PDF - Associação Paulista de Homeopatia
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Gheorghe Jurj 23 Homeopatia em imagens: Diagnóstico diferencial da acne, Parte II Gheorghe Jurj Resumo Considerada do ponto de vista homeopático, a acne não é meramente uma patologia a ser curada, mas carrega em si indicadores semiológicos tanto para sua cura, quanto para o diagnóstico do remédio de fundo (constitucional tipológico) do paciente. Este é o segundo de uma série de artigos dedicados à análise das características individualizantes da acne. São utilizadas, primariamente, a semiologia visual e a análise através de grupos de medicamentos homeopáticos. A Parte II está dedicada ao medicamento homeopático Hepar sulphur e ao seu diagnóstico diferencial com o radical enxofre. Palavras-chave Acne; Homeopatia; Individualização; Semiologia visual; Hepar sulphur Homeopathy in images: Differential diagnosis of acne, Part II Abstract From the homeopathic perspective, acne is not merely a disease to be healed, but carries semiologic markers for both its treatment and to diagnose the constitutional (typological) medicine of the patient. This is the second of a series of articles devoted to analyze the individualizing characteristics of acne. For this purpose, visual semiology and analysis by means of classes of homeopathic medicines are used. Part II is devoted to homeopathic agent Hepar sulphur and its differential diagnosis relative to the sulfur class. Keywords Acne; Homeopathy; Individualization; Visual semiology; Hepar sulphur Médico homeopata, Doutor em Filosofia, Doutor em Medicina Alternativa, Presidente da Associação Romena de Homeopatia Clínica, Vice-presidente da Sociedade Romena de Homeopatia. [email protected]. 24 Revista de Homeopatia. 2012;75(1): 23-34 Um dos principais problemas no diagnóstico diferencial da acne é representado pelo caso de Sulphur propriamente dito e Hepar sulphur. No entanto, duas séries de fenômenos contribuem a dirimir a questão: 1) O caráter local da erupção, que é sensivelmente diferente, e radicalmente diferente, quanto às modalidades de agravação e melhora: Hep apresenta extrema sensibilidade ao toque, evolução mais lenta e mais localizada, e marcada tendência para progredir em profundidade. 2) O caráter geral do paciente: Sulph é calorento, Hep é friorento; Sulph é extrovertido, Hep é introvertido, com todas as consequências derivadas, tanto do ponto de vista psíquico, quanto físico. Assim, o que na literatura homeopática muitas vezes é relatado como um “Sulphur magro”, muito sensível ao frio, mas que não tolera o calor, tende mais frequentemente a se tratar de um caso de Hep. Na presente análise, considero o radical enxofre como o ponto de partida, porque as caraterísticas principais da acne de Hep são, neste sentido, simples e claras, e derivam da “atenuação do enxofre” pelo processo de calcinação necessário para a produção de Hep: Em Hep, a acne é retentiva, lenta e destrutiva, com expressão difícil da secreção, enquanto que em Sulph a evolução é mais rápida e explosiva. Em Hep, a erupção é prolongada, com períodos de agravação e de melhora, em Sulph, é muito mais rápida e ininterrupta. Em Sulph, as pústulas “amadurecem” mais rapidamente, e o conteúdo é fácil de exprimir, em Hep, a pustulização é difícil, dolorosa, lenta e a destruição é muito maior. Da onde, a tendência evolutiva: a evolução de Hep é mais lenta, porém persistente, enquanto que a de Sulph é mais rápida, com extensão tanto em superfície, quanto em profundidade. Ambos os medicamentos evoluem formando furúnculos, mas em Hep são muito mais frequentes, recorrentes, dolorosos e sua evolução é mais lenta. Hep apresenta acne e também (ou só) furúnculos de repetição, amiúde em localizações “ocultas” (como Med, Merc ou Thuj) especialmente nas axilas (hidrosadenite), que muitas vezes têm indicação cirúrgica. Ao contrário, Sulph não “escolhe” a localização, mas apresenta furúnculos e processos inflamatórios por toda parte, por vezes associados com complicações. Nesse sentido, Hep é “seletivo”: afeta determinadas áreas e deixa outras indenes, embora, eventualmente, também possa associar-se com infecções sistêmicas. De fato, nos casos de infecções sistêmicas com ponto de partida cutâneo, Hep é um dos medicamentos de primeira linha (ao lado de Ars, Lach e Merc). Gheorghe Jurj 25 A acne é extremamente dolorosa em Hep. A sensibilidade pode ser tão extrema que não só as grandes, mas também as mínimas infecções causam dor, às vezes sem proporção com o grau da foliculite. A hipersensibilidade abrange um largo escopo de fatores ambientais: correntes de ar, frio, calor, aplicações locais e, especialmente, o toque. E assim, a pressão exercida para “apertar espinhas” embora dolorosa, após produza melhora local em Sulph, no caso de Hep leva a agravação e extensão em profundidade da acne. Por esse motivo, particularmente estético, deve advertir-se aos pacientes de Hep para não exprimir as pústulas enquanto ainda não apresentarem solução de continuidade – como no caso de todos os medicamentos sifilíticos (derivados de flúor, bromo, mercúrio e Lach). Ambos os medicamentos são congestivos, no entanto, a congestão tende a estender-se em profundidade em Hep e em superfície, em Sulph. Com outras palavras: Sulph é mais centrífugo e à inspeção, apresenta-se mais eritematoso, enquanto que Hep é mais localizado e mais profundo. Sulph tende a pustulizar na superfície, enquanto Hep tende a progredir em profundidade e permanentemente, da onde a destruição tissular é mais marcada. No entanto, deve levar-se em conta que nos casos de acne mais prolongada, também Sulph pode produzir destruição em profundidade. Assim, ambos os medicamentos podem deixar “estigmas sulfúricos” na pele: cicatrizes deprimidas de forma e tamanho diferentes, geralmente sobre um pano de fundo de pele oleosa. Deve remarcar-se que em todos os medicamentos do radical enxofre, o fundo das cicatrizes permanece congestivo durante longo tempo, mesmo depois do desaparecimento da foliculite ou da acne propriamente dita. As sensações gerais e locais são em parte similares (sensação de ardor local, queixas digestivas e nevrálgicas) e em parte diferentes (Hep agrava pelo frio e Sulph pelo calor). Assim, por vezes a demarcação entre esses dois medicamentos não é definida, especialmente depois de que a noção de “Sulphur magro” foi introduzida pela escola francesa e que inclui todas as características de Hep. Nesse sentido, deve observar-se que esses medicamentos podem complementar-se ou seguir-se um ao outro, levando estritamente em conta as diluições respectivas. No caso de um “Sulphur magro”, pode utilizar-se uma diluição mais baixa de Sulph, seguida de uma diluição alta de Hep. No caso de um Sulph rubicundo, calorento e congestivo, com acne cujas pústulas são difíceis de exprimir, pode utilizar-se Hep em diluições intermédias (30cH), seguido de Sulph em diluição alta, depois da eliminação da secreção. Sintetizando Hep é um Sulph magro, friorento, sensível a toda forma de frio em geral, mas com o padrão caracteristicamente psórico de agravação pelo calor da cama. 26 Revista de Homeopatia. 2012;75(1): 23-34 Além disso, apresente os medos, fobias, ansiedades e obsessões do radical carbono. No entanto, enquanto compensado, os traços psíquicos podem não se manifestar acentuadamente. Hep é um excelente medicamento para drenar abscessos difíceis e na minha opinião, a caracterização mais sucinta é “um Sulph frio, que agrava pelo frio, com muitos furúnculos e abscessos e, frequentemente, ideias fixas obsessivas”. Caso I: paciente de sexo feminino, 21 anos de idade. Fig. 1. Observe-se a distribuição da acne: predomina em algumas áreas, com elementos isolados na parte superior da bochecha, mas um conglomerado ao lado da boca e na região maxilar. Essa “distribuição interrompida” da acne, diferente da distribuição em Sulph, aparece também em outros medicamentos do radical enxofre (Calc-s, Kali-s, Nat-s) e nos permite distinguir entre Sulph puro e seus sais. Fig. 2. Detalhe da acne na região maxilar, apresentando muitas características sulfúricas. Na parte superior, elementos foliculíticos isolados, na parte inferior, o aspecto típico: sobre um fundo eritematoso e congestivo, pápulas muito próximas, pústulas pequenas, quase puntiformes, na superfície. Observese as áreas de pele sadia acima das lesões e a cor vermelha intensa do eritema basal. Gheorghe Jurj Fig. 3. Detalhe da face. Do lado da congestão, pápulas e pústulas puntiformes, esbranquiçadas, superficiais. Podem observar-se os primeiros sinais das futuras cicatrizes, como áreas afundadas e congestivas. Fig. 4. Detalhe de área eritematosocongestiva-papular típica do radical enxofre. A pele parece formar uma placa congestiva, ao redor da qual se localizam alguns elementos pustulosos, com pontas amarelo-esbranquiçadas. Em Hep, estas áreas são muito sensíveis ao toque, a expressão das pústulas agrava tanto a erupção, quanto a dor local. Fig. 5. Detalhe no lado esquerdo da face. Observe-se a presença de elementos foliculíticos no nível do lábio inferior (Nat-m) e a presença de crostas finas depois da expressão do conteúdo. 27 28 Revista de Homeopatia. 2012;75(1): 23-34 Fig. 6. Detalhe da foliculite labial, com ampla base congestiva, sem pustulização; crosta fina de cor amarelada depois da expressão do conteúdo. Fig. 7. Detalhe de lesão incipiente, aonde a inflamação aparente é mínima. Só se vê duas pápulas congestivas e muitos elementos pseudocísticos, nodulares, com ponta de cor preta (comedões). Daqui, a lesão pode estenderse em profundidade e em superfície, resultando no aspecto descrito mais acima. Gheorghe Jurj 29 Fig. 8. Sinais concomitantes: lábio inferior com rachadura medial profunda; lábio superior com proeminência medial (“lábio de anta”). Fig. 9. O mesmo aspecto do lábio superior numa criança de 5 anos, tratada com Hep. Caso II: Paciente com depressão e furunculose de repetição. Fig. 10, 11. Aspecto característico da pele de Hep, Poros muito dilatados, inclusive em localizações pouco comuns, como a região subnasal. A pele está infiltrada na superfície e é oleosa. Lábios secos, múltiplas rachaduras verticais no lábio inferior e proeminência medial no lábio superior. 30 Revista de Homeopatia. 2012;75(1): 23-34 Caso III: Paciente de 17 anos de idade, com acne juvenil rebelde. Depois do tratamento com Hep, a acne curou, mas ficaram leves “estigmas sulfúricos” na face e elementos característicos deste medicamento. Fig. 12. Depois do tratamento: elementos foliculares congestivos, isolados, tendendo para a cura, depois da redução da congestão e da tendência confluente. A pele é oleosa, com poros dilatados e muitos pseudo-cistos. Fig. 13. Detalhe: sobre o fundo de pele oleosa, alguns folículos proeminentes e cicatrizes (os futuros “estigmas”), que ainda conservam o fundo congestivo; algumas são bastante profundas, outras mais superficiais, depois da queda das crostas. Gheorghe Jurj 31 Fig. 14, 15. Dez anos mais tarde, depois de um período de estresse pessoal e profissional (mestrado, noivado, competências esportivas), consulta por foliculite facial, com elementos que indicam o mesmo medicamento. “Estigmas sulfúricos” nas bochechas e têmporas, com aspecto de cicatrizes retráteis, afundadas, com forma e profundidade diferente, mas nem tão profundas nem largas como em outros medicamentos sifilíticos (derivados de bromo, flúor, mercúrio); distribuição irregular das áreas afetadas. Fig. 16. Detalhe dos “estigmas sulfúricos”: cicatrizes puntiformes correspondentes a um único folículo, que podem ser confundidas com poros dilatados; cicatrizes mais longas e anfractuosas, correspondentes à afecção de vários folículos. A destruição tissular limita-se ao nível da derme (à diferença dos medicamentos sifilíticos, que também podem afetar a hipoderme). Linhas de fibrose que alteram a estrutura normal da pele. O aspecto é como de pequenas “crateras”, que persistem congestivas durante longo tempo. 32 Revista de Homeopatia. 2012;75(1): 23-34 Fig. 17,18. Foliculite recente, no limite entre a pele e a mucosa (embaixo do lábio inferior e do nariz). Inicialmente, as lesões se compõem de pústulas bem definidas, separadas, sobre um fundo congestivo, para após se estender. Fig. 19. A foliculite no couro cabeludo foi o motivo de consulta 10 anos depois da cura da acne juvenil. Elementos iniciais bem delimitados, porém, já com a tendência para confluir em profundidade, levando ao aparecimento de indurações locais muito dolorosas ao toque (mesmo, ao pentear). Fig. 20. Supuração típica de Hep, depois da expressão das pústulas: branco-amarelada, grossa (por vezes, com consistência caseosa), aderente e fétida. Gheorghe Jurj 33 Fig. 21. Crostas aderentes, amareladas, úmidas, sobre fundo congestivo, no couro cabeludo, depois da eliminação das pústulas. Caso IV: rosácea, que apareceu depois de dar à luz o segundo filho, com 34 anos de idade, num contexto de esgotamento e preocupações. Fig. 22. Múltiplos elementos foliculíticos no nariz, ao redor da boca e no queixo, sobre fundo eritematoso, extenso em superfície, mas pouco em profundidade. A observar, foliculite no limite entre a pele e a mucosa labial e as bochechas limpas. As lesões são extremamente dolorosas ao toque. Agrava por nervos, frio, calor excessivo, por temperos, tomate, lacticínios em excesso. Concomitantemente, lábios secos e rachaduras verticais. 34 Revista de Homeopatia. 2012;75(1): 23-34 Fig. 23. No detalhe, múltiplos elementos foliculíticos ao redor da boca; o contorno dos lábios é descontínuo e esfumaçado. No queixo, fundo congestivo, elementos foliculares isolados, mas com tendência para se agrupar formando ramalhetes. Pustulização difícil, a formação do pus é lenta, a secreção é pouca ou ausente, dói à expressão, que agrava a erupção.