pinguins-de-magalhães arribados na costa do rio

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pinguins-de-magalhães arribados na costa do rio
III Congresso Brasileiro de Oceanografia – CBO’2010
Rio Grande (RS), 17 a 21 de maio de 2010
PINGUINS-DE-MAGALHÃES ARRIBADOS NA COSTA DO RIO GRANDE DO
SUL: COMPOSIÇÃO DA DIETA E ECOLOGIA ALIMENTAR
Mäder, A.¹,³; Sander, M.²; Casa Jr., G. E.³
¹ Programa de Pós-graduação em Diversidade e Manejo de Vida Silvestre – UNISINOS; ² Laboratório de Ornitologia e
Animais Marinhos (LOAM) – UNISINOS. ³ Laboratório de Ecologia e Manejo de Vida Silvestre (LEMA). Avenida
Unisinos, 950. Cristo Rei. São Leopoldo / RS. CEP: 93.022-000. E-mail: [email protected]
RESUMO
Estudos sobre a ecologia alimentar da espécie em toda sua distribuição geográfica são de
extrema importância. Este estudo traz informações sobre a dieta do pingüim-de-Magalhães, (1)
identificando as principais presas consumidas e (2) quais fatores podem estar influenciando na
seleção de presas. Através da análise de 65 conteúdos gástricos de pingüins jovens
constatamos que o polvo A. nodosa foi a espécie mais freqüente na dieta (55.11%), seguido
pelas espécies de lulas do gênero Loligo e plásticos “nibs”. Nenhum indício de peixe foi
encontrado, diferente dos estudos de dieta argentinos e chilenos.
Palavras chave: alimentação, aves marinhas, cefalópodes
INTRODUÇÃO
Estudos sobre a composição da dieta e ecologia alimentar de aves marinhas são
importantes chaves para compreender as dinâmicas de suas populações e presas e, servem
como indicadores de qualidade ambiental (MONTEVECCHI,1993), pois existe uma grande
relação entre a distribuição de aves marinhas e as grandes áreas pesqueiras (AINLEY 1980).
Dentro dos limites de distribuição das populações, as densidades podem variar de
acordo com a qualidade do habitat (RICKLEFS, 1996). Principalmente quando a referem aos
recursos alimentares, pois a produtividade biológica na superfície do oceano varia em função
de luz solar e das condições oceanográficas de cada área (VOOREN E KIPPEL, 2005). Isso
faz com que muitas aves marinhas desloquem-se para o Brasil, a procura de maior aporte
alimentar, evitando as condições adversas nas altas latitudes e acompanhando também o
deslocamento sazonal das massas de água ricas e nutrientes (VOOREN E FERNANDES,
1989).
As populações de pingüins poderiam estar sofrendo com mudanças populacionais de
suas presas devido às grandes atividades de pesca. Para isso é muito importante estudos
sobre a ecologia alimentar da espécie em toda sua distribuição geográfica (FRERE et al.,
1996). Em função disso, buscamos trazer informações sobre a dieta do pingüim-de-Magalhães,
(1) identificando as principais presas consumidas e (2) quais fatores podem estar influenciando
na seleção de presas.
METODOLOGIA
Foram coletados estômagos de carcaças de pingüins frescos arribados na costa norte
e média do Rio Grande do Sul durante os anos de 2006 a 2008 e condicionados em álcool
70%. Para a identificação dos itens foram utilizadas coleções de referência de mandíbulas de
cefalópodes e guia específico (CLARKE, 1986). A partir da triagem foi calculada a freqüência
de ocorrência dos itens encontrados (número de estômagos contendo cada item / número total
de estômagos analisados).
RESULTADOS
Foram analisados 65 conteúdos gástricos de pingüins jovens em boas condições
(carcaças frescas). Em torno de 18% não apresentam itens alimentares, e estes apresentaram
uma grande quantidades de parasitos estomacais. Em 6% das amostras havia a presença de
petróleo no estômago. Os itens antrópicos mais encontrados foram nibs e snips (partículas
naturais do plástico e produto utilizado para limpeza de navios) (49,4 %) e o plástico que foi
bastante presente nas amostras (19%). No total 62.3 % apresentavam itens de origem
antrópica. O polvo Argonauta nodosa foi a espécie mais freqüente na dieta (55.11%), seguido
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pelas espécies de lulas do gênero Loligo, ocorrendo L. sanpaulensis (49.8%) e L. plei (26.3 %).
Também se registrou uma espécie de cefalópode bioluminescente do gênero Histiotheuthis
(Tab 1). Nenhum indício de peixe foi encontrado.
Tabela I. Freqüência de ocorrência (FO%) das
espécies de cefalópodes nos 65 estômagos de
pingüins analisados.
Espécie
FO%
Argonauta nodosa
55.11
Loligo sanpaulensis
49.78
Loligo plei
26.31
Liocranchia reinhardtii
4.02
Histioteuthis sp.
3.27
Illex argentinus
2.7
Loligo sp.
1.7
DISCUSSÃO
No sul do Brasil os pingüins-de-Magalhães que arribam a costa se alimentam
principalmente de cefalópodes (AZEVEDO E SCHIEFLER 1991; STRIEDER 1992; FONSECA
et al., 2001; PINTO et al., 2006; este estudo), ao contrário do que concluíram estudos
argentinos e chilenos que demonstram a preferência por peixes pela a espécie (CROXALL et
al. 1987, FRERE et al. 1996, SCOLARO et al. 1999, FORERO et al., 2002). O fato é que os
cefalópodes são considerados apenas suplementos alimentares, pois é uma presa de baixo
valor energético (RANDALL et al. 1981) quando comparado a peixes, isso pode acarretar maior
gasto energético para a captura, pois precisam de um maior número para suprir suas
necessidades.
Para FONSECA et al. (2001) e PINTO et. al. (2007) e este estudo, 8% , 5% e 0% dos
estômagos analisados apresentaram vestígio de peixes. Isto se deve por apresentam um
comportamento alimentar oportunista e pouco seletivo (AINLEY, 1980; FRERE, et al., 1996), e
provavelmente outros fatores estão associados, como sexo, idade, período reprodutivo,
métodos de captura e latitude. Na costa do Rio Grande do Sul 97.5 % são indivíduos jovens
(MÄDER et al., no prelo). Uma importante variação na dieta foi observada de acordo com a
idade dos indivíduos por FORERO et al., (2002). A idade e a experiência são fatores que
contribuem coma variação na exploração dos recursos (HODUM e HOBSON 2000). Muitas
vezes chegam à costa sul brasileira em pequenos grupos ou até mesmo náufragos (SICK
1997), isso, pode dificultar a captura de grandes cardumes, acabando por optar presas de fácil
acesso, como os cefalópodes.
O polvo Argonauta nodosa não é uma espécie visada pelas atividades pesqueiras. É
um polvo oceânico, epipelágico com distribuição tropical e subtropical (HAIMOVICI e PEREZ,
1991) e habitam a superfície (IMBER, 1992), até 30 m, facilitando a sua captura. Espécies do
gênero Loligo ocupam a coluna d’água até 200 m de profundidade e são organismos
semipelágicos e semélparos, tendo um pico de reprodutivo de julho a novembro (HAIMOVICI e
PEREZ, 1991), coincidindo com o pico de pingüins na costa gaúcha (MÄDER et al. no prelo).
MÄDER et al. (2007) registrou itens de origem antrópica em 37% dos conteúdos
gástricos analisados em 2002 e 2003, havendo um aumento para 62, 3% neste estudo. A
grande quantidade de nibs ou snips pode ter sido ingerida indiretamente, ou seja, junto às
presas capturadas ou ingeridos pelas presas consumidas. Um navio de que utiliza esferas de
poliuretano (snips) para jateamento de limpeza convencional e absorver quantidades residuais
de petróleo, lança ao mar em torno de 80 toneladas de resíduos (CARVALHO, 1975) e na
costa do Rio Grande do Sul são encontradas partículas de polietileno e polipropileno (nibs)
oriundas de navios de exportação de vários países como da Alemanha, Japão, Estados Unidos
para a América do Sul e consistem em PP, materiais para fabricação de utensílios domésticos
e autopeças; PEAD, materiais rígidos com maior resistência mecânica e PEBD, que são
utilizadas para fabricação de embalagens em geral (PETRY et al., 2004). Os plásticos ingeridos
podem ser confundidos com lulas (Loligo sp.) semélparas, que flutuam mortas e moribundas na
superfície da água. Podemos destacar a grande incidência de material antrópico no conteúdo
ingerido pelo pingüim-de-Magalhães e uma diferenciação na dieta desta espécie no sul do
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Brasil por fatores ecológicos e/ou uma deficiência na captura presas com maior valor
energético devido à redução na abundância dos estoques de teleósteos explorados na região
sul do Brasil – sobrepesca (CERGOLE et al., 2005), pois a expansão da pesca compete com
este pingüim por presas (SKEWGAR et al., 2007).
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