Relatório - PDBFF - Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos
Transcrição
Relatório - PDBFF - Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos
Recrutamento de plântulas sob a copa de árvores com diferentes síndromes de dispersão Fernanda C. Gil Cardoso planta mãe (Harms et al. 2000, Wang & Introdução Muitos estudos tentam explicar a Smith 2002, Wenny 2001). alta diversidade das florestas tropicais (Chesson 2000, Denslow 1987, A dispersão de sementes pela fauna, conhecida como zoocoria, Terborgh et al. 2002, Wright 2002), permite a dispersão dos propágulos por mas ainda não há um consenso sobre a distâncias mais maneira como tantas espécies podem comparada a ocorrer em um mesmo local. Um único dispersão. Em florestas tropicais, cerca hectare de floresta amazônica, por de exemplo, pode conter mais de 280 adaptados à zoocoria (Jordano 1992). espécies de árvores (Valencia et al. Árvores com dispersão zoocórica atuam 1994). Existem diversos mecanismos como um grande atrativo da fauna, tanto que possibilitam a coexistência de de aves como de mamíferos. Esses tantas espécies em uma escala espacial animais trazem nas fezes propágulos de pequena, como o efeito da densidade diferentes dependente Janzen concentração de sementes de diversas 1970), a limitação ao recrutamento espécies sob a copa dessas árvores. A (Hurtt a maior deposição das sementes pela heterogeneidade espacial (Sollins 1998, fauna aumenta as chances de indivíduos Svenning 2001). de sementes também (Connel & 1978, Pacala determinante da 1995) A e dispersão é um coexistência de 90% longas outras das diferentes formas plantas espécies, quando tem de frutos aumentando espécies a recrutarem, fator elevando a diversidade. Dessa forma, as de árvores com síndrome de dispersão espécies, pois possibilita a colonização zoocórica de hábitats distantes e possivelmente mantenedoras com condições mais propícias para a florestas tropicais. germinação, propiciando o escape às altas taxas de mortalidade próximo à podem atuar de diversidade como em Além do aumento da diversidade de espécies pelo recrutamento, é possível que sob a copa de árvores com de plântulas devem ser maiores sob suas dispersão diversidade copas. Espero que o número de funcional também seja maior, devido à morfoespécies e o número de plântulas grande concentração de propágulos sejam maiores sob a copa de árvores diferentes trazidos pelos animais. A com dispersão zoocórica e que plântulas diversidade funcional nas plantas é crescendo sob a copa dessas árvores medida tenham maior variação de área foliar, zoocórica através funcionais, a de que características seus são atributos quaisquer morfológicas forma foliar e tipo de defesa foliar. ou fisiológicas, que afetam o desempenho Métodos dos indivíduos em um determinado Realizei este estudo na ARIE do ambiente (Violle et al. 2007). Esses Km 41 (2º30’S-59º52’O), uma área de atributos informações floresta de terra firme na Amazônia relevantes de como os organismos se Central. A área está localizada 80 km ao relacionam com as condições bióticas e norte de Manaus, AM, Brasil e é abióticas a administrada pelo Projeto Dinâmica atributos Biológica de Fragmentos Florestais representam do abordagem meio. focada Portanto, nos funcionais das espécies tem sido muito utilizada para inferir sobre os processos determinantes Manilkara bidentata (Sapotaceae), cuja comunidades vegetais (Diaz & Cabido dispersão é zoocórica e 10 árvores de 2001, Lavorel & Garnier 2002, McGill espécies com dispersão anemocórica, et al. 2006). utilizadas como áreas controle. Todas esse estruturação Selecionei 10 árvores da espécie das Com na (INPA/Smithsonian Institution). procurei estavam localizadas em áreas de platô entender o papel de uma espécie arbórea para evitar o efeito do rolamento de com no sementes que ocorre em direção aos recrutamento de plântulas em uma área baixios. Todas as árvores escolhidas de floresta de terra firme na Amazônia. eram adultas, tinham a copa grande e Considerando com diâmetro a altura do peito maior que 50 síndrome de dispersão zoocórica atraem cm. Sob a copa de cada árvore, mais o demarquei uma parcela de 1,5 m2, recrutamento e a diversidade funcional sempre no sentido norte e a 2 m de dispersão animais que estudo, zoocórica árvores dispersores, distância do tronco da árvore. Coletei comparação todas as plântulas (com alturas entre 10 parcelas sob a copa de árvores com e 50 cm) presentes dentro da parcela e dispersão zoocórica e das parcelas calculei a abundância e a riqueza de controle. Para análise dos dados dos morfoespécies. Posteriormente atributos funcionais das folhas (área selecionei a folha mais desenvolvida de foliar, forma foliar e tipo de defesa) cada os calculei o índice de diversidade de folhas. Shannon para cada atributo e comparei Determinei três atributos foliares: área as médias das parcelas sob árvores com foliar, forma foliar e presença de dispersão zoocórica e das parcelas estruturas de defesa nas folhas. Para controle. Para calcular o índice de calcular o Shannon da área foliar classifiquei os comprimento e a largura de cada folha valores obtidos em oito categorias de selecionada e usei a fórmula da área da tamanho (<1cm2; 1-2cm2; 2,1-4 cm2; elipse (3/4π*comprimento/2*largura/2). 4,1-8 cm2; 8,1-16 cm2;16,1-32 cm2; Para os outros atributos classifiquei as 32,1-64 cm2 e > 64 cm2). plântula atributos para determinar funcionais a área das foliar, medi das médias entre as folhas em categorias de forma foliar e categorias de defesa da folha. As categorias de forma eram: Amostrei 296 plântulas no total, elíptica, composta, circular, palmeira, sendo 143 em parcelas sob árvores com linear, As dispersão zoocórica e 153 sob árvores categorias de defesa eram: presença de com dispersão anemocórica. Não houve látex, tricomas, espinhos, nectários e diferença na riqueza e abundância de cera. morfoespécies de plântulas que crescem digitada e foliar Resultados irregular. de sob a copa de árvores com dispersão abundância e riqueza de morfoespécies, zoocórica e anemocórica (t15,8=-0,047; fiz p=0,96 e t17=0,39; p=0,70, Figura 1a,b). Para um analisar teste t de os dados Student para Figura 1. Número de morfoespécies (A) e número de plântulas (B) sob a copa de árvores com dispersão zoocórica e anemocórica (controle) na reserva do Km 41, Amazônia Central. A área foliar variou de 0,7 a 126,8 cm2 Não houve diferenças no índice nas plântulas que estavam sob a copa de de área foliar entre os dois tratamentos árvores com dispersão zoocórica e 0,4 a (t17,9=0,33; p=0,75). A diversidade de 129,8 cm2 nas plântulas sob a copa de formas nas plântulas sob as árvores com árvores controle. A forma foliar elíptica dispersão zoocórica também não foi foi a mais comum nos dois tratamentos diferente das árvores controle (t17,4= - e o mecanismo de defesa foliar mais 2,04; p=0,06). Em relação à presença de comum foi a deposição de cera sobre as estruturas de defesa, também não houve folhas. diferença entre os dois tratamentos (t14,5=0,61; p=0,55) (Figura 2 a,b,c). Figura 2. Média dos índices de diversidade de Shannon por tratamento para os atributos foliares avaliados: forma foliar (A), área foliar (B) e presença de estruturas de defesa (C). comunidades de plântulas apresentaram Discussão Os resultados mostraram que valores de abundância e riqueza de não há diferença entre a comunidade de morfoespécies e diversidade funcional plântulas sob árvores com dispersão semelhantes. zoocórica e anemocórica. As Esse resultado ser podendo fazer com que essa semente como tenha mais chance de germinar (Forget dispersão secundária e predação de 1991, Silva & Tabarelli 2001) Dessa sementes sobre os diásporos que caem forma, apesar da chuva de sementes ser sob a copa de árvores com dispersão maior sob a copa de árvores com zoocórica. A maior parte dos estudos de dispersão zoocórica (Clark et al. 2004), dispersão aborda apenas a dispersão o primária por animais (Jordano 1992), funcional das plântulas podem não porém vários estudos têm demonstrado refletir esse padrão devido a eventos a importância de eventos pós-dispersão pós-dispersão. conseqüência de pode eventos recrutamento e a diversidade (ex: dispersão secundária, predação) no Mesmo com grande aporte de destino final de diásporos (Hulme 1998, sementes sob a copa, o estabelecimento Passos & Oliveira 2004, Pizo et al. e 1998, 2005). dependem de outros fatores como a Formigas e roedores são considerados competição por nutrientes e por luz e a importantes dispersores secundários em interação com animais herbívoros e florestas & patógenos (Augspurger 1984, Janzen Galetti 2007, Nepstad et al. 1996). 1970, Wright 2003). Adicionalmente, o Formigas cortadeiras, por exemplo, que pode influenciar mais que o tipo de podem causar alta mortalidade de dispersão da planta é o seu período de plântulas e remover uma quantidade frutificação. Árvores adultas sem frutos, notável de pequenas sementes (Silva et por exemplo, parecem prover sítios al. 2007, Zwiener 2009). Além das seguros para grandes sementes, já que formigas, estudos mostram que árvores não atraem a fauna que as remove com dispersão zoocórica que estão em (Pinto et al. 2007). Em síntese, o tipo de período de frutificação atraem mais dispersão da árvore que está acima da mamíferos, a plântula não deve ser determinante para remoção das sementes sob suas copas o recrutamento e para a diversidade (DeMattia et al. 2004, DeMattia et al. funcional das plântulas. A dispersão 2006, Pinto et al. 2007). Alguns secundária roedores, por exemplo, enterram as remoção e a predação, pode ter grande sementes influência Vander-Wall tropicais et (Christianini aumentando para al. assim consumi-las depois, o recrutamento das no das sementes, plântulas como estabelecimento a de plântulas em floresta de terra firme na coordenadores Amazônia. PDBFF/INPA pela oportunidade. Agradecimentos Referências Agradeço a todos os colegas e Augspurger, (Paulinhos) C.K. 1984. e ao Pathogen professores do EFA 2010, em especial: mortality Marcelo Manoela, seedlings: Experimental studies of Paulinho e Bruno Cintra pelas sugestões the effects of dispersal distance, a este projeto, ao grupo “Amazon seedling Forest Woody Seedlings Functional conditions. Oecologia, 61:211- Diversity Drivers Project” (Ricardo e 217. Tabarelli, Catá, Pedro) pela ajuda com as análises de Chesson, P. of tropical density, tree and light Mechanisms of dados e discussões, Bruno Cid eAlêny maintenance of species diversity. pela ajuda durante o trabalho, “The Roof 2000. Annual Review of Ecology Club” e “The Igarafoot Club” pelos and Systematics, 31:343-366. ótimos momentos na Amazônia, a todos Christianini, A.V. & M. Galetti. 2007. os colegas, monitoras e professores dos Spatial variation on pos-dispersal projetos livres e orientados (Lianas, seed removal in an Atlantic Convergência Divergência, Forest: Effect of habitat, location Sub-bosque, and guilds of seed predators. Acta Macrófitas, x Dossel x Swartzia e Murunduns), João e Junior por dividir seu conhecimento sobre a Amazônia, Dona Clark, C.J., J.R. Poulsen, E.F. Connor & pelas V.T. Parker. 2004. Fruiting trees deliciosas refeições, Thiago Preto por as dispersal foci in a semi- tirar minha rede da chuva já que eu deciduous sempre Oecologia, 139:66–75. esquecia, Eduarda Oecologica, 32:328-336. Cami por me tropical forest. emprestar o “Matacura” e por todo Connell J.H. Diversity in tropical rain carinho, Bruno Cintra pela“cambada”. forests and coral reefs. 1978. A todos os outros integrantes pela Science, 199:1302-1309. inestimável amizade, ao meu anjo por DeMattia, E.A., L.M. Curran & B.J. todos os presentinhos ; ). Por fim, Rathcke. 2004. Effects of small agradeço rodents and large mammals on imensamente aos neotropical seeds. Ecology, 85:2161-2170. Perspectives in Plant Ecology, Evolution and Systematics, 1:32- DeMattia, E.A., B.J. Rathcke, L.M. Curran & Vargas, R.A.O. 2006. 46. Hurtt G.C. & S.W. Pacala. 1995. The Effects of small rodent and large consequences mammal exclusion on seedling limitation: reconciling recruitment history and in Costa Rica. Biotropica, 38:196-202. differences Denslow J.S. 1987. Tropical rainforest gaps and tree species diversity. Annual Review of Ecology and Systematics, 18:431–451. Plant recruitment chance, competitive between plants. Journal of Theoretical Biology, 176:1-12. Janzen D.H. 1970. Herbivores and the number of tree species in tropical Díaz, S. & M. Cabido. 2001. Vive la différence: of functional diversity matters to ecosystem forests. The American Naturalist, 104:501-528. Jordano P. 1992. Fruits and frugivory, processes. Trends in Ecology and pp. Evolution, 16:646–655. ecology of regeneration in plant Forget P.M. 1991. Scatterhoarding of Astrocaryum paramaca by Proechimys in French Guiana: comparison with Myoprocta 105-156. In: Seeds: the communities (M. Fenner, ed.). Wallingford: CAB International. Lavorel, S. & E. Garnier. 2002. Predicting changes in community exilis. Tropical Ecology, 32:155– composition 167. functioning from plant traits – Harms, K.E., S.J. Wright, O. Calderón, A. Hernández & E.A. Herre. 2000. Pervasive revisiting and the ecosystem Holy Grail. Functional Ecology, 16:545-556. density- McGill, B.J., B.J. Enquist, E. Weiher & dependent recruitment enhances M. Westoby. 2006. Rebuilding seedling diversity in a tropical community forest. Nature , 404:493-495. functional ecology traits. Trends from in Hulme, P.E. 1998. Post-dispersal seed Ecology & Evolution, 21:178-185. predation: consequences for plant Nepstad, D.C., C. Uhl, C.A. Pereira & demography and evolution. J.M.C. Silva. 1996. A comparative study establishment in of tree abandoned Ducke: Guia de Identificação das Plantas Vasculares pasture and mature forest of Floresta de eastern Amazonia. Oikos, 76:25- Amazônia 39. INPA/DFID. Terra de uma Firme Central. na Manaus: Passos, L. & P.S. Oliveira. 2004. Silva, P.D. & M. Tabarelli. 2002. Seed Interaction between ants and fruits dispersal, plant recruitment and of spatial distribution of Bactris Guapira opposita (Nyctaginaceae) in a Brazilian acanthocarpa sandy plain rainforest: ant effects (Arecaceae) in a remnant of on Atlantic forest in northeast Brazil. seeds and seedlings. Oecologia, 139:376-382. Martius Acta Oecologica, 22:259−268. Pinto, S.R.R., A.M.M. Santos & M. Silva, P.D., I.R. Leal, R. Wirth & M. Tabarelli. 2009. Seed predation by Tabarelli. 2007. Harvesting of rodents and safe sites for large- Protium seeded trees in a fragment of the March. seeds (Burseraceae) by the Brazilian Atlantic forest Brazilian leaf-cutting ant Atta sexdens L. Journal of Biology, 69:763-771. promotes seed aggregation and Pizo, M.A., L. Passos & P.S. Oliveira. seedling heptaphyllum mortality. (Aubl.) Revista 1998. Ants and seeds of a Brasileira de Botânica, 30:553- nonmyrmecochorous neotropical 560. tree, canjerana Sollins P. 1998. Factors influencing (Meliaceae), in the Atlantic forest species composition in tropical of southeast Brazil. American lowland rain forest: does soil Journal of Botany, 85:669-674. matter? Ecology, 79:23-30. Cabralea Ribeiro, J.E.L.S., M.J.G. Hopkins, A. Svenning, J.C. 2001 Environmental Vicentini, C.A. Sothers, M.A.S. heterogeneity, Costa, J.M. Brito, M.A.D. Souza, limitation L.H.P. Martins, L.G. Lohmann, distribution of palms in a tropical P.A.C.L., Assunção, E. Pereira, montane C.F. Silva, M.R. Mesquita. & L. (Maquipucuna, Ecuador). Journal Procópio. 1999. Flora da Reserva of Tropical Ecology,17:97-113. and recruitment the rain mesoscale forest Terborgh J.T., N. Pitman, M. Silman, H. Wright, S.J. 2003. Gap-dependent Schichter & V.P. Núñez. 2002. recruitment, realized vital rates, Maintenance of tree diversity in and size distributions of tropical tropical forests, pp 1–17. In: Seed trees. Ecology, 84: 3174–3185. dispersal and frugivory: ecology, Wang, B.C. & T.B. Smith. 2002. evolution and conservation (D.J. Closing the seed dispersal loop. Levey, W.R. Silva & M. Galetti, Trends in Ecology Evolution, eds.). 17:379–387. Wallingford: CAB International. Wenny, D.G. 2001. Advantages of seed Valencia R., H. Balslev, Y. Paz & G. dispersal: A re-evaluation of Mino. 1994. High tree alpha directed dispersal. Evolotionary diversity in Amazonian Ecuador. Ecology Research, 3:51-74. Biodiversity Conservation, 3:2128. Zwiener, V.P. 2009. Efeito das perturbações de hábitat sobre a Vander-Wall, S.B., K.M. Kuhn & J.M remoção de sementes na Floresta Beck. 2005. Seed removal, seed Atlântica predation and secondary dispersal. Dissertação Ecology, 86:801-806. Universidade Federal do Paraná, Violle C., M.L. Navas, D. Vile, E. Kazakou, C. Fortunel, I. Hummel & E. Garnier. 2007. Let the concept of trait be functional! Oikos, 116:882-892. Wright, S.J. 2002. Plant diversity in tropical forests: a review of mechanisms of species coexistence. Oecologia, 130:1-14. Curitiba. em Antonina, de PR. Mestrado,
Documentos relacionados
Fenologia de espécies arbóreas em uma Floresta Estacional
processos ecológicos evolutivos de espécies e comunidades (NEWSTROM, FRANKIE e BAKER, 1994), assim como permite identificar os fatores que mais interferem no desenvolvimento de cada fenofase, espec...
Leia maisRiquezas da floresta: frutas, plantas medicinais e artesanato na
Muitos pesquisadores tem estudado produto florestais em diferentes partes do mundo utilizando métodos de várias disciplinas, incluindo silvicultura, economia e antropologia. Embora esses estudos te...
Leia mais