O super (?) espião

Transcrição

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ESTADOS UNIDOS
O super (?) espião
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Richard Helms, 58 anos, diretor ua
CIA (Agência Central de Inteligência), \
apreciador de divorciadas —* e martinis
secos nas sextas-feiras —, tornou-se na
semana passada capa da revista "News• r
week" e figura obrigatória nas fecha. { das reuniões do "high society" de WasI hington — e, teoricamente, um dos homens com mais podêres em todo o
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Ao ser indicado pelo presidente Richard Nixon comandante supremo das
atividades americanas de inteligência, * . •; . •
Helms ganha a chefia de um exército de
nove agências de segurança — tio qual
a CIA é apenas o núcleo central — e
200 000 agentes que em 120 nações gas.-. tam anualmente 6 bilhões de dólares —
mais que o orçamento federal brasileiro de 1971, equivalente a cerca de 5 bi! lhões de dólares.
O aparelho é impressionante. Mas, em
meio a tantos festejos c honrarias, Helms
pode duvidar se foi realmente promovi!
do — ou "chutado para cima", perdendo o controle direto sobre a CIA para t ? ' •
ganhar um comando apenas nominal e
volátil.
O que é certo, desde já, é que a reorganização dos serviços americanos de
inteligência foi decidida pela necessidade de torná-los mais eficientes. Uma das
funções de Helms no monótono expediente diário das 9 às 18h30, na sede
da CIA em Langley, do outro lado do
rio Potomac, junto a Washington, é redigir o relatório secreto que Henry Kissinger, assessor para Assuntos de Segurança Nacional, entrega na manhã seguinte ao presidente Nixon. Ültimamen-.
te, porém, Nixon não se limitava a elo.
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continua na página 44
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Helms: martinis só às sextas-feiras
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continuação da página 42
giar o "inglês claro" e a forma bem organizada da apresentação das informações no relatório. Ao contrário, tem feito críticas bastante severas ao seu conteúdo.
Siglas demais — Na verdade, parece
que a "crise da eficiência" nos Estados
Unidos se istendeu a esse seu microcosmo, a comunidade da espionagem,
que se abriga principalmente nas confortáveis casas do "subúrbio da inteligência" — Oakland, perto de Washington
— e se espalha pelo mundo inteiro.
Teoricamente, tudo funciona. A NSA
(Agência de Segurança Nacional), por
exemplo, deve dedicar-se exclusivamente
à decifração de códigos. No entanto, ela
acumulou em seus armazéns de Fort
Mead, em Maryland, toneladas e toneladas de fitas de mensagens radiofônicas
trocadas por agentes soviéticos e praticamente impossíveis de decifrar. Ê fácil
interceptar as mensagens, que se sucedem
às dezenas' diariamente. Não é muito
difícil igualmente decifrar um código,
desde que seja usado em pelo menos
uma frase inteira. No entanto, os soviéticos resolveram misturar em cada
mensagem vários códigos inteiramente
diferentes. Há dez anos a NSA não consegue decifrar uma única dos milhões de
mensagens desse tipo que se acumulam
em Fort Mead.
Tempo atrás teve de requisitar até
mesmo vagões ferroviários para poder
estocar as fitas e continua tentando decifrar as mais antigas, nisso desperdiçando metade de seu orçamento anual de
quase 1 bilhão de dólares.
A coordenação difícil — Na DIA
(Agência de Inteligência da Defesa), o
panorama não é mais animador. Ela deveria coordenar os serviços secretos do
Exército, Marinha e Força Aérea. Não
só o ciúme, mas principalmente as exi-
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gências de ordem e rotina típicas do raciocínio militar, têm tornado a tarefa de
coordenação um suplício sem perspectivas. A tal ponto, que a única solução
pensada por Nixon não é das mais imaginosas: a criação de outra coordenação dos serviços militares, com o novo
cargo de "secretário da Defesa assistente para Assuntos de Inteligência".
Há ainda o INR (Divisão de Inteligência e Pesquisa do Departamento de
Estado), que deveria preparar análises
gerais — exatamente o tipo de informações de que NixOn mais sente falta. Os
funcionários desse setor, acostumados ao
tratamento sutil das informações diplomáticas, não sabem porém manejar os
dados secos obtidos pela tecnologia moderna.
E o controle que o FBI (Bureau Federal de Investigações) deveria exercer
sobre os agentes estrangeiros nos Estados
Unidos tem falhado bastante nos últimos
anos, acompanhando a deterioração geral da imagem do órgão e seu diretor, J.
Edgar Hoover.
Azeitonas e satélites — O desafio de
Helms, em tese, é centralizar todo esse
mecanismo. Na juventude, êle gostou de
aventuras. Entrou na CIA no ano de
sua fundação, em 1947; fêz parte durante quinze anos do Setor de Planos —
o setor de operações secretas —, responsável entre outras coisas pela queda dos
governos esquerdistas do Irã, em 1953,
e da Guatemala, em 1954, e a construção do túnel secreto sob Berlim oriental em 1955.
Desde 1966, porém, quando se tornou o primeiro diretor da CIA saído
do quadro de funcionários da agência, Helms passou a ser um tecnocrata e
preferiu restringir as aventuras ao campo doméstico. Comandou a revolução
tecnológica da espionagem, passando a
recomendar o uso dos célebres microfo" ncs em azeitonas de martinis e de gigantescos satélites artificiais, ao mesmo
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tempo que casava com uma madura divorciada, da qual se separou em 1968
para casar noventa dias depois com uma
vizinha igualmente recém-divorciada,
Cynthia McKelvie, mãe de quatro filhos.
Diante do deserto em que foi mergulhando a espionagem americana, a CIA
de Helms surge quase como um oásis,
com seus 15 000 funcionários, todos com
alto grau de instrução, doutores acadêmicos em 298 especialidades diferentes, inclusive engenharia florestal e astronomia.
"Cite um assunto qualquer e a CIA pode tirar de suas cavernas uma pessoa
que dedicou as melhores décadas de sua
vida ao seu estudo exclusivo", diz-se nos
corredores da Casa Branca.
Helms, que instalou todos esses técnicos, encerrando a fase romântica da
CIA, tem oficialmente a missão de estender seus métodos às outras oito agências, na qualidade de chefe da Comissão de Inteligência dos EUA. No entanto, como êle já detinha esse cargo — a
novidade é que Nixon lhe pediu agora
dedicação exclusiva, deixando o comando da CIA para o vice-diretor Robert
Cushman —, muitos consideram que na
verdade Helms foi engolido pela máquina.
O blefe de Kruschev — Os veteranos
da CIA, como Helms, podem afinal vangloriar-se de muitos êxitos. Em 1961, um
operador de guincho de Porto Sudão,
agente da CIA, deixou cair um lote de
caixotes desembarcados de um navio
checo e dezenas de fuzis soviéticos destinados às tropas rebeldes de Antoine Gvzenga, no Congo, se espalharam pelo*
cais, tornando impossível às autoridades^
sudanesas continuar coniventes com o
contrabando. No dramático jogo de pôquer sobre os foguetes soviéticos em
Cuba, Kruschev blefou sem saber que
Kennedy conhecia todas as suas cartas.
O agente duplo soviético Oleg Penkowsky havia revelado à CIA que a União
Soviética não tinha condições de entren-
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Uma modesta sinalização em Langley
para o núcleo central da espionagem
VEJA
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O PRESIDENTE
CONSELHO
CONSULTIVO OE
INTELIGÊNCIA EXTERIOR
Um grupo de personalidades importantes com funçõea
apenas consultivas;
reúne-se de dois
em dois meses.
BT
Os serviços
CONSELHO
OE SEGURANÇA
NACIONAL (NSC)
de inteligência
O órgão básico de tomada de decisões.
Todas aa Informações destinadas to presidente possam pelo NSC e seu chefe,
Henry Klsslnger.
dos EUA
"COMISSÃO DOS QUARENTA"
OU "GRUPO 303"
COMISSÃO DE INTELIGÊNCIA DO NSC
Um órgão secreto,
presidido por Kisalnger,
assessora
o presidente em
operações slollosas.
Um novo departamento, chefiado por Kisslnger. Sua missão: distribuir tarefas aos
serviços de inteligência • avaliar os resultados.
LINHAS OE SUBORDINAÇÃO
GRUPO DE AVALIAÇÃO
UNHAS DE RELACIONAMENTO
COMISSÃO CONSULTIVA
DE RECURSOS PARA A
INTELIGÊNCIA
D e s membramento
da Comissão de Inteligência, sob a , *
chefia de Helms.
com a missão de
limitar orçamentos.
Outra comissão nova. Incumbida de comparações especificas no equilíbrio de poder no mundo.
. . . FLUXO DE INFORMAÇÃO
/H
COMISSÃO
DEPARTAMENTO
DE DEFESA
DE INTELIGÊNCIA
DOS EUA
7
£ s "diretoria" dos serviços de Inteligência. Todas aa agências nela estio representadas; seu chefe 4 Helms. da CIA.
BURFAU DE
INTELIGÊNCIA
E PESOUISA
Pequeno maa
com
autoridade; chefiado por
um ax-funclonárlo da CIA.
mfrPWBW
AGÊNCIA
DE SEGURANÇA
NACIONAI^NSA)
AGENCIA DE
INTELIGÊNCIA
DA DEFESA (DIA)
COMANDO
NACIONAL DE
CRIPTOLOGIA
ôrgáo coordenador da Inteligência militar. Utiliza
um orçamento de
100 milhões de
dólares. Despende
mais de 700 milhões através das
Forças Armadas.
Com 5 500 funcionários.
Elabore e decifra
c ó d i g o s . Com
20 000
funciona'rios, quase todos
em Fort Meada,
Estado de Maryland.
1
!
BUREAU FEDERAL
DE INVESTIGAÇÕES
(FBI)
O principal responsável
pei a
c o n tra espionagem doméstica
AGENCIA
CENTRAL DE
INTELIGÊNCIA (CIA)
O mala Importante serviço da inteligência Orçamento calculado am
750 milhões da dólares: 15 000 funcionários Analisa grande parta da
produção da DIA • da NSAr
COMISSÃO
DE ENERGIA ATÔMICA
Interpreta Informações sobre acontecimentos mundiais no
campo nuclear.
Com 3Í500 funcionários;
orçamento da 775 miIhoee da dólares
Realiza quaaa todo o aau trabalho
da
espionagem
para a NSA.
Com 10 000 funcionários a orçamento Igual ao do
Exército. Deixou
de utilizar navloaespióes
Com 60 000 f uncionárlos;
orçamento de 2.8 bilhões de dólares,
quase todo aplica'
do no programa da
satêlltes-espiõea.
O olho de Nixon — A falha mais importante que Helms terá de combater,
no entanto, é de origem burocrática. Os
serviços militares não conseguem pôr-se
de acordo a respeito do sistema de vigilância sobre as armas estratégicas, a tal
ponto, que Nixon. não pode formular
uma política coerente nas conversações
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Inteligência no
campo daa drogas a da economia.
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nos documentos secretos do Pentágono,
o órgão do governo americano que tinha
visão mais realista da guerra da Indochina, a CIA errou ao menosprezar a feroz resistência comunista no Laos, onde
mantém quase um exército particular. A '
CIA também demorou demais, segundo
Nixon, em apcrccber-se da instalação
de foguetes soviéticos na zona egípcia
de cessar-fogo.
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DEPARTAMENTO
DO TESOURO
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tar os Estados Unidos num eventual teste
de força.
Nesse campo, porém, é que hoje se
situa o maior desafio à CIA — e a principal crítica do píesidente Nixon. Os
maiores buracos até hoje cavados pela
espécie humana têm surgido como cogumelos nas estepes das buses soviéticas de
foguetes.
E ninguém, nem mesmo Helms, sabe
que mortíferos engenhos neles váo ser
instalados. Isso apesar de a espionagem
americana dispor de maravilhas como o
avião SR-71 (3 200 km por hora), os
•satélites do Projeto 647 (3 500 km de altura, capazes de detectar um submarino
nuclear no fundo do oceano), o satélite
Grande Pássaro (10 toneladas).
Por outro lado, embora parecesse ser,
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DEPARTAMENTO
DE ESTADO
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com Moscou a respeito da limitação dessas armas.'
Helms terá ainda de enfrentar os liberais que desconfiam que a CIA planeja combater também o "inimigo interno"
e os numerosos congressistas que julgam
excessivos os gastos com espionagem.
Muitos também não consideram patriótico nem eficiente um agente da CIA
imitar a voz do príncipe pró-comunista
Norodom Sihanouk e sugerir pelo rádio que moças cambojanas durmam com
vietcongs — com o fim de lançar os
camponeses do Camboja contra os comunistas.
Acima de tudo, porém, Helms deve
preocupar-se cora o olho vigilante de
Nixon, que não quer mais ler informações errôneas ao tomar o café da manhã.
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