Uso racional de medicamentos

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Uso racional de medicamentos
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USO RACIONAL DE MEDICAMENTOS
Quatro notícias inter-relacionadas
Cargas roubadas
FEDERAÇÃO NACIONAL DE POLICIAIS FEDERAIS – FENAPEF.
Anais do I Encontro Nacional do Transporte Rodoviário de Cargas - 2005.
As cargas mais visadas pelas organizações criminosas são aquelas com alto valor agregado e de fácil distribuição no
mercado ilícito da receptação. A afirmação é comprovada através dos dados extra-oficiais que realizaram o diagnóstico das
empresas do setor de cargas. Conforme demonstram os registros do Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas de
São Paulo e Região (SETCESP), o objeto-alvo mais comum são os produtos eletro/eletrônicos com o percentual de 26% das
ocorrências registradas entre os meses de janeiro e junho de 2005. Nos mesmos parâmetros, em segundo lugar aparecem os
medicamentos com o percentual de 16,40%. Apesar de o setor de medicamentos ter crescido em percentuais bem mais
baixos que o de eletrodomésticos, com o valor de 0,26% em relação ao ano de 2004, em volume de vendas, podemos afirmar
que as necessidades extremas do consumidor final na aquisição dos produtos medicamentosos tornam o mercado tentador
para as organizações criminosas. Uma carga de antibióticos roubados será facilmente dissolvida no mercado ilícito que
distribuirá os produtos com descontos tentadores para as farmácias e drogarias.
http://www.fenapef.org.br/htm/com_tribuna_exibe.cfm?Id=669
Filho de ex-vice-presidente dos E.E.U.U. é preso com drogas controladas
The Associated Press, Sexta-feira 6/7/2007. Carla k. Johnson
CHICAGO. Peritos em abuso de drogas que prenderam o filho de ex-vice-presidente americano Al Gore assinalaram o
crescente problema do abuso de drogas de prescrição entre os jovens americanos. Estudantes nas faculdades usam o
estimulante Adderall, uma droga para o tratamento do déficit de atenção, para obter um estado de excitação mental elevado.
Outros policiais de drogas dizem ter encontrado de posse do rapaz maconha, xanax, valium e vicidina – também muito
comuns nas Universidades. “O filho de Al Gore é apenas mais um como outro qualquer”, disse Donald Misch, diretor dos
serviços de saúde na Northwestern University em Evanston. “A única coisa que faltava era a droga nº. 1 em abusos, que é o
álcool." De acordo com a Pesquisa Nacional sobre o uso de drogas e saúde de 2005, são 14,6 milhões os usuários correntes
de maconha e 6,4 milhões os que usam abusivamente drogas controladas, a maioria usando analgésicos como a Vicidina. A
cocaína está em terceiro com 2,4 milhões de usuários. Dr. Misch também afirmou: "Esta é uma oportunidade para as pessoas
entenderem que isto acontece em nossa própria casa”. Acrescentou: “São nossos filhos. Os traficantes que eles procuram são
seus médicos, pais e amigos”.
Fonte: http://www.washingtonpost.com/wp-dyn/content/article/2007/07/05/AR2007070501415_2.html
Congresso busca equilíbrio na segurança na aprovação rápida das drogas
Washington Post. Quinta-feira, 5 de julho de 2007. David Brown
Três drogas - Vioxx, Ketek e Avandia – lançam sombras sobre os debates no congresso americano relativos à atualização e
revisão do sistema de aceleração do processo de autorização de comercialização de medicamentos controlados que completa
15 anos. Todas as três tiveram problemas após a aprovação pelo FDA. Os problemas foram desde milhares de ataques
cardíacos parcialmente atribuídos ao analgésico Vioxx até a poucos casos de falha hepática causada pelo antibiótico Ketec. E
os danos da droga antidiabética Avandia estão apenas começando. Juntas as três drogas são a epítome do que pode
acontecer quando um novo medicamento move-se do mundo pequeno e ordenado dos testes científicos para o enorme e
confuso mundo do uso cotidiano. [...] Jerry Avorn médico da Escola de Medicina de Harvard e especialista em segurança de
medicamentos afirma que não se gasta dinheiro suficiente nos “estudos correntes de farmacovigilância e que a dependência
do FDA do dinheiro da indústria (através da taxas pagas por ela) o pode estar corrompendo de forma sutil”. Os resultados são
controversos. Theresa Mullin, assistente para o planejamento do FDA citando estudos realizados na Universidade de Chicago
afirma que “O acesso precoce a medicamentos seguros e efetivos é bom para a saúde pública. Para pessoas com Parkinson,
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Alzheimer ou câncer tempo é um luxo que eles não têm”. Por outro lado, estudos feitos em Harvard mostraram que as drogas
aprovadas mais rápido do que o recomendado tinham de três a cinco vezes mais possibilidades de serem posteriormente
retiradas do mercado. Contudo não há dúvidas que mesmo as drogas testadas mais cuidadosamente podem trazer surpresas.
Tanto é verdade para problemas raros – como a falha hepática espontânea com o Ketek – quanto os muito comuns como os
ataques cardíacos atribuídos ao Vioxx e possivelmente ao Avandia. De qualquer forma os problemas são difíceis de serem
detectados. “Muitas reações adversas que nos preocupam não são reconhecidas como reações adversas na maioria das
vezes” diz Richard Platt, um pesquisador de Boston. Muitos especialistas acreditam que grandes bases de dados do governo,
do comércio e da indústria atualmente disponíveis devem ser revistas em busca de pistas que ajudem a identificar mais cedo
estes problemas. Tal foi o caso do Vioxx que se fora feita uma meta análise os efeitos cardíacos teriam sido identificados
desde 2001. Hoje praticamente todos concordam que uma atenção maior deve ser dada na busca da segurança das drogas
em uso.
Fonte: http://www.washingtonpost.com/wp-dyn/content/article/2007/07/04/AR2007070401712_3.html
China suspende as vendas de droga para leucemia
The Associated Press. Domingo, 8 de julho de 2007. Scott Mcdonald
BEIJIN - O governo chinês anunciou sábado a suspensão da venda de uma droga usada para tratar a leucemia aguda e
artrite reumatóide numa última tentativa de conter o escândalo da indústria de medicamentos do país. O governo chinês está
tentando aumentar o controle sobre os medicamentos em meio a crescentes críticas – em casa e no estrangeiro – que a
qualidade das drogas e outros produtos é pouco regulada. Na última semana o ex-chefe do Departamento Estatal de Drogas
e Medicamentos foi sentenciado à morte devido a acusações de corrupção, e foi anunciado que as licenças de cinco
produtores foram suspensas e mais 128 outras pessoas foram penalizadas. Tais fatos tiveram sua origem quando autoridades
da saúde dos E.E.U.U. retiraram do mercado mais três produtos de origem chinesa suspeitos de serem danosos às crianças,
parte de uma lista maior que prevê o banimento, recolhimento e restrição de importações chinesas – de sucos a pasta de
dentes – suspeitos de conterem altos níveis de toxinas. Sexta feira uma corte de justiça chinesa sentenciou Cao Wenzhuang
à morte. Ele era assistente de Zheng Xiaoyu que já fora condenado à morte em maio. O país atualmente está revendo seus
sistemas oficiais de segurança de drogas e alimentos prejudicados pela competição entre agências de governo, legislações
obscuras e corrupção. Fonte: http://www.washingtonpost.com/wp-dyn/content/article/2007/07/07/AR2007070700798.html
O que liga as quatro notícias diz respeito ao:
-
uso inadequado de medicamentos e o mal que isto pode trazer para a sociedade.
-
lucro que este mercado pode dar a quem o explore licitamente ou não.
medicamento ser um bem tão essencial que sempre haverá um mercado ávido para consumilo inclusive arriscando a própria integridade física.
rigor na analise dos pedidos de autorização de comercialização dos novos medicamentos
desconsideração e descompromisso com o próximo, daqueles socialmente encarregados da
garantia da qualidade dos produtos.
No Brasil se rouba muita carga de medicamentos porque é um bom negócio entre outros motivos
porque não se controla a prescrição médica abrindo o mercado para a automedicação.
Mesmo num país como os E.E.U.U. que são rigorosos no controle da prescrição, se reconhece que é
preciso melhorar. Também se identifica que as pressões comerciais por maior rapidez na liberação
de novas drogas, nos E.E.U.U. podem estar causando mais danos do que benefícios.
A fraude e a corrupção são práticas fatais não apenas para os indivíduos, mas para a própria
economia.
Finalmente, porque os eleitores e contribuintes brasileiros são tão lenientes com os descaminhos
legais e éticos dos seus representantes políticos?
Há leis muito antigas ainda atualíssimas, como os dez mandamentos.
Há quem afirme, como Kropotkin, que as leis são inúteis.
“Boa lei, é a que revoga uma lei pior mais antiga” – afirma o reformador.
Há, em nosso país, a lei que fenece sem nunca ter sido cumprida. “Não pegou” – dizem.
Pode-se afirmar que uma lei é tão forte quanto a vontade do povo em cumpri-la.
A Lei Federal nº 6.360 de 23 de setembro de 1976 tem como antepassados o Decreto-Lei nº 986,
de 21 de Outubro de 1969 , a Lei Federal nº 5.991, de 17 de dezembro de 1973 e foi seguida pela
Lei Federal nº 6.437, de 20 de agosto de 1977. O conjunto poderia ser chamado de “Código
Brasileiro de Vigilância Sanitária”.
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Foi, paradoxalmente, uma legislação progressista da ditadura. Pode-se encontrar nos seus textos o
viés autoritário do excessivo centralismo de poder nas mãos do governo federal. A criação do SUS,
com sua bela retórica socialista, e da ANVISA, não desmanchou esta nódoa.
Mas a coisa anda.
A repartição poeirenta, atulhada de papel, carimbos, poucos e despreparados funcionários,
operando uma burocracia exasperante foi contemplada, no dealbar do século XXI, por um corpo
com mais de cinco centenas de novos funcionários concursados, ávidos para a transformarem num
instrumento realmente eficiente de proteção social.
É uma vitória, mas, ainda há pedras no caminho.
Hoje a vigilância sanitária ampliou seus horizontes. Acrescentaram-se às velhas leis
responsabilidades de controle do fumo, prestação de serviços de saúde, propaganda,
farmacovigilância, equipamentos, agrotóxicos etc. Não que a idosa 6360 e suas companheiras
fossem omissas, mas careciam de estruturas administrativas que a executassem.
As respostas aos problemas devem ser mais rápidas. O principal motivo é que, pela magnitude e
velocidade do consumo, os efeitos de maus produtos no mercado difundem-se rapidamente e são
mais graves. As ações de vigilância sanitária tendem a ser mais voltadas para a fonte: a produção.
Isto quer dizer que a atuação dos inspetores sanitários será cada vez maior no interior da fábricas,
nas linhas de produção, logo, mais preventiva.
Os velhos e renovados desafios exigem novas e melhores habilidades dos inspetores. O funcionário
autodidata da vigilância sanitária está definitivamente obsoleto. Isto exige que as administrações
públicas selecionem os melhores quadros e provejam que eles se mantenham atualizados nas suas
áreas de atuação. Há contudo um substrato comum a todos eles. A ética no desempenho das
funções públicas. Isto não é uma exigência utópica, mas, como se pode depreender dos fatos mais
recentes, um questão essencial para a sobrevivência da democracia. Um bom exemplo que os
dirigentes dêem aos seus subordinados na gestão da coisa pública é a matéria prima da boa
política.
Há, no mínimo, mais de mil e quinhentas normas técnicas discorrendo sobre os mais variados
assuntos da vigilância sanitária. Cada uma delas relacionadas a um dos 88 artigos da “meia três
meia zero” ou aos 300 artigos das suas leis coadjuvantes. Não há um ser humano sequer, dos que
falem português, vivam no Brasil, militem na vigilância sanitária ou dela dependam, que seja capaz
de entender perfeitamente o que a maior parte destas normas estatuem. Isto para não falar sobre os
regulamentos estaduais e municipais que, ao fim e ao cabo, são meras repetições de normas
federais acrescidas dos trâmites das burocracias locais.
Alguns procedimentos terão de ser revistos pois se tornaram pouco eficientes até mesmo por razões
técnicas.
O país é muito diversificado culturalmente. A ignorância e a pobreza, endêmicas e mensuráveis,
favorecem certos comportamentos de sobrevivência prontamente explorados por oportunistas de
todos os matizes. Cultivar a solidariedade e a cooperação em um ambiente destes é dificílimo. Mas
a inação é pior porque representa a capitulação da inteligência e da criatividade diante das
iniqüidades brutais causadas pela exploração da população.
O sanitarista engajado na luta social (que outro sentido teria sua atividade?) tem o seu próprio
conhecimento a oferecer. Ele deve difundir o que vê, apontar soluções e não se intimidar com a
autoridade.