Trago fogo! - Fátima Missionária
Transcrição
Trago fogo! - Fátima Missionária
HORIZONTES Trago fogo! texto Darci Vilarinho foto Ana Paula – Trago-lhe fogo, dona Antónia! – Oh! É a Joaninha, o meu “Anjo da Guarda!”. Deixe-me vê-la, minha querida! “Minha querida” era o tratamento mais usual desta senhora de 89 anos a esta jovem. Joana entrou no quarto frio da casa gasta pelos anos. Dona Antónia estendeu-lhe os braços, convidando-a a sentar-se na beirinha da cama. A sua vida activa e silenciosa em torno de quem dela precisava, foi interrompida por uma queda e um longo período de hospitalização. E agora, em casa, sentia-se fraca e com dores que, nos dias mais frios a impediam de andar. Era a última sobrevivente da sua pequena família e os amigos que permaneceram na sua aldeia transmontana, tinham já falecido. Dona Antónia não conseguia impedir os momentos de solidão e de tristeza vivida no silêncio do seu quarto. Joana, uma jovem de 16 anos, conheceu esta simpática senhora numa actividade do grupo de voluntariado a que pertencia. Cruzou-se com ela na casa de um casal idoso a quem dona Antónia costumava visitar para lhes fazer alguma companhia e colaborar em algumas tarefas. Joana ficara tão impressionada com a alegria e voluntarismo desta senhora que, a partir de então, passou a haver entre ambas amizade e admiração mútuas. Após a queda da dona Antónia, Joana visitava-a frequentemente. Via a sua amiga entristecer e isso preocupava-a mais do que as dores. Tinha de fazer alguma coisa. Era isso que Joana vinha fazer: estar sentada junto da dona Antónia, a ouvir as suas histórias. Trazia-lhe sempre um miminho: umas bolachas para a sua gulodice, um arroz-doce especialidade da mãe, umas flores para a jarra que apanhava nos terrenos à volta da casa, uns grelos da horta dos pais… e, muitas vezes, “nada” – só a sua presença amiga e um colo grande para acolher as histórias e os conselhos da dona Antónia. Quanto aprendia com ela! Reconhecia-lhe uma sabedoria tão grande que, às vezes, era a Joana quem mais falava da sua vida, das suas dúvidas, dos seus medos. Saía de lá, sempre, com uma tranquilidade muito grande. Em nenhum outro lado se sentia tão escutada, entendida e útil como em casa da dona Antónia. Ela era tão agradecida! Dava valor ao mais pequeno gesto da Joana e fazia-a apren- FÁTIMA MISSIONÁRIA 0 JANEIRO 2010 der quanto valem os gestos pequeninos. Estava a transformar-se por dentro. Desta vez, Joana traz-lhe de presente um braçado de lenha. A lareira de dona Antónia há muito tempo que não é acesa e um dos prazeres dela é ver os desenhos, a dança e a música do fogo na lareira. Enquanto tagarelavam, Joana acendeu a lareira e, logo que o calorzinho se fez sentir em frente à chama, ajudou dona Antónia a deslocar-se até à sala, instalando-a na cadeira de baloiço. Pôs-lhe uma manta sobre os joelhos, aconchegou-lhe o xaile nas costas e sentou-se ao seu lado, no tapete, com o braço em cima dos seus joelhos. Uma mão vagarosa, aconchegante, pousou na sua cabeça. Durante os momentos de silêncio em que ali ficaram, Joana e dona Antónia sentiram-se a viver um bocadinho do paraíso. O rosado do rosto da dona Antónia foi-lhe rasgando um sorriso de felicidade. Joana olhou para a sua amiga. Na troca de olhares, soube que, com a sua ajuda, fez ressuscitar a alegria e o prazer de viver em dona Antónia. Mais uma vez, Joana levou dentro de si aquela felicidade que a fez cantarolar durante o caminho até casa.