PRÁTICA INTERDISCIPLINAR NO ENSINO FUNDAMENTAL

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PRÁTICA INTERDISCIPLINAR NO ENSINO FUNDAMENTAL
Simpósio Internacional sobre Interdisciplinaridade no Ensino,
na Pesquisa e na Extensão – Região Sul
PRÁTICA INTERDISCIPLINAR NO ENSINO FUNDAMENTAL:
Os limites e as possibilidades de atuação do pedagogo
Kellys Regina Rodio Saucedo
Universidade do Oeste do Paraná - UNIOESTE/CAPES/DS, [email protected]
Elocir Aparecida Correa Pires
Universidade do Oeste do Paraná - UNIOESTE/CNPq, [email protected]
Kely Cristina Enisweler
Universidade do Oeste do Paraná - UNIOESTE/CNPq, [email protected]
Vilmar Malacarne
Universidade do Oeste do Paraná – UNIOESTE, [email protected]
Dulce Maria Strieder
Universidade do Oeste do Paraná (UNIOESTE), [email protected]
Eixo temático: Teoria e Prática da Interdisciplinaridade
1 INTRODUÇÃO
A interdisciplinaridade propõe um conjunto de relações entre os conteúdos disciplinares trabalhados
nas escolas. O conceito de interdisciplinaridade tem sido tema de estudos de vários pesquisadores, tais
como: Fazenda (1991, 2008, 2009, 2011), Japiassu (1976, 2006), Morin (2008, 2010), Yared (2008). Na
escola o aprofundamento teórico deste conceito precisa ser construído no fazer prático disciplinar em sala de
aula e pressupõe o rompimento fronteiriço entre as disciplinas, mediações do saber e/ou na pesquisa. Frente
a essa realidade o desafio do professor implica na construção de propostas que busquem superar as “[...]
concepções tradicionais de ensino sustentadas por uma lógica formal que hierarquiza, fragmenta e
disciplinariza conhecimentos/conteúdos [...]” (CHAVES; AMORIM, 2009, p. 316).
Como forma de romper com a fragmentação e linearidade na produção e socialização do
conhecimento apresenta-se a interdisciplinaridade. Diante disto, esta pesquisa de cunho qualitativo teve por
objetivo investigar obstáculos encontrados por professores do Ensino Fundamental, formados em Pedagogia,
na implementação de trabalhos interdisciplinares em sala de aula, em uma Escola Municipal, localizada em
Cascavel/PR. Busca-se, também, apresentar neste artigo, algumas reflexões teóricas pautada em autores que
discutem a interdisciplinaridade no campo educativo.
Entre os resultados da pesquisa está o fato de que as professoras, apesar de compreenderem a
relevância de realizar trabalhos interdisciplinares, mantém uma orientação pedagógica pautada em práticas
de fragmentação e compartimentalização dos conteúdos.
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1.1 Procedimentos Metodológicos.
A presente pesquisa teve início em março de 2012 em encontros semanais que aconteciam nas
quartas-feiras. Foram realizadas oito observações de aulas práticas realizadas em seis turmas do 4º ano do
Ensino Fundamental, em uma pública municipal, da região Oeste de Cascavel-Pr. A pesquisa de campo é
objeto de análise baseada em pesquisa bibliográfica e documental (GRESSLER, 2004) sobre a
interdisciplinaridade. Na presente investigação são analisados os debates atuais sobre a atividade
profissional de pedagogos em trabalhos interdisciplinares. As observações foram criteriosamente registradas
em diários de bordo (PORLÁN; MARTIN, 2004) por estagiários do curso de Pedagogia com a intenção de
identificar a ocorrência de ações interdisciplinares durante as aulas.
1.2 Justificativa do eixo escolhido
A escolha pelo eixo temático Teoria e Prática da Interdisciplinaridade deve-se ao fato de que esta
pesquisa coloca em evidência a construção histórica do conceito de interdisciplinaridade, além de conter
aspectos da formação do professor de Pedagogia e da sua atuação apontando possibilidades e dificuldades
do trabalho no Ensino Fundamental.
1.3 A interdisciplinaridade nas discussões teóricas
Influenciados pela era da modernidade vive-se o processo da atomização dos saberes e o
parcelamento das tarefas reforçando-se a tendência da especialização e a compartimentação dos
conhecimentos, ao mesmo tempo em que é visível a sua crescente complexificação. Essa tendência tem
chegado ao ensino básico a partir do momento em que o saber passou a ser organizado em disciplinas,
influência recebida em grande parte dos modelos universitários pautados no pensamento cartesiano, o que
nos coloca em situação de perda do sentido da globalidade (MAINGAIN; DUFUOR, 2008).
A separação do conhecimento em grandes áreas foi estimulada pela teoria mecanicista de Descartes
quando propõe o problema do conhecimento, determinado por dois campos de conhecimento totalmente
separados e distintos, reconhecido como sujeito e objeto (MORIN; LE MOIGNE, 2000). Tal separação
exerceu forte influência no processo de aquisição, construção e disseminação do conhecimento em geral,
inclusive no campo da educação, bem como na estruturação do currículo escolar em disciplinas,
estabelecendo fronteiras entre elas (MORAES, 2000).
As fronteiras disciplinares, que tendem a delimitar os espaços se “[...] tornam compartimentadas e
impedem o contato, a circulação e o diálogo com as outras disciplinas, freando os movimentos
interdisciplinares e resistindo às novas teorias provenientes do exterior” (JAPIASSU, 2006, p. 34).
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Metodologia essa que leva a incompreensão dos objetos de pesquisa resultando na “[...] simplificação dos
fenômenos investigados” (SILVA, 2011, p.587). Contudo, de acordo com Maingain e Dufuor (2008) nos
últimos anos emerge tanto no campo das ciências exatas quanta nas humanas, o paradigma sistêmico, que
progressivamente faz emergir a “[...] representação do real como sendo um conjunto de sistemas abertos,
complexos e interactivos” (idem, p. 21). Nesse contexto cada vez mais o princípio atomizante perde espaço
para dar lugar à articulação dos saberes, principalmente, no âmbito educacional, recorrendo-se a
interdisciplinaridade.
Em nosso país a interdisciplinaridade ganha destaque ao final dos anos de 1960 com a publicação da
obra “Interdisciplinaridade e Pedagogia do saber” de Hilton Japiassu (1976), influenciado pelas publicações
de Georges Gusdorf na Europa, onde estava acontecendo, por parte de alguns professores e alunos
universitários, reivindicações em prol da interdisciplinaridade. Esse movimento registra um processo de
questionamento dos métodos tradicionais de ensino, que subdivide as áreas do conhecimento, assim como as
barreiras existentes entre as disciplinas. Posteriormente, essas reflexões são ampliadas por teóricos, como:
Fazenda (1991, 2003, 2008, 2009, 2011), Lück (1994), Trindade (2008), entre outros. Entre os documentos
oficiais normativos que regulamentam a educação brasileira que destacam a interdisciplinaridade, é possível
mencionar: a Lei de Diretrizes e Bases (LDBEN) nº 5.692/71, a Lei de Diretrizes e Base para a Educação
(LDB) nº 9.394/96 e, em específico no Estado do Paraná as Diretrizes Curriculares da Educação Básica,
entre outros. Estes últimos, em consonância com autores da área, advertem sobre a necessidade de se
discutir e refletir a interdisciplinaridade de forma a ultrapassar as tradicionais organizações disciplinares em
busca de propostas cada vez mais interdisciplinares e contextualizadas.
Se olharmos, entretanto, para nossa realidade marcada pela era da informação e dos saberes
contextualizados, a nossa realidade educacional na grande maioria, ainda, se pauta no método tradicional em
favor da fragmentação do conhecimento. Método esse que se limita apenas a mera justaposição das
disciplinas sujeitando o objeto de estudo a simples adição de informações. Como já afirmado por Lück
(1994) em nosso contexto educacional ha uma “[...] despreocupação por estabelecer relação entre idéias e
realidade, educador e educando, teoria e ação, promovendo-se assim a despersonalização do processo
pedagógico.” (p. 30).
Desse modo torna-se imprescindível discutir a interdisciplinaridade dentro do espaço escolar,
procurando superar as fronteiras disciplinares, consideradas por Japiassu (1997, p. 30) como forma mais
adequada para resolver “o sintoma da situação patológica” que se depara atualmente o saber.
Para Japiassu (1976) a interdisciplinaridade define-se e elabora-se através de uma crítica das
fronteiras das disciplinas, de sua compartimentalização, proporcionando uma grande esperança de renovação
e de mudança no domínio da metodologia das ciências humanas. Trata-se de explorar as fronteiras das
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disciplinas e as zonas intermediárias entre elas. Segundo o mesmo autor, a característica central da
interdisciplinaridade consiste no fato de que esta se incorpora aos resultados de várias outras disciplinas.
Distingue-se pela intensidade das trocas entre os especialistas e pelo grau de integração real das disciplinas,
no interior de um projeto específico de pesquisa ou de ensino, com o propósito de desenvolver um
conhecimento integrado, onde cada disciplina saia enriquecida.
De acordo com Fazenda (2009) a interdisciplinaridade se configura como uma nova atitude perante a
questão do conhecimento. Segundo a autora esta se da na interação entre duas ou mais disciplinas, no
estabelecimento de relações recíprocas e mutualidade num regime de co-propriedade que permite formas de
diálogos e intercâmbios entre os que estão envolvidos no processo, onde o conhecimento dos conteúdos de
cada disciplina saia mais fortalecido. Entende, para a autora, que tal atitude é “[...] assumida no sentido de
alterar os hábitos já estabelecidos na compreensão dos conhecimentos” (p. 29) entre professores e alunos.
Fazenda (1996) compreende a interdisciplinaridade na esfera da educação, como meio de estabelecer
condições para melhorias da qualidade de ensino, por propiciar a formação integral do sujeito. Muito
embora, o sucesso de tal formação dependa muito das medidas tomadas pelos educadores em relação ao
estabelecimento continuo de diálogos entre suas disciplinas e que promovam a integração entre o
conhecimento e a realidade concreta, ou seja, as expressões da vida, que fazem parte de todas as áreas do
conhecimento, extinguindo as barreiras existentes entre os conhecimentos produzidos. Através da
interdisciplinaridade produzimos novos saberes capazes de nos propiciar um novo entendimento sobre nossa
realidade social, pois os conhecimentos possíveis nessa perspectiva não se dão só em relação aos conteúdos
disciplinares, mas em relação a formação humana do sujeito. Para Marinho (2004) o objetivo deve ser o de
transformar o espaço escolar em um ambiente de aprendizagem e, não apenas, de transmissão de
informações, em que o aluno seja desafiado a solucionar problemas, para além de um conhecimento estático.
1.2 Dificuldades da construção de um trabalho interdisciplinar
Como já apontado anteriormente, muitos autores e documentos oficiais destacam a necessidade de se
integrar as disciplinas e contextualizar os conteúdos ensinados em sala de aula. Considera-se que a
abordagem interdisciplinar consiste na troca de conceitos, teorias e métodos entre as diferentes disciplinas
no sentido de revolucionar a atual estrutura escolar como estanques. Por outro lado, se observarmos a
realidade escolar veremos que muitas são as dificuldades encontradas para se implantar um trabalho
verdadeiramente interdisciplinar. Isso porque na maioria das vezes “[...] prega-se a necessidade de
interdisciplinaridade, mas os currículos, os programas de ensino, as unidades administrativas, as diretrizes
políticas da instituição são o primeiro e maior obstáculos à sua realização” (TEIXEIRA, 2007, p. 72),
somado a resistência dos próprios professores que por vários fatores tendem a resistir a essa temática.
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Características que contribuem para o insucesso escolar de muitos brasileiros, como destacam os autores
Rocha Filho, Basso e Borges (2009) muitos “[...] professores continuam atuando tradicionalmente por conta
da política educacional, por deficiência em sua formação ou por motivos econômicos” não se restringindo
somente aos problemas da estrutura educacional brasileira. Nesse caso, “[...] estamos enfrentado os
estertores de um sistema educacional desenvolvido e mantido pela perspectiva da separabilidade, numa
conjuntura social, política, econômica, científica e religiosa, cujas características estão gradativamente
exigindo posturas mais integradoras” (ROCHA FILHO; BASSO; BORGES, 2009, p.18). Indicativo,
geralmente, não encontrado nas escolas brasileiras, como é o caso de um posicionamento interdisciplinar.
Esta situação também foi denunciada, durante as observações realizadas em um Colégio Estadual de
Cascavel/Pr. Durante as observações notou-se que o encaminhamento metodológico utilizado pelas
professoras
remete
a
postura
tradicional
de
compartimentalização
do
saber.
Caracteriza-se,
predominantemente, por introduzir os conteúdos no quadro, utilizando como base na maioria das vezes
somente o livro didático e com poucos exemplos que envolvem o cotidiano, o lúdico, o trabalho em grupo e
a contextualização com outras áreas do conhecimento para além daquela de sua formação. Em diálogo com
os alunos os mesmos confidenciaram que, por exemplo, nunca tinham utilizado o computador ou multimídia
na sala de aula, apesar de, nesta escola, haver a disponibilidade de dois aparelhos de multimídia e um
laboratório de informática bastante espaçoso, além de muitos materiais pedagógicos, guardados em caixas
lacradas, um sinal que nunca ou raramente foram usados.
Ao questionar-se sobre a questão da interdisciplinaridade e das dificuldades encontradas para se fazer
um trabalho dessa natureza na escola, muitos foram os empecilhos destacados pelas professoras. Entre os
mencionados repetidas vezes estão: a falta de tempo que resulta na dificulta a busca por pesquisas, o
reduzido número de livros no acervo da biblioteca, assim como o escasso conhecimento sobre o assunto que
não lhes da segurança para realização de um trabalho nessa linha. Em relação a esse fato entende-se as
precárias condições de trabalho que muitos professores enfrentam hoje como, por exemplo: a baixa carga
horária para pesquisa em relação a uma extenuante jornada de trabalho em sala de aula, a baixa remuneração
que não lhes dá condições de comprar materiais de pesquisa como livros, por exemplo, entre outros
instrumentos que possibilitariam a sua melhor capacitação.
Uma das professoras destacou que “[...] os professores têm muitas aulas de manhã e a tarde não
temos tempo para pensar e discutir um projeto interdisciplinar, então cada um faz seu trabalho e o colega
muitas vezes nem sabendo o que você esta trabalhando”. Algumas se referiram ao livro didático como
obstáculo uma vez que este apresentaria os conteúdos de forma linear e fragmentada. Outras reclamaram que
necessitariam de uma pessoa com qualificação para coordenar um projeto dessa natureza e que este deveria
passar a integrar a concepção de educação da própria escola. Nesse caso, entende-se que tal trabalho deveria
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ser orientado pelo coordenador pedagógico, porém segundo as professoras este na maioria das vezes tem seu
tempo incumbido de outras funções burocráticas/administrativas.
Essa problemática é discutida por Fazenda (2009) que considera o fato de que as professoras
sozinhas na sua prática nem sempre conseguem visualizar suas limitações e possibilidades, portanto
necessitando do apoio de toda a comunidade escolar e muito mais da coordenação pedagógica. De acordo
com a autora:
[...] é fundamental o papel de um interlocutor que vá ajudando a pessoa a se perceber, que vá
ampliando as possibilidades de leitura de sua prática docente e da prática docente de outros colegas. O
papel de um supervisor ou de um coordenador pedagógico é fundamental nesse caso (FAZENDA,
2009, p. 72).
As professoras consideram ainda que a formação inicial não contribuiu para que elas tivessem a
iniciativa de fazer um trabalho interdisciplinar. Uma das professoras apontou que:
Penso que é interessante e até é possível realizar um trabalho interdisciplinar. Mas como? Não sei
nem por onde começar o que fazer como fazer até porque nossa formação na universidade foi
realizada de forma disciplinar e a escola também é disciplinar. Tudo isso de alguma forma acaba
determinando nossa forma de trabalhar. Mas fico feliz em ver que vocês estão tendo esse
conhecimento na graduação, no nosso tempo não se falava nisso. O curso era mais teórico com pouca
ênfase na prática.
Aqui vale ressaltar que mesmo o curso de pedagogia tendo uma formação generalista isso não
restringe a atuação desse profissional a uma só disciplina, mas sim, e por isso mesmo, a relação entre as
disciplinas deveria ser mais rotineira. Outras questões foram levantadas pelas professoras como a falta de
material, espaço físico, pouca disponibilidade de recursos para implantação de um projeto interdisciplinar e
salas superlotadas. Além destes destaca-se os problemas de relacionamento entre os próprios professores,
direção e coordenação. Muitas das professoras entendem que atividades diferenciadas podem deixar os
alunos muito agitados e causar certa indisciplina e, por isso, evitam novas práticas.
As professoras reconhecem a importância de se trabalhar interdisciplinarmente, mas admitem não
sentirem-se seguras para uma tarefa bastante ampla e complexa como esta e que exigiria dos envolvidos uma
grande responsabilidade. Como as discussões entre os professores sobre sua matéria ou até mesmo sobre
seus alunos não são regras na escola os mesmos não se sentem responsáveis pelo sucesso ou fracasso de
algum projeto e a busca por mudanças sempre fica para a responsabilidade do outro. De acordo com Ferreira
(2003) para que a interdisciplinaridade se efetive no processo educacional a parceria é um ato indispensável
além da imprescindível ideia de construção da aprendizagem e aspiração pela pesquisa. Não podemos deixar
de mensurar que o trabalho interdisciplinar exige de todo e qualquer professor pesquisa constante como
expõe os estudos de Fazenda (2003):
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Aprender a pesquisar, fazendo pesquisa, é próprio de uma educação interdisciplinar, que, segundo
nossos dados, deveria se iniciar desde a pré-escola. Uma das possibilidades de execução de um
projeto interdisciplinar na universidade é a pesquisa coletiva, em que exista uma pesquisa nuclear que
catalise as preocupações dos diferentes pesquisadores, e pesquisas-satélites em que cada um possa ter
o seu pensar individual e solitário. Na pesquisa interdisciplinar, está a possibilidade de que cada
pesquisador possa revelar a sua própria potencialidade, a sua própria competência (p. 8).
Complementando diz a autora (p. 29) “[...] o diálogo, a ousadia da busca e da pesquisa, é a
transformação da insegurança num exercício do pensar, num construir” uma educação de qualidade e
colaborativa. E, de acordo com Demo (2001, p. 43-44) “[...] o que faz da aprendizagem algo criativo é a
pesquisa, porque a submete ao teste, à dúvida, ao desafio, desfazendo tendências meramente reprodutivas.
[...] ensinar e aprender se dignificam na pesquisa, que reduz e/ou elimina a marca imitativa”. O que leva a
ousadia de criar e experimentar outras abordagens educativas, considerando que o conhecimento nunca será
completo ou finalizado em nossa formação inicial.
Klein (2003) ressalta que um ensino interdisciplinar não se realiza com práticas intuitivas sem regras
ou intenções bem definidas, esta necessita de uma “[...] pedagogia apropriada, processo integrador, mudança
institucional e relação entre disciplinaridade e interdisciplinaridade” (p. 110). Um fator preponderante para
que um projeto dessa natureza tenha sucesso, é o bom relacionamento entre os professores, apontado
também como uma das dificuldades encontradas na escola, que vai desde a falta de comprometimento de
alguns colegas a desmotivação e descontentamento com a atual situação profissional. Uma proposta como
essa carece de uma construção coletiva, na qual todos devem estar envolvidos e ávidos por mudanças. Um
trabalho pautado na prática interdisciplinar “[...] pressupõe uma desconstrução, uma ruptura com o
tradicional e com o cotidiano tarefeiro escolar” (TRINDADE, 2008, p.82) Implica, ainda, segundo Santomé
(1998) “[...] em uma vontade e compromisso de elaborar um contexto mais geral, no qual cada uma das
disciplinas em contato são por sua vez modificadas e passam a depender claramente uma das outras” (p. 63)
A resistência à concretização da interdisciplinaridade, no âmbito do ensino, é bastante grande e
acredita-se que isso se deve muitas vezes ao temor de muitos profissionais na perda de sua autonomia.
Porém uma atitude interdisciplinar se pauta no respeito à individualidade e a peculiaridade de cada um,
fortalecendo sua autonomia, seu direito de agir e pensar. Como destacado por Trindade (2008) o trabalho
interdisciplinar é:
[…] uma atitude de humildade diante dos limites do saber próprio e do próprio saber, sem deixar que
ela se torne um limite; a atitude de espera diante do já estabelecido para que a dúvida apareça e o
novo germine; a atitude de respeito ao olhar o velho como novo, ao olhar o outro e reconhecê-lo,
reconhecendo-se; a atitude de cooperação que conduz às parcerias, às trocas, aos encontros, mais das
pessoas que das disciplinas, que propiciam as transformações, razão de ser da interdisciplinaridade.
Mais que um fazer, é paixão por aprender, compartilhar e ir além. (p. 73)
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Um fator preponderante na prática dos professores que visem um trabalho pautado na
interdisciplinaridade é o ato de compartilhamento de informações com os demais membros da comunidade
escolar, sendo imprescindível que cada profissional transcenda suas especificidades visando oferecer um
atendimento integral a educação em nosso país. Para que isso ocorra Lück (1994) destaca a necessidade de
um:
[...] processo que envolve a interação e engajamento de educadores num trabalho conjunto, de
interação das disciplinas do currículo escolar entre si e com a realidade, de modo a superar a
fragmentação do ensino, objetivando a formação integral do aluno, afim de que possam exercer
criticamente a cidadania mediante uma visão global do mundo e serem capazes de enfrentar os
problemas complexos, amplos e globais da realidade atual (p. 64).
É preponderante a necessidade de tecer questionamentos sobre nossa própria prática. Como
salientado, por Fazenda (2003) “[...] o processo de passagem de uma didática tradicional para uma didática
transformadora, interdisciplinar supõe uma revisão dos aspectos cotidianamente trabalhados pelo professor”
(p. 78). Portanto, compete (também) a ele construir essa prática para além da repetição de regras e técnicas
de ensinar, torando-os mais capazes de inovar e atualizar continuamente as ações para melhoria da qualidade
do ensino.
2 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Autores como Fazenda (2008) e Trindade (2008) enfatizam a necessidade dos professores buscarem
relações entre as diversas áreas do conhecimento, no sentido de propiciar aos alunos uma compreensão mais
ampla, mas integrada do mundo e mais próxima da realidade. Entretanto, nesta pesquisa, notou-se que os
professores participantes, apesar de considerarem importante a interdisciplinaridade, na maioria das vezes
não fazem uma ligação entre os conteúdos e outras disciplinas, por assumirem dificuldades em estabelecer
essas relações. Entre os fatores que podem explicar os resultados da pesquisa em relação a ausência de
trabalhos interdisciplinares está a própria formação inicial do professor em que os conteúdos são trabalhados
de maneira compartimentalizada e em fragmentos da realidade. Em consequência disso, a proposta ruptura
com a fragmentação disciplinar que oportuniza interdisciplinaridade na maioria das vezes não se faz
presente nas escolas.
O fato é que não existem receitas prontas para o ensino, no entanto conhecer as diversas
possibilidades de trabalho em sala de aula, principalmente, o princípio da interdisciplinaridade é de extrema
importância para que o professor construa sua prática escolar da melhor forma possível.
A melhor capacitação dos profissionais numa perspectiva interdisciplinar poderia facilitar ou até
mesmo permitir o desenvolvimento de atividades englobando conhecimentos de diferentes áreas no âmbito
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escolar, o que requer, contudo propostas tanto na formação inicial quanto na formação continuada que visem
a inter-relações e interdependências das ciências.
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