Um modelo taxonômico de teleconsultas

Transcrição

Um modelo taxonômico de teleconsultas
Um modelo taxonômico de teleconsultas
Claudia Novoa Barsottini 1, Jacques Wainer 1,2,
1
Departamento de Informática em Saúde (DIS) Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP)
2
Instituto de Computação, Universidade Estadual de Campinas UNICAMP.
Resumo: O termo teleconsulta descreve um serviço que conecta dois ou mais profissionais de
saúde através de uma conexão remota com a finalidade de trocar informações sobre um caso.
Este trabalho propõe um modelo de taxonomia de teleconsultas que permite classificar diferentes
exemplos de uso descritos na literatura, e ainda permite limitar a variedade de alternativas
tecnológicas para o desenho de novos experimentos/sistemas. O modelo classifica exemplos de
teleconsulta através de três dimensões: tecnologia usada, forma de interferência do especialista à
distância na consulta, e tempo de resposta do especialista às questões do generalista. Vários
trabalhos da literatura em teleconsulta forma analisados sob a ótica deste novo modelo.
Palavras Chaves: Teleconsulta, Telemedicina, Interação em Telemedicina.
Abstract: The teleconsultation connects two or more professionals, giving a second opinion
about a case by remote connection with a medical expert, and represents a combination of
technologies over distance and telecommunication. We propose a new taxonomy for
teleconsultation, which classifies examples of use in three dimensions: type of technology, form of
interaction by the specialist, and time of the specialist response. We analyze some of the
experiments described in the literature using this new model.
Key words: Teleconsultation Telemedicine, Interaction in telemedicine
1.
Telemedicina e teleconsulta
Teoricamente a Telemedicina é possível
desde a invenção do telegrafo. Alguns dos
médicos da Western Union discutiam casos
através de telegrafo, telegrama e mais tarde
por telefone (7).
O tema telemedicina é caracterizado
principalmente
pela
convergência
dos
avanços tecnológicos dos setores de
informática em saúde e de telecomunicações.
Graças a esta infra-estrutura a telemedicina
vem sendo viabilizada, tornando acessível os
serviços de saúde a uma quantidade cada vez
maior de pessoas, principalmente se
considerarmos o uso da Internet (13).
Normalmente, telemedicina é aplicada em
hospitais e instituições de saúde que buscam
outras instituições de referência para
consultar e trocar informações; na atenção a
pacientes crônicos, idosos e gestantes de alto
risco; no cuidado direto ao paciente em sua
casa e na assistência primária a comunidades
de regiões em desvantagem geográfica ou de
desigualdade sociocultural (15). Tais serviços
são providos pôr profissionais da área de
cuidados com a saúde, usando tecnologias de
informação e de comunicação visando à troca
de informações necessárias para diagnosticar,
prevenir e tratar doenças, além da educação
continuada dos profissionais da saúde, para
fins de pesquisa e avaliação, voltados para a
melhoria da saúde dos indivíduos e de suas
comunidades (11).
O termo Telemedicina tornou-se muito
amplo e genérico, tanto que recentemente
outros termos vêem sendo utilizados para
especificar um ou outro ramo da telemedicina,
tais como: Telesaúde, Saúde on-line, e-saúde,
Teleconsulta;
Teleoftalmologia
e
Teledermatologia entre outros (2, 16).
Teleconsulta pode ser utilizado para
qualquer consulta feita à distância. Este é um
serviço que conecta dois ou mais profissionais
de saúde a fim de trocar informação sobre um
caso através de uma conexão remota,
geralmente esta conexão é feita de um
médico generalista para um especialista a fim
de obter uma segunda opinião sobre o caso
(3)
. Para os objetivos deste artigo, a
teleconsulta necessariamente envolve um
profissional
de
saúde
que
atende
presencialmente o paciente, e um médico
especialista à distância que interage com o
profissional de saúde (e em casos mais raros
com o próprio paciente). Chamaremos o
profissional de saúde que faz a consulta
presencial com o paciente de médico
generalista, e o medico contatado a distância
de médico especialista.
A teleconsulta entre o médico generalista e
o especialista, vem sendo utilizada como
alternativa para reter o paciente sob os seus
cuidados, gerenciando o problema dentro do
atendimento primário em saúde no seu local
de origem (16, 5).
Esta versão de Teleconsulta deve ser
contrastada
com
outras
formas
de
telemedicina que não são o foco deste artigo.
Juntas médicas à distância, por exemplo,
envolvem vários médicos, onde possivelmente
nenhum deles esta ou esteve em atendimento
presencial com o paciente (3,6); telenfermagem,
onde o paciente é atendido por um
profissional de enfermagem à distância.
Alguns
projetos
utilizam
o
termo
Telenfermagem, ou Telehome nursing (16,4)
para automonitorização; quando os sinais
vitais do paciente são monitorados a distância
através de aparelhos de coleta de sinais
digitais e enviados a uma central de home
care com enfermeiras que analisam e
orientam os pacientes mediante os sinais
enviados (8,14).
Mesmo dentro desta definição limitada de
teleconsulta, há uma grande variedade de
sistemas e experimentos, que torna a
comparação dos resultados difícil. Este
trabalho propõe um modelo de taxonomia de
teleconsulta que permite classificar diferentes
exemplos de uso descritos na literatura, e
ainda permita limitar a variedade de
alternativas tecnológicas para o desenho de
novos experimentos.
2.
Modelo taxonômico
O nosso modelo classifica exemplos de
teleconsulta através de três dimensões:
tecnologia usada, forma de interferência do
especialista à distância na consulta, e tempo
de resposta do especialista às questões do
generalista.
Tecnologia
Quanto à tecnologia, a única dimensão
relevante para uma analise dos trabalhos nos
parece ser quanto à forma de comunicação
propiciada
pela
tecnologia;
entre
as
tecnologias assíncronas estão e-mail, envio
de texto e imagens, etc., entre as tecnologias
síncronas, vídeo, voz ou mesmo texto (como
num Chat).
Forma de interferência
A forma de interferência do especialista na
consulta tenta avaliar o grau de controle que o
especialista tem sobre o desenrolar da
consulta entre generalista e paciente. No
modo assíncrono, o especialista não tem
nenhum controle sobre o desenrolar do
atendimento, ele é contatado pelo generalista
após o final da consulta (1). No modo semisíncrono o generalista interrompe a consulta
para se comunicar com o especialista, e,
portanto o especialista tem um controle
limitado sobre a consulta, já que ele pode
propor um plano de cuidados a partir de
informações
colhidas
pelo
generalista.
Finalmente no modo síncrono o especialista
esta em contato com o generalista durante a
consulta e, portanto pode ter um controle
maior sobre a coleta de informações,
desenrolar da consulta e do paciente
participando mais efetivamente junto ao
generalista da conduta geral (1).
Tempo de resposta
Esta dimensão se refere ao momento em
que o generalista espera que sejam feitas
contribuições do especialista. No tempo de
resposta postergada não se espera que o
especialista faça suas contribuições durante
ou logo após a interação com o generalista.
Já no modo imediato existe a forte expectativa
que as contribuições do especialista sejam
feitas durante ou no máximo logo após a
interação com o generalista.
3.
Survey
da
literatura
em
teleconsulta
Na maioria dos trabalhos revistos, muito se
fala sobre a tecnologia empregada no projeto,
tamanho de banda, qualidade da conexão,
equipamentos
de
teleconferência
e
telecomunicação. Alguns poucos trabalhos,
relatam de forma detalhada o modo atuação
entre os participantes do estudo. Já em
nenhum trabalho revisto ficou clara o tempo
de resposta do especialista que esta à
distância. Na tabela 1 a coluna interferência
assim com a coluna tempo de resposta é uma
interpretação sobre o trabalho, sendo que em
alguns casos não foi possível chegar a uma
conclusão.
Tabela 1: Classificação dos trabalhos de
teleconsulta
Trabalho
17
Wootton at al
8
Jonhston
10
Loane
12
Munro
Ltc James
9
Lamonte
7
Helen
18
OPHTEL
11
Kponline
11
Gómez
4.
Tempo de
resposta
Post Imed
?
?
?
?
x
x
x
?
?
x
x
?
x
?
Interferência
Tecnologia
sin semi assin sin
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
?
?
?
x
assin
x
x
x
x
x
Analise
Tanto os resultados da analise da literatura
quanto um pouco de reflexão sobre os
trabalhos, nos mostra que nem toda a
combinação entre os vários valores para as
três dimensões é igualmente valida. Talvez a
melhor forma de fazer esta analise seja do
ponto de vista da terceira dimensão, tempo de
resposta.
Para exemplos onde objetivos da
teleconsulta é fazer um diagnostico baseado
em exames físicos do paciente, ou guiar o
generalista na execução de um procedimento,
há a clara expectativa de tempo de resposta
imediata. Nestes casos tanto o grau de
influencia do especialista na consulta deve ser
alto (síncrono no caso do procedimento,
talvez semi-síncrono no caso de diagnóstico
através de exames físicos) e a tecnologia de
comunicação deve ser síncrona. É importante
também diferenciar os casos onde a
telecomunicação serve principalmente para a
comunicação especialista/generalista ou serve
para adquirir dados do paciente. No caso de
interação semi-síncrona, a tecnologia é usada
para criar um canal de comunicação entre
especialista e generalista, e uma vez que se
chega a um patamar aceitável em taxa de
transmissão de vídeo e voz, não parece que
haja maiores ganhos em aumentar esta taxa.
No caso onde a comunicação é usada para
adquirir dados do paciente, na interação
síncrona, parece que maiores taxas de
transmissão de dados (número maior
câmeras, e com melhor definição, etc) são
benéficas. Tecnologias assíncronas para uma
interação semi-síncrona são claramente
menos apropriadas, pois o generalista e o
especialista têm que trocar e-mails enquanto
o paciente espera pelo final da consulta. Uso
de tecnologia assíncrona numa interação
síncrona é provavelmente cômica.
No caso de tempo de resposta postergado,
os valores parecem ser o oposto. Por
exemplo, quando se espera que o especialista
proponha um tratamento para o paciente,
somente após ter considerado os exames, e
informações do paciente, o tempo de resposta
imediato parece ser inadequado. O uso de
tecnologias síncronas para estes casos é
desnecessário e pode ate ser prejudicial ao
processo: ter acesso às imagens de vídeo de
uma consulta pode ajudar muito pouco no
planejamento de um tratamento. O que é
preciso é o registro eletrônico do paciente,
imagens medicas, resultados de exames
laboratoriais, etc, que normalmente são
transmitidos de forma assíncrona. Também
uma interferência síncrona ou semi-sincrona
parecem desnecessárias no caso de resposta
postergada.
É interessante notar que teleradiologia é
um dos exemplos onde se verificou que há
beneficio em usar telemedicina/teleconsulta
frente à abordagem tradicional 19, e esta forma
de teleconsulta é maioritariamente de
resposta postergada e usa tecnologias
assíncronas.
5.
Experimentos em andamento
no Centro-Alfa /UNIFESP
O
Centro
Alfa
da
Unifesp
esta
desenvolvendo dois projetos de teleconsulta,
nos extremos da nossa classificação. No
primeiro projeto, para o atendimento de
pacientes ginecológicas, um estudante de
medicina (no papel de generalista) atuará com
um preceptor (no papel de especialista) num
modelo de teleconsulta com tecnologia
síncrona, atuação semi-síncrona e tempo de
resposta imediata. Num outro estudo, o
profissional de saúde localizado em outro
estado utilizará tecnologia assíncrona (e-mail)
para contatar o especialista no Centro Alfa e
obter uma segunda opinião sobre o caso
médico, sendo que o tempo de resposta pode
ser imediato ou postergado, pois o
especialista tem até 6 horas após ter recebido
o e-mail para responder ao generalista.
6.
Conclusões
Este trabalho propõe um modelo de
classificação de sistemas/experimentos de
teleconsulta. O modelo vai além da ênfase
que os trabalhos da literatura põe na
descrição da tecnologia. Na verdade, uma
hipótese que este modelo avança é que
tecnologias “caras”, ou nos termos deste
trabalho, síncronas, parece ser úteis apenas
para interação síncrona e semi-sincrona e
para tempo de resposta imediata. Tecnologias
assíncronas parecem ser mais relevantes
para teleconsultas com tempo de resposta
postergado, e interação assíncrona.
7.
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