Fantasporto 2006

Transcrição

Fantasporto 2006
02
FORWARD
A REVISTA DE TODOS OS FESTIVAIS
>>
Sundance Film Festival [EUA]
Festival de Berlim
Panorama
ZagrebDox [Croácia]
Santiago a Mil [Chile]
Angoulême BD [França]
Arco Madrid
Arte Fiera [Itália]
ENTREVISTA
WrayGunn
Ilse van Verzen
Costa Gavras
<< REWIND
Nippon Koma
Experimenta design
Recontre des labos [Bélgica]
Quinzena de dança
Wintercase [Espanha]
Trans musicales [França]
Fantasporto 2006
Entrevistas a Beatriz Pacheco Pereira
e Mário Dorminsky
O essencial do Fantas
www.festforward.com
ISSN 1646-3056
inverno 2006 | trimestral | 2€ (IVA inc.)
PANORAMA
MOSTRA DO
DOCUMENTÁRIO
PORTUGUÊS
27JAN. 05FEV.
2006
FÓRUM LISBOA
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PRODUÇÃO
APOIOS
FEST APRESENTA
Saco de Gatos 06
Phono 08
E D I T O R I A L
«Soon our work is done,
All of us one by one.
Still we live our lives,
As if all this stuff survives.»*
“Big City Life”, Mattafix
Uma das missões da FEST é aproximar o nosso país da cultura
europeia, reflectindo sobre o que pode ser melhorado nos festivais portugueses. Esta publicação de âmbito cultural prova que
há um longo caminho a percorrer para que certas áreas da cultura possam ter festivais com F maiúsculo. Mas há excepções. Os
nossos festivais de cinema estão cada vez melhores, com público
e convidados internacionais de renome. Já os de música parecem
estagnados na mediocridade e o público português, tido como bêbado e idiota continua condenado a ouvir sempre a mesma cantiga. Claro que há uma contra-corrente que trabalha com poucos
meios e que merece ser apoiada por todos no combate a esta
situação dominante.
Em ano de eleições presidenciais anuncia-se mais uma luta
entre David e Golias. Teremos um D. Quixote disposto a combater
moinhos de vento? Ou será antes um D. Sebastião numa acção
suicida? Maio anuncia-se tremendamente quente com novo episódio Rock In Rio vs Super Rock.
Por enquanto estamos no Inverno, a estação do ano na qual
poucos arriscam fazer festivais, sobretudo em Portugal. Por isso
destacamos o mais carismático festival de cinema do país, o Fantasporto. Conversámos com duas pessoas que vivem e respiram
cinema, Beatriz Pacheco Pereira e Mário Dorminsky. Na FEST, o
destaque vai para a directora do Fantas, que sai do lugar sombra
para o qual é geralmente votada (pela comunicação social), para o
mais do que merecido protagonismo. Outras conversas ocorreram
com Carlos Matos, do Festival Fade In, com o realizador CostaGavras, com a documentarista Ilse van Velzen (num exclusivo de
Filipe Araújo, em Amesterdão) e com os Wraygunn, regressados
de diversos concertos muito bem sucedidos em França e Inglaterra. Vale também a pena ler com atenção os diversos postais
ilustrados que o nosso amigo Alexandre Nunes de Oliveira envia
de Barcelona, um festival de cidade.•
FORWARD DESTAQUE
Entrevista Beatriz Pacheco Pereira 10
Fantasporto 2006 11
Entrevista Mário Dorminsky 16
FORWARD
Cinema
Teatro
BD
Artes Plásticas
Música
18
24
26
27
30
REC
Carlos Matos — Fade In
Wray Gunn
Ilse Van Verzen
Costa Gavras
32
33
34
36
STOP
Cd’s 38
Dvd’s 39
Livros 40
REWIND
Cinema
Design
Pluridisciplinar
BD
Dança
Artes Plásticas
Música
42
52
53
54
55
56
57
PLAY
Janeiro 64
Fevereiro 65
Março 66
*Edição dedicada à vida e obra de José Ernesto Barreiros Mateus,
impulsionador deste projecto e de tantos outros.
Filipe Pedro . D I R E C T O R - A D J U N T O Gonçalo Guedes Cardoso . D I R E C T O R A D E A R T E Filipa Lourenço . E D I T O R E S João Pedro Correia, Ricardo
Duarte . C O N S U LT O R D E E D I Ç Ã O Luís Pedro Oeiras Fernandes . R E D A C T O R E S Alexandre Nunes de Oliveira (Barcelona), Cátia Monteiro, Dora Carvalhas,
Pedro Moreira . C O L A B O R A M N E S TA E D I Ç Ã O Ana Baptista, Ana Rocha Duarte, Catarina Medina, Filipe Araújo, Fred Huiban (Paris), Gonçalo Tocha, Ana Isabel
José (revisão), Joaquim Beleza, Jota Assis, Laura González, Lino Ramos, Luís Mateus, Pedro Miguel Guimarães, Raquel Ribeiro, Ricardo Lourenço Nunes,
Rui A. Cardoso (fotografia) . E N T I D A D E P R O P R I E T Á R I A AIFPS . N I F 506 788 342 . M O R A D A Rua do Cerrado do Zambujeiro, n.º 27, 2.º Frente 2610-036 Amadora . N . º D E R E G I S T O D O I C S 124836 . D E P Ó S I T O L E G A L 236878/05 . I S S N 1646-3056 . T I R A G E M 8.000 exemplares . D I S T R I B U I Ç Ã O Logista Portugal
— Av. República da Coreia, 34 Ranholas 2710-460 Sintra . P E R I O D I C I D A D E Trimestral . E M A I L [email protected] . P U B L I C I D A D E pub@festforward.
com . I M A G E M D E C A PA Hawl, de Kim Ki-Duk
DIRECTOR
| 05
João Mota [esq.] e André Braz [dir.]
Adam Green
título
O primeiro filme português
na Coreia do Norte
Novos realizadores
Esta é uma história de estreias. O primeiro filme
português a ser exibido na Coreia do Norte é a primeira curta-metragem de um jovem realizador, nasceu a partir do seu primeiro romance e a viagem é,
também, a estreia internacional da fita. Além disso,
João Mota ainda arrastou André Braz para o cinema, tendo realizado juntos a curta Saco de Gatos,
que estreia em Janeiro.
É a primeira vez que um filme português é exibido
na Coreia do Norte, um dos últimos redutos do comunismo autoritário centralizado. João Mota é o realizador e argumentista de Philidor, a curta-metragem que
competirá no 10.º Festival Internacional de Cinema de
Piongjang, entre 8 e 18 Abr. «Aceitei logo, sem saber
quando era nem como iria até lá», recorda João, agora
que o filme está legendado (em castelhano) e enquanto aguarda ansiosamente pelo dia de embarque.
«O filme tem muitos erros, porque fiz o Philidor
para mim, queria que englobasse tudo o que eu tinha
visto», reconhece o realizador, que chegou ao cinema
como autodidacta e com apenas alguns apoios téc06 | Fest apresenta
nicos reunidos. «Juntei uma equipa muito disponível
e em que só uma pessoa sabia o que estava a fazer»,
revela em tom risonho, referindo-se a João Salomão,
co-realizador de Philidor e, na altura, estudante na
escola ETIC. «Arrisquei», assume, explicando como
acordou com a Sony Portugal o empréstimo dos
meios para fazer o filme, com o compromisso de, durante dois anos, apresentar vários conteúdos audiovisuais. Contudo, nenhuma das propostas agradou à
multinacional, nem a curta-metragem, nem um episódio piloto para uma série televisiva de humor, Cuecas
Curtas (2005).
O convite para a ida à Coreia do Norte surgiu
depois da passagem de Philidor pelo circuito nacional
de curtas em 2004, em que foi nomeado para vários
prémios.
O último reduto do comunismo
A Coreia do Norte é «o país menos visitado, menos conhecido e menos compreendido do mundo»,
pode ouvir-se na abertura de A State Of Mind, docu-
mentário britânico que reporta o quotidiano de duas
ginastas norte-coreanas e que fez furor na edição anterior do festival.
Na verdade, até à data de fecho desta edição, a
FEST apenas conseguiu confirmar a presença da fita
portuguesa e mais algumas informações.
Assim, nesta 10.ª edição, cujo programa ainda não
está definido, estarão presentes mais de 40 países,
que se espera que apresentem mais de uma centena
de filmes, entre curtas-metragens e documentários,
as duas categorias do evento.
Num misto de filmes independentes, e até contestatários, e de fitas glorificando o regime do país
— como este norte-coreano Glory Of Our People In
Holding the Great Leader In High Esteem, apresentado
em 1992, — o festival vem mostrando uma tendência
de abertura cultural. Prova disso foi a projecção
de fitas japonesas, pela primeira vez, na edição de
2000 e agora a inclusão de um filme português
cinematografia.
Este evento, originalmente denominado festival
Internacional de cinema de Piongjang para os não-alinhados e outros países em desenvolvimento, iniciouse em 1987 e desde 1990 que tem carácter bienal.
Saco de Gatos estreia em Janeiro
João Mota e André Braz não se conheciam até ao
momento em que o segundo disse: «vi o teu filme, e
não gostei». Em Julho passado filmaram Saco de Gatos, curta-metragem em que repartem a realização.
«Pensei que ele não me voltasse a falar», confessa André, 23 anos, recordando como se conheceram,
uma manhã, no bar da faculdade, obrigados pelo vigilante a acabar o cigarro na esplanada, ao frio. «Gostei
da frontalidade com que o André me disse que não tinha gostado do Philidor», acrescenta João, 25 anos.
A história de Saco de Gatos — cujo teaser a
FEST já viu e está disponível em www.c7nema.net
— desenvolveu-se a partir de uma ideia de André,
aparentemente banal: uma perseguição a pé, em
ambiente urbano. João construiu o argumento, num
ritmo dinâmico e invertendo a ordem cronológica dos
acontecimentos. Os autores descrevem-na como
«a história de um assalto a um banco, em que as
personagens não são o que parecem».
Saco de Gatos, curta-metragem que vai buscar o
nome a uma expressão portuguesa que designa uma
grande confusão, estreia em Janeiro.• T João Pedro Correia
Phono’05
Serviço público a precisar
de apoio público
O Phono preenche um espaço essencial na
apresentação de novas bandas. A edição de 2005
pautou-se por lotações esgotadas consecutivas e
pelas boas actuações dos Novembro e Bicho de
7 Cabeças. Apesar das excelentes competências
da organização, uma coisa é certa: a Fonoteca
necessita de mais apoios e de uma nova casa, com
mais condições e um anfiteatro para concertos.
O início do concerto dos Eroscópio foi penoso,
com som de baixo exagerado, bateria esmagadora
e guitarra acústica inaudível. Um dos trunfos da
banda é a voz de António Revéz, meio contador de
histórias, meio radiofónica. Contudo, as músicas soam
inacabadas, com finais abruptos. Excepções feitas
para “O Encontro”, de Natália Correia (hilariante e bem
tocado) e “O Ofício De Amar”, de Al Berto.
No dia seguinte, a guitarra foi demasiado
proeminente, deitando por terra um trabalho que se
poderia aproximar das bandas sonoras para filmes de
Emir Kusturica. Falamos da Orquestrinha do Terror,
onde coabitam uma série de ideias soltas. Contudo,
o facto de cada elemento puxar para seu lado resulta
numa cacofonia desinteressante.
Foi um verdadeiro Bicho de 7 Cabeças albergar
todos quantos quiseram ver a banda na Fonoteca.
A banda apresentou uma excelente conjugação
instrumental, com um sentido estético misto de
contemporaneidade e de tradição. Apesar do longo
trabalho a percorrer, a música tradicional portuguesa
poderá ter aqui descendentes do GAC e dos Gaiteiros
De Lisboa. Os temas “Dom Quixote” e “Cantar Da
Popa” resultaram muito bem ao vivo.
Sem desprimor para os Novembro, a voz de Miguel
Filipe tem algo de Paulo Bragança. João Pécurto e Mark
Harding completam a formação, na guitarra portuguesa
e no Roland V Drums, respectivamente. “Desordeiro”
foi a sua música mais Pop, com uma bateria mais
convencional e uso de pandeireta. “Jornada Dos
Passos Cegos” e “Plenitude” resultaram bem ao vivo,
tal como “Algemas”, de Amália Rodrigues, que apontou
para novos caminhos, incorporando guitarra baixo
numa interessante combinação de Fado com Pop.
Já os New Connection tiveram alguns problemas
iniciais com o som de palco, nomeadamente o que saía
da bateria de Jorge Nunes. A vocalista Sandra Cachaço
demonstrou presença e à-vontade, e os temas que
contaram com João Alves, convidado especial na
cítara, ganharam uma certa dinâmica, muito embora a
sensação de visto (e revisto) nunca deixasse de estar
presente ao longo de toda a actuação. Ainda assim, os
temas “Window Dummies” e “Little Tommy” resultaram
melhor ao vivo do que na compilação Phono’05,
distribuída gratuitamente aos visitantes da Fonoteca.•
T
Filipe Pedro I Rita Carvalho
www.cm-lisboa.pt/fonoteca
08 | Fest apresenta
Entrevista a Beatriz Pacheco Pereira
Cinema: ‘o respeito pela
imagem grande’
A Directora de Programação do Fantasporto é
uma pessoa muito peculiar. Para além de respirar
cinema, escreve, pinta, faz cerâmica e jardinagem.
Em pequena queria ser actriz, assustou-se com O
Feiticeiro de Oz e catalogava escrupulosamente os
filmes que via, em pequenos cadernos. Contagiada
pela magia do cinema, a FEST trocou a ordem natural das coisas: Beatriz Pacheco Pereira assume o
protagonismo, enquanto Mário Dorminsky desce à
segunda posição.
Estando tão próxima do mundo do cinema,
nunca se sentiu tentada a realizar algum projecto
nesse âmbito?
Digamos que sou muito boa espectadora de cinema e, como gosto de apreciar e depois criticar, reflectir,
10 | Forward Destaque
escrever, etc. ainda não passei por essa fase. Já tive
várias tentações de escrever um guião, de realizar a
partir de trabalhos de outras pessoas, mas nunca se
concretizou. Não me parece que seja a minha vocação,
porque se fosse já tinha dado por ela. Não tenho muita
pressa, prefiro outras coisas. O que é estranho, porque
normalmente as pessoas querem é fazer filmes.
Diversos críticos já fizeram…
São poucos os críticos de cinema que resistem à
tentação de fazer um filme, mas normalmente quando
fazem são muito maus. Eu prefiro a parte artístico-literária. E a reflexão sobre os filmes, como é que eles reflectem os tempos em que nós vivemos. Ver como é que
através deles se podem conhecer todas as épocas e
todos os sentimentos humanos, como se articula o mun-
do do passado e o do futuro com os nossos dias. Gosto
particularmente da ficção científica porque nos permite
ler as linhas mestras do nosso presente em relação ao
que poderá vir a ser o futuro.
Júlio Verne e William Gibson, por exemplo.
Exactamente. Há na ficção científica um lado premonitório, mas que se estiver totalmente desligado da
realidade acaba por não funcionar. Gosto muito dessa
ligação entre passado, presente e futuro.
Quais foram os filmes que marcaram a sua infância ou adolescência?
O Feiticeiro De Oz, por exemplo, um filme que marcava toda a gente que o via. Porque era um filme que
tinha uma história muito simples, mas ao mesmo tempo
tinha uma imaginação delirante e um lado brincalhão.
Ou seja, não era cinema de crianças, não era cinema de
horror, não era cinema do imaginário, mas ao mesmo
tempo era tudo isso. Além de que estava muito bem
feito. Fiquei assustadíssima com O Feiticeiro De Oz.
Gostei ainda dos filmes históricos que se faziam nas
décadas de 50 e 60, que eram bastante frequentes nos
nossos cinemas. Filmes que se passavam na Segunda
Guerra Mundial, que eram filmes relativamente recentes
quando tinha 15 anos. Gostei também de ver como os
antigos, ainda no tempo dos mudos, contavam a história. Como a narrativa se fazia quase sem palavras, só
com aqueles quadros intercalares. A narrativa cinematográfica é uma coisa fascinante. Podemos ter um só
plano, sem palavras e dizer-se imenso. Tal como existem planos cheios de diálogos onde não se diz nada.
Na altura já tinha curiosidade de descobrir pormenores cinematográficos por detrás dos filmes?
Não, não. Comecei como espectadora que reflecte
sobre os filmes depois de os ver. Tinha um caderno
onde apontava tudo, com uma espécie de sinalética,
porque não queria que ninguém percebesse o que andava a fazer. Tinha símbolos para os actores, o realizador, a história, etc. Depois agrupava-os por categorias,
em géneros e subgéneros. Mais tarde comecei a ver
cinema europeu e senti de imediato uma certa diferença, porque o cinema que chegava à nossa televisão, na
altura, era o cinema americano. Por um lado foi muito bom, porque me permitiu ver os grandes clássicos
dos anos 30, 40 e 50. Depois, quando comecei a ver
o cinema europeu consegui ver outra coisa muito interessante, que é a relação entre cinema e literatura. Vivi
sempre numa casa que tinha imensos livros e a minha
vocação do cinema é tão precoce que aos sete anos já
lia revistas de cinema e tudo o que apanhava. As fotonovelas, por exemplo, tinham sempre uma secção de
cinema. E sigo um bocado o gosto que os meus pais
também tinham pelo cinema...
Fale-nos da influência cinéfila dos seus pais.
A minha mãe fazia desenhos de actores e o meu
pai levava-me ao cinema. O colégio onde eu andava
tinha sessões de 35 mm. Ao lado havia a igreja de Nossa Sra. da Conceição, onde também havia sessões de
cinema. Portanto, havia cinema por todo o lado na minha vida. Mais, a televisão chegou a Portugal era eu
muito miudinha e foi assim um vislumbre, senti uma
iluminação. Eu queria ser actriz, atenção. Achava que
era natural para mim ser actriz.
Voltando ao tema do cinema europeu, este
está geralmente mais próximo da literatura do que
o americano.
Nomeadamente o cinema francês e o italiano,
que se via muito naquela época. O francês vive muito
da palavra. Os meus inícios fazem-se com o cinema
americano clássico e com o cinema europeu. Mais
tarde, nos meus 20 anos, por altura do 25 de Abril,
começa a chegar o cinema dos países de leste.
Agenda Fantasporto 2006
www.fantasporto.com
Ciclo de Cinema Neo-Zelandês
Passos Manuel
12 a 16 Jan, 18h e 21h30
12 Jan — The Price Of Milk, de Harry Sinclair
13 Jan — The Ugly, de Scott Roberts
14 Jan — Rain, de Christine Jeffs
15 Jan — Desperate Remedies, de Stewart Main e Peter Wells
16 Jan — Toy Love, de Harry Sinclair
Exposição de Manu Gomez
Biblioteca Almeida Garret, Galeria Sala Maior
1 Fev a 15 Mar
mundo das artes plásticas. Na Biblioteca Almeida Garret e na
Galeria Sala Maior, na Rua Miguel Bombarda, 498, é inaugurada
uma exposição dos trabalhos de Manu Gomez. Homens que se
transformam em peixes, figuras disformes, olhos que têm barbatanas e nadam, variações sobre a crucificação de Cristo, imagens que reunidas formam o mundo mágico, mutante e surreal
de Manu Gomez. Este artista belga, verdadeiro homem dos sete
ofícios, espalha o seu perfume criativo por diversificados domínios da arte, seja o cinema, a escultura, o design ou a pintura.
Artista polivalente, pinta, desenha e esculpe em vários suportes
e em diferentes materiais. Já expôs em Paris, em muitos outros
locais de França e no Palácio da UNESCO em Beirute.
Com a Exposição de Manu Gomez, o Fantasporto entra no
Forward Destaque | 11
Abre-se então um espectro enorme e aí arrancamos
com o Fantasporto.
Numa altura mais do que propícia para tal. Para
mais, já editavam a revista Cinema Novo.
Sim, 1981 era a altura perfeita. O grande salto da
palavra para a imagem faz-se na altura em que tudo é
possível, ou seja, todo o cinema que nós tínhamos visto até ao 25 de Abril era um cinema cortado, censurado
e limitado — não tínhamos acesso a todos os países
nem a todas as cinematografias. A revista surge para
absorver essa abundância de informação. De 1978 a
81, dá-se o nosso salto (meu e do Mário Dorminsky, já
na altura, claro), para ver o que é que se fazia lá fora em
termos de festivais de cinema. Por exemplo, o festival
de Sitges era uma coisa organizada por um senhor que
tinha uma loja de fotografia.
Mas já tinha alguns anos quando começou
o Fantas…
E era um festival de horror puro, não era de imaginário. Horror, horror. Mas nós também íamos ao festival
da Figueira da Foz e ao festival de Santarém... Eu e o
Mário achámos que havia que dar o passo, e o Fantasporto surge numa conversa de café. E por que é que
nós apostámos sempre numa revista? O meu grande
sonho era ter uma belíssima revista de cinema e em
1981 não havia Premieres. Era pela palavra que nós
chegávamos a todo o manancial de filmes que havia lá
fora. Quando começámos a ter a possibilidade de os
trazer para o Porto, para o Fantas, ficámos com a sensação de que o filme é que era. Anos depois fizemos
mais uma tentativa com a revista Estreia [que começou
em 1989, durou até há bem pouco tempo e continua
em formato blog].
125 dias de Fantasporto comemoram, no biénio
2005/06, 25 anos de festival. Não se torna complica-
do explicar como é que um festival pode ter quatro
meses de actividades quase permanentes?
Não, não é nada complicado. Nós estamos, e com
muito gosto, na cidade do Porto. Quando as pessoas
dizem que não se passa nada durante determinadas
épocas do ano, nós gostamos de dizer que podemos
animar a baixa. Para além disso, o Fantasporto tem excesso de oferta nas diversas retrospectivas. Se vamos
integrar tudo no Fantas, as pessoas não têm tempo
para ver. Por exemplo, este ano há uma belíssima retrospectiva de cinema húngaro. Quantas pessoas terão
tempo para ver as sessões competitivas e o cinema
húngaro? Portanto fizemos uma separação de águas.
Separámos algumas retrospectivas para outras épocas
do ano em que o cinema, como animação cultural, é
mais necessário. Foi por isso que inventámos o programa dos 125 dias.
Como é que será a animação da baixa em
Janeiro e Fevereiro?
Entre outras coisas, haverá uma mostra do cinema
espanhol e outra dedicada ao cinema de horror. Tornase premente manter o nome do Fantasporto porque há
muitas pessoas que, inclusivamente por falta de informação ou falta de leitura de jornais, não se apercebem
do que de facto se passa no Porto. E uma das coisas
que o Fantasporto sempre teve orgulho foi em nunca
mostrar apenas cinema, mas promover também exposições, a edição de livros, concertos desde a música
clássica ao Rock, etc.
E a homenagem a Bollywood?
Quem conhece sabe que o cinema indiano contemporâneo é absolutamente fascinante. Não falo apenas
do cuidado que eles colocam nas cores e nos cenários,
mas também daquela música contagiante. Saímos de
lá com uma enorme vontade de dançar. Além disso,
as histórias não são idiotas e a questão mais delicada
15, 16 Fev — Sangre Eterna, de Jorge Olguín
17, 18 Fev — The Irrefutable Truth About Demons, de Glenn
Stranding
19, 20 Fev — The Last Horror Movie, de Julian Richards
21, 22, 23 Fev — Meet The Feebles, de Peter Jackson
26.º Fantasporto
Diversos locais do Grande Porto
20 Fev a 5 Mar
Horror Film Fest
Passos Manuel
9 a 23 Fev, 18h e 21h30
09, 10 Fev — Audition, de Takashi Miike
11, 12 Fev — Braindead, de Peter Jackson
13, 14 Fev — The Texas Chainsaw Massacre, de Tobe Hooper
12 | Forward Destaque
São muitas as novidades para a 26.ª edição do Fantas. Retrospectivas sobre o Cinema Expressionista Alemão, a Bollywood,
aos Irmãos Shaw e a Bill Plympton. O Fantasporto realiza-se
entre 20 Fev e 5 Mar, em diversas salas do Grande Porto — no
Teatro Municipal Rivoli, no Cinema Passos Manuel, na Biblioteca
Almeida Garret, no Palácio de Cristal e nos Cinemas AMC do
Arrábida Shopping.
é o facto de os filmes durarem sempre três ou quatro
horas. Isso obriga-nos a dispor de mais um espaço de
projecção, neste caso a Biblioteca Almeida Garrett.
Pretendemos decorar o recinto a rigor para as pessoas verem o melhor cinema indiano de diversas épocas.
Possivelmente vamos ter danças indianas e húngaras.
Portanto este ano vai ser o ano da dança (risos).
O Fantassound mantém-se?
Sim, mas não terá lugar durante o festival, como
sucedeu em 2005. Vamos tentar conferir ainda maior
relevância à música portuguesa no Fantassound.
Nota-se uma disponibilidade enorme por parte dos
grupos portugueses por tocarem no contexto do Fantasporto. O que é um orgulho para nós. Somos do cinema e não do Rock, mas gostamos muito deste cruzamento entre as várias artes.
E o 26.º Fantasporto propriamente dito, como
será?
Este ano vai ser uma boa colheita. Em competição
teremos uma espécie de ópera de terror húngara, novos filmes de nomes japoneses e coreanos conceituados, como Shinya Tsukamoto (Female) e Kim Ki-duk
(Hwal), filmes espanhóis fascinantes, como Inconscientes, de Joaquín Oristrell, excelentes filmes do Quebec
e bons filmes portugueses — pela primeira vez o Fantasporto vai abrir com um filme português a concurso,
Coisa Ruim, de Tiago Guedes.
A primeira longa-metragem de Tiago Guedes
após uma mão cheia de curtas interessantes.
E é um sério candidato a prémios de interpretação.
Aliás há outro filme português muito bom. Chama-se
Animal e trata-se de uma co-produção portuguesa,
francesa e inglesa, com o Diogo Infante como protagonista. Este ano espero que o prémio de actores fique cá em Portugal (risos). Isto na secção do Cinema
Cinema Húngaro e Bollywood por um dia
Grande Auditório do Rivoli
20 a 23 Fev, às 15h, 17h, 21h15 e 23h15
Uma Retrospectiva do Cinema Húngaro será o prato forte do
Pré-Fantas. Alguns dos melhores filmes daquele país vão ocupar as tardes cinéfilas. Contudo, uma dessas tardes, é dedicada
ao cinema que se faz em Bombaim. A Retrospectiva Bollywood
terá o seu centro nevrálgico no auditório municipal da Biblioteca Municipal Almeida Garret, mas aqui vamos ver Devdas, uma
história de amor acima de tudo, até da vida. O programa será
complementado com diversas antestreias nacionais.
Fantástico, atenção. Vamos também passar o Espelho
Mágico, de Manoel de Oliveira, realizador que aos 97
anos está a fazer um novo filme e merece, sem dúvida,
a nossa homenagem. Temos ainda curtas metragens
de grande qualidade e uma Semana Dos Realizadores
muito boa. Vamos ter um filme muito engraçado chamado Cineastas Contra Magnatas.
Soa a documentário.
Exacto, são dois documentários muito recomendáveis do catalão Carlos Benpar (o segundo chama-se
Das artes marciais, à ópera Huangmei, passando pela comédia, o Fantas homenageia os Irmãos Shaw, os mais profícuos
produtores do cinema chinês. Por outro lado, vamos ter a oportunidade de ver os filmes de animação mais importantes de Bill
Plympton, como é I Married a Strange Person. Resta espaço,
ainda, para o Cinema Expressionista Alemão. Clássicos como
Nosferatu, Metropolis ou Fausto são projectados no Pequeno
Auditório.
Os Irmãos Shaw, Bill Plympton
e o Expressionismo Alemão
Pequeno Auditório do Rivoli
20 a 23 Fev
Forward Destaque | 13
Cineastas Em Acção), concorrentes aos prémios Goya.
Como se vê, vamos ter um programa muito variado.
Apesar da massificação do DVD, cinema é para
ver no cinema?
Para mim é. Em televisão também, mas como
complemento. Gosto de cinema é em ponto grande.
A magnitude do cinema marcou-me desde criança.
O cinema para mim é de impacto. Há uma espécie de
respeito, meu, pela imagem grande.
Os vossos comentários, a vossa disposição e
o vosso empenho é constante. É essa a receita do
sucesso Fantas?
Eu e o Mário damos a cara. Não há nenhum festival do nosso nível em que o director e a directora
estejam ali para falar com os convidados e com o público sem problemas. É uma vantagem de Portugal.
Qualquer trabalho que se faça com amor, empenho
e reflexão, acaba sempre por ter sucesso. Nós nunca
tivemos medo do contacto pessoal com o nosso público. Mesmo quando dizem «não gostei deste filme» ou
«este filme não devia estar cá», tentamos explicar que
aquele filme tem uma vertente que é importante para o
festival, que se deve mostrar. Nesse aspecto nós damos a cara com muito gosto.
Como é que se sente no conjunto mulher, mãe,
professora, escritora e directora do Fantas?
Também faço cerâmica, pinto, faço jardinagem, vou
às compras, passeio o cão... de tudo um pouco (risos).
Mas à custa de muitas horas de trabalho. A parte de ser
escritora era a que gostaria de explorar melhor agora,
até porque estou a ter bastante sucesso. Mais sucesso desde há quatro anos do que em quarenta anos de
cinema. Apesar de não ser nada rentável, gostava de
explorar a parte da escrita, pelo prazer de saber que se
tem leitores. Por exemplo, este de O Porto E As Suas
Mulheres acabou por me dar um feedback bastante
gratificante das pessoas que estão lá retratadas. Em
relação ao livro anterior, que era de crónicas, chamado
Do Porto E Do Olhar, recebi elogios de figuras públicas
como Marcelo Rebelo de Sousa, que disseram coisas
muito bonitas sobre o livro. Antes desse foi o romance. Houve quem gostasse, quem não gostasse, mas as
pessoas não ficam indiferentes.
Como é que foi o processo de recolha para
O Porto E As Suas Mulheres?
Tinha visto um dicionário de personalidades com
600 entradas de homens e 60 de mulheres, das quais
30 eram do Porto. Depois achei que muitas das pessoas que estavam nesse livro não eram aquelas que
conheço e que sei que fazem coisas. Algumas que lá
estavam não eram de facto personalidades, mas sim
pessoas conhecidas de quem fez o dicionário. Achei
que havia pessoas que mereciam estar registadas e foi
para isso que fiz o livro, para registar. O livro tem uma
parte biográfica e depois tem os depoimentos das pessoas. E essa parte dos testemunhos acabou por ser
muito mais interessante porque me deu uma perspectiva do mundo em função da história social portuguesa
desde os anos cinquenta. Isso foi muito interessante.
Até a conquista do próprio direito ao estudo, mudou imenso. As mulheres do Porto já fundaram companhias de teatro e já fizeram trabalhos pioneiros na
área da medicina.
E quais são as próximas edições?
Tenho programado outro volume de contos e tenho
um romance a meio. Mas, e tempo? Antes do Fantasporto não vou ter tempo para fazer nada. É uma vida
muito preenchida. Quando morrer espero que as pessoas digam «ah, aquela fulana valeu a pena ter vivido».
Se pelo menos disserem isso já não é mau (risos).•
T
Filipe Pedro
Bollywood no Palácio de Cristal
Auditório da Biblioteca Municipal Almeida Garret
22 Fev a 3 Mar, 15h e 19h
O cinema de Bombaim em destaque. A Retrospectiva Bollywood
leva o Fantasporto ao Palácio de Cristal. São exibidos alguns
dos maiores sucessos do cinema indiano da actualidade.
Love Connection
Passos Manuel
24 Fev a 2 Mar, 18h e 21h30
O Cinema Passos Manuel é o Quartel General da Secção Love
Connection. O amor já não é o que era. O ser humano tende
para um relacionamento diferente do habitual. O normal estraga
o amor. Os cineastas estão, cada vez mais, a explorar estas
relações diferentes, estranhas, excitantes! O Fantasporto criou
um espaço para elas… De mulheres que encontram a cura para
14 | Forward Destaque
as doenças através do sexo, a jovens prostitutos perdidos numa
França demasiado marginal, há de tudo um pouco.
Sessão Oficial de Abertura
Grande Auditório do Rivoli
24 Fev, 21h15
É a abertura oficial do Fantas com a exibição em antestreia
mundial de um dos grandes filmes da nova produção nacional:
Coisa Ruim, de Tiago Guedes, por certo uma das grandes surpresas do ano cinematográfico.
Cinema Fantástico e Semana dos Realizadores
Rivoli
25 Fev a 5 Mar
Até 5 Mar, com os seus dois principais sectores competitivos
— Secção de Cinema Fantástico e Semana dos Realizadores.
Cinematografias de todo o Mundo estarão representadas, em
particular a norte-americana e a europeia, que voltam em força
ao certame portuense.
Orient Express
Rivoli
24 Fev a 5 Mar
Foram escolhidos os melhores filmes da produção oriental, Japão, Coreia do Sul e Tailândia, entre outros. O Fantas é responsável pela introdução no nosso país desta cinematografia.
Sentido o peso da responsabilidade, só os melhores filmes vêm
ao Porto. A audiência é exigente e está atenta. Cinema de terror,
acção e ficção científica com carimbo do Oriente constrói esta
secção.
Baile dos Zombies
Sá da Bandeira
27 Fev, 23h59
Panorama do Cinema Português (Porto em Curtas)
Rivoli
2 a 4 Mar
Este ano o Fantasporto vai homenagear Manoel de Oliveira, projectando uma das suas últimas obras. Manoel de Oliveira é do
Porto e, tal como o Fantasporto, leva o nome da cidade invicta a
todo o mundo. É uma homenagem mais do que merecida.
Sessão Oficial de Encerramento (Entrega de Prémios)
Rivoli
4 Mar, 21h15
Baile dos Vampiros
Sá da Bandeira
4 Mar, 23h59
Premiados do Fantas 2006
Rivoli
5 Mar
Condições de acesso ao Fantas 2006
O bilhete para qualquer sessão normal do Rivoli pode ser adquirido por 3,5 euros; o bilhete para as galas e sessões de Abertura
e de Encerramento custa 4 euros; o Livre Trânsito Rivoli — que
inclui entradas para todo o programa do Grande Auditório do
Rivoli, para o Pequeno Auditório do Rivoli (mediante requisição
e sujeito à disponibilidade de lugares) e catálogo, cartaz e postal
do festival — custa cem euros; os bilhetes bónus Rivoli — colecção de dez bilhetes que podem ser trocados nas bilheteiras
do Rivoli para todas as sessões normais do Festival a terem
lugar no Grande e Pequeno Auditório do Rivoli (excepto para as
sessões de Abertura e Encerramento).
Anima-te
Rivoli
25 Fev a 5 Mar
O Festival Internacional de Cinema do Porto criou uma secção
oficial especificamente dedicada ao cinema de animação. Esta
secção incluirá uma mão cheia de longas metragens inéditas
em Portugal, vindas de todo o mundo, da França aos EUA,
passando pela Alemanha, Espanha e Coreia do Sul. Além de
curtas-metragens serão exibidas diversas longas-metragens
inéditas, bem como, algumas que passaram desapercebidas
do grande público, pérolas perdidas da animação.
DVDs Fantas no Público
www.publico.pt
Alguns dos melhores filmes do Festival Internacional de Cinema
do Porto vão chegar ao público em DVD, numa edição conjunta
com o jornal Público. Oportunidade para deitar a mão a filmes
de culto como Bug, de Phil Hay e Matt Manfredi, Sangre Eterna,
de Jorge Olguin, O Auto Da Compadecida, de Guel Arraes e An
Angel At My Table, de Jane Campion, entre outros. A melhor
maneira de começar o ano é esta, dar aos fãs do Fantas aquilo
que eles querem, os filmes que muitas só viram uma vez e agora
podem possuir em DVD.•
Forward Destaque | 15
Entrevista a Mário Dorminsky
Tiques fantásticos
Não é que as criaturas da noite e do terror tenham sido banidas do Fantasporto, mas aqui a noção de fantástico ultrapassa um género, para englobar «tudo o que é imaginário». O apelo da fantasia de um festival maduro e reconhecido a nível internacional, aqui dissecado por Mário Dorminsky,
director do Fantas.
O Fantasporto recebeu uma medalha de mérito
atribuída pelo Estado Português, para além de ter
sido considerado pela revista Variety como um dos
16 | Forward Destaque
25 festivais mais importantes do mundo. Foi a confirmação da maioridade do Fantas?
A maioridade do festival já existe, do meu ponto de
vista, desde os dez anos, altura em que a base do festival actual ficou criada, com a introdução da Semana
dos Realizadores e o alargamento do âmbito do certame, não só da área do fantástico como do cinema em
geral. A partir daí o festival foi crescendo no sentido de
conquistar mais públicos, mais divulgação e prestígio
internacional. A Variety, que é uma bíblia do espectáculo, considera o Fantasporto um dos 25 festivais mais
importantes do mundo. E isso é notável, não é uma
questão de ser uma honra mas sim o respeito por um
trabalho que tem sido feito ao longo de 25 anos.
O que permitiu a transição da mostra para o formato de festival?
A mostra foi um ciclo normal que nós realizámos
em 1981. Fizemos uma revista de cinema que durou
cerca de 15 anos, que era a Cinema Novo, lançada em
1978 por um grupo de cineclubistas. E as pessoas que
faziam parte dessa revista acharam que seria muito
interessante também a realização de eventos, ciclos,
retrospectivas. Eram mostras dedicadas a uma diversidade de temas e um dos que nós escolhemos foi o
cinema fantástico, que a determinada altura achámos
que estava a emergir no panorama internacional. Tinham aparecido dois grandes filmes que de alguma
forma tinham alterado o tipo de produção que se fazia,
os Encontros Imediatos Do Terceiro Grau, de Steven
Spielberg, e A Guerra Das Estrelas, de George Lucas.
Decidimos apostar num projecto na área do fantástico, só que com características diferentes. O fantástico
para muita gente é monstros, vampiros, sangue, terror
e coisas desse género. Para nós nunca foi isso. É o
oposto da realidade. Tudo o que não é real, tudo o que
é imaginário, é fantástico.
Como tem sido a afluência de público?
Eu diria de uma forma objectiva e real que nós não
podemos ter mais público do que temos. E por uma
razão simples: as sessões que não estão esgotadas
não o estão porque as pessoas que têm cartões não
foram às sessões. Quer dizer que não há hipótese de
ter mais gente a assistir ao Fantasporto. Isto nesta sala,
mas também não queremos mudar. Preferimos garantir
salas cheias e bom ambiente, garantir que as coisas
funcionem como têm funcionado, num regime de grande festa, do que ter salas semivazias só para dizer que
temos muitas salas com grande capacidade.
Este projecto teve sempre viabilidade financeira?
Sempre teve viabilidade financeira porque sempre
se realizou. O problema é que nós não temos hipótese
nenhuma de protestar, porque se dizemos que estamos em crise, isso em termos públicos altera a nossa
imagem de vencedor para uma imagem de perdedor.
Agora, que temos sofrido violentamente, especialmente nos últimos quatro anos com a recessão económica,
temos, e tem sido extremamente difícil garantir a manutenção do festival.
Como é a relação do Fanstasporto com o circuito de distribuição comercial português?
A relação é total. Integra-se no mundo da indústria
do cinema, e é assim que um festival se deve colocar.
Um festival de longa-metragem, que no fundo pretende
fazer parte do grupo dos tais leading festivals of the
world. E porquê isso? Por uma razão extremamente
simples: os grandes festivais internacionais de cinema
são meios para promover os filmes, as cinematografias, novos realizadores. Promover e lançá-los para o
mercado. E o Fantasporto, sobretudo a partir do ano
2000, começou a ter praticamente todos os filmes que
exibia com a chancela de vários distribuidores que iam
comprando, ou antes ou depois, os filmes que nós íamos exibindo. A taxa de filmes que o Fantasporto exibe
e que posteriormente ao festival têm exibição comercial em Portugal atinge quase os 95 por cento, o que
para nós eu acho que é fantástico.
Quais as preocupações inerentes à escolha dos
filmes que integram a programação do Fantas?
Qualidade, qualidade, qualidade. Gozo, gozo, gozo. Isto é, pode haver gozo com qualidade, pode haver
só gozo, ou pode haver bom cinema. Por exemplo,
quando apresento um filme como o Night Of The Living Dorks, aviso claramente na sessão de apresentação que «vamos ver um filme à Fantas antigo». Isto é,
um filme série B, um filme que é para as pessoas se
divertirem. E isso aí é exibir bom cinema? Não, mas
é uma forma de animar as pessoas. Por outro lado,
a selecção oficial competitiva da área do fantástico
tende a ser difícil e isso é algo que tem que ver com
o nosso sistema de patamares, que para nós é fundamental. Trata-se de garantir que possamos cada vez
mais mostrar os filmes que queremos mostrar, sem ter
problemas com o público.
Mas continua a haver a necessidade de usar determinados filmes mais fáceis como isco, até para a
comunicação social?
Teoricamente há dois tipos de comunicação social.
Há aquela que se considera inteligente e então não
é comunicação social, é crítica. E há a comunicação
social que faz jornalismo. A que faz jornalismo conhece pouco de cinema. Eu lembro-me perfeitamente de
anunciar o Guillermo del Toro e o Vincenzo Natali a
virem cá e nenhum jornal pegou nisso. Quer dizer que
eles nem sequer conhecem quem é o homem que faz o
Hellboy, não sabem quem é o homem que faz o Cubo.
Independentemente de Portugal não servir rigorosamente para nada em termos da promoção internacional dos nomes que neste momento fazem o cinema,
a vinda deles cá será pelo puro gozo de estar num
espaço em que eles se sintam bem. E vêm descobrir
uma cidade, o que creio ser um papel fundamental no
turismo cultural. O Fantasporto pode e deve integrar
aquilo que é a indústria da cultura e do turismo. Mas
nesse aspecto terá de ser muito mais bem aproveitado por aqueles que o patrocinam, que é o Estado. Só
que não é com as verbas com que apoiam actualmente
os festivais de cinema que o Estado vai garantir esse
impacto mediático internacional. Tem de haver apoios
mais substanciais para que os certames que já existem
e que têm algum impacto internacional possam ter um
impacto muitíssimo maior.• T Cátia Monteiro F Rui A. Cardoso
Forward Destaque | 17
28.º Festival Sundance
A referência em
cinema independente
Park City — Utah, EUA
19 a 29 Jan | www.sundance.org
Para a edição de 2006 deste Sundance foram
seleccionados 120 filmes, incluindo 84 estreias mundiais, em representação de 29 países, e 18 estreias
norte-americanas.
A participar na categoria de curtas-metragens estarão filmes tão distintos como Dealbreaker, realizado
por Gwyneth Paltrow e Mary Wigmore, ou Your Dark
Hair Ihsan, uma produção conjunta entre os EUA e
Marrocos, dirigido por Tala Hadid.
O festival abre com a estreia absoluta de Friends
With Money, escrito e realizado por Nicole Holofcener,
que actua no seu próprio filme, ao lado de Jennifer
Aniston e Joan Cusack. A fechar o evento, outra novidade, Alpha Dog, escrito e realizado por Nick Cassavetes, com Justin Timberlake e Sharon Stone.
O Festival de Cinema de Sundance tornou-se, ao
longo dos anos, no local ideal para ver cinema norteamericano independente. Filmes míticos como Sexo,
Mentiras E Vídeo, de Steven Soderbergh, Stranger
Than Paradise, de Jim Jarmusch, ou Blood Simple, dos
irmãos Coen, foram descobertos no certame.
Tudo começou em 1978, quando um grupo de jovens cineastas se juntou para organizar o Utah/US Film
Festival, em Salt Lake City, que durante sete dias apresentou uma competição para filmes independentes
americanos. O primeiro filme de Quentin Tarantino, Reservoir Dogs – Cães Danados, teve a sua estreia neste
festival, depois de produzido com o apoio do Instituto
Sundance. Foi este instituto, fundado por Robert Redford em 1981, que alargou o evento para 10 dias e
incluiu uma nova categoria de cinema internacional.•
T
Jota Assis
18.º Premiers plans d’Angers
Plano de abertura
Angers, França
20 a 29 Jan | www.premiersplans.org
Jacques Tati
A objectiva foca os realizadores novatos, com a selecção de primeiras obras para as secções competitivas. No entanto, e como também o cinema tem uma
História para apresentar, mostram-se as histórias de realizadores consagrados em diversos ciclos especiais.
Abolidas as restrições de género ou temática, as
curtas e longas-metragens europeias perfazem um total de 60 primeiros trabalhos que encontram em Angers
uma montra privilegiada. Fora da competição incluemse obras mais experimentais e segundos trabalhos de
cineastas descobertos no festival.
No âmbito da programação especial, faz-se uma
visita à Turquia, com a apresentação de alguns valo18 | Forward Cinema
res ali emergentes. O ciclo temático Une Journée Particulière transporta-nos entre Há Festa Na Aldeia, de
Jacques Tati, ou Mulheres À Beira De Um Ataque De
Nervos, de Almodóvar, num conjunto de filmes cuja acção decorre em apenas algumas horas. Completa-se o
cardápio com outras projecções, debates e ateliers.
O plano aperta e termina com o anúncio dos vencedores do Premiers Plans. Sob o lema descobrir para
dar a conhecer, já se focaram ali os primeiros passos
de referências como François Ozon ou Jim Sheridan.
Reserva-se, por isso, o efeito surpresa.• T Cátia Monteiro
F
Robert Doisneau
Documentários, curtas
e fantásticos
5.º Doc point – Festival de cinema
documental de Helsínquia
Helsínquia, Finlândia
25 a 29 Jan | www.docpoint.info
O Doc point é o ponto de encontro do documentário na Europa do Norte. Confirma o crescente interesse por este formato a nível global e faz chegar as
ferramentas também aos mais novos. Parece que a
descendência está assegurada.
O Dokkino Programme permite a alunos dos ensinos básico e secundário envolverem-se com as técnicas do documentário, apoiados por realizadores. Resultam dessa colaboração obras que são visionadas em
antestreia no Doc Point e que concorrem numa competição específica avaliada pelo público.
Em paralelo, o Doc View dedica-se ao que de mais
recente se tem feito no cinema documental nos países
que rodeiam o golfo da Finlândia. O festival foca ainda
a produção de outros países e complementa a exibição
de obras recentes a concurso com a mostra de clássicos que definiram a história do género.
Na Doc View Videotheque os profissionais credenciados têm acesso a todos os trabalhos enviados para
o Doc Point, enquanto os debates e colóquios são abertos ao público. O programa contempla ainda outros
prémios e mostras que no conjunto visam contribuir
para a visibilidade do documentário, numa perspectiva
edificante. Uma que permita compreender a linguagem
deste formato, que é em si uma forma particular de comentar o real, documentando-o.• T Cátia Monteiro
36.º Festival internacional de curtas
metragens de Tampere
Tampere, Finlândia
8 a 12 Mar | www.tamperefilmfestival.fi
Na Europa do Norte é o maior e mais antigo dentro
do formato. Entende-se por formato obra audiovisual
em vídeo ou película até 30 minutos.
A curta-metragem é o único factor de homogeneidade, e ainda assim meramente formal, num festival
que pretende nesta edição abordar temáticas como
a cultura cigana ou o islamismo. Enquanto lança um
olhar sobre o mundo do futebol, arrisca ainda uma passagem por filmes brasileiros. Se a isto somarmos uma
competição internacional e outra finlandesa, para além
de um espaço dedicado à animação, conseguimos antever o programa de um festival adulto, que contou na
última edição com mais de 30 mil visitantes.
Para a secção profissional, o festival de Tampere
oferece o International Short Film Market, que congrega a generalidade das obras enviadas para concurso,
aí disponíveis para visionamento. A completar a oferta
decorrem exibições, painéis e concertos, para além de
eventos nocturnos de confraternização, esses provavelmente não limitados pela regra da meia hora.• T CM
13.º Festival de Gérardmer
— Fantastic’arts
Gérardmer, França
25 a 29 Jan | www.gerardmer-fantasticart.com
O fantástico é um género de cinema que joga com as
emoções. Na edição número 13 a ficção cinematográfica
alia-se ao místico e à superstição, num esbatimento
cada vez mais forte entre realidade e fantasia.
Já foram premiados em Gerardmer autores como
Peter Jackson, aqui um pouco diferente daquele que
reconhecemos pela trilogia de O Senhor dos Anéis, ou
Vincenzo Natali, pelo objecto singular que constitui o
seu Cubo. Ao falar do Fantastic’Arts sente-se um pouco o sabor a Fantasporto, uma vez que partilham critérios de programação, fantasmas e vampiros.
A par da selecção de autores do circuito profissional, o festival francês procura destacar este ano o trabalho desenvolvido por alunos do liceu e da faculdade,
num concurso de primeiras obras que narrem nos domínios do fantástico. Para além desta apresentação de
argumentos, o incentivo à criação jovem concretiza-se
igualmente numa exposição intitulada Jeunes Talents,
que abrange formas de expressão tão díspares como
pintura, escultura, fotografia, artes gráficas ou multimédia. Um encontro multiforme do bizarro onde os
pesadelos se vivem à luz do dia.• T Cátia Monteiro
Forward Cinema | 19
56.º Festival de cinema internacional de Berlim
Caça ao urso
Berlim, Alemanha
9 a 19 Fev | www.berlinale.de
Tudo começou a 6 de Junho de 1951, quando Rebecca de Alfred Hitchcock foi apresentado na sessão
de abertura do primeiro festival. Agora, numa capital
reconstruída e mais cosmopolita do que nunca, irá
acontecer a 56.ª edição do Festival de Cinema Internacional de Berlim, vulgo Berlinale.
Como é habitual, o festival acaba por piscar o
olho aos Óscares, fazendo quase sempre uma antevisão de possíveis nomeados para a gala americana.
Cerca de 350 filmes de todo o mundo inundam a cidade alemã durante 10 dias. Os números são colossais: mais de 150 mil bilhetes são vendidos e 16 mil
profissionais da sétima arte visitam o festival, entre
os quais 3.600 jornalistas de 80 países diferentes. O
menu do Berlinale apresenta seis secções distintas:
Competição, onde são atribuídos os Ursos de Ouro
e os Ursos de Prata, Panorama, Fórum internacional
de cinema contemporâneo, Kinderfilmfest, Perspectivas alemãs e Retrospectiva.
No entanto, o Berlinale não trata apenas de filmes. Há ainda debates e encontros promovidos pela
organização. O mais recente dá pelo nome de Berlinale Talent Campus, realizando-se pela quarta vez
em 2006. 500 jovens cineastas de todo o mundo são
convidados a visitar a Casa da Cultura Mundial em
Berlim, onde se reúnem com os profissionais da indústria em oficinas e debates.
Agora resta esperar pelo próximo mês de Fevereiro
e ver qual será a nova residência das estatuetas. Do
Brasil ao Japão, cada urso pode ir parar a qualquer
ponto do globo.• T Catarina Medina F Berlinale
ZagrebDox — Festival international de cinema documental
Festival do sudeste europeu
Zagreb, Croácia
20 a 26 Fev | www.zagrebdox.net
Ao contrário da maioria dos festivais da região, que
mostram documentários como um suplemento do seu
programa principal de longas-metragens, o ZagrebDox
dedica-se em exclusivo à exibição deste tipo de filmes,
oferecendo ao seu público a oportunidade de assistir a
uma antevisão completa dos mais recentes espécimes
desta categoria cinematográfica.
O objectivo principal do ZagrebDox — Festival internacional de cinema documental de Zagreb, é apresentar o melhor da produção mundial e regional, sem
levar em conta a duração dos filmes ou a tecnologia
empregue na sua produção. O critério principal é a qualidade cinematográfica da fita.
20 | Forward Cinema
O programa do Festival internacional de cinema
documentário de Zagreb tem previstas três competições: um Programa regional de competição (com
filmes da Albânia, Bósnia Herzegovina, Bulgária, Croácia, Macedónia, Moldávia, Roménia, Eslovénia e Sérvia
e Montenegro); um Programa internacional de competição (com filmes de todos os outros países do mundo);
e um programa de Retrospectivas e Eventos.
Os realizadores, produtores e autoridades nacionais de cinema podem submeter películas para a Competição internacional regional. Os outros programas
são criados e definidos pelo director de programa do
festival.• T Luís Mateus
ANIMAC — Mostra internacional de cinema de animação
Anima-te, Catalunha!
Lleida, Catalunha, Espanha
2 a 6 Mar 2006 | www.animac.info
Christine Panushka
A 10.ª edição do ANIMAC (Mostra internacional
de cinema de animação da Catalunha) terá lugar em
Lleida, entre os dias 2 (5.ª) e 5 (dom) de Março, sendo que os preparativos para se atingir uma década
de cinema de animação já estão em marcha.
O festival é uma mostra não competitiva, dirigida
aos artistas que utilizam a animação como instrumento
de expressão pessoal. Criado em 1996 e inicialmente
chamado CINEMÀGIC, é organizado e produzido
pelo departamento da cultura da região de Lleida e
a sua importância é confirmada pela qualidade dos
participantes e convidados, além do programa de
projecções, que, ano após ano, atrai cada vez mais
entusiastas espectadores.
O festival ANIMAC tem conseguido, ao longo das
suas nove edições, um lugar de destaque no calendário espanhol dos certames de animação, sendo, assim,
a mostra mais importante da Catalunha no que se refere à indústria de animação.
Transgredindo e questionando os limites da narrativa tradicional, o certame procura visionários, trabalhos
independentes e arriscados que potenciem e enriqueçam a capacidade expressiva do cinema.
De Espanha para o mundo inteiro
os anos é convidado um país estrangeiro a divulgar a
sua actividade e produção na área da animação — a
Índia teve esse privilégio no ano passado. Acrescida
projecção tem tido, também, o projecto ANIMAC On
Tour, que, com a forma de mostra itinerante, leva pelo
mundo fora uma selecção de 17 curtas-metragens de
autores catalães e espanhóis.
O ANIMAC On Tour começou já a sua viagem na
China, em Junho passado, tendo continuado a sua rota
pela Hungria até chegar à Colômbia. Ao longo desta
jornada, a mostra catalã aproxima-se assim da indústria de animação de vários países, cumprindo um dos
objectivos primordiais: criar pontes de relação entre a
criação espanhola e os centros de produção, formação
e exibição de animação do mundo.
Em suma, o ANIMAC é um lugar onde se encontram artistas e obras, um laboratório em que se geram ideias e se estabelecem relações entre as distintas
disciplinas artísticas. É o espaço onde se sonha e se
projectam as inovadoras histórias do futuro, bem como
as do passado e do presente, abordando todas as
técnicas de animação.
Sem dúvida um festival muito interessante e apelativo tanto para os apaixonados como para os apenas
apreciadores dessa arte dentro da sétima arte que é o
cinema de animação.• T Jota Assis
O ANIMAC não se esgota no plano nacional. Todos
Forward Cinema | 21
10.º Festival international de cinema de Sófia
Uma outra Bulgária
Sófia e Burgas, Bulgária
9 a 19 Mar | www.sofiaiff.com
O Festival internacional de cinema de Sófia tem como objectivos principais, por um lado, a promoção dos
trabalhos mais inovadores e significativos do cinema
contemporâneo mundial para o público local e, por outro, a promoção do cinema regional para uma audiência
internacional. A finalidade é encorajar a cooperação
dos autores locais com os realizadores internacionais.
Existe uma competição internacional para curtas e
longas-metragens. São também organizadas conferências prévias à exibição dos filmes e ainda a mostra simultânea de filmes da região balcânica.
O programa do Festival internacional de Sófia inclui
as secções Programa Oficial (competição internacional
e exibições especiais), Longas-Metragens Búlgaras,
Showcase dos Balcãs, Secção Europeia, Secção Mundial, Curtas-metragens Búlgaras, Documentários, Tributos e Retrospectivas, Acontecimentos Especiais.
Um júri internacional de cinco membros julgará as
películas nas competições nacional e internacional de
curtas-metragens. A competição internacional incluirá
12 longas-metragens produzidas depois de 1 Set de
2004, enquanto a competição nacional de curtas-metragens até 30 minutos terá 12 filmes, produzidos por
autores búlgaros e realizados depois de 1 Jan de 2004.
A secção de longas-metragens búlgaras incluirá filmes
feitos a partir de 30 Mar de 2005.• T Luís Mateus
5.º RAF — Revija amaterskog filma
O público é quem mais ordena
Zagreb, Croácia
19 a 25 Mar | www.revijaamaterskogfilma.hr
A primeira Revija amaterskog filma (RAF) — Festival de cinema amador — ocorreu em Março de 2002,
em Zagreb. Setenta e quatro filmes de sete países
deram entrada no festival e todos foram exibidos. Em
2005, no quarto RAF, 180 filmes foram enviados para
a sede da organização e uma vez mais, todos foram
apresentados — 164 no programa oficial e os restantes
num programa paralelo.
Uma das característica que distingue o RAF de outros festivais do género, é o facto de não existir uma
verdadeira competição e do único júri ser a própria audiência. «Quem somos nós para dizer que o que é e
o que não é bom, para depois filtrar essa informação
para os outros?», comentou Oliver Sertic, um dos organizadores do festival.
Em 2006 o RAF celebrará seu quinto aniversário,
22 | Forward Cinema
uma ocasião especial. Oliver não quis avançar com as
propostas mais sonantes para a edição de Março, mas
sublinhou que «a nossa política é mostrar todos os filmes que nos são enviados, porque queremos que os
autores ouçam os comentários do público, em contacto directo. Assim poderão trocar ideias, organizar novos
projectos e projecções de filmes, tudo neste mesmo
lugar. Do nosso ponto de vista, o que é importante é
esta sinceridade, a eliminação de fronteiras entre profissionais e amadores, entre os organizadores e a audiência. Porque, no final de contas, um bom filme é
sempre um bom filme, não importando a quantidade
de dinheiro que se gastou na sua produção», disse.
Em 2005, uma lista de filmes foi feita pelo público
do RAF (na sua maioria curtas, mas também filmes de
animação, documentários ou experimentais), que escreveu os nomes das suas fitas favoritas num pedaço
de papel. Vinte e três filmes da Holanda, Áustria,
Sérvia e Montenegro, Eslovénia, Bósnia Herzegovina e
Croácia foram seleccionados. A esta selecção deu-se
o nome de RAF on the Road que, durante o mês de
Julho, integrou um dos maiores festivais de cinema
dos Balcãs, O Motovun Film Festival.• T Luís Mateus
Panorama — Mostra de documentário português
O que é nacional é bom
Fórum Lisboa — Lisboa
27 Jan a 5 Fev | www.apordoc.ubi.pt/panorama.html
A primeira edição da Panorama — Mostra de documentário português — traz à cidade de Lisboa uma
perspectiva geral do que melhor se faz neste género
cinematográfico em Portugal ou por portugueses.
Depois do DocLisboa, eis que se aproxima uma
mostra composta exclusivamente por trabalhos lusitanos. Dá pelo nome de Panorama e tem como missão
explorar a realidade de forma parcial e subjectiva, ou
não se tratasse de documentários.
A mostra é um evento não competitivo, cujo objec-
tivo se resume a três verbos: conhecer, partilhar e fortalecer. Dar a conhecer o documentário português e os
seus autores, proporcionando o encontro fácil entre eles
e o público e a consequente partilha, conseguindo assim
fortalecer a comunidade do documentário nacional.
A Panorama é o resultado de um esforço conjunto entre a Videoteca municipal de Lisboa e a Apordoc
– Associação pelo Documentário. Mais de cem trabalhos chegaram à organização, mas apenas os melhores
integram a programação deste evento.• T Catarina Medina
Festival internacional de cinema de Las Palmas
Um festival multicultural
Las Palmas, Canárias, Espanha
24 Mar a 1 Abr | www.festivalcinelaspalmas.com
Este é um certame que evidencia cada vez mais
a sua vocação para encurtar a distância entre o chamado cinema de periferia, como são o asiático, o ibero-americano, o africano e do leste europeu, e o centro da cidade cinematográfica, os EUA e a Europa.
A sétima edição do Festival internacional de cinema de Las Palmas chega com a Primavera, entre 24
Mar (6.ª) e 1 Abr (sáb). As ilhas Canárias são, geograficamente, um local periférico, porém privilegiado por
vários motivos: estão cultural e politicamente integradas na modernidade europeia, unidas por fortes laços
históricos e afectivos com a Ibero-América e compostas ainda, desde há muitos anos, por uma numerosa
população de origem asiática. O Festival de Las Palmas vai beber a tudo isso.
Para se ter uma noção da variedade de culturas
que compõem os filmes apresentados, na última edição
foi a concurso uma produção conjunta entre Arménia,
França, Itália e Suíça — Vodka Lemon, de Hinner Saleem. Um outro exemplo é Bab El Chams/La Porte Du
Soleil, de Yousry Nasrallah, um filme sobre a Palestina,
igualmente exibido na edição de 2005 — a grande particularidade desta fita foi a sua duração: 278 minutos.
Assim, como se pode comprovar, o projecto composto para esta iniciativa não pode senão basear-se em oferecer uma pluralidade de olhares sobre o mundo inteiro.
Na edição passada, até a sede do festival passou
dos subúrbios para o centro da cidade, tendo sido
adicionadas mais duas importantes colaborações
para a organização do evento, a da Universidade de
Las Palmas de Gran Canaria e a do Centro Atlântico
de Arte Moderna.
Para visionar as películas e afins, para além do
Auditório Alfredo Kraus, outros centros, como o
complexo de cinemas Monopol e o Gabinete Literário,
são cenários de projecções, apresentações e exposições programadas.
Dar voz ao cinema de autor
Os festivais de cinema são eventos excepcionais,
capazes de concentrar numa semana as energias de
uma cidade inteira, constituindo hoje em dia um círculo
cultural e industrial específico, alimentado por uma produção de cinema artístico, ou de autor, que, por sua vez,
não poderia existir se tal circuito não existisse também.
Assim, os festivais têm uma tendência cada vez
maior para diferenciar a sua oferta num panorama competitivo crescente. Apesar de tal facto, ou talvez por ele
mesmo, o festival de cinema de Las Palmas acolhe a
grande parte da sociedade que anda em busca da diversidade de culturas cinematográficas, tendo todos os
anos uma oferta de grande qualidade, vinda dos quatro
cantos do grande ecrã que é o Mundo.• T Jota Assis
Forward Cinema | 23
Ange De La Mort, Jan Fabre
Santiago a Mil — Festival internacional de teatro
Arte espanhola no Chile
Santiago, Chile
2 a 22 Jan | www.stgoamil.cl
Santiago a Mil convida a população chilena a
conhecer as artes de Espanha. Em palco haverá teatro, dança e artes plásticas.
Trazendo seis companhias, Espanha será o país
em destaque nesta 13.ª edição do Santiago a Mil, que
terá lugar na capital chilena. La Viuda Y Sol Pico apresenta Amor Diesel, um espectáculo de dança moderna que nasce da ideia de fazer uma coreografia sobre
uma retroescavadora. É uma história de amor algo
surrealista entre bailarinas e escavadoras. Ainda na
área da dança, a companhia Eva La Yerbabuena apresenta um espectáculo de Flamenco. A líder deste projecto, Eva Garrido, foi recentemente galardoada nos
Prémios Max de las Artes Escénicas na categoria
de Melhor Intérprete de Dança e provará que o paraíso
nunca envelhece.
A organização, que se baseia numa estreita colaboração entre o Ministério da Cultura Espanhol e o próprio festival, promete uma programação ambiciosa. O
objectivo é oferecer à população chilena uma visão ampla do que são hoje as artes do palco em Espanha.
La Zaranda traz o seu trabalho Homenaje A Los
Malditos, já aplaudido em festivais de teatro em Paris e
Espanha. O Xarxa Teatre leva a palco Déus O Bèsties,
uma cerimónia festivo-teatral. Desde 1983 que este
24 | Forward Teatro
grupo tem vindo a inovar a linguagem artística com espectáculos que apostam muito na componente visual.
Há uma junção do teatro a elementos festivos, tais
como o fogo de artifício, cativando um número maciço
de espectadores, que já foi comparado ao dos eventos desportivos. Chegarão companhias da Argentina,
da Bolívia, de França, da Bélgica e até dos EUA ou do
Japão. Entre os espectáculos nacionais estarão os melhores de 2005, assim como projectos emergentes. Paralelamente acontecerão seminários sobre teatro contemporâneo e mesas-redondas.
Na área das artes plásticas a organização avança
duas sugestões. No novo museu de Arte Contemporânea será exposta a colecção IVAN, da Equipa Crónica.
Uma exposição com obras de Rafael Salles e Manuel
Valdés, que representam a arte Pop hispânica, uma
resposta ao regime de Franco. A segunda sugestão
é Ange De La Mort, do artista belga Jan Fabre, com
inspiração em Andy Warhol. Este trabalho aposta na interacção entre a dança, o teatro e as artes plásticas. A
actriz croata Irene Joziv interage com as imagens. Esta
performance terá lugar de 18 Jan (4.ª) a 22 (dom) e Fabre dedica-a a William Forsythe, director e coreógrafo
pioneiro do Ballet De Frankfurt.• T Ana Rocha Duarte F cedida
pela organização
Escena contemporánea — Festival alternativo de las artes escénicas
Movimentos de vanguarda
Madrid
30 Jan a 26 Fev | www.escenacontemporanea.com
Escena Contemporánea regressa à capital espanhola em Fevereiro de 2006 e ocupa os palcos com
uma programação diversificada.
Teatro, ciclos de música, dança e conferências
são algumas das sugestões da Asociación Cultural y
Teatral Escena Contemporánea e da ¡mira!. A organização propõe-se apresentar uma programação vanguardista nos palcos de Madrid durante um mês. A inaugurar o festival no dia 30 Jan (2.ª), Atlas, de Mal Pelo, um
espectáculo de teatro coreográfico, já apresentado no
Festival Don Quijote (Paris).
O Teatro del Temple apresentará Ventajas De
Viajar En Tren, uma peça que não deixa espaço para a
criação de identificação com a realidade, desde que o
público ouve a primeira frase: «Imagina uma mulher…»
O Teatro del Velador apresentará uma comédia-retrato de sete imigrantes que ocupam a cozinha de um restaurante de luxo francês. A peça tem como nome La
Belle Cuisin e é de Juan Caballeros, um dos directores
artísticos mais inovadores no teatro espanhol.
Na área da música podemos contar com um ciclo do Japão. Por toda a cidade serão apresentados
outros ciclos, entre os quais alguns de autor. Destaque para o ciclo de Heiner Miller, nesta sexta edição
do Festival Alternativo de Artes Cénicas.• T Ana Rocha
Duarte F Jordi Bover
Forward Teatro | 25
33.º Festival internacional de BD de Angoulême
Viagem ao centro da BD
Angoulême, França
26 a 29 Jan | www.bdangouleme.com
Kotobuki Shiriagari
Todos os quadradinhos vão dar a Angoulême.
Ao maior festival de Banda Desenhada do mundo chegam as mais variegadas propostas, das
mais recônditas latitudes. Este ano, até um concerto de desenhos está previsto, além de muitas
léguas submarinas para ressuscitar o imaginário
de Júlio Verne.
Do Japão, da Finlândia e de África. Três das principais exposições da 33.ª edição do Festival Internacional de Banda Desenhada de Angoulême encontram a
sua identidade para lá dos palcos habituados aos holofotes dos média e do público. O que se faz além da
cultura manga, ou o que nasce num dos países mais
pequenos da União Europeia, mas com grande historial
na nona arte, ou, ainda, o que brota das savanas subsarianas, pode ser descoberto agora, em abordagens
artísticas e didácticas. Perspectiva também adoptada
nas duas grandes mostras individuais do festival. A
primeira, dedicada ao japonês Kotobuki, nascido em
1958, autor de tiras e histórias espalhadas por revistas
e álbuns. A segunda, ao tunisino George Wolinski, 71
anos, que preside ao júri dos galardões, ele que, na
edição passada, foi distinguido com o Grande Prémio
Cidade de Angoulême pelo conjunto da sua já vasta
26
| Forward Cinema
obra, sempre acutilante, subversiva e comprometida.
Um dos pontos altos será, no entanto, a reinterpretação do imaginário fantástico e científico das aventuras
de Júlio Verne. Numa co-produção entre o Museu de
Nantes, onde o escritor francês nasceu, em 1905, e o
próprio festival, apresentam-se obras de duas dezenas
de autores das mais variadas expressões estéticas.
Com a programação ainda em aberto à data de
fecho desta edição, o festival incluirá, ainda, homenagens às revistas Pilotes, que agora cumpre 30 anos
de publicação e de onde saíram alguns dos principais
nomes da BD francesa, e Capsule Cosmiquei, lançada
em 2004 com o objectivo de divulgar novos talentos
e novas tendências. Não faltarão, também, ciclos temáticos de cinema de animação, debates e encontros
informais com o público, sessões de autógrafos e concertos. Repetindo o sucesso de 2005, os desenhos
voltam a actuar num espectáculo único. Nesta performance, a audiência é desafiada a assistir à criação
de uma banda desenhada em tempo real, projectada
numa tela, inspirada numa música também ela tocada
ao vivo. São improvisos que revelam toda a magia do
mundo das histórias aos quadradinhos, numa autêntica viagem, ao ritmo da criatividade, rumo ao centro da
BD.• T Ricardo Duarte
Cochabamba, Demian Flores
Arco – Feira de arte contemporânea
Há 25 anos
na feira do costume
Madrid
9 a 13 Fev | www.arco.ifema.es
E já lá vão 25 anos a marcar o ritmo da arte contemporânea internacional. A Arco, uma das mais
prestigiadas feiras do mundo, oferece um programa de luxo na edição em que comemora as bodas
de prata. Representada por 22 galerias, a Áustria é
o país convidado.
Os números falam por si. As 269 galerias,
provenientes de 32 países, incluindo Portugal, mostram a vitalidade da Arco, uma das mais antigas
e prestigiadas feiras internacionais de Arte Contemporânea. Esta edição é também marcada pela
comemoração do 25.º aniversário da feira, oportunidade
para se fazer o balanço do caminho percorrido e para
estabelecer novos horizontes. A Áustria, terra natal do
arquitecto Adolf Loos, do pintor Oskar Kokoschka e do
fotógrafo Erwin Wurn, só para referir os mais sonantes,
é o país convidado, com uma selecção de 22 galerias
e exposições individuais.
Uma das novidades deste ano é 17x17: como metáfora da diversidade cultural espanhola, um projecto,
comissariado por Maria de Corral, que pretende homenagear artistas espanhóis consagrados através de
obras de jovens criadores. Esta mostra insere-se no
programa de exposições paralelas à zona de galerias
que inclui, ainda, Theblacbox@arco’06, comissariado
por Christianne Paul, Yukiko Shikata, Mark Tribe, Jemima Rellie e Karin Ohlenschlager, uma reunião de obras
que recorrem a novos suportes tecnológicos. Além dos
Project Rooms, terreno privilegiado para a experimentação, com propostas de todo o mundo e coordenação
geral de Agustín Pérez-Rubio e Octávio Zaya.
De salientar são também as exposições que compõem a área Novos Territórios, vocacionada para a
arte emergente e divulgação de artistas com menos
de 40 anos. Em On Youth Culture, comissariado por
Pedro Alonzo e Peter Doroshenko, os trabalhos reflectem a influência que o espaço urbano exerce sobre a
produção contemporânea. Por seu turno, Cityscapes
dá a conhecer a estética em voga nas cidades de São
Paulo, Rio de Janeiro, Nova Iorque, Los Angeles, Tóquio, Pequim, entre outras.
Ao longo da feira, que se realiza no Parque Ferial
Juan Carlos, decorre também o 4.º Fórum Internacional
de Especialistas em Arte Contemporânea, com conferências sobre os mais diversos aspectos das artes
plásticas, do coleccionismo à museologia, da formação
às novas tecnologias, passando pela teoria da arte e
o papel dos média. Tudo isto rodeado de um intenso
programa social e cultural que se estenderá a toda a
cidade de Madrid, com inaugurações nos principais museus da cidade, intervenções de arte pública, festas,
sessões fotográficas e outros entretenimentos que se
desejam em qualquer aniversário. Porque, na verdade,
25 anos também só se fazem uma vez.• T Ricardo Duarte
Forward Artes Plásticas | 27
Pequenas e grandes
bienais e feiras de arte
Arte fiera 2006
Bolonha, Itália
27 a 30 Jan | www.artefiera.bolognafiere.it
A loiça bem pode encher o lavatório, tal como a
água pode transbordar da banheira, ou o frigorífico esvaziar-se com a passagem dos dias. Entre 27 Jan (6.ª)
e 30 (2.ª), só a arte importa. É com este espírito, de primeiro a Arte depois o quotidiano, que se realiza a 30.º
edição da Feira Internacional Bolonha, que reúne mais
de 200 galerias italianas e estrangeiras, em articulação
com um conjunto de museus, instituições culturais, editores de livros e revistas da especialidade.
A divulgação de jovens artistas é um dos principais
destaques deste ano, com a organização de mostras
temáticas. Uma delas, sob o espírito da Arte Nova, fruto
da construção de um hall de entrada segundo um desenho original de Le Corbusier, agrupará uma selecção
de novas galerias. A própria cidade de Bolonha, onde
nasceu a primeira universidade do mundo, servirá de
palco a uma exposição de instalações de Arte Contemporânea. E um conjunto de eventos, intitulado Eas28 | Forward Artes Plásticas
tWards, dará a conhecer a dinâmica cultural e artística
dos países do leste europeu. Debates e conversas com
o público encerram a programação de uma feira que,
com o passar dos anos, tem ganho cada vez mais protagonismo entre coleccionadores, galeristas e artistas.•
T
RD F Arte Fiera
Feira internacional
de arte contemporânea
Innsbruck, Áustria
24 a 27 Fev | www.art-innsbruck.at
É na encruzilhada de três países, Alemanha, Suíça
e Itália, que se projecta a Feira Internacional de Arte
Contemporânea de Innsbruck, uma cidade do extremo
Oeste da Áustria. Esta 10.ª edição premeia a dedicação de uma organização que vê na máxima «pequena,
boa e bem sucedida» a chave do seu sucesso. É uma
feira feita com o «coração».
Sem querer perder a sua especificidade, a organização aposta, por isso, num máximo de 70 galerias
mo», algures entre «o dia e a noite». Tema abordado
em várias exposições que percorrem o amplo leque de
manifestações artísticas da contemporaneidade, com
especial incidência em pintura, escultura e vídeo. A
edição de um catálogo com mais de 800 páginas e a
atribuição de um prémio complementam as propostas
da Bienal.• T RD
The Armory show
Nova Iorque, EUA
9 a 13 Mar | www.thearmoryshow.com
É já a caminho do Central Park, junto ao rio Hudson, nos cais 90 e 92, entre as avenidas 12, 52 e 50,
que se realiza uma das mais importantes feiras do mundo. É The Armory Show, herdeira da exposição com o
mesmo nome de 1913, em que participou Amadeu de
Souza-Cardoso, que introduziu a Arte Contemporânea
nos Estados Unidos da América. Razões não faltam
para visitar a cidade que junta mais coleccionadores,
críticos e artistas por metro quadrado.
Um conjunto de 153 galerias, provenientes de 38
cidades dos cinco continentes, seleccionadas entre
as mais de 500 que se candidataram, dá corpo a esta
oitava edição, que se propõe apresentar o que «ainda
não foi visto» no campo das artes plásticas contemporâneas. O programa cultural continua, no entanto, no
segredo dos deuses. Ao artista plástico John Wesley
coube a criação de toda a identidade visual da feira,
impregnando a edição deste ano do sensualismo pop,
próximo dos registos de Roy Lichtenstein, Andy Warhol
e Donald Judd, que caracteriza a sua obra.• T RD
Bienal de arte contemporânea de Berlim
seleccionadas, equilibrando, também, a atenção dada
a novos e consagrados artistas. Um dos programas especiais deste ano é o Nice Price, uma mostra de obras,
entre pintura, desenho, escultura, instalação, fotografia, novos média e outros, cujo preço não ultrapassará
os dois mil euros.• T RD
Bienal Whitney de arte contemporânea
Nova Iorque, EUA
2 Mar a 28 Mai | www.whitney.org
Day For Night é o título da edição de 2006 da Bienal
de Arte Contemporânea, fundada em 1932 pelo Museu
Whitney. Inspirado no filme homónimo de François Truffaut, o trabalho dos curadores Chrissie Illes e Philippe
Vergne, que já escolheram 109 artistas, procura perceber de que forma o irracional, a religião, o oculto, o
erotismo e a violência influenciam a cultura americana.
É, pois, uma reflexão, como salientam os comissários, sobre a Arte Contemporânea que, actualmente,
«se situa entre os parâmetros do pré e pós-modernis-
Berlim, Alemanha
25 Mar a 28 Mai | www.berlinbiennale.de
Ainda não começou e já dá que falar, ou melhor,
entrevistar. Em colaboração com a revista Zitty, os
curadores da Bienal, Maurizio Cattelan, Massimiliano
Gioni e Ali Subotnick, têm vindo a publicar uma série
de conversas com artistas que actualmente trabalham
em Berlim. São retratos de uma geração em busca de
um tempo por conquistar, acompanhando a evolução
que, a olhos vistos e a cada dia que passa, se vê pela
cidade. Com o mesmo intuito, o de antecipar o que se
verá entre 25 Mar (6.ª) e 28 Mai (3.ª), foram organizadas
várias exposições na galeria Gagosian e foi lançado
um catálogo com o nome do famoso posto de controlo
russo e americano, Checkpoint Charley, com imagens
e documentações sobre os mais de 700 artistas contactados no trabalho de prospecção dos comissários.
Trabalho de fundo que sublinha o objectivo de reflectir
a diversidade da cena artística berlinense, patente na
exposição principal, Of The Mice And Men, que ocupará não só o recinto central, como toda a Augustrasse,
eixo principal do bairro histórico Mitte.• T RD
Forward Artes Plásticas | 29
Big day out
Um dia que são dias
Austrália e Nova Zelândia
20 Jan a 5 Fev | www.bigdayout.com
2 Many Dj’s
A organização apresenta-o como «o maior campo
de férias em movimento à escala mundial». Entre a Austrália e a Nova Zelândia, no espaço de alguns dias,
podem ver-se artistas separados por centenas de
quilómetros de distância, sem sair do mesmo festival.
Actuam nesta 14.ª edição bandas como os White
Stripes, duo de parentescos ambíguos, ou os Franz
Ferdinand, rapazes que fazem concertos para verem
as raparigas dançar. Outras escolhas recaem sobre
os dupla face 2 Many Djs/Soulwax ou Iggy Pop &
The Stooges. O alinhamento é extenso, e a um conjunto de bandas que marcam o panorama musical
internacional reúnem-se artistas locais, com algumas
presenças já habituais.
O Big Day Out conduz o espírito nómada a um
extremo. Quer para os artistas, que podem actuar em
vários dos palcos agendados, quer para o público, que
encontra aqui a oportunidade de fazer a sua própria tour.
O passe de Inter Rail adaptado aos termos melómanos
contempla a capital australiana, bem como Melbourne
e outras três cidades, enquanto na Nova Zelândia o
destino único é o recinto montado em Auckland. O Big
Day Out tem conhecido uma popularidade crescente
desde que estreou, em 1993, com uma conhecida
banda de Seattle.• T Cátia Monteiro
Baja prog fest 2006
Rock Progressivo no México
Hotel Araiza e Teatro del Estado — Mexicali, Baja California, México
8 a 11 Mar | www.bajaprog.com
Apesar de relativamente desconhecido do público
português, o Baja prog fest (BPF) é um dos maiores
eventos internacionais dedicados ao Rock Progressivo.
Para tal, muito contribui a sua localização na fronteira
entre o México e o Estado da Califórnia, nos EUA.
Na origem do festival esteve um concerto, em
1997, dos americanos Lands End, que contou com
duas bandas de suporte: os argentinos Ekus e os
locais CAST, dos quais faz parte o organizador do
festival, Alfonso Vidales.
A edição deste ano promete ser a melhor de sempre, indo o grande destaque para as duas actuações
acústicas dos Los Trios Marillos, um trio formado a
partir dos ingleses Marillion, composto por Steve Hogarth, Steve Rothery e Pete Trewavas. Igualmente interessante será o regresso ao activo dos americanos
30 | Forward Música
Mirthrandir, apesar da escassez de novidades discográficas dos últimos anos, e a presença dos suecos
The Flower Kings, que deverão centrar a sua actuação no último álbum da banda, Adam & Eve.
Além da actuação inaugural da banda de Alfonso
Vidales, uma tradição com origem nas primeiras
edições do festival, o BPF vai contar com actuações
dos franceses Lazuli, do teclista argentino Sergio
Alvarez, dos italianos Odessa, dos ingleses Hatfield
And The North, Nektar, Mostly Autumn e England, dos
suecos Trettioåriga Kriget, dos japoneses Interpose+
e Kinzokuebisu, dos mexicanos Toccata e Arbatel,
dos chilenos Evolucion, dos holandeses Flamborough
Head, dos espanhóis Amarok e dos polacos SBB.•
T
Pedro Moreira
Conversa com Carlos Matos — Festival Fade In
Levantar sons alternativos
Uma entidade faz Fade In nos sons de culto, em
Leiria. O Festival está a descentralizar-se, a crescer
e, no espaço de cinco anos, começa a ser alvo de
romaria para algumas ovelhas tresmalhadas, porém fiéis a este evento.
Carlos Matos é a cara e o fundador do Fade In.
Diz-se melómano, de gostos ecléticos e revela uma
relação próxima com a música que passa pela sua exbanda, Ode Filípica, a actividade de DJ, a radiofonia e
o jornal de Leiria.
O Fade In cresceu e até já viajou para outras cidades, mas no início era diferente. O festival concretizouse em 2001, a partir «da necessidade de dar visibilidade aos projectos musicais do distrito de Leiria».
Actualmente o evento é palco para nomes do gabarito de Jarboe e recebe concertos únicos, como
aconteceu com Deine Lakaien, em formato acústico.
«O crescimento que o festival tem tido deve-se, sobretudo, à programação cirúrgica e ao arrojo da nossa
directora artística, Célia Ribeiro Lopes. A qualidade e
singularidade das nossas propostas são a imagem de
marca do festival. Tem sido essa peculiaridade que tem
fidelizado o público.»
A política do festival mudou e isso vincou a postura
do evento. «Quando começámos a programar o Fade
In 2003, verificámos que havia pouquíssimas bandas
locais que preenchessem os requisitos de qualidade
atingidos nas duas edições anteriores. Ao delinear uma
estratégia diferente, não só elevámos o nível e a qualidade do Fade In, como o dotámos de um potencial de
projecção nacional e internacional», explica.
A vinda de bandas de culto de todo o mundo atrai
fãs oriundos de outras paragens também. «É vulgar termos espanhóis nos espectáculos. Já aconteceu virem
ingleses ou alemães propositadamente assistir a concertos do Fade In.»
A estrutura tem crescido, mas continua a funcionar
sem fins lucrativos. Todo o dinheiro ganho com cada
concerto serve de investimento para o seguinte. Este
ano fecha com saldo negativo, revela Carlos Matos.
«Isto tem que ver com o investimento que fizemos nalguns nomes que deram projecção ao festival, mas que
nem lotações esgotadas conseguiriam viabilizar. O tempo dirá se esta foi a estratégia correcta.»
Dependendo de apoios institucionais, meramente
a nível logístico, as receitas que suportam o Festival
provêm da discoteca Alquimia, em simultâneo o principal apoio e um dos projectos de Carlos Matos.
Nestes cinco anos, a vida na cidade do Fade In
mudou e isso reconhece-se dia a dia. «Não existe em
Leiria outro projecto com um conceito urbano tão definido e profundo como o Fade In. Hoje a cidade cohabita pacífica e harmoniosamente com um festival que
não é “politicamente correcto”, nem na forma nem nos
conteúdos. Isso foi uma conquista nossa, mas acaba
também por ser um reconhecimento da própria cidade
ao nosso trabalho.»• T Dora Carvalhas F Gil de Lemos
www.fadeinfestival.com
Destroyer
32 | Rec Música
Many Fingers
Wraygunn
Faíscas na Gália
Alguém endireitou o arrogante nariz dos franceses. Ao que parece bastam uns tons de Blues misturados com qualidade para que os loucos gauleses percebam que neste jardinzeco não se canta só o fado.
Quase 8.500 cópias vendidas, salas cheias um
pouco por toda a França e actuações em importantes programas radiofónicos e televisivos exibiram os
portugueses Wraygunn ao país de Asterix. Deviam ter
contado o segredo aos romanos. A explicação pode
estar no Blues, diz Paulo Furtado. «Se nós começarmos a pensar na carreira de uma série de artistas
norte-americanos, França recebeu sempre de braços
abertos este tipo de sonoridade. Mas, sobretudo, acho
que as pessoas gostaram. Em algumas críticas existia
um certo racismo, em frases do género “como é que
é possível esta banda tão boa ter vindo de Portugal?”
Por um lado, isto é um insulto para nós, como portugueses, mas por outro é um louvor como músicos.
Achar que somos bons demais para Portugal não é, de
modo algum, o que eu penso, mas ainda existe este
tipo de ideia.» Raquel Ralha diz que «a surpresa, como
contraponto desse preconceito, apanhou as pessoas
desprevenidas. Suscitou curiosidade para ver outra realidade». Finalmente perceberam que por aqui até se
fazem umas coisas, enquanto estamos virados para a
aragem do oceano.
Paulo Furtado recusa enrolar-se na conversa do
emigrante que diz que «lá em França é que é bom», mas
reconhece que algumas estruturas, no que concerne
ao circuito de salas de espectáculos, funcionam muito
melhor — muito embora se trate de estruturas apoiadas pelo Estado. Mas até esse deveria ser um passo a
dar pelas entidades portuguesas. Inevitavelmente, o fio
condutor da conversa chega ao festival de Blues que,
todos os anos muito a custo, Paulo Furtado tenta organizar. Autênticas epopeias de apoios institucionais retirados fragilizaram a base de um evento que faz toda a
falta e sentido em Portugal. «Não tenho neste momento
a certeza de que consiga fazer o festival de Blues. Daqui para a frente não sei como é que se vai conseguir
realizar, mas se calhar vamos ter de regredir um pouco
no formato e fazer uma coisa mais comedida.»
Em França os Wraygunn foram bem recebidos em
toda a parte: nos programas conceituados de TV, rádio
e, mais importante que tudo, nos palcos. «É bom perceber que lá, ao contrário de cá, as pessoas também
estão a apostar em nós como uma banda de primeira
linha internacional e que as rádios também têm essa
ideia. É algo bastante diferente do que estamos habituados em Portugal.»
Os planos dos Wraygunn não param por França.
O tempo começa a escassear, mas pretendem esticar ao máximo a amplitude geográfica da sua música.
Actuaram no festival Atlantic Waves, em Inglaterra, e é
aí que vão lançar o disco, embora com atraso — deveria estar pronto duas semanas antes da actuação da
banda em Londres, mas devido a «uns problemas no fabrico, acabou por ser adiado para Fevereiro. Queremos
incluir um DVD com videoclips e concertos para fazer
uma edição especial.»
Os planos futuros incluem o regresso a França para
mais cinco espectáculos e a participação num festival
organizado pela Fnac Europa, no qual são a banda
internacional convidada. Ainda na primeira metade
do ano editarão um DVD com os melhores momentos
da digressão que passou por Portugal e mostrou os
Wraygunn a França e Inglaterra.• T Dora Carvalhas F EMI
www.wraygunn.com
Rec Música | 33
Entrevista a Ilse van Velzen, documentarista
‘As pessoas estão fartas
da realidade’
Ilse van Velzen tem 25 anos, é holandesa e faz do
documentário a sua profissão desde que, em 2003,
se aventurou com a irmã a mergulhar no universo
do vídeo em cenários conturbados. Ainda este ano
lançou na Holanda um filme sobre os refugiados
angolanos repatriados. Embalada pela atmosfera
aconchegante do 11.º andar do mais panorâmico
bar de Amesterdão, aproveita agora o encerramento da última edição do Festival Internacional de
Documentários da cidade (IDFA — um dos cinco
mais importantes na Europa) para falar sobre o ac34 | Rec Cinema
tual estado do género. Aviso à navegação: não é uma
actividade fácil. Não fosse o biscate semanal que
mantém num restaurante e levar este sonho avante
seria para Ilse uma missão quase impossível.
Há uns anos atrás, era quase impossível falar-se
do documentário sem associar o género a um tipo
de trabalho de cariz jornalístico, com um narrador
sempre presente, ao bom estilo das produções da
BBC. Hoje em dia, porém, muita coisa mudou. Pelo
que se pôde ver no IDFA, as linguagens diversifica-
ram-se e a produção estética ganhou terreno, passando-se a tratar o material quase como na ficção.
O que aconteceu?
Quando só se faziam filmes em película, tudo saía
muito caro. Era impensável produzir-se um documentário sem um guião detalhado e muita precisão. Os passos eram todos cumpridos e havia mais regras a seguir.
Desde que se democratizou o acesso ao género, através do aparecimento das câmaras de vídeo digitais,
tremendamente mais acessíveis, passou a haver muito
mais gente a trabalhar em documentário. E se isso por
um lado é bom, porque promove uma grande diversidade de temas e de linguagens, fazendo de qualquer
um de nós um potencial realizador, por outro leva-nos
a cair numa quebra de qualidade generalizada.
Sentiu isso nesta edição do Festival?
Sim, sim. Apesar de ter gostado muito de dois
trabalhos (projectos sérios, com qualidade: um deles
levou sete anos a fazer), vi vários filmes inexperientes,
longos demais e filmados sem guião prévio. Resultado: certos temas que poderiam ser interessantes tornaram-se simplesmente aborrecidos. Não teres uma
história à partida leva-te a recaíres mais na pós-produção. E o problema é que se a coisa não é bem feita
acaba por soar a falsa.
Como chegou a este mundo?
Meti-me nisto com a minha irmã gémea. Decidimos
criar uma produtora caseira (a IF Productions) e
lançarmo-nos no meio com o auxílio das nossas câmaras
digitais e computadores. Na verdade, começámos a
aventura em 2003. O filme Return To Angola [selecção
oficial da edição especial deste festival] foi o nosso
primeiro grande projecto. Tínhamos como premissa
acompanhar três refugiados angolanos a viver na
Holanda durante o seu processo de repatriamento e
regresso a casa, aos 18 anos.
Encontraram muitos obstáculos?
Sim. Não é nada fácil… Sobretudo porque quando
ainda não tens nome não há quem te apoie em
projectos de risco. Fomos à televisão, andámos por
aí e não conseguimos nada. Ainda assim, decidimos
avançar com o projecto por nossa conta e risco.
Como conseguiram fazê-lo?
Estivemos uns dez meses à volta dos refugiados
a tentar conseguir uma permissão para filmar.
Depois de a conseguirmos e de já termos iniciado o
projecto, houve uma fundação que nos apoiou. Com
o dinheiro, fomos duas vezes a Angola. Seguimos os
refugiados por dois anos. Acabámos por conseguir
passar o filme na televisão.
Como foi filmar em Angola?
Difícil. Apesar de termos filmado o grosso do
filme com uma câmara apenas, optámos por levar
três aparelhos para o caso de nos roubarem ou
confiscarem o material. A legislação sobre a matéria
é ainda muito deficiente em Angola, pelo que éramos
muitas vezes abordadas pelas autoridades. Acabámos
por conseguir um papel do Ministério da Cultura que
nos foi resolvendo o problema.
Por curiosidade, ainda mantém os contactos
com os refugiados do filme?
Sim, sim, com a rapariga. Tivemos de criar uma
relação forte com eles para fazer o filme. Ligamos-lhe
com frequência.
E em termos materiais, já é possível viver só do
documentário na Europa?
Se és famoso, sim. Num caso como o nosso,
todavia, é preciso ser-se tremendamente persistente.
E mesmo assim é complicado sobreviver. Eu, por
exemplo, tenho de trabalhar uma vez por semana num
restaurante para estar mais à vontade.
Qual é o segredo: os subsídios?
Os subsídios são muito importantes, claro. Mas
para os conseguires precisas de ter alguém a trabalhar
nisso a tempo inteiro. É quase como ter uma outra
profissão. Para dar um exemplo, estamos agora a
iniciar um documentário no Congo. Apesar de haver
um produtor interessado, acabou por não nos apoiar
para não se comprometer. Filmar em palcos de guerra
é muito complicado e ninguém gosta de se arriscar.
Vou acabar por fazê-lo só com a minha irmã: as duas
sozinhas. Por isso, o importante agora é convencer
uma televisão a dar-nos o aval, mostrando intenções
de passar o filme. Se o conseguirmos, passa a ser
muito mais fácil conseguir um subsídio.
Quais as regras de ouro para se ser bem
sucedido no género?
Há duas muito importantes. Primeira: nunca desistir
perante os obstáculos, que serão sempre muitos —
não dá para tentar despachar a coisa só porque tens
uma data marcada, além de que os grandes trabalhos
podem levar anos. Segunda: criar uma relação de
grande confiança com as tuas personagens. São elas
que vão contar a história. Se não houver honestidade
nem à-vontade, é trabalho perdido.
Terá o documentário espaço para ganhar mais força nos cinemas e, quem sabe um dia, massificar-se?
Não acredito, ainda que o panorama esteja bastante melhor hoje do que há uns anos atrás. Adoraria, por
exemplo, que existissem clubes de vídeo só com documentários e que fosse possível encontrar este tipo de
filmes em todos os cinemas. Não creio, contudo, que
a massificação generalizada aconteça. As pessoas estão fartas da realidade, não querem ver a miséria. Para
isso, já têm a televisão e os telejornais.• TF Filipe Araújo
www.idfa.nl
Rec Cinema | 35
Entrevista a Costa-Gavras
‘O mais difícil em cinema
é fazer a pergunta certa’
Era importante mostrar no arranque do filme que
esta era uma personagem que faz coisas terríveis,
que detestamos e rejeitamos violentamente. Mas queria construir o argumento para que ao longo do filme
o espectador fosse simpatizando com ele. No final
queria que o espectador se perguntasse «mas por que
gosto eu desta personagem que é um assassino?». E a
moral do filme é quando o espectador tenta responder
a esta questão que se colocou. Penso que a resposta
é que ele é simpático pela forma como se relaciona
com quem encontra e pelo modo como enfrenta os
seus problemas. E também porque os assassinatos
não nos parecem muito credíveis.
O lançamento da Festa do Cinema Francês fezse com Golpe a Golpe, sátira de teor político engenhosamente sintetizada pelo realizador grego Costa-Gavras. Um golpe no fantasma do desemprego
que assola a França, mas também na consciência
individualista. Para o realizador, um filme deve colocar questões, este vai desferindo-as golpe a golpe.
Há uma ironia neste filme: o protagonista recusa-se ser vítima da sociedade, mas os outros tornam-se suas vítimas…
Toda a história ronda o facto de as outras personagens aceitarem a vitimação, a humilhação de trabalhar
em algo que não corresponde nem ao seu carácter,
nem à sua classe ou aos seus estudos… Porém, todos têm sempre uma esperança: a de que um dia tudo
vai mudar. Entretanto, a perda do trabalho e do salário
acaba por destabilizar o ambiente familiar, a moral, a
ética familiar, mas conduz também à perda da própria
dignidade, da auto-estima. É essa a pior das coisas.
Mas o protagonista não está disposto a perder tudo
isso. Então, decide fazer guerra.
Não podemos considerar Bruno Davert como
um assassino convencional, porque as circunstâncias e ele mesmo são bastante bizarros. Qual a preocupação inerente à construção desta personagem?
36 | Rec Cinema
Porque é que procurou um actor de comédia
[José Garcia] para encarnar esta personagem?
Acredito que podemos obter bastante de um actor
quando o deslocamos. Se ele aceita o desafio, pode
tornar-se muito bom. E penso também que os actores
cómicos têm uma capacidade formidável de representar o dramático.
No filme, Bruno Davert depara-se frequentemente com anúncios de mulheres em lingerie.
Este detalhe serve para ajudar a caracterizá-lo?
O protagonista não pode mais comprar essas coisas. O que se converte numa frustração permanente.
Uma outra razão para a presença desse nu é mostrar
como na publicidade só existem mulheres muito jovens, Lolitas, que surgem sem cabeça, como obsessões sexuais, fantasmas sexuais dos homens. E isto
está organicamente no filme porque a filha da família,
quando enfrenta os polícias… Serve-se de quê? Não
da sua inteligência, mas da sua beleza feminina. Ela sabe que vai resultar porque o observou na rua.
Numa altura em que se assiste na televisão a
uma discussão política vazia e as pessoas se interessam cada vez menos por estas questões, poderá
o cinema servir para reavivar o tema?
Sim, penso que o cinema pode desempenhar um
papel, mas não pode mais do que colocar questões
sobre a sociedade. Não creio que possa fornecer respostas. E ainda menos fazer promessas. E o mais difícil
é colocar a pergunta certa. T Cátia Monteiro F Mars Distribution
assinaturas
A FEST FORWARD MAGAZINE, em parceria com a editora Pop Stock,
tem para oferecer às 25 primeiras assinaturas
anuais [4 edições] os seguintes CDs
Numere por ordem os títulos do seu interesse:
1
2
3
4
5
1
Stuart A. Staples . Lucky Dog Recordings 03-04
2
Boedekka . The Piper, The Devil, The Poet & The Priest
3
Damon & Naomi . The Earth Is Blue
4
Xiu Xiu . La Foret
5
Destroyer . Your Blues
Nome _______________________________________________________________________________
Morada _____________________________________________________________________________
Localidade _________________________________________ Código Postal __________-______
E-mail _____________________________________________________________________________
Telefone __________________________________ Data de Nascimento _____-_____-_________
Profissão __________________________________________________________________________
Enviar cheque no valor de 8 euros à ordem de Associação Infinitos Frames Por Segundo
para Rua Cerrado do Zambujeiro, n.º 27, 2.º Frente, 2610-036 Amadora
F O T O C O P I E E S TA P Á G I N A
The Piper, The
Devil, The Poet
& The Priest
Boedekka
Pop Stock, 2005
Os ingleses Boedekka demonstram grande capacidade de
reciclagem e manipulação de sons, constituindo a inversão, o scratch, a distorção e a variação de pitch as técnicas mais frequentes. No entanto, o embrulho é Pop Rock,
como demonstram os temas “Forecourt Juntie” e “Nated
Angel”. Outros sugerem influências tão díspares quanto
Primal Scream ou Pink Floyd, como “Carnival Of The Antichrist”, “Velvet Sties” ou “Emergency Exit”. Pelo meio, há
ainda os deliciosos instrumentais psicadélicos “Microdot
Maintenance”, “Jeg Elster At Spille Tabale” e “Strom The
Palace”. Outro tema, “Devil On My Back”, inclui o peculiar
registo sonoro de um modem a estabelecer a ligação (tão
comum durante os anos 90), enquanto a curiosa faixa extra cruza influências nipónicas com os ruídos típicos de
um telemóvel.• FP
The Greatest
Pop Stock, 2006
www.catpowerthegreatest.com
Chan Marshall pode dar concertos insatisfatórios — Primavera Sound‘02 e Festival do Porto’03 —, mas a verdade é
que a cantautora continua a produzir excelentes músicas.
Exemplos disso são “The Greatest” e “Where Is My Love”,
onde belíssimos diálogos entre o piano e o violino fazem
canções simples mas cheias de força. Em “Lived In Bars”
e “Willie” coabitam piano, saxofone e nostalgia na voz de
Chan, que se assume como contadora de histórias. Por
outro lado, “After It All” casa Blues e Swing, num ambiente
de bar. “Islands” é uma ilha no álbum, onde o imaginário
havaiano marca presença. “Hate” vai ao baú Cat Power retirar guitarra, voz e melancolia, constituindo elo de ligação
com o passado num exercício de auto-reflexão e “Love &
Communication” é uma amálgama que sintetiza muito bem
The Greatest como álbum.• FP
Abertura
Single
Lupanar, 2005
Bor Land, 2005
Lupanar
www.lupanar.org
Três aspectos se destacam neste Abertura: canções que
não o são, no sentido tradicional do termo, a assustadora amplitude vocal que Ana Bacalhau demonstra nalguns
temas e a musicalidade rica e cheia. Traz à memória algumas referências de música tradicional popular portuguesa,
para o que contribui o acordeão, sobejamente usado.
Abertura é o disco de estreia e os seus 13 temas são uma
constante surpresa. Há-os com uma guitarra acústica
predominante, outros dão lugar à eléctrica, o contrabaixo
sente-se, um trompete espreita e além da voz principal, os
coros completam. Mas há mais: acordeão, tambor, djambé e darabuka, num elenco bastante longo.
Depois de subir ao pódio num Termómetro Unplugged e
participar na homenagem a Carlos Paredes, em Movimentos Perpétuos, os Lupanar e este seu Abertura são ousados. E “Roubadores” fica no ouvido.• JPC
38 | Stop Cd’s
Cat Power
Carlos Bica
www.carlosbica.com
Single é um disco maior. Nele Carlos Bica cumpre com
o prometido: explorar o espectro sonoro do contrabaixo,
totalmente a solo. Ao longo de 17 temas, Bica dá voz ao
instrumento, toca as cordas e maneja o arco como que
por desígnio, numa diversidade de arranjos e andamentos
— “Dança Para Um Folclore Imaginário” é o melhor exemplo. Mas, e o que dizer de “Softly as”, “Introdução/Chão e
Bolero” ou mesmo “White Wall”? Apenas isto: ouça-se.
Impossível de categorizar, em Jazz ou qualquer outra gaveta, Single é desde logo uma peça de culto. Pela captação, a cru, do som do contrabaixo; pela ausência de
elementos digitais; pela embalagem cartonada branca e
amarela e porque não se pode ouvir em headphones ou
qualquer outra coisa — Single requer um potente amplificador e colunas, à antiga, para que se note todas as nuances da sua sonoridade. Delicioso.• JPC
Wal Mart
Mind My Gap
Brave New Films, 2005
Chalet Pointu, 2005
Robert Greenwald
www.walmartmovie.com
Longe de ser uma obra-prima, Wal-Mart é um complemento interessante aos mais incisivos Corporation (inédito em
Portugal), Surplus (prémio do público em Vila do Conde) e
Big One (de Michael Moore). Em boa verdade, Wal-Mart
é um documentário mais específico do que os outros
exemplos dados, denunciando as implicações sociais,
económicas e políticas do gigante de hipermercados no
dia-a-dia dos americanos. Contudo, as violações dos direitos humanos chegam-nos através de relatos, em discurso
directo, de funcionários chineses que quase têm de pagar
para trabalhar (pagam, e bem, com o corpo), tais são as
condições sub-humanas a que se sujeitam. Tudo em nome
do lucro e do bem-estar dos accionistas sem escrúpulos
da Wal-Mart. No final, a redenção de ex-funcionários e exclientes passa pelas dezenas de acções bem sucedidas na
recusa do hipermercado dos preços baixos em determinadas cidades dos EUA.• FP
Rosto A. D.
www.rostoad.com
A trilogia Mind My Gap inclui os capítulos “Beheaded”,
“Anglobilly Feverson” e “Jona/Tomberry”. Este último foi
apresentado mundialmente no Festival de Cannes, em
2005, onde ganhou o Gran Prix Canal+. O filme é um prodígio tecnológico, encontro multimédia de 3D, filmagens
HD, desenhos e fotografias, onde Rosto cruza as influências do escritor Jorge Luís Borges (jogos de espelhos) e do
cineasta F. W. Murnau (expressionismo alemão). Se a concepção visual aconteceu na Holanda, a excelente banda
sonora foi elaborada do outro lado do Atlântico, nos EUA.
O DVD inclui ainda um detalhado making of de “Jona/Tomberry”, um slideshow Mind My Gap e as primeiras obras do
Estúdio Rosto AD — The 4 Trailers Of Dog, Live To Work,
Work To Live, além de quatro vídeos da banda de Rosto, os
mauzões do Rock’n’Roll, The Wreckers (Whip In My Valise,
Together In A Car, The Wreckers Sing! e Animatin’ Wrecker
Folley).• FP
Live 8
The
Ross McElwee
DVD Collection
EMI, 2005
First Run Features, 2005
www.live8livedvd.com
www.firstrunfeatures.com
Vários
Desta vez não foi necessário aguardar quase 20 anos pelo
registo vídeo. O DVD do concerto que tinha como missão
levar os líderes dos oito países mais ricos do mundo (G8) a
perdoar a dívida aos países africanos, a 2 Jul 2005, demorou apenas quatro meses a ser editado. Bob Geldof é um
herói para muitos, mas a realidade é que em Edimburgo o
clima geral era de cepticismo e interrogação em relação às
reais repercussões das suas acções no terreno. Ainda assim, a constelação de estrelas reunidas foi impressionante
(claramente superior à de 1985), com filmagem e edição
da irrepreensível BBC. O DVD permite esquecer a péssima
cobertura da RTP, onde se confundiram milhares de milhão
com biliões, se falou cinco vezes mais do que o suposto,
deixando de fora actuações essenciais, se alterou a transmissão de canal sem avisar e se pediu contribuições para
um número SMS duvidoso, quando o importante era a inscrição no site oficial.• FP
Ross McElwee
Documentarista da corrente cinema verite, Ross McElwee
é um pensador com um sentido de humor mordaz. Ross
assume o protagonismo nos seus próprios filmes, afirmando que é mais fácil filmar em modo auto-biográfico a
família e os amigos (e os amigos destes) do que invadir a
privacidade de desconhecidos. Charleen (1978), o primeiro
filme, retrata um mês na vida da excêntrica poetisa Charleen Swansea. Já Backyard (1984) debate a relação de Ross
com o seu pai. Em Sherman’s March (1986), Ross sente na
pele as crises do general Sherman durante a guerra civil
americana, enquanto filma a passagem de diversas mulheres pela sua vida. Casamento, vida e morte são os temas
de Time Indefinite (1993), enquanto que em Six O’Clock
News (1997) Ross percorre os EUA de carro de forma a
registar as notícias mais recentes por oposição à manipulação televisiva. Por fim, em Bright Leaves (2004), Ross fala
do seu avô e da indústria do tabaco.• FP
Stop Dvd’s | 39
Roteiro Breve Da Banda
Desenhada Em Portugal
Dádá-Zen – Pintura-Escrita
Eurico Gonçalves
Carlos Pessoa
Quasi
Dar a conhecer a evolução das histórias aos quadradinhos no nosso país é o objectivo do livro que Carlos
Pessoa lançou durante o Festival Internacional de
Banda Desenhada da Amadora. Roteiro Breve Da
Banda Desenhada Em Portugal é, assim, uma viagem
aos primórdios da nona arte, desde a primeira banda desenhada assinada, em 1872, por Rafael Bordalo Pinheiro, à série A Pior Banda Do Mundo, de José Carlos Fernandes, um dos mais destacados e profícuos nomes da
actualidade. Socorrendo-se dos estudos que têm vindo
a ser publicados, o jornalista do Público traça uma panorâmica da BD nacional, incidindo a sua análise nos
principais acontecimentos, revistas e autores.
Num registo rigoroso, acessível e profusamente
ilustrado, fica-se a saber que o séc. xix é dominado
por criações dirigidas a um público adulto, que 1915
é uma data chave na afirmação da BD, com Quim e
Manecas, de Stuart de Carvalhais, e que as revistas
Mosquito e Cavaleiro Andante configuraram, nas décadas de 30 e 40, os anos de ouro da BD em Portugal.
Há, ainda, referências à explosão dos anos 60, época
em que o álbum substituiu a imprensa como meio de
divulgação da BD, ao papel da revista Visão, nos anos
70, na ruptura com os modelos do passado, à crise dos
anos 80, e, por último, ao triunfo dos autores que se
tem verificado na última década.• RD
Mais do que um livro, Dádá-Zen – Pintura-Escrita
é um testemunho de uma vida inteiramente dedicada
à Arte. Através da pintura e do desenho, ou da análise
do trabalho dos seus companheiros de geração,
Eurico Gonçalves, distinguido este ano com o Grande
Prémio da 13.ª Bienal Internacional de Arte de Vila
Nova de Cerveira, na qual participa desde a primeira
edição, tem sido um espectador participante dos
novos rumos da Arte Contemporânea, sobretudo no
campo da arte abstracta e gestual. Nesta autobiografia
do olhar e sentir poético, como poderia chamar-se, o
pintor, nascido em Penafiel em 1932, passa em revista
os principais nomes das artes plásticas nacionais, bem
como o seu próprio percurso artístico, tentando definir
uma arte poética que se estabelece, à semelhança
do Budismo Zen, Dadaísmo e Gestualismo, pela
recusa, pela negação de qualquer intenção, conceito,
ou planeamento. É neste campo vazio, mas aberto
à liberdade do inconsciente humano, defendido por
André Breton, que Eurico Gonçalves assenta a sua
filosofia Dádá-Zen e caligrafia pictória, que está na
origem das despinturas e desdobragens que tem vindo
a realizar nos últimos 30 anos.• RD
CTT
40 | Stop Livros
Imago 2005 — Festival internacional de cinema jovem
Pequenos prazeres entre amigos
Fundão
1 a 8 Out | www.imagofilmfest.com
Premiados Imago 2005
Grande Prémio Cidade do Fundão
The Raftman’s Razor, de Keith Bearden
Prémio Jovem Realizador Europeu
A Bras Le Corps, de Katell Quillévéré
Prémio do Júri da Competição Internacional
City Paradise, de Gaelle Denis
Melhor Filme Competição Docs in Shorts:
Undressing My Mother, de Ken Waerdrop
Menção Especial
Against The Sun, de Valentin Vasyanovych
City Paradise, Gaelle Denis
O Imago 2005 foi sinónimo de uma criteriosa
selecção de filmes, de excelentes propostas
musicais e filmes concerto e de retrospectivas de
Terry Gilliam e Jess Franco.
«Este filme apresenta duas actrizes muito talentosas», afirmou Jess Franco na apresentação de
Snakewoman, a sua última longa-metragem. Se alguém tem dúvidas em relação à taradice lésbica do
realizador espanhol, bastará alugar Snakewoman na
secção pornográfica de um clube de vídeo.
Terry Gilliam foi alvo de uma justíssima homenagem no Imago, com a passagem de clássicos como
Monthy Python And The Holy Grail e a curta The Crimson Permanent Assurance.
Constituiu também um enorme prazer deparar com
a instalação que deu origem à capa do álbum de estreia de Badly Drawn Boy, The Hour Of Bewilderbeast
(exposição de Sleeve-Art de Andy Votel) e com uma
exposição de pintura e multimédia do holandês Rosto.
Por outro lado, em 2006 o Imago necessitará de
melhorar as condições de visualização de filmes e espaços de concertos. Há que calendarizar mais eficazmente, evitando momentos mortos e a perda desnecessária de algumas sessões. Por fim, faltam sessões
com os filmes premiados.
Aparentemente mais melómano do que cinéfilo, o
público do Imago marcou presença em peso nos momentos musicais. Na cerimónia de abertura do festival,
a electro-acústica dos Canal Zero encaixou na perfeição na curta Walking, de Ryan Larkin (Canadá, 1969),
tal como Kubik e o maestro Luís Cipriano trabalharam
42 | Rewind Cinema
Under 25 — Melhor Filme Internacional
Bow Tie For Squareheads, de Stephan Flint Müller
Under 25 — Melhor Filme Nacional
Lixo, de Mário Filipe Faria
Prémio 2: Onda Curta
The Raftman’s Razor, de Keith Bearden
Time Zone Explained By Use Of Light, de Nicolai
Ostergaard
Un Beau Matin, de Serge Avedikian
Willow Drive, de Jarob Rorvik
Menção Especial do Júri Onda Curta
Phantom Limb, de Jay Rosenblatt
Prémio Júri Jovem
Bow Tie For Squareheads, de Stephan Flint Müller
Menção Honrosa Júri Jovem
Hope, de Fernando Carmo
Prémio do Público — Competição Internacional
Cashback, de Sean Ellis
Prémio do Público — Competição Docs in Shorts
Undressing My Mother, de Ken Waerdrop
Prémio do Público — Competição Under 25
Bow Tie For Squareheads, de Stephan Flint Müller
muito bem uma banda sonora electro-orquestral para
Entr’Acte, de René Clair (França, 1924). No encerramento, Kid Koala, acompanhado pelos DJs Jester e PLove, demonstrou toda a perícia no controlo de pitch e
scratch. Pelo meio, destaque para o turco residente em
Berlim, Namosh. Old Jerusalem, Erlend Oye (apesar de
engripado), Toolshed (projecto de Graham Massey) e os
Norton constituem sempre apostas seguras. No campo
dos erros de casting ficaram Golden Pistolas, Ana (João
Marrucho) e Alex (das Chick On Speed).• T Filipe Pedro
Caché, Michael Haneke
6.ª Festa do cinema francês
Seduzir para distribuir,
em francês
Fórum Lisboa e Instituto Franco-Português — Lisboa
6 a 16 Out | www.festadocinemafrances.com
Sobraram confetti para os outros dias do ano.
Que é como quem diz, os filmes, vai ser possível
sabo–reá-los mais tarde, depois do banquete de
uma semana e meia.
A Festa do cinema francês tem procurado, sobretudo, incentivar na distribuição nacional a cinematografia
francesa, razão pela qual a maioria dos filmes se apresenta com a etiqueta de valor seguro.
As Bonecas Russas é disso exemplo. Após o culto
gerado em torno d’A Residência Espanhola, a acção
transporta as personagens para outros destinos, simultaneamente geográficos e relacionais. Cédric Klapich
apela de novo ao colorido cruzamento de referências
culturais dispersas, ainda com o recurso à ciência da
estereotipia. Romain Duris move-se com à-vontade
num papel que se revela mais complexo com o avançar
do filme. O mesmo actor converte-se ainda em Arsène
Lupin, sob a direcção de Jean-Paul Salomé. Na pele
do famoso ladrão de jóias que nada deve à classe ou
ao charme, fica prejudicado pelo recurso excessivo a
efeitos especiais e artifícios formais que descaracterizam a personagem face à narrativa original.
Luc Jacquet conseguiu n’A Marcha dos Pinguins
um documentário de singular beleza. Envolvido por
uma banda sonora original que invoca o estilo da Björk,
o cenário reveste-se de branco e azul, numa fotografia
límpida e majestosa. A narrativa é equilibrada, a tempos afectuosa sem se tornar piegas. E os pinguins são
actores de talento ímpar.
Arnaud Desplechin consegue com Reis e Rainha
uma das obras mais notáveis do cinema actual. A narrativa apresenta o trunfo de uma empatia natural com as
vivências que ali se jogam, suportada por interpretações
talentosas. No domínio do imprevisível plantam-se âncoras de reconhecimento que permitem ao espectador
acompanhar as diferentes velocidades praticadas no
filme. Verosímil sem ser banal, único sem se tornar extravagante, objecto revelador da vida humana.
No festim figuraram ainda obras de relevo como
La Moustache, de Emmanuel Carrère, história sobre o
impacto que uma porção de pêlos faciais poderá operar na vida de um homem — em sentido metafórico,
claro. Uma homenagem à Escola Superior de Teatro e
Cinema deu espaço a curtas-metragens de estudantes
portugueses e franceses, num intercâmbio que permitiu
esclarecimentos mútuos. E como de costume a Festa
alastrou a outros pontos do país, cada vez com mais
público e candidaturas de outras cidades à passagem
do cinema francês. Uma Festa para a qual todos parecem querer ser convidados.• T Cátia Monteiro
Rewind Cinema | 43
The Wayward Cloud, Tsai Ming-Liang
38.º Festival internacional de cinema de Sitges
O mundo numa praia
Sitges, Catalunha
9 a 18 Out | www.cinemasitges.com
Foi da América do Norte e do Extremo Oriente
que vieram as principais vedetas do certame. Os extremos voltaram a tocar-se na maravilhosa enseada
de Sitges, tão pacata como cosmopolita.
Quase quarenta anos impõem respeito e, por isso
mesmo, os símbolos deste ano foram dois monstros sagrados do cinema: o Tubarão (assinalando três décadas
sobre o primeiro filme da saga spielberguiana) e o King
Kong, em antecipação do novo filme de Peter Jackson.
Sitges não é Cannes, mas quem ali vai durante estes dias sabe que se pode deparar com ídolos inextricáveis do cinema actual. Além de toda a galeria de
mediáticos espanhóis, grande parte só para consumo
doméstico (a maior celebridade foi mesmo Álex de la
Iglesia), os notáveis vieram da Ásia mais longínqua e
também do Canadá e dos EUA, como se segue: o coreano Chan-Wook Park (vencedor em 2004 com o inesquecível Old Boy), a japonesa Chiaki Kuriyama (a adorável assassina de Kill Bill 1) e o seu maestro, Quentin
Tarantino, além de Jodie Foster, David Cronenberg e
Viggo Mortensen. Destes, Tarantino foi quem despertou o momento de maior delírio do festival. A sua presença em Sitges era supostamente um segredo, mas
houve fuga de informação... Na verdade, foi o próprio
director do Festival, Ángel Sala, a não resistir e passar
a palavra à comunicação social. Resultado mais que
44 | Rewind Cinema
previsível: uma multidão de cinéfilos e curiosos ficaram
à porta (e à chuva!) da esgotadíssima sessão surpresa,
na qual o director de Pulp Fiction apresentou Hostel,
película gore do seu afilhado Eli Roth, também presente. A obra arranca com o que parece ser uma banal viagem à Europa de três amigos americanos, que
acabam por envolver-se incautamente numa espiral de
violência sanguinária e escabrosa. Na concorridíssima
mesa-redonda que se seguiu à projecção, Tarantino
adiantou que o seu próximo projecto é uma nova parceria com Robert Rodríguez: «Será um filme de terror
e chamar-se-á Grind House. Estará dividido em duas
partes, uma rodada por mim e outra pelo meu amigo
Rodríguez», esclareceu.
A gozar um período auspicioso precisamente desde a sua colaboração com Tarantino (Kill Bill), a jovem
actriz nipónica Chiaki Kuriyama também cruzou o
promontório de Sitges, para promover o filme Yokai
Daisenso, assinado por Takashi Miike e que participou
na secção Fantástico. Trata-se de uma saga guerreira
com muitos efeitos especiais, entes e forças sobrenaturais, inspirada numa lenda tradicional do Japão que já
tinha sido levada ao grande ecrã em 1968. O papel de
Chiaki é afinal secundário e a sua presença foi basicamente de prestígio e visibilidade.
O mesmo não se pode dizer de Chan-Wook Park,
que se apresentou em concurso, também na sec-
Hard Candy, David Slade
ção Fantástico, com Sympathy For Lady Vengeance.
Este sul-coreano de 42 anos, licenciado em Filosofia, afirmou-se mundialmente com Old Boy, filme que
venceu 13 festivais em todo o mundo, incluindo Sitges
e Cannes. Mas este ano não repetiu o título, embora
tão-pouco tenha voltado de mãos vazias, já que o júri
atribuiu a Lee Yeong-Ae o prémio de Melhor Actriz.
O filme conclui a trilogia sobre a vingança que centrou
nos últimos anos as atenções criativas de Park, mas
acaba por reiterar um pouco os mecanismos narrativos
e psicológicos já usados em Old Boy.
Finalizando com as vedetas, estes sim totalmente
fora de competição, o canadiano David Cronenberg,
acompanhado do nova-iorquino Viggo Mortensen,
respectivamente realizador e protagonista de A History Of Violence. Cronenberg volta a reflectir sobre o
sentido da existência e da condição humana neste filme maduro em que a vida de um comerciante muda
totalmente após matar dois delinquentes que assaltam
a sua loja. A personagem torna-se um herói nacional,
o que acarreta porém a perda da sua privacidade.
Mortensen está à altura do papel e foi merecidamente
ovacionado pelo público.
Os premiados
Como dizíamos, não só os principais convidados
do Festival eram oriundos da América do Norte e do Extremo Oriente, como também foram estas as cinematografias que dominaram o certame. De facto, os galardões mais relevantes repartiram-se entre The Wayward
Cloud, de Tsai Ming-Liang (Taiwan), e Hard Candy, de
David Slade (EUA), num empate técnico de 3 a 3. O primeiro arrecadou o Prémio Especial do Júri, Melhor
Actor (Lee Kang-Sheng) e ainda o Prémio da Crítica. Quanto ao segundo, foi distinguido com o Grande
Cirkus, Thomas Pors
Prémio do Público, Melhor Argumento (Brian Nelson)
e Melhor Filme. Ou seja, um domínio indiscutível para
estas duas obras envolventes e provocatórias, nas
quais se desenrolam romances pícaros e improváveis.
Mais filmes da América do Norte e do Oriente a
serem contemplados, embora com prémios menores,
foram Election (Melhor Realizador e Prémio Jurado
Jovem), de Johnnie To (Hong Kong), Seven Swords
(Melhor Fotografia para Keung Kwok Man, também
de Hong Kong), The Dark Hours, do canadiano Paul
Fox (Prémio Midnight X-Treme), e The Girl From Monday, do nosso bem conhecido Hal Hartley, que conseguiu vencer na categoria Noves Visions e mostrar que
o seu cinema ainda é capaz de pequenas surpresas.
Num festival que dispõe de sete secções competitivas seria fastidioso enumerar todos os premiados,
mas realmente a presença europeia ficou abaixo das
expectativas e praticamente só se destacou na Animação (secção Anima’t), onde os Prémios de Melhor
Curta e Melhor Longa-Metragem recaíram respectivamente sobre Cirkus (Thomas Pors, Dinamarca) e The
District (Áron Gauder, Hungria).
Finalmente, como curiosidade, refira-se que o decano realizador bávaro Werner Herzog, conhecido pelo
seu cinema ultra-autoral, teve a ousadia (ou a originalidade) de apresentar dois filmes diferentes a concurso:
The Wild Blue Yonder e Grizzly Man. E a verdade é que
ambos lograram Menções Especiais por parte do júri,
tendo também semeado confusão e celeuma entre o
público, pois os espectadores não sabiam se se tratava
de documentários ou ficções.
Apesar de tudo, Herzog não deverá ser um dos
homenageados do próximo ano, edição que, como já
foi tornado público, focará a obra e a carreira de David Lynch. O mesmo é dizer: bom pretexto para ir ou
voltar.• T Alexandre Nunes Oliveira
Rewind Cinema | 45
Gosto de Ti Como És, Sílvia Firmino
DocLisboa
Ver para crer
Culturgest — Lisboa
15 a 23 Out | www.doclisboa.org
A terceira edição do DocLisboa superou todas
as expectativas. Durante nove dias a Culturgest fezse casa do documentário português e estrangeiro.
Os sintomas são claros e reveladores: olheiras profundas, café na mão esquerda, programa do
DocLisboa na mão direita todo rabiscado, bilhetes
laranjas e brancos nos bolsos e um recorrente chamar de casa à Culturgest. Assim se descreve alguém
que tenha vivido entre um pequeno e grande auditório
durante nove dias. Tudo resultou num visionamento exaustivo de 90 filmes, das 11h às 23h. Mas terá
compensado para quem cumpriu o programa à risca?
A resposta é afirmativa.
Ana Isabel Strindberg, responsável pela direcção
do DocLisboa, confirma: «O festival é uma visão transversal do mundo, que este ano resultou em mais secções, sessões, debates, prémios, masterclasses, uma
oficina de cinema e mais público» — uma média de 1
900 espectadores por dia, num total de 17 mil.
Mas não vale esquecer o motor do festival — os
filmes. Nomeadamente os cerca de 80 que não foram premiados, entre eles Sereias, de Dina Campos
Lopes, sobre o barco do aborto, ou Meet Me In The
Rothko Room, de Rob John, no qual é permitido ao
espectador olhar para os observadores dos quadros
de Rothko. Já em Nous, de Danielle Arbid, é documentado o processo de morte do seu pai. Retrato, de
46 | Rewind Cinema
Premiados Doclisboa 2005
Grande Prémio de Longa-Metragem
Before The Flood, de Yan Yu e Li Yifan
Alimentation Générale, de Chantal Briet
Grande Prémio de Curta-Metragem
Samagon, de E. Schlegel e S. Heinzel
Melhor Primeira Obra Documental
Before The Flood, de Yan Yu e Li Yifan
Menção Especial
Samagon, de E. Schlegel e S. Heinzel
Menção Especial Primeira Obra
Falta-me, de Cláudia Varejão
Melhor Documentário Português
Gosto De Ti Como És, de Sílvia Firmino
Melhor Documentário Português (dist. em sala)
Natureza Morta, de Susana de Sousa Dias
Melhor Documentário de Investigação
Massaker, de M. Borgmann, L. Slim e H. Theissen
Menção Especial
Occupation: Dreamland, de Garrett Scott e Ian Olds
Melhor Longa-Metragem Documental (IPJ)
By The Ways, de Vincent Gérard e Cédric Laty
Melhor Filme Português (IPJ)
Gosto De Ti Como És, de Sílvia Firmino
Carlos Ruiz Carmo, mostra as singularidades de um
casamento de 40 anos.
Já aos filmes premiados fica a conquista de um
troféu, um diploma, uma recompensa em dinheiro… e,
claro, a promessa de que para o ano o mundo inteiro
regresse e invada de novo Lisboa.• T Catarina Medina
29.º Cinanima
Premiados Cinanima 2005
Filmes até sete minutos
The Kiss Thief, de Elena Madrid
Before, de Gabor Ulrich
Menção Honrosa
The Last Knit, de Laura Neuvonen
Filmes de sete a 21 minutos
About Ivan The Fool, de Mikhail Aldashin e Oleg Uzhinov
The Old Crocodile, de Koji Yamamura
Filmes de 21 a 52 minutos — Menção Honrosa
The Mysterious Geographic Explorations Of Jasper
Morello, de Anthony Lucas
Primeiro Filme
Overtime, de Oury Atlan, Thibaut Berland e Damien Ferrié
Menção Honrosa
Cytoplasm In Acid Environment, de I. Iborra, D. Gautier
e E. Puertas
Melhor Filme Português
Menu, de Joana Toste
Melhor Animação num Filme Europeu
The Gates Of Heaven, de Lucy Lee
Prémio Especial do Júri
História Trágica Com Final Feliz, de Regina Pessoa
Grande Prémio Cinanima 2005
Milch, de Igor Kozalyov
Prémio Melhor Banda Sonora
Vent, de Erik Van Schaaik
Prémio Jovem Cineasta Português (até 18 anos)
A Ovelha Azul, do Colectivo Cinema Jovem
Prémio Jovem Cineasta Português (m. 18 anos)
O Remédio Maravilhoso De Jorge, de Jorge Marques
Menção Honrosa
Uma Carta Para Ronaldo, das educandas do Internato
de S. João
Prémio 2: Onda Curta
The Mysterious Geographic Explorations Of Jasper
Morello, de Anthony Lucas
The Last Knit, de Laura Neuvonen
About Ivan The Fool, de Mikhail Aldashin e Oleg Uzhinov
Menção Especial do Júri Onda Curta
História Trágica Com Final Feliz, de Regina Pessoa
Prémio António Gaio
História Trágica Com Final Feliz, de Regina Pessoa
Prémio Melhor Longa-Metragem
Laura’s Star, de T. Rothkirch e P. Rycker
Prémio Alves Costa — Imprensa
História Trágica Com Final Feliz, de Regina Pessoa
Prémio do Público
Maestro, de Géza Tóth
Pura magia
Centro Multimeios — Espinho
7 a 13 Nov | www.cinanima.pt
Os olhos brilham, a voz vibra e o tom é emocionado. Ouvir António Gaio, director do Cinanima,
apresentar o novo cartaz para 2006 não nos deixa
indiferentes. A experiência fala por si: 30 anos de
uma vida dedicados ao cinema de animação.
Há muita qualidade no Cinanima. Qualidade nas
sessões competitivas até 52 mins, na exposição de
Abi Feijó, na homenagem a Rafael Bordalo Pinheiro,
nas retrospectivas da Escola Polaca de Animação, da
Escola de Artes de Utrecht, da Academia de Artes de
Turku e de Phil Mulloy (sobretudo em Love Is Strange
e The Christies), no jornal diário do festival e nas condições do Centro Multimeios. Qualidade reconhecida
pela presença notável de realizadores internacionais e
na incontestável lista de premiados, a merecer transcrição directa para DVD.
De fora dos prémios ficaram outras curtas importantes. Um homem enlouquecido pela rotina entra em
parafuso na curta 529, dos holandeses Niek Castricum
e Maarten De With; a bela história de amor platónico
entre Lupe & Bruno, de Marc Riba e Anna Solanas;
aceitar ou não o destino de andar sempre em linha recta n’A Revolução Dos Caranguejos, de Arthur De Pins;
a bela e o monstro na personalidade de Emily & The
Baba Yaga, de Clive Tonge; tudo aquilo de que precisa
saber para namorar em The Instructional Guide To Dating, de Siobhan Bowers; uma mulher que nunca acerta
na roupa adequada ao estado do tempo em Notice,
de Roelof Van Den Bergh; como se processa a passagem de testemunho de um demónio em The Demon,
de Shin Hosokawa; e um morcego desesperado por
umas horas diurnas bem dormidas torna-se um vizinho
generoso em Nightshift, de Samppa Kukkomen, Sara
Wahl e Simo Koivunen.
Por outro lado, não se entende como é que o júri de
selecção deixa de fora a longa essencial The District!,
de Aron Gauder — a única justificação possível é o
enquadramento na competição de longas-metragens,
sendo claramente superior às seleccionadas. Notámos
ainda a falta de uma zona de debates com os convidados internacionais e de uma categoria independente
para telediscos, anúncios e genéricos de filmes.
Na cerimónia de encerramento aperaltaram-se os
políticos para falar da melhoria das condições para o
Cinanima, de apoios financeiros superiores e de uma
escola para profissionais de animação em Espinho.
Pela obra feita, o Cinanima bem merece.• T Filipe Pedro
Rewind Cinema | 47
FIKE — Festival internacional de curtas de Évora
Rule Britannia
Évora
18 a 26 Nov | www.fikeonline.net
The Man Who Was a Shoe — Among Other Things, Jonas Arnby (Prémio Dom Quixote)
A filmografia do Reino Unido dominou indiscutivelmente a quinta edição do certame alentejano,
chamando a si boa parte dos prémios. Pequena
crónica de um festival que ruma contra o marasmo
e a falta de apoios.
Conheceu horas contínuas de cinema o Festival
internacional de curtas metragens de Évora (FIKE),
que aconteceu entre 18 Nov (6.ª) e 26 (sáb). Desde a
primeira edição, em 2001, foi política da casa manter
uma selecção oficial aberta e abrangente e este ano
não foi excepção. Em concurso estiveram 115 obras,
divididas em sessões maratónicas que por vezes se
aproximaram das três horas de duração. Tudo em
nome da divulgação do cinema de autor, que, diga-se,
não aparece muito numa cidade onde só existem duas
salas com programação diária.
As sessões competitivas decorreram integralmente no auditório da universidade local, de razoáveis condições e dimensão. De maneira geral, o nível
exibido foi bastante alto, em particular no capítulo da
animação, de que vimos películas deslumbrantes, das
quais The Last Knit, da finlandesa Laura Neuvonen,
ou Beak, da holandesa Lucette Braune, que afinal foi
considerada a melhor pelo júri. O filme retrata a vida
de uma menina que nasceu pássaro e evidencia inspirações de Dalí e Fellini.
Embora houvesse curtas oriundas dos cinco continentes, os prémios do evento foram repartidos por
48 | Rewind Cinema
produções europeias e, entre estas, houve ainda uma
clara hegemonia da cinematografia das ilhas britânicas. Foi o caso da Melhor Ficção, Waverley, de Piers
Thompson, magnífica fotografia e direcção, recriando a ambiência obscura e fantasmagórica na vida de
uma idosa solitária. A menção honrosa atribuída pelo
júri contemplou a igualmente britânica Cashback, de
Sean Ellis, uma divertida fantasia erótico-artística improvavelmente passada num supermercado, sobre a
qual recaiu ainda o Prémio do Público. O Melhor Documentário era também de terras de sua Majestade:
Last Man Standing, de Sasha Djurkovic. Um trabalho
nada mais que razoável sobre a falta de perspectivas
da juventude na Inglaterra interior.
Refira-se a simpática presença portuguesa, encabeçada pela profissionalíssima Uma Noite ao Acaso,
de Victor Candeias, aziaga aventura nocturna de táxi
por Lisboa, bem como a truculenta animação A Dama
da Lapa, de Joana Toste. Receberam respectivamente o galardão Melhor Curta Portuguesa e o Prémio
Cidade de Évora.
O FIKE quer ser um evento marcante, mas para
isso necessita de alargar a sua estrutura. O tecido
empresarial da região prefere apoiar eventos desportivos e a autarquia de Évora parece não compreender
o potencial que o evento representa, destinando-lhe
apenas uma soma de 20 mil euros, manifestamente insuficiente para a sua profissionalização.• T Alexandre Nunes
Oliveira [com Laura González]
Nippon Koma 2005
Entre a tradição e a
modernidade
Culturgest — Lisboa
28 Nov a 5 Dez | www.culturgest.pt
No espaço que medeia a tradição espiritual e
a tecnologia de ponta, os japoneses traçam um
caminho irregular, aberto a inúmeras subculturas.
O Nippon Koma, festival de cinema de animação
japonês, projectou na tela algumas dessas visões
particulares de um mundo que encara a globalização cada vez mais fragmentado.
O Oriente tem sido apontado como uma espécie
de guru espiritual do mundo ocidental, com as suas
filosofias de tradição milenar. Não obstante, um país
como o Japão é hoje palco de uma forte dependência
dos mecanismos tecnológicos e de uma entrega ao
entretenimento audiovisual como forma de alienação
do anonimato humano. Uma herança do passado e o
questionar do legado futuro, que aqui se exploraram
em diferentes domínios.
Nas animações de Kawamoto Kihachiro, de uma
nítida beleza formal, reconhece-se a invocação da
mitologia oriental e de caracteres religiosos. Há uma
representação de valores e papéis tradicionais que se
reforçam num meio natural, virgem de qualquer vaga
de industrialização. Em contrapartida, o documentário
Peep “TV” Show, de Yutaka Tsuchiya, transporta-nos
para um Japão em crise de identidade, à deriva entre a
apatia e uma atitude reaccionária de pessoas que procuram um modelo de vida alternativo numa sociedade
estranha às suas inquietações.
Os formatos potenciam visões distintas de realidades que se tocam. No trabalho de Ono Satoshi podemos observar Bom Dia Yokohama, relato visual das
condições absurdas em que os habitantes daquela cidade portuária apanham o comboio na hora de ponta
matinal. Parece não caber mais ninguém e ainda assim
novos passageiros empurram os restantes, sucessivamente, até as portas se fecharem sobre uma densa
mistura de carne humana. Já na animação Plataforma,
em que recorre de forma brilhante à técnica de argila,
duas carruagens de sentidos opostos abrem as portas em simultâneo para um encontro de jornal em riste.
Paranoia Agent, Kon Satoshi
Homens de fato digladiam-se perante o olhar incrédulo
de dois jovens, num retrato satírico e humorado.
Na mostra do Nippon Koma passeámos por retratos de vida em formato documental, como Sombra, em
que Kawase Naomi explora a convulsão de sentimentos que se gera quando uma mulher aos 30 anos conhece o pai biológico. No campo da animação houve
investidas mais poéticas (Pó De Giz), experimentação
técnica sem grande lugar para estrutura narrativa (Série
Fundir Em Branco) e várias concretizações alternativas
da narrativa aliada à técnica, pontuadas de um humor
singular (Um Homem Velho E Um Boião).
No escuro do auditório as reacções espelhavam
fascínio, surpresa, reconhecimento ou incompreensão. Sem dúvida um espaço de descoberta de uma
outra dimensão que nos é, afinal, bastante próxima.•
T
Cátia Monteiro
Rewind Cinema | 49
A vida contínua
de Barcelona
CCCB — Barcelona, Espanha
Numa cidade onde há praticamente um festival a cada semana, há também um espaço que se
destaca pela sua capacidade de organizar e acolher
eventos desta natureza: trata-se do Centre de Cultura Contempòrania de Barcelona (CCCB), do qual
aqui destacamos duas actividades recentes — Festival L’alternativa de cinema independente e a Festa
da literatura Kosmópolis.
O Raval (Arrabalde) de Barcelona foi durante séculos uma zona de grandes conventos. Com a extinção
liberal das ordens religiosas, aqueles espaços foram
adaptados a outras funções, os claustros passaram
a ser praças públicas e alguns edifícios tornaram-se
pólos culturais. Assim aconteceu com o Mosteiro das
Monjas de Montalegre, hoje transformado num moderno complexo que alberga o Museu de Art Contemporani (MACBA) e o CCCB, ambos de gestão pública.
Festival l’alternativa
de cinema independente
11 a 16 Nov | www.cccb.org
Entre 11 Nov (6.ª) e 19 (sáb) decorreu o 12.º Festival de cinema independente de Barcelona, também
dito L’alternativa, no hall do antigo mosteiro, um dos
espaços escolhidos para a exibição de filmes, com
entrada grátis. No entanto, para assistir às secções
oficiais deveria ir-se ao Auditório (ou ao Cinema Meliés) e aí a entrada era a dinheiro. Mas o ambiente de
confraternização cinéfila que se gera no hall, onde se
50 | Rewind Cinema
ouve falar todas as línguas, é de facto impagável. A
participação portuguesa voltou a fazer-se notar, aqui
através do programa VS Project (resultante da colaboração entre o festival e o Imago do Fundão), o qual,
na verdade, parecia mais video-arte do que cinema.
Quanto aos galardões, a Melhor Longa-Metragem foi
Melegin Düsüsü (La Caída Del Ángel), de Semih Kaplanoglu (Turquia), e nas Curtas destacou-se A Bras Le
Corps, de Katell Quillévéré (França).
Festa da literatura Kosmópolis
2 a 4 Dez | www.cccb.org
Dos múltiplos eventos que tomam lugar no CCCB,
destacamos o terceiro Kosmópolis, festa internacional
da literatura, que teve lugar no fim-de-semana de 2 a 4
Dez. À semelhança dos outros anos, um certame notável, que só pecou pela duração tão reduzida. Verdadeiro caldeirão pós-moderno, este ano apresentou no
menu propostas tão variadas quanto a celebração do
quarto centenário da publicação de Dom Quixote (Quijote Reloaded) e, em simultâneo, um concurso de Hip
Hop/Spoken Word, intitulado Em Busca Do MC Definitivo, com eliminatórias e prémios. Além da projecção
de filmes, colóquios, palestras e exposições, cumpre
destacar ainda a soberba instalação vídeo ocupando
o claustro do antigo convento, iluminando-o com imagens, palavras e textos em movimento, uma criação
colectiva de vários artistas designada Lector Mundi.•
T
Alexandre de Oliveira Nunes F Susana Gellida
Rencontre des labos
Resistência ao fim da película
Bruxelas, Bélgica
2 a 10 Dez | www.nova-cinema.com
O que acham da ideia de existir um espaço em
Portugal onde se possa revelar, processar, editar e
projectar em película Super 8 e 16 mm, de uma forma independente e autónoma e com custos reduzidos? Pode parecer irreal mas é isto que existe há
alguns anos em várias cidades europeias. Espaços
com material técnico próprio, trabalhando em colectivo, abertos à comunidade. Servem como focos
de resistência contra a ideia generalizada do fim da
película. Para tal, a fórmula é simples: tornar os materiais acessíveis a todos.
Teve lugar em Dezembro a terceira edição do Rencontre des labos, estes chamados laboratórios de cinema independente, cuja organização quase perfeita
da Cinema-Nova — sala de cinema alternativo em Bruxelas — deu um impulso fundamental para o crescimento deste movimento que agora se espalha a outros
países do Sul e do Leste da Europa.
A representação portuguesa esteve a cargo do Incrível Club, antiga sala de cinema em Almada, que desde há dois anos vem fazendo uma intensa programação cultural no domínio das artes de rua, música, teatro e cinema. O Incrível Club, em colaboração com o
Nucivo (Núcleo de Cinema e Vídeo da Faculdade de
Letras da Universidade de Lisboa), organizou uma
mostra de cinema português experimental, apresentando filmes curtos de Paulo Abreu, Edgar Pêra, Pedro Sena Nunes, Renata Sancho, Nuno Cera, Miriam
Sampaio, Tiago Afonso, Ricardo Leite e Sal. Este programa integrou as várias compilações — 14 no total
— de filmes experimentais apresentados pelos vários
laboratórios presentes, juntamente com obras de realizadores independentes. Quatro filmes foram apresentados em sessões especiais, incluindo o documentário português Natureza Morta, de Susana Sousa
Dias, integrado numa discussão sobre preservação e
recuperação de arquivos. Tanto este como os outros
filmes portugueses apresentados tiveram excelentes
reacções do público, com possibilidade de outras exibições em alguns festivais europeus. A programação
foi feita também de debates, instalações, concertos e
performances com múltiplos projectores 16 mm e Super 8, com destaque dado ao puro deslumbramento
visual realizado pelo colectivo MTK.
No final destes encontros ficou a possibilidade de
em dois anos e meio o próximo Rencontre des labos
ser organizado em Portugal, pelo Incrível Club, o que
seria um excelente impulso para dotar esta mítica sala
de todas as condições necessárias para a projecção e
se poder formar, entretanto, um laboratório em película
neste espaço.• TF Gonçalo Tocha
Rewind Cinema | 51
ExperimentaDesign 2005
Design enquanto comunicação
Lisboa
15 Set a 30 Out | www.experimentadesign.pt
matar o design», declaração que agitou e demonstrou
à audiência o porquê de ser considerado o mais mediático e prestigiado designer em actividade.
Manipular e ser manipulado
Catalysts
Durante mês e meio, a ExperimentaDesign
– bienal de Lisboa confirmou ser um amplo e bem
sucedido espaço de apresentação e reflexão das
diversas áreas do Design.
Apesar dos significativos cortes no orçamento
para esta quarta edição, o programa apresentado e
os números já divulgados (só na primeira semana estiveram 17 mil visitantes) vêm confirmar a crescente
relevância da bienal ExperimentaDesign no panorama
nacional e internacional. Apresentando um programa
multidisciplinar, o evento espalhou-se por vários espaços da cidade de Lisboa, promovendo a interacção
entre criadores e visitantes.
A vinda a Portugal de Philippe Starck foi um dos
pontos altos da bienal, numa intervenção que encerrou
o ciclo de conferência, que esgotou todos os dias a
lotação das salas do CCB. Autor de centenas de objectos, alguns deles já verdadeiros ícones do design
moderno, Starck apresentou alguns trabalhos e esclareceu o seu constante interesse em democratizar o
Design e interrogar o papel dos objectos na sociedade
e cultura moderna. Num ambiente descontraído e bem
humorado desafiou a plateia: «Podem perguntar-me
tudo, mas o primeiro que fizer perguntas sobre design
está morto», para depois afirmar: «O meu trabalho é
52 | Rewind Design
A forma como cada um de nós assimila e interage
com a informação que nos é disponibilizada diariamente foi o mote da exposição Catalysts, que esteve patente no CCB, comissariada por Max Bruinsma.
Dividida em núcleos temáticos, Acredita, Seduz,
Informa, Compromete-te, Cronologia e Pânico Moral,
da responsabilidade de seis designers convidados
(Ed Annink, Fernando Brízio, Pierre di Sciullo, Erik
Adigard+M-A-D, Jan Van Toorn e Rob Schröder), a
mostra incidia sobre a forma como as expressões
visuais podem manipular e ser manipuladas no processo comunicativo, apresentando ao mesmo tempo
a importância do Design como elemento catalisador
da nossa cultura de comunicação.
Sob o desígnio O meio é a matéria, tema da edição
deste ano da bienal, o ciclo de cinema apresentado
na Culturgest focou a abordagem crítica aos meios de
criação e representação do cinema, a partir de um conjunto de obras de cineastas americanos. O destaque
foi para o premiado Los Angeles Plays Itself, uma obra
apresentada pelo próprio realizador, Thom Andresen.
Relativamente ao impacte desta edição junto do
público e da cidade, destaca-se o Lounging Space
,que devolveu à cidade, embora temporariamente, o
magnífico palácio de Santa Catarina (recebendo por
dia mais de 300 pessoas), a associação com o projecto
britânico Live Language, que permitirá o acesso através da Internet a várias comunicações realizadas nas
Conferências de Lisboa e nas Open Talks, bem como o
compromisso com um promotor imobiliário que aceitou
construir na localidade de Sarilhos Pequenos, no concelho da Moita, os projectos apresentados por 12 ateliers de arquitectura na exposição A Casa Portuguesa.
Estes são alguns exemplos que, associados aos
números que comprovam uma grande adesão do público durante todo o evento, provam a vitalidade e a
importância desta bienal, cada vez mais um marco no
panorama internacional dos eventos relacionados com
o Design.• T Ricardo Lourenço Nunes F Maria Machado
Festival temps d’images
Outono imaginário
Lisboa e Faro
6 a 29 Out | www.tempsdimages-portugal.com | www.tempsdimages.org
Imagem foi a palavra de ordem. Co-produzido pela
Duplacena, Devir/CAPA e pelo Centro Cultural de Belém (CCB), o temps d’images proporcionou a divulgação de novos artistas e de outros mais conceituados.
Um festival pluridisciplinar que contou este ano com
a quarta edição e que, segundo a organização, veio
para ficar, assegurando inícios de Outono de intensa
imagem e arte.
À tarde, num fim-de-semana de Outubro, a Praça
do Museu do CCB deu lugar a um recreio de crianças
entusiasmadas por uma ambulância que suscita curiosidade. Alain Moureau e o Tof Théâtre criaram um espectáculo que ganha pela exploração do universo das
histórias infantis, de uma forma quase surrealista, ao
exagerar no uso de objectos comuns numa operação
médica feita a um ser escondido. Um jogo entre o real
e o imaginário, a envolver a narrativa interpretada pela
marioneta-cirurgião. O mundo dentro da barriga de um
lobo, alcançado por uma pequena câmara, num espectáculo de nome Bistouri.
No campo da dança, dois espectáculos a destacar:
Set Up e Sand Table. O coreógrafo Rui Horta, um dos
mais conceituados coreógrafos do momento, convida
o público a esquecer-se do seu nome e olhar para o
palco numa nova perspectiva. As pessoas são levadas por um caminho não convencional para o palco
do Grande Auditório do CCB. Sentadas perante duas
cortinas que dividem o espaço cénico, sentem que deixa de haver uma divisão linear entre palco e plateia.
Set Up joga com a urgência da fala, com a resposta
do corpo perante outro corpo e, pensando no mote do
festival, com a imagem. Esta, juntamente com o tacto,
serve de impulso aos bailarinos, que se questionam e
nos questionam: «Se não tens um nome, não tens cara.
Consegues imaginar-te a falar com alguém sem cara?»
Saído deste espectáculo, o público é convidado
a ficar para vinte minutos de pura intensidade. Sand
Table é uma instalação viva, surgida de um encontro
entre a coreógrafa Meg Stuart e a artista visual Magali
Desbazeille. Visto de cima, a acontecer no Foyer do
Grande Auditório do CCB, a areia é um instrumento de
interacção entre corpos e imagens. Dois bailarinos movimentam-se, trabalhando o conceito de efemeridade.
O temps d’images contou ainda com outros espectáculos nas áreas da dança, teatro, artes plásticas e
ciclos de arte. William Kentridge apresentou vídeos e
instalações no Museu do Chiado, naquela que foi a sua
primeira exposição em Portugal. Outra grande novidade foi a de João Botelho. O realizador estreou-se com
Sonho de Verão, a sua primeira criação para palco, que
contou com Suzana Botelho na interpretação. Todos
os trabalhos tiveram como objectivo incentivar o encontro entre artistas de várias áreas e países. Depois de
Lisboa, partiram para Faro, alargando o festival, que
começou em França, pela mão do canal ARTE e da associação cultural Ferme du Buisson, a novas cidades.•
T
Ana Rocha Duarte F Chris van der Burgh
Sand Table, Magali Desbazeille e Meg Stuart
Coreógrafos, bailarinos, encenadores, actores,
realizadores e outros artistas cruzaram-se em espaços lisboetas antes de rumarem a Faro. O Festival
temps d’images trouxe-nos projectos inovadores,
que cruzaram o poder do palco com a intensidade
da imagem. Quem os perdeu terá a oportunidade de
se deixar surpreender no próximo Outono.
Rewind Pluridisciplinar | 53
16.º Festival internacional de banda desenhada da Amadora
Amadora aos quadradinhos
Amadora
21 Out a 6 Nov de 2005 | www.amadorabd.com
Tu és a mulher da minha vida, ela a mulher dos meus sonhos,
João Fazenda e Pedro Brito
Pais, filhos e todo o género de feitios voltam a
encontrar-se num dos acontecimentos mais plurais
do ano. A Amadora continua a ser a encruzilhada de
todas as bandas desenhadas.
Foi detectada uma cama voadora no Metropolitano
de Lisboa. Entre os últimos dias de Outubro e os primeiros de Novembro último, o fenómeno foi visível por todos os utentes da estação da Amadora Este. O objecto
voador inesperadamente identificado marcava a entrada de um universo paralelo: o Festival internacional de
banda desenhada da Amadora (FIBDA).
Empoleirado aos pés da cama, assim como um
capitão ao leme, é Little Nemo, personagem do autor
norte-americano Winsor McCay, quem liderava todo o
festival. Este menino que acordava no final de todas as
histórias fez cem anos e a mais importante exposição
54 | Rewind BD
do festival foi-lhe dedicada, num ano em que o tema foi
o Sonho. O destaque vai para três pranchas originais
que nunca tinham estado em exposição pública e que
fizeram as delícias de aficionados e estudiosos.
Outros públicos, com a mesma idade que o Little
Nemo terá sempre, preferem exposições de autores e
personagens mais recentes. O grande sucesso deste
ano entre a miudagem foi o autor Ricardo Ferrand e a
sua galinha. Entrevistado no passado número da FEST,
este jovem talento apresentou uma BD sem texto em
que o leitor se torna autor da aventura. Pequenas fontes bem informadas garantiram-nos que não se trata
de uma galinha mas de um peru disfarçado. Certo é
que havia grande expectativa para uma sequela protagonizada, desta vez, por um coelho e a ser editada
também pela Witloof.
O FIBDA é, sobretudo, lugar de muitas e desvairadas gentes, desde caçadores de autógrafos que
levam meia hora a serem desenhados, passando
por estudantes de artes, por experientes engenheiros
electrotécnicos e coleccionadores até ruidosos adeptos de galináceos sem texto. André Moreira, 31 anos,
um habitual do FIBDA desde que há festival, vai para
«descobrir autores novos e comprar qualquer coisa».
A sua filha Alice, de três anos, não presta declarações
à imprensa, mas é a segunda vez que visita o festival. Percebe-se que está deliciada com tudo, sobretudo com o espaço infantil, onde pode fazer os seus
próprios desenhos e pendurá-los na parede como os
autores grandes.
Entre crescidos, este ano, a atenção recaiu sobre
José Carlos Fernandes, cujo trabalho A Última ObraPrima De Aaron Slobdj, das Edições Devir, ganhou o
Prémio juventude e o Prémio melhor argumento
de autor português. Na categoria de melhor desenho foi distinguido Filipe Abranches, com As Aventuras Formativas De Fortunata, Maria e Garção, do IEFP.
Com ou sem cama voadora, em Outubro próximo a
romaria repete-se.• T Luís Pedro Oeiras Fernandes
Man in Skirts, Women — Too!?, Tala Dance Center
Quinzena de dança de Almada – Festival internacional de dança contemporânea
Coreografar o sonho
Almada
28 Out a 13 Nov | www.cdanca-almada.pt
Sonho, corpo e cultura. Foi sob o signo desta
artística trindade que decorreu a última edição
do Festival internacional de dança contemporânea, uma quinzena a provar que nem só de teatro
vive Almada.
Houve de tudo. Espectáculos que nasceram de
residências, oportunidades para jovens coreógrafos e
espaço para troca de experiências. Com artistas de várias nacionalidades, a Quinzena de dança de Almada,
simultaneamente Festival internacional de dança contemporânea, afirmou-se como uma das montras portuguesas mais importantes no campo da reflexão, exibição e criação dos novos territórios da Dança. O poder
imagético e inventivo dos sonhos, as várias fronteiras
do corpo humano, nas suas semelhanças e diferenças
em relação ao outro, e o cruzamento de culturas e linguagens artísticas foram as áreas em destaque nesta
13.ª edição, que também se dedicou aos mais novos
quer em coreografias, quer em actividades paralelas.
Neste sentido, a quinzena promovida pela Companhia de dança de Almada (CDA), dirigida, desde a
sua fundação, em 1990, por Maria Franco, trouxe a
Portugal o cubano Guillermo Horta Betancourt, que
apresentou Árbol Periférico O Poema Del Contorno,
uma reflexão sobre o teatro do corpo. Assim como a
companhia polaca Silesian Dance Theatre, pioneira na
era pós-URSS, criada e dirigida por Jacek Luminski,
com Glour Of A Mundane – Dream From A Saint, um
intenso ensaio sobre a realidade enquanto espartilho
dos nossos sonhos. Na secção Plataforma Coreográfica Internacional, que desafia bailarinos e instituições a
proporem trabalhos para eventual apresentação pública durante o festival, estiveram presentes 19 coreógrafos oriundos de 10 países, como Dinamarca, Espanha,
México, Suécia ou França. Esta área esteve dividida
em três temas, Ligações: sonhos e realidades, Natureza: encontros e desencontros e Híbridos: linguagens,
géneros e culturas, contando com os portugueses
Alexandra Nogueira, Ana de Castro, Ana Martins, Ana
Mira, Carla Jordão, Filipa Pires, Maria José Bernardino,
Rita Judas e Sílvia Pinto Coelho. As honras da casa estiveram a cargo de Rita Galo, que na abertura interpretou uma nova versão da sua coreografia …Embriagar
De Sonho O Silêncio Das Coisas…, e da própria CDA,
que com Cenas (Dês)Compostas II aproximou dança e
crianças, numa abordagem pedagógica e lúdica.
Ao longo da quinzena houve tempo ainda para três
workshops, com Liou Shaw-Lu, do Taipei Dance Circle
de Taiwan, Marie-Gabrielle Rotie, coreógrafa e bailarina inglesa, e Arantxa Sagarday, directora da compahia
Patal Arriba de Espanha, e um atelier de dança para
crianças. Refira-se, ainda, uma mostra internacional de
vídeo, com projecção contínua de trabalhos de vários
coreógrafos, um seminário sobre formação e um encontro informal entre artistas e público.• T Ricardo Duarte
F
Tomaz Zakizewkl
Rewind Dança | 55
Arte Lisboa – Feira de arte contemporânea
A prova dos nove
Lisboa
24 a 28 Nov | www.fil-artelisboa.com
Penn Ave. Washington, 2005, Roland Fischer
Em Portugal, não há feira como esta. Artistas,
galeristas, coleccionadores e amantes da arte encontraram-se para ver que rumo segue a contemporaneidade. Na sua quinta edição, a Arte Lisboa
conquistou a sua viabilidade, impondo-se na cena
artística nacional e estrangeira.
A prova foi superada. À quinta edição a Arte Lisboa
– Feira de arte contemporânea de Lisboa, afirmou-se
com um importante espaço de divulgação da produção
nacional e internacional no campo das artes plásticas,
ultrapassando, assim, as principais dificuldades sentidas no ano passado, no plano da organização e divulgação. O número de galerias seleccionadas, 58, mais
sete do que em 2004, entre portuguesas, espanholas,
56 | Rewind Artes Plásticas
brasileiras, alemãs e uma russa (a Stella Art Gallery,
uma estreia absoluta em Portugal) são disso um bom
testemunho. Não esquecendo as enchentes que se
verificaram todos os dias, afluência, no entanto, diluída
nos cerca de sete mil metros quadrados de exposição.
Se ao nível da produção, este ano da responsabilidade de Fátima Vila Maior, directora de feiras da FIL,
e de Ivânia Gallo, em dedicação exclusiva, o equilíbrio
foi a nota dominante, também ao nível das propostas artísticas se sentiu uma harmonia entre gerações,
suportes e linguagens. A aparente dispersão da arte
contemporânea, que hoje em dia faz conviver o vídeo
mais minimalista com a mais elaborada composição
pictórica, de matriz figurativa, não se sobrepôs a uma
ideia de pesquisa comum a todos os artistas. Ainda
que tudo isso se tenha evidenciado de uma forma inconsciente, na medida em que cada galeria apresentou
os seus artistas segundo critérios comerciais — a Arte
Lisboa é, ao fim e ao cabo, uma feira comercial. Nomes
como Adriana Molder, Cristina Canmpino, João Onofre, João Pedro Croft, João Pedro Vale, João Pombeiro,
José Maçãs de Carvalho, Manuel Gantes, Pedro Cabrita Reis (em desenho), Pedro Casqueiro, para não falar
nos veteranos Costa Pinheiro, Cruzeiro Seixas, Helena
Almeida, Jorge Martins, ou Nikias Skapinakis, ou nos
internacionais Gerard Richter e Peter Klasen, entre
outros, destacaram-se pelo rigor das suas pinturas,
esculturas, desenhos, vídeos ou fotografias, embora
alguns jovens artistas tenham apresentado percursos
pessoais interessantes e amadurecidos. Para se afirmar definitivamente como um dos pontos altos do ritmo anual das artes plásticas nacionais, talvez falte à
Arte Lisboa exposições paralelas, temáticas, vocacionadas para a divulgação de linhas de fundo e rupturas
na Arte Contemporânea.
Refira-se, ainda, o bem sucedido espaço Arte Lisboa Kids, que proporcionou aos mais novos um contacto com o poder da criatividade, bem como as visitas
guiadas, para curadores e galeristas estrangeiros, aos
ateliers de Joana Vasconcelos, João Louro, Julião Sarmento e Miguel Palma. A par dos debates, este ano
sobre coleccionismo, importância do sector e relação
público-privado, foram iniciativas que enquadraram os
participantes desta feira, contextualizando os segredos
das obras, as regras do mercado e os requisitos da
apresentação pública. O que, no seu conjunto, representou uma prova dos nove desta iniciativa. Agora, seguramente a repetir.• T Ricardo Duarte
6.º Festival Número – Festival internacional de multimédia, filme e música de Lisboa
Um Número discreto
Lisboa
04 a 13 Nov 2005 | www.numerofestival.com
A sexta edição do Festival Número passou por
Lisboa sob o tema «Jogos neurológicos», mas pouca gente terá dado por ele, pelo menos no aspecto
musical. Pecando por se querer movimentar na fronteira do mainstream com as sonoridades menos
convencionais, o cartaz acabou por não apelar nem
a um nem a outro público. Uma agradável excepção
foi a conferência «Portugal: um retrato musical»,
que encheu o auditório da Fonoteca Municipal.
A prova desta fraca adesão do público, inferior
a outras edições, percebeu-se melhor no Clube Lua
(Jardim do Tabaco) nos dias 11 Nov (6.ª) e 12 (sáb),
dedicados à música. Na primeira noite a sala apenas
ficou composta até à actuação de Jay Jay Johanson,
o mais aguardado, e assim que o concerto terminou o
público dispersou, deixando a sala praticamente vazia
e com apenas alguns corpos para se abanarem ao som
de Producers & Hana BI e Schneider TM vs Rechenzentrum. Jay Jay Johanson já esteve em melhor forma,
apesar de a actuação ter sido equilibrada, com temas
de todos os álbuns e com alguns novos, incluídos em
Rush, o mais recente registo.
Pelo Clube Lua passaram também as bandas portuguesas MAU, Lithium e U-Clic. Estes últimos, apesar
de serem um pouco repetitivos, tornaram-se interessantes graças ao VJing.
Na segunda noite pisaram o palco os Bangguru,
Nel’ Assassin, os Mécanosphére — um outro projecto
de Adolfo Luxúria Canibal, vocalista dos Mão Morta,
que se move na electrónica e na percussão —, os dinamarqueses Opiate e o inglês DJ Rupture, que tocou
para poucas dezenas de pessoas.
Destaques extramusicais
Durante dez dias de festival, divididos entre o Clube
Lua, Teatro Taborda, Fórum Lisboa e Fonoteca Municipal, houve de tudo, desde cinema, vídeo, exposições
e poesia. Nos debates marcaram presença Manoel de
Oliveira e Regina Guimarães (cinema), além de Hen-
Schneider TM
rique Amaro (música). Também houve espaço para a
entrega dos prémios portugueses de multimédia do
ICAM (Instituto do Audiovisual e Multimédia).
No entanto, o grande destaque deste festival foi
a conferência «Portugal: um retrato musical». Mesmo
na ausência dos representantes do Estado e da Associação de Editoras Independentes, convidados para
o evento, a troca de ideias teve como pano de fundo
o estado da música portuguesa. À semelhança de um
qualquer debate sobre o estado da nação, a discussão
não gerou quaisquer conclusões, mas, ainda assim,
falou-se de quotas de música portuguesa nas rádios,
de novos talentos, de editoras e de algumas sugestões
que ajudariam a que a música portuguesa fosse mais
assimilada ou mais divulgada. Sem dúvida um dos
eventos com mais público deste Número — um festival
ainda demasiado cerebral.• T Ana Baptista e Pedro Miguel Guimarães F Gerard von Foris
Rewind Música | 57
Quarteto Miguel Zenón
Seixal Jazz 2005
Desfile de individualidades
Seixal
20 a 22 e 27 a 29 Out 2005 | www.cm-seixal.pt/seixaljazz
Na edição de 2005 do Seixal Jazz não houve um
único ponto alto, mas vários. Três conjuntos presentearam-nos com excelentes bateristas. Dois sujeitos pareceram dançar com o contrabaixo. Dois
saxofones-altos ganharam vida em palco. Dois
trompetes vieram matar saudades. Uma de três
guitarras levou o público ao rubro. E um rapaz que
comentava com o pai, enquanto esperavam na fila,
que, por ter guitarra, o concerto que iam ver não era
mesmo jazz, «e ainda bem», foi enganado.
Único no figurino, por ser bienal e por contemplar
dois espectáculos por noite com bilhetes distintos, o
Seixal Jazz (SJ) é diferente. Ao longo de oito edições
tem reforçado o estatuto de referência, construído o
seu público e mostrado capacidade de atrair iniciados
e espectadores mais jovens, facto a que não é alheio o
palco paralelo e em jeito de bar, o Seixal Jazz Clube.
Coube ao quinteto de Wayne Escoffery (saxofone) a abertura do SJ 2005. O músico fê-lo de forma
muito controlada, com o próprio bastante discreto,
deixando, então, a descoberto uma secção rítmica
que também não fez melhor. Para além dos discos e
das pautas, salvou-se Jeremy Pelt (trompete), verdadeiramente ligado ao público, inventivo quando pôde,
sempre enérgico, com solos curtos mas fortes e bons
momentos em improvisação.
A presença portuguesa no festival coube a Lau58 | Rewind Música
rent Filipe (trompete), Mário Delgado (guitarra), Rodrigo Gonçalves (piano), Nelson Cascais (contrabaixo)
e Alexandre Frazão (bateria), reunidos para fechar a
apresentação em palco de Luz (2004), último registo
de originais de Filipe. O trompetista deu, aliás, novas
roupagens a vários temas do disco, através das misturas com pedais sintetizadores. Alexandre Frazão destacou-se, uma vez mais, pela diversidade de recursos
de que fez uso na bateria, algo que não é novo em Frazão e só veio mesmo confirmar — se dúvidas houvesse
— que o baterista é um portento. E a plateia, já mais
composta naquela noite de 6.ª, pareceu concordar.
Se as prestações se sucederam em crescendo,
também a bilheteira sofreu o mesmo efeito, tendo sido
pequeno o auditório municipal da cidade para acolher
tantos quantos quiseram ver Kurt Rosenwinkel. O quinteto do jovem guitarrista protagonizou o concerto mais
exuberante de todo o festival, musical e visualmente,
ao que o público não duvidou em corresponder com
notória satisfação. É verdade que no cômputo dos dois
concertos o guitarrista não variou muito, quase sempre iniciou os temas com um solo e vociferou (como
nos discos, aliás) por detrás da música, o que se pode
questionar. Mas é inegável que a música ali produzida,
ao longo de temas extensos e quase sempre com um
ritmo forte, mostrou um Rosenwinkel tecnicista, mas
sempre agradável e melódico. E porque a prestação
daquele quinteto foi, talvez, a mais consensual de
todos os conjuntos que se apresentaram no festival,
igualmente inspirados estiveram Aaron Goldberg (piano), Omer Avital (contrabaixo) e Eric Harland (bateria). A
cumplicidade entre estes três, para além de agradável
de se ver nos seus rostos e caretas, abraçou sempre a
guitarra, com Goldberg eléctrico e atacando o piano a
saltos; Harland possante e alegre na bateria, quer em
conjunto quer em solo; e Avital reunindo e escorando
tudo aquilo, sempre de olhos fechados. Somente Chris
Cheek (saxofone tenor), muito recatado, pareceu não
jogar naquela equipa, sem contudo deixar de cumprir o
seu papel preponderante — porque o fez, embora sem
brilho. A primeira parte do SJ 2005 não poderia ter terminado com mais eloquente exemplo do que é Jazz.
Mike Fahn contra a corrente
A segunda semana do festival começou com o sexteto de David Binney (saxofone-alto), que quase conseguiu uma casa cheia no primeiro espectáculo e cuja
boa prestação motivou uma corrida às bilheteiras após
esse primeiro set — a estrutura deste festival propicia
esta peculiaridade: se se gosta do que se vê, corre-se a
comprar bilhete para a segunda parte. O espectáculo,
quase ininterrupto, começou algo duro de roer — Binney é conhecido pelas suas composições complexas.
Contudo, a performance foi crescendo e depois de uma
aproximação ao free-jazz, com os saxofonistas tocando do fundo do palco e os restantes músicos realizando a seu bel-prazer, os dois últimos temas fecharam
em apoteose. O baterista Dan Weiss destacou-se, pois
que até com facas de mesa e sentado no palco tocou a
bateria, sem despropósitos sonoros — era incontornável: se nada mais houvesse a dizer, a oitava edição do
SJ estava sendo pródiga em revelar individualidades.
A penúltima noite esteve reservada para Miguel
Zenón e seu quarteto. O saxofonista porto-riquenho
empenhou-se com grande e visível esforço, muito extrovertido, impetuoso e desenvolto na condução da
música tocada pelo conjunto, um jazz de sabor latino. Do seu grupo, Luís Perdomo (piano) não teve o
espaço que se desejaria, se se tiver em conta performances passadas, mas Henry Cole (uma vez mais,
um baterista) deu espectáculo.
A fechar o festival, o quinteto do casal norte-americano Mike Fahn (trombone) e Mary Ann McSweeney
(contrabaixo) ofereceu dois espectáculos idênticos —
até nos comentários e apresentação dos músicos — e
sem brilho. O encerramento do SJ 2005 foi, então, e
em certa medida, uma desilusão, especialmente para
quem havia construído boas expectativas, ao ter reparado num Mike Fahn que, como que ansioso por
subir ao palco, ensaiou alguns temas em plena rua,
na noite anterior.
Festival regressa em 2007
Segundo o balanço da autarquia, cerca de sete
mil espectadores passaram por esta oitava edição do
Kurt Rosenwinkel
Laurent Filipe
festival, entre os concertos no auditório municipal, o
Seixal Jazz Clube, onde tocaram vários conjuntos portugueses, e as restantes actividades paralelas.
O SJ mantém a sua periodicidade bienal, ficando
agendada a nona edição para o Outono de 2007.•
T
João Pedro Correia F C. M. do Seixal
Rewind Música | 59
4.º Wintercase — Festival itinerante de música independente
Barcelona recebeu bandas
na pré-reforma
Barcelona
2 a 27 Nov 2005 | www.wintercase.com
Os The Tears protagonizaram, com grande distância, o melhor momento do festival Wintercase
de 2005. O novo grupo de Brett Anderson e Bernard Butler marcou a diferença, com uma actuação
cheia de energia e glamour, num festival que ficou
aquém das expectativas, em boa parte devido à
idade avançada de muitos dos protagonistas.
O conceito de festival itinerante de música independente tem em Espanha um nome de marca: Wintercase. Há quatro anos que atravessa Madrid, Valência, Bilbau e Barcelona, esta última a escolhida para a
reportagem da FEST.
O concerto de apresentação, ocorrido a 12 Out
(4.ª), esteve a cargo de dois artistas nova-iorquinos e
respectivas bandas: Jeffrey Lewis e Adam Green. Más
escolhas, já que ambos resultaram aborrecidíssimos.
O primeiro apenas conseguiu momentos emotivos
nos dois temas em que recorreu a uns curiosos livros
com ilustrações, um dos quais era uma «pequena história do comunismo». Mas, aparte as letras humoradas, a música apresentada não passou o umbral do
Folk mais banal.
Quanto a Adam Green, num momento de indiscutível reconhecimento internacional, tão pouco nos convenceu com uma mistura de Country e Pop. Apesar de
tudo, caiu-nos bem a atitude de deixar o público es-
colher os quatro temas do encore. Menos simpáticos
foram os funcionários da sala Razzmatazz, que expulsaram do recinto, quase à força, os mil e muitos pagantes, a maioria visivelmente impreparada para enfrentar
a brutal intempérie que entretanto se abatia sobre Barcelona — terá sido, para muitos, a molha do ano.
Quase um mês depois, a 4 Nov (6.ª), arrancou oficialmente o Festival Wintercase, com The Delays, os
veteranos Teenage Fanclub e os veteraníssimos GoBetweens. Destes três só os primeiros surpreenderam,
com a sua boa dose de psicadelismo. Os australianos,
profundamente quarentões, começaram por desfilar
um best of de temas com quase duas décadas (“Streets Of Your Town” e “Spring Rain”), intercalando com
outros mais recentes (“Here Comes A City”, “Finding
You”). As canções podem ser preciosas, mas o desfile
foi monótono, só animado pelo divertido episódio em
que o vocalista foi servido de um café em pleno palco.
Mas nem assim espevitou.
Adolescentes só no nome
Dos Teenage Fanclub esperava-se algo melhor,
mas foi em vão. Também se notam os anos a esta
banda escocesa — pelo que o nome deixou de ter
sentido —, que nunca passou da segunda divisão.
Vimos porquê: a música é um pouco mais elaborada e
Ian Brown
60 | Rewind Música
precisa que a dos Go-Betweens, pelo menos não soa
tão arcaica, mas resulta demasiado neutral e apagada,
como é o caso dos recentes singles, “Fallen Leaves” e
“Did I Say”. A actuação foi parca de fantasia, e mesmo
com alguns desafinanços — Teenage Fanclub é uma
banda para animar um festival, mas não está apta a ser
cabeça de cartaz.
O Wintercase prosseguiu no dia 13 Nov (dom), com
mais três projectos oriundos da Grã-Bretanha. A abrir
esteve o espírito sabotador de I Am Kloot, que deixou
terreno livre para a excelente actuação dos Supergrass,
que durou uma vintena de minutos e foi mesmo um dos
melhores momentos de todo o festival. Os Supergrass
sabem de cor o abc do Rock, desde Beatles a Stones,
passando pelo psicadelismo e o Blues, apresentando
ao vivo uma proposta coesa e madura, através de temas
como “Henry V” ou “Pumpin’ On Your Stereo”, além de
comunicarem estupendamente com a assistência.
O público, com alto contingente inglês, recebeu
efusivamente Ian Brown, que não teve pudor em
começar o concerto com “I Wanna Be Adored”, ao
que a plateia não só obedeceu como embeveceu.
Durante todo o concerto o músico executou simplórios
passos de dança, como quem marcha sem sair do
lugar, recorreu a uma pandeireta que moveu sempre
da mesma forma, além de ter desafinado e cuspido um
par de vezes. Mas tem carisma, é inegável. O grupo
manteve-se sempre num nível competente, chamando
a atenção o aplicado percussionista. Curiosamente,
Brown acabou o concerto sem fazer encore, embora
saudando efusivamente o público durante uns minutos
sozinho em palco.
The Tears foram estrelas para pouco público
Novo encontro a 18 Nov (6.ª), iniciado com Clovis,
único grupo espanhol do elenco. Começaram com gar-
Go Betweens
ra, mas rapidamente o nervosismo e a falta de rodagem
em palco se fizeram sentir. O grupo canta em inglês e
castelhano e tem alguns bons temas (como “Mundo”,
escolhido para promover o festival), mas cai facilmente
nas malhas das melodias redundantes.
Em substituição dos Kaiserchiefs tocaram os
The Tears, que assinaram o melhor concerto do
certame, a larga distância. Tanto Brett Anderson
como Bernard Butler estiveram exuberantes, dando
verdadeiro espectáculo, Glam Rock em estado puro.
Ao contrário de Ian Brown, que começou por captar
o público com êxitos dos Stone Roses, os The Tears
pretenderam distanciar-se totalmente de Suede — a
sua anterior banda — e não interpretaram qualquer
canção desse grupo. Mas um colectivo que tem como
figuras principais Brett e Butler dificilmente poderá não
soar a Suede... E realmente assim sucedeu com os
temas mais destacados, “Refugees”, “Beautiful Pain”
e “Imperfection”, que lembraram os hinos de Dog Man
Star, numa actuação irrepreensível, mas marcada pela
fraca adesão do público.
Para a última jornada, decorrida a 27 Nov (dom),
reservou-se o Folk aglutinador dos The Decemberists,
com prestação regular; a interessante explosão experimental de Dirty Three, muito saudados pelo público;
e, a encerrar, os Mercury Rev, que também não são
propriamente uma banda jovem, exercitando estilo e
quatro ou cinco canções de amplo mérito.
Ao contrário de outras, a edição de 2005 do Festival Wintercase não deixou marca profunda. Superaram-no em interesse outros motivos, na verdadeira invasão musical ocorrida em Barcelona durante Novembro, alguns no próprio Razzmatazz, como Goldfrapp,
Maxïmo Park ou Bloc Party — estes, diga-se, a rubricarem um concerto magistral, demonstrando que passa
pelas suas veias a responsabilidade de salvar o Rock.•
T
Alexandre Nunes Oliveira F Laura González Gómez
Clovis
Rewind Música | 61
Treva Whateva
GG Project
Hayseed Dixie
27.º Rencontres trans musicales
Demasiadas bandas para
descobrir
Rennes, França
8 a 10 Dez | www.lestrans.com | http://backstag3.free.fr/trans27
Desta edição permanecem três imagens na retina: DJ Champion, Birdy Nam Nam e Tiga, por nos
proporcionarem o prazer de manter as mãos no ar.
O pano desceu pela primeira vez ao som dos
Nervous Cabaret, El Pres!dente, Strup X e dos
Fugees, nomes que por si só justificariam uma deslocação de muito longe. Ainda assim, grande parte
do público reconheceu no conjunto de Lauryn Hill e
Wycleaf Jean uma interpretação abaixo da média,
pouco beneficiada pela entrada tardia da vocalista em
palco (30 minutos). Fontes bem colocadas garantem
que a senhora preferiu ficar no backstage a rezar enquanto Wyclef permaneceu em palco sozinho interpretando temas de Bob Marley.
No segundo dia, o primeiro nome da lista foi Dwight Trible, um cantor que diminuiu o fosso entre as
culturas africana e europeia, mostrando que, mais do
que um cantor sem vedetismo, é também um filósofo. Rendemo-nos, também, à interpretação de Rufus
Harley, cuja originalidade resulta da fusão de gaita-defoles com Jazz moderno. Seguiu-se-lhe Treva Whateva (Ninja Tune) com uma refinada selecção de vinis e
algum sex appeal. Sabem o que dizemos de homens
que usam óculos? A rapariga que o filmou era linda!
De volta ao Hall 5 fomos contagiados pela impaciência de ver uma das lendas do Rock’N’Roll — The
Undertones. Serão eles os padrinhos dos modernos
white trash rockers? Sem dúvida. Jean-Louis Brossard, o programador do festival acertou na mouche
ao valorizar o original em prol da cópia (Radio 4, LCD
Soundsystem, Franz Ferdinand e outros). Por falar em
essência, podemos adivinhar que os Mattafix são o
62 | Rewind Música
aroma que andará no ar por todo o lado nos próximos
meses. Misturando a Índia com as Caraíbas e Londres,
as suas letras ficam nos lábios de todos que os ouvem.
Os Hayseed Dixie são uma banda de bluegrass atípica. São a prova de que a música Folk também pode
estar na moda, enquanto se experimentam covers de
AC/DC ao sabor de marijuana. De Montreal também
chegou Rock com o som de DJ Champion And The G
String Band, um projecto criado pelo guitarrista Punk
Maxime Morin. Imaginem um DJ, uma vocalista, quatro
guitarristas e um baixo a improvisar.
Chegados ao último dia de festa, encontrámos
Kwal, que, acompanhado por Ben, o segundo MC, reproduziu batidas obscuras e sons indianos tradicionais
numa atmosfera visual ao estilo de Tim Burton. Apresentando-se em camisas apertadas, os bonitões Clap
Your Hands Say Yeah brindaram-nos com um Rock
previsível, devedor dos Sonic Youth mas sem a componente experimental destes. Sinceramente, temíamos
que os Pure Reason Revolution pertencessem à mesma espécie, mas por sorte enganámo-nos. Tocaram
um rock lo-fi perfeito, com uma boa dose de improviso,
pleno de guitarras estridentes, teclados e um excelente baterista. Algumas horas depois pudemos assistir a
uma alucinante lição de giradisquismo por parte dos
Birdy Nam Nam, cuja actuação por si só justificaria
o preço do bilhete. De seguida vimos Tiga. Durante
uma hora e meia, este DJ de Montreal bombeou batidas electrónicas potentes para a pista de dança, num
ambiente de gigantesco club, pleno de luzes. Para o
ano lá estaremos de novo.• TF Fred Huiban [tradução Gonçalo
Guedes Cardoso]
Radian
Festival Best Off
Criar ilusões
Casa da Música — Porto
7 a 10 Dez | www.casadamusica.com
Programado para quatro dias, entre 7 Dez (4.ª) e
10 (sáb), e destinado a uma faixa apertada de público, o Festival Best Off agrupou algumas novidades
do circuito electrónico na Casa da Música.
O ponto de partida deu-se com os The Mitchell
Brothers, Reel People e, para finalizar a noite, o ilustre Gilles Peterson. Os primeiros foram a surpresa da
noite, com um hip-hop descontraído, londrino, a tentar captar a atenção do público. A sala encontrava-se
pouco preenchida, fazendo anunciar uma noite bastante calma. Seguiram-se os Reel People, com a sua música Soul, cheia de clichés, mas que fez dançar parte
do público presente, tendo conseguido preencher um
pouco mais a sala. Por fim apresentou-se o popular
Gilles Peterson, o homem das compilações, responsável pela divulgação de inúmeros projectos no seu programa de rádio, que se limitou a domesticar a noite,
que já ia longa.
No dia 8 Dez (5.ª) teve lugar um dos melhores concertos (senão o melhor) do festival. Os Radian trouxeram a sua mescla de electrónica com pós-Rock e não
defraudaram as expectativas, juntando programações
ao baixo e bateria. Num concerto breve, ainda que
intenso, trouxeram algumas pessoas até ao corredor
nascente para mostrar o que se faz pelos lados da
Thrill Jockey — atenção ao último álbum produzido por
John McEntire —, para apreciar a versatilidade do local
e para perceber que há espaços em que a acústica podia ser melhorada, o que de resto não retirou brilho ao
excelente concerto.
Ao terceiro dia do festival surgiu o primeiro projecto português em palco. Kubik, no corredor nascente,
pôde mostrar a sua versatilidade e desdobrar-se pelo
palco em aventuras esquizofrénicas. O concerto foi intenso e merecia mais público para apreciar as virtudes
do músico. A Kubik seguiu-se Hecker, que trouxe Tina
Frank para acompanhar a performance em vídeo. Num
conceito bastante distinto do anterior, Hecker aproveitou a oportunidade para prosseguir a exploração sónica, através do uso do seu laptop, um concerto a evitar
para ouvidos sensíveis.
O último dia, 10 Dez (sáb), parecia, no mínimo,
promissor, mas não foi possível ser acompanhado
pela FEST.
Com um cartaz bastante eclético e na perspectiva de utilizar vários espaços da Casa da Música conseguiu-se atrair algum público até ao Best Off, sendo
expectável o aperfeiçoamento deste festival, pela importância do evento e pelo dinamismo que é preciso
imprimir a este pólo de actividade musical.• T Joaquim
Beleza e Raquel Ribeiro F Joaquim Beleza
Rewind Música | 63
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Artes Plásticas, BD, Cinema,
Dança, Música, Teatro
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Festival X . www.em-cena.com/olho
FTAM - Festival Teatro a Mil . www.fitam.cl
Flickerfest International Short Film Festival 2006 . www.flickerfest.com.au
Sydney Festival 2006 . www.sydneyfestival.org.au
Festival de Charolas . www.cm-tavira.pt
Festival de Musiques Sons D’Hiver . www.sonsdhiver.org
Festival C’est de la Danse Contemporaine 2006 . www.cdctoulouse.com
Tromso International Film Festival . www.tiff.no
Sundace Filme Festival . http://festival.sundance.org/2006
Festival Premiers Plans D’Angers . www.premiersplans.org
Big Day Out . www.bigdayout.com
13.º Festival de Gerárdmer — Fantastic’Arts . www.gerardmer-fantasticart.com
DocPoint - Helsinki Documentary Film Festival . www.docpoint.info
International Film Festival . www.filmfestivalrotterdam.com
Festival International de la bande desinée d’Angoulême . www.bdangouleme.com
Clermont-Ferrand International Short Film Festival . www.clermont-filmfest.com
Göteborg Film Festival . www.goteborg.filmfestival.org
Arte Fiera . www.artefiera.bolognafiere.it
Momix 2006 . www.momix.org
Panorama — Mostra do Documentário Português . www.apordoc.ubi.pt/panorama.html
Escena Contemporanea — Festival alternativo de las Artes Escénicas . www.escenacontemporanea.com
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Música
64 | Play Janeiro
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Dança
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Teatro
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Artes Plásticas
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Fevereiro
Artes Plásticas, Cinema,
Dança, Música, Teatro
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Going Underground - International Short Film Festival . www.interfilm.de
Cap’Danse — Festival de danses urbaines de Toulouse
Tampa International Film Festival . www.tampafilmfest.com
Théâtres d’Hivers . www.theatresdhivers.com
Festival International du Premier Film . www.annonaypremierfilm.org
Festival de Musiques Sons D’Hiver . www.sonsdhiver.org
Festival C’est de la Danse Contemporaine 2006 . www.cdctoulouse.com
10th Cheltenham Folk Festival . www.cheltenhamfestivals.com
Arco — Feira de Arte Contemporanea . www.arco.ifema.es
56.º Festival de Cinema Internacional de Berlim . www.berlinale.de
Big Day Out . www.bigdayout.com
Pan African Film Festival . www.paff.org
Take One! Online Movie Festival . www.takeonefest.com
International Film Festival . www.filmfestivalrotterdam.com
Boulder International Film Festival . www.biff1.com
Clermont-Ferrand International Short Film Festival . www.clermont-filmfest.com
Göteborg Film Festival . www.goteborg.filmfestival.org
Almost Famous Film Festival . www.thea3f.net
Momix 2006 . www.momix.org
Panorama — Mostra do Documentário Português . www.apordoc.ubi.pt/panorama.html
Escena Contemporanea — Festival alternativo de las Artes Escénicas . www.escenacontemporanea.com
Riverside International Film Festival . http://riversidefilmfest.org
ZagrebDox - International Documentary Film Festival . www.zagrebdox.net
Houston Black Film Festival . www.houstonblackfilmfestival.org
Feira Internacional de Arte Contemporânea . www.art-innsbruck.at
Fantasporto — Festival Internacional de Cinema do Porto . wwww.fantasporto.com
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Bienal Whitney de Arte Contemporanea . www.whitney.org
ANIMAC — Mostra Internacional de Cinema d’Animació . www.animac.info
The Celtic Festival of Wales . www.cwlwmceltaidd.com
Festival Internacional de Spoken Word de Sevilha
Miami International Film Festival . www.miamifilmfestival.com
Bergamo Film Meeting . www.alasca.it/bfm
8 a 12 Mar . Cinema . Tampere International Short Film Festival . www.tamperefilmfestival.fi
The Armory Show . www.thearmoryshow.com
Tiburon International Film Festival . www.tiburonfilmfestival.com
Sofia International Film Festival . www.cinema.bg/sff
Cinéma du réel - Festival Internacional de Cinema Documental etnográfico e sociológico . www.cinereel.org
FIFA - Festival International du Film sur l’Art . www.artfifa.com
Take One! Online Movie Festival . www.takeonefest.com
The Independent Black Film Festival . www.indieblackfilm.com
Festival Audiovisual zemos98 . www.zemos98.org
River Run Film Festival . www.riverrunfilm.com
The Other Venice Film Festival . www.veniceofilmfest.com
RAF - Revija Amaterskog Filma . www.revijaamaterskogfilma.hr
Canadian Filmmakers Festival . www.canfilmfest.ca
Roma Independent Film Festival . www.riff.it
Festival de Cinema de Las Palmas . www.festivalcinelaspalmas.com
Bienal de Arte Contemporânea de Berlim . www.berlinbiennale.de
Festival Audiovisual Black&White . www.artes.ucp.pt
Available Light Film Festival . www.yukonfilmsociety.com
Milano International Film Festival . www.miff.it
Fantasporto — Festival Internacional de Cinema do Porto . wwww.fantasporto.com
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