Trata-se de solicitação aprovada pela Comissão de Agricultura e

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Trata-se de solicitação aprovada pela Comissão de Agricultura e
GRUPO II - CLASSE I – Plenário
TC no 007.748/2002-0 (c/ 02 volumes e 01 anexo)
Natureza: Recurso de Revisão (TCE)
Unidade: Município de Rancho Queimado (SC).
Responsável: Mério César Goedert (CPF 536.777.309-53).
Advogado constituído nos autos: Leandro Bernardino Rachadel
(OAB/SC nº 15.781).
Sumário: RECURSO DE REVISÃO. TOMADA DE CONTAS
ESPECIAL.
CONVÊNIO.
INEXISTÊNCIA
DE
DÉBITO.
CONHECIMENTO
DO
RECURSO. APRESENTAÇÃO
DE
JUSTIFICATIVAS RAZOÁVEIS APRESENTADAS PELO GESTOR.
CIRCUNSTÂNCIAS PRESENTES NOS AUTOS CAPAZES DE
ALTERAR
O
JULGAMENTO
PELA
REGULARIDADE.
PROVIMENTO DO RECURSO. COMUNICAÇÕES.
RELATÓRIO
Cuidam os autos de recurso de revisão interposto pelo Sr. Mério César Goedert, então Prefeito
do Município de Rancho Queimado/SC, contra os Acórdãos nºs 770/2003 e 267/2005, ambos da 2 a
Câmara, com fulcro nas razões e documentos presentes às folhas 1/60 (Anexo 1) destes autos.
2.
Transcrevo, com fundamento no art. 1º, § 3º, inciso I, da Lei nº 8.443/1992, a instrução
elaborada na 1ª Diretoria Técnica da Secretaria de Recursos (anexo 1, fls. 64/71):
“HISTÓRICO
2. Cuidam os autos da tomada de contas especial instaurada por esta Casa contra o Sr.
Mério César Goedert, em razão da conversão do processo de denúncia determinada pelo
Acórdão n.º 1.528/2002-TCU-Plenário (fl. 225, Vol. 1), em face de irregularidades na
execução do Convênio n.º 638/2000, no valor de R$ 50.000,0, objetivando a reconstrução
de cinco pontes sobre os rios Scharf, dos Quatis, Bonito, da Areia e do Mato Francês.
3. O Acórdão n.º 770/2003 – TCU – 2.ª Câmara, ora atacado, deliberou no seguinte
sentido:
(...)
9.1. julgar as presentes contas irregulares e condenar o Sr. Mério César Goedert ao
pagamento da quantia de R$ 19.834,47(dezenove mil e oitocentos e trinta e quatro reais e
quarenta e sete centavos), fixando-lhe o prazo de 15 (quinze) dias, a contar da notificação,
para comprovar, perante o Tribunal (art. 214, inciso III, alínea "a" do Regimento Interno), o
recolhimento da dívida aos cofres do Tesouro Nacional, atualizada monetariamente e
acrescida dos juros de mora calculados a partir de 12/03/2001 até a data do recolhimento, na
forma prevista na legislação em vigor;
9.2. aplicar ao responsável a multa prevista no art. 57 da Lei n.º 8.443/92 c/c o art. 267 do
Regimento Interno, arbitrando-lhe o valor de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais),
correspondente a aproximadamente 10 % do valor atualizado do débito, fixando-lhe o prazo
de 15 (quinze) dias, a partir da notificação, para que comprove, perante o Tribunal (art. 214,
III, alínea "a" do Regimento Interno), seu recolhimento aos cofres do Tesouro Nacional,
atualizado monetariamente a partir do dia seguinte ao término do prazo ora fixado, até a data
do efetivo pagamento;
(...)
4. Irresignado com os termos do Acórdão, o Sr. Mério César Goedert interpôs Recurso de
Reconsideração, tendo o Tribunal conhecido do Recurso e no mérito negando lhe
provimento.
5. Ainda inconformado, o responsável interpôs Recurso de Revisão, às fls. 1/14 do Anexo
1, o qual foi admitido pelo Relator, conforme Despacho à fl. 62 do Anexo 1.
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TC-007.748/2002-0
ANÁLISE DO RECURSO
2.1.
Alegações de defesa
6. O responsável apresenta, em síntese, as seguintes alegações:
- por meio de processo licitátório, contando com os Recursos disponíveis em caixa,
contratou a empresa Tecnocasa Engenharia Ltda., que apresentou a proposta de
menor preço, no valor de R$ 54.280,00;
- fatos naturais supervenientes inviabilizaram o aproveitamento da estrutura
remanescente da Ponte sobre o Rio Bonito, impossibilitando a sua recuperação, por
consequência foi elaborado um novo projeto com especificação de todo recurso
técnico para construção de uma ponte de concreto armado na localidade de Rio
Bonito;
- analisando-se o Projeto apresentado, e diante da maior conveniência para
administração pública municipal, o Recorrente determinou que a empresa vencedora
da licitação, com os recursos possíveis e até então disponíveis para aquela ponte,
desse início à execução do projeto, o que resultou na realização dos serviços iniciais
até a execução das cabeceiras;
- salienta que não havia outra opção a ser tomada naquele momento, posto que a
reconstrução já não era mais possível quando se iniciou a execução do contrato,
como já mencionado, o que demonstra a ocorrência de um típico caso de força maior;
- ressalta que não mediu esforços no sentido de buscar recursos junto ao Governo
Federal, para conclusão da obra em questão;
- posteriormente, novamente, as chuvas provocaram danos em uma das cabeceiras
então construídas, mas que era e de fato foram perfeitamente recuperadas.
- assinala que em seu 2º mandato firmou convênio com o Governo do Estado de
Santa Catarina para dar continuidade à execução da conhecida Ponte do Rio Bonito,
aproveitando a parte já construída pela empresa Tecnocasa Engenharia Ltda., o que
estaria evidenciado no memorial descritivo do projeto licitado, itens 3.1 e 3.2 (fls.
27/28 do Anexo 1), mencionando-se nos seguintes termos:
(...)
"0 local de implantação da ponte encontra-se preparado para os trabalhos de
desenvolvimento das obras, necessitando apenas a realização da remoção de partes de uma
estrutura de concreto armado já executada que sofreu adensamento e deslocamento de
seu local de original decorrente uma grave enxurrada."
Mais adiante, constou no item 'LOCAÇÃO', ponto '3.2':
"A locação das fundações deverá estar orientada pelo eixo da rodovia existente e pelo
posicionamento das cabeceiras existentes. Essas cabeceiras constituem-se em paramentos
mistos de concreto e alvenaria de pedras argamassadas presentes nas duas cabeceiras da
ponte." (sublinhado)
Corroborando o efetivo aproveitamento das cabeceiras já existentes, segue em anexo (Doc.
02), declaração firmada em 29.04.2008 pelo engenheiro Wolnei Moreira, CREA/SC 27.6183, responsável técnico da empresa EPT Engenharia e Pesquisas Tcnológica S/A, vencedora
do certame 01/2004 (Docs. 01), dando conta de que "atendendo ao que constou no próprio
projeto da obra, as cabeceiras já construídas anteriormente e existentes no local foram
completamente aproveitadas na construção da nova ponte.";
(...)
- conclui que se a condenação for mantida estará o recorrente pagando do seu próprio
bolso parte da obra efetivamente incorporada ao patrimônio municipal, o que seria
inadmissível;
- ademais, menciona diversas deliberações desta Corte julgando regulares com
ressalva as contas dos gestores, quando comprovada a aplicação dos recurso, ainda
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que fora do prazo, com desvio de objeto ou que os recursos foram insuficientes para
a sua conclusão;
- quanto à suposta aquisição indevida de materiais de construção para as demais
pontes (R$ 1.930,47) afirma que esses serviram para execução de pontes nas mesmas
localidades daquelas que haviam sido objeto do convênio em questão, motivo pelo
qual quando da prestação de contas, inadvertidamente o setor contábil/financeiro
especificou estes gastos;
- ressalta que esses materiais foram adquiridos com recursos do município,
porquanto seria descabida a devolução dos recursos.
7. Por fim, pede que seja conhecido o presente Recurso de Revisão, dando-lhe
provimento no sentido de que, mesmo com eventuais ressalvas, julgue regulares as contas,
sem imputação de débito. Em caso adverso, que seja reconhecido a boa-fé do Recorrente,
possibilitando o recolhimento de eventual débito atualizado monetariamente, julgando, em
consequência, as contas regulares com ressalva, dando-se quitação ao Recorrente.
2.1.2 Análise.
8. A irregularidade das presentes contas tem como cerne a execução parcial de um dos
itens do objeto conveniado, ou seja, invés de reconstruir a ponte sobre o Rio Bonito,
limitou-se a construir tão-somente as cabeceiras. Essa ocorrência foi caracterizada como
dano, no valor total da obra, em parte porque as obras foram parcialmente destruídas pelas
chuvas e também em face da pouca probabilidade de seu aproveitamento futuro.
9. Quanto à conduta do responsável, ficou assente nos autos que o ex-Prefeito não se
beneficiou dos recursos federais, embora tenha aplicado os recursos de forma diversa da
pactuada. Em conclusão, o Relator assim caracterizou a sua conduta:
(...)
6.Considero que não se pode tolerar a falta de zelo na utilização dos cada vez mais parcos
recursos públicos disponíveis. De antemão, já se sabia que aquele montante não era
suficiente para a construção da ponte e, mesmo assim, o gestor municipal determinou que a
obra tivesse início, mesmo ciente que ela não atenderia à finalidade para a qual os recursos
foram repassados. Os valores foram transferidos para o município para que um determinado
objetivo fosse atingido, beneficiando a comunidade local. Mesmo sabendo que aquele
objetivo não seria alcançado, o Prefeito gastou os recursos numa obra que não trouxer
qualquer benefício à população e que já se encontra parcialmente destruída.
(...)
10. Nesta oportunidade, a defesa do responsável visa, primeiramente, elidir a hipótese de
dano. Nesse sentido, juntou elementos para demonstrar que, posteriormente, fora elaborado
um novo projeto e, no exato local, fora construída uma ponte, aproveitando as cabeceiras
então construídas. A comprovação desse fato cinge-se, basicamente, ao Memorial
Descritivo do projeto estrutural da ponte em concreto armado que teria sido construída e as
declarações constantes às fls. 39 e 42 do Anexo 1, conforme já relatado nas razões de
justificativas.
11. Desde logo, ressalto que os elementos juntados aos autos pelo responsável são
insuficientes para elidir a irregularidade que fundamentou o Acórdão ora recorrido. De
fato, conforme consignado pelo Relator, é evidente nos autos a falta de zelo na aplicação
dos recursos conveniados.
12. Nesse sentido, é relevante destacar que os recursos do Convênio foram supostamente
utilizados em uma obra sem projeto. Isso agrava a situação do gestor porque não se trata
tão-somente da aplicação de recursos em uma obra que ficou inacabada, mas também da
execução parcial de obra sem projeto. Isso, por si, já tornaria incerto o aproveitamento
presente e futuro do investimento inicialmente realizado.
13. Aliás, a inexistência de projeto quando da construção das cabeceiras da ponte do Rio
Bonito resta evidente. Essa assertiva ressai do fato de não constar nos autos o projeto que
contemplava as cabeceiras então construídas e também do fato da Tomada de Preço, objeto
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do Edital n.º 001/2004 (fls. 11/24 Anexo 1), ter licitado um projeto efetivamente novo,
elaborado em 2004, enquanto o Plano de Trabalho integrante do Convênio n.º 638/2000
fora elaborado em dezembro 2000.
14. Conclusivamente, os elementos juntados aos autos são insuficientes para afastar a
irregularidade, posto que os recursos financeiros empregados na construção das cabeceiras
da ponte sobre o Rio Bonito não trouxe benefícios a população. Inclusive porque ainda
subsiste incerteza quanto ao aproveitamento das obras inicialmente realizadas, visto que ao
menos uma das cabeceiras foi danificada pelas chuvas, conforme evidenciado nas fotos 3 a
7, às fls. 6/8 do Vol. Principal. Há, também, diferenças marcantes quanto à idade e
materiais utilizados na construção das cabeceiras da ponte mostradas nas fotos constantes à
fl. 46 do Anexo 1, indicando um baixo aproveitamento das obras realizadas com os
recursos do Convênio.
15. Ademais, pesa contra o recorrente o valor das obras remanescente e as que já teriam
sido executadas. É que a construção das cabeceiras teria custado R$ 17.904,00, enquanto o
projeto licitado fora contratado por R$ 188.050,08. Portanto, a obra licitada visando a
construção da ponte em concreto armado não pode ser entendida como obras
complementar, em face da pouca expressividade das obras já executadas e por se tratar de
um projeto efetivamente novo e diverso do iniciado. Isso demonstra a má utilização dos
recursos do Convênio, ante a total ausência de efetividade do gasto realizado.
16. Entretanto, mesmo que o débito não seja afastado, o recorrente solicita o
reconhecimento da boa-fé em sua conduta, possibilitando, assim, o recolhimento do débito
atualizado monetariamente, julgando, em consequência, as contas regulares com ressalva,
dando-lhe quitação.
17. Cabe esclarecer que o pedido do recorrente decorre do disposto no § 2º do art. 12 da
Lei n.º 8.443/92 que prescreve que “reconhecida pelo Tribunal a boa-fé, a liquidação
tempestiva do débito atualizado monetariamente sanará o processo, se não houver sido
observada outra irregularidade nas contas”. Esse procedimento está bem detalhado no
RI/TCU, especialmente nos §§ 2º, 3º, 4º e 5º do art. 202.
18. Entretanto, regimentalmente, a oportunidade para concessão do benefício previsto no §
4º do art. 202 do RI/TCU já estaria superada. Nota-se que o Tribunal poderia,
preliminarmente, ter decidido pela rejeição das alegações de defesa e fixado novo prazo
para a devolução da mencionada quantia nas condições previstas no §4º do citado artigo,
hipótese em que o débito poderia ser liquidado sem acréscimo de juros e as contas, em
conseqüência, julgadas regulares com ressalva.
19. Todavia, o Relator decidiu pelo rito previsto no § 6º do art. 202 do RI/TCU, julgando
em definitivo as contas do responsável, embora não tenha afastado expressamente a
hipótese da boa-fé na conduta do gestor.
20. Neste momento, dois quesitos são relevantes para o deslinde da questão:
a) a boa-fé na conduta do gestor pode ser reconhecida em qualquer fase do processo de
tomada de contas especial? e
b) houve boa-fé na conduta do recorrente, considerando que o Relator não examinou
expressamente essa questão?
21. Em relação a boa-fé, é decorrência do princípio da ampla defesa a inexistência de óbice
ao seu reconhecimento em qualquer fase processual. Todavia, isso implicará na
desconstituição da deliberação definitiva e prolação de outra, de natureza preliminar,
observando o rito previsto no § 2º do art. 12 da Lei n.º 8.443/92 c/c os §§ 2º, 3º, 4º e 5º do
art. 202.
22. Quanto à conduta do gestor, este Tribunal já deliberou em outras oportunidades que a
responsabilidade de agentes que praticam atos que se sujeitam ao controle do TCU é
subjetiva (Acórdão n.º 2006/2006-Plenário). Porquanto, devem estar presentes à conduta
dos gestores públicos os seguintes elementos, para que se possa apená-los:
a) ação comissiva ou omissiva e antijurídica;
b) existência de dano ou infração a norma legal, regulamentar ou contratual
(irregularidade);
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c) nexo de causalidade entre a ação e a ilicitude verificada; e
d) dolo ou culpa (negligência, imprudência ou imperícia) do agente.
23. No caso em exame, os elementos objetivos para avaliação da conduta do gestor ressai,
especialmente, do Relatório e Voto que fundamentaram o Acórdão ora recorrido. Nesse
sentido, ficou consignado no Voto as seguintes premissas:
a) o ex-Prefeito não se beneficiou dos recursos federais, embora tenha aplicado os recursos
de forma diversa da pactuada;
b) houve falta de zelo na utilização dos recursos públicos; e
c) o Prefeito gastou os recursos numa obra que não trouxer qualquer benefício à população
e que já se encontra parcialmente destruída.
24. Noto, pois, ausência de elementos que possam caracterizar a conduta do gestor, como
dolosa. Por conseguinte, não havendo dolo, igualmente, não há má-fé.
25. Porquanto, é imperativo, se reconhecida a boa-fé do recorrente, que lhe conceda a
oportunidade de sanear os autos, nos termos do disposto no § 2º do art. 12 da Lei n.º
8.443/92 c/c os §§ 2º, 3º, 4º e 5º do art. 202 RI/TCU.
CONCLUSÃO
26. Desse modo, submeto os autos à consideração superior, propondo, com fundamento no
art. 32, inciso III, e art. 35 da Lei n.º 8.443/92, conhecer do Recurso de Revisão interposto
pelo responsável, para, no mérito, dar-lhe provimento parcial e, em conseqüência:
a) tornar insubsistente o Acórdão n.º 770/2003-TCU-2ª Câmara e, em novo
julgamento, com fundamento no § 3º do art. 202 do RI/TCU, rejeitar as alegações de
defesa apresentadas pelo Sr. Mério César Goedert, fixando lhe o prazo de 15 dias
para o recolhimento da quantia de R$ 19.834,47(dezenove mil e oitocentos e trinta e
quatro reais e quarenta e sete centavos), a contar da notificação, para comprovar,
perante o Tribunal (art. 214, inciso III, alínea "a" do Regimento Interno), o
recolhimento da dívida aos cofres do Tesouro Nacional, atualizada monetariamente a
partir de 12/03/2001 até a data do recolhimento, na forma prevista na legislação em
vigor;
b) comunicar ao responsável, nos termos dos §§ 4º e 5º do art. 202 do RI/TCU que a
liquidação tempestiva do débito atualizado monetariamente, não havendo outras
irregularidades, saneará o processo e o Tribunal poderá julgar as contas regulares
com ressalva, dando lhe quitação; e
c) restituir os autos ao Relator a quo com vistas ao prosseguimento do julgamento do
feito.”
3.
Os Srs. Diretor da 1ª Diretoria Técnica e Secretário da Serur manifestaram-se contrários à
análise e proposta da instrução acima transcrita, não havendo como agasalhar a pretensão da instrução em
infirmar o Acórdão recorrido, uma vez que não há como reconhecer a boa-fé objetiva do recorrente.
4.
Nesse sentido, o Diretor da 1a. DT propõe que seja negado provimento ao recurso em
apreço.
5.
Por sua vez, a Ilustre Representante do Ministério Público junto ao TCU, Procuradora
Cristina Machado da Costa e Silva, concluiu pelo provimento do presente recurso, e a conseqüente
regularidade com ressalva destas contas, considerando que os atos de gestão do Responsável podem ser
reavaliados, já que as impropriedades verificadas nas ações por ele empreendidas podem ser mitigadas
em vista das circunstâncias fortuitas, como também do comprovado aproveitamento da parcela da obra
antes executada, e da desproporção que sobreviria pela mácula geral das contas por motivo que pode ser
considerado acessório.
6.
Transcrevo, a seguir, o Parecer da Representante do Parquet:
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“O aspecto determinante da imputação de irregularidade às contas do Senhor
Mério César Goedert, ex-Prefeito Municipal de Rancho Queimado/SC, e da conseqüente
condenação a ressarcimento de débito no valor integral dos recursos previstos no Convênio n.º
638/2000 para a reconstrução da ponte sobre o Rio Bonito, consistiu, nos termos da
deliberação inicial do TCU e de sua confirmação na fase de recurso de reconsideração –
Acórdãos n.ºs 770/2003 e 267/2005 da 2.ª Câmara –, em considerar que a finalidade do ajuste
não teria sido atingida em relação a esse objeto, uma vez que as cabeceiras construídas por
iniciativa exclusiva do gestor municipal, em parte destruídas pelas chuvas supervenientes,
teriam caracterizado desperdício de recursos públicos ante a ausência de benefícios à
comunidade e a pouca probabilidade de seu aproveitamento futuro.
2.
Em segundo plano, houve também condenação em débito, mas acerca de
aquisição indevida de materiais de construção com parcela dos recursos do convênio e da
contrapartida municipal.
3.
Agora em sede de Recurso de Revisão, traz o responsável um conjunto de
argumentos com o objetivo de evidenciar a regular aplicação dos recursos impugnados,
fundamentado principalmente nas circunstâncias de que, nas providências adotadas para
recuperar e viabilizar o empreendimento, foi elaborado e executado novo projeto de construção
com aperfeiçoamentos técnicos em relação à concepção original da ponte, no qual, sobretudo,
houve aproveitamento das cabeceiras (uma integralmente e outra em parte recuperada).
4.
Ao apreender novamente os fundamentos fáticos e jurídicos que nortearam
o julgamento desta Tomada de Contas Especial e reexaminá-los em confronto com as recentes
questões trazidas no recurso de revisão, consignamos de início que o ânimo próprio do gestor
municipal à época em construir apenas as duas cabeceiras da ponte Rio Bonito foi avaliado
pelo TCU como reprovável em grau de irregularidade em boa parte pela incerteza de sua
utilidade técnica (e, em conseqüência, pela ausência de benefícios à comunidade), agregada ao
conhecimento que detinha o responsável a respeito da insuficiência dos recursos para cumprir a
reconstrução como estava prevista no convênio e à falta de autorização prévia do órgão
concedente para executar apenas aquela porção do objeto do convênio.
5.
Entretanto, a nosso ver, deixa de subsistir a incerteza de utilidade das
cabeceiras ante a prova técnica objetiva de que efetivamente houve aproveitamento de
elemento estrutural anterior. De fato, confirmam-se nos autos do Anexo 1 as declarações nesse
sentido dos engenheiros que atuaram na execução e na fiscalização da obra (fls. 39 e 42) pelo
teor do memorial descritivo da nova ponte, em especial quando se refere: a) ao local de
implantação da ponte, consignando que “encontra-se preparado para os trabalhos de
desenvolvimento das obras, necessitando apenas da realização da remoção de partes de uma
estrutura de concreto armado já executado que sofreu adensamento e deslocamento de seu
local original decorrente de uma grande enxurrada” (ou seja, houve aproveitamento integral da
outra cabeceira; subitem 3.1 à fl. 27); e b) “aos parâmetros mistos de concreto e alvenaria de
pedras argamassas presentes nas duas cabeceiras da ponte” (subitem 3.2 à fl. 28). Confirmamse, também, pelas fotografias da nova ponte (fl. 46), em que se vê a cabeceira reconstruída em
concreto (foto superior) e a cabeceira que existia e foi aproveitada, constituída de concreto e
alvenaria de pedra (foto inferior).
6.
Não se deve ignorar, ainda, que a reconstrução de uma das cabeceiras – a
que sofreu adensamento e deslocamento de sua posição original – esteve vinculada ao caso
fortuito de enchentes ocorridas à época e a aspectos técnicos construtivos, sem nexo de
causalidade com alguma conduta culposa do gestor. Noutras palavras, seria impróprio inferir
que o inaproveitamento da cabeceira se teria dado em virtude da execução parcial das obras do
convênio, pois não se pode afirmar com certeza que o evento fortuito não seria factível de
ocorrer mesmo no decurso de uma execução integral da ponte, no estágio da obra em que
estivessem concluídas apenas as cabeceiras.
7.
Reportando-se à iniciativa de executar apenas as cabeceiras, agora
associada ao contexto de efetiva utilidade técnica de parcela da obra, pode-se dizer que pecou
o gestor municipal por não ter observado, perante o órgão concedente dos recursos financeiros,
as formalidades regulamentares acerca das alterações da concepção original do
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empreendimento e da correspondente autorização prévia para efetuar as despesas naquele
momento. Avaliamos que a conduta do responsável, por estar imbuída do espírito de
continuidade da obra e aproveitamento futuro dos recursos que decidiu investir, não subsiste
como reprovação suficiente a macular de irregularidade as contas, até mesmo pelos efeitos
também tardios que seriam de se esperar de medidas alternativas no tocante aos benefícios à
comunidade.
8.
Ora, é razoável entender que o fato de não ter havido um benefício imediato
ou a curto prazo para os usuários da ponte não está necessariamente atrelado aos gastos feitos
na construção apenas das cabeceiras. Isso porque, mesmo sob a alternativa de submeter
previamente a questão ao âmbito do órgão concedente, é sabido que a alocação de recursos
financeiros adicionais, em particular de montante bem superior ao antes requerido por causa
das alterações locais advindas das enchentes, demandaria período significativo de tempo e
medidas técnicas e jurídicas para concretizar-se, a exemplo de readequação ou reelaboração de
projetos, encaminhamento para aprovação na instância concedente, previsão orçamentária,
novo certame licitatório e outras providências pertinentes.
9.
A propósito da matéria, não nos afigura exata a afirmativa da Unidade
Técnica de que, em relação à ponte original, não teria havido projeto (itens 12 e 13 à fl. 68 do
Anexo 1). Constam dos presentes autos (fls. 184/213 do v.p. e fls. 254/305 do vol. 1) o projeto
de arquitetura das cinco pontes indicadas no convênio, o memorial descritivo dos itens que
compõem a execução de cada uma delas, as planilhas com discriminação de serviços, materiais
e respectivos preços unitários e, ainda, os projetos de superestrutura e infra-estrutura da ponte
do Rio Bonito. Seria então mais adequado dizer que, relativamente à nova configuração do
local da obra que adveio das enchentes, principalmente em virtude de erosões de terreno, não
constam dos autos os elementos de projeto indicativos das alterações dos serviços inicialmente
previstos, como volumes adicionais de escavações, terraplenagens, movimentos de terra,
cortes ou aterros e respectivos preços de serviços e materiais.
10.
Por sua vez, os efeitos das enchentes por alterar a configuração inicial do
local da obra induzem justificativas aceitáveis para a aquisição adicional dos materiais de
construção reputada irregular e com incidência de débito no julgamento das contas. Assim
entendemos pois, se os materiais de construção e a mão-de-obra previstos no contrato firmado
com a empresa Tecnocasa Engenharia Ltda. (fls. 244/305 do vol. 1) eram exatamente os
necessários à reconstrução da ponte conforme prevista no convênio, a superveniência de novos
serviços e, conseqüentemente, de materiais em decorrência dos trabalhos exigidos para
contornar os efeitos das enchentes, ou melhor dizendo, os acréscimos de quantitativos de
serviços e de materiais em relação aos itens estimados nas planilhas do contrato reduziriam o
resultado final do empreendimento que se executou (a construção de duas cabeceiras),
requerendo, assim, o gasto adicional dos materiais à parte pela Prefeitura seja com recursos
federais seja por meio da contrapartida.
11.
De todo o modo, é de notar-se que a aquisição de materiais de construção à
parte não configura, em qualquer hipótese, desvio de finalidade ou de objeto, segundo a
terminologia empregada na jurisprudência do TCU em situações semelhantes, cujos marcos
são os Acórdãos n.ºs 708/97-TCU-2.ª Câmara e 349/99-TCU-1.ª Câmara (contas irregulares,
com débito, no desvio de finalidade; e contas regulares com ressalva no desvio de objeto).
12.
Na noção de finalidade do ajuste, há um sentido de generalidade e amplitude
de uma ação pública, inserida em determinado segmento da atividade administrativa, como
saúde, educação, habitação, transporte e saneamento básico, entre outros. A finalidade é
descrita, por exemplo, como melhoria das condições hospitalares, incremento do atendimento
educacional, construção de habitações populares, melhoria do sistema de transporte de
passageiros urbanos e da infra-estrutura de saneamento básico e assim por diante. O objeto do
ajuste, por sua vez, é um desdobramento da finalidade, discriminado em metas ou etapas
objetivas a serem atingidas, em conformidade com o plano de trabalho, a exemplo de aquisição
dos equipamentos de laboratório indicados, construção de quantidade determinada de escolas,
construção de residências de certo padrão, modernização de ônibus coletivos nas características
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especificadas, implantação de certa extensão de rede de esgoto sanitário, galerias de águas
pluviais ou sistema de tratamento d’água ou de esgoto.
13.
No caso concreto dos presentes autos, os materiais de construção adquiridos
eram compatíveis com o objeto de reconstrução das pontes previstas no convênio, entre elas a
do Rio Bonito, prestando-se daí à finalidade de dotar o município de infra-estrutura adequada
de transporte.
14.
Com mais razão, não seria viável atribuir natureza de débito aos valores
incorridos na aquisição dos materiais, porquanto a hipótese seria plausível se a construtora
tivesse recebido pagamentos por materiais que ela própria não adquiriu ou, então, se os
materiais fossem comprovadamente desnecessários à obra.
15.
Por fim, descaracterizada a incidência de débito em virtude das
considerações expostas neste parecer, ponderamos que os atos de gestão do Senhor Mério
César Goedert podem ser reavaliados, no universo das ações por ele empreendidas para a
execução do objeto do Convênio n.º 638/2000, como regulares com ressalva. Entre as cinco
pontes previstas no ajuste, apenas a execução parcial da obra do Rio Bonito logrou
impropriedades, que podem ser mitigadas em vista das circunstâncias fortuitas (enchentes), do
comprovado aproveitamento da parcela da obra antes executada e, ainda, da desproporção que
sobreviria pela mácula geral das contas por motivo assim considerado acessório.
16.
Diante do exposto, esta representante do Ministério Público manifesta-se
por que sejam adotadas as seguintes medidas:
a) conhecer do Recurso de Revisão interposto pelo Senhor Mério César Goedert para, no
mérito, dar-lhe provimento, tornando-se insubsistentes o Acórdão n.º 770/2003-TCU-2.ª
Câmara e providências posteriores;
b) julgar regulares com ressalva as contas do responsável, dando-lhe quitação, com
fundamento nos arts. 16, inciso II, 18 e 23, inciso II, da Lei n.º 8.443/92;
c) dar ciência da deliberação ao recorrente e às instâncias relacionadas com o processo de
cobrança executiva (TC-012.309/2005-6, apenso).”
É o Relatório.
VOTO
Conheço do Recurso de Revisão, por preencher os requisitos de admissibilidade previstos nos
arts. 32, III e 35 III da Lei nº 8.443/1992.
2.
Examina-se recurso de revisão interposto pelo ex-Prefeito de Rancho Queimado/SC, Sr. Mério
César Goedert, tendo em vista o julgamento pela irregularidade destas contas, e sua condenação inicial e
em sede de recurso de reconsideração, no sentido de ressarcir o débito no valor total dos recursos
repassados por intermédio do Convênio nº 638/2000, que tinha por objeto a construção de cinco pontes
sobre os rios Scharf, dos Quatis, Bonito, da Areia e do Mato Francês, naquela comuna catarinense.
3.
Consoante decisão inicial desta Corte, a finalidade do ajuste não teria sido atingida, porquanto
as cabeceiras de uma das pontes, a saber, a ponte sobre o Rio Bonito, teriam sido construídas por
iniciativa exclusiva do ex-Prefeito e foram parcialmente destruídas por fortes chuvas ocorridas na
municipalidade. Nessa linha, este Tribunal havia caracterizado tal ação como desperdício de recursos,
ausência de benefícios à comunidade e inexistência de utilidade para aproveitamento futuro.
4.
Ocorre que, conforme anotado no Parecer da Ilustre Procuradora Cristina Machado da Costa e
Silva, e após a análise dos novos elementos trazidos aos autos pelo responsável, restou comprovada a
utilidade das obras realizadas naquela oportunidade, tendo sido, inclusive, consignado por engenheiros
que fiscalizaram o empreendimento, vez que ratificaram a reutilização das cabeceiras da ponte sobre o
Rio Bonito, anteriormente construídas pelo ex-Prefeito, não obstante alguns danos em decorrência das
enxurradas verificadas na região.
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC-007.748/2002-0
5.
De se consignar que, de fato, não houve, por parte do administrador público local, a
formalização junto ao órgão repassador das alterações sofridas na concepção original das obras sobre o
Rio Bonito, fato que, nesta oportunidade, como medida excepcional, deve ser relevado por esta Corte, por
não ter o condão de macular as contas em apreço, pois os objetivos do convênio foram atingidos, ainda
que em momento posterior, levando-se em conta, ainda, as chuvas supervenientes, que prejudicaram a
execução das obras.
6.
Cabe destacar, de acordo com o Parecer da Representante do Parquet especializado, que
mesmo que o responsável tivesse submetido as modificações havidas no empreendimento ao órgão
concedente, a alocação de novos recursos financeiros, e em valores bastante superiores aos originalmente
solicitados, demandaria tempo significativo para sua total realização.
7.
Constatadas, então, a existência de projetos, a obtenção final dos resultados previstos, a
compatibilidade dos materiais de construção adquiridos para os empreendimentos previstos no convênio,
além de terem sido adequadas as obras das cinco pontes originalmente previstas no convênio, não
obstante os problemas ocorridos com a execução parcial da ponte sobre o Rio Bonito, deve-se considerar
atendida a finalidade maior do ajuste, qual seja, a de dotar o município de infra-estrutura de transporte.
8.
Dessa forma, ao adotar como razões de decidir a proposta contida no Parecer da Representante
do MP/TCU, e tendo em vista que foram trazidos novos elementos aos autos os quais lograram justificar a
boa-fé e regular aplicação dos recursos repassados, ainda que com ocorrência de atraso na conclusão do
empreendimento, decorrente, principalmente, de motivos alheios à vontade do ex-Prefeito, entendo que
quanto ao mérito, deve-se dar provimento ao pleito formulado pelo interessado,.
Por todo o exposto, Voto por que o Tribunal adote o Acórdão que ora submeto à deliberação
deste Colegiado.
TCU, Sala das Sessões, 2 de julho de 2008.
RAIMUNDO CARREIRO
Ministro-Relator
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC-007.748/2002-0
ACÓRDÃO Nº 1269/2008- TCU - PLENÁRIO
1. Processo no TC 007.748/2002-0 (c/ 02 volumes e 01 anexo)
2. Grupo II - Classe I – Recursos de Revisão (TCE)
3. Responsável: Mério César Goedert ex-Prefeito (CPF nº 536.777.309-53)
4. Entidade: Município de Rancho Queimado (SC).
5. Relator: Ministro Raimundo Carreiro
5.1 Relator da deliberação recorrida: Ministro Ubiratan Aguiar
6. Representante do Ministério Público: Procuradora Cristina Machado da Costa e Silva
7. Unidades Técnicas: Secretaria de Recursos/Secex-SC
8. Advogado constituído nos autos: Leandro Bernardino Rachadel (OAB/SC nº 15.781)
9. Acórdão:
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revisão em Tomada de Contas Especial,
interposto pelo Sr. Mério César Goedert, contra os Acórdãos n os 770/2003 e 267/2005, ambos da
2ªCâmara,
ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão Plenária, diante das
razões expostas pelo Relator, em:
9.1. conhecer do presente Recurso de Revisão, com fundamento no art. 32, inciso III da Lei nº
8.443/1992, para, no mérito, dar-lhe provimento, tornando insubsistente o Acórdão nº 770/2003-TCU-2ª.
Câmara;
9.2. julgar regulares com ressalva as contas do Sr. Mério César Goedert, dando-lhe quitação, com
fulcro nos arts. 16, inciso II, 18 e 23, inciso II, da Lei nº 8.443/1992; e
9.3. dar ciência deste Acórdão, bem como do Relatório e Voto que o fundamentam, ao interessado,
bem como às instâncias relacionadas com o processo de cobrança executiva (TC 012.309/2005-6), apenso
a estes autos.
10. Ata nº 26/2008 – Plenário
11. Data da Sessão: 2/7/2008 – Sessão Ordinária
12. Código eletrônico para localização na página do TCU na Internet: AC-1269-26/08-P
13. Especificação do quórum:
13.1. Ministros presentes: Marcos Vinicios Vilaça (na Presidência), Valmir Campelo, Guilherme
Palmeira, Benjamin Zymler, Augusto Nardes, Aroldo Cedraz e Raimundo Carreiro (Relator).
13.2. Auditor convocado: Augusto Sherman Cavalcanti.
13.3. Auditores presentes: Marcos Bemquerer Costa e André Luís de Carvalho.
MARCOS VINICIOS VILAÇA
na Presidência
RAIMUNDO CARREIRO
Relator
Fui presente:
MARIA ALZIRA FERREIRA
Procuradora-Geral, em exercício