Dissecando a Camorra

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Dissecando a Camorra
Atualizado por Marcelo
Qui, 30 de Abril de 2009 15:34 Em “Gomorra”, jornalista Roberto Saviano revela a estrutura de funcionamento da violenta máfia
napolitana
Na abertura da temporada 2008/2009 do Campeonato Italiano, torcedores do Napoli tomaram
de assalto trens que os levaram até a Capital, para a partida contra a Roma. Além de não
pagarem pelas passagens, destruíram as conduções quando chegaram ao destino deixando
um prejuízo superior a meio milhão de euros à empresa de transporte público.
A ação policial foi enérgica e resultou na prisão de dezenas de ultras, como são chamados os
componentes de torcidas organizadas na Itália. Além de integrarem esse ou aquele grupo, o
que chamou a atenção era que muitos dos detidos também tinham uma vasta ficha policial e
vinculação à Camorra, a violenta máfia napolitana que domina o crime organizado no sul do
País. O fato apenas reforçou o que o jornalista Roberto Saviano havia exposto no contundente
“Gomorra”, dois anos antes.
Adequado aos novos tempos, o grupo mafioso não agia nas sombras, seus chefões não eram
protegidos por capangas e seus tentáculos criminosos não operavam de forma vertical, mas
funcionavam de modo independente, sem a necessidade imperiosa da palavra final do
patriarca do clã. Diferente da Cosa Nostra, a máfia siciliana, a estrutura horizontal da Camorra
ajudou, durante muito tempo, em sua manutenção como uma verdadeira ‘empresa do crime’. O
modelo seguido pelos colegas de contravenção na Sicília e em Palermo serviu de exemplo.
Com uma organização inflexível e muito atrelada ao poder do boss (chefe), a Cosa Nostra
acabou desmantelada pela Justiça italiana, especialmente por meio da ação do juiz Giovanni
Falconi, da província de Palermo, que acabou assassinado pela máfia siciliana em 1992. Ao
invés da extorsão e intimidação, práticas recorrentes nos grupos, a Camorra propôs uma
investida diferente, tendo um trunfo forte a seu favor: o porto de Nápoles. Porta de entrada de
mercadorias do Oriente, principalmente da China, a máfia utilizou o complexo para beneficiá-la.
Atuando basicamente em três frentes, a indústria têxtil, a venda de cocaína e, mais tarde, a
construção civil, a Camorra estendeu seu campo de ação financiando a abertura de novas
empresas, emprestando dinheiro à população, enfim, atuando como uma instituição financeira
desburocratizada. O não pagamento da dívida, no entanto, não resultava em costelas
quebradas ou dedos decepados, mas acabava por tornar o devedor um trabalhador a serviço
da máfia. A cumplicidade que a atuação gerava era conveniente para todos e criava um elo
difícil de ser rompido.
Porém, a riqueza produzida, principalmente com a cocaína, fez com que muitos desejassem
ocupar posição de destaque na hierarquia mafiosa. O princípio da década marcou a guerra
entre os clãs pelo controle do tráfico e banhos de sangue que inundaram Nápoles e toda região
da Campânia. Roberto Saviano deixa bem claro a lógica que vigorava no caso e a importância
desse revezamento no controle de poder.
“A força econômica do Sistema da Camorra está exatamente na contínua alternância de
líderes. A ditadura de um homem nos clãs é sempre breve. Se o poder de um boss durasse
muito tempo faria flutuar os preços, começaria a monopolizar os mercados (...) Em vez de ser
um valor agregado para a economia criminosa se tornaria obstáculo aos negócios. Por isso,
logo que um boss chega ao poder, outros emergem como candidatos ao seu posto, com
vontade e proposta de crescer sobre os ombros do gigante que eles mesmos contribuíram para
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criar”, explica. Quando a guerra entre as famílias explodiu, ninguém estava imune à insanidade
e à violência.
“Durante um conflito da Camorra, tudo aquilo que foi duramente construído é posto em perigo,
como um castelo de areia derrubado por uma onda do mar. As pessoas procuram passar
desapercebidas, procuram reduzir ao máximo a sua presença no mundo (...) A uma guerra não
declarada oficialmente, não reconhecida pelos governos e não narrada pelos repórteres
corresponde um medo não declarado, um medo escondido debaixo da pele (...) Quase como
uma fobia (...) Dizem que a guerra da Camorra é entre bandos que se matam. Mas ninguém
sabe onde ‘eles’ terminam e onde começam”, sintetiza o escritor. Ao final da obra, Saviano
revela, num misto de constatação e desalento, o fato de ser napolitano e crescer num solo
conflagrado pela ação da máfia.
"Nasci na terra da Camorra, no lugar com o maior número de assassinatos da Europa, no
território onde a violência está ligada aos negócios, onde nada tem valor se não gera poder.
Onde tudo tem sabor de uma batalha final (...) onde tudo deve ser conquistado arrancando a
carne do osso".
Ficha Técnica
Gomorra
Autor: Roberto Saviano
Gênero: não ficção
Literatura Italiana
Ano de publicação: 2006
Editora: Bertrand Brasil
Páginas: 350
Encadernação: brochura
Dimensões: 15,5 x 22,5 cm
Preço médio: R$ 39,00
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