A Disneylíada
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A Disneylíada
Gogol Alexander A Disneylíada Uma história de duas cabeças Ilustração provisória Editora Vaga _____________________________________________ Copyright Biblioteca Nacional Alexander Gomes Título : A Disneylíada Sub-título: Uma história de Duas Cabeças Ilustração : Duca Mendes Revisão: Vinícius Gonçalves Reg prof : 0000000 Dados internacionais de publicação Câmara Brasileira do Livro Alexander, Gogol,1963 – A Disneylíada ISBN 0000000000000 1 – crônicas de viagem 2 – guia de viagem 2007 todos os direitos reservados Editora Vaga A Disneylíada Para Manu Apresentação Este NÃO é apenas mais um guia de viagens. Vem com a voz de autor estreante numa viagem pop, a Disney da Flórida. Quase um diário de viagens. E ainda tem comparações com a Ilíada, história famosa na Idade Antiga. Se uma coisa tem a ver com a outra, aí, a decisão é do seu ouvido, amigo leitor, querida leitora. Mas também é um guia de viagens, como todos os outros. Basta ficar na primeira parte do livro, onde estão as listas de coisas para checar, ver e fazer quanto se vai à DisneyWorld. Vamos nomear esta primeira parte de Fast Lane, via rápida, que vai lhe ajudar a enxergar bem naquelas terras distantes e cheias de nomes estranhos, Orlando, Kissimee, Osceola, Tampa. Se gostou da Fast Lane, querendo mais, estamos aí, com um pouco de cultura clássica, universal. A Ilíada é um poema épico-religioso, quinze mil versos, escrito por Homero, um Aedos, um tipo de contador de histórias bem popular no século VIII AC. Foi o primeiro poeta na história do mundo a virar celebridade. Ele escreveu ainda a Odisséia e várias outras aventuras em verso, e as declamava em praças lotadas. Na Ilíada, Homero narra uma guerra há 3,2 mil anos, entre os Aqueus – antepassados dos gregos - e os Troianos, com a participação mais do que especial de Zeus, Poséidon, Hera, Tétis, Apolo, Afrodite e outras criaturas e deuses mitológicos. Exalta dois grandes guerreiros – Heitor e Aquiles - e milhares de guerreiros menores. É o confronto de duas culturas, um conflito iniciado muito antes da guerra, por causa de uma fruta dourada durante um casamento. O pomo da discórdia. Ação, intriga, sexo, amor, perícia, ódio, batalhas, tramas surpreendentes ao final, Hollywood à lá grega. Por isso, leitores e leitoras, a Disneylíada, uma quase paródia, uma história cruzada. Com certeza, relata um esforço homérico para todos que fazem essa aventura, pelo agrado dos nossos pequenos deuses, nossos filhos. Meses de preparação para alguns dias de desfrute mitológico. Quilômetros andados e horas discutidas por autorizações, documentos, verificações de segurança, consultas a amigos e parentes. Para se divertir num país que, assim como Tróia, vive em guerra. Porque também gosto de histórias e de viagens coloquei outros assuntos. Um pouco das origens de Disney e da Universal, dos personagens das notas de dólar, as roller-coaster, montanhas-russas, história do próprio turismo. Para que a leitura seja também uma viagem no conhecimento, que nunca termina, assim como o tempo. Posso supor que um dia, quando Orlando for descoberta por algum arqueólogo, daqui a três mil anos, talvez seja tratada com o mesmo respeito e admiração que hoje concedemos a Atenas e seus deuses. E pode ser também que naquela época Homero fosse apenas uma diversão de praça pública. Quem vai saber! Fast Lane Índice Primeira saída: .......Antes da Viagem Segunda saída: ........Polícia Federal Terceira saída: ..........Agendamento On-line Quarta saída : ...........Agências e empresas Quinta saída : ..........Roteiro de compras Sexta saída: ..............Preparativos da viagem Sétima saída: ................Estudos Unidos Oitava saída: ................Observações da Lei Nona Saída: .................Comunicação Décima Saída: ............. A Disneylíada Primeira Saída : Antes da Viagem Internet: buscas no Google, Yahoo, para conhecer os locais buscas no ORKUT e Flickr , para fotos de viajantes Palavras chaves : Walt Disney, DisneyParks, Magic Kingdom, MGM Disney, Disney Downtown, Disney Resorts, Animal Kingdom, Blizzard Beach, Typhoon Lagoon, Universal Parks, Wet’n Wild Orlando, Seaworld, Miami, Orlando, Lake Buena Vista, International Drive. Locais : Agências de Viagens e Revistas especializadas : gratuitamente nas agências existem folhetos de viagem com pacotes de várias operadoras para vários roteiros diferentes, em geral para Julho, Outubro e Fevereiro. Nas bancas existem revistas de turismo com matérias e fotos dos locais. Amigos e parentes : quem já foi sempre tem uma dica de viagem que você pode aproveitar, para o seu estilo de viajar. Também consiga com eles referências de agências ou contatos de serviços em Orlando, como guias ou Vans de Aluguel, caso você não queira ir por uma agência. Segunda Saída : Polícia Federal Internet : http://www.dpf.gov.br/ No site também se pode fazer o cadastramento on-line para passaporte, e imprimir a Guia de Recolhimento no valor de R$ 89, 71 (abril de 2007) para dar entrada em qualquer das localidades indicadas no site. As informações e o pagamento no Banco do Brasil mais perto de você. Locais : Há representações em todo o país. As principais são : Superintendência Regional do Rio de Janeiro Endereço: Av. Rodrigues Alves, 1 - 3º andar - Centro / CEP 20081-250 Fone: (21) 2203-4000 / 2203-4008 Fax: (21) 2253-3454 Superintendência Regional de São Paulo R. Hugo D'Antola, 95 - Lapa de Baixo - São Paulo-SP / CEP 05038090 PABX: (0xx-11) 3538-5000 Fax: (0xx-11) 3538-6187 Superintendência Regional de Minas Gerais Superintendente: DPF Sônia Estela de Melo Endereço: Rua Nascimento Gurgel, n° 30 - Bairro Gutierrez - CEP 30430-340 Fone: (0xx-31) 3330-5200 Fax: (0xx-31) 3335-8832 Superintendência Regional do DPF no Distrito Federal/DF Endereço : SAIS Quadra 7 - Lote 23 - Setor Policial Sul Brasília-DF / CEP 70610901 Fone: (0xx-61) 3345-9500 (0xx-61) 3245-7401 Plantão: (0xx-61) 3345-9503 3245-7025 (TeleFax) Recepção: (0xx-61) 3345-9501/02 Os documentos necessários para a solicitação do passaporte (Fonte: Departamento da Polícia Federal ) • Qualquer um documento de Identidade, para maiores de 12 anos, sendo que podem ser aceitos como documento de identidade: a) cédula de identidade expedida por Secretaria de Segurança Pública; b) carteira funcional expedida por órgão público, reconhecida por lei federal como documento de identidade válido em todo território nacional; c) carteira de identidade expedida por comando militar, exministério militar, pelo Corpo de Bombeiros ou Polícia Militar; d) passaporte brasileiro anterior; e) carteira nacional de habilitação expedida pelo DETRAN (modelo atual); f) carteira de identidade expedida por órgão fiscalizador do exercício de profissão regulamentada por lei; g) carteira de trabalho e previdência social-CTPS. OBS.: Carteira de Identidade Civil (RG) e Certidão de Casamento com a devida averbação, se for o caso, para as pessoas que tiverem o nome alterado em razão de casamento, separação ou divórcio.Carteira de Identidade Civil (RG) ou Certidão de Nascimento para os menores de 12 anos. O documento de identidade apresentado poderá ser recusado se o tempo de expedição e/ou o mau estado de conservação impossibilitarem a identificação do requerente. • Título de Eleitor e comprovantes de que votou na última eleição (dos dois turnos, se houve). Na falta dos comprovantes, declaração da Justiça Eleitoral de que está quite com as obrigações eleitorais, ou justificativa eleitoral. • Documento que comprove quitação com o serviço militar obrigatório, para os requerentes do sexo masculino à partir de 01 de janeiro do ano em que completam 19 anos até 31 de dezembro do ano em que completam 45 anos. • Certificado de Naturalização, para os Naturalizados. • Comprovante de pagamento da taxa em REAIS, por meio da guia GRU (Guia de Recolhimento da União), que deverá ser preenchida pela internet, sendo necessário o CPF do requerente ou responsável, código da receita e da unidade arrecadadora conforme tabela das receitas existente na própria guia. OBS: antes de efetivar o pagamento, verifique se a unidade arrecadadora foi preenchida corretamente. Não é possível requerer passaporte em unidade distinta daquela que constar na GRU. • Apresente o Passaporte anterior, quando houver (válido ou não). A não apresentação deste, por qualquer motivo, implica em pagamento da taxa em dobro. • Dê entrada na documentação com xerox não autenticadas junto com a guia de recolhimento, as fotos, o formulário ( on-line ou impresso ) na unidade da PF mais próxima da sua residência. Eles vão lhe dar um protocolo e uma data para buscar o documento. OBS. : Ainda no aeroporto, procurar a Polícia Federal para obter a DST (Declaração de Saída Temporária), que registra os objetos que serão levados na viagem, como máquinas fotográficas e filmadoras Terceira Saída : Agendamento para Visto On-line Internet : Sites oficiais http://www.embaixada-americana.org.br/ informativo http://www.consulados.com.br/consulados/usa.html informativo http://www.visto-eua.com.br/ site do agendamento Sites com informações sobre visto e viagem http://www.viajandoparaorlando.com/ http://www.conebraol.com.br/preparacao.htm http://goflorida.about.com/ Locais : Visto EUA : Centro de Agendamento e Informações sobre Vistos (55) 21-4004-4950. Embaixada dos EUA SES - Av. das Nações, Quadra 801, Lote 03 70403-900 - Brasília, DF Tel: (61) 3312-7000 Fax: (61) 3225-9136 Cons. Geral em São Paulo Rua Henri Dunant, 500, Chácara Santo Antônio, São Paulo- SP, 04709-110 Tel: (11) 5186-7000 Fax: (11) 5186-7199 Cons. Geral no Rio de Janeiro Av. Presidente Wilson, 147 Castelo 20030-020 - Rio de Janeiro, RJ Tel: (21) 3823-2000 Fax: (21) 3823-2003 Consulado em Recife Rua Gonçalves Maia, 163 Boa Vista 50070-060 - Recife, PE Tel: (81) 3416-3050 Fax: (81) 3231-1906 Os documentos necessários para a obtenção do visto e da Entrada nos EUA. • o formulário DS-156 (versão eletrônica e versão não- eletrônica, nos Consulados e Embaixada) e os maiores de 16 anos, o formulário DS-157 (versão não-eletrônica) devidamente preenchidos. • um passaporte válido por pelo menos seis meses a partir da data de viagem; • uma foto 5x7cm: o a fotografia deverá ter sido tirada há no máximo seis meses; propicie uma visão completa da face do solicitante, que não poderá estar olhando para baixo ou para qualquer lado, sendo que a sua face deverá cobrir 50% da área da foto. Observe-se que fotografias com visão lateral ou angular não serão aceitas; o que • comprovante de pagamento da Taxa de Solicitação de Visto de US$100,00 (no valor equivalente em reais), a qual deverá ser paga com antecedência numa agência autorizada do Citibank. OBS.: 1- O funcionário do Citibank ao emitir o recibo de pagamento da Taxa de Solicitação de Visto deverá escrever o nome e o número do passaporte do solicitante no recibo. Não deixe de atentar para esse detalhe, pois os recibos emitidos sem o nome e o número do passaporte do solicitante não serão aceitos. 2 - Todos os interessados devem evidenciar que possuem "fortes vínculos" com o seu país de residência e pretendem, tão somente, realizar uma visita temporária aos Estados Unidos. Tal comprovação pode ser dar através de documentos como: carteira de trabalho, declaração de imposto de renda, certidão de casamento ou de nascimento, extratos bancários, documento de propriedade de veículo, escrituras de propriedades, matrículasde colégios e faculdades. • Formulário I-94: Quando for desembarcar nos Estados Unidos, os funcionários pedem os passaportes com o visto americano anexados ao formulário "I-94". São dados pessoais e da viagem, sem documentos pedidos OBS.: Mantenha Formulário I-94 afixado em seu passaporte durante a sua permanência até sua saída dos EUA. Se você perder o Formulário I-94 deverá procurar o Departamento de Segurança Interna (DHS) • Entrevista na Imigração, na chegada aos EUA : É um balcão onde os funcionários da imigração possivelmente ainda irão lhe indagar o motivo da sua viagem, sobre as suas reservas de hotel,sua passagem de volta, dentre outras perguntas . Quarta Saída : Agências e Empresas Aéreas Internet : com vôos e pacotes para Orlando ( todos têm conexão Miami ou Dallas ) • Empresas Aéreas : todas tem serviço de reserva e pagamento on-line, mas só recomendo para pesquisas de preços. www.aa.com.br www.delta.com www.tam.com.br www.continental.com www.copaair.com • Agências: http://www.vamosparadisney.com.br/ http://www.grantur.com.br/ • Outros sites de viagens : http://hotels.bookit.com/ procure por Quality Inn International Drive http://www.frommers.com/ Locais : Grantur Agência Recomendada . Av. Rio Branco 181, 32 andar - Centro - Rio de Janeiro Tel: (55 21) 3262 7777 Fax: (55 21) 2524 1954. American Airlines Empresa Não-Recomendada Endereços: r. Araújo, 216, 9º andar; av. Nações Unidas, 12.901 (hotel Hilton); av. Ibirapuera, 2.927; al. Santos, 2.233, nível E1 (Hotel Renaissance), São Paulo Telefones: 0300-789-7778. SP: (0/xx/11) 4502-4000, 6445-3568 e 64453808 Delta Airlines Endereço: r. Marquês de Itu, 61, 12º andar, cj. 121, São Paulo Telefones (SP): (0/xx/11) 4003-2121 e 6445-3926 TAM Endereço: av. Jurandir, 856, São Paulo Telefones: 0800-5705700 e 4002-5700. Central de atendimento ao surdo: 0800-555500. SP: (0/xx/11) 5582-8811 Continental Endereço: r. da Consolação, 247, 13º andar, São Paulo Telefones: 0800-7027500. SP: (0/xx/11) 2122-7500 e 6445-4208 Copa Airlines Endereço: av. Paulista 1.337, 4º andar, São Paulo Telefone (SP): (0/xx/11) 3549-2672 OBS.: Nunca marque uma passagem para os EUA sem obter o visto primeiro. OBS.2 Todas as empresas relacionadas com escritórios em São Paulo têm representações no Aeroporto Antônio Carlos Jobim , no Rio de Janeiro. A TAM, em outros aeroportos. Quinta Saída : preparativos da viagem Internet : as informações abaixo são de www.viajandoparaorlando.com/ Roupas: Não encha a mala de roupas ! renove o guarda-roupa, uma vez que em Orlando você encontrará muitas lojas das mais variadas marcas pela frente. Leve roupas leves com as quais você se sinta confortável, pois caso contrário irá se tornar muito desagradável a sua experiência nos parques, pois não dá para descansar um minuto nas atrações e filas respectivas. IMPORTANTE : Em alguns parques é interessante que você tenha em mãos uma mochila com algumas roupas, pois algumas atrações irão molhar para valer. Não se esqueça de observar a temperatura de Orlando durante o período da sua estada para que você possa melhor planejar a sua mala. O próximo tópico trata exatamente sobre esse assunto. Malas: 02 (duas) malas (despachadas), com no máximo 32 (trinta e dois) quilos cada uma e tamanho máximo de 157cm (comprimento + largura + altura) 01 mala de mão com no máximo 18 (dezoito) quilos que caiba debaixo ou no compartimento acima do assento do avião, com tamanho máximo de 114cm (comprimento + largura + altura). OBS.: Esses valores podem variar de acordo com a empresa aérea contratada. Leve como bagagem de mão todos os artigos de valor (equipamento eletrônico, dinheiro em espécie jóias, câmera, etc), bem como aqueles de grande necessidade , como medicamentos, chaves, etc). Clima No verão em Orlando o protetor solar torna-se um item de primeira necessidade. Não deixe de se precaver, se estiver viajando com crianças. Para melhor ilustrar, segue abaixo uma tabela com as temperaturas (em graus Celsius) da cidade de Orlando ao longo do ano: MÊS MÁXIMA MAIO JUNHO JULHO AGOSTO 31° 35° 37° 36° MÍNIMA 19° 21° 22° 23° Conversão de valores em Farenheit - diminua 32; multiplique por 5 e ÷ divida por 9. Restrições de Segurança Artigos proibidos na bagagem de mão : Facas, canivetes, talheres que não sejam de plástico, tesouras, perfuradores de gelo, navalhas, saca-rolhas, agulhas, seringas (exceção: casos em que o passageiro possua autorização profissional farmacêutica em seu nome), armas de brinquedo, tacos de bilhar ou pólo, instrumentos desportivos (como raquetes e tacos de golfe), atiradeiras, estilingues, isqueiros ou fósforos. Artigos proibidos de ser transportados por avião : Ccarga para isqueiro, fogos de artifício, sinais luminosos, explosivos, combustíveis, tinta, alvejantes, amido em aerossol, inseticidas, limpadores e solventes, aerossóis, tanques de butano, combustível ou mergulho, tanques de propano, cartuchos de CO2, balsas autoinfláveis, armas de fogo, munições, pólvora, gás para defesa pessoal, gás lacrimogêneo, spray de pimenta, gelo Seco, ferramentas que utilizem gasolina para o seu funcionamento, baterias úmidas, materiais radioativos, venenos, substâncias infecciosas, dentre outras. Sexta Saída : Roteiro de Compras Internet : Premium Outlet www.premiumoutlets.com Florida Mall www.simon.com PROMOÇÃO COMPRA ANTECIPADA Prime One Out Let www.primeoutlets.com Mall At Millenia www.mallatmillenia.com Wal Mart www.walmart.com coloque o zip code 32789 Locais : Procure os shoppings para roupas e tênis, e Importadoras para perfumes, cremes, eletrônicos e jóias, na sua cidade. Isso ajuda a ver os preços cobrados aqui de artigos que você desejaria comprar lá, e já escolhe modelos e tamanhos. É uma boa maneira de treinar as compras, porque na hora não há muito tempo para buscar ofertas ou andar pelos shoppings Questões Financeiras : A cota oficial de compras do exterior vai até US$500,00 (quinhentos dólares) por pessoa, com a "cota de isenção", que também se aplica aos menores. Acima desse limite, é cobrado um imposto de 50% ( Cinqüenta por cento), sendo que se você não declarar o excesso, e a fiscalização lhe pegar, irá pagar 50% (cinquenta por cento) do valor excedente. Para o pagamento do imposto é necessário preencher o "Documento de Arrecadação de Receitas Federais - DARF", em qualquer agência bancária, inclusive em caixa eletrônico, quando disponível este serviço. Sair do país com mais de dez mil dólares necessita declaração especial. Consulte com a Polícia Federal e Consulados. Você também poderá trazer de Orlando sem pagar impostos: roupas e outros artigos de vestuário, artigos de higiene, beleza ou maquiagem e calçados, para uso próprio, em quantidade e qualidade compatíveis com a duração e a finalidade da permanência no exterior, bem como livros, folhetos e periódicos em papel. Na volta, se faltou alguma coisa, pode comprar sem impostos nas lojas do Duty Free Shop, mas os preços são mais caros que em Orlando. Há isenção para um número limitado de artigos eletrônicos no Free Shop, até 3 unidades. Bebidas, cosméticos e cigarros têm limitações mais folgadas, até dez unidades. Planilha de compras Loja Local Sbarro Belz Outlet Sbarro Belz Outlet Typhoon Donuts Disney Parks Amity Coke Universal Restaurantossaurus Disney Parks Walgreens Japan Pavilion Epcot Green Tumb Disney Parks Jurassic Fruit Animal Kingdom Hard Rock Universal Mc Gurkus Universal Mc Gurkus Casey Corner Disney Parks Mickey Star Disney Parks Origem Pacific sunwear Champs sports Mouse Gear Local da compra Florida mall Florida mall Disney Descrição s\ taxa c\taxa Almoço com Pepsi ( 1 ) Almoço ( 2 ) com Pepsi Coca 8,18 8,71 10,67 11,36 2,50 2,50 Churros ( 2 ) Lanche ( 3 ) 5,98 16,70 6,37 17,79 Lanche ( 1 ) Yakisoba Milk shake 6,49 1,00 2,50 6,59 1,00 2,67 Churros 2,99 3,19 Mint guitarr Coca Almoço Hot dog e coca Lembranças 3,50 4,78 16,18 21,55 3,73 5,10 17,24 22,96 17,50 18,64 Descrição dos itens Camisa Valor compra 19,50 Valor total 20,77 Tênis 54,99 58,56 Ventilador 29,95 31,90 parks Intern. drive Florida Mall Busch Garden Intern. Drive Perfumeland JC Penney Golden Scarab Yes Brasil Finish time Florida Mall Disney parks Florida Mall Inter drive Emporium complex Victoria secret Perfume land Brasil shampoos ( 6) Grill 84,40 89,89 19,99 21,99 bijouteria 6,99 7,48 Relógios, ipod nano, perfume e óculos ( 8 ) Zuma dot (?) Glitter 367,92 391,83 9,94 10,58 9,50 10,12 100, 106,50 49,39 52,60 Cremes e outros ( 12 ) Cremes e shampoos ( 4) 38 40 42 44 46 48 50 EUA 4 6 8 10 12 14 16 18 Europa 38 40 42 44 46 48 50 52 Blusas e suéteres Femininos Brasil 38 40 42 44 46 48 50 EUA 6 8 10 12 14 16 18 Europa 40 42 44 46 48 50 52 Calçados Femininos Brasil 35 36 37 38 39 EUA 3 4 5 6 7 8 9 10 11 Europa 34 35 36 37 38 39 40 41 44 Ternos Masculinos Brasil EUA Europa 46 34 36 48 38 40 42 50 52 54 44 46 48 Camisas Masculina Brasil 35 37 39 40 41 42 43 44 EUA 14 15 15,5 16 16,5 17 17,5 18 Europa 36 38 39 41 42 43 44 45 40 41 42 43 44 8,5 9 10 10,5 11 40 41 42 43 44 Calçados Masculinos Brasil 39 EUA 7,5 Europa 39 8 9,5 TEMPERATURA graus Cº -2-15 -10 -5 0 5 10 15 20 25 30 35 40 graus Fº -45 14 23 32 41 50 59 68 77 86 95 104 S, M, L, XL: S (Small) P (Pequeno) M (Medium) M (Médio) L (Large) G (Grande) XL (Extra Large) GG (Extra Gran Roupas infantis: Brasil - Estados Unidos 2244668710 12 14 16+ 3 5 6x 8 10 12 14 16+ Vestidos, saias e casacos femininos: Brasil Estados Unidos 38 4 40 6 42 8 44 10 46 12 48 14 50 16 Blusas e malhas femininas: Brasil Estados Unidos 38 6 40 8 42 10 44 12 46 14 48 16 50 18 Ternos masculinos: Brasil Estados Unidos 46 36 48 40 50 44 52 46 54 48 OBS . : Na Flórida, toda a mercadoria que você adquirir, além do preço da tabela, tem 6,5 % (seis e meio por cento) de imposto, cobrados no Caixa. Para comprar aparelhos eletrônicos e ou peças de grande valor pague com um cartão de crédito internacional. Nos parques é possível pagar desde a sua alimentação até fazer compras utilizando o cartão e os Traveller's checks, vendidos no Banco do Brasil, Safra e Caixa Econômica Federal. É um dinheiro garantido, se você perder os Travellers, é reembolsado. Guarde o contrato. Sétima Saída : Estudos Unidos, ou como se comportar naquelas bandas de lá. Internet : http://pt.wikipedia.org para leituras www.googlemaps.com para ver de cima, do satélite Palavras-chave : Turismo, Orlando, Flórida, Revolução Americana, Dólares, Hollywood, Anahein, Califórnia, Disney, Universal, Golfo do México, Lake Buena Vista, DisneyParks. Locais : • Gorjeta: é esperado gorgetar com freqüência: Carregadores de Mala = U$ 0,50 a U$ 1,00 por volume. Motoristas de Táxi = 15% do valor da corrida. Garçons = 15% a 20% do valor da conta. • Emergência: disque 911 em qualquer telefone, celular ou público. . • Dinheiro: Procure levar a quantia que você entende necessária para custear a sua alimentação, transporte, ingressos e algum dinheiro para fazer as suas compras. Distribua em dólares, travellers e limites do cartão. Leve uns reais para a volta, nunca se sabe. Não ande com todo o seu dinheiro no bolso, para a sua segurança utilize o cofre do hotel e leve a chave com você. Os nomes dados para as diversas moedas são os seguintes: penny nickel dime quarter half-dollar - 1 cent; 5 cents; 10 cents; 25 cents; 50 cents. 100 cents = um dólar OBS.: As notas mais comuns são: US$1, US$2, US$5, US$10, US$20, US$50 e US$100 dólares. Quando você utiliza notas acima de US$50,00 os vendedores costumam utilizar uma caneta especial para atestar a sua autenticidade. Oitava Saída : Observações legais mínimos. e cuidados Internet : mantenha-se informado com procedimentos legais sobre visto, imigração, consulte grupos sobre necessidades especiais, como tradução de receitas médicas ou documentos de autorização para menores. No Gmail há um serviço de alerta por e-mail, você coloca as palavras-chave e recebe notícias sobre o assunto da palavra, por ex.: visto EUA, turismo Orlando, etc. Locais : Embarque: No aeroporto chegue pelo menos 03 (duas) horas antes do horário embarque. Assim você não corre o risco de perder o seu avião e terá tempo, caso você esteja viajando com alguma empresa de turismo, para encontrar com o seu guia ou grupo de viagem. Tome muito cuidado no aeroporto com suas malas, bolsas e principalmente com os seus documentos. Procure o guichê da companhia aérea escolhida para levá-lo para Orlando, já de posse da sua passagem e demais documentos para que possa despachar a sua bagagem. Certifique-se de que lhe foram entregues os documentos pertinentes a sua bagagem. Coloque etiquetas e consulte serviço de seguros de bagagem com sua agência ou na empresa aérea. Não esqueça também de declarar os seus bens importados da sua bagagem, junto à Alfândega, utilizando a Declaração de Saída Temporária - DST, para assegurar o retorno desses bens ao Brasil sem pagamento de impostos. Nona saída : Comunicação Internet : Todos os sites e serviços on-line que você consultar mande e-mails para as pessoas, espere respostas e faça contato. Adicione os conhecidos ao seu MSN ou Google Talk, para saber detalhes do lugar ou confirmar informações especiais. Tanto aqui como nos EUA. Freqüente grupos de discussão sobre viagens, Orlando, Disney, busque palavras relacionadas no Google Groups, que elas aparecem. Locais : Ligando para o Brasil: BrasilDireto, é só discar o número de acesso ao serviço, 18003441055, ou 18002831055, ou 18008092292 ou 18007455521), escolher o idioma, a Embratel oferece uma série de opções: • Ligações Automáticas, bastando teclar o código da cidade brasileira e o número do telefone; • Ligações com cartão telefônico, no qual você poderá utilizar o Cartão Pré-Pago Embratel ou Cartão Pós-Pago AcesseFácil da Embratel,Ligação com auxílio de operador. Idioma: No aeroporto: Elevators ( elevêitor ) Stairs ( estérs ) Escalator ( escaleitor ) Customs ( igual à escrita ) Immigration ( igual ) Baggage Claim ( igual ) Exit ( igual ) Entrance ( igual ) Gate ( guêit ) Departures ( igual ) Arrivals ( igual ) Flight ( fláit ) Airline ( érláine ) Rest rooms ( igual ) Lost and found ( igual ) Cafeteria / coffee shop ( igual ) = elevadores = escadas = escada rolante = alfândega = imigração = área de bagagem = saída = entrada = portão de embarque = partidas = chegadas = vôo = Companhia de aviação = banheiros = achados e perdidos = lanchonete No hotel: Front desk ( igual ) Check in ( igual ) Safe Box ( sêif box ) Bell captain béu quéptêin ) Operator ( operêitor ) Housekeeper ( igual ) Towel ( tóuél ) Blanket ( igual ) Pillow ( igual ) Toilet paper ( tóilét pêiper ) Soap ( sôup ) Swimming pool ( igual ) Lobby ( igual ) Floor ( igual ) Check out ( igual ) Check / bill ( igual ) Receipt ( recipi ) = recepção = dar entrada no hotel = cofre = carregador de malas = telefonista = arrumadeira de quarto = toalha = cobertor = travesseiro = papel higiênico = sabonete = piscina = saguão = andar = dar saída do hotel = conta = recibo Dica: Um bom dicionário também é recomendável para sua viagem. Atualmente existem alguns dicionários que contém frases de uso corrente que com certeza irão facilitar a sua comunicação. E a Décima saída : Disneylíada ! Internet : http://www.disneyliada.blogspot.com o livro on-line Locais : Da próxima página em diante, você vive as experiências de um viajante em Orlando e suas pesquisas sobre cultura clássica e contemporânea. A Disneylíada Crônica da Viagem Índice Canto I Canto II Canto III Canto IV Canto V Canto VI Canto VII Canto VIII Canto IX Canto X Canto XI Canto XII Canto XIII Canto XIV Canto XV Canto XVI Canto XVII Canto XVIII Canto XIX Canto XX Canto XXI Canto XXII Canto XXIII Canto XXIV Fotos da Viagem Agradecimentos Bibliografia e Fontes Canto I - O sonho de Elias Garota eu vou pra Califórnia, viver a vida sobre as ondas “ Lulu Santos Como nasceu a Disneyworld? Uma oportunidade imobiliária surgida nos anos 60 do século XX, quando boa parte do interior da Flórida era um pântano infestado de alligators e no litoral, Daytona Beach, Fort Lauderdale, Tampa e Miami se confirmavam como destinos turísticos tropicais. Eram centenas de Convenções de religiosos e empresários ou categorias profissionais, desde os anos 20. Foi a primeira Era de Ouro Americana. A Flórida era também o melhor caminho para as Ilhas da América Central, para quem tinha um barco, uma classe acima, portanto. A primeira parada deles sempre acontecia na pequena pérola do Golfo do México, Key West . Aí veio um artista e empreendedor bilionário, às escondidas, comprou uma cidade inteira para construir atrações de grande público e tornou a Flórida destino do mundo. Chamava-se Elias. Walter Elias Disney. Nascido em Chicago, em 1901, crescido e espancado pelo pai numa fazenda em Marceline, Missouri. Morto em 1966, era mais famoso do Jesus Cristo, que o John Lennon não nos ouça. cccccccc O grande estado da Flórida sempre teve uma vocação natural muito forte para ser natureza mesmo. Não é uma ilha, mas é banhada de mar por – quase - todos os lados. Inclusive por dentro. Tem grandes, pequenas e minúsculas lagoas doces, ligadas a pântanos e tem o imenso parque florestal de Everglades, com o chão das ruas forrados de irmãos do Wally, aquele jacaré do desenho animado de Hanna & Barbera. Quando se vê do avião, parece playmobil, milhas e milhas de chão organizado. O clima tropical cheio de água favorece a vida animal e a costa ainda é cheia de fauna marinha, fonte de vida para os índios Seminoles, primeiros habitantes a serem expulsos do local. A história da Flórida é de menina abandonada que se fez por si mesma, mas com a ajuda de um admirador estrangeiro no final. Foi território espanhol do século XV até o século XVII, quando passou para os Ingleses numa troca – vejam só – por Havana, em Cuba. Correntes migratórias do Caribe marcaram o território latino desde cedo. Há uma fábrica de charutos Cubanos na Flórida com uns cem anos. Fidel é coisa recente por lá. Depois os ingleses perderam a guerra da independência dos EUA, em 1776, usando a Flórida como base operacional. Os americanos independentes trocaramna mais uma vez, pelo apoio dos espanhóis para a futura nação. Em 1821 a Flórida deixou de ser imigrante ilegal e passou a ser a estrela número 27 da Stars and Stripes, nome artístico da Bandeira Americana. Mas a Flórida tem, por ironia histórica, a mais antiga cidade americana, Saint Augustine, fundada em 1569. cccccccccccccccccccccccc No século XX, a Flórida Índico-CaribenhaEspanhola de plantações, gado, mineração, turismo nas praias, e dinossauros nos subsolos foi se extinguindo e dando lugar a um estado mais norte-americano. Foi a expansão multinacional dos EUA revertida para dentro. Hoje concentra grandes atrações de turismo – com e sem praias, aliás – e tecnologia das mais avançadas. Desde o retrô futurista no Magic Kingdom, primeira obra do Disney, até Cabo Canaveral, a estação de lançamentos de naves espaciais da NASA, obra do Verner Von Braun, aquele alemão que serviu ao Hitler enquanto os americanos não chegavam até ele. Disney e Von Braun trabalharam juntos. O cientista alemão e o cineasta americano já possuíam em comum o gosto pela leitura do mestre da ficção Julio Verne e ambos criaram lá suas coisas com base naquelas descrições. Disney criou filmes com foguetes, Von Braun, foguetes. Mas no início da década de 50, o alemão entrou na folha de pagamento do americano, o que era muito comum com europeus naquela época de pós-guerra. Von Braun foi consultor técnico na criação de um seriado Disney sobre extra-terrestres, algo que nunca fez sucesso, por isso, nunca achei o nome. Alguém se habilita? cccccccccccccccccccccc Então uma oportunidade imobiliária deve ter batido na mesa de Walt, tendo ao lado seu irmão Roy e o amigo Ub Iwerks. Vende-se Terrenos amplos na Flórida, clima tropical, fartura de água, tudo tão barato que você nem acredita. Ou seja, terrenos bem longe das cidades, na baixada do interior mais quente, cheio de lagoas que transbordam quando chove, e como chove na Flórida. A mãe de Disney se chamava Flora. Protegia-o das surras. Podia ser um sinal. Um empreendimento como aquele imaginado por Disney seria bem recebido em qualquer grande cidade americana. Os três empresários olhavam os anúncios da Flórida e viam o futuro do próximo parque, depois do estrondoso sucesso do primeiro, que hoje soma quase 500 milhões de visitas, noutra cidade transformada, Anaheim, na Califórnia, do outro lado dos EUA. No melhor estilo americano, Disney havia reunido seus funcionários mais criativos no que chamou de Disney Imageneering, uma fábrica de idéias. Daí nasceram os parques. A DisneyLand, a Californiana, inaugurada em 1955, era um pouco de Coney Island misturada com Hollywood, a imensa janela para a fantasia. Coney Island é a terra das primeiras roller coasters, no litoral do estado de Nova York. Este parque foi a marca da expansão do pós-guerra no terreiro dos Disney. Mas não era a primeira vez que alguém iria turisticamente visitar um filme, participar da experiência, com cenários e reprodução de emoções e sentimentos. A Universal Studios, em Hollywood, já dava seus passeios com turistas desde 1912, eu acho. A MGM, a United Artists, idem. Mas com Disney era a primeira vez que alguém misturava isso com parques de diversão, roller coasters e cobraria o valor de um almoço pela entrada. Velocidade, giro, música, dança, luzes, água espirrando, e o Mickey ali na sua frente. Qual criança no mundo, depois de assistir Fantasia, ou qual adulto, desde Steamboat Willie, não gostaria de ir à casa do rato ? A Disney na Flórida começou no início dos anos 60, com o nome de projeto X. Foram comprados 27 mil hectares, equivalente a tantos mil campos de futebol, através de várias empresas, para não levantar a bola. Quando o jornal Orlando Sentinel avisou que alguém ia comprar o condado de Osceola quase inteiro, especulou-se a vinda da Ford, da MacDonnel Douglas, da Hughes, grandes fábricas de artefatos antigos como aviões e carros. Houve alguma elevação de preços. Disney denunciou-se a si mesmo como o grande comprador e os imóveis vizinhos dispararam de preço. A indústria do futuro, Hollywood, estava a caminho da Flórida, entertainment business. Até os alligators comemoraram. Walt Disney chegou a ver em vida as maquetes, as primeiras obras, os projetos e os orçamentos, de 400 milhões de dólares, para gastar no que seria a Disneyworld. Depois de sua morte, em 66, o projeto foi rebatizado de Walt Disney World, mais conhecido por lá pelo nome de Magic Kindgom, o primeiro dos seis parques Disney na Flórida, inaugurado em 71. O irmão dele, Roy Disney, inaugurou o parque e morreu um ano depois, dando fim à Era Disney e início à era fantasma, sob a presidência do sobrinho de Walt, Roy Edwards, que por pouco não enterrou tudo com desmandos administrativos. A era Disney Corporation só começou a levantar o império de hoje, em 1984, sob a tutela dos administradores profissionais Michael Eisner e Frank Wells . As terras que abrigam o complexo Disney na Flórida, enfim, ganharam status de cidade, Lake Buena Vista. Disney pensou no particular como se faz infraestrutura de governo de primeiro mundo. Era um artista e empreendedor nato, tipo Midas, mas sem a maldição do ouro. A maldição de Disney foi outra. ccccccccccccccccccccccccccccc Midas foi um rei da mitologia grega, numa lenda que ensina sobre a ambição desmedida, o perdão e a honra. Ele ofereceu hospedagem, prazer e alegria a Sileno, o pai do deus do prazer, Dionísio. Sileno havia se perdido depois de uma bebedeira daquelas, promovida por Baco, Deus do Vinho, naquelas noites intermináveis no Baixo Olimpo. Pela cortesia, concedeu Dionísio a Midas a realização de um desejo, a ser pago por Baco, responsável pelo pileque de Sileno. Pediu Midas: quero que tudo quanto eu toque se transforme em ouro. Contrariado pela escolha imbecil, Baco aceitou e Midas saiu tocando tudo o que via até que sentiu fome e sede e tudo que sua língua tocava, virava ouro. Ele não morreu de fome. Midas pediu perdão à Baco, pelo olho grande, que muito mais contrariado, concedeu de novo, e mandou que ele se lavasse no rio Pactolo, na Grécia, que até hoje tem essas areias cor de ouro. A história de Midas é posterior à Ilíada. Midas terminou a vida distribuindo riquezas, assim como Disney, que se foi aos 65 anos, de câncer, a maldição que lhe coube, sem direito a perdão dos Deuses. Um Herói Americano. Quando tentou se alistar para a Guerra, já em 1918, foi rejeitado pela baixa idade. Inscreveu-se então na Cruz Vermelha e foi assim mesmo, para dirigir ambulâncias, com 16 anos. Gostava do Brasil. Conheceu Carmem Miranda, ouvia o Bando da Lua e veio ao Rio uma vez, mostrar o Zé Carioca. Dizem que colaborou com o senador MacCarthy para expulsar comunistas de Hollywood, nos anos 40. Pode ter sido. Se foi, pesa a balança a seu favor, por razões óbvias, preservou a Disney da política destruidora de imagens do Macarthismo. Filhos e netos dos comunistas devem ter ido à Disney também. E agradecem a Deus por isso. Canto II - O sonho da minha filha “Levava uma vida sossegada “ Rita Lee A geração da minha mãe teve uma infância sem muitas opções, aqui no Brasil da desigualdade faraônica. Para aquelas crianças, um cachorro chamado Joli, uma bicicleta Phillips, ir ao circo e viajar até Copacabana estavam de bom tamanho. Não ter que trabalhar aos 14 anos já era um luxo. Mas gerações não são feitas por idade, e sim por idéias e condições em comum, portanto a geração de minha mãe na infância continua por aí, aos milhões, off-Disney. A minha geração, comparsas na exploração da doce classe média apertada dos anos 70\80, já sonhava muito com a Disney, os mais velhos desde a inauguração em 71. Miami era mais perto e menos caro que a Califórnia, para onde sempre foram os da classe acima, desde 1955. Para mim o sonho acabou quando conheci outros dois típicos produtos americanos, o jazz e a revista Playboy. Minha Disneylândia imaginária se converteu em algum lugar entre a Mansão de Hefner e o Harlem, em Nova York. Disney virou coisa de criança. Eu tinha doze anos. Por favor, não confunda as coisas, não me politize. Eu tenho minhas brasilidades, nasci fluminense, conheço a Amazônia, morei no Recife, pulei Carnaval em Olinda, componho em português. Mas a história aqui é bem acima do Equador, por isso é justo recordar mais o que vem lá dos nossos colonizadores culturais da atualidade. Os Gringos. Ccccccccccccccccc A geração da minha filha cresceu com o Mickey desde o primeiro banho. No auge da produção corporativa multinacional, a holding que congrega todas as empresas da Disney vale hoje 32 bilhões de dólares. Dá pra comprar uns dois milhões de carros populares mais ou menos, se algum idiota se propusesse a fazer a compra. Do berço até os doze anos, então, viveu minha filha cercada de referências: livros, histórias, filmes, produtos, jogos, conjunto de cama, mesa e banho, sanduíches, biscoitos, desenhos na TV, sites na Internet, Disney na Disney, Disney na Pixar, Disney na Broadway. Suspeito que isso só aumentou o seu desejo de ver a Disney, que seria para ela uma grande soma visual. Daí, um belo dia, papai quero ir à Disney, já estou ficando grande, acho que sendo uma criança grande eu aproveito como criança e como gente grande, não é mesmo ? Bela resolução de paradoxo, minha filha, mas papai anda mais duro que a pedra a qual Sísifo foi obrigado a rolar eternamente. Eis que entra a fada madrinha da vida da minha filha, e de várias outras filhas de pais relapsos com economia, ainda que ricamente ilustrados. A Avó dela tinha lá uns dólares guardados. Vamos à Disney, finalmente. Arrancado da minha obra interminável de produzir cultura pela Internet, imerso que estava em leituras antigas e composições novas, fui sacudido pelo vento da mais antiga infância. Vamos conhecer o rato em pessoa. Cccccccccccccccccccccccccccccccc Desde já, um muito obrigado público a minha mãe, que na mitologia grega se encaixa pela metade no mito de Cassandra, filha de Príamo, rei de Tróia. Cassandra era religiosa e desde cedo cultuava o Deus Apolo, que se apaixonou por ela, dando-lhe o dom da profecia. Como ela não o amou de volta, ele arremata o dom com a maldição de que ninguém acreditaria nas falas de Cassandra. A metade que falta na semelhança entre Cassandra e as profecias de minha mãe é que na segunda todos acreditam. Para mim,Vovó Cassandra logo profetizou, ainda em março, com a nossa viagem programada para julho: vá logo fazer os passaportes para fazer o agendamento, porque senão perde a oportunidade de ir em julho. Fomos à PF em 07 de março, tiramos o passaporte dia 2 de abril e agendamos no mesmo dia a entrevista para o visto. Só tinha vaga para o dia 26 de junho, no consulado americano de São Paulo. No Consulado do Rio, onde vivemos, só havia data para 16 de julho, portanto, Cassandra estava certa mais uma vez. Não daria tempo de viajar antes das férias terminarem. Assim começou realização da idéia Disney. Idéia que é centelha divina concedida pelo titã Prometeu aos homens, um mito bem mais antigo que a Ilíada ou que os humanos. Faz parte da explicação dos gregos antigos para a criação do mundo. Foi Prometeu quem roubou o fogo do conhecimento dos deuses e entregou aos homens, que eram criaturas escravas e sem sexo. Pandora foi a primeira mulher, mas essa é outra história. Canto III - Começa a Aventura Mim quer tocar, mim gosta ganhar dinheiro, Roger , Ultrage a Rigor. Seria tão bom que no meu país, lá no litoral do Espírito Santo ou no Planalto Central houvesse um parque gigante. Seria a Terra do Saci Pererê, com a roller-coaster da Cobra Anaconda. Ou o Parque Aquático do Boto Cor de Rosa, com milhões de turistas brasileiros e alguns gringos. Quem sabe uma ideologia à moda do Darcy Ribeiro, com o espírito de Capitão Bandeira e Maurício de Souza, tornada viável com personagens cotidianos, o Zé da Viola, ou o tio da Mônica. Ou ainda uma indústria de filmes e atrações para juntar a identidade brasileira à cultura geral da humanidade. A celebração do sucesso coletivo nacional. Sonhar não custa nada. Pelo menos podia ter o Reino Encantado de Monteiro Lobato. Minha filha já ficava satisfeita, eu acho. Os primeiros recursos para se chegar à Disney são a paciência e um financiamento de uma importância em torno de 3 mil dólares por pessoa para quinze dias, sendo doze ou treze dias em terra e os outros dias para os aeroportos, as demoras de chegada e de saída. Só a alimentação durante doze dias dá uns 600 dólares por pessoa, no mínimo. A cota de compras com isenção de imposto na volta é de 500 dólares cada um, mas eu somei um trocado para compras abaixo do limite, naqueles três mil dólares lá em cima. A paciência você começa a gastar primeiro, mas não vi ninguém desistindo por falta dela, talvez eu fosse o candidato mais forte. cccccccccccccccccccccccccccccccc A primeira fila é da Polícia Federal, para tirar o passaporte. Os postos localizados nas grandes capitais recebem mais gente, nas cidades menores há convênios com representações públicas, tipo Correios ou Delegacias, mas isso acrescenta tempo ao processo do passaporte, livro de viagens mais lido e publicado em todo o mundo. A documentação é de praxe, você tem que provar que você é você, seus números, suas origens, todos os documentos que você guardou a vida toda e as cópias não autenticadas (veja a Fast Lane). Aí paga uma taxa de R$ 89,71 no Banco do Brasil ou CEF e eles te dão o livro verde um mês depois. É bem bonito, achei caro, vale pelo poder, depois que tiver outra peça burocrática, o visto americano que autoriza você a chegar a qualquer aeroporto americano. Entrar nos EUA é o passo seguinte, mas depende da imigração americana gostar de você. cccccccccccccccccccccccccccccc Os americanos complicam mais, porém facilitam ao extremo, uma vez que popularizaram a Internet e depois colocaram um excelente site, Visto EUA, onde se pode fazer o agendamento para a entrevista necessária para obtenção do visto. Custa R$ 38, o acesso ao site. Você ganha o direito de usar também um auxílio por telefone, mas guarde o número do recibo deste pagamento, eles pedem como senha para acessar o serviço telefônico. Eu joguei fora, fiquei só pela Internet, e toda vez que batia uma dúvida, não podia ligar. Não vou jogar mais nada fora. Foi o primeiro mau augúrio, como se chamava na Grécia Antiga um sinal do destino para coisas por vir. No começo da Ilíada, o Rei de Micenas, Agamenon, toma de Aquiles uma escrava, chamada Briseida, porque o deus Apolo tinha tomado de Agamenon a irmã dela, Criseida. Aquiles era seu maior guerreiro, e Agamenon fica sem ele para começar a invasão de Tróia no décimo ano da guerra. Para todos os outros reis foi um erro de Agamenon, um mau augúrio. Os Brasileiros complicam menos, mas erram mais. Comparecemos com duas horas de antecedência a PF no Rio, um dia sem chuva, que bom, porque a fila na área externa não tem bancos nem proteção, fica numa avenida que dá na famosa Praça Mauá. Depois entramos e esperamos mais uma hora e uns 40 minutos e conferimos um a um todos os três grupos de documentos, eu, minha mulher, minha filha. É bom levar já separado por pessoa, adianta a turma de lá. Voltamos um mês depois, sem espera, fomos ao guichê e apenas dois passaportes estavam prontos. O de minha esposa não era encontrado. Mais meia hora. Sumiu o protocolo. Vai ser feito outro passporte, que ficou pronto uma hora depois que ela tirou novas fotos 5 x 7 e novas cópias de documentos que instintivamente havíamos levado. Tememos encontrar outra pessoa com o nome dela fazendo coisa errada em algum lugar. Pelo menos o número do passaporte vai ser outro. Ficou essa dúvida e mais outra: se leva uma hora para fazer, quando eles erram, porque leva um mês quando eles acertam ? Vai entender! Canto IV - A Ilíada On-Line A verdade não rima “... Fátima Guedes Depois de tirar o passaporte, pegue os números e vá correndo agendar pela Internet, no site da embaixada on–line, a entrevista para o visto, numa das unidades do consulado americano. Com sorte, primeiro bom augúrio, os consulados resolveram atender viajantes de outras praças, neste ano de 2007. Por isso conseguimos agendar em São Paulo. A Embaixada dos EUA fica em Brasília, há consulados em Recife, Rio e São Paulo e escritórios em Belo Horizonte, Fortaleza, Porto Alegre e Salvador. As informações preenchidas no site não permitem erros, vão gerar um formulário eletrônico, DS156, que junto com seu irmão mais velho, o DS-157, serão úteis na entrevista. Ou seja, entre várias vezes no site da embaixada, leia cada assunto, para preencher certo. O DS157 pode ser impresso à partir do site também, mas tem que ser preenchido em letra de fôrma. Você apenas imprime o formulário em branco. Comece a arrecadar documentos que provem sua ligação com o Brasil, dívidas não servem. O assunto imigrante nos EUA está mais esticado que baba no precipício, por isso, eles pedem provas de que você tem muitas razões para voltar. O paraíso está ficando cheio e os moradores mais antigos reclamam constantemente da concorrência desleal por empregos de baixa e média renda. Leis de imigração e combate a ilegais são pauta diária dos periódicos americanos, sejam jornais, revistas, boletins de ocorrência, relatórios do congresso, redações de escola, pichações de banheiro e no metrô de Nova York. E ainda tem o problema de gente que explode no meio da rua ou derruba aviões em nome da Fé e da Liberdade. Depois do atentado das Torres Gêmeas em 11 de setembro de 2001 as medidas de segurança cresceram em aeroportos, alfândegas, locais públicos que são símbolos dos EUA e reúnam milhares de vítimas potenciais em um pequeno espaço físico com estruturas que agravem perdas. Ou seja, Disney. O povo americano mudou com os visitantes, eu acho. Para piorar, esse ano relatórios de segurança apontam o crescimento da Al Quaeda, que realiza pequenos golpes na Europa e anuncia um maior que o 11 de Setembro, nos EUA. Será que esse pessoal não tem mais nada o que fazer? Não tem filhos? Não tiveram infância? Ou a infância foi na escola de homem-bomba? Vai saber! Ccccccccccccccccccccccccc Fato marcante também deste começo de 2007 foi a flutuação do preço do dólar, por superávit da balança americana, eu acho. Por motivos que ninguém pode entender, só os economistas e os bruxos, o dólar cai, cai, cai. Segundo Leis da Economia, as filas para vistos para Disney sobem, sobem, sobem. Enquanto escrevo essa parte do livro, em junho, está o dólar por volta de R$ 1,90, se bem que na hora de comprar no banco estão todos com outros preços, as razões eu nem pergunto. Nas casas de câmbio chegava a R$ 2,05 para compra e R$ 1,85 para venda. Eu soube antes de ir que na fila do visto a média de atendimento em São Paulo subiu de 800 pessoas para mil cabeças num dia. Pague antes a taxa de cem dólares. O canhoto do recibo, com nome e número de passaporte escritos no verso, é o documento mais importante levando-se em conta a religião deles, o capitalismo. Vamos então imaginar: US$ 100, por cabeça, mil cabeças por dia, 22 mil no maior mês, umas 70 mil por ano, levando em conta baixa temporada, dá quanto? Embaixada americana é um negócio tão bom que eles podiam vender representações, os franchising. Se você pode gastar mais pela viagem, consegue ir em dois meses, até menos: há despachantes para todos os serviços inclusive para os consulados agilizarem grupos do pessoal da classe de cima. Geralmente os mais ricos ou mais gastadores andam com vistos atualizados, daí, vão até amanhã se quiserem. Não que eu esteja com inveja, sou apenas humano e observo o movimento de coisas, pessoas, coisas nas pessoas, pessoas com suas coisas e pessoas com suas pessoas. As coisas não possuem coisas. cccccccccccccccccccccc Foi assim o começo da Disneylíada, onde enfrentamos Burocraxion, Semi-deus dos papiros documentais. Vamos ao começo da Ilíada. O primeiro dos 24 cantos fala sobre uma divisão de espólios da invasão à praia de Tróia pelos Aqueus. Como já contei, Agamenon, Rei de Micenas, comandante dos Aqueus, fica com uma escrava, Criseida, que era vestal de Apolo, deus do Sol e deus das pragas. Ele castiga Agamenon com doenças. Não nele, nas tropas. Por despeito, Agamenon afronta o semideus mais próximo, Aquiles, e pega a mulher desse próximo, Briseida. Interessante sugestão para filhas gêmeas, Briseida e Criseida. Os dois grandes generais e guerreiros se desentendem. Aquiles pede a sua mãe, Tétis, que interceda junto a Zeus para apoiar os Troianos. Helena, motivo da guerra, a mais bela do mundo, já está em Tróia, nos braços do veterano príncipe Paris. Mas essa é outra história dentro da História. Eu reconheço prezado leitor ou leitora que será difícil relacionar um clássico antigo da cultura ocidental a uma viagem internacional moderna. Colabore comigo, portanto. Veja como uma promoção, afinal, são duas histórias numa lida só. Prático e moderno. Coisa de americano mesmo. Canto V - Tróia : Cidade Murada Nós vamo invadir sua praia “... Roger, Ultrage a Rigor Nos tempos antigos, ia-se à Olimpíada, ao Coliseu Romano, ou aos Anfiteatros Gregos como se vai hoje à Disney, ou Europa. O Coliseu, por sinal, tinha lá suas intenções parecidas com os parques temáticos. A estrutura na base da construção romana permitia que a arena principal se enchesse de água, para realização de batalhas navais, é um show ou não é? E o que não falta em Orlando são anfiteatros, todos com palco no centro, arquibancadas em meia-lua feitas com escadas, igual em Atenas. De Atenas saíam estradas para todo o mundo conhecido, ou seja, Mar Mediterrâneo, Norte da África e Oriente Médio. Daí pra cima o mundo virava outra coisa, tribos na Europa. Dos Estados Unidos partem as maiores e mais congestionadas rotas aéreas e marítimas. Visto do espaço, é o lugar onde as cidades mais brilham, com exceção talvez de Londres, Sidney ou Paris. Tão grande que seus muros só podem existir, portanto, no campo pessoal, um a um vigiado, pesado, medido, controlado. Mas tudo na maior competência possível, educação de primeiro mundo. E no primeiro contato com o território americano isso fica logo evidente: a segurança prioritária, a organização para que a fila ande, a simpatia com quem concorda. No prédio USA do Rio, a transparência dos vidros verdes acaba nos olhos verdes do militar que observa as filas. Ninguém fala nada. Lá dentro não sei dizer, eu fui a São Paulo. cccccccccccccccccccccccc Conferidas vinte vezes a documentação, toda original, fotos, formulários, roupa ideal, material para esperar na fila, fomos pela madrugada na Via Dutra de ônibus leito – um sono só - um dia antes da entrevista, marcada para as duas da tarde. Sabe como é, São Paulo = engarrafamento + longas distâncias. Se fosse de avião, seria apagão+neblina= aeroporto fechado. Como nada aconteceu, chegamos cedo na fila do consulado, 7:30h, para esperar até às 14:30h na rua, para entrar às 15:30, para sair às 16:30h. Todos muito pontuais e educados, até na longa espera. Fazia um belo dia de sol frio em São Paulo. Em volta do prédio, que parece uma fábrica, proliferam o comércio e serviços associados à fila e ao processo de visto. Tem vendedores de vaga na fila, estacionamentos com despachante incluído, uns bares com sanduíches típicos para pouca fome e bolso cheio. Fica numa parte feia do Morumbi, rua Henry Dunant, quem diria, um pacifista, ainda por cima, suíço. Foi o presidente da Convenção de Genebra, que formulou as leis de proteção ao indivíduo durante uma guerra. De manhã cedo vi muitos casacos e botas de couro, bolsas Vuitton, odores de Chanel. Senhoras colocavam lenços de seda sobre o jornal, para sentar no chão, em plena calçada. Nas mesas sempre ocupadas dos bares, adolescentes siderados chegavam com a aceitação do visto, mas vi uma mulher muito bonita sair do prédio e chorava. Um sujeito assustado chegou atrasado, dizendo-se envolvido num acidente, perdeu a hora, tinha o boletim de ocorrência. Teve que esperar o fim da fila, às 16:30h, mas conseguiu. O horário marcado no agendamento é só para concentrar pessoas. Você não será atendido na hora que marcou, portanto. Entramos no grupo, passamos por baias onde atendentes nacionais e estagiários fazem o préatendimento e conferem se estamos com os documentos. Depois tem cadeiras para esperar, o espaço lembra o que seria o atendimento do INSS, se funcionasse. Fomos chamados primeiro para colocar o dedo indicador numa leitora ótica de digitais, coisa do FBI. Chegou a hora, vamos até a funcionária americana num guichê de vidro, que nem prisão, onde tem um telefone ao lado. Esperamos ao todo nove horas, para mostrar aquela penca de documentos, e então veio a revelação. Com clientes da Disney eles são bastante tolerantes. Depois do registro eletrônico e mostrar que pelo menos tínhamos os documentos pedidos, ela não conferiu rigorosamente nada além dos formulários DS e o meu estava rasurado. A atendente americana perguntou coisas como: vocês vão pela primeira vez ? Quem banca a viagem ? Nem o Imposto de Renda a funcionária olhou. Pudera, são milhares de pessoas com a mesma história, mesmo destino, mesma cara de medo e cansaço, algumas prontas a explodir por qualquer detalhe. A atendente grampeou os formulários, ficou com os passaportes, fechou nosso arquivo no computador, e disse em português macarrônico, sio visto ésta apravado, el próximo. Duraram exatos quatro minutos a entrevista esperada por três meses, desde o agendamento. Felizes e cansados, - sinto que vou repetir muito isso - eu e minha mulher passamos à fase seguinte, ainda dentro do consulado USA de Sampa. Receber os passaportes. Só que eles vão pelos Correios, via Sedex, obrigatoriamente. Deix’eu ver, mil, por dia, 70 mil pessoas por ano, a R$ 22, cada Sedex, dá quanto a venda casada? A espera, portanto, só acaba três dias depois, de volta ao Rio, imaginando se o porteiro vai vacilar ou o carteiro vai ser roubado, sei lá, essas coisas que Cassandra sempre diz. ccccccccccccccccccccccccccccccccc Com o livro de volta às mãos, o visto com foto impresso em papel que imita dinheiro, você até pensa que conseguiu alguma coisa realmente de valor. Mas ainda falta um formulário, o I-94, distribuído dentro do avião, que depois de preenchido é revisto e carimbado pelo oficial da Alfândega americana e deve ser anexado ao passaporte. Sem esse papel, você simplesmente não consegue “fugir” nem do aeroporto dos EUA, vai ter que prestar contas ao serviço de imigração, pode perder o avião na volta. Tudo muito sério. Esse oficial da Alfândega deve ser como porteiro de boate famosa. Diz quem entra ou não, se a roupa combina, essas coisas. Mas não tente suborná-lo ou ser piadista. Lá nos EUA qualquer coisa fora do comum é suspeita de terrorismo. Sério, muito sério. Todos aconselham tirar cópias xerox coloridas, ou escaneadas, plastificadas, das folhas principais do passaporte, a que contém sua foto, suas informações e o visto. É para andar por lá enquanto o passaporte verdadeiro dorme tranqüilo no cofre do Hotel, com o I-94 vigilante ao seu lado. Canto VI - Os Argonautas O barco, meu coração não contenta.. “ Caetano Terezinha de Jesus, veio à queda, foi ao chão, acudiu três cavaleiros, todos de chapéu na mão. Encontrar a agência de turismo ideal para sua conta bancária – Terezinha - é mais ou menos isso, só que muitos cavaleiros são paquerados por Terezinha antes de casar. O casamento é um contrato pouco lido e muito assinado, naquela alegria toda que a eternidade promete. Quase igual a Turismo. Portanto, conhecer e confiar são as alianças da boa escolha. A DisneyWorld não teria mundo no seu nome, se fosse um destino nacional americano. Por isso, para nós, o grupo mais importante a ser conhecido nesse processo são os Heróis do Argos, nossos profissionais do deslocamento. Argos era o navio de Jasão, outro herói grego, muito citado na mitologia, porém não na Ilíada. No seu navio só entravam heróis em busca de aventuras, e se Jasão morreu de velho, então eram confiáveis os argonautas deles. Os nossos argonautas, da Disneylíada, são as empresas de turismo e as aéreas. Elas fornecem todo mês o número possível de visitantes, através do que é chamado bloqueio de passagem. As operadoras de Turismo – o atacado do negócio – e as agências de turismo – o varejo – distribuem esse número de vagas para seus clientes. Acho que eles equilibram isso tudo num cálculo só, para acertar os vistos liberados ao número de quartos de hotel e ingressos nos parques. Um negócio que hoje deve ser obra de algum software do departamento de turismo de lá. iOrlando. Como já disse, mesmo em alta temporada, não fica ninguém de pé no jogo das cadeiras. Só os muito distraídos. Você, viajante, deve marcar a passagem depois do visto aprovado, senão corre o risco de perder dinheiro se o visto for negado. Naquele período de espera entre o agendamento e a entrevista, ou até antes de tudo, vá levantar custos e tipos de viagem. Faça a escolha, mas não reserve nada, nem dê nomes completos, alguns apressadinhos pegam seu nome e marcam a passagem, para garantir o bloqueio da passagem para suas agências. Rubem Fonseca dizia em um de seus personagens mais sarcásticos que viajar é conhecer idiotas que falam outra língua. Pois o português é a primeira língua na qual você vai encontrar os tipos, bem antes da viagem. ccccccccccccccccccccccccccccccccccc O que as agências basicamente fazem é combinar seus bloqueios aéreos, que são médios ou ruins, com hotéis, quase todos bons, roteiros de compras, bons e ruins, parques, todos magníficos, e passeios noturnos, bons e fenomenais. Então tem aquela excursão onde você vai na cabine do capitão do Argos, a classe executiva, direto para Miami, hotéis tipo resort com tudo incluído (All In) dentro do complexo Disney, uma hora de entrada antecipada nos parques Disney ( Magic Hours ), dois dias inteiros de compras em Miami, estou falando de qualidade, quantidade e preço. A viagem toda vai custar um carro nacional, de luxo, por pessoa. Ou não. Tem também a classe turística do Argos, onde você voa mais apertado, com algumas excursões de até 70 pessoas de uniforme e dois guias, talvez faça algumas conexões distantes (Dallas) antes do destino, talvez fique num quarto com estranhos, talvez ache tudo isso fácil de resolver e viaje até melhor que o cara nervoso da classe executiva. Ou não. Ou talvez. O que importa é escolher logo entre várias combinações para qualquer faixa de preço. Se você é bom em buscas e orçamentos, pode encontrar a classe executiva por preço de econômica. Afinal podem existir oportunidades nas empresas com desistências antecipadas, prêmios à venda, sei lá, vai saber! Outro ponto fundamental. Você vai passar quinze dias nas mãos dos guias, Os Doutores do Destino, que têm grandes responsabilidades e grandes pressões. Desde cedo converse para saber como eles gostam de trabalhar, o que fazem melhor. E sobre pessoas que viajaram, procure seus registros de fotos na Internet, dá pra ver o tipo de hotel, o tamanho do grupo, número de guias, qualidade dos padrões de roupa e equipamento. Ou entre em contato mesmo com antigos clientes, vários, você tem tempo. Ccccccccccccccccccccccccc Negociar é hábito dos árabes. E-mail, invenção dos americanos. Use o e-mail para negociar com todos. Isso te permite registrar o que foi combinado. Informações erradas num bilhete aéreo podem custar R$ 200, se o erro for seu. Geram infortúnios, como o efeito borboleta. Diz o Zen Budismo, filosofia popular na China, que no momento em que uma borboleta bate asas no Oriente, ela desencadeia uma seqüência de eventos que vai provocar um furacão na Flórida. E você vai para a Flórida! Ajude para ser ajudado. Mesmo se tiver razões, mas sem email, nunca discuta com um representante do Destino antes da viagem. Ele é um mestre onde você é um gafanhoto. Pagar as agências só mediante contrato. A saúde financeira da empresa deve ser observada, se você for supersticioso. Há seguros para tudo, sai mais caro, se você for prevenido. Tem as festivas, grandes grupos, muitos adolescentes, se você for um deles. E tem as mais diurnas, menos gente, mais mistura entre idades, menos festa, é nessa que eu vou. Tenho quarto próprio, eu, minha mulher, minha filha. Mas desconfio - Cassandra me contou - que há os pequenos grupos, de uma dúzia na Van particular, esses são mais discretos, não usam uniforme, tem horários maleáveis. São os mais lentos. Talvez os melhores. Seja como for, uma vez acertados o contrato e os primeiros pagamentos, vá para o roteiro de compras, porque é preciso saber o que comprar para não perder tempo em fazer listas lá nos shoppings. Procure produtos e preços em locais já famosos de Orlando. Tudo graças à invenção da Internet, que por efeito borboleta começou na garagem de Steve Jobs e Stephen Wozniak, depois na micro-empresa de Bill Gates, garagem também foi o endereço da primeira produtora de Disney. Que por efeito borboleta nos trouxe até aqui. Canto VII - Bagagens à vista “ vou voltar, sei que ainda vou voltar, para o meu lugar “ Sabiá, Tom Jobim e Chico Buarque Nossa guia, RS, lembra Tia Augusta. Na minha infância, a agência da Tia Augusta e os brinquedos Estrela eram tudo de bom que vinha do céu de Papai Noel. Parque de diversão era o Tivoli, na Lagoa, o Shangai na Penha, isso no Rio de Janeiro. O Playcenter, o maior, era em São Paulo. Hoje tem o Beto Carrero lá em Santa Catarina e o Hopi Hari, no interior de São Paulo, onde você paga de pedágio nas estradas mais que o valor de uma entrada do parque. No Ceará tem um baita parque aquático há vinte anos, mas essa indústria de entretenimento físico-animalgravitacional parece não pegar forte no Brasil, ainda. A reta final, como eu ia lhe dizendo, é logística de batalha, antes do momento que o general grita: atacar! A lógica então é pensar aqui tudo o que você vai fazer lá. Desde o aeroporto na ida até o aeroporto na volta. Vamos preparados para esperar, jogos de mão, um baralho, um bom livro de viagens – Eça de Queiroz - remédios para dor de cabeça, enjôo, desinterias, alergias, travesseiro de ferradura, o escambau. Combine três vezes com o guia como será o embarque, é vital. O primeiro momento, primeira impressão não pode ficar, sendo ruim ou boa. Em geral os Doutores do Destino ficam com as passagens, reservas de hotel e os ingressos dos parques, tudo pago antecipado em quantas vezes você escolher. Veja bem, não é se meter no trabalho do guia, é assisti-lo trabalhar e conferir sua parte com ele. RS anda devagar mas nem sempre, às vezes desaparece rápido. Traz com ela toda a nossa vida nos próximos quinze dias, as reservas de hotel, os ingressos dos parques, tudo é distribuído na hora. Perder RS é perder a viagem. Mas ao contrário, ela não perde ninguém de vista no aeroporto e com total naturalidade, daquele tipo advindo de grande experiência. Já é avó, foi vinte e seis vezes à Disney, quatro delas à passeio com a família. ccccccccccccccccccccccccccccc O fiel da balança na hora de escolher e montar a bagagem é de novo o conceito de segurança dos americanos. Há listas detalhadas do que pode ser levado na bagagem de mão e de despacho. Se você está com sua busca na Internet, não esqueça de olhar a data da página, se está atualizada. Depois pense na rotina de viagem, para deixar as coisas mais necessárias à mão, menos as restrições da empresa aérea. E para os dias da viagem, lembre-se do clima, no nosso caso, quente e chuvoso, portanto, roupas adequadas e capa de chuva, toalhas, mudas de roupa. A Flórida em julho é mais ou menos como Belém do Pará em Dezembro. Como uma das atrações é comprar produtos chineses, coreanos, franceses, italianos, japoneses e até americanos, viaje com o mínimo possível de bagagem ms leve bolsas extras, malas não custam pouco, por lá. Reserve uma excursão que faça as compras logo no primeiro dia. Assim você se abastece de tênis e roupas, um ou outro objeto eletrônico, liberando você de incluí-los nas cotas de compras. Você precisa declarar que leva equipamentos importados caros como Lap-Top, câmeras poderosas e equipamentos profissionais, tipo um tomógrafo portátil. Mas não dê uma de esperto, não force nada, isso não ipode ! Lembre-se que eles ainda vão autorizar sua volta através daquele formulário imperdível, o I-94. Qualquer dado na sua ficha é uma pergunta a mais na Alfândega, Customs, vai se acostumando. Nossa bagagem foi assim: a guia nos deu – junto com as mochilas e as camisas - uma lista do isso sim, isso não. Remédios de tarja preta precisam de receita traduzida por um tradutor oficial, demora até uma semana, dependendo de quem você achou para o serviço, custa uns R$ 40,. Pasta de dente só em tubo plástico e pequeno, pentes com pontas de metal, nem pensar. Isqueiro, nem pensar. (veja detalhes na Fast Lane ) Traga o resto em sacos transparentes, Zip Loc, facilita a revista de bagagem. Qualquer objeto fora do comum deve ser consultado antes, na empresa aérea, para saber o procedimento correto, um nebulizador, por exemplo. Discutir na hora do embarque não vai te adiantar em nada e vai atrapalhar todo mundo. Canto VIII : In Memorian Esse capítulo é uma lembrança de que o turista mais relaxado e o trabalhador mais apressado quando vitimados em situações de vôo tornam-se heróis. Nessa missão inventiva de voar quando não se tem asas, de reforçar a curva do destino que levará um dia a unificação final dos povos. Se vai ser bom todos sermos iguais um dia, eu não sei, mas vai ser com a ajuda dos aviões. E da Internet. Neste momento que escrevo, ouço as terríveis notícias de que derrubaram mais um avião lotado, da TAM, com 199 vítimas fatais, num acidente pra lá de previsto e anunciado. Seja lá de quem foi a culpa, um acidente tão evidente é responsabilidade dos administradores do sistema todo. A começar pelo piloto da Democracia que regulamenta aeroportos e vôos de seus eleitores. Para os que se foram, que Deus os guie nessa viagem até a luz. Canto XIX O Ônibus Voador Quem foi que foi, falou no boi voador Manda prendê esse boi, seja esse boi o que for “... Buarque Chico Aeroporto às seis horas da tarde, 19 de julho, quinta-feira. O estacionamento um do Tom Jobim está lotado, em parte tomado pela realização do Pan, o Brasil estava em quinto na classificação dos Jogos que orgulhavam todo dia o povo carioca, massacrado na sua guerra civil. Eram as notícias que eu acompanhava além do terrível acidente da TAM. Chegamos cinco horas antes do embarque ao aeroporto. Ficamos 30 minutos na fila do Banco do Brasil – sinto que vou repetir muito isso – para trocar reais por dólares e por travellers. É um tipo de cheque administrativo que se perder te reembolsam e na volta você pode trocar dólares que sobram pela melhor cotação. Guarde o contrato de compra. O embarque seria às onze da noite, ainda jantamos um lanche, sinto que vou repetir isso também. O grupo da excursão se reúne, outros grupos vão no mesmo avião, nosso grupo de cariocas e fluminenses é o menor, há muitos mineiros e gaúchos no Tom Jobim. Todos logo se conhecem no nosso grupo, ficamos meio de fora. Rapidamente já falam como velhos amigos. Os Mirmidões, principalmente, que vamos chamar assim por um nome grego a classe masculina mais atuante, adolescentes entre 13 e 17 anos. Há quase igual números de garotas, por ora, as Vestais, que eram religiosas na Grécia Antiga. Há alguns adultos no grupo, sorte nossa. A primeira entrevista é na fila de despachar as malas grandes, cada mala com identificação, nome do hotel e cartão do seguro. A funcionária da AA veio com as perguntas-padrão. Você carrega líquidos com mais de 50ml? Deixou sua bagagem com alguém desconhecido? Carrega algum pacote entregue por desconhecido? Ah sim, carrego, era um sujeito alto, magro, com barba longa, turbante e bengala. Brincadeira. Na hora da entrevista foi: não, não e não, senhora. Depois não havia fila para a entrada da Polícia Federal, com a ajuda da nossa guia, RS. É um dos compromissos diários daquela profissão de Doutor Destino, o guia de turismo. Evitar filas = ganhar tempo. Ganhar tempo é nunca estar atrasado. Com tempo sobrando fomos aquecer as pernas e afiar os sentidos matemáticos nos preços de produtos no Free Shop, uma loja como a Zona Franca de Manaus, com menos taxação de impostos em produtos importados. Que é barato para quem está no Brasil, mas é caro – mais ou menos 20% - para quem está indo pros EUA. Comprar na ida, só artigos de primeira necessidade, como garrafas de whisky portáteis, jogos, etc.. Eles “lacram” os produtos com a nota num saco plástico. Esses líquidos você pode levar nos vôos. Ainda que as garrafas sejam de vidro. ccccccccccccccccccccc Tudo é alegria, tudo é vocação para gentileza e sorrisos, até que você vê a sua cadeira no avião. É um ônibus voador, bem pior que o Rio-São Paulo da Ita que nós pegamos para tirar o visto. Será uma noite mal dormida, nos intervalos aproveite para acompanhar a TV 14 polegadas que eles colocam a cada dez metros, se você comprou bilhete bem na frente, pode ver uma tela bem maior, não entendi, não faz sentido. Perto grande, longe pequena. Não seria melhor o contrário ? Na TV vejo um velho seriado, Wings, sobre um aeroporto numa cidade do interior. Passa ainda um programa com mapas, informações sobre o traçado do vôo, onde estamos, há tantos mil pés de altura, uns oito quilômetros, eu acho. Descobri que na costa da Flórida tem uma ilha chamada Hollywood. Naquele momento, cercado de estranhos e comissários cansados e desatentos, sem dormir, dentro de uma lata de alumínio metida à besta, era onde eu queria estar. Numa Ilha. Uma opção é não viajar de noite, e perder um dia. E também há a primeira classe, pelo quase triplo do preço e todas as conveniências possíveis, numa poltrona digna do ônibus Leito da Cometa, Flecha de Prata, que fazia a RioSão Paulo. Foi um veículo lendário, que para mim só teve correspondente na aviação nos Caravelles e Concordes, cada um no seu tempo. Tudo bem, eu gosto de hipérboles, exageros, superlativos. O Flecha e os aviões clássicos só não foram melhores do que os trens prateados, O Santa Cruz e o Vera Cruz, no vagão leito com cabines, para se dormir em camas, ao lado o seu próprio banheiro. Aquilo sim era viajar de madrugada. Ainda que demorasse 12 horas do Rio a Belo Horizonte e 10 horas do Rio a São Paulo. E o melhor é que às vezes demorava o dobro. Canto X - Hello, Gringos !! Mama put my guns on the ground I can’t use them anymore Bob Dylan Amanhecer no céu norte-americano é novo. Olhar as vastidões da civilização local animava muito, a dor da viagem é passado, também é futuro. Dá até para sorrir na saída do avião, depois do tormento. Na interminável fome de sensações e conhecimento, vejo o novo lugar não como os outros já invadidos e conquistados por hordas de turistas. Aqui eles estão esperando você, sejam lá quantas legiões você representa. É tudo huge, grande. Olhar do alto é olhar um mapa ao vivo. Deve ser fácil desenhar mapas hoje em dia na Flórida. Basta fotografar e colocar os nomes por cima. Dizem que no Google Maps é assim. Eu falo gógou méps, todo mundo me corrige, é gúgou, não é gógol. Assim ganhei o apelido. Gogol. É realmente impressionante a quantidade de estradas, terrenos cuidados, fazendas, matas separadas, lagos, muitos lagos. Não se vê terra vazia, ou estrada pequena e sinuosa. Tudo tem seu local. Está tudo arrumado. ccccccccccccccccccccccccccccccccc O Aeroporto de Miami, vou resumir numa placa. Tem letras A, B, C, D, E, F, G e H, ainda estão construindo o resto do alfabeto. Embaixo de cada letra, um valor de tempo. A-12 minutos. C - 8 minutos. H - 17 minutos. Depende de onde você saltou, são os minutos para andar – com ajuda de esteiras - até aquele terminal. Olha, eu nem lembro se tem terminal com a letra agá mesmo, mas já deu para entender. É huge, muito huge. Cabe uns seis aeroportos nossos num deles. A empresa da gente, do ônibus voador, tem um terminal só para seus clientes sofridos. Como o próximo vôo era com eles de novo, não andamos nada. Comprei meu primeiro café na Starbucks, um de-leite. Paguei errada minha primeira conta, os tais seis e meio por cento que não estão no cardápio, só na nota. A atendente deu aquele olhar de putz, mais um ! . Uma mala nossa havia desaparecido, uma companheira de excursão havia despachado por nós para Tampa, pensando que era dela, susto rápido, primeira adrenalina e primeira nova amizade com história pra contar. O nome dela é Ângela, viaja com o filho quase médico e uma pequena filha, a caçula de oito anos, que ora batizaremos de A Menor. Dali para um vôo lépido e fagueiro, até Tampa, um aeroporto menor, mas com trens elétricos que ligam terminais de passageiros à entrada para os aviões. O centro do Aeroporto tem uma altura interna de uns 30 metros, um teto oval, tudo em vidro e tubos de alumínio ovais. É bem novo, diferente de Miami, que parece coisa dos anos 80. A mala reapareceu. ccccccccccccccccccccccc Cansados e felizes, com a nova paisagem, nova luz e novo cenário, ainda não vamos para o Hotel. Vamos para o Wal-Mart, no ônibus que nos leva para Orlando, onde ficam os parques, hotel e tudo mais. Essa parada no supermercado é estratégica, precisa estar atento, ver e comprar rápido, por ordem da excursão, não entendi a pressa. Deve ser a tal intendência da guerra, o general dos suprimentos e víveres. Esse, Homero não reservou lugar na sua história, eu acho. Mas sem ele as galeras não se moveriam dos portos. Comprar nos EUA é um esporte, um pentatlo, como nas Olimpíadas. É preciso ter boa pontaria, para atingir logo a seção que você precisa, dentro de um enorme salão com gôndolas cheias de coisas que você nunca viu mas quer ver. Contam boas pernas para cumprir mais depressa o caminho entre as sessões. Raciocínio rápido ajuda nas contas, convertendo para o Real as compras que você vai levar de volta ao Brasil. Aquelas coisas que você vai consumir na viagem nem adianta converter. Estratégia de ação é fundamental, não vai dar tempo de passear entre as gôndolas a procurar curiosidades. Vá direto no que precisa. Nessa primeira seção de compras, no Wal-Mart, ficamos ligados em produtos para consumir no Hotel, mas os preços de eletrônicos são muito bons. Algumas pessoas da excursão já saíram com i-pods na bolsa, até roupas. Eu comprei um chapéu panamá de vaqueiro. Nosso hotel tem frigobar e microondas, vale a pena comprar víveres não-congelados, muito gatorade, biscoitos e coisas para lanches rápidos, que podem ser levados para os parques. RS só esqueceu de avisar, antes, que o frigobar não tinha congelador, só geladeira, eu comprei meu sorvete preferido em grande quantidade. Para beber depois. Lições pequenas. Pior foi almoçar no Mac Donald’s do local, cadê o Burguer King? Mas nada comparado a um estranho episódio que vai ficar sem explicação. Eu fumo, às vezes até lamento por isso. Nos EUA, você tem local para fumar e se fumar fora do local alguém aparece do nada para lhe advertir. É certo como água molha. Então fui para fora do supermercado, no local indicado, quando passou um coupê branco, Lincoln, tipo anos 80, com um sujeito muito mal encarado, de toquinha, bigode e recém-saído da prisão, eu acho. O cara me olhou como quem esperasse alguma confirmação, eu instintivamente ajeitei meu novo chapéu panamá de Caubói e o cara feia voltou. E eu olhei de novo! Lembrei no meu cachorro, João, quando ficamos encarando um ao outro para ver quem abaixa o olhar primeiro. Coisa de matilhas. Pensei também em Roberto Rodriguez e Tarantino. Câmera lenta. O cara passa devagar, saca uma Glock 9 mm e dispara quatro tiros num segundo. Tudo bem, exagero. Ele foi embora. Mas o olhar não era de boa coisa, com certeza. Depois terminei meu primeiro cigarro em terras americanas. Carlton, do Brasil. O Ministério da Saúde adverte. Fumar faz mal à saúde. cccccccccccccccccccccccccccccccccc Você caro leitor atento, minha leitora que nada deixa passar, vocês devem estar pensando, cadê a parte da revista no Aeroporto e a confirmação da entrada, o formulário I-94 para o oficial da alfândega te carimbar o passaporte? Claro, essa não podia ficar de fora, eu deixei pro final do capítulo. Compreendeu? Para você memorizar a cena. É o momento mais tenso para alguns, os que estão, por exemplo, devendo e não falaram nada. Não é o meu caso. Lembra de todos os formulários, documentos, comprovantes de que você é você, tudo aquilo que passamos juntos nos primeiros capítulos lá na PF? Servem para esse exato momento. Porque on–line sua ficha já foi investigada trocentas vezes e eles querem só ver pelo raioX algumas cores que indicam coisa proibidas. Enquanto as bolsas passam, você tira os sapatos, as coisas do bolso, tudo pros raios-X coloridos. E de meias – não use as furadas – você passa por uma máquina que assopra, um nariz eletrônico, para drogas e explosivos. Quase igual aos bancos no Brasil distante, quando apitam suas portas automáticas por excesso de moedas. Depois o oficial da alfândega nos sorriu enquanto liberava o I-94 sem perguntar nada, tipo sou gente boa mesmo. Atendeu a nós três, família toda e quase sempre junta, já sei, vão para a Disney, né mesmo ? podem entrar ! E gastem com se não estivessem em casa ! Não, isso ele não disse. Fui eu mesmo que pensei, sim, senhor ou sim, senhora. Canto XI A Terra da Mídia Quantas vezes se leu, só essa semana, Essa história contada assim por cima, “ Onze Fitas, Fátima Guedes Como já acompanhamos no capítulo anterior, foi longo o primeiro dia da viagem. Rio, Miami, Tampa, Orlando, Supermercado, Hotel, tudo em 24 horas. Convem um descanso, não é mesmo? Não, não é mesmo. Descanso rima com a maioria das viagens menos a Disneylíada. É agora que a guerra esquenta. Chegamos do supermercado para a Internacional Drive, a rua do Hotel, por volta das sete da tarde, hora de Miami, onde anoitece lá pelas oito e meia. Já fui logo na televisão, a minha janelinha para as besteiras do mundo, e as besteiras que a mídia fala sobre o mundo. Não deu tempo para muito, minha mulher e minha filha já me chamavam para ir às compras, numa loja brasileira, Yes Brasil, com jantar num restaurante brasileiro, o Camila’s. Não entendi, vim de tão longe para fazer compras em português e comer feijão com arroz ? Vai saber! Desde a primeira compra guardei a nota, qualquer compra. Depois terei uma planilha de gastos, no Excell. Tantos dólares com comida nos parques, tantos artigos no Shopping Tal. Mas os recibos mais importantes são aqueles que você vai usar para comprovar sua cota de US$ 500, principalmente se você ultrapassar a cota. Isso não é proibido, o excedente é taxado em 50% e você paga ali na alfândega no Brasil. Entenda-se por produtos de cota os eletrônicos ou grandes quantidades de qualquer coisa, cremes, perfumes, tênis. Há cotas individuais para quantidades, até 20 perfumes, por exemplo, depois disso, taxa. Minha filha não resistiu aos preços do produto número um de vendas do momento, i-pod nano, a US$ 199, na Yes Brasil. A loja tem funcionários brasileiros e vive cheia de excursões. Vende de tudo, algumas coisas são baratas, outras não. Como era o primeiro dia, não comprei muito. Só um perfume, enquanto minha mulher mergulhou em cremes e shampoos, produtos que ela garante não haver no Brasil com a mesma qualidade e preço. Eu só percebi até agora dos shampoos e cremes que eles pesam muito. cccccccccccccccccccccccccccc Na volta para o Hotel, quase onze horas, fui de novo ver a janela acesa do quarto, mas não aquela que dá vista para Orlando, do quinto andar. A outra janela acesa, a tal da Televisão Americana. Tem 32 canais, alguns abertos, outros fechados para o Hotel, todos com seriados e muito jornalismo. Há canais só sobre a Disney, outro que passa tudo da Universal Estúdios. Canal de Golfe só com jogos, produtos e anunciantes. Tudo 24 horas. Tem a PBS, o canal do governo, que passa programas educativos com a mesma qualidade de produção das outras. E boas audiências. Tem a CNN, e a FOXNEWS, claro. A NBC e a ABC, que passa num canal local chamado CW18. É onde tem o Seinfeld, o Friends, aqueles seriados de humor onde as pessoas são pagas para rirem quando acende uma luz no estúdio, a clack, mas eu rio de graça porque são humoristas e atores de competência e visível amor à profissão. O Seinfeld recusou 100 milhões de dólares por um ano de temporada do programa na TV, não é qualquer um que faz isso nos EUA. Seria a décima-primeira, ele largou para fazer mais shows em teatros e bares de comédia, uma coisa deles lá, Stand-Up Comedy. Dormi depois de meia-noite vendo a TV, com o ar condicionado mais frio do mundo e a certeza de que seria a noite mais rápida da minha vida. Não deu outra: Cinco e cinqüenta da madrugada toca o telefone. Ainda de noite. Quem será? Incêndio? Alguém passou mal e pensam que eu consigo traduzir a bula do remédio? Será que é sonho? Era a hora do super café da manhã com o Mickey. Putz ! Mas ainda é noite, esse rato não dorme!? Canto XII - Onde tudo começou It’s a Small World, after all “. Canção da Disney. Disneyworld, Uau! Para não dizer aquele exclamativo que mexe com muita gente. Eu tenho um amigo com grande imaginação para pensar as coisas da realidade e ele, vascaíno saudável, freqüentador domingueiro dos jogos do Maracanã e São Januário, divulga uma certa teoria. Quando você ouve aquele Úuuu nos estádios, logo após uma jogada com perigo de gol, diz esse meu amigo, que na verdade todos estão gritando um xingamento, aquela expressão de duas palavras mais um que no meio delas. A gente só ouve a parte mais forte, a sílaba inicial onde os pulmões avançam com mais força e energia. Úuuta que pariu. Pois a Disneyworld é Úuuuta... Um prodígio de construção e engenharia, botânica, física, química, essas ciências todas e a maior parte no subsolo. Por cima não se vê um poste de luz com fios. Só com luz ! O lago onde vive o elefante tem água azul-piscina, do hipopótamo também. É claro que não se pode entender tudo isso de uma vez só, como a jogada pela grande área e o chute rasteiro junto à trave. A sensação de queixo caído vai vindo aos poucos. cccccccccccccccccccccccc Fomos para o café com Mickey no Hotel Contemporâneo, ainda com gosto de travesseiro. Mr. Mickey é um indivíduo ocupado e se desdobra em dezenas de fantasias para cumprir uma lista interminável de tarefas no seu reino encantado. Todos os contratados que vestem aquele símbolo são treinados a fazer os mesmos gestos, as mesmas inflexões do corpo de rato cabeçudo. Você está sempre diante do mesmo Mickey. O café da manhã deles tem tradição de muita gordura, doces, pães, feijão com açúcar, e algumas frutas. É isso mesmo que você leu, feijão com açúcar no breakfast. Panquecas com calda de frutas não são interessantes como nos filmes, mas o bacon com ovos é uma delícia. E no café com Mickey, a Minnie e outros bonecos famosos, temos o buffê reforçado de um dos vários hotéis dentro da área dos parques, falaremos mais da geografia Disney daqui a pouco. Tem um biscoito frito com a forma da cabeça do Mickey, o logotipo das orelhas, tudo muito visual. Onde você anda tem música, até ao ar livre, com artistas da Disney. Esse hotel é dos mais antigos e possui um formado de pirâmide cortada, com uma área vazada no interior que faz o hall de acesso ao restaurante ter o teto a uns 80 metros de altura. Dá vertigem ao contrário. Por dentro deste mesmo salão, passa um trem elétrico futurista, que leva os hóspedes até os parques servidos pelo trem. Um colosso. Depois seguimos para a abertura do primeiro parque, às 9h da manhã, o Magic Kingdom, o primeiro da série de seis parques e uns dez hotéis, mais um mini-golfe gigante, tudo dentro do complexo Disney. Toda manhã às nove horas as pessoas se concentram no pátio da abertura do Kingdom, tem um show de boas vindas com a turma do Mickey, que já é outro, mas é o mesmo, chegando no trenzinho antiquado, “ à vapor “, que faz a volta no parque que deu origem à tudo. Os primeiros visitantes participam do show, alguns metros acima do pátio onde já estão uns mil visitantes esperando os portões do Magic Kingdom se abrirem. É rápido, o show. Nunca vi tanto brilho em tantos olhos de tantas crianças, só quando eu era criança e não reparava nos brilhos dos olhos e ia ver o Papai Noel no Maracanã. Aliás, Papai Noel não é da Disney, não? Tem tudo a ver. Lembrei, é da Coca-Cola. cccccccccccccccccccc Abrem-se os portões, chegar cedo é ótimo, apesar das duas noites mal dormidas. Quem chega cedo, bebe água limpa, diz o ditado, os brinquedos estão vazios, mas espera aí, aonde foram todos? Se eu perder a gente no meio disso tudo que eu não conheço ainda? Quando no alto a bandeira azul, flâmula tremulante com fitas vermelhas e uma bolinha plástica na ponta sinaliza o futuro de nós todos, seguir a bandeira e a guia, RS. Estar solto num local desse tamanho é certeza de perder tempo escolhendo demais e andando de menos. É preciso um bom sargento para a tropa caminhar unida em espírito e vontade. Contei uns vinte grupos iguais, depois parei de contar. Bandeiras, nas guerras, são também sinais de comunicação, embora eu nunca tenha ouvido falar de uma bandeira tipo, “estamos perdidos “ ou “ vamos ser massacrados “, não que não sejam úteis, mas estou me perdendo nas comparações, me desculpem. O parque tem divisões, todos têm, são parques temáticos dentro dos parques maiores. As primeiras emoções no Kingdom são comedidas, na AdventureLand. É um passeio de barco por uma mata plantada, a água nem é tão limpa, mas tem bonecos gigantes de elefantes e hipopótamos com caixas de som bem potentes. Espirra água do Elefante, tem um guia falando inglês que tenta embarcar a gente na fantasia de um floresta tropical. Oh, no, a Hippo will attack us ! o Hipopótamo vai nos atacar ! É um descanso, mas para os Mirmidões e as Vestais é um tédio, querem roller-coasters, adrenalina, emoção. Eu queria deitar, mas não há espaço. Da aventura florestal fomos para um futuro infantil, um conjunto de prédios com seu próprio trenzinho suspenso, e quase tudo é redondo, como nos Jetsons, desenho do Hanna & Barbera, que, eu acho, não tem parques na Flórida. Filmes 3D são rápidos demais para dormir e à essa altura já nem tinha mais sono. Só cansaço e impulso dos Gatorades. Os Mirmidões vão mais fundo, tomam Red Bull o dia todo. O 3D com Donald e o Mickey de Fantasia, o Filme, é esplêndido. Um revival do filme com a mágica científica dos óculos que filtram certas freqüências de luz, eu acho. Você vê mesmo aquilo bem na sua frente e todos vêm o mesmo, o que minha filha custou a acreditar, talvez a posição dela fosse melhor, quem vai saber. Minha mulher era a criança ao lado dela. Eles não chamam de 3D. É 4D, porque a cadeira balança, tem sopros no pescoço, água caindo do teto, vários recursos para a pele participar do banquete de sensações. Se Criseida estivesse lá, com certeza explicaria aquilo tudo. Mágica de Hipnos, deus do sono, que ao passar a mão à frente dos olhos de deuses e mortais, controlava suas vidas. Como fazem os hipnotizadores modernos. ccccccccccccccccc Do extenso cast de bonecos aparece, na área aberta, entre os prédios da cidade sideral, o monstrinho Stitch, em pessoa, de Lilo e Stitch, um filme que mistura Hawaii com Espaço. Tem filas curtas para tirar fotos ao lado. Basta fazer pose um pouco distante e já você tem uma foto também, sem fila, RS não deixa. Simuladores são de dois tipos, é minha a classificação. O Tipo Um – T1 - é o que sacode uma sala inteira, as cadeiras mexem e um filme numa imensa tela faz você acreditar que cinema é mais do que diversão. Tem laivos de realidade. O corpo eu acho que acredita e influencia a mente, nos lances múltiplos e rapidamente elétricos que acontecem dentro de nós e nas cadeiras. Coisa dos nervos. O simulador Tipo Dois – T2 - tem um carrinho que te leva por cenários e paisagens em escala reduzida. Tem ainda efeitos com bonecos, os animatronics, e com atores vivos, você verá muitos deles. Os simuladores T2 variam mais, de tamanho, convencimento e antiguidade. São mais, digamos, racionais, menos empíricos. O simulador do Peter Pan, T2, no Kingdom, é dos mais antigos e menores. Bem racional. Você voa sobre a casa da Wendy, e faz o caminho do Peter Pan para a Terra do Nunca, lirismo infantil. Os shows também variam de tamanho, alguns misturam cinema 3D com encenações, outros são gigantes apresentações como a Shamú, no Seaworld, ou o Indiana Jones e o show de dublés com carros, na MGM. ccccccccccccccccccccc Abro um parágrafo caro leitor que já estava com saudades do tempero mediterrâneo na salada que faço aqui na Disneylíada. Os empíricos foram importantes filósofos na Grécia e por eles tinham muita admiração os cidadãos futuros da futura cidade de Roma. Ainda em Atenas, lá nas praças, Ágoras, diziam os empíricos que se deve prestar muita atenção aos sentidos, porque depende deles o que vamos pensar como certo e errado. Agradar aos sentidos é ter mais vida. Ou era algo parecido, pesquise, vai valer a pena. Pois a Disney deve ser o fast-food da realidade para um empírico. É um banho de loja nos sentidos, todos, até o paladar. Mas esse fica por último. O primeiro dia só não foi perfeito porque perfeição entre humanos não existe. E também porque choveu, o que impede a apresentação de uma Parada Elétrica no Magic Kingdom, um desfile de carros alegóricos e pessoas vestidas de iluminação, parecidas com as luzes de Natal que decoram casas no fim de ano. E a tal queima de fogos que fecha o dia, em todos os parques maiores. Na hora da saída descobri para que serve a bolinha plástica no alto da bandeira azul da guia RS Aquilo acende! Para você não se perder de noite. Quando chegamos ao Hotel, por volta das dez e meia, pude ver outra queima de fogos no horizonte de Orlando, de geografia infinitamente plana. Nesse primeiro dia de parques, acumulados o cansaço e as observações, minha cabeça parecia mesmo ter fogos de artifício a explodirem no céu do meu crânio. Canto XIII Parque, Cinema e cansaço Deus me meu mão de veludo pra fazer carícia Deus me deu muita saudade e muita preguiça, Deus me deu perna comprida e muita malícia, Pra correr atrás de bola e fugir a polícia, Um dia ainda sou notícia .... Chico Buarque Cinqüenta e quatro horas depois de sair do Rio, eu era um homem cansado. Nada mais. Cansado num contraefeito de relaxamento de quem afastou-se de uma rotina de pequenos afazeres repetidos e reconfigura o corpo e mente para aquela nova e temporária realidade. Estamos em Orlando para usar os parques, fazer compras e coletar material para um livro. Nada mais. Estamos no terceiro dia aqui, segundo dia de parques. Faltam doze para terminar a viagem. Cansado, muito cansado. Cansado também porque andar no calor cansa muito. Anda-se até 5 km por dia em Orlando, eu calculo e chuto. Quando eu fujo da rotina no Rio pedalo por cinco, seis horas, com parada pro lanche. É uma necessidade de não ver tela de computador por algumas horas inteiras, de fugir da cadeira, da inércia física. U-Biker, tem na Internet. Então no dia seguinte fico assim cansado mas fico quase parado o dia todo. Aqui, não. É cansaço sem recuperação, esse é o segundo guerreiro a enfrentar na nossa Disneylíada. Cansaxion, o deus do esgotamento físico. ccccccccccccccccccccc Pelo menos foi um parque tranqüilo nesse dia, com muitas passagens para quem gosta de cinemão, muita atração onde ficamos sentados. A MGM Disney foi inaugurada para expandir a linha de montagem das duas empresas coligadas. Filmes da Pixar, mas também o passado, com séries de televisão ou grandes filmes de vendagem. Indiana Jones, ET, Guerra nas Estrelas, nota-se Spielberg por toda a cena. Tem um show com pilotos acrobatas em carros preparados onde ensinam os truques dos filmes. Num teatro para umas 2 mil pessoas, eu acho, acordei calculando mal hoje, dei várias topadas, lotei o café de açúcar. A arquitetura do parque é o passado futurista dos anos 50, acho que chamam de estilo Miami da Califórnia. Art Déco, sei lá. Tem uma reprodução da calçada da fama do Teatro Chinês, de Los Angeles, Califórnia. O prédio abriga um Simulador T2 gigante, com ator no nosso carrinho que vai a narrar cenas de filmes de bang-bang, com animatronics, os tais bonecos hidráulicos. Tem um com a cara do Clint Eastwood com vontade de ir ao banheiro. Depois você muda para um cenário de Múmia, depois vai para os anos 30 de Chicago com tiros e tudo mais. Como no cinema. Mas antes de começar o passeio, tem uma fila superlativa serpenteando uma sala igualmente grande onde passa um filme curto em homenagem aos clássicos do cinema. Por isso ninguém reclama das filas, nem eu, apenas relembro. Metrópolis, Casablanca, Cantando na chuva,..E o vento levou, Mari Poppins, Se meu fusca falasse, ET, Terremoto, tudo que é deles, MGM e Disney. Não tem Forrest Gump, por exemplo. A roller-coaster do parque é a Rock ‘n Roller, que dispara logo no início, e roda num prédio fechado, escuro, com cartazes grandes em néons e tinta fluorescente, simula uma ida a um show de rock, numa limusine ultra veloz. Tem Aerosmith no tema. Fui três vezes seguida, na singleline. Já explico. Todas os Parques lotam em julho, mas a capacidade dos brinquedos e atrações às vezes chega a 40 pessoas de uma vez num carro grande. Nos cinemas 3D, até 800 de uma vez. A fila anda rápido, mas ainda tem o fast-pass, uma senha que você pega antecipado, com um horário marcado. Na hora que você chega, tem fila, mas bem menor. De quebra, ainda colocam a opção single-line, uma fila para solitários que podem ocupar qualquer vaga. Se o brinquedo tem quatro vagas numa fila e aparecem três pessoas querendo andar juntas, sobra uma. O organizador do local então vai lá na fila single-line e pega alguém que topa andar só. Vi apenas nos parques da Disney. Nos parques da Universal Estudios tem fast-pass, mas é pago por fora, eu já soube. cccccccccccccccccccccc O melhor brinquedo da Disney MGM, segundo as deduções de minha filha – trem fantasma com elevador que cai! – e as reações de minha mulher - nunca mais! – foi o Hollywood Hotel. A obra de simulação começa desde longe. O prédio de uns dez andares imita um hotel anos 30, abandonado depois de um incêndio, com jardins opulentos, um ar de mistério proporcionado pelos pulverizadores de água sobre as plantas na entrada, que ameniza o calor também. Nas ante-salas do brinquedo, é um espetáculo de cenografia de cinema, numa tv preto e branco antiga você assiste o episódio do programa Twilight Zone, Além da Imaginação, sobre a história do hotel, enquanto a fila anda. A fila vai até o subsolo, pegar o “elevador”. Vemos a réplica de um sótão antigo, com tudo envelhecido, misturado a peças velhas de verdade, quase não se vê a diferença. No brinquedo você entra num carrinho para 50 pessoas dentro de um elevador numa ala do prédio. Sobe e o carrinho sai andando pelos corredores onde fantasmas projetados e jogos de cenografia iluminada criam um clima. Então o carrinho-elevador chega a outro poço de elevador, onde despenca e sobe rápido várias vezes. Para apavorar geral, as portas da frente abrem para a rua, e você vê que está a 30 ou 40 metros de altura, olhando os horizontes de Orlando. Um barato. cccccccccccc Desprovido de musculatura, entregue a qualquer proposta, fui no embalo, no dia quente de Orlando, uns 37 graus. Nem comer você consegue. Só Gatorade, picolé e Coca-Cola. O final da MGM valeu a espera de uma hora na platéia do anfiteatro, quase três mil pessoas fazendo a ola e a maioria cantando “ sou brasileiro, com muito orgulho, com muito amor”. Me emocionei. Mas lembrei do Bin Laden, aquela gente toda reunida por ali pode dar alguma idéia nele. É um show conhecido pelo nome de Fantasmia, onde o Mickey enfrenta forças do mal. Tem uma cobra, símbolo bíblico do mal. Projeções de desenho animado sobre cortinas de água pulverizada. Luz, cor, jatos espirrando, música potente, fogos estratégicos, vários personagens de Disney, fogo sobre água, tudo espetacular. Quem consegue pensar em cansaço ? Quem consegue pensar? E você vai querer mais, a essa altura já se viciou em adrenalina, não vai querer largar. Ainda bem que faltam doze dias. ccccccccccccccccccccc Nesta noite descobri um estranho efeito colateral da adaptação do corpo à nova rotina, nova comida, novo movimento físico, novo ar, novo tudo. Durante as noites mal dormidas nascem sonhos notáveis. Dobra o proveito de uma viagem tão cara. Eu teria passeios reais de dia e virtuais à noite, em qualquer lugar do meu desejo, sem custos adicionais. Vou encontrar Oneiros, o mensageiro dos sonhos, Oneiros, funcionário do Olimpo, que recebia direto de Zeus as ordens de sonhar mensagens aos heróis, como Heitor e o Rei Agamenon. Diferente de Hipnos, que controlava o sono. Quando faltou Aquiles nas tropas, Agamenon recebeu de Oneiros um sinal em sonhos para que atacasse Tróia assim mesmo, à mando de Zeus. Foi vitorioso. Consegue que seu irmão Menelau enfrente Paris e o derrote, em mais um episódio da guerra entre homens e deuses. Paris foi salvo por Afrodite, que o transmuta e teletransporta para longe, como em Guerra Nas Estrelas. Canto XIV - Big Orlando Quando eu te encarei frente a frente, não vi o teu rosto “ Caetano Veloso No quarto dia da viagem, Epcot Center, fiquei no Hotel, dormi até tarde, tratei da roupa na lavanderia de fichas, conversei mal em três idiomas, com hóspedes. Dormi mais um pouco, fui à piscina, me ralei no fundo de cimento pintado de azul, achei que era de fibra lisa. Depois dormi ao sol, voltei pro quarto, vi mais TV e dormi mais uma vez. Férias, é isso ! Andei na vizinhança, vi os carros e uma vida calma sem muita gente na rua. Há calçadas, onde se pode andar de bicicleta. Nos pontos dos ônibus tem várias placas que não pesquei as funções, devem ser as linhas. Nenhum lixo no chão. Nem caminhão de lixo, ou coletores grandes. Apenas as lixeiras, em todo lugar. Se você atravessa a rua na faixa, mesmo sem sinal, eles param os carros, mesmo sem guarda. Fiz isso umas quatro vezes, só para testar. Pensei que era sonho mas como eu estava no controle há tanto tempo, não podia ser. A cidade estava sendo invadida por 28 mil pessoas, todas da religião luterana, que faziam uma convenção nacional, como nos anos 20 do século passado. Vi centenas de grupos andando, todos americanos do tipo muito louro, muito sardento e muito gordo. Por favor, não me acuse de usar a proficiência orgânica de um cidadão com ponto de referência, mas eu anoto o que vejo. Eles sabem como chegar à um infarto antes dos 40 anos. Foi o que me disse um dos americanos que conheci, Edward, enquanto conversávamos sobre a superioridade do hambúrguer americano durante um lanche nos parques. Tenho uma foto dele. Gordo e feliz. Ccccccccccccccccccccccccccccccc Minha filha foi ao Epcot Center, na lógica dela não se vem à Orlando para ficar no Hotel. Na volta vibravam ela e minha mulher, com mais um corolário de novidades e sentimentos. Minha filha me contou maravilhas sobre o parque que congrega representações de vários países, mais algumas atrações como o Soarin’, um simulador T2 de asadelta ou o Test Crash, onde uma pista simula os testes de carros nas fábricas, como se você fosse um boneco de testes, crash test dumies, como eles chamam lá em Detroit. Tem 3D com o filme Querida, Encolhi as Crianças. E simuladores T1 que vai à Marte e outro que viaja pela Terra, mesmo. Em torno de uma imensa lagoa estão as representações do México, Noruega, China, Alemanha, Itália, Japão, Marrocos, França, Reino Unido e Canadá. Todos com sua culinária típica, minha filha e minha mulher almoçaram no Japão e comeram pão na França. Alguns países tem atrações, como o cinema 360 graus no Canadá, filmes na Noruega e França, simulador de viagem no México. T1, eu acho, elas não foram, estou lendo no folheto do parque. Em português. Todos os parques têm folhetos em seis ou sete línguas, inclusive o árabe. cccccccccccccccccccc Só no quinto dia começamos a conhecer melhor o povo da excursão. Desde o café da manhã do Hotel que era sempre entre 7 e 7:30h, para estarmos juntos no ônibus às 7:50h. Entre os garotos, os Mirmidões, destacava-se o menor deles, de dez anos, porque em torno das brincadeiras contra ele se reuniam os outros. Destino de grumete, o aprendiz dos navios. O nome dele então vai ser O Menor. As meninas são todas simpáticas e tranqüilas, não há histéricas falantes. Sorte nossa. Minha filha já se apresenta como a tradutora do grupo das meninas. Também se deu muito bem com A Menor, filha da Ângela, que tem oito anos. Tem uma garota diferente, mais tímida, porém muita risonha, basta olhar pra ela que ela automaticamente ri. Entre os adultos há uma família, duas irmãs vieram com os filhos, uma filha é a universitária, o outro, um dos Mirmidões. Adultos é força de expressão, na hora dos brinquedos, todos tínhamos 13 anos, no máximo. O Hotel é simples e para nós, estreantes, bem equipado. Camas grandes e macias, banheira com chuveiro massageador. Água quente e fria numa torneira só. E você pode beber a água da torneira, a do chuveiro não arrisquei. Diariamente vi um carrinho do handyman nos corredores, aquele sujeito que conserta tudo o tempo todo. Os frigobares não congelam porque não foram feitos para isso. Acredito que duas estrelas é justo com o estabelecimento. Duas estrelas americanas, veja bem. No Café da manhã tem aquele feijão com açúcar que não provei nem por conta do apego a vocês leitores e leitoras que vieram até aqui comigo. Sinto muito, não dava, logo pela manhã comer algo forte demais estava na minha lista do não pode. Dá para fazer sanduíches com bagels, tipo uma rosca de pão, mais o presunto fatia-gorda que eles regavam nas prateleiras. Com exceção do bule de café, era tudo SelfService, ou selv-selv como diz um notório analfabeto que eu conheço. Torradas normais e outras coisas conhecidas, manteiga, queijo, melão, completavam a refeição mais importante do dia. Pois era no selv-selv que começaram nossas conversas, com a maioria reclamando dos temperos, leite ralo, café ralo, muita fritura, poucas frutas, pouco sono. Eu comi muita torrada com ovos mexidos, o tal presunto grandão, e sempre tinha uma banana fantástica, daquelas que custam um dólar lá fora. A banana nos Estates tem um cheiro mais forte, parece que foi aromatizada artificialmente mas eu sei que isso é impossível. Ou não? O Salão do restaurante é pequeno, tem fila, mas chegaremos cedo todo dia, acho que não vai ter problema. Grupos têm preferência, porque têm horários Há muitos brasileiros no Hotel, até gente famosa, no Rio pelo menos. Rômulo C. e Priscila N., ele o empresário, ela, a apresentadora da F. 2000, uma empresa de produção cultural especializada em bailes funk no Rio de Janeiro. Estava em Orlando também o Henri C., ator de novelas, mas estava em outro grupo e outro hotel, onde apresentaria uma festa de quinze anos. ccccccccccccccccccccc Estávamos animados porque RS havia dito que teríamos possibilidade de dormir na próxima atração. Um paradoxo da adaptação. Animado para dormir. Eu ainda não estava satisfeito com meu déficit de sono, ou não estava adaptado a tanta caminhada. Era o dia do primeiro parque aquático, Blizzard Beach, fica no complexo Disney que vou explicar um pouco mais. O que acontece hoje com Disney na Flórida é a regra da concorrência produtiva. Desde que começou o Magic Kingdom, em 71, legiões de concorrentes apareceram. O primeiro dos grandes foi Anhausen Busch, da família cervejeira Budweiser. Ele já possuía uma área de trabalho voluntário para recuperar animais no que seria mais tarde o SeaWorld em Orlando. Dele também é o Busch Gardens, em Tampa, há 40 minutos de Orlando, especializado em roller coasters, as maiores, mais atuais e mais concorridas. Além desses, veio a Universal Estudios, em 98, com três grandes parques unificados a um grupo de hotéis, tudo interligado pela imensa praça que é o City Walk, um espaço de entrada grátis, uma espécie de ante-sala do paraíso. Por outro lado, o lado líquido, tem o Wet n’ Wild pousado bem no centro de Orlando, que gravita perto do nosso endereço temporário, a International Drive, a avenida concentradora de hotéis e atrações. Tem uns 10 quilômetros, a avenida, não o Wet n’ Wild. Fora os grandes parques, tem os pequenos. No Horizonte do quinto andar do Hotel, vi um balanço de uns 80 metros de altura, feito de braços de metal em treliças que suportam por dois cabos um bondinho tipo do Pão de Açúcar, para umas dez pessoas. Ele balança, somente, mas vai a uns cem quilômetros por hora. Eu calculei no chute a altura, o peso e a velocidade, com a equação pendular básica que temos de cabeça. Vi um anúncio de um kartódromo indoor com um ¾ de milha de circuito, dá mais de um quilômetro, imaginei a velocidade no final da reta. Na frente do Hotel tinha um prédio de arquitetura clássica, virado de cabeça para baixo. Era um centro de diversões eletrônicas e uma Casa do Terror, dessas que a gente vai andando e perde o chão, a mulherada grita. Cccccccccccccccccccccccccccccc Mas o passeio que demos agora, eu e os seus olhos, por Orlando, foi para localizar o complexo Disney, há quinze minutos de ônibus, longe disso tudo aí que eu falei, tudo o que é urbano. O complexo é uma área verde prodigiosa – estou ficando sem adjetivos - que faria o paisagista Burle Marx corar de vergonha quando o chamam de gênio. No centro tem um lago imenso, todo cercado de verde planejado, pinheiros, plantas diferentes no brilho e na textura das folhas, coqueiros gordos e simétricos, não sei botanizar. Nas margens do lago estão alguns parques, alguns hotéis, tudo interligado por barcas e o trem-bala. Além de um serviço de ônibus grátis, o complemento para ligações mais distantes do lago. Estão neste alcance outros hotéis e outros parques menores como o Blizzard Beach. Há ruas para o pessoal que trabalha, cenário vivo de cinema americano futurista. Tudo original da prancheta de Elias e seu grupo, que já previam todo o crescimento, eu acho. O crescimento foi impulsionado pelos concorrentes, na verdade é Disney contra todos. A Universal seria como Agamenon, o rei dos invasores. Mas Tróia, aqui, descobriu seu jeito americano de prosseguir. Tem inclusive condomínios para quem quiser morar na Disney. Deve ser caro, mas quanto mais dinheiro você tem, mais barato as coisas ficam. Paradoxo da Injustiça Social. cccccccccccccccccccccccccccccccc O Blizzard Beach já intriga no nome. Blizzard é nevasca e Beach é praia. Toda a decoração remete a uma montanha de neve, os quiosques são cabanas de lenhadores, e por aí vai. Me contaram que no inverno o parque funciona com água quente, mas se fizer abaixo de 10 graus centígrados, eles fecham, para evitar choques térmicos. Tem quedas quase verticais, tobogan, vários escorregas diferentes, alguns são túneis fechados. Foi o parque mais lotado, não consegui andar em quase nada, até porque achei uma ótima espreguiçadeira embaixo de uma árvore numa praia com areia e tudo. Dormi e sonhei que estava dormindo muito bem. Como é bom dormir nas férias. Quando acordei minha mulher e minha filha estavam pelo parque e fui procurá-las em vão. Voltei para uma conversa com Ângela e uma nova personagem que surge na nossa história, Lily, que até então eu não tinha visto, nem no avião, nem no aeroporto, nem no Hotel. Ela veio de Nova York, onde trabalha há um ano, encontrar a filha, a menina tímida, que está na excursão. Lily é uma brasileira à caminho do sonho americano. Foi uma das melhores fontes para anotar comparações e perguntas que simplesmente eu não poderia fazer aos americanos, que conheci de oi, tudo bem, vocês comem muita gordura por aqui ! essas coisas do trivial. Ccccccccccccccccccccccc O dia termina em compras no Florida Mall. Chove e esfria, 22 graus. Andamos na rua entre uma loja grande, Best Buy, só de eletrônicos e o shopping. Éramos aqueles grupos de japoneses e suas máquina de fotografia. RS bandeira à frente, olho vivo em todo mundo. Foi quando joguei a toalha, desisti, vou para o Hotel. Fazer compras? Shopping de Outlet? estou out . Mas não foi tão fácil assim debandar da excursão e recordar o dia anterior, de folga. Você, meu jovem de menor, minha jovem de menor, que já adquiriu esse fenomenal hábito de ler qualquer coisa, até esse livro, você precisa saber de uma coisa importante sobre viagens à Disney. A maioria dos freqüentadores de todos os parques são como você. O que o coloca num paraíso de opções de farra, emoção, amizades e até inimizade, o que é muito comum na sua idade. Porém, mesmo com 17 anos, está nas mãos dos Senhores do Destino. Não tem moleza como essa, de pegar um táxi e se mandar para o Hotel. Ou seja, vira criança de novo. Duas vestais quiseram voltar também. Perdi quase meia hora esperando o fim do drama, elas vão comigo ou ficam no Shopping? Ficam, RS não abriu a guarda e deu um ombro amigo para a menina chorar um pouquinho. Pode parecer cruel mas é como numa batalha, foi o que falei desde o início. Se abrir para um, todos vão querer debandar e ir para a piscina do Hotel, relaxante mais que necessário. O que fazem as excursões para resolver tais impasses? Reuniões, muitas, antes da viagem todos se conhecem, eu nem sabia disso, por isso eles “ficaram amigos” tão depressa no aeroporto, entendo agora. Os pais, e os filhos que viajarão sem os pais, se entendem antes da viagem sobre limites que a excursão impõe. Dinheiro por exemplo. RS era um banco teen. E toda noite ia fazer o balanço dos gastos porque senão tem gente que estoura tudo em três dias. Dólares são lindos e saborosos, como as coisas que eles compram. O Menor comprou bolas de basquete, luvas de beisebol, bola de futebol americano, mas não conhece ninguém que jogue. cccccccccccccccccccccccccc Desta vez as compras foram calmas, com tempo para olhar, contaram minha mulher e minha fila. Elas voltaram espantadas com tantas oportunidades de produtos com qualidade e preço. Tem todas as marcas “importadas” que você imagina, há uma loja da M&M com trocentas variedades de chocolates, além de artigos de roupa e lembranças da M&M. Havia uma loja da Disney, com os mesmos artigos dos parques, porém mais em conta o preço. Um dos Mirmidões comprou uma cartola do Chapeleiro Louco, de Alice no País das Maravilhas, muito útil na excursão. De qualquer lugar poderíamos avistá-lo, um ponto de referência, portanto. A menor coleciona bichos de pelúcia, depois da viagem terá uma coleção e tanto. Minha mulher comprou roupas para minha filha, mas ainda não encontrou os tênis encomendados. Teremos ainda uma visita a outro Shopping, Prime One, só de ponta de estoque, com uma loja da Nike. Canto XV As montanhas são russas mesmo. “Ando meio desligado, eu nem sinto meus pés no chão ” Mutantes, com Rita Lee Estou numa casa antiga, em Olinda, Pernambuco, salão de madeira, há uma festa, mas é dia. Lá fora vejo um telão com um trecho de Shrek, o Ogro da Disney Pixar. É um festival de cinema, espero a apresentação do meu filme. Na casa tem muitas mulheres, estão falando alto e rindo, eu falo com elas mas não me enxergam. Eu ando num carrinho com trilhos no alto, com um amigo que nunca tive. Reclamamos porque não passa o filme que fizemos. Eu lembro que pode ser tudo um sonho, porque festivais em Olinda não passam filmes da Disney. Tento controlar o sonho e ir a uma joalheria, comprar jóias por atacado e não pagar. Acordo. Ainda me sinto cansado. Ter voltado de táxi ontem à tarde e debandar do grupo foi a melhor coisa que fiz mas não foi o bastante. Minha mulher e minha filha mais que aprovaram, sabem das minhas limitações sociais durante as compras. Fiquei na banheira até enrugar a pele nas pontas dos dedos. Depois, cama e TV. O humor estava a zero grau. Na Univision, espanhola, assisti a história de Tiburón Negro, o mexicano Sérgio Jesus, campeão de nado em mar aberto. Atravessou da Espanha ao Marrocos pelo Mediterrâneo. Tiburón é tubarão em espanhol, ele só veste preto e quando levanta o braço, fica parecido com aquela ponta do tubarão fora d’água. O detalhe é que El Tiburón é paraplégico. Como se respeita e incentiva os especiais por aqui. Em cada canto, cada detalhe. Os parques têm vagas nos shows, nos simuladores, nos brinquedos, inclusive em algumas roller-coasters. E tem cadeiras de rodas para os mais gordos ou mais velhos não andarem muito. Sim, eu tentei, mas não deixaram. Fiquei zapeando a TV. No Tourist Channel passa propaganda dos advogados de causas turísticas: roubo de malas, táxi que cobra errado, eles pegam qualquer caso. Se eles estão na TV é porque ganham a maioria dos casos. Ou não teriam como pagar os anúncios. Em Orlando um restaurante chinês é assaltado, com tiros na saída, dois dias depois foram presos os agressores. Jovens, hispânicos, desempregados. É o padrão. Cccccccccccccccccccccccccccccc O dia de hoje começou às 6:30h mas depois do café voltei para a TV. RS havia dito que haveria atraso com o ônibus que nos levaria até Tampa, para o Busch Gardens. No CW18 dava que houve um acidente na I-4, a rodovia expressa para o parque de hoje. Mas foram dois, um guindaste que caiu do caminhão e um engavetamento, com feridos socorridos por helicóptero, vi na Univision também. As freeways têm cinco, seis faixas e áreas de escape. Quando batem dois, batem todos. Não se vê muitos carros na freeway fora da velocidade média, que é alta, 100 km por hora. Parece que foi ensaiado. Não se vê ninguém andando na beira da pista, nenhum cachorro ou bicho atropelado como se vê no Brasil. Por falar em bicho morto, por mim, só vi dois mosquitos no Hotel e uma barata chinesa, mas foi num dos parques, nem fica bem dizer o nome, era da Disney. Nas rodovias, nada além de carros, caminhões, ônibus, motos, bem poucas. Nenhum cachorro, morto ou vivo. De madrugada deve ter um time de caçadores pela rua, atrás dos bichos. Só pode ser. Vimos esquilos e muitas aves nos parques, atrás da comida de gente. Esquilos mordem. O Busch Gardens tem muitos animais da África, é também um zoológico. Porém os bichos que mais vimos eram nomes de roller coaster: Scorpion, Cheeta, entre outros. Sheikra não é um bicho mas é o bicho. A rollercoaster é a atração número um do parque, com uma descida vertical e o carrinho com umas 40 pessoas a plenos pulmões. Ainda pára na beirada da queda, antes de despencar. Há desfibriladores nas atrações, aquele equipamento de ressuscitar cardíacos, com choque elétrico. Não fui da Sheikra, estava passando mal na hora, a barriga embrulhada e o humor alterado. Acho que era medo, então fui tomar uma pepsi gigante à conselho de RS, potássio, ela disse. Quando você perde uma atração num parque desses, adeus, não tem tempo para outra vez, se sair do grupo pode atrasar a todos e nesse dia sairíamos mais cedo para uma festa da agência em um show de Piratas. Fiquei na vontade. Acho que vou ter que voltar ano que vem só por causa da Sheikra. cccccccccccccccccccccccccccc Você, vivente que lê em português, deve estar meio desagradado comigo, por tantas vezes repetir roller-coaster, por que não montanha-russa? Ora, coisas de escritor que pretende enriquecer a história principal, que é a nossa Disneylíada. Então chegou a hora de chamar montanharussa pelo nome oficial dela entre nós brasileiros, assim abro e fecho parênteses para falar deste meio de transporte que vai de nada à lugar nenhum. Foram mesmo os russos que inventaram a diversão, nos arredores nevados de São Petersburgo. Isso foi na mesma época que no Brasil ainda se tentava ensinar índio a viver e trabalhar como europeu, ou seja, a descer do paraíso tropical e ingressar no inferno das consciências católicas. Entre 1530 e 1600. Os russos não batizaram de montanha-russa a brincadeira de descer em carrinhos por uma trilha de gelo, com alguns plebeus a empurrar os carrinhos morro acima para os nobres descerem de novo. Com a popularidade crescente – os plebeus também queriam descer – vieram os parques, chamados em russo de Tobogan. Em 1784 foi desenvolvida a primeira montanha russa de madeira e registrado o invento como trem gravitacional, na Rússia. Foi muito usada em minas de carvão do mundo todo, para carga e pessoal. Todos os trilhos iam de um lugar até outro, e os carrinhos voltavam empurrados ou puxados à cavalo pelo mesmo trilho. Foram os franceses que popularizaram o nome Montaigne Russe, ao construírem algumas em Paris, à partir de 1812. Inclusive o primeiro looping, em 1846, chamado de estrada de ferro centrífuga. Os americanos fecharam o circuito. Por volta de 1884, Philip Hinkle, colocou um motor à vapor o qual guindava por correntes os carrinhos para o ponto mais alto, de onde se soltavam, A gravidade faz o resto até a estação inicial. Batizou o invento de monte-elevador, Lifting Mountain. Em 1885, Marcus Thompson, outro gringo, registrou outra parecida, com o nome de Roller Coaster. Cilindros na base é a tradução, os tais cilindros mantinham o carrinho nos trilhos. Em 1912 o sistema foi aperfeiçoado para o modelo de rodas atual, chamado underfriction, com três cilindros em volta do trilho. Até então muita gente já havia voado da montanharussa ao longo da história, alguns até sobreviveram para contar a experiência. Disney entrou no negócio em 1959, seus engenheiros resolveram os dois maiores problemas das montanhasrussas antigas. Os trilhos sobre estruturas imensas de madeira não permitiam muitas opções de curvas e os carrinhos tremiam incrivelmente com o aumento da velocidade. Até o dia da inauguração da Matterhorn Bobsled, na Disney da Califórnia. Ela é feita em aço tubular, modelo de sucesso até hoje, copiado às forras por todos os parques do mundo. A Sheikra, do Busch Gardens, assim como as outras maiores de lá, Montu, Scorpions e Kumba, são tubulares. A sensação é a de voar agarrado ao um trilho, as manobras em geral imitam um avião que faz acrobacias. Um barato. ccccccccccccccccccccccccccccccc Busch Gardens tem ainda uma penca de atrações que você não vai conhecer num dia só. O passeio, entre animais, é dentro de um trem. As sete variedades de decoração africana, um lado é o Egito, outro, o Marrocos, mais à frente, Nairobi, tudo na competência técnica e visão fantasiosa dos gringos. Os shows sobre cultura africana são mais reais. E tem a degustação de cervejas da Budweiser onde você compra um copo por uns 10 dólares e bebe o dia todo. O filho de Ângela, o quase médico, foi o único homem de maior que aproveitou. Estou sem beber, infelizmente. Alguns mirmidões ficaram na vontade. RS não deixa. Ao voltarmos de Tampa para o Hotel, o quase médico puxou a cantoria, pagode e funk que uniu mais rápido a moçada. O motorista reclama, para eles é risco de multa, se a polícia vê alguém de pé no ônibus na freeway. Algumas meninas me contavam que pela manhã aconteceu algo diferente. Minha mulher confirmou irritada, o que nela traduz a verdade. Elas estavam na entrada do Hotel tirando uma foto coletiva, daquelas que demoram a arrumar, o que obrigou um americano grande a esperar. Vamos batizá-lo Cerberry, como em Cérbero, o cão dos infernos gregos. Teve que esperar meio minuto, se muito. Não conseguiu. Cerberry empurrou a porta, as garotas foram ao chão, ele saiu praguejando alguma coisa que minha filha não entendeu direito. Vou ficar de olho nos irritados, parecem fontes reveladoras dos hábitos locais. Os maus hábitos, pelo menos. Canto XVI Sonhos de uma Nação Por mais terras que eu percorra Não permita Deus que eu morra Sem que volte para lá ! Hino da FEB na Segunda Grande Guerra Chegamos ao canto XVI – dezesseis, eu facilito – da Disneylíada. Eu precisava de um fator comum com a obra de Homero, para abrir este capítulo especial, sobre o SeaWorld. E vejam o que eu encontro: o capítulo quinze da Ilíada é sobre Poséidon, Deus do Mar para os gregos. Netuno, para os Romanos. Ora, o quinze é vizinho do dezesseis. Já basta. O SeaWorld é puro mar, apesar de estarmos a 80 quilômetros da costa da Flórida. A Ilíada tem um prefácio recomendado, com as ligações dos personagens, como naquelas propagandas das novelas da Globo antes de entrarem no ar. Começa com Helena, filha de Zeus com a mortal Leda, esposa do rei de Esparta Tíndaro. Com essa filiação tripla, veio a ser a mulher mais bonita da época, quando a beleza era um poder de Estado. Todos os reis e príncipes daqueles povos conhecidos por Aqueus, os formadores da Grécia, desejavam casar com Helena. O pai mortal, com a concordância do pai celeste e da mãe, decidiu que Helena haveria de escolher, e todos concordariam e protegeriam tal pacto. Helena por obediência à mãe Leda, escolhe Menelau, príncipe de Micenas e exilado em Esparta, junto com seu irmão, Agamenon. Todos concordam, até Paris e Heitor, príncipes de Tróia. Já vimos que as mulheres estão sempre no centro das histórias gregas, de deusas a escravas. Como no casamento de Tétis, filha de Zeus, com Peleu, guerreiro mortal e já velho à essa altura. Foi neste casamento que a deusa Éris, por não ter sido convidada, enviou a Tétis o pomo da discórdia, uma maçã de ouro. Nele estava escrito: à mais bela de todas as Deusas. Tétis não era deusa, era ninfa. Na festa estavam as deusas Hera, Atenas e Afrodite, para quem iria o pomo de ouro de Éris? Zeus escolheu para decidir a parada um pastor de coração puro que por ali soltava suas cabritas, porque o Olimpo é campo aberto. O pastor era o disfarce de Páris, irmão de Heitor, futuro príncipe de Tróia, dois dos cinqüenta filhos de Príamo, inclusive um chamado Heleno. As três deusas fizeram promessas à Páris. Hera oferece poder sobre a natureza, Atenas a força invencível para a guerra. Afrodite oferece o amor da mais bela mulher do mundo. Ele escolheu o amor. Acontece que a mulher mais bela àquela altura era Helena, casada com Menelau, sob proteção de seu marido, Tíndaro. A ninfa Tétis havia sido casada à força com o velho Peleu porque havia uma profecia de que o filho de Tétis – Aquiles - seria maior que o pai. Zeus e o irmão dele, o deus do Mar Poséidon, disputavam Tétis mas correram ante à profecia. Ninguém agüentaria alguém maior que Zeus ou Poséidon. Quando muitos anos depois Paris vai à Esparta em visita diplomática para negociar territórios, ele se apaixona imediatamente por Helena, que estava prometida à ele por Afrodite desde o casamento de Tétis. Fogem para Tróia, para confirmar a promessa de Afrodite. Helena já não era nenhuma menina, nem Páris um garoto. Aquiles sim era novo, robusto e matador. Chefiava um comando destacado para as piores missões de guerra da Tessália, os Mirmidões. Sua mãe Tétis o havia mergulhado no rio das almas, o Estige. O segurou pelo calcanhar para um banho de imersão mais completo. Todo o corpo de Aquiles era imune a ferimentos, menos o tal calcanhar. Estava confirmada a profecia, maior que o pai, Peleu. Homero escreveu a história oitocentos anos antes de Cristo, mas naquela época a guerra de Tróia já era antiga para eles. Menelau, o corno, incita o irmão, Rei Agamenon, para aproveitar a fuga de Helena com Páris e atacar Tróia. Os Espartanos eram os maiores guerreiros e reuniam seguidores em toda aquela vizinhança, inclusive a Tessália, terra de Aquiles. Tróia exercia influência no outro lado do mar da Antiguidade, ali em frente à Atenas, uns quinhentos quilômetros. Então juntam-se mil barcos para atravessar o mar da Grécia para invadir Tróia. Aquiles é o primeiro a chegar. Mas acontece aquele desentendimento dele com Agamenon, no primeiro canto da Ilíada, sobre a Briseida, sua irmã Criseida e o deus Apolo. Porque a Globo não gosta de cultura clássica? Daria uma tremenda novela, vocês não acham? Tudo isso que eu contei foi para colocar o Poséidon no seu reino marítimo do SeaWorld e na nossa Disneylíada. Poseidon, que por despeito à Aquiles, vai defender os Aqueus. Pede a Hipnos que faça Zeus dormir, para que os troianos possam ser derrotados mesmo sem Aquiles. Esse é o canto XV – o quinze – de que falamos lá em cima. cccccccccccccccccccccccccccccc Há muitas lembranças de guerra e pátria no Seaworld. O parque tem uma torre com elevador panorâmico a uns oitenta metros de altura. Na ponta da torre, uma imensa bandeira do EUA. Às nove da manhã, o parque abre e todos cantam o hino americano, chega a ser engraçado, porque os visitantes são de vários países, alguns árabes tiram o turbante para ouvir, parados. Mas a maioria passa batido. Eu estava comprando uma capa de chuva e não entendi à princípio porque a senhora do caixa botou a mão no peito. Pensei que era infarto, foi tão rápido o movimento. Então veio a letra da música na caixa de som mais próxima, Oh, say! can you see by the dawn's early light . Fiquei meio sem graça, mas tirei meu chapéu de vaqueiro, já descosturado atrás e com cheiro de chuva que secou na palha. Naquele tempo distante da Ilíada o conceito de Pátria era impossível, estavam saindo das tribos para criar uma unidade cultural, com fundo comum, a aliança sobre a vontade de Helena. Porém como os tribais espartanos, os americanos são patrióticos também porque são grandes guerreiros, acreditam no direito à guerra como fonte de poder e garantia de segurança. No Seaworld vi as maiores lembranças disso. Antes do show da baleia Shamú, ele pedem aos veteranos de guerra que se levantem. Sempre tem alguém veterano, ou parente que perdeu um soldado na Guerra. Nesse dia se levantaram uns quinze, de várias idades, homens e mulheres. O parque deve saber, talvez entrem de graça. Desde 1914 os americanos não ficam de fora de nenhum conflito internacional de peso. E nos últimos 50 anos só perderam uma, a do Vietnã. Acho que no Iraque estão perdendo também, os jornais e revistas não cansam de repassar o assunto. Quando vamos sair do Iraque? Pergunta a capa da Time desta semana, estamos em final de julho. Em 2008, responde o Presidente Bush, que nada tem a ver com o Busch da Budweiser. Ccccccccccccccccccccccc No Seaworld a atenção dos humanos é para com bichos e não são os mitológicos. O segundo parque de Anhausen Busch começou como centro de recuperação de animais marinhos, que iam bater na costa da Flórida. Com a chegada do modo Disney de diversão, progrediu para um estágio que nem os gênios de Elias puderam imaginar. No Seaworld os animais imitam gente, os cenários imitam Hollywood e o público não imita nada, fica ali de queixo caído. Eu não sabia que era possível adestrar um urubu. Kraken é a montanha russa do Seaworld. Tubular, com looping e torções em parafuso, além de um mergulho no subsolo do parque a uns 50 km por hora. Artic Expedition é um simulador T1 que te leva de helicóptero ao Ártico. Fila grande, mais de uma hora. Na saída tem aquários refrigerados onde você fica a um vidro de um urso polar, baleias belugas pequenas e leões marinhos gigantes. Os bichos parecem meio solitários, o urso ficava repetindo o mesmo movimento, meio pancado da cabeça aquele bicho. Na saída tem a lojinha de souvenirs, como em todas as atrações de todos os parques. Entertainment business, meu amigo, minha amiga. Com RS a puxar o passo, conseguimos ver três shows inesquecíveis. O Primeiro foi de golfinhos numa arena aquário para uns 800 assistentes, com música e coreografia da história de uma garotinha – adestradora mirim - que descobre um novo mundo. Meio ingênuo, corky, como eles dizem em inglês. Os golfinhos molham todo mundo Mas no grande final, os adestradores soltam pássaros que sobrevoam a platéia, então eu vi o tal urubu adestrado, voando numa rota pré-determinada, mas acho que não era urubu, não, era um condor. Quase igual. Depois o show do Seymor, uma foca. Todo o palco, com pequeno lago à frente, é formato de navio-pirata, por onde se desenrola a história de uma lontra que rouba um mapa do tesouro. Muito engraçado, o leão marinho é enorme. Na entrada tem um pirata mímico orientando a fila e fazendo piada com quem passa, o cara é muito bom. E por fim a glória de Orlando, a maior celebridade animal, com vocês, a baleia Shamú. É dela o maior auditório do parque. O Shamu Stadium, tem os melhores recursos de som e aquários. O show vai com um roteiro que, como já contei, mexe com a pátria americana, seu estilo reto de realizar os sonhos, garantir a liberdade, essas coisas que justificam – para eles - as guerras. ] Acho que a baleia sabe que é boa. Ela acredita na personagem dela. É um bicho inteligente, sem dúvida, ainda que não raciocine como nós. Agradece os aplausos, ganha mais uns peixes, e sai lentamente, como se alguma coisa ali estivesse acabando. E o público vai se retirando do estádio, a metade dos espectadores totalmente molhados. cccccccccccccccccccccc Num enorme tanque ao ar livre, você pode alimentar os bichos, por US$ 4, te dão três peixinhos para jogar às focas. Mas o parque não tem o mais leve aroma de peixe, como eles conseguem, na dá para entender. Todas as atrações têm peixes para os adestradores alimentarem os bichos durante os shows. Peixe sem odor, ou será que estou perdendo os meus sentidos? Se eu fosse um empiríco estaria em grandes problemas. O dia termina em mares infestados de piratas falsos, num show para a garotada. Escapei por pouco. É o encontro de todos os viajantes da nossa agência, mas como tenho me comportado muito bem, ganhei uma licença. Minha filha contou que foi uma discoteca, e um jogo dirigido por piratas num palco, não entendi muito bem. Acho que não perdi nada. Canto XVII La Nouba “ Que toda maravilha depende do conhecimento” Branca, Gógol No oitavo dia acordei benemérito como um rei depois da vitória. Adaptado à nova rotina, acordei sozinho minutos antes de RS ligar, como todas as manhãs, por volta das 6:30h. O ar condicionado já estava sob meu inteiro controle, descobri a potência correta para não gelar de madrugada. No café da manhã distribuí muitos dólares de caixinha. O garçom preferido, Jean, é taitiano. Os motoristas de táxi de Orlando também. Não falam muito, o funcionário do cyber -Internet - no Hotel tentou me explicar algumas coisas sobre o Haiti e Flórida, mas só pesquei que eles são muitos por aqui, vieram de barco e todos moram em Kissimee, cidade ao lado de Orlando. Nossa excursão engordou, dos 28 participantes iniciais para uns 70, com mais duas guias, e nos encontramos pela segunda vez, nesse oitavo dia de Disneylíada. Nossa agência distribui os grupos por datas, mas aproveita o transporte quando coincide o parque a ser visitado. Tem um sujeito da outra parte dando sinais de irritado, mas nesse dia ele se controla, não tenho nada para anotar. Fomos ao Magic Kingdom por duas horas, deu tempo de minha filha fotografar melhor a Mickey Toontown, com modelos em escala natural das casas de desenhos animados do Mickey, da Minnie, do Pateta, com jardins e autógrafos dos bonecos. E voltamos à padaria com o croissant que derrete na boca. Depois, barco e ônibus para chegar a Disney Downtown, a parte mais nova do complexo Disney, eu acho. Não tem montanha-russa, nem simuladores, é diversão menos infantil, com mais opções de restaurantes, compras, jogos eletrônicos, o Planet Hollywood. E o melhor de tudo, La Nouba. ccccccccccccccccccccc A verdade é que neste oitavo dia, com parada rápida no Magic Kingdom e o resto do dia e noite no Disney Downtown, eu estava me sentindo novo, recobrado e bem disposto. Mas só até depois do almoço. Porque congestão é algo que começa quando se come muito e se aquece o corpo, ao sol ou com movimento. Eu não cheguei a enrolar a língua mas tive que deitar até o branco sumir do rosto, a tonteira passar, e a fraqueza das pernas permitirem mais caminhadas ao sol. E a gente comeu muito e muito bem. Rain Forest é o nome do restaurante logo na entrada da Disney Downtown. O ambiente simula uma floresta tropical, tem bonecos mecânicos de gorilas, no teto iluminam-se trovões. A comida é slow-food, você marca uma hora para chegar e quanto tempo vai ficar, para evitar filas. Comemos frango, escalopes de carne e acompanhamentos, com talheres de metal, num prato gigante. Algumas paredes são grandes aquários, um local agradável de ficar. Foi quando eu saí dali que veio o problema. Me recobrei do quase apagão, num centro de jogos eletrônicos, deitado no banco de um caminhão de brinquedo. Levou uma meia hora para voltar a respirar direito. RS recomendou água Perrier, que contém magnésio. Depois uma Pepsi, potássio. Como eu estava fora de perigo a excursão andou e foram para o Disney Quest, um prédio com 4 andares de diversões eletrônicas, perdi. Mas não perdi La Nouba. ccccccccccccccccccccc Em uma hora e quarenta minutos entrei em contato com um tipo de atração que desafia todos os sentidos e emoções humanas resumidas. Espetáculo sem texto. Ou seja, uma forma de expressar cultura num nível bem acima da Disney ou Universal. Voltei a ser adulto por La Nouba. Os canadenses são alvos constantes de piadas em shows de tv e humor dos clubes Stand-ups americanos. Os próprios canadenses fazem piadas de canadenses. Há grandes atores canadenses, Jim Carrey, Yvone de Carlo, e atores menores, como Mathew Perry, o Chandler Bing de Friends. O Cirque de Soleil é canadense, acho que basta de colaboração cultural para qualquer país se orgulhar. Tem 23 anos, foi de companhia meio hippie em 1984 à produtora cultural hoje com cinco espetáculos simultâneos pelo mundo, com integrantes de vários países. Em Las Vegas tem um com música dos Beatles. Deve ser astrológico, desculpe o adjetivo, carência de vitamina A e de superlativos. O espetáculo La Nouba é fixo na Disney, está há uns dez anos em cartaz e por isso teve a vantagem de se adaptar até os limites da imaginação. Evolução é adaptação. Todo o teatro para 1600 pessoas em formato arena é dimensionado para aquele show. Nunca desmonta, nunca entre em cartaz outra peça que vai ter outra regulagem de luz, de som, de mecanismos que são centenas em grandes espetáculos. Por isso La Nouba tem tanto poder. O roteiro é simples, para ser entendido sem palavras por qualquer visitante do mundo. La Nouba é expressão francesa para Aproveite ! Viva a festa !. Para vincular com nossa antiga mãe Grécia, equivale à expressão Carpe Diem, aproveite o dia. Mas tem uma história, de uma trupe que vai a uma casa misteriosa, onde uma governanta encontra o seu príncipe encantado, que veio com os artistas. Daí vão desfilando atrações de circo, renovadas em linguagem, engenhos e apresentação. Por não haver um compromisso com textos, como no teatro, os sentidos das pessoas e os sentimentos mais presentes e atentos acabam atingidos pelo efeito Cirque de Soleil. O medo com o artista no fio, lá no alto, ou o empilhador de cadeiras que tenta chegar a um candelabro, dez metros acima do palco. A graça das meninas chinesas com malabares de fio e roldana, a magia de voar com o balé vertical. A surpresa com os movimentos inesperados de artistas em camas elásticas ao lado de paredes com janelas. Ora eles entram, ora eles chegam ao topo do prédio cenográfico, você nunca sabe, não tem material na sua cabeça para adivinhar o que virá. Nem na minha, só na deles. La Nouba. cccccccccccccccccccccccccccccccccccccc O almoço pesado foi meu Cavalo de Tróia. Trojan Horse, para os gringos. Trojan, para quem usa muito Internet é sinônimo de problemas, um velho vírus de computador que insiste em continuar na rede, infectando furtivamente por e-mail as máquinas que travam ou dão mensagens erradas ao usuário. O conceito de embutir alguma coisa ruim por dentro de outra boa parece que nasceu mesmo na Guerra de Tróia, com o momento em que os Aqueus abandonam o campo de batalha e deixam um cavalo de madeira imenso, como oferenda a Poséidon, para que cheguem bem de volta a suas casas. Os Troianos receberam a oferenda para seu deus Apolo e de noite os soldados aqueus saíram de dentro do cavalo, para iniciar a conquista de Tróia. Curioso como o final da história não está na Ilíada, que termina no canto XXIV – vinte e quatro – com os funerais de Heitor, derrotado por Aquiles. ccccccccccccccccccc Pensava ainda no grande final da peça dos canadenses, como o palco serve tão bem aos mecanismos que surgem e somem da cena, me levaram pela mão até o Planet Hollywood. Acordei na hora dos sanduíches no prato, havia macarrão também mas sempre vinha carregado na pimenta. O lugar é bizonho, mistura elementos de cinema e quadrinhos, com rock, mas tudo exagerado, over ,como dizem os gringos . Demorou muito, queria deitar logo na cama king-size do nosso quarto. E sonhar com La Nouba. Canto XVIII Folga nas férias “A televisão me deixou burro, muito burro demais” Televisão Titãs Desisti da idéia de controlar sonhos, porque esta noite tive uma tempestade no céu do crânio. Acho que Oneiros passou a ver em mim, consciente nos sonhos, um voraz espectador a ser alimentado. Assim que lembro que estou sonhando, fico feliz, pronto para ingressar em alguma espécie de aventura da minha escolha, mas então tudo muda, esqueço desse poder, ou acordo. Mas essa noite não. Foi além. Vejo a esposa de um primo, que não tenho, ser ressuscitada por ele, estavam em alguma casa grega, tinha pilastras. Ela diz que toda a família planejou sua morte, eu fico revoltado. Acho que estou numa platéia, mas não vi ninguém. Depois recebo um dinheiro de RS e fico preocupado em perdê-lo, vou a um banco e o caixa é o Pedro Paulo Rangel, ator, que não vejo há décadas. Na seqüência, esquilos me apontam um caminho dentro de um parque, eu queria muito ver a atração que eles indicam mas penso que esquilos não apontam. Sei que sonho, tento voar mas estou pesado. Depois esqueço, estou chegando a casa de um amigo, esse existe, é diretor de teatro e planejamos um musical estilo Disney, cheio de efeitos, o Pedro Paulo Rangel está lá de novo. O ator adora a idéia. O diretor não. Não acaba. Estou agora numa praia, parece nordeste, há um prédio em construção, eu observo trabalhadores inflarem um imenso balão, que vai erguer um carro amarelo, de corrida. Na mesma construção, procuro cigarros numa gaveta, os operários brigam comigo eu toco suas cabeças e eles viram montes de cinzas. Tudo isso passa devagar, é sempre dia, entendo que estou sonhando, quero acordar mas não consigo. Tudo muito nítido. E assustador. Cccccccccccccccc Quando acordei, resultado, estava cansado de novo. Havia andado muito nos sonhos. O mal-humor resultante me fez entender que um parque era como todos, hoje seria o primeiro dia da Universal. Lembrei que haveria mais dois dias para aquele parque, o que eu já sabia com certeza é que não iria conhecer nem a metade. Minha mulher insiste, já serão dois dias perdidos para mim, faz um esforço, vai. Não deu, é um nó que vem na cabeça desses que não desatam. Os argumentos para ficar foram dormir até tarde, ver TV, piscina e recolher anotações para o livro. Minha filha não demonstrou a menor vontade de ficar, nenhum dia, até apelamos para ficarmos os três e ver outras coisas. Ela dormiu nos ônibus, dormiu nos parques, dormiu nas atrações, mas não perdeu nada. Ccccccccccccccccccccccccccc Um antigo show da CBS, The Price is Right, vai mudar de apresentador, Drew Carey, substitui Bob Barker, veterano da TV que se aposenta. Drew é conhecido dos canais a cabo no Brasil pelo show dele, Who line is this anyway, de humor com improviso. The Price is Righ é um dos quadros adaptados do SBT, onde as pessoas chutam uns números. Qual a percentagem de ladrões no Congresso Nacional ? 20%, 23 % , 97 % ? Acertou ! Com a TV nos EUA você entende que não há quase nada de original na TV do Brasil, algumas cópias são propositalmente mal feitas, para custar pouco, testar o público. Um crime contra a criatividade nacional. Vai entender. Será que alguma TV paga pela concessão? Quando anunciam sua própria programação, ou suas empresas, não deveriam pagar por isso, se é concessão e não doação? Ver TV nos EUA não me responde nada disso, acho que não existe resposta. Como cabeça de bacalhau e mosca branca. ccccccccccccccccccccccccccccc Depois, o almoço de micro-ondas, no quarto, com lasanha quase de carne, US$ 1, do Wallgreens. Um supermercado de bairro em Orlando podia ser exemplar da vida cotidiana deles. Pena que nesse caso é uma grande loja de conveniência para turistas. Tudo embalado, milhares de embalagens, centenas de opções de escolha, sanduíches de máquinas, roupas, relógios. Mas o preço é alto para esses artigos mais caros. Instigado pela nova visita ao Wallgreens, ia voltar de bloquinho na mão para anotar aquilo tudo. A timidez de iniciante me limitou a anotar coisas na loja de conveniência, bem menor, do hotel. Estava atrás de coisas estranhas. Salada de frutas não tem caldo, pode ser só ali naquela loja. Mas nas embalagens de batatas chips e alguns biscoitos salgados vi sabores como churrasco com mel e morango com queijo. Loja de hotel é tudo igual, no mundo todo. Muito caro. A mesma lasanha de um dólar no Wallgreens da esquina custava cinco dólares no hotel. Uma cerveja Foster, cinco dólares. Outra coisa que notei mas deve ser coisa de hotel. Havia meia prateleira numa geladeira para frutas e uma cesta de bananas e laranjas sobre o balcão. Uma banana, um dólar. Mas eu contei duas gôndolas de supermercado com mais de 40 tipos de chocolates, outras duas com batata chips. Tem um saco de Doritos quase do tamanho do meu braço. Os atendentes estranharam o sujeito de bloco na mão anotando preços há quase quinze minutos, mas não chamaram o segurança. Também não responderam nenhuma pergunta sobre fornecedores, quanto tempo fica um sanduíche na geladeira ou como se livravam do lixo. Com eles é tipo, thank you, sir , have a nice day , next . Obrigado, senhor, tenha um bom dia, o próximo. Quando elas chegaram à noite, falavam como duas rádios paralelas. As maravilhas da Universal Studios, Simulador do Homem Aranha. Montanha Russa com duas vias no mesmo espaço, como um duelo de dragões. Uma praça com lago e calçadas em volta. Eu quase me arrependo de não ter ido ao primeiro dia de Universal Studios. Mas amanhã tem mais. Canto XIX O Vilão da Disney My life it’s such a mess Let’s have a Brahma Chansong Tom Jobim Faltam três dias para acabar a viagem. Imerso na vida de turista, sem trabalhar, diversão em quantidade além da conta, dá para se acostumar e pensar em aposentadoria precoce. Muitos aposentados nos EUA vêm para cá, compram casas em condomínios e passam a vida entre a piscina, a TV, o golf, o jogo de bridge. Uma parte deles vai para os parques, à trabalho. Nos parques da Disney, com exceção dos aquáticos, vemos muitos idosos no atendimento. No Magic Kingdom é evidente a preferência de cidadãos na casa dos 70 anos em contato com o público. Até segurança eu vi. São aposentados que retornam ao batente ganhando menos, trabalham por evidente vontade de ocupar o tempo, e não por dinheiro. São todos muito bem humorados. Quem não ama o trabalho fica mal humorado em fazer algo desagradável por tanto tempo. Convenhamos, oito horas por dia é muito. ccccccccccccccccccccc No dia em que fui conhecer os parques da Universal Studios estava com a sensação boa e ruim de que a viagem mais intensa da minha vida estava para chegar ao fim. Sensação boa de continuar a vida real, voltar às dívidas, às promessas, aos caminhos para levar um pouco mais de música a alguns poucos ouvidos brasileiros. A sensação ruim é que vou deixar de viver num lugar onde tudo funciona. Basta ter os dólares. Alguns milhares por mês. Tudo dá certo. O Tom Jobim definiu essa questão. Como todo candidato a gênio, tornava simples o que parece complicado, tanto em música quanto em comportamento humano. O Maestro morou em Nova York. O porteiro do seu prédio o chamava de Mr. Joe Bean, Jonas Feijão. Então dizia o Feijão sobre Brasil e Estados Unidos: Aqui nos Estates é bom, mas é uma merda. E no Brasil é uma merda, mas é bom. Desculpe aí a palavra forte, você que continua aqui, ao longo da história, já percebe que forte também é a questão. Acrescento a este gênio brasileiro a fala de outro gênio, Van Gogh, pintor expressionista holandês, que viveu muitos anos na França. Pátria, dizia ele, é onde vivemos e realizamos nossos sonhos. Cccccccccccccc Pai, você tem que ir no Hulk, tem que ver o simulador do Homem-Aranha, tem isso, tem aquilo! Minha filha já delineava o novo dia de parques enquanto minha mulher relatava os tamanhos a serem percorridos. E como elas gostam muito de mim, lembraram que na Universal tem uma coisa que eu procurava desde o início da viagem. Forrest Gump. A Universal tem história. Carl Laemmle era um imigrante alemão que vendia gravatas em sua loja, no Wincousin, estado do Nordeste Americano. Um dia foi ao cinema em Chicago, estado vizinho do Illinois, um dia de 1905. Eram os Nickelodeons, cinema por um níquel. Gostou tanto que decidiu ser o dono de uma sala daquelas. Sete anos depois, estava fundada a Universal Studios, porque depois de conseguir alguns teatros arrendados para passar os filmes, Carl percebeu que havia mais lucro em fazer os filmes. A Universal hoje é a segunda mais antiga empresa de cinema em Hollywood, a primeira é a Paramount. Foi da Universal o primeiro grande estúdio, galpão de uns quinhentos metros quadrados. Desde aquela época Carl promovia a visita de turistas aos estúdios de sua empresa. Quando a MGM passou à frente da Universal em 1925, a empresa nunca mais foi a mesma. Até 1950, Carl insistiu em manter a rede de cinemas, o que atrasou a evolução da Universal como estúdio de cinema Hoje a Universal Studios está em parte coligada a rede de TV NBC. São propriedades de uma sociedade da General Eletric com quase 80% e um grupo de água mineral francês, Vivendi, com quase 20%. O resto está na Bolsa de Valores, se você quiser pode ser sócio também. Os parques pertencem portanto a uma empresa que vende geradores de eletricidade, ideal para quem possui montanhas-russas e cinemas. cccccccccccccccccccccccccccccc O dois grandes concorrentes em Orlando, Universal e Disney, já estiveram juntos, em 1925. Um dos primeiros produtos de Disney, ainda uma empresa pequena, foi o desenho Oswald, The Lucky Rabbit, feito pelo amigo e sócio de Disney, Ub Iwerks. Levaram para a Universal produzir e distribuir. Dois anos depois, Carl Laemmle achou que já podia fazer o desenho com seus animadores e desfez o contrato com Disney. Ub foi convidado a ficar, mais saiu com Disney. Os dois então procuraram algo parecido para continuarem em Hollywood, com animação. Encontraram numa foto de Walt Disney, bem jovem. Ub havia desenhado na moldura branca da foto, um esboço de um rato com orelhas redondas, que seria um marinheiro. Era o Mickey, de SteamBoat, Willie, a primeira animação do roedor. Por tabela, a Universal ajudou os dois a chegarem no ratinho de ouro. Iweks foi amigo de Disney até o fim. Mas tentou por doze anos – 1928 a 1940 - emplacar outros empregos e também seu Iwerks Studio. Depois voltou para a Disney, trabalhou em efeitos de pós-produção, fez o primeiro filme que reunia atores e desenhos, terminou como responsável pela equipe da Imageneering, que fazia os parques. Iwerks, o pai do Mickey – Disney foi a mãe, o nutriu – morreu no ano da inauguração da Disneyworld, 1971. Era americano de Kansas City, descendente de alemães. A Universal têm três parques, chamados de Ilhas. Uma com montanhas-russas, uma com atrações de cinema e shows, e a última misturada dos dois. A ligar tudo isso tem um lago – todos os parques têm – onde acontece show noturno com dublês e acrobatas em jetskis. Nas margens do lago uma praça imensa, com atrações em bares e restaurantes. A NBA é uma casa de jogos e venda de produtos para basquete. Há uma estátua de uns cinco metros de altura, de um jogador que não conheço. O Hard Rock Café é uma arena para milhares de pessoas onde acontecem grandes shows. Tem ainda um restaurante com peças de colecionadores de astros do rock, desde Ray Charles até Green Day. Elvis está num vitral, como um deus. Nos parques vimos simuladores tipo T1, Jimmy Nêutron, e num simulador T2 aconteceu uma coisa engraçada. Era o Exterminador do Futuro, que nos leva para dentro da CyberDine, empresa onde, no filme, começa a revolução das máquinas. Antes de entrar na atração, num filme bem marqueteiro, a CyberDine está vendendo o soldado do futuro para nós, quando a mensagem é interrompida pelos heróis do filme, os O’Connors, o filho e a mãe. Vamos então a uma sala de cinema, no palco vários engenhos, acho que vai ter teatro também. O filme é 3D, os atores encenam uma revolta na Cyberdine, com tiros, motos no palco, uma zoeira doida. Até que um raio cai lá fora, eu acho, e tudo pára, as luzes acendem. É claro que 100% dos presentes acharam que tudo fazia parte da trama. Ficamos parados, uma voz ao microfone explicava a interrupção por causa da chuva, mas todo mundo, ah, é mesmo, e agora vem o quê, cadê o Exterminador? Ninguém se mexeu. Precisou vir dois guardas com voz forte, mandar todos se levantarem e saírem da atração. Depois de um certo tempo comendo sanduíches, você percebe outras coisas para provar. Quem gosta de macarrão se faz por aqui, apesar da pimenta. Os churros são deliciosos, grandes, mas não pesam e nem tem recheio. Na praça da Universal descobrimos uma loja que vende bolinhos de canela, parecidos com churros, muito bom. E o Starbuck era bem em frente. Nessa altura da praça tem o restaurante do BubbaGump, uma sociedade surgida no Forrest Gump, filme que é uma pequena aula de história contemporânea sobre os gringos. Resisti aos camarões fritos mas não resisti a um boné, por quase 18 dólares. Cap, como eles chamam. O pessoal da excursão também dá seus sinais de cansaço, Uma das irmãs que trouxeram os filhos teve que voltar outro dia para o Hotel mais cedo, se sentiu mal do estômago. Um dos Mirmidões, também. A comida é difícil de se adaptar, mas acho que tem a ver com o calor e o cansaço. No ônibus todos dormem. Ccccccccccccccccccccccccc No Hotel, jantamos lasanha à bolonhesa e pizza de caixa, do microwave oven. À noite, mais TV. Assistimos Hanna Montana, uma série de humor com adolescentes que cantam, no canal Disney. Minha filha entende uma parte, eu completo para ela. Nunca vi minha filha tão decidida, intensa, e sem pensar na vida. Essa idade é fogo, nem uma coisa, nem outra, todos te dizendo que você vai mudar logo. E você não muda! Se minha filha está bem, estamos bem eu e minha mulher. Saio para fumar um cigarro, dou de cara com a lua cheia, um espetáculo inigualável por nenhum engenho humano. A Lua por aqui parece maior, ou estamos mais perto dela. Ao lado, na paisagem do quinto andar, fogos de artifício explodem como todas as noites. Canto XX Os deuses e os animais “Ah, como é difícil tornar-se herói “” Aldir Blanc e João Bosco Desde o início da Disneylíada, em março, minha filha relatava, a cada duas horas, a seqüência de brinquedos que não iria perder. O elevador do Hotel do Terror, como ela chamava o Hollywood Hotel, na Disney MGM. O Magic Kingdom, e o Animal Kingdom. Quando mudava a lista, qual fosse a mudança, o Animal Kingdom estava lá. Hoje é o dia do Animal Kingdom, o Busch Gardens da Disney. Não sei quem copiou quem, desconfio que o Busch Gardens é mais antigo, tem uma montanha-russa de madeira, que me recusei a andar. Mas primeiro vamos no Typhoon Lagoon, a Lagoa do Tufão, o segundo parque aquático no complexo da Disney. Fez sol, diferente do primeiro parque, o Blizzard Beach. Porém a rápida lotação dos brinquedos é comum entre os dois parques. Por isso sugeri a minha mulher e minha filha irmos primeiro no mergulho com tubarões, que me pareceu coisa demorada, criadora de filas. O problema é que os bichos gostam de água muito fria, eram nove da manhã. Corremos dali, não deu. No alto de um monte artificial, no centro do Typhoon, tem um barco cenográfico, lembrança de um furação que passou por lá e criou uma cena real dessas. Abaixo, uma piscina abrangente – estou apelando – com ondas a cada minuto. Você ouve um barulho, tum, e lá vem a onda. É meio metro de onda mas tem escola de surf no parque. A água é azul e não tem cloro, acho que tem zinco. O fundo é de cimento, rala o pé. Muita gente usa sapatos de borracha alugados no parque, por higiene e segurança, mas a grande maioria anda de chinelos e sandálias. Não vi nenhum homem ou garoto de sunga, nenhuma garota com biquíni cavadão, só calçolão. Minha senhora, por favor, não me tome por libidinoso, ainda mais num livro assim tão infanto-juvenil, mas é que vou à praia no Rio de Janeiro, e a total inexistência de biquínis brasileiros me pareceu outro mundo. Aluga-se armários, dá para tomar banho, trocar de roupa, e ir para outro parque. Lembre-se de levar uma mochila bem equipada, sempre. Capas de chuva nessa época são tão indispensáveis que destruímos duas de tanto usar. cccccccccccccccccccccccccccccccc No complexo da Disney, vamos pegar os ônibus deles. Essa demora nos deslocamentos é freqüente, todos se jogam no chão, dormem mirmidões e vestais ao sol de Parador. Numa dessas paradas, vimos as instalações de um haras, com uns 40 cavalos. É parte de um hotel resort, Fort Wilderness, ambiente rural. Não vi o hotel. Quem vai lá, esquece celular e TV, pode viver como no Velho Oeste. Com os confortos de hoje em dia, se quiser. No Animal Kingdom, vamos direto para o restaurante de sanduíche. Depois o passeio principal é entre os animais de verdade. Eles drenaram uma grande área para ficar semelhante ao deserto do Serenguetti, e trouxera girafas, leões, rinoceronte, gado indiano, gnus, hipopótamos, guepardos, tudo para a gente passear no meio deles. Deve ter uns funcionários do parque escondidos pelos matos para tocar os bichos para perto das trilhas, ou deixam por lá os alimentos nos locais preferidos. Os bichos chegam bem perto do carro, menos os felinos. Eles simulam ainda que há caçadores no local, passamos por uma cabana de camping e dentro de uma mala de um Jeep tinha um animatronic de pequeno rinoceronte. O Animal Kingdom têm lá suas divisões por países da África e Índia, e suas montanhas-russas são fechadas. A que tem uma queda d’água não fui, mas não perdi a maior, Everest. Simula uma subida ao monte famoso do Tibet, e tem o fato de que pára dentro de uma caverna, anda para trás, um tanto rápido, e muda de trilho para completar o circuito. Você vê um imenso boneco do Yeti, da lenda do Pé-Grande. Por falar em Pé Grande, dei uma topada na porta de um restaurante, o dedão sangra. Vamos a um ambulatório, eu e um dos garotos, que havia danificado o mesmo dedo, o que leva mais topadas. Cinco minutos depois estamos com band-aids que contém uma pomada meio anestésica. Pensei na propaganda dos advogados para turistas, quem sabe eu não ganhava outra viagem para o ano que vem? Desisti, por gratidão a todas as emoções concedidas por eles. Cccccccccccccccccccccc O Marrocos, norte da África, dentro do Animal Kingdom, foi o mais perto que cheguei do cenário da Ilíada, trecho do mar Mediterrâneo conhecido por Mar Grego. Não há nenhuma referência aos gregos em toda a viagem, nem o filme do Hércules eu vi. A Grécia hoje é destino turístico cinco estrelas do mundo todo, dezenas de transatlânticos pelas ilhotas entre Atenas e Anatólia. Concorrência. Na Ilíada estávamos no Canto XV quando Poséidon pede a Hipnos que passe a mão na cara de Zeus, fazendoo dormir. Digamos que, em termos de futebol, o jogo estava cinco a cinco e os melhores lances, no meu humilde entender de Ilíada, foram nos Cantos III, XIX e XXII. No canto três, Menelau duela com Paris, quem sobrevivesse levava Helena para casa e a guerra acabaria com um só morto. Isso era um hábito mostrado no filme Tróia, logo no começo. Os generais poupavam soldadoscom isso e não raro faziam aliados para saquear a próxima nação juntos. Menelau vence, mas a deusa Afrodite interfere, livra Paris do vexame de ser morto, e o pacto para o fim da guerra se desmancha no ar. O Canto dezenove é a virada da história. Aquiles finalmente faz as pazes com Agamenon, depois que seu amigo Pátroclo é morto por Heitor, que ainda leva a armadura de Aquiles. Ele emprestara ao companheiro. Mas no filme Tróia eles mudam tudo, criam um clima de que foi Pátroclo quem teria saído às escondidas. Besteira, o filme é muito ruim, salva-se o Brad Pitt, o Peter O’Toole e o Eric Bania, respectivamente como Aquiles, Príamo e Heitor. Eles nem consideraram a hipótese de colocar os deuses em atuação. Por isso vamos deixar o filme de lado. O canto vinte e dois é o duelo maior da história. Quando uma cultura acaba com a outra, desfaz seu manancial de qualidades. Diz Aquiles a Heitor antes da luta: a caça não pode fazer tratos com o caçador. Aquiles mata-o e nega o direito entre guerreiros de restituir o corpo do derrotado para os funerais adequados. Cruel como um deus. Acho que Homero determina ali o fim da história, venceram os reinos mais fortes, que ficam do lado da Grécia de hoje, perderam as tribos que ficavam do outro lado, a Turquia. Homero era grego, quem vence conta a história como lhe convêm. Os últimos capítulos da Ilíada são os funerais de Patróclo e de Heitor. O pai do guerreiro derrotado, Príamo, vai à tenda de Aquiles, correndo o risco de nunca mais voltar. Pede ao guerreiro Semi-deus que devolva o corpo do filho Heitor, para os rituais. Aquiles, finalmente humano, se emociona e concede o pedido, garantindo a volta de Príamo aos muros até então intactos de Tróia. A morte de Aquiles, por uma flecha envenenada de Páris, no calcanhar, também está fora da Ilíada, é contada na Eneida, do poeta romano Virgílio, muitos séculos depois. Assim como o Cavalo de Tróia, artimanha de Ulisses para colocar soldados dentro da cidade murada e com isso vencer a guerra mais famosa da Antiguidade. Canto XXI Começa a despedida Tatoos of memories and dead skin on trial The Time of Your Life Green Day Converso com Lily, a brasileira que vive em Nova York e acompanha a filha que veio do Brasil, a menina tímida. Ela explica que os americanos em Nova York são diferentes daqui, lá a concorrência é mais forte por tudo, os táxis são disputados à tapa na rua, mas se você tem força de trabalho e produz, sempre aparece alguém para ajudar. Ela descansa na viagem mas não deixa de ver os e-mails, organizar serviços para quem ficou no seu lugar, nos pontos de venda que ela tem. Está a um ano e meio, tem visto de trabalho. A filha nem é tão tímida assim. Tem o hábito de conferir a pintura dos olhos num pequeno espelho, a cada hora, pelo menos. Quem descobriu primeiro foi a menor, ficaram grandes amigas, e das Vestais também. Quanto mais avança o conhecimento, mais conversas você ouve. Já falam em saudade, em novos encontros. Estivemos até agora quase quinze dias juntos, na maratona de parques e compras, ônibus e esperas, sempre juntos quase no mesmo passo. Imagino como seria esticar uma excursão destas até o máximo, uns três meses nessa rotina fora do comum. Como aquele sujeito que passou um mês almoçando em cadeias de sanduíches, para testar a resistência do organismo àquela dieta fast-food. Eu endoidava com certeza, perderia os sentidos para a realidade, numa dose excessiva de fantasia. A única coisa boa seria conviver e conhecer melhor todos os novos amigos da excursão. Cada ser humano é um parque cheio de atrações. De novo na Universal, dou uma fugida do grupo e vou às montanhas russas do Hulk, setenta minutos de espera, e as gêmeas Duel of Dragons, onde esperei quinze minutos na primeira vez, vinte e cinco na segunda. E o parque estava lotado. A Duel são duas montanhas russas entrelaçadas, uma azul outra vermelha, os caminhos são surpreendentes, com loopings torcidos no meio e quedas laterais repentinas. Reencontrei o grupo nos simuladores T2, modelos grandes. Fomos ao Terremoto e ao Tornado. Ambos são sobre filmes de cataclismas, um perigo cotidiano dos americanos. No Terremoto tem uma aula sobre os terremotos em Los Angeles, durante a fila. Também ensinam a fazer o cromaquei, um truque de cinema, numa ante-sala. Pessoas da platéia vão ao palco e aparecem num submarino em alto-mar. Depois entramos num carrinho que imita o metrô. Ele pára numa estação e começa o Terremoto. Bem realista. No Tornado, a mesma coisa. Um vídeo mostra o making off do filme, misturado a histórias reais. Prometem nos fazer sentir a condição de estar próximo de um tornado. No brinquedo estamos de pé no cenário do filme Twister, quando o tornado chega à noite, por dentro de um cinema drive-in e atinge a garagem onde os personagens estão. È bastante vento, chuva, uns carros se movem, o telhado cai, pega fogo no posto de gasolina, bem legal. Por volta das quatro da tarde chove mais uma vez. Choveu quase todos os dias, por uma hora ou duas no máximo, com exceção de um dia que ficou nublado. O calor é forte mas não faltam recursos para amenizá-lo. Todos os parques têm grandes ventiladores que espirram água, no interior das atrações, ar condicionado. Chapéus, óculos e filtro-solares arrematam o resto do problema. Apesar dos parques cheios, verão é uma época em que as pessoas estão mais encantadas, mais dispostas à diversão. Cansados e felizes, saímos pela esteira rolante do complexo da Universal, nesse último dia de parques. Toca Green Day no sistema de som, um verso me chama atenção. I hope you had the time of your life. Espero que você tenha aproveitado a sua vida. Combina. Tem gosto de final da história. Cccccccccccccccccccccc Fim dos parques, começo da volta. Ainda vamos nesse dia, à noite, fazer mais umas compras na tal Yes, Brasil, mas ninguém está disposto a encarar o restaurante Camila’s, acho que comemos o suficiente na Universal, onde há bons restaurantes e lanches diferentes, como a loja de bolinhos de canela. Tiro de dentro das calças mais uma vez a bolsa colada ao corpo, onde por toda a viagem guardei dinheiro, cartões, cópias de passaporte, chave do cofre do hotel. Presente de Vovó Cassandra. Entrego os últimos travellers a minha mulher e minha filha e fico namorando as notas verdes de dólar. Enquanto espero pelas duas nas últimas compras, vejo que o dinheiro americano dá dicas da história deles, suas crenças comuns. cccccccccccccccccc A nota de um dólar tem aquele selo de pirâmide com inscrições em latim. Annuit coeptis, novus ordo seclorum. Significa mais ou menos, concordamos com a nova ordem que começa. Vem com a figura de George Washington, um agrimensor que virou general na luta contra os Ingleses e depois da americano. independência foi o primeiro presidente Tem ainda o selo da águia, segura flechas numa pata e um ramo de oliveira na outra. Guerra e Paz. No alto da cabeça da águia, um símbolo interessante. São 13 estrelas – os treze estados independentes – posicionadas em forma de estrela de Davi. Símbolo dos Judeus. A pirâmide é símbolo dos Maçons. Mistura produtiva. Todas as notas são feitas de papel verde ou laranja, com tinta verde e preta. As notas mais novas tem um desenho mais limpo, sem tantos símbolos, ou margens com desenhos barrocos, gongóricos, como as antigas. Mas em compensação possuem mais selos de segurança, em dourado, além de marcas d’água mais modernas. Na nota de dois dólares, tem o Thomas Jefferson, terceiro presidente americano, filósofo iluminista, arquiteto e dono de terras. Mais um que lutou na independência. No outro lado da nota, a cena da declaração da Independência e quase os mesmos símbolos da única nota menor que ela, a de um dólar. A nota de cinco dólares traz Abrahan Lincoln sentado num trono gigante, como no memorial dele, em Washington. Tudo sustentado em colunas em mármore, como nos templos dos deuses antigos. Parece a Acrópole de Atenas. Por aqui gostam muito dele. Lincoln foi o décimo-sexto presidente, o primeiro eleito pelo Partido Republicano. Acho que ele colocou os Estados Unidos no século XX, ainda em 1860, quando venceu as eleições na firme promessa de libertar os escravos de todo o país e torná-los cidadãos consumidores e produtivos. Cumpriu a segunda metade. Mas teve que aceitar a Guerra Civil, para isso. Treze Estados do Sul, com economia fundada em latifúndios com escravos, declararam a guerra, não aceitaram a eleição de Lincoln. Foram quatro anos de presidência e de guerra civil. 600 mil eleitores a menos, dois terços soldados de ambos os lados. Inclusive o presidente Lincoln, assassinado num teatro, por um oficial do exército derrotado. Foi desse ódio da derrota que nasceu a Ku Klux Klan, um grupo radical que executa negros no sul dos EUA até hoje. Chegou a ter 20 milhões de seguidores, mesmo banida como associação formal em 1870. A nota de dez, Alexander Hamilton, legislador. A nota de vinte, Andrew Jackson, sétimo presidente americano, um dos fundadores do partido democrata. A nota de cinqüenta, Ulisses Grant, o general que venceu a guerra para Lincoln. E chegamos a minha preferida. A nota de cem dólares, com o sorridente inventor Benjamin Franklin, cientista, geógrafo, incentivador dos Correios e Telégrafos, pertencia a Sociedade Lunar. Todos participaram de momentos históricos, todos estiveram em guerras. Há 350 bilhões de dólares em circulação, uns duzentos aqui comigo. Ccccccccccccccccccccccccccccccccccc Sentados na calçada da loja brasileira, mirmidões e vestais mostram fotos nas câmeras digitais e relembram as histórias desde o início. Teve um que dormiu escondido num parque mas foi encontrado. Alguém que caiu num chafariz por causa do calor. Outro que testou uma máquina de cortar cabelos na cabeça do Menor. Óculos, roupas e aquela cartola de referência, perdidos. As dificuldades com as moedas, com a comida, com a língua estrangeira, todos concordam que deveriam ter estudado mais naqueles cursos de inglês no Brasil. Todos concordam também que foi tudo muito bom, vale qualquer esforço ou aborrecimento. Já passa da meia-noite, hoje é o dia da volta. Canto XXII O dia da volta “Pode ir armando o Coreto e preparando aquele feijão preto, eu tô voltando “ Chico Buarque Não consigo parar de sonhar. Esta noite estou numa favela que nunca vi, encontro artistas populares que trabalham com couro e barro. Parecem personagens de um livro de Sebastião Salgado. Um deles explica a invenção do seu teleférico, onde vou andar. Tem uma cadeira só e voa por sobre um canal. Quando olho para a ponte sobre o canal, pessoas discutem e começam um tiroteio. Pulo do teleférico e me escondo dentro de um barraco de zinco, um depósito de material de construção. Fico preocupado se os artistas fugiram também. Quando saio, não há mais nada nem ninguém. Tudo é branco e com muita luz. Acordei assim, no meio da noite. No bloco de notas ao lado da cama, escrevo mais um sonho. Penso que estou vivendo como um escritor de verdade, tomando notas no meio da noite, com ganas de explicar por que nada no mundo é banal ou transitório. Tudo está repleto de significados, vive mais quem entende mais. O sonho é mau augúrio, estou voltando para uma guerra civil. Nos jornais daqui nada vi sobre isso, nem sobre o Pan do Rio. Nem sobre o acidente da TAM. Essa noite mal-dormida será como a próxima, dentro do boi voador. Cccccccccccccccccccccccccc Conforme RS já explicava há dois dias, há regras para seguir e facilitar a volta para casa, principalmente das bagagens. Desde a manhã, todos têm que ficar de olho nas bagagens, à partir do momento em que são colocadas fora dos quartos, para os carregadores levarem. De novo checamos vinte vezes. Cada bagagem a ser despachada deve estar com selo de identificação e cartão de seguro. Uma fita vermelha também ajuda a localizar mais rápido sua mala na esteira do desembarque. Temos uma bolsa à mais, que está lotada de compras. Pesa muito. Pode dar problemas, mas não temos outra saída, não compramos malas. Distribuímos as compras pelas malas a serem despachadas, vestimos coisas novas e os i-pod foram na mão. Não ultrapassamos a cota. No último café da manhã distribuo mais dólares em notas de um, um sacrifício aos deuses Burocraxion, Conexius e Cansaxion. Vários garçons, algumas arrumadeiras e um porteiro ganham mais uma foto do Washington na carteira deles. São todos muito gratos e eficientes, tem escrito thank you em vários lugares, inclusive nos palitos de fósforos de papelão que eu pegava todo dia na loja de (f)utilidades do Hotel. Antes de sair tiro mais fotos do quinto andar do Hotel, reparo que os telhados de Orlando são todos decorados, não se vê caixa d’água, torre de elevador, antena de TV, um cuidado de cenário para visitantes. Enquanto saímos do Hotel, acompanhamos as malas e conferimos o material que ficará em nossas mãos, bolsas com passatempos, passaportes com o I-94 e dinheiro. Temos quase mil fotos na máquina digital, e um dia inteiro pela frente em ônibus, aeroportos e aviões para lembrar dos quinze dias nesta cidade feita para encantar turistas de qualquer idade, cultura ou religião. ccccccccccccccccccccccccccccc O ônibus segue para Tampa, há cinqüenta minutos. São quase uma da tarde e pegaremos um vôo às quatro para Miami. Na hora de despachar as malas, um susto, como no início da viagem. Mas desta vez é por mala demais e não de menos. O ajudante da agência me diz que pela sua experiência minha bolsa de compras está acima do peso, o que vai custar US$ 100, de excesso de bagagem. Até colocar na balança, meu coração balança. Não podia passar de 32 kg, deu 30,2 Kg. Salvo por um quilo e oitocentas gramas. Se tivesse mais uns três shampoos grandes, iriam custar bem caro. Depois de tirar os sapatos de novo, ver as coisas no raio-X, embarcamos para Miami quase seis da tarde, mas o atraso não assusta RS que havia marcado o vôo de Miami para o Brasil às onze da noite, o ônibus noturno da AA. No vôo curto até Tampa, minha filha repara em duas americanas que falam sem parar, eu reparo que minha filha já se atreve a entender conversa dos outros, em inglês. Os bancos do avião são muito próximos, é inevitável acompanhar. Material para o fim da história. As Gringas falam, como todo mundo, de família, trabalho, diversão, como vêm as pessoas desconhecidas, como se relacionam com as pessoas conhecidas, essas coisas. Tudo igual entre pessoas do mundo todo, nas conversas que todos podem ouvir. Canto XXIII O comissário Stallone “Nestas tortuosas trilhas, a viola me redime” Paratodos Chico Buarque Desta vez o terminal em Miami não era o mesmo, tivemos que andar algumas letras do alfabeto, do C ao E, se não me engano, uns doze minutos. A tropa estava munida de um certo espírito rebelde, talvez o cansaço de tanta obediência à RS. Eu sei que três se perderam no caminho, o local onde embarcaríamos não tinha opções de comida depois das nove da noite, outros saíram depois, RS suou um pouco ao final da viagem. O menor também brilhou na ocasião. Vestido em trajes de basquete de rua, com uma fivela imitando diamantes com suas iniciais, RR, careca e de boné invertido, teve seu bilhete para o Rio trocado de nome, para Elisabeth. Foi o suficiente para um susto geral com possível atraso e muita zoação com o moleque. Beth. A menor carregava um imenso boneco de pelúcia da Shamú e pulava de mão de mão entre os muitos amigos e amigas que fez naturalmente. Essa menina tem estrela. Numa das noites no hotel, por volta das onze, ela desapareceu. Foi para um dos muitos quartos da garotada, brincar e não avisou ao irmão e a mãe. Foram 20 minutos de agonia para o irmão mais velho, a mãe e todos nós. Voltou dormindo, no colo do irmão quase médico e quase infartado. A santa inocência em pessoa. No ponto de encontro do Terminal de Miami, local de embarque do último vôo da viagem, concentram-se outras excursões, uma delas de Minas Gerais com quase oitenta pessoas. Falavam muito e alto, uma excitação de quem começaria tudo de novo naquele instante, se assim fosse possível. 90% adolescentes, grupo homogêneo. Excursão festiva. Foi quase assim que o turismo começou, com jovens sedentos de aventura. Pelo menos nos tempos modernos. A palavra turismo vem do inglês Grand Tour, a grande volta, uma tradição entre alunos das Universidades de Oxford e Cambridge, na Inglaterra. A Rainha Vitória bancava os custos, os formandos, todos jovens, passavam de seis meses a dois anos viajando pelo mundo, viagens que até então eram hábitos de elite, de aventureiros ou de religiosos. O turismo de massa veio com os ingleses também, um deles, Thomas Cook, organizou a primeira viagem de um grupo pago. Ele alugou um trem para 570 pessoas irem de Londres a uma palestra em Leicester, sobre os males do álcool. Protestantes só vendem álcool, jamais tomam. A Cook & Son tornou-se a primeira agência de viagens da história. Criou o voucher, um bilhete de garantia para hotéis e restaurantes. Seus concorrentes americanos, Wells e Fargo, criaram o Traveller-check, numa empresa recém inaugurada naquela época, uma tal de American Express. Depois o turismo explodiu como cultura e fonte de riquezas. Chegamos até Orlando, uma máquina de turismo no tamanho das necessidades multinacionais dos americanos. É indústria limpa, agregadora de pessoal e difusora de cultura. Seria muito bom para o Brasil, se alcançassemos o nível deles. cccccccccccccccccccccccc Mas o primeiro salto do turismo na história, para criar na humanidade o hábito de viver temporariamente em outras terras, outros ares, foi na Grécia, por volta do século V A.C. Os gregos, como vimos aqui, são resultado de vários povos unidos por uma mitologia em comum. Cresceram desse jeito, com língua comum, moeda comum. Mas diferente dos outros povos, realizavam encontros gigantes, as Olimpíadas, a cada quatro anos, com o objetivo de celebrar a existência de Zeus e sua criação humana, em vários sentidos, com os esportes, com as declamações, o teatro, os banhos, os sacrifícios animais. Os Romanos, herdeiros da filosofia e política dos Gregos, deitaram estradas até a Inglaterra, Alemanha e Espanha, então territórios de diferentes culturas, Celtas, Bretãos, Gauleses. O turismo nunca mais parou de receber suas facilidades, como estalagens, e o intinerarium, primeiro mapa das estradas romanas. Na Idade Média foram as viagens À Terra Santa o grande fluxo turístico e na Renascença, viajar, com os navegantes portugueses, fez o mundo aumentar de tamanho. Chegamos ao Iluminismo, pós Revolução Francesa, onde viajar era símbolo de cultura científica e expedições de aventura. Sob essa influência de lordes aventureiros, surgiu o Grand Tour, dos universitários ingleses. E fechamos o ciclo. Ccccccccccccccccccccccccc A volta no madrugadão da AA foi pior. O barulho da garotada pão-de-queijo dentro do avião foi amplificado e a total displicência com que foram tratados os reclamantes pelos comissários deu o tom ácido do vôo. Havia um comissário tão forte que não havia camisa no seu tamanho. A camisa que ele usava estava prestes a explodir os botões. Se aquele gigante levantasse a voz um pouquinho só, ao pedir silêncio, todos se calariam no susto. Tinha um americano bem na minha frente que não parava de reclamar do barulho. Ele queria o melhor para esposa, que estava doente. Os comissários diziam apenas que não iam bancar as babás, se os guias da excursão mineira não estavam fazendo isso, é porque devia ser impossível. Eu fiz minha parte, pedi silêncio à garota no banco de trás, com a voz forte e colocada, quase assustador. Ela não falou mais, mas só durante uns dois minutos. Você, amigo leitor, querida leitora, jovens e jovens, se você é mineiro ou mineira, não se sinta ofendido pela crítica a esse grupo, por favor. O estado de espírito que vi na lata voadora não é o Estado de Minas que eu conheço, onde morei e aprendi o valor da música e das amizades. Com tal barulho e tensão no ar, comissários em fim de carreira, a poltrona dos insones, tentei assistir a mesma série da TV, Wings, que vi no vôo de chegada, há quinze dias. Era o mesmo episódio. Mas nem com o fone de ouvido foi possível. O silêncio das línguas cansadas só veio por volta das duas da madrugada, tentei dormir de lado e sonhei. Estávamos num ônibus, com RS na porta a entregar um por um na sua casa, todos os amigos da excursão. Eu me sentia feliz de ter acabado o tormento do avião, não via a hora de chegar em casa. Acordo e percebo que ainda faltam cinco horas de viagem, compreendo melhor a necessidade de permanecer nos sonhos, para que eles nos protejam da realidade absurda que nos colocamos às vezes. Canto XXIV O Brasil com S “Minha alma canta,vejo o Rio de Janeiro” Samba do Avião Tom e Vinícius Quando amanhece o dia já estamos sobre o Brasil. Antes que a barulhada recomece no avião, abro o livro que tentei ler durante toda a viagem. Eça de Queiroz, contos. Sem nenhuma preferência, escolho o primeiro conto, A Perfeição. Mãe das coincidências ! Trata-se de Ulisses, um dos generais da Ilíada. Eça o colocou prisioneiro de uma deusa marinha, Calipso. A deusa o nutre por oito anos, com todas as benesses que um grande herói pode desejar, menos sair da ilha de Ogígia, onde vive a deusa e sua corte. Ulisses é prisioneiro da perfeição. Lembro de tudo quanto foi perfeição ou pelo menos intenção de ser perfeito na nossa viagem. É a busca incessante dos americanos, talvez o resultado apenas de uma necessidade comum aos povos do hemisfério Norte, mais frio, mais desafiador à vida em geral. Eles não escolheram ser daquele jeito, foi uma necessidade climática. Hoje são prisioneiros de um sonho de perfeição. Todos sonham, nem todos realizam. É a sociedade dos que se encontraram naquele país de clima rude, natureza rala, extremos e gigantismo territorial e dela tiraram uma necessidade tamanha, em proporção ao problema de viver por lá. E tinha que ser rápido, ou não se vêem os filhos crescer, morreriam antes. Por isso tanto respeito ao trabalho e a produção, e suas manutenções. Mas também por isso, não se fala de outra coisa. Ulisses, farto da boa vida, encontra uma maneira de fugir rezando aos deuses, cobrando dívidas de vitórias e antigos sacrifícios. É atendido, Hermes visita Calipso com ordens de Zeus de liberar o herói da Ilíada e da Odisséia. Escreve o Eça ao final do conto: - Quantos males te esperam, desgraçado, antes ficasses, para toda imortalidade perfeita, na minha ilha, nos meus braços perfeitos. Diz Calipso.Ulisses recuou, com um brado magnífico. - Oh, Deusa, o irreparável e supremo mal está na tua perfeição!E através da vaga, fugiu, trepou sofregamente à jangada, soltou vela, fendeu o mar, partiu para os trabalhos, para as tormentas, para as misérias. – Para as delícias das coisas imperfeitas! Pois a delícia das coisas imperfeitas já pousava na bandeja à minha frente. Um yogurte indecifrável, um café da manhã com olhares de raiva e cansaço. Só mais uma hora e pousaremos no Rio de Janeiro. ccccccccccccccccccccccccc Na saída do avião, o americano possesso deu um chute numa das garotas da turma barulhenta do pão-de– queijo. Eles foram à polícia, mas bastou alguns depoimentos sobre a viagem para comprovar que o americano foi até gentil com um só chute. Não deu em nada. Estamos de volta ao Brasil. Na fila da Polícia Federal esperamos quase uma hora e meia, tudo bem, é a penúltima fila da viagem. Não há entrevistas como na ida, nem revistas, como nos EUA. Ao conferir nossos passaportes o oficial da Polícia Federal não encontrou apenas um número para o nome de minha mulher. Encontrou dois, lembram que lá no começo da história ela teve que tirar de novo o passaporte? Eu sabia que em algum lugar isso podia dar encrenca. Ainda bem que foi aqui. O jovem oficial recomendou que nos informássemos sobre o procedimento correto com seus superiores, mas àquela hora da manhã tudo que pedi foi, libera, aí, meu amigo! Ele liberou. Sem custos. Obrigado. Caro leitor, querida leitora, vamos falar do jeitinho brasileiro, esse mecanismo absurdo que faz a maioria de nós desrespeitar qualquer trato, em qualquer momento. Até os tratos com a gente mesmo, as promessas de vida, sob a mais honrosa das motivações, fiz pelos filhos, ou a mais fútil e cruel, o outro está fazendo também. Num país imenso e com tal dimensão de facilitação pessoal vai-se contra as regras que permitem a melhoria de todos, ou pelo menos da maioria, como nos EUA. Mas, meus amigos e amigas que chegaram até aqui, eu disse isso tudo para mostrar até com mais firmeza - por que fui eu mesmo que escrevi e li antes de vocês – o lado bom e mágico do nosso jeitinho. É fazer de graça a um desconhecido o que você poderia tranqüilamente estar cobrando uns reais a mais. Quando eu saio de bicicleta e atravesso a minha cidade, passo o dia com dois ou três reais no bolso, carrego meu isotônico e depois encho de água nos botecos da vida. Ou peço regulagens para Marcela, minha bike, que até já ganhou uns raios quebrados e consertos de furo de pneus, de grátis. O jeitinho é a empatia dos problemas em comum. É a simpatia nacional que fascina os gringos e europeus. E disso o Brasil está cheio, problemas em comum. Arrisco até a dizer que acontece entre gente muito rica e muito influente, que faz, aqui e ali, um favorecimento de classes, elege um amigo para algum cargo influente. É tudo jeitinho também. As conseqüências? É cada um por sua consciência de que ajudou a pessoa certa, no momento exato que ela realmente precisava, num evento que não prejudique a mais ninguém. Aí é que o bicho pega, a maioria da população sempre se lasca. É o jeitão brasileiro de andar. cccccccccccccccccccccccccccccc A caminho do último obstáculo, buscar as malas que foram despachadas ainda em Tampa, procuro informações sobre o Pan. O Brasil estava em quinto quando saímos, terminou em terceiro, atrás dos EUA e de Cuba. Comentase que o bom resultado cubano se deve a um empréstimo de Hugo Chavez, o presidente da Venezuela que sonha em ser o novo Simon Bolívar, libertador das Américas. As malas chegaram bem, Hugo Chavez que se dane. Com o fim do Pan, volta a guerra civil carioca. O acidente da TAM ganhou novas informações da mídia sempre desinformada. Agora pode ser culpa do equipamento, embora a pista ainda esteja entre os suspeitos. Parece que a delícia das coisas imperfeitas não funciona em aviação. ccccccccccccccccccccccc Recebemos as malas intactas, e um formulário, o último, para declararmos o conteúdo das bagagens que carregamos, se passa da cota, quanto passa. O formulário era para ser entregue e preenchido calmamente dentro do avião, mas não sei porque razão – fim de carreira – os comissários não distribuíram para todos. Já na saída para o saguão de desembarque do aeroporto, a última fila. Se você mentiu e declarou não ter nada, pode se dar bem, mas só recomendo para quem tem nervos de aço. Há um botão que você aperta, se der verde, você passa, se der vermelho, você vai ser revistado e suas declarações conferidas. O meu foi vermelho, passaram pelo raio-x e não deu nada. Eu havia dito a verdade. cccccccccccccccc Quinta-feira, 2 de Agosto, 9:15 da manhã. A viagem acabou. Nos despedimos dos amigos de excursão com promessas de nos vermos em breve, esticar um pouco a convivência, quem sabe. Como o Destino faz força para todas as coisas se separarem com o tempo, sinto que nunca mais verei algumas daquelas pessoas. Mas espero que não seja assim, se fizermos força no sentido contrário. Também queria me despedir de vocês, fiéis leitores e leitoras, que chegaram até aqui, no penúltimo parágrafo da minha história de duas cabeças.