Interdisciplinar: Revista Eletrônica da UNIVAR

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Interdisciplinar: Revista Eletrônica da UNIVAR
Interdisciplinar: Revista Eletrônica da UNIVAR
http://revista.univar.edu.br
Ano de publicação: 2014
N°.:11 Vol.:1 Págs.241? - 245
ISSN 1984-431X
ENTRE REPRESENTAÇÕES E FRONTEIRAS DO ÍCONE: O CASO DAS
ONOMATOPEIAS EM MANGÁS JAPONESES
Francisca Lailsa Ribeiro Pinto1 George Lima² Ederson Luís Silveira³
RESUMO: Neste artigo, nos propomos analisar a iconicidade diagramática das onomatopeias nos quadrinhos japoneses.
Com base nos estudos teóricos da Teoria Geral dos Signos, proposto por Charles Sanders Peirce, dos quais nos
serviremos do modo de representação icônico, centrada na iconicidade diagramática, configuraremos o reconhecimento
de iconicidade evocado por suas qualidades sensoriais, imagéticas. Além disso, consideraremos as contribuições dos
estudos de Sônia B. Luyten sobre o aspecto semiótico das onomatopeias dos quadrinhos japoneses. Analisamos, então,
as onomatopeias dos mangás para tentar elucidar a forma como o ícone se assemelha levando em conta sua
convencionalidade.
Palavras-chave: Mangá. Iconicidade diagramática. Onomatopeias.
ABSTRACT: In this article, we propose to analyze the iconicidade of comic Japanese onomatopoeias diagrammatic.
Based on theoretical studies of the general theory of Signs, proposed by Charles Sanders Peirce, from which we will
serve us iconic representation mode, centered on diagrammatic iconicidade, we'll set up the recognition of iconicidade
evoked by sensory qualities, imagistic. In addition, we will consider the contributions of the Sonia b. Luyten studies
about the semiotic aspect of onomatopeias Japanese comic. We analyze the onomatopoeias of manga to try to elucidate
how the icon resembles taking into account its conventionality.
Keywords: Mangá. Diagrammatic Iconicidade. Onomatopoeias.
Mestranda em Letras pela Universidade Federal da Paraíba – UFPB/ Bolsista CAPES.
² Graduando em Letras pela Universidade do Estado da Bahia – UNEB.
³Mestrando em Linguística pela Universidade Federal de Santa Catarina –UFSC, graduado em Letras pela Universidade Federal do Rio Grande-FURG
(RS), membro do FORMATE- Grupo de Estudos em Territorialidades da Infância e Formação Docente da Universidade Estadual do Sudoeste BaianoUESB.
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1. INTRODUÇÃO
1. 1.Situando o percurso...
As situações cotidianas envolvem a prática
constante de elementos verbais e não-verbais,
tipologias sígnicas que pode ser observadas compondo
a tricotomia peirciana dos modos de representação do
signo em relação ao seu objeto: o símbolo, o índice e o
ícone. No entanto, por interpretação, podemos
reconhecer de forma mais elevada um desses níveis de
representação. Neste artigo, analisamos através dos
exemplos envolvendo as onomatopeias japonesas à
iconicidade diagramática, cuja ênfase recai sobre a
apreensão de sentido dado a partir da representação da
imagem gráfica num texto e a correspondência do
efeito sonoro e visual provocado.
1. 2.O que parece só parece: o fundamento do ícone
Se um Signo é algo distinto de seu objeto,
deve haver, no pensamento ou na expressão,
alguma explicação, argumento ou outro
contexto que mostre como, segundo que
sistema ou por qual razão, o signo representa
o Objeto ou conjunto de Objetos que
representa. (PEIRCE, 2010, p. 47).
Neste artigo, investigamos os paradigmas
representacionais que potencializam os signos
presentes no nosso corpus de análise enquanto
representamens icônico-diagramáticos. Mas, para isto,
foi preciso apontar antes os procedimentos utilizados
no manuseio das informações, isto é, algumas
proposições que fundamentam os paradigmas de
representação observados por nós.
Para falarmos do ícone é preciso retomar a
noção de representação decantada por Peirce em seus
tratados. Ligado a este conceito, encontramos a
definição de signo. Segundo Peirce (2010, p. 46), o
signo é tudo aquilo que representa algo a alguém (seja
uma formula matemática, um monitor, uma palavra,
um grito, uma dor, etc.). Ao levar em conta esta
definição de signo, podemos perceber a relação entre
três correlatos, isto é, a forma ordenada de um processo
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lógico acontece entre três elementos: 1) o signo ou
representamen, aquilo que está representando algo em
uma mente leitora; 2) o objeto, o algo representado
pelo signo; e 3) o interpretante, que é o outro signo
criado e determinado pelo representamen na mente
interpretadora.
Neste sentido, há um fator importante a
respeito do signo nesse acarretamento determinante.
Referimo-nos a função do signo. O que fundamenta o
funcionamento de um signo? Eis uma das
características mais importantes que fundamenta a
semiótica peirciana e, também, ponto crucial de nosso
trabalho, tendo em vista o modo com que faremos a
analise do corpus no presente trabalho.
Conforme Peirce (2010, p. 47), o signo possui
um preceito que justifica sua natureza de algo que
surge a partir de seu objeto. Tal natureza que dá ao
signo função de primeiro correlato de uma semiose é
chamada de fundamento do signo. Esse poder é devido
aos modos de apresentação do signo que traz/leva o
objeto representado a uma mediação com o
interpretante gerado.
Com base nos postulados de Peirce,
percebemos que o signo possui uma essência que o
define como primeiro correlato de um processo de
representação, entendendo desse modo uma qualidade
que o coloca enquanto representante de um objeto.
Esse fundamento é, na verdade, a relação entre objeto e
o signo, que pode acontecer de três maneiras: de forma
qualitativa, existencial e/ou convencional. Santaella
acrescenta:
Para Peirce, entre as infinitas propriedades
materiais, substanciais etc. que as coisas
têm, há três propriedades formais que lhes
dão capacidade para funcionar como signo:
sua mera qualidade, sua existência, quer
dizer o simples fato de existir e seu caráter
de lei. Na base do signo, então, como se
pode ver as três categorias fenomenológicas.
Ora, essas três propriedades são comuns a
todas as coisas. Pela qualidade, tudo pode
ser signo, pela existência, tudo é signo, e
pela
lei,
tudo
deve
ser
signo.
(SANTAELLA, 2010, p. 12).
Nesse fragmento, podemos notar as tipologias
de fundamento que um signo pode ter em relação com
o seu objeto, as quais podem ser observadas quando é
considerado as três mais notáveis classificações de
signo nos estudos semióticos: 1) ícone, quando a
relação do signo com seu objeto, ou melhor, quando o
fundamento do signo for de semelhança (qualitativa);
2) índice, quando o fundamento do signo for uma
conexão existencial; e 3) símbolo, quando o
fundamento do signo for uma lei.
Convêm apontarmos aqui a existência de dois
tipos de objetos, elementos essenciais para o
entendimento dos processos representativos. Estes são
caracterizados como: objeto imediato e objeto
dinâmico. Em relação ao objeto imediato podemos
dizer que se trata dos aspectos do fundamento do signo
que remetem aquilo que está sendo representado, neste
caso, o objeto dinâmico (determinante do signo). Este é
dinâmico por só ser tangível por meio do objeto
imediato. Como observamos anteriormente, essa
conexão acontece também de forma triádica: relação de
semelhança, de conexão existencial e convencional.
Como vimos, quando as características que
fundamentam o signo mantêm uma determinada
relação de semelhança com o que está sugerindo,
chamamos esse signo de Ícone. Mas como funciona
essa relação de semelhança?
Muitos teóricos costumam dizer que os ícones
na sua pureza qualitativa efetivamente não representam
nada, senão puras qualidades, elementos sensoriais,
sentimentos (visuais, verbais e sonoros), uma vez que o
procedimento de representação é o fundamento do
signo no seu terceiro nível fenomenológico (o
símbolo). Tal aspecto do ícone mostra esse teor alto de
sugestão, isto é, qualquer qualidade tem o poder de
substituir aquilo que se assemelha a ela. Daí as
imprescindíveis relações de comparação entre pessoas
que muitas vezes fazem mais sentido para aquele que
faz tal intersecção entre os semelhantes, por exemplo.
Peguemos mais um exemplo para clarearmos a
ideia do que seja um ícone. A contemplação das
nuvens, por exemplo.
Quem nunca parou para
observar o formato de uma nuvem? Quando paramos
para contemplar as sinuosas formas de uma
determinada nuvem na imensidão azul do céu,
tendemos a procurar nestas silhuetas (que são
inquestionavelmente qualidades) algo que fundamente
esta nuvem como semelhante a algo. Diante desta
postura comparativa, tendemos dizer que a nuvem
parece com um cachorro, com um barco, com um
cavalo ou parece uma cachoeira. Ora, essas formas das
nuvens não representam de fato todos esses objetos.
Podem, no máximo, sugeri-las. Não é atoa que os
interpretantes criados na mente a partir de um ícone são
chamados de hipotéticos, uma vez que não têm a
Secundidade para dar a este interpretante a natureza
dicente nem a Terceiridade para tornar o interpretante
um argumento, ou seja, os interpretantes hipotéticos
são possibilidades de conexões qualitativas entre aquilo
que se percebe e aquilo que se dá conta na percepção.
Em outros termos, o que parece só parece.
São exemplos de ícones os esquemas, as
maquetes, os desenhos, entre outros, pois mimetizam
algo semelhante ao que apresentam. A identificação
desse signo é alcançada quando associamos os aspectos
qualitativos entre o signo e o objeto dinâmico.
Costumamos dividi-lo em três tipos de ícones seguindo
a lógica triádica-vertical da semiótica: 1) as imagens,
2) os diagramas e 3) as metáforas.
Levando em conta a premissa fenomenológica
da Primeiridade, os ícones enquanto imagens (não
tomando imagem aqui como corriqueiramente é
considerada) são meras aparências, “são as qualidades
primeiras – forma, cor, textura, volume, movimento
etc. – que entram em relação de similaridade e
comparação, tratando-se, portanto, de similaridade na
aparência” (SANTAELLA, 2008, p. 120).
Considerando o caráter fenomenológico de
Secundidade, os ícones são chamados de diagramas.
Não são mais as aparências que regem a semelhança
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entre o representamen e o objeto, porém as relações
internas do signo que se assemelham as relações
internas do objeto sugerido. Na aparência, pode não
haver nenhum tipo de semelhança entre o
representamen e o objeto, mas as relações entre as
partes que compõem o representamen e as relações
internas do objeto. Os mapas podem ser citados aqui,
pois, aparentemente, não mantém relação de
semelhança com aquilo que representa, mas quando
passamos a comparar as relações internas que
compõem o mapa com as relações internas que
compõem o espaço geográfico de um continente, por
exemplo, podemos entender o porquê de o mapa ser
tomado como ícone do continente sugerido.
Já as metáforas, tomadas aqui como ícones
no nível fenomenológico de Terceiridade, fazem um
paralelo entre o caráter representativo de um signo
convencional com outro caráter representativo de outro
signo convencional para tentar representar um objeto
possível. Por exemplo, a expressão “morte social”. A
“morte” aí não significa a morte ipso facto, pois, ao
fazer um paralelo com o caráter representativo do
sintagma “social”, constrói outro significado: a
finalização dos status que permitem um indivíduo ser
considerado participante de uma sociedade ou de um
dado grupo.
Finalmente, retomando o que dissemos a
respeito da funcionalidade do ícone e levando em conta
o objetivo do presente artigo, vejamos como e porque
os signos onomatopeicos, que compõem os mangas
utilizados enquanto corpus deste trabalho, possuem o
aspecto e a funcionalidade de ícones diagramáticos
referente àquilo que representam no curso de sua
significação.
1. 3.O mangá em foco: a iconicidade diagramática
das onomatopeias
A expressão “onomatopeia” tem raiz
etimológica grega (onomatopoiía), que significa a ação
de reproduzir por imitação a imagem sonora de uma
ocorrência linguística numa determinada ocorrência
gráfica de uma língua. Claro que, a definição da
onomatopeia não compõe os estudos sobre a Semiótica,
no entanto, sua ideia pode ser clareada quando
consideramos algumas premissas que configuram a
semântica do que entendemos por semiose. Entre estas
premissas, podemos destacar o conceito de ícone.
A eficiência da representação icônica consiste
numa tomada de posição especifica dos eventos por
parte do enunciador, o qual utiliza os quali-signos das
normas convencionais de uma determinada ocorrência
linguística na construção de significados específicos
durante a realização do suporte a que se encontra a
onomatopeia.
Ao tratar sobre o uso das onomatopeias nos
quadrinhos japoneses (o mangá), é necessário polidez
em relação aos hábitos e costumes do oriente para não
causar certos atritos sociais. O idioma japonês se serve
das onomatopeias na sua linguagem escrita e falada,
ampliando a expressividade dos sons identificados no
cotidiano. O katakana é, corriqueiramente, o sistema
silabário para representação das onomatopeias nos
quadrinhos japoneses. A forma japonesa no mangá em
relação à representação do som das onomatopeias é tão
preciso e harmônico que os elementos estruturais
possuem semelhança imediata com aquilo que
representa.
Diante do abundante número de onomatopeias
presente no vocabulário japonês, ocorre que estas
foram divididas em categorias para descrever
sentimentos, ruídos, vozes de animais. Assim, o giseigo
é a onomatopeia das vozes – “palavras imitando sons
humanos ou de animais”, e o giongo é a onomatopeia
do som – que “imitam sons ouvidos-como o bater de
um sino ou estraçalhar de uma madeira”. Há ainda a
categoria de mímesis – “palavras que expressam, em
termos descritivos e simbólicos, os estados ou
condições de serem animados ou inanimados, assim
como mudanças ou fenômenos, movimentos,
crescimentos de árvores e plantas da natureza” – que
subdivide em gitaigo – “não expressa nenhum som” – e
gijogo – “descrevem emoções ou sentimentos
humanos”. (LUYTEN, 2002, p. 181).
Um aspecto importante em relação as
onomatopeias defendido por Luyten (2002) é o de que
há palavras com mais de uma interpretação, a variação
dependerá do contexto e do repertório do leitor. Então,
como menciona a autora, a palavra “kara-kara”, por
exemplo, pode expressar o som de objetos duros ou
finos chocando-se (giseigo-voz), além de uma ação
rotativa (giongo-sons) e emoções humanas como riso
alto (gitaigo-natureza/gijogo-sentimentos).
Nas histórias em quadrinhos japonesas, por
exemplo, os desenhistas costumam registrar as
onomatopeias ligando-as diretamente à representação
da cena, facilitando aos leitores não fluentes na língua
japonesa. Para este estudo teremos como corpus as
onomatopeias descritas fora dos balões de diálogo. Os
exemplos pertencem ao Shojo mangá (voltadas para o
público feminino), Card Captors Sakura, da editora
CLAMP (1997), editado no Brasil pela JBC (1997),
com tradução de Luiz Octávio Kobayashi (volumes 4 e
5).
Atualmente a preocupação dos editores em
manter a grafia das onomatopeias nos aproxima ao
máximo da expressão ilustrada e descrita dentro
mangá. No exemplo que se segue, temos a abreviação
da palavra “niko” traduzido como sorriso gentil, esta
vem de “nikori”, sendo o fonema /ri/ associado à ideia
de suavidade ao movimento do sorriso delicado:
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(Sakura Card Captors, v 4, p. 48, 2 e 3 quadrinho:
sorriso suave)
Notamos na imagem do mangá de Sakura
(Card Captors) a iconicidade diagramática da
onomatopeia grafada em hiragana (e não katakana
como
costumeiramente)
assemelhando-se
ao
movimento do sorriso feminino japonês, já que este
silabário possui formas mais arredondadas associadas
ao universo do Shojo e intimamente ligado ao
significado do efeito causado na cena. Aqui, ocorre a
mimesis gitaigo “niko”, sorriso delicado que Sakura
troca com sua amiga de escola Rika. Se grafado em
katakana (como normalmente acontece) poderia sugerir
um certo distanciamentos das personagens, o que não é
verdade.
Temos, portanto, o diagrama correlacionado
com o processo de aspecto sensorial provocado em nós
pela semelhança das relações, além do recurso visual e
linguístico construindo a ponte sinestésica do leitor
com texto, tido como iconicidade diagramática.
Outro caso tipicamente diagramático dentro
do quadrinho japonês são relacionados ao tempo e o
ritmo de leitura. As onomatopeias mimeticamente
imitam a velocidade dos acontecimentos quase como o
movimento das ideias que perpassam pela mente das
personagens. Notamos tal efeito na disposição dos
quadros, poucos balões de diálogos, a ênfase recai
sobre as onomatopeias, além da grafia do desenho
pouco detalhado (mesmo se tratando do refinamento do
traço japonês), como na cena:
(Sakura Card Captors, v. 5, p. 27, 1 e 2 quadrinho:
vermelho-expressão).
Peirce (2010) nomeia ainda a existência de
signos icônicos auxiliados pela representação do modo
simbólico. No exemplo anterior, notamos que a
onomatopeia “Kaaaaaa” está intimamente ligada a
expressão de vergonha das personagens Sakura e
Shoran Li marcada pelos traços no rosto
(traduzido/interpretado pela palavra vermelho). A
construção do quadrinho japonês auxiliado pelo
movimento de expressão das personagens e a sequência
das onomatopeias descrevem o efeito diagramático.
Nas palavras de Cagnin (1975, p. 46):
capacidade de organizar as sensações
recebidas e de as relacionar com os dados
que envolvem ou antecedem a comunicação
visual; estes dados formam o que chamamos
de contexto.
Ou seja, a onomatopeia do mangá movimentase diagramaticamente à cena representada, e a
linguagem verbal atrelada a linguagem visual se
correspondem em sequência no discurso, bem como o
desenvolvimento do tempo durante a leitura. Este
segue o envolvimento dinâmico da disposição dos
quadros acoplado à leitura do interpretante, causando
assim o efeito real da narrativa através da percepção
subjetiva do leitor na cena descrita (jogo com o
imaginário).
Não há dúvida que os elementos gráficos das
onomatopeias produzem experiências sensoriais
(agressividade, sentimentos delicados, movimentação
afetiva, os ruídos dos animais etc.) que predomina o
modo de representação simbólico. No entanto, a
representação gráfica do quadrinho japonês atinge um
grau elevando quando compartilha com o leitor as
cenas análogas às que estão figuradas, recurso este
manifestado como iconicidade diagramática.
Segundo Expedito Ferraz Junior (2012, p. 66):
“outro campo teórico em que se aplica com proveito a
noção de iconicidade é o da tradução de obras
literárias. Traduzir é eleger (ou construir) um signo
equivalente para o mesmo objeto”. A tradução, aqui,
dos quadrinhos japoneses, obra artística, para o Brasil
requer uma certa preocupação dos editores para manter
as ilustrações sem alterá-las. Mantem-se a grafia do
mangá e a tradução aparece em uma fonte menor ou em
nota de rodapé próximo a onomatopeia.
Nessa perspectiva, a recriação do que é
representado envolverá a busca icônica de traços
semelhantes entre as duas mensagens, ou seja, a
original e sua equivalência. Os editores investirão nos
diagramas analógicos, por efeitos que remetem ou se
relacionam com o quadrinho original. Para ilustrar,
primeiramente,
observaremos
a
onomatopeia
gitaigo/giseigo “patapata”.
“Patapata” é uma onomatopeia de som e
representa o barulho de passos, pessoa andando, sugere
batidas. Em português, foi traduzido por “tap” e seu
significado nos remete a tradução do inglês “pancada
leve” e/ou “bater levemente”. A equivalência entre
ambas é notável, pois “patapata” figurativamente
parece ser tão angelical quanto sua tradução “tap” com
efeito da disposição das onomatopeias.
Já “tap” é utilizado na reprodução de sons
suaves. E, portanto, lembramos dos novos modelos de
aparelhos celulares, que são touch screen, se fala “tap”
como apertar com o dedo (toque leve, sensível), e
equivalente tanto em inglês como em português. Ao
traduzir “patapata” por “tap” os editores se valem da
fiel musicalidade do ruído de passos, percebido em:
Ao receber um estímulo vindo diretamente
de um objeto ou de uma imagem gráfica,
podemos perceber o objeto real e receber
outras informações acessórias, se houver
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todo trabalho é inconcluso e propenso a releituras e
modificações assim como os sujeitos que pesquisam,
que leem e que estudam os fatos da linguagem...
3. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CAMPOS, A.; PIGNATARI, D.; CAMPOS, H. Sobre
poesia oral e poesia escrita. In: _____. Teoria da
poesia concreta: textos críticos e manifestos 19501960. Cotia, SP: Ateliê Editorial, 2006. p. 23-26.
CAGNIN, A. L. Os quadrinhos. São Paulo: Editora
Ática, 1975.
(Sakura Card Captors, v. 4, p. 30, 3 quadrinho:
passos).
CLAMP. Trad. Luiz Octávio Kobayashi. Card Captors
Sakura. São Paulo: JBC, 1997, vol. 4.
Na sequência, observamos que a onomatopeia
é grafada em hiragana fazendo alusão aos passos da
personagem que é feminina, Sakura. Além da
aproximação semântica, o traço delicado do desenho
japonês faz sintonia com a semelhança da tradução.
Sem
prejuízo
de
significados
e
grafada
harmonicamente, prevalece na onomatopeia a
iconicidade diagramática sensorial.
Os exemplos apresentados servem para
demonstrar que certos sons e padrões de sons ocorrem
para representar o potencial icônico analógico. Um
potencial que as onomatopeias dos quadrinhos
japoneses,
mangá,
geralmente
exprimem,
transfigurando a convencionalidade em fenômenos
similares motivados por aspectos sensoriais e/ou
imagéticos.
_____. Trad. Luiz Octávio Kobayashi. Card Captors
Sakura. São Paulo: JBC, 1997, vol. 5.
2.CONSIDERAÇÕES FINAIS
No caminho que aqui traçamos, procuramos
apresentar o fato de que as onomatopeias possuem
valor icônico diagramático representado por meio dos
elementos gráficos atrelados ao nível do interpretante.
Sabendo que os recursos visuais, sonoros e sensoriais
correlacionados diagramaticamente produzem uma
espécie de sinestesia é fácil reconhecer que os
significados e as qualidades relacionados ao objeto
configuram as diversas maneiras da convencionalidade
do diagrama.
Neste sentido, a análise, proveniente dos
estudos peircianos e dialogado com outros autores,
apresenta uma das possíveis interpretações aplicáveis a
iconicidade diagramática. As categorias trabalhadas
apontam meios e não fins e, por essa razão, o modo de
representação elencado possui níveis de leituras que
acarretará em efeitos distintos, de acordo com os
pressupostos teórico-metodológicos utilizados para
análise do corpus de estudo. Deixamos aqui o caminho
das reticências para que este trabalho sirva de
inspiração para trabalhos posteriores, que visem
problematizar sob outros aportes teóricos ou mesmo
sobre a mesma inscrição de estudos, para que venham
os próximos trabalhos (não necessariamente dos
autores deste) lançar luzes, assim como este, à temática
em questão e venham somar, tensionar, problematizar
ao invés de soberbamente apresentar conclusões, pois
FERRAZ JUNIOR, Expedito. Semiótica aplicada à
linguagem literária. João Pessoa: Editora da UFPB,
2012.
LIMA, George. A tradução e a relação triádica do
signo. (no prelo)
LUYTEN, S. M. B. Onomatopeias e mimesis no
mangá: a estética do som. Revista USP. São Paulo,
2001-2002, n. 52, pp. 176-188.
PEIRCE, Charles S. Collected papers. C. Hartshorne e
P. Weiss. eds. (v. 1-6). Cambridge, MA, Harvard
University Press [durante o texto referido como CP; os
números das citações referem-se respectivamente aos
volumes e parágrafos] 1931-1958.
_____. Semiótica. Tradução de José Teixeira Coelho
Neto. 4ª ed. São Paulo: Perspectiva, 2010.
SANTAELLA, Lúcia. O que é semiótica. São Paulo:
Brasiliense, 2004.
_____. Teoria geral dos signos: de como a linguagem
significa as coisas. São Paulo: Cengage Learning,
2008.
245