Escatologia - Compartlhando a Verdade

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Escatologia - Compartlhando a Verdade
STBRS-PETE “5.000 Æ 5.000” Escatologia e o Apocalipse
Pr. Chrístopher B. Harbin
Escatologia:
Estudo Teológico das Coisas Finais (Vida além-túmulo, Parousia,
Ressurreição, Julgamento, Fim do Mundo e o Apocalipse)
Um estudo preliminar das doutrinas centrais referentes às temáticas da escatologia e o
Apocalipse, procurando uma aproximação maior com a base bíblica na elaboração de conceitos
em resposta ao contexto evangélico riograndense e os tratamentos sistemáticos norteamericanos
existentes no mercado evangélico brasileiro. Por questão da influência de interpretações
populares do Apocalipse de João na definição de conceitos escatológicos, um breve comentário
ao livro está incluido neste estudo. Material preparado para uso em aula de teologia sistemática
com alunos do Seminário Teológico Batista do Rio Grande do Sul.
Apostila preparada por:
Christopher B. Harbin
Seminário Teológico Batista do Rio Grande do Sul
Edição impressa sem gráfica: janeiro 2006
Edição: 12-09-2002
©Copyright 2002 por Chrístopher Byron Harbin
Todos os direitos reservados.
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Pr. Chrístopher B. Harbin
©Copyright 2002 por Christopher Byron Harbin.
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O autor pode ser contatado conforme abaixo:
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Seminário Teológico Batista do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS
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Escatologia:
Estudo das Últimas Coisas
“Quer concordemos que estas questões [de escatologia] são importantes, quer não,
devemos examiná-las, pois aqueles que as discutem as consideram importantes” 1.
Anotações Gerais:
A escatologia compreende dois aspectos principais: a escatologia cósmica e a escatologia individual2.
Pretende-se em primeira instância tratar algumas das questões de referência comunal e cósmica. Por
outro lado, pretende-se dar mais ênfase aos aspectos individuais da temática. Neste estudo são os
aspectos individuais que serão enfocados, pois são nestes elementos da temática que o indivíduo se vê
em necessidade pessoal de estar relacionado devidamente com Deus. A escatologia reúne um
apanhado de conceitos que sofreu muita transformação ao longo do trajeto revelacional do povo de
Israel. As expectativas escatológicas foram em muito modificadas através do tempo, incluindo o caso
de muitas correntes que nem mantinham conceitos propriamente escatológicos3.
Não existe um só conceito unificado e sistemático na Bíblia referente a questões de escatologia, mas
vários conceitos com enfoques diferenciados. Estas diferenças se devem ao caráter progressivo da
revelação em termos da escatologia. Ao mesmo tempo, pode-se delinear que há em várias passagens
do Antigo Testamento, da literatura judaica até o primeiro século e do Novo Testamento uma
consciência “de que Deus agirá de forma decisiva no futuro,” fazendo surgir um contexto diferente e
novo4. Em muitos casos essas conceitualizações são expressas em termos de uma volta a um tempo
primordial ou ideal, como no Éden5.
Deve-se lembrar que algumas passagens tratam assuntos tais como a ressurreição e julgamento desde
perspectivas completamente distintas. Uma perspectiva trata o assunto de forma aorista, ou resumida
como se tudo acontecesse num só instante—uma grande ressurreição e julgamento6. Outra
perspectiva trata o conceito de forma a destacar a diferenciação temporal do indivíduo—ressurreição
e julgamento para cada indivíduo no momento de sua morte física7. A diferença nessas perspectivas
tem induzido alguns a tratarem um conceito de “estado intermediário” entre a morte e o “grande
julgamento”. Tudo pode não passar de perspectivas diferentes de uma mesma coisa, sem qualquer
“estado intermediário”. De qualquer forma, Paulo diz em Filipenses 1.23 que partindo desta vida ele
está com Cristo. Mesmo que haja algum estado “intermediário”, portanto, tal não vem a ser
diferente do que o estado “final”.
No estudo da escatologia, muito tem-se dito e publicado sobre o livro de Apocalipse. Grande parte
dos posicionamentos referidos são simplesmente feitas em ignorância. Pode ser um tanto mais difícil
determinar com precisão o que se pode dizer com certeza, mas deve ser um alerta para todo
1
ERICKSON, OCnE, 10.
D. E. Aune em FREEDMAN, “Eschatology: Early Christian Eschatology”.
3
David L. Petersen em FREEDMAN, “Eschatology: Old Testament”.
4
George W. E. Nickelsburg em FREEDMAN, “Eschatology: Early Jewish Literature”.
5
D. E. Aune em FREEDMAN, “Eschatology: Early Christian Eschatology”. Veja Isaías 11.6 como exemplo desta forma de expressão.
6
Uma grande ressurreição e um grande julgamento se vê retratado em passagens como Apocalipse 20.5-13.
7
Como se vê na parábola de Lázaro e o homem rico em Lucas 16. Os irmãos do rico estão vivos ainda na terra, enquanto Lázaro e o rico já
receberam “juízo e sentença”.
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intérprete a vasta literatura que tem sido escrita e descartada, especialmente entre aqueles que querem
definir com base nesta carta a predição da época e as condições do fim do mundo. Vários
“intérpretes” já pronunciaram erroneamente a data certa do fim do mundo. As palavras de Jesus
deveriam ser o suficiente para o cristão: “Vigiai, pois ninguém sabe quando será aquele dia, a não
ser o Pai”. Certos assuntos não cabem ao ser humano definir. Afinal, foi para um relacionamente
de fé que fomos convocados. Fé em Deus, não nas minhas definições e ilusões dogmáticas.
Problemas em tratar Escatologia:
Distância Pessoal: Um dos primeiros problemas a serem evitados no estudo de Escatologia, é de
manter o assunto muito distante do indivíduo. Pode-se muito facilmente falar da segunda vinda de
Cristo usando expressões no sentido de que Jesus pode voltar amanhã, porém não se ouve a
necessidade de estar preparado. Em geral pensa-se: “Pode ser que Jesus venha amanhã, mas não é
muito provável. Não é preciso dar muita importância ao assunto.” Neste contexto, o estudo da
escatologia vem a ser um estudo bem confortável, pois trata-se de algo polêmico, intrigante, ambíguo
e muito distante. Por outro lado, a Bíblia parece sempre abrir o assunto assinalando a necessidade de
cada um estar preparado. É necessário lembrar que estas “últimas coisas” incluem aspectos que são
refletidos no cotidiano.
Princípios de Interpretação: Outro problema a ser considerado ao estudar assuntos de escatologia
(como também qualquer outro tema bíblico) concerne à necessidade de respeitar os princípios de
interpretação bíblica. Além de sempre ler os versículos e as passagens dentro de seus respectivos
contextos, é necessário lembrar que as passagens de ensino claro sempre tomam precedência no
tratamento de um tema. Por exemplo, 1ª João é muito mais claro ao tratar do anticristo do que o
livro de Apocalipse. Outro ponto a observar é o tipo de literatura que se está estudando ao tratar um
texto. O estilo literário do Apocalipse não é igual a 1ª João e o tratamento dos livros deve respeitar
essa diferença.
Leitura Contextual: Mais um problema a negociar é a necessidade de ler as passagens bíblicas em
relação aos seus propósitos, não em sentido de responder curiosidades pessoais. A Bíblia foi escrita
para tratar da necessidade do homem perante Deus, não para ensinar ciência, história, nem
futurismo. No final de um estudo, nem todas as perguntas, dúvidas e questionamentos serão
respondidos, pois a Bíblia não segue o propósito de responder às curiosidades humanas. Jesus
mesmo disse, “Não vos compete saber os sinais e os tempos” (Atos 1.7). Deus exige do homem uma
dependência e confiança sem se propor necessariamente a aplacar todas as dúvidas e preocupações
humanas.
História: Outro problema a ser evitado está relacionado à história. Berstén e outros fazem distinção
entre profecias que se cumpriram e outras que ainda não se cumpriram. O problema que deve ser
tratado nesse contexto é o de compreender o que já sucedeu na história para então poder fazer uma
melhor declaração entre aquilo que tem e não tem acontecido. Salienta-se aqui a passagem de Mateus
24.1-28 e o contexto da destruição de Jerusalém no ano 70 depois de Cristo8.
Cosmologia: É necessário compreender como o povo, especialmente os autores bíblicos entendiam o
mundo em que viviam. Sua cosmologia implicava na sua terminologia aplicada a conceitos espaciais
e geográficos, como também a certas referências escatológicas. Não é lícito forçar o texto bíblico a
8
LOWRY, 35, Jerusalém foi incendiado na manhã de 26 de setembro de 70.
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refletir um conceito cosmológico do século vinte, quando os autores não compartilhavam esse
conceito.
Vocabulário Especializado: Por outro lado, é indispensável que se trate o vocabulário bíblico
conforme o uso dos próprios autores. Certas palavras ou frases eram usadas diferenciadamente da
forma atual. O judeu dividia o tempo em duas partes: antes do Messías e depois do Messías. Por
“últimos tempos” ou “tempos postreros”, a Bíblia designa a segunda etapa do tempo. Os últimos
tempos, então, começaram com Jesus e referenciam o tempo desde aquela época até o final do tempo.
Supremacia Bíblica: É sumamente necessário que respeitemos que a palavra final referente a
qualquer assunto teológico é a palavra bíblica. Não é lícito dar mais confiança a sonhos, palavras de
profecia e visões do que ao próprio texto bíblico. Toda outra fonte deve ser submetida às indicações
e às limitações apresentados no tratamento bíblico dos assuntos correspondentes. A Bíblia é a
Palavra de Deus e Deus não se contradiz, ainda que a Bíblia exibe um desenvolvimento teológico no
processo revelacional. Quando houver conflito entre a mensagem bíblica e a palavra ou evento
profético, a dúvida recairá sobre a fonte extra-bíblica.
Respeitar Limitações: Também é necessário lembrar que existem limitações ao que pode ser
conhecido em certas áreas. Atos 1.7 indica que não compete ao ser humano saber e entender a
maioria das questões referentes a eventos futuros. Precisa-se aceitar que Deus simplesmente não
revela detalhes a respeito de toda curiosidade humana. É necessário ler o texto bíblico reconhecendo
o propósito do proprio texto, não jogando por cima do texto um propósito pessoal especulativo sobre
o fim do mundo. O que realmente importa saber está exposto de forma clara: “Vigiai, pois não
sabeis em que dia vem o vosso Senhor!”9.
Em consideração às limitações do intérprete bíblico referente a formas divergentes de compreender o
mundo (ou seja, divergências entre as formas da antigüidade e as atuais), apresenta-se certas
reflexões sobre a forma na qual os autores bíblicos refletiram sobre o mundo. Os textos bíblicos
apresentam muito ensino com o uso de expressões que referenciam ou retratam os conceitos
cosmológicos do povo e de seus vizinhos. Espera-se que este tratamento possa ajudar a compreender
melhor as implicações dos termos usados na Bíblia.
Cosmologias Antigas10:
Em vários casos, será de ajuda na compreensão de um texto saber algo sobre o conceito cosmológico
do povo hebreu na época bíblica. Este conceito, embora diferenciado, está relacionado aos conceitos
cosmológicos dos povos ao seu redor. É importante conhecê-los especialmente ao lidar com
narrativas concernentes à criação, ao dilúvio e tópicos escatológicos que retratam realidades celestias
em terminologias da realidade física conhecida. Evidências deste conceito cosmológico serão
encontradas em outras narrativas e textos ao descrever algo do mundo além-túmulo ou aspectos do
universo criado por Deus.
O conceito hebraico do formato do universo deve ser considerado ao tratar de assuntos tais como a
criação. Os hebreus tinham a mesma percepção “científica” do mundo dos outros povos de sua
época, porém faziam suas distinções. Em matéria do formato físico-estrutural do universo, tinham
9
Mateus 24.42.
Observação: Esta seguinte porção do texto sobre as cosmologias antigas procede da apostila, Homilética da Teologia das Narrativas, na versão
de julho de 2002.
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muito em comum com os outros povos. O texto bíblico usa termos como “abismo”11, “expansão”
(em algumas traduções “firmamento”)12, “janelas dos céus”13 e outros termos que de certo soam um
tanto estranhos no século presente. Estes termos demonstram a forma antiga de se refletir sobre o
mundoa sua perspectiva do universo criado por Deus. Pode-se ver que certos assuntos atuais,
como a preocupação de encontrar vida em outros planetas, não tem cabimento no texto bíblico pelo
simples fato de que estas perguntas baseiam-se em outra cosmologia, muito distinta daquela dos
hebreus14.
O gráfico apresentado a seguir ajuda na compreensão da perspectiva “científica” dos hebreus
referente ao formato do universo, refletido especialmente em passagens como Gênesis 1-11 e de Jó
38-41, na qual Deus faz perguntas a respeito da criação do universo que Jó não consegue responder.
Os elementos comuns entre os hebreus e os outros povos são diferenciados em seus termos
representativos e especialmente na sua explicação religiosa. É importante lembrar que mesmo
quando o conceito hebraico reflete certas noções tidas em comum com os outros povos, a ênfase das
narrativas hebraicas é a de oferecer uma crítica nos pontos em que divergem deles pela revelação de
Deus.
Este gráfico do conceito
hebraico da estrutura do
universo limita-se a uma
fração mínima da cosmologia
científica atual. Pode-se ver
como a Bíblia utiliza certa
terminologia que se refere ao
conceito cosmológico de
seus autores15. Pode-se ver
no gráfico o título de
“firmamento”
(ou
“expansão”) para o círculo
dos céus que separa as águas
acima do firmamento da
zona que se denomina hoje
por atmosfera. Estes termos
ajudavam o povo a falar do
mundo ao seu redor, mesmo
que o seu conceito específico
tenha sérios problemas em
face da ciência atual.
Entender a cosmologia
hebraica é de ajuda para compreender as implicações das narrativas que utilizam a terminologia do
mesmo conceito. Quando o autor bíblico refere-se às janelas do céu, é bom saber que faz referência
ao seu conceito de como a água acima do firmamento chega até a terra em forma de chuva.
11
Refletido em passagens como Gênesis 1.2; 7.11; 8.2; 49.25; Deut. 33.13; Jó 28.14; 38.16; 38.30; 41.31-32; Salmo 36.6; 42.7.
Refletido em passagens como Gênesis 1.6-8, 14-15, 17, 20; Salmo 19.1; 150.1; Ezequiel 1.22-26; 10.1; Daniel 12.3.
13
Refletido em passagens como Gênesis 7.11; 8.2; 2a Reis 7.2, 19; Malaquias 3.10.
14
Segue-se o quadro: “Cosmologia Hebraica”, conforme BANDSTRA, 56, KASCHEL, 159 e WEST, 81.
15
Gênesis 1.2,6-8,16-17, 7.11; Êxodo 20.4.
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A cosmologia é uma área da
ciência que influi muito em vários
aspectos da comunicação humana,
pois muitos dos seus conceitos
alteram a forma de conceber o que
acontece em volta do indivíduo e a
sua sociedade. A cosmologia
hebraica aparece até no livro de
Apocalipse, onde o “‘abismo sem
fundo’ está vinculado a idéias
concernentes à forma do mundo.
A terra era concebida como um
disco plano que flutuava em cima
da água. O abismo refere-se às
profundezas imensuráveis debaixo
da terra, para os quais pensava-se existir uma fenda capaz de ser selada”16. Até o Novo Testamento,
portanto, sente a influência desta cosmologia.
O conceito egípcio era estruturalmente bem parecido com o hebreu, mas representado nas pessoas de
seus deuses17. Estes representavam para os egípcios as várias partes do cosmos. Enquanto trata-se
na atualidade do mundo fenomenológico como objeto impessoal, “os antigos reagiam a ele como a
uma ‘pessoa’”18. Assim, entre os egípcios, a mitologia e apresentação cosmológica defendiam que o
panteão de deuses era parte do cosmos em termos físicos e representativos. Assim, o universo é
tanto criação de seus deuses, como também os seus deuses compõem as partes do universo.
Não parece que houve muita diferenciação entre a obra resultante e o originador da mesma. No
antigo conceito cosmológico egípcio, o deus-céu é o céu, o deus-terra é a terra, o deus-Nilo é o Nilo
e o deus-ar é o ar. (Portanto, no relato das pragas do Egito19, Deus se revela como maior que os
deuses do Egito, não apenas por dominar suas esferas de influência, mas, segundo a forma egípcia de
ver as coisas, por dominar os seus próprios deuses!) Essa forma segue alguns aspectos da mitologia
babilônica retratadas no seu épico, Enuma Elish20, porém é diferenciada em suas próprias expressões.
Os relatos mitológicos dos egípcios referentes a este conceito cosmológico divergiam em muito das
narrativas que se encontram no livro de Gênesis. Os primeiros relatam lutas e intrigas entre deuses
que atuam tais como ou até piores do que os seres humanos. Esses deuses têm muito em comum
com os deuses dos gregos, romanos, e babilônicos, porém pouco ou nada com YHWH (hwhy), Senhor
de Israel.
O conceito babilônico (ou seja, mesopotâmico) do universo é parecido com os conceitos hebraico e
egípcio em seus termos estruturais, mesmo que apresentando outro formato que centraliza a
montanha da terra. Esta montanha era muito importante para os babilônicos, refletindo a idéia de
que no seu ápice era a morada de seus deuses. O épico Enuma Elish21 amplia a perspectiva narrativa
e histórica do conceito babilônico em termos de como o mundo chegou a ser formado. Este épico
enfatiza mais o relacionamento com a perspectiva do panteão de deuses egípcios, pois ele relata o
16
ROBBINS, 221-222.
Aqui a deusa é retratada como suspensa pelo deus do ar, firmado no deus da terra. Veja WEST, 82.
18
LASOR, 24 e 32.
19
Êxodo 7-12, incluindo a morte do herdeiro de Faraó, que também se considerava um deus ou representante divino.
20
Enuma Elish é um poema babilônico, retratando a criação do mundo a partir da perspectiva babilônica de um panteão (veja HEIDEL, 1-60).
21
HEIDEL, 78-79.
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assassinato de alguns deuses e a construção das
partes do cosmo com a utilização de seus
corpos. O mesmo relato diverge do egípcio em
que os deuses usados para essa “construção” já
não existem, pois usou-se seus cadáveres na
estrutura física do mundo.
A estrutura física resultante desta cosmologia,
porém, apresenta-se bem semelhantemente à
hebraica. Tem-se também uma reflexão da
perspectiva cosmológica do Apóstolo Paulo, ao
mencionar um homem que foi levado até “o
terceiro céu”22. Esta citação reflete sua visão
estrutural do universo. O quadro acima ilustra
a cosmologia babilônica23. Nota-se que a
perspectiva é a da terra ser uma espécie de ilha,
com água na volta por todos os lados. Tal era
o conceito geral dos hebreus e seus povos
vizinhos24. Um detalhe faltando no quadro é o
túnel por debaixo da superfície da terra pelo qual o sol passava cada noite para chegar de novo a seu
lugar de nascer25.
Nota-se nos relatos babilônicos uma série de conflitos, lutas e intrigas. Estas sucedem tanto entre os
seus próprios deuses, como também entre os deuses e o caos do universo quando da criação do
mundo habitado pelos homens. Desde a perspectiva babilônica, “a criação é realmente nada mais
que a vitória sobre os poderes caóticos que ameaçam a vida dos deuses e das pessoas”26. Os deuses
até conseguem vitória sobre o caos do universo, mas não há uma certeza de vitória entre si, já que
existe entre eles uma disposição a intrigas. Também as suas narrativas referentes ao dilúvio revelam
este mesmo caráter de incerteza, desconfiança, capricho e intriga.
Na cosmologia babilônica pensava-se que a criação do mundo era o resultado da junção dos oceanos
de água salgada e de água fresca na pessoa dos deuses, Tiamat e Apsu. Estes nomes servem de igual
modo para designar os oceanos referentes27. Foi na junção ou união destes deuses que a terra seca se
formou28. O formato do mundo, portanto, era concebido de modo essencialmente igual, trocando o
estilo e especificidade da atuação e identificação dos personagens divinos associados à criação.
Assim, as mitologias narradas por estes outros povos divergem muito das narrativas hebraicas do
Gênesis. No texto bíblico encontra-se conflito, mas este conflito é procedente do homem, não dos
céus entre um panteão de deuses. Em Gênesis, Deus cria a partir de uma decisão de sua livre e
soberana vontade e até domina o “caos” ao começar sua obra criativa. A descrição do restante deste
primeiro relato da criação mostra como Deus operou para impor ordem ao caos que já lhe obedecia e
lhe serviu de base para o restante de sua criação. O narrador continua mostrando ainda a soberania
divina sobre o caos na descrição do dilúvio, apresentando o conceito de YHWH ser muito acima do
conceito dos outros povos referente a seus deuses.
22
2ª Coríntios 12.2.
Segue-se o quadro: “Conceito Babilônico do Universo” – WEST, 83.
24
BANDSTRA, 55.
25
SASSON, 40-41.
26
BRONGERS em WOUDE, 116.
27
BANDSTRA, 51.
28
COOGAN, 9.
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O conceito estrutural da forma do universo, então, era mantido basicamente em comum com os
outros povos ao seu redor, porém as considerações teológicas que os hebreus mantiveram referente a
essas estruturas físicas é algo completamente diferente. Como participavam dos conceitos
cosmológicos dos seus vizinhos, a sua ciência geofísica e geográfica era muito diferente daquela
aceita no século vinte. Estas diferenças devem ser levadas em consideração para uma melhor
compreensão de textos tão antigos.
Mesmo com as diferenças enormes entre conceitos da estrutura do universo de hoje e dos povos do
mundo antigo, as considerações teológicas destes que apresentam conceitos divergentes são aplicáveis
aos dias de hoje, sem qualquer necessidade de alteração. O texto bem pode falar com um linguajar
geográfico ao considerar a vida além do túmulo, sem alterar o significado do ensino teológico da
expressão.
Hoje ainda se fala com o mesmo tipo de linguagem sobre o viver com Deus “nos céus”, mesmo que
se saiba que Deus não mora num lugar fixo acima das núvens. Ainda se faz referência a um inferno
que se localizaria abaixo da crosta da terra, mesmo que não mais se pense no inferno como uma
habitação debaixo da superfície da terra. Estas formas de expressão remontam a cosmologias bem
diferentes da atual. O problema maior para o intérprete é descobrir a intenção teológica do texto,
não considerar a validade científica do pensamento do povo e do autor.
Não se deve cometer o mesmo tipo de erro que a igreja enfrentou na época de Galileu Galilei,
opondo-se a novos posicionamentos científicos para “proteger” os vínculos que se haviam construído
entre questões de fé e conceitos científicos. Aceitando o propósito bíblico básico como sendo
teológico, recorre-se à Bíblia para embasamento de questões de fé e prática, não de conceituações
intelectuais referentes ao mundo criado por Deus. A Bíblia interessa-se mesmo em explicar “Quem”
criou, não o método, nem o formato da criação.
As narrativas bíblicas pretendem demonstrar a identidade de YHWH em relação e contraste com o
homem, não pretendem ensinar ciência. O importante das narrativas, então, não é uma veracidade
detalhada de suas considerações científicas e descritivas do universo, mas o seu ensino referente a
YHWH e Seus desígnios para a humanidade. É interessante lembrar que as narrativas não contam
toda a história da interação de YHWH com o Seu povo. Como o autor do Evangelho de João coloca,
há muitas coisas que poderiam ter sido escritas referente aos acontecimentos históricos entre Deus e o
seu povo, mas estas foram escritas com propósito específico. Assim como o Evangelho de João foi
escrito para suscitar a fé real, também é este o propósito das narrativas bíblicas em geral—“para que,
crendo, tenhais vida em seu nome”29.
Bultmann, estudioso do Novo Testamento, referiu-se à cosmovisão expressa no Novo Testamento em
termos parecidos com a descrição anterior.
Examinando a cosmovisão do NT, [Bultmann] achou que boa parte dela era mítica em sua natureza. Por mito quis
dizer a descrição de realidades do outro mundo em linguagem figurada tirada deste mundo. Os escritores do
Novo Testamento concebiam da totalidade da realidade como sendo um universo em três andares. O andar
superior é o céu, habitado por Deus e os anjos; o do meio é a terra, habitado por seres humanos; e o inferior é
o inferno, a base de operações do diabo e dos seus assistentes demoníacos. Mesmo na terra nem tudo é o
resultado de forças puramente naturais. Poderes sobrenaturais intervêm no fluxo “natural” dos eventos. Os
milagres ocorrem com considerável freqüência. Os maus espíritos podem tomar posse do homem, causando
29
João 20.30-31.
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doenças. Deus ou Satanás podem inspirar os pensamentos do homem e guiar suas ações, eles podem receber
visões de origem divina30.
A forma estrutural do universo, então, é mantida basicamente em comum com os outros povos ao
redor dos hebreus, porém as considerações teológicas que os hebreus mantiveram referente a tais
estruturas físicas é algo completamente diferente. A interpretação da estrutura e suas implicações
divergem em muito, porém a armação física é compreendida de forma quase idêntica.
Geografia/Mundo Físico:
Mapa de Hecataeus, c. 520 a.C.
Não se dispõe hoje de mapas do mundo provindo do povo
hebreu, porém existem alguns provenientes de outros povos
ao seu redor. Em tese, estes refletem algo da perspectiva dos
povos mediterrâneos, incluíndo os hebreus, referente à
organização e ao tamanho da superfície da terra. Sua
perspectiva cosmológica era diferente da atual, como também
era diferente a sua perspectiva cartográfica. Distâncias e
medidas na Bíblia não refletem as precisões da pesquisa
científica atual.
O Pentateuco teria chegado à sua forma atual na época do
exílio do povo hebreu, entre os séculos sexto e quarto a.C.31.
O mapa de Hecataeus, grego que viveu por volta de 520
a.C.32, ajuda a posicionar uma referência mundial relativamente parecida com a que o povo hebreu
poderia ter conhecido por volta desta época. Esta perspectiva é provavelmente mais desenvolvida do
que aquela que os hebreus teriam ao seu dispor. Os hebreus dificilmente teriam conhecimento de um
mundo maior do que o aqui representado. Como o povo hebreu não era um povo marítimo, é bem
provável que sua perspectiva do tamanho do mundo fosse razoavelmente menor do que a perspectiva
refletida por Hecataeus.
Mapa de Strabo, c. 18 d.C.
Estudando o mapa de
Hecataeus, é necessário
lembrar que o centro do
mundo para os hebreus
seria o crescente fértil e
mais
precisamente
a
Palestina,
não
as
montanhas do norte da
Grécia (o Monte Olympo
sendo
central
nas
mitologias
gregas
e
30
ERICKSON, OCnE, 30.
BARR, James em MAYS, 68.
32
BAIN.
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também neste mapa). Assim, poderia-se tomar uma perspectiva de tamanho deste mapa e vinculá-lo
com o mundo conhecido por Strabo, grego do primeiro século depois de Cristo. Strabo reflete
descobertas das conquistas de Alexandre após a época de Hecataeus.
O povo hebreu na época do Antigo Testamento provavelmente conhecia algo da metade a dois terços
do mundo representado por Strabo. Provavelmente desconhecia a maior parte da Europa e a parte da
África denominada como Líbia ao oeste do Egito, também como o extremo leste do mapa que
representa a Índia. Sabia-se a respeito da Índia, porém é provável que o conhecimento fosse pouco.
Já no Novo Testamento, o conhecimento do mundo refletido por Strabo estaria acessível para os mais
estudados, como Paulo e Lucas.
Estes dois mapas em conjunto mostram um grande aumento no conhecimento grego do mundo como
resultado das conquistas de Alexandre. Com o crescimento do conhecimento grego, viria também
um crescimento entre os judeus, especialmente com o evento da Diáspora, no qual os judeus
entraram em contato com os ensinos gregos de uma forma muito mais abrangente. O povo hebreu
provavelmente não teve muito contato com as terras ao oeste da Palestina até esse período após o
exílio babilônico e o Antigo Testamento chegar à sua forma atual.
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Escatologia, Conceitos Essenciais:
“Reinar de Deus”:
No estudo da eclesiologia foi revisto algo da importância do conceito do Reino de Deus. Como o
conceito é também de muita importância na escatologia, será tratado aqui de forma mais dirigida às
temáticas escatológicas.
Para a escatolgia, a categoria principal na Bíblia é o Reino de Deus, seu “governo em ação”33. Em
razão disto, usaremos a frase o “reinar de Deus”34 em lugar do costumeiro “Reino de Deus”. Jesus
declarou que esse reinar já se fazia real dentro dos parâmetros da historia35, mesmo que muitos
tratem do reinar de Deus em sentido futuro. O Reinar “não é somente algo que se acerca no
ministério de Jesus, mas que realmente chega numa data futura”36. Esta data pode ser entendida
como o evento de pentecostes, entre outras opções. Nos evangelhos sinópticos, Jesus é apresentado
anunciando não somente a iminência, mas a própria chegada do reinar de Deus37. Logo, não deve
ser concebido apenas em termos da vida após a morte, pois reflete o reinar de Deus na vida do
cristão no “aqui e agora”.
O Reinar de Deus é uma temática especial dos evangelhos sinópticos, porém, principalmente do livro
de Mateus, onde se encontra a terceira parte das referências neotestamentárias ao Reinar de Deus/dos
céus38. “Havia urgência, porque o reino estava vindo, e o único aspecto especialmente ressaltado foi
o arrependimento”39. Muitas vezes a palavra de Jesus refere-se à crise centralizada no ingresso ao
reinar de Deus40, como nos capítulos 13 a 16 de Lucas. No ensino de Jesus, nada tem valor ao ser
comparado com o reinar de Deus41. Jesus convocava à renúncia de todo laço que impediria o
indivíduo de seguir o seu exemplo de submissão total a Deus, o que o levou à cruz42.
É comum certa confusão referente ao Reinar de Deus, especialmente em termos de seu tempo.
Como já tem sido visto, Jesus trata o reinar de Deus em tempo presente. Simultaneamente, Jesus
trata o reinar em tempo futuro. A ênfase é na realidade presente, mesmo que seja mais comum tratar
a temática em expectativa futura:
[Mateus 12.28 e Lucas 11.20] aparentemente indicam que o reino não apenas está perto, mas que realmente já
chegou. Não há contradição, no entanto. Ambas as coisas são verdade. O reino está perto no sentido de que
não está consumado; está presente no sentido de que o poder de Deus que o caracteriza começou a manifestar-se
nas palavras e ações de Jesus e continua a fazer o mesmo na igreja43.
O tratamento bíblico do reinar de Deus da perspectiva após o ministério de Jesus visa menos
futuricidade do que recebe durante o seu ministério sobre a terra. Ao mesmo tempo, permanece a
33
MILNE, 259.
D. E. Aune em FREEDMAN, “Eschatology: Early Christian Eschatology” e MOODY, 516.
35
MILNE, 260.
36
Brooks em HEMPHILL, 26.
37
D. E. Aune em FREEDMAN, “Eschatology: Early Christian Eschatology”.
38
Brooks em HEMPHILL, 23.
39
ERICKSON, OCnE, 22.
40
D. E. Aune em FREEDMAN, “Eschatology: Early Christian Eschatology”.
41
ERICKSON, OCnE, 22.
42
NOLLAND, 762.
43
Brooks em HEMPHILL, 28-29
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expectativa de um complemento à realidade do reino já inaugurada nas vidas dos crentes. Tal
expectativa, porém, encontra a sua expressão na base do que Jesus já tem realizado.
“A confissão cristã não é apenas de que Cristo virá ao final da história, mas que Cristo já veio; não apenas que
a salvação espera o crente no futuro escatológico, mas que a salvação já é experimentada, numa forma
antecipatória, porém real, no aqui e no presente, no meio de problemas e não apenas ao seu fim…. O presente é
moldado não apenas pelo passado, mas também pelo futuro de Deus”44.
“No Novo Testamento, o reino de Deus é principalmente o seu reinar nas vidas daqueles que se
submetem à sua autoridade”45. O ingresso ao reino é agora, não no porvir. No momento em que se
abre a vida para depender de Deus completamente, há ingresso no seu reinar. Em termos políticos,
esse reinar “não é deste mundo”46, porém não há necessidade de pensar que seja apenas um conceito
futurístico.
Ao tratarmos a questão do reinar de Deus, deve-se salientar alguns aspectos da temática do céu, por
questão de ser complemento do ensino referente ao reinar de Deus—o reinar de Deus após a morte
física.
Os termos bíblicos para céu, “mymc e ouranovs são usados basicamente de três maneiras na Bíblia”:
referindo-se à estrutura do universo, como sinônimo de Deus e como o local da morada de Deus47.
Olhando para Lucas 15.18, pode-se ver claramente que esta referência é feira especificamente a
Deus48, não àquela espansão estrutural acima das núvens, pois o filho havia pecado contra Deus, não
contra uma localidade. Pode-se ver que o reino do qual Jesus ensina em Mateus 5.3 e em Lucas 6.20
é o mesmo. Logo, o chamado “reino de Deus” e o “reino dos céus”, são expressamente a mesma
coisa.
Entre o uso do termo como morada de Deus e sinônimo de Deus, existe um relacionamento que nos
interessa em referência à temática do reinar de Deus. Há um vínculo entre o estar sob o reinar de
Deus e o estar presente com Deus. Essa presença com Deus é elemento essencial da temática de
“céu”, como também do reinar de Deus.
Usa-se também o termo descanso para tratar considerações referentes à vida no céu, mesmo que
tenha conotações presentes49. “Descanso, como o termo é usado em Hebreus, não é apenas uma
cessação de atividade, mas a experiência de alcançar um alvo de importância crucial”50. Quando
falamos em descanso em termos celestiais é necessário lembrar deste aspecto da utilização do termo.
“Schweitzer não gostava [das referências ‘segunda vinda de Jesus’ e sua ‘volta’],… [pois] não era
termo de Jesus… Schweitzer considerava que Jesus colocava sua morte numa conexão temporalcausal com a vinda escatológica do reino”51. O termo bíblico para a chamada segunda vinda é
“parousia”—aparecimento. É designação de Jesus ser revelado em glória52.
44
BORING, 33.
Brooks em HEMPHILL, 21.
46
João 18.36.
47
ERICKSON, CT, 1226.
48
NOLLAND, 784 trata este uso do termos especificamente na categoria de perífrase.
49
HAGNER, NIBCH, 69-73.
50
ERICKSON, CT, 1229.
51
ERICKSON, OCnE, 21.
52
Veja comentários sobre a1a e 2a Tessalonicenses na página 24.
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Fim do Mundo/Últimos Dias:
É valioso lembrar que o uso de frases como “o fim do mundo” e “os últimos dias” nem sempre
referem-se à destruição do mundo físico. Os judeus dividiam o tempo em duas partes—antes e depois
do messías53. Logo, com o dia de Pentecostes em Atos 2, já se pode falar destes últimos tempos,
conforme Paulo, em 1a Coríntios 10.11. Em conjunto com estas frases, encontra-se em certas
passagens a frase “última hora”. Esta refere-se de forma parecida, se não igual, ao conceito últimos
dias. Pode ao mesmo tempo espelhar uma compreensão de ser um tempo imediatamente antes da
vinda de Jesus em glória, porém tal compreensão deve ser vista no contexto dos quase dois mil anos
após estes textos terem sido escritos, sem que Jesus tenha vindo em sua glória. Autores bíblicos de
textos como Apocalipse e 1a João esperavam que Jesus voltasse a qualquer minuto, porém estavam
errados nos seus cálculos. Tal fato deve servir de alerta àquele que busca definir o quando da
parousia54 e o fim do mundo—ninguém sabe.
Ressurreição e Juizo:
Os conceitos de ressurreição e juizo estão ligados de pelo menos duas formas: a ligação de seqüência
temporal dos conceitos e o seu tratamento bíblico por via de duas perspectivas distintas. A ligação
temporal é produto de uma das perspectivas que trata a ressurreição como o evento que introduz o
julgamento. As duas perspectivas bíblicas divergentes sobre os conceitos visam a duas ênfases
primárias das temáticas, o individual e o universal.
Na perspectiva individual, os autores bíblicos tratam de enfatizar que cada indivíduo passa pela
ressurreição e o julgamento na hora de sua morte. Essa perspectiva realça tanto a experiência
individual como a instantaneidade da experiência. A perspectiva universal normalmente trata o
evento de ressurreição ou julgamento como um evento compartilhado de forma simultânea entre
todos da raça humana de todos os tempos. Poderia-se designar as perspectivas como pontilhar
seqüêncial (olhando a história como uma série de pontos individuais) e aorista sumária (olhando
desde o futuro para trás sem diferenciar questões temporais), descrevendo os mesmos acontecimentos
de perspectivas diferentes. Por outro lado, pode-se interpretar o aspecto pontilhar seqüêncial como
sendo a experiência normativa, passando para o aorista sumário num final cósmico cataclismático.
Assim, Hebreus 9.27 trata da perspectiva pontilhar seqüêncial: cada um morre e segue para o seu
julgamento. Mateus 25 trata de forma aorista sumária: virá o dia de prestar contas, e todos os servos
aparecerão perante o Senhor para serem julgados. Paulo parece vincular as duas perspectivas em
Tessalonicenses: não chegaremos antes dos que dormiram primeiro, mas os encontraremos na região
celestial. Não há necessidade de cogitar um estado intermediário como alguns têm feito. Lucas 16
parece ensinar que o juizo é imediato na hora da morte, enquanto João 5 denota o juizo como tendo
ocorrido mesmo antes da morte do indivíduo.
53
54
ROBBINS, 222.
Vinda ou chegada em glória do Messías, já que os termos segunda vinda e volta de Cristo não são bem assentados no texto bíblico.
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Inferno:
Como o conceito “céu” tem vínculo estreito com o estar presente com Deus, o conceito inferno
vincula-se diretamente ao oposto. Várias figuras são usadas para descrever essa realidade, mas o
essencial é de estar completamente desvinculado de Deus para sempre. Há passagens que tratam o
inferno como ardendo em fogo, enquanto outras passagens descrevem com o ranger de dentes,
refletindo um frio interminável. Lembra-se que são figuras para descrever uma realidade que não se
reduz à linguagem humana. Outras formas descritivas também são usadas, como de ser deixado do
lado de fora da festa nupcial ou banquete. Qualquer que seja o detalhe, é um estado consciente de
separação de Deus.
Escatologia, Textos Bíblicos Essenciais:
Passemos agora a tratar alguns textos chaves para a compreensão das temáticas da escatologia. As
passagens a seguir não são todas as passagens relevantes, mas são as mais centrais para tratar essas
temáticas.
1ª Coríntios 3.10-4.5:
“Aquele que constrói banalmente a igreja de Deus sofrerá a perda de recompensas especiais que Deus tem
preparado para serviço bem prestado. Sua salvação não está envolvida. Ela é um presente da graça de Deus,
recebido pela fé. No entanto, tal salvação teria sido de muito mais agrado se houvesse resultado em boas obras,
em materiais dignos, contribundo para a construção da igreja de Deus”55.
Por contrastar ouro, prata e mármore com madeira, palha e joio, Paulo fala de “um palácio por um
lado, e uma barraca de lodo por outro”56, segundo os materiais em uso comum na época. Os
materiais dignos para a construção sobrevivem ao fogo mencionado. Se Cristo for o alicerce, a
estrutura erguida por cima deveria ser digna da qualidade do seu fundamento. Não se deve construir
de qualquer maneira, mas com qualidade57. Em algum ponto o material utilizado na construção será
visto e provado58.
Não há como escapar desta prestação de contas a Deus59, pois nesta menção do fogo é feita em
conjunto a menção do “Dia”—uma referência escatológica—essa junção refletindo o dia de juízo
escatológico. Nestes termos, a igreja primitiva ouvia uma mensagem de boas novas pelo interesse e a
autoridade de Deus exercida sobre o que se passava entre o seu povo ou sua igreja60. O interesse de
Deus está presente na sua igreja e no labor desse seu campo. Esse interesse virá a ser revelado de
forma mais efetiva no juízo ao qual Paulo aqui se refere. No entanto, muitos trabalham no campo,
mas haverá um prestar de contas. Esta prestação aqui referida não está necessariamente vinculada
com a salvação, mas com a recompensa do justo fiel.
55
BERQUIST, 26.
Lighfoot em ROBERTSON, WPNT IV, 97.
57
BERQUIST, 25-26.
58
FEE, 141.
59
ROBERTSON, WPNT IV, 97.
60
SOARDS, 73.
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A figura do juízo aqui não é a questão da separação entre os fiéis e os infiéis, “é a tragédia de uma
vida infrutífera, de um ministro que trabalhou tão pobremente no alicerce verdadeiro que o seu
trabalho subiu em fumaça… É a figura de uma vida desperdiçada…. Não há almas no céu como
resultado de seu labor por Cristo, enriquecimento de caráter, nem crescimento em graça”61. A
questão básica aqui é de que importa para Deus a qualidade do investimento que cada qual faz no
desenvolvimento do reinar de Deus62.
Quando Paulo trata a questão do corpo do cristão como templo, ele emprega o termo nao;" (naós),
que designa mais precisamente o santuário em si, do que o templo como um todo. O uso aqui pode
designar a parte interna do templo, o santuário63, onde se visualizava a mera presença de Deus. Um
santuário, ou templo, era para o povo da época uma manifestação visível da presença do deus ali
cultuado64, neste caso, YHWH (hwhy). É neste contexto que Paulo retrata a vivência interna do “Sopro
de Deus” no cristão, como parte desse templo. Vale ressaltar que o termo pneu`ma (pneuma) é usado
nos parâmetros do termo hebraico jwr (ruach), o qual designa não apenas o conceito de espírito, mas
o próprio fôlego65. A intimidade da vivência interna do pneu`ma tou` qeou` (sopro de Deus) é igual ao
respirar do homem no seu viver diário, ressaltando assim a importância e a proximidade do corpo
como sendo a “nave”66 do templo de YHWH.
O conceito de “o dia” é especificamente uma referência judicial67. Nesse dia, o juiz seria Deus, não
algum ser humano que usaria de parcialidade no seu juízo. Este juiz julgaria conforme os reais
méritos, não por alguma perspectiva falha ou parcial68. Este julgamento, portanto, é motivo de
alegria para Paulo, pois o seu julgamento e o seu futuro está nas mãos de Deus, não dos homens.
Deve-se lembrar que Paulo termina num ponto positivo, mostrando que o prestar contas ao Senhor
deveria ser um motivo de alegria para o cristão69.
Esta passagem de 1a Coríntios, revela que o julgamento vindouro é mais do que uma símples
separação entre os fiéis e os infiéis. Remonta também a alguma diferenciação entre a qualidade do
investimento de cada cristão na construção da igreja, ou seja, no reino de Deus. Nesta diferenciação,
não existe motivo de se gloriar por haver em qualquer caso “merecido” a salvação, mas parece ser
um ensino coerente com a passagem de Mateus 25.14-30, onde aos servos fiéis são dados novas
responsabilidades, ou seja, oportunidades de continuar o seu serviço a Deus. O reinar de Deus
continua, e o cristão ainda permanece como servo ou mordomo do Senhor do reino.
Lucas 14.1-16.31:
A parábola de Lázaro e o homem rico é uma das passagens mais marcantes referente ao estado do ser
humano após a morte. Aqui se evoca imagens bem ilustrativas de recompensa e juízo. É
interessante notar que Jesus referiu esta parábola aos fariseus e não aos saduceus. Os saduceus não
pensavam existir uma vida além-túmulo no sentido de céu e inferno, apoiando-se aos conceitos mais
tradicionais do judaismo do Seol como o lugar de todos os mortos, sem diferenciação. Esta parábola,
como todo o texto maior desde o capítulo quatorze, parece estar bem dirigida aos fariseus, os quais
61
ROBERTSON, WPNT IV, 98
SOARDS, 74.
63
BAUER, 533-534 e SOARDS, 74.
64
BERQUIST, 27.
65
Veja “O Sopro de Deus” em Homilética da Teologia das Narrativas, p. 18.
66
O termo é provavelmente proveniente do grego nao;" (naós) desta passagem.
67
SOARDS, 87.
68
BERQUIST, 32.
69
SOARDS, 89.
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tinham expectativas messiânicas e escatológicas bem desenvolvidas. Este ensino, portanto, tem uma
audiência específica. Parece que o tratamento do reino dado por Jesus para os saduceus teria uma
ótica e ênfase diferente.
Tem sido comentado que Jesus parece colocar mais ênfase no ensino referente ao inferno do que
propriamente no ensino referente ao céu. Deve-se lembrar, porém, que o inferno não é o
contraponto ou oposto do céu, mas do reino. Nestes termos, o ensino de Jesus é bem dirigido à
inclusão dos saduceus. O reino já chegou e começa no aqui e agora. Esta vida no reino é a “vida
das eternidades”, o qual começa aqui e continua para sempre. Como a vida do reino é deixar que
Deus reine no indivíduo e no corpo, o céu é a continuação do reinar de Deus, mesmo após a morte.
A morte não interfere no reino, apenas modifica a esfera de sua atuação. O ser humano continua
após a morte no seu relacionamento com Deus, seja como for o mesmo—na intimidade do reinar de
Deus ou na eterna separação de Deus, o inferno.
Para tratar bem a parábola de Lázaro e o homem rico, é necessário ver alguns assuntos do contexto
maior desde o início de Lucas 14. Em geral, uma parábola é dirigida a alguem para evocar uma
resposta70. Assim, é necessário compreender do contexto a quem a parábola estava sendo dirigida e
com que motivo foi empregada por Jesus. Também algumas questões clarificativas devem ser
colocadas de antemão.
O contexto maior começa fazendo uma diferenciação entre a ótica ou prática dos fariseus e a forma
de vida do reino que Jesus pregava. Desde pelo menos o capítulo 14, Jesus vem lançando uma série
de críticas aos religiosos do seu dia. Com esta crítica, Jesus vem enfatizando o tipo de vida do reinar
de Deus—a “vida das eternidades”—pelo seu caráter ou sua qualidade. No gráfico a seguir, pode-se
ver algo da crítica colocada por Jesus em oposição aos líderes religiosos dos judeus do seu tempo.
Como tem sido comentado em outra parte, a crítica de Jesus “questiona a confiança daqueles que
tomam por certo que estarão presentes no grande banquete escatológico. …São os pobres, os coxos e
os cegos que estão se encaminhando ao banquete, enquanto muitas das pessoas mais óbvias da lista de
convidados estão mais preocupadas com outros assuntos”71.
Ref:
70
71
Designação Crítica de Jesus
14.1-6Æ
Negligenciando os pobres e necessitados
14.7-14Æ
Buscavam o melhor para si; faziam bem para que o bem fosse feito em retorno
14.15-24Æ
Os grandes não querem ir ao banquete, criam desculpas, pois não querem a
renúncia.
14.25-35Æ
Necessidade de renúncia/contar o custo
15.1-2Æ
Murmuravam por Jesus aceitar pecadores
15.3-7Æ
Festa pela ovelha: 1/100
15.8-10Æ
Festa pela moeda: 1/10
15.11-32Æ
Festa pelo filho: ½
16.1-9Æ
Infiel sabe utilizar infidelidade em ganância própria, não o fiel
16.10-13Æ
Fiel em pouco, também em muito
FEE e STUART, 124.
NOLLAND, 758.
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16.14-18Æ
Fariseus gananciosos e infiéis à lei
16.19-31Æ
Reversão completa no juízo
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O termo “Hades” (adh") é a expressão grega utilizada na Septuaginta para traduzir o termo hebraico,
lwav (Seol), este designando o lugar de continuidade nebulosa dos mortos72. No Antigo Testamento,
o termo mais significativo para referir-se ao mundo dos mortos é esse termo, “Seol, uma palavra de
origem incerta, porém usada 65 vezes no Antigo Testamento”73.
O conceito do Seol veio sofrendo modificações ao longo do processo revelatório de Deus com o povo
de Israel. Eclesiástes nem compreende qualquer vida além do túmulo, enquanto por outro lado
vários textos começam a sugerir imagens dessa existência ou continuidade. Quando inicialmente
surge o conceito de uma vida além-túmulo, concebe-se em geral um lugar de silêncio74. O termo
essencial é Seol, porém outros termos são empregados para expressar esse conceito. Abadon (@wdba)
por si significa destruição, mas é usado no Antigo Testamento também em referência ao Seol75, o
reino dos mortos76. Mesmo assim, o significado é impreciso por causa de termos que são muitas
vezes vínculados ao seu contexto, gerando a idéia de lugar daqueles que dormem, conforme as
sombras dos mortos que se acordam um pouco para receber o rei da Babilônia77. Em Jó 26.6 e
28.22, o Abadon é a personificação do lugar de destruição, ou seja, dos mortos78. O tehom (µwht—
profundezas, ou abismo) e o deserto são também símbolos, para os hebreus, referentes ao lugar dos
mortos79.
Moody coloca a passagem de Isaías 14.9-15 como sendo a descrição mais vívida do conceito do
Seol80. Ao ler a seguinte passagem, deve-se lembrar o gráfico do conceito hebraico do universo81:
“O Seol desde o profundo se turbou por ti, para sair ao teu encontro na tua vinda; ele despertou por ti os mortos,
todos os que eram príncipes da terra, e fez levantar dos seus tronos todos os que eram reis das nações. Estes
todos responderão, e te dirão: Tu também estás fraco como nós, e te tornaste semelhante a nós. Está derrubada
até o Seol a tua pompa, o som dos teus alaúdes; os bichinhos debaixo de ti se estendem e os bichos te cobrem.
Como caíste do céu, ó estrela da manhã, filha da alva! Como foste lançado por terra tu que prostravas as nações!
E tu dizias no teu coração: Eu subirei ao céu; acima das estrelas de Deus exaltarei o meu trono; e no monte da
congregação me assentarei, nas extremidades do norte; subirei acima das alturas das nuvens, e serei semelhante
ao Altíssimo. Contudo levado serás ao Seol, ao mais profundo abismo.”82
“O contraste entre o temor e desespero que se agarrava às almas dos homens no Seol, e a esperança
jubilosa que surgia pela expectativa da ressurreição, é vividamente expressa no Apocalipse de Isaías
(24-27). Isaías 26.14 diz com respeito aos ímpios: ‘Os falecidos não tornarão a viver; os mortos não
ressucitarão; por isso os visitaste e destruíste, e fizeste perecer toda a sua memória’. No mesmo
capítulo aparece a primeira referência clara à ressurreição da vida. Dos justos declara-se (v. 19):
‘Os teus mortos viverão, os seus corpos ressuscitarão; despertai e exultai, vós que habitais no pó;
72
MOODY, 493 e NOLLAND, 557.
MOODY, 492.
74
WATTS, 209.
75
MOODY, 493. Jó 26.5-6 “As sombras abaixo tremem, as águas e seus habitantes. O Seol é nu perante Deus, e o Abadon não tem coberta”
(citação bíblica da versão Imprensa Bíblica Brasileira, de acordo com os melhores textos). AUNE (B., 534), portanto, coloca o Abadon como
sinônimo de Seol, o reino dos mortos.
76
TATE, 403.
77
WATTS, 209.
78
AUNE, B., 534.
79
MOODY, 493.
80
ibid., 495.
81
Veja a página 6 desta apostila.
82
Versão da IBB, de acordo com os melhores textos.
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porque o teu orvalho é orvalho de luz, e sobre a terra das sombras fá-lo-ás cair’. A ressurreição dos
mortos depende do poder e da realidade de Deus e o relacionamento correto do homem para com
Deus”83. Em Apocalipse 20.14-15, a morte e o Hades são jogados em conjunto no lago de fogo.
Seu poder sobre o ser humano é aniquilado84, mostrando em concordância com outras passagens que
até “o Seol fica sob o domínio de Deus”85.
Ao retratar o nosso conceito de inferno com o emprego de termos como Seol e Hades, deve-se
lembrar as limitações do conceito expresso com esses termos por suas conotações geofísicas.
Lembrando o conceito hebraico do formato físico do mundo, o Seol era o mundo subterrâneo ou
parte dele. Com o complemento do ensino de Jesus e o emprego de outras metáforas para o
inferno86, vale lembrar que a verdade do ensino não está ligada ao espaço físico, mas à sua realidade
relacional. “O inferno não é tanto um lugar de tormento físico, como é a horrível solidão de uma
separação total e completa do Senhor”87.
A ótica normativa do povo apegava-se a um conceito de retribuição. O justo recebia recompensa
material enquanto o injusto sofria a falta de bens materiais e saúde. Conseqüentemente, era comum
pensar nos ricos serem aqueles que eram abençoados por Deus e dignos para participação no reino
messiânico por vir. Ao nomear o mendigo na parábola, porém, Jesus contradiz grandemente esta
questão, especialmente em contraste à falta de nome para o rico.
O nome dado ao mendigo, Lázaro, tem como significado o mesmo de Eliezar (rz[la)—“Deus ajuda”
ou “Deus, Ajude!”. O nome é uma transliteração grega de uma forma variante do mesmo nome
hebraico88. A própria questão de que ao mendigo é dado um nome, denota a distinção real entre o
valor de sua vida em comparação com a do rico, a quem é dado importância pela sociedade. O rico
atua em desprezo ao mendigo, porém Deus vem à sua ajuda.
Em toda a passagem, Lucas retrata Jesus oferecendo uma série de críticas referentes às práticas
farisaicas do seu tempo, as quais serão tratadas como um todo na parábola de 16.19-31. Aqui vemos
as críticas da negligência para com os pobres, da reivindicação de direitos, do fazer bem aos que
podem dar retorno, da falta de aceitabilidade de renúncia própria e a infidelidade às demandas da lei
em relação ao próximo. Todo o ensino de Jesus nos últimos três capítulos de Lucas encontra um
resumo aqui nesta parábola.
Nesta parábola, mesmo que seja uma figura lingüística ao todo, Jesus coloca algumas informações
sobre a vida futura em sentido de ensino veraz. Não se deve dar ênfase demais aos elementos
referentes ao mundo além-túmulo aqui descrito. Se o teor básico coerente com a crítica lançada
contra os fariseus desde o capítulo 14 fosse inverídico, não haveria por que oferecer a parábola. É,
portanto, uma passagem que contém informação sobre a vida além-tumulo, mesmo que esse enfoque
seja parcialmente restrito em função de ser uma parábola. Alguns dos ensinos referentes à vida alémtúmulo nesta passagem incluem os seguintes:
•
Há consciência do estado além-túmulo;
•
Há memória desta vida na vida futura;
•
Há um juízo imediato (mesmo que intermediário) envolvendo algum conceito retribuitivo;
83
MOODY, 504, citações bíblicas da versão Imprensa Bíblica Brasileira, de acordo com os melhores textos.
ROBBINS, 230.
85
MOODY, 493. Veja também a referência que Moody faz a 1a Samuel 2.6 e Amós 9.2.
86
Veja Mateus 25.30, onde o servo inútil é colocado para fora no frio, onde existe “o ranger de dentes”.
87
ERICKSON, CT, 1241. Ênfase minha.
88
NOLLAND, 828.
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84
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•
Mesmo que o retrato seja de um estado intermediário, vê-se um juízo já pronunciado;
•
Há conforto além-túmulo para os fiéis oprimidos neste mundo;
•
Não há reversões do juízo de Deus após a morte;
•
A informação necessária para receber o “descanso” na vida além-túmulo está clara o suficiente na
“lei e nos profetas”89;
•
Deus se preocupa com aqueles descartados pela sociedade;
•
Não há retorno para esta vida terrestre após a morte;
•
Confiança em Deus é o único mérito de Lázaro (expresso no seu nome);
•
A situação de vida neste mundo é de muito menos valia quando se passa ao mundo além-túmulo.
Uma pergunta que provém do estudo da parábola pode bem ajudar a redefinir as prioridades do
quotidiano. Que diferença faz a minha presente circumstância ou forma de atuar em termos da minha
vida daqui a dez mil anos? Em certo sentido, é esta a pergunta de Jesus aos fariseus através desta e
outras palavras de ensino. Em outra passagem se registra as palavras de Jesus em reação à
preocupação de ter um corpo inteiro na ressurreição (para tal queriam guardar qualquer parte do
corpo que fosse amputado para ser incluído com o resto do corpo no sepultamento). Nesse contexto,
Jesus diz que é melhor arrancar e jogar o olho fora90 se fizer a diferença no ingressar no reinar de
Deus. Muito melhor viver no reino coxo, cego, ou aleijado do que perder o reino por completo.
João 3.16-21; 5.5-25:
João lança que o homem “já está julgado”, mas Jesus veio para o livrar da condenação. “E o
julgamento é este, que os homens amaram mais as trevas do que a luz, pois a suas obras eram más”.
O julgamento e a condenação já estavam realizados e atuantes na humanidade, como também são até
hoje. Não havia de se esperar a chegada de um dia de juízo, mas apenas a efetivação da sentença.
No período antes da morte do indivíduo, porém, existe a possibilidade de ser inocentado por Cristo.
Em outras passagens trata-se de um juízo vindouro, mas aqui de outra perspectiva, a qual trata o
julgamento como fato já no passado. Esta temática será repetida em 5.24-25.
Em João 5.5-14, Jesus vincula a cura do paralítico com questões de fé e pecado. Jesus não curou a
todos, mas curou a este. Logo, a cura deste paralítico vincula-se com o ensino de Jesus referente ao
morto ambulante91. Já há condenação e juízo, o homem apenas está aguardando cumprir a sentença,
mas existe a possibilidade de ser inocentado, mesmo que já tenha sido julgado culpado.
Essa não é a única perspectiva bíblica sobre o julgamento, mas deve ser vista como corretiva a um
conceito dogmático demais referente ao procedimento específico além-túmulo da realidade.
89
Jesus expressa aqui continuidade do plano redentor de Deus. Em concordância com Gênesis 15.6, Romanos 4.3, Gálatas 3.6 e Hebreus 11.114, a salvação é e sempre foi pelo relacionamento de fé—uma confiança e dependência completa de Deus.
90
Mateus 5.29.
91
João 5.24-25.
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Mateus 23.29-24.44:
O capítulo 23 de Mateus fornece a base segundo a qual se pode compreender as palavras de Jesus no
capítulo 24. Pela pergunta dos discípulos em Mateus 24.3, é óbvio que eles pensavam que as três
coisas (destruição de Jerusalém, parousia92 de Jesus e fim do mundo) aconteceriam juntas93. Guerras,
fomes e terremotos citados por Jesus em Mateus 24 eram sinais comunmente associados com a
aproximação do “fim” na literatura apocalíptica judaica da época94. Jesus diz que estas coisas não
são sinais de nada! Diz que acontecerão, mas os discípulos não devem preocupar-se até verem a
abominação desoladora predita por Joel. Muitos tratam esta passagem como uma coletânea de
ensinos dados por Jesus, não sendo necessariamente tão homogênea95. Há, no entanto, uma lógica de
argumentação que indicaria um discurso direto e coerente, mantendo em vista as expectativas
apocalípticas do dia e as três perguntas a serem respondidas por Jesus.
Mateus 24.29-31 reflete a linguagem apocalíptica de Isaías 13.10, 34.4; e Ageu 2.696, como também
de Joel 2.10, e da expressão de um commentário livre sobre Daniel 7.8-27, 8.9-26, 9.24-27, e 11.2112.1397. “O termo eleitos em Mateus 24 deve ser compreendido de acordo com o seu uso em outras
partes das Escrituras, em que significa ‘crentes’”98.
Mounce coloca em questão a referência do capítulo 24.3-31 à destruição de Jerusalém, considerando
que a linguagem de vários versículos trata da vinda de Cristo99. Todos os sinais a serem vistos são
enganosos, pois não remontam ao fim, a não ser o fim de Jerusalém100. Os versículos 29-31 tratam
da parousia de Jesus. Ao mesmo tempo, esse tratamento é dado a fim de esclarecer a questão de que
os falsos cristos são exatamente isso—falsos. O enfoque da passagem não chega a tratar a parousia
diretamente, mas o faz em termos de um excursus101. Assim Mateus 24.23-28 trata a questão dos
falsos cristos, mesmo que o versículo 27 entregue o ensino específico sobre a vinda de Jesus. O tema
que está sendo tratado não é a parousia, mas os falsos cristos que estavam para surgir. Em Mateus
24.27, o essencial no que corresponde à vinda de Jesus, “é de que a volta do filho do homem será
claramente visível a todas as pessoas, em todos os lugares”102.
Propõe-se a seguinte divisão temática para a passagem:
23.1-39
23.37-24.2
24.3
24.4-28
24.29-25.46
“Censura aos escribas e fariseus”
“Jesus fala sobre a destruição de Jerusalém e do templo”
“Perguntas dos discípulos”
“Resposta: Destruição de Jerusalém e do templo”
“Resposta: Vinda do Filho do Homem/Fim”.
Nas palavras de Jesus, não existe sinal nenhum referente ao fim do mundo nem da parousia. Jesus
mesmo diz aqui o que Paulo repete em 1ª Tessalonicenses, e João em Apocalipse 16.15, que ele virá
como o ladrão inesperado durante a noite. Jesus diz propriamente que nem ele sabe quando será essa
vinda. Como, então, poderia ele dar um sinal da vinda cujo tempo desconhecia?
92
Termo do grego para a vinda de Jesus em glória.
MORRIS, 596.
94
MOUNCE, 234.
95
ALBRIGHT, 286 e 288.
96
MOUNCE, 237-238.
97
ALBRIGHT, 289.
98
ERICKSON, ITS, 522.
99
MOUNCE, 237.
100
RIENECKER, 390-391.
101
Um excursos é um texto parentético que visa a tratar uma temática levantada antes de voltar à linha de argumentação geral do texto.
102
MOUNCE, 238.
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“…Durante os séculos que precederam ao advento de Jesus, houve um número cada vez maior de
judeus que viviam fora da Palestina”103, o que se chama de Diáspora ou Dispersão104. “…Já no
século primeiro as colônias judaicas em Roma e em Alexandria eram numerosíssimas. Em quase
todas as cidades do Mediterrâneo oriental havia pelo menos uma sinagoga”105. Logo, em Atos 2, é
apresentado que o evangelho foi pregado a todas as nações (etnias—e[qnh) no dia de Pentecostes,
entendendo que estes judeus espalhados levaram o evangelho de volta para as suas cidades, dispersos
por todo o mundo conhecido.
Os judeus haviam parado de oferecer sacrifícios a YHWH (hwhy) em favor do Imperador, assim
rompendo o trato que tinham com Roma. Esse trato foi a forma encontrada para apaziguar as
relações deles com Roma: os judeus sacrificavam em prol do império, o que os preservava da
necessidade de sacrificar aos deuses romanos e à imagem do imperador106. Buscando a resolução do
impasse dos judeus nos anos finais da década de 60, no ano 70 Tito entrou em Jerusalém para fazer o
sacrifício mandatório107, em resposta ao rompimento do acerto com Roma. O templo foi queimado
por completo em reação por parte dos judeus ao procedimento Romano em oferecer sacrifício a
César sobre o altar do Templo108. Em conseqüência da revolta, toda Jerusalém foi destruída. A
destruição deu-se tão completamente que entre os anos 302 e 312, o governador Romano da Palestina
nem havia ouvido falar de Jerusalém109.
Conforme Josefo descreve o caso, não era intenção de Roma destruir Jerusalém, mas tornou-se
realidade em conseqüência da reação judaica em oposição ao sacrifício feito sobre o altar. “[Os
romanos] tiveram durante todo o tempo da guerra grande misericórdia do pobre povo, ao qual era
proibido fazer o que quissesse por aqueles [judeus] tumultuadores e sediciosos… por não [querer]
destruir a cidade [de Jerusalém], somente para que os que eram autores de tal grande guerra tivessem
tempo para se arrependerem”110.
O império enfrentava guerras e dificuldades de todos os lados por volta da época da destruição de
Jerusalém. A introdução descritiva histórica de Tácito é bem ilustrativa: “Começo a obra de escrever
sobre uma época que é rica em tragédias, sangrenta por causa de batalhas, dilacerada por revoltas”111.
Houve terremotos na Ásia nos anos 60. A morte de Nero em 68 foi seguida por um período de muita
instabilidade, mais guerras e até três imperadores num período de dois anos. Em 62, os partos
estavam em revolta, em 68 havia revolta na Galícia, na Germânia em 69, na Judéia de 66 a 70.
Vesúvio erruptou em 79, cobrindo Pompeii e cidades vizinhas e enviando uma núvem sobre grande
parte do império. Houve fomes nos anos 90112. “…E maior que quantas [guerras] jamais temos
ouvido de cidades contra cidades e povos contra povos…”113. Também se sabe pelas cartas de Paulo
e de Atos que houve fomes na Judéia durante o período de seu ministério, como a fome nos dias de
Cláudio no ano 46114.
“Molestavam aos romanos os galos que são vizinhos [dos judeus]; não descansavam os germânicos; o
universo estava cheio de discórdias depois da morte de Nero; havia muitos que, por ocasião dos
103
GONZÁLEZ, 20.
cf. 1ª Pedro 1.1.
105
GONZÁLEZ, 20.
106
AUNE, A., 170.
107
GONZÁLEZ, 58.
108
JOSEFO, 17.
109
FREND, 2, citando Eusébio.
110
JOSEFO, 13.
111
Tácito em RIENEKER, 391.
112
BORING, 10.
113
JOSEFO, 11.
114
RIENECKER, 390.
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tempos e de tão grandes revoltas, pretendiam agarrar para si o império; e os exércitos todos, pela
esperança de maior lucro desejavam tumultuar tudo”115.
Mateus 25.14-46:
A apresentação aqui do juízo não deve ser vista como uma figura completa de todo aspecto da
salvação, pois tem como objetivo ressaltar a evidência de que o ser humano será julgado116. Não se
deve pensar aqui em dinheiro, mas em potencial a ser aplicado sob o reinar de Deus117.
Alguns interpretam a passagem para dizer que a salvação é merecida pelas obras, mas deve-se
lembrar a implicação aqui de que todos somos servos de Deus. Nesse contexto, Jesus descreve a
realidade da diferença de atitudes entre fiéis e infiéis. Graça é tão importante em Mateus, como em
qualquer outro texto neotestamentário118. Mesmo assim, deve-se lembrar que todos são vistos aqui
como servos de Deus—uns são fiéis, outros são infiéis. Tal como na parábola dos lavradores maus,
todos eram servos, mesmo aqueles que foram depostos dos seus cargos. Não vem ao caso tratar a
forma de alcançar a salvação, muito menos salvação mediante obras, mas, como Jesus já designara
no final de capítulo 24, o infiel mostra-se infiel por suas ações, enquanto o fiel pratica fidelidade. As
ações revelam o caráter da pessoa e a qualidade do seu relacionamento com Deus.
A segunda parábola aqui reflete outra vez conceitos de Mateus 16.27, onde cada qual recebe juízo ou
recompensa de acordo com a sua atuação no reino119. O ministério das ovelhas obviamente não é
uma ação com fins de alcançar mérito, pois não se percebe o mérito de suas ações. É simplesmente
uma forma natural de viver o evangelho de Cristo120.
Interessante no tratamento da parábola dos talentos, é que o talento era uma medida de peso,
equivalente a uns vinte quilos. Provavelmente refere-se a prata ou ouro, mas a designação não é
específica nesse sentido. Se fosse um talento de ouro, o preço de mercado atual colocaria o talento
no valor de mais ou menos 3.100 salários mínimos mensais. Ao que fora fiel com os cinco talentos,
no entanto, é designado como tendo sido fiel em pouco (15.500 salários, o que seria em 2002 uns
R$3,1 milhões, dobrado em R$6,2 milhões)—agora este será colocado sobre muito! Aqueles dez
talentos não são de muito valor, mas o Senhor colocará este servo fiel sobre muito mais—o suficiente
para que ele veja a insignificância do primeiro encargo. Uma implicação desta parábola é de que o
céu não é uma “aposentadoria legal”, como no conceito de muitos. É a oportunidade de continuar a
servir ao Senhor de forma ainda mais significativa. Em nenhuma instância essa vivência é para
aqueles que não querem servir—é para aqueles que querem ser úteis no reino de Deus e que tem
mostrado tal por meio de serviço prestado.
1ª João 2.18-4.6:
“É a última hora”. Para João, não existe nenhum intervalo antes dessa última hora chegar. Ela já
estava presente para ele no primeiro século. O judeu dividia o tempo em duas etapas—antes e depois
115
JOSEFO, 12.
MORRIS, 634.
117
HAGNER, WBCM, 737.
118
MORRIS, 637.
119
HAGNER, WBCM, 741.
120
MORRIS, 639.
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do Messias. Logo, após a ressurreição de Jesus os cristãos já presenciavam os últimos tempos ou a
última hora—essa segunda etapa do tempo. Jesus modificou a expectativa judaica, pois não
estabeleceu um reino político, mas já começara o seu reinar nos cristãos do primeiro século. Agora o
cristão anela uma terceira etapa de tempo, marcado pela vinda em glória (parousia) de Jesus.
O Anti-Cristo já está presente—na época de João! Realmente, o texto trata de “anti-cristos”, ou seja,
muitos que atuam em luta contra Cristo. Não se trata aqui de um anti-cristo singular, mas de muitos
anti-cristos, já na época do próprio João. Conseqüentemente, a sua descrição do tempo em termos de
ser a última hora já entrou em vigor há quase dois mil anos atrás. Já é a última hora, como vem
sendo desde o primeiro século. Quer dizer, já vivemos na época após a vinda do Cristo, esperando a
sua vinda em glória.
João afirma que não há mistério escondido para os fieis, pois o evangelho já fora pregado a eles.
Essa declaração contradiz diretamente os ensinos gnósticos prevalentes já no primeiro século. Tal
grupo ensinava a necessidade de aceitar uma doutrina escondida e especial, e que a salvação era
através de um correto conhecimento da doutrina escondida. João responde que não há novidade, mas
apenas a mensagem gloriosa do evangelho eterno de Jesus Cristo. Não há segredos a serem
descobertos, mas uma mensagem aberta para todos que quiserem assumir o compromisso com Cristo.
Logo, em termos escatológicos, também não há ensinos secretos a serem decifrados. A mensagem
do evangelho é clara—ninguém sabe quando Jesus virá em glória, mas é verdade que virá. Ninguém
pode discernir os tempos, predizendo os eventos futuros escatológicos, mas pode-se saber do próprio
evangelho as verdades referentes àqueles eventos. Não compete ao cristão conhecer os detalhes, mas
compete a ele conhecer o Salvador e obedecê-lo em fidelidade.
1ª Tessalonicenses 4.13-5.11; 2ª Tessalonicenses 2.1-3.5:
O termo “dormir” é comumente usado como um eufemismo para morte, sendo este o uso aqui121.
Deve-se tomar cuidado para respeitar esse uso do termo. 1ª Reis 2.10 diz que Davi dormiu com os
seus pais e foi sepultado, 1ª Reis 11.43 diz que Salomão dormiu com os seus pais e foi sepultado.
De 1ª Reis a 2ª Crônicas, existem 36 ocorrências deste uso do termo dormir. Atos 7.60 diz que
Estevão adormeceu, mas 8.1 diz que Saulo consentia na sua morte! É também neste emprego do
termo que Jesus o usa em João 11.11-14, mesmo que os próprios discípulos não tivessem
compreendido de início.
Paulo aqui em 1a Tessalonicenses 4.13-14 contrapõe a esperança do cristão em contraste à falta de
esperança no mundo pagão. Para o cristão e o judeu havia esperança de ressurrreição, mas então não
havia entre os pagãos122. Aqueles que estavam "em Cristo" antes de suas mortes, continuam "em
Cristo" após a mesma.
121
122
BRUCE, 95 e WATTS, 209, em discussão do Seol e Abadon como lugar dos mortos, vinculado ao conceito do lugar dos que dormem.
BRUCE, 96.
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Apocalipse, Introdução Geral e Histórica:
Qualquer interpretação textual é uma hipótese que precisa ser analisada, criticada e comprovada ou
descartada. “As provas de uma hipótese interpretativa estão primeiramente no seu poder para trazer
vida ao texto, fazer compreensível por que o autor fez o esforço para escrever o texto e (em grau um
pouco menor) por que os primeiros leitores apreciaram o texto pelo menos o suficiente para não o
jogar fora”123. O leitor deve, portanto, analisar as colocações destes comentários interpretativos
como hipóteses a serem consideradas e avaliadas. Espera-se definir algumas linhas interpretativas
que fazem jus ao texto, para que o mesmo possa ter aplicação para a vida do leitor.
Há várias perspectivas gerais no mercado referente à ótica interpretativa geral que se deve trazer ao
livro de Apocalipse. Em grande parte, essas opções interpretativas dependem das presuposições com
as quais os intérpretes começam suas leituras124. A grande maioria dessas posições ignoram o
contexto histórico do próprio autor e as igrejas às quais a carta foi originalmente dirigida. “Quando
se perde de vista o fundo histórico de que o livro proveio e o seu propósito na época em que foi
escrito, pode-se oferecer qualquer teoría de interpretação”125. Apresenta-se nesta apostila, algo do
fundo histórico para ajudar o leitor a situar a carta na condição vivida pelo autor da carta e pelas
igrejas às quais foi dirigida.
Se o livro de Apocalipse foi transmitido até a época presente, deve ser pelo fato de que os cristãos da
época ouviram nesta profecia a mensagem de Deus para suas vidas. Isto os impeliu a preservar o
texto para gerações futuras. Assim, espera-se que, com o estudo do contexto histórico do autor e dos
ouvintes originais, o propósito do autor possa ser resgatado, para que o livro de Apocalipse
comunique mais claramente ao leitor atual.
O texto central do livro de Apocalipse encontra-se nas próprias palavras de Deus referidas desde o
trono em 21.5-8126. Em todo o livro, estas são as únicas palavras registradas como saindo
diretamente da boca de Deus. Nas palavras desta passagem, encontra-se o tema do livro, localizado
precisamente no clímax literário de Apocalipse, numa forma bem sucinta e direta—“sê fiel até a
morte”.
Um destaque a ser feito referente ao livro é o uso da língua grega. O grego utilizado em Apocalipse
é distinto do grego do resto do Novo Testamento, sofrendo muita influência semítica, provavelmente
ambos do aramaico e do hebraico127. As regras gramaticais normativas do grego são parcialmente
dispensadas, sendo utilizado um estilo gramatical peculiar a este livro. As modificações de regras
gramaticais gregas obedecem normas de gramática semítica. A influência semítica também é clara
pelo fato de haver cerca de 500 alusões às Escrituras128.
No texto traduzido de Apocalipse, essas modificações de gramática não poderão ser apreciadas em
geral. No entanto, haverá no grego certas distinções que podem ser relevantes na interpretação de
uma passagem. Um exemplo é de distinguir entre um personagem já conhecido e um novo
personagem que entra em cena. A mesma regra indica no capítulo 21 que os novos céus e a nova
terra são completamente novos, não apenas uma reformulação das existentes.
123
GUNDRY, 254.
ALTER, 414 e 564.
125
HALE, 445. Esta introdução ao Novo Testamento é um dos melhores recursos gerais em Português para oferecer um resumo das preocupações
básicas da carta.
126
AUNE, A., lxxxi.
127
AUNE, A., clxii.
128
BORING, 27.
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Autoria e Contexto Histórico:
O livro de Apocalipse foi escrito com a intenção de ser lido em voz alta como uma obra completa. A
idéia era que fosse lido no contexto do culto cristão. Fazer tal leitura não deve ser visto como
opcional para o intérprete, pois esse drama não pode ser compreendido através do estudo de
versículos individuais. O ensino sobre alguma das seções do livro deve compreender a sua função
como parte da obra completa129.
O livro de Apocalipse é em gênero de literatura apocalíptica, a qual obedece regras interpretativas um
tanto diferentes do que se usa para a maioria das outras classes literárias da Bíblia. Entre as várias
distinções da literatura apocalíptica, duas devem ser vistas em tensão: a ênfase escatológica e a
significância histórica130. Não se pode colocar todo o ensino do livro em termos de relevância
escatológica e perder a questão de seu significado no seu contexto histórico.
O Apocalipse tem o caráter de uma carta pastoral dirigida às igrejas da Ásia Menor que enfrentavam
uma crise religiosa e política. Mesmo que seja de difícil interpretação, deve ser lida, pois tem uma
mensagem para a igreja de hoje, como tinha para a igreja da época131. A mensagem para hoje deve
ser coerente com a mensagem que tinha para os destinatários originais. Como João teve um
propósito ao escrever a carta, procura-se descobrir esse propósito e conseqüentemente a relevância do
livro132.
Desde sua concepção, o livro de Apocalipse tem sido controverso, porém foi ao mesmo tempo
incluído no cânon das escrituras133. Lutero negou estatus canônico funcional a Apocalipse, por
entender que não era teologicamente adequado, mas o reteve no seu cânon134. Foi um dos poucos
escritos dos crentes do primeiro século que sobreviveu e foi incluído no cânon neotestamentário135.
Há discórdia entre os estudiosos referente à pessoa do autor de Apocalipse. Muitos afirmam que o
autor foi o Apóstolo João, seguindo posicionamentos tradicionais136. A discussão, porém, não é
necessariamente convincente, vendo todas as provas oferecidas por todos os lados. É tão provável
que tenha sido João, o Apóstolo, como é provável que fosse escrito por qualquer outro João que
considerava-se profeta de Cristo, conhecido dos cristãos da Ásia Menor como sofrendo exílo na ilha
de Patmo. As fontes de tradições nas quais Carson e outros se apóiam não parecem ter o peso
necessário para demandar aceitação, mesmo durante o segundo século137.
Alguns têm procurado ver por detrás da carta uma história de transmissão e redação editorial entre
várias fontes, mas o estilo e coerência lingüística e simbólica não deixam espaço para esta
consideração. O Apocalipse deve ser visto em termos de uma unidade composicional, não uma obra
de aglomerações de passagens acopladas138. A carta foi escrita por um só autor, mas é difícil definir
129
BORING, vii e 5.
HALE, 426.
131
BORING, 1.
132
ROBBINS, viii.
133
BORING, 2 e HALE, 423.
134
BORING, 3 e GEORGE, 85.
135
BORING, 4. Lembre-se de que mais de quarenta evangelhos foram redigidos, porém apenas quatro deles foram incluídos no cânon do Novo
Testamento. Mesmo que o Apocalipse tenha sido “maltratado” por muitos ao longo dos séculos, merece o destaque de pertencer ao cânon, pois
o povo de Deus ouviu em suas palavras a Palavra de Deus e por isso o guardou até hoje.
136
veja CARSON, 520-525.
137
BORING, 34-35 e AUNE, A., xlvii-lvi.
138
FIORENZA, 347.
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a pessoa específica. Conforme estudo literário e lingüístico, é muito difícil que tenha sido escrita
pelo evangelísta139.
Seguindo Robbins140, deixamos a questão de autoria específica em aberto aqui com a definição de
Aune: “o autor de Apocalipse… era provavelmente um judeu palestino que emigrou à província
romana da Ásia, possivelmente em conjunto com a primeira revolta judaica, que se deu em 66-70
d.C. Ele se designava como profeta cristão e sua composição como um livro profético, e era
conhecedor das congregações da Àsia, às quais endereçou… o seu livro”141.
O livro de Apocalipse foi mais provavelmente escrito no final da época do Imperador Domiciano (8696) durante um período de perseguição dos crentes142, perseguição esta que se deu ao final de seu
reinado, começando no ano 95143. Entende-se que João escreveu, alertando para uma possível
eventualidade de intensificação da perseguição144, como também profetas do Antigo Testamento
davam espaço para arrependimento–i.e. Jonas–sendo as suas mensagens de interpretação de eventos,
não de predições, especialmente em termos do sentido da história145.
No contexto histórico após a guerra na Palestina entre judeus e romanos entre 66 e 70, houve uma
grande migração judáica de refugiados para a região da chamada Ásia Menor146. Esta migração se
deu antecipadamente às guerras na judéia que levaram à destruição de Jerusalém sob Tito no ano
70147. “…A perseguição sob Nero foi de enorme importância, não tanto por sua magnitude, mas por
ter sido a primeira de uma larga série, de crueldade sempre crescente”148. Após uma tentativa de
culpar os judeus, “…Nero fez aparecer como culpados [do incêndio de Roma] os cristãos, uma gente
odiada por todos por suas abominações, e os castigou com mui refinada crueldade”149. Como Nero
era odiado por muitos, não apenas pelos cristãos, surgiu o mito após o seu suicídio em 09 de junho
de 68 de que não morrera ou que havia ressucitado dos mortos, mito este que circulou no império
amplamente no final do século150.
Após a destruição de Jerusalém no ano 70151, houve muito conflito sobre a nova identificação e
definição do que era ser judeu. Nesse período de busca por identidade, a igreja encontrava-se ao
mesmo tempo numa época após a morte da maioria dos apóstolos e no começo da elaboração de uma
nova estrutura e uma identidade própria à parte do vínculo com o judaismo152.
Um dos pressupostos da cidadania grega era que todos tinham o dever de participar do culto religioso
sobre o qual a cidade era fundada153. No contexto do culto ao imperador Domiciano, recusa era
punível com morte154. A importância dada a tais cultos gerava muito conflito com as isenções
especiais oferecidas às comunidades judaicas. Neste contexto surgia grande parte da perseguição aos
judeus por parte das comunidades gentílicas. Os judeus, por sua vez, podiam acusar os cristãos de
139
ALTER, 414.
ROBBINS, 17.
141
AUNE, A., lvi.
142
BORING, 1, 10, GONZÁLEZ, 4 e ROBBINS, 18.
143
CAIRNS, 74.
144
AUNE, A., lxv.
145
BORING, 25-26.
146
BORING, 9 e GONZÁLEZ, 20.
147
JOSEFO, 17.
148
GONZÁLEZ, 52.
149
Tácito citado em GONZÁLEZ, 55.
150
AUNE, A., lxi.
151
LOWRY, 35.
152
BORING, 9.
153
AUNE, A., 170.
154
ROBBINS, 24.
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não serem judeus, porém revindicando as condições especiais dos judeus. Nos capítulos 2 e 3 do
Apocalipse, os perseguidores parecem ser judeus, não romanos155.
Perseguição:
“Este livro magnificente [Apocalipse] foi escrito para comfortar os santos num período de grande
dificuldade”156. É, portanto, uma palavra de conforto para a igreja atual ao passar dificuldades.
Muito tem sido referido sobre a perseguição geral aos cristãos por Domiciano. Ao mesmo tempo,
outros eruditos entendem que tais afirmações não têm base firme o suficiente para serem apoiadas.
Claramente havia perseguição, mas não foi generalizada e sistemática como alguns querem afirmar.
Muitos sofreram perseguição na era de Domiciano e após, porém não da forma sistemática nazista157.
Pode-se dizer que João viu o que se entende ser a primeira etapa de algo que prontamente tornar-se-ia
numa perseguição universal e sistemática, sendo no seu imediato uma situação religiosamente
constrangedora158. Sem intervenção divina, a progressão dos eventos levaria a um nível de
perseguição até então desconhecido.
Um historiador social romano define os parâmetros da perseguição da seguinte forma: “Desconhecese qualquer perseguição da parte do governo romano até 64, e não havia perseguições gerais até a de
Décio. Entre 64 e 250, havia apenas perseguições locais e isoladas; e até se o número total de
vítimas era considerável (como creio que era), a maioria dos casos de perseguições deve geralmente
ter sido bem breve”159.
“Em meio à perseguição, o Apocalipse mostra uma atitude muito mais negativa contra Roma do que
o resto do Novo Testamento. Paulo havia ordenado aos romanos que se submetessem às autoridades,
que haviam sido ordenadas por Deus. Mas agora o vidente de Patmos descreve Roma em termos
nada elogiosos, como ‘A grande rameira … ébria do sangue dos santos, e do sangue dos mártires em
Jesus’ (Ap. 17.1,6). E Pérgamo, a capital da região, é o lugar ‘onde está o trono de Satanás’ (Ap.
2.13)”160. Na cidade de Pérgamo, como também em Êfeso e Smyrna, havia um templo dedicado a
César nos dias de João161.
Em 107 d.C., Inácio de Antioquia, um notável líder da igreja de sua época, escreveu referente a
perseguição sob prisão, sendo levado a Roma para ser julgado. “Estou começando a ser discípulo …
O fogo e a cruz, multidões de feras, ossos quebrados (…) tudo eu hei de aceitar, contanto que eu
alcance a Jesus Cristo”162. A perseguição era real, mas Roma não estava procurando diligentemente
matar todos os cristãos do império.
Os cristãos do primeiro século no império romano eram comunmente vistos como faltosos em
patriotismo, não sendo religiosos e às vezes tachados de ateus, por não terem ídolos, enquanto os
povos do império eram extremamente politeístas163. Era difícil para os judeus e, logo, para os
155
AUNE, A., lxiv-lxv
ROBERTSON, 458.
157
GONZÁLEZ, 60-67.
158
BORING, 17-23.
159
Saint Croix citado em AUNE, A., lxxvii.
160
GONZÁLEZ, 60.
161
BORING, 19-20.
162
Inácio de Antioquia, citado em GONZÁLEZ, 61 e 66.
163
BORING, 11.
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cristãos mostrarem que criam em Deus, quando os vizinhos pensavam que ídolos eram integrais a
qualquer forma de culto.
Na época de 112 d.C., o governador da província ao norte da Ásia (Bitínia), escreveu uma carta ao
Imperador Trajano, referente ao tratamento devido aos cristãos. Como se vê na carta e na resposta,
não há exatamente uma perseguição institucional e programática, mas uma falta de compreensão da fé
cristã num contexto muito constrangedor para o crente da época164. Havia perseguição, sim, mas não
como aquela por Nero em 68. Esta carta de Plínio e sua resposta encontra-se traduzida abaixo165.
Tenho feito como regra, Senhor (reclamado como título pelo imperador, porém usado pelos cristãos apenas
para Deus e Jesus), para referir-lhe tudo sobre o qual tenho dúvidas. Pois quem melhor poderia orientar-me as
hesitações ou instruir minha falta de conhecimento?
Nunca estive presente na interrogação de cristãos, pelo qual não sei até que ponto tais investigações devem ser
estendidas, nem quais punições são apropriadas. Também tenho estado incerto se idade é implicada, ou se os
muitos jovens devem ser tratados igualmente como os adultos, se arrependimento e renuncia do cristianismo é
suficiente, ou se os acusados devem ser considerados criminosos por haverem sido cristãos, mesmo se depois
renunciarem, e se pessoas devem ser punidas simplesmente pelo nome “cristão”, mesmo se nenhum ato criminoso
tenha sido cometido, ou se somente crimes associados com o nome devem ser punidos.
No entanto, tenho atuado com aqueles denunciados como cristãos da seguinte forma: tenho perguntado se eram
cristãos. Aqueles que responderam afirmando, tenho perguntado uma segunda e terceira vez sob ameaça de
morte. Se persistissem em sua confissão, eu os mandei executar, pois seja o que for que eles estejam
asseverando, parece-me que a obstinação e a tenacidade devem ser punidas de qualquer forma. Outros que têm a
mesma delusão, mas que foram cidadãos romanos, tenho designado a serem enviados a Roma.
No trascurso das investigações, como normalmente acontece, acusações são trazidas contra círculos maiores de
pessoas, e os seguintes casos especias têm surgido:
Um letreiro anônimo foi colocado, acusando um grupo grande de pessoas por nome. Aqueles que negaram ser
cristãos agora ou no passado, pensei necessário soltar, já que invocaram os nossos deuses de acordo com a
fórmula entregue e por oferecerem sacrifícios de vinho e incenso perante a tua imagem que eu fiz trazer para tal
propósito, junto com estátuas de nossos deuses. Também os fiz maldizer a Cristo. É dito que cristãos
verdadeiros não podem ser forçados a fazer qualquer dessas coisas.
Outros acusados assim no início admitiram que haviam sido cristãos numa época, mas que haviam renunciado,
alguns há três anos, alguns há mais tempo, alguns há tanto como vinte e cinco anos atrás166. Todos esses
adoraram a tua imagem e as estátuas de nossos deuses e amaldiçoaram a Cristo. Eles verificaram, no entanto,
que toda a sua culpa ou erro consistia no fato de que num certo dia antes da alvorada eles acostumavam-se a
reunir e cantar um hino a Cristo como o seu deus e jurarem-se com um juramento para não praticar qualquer
crime, mas para abster-se de todo roubo, assalto e adultério, para não quebrar a sua palavra depois de dada, e
para não recusar a pagar as suas dívidas legais. Depois íam pelos seus próprios caminhos, e juntavam-se mais
tarde para comerem uma ceia em comum, mas era comida ordinária e normal. Eles suspenderam até esta prática
em acordo com um edito pelo qual eu havia proibido associações políticas, de acordo com as tuas instruções.
Considerei ainda mais necessário obter através de tortura uma confissão da verdade de duas escravas, as quais
chamavam diaconisas. Não encontrei nada mais que uma superstição vulgar e excessiva.
Assim, eu parei de ouvir outras acusações, para procurar conselho de ti. O assunto me parece necessitar bom
conselho, especialmente em consideração ao grande número dos acusados, pois muitos de toda idade e classe, de
ambos os sexos, estão em perigo de serem julgados agora e no futuro. A praga desta superstição tem se
espalhado não apenas nas cidades, mas também pelas aldeias e pelos campos, porém eu creio que pode ser
parada e uma solução providenciada. De qualquer forma, está agora bem claro que os templos anteriormente
quase desertos estão pouco a pouco recebendo mais e mais visitantes, e os muito negligenciados festivais sagrados
estão mais uma vez sendo observados, e a carne sacrifical, para a qual compradores eram difíceis de encontrar,
está mais uma vez sendo comprada. Disso pode-se ver facilmente que tipo de melhoria pode ser feita com as
massas quando se dá lugar para arrependimento.
164
Constrangedor o suficiente para causar a morte do cristão que se recusasse a sacrificar ao imperador (ROBBINS, 24).
BORING, 13.
166
A data especificada aqui estipula a época de Domiciano e o contexto da redação do livro de Apocalipse.
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(Resposta do Imperador Trajano)
Meu Segundus! Tens escolhido a forma correta em questão dos casos dos que têm sido acusados perante ti como
cristãos. Nada existe que poderia ser considerado como uma norma universal referente a tais casos. Cristãos
não devem ser procurados, mas se forem acusados e entregues, devem ser punidos, mas apenas se não negarem
ser cristãos e demonstrá-lo pelo ato apropriado, ou seja, o culto aos nossos deuses. Mesmo se um é suspeito por
causa de conduta prévia, ele ou ela deve ser inocentado em vista de arrependimento.
Acusações anônimas não podem ser consideradas em qualquer tribunal, pois seria um precedente perigoso, e não
se dá com os nossos tempos167.
O contexto vivido pelas igreja na Asia Menor era muito constrangedor, enfrentando certa perseguição
da parte do Império Romano168. João escreveu Apocalipse não sob uma perseguição sistemática, mas
frente a uma perseguição que esperava crescer em intensidade. Ele compreendia estar vivendo as
primeiras fases de uma perseguição que poderia se transformar em algo de escala universal169. Havia
perseguição, mas não no sentido de aniquilação sistemática. O cristão podia ser executado por não
cumprir com sacrifício ao Imperador170. Sabe-se que muitos foram executados nessa época, acusados
de ateísmo, resultado da recusa de adorar os deuses de Roma e o Imperador. Essa adoração ao
imperador o posicionava como um deus, blasfêmia tanto para judeus como cristãos. Na época em
que vivia sob o Imperador Domiciano, todas as declarações oficiais do governo começavam da
seguinte forma, “Nosso Senhor e Deus Domiciano ordena…”171.
Na sua época, Nero não era bem-quisto no império. Por questão de Nero haver acusado os cristãos
de queimar Roma e haver executado muitos de formas grotescas, a sua figura era vista
incrustadamente na consciência cristã como uma fera selvagem. Após o seu suicídio, houve rumores
de que não havia realmente morrido ou que retornara dos mortos e estaria voltando com os exércitos
partos para uma nova conquista172. Certas atitudes do Imperador Domiciano fizeram com que muitos
o associassem ao mito de Nero redivivo.
O Imperador Domiciano insistia que todos que o endereçassem por escrita ou palavra o entitulassem
“Senhor e Deus”173.
“…Domiciano começou a perseguir [os judeus] e a exigir o pagamento da oferta [antes dada ao Templo em
Jerusalém]. Quando alguns judeus negavam-se a fazê-lo ou mandavam o dinheiro ao mesmo tempo que deixavam
bem claro que Roma não havia ocupado o lugar de Jerusalém, Domiciano começou a persegui-los e exigir o
pagamento da oferta. Já que ainda não estava totalmente limitada a relação do judaísmo com o cristianismo, os
funcionários imperiais começaram a pressionar todos os que praticavam ‘costumes judaicos’ ”174.
Com a necessidade política de reverenciar o imperador como um deus, havia uma série de opções
limitadas para os cristãos em termos de sua resposta, opções para as quais João aponta no livro de
Apocalipse. Essas opções eram: 1-desistir de Cristo, 2-mentir sobre Cristo, 3-lutar contra o império
romano, 4-mudar a lei, 5-adaptar-se às normas do império, ou 6-morrer. Esta última opção é a única
que João diz ser uma possibilidade fiel cristã175. Desse posicionamento, pode-se ver facilmente por
167
Pliny the Younger, Letters X.96-97 em BORING, 14-15.
ROBBINS, 24.
169
BORING, 17.
170
ROBBINS, 24.
171
BORING, 18.
172
COLLINS, 126.
173
BORING, 21.
174
GONZÁLEZ, 58.
175
BORING, 21-23.
168
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que o conceito “aquele que perseverar até o fim” permeia toda a carta de Apocalipse176 e por que
João pode falar de todos os fiéis sendo mortos em testemunho177.
“Os profetas como os apocalípticos eram homens que falavam para a sua própria geração”178. Menos
de oito por cento das profecias no Antigo Testamento tinham a ver com uma época após a do próprio
profeta179. Nesses mesmos termos, João dirige Apocalipse às igrejas de sua época, mesmo que a sua
mensagem seja válida também às igrejas da atualidade.
Considerações Escatológicas referentes ao Apocalipse:
“Como o mal não se originou com a história, não desaparecerá completamente dentro da história,
porém além dela, na inauguração do mundo por vir”180. À luz do Novo Testamento, diria-se que
esse “mundo por vir” já foi inaugurado em certo sentido, pois é o mundo do Reino anunciado por
Jesus. Ao mesmo tempo, o Novo Testamento afirma que há outro mundo além desta “nova época”
(ou seja, “tempos finais”, “tempos posteriores” ou “últimos tempos”), um mundo que poderia-se
chamar de não material, o qual designa-se por “céus” ou “reinar dos céus/Deus”.
No livro de Apocalipse, o final do mundo vem “à conclusão de cada série de sete. O sexto selo181,
por exemplo, reflete a dissolução do cosmo”, dificultando a compreensão de que possa haver mais
duas séires de desastres na seqüência da história. Logo, o livro parece tratar recapituladamente
impressões variadas da realidade sendo apresentadas em diversas imagens evocativas182. Não se deve
forçar o texto a apresentar uma progressão de eventos que culminam no final do livro através de uma
seqüência direta. Tampouco deve-se fazer da carta apenas uma predição de eventos históricos183.
Conforme também na introdução de Apocalipse, “Quando Cristo é chamado ‘o primogênito de toda a
criação’ (Cl. 1.15), e ‘o primogênito dos mortos’ (1.18), é a sua soberania sobre a criação e a morte
que está sendo proclamada. O famoso jogo de palavras de Paulo esclarece isto: ‘O primogênito
(prototokos184) dos mortos, para que em tudo seja pre-eminente (proteuon185)’ (Cl. 1.18)”186. Jesus
havia ressucitado outras pessoas dos mortos, mas é Jesus que se mostrou vitorioso sobre a morte187.
O termo “primogênito recorda a crença hebraica de que o lugar [de importância] era do pimogênito
(Êx. 4.22; Jr. 31.9; Sl. 89.27)”188.
Quando o livro menciona o escurecer do sol, deve-se lembrar da erupção de Vesúvio no ano 79. A
erupção causou a impressão de que a terça parte das estrelas desapareceram por causa da nuvem que
cobriu grande parte do império romano na época189.
Há muitas formas de interpretação popular de Apocalipse procurando prever os eventos de juízo do
final do mundo—uma para cada gosto. Muitas das mesmas já sofreram grandes reformulações por se
176
i.e. 2.7, 11, 17, 26; 3.5, 10, 12, 21; 7.14-15; 12.11; 13.10; 14.12-13; 17.14; 18.20; 20.4; 21.3-7; 22.3-4, 14.
1.5, 17-18; 2.10; 12.11; 13.15; 14.13; 20.4.
178
ROWLEY, 15.
179
FEE e STUART, 154.
180
LEVENSON, 50.
181
Apocalipse 6.12-17.
182
BORING, 32.
183
RISSI, 3.
184
prwtovtoko"
185
prwteuvwn
186
MOODY, 504-505.
187
ROBBINS, 35.
188
MOODY, 571.
189
BORING, 10.
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basearem em especulativas políticas, não em revelação, não em inspirição interpretativa divina, nem
num bom conhecimento dos fatos históricos da carta sendo lida. Deve-se levar em conta que Jesus
diz que ninguém pode discernir de antemão a data do fim, e é imprescindivelmente necessário
submeter a vida ao senhorio de Cristo para estar pronto quando vier o fim. Tal ensino é muito mais
claro do que as interpretações variadas no mercado. É também o tema mais negligenciado entre as
opções populares.
O Apocalipse não é uma carta dirigida especificamente à igreja que vive imediatamente antes do fim
do mundo. É uma carta para a igreja de todas as épocas. O fim está próximo de todos, pelo menos
no sentido da morte física do indivíduo. Várias formas de opressão à mensagem do evangelho estão
presentes em toda parte do mundo desde o primeiro século até o atual. A mensagem escatológica do
livro de Apocalipse é presente e atual como era nos dias do autor e das igrejas da Ásia Menor a quem
foi escrita a carta. Estas igrejas preservaram Apocalipse não por predizer o futuro, mas por ajudá-las
a enfocarem a realidade da vitória de Cristo, o Cordeiro imolado de Deus. Gerava esperança e
confiança em Deus, assim ajudando o cristão a permanecer fiel em toda e qualquer circumstância.
Esta é a mensagem atual da carta—a vitória é do Cordeiro, mesmo que os inimigos possam figurar
como enormes e poderosos. O Cordeiro imolado venceu e tem nas mãos as chaves das cadeias da
morte. Vive e concede vida a todos que confiam nEle.
Literatura Apocalíptica e Linguagem Pitoresca:
Após larga discussão dos posicionamentos dos eruditos, Aune defina Apocalipse como sendo uma
obra apocalíptica, porém apocalíptica Cristã, fazendo distinção da judaica190, proposta que se aceita
neste trabalho. Uma diferença grande entre a apocalíptica judaica e a cristã é a de que o cristão olha
não apenas para um evento salvífico futuro, como fazia o judeu. Ele olha para a obra de Cristo, pois
a vinda de Cristo tem modificado tudo, e conseqüentemente a apocalíptica cristã reflete a
transformação contida na vinda de Cristo, mesmo antecipando a sua vinda final em glória191.
Autores de literatura apocalíptica dirigiam suas obras às suas próprias gerações com um senso de
urgência. Zelavam por oferecer uma resposta de orientação àqueles que procuravam entender a
opressão e o sofrimento que experimentavam. Comumente “prediziam” certos eventos da história,
como se a escrita fosse proveniente de épocas anteriores, assim oferecendo uma interpretação dos
eventos descritos. João, porém, não “prediz” eventos nesse sentido, mas interpreta a natureza da
história192. O autor de Apocalipse se vê como profeta, referindo uma mensagem de aplicação da
palavra de Deus para a vida do indivíduo193. Ele vincula aspectos de urgência apocalíptica com o
senso profético de sua mensagem. A proposta básica da carta é de dar a entender a razão do
sofrimento, sendo a literatura apocalíptica uma expressão de fé na fidelidade de Deus, frente a
circunstâncias que a punham em dúvida194.
Para entender o que é um apocalipse, é necessário compreender algo do estilo literário geral. Como
forma literária, um apocalipse apresenta certos parâmetros específicos. Oferece-se a seguinte
definição em termos de forma, conteúdo e função.
190
AUNE, A., lxx-xc.
BORING, 44.
192
RISSI, 4-5.
193
ROBBINS, 20.
194
BORING, 41-43.
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1) Forma: um apocalipse é uma narrativa prosa em primeira pessoa, com uma estrutura episódica consistindo de
visões revelatórias comunmente mediadas ao autor por um revelador sobrenatural, estruturadas de forma que a
mensagem revelatória constitui-se num clímax literário, bordado pela narração das circunstâncias da suposta
experiência reveladora. 2) Conteúdo: a comunicação de uma perspectiva transcendente, normalmente
escatológica, de experiências e valores humanos. 3) Função: a) legitimizar a autorização transcendente da
mensagem, b) por mediar uma reatualização da experiência revelatória original através de uma variedade de
ferramentas literárias, estruturas, e imagens, que funcionam para ‘ocultar’ a mensagem que o texto propõe
‘revelar’, tal que c) os receptores da mensagem sejam motivados a continuar procurando, ou se necessário
modificar seu pensamento e atuação em conformidade com perspectivas transcendentes195.
Em outras palavras, a forma apocalíptica utiliza uma narrativa como um esqueleto para retratar
revelação em termos de visões. Estas visões geralmente vêm através de algum tipo de mensageiro
sobrenatural, levando a um clímax literário. O tratado comunica valores ou experiências humanas de
uma perspectiva que trancende o ponto de vista humano natural. A função do tratado é de legitimizar
a autoridade da mensagem ao convocar o ouvinte a participar da experiência revelatória,
simultaneamente escondendo e ilustrando aquilo que se propõe revelar através de diversos recursos
literários. Assim, visa a incentivar o ouvinte a investigar e modificar suas atitudes em conformidade
com a mensagem referida pelo autor.
Já que o livro de Apocalipse é em estilo literário um apocalipse, a sua linguagem deve ser respeitada
como linguagem apocalíptica. Como outras obras apocalípticas, a sua forma de expressão é pitoresca
em contraste à linguagem proposicional. Em vez de pregar de forma direta, o livro pinta um quadro
da segurança “de que Deus é o Senhor da criação e da história”196. Esta linguagem não é tão
específica como a linguagem proposicional com a qual se costuma tratar. João pode até falar de
estradas pavimentadas com ouro que são ao mesmo tempo transparentes, sem que haja contradição,
nem distorção de sua mensagem pelo uso de símbolos que seriam conflitantes em outro tipo de
literatura197.
Esse estilo de comunicar é distinto das normas utilizadas atualmente. Existe, porém, certas formas
pelas quais a sociedade atual aproxima-se ao uso do estilo apocalíptico de comunicação. Tais formas
de linguagem não vêm a ser iguais à apocalíptica, mas apresentam certos fatores importantes em
comum, que servem de uma ponte para ajudar na compreensão do conceito. A exemplo desse fato,
certo estilo de programação da televisão pode ser útil para compreender como se pode comunicar
certas verdades por meio de uma linguagem que diverge da norma estabelecida de linguagem
analítica e precisa.
É comum ver nos desenhos animados algum personagem como o coiote ser atropelado por um trem.
Enquanto ele é aplastado, um curativo lhe é aplicado e em três segundos ele encontra-se
completamente sarado, pronto para mais uma vez abordar o papa-léguas! Não importa quantas vezes
a dinamite explode na sua boca, balas chegam a furar a sua barriga, sofre quedas desde mil metros de
altura, é atropelado por caminhões ou é engolido por alguma fera, numa questão de segundos ele já
está em plena forma para novamente caçar o papa-léguas.
Esta forma de comunicação não é proposicional, mas pitoresca. O espectador diverte-se com a
contagem e as imagens da caçada interminável, sem se preocupar com a incompatibilidade das cenas
narradas. As imagens comunicam ao telespectador, mas não dentro dos padrões de linguagem de
precisão científica. Comunicam através da impressão emocional gerada no indivíduo, não como
relato clínico de um evento. Neste caso nem sempre há muita mensagem a compartilhar, mas há uma
195
AUNE, A., lxxxii.
LINDVALL, 173.
197
GUNDRY, 254.
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comunicação—a comunicação do desafio além do alcance e a determinação para prosseguir com um
alvo estabelecido, mesmo inalcançável.
Os quadrinhos e caricaturas políticas nos jornais e nas revistas atuais também comunicam através de
imagens exageradas e retratos distorcidos da realidade, porém comunicam verdades de possível
compreensão do leitor. Assim também, a linguagem apocalíptica aborda questões de revelação por
meios não-clínicos, retratos às vezes incoerentes e imagens chocantes, não por meio de uma
linguagem fria, clínica, científica e proposicional. Para ajudar a diferenciar os dois tipos de
linguagem, apresenta-se um quadro com base no trabalho de Boring para contrastar as maiores
diferenças entre estas formas de comunicação198.
Linguagem Proposicional
Supõe que toda linguagem refere-se
em descrição a algo objetivo
Linguagem Pitoresca/Apocalíptica
Utiliza retratos falados para apontar a realidade suprema por trás de
e além de si
Supõe que palavras não podem comunicar realidade, mas apontam
em direção à realidade suprema
Supõe que subjetividade é desprezível
A subjetividade das imagens retratam o sentido da realidade objetiva
Quando usa símbolos, os utiliza como
código específico
Utiliza símbolos para apontar as realidades por trás do que pode ser
descrito objetiva e diretamente
Evoca imagens que não podem ser visualizadas, mas o impacto das
mesmas pode ser sentido
Não é linguagem de código, pois código é linguagem literal e
objetiva para aquele que tem a “chave”
Os símbolos são usados para comunicar o que não pode ser
comunicado de outra forma
Os símbolos não podem ser reduzidos à linguagem objetiva sem
perda de sentido
Identificando o referente particular de uma imagem, não delimita a
significância da simbologia empregada
O leitor perde a riqueza e o poder da retórica apenas substituindo
“Babilônia” por “Roma”
A interpretação necessáriamente deve ir além da decodificação de
imagens
É linguagem de lógica
É linguagem de participante de culto (litúrgica)
Não deve ser tomado como premisas de argumento lógico ou
doutrinário
É linguagem de confissão e adoração
Utiliza consistência lógica como
critério para definir a verdade
Não exibe interesse em consistência lógica (várias visões nem
podem ser visualizadas)
Certos detalhes descrtios funcinam como cenário, não como
alegoricamente importantes
198
BORING, 51-59.
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A mensagem é comunicada através de símbolos, mesmo sem
afirmar toda implicação possível nos termos da linguagem
proposicional
Cada imagem expressa uma verdade no que diz, não pelas
inferências que possam ser traçadas
Trata uma coisa de cada vez
Infere o tratamento de um todo através da sua simbologia
Não trata assuntos de acordo com lógica linear
As visões e símbolos comunicam pela impressão evocativa que
apresentam ao serem tratados como um todo
Trata o todo com uma mistura (amalgama) de imagens simultâneas
Uma imagem isolada não tem condições de apresentar a realidade
toda sendo apontada
Preza clareza como indicador de
verdade
Pressupõe que linguagem “clara” é limitada demais para expressar
certas verdades transcendentes
Preza imagens como indicadores de verdades que não podem ser
objetivadas por causa da finitude humana
Contrasta “mito” com “verdade”,
entendendo-o como falso
Não funciona para transmitir verdades objetivas sobre o mundo
celestial
Utiliza linguagem mitológica como veículo de verdades
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Apocalipse, Comentário Textual:
Esboço do Livro:
Existe mais de um conceito sobre a forma mais apropriada para dividir o livro de Apocalipse. É bem
viável entender que o livro tenha sido escrito em sete atos de uma peça para ser apresentada no teatro
de Êfeso. Aproveitaremos para os fins deste estudo o esboço oferecido por Boring no seu comentário
sobre Apocalipse por sua utilidade em facilitar a compreensão do panorama geral do livro e sua
divisão de blocos maiores de pensamento199.
I.
Deus fala à Igreja na Cidade (1.1-3.22).
II.
A.
O Título Sumário (1.1-3).
B.
O Começo da Carta (1.4-8).
C.
A Presença do Cristo Ressurreto (1.9-20).
D.
As Mensagens às Sete Igrejas (2.1-3.22).
Deus Julga a “Grande Cidade” (4.1-18.24).
A.
A Sala do Trono Celestial (4.1-5.14).
1.
2.
3.
4.
B.
A Adoração Celestial—Abrindo o Rolo Selado (6.1-8.1).
1.
2.
3.
4.
5.
C.
Os Primeiros Quatro Selos—Os Quatro Cavaleiros (6.1-8).
O Quinto Selo—O Clamor dos Mártires (6.9-11).
O Sexto Selo—O Cosmo Treme na Chegada de Deus (6.12-17).
Interlúdio—A Igreja Militante e Triunfante (7.1-17).
O Sétimo Selo—Silêncio (8.1).
A Adoração Celestial—Tocando as Sete Trombetas (8.2-11.19).
1.
2.
3.
4.
5.
6.
D.
A Sala do Trono do Universo (4.1-6a).
O Deus Criador de Tudo (4.6b-11).
A Redefinição Cristológica de Vencer (5.1-7)
A Vitória e o Louvor Universais (5.8-14).
As Orações da Igreja na Adoração Celestial (8.2-5).
As Primeiras Trombetas—A Intensificação dos Problemas Finais (8.6-12).
A Quinta Trombeta—O Primeiro Ai (9.1-12).
A Sexta Trombeta—O Segundo Ai (9.13-21).
Interlúdio—A Igreja dos Profetas e Mártires (10.1-11.13).
A Sétima Trombeta—O Reino Vem Como Salvação e Ai (11.14-19).
A Exposição das Forças Malignas (12.1-14.20).
1. Atrás das Cenas do Drama (12.1-13.18).
199
ibid., ix-xi.
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2. A Verdade Sobre a Salvação e o Julgamento (14.1-20).
E.
As Últimas Sete Pragas (15.1-16.21).
1. A Celebração de Vitória na Adoração Celestial (15.1-8).
2. As Sete Taças da Ira de Deus (16.1-21).
F.
A Queda de Babilônia e o Lamento (17.1-18.24).
1. Roma é Babilônia (17.1-18).
2. Celebração/Lamento da Queda de Babilônia (18.1-24).
III.
Deus redime a “Cidade Santa” (19.1-22.21).
A.
Coros de Aleluia Louvam a Vitória de Deus (19.1-10).
B.
Sete Visões do Fim (19.11-22.5).
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
Parousia (19.11-16).
Batalha Final (19.17-21).
Satanás Amarrado (20.1-3).
Milênio (20.4-6).
Derrota de Gogue e Magogue (20.7-10).
Julgamento Final (20.11-15).
Nova Jerusalém (21.1-22.5).
C.
Conclusão da Visão (22.6-20a).
D.
Conclusão da Carta (22.20b-21).
Apocalipse 1.1-3.22:
João confiava que as coisas que descrevia estavam prestes a acontecer200. Vale lembrar que a sua fé
enfatizava a certeza da mensagem, não o seu tempo201. Em termos de haver um cumprimento
histórico físico visível e final na terra, a confiança e espectativa de João estavam erradas. A
realidade da mensagem da profecia, no entanto, mantém sua vitalidade expressa pela preservação do
texto através dos séculos, pois quem teria guardado e reproduzido a grande custo o que não lhe
valesse nada?
A bênção referida sobre a divulgação desta profecia não compreende uma mágica auditiva, mas
refere-se aos que lêem e ouvem no sentido de colocar em prática a mensagem proferida202. Deve-se
lembrar que foi escrita para ser lida na sua íntegra em situação pública. Para quem lê a carta em sua
totalidade, a experiência e o impacto é bem diferente do que para aquele que lê apenas partes do
texto203.
Na descrição de Jesus em 1.13 a frase “filho do homem” lembra Daniel 7.12 e a autodescrição
favorita de Jesus204. Essa frase era comumente compreendida como uma referência messiânica205.
Cristo aparece nesta visão expressamente para ditar as cartas para as sete igrejas, fato que delimita
200
ibid., 72-73 e ROBBINS, 29.
ROBBINS, 29-30.
202
BORING, 68 e ROBBINS, 31-32.
203
FIORENZA, 345 trata esse assunto entre os estudos e posicionamentos eruditos sobre a carta, onde também há o mesmo problema.
204
GOLDINGAY, xxvii-xxix e ROBBINS, 43.
205
GOLDINGAY, 170.
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esta passagem como uma unidade de pensamento206. Esta visão de Cristo, portanto, é o início e parte
integral da passagem das cartas às igrejas.
Os termos descritivos de Jesus nesta introdução servem mais do que nada para revelar a sua grandeza
e poder207. As estrelas não controlam o destino dos homens e não precisam ser temidas, pois estão na
própria mão de Cristo. Os imperadores romanos reivindicavam para si o governo do universo.
João, porém, diz que Cristo é o Soberano, não o imperador208.
É o mesmo Jesus descrito no capítulo 1 que bate à porta em Apocalipse 3.20, não o Jesus das
pinturas religosas tão comuns209. Jamais deveria-se ver aqui aquele Jesus manso, meigo e suave,
implorando com toda ternura. Cada carta a uma das igrejas individuais relembra aspectos da
descrição de Jesus oferecida no capítulo primeiro.
Além dos conflitos com o governo romano, as mensagens às igrejas nos capítulos dois e três refletem
a existência de conflito entre liderança cristã como entre os cristãos e os judeus em geral210. As
cartas foram dirigidas aos santos da época. Tratam assuntos específicos dos contextos que cada igreja
enfrentava—numa cidade o templo dedicado ao Imperador, noutra a heresia dos Nicolaitas, etc. O
contexto de uma igreja atual pode ser espelhado nas dificuldades enfrentadas por uma ou outra dessas
igrejas, porém, deve-se lembrar que a associação reflete uma nova apropriação da mensagem que
fora endereçada originalmente às igrejas na Asia Menor.
Apocalipse 4.1-18.24:
Nesta porção de Apocalipse, há uma mudança no tratamento com perspectiva de lidar com o tema do
julgamento da “Grande Cidade”. Assim, o enfoque muda desde as igrejas na Ásia para o mundo ao
seu redor. João trata a vitória já ganha junto com a vitória que está sendo antecipada, utilizando uma
série de imagens e descrições para tratar desta vitória singular211. Lembra-se que não se trata de
novos eventos, mas de múltiplas perspectivas ou retratos dos mesmos acontecimentos e das mesmas
verdades.
Apocalipse 4.1-5.14:
Compreender quem é Deus é um ponto de partida referencial para compreender a necessidade e a
responsabilidade humana. O ser humano frente a Deus tem obrigação de oferecer uma certa resposta
ao Criador. A devida adoração a Deus está vinculada à necessidade humana de responder em
compromisso e ação, seguindo as implicações da identidade divina em contraste ao dever humano de
testemunhar em fidelidade. No capítulo 4, existe uma convocação para confiar na grandeza e
soberania de Deus212.
206
BORING, 63.
ROBBINS, 45-47.
208
BORING, 84.
209
WILLIS.
210
COLLINS, 120.
211
BORING, 99.
212
ROBBINS, 82.
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João afirma primeiramente que Deus reina supremo no cerne de tudo, pois o trono do universo não
está vazio213. Na simbologia de João, o trono representa a autoridade de Deus, e Deus estando
entronizado revela a Sua supremacia214. Deus é o soberano, governando até mesmo a história caótica
do mundo215. João não descreve a Deus, mas o trono não está vazio. Deus pode não ser visto por
João, mas a sua presença e ação estão claras nos trovões e relâmpagos ao redor do trono216.
O mar aqui tem um caráter de tranqüilidade perante Deus217. Na concepção judaica, o mar é símbolo
da ameaça contra a própria criação, um termo que aqui resume toda agência maligna218. Muitas
vezes o mar aparece num contexto de ameaça à criação e à soberania de Deus, procurando levar o
mundo de volta ao caos de Gênesis 1.2. “Os perigos das profundezas (abismo) designam a ameaça
de destruição, a perda de todo significado e a falha de não funcionar de acordo com o propósito de
Deus. Este caos é ‘sem forma e vazio’, sem a estrutura de significado e vazio de todo propósito”219.
Aqui, porém, o mar já não existe mais como uma ameaça, pois na presença de Deus está plácido que
nem um cristal220.
Deve-se levar em conta que as descrições celestiais no livro de Apocalipse não são detalhes
supérfluos no relato, mas contém teor importante para a elaboração do sentido do livro. Há quem
diga que a descrição da Nova Jerusalém, ou seja, a celestial, é a descrição culminante da obra
completa221. No mínimo, estas descrições devem indicar ao leitor a preocupação de João em
descrever a realidade suprema por detrás dos eventos na terra. É a realidade celestial que importa
para João, não as aparências terrestres.
As criaturas ao redor do trono representam toda classe de criatura que respira—animais selvagens,
animais domésticos, humanos e pássaros—toda a criação222. João lembra aqui as figuras de Ezequiel
1.10223. João aqui reflete um conceito de representatividade já expresso entre os judeus. “O homem
é exaltado entre as criaturas, a águia entre as aves, o touro entre os animais domésticos, o leão entre
os animais selvagens; todos eles receberam domínio”224. Estes, porém, estão cheios de olhos, vendo
tudo ao seu redor, porém, expressando sempre que Deus é santo, ou seja único e digno de louvor.
Assim, João aponta para o contraste entre estes seres e o imperador que reclama título divino sem
enxergar a soberania e grandeza do Criador!
O termo grego usado para expressar a grandeza de Deus, como “Todo poderoso” tem mais
literalmente o sentido de “tudo-reinando” ou “o que reina sobre tudo”225. Sendo incontestavelmente
soberano, Deus compartilha o seu reinar com outros, ou melhor, delega de sua autoridade. Deus não
reina de forma unilateral e não teme por qualquer motivo de insegurança. O seu trono e o do
cordeiro são o mesmo226.
213
BORING, 102-103.
ROBBINS, 85.
215
RISSI, 5.
216
BORING, 104.
217
ROBBINS, 89.
218
COLLINS, 122, 124.
219
MOODY, 492.
220
BORING, 105.
221
READER, 433.
222
BORING, 107 e ROBBINS, 88.
223
ROBBINS, 89 – veja também Ezequiel 1.6, 10, 18, 22, 26; 10.12, 20 e 22.
224
Midrash Shemoth, R. 23 citado em BORING, 107.
225
ROBBINS, 90 com apoio de BAUER, 449, 608-609. pantokravtwr—pantos equivale a “tudo”, enquanto krator equivale a “poder” ou “reinar”.
Pelo menos deve-se pensar em “poder para reinar” quando se traduz por “todo poderoso”. RISSI (5) toma a mesma posição no seu artigo.
226
BORING, 106.
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O livro na mão daquele no trono tem um emprego polivalente. É um rolo escrito em dois lados,
mesmo que a norma fosse do papiro ser escrito num só lado227, sugerindo assim que não havia mais
para ser acrescentado228. Reflete vários conceitos a uma—o livro da lei, o livro dos profetas, o rolo
dado a Ezequiel, as chamadas tábuas do destino, o livro da vida, os livros celestiais onde os feitos
dos homens são registrados para julgamento e os testamentos que eram selados com sete selos229.
Outrossim pode-se compreender este rolo como sendo a história num sentido abrangente230, o plano
redentor de Deus na história231.
João insiste no fato de que Deus é Criador de tudo que existe e de que Deus atua na criação. A
perseguição sofrida não desanima a sua fé, nem o leva a ignorar a existência dos problemas reais que
enfrenta. A sua fé no Criador o leva a uma esperança escatológica, dando-lhe uma perspectiva além
da situação constrangedora que enfrenta232.
As referências da descrição do leão digno expressam a continuidade com o trono e reinado de Davi.
Este é o herói de Deus, o Messías tão esperado233 qur executa o plano redentor divino234. A imagem
evoca claras referências de expectativas messiânicas do grande guerreiro como o próprio Davi. A
colocação referente à raiz de Davi evocava o mesmo conceito de um messias guerreiro. Tal era a
expectativa do povo de Israel referente ao messias e também o anseio escatológico do povo cristão.
João olha com toda esta expectativa ao lugar onde o Leão deve aparecer, mas o que enxerga é um
cordeiro que fora sacrificado! O que aconteceu com o leão tão esperado? O cordeiro imolado tomou
o seu lugar235.
É necessário enxergar que João diz explicitamente que não existe Leão. Em lugar do Leão esperado,
temos o Cordeiro imolado. Amor sacrificial não era uma estratégia provisória de Jesus, mas a sua
estratégia definitiva. Não é leão para uns e cordeirinho para outros, nem leão em traje de cordeiro236.
Onipotente e onisciente, o Cordeiro exerce um reinado redentor237, não agindo em caráter de leão
feroz. João apresenta o Cordeiro de Deus, devidamente poderoso, mas expressa a sua vitimização
sobre o altar em contraste com o leão esperado. João profere algo no sentido de “quando a tradição
diz ‘leão’, leia ‘cordeiro’ em seu lugar”. Este cordeiro tem pleno poder—visível nos seus sete
chifres—mas não utiliza do seu poder segundo a expectativa referente ao Leão238.
O cordeiro é vencedor! Ele triunfa, porém, a sua conquista é definida em morte. Vencer para João
equivalia a morrer! O amor auto-sacrificial vence sobre a força que o ser humano procura para
vencer239. A conquista vem através da morte em fidelidade, ambos para Jesus e também para o
cristão. Para o crente, a definição de vencer foi modificada pela cruz de Cristo240. Deve-se lembrar
que este cordeiro não está despido de poder, pois tem sete chifres—símbolos de autoridade, aqui
autoridade completa241. A sua autoridade não provém simplesmente do Cordeiro ser divino, mas pela
227
HALE, 37-38.
ROBBINS, 92.
229
BORING, 104.
230
John R. Miles “Lamb” em FREEDMAN.
231
RISSI, 7.
232
BORING, 107.
233
O’BRIEN, 178.
234
RISSI, 6.
235
BORING, 108 e O’BRIEN, 178. Boring trata o termo ajrnivon em sentido de cordeirinho, mas BAUER (108) não aceita o diminutivo para a
época do primeiro século. O termo ajrnivon, já estava sendo usado no sentido genérico de cordeiro ou ovelha, ignorando-se a origem da forma
como expressão diminutiva.
236
BORING, 109.
237
RISSI, 6.
238
BORING, 110.
239
ROBBINS, 94.
240
BORING, 111.
241
ROBBINS, 95.
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sua atuação dentro dos parâmetros da história242. Mesmo a entrega do rolo ao Cordeiro indica algo
da inseparabilidade do Cordeiro de Deus Pai243. Em especial, o contexto simbólico do rolo vem da
mão direita de Deus, a mão direita espelhando autoridade.
Mesmo assim, o poder do Cordeiro é diferente. É um poder que não se limita à força no estilo da
autoridade humana. Ser judicialmente inocentado é o sentido do termo “vencer” no contexto de
Apocalipse. Certamente é um paradoxo, pois é de se esperar que o cristão seja julgado perante o
tribunal romano e condenado, porém, tal condenação equivale a ser inocentado no tribunal
celestial244.
Baseado na redefinição apresentada, o louvor dado é um novo cântico, pois é louvor ao cordeiro
imolado, não ao leão. A redefinição causa uma mudança na própria expectativa do cristão, podendo
enxergar com olhos diferentes o plano de Deus e a sua atividade entre o seu povo. Temos aqui o
cerne da cristologia de João. A vitória de Cristo já se deu no ato histórico de sua morte, não
havendo mais necessidade de outra batalha, pois sua vitória no passado foi decisiva para sempre245.
O cordeiro é o Cristo, e sua vitória é tanto absolutamente distinta em forma, como também é mais
completa e irrevogável. A vitória do Cordeiro dita um paradigma completamente novo para a vida,
incluindo definições de poder, vitória e realidade máxima. É o mesmo tipo de mudança de
paradigma que Jesus teve que dar aos discípulos. O importante não é a estrutura política externa,
mas o reinar de Deus no interior do indivíduo.
Apocalipse 6.1-8.1:
Os eventos acompanhantes da quebra dos selos espelham conceitos judaicos e cristãos referentes às
tribulações que se pensava vir para introduzir o fim246. “Os quatro cavaleiros retratam o juízo de
Deus sobre a arrogância e a rebelião humana”. Os partos eram os únicos cavaleiros montados do
primeiro século, e o cavalo branco era a sua marca registrada247.
Os mártires mencionados seriam cristãos, não mártires pré-cristãos, como alguns têm asseverado248.
A morte desses mártires os coloca na mesma categoria do cordeiro imolado, o termo grego sendo
igual ao da descrição do cordeiro249. Havia uma idéia já no judaismo, a qual se passou ao
cristianismo primitivo, de que um número predeterminado de fiéis deveria ser morto antes que Deus
colocasse o mundo sob juízo250.
O crente chega ao céu da mesma forma que Jesus—por meio de sofrimento e morte. Mesmo assim, a
injustiça não chega a ser a palavra final, mesmo que não se compreenda a razão pela qual Deus não
termina com a injustiça de imediato. Existe, no entanto, o apelo a que Deus se revele251.
No relato dos prodígios, inclui-se um custo excessivamente elevado para os grãos, sendo que a
especificação é de um aumento aproximado de oito a dezesseis vezes o preço normal. O vinho e o
242
RISSI, 7.
John R. Miles “Lamb” em FREEDMAN.
244
A. Y. Collins, O Apocalipse, citado em BORING, 111.
245
RISSI, 8.
246
AUNE, B., 424.
247
BORING, 122.
248
AUNE, B., 424 e BORING, 122.
249
BORING, 124.
250
AUNE, B., 424.
251
BORING, 125.
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azeite não sofrem modificação, pois uma seca não necessaraiamente afeta em muito a produção
desses produtos agrícolas. As implicações da situação é de desastre para os necessitados e vida
normal para os abastecidos, pois vinho e azeite seriam artigos de consumo especial252.
A ira tratada no capítulo 6 é a ira do Cordeiro253. Esta ira espera para que o número dos salvos se
complete. Deus age em longanimidade no sentido da parábola do joio e do trigo254. Deus espera
para resgatar também a outros. Para tanto, Deus espera com paciência, pois a ira, ou seja, o juízo,
virá no tempo devido. Aqui a espera é para atingir um número pré-determinado de eleitos255.
Espera-se ver a destruição do mundo no capítulo 7, porém o que se apresenta é a igreja triunfante.
No contexto dos cristãos da Ásia Menor, eles precisavam de uma nova perspectiva referente à igreja,
para reconhecer que eram parte de algo muito maior e mais glorisoso do que a sua experiência
ditava. Nessa nova perspectiva, os cristãos fiéis são preservados em meio a uma grande
perseguição256.
A lista das tribos de Israel nesta passagem é diferente de qualquer outra lista proveniente da época257.
João considera a igreja como sendo a continuação de Israel, especialmente considerando que já não
havia 12 tribos identificáveis na época do primeiro século258. Onde foi a tribo de Dã? Por que a
tribo de Manassés e também de José, se Manassés era filho de José? Segundo a bênção de Jacó aos
filhos de José, Manassés receberia uma porção dupla, enqanto a tribo de Dã era vista em geral como
uma tribo rebelde. A reunião das tribos dos quatro ventos espelha uma idéia cristã do primeiro
século da restauração de Israel em termos das doze tribos259.
Miríade (dez mil) e mil são os termos numéricos maiores que existem na Biblia. A idéia partilhada é
de um número vasto. A expressão 144,000 (cento e quarenta e quatro mil) seria equivalente à frase
‘uma grande multidão que não podia ser contada’. Mil também pode espelhar uma conotação militar,
gerando a idéia de um batalhão260. Este conceito militar tem apoio no uso geral do censo por motivos
militares261. Mesmo assim, o Apocalipse nunca coloca o cristão na frente da batalha. O cristão fiel é
apenas um espectador da vitória alcançada por Deus na figura do Cordeiro imolado262.
O sangue do cordeiro derramado é o sangue de aliança. Ao banhar-se no sangue do Cordeiro (ou
seja, ao ser espargido com o sangue, o qual faz parte da apresentação do sacrifício), o individuo se
acerca para estabelecer ou aceitar a aliança proposta. Este sangue da aliança promete vitória àqueles
que se assemelham ao Cordeiro na entrega de suas vidas263. Deve-se lembrar os eventos
veterotestamentários da promulgação de alianças, essencialmente no evento do êxodo. O êxodo é
provavelmente o contexto joanino para compreender o sacrifício de Cristo. É um sacrifício de
ratificação de uma nova aliança em resgate de um povo oprimido—no caso, todos que se equivalem
ao sacrifício oferecido.
252
AUNE, B., 397-398.
BORING, 127.
254
Mateus 13.24-30.
255
AUNE, B., 391.
256
BORING, 127-128.
257
AUNE, B., 479.
258
BORING, 129 e HALE, 8-9. O cativeiro assírio havia feito com que as tribos do norte perdessem a sua identidade e se misturassem com os
demais povos.
259
AUNE, B., 436.
260
BORING, 130-131.
261
AUNE, B., 436.
262
RISSI, 15.
263
John R. Miles “Lamb” em FREEDMAN.
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O culto na perspectiva do Apocalipse não vem a ser um evento desenvolvido para agradar ao
indivíduo que presta o culto. Culto como entretenimento, cura ou até ensino não chega ao padrão do
culto em Apocalipse, por causa do enfoque no indivíduo. O culto aqui é direcionado expressamente
a Deus, no reconhecer a distinção enorme entre o Criador e a criatura. Deve-se lembrar, neste
contexto de culto, do trono vazio no lugar santíssimo do templo de Jerusalém e também da imagem
celestial do trono vazio264. Culto aqui parece ser espontâneo, não uma formalidade, nem rotina
planejada. Essa expressão flui de um agradecimento a e reconhecimento de Deus.
É de interesse notar que o rolo não poderia ser lido até que o sétimo e último selo fosse aberto,
mesmo que alguma descrição pudesse estar visível265. É em 8.1 que esse útlimo selo é aberto.
Chegando ao final tão esperado, encontramos apenas silêncio266. Existe toda uma expectativa, mas
João não relata nenhum detalhe referente ao fim, a não ser este. Haverá um pouco mais a ser
descrito no seguinte ciclo, mas aqui tudo acaba e há apenas meia hora de silêncio.
No culto, no templo em Jerusalém, havia silêncio especificamente na hora do sacrifício e não em
outras partes. Aqui é a única passagem do livro onde um sacrifício é feito, sendo um sacrifício de
incenso, visto que o Cordeiro já fora sacrificado e vive267. É portanto no sacrifício do Cordeiro
(imolado na cruz) que o livro se abre e pode-se ler e compreender os mistérios do rolo de sete selos.
Este é, portanto, um conceito-chave para o livro. O Leão esperado é o Cordeiro imolado. Sua é a
vitória decisiva, porém completamente distinta da expectativa judaica adotada por muitos cristãos. O
amor que se entrega em fidelidade pelos demais é invencível perante a força física ou militar. Este
tipo de amor é o cerne da “vida das eternidades”—o reinar de Deus—pregado por Jesus no Sermão
do Monte e caracterizado em seu ministério terrestre. Para João, esta forma de viver tem uma
abrangência que vai muito além da compreensão humana da realidade. Esse amor é mais poderoso
do que qualquer esforço militar, pois venceu e vence a própria morte, o próprio medo que dá
autoridade à força física.
Apocalipse 8.2-11.19:
A ótica geral de João é de que o cristão deveria prestar mais atenção para a realidade espiritual do
que para o mundo material. É no reinar de Deus na vida do indivíduo que se vê a realidade tal qual
ela é. A oração faz ponte entre o mundo presente e o eterno. As orações dos santos não resultam no
resgate das circunstâncias, mas no resgate do próprio mundo e da história humana nos confins da
inauguração do Reino. “Através do seu culto e sua oração, a igreja é ligada intimamente com o
mundo real, o mundo de Deus”268.
Em última análise, tudo procede do único e soberano Deus. Todas as pragas descritas nesta
passagem têm origem em Deus, pois tudo está sob o Seu controle. O ciclo das pragas aqui é
basicamente o mesmo de antes, porém, há uma intensificação na expressão dos eventos. Como existe
um vínculo com o evento do Êxodo do Egito (o qual teve início com um ciclo de pragas)269, pode-se
esperar que, ao final das pragas, vejamos a efetivação do Êxodo do povo do seu Egito—“O Êxodo
264
LINDVALL, 174-175.
AUNE, A., xcviii.
266
BORING, 132.
267
WICK, 512-513.
268
BORING, 133.
269
AUNE, B., 499. Não há dependência aqui no texto de Êxodo, mas sim existe uma alusão pela normativa referência de pragas em sentido de
anúncio ou “abre-alas” de eventos de intervenção e juízo divino.
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real está prestes a acontecer”270. Depois do Êxodo, o povo entrou na terra prometida—aqui a terra
celestial.
As estrelas ou o fogo caindo do céu em 8.8 e 8.10 não espelham agência maligna, mas intervenção
divina no resgate dos justos. Deve-se notar que a atuação dos elementos celestiais aqui surge em
oposição ao mar e às águas, que são em geral símbolos de agência maligna271. Não há, portanto,
nenhuma alusão a anjos caídos no sentido popular atual, mas à atuação divina em juízo. No
contexto, anjos teriam sido vistos como acima das nações do mundo, portanto, poderia-se conceber
em termos de serem retirados de suas posições por juizo divino.
Os povos da época e anterior viam as estrelas como sendo deuses272. Aqui fazem parte do juízo e as
pragas de Deus—não sendo deuses, mas agentes do juízo divino. Há novamente um certo vínculo
com as pragas no Egito, em que atacavam a soberania dos deuses egípcios. João outra vez nega não
apenas a divindade do imperador, mas também a soberania dos deuses de Roma.
Nero declarava ter um relacionamento especial com o deus Apolo273 e Domiciano gostava de usar
para si o mesmo nome, Apolo, ao qual o termo “Apolyon” referencia. Havia também o uso comum
do gafanhoto como símbolo desse mesmo deus274. Apolo era importante o suficente para Roma que,
pelo menos em uma moeda dos anos 35-36 trazia a figura do templo de Apolo275. Os gafanhotos aqui
são agentes do juízo de Deus, como também ocorreu nas pragas no Egito. Apolyon é o rei sobre
estes gafanhotos, mas o que consegue fazer é apenas efetivar o juízo de Deus sobre os homens. Com
todo o seu poder, ele é ainda agente do único Deus.
Os cristãos são “selados com a marca da segurança divina, mesmo que tenham que morrer”276, pois a
sua segurança independe de sua morte física. Esse selo dá ao cristão a possibilidade de permanecer
fiel por causa da proteção divina sobre a sua vida277. Como a morte não interrompe o seu vínculo
com Deus, o que enfrenta a morte não sofre dano real, mas aparente.
A oportunidade para arrependimento frente ao anúncio de juízo é uma possibilidade em todo contexto
profético de Israel. Há sempre uma possibilidade real de modificação do juízo de Deus manifesto na
palavra do profeta se o povo se arrepender278, conforme pode-se ver no anúncio de Jonas a Nínive e
em 2a Crônicas 7.14. “Tal como os cristãos fiéis se recusam a arrependerem-se no sentido romano,
o mundo romano recusa-se a arrepender-se no sentido cristão”279. Nesse contexto, o juízo
seguramente vem.
Pode ser que em parte a descrição dos cavalos como tendo cabeças de leões retome a figura do
cristão sendo ameaçado de morte na arena com os leões, conforme prática romana já nos dias de
Nero280. Assim, a figura reflete outra vez o contraste entre o arrependimento exigido pelos pagãos e
por Deus. Deus tem a liberdade para modificar os planos de juízo estabelecidos em resposta à
criatura arrependida281. Mesmo que Deus esteja disposto a colocar em pausa o juízo, o ser humano
270
BORING, 135.
AUNE, B., 520-521.
272
BORING, 136.
273
AUNE, B., 535.
274
BORING, 138.
275
FIORENZA, 365.
276
BORING, 143.
277
RISSI, 14.
278
Veja o livro de Jonas e o contraste entre “Ninive será subvertida” e “eu sabia que és Deus compassivo e misericordioso, longânimo e grande
em benignidade, e que te arrependes do mal”, Jonas 3.4 e 4.2. Implícita está a mensagem de arrependimento ao qual o povo aderiu.
279
BORING, 138.
280
Inácio de Antioquia, citado em GONZÁLEZ, 61 e 66.
281
BORING, 141 com base em Jer. 9.5; 18.8, Jonas 3.9.
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geralmente não se prontifica para o arrependimento. Como em Êxodo 7-14, não se espera
necessariamente que os inimigos de Deus se arrependam282, mas existe a disposição divina para
aceitar o arrependimento, já que o juízo reflete o amor do Cordeiro no caráter de seu sacrifício e da
sua vitória283.
YHWH (hwhy) revela tudo aquilo que é realmente necessário para o seu povo poder viver uma vida de
fé real, mas não oferece detalhes especulativos. Mesmo o profeta, aqui, não pretende saber tudo, a
não ser o que é necessário ser revelado284. Essa colocação também é coerente com uma gama de
literatura revelatória em que se guardava um elemento em segredo nos padrões de 2a Coríntios 12.4 e
Daniel 12.4, pois nem tudo deve ser revelado ao ser humano285.
O termo profetizar deve ser definido como falar e atuar por Deus286. Considera-se que o profeta dava
testemunho morrendo, mantendo-se firme nas suas declarações. Nesta passagem, portanto, os termos
“profeta” e “testemunha” são usados de forma idêntica. Os profetas/mártires representam a igreja
completa como um todo, não uma parte dela287. As duas testemunhas provavelmente relembravam os
dois ramos de oliveira de Zacarias 4.2-14288. O testemunho do cristão é dado através de seu
martírio289. A roupa das testemunhas aqui é a única indicação do conteúdo de sua profecia, esta
sendo uma mensagem de arrependimento290. Porém, a profecia não é ouvida e os profetas são
mortos. Mesmo assim, a morte das duas testemunhas não é sem significado, pois é na sua morte que
completam o seu testemunho. “A fera não tem a última palavra”291. Como o par de fiéis representa
mais do que nada o testemunho do povo fiel como um todo, é o seu Senhor que triunfa sobre o sofrer
e a morte292.
Por causa das conotações do termo “besta” no português, a melhor tradução do termo aqui seria
“fera”. O termo besta é usado seguindo o uso do termo em inglês, beast, historicamente sendo
sinônimo de “fera” na época de João Ferreira de Almeida. A montadora asiática, Kia, teve certos
problemas com o emprego deste mesmo termo como nome para um dos seus veículos, não
compreendendo as associações do termo feitas no Brasil. Querendo tratar do veículo simbolicamente
como animal de carga, não percebeu as associações mais fortes designando aspectos negativos do
animal selvático. No português mais arcaico, as conotações do termo equivalem mais ao uso do
grego, designando a idéia do animal selvagem indomado, porém, potente. Aparecendo o termo
“besta” nas traduções atuais do Apocalipse, portanto, leia-se “fera” ou “animal selvagem”. Esta fera
está colocada por João em contraste ao dragão. O dragão espelha a fera das águas, em contraste à
fera que atua sobre a terra.
A fera reflete conceitos das quatro feras de Daniel e, como elas, procede do mar. Reflete igualmente
os monstros das mitologias de combate do mundo antigo, como o Mar (Yamm), Leviatã e Tiamat293.
Essa mitologia de combate provinda do Oriente Próximo Antigo era temática comum de obras
apocalípticas, retomando o conceito da criação do mundo como resultado de batalha cósmica contra o
282
AUNE, B., 545.
RISSI, 12 e 15.
284
BORING, 141.
285
AUNE, B., 562-563 e 575.
286
O profeta profere ou professa a palavra de Deus, conforme os termos bíblicos que colocam o profeta como porta-voz de Deus.
287
BORING, 144-145.
288
AUNE, B., 579.
289
BORING, 153.
290
AUNE, B., 611.
291
BORING, 147.
292
AUNE, B., 603.
293
COLLINS, 125.
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monstro do caos aquático e relacionando a história mitológica com os eventos da história atual. As
duas linhas de pensamento eram misturadas, cada qual modificando a compreensão da outra294.
“Com o soar da sétima trombeta em 11.15-19, chegamos (novamente) ao final! …Cronologicamente
os eventos não podem proceder mais adiante: já andamos pelas pragas finais (duas vezes!) e estamos
novamente no final”295. O Apocalipse não está organizado de forma cronológica, mas por conceitos
de temática teológica296. Seus ciclos de sete etapas se repetem três vezes, sempre com o final
cataclismático chegando na sétima etapa. No intervalo dos capítulos doze a quatorze, a luta com os
inimigos de Deus é vista por ainda outra ótica.
“A figura final da série não apresenta apenas a chegada do reino de Deus, mas também anuncia a ira
de Deus, a destruição daqueles que destróem a terra”297. O produto final deste juízo é a cena
celebrativa ao redor do trono, o reconhecimento da soberania de Deus. No soar da sétima trombeta,
o reinar do mundo foi transferido ao reinar eterno de Deus298. Não há qualquer descrição de ruína do
mundo aqui, mas uma retribuição àqueles que estavam destruindo a terra.
Apocalipse 12.1-14.20:
Os capítulos 12 a 14 são uma unidade que mantém um caráter especialmente dramático, “no qual
todas as personagens e ações são exageradas e maiores do que a vida”299. Nos primeiros versículos
temos a apresentação dos principais personagens da peça300. Aqui se descreve dois grupos
polarizados em extremo, sem qualquer comunalidade301. Todos os personagens aqui estão postos em
contraste um ao outro, a exemplo da prostituta e da noiva302.
Escrevendo de uma perspectiva judáica, Levenson aponta que “a presente ordem das coisas encontrase antes, não após o triunfo de Deus: o Leviatã ainda está solto, e a soberania absoluta do Deus
absolutamente justo está pela frente”303. Por outro lado, a expressão cristã é um tanto diferente.
Cristo não está apenas por vir na consumação dos séculos, mas já veio. A salvação plena é esperada
pelo crente em sua expectativa escatológica, mas já é a sua experiência no meio dos problemas que
vivencia304. Neste capítulo, pode-se ver a vitória alcançada, porém, ainda esperada305. A João é dado
ver a realidade de outra perspectiva, como também o servo do profeta Eliseu pôde contemplar a
realidade além do seu olhar amedrontado. Sua esperança é ao mesmo tempo futura e presente, sendo
realidade por conseqüência da fidelidade da promessa de Deus.
Em Apocalipse 12.9, encontra-se menção do dragão, a serpente, o adversário (diabolos), o Satanás
(Satana", transliteração do termo hebraico para adversário, @fv), todos aparecendo com o artigo
definido. No texto grego de Apocalipse, o autor parte de regras gramaticais normativas do grego,
294
Bernard McGinn em ALTER, 568.
BORING, 150.
296
FIORENZA, 350.
297
BORING, 149.
298
AUNE, B., 646.
299
BORING, 150.
300
AUNE, B., 661.
301
BORING, 152.
302
FIORENZA, 359.
303
LEVENSON, 48.
304
BORING, 33.
305
veja em contraste com 21.1-8.
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utilizando o artigo definido, quando considera que o leitor/ouvinte já conhece o referenciado, porém,
não é utilizado em listas quando um mesmo referente é indicado306.
O chamado Leviatã (@tywl—um monstro marinho da mitologia da criação como resultado de uma
batalha cósmica) é normalmente apresentado como sendo primordial. “Enquanto Jó 40-41 declara
explicitamente que Beemote é uma obra de Deus, nenhuma vez tal afirmação é feita referente a
Leviatã na passagem muito mais longa concernente a ele”307. Geralmente, ele é visto como um
monstro marinho dominado por Deus na era primeva, porém ainda reflete poder e atuação ao ser
acordado ou incitado308.
Interpretando os personagens principais do capítulo doze em termos de respresentações de agências
centrais à mensagem e relato do evangelho, teria-se que dizer que 1) a mulher representa os servos de
Deus, seja Israel, Maria, o povo de Israel, a igreja, ou por outra agência; 2) o dragão representa
agência oponente a Deus, seja em Herodes, Satanás, Leviatã, judeus perseguidores dos cristãos,
governo Romano, ou outros personagens; 3) Miguel, do hebraico (lakym—“quem como Deus?”)
miychael309 representa Jesus junto com seus servos310.
Poderia-se tentar interpretar este capítulo num sentido futurístico, porém já existe uma corrente
interpretativa forte que restringe a referência específica aos acontescimentos do ministério de Jesus,
os quais tem implicações ainda futuras. Como a intenção específica do autor é retratar que a vitória
fora ganha em Cristo, o essencial para o cristão é apegar-se à vitória alcançada e permanecer fiel311.
Mesmo que a vitória já tenha sido ganha, a guerra continua e é necessário que o cristão se apegue a
Cristo, o vitorioso312. O combate descrito aqui é colocado como sendo consumado nos céus, mas
ainda não havendo chegado a ser finalizado na terra, em termos de obediência completa a Cristo
como vitorioso313. Os inimigos de Deus ainda atuam no mundo, mas não há razão para o cristão
ceder a vitória que foi alcançada por Cristo.
Havia, no conceito mitológico greco-romano, a lenda do nascimento do deus Apolo que se
assemelhava ao relato de João nestes capítulos. Um cidadão romano podia pensar da narração em
termos dos seguintes personagens: “A mulher é a deusa Roma, a rainha dos céus; o filho é o
imperador, que mata o dragão e estabelece a era dourada; o dragão representa o poder da escuridão,
‘nossa velha maldade’”314. João, porém, toma o relato e o retoca com novos personagens e novo
simbolismo, mostrando outra perspectiva da verdadeira realidade do contexto político-religioso
romano, sendo uma polêmica contra o culto imperial romano315.
“[João] afirma que Deus não é diretamente responsável pelo mal, mas que Satanás não tem poder
independente no mundo”316. Mesmo que o inimigo conquiste alguma vitória, nada pode fazer para
anular a vitória decisiva efetivada na cruz317. O inimigo utiliza como sua arma o medo da morte,
porém, o poder da morte já foi anulada pelo Cordeiro imolado que vive.
306
AUNE, A., clxiii e clxv.
LEVENSON, 49.
308
CLINES, 86-87.
309
lakym -- “Quem é como Deus?”, tomado na literatura judaica como defensor especial do povo judeu conforme BAUER, 524 e Harris, 68, 693 e
832. Este Miguel aparece três vezes no Antigo Testamento e duas vezes no Novo (Daniel 10.13, 21; 12.1; Judas 9; Apocalipse 12.7).
310
BORING, 152-157.
311
Apocalipse 22.5-8.
312
FIORENZA, 359.
313
COLLINS, 124.
314
Vergílio, Eclogue IV.15 em BORING, 151.
315
SCHERRER, 599.
316
BORING, 154.
317
RISSI, 9.
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O dragão, a fera, e o profeta falso são uma unidade318. “Identificando o dragão com Satanás, o
Diabo, a antiga serpente, João mostra que ele pretende simbolizar todas as forças contra Deus desde
o Éden”319. Essa totalidade inimiga é derrotada. Em meio à história da humanidade, os inimigos de
Deus são conquistados pela redenção divina em Cristo320. Como Jesus falava do reinar de Deus já ter
inicio por ter recebido toda autoridade321, aqui João espelha essa vitória completa alcançada e
demonstrada na sua ressurreição.
“Na época de João, a quarta fera de Daniel era comumente interpretada pelos judeus como
representando o Império Romano”322. Deve-se lembrar, no entanto que João não retrata o Império
Romano em sua totalidade com a figura da fera, mas certos elementos da mesma, como na pessoa de
Nero323. A fera respresenta toda agência inimiga, não se limitando a Roma.
“João não apresenta reivindicações milagrosas para os verdadeiros profetas, cujo testemunho é dado
através do sofrimento, não em milages triumfantes”324. No caso do culto imperial, havia caso do uso
de sinais “milagrosos” para sustentar o suposto poder das imagens, como trovões e relâmpagos325.
“A fé verdadeira não é provada, nem invalidada pela manifestação de poder milagroso, nem pela sua
falta”326. Jesus não confiava naqueles que creram por causa dos sinais que ele operava, nem deveria
o crente crer em outro por causa da operação de feitos milagrosos.
A Bíblia simplesmente não explica a origem de Satanás. Isaías 14 é muitas vezes colocado como
explicando a sua origem, porém Isaías não pretende mais do que dirigir a palavra de Deus ao rei da
Babilônia. É interessante notar que nesta passagem de Apocalipse não há nenhum referente em si ao
texto de Isaías 14327. O texto aqui trata que o fato da vitória de Cristo na terra efetivamente expulsa
Satanás de qualquer posição que teria no céu328. Havia relatos da expulsão de Satanás do céu entre os
judeus, mas não em textos que foram creditados com autoridade para serem incluídos na Bíblia329.
A convicção de João em Apocalipse é de que “Alinhar-se com o culto romano é entregar-se ao
inimigo que já está derrotado”330. Que o inimigo fora expulso reflete a vitória de Deus331. A vitória
já foi decisiva e de nenhuma forma carece de outra batalha escatológica final332. Preocupações de
uma batalha cataclismática final eram comuns na época de Jesus, mas deve-se lembrar que em
Mateus 24 ele diz que guerras e rumores de guerras não são sinais que apontam para qualquer coisa.
Todos levam alguma marca, seja a da fera, seja a de Deus, mas o levam sobre si de forma aberta e
óbvia333. A marca ou selo do cristão reflete a sua proteção sob o nome ou autoridade do Cordeiro334.
As marcas são formas de identificação externa tão óbvias como as estrelas de Davi que Hitler obrigou
os judeus a vestirem na época da Segunda Guerra Mundial. Aqui, ambos os lados estão designados
318
Apocalipse 16.13 e BORING, 154.
BORING, 155.
320
RISSI, 10.
321
Mateus 28.18.
322
BORING, 155.
323
RISSI, 11.
324
BORING, 157.
325
SCHERRER, 607-608, 610.
326
BORING, 161; Êxodo 7.11, 22; 8.7; Deuteronômio 13.1-5; Mateus 7.21-23; Marcos 13.22; 2ª Coríntios 10-13; 2ª Tessalonicenses 2.9.
327
WATTS, 212.
328
BORING, 158.
329
AUNE, B., 695. Aqui, a expulsão é escatológica, enquanto na literatura judaica era em geral uma questão primordial, assim refletida em textos
como Adão e Eva 12-16, Evangelho de Bartolomeu 52-55, Qu’ran 7.11-17 e Apocalipse de Moisés 39.
330
BORING, 159.
331
AUNE, B., 699.
332
RISSI, 8 e 15.
333
BORING, 161.
334
RISSI, 14.
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por símbolos externos visíveis para todos identificarem—muito diferente do que a realidade
vivenciada pelo cristão que não tem como distinguir visivelmente o fiel do infiel.
O número seis leva certos conceitos simbólicos, incluindo os de imperfeição, juízo, falta e de ser
incompleto335. A repetição tríplice do número reflete a totalidade ou nível da qualidade de
imperfeição designada.
Apocalipse 15.1-16.21:
O esquema desta passagem prepara o cenário para o lamento da queda de Babilônia a seguir,
refletindo novamente a série de pragas, aqui descritas em termos de taças da ira divina336. O lamento
retoma a linguagem e figura dos lamentos dos profetas do Antigo Testamento como Isaías e Ezequiel
que entre outros profetizaram sobre a queda de reis e nações. Como João se designa profeta, aqui o
papel de profeta é desenvolvido na linhagem dos profetas veterotestamentários.
A linguagem de João é uma linguagem de extremos. Existe o “nós” e o “eles”, mas somente estas
duas categorias, sem qualquer mistura. Em contraste com os filmes populares apocalípticos da
atualidade, a ênfase não recai sobre o que acontece com os que não pertencem a Deus. João
interessa-se mais com a condição eterna dos que pertencem ao Cordeiro337. No tratar dos ímpios, o
texto reflete a justiça de Deus na retribuição em vingança da morte dos servos de Deus338.
As pragas descritas nesta ocasião são expostas em sua intensificação suprema. Trata mais uma vez
das mesmas coisas, mas de forma ainda mais drástica339. O conceito do rio Eufrates tornar-se seco
seria em muito extraordinário, sendo o único rio do Oriente Médio que jamais secava340. A praga
descrita provavelmente deveria trazer à memoria as pragas do evento do Êxodo e a passagem do
povo pelo mar de varas ao sair do Egito.
Toda a cena de uma batalha é preparada aqui, mas não há batalha nenhuma. Faça o que quiser, o
inimigo não consegue alterar os planos redentivos de Deus341. Todas as suas tentativas, artimanhas e
planos não chegam a constituírem um desafio real ao Cordeiro e o trono celestial. Os planos do
inimigo resultam em esforço perdido.
Referente ao Armagedom (“monte de Megido”), deve-se dizer de início que nunca foi explicado de
forma satisfatória o local referido342. É interessante notar que não existe nenhum monte em Megido.
O monte mais próximo a Megido é o Monte Carmelo, mas é duvidoso que os cristãos da Ásia Menor
tivessem conhecimento disso. Alguns apontam para uma modificação mínima para associar o termo
ao “monte da congregação”, mas em realidade não há como definir com precisão um ponto
geográfico de referência. O essencial da menção de João é em termos da iminência de um grande
confronto final entre Roma e seus inimigos343. Mesmo assim, porém, a tal batalha referida não
acontece! Em lugar da batalha esperada, a sétima taça é derramada e o mundo acaba num enorme
terremoto.
335
BORING, 162.
AUNE, B., 903.
337
BORING, 173.
338
AUNE, B., 903.
339
BORING, 174-175
340
AUNE, B., 890-891.
341
RISSI, 12.
342
AUNE, B., 898.
343
BORING, 177.
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336
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Em lugar de batalha escatológica temos apenas o juízo divino. Esse juízo ou julgamento deve ser
visto espelhando outra vez o sacrifício do Cordeiro, um derramar do grande amor de Deus344. Foi
este o evento de vitória e também de juízo, tal como retratado no silêncio do sétimo selo345.
Na descrição da cena aparece em mais de uma ocasião a idéia da possibilidade de arrependimento
ignorado pela humanidade. Esse arrependimento é o alvo da ira do Cordeiro, não aniquilação e
destruição346. João se coloca aqui nos moldes das palavras de Jesus ao chorar sobre Jerusalém e a sua
eventual destruição347.
Apocalipse 17.1-18.24:
João é levado ao deserto para ver a cidade, pois o deserto é lugar de refúgio para o povo de Deus.
As imagens de João não são codificações alegóricas que podem ser decifradas com uma simples
chave. O simbolismo das imagens relaciona-se com várias coisas de uma só vez348. Lembra-se que o
pano de fundo para Apocalipse inclui o Antigo Testamento inteiro, bem como o evangelho de Jesus
Cristo, as expectativas judaicas do messias e o fim do mundo e o contexto vivido por João e as
igrejas na Ásia Menor.
A deusa romana principal, Dea Roma, era cultuada na maioria das cidades mencionadas nas cartas às
sete igrejas349. Retratando Roma, João faz referencia ao governo, às práticas religiosas, à deusa
Roma com o seu culto, ao império romano, ao culto a César, como também Nero e às lendas
referentes a ele350. Roma tinha deuses, cujos nomes não eram publicados, para que não fossem
invocados a deixar Roma e irem para outro lugar. Comumente pensava-se que o nome secreto da
deusa Dea Roma fosse Amor (Roma escrita ao inverso, retratando conceitos de Vênus/Afrodite, a
suposta mãe de Aeneas, tido como ancestral dos romanos). João trata a deusa Roma como uma
prostituta, provavelmente aproveitando conceitos vulgares da época e expondo-os em crítica351.
As reflexões de João sobre a fera e os oito reinados de sete reis reflete as colocações de Daniel 7. Há
considerável dificuldade em identificar reis específicos da cronologia Romana, mas parece ter algo a
ver com Nero de volta dos mortos352. No entanto, não há como especificar a lista de sete reis, para
que se entenda que a fera é Nero. O mais correto, provavelmente, seria aceitar o número como
designando todos os reis de Roma353. Por outro lado, é possível que João não se interesse em que
todos os imperadores romanos estejam representados, já que nem todos refletiam um caráter
impróprio em relação ao judaismo e o cristianismo. De qualquer forma, a preocupação de João era
de mostrar o caráter do imperador. Seu interesse não era dizer quem ele era, mas o que ele era354.
344
RISSI, 12 e 15.
WICK, 512-513 conforme referido anteriormente, o silêncio do momento de sacrifício parece ser espelhado no silêncio aqui.
346
RISSI, 12.
347
Mateus 23.37-38.
348
BORING, 179.
349
AUNE, C., 959.
350
BORING, 179-180.
351
AUNE, C., 926-927. Era comum entre a população romana uma distorção da lenda de Rômulo e Remo sendo por uma lupa, termo latin para
designar a fêmea do lobo, mas também usada para indicar uma prostituta (929).
352
BORING, 182 e COLLINS, 126.
353
AUNE, C., 960.
354
BORING, 183.
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Apocalipse 19.1-10:
Deus derrotou o inimigo, e é por isto digno de louvor. Esta passagem é uma passagem de culto a
este grande Deus, a iminência das bodas do Cordeiro sendo o cerne deste culto 355. A fumaça tem um
vínculo com a fumaça dos altares e incenso que era oferecido como sacrifício a Deus. A norma da
figura é que Deus preza o cheiro suave do sacrifício, mas aqui o cheiro vem do juízo de Roma, o
qual parece ter o aspecto de cheiro suave, agradável a Deus.
Apocalipse 19.11-22.5:
Outra vez não há nenhuma necessidade de uma grande batalha escatológica, pois o inimigo já foi
derrotado. Sem qualquer ação de combate da parte de Cristo ou dos santos, toda a aglomeração
inimiga se desfaz356. Em contraste com a suposição popular de conhecer o nome secreto da deusa
Roma, ninguém sabe o nome secreto do Cordeiro, a não ser o próprio Cordeiro. Logo, ninguém tem
controle sobre a sua intervenção.
A ênfase na parousia do Cordeiro nesta passagem é em termos da função judicial do evento da
chegada de Cristo357, não de um arrebatamento do povo de Deus ao céu. A vinda de Cristo em glória
espelha o dia de prestar contas, no qual não há forma de fugir da justiça e do juízo de Deus.
“O capítulo 20 [de Apocalipse] é a continuação dos eventos de vitória relatados no capítulo 19, sendo
a parte conclusiva da visão”358. O juízo está completo, abrindo espaço para a descrição da nova
realidade da noiva, o povo do Cordeiro.
“Platão, sem a luz da Santa Escritura, mas refletindo sobre o eterno, falou de ‘a cidade cujo lar
encontra-se no ideal’, o padrão que é ‘reservado no céu para aquele que o queira contemplar e assim
contemplando constituir-se como o seu cidadão’”359. De modo bem semelhante, Agostinho trata de
duas cidades “compostas de dois amores: a cidade terrenal por amor a si, em desprezo a Deus, e a
cidade celestial pelo amor a Deus, em desprezo a si”360.
“O termo ‘abismo sem fundo’ está vinculado a idéias concernentes à forma do mundo. A terra era
concebida como um disco plano que flutuava por cima de água. O abismo refere-se às profundezas
imensuráveis embaixo da terra, pois pensava-se existir uma fenda capaz de ser selada”361 .
Obviamente as expressões aqui não devem ser tidas como literais, pois é impossível e inconcebível
amarrar um ser espiritual com cadeias e selar uma fenda na terra com um cadeado. A chave para a
porta do abismo designava o conceito de autoridade sobre o abrir e fechar a fenda ao abismo362,
poder sobre a morte e o mundo além túmulo.
“A figura do amarrar de Satanás é compatível com a expressão em Efésios que o nomeia como
‘príncipe do poder do ar, o espírito que agora opera nos filhos da desobediência’. Ele é restringido,
porém não destruído. Dentro de sua esfera restringida, ele ruge furiosamente (1a Pedro 5.8). Para
355
AUNE, C., 1040.
RISSI, 8.
357
AUNE, C., 1069.
358
ROBBINS, 221.
359
Republic IX, 592, tr. Shorey citado em MOODY, 576.
360
Agostinho, The City of God. XIV, 28 citado em MOODY, 576.
361
ROBBINS, 221-222.
362
AUNE, B., 527.
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os cristãos, Satanás foi completamente amarrado, e eles não precisam temer a sua decepção ou o seu
poder”363. A igreja está protegida do inimigo, pois mesmo que a fera mate o cristão, a morte apenas
o conduz à presença de Deus364.
Como a chave do abismo designava autoridade sobre o mesmo, a chave das cadeias expressa
autoridade sobre a limitação do poder do dragão, refletido ao mesmo tempo pelas cadeias. O dragão
ainda pode ser forte e poderoso, mas a abrangência do seu poder tem sido reduzida365.
A vitória já foi ganha pelo Cordeiro, mesmo que o inimigo se prepare para a batalha366. “O poder
protetor de Deus é tão extraordinário que não há nem a aparência de uma batalha, quando Deus
deseja destruir as forças do mal”367. A soberania de Deus é completa, não tão pequena que
forneceria a possibilidade de uma batalha. Conforme a soberana vontade de Deus, querendo, ele
executa sua vontade, sem importar aqueles que se oponham. Sua vitória é final e absoluta—
incontrovertida e já realizada pelo Cordeiro.
Na literatura Apocalíptica, Gog e Magog são símbolos para as nações idólatras que atuam em
oposição a Deus368, sendo usados poucas vezes nessa literatura mas encontrados também em Ezequiel
38.22369. Logo, João demarca aqui a confiança de que a vitória de Cristo será revelada como
completa, até o ponto de toda agência maligna ser totalmente eliminada. Quando Gog e Magog vem
para atacar os santos, o seu exército se alinha pela extensão completa da terra, o que pareceria
indicar que o lugar de vivência dos santos não está delimitado a uma localidade geográfica. Em lugar
disso reflete de certa forma que o campo sitiado refere-se aos santos espalhados por todo âmbito da
terra. Estes santos são o acampamento dos fiéis, a própria “cidade querida” que não se limita a uma
definição local370.
“Em escritos apocalípticos, os números tem sentidos simbólicos em lugar de numéricos. O número
dez era o número de um homem completo. Mil é o cubo de dez, que simboliza um período de tempo
compreendendo toda a humanidade”371. “Neste livro de símbolos, qual é a duração de mil anos?
Todo tipo de teorias são propostas, porém nenhuma delas realmente satisfaz”372. “Não temos mais
direito de tomar os mil anos literalmente do que temos para tomar o monstro de dez cabeças e sete
chifres literalmente”373.
À luz de Apocalipse 20.6-8, obviamente “o milênio, o que quer que seja, não significa um vasto
período no qual Satanás não tem seguidores sobre a terra, pois estas hostes vastas erguem-se
imediatamente sob seu comando”374. É mais viável ver o reinar com Cristo como a colocação de
forma positiva do amarrar o inimigo375. Não há referente de localidade para o exercício deste
reino376. Reina-se com Cristo, mas o local não é especificado. Esta passagem pode referir-se tanto a
um local terreno, como também pode caracterizar o que chama-se de céu. O essencial é o aspecto de
estar junto a Cristo, o seu reinado efetivo na vida do cristão.
363
ROBBINS, 223.
RISSI, 15.
365
ROBBINS, 222.
366
RISSI, 15.
367
ROBBINS, 227.
368
ibid., 226.
369
AUNE, C., 1099-1100 e 1104.
370
GUNDRY, 256-257.
371
ROBBINS, 222.
372
ROBERTSON, 457.
373
Torrance citado em ROBBINS, 222.
374
ROBERTSON, 461.
375
ROBBINS, 224.
376
Swete citado em ROBERTSON, 460.
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Quem participa da primeira ressurreição, não participa da segunda morte. O termo segunda
ressurreição, não é utilizado377. O sentido de “primeira” parece expressar a unicidade e importância
da ressurreição.
Na passagem de Apocalipse 20.15, não existe cogitação nenhuma para os conceitos de sono da alma,
estado intermediário, uma segunda chance após a morte, nem mesmo para uma aniquilação dos
infiéis378. O julgamento divino é decisivo, tal como a decisão do ser humano em aceitar ou rejeitar a
obra redentora do Cordeiro imolado.
A partir do capítulo 21, encontra-se uma extensa descrição da Nova Jerusalém. Esta não é figura da
localidade de vivência dos santos, mas é figura dos santos em si—“a morada de Deus nos santos, em
vez de sua morada na terra”379. A cidade é a santa380 noiva381 do Cordeiro. Deve-se tomar cuidado
para não forçar demais os símbolos descritivos, mesmo assim, fornecem detalhes importantes para a
compreensão temática do livro.
Na literatura Ugarítica382, o mar figura como um monstro. “Seus aliados, os inimigos de Baal,
incluem o dragão, a serpente tortuosa, Shilyat com sete cabeças. Aparecendo na Bíblia sob o nome
Leviatã. Lotan é o aliado da Morte. O Mar e a Morte representam forças monstruosas, hostís à raça
humana e atemorizantes à assembléia divina”383, conforme conceitos de oposição entre o mar e
YHWH (hwhy)384.
O mar no conceito hebraico era visto muitas vezes como um símbolo, ou até a personificação, de
agência maligna, em rebelião contra Deus. Este conceito encontrava-se vinculado a um combate
escatológico entre as forças do mal e YHWH. O mais próximo a um mito de combate no contexto
cristão é o que se encontra nesta passagem nos termos “de ‘um novo céu e uma nova terra’ onde ‘o
mar ja não existe’”385. Esta agência inimiga não está apenas amarrada, mas passa da existência no
novo contexto da Nova Jerusalém. Não há mais implicância da fera, do dragão, de ninguém.
Havia sido já expresso, a exemplo em Isaías 65.17-25, o conceito de que toda a criação precisava ser
transformada para que o reino eterno messiânico pudesse ter um contexto novo e perfeito386. As
descrições seguintes da nova cidade, ou da noiva, são expressamente esse novo contexto de vida no
reino eterno de união com o Cordeiro. As questões da falta de lágrimas e choro devem ser lidas em
comparação com outras passagens que apresentam o choro divino. O ensino é válido em termos de
uma mudança drástica do contexto de vida do cristão, mas não deve ser forçado ipsis literis acima de
outros textos ausentes de figuras e linguagem simbólicas387. As frases de Apocalipse 7.17 e 21.4
servem mais com o sentido de colocar a reversão do lamento e choro do povo em contraste a Tiago
4.9, nos termos de Jesus em Mateus 5.4.
377
ROBBINS, 225.
ROBERTSON, 465.
379
GUNDRY, 256.
380
Apocalipse 21.2.
381
Apocalipse 21.3.
382
Língua de um povo vizinho dos hebreus que exprime certos conceitos tidos em comum entre os hebreus e os seus vizinhos. O nome vem da
cidade de Ugarit, na costa mediterrânea ao noroeste de Israel. A cidade foi destruída por volta de 1650 a.C., época não muito distante da de
Abraão.
383
COLLINS, 124.
384
AUNE, C., 1119.
385
LEVENSON, 33.
386
AUNE, C., 1133.
387
Veja Mateus 23.37, onde Jesus retrata inúmeras ocasiões de estar entristecido por causa da rebeldia do povo. Deus chora assim pela falha
humana como o pai que anseia o retorno do filho, regozijando na sua volta (Lucas 15.20-32). A alegria descrita é apenas possível onde há
tristeza na separação original. Hebreus 5.7 se refere à angústia de Jesus no Getsemane.
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As figuras de Apocalipse 21.5 retomam à linguagem de Isaías 25.8, na restauração feita pela
iniciativa de YHWH388. Tudo é novo e agora reflete em coerência o propósito original da criação.
Tudo é novo, e o reinar de Cristo tem agora um início mais real, o fiel herdando a vida como ela
deveria ser.
A lista de ações pecaminosas aqui provavelmente reflete mais o conceito dos cristãos que foram
infiéis, já que os de fora têm sido categoricamente cortados da vivência no contexto da Nova
Jerusalém. A mensagem de João retrata que os de dentro que escaparam da morte por participar nos
sacrifícios oficiais do culto romano, adoraram à fera, incluindo-se na prática adúltera de prostituição
aos ídolos e com a prostituição nos templos, tiveram medo da perseguição em lugar de confiança em
Cristo, efetivamente participando da morte dos fiéis389.
O formato cúbico da cidade espelha o cubo do lugar santíssimo do templo e do tabernáculo390. Em
lugar da Nova Jerusalém ser um grande templo de Deus, ela é o lugar santíssimo da mera presença
de Deus. A igreja, a noiva do Cordeiro, está repleta da glória e da presença de Deus.
Apocalipse 22.6-21:
Adore apenas a Deus—não se deve adorar nem mesmo ao seu mensageiro, e especialmente não adore
a César! Outra vez repete-se a mensagem básica da carta—ser fiel Àquele que é digno. César
reclama culto a si, mas os próprios mensageiros celestiais (mais altos do que César) não reclamam o
direito de serem adorados. Apenas Deus é digno de adoração.
Conclusão:
O livro de Apocalipse é obra de temas escatológicos, porém de alcance imediato e atual. O enfoque
não é sobre predições futurísticas, mas sobre a realidade alcançada por Cristo, o Cordeiro de Deus
que venceu por completo o inimigo. A mensagem geral do livro leva o leitor a perceber que mesmo
que o inimigo pareça governar o mundo à sua volta é Deus em Cristo Jesus que executa a Sua
vontade de forma incontrovertida. As aparências são enganosas, mas o cristão não se deve deixar ser
levado pelas aparências. A realidade é outra.
Há atuação maligna em volta do ser humano, mas a vitória do Cordeiro posiciona ao cristão fiel
como vitorioso. Há, portanto, que lembrar e colocar em prática o mandamento de Jesus, dirigido de
forma tão clara inúmeras vezes: “Quem é, pois, o servo fiel e prudente, que o senhor pôs sobre os
seus serviçais, para a tempo dar-lhes o seu sustento? Bem-aventurado aquele servo a quem o seu
senhor, quando vier, achar assim fazendo”391. Vigia e sê fiel!
388
WATTS, 333.
GUNDRY, 258.
390
AUNE, C., 1187 e GUNDRY, 261, ambos referindo a 1a Reis 6.20.
391
Mateus 24.45-46.
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livro reúne, portanto, de perspectiva erudita e evangélica, o melhor de estudo crítico do texto veterotestamentário, com
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MAYS, James L., editor geral. Harper’s Bible Commentary. San Francisco: Harper & Row Publishers, 1988. (Citações traduzidas
por Chrístopher B. Harbin). [Comentário de boa erudição, porém limitada como qualquer comentário de um só volume.
Apresenta uma perspectiva de erudição sem vínculo confissional, sendo publicada por editora secular para o mercado
religioso geral. O editor é presbiteriano e professor da Union Theological Seminary em Richmond, Virginia.].
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STBRS-PETE “5.000 Æ 5.000” Escatologia e o Apocalipse
Pr. Chrístopher B. Harbin
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enciclopédica de artigos de eruditos sobre a história, a literatura, as instituições, as perspectivas religosas e as contribuições
gerais dos povos do antigo oriente. O editor é professor da Vanderbilt University.].
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[Livro de Teologia do Novo Testamento por professor da Southern Baptist Theological Seminary. O autor foi também
professor da New Orleans Baptist Theological Seminary durante vinte e quatro anos. Foi Ph. D. da Southern Baptist
Theological Seminary, com estudos de pós-doutorado em Edinburgh e na Suíça.].
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Chrístopher B. Harbin).
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traduzidas por Chrístopher B. Harbin).
Edição: 12-09-2002
©Copyright 2002 por Chrístopher Byron Harbin
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Eerdmans, 1989. (Original em holandês, 1982). (Citações traduzidas por Chrístopher B. Harbin).
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