Revista O Brasil Feito à Mão- no. 12

Transcrição

Revista O Brasil Feito à Mão- no. 12
Ano 4 - nº12 - Julho 2011
Year 4 - nº12 - July 2011
Entrevista com o estilista Ronaldo Fraga:
“Eu sou um artesão da moda”
Rede européia El Corte Inglés abre as
portas para o artesanato brasileiro
Uma viagem bela e rica à produção
artesanal de várias regiões do Brasil
Interview with stylist Ronaldo Fraga:
“I’m a fashion artisan”
European chain El Corte Inglés
opens its doors to Brazilian
handicraft
A beautiful and rich journey into
handicraft production throughout
Brazil
Editorial / Editorial 2
Artigo / Article 4
Oportunidades / Opportunities 8
Tesouros da floresta / Treasures of the forest 12
Arte em madeira / Art in wood 18
Tecidos e cores / Fabrics and colours 23
Dona Marlene / Mrs. Marlene 28
Cidade de teares / City of looms 33
Edição e projeto editorial / Ediction and editorial project
Instituto Centro Cape e Central Mãos de Minas
Editor / Editor
Carlos Moreira
Colaboradores / Colaborators
Antônio Siúves
Regiane Marques Sampaio
Fotografia / Photography
Alexandre Mota
Elsio Moriani
Fernando Chaves
Pedro Gil
Martinez Fotografia
Wilkerson Kuroki/Amazonastur
Revisão / Revision
COM! Soluções em Comunicação
Tradução de textos / Translation
Luiz Augusto Ferreira Araújo / Supernova SCI
Alpha Traduções
Diagramação e arte / Diagramming and graphic arts
Flávio Christo
Gráfica / Printing company
Difusora Editora Gráfica
Tiragem / Drawing
5.000 exemplares
Distribuição gratuita / Costless Distribution
Foto da capa: Divulgação / Associação Acreana Buriti da Amazônia
Elsio Moriani
Abrindo passagem / Making the way 36
Entrevista / Interview 40
Eu faço / I make 47
CENTRO CAPE MINAS GERAIS
Rua Grão Mogol, 662 - Sion
CEP 30310-010 - Belo Horizonte - MG
Tel. 55 31 3282 8300 Fax 55 31 3282 8301
CENTRO CAPE DISTRITO FEDERAL
SNC, Quadra 5, Bloco A, sala 212
Ed. Brasília Shopping
CEP 70710-500 - Brasília - DF
Tel. 55 61 3328 0621 Fax 55 61 3328 5802
SHOW ROOM ESTADOS UNIDOS
7 West 34th Street Suíte 725.1001
New York City - NY - Phone 917 282 5838
[email protected]
SHOW ROOM PORTUGAL
Parque Industrial Meramar IV
R. da Amendoeiras, / ZIP Code: 2645 097
Phone: 351 96 707 2538
[email protected]
www.centrocape.org.br
[email protected]
55 31 3281 6820
Editorial
O artesanato é uma atividade
desenvolvida em todo o país e com imenso
potencial para exportação e geração de emprego
e renda. Em dezembro de 2010, a Agência
Brasileira de Promoção de Exportações e
Investimentos (Apex-Brasil) teve a satisfação
de sediar, em Brasília, o evento de lançamento
da Associação Brasileira de Exportação de
Artesanato (Abexa) — a nova entidade nacional
criada com o objetivo de fortalecer as exportações
do artesanato brasileiro. Com a Abexa, pela
primeira vez, os artesãos exportadores passaram
a ser apoiados por uma entidade de âmbito
nacional.
Para nós, da Apex-Brasil, esse é um marco
muito importante para a internacionalização
do setor. Vimos apoiando as exportações de
artesanato há vários anos, e a nossa expectativa
é de que a criação da entidade fortaleça ainda
mais a promoção comercial do setor.
No início deste ano, a Apex-Brasil firmou
convênio com a Abexa para a execução de um
novo projeto para o setor, de dois anos de duração.
As metas para 2012 são de reunir 330 empresas
participantes e obter exportações de US$ 6,12
milhões, superando o valor de exportações (US$
3,12 milhões) alcançado pelas 163 empresas que
integraram, em 2010, os projetos da Apex-Brasil
para o setor.
Com o novo projeto, cujo foco será em
artesanatos de moda e de decoração com
maior valor agregado, artesanatos com forte
componente de design e artesanatos orientados
à tradição popular, a promoção comercial do
artesanato brasileiro no exterior será unificada,
fortalecendo a divulgação da imagem do
produto nacional. Algumas ações previstas são
a contratação de empresa de Relações Públicas
na Europa e nos Estados Unidos e de contêiner/
Handicraft is developed as an
activity throughout the entire country, having
great potential for exportation, employment
and income generation. In December of 2010, the
Brazilian Trade and Investment Promotion Agency
(Apex-Brasil) was glad to host the launching event
for Abexa (Associação Brasileira de Exportação
de Artesanato, Brazilian Handicraft Exportation
Association) in Brasília — a new national
organization with the purpose of strengthening
Brazilian handicraft exportations. Through
Abexa, exporting artisans have finally started
to receive support from a national organization.
Forus, fromApex-Brasil,this is a very important
landmark for the sector’s internationalization.
We’ve been supporting handicraft exportation
for many years, and our expectation is that
the creation of Abexa will strengthen the
sector’s commercial promotion even more.
In the beginning of this year, Apex-Brasil
established a partnership with Abexa in
order to execute a new two-year plan for
the sector. The goals for 2012 are to gather
330 participant companies and reach US$
6.12 million in exportations, surpassing the
exportation value (US$ 3,12 million) achieved
by the 163 companies which integrated
Apex-Brasil’s projects for the sector in 2010.
Through this new project, which will focus on
fashion and decoration handicraft with higher
aggregate value, on handicraft with strong
design components, and on popular traditionoriented handicraft, the overseas Brazilian
handicraft commercial promotion will be unified,
strengthening the image marketing for this
national product. Planned actions include hiring
Public Relation companies in Europe and in
the United States, as well as container/itinerant
stores in order to promote the products in several
loja itinerante para promover os produtos em
diversos países da Europa, além da participação
nas maiores feiras de artesanato do mundo, tais
como a Maison Object na França, a Ambiente e
a Tendence na Alemanha, a Bijoutex e a Intergift
na Espanha, a Las Vegas Show e a Gift Fair
nos Estados Unidos. Também serão realizadas
atividades de capacitação e desenvolvimento dos
artesãos. Além disso, estudos de mercado sobre
o setor estão sendo produzidos pela Unidade de
Inteligência Comercial e Competitiva da ApexBrasil.
Os países-alvo da parceria, definidos pelo
estudo de inteligência comercial desenvolvido
pela Agência são Alemanha, Espanha, Portugal,
França, Itália e Estados Unidos.
É importante ressaltar que a Abexa foi criada
após um trabalho de planejamento estratégico,
com base em análise profunda das necessidades
do setor (principalmente de capacitação) e de
novos direcionamentos que devem ser dados para
que o Brasil marque presença em todo o mundo
com a beleza, criatividade e diversidade de seu
artesanato.
European countries, besides participations in the
world’s largest handicraft fairs, such as Maison
Object in France, Ambiente and Tendence in
Germany, Bijoutex and Intergift in Spain, and Las
Vegas Show and Gift Fair in the United States. In
addition, qualification and development activities
will be offered for artisans. Market studies on the
sector are also being produced by Apex-Brasil’s
Commercial and Competitive Intelligence Unit.
The target countries for this partnership
are Germany, Spain, France, Italy and
the United States, selected through the
Agency’s
commercial
intelligence
study.
It is important to highlight that Abexa was
created through a strategic planning effort, based
on a profound analysis of the sector’s needs
(mainly concerning qualification) and of new
directions to be established in order to increase
the Brazilian handicraft footprint abroad,
leveraging its beauty, creativity and diversity.
Rogério Bellini
Diretor de Negócios da Apex-Brasil / Apex Brasil Business Director
FOTO / PHOTO
Divulgação/Apex-Brasil
OPORTUNIDADES E DESAFIOS
na exportação para grandes lojas de departamentos
Opportunities and challenges in exporting to large
department stores
ALEXANDRE DE BRITO SANTOS
Consultor do Centro Internacional de Negócios da Federação das Indústrias de Minas Gerais
(CIN/Fiemg)
Consultant to the International Business Center of the Federation of Industries in Minas Gerais
(CIN/Fiemg)
A tendência atual de valorização
da taxa de câmbio no Brasil tem levado os
exportadores, tanto da indústria como do
artesanato, a desenvolver novas estratégias de
competitividade para se manter no mercado
externo. Uma dessas estratégias é a concentração
de vendas em poucos clientes.
Neste caso, o objetivo dos empreendedores e
artesãos é manter a venda ao exterior competitiva
através de operações concentradas em poucos
clientes compradores. Assim, evita-se a dispersão
de esforços e de operações logísticas, concentrando
as operações em um único comprador ou em
poucos compradores. Este ganho financeiro advém,
principalmente, da redução de gastos em operações
complexas e pela queda nos gastos na contratação
de frete. O que ocorre é que ,naturalmente, quando
se tem várias cargas fracionadas para diferentes
destinos, sempre existe a possibilidade de perda de
eficiência na consolidação da carga.
Normalmente, como se tratam de pequenas
empresas e especialmente de artesanato, os
volumes embarcados são pequenos, o que exige
a consolidação da carga com outros produtos.
Esta consolidação envolve produtos diferentes, de
tamanhos e pesos distintos, o que acarreta custos
maiores.
Pelo lado dos compradores observa-se que,
em muitos casos, apenas uma empresa receptora
adquiriu toda a carga. Neste caso, o comprador
receberá toda a carga do container. Outra
possibilidade é que as cargas contidas tenham
vários destinos e, nesta situação, cada importador
deverá desembaraçar sua mercadoria.
4 artigo / article
The current trend of exchange rate
valuation in Brazil has led exporters both from
factories and from arts and crafts, to develop new
competition strategies in order to secure their places
in the external market. One of these strategies is
the concentration of sales around a few customers.
In this case, the aim of entrepreneurs and artisans
is to keep the international sales competitive
through operations concentrated around a few
buyers. This way the dispersion of efforts and
logistic operations is avoided, concentrating the
operations in a single buyer or around a few buyers.
This financial gain comes mainly from cutting off
costs in complex operations and from cutting off
expenses in freight contracting. What occurs is
that when you have many fractioned cargos to
different destinations, there is always the possibility
of loss of efficiency in the consolidation of cargo.
Usually, as we are talking about small
companies, especially arts and crafts ones,
the volume shipped is small, demanding the
consolidation of the cargo with other products.
Such consolidation involves different products of
different sizes and weight, leading to higher costs.
From the buyers’ side it is observed that,
in many cases, only one receiving company
has acquired the entire cargo. In this case, the
buyer will receive all the cargo in the container.
Another possibility is that the cargo in the
containers has many destinations and in this
situation, each importer shall clear its own goods.
As empresas que compram mercadorias de
diferentes vendedores procuram organizar e
gerenciar o processo de consolidação da carga no
país de origem das mesmas, pois neste caso o peso
do frete pode elevar sobremaneira os custos. Assim,
este comprador tende a contratar os serviços de
um operador logístico que será responsável pela
contratação do frete, consolidação da carga e
emissão da documentação.
Nesse processo de negociação os artesãos e
produtores vão vender para um único comprador
e vão utilizar um único operador logístico.
Isto torna a operação demasiado onerosa para
o produtor, uma vez que ele se defronta com
dois monopsonistas. Na literatura econômica,
monopsonista é a situação onde só existe um
comprador para vários vendedores. Neste caso,
parte importante da margem de lucro vai ser
transferida do produtor para o comprador. Os
produtores são obrigados a aceitar os preços
determinados tanto pela carga como pela operação
de transporte e distribuição.
Vender um número limitado de unidades para
um comprador significa que este comprador é, em
geral, uma organização que trabalha diretamente
com o consumidor, não necessitando de estoques
muito grandes de produtos. Nesta categoria estão
enquadradas as grandes lojas de departamentos, os
chamados magazines.
Na Europa e nos Estados Unidos eles se
confundem com a própria cidade onde estão
estabelecidos e se transformaram em referência
obrigatória para o turismo de compras. Em Paris,
os mais famosos são as Galeries Lafayette e o
Printemps, em Londres é a Harrods e, em Madrid,
o El Corte Inglés.
A estratégia de vendas destes grandes
magazines é oferecer uma gama de opções para
todos os consumidores, com áreas especializadas
em vestuário, cosméticos e perfumaria, vestuário
masculino, calçados, eletrônicos de consumo,
artefatos de decoração, artigos de casa de campo,
cama, mesa e banho, brinquedos e área gourmet.
Isto atende aos anseios dos consumidores que
buscam otimizar as compras e encontrar de tudo
no mesmo lugar. As grandes redes apostam em
temas da temporada e de alguma forma todas as
áreas ligadas à moda e à decoração deverão estar
de acordo com a linguagem da temporada.
Ao lado de produtos de consumo tradicionais,
aos quais freqüentemente estão incluídas algumas
ofertas interessantes para atrair o público,
estão expostos artefatos diferentes, produtos
Companies that bought products from many
different sellers try to organize and manage the cargo
consolidation product in the country of origin of
the products, as in this case the cargo weight might
increase costs exceedingly. This way, this buyer
tends to hire the services of a logistics operator that
will be responsible for contracting services of cargo,
cargo consolidation and documents issuance.
In this process of negotiation artisans and
producers sell to a single buyer and use a single
logistics operator. This makes operation too
costly to producers, since he has to deal with two
monopsonists. In economy literature, monopsonist
is the situation where there is only a single buyer
to many sellers. In this case, a significant portion
of the profit margin is transferred from the
producer to the buyer. Producers are obliged to
accept the prices determined both by the cargo
and by the transport and distribution operation.
Selling a limited number of units to one buyer
means that this buyer is. In general, an organization
that works directly with consumers, not requiring
large stocks of products. This category comprises
large department stores, called “stores”.
In Europe and in the United States they get
mixed with city where they are established and
become a mandatory reference of shopping
tourism. In Paris the most famous ones are
the Galeries Lafayette and Printemps, Harrods
in London and, in Madrid, El Corte Inglés.
Sales strategies of these large stores is offering
a range of options to all consumers with areas
specialized in clothing, cosmetics and perfumery,
men’s clothing, shoes, consumption electronics,
decoration items, country house items, bedding and
bath, toys and cookware. It fulfills the expectations
of consumers who seek to optimize shopping and
find everything at the same place. Large store
chains invest in season themes and, somewhat, all
the areas connected to fashion and decoration must
be in agreement with the language of the season.
Beside the traditional consumption products
to which some interesting offers are frequently
attached in order to attract audience, there
are different products, handicraft items often
originated from foreign countries and that
are extremely valued in European countries.
Over the last years, these large stores have
artigo / article
5
de artesanato geralmente originários de países
estrangeiros e que são extremamente valorizados
nos países europeus.
Nos últimos anos, estes grandes magazines
tem aberto espaço para exibições de artesanato
do Brasil. O nosso país esta na “moda”,
atraindo interesse estrangeiro por produtos que
reflitam o nosso ambiente cultural. Peças de
artesanato, vestuário, bijouteria e com materiais
brasileiros estão entre as mais demandadas pelos
consumidores. Contudo, o fechamento de um
contrato de venda é uma tarefa complexa para os
produtores. Embora valorizem a originalidade do
artesanato, os departamentos responsáveis pelas
compras tendem a adotar as mesmas estratégias
utilizadas em aquisições de grande volume – os
preços oferecidos são reduzidos e as condições de
pagamento, bastante rígidas.
Ofertas de compras incluem mercadorias que
serão pagas somente após efetiva venda, geralmente
ao fim da temporada. Ou seja, em muitas situações
cabe ao vendedor arcar com o capital de giro
e financiar as vendas a prazo. Eventuais peças
com defeito ou entregues fora do prazo são de
responsabilidade exclusiva do vendedor e geram
inclusive multas contratuais.
Por tudo isto apesar de ser um mercado em
expansão recomenda-se cautela na hora de assinar
um contrato com estas empresas. Como qualquer
outro comprador ela exige alta qualidade,
pontualidade na entrega e logística eficiente e
barata, não se responsabilizando por ocorridos
problemas durante o transporte.
Portanto, ainda que seja muito interessante
a negociação de um contrato com um grande
magazine, é importante que os produtores e
vendedores estejam atentos para as exigências e
imposições contratuais colocadas.
allowed some room display handicraft from
Brazil. Our country is fashionable, attracting
international interest to products that mirror
our cultural environment. Pieces of handicraft,
clothing and jewelry made with Brazilian
materials are among the most requested pieces by
consumers. However, signing a sales agreement is
a complex task to products. Although handicraft
originality is valued, departments responsible for
purchases tend to adopt the same strategies used
in large volume acquisitions – prices offered are
reduced and payment conditions are quite strict.
Purchase offers include products that will only
be paid after the sale is consolidated, generally
by the end of the season. That means, in many
situations sellers must have a substantial working
capital in order to support credit sales. Occasional
defective pieces or pieces not delivered on time
will be under the exclusive responsibility of
the seller and imply in contractual penalties.
For all that, although is it a market in expansion,
we recommend attention at signing contracts with
these companies. Just like any buyer, they demand
high quality, on-time delivery in addition to effective
and inexpensive logistics, not taking responsibility
for problems occurred during transportation.
Thus, even though the negotiation of a contract
with a large store is very interesting, it is important
that producers and sellers are attentive to the
contractual demands and impositions established.
Onde encontrar artesanato brasileiro tipo exportação
How can you find brazilian handicraft, prepared TO export
www.ecoarts.bys
www.brazilhandicraft.org.br
www.artest.com.br
www.fazerbrasil.org.br
www.projetoartbrasil.com.br
6 artigo / article
SEBRAE MAIS é gestão sob medida
para pequenas empresas
O Sebrae Mais é um programa nacional de consultoria sobre gestão.
São soluções práticas para modernizar a gestão, ideais para quem
não tem tempo: conteúdo aplicado imediatamente na empresa,
menos tempo em sala de aula e presença de um consultor dentro do
negócio, do diagnóstico aos resultados.
Sua empresa cresceu?
Acesse agora: www.sebraemg.com.br
Quem tem conhecimento vai pra frente | 0800 570 0800
Portas abertas na Europa
Open doors in Europe
Carlos Moreira
FOTOS / PHOTOS Divulgação – Centro Cape / Divulgação – Sebrae (DF)
POR /BY
O artesanato brasileiro está
atraindo novos olhares do mundo, a partir da
atenção que as pessoas começam a dispensar
à sustentabilidade e ao consumo consciente.
Originalidade, autenticidade cultural e o
trabalho manual são características cada vez mais
valorizadas por europeus e norte-americanos, com
reflexos no interesse de grandes redes de lojas
de departamento na produção artesanal, como a
El Corte Inglés (Portugal e Espanha) e a Macy’s
(Estados Unidos).
8 oportunidades / opportunities
Brazilian arts and crafts have
caught eyes from all over the world, derived from
the attention people start to pay to sustainability
and conscious consumption. Originality, cultural
authenticity and manual work are characteristics
more and more valued by Europeans and NorthAmericans, with reflections on the interest of large
department store chains towards arts and crafts
production, as it is occurring in El Corte Inglés
(Portugal and Spain) and Macy’s (United States).
Em maio último, uma missão de 14 compradores
da rede européia visitou o Brasil e participou de
rodadas de negócios nos Estados de Minas Gerais,
Ceará e Distrito Federal, onde foram montadas
exposições de produtos de diversas regiões do
Brasil. Os compradores, com até 4 milhões de
euros para aquisições, também visitaram ateliês e
oficinas de tecelagem e mobiliário no interior de
Minas Gerais.
O Instituto Centro de Capacitação e Apoio ao
Empreendedor (Centro Cape) já possui há mais
de dois anos pontos de vendas nas unidades da El
Corte Inglés em Gaia-Porto e Lisboa (Portugal)
e em Madri (Espanha). Segundo a presidente da
entidade, Tânia Machado, a boa aceitação dos
produtos artesanais mineiros resultou no interesse
da rede em abrir, no final do segundo semestre
deste ano, um espaço destinado à venda de artigos
brasileiros em suas lojas.
A visita foi promovida por organizações
governamentais,
não-governamentais
e
empresariais, como o Centro Cape, Agência
Brasileira de Promoção de Exportações e
Investimentos (Apex-Brasil), Federação das
Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) e
o Serviço Brasileiro de Apoio à Micro e Pequena
Empresa (Sebrae). A escolha dos artesãos que
participaram das negociações foi feita pelo
Centro Cape, a partir de convites a profissionais,
associações e cooperativas de todo país, que
enviaram fotos de seus produtos para uma préseleção dos compradores da El Corte Inglés.
Last May, a commission comprising 14 buyers of
the European chain visited Brazil and participated
in business sessions in the states of Minas Gerais,
Ceará and Distrito Federal, where exhibitions of
products from several regions in Brazil were being
zheld. The buyers, who had up to 4 million euros
for purchases, also visited weaving and furniture
ateliers and shops in small cities of Minas Gerais.
The Institute Center for Qualification and
Support to Entrepreneurs (Centro Cape) has had,
for over two years, purchase points in the El Corte
Inglés units in Gaia-Porto and Lisbon (Portugal)
and in Madrid (Spain). According to the president
of the entity, Tânia Machado, the good acceptance
of the handicraft products from Minas Gerais
resulted in the interest by the company in opening,
at the end of the second half of this year, a space
intended to selling Brazilian items in its stores.
The visit was promoted by governmental, nongovernmental and corporate organizations as the
Centro Cape, the Brazilian Agency for Exports
and Investments Promotion (Apex-Brazil), the
Federation of Industries in the State of Estado de
Minas Gerais (Fiemg) and the Brazilian Service for
Support to Micro and Small Enterprises (Sebrae).
The choice of the artisans who participated in
the negotiations was made by Centro Cape,
from invitations to professionals, associations
and cooperative organizations from all over the
country, which sent pictures of their products for
a pre-selection by the buyers of the El Corte Inglés.
Oportunidade única
A single opportunity
A visita mostrou que a exportação é um desafio
e tanto para os artesãos, que precisam apresentar
garantias de produção, preço e logística para que
os negócios sejam concretizados. Até o fechamento
desta edição, ainda não havia um balanço final das
vendas, já que os pedidos foram colocados, mas
os contratos ainda não haviam sido assinados. De
qualquer forma, produtores de todo o país tiveram
uma grande oportunidade de mostrar seu trabalho
e estabelecer um contato valioso, ainda que não
tenham concretizado as vendas.
“A reunião com os espanhóis criou expectativa
de mais vendas no futuro. Essa é a minha primeira
experiência em exportação. Mesmo se não tivesse
vendido, já sairia daqui satisfeito”, disse o artesão
Elsio Moriani, de Brasília, que conseguiu vender
seus objetos e biojóias em madeira . Thiago Silva,
do ateliê ReThalho de Lagoa Santa (MG), ressalta
a demanda por originalidade. “Querem tudo bem
The visit showed that exporting is a big challenge
both to artisans, who have to offer warranties
of production, price and logistics in order to
consolidate business. Until the closing of this
edition, there was no final balance of sales, since
the orders had been placed but the contracts had
not been signed yet. Anyhow, producers from all
over the country had a great opportunity to display
their work and establish a valuable contact, even
though sales have not been concretized yet.
“The meeting with Spanish buyers generated
expectations of more sales in the future. This is
my first experience with exports. Even if I had not
made any selling, I would leave here pleased”, said
artisan Elsio Moriani from Brasília, who managed
to sell his objects and biojewelry in wood. Thiago
Silva, from atelier ReThalho de Lagoa Santa (MG),
emphasizes the demand for originality. “They want
it very Brazilian, full of color and calico (a type
oportunidades / opportunities
9
produzir, até novembro, quando têm de enviar
as mercadorias, 200 camisas, 200 almofadas e 200
panos de prato pintados à mão com figuras da
fauna e flora da Floresta Amazônica.
brasileiro, com bastante cor e bastante chita (tecido
com estampas coloridas e chamativas)”, comenta.
Suas peças, elaboradas com embalagens tetra pak e
tecido, também tiveram boa aceitação.
Já os artesãos da Cooperativa de Produtos e
Serviços Econômicos e Solidários do Acre (Cooesa)
terão de produzir 12 mil biojóias, entre colares,
pulseiras e brincos, e 3.000 velas em ouriço. A
produção terá de ser entregue em novembro e os
artesãos já trabalham a todo vapor. “A Cooesa tem
estrutura para atender à demanda, mas estamos nos
organizando para que todas as fases da produção,
que incluem a coleta, preparação das sementes e
montagem das peças, ocorram sem problemas”,
diz o presidente da entidade, Carlos Taborga,
escolhido o representante das três organizações
acreanas para cuidar do trâmite necessário para a
exportação.
Além da Coeesa, a Associação Acreana
Buriti da Amazônia, fundada por Márcia Silva de
Lima, recebeu pedido de 8.000 chaveiros, 7.500
pulseiras, 800 mandalas. “Do nosso encontro com
os representantes da El Corte Inglés, surgiu um
novo produto. Eles gostaram tanto das camisas
pintadas à mão que encomendaram almofadas,
que passamos a confeccionar”, disse a presidente
da Cooper MAV, Othília Batista Melo de Sampaio,
também do Acre. Como a produção é manual, e
não se aprende pintura de um dia para o outro,
a Cooper MAV acredita que vai conseguir
10 oportunidades / opportunities
of fabric with bright and colorful patterns)”, he
comments. His pieces made of tetra pak packages
and fabric were also well accepted.
The artisans of the Cooperative of Economic
and Solidary Products and Services of Acre
(Cooesa) will have to produce 12 thousand pieces
of biojewelry among necklaces, bracelets and
earrings, besides 3,000 candles in seed shells.
Production will have to be delivered in November
and artisans are already working in full swing.
“Cooesa is structures in order to meet the demand,
but we are organizing ourselves so that all the
production phases occur free of trouble, including
the gathering, preparation of seeds and assembly
of pieces”, says the president of the entity, Carlos
Taborga, elected as the representative to the three
Acrean organizations to take care of the procedures
required to exporting.
In addition to Coeesa, the Acrean
Association Buriti da Amazônia, founded by
Márcia Silva de Lima, has received an order
for 8,000 key-chains, 7,500 bracelets, and 800
mandalas. “From our meeting with the El Corte
Inglés representatives emerged a new product.
They liked the hand-painted shirts so much that
ended up by also ordering cushions, which we
started producing”, said the president of Cooper
MAV, Othília Batista Melo de Sampaio, also from
Acre. As the production is manual and painting
cannot be learned in a day, Cooper MAV believes
it will be able to produce, until November, when
they have to ship the products, 200 shirts, 200
cushions and 200 hand-painted table cloths with
figures of the Rain Forest fauna and flora.
Cícero Resende Chaves, who produces and sells
Cícero Resende Chaves, que produz e comercializa
produtos têxteis em Resende Costa (MG), não chegou
a fechar vendas para a rede européia, principalmente
em função do preço e por já desfrutar de uma boa
posição no mercado interno. Apesar disso, ele ficou
satisfeito com o interesse em suas peças e com a
possibilidade de negociações futuras.
Sérgia Almeida, que representa duas cooperativas e
20 associações de artesãos do Estado de Pernambuco,
também aprovou a oportunidade de negociar com a
El Corte Inglés, embora confesse ter ficado frustrada
por não ter havido a consolidação de vendas. “Eles
ficaram encantados com nossos produtos”, afirma,
referindo-se às redes, mantas, passadeiras, almofadas
e cerâmicas que expôs. Aos interessados e à própria
rede européia, ela avisa: “Nós temos um artesanato
muito diversificado e plenas condições de produzir e
entregar grandes quantidades. Estamos prontos para
exportar”.
Nas páginas seguintes, conheça mais sobre o
trabalho de alguns dos artesãos que participaram das
negociações com a El Corte Inglés.
textiles in Resende Costa (MG), did not make
any business deal with the European chain,
mainly for the price and for already enjoying
a comfortable position in the internal market.
Despite all this, he was content with the interest
showed in his pieces and with the possibility of
future negotiations.
Sérgia Almeida, who represents two
cooperatives and 20 associations of artisans
in the state of Pernambuco, has also approved
the opportunity of negotiating with the chain
El Corte Inglés, although she confesses being
frustrated for not having consolidated any sales.
“They were charmed by our products”, she says,
meaning the hammocks, bed spreads, mats,
cushions and pottery exhibited. And she warns
the ones interested and the European chain
itself: “We have offer diversified handicraft at full
conditions for production and delivery in large
scale. We are ready to export”.
On the next pages, learn more about the work
of some of the artisans who participated in the
negotiations with the chain Corte Inglés.
oportunidades / opportunities 11
Tesouros da
Floresta
Treasures of the Forest
Associações se dedicam a organizar e divulgar a
produção artesanal do Acre
Entities dedicate themselves to organizing and
promoting handicraft in Acre
POR /BY Regiane
Marques Sampaio
FOTOS / PHOTOS Divulgação
Numa segunda-feira de
junho, Maria de Fátima e Carlos viajavam
para Recife. Othília fazia curso de aprimoramento
em São Paulo, enquanto Márcia terminava os
preparativos para embarcar para o Rio Grande
do Sul. Em comum, além da agenda ocupada por
viagens, essas pessoas trabalham em torno de um
mesmo objetivo: organizar e divulgar o artesanato
do Acre – Estado encravado na Amazônia
Brasileira, atuando como representantes de três
entidades que reúnem artesãos acreanos das mais
diversas especialidades.
Como resultado desse trabalho, até o final do
ano os consumidores espanhóis e portugueses
poderão ver nas prateleiras da rede El Corte Inglés
itens como biojóias, velas, mandalas e outros
objetos com matérias-primas regionais, além de
camisetas e almofadas pintadas à mão, com figures
alusivas à fauna e à flora da Amazônia. O pedido
da rede européia deixou a vida ainda mais corrida
– há uma grande mobilização para atender às
encomendas, mas todos estão muito felizes com
isso.
Com um território de 152 mil quilômetros
quadrados em plena Floresta Amazônica, o Acre
possui uma vasta riqueza natural. Sementes, folhas,
sobras de madeiras e látex são transformados em
objetos de arte por comunidades de artesãos. E
ao aliar matéria-prima com talento e organização,
os artistas acreanos estão ganhando mercado em
outros Estados brasileiros e, agora, também no
exterior.
On a June Monday, Maria de Fátima
and Carlos were traveling to Recife, as Othília
was taking a specialization course in Sao Paulo,
and Márcia was finishing packing to go on a trip
to Rio Grande do Sul. In common, in addition to
the schedule filled with trips, these people had the
fact of being working for the same aim: organizing
and promoting handicraft in Acre – A State
encrusted in the Brazilian Amazon region, acting
as representatives to the three entities that gather
Acrean artisans with the most varied specialties.
As a result to this work, Spanish and Portuguese
consumers will enjoy, on the shelves of the El
Corte Inglés department store chain, items such
as biojewelry, candles, mandalas and other objects
made of regional raw material, besides shirts and
hand-painted cushions, with illustrating symbols
of the Amazon fauna and flora, by the end of the
year. The order received from the European chain
has made life even busier – there is a massive
mobilization towards delivering orders, though
everyone is very happy about all that is going on.
With a territory of over 152 thousand square
kilometers in the very Amazon Rainforest, Acre
presents vast natural wealth. Seeds, leaves, wood
remainders and latex are transformed into art
objects by communities of artisans. And, in joining
raw material, talent and organization, Acrean
artisans are gaining market share in other Brazilian
states and now also abroad.
12 tesouros da floresta / treasures of the forest
Maria de Fátima Taborga e Carlos Laran Taborga
são, respectivamente, presidente e administrador
da Cooperativa de Produtos e Serviços Econômicos
e Solidários do Acre (Cooesa), que funciona desde
1997. O casal é o principal prospector da entidade
e vive para divulgar os trabalhos dos cooperados e
conquistar novos clientes. Para atender a El Corte
Inglés, eles vão ter de trabalhar como nunca, pois
receberam a encomenda de 15 mil peças, entre
biojóias e velas de ouriço, a maior feita à Cooesa
até hoje.
A união em cooperativa permitiu que os próprios
fabricantes de artesanato assumissem, por meio de
concorrência pública, em 2005, a Casa do Artesão
do Acre, que era administrada pela Secretaria de
Estado do Turismo. A edificação,
localizada na capital Rio Branco,
foi cedida pelo governo estadual
e é gerenciada pela Cooesa, que
se profissionalizou para manter
o local atrativo, lucrativo e
como ponto de divulgação do
artesanato do Acre.
Hoje são 170 cooperados,
mas a rede de beneficiados é
muito maior, já que favorece
desde os responsáveis pela coleta
de matéria-prima até os artesãos.
Coleta esta, cabe ressaltar, que é
feita de maneira sustentável, sem
agredir a fauna e a flora locais.
Mensalmente, o cooperado conta
com o depósito do dinheiro
arrecadado com a venda dos seus produtos, sendo
que 20% vão para a manutenção da Cooesa.
Entre as mercadorias comercializadas pela
cooperativa estão biojóias feitas com sementes;
velas em ouriço – fruto da castanheira-do-brasil,
camisetas e objetos de casa pintados a mão com
desenhos da fauna e flora da Amazônia. São
os animais e plantas que também estampam os
trabalhos de marchetaria, em que caixas e outros
objetos são ornamentados com figuras feitas
com lâminas de madeira de várias cores. O látex,
chamado de leite da seringueira, é transformado
em bolsas, sapatos, porta-treco, jogo americano,
toalhas e tapetes.
Reunidos na Cooesa, os artesãos conseguiram
maior visibilidade, não apenas por terem um local
para exposição dos produtos, mas por contarem
com o trabalho de divulgação feito por Maria de
Fátima e Carlos Taborga. Os cooperados têm ainda
o apoio do governo do Estado e da prefeitura, além
de receberem orientação do Sebrae, como cursos
de capacitação.
Maria de Fátima Taborga and Carlos Laran
Taborga are, respectively, the president and e
administrator to the Cooperative of Economic and
Solidary Products and Services of Acre (Cooesa),
established in 1997. The couple is the main
prospector to the entity and is fully dedicated to
promoting the works of members and winning new
customers. In order to deliver to El Corte Inglés
they have to work as never before, as they received
a 15 thousand piece order, the largest order Cooesa
has received so far, among biojewelry and seed
shells candles.
The union as a cooperative enterprise allowed
the
artisans
to
undertake, through a
public bid in 2005, the
Casa do Artesão do
Acre (Artisans’ House
in Acre), which was
managed by the State
Secretariat of Tourism,
back then. The building,
located in the capital
Rio Branco, has been
given over by the state
government and is
managed by Cooesa,
which in its turn pursuit
qualification to keep
the place attractive,
profitable and a point of
handicraft promotion in
Acre.
There are 170 members today, though the
network of beneficiated people is much larger, as
it favors from the ones responsible for gathering
raw material to the artisans. It is important to
highlight that such gather is done in a sustainable
way, without harming the local fauna and flora.
Monthly, members rely on the deposit of the money
collected from the selling of products, of which
20% is destined to the maintenance of Cooesa.
Among the goods sold by the cooperative are
biojewelry made of seeds; candles made of seeds
shells – fruits of the Brazil nut; shirts and home
decoration objects hand-painted with Amazonian
fauna and flora motifs. Animals and plants are also
illustrated in marquetry works, where boxes and
other objects are adorned with figures made of
multicolored wood sheets. Latex, called the rubber
tree milk, is transformed into bags, shoes, objects
holders, placemats, towels and mats.
Gathered at Cooesa, artisans gained more
visibility, not only for having a place to exhibit their
tesouros da floresta / treasures of the forest 13
Foi graças a uma dessas aulas que a artesã e
cooperada e vice-presidente da Cooesa, Cesarina
Pereira de França, 42, conseguiu agregar mais
valor ao seu produto. Com a pesquisadora da
Universidade de Brasília (UnB), Denise Vilela,
ela e outros artesãos aprenderam técnicas de uso
de óleos naturais que ajudam na conservação
e aumentam a durabilidade da matéria-prima
utilizada em seu artesanato.
Nas mãos de Cesarina, sementes de jarina,
conhecida como marfim vegetal da Amazônia,
oriunda de uma palmeira, assim como o açaí,
patuá, comaru-ferro são transformados em colares,
pulseiras e brincos.
Fundadora do grupo Biojóias da Amazônia,
Cesarina participou da criação da Cooesa. Exfuncionária de uma panificadora, mas que fazia
manualmente convites de casamento e festas de 15
anos, ela viu no artesanato a solução para os seus
problemas financeiros, após ficar desempregada.
“Quando descobri as sementes, me apaixonei de
vez pelo artesanato, e até deixei a arte de fazer os
convites”, relembra.
Com o tempo, o trabalho de Cesarina e o lucro
obtido com as sementes fizeram marido, filhos e o
irmão aderirem à confecção de jóia, e hoje toda a
família vive do artesanato.
products but also for relying on the promotional
work performed by Maria de Fátima and Carlos
Taborga. Members of the cooperative enterprise
also receive support from the state and city
governments, besides receiving guidance from
Sebrae, as qualification courses.
Thanks to some of these classes the artisan,
member and vice-president of Cooesa, Cesarina
Pereira de França, 42, managed to add more value
to her products. Together with Denise Vilela, a
University of Brasília (UnB) researcher, Cesarina
and other artisans learned techniques for the use
of natural oils that help in the preservation and
durability of the raw material employed in their art
works.
In Cesarina’s hands jarina’s seeds (also known
as the vegetal ivory of Amazon, originated from a
palm tree just like açaí, patuá, and comaru-ferro),
are transformed into necklaces, bracelets and
earrings.
The founder of the group Biojewelry of the
Amazon, Cesarina participated in the creation of
Cooesa. A former worker in a bakery who would
also produce, manually, debutant and wedding
parties invitations, she saw in handicraft the
solution to her financial problems, after becoming
unemployed. “When I discovered the seeds, I
totally fell in love with handicraft and even quit
producing the invitations”, she recalls.
As time passed the work of Cesarina and the
profit made from the seeds made her husband,
children and brother adhere to the production
of jewelry, and now her entire family live from
handicraft.
14 tesouros da floresta / treasures of the forest
União e força
Union and power
Após uma reunião na Secretaria de Pequenos
Negócios do Acre e antes de embarcar para
participar da Feira de Economia Solidária do
Mercosul, no Rio Grande do Sul, a artesã Márcia
Silva de Lima falou sobre a sua prioridade
atualmente: atender à encomenda da El Corte
Inglés à Associação Acreana Buriti da Amazônia,
entidade fundada por Márcia e que terá que
produzir 16.300 peças para a rede européia, que
se junta agora a outros clients estrangeiros da
entidade.
Desde criança, Márcia gostava de artesanato. Na
vida adulta, escolheu a palha e as sementes de buriti
(uma espécie de palmeira) para trabalhar, e passou
a ministrar cursos financiados por fundações,
governos e entidades. Mas algo a incomodava:
seus alunos, depois de formados, não conseguiam
condições para colocar os conhecimentos em
prática.
Márcia reuniu 18 deles e dediciu fundar, há 17
anos, a Associação Acreana Buriti da Amazônia.
Já no primeiro ano receberam uma encomenda
da Escola de Samba Beija-Flor, do Rio de Janeiro,
para confecção de bolsas. “Chamei os alunos,
fizemos o design, os protótipos e todos adoraram”,
disse Márcia. Mas como a encomenda era grande
e não havia recursos, Márcia e os alunos fizeram
rodízio na venda de sanduíches em uma escola e
conseguiram, em um mês, dinheiro para a compra
do maquinário.
Daí em diante, Márcia não parou mais. Buscou
parcerias no Sebrae, na Secretaria de Turismo
do Acre, entre outros. Seu esforço resultou em
vendas e a associação conseguiu juntar recursos
para divulgar a arte com o buriti em várias
partes do país e do mundo. “Passamos a adquirir
estandes em feiras, onde fazíamos contato com
compradores de todo o planeta”. Jóias, objetos de
decoração e adorno da associação já chegaram a
Itália, Holanda, Japão e Estados Unidos.
After a meeting at the Secretariat for Small
Business in Acre and before going to participating
in the Mercosul Solidary Economy Exhibit in
Rio Grande do Sul, artisan Márcia Silva de Lima
commented on its current priority: delivering
the order made by El Corte Inglés to the Acrean
Association Buriti da Amazônia, an entity
established by Márcia that receive the incumbency
of producing 16,300 pieces to the European
chain, joining now other foreign customers of the
enterprise.
As a child, Márcia already liked handicraft. In
adult life, she has chosen the straw and seeds of
buriti (a type of palm tree) as work material and
started to offer courses funded by foundations,
governments and corporations. Yet, there was
something bothering her: her pupils, after taking
the courses, could not make it to put the knowledge
into practice.
Márcia gathered 18 of them and decided
to establish the Acrean Association Buriti da
Amazônia, 17 years ago. Right at the first year
they received an order from the Escola de Samba
Beija-Flor (Beija-Flor Samba School), from Rio de
Janeiro, to produce bags. “I gathered the students,
we worked on design, prototypes and everyone
loved it”, said Márcia. But, as the order was massive
and resources scarce, Márcia and the students
alternated shifts selling sandwiches in a school and
managed to raise, within a month, money enough
to buy the tools required.
From there, Márcia has not stopped. She
searched partnerships at Sebrae, at the Secretariat
of Tourism in Acre, among other. Her efforts
resulted in sales and the association managed
to raise funds to promote artistic works using
buriti in several places in the country and abroad.
“We started to buy booths in exhibits, where we
established contact with buyers from everywhere
in the planet”. The jewelry and decoration objects
produced by the association have already reached
Italy, Japan and the United States.
tesouros da floresta / treasures of the forest
15
A arte de vencer
The art of winning
Três amigas com habilidades diferentes para o
artesanato, mas com a mesma dificuldade para
expor e vender seus produtos. Se unissem forças,
elas acreditavam que esse obstáculo seria vencido;
e assim o fizeram. Em 2010, a união das amigas
foi consolidada com a fundação da Cooperativa de
Artesãos Mulheres Arte de Vencer (Cooper MAV),
que hoje reúne 20 cooperadas.
Os trabalhos são divididos em três linhas
de produção. A moda casa, que deu inicio à
cooperativa, em que são confeccionados panos
de mesa, fogão, geladeira, tapetes e guardanapos,
utilizando técnicas como o crochê, fuxico,
macramê, costura e pintura. Moda família, com a
produção principalmente de camisetas pintadas
à mão. A linha de biojóias feitas com sementes,
junto com os trabalhos em madeiras, com foco
na reprodução de animais da floresta, como
araras e tucanos.
Para a rede El Corte Inglés, a cooperativa
produzirá camisetas, almofadas e panos
de prato pintados a mão, como informa a
presidente da Cooper MAV, Othília Batista
Melo de Sampaio. São 600 peças no total,
que exigirão trabalho extra das artesãs,
uma vez que a arte da pintura não pode
ser ensinada no curto prazo.
Em busca de aumentar a produção e
permitir que mais acreanos tenham uma
opção de renda, a cooperativa firmou
parceria com o Rotary e as artesãs
oferecem cursos para a formação de
novos profissionais. E as próprias
fundadoras também estão em
reciclagem
e
aprendizado
constante. Depois de participar
do encontro em Brasília com
representantes da loja de departamentos
El Corte Inglés, Othília já esteve em outros
Estados do país em busca do crescimento da
cooperativa.
Em São Paulo, junto com outras três cooperadas,
Othília participou de cursos na Mega Artesanal,
feira de oficinas de aprimoramento e divulgação
de novidades aos artesãos. O artesanato rendeu
frutos até na família de Othília. Sua filha Magali
Sampaio, 35, também se tornou cooperada e
realiza bordados em ponto vagonite - desenhos
feitos com a trama de linhas.
As três entidades vivem agora a expectativa de
que seus produtos sejam bem aceitos pelos clientes
da El Corte Inglés, abrindo um Mercado firme
para o artesanato acreano na Europa.
Three friends with different skills for handicraft,
but experiencing the same difficulties to exhibit
and sell their products. They believed that if they
joined efforts such obstacles would be conquered,
and so they did: in 2010, the union of friends
was consolidated with the establishment of the
Cooperative of Women Artisans
Arte de Vencer (Cooper MAV), with
20 members, currently.
Works are divided into three
production lines: home fashion, which
initiated the cooperative works and where
table, stove and fridge cloths are produced
besides mats and napkins, using techniques as
crochet, fuxico (round pleated pieces of cloth),
macramé, sewing and painting; family fashion,
with the production of hand-painted shirts,
specially; biojewelry line made with seeds and
crafts in wood, focused on the reproduction of the
rainforest animals such as macaws and toucans.
As for the El Corte Inglés chain, the cooperative
will produce hand-painted shirts, cushions and
table cloths, as informed by the president of Cooper
MAV, Othília Batista Melo de Sampaio. These will
be 600 pieces in total, demanding extra work from
the artisans, as art painting work cannot be taught
in such short term.
Seeking to increase production and allowing
more Acreans to have an income option, the
cooperative signed a partnership with the
Rotary Club and artisans offer courses for the
qualification of new professionals. And the
founders themselves are in a continual process
of re-qualification and learning.
After participating in a meeting in
Brasília with representatives from
the El Corte Inglés department
store chain, Othília has already
visited other states in the country,
aiming the expansion of the cooperative.
In São Paulo, together with other three members,
Othília participated in courses at Mega Artesanal,
a qualification and promotion workshops exhibit
for artisans. Handicraft has been productive even
within Othília’s family. Her daughter Magali
Sampaio, 35, has also become a member in the
cooperative and performs embroidery in huckweaving stitch – drawings made by the woof of
threads.
The three entities now live the expectation of
having the successful acceptance of their products
by the customers of El Corte Inglés, opening a
loyal market to Acrean handicraft in Europe.
16 tesouros da floresta / treasures of the forest
PRESENTE NO AÇO
QUE VOCÊ TOCA.
PRESENTE NA ARTE
QUE VOCÊ APRECIA.
PRESENT IN THE STEEL YOU TOUCH.
PRESENT IN THE ART YOU ENJOY.
Orquestra de Câmara Jovem de Ipatinga
Youth Chamber Orchestra of Ipatinga
Para fazer parte da vida das pessoas, o aço Usiminas se apresenta de várias formas. Ele está nos eletrodomésticos, casas,
carros, pontes e também na diversão, na cultura e no artesanato. A Usiminas é a maior investidora em cultura de Minas Gerais,
e uma das maiores do Brasil. Foram mais de 1.500 projetos patrocinados em 18 anos. Por meio do Instituto Cultural Usiminas,
a empresa investe na inclusão, formação e desenvolvimento do cidadão.
Usiminas steel is found in many forms in people’s life. It’s in the home appliances, houses, cars, bridges, and also in the arts,
entertainment and handcrafting. Usiminas is the largest investor in culture in Minas Gerais and one of the largest in Brazil,
having sponsored more than 1,500 projects over the past 18 years. Through its Cultural Institute, Usiminas invests in the citizen’s
education, inclusion and growth.
Usiminas.
Fazer melhor sempre. | Always doing the best.
Pública
www.usiminas.com
All lumber is noble for a marquetry master
Tacos, galhos e móveis velhos se transformam em arte nas mãos de Elsio Moriani
Old furniture, branches and wooden floor tiles become art in the hands of Elsio Moriani
Antônio Siúves
FOTOS / PHOTOS Elsio Moriani
POR /BY
No final do século passado,
aos 30 anos, Elsio Moriani (pronuncia-se Elcio)
encontrou uma pedra no meio do caminho,
mas essa pedra iria se transformar em madeira.
O casamento de cinco anos tinha terminado. E
também sua relação com a fotografia, que era seu
ganha-pão há vários anos. Aprendera o ofício
trabalhando no departamento de arte final de uma
agência de publicidade, seu primeiro emprego
formal, na virada dos 17 para os 18 anos, em
Brasília, onde nasceu e vive
até hoje.
Depois
de
alguma
errância, Elsio encontrou a
redenção no talento manual
da herança familiar. Foi o que
permitiu que progredisse na
seara artística. De cinco anos
para cá, tornou-se um craque
da marchetaria. Sua obra,
que pôde ser vista até 2 de
julho na exposição coletiva
“Eu e o Meio Ambiente”,
nas galerias do Senado,
começa a ser conhecida
nacionalmente. Em breve,
também será apreciada na
Europa, na vitrine das 82
lojas de departamento El Corte Inglés, distribuídas
entre Espanha e Portugal.
18 arte em madeira / art in wood
In the end of the last
century, at age 30, Elsio Moriani found a rock
on his path, but this rock would soon turn into
wood. His five-year marriage was over, as well as
his experience with photography, which had been
his profession for many years. He had learned this
craft while working in the artwork department of
an advertising agency, his first formal job, between
the ages of 17 and 18 in Brasília, where he was born
and still lives.
After
some
wandering, Elsio
found redemption
in the manual talent
that runs in his
family. This allowed
him to progress in
the artistic field.
Throughout
the
last five years, he
became an expert
in marquetry. His
work, having been
displayed until July
2nd at the collective
exhibition “Me and
the Environment”,
at
the
Senate
galleries, started to gain national recognition.
Soon, it will also be appreciated in Europe on 82
El Corte Inglés department stores, which spread
between Spain and Portugal.
De volta um pouquinho no tempo, a 1999. Sem
o casamento e longe da fotografia, Elsio Moriani
foi à luta. “Eu vivia uma situação meio sem rumo”
– ele conta –. “Fiquei desempregado e fui pulando
de emprego em emprego. Trabalhei no Senai aqui
em Brasília, no Ministério do Trabalho e em outros
lugares. Sei que não tenho dom para funcionário
público”.
Neto do marceneiro Mario Moriani – que tinha
negócio próprio na Barra Funda em São Paulo e
com quem conviveu um pouco na infância – e filho
do também marceneiro e tapeceiro Walter Moriani,
um pioneiro da Capital Federal que atendeu com
seus serviços o Palácio do Planalto e o Itamaraty,
o próprio Elsio chegou a trabalhar por seis meses,
na adolescência, como auxiliar de marcenaria no
então recém-criado Estado do Tocantins. Ele tinha,
portanto, um background onde pudesse ancorar.
A vontade de trabalhar por conta própria
o levou a voltar os olhos para o artesanato. Em
2006, começou a fazer bijuterias, brincos e anéis,
observando o trabalho de alguns artesãos e
marcheteiros de Brasília. De ver fazer, aprendeu
praticamente sozinho e procurou andar numa
trilha que ele mesmo conseguisse abrir.
Logo passou a criar “biojóias” – jóia feita com
produtos naturais, como ele define – objetos e
quadros decorativos que são mais propriamente
esculturas em forma de painéis, compostas com
tramas de pedaços de madeira talhada. “Pensava
no meu pai, que era muito bom, um tremendo
artista, e fui descobrir que tinha esse talento depois
de velho”, diz Elsio. Ele se considera “um eterno
aprendiz dessa área”.
Para ele, a madeira é uma jóia que está
ficando escassa na natureza, mas que, quando
pode ser aproveitada, ou, na maioria das vezes,
reaproveitada, torna-se ouro puro. Ele recolhe
sobras de podas, galhos cortados de árvores velhas
que ameaçam cair, e tudo mais que coleta Brasília
afora, inclusive toras de mangueiras e abacateiros
sacrificados na vizinhança. Leva para a pequena
oficina, montada no pequeno terraço de fundos
da casa onde vive sozinho, em Gama, madeira de
demolição, portais, tacos jogados fora, pisos de
madeira e verdadeiros tesouros que encontra na
rua, no meio do caminho.
Elsio demonstra uma intensa relação de afeto
com a principal matéria-prima da atividade
que hoje provê inteiramente seu sustento e o faz
prosperar na vida. Para ele, toda madeira é boa,
toda madeira é nobre, e algumas prendas que acha
nas ruas são inesquecíveis, autênticos troféus.
“Tenho que perder um pouco de tempo caçando
essas madeiras. Outro dia, vindo da reunião de
Let us go back in time a little, to 1999. With his
marriage over and away from photography, Elsio
Moriani decided to make a change. “I was living in
a situation where I had no goals” – says Elsio –. “I
was unemployed and kept going from job to job. I
worked at Senai, here in Brasília, at the Ministry of
Labor and other places. I know I have no talent to
be a civil servant”.
Being the grandson of carpenter Mario Moriani,
who had his own business at Barra Funda, São Paulo
and Elsio knew as a child – and the son of Walter
Moriani, also a carpenter and a tapestry maker, a
pioneer in the Federal capital, having provided his
services to the Presidential Palace and the Ministry
of Foreign Relations; Elsio himself worked for six
months, during his teenage years, as a carpentry
assistant in the recently created Tocantins State.
Thus, he had a background which could provide
him support.
The desire to work for himself drove him to
turn his attention handicraft. In 2006, he began
making jewelry, earrings and rings, by watching
the work of other artisans and marquetry makers
in Brasília. He practically learned the craft by
himself, only from watching, and started to seek
his own signature path.
He soon started creating “biojewelry” – jewelry
made from natural materials, as he defines it –
objects and decorative paintings which can be
defined as panel-shaped sculptures, composed by
weft and carved wood pieces. “I used to think of
my father, who was very good, a tremendous artist,
and I only discovered I had this talent at an older
age”, says Elsio. He considers himself “an eternal
apprentice in this area”.
To him, wood is a jewel that is getting scarcer
in nature, but when it’s used, or, most of the time,
reused, turns into pure gold. He collects pruning
remnants, branches cut from old, falling trees, and
everything else available around Brasília, including
logs from mango and avocado trees torn down
along surrounding areas. He takes everything to
his small workshop, set in a small terrace in the
back of his house, where he lives alone, in the city
of Gama; demolition wood, thrown away parquet
floor tiles, hardwood floors and true treasures he
finds on the street, on his path.
Elsio shows an intense affection for the main
raw material used in the activity that currently
provides his living, and makes him prosper in life.
To him, all lumber is good, all lumber is noble, and
some treats he finds in the streets are unforgettable,
authentic trophies. “I always need to put quite
some time into hunting for wood. The other day,
when I was returning from a meeting of the artisan
arte em madeira / art in wood 19
uma associação de artesãos de que participo, vi
uma cama de cerejeira, uma cama de casal inteira
jogada fora. Para mim, isso é maravilhoso. É uma
madeira linda. Provavelmente vai virar portajóias”, imagina.
Os porta-jóias talhados são pequenas
esculturas, com gavetas em formatos variados e
desenhos sinuosos que lembram ora contorções
vegetais do planalto central, ora bichos da fauna
brasileira. Estão entre as peças de maior sucesso do
seu catálogo e foram incluídas na encomenda do
El Corte Inglês. Elsio também confecciona outros
objetos de decoração utilitários, como fruteiras,
bandejas, banquetas, além de brincos e anéis de
grande aceitação.
A madeira cortada é enriquecida com
sementes e pedras – principalmente
quartzo branco e verde, que recebe de
um fornecedor de Cristalina, cidade
vizinha no Estado de Goiás. Às vezes
adiciona uma água marinha, raramente
um toque de prata. Tal prática é a essência
da marchetaria.
Os painéis, ou esculturas chapadas,
como ele explica essas obras, são
criadas para ser dependurados na
parede. As molduras ganham ricas
composições de madeira recortada,
com texturas e tons variados, sempre
no colorido natural da matéria.
O efeito harmonioso das tramas
exprime o exercício criativo do artista.
“Movimentos Geométricos”, “Janelas
da Cidade”, “Cata-vento” são alguns
dos títulos com os quais batiza esses
trabalhos (podem ser visto em seu
blog, no endereço http://artemoriani.
blogspot.com/). As peças recebem uma
camada de selador que o próprio Elsio prepara
à base de cera de carnaúba ou de abelha, para
conferir durabilidade.
As obras são concebidas a partir do que a
madeira encontrada sugere – quadro, porta-jóia
ou bijuteria. Mas as ideias podem surgir a qualquer
momento e lugar. “Ando sempre com uma agenda.
A coisa acontece de repente”, descreve. “Estou
dentro do ônibus e me vem a ideia de fazer alguma
coisa. Vou e rabisco o que está na cabeça. Depois
elaboro o desenho e vejo a viabilidade, se é possível
produzir bastantes peças a partir daquele ideia”.
Sabe que é preciso sempre apresentar novidades
aos compradores e que se não fizer isso não vende.
“Você é valorizado à medida que é capaz de colocar
coisas novas na praça”, diz.
20 arte em madeira / art in wood
association in which I take part, I saw a cherry
wood bed, an entire double bed that had been
thrown away. To me, that’s a wonderful thing. It is
a beautiful type of wood. It will probably become a
jewelry box”, he imagines.
The carved jewelry boxes are small sculptures
with drawers in several shapes and sinuous patterns
that resemble the twisted vegetation of the central
plateau and the animals of the Brazilian fauna.
They are among the most admired pieces on his
catalog and were also ordered by El Corte Inglés.
Elsio also makes other utilitarian decor objects,
such as fruit bowls, trays, stools and earrings and
rings which are highly appreciated.
The pieces of wood are enriched with seeds and
stones – mostly white and green
quartz sent by supplier form
Cristalina, a neighboring city in
the Goiás State. He sometimes
adds an aquamarine and, rarely,
a touch of silver. This practice
is the essence of marquetry.
The panels or plain
sculptures, as he refers to these
works, are made to be hung on
walls. The frames are enhanced
with cut wood compositions,
with multiple textures and tones,
always in the natural material
colors. The harmonious effect of
the frames expresses the artist’s
creative efforts. “Geometric
Movements”, “City Windows”
and “Pinwheel” are some of the
names he has given these works
(which can be seen on his blog at
http://artemoriani.blogspot.com/).
T h e pieces receive a sealing layer, prepared by
Elsio himself and based on carnaúba or beeswax,
to grant durability.
The works are conceived from what the
collected wood suggests – flat sculptures, jewelry
boxes, or imitation jewelry. But the ideas can arrive
at anytime, anywhere. “I always carry a notebook.
Things happen out of the blue”, he describes. “I’m
on the bus, and the idea of doing something comes.
I scribble what’s in my head. Then I elaborate the
design and see if it is doable, if it is possible to
make a piece from that idea”. He knows he needs
to present new material to the buyers and that if he
doesn’t, he won’t sell his products. “You are valued
as long as you are capable of putting new things on
the table”, he says.
A marchetaria de Elsio frisa o sentido da palavra
sustentabilidade e reflete um modo novo de ele
encarar a vida. “Comecei a sentir a necessidade
de mudar minha consciência com o trabalho de
reaproveitamento. Mudei e continuo mudando,
aprendendo a cada dia. É um processo. Isso me
faz pensar no futuro que nossos filhos vão ver”,
concebe. Elsio é pai de Henrique, de 15 anos, e
Helena, que tem sete.
Ele abriu uma empresa individual com suporte
do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas
Empresas (Sebrae); fora o apoio dessa instituição,
lembra que teve uma ajuda da Secretaria do
Trabalho do Distrito Federal no começo da nova
carreira, uma ajuda financeira de R$ 2.000.
Trabalha sozinho na pequena oficina em Gama
– a dez minutos da região central de Brasília. Tem
algumas poucas máquinas, duas serras, lixadeira
e furadeira de bancada. Ali, produz ao todo, na
média, mil unidades por mês, entre anéis, brincos,
porta-jóias e outras peças. Os painéis demandam
mais tempo, pelo menos um mês entre elaboração e
acabamento. Às vezes, quando os pedidos apertam,
contrata um ajudante diarista.
A presença de Elsio na Feira Botânica, conhecida
atração de Brasília dedicada a produtos sustentáveis,
se reduziu a um comparecimento por mês. Aos
poucos, está trocando o varejo pelo atacado.
Tem clientes fixos entre os lojistas de Brasília e
nos últimos dois anos começou a apresentar seu
artesanato a lojas e butiques especializadas no país.
Já viajou ao Ceará, Piauí, Rio de Janeiro, a São
Paulo – onde participa do Salão do Turismo, que
vai até 17 de julho, no Anhembi – e Minas Gerais.
Elsio’s marquetry emphasizes the meaning of
the word sustainability and reflects a new way
of looking at life. “I started to feel the need of
changing my conscience through my work with
recycling. I changed and I keep changing, learning
every day. It’s a process. It makes me think of the
future our children will see”, he reflects. Elsio has
two children, Henrique, age 15, and Helena, age 7.
He started an individual business supported
by Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e
Pequenas Empresas, Brazilian Service of Support
to Micro and Small Businesses); besides this
institutional support, he was also supported by
the Department of Labor of the Brazilian Federal
District in the beginning of this new career,
receiving a financial aid of R$2,000.00.
He works by himself at his small workshop in
Gama – ten minutes away from Brasília’s central
region. He owns a few machines, two saws, a sander
and a bench drill. There he produces, on average, a
thousand pieces a month, among earrings, rings,
jewelry boxes and others. The panels demand
more time, at least a month between development
and finishing. Sometimes, when he has too many
orders, he hires an assistant.
Elsio’s presence at the Feira Botânica (Botanic
Fair), a well-known attraction in Brasília
dedicated to sustainable products, was reduced
to one attendance per month. Little by little, he is
changing from retail to wholesale. He has regular
customers among Brasília’s shopkeepers and, in the
last two years, he began to introduce his handicraft
to specialty stores and boutiques throughout the
country. He has been to the Ceará, Piauí, Rio de
arte em madeira / art in wood 21
Já tem clientes no Rio e em São Paulo, de quem
recebe pedidos por e-mail.
A ampliação da escala de produção o levou a
participar da rodada de negócios com executivos
do El Corte Inglés, promovida no último dia 17 de
maio, em Brasília. Elsio recebeu a encomenda de
600 peças – cem caixas porta-jóias, 200 brincos e
300 anéis. Na primeira semana de julho, quando
falou com a “Brasil Feito a Mão”, ele aguardava
a celebração final do contrato para iniciar a
produção das peças, com entrega
prevista para novembro deste ano;
a assinatura do contrato agora
vai permitir que ele trabalhe com
tranqüilidade nos pedidos. Espera
dar conta de confeccionar todas as
unidades sozinho, com a aquisição
de mais duas máquinas para a
oficina, mas se precisar vai recorrer
à ajuda necessária com a gente
conhecida do bairro.
A vida de produtor de arte sustentável de
qualidade que descobriu deu a ele os rumos
que procurava. Anda animado para cumprir o
“batidão”, como se refere à jornada diária das
8h às 18h que mantém no ateliê-oficina. Para se
aprimorar, espera conseguir se matricular em
cursos de design industrial e de interiores. “Não
sobrou grana para isso ainda”, ele explica. Até o fim
do ano ele se casa pela segunda vez.
22 arte em madeira / art in wood
Janeiro, São Paulo – where he attends the Salão do
Turismo (Tourism Fair), which happens until July
17th, at Anhembi –, and Minas Gerais States. He
already has clients in Rio and São Paulo who order
his pieces via email.
The expansion of the production scale led him
to attend the round of negotiations with El Corte
Inglés executives, held on May 17th, in Brasília.
Elsio received an order of 600 pieces – 100 jewelry
boxes, 200 earrings, and 300 rings. On the first
week of July, when he spoke to the
“Brasil feito a Mão”(“Handmade
Brazil”) magazine, he was waiting for
the final contract confirmation in order
to begin producing the pieces, to be
delivered in November; signing this
contract will allow him to work calmly
on his orders. He expects to produce
all units by himself, after purchasing
two new machines for the workshop,
but if needed he will hire people from his own
neighborhood.
His newly discovered life as a sustainable art
producer provided him with the goals he was
looking for. He’s been enjoying his daily journey
from 8 AM to 6 PM at the workshop. In order to
improve his work, he seeks to enroll in industrial
and interior design courses. “There is not enough
money for that yet”, he explains. By the end of this
year, he will be getting married for the second time.
Mudança de vida
e
um salto de qualidade
Life change and a quality leap
Exportação muda patamar do artesanato com
reciclados e tecidos de Thiago Silva
Thiago Silva’s recycled product and fabric handicraft
improves through exportation
Antônio Siúves
FOTOS / PHOTOS Martinez Fotografia
POR /BY
Dois acontecimentos mudaram
a vida de Thiago Silva de um ano e meio para
cá. Primeiro, ele tomou coragem para deixar um
emprego estável, de funcionário administrativo
concursado da Prefeitura de Lagoa Santa, para
se dedicar integralmente ao artesanato. Logo em
seguida, se viu diante de uma grande oportunidade
inesperada, que não deixaria escapar. No começo
de julho, havia dado os últimos passos para fechar
um contrato de exportação com a rede de lojas
de departamentos europeia El Corte Inglés e ver
suas criações oferecidas a consumidores espanhóis
e portugueses. Para isso, teve que redimensionar
seu ateliê, o ReTHalho, e se preparar para os
novos desafios, com o apoio do Instituto Centro
de Capacitação e Apoio ao Empreendedor (Centro
Cape).
Thiago Silva has had two life changing
events over the past year and a half. First, he took
the courage to leave a steady job as a civil servant in
Lagoa Santa in order to dedicate himself exclusively
to handicraft. Next, he found himself facing a great,
unexpected opportunity, which he wouldn’t miss.
In early July, he completed the last steps to sign
an export contract with the European department
store El Corte Inglés and see his works offered to
Portuguese and Spanish customers. In order to do
so, he had to rescale his studio, called ReTHalho,
and prepare for these new challenges with the
support of Centro Cape (Centro de Capacitação e
Apoio ao Empreendedor, Entrepreneurial Training
and Support Center).
tecidos e cores / fabrics and colours 23
Há seis anos, Thiago começou a fazer
ecocarteiras – carteiras de dinheiro confeccionadas
com embalagens de leite tetra-pak e forradas
com tecido; hoje, produz 25 tipos de peças com
material reciclado, retalhos e tecidos variados.
Seus trabalhos incluem objetos de uso doméstico
e decorativo, como anéis de guardanapos, quadros
de recado, porta-chaves e vasos de flores.
Logo, chamou atenção dos amigos e conquistou
os primeiros clientes, mas o negócio ia devagar.
“Não levava a coisa muito a sério, não conseguia
atender às encomendas, era tudo meio confuso”,
ele conta. Incentivado pelos sogros, com quem
morava com a mulher e os dois filhos do casal, e
com a colaboração de uma amiga, aos poucos se
deixou convencer a apostar no próprio talento,
talento que para ele ainda
não era evidente. “Não tinha
noção da minha capacidade
de criação”, lembra.
Depois de cinco anos
no funcionalismo público
municipal, resolveu dar uma
guinada na vida. “Durante
uma conversa, minha sogra
me deu a ideia, por acreditar
demais em mim, de eu
largar tudo e investir nisso”,
recorda Thiago. “Com a
corda do pescoço”, como
diz, custou a ceder, mas
acabou por “meter as caras”
no artesanato. Os sogros lhe
emprestaram os primeiros
recursos e ele então abriu
o ReTHalho, ateliê que fica
dentro de Lagoa Santa, no
bairro Ovídio Guerra, a
dez minutos do centro da
cidade.
O sucesso de Thiago
acompanhou a expansão da Artessanta, feira
de artesanato que acontece todo sábado, das 9h
às 17h, na orla da lagoa que batiza o município
da região metropolitana de Belo Horizonte,
em Minas Gerais. Há mais ou menos três anos,
apenas doces e panos de prato decorados eram
vendidos no local, em meia dúzia de barraquinhas.
A feira cresceu, recebe hoje 120 expositores e
uma freguesia de bom poder aquisitivo. “Temos
trabalhos deslumbrantes lá, e minha experiência é
muito boa. Nossa clientela principal é formada por
moradores dos condomínios de luxo ao redor de
Lagoa Santa”, conta.
24 tecidos e cores / fabrics and colours
Six years ago, Thiago started making ecowallets
– wallets made from tetra-pak milk cartons
and fabrics; nowadays, he produces 25 types
of products with recycled material, different
fabrics and patches. His work includes objects for
domestic and decorative use such as napkin rings,
note boards, key holders and flower vases.
Soon, he caught the attention of his friends
and conquered his first clients, but business was
still slow. “I didn’t take it very seriously, I couldn’t
deliver all the orders, it was all a little confusing”,
he tells. Encouraged by his in-laws, with whom he
lives along with his wife and two children, and with
the help of a friend, he was eventually convinced to
invest in his talent, which was still not evident to
him. “I wasn’t aware of my own creation ability”, he
remembers.
After five years of
municipal public service,
he decided to take a
serious turn in his life.
“During a conversation
with my mother-in-law,
she suggested I should
drop everything and invest
in my handicraft, because
she really believed in me”,
Thiago remembers. “Having
the rope on his neck”, as he
says, he ended up giving in
and finally decided to “dive
into” his handicraft. His
in-laws lent him the initial
resources and he opened
his studio, ReTHalho,
at the Ovídio Guerra
neighborhood, in the city
of Lagoa Santa, ten minutes
away from downtown.
Thiago’s success followed
the expansion of Artessanta,
a handicraft fair held every Saturday, from 9 AM
to 5 PM, by the lake after which this city was
named, located in the metropolitan region of Belo
Horizonte, Minas Gerais State, Brazil. Three years
ago, only sweets and decorated dishcloths were
sold, in only about half-dozen stands. The fair has
grown and currently has 120 exhibitors, as well as
customers with fine purchasing power. “We have
marvelous works there, and my experience is very
good. Our primary clientele is composed of people
who live in luxury condos around Lagoa Santa”, he
tells.
e foi indicado para exibir sua produção em showroom montado no último Minas Trend Preview,
realizado em Belo Horizonte no final de maio,
especialmente para apreciação dos representantes
da cadeia de lojas européia.
O trabalho que realiza é cem por cento manual,
qualidade que distingue seu artesanato. “Não uso
máquina de costura porque não sei costurar. Hoje
em dia tenho consciência da minha habilidade com
as mãos e da minha facilidade para criar, que é um
processo infinito, novas ideias sempre vêm”, garante.
Além de tecido e embalagens tetra-pak, utiliza na
confecção das peças perfis de madeira (MDF) e
galhos de podas das árvores que são descartados
em profusão na arborizada Lagoa Santa. Os vasos
artificiais são feitos com esses galhos, que recebe
folhas e flores recortadas em tecidos. Os quadros
decorativos para quartos de crianças são feitos de
madeira emoldurada com tecidos estampados e
recebem motivos florais, pássaros e outros bichos.
As caixinhas de leite, inicialmente usadas
para a confecção das carteiras de dinheiro, foram
adaptadas na criação dos nos anéis de guardanapos.
A matéria-prima é obtida em casa – os dois filhos
consomem uma doze caixas de leite a cada dez
dias – e principalmente por meio de doações. “As
pessoas me entregam sacolas cheias na feira, às
vezes já limpas e abertas”, conta.
Thiago está se preparando para começar a usar
também garrafas pet no ateliê. Já tem um bom
estoque limpo e cortado do material disponível
no ateliê. A lida com matéria-prima reciclável é
uma razão de ser da sua atividade. Está claro para
o artesão que a produção sustentável agrega um
valor social ao ofício que escolheu para ganhar a
vida. “Isso é de extrema importância. Os benefícios
não são só para mim, mas para meus filhos e para a
cidade, com a expansão da consciência ambiental”,
afirma.
Foi por intermédio de duas amigas de Lagoa
Santa, numa conversa durante um almoço, que
Thiago soube da oportunidade de participar da
seleção promovida pelo Centro Cape, em parceria
com a Federação das Indústrias do Estado de
Minas Gerais (Fiemg), da mostra de artesanato a
ser apresentada a uma missão de compradores do
El Corte Inglés em visita ao Brasil. Incentivado, ele
mandou fotos para os avaliadores do Centro Cape
The work he creates is 100% manual, a
distinguished quality mark. “I don’t use a sewing
machine because I don’t know how to. Nowadays,
I acknowledge my hand skills and my aptitude for
creation, which is an infinite process, new ideas
are always coming”, he assures. Besides fabric and
tetra-pak packages, he also uses medium-density
fiberboard (MDF) and pruned branches of trees in
his production, all of which are abundantly found
laying around Lagoa Santa. These branches are
used in the making of artificial vases, also applied
with trimmed leaves and flowers on fabrics. The
decorative paintings for children’s rooms are made
of framed wood and printed fabrics, displaying
themes with flowers, birds and other animals.
The milk cartons, initially used in the production
of wallets, were adapted for the creation of napkin
rings. The raw material is obtained at home – his
two children consume a dozen milk cartons every
ten days – and mostly from donations. “People
bring me bags full of cartons, sometimes already
clean and cut”, he tells.
Thiago is also preparing in order to start using
PET bottles at his studio. He already has a good
clean and cut stock of available material. Dealing
with recyclable raw materials is one of the reasons
which fuel his work. This artisan clearly understands
that sustainable production aggregates a social
value to his profession of choice. “This is extremely
important. The benefits are not just for me, but for
my children and for the city, with the expansion of
environmental conscience”, he says.
It was through two friends from Lagoa Santa,
in a conversation during lunch, that he heard of
the opportunity to participate in Centro Cape’s
selection, promoted in collaboration with Fiemg
(Federação das Indústrias do Estado de Minas
Gerais, Industry Federation of the Minas Gerais
State), for a handicraft exhibition targeting a group
of buyers from El Corte Inglés, who were visiting
Brazil. Filled with encouragement, he sent pictures
to the Centro Cape evaluators and was selected
to display his products in a showroom at the last
Minas Trend Preview, which took place in Belo
Horizonte in the end of May, especially intended
for the appreciation of this European chain store’s
representatives.
tecidos e cores / fabrics and colours 25
Os espanhóis gostaram do mostruário e, no caso
do ReTHalho, demonstraram interesse especial
pelos anéis de guardanapo, porta-chaves, quadro
de recados, e quadros de decoração. Thiago então
percebeu que a capacidade de produção do ateliê
não era suficiente para satisfazer uma demanda
de mais de cem peças por produto escolhido. Por
enquanto, conta com apenas uma colaboradora a
seu lado, a amiga Fabrícia Sá, cujo talento ele se
orgulha de ter revelado. “Não estava preparado
para aquilo, não imaginava essa realidade”, conta.
Diante do gargalo, resolveu “correr atrás” de
capacitação para reestruturar e criar condições de
atender aos pedidos dos espanhóis.
Thiago procurou o Centro Cape e ingressou
no PQS (Programa de Qualidade Sustentável). O
treinamento é dado em seu próprio ateliê, para onde
se desloca um professor. Em cada etapa do PQS, o
artesão aprende a se localizar na cadeia produtiva,
definir custos financeiros e administrativos, os
preços no atacado e varejo, e aprende a organizar o
local de trabalho. Ao final é feita uma auditoria e o
artesão aprovado recebe uma primeira remessa de
selos de certificação IQS.
No início de julho, Thiago tinha cumprido a
segunda etapa do PQS, mas a reorganização do
ReTHalho foi adiantada. Montou um mini showroom na casa e transformou o que era um quarto
de entulhos num ateliê novinho em folha. “Agora,
tenho um local preparado única e exclusivamente
para trabalhar”, orgulha-se. E tem certeza de que
seus clientes vão se surpreender quando virem as
novas instalações. “O pessoal que chegar aqui vai
cair para trás ao ver as mudanças”, garante.
Em poucos meses, Thiago passou a conceber sua
atividade sob nova perspectiva. “O treinamento dá
uma segurança muito grande para a gente saber
como trabalhar e negociar. Também aprendemos
que se pode ganhar em escala diminuindo os preços
e a ver se estamos ou não dentro das regras certas
para fazer o dinheiro girar e o negócio crescer”, ele
conta.
26 tecidos e cores / fabrics and colours
The Spanish liked the products and, in the
case of ReTHalho, demonstrated special interest
in napkin rings, key holders, note boards and
decorative paintings. Thiago then realized that
his studio’s production capacity wasn’t enough to
meet a demand of more than one hundred pieces
of each chosen product. For now, he only has one
collaborator, his friend Fabrícia Sá, whose talent he
is proud to have revealed. “I wasn’t ready for that,
I couldn’t imagine this reality”, he tells. Facing this
bottleneck, he decided to “go after” the necessary
qualifications in order to restructure and create
conditions to meet the requests of the Spanish
buyers.
Thiago sought Centro Cape and enrolled in PQS
(Programa de Qualidade Sustentável, Sustainable
Quality Program). He receives training in his own
studio, visited by a teacher. In each stage of PQS, the
artisan learns to locate himself in the production
chain, to define his financial and administrative
costs, his retail and wholesale prices, and learns
how to organize the workplace. At its conclusion,
an audit is made and the approved artisan receives
the first shipment of IQS certification labels.
In the beginning of July, Thiago had completed
the second stage of PQS, but the reorganization of
ReTHalho was ahead of schedule. He set a mini
showroom in his house and transformed what
used to be a storeroom in a brand new studio.
“Now, I have a place which is exclusively prepared
for work”, he proudly states. And he is sure his
customers are going to be surprised when they
visit the new installations. “They are going to drop
their jaws when they see the changes”, he assures.
In only a few months, Thiago acquired a new
perspective on his activity. “The training gives
us the confidence of knowing how to work and
negotiate. We also learn that we can gain in scale
by lowering the price and seeing whether we are
complying with the right rules to make the money
flow and the business grow”, he says.
Indagado sobre o que ganhou com o curso até
aqui, ele responde que “mudou completamente”
sua abordagem da atividade. Para começar, mudou
a maneira de lidar com seus clientes e receber as
pessoas no ateliê remontado.
Também aprendeu que deve definir uma
rotina saudável de trabalho e está se adaptando às
orientações recebidas no PQS. “Trabalhava mais
quando estava mais inspirado, desde a tarde até de
madrugada, às vezes até as 4h. Estou me ajustando
para ter um horário definido para também cuidar
da saúde”, diz. Sua jornada atual no ateliê vai das
13h às 20h, em média, mas ele está se preparando
para começar no período da manhã.
Thiago espera exportar, em três meses, cerca de
2.000 peças para a rede El Corte Inglés. Os últimos
formulários tinham sido enviados no final de
junho e a assinatura do contrato deveria ocorrer em
seguida. Ele já tinha pré-estabelecido a ampliação
da estrutura do ateliê e o número de pessoas a
contratar para cumprir o pedido dos europeus.
Na hora de exportar os produtos ele vai contar
com a experiência da Associação Mão de Minas
para cuidar das etapas de emissão de documentos,
preparação das peças, embalagem e despacho, em
troca de uma percentagem das vendas.
Com o trabalho realizado em novo padrão,
Thiago estabelece padrões de qualidade mais
apurados, com mais atenção ao acabamento. Ele se
sente cheio de energia e extremamente estimulado.
“Este foi o maior acontecimento desde que comecei
a trabalhar com artesanato. São portas enormes
que se abriram para mim”, festeja. E agrega outros
benefícios que teve nos últimos meses, como
o acolhimento da sua obra pelo Centro Cape,
o programa de treinamento, e o fato de ter se
associado à Mãos de Minas.
Ao mesmo tempo, Thiago trabalha para
consolidar o ReTHalho no novo patamar. Ainda
este ano vai participar de uma feira nacional no
Expominas. Ele e mais quatro artesões de Lagoa
Santa vem se reunindo semanalmente
para planejar a abertura de um
galpão onde serão construídos
ateliês de produção. Querem se
preparar para aproveitar o fluxo
de turistas esperado na região em
2014, durante a realização da Copa
do Mundo. “Quero estabelecer
um padrão de qualidade
crescente para conquistar
cada vez mais a confiança do
comprador”, anuncia.
When questioned about what he has gained
through the course so far, he says “it completely
changed” his approach to the activity. For starters,
he changed the way he deals with the customers
and receives people in his reorganized studio.
He also learned that one must define a
healthy work routine, and he is adapting to PQS
orientations. “I used to work mainly when I
was inspired, from the afternoon to late night,
sometimes until 4 AM. I’m adjusting to a more
defined schedule so I can take care of my health
as well”, he says. His current journey at the studio
usually starts at 1 PM and lasts until 8 PM, but he
is preparing to start working mornings.
Thiago hopes to export, in three months, about
2,000 pieces to the El Corte Inglés chain. The
last forms were sent in the end of June and the
contract signature should follow. He had already
predetermined the expansion of his studio structure
and the number of people to be hired in order to
fulfill the European`s requests. During product
exportation, he will count on the experience of
Associação Mãos de Minas for handling document
emission, piece preparation, packaging and
shipping, in exchange for a percentage of sales.
By performing his work through new criteria,
Thiago establishes more accurate quality standards,
giving more attention to the finishing process. He
is very excited and full of energy. “This was the
greatest happening ever since I started working
with handicraft. These are huge doors that have
opened for me”, he celebrates. He also mentions
other attained benefits throughout the last
months, such as Centro Cape taking in his work,
the training program, and the fact he has become a
member of Mãos de Minas.
At the same time, Thiago works hard to
consolidate ReTHalho on this new level. Yet this
year, he is also going to participate in a national
fair at Expominas. He and four artisans from
Lagoa Santa have been meeting weekly to plan the
opening of a common space where three
production studios will be built. They
want to be prepared for the flow
of tourists expected in the region
for 2014, during the World Cup.
“I want to establish an increasing
quality standard in order to keep
on conquering the buyer’s trust”,
he states.
tecidos e cores / fabrics and colours 27
A saga de dona Marlene às margens do
Rio Negro
The journey of Mrs. Marlene by the shores of Rio
Negro
Matriarca lidera comunidade e produção de artesanato em Iranduba, no Amazonas
Matriarch leads community and handicraft production in Iranduba, Amazonas
Antônio Siúves
FOTOS / PHOTOS Wilkerson Kuroki/Amazonastur
POR /BY
Dona Marlene Alves da Costa vive no povoado
de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, em Lago
do Acajatuba, município de Iranduba. A sua gente
está separa por hora e meia de lancha de Manaus, no
Amazonas. A comunidade é a maior da localidade
ribeirinha do Rio Negro, com 230 moradores. Seus
filhos, dois homens e quatro mulheres, se juntam
a amigos organizados em torno da Associação de
Artesanato Sustentável Grupo Japiim, formada por
30 pessoas sob a liderança e inspiração de dona
Marlene.
“O nome da associação é uma homenagem ao
pássaro que tem aqui em frente a nossa casa, na
beira do rio e que nunca nos abandona. Ele figura
na nossa logomarca”, ela explica. Japiim, japim,
xexéu nomeiam a mesma bela ave de plumagem
preta e amarelo vivo, com variações de preto e
vermelho, muito comum no Rio Negro.
Mrs. Marlene Alves da Costa lives in the Nossa
Senhora do Perpétuo Socorro village, in Lago de
Acajatuba, within the Iranduba municipality. She
is an hour and a half by motorboat away from her
people, in the Amazonas State. The community is
the largest riverside village of Rio Negro, with 230
residents. Her children, two men and four women,
as well as some friends, are part of the Associação
de Artesanato Sustentável Grupo Japiim (Japiim
Group Sustainable Handicraft Association),
composed by 30 people who are led and inspired
by Mrs. Marlene.
“The association’s name is a tribute to a type of
bird that appears in front of our house and by the
river banks, never abandoning us. He appears in
our logo”, she explains. Japiim, japim, xexéu are
names for the same beautiful bird which has black
and bright yellow plumage, also varying from black
to red and very common in Rio Negro.
28 dona marlene / mrs. marlene
A família de dona Marlene se dedica ao
artesanato há 26 anos. A mãe, descendente de
índios bugre, trabalhava com cerâmica e tecidos;
o pai português foi um conhecido carpinteiro que
fabricava canoas e objetos em madeira. “A gente
não estudou, não é? É tudo cultura mesmo”, diz a
matriarca. Ela fala com orgulho da filha, Caroline
Costa, design do grupo, e do filho mais velho, o
escultor Nei Costa. “Ele é meu grande amigo, que
trabalha comigo na administração da comunidade”,
conta.
Primeiro membro da família a viajar de avião,
Nei foi este ano ao Rio de Janeiro para apresentar,
por iniciativa da Empresa Estadual de Turismo
do Amazonas – Amazonastur, os produtos de
Acajatuba na feira Fashion Business. Os trabalhos
também foram mostrados aos empresários da rede
El Corte Inglés, com sede na Espanha, em rodada
de negócios promovida pela Fundação Centro de
Análise, Pesquisa e Inovação Tecnológica (Fucapi).
A visita foi organizada em maio pela Agência
Brasileira de Promoção de Exportações (Apex
Brasil), em conjunto com o Serviço Brasileiro de
Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e a
Associação Brasileira de Exportação de Artesanato
(Abexa).
As peças encantaram os compradores da cadeia
europeia. “Viram na feira de Manaus e vieram até
aqui conhecer de perto tudo que temos na nossa
loja. Gostaram do que viram e foram separando
algumas coisas que acharam legais. O que eles
pediram ainda não estava em nosso catálogo, mas
já estamos incluindo”, conta.
Colares, peixes, canoinhas
Dona Marlene recebeu a encomenda de 4.000
peças, entre colares longos matizados – “eles ficaram
fascinados com esses colares, que ficam muito
bonitos nas mulheres”, comenta – miniaturas em
madeira de peixes, colheres e canoinhas. Também
fizeram sucesso os porta-pratos que podem ser
usados em casa ou restaurantes.
Ela esperava a confirmação do contrato para a
última semana de julho. Acostumada a pelejar com
obstáculos diários comuns a quem vive isolado
em um povoado amazônico, dona Marlene não se
abala nem um pouco com os percalços para fazer
a primeira exportação do artesanato de Acajatuba.
“Estamos lutando para desenrolar os papéis, pois
é difícil nos comunicarmos com nossos fregueses”,
ela diz. Ainda sem acesso à internet na localidade,
dá graças pela linha telefônica de que dispõe.
Fora isso, é pegar o barco até Manaus tantas vezes
quanto for preciso.
Mrs. Marlene’s family has been engaged in
handicraft fo.r 26 years. Her mother, an Indigenous
descendant, worked with ceramics and textiles; her
Portuguese father was a popular carpenter who
made canoes and wooden objects. “We didn’t study.
It’s all in our culture, really”, says the matriarch. She
proudly talks about her daughter, Caroline Costa,
the group’s designer, and about her oldest son, the
sculptor Nei Costa. “He is a great friend, who helps
me managing the community”, she tells.
The first family member to travel by airplane,
Nei went to Rio de Janeiro this year in order to
present products from Acajatuba, through an
initiative of Amazonastur (Empresa Estadual de
Turismo do Amazonas, Amazonas State Tourism
Company), in the Fashion Business fair. The
works were also shown to entrepreneurs from the
El Córte Inglés chain, headquartered in Spain,
in a round of negotiations promoted by Fucapi
(Fundação Centro de Análise, Pesquisa e Inovação
Tecnológica, Analysis, Research and Technological
Innovation Center Foundation).
This visit was organized in May by Apex-Brasil,
the Brazilian Trade and Investment Promotion
Agency, along with Sebrae, the Brazilian Service
for Supporting Micro and Small Businesses, and
Abexa, the Brazilian Handicraft Exportation
Association.
The European chain buyers were fascinated by
the pieces. “They saw them at the fair in Manaus
and came all the way here to see everything we
have in our store. They liked what they saw and
selected some of the things they found interesting.
The products they ordered were not in our catalog
yet, but we are including them now”, he tells.
Necklaces, fish, little canoes
Mrs. Marlene received an order of 4,000 pieces,
including long, tinted necklaces – “they were
fascinated by these necklaces, which look very
beautiful in women,” she says – miniature wooden
fish, spoons and little canoes. They were also
attracted by the dish holders, which can be used at
home or in restaurants.
She was expecting the contract confirmation
by the last week of July. Used to struggle with
ordinary daily obstacles for those who live in
isolated Amazonian villages, Mrs. Marlene is not
at all intimidated by the challenges involved in the
first exportation of Acajatuba’s handicraft. “We are
struggling to solve all the paperwork, because it’s
difficult to communicate with our customers”, she
says. Without Internet access in the village, she
is grateful for the available telephone line. Other
dona marlene / mrs. marlene 29
Ao se concretizar, a exportação para El Corte
Inglés vai trazer um novo alento para o grupo de
artesãos de Lago do Acajatuba. “É um passo além
que estamos dando, uma oportunidade muito boa
para quem vive no meio do mato, na Amazônia”
– celebra dona Marlene –. “Espero que mais
pessoas venham sentir aqui nosso calor humano,
que venham ver o trabalho, que é simples, feito
por pessoas simples que vivem como podem
graças à madeira. Espero que esse trabalho seja
reconhecido”, ela diz, em sua fala de doce acento
nortista.
A madeira na beira do rio
A associação Japiim também confecciona uma
gama de bijuterias, brincos, pulseiras, colares
e outras peças. Todo o trabalho é manual e
sustentável, inclusive o processo de tingimento
natural. “Aproveitamos restos de madeira, de
árvores que caem e aparecem na beira do rio, mais
na época da seca”, explica dona Marlene.
As madeiras mais utilizadas são itapuba, pauari
e pau-santo. “São as melhores que existem para
esculpir e as mais durativas”, ela explica. O colorido
do artesanato é obtido com pigmentos naturais por
meio de um longo processamento da casca da cebola
amarela, da borra de café, de algumas madeiras
e do urucum. Depois de cozimento, filtragens e
misturas se extraem as tonalidades rosas, amarelas,
alaranjadas e vermelhas que decoram o artesanato.
30 dona marlene / mrs. marlene
than that, she needs to get on the boat to Manaus
as many times as necessary.
When finished, the exportation to El Corte
Inglés will bring a new hope to the group of
artisans of Lago de Acajatuba. “It’s a big step we’re
making, it’s a great opportunity for those who live
in the middle of the forest, in Amazonia” – she
celebrates –. “I hope more people come here to
feel our warmth and see our simple work, carried
out by simple people who manage to make their
living thanks to the forest’s wood. I hope this work
is recognized”, she says, in a speech filled with a
sweet northern accent.
The wood on the river banks
The Japiim Association also makes a wide variety
of jewelry, earrings, bracelets, necklaces and other
pieces. All the work is manual and sustainable,
including the process of natural dyeing. “We use
wood branches which fall down from trees and
appear on the river banks, around the dry season”,
explains Mrs. Marlene.
The most commonly wood types are itapuba,
pauari, and pau-santo. “They are the best to
sculpt and the most durable”, she explains. Their
handicraft colors are obtained using natural
pigments, obtained through a long processing
of yellow onion skin, coffee grounds, woods and
urucum (annatto). Once cooked, filtered and
mixed, tones of pink, yellow, orange and red are
extracted and used to decorate the pieces.
Diante do futuro na reserva sustentável
A consciência ecológica é dado permanente para
quem habita o interior de uma reserva biológica,
a RDS (Reserva de Desenvolvimento Sustentável)
do Rio Negro, dedicada ao manejo e à subsistência
das comunidades ribeirinhas. “Sabemos que se nós
acabarmos com tudo hoje, amanhã não existirá
nada. Estamos aprendendo a ver o futuro. Aqui,
de tudo que se colhe, um pouco é deixado para a
natureza”, se expressa dona Marlene.
As bijuterias recebem detalhes em palha de
tucumã e tucum e delicadas incrustações com
sementes de morototó e açaí colhidas em capoeiras
nas proximidades. Com vistas à exportação
para Ele Corte Inglés, a associação contratou
um laboratório para fazer a certificação dessas
sementes. O controle de qualidade dá garantias
ao comprador quanto à resistência dos produtos
em outros climas e imunidade ao bolor e outras
possibilidades de deterioração.
Qualificação e suporte no lago
A Associação de Artesanato Sustentável Grupo
Japiim tem se aprimorado por meio de uma série
de cursos e palestras oferecidos pela Amazonastur,
entre os quais uma preparação ministrada pelo
Grupo A G, de Brasília. Durante um mês, os
artesãos receberam aulas de associativismo,
manejo, tingimento natural e comercialização.
“Aprendemos a estabelecer o preço e saber se
estamos vendendo ou dando nossa mercadoria”,
comenta dona Marlene.
A empresa ofereceu representação e suporte à
comunidade do Lago de Acajatuba em cinco feiras
de artesanato organizadas nos Estados. “Estão
cumprindo com a palavra e ainda correndo com
nossos produtos por aí”, alegra-se.
Em Acajatuba, dona Marlene é mais do que
uma líder da associação de artesãos cujo núcleo
é a própria família. A ela recorre todo o povoado
para se aconselhar e pedir auxílio na hora de um
aperto. “Minha rotina é corrida. Sou mulher de 24
horas. Toda comunicação dentro da comunidade é
comigo”, ela diz por telefone, em meio a um sorriso.
Há 28 anos comanda, como auxiliar técnica, o
posto de saúde da localidade.
A reportagem pergunta se sua função no posto
é de enfermeira. A resposta é uma síntese do que
pode uma mulher brasileira habitante da Região
Amazônica: “Num interior desses, mano, a gente
é parteira, médico, tudo. A gente faz de tudo ou os
amigos morrem”.
Facing the
reservation
future
in
a
sustainable
Environmental awareness is a permanent state
for those who inhabit a biological reservation, the
Rio Negro RSD (Reserva de Desenvolvimento
Sustenvável,
Sustainable
Development
Reservation), dedicated to the management and
subsistence of riverside communities. “We know
that if we use everything today, tomorrow there will
be nothing. We are learning to see the future. Here,
we always leave nature’s share among everything
that’s gathered”, states Mrs. Marlene.
The jewelry receives details in tucum and
tucumã straw, as well as delicate inlays with
morototó and açaí seeds which are collected nearby
brushwood. Aiming to export to El Corte Inglés,
the association hired a laboratory to perform the
certification of these seeds. This quality control
assures the buyer that the products will endure in
other weather conditions, being immune to mold
and other deterioration possibilities.
Q ualification and support by the lake
The Japiim Group Sustainable Handicraft
Association has been improving itself through
a series of courses and lectures offered by
Amazonastur, including training offered by the A
G Group, from Brasília. For a month, the artisans
received classes on associations, management,
marketing and natural dyeing. “We learned how to
establish prices and to tell if we are selling or giving
away our products”, Mrs. Marlene comments.
The company offered representation and
support to the community of Lago de Acajatuba
for five handicraft fairs organized throughout the
Brazilian States. “They are keeping their word and
running around with our products”, she says with
joy.
In Acajatuba, Mrs. Marlene is more than just a
leader of the artisan association, whose core is her
own family. All the residents turn to her for advice
and help when facing adversities. “My days are full.
I’m a 24 hour woman. All communication in the
community relies on me”, she says on the phone,
with a smile. For 28 years, she has been in charge of
the town’s health center as technical assistant.
We asked her if she works as a nurse at the
center. The answer is a synthesis of what a Brazilian
woman inhabiting the Amazonia region can be:
“In a place like this, man, we act as the midwife,
the doctor, everything. We have to do everything
or our friends die.”
dona marlene / mrs. marlene 31
Artesanato Wariró está na mira
Wariró handicraft in focus
Catarina Pessoa, funcionária da Amazonastur,
explica que a empresa de turismo selecionou
trabalhos de artesãos do Amazonas para exposição
em três feiras nacionais e duas internacionais. No
Rio, a Fashion Business e a Bright; em São Paulo,
a Paralela Gift. Representações também estiveram
em Florença, na Itália, e em Lisboa, Portugal.
A visita da comissão do El Corte Inglês à
feira da Fucapi, em Manaus, parceira do projeto
governamental “Artesanato Sustentável do
Amazonas”,
resultou
na encomenda feita
à Acajatuba, e num
interesse especial pelo
trabalho
realizado
por Gilda da Silva
Barroso, de etnia baré,
que também é gerente
da Casa de Produtos
Indígenas do Rio Negro –
Wariró (FOIRN), em São
Gabriel da Cachoeira, no
Amazonas.
Da linha de produtos
confeccionados
por
Gilda constam cerâmicas
e cestarias trabalhadas
com fibra de piaçava e
tucum – uma palmeira da
região –, desenvolvidos
por meio de manejo
florestal. Gilda também destaca as bolas batidas em
novelo de tucum, bijuterias, cestinhas e samburás
com tampa.
Conforme o site da Oscip (0rganização Social
de Interesse Público) Defender – Defesa Civil
do Patrimônio Histórico, além de promover o
comércio do artesanato indígena do Rio Negro
de maneira justa, sem intermediação, a Wariró
supervisiona o processo de retirada da matériaprima e a confecção do artesanato, com a
finalidade de apoiar o desenvolvimento sustentável
e a consciência ambiental dos povos indígenas. Os
produtos da Wariró são comercializados na loja em
São Gabriel da Cachoeira e podem ser encontrados
em unidades redes Tok & Stok e Pão de Açúcar.
Catarina Pessoa, an Amazonastur employee,
explains that the tourism company selected works
by artisans from Amazonas to be exhibited in three
national fairs and two international fairs. Fashion
Business and Bright, in Rio, and Paralela Gift, in
São Paulo. They were also represented in Florence,
Italy, and in Lisbon, Portugal.
The visit of the El Corte Inglés commission to the
Fucapi fair in Manaus, a partner of the “Sustainable
Handicraft in Amazonas” government project,
resulted in their Acajatuba
product orders, as well
as in special interests on
works by Gilda da Silva
Barroso, who belongs to
the baré ethnicity and
also manages the FOIRN
(Rio Negro House of
Indigenous Products –
Wariró), in São Gabriel
da Cachoeira, Amazonas
State.
Gilda’s product line is
composed by ceramics,
baskets decorated with
piaçava
and
tucum
fibers – a palm tree from
the region –, and are
developed using forest
management
efforts.
Gilda also highlights
the tucum balls, imitation jewelry, baskets and
samburás with lids (a type of basket used by
fishermen).
According to the Defender Oscip website (a
Public Interest Social Organization for Civil and
Historical Patrimony Defense), besides promoting
the commerce of Rio Negro’s indigenous handicraft
in a just, intermediation-free manner, Wariró
supervises raw material withdrawal and handicraft
production processes in order to support the
sustainable development and environmental
awareness of the indigenous people. The Wariró
products are sold at the store in São Gabriel da
Cachoeira, and can be found in Tok & Stok and
Pão de Açúcar chain stores.
32 dona marlene / mrs. marlene
Uma cidade de Teares
A city of looms
Em Resende Costa (MG), artesanato é tradição familiar e atividade econômica consolidada
In Resende Costa (Minas Gerais), handicraft is a family tradition and a consolidated economic activity.
Regiane Marques Sampaio
FOTOS / PHOTOS Fernando Chaves
POR /BY
Quando tinha 12 anos, Cícero
Resende Chaves deixou de observar a mãe na arte
do tear e passou também a transformar retalho
de malha em tapetes, colchas e outros objetos de
decoração. Hoje, é a filha mais velha do tecelão, de
apenas 7 anos, que brinca de fazer crochê com a
avó Tarcília Lindaura Chaves, 65.
Na pequena Resende Costa, de 10 mil habitantes
e vizinha das cidades históricas de São João del Rei e
Tiradentes, onde para cada casa tem um tear, Cícero
Chaves, atualmente com 32 anos, sustenta a família
com o dinheiro ganho com o artesanato. “Como
em 40% das moradias há pelo menos duas ou três
máquinas, temos a mesma quantidade de casas e
teares em Resende Costa”, diz Cícero Chaves, que
também é presidente da Associação Empresarial e
Turística de Resende Costa (Asseturc).
When he was 12 years old, Cícero
Resende Chaves stopped just watching his mother
working at the loom and started transforming
fabric remainders into mats, bedspreads, and other
decoration objects. Today it’s the weaver’s elder
daughter, of only 7 years old, who plays crocheting
with her grandma, Tarcília Lindaura Chaves, 65.
At the little Resende Costa, a 10 thousand
inhabitant’s city close to the historical cities of São
João del Rei and Tiradentes, where each house has
a loom, Cícero Chaves, 32 years old, supports his
family with the money made with handicraft. “As
in 40% of dwellings there are at least two or three
machines, we have the same quantity of houses and
looms in Resende Costa”, says Cícero Chaves, who
is also the president of the Business and Tourism
Association of Resende Costa (Asseturc).
cidade de teares / city of looms 33
O tear começou a gerar renda na região nos
anos 60 e 70, na Comunidade de Pintos, onde a
avó Tarcilia e outras tecedeiras produziam peças
para vender. Mascates compravam as mercadorias
e as vendiam pelo país, despertando o interesse de
comerciantes pelas peças. O artesanato cresceu e se
instalou em Resende Costa, sendo hoje a principal
fonte de receita do município.
Com o aumento do
turismo em São João delRei e Tiradentes, no final
dos anos 80, a população
de Resende Costa passou
a abrir lojas para expor
os seus produtos. Hoje
somam cerca de 80
estabelecimentos. Cícero
Chaves inaugurou a
sua loja na década de
1990, junto com sua
irmã, Silvana. Com 600
metros quadrados, o
espaço reúne o trabalho
de cerca de 250 artesãos.
“Uma peça pode ter a
mão de dois, três ou mais
pessoas; uma tece, outra
pinta e assim por diante”,
conta.
No início da produção,
era Cícero Chaves quem
comprava a matériaprima e a entregava aos
artesãos que trabalhavam
para ele. Mas, com o
aumento da demanda de
mercadorias e também de
pessoas trabalhando com
o tear, os próprios artesãos passaram a comprar os
fios e malhas para produzir as suas peças e, depois,
entregá-las para Cícero Chaves e outros lojistas
revenderem.
Produção
O processo de produção envolve várias fases e
trabalhadores. Em Resende Costa, há lojistas que
apenas comercializam os retalhos, comprados
de malharias de Santa Catarina, Rio de Janeiro
– principalmente de Petrópolis –, e de outros
Estados.
Na cidade, não há marceneiro que não saiba
fazer um tear, e dificilmente encontra-se uma
família que não tenha um tecelão. Não há livro
nem escola para aprender a arte. Em Resende
34 cidade de teares / city of looms
Looms began to generate income in the region
in the 60’s and 70’s, in the Community of Pintos,
where grandma Tarcília and other weavers would
produce pieces for selling. Street vendors would
buy them and sell them all over the country, calling
the attention of merchants to the pieces. Handicraft
increased and was established in Resende Costa,
representing today the main source of income in
the city.
With the growth of
tourism in São João del-Rei
and Tiradentes, at the end
of the 80’s the population
of Resende Costa started
opening small stores to
display their products.
Currently, there are around
80 shops. Cícero Chaves
opened his shop in the 90’s.
Now, featuring 600 square
meters, the space gathers
the work of approximately
250 artisans. “One piece
may have been made by the
hands of two, three or more
people; one weavers, the
other paints and so on”, he
tells.
At the beginning of the
business, it was Cícero
Chaves who used to buy
raw material and deliver it
to the artisans who worked
for him. However, as the
demand for products and
number of people working
at the looms increased,
artisans themselves started
buying the thread and fabric in order to produce
their own pieces and delivering so that Cícero
Chaves and other shop owners could resell them.
Production
Production process involves many stages and
workers. In Resende Costa there are shop owners
who sell only fabric pieces bought from fabric
factories in Santa Catarina, Rio de Janeiro – mainly
in Petrópolis –, and in other states.
There is not, in the city, a single woodworker
who cannot make a loom, and it is hard to find
a family that does not have a loom. There are no
books or schools to teach the craft. In Resende
Costa to become a weaver is to watch someone
weaving and then imitating the weave and the
Costa, ser tecelão é ver alguém tecendo e, depois,
imitar a trama e os movimentos. “Primeiro se faz
um tapetinho, depois vai se aprimorando a técnica”,
explica Cícero Chaves.
Mas o que Resende Costa busca aprimorar
agora é a infraestrutura para receber o turista. A
oferta de restaurantes, bares e pousadas cresceu,
mas a população demanda qualificação. “Temos
uma história de trabalho individual, mas a cidade
foi crescendo e estamos sendo muito mais do
que um pólo de venda”, ressalta o presidente da
Asseturc. No ano passado, a criação do Conselho
Municipal de Turismo (Comtur) ofereceu suporte
para o melhor atendimento aos turistas.
Sustentabilidade
Nem todo mundo que compra as peças sabe,
mas os artesãos se orgulham de fazer artesanato
com materiais que poderiam ir para o lixo.
“Retalhos já significam descartes, mas quem vê
nossas peças não enxerga a utilização de sobras ou
resíduo”, conta Cícero Chaves.
Outro motivo de satisfação é saber que cada
trabalho é único, seja um pequeno tapete ou uma
colcha. “Às vezes, vejo uma peça em um hotel de
outra cidade ou até Estado e digo: ‘É da minha loja’.
E quando confiro a etiqueta tenho a confirmação”,
diz Cícero Chaves.
O “tapetinho” é o carro-chefe do artesanato
feito no tear. É a peça mais vendida aos turistas, aos
visitantes em feiras e para os comerciantes do país
e também do exterior. Esporadicamente, os lojistas
de Resende Costa recebem encomenda de peças
para o exterior, mas o forte é o mercado nacional.
O valor agregado do produto dificulta
a exportação, principalmente quando há
concorrência de mercadorias similares de outros
países. Esse foi um dos motivos, na avaliação do
presidente da Asseturc, que inviabilizou a compra
de peças pela rede de departamento El Corte Inglés,
com sede na Espanha e Portugal. Uma comitiva
visitou a cidade para conhecer o artesanato, no
primeiro semestre deste ano, mas o valor da
mercadoria e também problemas no cumprimento
das exigências de exportação pelas empresas
do setor têxtil, fornecedoras de matéria-prima,
impossibilitaram a realização do negócio. “Todos
os compradores são importantes, mas valorizo
muito o mercado interno que hoje consome nossa
oferta de peças”, declara Cícero Chaves.
movements. “First your produce a little mat, then
you go on improving the technique”, explains
Cícero Chaves.
But what Resende Costa seeks to improve,
currently, is the infrastructure to receive tourists.
The offer of restaurants, bars and inns has increased,
but the population requires qualification. “We have
a history of individual work, but the city evolved
and now we represent much more than a purchase
hub”, highlights the president of Asseturc. Last
year, the creation of the City Council for Tourism
(Comtur) offered support for better receiving
tourists.
Sustainability
Nott everyone purchasing the pieces knows it,
but the artisans take pride in making handicraft
using materials that might end up in the trash can.
“Fabric remainders would mean discard, but who
sees our pieces does not see the reuse of remainders
or waste”, says Cícero Chaves.
Other reason of satisfaction is to know that each
work is unique, be it a small mat or a bedspread.
“Sometimes I see a piece in a hotel in another city
or even in another state and I say: ‘It’s from store’.
And when I check the tag I have the confirmation”,
says Cícero Chaves.
The “little mat” is the flagship of handicraft made
on the loom. It is the best-selling piece to tourists,
to exhibits visitors and to the traders in the country
and abroad. Occasionally, the retailers of Resende
Costa receive orders for delivers overseas, but its
strength is in the domestic market.
The product added value makes it difficult to
export, mainly when they face the competition
of similar products from other countries. This
has been one of the reasons why the purchasing
of pieces by the department store chain El Corte
Inglés with head offices in Spain and Portugal is
unfeasible, according to the president of Asseturc.
The city received the visit of a commission in the
first half of this year, intended to learn about the
handicraft, but the price of the merchandise and
some problems in complying with the demands
for exporting by the companies in the textile
industry and raw material suppliers made business
impracticable. “All markets are important, but I
appreciate the domestic market very much, as it
is the one that absorbs our offer of pieces”, states
Cícero Chaves.
cidade de teares / city of looms 35
Artesanato de Pernambuco
PEDE PASSAGEM
Handicraft from Pernambuco makes way
Negociações com El Corte Inglés não avançaram, mas associações e cooperativas estão prontas para atender à demanda internacional
Negotiations with El Corte Ingles have not advanced, but associations and cooperatives are ready to meet international demand
Carlos Moreira
FOTOS / PHOTOS Divulgação
POR /BY
Sergia Almeida é uma mulher disposta
a mover céus e terra, a lutar contra tudo e contra
todos, desde que seja na defesa e divulgação do
artesanato do Estado de Pernambuco. Gestora do
braço local do Instituto Cearense de Artesanato, ela
quer um lugar ao sol para as duas cooperativas e 20
associações de artesãos que representa. Para tanto,
ela aposta na qualidade e capacidade de produção
de seus associados e, claro, na beleza, originalidade
e diversidade das peças que eles fabricam tanto
nas cidades quanto nos mais remotos lugarejos do
sertão.
A diversidade é realmente grande. O portfólio
representado por Sergia inclui trabalhos em
tecelagem, como mantas, redes, passadeiras e
Sergia Almeida is a woman that is
willing to move mountains, to fight whatever
gets on her way, as long as it is to defend and
promote arts and crafts in the region of the State of
Pernambuco. A manager to the local branch of the
Cearense Handicraft Institute, she wants a place in
the sun for the two cooperatives and 20 artisans
associations she represents. For that, she trusts the
quality and production capability of her associates
and, of course, the beauty, originality and diversity
of the pieces manufactured both in the cities and in
the most remote villages in the sertão.
Diversity is really great. The portfolio
represented by Sergia includes weaving works
such as bedspreads, hammocks, mats and rugs;
36 abrindo passagem / making the way
tapetes; bordados nos mais diversos pontos; renda
renascença, filé e richelieu; cerâmica figurativa
(santos, homens, mulheres e animais); toalhas de
crochê, trabalhos em fibra, almofadas e diversos
outros produtos. “O que quiserem comprar, aqui
tem”, assegura a gestora do ICA em Pernambuco.
Com carreira profissional construída na área
de vendas, Sergia se mostra até ansiosa para
impulsionar as vendas de seus associados. Além
da motivação comercial, ela quer rentabilizar e
viabilizar o trabalho dos artesãos como uma forma
de preservação das tradições culturais da região.
“Eu não vendo produtos. Eu trabalho é com a
história de pessoas da zona rural, principalmente
mulheres, que precisam de apoio para dar
continuidade ao seu trabalho, porque os filhos
e netos dessas pessoas já não querem aprender
o artesanato e, sem esse apoio, a tradição vai
acabar”, alerta.
Logicamente, boas vendas e projeção
são atrativos importantes para
que as crianças se interessem
por ofícios e técnicas que vem
se perpetuando por gerações
e gerações de famílias artesãs. N o
grupo de Sergia, estão reunidas mais de 40
comunidades espalhadas pelo sertão, agreste
e zonas da Mata Sul e Norte de Pernambuco.
“São pessoas que já nasceram fazendo isso.
Temos uma associação, por exemplo, que produz
rendas dentro de uma tribo indígena”, exemplifica.
Uma das formas de apoio, segundo a gestora,
é o investimento na capacitação dos artesãos.
Entre seus representados, diz, o esforço próprio
dos artesãos já trouxe melhorias na gestão do
trabalho, o que inclui a capacidade de produção,
negociações com preços justos e o afastamento
da figura do atravessador – aquele intermediário
interessado exclusivamente no lucro, com
interferências negativas na qualidade do produto e
no rendimento financeiro do trabalho.
Outro ponto importante, segundo Sergia,
é o trabalho de divulgação do artesanato nos
mercados interno e externo. A carência de recursos
produz poucos resultados, mesmo quando há
o investimento na participação em eventos no
exterior. “A gente vai a feiras em Madri, Frankfurt
ou Paris, mas fica em um stand pobre e acanhado.
A China monta um galpão, mostra tudo o que tem
e consegue um volume muito maior de negócios”,
exemplifica.
Por tudo isso, Sergia encarou a rodada de
negócio com a rede El Corte Inglés como uma
oportunidade única de mostrar o artesanato de
Pernambuco e fechar vendas de grandes volumes,
embroidery in the most varied stitches; renaissance
lace, filet and Richelieu; illustrated pottery (saints,
men, women and animals); crochet towels, works
in fiber, cushions and several other products.
“Whatever you want to buy, it is here”, ensures the
ICA manager, in Pernambuco.
With a professional career built in the area of
sales, Sergia is eager to propel the associates’ sales.
Besides commercial motivation, she wants to make
the artisans works profitable and feasible as a way
to preserve the cultural traditions in the region. “I
don’t sell products. I work with the history of these
people in rural areas, mainly women, who need
support to give continuity to their work, as the
sons and grandsons of these people do not want to
learn the craft and, without this support, tradition
is going to die”, she warns.
Obviously, good sales and projection
are important attractions to make
children interested in the craft and
techniques that are passed from
generation to generation
of artisans’ families. In
Sergia’s group there are
over 40 communities
scattered along the sertao,
agreste and zona da mata in the
South and North of Pernambuco.
“These are people who do that from
berth. We have an association, for example,
that produces laces from inside an indigenous
tribe”, she explains.
One of the ways of support, according to the
manager, is the investment in the qualification of
artisans. Among her represented ones the efforts
of artisans themselves have already brought
improvement in the management of work, which
includes production capability, negotiations with
fair prices and the step out of the intermediary
figure – that intermediary interested exclusively in
the profit, with negative interference in the product
quality and in the financial gains of the work.
Another important point, according to Sergia,
is the work of promotion of handicraft in the
domestic and external market. The scarcity of
resources produces a few results, even when there is
no investment in the participation in international
events. “We go to exhibits in Madrid, Frankfurt or
Paris, but stay in a rustic and shy booth. China puts
together a warehouse, displays everything they
have and obtain a much higher business volume”,
she explains.
For all that, Sergia sees the business session with
the El Corte Inglés chain as a unique opportunity to
show handicraft from Pernambuco and close large
abrindo passagem / making the way 37
garantindo atividade e renda para seu pessoal.
“Seria uma vitória fora do comum, uma chance
de decolar”, resume. “A compradora ficou muito
impressionada com o produto e dei a ela a garantia
de produção e entrega. Disse que o que ela quisesse,
na quantidade que fosse, estaria embarcando no
porto em novembro, que é o prazo para despachar
as mercadorias”, conta.
De acordo com gestora, as associações,
individualmente, não teriam condições de atender
grandes pedidos em prazos curtos, mas bastaria
que ela distribuísse os pedidos pelas diversas
comunidades para que os volumes fossem
alcançados. Ou seja, era só uma questão de gerir
corretamente a encomenda.
Apesar de não ter conseguido concretizar
negócios com a rede européia, Sergia não pretende
desistir e seguirá em busca de contatos com
compradores de grande porte. Hoje, os grupos
de tecelagem já colocam seus produtos nas lojas
da Tok Stok (mobiliário e decoração), Pão de
Açúcar (hipermercados) e em pequenos varejistas
da Itália. A comercialização no mercado regional
já está consolidada, com showroom e vendas
voltadas para turistas que visitam Pernambuco e
para a população local. O que Sergia quer são voos
maiores e conquistar mais respeito e admiração
para o artesanato e os artesãos.
Paixão imediata
Apesar de representar pessoas que sustentam
longas tradições culturais com o seu trabalho
manual, a relação de Sergia com o artesanato é
relativamente recente. Como dito anteriormente,
ela fez carreira profissional na área de vendas e foi
justamente isso que possibilitou um contato mais
próximo com o setor. Em 2003, ela foi convidada
pelo Sindicato dos Artesãos de Pernambuco para
cuidar da parte comercial de um projeto que
pretendia levar a produção local para pontos de
venda nos Estados Unidos.
O projeto não foi levado adiante, mas Sergia
já havia sido contaminada pelo “vírus” do
artesanato. Interessada pelo setor e pelas pessoas
nele envolvidas, ela prosseguiu no trabalho de
pesquisa e prospecção de entidades que ela pudesse
representar comercialmente. A partir daí, ela
acumulou um grande conhecimento da artesania
pernambucana e desenvolveu uma relação afetiva
com a produção local, como fica evidente em sua
fala emocionada e aguerrida na defesa dos valores
e da arte daqueles que representa.
38 abrindo passagem / making the way
volume deals, ensuring the work and income to
her people. “It would be an unprecedented victory,
a chance to take over”, she summarizes. “The buyer
was very impressed by the product, and then I gave
her warranties of the product and delivery. I said
that whatever she wanted, no matter what quantity,
would be shipped from the port in November, that
is the deadline to ship the goods”, says she.
According to the manager the associations,
individually, would not be able to cope with large
orders within short periods, but it only takes
dividing the order among the several communities
and the quantities would be reached. That is, it is
just a matter of properly managing the order.
Although business have not been closed with the
European chain, giving up is not in Sergia’s plans
and she continues seeking contact with large scale
buyers. Today, weaving groups can already place
their products at the Tok Stok stores (furniture and
decoration), Pão de Açúcar (hypermarkets) and
at small retailers in Italy. Commercialization in
the regional market is already consolidated, with
showroom and sales turned to tourists who visit
Pernambuco and to local population. What Sergia
wants is to go farther and win more respect and
admiration to handicraft and artisans.
Passion at first sight
In spite of representing people that carry long
cultural traditions through their manual work, the
relation of Sergia with handicraft is fairly recent.
As previously said, she built a professional career
in the sales area and that is what made possible
a closer contact with the sector. In 2003, she was
invited by the Union of Artisans of Pernambuco
to take care of the commercial part of a project
that intended to take local production to purchase
points in the United States.
The project was not carried on, but Sergia
has already been contaminated by the “virus” of
handicraft. Interested in the sector and in the people
involved in it, she carried out the research and
prospection works for entities she could represent,
commercially. From there, she has accumulated
great knowledge on handicraft from Pernambuco
and developed an affection relationship with the
local production, as it becomes evident in her
emotional and brave speech in the defense of the
values and art of those represented by her.
In 2007 she met Benedito Monteiro, a.k.a. Sumé,
founder of the Cearense Institute of Handicraft
that invited her to be the manager of the entity’s
branch in Pernambuco, where it still is.
Em 2007, ela conheceu Benedito Monteiro,
o Sumé, fundador do Instituto Cearense de
Artesanato, que a convidou para ser a gestora do
braço da entidade em Pernambuco, onde está até
hoje.
Nesse processo, Sergia acabou por criar uma
linha de produtos própria em confecção e pretende
trabalhar também com reciclados. Ela comercializa
vestimentas para os praticantes da religião afrobrasileira do Candomblé e se orgulha da qualidade
de seus produtos. “Eu faço axó (roupa ritual) só
com percal, linho e renda richelieu de primeira
qualidade. Eu vendo richelieu até para o Barack
Obama, e a Michelle vai usar”, diverte-se. Para
quem não conhece, as roupas do Candomblé são
ricas em rendas e bordados, com cores específicas
para cada orixá.
Ela usa seu próprio caso, inclusive, para falar
sobre a questão da qualidade no artesanato. Muitos,
diz, fazem o axó com morim, um tecido mais
barato e que perde o caimento depois de lavado.
Da mesma forma, há quem produza o artesanato
típico da região com materiais inadequados ou de
baixa qualidade, seja por opção ou como reflexo
de distorções do mercado e da perda da identidade
cultural. Para quem se interessa pela qualidade
e beleza das peças pernambucanas, porém, ela
garante que entrega qualidade, preço e quantidade.
Fica feito o convite.
In this process, Sergia ended up by creating her
own products line in weaving and she also intends
to work with recycled materials. She sells outfits to
practitioners of the Candomble, an Afro-Brazilian
religion, and is proud of the quality of her products.
“I make axó (a spiritual outfit) using only percale,
linen and first quality Richelieu lace. I could sell
Richelieu even to Barack Obama, and Michelle
would wear it”, says she, amused. For those not
familiar with it, Candomble outfits are rich in laces
and embroidery, with specific colors to each orixá.
She even uses her own case to talk about the
issue quality in handicraft. Many people make axó
using a cheaper and finer cotton fabric that loses
fitting after it is washed. Likewise, there are people
who produce typical handicraft of the region
using improper or low quality materials, either as
an option or a reflection from market distortions
and from the loss of cultural identity. To those
interested in the quality and beauty of the pieces
from Pernambuco, however, she warrants she
delivers quality, price and quantity. The invitation
has been made.
abrindo passagem / making the way 39
Entrevista / Interview
Ronaldo Fraga
Estilista de moda e proprietário da grife Ronaldo Fraga
Fashion designer and owner of the brand Ronaldo Fraga
Carlos Moreira
FOTOS / PHOTOS Alexandre Mota
POR /BY
Ronaldo Fraga é um dos estilistas de moda mais respeitados do Brasil, atualmente. Embora seja formado
pelo curso de estilismo da Universidade Federal de Minas Gerais, com pós-graduação na Parson’s School of
Design de Nova York e pela Saint Martins School (Londres), a marca de seu trabalho não vem do banco da
escola ou dos ateliês de alta costura, mas de uma profunda relação com a cultura brasileira e da observação
das pessoas, dos contextos e da história de seu tempo. Ronaldo gosta de dizer que descobriu seu caminho
ainda em seu primeiro emprego em uma loja de tecidos. Lá, ainda inexperiente, foi contratado para desenhar
roupas para as mulheres que visitavam o estabelecimento. Da conversa com elas, quando buscava entender
desejos e a relação de cada uma com a roupa, ele percebeu seu gosto e necessidade de entender os indivíduos
e seu mundo, de enxergar as transformações culturais e incorporar tudo isso a seu trabalho.
Em sua trajetória, Fraga passou pelo desafio de criar sua própria marca, produzir, vender e distribuir,
mas sem perder sua identidade e o prazer pelo desenho. Ou seja, um caminho muito similar ao trilhado por
quem se dedica ao artesanato. O estilista, aliás, tem relação íntima com o artesanato, tanto na participação
em projetos de capacitação e geração de renda, quanto na incorporação de elementos genuínos da cultura
brasileira a suas coleções, caso de um grupo de bordadeiras de Passira (PE), com quem desenvolveu um
trabalho e que se tornaram fornecedores de sua grife. Confira.
Ronaldo Fraga is one of the most respected fashion designers in Brazil, currently. Although he holds a
fashion designer degree by the Federal University of Minas Gerais, with specialization by the Parson’s School
of Design New York and by the Saint Martin’s School (London), the trade mark of his work does not come
from a school bench or from couture ateliers, but from a deep relationship with Brazilian culture and from
the observation of people, of contexts and of his contemporary history. Ronaldo likes to say he discovered
his path right in his first job, in a fabric store. There, still inexperienced, he was hired to design clothes to
women who visited the store. From conversations with them, while he tried to understand desires and the
relationship of each one with the outfit, he started observing his taste and the need to understand individuals
and their world, the need to see cultural transformations and incorporating everything to his work.
During his journey, Fraga faced the challenge of creating, producing, selling and distributing his own
brand, without losing his identity and pleasure of drawing, that is, a path very similar to the one followed
by those who are dedicated to handicraft. By the way, the designer has a close relationship with handicraft,
both participating in projects of qualification and income generation and in the incorporation of genuine
elements of the Brazilian culture to his collections, which was the case of a group of embroiderers from
Passira (PE), with whom he developed a work and became suppliers to his brand. Check it out.
40 entrevista / interview
Do ponto de vista industrial, quando
você começou a lançar suas coleções e teve
que vendê-las, teve que produzir. O que
você encarou nesse momento?
Ronaldo Fraga – É difícil, a mesma coisa até hoje.
É produção e distribuição. Tudo que eu produzo, eu
vendo. O negócio é que eu fico segurando a marca
para não crescer demais, por questões óbvias. Hoje,
no Brasil, a gente está passando por uma situação
em que a pequena e a micro empresa, na forma
que está indo, estão com os anos contados, assim
como a indústria têxtil brasileira. É caro produzir
no Brasil. É mais negócio ter uma marca no Brasil
e produzir na China. Isso é o mais barato, o mais
viável. Então, desde que eu comecei, meu problema
nunca foi venda, foi produção. É o grande gargalo.
É a produção e, depois, a distribuição.
E qual dos dois aspectos é mais
desafiador, produzir ou distribuir?
Ronaldo – A produção é mais porque você não
cuida da distribuição daquilo que não se produz.
Você tem que ter capacidade de produção. Tem
um ano que estamos aqui (na confecção atual) e
este galpão já está pequeno. Teremos que alugar o
galpão ao lado, que é uma coisa que eu não queria.
Não quero ser industrial, não quero ser empresário.
From an industrial point of view, at
the moment you started launching your
collections and selling them, you had to
produce.What challenges did you have to
face, then?
Ronaldo Fraga – It is hard, the same difficulties
of today. It is production and distribution.
Everything I produce I sell. Thing is, I keep holding
the brand so it will not grow too much, for obvious
reasons. Today, in Brazil, we are going through a
situation in which small and micro enterprises,
seeing the current conditions, have their days
numbered, as well as the Brazilian textiles
industry. It is expensive to produce in Brazil. It is
more advantageous having a brand in Brazil and
producing in China. This is the cheapest and most
feasible. Thus, since I started, my problem has
never been sales, but production. It is the biggest
bottleneck. It is production and, then, distribution.
And which of the two aspects is the
most challenging one, producing or
distributing?
Ronaldo – Production is the biggest, because
it is impossible to distribute what you have not
produced. One has to have production capacity.
We have been here for year (at the current atelier)
entrevista / interview 41
Quero continuar viajando, quero ir para o interior
do Brasil, quero continuar desenvolvendo projetos
com comunidades, quero continuar fazendo
figurino para cinema e televisão...
E como você lida com esses opostos, com o
seu prazer pela pesquisa e pela criação em
oposição às demandas de ser empresário,
de responder por uma marca, empregos e
ações de mercado. Como você compara isso
com a atividade do artesão?
Ronaldo – Primeiro, o que me oxigena? É o
que sempre me oxigenou, eu preciso entrar nesses
universos para continuar fazendo o que eu faço.
Não posso ficar enfiado dentro dessa confecção.
Segundo, a história do artesanato... Eu não conheço
ninguém que tenha se envolvido com artesanato
por questão econômica. Quem entrou com vontade
de ganhar dinheiro, simplesmente, não ficou muito
tempo, porque a relação com o artesanato, antes de
qualquer coisa, ela parte de um ponto que é visão
de mundo, que é se emocionar por uma cultura
brasileira, por uma cara brasileira feita à mão.
E acreditar que isso não só pode como deve ser
viabilizado para que não morra. Muito mais que
uma coisa econômica, que o artesão produz ou
não para venda, tem um caráter antropológico.
Imagine o quanto a perda de um ponto de bordado
no artesanato é um desastre cultural sem retorno.
Sua consistência não é que você tem um
traço característico, uma regularidade. É
que tudo que você faz tem uma pesquisa,
um tema, um envolvimento.
Ronaldo – É verdade. E por que isso? Porque
é um lugar de conforto para mim, eu escolhi fazer
isso. Então, se eu tivesse, no meio do caminho,
sido arquiteto ou qualquer outra coisa, certamente
eu teria levado isso para minha história. O meu
grande prazer é a pesquisa, é agora, neste momento,
definir o meu objeto de trabalho para os próximos
seis meses, porque ele vai me trazer um universo
que não conheço, uma leitura de assuntos que eu
não conheço e que provavelmente vai entrar no
meu trabalho para não sair mais.
42 entrevista / interview
and the warehouse is already becoming small. We
have to rent the neighbor warehouse, which is
something I would not like. I do not want to go
industrial; I do not want to be a businessman. I
want to continue traveling, going to small cities in
Brazil, I want to continue developing projects with
communities; I want to go on making costumes to
films and television...
And how do you deal with these
opposites, with your taste for research
and creation as opposed to the demands
of being a businessman, of responding for
a brand, jobs and market share. How do
you compare that with the activity of an
artisan?
Ronaldo – Firstly, what drives me? Is what has
always driven me; I need to be in these spheres to
continue doing what I do. I cannot be locked inside
this atelier. Secondly, the history of handicraft...
I do not know anyone who has get involved with
handicraft for economic reasons. Those who
entered aiming to make money simply did not
stay long, because the relationship with handicraft,
before anything, starts from a point that is a vision
of world, that is getting emotionally involved with
the Brazilian culture, with a face behind something
hand-made. And believing it can and must be made
feasible so it will not die. Beyond an economic thing
that artisans produce destined to be sold or not,
it presents an anthropological character. Imagine
how disastrous, beyond fixing, is it missing a stitch
in the handicraft cultural embroidery.
Your consistency is not translated into
a characteristic aspect, into regularity. It
is the research that is behind everything
that you do, a theme, involvement.
Ronaldo – That is true. And why is that? Because
it is my comfort zone, I have chosen to do that. If
I had chosen, in the middle of way, to become an
architect or any other thing, I certainly would have
taken that to my history. My biggest pleasure is
research, it is now, at this moment, to define my
goals of work for the next six months, because it
going to bring me a universe that is unknown to
me, a reading of subjects I do not know and that
will probably enter my work to never leave again.
Conte-nos sobre o trabalho com artesãos,
tanto no que diz respeito à incorporação
do artesanato a sua arte, quanto no
envolvimento com a troca de experiências
e projetos de geração de emprego e renda.
Ronaldo – A relação com estes ofícios – uso
essa palavra porque eles são bem diversos – já é
longa. Eu trabalhei por dois anos em São Borja,
na divisa do Rio Grande do Sul com a Argentina,
com artesanato de crina de cavalo e lã. Um ano
e meio com um grupo de couro de peixe no
Pantanal; de bordado cheio e bordado labirinto
na Paraíba e grupo de renda renascença na divisa
da Paraíba com Pernambuco. Em Minas, também,
lá na cidade de Salinas. Como tudo e todo objeto
de pesquisa das minhas coleções, esses ofícios
entram na minha vida, no meu trabalho, para não
sair mais. De alguma forma, eles estão ali. De uma
forma mais clara e explícita em algumas coleções
ou mais implícita em outras. O bordado e o feito
à mão sempre se fazem presente nas minhas
coleções. Da mesma forma que eu vou definir
os tecidos e a estamparia da próxima estação, eu
defino também os bordados e que grupo vai fazer
isso. Então, na maioria das vezes eu nem divulgo,
porque isso para mim já é absolutamente natural.
Eu acho que é legal quando você chega nesse
ponto, nesse tipo de relação. Por exemplo, tem
um grupo de Itabira com o qual trabalho desde
2005, na coleção dedicada ao Carlos Drummond
de Andrade. Hoje, ele é fornecedor como outro
qualquer. Um fornecedor com quem eu brigo para
poder entregar, e brigamos por causa de preço.
Não tem essa relação paternalista.
Tell us about the work with artisans,
both regarding the respect to the
incorporation of handicraft to your art
and in the involvement with the expertise
exchange and projects of generation of
jobs and income.
Ronaldo – The relationship with these crafts – I
use this word because they are very different – is
long. I worked for two years in São Borja, at the
border between Rio Grande do Sul and Argentina,
with horse mane and wool handicraft. A year and
a half with a fish skin group in Pantanal; of full
embroidery and labyrinth embroidery in Paraíba
and a group of renaissance lace in the border
between Paraíba and Pernambuco. Also in Minas,
in the city of Salinas. As everything and every
object of research in my collection, these craft
enter my life and my work not to ever leave again.
Somehow, they will be there. In a more clear and
explicit way in some collections or more implicit
in others. Embroidery and hand-made items have
always been present in my collections. The same
way I am going to define fabrics and patterns
for the nest season, I also define the embroidery
and the group who is going to make it. So, most
of times, I do not even disclose it, as for me it is
absolutely natural. I think it is nice when you reach
this point, in this type of relationship. For example,
there is a group from Itabira with whom I have
worked since 2005, in the collection dedicated to
Carlos Drummond de Andrade. Today, they are a
supplier just like any other. A supplier with whom
there is struggle for delivery, there is struggle for
price. There is no paternalist relationship.
E qual o seu critério para incorporar
o artesanato ao seu trabalho? Como
garantir que haja geração de renda e
preservação da atividade?
And what are your criteria to
incorporate handicraft to your work? How
to ensure there is income generation and
preservation of the activity?
Ronaldo – Eu sempre fiz esse tipo de trabalho
com artesãos, mas pouquíssimos deles eu trouxe
para o meu trabalho, para a minha marca, porque
eu sempre tive muito pudor com relação a isso. Eu
coordenava o trabalho, as artesãs desenvolviam
uma coleção, um produto, que era lançado numa
feira tal e elas usavam meu nome para poder
vender. E eu sempre vi essa dificuldade de ponto de
venda. As pessoas iam para a feira, faziam o maior
sucesso, vendiam rápido. Mas depois o comprador
Ronaldo – I have always done this type of work
with artisans, but not all these groups, only a few
of them, I have brought to my work, to my brand,
because I have always been very timid in this
regard. I coordinated the work, artisans developed
a collection, a product that was launched in a given
fair and they used my name in order to sell. And
I have always seen this difficulty in the purchase
point. People would go to the fair, make successful
sales, and sell very quickly. But then buyers could
entrevista / interview 43
não conseguia encontrar o grupo de novo, o
telefone estava cortado, o envio da encomenda é
caríssimo. Enfim, nada para facilitar e tudo para
dificultar. Com as bordadeiras de Passira (PE), eu
pensei “tenho uma pontos de venda, tenho acesso,
tenho que trazer isso para dentro da minha loja.
Então, a partir da coleção “Turista Aprendiz”
(verão 2010/2011), todas as minhas peças têm
uma etiqueta com o nome da bordadeira, em que
comunidade foi feita peça e o contato delas. Esse
grupo de Passira, por exemplo: tem empresas de
enxoval de luxo de São Paulo, de cama, mesa e
banho, de acessórios, que, através desse contato,
chegou diretamente a elas.
No trabalho com os artesãos, tanto entre
os que você desenvolve coleções, quanto os
que você agrega como fornecedores, o que
você percebe como dificuldades e desafios?
Ronaldo – Tem uma coisa que é difícil em
qualquer processo industrial ou empresarial, que
é a gestão. Gestão de produção e de pessoal é uma
coisa difícil não para os artesãos, mas para todo
mundo. Então, pegar esse talento, a alma genuína
desse produto, aparar arestas para que isso chegue
a um determinado público que se quer atingir e
coordenar de forma redonda toda essa produção
não é uma coisa fácil. Se pouquíssimos têm
condições para ser um estilista ou designer, menos
ainda para ser um administrador, um gestor. Esse é
um grande problema: gestão e organização de todo
o processo de produção.
E o que acontece com seus fornecedores?
Há esses problemas?
Ronaldo – Vou dar um exemplo. Hoje, o Brasil
não produz linho. Se quiser um linho de qualidade,
tem que importar. Em uma coleção, comprei
o linho branco, cortei as peças e mandei para as
bordadeiras de Passira. Llá elas têm uma chefe de
produção que montou uma força-tarefa, dobrou
o número de bordadeiras e otimizou a produção.
Uma ficou com a manga, outra com as costas,
outra com a frente. Aí, bordaram, engomaram
e despacharam. Chegou a tempo, tudo certo.
Quando a gente começou a montar, uma frente era
marrom, a outra amarela... Simplesmente porque
ninguém pensou que estávamos lidando com o
agreste pernambucano. Então, uma engomou com
44 entrevista / interview
not find the group again, phone were cut off, the
shipping of orders is very costly. In summary,
nothing for and all against. With the embroiderers
from Passira (PE) I thought “I have purchase sales,
I have access, and I have to bring it inside my store.
Then, since the collection “Apprentice Tourist”
(2010/2011 Summer), all my pieces have a tag with
the name of the embroiderer, the community where
it was made and their contact info. This group
from Passira, for example, has some businesses of
luxury bed and bath and accessories in São Paulo
that, through this contact, have been put in direct
contact with them.
At the work among artisans both
among the ones with whom you develop
collections and among those aggregated
as suppliers, what do you see as difficulties
and challenges?
Ronaldo – There is something that is difficult
in any industrial or business process, which is
management. Production and staff management
is something hard not only to artisans, but to
everybody. Thus, taking this talent, the genuine
soul of this product, trim these ends so that it can
reach a specific desired audience and properly
coordinating all this production is not an easy task.
If only a few ones have conditions to be a fashion
designer, only fewer could be administrators or
managers. This is a big problem: management and
organization of the entire production process.
And what happens to your suppliers Do
they face these problems?
Ronaldo – Let me give you an example. Brazil
does not produce linen, currently. If I want some
quality linen, I have to import. For a collection, I
bought white linen, cut the pieces and sent them
to the embroiderers from Passira. There, they have
a forewoman who gathered a task-force, doubled
the amount to embroiderers and optimized
production. One was in charge of the sleeves,
another one of the back, of the front, and so on.
They embroidered, ironed and shipped. It arrived
on time, everything right. When we started to put
the pieces together, one front was brown, the other
was yellow... Simply because nobody thought we
were dealing with the agreste in Pernambuco. So,
one ironed using water from the river, another one
água do rio, outra com água da cisterna. Imagine a
encrenca, foi tudo perdido.
Então, há uma questão delicada.
Tem que haver a preservação cultural, a
autenticidade, mas tem que haver uma
profissionalização para que a produção
atenda aos requisitos.
Ronaldo – Sim, claro. Na verdade, é um grande
ciclo. Por mais que eu fale em andar à parte do
poder público, não tem jeito. Essa gestão, essa
organização, tem que vir das esferas do poder.
Sou extremamente otimista. Estamos discutindo
isso no Ministério da Cultura, que tem elementos
facilitadores nesse sentido. Mas, para começar,
esses ofícios de determinada região têm que estar
na escola. As pessoas têm que aprender a bordar na
escola, como parte do currículo. Todas as rendas
que o Nordeste produz estão sendo produzidas na
China por um terço do preço. Se grandes indústrias
não conseguem competir com a China, há como
artesãos enfrentarem isso? Se for ver só a questão
da viabilidade econômica, a gente desiste. Já escutei
muito que é inviável trabalhar com artesanato no
Brasil.
Você acha que o artesanato brasileiro é
negligenciado de alguma forma?
Ronaldo – A relação que nós temos com
artesanato no Brasil ainda é uma relação de país
colonizado. É coisa de pobre, feita por pobre que
as pessoas compram para ajudar. Então, as pessoas
se ofendem quando querem comprar alguma
coisa e descobrem que o preço é maior do que elas
imaginavam. Isso demanda cultura, demanda uma
apropriação cultural das pessoas em relação ao
país. E, principalmente, um investimento no fim
do paternalismo, porque a história do “comprar
para ajudar” é um paternalismo. O que eu vejo
de melhor na arte contemporânea do país tem
influência da arte popular. No diálogo entre esses
segmentos, ganha o país e nós temos condições de
desenvolver um produto sem similar no mundo,
com uma percepção de valor completamente
diferente.
from the pit. Imagine the trouble. It was all lost.
So, there is a sensitive issue.There must
be cultural preservation, authenticity, but
there must also be qualification, so that
production can meet the requirements.
Ronaldo – Yes, of course. Actually, it is a big
cycle. Although I talk about acting independently
from public power, there is no way out. This
management, this organization has to come from
the power spheres. I am extremely optimistic.
We are discussing it at the Ministry of Culture,
which has facilitating elements, in this sense. But,
to start with, these crafts of a given region must
be at schools. People need to learn embroidering
at school, as a part of the course syllabus. All the
income the Northeast produces is being produced
in China for a third of the price. If large industries
cannot compete with China, is there any way
artisans can face it? If we take it only from the
economic feasibility perspective, we give up. I have
heard a lot about how it is impossible to work with
handicraft in Brazil.
Do you think that Brazilian handicraft
is neglected, somehow?
Ronaldo – The relationship we have with
handicraft in Brazil is still a colonized country
relationship. It is something poor, made by the poor
and people buy it as a way of helping. So, people
get offended when they want to buy something and
find out the price is higher that they imagined. It
requires culture, requires a cultural appropriation
of people in relation to the country. And, mainly,
investment towards the end of paternalism,
because the story of “buying to help” is paternalist.
What I see that is best in the contemporary art of
the country receives the influence of popular art. In
the dialogue between these segments, there is gain
to the country and we have conditions to develop
a product without a similar product in the world,
with a completely different perception of value.
entrevista / interview 45
Feiras e Eventos
Fairs and Events
Gift Fair
3º Salão Especial
27/08/2011 a 30/08/2011
Local: Expo Center Norte – São Paulo – São Paulo
www.grafitefeiras.com.br
05/10/2011 a 07/10/2011
Local: Serraria Souza Pinto – Belo Horizonte –
Minas Gerais
www.centrocape.org.br
Art Mundi – 8ª Feira Mundial de
Artesanato
Salão Internacional do
Artesanato – 4ª Exposição
Internacional de Artesanato
02/09/2011 a 11/09/2011
Local: Mendes Convention Center – Santos – São
Paulo
www.artmundisp.com.br
02/11/2011 a 06/11/2011
Local: Pavilhão de Exposições Expobrasília –
Brasília – Distrito Federal
www.salaodoartesanato.com.br
FEIARTE – 30ª Feira Internacional
de Artesanato
16/09/2011 a 25/09/2011
Local: Centro de Eventos do Pantanal – Cuiabá –
Mato Grosso
www.feiartemt.com.br,
Natal Artesanal – 6ª Feira de
Artigos Natalinos Artesanais
10/11/2011 a 15/11/2011
Local: Complexo Cultural da Urca – Poços de
Caldas – Minas Gerais
www.feiradenatalpocosdecaldas.com.br
22ª Feira Nacional de Artesanato
ART VALE – Edição Sorocaba – 3ª
Feira Internacional de Cultura
e Artesanato e Festa das Nações
14/10/2011 a 23/10/2011
Local: Clube União Recreativo – Sorocaba – São
Paulo
www.tmlpromoeventos.com.br
46 eu faço / i make
22/11/2011 a 27/11/2011
Local: Centro de Exposições Expominas – Belo
Horizonte – Minas Gerais
www.feiranacionaldeartesanato.com.br
Eu Faço / I Make
Aline Veloso de Matos
FOTOS / PHOTOS
Pedro Gil
“EU VIVO DO LIXO!” Esta é a forma a um só
tempo sintética e múltipla com a qual Aline Veloso
de Matos define aquilo que é, hoje, seu trabalho e
sua forma de ver o mundo. Afinal de contas, são 17
anos vividos a transformar resíduos em arte, boa
parte deles dedicados também a ensinar o ofício e
a mostrar aos mais diversos públicos que há beleza
e utilidade onde a maioria enxerga apenas restos
de consumo, que embalagens vazias, latas, tampas,
pedaços de plástico e papel trazem em si formas e
objetos que dependem apenas da criatividade para
se revelar.
Graduada em Relações Públicas, o que Aline
menos fez em sua vida foi exercer essa profissão.
Pouco depois de formada, percalços da vida a
desafiaram a buscar uma alternativa de atividade
e renda. A solução foi encontrada no gosto por
reaproveitar coisas, gosto este que já a havia
ajudado a pagar seus estudos com a venda de papel
artesanal e produtos derivados, como agendas e
pastas.
Da união do gosto com a necessidade nasceram
bijuterias de garrafa pet, bolsas de lata, brinquedos
de embalagem tetra pak e o que mais os materiais e
a criatividade permitissem. Vendidos inicialmente
com a ajuda de amigos e no boca a boca, hoje seus
objetos podem ser vistos até em outros países,
como Itália, Espanha e França, onde encontraram
espaço na loja da De Bruille, que reúne artesanato
de resíduos do mundo todo.
Nessa trajetória, Aline testemunhou uma
mudança de mentalidade na sociedade. Quando
começou, sua passagem pelas ruas à cata de
material era vista com um misto de estranheza e
pena. Ao longo dos anos, ela viu essa percepção se
transformar em admiração, na medida em que a
consciência ambiental abriu os olhos das pessoas
para a importância e a beleza dos objetos nascidos
do reaproveitamento de restos.
Autodidata, Aline se tornou instrutora,
ministrando oficinas para catadores de recicláveis
e para comunidades por meio de contratos com o
Instituto Nenuca de Desenvolvimento Sustentável
(Insea) e com a Companhia Energética de Minas
Gerais (Cemig). Seu objetivo é ver os catadores
aderirem ao artesanato com resíduos como forma
de agregar valor ao seu trabalho.
“I LIVE OUT OF GARBAGE!” This is the
synthetic and multiple definition with which Aline
Veloso de Matos describes her current work and
the way she perceives the world. After all, she has
made a living out of transforming waste into art
for 17 years, good part of which also dedicated to
teaching the craft and showing a wide variety of
audiences that there is beauty and utility where
most people only see garbage, demonstrating that
empty packages, cans, lids, pieces of plastic and
paper carry shapes and objects which only depend
on creativity to be revealed.
Although having a public relations degree,
Aline has never exercised this profession. Shortly
after graduation, mishaps in life challenged her to
look for an alternative activity and income source.
The solution was found through her joy in reusing
things, something that had already helped her
paying for her education, by selling handcrafted
paper and related products, such as notebooks and
folders.
From this union between joy and necessity, PET
jewelry, tin bags and milk carton toys were created,
as well as anything else allowed by her materials
and creativity. Initially sold with the help of friends
and by word of mouth, her objects can be currently
found abroad, in countries such as Italy, Spain and
France, having conquered their space at De Bruille
stores, which gather waste material handicraft
from all over the world.
Throughout her journey, Aline has witnessed
a shift in society’s thinking. In the beginning, her
wandering through the streets collecting material
was perceived with a mixture of strangeness and
pity. Throughout the years, she saw this perception
change into admiration, since environmental
awareness opened people’s eyes to the importance
and beauty of objects created from recycled waste.
Being a self-taught person, Alice became an
instructor and promotes workshops for recyclable
material collectors and communities through
partnerships with Insea (Instituto Nenuca de
Desenvolvimento Sustentável, Nenuca Sustainable
Development Institute) and Cemig (Companhia
Energética de Minas Gerais, Minas Gerais State
Power Company). Her goal is to influence the
collectors to adopt waste handicraft as a way of
aggregating value to their work.
eu faço / i make 47
Onde Encontrar
WHERE TO FIND
Associações do Acre
(Página 12 / Page12)
Cooperativa de Produtos e Serviços Econômicos e Solidários
do Acre (Cooesa)
Carlos e Maria de Fátima Taborga
Tel. 55 68 3223-8062 / 3223-0010 / 9981-1394 / 9978-7543
[email protected]
Cooperativa de Artesãos Mulheres Arte de Vencer (Cooper Mav)
Othília Batista Melo de Sampaio
Tel. 55 68 3224-1973 / 9971-2452 / 8121-4752
[email protected]
Associação Acreana Buriti da Amazônia
Marcia Silvia de Lima
Tel. 55 68 3026-1678 / 68 9995-9388
[email protected]
Elsio Moriani
(Página 18 / Page 18)
Brasília – Distrito Federal
Tel. 55 31 3382-3485 / 8408-4696
E-mail: [email protected]
Thiago Rethalho
(Página 23 / Page 23)
Tel: 55 31 3686-7440 / 9443-2034
E-mail: [email protected]
http://rethalhoarte.blogspot.com/
Marlene Alves da Costa e Gilda da Silva Barreto
(Página 28 / Page 28)
Dona Marlene
Tel: 55 92 9239-5239
Gilda Barreto
Tel: 55 97 8114-9152
Cícero Resende Chaves
(Página 33 / Page 33)
Tel. 55 32 3354-1588
Caixa Postal nº 12
CEP: 36.340-970
Resende Costa - MG
[email protected]
Artesanato de Pernambuco
(Página 36 / Page 36)
Sérgia Almeida
Tel. 55 81 3227 2687 / 8764-2234
[email protected]
[email protected]
22ª Feira Nacional
de artesanato
O Brasil Feito a Mão
WELL COME
Toda a diversidade do
artesanato e da cultura
brasileira em
um só lugar
All the diversity of
brazilian handcraft and
culture in
just one place
Expominas - Belo Horizonte - MG
22 a 27 22rd to 27th
de novembro of november
dia 22 só para lojistas
22rd only for professional buyers
www.feiranacionaldeartesanato.com.br
31 3282 8280 - [email protected]

Documentos relacionados

Revista O Brasil Feito à Mão- no. 13

Revista O Brasil Feito à Mão- no. 13 Henrique Queiroga Revisão / Revision Fernanda Carvalho Tradução de textos / Translation Fernanda Carvalho Ivana Pignolati Diagramação e arte / Layout and art direction Escritório Branding+Packaging...

Leia mais

Revista O Brasil Feito à Mão- no. 09

Revista O Brasil Feito à Mão- no. 09 CENTRO CAPE MINAS GERAIS Rua Grão Mogol, 662 - Sion

Leia mais