O Uso Pedagógico do Web-Based Chat

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O Uso Pedagógico do Web-Based Chat
O Uso Pedagógico do Web-Based Chat
Uma atividade piloto para explorar o potencial pedagógico do
web-based chat
Vera Suguri1, Lourdes Matos2, Noara Castro3, Ieda Castro4, Lurdes
Marilene Jung5 e Eric Rusten6
1 Programa Nacional de Informática na Educação, Secretaria de Educação a Distância,
Ministério da Educação, Brasília, DF.
2 NTE Montes Claros, MG.
3 E. M. Hilda Rabello Matta, Belo Horizonte, MG.
4 NTE Gurupi, TO.
5 NTE Novo Hamburgo, RS.
6 LTNet/AED.
{[email protected], [email protected], [email protected],
[email protected], [email protected], [email protected]}
Abstract: For over four years, the ProInfo program, in collaboration with
teachers and Multipliers across the country, has been seeking ways to help
educators integrate ICT into learning activities. Much of this work has focused on
using a variety of basic software applications in school computer labs to enable
teachers and students to develop interdisciplinary projects. The paper describes
an experiment led by teachers and pupils from different cities all over Brazil to
explore the pedagogical uses of Web-based chat.
Resumo: Há mais de quatro anos, o ProInfo, em parceria com professores e
Multiplicadores em todo o país, procura formas de ajudar os educadores a integrar
o uso de tecnologias de informática e telecomunicações ao processo de ensinoaprendizagem. Parte considerável desse programa enfatiza a realização de
projetos interdisciplinares mediante a utilização de uma variedade de aplicativos
básicos nos laboratórios de informática das escolas. O artigo descreve uma
experiência conduzida por professores e alunos de diferentes cidades do Brasil
para explorar o potencial pedagógico do web-based chat.
Palavras-chave: Chat, Internet, Educação.
Introdução e Antecedentes:
Em todo o mundo, os educadores estão utilizando intensamente computadores e
Internet para aprimorar o processo ensino-aprendizagem. Por mais de quatro anos, o
Programa Nacional de Informática na Educação - ProInfo1 brem apoiado os educadores a
integrar as diversas tecnologias às atividades de aprendizagem. Grande parte desse trabalho
concentra-se na utilização de uma variedade de software de aplicações básicas em
laboratórios de informática nas escolas para permitir que professores e alunos desenvolvam
projetos interdisciplinares. Para solidificar mais a base do programa e aumentar as
oportunidades de utilização de computadores e Internet na aprendizagem, Vera Lúcia
Atsuko Suguri, coordenadora pedagógica do ProInfo, propôs a quatro multiplicadoras2 —
Maria de Lourdes Matos, Noara de Resende e Castro, Rosalva Ieda Vasconcelos Guimarães
de Castro e Lurdes Marilene Jung — que desenvolvessem um projeto piloto para avaliar o
potencial pedagógico do web-based chat3
Entusiasmadas com a oportunidade de contribuir para o esforço nacional de tornar
efetivo o uso dos recursos dos computadores e Internet para melhorar a educação, as quatro
multiplicadoras aceitaram o desafio proposto. A equipe do projeto pediu a Eric Rusten,
Diretor da Rede de Tecnologias de Aprendizagem EUA/Brasil (LTNet)4 que criasse, no
website da LTNet, um ambiente de bate-papo na web de fácil operação para desenvolver o
Projeto Piloto Chat. A LTNet busca apoiar os esforços no Brasil e nos Estados Unidos para
o emprego eficaz de computadores e da Internet para melhorar a qualidade da educação em
ambos os países. O projeto alcança essas metas mediante a combinação de atividades
presenciais, no Brasil e nos EUA, incluindo workshops, seminários e apresentações, e
atividades a distância, baseadas no website bilíngüe http://www.ltnet.org . Um dos
principais objetivos da LTNet é proporcionar aos educadores, nos EUA e no Brasil, acesso
fácil a informações sobre como usar efetivamente os computadores e as redes de
telecomunicações na educação. Como parte desse esforço, a LTNet trabalha em colaboração
com o ProInfo e com outras instituições brasileiras, para experimentar atividades
inovadoras. A LTNet também se dedica a criar e a fomentar intercâmbios virtuais entre
educadores e estudantes no Brasil e nos EUA.
Este projeto piloto, que se realizou de julho a dezembro de 2000, tinha três objetivos:
1 Programa administrado pela Secretaria de Educação a Distância (SEED), do Ministério da Educação e implementado
em parceria com os 27 estados brasileiros para instalar laboratórios de informática nas escolas públicas e promover
inovações na educação http://www.proinfo.mec.gov.br
2 Multiplicadores são especialistas em tecnologia na educação que capacitam os professores para a integração do
emprego de computadores e Internet no cotidiano do processo ensino-aprendizagem. Os multiplicadores trabalham em
centros de recursos de treinamento de professores, chamados Núcleos de Tecnologia Educacional (NTEs) que se
encontram distribuídos por todo o Brasil.
3 Existem basicamente dois tipos de aplicativos utilizados para chat: o que precisam ser baixados para o servidor ou para
a máquina utilizada e aqueles que fazem parte de uma página Web, não precisando de download para sua utilização. O
Web-based chat é uma forma de comunicação de bate-papo sincrônico utilizando um software que é parte de uma página
Web. Essa forma de bate-papo não exige que os usuários baixem nenhum software especial.
4 A LTNet é um projeto financiado pela USAID e gerido pela AED, criado sob a Parceria para a Educação
EUA/Brasil, uma programa bilateral iniciado em 1997 para ajudar a melhorar a educação em ambos países. O
projeto LTNet desenvolveu e administra um Website bilíngüe, http://www.ltnet.org, para ajudar na realização
de suas atividades
!
!
!
Verificar o potencial pedagógico de uma ferramenta simples de web-based chat
em projetos educacionais colaborativos;
Identificar estratégias eficazes para integrar o uso do chat na Internet aos
currículos brasileiros; e
Descobrir que impactos o chat na Internet poderá ter no processo ensinoaprendizagem e na execução de projetos colaborativos interdisciplinares.
Uma vez que os ambientes de aprendizagem são extremamente complexos, sejam
salas de aula convencionais, sejam ambientes virtuais criados na Internet e uma análise
mais aprofundada envolveria muitos aspectos do processo de ensino-aprendizagem, este
relato concentra-se em descrever algumas das experiências vividas pela equipe do projeto,
professores e alunos envolvidos. O estudo também pretende relatar as dúvidas, idéias e
interações de professores, alunos, multiplicadores e especialistas no transcorrer do projeto
piloto. É importante observar que os comentários feitos neste relato representam somente
uma visão resumida das muitas situações que ocorreram durante os muitos intercâmbios de
bate-papo no projeto e são apresentados para ajudar na compreensão do impacto
educacional que o chat na Internet pode ter, como também mostrar algumas possibilidades
de seu uso na educação.
O texto apresenta as tecnologias que foram utilizadas, descreve as diferentes
atividades, apresenta uma análise de seus resultados e discute as lições aprendidas com o
Projeto Piloto Chat5. O roteiro abaixo descreve como a equipe do projeto utilizou o chat,
com professores, alunos e especialistas, nas quatro escolas relacionadas:
! Descoberta em colaboração;
! Seminários e entrevistas online;
! Orientação profissional;
! Desenvolvimento profissional; e
! O chat com estudantes deficientes e com necessidades especiais.
Escolas participantes
A equipe de multiplicadores que executou o estudo identificou as escolas que se
seguem para participar do Projeto Piloto Chat. Nessas escolas, professores e alunos
aprenderam a usar o software de bate-papo e explorar as suas diferentes aplicações
pedagógicas.
! Escola Estadual Antônio Canela, de Montes Claros, Estado de Minas Gerais,
! Escola Municipal Hilda Rabello Matta, de Belo Horizonte, Estado de Minas
Gerais.
! Centro de Ensino Médio Ary Ribeiro Valadão Filho, de Gurupi, Estado de
Tocantins,
! Escola Jacob K. Neto, de Novo Hamburgo, Estado do Rio Grande do Sul
5 Este documento utiliza algumas informações que foram apresentadas originalmente em um documento sobre o Projeto
Piloto, "INTERNET CHAT: AN EDUCATIONAL ACTIVITY" (Internet Chat: uma atividade educacional), escrito por
Rosalva Ieda Vasconcelos Guimarães de Castro e Eric Rusten.
Essas escolas acham-se localizadas em quatro cidades no Brasil, conforme aparecem
no mapa abaixo:
Figura 1. Mapa do Brasil mostrando a localização das escolas que participaram do Projeto
Piloto Chat.
Colaboradores no projeto
Um dos traços marcantes deste projeto é o esforço de colaboração entre instituições e
educadores no Brasil e nos Estados Unidos. A idéia deste projeto piloto surgiu quando Vera
Suguri respondeu a uma pergunta feita por Noara Castro na Lista de Discussão de
Multiplicadores do ProInfo. Naquela ocasião, Noara estava em busca de um vídeo para
ajudá-la a apresentar os usos da Internet aos professores de sua escola. Vera sugeriu então
que, em vez de demonstrar a Internet por meio de um vídeo, que os professores
aprendessem a usar a Internet, usando a própria Internet. A discussão continuou nas
mensagens intituladas “Longos Papos” na Lista de Multiplicadores e, finalmente,
decidiram testar o web-based chat para recepcionar os alunos que voltavam das férias de
julho (2000). Para um teste efetivo, outras três multiplicadoras foram convidadas – Lourdes
Matos, Montes Claros/MG, Rosalva Ieda Castro, Gurupi/TO e Lurdes Marilene Jung, Novo
Hamburgo/RS por terem acesso à Internet e interesse em experimentar novas tecnologias.
Este projeto piloto se enquadrava bem dentro das metas e objetivos do ProInfo, um
programa educacional administrado pela Secretaria de Educação a Distância (SEED), do
Ministério da Educação do Brasil. Este programa inovador funciona em parceria com todos
os 27 Estados brasileiros para instalar laboratórios de informática nas escolas e para
instituir uma rede de capacitação de professores e centros de recursos tecnológicos, os
Núcleos de Tecnologia Educacional (NTE), por todo o país. O ProInfo tem várias
características que o tornam um programa efetivo, como o investimento significativo (cerca
de 40% do orçamento do programa) em desenvolvimento de recursos humanos e
capacitação de professores, antes de distribuir os computadores às escolas. A capacitação
realizada se concentrou em práticas educacionais e não puramente no uso de computadores
e de software. Além disso, o ProInfo é um programa elaborado e administrado por
educadores para educadores e é implementado em parceria com instituições federais,
estaduais e municipais. Além desses papéis cruciais, o ProInfo também promove inovações
na educação com o emprego de tecnologias de informática e de Internet. Este Projeto Piloto
Chat é um exemplo dos esforços do ProInfo para estimular e apoiar atividades inovadoras
de pesquisa.
Para apoiar o projeto piloto, a LTNet proporcionou o espaço virtual e salas de batepapo como também o espaço para a publicação dos resultados obtidos pelos participantes
do projeto em um website dinâmico (http://www.ltnet.org/SchoolLinks/ChatPilot). A
seguir, mostra-se a figura da página de abertura do website do projeto. Os leitores
interessados são convidados a visitar esse site para saber mais sobre o projeto e ler os
arquivos de registro de diferentes atividades de bate-papo.
Figura 2 Tela de abertura do website do Projeto Piloto Chat.
Tecnologias do projeto
O chat na Internet é uma forma de comunicação sincrônica online que utiliza um
software para manter discussões em tempo real, via teclado. Diferentemente de muitos
aplicativos de bate-papo pela Internet hoje existentes, o software de chat utilizado nesta
atividade piloto, Ralf's Chat6, foi inserido no website da LTNet possibilitando a realização
dos bate-papos com muita facilidade. O único requisito era o acesso a computadores
conectados à Internet e o uso de uma versão recente de um browser, tal como o Internet
Explorer, da Microsoft, ou o Netscape.
Conforme apresentado a seguir, a "sala" de bate-papo aparece no browser do usuário
como uma página web comum:
6
Este software foi criado por Ralf Gueldemeister e acha-se disponível gratuitamente na Internet
(http://www.ralfchat.de/) e, por ser um GCI de código aberto e estar escrito em Perl, uma linguagem de programação, foi
facilmente modificado de modo que todos os itens do menu e as instruções estivessem em português e em inglês.
Figura 3 Foto da tela de um chat realizado na Internet utilizando o mesmo software usado
no Projeto Piloto Chat.
Os participantes só precisam registrar um nome de usuário e uma senha e, depois,
entrar na sala de bate-papo. Os usuários podem mudar a cor do texto de suas mensagens
para diferenciá-las, tornando os diálogos entre diferentes usuários mais fáceis de
acompanhar, como também podem sinalizar o diálogo com os emoticons em trechos com
conotação irônica ou engraçada na mensagem.
O chat na Internet permite que as pessoas permaneçam anônimas, se assim optarem, e,
muitas vezes, estas usam codinomes ou até mesmo assumem uma nova identidade. Essas
características do chat são fortemente responsáveis tanto por tê-lo tornado um dos recursos
mais populares e divertidos da Internet, quanto pelo fato de muitos educadores o
considerarem de muito pouco valor educacional.
Um aspecto importante do software que ajudou a superar essa preocupação é a
possibilidade de armazenar uma cópia dos debates num arquivo de registro. Este arquivo de
registro, que se mostrou um dos recursos pedagógicos mais importantes do projeto piloto,
foi utilizado pelos coordenadores do projeto, professores e – o mais importante – pelos
alunos, para refletir sobre a discussão realizada, para identificar erros de expressão que
possam ter ocorrido, para planejar tópicos para discussões e pesquisas futuras, etc. O
arquivo de registro também ajudou os professores a superar um dos aspectos mais
desafiadores da educação baseada em projetos, que é identificar e responder às necessidades
dos estudantes.
Atividades piloto — chat na Internet usado em projetos educacionais
O projeto piloto concentrou-se na utilização do chat na Internet dentro do contexto de
diferentes projetos e temas educacionais. Isto foi feito para testar a efetividade do mesmo
sob condições variadas e com diferentes grupos de usuários. Para facilitar a avaliação, as
atividades-piloto mais importantes foram organizadas nas categorias listadas abaixo, não
sendo porém, as únicas maneiras de uso pedagógico e encoraja-se outros educadores ao uso
criativo do chat e a adaptar essa ferramenta de comunicação as suas necessidades
específicas.
! Descobertas em colaboração
! Seminários e entrevistas online
! Orientação profissional
! Desenvolvimento profissional
! Bate-papo com estudantes deficientes e com necessidades especiais
Uma parte considerável das atividades testadas neste projeto piloto envolveu projetos
interdisciplinares colaborativos. Os autores acreditam que o chat na Internet em projetos
colaborativos pode ser uma maneira extremamente poderosa para tornar a educação baseada
em projetos mais dinâmica e interessante. Um dos pilares da teoria construtivista e da
aprendizagem por projetos reside na busca, pelos professores, dos verdadeiros interesses,
necessidades e problemas dos alunos e não procurar impor o que percebem como sendo
uma necessidade. Infelizmente, descobrir as verdadeiras necessidades e desejos dos alunos
é uma das partes mais difíceis das atividades educacionais. No entanto, os próprios alunos
expuseram naturalmente suas necessidades e desejos educacionais ao se engajar nos batepapos de discussão na Internet. E, como essas necessidades ficaram registradas, os
professores puderam acompanhar e orientar os esforços dos alunos para satisfazer seu
desejo natural de encontrar respostas para suas perguntas e dúvidas levantadas durante o
chat.
No contexto desses projetos colaborativos usando o bate-papo da Internet, os
coordenadores do projeto observaram cuidadosamente o comportamento dos alunos e dos
professores e o relacionamento entre ambos, como também revisaram e analisaram as
cópias digitais de cada diálogo no chat para aprender mais sobre a dinâmica desse ambiente.
Embora não se tivesse controlado “cientificamente” as sessões de chat, os coordenadores
compararam o comportamento ali observado com o comportamento dos alunos e dos
professores nas atividades de sala de aula convencionais. O restante do documento
descreverá brevemente cada um desses empregos do bate-papo na Internet e seus benefícios
para o ensino e a aprendizagem. É importante observar que foram escolhidos apenas um ou
dois exemplos, dentre uma variedade de atividades de bate-papo, para ilustrar cada uma das
categorias de atividade realizadas.
Descobertas em colaboração
Em 6 de setembro de 2000, um grupo de estudantes de 14 e 15 anos de idade, da
Escola Jacob K. Neto, de Novo Hamburgo/RS, reuniu-se numa sala de bate-papo com
estudantes da Escola Estadual Antônio Canela, de Montes Claros/MG. Lurdes Marilene
Jung e Lourdes Matos mediaram esta sessão de bate-papo. O objetivo desse chat foi
possibilitar que os estudantes explorassem as diferenças e semelhanças entre as duas
regiões do Brasil onde os alunos vivem. Durante a discussão, eles compararam o clima, a
vegetação, a produção industrial, os estilos de vida e as festividades tradicionais.
Os alunos de Novo Hamburgo mostraram grande curiosidade em saber o que há de tão
especial no pequi, uma fruta da qual nunca tinham ouvido falar, para merecer um festival
em Montes Claros. Isto originou uma discussão animada sobre o pequi e a importância
desta fruta para a economia e a cultura de Montes Claros. Em outra situação, quando os
estudantes de Novo Hamburgo mencionaram que sua economia baseava-se no couro, um
estudante de Montes Claros disse que a produção de insulina era fundamental para a
economia de Montes Claros. Houve perguntas sobre a insulina que nenhum dos alunos pôde
responder e, como resultado, um dos estudantes de Montes Claros começou, com a ajuda de
seu professor, a avidamente pesquisar sobre a insulina. É pouco provável que o aluno
ficasse tão ansioso ou que fizesse um trabalho tão completo se o professor tivesse lhe
designado esse tópico para pesquisar. Este resultado ilustra como o chat na Internet é útil
para expor os interesses educacionais dos alunos e provocar demandas, bem como para
apresentar tópicos para projetos de aprendizagem.
Seminários e entrevistas online
Em 3 de outubro de 2000, houve uma sessão de entrevista no chat, moderada por
Lourdes Matos, entre estudantes de segundo grau da Escola Antônio Canela e a Dra. Kátia
Liliane, uma psicóloga, da Superintendência Regional de Montes Claros. A necessidade de
se realizar uma entrevista virtual com um especialista surgiu quando esses alunos passaram
a levantar questionamentos sobre os impactos psicológicos nos adolescentes e suas famílias
enquanto trabalhavam no projeto “Gravidez na Adolescência” e a professora constatou que
as perguntas dos alunos exigiam respostas mais específicas e científicas do que ela poderia
proporcionar.
Em 20 de outubro, houve uma sessão semelhante de entrevista no chat com a
psicóloga Gilvane da Silva Terra, de Gurupi/TO com os alunos (11 a 14 anos) da
professora de ciências, Geralda Sueli da Silva, da E. M. Hilda Rabello Matta, Belo
Horizonte/MG. Esse grupo de alunos estava desenvolvendo o projeto “Sexualidade na
Adolescência” e também sentiu a necessidade da ajuda de um especialista. A professora de
ciências, Vilma Borges de Moura Perini, de Gurupi/TO foi convidada a participar desta
sessão porque também desenvolvia um projeto similar com seus alunos. Os alunos
debateram sobre algumas questões, incluindo a primeira ejaculação de um menino, a
primeira menstruação, métodos de prevenção a AIDS, relacionamento afetivo e o processo
de aprender sobre seus próprios corpos e de descobrir a sexualidade. A psicóloga e a
professora de ciências puderam proporcionar aos estudantes informações detalhadas e
precisas numa discussão bem franca e animada. Esse seminário virtual também permitiu
que a psicóloga e os professores discutissem outros tópicos importantes, tais como o
impacto psicológico causado por uma gravidez precoce.
Sem o uso do chat na Internet, essas especialistas não teriam podido colaborar com
esses alunos sobre esses assuntos. Também é provável que, em uma reunião presencial, a
discussão sobre esse tema não teria sido tão aberta como foi com o chat na Internet.
Orientação profissional
Em outro exemplo, estudantes do ensino médio, na faixa de 16 a 18 anos de idade, da
Escola Antônio Canela, Montes Claros/MG, participaram de um bate-papo com o professor
Carlos Meira, coordenador do Curso de Formação Voltada para o Comércio, da
Universidade de Montes Claros. Esse bate-papo, mediado por Lourdes Matos,
multiplicadora do NTE de Montes Claros, objetivou a discussão a respeito das várias
oportunidades de carreiras e da educação necessária para as mesmas proporcionando aos
estudantes uma rara oportunidade de conversar diretamente com um professor universitário
sobre diferentes cursos, campos de estudo e oportunidades profissionais correlatas. Isto
proporcionou aos estudantes informações cruciais para decidir que cursos fazer e os
desafios com que se defrontariam na universidade e no mercado de trabalho. Atualmente,
poucos estudantes têm acesso a essa informação de primeira mão pelos canais
convencionais. O chat na Internet permitiu que o profissional, do conforto de seu escritório,
dedicasse um pouco do seu tempo com um grupo de estudantes. É pouco provável que uma
reunião presencial com essa mesma finalidade tivesse sido possível.
Desenvolvimento profissional
O chat começou a ser utilizado na capacitação continuada dos professores. Em 1º de
novembro de 2000, mediadas por Noara Castro e Ieda Castro, os professores de três escolas
- Colégio Estadual de Gurupi, Colégio Bom Jesus e CEM Arizinho - reuniram-se em uma
sala de bate-papo para discutir a elaboração de projetos interdisciplinares utilizando
tecnologias da informática e a Internet. Os professores compartilharam suas dúvidas,
temores, experiências e trocaram idéias sobre as diferentes metodologias que podem ser
usadas em trabalhos colaborativos e interdisciplinares.
Outra reunião pedagógica virtual semelhante aconteceu no dia 23 de novembro entre
os professores do 2º turno da E.M. Hilda Rabello Matta e vários profissionais da educação
no Brasil, dentre eles Beatriz Corso Magdalena, pesquisadora do LEC/UFRGS. Mediando o
chat, Noara Resende observou que os professores ainda têm grandes resistências à
utilização de novas tecnologias e ao diálogo aberto, por medo do novo ou por comodismo
na maneira de ensinar, trabalho este que com alunos acontece dentro da maior
espontaneidade possível. Ao discutir a educação, muitos professores se esquivam das
questões mais profundas, dando respostas evasivas e muitas vezes sem ligação com o
contexto da discussão. A experiência, porém, foi de grande validade para o despertar de um
novo tempo, e esta oportunidade só foi possível pelo ambiente pedagógico do ChatPiloto,
mostrando aos professores e convidados a necessidade ainda latente de uma capacitação
mais ampla e integral.
Bate-papo com alunos deficientes e com necessidades especiais
Uma experiência muito marcante ocorreu quando Ieda Castro, multiplicadora de
Gurupi entrou por acaso numa sala de bate-papo já em andamento onde os alunos de
Montes Claros conversavam com alunos de Novo Hamburgo. Imediatamente, os alunos
ficaram curiosos sobre quem era e de onde era. À medida que a discussão foi progredindo, a
conversa ficou muito animada e diversificada e todos começaram a fazer perguntas
específicas sobre Gurupi e a fazer comparações com suas comunidades. Por se tratar de um
chat informal, as conversas eram entremeadas com gostos e preferências pessoais e as
discussões fluíam com naturalidade e divertidamente. Em um dado momento, a
multiplicadora de Montes Claros, Lourdes Matos, mandou uma mensagem privada para
Ieda Castro explicando que os estudantes de Montes Claros eram crianças com
necessidades especiais com um misto de deficiências mentais, visuais e auditivas. Isto foi
uma grande surpresa para Ieda Castro que, mais tarde, mencionou que "apesar de uma das
meninas ter demonstrado falta de atenção, nada mais parecia ser diferente de ter uma
conversa com pessoas normais. Eu só imaginei que estava conversando com crianças."
Pouco depois dessa sessão de chat, ter iniciado uma menina surda de Montes Claros
começou a tremer. Lourdes Matos rapidamente tomou as providências para identificar o
problema. A menina explicou que não havia nenhum problema, ela simplesmente estava
emocionada por ter conseguido se comunicar, pela primeira vez na vida, com alguém que
vivia longe, sem ajuda de intermediários para se comunicar. O chat na Internet havia
proporcionado um meio para ela se comunicar por si só, em pé de igualdade, com crianças
que não eram surdas e que não conheciam as libras. Repentinamente, as oportunidades de
aprendizagem e conhecimento de outras pessoas tinham-se expandido dos limites de sua
casa e escola para o resto do Brasil e do mundo. Em poucas palavras, a visão que ela tinha
do mundo havia se transformado.
Alguns meses após essa sessão de chat, Ieda visitou Montes Claros para participar de
uma reunião internacional. Nessa ocasião, ela visitou a escola e encontrou-se com os
estudantes com quem conversara. Contudo, em contraste com a discussão franca e
dinâmica no ambiente virtual, ao reunir-se com os estudantes presencialmente eles se
mostraram tímidos e pouco falaram. Além disso, o fato de Ieda não saber comunicar-se por
libras (a linguagem de sinais) e as crianças serem surdas, eles pouco conseguiram se
comunicar. Este exemplo ilustra o poder do diálogo anônimo e do bate-papo com pessoas
com necessidades especiais.
Avaliação e lições
Um aspecto que muito impressionou os participantes desse projeto foi a grande
expressão de afeto e amizade emanada das conversas online, mesmo que a maioria dos
participantes nunca tivesse se encontrado presencialmente. No início, os coordenadores do
projeto pensavam que as sessões de chat fossem ser formais e sem emoções, mas durante o
processo, constatou-se que foi possível compartilhar emoções, informações, fazer amizades
e também construir conhecimentos.
Outro fator importante observado claramente pelos professores relacionou-se com as
possibilidades de os estudantes surdos e com outras necessidades especiais superar certas
dificuldades que sentiam ao tentar se comunicar, especialmente a distância, com outras
pessoas. Os professores e os coordenadores ficaram surpresos ao perceberem que a
participação no ambiente do chat possibilitou que estudantes surdos compreendessem
melhor como, por exemplo, utilizar as preposições e os artigos na linguagem escrita.
Quando empregados isoladamente, as preposições e os artigos têm pouco valor intrínseco e
os estudantes surdos têm dificuldade em compreender como essas palavras deveriam ser
usadas. Durante o bate-papo, os estudantes tiveram oportunidade de ver essas palavras
sendo usadas em conversas escritas, e começaram a fazer perguntas sobre elas e a discutir
com os professores e com outros alunos sobre a utilidade dessas palavras. Este exemplo
mostra como as atividades do chat, com orientação, podem ajudar os estudantes a refletir
sobre a linguagem e sobre os desafios de escrever com clareza de modo que outras pessoas
possam entender.
Embora as pessoas participantes das sessões de bate-papo não fossem inteiramente
anônimas, uma vez que utilizaram seus nomes verdadeiros e todos sabiam de onde cada
um era, algumas pessoas publicaram suas fotos e perfis, mas mesmo assim, era como se
elas não estivessem no ambiente. Esta situação permitiu que os participantes se sentissem
no anonimato e os debates eram menos inibidores, especialmente quando os estudantes
mais jovens estavam conversando com adultos. Geralmente, os alunos se sentem
encabulados ao conversar com professores e raramente fazem perguntas ou conversam
sobre temas que possam ser considerados pessoais ou controversos. No entanto, nas sessões
de chat, as conversas foram animadas, francas e fluíram com naturalidade. Alunos que
normalmente eram muito tímidos quando em situações presenciais mudaram seu
comportamento nos ambientes virtuais, atuando com muita fluência e franqueza. Isso
possibilitou a discussão sobre tópicos que presencialmente nem seriam tocados.
Conseqüentemente, informações e opiniões foram facilmente trocadas e todos os
participantes, mesmo os mais inibidos em discussões convencionais, puderam comunicar-se
em pé de igualdade.
Pelo fato de os diálogos serem escritos, os participantes dedicaram mais atenção para
formular e redigir as perguntas e os comentários do que em uma discussão verbal. Também
podiam ler o que haviam escrito e, depois, revisar suas sentenças e expandir suas idéias.
Esta combinação de fatores contribuiu para que as discussões fossem mais significativas. O
foco na comunicação escrita realçou a importância e a necessidade do conhecimento em
ortografia e gramática para uma comunicação eficaz. O bate-papo na Internet é, muitas
vezes, caracterizado pelo enfoque descontraído no uso da gramática e da ortografia.
Contudo, quando usado em ambientes educacionais, especialmente entre participantes de
lugares diferentes, é possível concentrar a atenção dos alunos na qualidade da sua
comunicação. Os alunos rapidamente se deram conta da necessidade de se expressarem com
clareza e precisão, pois não podiam lançar mão de expressões faciais, gestos ou alterações
no tom de voz para ajudar na comunicação. No entanto, o Projeto Piloto Chat não
investigou se as mudanças no uso da comunicação escrita usada durante as sessões do chat
tiveram algum efeito permanente nas habilidades de redação dos estudantes e no domínio
da língua.
Os professores envolvidos comentaram que tinham dificuldades em conseguir com
que os estudantes escrevessem, e estes, por sua vez, constantemente reclamavam quando
lhes pediam um trabalho por escrito. Contudo, estavam extremamente ansiosos em
participar das atividades do chat, em que não tinham escolha a não ser escrever e se
preocupar com a qualidade de sua comunicação.
Como foi dito anteriormente, um arquivo de registro é gerado automaticamente
durante a sessão de chat. A importância desse arquivo, especialmente para os estudantes,
surpreendeu a equipe do projeto. Por um lado, os estudantes mostraram-se muito
orgulhosos ao rever o arquivo de registro para identificar a sua própria fala. Por outro,
ficaram muito preocupados ao identificar inconsistências de ortografia e de gramática.
Muitos estudantes procuraram nos dicionários e pesquisaram em outros livros a forma
ortográfica e emprego correto das palavras sem necessidade da intervenção do professor,
demonstrando mais interesse no português correto.
O estudo do arquivo de registro também ajudou os alunos a descobrir áreas sobre as
quais pouco ou nada sabiam sobre os tópicos que apareceram nas discussões. Essa
percepção era, muitas vezes, acompanhada por uma pesquisa pessoal em busca de mais
conhecimentos e informações — busca essa que, se tivesse sido tarefa dada pelo professor,
provavelmente não ocorreria.
O projeto piloto também demonstrou o poder do chat na Internet de conectar pessoas
de diferentes grupos etários e de locais distantes. Especialistas que, de outra forma, não
poderiam visitar escolas afastadas para reuniões convencionais puderam dedicar algum
tempo colaborando com os alunos, sem sair de seu local de trabalho. Da mesma forma,
professores que tinham poucas oportunidades de participar de atividades de
desenvolvimento profissional ou de desenvolver trabalhos em parceria com outras escolas,
descobriram que o chat na Internet lhes permitia explorar novas idéias e práticas
educacionais, assim como, compartilhar desafios e habilidades com colegas de outras partes
do
país
ou
mesmo
de
outros
países.
No projeto piloto chat, verificou-se, também, que a qualidade dos debates decresce se
houver muitas pessoas participando. O projeto piloto não procurou determinar o número
ótimo de participantes em um ambiente de bate-papo, mas verificou-se que a participação
de mais de 15 pessoas torna o trabalho pouco produtivo. Contudo, é possível que uma parte
da turma participe ativamente do chat enquanto os demais colegas acompanham a conversa
e oferecem sugestões sobre o que escrever. Os estudantes podem revezar o controle do
teclado de modo que seus companheiros tenham sua vez de digitar. Por exemplo, na E. M.
Hilda Rabello Matta, os estudantes foram organizados em grupos com os nomes dos
planetas. Cada grupo faz o login usando o nome de seu planeta e, sucessivamente, cada
membro do grupo digita as respostas, perguntas e comentários. Isto não só facilita aos
participantes acompanhar a discussão no chat, mas também ajuda a desenvolver boas
habilidades de trabalho em equipe.
Conclusões:
O Projeto Piloto Chat demonstrou que o chat na Internet pode ser uma ferramenta
pedagógica poderosa que, definitivamente, pode melhorar o processo de ensinoaprendizagem de maneiras diferentes. No entanto, para alcançar os benefícios educacionais
do chat na Internet é necessário que as atividades sejam bem planejadas e mediadas pelos
educadores. Também é importante que os professores tenham uma perspectiva de longo
prazo com o uso do chat, de modo que os estudantes possam acompanhar tópicos
emergidos em sessões anteriores. Este se torna uma ferramenta mais poderosa quando
combinado com outras ferramentas, tais como correio eletrônico e listserv. Essa
combinação de ferramentas de comunicação permite discussões mais amplas e
aprofundadas. Por exemplo: durante um chat, aparecem questões que necessitam de mais
tempo e de mais espaço para serem tratadas com profundidade. Era comum no projeto
piloto, os participantes trocarem endereços de correio eletrônico para prosseguir discussões
mais aprofundadas e detalhadas sobre temas levantados durante o chat. Isto ampliou e
expandiu as oportunidades de aprendizagem e fortaleceu o relacionamento entre os
participantes. O projeto piloto também mostrou que tanto professores quanto alunos
aprendem rapidamente a utilizar as ferramentas do chat e apreciam enormemente as
discussões dinâmicas que acontecem.
É importante observar que esta não é uma ferramenta perfeita e que não deve ser
empregado como substituto das atividades presenciais. O contato humano tem benefícios
incontestáveis que não podem ser reproduzidos em ambientes virtuais. Contudo, é
igualmente importante enfatizar que o chat na Internet proporciona benefícios que podem
ser difíceis, quando não impossíveis, de se alcançar em situações presenciais.
Ainda há muito a aprender sobre como usar o chat na Internet em diferentes ambientes
educacionais e sobre qual a melhor maneira de integrar essa ferramenta e demais
tecnologias de informática e da Internet ao processo educacional. À medida que mais e mais
professores e multiplicadores por todo o Brasil começarem a usar o chat na Internet como
parte rotineira da educação, mais aprenderemos sobre o poder pedagógico desta interessante
ferramenta de comunicação.