1º seminário de enfermagem em cuidados intensivos da beira interior
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1º seminário de enfermagem em cuidados intensivos da beira interior
Este suplemeto faz parte da Revista Amato Lusitano, n.32, 1º Trimestre “CUIDAR EM FAMILIA” Alexandra Roque – Enfermeira Graduada Dina Fabião – Enfermeira Especialista Enfermagem Reabilitação Virgínia Oliveira - Enfermeira Especialista Enfermagem Reabilitação RESUMO A Unidade de Cuidados Intensivos (UCI) é um ambiente culturalmente carregado de significados míticos negativos relacionados com a morte e/ou incapacidades permanentes. Possuir um membro da família internado nessa unidade costuma estar diretamente relacionado com a real possibilidade de o perder, representando uma forte ameaça à integridade e à segurança do grupo familiar. A família encontra-se em evidente estado de desequilíbrio, apresentando várias necessidades e exigindo atendimento específico. O enfermeiro é o profissional da equipa de saúde mais frequentemente citado como responsável pela satisfação das necessidades da família do doente. A nossa prática diária leva-nos a refletir sobre as diferentes formas, como as famílias/pessoas significativas do doente, manifestam as suas angústias e dúvidas ao longo do internamento do seu familiar e consequentemente a eventual necessidade de encaminhamento e apoio adequados. Pensamos que o suporte psicossocial dos doentes e famílias é um componente integral em qualquer plano de cuidados. Com a elaboração deste projeto pretendemos criar linhas orientadoras no que diz respeito à forma como lidar com as famílias de doentes internados e que possam ser identificadas como famílias de risco, sendo nossa intenção criar um circuito interno de apoio aos familiares. Pensamos que a tentativa de disponibilizar o apoio direto de um psicólogo seria uma forma de praticar melhores cuidados e prevenir situações mais graves que muitas vezes nos sentimos incapazes de ultrapassar. Palavras-chave: Unidade de Cuidados Intensivos, Família de Risco, Apoio Psicológico INTRODUÇÃO Quando surge a necessidade de internamento num serviço de cuidados intensivos, pelas mais variadas razões, a maioria dos indivíduos interpretam essa necessidade como o início do último percurso de vida. O estado manifestado pelo doente crítico que vai ser internado numa UCI significa, de uma maneira geral, ‘uma ida sem retorno’. Este conceito que tem vindo a ser combatido das mais variadas formas é, ainda hoje um estereótipo da sociedade atual para a qual UCI significa sofrimento, morte e supervalorização da tecnologia. Pouco adianta possuir tecnologia de ponta e primorosa estrutura física e organizacional se o fator huma- no e o relacionamento que se estabelece entre profissionais e o doente/família no processo de atendimento não forem de boa qualidade. A comunicação adequada, honesta e uniforme é de extrema importância para evitar e diminuir a ansiedade manifesta pelo doente e família. Na realidade, sob um ponto de vista ético/moral, as decisões de saúde a tomar para os doentes de cuidados intensivos provocam maior controvérsia do que qualquer outra área de cuidados de saúde, independentemente de estas continuarem a ser vigorosamente debatidas na literatura. Torna-se, então, prudente criar estratégias que permitam uma avaliação psicossocial das famílias/pessoas significativas dos doentes internados na nossa unidade. Tendo em conta que existe uma reciprocidade entre o doente e a sua família cabe ao enfermeiro de cuidados intensivos a capacidade de apoiar e fortalecer relações significativas durante momentos de elevado stress tomando consciência que isso constitui outra forma de cuidar o doente. A família encontra-se em evidente estado de desequilíbrio, apresentando várias necessidades e exigindo atendimento específico. Essas necessidades podem ser exemplificadas por situações ou eventos como: saber quem pode dar informação ao familiar, sentir que há esperança de melhora, saber qual o tratamento médico que está a ser aplicado e ter orientações gerais sobre a UCI na primeira visita. É muito difícil para os familiares, com pouca ou nenhuma experiência estar adequadamente preparados para uma situação de doença inesperada. A nossa experiência profissional no acompanhamento das visitas dos doentes internados na UCI leva-nos a concluir que múltiplos fatores promovem ansiedade e stress. Muitos desses fatores podem ser atenuados por intervenções de enfermagem. Tendo em conta que existe uma reciprocidade entre o doente e a sua família cabe ao enfermeiro de cuidados intensivos a capacidade de apoiar e fortalecer relações significativas durante momentos de elevado stress tomando consciência que isso constituí outra forma de cuidar o doente. Por outro lado, a nossa prática diária leva-nos a refletir sobre as diferentes formas, como as famílias/pessoas significativas do doente, manifestam as suas angústias e dúvidas ao longo do internamento do seu familiar e consequentemente a eventual necessidade de encaminhamento e apoio adequados. Pensamos, portanto, que o suporte psicossocial dos doentes e famílias é componente integral em qualquer plano de cuidados. Com a elaboração deste trabalho pretendemos criar linhas orientadoras no que diz respeito à forma como 2 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 lidar com as famílias de doentes internados e que possam ser identificadas como famílias de risco. Assim sendo, consideramos de vital importância averiguar de que forma se processa o acolhimento na UCI. É necessário consciencializar a realidade atual e identificar se existem lacunas, traçando estratégias que nos permitam modificar comportamentos, de forma a promover o bem-estar das visitas. Face a esta problemática delineámos a seguinte questão de investigação: “Como se processa o acolhimento dos familiares/pessoas significativas, dos doentes internados na UCI no que se refere à eficácia da comunicação estabelecida, à disponibilidade dos profissionais assim como às dificuldades inerentes?” Só averiguando o grau de satisfação das visitas poderemos atuar perante a ansiedade e desconfiança inicial da família, dificuldades de comunicação, ou fatores que prejudicam a relação empática enfermeiro/doente/família. Também, não descurando a importância da execução e aplicação de cuidados técnicos devemos promover a importância da disponibilidade na humanização de todo o cuidado prestado. Para isso, a informação recolhida através do instrumento de colheita de dados é fundamental para intervir favoravelmente delineando intervenções futuras consideradas essenciais ao acolhimento das visitas. É nossa intenção criar um circuito interno de apoio aos familiares. É para isso necessário delinear estratégias de classificação e avaliação das famílias. Essa avaliação será efetuada com base em escalas de avaliação comportamentais, que posteriormente passaremos a expor. Pensamos que a tentativa de disponibilizar o apoio direto de um psicólogo seria uma forma de praticar melhores cuidados e prevenir situações mais graves que muitas vezes nos sentimos incapazes de ultrapassar. A criação de um elo de ligação com psicólogos do Centro Hospitalar onde estamos inseridos seria, na nossa opinião uma boa alternativa. Perante a identificação de um problema do foro social sabemos que caminho percorrer, uma vez que existe um assistente social destacado para apoiar a nossa unidade. Se o mesmo se verificasse relativamente à possível colaboração de um psicólogo, o apoio a prestar a familiares/ pessoas significativas dos nossos doentes seria sem dúvida facilitado. Poderíamos, assim, iniciar uma nova etapa no que se refere ao desenvolvimento e capacidades de resposta do nosso serviço contribuindo para a promoção do seu valor e prestigio e no que diz respeito à essência do cuidar o indivíduo como um todo, em que o corpo, pensamento e espírito operam em consonância. A EXPERIÊNCIA VIVIDA DA PESSOA DOENTE INTERNADA NUMA UCI Vários são os estudos que nos indicam que as vivências das pessoas internadas na UCI estão geralmente associadas a sentimentos negativos, tais como o medo da morte e a dificuldade em adormecer, a sonhos e a alguma incapacidade em orientar-se no espaço e no tempo. Todavia, outros relatos salientam aspetos positivos, como a amabilidade dos enfermeiros, a empatia e a segurança na prestação de cuidados. A família, a espiritualidade e as crenças religiosas surge em número elevado, como estratégias de apoio a que as pessoas doentes em UCI recorrem, durante o internamento. Segundo CASTLEDINE, G. (2001).”…um período crítico da doença e de permanência na UCI para o tratamento pode deixar vestígios duradouros na vida da pessoa. Achados em termos da natureza existencial e ontológico parece ter uma importância decisiva para as pessoas, para as suas vidas depois de ter vivido tratamento intensivo. A viagem identificada na busca de significados aponta para a necessidade de programas de acompanhamento, e os familiares próximos devem também funcionar como recursos importantes tanto durante internamento como no subsequente processo de descobrir o significado na experiência vivida. Um maior conhecimento das vivências da pessoa doente pode ajudar a enfermagem a obter uma compreensão mais profunda da sua saúde e dos processos de doença, e assim fornecer uma base mais sólida para os cuidados de saúde ou mesmo levar à introdução de novas intervenções de enfermagem. Os enfermeiros podem melhorar a qualidade dos cuidados, ouvindo o outro. As estratégias que facilitam o contacto, a interação e a dinâmica no contexto da UCI podem ser consideradas como premissa básica para o cuidado humanizado. É fundamental que o profissional de enfermagem possua o agir comunicativo no cuidar da pessoa doente, sobretudo naqueles que possuem algum grau de limitação. Para BARLEM, et al (2008) “…a comunicação se apresenta como uma componente do cuidado, manifestando estas dificuldades na comunicação não-verbal. A presença de dor acarreta um aumento substancial do desconforto, além de frequentemente a pessoa doente estar impossibilitada, ou com dificuldade em comunicar o seu sofrimento pelo uso frequente e imperativo de artefactos e restrições impostas pelos métodos terapêuticos. A necessidade de apoio social da família, o estar lá, a visita destes, as diferentes formas de lidar na primeira e seguintes visitas, foi referenciada por vários autores como 3 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 fonte de apoio emocional. Embora o ambiente tecnológico da UCI gere benefícios em termos de equilíbrio biológico, ele é física e psicologicamente agressivo. As pessoas doentes têm um grande risco de desenvolver distúrbios comportamentais relacionados com o stress, e o ambiente da UCI pode contribuir significativamente para essas alterações GARDNER, et al (2005) Com base em vários autores e estudos de análise do comportamento dos doentes internados em UCI, na sua maioria as vivências experienciadas pela pessoa doente na UCI são de cariz negativo, embora sejam referenciadas algumas positivas. Umas são relacionadas com a morte, distúrbios cognitivos e de desconforto devido à presença de dispositivos invasivos, restrições que afetam o movimento, a incapacidade de falar, a sede, o ruído, dificuldade em dormir, dor, ansiedade e medo. As positivas estão associadas, a maioria das vezes, com a segurança fornecida pela presença constante dos enfermeiros e a com a confiança transmitida pelos profissionais no domínio das suas competências. “CUIDAR EM FAMILIA” Perante esta realidade parece importante debruçar a nossa atenção em aprofundar esta realidade. Neste sentido elaboramos esta pesquisa. O nosso estudo intitula-se CUIDAR EM FAMÍLIA. Representa, a forma, como a família da UCI acolhe as visitas dos nossos doentes e tenta ao mesmo tempo melhorar e atualizar conhecimentos para promover o seu acolhimento e consequente grau de satisfação. O nosso principal objetivo visa satisfazer as necessidades da família/pessoa significativa dos doentes internados na UCI. Ao mesmo tempo, esperamos conseguir avaliar as necessidades da família/pessoa significativa do doente internado na UCI e delinear estratégias de intervenção decorrentes da avaliação da família/pessoa significativa dos doentes internados na UCI. Para isso optamos por um estudo nível I, descritivo – exploratório transversal, com análise quantitativa dos dados. A UCI é o nosso local de pesquisa e a população alvo a família/pessoa significativa que visita o doente internado na UCI. O indicador de resultado definido é a satisfação das visitas dos doentes internados na UCI. O estudo compreende três anos (2011, 12 e 2013). Em 2011 tivemos um primeiro tempo de aplicação do instrumento de colheita de dados cujos resultados foram analisados e discutidos no 2º semestre do referido ano. Ao longo de este ano pretendemos aplicar uma escala hospitalar de ansiedade e depressão a qual será aprofundada posteriormente, e, ainda, um segundo período de aplicação do instrumento de colheita de dados ao qual se segue uma análise comparativa de dados e posterior apresentação de resultados. Como vimos, Existem dois momentos de aplicação do instrumento de colheita de dados. Com estes dois momentos de aplicação do instrumento de colheita de dados esperamos, conseguir averiguar de que forma se processa o acolhimento na UCI. É imprescindível tomarmos consciência da realidade atual para deste modo podermos identificar as lacunas existentes, e paralelamente, traçar estratégias que nos permitam modificar comportamentos, de forma a promover o bem-estar das visitas. Como instrumento de colheita de dados foi utilizado um formulário, aplicado às visitas, dirigido aos objetivos que se pretendiam alcançar e constituído por cinco partes: uma primeira parte relacionada com a caracterização da amostra, na segunda parte as questões referem-se ao modo como se processa o acolhimento das visitas, na terceira evidencia-se uma potencial influência provocada por alguns fatores desencadeantes de stress, uma quarta parte relacionada com a importância da informação dada na primeira visita e uma última parte relativa a sugestões que poderão intervir de forma indireta no objeto da investigação. Com a aplicação do instrumento de colheita de dados, conseguimos apurar os seguintes resultados: A família manifesta grande importância à forma como é acolhida na primeira visita; A maioria considera importante a proximidade do enfermeiro à família na hora da visita; A ansiedade da família e a falta de disponibilidade dos profissionais foram dos principais fatores desencadeantes de stress e ainda que o espaço físico onde as famílias foram abordadas pelos profissionais foi considerado pouco adequado. Sabemos que possuir um membro da família internado numa UCI costuma estar diretamente relacionado com a real possibilidade de o perder, representando uma forte ameaça à integridade e à segurança do grupo familiar. Assim, consideramos de extrema importância uma real proximidade na primeira visita, tentando desde logo estabelecer uma relação de confiança e segurança e que possa contribuir para a diminuição do grau de stress ou ansiedade vivenciadas pela família. São destacados alguns pontos essenciais a referir nesta primeira visita, entre os quais, tentamos não fornecer informação em excesso, uma vez que temos consciência que a prioridade da família é ver e estar novamente junto do seu familiar e que, por essa razão, uma grande parte das informações fornecidas não são de todo assimiladas e devem, sim, ser reforçadas em visitas posteriores. Desta forma apenas salientamos algumas orientações que consideramos fundamentais, 4 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 tais como, horário das visitas e Duração das visitas, número de visitas permitido, estrutura física e ambiente da UCI, formas de contactar o serviço, perigos de infeção e importância da lavagem das mãos. O elevado grau de stress e ansiedade que habitualmente acompanha as famílias durante as visitas ajuda-nos a concluir o porquê da maioria dos inquiridos consideram fundamental a proximidade do enfermeiro à família na hora da visita. Em função dos resultados encontrados e após reflexão e análise considerámos essencial delinear estratégias que poderiam contribuir para a manutenção ou melhoria dos resultados encontrados. Nesse sentido, foram desenvolvidas ações de sensibilização dirigidas à equipa e promotoras da humanização dos cuidados, tentámos reforçar a importância em conquistar uma relação interpessoal e empática com o familiar/pessoa significativa do doente desde a primeira visita. Apostámos também na elaboração de um póster e um folheto informativo alusivo ao acolhimento que colocamos ao dispor da família, na sala de visitas. Relativamente aos outros dois resultados encontrados, consideramos o seguinte: A UCI é um ambiente rodeado de doentes instáveis que exigem vigilância extrema e intervenção atempada, a fim de garantir uma correta e efetiva assistência. Muitas vezes, devido à imprevisibilidade de inúmeras situações o enfermeiro não tem capacidade de fornecer à família uma atenção e reposta imediata às suas necessidades. Esta é uma das razões porque possivelmente a maioria dos inquiridos consideram que tal como a ansiedade, a falta de disponibilidade dos profissionais foram dos principais fatores desencadeantes de stress. De igual modo, as famílias inquiridas consideram ainda que o espaço físico onde foram abordadas pelos profissionais é pouco adequado. Em relação a estas conclusões considerámos importante desenvolver e aprofundar algumas premissas nomeadamente, que é essencial proporcionar formas de apoio à família, identificar sinais de ansiedade ou depressão, diagnosticar as famílias em risco, arranjar meios que garantem uma classificação fiável e cientifica e, por fim, utilizar meios e recursos disponíveis de forma a garantir disponibilidade e privacidade no atendimento às famílias. Em função das referidas premissas, achámos essencial delinear estratégias que permitam uma avaliação psicossocial das famílias dos doentes internados na nossa unidade. Para isso, julgámos importante adotar a utilização de uma escala de classificação de ansiedade e depressão que facilitasse a identificação das famílias de risco e posterior sinalização. Pensámos que a tentativa de disponibilizar o apoio direto de um psicólogo seria uma forma de praticar melhores cuidados e prevenir situações mais graves que muitas vezes nos sentimos incapazes de ultrapassar. A criação de um elo de ligação com psicólogos do Centro Hospitalar onde estamos inseridos seria então na nossa opinião uma boa alternativa. A escala escolhida é uma escala validada e utilizada desde a alguns anos por alguns hospitais, e que permite a identificação e diagnóstico de ansiedade e/ou depressão que facilita uma atempada sinalização e acompanhamento especializado. A referida escala está em utilização desde o início deste ano. Neste momento a nossa maior preocupação relativamente à sua aplicabilidade, está relacionada com a necessária envolvência de todos os membros da equipa para que a sua utilização seja efetiva e traga mais-valias ao nosso estudo. Os membros do grupo de trabalho do Acolhimento não estão, como é evidente, presentes em todos os turnos, tornando-se essencial a participação dos restantes membros da equipa. Para isso, é nossa intenção realizar uma nova sessão formativa em serviço que venha a realçar a importância da aplicabilidade da Escala de classificação de ansiedade e depressão, assim como a criação de estratégias alternativas que facilitem a correta identificação das famílias em risco. Pensamos, ainda, que a sinalização do familiar em causa para um dos elementos que forma o grupo do acolhimento, passando a aplicabilidade da referida escala ser apenas da nossa responsabilidade, é uma das hipóteses a considerar. A segunda aplicação do instrumento de colheita de dados irá decorrer entre 2 Janeiro a 30 Abril de 2013. Posteriormente iremos poder proceder a uma análise comparativa de dados, através da qual esperamos conseguir apurar se as estratégias implementadas foram ou não de encontro ao nosso principal objetivo, e que irão traduzir ganhos em saúde no que se refere à humanização dos cuidados de enfermagem prestados. CONSIDERAÇÕES FINAIS Só averiguando o grau de satisfação das visitas poderemos atuar perante a ansiedade e desconfiança inicial da família, dificuldades de comunicação, ou fatores que prejudicam a relação empática enfermeiro/doente/família. Também, não descurando a importância da execução e aplicação de cuidados técnicos devemos promover a importância da disponibilidade na humanização de todo o cuidado prestado. A comunicação adequada, honesta e uniforme é de extre5 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 ma importância para evitar e diminuir a ansiedade manifestada pelo doente e família. A criação de um elo de ligação com um psicólogo do CHCB, permitiu disponibilizar o apoio direto de um psicólogo e desta forma tornou-se possível praticar melhores cuidados e prevenir situações mais graves que muitas vezes nos sentimos incapazes de ultrapassar, tendo esta atitude trazido sem dúvida ganhos em saúde. Com a continuação deste estudo, as reflexões e conclusões atingidas esperamos, ainda, ter a oportunidade de divulgar a missão da UCI, tentando desmitificar algumas ideias ou falsos conceitos estereotipados que dificultam a relação doente/família durante a situação de crise. A nossa experiência profissional no acompanhamento das visitas dos doentes internados na UCI leva-nos a concluir que múltiplos fatores promovem ansiedade e stress. Muitos desses fatores podem ser atenuados por intervenções de enfermagem. Tendo em conta que existe uma reciprocidade entre o doente e a sua família cabe ao enfermeiro de cuidados intensivos a capacidade de apoiar e fortalecer relações significativas durante momentos de elevado stress PREVENÇÃO E CONTROLO DAS INFEÇÕES ASSOCIADAS AOS CUIDADOS EM SAÚDE (IACS) Jaime Manuel Afonso Pintassilgo de Matos Maria Manuela Coluna Moleiro João Pedro Oliveira Valente UCIP do Hospital Amato Lusitano – ULSCB RESUMO Este artigo de revisão bibliográfica pretende reconhecer a importância da prevenção e controlo das Infeções Associadas aos Cuidados de Saúde (IACS) na Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente (UCIP) da ULSCB, refletindo acerca do tema e relacionando-o com o passado, o presente e o futuro da UCIP - ULSCB. Apesar de o conceito de infeções associadas aos cuidados de saúde ser uma noção mais ou menos recente, a sua importância vem desde os meados do século XIX, em que I. Semmelweis e F. Nightingale, considerados pioneiros nesta temática, primeiramente como infeção hospitalar, posteriormente como infeção nosocomial e atualmente como IACS, demonstraram a sua importância aquando da prestação de cuidados de saúde ao doente. tomando consciência que isso constituí outra forma de cuidar o doente. REFERENCIAS BIBLOGRAFICAS BARLEM, E., ROSENHEIM, D., LUNARDI, V., et al - W. Communication as a tool of humanization of nursing care: experiences in intensive care unit, [Portuguese], 2008 CASTLEDINE, G. - Is nursing care losing its holistic focus? British Journal of Nursing; 10, 1091; 2001 GARDNER, G., ELLIOTT, D., GILL, J., et al - Patient experiences following cardiothoracic surgery: an interview study, European Journal of Cardiovascular Nursing, 4(3), 242-250, 2005 HESBEEN, W. – Cuidar no Hospital – Enquadrar os cuidados de enfermagem numa perspetiva de cuidar, Loures, Lusociência, 2000, ISBN 972-8383-118 LOPES, M.J - A relação enfermeiro- doente como intervenção terapêutica, Formasau, 2006, ISBN972-8485-6-X Plano Nacional de Saúde 2011-2016 - Cuidados de saúde hospitalares, [Em linha] [Consultado 4 Jan. 2011] Disponível em WWW: <URL:http://www.observaport.org/sites/ observaport.org/files/CSH2.pdf POLIT,D.F.; BECK, C.T; HUNGLER, B.P – Fundamentos de Enfermagem: Métodos, avaliação e utilização. 5ªed, Porto Alegre, Artmed, 2004 SWEARINGEN, P.L; KEEN, J.H, et al – Manual de Enfermagem de Cuidados Intensivos – Intervenções de Enfermagem independentes e interdependentes, Loures, Lusociência, 4ª edição, 2001, ISBN 972-8383-52-5 VILA, V.S.C; ROSSI, L.A – O significado cultural do cuidado humanizado em unidade de terapia intensiva: “Muito falado e pouco vivido”. [Em linha] Revista Latino-am Enfermagem (2002), 10 (2):137-44 [Consultado 15 Fev. 2011] Disponível em WWW: <URL: http://www.eerp.usp.br/laenf Essa preocupação motivou o aparecimento de programas e orientações por parte da OMS, a nível mundial, e da DGS [1] , em Portugal, para que esta temática tivesse impacto em todas as instituições de saúde, particularmente em cada UCI. A sua crescente divulgação e o crescente reconhecimento da sua importância têm motivado os enfermeiros a assumir um papel fundamental na valorização e interiorização das IACS como um problema real e influindo em vários aspetos, tais como o aumento da mortalidade, o aumento da permanência do tempo de internamento, a consequente diminuição da qualidade de vida dos doentes e o aumento dos custos intrínsecos à hospitalização (custos pessoais, entre outros). Palavras-chave: Infeção Associada aos Cuidados de Saúde (IACS); Prevenção. “Quanto teremos que fazer nesta terra em matéria de saúde e higiene tão pouco há feito! Curar e tratar enfermidades era outrora o único objectivo hoje há o de prevenir as evitáveis.” Dr. Ricardo Jorge Discurso no Hospital de Tomar, 1928 6 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 INTRODUÇÃO Ao longo dos tempos, a Higiene tem sido uma das preocupações de todas as sociedades, tendo evoluído em termos de conceitos, de importância e até de técnicas, desde os tempos mais remotos até aos dias de hoje. Importa diferenciar entre qualidade no produto final e qualidade no processo para alcançar o produto final. Apesar de ser evidente que nos serviços de saúde o produto final é essencial - ajudar o Homem na obtenção do bemestar, na ausência de doença e satisfação das suas necessidades - é o processo em si mesmo o centro de interesse e o objeto de análise, controlo e melhoria para a obtenção de resultados desejáveis e com menor grau de variabilidade. Um elemento de vital importância são os “custos e os benefícios” de uma qualidade de higiene acima da suspeita. Conseguir um ambiente com esta qualidade não é dispendioso, tornando-se mais caro, o remediar situações ou sustentar serviços que não cumpram os requisitos mínimos necessários. Os benefícios de se produzir um trabalho com qualidade são múltiplos havendo eficiência, eficácia e efetividade. Se um elevado grau de qualidade traz benefícios conjuntos - quer para os técnicos que trabalham no hospital quer para os utentes que nele procuram ajuda e o resultado lógico é a satisfação para o paciente - também para alcançar essa meta é necessário o compromisso de todos e de cada um dos membros das equipes de saúde. A qualidade da higiene de um serviço deverá ser sempre garantida com a idoneidade científica e técnica de todos os profissionais de saúde, que executam as ações orientadas a restituir a saúde ou a evitar que esta se deteriore, mas também com a capacidade tecnológica que a instituição coloca à nossa disposição. O aparecimento recente, de doenças cada vez mais complexas e com prognósticos mais reservados e até mesmo indefinidos, obrigaram a uma maior consciência, tanto dos profissionais, como do público em geral, no que se refere à importância de práticas adequadas de controlo de processos infeciosos. Infelizmente existem provas preocupantes de que o controle das IACS pode ser descurado nas unidades de saúde, o que tem repercussões inevitáveis nas normas de higiene e de qualidade assistencial. É, sem dúvida, um tema embaraçoso quando abordado diretamente, pois é difícil a um profissional de saúde assumir que falha num aspeto tão elementar. Apesar do aumento dos conhecimentos sobre a necessidade de exercer prática clínica com base na evidência científica, é frequente esta não ser seguida nos estabelecimentos de saúde. É sabido que as IACS estão diretamente relacionadas com um aspeto muito importante que é a higiene hospitalar ou limpeza hospitalar, o gesto primordial, obrigatório e insubstituível para que, em tempos posteriores e na conformidade dos procedimentos mais necessários, possam alcançar-se, com o sucesso mais exigível, tanto a desinfeção como a esterilização [2]. Ou então, deve ser entendida como um conjunto de práticas que têm como objetivo garantir um ambiente limpo e livre de potenciais contaminantes [3]. Os conceitos de higiene e limpeza hospitalar remontam desde meados do séc. XIX, sendo Ignaz Semmelweis e Florence Nightingale, considerados pioneiros nesta área. Florence Nightingale (1820-1910) descreveu os primeiros procedimentos de cuidados relacionados com os doentes e com o ambiente, com a finalidade de diminuir os riscos de infeção hospitalar nos hospitais militares [3]. A mesma autora publicou em 1859 o Notes on Nursing, onde defende a valorização e a manipulação do ambiente básico: ar fresco, livre de cheiros, água pura, esgotos eficazes e limpeza. Sendo enfermeira de formação, insiste com as suas colegas para a observação deste último aspeto nos cuidados a administrar aos soldados feridos durante a guerra da Crimeia [4]. IACS - INFEÇÃO ASSOCIADA AOS CUIDADOS DE SAÚDE IACS é uma infeção adquirida pelos doentes em consequência dos cuidados e procedimentos de saúde prestados e que pode, também, afetar os profissionais de saúde durante o exercício da sua atividade [5] . As IACS, anteriormente denominadas de infeção nosocomial ou hospitalar, são também definidas como uma infeção que ocorre num doente durante a prestação de cuidados num hospital ou numa outra instituição prestadora de cuidados de saúde, que não existia nem estava em incubação na altura da sua admissão. Inclui infeções adquiridas no decurso da prestação direta de cuidados, mas que se manifestam após a suspensão dos mesmos, assim como infeções de natureza ocupacional que surgem nos profissionais da instituição. Esta designação (IACS) é mais envolvente e abrangente, no sentido em que engloba além das infeções adquiridas em meio hospitalar (nosocomial), todas as infeções que surgem em consequência da prestação de cuidados de saúde, onde os doentes se encontrem (agudos, reabilitação, ambulatório e domiciliários). O aparecimento da IACS está ligado à prestação dos cuidados de saúde podendo nem sempre surgir como consequência da falha de siste7 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR2013; 32:2-53 mas e processos da prestação de cuidados, assim como do comportamento humano (profissionais, doentes e visitas). As principais medidas de prevenção e controlo assentam por um lado, no cumprimento das boas práticas: precauções básicas (como higiene das mãos, uso adequado de equipamentos de proteção individual, controlo ambiental) e isolamento e, por outro, no uso racional de antimicrobianos. Deste modo, representa um problema maior da segurança dos doentes [6]. As IACS são um problema de âmbito universal e um dos riscos major a que os doentes ficam sujeitos ao serem hospitalizados. As IACS aumentam a morbilidade, mortalidade, permanência do tempo de internamento diminuindo a qualidade de vida dos doentes, além dos custos intrínsecas à hospitalização, custos pessoais, assim como sofrimento físico e emocional nos doentes e respetivas famílias. Os estudos de prevalência de infeção nacional ou multicêntricos mais recentes mostram que a percentagem de doentes com IACS em hospitais num determinado dia oscila entre 3,5% e os 10,5% [7]. PREVENÇÃO E CONTROLO DAS IACS Em locais de elevado risco, como nas UCI’s, mais de um terço dos doentes pode ser afetado e a mortalidade imputável pode atingir valores na ordem dos 44% [8]. O risco de complicações sérias devido a IACS é particularmente elevado para os doentes em UCI, contribuindo para este problema o aumento dos microrganismos multirresistentes, o uso de tecnologia médica cada vez mais invasiva, o desenvolvimento de procedimentos cada Tabela 1 - Resultados de estudos de prevalência de IACS em países industrializados. Fonte: European Commission, (2012), Healthcare Associated Infections [8] vez mais complexos que colocam os doentes em maior risco para infeções associadas a procedimentos e dispositivos, assim como a crescente população de doentes idosos, imunodeprimidos e com co morbilidades. A prevenção das IACS tem evoluído nas últimas décadas, criando no entanto, um desafio major, a sua implementação. No âmbito dos cuidados de saúde há uma evidência crescente de que o conhecimento das “bundles” para influenciar o comportamento dos profissionais, deve ser energicamente implementado. Os fatores essenciais predisponentes ao incremento da frequência e gravidade das IACS são: - Suscetibilidade do hospedeiro - os opostos da idade (muito novos e muito velhos), comorbilidades, tais como SIDA, insuficiência renal, insuficiência cardíaca, póscirurgia, queimaduras entre outras; Intervenções terapêuticas entubação endotraqueal, ventilação mecânica, cateterismo venoso central, cirurgia major, terapêutica imunossupressora e/ ou antibioterapia antecedentes; - Comportamento dos profissionais de saúde - como potenciais veículos de transmissão de micro-organismos patogénicos; - Fatores ambientais - má ou deficiente desinfeção, esterilização e uma descuidada higiene, assim como uma má qualidade do ambiente (temperatura e humidade desadequadas); - Fatores organizacionais - cultura organizacional desadequada das necessidades, pondo em causa a segurança quer do doente, quer dos cuidados de saúde; - Resistência aos antimicrobianos - cuidado especial na eleição dos antibióticos, assim como de uma severa prescrição e administração. As principais IACS são de 4 tipos: Infeções Respiratórias (33,2%); Infeções Urinárias (23,8%); Infeções do Local Cirúrgico (14,3 %) e Infeções da Corrente Sanguínea (14%) [8]. Todos os anos, na União Europeia (UE), são contraídas pelos doentes, 4 milhões de IACS, sendo responsáveis por cerca de 37.000 mortes. Nas UCI’s as IACS são relacionadas com instrumentação invasiva (ventilação e cateterismo). Estima-se que 20 a 30% destas infeções sejam completamente evitáveis [8]! Devemos ter em conta as preocupações inerentes às barreiras das vias de transmissão. São medidas acessórias e complementares, que fazem com que a transmissão seja realmente bem-sucedida e contribua para a minimização de danos. Caso as medidas efetuadas sejam insuficientes, há a necessidade de ponderar as medidas de isolamento. Entende-se por isolamento, o esta- 8 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 belecimento de barreiras físicas, de níveis variáveis, de modo a limitar a transmissão dos agentes infeciosos de um doente para o outro, dos doentes para os prestadores de cuidados e vice-versa. CONSIDERAÇÕES FINAIS A prevenção é sem dúvida, a melhor forma de combater a problemática das IACS! O envolvimento de todos os Profissionais é precioso, crucial e decisivo. No decorrer do seu exercício diário, detêm imensa responsabilidade no precaver das IACS, implementando procedimentos adequados, minimizando a disseminação de microrganismos. Representam pois um papel-chave na prevenção e controlo destas infeções. Neste sentido o objetivo será caminhar para a excelência na prestação de cuidados, tendo sempre em conta a pessoa que ocorre aos serviços de saúde, que tem direito a ser protegida e defendida na sua integridade. São também fatores primordiais, um plano de formação adequado para todos os profissionais, a existência de normas de prevenção e o controlo dos principais tipos de infeção, a responsabilidade dos profissionais no cumprimento dessas normas, um plano de vigilância dos microrganismos presentes no hospital e, acima de tudo, o envolvimento das chefias de topo no combate às IACS. Uma postura igualmente importante é a avaliação dos resultados das intervenções. É importante que cada profissional de saúde saiba identificar os riscos afim de que possam reconhecer os incidentes e ainda que tenham a perceção da sua importância. Não se pode ignorar que a prevenção e controlo das IACS representam um custo para cada instituição e para o país. É intuitivo que os Conselhos de Administração, quer por orientações socioeconómicas, quer políticas, têm as suas metas de produtividade. É no entanto necessário haver compromissos, por parte destes, para que esses objetivos sejam atingidos sem pôr em risco a segurança do doente. Devemos pois colaborar todos nesse rumo. Atualmente, a investigação e orientação está direcionada numa abordagem de intervenção multimodal assente no conceito de “care bundles” proposto pelo Institute for Healthcare Improvement [8]. Uma revisão sistemática sobre o tema identificou que, na maioria dos estudos, uma “bundle” era constituída por intervenções estando articulada como: (1) Educação; (2) Formação de equipas de qualidade; (3) Monitorização do cumprimento das práticas e (4) Informação de retorno sobre o desempenho dos profissionais. Intrínseco à utilização destas intervenções deve haver um princípio e uma cultura que faça com que os profissionais comuniquem entre si analisando e revendo com frequência os objetivos e as estratégias determinadas [9]. Em conclusão, o repto é claro. Devem os profissionais de saúde, educar-se de modo a consciencializar-se do desafio que têm pela frente. Não basta reconhecer que as IACS são um problema extremamente premente, mas, devem os próprios profissionais interiorizarem que eles são uma parte muito importante da solução. Como? Certamente mudando comportamentos e atitudes, nunca descurando que a segurança do doente é fundamental na excelência do cuidar. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Direção Geral da Saúde, (2010), Orientação de Boa Prática para a Higiene das Mãos nas Unidades de Saúde, Circular Normativa nº 13/DQS/DSD de 14/ 06/2010,pp.1-6. http://www.rncci.min-saude.pt/SiteCollectionDocuments/i013069.pdf Acedido em 19 Fevereiro de 2013. 2. Veiga, C., (2012), Pede-se outra atenção para a questão da infeção hospitalar, Tecno Hospital, pp.11. 3. Reis, L., (2012), Sistema de Lavagem de 2 passos, Tecno Hospital, pp.21. 4. Veiga, A. (2012), Limpeza, desinfeção e esterilização no hospital, Tecno Hospital, pp.18. 5. 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Institute for Healthcare Inprovement, (2012), Healthcare Associated Infections, http://www.ihi.org/explore/Bundles/Pages/default.aspx Acedido em 23 Fevereiro de 2013. 9 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 AVALIAÇÃO DA DOR NO DOENTE EM SITUAÇÃO CRÍTICA Célia Alexandra Duarte Eusébio Caetano Elsa Maria Gomes Lopes Eugénia Conceição Martins Ribeiro Dias Sandrina Rodrigues Duarte Enfermeiras na UCIP do Hospital Amato Lusitano – ULS Castelo Branco RESUMO A dor é uma experiência que se caracteriza pela sua complexidade, subjetividade e multidimensionalidade. Como diz McCaffery, “a dor é o que o doente diz que é, existindo quando ele diz que existe”. Apesar dos avanços tecnológicos, o controlo da dor no doente crítico é muitas vezes considerado não prioritário causando, seguramente, um sofrimento desproporcionado. Avaliar a dor é um dever dos profissionais de saúde, um direito dos doentes e um passo fundamental para a humanização das unidades de saúde. Sendo esta considerada o 5º sinal vital, exige um tratamento eficaz com uma avaliação correta e contínua. Os doentes críticos estão mais vulneráveis à dor, no entanto o seu controlo é muitas vezes considerado não prioritário, especialmente no doente hemodinamicamente instável. Uma correta avaliação da dor requer um instrumento de avaliação, que tenha em consideração que a resposta do doente à dor é individualizada, mas que há indicadores comportamentais e fisiológicos da dor. Atendendo a que a adequada avaliação da dor em Unidade de Cuidados Intensivos e a aplicação de instrumentos validados não é frequente, a Sociedade Portuguesa de Cuidados Intensivos sentiu necessidade de criar um grupo de trabalho, com o objetivo de indicar uma escala comportamental para avaliar a dor, em doentes sedados que não comunicam de forma verbal ou motora e ventilados. Pensamos que o instrumento de avaliação da dor, adotado pela nossa unidade, contribui para a tão desejada qualidade na prestação de cuidados, permitindo um aumento da capacidade de resposta por parte dos prestadores de cuidados. É fundamental o envolvimento de toda a equipa no controlo da dor, efetuando-se o registo sistemático dos progressos obtidos, de modo a melhorar a qualidade dos cuidados prestados ao doente critico. PALAVRAS-CHAVE:Dor, Doente Critico, Escalas Avaliação da Dor, Unidade Cuidados Intensivos. INTRODUÇÃO A dor é uma experiência comum a todos nós e, provavelmente uma das mais temidas pelo homem, geralmen- te associada a fatores negativos que geram sentimentos de angústia, mal-estar e até medo da incapacidade ou morte. Um doente com dor é um todo em sofrimento, pois a dor não afeta apenas o corpo mas também a pessoa, quebrando a evidência da sua relação com o mundo. Diariamente, os enfermeiros das Unidades de Cuidados Intensivos (UCI’s) defrontam-se com esta realidade, muitos pedidos de auxílio são manifestados pelo doente, quer verbalmente, quer pela expressão facial com esgar de dor notório. O doente que diariamente cuidamos encontra-se, geralmente, em estado crítico e muitas vezes inconsciente. Estes doentes, para além da dor física a que estão sujeitos, apresentam uma dor psicológica, também não menos difícil de suportar, causada pelo medo do desconhecido, da ameaça e perda de controlo. A dor só pode ser aliviada com intervenção de uma equipa multidisciplinar que se mostre sensível a esta temática. Nas Unidades de Cuidados Intensivos (UCI’s) o grau de exigência no desenvolvimento das habilidades tecnológicas é cada vez maior, mas não podemos esquecer a componente humana. Para cuidar de um doente com dor é fundamental avaliá-la. Neste sentido, melhorar o controlo da dor deve ser considerado um dos objetivos prioritários dos profissionais de saúde. Pretendemos com este artigo consolidar conhecimentos sobre a temática da dor e seus instrumentos de avaliação, dar a conhecer os instrumentos de avaliação da dor na Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente (UCIP) e sensibilizar para a importância da avaliação da dor no doente crítico. DOR A dor é considerada uma das situações mais incómodas e desesperadas que afetam o homem. É percecionada como uma experiência desagradável e, como referem PEREIRA e SOUSA[1], tão antiga quanto a própria humanidade, a dor é uma experiência que se caracteriza pela complexidade, subjetividade e multidimensionalidade. Ao tentar apresentar uma definição de dor deparamonos com várias interpretações de um mesmo fenómeno que, por si só, se torna demasiado complexo, apesar de todos termos sido confrontados com a dor, é evidente que nem todos a sentem, suportam e a referem do mesmo modo, diferindo até na mesma pessoa consoante as circunstâncias. Em 1983, McCaffery, definiu que “a dor é o que o doente diz que é, existindo quando ele diz que existe” citada por 10 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 ROPER, LOGAN &TIERNEY [2]. Esta definição veio centrar a atenção dos profissionais de saúde na subjetividade da dor. A Associação Internacional para o Estudo da Dor – IASP (International Association of Study of Pain), em 1986, definiu “Dor é uma experiência emocional e sensorial desagradável, associada a lesões reais ou potenciais, ou descrita em termos dessas lesões”[1]. Esta definição contém a componente sensorial, emocional e comportamental, através da descrição que o doente faz da sua dor. Contudo, estas definições dão muito valor à autoapreciação da dor feita pelo doente, o que pode levar a menosprezar a dor daqueles que não possuem esta capacidade, como crianças e doentes incapazes de verbalizar a sua dor [3]. Resposta à dor A dor é um sinal de alerta que ajuda a proteger o corpo de danos nos tecidos, mas pode ter um efeito prejudicial e inútil, como nos refere VALENÇA [4]. Com a dor libertam-se várias substâncias no local da lesão (interleucinas, bradiquinina, serotonina, histamina…); se a dor se mantiver ocorre a libertação entre outras, das hormonas sistémicas do stresse: nor-epinefrina, epinefrina, glucagon e cortisol. Estas originam um aumento da glicemia e restrição à sua utilização pelos tecidos, aumento do metabolismo, aumento da frequência cardíaca, da pressão arterial e do débito cardíaco, atraso no esvaziamento gástrico, diminuição da absorção e motilidade intestinal, existindo também aumento da coagulabilidade sanguínea e alterações das funções imunitárias. Ainda segundo este autor, a libertação descontrolada das hormonas do stresse pela dor não tratada pode aumentar a agressão tecidular, impedir a cicatrização, favorecer a infeção, prolongar a hospitalização e conduzir à morte. Este efeito evidencia-se principalmente no doente crítico. Segundo WRIGHT [5] a resposta à dor inclui manifestações fisiológicas e comportamentais, nomeadamente: Respostas fisiológicas: envolvem uma ação reflexa voluntária e uma resposta involuntária ou autónoma. As respostas autónomas incluem dilatação das pupilas, tensão muscular, sudorese, aumento da pressão sanguínea, do pulso e da respiração. Respostas comportamentais: variam consoante o indivíduo e são influenciadas pelo estado emocional, antecedentes culturais, ensino na infância e as experiências anteriores do indivíduo com dor. Podemos então concluir que é essencial que o enfermeiro esteja consciente destas diferenças, quer em relação ao modo como a dor é percecionada pelos indivíduos, quer em relação às diversas respostas à dor e sua adaptação. DOENTE CRITICO COM DOR O doente crítico é uma pessoa com características próprias que devido às circunstâncias da vida, num dado momento se vê confrontado com uma doença grave, com necessidade de ser internado numa Unidade de Cuidados Intensivos (UCI), como salienta PASCOAL [6]. As UCI’s devido às suas características especiais e ao seu elevado tecnicismo provocam no doente sensações de ansiedade, sofrimento e medo da morte, este é desprovido da sua privacidade e fica sujeito às “vontades” da equipa de saúde que executam as técnicas necessárias mas, por vezes, esquecendo o elemento principal que é o doente. A dor provocada pelos cuidados deve-se a pequenas agressões que isoladamente não provocam dor mas que devido ao efeito de acumulação diária produzem uma dor insuportável, devemos estar atentos e questionar as rotinas do serviço, agrupar os cuidados, respeitar o repouso do doente e evitar técnicas desnecessárias. Temos que atender aos pormenores, usar métodos de avaliação da dor e implementar intervenções para diminuir a dor provocada pelos cuidados. AVALIAÇÃO DA DOR O controlo eficaz da dor é um dever dos profissionais de saúde, um direito dos doentes e um passo fundamental para a humanização das unidades de saúde; sabese também que a avaliação e registo da intensidade da dor, pelos profissionais de saúde, tem de ser feita de modo a otimizar a terapêutica, dar segurança à equipa de saúde e melhorar a qualidade de vida do doente. Apesar do controlo da dor ser uma atividade multidisciplinar, o enfermeiro está na posição ideal para avaliar, registar e interpretar a evolução temporal, relativamente ao nível de dor do doente. A Direcção-Geral da Saúde, atendendo ao exposto anteriormente e após ouvir a Comissão de Acompanhamento do Plano Nacional de Luta Contra a Dor, instituiu através da Circular Normativa Nº 9 de 14/06/2003, a “Dor como o 5º Sinal Vital”[7]. Esta circular refere como norma de boa prática, no âmbito dos serviços prestadores de cuidados de saúde: 1- O registo sistemático da intensidade da dor. 2- A utilização para mensuração da intensidade da dor, de uma das seguintes escalas validadas internacional11 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 mente “Escala Visual Analógica” (convertida em escala numérica para efeitos de registo), “Escala Numérica”, “Escala Qualitativa” ou “Escala de Faces”. 3- A inclusão na folha de registo dos sinais e sintomas vitais, em uso nos serviços prestadores de cuidados de saúde, de espaço próprio para registo da intensidade da Dor[7]. Os doentes críticos estão particularmente vulneráveis à dor e referem-na como o 2º maior fator de stresse numa UCI, esta foi também identificada como um fator de complicação na doença grave, no entanto, o controlo da dor é muitas vezes considerado não prioritário pela equipa da UCI, especialmente se o doente está hemodinamicamente instável [8]. A analgesia é muitas vezes feita só quando necessária ou a dosagem é restringida por se acreditar que isso poderá comprometer o doente a nível hemodinâmico ou a nível da função respiratória. De igual modo, a comissão de acreditação das unidades de saúde americana - Joint Comission, recomenda como normas para avaliação e gestão da dor que, “os pacientes críticos têm o direito à analgesia adequada e à gestão da sua dor” e “a avaliação da dor e a resposta à terapêutica deve ser realizada gradualmente através de uma escala adequada à população de doentes e sistematicamente documentada” grau de recomendação C [9]. A dor é uma experiência subjetiva e, como tal, o melhor indicador da dor do doente é a sua informação verbal. Contudo, no ambiente da UCI é difícil avaliar a dor porque os doentes estão muitas vezes incapazes de comunicar verbalmente, devido à presença de tubo endotraqueal e traqueostomia, sedação e bloqueadores neuromusculares [8,9]. A Joint Comission recomenda também que, “o nível de dor relatada pelo paciente deve ser considerado o gold standard para a avaliação da dor e resposta à analgesia. O uso da escala visual numérica (EVN) é recomendada para avaliar a dor”; “A dor em pacientes que não podem comunicar, deve ser avaliada por meio subjetivo de observação de comportamentos e indicadores fisiológicos” grau de recomendação B [9]. Instrumentos de Avaliação Da Dor Atualmente existem vários instrumentos validados e podem ser de três tipos: unidimensional, multidimensional e comportamental. Escalas unidimensionais – avaliam globalmente a dor segundo o grau de intensidade. Destacam-se a Escala Visual Analógica (EVA), Escala Numérica (EN) e a Escala Verbal Simples (EVS). Escala Verbal Simples (EVS) ou Escala Qualitativa, é composta por cinco designações: sem dor, dor suave, dor moderada, dor intensa, dor insuportável. O doente indica a palavra que melhor descreve a sua dor, é uma autoavaliação qualitativa, figura 1. Escala Numérica (EN), pede-se ao doente que atribua um número à dor, entre zero “sem dor” e dez “pior dor possível”, pode ser usada por um doente que não compreenda os qualificativos usados na EVS, pois a numeração é universal, figura 2. Escala Visual Analógica (EVA), é a mais usada, pode apresentar-se sob a forma de uma régua ou sob a forma escrita. Estas escalas podem usar desenhos de faces ordenadas, figura 3, desde uma face feliz (sem dor) até uma face muito triste (dor insuportável), o doente escolhe a face que melhor caracteriza a sua dor, é útil para doentes com dificuldade de expressão verbal, idosos e crianças, podem ser influenciadas por atitudes culturais em relação à dor [1]. Este tipo de escalas só pode ser usado, com confiança, em doentes conscientes e capazes de comunicar verbalmente; como muitos doentes internados na UCI têm uma redução do nível de consciência estes instrumentos podem ser inadequados. No entanto, são de confiança e válidas no doente consciente e comunicativo, devendo ser usadas neste grupo de doentes [10]. Figura 1 – Escala Verbal Simples Fonte: Adaptada de: A Dor como 5º Sinal Vital. Registo sistemático da intensidade da Dor. Direcção-Geral da Saúde – Circular Normativa nº09 (2003). Figura 2 – Escala Numérica Fonte: Adaptada de: A Dor como 5º Sinal Vital. Registo sistemático da intensidade da Dor. Direcção-Geral da Saúde – Circular Normativa nº09 (2003). 12 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 Figura 3 – Escala Visual Analógica Fonte: Adaptada de: A Dor como 5º Sinal Vital. Registo sistemático da intensidade da Dor. Direcção-Geral da Saúde – Circular Normativa nº09 (2003). Escalas Multidimensionais, são compostas por questionários com base em adjetivos, que analisam as componentes sensoriais e emocionais, são complexas, usadas principalmente na avaliação da dor crónica e não estão indicadas nos casos de dor intensa, fadiga extrema ou em doentes com dificuldade de compreensão da língua. Escalas Comportamentais, avaliam as consequências na vida do doente (estado de ansiedade, depressão, entre outros) e em casos de doentes com dificuldades na expressão verbal (crianças pequenas, doentes com perturbações das funções superiores, demência, afasia…), este pode ser o único meio para se avaliar a dor, é uma heteroavaliação, realizada por diversos membros da equipa, em diferentes alturas do dia (repouso, mobilização, tratamentos…), fornecem indicações importantes mas não exploram a experiência dolorosa na sua totalidade [3]. Existem certos comportamentos não-verbais que indicam a presença de dor. WRIGHT [5], refere que existem numerosas expressões faciais que podem indicar dor, tais como, franzir a testa, fazer uma careta ou cerrar os dentes e comportamentos como gemidos ou gritos, segurar ou esfregar uma parte do corpo, inquietação ou ficar deitado rigidamente imóvel. Daqui se pode depreender que a avaliação da dor deve incluir a comunicação verbal e não-verbal do paciente. Uma correta avaliação da dor, no doente crítico, requer um instrumento de avaliação que tenha em consideração que a resposta do doente à dor é tão individualizada assim como o doente a experimenta, mas que há indicadores comportamentais e fisiológicos de dor que já estão identificados e foram referidos anteriormente por vários autores [8,10]. Plano Nacional de Avaliação da Dor da Sociedade Portuguesa de Cuidados Intensivos (PNAD-SPCI) Apesar das recomendações das sociedades científicas, a adequada avaliação da dor em UCI não é consensual e a aplicação de instrumentos validados não é frequente, notando-se uma tendência para a subvalorização da intensidade da dor dos doentes críticos. “Os doentes críticos estão particularmente vulneráveis à dor”, “A eficaz gestão só pode ser alcançada com uma avaliação precisa da dor”, “A dor não é considerada uma prioridade” [8, 11]. Após uma reunião de 17 UCI’s portuguesas, a 19 de Abril de 2010 em Viseu no Hospital S. Teotónio, constatouse que também em Portugal não havia consenso em relação à avaliação da dor no doente crítico em cuidados intensivos [12]. Do diagnóstico da situação efetuado e que tentou conhecer como se avaliava a dor do doente crítico nas UCI´s portuguesas, verificou-se que: ·8% das UCI’s não avaliavam a dor do doente crítico, nem a resposta à terapêutica analgésica; ·67% utilizavam a Escala Visual Numérica (EVN) para avaliar a intensidade da dor relatada pelo doente. Esta escala é recomendada para avaliar a dor em doentes que comunicam, mas não é indicada para doentes críticos que estão submetidos a ventilação mecânica e sedados; ·25% utilizavam instrumentos de avaliação da dor adequados para este tipo de doentes. Atendendo a isto, surgiu a necessidade da criação de um grupo de trabalho a nível nacional, designado por grupo de avaliação da dor (GAD), com o objetivo de indicar uma escala comportamental para avaliar a dor em doentes sedados, que não comunicam de forma verbal ou motora e ventilados. O diagnóstico da situação mostrou que existia uma ausência de uniformização de escalas de avaliação da intensidade da dor, no doente internado nas UCI’s portuguesas [12]. Após esta fase, o GAD desenvolveu uma formação uniformizada para todos os enfermeiros das UCI’s portuguesas, com o objetivo de promover o desenvolvimento de competências na área da avaliação da dor em doentes críticos. De Março a Abril de 2011 propôs-se aos enfermeiros que avaliassem as caraterísticas, como instrumento de medida, de 2 escalas de avaliação da dor em doentes sedados, que não comunicavam de forma verbal e motora e submetidos à ventilação mecânica. As duas escalas selecionadas foram a Behavioral Pain Scale (BPS) e a Escala de Conductas Indicadoras de Dolor (ESCID), porque eram as duas escalas que estavam a ser aplicadas em Portugal para este tipo de doentes. Para a avaliação da dor em doentes que comunicavam de for13 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 ma verbal ou motora utilizaram-se as escalas: Escala Visual Analógica (EVA) ou a Escala Visual Numérica (EVN). Na fase da implementação do PNAD foi constituída uma rede nacional, sendo designado um enfermeiro de referência em cada UCI, com o objetivo de promover o PNAD na sua equipa de trabalho. Com o intuito de sensibilizar e dotar de conhecimentos na área da avaliação da dor, foi elaborada uma formação para os enfermeiros que participaram no PNAD e que foi ministrada pelos enfermeiros de referência às equipas de enfermagem das 61 UCI´s que fizeram parte do estudo. O PNAD pretendeu incluir todas as UCI´s Portuguesas na sua implementação sendo por isso considerado, pela Ordem dos Enfermeiros, como um projeto pioneiro a nível mundial. Os Enfermeiros consideraram que ambas as escalas, BPS e ESCID, são uma ferramenta útil, fidedigna, simples, objetiva e discriminatória na avaliação da dor: ·Avaliam adequadamente a dor no doente crítico; ·Promovem interação com o doente crítico; ·Com benefícios reais para o doente, para o enfermeiro e instituição; ·Capaz de produzir um indicador do estado clínico do doente e da qualidade dos cuidados de enfermagem; ·Permitem a investigação sobre a dor; ·Caracterizam mais dimensões do comportamento do doente crítico e uma linguagem universal entre os profissionais[12]. Após a utilização de ambas as escalas, 53,5% dos enfermeiros escolheram a BPS como escala a ser utilizada na avaliação da dor no doente crítico, adulto, sedado e que não comunica de forma verbal e motora, enquanto apenas 46,5% optaram pela ESCID[12] (Gráfico 1). Realidade da ucip Gráfico 1 – Escolha dos enfermeiros sobre o instrumento de avaliação da dor. Fonte: Resultados do Plano Nacional de Avaliação da Dor. Grupo de avaliação da dor, SPCI (2012). Na UCIP da Unidade Local de Saúde de Castelo Branco optou-se pela aplicação da escala comportamental da dor – BPS, adaptada de Payen et al [13] (Quadro I). Esta escala tem como objetivo avaliar comportamentos considerados indicadores de dor, na pessoa em situação crítica e faz a avaliação de 3 indicadores: ·Expressão Facial - pretende-se avaliar o modo como o doente se apresenta, observando o seu rosto, registando a sua expressão facial no momento da avaliação e selecionar a que melhor se configura com o rosto do doente. ·Tónus dos Membros Superiores - avalia-se o doente quanto ao tónus muscular, foca-se a atenção nos membros superiores, depois regista-se qual o comportamento que ele adota de entre as opções descritas. ·Adaptação à Ventilação - deve-se ter em atenção para não confundir com desadaptação ventilatória à alteração de parâmetros ventilatórios, caso isso aconteça deve-se colocar em observações. Cada indicador é dividido em 4 descrições, refletindo Quadro I – ESCALA COMPORTAMENTAL DA DOR FONTE: Adaptada da BPS (Behavioral Pain Scale) - Payen JF et al, (2001: 2258-2263). um aumento gradual da intensidade da dor. Esta corresponderá à soma obtida em cada indicador e pode oscilar entre 3 (sem dor) e 12 (dor intensa). Com uma pontuação de BPS e” 4, o doente apresenta dor e torna-se necessário uma intervenção de alívio, farmacológica ou não farmacológica. Trata-se de uma avaliação simples, rápida, contudo implica que haja um conhecimento prévio do doente, tornando-se assim individualizada [12]. A avaliação sistemática da dor e da sedação em contexto de cuidados intensivos, mediante o uso de escalas está associado a uma diminuição da incidência de dor e agitação, redução da duração da ventilação 14 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 mecânica e menor incidência de infeções nosocomiais [14] . O nível de sedação dos nossos doentes é avaliado recorrendo à Escala de Sedação de Ramsay. Pensamos que o instrumento de avaliação da dor utilizado contribui para um aumento da tão desejada qualidade na prestação de cuidados, permitindo um aumento da capacidade de resposta por parte dos prestadores de cuidados. Após este percurso, sentimo-nos responsáveis para desenvolver meios que promovam a adesão da utilização no serviço da Escala Comportamental da Dor e posteriormente a elaboração de protocolos de analgesia/ sedação. Referências bibliográficas Quadro II – Recomendações do Grupo de Avaliação da Dor da Sociedade Portuguesa de Cuidados Intensivos. FONTE: Resultados do Plano Nacional de Avaliação da Dor. Grupo de avaliação da dor, Sociedade Portuguesa de Cuidados Intensivos (2012). Conclusões Dado o tempo de permanência e de interação com o doente, os enfermeiros são os profissionais que ocupam um lugar privilegiado, para lidar com o doente que sente dor com o objetivo de a aliviar. Não sabemos o tempo de vida do doente crítico, mas a vida é um bem limitado no tempo, no entanto, é mais importante a qualidade desse tempo que a sua duração. O instrumento de avaliação da dor destina-se a ser usado por enfermeiros e portanto não é uma verdadeira reflexão da dor individual do doente, como tal, não pode e não deve pretender refletir as várias dimensões da experiência de dor. No entanto, pretende-se que forneça aos enfermeiros informações sobre a severidade da dor do doente, como ele a vive num determinado momento, de modo a que possam ser aplicadas intervenções farmacológicas e não farmacológicas pela equipa multidisciplinar. 1- PEREIRA L.; SOUSA F. Considerações gerais sobre a experiência dolorosa. In: CINTRA EA, Assistência de Enfermagem ao Paciente Critico. São Paulo: Editora Atheneu, 2000:575-585. 2 - ROPER N., LOGAN WW., TIERNEY AJ. Modelo de Enfermagem. Alfragide: Editora McGraw-Hill de Portugal Lda; 1995: 472. 3- METZGER C., MULLER A., SCHWETTA M., WALTER C. 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Grupo de avaliação da dor, sociedade portuguesa de cuidados intensivos, Setembro de 2012. http:/ /www.ordemenfermeiros.pt/colegios/Documents/PNAvaliacao_dor.pdf acedido em 16 de Outubro de 2012. 13 - PAYEN JF., BRU O., BOSSON JL. et al Assessing pain in critically ill sedated patients by using a behavioral pain scale. Crit Care Med 2001; 29(12): 2258-2263. 14 – CHANQUES G., JABER S., BARBOTTE E. et al. Impact of systematic evaluation of pain and agitation in an intensive care unit. Crit Care Med 2006; 34(6): 1691-1699. 15 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 ABORDAGEM AO DOENTE EM SÉPSIS/ CHOQUE SÉPTICO EM UNIDADES DE CUIDADOS INTENSIVOS Daniela Rodrigues Dias (4º ano Licenciatura de Enfermagem) Magda Alexandra Martins Castanheira (4º ano Licenciatura de Enfermagem) Marina Figueiredo Cardoso (4º ano Licenciatura de Enfermagem) Rita Sofia Teixeira Macedo Gomes (4º ano Licenciatura de Enfermagem) Sandy Julie Edwige Rosique (4º ano Licenciatura de Enfermagem) Tiago André Batista Silva (4º ano Licenciatura de Enfermagem) Paulo Jorge da Cruz Tavares (Professor Adjunto – IPG Escola Superior de Saúde) RESUMO A Sépsis/Choque Séptico traduz um processo agudo e disseminado de deficiente perfusão tecidual capaz de provocar distúrbios celulares, metabólicos e hemodinâmicos, pondo em risco a vida do doente. A perfusão dos tecidos torna-se deficiente quando ocorre um desequilíbrio entre o aporte de oxigénio às células e a respetiva necessidade. Este desequilíbrio pode surgir por vários motivos e dele pode resultar disfunção e morte celular. Em Portugal, a sépsis ocorre em 75% dos doentes hospitalizados, sendo causadora de 22% dos internamentos em Unidades de Cuidados Intensivos, estes casos conduzem a uma taxa de mortalidade hospitalar global de 38%. Os cuidados de enfermagem ao doente em sépsis/ choque séptico são complexos e de grande responsabilidade. Requerem uma profunda compreensão da fisiopatologia da doença e a antecipação dos efeitos de cada intervenção, bem como um conhecimento sólido de todo o processo de atuação. PALAVRAS-CHAVE: Sépsis; Choque Séptico; Unidades de Cuidados Intensivos; Cuidados de Enfermagem. INTRODUÇÃO A sépsis é uma infeção generalizada no organismo, em que ocorre disseminação contínua ou periódica de agentes infeciosos (bactérias, vírus ou fungos) para a corrente sanguínea, a partir de um foco, sendo esta uma condição potencialmente fatal que afeta diretamente os pulmões, os rins e o coração. [1] Grande parte dos casos de sépsis diagnosticados evoluem para choque séptico, sendo este clinicamente definido como um estado hipotensivo persistente não revertido pela expansão volémica adequada. [1] Em Portugal, a sépsis ocorre em 75% dos doentes hospitalizados, sendo causadora de 22% dos internamentos em Unidades de Cuidados Intensivos, estes casos conduzem a uma taxa de mortalidade hospitalar global de 38%. [2] Os cuidados de enfermagem inerentes ao doente em sépsis/ choque séptico são complexos e de grande responsabilidade, requerendo uma profunda compreensão da fisiopatologia da doença e a antecipação dos efeitos de cada intervenção, bem como um conhecimento sólido de todo o processo de atuação.[3] O presente artigo tem como objetivos: transmitir conhecimentos teóricos/ científicos acerca da sépsis/choque séptico e normas elaboradas para a sua abordagem, nomeadamente a Via Verde Sépsis; dar a conhecer os cuidados de Enfermagem essenciais ao doente em sépsis/choque séptico e ainda, enaltecer a importância da aquisição de conhecimentos acerca da sépsis/choque séptico de modo a otimizar os cuidados de Enfermagem. A metodologia utilizada para a elaboração deste artigo é a revisão bibliográfica, sendo a pesquisa bibliográfica e eletrónica a base do artigo. SÉPSIS/CHOQUE SÉPTICO A sépsis é uma infeção generalizada no organismo, em que ocorre disseminação contínua ou periódica de agentes infeciosos (bactérias, vírus ou fungos) para a corrente sanguínea, a partir de um foco, sendo esta uma condição potencialmente fatal que afeta diretamente os pulmões, os rins e o coração. [1] Pode ser causada por uma grande variedade de microrganismos, entre estes os aeróbios gram-negativos e gram-positivos, os anaeróbios, os fungos e os vírus, cuja origem pode ser diversa. As fontes exógenas incluem o ambiente hospitalar e os membros da equipa de saúde. Por outro lado, as endógenas incluem a pele do doente, o seu trato gastrointestinal, respiratório e geniturinário.[4] Grande parte dos casos de sépsis diagnosticados evoluem para choque séptico, sendo este clinicamente definido como um estado hipotensivo persistente não revertido pela expansão volémica adequada. [1] O choque séptico é então, um tipo de choque distributivo resultante da resposta sistémica a uma infeção grave do organismo, sendo caracterizado pela distribuição irregular do sangue nos tecidos dando lugar a áreas hiperperfundidas e outras hipoperfundidas.[5] O choque séptico, que resulta da resposta do organismo aos microrganismos invasores, é ativado pelos sistemas neurológico e endócrino, pelos danos causados aos tecidos e por inúmeros mediadores imunitários. Em consequência, sucedem-se disfunções celulares e metabólicas que se repercutem no funcionamento dos órgãos e na perfusão dos tecidos.[5] FISIOPATOLOGIA O choque séptico diz respeito a uma complexa resposta sistémica que se inicia quando um microrganismo entra no organismo e estimula o sistema imunitário. Os fragmentos 16 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 de proteínas disseminados e a libertação de toxinas e outras substâncias do microrganismo ativam as cascatas de enzimas plasmáticas bem como plaquetas, neutrófilos, monócitos e macrófagos. Após ativação do sistema imunitário, as células libertam uma variedade de mediadores, ou citocinas que iniciam uma cadeia de reações complexas. Esta resposta do hospedeiro é uma forma de proteção controlada por mecanismos de feedback. Uma vez ativados os mediadores, ocorrem diversos eventos fisiológicos e fisiopatológicos que afetam a coagulação, a distribuição do sangue nos tecidos e multiorgãos (levando a falência posteriormente), a permeabilidade da membrana capilar e o estado metabólico do organismo. Assim sendo, surge um desequilíbrio sistémico entre o fornecimento e o consumo de oxigénio pelas células, que irá resultar na hipoxia, lesão e morte celular.[4] MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS O choque séptico traduz um processo agudo e disseminado de deficiente perfusão tecidual capaz de provocar distúrbios celulares, metabólicos e hemodinâmicos, pondo em risco a vida do doente. A perfusão dos tecidos torna-se deficiente quando ocorre um desequilíbrio entre o aporte de oxigénio às células e a respetiva necessidade. Em termos hemodinâmicos, ocorrem dois padrões típicos de alterações no choque séptico: uma fase inicial, a hiperdinâmica ou quente, na qual são ativados os mecanismos de compensação; e uma segunda fase, a hipodinâmica, onde ocorre a deteorização do estado do doente.[4] [6] Na fase hiperdinânica o débito cardíaco, a frequência cardíaca, a frequência respiratória e a temperatura encontramse aumentados. No entanto a pressão arterial e a eliminação urinária diminuem. No que concerne à pele, esta encontra-se quente, rosada e ruborizada. Um doente nesta primeira fase apresenta um nível de consciência reduzido.[6] Na fase hipodinâmina o débito cardíaco e a frequência respiratória encontram-se diminuídos. A frequência cardíaca aumenta e a pele apresenta-se pálida e fria. Um doente nesta fase, apresenta anúria e no que diz respeito ao seu estado de consciência, este não responde a estímulos dolorosos.[6] TRATAMENTO Doentes com indícios de choque séptico devem ser transferidos para a Unidade de Cuidados Intensivos, uma vez que necessitam de cuidados específicos e rigorosos e ainda, por o fator tempo nestes doentes ser uma questão muito importante, quanto mais cedo se iniciarem os tratamentos, maior é a probabilidade de sucesso de recuperação. [7] Após a confirmação de um foco infecioso primário as prioridades na terapêutica do choque séptico são: a administração de antibioterapia precoce e adequada, sendo orientada por antibiogramas; e as correções de desequilíbrios fisiológicos, como a perfusão, a hipotensão e a oxigenação dos tecidos. [8] VIA VERDE SEPSIS A circular normativa nº 01/DQS/DQCO da Direcção-Geral da Saúde, data de 06/01/2010 regulamenta que intervenções precoces e adequadas, tanto em termos de antibioterapia como de suporte hemodinâmico, podem melhorar significativamente o prognóstico dos doentes com sepsis. Neste sentido, a Direcção-Geral da Saúde, no uso das suas competências técniconormativas, e através da tradução e adaptação das orientações existentes a nível nacional e internacional, validadas por um grupo de peritos, determina, por recomendação do Departamento da Qualidade na Saúde, a criação, a nível nacional, da Via Verde da Sépsis. Esta está dividida em três etapas essenciais que passam por, em primeiro lugar, identificar o caso-suspeito de sepsis, de seguida, existir confirmação médica de um caso-suspeito de sepsis, de existência de hipoperfusão e de ausência de critérios de exclusão, existindo, por último, a aplicação do algoritmo terapêutico.[9] CUIDADOS DE ENFERMAGEM A identificação dos doentes em risco de infeção e a redução da sua exposição aos microrganismos invasores constituem medidas preventivas e são responsabilidade da equipa de enfermagem. A monitorização de sinais de infeção nos acessos venosos e arteriais, incisões cirúrgicas, feridas traumáticas, cateteres urinários e úlceras de pressão são aspetos essenciais na prevenção de infeção.[3] O objetivo fundamental das intervenções de enfermagem direcionadas para o doente em choque é a manutenção do sistema cardiorrespiratório e metabólico, que permitam manter o doente com vida até à sua recuperação completa. O controlo definitivo do foco da infeção é imperativo no tratamento, sendo este a primeira prioridade.[3] Da panóplia de Cuidados de Enfermagem regulamentados em casos de sépsis/choque séptico, são essenciais[3]: 17 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 - Monitorização: Sinais Vitais; Oximetria de Pulso; Nível de consciência; - Pressão Venosa Central; - Saturação Venosa Central de Oxigénio; - Avaliação das características da pele e tegumentos; - Realização de aquecimento/arrefecimento corpóreo; - Promoção de uma dieta hiperlipídica: São administrados ácidos gordos para travar o catabolismo proteico (ácidos gordos de cadeia curta, ácidos gordos de cadeia média, aminoácidos de cadeia ramificada). - Administração mediante prescrição e fármacos conforme protocolo instituído: ·Oxigenioterapia: Perante os resultados da gasimetria orienta-se a quantidade e o método de administração de oxigénio, pode haver necessidade de entubação e ventilação mecânica; ·Antibioterapia: Inicia-se logo após a colheita de amostras para cultura e antes de se concluir os estudos de sensibilidade (geralmente 24h-48h); ·Regulação da temperatura; ·Fluidoterapia: Administração de Lactato de Ringer, Soro Fisiológico, Albumina e plasma para manter pressões e volumes adequados de preenchimento ventricular, que ficam comprometidos com o aumento da permeabilidade e vasodilatação capilar; ·Bicarbonato de Sódio: Após a administração de Oxigenioterapia, procede-se à administração de Bicarbonato de Sódio apenas em doentes com acidose metabólica grave (pH <7, 25), uma vez que a diminuição de oxigénio tecidular é um dos efeitos secundários; ·Inotrópicos Positivos: Administrados para aumentar a força de contractilidade cardíaca e o débito cardíaco (Ex: dopamina e dobutamina); Em estádios avançados da sépsis, são administrados vasodilatadores (Nitroprussiato e a nitroglicerina); ·Vasopressores: Administrados em casos em que a pré-carga do ventrículo esquerdo não chega para restaurar a adequada perfusão dos tecidos (Fármacos de 1ª linha: Noradrenalina e dopamina; fármacos de 2ªlinha: adrenalina); ·Esteróides: Administrados em casos de existência ou suspeita de insuficiência supra-renal; ·Naloxona: Administrada para reverter alguns efeitos vasodilatadores da sépsis; ·Glicose, Potássio e Insulina: Administrados para aumentar a função cardíaca durante a sépsis; - Avaliação das características da urina; - Manutenção do débito urinário maior ou igual a 30 ml/l; - Realização do Balanço hídrico todas as horas. Note-se que os cuidados de enfermagem para o doente em sépsis/choque séptico são complexos e de grande responsabilidade, requerendo uma permanente vigilância hemodinâmica do doente e da perfusão tecidular dos diferentes órgãos. Esta vigilância deverá ser, preferencialmente, efetuada em Unidades de Cuidados Intensivos.[3] CONCLUSÃO No caso da sépsis/choque séptico, existe um conjunto de atitudes que, se realizadas numa fase precoce da doença, podem prevenir e minimizar os danos para o doente. Estas atitudes incluem a identificação e estratificação rápidas de doentes, a utilização de antibioterapia adequada e de estratégias de ressuscitação hemodinâmica guiada por objetivos. Este artigo pretende fazer uma abordagem global ao doente em sépsis/choque séptico e expor a Via Verde de Sépsis, a nível nacional, com vista a uma atualização do suporte teórico e científico e consequente promoção da qualidade dos cuidados de Enfermagem prestados a este tipo de doentes. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: [1] – Shaffler, A., Menche, N. (2004). Medicina Interna e Cuidados de Enfermagem: Manual para enfermeiros e outros profissionais de saúde. Lisboa: Lusodidática. [2] – Póvoa, P; Carneiro, H.; Ribeiro, O. e Pereira, A. (2009). Influence of vasopressor agent in septic shock mortality. Results from the Portuguese Community -Acquired Sepsis Study. Acedido em fevereiro, 14, 2013 em:http://www.jvsmedicscorner.com/ICUCardiovascular_files/ Vasopressors%20in%20sepsis%20Portugese%20trial%20+%20Edit.pdf. [3] – Swearingen, P. e Keen, J. (2004) Manual de Enfermagem de Cuidados Intensivos: Intervenções de Enfermagem Independentes e Interdependentes (4ª ed.). Loures: Lusodidacta. [4] – Urden, L.; Stacy, K. e Lough, M. (2008). Enfermagem de Cuidados Intensivos (5ªed.). Camarate: Lusodidacta. [5] – Thelan, L.; Lough, M.; Davie, J. e Urden, L. (2008). Enfermagem em Cuidados Intensivos, diagnóstico e intervenção, 5.ª edição, Lisboa: Lusodidacta. [6] – Smith-Blair, N (2010). Choque In Monahan, F.; Sands, J.; Neighbors, M.; Marck, J. e Green, C. Phipps, Enfermagem Médico-Cirurgica, Perspectivas de Saúde e Doença. (Vol. 1) Loures: Lusodidacta: 411-414 [7] – Azevedo, L. e Pizzo V. (2006). Choque Séptico In Schettino, G.; Cardoso, L.; Jorge J. e Filho, F.. Paciente Crítico: Diagnóstico e Tratamento (capítulo 3) (1ª ed.). São Paulo: Manole. [8] – Batista, J. (2009). Choque Séptico. Acedido a fevereiro, 14, 2013 em: http://www.feeaportugal.org/downrestri/curso3_2009/docs/ Choque_septico.pdf [9] – Direcção Geral da Saúde. Circular Normativa 01/DQS/DQCO (2010, janeiro). Acedido em fevereiro, 13, 2013 em: http://www.min-saude.pt/ NR/rdonlyres/051D4394-95FA-419F-98DB7AEED3E/0/i012305.pdf 18 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 PNEUMONIA ASSOCIADA À VENTILAÇÃO MECÂNICA (PAVM) DA EVIDÊNCIA À PRÁTICA PREVENTIVA Daniel Jorge Oliveira Valente João Pedro Oliveira Valente Bárbara Susana Clímaco Rebelo Joana Rodrigues Santos RESUMO A infeção associada aos Cuidados de Saúde (IACS), não sendo um problema novo, assume cada vez maior relevância, à medida que a esperança média de vida aumenta e se dispõe de fármacos de maior espetro e de tecnologias diagnósticas e terapêuticas mais avançadas. Contudo, procedimentos mais invasivos conduzem também, à existência de novos agentes patogénicos e consequentes processos de multi-resistência. A Pneumonia associada à Ventilação Mecânica (PAVM) é das IACS mais frequentes, tendo uma prevalência que varia entre 9-27%. De acordo com a Direção Geral da Saúde (DGS), apresenta repercussões importantes na sobrevida dos doentes, uma vez que é responsável por internamentos longos e taxas de mortalidade elevadas. Trata-se, pois, de um fenómeno globalizado e uma das mais significativas causas de morbilidade e mortalidade nos doentes hospitalizados, bem como de consumo acrescido de recursos hospitalares e comunitários, constituindo assim um peso significativo para a saúde pública. Neste sentido, os profissionais de saúde, desempenham um papel de relevo na prevenção da transmissão de infeções e controlo de doenças. Estes devem atuar sobre os factores de risco da PAVM através da implementação da assepsia antes, durante e após a execução de procedimentos, assim como no correto cumprimento das diversas medidas preventivas, farmacológicas e nãofarmacológicas, sobretudo no que concerne à descontaminação das mãos, uso de equipamentos de proteção individual e a outros focos de atenção específicos relacionados diretamente com a presença de uma via aérea artificial. Com o presente artigo, objetiva-se a devida enfatização das intervenções na prevenção da PAVM, enunciando as medidas, farmacológicas e não farmacológicas relevantes. Palavras-chave - Infeção associada aos Cuidados de Saúde; Enfermagem; Ventilação Mecânica; Pneumonia; Prevenção. PNEUMONIA ASSOCIADA À VENTILAÇÃO MECÂNICA… UMA REALIDADE A pneumonia é uma das infeções associadas aos cuidados de saúde (IACS) mais frequentes e pode ocorrer mediante a aspiração da flora microbiana orofaríngea; através da inalação de aerossóis contaminados; ou disseminar-se por infeção cruzada (mãos/equipamentos) ou por via hematogénica, através de um foco de infeção distante [1]. A colonização microbiana da orofaringe e trato gastrointestinal seguida de microaspiração é dos três a causa mais frequente da pneumonia nosocomial, sendo a ventilação mecânica o fator predisponente mais importante para a ocorrência desse fenómeno. A pneumonia associada aos cuidados de saúde surge em diferentes grupos de doentes sendo os mais importantes os doentes ventilados, onde a taxa de incidência de pneumonia é de 3% nos 5 primeiros dias de VM, 2% entre os 6 e os 10 dias de VM e 1º após o décimo dia. A morbilidade da pneumonia associada à ventilação mecânica (PAVM) atinge cerca de 20% dos doentes ventilados, sendo mortal em cerca de 37%, embora o risco atribuível seja difícil de determinar dadas as frequentes comorbilidades dos doentes. A ocorrência de pneumonia aumenta de 3 a 21 vezes mais em relação a doentes não ventilados [2,3]. De forma a fazer face às crescentes taxas de incidência e prevalência de PAVM a nível hospitalar torna-se imperioso a tomada de medidas, sobretudo no campo de atuação de enfermagem. Além do correto cumprimento das várias medidas básicas de higiene hospitalar, sobretudo no que concerne à descontaminação das mãos e uso de EPI, existem vários focos de atenção relacionados diretamente com a presença de uma via aérea artificial. Segue-se, assim, um conjunto de medidas preventivas, não-farmacológicas e farmacológicas a aplicar a todo o doente hospitalizado submetido a ventilação mecânica, sendo as mesmas baseadas em diretrizes e recomendações de entidades destacáveis como o Instituto Nacional Dr. Ricardo Jorge, o Centers for Disease Control and Prevention, o American College of Physicians, a Society for Healthcare Epidemiology of America, ou o European Respiratory Journal, entre outras. PAVM - MEDIDAS PREVENTIVAS NÃO-FARMACOLÓGICAS a) Entubação Endotraqueal A entubação nasotraqueal, quando comparada com a entubação orotraqueal, está associada a uma maior incidência de sinusite nosocomial. A sinusite nosocomial, por sua vez, pode predispor à PAVM em virtude da aspiração de secreções infetadas provenientes dos seios nasais. Desta forma, perante a necessidade de entubação endotraqueal, é pertinente dar prioridade à via orotraqueal caso o doente não possua contraindicações para tal [4,5]. Para além da via de inserção, aspetos como 19 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 o tamanho e tipo de tubo endotraqueal (TET) têm influência no acréscimo ou decréscimo do risco de PAVM [6]. Recomenda-se a utilização preferencial de tubos endotraqueais resistentes a dobras, sem que percam a flexibilidade; não devem ser tóxicos ou irritantes para os tecidos e devem adaptar-se ao formato da via aérea superior, com calibre e comprimento adequados ao doente de forma a prevenir lesões traumáticas da mucosa traqueal [7]. Após a sua instalação na via aérea do indivíduo, os TET vão sendo colonizados por microorganismos do próprio trato respiratório do doente que, ao agregarem-se com muco e glicopolissacarídeos formam biofilme. Uma vez formado, o biofilme favorece a permanência de microorganismos dentro do TET. Através do fluxo de gás do ventilador e da aspiração endotraqueal desalojam-se agentes patogénicos repetidamente para os pulmões. Esta situação pode ser minimizada através da utilização de TET revestidos de material com propriedades anti-microbianas à base de sulfadiazina de prata, uma vez que a esta interfere no DNA de alguns microorganismos prevenindo a sua replicação [6,7]. São, ainda, recomendados os TET com sistemas de sucção incorporados que evitam que as secreções se acumulem nas paredes do lúmen e ainda dispositivos externos de remoção do biofilme, dado que permitem uma significativa diminuição da colonização do trato respiratório[8]. b) Monitorização da Pressão do Cuff do Tubo Endotraqueal O cuff do tubo endotraqueal deve possuir um nível de pressão suficiente para evitar a perda de gás e, assim, eventuais deslocações de agentes microbianos presentes na região subglótica para o trato respiratório inferior [6] . Num estudo de Rello et al. (1996), 83 doentes entubados foram avaliados, tendo havido uma maior tendência de desenvolvimento de PAVM entre os doentes com uma pressão intra-cuff persistentemente menor que 20 cmH2O, (risco relativo de 2,57; intervalo de confiança (IC) de 95% 0,78-8,03). Em doentes entubados igualmente com uma pressão intra-cuff inferior a 20 cmH2O, contudo, sem antibioterapia profilática, o risco de desenvolvimento de PAVM foi ainda superior (risco relativo 4,23, IC 95% 1,12-15,92) [9]. A pressão do cuff deve também ser mantida a menos de 30 cmH2O de forma a evitar o risco de lesão traqueal . Recomenda-se, portanto, que a pressão intra-cuff se encontre mantida constantemente entre 20-30 cmH2O [5]. b)Aspiração das Secreções Subglóticas As secreções existentes a nível da orofaringe podem descer para o interior da traqueia, acumulando-se na região subglótica, acima do cuff do tubo endotraqueal. A presença de secreções nesse ponto anatómico predispõe à ocorrência de microaspirações, avançando para o trato respiratório inferior e aumentando o risco de PAVM[9]. A forma de eliminar essas secreções ocorre através da aspiração de secreções subglótica - “Subglottic Secretions Drainage” (SSD). Este método é realizado mediante a utilização de um tubo endotraqueal ou de traqueostomia com um lúmen dorsal separado, que abre diretamente acima do cuff e permite a aspiração contínua de secreções. A SDD diminui o risco de microaspirações e, assim, o risco de colonização da via aérea e o risco de PAVM em cerca de 42% [10]. Através dos resultados obtidos numa meta-análise de Dezfulian et al. (2005) que envolveu 896 pacientes de cinco estudos, confirma-se que a SSD parece ser eficaz na prevenção da PAVM (risco relativo 0,51, IC 95% 0,37-0,71), sobretudo em doentes que possam requerer ventilação mecânica invasiva por períodos superiores a 72 horas. Poder-se-á assim considerar benéfico o uso de TET ou de traqueostomia com SDD incorporado para doentes que exijam mais de 72 horas de VMI[9]. c)Desmame Ventilatório A presença de um TET aumenta a probabilidade de aspiração de microorganismos existentes no trato respiratório superior para as vias aéreas inferiores, propiciando a ocorrência de pneumonia nosocomial. Com base neste princípio, o risco de desenvolver infeção aumenta de forma proporcional ao tempo de permanência do TET. Considera-se que a ventilação mecânica é prolongada se há dependência da assistência ventilatória, invasiva ou não-invasiva, por mais de 6 horas diárias por um período superior a 3 semanas [1]. O desmame progressivo da ventilação mecânica invasiva até à extubação do TET constitui uma das medidas mais eficazes de prevenção da PAVM. Um dos métodos mais eficazes de interrupção da VM é o teste da respiração espontânea. Após um teste bem-sucedido, deve considerar-se a estabilidade de alguns fatores com o nível de consciência, o grau de colaboração do paciente e sua capacidade de eliminar secreções respiratórias antes de se proceder à interrupção da ventilação assistida. Posteriormente, o mesmo autor recomenda um período de vigilância de 48 horas antes da extubação [1]. Existem evidências de que a realização diária de teste de respiração espontânea abrevia o tempo de ventila- 20 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 ção mecânica e presença de TET [5,11]. Para tal, considerase pertinente a criação de protocolos que melhoram o uso da sedação e permitam identificar de forma sistemática os doentes elegíveis para o teste de respiração espontânea [12]. d)Minimização da Reentubação Endotraqueal Após vários dias de entubação endotraqueal, os doentes adquirem disfunção subglótica [9]. A reentubação endotraqueal tem sido, assim, associada a um aumento acrescido do risco de aspiração de microorganismos para a orofaringe, com consequente aumento do risco de PAVM, pelo que a reentubação da via aérea inferior deve ser evitada na medida do possível [6]. Como medidas redutoras da reentubação, sugere-se a melhoria do planeamento da extubação, a formulação de protocolos de desmame ventilatório, a prevenção da extubação acidental do TET ou mesmo o recurso a ventilação mecânica não-invasiva (VMNI) [9,5]. e)Ventilação Mecânica não Invasiva A utilização de VMNI tem demonstrado uma redução considerável da incidência de PAVM, sobretudo em doentes com insuficiência respiratória [6]. Com efeito, numa meta-análise de Burns et al. (2006), que incluiu 150 doentes de quatro estudos, constatou-se que esta, em comparação com ventilação mecânica invasiva, diminuiu a incidência de PAVM (risco relativo 0,28, IC 95% 0,090,85), a mortalidade (risco relativo 0,41, IC 95% 0,220,76), bem como a duração da ventilação mecânica (diferença de média ponderada - 7,33 dias, IC 95%, 11,45 - -3,22 dias) [9]. f) Traqueostomia Precoce A traqueostomia diminui a resistência e o trabalho ventilatório, facilitando o desmame dos pacientes com alterações acentuadas da mecânica respiratória. Assim, a traqueostomia precoce, isto é, até 48 horas após o início da ventilação mecânica, em doentes com previsão de permanecer por mais de 14 dias conectados ao ventilador tem um contributo na redução da mortalidade, da incidência de PAVM, do tempo de internamento e do tempo de ventilação mecânica [12]. Numa metaanálise de Griffiths et al. (2005), que envolveu 382 doentes de cinco estudos, a traqueostomia precoce não diminuiu significativamente o risco de PAVM (risco relativo 0,90, IC 95% 0,66-1,21) e mortalidade (risco relativo 0,79, IC 95% 0,45 -1,39), contudo reduziu significativamente o tempo de ventilação artificial (diferença média -8,5 dias, 95% CI, 15,3, -1,7 dias) e o tempo de internamento (diferença média - 15,3 dias, 95% CI, 24,6, -6,1 dias) [9]. No entanto, não há uma regra geral em relação ao tempo que se deve realizar a traqueostomia, sendo que este procedimento deve ser individualizado [12] . g)Filtros Respiratórios No contexto da assistência ventilatória ou anestesia inalatória há evidências de que, quando os circuitos internos do ventilador não são substituídos ou submetidos a desinfeção, podem ser potenciais fontes de contaminação cruzada das mucosas do trato respiratório dos pacientes. Como medida para o aumento da segurança com o procedimento e no intuito de não contaminar estes circuitos, evitando a necessidade da troca dos mesmos após a utilização em cada paciente, tem sido proposta a utilização de filtros bacterianos nos procedimentos de ventilação mecânica. Existem dois tipos de filtros: higroscópicos e hidrofóbicos. Os filtros higroscópicos possuem um condensador de baixa condutividade térmica à base de papel, algodão ou espuma e estão impregnados com um sal higroscópico (cloreto de cálcio ou de lítio). A baixa condutividade permite a retenção de calor e o sal ajuda a reter a humidade. Caraterizam-se, assim, mais pelo seu papel na humidificação do que pela filtração bacteriana, sendo usados no circuito inspiratório. Já os filtros hidrofóbicos utilizam um elemento com uma grande área de superfície e baixa condutividade que repele a água. Caracterizamse, portanto, pela sua eficácia na filtração bacteriana, sendo instalados no circuito expiratório no sentido de evitar a contaminação das peças internas do ventilador[13]. Alguns autores recomendam a utilização obrigatória de filtros antimicrobianos a nível do circuito expiratório apenas em doentes com suspeita ou confirmação bacilar de tuberculose pulmonar, submetidos a ventilação mecânica, de forma a evitar a contaminação do ventilador ou do ar ambiente [14]. h)Sistemas de Humidificação O gás inspirado durante a VM é frio e seco e, face à existência do tubo endotraqueal ou de traqueostomia, as vias aéreas superiores não podem contribuir com os mecanismos fisiológicos de filtração e aquecimento [9]. Face a níveis diminuídos de humidade inspirada, grande parte da porção de água existente é removida do muco respiratório e fluido periciliar por evaporação, causando uma diminuição na clearance mucociliar, conduzindo a um aumento da espessura das secreções e da resistência à passagem do gás ventilatório e uma diminuição das trocas gasosas, exponenciando o risco de infeções respiratórias [13]. Em situações de VM é necessário o recurso à 21 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 humidificação artificial do gás inspirado. Esta humidificação pode ser ativa ou passiva. A humidificação ativa ocorre através da utilização de Heated Humidifiers (HH), conhecidos como “humidificadores de água aquecida” ou “panelas de humidificação”, em que o gás inspirado é submetido a um banho de água aquecida através de um dispositivo aplicado na saída do ventilador. A humidificação passiva é aplicada por meio do uso de Heat and Moisture Exchangers (HME), também chamados de “filtros permutadores de calor” ou “narizes artificiais”, sendo a sua função coletar o calor e humidade provenientes do ar expirado pelo doente, devolvendo uma parte dos mesmos para a via aérea na inspiração subsequente [9]. Os estudos não encontraram diferenças significativas entre os dois sistemas de humidificação artificial no que concerne à incidência de PAVM, no entanto os HH, conferem níveis superiores de humidade absoluta, estando associados a uma menor ocorrência de secreções brônquicas espessas com oclusão do TET, menor incidência de atelectasias e de PAVM. São recomendados em doentes com VM por períodos mais prolongados (superiores a 5 dias) [9]. No entanto, importa referir que os humidificadores de água aquecida provocam condensação no circuito o que constitui um reservatório e fonte de proliferação bacteriana, pelo que implicam um maior tempo de cuidado por parte do enfermeiro. Os HME, por sua vez, são responsáveis por uma maior resistência ao ar inspirado e à existência de espaço morto, com consequente aumento do trabalho respiratório [7,15]. Atribuem-se, ainda, aos HME uma menor colonização dos circuitos ventilatórios, pelo que o seu período ideal de utilização é de 24 a 48 horas de VM [4,10]. Para o seu correto funcionamento, este deve encontrarse na vertical acima do tubo endotraqueal. No que concerne à sua mudança, não há um consenso sobre o intervalo de tempo ideal. O mesmo autor afirma que não devem ser substituídos por rotina mas apenas quando se encontrem contaminados macroscopicamente de secreções/vestígios hemáticos ou apresente sinais de mau funcionamento – excesso de saturação de H2O. Consoante as particularidades de cada doente e indicações do fabricante, a substituição é realizada com periodicidade desde 48 horas até semanal [15]. i)Circuitos do Ventilador Os circuitos externos dos ventiladores devem ser substituídos entre doentes. Já num mesmo doente, perante a utilização circuitos ventilatórios exteriores conectados a um filtro higroscópico (HME), estes não devem ser substituídos por rotina, mas apenas quando se encontrem visivelmente conspurcados ou com deficiências de funcionamento. Relativamente a circuitos externos associados a um humidificador de água aquecida, preconizamse as seguintes recomendações: - Utilizar água esterilizada nos reservatórios dos humidificadores; - Eliminar de forma periódica os líquidos condensados nos circuitos externos, tomando precauções para não os introduzir de forma inadvertida para o interior da via respiratória do paciente; - Não mudar por rotina os circuitos, quando em uso num mesmo doente, sendo que a haver mudança, esta não deve ocorrer em períodos inferiores a 48 horas, exceto em casos de conspurcação; - Não colocar filtros antimicrobianos entre o reservatório do humidificador e o circuito inspiratório externo; - Entre doentes, esterilizar ou submeter a desinfeção de alto nível os circuitos externos e dispositivo humidificador (HH), caso sejam reutilizáveis [15]. Quanto aos circuitos internos, não está indicada a sua esterilização ou desinfeção rotineira, uma vez que não são considerados fontes importantes de contaminação bacteriana. Deve atuar-se segundo as indicações específicas do fabricante para o ventilador em causa, sendo as suas componentes internas limpas com um desinfetante (geralmente álcool etílico a 70%) em intervalos periódicos com base nas horas de uso [7]. j) Sistemas de Aspiração Endotraqueal A aspiração endotraqueal é uma técnica utilizada em doentes submetidos a VM com recurso a entubação endotraqueal ou traqueostomia dado que estes não conseguem expelir voluntariamente as secreções traqueobrônquicas[3]. Existem dois tipos de sistemas de aspiração de secreções brônquicas: aberto e fechado. Relativamente ao sistema aberto de aspiração, é utilizada uma sonda de aspiração de uso único, existindo necessidade de desconexão do circuito ventilatório. Este procedimento deverá ser executado com técnica asséptica, sendo fundamental a lavagem das mãos antes e após a assistência ao doente. Durante o processo, pode ser necessário instilar soro fisiológico (até 5 mL) ou bicarbonato de sódio (0,5 mL + 2,5 mL de H 2O destilada esterilizada) em ampôlas de uso único, para fluidificar, mobilizar as secreções e estimular a tosse. Caso a obstrução persista pode fazer-se ventilação com insuflador manual [3]. Por sua vez, o sistema de aspiração fechado usa uma sonda 22 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 de aspiração reutilizável e não requer a desconexão do circuito ventilatório. A principal restrição sobre o uso deste sistema é o seu custo mais elevado, uma vez a sua substituição é recomendada diariamente ou de 2 em 2 dias, dependendo dos fabricantes. Já Darvas e Hawkins (2003) afirmam que a incidência de PAVM não aumentou num estudo em que o prazo para a mudança do sistema fechado de aspiração foi prolongado para além de 24 horas, não existindo assim uma diferença significativa na incidência de PAVM relativamente aos doentes em que a substituição obedecia a uma rotina diária [9]. Já num outro estudo aleatório de Lorente, L., Blot, S. & Rello, J., (2007) em que se testou a incidência de PAVM e os custos de aspiração, comparando os sistemas de aspiração aberto e fechado, o sistema fechado utilizado não foi trocado de forma rotineira, sendo substituído parcialmente apenas em caso de falha mecânica, reentubação ou quando se encontrasse visivelmente conspurcado. Não se encontraram diferenças relevantes na incidência de PAVM entre o sistema fechado e aberto [9]. Concluindo, ambos os sistemas de aspiração são igualmente válidos, contudo o sistema fechado oferece um menor comprometimento gasométrico e hemodinâmico durante a aspiração de secreções brônquicas. Além disso apresenta uma maior eficácia na redução de infeção exógena, dado que o sistema fechado impede a manipulação direta da sonda de aspiração e a desconexão do circuito [16,9]. k) Camas Cinéticas Os doentes conectados ao ventilador são frequentemente cuidados em posição supina por longos períodos de tempo. Nesta posição a capacidade funcional residual é reduzida face ao encerramento alveolar e a clearance mucociliar está comprometida devido à redução da mobilidade, resultando na acumulação de secreções nas regiões pulmonares dependentes. Tal situação vai exponenciar o risco de atelectasias e infeção respiratória associada à VM [9]. Segundo o mesmo autor, os doentes submetidos à VM, por norma, deveriam ser posicionados a cada 2 horas. Através do uso de camas cinéticas, é possível exercer rotação contínua até 40º de amplitude para cada lado, além da terapia de percussão e vibração, que otimizam a função mucociliar evitando a acumulação de secreções na árvore brônquica. Numa meta-análise de Delaney et al. (2006) que incluiu 1169 doentes pacientes de 15 ensaios e 967 pacientes de 10 estudos, demonstraram que a utilização de camas cinéticas reduz a incidência de PAVM, contudo não apresentou benefício no tempo de ventilação mecânica e de internamento [9]. Por outro lado, de acordo com um estudo aleatório de Amanullah e Posner (2010), os resultados mostram que os doentes em que foram usadas camas cinéticas, comparativamente a uma cama comum, obtiveram uma redução na duração da VM (8 ± 5 dias contra 14 ± 23 dias; P=0,02), no tempo de internamento (25 ± 22 dias contra 39 ± 45; P=0,01), pelo que recomenda o seu uso [10]. a)Posicionamento em Semi-Fowler O posicionamento em semi-fowler, contrariamente à posição de supina, tem sido associado a menores níveis de aspiração do conteúdo gástrico e secreções, evitando assim um incremento da colonização da via aérea inferior e da incidência de PAVM [6]. Um estudo de Drakulovic et al. (1999) refere que o posicionamento do doente em semi-fowler reduz a ocorrência de pneumonia associada à VM, especialmente em doentes que recebem nutrição enteral [9]. Num estudo aleatório de Orozco-Levi et al. (1995), utilizando alimentação enteral marcada com isótopos radioativos, a sua contabilização a nível endotraqueal era superior nos doentes posicionados em posição de supina a 0º, quando comparada com doentes posicionados em semifowler a 45º [6]. Recomenda-se que a posição tronco do paciente não seja inferior a 10º, inclusive durante os cuidados de higiene ou transporte do doente. Note-se que a elevação da cabeceira da cama, apesar de conferir benefícios evidentes na prevenção da PAVM, pode aumentar o contacto entre o doente e a superfície da cama, potenciando o risco de úlceras de pressão [11]. Ainda assim, face à evidência de benefício, e mediante uma prática cuidativa assertiva, está indicado o posicionamento em semi-fowler entre 30-45º, caso não haja contraindicação para tal. Esta medida, além da prevenção da PAVM, influencia a obtenção de volumes correntes superiores [4,17]. b) Nutrição Enteral A instituição de nutrição enteral precoce (desde o primeiro dia de entubação endotraqueal e VM) está associada a um aumento da incidência de PAVM, comparativamente à nutrição enteral tardia, isto é, após cinco dias do início da ventilação assistida. Ainda assim, é recomendada face aos benefícios óbvios que a nutrição confere, além da sua influência na manutenção da acidez gástrica [10,6]. A alimentação gástrica tem uma influência direta na ocor23 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 rência de refluxo gastro-esofágico que, por sua vez, contribui para o risco de aspiração do conteúdo gástrico para as vias aéreas inferiores e, portanto, para o risco de PAVM. Por estes motivos tem sido sugerido a remoção das sondas gástricas e como alternativa a entubação pós-pilórica [9]. Na meta-análise de Marik e Zaloga (2003) que envolveu 522 pacientes de nove estudos, constatou-se que a alimentação gástrica mostrou uma maior tendência para o desenvolvimento de PAVM comparativamente à alimentação pós-pilórica, ainda assim, as diferenças não foram estatisticamente significativas [9]. Por fim, reforça-se a importância do enfermeiro avaliar regularmente a posição da sonda e a motilidade intestinal do doente, através da auscultação de ruídos intestinais, do resíduo gástrico e do perímetro abdominal. Se necessário deve ajustar quer o volume quer a composição da nutrição entérica [15]. PAVM - MEDIDAS PREVENTIVAS FARMACOLÓGICAS a)Sedação e Agentes Curarizantes No estudo de Kress et al. (2000), em que 128 doentes adultos submetidos a VM foram escolhidos aleatoriamente para interrupção diária da infusão de sedativos até se encontrarem totalmente despertos. Os doentes alvo do estudo, comparados com um grupo cuja interrupção aconteceu sob o esquema convencional por prescrição médica, apresentaram uma redução de duração da VM de 7,3 dias para 4,9 dias (P= 0,004) e do tempo de internamento em 3,3 dias (P= 0,02) [17] . Em consequência da redução do tempo de VM, ocorre também uma diminuição das suas complicações como PAVM, hemorragia digestiva alta, sinusite, bacteriémia e barotrauma. Já num estudo prospetivo de Cook et al. (1998), demonstrou-se também que a utilização de agentes curarizantes ou bloqueadores da junção neuromuscular foram associados ao aumento da incidência de PAVM [9]. Recomenda-se, portanto, que doentes sob VM e sedação, particularmente em infusão contínua, devem cumprir protocolos que melhorem o uso da sedação e estabelecer metas que incluam o seu desmame diário, bem como interrupção da curarização [10,11]. É imperioso referir que a interrupção da sedação não é isenta de riscos, o que requer uma vigilância e controlo mais efetivo [17]. b) Higiene e Descontaminação Oral A colonização da orofaringe tem sido identificado como um factor da pneumonia associada aos cuidados de saúde, sobretudo causadas pela bactéria entérica Gramnegativa P. aeruginosa [6]. Com base num estudo de Koeman et al. (2006), a aplicação de solução de clorexidina em doentes que necessitam de VM por mais de 24 horas, apresentaram uma menor incidência de PAVM [9]. Através de um outro estudo realizado por Mori et al. (2006) demonstrou-se que a incidência de PAVM em 1252 doentes que receberam tratamento oral com solução de iodopovidona em combinação com uma escova de dentes foi menor do que num grupo de 414 pacientes que receberam apenas tratamento sem o contributo da escova de dentes [9]. Conclui-se, portanto, que a descontaminação química com solução desinfetante como uma intervenção única pode ser insuficiente para diminuir de forma significativa o risco de pneumonia, sobretudo em pacientes onde se verifique a presença de cáries dentárias e doença periodontal onde há uma maior acumulação de microorganismos patogénicos, pelo que deve ser associada a uma limpeza mecânica com escova de dentes ou outro dispositivo análogo. É considerada benéfica a lavagem dos dentes e cavidade oral com solução anti-séptica à base de clorexidina antes da entubação endotraqueal, caso esta seja eletiva. Contudo, em entubações de emergência nem sempre essa medida é possível, resultando numa introdução microbiana acrescida para o interior das vias aéreas inferiores, que pode ser suficiente para dar origem a um processo infecioso [18]. Em resumo, pode sistematizar-se a prática de descontaminação oral em doentes submetidos a VM, recomendando-se que o enfermeiro inspecione regularmente a cavidade oral, aplique solução anti-séptica (clorexidina) a cada 2-4 horas antes de mobilizações major e após a aspiração de secreções da hipofaringe e escove os dentes e a língua a cada 12 horas[19]. c) Descontaminação Digestiva Seletiva De forma a moderar a colonização da orofaringe e suas potenciais consequências, foi proposto o uso de descontaminação digestiva seletiva (Selective Digestive Decontamination – SDD), que consiste na administração de antibióticos absorvíveis, como a polimixina, tobramicina ou anfotericina B, aplicados topicamente a nível oral, endotraqueal e gástrico, conjuntamente com a administração intravenosa de cefotaxima [4]. Vários estudos, entre os quais o de Liberati et al. (2004), consideram que a SDD diminui as taxas de PAVM e de mortalidade, sobretudo em doentes do foro cirúrgico, no entanto, como desvantagem a esta medida terapêutica insurge-se a dificuldade na correta aplicação dos antibióticos, dado que este processo constitui um estímulo potencial para a resistência microbiana [9]. 24 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 Assim, esta prática administrada de forma continuada só é recomendada para doentes selecionados ou para erradicação de microrganismos nosocomiais multi-resistentes [15,4]. d) Administração Preventiva de Antibióticos Intravenosos A utilização preventiva de antibióticos sistémicos em situação de entubação endotraqueal emergente pode diminuir a probabilidade de ocorrência de PAVM nas primeiras 48 horas. Já a administração de antibioterapia profilática de forma continuada, à semelhança da SDD pode aumentar o risco de infeção a médio prazo decorrente de fenómenos de multi-resistência bacteriana [6]. Deste modo, a administração de antibióticos no sentido de prevenir a PAVM deve ser criteriosa, sendo preferível a administração de antibióticos de menor espetro e que tenham reduzido efeito sobre a flora anaeróbia do trato gastrointestinal [10]. e) Profilaxia da Úlcera de Stress A úlcera de stress constitui a causa mais comum de hemorragia digestiva em doentes críticos, estando associadas a um aumento em 5 vezes superior no risco de mortalidade. Por este motivo a prevenção da úlcera péptica é uma intervenção mandatória em doentes críticos. A preocupação surge dado que esta pode ser um fator potenciador da pneumonia nosocomial. Tal situação devese ao fato de a administração de agentes que suprimam a acidez gástrica causar um aumento do pH, promovendo o crescimento de bactérias como C. difficile e bacilos Gram-negativos a nível gástrico. O doente sujeito a VM e entubado, apresenta os mecanismos de defesa da via respiratória diminuídos, sendo que desse modo a ocorrência de refluxo de conteúdo e secreções gástricas, ricos em bactérias, e a sua aspiração podem levar à colonização brônquica e PAVM. Ainda assim, para doentes críticos com ventilação artificial, a profilaxia da úlcera de stress pode ser mais benéfica do que o potencial risco de colonização por C. difficile. No entanto, para cada doente e sua situação clínica deve ser analisada a relação risco/benefício para a implementação desta medida [17,4]. Num estudo de Cook et al., (1998), 1200 doentes críticos ventilados receberam aleatoriamente sucralfato ou ranitidina, sendo que o surgimento de hemorragia digestiva foi menor nos doentes receberam ranitidina, embora não tenha havido diferenças significativas entre a incidência de PAVM, taxa de mortalidade ou a duração do internamento. Por sua vez a ranitidina, em relação ao omeprazol, teve uma incidência de PAVM consideravelmente superior num estudo envolvendo 67 do- entes (31% contra 6%, P<0,05) [9]. Com efeito, os agentes profiláticos mais recomendados atualmente são os inibidores da bomba de protões (ex: omeprazol, pantoprazol), preferencialmente via endovenosa. Estes fármacos tendem a propiciar um melhor controlo do pH do gástrico que os agentes antagonistas dos recetores H2 de histamina (ex: ranitidina) e, segundo o autor, a evidência disponível indica que eles demonstram que são tão eficazes quanto a ranitidina [17,10]. Note-se, ainda, que o sucralfato, que durante muito tempo foi o fármaco de eleição para a prevenção da úlcera péptica, não demonstra diferença significativa nas taxas incidência de PAVM, taxa de mortalidade ou demora de internamento [15]. CONSIDERAÇÕES FINAIS A IACS representa atualmente uma problemática preponderante no panorama da saúde nacional e mundial. Os índices de incidência das infeções nosocomiais constituem um indicador da qualidade dos cuidados prestados, sendo que, qualquer profissional de saúde em contato com o doente, não deve negligenciar a sua prática, protagonizando atitudes orientadas no sentido da prevenção e controlo da infeção. A ventilação mecânica é, sem dúvida, um método de suporte ventilatório primordial e indispensável em doentes críticos, cuja função respiratória está comprometida por lesão primária ou associada. Contudo, os riscos inerentes a esta prática são significativos e o enfermeiro assume um papel decisivo na avaliação do risco de PAVM, devendo considerar o estado clínico do paciente e terapêuticas instituídas na implementação de cuidados proficientes e em concordância com as linhas orientadoras mais atuais, de forma a minimizar a transmissão e disseminação de microrganismos. Ressalte-se que as ambiguidades e contrariedades por vezes encontradas para esta temática, entre os diversos estudos e autores, dificultam a estratificação das medidas enunciadas quanto à sua importância na prevenção da PAVM. No entanto, pode concluir-se que a instituição da ventilação mecânica invasiva confere riscos elevados sob o ponto de vista da IACS. Como autores esperamos que, para além do suporte científico, este artigo contribua para uma reflexão e veículo de mudança, no sentido de orientar a atuação dos enfermeiros para a excelência cuidativa na prevenção das IACS, possibilitando que os doentes tenham acesso ao principal direito que lhes assiste: melhores cuidados de saúde. 25 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFIAS 1.Hospital Santa Maria, (2002), Prevenção da Infecção Respiratória Nosocomial. Comissão de Controlo de Infecção Hospitalar, http://www.hsm.minsaude.pt/contents/pdfs/CCIH/Inf._respiratoria.pdf. Acedido em 7 de Janeiro de 2013. 2.Ducel, G. et al., (2002), Prevenção de Infecções Adquiridas no Hospital: Um Guia Prático. Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge, 2ª Edição, http://www.bvsde.ops-oms.org/bvsacd/cd49/man_oms.pdf. 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Acedido em 7 de Janeiro de 2013. 26 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL (AVC) ATITUDES NA EMERGÊNCIA NEUROLÓGICA João Pedro Oliveira Valente Daniel Jorge Oliveira Valente resumo De acordo com os dados da Direção Geral da Saúde, em Portugal, o Acidente Vascular Cerebral permanece como a principal causa de morte bem como a principal causa de incapacidade na terceira idade. É imperioso tentar travar esta tendência. É de importância fulcral que a abordagem ao AVC isquémico seja simultaneamente célere e eficaz. “Tempo é Cérebro”, por isso o AVC é considerada uma emergência médica neurológica. [1] Após décadas de investigação, são conhecidos alguns dos fatores basilares deste problema e as suas diversas vertentes preventivas. Os mais recentes progressos levaram à aprovação e disseminação da terapêutica trombólitica (fator Ativador do Plasminogénio Tecidular Recombinante (rt-PA), em simultâneo com a criação de infraestruturas específicas de apoio ao doente com AVC. Surgem novos conceitos, estruturas e metas, Via Verde AVC, Unidades de AVC, Escala de NIHSS e toda uma multi-evidência dinâmica de ações urgentes/emergentes no cuidado ao doente com AVC, com objetivo único de iniciar precocemente o tratamento, neuroreabilitação, reduzindo a incapacidade funcional e as complicações pós-AVC. PALAVRAS CHAVE: Acidente Vascular Cerebral; Emergência Neurológica; Via Verde AVC; Trombólise; Cuidados Intensivos Acidente Vascular Cerebral… O Problema O acidente vascular cerebral (AVC) constitui a segunda causa de morte em todo o mundo, contribuindo com aproximadamente 5 milhões de mortes/ano e cerca de15 milhões de acometidos não fatais. Estima-se que existam 50 milhões de sobreviventes de AVC e AIT (acidente isquémico transitório), muitos dos quais (1 em cada 6 doentes) terão recorrência de novo AVC ou AIT nos 5 anos próximos ao evento. [2,3] Em Portugal, o AVC constitui a primeira causa de morte, representando 20% da mortalidade global do território nacional, com mais de 21000 mortes/ano, nas idades compreendidas entre os 35-70 anos. As estatísticas atuais são preocupantes… no entanto, mais preocupante é que a prevalência e incidência do AVC tendem a aumentar no futuro. [2,3] Além da grande mortalidade, tal condição clínica acarreta forte morbidade com perda funcional associada, surgimento de dependência parcial ou mesmo total com os elevados e consequentes custos diretos ou indiretos. O AVC é hoje, a principal causa de incapacidade nas pessoas com idades superiores aos 65anos. [4] A melhoria da acessibilidade aos cuidados médicos e dos próprios cuidados, o avanço contínuo do tratamento das doenças cardiovasculares, com o consequente aumento da sobrevida, resultou num aumento substancial da população idosa. Estima-se que no ano 2030 existam cerca de 300 milhões de pessoas com mais de 75 anos de idade! Contudo os factores de risco do AVC, apesar de bem identificados, parecem estar “fora de controlo”. O aumento contínuo da incidência do AVC vai ter, com certeza, ainda maior impacto social e económico na nossa população. O AVC constitui hoje e no futuro um grave problema de saúde. É imperioso tentar travar esta tendência… [2,3] DIAGNÓSTICO DE ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL O diagnóstico clínico de AVC deve ser considerado sempre que um paciente apresentar início súbito de défice neurológico focal, com ou sem alteração do nível de consciência. Note-se que o erro na interpretação dos sinais e sintomas do doente com AVC pode impedir o diagnóstico, levando, consequentemente, a um tratamento inadequado. O primeiro objetivo é, portanto, confirmar se os sintomas focais que o doente apresenta são, de facto, resultantes de AVC e não de outro distúrbio neurológico ou sistémico pelo que é necessário obter uma completa história clínica e fazer uma exploração objetiva, com particular ênfase para a componente neurológica. [5] Na anamnese, é essencial definir a hora exata em que surgiram os sintomas (na sua impossibilidade, assume-se a hora da última vez em que doente foi visto sem défices), a forma como surgiram (início súbito ou progressivo), se houve alteração do estado de consciência e os sintomas propriamente ditos. Também é relevante excluir outras situações clínicas, como traumatismos, cirurgias, enfartes do miocárdio e AVC prévios, bem como inquirir terapêuticas habituais, nomeadamente anti-agregantes e anticoagulantes orais. Se o doente se encontrar afásico, confuso ou inconsciente, as informações devem ser obtidas por via de familiares, além da informação fornecida pelas equipas de emergência pré-hospitalar. [6] Devem determinar-se os sinais vitais, proceder-se à exploração física, exame da pele, extremidades, abdómen e avaliação cardíaca, englobando uma atenta ausculta27 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 ção. Quanto ao exame neurológico, o mesmo deve incidir na pesquisa défice focal neurológico súbito como disartria, hemianopsia, diplopia, parestesia ou défice motor em membro superior e vertigem, visto que estes constituem os sintomas mais prováveis para o diagnóstico de acidente isquémico transitório e AVC, quando não associados a traumatismo. A presença de défice neurológico leve ou a ausência de défice motor, quando associada à ausência de fatores de risco vascular num doente com um quadro clínico progressivo não afasta o diagnóstico de AVC, contudo exige um exame diferencial mais criterioso, além de uma possível consulta por neurologista. O AVC isquémico que envolve o território carotídeo pode manifestar-se com isquémia a nível da retina e encéfalo ao qual se associam défices de funções corticais como a afasia, défice motor e/ou sensitivo. Já o AVC isquémico do sistema vértebro-basilar pode remeter para sintomas vestíbulos-cerebelares (vertigem, ataxia), anomalias na movimentação ocular (diplopia) e défice motor e/ou sensitivo unilateral ou bilateral, além das alterações visuais, como hemianopsia. O quadro clínico é determinado pela localização e tamanho da lesão encefálica.[6,7] Após a anamnese é fulcral a realização de exames complementares de diagnóstico para diferenciar o tipo de AVC, dado que um enfarte cerebral obedece a uma linha de tratamento diferente da de uma hemorragia cerebral. A tomografia computorizada crânio-encefálica (TC-CE) sem contraste é o exame de primeira linha pois permite determinar com boa acuidade o tipo de AVC (embora nas primeiras horas do AVC, a área de isquémia possa não se visualizar convenientemente - principal limitação da TC, a presença de hemorragia é quase sempre visível). Já a ressonância magnética (RM) é relativamente insensível às alterações de isquémia aguda nas primeiras horas a seguir ao AVC. A implementação de exames radiológicos permite igualmente despistar patologias com sintomatologia neurológica análoga à do AVC, tais como tumores cerebrais, doenças desmielinizantes, encefalopatias hipertensivas, entre outras. Um eletrocardiograma (ECG) também deve fazer parte da avaliação de todos os doentes com AVC, uma vez que arritmias (Ex: fibrilação auricular) e enfarte agudo do miocárdio podem constituir causa de AVC. Relativamente aos testes sanguíneos, estes devem incluir uma contagem completa das células sanguíneas, a glicémia (hipoglicémia pode induzir a depressão do nível de consciência com défice neurológico focal, além de que sinais e sintomas de AVC com hiperglicémia está associado a um prognóstico desfavorável), ionograma, provas de função renal (ureia e creatinina), tempo de protrombina/International Normalized Ratio (INR) e tempo de tromboplastina parcial ativado, bem como biomarcadores cardíacos, para determinar lesão miocárdica. Se o quadro clínico assim o justificar, podem ser necessários outros exames para exclusão de patologias, designadamente a ultrassonografia doppler transcraniana, a angiografia por RM e por TC, o ecocardiograma e a ultrassonografia carotídea e vertebral, contudo não são considerados exames de carácter urgente. [6,7] A decisão terapêutica deve, idealmente, ser formulada num período de 60 minutos, pelo que a realização de TC deve acontecer nos primeiros 25 minutos e o seu resultado deve estar disponível após 20 minutos (45 minutos como limite máximo desde a chegada ao Serviço de Urgências) Relativamente ao ECG, nenhum timing se encontra definido. As análises, por sua vez, devem ser realizadas o mais precocemente possível, mas a instituição do tratamento não deve ser protelada enquanto se aguardam os resultados, a não ser que haja uma suspeita forte de distúrbios da coagulação ou o doente se encontre sob o efeito de anticoagulantes orais com elevado risco hemorrágico, como a varfarina ou heparina. [6] AÇÕES URGENTES/ EMERGENTES NO CUIDADO AO DOENTE COM AVC Nas suas mais diversas formas o AVC constitui uma emergência neurológica. Idealmente, recomenda-se que o doente acometido de AVC seja encaminhado da forma mais célere para uma Unidade de AVC uma vez que a perda de tempo na abordagem destes doentes é sinónimo de pior evolução. É aconselhável assim o desenvolvimento de Unidades de AVC em todos os centros hospitalares em que seja comum o atendimento a doentes com AVC.[8] Organizam-se em seguida de forma sucinta e clara as ações urgentes/ emergentes ao doente com AVC na sua fase aguda. A informação redigida tem por base estudos científicos, ensaios clínicos, meta-análises e várias publicações especializadas na temática, sendo mencionado o grau de recomendação da informação e força de evidência, de acordo com o Quadro1. - Controle da Pressão Arterial Estima-se que em cerca de 50 a 80% dos doentes com AVC, exista hipertensão arterial (HTA), contudo a necessidade do seu controlo é bastante controversa, uma vez que tem sido descrito algum grau de deterioração neurológica com o uso de agentes anti-hipertensivos (D). [8] Os estudos científicos recomendam nos casos de HTA leve/ 28 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIORO 2013; 32:2-53 Quadro 1 - Graus de recomendação e força de evidência ciêntifica Fonte: Gagliardi, et al, (2001), Tratamento da Fase Aguda do Acidente Vascular Cerebral, Projeto Diretrizes [8] moderada, o mínimo tratamento na fase aguda do AVC isquémico, ressalvando o facto que não existem estudos randomizados que permitam firmar definitivamente tal conduta (D). Já nos casos de HTA grave (pressão arterial (PA) sistólica >220 mmHg ou PA diastólica >120 mmHg ou PA média >130 mmHg), o controlo deve ser feito de modo bastante cauteloso, uma vez que é possível ocorrer agravamento do quadro neurológico em consequência de resposta hipotensora excessiva. Nos doentes com hemorragia intracerebral, deve-se evitar que a PA sistólica >180 mmHg e que a PA diastólica >105 mmHg, recomendandose nestas situações a utilização intravenosa de beta bloqueadores como o metoprolol e nitroprussiato de sódio em perfusão contínua (D). A terapêutica por via oral também pode ser utilizada, com preferência para os inibidores da enzima conversora da angiotensina e betabloqueadores. Fármacos que possam causar queda brusca e imprevisível da pressão arterial, tais como os bloqueadores de canais de cálcio por via sublingual e os diuréticos de ansa, devem ser evitados. [8] Apesar de incomum na fase aguda do AVC, casos de hipotensão arterial podem ter efeitos deletérios sobre os défices neurológicos, devendo sempre ser evitada. O combate à hipovolémia e à falência cardíaca são medidas prioritárias nessa situação (D). [8] Perante o exposto, assume-se que a monitorização constante dos níveis de pressão arterial nesta fase aguda do AVC isquémico deve ter especial relevo. [8] - Controle da Glicemia Nos estudos analisados existe relativo consenso de que valores de glicémia superiores a 120 mg/dl são deletérios na fase aguda do AVC, independentemente da idade do paciente ou da extensão e tipo do AVC (B). A Diabetes Mellitus pode piorar o prognóstico do AVC, pelo fato de favorecer o desenvolvimento de complicações clínicas no curso da doença. Contudo, não há evi- dência direta de que o controle estrito da glicemia com insulinoterapia nos primeiros dias altere a sua evolução clínica a curto ou longo prazo (D). [8] Na fase aguda do AVC, recomenda-se a pesquisa de eventual Diabetes Mellitus em todo o doente que apresente valores de hiperglicemia. A monitorização da glicemia nas primeiras 48 a 72 horas é também importante, em regime mais intensivo nos doentes com hiperglicemia grave, história prévia de diabetes insulinotratados ou hipoglicemia (B). [8] Na fase aguda do doente com AVC, até que estejam reunidas mais informações relativas ao doente, não é recomendável a utilização de insulina em perfusão contínua, sugerindo-se a administração de doses isoladas de insulina sempre que os níveis glicémicos ultrapassem os 180mg/dl (B). [8] - Controle da Temperatura Existe evidência científica relativamente ao facto de temperaturas corporais elevadas exacerbarem a lesão neurológica na vigência de isquemia cerebral (D). Assim sendo a hipertermia corporal deve ser alvo de controlo imediato. [8] No que concerne à hipotermia moderada induzida (3334°C), esta tem sido utilizada como abordagem terapêutica para diminuição do edema cerebral (B), contudo deve ser realizada somente em unidades de tratamento intensivo e efetuada por profissionais especializados (C). [8] - Antiagregação Plaquetária O fármaco de eleição para a promoção da antiagregação plaquetária é o ácido acetilsalicílico (AAS), pelo baixo custo, rápido início de ação e por ser o único antiagregante testado clinicamente no tratamento da fase aguda do AVC (200mg a 500mg de AAS/dia). (A) [8] O grupo “Antithrombotic Trialists Collaboration”, na sua última meta-análise, refere que a terapêutica antiplaquetária protege os doentes contra a recorrência dos eventos vasculares e que esta terapêutica deve ser iniciada de forma precoce durante a fase aguda do AVC isquémico e com carácter contínuo. Este grupo recomenda o Clopidogrel, como fármaco alternativo para os doentes que apresentem contra-indicação clínica para a administração do AAS (A). [9] - Anticoagulantes: Heparina O uso de anticoagulantes na fase aguda do AVC é algo controverso na literatura. Em casos de AVC Isquémico Arterial, não existem estudos definitivos que demonstrem a pertinência do uso da heparina sobre a evolução clínica do doente (D). [8] No caso específico dos doentes acometidos de AVC 29 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 Isquémico Venoso, recomenda-se o uso da heparina na fase aguda (heparina 5000 UI/ml - Dose de ataque: 1 a 2 ml IV. Dose de manutenção: 1 ml IV de 4/4h ou 1,2 ml diluídos em 120 ml de SF 0,9% IV contínuo a 20cc/h (D). No caso da utilização da HBPM (Heparina de baixo peso molecular), a opção deve recair na Nadroparina 0,6 ml/SC·12/12h ou Enoxaparina 60 mg/SC 12/12h, com manutenção por três semanas, seguido por anticoagulante oral (D). [8] e mantido por um período de 5 a 10 dias (B). [8] Os casos de menor severidade não necessitam desta terapêutica (B). A administração de antiedematosos merece ainda especial atenção nos doentes com insuficiência cardíaca, renal e diabetes, devendo a sua utilização estar contraindicada (A). [8] NIHSS - NATIONAL INSTITUTE OF HEALTH STROKE SCALE - Trombolíticos O uso do Alteplase - fator ativador do plasminogénio tecidular (rtPA) é um fármaco seguro e eficaz, com resultados significativos, quando administrado ao doente nas primeiras 3 horas de evolução clínica sintomática (A). [8,10] Na sua administração deve ser respeitada a dosagem de 0,9 mg/Kg de peso corporal, até um máximo de 90 mg/ doente (de acordo com valores tabelados) devendo esta ser subdividida em duas fases, um bólus inicial de 10% da dose total durante 1 a 2 minutos, ao qual se segue um pequeno intervalo de 3 a 5 minutos para avaliação da ocorrência de eventuais reações alérgicas, e por fim, os restantes 90% em perfusão contínua durante 60 minutos. [8,10] Na administração do Alteplase deve ter-se em linha de conta alguns alertas a ter em consideração no período pré e pós tratamento, nomeadamente a monitorização de parâmetros vitais, em particular da PA, a assistência imediata em caso de hemorragia sintomática após a administração do rt-PA, e cuidados acrescidos relativos a alguns procedimentos invasivos (algaliação, entubação naso-gástrica, cateterização de veia ou artéria), evitando efetuá-los nas primeiras 24horas pós administração trombólitica. [8,10] - Neuroproteção Apesar das evidências experimentais de sucesso com este grupo de fármacos, o mesmo não se tem verificado em ensaios clínicos, não se evidenciando benefícios no seu uso clínico (B). Contudo as recomendações relativas à instituição de neuroprotecção na fase aguda do AVC assentam essencialmente na prevenção da hipertermia, com o uso de paracetamol 500mg de 6 em 6 horas (B), bem como no diagnóstico precoce das infeções e respetiva intervenção eficaz (B). [8] - Antiedematosos O edema cerebral constitui a principal causa de complicações e óbito após o AVC (D). O seu controlo é controverso! Contudo, há evidências de benefícios no uso de terapêutica hiperosmolar (glicerol e manitol) (D). Na fase aguda do AVC, o tratamento deve ser instituído o mais precocemente possível Quadro 2 - NIHSS - National Institute Of Health Stroke Scale Fonte: Adaptado de Adams, R.J. et al, (2008), Update to the AHA/ASA Recommendations for the Prevention of Stroke in Patients with Stroke and Transient Ischemic Attack, AHA/ASA Science Advisory, pp. 1059 A gravidade do AVC baseada nos achados neurológicos constitui um indicador prognóstico. De entre várias escalas de avaliação, a NIHSS, desenvolvida pelo National Institute of Health, tem ganho algum destaque, sendo 30 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 atualmente a mais utilizada em Portugal. [11] A NIHSS é um instrumento de uso sistemático, aplicado por médicos ou enfermeiros, que permite uma avaliação quantitativa dos défices neurológicos relacionados com o AVC na sua fase aguda, prevendo o tamanho da lesão e sua gravidade. Permite a determinação do tratamento mais apropriado e a previsão do prognóstico do doente a curto e a longo prazo. Adicionalmente, a escala serve para monitorizar o estado do doente, enfatizando a sua utilidade no planeamento dos cuidados.[11] São 11 os itens de exame neurológico contemplados pela NIHSS, cada um deles mensurável de acordo com o défice apresentado (Quadro 2). Segundo o NIH, 60 a 70% dos doentes com AVC isquémico e um score inferior a 10 na NIHSS, apresentam um prognóstico favorável ao fim de um ano. Por outro lado, aqueles que somam um valor superior a 20, só 4 a 16% evidenciaram uma boa recuperação. Para além do valor prognóstico, a NIHSS revela-se uma ferramenta útil para quantificar o risco de hemorragia intracraniana associada à trombólise. Um score igual ou superior a 20, aumenta o risco de hemorragia em 17%, quando comparado com valores inferiores a 10.[11,12] VIA VERDE DE ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL A Via Verde de AVC consiste numa estratégia organizada para a abordagem, encaminhamento e tratamento mais adequado de situações clínicas frequentes e/ou graves que importam ser especialmente valorizadas pela sua importância na saúde das populações. Neste contexto focamo-nos na Via Verde de AVC. [13] Este sistema de assistência processa-se mediante dois tempos: pré-hospitalar e intra-hospitalar. A nível pré-hospitalar pretende-se a recolha e transporte urgente para a unidade hospitalar adequada, preferencialmente por unidades móveis de elevada operacionalidade e competência técnica como é o caso das viaturas médicas de emergência e reanimação (VMER). Por sua vez, a nível intra-hospitalar, a Via Verde permite facilitar ao doente com AVC o acesso à terapêutica fibrinolítica, objetivando reduzir o tempo porta-agulha, isto é, o período de tempo que decorre entre o diagnóstico do AVC e o início da administração do protocolo de rt-PA. [13,14] Para a redução do tempo porta-agulha é necessário agilizar toda a dinâmica funcional inerente à Via Verde. Deve apostar-se na formação permanente do pessoal que presta serviço em urgências, deve ser tida em atenção a frequência de rotação das equipas de urgência e seus constituintes. Deve existir, por parte do CODU ou siste- ma equivalente, comunicação prévia da chegada do doente ao hospital para que o pessoal adstrito à Via Verde possa preparar a admissão ao doente no que concerne aos procedimentos clínicos e administrativos, em articulação com o laboratório, serviço de radiologia e unidade de AVC. [13] UCIP - ULSCB, CASUÍSTICA DE 2012 Durante o ano 2012 foram admitidos na Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente (UCIP) do Hospital Amato Lusitano, 11 doentes pela Via Verde AVC, todos eles com critérios de inclusão para protocolo de fibrinólise com Alteplase. 68,9 anos foi a média de idades dos doentes admitidos, sendo que 54,4% dos admitidos pertencem ao sexo feminino. A presença de co-morbilidades nos doentes admitidos é quase transversal, sendo que a hipertensão arterial, diabetes mellitus, dislipidemia e obesidade são os fatores de risco mais presentes. Antecedentes de AVC e hábitos etanólicos estão também presentes nalguns casos. Constatamos que da totalidade das admissões, apenas 2 casos obtiveram assistência préhospitalar pela equipa da VMER. Todos os restantes chegaram ao Serviço de Urgência em ambulância de socorro ou veículo próprio conduzido por familiares. Relativamente ao período de evolução após início de quadro clínico até à administração da terapêutica fibrinolítica, conseguiu-se uma média de 3 horas. Todos os doentes admitidos foram submetidos ao Protocolo de Alteplase com 1 minuto de dose carga e 59 minutos com dose de manutenção, ajustada ao peso estimado de cada doente. Para nenhum dos doentes houve complicações pós-fibrinólise à excepção de 1 caso com evolução para hemorraiga cerebral extensa. No que concerne à avaliação com a NIHSS, observa-se um score médio de 20,8 à admissão na UCIP. Em nenhum dos doentes, houve evolução desfavorável do score durante a administração do fibrinolítico. O score médio para os 11 doentes à saída da UCIP é de 11,25. Por fim, observou-se um período médio de 3,54 dias de internamento na UCIP destes 11 doentes da Via Verde AVC, tendo sido a totalidade transferida para a Unidade de AVC do HAL ou Serviço de Medicina Interna (por ausência de vaga na Unidade de AVC). CONSIDERAÇÕES FINAIS O AVC é, de forma indubitável, um “ûagelo” da humanidade. Apesar dos esforços desenvolvidos nas últimas décadas, a incidência desta patologia tem vindo a au31 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 mentar, fruto do aumento da esperança de vida, repercussão natural do crescimento da população idosa, o principal grupo etário atingido. Note-se que, para além da enorme mortalidade, as suas sequelas são frequentes e as suas repercussões a nível familiar, social e económico, inestimáveis. Dos doentes que são vítimas de um AVC, 80% atingem o melhor nível funcional às seis semanas, 90% atingemno após 12,5 semanas (3 meses). Por sua vez, após um período de 3 meses, torna-se irrealista esperar significativa melhoria funcional ou neurológica, sendo que apenas 5% dos doentes farão algum progresso a partir desta altura. Após terminado o programa de reabilitação, 20% ficarão com incapacidade grave, 8% com incapacidade moderada, 26% com ligeira incapacidade e 46% ficam independentes nas suas atividades de vida diária. Uma percentagem próxima dos 50% retomará uma profissão ou manterá as atividades habituais. [15] Reconhecendo, assim, o AVC como uma emergência neurológica, é imperioso minimizar as suas consequências após acometido o evento. Preconiza-se, portanto, a necessidade de uniformizar a abordagem a este tipo de doentes, que se pretende rápida, organizada e devidamente fundamentada a nível científico. Ao nível dos cuidados diferenciados, onde é cuidada a fase aguda, é imperioso o investimento na formação e criação de protocolos que facilitem um rápido diagnóstico e permitam uma criteriosa seleção dos doentes a utilizar a Via Verde e a aceder à terapêutica trombolítica. Neste sentido é também pertinente melhorar o circuito interno adotado na admissão do doente, desde os timings de realização da TC-CE, análises laboratoriais, ECG, até à transferência para a Unidade de AVC e respetiva monitorização. É importante que quando os resultados dos exames complementares de diagnóstico são conhecidos, já o doente esteja totalmente preparado para receber a terapêutica trombolítica - minimização do tempo porta-agulha. No que concerne ao próprio protocolo de terapêutica trombolítica, devem otimizar-se alguns aspetos de forma a melhorar os seus resultados, nomeadamente o registo de todos os dados relativos ao doente nos processos clínicos, designadamente a hora de início dos sintomas. Para tal, é necessário um crescente envolvimento das equipas prestadoras de cuidados, assim como de melhor apoio por parte dos Serviços de Imagiologia, no que concerne à interpretação da neuroimagem. Importa, ainda, realçar que doentes com AVC benefici- am de uma avaliação neurológica seriada segundo a escala de NIHSS, pelo que a mesma deve ser incluída na abordagem ao doente, como se constatou, além de ser a mais aceite internacionalmente, permite também averiguar a evolução do estado neurológico ao longo do tempo, bem como aferir o prognóstico. Quanto ao sistema da Via Verde, sugere-se o alargamento do seu espetro de ativação a todos os doentes com défices neurológicos súbitos e não só àqueles que, teoricamente, sejam candidatos à trombólise. Desta forma todos poderão beneficiar de assistência e tratamentos precoces, sejam, estes trombolíticos ou apenas conservadores. Relembre-se que o AVC é uma emergência! No que respeita à esfera preventiva do AVC, esta jamais deve ser ignorada, pelo que é fundamental que da parte dos profissionais de Cuidados de Saúde Primários se reforçe que a prevenção deve começar desde o início do ciclo vital, bem como promoverem orientações para a minimização dos fatores de risco cardiovasculares, com destaque para a hipertensão arterial e dislipidémia. Importa, portanto, ao nível da prevenção primária, estabelecer como pressão arterial padrão valores na ordem dos 120/80 mmHg e níveis de LDL-C inferiores a 100 mg/dl, sobretudo em doentes de alto risco cardiovascular, promovendo hábitos alimentares e de atividade física saudáveis bem como exclusão de consumos nocivos. 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Fábio, S.R. et al, (2001), Tratamento da Fase Aguda do Acidente Vascular Cerebral, Projeto Diretrizes - Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina, Academia Brasileira de Neurologia, pp.3-7. 9.Antithrombotic Trialists Collaboration, (2002), Collaborative meta-analysis of randomizaed trials of antiplatelet therapy for prevention of death, myocardial infarction, and stroke in high risk patients - BMJ 321, pp.71-86. 10.Rocha, S.I., (2008), Doença Cerebrovascular Isquémica Aguda, Avaliação de Protocolo de Trombólise - Unidade de Acidentes Vasculares Cerebrais - Centro Hospitalar Cova da Beira, E.P.E., pp.53-56. 11.National Institute of Health, (2010), NIH Stroke Scale, http:// www.nihstrokescale.org/portuguese.shtml; Acedido em 22 de 2013. 12.Adams, R.J. et al, (2008), Update to the AHA/ASA Recommendations for the Prevention of Stroke in Patients with Stroke and Transient Ischemic Attack, AHA/ASA Science Advisory, pp. 1059. 13.Alto Comissariado da Saúde, (2007), Coordenação Nacional para as Doenças Cardiovasculares, Recomendações Clínicas para o Enfarte Agudo do Miocárdio (EAM) e o Acidente Vascular Cerebral (AVC) - Vias Verdes do EAM e do AVC, ISBN:978-989-95146-2-1, pp.23-58. 14.Administração Regional de Saúde do Norte, (2009), Via Verde AVC na Região Norte, pp 1-2, http://portal.arsnorte.min-saude.pt/portal/page/portal/ A R S N o r t e / C o n t e % C 3 % B A d o s / F i c h e i r o s / Via%20Verde%20AVC%20na%20Regi%C3%A3o%20Norte.pdf; Acedido em 27 Fevereiro de 2013. 15.Direcção-Geral da Saúde, (2001), Unidades de AVC - Recomendações para o seu desenvolvimento, ISBN: 972-9425-97-3, pp. 5-8. NUTRITION DAY IN INTENSIVE CARE UNIT A IMAGEM ESTATÍSTICA DA UNIDADE DE CUIDADOS INTENSIVOS POLIVALENTE UNIDADE LOCAL DE SAÚDE DE CASTELO BRANCO Fernando José Freixo Micaelo João Pedro Oliveira Valente Olinda Maria Cebola Monsanto Gonçalves Roberto Miguel Gonçalves Mendes Sandrina Rodrigues Duarte Resumo O suporte nutricional integra todo um conjunto de cuidados diferenciados prestados ao doente crítico. Com a finalidade de minimizar um défice nutricional já existente, ou com o intuito de prevenir o seu aparecimento, o suporte nutricional tem especial importância para os profissionais que integram as unidades de cuidados intensivos. O estudo multicêntrico Nutrition Day in European Hospitals permite a auditoria ao estado nutricional dos doentes e respetivos cuidados nutricionais desenvolvidos nos hospitais e com carácter mais específico nas unidades de cuidados intensivos, no sentido de se criar uma base de dados que permita a implementação de estratégias que visem a redução da prevalência da malnutrição. Nos últimos 4 anos, a Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente do Hospital Amato Lusitano - Unidade Local de Saúde de Castelo Branco tem participado no projeto Nutrition Day, procurando conhecer a realidade do suporte nutricional, comparando-a com as unidades de referência a nível europeu. PALAVRAS CHAVE:Suporte Nutricional; Nutrição; Nutrition Day; Unidade de Cuidados Intensivos NUTRITION DAY - DO PROJETO AO ESTUDO MULTICÊNTRICO O projeto Nutrition Day (ND) inicialmente intitulado de ND in Europe surge no ano 2005 no seguimento da Resolução do Conselho Europeu sobre Alimentação e Cuidados Nutricionais nos Hospitais (ResAp 2003). Especificamente, esta resolução é sustentada pelos efeitos benéficos que os cuidados nutricionais apropriados têm na recuperação e na qualidade de vida e pelo número inaceitável de doentes desnutridos (entre 30 a 50%) em hospitais europeus [1,2]. Presentemente sabe-se que a malnutrição hospitalar leva a um aumento do tempo de internamento e de reabilitação, e consequentemente a um aumento dos custos associados ao tratamento, assim como a uma diminuição da qualidade de vida [1,2]. O ND constitui assim um projeto desenhado por uma rede de peritos que tem por objetivo primordial aumentar a consciência dos problemas associados com a nutrição dos doentes hospitalizados, através da identificação das principais barreiras que comprometem uma ingestão alimentar adequada. Pretende de igual forma aumentar o conhecimento da situação alimentar e nutricional nas instituições de saúde e disponibilizar dados que permitam comparar unidades nacionais e internacionais [3]. Na sua essência, o ND consiste num estudo multicêntrico, 33 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 transversal, cuja primeira fase tem a duração de um dia, em que se audita o estado nutricional dos doentes e dos cuidados alimentares e nutricionais prestados em ambiente hospitalar. O 2º momento corresponde à avaliação dos “outcomes”, 60 dias depois do dia da recolha de dados. No dia estipulado para o ND são aplicados quatro tipos de formulários, um de caracterização da unidade, onde se avaliam os recursos humanos disponíveis, nº de camas, especialidades médicas e a existência de protocolos de nutrição, dois formulários aplicados aos doentes cuja finalidade é a caracterização do estado nutricional e avaliação do aporte alimentar numa das refeições do dia previamente definida, e um 5º formulário para avaliação do desfecho nutricional, 60 dias após a auditoria ND. Desta forma, é possível identificar o doente desnutrido, os motivos que conduziram à sua desnutrição durante a sua hospitalização e a sua situação 60 dias depois.[4] Existem inquéritos específicos para doentes internados em Enfermarias, Cuidados Intensivos e Lares, sendo que a aplicação nas duas últimas vertentes apenas se iniciou no ano 2007. Os intervenientes na recolha da informação são responsáveis pelo envio informático de todos os dados, para o centro de coordenação na Áustria, através de uma plataforma disponível no website do ND - http://www.nutritionday.org/[5,6,7,8] O ND tem o apoio da European Society for Clinical Nutrition and Metabolism (ESPEN), American Society for Parenteral and Enteral Nutrition (ASPEN) e da Associação Portuguesa de Nutrição Entérica e Parentérica (APNEP), todas elas, conceituadas organizações no âmbito nutricional. Atualmente, a equipa de coordenação e planeamento internacional está sediada em Viena de Áustria, liderada pelo Prof. Michael Hiesmayr da Medical University of Viena. No que concerne ao contexto português a coordenação modifica de 2 em 2 anos, assumindo o cargo atualmente a Drª Paula Alves do Instituto Português de Oncologia do Porto - Serviço de Nutrição e Alimentação. A Drª. Sónia Cabral do Instituto Português de Oncologia de Lisboa Francisco Gentil, assume atualmente a responsabilidade pelo ND nas Unidades de Cuidados Intensivos. [5,6,7,8] UCIP- ULSCB E O NUTRITION DAY De acordo com a APNEP é de extrema importância a participação das unidades hospitalares portuguesas neste projeto, pois permite promover a implementação de estratégias que visem a redução da prevalência de malnutrição nos hospitais portugueses. [3] Da nossa prática diária, sabemos que a desnutrição do doente crítico é um fator de risco para um desfecho contrário às nossas expectativas, prolongando o período de internamento em ambiente de cuidados intensivos e, diminuindo consideravelmente a taxa de sobrevivência. O Grupo de Nutrição da Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente (UCIP) do Hospital Amato Lusitano (HAL) - Unidade Local de Saúde de Castelo Branco (ULSCB), unidade com manifesto interesse na área da nutrição participa no projeto “Nutrition Day in Intensive Care Unit” (ND-ICU) à 4 anos sucessivos (2009-2012), apostando numa crescente preocupação no estado nutricional do doente crítico, continuidade da excelência cuidativa e projeção do “bom nome” institucional entre os seus pares europeus. NUTRITION DAY IN ICU (2009-2011) - A IMAGEM ESTATÍSTICA DA UCIP-ULSCB A análise metodológica do ND-ICU engloba todos os doentes presentes nas unidades participantes entre o primeiro turno de enfermagem do dia da auditoria e o do dia seguinte, com inclusão das admissões e altas/transferências nesse período de tempo. São incluídos no estudo todos os doentes com idade igual ou superior a 18 anos. A colheita de dados implica obrigatoriamente o preenchimento dos 5 formulários online, respeitando os prazos estipulados pela coordenação internacional do ND. [5,6,7,8] A análise de dados é realizada no centro de coordenação do projeto ND em Viena de Áustria, sendo os resultados da análise descritiva das variáveis, disponibilizados para cada unidade participante. Nos anos em análise (2009, 2010 e 2011), foram incluídos no ND-ICU 2772 doentes das Unidades de Cuidados Intensivos participantes no estudo, tendo a UCIP-ULSCB participado com a inclusão de 18 doentes nestas 3 auditorias. Toda a análise que se segue é respeitante a esta amostra e tem por base toda a informação enviada pelo Centro de Coordenação Internacional do ND, fazendo a comparação estatística dos dados referentes à UCIP-ULSCB com a média das unidades europeias participantes. [9,10,11] - Estrutura das Unidade de Cuidados Intensivos [9,10,11] Estruturalmente a UCIP do HAL tem uma capacidade de internamento de 8 doentes, possuindo a totalidade das unidades de internamento equipamentos de monitorização e ventilação mecânica específicos para a assistência ao doente crítico. Os resultados do estudo ND, ao longo destes 3 anos (2009, 2010 e 2011) evidenciam que a média das UCI’s europeias participantes, tem uma maior capacidade de internamento (11 a 14 camas/unidade), comparativamente à UCIP-ULSCB (8 camas). Também o rácio enfermeiro/doente, no turno da manhã, acompanha essa tendência, sendo superior à nossa realidade, conforme se verifica na Tabela 1. 34 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 os mais prevalentes nas suas unidades. (Tabela 3) No que concerne ao tópico “doentes ventilados”, verifica-se na UCIP-ULSCB um elevado número de doentes ventilados nos anos 2009 e 2010 do estudo ND, o que traduz a realidade da nossa unidade de cuidados intensivos. A exceção é feita ao ano 2011, uma vez que no dia da auditoria ND não havia nenhum doente sob ventilação mecânica invasiva. (Tabela 3) Tabela 1 - Capacidade de internamento na UCI e número de enfermeiros no turno da manhã. Fonte: Nutrition Day in Europe - Preliminary Unit Report, Nutrition Day in ICU 2009, 2010 e 2011 Dados Demográficos [9,10,11] No que concerne à caracterização demográfica da população da UCIP-ULSCB, comparativamente à população que compõe a média das unidades europeias, não há nada de muito relevante a assinalar. Os nossos doentes têm, nos aspetos avaliados do ND (idade, sexo, altura, peso e índice de massa corporal (IMC), características muito semelhantes à média europeia, salvaguardando apenas uma pequena diferença nos valores do IMC. Curiosamente, o estudo revelou que os doentes internados na UCIP-ULSCB apresentavam estaturas mais altas que a média europeia, traduzindo-se depois em valores de IMC relativamente mais baixos. (Tabela 2) Tabela 2 - Características demográficas dos doentes. Fonte: Nutrition Day in Europe - Preliminary Unit Report, Nutrition Day in ICU 2009, 2010 e 2011 Tipo de Admissão na Unidade de Cuidados Intensivos [9,10,11] Ainda que com algum grau de heterogeneidade, na população da UCIP-ULSCB que integrou o estudo ND (2009, 2010 e 2011) verifica-se um significativo predomínio dos doentes do foro respiratório, com exceção do ano 2011, onde prevalece o doente do foro cardíaco face ao doente respiratório. Já a média das UCI’s europeias participantes, demonstra que os doentes do foro cirúrgico são Tabela 3 - Tipologia prevalente de doentes e ventilação mecânica invasiva nos doentes internados Fonte: Nutrition Day in Europe - Preliminary Unit Report, Nutrition Day in ICU 2009, 2010 e 2011 Scores de Gravidade [9,10,11] O preenchimento dos formulários referentes ao ND envolve duas escalas de avaliação de gravidade dos doentes internados na UCI: SAPS (Simplified Acute Physiology Score) e NEMS (Nine Equivalents of nursing Manpower use Score). Pela análise do estudo, verificamos que a UCIPULSCB apresenta índices preditores de mortalidade ligeiramente mais elevados face à média europeia, nos dias de avaliação ND 2009 e 2010. No ano 2011, pela presença de doentes de menor gravidade, os valores do SAPS e NEMS são ligeiramente inferiores aos obtidos nas UCI’s europeias. (Tabela 4) Tabela 4 - Scores de Gravidade SAPS 2 e NEMS. Fonte: Nutrition Day in Europe - Preliminary Unit Report, Nutrition Day in ICU 2009, 2010 e 2011 Tipos de Dieta [9,10,11] No que concerne aos tipos de dieta providos aos doentes internados nas UCI’s europeias, verifica-se que a totalidade da amostra apresenta uma tendência para a administração de Nutrição Entérica (NE), seguida depois pela dieta oral e finalmente a opção da Nutrição Parentérica Total (NPT). Na UCIP-ULSCB, provavelmente 35 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 devido à baixo amostragem não é possível identificar esta tendência no estudo ND 2009, 2010 e 2011. Contudo, a realidade anual da UCIP-ULSCB não será muito distante da média europeia, uma vez que na generalidade das situações clínicas, é preferencial a administração de NE, quando a via oral não está disponível, reservando a NPT apenas para os casos de contraindicação clínica ou intolerância gástrica. (Gráfico 1) Nutrição Entérica vs Nutrição Parentérica Total [9,10,11] Em ambas as amostras se verifica uma tendência para a administração de NE face à NPT, respeitando desta forma as mais aceites linhas orientadoras internacionais do suporte nutricional. (Gráfico 2) No que respeita ao início precoce da NE, sabemos que esta deverá ter início nas primeiras 24 horas de internamento, desde que estejamos perante um doente estável sob o ponto de vista hemodinâmico, que não se preveja a alimentação oral completa até 3 dias e com ausência de contraindicações à administração de NE [12,13,14]. Os dados estatísticos demonstram isso mesmo, verificando-se na UCIP-ULSCB o início de administração de NE, em média, durante o 1ºdia de internamento e a média das UCI’s europeias, inicia NE ao 2º dia de internamento. (Tabela 6) Gráfico 1 - Tipos de dieta administrados nas UCI’s: Oral, Enteral e Parenteral. Fonte: Nutrition Day in Europe - Preliminary Unit Report, Nutrition Day in ICU 2009, 2010 e 2011 Suporte Nutricional Planeado vs Administrado [9,10,11] No ano 2011 não é possível uma análise real da UCIPULSCB, uma vez que todos os doentes participantes no ND se alimentavam oralmente. Nos anos 2009 e 2010 verifica-se uma curiosa tendência para planear e administrar mais energia (Kcal) aos doentes da UCIP-ULSCB, comparativamente com a média global das unidades participantes do estudo. A realidade vigente alerta para o fato dos doentes em ambiente hospitalar, muitas vezes serem malnutridos. Contudo estes dados mostramnos precisamente o oposto. (Tabela 5) Estaremos a sobrealimentar os nossos doentes ou serão apenas os dados isolados deste dia de auditoria? Gráfico 2 - Nutrição Entérica vs Nutrição Parentérica Total. Fonte: Nutrition Day in Europe - Preliminary Unit Report, Nutrition Day in ICU 2009, 2010 e 2011 Tabela 6 - Início da Nutrição Entérica e Nutrição Parentérica Total. Fonte: Nutrition Day in Europe - Preliminary Unit Report, Nutrition Day in ICU 2009, 2010 e 2011 Efeitos Secundários da Nutrição Entérica [9,10,11] Múltiplos fatores contribuem para a inadequada administração de um volume de NE, frequentemente associados ao aparecimento de complicações que podem surgir devido à administração da mesma. [12,13,14] Os dados obtidos nas auditorias ND (2009-2011) demonstram maior índice de complicações associadas à NE na UCIPULSCB comparativamente à média europeia, sendo que as complicações mais frequentes são a obstipação e estase gástrica. Enquanto Grupo de Nutrição da UCIPULSCB, consideramos que a uniformização de procedimentos é fundamental para a diminuição destes índices, Tabela 5 - Suporte Nutricional Planeado vs Administrado. Fonte: Nutrition Day in Europe - Preliminary Unit Report, Nutrition Day in ICU 2009, 2010 e 2011 tendo elaborado um protocolo/guia de administração de NE e de atuação perante cada uma destas complica- 36 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 ções, instrumento que tem como objetivo primário a diminuição destas complicações na nossa prática diária. (Gráfico 3) Gráfico 3 - Efeitos Secundários da Nutrição Entérica. Fonte: Nutrition Day in Europe - Preliminary Unit Report, Nutrition Day in ICU 2009, 2010 e 2011 Glicemias e Insulinoterapia [9,10,11] No que diz respeito aos itens de avaliação “Glicemias e Insulinoterapia”, verificaram-se na amostra da UCIP-ULSCB níveis médios de glicemia mais elevados (valores superiores a 200mg/dl) que na globalidade da amostra europeia (valores entre 150 - 160mg/dl). De sublinhar a baixa utilização de perfusão contínua de insulina na UCIP-ULSCB nos anos 2009 e 2010, o que poderá explicar os valores de hiperglicemia obtidos. A realidade vigente da UCIP-ULSCB é hoje diferente, com uma tendência crescente para a utilização da insulina em perfusão contínua, objetivando valores target entre os 120 180mg/dl. (Tabela 7) Tabela 7 - Valores glicémicos e Insulinoterapia. Fonte: Nutrition Day in Europe - Preliminary Unit Report, Nutrition Day in ICU 2009, 2010 e 2011. Permanência na Unidade de Cuidados Intensivos e Outcome [9,10,11] As UCI’s na sua generalidade caracterizam-se por terem períodos de internamento bastante longos. Neste aspeto da avaliação, verificamos que os valores médios obtidos, quer na UCIP-ULSCB, quer nas unidades europeias apontam também nesse sentido (5 - 28 dias). (Tabela 8) No que concerne à morte do doente durante o período de internamento na UCI, verificamos que os dados do ND não revelam a nossa realidade anual. No estudo ND 2009, 2010 e 2011, todos os doentes foram transferidos da UCIP para outros serviços (0% morte intra-UCIP). Contudo, a taxa de mortalidade na UCIP-ULSCB é atualmente (ano 2012) de 22%. (Tabela 8) Destaca-se aqui também a elevada taxa de mortalidade após a transferência da UCIP-ULSCB (50%) nos anos 2009 e 2010, comparativamente à média europeia (27,8% 2009 e 27,1% - 2010). São, no entanto valores percentuais que a maioria das UCI’s portuguesas acompanha. (Tabela 8) Tabela 8 - Permanência na Unidade de Cuidados Intensivos e Outcome Fonte: Nutrition Day in Europe - Preliminary Unit Report, Nutrition Day in ICU 2009, 2010 e 2011 CONSIDERAÇÕES FINAIS Vários estudos apontam para a existência de evidência científica, para um certo grau de mal nutrição no doente crítico hospitalizado, e que pode ter consequências adversas, nomeadamente a redução da capacidade ventilatória, perda de força, autonomia, maior morbilidade e mortalidade. [15] Nos doentes malnutridos, observa-se igualmente um maior período de internamento e de custos associados ao seu tratamento. [16] Tendo em conta as inúmeras consequências associadas à malnutrição, é fundamental definir estratégias para reduzir a sua prevalência. O estudo multicêntrico ND tem por objetivo analisar os 37 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 fatores potencialmente implicados na etiologia da malnutrição dos doentes hospitalizados. Objetivamente, a informação obtida neste estudo pode contribuir para a alteração da prática atual, com vista à sua prevenção. A participação no projeto ND, além de fácil, é importante para caracterizar a dimensão real desta problemática no nosso país, além de sensibilizar e consciencializar as equipas multidisciplinares quanto aos principais problemas associados à nutrição do doente internado nas UCI’s. O estudo ND, nos anos 2009, 2010 e 2011 adotado na UCIP-ULSCB representa a imagem estatística referente ao suporte nutricional e seus cuidados inerentes, contudo é relevante a ressalva, de que os dados estatísticos aqui apresentados refletem apenas a realidade de um dia auditado, o dia do ND. Assim sendo, a inferência desta realidade para a globalidade estatística da UCIP deve ser cautelosa! Em suma, o ND é um estudo essencialmente descritivo, que nos permitiu levantar questões relativas ao suporte nutricional dos doentes internados na UCIP-ULSCB. Através dos resultados obtidos, parece-nos evidente a necessidade de melhoria contínua da operacionalidade de alguns cuidados inerentes à nutrição do doente crítico, sobretudo ao nível da monitorização e uniformização de procedimentos práticos dos cuidados nutricionais. A existência de equipamentos específicos, materiais de consumo clínico e diversidade nos suportes nutricionais, poderá igualmente contribuir para esse esforço conjunto. Para além disto, denotamos que a existência de mais estudos vocacionados para aferir a eficácia da intervenção nutricional, poderiam ser muito úteis no contexto da UCIP-ULSCB. A contínua participação da UCIP-ULSCB no projeto ND in ICU e o desejo futuro de continuidade formativa nesta área nobre dos cuidados intensivos vem demonstrar a preocupação da equipa da UCIP no estado nutricional do doente crítico, bem como a vontade em continuar apostar na qualidade do cuidar. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Council of Europe Committee of Ministers, Resolution ResAP(2003)3 on Food and Nutritional Care in Hospitals, Nutrition Day. http://www.nutritionday.org/uploads/media/ Resolution_of_the_Council_of_Europe.pdf. Acedido em 20 Fevereiro de 2013. 2. Beck, A. et al (2002) - Practices in Relation to Nutritional Care and Support - Report from the Council of Europe Clinical Nutrition. 3. Alves, P., (2011) - Nutrition Day - Grupo de Estudo de Desnutrição. Revista da APNEP - Associação Portuguesa de Nutrição Entéria e Parentérica, Vol. V - Nº1 - Abril 2011, ISSN: 1646-7183, pp. 22. 4. Velho, S., (2010) - Dados Nacionais Nutrition Day - Grupo de Estudo de Desnutrição. Revista da APNEP - Associação Portuguesa de Nutrição Entéria e Parentérica, Vol. V - Nº1 - Junho 2010, ISSN: 1646-7183, pp.58. 5. Velho, S., Nutrition Day in European Hospitals - Equipa Multidisciplinar de Nutrição do Instituto Português de Oncologia de Lisboa, Francisco Gentil E.P.E. http://www.apnep.pt/downloads/Nutrition_Day_2006.pdf Acedido em 19 Fevereiro de 2013. 6. Velho, S. et al, Nutrition Day in European Hospitals: Dados Nacionais - Equipa Multidisciplinar de Nutrição do Instituto Português de Oncologia de Lisboa, Francisco Gentil E.P.E. http://www.apnep.pt/downloads/Nutrition_Day_2007.pdf Acedido em 19 Fevereiro de 2013. 7. Velho, S. & silva, E., Nutrition Day in European Hospitals: Resultados Nacionais de 2008 - Equipa de Coordenação Nacional do Instituto Português de Oncologia de Lisboa, Francisco Gentil E.P.E., http://www.apnep.pt/downloads/ Nutrition_Day_2008.pdf Acedido em 19 Fevereiro de 2013. 8. Velho, S., Dados Nacionais Nutrition Day - Equipa de Coordenação Nacional do Instituto Português de Oncologia de Lisboa, Francisco Gentil E.P.E., http:// www.apnep.pt/downloads/Nutrition_Day_2009.pdf Acedido em 19 Fevereiro de 2013. 9. Nutrition Day in Europe, Nutrition Day in ICU 2009, Preliminary Unit Report - Centre:1721, Unit:8696. 10. Nutrition Day in Europe, Nutrition Day in ICU 2010, Preliminary Unit Report - Centre:1721, Unit:8696. 11. Nutrition Day in Europe, Nutrition Day in ICU 2011, Preliminary Unit Report - Centre:1721, Unit:8696. 12. Fernandez, O. et al (2011) - Guidelines for specialized nutritional and metabolic support in the critically-ill patient. Update. Consensus SEMICYUC-SENPE: Indications, timing and routes of nutrient delivery. Nutrición Hospitalaria, ISSN: 0212 1611 26: Suplemento 2, pp.7-11. 13. Kreymann, K. et al (2006) - ESPEN - Guidelines on Enteral Nutrition: Intensive Care. Clinical Nutrition, ISSN 0261 5614. 25: 2, pp. 210223. 14. Mcclave, S. et al (2009) - Guidelines for the Provision and Assessment of Nutrition Support Therapy in the Adult Critically Ill Patient: Society of Critical Care Medicine (SCCM) and American Society for Parenteral and Enteral Nutrition (ASPEN). Journal of Parenteral and Enteral Nutrition, ISSN 0148 6071. 33: 3, pp. 277-316. 15. Cutsem, E. et al (2005) - The causes and consequences of cancer associated malnutrition. European Journal of Oncology Nursing, pp. S51-S63. 16. Chima, E. et al (1997) - Relationship of nutritional status to length of stay, hospital costs, and discharge status of patients hospitalized in the medicine service. Jornal of the American Dietetic Association, pp.975-978. 38 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 GUIA DE ACOLHIMENTO A FAMILIARES NA UNIDADE DE CUIDADOS INTENSIVOS POLIVALENTE - ULSCB MAIS UM CONTRIBUTO PARA A HUMANIZAÇÃO DO CUIDADO Manuela Moleiro Jaime Matos João Valente UCIP do Hospital Amato Lusitano - ULSCB Resumo A saúde e o bem-estar do indivíduo, nos últimos anos, obtiveram ganhos, possibilitando-lhe uma maior e diferente qualidade de vida. Ainda assim, o indivíduo e a família não estão impedidos de vivenciar a experiência da hospitalização. A Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente (UCIP) tem um ambiente sui generis, onde se podem integrar as mais sofisticadas intervenções de carácter médico e de enfermagem, procurando dar resposta a doentes instáveis, em estado crítico e com um grau de risco elevado. A sua condição clínica pode alterar-se de minuto a minuto. Neste contexto, se a Família for integrada e informada, pode ter um papel relevante no apoio psicossocial e afetivo ao doente internado, bem como na continuidade da prestação de cuidados. Uma das principais necessidades da família do doente internado na UCIP é a necessidade de informação. Nesse sentido o “Guia de Acolhimento a Familiares - UCIP” surge como um instrumento de apoio e de informação prestado aos familiares, numa perspetiva humanizadora e de melhor cuidar. Para a Família do doente internado na UCIP, sem prejuízo pelo disposto no regulamento da instituição e na legislação em vigor, sobre o acompanhamento familiar, o “Guia de Acolhimento a Familiares”, desempenha, essencialmente, mais um contributo para a humanização do cuidar. PALAVRAS CHAVE: Família; Humanização; Guia de Acolhimento; Cuidados Intensivos INTRODUÇÃO A família é composta por pessoas em constante interação entre si e o meio, aporta grande significado na vida de cada indivíduo e da sociedade. É o local de excelência onde se estabelecem comportamentos humanos direcionados para a saúde. É no seu seio, através da adaptação às influências do meio envolvente, que se cumprem as funções de proteger, assegurar e restabelecer a saúde dos seus membros. No contexto da família, a identidade individual desenvolve-se e constrói-se em simultâneo com a identidade familiar, com uma história comum na sua origem. Por outro lado, cada família é uma família, que deve ser entendida num determinado contexto cultural, geográfico e socioeconómico. Nesta perspetiva, Segalen (1999) reforça que a “família é um termo polissémico: designa tanto os indivíduos ligados pelo sangue e pela aliança como a instituição que rege esses laços”[1]. O conceito “família” sofreu profundas mudanças sob temporalidades diferentes, sendo que atualmente não existe um único “modelo” de família, mas sim diferentes estruturas familiares. Assistiu-se nos últimos anos, ao desenvolvimento de novas tecnologias e terapêuticas, que garantem ao indivíduo melhoramentos assistenciais, possibilitando-lhe uma maior esperança de vida. Esta evolução não impede de levar o individuo/família a vivenciar a experiência da hospitalização, arredado do contexto familiar, entre equipamentos sofisticados e rostos desconhecidos. É neste contexto, que os enfermeiros procuram desenvolver uma estratégia de intervenção e interação, capaz de melhorar o estado clínico do doente correspondendo às necessidades da família. A equipa de enfermagem, numa unidade de cuidados intensivos (UCI), constitui um espaço em que se cruzam os saberes humanísticos com as tecnologias mais avançadas, cujas intervenções também são objetivadas no sentido de apoiar a família e esta ajudar o doente a superar limitações. Os cuidados de enfermagem consistem no cuidar e no manter o bem-estar físico, emocional, social, espiritual e cultural de um indivíduo assim como da sua família ou da comunidade [2]. FAMÍLIA - PAPÉIS E FUNÇÕES O termo família cobre uma variedade de experiências e relações. Cada família tem a sua história e em cada uma permanece a herança e o património de valores dos seus antepassados, que se vão transmitindo de uma forma mais ou menos clara, não deixando de influenciar a nossa atitude e comportamento. As aprendizagens e aquisições que se fazem nas nossas famílias são também as da cultura em que estão integradas, a qual se difunde ao longo das distintas gerações [3]. Se refletirmos um pouco sobre a família, verificamos que o significado desta palavra se tem alterado de forma mais ou menos intensa ao longo da existência humana. O homem, como ser complexo, global e inacabado que é, 39 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 vai-se construindo e renovando constantemente ao longo da sua vida, durante as diferentes etapas da sua evolução. Cada um de nós descobre-se e constrói-se, conferindo um sentido único à vida, de acordo com a interação com os outros que lhes são significativos em grupos de pertença. A família constitui um destes grupos, uma estrutura dinâmica em constante mudança ao longo do tempo, desenvolvendo-se como um todo. Permite a descoberta das aptidões individuais de cada membro, admitindo e respeitando as diferenças entre cada um, porque é no conjunto destas diferenças que se baseia a diversidade de cada família. É por isso, pertinente perceber como o indivíduo se relaciona e interage com os membros da sua família. Neste sentido, Stanhope (1999) diz-nos que “as tendências actuais do casamento e da família influenciam os tipos de papéis encontrados, o desempenho desses papéis e as funções executadas pela família”[4]. Por “papel familiar”, Stanhope (1999) entende-o como um “procedimento repetitivos aprendidos, através dos quais cada membro cumpre com o que é esperado do seu papel (ex: pai, mãe, irmão/a, outras pessoas significativas)”. Aos pais cabem papéis de liderança, tomando a cargo o sustento e a assistência aos filhos, adotando portanto funções executivas e ocupando o topo da hierarquia familiar [4]. Por parte de toda a família é relevante a noção dos papéis que cada um representa. O carácter destes está relacionado com as tarefas, responsabilidades e expectativas de cada um dos seus membros, mas também com os seus direitos individuais. A segurança e o conforto no cumprimento destes são importantes, tanto para o bem-estar de quem os exerce, como para a obtenção do respeito dos outros. Porém, também o é a disponibilidade para experimentar novos papéis [5]. Certamente não será uma abordagem profunda, mas possibilita a perceção de que “certas funções são desempenhados para manter a integridade da unidade familiar e dar respostas às suas necessidades, às expectativas, às necessidades dos seus membros individualmente e às expectativas da sociedade”[4]. As famílias são responsáveis por grande parte da provisão e de bem-estar “uma função básica da família é proteger a saúde dos seus membros e dar apoio e resposta às necessidades básicas durante os períodos de doença” [4]. A UNIDADE DE CUIDADOS INTENSIVOS E A FAMÍLIA DO DOENTE As unidades de cuidados intensivos (UCI) diferem de qualquer outro serviço, por um lado, por serem um serviço mais fechado, por outro, pelo facto dos doentes in- ternados, na sua maioria, terem um prognóstico reservado, encontrando-se por isso numa situação de risco de vida. Para alguns, a situação clínica poderá ser reversível em poucas horas, podendo retomar a sua vida normal, num curto espaço de tempo Para outros, pela complexidade da doença, ou das complicações que dela advêm, permanecerão durante um longo período como “habitantes” da UCI. Falamos de doentes que, na sua maioria, dependem de ventilação mecânica, com sobrecarga terapêutica e um elevado grau de dependência. Processo este, acompanhado de enorme sofrimento por parte do indivíduo doente e também dos seus familiares. De facto, muitos resistem a esta luta constante pela sobrevivência, outros há que não ultrapassam estas provações e acabam por morrer [6]. A partir destas características do serviço, melhor se poderá compreender a sua dinâmica e depreender a importância vital da inter-relação entre ele e a família. O ambiente pouco comum, de sofisticada tecnologia, característico da UCI é talvez o que angustia mais a família num primeiro contacto visual. Neste contexto, Curry (1995) define UCI como “uma sala sem janelas, sem cor, austera, com várias camas, com monitores assustadoramente estranhos, respiradores e outro equipamento mecânico de cabeceira” [7]. É bom relembrar que avaliação que a família faz é, muitas vezes, leiga e prende-se mais com o que observa: o cabelo, as unhas, a boca, o ter ou não roupa suficiente. Da mesma forma, é alvo de preocupação familiar toda a atmosfera envolvente, como as luzes e a sua intensidade, a temperatura, o ruído, ou seja todo o ambiente físico que rodeia o seu familiar [8]. Grande parte do ambiente de alta tecnologia não pode ser evitado, contudo está ao alcance dos profissionais que ali desempenham as suas funções, conseguir preparar os familiares para a primeira visita ao doente, minimizando todo o impacto inerente a esse momento. Ao fornecer à família uma ideia generalizada do equipamento, da sua utilidade e da condição do seu familiar, podemos desdramatizar um pouco a primeira reação ao ambiente da UCI, favorecendo a confiança dos familiares e reduzindo o medo e a ansiedade face ao desconhecido [7]. Neste sentido, enquanto grupo de trabalho, considerámos pertinente elaborar um “Guia de Acolhimento a Familiares - UCIP”. Objetivámos que, através da sua leitura prévia à entrada no espaço da UCIP, os familiares dos doentes internados poderiam entender mais facilmente 40 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 valia no entendimento daquilo que é a realidade dentro de um serviço desta natureza. Contudo… fomos mais ambiciosos! Aliámos a inovação ao dinamismo… e com o apoio fulcral do Serviço de Voluntariado do Hospital Amato Lusitano, transformámos o “Guia de Acolhimento a Familiares - UCIP” versão panfleto desdobrável, em suporte multimédia e som. Um LCD fixo na parede lateral à porta de acesso à UCIP, onde, em modo contínuo passa toda a informação disponível no “Guia de Acolhimento a Familiares - UCIP”, associada a imagens/ fotografias elucidativas dessa mesma informação. Em complemento o efeito tranquilizante da música ambiente oferece maior sensação de calma a quem vivencia momentos de ansiedade, receio e angústia. aquilo que irão encontrar junto do seu ente querido. De forma sucinta, pretendemos informar a família do que tem à sua disposição, para que esta perceba que os profissionais de saúde estão presentes não só para cuidar o doente, mas também para a apoiar, esclarecer e facilitar a sua integração na UCIP. Na elaboração do “Guia de Acolhimento a Familiares UCIP”, para além do conteúdo intencionalmente simplista para fácil leitura e compreensão, procurámos ser sensíveis à forma, cor e dimensão a adotar, de modo a tornálo num instrumento útil e de fácil utilização. No que concerne aos conteúdos informativos, para além dos horários preconizados na UCIP e alguns telefones de serviço ao dispor dos familiares, o nosso maior cuidado recaiu nas questões que mais frequentemente são solicitadas pelas famílias de doentes da UCIP. “Para que serve todo o equipamento que está à volta do doente?”, “Posso falar com o doente?”, “O doente ouve?”, “O doente tem dores?”, são questões, que sistematicamente são feitas aos profissionais de serviço aquando da visita. As respostas simples, claras e objetivas a estas questões estão presentes no “Guia de Acolhimento a Familiares UCIP”, permitindo um esclarecimento prévio aos familiares, assim como uma maior serenidade no encarar do cenário intra-UCIP. Considerámos ainda pertinente, inserir alguma informação útil na prevenção de malefícios para os doentes internados. Essa informação encontrase de forma resumida nos “Cuidados a ter ao visitar o doente”. A colocação de “Guias de Acolhimento a Familiares UCIP” disponíveis na porta de acesso aos Cuidados Intensivos, foi quanto a nós uma iniciativa bem sucedia, e favoravelmente aceite pelas famílias como uma mais- Imagem I - Guia de Acolhimento a Familiares - Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente (UCIP - ULSCB) (Frente e Verso). Ambos os elementos informativos, “Guia de Acolhimento a Familiares - UCIP”, formato panfleto e vídeo, serão sempre alvo de atualização em função das necessidades apreendidas pela equipa UCIP ou apelo dos familiares, atendendo à consecução dos objetivos que lhe são inerentes. REFLEXÃO FINAL A família é a unidade básica e funcional mais significativa da sociedade, a qual tem passado por mudanças consideráveis. Estas, têm afetado o desenvolvimento da família, quer na estrutura e organização, quer nas suas funções e interações, tanto internas como com a comunidade. A diversidade de modelos de família é hoje significativa, cada um diferente do outro! Na nossa região, em que a população tem na sua maio41 SUPLEMENTO DA 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 ria características de ruralidade, quantas vezes o vizinho do lado é o familiar mais próximo e significativo do doente. É com esta diversidade que trabalhamos todos os dias, mantendo um objectivo comum: o bem-estar do doente e da sua família. A compreensão e aceitação da doença e da gravidade do seu estado, por parte da família, são expressas por atitudes, expectativas, medos e dúvidas que variam de indivíduo para indivíduo e de família para família, dependendo das experiências anteriormente vividas, do laço familiar e afectivo que os une e muitos outros factores. Independentemente da forma como se apresentam, uns cheios de coragem e emocionalmente controlados, outros em pânico e fora de controlo, os familiares têm algo em comum, o medo do desconhecido, bem como a consciência da vulnerabilidade e do risco em que o seu doente se encontra. A observação atenta e constante da realidade na UCIP, conjugada com a necessidade de desenvolver mais um PICCO2 - MONITORIZAÇÃO HEMODINÂMICA INVASIVA A EXPERIÊNCIA PRÁTICA DA UNIDADE DE CUIDADOS INTENSIVOS POLIVALENTE (UCIP) DA UNIDADE LOCAL DE SAÚDE DE CASTELO BRANCO (ULSCB) Sandrina Rodrigues Duarte João Pedro Oliveira Valente Olinda Maria Cebola Monsanto Gonçalves UCIP do Hospital Amato Lusitano - ULS Castelo Branco RESUMO A monitorização hemodinâmica assume um papel fundamental na avaliação e monitorização do paciente crítico, permitindo identificar a instabilidade hemodinâmica, suas causas e monitorizar a resposta à terapêutica instituída. Monitorizar hemodinamicamente está indicado sempre que surgir diminuição do débito cardíaco, défice ou excesso de volume de líquidos e ineficaz perfusão dos tecidos. Na Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente (UCIP) da Unidade Local de Saúde de Castelo Branco (ULSCB), a monitorização hemodinâmica no paciente crítico é realizada recorrendo à monitorização da pressão da artéria pulmonar - utilizando o Cateter Swan-Ganz, e mais recentemente utilizando o Cateter PiCCO2 (Pulse Induced canal de comunicação e de aproximação à família do doente internado, conduziu-nos à elaboração deste “Guia de Acolhimento a Familiares - UCIP”, como um instrumento de apoio e de informação aos familiares, numa perspectiva humanizadora do cuidado. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1.Segalen, M., (1999), Sociologia da Família, Editora Terramar, pp.20. 2.Atkinson, B.L., (1988), A Unidade de Cuidados Intensivos, Revista Nursing - nº1., pp.3-6. 3.Fragoeiro, I.M., (1999), A família e a descoberta das aptidões individuais, Revista Servir, nº 47, pp. 10-13. 4.Stanhope, M. (1999), Teorias e Desenvolvimento Familiar, Revista Enfermagem Comunitária, Lusociência, pp. 492-515. 5.Soares, M.L.B, (2003), Família digo, famílias…, Cadernos de Bioética, nº23, pp. 47-56. 6.Santos, A.L., (2001), Ética nas Unidades de Cuidados Intensivos Novos desafios à bioética, Porto Editora, pp. 244-247. 7.Curry, S., (1995), Identificação das necessidades e das dificuldades das famílias do doente na UCI, Revista Nursing, nº 94, pp. 26-30. 8.Silvia, M.J.P., (2000), Humanização em UTI - Assistência de enfermagem ao paciente crítico, São Paulo, Editora Atheneu, pp. 121130. Contour Cardiac Output). Este dispositivo permite a determinação e monitorização de variáveis cardiopulmonares e circulatórias do ser humano, avaliando o débito cardíaco contínuo combinado com a monitorização do volume de pré-carga cardíaca, água pulmonar extra vascular e saturação de oxigénio venoso central. PALAVRAS CHAVE:Monitorização Hemodinâmica, PiCCO2, UCIP – ULSCB. INTRODUÇÃO A instabilidade hemodinâmica é uma situação frequente no paciente crítico admitido nas unidades de cuidados intensivos (UCI’S). Com o avanço tecnológico a que hoje assistimos, cada vez mais somos confrontados com novos métodos de monitorização hemodinâmica. A monitorização hemodinâmica contínua é preferencial, porque permite responder mais precocemente às alterações cardiovasculares e circulatórias no paciente crítico, otimizando a oxigenação global dos tecidos. A decisão sobre o seu uso deve ser o mais precoce possível, assim que o paciente comece a apresentar os primeiros sinais e sintomas de instabilidade hemodinâmica. Na UCIP-ULSCB a monitorização hemodinâmica no paciente crítico é assegurada, com recorrência à monitorização da pressão da artéria pulmonar, utilizan- 42 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 do o Cateter Swan-Ganz e mais recentemente utilizando o Cateter PiCCO2. Por ser a técnica mais utilizada iremos centrar este artigo nesta forma de monitorização hemodinâmica. São objetivos do presente artigo: reconhecer a importância da monitorização hemodinâmica nas UCI’S, apresentar as funcionalidades do monitor PiCCO2, informar quais os principais parâmetros avaliados e valores de referência e explicar as intervenções de enfermagem na utilização do monitor PiCCO2. PiCCO 2 DISPOSITIVO DE AVALIAÇÃO HEMODINÂMICA O PiCCO2 (Imagem 1) é um dispositivo que permite a determinação e monitorização de variáveis cardiopulmonares e circulatórias do ser humano. Tratase de um dispositivo para avaliação do débito cardíaco contínuo combinado com a monitorização do volume de pré-carga cardíaca, água pulmonar extra vascular e saturação de oxigénio venoso central (1). O dispositivo PiCCO2 avalia o débito cardíaco contínuo através da técnica de termodiluição transpulmonar e análise de contorno de pulso, possibilita a avaliação contínua da saturação do oxigénio venoso central, uti- Imagem 1 - Monitor PiCCO2. Fonte: Cedida por PULSION Medical Systems, AG lizando a sonda CeVOX e avalia a função e perfusão hepática através da técnica LIMON. O débito cardíaco (DC) é determinado recorrendo à combinação de duas técnicas de medição de máxima precisão. Ele é determinado tanto de forma intermitente, utilizando a técnica de termodiluição transpulmonar, como continuamente mediante a aná- lise de contorno de pulso, recorrendo a monitorização da pressão arterial sistémica (1). Para além da avaliação do DC, o dispositivo PiCCO 2 possibilita a avaliação contínua da saturação de oxigénio venoso central (ScvO2), através de uma sonda de fibra ótica - CeVOX. Após a sua calibração, com os resultados da análise de gás sanguíneo venoso e arterial, permite o cálculo contínuo da entrega de oxigénio (DO2) e consumo de oxigénio nos tecidos (VO 2) (1) . Através da introdução dos parâmetros peso, altura, idade e sexo do paciente, o dispositivo PiCCO 2 indexa os parâmetros às características corporais do paciente, ou seja à área de superfície corporal de cada paciente, apresentando os parâmetros indexados (1). Este dispositivo foi projetado para ser utilizado em hospitais, por profissionais de saúde experientes e com perícia na sua utilização (1). INDICAÇÕES E CONTRAINDICAÇÕES O monitor PiCCO 2 é um meio de monitorização diagnóstica que pode melhorar o prognóstico do paciente pela alteração terapêutica proporcionada, com a adequação da reposição volémica e melhor titulação da dose de drogas vasoativas (2). Recomenda-se a utilização do monitor PiCCO 2 , na monitorização do estado do volume cardiovascular e circulatório, em contexto de UCI’s, nomeadamente em situações de choque sético, choque cardiogénico, choque hipovolémico, queimados, trauma e síndrome de dificuldade respiratória no adulto (ARDS) e na monitorização intra-operatória de pacientes cirúrgicos de elevado risco (1) (2). Está contraindicado nas situações em que a colocação de um cateter arterial ou cateter venoso central estejam contra-indicados, como na insuficiência arterial e venosa grave, oclusão arterial e nos pacientes com balão intra-aórtico (1). PRINCÍPIOS DE MEDIÇÃO E PARÂMETROS Como foi referido no capítulo anterior o PiCCO2 é um dispositivo para medição do DC contínuo combinado com a monitorização de volume de pré-carga cardíaca, água pulmonar extravascular e a ScvO2. O monitor PiCCO2 é fácil de utilizar e manusear, permitir rigor e uniformidade na administração de fluidos e catecolaminas, avaliando assim a sua eficácia, disponibiliza informação de várias variáveis em simultâneo e permite a visualização da evolução dessas variá43 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 veis ao longo do tempo, facilitando a avaliação da condição hemodinâmica do paciente e a tomada de decisões rápidas (1) (3). PRINCÍPIOS DE MEDIÇÃO - Técnica de Termodiluição Transpulmonar Para a monitorização com o cateter PiCCO2 é necessário a colocação de um cateter venoso central com dispositivo de termodiluição, que deve ser colocado preferencialmente na subclávia ou jugular direita e um cateter PiCCO2 colocado preferencialmente na artéria femoral (Imagem 2). O enfermeiro é responsável pela montagem de todo o cativas nas condições hemodinâmicas do paciente crítico, tais como mudanças de volume ou mudanças significativas na medicação vasodilatadora e/ ou inotrópica (1) . Após calibração do DC, todos os outros parâmetros fisiológicos ficarão disponíveis no monitor. PARÂMETROS DE AVALIAÇÃO O monitor PiCCO2 disponibiliza a visualização simultânea de vários parâmetros fundamentais para a avaliação hemodinâmica no paciente crítico, que estão divididos em 4 grupos essenciais: Fluxo, Volume, Função de Órgão e Oxigenação (Imagem 3). Imagem 3 - Parâmetros de avaliação disponibilizados pelo Monitor PiCCO 2. Fonte: Cedida por PULSION Medical Systems, AG. Imagem 2 - Esquema de montagem do Monitor PiCCO2. Fonte: PULSION Medical Systems, AG. PiCCO2 Versão 2.0 Manual do operador e Informação do Produto. Munique; 2009:1-96 equipamento e preparação do material para a colocação de cateteres venosos e arteriais. Para a realização da técnica de termodiluição, utiliza-se uma solução fria (ex. soro fisiológico 0.9%, que deverá estar pelo menos 10pC abaixo da temperatura corporal do paciente), que deve ser injetada através do lúmen distal do cateter venoso central antes do dispositivo de termodiluição, tão rápido quanto possível, a solução salina é detetada pelo cateter PiCCO2, que mede a variação de temperatura. A mudança de temperatura descendente registada depende do fluxo e volume sistólico pelo qual a solução salina de frio passou. Como resultado, é registada uma curva diferencial de temperatura - a curva de termodiluição transpulmonar. O DC é calculado pela análise da curva de termodiluição, utilizando uma versão modificada do algoritmo de Stewart- Hamilton (curva de diluição do indicador) (1)(2)(3). O ponto hemodinâmico (calibração) é recomendado a cada 8 horas ou sempre que surgirem alterações signifi- Parâmetros relacionados com o Fluxo (1)(3)(4): - CO - Representa o volume de sangue ejetado pelo coração num minuto, resultando do produto do volume sistólico pela frequência cardíaca; - CI - Índice Cardíaco. Resulta do débito cardíaco ajustado à área de superfície corporal (valores de referência 3,0 - 5,0 l/min/m2); - PCCI - Índice Cardíaco por Contorno de Pulso. Variável hemodinâmica mais importante que permite a avaliação da função cardíaca e orientação de terapêutica no paciente crítico; - SVRI - Resistência Vascular Sistémica Indexada. Representa a resistência que o sangue tem de vencer para fluir no sistema vascular (valores de referência 1700 2400 dyn.sec.cm5.m2). Indicador de pós-carga. Parâmetros relacionados com o Volume (1)(3)(4): - GEDI - Volume Global no Final da Diástole. Volume total de sangue existente nas 4 câmaras cardíacas, no final da diástole, ou seja, representa o volume de sangue disponível para ser bombeado (valores de referência 680-800 ml/m²). Indicador de pré-carga; 44 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 - SVV - Variação de Volume Sistólico. Prevê se o aumento da pré-carga resultará no aumento do DC (valor de referência <10%). Este parâmetro apenas se pode aplicar em pacientes sob ventilação mecânica e sem arritmias. Parâmetros relacionados com a Função de Orgão (1)(3)(4) : - ELWI - Volume de Água Pulmonar Extravascular. A sua importância chama a atenção para a existência ou desenvolvimento de edema pulmonar no doente. Ao medir a água pulmonar, considera a água pulmonar intraalveolar, intracelular e intersticial. Este parâmetro possibilita a correta gestão de fluídos no paciente crítico (valores de referência 3.0 - 7.0 ml/kg); - PVPI - Índice de Permeabilidade Vascular Pulmonar. Possibilita distinguir a origem do Edema Pulmonar (valores de referência 1.0 - 3.0); - GEF - Fração de Ejeção Global. Traduz a contractilidade cardíaca global, permite identificar uma possível gue o equilíbrio entre o aporte e as necessidades de oxigénio (Imagem 4). Os quatros fatores que contribuem para este equilíbrio são o DC, a Hb, a SaO2 e o metabolismo tecidular (VO2). A situação desequilibra-se quando ocorre uma diminuição do fornecimento de oxigénio, decorrentes da variação do DC, da hemoglobina e da saturação arterial de oxigénio ou quando ocorre aumento das necessidades de oxigénio. Se este desequilíbrio não for corrigido atempadamente e se a saturação de oxigénio venoso central baixar significativamente, comprometerá as necessidades do tecido a nível celular e as células deixarão de ter capacidade de produzir energia a partir da utilização de oxigénio, conduzindo ao choque, lesão ou morte celular (4)(5). A ScvO2 permite identificar pacientes que apresentem hipoxia tecidular e que podem evoluir rapidamente para a disfunção orgânica. O DC influencia a entrega de oxigénio e resulta do pro- disfunção ventricular direita e/ou esquerda (valores de referência 25-35%). Parâmetros relacionados com a Oxigenação (1)(4): - ScvO2 - Oximetria Venosa Central. Reflete a saturação de oxigénio na hemoglobina, na veia cava superior/ aurícula direita (valores de referência 70-80%). A sonda de fibra ótica CeVOX, deve ser colocada obrigatoriamente no lúmen distal do cateter venoso central. A monitorização contínua da saturação de oxigénio venoso central está indicada em pacientes com potencial para desenvolver um desequilíbrio entre o aporte de oxigénio e as necessidades metabólicas dos tecidos, como pacientes com sépsis grave ou em choque, ou pacientes com grave compromisso respiratório como SDRA. A introdução de dados da saturação de oxigénio arterial e venoso no monitor é essencial para exibir os parâmetros DO2 e VO2. - DO2 - Representa a quantidade de oxigénio fornecida aos tecidos (valores de referência 400-650 ml/min/m2), este valor depende do DC, da quantidade de hemoglobina (Hb) e da saturação de oxigénio arterial (SaO2). - VO2 - Representa a quantidade de oxigénio consumida pelos tecidos (valores de referência 125-175 ml/min/m2). OTIMIZAÇÃO DA OXIGENAÇÃO GLOBAL DOS TECIDOS Em condições normais o sistema cardiopulmonar conse- Imagem 4 - Esquema de Otimização da Oxigenação Global Tecidular. Fonte: Cedida por PULSION Medical Systems AG. duto do volume de ejeção pela frequência cardíaca. O volume de ejeção é influenciado pela pré-carga, contratibilidade e pós-carga. As alterações de um ou mais destes fatores hemodinâmicos vão repercutir-se no valor do DC (4)(5). O monitor PiCCO2 torna-se muito útil porque permite ajustar a terapêutica ao paciente de acordo com os parâmetros visualizados, otimizando assim a oxigenação global dos tecidos no paciente crítico. DISPOSITIVO LIMON A técnica do LiMON é outra das potencialidades do monitor PiCCO2, permite a determinação da função e perfusão hepática no paciente. A taxa de eliminação plasmática de PDR-ICG (indocyanine green plasma disappearance rate) é influenciada pela função hepática e perfusão hepática. Alterações na PDR-ICG num curto 45 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 período de tempo refletem variações na perfusão esplénica e disfunção nas células hepáticas. A técnica Limon consiste na instilação de um produto corante verde indocianina (quantidade compreendida entre 0,5 e 0,25 peso corporal mg / kg), diluído num solvente não iónico, injetado pelo cateter venoso central, sendo a leitura do parâmetro feita num sensor digital colocado no dedo do paciente (6)(7). A informação é visualizada de forma rápida, sendo considerado um método nãoinvasivo. Dependendo do desempenho do fígado o verde indocianina é eliminado pelo organismo, com uma semivida de aproximadamente 3-4 minutos, a sua utilização como marcador da função hepática, pode prevenir complicações nomeadamente nos pacientes após transplante hepático (7). Na UCIP da ULSCB não dispomos desta técnica para a avaliação da função e perfusão hepática. ALGORITMO AUXILIAR DE DECISÃO O monitor PiCCO2 permite ainda visualizar um algoritmo que auxilia o clínico (Imagem 5), no final de cada calibração. O modelo de decisão não deve ser obrigatório, e não deve substituir as decisões individuais de terapêutica e tratamento médico para cada paciente. O tratamento das alterações do DC, volume de líquidos e perfusão dos tecidos deve ter em conta as causas precipitantes e o diagnóstico médico de cada paciente. CONCLUSÃO A monitorização hemodinâmica invasiva tornou-se uma das áreas que exige maior perícia aos enfermeiros em UCI‘s. Conhecer as bases teóricas da monitorização hemodinâmica hoje em dia não é suficiente! Há necessidade de evolução! A análise e in- terpretação clara e inequívoca de parâmetros fisiológicos são fundamentais para que seja possível um planeamento rigoroso e personalizado de cuidados de enfermagem ao paciente internado em ambiente de cuidados intensivos. Enquanto grupo de trabalho, consideramos a temática de elevada pertinência para a nossa prática laboral diária em contexto de UCI‘s. A introdução da monitorização com o dispositivo PiCCO2 trouxe potencialidade de monitorização do paciente crítico, rigor analítico e maior segurança e confiança de atuação à equipa multiprofissional da UCIP-ULSCB. Contudo, não esqueçamos que é a mente humana que deve controlar a máquina e dela tirar o seu partido máximo! Não centralizemos toda a nossa atenção em monitores e sofisticados equipamentos... esquecendo o nosso foco major de atenção, o paciente! Como autores esperamos que, para além do suporte científico, este artigo seja profícuo na consolidação de conhecimentos relativos à monitorização hemodinâmica com auxílio do monitor PiCCO2 e que contribua também para uma reflexão pessoal, no sentido de orientar a atuação dos enfermeiros para a excelência cuidativa do paciente crítico. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1.PULSION Medical Systems, AG. PiCCO2 Versão 2.0 Manual do operador e Informação do Produto. Munique; 2009:1-96; 2.Júnior GAP, Marson F, Ostini FM, Antoniazzi P, Gomide MDA, BasileFilho A. Monitorização Hemodinâmica Invasiva. Medicina, Ribeirão Preto 1998;31: 380-399; 3.PULSION Medical Systems AG - Train the Trainer Folder - Advanced Hemodynamic Monitoring - PiCCO® technology & parameters; 2009: 1-16; 4.Urden, L, Stacy, K, Lough, M. Thelans - Enfermagem de cuidados IntensivosDiagnóstico e Intervenções. Loures: Lusodidacta;5ª Edição; 2006: 387427; 5.Carneiro AH, Póvoa P. Disfunção cardio-circulatória: monitorização e suporte hemodinâmico. In: Martins A, Geada A, Pedro AL et al, Manual do CursoSépsis e Infeção Grave para Médicos, Porto: Reanima, 2011: 23-41; 6.Pisarro, S. PULSION - Limon. In: Hospital Universitario La Paz, Madrid, 2011: 1-51; 7.Levesque E, Saliba F, Benhamida S et al. Plasma Disappearance Rate of indocianine green: a tool to evaluate early graft outcome after liver transplantation. Liver Transplant 2009; 15(10): 1358-64. Imagem 5 - Algoritmo auxiliar de decisão - PiCCO2. Fonte: Cedida por PULSION Medical Systems AG. 46 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 VIA VERDE DE SÉPSIS RUI PEDRO ANTUNES MACEDO Resumo Tendo o autor, como base de pensamento - refletir para melhor cuidar, é feita uma revisão sobre, conceitos e pressupostos acerca desta temática, tentando expô-los de forma clara, concisa e de fácil apreensão. Os cuidados de enfermagem ao doente com sépsis grave/ choque sético requerem uma profunda compreensão da físiopatologia da doença, a fim de conseguir perceber e antecipar os efeitos de cada intervenção, alcançando um sólido conhecimento de todo o processo de atuação. A Direção Geral da Saúde, em 06/01/2010, apresentou a circular normativa nº 01/DQS/DQCO, com vista à criação e implementação da via verde de sépsis (VVS), por Miguel Soares de Oliveira. Dando cumprimento à referida circular, a direção do serviço de urgência da Unidade Local de Saúde de Castelo Branco – Hospital Amato Lusitano, operacionalizou a Via Verde de Sépsis em 01/11/2012. Este artigo expõe a recente implementação da Via Verde de Sépsis na Unidade Local de Saúde – Hospital Amato Lusitano, dissecando sobre a abordagem do doente com sépsis grave/ choque sético, tendo em linha de conta as mais recentes guidelines (2012). 5.Redução da morbi-mortalidade. Para uma perceção facilitada acerca da criação da VVS, importa recuar um pouco no tempo e rever as conclusões de quem refletiu profundamente sobre o assunto em epígrafe. Segundo Póvoa P. R. et al (2009)1, baseados num estudo português, multicêntrico, onde participaram 17 Unidades de Cuidados Intensivos, durante os anos de 2004 e 2005, de seu nome SACiUCI (Sépsis Adquirida na Comunidade e internada em Unidade de Cuidados Intensivos), invocam que: - 22% dos internamentos em unidades de cuidados intensivos são devidos a sépsis adquirida na comunidade; - Estes casos originam uma mortalidade hospitalar global de 38%, ou seja quase três vezes superior à mortalidade dos casos de AVC, internados no ano de 2007; - A mortalidade das formas mais graves de sépsis, nomeadamente o choque sético, atinge 51%. Ao analisar um dos muitos contributos de Daniels, R. e Nutbean, T. (2010),2 pode-se inferir que a sépsis comparativamente com outras doenças tem alta representatividade. (Gráfico I) Palavras-chave: Via Verde de Sépsis; Sépsis Grave; Choque Sético. Introdução O choque é um estado fisiológico de hipoperfusão tecidular. Independentemente da causa, caracteriza-se por um desequilíbrio entre o transporte e as necessidades de oxigénio, o qual pode gerar hipóxia e morte celular. Com este artigo pretendo realçar os ganhos em saúde que a VVS poderá proporcionar, destacando os seus objetivos: 1.Identificação e estratificação rápida de doentes com sépsis grave e choque sético; 2.Utilização de antibioterapia adequada; 3.Implementação de estratégias de ressuscitação hemodinâmica, guiada por objetivos; 4.Diminuição substancial dos custos para as instituições, com óbvia diminuição de recursos materiais e diminuição das taxas de internamento; Gráfico I – Estudo comparativo entre sépsis e outras patologias Fonte: Daniels, R., & Nutbean, T. (2010). ABC fo Sepsis A implementação da VVS era um imperativo, tendo em consideração, o número crescente de doentes com sépsis. Dados recentes, vindos da Europa e dos Estados Unidos da América (EUA), indicam que a sépsis representa um grave problema de saúde pública, comparável ao acidente vascular cerebral (AVC) e ao enfarte agudo do miocárdio (EAM)3. (Gráfico II) Segundo Rivers, E. et al (2001)4, considerado por muitos como pai da VVS, o paradigma fundamental na abordagem inicial do doente sético é a noção de que, tal como 47 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 Gráfico II – Relação incidência / mortalidade entre AVC, Sépsis e EAM Fonte: Angus D. C. Et al. Epidemiology of severe sepsis in the United States (2001) o AVC ou o EAM, a sépsis pode constituir uma emergência médica onde as primeiras horas de terapêutica são determinantes para a melhoria do prognóstico. O mesmo autor introduz o conceito, de medidas iniciais de ressuscitação hemodinâmica e suporte orgânico, guiadas por objetivos. Considerando o contributo de Carneiro, A. H. et al (2010)5, importa contextualizar os seguintes conceitos: SIRS (Systemic Inflamatory Response Syndrome), entendido como a resposta inflamatória a um determinado insulto, de magnitude tal que provoca repercussões à distância da lesão inicial (sistémicas); Sépsis: “… expressão da resposta sistémica do organismo à infecção …”; Sépsis grave é a designação da sépsis a que se associa disfunção de órgãos; Choque sético foi definido como sépsis com hipotensão que não responde à reposição adequada de volume (pelo menos 20ml/Kg) e/ou cursa com hiperlactacidemia grave (lactato superior a 4 mmol/L). Soares, J. et al (2003)6, desenha de forma muito clara a relação entre a infeção e os sinais inflamatórios do hospedeiro, podendo nesta disputa, progredir a instalação dos conceitos supra citados. (Figura I) Por outro lado, Daniels, R. e Nutbean, T. (2010)2, num outro contributo, relacionado com a mortalidade em sépsis, sépsis grave e choque sético, evidencia a forte mortalidade no choque sético. (Gráfico III) Na presença de um doente com suspeita clínica de sépsis é urgente obter muito rapidamente uma avaliação clara do seu estado hemodinâmico o que implica, não só a avaliação dos sinais vitais, dando destaque à temperatura (e” 38ºC e d” 36ºC), frequência cardíaca (> 90 Bat. / min.) e frequência respiratória (> 20 ciclos/min.) = Sinais de SIRS, mas também a do lactato sérico. Segundo Gráfico III – Evidência da mortalidade no choque sético Fonte: Daniels, R., & Nutbean, T. (2010). ABC of Sepsis Figura 1 – Relação infeção / sinais inflamatórios / instalação de doença Fonte: Soares, J. Et al. Fisiologia do Choque (2003) Daniels, R. e Nutbean, T. (2010)2 mostram que há uma correlação entre hiperlactacidemia e aumento da mortalidade (Gráfico IV), que pode ser um marcador precoce de hipoperfusão, mesmo na ausência de hipotensão (choque críptico). Gráfico IV – Correlação entre hiperlactacidemia / aumento da mortalidade Fonte: Daniels, R., & Nutbean, T. (2010). ABC of Sepsis 48 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 Figura 2 – Pilares fundamentais na terapêutica da sépsis Fonte: Carneiro, A.H. et al (2010) Gráfico V – Estudo SACiUCI – Principais focos de infeção Fonte: Carneiro. A. H. Sépsis e Infecção Grave (2011) Gráfico VI – Causas de Sépsis Grave Fonte: Daniels, R., & Nutbean, T. (2010) - ABC of Sepsis Segundo Rivers E. et al (2001)4, os três pilares fundamentais da terapêutica na sépsis são a antibioterapia adequada, o controlo do foco e a ressuscitação hemodinâmica/suporte orgânico, como apresenta Carneiro, A. H. et al (2010)4 na figura II. Mais recentemente foi estimado que cada hora de atraso na administração de antibioterapia apropriada em doentes com choque sético, durante as primeiras 6 horas, se associa a um aumento de mortalidade de 7,6%, segundo o estudo de Kumar A. et al (2006)7. A s guidelines e m a n a d a s p e l a S u r v i v i n g S e p s i s Campaign, através de Dellinger R.P. et al (2008 e 2012)8,9, referem que o intervalo de tempo entre o reconhecimento do quadro e o início da antibioterapia deve ser sempre inferior a uma hora. A procura do foco de infeção exige história e exame físico rigorosos, deve-se prestar especial atenção ao tórax, abdómen, sistema nervoso central e pele. Os principais focos de infeção em doentes com sépsis grave, constituindo mais de 75% dos casos, são do trato respiratório, do trato urinário, região abdominal e a bacteriemia primária, tendo em linha de conta Carneiro, A. H. et al (2011) 10, baseado no estudo SACiUCI. (Gráfico V) Daniels, R. e Nutbean, T. (2010), mostram-nos que o principal foco de infeção é de origem respiratória, estando em sintonia com o anterior estudo. (Gráfico VI) As guidelines 2012 9 estabelecem um limite de 12 horas para efetuar controlo do foco. Todos os doentes com sépsis e evidência de hipoperfusão devem ser considerados candidatos a um protocolo de terapêutica precoce, estabelecendo um limite de 45 minutos de atraso na antibioterapia, para colher culturas (2 hemoculturas) até à admissão numa unidade de cuidados diferenciados. As primeiras 6 horas, após o diagnóstico de sépsis, são caracterizadas como o período de reanimação inicial, devendo estas, para além da antibioterapia precoce, procura/ controlo do foco de infeção e normalização do lactato, incidir em medidas de ressuscitação hemodinâmica e suporte orgânico, destacando: Fluidoterapia A reposição de volume é uma das intervenções prioritárias, dando primazia a cristalóides – mínimo de 30 ml/Kg e descontinuando os colóides,9 procurando atingir uma pressão venosa central (PVC) entre 8 e 12 mmHg, e 12 a 15 mmHg no doente ventilado, medida 49 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 no lúmen distal do catéter venoso central (tetralumen), colocado a nível da veia subclávia (preferencial) ou veia jugular interna. e sem querer ser de alguma forma redutor, realço apenas algumas diretrizes, no que concerne aos cuidados Vasopressores Permitem compensar o efeito da libertação maciça de mediadores inflamatórios com propriedades vasodilatadoras. O vasopressor de eleição para tratamento inicial deve ser a noradrenalina; a dopamina apenas utilizada para casos muito específicos 9 . A vasopressina tem mais espaço de utilização, desaconselhando o uso de fenilefrina9. No choque sético, se a hipotensão não corrigir com o uso de noradrenalina e dopamina, o clínico deverá considerar adrenalina9. O objetivo passa por conseguir uma pressão arterial média (PAM) e” 65 mmHg, devendo a mesma ser monitorizada através de cateter arterial (na UCIP é utilizado catéter PICCO, nas formas mais graves de sépsis). Este catéter fornece uma panóplia de informação útil para um melhor controlo hemodinâmico. Destaco a SvcO2 (saturação venosa central de oxigénio – Bom indicador do aporte de oxigénio aos tecidos) a qual se pretende que seja superior a 70 %. Orotraqueal, toillet brônquica, aspiração de secreções…); Inotrópicos Positivos Devem ser utilizados em concomitância com vasopressores; Nos doentes com disfunção cardíaca traduzida por pressões de preenchimento elevadas e baixo débito cardíaco, o clínico deverá considerar dobutamina para aumentar o débito cardíaco8,9. Corticóides As Guidelines mais recentes recomendam o uso de de enfermagem: - Doente com ventilação mecânica invasiva (Tubo - Sedação e analgesia – guiadas por objetivos, utilizando a escala de sedação de Ramsay e a escala comportamental de dor: Behavioral Pain Scale (BPS); - Não usar bloqueadores musculares (Besilato de Atracurium) por mais de 48 horas, tendo em linha de conta os efeitos nefastos dos mesmos no sistema neuromuscular; - Controlo da glicemia, passando o limite para 180 mg/dl9; - Monitorização contínua do débito urinário (> 0,5 ml/ Kg/hr); - Caso o foco infecioso tenha sido drenado, executar o penso e avaliação contínua do mesmo, bem como de todas as portas de entrada (catéter venoso e arterial); - O início da reposição nutricional é também de extrema importância pois melhora o estado nutricional do doente, estimula o sistema imunológico e promove a cicatrização (usar alimentação parentral, apenas se não houver tolerância da alimentação enteral); - Vigiar tecidos/ pele promovendo a sua integridade, guiado por objetivos. Caso surja solução de continuidade ou úlcera de pressão, a mesma é monitorizada através da escala de Braden; -Proporcionar bem-estar físico e psíquico (posicionamentos e cuidados de higiene e conforto adequados). hidrocortisona 200 mg/dia em perfusão endovenosa contínua. A fludrocortisona deixou de ser considerada9. A Proteína C Reativa recombinante deixou de ter lugar na terapêutica9. Derivados e componentes do sangue Administrar concentrados de eritrócitos, se a hemoglobina for inferior a 7.0 gr/dl ou hematócrito inferior a 30%, promovendo a entrega de oxigénio, melhorando dessa forma a hipoxia e acidose láctica 8,9. Nas situações de grande utilização de cristalóides usar albumina humana na ressuscitação hídrica 9. Para além de toda a cooperação com objetivo único, da equipa multidisciplinar, atingir as metas supra definidas, Figura 3 - Circular Normativa da Direção Geral da Saúde 50 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 01/11/2012 a 20/02/2013, salienta que: - Foram tríados uma média de 6,5 doentes/ mês, com ligeiro predomínio do sexo masculino. (Gráfico VII) - A faixa etária mais representativa situa-se entre os 70 e 80 anos de idade, ao invés, a menos representativa situa-se entre os 40 e 50 anos de idade. (Gráfico VIII) - O foco de infeção mais expressivo, indo de encontro aos estudos consultados, é o do trato respiratório. (Gráfico IX) - Dos 26 doentes considerados como casos suspeitos de via verde de sépsis, 4 apresentavam sépsis grave/ choque sético. (Gráfico X) - A grande maioria dos doentes teve alta para o domicílio. Os casos mais graves foram tratados na Unidade de Cuidados Intensivos e Serviço de Observação – Urgência. (Gráfico XII) Gráfico VII – Triagem de doentes por Mês e por Sexo Figura 4 – Protocolo de Colheita de Dados para caso suspeito de VVS A NOSSA REALIDADE Ao dar cumprimento à circular normativa nº 01/DQS/ DQCO, de 06/01/2010, da Direção Geral da Saúde (Figura 3), a direção do serviço de urgência da Unidade Local de Saúde de Castelo Branco – Hospital Amato Lusitano, procedeu à implementação da VVS, tendo o seu início em 01/11/2012. Para uma adequada triagem foi criado um protocolo interno (Figura 4) com vista à colheita de dados necessários, para um correto diagnóstico de sépsis, sépsis grave ou choque sético. A informação estatística recolhida da base de dados do Dr. Paulo Costa (gentilmente fornecida pelo próprio), de Gráfico VIII – Triagem de doentes por Faixa Etária 51 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 Bibliografia Consultada 1.Póvoa P.R. et al. Influence of vasopressor agent in septic shock mortality. Results from the Portuguese Community-Acquired Sepsis Study (SACiUCI study). Crit Care Med 2009; 37: 410-6; 2.Daniels, R., & Nutbean, T. (2010). ABC of Sepsis. Oxford: Blackwell Publishing Ltd. 3.Angus D.C. et al. Epidemiology of severe sepsis in the United States: Analysis of incidence, outcome, and associated costs of care. Crit Care Med 2001; 29:1303-10; 4.Rivers E. et al. Early Goal-Directed Therapy in the Treatment of Severe Sepsis and Septic Shock. New England Journal Medicine, 2001; 345:1368-77; 5.Carneiro, A.H. – Sépsis e infecção grave: Conceitos, termos e definições, 2010, Porto; 6.Soares, J. et al (2003). Fisiologia do Choque. Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, Porto; 7.Kumar, A. et al. Duration of Hypotension Before Initiation of Effective Antimicrobial Therapy is the Critical Determinant of Survival in Human Septic Shock. Crit Care Med 2006; 34:1589-96; 8.Dellinger R.P. et al. Surviving Sepsis Campaign: International Guidelines for Management of Severe Sepsis and Septic Shock: 2008. Crit Care Med 2008; 36:296–327; 9.Dellinger R.P. et al. Surviving Sepsis Campaign: International Guidelines for Management of Severe Sepsis and Septic Shock: 2012. Critical Care Medicine Journal 2012; Special Article, February 2013, volume 4, number 2, pg.580637; 10.Carneiro, A.H. - Sépsis e Infecção Grave para médicos, reanima, 1ª Edição, Outubro (2011), Porto. Gráfico IX – Triagem de doentes por Foco de Infeção Gráfico X – Triagem de doentes tendo em conta o índice de gravidade da sépsis Gráfico XI – Destino dos doentes tríados através da VVS 52 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 EEMI - EQUIPA DE EMERGÊNCIA MÉDICA INTRA-HOSPITALAR DO HOSPITAL AMATO LUSITANO - CASTELO BRANCO DO PROJETO À OPERACIONALIDADE Fernando José Freixo Micaelo, João Pedro Oliveira Valente, Nelson Serrano Antunes RESUMO É expetável para doentes, familiares, visitas e funcionários, que o ambiente hospitalar espelhe segurança e capacidade de resposta em situações de emergência ameaçadora da vida, que envolva qualquer um dos frequentadores destes espaços. Diversos estudos internacionais revelaram que a existência de uma Equipa de Emergência Médica Intra-hospitalar (EEMI) consegue melhorar a morbilidade e a mortalidade intra-hospitalar, ao propor metodologias de sistematização da avaliação dos utentes e de intervenção precoce por parte de equipas altamente diferenciadas. Contudo a realidade nacional, no que toca à criação de EEMI, é ainda preambular comparativamente com a realidade de outros países. A Direção Geral da Saúde (DGS) desperta para esta carência, emitiu no ano 2010, normas imperativas para a implementação destas equipas em todas as unidades hospitalares nacionais. Dando cumprimento a essa normativa da DGS, foi implementada, no início de 2013, no Hospital Amato Lusitano (HAL) uma Equipa de Emergência Médica Intrahospitalar. Com o presente artigo pretendemos dar a conhecer os objetivos, linhas orientadoras e o desenvolvimento de todo esse projeto de implementação da EEMI do HAL, apresentando no final os primeiros números referentes à sua atividade PALAVRAS-CHAVE: Emergência Médica; Enfermagem; Paragem Cardiorrespiratória CONCEITO A EEMI é uma equipa constituída por médicos e enfermeiros com competências em abordagem avançada da via aérea, técnicas de reanimação e, idealmente, formação em emergência e intensivismo. A sua dinâmica assenta na perceção objetiva que associando a identificação precoce da deterioração clínica a uma resposta diferenciada e interventiva, pode prevenir-se a ocorrência de eventos clínicos adversos, o seu eventual agravamento e até prevenir episódios de Paragem Cárdio-Respiratória (PCR). [1, 2] No contexto hospitalar é expetável para os utentes se- rem rececionados num ambiente que espelhe uma imagem de segurança e vigilância e onde esperam obter os melhores cuidados e tratamentos necessários à sua condição clínica, com o menor risco possível de eventos adversos. Na mesma linha de pensamento, é esperada igual proteção e segurança pelas visitas, familiares, funcionários e toda e qualquer outra pessoa que frequente esse espaço, pelas mais diversas razões, surgindo as EEMI como parte do garante dessa segurança. [1, 2, 3] Originário do final do séc. XX, o conceito EEMI tem raízes bem mais ambivalentes e antigas, surgindo quase que implicitamente com o desenvolvimento da emergência médica, fundamentando-se na necessidade de sistematização da avaliação dos utentes e na precoce identificação de sinais de deterioração clínica servindo como base prática para uma atuação clínica incisiva e atempada, melhorando os resultados da morbilidade e mortalidade intra-hospitalar.[3] A primeira EEMI surge em meados dos anos 90, na Austrália, espalhando-se este conceito rapidamente por todo o mundo, conduzindo a mudanças significativas no atendimento hospitalar dos utentes mais graves. Diversos estudos, posteriormente desenvolvidos, demonstraram que, ao identificar precocemente os utentes em maior risco através de critérios de avaliação previamente delineados, verificavam-se melhorias no número de internamentos não planeados em cuidados intensivos, prevenção da PCR e melhoria da morbilidade e mortalidade intra-hospitalar.[3, 4, 5, 6, 7, 8] Uma recente revisão sistemática da literatura sobre a temática, aponta moderada a forte evidência, na associação da existência da EEMI a uma diminuição das taxas de PCR e mortalidade e uma fraca evidência sobre o impacto que esta medida tem na redução das taxas de internamento não planeado em cuidados intensivos.[4] As mesmas autoras sugerem ainda que, para além da necessidade de se realizarem mais estudos, é imperativo reforçar a formação específica direcionada aos profissionais de saúde destas áreas, assim como a implementação de estratégias de sistematização da avaliação clínica, como garantia de otimização das EEMI com consequentes melhorias diretas nos resultados da morbilidade e mortalidade dos utentes. [4] OBJETIVOS Uma EEMI pretende, em termos gerais, por em prática os seguintes objetivos: 1.Promover o reconhecimento precoce da deterioração 53 SUPLEMENTO 1º SEMINÁRIO DE ENFERMAGEM EM CUIDADOS INTENSIVOS DA BEIRA INTERIOR 2013; 32:2-53 Tabela 1 - Critérios de Ativação da EEMI do HAL Fonte: (Micaelo, et al., 2012; DGS, 2010) Tabela 2 – Dados de Ativação da EEMI do HAL: Janeiro/Fevereiro 2013 Fonte: Registos 2013 EEMI/HAL clínica dos utentes como garante de prevenção da PCR e morte intra-hospitalar; 2.Fomentar o início atempado de medidas clínicas adequadas, consentâneas com as necessidades identificadas dos utentes com agravamento da sua condição clínica, subjacente ou não à sua doença base; 3.Intervir em situações de emergência intra-hospitalar, em utentes internados ou utentes dos espaços comuns da instituição; 4.Reduzir a taxa de mortalidade intra-hospitalar.[1,2] PROJETO EEMI DO HAL Até à criação da EEMI do HAL o sistema vigente era o tradicional e comum a alguns hospitais - perante um utente internado com alteração súbita do seu estado clínico, o enfermeiro contatava o médico de prevenção do serviço ou o médico de serviço na urgência, que mediante a sua disponibilidade e urgência da situação, se deslocava ao internamento, avaliava o utente e eventualmente instituía novas medidas terapêuticas, solicitando apoio diferenciado, nos casos mais graves. Este sistema denotava algumas fragilidades, que iam desde a débil sistematização dos critérios de avaliação e ativação diferenciada, suscetibilidade a atrasos na verificação de eventos críticos e um indesejado mas expectável redireccionamento e concentração dos cuidados de enfermagem num determinado utente com consequente risco de diminuição da disponibilidade para todos os outros utentes, durante esse evento clínico prioritário. Datado de 2009, o Relatório de Avaliação para a Restruturação dos Carros de Emergência do HAL, recomendava, entre outras, a necessidade da criação de uma EEMI como parte integrante da capacidade de resposta da instituição a situações de emergência interna, articulada com reforço da formação dos profissionais e disponibilização de carros de emergência padronizados.[9] Esta problemática, saliente no relatório do HAL, era também comum a outras instituições de saúde levando a tutela a emanar em 2010 a Circular Normativa n.º 15/2010 da DGS, que determinava a criação e implementação, a nível nacional, das EEMI, inicialmente em hospitais detentores de Unidades de Cuidados Intensivos, estendendo-se progressivamente a todos os outros hospitais do Sistema Nacional de Saúde. [2] O Projeto EEMI do HAL surge em finais de Setembro de 2012 aproveitando uma oportunidade aberta pela atual direção hospitalar, desperta para este imperati- vo, no sentido de construir um projeto de raiz, que cumprisse os requisitos emanados pela tutela, garantindo a todos os utentes do hospital um novo serviço clínico, altamente diferenciado, e inovador na Beira Baixa. O grupo de trabalho constituído para o efeito, planeou, organizou e implementou ao longo de 3 meses as linhas orientadoras que iriam nortear todo o projeto, culminando com a sua efetiva colocação em funcionamento no dia 2 de Janeiro de 2013. As principais linhas orientadoras foram: 1.Documentação, análise e construção do Projeto EEMI do HAL, tendo por base a Circular Normativa n.º 15/ 2010 da DGS, literatura específica e consulta informal de outras experiências nacionais (Setembro - Outubro, 2012); 2.Apresentação do Projeto ao Conselho de Administração do HAL e pedido de autorização de funcionamento (Novembro, 2012); 3.Apresentação do projeto e envolvimento das Chefias de Enfermagem e Médicas (Novembro, 2012); 4.Apresentação e dinamização do projeto junto da equipa de enfermagem da Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente (UCIP) do HAL, com subsequente formação (Dezembro, 2012); 5.Escolha, aquisição e organização de materiais e equipamentos específicos (Dezembro, 2012); 6.Divulgação, dinamização e formação aos profissionais de enfermagem e médicos, em todos os serviços clínicos do HAL, num total de 21 formações ministradas a mais de 280 profissionais (Dezembro, 2012); Todo este projeto assenta em pontos-chave, baseados na literatura existente e na própria Circular Normativa n.º 15/2010 da DGS, que norteou toda a sua construção: 1.Critérios de ativação da EEMI 2.Recursos Humanos 3.Equipamento e material 4.Divulgação, dinamização e formação 5.Registos e Avaliação CRITÉRIOS DE ATIVAÇÃO A literatura sobre a temática salienta que independentemente da patologia base que ditou o internamento na instituição, existem uma série de sinais respiratórios, cardíacos e/ou neurológicos comuns e elucidativos da deterioração clínica do utente, que sendo devidamente valorizados, vigiados sucessivamente e adequadamente tratados e revertidos, poderão prevenir o agravamento incondicional do estado de saúde do utente e/ou a ocorrência da PCR. A observação desses sinais e a sua caracterização podem ser enquadrados num painel de critérios desenvolvidos ao longo dos anos pelos peritos da área, e que a DGS aconselha, como orientadores da ativação de uma EEMI. [1, 2,4] RECURSOS HUMANOS Diversos autores consultados e a própria norma da DGS são perentórios, ao afirmar que estas equipas devem ser constituídas por profissionais com formação e experiência em emergência e intensivismo, estando implícito o reforço destas equipas para conseguirem responder eficazmente a esta nova função.[1] A opção passaria então por alocar a EEMI ao serviço de Urgência ou à UCIP do HAL, os locais com maior concentração de profissionais com os referidos requisitos. A opção recaiu na UCIP do HAL, uma vez que a DGS ressalva este facto, ao direcionar este imperativo primariamente, para os hospitais com cuidados intensivos. A dinâmica impressa pela tutela, na reorganização dos serviços de urgência, acaba por determinar essa disposição, concentrando no serviço de Urgência, os serviços de emergência externa - Viatura Médica de Emergência e Reanimação (VMER) e na UCIP, a EEMI.[1] EQUIPAMENTO E MATERIAL Em termos de equipamento e material, a opção recaiu pelo reaproveitamento e reafectação de equipamentos menos utilizados, nomeadamente um monitor de transporte, equipamento de laringoscopia, entre outros. O material de consumo clínico estaria incluído nos gastos operacionais da UCIP, passando o investimento apenas pela aquisição de um saco de transporte específico e um telemóvel. Para isso foi atribuída uma linha telefónica dedicada, ficando como número de emergência interna o 7112 por uma questão de operacionalidade da central telefónica.[1] DIVULGAÇÃO, DINAMIZAÇÃO E FORMAÇÃO Este foi o maior desafio do grupo de trabalho, e sem dúvida o mais gratificante. Diversos autores referem que o início de uma EEMI implica sempre quebrar estatutos, mentalidades, barreiras, às vezes criadas ao longo de anos, alimentadas pela pesada hierarquização das organizações.[3, 4] O primeiro desafio colocado aos autores do projeto, passava pela apresentação do projeto à equipa da UCIP e tudo o que isso implicava em termos de aumento da carga de trabalho, novas funções e correspondente acréscimo de formação. O que inicialmente se assumiu como um fator de resistência, stresse e desconfiança, a seu tempo se tornou num fator de motivação, quer para os autores, quer para a própria equipa. Relativamente aos serviços do HAL, efetuou-se um plano de formação audacioso, que compreendeu 21 formações a 280 enfermeiros e médicos, abrangendo mais de 20 serviços clínicos, ao longo das duas primeiras semanas de dezembro. Estas sessões incidiram sobre a divulgação do projeto, formação específica sobre critérios de ativação, metodologia de avaliação sistematizada e procedimentos peri-reanimação. A recetividade percebida sobre o projeto foi excelente, pois precocemente as equipas do internamento compreenderam, o que o projeto representava em termos de melhoria da capacidade de resposta em situações de emergência e consequente acréscimo da qualidade dos cuidados prestados no HAL. Toda esta dinamização em torno da emergência intrahospitalar, não se esgota nestas formações iniciais, pretendendo o grupo de trabalho recomendar a sistematização da formação em Suporte Básico Vida e Suporte Avançado de Vida a todos os profissionais de saúde do HAL, um ponto bem vincado pela DGS como primordial em todo este processo.[2] REGISTOS E AVALIAÇÃO Um dos pontos normativos da DGS refere-se aos registos e avaliação do funcionamento das EEMI, inseridos em Programas de Melhoria da Qualidade. Para tal, cumprindo os pontos previstos, o grupo de trabalho construiu uma folha de registo específica, com o aval do Gabinete de Qualidade do HAL. Em relação à avaliação do seu funcionamento, o grupo de trabalho especificou alguns pontos de auditoria, a registar em suporte informático, que irão ser avaliados e relatados futuramente: 1.Número de ativações 2.Tipologia da ativação 3.Cumprimento de critérios 4.Relação ativações/número de internamentos 5.Relação Taxa de mortalidade antes/depois EEMI A REALIDADE DOS PRIMEIROS NÚMEROS Passadas 7 semanas do início de funções e em contexto académico, é-nos permitido trazer aqui já alguns resul- tados preliminares daquilo que tem sido as ações desenvolvidas pela EEMI do HAL, em ambiente hospitalar, no contexto de emergência. A tabela 2 traz-nos uma suma do registo do número total de ativações, média de idade das vítimas, tempos médios de atuação e a existência de critérios. De salientar a elevada idade média das vítimas, o baixo tempo de chegada ao local e o cumprimento do pedido de apoio da EEMI com base nos critérios de ativação previstos. Das 11 ativações aqui referenciadas, 9 tiveram como foco de atuação o internamento de doentes, tendo apenas 2, como destino, as áreas comuns do HAL. Gráfico 1 – Distribuição dos Critérios de Ativação da EEMI do HAL: Janeiro/Fevereiro 2013 Fonte: Registos 2013 EEMI/HAL Gráfico 2 – Evolução Clínica dos doentes atendidos pela EEMI do HAL: Janeiro/Fevereiro 2013 Fonte: Registos 2013 EEMI/HAL No gráfico 1 podemos ver quais os critérios mais comuns que ditaram a ativação da EEMI do HAL. Destacase do conjunto a PCR como critério mais frequente, o que vem de encontro aos objetivos iniciais que norteiam as metas desta e qualquer EEMI. No gráfico 2 podemos verificar qual foi a evolução clínica dos doentes atendidos pela EEMI, evidenciando-se a obtenção de melhorias destas vítimas, o que igualmente vem de encontro à metodologia subjacente a esta equipa, que promove a atuação e reversão precoce e atempada da deterioração clínica. No gráfico 3 apontamos qual foi o destino dado às vítimas atendidas, sendo de salientar que a maioria ficou internada no mesmo serviço, o que evidencia ganhos em saúde ao evitar a deslocação e internamento destes doentes em serviços mais diferenciados, com os consequentes aumentos de custos associados, para além da já evidenciada melhoria da deterioração clínica dos mesmos. Gráfico 3 – Destino dos doentes atendidos pela EEMI do HAL: Janeiro/Fevereiro 2013 Fonte: Registos 2013 EEMI/HAL REFLEXÃO A implementação com êxito de uma EEMI é um processo progressivo, que requer algum dinamismo e rigor e que não se esgota no simples fato de a colocar em funções. Para quem promove um projeto destes, continuar, implica certamente, dinamizar, formar, avaliar e evoluir. Da resistência inicial de alguns profissionais, aos potenciais gastos associados, há um certo número de variáveis que podem questionar toda a construção do processo. Contudo o carácter normativo da questão, associado ao empenho incondicional dos seus fomentadores, pode resultar num projeto importante, que a um dado passo, poderá constituir o ponto diferencial na qualidade da assistência, a um determinado utente, relegando para segundo plano essas variáveis bem identificadas. Os primeiros resultados aqui trazidos ainda não permitem tirar ilações conclusivas e alicerçadas sobre as vantagens de se ter uma EEMI em funções. Contudo, perante os parcos gastos associados até ao momento, em conjunto com o sucesso clínico já obtido nos doentes atendidos, revelam isso mesmo: A qualidade da assistência pode ser influenciada positivamente rumo à obtenção de ganhos em saúde, sempre difíceis de contabilizar exaustivamente. BIBLIOGRAFIA 1. Micaelo, F., Valente, J., Antunes, N., Lourenço, N., Costa, P., & Costa, P. (2012). Projeto Equipa de Emergência Médica Intra-Hospitalar. Castelo Branco. 2. DGS. (2010). Circular Normativa nº 15/DQS/DQCO de 22/06/2010. Retrieved setembro 10, 2012, from Direcção Geral da Saúde: http://www.dgs.pt/ ?cr=16312 3. Jones, L., King, L., & Wilson, C. (2009). A literature review: factors that impact on nurses’ effective use of the Medical Emergency Team. Journal of Clinical Nursing, pp. 3379-3390. 4. Laurens, N., & Dwyer, T. (2010). The effect of medical emergency teams on patient: A review of the literature. International Journal of Nursing Practice, pp. 533-544. 5. 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Padronização da Organização e Composição dos Carros de Emergência; Génese da Emergência Interna. Castelo Branco.
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