Revista Ciências da Saúde - Universidade Federal de Santa Catarina

Transcrição

Revista Ciências da Saúde - Universidade Federal de Santa Catarina
REVISTA
CIÊNCIAS
DA SAÚDE
Editora da UFSC
1
REVISTA
CIÊNCIAS
DA SAÚDE
ISSN 0101 – 9546
Revista Ciências da Saúde
Florianópolis
V. 25, N. 1
P. 1-134
2006
2
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
Reitor: Lúcio José Botelho
Vice-Reitor: Ariovaldo Bolzan
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
Diretor: Cleo Nunes de Sousa
EDITORA DA UFSC
Diretor Executivo: Alcides Buss
Conselho editorial
Eunice Sueli Nodari (Presidente)
Cornélio Celso de Brasil Camargo
João Hernesto Weber
Luiz Henrique de Araújo Dutra
Nilcéia Lemos Pelandré
Regina Carvalho
Sérgio Fernando Torres de Freitas
3
Revista Ciências da Saúde é uma revista semestral editada pelo Centro de
Ciências da Saúde da Universidade Federal de Santa Catarina.
Comissão Editorial: Tânia Silvia Fröde (Editora-chefe), Roberto Henrique Heinish,
Inês Beatriz Rath, Liliane Janete Grando, Elisabeth Wazlawik, Letícia Scherer
Koester, Maria Itayra Coelho de Souza Padilha.
Comissão Consultiva: Alvorita Leite Bittencourt (Instituo Geral de Perícia do Estado de
Santa Catarina); Antonio Carlos Marasciuloalessandra Beirith (FURB); Cláudio Laurentino
Guimarães (FURB); Cleusa Rios Martins (UFSC); Deisi Maria Vargas (FURB); Denise Maria
Guerreiro Vieira da Silva (UFSC); Eduardo M. Dalmarco (FURB); Elisete Navas Sanches
Próspero (UNIVALI); Eugênio Rodrigo Zimmer Neves (UNIVALI); Francisco de Assis
Guedes de Vasconcelos (UFSC); João Luiz Gurgel Calvet da Silveira (FURB); Letícia
Scherer Koester (UFSC); Liliane Janete Grando (UFSC); Luciane Peter Grillo (UNIVALI);
Maique Weber Biavatti (UNIVALI); Marcos Vinícius da Silva (Hospital Emílio Ribas);
Maurício José Lopes Pereima (UFSC); Michel Fleith Otuki (FURB); Roberto Henrique
Heinish (UFSC); Rosita Saupe (UNIVALI); Rossana Pacheco da Costa Proença (UFSC);
Ruth Meri Lucinda da Silva (UNIVALI);Silvia Berlanga de Moraes Barros (USP); Vera
Tramonte (UFSC).
Editoração: Flávio Fontes de Oliveira e Claudia Crespi Garcia
Capa: Paulo Roberto da Silva
Secretário: Luiz Vicente Vieira
(Catalogação na fonte pela Biblioteca Universitária da
Universidade Federal de Santa Catarina)
Revista Ciências da Saúde / Universidade Federal de Santa Catarina. Centro de
Ciências da Saúde. -- v.1, n.1 (1982)- , - Florianópolis: Imprensa Universitária, 1982.
v.: 27cm
Semestral
ISSN 0101-9546
1.Ciências Médicas. 2. Saúde – pesquisas I. Universidade Federal de Santa
Catarina. II Centro de Ciências da Saúde.
Indexada na Base de Dados LILACS
Endereço:
Revista Ciências da Saúde - Secretaria do Centro de Ciências da Saúde da UFSC
Campus Universitário - Trindade
Caixa Postal 476
88040 970 - Florianópolis - SC
Telefone (0xx) 48 3721-9525 / 3721-9783 / (0xx) 48 3721-9712 ramal 211
4
SUMÁRIO
Editorial............................................... 08
DIAGNÓSTICO CLÍNICO-LABORATORIAL DE REAÇÕES DO TIPO
ALÉRGICO GRAVE A MEDICAMENTOS [Clinical-laboratory diagnosis of
allergic reactions to drugs] Fernando
Isoppo; Teixeira Rodrigo; Thomaz
Alaver; Tânia Silvia Fröde................... 09
ENDOTELINAS NO TRATO RESPIRATÓRIO [Endothelins in respiratory tract]
Cláudio Laurentino Guimarães........... 15
FATORES DE RISCO PARA DOENÇAS
CARDIOVASCULARES E DISTRESSE
PSICOLÓGICO EM UNIVERSITÁRIOS
DISLIPIDÊMICOS [Risk factors for
cardiovascular
disease
and
psychological stress at dyslipidemic
college students] Tassiele A. Heinrich;
Cláudia S. M. Silva; Elizabeth M.
Hermes; Maria da Graça W. Balen;
Manoela Maria Bagestan; Cláudia
Cavalett; Gany A. Cantos................... 26
PERFIL ANTROPOMÉTRICO DOS
IDOSOS VINCULADOS AO PROATIPROGRAMA
DE
ATENÇÃO
À
TERCEIRA IDADE DA PREFEITURA
MUNICIPAL
DE
FLORIANÓPOLIS
[Anthropometric profile of elderly citizens
attended by a municipal attention
program in Florianópolis (PROATI)] Ana
Paula Warken do Valle Pereira; Ileana
Arminda Mourão Kazapi..................... 34
A RELAÇÃO OBESIDADE MÓRBIDA E
QUALIDADE DE VIDA: explorando o
estado da arte [Relation between morbid
obesity and quality of life: exploring the
state-of-the-art] Sérgio Ricardo Pasetti;
Aguinaldo Gonçalves.......................... 41
CURSO
DE
ESPECIALIZAÇÃO
MULTIPROFISSIONAL EM SAÚDE DA
FAMÍLIA
DA
UNIVERSIDADE
FEDERAL DE SANTA CATARINA
COMO PRÁTICA DE UMA EDUCAÇÃO
REFLEXIVA: limites e possiblidades
[Multidisciplinary specialization in Family
health course of the Federal University
of Santa Catarina as a reflexive
education
exercise:
limits
and
possibilities] Antônio de Miranda Wosny;
Candice B. Besen; Fernanda Werner da
Silva; Jurandyr V. M. Filho; Mônica de
Souza Netto........................................ 48
O ENVELHECIMENTO EM SANTA
CATARINA [Aging in Santa Catarina
State] Kelly Antunes dos Santos;
Ricardo Koszuoski; Alexandre de Mattos
Gomes................................................ 55
INSERÇÃO
COMUNITÁRIA
DO
ESTUDANTE DE MEDICINA
NA
PRIMEIRA FASE: a experiência na
UFSC [Community insertion of medical
students of the first period: the
experience at UFSC] Walter Ferreira de
Oliveira; Patrícia Alves de Souza........ 63
EDUCAÇÃO POPULAR E SAÚDE NO
CENÁRIO RURAL: análise de um
projeto
de
extensão
universitária
[Popular education and health in the
rural scenario: analysis of a universitay
extention project] Ana Paula Saccol;
Antônio de Miranda Wosny; Adalbi
Cilonei Souza; Alexandre Pareto da
Cunha; Andréia Medina Gonçalves Cruz;
Camila
Stefanes.
Lenilza
Mattos
Lima.................................................... 71
... PARA PENSAR UMA FORMA DE
OPERACIONALIZAR O PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO EM SAÚDE [... To
think of a way to work with strategic
planning for health] Marco Aurélio da
Ros; Thaís Titon de Souza…………... 76
5
VIOLÊNCIA CONJUGAL – um problema
de saúde pública: refletindo os porquês
do adiamento da denúncia [Conjugal
violence – a problem of public health:
reflectinf the reasons of the adjournment
of the denunciation] Patricia Alves de
Souza; Marco Aurélio Da Ros............. 81
review] Jane Parisenti; Emilaura Alves;
Vera
Lúcia
Cardoso
Garcia
Tramonte........................................... 118
PSICOLOGIA NO ÂMBITO DO SUS:
práticas de promoção da saúde e
empoderamento com grupos etários
[Psychology in the ambit of SUS:
practices of promotion of the health and
empowerment with age groups] Leiliane
G. Raimundo; Miriam B. Guesser;
Sabrine Ciotta Pereira......................... 86
Aplicando a Teoria do Auto Cuidado de
Orem no cuidado ao trabalhador de uma
indústria metalúrgica. Narloch, L.;
Ledoux, T.; Gelbeck, F. L.; Reibnitz, K.
S……………………………………….. 126
NÍVEL
DE
INFORMAÇÃO
DOS
PACIENTES
DO
HU/UFSC
A
RESPEITO
DO
RECEITUÁRIO
MÉDICO
[HU/UFSC
outpatients
information level about their medical
prescription] Caroline Alves Natividade;
Cintia Vitto Bongiollo; Célia Maria
Teixeira de Campos; Aline Cláudia de
Mello; Maria Bernadete de Souza....... 93
O PROCESSO DE PARTICIPAÇÃO E A
CULTURA
ORGANIZACIONAL
NA
ENFERMAGEM: desafios neste novo
milênio [The processo f participation and
the organized culture in nursing:
challenges in the new millennium]
Eunice Maria Hirt; Francine Lima
Gelbcke............................................. 101
MERCADO
DE
TRABALHO
DO
NUTRICIONISTA
EGRESSO
DA
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA
CATARINA: índices de emprego /
desemprego, jornada de trabalho e
níveis salariais [Graduated nutritionists
labor market from Santa Catarina Feral
University: employment, unemployment,
work hour and wagel] Francisco de Assis
Guedes
de
Vasconcelos;
Camila
Elizandra Rossi; Emilaura Alves....... 111
BIODISPONIBILIDADE DE FERRO:
uma revisão [Iron bioavailability: a
Resumos
A enfermagem humanística no cuidado
perioperatório à criança e seu familiar.
Maceno, P. R.; Reis, S. da S.; Maia, A.
R. C. ................................................. 126
A prática de enfermagem como
processo educativo em saúde: a
contribuição dos agentes comunitários
na prevenção precoce e DST. Matos, L.
H. L.; Romanini, L. K.; Cardoso, S. B. de
A.; Cartana, M. do H. F. ................... 126
O processo do nascimento no sistema
prisional: assistência de enfermagem a
gestantes, puérperas e recém-nascidos
em privação de liberdade. Oliveira, A. M.
de; Cordeiro, C. G.; Rosiniski, T. C.;
Monticelli, M. .................................... 126
“Minha maluquez, misturada com minha
lucidez”: A atuação de acadêmicos de
enfermagem junto a adolescentes
usuários de um CAPSi. Hagemann, S.;
Zardo, C.; Marcelino, M. A.; Sprícigo, J.
S. ...................................................... 127
Redescobrindo a vida: o cuidado de
enfermagem junto ao paciente com
diagnóstico de câncer fundamentado em
Dorothea E. Orem e Hildegard E.
Peplau. Souza, H. E. de; Hendges, L.;
Radünz, V. ....................................... 127
Promoção da saúde do trabalhador de
enfermagem psiquiátrica. Sanchez, A.
6
D.; Martins, T. S.; Albuquerque, G. L. de;
Sprícigo, J. S. ................................... 127
Uma
caminhada
com
Florence
Nightingale: cuidando de mulheres
gestantes/puérperas e suas famílias em
busca do fortalecimento de seu poder
vital. Mocellin, A.; Rodriguez, I. G.;
Justino, M. M.; Carraro, T. E. ……… 127
Empoderando o ser mulher trabalhadora
para o autocuidado em amamentação à
luz da teoria de Dorothea E. Orem.
Gonçalvez, J.; Mendes, B.; Tramontin,
M. B.; Santos, E. K. A. dos. ............. 128
Assistência
de
enfermagem
às
premipuérperas, recém-nascidos e avós
no alojamento conjunto e domicílio
fundamentada na Teoria de Madeleine
Leininger. Floriano, D. M.; Westphal, L.
E.; Arruda, M. C.; Gonçalves, L. H. T.;
Gregório, V. R. P. ............................. 128
Cuidando da criança com câncer e seu
familiar acompanhante em internação
hospitalar: um olhar a partir da Teoria da
Adaptção de Sister Callista Roy. Lancini,
A. de B.; Daniel, H. S.; Maciel, L. da S.;
Nunes, S. M.; Farias, A. M. .............. 128
Vivenciando o cuidado transdimensional
a pessoas com câncer: o desafio do
exercício
do
Toque
Terapêutico.
Petersen, A.; Machado, C. B. M.;
Ghiorzi, A. M. ................................... 129
Prática assistencial junto aos idosos,
familiares e/ou cuidadores usurários da
unidade local de saúde da trindade,
baseada na Teoria do Autocuidado de
Orem.
Assmann, A.; Alves, K. L.;
Ferreira, N.; Frank, S.; Santos, S. M. A.
dos. .................................................. 129
O cuidado humanístico a Idosos
fragilizados e seus familiares cuidadores
em uma unidade local de saúde.
Stefanes, C.; Toledo, G. B.; Nora, P. T.;
Alvarez, A. M. ................................... 129
Normas de Publicação ..................... 130
7
Revista Ciências da Saúde
Editorial
Quando assumimos a direção do Centro de Ciências da
Saúde, entre nossas metas de gestão estava a revitalilzação
da Revista Ciências da Saúde. Entendemos que um Centro de
Ensino forte como é o CCS, o segundo em número de
professores e alunos da Universidade Federal de Santa
Catarina, com cinco cursos de graduação e seis programas de
pós-graduação sctricto sensu e vários lato sensu, tem a
necessidade de dispor de um Revista forte para a publicação
de sua produção científica.
Para que uma revista possua credibilidade é necessário
que atenda a diversos quesitos, dentre os quais a
periodicidade. Com o esforço da atual comissão editorial, sob a
coordenação da Professora Tânia Silvia Fröde, este primeiro
objetivo já foi alcançado.
Com a construção do bloco da pós-graduação, onde os
programas terão condições físicas e materiais e de melhor
desenvolver suas pesquisas, certamente, teremos um salto de
qualidade em nossas pesquisas e, com isto, valorizando
nossas publicações e, por conseguinte, qualificando ainda
mais nossa Revista.
Que 2006 seja efetivamente um novo marco da Revista
Ciências da Saúde.
Prof. Cleo Nunes de Sousa
Diretor do CCS/UFSC
8
Isoppo, F. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 09-14, jan./jun.. 2006
DIAGNÓSTICO CLÍNICO-LABORATORIAL DE REAÇÕES DO TIPO ALÉRGICO
GRAVE A MEDICAMENTOS [Clinical-laboratory diagnosis of allergic reactions to
drugs]
Fernando Isoppo; Teixeira Rodrigo; Thomaz Alaver e Tânia Silvia Fröde
Resumo: A reação alérgica aos medicamentos é um dos tipos de reações adversas. Estas reações
ocorrem devido a períodos prolongados de hospitalização, aos padrões atuais de prescrições médicas,
o que leva ao comprometimento da vida do paciente. Estes fatos promovem alto custo sócioeconômico para o país. As reações de hipersensibilidade representam aproximadamente 1/3 de todas
as reações adversas aos fármacos. Estas reações ocorrem em cerca de 10-20% nos pacientes
hospitalizados e mais de 7% na população em geral. Dentre as reações adversas severas destacam-se:
anafilaxia, síndromes de hipersensibilidade, síndrome de Stevens Johnson, necrose epidérmica tóxica.
Pelo qual estão associadas à significativa morbidade e mortalidade Embora diversos fatores de risco
possam ser identificados, a importância clínica ainda não está totalmente esclarecida. No futuro, o
progresso nas áreas de imunogenética, bem como farmacogenética poderão auxiliar na identificação
de populações de risco em desenvolver determinado tipo de reação adversa. podendo contribuir, desta
forma, para medidas de prevenção.
Palavras-chave: reações adversas, fármacos, testes in vivo e in vitro.
Abstract: Hypersensitivity drug reactions are but one of the many different types of adverse drug
reactions. They may be potentially life-threatening, prolong hospitalization, affect drug prescribing
patterns of physicians and result in socioeconomic costs. Hypersensitivity reactions represent about
one third of all adverse drug reactions. Adverse drug reactions affect 10-20% of hospitalized patients
and more than 7% of the general population. Severe reactions including anaphylaxis, drug
hypersensitivity syndromes, Stevens Johnson syndrome and toxic epidermal necrolysis are associated
with significant morbidity and mortality. Although several risk factors have been identified, their
clinical importance has not been fully understood. Future progress in immunogenetics and
pharmacogenetics may help identify populations at risk for specific types of reactions and
implementing early preventive measures.
Keywords: adverse reactions, drugs, in vivo and in vitro tests.
Introdução
Atualmente o diagnóstico laboratorial
para as alergias evoluiu no que diz respeito
aos exames imunológicos existentes. Dentre
os exames destaca-se a pesquisa da
imunoglobulina do tipo E (IgE) total e
específica, considerada um marcador de
doenças alérgicas do tipo grave. Além disso,
atualmente o laboratório de imunologia tem
se destacado na tentativa de elucidar as
reações alérgicas do tipo grave, ou seja, o
choque anafilático. Este evento que ocorre
principalmente
devido
a
múltiplos
medicamentos administrados nos pacientes,
principalmente aqueles pacientes atendidos
em Unidades de Terapia Intensivas, Centros
Cirúrgicos, Emergências nos Hospitais1. É
imperativo informar que a reação alérgica
não depende da dose administrada, mas sim
da sensibilização prévia do indivíduo por
exposição anterior ao medicamento. Essas
reações
não
são
explicadas
pelas
propriedades
farmacológicas
do
medicamento e estão relacionadas com as
defesas imunológicas dos indivíduos2,3. As
reações alérgicas são de diversos tipos e
algumas de extrema gravidade. De modo
geral, são imprevisíveis, pois ocorrem com
baixa freqüência na população e, às vezes em
pacientes que já foram tratados com o
mesmo medicamento4. Para elucidar estas
reações, um novo marcador imunológico
denominado triptase surgiu no intuito de
identificar as reações alérgicas graves. É
importante, portanto, neste momento que
façamos uma revisão dos principais
medicamentos envolvidos nas reações do
9
Isoppo, F. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 09-14, jan./jun.. 2006
tipo alérgicas graves e o possível diagnóstico
laboratorial na tentativa de elucidar o agente
causal e/ou prevenir futuras reações que
comprometam a vida do paciente.
As reações adversas aos fármacos são
de ocorrência freqüente, cursam com
quadros clínicos variados e não têm testes
preditivos seguros para o seu diagnóstico.
Podem ser de natureza tóxica, idiossincrática
ou de hipersensibilidade e são classificadas
em reações preditíveis e não preditíveis. As
reações preditíveis são aquelas que
apresentam
efeitos
colaterais
do
medicamento5. As reações não preditíveis
são as reações idiossincráticas e de
hipersensibilidade, sendo que as primeiras
dependem de alguma qualidade especial do
indivíduo receptor do fármaco6. As reações
alérgicas de vários tipos constituem uma
forma muito comum de resposta adversa aos
fármacos. Estes por serem em sua maioria,
substâncias de baixo peso molecular, não são
imunogênicos por si só. Um fármaco e seus
metabólitos podem, entretanto, interagir com
proteínas, formando um conjugado estável
capaz de atuar como imunógeno.
As
reações
alérgicas
ou
de
hipersensibilidades incluem uma grande
variedade de quadros clínicos produzidos por
um mecanismo imunológico. As respostas
imunológicas podem estar dirigidas a
epítopos únicos do fármaco, conjugados do
fármaco com proteínas do paciente, ou à
metabólitos do fármaco. O desconhecimento
dos determinantes antigênicos dos distintos
medicamentos faz com que o diagnóstico de
hipersensibilidade a medicamentos seja
bastante complexo e difícil na maioria dos
casos
clínicos7.
As
reações
de
2,3
hipersensibilidade
compreendem
as
reações anafilactóides que não têm ainda seu
mecanismo fisiopatológico esclarecido e, que
clinicamente simulam uma reação alérgica, e
as reações verdadeiramente imunológicas
mediadas por qualquer dos mecanismos
imunológicos descritos por Gell e Coombs
(tipos I, II, III e IV)8. Estas últimas são
chamadas de anafiláticas ou imediatas (tipo
I), citotóxicas (tipo II), mediadas por
complexos imunes (tipo III) e as reações
celulares ou tardias (tipo IV). Dentre todas as
citadas, as reações de hipersensibilidade do
tipo imediato são as que apresentam maior
gravidade e maior risco de vida1,6. As reações
adversas do tipo alérgico de ocorrência
imediata após uso de um medicamento são
chamadas de anafiláticas. Estas reações são
consideradas verdadeiramente imunológicas
quando decorrem da sensibilização prévia do
indivíduo por anticorpos específicos e, são
chamadas de anafilactóides quando decorrem
da liberação ou da ativação de mediadores
vasoativos por mecanismos independentes da
participação de anticorpos9. A caracterização
clínica do que seja uma reação anafilática ou
anafilactóide é, entretanto, muitas vezes
difícil de ser realizada. Essas duas formas
podem ser denominadas de Reações do Tipo
Alérgico (R.T.A.) para simplificação dos
fatos apresentados.
A alergia a medicamentos é a principal
causa de reações anafiláticas, as quais podem
causar risco de vida. Dentre os principais
fármacos associados a esse tipo de reação
destacam-se: antibióticos, antiinflamatórios
não hormonais (AINES), anestésicos locais e
bloqueadores neuromusculares (relaxantes
musculares), dentre outros10,11.
A anafilaxia ou reações anafilactóides
tem sido descritas freqüentemente em
reações adversas causadas por bloqueadores
neuromusculares.
Esses
agentes
são
responsáveis pela grande maioria das reações
anafiláticas ocorridas durante a anestesia. Os
bloqueadores neuromusculares podem se
ligar a anticorpos específicos IgE ou
mastócitos em pacientes sensíveis. Mas o
mecanismo mais freqüente é o nãoimunológico responsável pela ativação de
mastócitos12. O sinal clínico de uma reação
anafilática
aos
bloqueadores
neuromusculares ocorre dentro de poucos
minutos seguido à administração do
medicamento e ameaçam a vida em 70% dos
casos (graus de severidade 3-4: colapso,
eritema,
brocoespasmo)
requerendo
ressuscitarão intensiva e administração de
adrenalina13.
Já as reações do tipo alérgico aos
antiinflamatórios não-hormonais (AINES)
10
Isoppo, F. et al.
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têm sido cada vez mais freqüentes. Estas se
manifestam pela presença de angioedema
e/ou urticária localizados ou generalizados,
broncoespasmo e até mesmo parada cardiorespiratória14.
Os efeitos adversos aos antibióticos são
freqüentes durante o tratamento dos
pacientes. A maioria destas consistem na
intolerância, efeitos colaterais e secundários,
alergias,
overdose
ou
interações
15
farmacológicas indesejáveis .
Em relação à freqüência de reação do
tipo alérgica aos antibióticos é importante
informar
que
os
antimicrobianos
betalactâmicos constituem a primeira causa
de reações por IgE seguido das pirazolonas.
Os betalactâmicos contêm em comum uma
estrutura denominada “anel betalactâmico”.
Já as cefalosporinas pertencem a este grupo
de fármacos, apresentado diferenças
estruturais e funcionais em relação às
penicilinas. O estudo sobre a reatividade
cruzada entre o grupo das penicilinas e das
cefalosporinas é controverso. Alguns estudos
direcionados a avaliação desta reatividade
cruzada sugeriram a existência de uma
importante reatividade em pacientes, no
entanto, outros trabalhos, mais recentes
apontam escassa reatividade clínica cruzada
entre as duas classes e demonstram uma
variedade
de
padrões
na
resposta
imunológica aos betalactâmicos entre os
indivíduos16.
O diagnóstico de hipersensibilidade aos
betalactâmicos está baseado na realização de
uma história clínica, dos testes cutâneos e/ou
das determinações de IgE, além dos testes de
provocação. Em qualquer destes passos é
possível estabelecer um diagnóstico de
hipersensibilidade, ainda que o mais
freqüente é realizá-lo mediante os testes
cutâneos e/ou a determinação de IgE
específica. No entanto, existem estudos que
demonstram que os testes cutâneos ou da IgE
especifica
podem
ser
negativos
e
posteriormente positivar ao longo do
tempo17. Estima-se que a penicilina seja
responsável por 75% das mortes por reação
anafilática nos EUA e que ela cause 400 a
800 mortes por ano16. Segundo estudos
recentes realizados pela Coordenação
Nacional de DST e AIDS do Ministério da
Saúde do Brasil, as reações anafiláticas à
penicilina ocorrem com prevalência estimada
de 0,04 % a 0,2 % e a taxa de letalidade é em
torno de 0,001 %, ou seja, um a cada 50.000
a 100.000 tratamentos18.
Em relação aos anestésicos locais, não
está bem esclarecido o mecanismo das
reações alérgicas a estes medicamentos, pois
não está demonstrado de forma absoluta a
existência de reação IgE mediada. Entretanto
sabe-se que os anestésicos locais do tipo
éster e seu produto de hidrólise, o ácido paraamino benzóico (PABA), o qual possui uma
amina na posição para do anel benzóico, são
altamente alergizantes. Embora estas reações
alérgicas sejam mais freqüentes com o grupo
dos ésteres do ácido benzóico, também
ocorrem com o grupo das amidas. Algumas
das manifestações mais comuns de alergia
por anestésicos locais são: erupções
urticárias, exantemas eritematosos e outras
respostas dermatológicas. Outro aspecto
importante a considerar, é que as reações
cruzadas são freqüentes entre os anestésicos
do grupo dos ésteres e menos freqüentes no
grupo das amidas. No caso de não existir
anestésico local alternativo, deve-se propor a
utilização de medicamentos indutores do
sono ou anestesia geral10.
O objetivo deste trabalho foi fazer uma
revisão bibliográfica das principais reações
alergias a medicamentos do tipo grave e o seu
diagnóstico clínico-laboratorial.
Diagnóstico Clínico laboratorial
História do paciente
A História do paciente é uma
importante ferramenta diagnóstica. Em geral,
nas patologias mediadas por IgE , as reações
ocorrem logo após o contato com o antígeno
e
múltiplos
alvos
são
afetados,
principalmente o sistema cardiovascular. A
anafilaxia inicia, em média, dentro de 15 min
a 1 hora em média após a exposição
11
Isoppo, F. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 09-14, jan./jun.. 2006
antigênica24. A anamnese é importante para a
identificação de prováveis alérgenos,
podendo ser confirmados por testes “in vivo”
(testes puntura e de provocação) ou “in
vitro” (níveis séricos de IgE total e
específica)19.
As manifestações clínicas mais
freqüentes são descritas por: alterações
cardiovasculares – hipotensão, arritmias,
alterações respiratórias – congestão nasal,
rinorréia, broncoespasmo, edema de laringe e
glote; manifestações cutâneas – prurido,
eritema,
urticária,
angioedema;
gastrointestinais – náuseas, vômitos, diarréia,
dor abdominal e neurológicas – cefaléias,
vertigens, relaxamentos de esfíncteres,
convulsões, perda da consciência.
dentro de 15 a 20 minutos e pode ser lida
imediatamente, desaparecendo rapidamente
em algumas horas23.
Nos pacientes que sofreram episódios
de anafilaxia como conseqüência de um
determinado antígeno, os níveis de IgE
específica e os testes cutâneos deverão
apresentar positividade24.
Os
testes
de
punctura
são
amplamente utilizados para confirmação
diagnóstica da alergia induzida por grande
variedade de substâncias inalantes e
alimentos. Estes são freqüentemente usados
como padrão de referência para avaliar a
especificidade e a sensibilidade dos testes de
laboratório que dosam o anticorpo IgE
específico circulante e também para
determinar as bioequivalências dos extratos
alergênicos25,26.
Testes Realizados
Teste de Provocação
Teste da Puntura
O teste da puntura ou prick teste é o
exame diagnóstico mais simples para
alergias e que fornece inúmeras informações
sobre a imunologia das reações alérgicas. No
teste cutâneo, o fármaco ou o antígeno é
introduzido na pele, o que leva à liberação de
mediadores pré-formados, promovendo o
aumento da permeabilidade vascular, edema
local e prurido. Um teste cutâneo positivo
normalmente correlaciona-se com um teste
de radioimunoensaio: RAST para IgE
específica no soro do paciente20,21.
Os testes intradérmicos são contra
indicados em alguns pacientes pelo risco de
reações sistêmicas graves22. Os testes de
punctura são usados para confirmar a
hipersensibilidade a uma variedade de
alérgenos, são os métodos de triagem mais
específicos e convenientes para a detecção
de anticorpos IgE, no entanto são menos
específicos que os testes intradérmicos23.
Este teste é realizado para confirmar um
diagnóstico baseado em sintomas e é
usualmente realizado na parte superior das
costas e/ou na parte interior do antebraço. O
ponto máximo da reação usualmente ocorre
O teste de provocação devem ser
realizado no Centro Cirúrgico do hospital e
os pacientes devem ser monitorizados,
avaliando-se a frequência cardíaca, a pressão
distólica e sistólica. Este paciente é avaliado
por um alergista e um imunologista que
deverão estar presentes em todo o
procedimento. No paciente aplica-se por via
subcutânea o medicamento (não diluído) que
possivelmente o levou a desenvolver uma
R.T.A. Avaliamos se o paciente apresentou
reações
cutâneas,
respiratórias
e/ou
cardiovasculares. Este teste confirma ou não
uma reação alérgica do tipo grave naqueles
pacientes que tiveram choque anafilático. No
entanto, um resultado negativo pode não
excluir o medicamento em estudo.
Diagnóstico laboratorial
Dosagem da Triptase
A desgranulação dos mastócitos pode
ser determinada pela mensuração dos níveis
séricos de triptase, devido à sua
12
Isoppo, F. et al.
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estabilidade20. A triptase é uma das
endoprotease que se concentra de forma
seletiva nos grânulos dos mastócitos
humanos. Os níveis plasmáticos de triptase
são um indicador da atividade dos mastócitos
e se correlacionam com a gravidade clínica
da anafilaxia24.
A triptase está presente nos
mastócitos, sendo considerado um marcador
seletivo para identificar a ativação desta
célula. Além disto, a triptase possui uma vida
média maior que a da histamina (4 horas).
Estas duas características fazem com que a
triptase sérica seja útil no diagnóstico da
anafilaxia. Em pacientes alérgicos não
expostos, os níveis de triptase estão
habitualmente baixos (< 5 ng/dL), exceto em
mastocitose. No entanto a exposição do
paciente aos alérgenos resultando em reações
alérgicas graves (choque anafilático),
promove aumento considerável deste
marcador na anafilaxia chegando a níveis
superior a 100 ng/dL27. A concentração
plasmática da triptase é aproximadamente de
45 minutos depois de iniciada a reação. A
coleta da amostra deve proceder-se uma hora
após ter iniciado os primeiros sintomas.
Outro parâmetro laboratorial para auxiliar no
diagnóstico
de
anafilaxia
seria
a
determinação da concentração de histamina
no plasma, mas esta avaliação é pouco
utilizada na prática, devido entre outros
motivos, à sua curta meia – vida19, 28.
Conclusão
As
reações
alérgicas
graves
constituem uma fração importante dos
eventos adversos decorrentes da exposição a
medicamentos e de seu potencial de
morbidade e mortalidade. É importante
enfatizar a necessidade de notificação das
reações alérgicas graves pelos profissionais
envolvidos no tratamento do paciente de
forma sistematizada, por meio de ações da
farmacovigilância e também na descoberta e
utilização de novos métodos de diagnostico
laboratorial.
É de suma importância a elucidação
dos mecanismos imunológicos envolvidos no
processo alérgico à fármacos como também
a identificação do agente causal para a
prevenção de futuras reações alérgicas que
possam comprometer a vida do paciente.
Atualmente no diagnóstico laboratorial
realiza-se a determinação da IgE específica
que permite a identificação do alérgeno
causador da R.T.A. fornecendo uma medida
objetiva da sensibilização do paciente,
possibilitando prever o risco de desenvolver
a alergia no futuro. Há também a
determinação da enzima triptase sérica que é
considerada um marcador específico para as
reações anafiláticas.
O diagnóstico da doença alérgica
depende prioritariamente da história clínica e
do exame físico do paciente. Entretanto,
testes laboratoriais podem contribuir para a
confirmação do diagnóstico, avaliação do
paciente e estabelecimento da conduta
terapêutica.
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ENDOTELINAS NO TRATO RESPIRATÓRIO [endothelins in respiratory tract]
Cláudio Laurentino Guimarães
Resumo: Endotelinas (ETs) são peptídeos com 21 aminoácidos que apresentam atividade biológica
diversa e estão implicadas em numerosas doenças. A ET-1 é um potente regulador do tônus da
musculatura lisa e mediador inflamatório que possui papel chave nas doenças das vias aéreas,
circulação pulmonar e doenças pulmonares inflamatórias agudas ou crônicas. Esta revisão focaliza a
biologia das ETs e seu papel no trato respiratório.
Palavras-chave: endotelinas, trato respiratório, pulmão.
Abstract: Endothelins (ETs) are 21 amino acids peptides with diverse biological activity that has
been implicated in numerous diseases. ET-1 is a potent regulator of smooth muscle tone, and
inflammatory mediator that may play a key role in diseases of the airways, pulmonary circulation, and
inflammatory lung diseases, both acute and chronic. This review will focus on the biology of ETs and
its role in respiratory tract.
Keywords: endothelins, respiratory tract, lung.
Introdução
Endotelinas
são
peptídeos
estruturados com 21 aminoácidos e duas
pontes dissulfeto, posicionadas entre os
resíduos 1-15 e 3-111. Três isoformas de
endotelinas são encontradas em humanos,
além de outros mamíferos, a endotelina-1
(ET-1), a primeira a ser isolada a partir do
sobrenadante de células endoteliais de aorta
de suínos2, a endotelina-2 (ET-2) e a
endotelina-3 (ET-3)2,3. Agregam-se a esta
família de peptídeos as sarafotoxinas4 (SX6a,
b, c, d) e a bibrotoxina5, presentes no veneno
das serpentes Atractaspis engaddensis e
Atractaspis bibroni, respectivamente; e o
peptídeo intestinal vasoativo (VIC), uma
variante da ET-2 presente em camundongos
e ratos, também chamado de ET-6. Em
adição, há também, duas variantes de ETs
com 31 e 32 aminoácidos (exceções quanto à
estrutura), denominadas de ET-1(1-31) e ET1(1-32)7,8.
Receptores endotelinérgicos
As respostas fisiológicas induzidas
pelas ETs são sinalizadas através da ativação
de receptores endotelinérgicos específicos1.
Existem, pelo menos, dois tipos de
receptores
bem
caracterizados
em
mamíferos, os do tipo ETA e ETB. Estudos
farmacológicos apontam para a existência de
um terceiro tipo de receptor, o ETC
encontrado em anfíbios, e também de
subtipos de receptores ETA (ETA1 e ETA2) e
ETB (ETB1 e ETB2), conhecidos como
receptores atípicos.
Os
receptores
endotelinérgicos
pertencem à superfamília de receptores
metabotrópicos que contém sete domínios
transmembrana e se acoplam às proteínas G,
ativando múltiplas vias intracelulares de
transdução de sinal, incluindo-se as
fosfolipases, adenilato ciclase, bomba
antiporte Na+/H+, entre outras. Estes
processos celulares resultam na elevação
intracelular de inositol-1,4,5-trifosfato, 1,2diacilglicerol e/ou monofosfato-cíclico de
adenosina, liberação de íons cálcio dos
estoques intracelulares e ativação de
proteínas quinases9.
Os receptores do tipo ETA possuem
maior afinidade à ET-1 e ET-2 do que à ET3. Embora, não existam até o presente
momento agonistas seletivos para esse tipo
de receptor, já foram sintetizados diversos
antagonistas seletivos como o BQ-123, A127722.5, FR 139317 e o SB 234551. Os
receptores ETB apresentam afinidade
semelhante para as três isoformas peptídicas.
Entre os agonistas seletivos para esse
receptor, destacam-se a SX6c, o IRL-1620 e
15
Guimarães, C. L.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 15-25, jan./jun.. 2006
o BQ-3020. Entre os antagonistas seletivos,
existem o Ro 46-8443, o IRL-2500, BQ-788
e o A-192621. Há ainda, os antagonistas
mistos (ou dualistas) ETA/ETB como o
bosentan, o L751281 e o SB-21724210,11.
Desde a descoberta das endotelinas, diversas
empresas farmacêuticas desenvolveram
diferentes antagonistas endotelinérgicos;
entre esses, vários são estruturalmente nãopeptídicos e apresentam boa disponibilidade
por via oral, como o bosentan e o
tezosentan12.
Biosíntese
Semelhante a biosíntese protêica de
outros peptídeos, as ETs são sintetizadas a
partir de etapas proteolíticas específicas. A
etapa inicial ocorre com a formação da prépró-endotelina,
codificada
por
gene
específico3.
Este
polipeptídeo
(com
aproximadamente 210 aminoácidos) é
substrato enzimático para endopeptidades
específicas, possivelmente a furina, sendo
clivada entre os resíduos de lisina e arginina,
nas posições 53 e 93. A lise enzimática
origina um peptídeo intermetiário chamado
de big-endotelina, biologicamente inativo
como tal. A big-ET-1 e a big-ET-2 possuem
38 aminoácidos e são clivadas entre os
aminoácidos Trp21-Val22, enquanto que a
big-ET-3, com 39 aminoácidos, é clivada
entre os sítios Trp21-Ile22, por ação de
enzimas converosoras de endotelina (ECE,
sensíveis ao bloqueio por fosforamidon e, em
alguns casos, tiorfano e 1,10-fenantrolina)
dando origem à respectiva endotelina13.
Existem, pelo menos, dois subtipos de ECEs,
denominadas de ECE-1 e ECE-2 e, em
adição, existem também distintas isoformas
de ambas enzimas. Por final, a inativação
biológica das ETs ocorre através da ação
enzimática de endopeptidases neutras (NEP),
que clivam as ETs em fragmentos peptídicos
inativos14.
A exemplo do endotélio vascular,
diversos outros tipos celulares possuem a
capacidade de sintetizar e secreta ETs. No
Trato respiratório em particular, diferentes
populações de células são potencialmente
produtoras de ETs, no entanto, as células
endoteliais pulmonares ocupam grande
extensão, quando comparadas a outros tipos
celulares.
A existência do RNAm como
também das isoformas de ECESs no sistema
respiratório, sinalizam a capacidade de
síntese de ETs ao longo do trato respiratório.
O RNAm para a ECE-1a, detectado por
hibridização in situ ou por imunohistoquímica, foi encontrado em quantidades
significativas no pulmão de humano15,16 e
rato e na mucosa nasal de humano. Quando
comparada às concentrações tissulares de
humano, as três isoformas de ECE-1 estão
em maior proporção no pulmão17. Estudos
com imunofluorescência ou anticorpos,
através da técnica de “análise de Western
Blot”, detectaram somente a expressão de
ECE-1a em células endoteliais vasculares de
pulmão de rato18. Ao nível celular, a ECE-1a
foi co-localizada com a big-ET-1 e ET-1
junto às células epiteliais, células endoteliais,
glândulas submucosas e células musculares
lisas do trato respiratório de indivíduos
sadios10.
A provável transcrição protêica para
os peptídeos precursores para as ETs, de
forma especial para a ET-1, no pulmão de
diversas espécies animais, foi avaliada
através da detecção do RNAm para a ET-1
por meio da análise da hibridização in situ ou
pela técnica de “Northern Blot”10. No
pulmão de rato, o RNAm para a ET-1 está
associado às células epiteliais dos
bronquíolos e nos vasos sangüíneos18 e, em
humano, encontra-se presente nas células
endoteliais pulmonares, vasos sangüíneos
alveolares e brônquicos19,20,21. Em adição, os
RNAs mensageiros tanto para a ET-1 como
também para a ET-3 são expressos nos
macrófagos pulmonares de humano22.
Ambas as isoformas de ETs, ET-1 e ET-3,
são abundantemente expressadas no pulmão
fetal de rato18 e humano23. Similarmente,
ETs imunoreativas (irET-1) estão presentes
no pulmão adulto de porco24,25, rato26,
cobaia27, camundongo28 e humano29 e, a bigET1-39 no pulmão de porco26.
16
Guimarães, C. L.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 15-25, jan./jun.. 2006
Diferentes substâncias bioativas são
capazes de induzir a síntese e secreção de
ETs de diferentes células do sistema
respiratório, incluindo-se, também, as células
endoteliais16,30. A indução da síntese nas
células endoteliais é estimulada pela
trombina31, adrenalina2, ionóforo de Ca2+ A231872, 12-tetradecanoilforbol-13-acetato3,
fator de crescimento tumoral-32, IL-1
(interleucina-1)33, IL-234, interferon-35,
lipopolissacarídeo bacteriano36, argininavasopressina37 e oxi-hemoglobina38. Por
outro lado, a síntese de ET-1 por células
epiteliais de traquéia de cobaia em cultura é
aumentada por endotoxina bacteriana, fator
de crescimento tumoral  (TNF-), TNF-,
IL-1, IL-2, IL-6 e IL-816,39,40 e por trombina
em coelho41.
A distribuição ou proporção relativa
de receptores endotelinérgicos ETA e ETB na
musculatura lisa brônquica e traqueal,
epitélio brônquico, alvéolos, parênquima
pulmonar e pelos vasos sangüíneos que
irrigam o trato respiratório parece ser
bastante heterogênea. No trato respiratório
de camundongo, cobaia e humano, há maior
prevalência dos receptores do tipo ETB sobre
os ETA. Já os receptores ETA encontram-se
em maior proporção na musculatura lisa
traqueal e no alvéolo de ovelha, músculo liso
brônquico de porco e, alvéolo de cobaia.
Estudos com vasos sangüíneos pulmonares
apontam para a prevalência dos receptores
ETA ou ETB na artéria pulmonar de humano
e coelho, respectivamente10,42.
O
leito
vascular
pulmonar
desempenha importante papel depurativo
sangüíneo e catabólito, removendo e
degradando a maior parte das ETs
circulantes, logo em sua primeira passagem
pelo pulmão. Diversos estudos experimentos,
com
diferentes
espécies
animais,
demonstraram que as ETs sofrem depuração
sangüínea de 30 a 60 % ao nível pulmonar10.
Além disso, há fortes evidências sugerindo
que a remoção das ETs circulantes, pelo leito
vascular pulmonar, depende principalmente
da
sua
associação
aos
receptores
endotelinérgicos do tipo ETB43,44.
Efeitos farmacológicos das endotelinas no
trato respiratório
Uma vez sintetizadas, as ETs
parecem desempenhar funções autócrinas
e/ou parácrinas e medeiam diversas ações
como mitogênese, constrição ou relaxamento
da musculatura lisa traqueal, brônquica e
vascular e induzem a formação e liberação
de
diversas
outras
substâncias
potencialmente
bioativas.
Numerosos
estudos farmacológicos in vitro e in vivo têm
demonstrado as potentes ações das ETs no
trato respiratório. As diferentes atividades
exercidas por esses peptídeos podem ocorrer
diretamente, através da ativação dos
receptores ETA e/ou ETB e posterior ativação
de mecanismos intracelulares de transdução
de sinal, ou indiretamente, através da
indução da síntese e/ou secreção de outras
substâncias bioativas9,10,42.
Em preparações isoladas, as ETs
exercem potente atividade constritora da
musculatura lisa traqueal e brônquica de
cobaia, furão, rato, coelho e humano. As
respostas
contráteis
desenvolvem-se
lentamente e prolongam-se por um extenso
período de tempo. Em bases molares, a ET-1
é o mais potente broncoconstritor, quando
comparada à histamina, à neurocinina A ou
aos leucotrienos45,46. Quando administrada
intravenosamente, as ETs, a big-ET-1 ou a
SX6b
evocam
potente
efeito
broncoconstritor
dose-dependente,
acompanhado do aumento da pressão arterial
média em cobaia47 e gatos48. Porém, quando
a ET-1 é administrada na forma de aerossol
não se observam mudanças na pressão
arterial. A resposta broncoconstritora, in
vivo, mediada pela ET-1 é máxima em 1 a 2
minutos e observa-se forte taquifilaxia das
respostas pressórica e broncoconstritora
quando da administração de doses
intravenosas repetidas47.
A resposta contrátil da musculatura
lisa traqueal ou brônquica induzida pelas
ETs é mediada, em parte, através da
liberação e ação de outras substâncias9. Há
evidências substâncias que apontam o
envolvimento de derivados eicosanóides nas
17
Guimarães, C. L.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 15-25, jan./jun.. 2006
respostas contráteis eliciadas pelas ETs no
trato respiratório. A ET-1 induz liberação de
tromboxano-A2 (TXA2) em pulmão isolado e
perfundido de rato e cobaia, e traquéia,
brônquio e parênquima de cobaia e brônquio
humano47,49-52. Além do TXA2, a ET-1 é
capaz de induzir a formação de outros
derivados eicosanóides (prostaglandinas do
tipo PGI2, PGF2, PGD2, PGE2 e leucotrienoC4) de diferentes tipos celulares do trato
respiratório51,53-56, bem como liberar
mediadores não-eicosanóicos como a
histamina56,57 e serotonina de mastócitos
pulmonares ativados56. Na presença de
bloqueadores da cicloxigenase58-60, como a
indometacina, ou por antagonistas de
receptores para leucotrienos como o YM
16638 e o FPL 5571261, as respostas
contráteis induzidas pela ET-1 são reduzidas
em preparações isoladas de traquéia e
brônquio. Em adição, o pré-tratamento com
indometacina diminui a broncoconstrição in
vivo induzida por ET-1 em cobaia60 e gato62.
Por outro lado, há diversos estudos
questionando a mediação dos produtos da via
da cicloxigenase nas ações constritoras
mediadas pelas ETs no trato respiratório.
Além da atividade constritora no
sistema respiratório, as ETs também podem
mediar ações relaxantes da musculatura lisa,
particularmente
em
preparações
que
apresentam elevado tono basal. Vários
estudos apontam para a mediação indireta da
prostaciclina (PGI2) ou do óxido nítrico
(NO) na mediação do relaxamento das vias
aéreas isoladas induzidas pela ET-142. Em
preparações de traquéia de cobaia, in situ, a
ET-1, administrada intravenosamente, causa
resposta
bifásica,
caracterizada
por
relaxamento transiente seguida por contração
sustentada. Além disso, o tratamento com
indometacina foi capaz de reduzir a atividade
constritora52. Em tiras isoladas de traquéia de
cobaia, pré-contraídas com acetilcolina ou
submetidas ao choque anafilático, in vitro,
com ovalbumina, a adição de ET-1 é capaz
de induzir resposta relaxante63,64.
O leito vascular do sistema
respiratório é extremamente sensível às
ações mediadas pelas ETs. Dependendo do
tônus vasomotor, as ETs podem induzir
vasoconstrição ou relaxamento10,42. As ETs
induzem contração de anéis isolados de
vasos pulmonares de ovelha65, cobaia66 e
humano67. No leito vascular pulmonar
perfundido, com tônus sub-basal, tanto a ET1 como a ET-3 elevam a pressão pulmonar
arterial e/ou a resistência vascular pulmonar
em diferentes espécies animais68-71. Por outro
lado, quando o tônus vascular está elevado,
naturalmente ou artificialmente, as ETs
induzem respostas vasodilatadoras dosedependentes68,71-73. Os receptores ETA
participam na mediação de respostas
predominantemente
vasoconstritoras,
especialmente em vasos pulmonares de
condutância. Por outro lado, os receptores
ETB
geralmente
medeiam
respostas
vasodilatadoras
e
estão
densamente
localizados nos vasos de resistência. Em
adição, a reposta vasodilatadora via ativação
dos receptores ETB é devida, em parte, pela
formação de óxido nítrico e PGI210,74. Porém,
há discrepâncias importantes quanto a este
aspecto, entre as quais a artéria pulmonar
isolada de coelho, onde receptores ETB
medeiam vasoconstrição ao invés de
vasodilatação43,75.
Implicações
fisiopatológicas
endotelinas no trato respiratório
das
No trato respiratório, as ETs
medeiam direta ou indiretamente a
fisiopatologia de várias doenças, crônicas ou
agudas1,42,76. As concentrações das ETs em
macerado tecidual, em amostras séricas ou
plasmáticas
ou,
ainda,
no
lavado
broncoalveolar (BAL) estão elevadas em
distintas patologias em humanos ou
determinada por intermédio de modelos
experimentais.
Logo após a descoberta das ETs,
ocorreram sugestões implicando-as como
possíveis mediadores da asma brônquica,
tendo-se por base a potente atividade
espamogênica na musculatura lisa das vias
aéreas humana e animal (vide tópico
anterior). Além disso, os níveis de ET-1
estão significativamente elevados no tecido
18
Guimarães, C. L.
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brônquico, BAL e no sangue de pacientes
acometidos de asma77-81. As ETs mimetizam
vários sintomas co-relacionados à asma
como hipersecreção e diminuição da
depuração de muco, hiperplasia das
glândulas mucosas, aumento da sensibilidade
da musculatura lisa traqueal e brônquica,
fibrose
subepitelial
e
atividade
82,83
mitogênica
. A ET-1 é um dos mais
potentes peptídeos espamogênicos da
musculatura lisa aérea humana e animal,
tendo as concentrações efetivas médias
abaixo da unidade dos nanomolares84,85. Este
achado é compatível com a idéia de que a
liberação endógena de ET-1 contribua
significativamente com a elevação do tônus
brônquico observado na asma. Nesta
patologia, a ativação de vias nervosas
colinérgicas está diretamente implicada no
aumento do tônus muscular liso. A ET-1
potencializa a resposta contrátil colinérgica
da musculatura lisa aérea, induzida por
estimulação
elétrica,
em
coelho86,87,
88,89
90
91,92
camundongo
, rato e humano
. A ET1 também possui importante papel
mitogênico nas vias aéreas. Esta suposição
encontra respaldo nos estudos que
evidenciaram que a ET-1 causa proliferação
de células musculares lisas de traquéia de
cobaia, coelho e ovelha em cultura93-95. Além
disso, em humanos, a ET-1 é um potente
secretagogo na mucosa aérea, o que sugere,
também, a mediação endotelinérgica na
rinite alérgica. A exposição da mucosa nasal
humana à ET-1 resulta na secreção de
lactoferrina e muco glicoprotêico de ambas
células mucosa e serosa96. Em adição, em
indivíduos sadios e alérgicos, a ET-1 eleva a
concentração de muco nasal de forma
concentração-dependente97. No processo
fisiopatológico da asma brônquica, o
aumento da permeabilidade vascular
contribui significativamente para a obstrução
das vias aéreas, acarretando diminuição do
diâmetro do lúmen e impedindo o fluxo de
ar. Neste sentido, as ETs podem estar
envolvidas no extravasamento vascular nas
vias aéreas. No pulmão isolado e perfundido
de rato e cobaia, a ET-1 induz edema e
elevação do peso pulmonar, provavelmente
devido à elevação da pressão microvascular
e um efeito direto na retração das células
endoteliais, acarretando no aumento da
permeabilidade vascular98. Isto pode ser
devido, em parte, via liberação de
mediadores secundários como o fator
ativador de plaquetas (PAF) e TXA250,99.
Além desses mediadores, as ETs estão
envolvidas na síntese e liberação de diversos
agentes pró-inflamatórios nas vias aéreas
(vide item anterior), que podem estar
contribuindo para a fisiopatologia da asma
brônquica.
A alveolite fribrosante criptogênica
e a fibrose pulmonar idiopática são
patologias pulmonares caracterizadas por
fibrose pulmonar periférica acompanhada da
proliferação dos pneumócitos do tipo II e
fibroblastos. Os níveis tissulares de irET-1
estão significativamente elevados em
pneumócitos do tipo II e células epiteliais,
obtidas de amostras de pulmão de pacientes
acometidos
de
alveolite
fibrosante
100
criptogênica . Em adição, as ETs parecem
desempenhar relevante função de fatores de
crescimento, como observado em alguns
casos de tumores pulmonares. Em amostras
de tumores pulmonares (carcinoma de
células escamosas e adenocarcinoma) foram
determinados níveis elevados de irET-1 e,
por outro lado, a ET-1 é profusamente
secretada por células tumorais em
cultura101,102.
Além das patologias respiratórias
que acarretam aumento na resposta contrátil
da musculatura lisa da traquéia, brônquios ou
parênquima pulmonar, as ETs estão,
também,
implicadas
nas
patologias
vasculares, como a hipertensão pulmonar.
As concentrações de irET-1 em amostras de
sangue arterial e venoso de indivíduos sadios
estão significativamente menores do que em
amostras obtidas de pacientes com
hipertensão pulmonar secundária a várias
patologias. Por exemplo, em pacientes com
hipertensão pulmonar secundária a distúrbios
das válvulas cardíacas, os níveis plasmáticos
de irET-1 estão significativamente elevados,
retornado ao normal, após cirurgia cardíaca
corretiva103. Os níveis elevados de ETs
19
Guimarães, C. L.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 15-25, jan./jun.. 2006
também são possíveis de serem determinados
em modelos experimentais de hipertensão
pulmonar. Em ratos com hipertensão
pulmonar idiopática, ocorre produção
elevada de ET-1 intrapulmonar104. Por outro
lado, no modelo induzido por monocrotalina,
evidencia-se elevação da pressão intraarterial
pulmonar e hipertrofia ventricular direita.
Estes achados estão correlacionados com
aumentos do teor plasmático de ET-1, como
também na susceptibilidade destes efeitos à
inibição por antagonistas de receptores ETA
ou ETA/ETB74. Recentemente, aprovado para
uso clínico em humanos, o bosentan,
antagonista misto de receptores ETA e ETB,
vem sendo utilizado na hipertensão
pulmonar.
A elevação do extravasamento
vascular pulmonar, acarretando a formação
de edema, pode ser devido às lesões
pulmonares diretas ou indiretas, causadas por
diferentes agentes etiológicos. Entre as
doenças do trato respiratório no qual há o
possível envolvimento das ETs mediando os
processos de permeabilidade vascular,
migração de células inflamatórias ou, ainda,
na manutenção do processo fisiopatológico
encontra-se a Síndrome da Angústia
Respiratória Aguda (SARA). Estudos
clínicos e experimentais demonstraram que
os níveis plasmáticos de ET-1 estão elevados
em humanos105,106 acometidos de SARA ou,
em animais submetidos à lesão pulmonar
com ácido olêico107. Recentemente, foi
demonstrado que o pré-tratamento de
camundongos com bosentan, reduz o
extravasamento vascular induzido por ácido
olêico108,109.
A participação das ETs nos processos
fisiopatológicos de doenças que acometem o
trato respiratório, aliado à descoberta e ação
de antagonistas endotelenérgicos seletivos
apontam para futuros avanços terapêuticos a
doenças como a asma, rinite, SARA e fibrose
pulmonar.
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25
Heinrich, T. A. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 26-33, jan./jun.. 2006
FATORES DE RISCO PARA DOENÇAS CARDIOVASCULARES E DISTRESSE
PSICOLÓGICO EM UNIVERSITÁRIOS DISLIPIDÊMICOS [risk factors for
cardiovascular disease and psychological distress at dyslipidemic universities]
Tassiele A. Heinrich1; Cláudia S. M. Silva2; Elizabeth M. Hermes3; Maria da Graça W.
Balen4; Manoela Maria Bagestan5; Cláudia Cavalett6 e Geny A. Cantos7
Resumo: Este trabalho teve por objetivo discutir a relação entre distresse psicológico e alguns fatores
de risco para doença arterial coronariana em 90 indivíduos com dislipidemia pertencentes a uma
comunidade universitária, considerando o tratamento interdisciplinar e multiprofissional, no período
de março de 2002 a dezembro de 2003. A população analisada foi constituída por 58,9% mulheres e
41,1% homens, com idade entre 28 e 81 anos. A prevalência dos fatores de riscos analisados foi de
59% para sedentarismo, 46% para hipertensão arterial, 19% para tabagismo, 18% para diabete mellitus
e 14% para obesidade. O percentual de indivíduos que apresentaram distresse foi de 68%. O nível de
adesão ao tratamento proposto foi de 27%. Este trabalho mostrou que é necessária atenção efetiva na
detecção e correção de todos os potenciais fatores de risco para doenças cardiovasculares, incluindo o
reconhecimento do distresse, de forma que haja o estabelecimento de estratégias de tratamento e uma
sensibilização permanente para a adoção de estilos de vida mais saudáveis.
Palavras-chave: fatores de risco, doença arterial coronária, estresse psicológico.
Abstract: This work had for objective to argue about the relation between psychological distress and
some risk factors for arterial coronary disease in 90 individuals with dyslipidemia from a university
community, regarding the interdisciplinary and multiprofessional treatment, in the period of March
2002 to December of 2003. The analyzed population was constituted of 58,9% women and 41,1%
men, with age between 28 and 81 years. The prevalence of the analyzed risk factors was of 59% for
sedentary profile, 46% for hypertension, 19% for tobacco addicted, 18% for diabetes mellitus and 14%
for obesities. The percentage of individuals that had presented distress was of 68%. The level of
adhesion to the considered treatment was of 27%. This work showed that it is necessary accomplished
attention in the detention and correction of all the potential risk factors for cardiovascular disease,
including, the distress recognition, in a way to allow the establishment of treatment strategies and a
permanent sensitization for the adoption of more healthful styles of life.
Keywords: risk factors, coronary arterial disease, psychological stress.
Introdução
As doenças cardiovasculares têm papel
indiscutível na morbidade e mortalidade do
mundo ocidental, tanto nos países
desenvolvidos
como
nos
em
desenvolvimento1. A herança genética, as
dislipidemias, a hipertensão arterial, o
sedentarismo, o tabagismo, a diabete mellitus
e a elevada ingestão de calorias são fatores
de risco diretamente relacionados ao dano
cardiovascular2, 3.
_____________
As dislipidemias estão entre os mais
importantes fatores de risco da doença
cardiovascular aterosclerótica. O aumento de
colesterol (CT), juntamente um aumento do
colesterol das lipoproteínas de baixa
densidade (LDL-C) e a diminuição do
colesterol das lipoproteínas de alta densidade
(HDL-C) têm sido usados como indicadores
de ateroma, e também estão associados a
acidente vascular cerebral4.
1
Aluna de iniciação científica do curso de farmácia UFSC.
Cardiologista do Hospital Universitário – UFSC.
3
Bioquímica do Hospital Universitário – UFSC.
4
Nutricionista do Hospital Universitário – UFSC.
5
Aluna da graduação do curso de farmácia – UFSC.
6
Aluna de mestrado do Curso de Farmácia – UFSC.
7
Prof (a). Dr(a) do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Contato:
[email protected].
2
26
Heinrich, T. A. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 26-33, jan./jun.. 2006
As características biológicas de cada
indivíduo, como história familiar e idade são
fatores contribuintes para o desenvolvimento
de doenças cardíacas, sendo que os homens
têm predisposição maior de desenvolver a
doença do que as mulheres. Por outro lado, a
hipercolesterolemia, a hipertensão e o
tabagismo multiplicam por 10 as chances de
desenvolver doença arterial coronariana
(DAC)5. Além disso, pacientes com diabetes
tipo 2, independente do tempo e da evolução
da doença, o risco para DAC aumenta cerca
de duas a quatro vezes6, 7.
Os fatores emocionais exercem forte
influência na evolução das doenças
cardiovasculares. A solidão, o estresse e
excesso
de raiva
podem
provocar
palpitações, dores precordiais, dispnéias,
tontura, sudorese, extremidades frias e
fadiga, podendo ocorrer ainda bradicardia e
hipertensão, levando ao colapso circulatório8.
Estas manifestações somáticas evidenciam
uma hiperatividade do sistema nervoso
central autônomo ou vegetativo endócrino e
os pacientes que já possuem distúrbios
cardio-circulatórios
podem
ter
sua
sintomatologia agravada pela presença
concomitante
do
estresse.
A
essa
manifestação negativa do estresse, onde o
mesmo passa a interferir nas funções e no
desempenho de alguns órgãos é chamada de
distresse. Dentro desta esfera psicológica, há
hipóteses de que os chamados hormônios do
estresse levem a uma produção de adrenalina
produzindo sintomas típicos de diabetes9. O
estresse também está fortemente ligado à
questão nutricional, sendo que os maus
hábitos alimentares podem levar o organismo
a uma situação de distresse10.
Nota-se então, que o estresse aparece
como um fator de risco importante para
DAC, principalmente quando somado a
outros fatores de risco. Isto remete a questão
da prevenção, pois este quadro implica, entre
outros problemas, na ausência no trabalho, na
perda de produtividade e em maiores
cuidados e gastos com a saúde. As pesquisas
sobre estresse e doenças cardiovasculares
ainda são escassas no Brasil. Portanto, há
necessidade de mais estudos sobre a
dimensão real deste problema para dar
suporte na implementação de ações
específicas no âmbito da saúde coletiva.
Considerando-se o exposto acima, este
trabalho tem como objetivo associar alguns
fatores
de
risco
para
doenças
cardiovasculares com o distresse, em
indivíduos com dislipidemia, levando em
conta um programa interdisciplinar e
multiprofissional oferecido a estes pacientes.
Métodos
Participaram deste trabalho 90
indivíduos integrantes do Núcleo de
Pesquisa,
Ensino
e
Assistência
a
Dislipidemia do Hospital Universitário da
Universidade Federal de Santa Catarina
(NIPEAD-HU-UFSC).
Todos
os
participantes deste estudo foram esclarecidos
quanto aos objetivos e procedimentos a que
seria submetido, assinando um termo de
consentimento livre e esclarecido. O trabalho
foi aprovado pelo Comitê de Ética em
Pesquisa da Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC).
A obtenção dos dados foi feita a partir
do exame clínico realizado pelo setor de
cardiologia, onde se investigou a presença de
alguns fatores de riscos coronarianos (FRC)
para DAC como: obesidade, tabagismo,
hipertensão,
dislipidemia,
diabetes
e
sedentarismo, os quais foram associados ao
estado de estresse.
Para análise da obesidade considerouse o índice de massa corpórea (IMC), sendo
que sobrepeso corresponde a valores de IMC
entre 25 e 29,99, obesidade entre30 e 30,99 e
obesidade mórbida nos casos de IMC maior
que 40.
Foram
considerados
tabagistas
indivíduos
que
fumavam
qualquer
quantidade de cigarro todos os dias.
Em relação à pressão arterial, os
valores de referência adotados obedeceram às
recomendações do Joint National Committee
VI, que define como hipertensão arterial
níveis > 90 mmHg de pressão diastólica e >
27
Heinrich, T. A. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 26-33, jan./jun.. 2006
140 mmHg de pressão sistólica11. As pessoas
que estavam com pressão arterial abaixo
desses níveis, mas referiam uso de drogas
anti-hipertensivas,
também
foram
consideradas hipertensas.
Para dislipidemia foram dosados os
níveis de colesterol total (CT) e triglicerídeos
(TG), utilizando método enzimáticocolorimétrico
automatizado,
sendo
considerados elevados a partir de 200mg/dL;
a fração LDL- colesterol (LDL-C), foi obtida
por cálculo, utilizando a fórmula de
Friedewald12, excetuando-se os valores de
triglicerídeos acima de 400mg/dL, sendo esta
considerada elevada a partir de 130 mg/dL; a
fração HDL-colesterol (HDL-C) foi obtida
pelo método de precipitação seletiva
acoplada a dosagem por método enzimático
colorimétrico
automatizado,
sendo
considerada baixa quando foi menor que
40mg/dL. Também foi dosada a glicemia de
jejum pelo método da glicose oxidaseenzimático.
A prevalência de sedentários na
população foi obtida por meio de
questionamentos feitos durante o exame
clínico realizado pela equipe multidisciplinar
e multiprofissional, sendo considerado
sedentário o indivíduo que não realizava
nenhum tipo de atividade física.
A variável do estado de estresse foi
levantada por meio de um questionário de
Lipp, 199613, contendo uma escala de
intervalos de sete pontos,
1- indica
positividade; 2- bem estar; 3-baixa
positividade; 4- marginal; 5- problema de
estresse; 6- sofrimento; 7- sério sofrimento.
O EE negativo foi considerado a partir do
nível quatro.
As
variáveis
quantitativas
foram
expressas em média ± desvio padrão e
percentagens.
Resultados e Discussão
As doenças cardiovasculares levam a
graves implicações para a sociedade,
podendo ser consideradas como problema de
saúde pública. Sendo assim, é importante que
haja um plano de atuação organizado, que
leve a conhecer a etiopatogenia e história
natural dessas doenças, de forma que se
possa atuar na prevenção das mesmas.
Dentro deste contexto, é importante que se
identifique os fatores de risco modificáveis
como:
estresse,
hipertensão
arterial,
obesidade,
tabagismo,
dislipidemia,
sedentarismo e diabetes, de maneira que o
controle efetivo desses fatores possa refletir
em efeitos mais positivos na morbimortalidade dessas doenças14.
Além dos fatores acima referidos,
algumas condições individuais atuam como
fatores
que
proporcionam
maior
vulnerabilidade aos indivíduos, contribuindo
para o desenvolvimento de doenças
cardíacas. Por exemplo, com o aumento da
idade,
aumenta
também
o
risco
cardiovascular. Neste trabalho, a faixa etária
dos pacientes analisados variou entre 28 e 81
anos e a idade média tanto para o sexo
masculino como feminino foi acima de 40
anos (figura1). Isto significa que os
indivíduos em estudo já possuem um fator de
risco não modificável inerente à sua condição
biológica. É de se considerar ainda, que
desde a desde a década de 40, a população
brasileira vem passando por um processo de
inversão das curvas de morbidade e
mortalidade em que se observa um declínio
na mortalidade por doenças infecciosas e um
concomitantemente aumento na mortalidade
por doenças crônicas não transmissíveis,
como as doenças do coração. Esse processo
chamado
fenômeno
de
transição
epidemiológica ocorreu em todos os países
hoje desenvolvidos, onde a população de
idosos é cada vez mais expressiva15.
28
Idade dos pacientes
(anos)
Heinrich, T. A. et al.
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100
80
60
40
20
0
0
20
40
60
80
100
Pacie ntes
Figura 1 - Proporcionalidade da idade dos pacientes atendidos no NIPEAD
A população estudada possui
dislipidemia isolada ou associada a outros
fatores de risco, o que já determina um
processo acelerado de envelhecimento dos
vasos e predispõe esses indivíduos a todas as
condições dessa disfunção. A tabela 1 se
refere ao perfil lipídico dessa população,
mostrando diferenças encontradas nas médias
entre o sexo feminino e masculino, sendo que
as variações mais expressivas foram nos
valores de HDL-C, o que se traduz em menor
risco coronário16.
Tabela 1 - Perfil lipídico de pacientes com dislipidemia pertencentes a uma comunidade
universitária.
Perfil Lipídico
Feminino(n = 53)
Masculino(n = 37)
Total(n = 90)
a
b
a
b
CT (mg/dl)
240,85 + 46,36
225,87 + 39,48
234,82a + 44,39b
c
c
13 7- 362
156 - 341
137 - 362c
HDL-C (mg/dl)
45,40a + 10,35b
35,23a + 10,87b
41,21a + 11,58b
c
c
25,75 - 77,5
21 - 77
21 - 77,5c
a
b
a
b
LDL-C (mg/dl)
167,78 + 41,61
159,42 + 11,21
164,58a + 41,84b
84,8 – 279,4c
89 - 295,8c
84,80 - 295,80c
a
b
a
b
CT/HDL-C
5,49 +1,68
6,88 + 2,16
6,15a + 2,03b
3,2 - 9,69c
3,1 - 11,5c
3,1 - 11,5c
a
b
a
b
TG (mg/dl)
147,77 + 87,45
191,94 + 138,16
165,84a + 112,42b
43 – 548c
51 - 685c
43 - 685c
Onde: amédia; bdesvio padrão; camplitude.
No
entanto,
a
ciência
tem
demonstrado uma grande variedade de
fatores envolvidos no desenvolvimento da
doença, sendo os mais freqüentemente
referidos
a
predisposição
genética,
tabagismo, hipertensão arterial, elevação dos
níveis de colesterol, estresse cotidiano, vida
sedentária do homem moderno, obesidade e
diabetes16.
A figura 2 mostra a prevalência dos
fatores de risco presentes na população
analisada. Percebe-se que na esfera
psicológica, 68 % dos indivíduos estudados
apresentaram o resultado negativo ao
estresse, ou distresse. Considerando que a
população estudada é pertencente a uma
comunidade universitária, é possível que as
situações desgastantes sejam muito mais de
ordem intelectual do que física, levando entre
outros sintomas, a uma tensão crônica,
cansaço e irritabilidade. Provavelmente estas
situações podem provocar uma alteração
indesejável nos níveis de lipídeos. De fato, a
literatura mostra que o estresse provoca
aumento nos valores do CT, LDL-C,
diminuição do HDL-C e o aumento da
pressão arterial, contribuindo assim, para o
desenvolvimento
das
doenças
17-19
cardiovasculares
.
29
Heinrich, T. A. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 26-33, jan./jun.. 2006
68%
Estado de estresse
negativo
59%
Sedentarismo
46%
Hipertensão arterial
Tabagismo
19%
18%
14%
Diabete mellitus
Obesidade
Figura 2 – Prevalência quanto aos fatores de risco analisados para DAC
O atual conhecimento médico no que
diz respeito às causas da hipertensão arterial,
tem enfatizado seu aspecto multifatorial,
resultante de um complexo desequilíbrio no
sistema responsável pela manutenção de um
fluxo e volume sanguíneo satisfatórios e do
tônus da musculatura arterial. O estresse
também tem se destacado na gênese da
hipertensão18,20.
Na tabela 2, pode-se notar que 46%
dos
indivíduos
que
apresentavam
hipertensão,
68,3%
também
tinham
problemas ou sofrimento ao estresse. Esse
alto percentual de indivíduos hipertensos e
estressados mostra que é importante manter o
equilíbrio no dia-a-dia, procurando sempre
melhorar o processo de interiorização de
hábitos saudáveis, aumentando a capacidade
de enfrentar pressões e vivendo mais
consciente e harmônico em relação ao meio
ambiente, às pessoas e a si próprio21.
Tabela 2 – Correlação entre alguns fatores de risco clássicos para DAC e estresse
psicológico.
Parâmetro
Hipertensos
Tabagistas Obesos Sedentários Diabéticos
Considerado
Distresse
68,3 %
64,7 %
76,9%
59%
90%
A prática regular de atividades físicas
faz com que o indivíduo se sinta melhor e
mais disposto para realizar as tarefas diárias,
pois a hipófise aumenta a produção de
endorfina, que é um hormônio responsável
pelo bem-estar, dando a sensação de mais
tranqüilidade e euforia22. Por isso, a
realização de atividades físicas tem um papel
importantíssimo no tratamento e na
prevenção da depressão, da ansiedade e do
estresse, auxiliando na redução de peso,
aumentando os níveis séricos de HDL-C e
diminuindo os níveis de TG20,23,24. Apesar
dos efeitos benéficos dos exercícios físicos,
percebe-se que a população em geral está
progressivamente reduzindo esse hábitos,
seja pelo comodismo da oferta tecnológica
ou por falta de educação para a saúde. Neste
trabalho, 59% da população analisada era
sedentária, sendo que este percentual foi
representado principalmente pelo sexo
masculino. Este fato refletiu certamente nas
menores taxas de HDL-C apresentado pelos
homens (tabela 1). Diga-se que 68% dos
indivíduos sedentários apresentaram também
distresse (tabela 2).
O tabagismo provoca diminuição de
HDL-C, sendo que a nicotina propicia a
liberação de determinadas substâncias que
aumentam a freqüência cardíaca e a pressão
arterial, elevando o risco cardiovascular.
Paradoxalmente o tabaco libera altas doses
30
Heinrich, T. A. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 26-33, jan./jun.. 2006
de "dopamina" e "endorfina" no cérebro,
hormônios que proporcionam sensação de
prazer e reduzem a ansiedade e o estresse.
Embora a prática de esportes, também
estimula a produção de endorfina de forma
natural, o controle do tabagismo é difícil,
pois passa pela sensação de prazer que o
cigarro exerce. Por outro lado, na maioria dos
casos, principalmente quando o indivíduo é
fumante há muito tempo, seu organismo
acostuma-se de tal maneira à nicotina, que a
simples parada de um dia já é suficiente para
provocar dores de cabeça, ansiedade,
nervosismo, e outras reações, associadas à
"síndrome de abstinência da nicotina". Neste
trabalho 19% da população estudada era
tabagista e 64,7% sofria de distresse (tabela
2). Assim, a compreensão dos mecanismos
neurobiológicos
e
comportamentais,
subtendendo as relações entre o tabagismo e
os transtornos de ansiedade, torna-se
necessária para melhorar a assistência médica
prestada ao fumante em abstinência.
O estresse está no rol dos ingredientes
que mais têm contribuído para a deterioração
dos hábitos alimentares saudáveis e para os
problemas de oxidação e dos radicais livres.
O alto consumo de gorduras saturadas,
diminuição da ingestão de carboidratos
complexos e fibras, aliados ao tabagismo e
inatividade física, levam ao aparecimento das
dislipidemias3. Neste trabalho pode-se notar
que 14% dos indivíduos eram obesos e que
desses, 76,9% tinham problemas de estresse
(tabela 2). Dentro deste contexto, cabe ao
nutricionista um importante papel na
orientação e no controle alimentar desses
indivíduos.
A diabete mellitus ataca 7,6% da
população adulta, duplicando a taxa de
mortalidade por doença isquêmica do
coração, quando a glicemia de jejum sobe de
100-109 para 130-139 mg/dL. O estresse atua
na liberação de certos hormônios, que em um
organismo saudável participará das reações
metabólicas em geral. No entanto, em
pacientes diabéticos, onde o organismo
produz pouco ou não produz insulina, a
indução ao estresse aumenta os níveis de
glicose e esta não poderá ser metabolizada
adequadamente. Com isso, pode-se dizer que
o estresse é um potencial contribuidor da
hiperglicemia crônica em diabéticos25. Por
outro lado, constata-se que os efeitos
protetores contra a doença coronariana
naturais do sexo feminino, estão diminuídos
ou praticamente anulados na presença da
diabete26. Sem dúvida, há uma interação
psicológica e comportamental entre a diabete
e o estresse, e ambos passam a ser de
controle mais difícil, aumentando os riscos
das duas doenças. Esta pesquisa mostra que
90% dos indivíduos diabéticos tinham
distresse (tabela 2), mostrando que os
mesmos
necessitam
de
tratamento
continuado tanto para uma patologia quanto
para outra.
Após a identificação e estratificação
dos fatores de riscos para DAC, a proposta
deste Núcleo era de intervir nesses fatores,
com intuito de modificar a evolução natural
dessa doença, tentando evitar a instalação da
mesma (prevenção primária), como também
para impedir ou reduzir o surgimento de
eventos isquêmicos (prevenção secundária e
terciária). Este tipo de conduta tem sido
adotado pelos clínicos que cuidam deste tipo
de pacientes no sentido de regredir as lesões
ateroscleróticas das coronárias14,27.
Contudo, a adesão ao tratamento sofre
muitas influências variáveis relativas ao
paciente, tais como idade, sexo, raça, nível
socioeconômico, escolaridade, hábitos de
vida, aspectos culturais, crenças de saúde,
entre outras28. Estas diferenças trazem um
desafio ao sistema público de saúde,
dificultando o acompanhamento sistemático
dos indivíduos identificados como portadores
desses
agravos,
assim
como
o
desenvolvimento de ações referentes à
promoção da saúde e à prevenção de doenças
crônicas não transmissíveis.
Outrossim, cumpre notar que uma
interpretação em termos do perfil de
evolução das variáveis de um programa
adotado, passa também pela adesão que os
participantes tiveram junto ao programa.
Nesse contexto, programas concomitantes
poderiam auxiliar na manutenção de uma
maior freqüência, permitindo assim melhores
31
Heinrich, T. A. et al.
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resultados29. Neste trabalho, apesar das
palestras ministradas e atividades interativas
desenvolvidas pela equipe interdisciplinar e
multiprofissional, a adesão ao tratamento foi
limitada. A figura 3 mostra que dos 90
indivíduos que compareceram às consultas
cardiológicas, apenas 27% participaram
efetivamente do programa oferecido.
27,00%
63,00%
Participaram
Efetivamente do
Programa
Não participaram
Efetivamente do
Programa
Figura 3 – Percentual de indivíduos que participaram efetivamente do programa oferecido
pelo NIPEAD
Cabe salientar que 53,5% dos indivíduos
que realizaram e participaram efetivamente
do programa, apresentaram uma considerável
melhora nos valores do perfil lipídico e
58,5% melhoram o estado de estresse, sendo
que 52,2% seguiram o tratamento sem ação
medicamentosa.
Conclusões
Conclui-se que o estresse psicológico
pode ser considerado como um importante
fator de risco para DAC, ainda mais quando
somado a outros fatores de risco. Percebe-se
então, a necessidade da intervenção
multiprofissional e interdisciplinar, para sua
detecção e prevenção. Contudo, salienta-se
também, a conscientização por parte das
pessoas a despeito dos problemas que
envolvem os fatores de risco para DAC e a
importância de controlá-los.
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33
Pereira, A. P. do V. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 34-40, jan./jun.. 2006
PERFIL ANTROPOMÉTRICO DOS IDOSOS VINCULADOS AO PROATI –
PROGRAMA DE ATENÇÃO Á TERCEIRA IDADE DA PREFEITURA MUNICIPAL
DE FLORIANÓPOLIS
Ana Paula Warken do Valle Pereira1; Ileana Arminda Mourão Kazapi2
Resumo: Avaliou-se o perfil antropométrico dos idosos do PROATI. Obteve-se os dados
antropométricos de 149 idosos (10 homens e 139 mulheres) referentes ao peso, altura, circunferência
da cintura e relação cintura e quadril. Foi encontrado pré - obesidade em mulheres encontradas nas
regiões sul (52,9%) e leste (41,37%). A relação cintura e quadril foi semelhante ao da circunferência
da cintura (90%), sendo encontrado em todos os grupos pesquisados valores acima do nível máximo
de adequação em 95% dos entrevistados. Encontrou-se uma alta prevalência de sobrepeso e obesidade
que pode Ter contribuído para o aumento dos valores dos outros indicadores.
Palavras-chave: Idosos, perfil antropométrico, estado nutricional
Abstract: The anthropometric profile of elderly citizens assisted by proati was evaluated.
Anthropometric data from 149 elderly (10 men and 139 women) were collected: weight, height, waist
circumference and wais-hip ratio. Pre-obesity was found in women from the southern and eastern
regions (52,9% and 41,37%). Waist-hip ratio presented similar results to waist circumference (90%),
all groups researched presented adequacy values above 95%. The high percentages of overweight and
obesity may have contributed to the increased values of other indicators.
Keywords: Elderly, anthropometric profile, nutritional status
Introdução
Para a OMS (Organização Mundial da
Saúde), é considerado idoso o indivíduo que
tiver 60 anos ou mais nos países em
desenvolvimento, e 65 anos ou mais nos
países desenvolvidos.
Desde o final do século passado, o
Brasil vêm assistindo a um acelerado
crescimento da população idosa.
Dados estatísticos demonstram que
esse segmento no país passará dos 12
milhões existentes hoje, para 32 milhões no
ano de 2025. O Brasil passará a ocupar o 6º
lugar na escala mundial de população
idosa.(IBGE, 2000)1
O crescimento do grupo etário de
pessoas com mais de 60 anos no Brasil é
evidente e exige um planejamento que atenda
a demanda. No nosso país, onde as
características da população variam de região
para região, é preciso que se conheça a
população local para favorecê-la de acordo
com a realidade. Por isso tem-se direcionado
a ação na busca de novas formas de
atendimento ao idoso.
A nutrição e a alimentação na terceira
idade ainda são áreas pobres em
investigação, sendo pouco exploradas e não
tendo recebido a atenção que lhes é devida.
Em alguns países desenvolvidos, muitas
pesquisas têm sido feitas, visando a
identificar o consumo alimentar de idosos.
Na América Latina, particularmente no
Brasil, essas investigações praticamente
inexistem.(Najas, 1994)2
Em idosos no entanto, torna-se mais
complexa a análise do estado nutricional em
virtude da maior heterogeneidade entre os
indivíduos deste grupo (Goodwin, 1989)3 e
do fato de seu valor preditivo estar atrelado a
um conjunto de fatores não apenas
relacionado às mudanças biológicas da idade,
doenças e mudanças seculares, como também
às práticas ao longo da vida (fumo, dieta,
atividade física) e aos fatores sócioeconômicos (WHO, 1995)4.
___________________
1
2
Acadêmica do Curso de Graduação em Nutrição da UFSC
Orientadora. Professora do Curso de Graduação em Nutrição da UFSC
34
Pereira, A. P. do V. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 34-40, jan./jun.. 2006
As mudanças fisiológicas que interferem no
estado nutricional são: alterações no sistema
digestório, a diminuição do metabolismo
basal e alterações sensoriais, redução da
sensibilidade por gostos primários doce,
salgado, amargo e ácido. Devido a isto, a
maioria das pessoas comem menos, em
conseqüência, a ingestão de nutrientes pode
ser mais baixa que o recomendado,
sugerindo, então deficiência de nutrientes
essenciais. Para Moreira (1995) a
alimentação e o estado nutricional podem
estar associados com o processo de
envelhecimento e estilo de vida. ( Monteiro,
2004)5
Um bom estado nutricional pode
encurtar as estadias em hospitais e retardar a
entrada em casa de repouso e menos
mortalidade. (Krause, 1999)6
No entanto as poucas pesquisas
realizadas revelaram que a situação
nutricional dos idosos sofreu uma grande
alteração. Nos últimos 15 anos estima-se uma
redução de 36% no grupo de baixo peso, com
aumento maior dos casos de sobrepeso e
obesidade, em ambos os sexos, tendo
reduzido
o
número
de
indivíduos
eutróficos.(Campos, 2000)7
Segundo Passero, 20038 mantendo os adultos
mais velhos em bom estado nutricional,
pode-se ajudá-los a manter sua saúde e
independência diminuindo, com isso, as
demandas dos cuidados institucionais e a
melhorar a qualidade de vida. A importância
de um bom estado nutricional na manutenção
da independência, entre os idosos, não se
pode ser exagerada. Ficar velho não precisa
ser peso para sociedade, mas atenção maior
com a saúde é necessária.
O estudo em questão irá avaliar o
estado nutricional dos idosos residentes das
comunidades onde atua o PROATIPrograma de Atenção á Terceira Idade,
programa da Prefeitura Municipal de
Florianópolis que atua junto aos idoso desde
1979, através da formação e organização de
grupos de convivência e atividade física,
oportunizando espaços de convívio, de
expressão,
reflexão
e
aprendizagem,
buscando a valorização pessoal e social do
idoso.
Acredita-se na importância deste
estudo, visto que é de suma importância
conhecermos o perfil dos idosos que habitam
o município de Florianópolis para que
futuramente se possa aplicar ações mais
diretas e dinâmicas, bem como a criação de
políticas públicas para esse significativo
segmento da nossa sociedade.
Métodos
Material:
População: A população deste estudo contou
com todos os idosos acima de 60 anos que
freqüentam os grupos de convivência e
atividade física vinculados ao Programa de
Atenção á Terceira Idade, programa da
Prefeitura Municipal de Florianópolis, que
atua junto aos idoso desde 1979, através da
formação e organização de grupos de
convivência e atividade física, oportunizando
espaços de convívio, de expressão, reflexão e
aprendizagem, buscando a valorização
pessoal e social do idoso. A referida
população no ano de 2003 era de 845 idosos.
SELEÇÃO DOS SUJEITOS: A escolha dos
idosos que foram alvo da pesquisa seguiu o
perfil dos idosos cadastrados nos grupos de
atividade física e convivência no ano de
2003/2004, conforme o sexo, aplicando-se o
percentual de 20% em cada grupo de acordo
com o quadro abaixo; alguns grupos
ultrapassaram este percentual e não se
excluiu o idoso voluntário. Este percentual
totalizou 149 idosos distribuídos em 4
regiões conforme tabela abaixo.
35
Pereira, A. P. do V. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 34-40, jan./jun.. 2006
Quadro 1– Nome e local dos grupos pesquisados de acordo com a região e o número de
idosos entrevistados por sexo.
REGIÃO
Central
Norte
Leste
Sul
Nome
Grupo
do Comunidade
Nº
de
participantes
do
sexo
masculino
Judas Morro da caixa 02
São
Tadeu
Rainha
da
Gloria
A
Grande
Família
Esperança
Alegria
de
Viver
Entrevistado Entrevistado
s do sexo s do sexo
masculino
feminino
-
03
BalneárioEstreito
Centro
-
38
-
08
-
45
-
09
Chico Mendes
Mocotó
-
10
17
-
03
04
Saco
dos
limões
Renascer
Canasvieiras
Primavera
Barra da Lagoa
Esperança
Ingleses
Vó Itelvina
Rio Vermelho
Alegria
de Jurerê
Viver
Cantinho
da Pontas
das
Amizade
Canas
Vida Esperança Saco Grande II
N.
Sra. Sambaqui
Aparecida
Renascer
Sto. Antônio de
Lisboa
Renovação
Monte Verde
Amor e União Ribeirão
da
Ilha
Amizade
Costeira
do
Ribeirão
Com Vivência Morro
das
Pedras
N. Sra. Fátima Costa
de
Dentro
Sempre Unidos Tapera
N. Sra. Fátima Rio Tavares
Trevo
Alto Ribeirão
II
Alegria
Alto Ribeirão I
Fazenda do Rio Rio Tavares
Tavares
Felicidade
Campeche
Raio de Sol
Carianos
Unidas
do Alto Ribeirão
Canto
TOTAL
Nº
de
participantes
do
sexo
feminino
14
03
05
01
04
-
28
28
50
36
23
01
01
-
06
06
10
07
05
-
29
-
06
04
38
34
01
08
07
03
44
01
09
-
19
22
-
04
04
07
23
02
05
02
17
-
03
01
11
-
02
03
02
31
08
17
01
-
06
02
03
03
05
23
28
01
01
05
07
06
02
21
37
28
01
-
04
07
06
51
719
10
149
36
Pereira, A. P. do V. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 34-40, jan./jun.. 2006
Avaliação do estado nutricional
Índice de Massa Corporal (IMC) ou Índice
de Quetelet (Kg/ m²)
O Índice de massa corporal (IMC) é um
indicador que vem sendo incorporado aos
estudos nutricionais de caráter populacional.
Ele é um indicador do estado nutricional
atual, utilizado em avaliação do estado
nutricional de adultos.
Para as medidas antropométricas foi
verificado o peso através da balança
eletrônica pessoal, marca: Tech Line, modelo
Tec 10 com capacidade até 136Kg, a estatura
foi mensurada utilizado uma fita métrica
milimetrada, afixada na parede a 50 cm do
chão, e uma régua milimetrada.
Para a classificação do estado nutricional
segundo o IMC utilizou-se a classificação
proposta pela World Health Organization
(1998) sendo esta apresentada abaixo:
Tabela 1 - Classificação do estado nutricional segundo o IMC (WHO, 1998)9
Classificação
IMC (Kg/m²)
Baixo peso
< 18,5
Eutrofia
18,5 – 24,9
Sobrepeso
>= 25
Pré-obesidade
25 – 29,9
Obesidade grau 1
30 – 34,9
Obesidade grau 2
35,0 – 39,9
Obesidade grau 3
<= 40
Relação Cintura/ Quadril (RCQ)
Circunferência da cintura
A relação da circunferência da cintura ou
abdominal e do quadril ou glútea tem sido o
índice mais utilizado para averiguar a
distribuição local de tecido adiposo regional,
que é parcialmente independente da
adiposidade total. Esta relação esta associada
a risco de doenças crônicas não
transmissíveis.
Determinou-se a circunferência da cintura
através da área mais estreita, acima do
umbigo, e a do quadril, sobre a protusão
máxima dos glúteos.
Foi utilizado o ponto de corte para risco
de acordo com Bray (1991)10, onde para
homens é > 0,95 e mulheres > 0,80.
Esses limites são compatíveis com
especificidade entre alta e moderada,
conseqüentemente com uma taxa de falsopositivos reduzida.
Nesse estudo classificaremos os idosos
quanto a presença ou ausência deste fator de
risco.
A circunferência da cintura foi
determinada através da área mais estreita,
acima do umbigo. Os pontos de corte para
riscos adotados foram os preconizados por
Han e cols. (1995), onde para homens a
circunferência da cintura é > 94cm e para as
mulheres é > 80cm.
Coleta de dados
A coleta de dados foi realizada nos
dias e horários de reunião dos grupos (14:00
às 17:00 hs). A coleta de dados teve início
em agosto de 2003 e término em julho de
2004. Os dados foram agrupados pela
planilha eletrônica Excel. Os resultados
foram expressos em número absoluto e em
percentual e apresentados através de gráficos
e tabelas.
A pesquisa em questão obteve o
parecer do Comitê de Ética da Universidade
Federal de Santa Catarina em pesquisas com
seres humanos de acordo com a legislação
vigente sendo os resultados tornados públicos
sendo eles favoráveis ou não, preservando o
sigilo da identidade dos participantes.
37
Pereira, A. P. do V. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 34-40, jan./jun.. 2006
Resultados e discussão
A tabela 1 mostra o estado nutricional
dos idosos onde se verificou uma tendência
de maior prevalência de sobrepeso e
obesidade em ambos os sexos. As alterações
nutricionais observadas não apresentam
grande variação entre as regiões do
município, sendo as maiores prevalências de
pré - obesidade em mulheres encontradas nas
regiões sul (52,9%) e leste (41,37%).
A tendência de aumento do sobrepeso
tem sido
acompanhada em
países
desenvolvidos,
questionando-se
suas
implicações na morbi-mortalidade futura,
particularmente
em
populações
que
envelhecem (Kuczs-marski et al, 1994)11.
Os índices de sobrepeso elevados
confirmam a tendência encontrada em um
estudo realizado por Tavares em 1999 que
teve com base os dados da Pesquisa Nacional
sobre Saúde e Nutrição de 1989 onde se
identificou desse problema em mulheres
idosas brasileiras, principalmente das regiões
sul (23,3%) e Sudeste (21,9%). Segundo esse
autor, esses dados se aproximam a de países
da Europa com altas prevalências de
sobrepeso. O sobrepeso é um problema
eminentemente urbano, com algumas
diferenciações por região. Na região sul do
Brasil, o excesso de peso em mulheres é
também elevado na área rural.
Ainda não há consenso sobre o
impacto do sobrepeso na longevidade, porém
vêm-se encontrando associações deste
problema com mortalidade em idosos e
questionando-se
sua
relação
com
incapacidade, que nestes indivíduos significa
autonomia, favor imprescindível para uma
boa qualidade de vida. (PopKins, 1994)12
Segundo Popkins (1994)12, esse
processo estaria acontecendo pelo aumento
proporcional do consumo de dietas
caracterizadas com risco para doenças
crônicas. Tem–se mais intenso justamente
nas camadas sócio –
econômicas
intermediárias e baixas, situação que sinaliza
a obesidade como questão de saúde pública e
a necessidade de adoção de políticas
preventivas (Monteiro et al, 1995)5.
TABELA 1- Avaliação do estado nutricional de acordo com sexo dos grupos de idosos por região,
segundo classificação do IMC, estabelecida pela FAO/OMS - 98, Florianópolis, 2004.
ESTADO
NORTE
NUTRICIONAL
M
n(%0)
Baixo peso
Eutrofia
1(100)
Sobrepeso
Pré-obesidade
-
F
n(%)
0
16(38,09)
1(2,38)
14(33,33)
Obesidade G1
Obesidade G2
TOTAL
9(23,8)
1(2,3)
41(100)
1(100)
CENTRO
E
CONTINENTE
M
F
n(%)
n(%)
0
7(26,08)
2(8,69)
10(30,43
)
7(26,08)
2(8,69)
28(100)
A proporção da circunferência de
cintura e quadril tem sido usada em estudos
populacionais, como uma preditora de risco
de doenças cardiovasculares. O aumento da
adiposidade central está associada com o
aumento de doenças crônico degenerativas e
maiores riscos de mortalidade. ( Passero,
2003)8
De acordo com a relação da cintura e quadril,
observamos que o resultado foi semelhante
SUL
NORTE
M
n(%)
3(50)
2(33,33)
F
n(%)
1(1,96)
11(23,52)
0
24(52,94)
M
n(%)
1(56)
-
F
n(%)
0
11(41,37)
1(3,44)
10(41,37)
1(16,66)
6(100)
6(15,68)
3(5,88)
45(100)
1(50) 4(13,79)
0
2(100) 26(100)
ao da circunferência da cintura, sendo
encontrado em todos os grupos pesquisados
valores acima do nível máximo de adequação
em 95% dos entrevistados (Tabela 2).
Segundo Machado, 200413 este dado
isoladamente ou associado com
a
circunferência da cintura caracteriza mais um
fator
de
risco
para
problemas
cardiovasculares.
38
Pereira, A. P. do V. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 34-40, jan./jun.. 2006
TABELA 2- Presença e ausência de risco para problemas cardiovasculares de acordo com a relação
da circunferência da cintura e do quadril nos grupos de idosos por região, Florianópolis, 2004.
GRUPOS
NORTE
Risco
Ausência
TOTAL
M
n (%)
2(100)
0
2(4,76)
F
n (%)
39(97,5)
1 (2,5)
40(100)
CENTRO
E SUL
CONTINENTE
M
F
M
n (%) n (%)
n (%)
0
27(96,4)
3(50)
0
1(3,57)
3(50)
0
28(100)
6(100)
Segundo
Machado,
200413
a
circunferência da cintura isoladamente ou
associado com a relação da cintura e do
quadril caracteriza mais um fator de risco
para problemas cardiovasculares.
Podemos verificar através da tabela 3 que na
maioria dos grupos mais de 90% dos
entrevistados apresentaram valores de
circunferência de cintura acima do nível
máximo de adequação. Esse resultado vem
de encontro aos achados por Machado, 2004,
onde foram analisados 50 idosos do bairro de
LESTE
F
n (%)
43(95,5)
2
45(100)
M
n (%)
2(100)
0
2(100)
F
n (%)
26(100)
0
26(100)
Copacabana no RJ, sendo encontrado em
68% dos homens e 60% das mulheres
medidas de circunferência de cintura acima
do recomendado.
Essa situação foi observada também
na pesquisa desenvolvida com 30 pessoas
idosas residentes de uma comunidade de
baixo nível sócio - econômico da cidade de
Curitiba onde 53,3% dos entrevistados
encontram-se acima de 100% do padrão de
normalidade para relação cintura e quadril.
TABELA 3- Presença e ausência de risco para problemas cardiovasculares de acordo com a
circunferência da cintura nos grupos de idosos por região, Florianópolis, 2004.
GRUPOS
NORTE
Risco
Ausência
TOTAL
M
n (%)
2(100)
0
2(100)
F
n (%)
36(90)
4(10)
40(100)
CENTRO
E SUL
CONTINENTE
M
F
M
n (%)
n (%)
n (%)
0
28(100)
3(50)
0
0
3(50)
0
28(100)
6(100)
Conclusão
A pesquisa em questão buscou
correlacionar
diversos
fatores
que
identificam o perfil nutricional de diferentes
regiões do município de Florianópolis.
De acordo com a população estudada
podemos
observar
que
o
perfil
antropométrico não apresentou grande
alteração entre as regiões do município de
Florianópolis.
Quanto ao estado nutricional foi
verificado um alto percentual de sobrepeso e
obesidade em ambos os sexos, este fator
consequentemente atuou negativamente para
o aparecimento de valores acima do limite
também em relação à circunferência da
cintura e a relação cintura quadril em todas
as regiões. Tal quadro é preocupante pois
favorece o aparecimento de doenças crônico
LESTE
F
n (%)
42(93,3)
3(6,6)
45(100)
M
n (%)
2(100)
0
2(100)
F
n (%)
25(96,1)
1(3,8)
26(100)
degenerativas como diabetes, hipertensão e
doenças cardiovasculares.
Porém considerando que as pessoas
idosas constituem uma população de risco
por apresentar alterações fisiológicas,
particularidade de seus hábitos alimentares e
déficit do estado nutricional devemos praticar
ações e adotar medidas preventivas que
mudem esta realidade já que estes são fatores
modificáveis, a fim de melhorar a qualidade
de vida desta população.
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Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 41-47, jan./jun.. 2006
A RELAÇÃO OBESIDADE MÓRBIDA E QUALIDADE DE VIDA: EXPLORANDO O
ESTADO DA ARTE [Relation between morbid obesity and quality of life: exploring the
state-of-the art]
Sérgio Ricardo Pasetti1; Aguinaldo Gonçalves 2
Resumo: A obesidade, considerada epidemia mundial, atinge todas as idades e classes sociais. Este
agravo compromete a saúde e a Qualidade de Vida (Q.V.) do indivíduo, podendo também elevar
gastos financeiros com saúde pública. Os métodos utilizados para combate ao excesso de peso são:
controle alimentar, medicamentos, cirurgias e exercícios físicos. Este trabalho tem como objetivo
pontuar, através da revisão da literatura, as formas de tratamento para controle da obesidade e as
contribuições da atividade física para evolução da Q.V. de obesos. A literatura indica que exercícios
físicos contribuem para redução do peso e melhora da Q.V.
Palavras-chave: obesidade, qualidade de vida, métodos de tratamento e controle da obesidade.
Abstract: Obesity, considered as world epidemics, touches all ages and social classes. This disorder
impairs individual health and Quality of Life (QOL) and can also raise public health financial
expenditures. Methods adopted to fight weight excess comprise: diet control, medicines, surgeries and
physical exercises. The purpose of this work is to point out, through literature review, treatment forms
for obesity control and physical activity contribution to obese QOL. Literature indicates that physical
exercises contribute to weight reduction and QOL improvement.
Keywords: obesity, quality of life, treatment methods and obesity control
Introdução
A obesidade, tida como acúmulo
excessivo de gordura e não somente excesso
de peso além daquele considerado normal
para a idade, sexo e tipo corporal, é avaliada
pela Organização Mundial de Saúde (OMS)
como um dos maiores problemas de saúde
pública no mundo. 1,2 O agravo em questão
também
pode
ser
definido
como
armazenamento em demasia de energia no
tecido adiposo. 3
Através do índice de massa corporal
(IMC) pode-se determinar se um indivíduo
apresenta concentrações elevadas de células
gordurosas. O IMC é determinado dividindose o peso da pessoa (em quilogramas) pelo
quadrado de sua altura em metros; valores
acima de 30 kg/m² são definidos como
obesidade. 4 É importante ressaltar que este
valor é de referência e não há como saber se
o que o avaliado possui uma grande massa
muscular ou não. 5
_____________
Quanto à massa corporal, o sujeito
com 20% acima do peso-padrão em relação
ao sexo, altura e estrutura corporal é
classificado como obeso. 6
A mesma
identificação é dada para homens e mulheres
com percentual de gordura superior a 20% e
30%, respectivamente.5
Trata-se de afecção que se desenvolve
a partir de fatores genéticos, sociais,
comportamentais e culturais.7 Alimentação,
imagem corporal, mudanças demográficas,
sócio-econômicas e epidemiológicas e
diferenças bioquímicas relacionadas à taxa
metabólica de repouso também devem ser
considerados. 8,9
Os riscos da doença incluem
hipertensão, diabetes mellitus, problemas
cardiovasculares, apnéia noturna, lesões
articulares degenerativas e hipóxia crônica.
Há também acréscimo na probabilidade de
mortalidade causado por câncer endometrial
em mulheres e colorretal em homens.10
1
Mestre em Ciências do Esporte. Faculdade de Educação Física. Universidade Estadual de Campinas.
E-mail: [email protected]
2
Prof. Titular do Departamento de Ciências do Esporte. Faculdade de Educação Física. Universidade Estadual
de Campinas. E-mail: [email protected]
Agradecimentos CNPq (130874/04-3); FAEP / UNICAMP (491/03) e FAPESP (03/06366-5).
41
Pasetti, S. R. et al.
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As principais causas envolvidas são o
consumo crescente de dietas com alta
densidade energética, ricas em lipídios
saturados e açúcares, além de atividade física
reduzida. 11 É condição complexa, com sérias
dimensões sociais e psicológicas, que afetam
praticamente todos os grupos etários e
socioeconômicos,
tanto
em
países
desenvolvidos como em desenvolvimento.12
O impacto da moléstia está dobrando
a cada cinco a dez anos em algumas regiões
do mundo. 13 Essa situação traz enorme ônus
financeiro aos sistemas de saúde pública,
hoje já bastante sobrecarregados.11 Nos
Estados Unidos cerca de dez por cento do
orçamento
anual
para
a
saúde,
aproximadamente US$ 100 bilhões, são
gastos com doenças relacionadas a este
distúrbio. 14 Em nosso país os serviços de
saúde gastam cerca de R$ 1,45 bilhões anuais
com o problema. 15
Em 1995 havia estimativa de 200
milhões de obesos adultos no mundo; em
2000 este número aumentou para mais de
300 milhões. Estima-se que há mais de um
bilhão de adultos com excesso de peso. 11 Na
maioria dos países europeus a prevalência
desta
população
tem
crescido
em
aproximadamente 10 a 14 % nos últimos dez
anos. 16
Nos Estados Unidos um terço da
população está acometida, sendo um por
cento, aproximadamente (cinco milhões),
com forma clínica severa.17 No Brasil,
segundo a Pesquisa de Orçamentos
Familiares 2002-2003 do IBGE, cerca de
40% dos adultos (38,8 milhões) apresentam
algum grau de excesso de peso, 27% dos
quais são considerados casos mais graves.18
Em 2000 a prevalência aumentou no nordeste
e nas faixas de menor poder aquisitivo.19
Três anos depois o número total de casos
tornou-se superior nas regiões Sul e Sudeste
do Brasil. 18
Entre
adolescente
e
crianças
brasileiros a situação também é grave; entre
os 6 a 18 anos de idade, existem ao menos
6,7 milhões de ocorrências. 15 Entre os
jovens de poder aquisitivo mais elevado
observam-se as maiores taxas de sobrepeso e
acúmulo de gordura. 20
Frente a tal realidade, o objetivo da
presente comunicação consiste em apresentar
através da revisão da literatura formas de
tratamento para controle deste agravo e,
posteriormente, pesquisas envolvendo a
prática de atividade física e melhora da
Qualidade de Vida.
Os distintos métodos de tratamento e
controle da obesidade – uma breve
caracterização
Com orientação e apoio de médicos,
psicólogos, nutricionistas, professores de
Educação Física, familiares e amigos, obesos
podem melhorar sua saúde geral. Atualmente
há vários recursos utilizados, sobretudo: 14
Métodos Cirúrgicos
Procedimento baseado em restrição
e/ou mal-absorção dos alimentos ingeridos, é
indicado para indivíduos com IMC igual ou
superior a 40Kg/m². 21 São reconhecidas três
técnicas: 22 i) gastroplastia vertical com
bandagem (há o fechamento de uma porção
do estômago através de sutura, resultando em
diminuição do reservatório gástrico; um anel
de contenção é colocado no orifício de saída,
tornando o esvaziamento mais lento); ii) Lap
Band (aplica-se banda regulável na porção
alta do estômago, criando uma pequena
câmara esofágica, cuja passagem é ajustada
por mecanismo percutâneo de insuflação) e;
iii) gastroplastia com derivação gastrojejunal (envolve redução do reservatório
gástrico, restrição ao seu esvaziamento e
pequeno prejuízo na digestão por derivação
gástrica-jejunal).
Medicamentos
O tratamento farmacológico é
indicado para indivíduos com IMC superior a
30 Kg/m² ou maior que 27 Kg/m², quando
houver alguma complicação (diabetes e
hipertensão). 14 Este tipo de intervenção
justifica-se apenas em conjunção com
42
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orientação dietética e mudanças no estilo de
vida. 23
Nos Estados Unidos apenas dois
fármacos são aceitos pelos FDA (órgão
norte-americano que permite liberação e
comercialização de remédios e alimentos)
para uso a longo prazo, a saber: Sibutramina
- inibidor da captação de serotonina e
noradrenalina, contribui para manutenção do
peso perdido entre seis a 18 meses; as
conseqüências do seu uso consistem em
elevação da pressão arterial média entre 3-5
mmHg e freqüência cardíaca de repouso
aumentada (2 a 4 batimentos por minuto),
Orlistat - Inibidor da lipase que age no trato
gastrintestinal, diminuindo a absorção de
gordura; há redução das lipoproteínas de
baixa densidade (LDL) e da pressão arterial
sistólica. A desvantagem é perda da absorção
das vitaminas lipossolúveis A, D, E e K. 14, 23
No Brasil, além da sibutramina e
orlistat, são registrados no Ministério da
Saúde como agentes anti-obesidade a
dietilpropiona, fendimetrazina, mazindol, e
fentermina. 23, 24 Estes quatro medicamentos
são estimulantes do sistema nervoso central e
causam supressão do apetite.25
semanal de 0,5 – 0,9 Kg de maneira saudável
e possível, já que diminuições elevadas e
rápidas de peso não são efetivas. 14, 28
Dietas
A relação obesidade versus qualidade de
vida
No manejo deste conjunto de
condutas, parte-se do princípio que para
conseguir a diminuição da massa gordurosa é
necessário um balanço energético negativo,
ou seja, o gasto supera o consumo de energia.
26
Para isso consideram-se três componentes
da equação de balanço energético, onde gasto
energético = taxa metabólica basal + energia
gasta nas atividades físicas + efeito térmico
do alimento.27
A taxa metabólica basal depende da
idade, sendo determinada pelo total de massa
magra; o segundo componente decorre da
intensidade e da duração do exercício físico e
o último item, também denominado de
termogênese de indução dietética, envolve o
processo de digestão, absorção e assimilação
dos nutrientes. 27
A restrição calórica deve estar entre
1000 – 1500 Kcal/dia, o que permite redução
Exercícios Físicos
Importantes
para
melhora
e
manutenção da saúde, por promoverem
alterações
significativas
no
sistema
cardiorrespiratório, imunológico, endócrino,
possibilitam redução da gordura corporal,
ganho de massa muscular e óssea e
prevenção de doenças degenerativas. A
prática regular de exercícios produz
adaptações morfofuncionais, beneficiando a
capacidade funcional e laborativa do
indivíduo.29
Evidências epidemiológicas sugerem
associação inversa entre a atividade física e o
peso, pessoas fisicamente ativas possuindo
distribuição mais favorável da gordura
corporal. 3 O exercício físico é reconhecido
como componente essencial de qualquer
programa de redução ou controle de peso;
quanto mais se pratica, maior o consumo
diário de energia e mais rapidamente se
controla o agravo. 5,30
A Qualidade de Vida (Q.V.) diz
respeito ao cotidiano das pessoas,
envolvendo saúde, transporte, educação,
moradia, trabalho e participações nas
decisões que lhes dizem respeito. Ao usar o
termo Q.V. pode-se estar indicando, entre
outros, bem estar pessoal, posse de bens,
participações em deliberações coletivas, ou
seja, a palavra é utilizada para inúmeros
sentidos.31 Um dos mais utilizados é o da
OMS como percepção do indivíduo de sua
posição na vida, no contexto da cultura e do
sistema de valores em que vive e em relação
aos seus objetivos, expectativas, padrões e
preocupações. 32
Nesta definição observam-se duas
concepções importantes para compreender
Q.V.: caráter subjetivo (como o indivíduo
percebe suas condições físicas, emocionais,
43
Pasetti, S. R. et al.
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culturais e sociais) e objetividade das
condições materiais (posição na vida e as
relações estabelecidas nessa sociedade). 33 A
abordagem conceitual da OMS é tendência
observada nos diferentes instrumentos de
avaliação pessoal de Q.V. 32
Para medir Q.V., de acordo com os
objetivos e populações a serem estudados,
existem mais de mil instrumentos
específicos.34 Os mais utilizados são:
WHOQOL-100 desenvolvido pela OMS ,
para populações em geral 32 e o Medical
Outcome Study Sort Form-36 (SF-36) 35,
destinado predominantemente para pesquisas
clínicas.
Há instrumentos específicos para
avaliar a Q.V. de obesos, nomeadamente o
Impact of Weight on Quality of Life
Questionnaire (IWQOL) questionário de
impacto do peso na qualidade de vida;
IWQOL-Lite (versão abreviada do IWQOL);
o Bariatrics Analysis and Reporting Outcome
System (BAROS) aplicado em pessoas
submetidas a cirurgias bariátricas; o Obesityrelated Well-being Scale (ORWELL), que
tem a finalidade de avaliar a escala de bem
estar e o Obesity Related Psychosocial
Problems (OP) para problemas psicosociais
relatados na obesidade. 7
Estudos apontam relação inversa
entre o grau de acúmulo de gordura em que o
indivíduo se encontra e sua Q.V., ou seja,
quanto maior a quantidade de peso menor
será sua percepção; por outro lado, quando
há redução do peso corporal há expressiva
melhora desta condição. 36-38
Obesos, inseridos em qualquer
programa ou tratamento, ao reduzirem seu
peso terão avanço da percepção de Q.V. 39 O
controle alimentar com baixo consumo
calórico aliado a prática de atividades
aeróbias ou resistidas torna-se mais eficiente
no aperfeiçoamento da Q.V., além de
contribuir para aprimoramento da aptidão
física principalmente nos praticantes de
exercícios aeróbios.40 Em qualquer faixa
etária, a inclusão de dietas parece ser mais
eficaz para o tratamento.41 Em crianças
obesas a percepção de Q.V. também é
comprometida, sendo semelhante àquelas
com diagnóstico de câncer.42
Foi estudada a Q.V. de 82 pacientes –
18 a 70 anos – antes e após seis, doze e vinte
e quatro meses de cirurgia de gastroplastia.
Durante este período notou-se redução do
peso e progresso na Q.V. em relação ao
período pré-operatório e quanto maior o
tempo pós-cirúrgico mais favoráveis foram
os resultados. Os pesquisadores concluíram
que pode haver expressiva evolução da Q.V.
e perda significativa do peso após este tipo
de intervenção. 43
Em pesquisas longitudinais, os
instrumentos Depression and Anxiety
Subscales of the Brief Symptom Inventory;
Life Distress Scale; Life Satisfaction Scale;
Rosenberg Self-Esteem Scale e SF-36 foram
aplicados para verificar os efeitos da raça,
sexo, climatério e redução do peso sobre a
Q.V. Entre americanos brancos e negros
obesos não se registraram diferenças na
percepção de Q.V.; quando há redução de
10% do peso, a evolução da Q.V. ocorre de
maneira semelhante entre os dois grupos. 7
Em mulheres com excesso de gordura
corporal, na pré-menopausa e pós-menopausa
observa-se menor satisfação na vida e
maiores níveis de estresse no primeiro grupo
do que no segundo.44 Em relação ao sexo,
homens
possuem
escores
superiores
enquanto elas indicam maiores problemas
psicosociais. Após programa de redução de
peso, ambos demonstraram melhoras
significativas; em alguns estudos eles
atingiram scores bem superiores. 7
Para indivíduos com a forma
mórbida, métodos cirúrgicos como a
gastroplastia contribuem para redução do
peso e aprimoramento da Q.V. com
resultados mais favoráveis quanto maior o
tempo pós-cirúrgico. 45 A obesidade afeta a
percepção de Q.V., mas o impacto do
sobrepeso e excesso de peso também
interferem nesta percepção de acordo com a
faixa etária e sexo. 46
Portanto não apenas aspectos de
ordem física devem ser considerados. A
questão psicológica também é relevante no
tratamento destes casos: problemas de agravo
44
Pasetti, S. R. et al.
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mental não podem ser excluídos de
respectivos estudos, assim como gastos com
saúde e conseqüências sociais a médio e
longo prazo.
Conclusão
Há vários métodos para controle e
combate da obesidade, nomeadamente dieta,
medicamentos, atividade física e, em casos
extremos, cirurgias. Aliar estes recursos a
instrumentos que avaliem a percepção de
qualidade de vida mostra-se necessário e
deve fazer parte do tratamento; os resultados
podem ser mais expressivos e precisos.
É interessante salientar que a
efetividade do controle e combate ao
acúmulo excessivo de gordura depende da
aderência do acometido, apoio familiar,
integração multidisciplinar, mudanças sociais
que propiciem condição de vida mais
saudável.
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Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 48-54, jan./jun.. 2006
CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO MULTIPROFISSIONAL EM SAÚDE DA FAMÍILA
DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA COMO PRÁTICA DE
UMA EDUCAÇÃO REFLEXIVA: LIMITES E POSSIBILIDADES [Multidisciplinary
specialization in family health hourse of the Federal University of Santa Catarina as a
reflexive education exercise: limits and possibilities]
Antônio de Miranda Wosny1; Candice Boppré Besen2; Fernanda Werner da Silva3;
Jurandyr Veiga Mello Filho4; Mônica de Souza Netto5
Resumo: Este artigo apresenta uma reflexão sobre o Curso de Especialização Multiprofissional em
Saúde da Família realizado na Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC. Objetiva contribuir
para a consolidação da Política Nacional de Educação Permanente em Saúde proposta pelo Ministério
da Saúde. A partir da análise da segunda edição do curso, pretende-se refletir sobre mudanças
necessárias nos processos de formação de profissionais e de trabalho, especialmente, aquelas
relacionadas à Estratégia Saúde da Família.
Desta forma, busca-se estimular um modelo de formação profissional alicerçado numa prática
multiprofissional, interdisciplinar e intersetorial, e contribuir de maneira crítica e construtiva para
melhorar este processo.
Palavras-chave: recursos humanos em saúde, saúde da Família, interdisciplinaridade.
Abstract: This article proposes a reflexion about the Multidisciplinary Specialization in Family
Health of the Federal University of Santa Catarina. It’s objective to contribute to consolidate the
National Policy of Health Permanent Education developed by the Brazilian Ministry of Health.
Starting from the analysis of the 2nd edition of that course, it’s intention to reflect about necessary
changes in the professional education and work process, specially in the Family Health Strategy.
Therefore, it’s intention to stimulate the transformation of the professional education model based on
an interdisciplinary and intersectorial practice and to contribute in a critical way to improve this
process.
Keywords: health occupations manpower, family health, interdisciplinary.
Introdução
Desde os primórdios da humanidade
já se questionava sobre o processo saúdedoenca. Muitas teorias surgiram no decorrer
da história. Algumas delas se mantém até
hoje, como a Teoria da Medicina Social e a
Teoria da Unicausalidade.
Centrado na Unicausalidade, a partir
do início do século XX, houve o crescimento
de um modelo de ensino nos Estados Unidos
conhecido como Flexneriano que se expandiu
e fomentou vultosos investimentos no campo
médico-industrial.
No Brasil, durante o período pósgolpe militar, viabiliza-se, como nunca, o
crescimento hospitalar e investe-se na
medicina especializada e de alto custo, mas
_____________
que não trouxe melhorias para o nível de
saúde das pessoas. Inconformados com a
piora crescente da saúde da população, as
lutas e movimentos sociais constroem um
amplo processo de reforma sanitária, que
levam à criação do SUS e seus princípios:
atenção integral e universal à saúde com
equidade de acesso.
Em 1993, formula-se o PSF
(Programa
de
Saúde
da
Família),
inicialmente um programa focalizado e
direcionado à classe pobre, que mais tarde
passa a se tornar uma estratégia de
reorganização da atenção básica. Com a ESF
(Estratégia Saúde da Família), o SUS busca
uma nova configuração com foco voltado
para a promoção e prevenção da saúde ainda
hoje curativa e fragmentada.1
1- Prof. Dr. Coordenador do Curso de Especialização Multiprofissional em Saúde da Família da UFSCFlorianópolis/SC
2-5- Especializandos em Saúde da Família da UFSC
48
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Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 48-54, jan./jun.. 2006
Contudo, alguns obstáculos se
contrapõem ao SUS (Sistema Único de
Saúde) e o Ministério da Saúde (MS) tem
buscado a adoção de instrumentos que
equacionem as distorções existentes neste
novo modelo assistencial. Entre outros,
assume definitivamente a formação de
recursos humanos para a saúde e fortalece os
Pólos de Capacitação em Educação
Permanente.
Em 2002, a UFSC, como aliada desta
nova política de formação de profissionais de
saúde para o SUS, capacita seus primeiros
profissionais
através
do
Curso
de
Especialização Multiprofissional em Saúde
da Família. Utilizar-se-á da vivência na
segunda edição do curso, desenvolvida no
período 2004/2005, como ferramenta para
reflexões e proposição de mudanças no
processo de formação e trabalho.
Marco Referencial
No começo do século XIX, paralelo
ao início do surgimento do sistema
capitalista, inicia-se na Europa um
movimento pela medicina social que buscava
dar explicação para o processo saúde/doença,
sendo que o perfil das patologias era definido
pelas condições da sociedade. Em
contrapartida, na segunda metade do século
XIX, com a descoberta de Pasteur que
associa bactéria à doença, o modelo
unicausal passa a ser hegemônico.
Uma outra reflexão segundo Da Ros2,
é a forma como se estabelece o modelo
médico norte-americano. A Rockfeller
Foundation, um dos pilares do modelo
capitalista norte-americano financia a John´s
Hopkin´s University, no início do século XX
que pratica um modelo de ensino centrado
na unicausalidade, no hospitalocentrismo, no
biologicismo e na fragmentação. Em 1910, é
publicado o relatório Flexner, que estabelece
um modelo claramente hegemônico de
medicina especializada, e dá base para o
desenvolvimento do poderoso complexo
médico-industrial.
Até meados da década de 60, a
medicina privada no Brasil tinha um traço
europeu, com ênfase em médicos de família.
Nesta época, a população pobre dependia de
hospitais ou iniciativas de caridade para lidar
com as doenças. A Saúde Pública se resumia
ao sanitarismo campanhista promovido pelo
Ministério da Saúde, em que as ações eram
restritas à perseguição a vetores, saneamento
e programas de atendimento a grandes
endemias. O modelo de atenção à doença
baseava-se nos Institutos de Aposentadorias e
Pensões e só possuíam acesso aos serviços de
saúde existentes, os contribuintes que
estivessem inseridos no mercado de trabalho
formal.3
Em 1964, com o Golpe Militar, é
introduzido no Brasil o modelo Flexneriano.
Viabiliza-se a partir de então, o crescimento
de um complexo médico-industrial e
hospitalar respaldado em normas que
privilegiam a contratação de serviços
terceirizados. Este modelo, denominado por
vários autores como modelo médico
assistencial privatista vigorará hegemônico
de 1960 até meados dos anos 80.4
No setor saúde, é possível deflagrar
com mais nitidez as mudanças a partir da
década de 70. As lutas e movimentos sociais
que construíram um amplo processo de
reforma sanitária tiveram no ano de 1988 um
marco importante, a promulgação dos artigos
constitucionais 196 a 200;5 no ano de 1990, a
criação das Leis Orgânicas da Saúde
nº8080/906 e 8142/907 e, conseqüentemente,
a efetivação do SUS. Ou seja, com este
amplo processo de reforma, cada indivíduo
passou à condição de cidadão de direito,
sendo possuidor de acesso universal à saúde.
Em meados dos anos 90 surgiu a ESF,
cujas raízes recaem na década de 70 e na
forte crise estrutural do capitalismo que
desencadeou uma recessão generalizada. Os
vultosos
investimentos
em
medicina
especializada e medicamentos de alto custo
começam a ser questionados juntamente com
o surgimento de novas concepções do
processo saúde-enfermidade-cuidado.2
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Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 48-54, jan./jun.. 2006
Para Franco e Merhy, a declaração de
Alma-Ata,
advinda
da
Conferência
Internacional sobre os Cuidados Primários
em Saúde (1978), parte de uma lógica
racionalizadora para os serviços de saúde,
pretendendo responder aos investimentos
necessários à assistência, com menores
custos possíveis.8
A Carta de Otawa, resultante da I
Conferência Internacional sobre a Promoção
da Saúde em 1986 no Canadá, preconiza a
reorientação dos serviços de saúde na direção
da promoção da saúde, além do provimento
de serviços assistenciais. Ela estabelece,
assim, que as condições e os recursos
fundamentais para a saúde são: paz,
habitação, educação, alimentação, renda,
ecossistema estável, recursos sustentáveis,
justiça social e equidade, afirmando que o
incremento nas condições de saúde requer
uma base sólida nestes pré-requisitos básicos.
Segundo Buss9, a percepção de que tais
mudanças devem ser acompanhadas na
formação dos profissionais de saúde também
está presente na declaração resultante da
Conferência em Otawa.
A vigilância da saúde é uma nova
forma de resposta social organizada aos
problemas de saúde, referenciada pelo
conceito positivo de saúde e pelo paradigma
da produção social da saúde. Essa prática
articula as estratégias de intervenção
individual e coletivo e atua sobre os nós
críticos de problema de saúde, com base em
um saber interdisciplinar e em um fazer
intelectual.4
O modelo assistencial proposto pelo
PSF prioriza ações de proteção e promoção à
saúde, além da assistência individual, como
elementos para a construção de um novo
modelo, cujo foco se amplia para o
indivíduo/família e comunidade. Assim, o
PSF objetiva colaborar na organização do
SUS e na municipalização com vista à
integralidade e participação comunitária.10
Contudo, para Anderson,11 os avanços
do SUS, não são compatíveis com o atual
modelo econômico. A proposta neoliberal só
reforça a importância do SUS como política
social que caminha na contramão dos atuais
processos
ideológicos,
políticos
e
econômicos de exclusão social. A diminuição
dos gastos em saúde e as constantes
mudanças político-governamentais vêm
deformando a questão da ESF. Desta forma,
surgiram, dentre outros entraves, a
precarização das relações de trabalho e a falta
de recursos humanos capacitados. Verifica-se
que não há uma formação adequada dos
profissionais para atuarem na perspectiva das
práticas preconizadas pelo SUS. Essas
reflexões são percebidas no documento
NOB/RH para o SUS. 12
Os problemas relacionados à área da
gestão do trabalho e da educação na saúde
são apontados como alguns dos principais
fatores que levam à prestação de serviços de
saúde sem a necessária qualidade. Entretanto,
o Ministério da Saúde tem buscado a adoção
de instrumentos que possibilitem o
equacionamento das distorções existentes na
ESF. A articulação e integração são o
caminho permanente a ser percorrido como
forma alternativa, resolutiva e eficaz de
enfrentamento dos desafios postos na
construção do Sistema Único de Saúde.
A fim de fortalecer a articulação
ensino-serviço foram criados em 1998 os
Pólos de Capacitação e Educação
Permanente em Saúde da Família. Assim, o
MS lançou, em 2000, uma convocatória
nacional com o objetivo de implementar a
oferta de cursos de pós-graduação lato sensu,
nas modalidades de especialização e
residência multiprofissional em saúde da
família.13
Os Pólos foram constituídos como
instâncias de articulação interinstitucional
para a gestão de educação permanente em
saúde. Para tanto, é necessário o
envolvimento de dirigentes, profissionais em
formação, trabalhadores, estudantes e
usuários que se ocupam do fazer, pensar e
educar em saúde nas diferentes realidades do
país. São esses atores que em “roda”
negociam seus diferentes interesses e pontos
de vista para prática nas áreas de saúde e
educação.
A partir de 2003, a educação na saúde
ganhou estatuto de política pública para a
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Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 48-54, jan./jun.. 2006
formação e desenvolvimento no SUS como
desafio para superar a tradição das ações
pedagógicas
pontuais,
individualistas,
autoritárias e focalizadas na culpabilização
dos indivíduos. O Ministério da Saúde criou
a Política Nacional de Educação Permanente
em Saúde, portaria 198/03,14 a qual
recompõe as práticas de formação, atenção,
gestão, formulação de políticas e controle
social no setor saúde,
procurando
humanizar os recursos humanos, agora
trabalhadores e não mais recursos.
O Curso de Especialização em Saúde da
Família da Universidade Federal de Santa
Catarina – UFSC
Desde o início dos anos 80, o tema
saúde comunitária/saúde da família vem
sendo discutido na UFSC por professores e
profissionais comprometidos com esta área
de atuação.
Inicialmente, as equipes de saúde da
família eram capacitadas com um
treinamento introdutório de abrangência
razoável, mas sua profundidade era limitada.
Então, no final do ano de 1999, o Pólo
Estadual de Capacitação, Formação e
Educação Permanente de Recursos Humanos
para a Estratégia de Saúde da Família, ao
qual a Universidade é vinculada como
coordenadora do Núcleo 1 (18a Regional de
Saúde), encaminhou a proposta oriunda do
MS objetivando a implantação do Curso de
Especialização Multiprofissional em Saúde
da Família.
Seguindo a filosofia do 1º curso
(2002/2003), ancorado nos princípios do
SUS e tendo como base a ESF, no ano de
2004, iniciou-se a formação das turmas do 2º
curso de Especialização Multiprofissional em
Saúde da Família da UFSC, marcando
novamente a contribuição desta instituição
para o processo de mudança no modelo
assistencial vigente.
O quadro docente é composto por sete
departamentos de ensino da UFSC, sendo
cinco pertencentes ao Centro de Ciências da
Saúde
(Ciências
Farmacêuticas,
Enfermagem, Estomatologia, Nutrição e
Saúde Pública), um ao Centro de Filosofia e
Humanas (Psicologia) e um ao Centro SócioEconômico (Serviço Social) que juntos
construíram o projeto deste curso.
O curso é destinado a profissionais
oriundos dos municípios de Santa Catarina
abrangendo
as
seguintes
profissões
envolvidas no modelo da ESF: Serviço
Social, Farmácia, Odontologia, Enfermagem,
Psicologia, Nutrição e Medicina. A titulação
conferida pela UFSC aos alunos que
cumprirem os requisitos do curso é a de
“Especialista em Saúde da Família”.
A Estratégia de Saúde da Família é
colocada atualmente como a opção
estratégica de reorganização da atenção
primária de saúde no contexto do SUS.
Contudo, um dos maiores desafios da
efetivação deste processo de transferência do
sistema e do modelo assistencial de saúde
está na relação serviços de saúde e formação
profissional, pois a maioria das universidades
ainda forma profissionais da área da saúde
guiados pelo modelo centrado na lógica
assistencial curativa e hospitalocêntrica.
Assim sendo, é essencial a formação de
profissionais aptos a trabalhar em equipe no
sentido de contemplar a integralidade das
ações em nível individual, familiar e
coletivo. Na Estratégia Saúde da Família, o
trabalho em equipe mostra-se fundamental
para a integralidade das ações e construção
de uma concepção ampliada de saúde.15
Direcionado a atender as expectativas
desta Estratégia, este curso propõe: estímulo
à educação popular com referencial em Paulo
Freire como proposta pedagógica de criação
de vínculo profissional-comunidade; alta
resolutividade
na
atenção
básica;
humanização da assistência; foco na
determinação social do processo saúdedoença; indissociabilidade entre a atenção
clínica e epidemiológica, entre a atenção
coletiva e individual e ênfase na promoção da
saúde e assistência domiciliar. Também
busca formar profissionais inovadores, com
abordagem crítico-reflexiva e democráticoparticipativa e que desenvolvam uma prática
multiprofissional,
interdisciplinar
e
intersetorial.
51
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Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 48-54, jan./jun.. 2006
A interdisciplinaridade ajuda a
melhorar a compreensão da realidade, através
do diálogo com outras formas de
conhecimento de maneira compartilhada e
interativa, numa aprendizagem contínua que
facilita os enfrentamentos profissionais e a
assistência humanizada e cidadã.16
A proposta do curso fomenta os
alunos para que conheçam a rede de apoio
institucional-social,
articulando
e
promovendo propostas de ações integradas
para melhorar a qualidade de vida da
população.
Também
capacita
para
planejamento e gerência nas Unidade de
Saúde, bem como monitoramento e avaliação
contínuos a fim de que se alcance a
efetividade das ações.
Reflexão
Alcançar o patamar ideal, visando à
garantia da melhoria da qualidade de vida de
saúde da população, não se traduz em tarefa
simples, pois exige de cada profissional da
saúde da família o rompimento com a
uniteralidade de suas práticas e saberes, e
também que estes sejam estimulados a (re)
aprender conceitos, práticas e relativizar o
modo de viver em uma determinada
sociedade, comunidade e/ou família. Esse
novo estilo de pensamento está voltado a um
processo de sensibilização dos profissionais
que passam a entender a saúde como um
processo multidimensional e complexo e
desenvolver uma práxis mais critica, criativa
e emancipadora.
No decorrer do 2º curso de
Especialização Multiprofissional em Saúde
da Família, algumas reflexões surgiram entre
os discentes o que permitiu esta análise. É
possível considerar como importante
contribuição
para
a
formação
e
desenvolvimento profissional, a consciência
interdisciplinar adquirida durante o curso,
que por si só já é um grande avanço para a
(re) construção de um novo estilo de
pensamento em saúde. A própria convivência
entre diversos sujeitos com diferentes saberes
profissionais no decorrer das aulas e durante
a elaboração da monografia interdisciplinar,
contribui
para
fortalecer/propiciar
enriquecimento nesse sentido.
Além disso, o curso propicia um
embasamento no sentido de problematizar a
educação em saúde, ressalta a importância
dos profissionais se engajarem aos
movimentos populares, a fim de participar
dos interesses e da cultura da comunidade
com a qual trabalham, criando parcerias e
estreitando vínculos para que fortaleçam a
Educação Popular no cotidiano sócioinstitucional.
A Educação Popular consiste na
formação de pessoas mais sabidas e mais
fortes para uma melhor retribuição à sua
contribuição econômica, política e cultural;
mais sabidas e fortes para serem tranqüilas,
sadias e felizes e para terem uma convivência
construtiva e preservadora com os seres
humanos e o meio ambiente.17
Para que exista a articulação das
ações básicas de saúde por parte dos agentes,
mas considerando a especificidade de cada
profissão, é necessário que cada profissional
conheça um pouco do trabalho do outro e
tenha reconhecimento de sua necessidade de
atuação. Os conceitos de Campo e Núcleo de
competência e de responsabilidade são
sugeridos por Campos18 como forma de
combinar a necessidade de polivalência e ao
mesmo tempo de especialização, e de lidar
com a autonomia e definição de
responsabilidades. Por Núcleo entender-se-ia
o conjunto de saberes e de responsabilidades
específicos
de
cada
profissão
ou
especialidade. Por Campo, ter-se-iam saberes
e responsabilidades comuns ou confluentes a
várias profissões ou especialidades.
O curso possibilita e estimula a troca
de experiências em eventos nacionais
relacionados à
área. Um dos eventos que os alunos tiveram a
possibilidade de prestigiar foi o VI Encontro
Nacional da Rede Unida em Minas Gerais
que agregou inovações aos alunos.
Alguns momentos enriquecedores
também fortalecem a criatividade e espírito
crítico quando alguns docentes trazem novas
experiências para que os profissionais vejam
além do corpo e da doença em aulas como
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Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 48-54, jan./jun.. 2006
Interacionismo Simbólico, Axiomas da
Comunicação e Ludicidade.
São proporcionadas fundamentações
teóricas em eixos temáticos que alertam os
alunos para que se despojem da detenção da
verdade sobre o que é ruim ou bom para a
comunidade e seus sujeitos. Não existe
verdade sobre saúde-doença das pessoas
neste sentido, mas estilos de pensamentos
que estão todo o tempo se (re) significando e
que os saberes devem ser respeitados para
uma busca da qualidade de vida.
Com o objetivo de sempre garantir a
primazia, é necessário que reconheçamos
também as fragilidades deste curso, para que
estas sejam transformadas em desafios a
serem transpostos por aqueles que estão
comprometidos com a construção de um SUS
cada vez melhor. Nesta direção, procurar-seá a seguir formular algumas ponderações a
esse respeito, e propor sugestões que
garantam a fundamentação e a (re)
estruturação de situações que venham ao
encontro do que é necessário para consolidar
esta importante iniciativa de processo ensinoaprendizagem.
Acreditamos que exista a necessidade
de
uma
ampliação
das
vivências
profissionais, no que se refere aos papéis
desempenhados na estruturação das equipes
da ESF. Sugere-se que todos os
especializandos, em especial os que não
tiveram ainda oportunidade de atuação na
ponta, possam ir a campo, para vivenciarem a
prática da teoria aplicada em sala de aula.
Outrossim,
urge
ressaltar
a
essencialidade da existência de parcerias com
gestores
das
diferentes
esferas
governamentais, além de outros setores da
sociedade, de forma a firmar parcerias com o
intuito de juntar esforços para a conquista de
um sistema de saúde efetivamente justo,
igualitário e de qualidade.
referencial
teórico,
da
vivência
interdisciplinar e das reflexões e análise das
informações obtidas no trabalho de campo.
A constatação nesta fase final do
Curso de Especialização Multiprofissional
em Saúde da Família da UFSC traz a
percepção do caráter dinâmico do mesmo,
visto que transformar a formação e a gestão
do trabalho em saúde não são questões
simplesmente técnicas, mas mudanças nas
relações, nos processos, nos atos de saúde e,
principalmente, nas pessoas.
A partir dos limites e das
possibilidades apontadas nesta análise do
curso, reflete-se sobre a realidade deste ser
ainda um processo que precisa ser construído
e
reconstruído
cotidianamente,
principalmente, porque a luta pela
compreensão ampliada de saúde e sua
complexidade é a mesma dentro do serviço e
dentro da academia, e ainda há muita
resistência de alguns em romper paradigmas.
Várias são as dificuldades que os
sujeitos do curso enfrentam no seu
transcorrer, pois essa nova formação provoca
discussões permeadas de incertezas e
avanços, num cenário de complexidade que
envolve
estruturas
organizacionais
fragmentadas
e
hierarquizadas
em
contraponto ao seu referencial que caminha
na direção contrária – da integralidade,
interdisciplinaridade, valorização da escuta e
das necessidades sociais.
Apesar destes aspectos apontados,
alunos e professores buscam pelo mesmo
ideário
de
construção
de
novos
conhecimentos, contribuição para esta nova
reorientação das estratégias e modos de
cuidar, tratar e acompanhar a saúde
individual e coletiva assim como provocar
importantes mudanças nos modos de ensinar
e aprender.
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Considerações Finais
As considerações expostas neste
artigo surgiram a partir das reflexões durante
o processo ensino-aprendizagem dos alunos
do curso, de seu aprofundamento do
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Kelly Antunes dos Santos1; Ricardo Koszuoski2; Alexandre de Mattos Gomes3
Resumo: Este estudo caracteriza-se por ser uma pesquisa de caráter descritivo. Inicialmente foi
realizado uma pesquisa bibliográfica no intuito de se fazer um breve relato sobre aspectos do
envelhecimento de um modo geral. Posteriormente realizou-se um levantamento de dados referentes à
mortalidade, morbidade, causas de internações hospitalares, expectativa de vida e valores
demográficos da população com mais de sessenta (60) anos do Estado de Santa Catarina como um
todo e de suas macrorregiões. Apresenta por objetivo abordar características de como vem se
processando o envelhecer no Estado de Santa Catarina, bem como de suas macrorregiões
especificamente.
Palavras-chave: envelhecimento, idoso, Estado de Santa Catarina, macrorregiões.
Abstract: This study is characterized for being a research of descriptive character. Initially it was
carried through a bibliographical research in the intention of making a brief story about the aspects of
aging in a general way. Later was carried a data-collecting referring to mortality, morbidade, hospital
internments causes, life expectancy and demographic values of the population over sixty (60) years of
Santa Catarina State as a whole and its macroregions. The objective is to approach characteristics of
the aging process in Santa Catarina State as well as in its macroregions specifically.
Keywords: aging, aged, Santa Catarina State, macroregions.
Introdução
Ao considerarmos o aumento da
população
idosa
tanto
nos
países
desenvolvidos como nos que estão em
desenvolvimento, notamos que um dos
desafios que se propõe à Geriatria e
Gerontologia e a outras instituições sociais é
enfrentar a velocidade com que se processa o
aumento do número de pessoas com mais de
60 anos na sociedade brasileira e as
conseqüências que esse fenômeno acarreta.
O envelhecimento da população
brasileira é um fenômeno social inconteste. O
aumento do número de idosos brasileiros, em
um período relativamente curto, é um dos
processos mais acelerados de envelhecimento
populacional do mundo. No Brasil, a
transição demográfica teve início nos anos
40, quando doenças infecciosas e parasitárias
começaram a reduzir-se de forma acentuada.
Neste mesmo período, observou-se um
aumento de óbitos por doenças crônicas e
___________________
degenerativas, podendo ser atribuído ao
envelhecimento da população. 1, 2.
A redução da mortalidade precoce,
associada à significativa queda na taxas de
natalidade e fecundidade, característica de
transição demográfica, vem produzindo um
acentuado envelhecimento populacional no
Brasil. Essa mudança no perfil de
morbimortalidade faz com que o cenário,
caracterizado por uma população jovem com
maior incidência de doenças infecciosas, se
transforme-se em outro, no qual predominam
os agravos crônicos, característicos de uma
população mais envelhecida 3.
Basta um olhar mais aguçado em
nossa volta para percebermos que, a partir de
nós mesmos esse envelhecimento está mais
visível. A velhice como experiência vital
humana está cada vez mais ampliada e o
processo de envelhecimento se tornou um
objeto de estudo sério, não só para as
ciências biomédicas, como também para as
ciências humanas e sociais.
1
Mestranda do PPG em Ciências da Saúde da Universidade do Vale do Rio do Sinos – UNISINOS.
Médico. Especialista em Geriatria pelo Instituto de Geriatria e Gerontologia da Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul – PUC-RS.
3
Médico. Especialista em Geriatria pelo Instituto de Geriatria e Gerontologia da Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul – PUC-RS.
1
55
Santos, K. A. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 55-62, jan./jun.. 2006
Aumenta cada vez mais o número de
brasileiros estudiosos desse fenômeno pelas
inúmeras conseqüências que origina.
Devemos estar atentos para o fato de que o
processo de transição demográfica, no Brasil,
caracteriza-se pela rapidez com que o
aumento das populações adulta e idosa vêm
alterando a pirâmide populacional. O
conhecimento da situação do idoso num país
com tantas diferenças regionais, onde a
esperança de vida nos Estados mais pobres
do Nordeste não chega aos 60 anos e nos
mais desenvolvidos do Sul passa dos 70
anos, permite constatar que não existe uma
velhice, mas velhices distintas4, 5.
Neste estudo será abordado algumas
características de como vem se processando
o envelhecer no Estado de Santa Catarina,
pois já vimos que não há uma forma de
envelhecer uniforme em todo o nosso país, o
que há são visíveis disparidades entre as suas
regiões. Procuramos, através desse saber,
analisar e conhecer a situação do processo de
envelhecimento nas diferentes macrorregiões
do Estado de Santa Catarina. Apresenta como
objetivos: 1. realizar um estudo sobre as
características do envelhecimento no Estado
de Santa Catarina; 2. realizar um
levantamento da população idosa de Santa
Catarina e suas macrorregiões; 3. coletar
dados referentes a esperança de vida ao
nascer, principais causas de mortalidade e de
internações hospitalares no Estado como um
todo e respectivas macrorregiões; 4.
comparar as variáveis em estudo entre as
macrorregiões e o Estado de Santa Catarina e
estabelecer relações
deste com
as
características encontradas correspondentes
as variáveis em nível nacional.
Metodologia
Delineamento: Este estudo caracteriza-se por
ser uma pesquisa de caráter descritivo2,6.
Coleta de Dados: Inicialmente foi realizado
uma pesquisa bibliográfica em livros textos,
páginas eletrônicas, artigos nacionais e
internacionais no intuito de se fazer um breve
relato sobre aspectos do envelhecimento de
um modo geral e de realizar um
levantamento de dados referentes à
mortalidade,
morbidade,
causas
de
internações hospitalares, expectativa de vida
e valores demográficos da população do
Estado de Santa Catarina como um todo e de
suas macrorregiões. Estas variáveis foram
obtidas levando-se em consideração a
população com mais de 60 anos vigente no
Estado, para que, posteriormente, pudessem
ser feitas as tabelas com os valores
respectivos de cada variável e as possíveis
comparações entre as macrorregiões e o
Estado.
Resultados
Gráfico 01 – Porcentagem da população maior de 60 anos no Estado de Santa Catarina e
em suas macrorregiões, ano 2003.
7,9%
8,2%
8,1%
8,3%
8,7%
8,7%
7,7%
8,2%
6,9%
Fonte: Santa Catarina. Secretaria de Estado da Saúde7.
56
Santos, K. A. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 55-62, jan./jun.. 2006
A porcentagem de maiores de 60 anos
na população catarinense é de 7,9% da
população total do Estado. Observa-se que o
menor índice deste dado refere-se a
macrorregião Nordeste com um valor de
6,9%. Acredita-se que, por ser esta região
uma das mais industrializadas do Estado,
ocorra uma maior imigração de jovens para a
mesma em busca de trabalho. Utilizando-se o
mesmo raciocínio, podemos justificar a
maior porcentagem de idosos encontrada nas
regiões de Lages e Planalto Norte, por serem
essas, principalmente, agrícolas e madeireiras
que caracteriza uma maior emigração de
jovens (Gráfico 01).
Gráfico 02 – Proporção da população maior de 60 anos, caracterizadas por sexo, no Estado
de Santa Catarina e em suas macrorregiões:
60,0%
50,0%
55,4%
54,9%
45,1%
44,6%
54,8%
53,6%
46,4%
45,5%
45,2%
55,5%
54,5%
56,6%
53,4%
52,3%
47,7%
44,5%
46,6%
43,4%
40,0%
Masculino
30,0%
Feminino
20,0%
10,0%
0,0%
Fonte: Santa Catarina. Secretaria de Estado da Saúde7.
Há um predomínio da população
idosa feminina no Estado, com 54,9% em
comparação aos 45,1% do sexo masculino
(Gráfico 02). Esta variação, observada entre
os sexos, faz com que o Estado apresente
44.000 mulheres idosas a mais do que os
homens desta mesma faixa etária8.
Observa-se, também, que há pouca
diferença entre os sexos nas macrorregiões,
sendo que todas apresentam um predomínio
do sexo feminino, com variações de 52,3%
em Lages à 56,6% em Florianópolis (Gráfico
02).
Gráfico 03 – Expectativa de Vida ao Nascer no Estado de Santa Catarina e suas
macrorregiões, estimativa 2003.
62
64
66
68
70
Santa
Catarina
72
78
80
82
77,49
77,33
69,43
ExtremoOeste
78,21
71,15
77,35
Meio Oeste
70,79
Feminino
75,59
Planlto Norte
68,86
78,04
Nordeste
70,41
75,05
Lages
70,43
79,77
Florianópolis
70,75
77,33
Sul
Santa
76
70,03
Vale do itajaí
Fonte:
74
69,43
Catarina.
Secretaria
de
Estado
da
Saúde7
57
Santos, K. A. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 55-62, jan./jun.. 2006
A expectativa de vida ao nascer no
Estado catarinense é de 70,03 anos para o
sexo masculino e de 77,49 anos para o sexo
feminino (Gráfico 03).
Quanto as macrorregiões, podemos
observar pequena variação nos valores da
esperança de vida em relação ao sexo
masculino, porém estes valores variam
consideravelmente entre as macrorregiões
quando se trata do sexo feminino. Cabe
destacar as diferenças observadas entre a
região de Florianópolis e Lages, onde a
esperança de vida ao nascer na capital do
Estado é de, praticamente, 5 anos a mais,
com valores de 79,77 anos e de 75,05 anos,
respectivamente (Gráfico 03).
Buscou-se às 06 (seis) principais
causas de internações hospitalares, na
população acima de 60 anos, no ano de 2003
no Estado de Santa Catarina e suas
macrorregiões, sendo estas responsáveis por
mais de 80% do total das internações (Tabela
01).
Tabela 01 – Principais causas de Internações Hospitalares
VALE
ITAJAI
EXTRE
MO
OESTE
MEIO
OESTE
PLAN.
NORTE
SUL
NORDE
STE
SC
LAGES
MACRORREGIÕES
FLORI
PA
DOENÇAS
APARELHO
CIRCULATÓRIO
31,3
36,2
31,2
35,7
27,3
29,5
25,2
25,7
34,7
APARELHO
RESPIRATÓRIO
23,7
23,9
16,1
22,6
17,0
24,9
32,1
33,9
20,6
APARELHO
DIGESTIVO
8,8
6,5
9,5
9,1
11,3
9,2
8,2
8,8
9,2
NEOPLASIAS
8,3
7,6
12,0
8,6
12,0
5,7
7,1
6,8
7,1
APARELHO
GENITURINÁRIO
4,7
3,3
5,7
4,1
5,2
4,4
4,4
4,9
5,5
ENDOCRINAS
METABOLICOS
NUTRICIONAIS
3,9
4,6
2,9
3,8
4,5
5,2
4,5
3,0
3,7
Fonte: Santa Catarina. Secretaria de Estado da Saúde7.
As
patologias
dos
Aparelhos
Circulatório e Respiratório são responsáveis
por mais da metade das internações
hospitalares, com destaque para a
macrorregião Sul com 60% das internações e
a Nordeste que atingiu o menor índice de
internações por estas causas, com 40,3%
(Tabela 01).
Cabe
destacar
ainda
outras
diferenciações da macrorregião Nordeste,
esta apresenta os maiores índices de
internação por causas Neoplásicas e do
Aparelho Digestivo com 45% acima da
média estadual (Tabela 01).
As causas relacionadas ao Aparelho
Geniturinário, Endócrinas / Metabólicas /
Nutricionais, apresentam pequena variação
entre as macrorregiões do Estado, ocupando
a quinta e a sexta causas de internações,
respectivamente (Tabela 01).
Tabela 02 refere às principais causas
de Mortalidade. Buscou-se as 06 (seis)
principais causas de mortalidade da
população acima de 60 anos no Estado de
58
Santos, K. A. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 55-62, jan./jun.. 2006
Santa Catarina e suas macrorregiões no ano
de 2003, pois estas causas foram
responsáveis por 92,1% dos óbitos no
território catarinense no período.
Tabela 02 – Principais causas de Mortalidade
REGIÕES
DOENÇAS
APARELHO
CIRCULATÓRIO
NEOPLASTIAS
(TUMORES)
APARELHO
RESPIRATÓRIO
ENDÓCRINA,
NUTRICIONAIS
METABÓLICAS
APARELHO
DIGESTIVO
CAUSAS
EXTERNAS
SC
39,5
46,2
22,7
16,8
17,2
12,6
4,6
8,8
4,5
4,8
3,9
2,1
42,6
20,1
15,1
6,5
4,7
3,1
PLANALTO
NORTE
39,2
41,6
44,3
22,5
20,1
17,1
15,7
14,7
13,4
4,0
6,0
8,4
6,5
7,5
4,0
2,2
7,0
3,2
MEIO
OESTE
36,1
40,4
45,4
23,5
19,6
15,1
18,6
16,8
14,7
4,5
6,8
9,4
41,9
49,0
22,4
15,1
16,3
10,3
5,1
5,2
4,9
3,4
2,5
3,8
4,1
3,1
2,5
5,1
3,0
SUL
FLORIPA
45,2
19,1
13,5
7,7
10,7
4,0
2,8
44,4
44,3
23,2
18,9
14,4
12,6
3,8
7,8
4,2
4,2
3,1
2,0
44,4
21,2
13,5
5,7
4,2
2,6
LAGES
39,4
48,1
22,4
20,2
12,2
12,1
6,4
7,3
5,4
5,0
2,6
1,8
43,3
21,4
15,0
6,8
5,3
2,2
EXTREMO
OESTE
34,4
39,3
45,6
25,0
22,3
18,7
21,6
18,2
13,7
3,8
5,3
7,1
VALE
ITAJAI
39,5
42,9
46,9
21,9
19,2
15,8
18,0
15,9
13,3
5,1
6,9
9,0
4,1
4,9
5,0
1,9
4,0
4,2
4,3
2,1
4,5
3,7
4,1
3,3
NORDESTE
38,5
44,4
22,6
16,7
15,5
11,2
4,3
9,0
5,2
5,8
4,4
1,2
Fonte: Santa Catarina. Secretaria de Estado da Saúde7.
Legenda
Masculino
Feminino
As doenças do Aparelho Circulatório
são a principal causa de óbitos entre os
idosos com 42,6%. Este predomínio ocorre
também nas macrorregiões com pequena
variação entre as mesmas, oscilando de
39,3% à 45,2%. Em relação a variação por
sexo, percebe-se que o sexo feminino é mais
acometido, por esta patologia, no Estado
como um todo em relação ao sexo masculino
(Tabela 02).
Neoplasias com 20,1% dos óbitos dos
maiores de 60 anos somam a segunda causa
de mortes do Estado, ocorrendo um
predomínio da população idosa masculina.
As
patologias
do
Aparelho
Respiratório aparecem como a terceira causa
de óbitos e ocorre um predomínio do sexo
masculino (Tabela 02).
Os
Distúrbios
Endócrinos,
Nutricionais e Metabólicos são responsáveis
por 6,5% dos óbitos e correspondem a causa
que demonstra um maior predomínio do sexo
feminino em, aproximadamente, 100% em
relação ao sexo masculino (Tabela 02) .
O sistema digestivo ocupa a quinta
colocação com 4,7% das causas de óbito e
apresenta uma certa uniformidade em relação
as diferenças por sexo (Tabela 02).
Total
Causas Texternas (trânsito, violência,
fraturas, entre outras) somam a sexta causa
de óbitos da população idosa catarinense,
apresentando maior prevalência no sexo
masculino, em torno de 100% em relação ao
sexo feminino (Tabela 02).
Discussão
Atualmente a população idosa
brasileira com idade igual ou superior a 60
anos ultrapassa 15 milhões de habitantes8. O
caso do envelhecimento brasileiro pode ser
exemplificado por aumento da participação
da população maior de 60 anos no total da
população nacional de 4%, em 1940, para
9%, em 2000. Também pode-se fazer
referência ao aumento da proporção da
população mais idosa, isto é, de 80 anos ou
mais, a qual está alterando a composição
etária dentro do próprio grupo, ou seja, a
população considerada mais idosa também
está envelhecendo. Esse tem sido o segmento
populacional que mais cresce, embora ainda
apresente um contingente pequeno. De 166
mil pessoas em 1940, o contingente mais
idoso passou para quase 1,9 milhões no ano
2000. Representava 12,6% da população
59
41,2
19,9
13,6
6,5
5,5
3,0
Santos, K. A. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 55-62, jan./jun.. 2006
idosa em 1996 e 1,1% da população total.9
Isto leva á heterogeneidade do segmento
populacional chamado idoso.
Um dado importante a ser observado
diz respeito a feminilização das pessoas
idosas quando em 1996, dos 12,4 milhões de
idosos 54,4% eram do sexo feminino. Isso se
deve à sua maior taxa de crescimento
relativamente à do segmento masculino. A
predominância da população feminina entre
idosos tem repercussões importantes nas
demandas por políticas públicas. Uma delas
diz respeito ao fato de que, embora as
mulheres vivam mais do que os homens, elas
estão mais sujeitas a deficiências físicas e
mentais, além do que, a viuvez tem sido
apontada, em geral, como sinônimo de
solidão, considerando que no ano de 1996
45% das mulheres idosas eram viúvas.10
Comparando-se os dados a nivel de
Brasil com os dados encontrados neste
estudo relativos a população idosa do Estado
de Santa Catarina, observamos que os idosos
do Estado representam 7,9% da população
total o que corresponde valores abaixo dos
observados no país. Porém, quando se trata
da divisão da população por sexo, tanto no
Brasil quanto em Santa Catarina a população
feminina predomina com valores de 54,4% e
54,9% respectivamente.11
O envelhecimento da população
brasileira é um fato incontestável,
principalmente, a partir da década de 70,
constata-se no país um crescimento
considerável do contingente populacional de
indivíduos com mais de 60 anos em contraste
ao início do século passado (1900), quando a
expectativa de vida ao nascimento era de
33,7 anos. A expectativa de vida média do
brasileiro aumentou quase 25 anos nestes
últimos 50 anos. A expectativa de vida após
os 60 anos não varia significativamente, por
exemplo, entre países com diferentes níveis
socioeconômicos. Ao contrário do esperado,
a expectativa de vida do idoso pode ser maior
em populações de nível socioeconômico mais
baixo. Uma comparação entre a curva de
expectativa de vida da Inglaterra com a de
São Paulo mostrou que, até os 50 anos para
homens e 55 para mulheres, a expectativa de
vida era maior na Inglaterra, com os maiores
diferenciais nos primeiros 5 anos de vida. A
partir dos 55 e 60 anos, para homens e
mulheres, respectivamente a expectativa de
vida passa a ser maior em São Paulo. O dado
serve para ressaltar que a expectativa de vida
após os 60 anos é praticamente a mesma em
todo o mundo, o que varia é a proporção de
pessoas atingindo essa idade. Em outras
palavras, os cerca de 20 anos que se espera
viver após os 60 são realidade tanto para o
idoso europeu, por exemplo, como para o
idoso no Brasil. No Brasil como um todo, a
esperança de vida ao nascer apresentou
ganhos de cerca de 30 anos, entre 1940 e
1998, como resultado, principalmente, da
queda da mortalidade infantil.10
Segundo
o
Relatório
de
Desenvolvimento Humano da ONU (2004)9,
a expectativa de vida média no Brasil é de 68
anos, a partir desse dado podemos destacar
os valores encontrados para essa variável no
Estado catarinense em relação ao Nacional,
já que a expectativa de vida neste Estado é de
70,03 anos para o sexo masculino e de 77,49
anos para o sexo feminino.
A fase idosa é um período da vida
com uma alta prevalência de doenças
crônicas não transmissíveis (DCNT),
limitações físicas, perdas cognitivas,
sintomas depressivos , declínio sensorial,
acidentes e isolamento social. No entanto tem
crescido o interesse em estabelecer quais as
causas que, isolada ou conjuntamente,
explicam melhor o risco que um idoso tem de
morrer. Junto com a expansão da população
idosa encontra-se uma elevação da
prevalência da doença cardiovascular
aterosclerótica, representada, em maior grau,
pela cardiopatia isquêmica e pelo acidente
vascular encefálico e justificada pela maior
frequência dos fatores de risco cardiovascular
(obesidade,
diabetes,
dislipidemia
e
hipertensão arterial). Dados estatísticos
mostram que ocorrerá um significativo
aumento da mortalidade por doença
coronariana e cerebrovascular nos próximos
20 anos.12
Com a Transição Demográfica (TD),
o panorama epidemiológico relativo à
60
Santos, K. A. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 55-62, jan./jun.. 2006
morbidade
e
mortalidade
de
uma
determinada
população
alterou-se
fundamentalmente. As doenças infectocontagiosas (DIC), altamente prevalentes em
populações jovens, tendem a diminuir sua
incidência, enquanto as DCNT aumentam
sua prevalência, expressando a maior
proporção de pessoas idosas portadoras
dessas doenças. A esse processo de mudança
do perfil da morbimortalidade que
acompanha o processo demográfico,
denomina-se
transição
epidemiológica
12
(TE) . No Brasil, à semelhança do que se
observou com os coeficientes de mortalidade
geral, houve uma queda abrupta da
mortalidade por DIC e um aumento
concorrente por DCNT, sobretudo as de
origem cardiovascular. Num período de 30
anos (1950-80), as DIC caíram do primeiro
lugar para o terceiro, e as doenças
cardiovasculares (DCV) assumiram o posto
da principal causa de morte no país, em todas
as suas diferentes regiões geográficas. Antes
consideradas doenças do desenvolvimento, as
doenças cardiovasculares, hoje, podem ser
mais bem caracterizadas como doenças da
urbanização 5,8. Países como o Brasil, mesmo
sem
terem
experimentado
um
desenvolvimento social pleno, vivem uma
epidemia de DCV, muito provavelmente
explicada pela mudança de hábitos
alimentares, pelo excesso de estresse e de
poluentes ambientais, todos decorrentes do
processo de urbanização. Dados do
Ministério da Saúde9 mostram que a
principal causa isolada de internação no
Brasil é a insuficiência cardíaca congestiva
(ICC), trata-se de uma doença crônica
exigindo cuidados especializados e seu
impacto no custo do sistema é bastante
significativo.
É de grande valia citar as principais
causas de internações hospitalares do
contingente idoso a nível de Brasil no ano de
2003: causas relacionadas ao Aparelho
Circulatório (28,9%), Aparelho Respiratório
(17,4%), Aparelho Digestivo (9,2%),
Doenças Infecciosas e Parasitárias (7,1%),
Neoplasias (6,8%), Aparelho Geniturinário
(5,6%), Doenças Endócrinas / Metabólicas /
Nutricionais (4,9%)(9). De acordo com estes
dados, podemos verificar que, a diferença do
Estado catarinense para o Brasil, situa-se,
basicamente, nas causas de internação por
doenças Infecciosas e Parasitárias, sendo que
esta ocupa a quarta colocação a nível
nacional com 7,1%, enquanto que em Santa
Catarina é citada como a oitava causa de
internação com apenas 1,1%. Porém, cabe
observar que as patologias relacionadas ao
aparelho circulatório aparecem como
principais causas de morbimortalidade tanto
no Brasil como no estado em estudo.
Conclusão
De acordo com este estudo pode-se
concluir que os idosos catarinenses:
Representam 7,9% da população total
do estado, sendo que as macrorregiões
Planalto Norte e Lages, destacam-se por
apresentar porcentagens maiores que a média
estadual desta população com 8,7% em
ambas regiões. E a macrorregião Nordeste
apresenta valores abaixo dos observados no
estado, com 6,9%.
Em relação a proporção da população
estudada dividida pelo sexo observa-se que
há um predomínio do sexo feminino em
relação ao sexo masculino com, 54,9% e
45,1%, respectivamente.
A expectativa de vida ao nascer em
Santa Catarina é de 77,49 anos para o sexo
feminino e 70,03 anos para o sexo masculino.
Destacam-se
as
macrorregiões
de
Florianópolis e Planalto Norte por
apresentarem diferenças mais significativas
nesta variável entre os sexos.
As maiores causas de internações
hospitalares observadas no estado como um
todo são as patologias do aparelho
circulatório (31,3%), seguidas das patologias
do aparelho respiratório (29,7%), digestivo
(8,8%) e das neoplasias (8,3%).
Em relação a variável mortalidade,
temos seis (6) principais patologias que
causam esta condição, sendo as do aparelho
circulatório responsáveis por 42,6% dos
óbitos , as neoplasias com 20,1%, doenças
respiratórias
com
15,1%,
causas
61
Santos, K. A. et al.
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endócrinas/nutricionais e metabólicas com
6,5%, aparelho digestivo com 4,7% e causas
externas com 3,1%. Observa-se que há um
predomínio das patologias relacionadas ao
aparelho
circulatório
e
causas
endócrinas/nutricionais/metabólicas
pelo
sexo feminino, já as relacionadas ao aparelho
respiratório, neoplasias e causas externas
acometem mais os idosos homens.
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62
Oliveira, W. F. de et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 63-70, jan./jun.. 2006
INSERÇÃO COMUNITÁRIA DO ESTUDANTE DE MEDICINA NA PRIMEIRA
FASE: A EXPERIÊNCIA NA UFSC [Community insertion of medical students of the
first period: the experience at UFSC]
Walter Ferreira de Oliveira1; Patrícia Alves de Souza2
Resumo: No novo currículo integrado do Curso de Medicina da UFSC, os estudantes realizam, desde
a primeira fase, atividades nas comunidades, refletindo sobre a cidadania e a realidade social. As
atividades se organizam segundo um eixo teórico-prático, que se materializa no módulo “Interação
Comunitária” (práticas), considerado elemento integrador dos módulos do curso. Permite aos
estudantes desvendar a construção dos sistemas de saberes, fortalecer a possibilidade do vínculo entre
o futuro profissional e os habitantes das comunidades onde estão inseridos e ampliar a consciência da
formação de sua própria identidade.
Palavras-chave: extensão comunitária, atenção primária, mudanças curriculares
Abstract: In the new medical integrated curriculum of UFSC, students carry through, since the first
period, supervised activities in the communities, reflecting on citizenry and on the social reality. These
activities are organized according to a theoretical and practical ax, materialized in the module
"Communitarian Interaction" (practical), an integrative element of the course. Modules. This allows
the students to unmask the ways of construction of knowledge, to fortify bonds between the future
professionals and community members, as well as to amplify their conscience about the formation of
its own identity.
Keywords: community extension, primary care, curricular changes.
Introdução
O novo currículo e o conhecimento sobre a
comunidade
O Programa de Mudanças Curriculares
(PMC), implantado, inicialmente, em 24
universidades federais, entre as quais a
UFSC, propicia a transformação dos
currículos de cursos de graduação na área da
saúde 1. A necessidade de um novo currículo
vem sendo discutida já desde os anos de
1970, por grupos de estudantes e
profissionais, que constituíram o movimento
da reforma sanitária 2,3.
No novo currículo integrado do Curso
de Medicina da UFSC, os estudantes
realizam, desde a primeira fase, atividades
supervisionadas junto a comunidades, o que
marca uma postura radicalmente contrária ao
isolamento tradicional frente à sociedade, à
cidadania e à realidade social, característica
dos currículos anteriores. Estas atividades
são organizadas segundo um eixo teóricoprático, que se materializa no módulo
“Interação
Comunitária”
(práticas),
considerado como elemento integrador dos
módulos do curso, da 1ª até a 8ª fase.
As atividades comunitárias seguem a
lógica da territorialização, base para o
funcionamento operacional do SUS. Assim,
os estudantes têm atividades em áreas de
abrangência de 16 Centros de Saúde (CS)
municipais conveniados com o curso. Áreas
de abrangência são definidas como áreas
geográficas que têm como ponto de
referência os serviços básicos de saúde, isto
é, CS, Postos de Saúde ou Unidades Básicas
de Atenção à Família, e que identificam uma
população adscrita a cada serviço, que tem
responsabilidade pelos cuidados sanitários
4
dessa
população
.
________________
1
Professor Doutor do Departamento de Saúde Pública, Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal de
Santa Catarina. [email protected].
2
Professora Mestre do Departamento de Saúde Pública, Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal de
Santa Catarina, [email protected].
63
Oliveira, W. F. de et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 63-70, jan./jun.. 2006
Os estudantes de primeira fase vão às
comunidades sob a supervisão de professores
da UFSC. Para cada área de abrangência/CS
é designado um professor-supervisor e entre
dois a quatro alunos de cada fase.
As atividades de campo são
acompanhadas por Agentes Comunitários de
Saúde (ACS), o que é visto como estratégico,
por constituírem estes agentes um elo
primordial do sistema de saúde com a
comunidade, sendo responsáveis pelo
acompanhamento das ações de saúde, pela
detecção de problemas e riscos de saúde e
pelo acompanhamento de tratamentos. O
ACS promove uma capilaridade fundamental
à operacionalização do SUS, sendo essencial
na construção do vínculo com os habitantes,
visitando-os em seus domicílios. Algumas
atividades dos estudantes de primeira fase
são realizadas em ambientes institucionais,
como escolas e centros comunitários ou no
próprio CS, e outras são externas, no bairro,
em caminhadas ou de carro e, ainda,
eventualmente, em ambientes domésticos,
em visitas domiciliares. Dado o objetivo
principal, de inserção na comunidade 5 o CS
não deve ser a principal opção para as
atividades, mas um local de apoio, um ponto
de encontro, uma referência. Os conteúdos
teóricos ministrados pela disciplina “Saúde e
Sociedade”, também sob responsabilidade do
Departamento de Saúde Pública, servem
como base para as atividades programadas e
tarefas a serem cumpridas no âmbito do
trabalho de campo.
Um dos objetivos do PMC é a inserção
precoce do estudante junto às comunidades,
vista como essencial para uma formação
humanizada e crítica 6. Assim, se busca
proporcionar um olhar diferenciado para as
realidades sócio-econômicas e culturais que
permeiam as relações entre o sistema
institucional de saúde e os cidadãos,
considerando-se que o setor saúde
compartilha responsabilidades na relação
com a vida comunitária, constituindo-se,
desta forma, em componente fundamental da
estrutura sócio-ambiental. Para que os
professores possam verificar os resultados da
experiência junto à comunidade, e como
parte de sua avaliação, os estudantes
constróem relatórios de campo, em grupo,
durante o semestre.
Este artigo se baseia na vivência de
dois professores do Departamento de Saúde
Pública, que vêm atuando no processo do
PMC, um deles desde a fase de planejamento
da implantação, no segundo semestre de
2002 e o outro desde o primeiro semestre de
2004. Durante este período os autores
atuaram no PMC como parte do grupo gestor
do projeto de implantação, coordenadores da
disciplina “Saúde e Sociedade” na primeira e
segunda fases e membros do planejamento e
supervisores de campo no módulo “Interação
Comunitária”. Privilegia-se, no artigo, a
descrição do processo teórico-prático do
estudante de primeira fase.
Metodologia de trabalho
Com a implantação das mudanças
curriculares, novos fatores passaram a
influenciar a formação teórico-prática do
estudante de medicina, já na primeira fase.
Do ponto de vista da atuação profissional, o
estudante começa, a reconhecer e discutir a
diversidade das concepções de saúde e
normalidade e os princípios e diretrizes do
Sistema Único de Saúde, bem como, no
âmbito do SUS, o discurso e a prática, as
condições de trabalho dos profissionais de
saúde e os desafios do trabalho
interdisciplinar. Outros assuntos emergentes
no contexto das atividades de Interação
Comunitária e nas discussões teóricas da
disciplina Saúde e Sociedade incluem a
conscientização dos estudantes sobre a
realidade nas comunidades e a desinformação
dos estudantes sobre a vida em comunidades
carentes.
A abordagem pedagógica adotada no
novo currículo é de natureza construtivista,
conforme acordado durante o processo de
planejamento
da
implantação.
Esta
abordagem, em tese, facilita o aprendizado
conjunto de estudantes e professores e prevê
que o professor e o estudante construam
juntos, em muitos aspectos, o conhecimento
sobre o objeto de estudo 7.
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Oliveira, W. F. de et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 63-70, jan./jun.. 2006
Atualmente as atividades dos
estudantes de medicina da primeira fase à
comunidade realizam-se quinzenalmente,
devendo o estudante cumprir, em cada uma,
determinadas tarefas. Estas, apesar de serem
as mesmas para todos os grupos, são
executadas de acordo com as características
de cada local. As 16 áreas de abrangência são
diferentes, bem como suas equipes, seus
problemas e seus modos de trabalhar. Cabe
ao estudante e ao supervisor manter um foco,
ao mesmo tempo em que devem exercer uma
certa flexibilidade que permita a adaptação às
situações específicas. Incluem-se entre as
atividades a territorialização, reuniões com
cidadãos e líderes comunitários, uma visão
dos equipamentos da comunidade (áreas de
lazer, praças, centros comunitários, escolas,
centros e estabelecimentos de comércio, etc)
e observação do funcionamento do CS.
O trabalho de campo traz à tona um
grande número de temas, que refletem os
desafios vividos por alunos e professores no
contexto de uma prática tradicionalmente
pouco exercida neste estágio da formação
médica. Alguns destes temas têm chamado
bastante à atenção, por sua persistência e
pelo interesse demonstrado pelos estudantes,
em seus relatórios e conversas de supervisão.
Entre estes estão a conscientização dos
estudantes
sobre
a
realidade
nas
comunidades, a desinformação prévia destes
estudantes sobre a vida da comunidade, a
relação dos estudantes com os diferentes
atores deste cenário de práticas, inclusive os
ACS, pessoal do CS, professoressupervisores e os habitantes dos bairros, o
desvelar, perante o estudante, e conforme sua
percepção, de sua futura carreira profissional,
e o avanço, por parte de alunos e professores,
na compreensão dos determinantes da saúde
dos cidadãos.
Discussão dos temas emergentes
A implantação dos novos currículos
nos cursos de medicina almeja, entre outras
coisas, a transformação na forma de atuar dos
corpos docente e discente e a promoção de
reflexões sobre a função social do acadêmico
de medicina, do médico, dos profissionais e
dos serviços de saúde 8. Um dos resultados
buscados é uma reorganização nas relações
sociais mediadas pela Saúde, vista como
agente, representação e construção social. Na
implantação do Currículo Integrado do Curso
de Medicina da UFSC vem-se buscando, por
meio
das
atividades
de
Interação
Comunitária, favorecer uma nova relação do
estudante com a cidade e seus cidadãos.
Ocorre aí uma guinada epistemológica
profundamente significativa, passando-se a
privilegiar o raciocínio do bem-estar
coletivo, a partir do campo de ação da Saúde
Pública. Este raciocínio, esta mentalidade,
passa a organizar a estrutura pedagógica e a
nortear o desenvolvimento de uma visão de
futuro que prevê transformações nos papéis
sociais
e
culturais
tradicionalmente
executados pelos profissionais de saúde.
Reordena-se também a dinâmica interna do
próprio curso de medicina, que passa a
incorporar a Atenção Primária como foco
maior
das
intervenções
de
saúde,
legitimando, assim, o redirecionamento das
energias, antes totalmente aplicadas às
demandas do modelo hospitalocêntrico.
Muda, com isso, a perspectiva teórico-prática
do curso e concretiza-se a proposição de um
novo olhar para a relação profissionalcidadão.
Na vertente teórica, um dos primeiros
temas discutidos em sala de aula é o conceito
de Saúde. Este tema é tratado de forma
aprofundada, a partir do entendimento de que
ele organiza, epistemologicamente, e
permeia, operacionalmente, os outros
conceitos que fundamentam a base
curricular. Os alunos são inicialmente
convidados a apresentarem seus próprios
conceitos de saúde. A seguir, o professor
examina,
com
eles,
os
conceitos
apresentados, discutindo sua origem, isto é, a
construção social e cultural destes conceitos
pelos estudantes, que refletem a construção
social e cultural mais ampla, em nível de
concepção
coletiva
culturalmente
compartilhada. Em todas as turmas a maioria
dos alunos se surpreende com a diversidade
de conceitos emergentes na classe e com o
65
Oliveira, W. F. de et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 63-70, jan./jun.. 2006
fato de usarem, em seus raciocínios,
conceitos dos quais não têm necessariamente
consciência, pois que raramente são
discutidos ou examinados. Surpreendem-se,
também, por descobrirem que esses conceitos
não são necessariamente construídos de
maneira autônoma e informada, mas a partir
da influência nem sempre desinteressada de
vários atores sociais e transmitidos
geralmente pela mídia.
O próximo passo é desafiar os
conceitos, por meio de uma dinâmica onde
são propostas situações para serem analisadas
em pequenos grupos, onde os estudantes
“julgam” se determinadas pessoas, com
determinadas características, podem ser
consideradas saudáveis ou não. O exercício
se constitui de três blocos de “casos”, onde as
descrições são apresentadas de forma a gerar
dúvidas sobre o “diagnóstico” que o grupo
poderá oferecer. Os grupos raramente
chegam a consenso sobre o diagnóstico e
muito menos este consenso é alcançado no
grande grupo, quando os pequenos grupos
relatam a experiência. Aparece, novamente, a
diversidade de conceitos, de estilos de
pensamento e de análise, de maneiras de
encarar a saúde, a doença e a qualidade de
vida. O exercício suscita descobertas e
procura mostrar que conceitos são
construções culturais e que nem sempre
todos compartilham das mesmas idéias.
Finalmente, é apresentada aos alunos a
história conceitual da saúde, isto é, os alunos
aprendem a contextualizar os conceitos
vigentes de saúde nas diferentes épocas e
culturas, até o conceito atual utilizado no
Sistema Único de Saúde, emergente da 8a.
Conferência Nacional de Saúde de 1986 9 .
A discussão sobre o conceito de saúde
inclui, entre seus objetivos, preparar o aluno
para a realidade da lida com grupos e
populações, alertando-o para o fato de que
nem todos os conceitos que cada indivíduo
tem sobre um assunto são óbvios para outros
e muito menos compartilhados por todos.
Este é um passo importante no preparo para a
interação com a comunidade, pois pode
“desarmar”
atitudes
etnocêntricas,
preconceitos e tendências ao autoritarismo e
à discriminação. Além disso, auxilia o
estudante a colocar-se numa posição mais
equânime, mais curiosa, mais disposta a
ouvir e aprender com o outro, inclusive com
um outro que é visto, tradicionalmente, como
menos preparado, menos educado, menos
instruído e portanto destituído de saberes; o
outro que Foucault (1979)10 identifica como
portador de um “saber dominado”, um saber
menosprezado pelos que “sabem mais” - na
visão de uma sociedade onde se reconhece
como legítimo apenas o pensar científico e
onde se perpetua a hegemonização da cultura
da classe dominante.
A primeira visita à comunidade
costuma coincidir com o início da discussão
teórica sobre os princípios do SUS. Nesta
visita o principal objetivo é conhecer a
equipe do CS, o funcionamento da unidade,
entender sua base territorial e ter uma visão
geral da área de abrangência. Não é a
finalidade da visita, mas pode acontecer, e
muitas vezes acontece, de o estudante, em
suas caminhadas junto com o ACS, seja
convidado a entrar em alguma casa ou
mesmo visitar uma instituição do bairro.
Apresenta-se um grande desafio, de não
ceder à tentação de colocar-se o estudante
centrado na idéia de mostrar-se já como um
profissional da saúde. O papel do estudante é,
neste momento, de aprendiz, de se colocar
perante o bairro, a comunidade e o território,
não como “futuro médico”, mas como
visitante, como cidadão jovem que procura
entender a dinâmica do local, com interesse
em aprender sobre as formas da vida na
comunidade. Não tem, ainda, uma base
teórica ampla e sólida, por isso lhe é sugerido
que olhe, anote, pergunte, exercite sua
curiosidade e reconheça que pode apenas, até
aí, imaginar como vivem as pessoas nas
casas que eles apenas vêem de fora,
caminhando ou de carro, ou entram,
eventualmente, pela primeira vez e numa
visita relativamente rápida.
As tarefas consignadas implicam em
outros ensinamentos, como o de desmistificar
as generalizações fáceis e aprender a não tirar
conclusões apressadas, entender a diferença e
o devido lugar do saber científico e das
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Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 63-70, jan./jun.. 2006
construções, às vezes equivocadas, do senso
comum. E, sobretudo, manter uma mente
aberta ao aprendizado. A experiência é, por
vezes, fonte de muita satisfação para o
estudante, que descobre que sua postura mais
igualitária.
Enquanto os fundamentos teóricos
continuam a ser apresentados a próxima
tarefa é um encontro com pessoas da
comunidade que têm um conhecimento do
bairro, pessoas de mais idade, que moram há
muito tempo ali e que podem dar uma idéia,
aos alunos, da evolução urbana, econômica,
cultural e social da área. É fundamental a
mediação do ACS que conhece as pessoas,
verifica disponibilidades e planeja o
encontro, que pode se dar numa praça, num
café, à beira da praia ou em qualquer lugar
onde se possa promover uma conversa
tranqüila, agradável e produtiva. Assim os
estudantes vão, ao mesmo tempo, se
familiarizando com a área de abrangência e
as micro-áreas em que estas se dividem, suas
diversas potencialidades e dificuldades, e
com os moradores, sobretudo os mais idosos,
apresentados como importantes depositários
da cultura do local. Procura-se evitar que o
encontro se dê no CS, para que o estudante
possa melhor perceber, num local livre das
ainda inevitáveis associações com a
patologia, as capacidades das pessoas, ao
invés de suas limitações. Aprendem que
antes de ser pacientes os cidadãos da
comunidade podem ser pessoas cultas,
autônomas e produtivas. O ideal é que se
possa, já desde o início, trabalhar a
desconstrução da visão medicalizante da
sociedade, trazendo o estudante para o
território onde pessoas, com diferentes graus
de autonomia e também com seus problemas,
habitam e atuam socialmente.
No segundo semestre de 2004 um dos
autores acompanhou um grupo de estudantes
que se encontrou com um pequeno grupo de
senhoras, que contaram muitas histórias
sobre o bairro. O encontro se deu sob uma
árvore frondosa, tendo o mar como pano de
fundo, e os estudantes quedaram-se por longo
tempo, fascinados pelas senhoras, que eram
muito ativas em um grupo de convivência da
terceira idade, cujas atividades principais são,
atualmente, viajar pelo estado em ônibus
fretados
pelo
grupo
e
participar,
mensalmente, de um bingo dançante num
clube local. O encontro culminou com a
participação inesperada de um senhor que é
poeta e que, além de contribuir com suas
histórias sobre o bairro, brindou a todos
recitando suas poesias. Já em outro encontro,
em outro bairro, no primeiro semestre de
2005, um pescador, que depois revelou ter,
também, um diploma em pedagogia, contou
para os estudantes não só a história do bairro,
mas como esta história local se confunde
com a história de toda a cidade de
Florianópolis, revelando fatos desconhecidos
por todos os estudantes, que manifestaram,
em seus relatórios, sua admiração não só pela
inesperada erudição do pescador, mas pela
grande valia do que com ele aprenderam.
A terceira e quarta visitas compõem-se
de atividades de territorialização. Os
estudantes discutem, previamente, o conceito
de territorialização, na sala de aula, fixando
definições como as de área de abrangência,
de influência e microáreas, bem como a
noção de populações adscritas ao CS, entre
outras. Nestas atividades o estudante
constrói, com a ajuda do ACS e a partir do
reconhecimento das micro-áreas, em
caminhadas e de carro, mapas do território,
localizando seus equipamentos e redes de
urbanização, como esgotos, coleta de lixo,
disponibilidade e qualidade da água,
transporte, instituições comunitárias, de
saúde e educação, áreas de lazer, praças,
centros culturais e comerciais, etc. Aprende a
mapear a existência ativa e dinâmica dos
bairros, dos centros vivos que constituem o
cerne da vida cidadã, e a reconhecer suas
igualdades e desigualdades, necessidades e
características diferenciais. Os estudantes se
deparam com um mundo que lhes
impressiona pela insuspeitada exuberância:
Apesar de se designar tarefas
específicas para cada visita, uma das riquezas
do trabalho junto à comunidade é a
possibilidade de acontecimentos inesperados.
Isto se dá principalmente pelas características
diferentes de cada local, tendo cada CS sua
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própria dinâmica, e pela natureza do trabalho
da saúde, sempre apresentando necessidades
de última hora, que levam ao conhecimento
de outras realidades e ao aprendizado no lidar
com situações inusitadas. Numa destas
ocasiões um grupo de estudantes viu-se sem
o acompanhamento dos ACS, que foram
convocados emergencialmente para outra
atividade. Além disso, estavam juntos alguns
alunos que não haviam conseguido, naquele
dia, transporte para dois outros CS mais
longínquos. O professor de Saúde Pública
resolveu visitar, com eles, algumas
instituições do bairro. Foram primeiro a um
grêmio recreativo e esportivo e, logo depois,
em sua caminhada, viram um distrito
policial, onde resolveram entrar, tendo sido
lá bem recebidos pelos funcionários de
plantão. Conheceram o interior da delegacia,
as celas, que estavam vazias, o
funcionamento do trabalho dos policiais na
comunidade, e conversaram com a delegada,
que explicou toda a lógica do policiamento
na região. Discutiram com a delegada sobre
vários problemas, como “pena de criminosos
e quais os motivos que ela (a delegada)
achava serem a causa de tanta violência.”
Aprenderam como agem os traficantes do
local, como se localizam no território e sobre
o uso dos adolescentes na cadeia do tráfico
de drogas, o que propiciou, conforme os
colocam em seu relatório “compreender
melhor alguns problemas que a região
enfrenta e que já haviam sido citados pela
coordenadora do CS e pelas ACS”. Nesta
tarde, os estudantes visitaram ainda um
ginásio de esportes e um colégio estadual,
que também os recebeu “de forma calorosa”.
Uma outra vertente de aprendizado
nesta breve experiência dos estudantes nas
comunidades refere-se ao reconhecimento do
trabalho dos outros profissionais da saúde,
particularmente dos ACS. A proximidade
com o ACS revela-se extremamente
enriquecedora, tanto do ponto de vista do
aprendizado das práticas quanto do
entendimento da complexidade do trabalho
destes profissionais. Ao mesmo tempo, a
partir da percepção da realidade dos
profissionais, os estudantes desenvolvem
uma visão crítica, observando as conexões
entre as condições de trabalho nos serviços e
as conseqüências para o funcionamento do
sistema como um todo:
No decorrer do trabalho, os estudantes
tomam contato com as dificuldades do
Sistema de Saúde para colocar em prática
seus princípios e diretrizes. O SUS é
percebido como uma construção histórica,
num país que, por um lado, anuncia o
privilegiamento da saúde mas, por outro, não
consegue demonstrar, em termos de alocação
de recursos, seu apoio de forma inequívoca.
A ambigüidade do discurso político-social
frente às iniqüidades encontradas na prática
não passa despercebida nos relatórios de
campo:
Ao final do semestre, os alunos fazem
um fechamento, junto ao CS, voltando a se
encontrar, se possível, com toda a equipe, e
proporcionando um retorno de seu trabalho.
Este retorno se deu, em algumas turmas,
através dos próprios materiais produzidos
pelos alunos para sua avaliação final. Em
uma das turmas, por exemplo, a avaliação
constou de pôsteres sobre o trabalho
desenvolvido durante o semestre. Após a
exibição dos pôsteres no salão principal do
Centro de Ciências da Saúde – CCS, da
Universidade, os alunos eram então
incentivados a levá-los para o CS, onde
poderiam deixá-los ou promover uma
exibição e posteriormente recolhê-los.
Considerações finais
A função de incutir nos estudantes de
medicina uma consciência mais holística,
humanista, crítica e anti-etnocêntrica é
imprescindível para que estes, em sua
formação como profissionais de saúde,
possam avaliar, de uma maneira efetiva, as
capacidades dos cidadãos e os infortúnios
que atingem as comunidades. As atividades
comunitárias, aliadas às reflexões teóricas
correlacionadas, permitem aos estudantes
desvendar as maneiras de construção dos
sistemas de saberes, que estão, conforme nos
demonstra Foucault (1979)10, freqüentemente
por trás das estruturas diferenciais de poderes
68
Oliveira, W. F. de et al.
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disciplinares e de injustiças sociais. O
estudante de medicina necessita exercitar
uma visão crítica e, tanto quanto possível
imparcial, para que as melhores soluções
sejam encontradas na busca de servir e
auxiliar esses cidadãos, que esperam que o
CS, assim como todo o sistema, os ajude a
realizar suas potencialidades biopsicossociais
e a combater suas mazelas. É através de uma
formação com tais características que pode se
concretizar a transformação almejada no
panorama da dinâmica interna dos cursos de
Medicina, na medida em que passam a
privilegiar uma nova forma de relação entre o
profissional e os cidadãos que buscam sua
ajuda, no contexto da atenção primária e da
saúde coletiva, conforme preconizado nas
diretrizes curriculares dos Ministérios da
Educação e da Saúde.
Nessa caminhada de implantação do
Currículo Integrado do Curso de Medicina na
UFSC, há uma nova forma de encarar a
Saúde Pública, que passa a protagonista dos
eixos pedagógicos e organizadora da
interação comunitária, favorecendo, desta
forma, a inserção dos estudantes nas 16 áreas
de abrangência dos respectivos CS
municipais conveniados. Este protagonismo
constitui, já em si, uma transformação. Na
dinâmica interna dos cursos tradicionais de
Medicina a Saúde Pública e, por conseguinte,
a Atenção Primária, foram sempre
incompreendidas e periféricas ao processo de
formação. O reconhecimento, pelo PMC, da
necessidade de priorização da Saúde Pública
e da Atenção Primária aponta uma nova era
na educação de profissionais de saúde, onde
a tônica deve ser a interdisciplinaridade e o
foco na pessoa e na promoção da saúde, sem
prejuízo da cura e da reabilitação, ao invés da
posição corporativista, médicocêntrica e do
foco na patologia e limitado à ação curativa.
Com
a
alteração
de
visão
epistemológica
proporcionada
pela
ratificação da Saúde Pública como eixo
central do curso em suas primeiras fases,
altera-se também a perspectiva teóricoprática dos estudantes, que passam a exercer
um novo papel no contexto das relações entre
o sistema de saúde e a população. Este novo
papel favorece a desconstrução de mitos e
posturas que têm tradicionalmente servido
para afastar o estudante do entendimento da
vida comunitária, aumentando a distância
entre estes atores sociais e favorecendo a
objetificação dos sujeitos-cidadãos. O novo
currículo tem como objetivo reverter este
distanciamento e fortalecer a possibilidade do
vínculo entre o futuro profissional e os
habitantes das comunidades onde estão
inseridos.
Os exercícios teóricos priorizados na
primeira fase, partindo do aprofundamento e
da ampliação da idéia conceitual sobre saúde,
contribuem
favoravelmente
para
o
entendimento do estudante a respeito da
produção social dos conceitos, bem como da
consciência da formação de sua própria
identidade. Acredita-se que os estudantes que
iniciam desta forma seu curso de medicina
poderão desenvolver um olhar mais sensível
para com seus concidadãos, poderão estar
mais imunes aos perigos da medicalização da
vida social, e obterão mais satisfação pessoal
no exercício de sua profissão. Poderão, até
mesmo, ter mais sucesso em atribuir
significado à sua vida pessoal, sentindo-se
mais presentes como profissionais cidadãos.
Suas
práticas
serão,
quiçá,
mais
humanizadas, na medida em que se
enriquecem no caminho que lhes é dado
construir.
Referências Bibliográficas
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Curriculares
nos
Cursos
de
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um novo Sistema de Saúde. Brasília:
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70
Saccol, A. P. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 71-75, jan./jun.. 2006
EDUCAÇÃO POPULAR E SAÚDE NO CENÁRIO RURAL: ANÁLISE DE UM
PROJETO DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA [Popular education and health in the
rural scenario: analysis of a universitary extension project]
Ana Paula Saccol1; Antônio de Miranda Wosny2; Adalbi Cilonei Souza3; Alexandre
Pareto da Cunha4; Andréa Medina Gonçalves Cruz5; Camila Stefanes6; Lenilza Mattos
Lima7
Resumo: O NEPEPS/CCS/UFSC propicia formação prática e humanística, promovendo a
participação de professores e estudantes de graduação e pós-graduação interdisciplinarmente. A
proposta fortalece vínculos com a comunidade objetivando a reflexão crítica sobre iniciativas de
problematização e enfrentamento de suas necessidades, apoiada na Pedagogia de Paulo Freire,
aproximando as práticas educativas com as políticas, transformando os sujeitos em autores de suas
histórias. Como ferramenta de ação e luta, recorreu-se ao diálogo, como perspectiva de solução aos
impasses encontrados. Problematizam-se entraves políticos, ideológicos e burocráticos dos poderes
relacionados a dificuldades de acesso às informações técnicas, sanitárias, econômicas e sociais.
Palavras-chave: educação em saúde, qualidade de vida, população rural.
Abstract: The NEPEPS/CCS/UFSC propitiates to its integrants a practical and humanistic
background, promoting the participation of professors, graduation and post-graduation students in
interdisciplinary work. The application fortifies bonds with the community aiming at the critical
reflection on problematization initiatives and facing their needs, based upon Paulo Freire’s pedagogy,
bringing educative and political practices together, turning the subjects into their own stories’
authors. As an alternative tool of action and fight, the dialogue as perspective of solution to the
impasses found, was appealed. Many local political, ideological and bureaucratic obstacles are
conjecturated, such as: difficulties of access to the information of sanitary, economic and social
techniques.
Keywords: education in health, quality of life, agricultural population
O Núcleo de Extensão e Pesquisa em
Educação Popular e Saúde/CCS/UFSC
desenvolve desde sua criação em 1994,
atividades de ensino, pesquisa e extensão,
propiciando aos seus integrantes, uma
vivência extra mural em distintas realidades.
Constitui-se em um Grupo de Pesquisa da
Pós Graduação de Enfermagem, registrado
no CNPq. Subdividido em duas áreas de
pesquisa: saberes compartilhados com o
sistema familiar de cuidado com marco
teórico em autores da antropologia da saúde e
a área de educação popular e saúde sob o
referencial pedagógico de Paulo Freire.
No ano de 1999, dentro da área de
educação popular e saúde, constituiu-se o
__________________
Projeto Passos Maia/SC, com o objetivo de
atender
necessidades
assistenciais
e
educacionais em saúde, contribuir com o
desenvolvimento da comunidade local e
favorecer a presença universitária no cenário
rural. Este trabalho relata a reflexão crítica
decorrente da inserção de novos atores e
novas propostas metodológicas em espaço
onde, tradicionalmente, a maioria das ações
político-pedagógicas desenvolviam-se de
maneira verticalizadas. Configurou-se como
prática de educação popular, contribuindo
para a democratização do conhecimento e
aproximação do Sistema Único de Saúde ao
cotidiano das pessoas, em especial atenção,
aos moradores do interior do município.
1
Estudante do Curso de Ciências Sociais da UFSC; [email protected]
Professor do Departamento de Enfermagem da UFSC e Coordenador do Projeto; [email protected]
3
Enfermeiro e Professor Substituto da UFSC do Departamento de Enfermagem; [email protected]
4
Enfermeiro e Professor Substituto da UFSC do Departamento de Enfermagem [email protected]
5
Bióloga, Mestre em Enfermagem; [email protected]
6
Enfermeira do Programa de Saúde da família/Biguaçu – SC; [email protected]
7
Professora do Departamento de Análises Clínicas da UFSC; [email protected]
2
71
Saccol, A. P. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 71-75, jan./jun.. 2006
O Município de Passos Maia foi
fundado há 14 anos, na região conhecida
como Alto Irani, a Noroeste do Estado de
Santa Catarina, aproximadamente 512 km de
distância da Capital/Florianópolis. Conta
com uma população de 5000 habitantes,
sendo a maioria residente em área rural e nos
assentamentos da reforma agrária.1 A
realidade deste município, não difere muito
da realidade do espaço rural em todo o país.
Infelizmente, é diagnosticado que, os setores
que trabalham com a saúde, encontram-se
geralmente longe destas comunidades. A
maior queixa na população rural está
relacionada a não acessibilidade a serviços de
saúde. Destaca-se a necessidade de
atendimento médico e de outros profissionais
da área, caracterizando precariedade das
condições de saúde da população.2
A falta de infra-estrutura mínima no
município retrata a realidade acima descrita,
visto que a grande maioria da comunidade
carece de informação sobre o cuidado com o
meio ambiente, aliado às péssimas condições
de vida, tais como: habitações precárias,
inexistência de saneamento básico (água
potável e esgoto), a não acessibilidade à luz
elétrica, tornando a população extremamente
fragilizada no que diz respeito as seus
direitos de cidadão. Acrescentando-se a isso,
o imaginário popular e o senso-comum que
vincula automaticamente saúde com doença,
farmácias, remédios, hospitais e congêneres,
destacam-se necessidades emergências de
práticas educativas em saúde.
Após estudo das condições de saúde
do município, verificou-se que os problemas
mais urgentes no município, são as carências
relativas ao meio ambiente e saneamento
básico e a constituição de um novo modelo
de atenção à saúde de acordo com o princípio
da integralidade. Para enfrentar estes
problemas, foi estabelecida uma parceria
entre a UFSC, a Prefeitura Municipal de
Passos Maia e os integrantes da Comunidade
no sentido de tentar reverter o modelo
vigente encaminhando ações de promoção,
proteção e recuperação da saúde.
Desta maneira, estabeleceu-se uma
proposta dialógica na perspectiva de ampliar
e fortalecer a troca de conhecimentos
acadêmicos e populares relativos à saúde,
higiene,
meio
ambiente,
fitoterapia,
cidadania, entre outros assuntos levantados
pela comunidade e/ou diagnosticados pelos
sujeitos do projeto resgatando a necessidade
de se trabalhar com uma ideologia social,
aliando os saberes na construção de novos
saberes.3 Como metodologia, para trabalhar
estes temas, foram planejadas atividades
lúdicas desenvolvidas conjuntamente com a
comunidade participante envolvendo temas
de educação popular e saúde.
A
equipe
composta
interdisciplinarmente contou com professores
e alunos de graduação e pós-graduação, das
áreas de Enfermagem, Farmácia-Análises
Clínicas, Sociologia, Saúde Pública e
Biologia trabalhando na perspectiva de
construção de uma sociedade justa e
democrática e em defesa da qualidade de
vida. Este interesse e a necessidade de criar
espaços específicos para a reflexão e a busca
da consolidação destas práticas educativas e
populares, nada mais é do que a construção
da cidadania e da dignidade desta
comunidade. Buscaram-se estratégias para
evitar ou reduzir esta exclusão social que as
comunidades rurais enfrentam. Trabalhar
com classes excluídas, faz com que a equipe
envolvida nas atividades perceba um modo
de pensar diferente. Há uma valorização dos
trabalhos em grupo, da interdisiplinariedade,
no cuidar do próximo, o preocupar-se com o
bem estar geral, valorizando os sentimentos
humanos, criando e desenvolvendo vínculos
de acolhimento de forma mais afetiva.
Os movimentos populares e sua luta
pela saúde vêm conquistando cada vez
espaços maiores para a obtenção da melhoria
de sua qualidade de vida. Estes movimentos
propiciam a participação em programas e
projetos, com representação democrática em
termos reais. Articula parcerias numa rede
social mais humana. “Com isso a sociedade
aprendeu a se organizar e reinvidicar por seus
direitos de cidadania, a partir da qualidade de
não cidadãos que são na prática.”4 Estes
grupos, intitulados populares, tornam-se
sujeitos de direito, ao lutar por seus sonhos
72
Saccol, A. P. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 71-75, jan./jun.. 2006
de transformação da cidadania individual
numa cidadania coletiva.
A educação popular esforça-se no
processo de mobilização, organização e
capacitação das classes populares, incluindo
a capacitação científica e técnica. “Sempre
que se luta há uma certa noção, há uma certa
claridade sobre aquilo que se luta, há uma
noção de remover obstáculos. [...]. há um
momento em que se pode descobrir que as
necessidades pelas quais se lutam, podem ser
resolvidas; essa descoberta dá conta de que
há caminhos possíveis e que as necessidades
– as que fazem lutar – não são tão exageradas
e podem ser resolvidas.”5
O educador Paulo Freire nos ensina
através de suas reflexões que o mundo é feito
por nós mesmos. A educação não é capaz de
mudar o mundo, mas ajuda as pessoas que
vivem neste mundo a mudar o que as cercam,
tornando-se autores de suas histórias. O
aprendizado se dá um pouco por dia, a cada
minuto de cada hora da vida das pessoas; ao
aprender se ensina, assim como, ao ensinar se
aprende. A educação crítica e reflexiva, deve
levar as pessoas a apreenderem e a procurar
quais são os motivos que fazem o mundo ser
o que é.6 “Educação é formação, perpassando
a informação, é o aprofundar do sentir,
pensar e agir. Quem ensina aprende ao
ensinar e quem aprende ensina ao aprender.
(...) Esta é uma das significativas vantagens
dos seres humanos – a de se terem tornado
capazes de ir mais além de seus
condicionantes”.7
Para Freire, aprender criticamente é
ter pessoas criadoras, instigadoras, inquietas,
rigorosamente
curiosas,
humildes
e
persistentes, se transformando em reais
sujeitos da construção e da reconstrução de
sua realidade. É o pensar sobre o fazer, é o
pensamento dinâmico, em movimento, é
dialético. O ser humano enquanto ser cultural
é um ser histórico, inacabado e consciente do
inacabamento. “A Educação Popular em
Saúde consiste na formação de pessoas mais
sabidas e mais fortes para uma melhor
retribuição à sua contribuição econômica,
política e cultural; mais sabidas e fortes para
serem tranqüilas, sadias e felizes e para terem
uma convivência construtiva e preservadora
com os seres humanos e o meio ambiente”.8
No Projeto Passos Maia, todas as
técnicas e dinâmicas utilizadas na execução
das atividades vieram para facilitar o
processo de aprendizagem. Com o apoio da
metodologia Freiriana os objetivos do Projeto
de se trabalhar critica e reflexivamente com
os indivíduos, acabaram tornando-se projetos
de sociedade onde o ser humano foi
resgatado às idéias de libertação, começando
pela aquisição de seus direitos e pelo
cumprimento de seus deveres. “É possível
transformar os sonhos em realidade quando
se é movido por atitude de curiosidade e
pesquisa e se opta por uma prática
pedagógica
democrática,
radical
e
progressista, rompendo criticamente com as
amarras da acomodação, do silenciamento,
da discriminação, para a superação dos
desequilíbrios do mundo”.9
A
maioria
das
atividades,
especialmente as que trabalharam com o
imaginário criativo, despertando o prazer e a
curiosidade em aprender tiveram boa
aceitação entre as crianças. Dentre as
técnicas
pedagógicas
destacou-se
a
teatralização, relacionando temas como
higiene,
meio
ambiente,
parasitoses
intestinais,
pediculose,
entre
outros,
invadindo o imaginário infantil. Estes temas
foram sugeridos pela comunidade, incluindo
pais e professores, sendo desenvolvidos com
os mesmos, oficinas participativas, utilizando
ilustrações em retroprojeção, debates em
rodas de cultura, oficinas de preparações
fitoterápicas, proporcionando a abrangência e
profundidade das propostas educativas, no
que diz respeito à contribuição aos saberes
construídos nestes espaços de discussão.
No entanto toda atividade que
desenvolve e propicia a reflexão crítica e a
faz como prática transformadora defronta-se
com a legitimidade do poder no intuito de
manter o status quo. É longa e secular a
reflexão sobre o problema de relação entre
Estado e Sociedade, provocando uma ruptura
do fluxo social do fazer.10 As instituições que
deveriam estar comprometidas em atender as
necessidades assistências da população que
73
Saccol, A. P. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 71-75, jan./jun.. 2006
elegeu seus representantes, muitas vezes
acabam transformando-se em obstáculos para
o desenvolvimento de projetos e atividades
educativas.
Além
da
burocratização,
procrastinação e falta de vontade política, há
ainda, a existência de um pensamento
predominantemente cartesiano que engloba o
agir de programas propostos pelos
governantes Numa tentativa de superar estes
obstáculos a participação da UFSC, a
combinação de necessidades e a vontade da
comunidade local, realizaram-se diversas
atividades com o objetivo de refletir e
intervir sob a realidade de vida de sua saúde,
evitando fragilizar-lhes, resgatando espaços
de lutas e conquistas aos seus direitos.
Esta participação não realizou-se de
forma facilitada e espontânea. Ela resultou do
empenho de professores e acadêmicos na
negociação, planejamento de atividades e
viabilização de recursos humanos e
materiais. Não foram medidos esforços para
a concretização dos objetivos propostos para
garantir permanência e efetiva criatividade na
elaboração das propostas aplicadas. A
distância física não foi impedimento para os
bons resultados alcançados, sendo possível a
superação desta barreira ao longo do trajeto.
Quando se trabalha com práticas
educativas reflexivas e educação política,
espera-se a transformação dos sujeitos em
autores de sua história. Esta possibilidade
gerou debate relativo as diferentes instâncias
de poder envolvidas no projeto. De um lado a
Academia, de outro o Estado, e entre eles, a
Comunidade. Havendo neste contexto os
poderes
hierarquizados,
decidindo
verticalmente, sendo visível às dificuldades
de diálogos referentes aos de programas
elaborados pelo governo, em todos os seus
níveis.
Na perspectiva ideal para superar
estes conflitos é necessário lembrar que a
saúde deve ser considerada em sua visão
integral, incluindo aspectos sociais atendendo
as necessidades da população com
autoconfiança
e
responsabilidade.
A
Educação em Saúde na lógica desencadeada
pelo projeto nos aponta para a troca de
conhecimentos, num processo dialógico e
construtivo tem como meta a melhoria na
qualidade de vida da população.11
Verifica-se que é cada vez mais nítido
que os espaços de grandes transformações
estão ocorrendo nos movimentos sociais,
fortalecendo os grupos excluídos pelo
sistema sócio-econômico vigente. Estas
ações políticas devem estar em sintonia com
esta era em que vivemos. Os caminhos certos
são aqueles que se fazem ao andar, às teorias
de dominação existentes devem ser
transformadas em teorias de revolução, de
luta. Assim como defende e retrata em seu
discurso, Brandão nos aponta que os
movimentos sociais fomentam pela sua
independência, identidade e visibilidade
social.12 Não estamos diante de uma prática
isolada, mas de algo inerente à nossa história,
à construção de novas sociedades, de novas
condições de saúde para a vida do campo.
Essas mudanças refletem-se na construção
crescente de uma consciência que se faz
necessária para a mudança do modelo
assistencial predominante e uma reordenação
do sistema de formação em saúde.13
As transformações desejadas não
ficaram somente na esfera da comunidade e
das organizações sociais. Os acadêmicos
envolvidos nestas atividades percebem-se
como importantes sujeitos de mudança no
modelo pedagógico educativo tradicional
representado por uma educação bancária.
Mudam suas atitudes não somente na prática
profissional, mas enquanto estudantes
responsáveis pela construção libertador
evitando a reprodução de um novo processo
educacional de conhecimento pronto e
acabado.
Aponta-se
também
para
uma
iniciativa mais forte para a superação das
carências
dos
pequenos
municípios,
principalmente relativas ao acesso às
informações técnicas necessárias para o
enfrentamento das questões ambientais,
saúde e educação. Bem como, maior
aproximação dos acadêmicos com a realidade
vivenciada fora dos muros das salas de aula,
numa perspectiva de aproximação entre
teoria e prática, formando profissionais
solidários, conscientes e sincronizados com
74
Saccol, A. P. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 71-75, jan./jun.. 2006
os problemas atuais.
Outro fator, que por vezes, prejudicou
o desenvolvimento das atividades, foi a longa
distância para deslocamento dos estudantes
ao município. O planejamento das atividades
era realizado com antecedência para que
pudessem ser viabilizados o transporte e os
materiais didáticos utilizados. Não foram
medidos esforços humanos para a
concretização dos objetivos propostos. A
permanência e efetividade da criatividade de
todos os membros envolvidos nas diversas
etapas foram permanentes e decisivas para os
bons resultados alcançados, facilitando a
superação das barreiras encontradas ao longo
do caminho.
Cada povo cria e recria as condições
sob as quais pretende viver, estando em seu
poder, o poder de fazer história. Durante a
execução do projeto, pode-se perceber, que o
cenário rural encontra-se isolado, não
somente no que se refere a acessibilidade dos
serviços de saúde, mas também em outros
aspectos de desenvolvimento, especialmente
a educação superior e suas instituições
normalmente instaladas em grandes centros
urbanos. As Universidades, em especial as
Universidades Públicas, são de fundamental
valor no processo de fortalecimento aos
movimentos sociais. Nota-se ainda, a
importância de se quebrar algumas barreiras.
“ [...] nós do interior dizemos que a
universidade é negocio da cidade. UNIVERSIDADE, no próprio nome dá impressão que
é uma coisa só da cidade. Esta barreira temos
que quebrar entre a universidade e a
comunidade”.14
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12. Brandão CR. História do menino que lia
o mundo. Associação Nacional de
Cooperação Agrícola
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69.
75
Da Ros, M. A. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 76-80, jan./jun.. 2006
... PARA PENSAR UMA FORMA DE OPERACIONALIZAR O PLANEJAMENTO
ESTRATÉGICO EM SAÚDE [... To thing of a way to work with strategic planning for
health ]
Marco Aurélio Da Ros1; Thaís Titon de Souza2
Resumo: O artigo se insere numa proposta de construção do SUS, utilizando a lógica do Planejamento
Estratégico em Saúde, especialmente nas vertentes de Mário Testa, e o Documento da OPAS –
Formulacion de Políticas de Salud1. Propõe-se a contribuir para operacionalizar uma proposta de
execução do Planejamento. São colocadas categorias tradicionais de Planejamento Estratégico e é
discutida uma forma de torná-las um instrumento prático. Na caracterização da forma de executar,
discute análise de conjuntura em contraste com uma Imagem-Objetivo sonhada. Propõe a
subordinação do Planejamento Local (entendido como Programação) a uma proposta maior,
resgatando a importância de associar Planejamento à Programação.
Palavras-chave: planejamento estratégico em saúde, programação, imagem-objetivo.
Abstract: The article inserts itself in a construction proposal from SUS, using the logics of Strategic
Health Planning, specially the ideas of Mário Testa and the OPAS Document – Formulacion de
Políticas de Salud1. Its objective is to contribute with the organization of a Planning execution
proposal. Traditional forms of Strategic Planning are viewed, and a form to make them viable is
discussed. When viewing ways for it to be executed, the contrast between an idealized ObjectiveImage and a conjuncture analysis is discussed. It proposes the subordination of the Local Planning
(considered Programation) to a bigger proposal, getting back the importance of associating Planning to
Programming.
Keywords: strategic planning for health, programming, objective-image.
Se planejar é pensar no futuro, é sonhar
e ter um desenho (pelo menos aproximado)
de onde se quer chegar, vamos pensar um
pouco sobre isso.
Talvez um dos exemplos mais
importantes para refletir sobre a importäncia
do planejar seja uma pequena história
infantil. Alice quando dialoga com o gato no
livro de Lewis Carol, Alice no País das
Maravilhas, acaba deixando explícito que
quando não se sabe aonde ir, não se chega
onde se quer. Nunca! Só chega aonde o
caminho leva – e quem o fez sabe porquê o
fez, e aonde queria que levasse.
Portanto, a primeira etapa do
planejamento é colocar uma Imagemobjetivo (I. O.), de preferência societária –
que sociedade sonhamos, que é para onde
queremos ir - para só à posteriori fazer
análise de conjuntura -, verificando que
meios temos de chegar lá, ou o que vamos
precisar fazer para conseguir meios de chegar
_____________
lá. Quem parte dos recursos que tem, para
adaptar-se, não sonha... E nem chega, LÁ2.
Uma argumentação bastante comum, em
momentos de neoliberalismo, é que devemos
planejar nos adequando aos recursos que
temos. Além de isto não ser planejamento,
nos coloca a impossibilidade de sonhar com
mudanças. Pode significar, no máximo,
programação de recursos.
A análise de conjuntura (segunda fase
do planejamento) é uma função da I. O.
Diferentes Imagens-objetivo fazem diferentes
análises de conjuntura. A análise faz eco, a
partir daquilo que queremos fazer. Se nosso
objetivo intermediário é fazer funcionar um
Pólo de Educação Permanente, em princípio
não nos interessa se, por exemplo, morreu
uma girafa no zoológico australiano ontem.
Já se nosso objetivo é garantir a reprodução
das girafas, este caso anterior nos interessa
muito para a análise de conjuntura.
1
Professor Titular do Departamento de Saúde Pública – UFSC; Mestrado em Planejamento em Saúde – ENSP FIOCRUZ; Doutorado em Educação – UFSC.
[email protected]
1
Graduanda do Curso de Nutrição da UFSC.
76
Da Ros, M. A. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 76-80, jan./jun.. 2006
Numa sociedade dividida em classes ou
como o neoliberalismo propôs mais
recentemente em ghettos/tribos, onde cada
um defende a sua corporação, há uma
implicação óbvia de que existem I.O distintas
– cada grupo-classe quer assegurar ou as
desigualdades ou a proposta de erradicá-las,
ou minimizá-las, ou....
Isto implica em projetos de construção
de situações intermediárias distintas, que
conduzem à aproximação de I. O. Este é o
terceiro passo de planejamento, já que o
segundo passo é a análise de conjuntura.
Ou seja: dada uma determinada
realidade (conjuntura) o que devemos fazer
para acumular poder (construção de
viabilidade) Ou, dito de outra forma, para
construir situações intermediárias que nos
permitam ir construindo a I. O3.
Para tentar continuar o raciocínio vamos
eleger uma situação intermediária como I. O.
provisória (aquela que imaginamos como
forma de nos aproximar da I. O. final). Em
verdade devemos fazer isso com cada
situação intermediária imaginada como
importante para construir a I.O. Mas, eleita
uma para continuar, agora devemos fazer
nova análise de conjuntura, mais específica
da situação escolhida, mais detalhada, mais
aprofundada. Nela vamos desenhar os aliados
e inimigos (tanto estratégicos quanto táticos)1
e, se possível, sabermos de seus projetos para
forjarmos alianças ou delinearmos formas de
combatê-los. Desta forma, estamos pensando
em construir acumulação (poder) para
aproximação da I.O. Aqui, Mário Testa4
coloca a dialética da opacidade-transparência
(que será explicada mais adiante).
Isto permite fazer um exercício de
criação de novas situações intermediárias que
nos aproximam da I. O. provisória (para
efeito prático, promovida à I. O. de fato).
Para cada situação intermediária devem
ser feitas análises de conjuntura que, como se
vê, são uma função daquela I. O.
É possível que algum adversário
estratégico tenha situações intermediarias
muito semelhantes à nossa (do planejador
que estamos definindo). Isto pode vir a
caracterizar uma aliança tática que durará até
o momento em que um tiver mais poder, e
“engolir”, cooptar, absorver o outro. Pode-se
caminhar juntos muito tempo, mas como a
I.O. final é diferente, é inevitável o fim de
um destes projetos. Como não queremos que
seja o nosso, quanto mais conhecermos o
projeto do inimigo estratégico, quanto mais
alianças fizermos, apesar da opacidade de
nossa I. O., melhor... Mais teremos chance de
implodir o projeto do adversário estratégico5.
Este entendimento de alianças faz com que
vislumbremos mais facilmente alguns
equívocos constantes aos que querem
transformar a sociedade. É muito comum
verificarmos lutas por projetos táticos, entre
aliados de uma mesma I. O., entregando,
desta forma, mais poder para o adversário
estratégico - que tem uma sociedade
diferente da nossa por objetivo - em função
de não se esclarecer que o ponto de chegada
é o mesmo e que existem diferentes
caminhos de chegar lá. Costumamos errar
muito de inimigo por não dialogar com
nossos aliados.
Nestes sucessivos deslocamentos de I.
O. vamos construindo desenhos de análise de
conjuntura e construções de situações
intermediárias, o que é chamado por Matus6
de Rede de Trajetórias. Uma situação
intermediária 1 pode ser construída por
várias situações intermediárias 2 e uma
situação intermediária 2 pode colaborar com
vários situações
intermediárias 1 (vide
desenho).
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Da Ros, M. A. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 76-80, jan./jun.. 2006
Figura 1: Representação resumida do discurso do Planejamento Estratégico em Saúde.
Situação Intermediária 3
ou Projetos Dinamizadores
Situação Intermediária 2
Situação
Intermediária 1
I. O.
I. O. Deslocada
Análise de
conjuntura 2
Análise de
conjuntura 1
Rede de Trajetórias
Situação Intermediária Compartilhada com
Adversário Estratégico ou Aliança Tática
I. O.
Adversária
Fonte: os autores.
1
Entendemos como aliado estratégico aquele que compartilha da mesma imagem-objetivo e tático como
aquele que, apesar de I.O. diferente compartilha de alguma situação intermediária. O adversário
estratégico é aquele que tem I.O. antagônica, mas eventualmente poderá ser aliado tático. O adversário
tático é aquele contrário às nossas propostas de situações intermediárias.
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Da Ros, M. A. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 76-80, jan./jun.. 2006
Isto aponta para que, se um caminho não se
viabilizar, existem outros possíveis.
Tentamos caracterizar até aqui que, mesmo
sendo contra-hegemônicos, é possível,
necessário e desejável que se planeje (a partir
de um grupo-referência), pelo fato de que se
não tomarmos o leme do barco na mão, o
barco ou fica desgovernado ou outro segura o
leme e leva para onde ele quer. É importante
assinalar que até agora não falamos em
recursos, não estabelecemos financiamento,
não programamos ações. Fizemos um
exercício de política, viabilidade, desenho de
alianças, necessidade de combate à projetos
adversários.
Outra coisa importante a assinalar é que para
tudo isto não há prazos. O planejamento não
tem tempo mensurável7. É importante que ele
seja conduzido de forma a acumular poder
para a construção da I. O. societária sonhada.
Quanto menos tempo levar, melhor. Mas é
imensurável se vamos levar trinta dias ou um
século para chegarmos lá.
Há, segundo Matus6, uma Conjuntura
Dinâmica dos Fatos (CDF) e uma Política
Construída por Atores Sociais (PCAS). Na
primeira temos pouca capacidade de
intervenção, embora ela, a CDF, tenha que
estar sempre contida como possibilidade em
nosso planejamento (PCAS). Embora não
tenhamos governabilidade sobre ela, a
mesma determina novas estratégias e alianças
a todo o momento. Portanto, a mobilidade é
uma
característica
fundamental
do
8
planejamento . Isto não implica em mudança
da I. O.( que é inegociável), mas das táticas
necessárias para a construção de situações
intermediárias.
Nesta sucessão de deslocamentos podemos
identificar, numa determinada situação, que
um aliado tático ou estratégico de nosso
grupo planejador pode ter a função de passar
o dia carimbando papéis (por exemplo), mas,
nem por isso, sua tarefa é menos importante,
já que ele estará, desta maneira, ajudando a
construir a I. O. revolucionária. As pessoas
passam, desta forma, a construir um
processo-projeto. O trabalho deixa de ser
alienante e passa a estar a serviço da causa
dos aliados, da construção da sociedade
sonhada.
É também em algum momento dos
sucessivos deslocamentos de situações
intermediarias “n” que desenhamos projetos
para viabilizar uma determinada situação.
Estes projetos são chamados de projetos
dinamizadores ou de programas. Aqui
chegamos à linguagem do tal Planejamento
CENDES-OPAS1: como
organizar
programas Deve ter um ponto de chegada,
um financiamento, um desenho de recursos,
um desenho de alianças, mas... Um prazo.
Podemos chamar isso de Planejamento
Local, sim, e devemos fazê-lo. Isso não é
incompatível com toda a discussão anterior.
Ao contrário, trata-se agora de tornar o
projeto factível. E isso deve assinalar prazos,
inclusive para reavaliar, se for o caso.
O que questionamos é fazer um
Planejamento Local sem ter desenhado antes
onde se quer chegar. Sem este desenho
assumimos a priori que o desenho
institucional é o único possível e que
programaremos ações para que aquela
situação intermediária se viabilize. Ela pode
não ser a nossa. Então, clareemos antes se
faremos uma aliança tática, se ela é
estratégica ou se nossos projetos devem
combater os da instituição ou se devemos
buscar outros aliados. Daí, com opacidade.
Mas, afinal, o que é essa opacidade –
transparência 
Mário Testa4 faz uma analogia com um
jogo de pôquer para tentar esclarecer. A idéia
é que se mostrarmos o nosso jogo, perdemos.
Se as pessoas têm um jogo menor na mão
não quererão jogar para perder. Se têm mais
ganharão SEMPRE, porque conhecem nossas
cartas-projetos. Portanto, é necessário que se
oculte a I. O. Mas, não por tempo tão grande
que inviabilize a construção de aliados. Às
vezes é conveniente mostrarmos em parte
nosso jogo (pedindo duas cartas, por
exemplo), ao invés de nunca pedirmos carta
nenhuma. Isto garante a transparência e a
possibilidade de conquistarmos aliados. Por
outro lado, isto pode entusiasmar nossos
adversários, mas certamente eles granjearão
79
Da Ros, M. A. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 76-80, jan./jun.. 2006
inimigos também, já que eles também estarão
pedindo (ou não) cartas.
Planejar, portanto, é construir o sonho.
Programar é ver como se constrói o tijolo.1.
Não adianta termos ótimos tijolos se não
sabemos para que usá-los. Se não soubermos
pode ser que alguém saiba e use. Devemos
preferir só construir o tijolo quando2.
soubermos para que ele será usado.
As etapas da programação, por outro
lado, não são atividades menores. Sem tijolo
não há prédio. Se o tijolo é ruim, ele (o
prédio) cai. Portanto... Ao planejamento
local. Alianças serão construídas neste3.
processo. Já sabemos que o SUS nos une.
Para os autores, o SUS deve ser uma situação
intermediária. Para outros não foi dada ainda
a possibilidade nem ao menos de sonhar
sobre o SUS que querem.
O Neoliberalismo criou na nossa idéia
uma coisa assim: adequar o sonho ao recurso
que temos. Como o recurso para o SUS tem5.
sido pequeno (orientação de um determinado
tipo de poder, seguramente com outra
imagem-objetivo), devemos nos adaptar,6.
tirando, portanto, ou a integralidade, ou a
equidade, ou a universalidade. E deixando no
lugar dele um monstro. Monstro este que
poderá ser justamente o sonho de outros7.
planejadores (adversários), cujo projeto de
SUS amplo como está concebido pelo
movimento sanitário, os inviabiliza.
Portanto, vamos tentar construir este
sonho, pelo menos do SUS que queremos, ou8.
se ousarmos mais, da sociedade que
imaginamos... Planejando e arregaçando as
mangas para o processo de luta que esta
proposta implica.
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80
Souza, P. A. de et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 81-85, jan./jun.. 2006
VIOLÊNCIA CONJUGAL – UM PROBLEMA DE SAÚDE PÚBLICA? REFLETINDO
OS PORQUÊS DO ADIAMENTO DA DENÚNCIA [Conjugal violence - a problem of
public health: reflecting the reasons of the adjournment of the denunciation]
Patricia Alves de Souza1; Marco Aurélio da Ros2
Resumo: A violência contra a mulher, no âmbito interpessoal, é uma das mais difíceis de serem
prevenidas e evitadas. O objetivo foi identificar se a dependência financeira é um dos fatores
determinantes para o adiamento da denúncia na delegacia de polícia. Foram investigadas mulheres
vítimas de violência física conjugal atendidas no CEVIC (Centro de Atendimento à Vítima de Crime),
em Florianópolis. Embora algumas mulheres relataram o medo de não se sustentar e aos seus filhos,
existe um contraponto de que várias mulheres são as provedoras do lar. Desta forma, não se confirma
o pressuposto e levanta-se a possibilidade da dependência emocional.
Palavras-chave: violência física, mulher, dependência financeira., dependência emocional
Abstract: Violence against women is extremely difficult to be prevented and avoided. The objective
of this study was to identify whether financial dependence is a determining factor for the
postponement of charges. Victims of marital physical violence assisted at CEVIC (Assistance Center
to Crime Victims), in Florianópolis, were investigated. Although some women reported the fear of
having to support their children, many of them are breadwinners. Therefore, the premise is not
confirmed and the possibility of emotional dependence is considered.
Keywords: physical violence, women, financial dependence, emotional dependence.
Introdução
A violência contra a mulher vem
sendo tratada como problema de Saúde
Pública1,2, tanto pelo movimento feminista,
quanto por associações profissionais,
serviços de saúde e organismos nacionais e
internacionais3. E é, neste contexto, definida
como uma maneira coerciva de controle
conjugal, podendo ocorrer na forma de
agressão física, sexual e/ou psicológica.
Geralmente a violência contra a mulher é
cometida pelo seu companheiro1,2,4 e as
conseqüências podem ser sérias, causando
danos físicos e incapacidades, podendo levar
a homicídio, suicídio, agressão sexual,
complicações na gravidez,
depressão,
alcoolismo, abuso de drogas e prejuízos
econômicos1.
Esse tipo de violência em particular
pode englobam tipos específicos e variações
que oscilam de física a verbal, afetam a autoestima, a capacidade de reação e decisão da
pessoa agredida, originando, barreiras e
traumas psicológicos4.
Segundo o Ministério da Saúde3, “a
violência física ocorre quando uma pessoa
está na relação de poder em relação à outra,
causa ou tenta causar dano não acidental, por
meio da força física ou de algum tipo de
arma que pode provocar ou não lesões
externas, internas ou ambas. Sendo
empurrão, tapas, socos, mordidas, chutes,
queimaduras, cortes, estrangulamento, lesões
por armas ou objetos, obrigar a tomar
medicamentos
desnecessários
ou
inadequados, tirar de casa à força, amarrar,
arrastar, arrancar a roupa, abandonar em
lugares desconhecidos, danos à integridade
corporal decorrentes de negligência”.
A violência doméstica é relatada, em
um elevado número de vezes, como queda
acidental, o que a torna oculta. De acordo
com Deslandes5, os dados de violência
doméstica são subnotificados.
_____________
1
2
Professora Mestre do Departamento de Saúde Pública, UFSC, [email protected]
Professor Doutor do Departamento de Saúde Pública, UFSC, [email protected]
81
Souza, P. A. de et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 81-85, jan./jun.. 2006
A violência contra a mulher, no
âmbito interpessoal, é uma das mais difíceis
de serem prevenidas e evitadas. Além de
causar problemas de saúde física e mental, a
relação violenta vai diminuindo a qualidade
de vida da mulher, sua capacidade produtiva
e sua auto-estima6 influencia também a vida
dos filhos7. A violência conjugal acontece em
todos os países independem do grupo social,
econômico ou religioso4.
Nos Estados Unidos, foram realizadas
pesquisas que constataram que a prevalência
da violência física contra as mulheres está
entre 28% e 54,2%, sendo que a cada ano, 2 a
4 milhões de mulheres são vítimas de
violência física e uma em cada 4 famílias
vive em situação de violência doméstica4.
Dados da Organização das Nações Unidas
(ONU) revelam que a cada 4 minutos uma
mulher é espancada no mundo7. Segundo o
Banco Mundial, para cada cinco mulheres
entre 15 e 44 anos, a violência intrafamiliar
representa quase um ano de vida saudável
perdido, com significância similar aos
números de casos de tuberculose, HIV e
enfermidades
cardiovasculares3.
As
estimativas
internacionais
variam
extensamente: de 10 a 69% das mulheres que
relatam agressão física por um companheiro
em sua vida, e de 1 a 52% das mulheres que
sofreram violência conjugal nos últimos 12
meses8.
A mulher inserida em uma situação
de violência muitas vezes não consegue
visualizar o que a faria se libertar. E, para dar
esse suporte, existem instituições que
funcionam como apoio para sua “libertação”
de um relacionamento violento.
Está comprovado que de 20 a 70 %
das mulheres que são vítimas de maus tratos
dentro de um relacionamento conjugal nunca
relataram o assunto a outras pessoas.4
No Brasil, os primeiros frutos das
reivindicações feministas foram a criação dos
Conselhos Estaduais de Direitos das
Mulheres (1982/1983), das Delegacias de
Polícia de Defesa da Mulher e da primeira
Casa Abrigo para Mulheres (1986). Essas
iniciativas formam um espaço de denúncia e
de elaboração de políticas públicas9 para a
diminuição da violência doméstica, mais
especificamente, da violência conjugal contra
a mulher6,9. Em Florianópolis, SC, foi criado
o Centro de Atendimento à Vítima do Crime
(CEVIC), local onde foi realizada a presente
pesquisa. O CEVIC foi fundado em 1997
pelo Governo Federal, por meio do
Ministério da Justiça, em parceria com o
Governo do Estado de Santa Catarina,
através da Secretaria de Estado da Justiça e
Cidadania. O Centro oferece atendimento
assistencial, psicológico e jurídico às vítimas
de crime da grande Florianópolis, sendo que
o maior número de ocorrências é o de
mulheres agredidas fisicamente. As vítimas
são encaminhadas ao serviço pela mídia
(jornais, rádio, televisão), amigos, familiares
e delegacia (quando a denúncia é realizada).
A decisão da denúncia na delegacia parte da
própria vítima e é muitas vezes um fator
contínuo da guerra conjugal, pois o marido
agressor sente-se agredido10.
A maioria das mulheres não realiza a
denúncia na delegacia após a primeira
agressão e demora em média 8 anos para
prestar a primeira denúncia11. Uma das
razões desse adiamento pode ser a
dependência financeira.
O objetivo deste artigo foi identificar
se a dependência financeira (falta de
condições da mulher de se sustentar e/ou os
filhos) é fator determinante para o adiamento
da denúncia na delegacia de polícia.
Método
A
população
investigada
foi
constituída de mulheres vítimas de violência
física conjugal atendidas no CEVIC, em
Florianópolis, no ano de 2002.
Foram convidadas, via telefone, 47
mulheres vítimas deste tipo violência,
atendidas pela instituição, no período de
junho a agosto de 2002, para participarem do
grupo de estudo.
Os encontros foram realizados em
cinco horários sugeridos, que duraram em
média quatro horas, envolvendo relatos da
infância, namoro, noivado, casamento, filhos,
e contaram
com a
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Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 81-85, jan./jun.. 2006
participação de 11 das 47 mulheres
convidadas. Os encontros foram gravados em
fita cassete e transcritos para facilitar a
análise do material.
A metodologia utilizada foi a
qualitativa, na forma de análise de conteúdo
de entrevistas abertas e semi-estruturadas,
trabalhadas em grupo através de grupo focal.
A análise de conteúdo, conforme
Bardin12, pode ser conceituada como “um
conjunto de técnicas de análise das
comunicações que visa obter, por
procedimentos sistemáticos e objetivos de
descrição do conteúdo das mensagens,
indicadores (quantitativos ou não) que
permitam a inferência de conhecimentos
relativos às condições de produção/recepção
(variáveis inferidas) dessas mensagens”.
Para a análise de conteúdo, segundo
12
Bardin , o corpus constituiu-se do material
transcrito das reuniões. A constituição do
corpus de um trabalho segue certas regras,
como a da exaustividade, que é aplicada
quando há ampliação dos temas de pesquisa,
em que não se pode deixar de fora qualquer
elemento. Já a regra da homogeneidade,
segundo Coelho13, determina que “os
documentos devem obedecer a critérios
precisos de escolha e não apresentar
demasiada singularidade fora dos critérios de
escolha”. E a última regra que diz respeito à
pertinência do material de análise, ou seja,
esse material deve se adequar ao objetivo da
análise como fator de informação.
Após a constituição do corpus do
trabalho pelas regras acima citadas, passouse à categorização, que, de acordo com
Coelho13, é uma operação de classificação
dos elementos que constituem o conjunto,
por diferenciação e por reagrupamento,
segundo critérios previamente definidos.
Para preservar suas identidades, as
mulheres receberam o nome de pedras
semi-preciosas: Pérola, Esmeralda, Granada,
Turmalina, Ametista, Jade, Sodalita, Safira,
Ágata, Água Marinha e Turquesa.
O trabalho foi submetido e aprovado
pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFSC.
As mulheres foram informadas de que suas
identidades seriam preservadas e que
questões relativas à violência seriam
abordadas. Todas as mulheres que aceitaram
participar do estudo concordaram em assinar
o termo de consentimento.
Resultados e Discussão
Feito o convite para as quarenta e sete
mulheres, cinco disseram que não tinham
interesse em participar, pois haviam se
reconciliado com seus companheiros
(homens que vivem em um relacionamento
conjugal com essas mulheres); quatro
responderam que não gostariam de participar;
três afirmaram que estavam em tratamento de
saúde; oito não foram encontradas; sete
relataram disponibilidade de participar e
outras vinte confirmaram a participação mas
somente onze participaram de fato.
Todas as mulheres que participaram
do grupo já haviam realizado pelo menos
uma vez a denúncia contra o seu
companheiro na delegacia de polícia.
Um dos pressupostos para o adiamento da
denúncia era o de que a mulher dependesse
financeiramente do companheiro, razão da
inibição para a tomada de atitude, segundo os
relatos contidos na bibliografia.
Os dados, porém, demonstraram que a
mulher vítima de violência muitas vezes é a
provedora do lar, sendo o companheiro o
dependente financeiro, conforme se pode
observar pelos relatos abaixo:
Ágata: eu até montei um barzinho pra ele
embaixo de casa, mas não dava lucro, ele
bebia e pagava pros amigos ... eu trabalhava
... ele ficava em casa ... (...) a casa quem
comprou fui eu, com as minhas economias ...
Ametista: ... Não trabalha, não faz nada, não
faz nada 24 horas por dia, tu só pode ficar
pensando coisa ruim, na vida, então ... eu
sempre dizia pra ele ... eu tô assim doente
por causa de ti, ele ... é ... desceu o sarrafo
em cima, né, e tudo de ruim eu era ... tudo ...
ééé ... depois hoje eu vejo ... ele dizia: ah
por que se eu sair dessa casa quem é que vai
limpar? Essa casa vai viver numa sujeira, ah
... o Junior vai viver não sei como... o que vai
ser do nosso filho? Quem é que vai cuidar
dele? Pois eu trabalhava e trabalhava à
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noite e trabalhava durante o dia queria que
eu trabalhava, eu sou formada ..., queria que
eu tivesse outro emprego, queria que eu
tivesse três emprego, queria dizer que era
formado ..., e tinha vários anúncios no jornal
...
Jade: Chegava tava bêbado, mas deixava ...
ninguém dormia, nós saía pra trabalhar a
criança ir pra escola e ele dormia o resto do
dia ... E aquilo ainda se tornou mais 3 anos,
tanto que chegou um dia e eu disse A CA BÔ,
cada um vai viver a sua vida, o tanto que ele
não quis sair de casa ...
Depreende-se então que, segundo os
relatos apresentados acima, mesmo sendo as
mantenedoras do lar, as mulheres assumem
uma postura de dependência diante do
marido provavelmente, emocional. Estão tão
envolvidas no relacionamento que não
conseguem enxergar as contradições em que
vivem.
Observa-se, todavia, que para
algumas
mulheres,
confirma-se
o
pressuposto: o medo de não conseguir se
sustentar e sustentar os filhos é o fator que as
prende à relação.
Água Marinha: ... tenho medo de não
conseguir me sustentar e os meus filhos ...
agora depois de muito tempo voltei a
trabalhar de recepcionista ...
Esmeralda: ... eu não tenho nada, eu
costurava pra fora ... mas parei, a nossa
casa é alugada, e eu não tenho pra onde ir ...
é ele que manda o dinheiro contadinho para
as compras ...
Outra
questão
levada
em
consideração neste estudo foi o “grau de
escolaridade”. Pode-se afirmar que a sujeição
feminina às normas masculinas não ocorre
apenas devido ao baixo grau de instrução das
mulheres ou à falta dele. Isso pode ser
verificado através dos depoimentos Jade e
Ametista anteriormente citados.
Um sentimento que leva mulheres à
denúncia é a contínua exposição à agressão e
a exaustividade gerada pela situação de
violência, especialmente a vergonha dos
filhos. Outro sentimento detectado é o medo
de que a situação se agrave mais14.
Langley e Levy15 observaram que a violência
também é comum nos casos em que a classe
social a que pertence o marido é mais baixa.
Quando não se sente prestigiado e satisfeito
economicamente, é comum que use a
violência contra a mulher. A educação
machista atribuiu aos homens o papel de
chefe da família e às mulheres a tarefa de
cuidarem dos filhos, o que tem gerado sérios
problemas nos relacionamentos e problemas
psicológicos nos filhos4, visto que a realidade
nem sempre proporciona esses papéis na
nossa cultura atual15.
Conclusão
A violência contra a mulher, como pôde ser
constatado através da bibliografia e em parte
por este trabalho, mesmo atualmente, aparece
ainda recoberta pelo manto da invisibilidade
política, pela vergonha da denúncia, pela
falta de acesso a informações jurídicas, pela
ausência de políticas públicas e pela pouca
legitimidade social que muitas vezes lhe é
atribuída. Principalmente a violência que
ocorre no âmbito doméstico. Há muita
dificuldade de se trabalhar com a questão. A
interferência do público no privado ainda é
muito delicada na questão não legitimada ou
legislada. As relações afetivas são
complexas.
Diversas
formas
de
relacionamento são tidas como "diferentes" e
na realidade fazem parte de um "pacto
relacional", o que poderia servir como “pano
de fundo” para a não denúncia.
As mulheres adiam a denúncia por
motivos diversos (medo de novas agressões,
vergonha, falta de apoio da família,
dependência emocional e de modo que) não
se confirma a hipótese de ser unicamente em
função da dependência financeira. Como se
observou em alguns casos, a mulher era a
responsável pela sustentação financeira do
casal. Manter-se em um relacionamento
violento parece vir da necessidade de um
modelo de complementaridade de um em
relação ao outro, no qual estão envolvidos
jogos de valores, interesses, afirmações e
sentimentos. Pode-se dizer que um suprime o
outro dentro de um jogo simbiótico. Quando
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Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 81-85, jan./jun.. 2006
o “equilíbrio do jogo” e das trocas de poder
dentro do relacionamento “desestabiliza-se”
a mulher vai em busca de auxílio. Segundo
Grossi16, existe um “jogo simbiótico” no qual
existem alternâncias de poder, como se fosse
uma gangorra. A partir do momento em que
ocorre uma desestruturação na sustentação
desse relacionamento violento, a mulher
decide denunciar, procurar ajuda, pois não
está conseguindo sustentação para a relação.
Pode-se observar que a falta de apoio
financeiro e psicológico pode levar a mulher
a não sair do relacionamento, sem, contudo,
ser fator determinante, mas sim, de apoio à
tomada de decisões.
Portanto, nas entrevistas realizadas não foi
possível confirmar o pressuposto da
dependência financeira, mas os dados geram
pistas para uma investigação mais
aprofundada sobre a dependência emocional
em um trabalho futuro.
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EMPODERAMENTO EM UMA INSTITUIÇÃO PÚBLICA DE SAÚDE [Psychology in the
ambit of SUS: practices of promotion of the health and empowerment in a public
institution of health.]
Leiliane G. Raimundo1; Miriam B. Guesser2; Sabrine Ciotta Pereira3
Resumo: O presente artigo tem a finalidade de expor a atuação de estagiárias de Psicologia inseridas em
uma instituição filiada ao Sistema Único de Saúde - SUS, denominada Policlínica Municipal de
Campinas. Esta é tida como uma unidade de saúde de especialidades e de referência do município de São
José. O local não contava com este tipo de serviço, sendo que o trabalho desenvolvido foi pioneiro. Serão
enfocados os projetos direcionados à promoção e prevenção da saúde, através de atividades com grupos
etários, pensando, também, a questão do empoderamento como proposta que ultrapassa modelos
convencionais de atenção à saúde.
Palavras-chave: psicologia da saúde, SUS atenção primária, promoção da saúde, grupos de reflexão,
empoderamento.
Abstract: The present article has the purpose of exposing the performance of probationers of Psychology
inserted in an institution affiliate to the Only System of Health - SUS, denominated Municipal Policlínica
of Campinas. This is had about an unit of health of specialties and of reference of the municipal district of
São José. The place didn't count with this service type, and the developed work was pioneer. The projects
addressed to the promotion and prevention of the health will be focused, through activities with age
groups, thinking, also, the subject of the empowerment as proposal that surpasses conventional models of
attention to the health.
Keywords: psychology of the health, SUS, primary attention, promotion of the health reflection groups,
empowerment.
O presente artigo é o resultado de
atividades desenvolvidas por três estagiárias
do Curso de Psicologia, supervisionadas pela
Professora Maria do Rosário Stotz, na
Policlínica de Campinas, São José/SC,
unidade de especialidades e de referência do
Município. As atividades referem-se ao
Estágio Curricular para conclusão do Curso de
Psicologia da Universidade do Sul de Santa
Catarina – UNISUL - e foram realizadas no
período de março a dezembro de 2004,
perfazendo um total de 180 horas/aula,
distribuídas em 8 (oito) horas semanais em
atividades na própria instituição. A população
envolvida nos projetos desenvolvidos pela
equipe foi a comunidade de São José, área de
__________________
abrangência dos serviços de saúde da
Policlínica.
O interesse pelo estágio se deu pelo
desejo da equipe em estar atuando na área da
saúde, mais especificamente no Programa
Saúde da Família - PSF, visando estratégias
de promoção da saúde e também pela carência
deste tipo de serviço naquela unidade. Tratase, portanto, de um trabalho novo na
instituição, que até então não contava com a
atuação da área da Psicologia no rol dos
serviços que presta à comunidade. Este
trabalho, então, faz parte de um serviço
implantado pela equipe, sendo que a mesma
teve aceitabilidade em todos os projetos
desenvolvidos.
1
Psicóloga e aluna da Especialização Multiprofissional em Saúde da Família (UFSC). Contato: [email protected]
Psicóloga. Contato: [email protected]
3
Psicóloga e aluna da Especialização Multiprofissional em Saúde da Família (UFSC). Contato:
[email protected]
2
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Raimundo, L. G. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 86-92, jan./jun.. 2006
Este artigo tem como objetivo, através
do relato da experiência vivida pela equipe,
problematizar o trabalho da Psicologia com
vistas à promoção da saúde no âmbito do
SUSa. Para tal, convém, a princípio, destacar
que as intervenções realizadas pela equipe, na
Policlínica dividiram-se em dois tipos de
atenção à saúdeb: uma voltada à atenção
primária e outra à atenção secundária.
Direcionada à primeira, foram desenvolvidos
dois projetos, um com um grupo de sujeitos da
terceira idade – Grupo de Reflexão “Um novo
idoso”, na própria Policlínica – e um outro
trabalho com um grupo de adolescentes –
Grupo de Reflexão “Caminhando e Cantando”,
em uma escola da comunidade de Campinas,
área de abrangência da Policlínica.1
O projeto com os idosos foi formulado
a partir do convite para integrar a equipe do
NAMTI
–
Núcleo
Ambulatorial
Multidisciplinar da Terceira Idadec, enquanto
que o projeto com os adolescentes foi uma das
necessidadesd a serem trabalhadas na
instituição, identificadas a partir do
diagnóstico institucional da Policlínica,
realizado num primeiro momento.
Em relação ao segundo tipo de atenção
à
saúde
(secundária),
foi
realizado
Atendimento Clínico Individual com pacientes
encaminhados via médicos do PSF, o que
também foi uma necessidade identificada
através do diagnóstico realizado. Articulando a
relação atenção primária - promoção de saúde,
serão destacados nos projetos desenvolvido
com os idosos e com os adolescentes esta
perspectiva.
Optou-se por trabalhar com grupos,
pois, segundo Zimerman (1997), as atividades
grupais objetivam um compartilhar entre
pessoas com características em comum, uma
vez que, favorece o bem-estar das pessoas,
pois, facilita a emergência de significados
comuns, permitindo que estes verbalizem seus
conflitos,
seus
desejos,
favorecendo
aproximação interpessoal. Neste sentido,
trabalhou-se na perspectiva de grupos etários
por compreender que esta modalidade de
trabalho configura-se como uma técnica
significativa no tocante à promoção da saúde.2
Segundo Néri (2001) a Psicologia,
enquanto um campo de conhecimento, vê o
desenvolvimento ontogenético como um
processo que dura toda a vida e elimina a
supremacia de qualquer estágio ou tempo de
vida sobre o outro, de modo que, em todos os
estágios do curso de vida operam tanto
processos contínuos (cumulativos) como
descontínuos (inovativos). Qualquer mudança
significa simultaneamente ganhos e perdas. As
pessoas apresentam capacidade de mudanças e
adaptação que podem ser maiores ou menores,
dependendo das suas condições de vida e
experiências anteriores. Desta forma, o
partilhar destas experiências permite a
continuidade do desenvolvimento humano,
independente da idade cronológica (p. 26-33).3
Em relação ao grupo a ser
desenvolvido com os sujeitos do NAMTI c, o
primeiro encontro teve como objetivo, a
apresentação da proposta, através de folders, e
o convite para a participação às pessoas
interessadas. Logo, de início, percebeu-se a
necessidade de dividir o grande grupo em dois,
devido o grande número de pessoas. O projeto
do grupo de reflexão com idosos contou,
então, com o Grupo A e o Grupo B, cujos
encontros foram realizados quinzenalmente,
cada grupo em uma semana diferente, no
período da manhã, das 9h às 10h e 30min., na
sala de Educação para Saúde da Policlínica,
com uma média de 17 participantes.
O projeto do grupo de adolescentes foi
divulgado através de folders, cartazes
distribuídos pela escola e visitas as salas de
aula como convite para a triagem. A partir da
triagem
organizaram-se
dois
grupos
respeitando o horário de aula, de modo que
quem estudava no período matutino
freqüentava o grupo vespertino, e vice-versa: o
grupo matutino e o vespertino com encontros
quinzenais, porém, ambos no mesmo dia. O
encontro do grupo matutino se dava das 10h às
11h e 30 min. e o vespertino das 15h às 16h e
30 min., na sala de vídeo da Escola Laércio
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Caldeira de Andrada e contava com uma
média de três a seis participantes.
Após a organização dos projetos, foi
elaborado um cronograma dos encontros a
serem realizados no ano, registrados em
cartões
que
foram
distribuídos
aos
interessados, sendo que no projeto realizado
com os idosos ocorreram 13 encontros com o
grupo A e 14 com o grupo B, e com os
adolescentes foram 09 encontros.
Buscando referência nos conceitos de
Promoção da Saúde e Empoderamento que
integram estratégias de trabalho nos serviços
de saúde pública, o presente artigo abre um
debate acerca das possíveis contribuições da
Psicologia no campo dos cuidados primários
de saúde como promotora de saúde.
A Declaração de Alma-Ata documento que registra os princípios
discutidos na I Conferência Internacional
sobre Cuidados Primários, de 1978 - define
Cuidados Primários como sendo “[...] cuidados
essenciais de saúde baseados em métodos e
tecnologias práticas, cientificamente bem
fundamentadas e socialmente aceitáveis,
colocadas ao alcance universal de indivíduos e
famílias da comunidade, mediante sua plena
participação e [...]” (BRASIL, 2001a, p.15). 4
Seguindo a articulação já mencionada,
cuidados primários - promoção da saúde, os
projetos referidos foram elaborados com o
objetivo de proporcionar a cada população
específica a promoção da saúde voltada,
também, para os aspectos psicológicos dos
sujeitos, integrando uma concepção de saúde
ampliada referenciada pelo relatório da 8ª
Conferência Nacional de Saúde, segundo o
qual:
[...] a saúde é a resultante das condições de
alimentação, habitação, educação, renda,
meio-ambiente, trabalho, transporte, emprego,
lazer, liberdade, acesso e posse da terra e
acesso a serviços de saúde. É, assim, antes de
tudo, o resultado das formas de organização
social da produção, as quais podem gerar
desigualdades nos níveis de vida (BRASIL,
1986, p. 12).5
Diante de uma concepção de saúde
ampliada a Psicologia deve incluir-se,
também, com uma concepção de homem e de
mundo ampliada, tendo uma visão integral da
subjetividade e do coletivo.
A concepção de saúde adotada em uma
sociedade é de fundamental importância, uma
vez que é o norte para as formas de se pensar a
saúde e conseqüentemente para orientar as
práticas voltadas à saúde da população.
Mendes (1996, p. 235), em sua discussão
acerca de um novo paradigmaf sanitário que
leva a uma nova prática sanitária, marca esta
questão6. Para o autor “A prática sanitária é a
forma como uma sociedade, num dado
momento, a partir do conceito de saúde
vigente e do paradigma sanitário hegemônico,
estrutura as respostas sociais organizadas ante
os problemas de saúde”. O novo paradigma
baseia-se em uma concepção de processo
saúde-doença ampliada, que relaciona saúde
com condições de vida, concepção esta que se
contrapõe ao conceito de saúde postulado pelo
paradigma Flexnerianog. O resultado é a nova
prática sanitária que para Mendes é “[...] uma
nova forma de resposta social organizada aos
problemas de saúde, referenciada pelo
conceito positivo de saúde e pelo paradigma
da produção social da saúde.” (p. 241 - 243). 6
Para discutir promoção e prevenção de
saúde, é importante, de acordo com Buss
(2003) entendê-las como ações distintas.7
Dentro das práticas da atenção básica toma-se
como norte a promoção da saúde por se tratar
de uma ação bastante difundida desde a I
Conferência sobre Promoção da Saúde em
1986, da qual resultou a Carta de Ottawa. De
acordo com esta carta, Promoção da Saúde é:
[...] o processo de capacitação da comunidade
para atuar na melhoria de sua qualidade de
vida e saúde, incluindo uma maior
participação no controle deste processo. Para
atingir um estado de completo bem-estar
físico, mental e social os indivíduos e grupos
devem saber identificar aspirações, satisfazer
necessidades e modificar favoravelmente o
meio ambiente (BRASIL, 2001b, p.19).8
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Quanto à prevenção da saúde, segundo
Buss (2003, p.33), tem-se que a mesma [...]
“orienta-se mais às ações de detecção, controle
e enfraquecimento dos fatores de risco ou
fatores causais de grupos de enfermidades ou
de uma enfermidade específica; seu foco é a
doença e os mecanismos para atacá-la
mediante o impacto sobre os fatores mais
íntimos que a geram ou precipitam”. Deste
modo, enquanto o objetivo da prevenção é
evitar a doença, a promoção da saúde propõe
buscar continuamente um nível de saúde
sempre melhor. Por isso, é possível afirmar
que o enfoque da prevenção é a doença e o da
promoção, a saúde. O autor afirma: [...] “as
estratégias de promoção da saúde são mais
integradas e intersetoriais, bem como supõem
uma efetiva participação da população desde
sua formulação até sua implementação”.7
Enredado neste processo, tomou-se o
empoderamento por ser um conceito, também
bastante referenciado, e que constitui uma das
ações norteadoras da promoção da saúde. De
acordo com Gibson e Airhihenbuwa (apud
TEIXEIRA, 2002, p.1) “Empoderamento, em
Promoção da Saúde, é sempre definido como
‘um processo que ajuda as pessoas a firmar seu
controle sobre os fatores que afetam a sua
saúde’”. De acordo com Labonte, Bersntein et
al (apud TEIXEIRA, 2002, p. 4) existem
algumas estratégias de empoderamento, como:
“[...] as várias formas de desenvolvimento de
grupos de suporte pessoal, incluindo educação
crítica, ajuda mútua, suporte terapêutico”.9
Seguindo esta concepção, os grupos
foram formados a partir de uma demanda
espontânea, sendo que foi feito todo um
trabalho de divulgação sobre o que seria o
grupo e quais os seus objetivos, de acordo com
as características de cada grupo. O molde de
trabalho em grupo utilizado nos projetos foi o
de “Grupo de Reflexão e Informação” que,
segundo Coronel (1997), permite a resolução
das ansiedades quando estas estão relacionadas
ao ensino/aprendizagem e à informação.10
Os grupos desenvolveram-se partindo
da premissa de que somente às pessoas
envolvidas no processo, seja ele qual for,
cabem as decisões e direção dos seus desejos.
Por isso, a cada final de encontro era acordado
com o grupo o tema que gostariam de discutir
no encontro seguinte. Trabalhou-se de acordo
com as necessidades emergidas no grupo, ou
seja, a cada encontro partia-se do que o grupo
trazia como importante naquele momento e
somente sobre esta demanda é que se
intervinha com informações que se faziam
necessárias; pontuavam-se e assinalavam-se
questões relevantes trazidas e enfatizadas pelo
grupo com o intuito de permitir que o tema
não se perdesse e seguisse o movimento do
grupo. O fechamento dos grupos era feito
sobre o que foi dito durante o encontro,
resgatando-se as falas e sintetizando o assunto
em questão, frisando a importância da
experiência individual e o compartilhar grupal.
Marca-se, aqui, o papel fundamental do
facilitador do grupo, no caso, Psicólogos,
como sendo o diferencial do grupo de reflexão.
Em casos em que se percebia que as falas
tinham uma forte carga afetiva tomava-se
cuidado para que todas as questões levantadas
não se perdessem e fossem resgatadas ao final,
buscando delinear o aspecto das diferenças de
experiências de cada sujeito dentro de sua
singularidade e a importância do resgate e
integração das experiências vividas por cada
um.
Quanto à característica do Grupo de
Reflexão e Informação, aberto a trabalhar
temáticas pertinentes às vivências de cada
faixa etária, advinda dos próprios sujeitos,
percebeu-se, inicialmente, que a dinâmica do
grupo estava sempre voltada para que as
facilitadoras trouxessem temas prontos, de
modo que os participantes ficassem como
ouvintes, denotando o quanto a cultura de
“receber o conhecimento pronto” ainda
perdura. Este aspecto remonta uma forma de
funcionamento estereotipada dos serviços de
saúde, herdada do modelo hegemônico
médico-centradoh, em que a população estava
acostumada a delegar ao médico as decisões
sobre sua saúde.
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Raimundo, L. G. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 86-92, jan./jun.. 2006
Hoje, fala-se em uma nova forma de
atuar sobre a saúde, não mais partindo de
decisões externas à realidade dos sujeitos, mas,
ao contrário, partindo desta realidade e
transferindo aos sujeitos o papel ativo sobre o
seu estado de saúde. Esta prática se solidifica
sobre a concepção de saúde ampliada.
Segundo Mendes (1996, p. 236), as
novas práticas voltadas à saúde, baseadas em
“[...] novas concepções de processo saúdedoença - surgidas nos países do primeiro
mundo em meados dos anos 70 -, procuram
[...]” articular quatro dimensões explicativas:
biologia humana, estilos de vida, meio
ambiente e serviços de saúde”.6
Resgata-se, aqui, o empoderamento
enquanto estratégia de promoção da saúde que
vem ao encontro da concepção de saúde
ampliada. A Carta de Ottawa propõe
estratégias de que visam a promoção da saúde
considerando o processo de empoderamento
dos sujeitos envolvidos, entre estas estratégias
está o “Desenvolvimento de Habilidades
Pessoais” que se refere à importância de “[...]
capacitar as pessoas para aprender durante
toda a vida, preparando-as para as diversas
fases da existência, o que inclui o
enfrentamento das doenças crônicas e causas
externas”.8 O trabalho da equipe de Psicologia
na Policlínica sugere exatamente este
encontro, pois a partir do momento que se
proporcionou a vivência de trocas de
experiências em comum - como no caso de
grupos etários – as pessoas envolvidas neste
processo tornaram-se mais preparadas para
elas mesmas lidarem com situações que
pudessem surgir no intercurso de suas vidas,
inclusive no que se refere ao processo de
saúde-doença.
No grupo com os idosos, este aspecto
ficou evidenciado ao longo dos encontros nos
discursos dos participantes, principalmente no
último encontro em que foi discutido o
aproveitamento do grupo. De um modo geral,
foi trazido o quanto a participação no grupo foi
importante em vários aspectos, como no caso
de uma idosa, de 78 anos, que ao ingressar no
grupo relatou ter dificuldades de se expressar
devido a timidez e um certo nível de tristeza.
À medida que foi se integrando ao grupo ela
passou a participar ativamente, falando sobre
seus sentimentos, angústias e sobre sua vida de
um modo geral. Ao final, trouxe, claramente,
as mudanças ocorridas em sua vida cotidiana,
de modo que até mesmo em suas consultas
médicas passou a falar mais de si e de seus
problemas de saúde, atitude esta que,
anteriormente, sentia-se insegura para fazer.
Outro caso marcante foi de um idoso
de 75 anos, militar aposentado, que trouxe, ao
longo dos encontros, as mudanças ocorridas
em sua vida pessoal. No primeiro encontro,
frisou que nunca falou de si mesmo e que se
achava “esquisitão”. No decorrer dos
encontros foi trazendo questões pessoais com
mais facilidade e no último encontro, também,
marcou bastante o quanto a participação no
grupo refletiu em suas relações e no seu modo
de viver a vida.
Com os adolescentes, este aspecto,
também, foi marcado. Um exemplo foi um
adolescente de 13 anos que iniciou no grupo
com bastante ansiedade relativa a alguns
comportamentos seus que considerava “antisocial”. Através de temas refletidos no grupo,
ele conseguiu baixar sua ansiedade de maneira
que passou a lidar com algumas situações de
uma forma mais tranqüila. Este fato foi, não só
percebido pelas facilitadoras, mas trazido no
próprio discurso do adolescente.
Estes são apenas alguns exemplos de
mudanças positivas ocorridas através dos
grupos, demarcando sua relevância no
processo de promoção da saúde.
Outro ponto a ser considerado é a
relação feita entre empoderamento e o
conceito de Apoio Social. De acordo com a
classificação de apoio social de Arrosi (apud
TEIXEIRA, 2002, p. 14) pôde-se identificar
nos grupos o “[...] apoio emocional, que é
referente à ajuda emocional, tais como
carinho, afeto, estima, valor, etc.”.10 No
decorrer dos encontros com os grupos,
principalmente dos idosos, este tipo de apoio
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social ficou evidente durante as trocas de
experiências, tanto por parte dos próprios
integrantes, os quais ouviam a fala um do
outro, e, na medida do possível, devolviam
estas falas com palavras de reconhecimento
do tipo “Eu já passei por isso”; quanto por
parte das facilitadoras, que tinham o cuidado
da escuta que respeitava cada sentimento que
permeava as falas.
Outra questão que merece ser pontuada
é o “insight” ocorrido no grupo em relação ao
processo de aprendizagem como algo que não
tem tempo determinado para ocorrer. Ficou
marcado que é possível aprender ao longo da
vida, permitindo, assim, que os sujeitos
revejam valores e pré-conceitos tidos como
definitivos.
Diante destes resultados positivos,
pode-se afirmar que as necessidades
anteriormente levantadas foram, de alguma
forma, trabalhadas e, embora um dos grupos
de adolescentes não tenham se mantido até o
fim, o grupo dos idosos (ambos) conseguiu
configurar uma identidade de grupo, com
estabelecimento de vínculo e com resultados
positivos, também, no que tange à
singularidade dos participantes. O retorno
positivo por parte dos participantes confirmou
mudanças percebidas pela equipe.
A partir do momento que se abre um
espaço para trocas de experiências, permite-se
a reflexão “sobre” e, consequentemente,
mudanças de atitudes negativas assumidas
frente à vida. Ao falar, o sujeito coloca em
questão situações que, embora existam
diferenças, coincidem com situações vividas
por outros participantes, facilitando, assim, o
apoio mútuo.
A vivência grupal, então, pode ser
pensada como uma das possibilidades de
fomentar o empoderamento dos sujeitos
visando a promoção e manutenção da saúde,
de modo que, a Psicologia, com seu corpo de
conhecimentos a serviço do bem estar e
qualidade de vida do ser humano, pode incluirse nesse processo.
Notas de rodapé
a
Constitui o Sistema Único de Saúde – SUS,
[...] “o conjunto de ações e serviços de saúde,
prestados por órgãos e instituições públicas
federais, estaduais e municipais, da
administração direta e indireta e das fundações
mantidas pelo Poder Público”. Entre os
princípios e diretrizes que norteiam os serviços
do
SUS
estão:
da
universalidade,
integralidade,
equidade,
autonomia,
participação da comunidade, regionalização e
hierarquização (Lei Orgânica 8.080 de 19 de
setembro de 1990).
b
Mendes (1996) refere-se a três níveis de
atenção à saúde: Atenção Primária, que
envolve a promoção da saúde e prevenção da
ocorrência de enfermidades e profilaxia;
Atenção Secundária, que se refere á prevenção
da evolução das enfermidades ou execução de
procedimentos diagnósticos ou terapêuticos;
Atenção Terciária, que diz respeito á invalidez
ou reabilitação dos enfermos (p. 245).
c
O NAMTI é um projeto implantado
recentemente com o objetivo de trabalhar com
a
terceira
idade
numa
perspectiva
interdisciplinar. Conta com uma equipe
composta por um Médico, uma Assistente
Social, uma Enfermeira, uma Professora de
Educação Física, uma Nutricionista e
Estagiárias de Psicologia.
d
Uma outra necessidade a ser trabalhada,
surgida a partir do diagnóstico, foi a de estar
desenvolvendo um projeto junto aos
funcionários da Policlínica. Este trabalho não
pode ser realizado, no momento, devido ao
fluxo de trabalho do local que dificultou a
disponibilização dos funcionários para estar
desenvolvendo um trabalho efetivo.
e
Grifo nosso.
f
Mendes (1996) conceitua paradigma como
sendo o “conjunto de elementos culturais, de
conhecimentos e códigos teóricos, técnicos e
metodológicos compartilhados pelos membros
de uma comunidade científica” (p. 237).
g
De acordo com Mendes (1996), este
paradigma “consolida-se pelas recomendações
91
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Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p. 86-92, jan./jun.. 2006
do famoso Relatório Flexner, publicado em
1910, pela Fundação Carnegie” e tem como
elementos centrais o mecanismo (“analogia do
corpo humano com uma máquina”), o
biologismo (foco na natureza biológica das
doenças), o individualismo (exclusão dos
aspectos sociais da vida dos indivíduos), a
especialização (“parcialização abstrata do
objeto global”), a tecnificação (investimento
em instrumentos para intervenções médicas) e
o curativismo (ênfase nos aspectos curativos).
Todos estes aspectos norteiam o conceito de
saúde flexneriano como sendo “ausência de
doença” (p. 238).
h
Este modelo de atenção à saúde fundamentase na concepção de saúde como sendo
ausência de doença “e a organização dos seus
serviços é medicamente definida e tem como
objetivo colocar à disposição da população
serviços preventivos e curativo-reabilitadores
acessíveis, de conformidade com os elementos
ideológicos do flexnerianismo” - citado
anteriormente - (MENDES, 1996,.p. 236)
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Nacional de Saúde Pública, 2002. 105 p.
Disponível
em:
URL:
http://portalteses.cict.fiocruz.br/transf.
92
Natividade, C. A. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p.93-100, jan./jun.. 2006
NÍVEL DE INFORMAÇÃO DOS PACIENTES DO HU/UFSC A RESPEITO DO
RECEEITUÁRIO MÉDICO [HU/UFSC outpatiens information level about their medical
prescription]
Caroline Alves Natividade1; Cintia Vitto Bongiollo1; Célia Maria Teixeira de Campos2;
Aline Cláudia de Mello2; Maria Bernadete de Souza3
Resumo: A prescrição é um documento de consulta ao paciente que deve ser emitida completa, correta e
legível. No presente trabalho foi realizada uma pesquisa com os pacientes provenientes do ambulatório ou
emergência do HU/UFSC com o objetivo de avaliar quanto o mesmo entende sobre o seu receituário
médico. Os resultados obtidos revelaram que os pacientes estavam orientados pelos médicos quanto ao
uso correto dos medicamentos, facilitando a dispensação pelo farmacêutico, reduzindo os erros de
medicação.
Palavras-chave: prescrição, uso correto de medicamentos, dispensação.
Abstract: The prescription is a patient’s consultation document. Information on it should be correct,
complete and legible. The present work was designed to evaluate how much clinic or emergency
HU/UFSC patients undertand about their medical prescription. According with the obtained results,
patients were instructioned by the physicians about the correct use of medication. This reduce medications
errors and can aid the pharmacist in health care delivery.
Keywords: medical prescription, correct use of medication, health care delivery.
para alcançar o que foi proposto pela lei. A sua
definição e a inserção no âmbito da política
Durante a 8a. Conferência Nacional de nacional de saúde é um elemento fundamental
Saúde, realizada em Brasília no ano de 1986, para a implementação de ações capazes de
elaborou-se um projeto para a criação de um promover a melhoria das condições de
Sistema Único de Saúde (SUS). A Constituição assistência à saúde da população 5-7.
de 1988 incorporou esta proposta. A
A atenção farmacêutica compreende
regulamentação do SUS, em 1990, deu-se atitudes, valores éticos, comportamentos,
através da Lei Orgânica de Saúde 8080/90 e da habilidades,
funções,
conhecimentos,
Lei 8142 1,2.
compromissos e co-responsabilidades na
Dentre
os
princípios prevenção de doenças, promoção e recuperação
éticos/doutrinários do SUS destacam-se: a da saúde de forma integrada à equipe
universalidade, a equidade e a integralidade. multiprofissional. É a interação direta do
Como atribuição, a execução das ações de: farmacêutico com o usuário, sendo este o
vigilância sanitária e epidemiológica, saúde do principal foco do profissional e não o
trabalhador, assistência terapêutica integral, medicamento. Também, cabe ao profissional
inclusive a assistência farmacêutica3, 4.
garantir o acesso, racionalização, adesão e
A assistência farmacêutica tem como farmacoterapia com qualidade, segurança e
objetivo garantir a acessibilidade e o uso eficácia 8-11.
racional de medicamentos como ferramentas
Introdução
______________________
1 Acadêmicas do Curso de Farmácia da Universidade Federal de Santa Catarina.
2 Professoras do Departamento de Ciências Farmacêuticas/ CCS/ UFSC. E-mail: [email protected].
3 Farmacêutica – Serviço de Farmácia do HU
93
Natividade, C. A. et al.
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Dentro da assistência farmacêutica, a
dispensação consiste no último elo entre a
complexa cadeia de eventos envolvendo o
medicamento e o paciente. É o ato
farmacêutico de distribuir um ou mais
medicamentos a um paciente, geralmente,
como resposta a apresentação de uma
prescrição elaborada por um profissional
autorizado. Neste momento é possível informar
e orientar o paciente quanto ao uso correto do
medicamento e fornecer esclarecimentos acerca
da prescrição, garantindo que a terapia
medicamentosa se faça completa e sem erros.
Todo o processo de atenção farmacêutica deve
envolver as atitudes de respeito aos princípios
da bioética, as habilidades de comunicação e os
conhecimentos técnico-específicos12, 13. A
partir disto, observa-se a importância do
farmacêutico em todas as etapas da assistência
farmacêutica, destacando o seu papel
insubstituível na dispensação. Outro fator a ser
relatado durante a dispensação é orientar o
paciente a respeito do armazenamento de seus
medicamentos. Este é um conjunto de
atividades destinadas a protegê-los contra os
riscos de alterações físico-químicas e
microbiológicas, garantindo a qualidade e
segurança dos mesmos durante a estocagem1316
.
Portanto, os pacientes precisam de
informações, instruções e advertências que lhes
permitam ter os conhecimentos necessários
para aceitar e seguir o tratamento e para
adquirir as habilidades necessárias para
administrar as formas farmacêuticas de
maneira adequada. A informação deve ser
oferecida em linguagem clara e fácil, e se faz
necessário que o paciente repita com as suas
palavras todas as informações para assegurar
que ele a tenha entendido 17.
Ao mesmo tempo em que o
medicamento é um importante insumo no
processo de atenção à saúde, pode também se
constituir em fator de risco quando utilizado de
maneira inadequada. A morbi-mortalidade
relacionada ao uso de medicamentos constitui
um sério problema de saúde coletiva tanto no
Brasil quanto em vários outros países. A
maioria das falhas na farmacoterapia ocorre em
função da má utilização por parte dos
pacientes9, 10.
A prescrição é o processo de escolha e
indicação de uma terapêutica adequada para o
paciente, consciência do diagnóstico preciso. É
a indicação por escrito de medicamentos a
serem usados e condutas a serem adotadas.
Consiste no elo chave da idéia de
racionalização de consumo de medicamentos.
Um receituário deve incluir: nome, endereço,
telefone, número do Conselho Regional de
Medicina ou Odontologia (CRM, CRO) e sua
devida especialidade; identificação do paciente
(nome, sexo e idade); informações essenciais
do medicamento (nome, posologia, forma
farmacêutica, via de administração, tempo e
quantidade suficiente para o tratamento,
concentração do fármaco e intervalo
posológico). A condição mais importante é que
a prescrição seja clara e legível, já que 15%
dos erros de medicação são resultados de erros
provenientes de uma prescrição ilegível e
dificuldade de interpretação do receituário 18-20.
Com
isto,
uma
farmacoterapia
apropriada permite obter uma assistência
sanitária segura e econômica, enquanto que o
uso inadequado de medicamentos tem
importante conseqüência tanto para os
pacientes como para a sociedade em geral. É
necessário assegurar sua utilização racional e
econômica em todos os países, independente
do seu nível de desenvolvimento. Os médicos e
os farmacêuticos têm uma atribuição
fundamental a desempenhar, no que se refere a
atender as necessidades do indivíduo e da
sociedade a este respeito 4.
Para isso, o presente estudo tem como
objetivo de verificar se os usuários que
procuram a Farmácia Básica do SUS do
HU/UFSC estavam orientados pelos médicos
quanto ao uso seguro e correto dos
medicamentos.
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Metodologia
Local
O estudo foi realizado na Farmácia
Básica do Hospital Universitário da UFSC
(HU/UFSC), com pacientes que deixaram o
ambulatório ou emergência.
Pacientes
Foram entrevistados pacientes de todas
as idades e ambos os sexos moradores de
Florianópolis que apresentavam o cartão SUS.
Os usuários com idade inferior a 15 anos e
idosos, cuja administração do medicamento era
feita por outras pessoas, o questionamento foi
realizado com o responsável. Estes foram
selecionados por meio de uma amostragem
aleatória, no período de 15/03/2005 a
29/04/2005, atingindo um total de 120
entrevistados.
Coleta de dados
Para realização do trabalho, foi feito um
estudo piloto para a validação do instrumento
de coleta de dados. Os usuários foram
entrevistados individualmente, em local
reservado a respeito do nível de informação de
seu receituário, mediante perguntas relativas ao
nome e identificação do medicamento
prescrito; se o paciente já o utilizou; com qual
finalidade; conhecimento da dose, dos horários
e como se deve administrá-lo(s); se foi
orientado pelo médico para tomar alguns
cuidados especiais durante o tratamento
medicamentoso; noções de como manusear
o(s) medicamento(s), e por fim, o quanto a
receita é legível. Durante a conversa foi
permitido ao paciente consultar sua receita para
responder
as
questões
relativas
ao
medicamento. O usuário foi questionado
somente após sua aceitação, mediante termo de
compromisso assinado. Este projeto (nº
104/05) foi aprovado pelo Comitê de Ética em
Pesquisa em Seres Humanos da Universidade
Federal de Santa Catarina.
Avaliação dos dados
Como era permitido ao paciente
consultar a receita durante a pesquisa,
considerou-se corretas as respostas em que o
relato do usuário coincidia com os dados da
receita e, também, nos casos em que utilizavam
termos populares, porém, com o mesmo
sentido das informações passadas a eles.
Para questões em que sabia apenas
parte da resposta (informações incompletas),
seu conhecimento era considerado razoável. As
respostas incorretas eram aquelas em que o
entrevistado não possuía informação alguma,
ou quando respondia incorretamente aos itens
em questão.
Resultados e discussão
A tabela 1 mostra que a maior parte dos
usuários participantes do estudo são do sexo
feminino (69,17%). Com relação a idade dos
pacientes, a prevalência foi da faixa etária de
45 a 60 anos.
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Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p.93-100, jan./jun.. 2006
Tabela 1: Prevalência do sexo e idade dos pacientes
Características
Sexo
Feminino
Masculino
Faixa Etária
0  15
15  21
21  45
45  60
acima de 60
Freqüência
83 (69,17%)
37 (30,83%)
29
06
32
34
19
(24,17%)
(5,00%)
(26,67%)
(28,33%)
(15,83%)
A tabela 2, a seguir, informa os resultados obtidos no estudo referentes a cada pergunta
feita ao usuário.
Tabela 2: Resultado total dos dados obtidos pelo instrumento de coleta de dados
Pergunta
Sim (%)
Razoável
(%)
Conhece o(s) medicamento(s) receitado(s)
65,00
11,67
Consegue identificar as informações contidas na receita
65,83
12,50
Já utilizou o medicamento alguma vez
78,33
----Sabe para qual doença está sendo tratado
99,17
----Sabe a dose e como deve(m) ser administrado(s) o(s) 77,50
3,33
medicamento(s)
Sabe os horários de administração
78,33
4,17
Foi orientado a tomar alguns cuidados especiais durante o 46,67
1,66
tratamento
Tem noção de como manusear e armazenar
os 44,17
11,66
medicamentos
Do total dos indivíduos indagados a
respeito do nível de informação em relação ao
seu receituário; 65% destes conheciam os
medicamentos prescritos, sendo que foram
consideradas corretas todas as respostas em
que o paciente não confundia o medicamento
prescrito com o nome de outro qualquer;
78,33% já os haviam utilizado anteriormente e
99,17% sabiam qual patologia estava sendo
tratada.
Identificação do medicamento e outras
informações contidas na receita: Em relação a
esta questão, a receita era legível para 65,83%
dos entrevistados. Foram consideradas
respostas corretas todas aquelas em que o
paciente conseguia ler a receita, sem ficar com
nenhuma dúvida.
Não (%)
23,33
21,87
21,67
0,83
19,17
17,50
51,67
44,17
Dose e Administração: 77,5% dos
indivíduos estavam orientados pelos médicos,
já que havia concordância entre a sua resposta
e a informação contida na receita (a forma
farmacêutica, quantidade a ser administrada e
via de administração).
Horários: Observou-se que 78,33% dos
usuários sabiam os horários corretos de
administração dos medicamentos, visto que
foram julgadas corretas as respostas em que o
usuário respondia o intervalo entre doses (Ex:
de 8 em 8 horas) ou quantas vezes ao dia
utilizavam a medicação (Ex: 3 vezes ao dia).
Cuidados
especiais
durante
o
tratamento: Dos 120 entrevistados, 51,67%
não estavam orientados pelos médicos em
relação a esta questão. As respostas corretas
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Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p.93-100, jan./jun.. 2006
eram aquelas em que o paciente sabia de
informações e cuidados suficientes no que diz
respeito à patologia e ao medicamento.
Armazenamento e manuseio dos
medicamentos
(conta-gotas/aplicador
vaginal): Neste item foi verificado um
resultado igual de 44,17% entre os indivíduos
orientados pelos médicos e não orientados.
Para esta questão ser considerada correta, o
paciente teve que descrever como utilizava o
conta-gotas e/ou aplicador vaginal. Com
relação ao armazenamento foram julgadas
corretas as respostas em que os usuários
sabiam que deviam deixar o medicamento
longe de umidade (banheiro), calor (cozinha) e
evitar luz solar ou artificial incidente.
Na tabela 3, constam os lugares
relatados mais utilizados pelos pacientes para
o armazenamento de seus medicamentos.
Tabela 3: Locais relatados de armazenamento dos medicamentos pelos pacientes.
Local
Porcentagem
Cozinha
45,83
Quarto
35,00
Sala
12,50
Banheiro
4,17
Copa
1,67
Geladeira
0,83
Como informa o gráfico 1, 65,83% dos pacientes em estudo conseguiram identificar
todas as informações contidas no receituário.
100
freqüência
80
60
40
20
0
Sim
Não
Razoável
Respostas
Gráfico 1- Percentagem de respostas corretas quanto a identificação das informações contidas nos
receituários avaliados.
O fato de se obter um resultado positivo
em relação a esta questão pode ser explicado,
pois 78,33% dos pacientes já utilizaram os
medicamentos prescritos alguma vez. Além
disto, verificou-se que dos 120 entrevistados,
40 utilizavam os medicamentos continuamente.
Isto explica o fato de 65% dos usuários
conhecerem o nome do medicamento que estão
utilizando e 99,17% sabiam qual patologia
estava sendo tratada.
Percebeu-se que alguns destes pacientes
conseguiam identificar os dados contidos no
receituário em função do uso rotineiro destes
medicamentos, o que levava a uma dedução
das
informações.
Deve-se
levar
em
consideração que para 21,67% dos usuários a
receita era considerada ilegível e que 12,5%
conseguiam identificar apenas parte das
informações, dificultando assim uma adesão
completa ao tratamento. Se o paciente não for
orientado pelo médico e/ou farmacêutico,
provavelmente, apresentará dúvidas quanto à
utilização dos medicamentos, sendo que o
último recurso para o esclarecimento de suas
dúvidas seria o receituário legível.
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A partir dos gráficos 2 e 3, verificou-se informações a respeito da dose e horários de
que uma receita preenchida completa e administração.
corretamente, também auxilia o usuário a saber
100
100
80
% pacientes
freqüência
80
60
40
60
40
20
20
0
Sim
Não
Razoável
Resultados
0
Sim
Não
Razoável
Respostas
Gráfico 2- Percentagem de respostas corretas
quanto ao nível de conhecimento sobre dose e
administração.
Gráfico 3- Percentagem de respostas corretas
quanto ao nível de conhecimento sobre o horário
de uso dos medicamentos.
Embora a maioria dos pacientes tenha
sido orientada pelo médico quanto à dose e
horário de administração do medicamento
(77,5% e 78,33%, respectivamente), verificouse que no momento da dispensação, o
indivíduo não conseguia reproduzir o que lhe
havia sido informado. Isto pode ser explicado
pelo fato dos usuários se prenderem a doença e
diagnóstico durante a consulta, não dando tanta
importância às explicações dadas pelo
profissional da saúde (médico, dentista) a
respeito do(s) medicamento(s) indicado(s).
Como durante a pesquisa foi permitido
consulta a receita, observou-se que mesmo os
indivíduos que não recordavam das
informações
conseguiam
responder
corretamente as perguntas relativas à
administração dos medicamentos.
Com relação aos cuidados especiais que
o paciente deve ter durante o tratamento,
51,67% destes não foram orientados pela
equipe de saúde (médico, dentista, enfermeiro)
a respeito de cuidados na alimentação; prática
de exercício físico; não ingerir bebida
alcoólica; evitar cigarros, relação sexual; não
interromper o tratamento. Destes 46,67%
foram orientados e 1,66% receberam instruções
de forma incompleta. As informações
mencionadas
anteriormente devem
ser
completadas pelo farmacêutico no momento da
dispensação, já que somente este profissional
tem conhecimento de cuidados relativos aos
fármacos.
Durante a pesquisa, os usuários foram
abordados a respeito do manuseio e
armazenamento dos medicamentos. Obteve-se
uma parcela muito pequena dos entrevistados
que utilizavam aplicador vaginal e/ou contagotas, todavia estes se apresentavam orientados
pelos médicos. Segundo Marin e colaboradores
(2003), o medicamento armazenado em local
inadequado (luz solar e artificial incidente,
umidade, calor) pode ter suas propriedades
físico-químicos alteradas, o que o torna
inapropriado para o tratamento. Verificou-se
para esta questão um resultado igual de 44,17%
dos usuários sabiam onde guardar e os outros
44,17% estavam desinformados a respeito do
local de armazenamento.
98
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Como mostrou a tabela 2, de modo
geral os pacientes estavam orientados pelos
médicos a respeito das questões ao qual foram
avaliados. Porém,
deve-se levar em
consideração a parcela dos não orientados
acrescidos dos que receberam uma informação
incompleta.
Salienta-se a que a prática
farmacêutica é de extrema importância para
uma orientação adequada e completa.
O receituário médico é um documento
de extrema importância tanto para uma
dispensação e orientação correta quanto para
uma fonte de informação ao paciente. Por isso
seu preenchimento deve ser correto, completo e
de forma legível. Alguns estudos demonstram
que a introdução de prescrições eletrônicas
pode minimizar, mas não eliminam totalmente
a possibilidade dos riscos de problemas
relacionados aos medicamentos. Mesmo com a
prescrição eletrônica o farmacêutico é essencial
para a orientação sobre o uso correto dos
medicamentos e para o esclarecimento das
dúvidas referentes ao tratamento 18-20.
Conclusão
Foi verificado que os pacientes
entrevistados estavam orientados pelos
médicos quanto ao uso correto dos
medicamentos, o que indica que o atendimento
prestado no Hospital Universitário HU/UFSC é
satisfatório. Mesmo o resultado apontando para
o positivo, não se deve deixar de lado a parcela
significativa dos usuários não orientados
juntamente com os que apresentavam
orientação razoável. É sobre esta parcela de
pacientes que os farmacêuticos devem ficar
atentos durante a dispensação, para que possam
atender as necessidades dos indivíduos, quanto
ao uso racional e correto dos medicamentos.
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Hirt, E. M. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p.101-110, jan./jun.. 2006
O PROCESSO DE PARTICIPAÇÃO E A CULTURA ORGANIZACIONAL NA
ENFERMAGEM: DESAFIOS DESTE NOVO MILÊNIO [The process of participation and
the organized culture in nursing: challenges in new millennium]
Eunice Maria Hirt1; Francine Lima Gelbcke2
Resumo: Nesta reflexão busca-se compartilhar o conhecimento produzido acerca da organização do
trabalho na área da saúde e em especial na enfermagem e os reflexos desta na cultura organizacional.
Salienta-se que com a reestruturação produtiva e com novos modelos de gestão há que se alterar a cultura
organizacional, por meio da participação dos trabalhadores, sendo o modelo de gestão participativo uma
alternativa viável para a construção da cidadania do trabalhador.
Palavras-chave: organização do trabalho, cultura organizacional, saúde, enfermagem, participação.
Abstract: This study shows health work organization, nursing specially, and its consequences of
organized culture. It is quoted also that it is necessary a productive reorganize and new management
patterns to alterate organized culture through workers participation.
Keywords: work organization, organized culture, health, nursing, participation.
Introdução
Ao longo dos últimos anos houve uma
significativa reorganização do processo de
trabalho nas organizações empresariais, com a
implementação
de
novas
teorias
administrativas
que
flexibilizam
e
descentralizam os processos de decisão e
trabalho, que visando a qualidade e eficiência
dos serviços. Na administração pública
brasileira, tem se buscado na última década
implementar, também, mudanças gerenciais,
sendo que no setor saúde, estas se tornam mais
difíceis, tendo em vista a complexidade destas
organizações1.
Considerando que a enfermagem
encontra-se inserida nos serviços de saúde, sua
organização se pauta, ainda, em modelos
gerenciais inspirados na escola clássica ou
científica, influenciado pelo trabalho parcelado
e pela gerência taylorista-fordista. No dia a dia,
os serviços de enfermagem permanecem com
tarefas repetitivas, normas e rotinas
determinando o fazer, sem a participação dos
trabalhadores na definição das mesmas.
________________-
Neste sentido, consideramos como uma
possível estratégia para romper com práticas
antigas, que não possibilitam acesso à
cidadania, a incorporação de uma nova
filosofia ou política de liderar pessoas - a
participação. Desta forma, novos modelos de
gerenciamento
se
fazem
necessários,
destacando-se a gestão participativa, no qual a
participação ocorre no âmbito da organização
do trabalho, bem como do poder, do ter e obter
resultados. O modelo de gestão participativo
“parte do princípio de que o ser humano é uma
pessoa responsável à qual se deve conceder
toda a autonomia necessária para a realização
da tarefa para, na verdade, integrá-la na gestão
mais global da empresa”2.
Pensar em participação na estrutura dos
serviços de saúde, na atualidade, é repensar a
cultura organizacional. Poucos são os estudos
encontrados na literatura específica de
Administração em Enfermagem, que possam
dar suporte a esta forma de organização do
trabalho, desta forma, buscaremos respaldo na
literatura da Administração Geral para esta
reflexão.
1
Enfermeira/HU/UFSC, Especialista em Gestão dos Serviços de Enfermagem, Mestranda em Enfermagem da
UFSC. e-mail: [email protected]
2
Enfermeira, Diretora de Enfermagem/HU/UFSC, Doutora em Filosofia da Enfermagem. Docente do Departamento
de Enfermagem da UFSC.
101
Hirt, E. M. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p.101-110, jan./jun.. 2006
Há que se considerar, no entanto, que
mesmo
nos
estudos
sobre
cultura
organizacional, há uma multiplicidade de
abordagens teóricas e metodológicas, sendo
este um campo de conhecimentos vasto e que
necessita de aprofundamentos teóricos, com
uma diversidade de correntes de pensamento
que determinam diferentes pressupostos
filosóficos e teóricos que orientam os estudos
nesta área do conhecimento3.
Na visão da antropologia social, a
cultura está relacionada a um conjunto de
significados compartilhados por um grupo, que
permite a seus membros interpretar e agir sobre
ambiente que está inserido. Esse conceito nos
revela dois elementos importantes, coletividade
e comunicação. O primeiro exprime a
necessidade de grupos humanos como meio
propício ao desenvolvimento da cultura,
enquanto o segundo, refere-se à transmissão da
informação como elemento chave de sua
evolução. Na verdade, para o desenvolvimento
da cultura é necessário que, além dos grupos,
existam as interações sociais entre seus
membros 4. Logo, podemos afirmar que cultura
é muito mais do que conhecimento: é
linguagem, código, que se expressa por meio
de valores, crenças, mitos, religiões, folclores,
entre outros.
Para os sociólogos, uma corrente
importante para a análise da cultura é o
interacionismo simbólico, no qual toda
atividade está sujeita ao hábito. Qualquer ação
freqüentemente repetida torna-se um padrão
que pode ser reproduzido, com economia de
esforço e tempo. Os fenômenos estão préarranjados em padrões que parecem ser
independentes da apreensão que cada pessoa
faz
deles
individualmente.
Existe
o
compartilhar de um senso comum sobre a
realidade, produzindo signos (sinais que têm
significação). Nas organizações, observa-se
como certos símbolos são criados, com
procedimentos implícitos e explícitos para
legitimá-los 5.
A socialização ocorre em diferentes
grupos sociais dentro de uma mesma
sociedade. Isto porque dentro de um mesmo
sistema social existem múltiplos subsistemas,
como por exemplo, as estratificações de classe.
Dentro dos sistemas culturais também
encontramos inúmeros subsistemas, cada um
reunindo características diferentes em função
da natureza dos indivíduos que agrega.
Podemos citar, ainda, os subsistemas regionais,
étnicos e religiosos. Ainda neste contexto, as
organizações surgem como um subsistema
cultural, já que representam grupos de pessoas
com identidades claramente definidas. Sendo
assim, são os indivíduos que por meio de suas
ações, contribuem para a construção da
organização. Porém, os contextos que lhes são
preexistentes orientam o sentido de suas ações.
São os indivíduos da organização que
pressionam a mudança, e também dificultam
estas pelo próprio contexto e pelas estruturas
por eles criadas 6,7.
A cultura organizacional é um sistema
que se estrutura, sobretudo, pelo jogo dos
atores que agem na organização em um
ambiente de múltiplas interações e que
desempenham um papel importante na
construção de conteúdos significantes, por
exemplo, na construção de novos valores e
mitos da organização. Portanto, a cultura pode
ser considerada como um processo e um
produto que ocorre, ao mesmo tempo, dentro e
fora da organização8.
Também é entendida como um conjunto
de valores e pressupostos básicos expressos em
elementos simbólicos, que em sua capacidade
de ordenar, atribuir significações e construir a
identidade organizacional, tanto agem como
elemento de comunicação e consenso, como
ocultam e instrumentalizam as relações de
dominação9.
Frente a isto, reafirmamos que a
enfermagem ainda mantém a cultura de
comando e controle, pressupondo concentração
de poder – o autoritarismo. O caminho para a
democratização do poder está na participação,
que é definida como
O caminho natural para o homem exprimir sua
tendência inata de realizar, fazer coisas,
102
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afirmar-se a si mesmo e dominar a natureza e o
mundo. Além disso, sua prática envolve a
satisfação de outras necessidades não menos
básicas, tais como a interação com os demais
homens, a auto-expressão, o desenvolvimento
do pensamento reflexivo, o prazer de criar e
recriar coisas, e, ainda, a valorização de si
mesmo pelos outros10.
Buscar a participação na enfermagem
possibilitará redescobrir valores, repensar
posições, abandonar velhos paradigmas,
desafiar idéias, visando o exercício da real
cidadania. Destacamos, também, a importância
dessa reflexão para a área da saúde, visto que
muitas vezes os enfermeiros administram as
organizações de saúde, sendo imprescindível à
compreensão e o significado do que é, e o que
representa a cultura organizacional, o que
instrumentalizará o enfermeiro para gerenciar a
mudança.
A organização do trabalho na enfermagem e
a necessidade de mudança
Atualmente, para a maioria das pessoas,
o trabalho acontece no contexto de uma
empresa, de uma organização, de uma
instituição. Isso significa que o trabalho,
geralmente, ocorre em contextos culturais bem
determinados. Tomando como base os períodos
históricos da evolução da sociedade, marcados
inicialmente pela produção manufatureira e,
posteriormente, demarcados pela produção
industrial e pós-industrial, constatamos que
foram
fortemente
influenciados
pela
incorporação tecnológica nos processos de
produção e que causaram grandes mudanças na
forma de vida das pessoas. Com o avanço
tecnológico, este processo tornou-se mais
complexo. As organizações tornaram-se
hierarquizadas, especializadas, demandando
supervisão e gerência. Por conseguinte, a
preocupação passou a ser com a autoridade,
responsabilidade, planejamento, controle,
coordenação e relações no trabalho11.
Desde o início do século XX, as
empresas foram organizadas a partir dos
princípios da Teoria Científica, cujo precursor,
Frederick Taylor, preconizava a divisão do
trabalho, a disciplina, a racionalização dos
métodos e sistemas de trabalho e a
padronização da produção. Para garantir que os
padrões de produção fossem atingidos, sugeriu
a seleção, o treinamento e o controle dos
trabalhadores, incluindo o pagamento pela
produção gerada em cada um deles, por meio
de um sistema de incentivos monetários12.
Os antigos paradigmas tayloristas
levaram
a
profundas
distorções
nas
organizações, que desumanizaram as relações
no trabalho e robotizaram os indivíduos. Neste
contexto, os gerentes assumiam o papel de
“controladores”, encarregados de fiscalizar os
funcionários
para
garantir
maior
13
produtividade .
Os pressupostos da administração
científica estão presentes na enfermagem desde
a época de Florence Nightingale, que
preconizava a divisão entre quem concebe e
quem executa o trabalho; a substituição do
critério individual e improvisação pelo
emprego de métodos baseados nos princípios
científicos; a seleção científica do trabalhador e
treinamento do mesmo; o controle do
trabalhador, por meio do papel do supervisor
(enfermeiro chefe de serviço e/ou enfermeiro
assistencial); e a distribuição de atribuições e
tarefas, disciplinando ao extremo o trabalhador.
Ao analisar a influência deste modelo de
gestão, observa-se o quanto as normas, rotinas,
padrões fazem parte do cotidiano de trabalho
da enfermagem, justificando-se sua aplicação
em função da qualidade da assistência prestada.
No entanto, este modelo de organização
rotiniza e robotiza o trabalhador, bem como
permite selecioná-lo e treiná-lo conforme
padrões definidos, facilitando o controle do seu
trabalho, já que as atribuições são dadas em
função das normas e rotinas pré-estabelecidas,
podando, desta forma, qualquer possibilidade
de
manifestação
de
criatividade
do
14
trabalhador .
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Em 1916, Henry Fayol, buscando a
racionalização da estrutura administrativa,
salienta nesta estrutura o princípio da unidade
de comando, da divisão do trabalho, da
especialização e da amplitude de controle15.
A
estrutura
organizacional
da
enfermagem segue esse modelo, com ênfase na
hierarquia, sob o ângulo vertical, e a
departamentalização, sob o ângulo horizontal;
com a
divisão do trabalho pautada na
especialização; ênfase na autoridade do
gerente; disciplina rígida; ordem, em que
pessoas e materiais devem estar no lugar certo
e no tempo certo; espírito de equipe, visando
harmonia e unidade na organização; e as
funções da administração: prever, organizar,
comandar, coordenar e controlar14.
No modelo clássico, as pessoas e as
relações interpessoais não são devidamente
consideradas
e
as
avaliações
são
exclusivamente quantitativas16.
Com a introdução da administração
científica/clássica
no
hospital,
surge
conseqüentemente a padronização hospitalar,
que consiste em normas para a realização das
atividades
internas
e
com
intensa
burocratização. A enfermagem mantém todas
as características da administração científica e
clássica, adotando a regulamentação por meio
de normas, rotinas rígidas, formais e escritas,
assegurando
uma
uniformidade
(impessoalidade das relações); com ênfase na
competência profissional e técnica, com
admissão por concursos e provas de seleção
descritivas.
A influência da burocracia constitui um
dos fatores que tem contribuído para uma
prática administrativa estanque, baseada em
regras e normas obsoletas, mostrando poucas
perspectivas de mudança. Há que se considerar
que o profissional enfermeiro se submete às
diferentes formas de poder organizacional e
assume o papel de cumprir e fazer cumprir as
decisões do poder maior da instituição. Exerce,
muitas vezes, um papel de capataz,
gerenciando recursos humanos e materiais
insuficientes e inadequados, sem ter o poder
decisório sobre a transformação desta
condição16.
Na década de 30, a administração
passou a valorizar os recursos humanos,
correspondendo a um deslocamento da ênfase
na organização formal para a informal,
entendida como o conjunto das relações sociais
não previstas em regulamentos e organogramas
e nas relações de trabalho, caracterizadas pela
espontaneidade e pela falta de objetivo
comum12. Estas premissas foram marcantes na
influência das teorias da administração
posteriores que passaram a preocupar-se com o
lado psicossocial que envolve o processo de
trabalho.
Na década de 40, a Teoria
Comportamentalista reforça a preocupação
com as relações das pessoas no processo de
trabalho nas organizações, reconhecendo a
propriedade de adaptação do ser humano e
enfatizando a maneira satisfatória de
realização do trabalho, e não a melhor maneira
de realizar o trabalho13, 17.
A enfermagem mantém as práticas
anteriores e com a escola das relações humanas
passa a repensar o indivíduo na organização,
trazendo dessa teoria aspectos ligados à
liderança, motivação, comunicação e dinâmica
de grupos, além de possibilitar uma
participação maior dos enfermeiros nos
processos decisórios. Porém, o que se observou
é que com esta teoria se consolida uma forma
paternalista de administração, em que na busca
de harmonia, os conflitos são abafados e os
confrontos entre trabalhador e a administração,
ignorados. Outro alerta se faz necessário frente
à defesa da necessidade psicológica do
trabalhador, em sentir-se como membro de um
grupo social, pois esse discurso traz camuflada
uma nova forma de controle do indivíduo,
visando o aumento da produção, por meio de
uma supervisão mais humanizada 14, 16.
Na década de 60, a Teoria de Sistemas,
foi introduzida na análise organizacional,
fundamentando-se na premissa de que os
sistemas existem dentro de sistemas, são
abertos e suas funções dependem de sua
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estrutura16. Neste contexto, sistema é entendido
como um conjunto de partes que se relacionam,
cujos objetivos fazem com que o arranjo das
partes não ocorra ao acaso. O homem se
caracteriza pelo relacionamento interpessoal
com outros indivíduos, e todos, na organização,
são atores que representam papéis. Dessa
teoria, a enfermagem incorpora a preocupação
com o estabelecimento de metas, objetivos e
finalidades,
buscando
adequar-se
ao
14
estabelecido pela instituição .
Em décadas mais recentes, a Teoria
Contingencial surge como resposta a estudos
que buscam entender como uma empresa se
comporta em diferentes cenários, partindo do
princípio de que a organização e o processo de
trabalho são influenciados pelo ambiente
externo em que se inserem 17. Porém, dessa
teoria, a enfermagem não incorporou nenhum
princípio 14.
Todas estas correntes do pensamento
administrativo deixaram sua contribuição na
organização das empresas modernas públicas e
privadas.
Inicialmente,
mediante
a
incorporação da racionalidade nas empresas e,
gradativamente, da adaptação ao contexto
social e da evolução e incorporação
tecnológica. Alguns traços podem ser
percebidos na estrutura das instituições que nos
remetem à forma complexa de organização,
tais como os vários níveis hierárquicos,
concentração de poder e autonomia para
tomada de decisão restrita aos que ocupam os
cargos de chefia e direção. Mais recentemente
podem ser citados, entre outros aspectos, a
valorização do contexto social na definição do
negócio da empresa, a flexibilização nos
processos gerenciais, a mudança no processo
de trabalho a partir da incorporação
tecnológica e a participação do cliente interno e
externo na definição do produto/serviço final.
A enfermagem incorporou alguns
aspectos das teorias modernas ou modelos de
gestão, porém vêm sendo apreendidos
lentamente. Da qualidade total, a enfermagem
visualizou um referencial para “exigir”
qualidade de assistência, adotando, em muitas
instituições, opiniões do usuário externo, que
servem de parâmetro para avaliar o seu
trabalho. Também adotou fortemente a
responsabilização do trabalhador, que deve
“vestir
a
camisa”
da
instituição,
comprometendo-se com ela. Não há, contudo,
uma maior autonomia e flexibilidade no
processo de trabalho da enfermagem,
tampouco a rotatividade entre os diferentes
locais de produção, aspectos preconizados por
esse modelo. Em relação à gestão participativa,
a enfermagem, enquanto profissão, têm poucas
experiências ainda nesta direção, no sentido de
valorização efetiva do trabalhador, como
preconizado em abordagens participativas14.
Em relação às modernas teorias de
gestão, destaca-se a utilização destas como
instrumento para tornar a força de trabalho, em
função das necessidades do capital, mais
eficiente, produtiva, satisfeita, cooperativa,
harmônica, dócil e leal 18.
Um repensar dos modos de gestão se
faz presente na atualidade, tanto no setor saúde,
como na enfermagem, especificamente. Desde
a década de 70, estudos têm sido realizados
focalizando a tendência do gerenciamento na
enfermagem
como
terreno
nebuloso,
interfacetado por características que variam de
acordo com o nível ocupado na escala
hierárquica
da
organização
(direção
intermediária e ocupacional). Dessa época em
diante, críticas têm surgido em relação à
situação do papel gerencial do enfermeiro,
porém mudanças efetivas ainda não se
consolidaram na prática, visando uma mudança
significativa que busque a socialização do
saber, em que a prática gerencial do enfermeiro
possa avançar para uma construção coletiva19,
sendo que esta mudança não se restringe à
enfermagem, mas à cultura organizacional das
instituições de saúde.
Conhecer a identidade organizacional é
rever o sistema de gestão. Este aspecto é
importante no sentido de se alcançar um
sistema de gestão mais democrático, dirigido
de forma colegiada, no qual o papel do
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enfermeiro como facilitador não pode ser
ignorado 20.
Neste sentido, a “forma como o
trabalho da enfermagem está organizado
dificulta a manifestação da dimensão humana e
da subjetividade. As normas, regras, rotinas
determinam o que fazer, como fazer e inclusive
o que sentir” 14. As modernas teorias de gestão
são as que mais preconizam a valorização do
ser humano, onde são vistos como pessoas, e
nelas buscam integrar as instâncias individuais
e coletivas, pessoais e profissionais, portanto,
sua utilização é uma possibilidade de introduzir
na enfermagem, principalmente o modelo de
gestão participativo 14.
Processo participativo como forma de
alterar a cultura organizacional na Saúde e
na Enfermagem
A
pressão
histórico-social
por
competências gerenciais é, neste inicio de
século, intensa e concreta, exigindo resultados
institucionais e novos modelos de gestão que
possam atender as necessidades de escassez de
recursos e o desenvolvimento de programas
sociais. Estamos submersos em um contexto de
mudanças e transformações, provocadas por
avanços tecnológicos e que ocasionam o
obsoletismo dos conhecimentos em gestão,
determinando uma necessidade de mudanças
no perfil do gerente e das formas de abordagem
de gestão em saúde 19.
Nas organizações de saúde é necessário
que a gerência considere o sujeito – usuário
interno (trabalhador) e o usuário externo
(paciente), como o centro do seu trabalho.
As organizações hospitalares possuem
características próprias de seu ambiente
profissional, tornando o processo decisório
nessas organizações bastante difícil, sendo a
cooperação um grande desafio19. Desta forma,
destaca-se o papel de liderança a ser
desenvolvido pelos gerentes.
O discurso na enfermagem enfatiza o
elemento humano como principal capital,
assim
é importante que os enfermeiros
trabalhem articuladamente com os demais
trabalhadores, visando um trabalho em equipe,
em que a participação seja mola mestre na
articulação e na relação dos trabalhadores de
enfermagem. A tarefa suprema da liderança é a
criação de energia e visão humanas21.
O verdadeiro líder é essencialmente um
indivíduo capaz de investir tempo e energia no
futuro de sua organização e, principalmente, no
seu pessoal22,23. A essência da liderança para os
autores está em saber distribuir o poder com os
outros, para traduzir suas intenções em
realidade e sustentá-las ao longo do tempo.
Há que se ter em mente que as relações
de poder estão sempre presentes nas questões
ligadas à participação, sendo baseado na
definição de controle como a capacidade de
criar efeitos desejados ou de impedir efeitos
indesejados. Neste sentido, se faz necessário
um alerta para duas teorias que abordam a
ligação entre participação e poder nas
organizações. A primeira diz que a participação
aumenta o controle por parte de todos os
grupos que participam no processo de decisão,
envolvendo
tanto
gerentes
quanto
trabalhadores; a segunda nos fala que a
participação serve apenas para reforçar a
estrutura de poder, a menos que se mude
radicalmente
a hierarquia básica da
organização 24.
Participar não significa assumir poder,
mas participar de um poder, o que desde logo
inclui qualquer alteração radical na estrutura de
poder. Ainda, freqüentemente é difícil avaliar
até que ponto as pessoas efetivamente
participam na tomada e na implantação das
decisões que dizem respeito à coletividade.
As formas participativas normalmente
utilizadas pelas organizações se situam, como
meio de integração e de mobilização
ideológica. Essas técnicas agem, sobretudo, na
distribuição dos sentimentos de estar engajado,
mas ainda são muito frágeis no que se refere a
distribuição do poder, inteferindo na verdadeira
participação, que pressupõe aos grupos ou
atores sociais atuarem como parceiros de
negociação nas relações de trabalho. Desta
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forma, podemos afirmar que só podemos
localizar o sentido real da participação, se ela
implicar na divisão de poder entre os grupos e
a possibilidade concreta de todos influenciarem
à decisão coletiva sobre os objetivos sociais10,
25, 26
.
A construção da liberdade é feita,
paralelamente com a construção da cidadania.
Sendo assim, podemos resumir cidadania a
uma palavra – participação. Isto é, de não
omissão, indiferença em relação ao exercício
do poder 26, 27.
A cidadania democrática é aquela que
realmente se apóia nos pilares da democracia,
que são a liberdade, a igualdade e a
solidariedade. Essa liberdade recupera todo o
processo de garantia dos direitos individuais e
das liberdades públicas; a igualdade no sentido
de reconhecimento da igualdade intrínseca de
todos os seres humanos em relação aos direitos
fundamentais para uma vida digna; e a
solidariedade no sentido de que a sociedade é
esse sólido que deve estar interligado por laços
de apoio, de convivência, entre outros27.
Entendemos
que
estimular
o
desenvolvimento da cultura organizacional
alicerçada na participação é valorizar uma nova
forma de cooperação em que os valores
individuais venham a ser estimulados a somar e
se fortalecer, e não tenham de se anular em
uma disputa febril pelo poder. Com isso,
acreditamos que a gestão participativa na
enfermagem só se formará por meio da
consciência social dos trabalhadores. Para
fortalecer a condição de ser humano é
indispensável que este assuma novas
responsabilidades, individuais e coletivas, não
ficando apenas dependendo dos gerentes, mas
que se mostre cidadão, isto é, ator ativo no
processo de construção de uma nova gestão
solidária. Esse novo perfil não pode ser
imposto, mas, pode ser aprendido.
Contudo, ingressar na dimensão
participativa significa substituir os estilos
gerenciais
tradicionais
–
autoritários,
impositivos, indiferentes, paternalistas – por
cooperação mútua, liderança, autonomia e
responsabilidade.
Informar,
envolver,
delegar, consultar e perguntar, em vez de
mandar – são palavras-chaves da gestão
participativa, no que diz respeito ao
comportamento do enfermeiro, seja chefe ou
não. Porém, também requer mudança do
comportamento dos demais integrantes da
equipe de enfermagem. Tomar a iniciativa,
agir, perguntar, questionar, participar,
oferecer sugestões – em vez de esperar a
decisão que “vem de cima”. Desta forma,
entendemos que sem disposição nos escalões
operacionais para participar, não há
administração participativa28.
Todavia, a preocupação com a
participação é algo que decorre de valores
democráticos, isto é, da idéia de que a
sociedade ou as coletividades menores como as
organizações de saúde são pluralistas,
constituindo-se num sistema de pessoas e
grupos heterogêneos, e que, por isto mesmo,
precisam ter seus interesses, suas vontades e
seus valores levados em conta. Na verdade,
pensar o pluralismo na enfermagem é acima de
tudo romper com as formas, os padrões
instituídos, repensar a sua prática não mais
como meramente técnica ou reproduzindo os
erros administrativos do passado, mas,
sobretudo, compreendendo que a imposição de
limites estabelece uma estagnação no âmbito
do seu saber e da sua prática29.
Participação é um dos cinco princípios
da democracia. Sem ela, não é possível
transformar em realidade, em parte da história
humana, nenhum dos outros princípios:
igualdade,
liberdade,
diversidade
e
solidariedade.
Considerações finais
A cultura organizacional é criada por
meio das interações simbólicas do grupo,
estabelecendo-se uma conduta coletiva, um
universo simbólico. Esse universo simbólico
serve de referência, norteia comportamentos,
atitudes e ações. Analisar a cultura
organizacional, nesta perspectiva pressupõe
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decifrar como seus membros interpretam e
compreendem suas experiências, o que
significa compreender a cultura como algo
interno ao grupo e não manipulável.
O estudo da cultura organizacional deve
ser realizado com a crença de que possa vir a
constituir-se num evento histórico naquela
subcultura e com a convicção de que, alguns
trabalhadores, num certo momento de sua vida,
possam refletir sobre si ou sobre sua prática.
No entanto, o estudo da cultura organizacional
traz, também, contribuições no âmbito externo
à subcultura estudada. Pode constituir-se em
instrumento de reflexão dos enfermeiros em
geral, por meio de uma reflexão pedagógica,
levando ao crescimento pessoal e profissional
e, assim, gerar mudanças, não como estratégias
de intervenção gerencial, mas como um evento
natural da trajetória histórica de um grupo e de
uma profissão.
Mudar a organização do trabalho,
reformular a equipe para que o trabalho possa
fluir adequadamente, fazendo parceria com os
seus membros, tornando-os responsáveis pelo
processo de trabalho é, em nosso
entendimento, um caminho para melhorar a
condição de vida no trabalho. No entanto, só
avançaremos se houver interesse dos
trabalhadores em participar. Porque participar
implica num desejo. Pessoas educadas em
contextos
muito
autoritários
podem
simplesmente preferir não participar. Esse
interesse somente será despertado, por meio da
reflexão crítica do cotidiano, de nossas ações,
crenças, valores poderemos mudar a realidade
e promover uma mudança na postura
profissional dos trabalhadores de enfermagem.
Por que a enfermagem precisa manter o
ultrapassado?
Criar, inovar é como respirar. Faz parte
da necessidade e sobrevivência humana, bem
como das organizações, as quais, para não se
tornarem obsoletas, precisam iniciar o processo
de mudanças, em busca de ações criativas.
Dentro desse sistema padronizado que se
encontra a enfermagem, as pessoas recebem
um uniforme organizacional, recheado de
regras e procedimentos, para que a sua
adaptação seja mais rápida e eficaz. Essa
cultura tolhe as pessoas, isto é, o trabalhador é
obrigado a bloquear seu jeito de ser para se
adequar. Assim, ao assumir um papel que
contraria sua própria característica humana, o
trabalhador estará indo contra sua própria
essência, o que limita sua criatividade, seu jeito
de agir, pensar e decidir sobre o que faz.
Acreditamos que o passo inicial parece
estar em uma mudança de atitude, e isso se
refere a todos os participantes diretos e
indiretos das organizações hospitalares e
sistemas educacionais. No âmbito das unidades
formadoras de profissionais de enfermagem, a
participação deveria constituir tema de
formação, voltada para a construção de uma
sociedade verdadeiramente igualitária, em
termos de distribuição de poder.
A tomada de decisão é um fator
essencial a todas as ações do enfermeiro e
muitas vezes não se dá à devida importância a
essa questão. Portanto, é preciso estudar
formas criativas e partilhar as decisões com a
equipe, fazer uma revisão diária das ações e do
papel assumido. O espaço que se cria para a
participação permite aos trabalhadores
compartilhar seus saberes, suas dificuldades,
ampliar seus conhecimentos a respeito do
funcionamento da organização, assumir
responsabilidades pela execução e controle de
seu próprio trabalho.
O desenvolvimento da participação
exige um aprendizado contínuo, tanto das
tarefas que serão executadas, como a respeito
da organização, o que pressupõe produzir
conhecimento também de forma contínua, já
que este muda constantemente. Participação é
pois um processo constante, com produção de
conhecimento e transformação da realidade. Há
que se pensar no novo, nos desafios que são
colocados atualmente às organizações,
principalmente na administração pública e nos
serviços de saúde, e, consequentemente, na
enfermagem. Portanto, porque não dar um
novo direcionamento à organização do trabalho
na enfermagem?
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MERCADO DE TRABALHO DO NUTRICIONISTA EGRESSO DA UNIVERSIDADE
FEDERAL DE SANTA CATARINA: ÍNDICES DE EMPREDO/DESEMPREGO,
JORNADA DE TRABALHO E NÍVEIS SALARIAIS [The labor market of nutrition
graduates from Universidade Federal de Santa Cararina: employment and unemployment
indexes, work day and salary levels
Francisco de Assis Guedes de Vasconcelos1; Camila Elizandra Rossi2; Emilaura Alves2
Resumo: Este artigo apresenta os resultados de investigação transversal descritiva sobre o mercado de
trabalho de nutricionistas egressos da Universidade Federal de Santa Catarina. Aplicou-se questionário
auto-resposta aos 296 egressos localizados, sendo o serviço de Correios a principal via de remessa. Os
resultados indicaram 84,9% dos egressos atuando na profissão. Destes, 67,6% possuem somente um
emprego e 81,1% vinculam-se às instituições como empregados. A maioria, 60,4%, tem jornada semanal
acima de 30 horas e 34,2% até 30 horas (média de 34,9 ± 13,0 horas/semana). A média salarial foi 7,4
salários mínimos para uma jornada semanal média de 35 horas.
Palavras-chave: mercado de trabalho, nutricionista, perfil profissional do nutricionista.
Abstract: This article presents the results of a descriptive traverse investigation about the labor market of
nutrition graduates from Universidade Federal de Santa Catarina. It was applied an auto-answer
questionnaire to the 296 found addresses, being the service of Mail the main remittance road. The results
indicated 84.9% of graduates acting in the profession. Of these, 67.6% possess only an employment and
81.1% are linked to the institutions as employees. The most, 60.4%, acts with weekly day above 30 hours
and 34.2% up to 30 hours (average of 34.9 ± 13.0 hour/week). The salary average approaches of 7.4
minimum wages for a day weekly average of 35 hours.
Keywords: labor market, nutritionist, nutritionist’s professional profile.
mercado de trabalho concentrou-se em duas
áreas de atuação: Nutrição Clínica e
No Brasil, a profissão de nutricionista Alimentação Coletiva. A Nutrição Clínica
surgiu há cerca de sessenta e seis anos, quando, caracterizava-se por ações de caráter
em 1939, foi implantado o primeiro Curso de individual, em hospitais públicos e privados,
Nutrição do país1-3. Àquela época, frente à tendo como base a assistência dietoterápica (o
tortuosa tarefa de construção da nacionalidade alimento como agente de tratamento). A
brasileira e de implantação das bases de uma Alimentação Coletiva, por sua vez, voltava-se
sociedade capitalista urbano-industrial, o ao desenvolvimento de ações de administração
principal desafio que se colocava a este de serviços de alimentação de coletividades
profissional era a superação do perfil sadias e enfermas de instituições públicas e
epidemiológico nutricional, caracterizado, privadas4,5.
sobretudo pelas doenças
carenciais
Nas duas décadas seguintes (1960(desnutrição
energético
protéica, 1970), às duas primeiras áreas agregaram-se
hipovitaminose A, anemia ferropriva, etc.), mais duas: Nutrição em Saúde Coletiva e
associadas às condições de pobreza, de fome, Ensino
da
Nutrição,
ampliando
de desigualdades regionais4.
consideravelmente o mercado de trabalho do
Nas duas primeiras décadas de nutricionista.
existência do nutricionista (1940-1950), o
_________________
Introdução
1
Professor titular do Departamento de Nutrição/CCS/UFSC. E-mail: [email protected]
Nutricionistas egressas do Curso de Graduação em Nutrição/CCS/UFSC, bolsistas do Programa Institucional de
Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC/CNPq/BIP/UFSC.
2
111
Vasconcelos, F. de A. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p.111-117, jan./jun.. 2006
A Nutrição em Saúde Coletiva voltavase às ações de caráter coletivo, visando à
garantia de produção e consumo de alimentos
adequados e acessíveis a todos os indivíduos da
sociedade. Na área de Ensino caberia ao
nutricionista o ensino de disciplinas de
Nutrição nos Cursos de Graduação em
Nutrição e outros da área de Saúde e afins4,5.
Nos últimos vinte e cinco anos,
sobretudo a partir de 1996, com a instituição da
nova Lei de Diretrizes e Base da Educação
(LDB), observou-se uma intensa expansão no
número de Cursos de Graduação em
Nutrição4,6-8. Segundo dados do Conselho
Federal de Nutricionistas (CFN), até outubro
de 2005 existiam 262 Cursos de Nutrição no
país9. Por conseqüência, dados do CFN
apontam um efetivo de 37.238 nutricionistas
registrados, até 30 de março de 2005, nos
distintos conselhos regionais10.
Esta expansão do número de cursos e,
conseqüentemente de nutricionistas no país,
têm propiciado a ampliação e a diversificação
do mercado de trabalho, provocando alterações
nas condições de trabalho. Este contexto tem
provocado o debate das distintas entidades da
categoria (escolas, associações científicas,
conselhos profissionais e sindicatos)11, bem
como suscitado a realização de investigações
que buscam retratar a realidade da atuação e
das condições de trabalho do nutricionista2,7,1220
.
O presente artigo refere-se aos
resultados de um estudo mais amplo que
procurou traçar um perfil quanti-qualitativo da
atuação do universo de egressos do Curso de
Nutrição da UFSC, visando à criação de
subsídios que possam contribuir para a
melhoria do processo de ensino de graduação e
pós-graduação em Nutrição. Este artigo
descreve aspectos relacionados à situação
profissional (índices de emprego, desemprego
e abandono da profissão), à jornada de trabalho
e aos níveis salariais dos nutricionistas
egressos da UFSC, no período de dezembro de
1983 a fevereiro de 2000. Ressalta-se que o
Curso de Nutrição da UFSC foi criado em 10
de agosto de 1979 e implantado no primeiro
semestre de 1980. A primeira turma de
egressos colou grau em dezembro de 1983. Até
fevereiro de 2000, 343 nutricionistas haviam
colado grau. Até fevereiro de 2005, ao
completar 25 anos de implantação, vinte e duas
turmas haviam colado grau, totalizando 509
nutricionistas egressos da UFSC 7,8,16,19.
Método
Realizou-se
estudo
transversal
descritivo, cujos procedimentos metodológicos
iniciaram-se com o levantamento dos
endereços residenciais e telefônicos do
universo de nutricionistas egressos da UFSC,
ao longo de dezembro de 1983 a fevereiro de
2000. Recorreu-se às listagens de endereços
dos profissionais cadastrados no Conselho
Regional de Nutricionistas (CRN-2), na
Associação Catarinense de Nutrição (ACAN) e
nas malas-diretas de eventos organizados pelo
Departamento de Nutrição da UFSC. Dispôs-se
também da relação de assinantes fornecida
pelas Telecomunicações de Santa Catarina S.A.
Ao final, localizaram-se 296 (86,3%)
endereços.
Não foram localizados os
endereços de 47 (13,7%) egressos. Esses
resultados são semelhantes aos de BOOG et
al.12 sobre os egressos da Pontifícia
Universidade
Católica
de
Campinas
(PUCCAMP), no qual 15,1% dos endereços
não foram localizados.
Aplicou-se um questionário autoresposta, desenhado especificamente para
atender aos objetivos da pesquisa. A principal
via de remessa do questionário foi o serviço de
Correios. Utilizou-se também endereço
eletrônico (e-mail), fax e contato pessoal para
entrega dos questionários. As informações
foram processadas no Microsoft Access 97. As
variáveis foram analisadas a partir da
distribuição de freqüência, acompanhada de
cálculos de medidas de tendência central e
dispersão (médias e desvios-padrão). Neste
artigo apresentam-se os resultados relativos aos
índices de emprego, desemprego e abandono
112
Vasconcelos, F. de A. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p.111-117, jan./jun.. 2006
da profissão; número de empregos por
profissional; vínculos empregatícios e cargos
ocupados; jornada de trabalho e níveis
salariais, incluindo nível salarial médio em
cada área de atuação profissional (Ensino,
Nutrição Clínica, Nutrição em Saúde Coletiva
e Alimentação Coletiva).
Em relação aos índices de emprego e
desemprego, considerou-se empregado o
profissional que desempenhava atividades
remuneradas na área da Nutrição no momento
da pesquisa e desempregado aquele que não as
exercia, mas estava à procura de emprego na
área. Designaram-se vínculo empregatício
quatro categorias de relações trabalho:
empregados, empregadores, voluntários e/ou
autônomos. O cargo designa a função
específica do profissional junto ao órgão em
que trabalha. Para especificar vínculo
empregatício e cargo ocupado foi necessário
estabelecer um emprego principal nos casos em
que o profissional possuía mais de um
emprego. Sendo assim, considerou-se emprego
principal aquele de maior carga horária
semanal e/ou de maior remuneração salarial e
emprego secundário aquele de menor carga
horária e/ou de menor remuneração salarial.
Quanto à jornada de trabalho,
considerou-se o total de horas trabalhadas
semanalmente, sendo somadas as cargas
horárias quando houvesse mais de um
emprego. Em relação à variável nível salarial,
os dados são apresentados em faixas salariais,
tomando-se como referência o valor do salário
mínimo vigente em agosto de 2001, igual a R$
180,00 (cento e oitenta reais).
O protocolo de pesquisa foi aprovado pelo
Comitê de Ética em Pesquisa com Seres
Humanos da UFSC. Um Termo
Consentimento Livre e Esclarecido
assinado pelos nutricionistas participantes
investigação, garantindo-se o sigilo e
anonimato das informações obtidas.
de
foi
da
o
Resultados e discussão
Retornaram
respondidos
131
questionários, perfazendo um índice de 44,2%
de adesão à pesquisa. Esse resultado
assemelha-se aos encontrados em estudos desta
natureza realizados com nutricionistas12,13,18,20.
Índices de emprego, desemprego e abandono
da profissão
De acordo com a tabela 1, verificou-se
que 84,7% dos egressos encontravam-se
empregados e exercendo a profissão de
nutricionista. Apenas 4,6% encontravam-se
desempregados, destacando-se o percentual de
abando da prática profissional (6,9%). BOOG
et al.12, a respeito dos egressos da PUCCAMP,
encontraram um percentual inferior de
desempregados (2,4%), enquanto PRADO &
ABREU15, entre os nutricionistas residentes no
Estado do Rio de Janeiro, encontraram índices
mais elevados de desemprego (13,2%).
Ressalta-se que o percentual de desemprego
encontrado apresentou-se bem inferior aos
índices do período, divulgados pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
(10% da população ativa) e pelo Departamento
Intersindical de Estatística e Estudos Sócioeconômicos (DIEESE) (20% em algumas
metrópoles brasileiras)21-23.
Tabela 1. Distribuição dos nutricionistas egressos da UFSC de acordo com sua situação profissional Florianópolis, agosto de 2001.
Situação profissional
Empregado
Abandonou a profissão
Desempregado
Nunca exerceu a profissão
TOTAL
N
111
9
6
5
131
%
84,7
6,9
4,6
3,8
100,0
113
Vasconcelos, F. de A. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p.111-117, jan./jun.. 2006
Dentre os motivos de abandono
alegados, destacam-se a baixa remuneração
(44%), o zelo à família (22%), a não
identificação com a profissão (22,2%) e a falta
de emprego (11,1%). A maioria daqueles que
nunca exerceram a profissão (60%),
ingressaram na pós-graduação imediatamente
após o término do curso de graduação,
justificando que nunca tenham trabalhado.
Houve apenas um caso (20%) de dedicação
imediata à família e outro (20%) de
insegurança para o exercício da profissão.
Em relação ao número de empregos
dos 111 que exercem a profissão, 75 (67,6%)
possuem apenas um emprego, 25 (22,5%)
possuem dois empregos e 11 (9,9%) possuem
três. Este achado assemelha-se ao de Prado &
Abreu15, onde 62,3% dos nutricionistas
estudados possuíam apenas um emprego.
Quanto ao vínculo do principal emprego
exercido, 81,1% são empregados, 11,7% são
autônomos, 4,5% são empregadores, 0,9% é
voluntário e 1,8% não responderam. Os
empregadores atuam como gerentes ou
administradores comerciais de empresas,
destacando-se a venda de carnes exóticas,
panificados e refeições prontas. No emprego
secundário, entre os 36 egressos que possuem
mais de um emprego, 63,9% são autônomos,
27,7%
são
empregados,
5,5%
são
empregadores e 2,7% é voluntário. Ainda em
seus empregos secundários, a maioria dos
autônomos atua em consultórios clínicos,
enquanto a maioria dos empregados atua como
docentes. Em relação ao cargo ocupado no
emprego principal, 55,0% dos egressos atuam
como nutricionistas, 19,8% como docentes e os
demais desempenham variados cargos, tais
como administradores, assessores, empresários,
fiscais sanitários, gerentes, representantes de
vendas, responsáveis técnicos e supervisores
comerciais.
Jornada de trabalho e níveis salariais
Verificou-se que a maioria dos egressos
trabalha semanalmente até 40 horas (69,4%),
destacando-se o percentual de nutricionistas
trabalhando com jornada semanal superior a 40
horas (25,2%) (Tabela 2). A média de jornada
de trabalho perfaz um total de 35 ± 12,5 horas
semanais.
GAMBARDELLA
et
al.18
observaram que 88,7% dos egressos da USP
trabalhavam 40 horas ou mais por semana,
índice superior ao encontrado entre os egressos
da UFSC.
Tabela 2. Distribuição da jornada semanal de trabalho dos nutricionistas egressos da
Florianópolis, agosto de 2001.
Jornada semanal (horas)
< 10
N
9
%
8,1
% acumulado
8,1
10 ├– 20
7
6,3
14,4
20 ├–30
22
19,8
34,2
30 ├– 40
39
35,2
69,4
> 40
28
25,2
94,6
Não responderam
6
5,4
100,0
TOTAL
111
100,0
---
A média salarial encontrada foi de
R$ 1.311,93, correspondente a 7,3 ± 4,3
salários mínimos. Resultado semelhante
também foi encontrado por Boog et al.13 entre
UFSC.
os egressos da PUCCAMP, onde se verificou
uma faixa salarial média entre 6 e 8 salários
mínimos mensais. Na tabela 3 apresenta-se a
distribuição dos níveis salariais encontrados,
114
Vasconcelos, F. de A. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p.111-117, jan./jun.. 2006
onde se observa que a maioria recebe menos de
10 salários mínimos mensais (66,7%). Em
estudo anterior realizado em Florianópolis, os
resultados mostraram-se semelhantes, uma vez
que 65% dos nutricionistas investigados
ganhavam menos de 10 salários mínimos16.
Além disso, observa-se que esses
resultados destoam com a reivindicação de um
piso salarial de 10 salários mínimos para uma
jornada de trabalho de 30 horas semanais, com
proporcionalidade salarial à jornada que
ultrapasse este limite, aspirada pelas entidades
da categoria profissional em meados da década
de 198016. Prado & Abreu15 verificaram que a
carga horária média de trabalho dos
nutricionistas do Estado do Rio de Janeiro
totalizava 36,8 horas semanais, com
remuneração média de 7,5 salários mínimos,
demonstrando
semelhança
aos
valores
observados entre os egressos da UFSC.
Tabela 3. Distribuição dos nutricionistas egressos da UFSC de acordo com a faixa
salarial . Florianópolis, agosto de 2001.
Faixa salarial (salário mínimo)
< 3
3 ├– 5
5 ├– 10
10├– 15
15
Não responderam
TOTAL
N
9
23
42
15
7
15
111
%
8,1
20,7
37,9
13,5
6,3
13,5
100,0
% acumulado
8,1
28,8
66,7
80,2
86,5
100,0
---
Observou-se entre os 75 nutricionistas
que possuem apenas um emprego uma média
salarial de 7,8 ± 4,6 salários mínimos. Entre os
36 que possuem mais de um emprego, a média
salarial encontra-se na faixa dos 6,4 ± 3,0
salários mínimos. Ou seja, os nutricionistas
com apenas um emprego possuem rendimentos
mensais médios superiores aos que possuem
mais de um emprego.
Por fim, observaram-se os maiores
índices salariais na área de Ensino. As áreas da
Alimentação Coletiva, Nutrição Clínica e
Nutrição em Saúde Coletiva revelam níveis
salariais
semelhantes,
correspondendo
aproximadamente a uma média de 3,3 salários
mínimos mensais. Boog et al.13 também não
detectaram diferenças salariais importantes
entre as distintas áreas de atuação do
nutricionista.
quando comparado aos índices encontrados
pelo IBGE e DIEESE entre a classe
trabalhadora em geral. A maioria dos
profissionais encontra-se empregada e vinculase à instituição onde trabalha como
nutricionista. A maioria dos egressos possui
apenas um emprego, recebendo remuneração
salarial superior a dos egressos com mais de
um vínculo empregatício. A área de Ensino
revela-se como a que melhor remunera,
enquanto as áreas de Alimentação Coletiva,
Nutrição Clínica e Nutrição em Saúde Coletiva
não
demonstram
diferenças
salariais
importantes. Apesar disso, a remuneração
salarial média não atende às reivindicações da
categoria profissional.
Em relação aos índices de adesão à
pesquisa, cabe apontar as limitações da
presente investigação, embora o percentual de
adesão obtido tenha sido semelhante aos de
outros estudos realizados no país. Sendo assim,
Conclusão
é preciso ressaltar que a generalização dos
Os resultados indicaram um baixo resultados da presente investigação para o
índice de desemprego entre os nutricionistas universo dos nutricionistas egressos da UFSC,
115
Vasconcelos, F. de A. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p.111-117, jan./jun.. 2006
no período analisado, deve ser feita com
bastante cautela.
Enfim, a realização de investigações
sobre perfil profissional e mercado de trabalho
revela-se de grande importância. Para o campo
da formação acadêmica, os resultados destes
estudos poderão direcionar a formulação de
propostas visando à melhoria do ensino de
graduação e pós-graduação em Nutrição no
país. Para o campo da atuação profissional,
estudos desta natureza revelam-se não menos
essenciais, uma vez que podem captar a
dinâmica do processo de atuação do
nutricionista na sociedade brasileira e, por
conseqüência, sinalizar aos profissionais as
atuais condições e as novas tendências e
exigências do mercado de trabalho.
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BIODISPONIBILIDADE DE FERRO: UMA REVISÃO [Iron bioavailability: a review]
Jane Parisenti1; Emilaura Alves1; Vera Lúcia Cardoso Garcia Tramonte2
Resumo: Este artigo tem o objetivo de apresentar uma revisão sobre o ferro e os fatores interferentes na
sua biodisponibilidade. O estudo da biodisponibilidade de minerais e sua interação com outros nutrientes
torna-se cada vez mais importante diante do aumento da oferta de produtos fortificados e do crescente uso
de suplementos alimentares, especialmente com ferro. O ferro é um mineral de extrema importância para o
organismo humano. No Brasil, a deficiência de ferro afeta principalmente crianças de 6 a 60 meses, com
prevalência em torno de 50%. A biodisponibilidade do ferro é determinada pelo estado fisiológico e
nutricional do indivíduo, pela forma química do ferro e a presença de inibidores e facilitadores da
absorção. Os fatores dietéticos primários da quantidade de ferro absorvida são o conteúdo de ferro heme e
de ferro não-heme e o balanço entre os fatores que influenciam sua biodisponibilidade. O ferro heme, mais
solúvel no trato gastrointestinal, tem melhor absorção comparado ao ferro não-heme. Entre os fatores
inibidores da absorção do ferro não-heme estão fitatos, proteína de soja, polifenóis, fibra alimentar, cálcio,
zinco e produtos da reação de Maillard. Entre os fatores promotores da absorção do ferro não-heme estão
o ácido ascórbico e outros ácidos, “fator carne”, vitamina A e β-caroteno. A interação dos promotores e
inibidores é determinante na biodisponibilidade do ferro. Muitos conhecimentos sobre a interação do ferro
com outros elementos já estão consolidados e devem ser aplicados nas práticas de fortificação de
alimentos ou suplementação.
Palavras-chave: biodisponibilidade, ferro heme, ferro não-heme, interação
Abstract: This paper presents a review on iron and the factors that interfere in its bioavailability. The
study of bioavailability of minerals and its interaction with other nutrients is becoming more and more
important due to the increase of the offer of fortified products and of the crescent use of alimentary
supplements, especially with iron. Iron is a mineral of extreme importance for the human organism. In
Brazil, the deficiency of iron affects mainly children from 6 to 60 months old, with prevalence around
50%. The bioavailability of iron is determined by the individual’s physiologic and nutritional state, for the
chemical form of iron and the presence of inhibitors and facilitators of absorption. The primary dietary
factors of the amount of iron absorbed are the amount of heme iron and nonheme iron and the balance
among the factors that influence its bioavailability. Heme iron, more soluble in the intestine, has better
absorption compared to nonheme iron. Among the inhibiting factors of absorption of nonheme iron are
phytate, soy protein, polyphenols, alimentary fiber, calcium, zinc, and products of the reaction of Maillard.
Among the factors that promote the absorption of nonheme iron are the ascorbic acid and other acids,
“factor meat”, vitamin A and β -carotene. The interaction of the promoters and inhibitors is decisive in the
bioavailability of iron. Many studies about the interaction of iron along with other elements have already
been consolidated and they should be applied to the practices of fortification of food or supplementation.
Keywords: bioavailability, heme iron, nonheme iron, interaction
Introdução
O ferro é um mineral de extrema
importância para o organismo pois participa do
transporte de oxigênio, síntese do DNA,
transporte de elétrons e outras funções
________________
essenciais 1. No entanto, a deficiência de ferro
é a carência nutricional mais comum no mundo
2,3
e a causa de 90% dos casos de anemia. No
Brasil a prevalência da anemia é em torno de
20% em adolescentes, 15 a 30% em gestantes e
de até 50% em crianças de 6 a 60 meses 4.
1
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Nutrição. Departamento de Nutrição, Centro de Ciências da
Saúde, Universidade Federal de Santa Catarina. [email protected]
2
Professora do Departamento de Nutrição, Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal de Santa Catarina.
118
Parisenti, J. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p.118-125, jan./jun.. 2006
A deficiência de ferro e a anemia
ferropriva devem-se em grande parte a baixa
ingestão
de
ferro
aliada
à
baixa
biodisponibilidade
deste
mineral.
Para
apresentar boa biodisponibilidade o nutriente
deve estar disponível para absorção no lúmem
intestinal, ser absorvido, retido e utilizado pelo
organismo 2.
A homeostase de ferro no organismo
deve ser muito bem controlada, pois embora a
deficiência seja preocupante, o excesso
também pode ser tóxico para o organismo. O
efeito tóxico do ferro no organismo deve-se
principalmente a capacidade de gerar radicais
nocivos a células e tecidos. Além de doenças
como a hemocromatose hereditária, o excesso
de ferro pode ser uma das causas de câncer de
fígado 5.
Fatores
que
interferem
biodisponibilidade do ferro
na
A disponibilidade do ferro na dieta é
fortemente
determinada
por
fatores
relacionados com o indivíduo (fisiológicos),
como estado fisiológico e nutricional, e com a
dieta, em especial a forma química do ferro e
presença de inibidores e facilitadores da
absorção 6.
Fatores fisiológicos
As variações fisiológicas individuais
como eficiência da digestão, ingestão anterior
do nutriente, estado nutricional, tempo de
trânsito intestinal, doenças gastrointestinais 7,
além de variações genéticas, doenças e uso de
medicamentos 8 afetam a biodisponibilidade do
ferro e de outros nutrientes.
Estudos sugerem que em condições
onde a necessidade de ferro está aumentada
como na gravidez, período de crescimento
(infância) e perdas sanguíneas, a sua absorção
está aumentada 1. Doenças que causam
alterações nas secreções gástricas e intestinais
(acloridria),
aumento
da
motilidade
gastrointestinal, síndrome da má absorção e
hemorragia crônica também podem interferir 8,2
A deficiência de ferro promove maior
absorção desse mineral sendo a homeostase
mantida pelo controle da absorção intestinal
9,10
. Estima-se que indivíduos com carência de
ferro absorvem até 20% do ferro não-heme e
35% do ferro heme, enquanto indivíduos com
estoques normais absorvem em torno de 2% e
15% 9.
Estudo realizado por Hunt & Roughead
11
em que avaliaram 31 homens, durante 12
semanas, consumindo dietas com igual
quantidade de ferro total, mas com diferentes
biodisponibilidades (alta e baixa), mostra que a
absorção do ferro (heme e não-heme) não foi
correlacionada com os níveis de ferritina
sérica. No entanto, foi observado que na dieta
de baixa biodisponibilidade houve diminuição
da excreção de ferritina fecal. Observou-se
uma resposta adaptativa na absorção de ferro
não-heme (mas não no ferro-heme) em relação
a biodisponibilidade da dieta, resultando em
diminuição da absorção na dieta de alta
biodisponibilidade (3,4% - 2,1%) e aumento na
dieta de baixa biodisponibilidade (0,7% 0,9%) com o passar das semanas do estudo. A
diferença na absorção do ferro não-heme entre
as dietas no início do estudo era de 5 vezes, no
final do experimento diminuiu para 2 vezes.
Essa mudança na absorção aconteceu mais
pronunciadamente em indivíduos com baixos
níveis de ferritina sérica. A incorporação do
ferro absorvido pelos heritócitos foi
inversamente correlacionada com a ferritina
sérica. Este foi o primeiro estudo longitudinal
sobre absorção do ferro e sugere que estudos
de curta duração podem superestimar
diferenças na biodisponibilidade entre dietas.
Fatores dietéticos
Dietas que apresentam um balanço
positivo entre inibidores e facilitadores da
absorção de ferro e boa quantidade de carne
são consideradas de alta biodisponibilidade 11 e
propiciam absorção de seis vezes mais ferro
119
Parisenti, J. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p.118-125, jan./jun.. 2006
que dieta com a mesma quantidade de ferro,
mas de baixa biodisponibilidade 12.
Fatores inibidores
Entre os fatores inibidores da absorção
do
ferro
não-heme estão fitatos, proteína de
Forma química (especiação)
soja, polifenóis (taninos), fibra alimentar,
Através da alimentação podemos cálcio, zinco, produtos da reação de Maillard,
consumir dois tipos de ferro, heme e não-heme. avidina (ovo), ácido oxálico (espinafre),
O ferro heme é derivado da hemoglobina e fosfatos e outros elementos inorgânicos (Cu,
mioglobina das carnes e apresenta-se na forma Mn) 6.
Fe+2 (íon ferroso). O ferro não-heme está
presente nos alimentos vegetais, ovo, leite e Fitatos
parte não-heme das carnes (ferritina,
hemossiderina e ferro heme oxidado) e
O fitato, presente nos grãos de cereais,
apresenta-se principalmente na forma Fe+3 (íon nas sementes de legumes e proteína texturizada
férrico), menos solúvel no organismo 9.
de soja, é o principal fator responsável pela
Embora as taxas de absorção do ferro baixa absorção do ferro nestes alimentos e seus
variem muito, estima-se que o ferro heme é derivados 18.
absorvido em torno de 15 – 30 % e o ferro nãoA interação ferro e fitato ocorre porque
heme entre 2 – 20% 13.
o fitato não é digerido e liga-se facilmente ao
Cerca de 40% do ferro das carnes está ferro,
formando
compostos
insolúveis
na forma de ferro heme. Alimentos à base de impedindo sua absorção 19. Conforme a
sangue de animais e moluscos (em especial quantidade de fitato fosfatado aumenta na
mexilhões) são os alimentos (não fortificados) refeição, diminui a absorção de ferro 20.
que apresentam as maiores quantidades de
Alguns processos como a fermentação,
ferro. A carne vermelha (bovina) tem mais a germinação e o “deixar de molho” podem
ferro por apresentar mais vasos sanguíneos, ativar as enzimas fitases presentes nos grãos de
mioglobina e hemoglobina que as carnes cereais, degradando o conteúdo de fitato e
brancas 14,15.
melhorando a absorção do ferro 18,21,22. O
Os alimentos de origem vegetal processo térmico de extrusão também diminui
fornecem ferro não-heme sendo a quantidade e o fitato e os taninos de sementes 22.
biodisponibilidade dependente da idade da
planta, horas de luz solar durante a fase de Proteína de soja
crescimento, hora do dia e estação do ano no
momento da colheita, matriz alimentar,
Quanto à proteína de soja, além do
resíduos de pesticidas e fertilizantes 16, além conteúdo de fitato, a redução da absorção de
dos demais fatores dietéticos facilitadores e ferro deve-se as proteínas de alto peso
inibidores da absorção.
molecular e polipeptídios produzidos pela
digestão gastrointestinal que podem também
ligar-se ao ferro no duodeno e impedir sua
Interação do ferro com outros nutrientes
absorção. A fração conglicina da proteína de
A absorção do ferro não-heme é soja também pode ser responsável pela
fortemente influenciada por fatores promotores diminuição da biodisponibilidade 23.
e inibidores presentes na dieta 9,17. Para o ferro
heme os únicos fatores dietéticos que parecem Polifenóis (taninos)
influenciar na sua biodisponibilidade são o
cálcio e a carne presentes na refeição 3.
Os polifenóis (ácidos fenólicos e
derivados, flavonóides e taninos) presentes nos
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alimentos vegetais e em grandes quantidades
nas bebidas como chá, café, chá verde, cocacola e vinho tinto são potentes inibidores da
absorção do ferro 18. O consumo de chá verde
ou preto junto com a refeição diminui a
biodisponibilidade de ferro 24.
A absorção do ferro em humanos,
diminuiu cerca de um terço quando se
adicionou no pão 12mg de tanino. O efeito
inibitório foi maior com a adição de doses de
26mg e 55mg, esta última reduziu a absorção
em aproximadamente 70%. Com superdoses de
263mg e 833mg deste ácido, a absorção
reduziu cerca de 80% 20.
1,1mg de ferro heme e 4,3mg de ferro não
heme. A esta refeição foi adicionado 127mg de
cálcio. A absorção de ferro heme foi de 15%.
Cerca de 11% do conteúdo de ferro
não-heme contido na refeição passou do
lúmem intestinal para a mucosa e 7% foi
absorvido. Segundo os autores, esta quantidade
de cálcio não foi suficiente para alterar
significativamente a absorção de ambas formas
de ferro. Todavia, dois terços do ferro nãoheme captado pela mucosa intestinal 8 horas
após a ingestão da refeição foi retido pelo
corpo depois de duas semanas (transferência
serosal). Isto quer dizer que uma quantidade
considerável de ferro não-heme que entrou nas
células da mucosa não foi transferida para o
Fibra dietética
organismo (cerca de 37%), indicando que além
Os estudos para avaliar a influência da do controle primário da regulação da absorção
fibra na biodisponibilidade de ferro são através da entrada do ferro não-heme nas
conflitantes, pois existem poucas informações células da mucosa, a transferência serosal
de estudos “in vivo” 25.
também exerce um papel importante.
26
21
Gibson
e Brune et al. , defendem
O efeito de um componente dietético
que as fibras por si só não exercem grande específico na absorção do ferro pode ser
influência na absorção do ferro e o efeito superestimado
em
estudos
de
inibitório dos cereais e seus derivados podem biodisponibilidade de curta duração ou com
ser atribuídos ao alto nível de fitatos e aos refeição única, enquanto que em períodos de
produtos de sua degradação.
tempo maiores as respostas de mecanismos
Um estudo “in vitro” apontou que a adaptativos podem evitar este efeito verificado.
biodisponibilidade de ferro é reduzida em 32% Sugere-se que a diminuição do conteúdo de
pela pectina altamente esterificada, 2,2% pela ferro no plasma, observada no início dos
oligofrutose e 2,1% pela a pectina pouco experimentos, modificaria o desenvolvimento
esterificada, enquanto que a inulina não dos enterócitos nas criptas das vilosidades
mostrou alterar a quantidade de ferro intestinais, estimulando a produção de
disponível 27.
proteínas específicas, que induziria um melhor
aproveitamento do ferro dietético quando estas
células alcançassem a maturidade. Assim,
Cálcio
mesmo em dietas suplementadas com cálcio, as
O cálcio é o único componente dietético reservas orgânicas de ferro não seriam
conhecido capaz de inibir a absorção das duas comprometidas 29.
formas de ferro (ferro heme e não-heme) 3.
Esta interação ocorre nas células da mucosa Zinco
através de mecanismo intracelular comum para
ambos os minerais, especialmente quando são
Em relação ao zinco, a inibição da
consumidos concomitantemente 28.
absorção do ferro parece depender da forma
Roughead et al. 10 testaram o efeito química dos minerias, da proporção entre eles e
inibitório do cálcio na absorção do ferro em da matriz alimentar. O mecanismo de interação
humanos. A refeição teste continha cerca de
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destes minerais parece surgir da afinidade
mútua pela proteína carregadora transferrina 26.
Segundo Pedrosa & Cozzolino 30, a proporção
ferro:zinco encontrada nos alimentos naturais
(0,5 a 2) possivelmente não exerce influência
no processo competitivo, com exceção dos
alimentos fortificados.
Herman et al. 31, estudaram em crianças
o efeito do óxido de zinco e do sulfato de zinco
na absorção do ferro (sulfato ferroso)
fortificado na farinha de trigo refinada. A
absorção de ferro e zinco foi considerada boa,
contudo, a co-fortificação da farinha com
sulfato de zinco aparentemente reduziu a
absorção de ferro. Essa inibição não foi notada
quando a co-fortificação deu-se com óxido de
zinco, menos solúvel em água.
A vitamina A e o β-caroteno aumentam
a absorção de ferro não-heme de diversos
cereais, formando complexos solúveis com o
ferro e prevenindo o efeito inibidor dos fitatos
e polifenóis na absorção de ferro 34.
Compostos de ferro: sódio-ferro-EDTA, ferro
quelado com glicina e sulfato ferroso
Suplementos como sódio-ferro-EDTA,
ferro quelado com glicina e sulfato ferroso são
utilizados no tratamento e prevenção de
anemia.
O EDTA (etileno diamino tretraacetato)
é adicionado nos alimentos como um
antioxidante na forma de Na2ETDA (di-sodio
etileno diamino tretraacetato). Possui a
capacidade de aumentar a biodisponibilidade
de ferro por ligar-se a ele formando um
Fatores promotores
composto quelado (NaFeETDA), protegendo o
Entre os fatores promotores da absorção ferro dos fatores inibidores, como o fitato 35.
do ferro não-heme estão os ácidos ascórbico
Um estudo realizado por MacPhail 36,
(mais potente), cítrico, maláico, tartárico, lático em humanos, observou que a adição de ferro
25
e eritórbico (estéreo isômero do ácido (sulfato ferroso) e EDTA na fração molar de
ascórbico empregado como antioxidante na 0,5 a 1 aumentou em 5 vezes a absorção do
indústria de alimentos)32. Também o “fator ferro, quando comparada com adição de apenas
carne”, vitamina A e β-caroteno, compostos de ferro. Frações molares superiores a 1
ferro como EDTA (etileno diamino mostraram diminuição da absorção de ferro.
tretraacetato), ferro quelado com glicina e
No entanto, o uso prolongado de EDTA
sulfato ferroso, álcool 2.
pode induzir depleção de elementos traços,
particularmente zinco.
Ácido ascórbico
“Fator carne”
O ácido ascórbico melhora a absorção
do ferro devido a sua capacidade óxidoO “fator carne” presente na carne
redutora, convertendo o ferro férrico para a vermelha, cordeiro, porco, frango, peixe e
forma ferrosa que é mais solúvel no pH do fígado aumentam a absorção de ferro. Outros
duodeno, evitando a formação de hidróxido alimentos de origem animal como o leite,
férrico insolúvel. Também no estômago, em queijo e ovos podem diminuir o ferro
pH altamente ácido, o ácido ascórbico forma disponível, demonstrando que não seria a
compostos solúveis com íons férricos proteína o fator responsável pelo aumento da
mantendo essa solubilidade a pH alcalino no biodisponibilidade do ferro 9. Possivelmente a
duodeno 33. O ácido ascórbico pode prevenir os proteína de moluscos e crustáceos também
efeitos inibitórios dos polifenóis e fitatos 20.
apresenta o “fator carne” 37.
O efeito promotor do “fator carne”
parece estar relacionado ao alto nível do
Vitamina A e β-caroteno
aminoácido cisteína presente no tecido
122
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muscular destes animais 38,11. A cisteína liga-se
ao ferro, reduzindo a forma férrica (ferro nãoheme) à ferrosa 18. Embora a alta temperatura
reduza a quantidade de cisteína presente na
carne, o efeito promotor mantem-se após o
cozimento 38.
Em estudo com ratos deficientes em
ferro a adição de carne ao feijão promoveu um
aumento na biodisponibilidade do ferro em
147% 24.
Embora a absorção de ferro varie muito,
estima-se que em dieta com grande quantidade
de carne, cerca de 10-15% do ferro total
ingerido é absorvido. Aproximadamente 25%
do ferro heme é absorvido e 10% do não-heme
em dietas contendo carnes 2.
Tratamento térmico e absorção do ferro
Com o cozimento, parte do ferro heme
presente nas carnes é convertido em ferro nãoheme 11. Essa perda de ferro heme deve-se a
desnaturação da hemoglobina e mioglobina,
onde o ferro esta armazenado, com oxidação e
quebra do anel porfirínico e conseqüente
liberação do ferro, o qual passa a fazer parte do
pool de ferro não-heme. Segundo vários
autores a quantidade de ferro heme convertido
em ferro não-heme pode variar de 10 – 100% e
depende da temperatura e tempo de cozimento
38
.
A adição de 1,5 a 3% de sal de cozinha
(NaCl), antes da cocção diminui os efeitos da
alta temperatura sobre o ferro heme 39.
Considerações Finais
A deficiência de ferro representa a
carência nutricional mais comum no mundo. O
crescente uso de suplementos alimentares e o
aumento da oferta de produtos fortificados
ressaltam a importância de estudos sobre a
biodisponibilidade de minerais.
Novas pesquisas são necessárias para
melhor compreensão das interações do ferro
com outros nutrientes ou substâncias
adicionadas
aos
alimentos,
elucidando
principalmente os mecanismos que permitem o
aumento ou redução da biodisponibilidade
desse mineral.
Apesar dos mecanismos envolvidos na
biodisponibilidade de ferro não serem ainda
totalmente
compreendidos,
muitos
conhecimentos sobre a interação do ferro com
outros elementos já estão consolidados e
podem ser aplicados nas práticas de
fortificação de alimentos ou suplementação.
Dessa forma é possível evitar uma ingestão
deficiente ou excessiva, prevenindo-se um
desequilíbrio no estado nutricional do ferro e
de outros nutrientes.
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Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p.126-129, jan./jun.. 2006
Aplicando a Teoria do Auto Cuidado de Orem no cuidado
ao trabalhador de uma indústria metalúrgica
Narloch, L; Ledoux, T.; Gelbcke, F. L; Reibnitz, K. S.
Este trabalho apresenta a experiência vivenciada, pelas
acadêmicas da 8ª unidade curricular do curso de Enfermagem
da UFSC, resultante da prática assistencial de conclusão de
curso, apresentada à disciplina de Enfermagem Assistencial
Aplicada. Foi desenvolvido no período de 30 de agosto de
2005 a 31 de outubro de 2005, no Serviço de Saúde da
Fundição Tupy, localizada em Joinville. Utilizando como
A Enfermagem Humanística no Cuidado Perioperatório à
criança e seu familiar
Maceno, P. R.; Reis, S. da S.; Maia, A. R. C.
Este trabalho é o relato do desenvolvimento da prática
assistencial, visando atender as necessidades da disciplina
Enfermagem Assistencial Aplicada da VIII Unidade Curricular
do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade
Federal de Santa Catarina. Nosso objetivo foi desenvolver uma
assistência humanizada de Enfermagem durante os períodos
pré, trans e pós-operatórios, a crianças submetidas a cirurgias
ambulatoriais no Hospital Infantil Joana de Gusmão, baseandose na Teoria de Josephene E. Paterson e Loretta J. Zderad. A
população de estudo foram crianças de um a dez anos
submetidas à cirurgia ambulatorial, especificamente
Herniorrafia. A metodologia assistencial utilizada foi a
realização de consultas de enfermagem nas visitas domiciliares
A prática de enfermagem como processo educativo em
saúde: a contribuição dos agentes comunitários na
prevenção precoce e DST
Matos, L. H. L; Romanini, L. K.; Cardoso, S. B. de A.;
Cartana, M. do H. F.
Este trabalho consiste em uma reflexão, através do projeto
teórico-prático assistencial, desenvolvido na disciplina de
Enfermagem Prática Assistencia Aplicada, da VIII Unidade
Curricular do Curso de graduação de Enfermagem da
Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Foi
executado na Unidade Básica de Saúde do Sapé, FlorianópolisSC, no período de março a junho de 2005, objetivando a
vivência experiência e ponderação do processo educativo e
preventivo na Atenção Primária à Saúde. Nossa proposta
refere-se à construção, implementação e avaliação de uma
proposta pedagógica fundamentada em Paulo Freire
O processo do nascimento no sistema prisional: assistência
de enfermagem a gestantes, puérperas e recém-nascidos em
privação de liberdade
Oliveira, A. M. de; Cordeiro, C. G.; Rosinski, T. C.;
Monticelli, M.
Trata-se de um relato de experiência sobre a prática assistencial
desenvolvida pelas acadêmicas da última fase do curso de
graduação em enfermagem da UFSC, no Presídio Feminino de
Florianópolis-SC, no período de 30 de agosto a 31 de outubro
de 2005. Este estudo teve como principal objetivo prestar
assistência de enfermagem a gestantes, puérperas e recém-
referencial teórico a Teoria do Auto Cuidado de Dorothea
Orem, foram assistidos, trabalhadores com níveis pressóricos
elevados, por meio de consultas de enfermagem, estendendo o
cuidado aos familiares no domicílio, bem como foram
realizadas atividades educativas, com o objetivo de atingir uma
parcela maior de trabalhadores. Ao término deste trabalho, as
acadêmicas consideram que foi possível vivenciar uma
experiência ímpar, na qual estabeleceu-se uma interação
trabalhador-enfermagem, além da aplicação de uma
metodologia da assistência fundamentada num referencial
teórico favorecendo as práticas de auto cuidado.
pré e pós-operatórias, acompanhamento à criança/família na
chegada ao Hospital, no trans-operatório, no pós-operatório
imediato e mediato, bem como, o acompanhamento da criança
na consulta pós-operatória. Desta forma, percebemos que as
visitas domiciliares pré-operatórias tiveram como resultado um
trans-operatório menos estressante, pois à criança sentia-se
confiante com a nossa presença no Centro Cirúrgico,
facilitando o processo anestésico. Além disso, após as
informações sobre o processo cirúrgico, fornecidas à criança,
família, houve uma melhor compreensão facilitando a
segurança, tranquilidade e auxiliando na recuperação cirúrgica.
Concluímos que o cuidado de crianças em situações
perioperatórias com a filosofia do cuidadohumanizado
assegura uma assistência de qualidade e restabelecimento mais
rápido. Tornando o cuidador, a criança e sua família mais
sensíveis e possibilitando o enfermeiro/cuidador ser
reconhecido por sua humanindade/sensibilidade e competência
técnico científica como um profissional do cuidado.
envolvendo a Enfermeira, Agentes Comunitários de Saúde e
adolescentes, da área de abrangência da Unidade, na prevenção
da gravidez precoce e das Doenças Sexualmente
Transmissíveis. Visa aprimorar as Estratégias de Saúde da
Família no âmbito da educação, utilizando as concepções do
educador Paulo Freire voltadas à educação, prevenção,
promoção e manutenção da saúde dos jovens locais, que já
iniciaram ou iniciarão sua vida sexual, com risco de uma
eventual gravidez ou exposição às DST. Através de processos
educativos como a construção de conhecimentos relacionados e
a elaboração de uma peça teatral, para a abordagem e resgate
das situações com os jovens, proporcionou-se a reflexão da
realidade com as ACS. Por meio da proposta de educação em
saúde, conseguimos pensar coletivamente sobre a situação
local e construir saberes que podem, potencialmente, refletir na
melhoria da qualidade de vida da população.
nascidos em privação de liberdade, fundamentada na Teoria
Geral de Enfermagem de Dorothea E. Orem. Entendeu-se
como pressuposto do estudo, que a enfermagem deve estar
presente no ambiente institucional para ajudar as mulheres
privadas de iberdade, que vivenciam o processo do nascimento,
a aumentarem seus potenciais e habilidade para o autocuidado
e para serem agentes dos cudiados aos recém-nascidos.
Assumiu-se que a enfermagem deve ser suporte nesses
períodos desenvolvimentais, instrumentalizando-as com
conhecimentos e práticas que as promovam como agentes
ativos neste processo, mesmo estando inseridas em um
contexto prisional. O marco conceitual adotado para a prática
fez referência aos conceitos de ser humano, enfermagem,
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Resumos
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p.126-129, jan./jun.. 2006
processo saúde-doeça, sociedade/meio-ambiente, autocuidado,
demanda terapêutica (ou requisito, ou exigência) de
autocuidado, déficits de autocuidado, sistemas de enfermagem,
competência do indivíduo para o autocuidado e competência
ou poder da enfermagem para agenciar o autocuidado. A
metodologia adotada para a prática assistencial com as
mulheres e seus filhos compreendeu a consulta de enfermagem
(contemplando três fases concomitantes e complementares:
coleta de dados, plano de cuidados e implementação, e
evolução de enfermagem) e abordagens coletivas (oficinas com
temáticas pertinentes ao processo de nascimento). A vivência
com estas mulheres e seus filhos dentro do contexto prisional,
em ambas as atividades, oportunizou a identificação dos
requisitos e habilidades de autocuidado de cada mulher, sendo
que através desta relação foi possível o estabelecimento dos
déficits para o autocuidado. A partir destas identificações
foram emitidas as metas assistenciais introjetadas de modo
participativo, visando a resolução dos déficits apresentados. Os
resultados deste trabalho proporcionaram um maior
entendimento das relações de cuidado adotadas por estas
mulheres a partir dos recursos que dispõem ara tal, assim ocmo
os valoers da sociedade civil e do universo carcerário que se
fundem dentro desta realidade. Conseguiu-se atuar junto às
mulheres de maneira participativa, ajudando a empoderá-las
para as ações de auto-cuidado, desenvolvendo aprimorando
habilidades para o contínuo processo de cuidar.
“Minha maluquez, misturada com minha lucidez”: A
atuação de acadêmicos de enfermagem junto a adolescentes
usuários de um CAPSi
Travelbee e o Método Problematizador de Paulo Freire. A arte
de “se olhar olhando” tem nos proporcionado ver, sentir,
interpretar e agir com estes adolescentes entre de 15 a 18 anos.
Temos compreendido com os participantes do estudo que a
diversidade e modificações biopsicossociais da adolescência,
associadas à necessidade de superação da realidade é um fazer
acontecendo e um conhecer vivendo. As transformações
naturais, muitas vezes julgadas como transtorno ou mau
comportamento social, servem como justificativa para a baixa
autoestima, isolamento, estigma e falta de sentido de vida a
eles atribuídos. Nossa atuação enquanto acadêmicos tem sido
impulsionada pela problematização, discussão das escolhas,
criação de oportunidades para repensarmos juntos aos
adolescentes, suas trajetórias de vida, assim como as nossas,
descortinando cada cena e com isto buscando as tão almejadas
liberdade e felicidade.
Hagemann, S.; Zardo C.; Marcelino, M. A.; Sprícigo, J. S.
Com a necessidade de elaboração de um projeto de assistência
para conclusão do Curso de Graduação em Enfermagem e
motivados pelo processo atual da Reforma Psiquiátrica
brasileira, iniciamos nosso projeto. Neste relato destacamos a
assistência de enfermagem prestada a adolescentes que
vivenciam alguma dificuldade em relação a sua saúde mental.
Para concretizar essa assistência selecionamos usuários de um
Centro de Atenção Psicossocial (CAPSi), em Florianópolis,
Santa Catarina, Brasil. Como referencial teórico utilizamos a
Relação Pessoa Pessoa de Joyce
Redescobrindo a vida: o cuidado de enfermadem junto ao
paciente com dianóstico de câncer fundamentado em
Dorothea E. Orem e Hildegard E. Peplau
Souza, H. E. de¹; Hendges, L.¹; Radünz, V.²
No presente Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação em
Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina,
apresentamos o caminho trilhado desde a elaboração do projeto
assistencial, sua implementação e o relatório desta prática,
Promoção da Saúde do Trabalhador de Enfermagem
Psiquiátrica
Sanches, A. D.¹; Martins, T. S.¹; Albuquerque G. L. de²;
Sprícigo, J. S.²
Desenvolver a Assistência de Enfermagem e Educação
Continuada aos trabalhadores da área de Enfermagem
Psiquiátrica, visando o cuidado de si e o cuidado de outro, na
perspectiva da humanização da atenção em saúde. A
metodologia utilizada fundamentou-se na Teoria Humanística
Uma caminhada com Florence Nightingale: cuidando de
mulheres gestantes/puérperas e suas famílias em busca do
fortalecimento de seu poder vital
Mocellin, A.¹; Rodriguez, I. G.¹; Justino, M. M.¹; Carraro, T.
E.²
Este trabalho relata um caminhada com mulheres que
vivenciam o período gestacional e puerperal e suas famílias,
descrevendo as vivências, experiências e o aprendizado no
cuidado ao paciente com diagnóstico de câncer, incluindo neste
processo seu acompanhante. Foi desenvolvido no Hospital de
Internação do CEPON, na Unidade de Oncologia Clínica. A
população alvo compreendeu os pacientes internados nesta
Instituição. O Referencial Teórico utilizado foi o processo de
enfermagem proposto pelas enfermeiras do CEPON (ÁVILA,
1997) que está baseado nas teorias de autocuidado de Dorothea
E. Orem e do inteacionismo de Hildegard E. Peplau.
de Paterson & Zderad, tendo a observação participante, sobre o
que ocorre no campo e na cena observada, princípios da
metodolia problematizadora, para criarmos um ambiente
reflexivo. Aplicando o lúdico, a motivação nos encaminhando
a educação permanente. Considerando a temática proposta,
buscamos com os trabalhadores conhecer meios de extravasar
seus sentimentos, mostrando que é possível prestar um cuidado
de Enfermagem, respeitando o cliente, e o colega de profissão,
aprendendo a reduzir a influência de sentimentos de raiva sobre
si e sobre as outras pessoas, seja por gestos ou palavras.
utilizando o Modelo de Cuidado de Carraro elaborado em 1994
para cuidar de pacientes cirúrgicos sob o título de: A Trajetória
de Enfermagem junto ao Ser Humano e sua família na
Prevenção de Infecções, embasado na teoria de Florence
Nightingale. Foi desenvolvido no alojamento conjunto e sala
de espera do ambulatório gineco/obstetra do Hospital
Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina, no
Grupo de Casais Grávidos do HU, no Grupo de Gestantes da
Igreja Santíssima Trindade e no domicílio de mulheres
gestantes/puérperas, na cidade de Florianópolis – SC. Os
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Resumos
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p.126-129, jan./jun.. 2006
relatos, junto às cinco mulheres gestantes/puérperas e suas
famílias que caminhamos, são neste apresentados e analisados
a partir dos objetivos traçados. A realização destas caminhadas
contribuiu para visualização da oscilação e fortalecimento do
poder vital dos envolvidos. Desta forma pudemos concluir a
importância de ver e valorizar a mulher como um ser integral e
Empoderando o ser mulher trabalhadora para o
autocuidado em amamentação à luz da teoria de Dorothea
E. Orem
Gonçalves, J.¹; Mendes, B.¹; Tramontin, M. B.¹; Santos, E. K.
A. dos²
Este trabalho trata do relato de experiência de uma proposta
assistencial desenvolvida em uma Unidade Local de Sáude
(ULS) da cidade de Florianópolis, SC, Brasil, por três
acadêmicas do oitavo período do Curso de Graduação em
Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina
(UFSC), formandos 2005/01. Foi desenvolvido no período de
01/03/2005 a 30/06/2005 na área da saúde da mulher,
enfocando o serr mulher trabalhadora e/ou estudante sendo ela
gestante ou puérpera. O mesmo baseou-se na teoria do
autocuidado proposta por Dorothea E. Orem, tendo como
Assistência de Enfermagem às Primipuérperas, RecémNascidos e Avós no Alojamento Conjunto e Domicílio
Fundamentada na Teoria de Madeleine Leininger
Floriano, D. M.¹; Westphal, L. E.¹; Arruda, M. C.¹;
Gonçalves, L. H. T.²; Gregório, V. R. P.²
O presente trabalho relata a experiência desenvolvida pelas
autoras, enquanto acadêmicas de enfermagem da disciplina
Enfermagem Assistencial Aplicada da VIII Unidade Curricular
do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade
Federal de Santa Catarina. Teve como objetivo geral
desenvolver assistência de enfermagem, com base na teoria da
Diversidade e Universalidade do Cuidado Cultural de
Madeleine Leininger, focalizando a influência cultural das avós
no cuidado da primipuérpera e do recém nascido. A prática
assistencial foi realizada no período de 30/03 a 03/06/2005, no
Alojamento conjunto do HU/UFSC. A teoria foi escolhida para
Cuidando da criança com câncer e seu familiar
acompanhante em internação hospitalar: um olhar a partir
da Teoria de Adaptação de Sister Callista Roy
Lancini, A. de B.¹; Daniel, H. S.¹; Maciel, L. da S.¹; Nunes,
S. M.¹; Farias, A. M.²
Este trabalho trata do relato de uma prática assistencial
desenvolvida para a conclusão do Curso de Graduação em
Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina,
realizada na unidade de internação Onco-Hematológica do
Hospital Infantil Joana de Gusmão, em Florianópolis – SC,
Brasil, no período de 30 de agosto a 31 de outubro de 2005,
tendo como objetivo geral prestar cuidado de Enfermagem à
criança com câncer e seu familiar acompanhante, embasado na
Teoria de Adaptação de Sister Callista Roy. Para
implementação da prática adotou-se como metodologia: a
aplicação do Processo de Enfermagem a partir de Roy,
constituído de seis etapas (avaliação de primeiro nível,
singular que está vivenciando um momento único, repleto de
mudanças que podem influenciar diretamente em seu poder
vital. O cuidado que este relatório propõe é direcionado ao
fortalecimento do poder vital da mulher e família que estão
passando por estes períodos.
objetivo geral: empoderar o ser mulher trabalhadora e/ou
estudante para se engajar em ações de autocuidado,
fundamentadas na Teoria de Orem, visando a efetivação e
posterior manutenção do aleitamento materno quando esta
retornar as suas atividades profissionais. Durante as atividades
na ULS realizamos 12 consultas de enfermagem e aplicamos o
processo da teoria utilizada. Nós também visistamos creches,
empresas, visita domiciliar, grupo de gestantes e realizamos
demais atividades de enfermagem. Acreditamos que este
trabalho seja de grande relevância social, uma vez que, visa
através da educação à busca dos direitos já conquistados e que
muitas vezes são negados, negligenciados ou esquecidos. Além
disso, contribuiu imensamente para a nossa formação
profissional já que entendemos que o autocuidado é algo
aprendido e que o Enfermeiro possui responsabilidades em
cuidar e atender os requisitos para o autocuidado terapêutico de
seus pacientes, além de ser este, um agente de formação e
transformação da sociedade.
direcionar a prática, por conceber o cuidado numa visão
holística e permitir o reconhecimento da cultura e sua
influência sobre o processo de cuidar. Para implementar o
referencial na prática utilizamos a aplicação do processo de
enfermagem baseadas no processo de Silva (2002), que se
divide em quatro fases distintas: conhecendo a situação,
refletindo sobre a situação, planejando e implementando os
cuidados e avaliando os cuidados. Este processo foi aplicado a
seis primipuérperas, seus recém-nascidos e avós
acompanhantes e a implementação dos cuidados baseou-se nas
seguintes formas de cuidado: manutenção, acomodação e
repadronização dos cuidados culturais, conforma propõe a
teórica. Conclui-se que apesar das primipuérperas estarem
passando por experiências semelhantes há diversidades
culturais entre elas, as quais nos mostram o quanto é
importante o atendimento de forma individualizada focalizando
suas crenças, valores, significados e práticas de cuidado, pois
isto favorece a assistência culturalmente congruente.
avaliação de segundo nível, diagnóstico, fixação de metas,
intervenção, evolução) a fim de sistematizar os cuidados
prestados, sendo este aplicado a quatro crianças e seus
familiares acompanhantes: a realização de atividades lúdicorecreativas e de sensibilização; as oficinas educativas, entre
outras. O estudo permitiu a identificação: das diversas reações
adaptativas apresentadas pelas crianças e seus familiares
acompanhantes frente ao adoecimento pelo câncer e sua
consequente hospitalização; os fatores que influenciaram
positiva ou negativamente no processo de adaptação, tais como
experiências anteriores, suporte social, espiritual e familiar,
capacidade de enfrentar os problemas; das contribuições da
Enfermagem para tornar o ambiente hospitalar propício a uma
adaptação saudável. Ressaltamos a necessidade da equipe de
saúde estender o cuidado ao familiar acompanhante, para que
este possa contribuir no processo adaptativo da criança, uma
vez que percebemos ser a adaptação um processo individual e
contínuo enfrentada de maneira diferenciada por cada ser.
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Vivenciando o Cuidado Transdimensional a pessoas com
câncer: o desafio do exercício do Toque Terapêutico
Petersen, A.¹; Machado, C. B. M.¹; Ghiorzi, A. M.²
Trata-se do relatório de nossa vivência de Cuidado
transdimensional a pessoas com câncer utilizando o Toque
Terapêutico no cuidado de Enfermagem. O referencial teórico
estudado e aplicado é o do Cuidado Transdimensional de Silva
(1997). A prática de cuidado foi desenvolvida no Centro de
Apoio ao Paciente com Câncer – CAPC, instituição que utiliza
como base de tratamento a Medicina Vibracional/Energética,
junto com pessoas que estavam em regime de internação, com
pessoas externas para o atendimento e com pessoas que faziam
parte do Programa de Auto-Ajuda. A teoria do Cuidado
Prática assistencial junto aos idosos, familiares e/ou
cuidadores usuários da unidade local de saúde da trindade,
baseada na Teoria do Autocuidado de Orem
Assmann, A.¹; Alves, K. L.¹; Ferreira, N.¹; Frank, S.¹; Santos,
S. M. A. dos²
Trata do relatório da prática assistencial apresentado à
disciplina Enfermagem Asssitencial Aplicada, da VIII Unidade
Curricular do Curso de Graduação em Enfermagem da
Universidade Federal de Santa Catarina. A prática foi realizada
durante o segundo semestre de 2005, na Unidade Local de
Saúde Dr. Waldomiro Dantas da Trindade, em Florianópolis,
Santa Catarina. Nessa prática tivemos como objetivo prestar
assistência de enfermagem à clientela idosa, seus familiares
e/ou cuidadores, com enfoque na promoção do autocuidado na
esfera da saúde coletiva e no âmbito domiciliar. Para tanto,
utilizamos como Marco Conceitual a Teoria de Enfermagem
do Autocuidado de Dorothea E. Orem. Assim, desenvolvemos
atividades assistenciais na ULS – Trindade e, quando fizemos
O Cuidado Humanístico a Idoso Fragilizados e seus
Familiares Cuidadores em uma Unidade Local de Saúde
Stefanes, C.¹; Toledo, G. B.¹; Nora, P. T.¹; Alvarez, A. M.²
O presente estudo trata-se do registro da prática assistencial
implementada na Unidade Local de Saúde (ULS) da Trindade,
no período de 30 de março a 06 de junho de 2005, como
trabalho de conclusão de curso da disciplina de Enfermagem
Assistencial Aplicada da VIII Unidade curricular do Cursode
Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC). Esse estudo consistiu na implementação da
assistência de enfermagem ao idoso fragilizado e seu familiar
cuidador no cenário comunitário de saúde. Como metodologia
norteadora utilizou-se a Teoria Humanística de Paterson e
Zderad, a qual considera o encontro, o relacionar-se, o diálogo
vivido e a presença efetiva do enfermeiro como elementos
terapêuticos de uma enfermagem existencial. As atividades
desenvolvidas foram de caráter assistencial-educativas visando
o bem-estar e o estar melhor dos clientes envolvidos no
processo de cudiado. Tais atividades foram realizadas tanto no
serviço primário como em domicílio e vieram ao encontro das
Transdimensional permitiu cuidar, percebendo e sentindo as
pessoas de forma transdimensional: plural, indivisível e
irredutível somenta às explicações da razão, apesar de suas
diversidades estruturantes. Pessoas que são razão e emoção,
corpo físico e corpo energético mais sutil. Esse cuidado
mostrou-se multissensorial, extrapolando o corpo e o cérebro
pensante, o tempo e o espaço. É a vivência do paradigma da
Simultaniedade. Concluimos conceituando Consulta de
Enfermagem na Era III de atenção à saúde, apontando o amor
como fonte energética curadora, o Toque Terapêutico como
terapia integrante do cuidado de enfermagem, a importância do
cudiado do próprio cuidador e a importância da integralização
dos cuidados biológico, psicológico, espiritual e energético
para a saúde e a cura do corpo e da alma.
visitas domiciliárias a idosos que não apresentavam condições
de irem até essa unidade. Também fizemos o mapeamento dos
idosos de uma microárea de abrangência dessa unidade com
finalidade de levantarmos as demandas de saúde e suas
competências para realizarem o autocuidado. Destacamos,
ainda, as atividades adminsitrativas e assistenciais
desenvolvidas pelas acadêmicas na própria unidade. Através do
trabalho desenvolvido foi possível conhecer-se a realidade
cotidiana de uma unidade local de saúde e o significado do
trabalho em equipe interdisciplinar. Percebemos também que,
para se estimular o autocuidado entre a clientela idosa, é
necessário conhecer-se suas exigências e competências para
implementá-lo. Dessa forma, entendemos que os profissionais
precisam estar imbuídos do referencial teórico escolhido,
possuir conhecimentos sobre o processo de envelhecimento e
as necessidades de saúde requeridas pela clientela idosa.
Assim, os profissionais poderão estabelecer a relação entre
teoria e prática, prestar uma assistência de qualidade e
favorecer a troca de conhecimentos com os idosos, familiares
e/ou cuidadores e os demais membros da equipe.
disposições legais previstas nas Políticas Públicas de
Assistência ao Idoso. Fez parte desse estudo o
desenvolvimento e implementação de passos metodológicos
que contribuíram para a organização da assistência
gerontológica na unidade local, como a consulta de
Enfermagem: a visita domiciliária e a implantação de um grupo
de ajuda mútua de familiares cuidadores de idosos fragilizados.
Ainda emergiram outras ações políticas e adminsitrativas de
Enfermagem que permearam a prática e enriqueceram essa
vivência. Conclui-se que se estabeleceu uma relação empática
e um vínculo entre o ser-idoso, ser-familiar cuidador e o serenfermeiro, possibilitando um cuidado humanizado e um olhar
gerontológico aos usuários idosos da Unidade Local de Saúde.
Assim como, foi possível também participar de um trabalho
interdisciplinar com toda a equipe da Unidade. Por fim, esse
trabalho permitiu a intefração do enfoque humanístico aos
conhecimentos já adquiridos durante a graduação contribuindo
desta maneira para com nossa formação no sentido de uma
sensibilização para um cuidado efetivamente integral e
comprometido com a saúde de todos os seres humanos.
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8. A revista classificará os textos
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8.1
EDITORIAL
–
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de
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Revista.
8.2
ARTIGOS
ORIGINAIS:
a)
PESQUISA – constará de relatos de
investigações científicas concluídas. b)
REVISÃO – abrangerá revisões de literatura
sobre temas específicos. c) RELATO DE
EXPERIÊNCIA/CASOS CLÍNICO –
incluirá descrições de atividades acadêmicas
assistenciais e de extensão. d) REFLEXÃO
– apresentará materiais de caráter opinativo
e/ou análise de questões que possam
contribuir para o aprofundamento de temas
relacionados à área a que se destina a revista.
8.3 OUTRAS SEÇÕES: a) ENTREVISTA
– espaço destinado a entrevistas de
autoridades / especialistas / pesquisadores. b)
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE
CURSO
/
DISSERTAÇÕES
DE
MESTRADO
E
TESES
DE
DOUTORADO
–
RESUMOS
E
ABSTRACT c) PÁGINA DO LEITOR.
9. NORMAS DE APRESENTAÇÃO DE
TRABALHOS
9.1 – FORMATO – O trabalho deverá ser
encaminhado em 02 (duas) vias. Na
digitação deverá ser utilizado espaço 1,5;
com margem esquerda 3 cm; margem direita
(superior e inferior) 2 cm; letra Times New
Roman, tamanho 12, observando a ortografia
oficial, editor Word For Windows. O título
deverá ser em caixa alta, negrito, espaço 1,5
simples e justificado. Os autores deverão
estar abaixo do título do artigo, em negrito,
espaço simples e em caixa baixa. O texto
deverá conter seus respectivos títulos, de
acordo com as características do trabalho
(ex. Artigo de pesquisa: Introdução,
Métodos, Resultados e Discussão, etc.),
formatados em caixa baixa, negrito. É
obrigatório o envio de disquete ou CD-ROM
na primeira etapa do trabalho.
9.2 – PADRÃO DE APRESENTAÇÃO –
a) ARTIGOS ORIGINAIS – redigidos de
acordo com as normas da Revista do CCS
devendo conter no máximo 15 laudas de
texto para artigos originais e 25 para revisões
e observar o que segue:  Título do artigo em
português (caixa alta) e inglês (caixa baixa) e
130
Normas de Publicação
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entre colchetes. Nome(s) completo(s) do(s)
autor(es). Em nota de roda pé a(s)
credencial(is) e local de atividade do(s)
autor(es) (espaço 1,5 cm), email para
correspondência.  Resumo indicativo em
português, de acordo com as normas da
Revista do CCS, com até 100 palavras, em
espaço 1,5.  Palavras-chave - palavras ou
expressões que identifiquem o artigo. Para
determinação das palavras-chave consultar
a lista de “Descritores em Ciências da Saúde
– DECS-LILACS”, elaborada pela BIREME
e/ou “Medical Subject Heading –
Comprehensive Medline”. Texto – incluindo
ilustrações (quadros, fotos, modelos, mapas,
desenhos, gravuras, esquemas, gráficos e
tabelas), com seus respectivos títulos e fontes
(quando houver). Exceto gráficos e tabelas,
todas as ilustrações deverão ser designadas
como figuras. As despesas com os fotolitos
de figuras somente coloridas serão de
responsabilidade dos autores  Abstract –
tradução do resumo em inglês, em espaço 1,5
cm.  Keywords – tradução das palavraschave para o inglês.
As referências (Normas de Vancouver) no
texto
deverão
ser
numeradas
consecutivamente de forma crescente e na
ordem que aparecem no texto pela primeira
vez, identificando assim os autores
SOMENTE
POR
NÚMEROS.
A
numeração, no texto, portanto deve ser em
ORDEM
CRESCENTE
e
SOBRESCRITO. NÃO LISTAR OS
NOMES DOS AUTORES NO TEXTO.
No setor de referências: (Normas de
Vancouver)
A
listagem
de
referências deverá seguir a mesma ORDEM
NUMÉRICACRESCENTE do texto. NÃO
COLOCAR OS AUTORES EM ORDEM
ALFABÉTICA.
 EXEMPLOS DE REFERÊNCIAS
A) Artigos de revistas
1. Artigo padrão de revista:
Listar os primeiros seis autores seguido por
et al.
Vega KJ, Pina I, Krevsky B. Heart
transplantation is associated with an
increased risk for pancreatobiliary disease.
Ann Intern Med 1996;124:980-3.
Mais do que seis autores:
Parkin DM, Clayton D, Black RJ, Masuyer
E, Friedl HP, Ivanov E, et al. Childhood-leukaemia in Europe after Chernobyl: 5 year
follow-up. Br J Cancer 1996;73:1006-12.
2. Organização como autor:
The Cardiac Society of Australia and New
Zealand. Clinical exercise stress testing.
Safety and performance guidelines. Med J
Aust 1996;164:282-4.
3. Sem menção de autor:
Cancer in South Africa [editorial]. S Afr
Med J 1994;84:15.
4. Volume com suplemento:
Shen HM, Zhang QF. Risk assessment of
nickel carcinogenicity and occupational lung
cancer. Environ Health Perspect 1994;102
Suppl 1:275-82.
5. Número com suplemento:
Payne DK, Sullivan MD, Massie MJ.
Women's psychological reactions to breast
cancer. Semin Oncol 1996;23(1 Suppl 2):8997.
6. Volume com parte:
Ozben T, Nacitarhan S, Tuncer N. Plasma
and urine sialic acid in non-insulin
dependent diabetes mellitus. Ann Clin
Biochem 1995;32(Pt 3):303-6.
7. Número com parte:
Poole GH, Mills SM. One hundred
consecutive cases of flap lacerations of the
leg in ageing patients. N Z Med J
1994;107(986 Pt 1):377-8.
8. Número sem menção de volume:
Turan I, Wredmark T, Fellander-Tsai L.
Arthroscopic ankle arthrodesis in rheumatoid
arthritis. Clin Orthop 1995;(320):110-4.
9. Sem menção de número nem de
volume:
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Normas de Publicação
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p.130-133, jan./jun.. 2006
Browell DA, Lennard TW. Immunologic
status of the cancer patient and the effects of
blood transfusion on antitumor responses.
Curr Opin Gen Surg 1993:325-33.
10. Paginação em numeração romana:
Fisher GA, Sikic BI. Drug resistance in
clinical
oncology
and
hematology.
Introduction. Hematol Oncol Clin North Am
1995 Apr;9(2):xi-xii.
11. Indicação do tipo de artigo, se
necessário:
Enzensberger W, Fischer PA. Metronome in
Parkinson's
disease
[carta].
Lancet
1996;347:1337. Clement J, De Bock R.
Hematological complications of hantavirus
nephropathy (HVN) [resumo]. Kidney Int
1992;42:1285.
12. Artigo contendo retratação:
Garey CE, Schwarzman AL, Rise ML,
Seyfried TN. Ceruloplasmin gene defect
associated with epilepsy in EL mice
[retractação de Garey CE, Schwarzman AL,
Rise ML, Seyfried TN. In: Nat Genet
1994;6:426-31]. Nat Genet 1995;11:104.
13. Artigo retratado:
Liou GI, Wang M, Matragoon S. Precocious
IRBP gene expression during mouse
development
[retractado
em
Invest
Ophthalmol Vis Sci 1994;35:3127]. Invest
Ophthalmol Vis Sci 1994;35:1083-8.
14. Artigo com erratum publicado:
Hamlin JA, Kahn AM. Herniography in
symptomatic patients following inguinal
hernia repair [erratum publicado encontra-se
em West J Med 1995;162:278]. West J Med
1995;162:28-31.
B- Livros e outras monografias
1. Autor(es) individual:
Ringsven MK, Bond D. Gerontology and
leadership skills for nurses. 2nd ed. Albany
(NY): Delmar Publishers; 1996.
2. Editor(es), compilador, como autor:
Norman IJ, Redfern SJ, editors. Mental
health care for elderly people. New York:
Churchill Livingstone; 1996.
3. Organização como autor e editor:
Institute of Medicine (US). Looking at the
future
of
the
Medicaid
program.
Washington: The Institute; 1992.
4. Capítulo de um livro:
Phillips SJ, Whisnant JP. Hypertension and
stroke. In: Laragh JH, Brenner BM, editors.
Hypertension: pathophysiology, diagnosis,
and management. 2nd ed. New York: Raven
Press; 1995. p. 465-78.
5. Livro de atos de conferência, congresso,
encontro:
Kimura J, Shibasaki H, editors. Recent
advances in clinical neurophysiology.
Proceedings of the 10th International
Congress
of
EMG
and
Clinical
Neurophysiology; 1995 Oct 15-19; Kyoto,
Japan. Amsterdam: Elsevier; 1996.
6. Comunicação em conferência:
Bengtsson S, Solheim BG. Enforcement of
data protection, privacy and security in
medical informatics. In: Lun KC, Degoulet
P, Piemme TE, Rienhoff O, editors.
MEDINFO 92. Proceedings of the 7th World
Congress on Medical Informatics; 1992 Sep
6-10; Geneva, Switzerland. Amsterdam:
North-Holland; 1992. p. 1561-5.
7. Relatório técnico ou científico:
Publicado pela entidade financiadora ou
patrocinadora: Smith P, Golladay K.
Payment for durable medical equipment
billed during skilled nursing facility stays.
Final report. Dallas (TX): Dept. of Health
and Human Services (US), Office of
Evaluation and Inspections; 1994 Oct.
Report
No.:
HHSIGOEI69200860.
Publicado pela entidade executora: Field
MJ, Tranquada RE, Feasley JC, editors.
Health services research: work force and
educational issues. Washington: National
Academy Press; 1995. Contract No.:
AHCPR282942008. Sponsored by the
Agency for Health Care Policy and
Research.
8. Dissertação:
Kaplan SJ. Post-hospital home health care:
the elderly's access and utilization
[dissertação]. St. Louis (MO): Washington
Univ.; 1995.
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Normas de Publicação
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 25 n.1, p.130-133, jan./jun.. 2006
9. Patente:
Larsen CE, Trip R, Johnson CR, inventors;
Novoste Corporation, assignee. Methods for
procedures related to the electrophysiology of
the heart. US patent 5,529,067. 1995 Jun 25.
C).Outras publicações
1. Artigo de jornal:
Lee G. Hospitalizations tied to ozone pollution:
study estimates 50,000 admissions annually.
The Washington Post 1996 Jun 21;Sect. A:3
(col. 5).
2. Material audiovisual:
HIV+/AIDS: the facts and the future [cassette
video]. St. Louis (MO): Mosby-Year Book;
1995
3. Texto legal:
Legislação publicada Preventive Health
Amendments of 1993, Pub. L. No. 103-183,
107 Stat. 2226 (Dec. 14, 1993). Legislação não
promulgada: Medical Records Confidentiality
Act of 1995, S. 1360, 104th Cong., 1st Sess.
(1995). Code of Federal Regulations: Informed
Consent, 42 C.F.R. Sect. 441.257 (1995).
Audição: Increased Drug Abuse: the Impact on
the Nation's Emergency Rooms: Hearings
Before the Subcomm. on Human Resources
and Intergovernmental Relations of the House
Comm. on Government Operations, 103rd
Cong., 1st Sess. (May 26, 1993).
4. Mapa:
North Carolina. Tuberculosis rates per 100,000
population, 1990 [demographic map]. Raleigh:
North Carolina Dept. of Environment, Health,
and Natural Resources, Div. of Epidemiology;
1991.
5. Livro da Bíblia:
The Holy Bible. King James version. Grand
Rapids (MI): Zondervan Publishing House;
1995. Ruth 3:1-18.
6. Dicionário e referências semelhantes:
Stedman's medical dictionary. 26th ed.
Baltimore: Williams & Wilkins; 1995.
Apraxia; p. 119-20.
7. Texto clássico:
The Winter's Tale: act 5, scene 1, lines 13-16.
The complete works of William Shakespeare.
London: Rex; 1973.
B) Material não publicado
8. Aguardando publicação:
Leshner AI. Molecular mechanisms of cocaine
addiction. N Engl J Med. Em publicação 1996.
Material electrónico
C) Material eletrônico
9. Revista em formato eletrônico:
Morse SS. Factors in the emergence of
infectious diseases. Emerg Infect Dis [serial
online] 1995 Jan-Mar [cited 1996 Jun 5];
1(1):[24 ecrans]. Disponível em: URL:
http://www.cdc.gov/ncidod/EID/eid.htm
10. Monografia em formato eletrônico:
CDI,
clinical
dermatology
illustrated
[monografia em CD-ROM]. Reeves JRT,
Maibach H. CMEA Multimedia Group,
producers. 2nd ed . Version 2.0. San Diego:
CMEA; 1995.
11. Ficheiro de computador:
Hemodynamics III: the ups and downs of
hemodynamics [programa de computador].
Version 2.2. Orlando (FL): Computerized
Educational Systems; 1993.
10.O(s) autores deverão encaminhar o artigo
para análise acompanhado de uma carta com os
seguintes dizeres:
(Cidade, data)
À Comissão Editorial
Revista de Ciências da Saúde
Os autores abaixo assinados transferem come
exclusividade, os direitos de publicação, na
Revista de Ciências da Saúde do artigo
intitulado: (escrever título do artigo) e
garantem que o artigo é inédito e não está
sendo avaliado ou foi publicado por outro
periódico.
(incluir nome completo de todos os autores,
endereço postal, telefone, email, fax, e
assinaturas respectivas.
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