Anais - UNESP: Câmpus de Ourinhos
Transcrição
Anais - UNESP: Câmpus de Ourinhos
Anais da IX Semana de Geografia 05 a 08 de novembro de 2013 da UNESP - Ourinhos O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região re a liz a ç ã o unesp IX Semana de Geografia 05 a 08 de novembro de 2013 O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região Ourinhos Universidade Estadual Paulista 2013 Semana de Geografia da UNESP/Ourinhos / Organização: Leandro Bruno Santos; Nelson Rodrigo Pedon. (9.:2013: Ourinhos). On line. Anais da 9. Semana de Geografia da UNESP/Ourinhos: O espaçobrasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidad e e região – 05 a 08 de novembro de 2013, Universidade Estadual Paulista, Campus Experimental de Ourinhos / Organização: Leandro Bruno Santos; Nelson Rodrigo Pedon. – Ourinhos: UNESP/Campus Experimental de Ourinhos, 2013. ISSN 2179-927X 1. Espaço geográfico. 2. Espaço rural. 3.Espaço urbano. 4. Geografia regional I. Título. II. Universidade Estadual Paulista, Campus Experimental de Ourinhos. III. Santos, Leandro Bruno. IV. Pedon, Nelson Rodrigo. V. Semana de Geografia da UNESP/Ourinhos. CDD 910.7 Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Julio Cezar Durigan Reitor Campus de Ourinhos Andréa Aparecida Zacharias Coordenador executivo Comissão Organizadora da IX Semana de Geografia da Unesp de Ourinhos Nelson Rodrigo Pedon, Leandro Bruno Santos, Fátima Aparecida Costa, Maria Lucila Abacherly, Wander Luis de Melo Cruz, Juliana Lopes dos Santos, André Luiz Vieira Martins, Gabriel Fernades Rios, Marina Gama Diotto, Alessandro Bernardes Pereira, Sergio Marcelino P.S Cezario e Paulo Victor Godinho da Silva e Ricardo de Carvalho Isídio Bruno Comissão Científica da IX Semana de Geografia da Unesp de Ourinhos Adriano Amaro de Sousa, Amir El Hakim de Paula, Carlos de Castro Neves Neto, Cássio Antunes de Oliveira, Clerisnaldo Rodrigues de Carvalho, Cleverson Alexsander Reolon, Diego Corrêa Maia, Erika Vanessa Moreira Santos, Leandro Bruno Santos, Leda Correia Pedro Miyazaki, Lucas Labigalini Fuini, Luciano Antonio Furini, Luciene Cristina Risso, Marcelo Dornelis Carvalhal, Márcia Cristina de Oliveira Mello, Marcilene dos Santos, Maria Cristina Perusi, Nelson Fernandes Felipe Junior, Nelson Rodrigo Pedon, Oscar Gabriel Benítez González, Paulo Fernando Cirino Mourão, Rodrigo Lilla Manzione, Vitor Koiti Miyazaki Sumário Apresentação............................................................................................... A Semana.................................................................................................... Programação................................................................................................ Mesas.......................................................................................................... Minicursos.................................................................................................... 09 10 12 14 16 Espaços de diálogo Eixo 1 – Ensino de Geografia Estudo do potencial geológico/geomorfológico na região de Ribeirão Claro (PR) para a proposição de um georoteiro aplicado ao ensino em Geografia Euzemar Florentino Junior, Marcilene dos Santos, Tadeu Jussani Martins e Alexandre Greco Catania de Oliveira....................................................... Mudando meu pedacinho: IV conferência infanto-juvenil pelo meio ambiente, E.E. “Dom Antônio José dos Santos” Débora Jurado, Gisele Torsani, Eliana Ribeiro e Carla C. R. G. de Sena.. A aula de campo no Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) em Geografia Larissa Alves de Oliveira e Douglas Vitto.................................................... Geografia, música e ensino: Algumas considerações Alice Martins Farias, Elaine Cristina Santos Gomes e Lucas Labigalini Fuini............................................................................................................ Alfabetização geográfica e a teoria da ecologia do desenvolvimento humano: Em busca de uma aproximação Beatriz Moreto de Campos e Nelson Rodrigo Pedon.................................. Semana da Geografia 2013 “Lixo urbano & seu contexto” da ETEC “Jacinto Ferreira de Sá: Resultados positivos na prática social final Willian da Silva Santos e Márcia Mello........................................................ 21 30 40 49 53 63 Eixo 2 - Epistemologia e história do pensamento geográfico O território e os territórios: Um debate fundamental para a ciência geográfica brasileira de nosso tempo Lucas Labigalini Fuini.................................................................................. O poder na Geografia: Ruptura através de Kropotkin e Foucault Gabriel Fernandes Rios e Juliana Lopes Dos Santos................................. Eixo 3 - Geografia física e meio ambiente Identificação de matéria orgânica na areia destinada à construção civil: Possível comprometimento da qualidade do material Angélica Scheffer da Motta Abrantes, Maria Cristina Perusi e Jakson José Ferreira............................................................................................... Avaliação de impactos e mudanças antrópicas no Córrego da UNESP, no meio urbano do município de Presidente Prudente – SP 68 81 86 Nayara Rodrigues da Silva e Isabel Cristina Moroz – Caccia Gouveia....... Caracterização e classificação dos extremos de precipitação através das técnicas estatísticas do desvio padrão e percentil, na cidade de Ubatuba/SP (2000 - 2010) Washington Paulo Gomes e Margarete C. de C. T. Amorim....................... Espacialização dos teores de fluor em águas superficiais do Município de Santo Antônio da Platina - PR e as possíveis implicações na saúde coletiva Naibi Souza Jayme, Heitor Matos da Silveira, Aline Ross, João Carlos Alves e José Paulo Peccinini Pinese.......................................................... Monitoramento do início do ciclo vegetativo da soja no Estado do Paraná utilizando imagens EVI/MODIS, ano safra de 2010/2011 Daniela Fernanda da Silva-Fuzzo, Mateus Brossi dos Santos e Jansle Vieira Rocha................................................................................................ Estimativa da produtividade da soja no Município de Ourinhos-SP por meio de modelagem agrometeorológica Daniela Fernanda da Silva-Fuzzo, Angélica Prela-Pantano e Marcelo Bento Paes de Camargo............................................................................. A utilização do geoprocessamento aplicada à análise morfoestrutural Aline Natasha Pereira, Marcilene dos Santos e Alexandre Catania Greco de Oliveira.................................................................................................... Mapeamento do uso do solo na bacia hidrográfica do Ribeirão Barra Funda, em Londrina, PR Heitor Matos da Silveira, Nazareno Agustín Escobar e Naibi Souza Jayme.......................................................................................................... Kosi Ewe Kosi Orixa: A manutenção das religiões afro em tempos de crise ambiental Diego F. R. Azorli........................................................................................ A presença da macrofauna como indicadora de qualidade do solo em diferentes usos no Município de São Pedro do Turvo/SP Jakson José Ferreira e Maria Cristina Perusi.............................................. 96 101 111 121 129 137 148 159 165 Eixo 4 – Processos espaciais O Banco Mundial e o Programa Vila Rural no Estado do Paraná: Uma reflexão sobre possíveis aproximações Alessandro Viceli......................................................................................... A industrialização em perspectiva espacial multiescalar: Brasil, São Paulo e Ourinhos Jean Carlos Izzo e Lucas Labigalini Fuini……………………………………. Os ciclos econômicos e suas manifestações no Brasil Washington Soares Silva............................................................................. Algumas considerações sobre a política estatal chinesa Washington Soares Silva............................................................................. 175 179 190 198 Território e mobilidade: Contribuições para a compreensão dos fluxos de refugiados contemporâneos Raphael Henrique de Moraes Gregorio, Samir Eid Pessanha e Paulo Fernando Cirino Mourão.............................................................................. A inserção dos refugiados no mercado de trabalho no Estado de São Paulo Raphael Henrique de Moraes Gregorio e Marcelo Dornelis Carvalhal........ Análise da inserção da Colômbia nos fluxos mundiais de IED e de comercio entre os anos 1990 e 2010 Sergio Marcelino P.S Cezario e Leandro Bruno Santos.............................. Estado como agente de exclusão social e configuração espacial urbana Alessandro Bernardes Pereira, Sérgio Marcelino P. S. Cezario e Manoel Vinícius M. Souza........................................................................................ Processo de modernização no capitalismo periférico e o conceito de trabalho em Robert Kurz Bárbara Regina Bertoni Letta e Marcelo Dornelis Carvalhal....................... A política de emigração portuguesa para as colônias africanas ao longo do terceiro império português (1890 – 1974) Thiago Henrique Sampaio........................................................................... Jean-Paul Sartre e a guerra de independência da Argélia (1954 – 1962) Thiago Henrique Sampaio........................................................................... Eixo 5 – Dinâmicas territoriais A permacultura como medida de mitigação à seca: Uma abordagem sobre ética e a prática Sarah Cledia Malta Ferreira......................................................................... A industrialização no Vale do Paraíba Paulista: Escalas possíveis para entender as peculiaridades no desenvolvimento do setor industrial Ítalo Franco Ribeiro...................................................................................... Mudanzas territoriales y riesgos ambientales en el Estado de Hidalgo por el proyecto de la refinería bicentenario Luis Alberto Luna Gómez………………………………………………………. A cidade de São Paulo e a contextualização do megaevento copa do mundo em Itaquera Daniel Bruno Vasconcelos........................................................................... Taboão da Serra - SP: uma nova centralidade na região sudoeste da metrópole paulistana Isaac Rodrigues dos Santos........................................................................ A comunidade caiçara da praia do sono e o turismo Sergio Elias Caperuci e Luciene Cristina Risso........................................... 202 211 220 230 239 245 259 272 282 293 303 313 323 Transformações socioespaciais no Distrito de Gardênia, Município de Rancharia – SP: uma proposta de conscientização turística Sueli Aparecida de Souza e Rosângela C. Cortez Tomaz.......................... A estrutura da governança do parque tecnológico “Alexandre Beldi Netto”: o caso do Município de Sorocaba Ivana Iyulka Hori e Lucas Labigalini Fuini.................................................... O entorno da universidade: a importância da proximidade geográfica para empresas graduadas pela INCAMP Lucas Baldoni.............................................................................................. O novo espaço de CT&I em Campinas-SP: parque científico e tecnológico da INCAMP Lucas Baldoni.............................................................................................. Indústria de couros no Brasil: O caso do Grupo Fuga Couro Targino Pereira de Sousa Filho e Paulo Fernando Cirino Mourão.............. Procedimentos de pesquisa em Geografia do Comércio: Delimitação, intensidade e especialização de áreas comerciais. Análises em LondrinaPR, Presidente prudente-SP e Ribeirão Preto-SP Talita Lopes Ruano e Arthur Magon Whitacker……………………………… Território e indústria na Região de Ourinhos: Entendendo a governança das aglomerações produtivas Lucas Labigalini Fuini e Bibiana Conceição Rezende................................. De fazenda a assentamento: O processo de territorialização do Assentamento Oito de Abril em Jardim Alegre/PR Cleiton Costa Denez e Vitor Hugo Ribeiro................................................... As redes de consumo e seu impacto em pequenas cidades: O caso de Ipeúna – SP Karlise Klafke e Silvia A. G. Ortigoza........................................................... Território e territorialidade dos indígenas da etnia terêna da Aldeia Ekeruá – Avaí/SP Angela dos Santos Machado e Luciene Cristina Risso............................... Terras, águas e fronteiras: O uso e ocupação do solo na interface periurbana do Município de Foz do Iguaçu, PR Exzolvildres Queiroz Neto, Andrea Montano Lourtet, William Dellai e Karoline Ribeiro........................................................................................... Em busca da memória de Jacarezinho/PR: A cidade e seus símbolos em meados do Século XX Juliana Carolina da Silva e Luciana Brito..................................................... Construção do turismo religioso em Ourinhos, entre a fé, a memória e a realidade Alessandro Bernardes Pereira..................................................................... Precarização do trabalho na cadeia produtiva da reciclagem: Um olhar sobre a questão de gênero Carolina Michelle Brito, Rodrigo Macario e Yume Kikuda Silveira.............. 329 334 346 353 363 370 380 393 403 411 420 427 437 447 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 APRESENTAÇÃO Na sua IX edição, o evento buscou ampliar o debate acerca das atualidades dos processos urbanos, rurais e regionais atinentes ao território brasileiro, tendo como título “O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região”. O território é uma forma de concretização do espaço geográfico, por meio do qual os sujeitos sociais executam seus projetos de vida para o desenvolvimento. Os sujeitos sociais organizam-se por meio das relações sociais para desenvolver seus territórios, ao mesmo tempo, imprimem um significado cultural sobre ele. O território nacional também reflete uma determinada apropriação dos recursos naturais, exercendo uma pressão sobre o meio ambiente à medida que busca reunir as condições necessárias para sua reprodução econômica. Todas essas dimensões do território interagem de maneira a dar movimento constante às transformações ao longo do tempo, podendo ser verificadas por meio da paisagem. Visando contribuir para que o processo de formação de profissionais geógrafos e professores de geografia contemple os debates sobre a diversidade e atualidade espacial brasileira, tanto no contexto dos processos gerais como no das dinâmicas de âmbito especial, foi proposta a realização da IX Semana de Geografia da UNESP de Ourinhos. Nelson Rodrigo Pedon IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 A SEMANA DE GEOGRAFIA DA UNESP DE OURINHOS Justamente quando nossa unidade comemora seus 10 anos de existência, oficialmente registrada no mês de agosto, estamos realizando nossa IX SEMANA DE GEOGRAFIA. Todavia, se retrocedermos nesta nossa trajetória, vale lembrar que nosso primeiro evento científico ocorreu quando ainda não tínhamos completado nem 1 ano de existência. Foi no ano de 2004, com a "COMEMORAÇÃO DO DIA DO GEÓGRAFO, com o tema "Tendências e Debates na Geografia". Podemos dizer que este primeiro evento foi um evento simples, tímido, que agregou, durante seus dois dias, nomes de expressividade dentro do cenário nacional da Geografia. Porém, o objetivo maior era trazer para uma unidade recém criada da UNESP o debate científico proporcionado pelas humanidades. A partir de então, verdadeiras veleidades aconteceram em nossos eventos científicos e tivemos debates altamente relevantes em prol da Geografia, tanto que, em 2005, criamos e formalizamos nossa I SEMANA DE GEOGRAFIA, intitulada "Globalização e novos arranjos espaciais". Desde então, não paramos com nossas audácias em prol de seu crescimento. E, no ano de 2006, ocorreu a II SEMANA DE GEOGRAFIA, com a proposta de discutir a “Geografia em questão: teorias e práticas", tendo, inclusive, a memorável oportunidade em uma Conferência de Abertura das presenças dos Professores Aziz Ab´Saber e Carlos Augusto de Figueiredo Monteiro. Em 2007, a III SEMANA DE GEOGRAFIA, brilhantemente apresentou um tema do qual sempre me simpatizei: "Pensar a Geografia é pensar o mundo, pensar o mundo é entender as multiplicidades das abordagens geográficas”. Com temas complexos, fomentados no decorrer de uma semana, os debates e trocas de experiências foram inquestionáveis. IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Já em 2008, a IV SEMANA DE GEOGRAFIA, com veemência total, traz como eixo norteador pensar o Brasil e a América e, assim, nos apresentou o tema “Pensando o Brasil e a América Latina no século XXI: nação, sociedade e natureza". Em 2009, abrimos nossas discussões para "A Geografia e as transformações do homem no espaço e no tempo". Em 2010, mais um tema amplo, que nos fez repensar valores por meio do desafio "Por que legar àqueles a quem demos a vida um futuro sombrio, um mundo de ódio de fome, poluído e sem esperança?” No ano de 2011, o tema posto foi "Política, cultura e meio ambiente: múltiplas dimensões do território. Ainda nesta perspectiva, porém indo além dela, em 2012 nos lançamos às inquietações e perguntas sobre “Qual é o modelo de desenvolvimento que queremos? Um olhar geográfico sobre o território e suas dinâmicas socioeconômicas e ambientais”. Como observaram, foi uma trajetória e tanto. Com temas relevantes que propiciaram discussões para as múltiplas historicidades e geograficidades no contexto político, econômico, social, urbano, rural e ambiental. E, para este ano, mais uma vez apresentamos um tema atual, desafiador, propício, que nos instiga a várias reflexões acerca do "O espaço brasileiro contemporâneo: leitura sobre campo, cidade e região". Portanto, com 10 anos de existência, já estamos realizando nosso 10º evento científico em prol da Geografia, o que me faz parabenizar os professores organizadores não só pelo empenho em sua organização, mas sobretudo pelo olhar geográfico diante dos nomes neste reunidos. Andrea Aparecida Zacharias Coordenadora Executiva do Campus de Ourinhos PROGRAMAÇÃO Horários Dia 05/11/2013 Credenciamento (08:00 às 12:00) Dia 06/11/2013 Dia 07/11/2013 Minicursos (08:00 às 12:00) Espaços de diálogo (08:00 às 12:00) 2. O ANARQUISMO COMO PRÁTICA SÓCIO-TERRITORIAL Prof. Dr. Amir El Hakim de Paula (UNESP/Ourinhos) Trabalho de Campo (08:00 às 18:00) Manhã Tarde Minicursos (14:00 às 18:00) Minicursos (14:00 às 18:00) 1. INTRODUÇÃO À ARQUEOLOGIA NO VALE DO PARANAPANEMA - Prof. Dr. Silvio Alberto Camargo Araújo (ETEC/Capão Bonito) 5. NOÇÕES BÁSICAS DE MAPEAMENTO GEOMORFOLÓGICO - Profa. Msc. Leda Correia Pedro Miyazaki (UFU/Ituiutaba) 3. APLICAÇÕES DA CARTOGRAFIA TÁTIL NO ENSINO DE GEOGRAFIA Profa. Dra. Carla Cristina Reinaldo Gimenes de Sena (UNESP/Ourinhos) 6. INTRODUÇÃO À ANÁLISE DE DADOS SECUNDÁRIOS EM GEOGRAFIA ECONÔMICA E REGIONAL: PESQUISA E UTILIZAÇÃO DE DADOS DO SEADE, RAIS E IBGE Prof. Dr. Lucas Labigalini Fuini (UNESP/Ourinhos) Noite 7. MECANISMOS COLECTIVOS DE ACCESO A LA TIERRA: EL CASO DE LAS ZONAS DE RESERVA CAMPESINA EN COLOMBIA - Profa. Msc. Hellen Charlot Cristancho Garrido 8. UTILIZAÇÃO DE SIG PARA INTERPOLAÇÃO E ESPACIALIZAÇÃO DE DADOS DE CHUVA - Profa. Msc. Daniela Fernanda da Silva Fuzzo Café filosófico (16:00 às 18:00) OS LABIRINTOS DA CRISE INTERNACIONAL: DA DESVALORIZAÇÃO DE ATIVOS AOS IMPASSES DA GEOPOLÍTICA DO DÓLAR - Prof. Dr. Everaldo Melazzo (UNESP/Presidente Prudente) Palestra de abertura (19:00 às 23:00) Mesa Redonda (19:00 às 23:00) A QUESTÃO AGRÁRIA NO BRASIL Prof. Dr. Ariovaldo Umbelino de Oliveira (USP) REDE URBANA E FORMAÇÃO SOCIOESPACIAL Prof. Dr. Vitor Koiti Miyazaki (UFU/Ituiutaba) e Profa. Dra.Tânia Maria Fresca (UEL) PEDRINHAS PAULISTA. LEITURA INTEGRADA DA PAISAGEM QUE REPRESENTA “UM PEDAÇO DA ITÁLIA NO INTERIOR PAULISTA” – Profa. Dra. Maria Cristina Perusi (UNESP/Ourinhos) Minicursos (14:00 às 18:00) 4. AGRICULTURA URBANA E PERIURBANA EM CUBA - Profa. Dra. Erika Vanessa Moreira Santos (UFF/Campos dos Goytacazes) Palestra de encerramento (19:00 às 23:00) REGIÃO E O URBANO - Profa. Dra. Sandra Lencioni (USP) MESAS IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Mesa de abertura - A QUESTÃO AGRÁRIA NO BRASIL Prof. Dr. Ariovaldo Umbelino de Oliveira (USP) Dia 05 de novembro de 2013 Mesa redonda - REDE URBANA E FORMAÇÃO SOCIOESPACIAL Prof. Dr. Vitor Koiti Miyazaki (UFU/Ituiutaba) Profa. Dra.Tânia Maria Fresca (UEL) Dia 06 de novembro de 2013 Mesa de encerramento - REGIÃO E O URBANO Profa. Dra. Sandra Lencioni (USP) Dia 07 de novembro de 2013 MINICURSOS IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Minicurso 1: INTRODUÇÃO À ARQUEOLOGIA NO VALE DO PARANAPANEMA Ministrante: Prof. Dr. Silvio Alberto Camargo Araújo Carga Horária: 4 horas Dia: 05 de novembro de 2013 Minicurso 2: O ANARQUISMO COMO PRÁTICA SÓCIO-TERRITORIAL Ministrante: Prof. Dr. Amir El Hakim de Paula Carga Horária: 04 horas Dia: 07 de novembro de 2013 Minicurso 3: APLICAÇÕES DA CARTOGRAFIA TÁTIL NO ENSINO DE GEOGRAFIA Ministrante: Profa. Dra. Carla Cristina Reinaldo Gimenes de Sena Carga Horária: 04 horas Dia: 05 de novembro de 2013 Minicurso 4: AGRICULTURA URBANA E PERIURBANA EM CUBA Ministrante: Profa. Dra. Erika Vanessa Moreira Santos Carga Horária: 04 horas Dia: 07 de novembro de 2013 Minicurso 5: NOÇÕES BÁSICAS DE MAPEAMENTO GEOMORFOLÓGICO Ministrante: Profa. Msc. Leda Correia Pedro Miyazaki Carga Horária: 4 horas Dia: 06 de novembro de 2013 Minicurso 6: INTRODUÇÃO À ANÁLISE DE DADOS SECUNDÁRIOS EM GEOGRAFIA ECONÔMICA E REGIONAL: PESQUISA E UTILIZAÇÃO DE DADOS DO SEADE, RAIS E IBGE Ministrante: Prof. Dr. Lucas Labigalini Fuini Carga Horária: 4 horas IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Dia: 05 de novembro de 2013 Minicurso 7: MECANISMOS COLECTIVOS DE ACCESO A LA TIERRA: EL CASO DE LAS ZONAS DE RESERVA CAMPESINA EN COLOMBIA Ministrante: Profa. Msc. Hellen Charlot Cristancho Garrido Carga Horária: 4 horas Dia: 06 de novembro de 2013 Minicurso 8: UTILIZAÇÃO DE SIG PARA INTERPOLAÇÃO ESPACIALIZAÇÃO DE DADOS DE CHUVA Ministrante: Profa. Msc. Daniela Fernanda da Silva Fuzzo Carga Horária: 4 horas Dia: 06 de novembro de 2013 E TRABALHO DE CAMPO ESPAÇOS DE DIÁLOGO Eixo 1 Ensino de Geografia IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 ESTUDO DO POTENCIAL GEOLÓGICO/GEOMORFOLÓGICO NA REGIÃO DE RIBEIRÃO CLARO (PR) PARA A PROPOSIÇÃO DE UM GEOROTEIRO APLICADO AO ENSINO EM GEOGRAFIA Euzemar Florentino Junior1 Marcilene dos Santos2 Tadeu Jussani Martins3 Alexandre Greco Catania de Oliveira4 1- Introdução Esta pesquisa está vinculada ao projeto de extensão “Georoteiros: Ourinhos e região”, desenvolvido no ano de 2012 na Unesp – Câmpus de Ourinhos. Tal projeto tem como finalidade levantar e pesquisar feições geológicas e geomorfológicas, num raio de até 100 km a partir de Ourinhos, ao longo de estradas pavimentadas e não pavimentadas e, a partir destas, elaborar georoteiros de caráter científico e educacional, além de gerar conhecimentos científicos a respeito da região e, assim, contribuir para a valorização e geoconservação da mesma. Georoteiros são roteiros de natureza geológica, geomorfológica, de beleza cênica, arquitetônica, dentre outras, criados ao longo de estradas, trilhas, cursos de rios, oceanos, mares, etc., através da demarcação geográfica de pontos selecionados que contenham as feições de interesse de acordo com sua finalidade, tendo como característica comum a divulgação, valorização e geoconservação dos patrimônios naturais ou históricos de uma determinada região. Constituem-se em recursos muito importantes para o desenvolvimento de estudos científicos em diversos campos do conhecimento científico, do turismo (como opção de lazer, educação, recreação e contemplação da beleza 1 Licenciado em Geografia e bacharelando em Geografia. UNESP/Câmpus de Ourinhos. [email protected]. 2 Professora do curso de Geografia. UNESP/Câmpus de Ourinhos. [email protected]. ³ Licenciado em Geografia e bacharelando em Geografia. UNESP/Câmpus de Ourinhos. [email protected] 4 Discente do curso de Geografia e técnico do laboratório de Geoprocessamento. UNESP/Câmpus de Ourinhos. [email protected]. 21 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 cênica), da educação ambiental voltada especialmente para a preservação e conservação dos recursos naturais e ambientais (NASCIMENTO, 2010). Dentre os mais variados tipos de objetos de estudos explorados na elaboração de georoteiros, os aspectos geológicos e geomorfológicos são os mais utilizados. De acordo com Silva (2008), os georoteiros podem descrever afloramentos rochosos, monumentos naturais, cachoeiras, paisagens ou, segundo Brilha (2005), até mesmo comunidades humanas. Neste trabalho, os estudos são voltados para a elaboração de um georoteiro aplicado para a educação. Essa escolha deve-se ao fato de que existem poucos trabalhos em geociências que articulem ensino e geoconservação, especialmente voltados à preservação dos patrimônios geológico-geomorfológicos (geodiversidades). 2– Objetivos O objetivo dessa pesquisa é levantar e pesquisar feições geológicas e geomorfológicas existentes nos municípios de Ribeirão Claro e Jacarezinho (PR), ao longo de estradas pavimentadas e não pavimentadas e a partir destes dados, avaliar seu potencial para a criação de um georoteiro para fins educacionais. No âmbito deste objetivo geral, pretende-se também proporcionar aos alunos do ensino básico, acesso aos conhecimentos científicos produzidos em meio universitário, conscientizando os mesmos a respeito da importância de se promover a educação ambiental para a preservação do patrimônio geológicogeomorfológico da região. 3- Procedimentos metodológicos A área escolhida para a realização do Georoteiro foi a região de Ribeirão Claro/Jacarezinho (PR), localizada no estado do Paraná, mais especificamente na Mesoregião geográfica Norte Pioneiro (IPARDES, 2013), conforme apresentado na Figura 1. A escolha desta região deu-se pelo fato de ser conhecida regionalmente pelas suas belezas cênicas e também pelo seu 22 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 potencial paisagístico, que incluem feições geológicas e geomorfológicas de grande potencial didático-pedagógico. Figura 1. Localização da área de estudo. Nesse respectivo trabalho, foram realizados dois tipos de levantamentos bibliográficos, temático e específico. Através do levantamento bibliográfico temático, foram levantadas bibliografias referentes aos temas mais abrangentes da pesquisa, tais como os Georoteiros, a Geoconservação, o estudo da Paisagem em Geografia, a Educação Ambiental, o trabalho de campo e o ensino em Geografia, enfim, foram levantadas bibliografias de caráter metodológico e técnico. Já no levantamento bibliográfico específico, foram levantadas bibliografias específicas e documentação sobre a região de estudo, sobretudo acerca de suas características físico-naturais, principalmente os aspectos de caráter geológico, geomorfológico, além de outros aspectos como o climático, o pedológico, o biogeográfico e o hidrológico. A partir da pesquisa bibliográfica e de documentação existente, realizouse um trabalho de campo ao longo de estradas pavimentadas e não 23 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 pavimentadas, para levantar e descrever feições de interesse de caráter geológico-geomorfológico e de beleza cênica, além de fotografar tais feições e localizar suas coordenadas UTM com o auxílio de GPS. A partir deste levantamento de campo, foram selecionados os pontos potencialmente interessantes para a criação de um georoteiro na referida área, considerando a natureza, diversidade, representatividade e valor científico e/ou paisagístico das feições. Com base nas cartas topográficas em 1:50.000 de Jacarezinho e Ipauçu, foram plotados os pontos selecionados com o auxílio do ArcGIS 9.3 e em seguida foi elaborado um mapa com a proposição de um georoteiro com o auxílio do CorelDraw. Além desse mapa, foi elaborada a partir do programa Flash, uma versão on line do georoteiro, a ser disponibilizado no site da UnespOurinhos. Nesta versão, o usuário realiza o percurso do georoteiro ao clicar nos pontos do mapa do georoteiro, fazendo com que abram janelas com a visualização da fotografia do ponto e respectiva descrição, além de uma legenda na porção inferior da tela. Posteriormente com a participação dos alunos de graduação da UNESPOurinhos, matriculados na disciplina de Geologia (1º termo), fez-se o percurso parcial do georoteiro em campo, observando as feições geológicasgeomorfológicas as quais estavam estudando na disciplina de Geologia. Como o tempo de realização do trabalho de campo foi muito curto para apresentar todos os pontos do Georoteiro, foram visitados apenas os pontos números 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 11.02. Nesta ocasião, aplicou-se um questionário com o objetivo de avaliar o grau de entendimento do georoteiro e o seu potencial didáticocientífico. Também aplicou-se o questionário aos alunos da 8ª Série do Ensino Fundamental da Escola Estadual Professor José Augusto de Oliveira do município de Ourinhos, após apresentação breve da pesquisa e da versão on line do Georoteiro Ribeirão Claro-Jacarezinho com todos os pontos propostos. Os resultados dos questionários referentes a estas duas categorias de estudantes foram tratados estatisticamente através de gráficos de porcentagem 24 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 elaborados no programa Excel, objetivando a obtenção de informações acerca da qualidade didática e científica do georoteiro e grau de interesse despertado no público-alvo para futuros ajustes. 4- Resultados 4.1. Breve descrição do georoteiro Riberão Claro/Jacarezinho (PR) A paisagem regional de Ribeirão Claro/Jacarezinho (PR) é caracterizada por feições geológicas tanto de origem sedimentar como magmática, todas elas associadas à Bacia Sedimentar do Paraná. Além de tais feições, ocorrem também importantes feições geomorfológicas, tais como morros testemunhos, superfícies de aplainamento, cornijas, depósitos de tálus, dentre outras. O georoteiro Ribeirão Claro/Jacarezinho (PR) possui 16 pontos, tendo como ponto de partida a cidade de Jacarezinho e, a partir desta, segue-se pela Rodovia Benedito Moreira no sentido Ribeirão Claro até alguns metros antes da ponte sobre o Córrego Água do Ouro Grande, tomando-se a direita onde se segue por uma estrada de terra para se percorrer os pontos 1 a 4 (Figura 2). Figura 2. Apresentação do Georoteiro Ribeirão Claro-Jacarezinho sob a forma de mapa contendo os pontos de observação. 25 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Após o ponto 4, retorna-se à Rodovia Benedito Moreira no sentido para Ribeirão Claro (PR), para observação dos pontos 5 e 6 à margem de tal rodovia. Em seguida toma-se uma estrada de terra à esquerda da Rodovia Benedito Moreira - sentido para Ribeirão Claro - (saída para a Igreja Nossa Senhora Aparecida), onde estão localizados os pontos 7 a 10. A partir do ponto 10, segue-se na estrada de terra até a Rodovia Fausi Mansur, que liga os municípios de Chavantes (SP) a Ribeirão Claro (PR). À margem desta rodovia, no sentido para Ribeirão Claro, estão localizados os pontos 11.1 e 11.2. A partir da cidade de Ribeirão Claro , segue-se pela estrada para a Pousada da Ilha, uma importante pousada turística localizada no município de Ribeirão Claro (PR), onde estão localizados os pontos 12 a 16 (Figura 2). As feições destacadas nos pontos são as seguintes: Ponto 1. Arenitos da Formação Pirambóia em frente de lavra a céu aberto à margem da estrada; Ponto 2. Argilitos arroxeados e esverdeados da Formação Rio do Rasto aflorando em corte de estrada de terra; Ponto 3. Cornija e depósito de tálus nos arenitos da Formação Botucatu à esquerda e ao fundo da paisagem, e os arenitos da Formação Pirambóia à direita e mais à frente; Ponto 4. Dique de diabásio (Formação Serra Geral), destacado na paisagem pelas cristas alongadas e estreitas; Ponto 5. Dique de diabásio no corte da Rodovia Benedito Moreira, na margem esquerda, sentido JacarezinhoRibeirão Claro; Ponto 6. Feições de relevo formadas por processos erosivos de longo tempo (superfície de aplainamento e morro testemunho) (visada rumo a SE (sudeste) para a região da Fazenda Monte Belo, a partir da Rodovia Benedito Moreira); Ponto 7. Mirante próximo às torres de transmissão de TV às margens de estrada de terra; Ponto 8.1. Rocha magmática Traquidacito “chocolate”, apresentando grande quantidade de vesículas e de material vítreo; Ponto 8.2. Afloramento de Traquidacitos com falha transcorrente sinistral em corte de estrada; Ponto 9. Confluência do ribeirão Anhumas e o rio Paranapanema; Ponto 10. Feições ruiniformes no arenito da Formação Botucatu silicificado; Ponto 11.1. Perfil de dacito no corte da estrada; Ponto 26 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 11.2. Cachoeira Véu da Noiva no ribeirão Claro, localizada à margem direita da Rodovia Fausi Mansur no sentido Ribeirão Claro; Ponto 12. Morro da Pedra. Margem direita da estrada Ribeirão Claro – Pousada da Ilha; Ponto 13. Morro testemunho de arenito da Formação Botucatu mostrando antiga frente de lavra; Ponto 14. Vale em forma de V em afluente do rio Itararé, mostrando rampas de colúvio na terço inferior da vertente; Ponto 15.1. Intrusão de dique de diabásio; Ponto 15.2. Esfoliação esferoidal ou “acebolamento” no basalto da Formação Serra Geral; Ponto 16.1. Lago da Usina Hidrelétrica de Chavantes no rio Paranapanema localizada nos arredores de Ribeirão Claro e Chavantes. Destaque para as ilhas artificiais formadas pelo lago a montante da barragem; Ponto 16.2. Marcas de animais escavadores e/ou raízes (Paleossolo). 4.2. Resultados da aplicação dos questionários Antes de discutir os resultados da aplicação dos questionários, cabe destacar que o trabalho de campo com os alunos da graduação em Geografia percorreu somente alguns pontos do Georoteiro, mais especificamente os pontos números 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 11.02; já os alunos da 8ª série do Ensino Básico não realizaram o campo, sendo assim, observaram os pontos por meio da apresentação da versão on line do georoteiro em sala de aula. Observando-se os resultados dos questionários, nota-se que tanto alunos de graduação em Geografia, quanto os alunos do ensino básico apresentaram um padrão similar nas respostas. As duas categorias de amostragem afirmaram que a forma de apresentação do Georoteiro Jacarezinho – Ribeirão Claro é de fácil entendimento. Quanto à questão se as informações apresentadas no Georoteiro são compreensíveis, 96% dos alunos de graduação em Geografia afirmaram que são de fácil entendimento; por outro lado, somente 71% dos alunos do ensino básico optaram pelo “sim” nessa mesma questão. Quanto à questão se o Georoterio foi apresentado de forma lógica e clara, 96% da primeira categoria e 76% dos alunos do ensino básico responderam “sim”. 27 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Quanto à clareza da linguagem do georoteiro, 95% dos alunos de graduação em Geografia e 52% dos alunos do Ensino Básico a acharam clara. Quanto aos pontos de maior beleza cênica, os alunos de graduação em Geografia acharam os pontos de número 2 (lavra a céu aberto nos Arenitos da Formação Pirambóia), 1 (argilitos arroxeados e esverdeados da Formação Rio do Rasto) e 3 (cornija e depósitos de tálus da Formação Botucatu e também os arenitos da Formação Pirambóia). Neste mesmo aspecto, os alunos do ensino básico elegeram os pontos número 15.1 (lago da Usina Hidrelétrica de Chavantes no Rio Paranapanema), 11.2, 9. (cachoeira Véu da Noiva no Ribeirão Claro à margem direita da Rodovia Fausi Mansur) e o ponto número 9 (confluência do Ribeirão Anhumas com o rio Paranapanema). Os alunos de graduação em Geografia, afirmaram que as feições que mais foram fáceis de serem visualizadas no trabalho de campo em ordem decrescente, foram as “Estratificações Cruzadas no arenito Pirambóia”, o “Argilito no corte da estrada” e o “Morro testemunho”. Já os alunos do ensino básico, apontaram as “Estratificações Cruzadas no arenito Pirambóia”, “Morro testemunho” e “Ribeirão Anhumas”, em ordem decrescente. Quanto ao conhecimento do conceito de Georoteiro, 90% dos alunos da escola pública e 74% dos alunos de graduação em Geografia responderam que nunca haviam ouvido falar no conceito de Georoteiro. Quanto à questão se os alunos de graduação em Geografia fariam esse georoteiro novamente, a resposta foi 100% afirmativa. Quanto aos alunos da educação básica, ao serem questionados se fariam o referido georoteiro, 68% responderam afirmativamente. 5- Considerações Finais Os resultados apresentados evidenciam que a região estudada possui feições geológicas e geomorfológicas de interesse, que indicam importante potencial para estudos voltados à geoconservação, seja no âmbito científico, seja no âmbito educacional. Torna-se pertinente também a necessidade de aprimoramento da transposição didática para o georoteiro voltado pra fins 28 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 educacionais, já que a linguagem deve ser de fácil entendimento e adequada ao estágio de desenvolvimento educacional do público-alvo. Finalmente, conclui-se que o conceito de georoteiro ainda é pouco conhecido, havendo necessidade de amplicação de estudos na área da geoconservação e maior disseminação destes. 6- Referências BRILHA, J. , Patrimônio Geológico e Geoconservação: A conservação da Natureza na sua vertente geológica, Braga, Palimage Editores, 2005. CONCEIÇÃO, L. F. ; COSTA, C. F. da ; BARRETO, M. B. ; NASCIMENTO, D. T. F. ; OLIVEIRA, I. J. Geologia e Turismo: Perspectivas para a Geoconservação e a promoção do Geoturismo no município de Pirenópolis-Go. Ateliê Geográfico (UFG), v. 3, p. 74-91, 2009. IPARDES. Leituras Regionais. Disponível em: <http://www.ipardes.gov.br/web isis.docs/leituras_reg_meso_norte_pioneiro.pdf> Acesso em: 08 de Ago. 2013. NASCIMENTO, M.A.L. Diferentes ações a favor do patrimônio geológico brasileiro. Estudos Geológicos, v. 20, n. 2, p. 81-92, 2010. SILVA, C.R. (Ed.). Geodiversidade do Brasil: conhecer o passado, para entender o presente e prever o futuro. Rio de Janeiro: CPRM, 2008. Agradecimentos À PROEX- Unesp pelo financiamento do projeto e da bolsa de estudo e à unidade da Unesp de Ourinhos pelo apoio. 29 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 MUDANDO MEU PEDACINHO: IV CONFERÊNCIA INFANTO-JUVENIL PELO MEIO AMBIENTE, E.E. “DOM ANTÔNIO JOSÉ DOS SANTOS” Débora Jurado1 Gisele Torsani2 Eliana Ribeiro3 Carla C. R. G. de Sena4 1- Introdução O mundo contemporâneo está marcado pela desigualdade social e desequilíbrio ambiental, sendo questões como a reciclagem de lixo, a preservação de áreas ambientais, a proteção de espécies ameaçadas, aquecimento global, além de um contato mais íntimo com a natureza, importantes elementos componentes do currículo escolar desde as séries iniciais a fim de preparar os alunos para adentrar este espaço globalizado. Segundo a Proposta Curricular do Estado de São Paulo (PCSP) a Geografia enquanto ciência deve estar socialmente “engajada e atuante num mundo cada vez mais dominado pela globalização dos mercados, pelas mudanças nas relações de trabalho e pela urgência das questões ambientais e etnoculturais” (PCSP, 2008, pág. 41), desta forma, cabe a nós professores de Geografia e Ciências Naturais o dever de mediar os problemas socioambientais da comunidade, assim como orientar e intermediar a participação ativa do aluno na organização de seu ambiente escolar, para Costa (1998, pág. 137) é preciso “criar espaços para que o educando possa empreender, ele próprio, a construção de seu ser”, portanto é de primordial importância que o professor 1 Aluna do curso de graduação em Geografia da Universidade Estadual Paulista/Campus de Ourinhos e professora de geografia na EE “Dom Antônio José dos Santos” [email protected]. 2 Graduada em Ciências Biológicas pela Universidade Estadual Paulista/Campus de Assis e professora de Biologia e Ciências na EE “Dom Antônio José dos Santos” - [email protected] 3 Coordenadora do Ensino Fundamental na EE “Dom Antônio José dos Santos” 4 Graduação em Geografia pela Universidade de São Paulo (1993), mestrado em Geografia (Geografia Física) pela Universidade de São Paulo (2002) e doutorado em Geografia (Geografia Física) pela Universidade de São Paulo (2009). Atualmente é Professora Assistente Doutora da UNESP Campus de Ourinhos. 30 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 forneça ao aluno condição plena de construção social de seu espaço de vivencia, a escola. Neste sentido, envolver estudantes, professores, juventude e comunidade escolar para construir um Brasil sustentável, com equidade, diversidade e justiça tornam-se objetivos da Coordenação Geral de Educação Ambiental da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD), do Ministério da Educação e Cultura (MEC), juntamente em parceria com o Ministério do Meio Ambiente, como integrantes do Órgão Gestor da Política Nacional de Educação Ambiental, seguindo a Lei 9795/99 que estabelece as Políticas Nacionais de Educação Ambiental. Assim sendo, a IV Conferência Nacional Infanto-juvenil pelo Meio Ambiente (IV CNIJMA) é um instrumento voltado para o fortalecimento da cidadania ambiental a partir de uma educação crítica, participativa, democrática e transformadora e se caracteriza como um processo dinâmico de encontros e diálogos, para debater temas propostos, deliberar coletivamente e escolher os representantes que levarão as ideias consensuadas para o restante dos acadêmicos, além do efetivo envolvimento dos escolares na elaboração de propostas, projetos, e divulgação de ações no ambiente escolar. Em nosso caso, além das discussões feitas no momento da conferência, foram propostos também projetos que viessem de encontro com as ânsias dos alunos e que possibilitassem melhorias desde o espaço físico da escola até as relações ensino-aprendizagem das aulas cotidianas, por fim, produzimos um produto educomunicativo, que segundo o Manual da Conferência InfantoJuvenil pelo Meio Ambiente, trata-se de uma forma didática e dinâmica de disseminar informação e conhecimento a um grupo maior de pessoas, ou seja, todos os alunos da escola. Construímos então um vídeo-documentário que mostra o passo a passo da conferência, além das ações já realizadas pela escola para solucionar as questões levantadas pelos discentes. 2- Objetivo O presente projeto objetivou a construção de um espaço de debates dentro do ambiente escolar, este chamado IV Conferência Infanto-Juvenil pelo 31 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Meio Ambiente (IV CNIJMA), entre alunos, professores e funcionários a fim de problematizar e levantar questionamentos a cerca de problemas ambientais vividos pela escola e arredores. Propomos também a construção de projetos permanentes a fim de solucionar os pontos observados pela comunidade escolar, e a produção de um produto Educomunicativo que divulgasse a IV CNIJMA e as ações viabilizadas por discentes e docentes na solução dos problemas ambientais encontrados nas dependências da EE “Dom Antônio José dos Santos”, AssisSP. 3- Procedimentos metodológicos Inicialmente, os professores envolvidos com a IV CNIJMA foram convocados no dia 29/05/2013 para receber orientações e propostas de como trabalhar a conferência dentro da escola. Após este encontro utilizamos Reuniões de Aula de Trabalho Pedagógico Coletivo (ATPC) para discutir e organizar com os demais professores, o tema proposto, a atividade de conscientização pré-conferência, possibilidades de horários e possíveis datas para realização da atividade. Sendo o tema principal do evento: Vamos cuidar do Brasil com escolas Sustentáveis, selecionamos textos e fizemos levantamentos bibliográficos que nos ajudasse a preparar aulas de conscientização política, social e ambiental antes dos alunos se encontrarem no espaço de debates proposto. No dia da IV CNIJMA, utilizamos aparelhos multimídias, músicas e atividades lúdicas para efetivar as discussões e proporcionar um ambiente amistoso de debate e crescimento social para os participantes. Todas as aulas de conscientização foram preparadas dentro das propostas de educação histórico-critica, utilizando de leituras e aplicações práticas como o Plano de Aula de Libâneo (1994), isso porque, acreditamos que nos possibilitaria um saber crítico e nos levaria ao aluno protagonista, segundo Saviani (2008, p.9) é necessário garantir, 32 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 [...] provimento dos meios necessários para que os alunos não apenas assimilem o saber objetivo enquanto resultado, mas apreendam o processo de sua produção, bem como as tendências de sua transformação. Portanto, é mais do que necessário que o aluno participe efetivamente das tomadas de decisões na escola, fomentando assim, não somente o saber já construído e repassado para o aluno a partir do professor, mas também, valorizando o processo de construção de todo ambiente escolar e percebendo a importância de pensarmos a escola como um espaço dinâmico. O Projeto Votado foi denominado “Mudando Meu Pedacinho”, a divulgação deste ocorreu por vídeo-documentário que foi produzido utilizando câmera digital comum, programa de computador Windows Movie Maker e sala de vídeo da escola. 4- Resultados O primeiro contato com a IV CNIJMA ocorreu a partir da convocação dos professores de Geografia e Ciências, nos dias 29/05/2013, onde recebemos orientações para a realização do evento na escola e a importância deste para a formação de um aluno critico e atuante, um verdadeiro protagonista no processo ensino aprendizagem. Após este encontro iniciamos discussões em ATPCs que nos permitiram organizar e discutir o tema proposto: Vamos Cuidar do Brasil Com Escolas Sustentáveis. Estes encontros foram importantes para a construção bibliográfica e organizacional do projeto, já que trouxe ao ambiente de debate do professor a importância do aluno atuante no processo de ensino e aprendizagem, e a utilização do método histórico-crítico no preparo das aulas cotidianas, a fim de buscar um aluno crítico e participativo socialmente. Escolhemos também as datas de realização da IV CNIJMA e as salas que participariam, o evento ocorreu em mais de um dia, isso porque a escola não dispõe de espaço amplo para receber todos os alunos envolvidos de uma única vez, e as salas participantes foram somente 6º anos do Ensino 33 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 fundamental, esta escolha se deu por ser a primeira experiência da escola com este tipo de evento. Após vários dias de leituras e discussões críticas sobre a organização da IV CNIJMA, propomos o preparo dos alunos para este dia, tendo em vista, que estes nunca participaram de um local tão amplo para debates e discussões, para isso aplicamos planos de aulas, como já dito, baseados em Libâneo (1994) e conteúdos que enfatizassem a participação popular em discussões essenciais para desenvolvê-lo socialmente, como assembleias e eleições. A Conferência na Escola foi o momento em que estudantes, professores e demais membros da comunidade escolar reuniram-se para dialogar sobre como transformar nosso local de convívio em um lugar de educação e sustentabilidade, constituindo-se, assim, em um lócus privilegiado para aprofundar o debate sobre o tema da Conferência em nível local. Na EE “Dom Antônio José dos Santos”, a IV CNIJMA aconteceu entre os dias 05 e 09 de agosto de 2013, sendo iniciada com a dinâmica lúdica escravos de Jó, observada na imagem 1, que visa demonstrar aos alunos a importância da coletividade, está atividade foi proposta, pois acreditamos que, [...] pelo fato de o jogo ser um meio tão poderoso para a aprendizagem das crianças, em todo o lugar onde se consegue transformá-lo em iniciativa de leitura ou ortografia, observa-se que as crianças se apaixonam por essas ocupações antes tidas como maçantes (WADSWORTH, 1977. p. 14-31). Sendo que, ao aplicar a atividade, percebemos que os alunos se propuseram com maior facilidade e abertura as discussões, sentindo que aquele momento realmente fazia parte do que ele acreditava ser lugar para expor sua opinião. Após a dinâmica, ocorreram as discussões onde os alunos demostraram grande interesse e familiaridade com o tema, formando conceitos e fornecendo ideias importantes. 34 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Imagem 1: Dinâmica “Escravos de Jó” Fonte: Ribeiro, 2013 A Conferência contou com a participação de 55 alunos, 2 professores, 1 coordenador e a colaboração dos demais membros da comunidade escolar. Como foi fragmentada, cada sala escolheu representantes para que na conferência final, que aconteceu no dia 09/08/2013, representassem as ideias da classe e pudessem participar da eleição do delegado e suplente ambiental. Os representantes escolhidos por cada sala foram: Carlos e Samuel 6ºB; João e Laís 6ºC e Angélica 6ºD. A delegada ambiental eleita foi aluna Angélica 6ºC e suplente aluna Laís do 6ºD. A imagem 2 mostra os alunos escolhidos por sala em atividade do projeto. Imagem2: Alunos eleitos por sala em atividade do projeto. Fonte: Ramos, 2013 35 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 O projeto votado pelos alunos foi direcionado a limpeza e conservação patrimonial da escola, para isso eles propuseram aulas de conscientização, cartazes, vídeos e anúncios na rádio da escola a fim de buscar a manutenção do prédio escolar. A reciclagem e reutilização do lixo foram propostas para as aulas cotidianas, seguindo o currículo escolar, para incrementar e tornar mais didático os conteúdos estudados, por fim, produzimos um vídeo-documentário que mostra todo o momento de discussão, decisões e cumprimento das exigências propostas. Os alunos chamaram o projeto de “Mudando Meu Pedacinho”, nome escolhido após frequente utilização deste termo por eles no momento da IV CNIJMA. O projeto principal foi fragmentado em microprojetos, a fim de atender todas as demandas da escola e encaixa-lo no currículo escolar durante o ano. Estes foram desenvolvidos por professores de História, Matemática, Geografia e Educação Artística e os mesmos seguem: - “Exposição Geográfica e Arte: Retratos da materialidade, sustentabilidade, caminhos contemporâneos”. vida cotidiana, Desenvolvido pelos professores Elton (Geografia) Andrea (Educação Artística) que visa à utilização de material reciclado na confecção de quadros, esculturas e maquetes, demonstrando conceitos de correntes artísticas e espaço geográfico. - “Preservação e Valorização do Patrimônio Público Escolar”. Proposto pelo professor Sérgio (História) e grupo do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) UNESP Assis-SP, cujo objetivo é a conscientização a fim de alcançar a conservação do patrimônio escolar; - “Matemática Viva”. Desenvolvido pelos professores Katia (Matemática), Eraldo (Ciências) e Katty (Matemática), que criaram um minimercado na escola com embalagens descartadas. O mesmo foi utilizado nas aulas de matemática para incentivar cálculos de adição, subtração, porcentagem e nas aulas de geografia a fim de exemplificar diferenças sociais e regra de compra e venda dentro do capitalismo. 36 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Após o desenvolvimento da IV CNIJMA e do projeto em andamento iniciamos a produção do produto educomunicativo, o Manual da Conferência Infanto-Juvenil do Meio Ambiente, pág. 34 propõe, [...] que a comunicação faça parte dos trabalhos a favor do meio ambiente e da melhoria de qualidade da nossa vida. Ela pode contribuir efetivamente para consolidar nossos planos de transformar as escolas em espaços educadores sustentáveis. Ou seja, a escola deve utilizar de meios de comunicação dinâmicos e que atinja o público adolescente a fim de conscientizar e disseminar ideias sustentáveis, a esta divulgação chamamos de educomunicação, que em nosso caso foi o vídeo documentário. A produção áudio visual foi toda produzida pelos alunos da escola juntamente com os professores orientadores e teve por objetivo demonstrar como foi o decorrer da conferência e dos projetos, após sua edição o produto educomunicativo foi transmitido para todos os alunos utilizando a sala de vídeo da escola, com repercussão de grande sucesso e atingindo de forma ampla a todos. 5- Considerações finais A IV Conferência Infanto-Juvenil pelo Meio Ambiente contribuiu para dar as crianças à oportunidade de olhar o mundo de uma nova forma, para que possam observar e entender como a natureza se comporta, permitindo, assim, que se reconheça como parte integrante desse ambiente, e em especial o espaço escolar. A inserção desses alunos como protagonistas foi o principal ganho, já que a isto se dá todos os méritos de conquistas e construções intelectuais feitas pelos discentes nestes momentos. Foi nítida como a oportunidade de escolha e planejamento escolar mexeu com o instinto de pertencimento destes e de preservação do bem social comum, a escola. Os objetivos dos projetos de demonstrar a importância da manutenção do prédio e limpeza escolar a fim de favorecer e enriquecer as aulas, assim 37 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 como incentivar a diminuição de materiais descartados pelos alunos todos os dias e a conscientização da reciclagem como algo concreto e atuante no dia a dia do discente, foram alcançados. As salas de aula permaneceram consideravelmente mais organizadas e a quantia de lixo recolhido diariamente na escola diminuiu, além é claro, de termos resultados surpreendente com os projetos na relação ensino/aprendizagem, que melhorou muito após a utilização da reciclagem e reutilização do lixo para exemplificar conteúdos. A escola é um espaço privilegiado, assim, deve cumprir o papel de conscientizar os alunos e proporcionar aos mesmos, contato com diferentes elementos, fenômenos e acontecimentos do mundo, onde sejam instigados por questões significativas para observá-los e explicá-los e tenham acesso a modos variados de compreendê-los e representá-los. O projeto desenvolvido, “Mudando meu Pedacinho” foi satisfatório, e provocou uma enorme onda de conscientização e preocupação por parte dos alunos e professores quanto ao ambiente escolar e as problemáticas ambientais, trazendo frutos valiosos e de caráter permanente. Os mesmos terão continuidade, assim como o espaço de debate aberto aos estudantes, este ampliado e reprogramado a fim de atender a toda escola, pois as ganhos foram muitos e o principal beneficiado foi o aluno. 6- Referências ABREU, Lenir Silva. O desafio de formar professores das séries iniciais para ensinar ciências. 2008. 150 f. Dissertação (mestrado em Ensino, Filosofia e História das Ciências). Salvador 2008. Programa de PósGraduação em Ensino, Filosofia e História das Ciências, Universidade Estadual de Seira de Santana, Bahia. 2008 BRASIL. Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (Secadi) – Ministério da Educação. Passo a Passo Para a Conferência de Meio Ambiente na Escola+ Educomunicação. Brasília: Ministério da Educação, 2012. COSTA, Antônio Carlos Gomes Da. Protagonismo juvenil: adolescência, educação e participação democrática. Salvador, Fundação Odebrecht, 2000. LIBANÊO, José Carlos. Didática. São Paulo. 1º ed. São Paulo: Cortez, 1994. 38 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 SÃO PAULO (Estado). Secretaria da Educação. Proposta Curricular do Estado de São Paulo: Geografia. São Paulo: SEE, 2008. WADSWORTH, Barry. Inteligência e afetividade na teoria de Piaget. São Paulo: Pioneira, 1977. 39 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 A AULA DE CAMPO NO PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSA DE INICIAÇÃO À DOCÊNCIA (PIBID) EM GEOGRAFIA Larissa Alves de Oliveira1 Douglas Vitto2 1 - Introdução O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação a Docência (PIBID) é um programa do Governo Federal que, por meio do fornecimento de bolsas de estudo, visa incentivar a carreira docente pelo contato direto do licenciando no convívio escolar, permitindo-lhe atrelar os estudos acadêmicos à prática vivenciada nas escolas. O PIBID de Geografia da Universidade Estadual de Londrina/UEL tem como eixo central o estudo das problemáticas ambientais, em escala global e local, cuja metodologia se pauta na construção da Agenda 21 escolar. O projeto é aplicado, semanalmente, em três colégios estaduais, sendo dois em Londrina e um em Cambé, ambas no Paraná. Os bolsistas deste programa são estimulados a estudarem práticas de ensino efetivas e maneiras de interagir com os alunos para que a aprendizagem dos conteúdos escolares ocorra. No processo de construção da Agenda 21 escolar é necessário que os alunos reflitam e conheçam as singularidades da instituição onde estudam e do ambiente onde moram, para isso, são instigados a observar, a analisar e a refletir sobre o seu espaço vivido. Dessa forma, as estratégias utilizadas pelo PIBID procuram valorizar o local de vivência e o município onde residem para que construam um conhecimento sólido da dinâmica das cidades e estejam preparados para pensarem a organização e a produção de outros espaços que não fazem parte de sua realidade imediata. A aula de campo é uma das estratégias norteadoras usada no PIBID por se mostrar frutífera no aprimoramento dos conteúdos estudados e na 1 Graduanda em Geografia e bolsista do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência. Larissa Alves de Oliveira. Universidade Estadual de Londrina, [email protected]. 2 Graduando em Geografia e bolsista do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência. Douglas Vitto. Universidade Estadual de Londrina, [email protected].. 40 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 aproximação da teoria e da prática. Entre as aulas de campo realizadas, destacamos neste artigo, a importância da visitação de parques ecológicos urbanos, para que o aluno conheça os remanescentes, no caso de nossa região, da Mata Atlântica, e perceba a presença do verde em ambientes urbanos e a importância de sua conservação. Nesse sentido, foi realizado um trabalho de campo ao Jardim Botânico da cidade de Londrina, PR, que ainda se encontra em processo de construção, mas se mostra um importante ambiente para se refletir sobre o desenvolvimento sustentável. O local foi escolhido por ser diferente do ambiente onde os alunos estão habituados e percorrerem e por permitir a análise de uma paisagem singular no meio urbano. O presente trabalho apresenta uma discussão sobre a importância dessa experiência na formação pessoal dos alunos, além da formação profissional dos bolsistas. 2 - Referencial teórico A discussão de metodologias diferenciadas se faz necessária na contemporaneidade, pois percebemos que a aprendizagem significativa ocorre quando o aluno relaciona os temas estudados com o seu cotidiano. A aula de campo é uma ferramenta para a demonstração de diversos conteúdos teóricos, apresentados em sala, atingindo as diversas escalas, ou seja, nem sempre requer uma longa viagem, pois uma observação no entorno do próprio colégio poderá cumprir os objetivos do ensino. Segundo a Pontifica Universidade Católica de Minas Gerais (2002, p. 06), [...] podemos exemplificar como objetivos: desenvolver a capacidade de observação e do senso crítico; integrar o acadêmico ao meio natural; desenvolver habilidades de interação social; promover maior relacionamento do acadêmico com a comunidade; formar atitudes como o senso de responsabilidade, de trabalho em equipe; desenvolver habilidade de coleta e manipulação de dados empíricos; desenvolver capacidade de trabalhar com modelos analíticos/conceitos para compreensão das realidades observadas; desenvolver habilidades relacionadas aos procedimentos metodológicos adequados à pesquisa empírica, e/ou experimental, dentre outros. 41 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Dessa maneira, podemos verificar a abrangência de fatores que se manifestam nos objetivos de uma aula de campo e, no contexto escolar, contempla a meta da formação de sujeitos autônomos, transformando os alunos em cidadãos na medida em que poderão desenvolver a sua capacidade de leitura de mundo, como indicado nos Projetos Político-Pedagógicos (PPP) das escolas. É necessário ressaltar que o trabalho de campo é uma ferramenta antiga usada por geógrafos, como menciona Rio (s/d, p. 47) “o trabalho de campo tem longa história na Geografia e seu papel na pesquisa de curto e longo prazos varia espacial e temporalmente”, no entanto, não minimiza sua importância na construção da ciência geográfica. A tradição dos geógrafos com os trabalhos de campo devem ser resgatada como meio de desenvolvimento de ensino e pesquisa, em nosso caso, utilizamos o termo “aula” de campo, por considerar que promovemos um primeiro contato dos alunos com o meio estudado, em que as estratégias se pautaram na observação, percepção e reconhecimento da área de estudo; o “trabalho” de campo é uma metodologia mais abrangente que permite a coleta e pesquisa de materiais de estudo. É necessário que o aluno tenha o contato direto com os diversos tipos de ambientes, para que estes compreendam os conteúdos, como menciona Silva (2002) ao colocar o campo como a “leitura” do entorno e a mediação entre o registro mental e o conhecimento sistematizado, Suetergaray enfatiza que para se alcançar uma aprendizagem verdadeira, é necessário a compreensão dos fenômenos e a leitura destes, sendo a fenomenologia também trabalhada na Geografia. Esta prática promove o reconhecimento do campo entendendo-se como observador externo, capaz de captar a informação vinda do objeto em análise, portanto, um conhecedor neutro, apenas sistematizador do que o mundo dos fenômenos lhe revela. (SUETERGARAY, s/d, p.03). Durante a realização da aula de campo é necessário que os alunos coloquem em prática os sentidos da percepção, sendo estes essenciais ao geógrafo, como a visão, tato, audição, olfato e paladar. Podemos enfatizar que os sentidos são essenciais na formação dos sujeitos, pelos quais é possível 42 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 fazer a identificação dos locais em suas várias singularidades, levando-os a refletirem não somente sobre os aspectos físicos, mas de que maneira este ambiente remodela os indivíduos nele presentes. Aguçar esta visão crítica no processo de ensino e aprendizagem é fundamental por captar uma grande quantidade de informações e com o tempo/experiência este ultrapassa as aparências estéticas, facilitando na compreensão dos mecanismos humanos de determinado local específico. Os sentidos do tato permitem distinguir os detalhes, como por exemplo, os da vegetação (folhas, troncos, grama, entre outros), Tuan (1930, p. 24) coloca que “a prática melhora a sensibilidade” facilitando com o decorrer do tempo a identificação de diferenças sutis em meio ao cotidiano. A audição nos torna vulneráveis à percepção do dinamismo/agitação ambiental e social, uma vez que “a sensibilidade auditiva no homem não é muito fina” (TUAN, 1930, p. 25), mas que pode identificar o sopro dos ventos entre as folhas das árvores, canto dos pássaros, barulho do percurso da água em alguns trechos, entre outros; despertando uma experiência emocional sobre o meio ambiente, que antes não acontecera no meio urbano de maneira apreciativa. Já o olfato humano fareja informações, odores (toda substância capaz de despertar a percepção olfativa), são presenciados, constantemente, durante os percursos em trabalhos de campo, uma vez que os odores despertam emoções que remetem a momentos vividos, portanto, se o odor muda, a paisagem sofre alterações na percepção do indivíduo. Diante disso, podemos compreender a importância dos sentidos em uma união, sendo este chamado de percepção. Segundo Tuan, a percepção é uma atividade de extensão para o mundo, podemos então compreender porque da Geografia fazer cada vez mais essa conexão com os sentidos e mais que isso, buscar através destes a percepção e leitura de mundo. Tuan faz uma síntese das diferenças a serem consideradas na eficácia dessa percepção. Embora todos os seres humanos do planeta tenham órgãos dos sentidos similares, o modo como suas capacidades são usadas e desenvolvidas 43 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 começa a divergir numa idade bem precoce. Como resultado, não somente as atitudes para com o meio ambiente diferem, mas também a capacidade real dos sentidos, de modo que uma pessoa em determinada cultura possa desenvolver um olfato aguçado para perfumes, enquanto os de outra cultura adquirem profunda visão estereoscópica. Ambos os mundos são predominantemente visuais: um será enriquecido por fragrâncias, o outro pela agudeza tridimensional dos objetos e espaços. (TUAN, 1930, p. 30). Dessa maneira, confirmamos a eficácia das aulas e dos trabalhos de campo para se trabalhar os sentidos, a percepção e a tarefa de reflexão. Ao extrapolar as paredes da sala de aula, os alunos demonstram satisfação ao se apropriarem dessa metodologia ativa, pois são mais perceptíveis às diversas realidades quando em contato direto com elas, como enfatiza Suetergaray (s/d, p.03) “a pesquisa de campo constitui para o geógrafo um ato de observação da realidade do outro, interpretada pela lente do sujeito na relação com o outro sujeito”, valendo colocar que todo aquele que pratica a Geografia no ato de observar, de refletir, de ser crítico, é por sua própria natureza um geógrafo por contribuir com a ciência ao passo que transforma o seu meio. 3 - Estudo de caso Para a construção da Agenda 21 escolar é necessário que os alunos tenham em mente as singularidades da instituição onde estão inseridos e do ambiente que habitam, dessa maneira, o PIBID propõe atividades que façam com que estes possam observar, analisar e refletir os espaços da rua, do bairro, como também da cidade. A aula de campo, realizada no primeiro semestre de 2013, no Jardim Botânico da cidade de Londrina – PR, que ainda se encontra em processo de construção, se mostrou frutífera pelo potencial de trabalhar os cuidados com a natureza e os meios para se atingir um desenvolvimento sustentável, pois, ao colocar os alunos em contato direto com a natureza, este é impactado e levado a refletir sobre a necessidade de sua conservação, não somente em parques ecológicos, mas em todo o meio, seja urbano ou rural. O local foi escolhido por ser diferente do ambiente onde os alunos estão habituados a percorrerem, cujo objetivo foi estimulá-los à leitura dos 44 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 remanescentes da Mata Atlântica de nossa região. O colégio Olympia Tormenta, onde esta prática foi aplicada se localiza na zona norte de Londrina, próximo a Avenida Saul El Kind, sendo uma área de grande expressão econômica por concentrar centros comerciais, bancos, lojas, shoppings, entre outros. Tem como ponto positivo uma diversidade de bens econômicos próximos a população, no entanto, permite também um isolamento destes em relação às demais áreas da cidade, dificultando o conhecimento dos alunos das outras zonas de Londrina, incluindo os parques ecológicos que são distantes na zona norte de Londrina. É necessário salientar que os padrões residenciais da região norte do município de Londrina, especificamente os que estão ao entorno do colégio, se caracterizam por uma maior sofisticação e valorização ao se aproximarem da Avenida Saul Elkind, e conforme de afastam desta os padrões socioeconômicos também tendem a ser menores. Durante o trajeto que se percorreu, do colégio ao Jardim Botânico, alguns estudantes do colégio demonstraram curiosidade pelo percurso e relataram não conhecerem a região central, sul, leste e oeste da cidade de Londrina. Sendo assim, o trabalho de campo ao Jardim Botânico de Londrina (localizado na região sul) permitiu que os alunos observassem as mudanças físicas e espaciais durante o percurso. Seguindo o percurso, ao se aproximar da região central, os alunos perceberam as mudanças nas paisagens urbanas, as quais foram identificadas pelos bolsistas, a exemplo da a verticalização da cidade, que está em plena expansão com a construção civil; o intenso fluxo de veículos provenientes, principalmente, dos habitantes das regiões leste (Ibiporã) e oeste (Cambé) que se deslocam a Londrina com frequência; a qualidade do ar diferenciada pelas ilhas de calor; a constante e intensa poluição sonora que se propaga; a ausência significativa de áreas verdes; alterações no perfil do relevo de uma região para outra, entre outras peculiaridades. Ainda durante o percurso os alunos observaram de forma notória o contraste entre as extremidades da região sul, pouco desenvolvida e da região sudeste, em que há grande concentração de condomínios luxuosos, além de 45 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 obterem o conhecimento de alguns órgãos públicos da cidade de extrema importância para o Estado, como o Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR). Ao chegarmos ao Jardim Botânico contamos com a participação de professores da UEL e de funcionários do parque que atuam na área e puderam dar grandes contribuições na análise da tipologia da vegetação e dos demais elementos bióticos e abióticos presentes nas trilhas realizadas, bem como informações sobre o processo de construção do Jardim Botânico, um local essencial para se trabalhar a Educação Ambiental e desenvolver atitudes conservacionistas na população em geral. O Jardim Botânico é caracterizado pela sua biodiversidade, possibilitando que os alunos tivessem um contato real e direto com as características físicas e biológicas deste local, como por exemplo, a presença de uma nascente que abastece toda a água do lago, as áreas verdes de remanescentes de Mata Atlântica, a qualidade do ar, o conforto acústico, a variedade de aves e plantas, as plantas aquáticas, como por exemplo, a vitóriarégia, que é utilizada por algumas culturas indígenas e afrobrasileiras, além de sua importância biológica. A figura 1 mostra os alunos visualizando duas das três estufas de herbologia que estão sendo construídas no Jardim Botânico. Figura 1: Alunos no Jardim Botânico em Londrina/PR Fonte: Arquivo Pessoal (27 de maio de 2013) O Jardim Botânico serviu para se firmar como uma área de lazer e/ou produção científica, mas dentre os objetivos traçados nesta aula prática, está a 46 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 preocupação em resgatar a importância da conservação deste local por toda a população. Os alunos foram motivados a serem multiplicadores desta ideia, aprendendo a fazer a leitura dos ambientes e das sensações que estes trazem e valorizando o equilíbrio na íntima relação do homem com o seu meio. A figura a seguir mostra a vista do lago e da vegetação presente. Figura 2: Visão parcial do Jardim Botânico de Londrina Fonte: Arquivo Pessoal (27 de maio de 2013) 4 - Considerações finais O presente trabalho enfatizou a importância do PIBID para a sociedade, vez que atua na formação de professores dinâmicos com foco no seu papel socioambiental. As aulas de campo, entre outras práticas diferenciadas oferecidas ao colégio pelo PIBID, têm se mostrado eficazes, tanto para a formação do aluno-cidadão, quanto para a formação inicial dos futuros docentes em Geografia, o que contou com a receptividade e apoio do colégio ao aderir as ideias do projeto e confiar no trabalho realizado em sala em aula. Podemos ressaltar que o PIBID tem cada vez mais (re)descoberto novas metodologias e maneiras de se trabalhar em sala, a exemplo da realização de aulas e de trabalhos de campo. Tal metodologia expressou aos alunos o verdadeiro sentido da ciência geográfica e sua aplicação no cotidiano, vez que permitiu estudar de maneira prática os fenômenos físicos e os fatores humanos que constroem as paisagens, guiando os mesmos na leitura dos locais por 47 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 onde passam na cotidianidade e proporcionando transitar por outros lugares que não tinham contato, sendo que o seu desvendamento foi possível pela aula de campo, prática essencial para pensar a sua cidade. 5 - Referências PUC. Orientações gerais para a realização de trabalho de campo e similares: das disciplinas de graduação. Belo Horizonte: PUC Minas, PróReitoria de Graduação, 2002. 9p. RIO, G. A. P. Trabalho de campo na (re) construção da pesquisa geográfica: reflexões sobre um tradicional instrumento de investigação. Disponível em: http://www.uff.br/geographia/ojs/index.php/geographia/article/download/404/314 Acesso em: 24/10/2013. SILVA, A. M. R. Trabalho de campo: prática “andante” de fazer Geografia. Geo UERJ Revista do Departamento de Geografia, UERJ, RJ, n. 11, p. 61-74, 1º semestre de 2002. SUETERGARAY, D. M. A. Pesquisa de campo em Geografia. Disponível em: http://www.uff.br/geographia/ojs/index.php/geographia/article/download/78/76 Acesso em: 23/10/2013. TUAN, Y. F. Topofilia: um estudo da percepção, atitudes e valores do meio ambiente. Londrina: Eduel, 2012. 48 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 GEOGRAFIA, MÚSICA E ENSINO: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES Alice Martins Farias1 Elaine Cristina Santos Gomes2 Lucas Labigalini Fuini3 Introdução O tema geografia e música têm sido foco de grandes discussões e pesquisas, abordando também uma nova perspectiva para o ensino. O ponto de partida para iniciar essas discussões é o estudo dos materiais disponíveis referente ao tema, principalmente em formato digital, o que nos permite uma análise mais abrangente, desde o alemão Friedrich Ratzel, George Carney, o francês Paul Claval, a singapurense Lily Kong, o brasileiro Lucas Fuini, entre outros. O presente trabalho traz uma releitura desses autores que contribuem para a geografia cultural e ajudam no método desenvolvido pelo GEMUG – Grupo de Estudos de Música em Geografia, que desde 2012 trabalha nas escolas da rede pública de ensino do município de Ourinhos com o projeto de extensão "O uso de letras de música no ensino de Geografia", auxiliando docentes e alunos no trabalho com conteúdos geográficos por meio do uso de músicas em âmbito nacional. Objetivos As leituras seguidas das discussões realizadas em ciclos de debates e apresentações de seminários do grupo foram realizadas com o objetivo de dotar o projeto de um embasamento teórico inicial, relacionando-as com intervenções aplicadas em salas de aula de escolas públicas, na tentativa de 1 Graduanda do Curso de Geografia da Unesp - Campus de Ourinhos/SP membro do Grupo de Estudos de Música em Geografia (GEMUG). Email: [email protected]. 2 Graduanda do Curso de Geografia da Unesp - Campus de Ourinhos/SP membro do Grupo de Estudos de Música em Geografia (GEMUG). Email: [email protected] 3 Professor Assistente Doutor do Curso de Geografia da Univ Estadual Paulista/Unesp, câmpus de Ourinhos. É coordenador do projeto regular de pesquisa FAPESP (2011/20203-8), integrante do Grupo de Pesquisa/CNPq sobre Processos e Dinâmicas Territoriais (DITER) e coordenador do Laboratório de Geografia Humana. Email: [email protected] 49 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 construir conceitos geográficos com os alunos, principalmente da região de Ourinhos. Tendo em vista o vasto conteúdo relacionado ao tema, a revisão bibliográfica vem com o caráter de encontrar informações precisas e relevantes sobre o tema geografia, música e ensino e determinar um foco de interesse. Podemos citar também como objetivo desta revisão fazer um histórico e uma atualização sobre o tema, responder e questionar algumas hipóteses das leituras realizadas, levantando assim suas contradições (PANITZ, 2010). Resultados A revisão bibliográfica foi fundamental para a aproximação da teoria com a prática, pensando também no diálogo da universidade com a escola. Pensando nas dinâmicas socioespaciais, Carney (2003) faz uma divisão das principais interpretações de músicas e a geografia, sendo elas: Interpretação da música regional, dimensões espaciais da música com relação à migração humana, efeito da música na paisagem cultural, relações da música com outros traços culturais, relação da música com meio ambiente, a música nacionalista e a antinacionalista, evolução de um estilo, gênero ou música específica de um lugar, e a descrição de lugares através de letras de músicas, aplicadas de maneiras didáticas, como a utilização de multimídia, atividades em cartilhas, oficinas e gincanas. A Geografia cultural re-teorizada de Lily Kong (1995) reconhece que é notável a penetração da música na sociedade, afirmando a negligência de geógrafos com a música na história da ciência, em especial a popular. Atualmente, através de novas técnicas de análises de Kong e de outros autores, podemos observar um novo cenário da Geografia Cultural. No Brasil é muito recente o desenvolvimento da música e da geografia, porém, devido ao amplo material para pesquisa, este cenário está se consolidando, principalmente com a utilização das novas técnicas propostas por Kong a seguir: significados simbólicos, música e comunicação cultural, política cultural e música, economia e música, música e construção de identidades e, também, a análise temática das letras, método utilizado pelo GEMUG. 50 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Segundo Fuini (2013), a música - com suas letras - se coloca como instrumento importante e favorável à discussão e reflexão coletiva em sala de aula sobre conceitos da Geografia, estimulando a estruturação de conceitos científicos em conceitos escolares através da observância de dois elementos: cotidiano/vivência do aluno e a relação dialógica aluno-professor-aluno. As letras musicais, por seu conteúdo rico, popularidade e atualidade, estimulam o aprendizado de conteúdos geográficos, pois, instigam os alunos ao interesse pela descoberta do novo e dão ao professor outros meios para realizar seu papel de intervenção na aprendizagem, problematizando e reconstruindo os conteúdos aprendidos na escola. Considerações finais O presente trabalho ainda está em desenvolvimento, a todo o momento está sendo realizadas leituras referentes ao tema, a fim de abordar uma linha de pesquisa especifica, por ora, foram realizadas discussões teóricas e fichamentos bibliográficos. A música como qualquer outra manifestação cultural tem fundamental importância não só para o conhecimento popular como também para o científico, pois nos permite pensar sobre a sociedade a qual pertence. Trabalhar com música é como a geografia, é estar em constante processo de transição. “A cidade não para, a cidade só cresce, o de cima sobe e o de baixo desce”. (A Cidade – Nação Zumbi e Chico Science) Referências CARNEY, George O. Música e Lugar. In: CORRÊA, Roberto Lobato; ROSENDAHL, Zeny, Literatura, Música e Espaço. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2007. CORRÊA, Roberto. L.; ROSENDAHL, Zeny. Literatura, música e espaço: Uma introdução. Rio de Janeiro: Eduerj, 2007. 51 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 FUINI, L. L. O ensino da Geografia e de seus conceitos através da música. Geografia, Rio Claro, Ageteo, v. 38, n.1, p. 93-106, jan./abr. 2013. KONG, L. Música popular nas análises geográficas. In: CORRÊA, Roberto L.; ROSENDHAL, Zeny (orgs.). Cinema, música e espaço. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2009, p.129-175. PANITZ, Lucas M. Por uma Geografia da Música: O espaço geográfico da música popular platina. Mestrado (dissertação), Programa de Pós-graduação em Geografia, Porto Alegre, UFRGS, 2010, 199 f. 52 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 ALFABETIZAÇÃO GEOGRÁFICA E A TEORIA DA ECOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO HUMANO: EM BUSCA DE UMA APROXIMAÇÃO Beatriz Moreto de Campos1 Nelson Rodrigo Pedon2 Introdução A alfabetização espacial é um processo através do qual a criança inicia sua leitura sobre o mundo por meio dos diversos signos que vão além do alfabético. Para Marques (2009), a alfabetização espacial é um processo que engloba a obtenção de capacidades que possibilitem o desenvolvimento da habilidade de decodificar os signos visual e espacial, tratando-se de um processo permanente; segundo Callai (2005), a noção de espaço é construída socialmente e a criança vai ampliando e complexificando o seu espaço vivido concretamente, e para que isso se dê é necessário que ela aprenda também a ler, estudar e analisar o mundo, bem como as dinâmicas sociais nele inseridas. Ambas concordam que as considerações de Vygotsky são fundamentais, pois ele considera o desenvolvimento humano a partir das relações sociais e históricas nas quais as pessoas/sujeitos estão envolvidas. Ao tratar da importância da interação da pessoa com seu meio no processo de desenvolvimento, Bronfenbrenner (1996) desenvolve a “teoria da ecologia do desenvolvimento humano”, na qual defende a ideia de que o meio corresponde a um complexo de relações que se apoia de forma dinâmica, na pessoa, nos processos, no contexto e no tempo em quatro níveis dinâmicos inter-relacionados: os macro, meso e microssistemas e o tempo. O autor destaca os processos psicológicos e sua relação com as multideterminações ambientais. 1 2 Graduanda na UNESP Campus Ourinhos, [email protected]. Professor da UNESP Campus Ourinhos, [email protected]. 53 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Objetivos Com base nas leituras das obras de Vygotsky, Bronfenbrenner e demais autores que trabalham com estes, este estudo tem como objetivo realizar uma aproximação teórica sobre a importância da interação do indivíduo, no caso o aluno das séries iniciais, com o meio no qual vive para sua aprendizagem sobre os conceitos geográficos e seu concomitante avanço na alfabetização espacial. Procedimentos metodológicos Este trabalho tem como procedimento metodológico a revisão bibliográfica. Constitui um trabalho teórico baseado na pesquisa de material publicado por autores que discutem o ensino de Geografia fundado na perspectiva da alfabetização espacial e nos trabalhos de Urie Bronfenbrenner, bem como p refinamento da proposta e levantamento de material bibliográfico e documental: serão realizadas reuniões com a equipe para definição das estratégias de ação, elaboração dos instrumentos de pesquisa e revisão bibliográfica, com foco nas principais questões dos autores escolhidos. Resultados A alfabetização espacial consiste em ensinar ao aluno a maneira correta de observar, analisar, comparar e localizar-se; segundo Marques (2009: 36), “[...] alfabetizar é ir além das técnicas de ler e escrever [...]”, para a autora, trata-se também da obtenção de capacidades que possibilitem o desenvolvimento da habilidade para decodificar signos além do alfabético – o visual, o artístico, o matemático e o espacial, por exemplo – tratando-se de um processo permanente. É de fundamental importância que haja esse ensino nas séries iniciais para que a criança comece a desenvolver sua noção de espaço, de localização e de distância, assim como suas percepções sobre a paisagem, podendo interpretá-los e compreendê-los, atribuindo significados próprios para o lugar. Atualmente, muitos livros didáticos e professores, com a intenção de dar início a essa percepção de lugar partem do “eu”, da família, o que, segundo 54 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Callai (2005) gera uma proposição antropocêntrica, ou mesmo egocêntrica. Para Marques (2009) na alfabetização geográfica nas primeiras séries as crianças passam a se apropriar da linguagem geográfica, isto é, vocabulário e conceitos específicos. (2009: 48). Para Straforini (2001) as escalas espaciais são ensinadas de forma isolada sem que haja uma relação entre o espaço imediato e próximo com o longínquo e distante, porém, elas não podem ser compreendidas como coisas únicas e isoladas. Dessa forma, o autor continua e afirma que a prática pedagógica do professor precisa estar “[...] alicerçada no conceito atual de lugar e espaços da globalização [...]”, pois de modo contrário, será ensinado “[...] um mundo distante da realidade vivenciada pelos alunos”. (STRAFORINI, 2001: 55). A contribuição da Geografia nas séries iniciais, etapa que o aluno passa pelo processo de alfabetização, tem uma papel significativo, pois constrói no aluno a prática da observação e da análise dos espaços construídos, abrindo caminho para entender como a concretização das relações sociais configura um lugar e impõe limitações ou possibilidades para a sociedade. Para Straforini (2002a; 2002b), as ações do aluno sobre o bairro no qual mora, pouco conseguem explicá-lo, pois jamais é levado a considerar as características e influências localizadas em outros bairros, estados e países, agindo somente sobre o imediato concreto e privilegiando a forma em detrimento do seu conteúdo, ou seja, a realidade acaba por se tornar o ponto de partida e o de chegada. É preciso que a criança aprenda a ler esse espaço, que ela saiba ler e interpretar as paisagens e os conceitos que lhe serão apresentados; simultaneamente ao aprendizado da leitura do espaço, ela aprende também a ler as palavras e o mundo. A partir desse momento a Geografia passa a poder trabalhar os conceitos próprios de seu conteúdo. A alfabetização geográfica amplia a visão que o aluno tem do espaço no qual está, seja ele familiar ou não, ele aprende a pensar o espaço e desenvolve raciocínios geográficos, construindo seus próprios conceitos, ou seja, abstrações da realidade. 55 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 A escola tradicional tem como objetivo a transmissão do conhecimento, ou seja, uma preocupação com o conteúdo que será passado. Dessa forma, o aluno acaba sendo visto apenas como um agente passivo o qual deve somente decorar e/ou memorizar o conjunto de conhecimentos previamente selecionados; o mundo, a externalidade e também o contexto no qual o aluno está inserido em seu dia a dia são deixados de lado e ele não é posto como participante ativo do processo histórico (STRAFORINI, 2001). Quando tratamos de crianças que estão na faixa etária dos 6 aos 12 anos, fase chamada por Piaget de “Estádio Operacional Concreto”; abordamos um período bem delineado do desenvolvimento das funções de conhecimento, das funções afetivas e de representação. Durante esse tempo as operações diferem das ações das crianças, o que resulta na manipulação e no contato direto com o real. Segundo Goulart (2011: 26), “esta nova forma de abordar o mundo permite à criança pensar a realidade, organizando-a graças a artifícios mentais, embora ainda precise usar como referencia objetos concretos”. Enquanto no período pré-operatório a criança construía seu conhecimento sobre o mundo através de ações que implicam em contato direto com o real, a partir do período em que se instala o estádio das operações concretas surge a conservação - capacidade de perceber que apesar das variações de forma ou arranjo espacial, uma quantidade ou valor não varia se dele não se retira ou adiciona algo -, o egocentrismo regride e estas condições são substituídas por operações, as quais são ações interiorizadas, ou seja, conhecer o real agora significa pensar sobre ele. No tocante à descentralização – regressão do egocentrismo – a qual a criança passa durante as séries iniciais, CAVALCANTI (2005: 95) contribui com o exemplo do desenvolvimento da habilidade de orientação espacial que se dá “a partir das relações topológicas de proximidade, distância, ordem, continuidade e evolui com a habilidade de orientação corporal da criança”, ela passa a conseguir localizar objetos utilizando-se de pontos de referência externos a ela. A partir desse exemplo podemos verificar que durante seu desenvolvimento cognitivo e social, o aluno avança dentro de suas próprias 56 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 escalas, ou seja, ele amplia as suas noções espaciais sobre os ambientes nos quais vive. Quando falamos de Vygotsky e sua leitura sobre o desenvolvimento e a aprendizagem da criança, muda-se o ponto de vista. O autor aponta que a primeira fase que a criança passa no processo de formação dos conceitos é o sincretismo, momento no qual ela aglutina diversos objetos desiguais que não possuem nenhuma relação entre si. A segunda fase é chamada de pensamento por complexo, durante esse período os objetos que se encontravam isolados na mente da criança começam a associar-se devido às relações existentes entre eles; o autor continua, e afirma que, quando superado esse nível, já superou parcialmente seu egocentrismo e não confunde mais as relações entre suas próprias impressões com as relações entre as coisas. Vygotsky concebe a consciência como a “percepção da atividade da mente – a consciência de estar consciente” (VYGOTSKY) apud STRAFORINI (2009: 74), esse processo de consciência ocorre através da interiorização dos aparelhos culturais e do próprio comportamento. Ou seja, o processo de desenvolvimento de conceitos propriamente ditos proposto por Vygotsky não se dá de dentro – intrapessoal – para forainterpessoal, mas sim no movimento contrário, ou seja, de fora para dentro, ou ainda do interpessoal para o intrapessoal. Os Processos Psicológicos Superiores – PPS – se originam na vida social, quer dizer, na participação do sujeito em atividades compartilhadas com outros. Essa é a formulação central da Teoria Sócio Construtivista de Vygotsky (STRAFORINI 2001: 74). Em seu trabalho, CAVALCANTI (2005) trabalha com o processo de ensino-aprendizagem em uma perspectiva intitulada socioconstrutivista, a qual se aproxima muito da concepção construtivista abordada nos trabalhos de STRAFORINI (2001) e VYGOTSKY. Segundo a autora, nesse processo socioconstrutivista o sujeito – aluno – se relaciona com seus objetos de conhecimento sob a orientação do professor, o qual tem o papel de contribuir para que o sujeito construa seu conhecimento. Libâneo apud Cavalcanti (2005) define este processo da seguinte forma: 57 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 É sócio porque compreende a situação de ensino-aprendizagem como uma atividade conjunta, compartilhada, do professor e dos alunos, como uma relação social entre professor e alunos ante o saber escolar. É construtivista porque o aluno constrói, elabora, seus conhecimentos, seus métodos de estudo, sua afetividade, com a ajuda da cultura socialmente elaborada, com a ajuda do professor (1995, p. 6). Segundo Straforini (2001) os conceitos são “construções culturais internalizadas pelos indivíduos” durante seu processo de desenvolvimento e para que haja a definição de um conceito são necessários atributos determinados conforme as características dos elementos encontrados no mundo real e selecionados como importantes pelos grupos sociais. Um conceito importante desenvolvido por Vygotsky é o de Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP), definida por Straforini (2001:77) como “[...] a capacidade que a criança apresenta para desenvolver determinada atividade, resolver determinado problema com a ajuda de um adulto ou uma criança mais experiente [...]”; esse conceito valoriza a interação social no desenvolvimento psicológico humano. Quando se trata de crianças, a questão dos meios, das experiências e de seus resultados também englobam a escola, pois se trata de um dos principais lugares no qual a criança tem contato com pessoas que muito se diferenciam entre si, além de receber diversos estímulos que contribuem para o seu desenvolvimento cognitivo e social. Bronfenbrenner3 (1996) define desenvolvimento como “[...] uma mudança duradoura na maneira pela qual uma pessoa percebe e lida com o seu ambiente [...]” (1996: 5) e também como “[...] a concepção desenvolvente da pessoa do meio ambiente ecológico, e sua relação com ele, e também como a crescente capacidade da pessoa de descobrir, sustentar ou alterar suas 3 Urie Bronfenbrenner nasceu em 1917 em Moscou e ainda criança se mudou para os Estados Unidos, foi criado dentro da tradição judaica vivendo em um ambiente multicultural. Formou-se em Psicologia e Música na Universidade de Cornell. Deu início às formulações da Abordagem Ecológica na década de setenta. Em seu livro A Ecologia do Desenvolvimento Humano: Experimentos Naturais e Planejado, publicado em 1979 e traduzido para o português em 1996, o autor apresenta uma proposta ecológica do desenvolvimento, nesta, existem aspectos fundamentais os quais se diferenciam dos da psicologia clínica e científica realizada até então. A abordagem privilegia os aspectos saudáveis do desenvolvimento, os estudos realizados em ambientes naturais e a análise da participação da pessoa focalizada no maior número possível de ambientes e em contato com diferentes pessoas. 58 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 propriedades [...]” (1996: 9); ainda na mesma obra o autor define ambiente como sendo “[...] um local onde as pessoas podem facilmente interagir face a face – casa, creche, playground e assim por diante [...]” (1996: 19). Já quanto ao ambiente ecológico, Bronfenbrenner se refere a ele, topologicamente, como um arranjo de encaixe entre estruturas concêntricas, e a essas estruturas ele dá o nome de micro-, meso-, exo- e macrossistema; e é no nível mais interno – microssistema – onde está o ambiente imediato contendo a pessoa em desenvolvimento. Conforme o próprio autor delibera, “[…] no que se refere ao mundo externo, o que é apresentado aqui é uma teoria das interconexões ambientais e seu impacto sobras as forças que afetam o crescimento psicológico.” (1996: 9). Mas, ainda segundo Bronfenbrenner, a ênfase do seu trabalho não está nos “processos psicológicos tradicionais da percepção, motivação, pensamento e aprendizagem”, mas sim no seu conteúdo, ou seja, naquilo que é “percebido, desejado, temido, pensado ou adquirido como conhecimento”, e também de que forma o caráter desse material psicológico modifica conforme a exposição e interação de uma pessoa com o meio ambiente. Seu trabalho está fundamentado em quatro conceitos inter-relacionados: a pessoa, o processo, o contexto e o tempo, bem como a interdependência do ser humano com o meio ambiente no qual vive. Para entendermos como os sistemas (micro, meso, exo e macro) se relacionam entre si e com as pessoas, é preciso primeiramente fazer uma breve definição sobre cada um deles com base no que é mostrado na obra do autor: microssistema: um padrão de atividades e relações interpessoais experenciados pelo indivíduo em desenvolvimento em um determinado ambiente com atributos físicos e materiais específicos; mesossistema: engloba as inter-relações entre dois ou mais ambientes no quais a pessoa em desenvolvimento participa ativamente, é, portanto, um sistema de microssistemas e sua formação ou ampliação se dá sempre que a pessoa em desenvolvimento entra num novo ambiente; exossistema: um ou amais ambientes nos quais a pessoa em desenvolvimento não é um participante 59 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 ativo, mas cujas ações que neles existem afetam seu desenvolvimento; macrossistema: abrange os outros sistemas e também aqueles de valores e crenças que permeiam a existência das diversas culturas, e que são vivenciados e assimilados no decorrer do processo de desenvolvimento. Tendo as definições dos sistemas em vista podemos tratar da escala de forma que realizaremos uma aproximação entre a passagem da criança de um ambiente para o outro bem como de uma escala para a outra. Para adentrar na questão da escala tomaremos como base o trabalho de CASTRO (2000); neste a autora propõe uma análise da escala fora de uma concepção puramente matemática e inserida na questão da “representação dos diferentes modos de percepção e de concepção do real” (2000: 118). Ao citar GRATALOUP (1979) a autora traz uma definição para a escala geográfica: “[...] este autor define a escala geográfica como uma hierarquia de níveis de análise do espaço social, que pode ser concebido como um encaixamento de estruturas [...]” (CASTRO, 2000: 124), ao se falar em “encaixamento de estruturas” logo podemos associar esse conceito à ideia sistêmica defendida por Bronfenbrenner. Sabemos que, conforme a criança se desenvolve, suas noções de espaço se modificam e segundo Bronfenbrenner ela avança na passagem dos sistemas, saindo do microssistema e, aos poucos, atingindo os demais; esse mesmo fato também se dá quanto à sua noção de escala, já que ela passa a ter outras percepções do espaço em que se encontra conforme seu egocentrismo regride, ocorre o chamado salto de escala, ou seja, o sujeito sai de um sistema seguro, conhecido e vai para um novo, desconhecido, diferente, havendo uma ampliação da percepção sobre o ambiente e fazendo surgir novas experiências, é o mesmo que ocorre no processo chamado pro Bronfenbrenner de Transição Ecológica e definido por ele como algo que: […] ocorre sempre que a posição da pessoa no meio ambiente ecológico é alterada em resultado de uma mudança de papel, ambiente, ou ambos. A importância desenvolvimental das transições ecológicas deriva-se do fato de elas quase invariavelmente envolverem uma mudança de papel, isto é, das expectativas de comportamentos associados a determinadas posições na sociedade (1996: 7). 60 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Portanto, as mudanças nas ações e nas percepções da criança envolvem muito mais do que seu progresso nas séries escolares ou seu avanço na idade, envolvem também o modo como ela se relaciona com os outros indivíduos e o seu papel nos ambientes em que está inserida; isso porque, conforme seu egocentrismo regride e ela passa a notar outros espaços que vão além daqueles com os quais ela já está familiarizada, sua prática de observação, elaboração e compreensão do mundo avançam e ela consegue remodelar sua realidade conforme os requerimentos espaciais que vivencia. Considerações finais Como visto no trabalho, a alfabetização geográfica é de grande importância para que a criança desenvolva, desde as séries iniciais, suas potencialidades em ler e compreender o espaço vivido, durante essa ampliação das suas noções de espacialidade e tempo os meios nos quais ela está inserida também mudam, assim como o seu papel em cada um deles. As influências sociais vivenciadas por ela são fundamentais para a instauração dos conceitos que ela levará consigo. Apoiando-se nas teorias de Vygotsky – construtivista - e de Bronfenbrenner – ecologia do desenvolvimento humano – podemos fazer uma análise mais aprofundada de como esse desenvolvimento vivido pelo indivíduo abrange de forma tão plural a sua formação, o que significa que a criança tanto não desenvolve por si só, como cada uma delas não apreende os conceitos da mesma forma, o que ocorre são diferentes leituras, pois diferentes indivíduos constroem sua formação e seus conceitos conforme as experiências pelas quais passam e também conforme avançam em sua Transição Ecológica. Bibliografia BRONFENBRENNER, Urie. A Ecologia do Desenvolvimento Humano: experimentos naturais e planejados. Porto Alegre. Ed: Artes Médicas. 1996. CALLAI, Helena Copetti. Aprendendo a ler o mundo: a Geografia nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Cadernos Cedes, Campinas, São Paulo: vol. 25, n. 66, p. 227-247, Maio/Ago. 2005. 270 p. 61 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 CAMPOS, Beatriz M.; PEDON, Nelson R. Políticas curriculares para o ensino de Geografia nas séries iniciais. In: Anais do XXIV Congresso de Iniciação Científica/UNESP-Ourinhos, 2012. _________. Espaço e paisagem no ensino de geografia nas séries iniciais. In: Anais do XIV Encontro de Geógrafos da América Latina/UNESP-Ourinhos, 2013. CASTRO, I. E. de. O problema da escala. In: CASTRO, I. E. et alli. (org.) Geografia: Conceitos e Temas. 2 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000. CAVALCANTI, Lana de Souza. Geografia, escola e construção de conhecimentos. Ed. 7. São Paulo, Campinas: Papirus, 2005. STRAFORINI, Rafael. A totalidade mundo nas primeiras séries do ensino fundamental: um desafio a ser enfrentado. In: Terra Livre, n.18, Ano 18, vol. I. São Paulo, 2002a, p. 95 – 114. __________. Ensinar Geografia nas séries iniciais: da realidade à totalidade. In: XIII Encontro Nacional de Geógrafos, João Pessoa, 2002b. MARQUES, Valéria Maria. Alfabetização Geográfica: o ensino de Geografia nas séries iniciais do ensino fundamental. Dissertação de Mestrado. São Paulo PUC, 2009. KOLLER; Silvia; LISBOA, Carolina. O Microssistema Escolar e os Processos Proximais: Exemplos de Investigações Científicas e Intervenções Práticas. In: KOLLER, Silvia et. alli (org.) Ecologia do Desenvolvimento Humano: pesquisa e intervenção no Brasil. SP: Casa do Psicólogo, 2004. KOLLER; Silvia; NARVAZ, Martha Giudice. O Modelo Bioecológico do Desenvolvimento Humano. In: KOLLER, Silvia et. alli (org.) Ecologia do Desenvolvimento Humano: pesquisa e intervenção no Brasil. SP: Casa do Psicólogo, 2004. 62 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 SEMANA DA GEOGRAFIA 2013 “LIXO URBANO & SEU CONTEXTO” DA ETEC “JACINTO FERREIRA DE SÁ: RESULTADOS POSITIVOS NA PRÁTICA SOCIAL FINAL Willian da Silva Santos1 Márcia Mello2 Introdução Devido a sua abrangência, a Geografia Escolar tem por excelência compreender a complexidade das relações entre homem e meio natural no espaço geográfico e desenvolver a compreensão do papel do indivíduo na sociedade (BRASIL, 2000, p. 121), por isso, possui grande flexibilidade ao trabalhar multidisciplinarmente. Por vivermos numa sociedade onde o consumismo tem um lugar privilegiado, torna-se vital tratar dos resíduos gerados por essa prática: o descarte frenético de intermináveis tipos de materiais, e com eles, as interferências na qualidade de vida em geral, daqueles que consomem muito e daqueles que nada podem consumir. A terceira edição da Semana da Geografia na ETEC de Ourinhos “Jacinto Ferreira de Sá” em 2013, realizada entre 27 – 31 de maio, teve como tema gerador “O lixo urbano & seu contexto” e foi norteada por temas como o consumismo, urbanização e habitação, sustentabilidade e meio ambiente, condições de trabalho e paisagem. Destaca-se a importância social do trabalho de campo na Cooperativa de Catadores – RECICLA OURINHOS e seus resultados. A escolha do tema teve a proposta de aproveitar a vivência dos alunos em diferentes partes da cidade pelo que viam, pelos hábitos de reciclar ou não os materiais, seu consumo e sobre seu papel na sociedade, proposta essa, baseada em Paulo Freire (2001). 1 Graduando em Geografia pela Universidade Estadual Paulista – UNESP campus de Ourinhos. [email protected]. 2 Professora Doutora do curso de Geografia da Universidade Estadual Paulista – UNESP campus de Ourinhos. [email protected] 63 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Materiais e métodos As atividades da semana se destinaram a todos os alunos do ensino médio do período matutino e parcialmente aos alunos do vespertino, além da comunidade escolar em geral. Por meio de atividades realizadas com a colaboração dos grupos de extensão, ensino e pesquisa da UNESP- Campus de Ourinhos, pode-se destacar: Cine-debates, com o filme Lixo extraordinário, no qual discutiu-se a situação insalubre dos catadores de um aterro, a exclusão social, os impactos da urbanização e o reaproveitamento de descartes das mais variadas formas, além do curta A engrenagem do Instituto Nina Rosa, tratando dos atuais hábitos de consumo, das questões ambientais vigentes e proposta de novos paradigmas. Em parceria com o professor de Geografia da unidade escolar, atividades pertinentes ao tema também foram desenvolvidas por ele durante as aulas. No último dia do evento, foi proporcionado um trabalho de campo na Cooperativa de Catadores – Recicla Ourinhos com os alunos dos 1ºs A e B da escola, onde, puderam conhecer a realidade da diferença entre lixo e material reciclável, o destino de cada um, o movimento social dos catadores e a realidade muitas vezes invisível para muitos moradores de Ourinhos. Antes da realização do trabalho de campo, o levantamento dos conhecimentos iniciais dos alunos acerca do conteúdo estudado e a problematização foi o encargo dos estagiários e grupos da universidade para um bom resultado da atividade. Durante toda a realização do evento, um vídeo documentário foi elaborado pelos estagiários composto por entrevistas com alunos, com o professor da unidade, professora da disciplina de Estágio da universidade e com membros da Recicla Ourinhos com finalidade de divulgar o projeto, estreitar a relação entre a universidade e as escolas e expor os resultados obtidos. Resultados e discussão Os objetivos propostos no projeto da semana foram plenamente cumpridos. Pode-se afirmar que houve um despertar no senso crítico dos 64 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 estudantes acerca dos problemas ambientais e sociais causados pelo lixo em diversas escalas, uma reflexão sobre valores, atitudes e comportamentos dos alunos em relação ao lixo, além da rica discussão na aquisição de novos hábitos de consumo, descarte e reaproveitamento de materiais. Além destes, o resultado que mais se destacou foi o interesse dos alunos na colaboração com os catadores para além do momento do trabalho de campo. Ao explicar as contradições e falta de um incentivo efetivo por parte da prefeitura da cidade, os alunos independentemente elaboraram uma lista de e-mails e telefones junto à cooperativa, na tentativa de mover um abaixo assinado entre as escolas do município para expressarem suas indignações e fazer valer os benefícios para a cidade por meio do trabalho (mais valorizado) dos catadores, isso “sem nenhum estímulo” dos estagiários, ou seja, indiretamente a problematização gerou resultados. Este efeito, ilustra a prática social final, um momento do processo de aprendizagem elaborado por João Luiz Gasparin (2007), na qual uma nova postura do aluno perante o assunto apresentado é revelada. A atitude de se posicionarem politicamente frente a um problema que a partir desse momento tornou-se deles, revela uma preocupação com os indivíduos envolvidos e um cuidado com o meio ambiente. Pode-se concluir que a Semana de Geografia na ETEC em 2013 teve um saldo positivo na promoção de uma real educação ambiental na escola, de forma a auxiliar na formação de sujeitos multiplicadores do conhecimento adquirido. Referencias BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: História e Geografia. 2. Ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2000. DIAS, G. F. Atividades interdisciplinares de educação ambiental: práticas inovadoras de educação ambiental. 2.ed., apl. E atual. São Paulo: Gaia,2006. FREIRE. P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 20. Ed. São Paulo: Paz e Terra. 2001. 65 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 GASPARIN, J. L. Uma Didática para a Pedagogia histórico-crítica. Campinas: Autores associados, 2007. VARIOS. Coleção Entenda e aprenda: Como combater o desperdício. São Paulo: BEI Comunicação. 2004. VENTURINI, L. A. B. (org.) Geografia: práticas de campo, laboratório e sala de aula. Coleção praticando. São Paulo: Editora Sarandi. 2011. 66 ESPAÇOS DE DIÁLOGO Eixo 2 Epistemologia e história do pensamento geográfico IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 O TERRITÓRIO E OS TERRITÓRIOS: UM DEBATE FUNDAMENTAL PARA A CIÊNCIA GEOGRÁFICA BRASILEIRA DE NOSSO TEMPO Lucas Labigalini Fuini1 1 - Introdução, objetivos, metodologia O território aparece como um dos conceitos fundamentais da ciência geográfica, construindo o edifício dessa ciência desde que ela se constituiu em termos oficiais e institucionais, a partir do final do século XIX. Sendo conceito, ou seja, uma abstração a designar um conjunto de relações e processos, o território também apresentou no desenrolar da história do pensamento geográfico diferentes designações, conforme o contexto histórico ou o referencial filosófico e ideológico a tratá-lo. Mais recentemente, a ciência geográfica retoma com ímpeto o emprego desse conceito para a análise da realidade geográfica, obliterando inclusive, outros conceitos fundamentais, como região e espaço geográfico. A ciência geográfica brasileira também passa a se situar nesse debate com mais força a partir de meados dos anos 1990, atendendo ao prenúncio do geógrafo Milton Santos a tratar do “retorno do território”, ou do território usado, como ele mesmo definia (SANTOS, 2002). O “território usado são os objetos e ações, sinônimo de espaço humano e espaço habitado” (SANTOS, 2002, p. 16), onde se encontram as horizontalidades (lugares vizinhos, continuidade territorial, espaço banal) e as verticalidades (pontos distantes uns dos outros ligados por formas de processos sociais, redes). Posteriormente, outros geógrafos se inseriram nesse debate e voltaram seus olhares ao conceito, com especial atenção para as novas qualidades que assumia com o processo de globalização e mundialização da economia e os movimentos de reestruturação produtiva do território. Assim, aparecem com 1 Professor Assistente Doutor do Curso de Geografia da Univ. Estadual Paulista/Unesp, Campus de Ourinhos. É coordenador do projeto regular de pesquisa FAPESP (2011/20203-8), integrante do Grupo de Pesquisa/CNPq sobre Processos e Dinâmicas territoriais (DITER) e coordenador do Laboratório de Geografia Humana. Email: [email protected]. 68 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 força também outras duas especificidades do território: seu conteúdo, ou as territorialidades e, sua ação ou movimento, as territorializações e desterritorializações. Em suma, o território é o recorte espacial definido por relações de apropriação, poder e de controle sobre recursos e fluxos baseado em aspectos políticos, econômicos e culturais (HAESBAERT, 2006; SAQUET, 2007; SPÓSITO, 2004). O território contém formas diversas de apreensão e de manifestação individual e coletiva de um Estado, grupo cultural, classe social ou atividade econômica. Isso é chamado por territorialidade, ou seja, o próprio conteúdo do território, suas relações sociais cotidianas que dão sentido, valor e função aos objetos espaciais. Essas territorialidades são associadas aos diferentes tipos de usos do território. Já a territorialização seria o movimento de se constituir referenciais simbólicos e identitários (materiais e imateriais) junto a um recorte espacial definido, dotando-o de unidade. Poderia ser também chamada de enraizamento territorial, vinculando populações, empresas e instituições de governo ao território. Portanto, esse artigo tem por objetivo realizar uma primeira aproximação teórica para entender como o discurso científico contemporâneo da Geografia brasileira tem analisado o conceito de território, revelando-lhe novos valores. Para tal tarefa, usaremos de metodologia de pesquisa de revisão bibliográfica e análise de discursos que nos trazem determinadas intenções e sentidos. Destacamos também que outro objetivo de nossa análise é qualificar os atuais discursos sobre o território, as territorialidades e a territorialização na ciência geográfica em nosso país, admitindo, nesse sentido, que se trata de um nível ainda preliminar de investigação. 2 - Discussão e Resultados 2.1 - O conceito de território O território, como conceito fundamental da análise geográfica, é definido por Johnston (1994, apud, SPÓSITO, 2004), como a porção do espaço ocupado pela pessoa, grupo ou Estado, ou como um espaço social definido, 69 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 ocupado e utilizado por diferentes grupos sociais como consequência de sua prática de territorialidade ou o campo de forças exercitado sobre o espaço pelas instituições dominantes. O território pode também ser entendido como o nome político para o espaço de um país, sendo indissociável da ideia de Estado. Além disso, o território é também qualificado pelos seus diferentes usos, ou seja, pela implantação de infraestruturas (sistemas de engenharia) e pelo dinamismo da economia e da sociedade, abarcando os movimentos de população, distribuição da agricultura, indústria e dos serviços, o arcabouço normativo, incluídas a legislação civil, fiscal e financeira, além do alcance e extensão da cidadania (SANTOS; SILVEIRA, 2010). Santos (1992) ressalta a importância de se reconhecer o território como uma unidade espacial de trabalho, considerando o exemplo da região produtiva. Desse modo, o território é visto uma unidade espacial constituída por frações funcionais diversas, que funcionam a partir de demandas a vários níveis, do local até o mundial. A articulação entre essas frações se dá por meio de fluxos criados e mantidos pelas atividades, população e herança espacial. A análise do território deve se pautar, então, pela consideração da estrutura interna de cada fração e as interações entre elas, à luz da ideia de que o território pode abarcar o espaço de produção propriamente dito, o espaço de circulação e distribuição e os espaços de consumo. A questão das escalas de análise do território – o global, o supranacional (blocos regionais), o nacional, o regional, o local – é dado considerado importante na análise espacial, pois o conjunto do processo produtivo dota os diversos lugares de valores diferenciados, de acordo com suas virtualidades e potencialidades, e a profundidade e abrangência da interpenetração dos lugares é que define, por último, o alcance espacial dos processos territoriais em análise. Mas o valor e o uso de cada fração escalar do território sofre alterações a partir, sobretudo, do último quarto do século XX, quando se colocam importantes mudanças nas condições de produção, competição e 70 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 interdependência espacial e na própria forma de regulação política do território2. Segundo Santos (1996), o território atua como a mediação entre o mundo e a sociedade local e nacional, recebendo as possibilidades e virtualidades do global conforme suas oportunidades. Assim se constroem territórios locais como normas, constituídas pelo conjunto de elementos inerentes ao espaço (homens, empresas, instituições, formas sociais e jurídicas e formas geográficas), em contraponto às normas globais desterritorializadas. As normas criadas nos lugares atuam para atender às exigências dos capitais em busca de maior rentabilidade e competitividade territorial aos seus investimentos. Essa produtividade espacial é dada pela capacidade dos lugares em se distinguir conforme suas condições locais de ordem técnica e ordem organizacional, sendo esta última referente às leis, impostos, relações trabalhistas e condições laborais presentes nos lugares. A busca das empresas pelas melhores localizações e dos lugares pelas implantações cria aquilo que é definido como guerra entre lugares, movimento que vai além da guerra fiscal strictu sensu (SANTOS , 1996)3. Definindo o território, sobretudo, como um espaço de referência para construção de identidades (território simbólico), Haesbaert (2006) salienta que existem três grandes noções ou concepções envoltas na discussão sobre o território, evidenciadas no quadro esquemático abaixo: 2 Segundo Benko (2001, p. 2), a ordem que substitui aquela é uma ordem global difusa na qual as relações entre os estados diluem-se, em certa medida, ao proveito das conexões entre economias regionais afastadas, ligadas por intercâmbios complexos feitos de competição e colaboração. (...) Assiste-se, por um lado, a um movimento de internacionalização da atividade econômica em um mundo cada vez mais destituído de fronteiras reais, a tal ponto que não hesitam em aventar também a hipótese de um eminente desaparecimento do Estado soberano clássico, fundado sobre a noção de território, um dos três elementos constitutivos do Estado em direito internacional, ao lado do governo e da população, por outro lado, sublinha-se a intensificação do crescimento econômico de certo número de regiões, reconhecidas como os motores da prosperidade mundial, e que dão origem a uma recomposição da hierarquia dos espaços produtivos (...). 3 Segundo Santos; Silveira (2010, p. 296-297), "os fundamentos da guerra de lugares podem ser tanto locais quanto regionais, nacionais ou mundiais. Neste último caso, tratar-se-á de uma guerra global dos lugares, quando uma localidade, em um país ou continente, disputa a mesma atividade ou empresa frente a outro país ou continente; mas pode ser examinada pela ótica da empresa, quando esta acolhe o lugar para se instalar e negocia a introdução, nesse lugar, de condições ainda não existentes e cuja presença fará dele um espaço ainda mais atrativo". 71 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Quadro 1 - Vertentes básicas atuais da discussão sobre território Vertente básica Concepção Política ou jurídica-política Traz a ideia de espaço-poder ou espaço-poder institucionalizado. O território é visto como um espaço delimitado e controlado através do qual se exerce determinado poder, na maioria das vezes relacionado ao poder político do Estado. Prioriza a dimensão simbólica e mais subjetiva, em que o território é visto como produto da apropriação/valorização simbólica de um grupo em relação ao espaço vivido. Enfatiza a dimensão espacial das relações econômicas, colocando o território como fonte de recursos e/ou incorporado no embate entre classes sociais e na relação capital-trabalho, como produto da divisão territorial do trabalho. Cultural ou simbólico-cultural Econômica Fonte: Haesbaert, 2006. Storper; Walker (1989) pontuam que a noção de território é mais apropriada para se tratar das dinâmicas espaciais da industrialização capitalista atual, pois o território aborda fenômenos em qualquer escala geográfica a partir de processos de construção e reconstrução social, ao passo que a região, comumente, enfoca espaços delimitados no nível subnacional. Gilly; Pecqueur (1997) complementam essa ideia colocando que o território não pode ser tratado como um simples espaço dotado de recursos, mas sim como um modo de estabelecimento de um grupo social, considerando a organização de suas atividades e as relações de comunicação/linguagem e aprendizado que estabelecem como o meio. Assim, o território deixa de ser apenas uma base ou fonte de recursos mercantis, passando a ser evidenciado como uma instância de regulação social e política, um ator. 2.2 - As territorialidades Para Spósito (2004), a territorialidade representa o território do indivíduo, seu espaço relacional, horizonte geográfico e limite para a vivência e apreensão da realidade. “A territorialidade pertence ao mundo dos sentidos e, 72 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 portanto, da cultura e das interações cuja referência básica é a pessoa e sua capacidade de se localizar e deslocar” (SPÓSITO, 2004, p. 113). Haesbaert (2002) se apoia em Sack (1986) para definir a territorialidade como a tentativa, por um indivíduo ou grupo, de atingir, influenciar ou controlar pessoas, fenômenos e relacionamentos, através da delimitação e afirmação de controle sobre uma área geográfica, valorizando-se a ideia de acessibilidade. Saquet (2007) complementa o debate ao pontuar que a territorialidade apreende os aspectos imateriais da constituição múltipla do território no real, dividindo-se em territorialidades culturais (folclóricas), políticas (do Estado, de partidos e de bairros) e econômicas (centradas na criação de reprodução do capitalismo). Santos; Silveira (2010) atribuem à palavra territorialidade a ideia de pertencimento que faz associar as ações de vivência e reprodução dos homens com as estratégias do Estado. Haesbaert (2006) reivindica o uso da noção de “multiterritorialidade” à dinâmica combinada de múltiplos territórios em termos de justaposição e convivência da diversidade territorial representada pelas dimensões sociais, escalas e dinâmicas. Essas dinâmicas se desdobram num continuum que vai do caráter mais concreto ao mais simbólico, sem que um esteja dicotomicamente separado do outro. No caso de um indivíduo ou grupo social mais coeso, podemos dizer que eles constroem seus (multi) territórios integrando, de alguma forma, num mesmo conjunto, sua experiência cultural, econômica e política em relação ao espaço (HAESBAERT, 2006, p. 341). Poderíamos tratar então de territorialidade associada a grupos sociais, eventos culturais e religiosos, intervenções públicas, investimentos privados etc. A territorialidade se expressa em espaços e tempos distintos e, às vezes, simultâneos, como é o caso dos centros urbanos, com as territorialidades do comércio entrecruzadas pelas territorialidades das tribos urbanas, do trânsito, das igrejas, enfim, com a justaposição de territorialidades sagradas e profanas. Até mesmo podemos tratar de territorialidades cíclicas, com o uso de espaços urbanos pela atividade empresarial durante o dia e, à noite, pela prostituição e por usuários de drogas, por exemplo. 73 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Entendemos com isso que a territorialidade é definida por eventos que dão conteúdo a mesma e que estão relacionados com o tempo e o espaço, com o presente e o passado. Santos (1996) define o evento como um vetor das possibilidades existentes no mundo, mais precisamente em uma formação social, tratada como um país, uma região ou um lugar. Mas o lugar seria o depositário final e obrigatório de um evento. Os eventos são sempre novidades, realidades do presente e podem ser naturais, sociais ou históricos. Além disso, não há evento sem sujeitos e atores, portanto, os eventos envolvem um conjunto de ações em conflito. Desse modo, se as territorialidades expressam os dinamismos que ocorrem nos territórios, envolvendo expressões, sensações, sentimentos e simbolismos, os eventos são as ações que dão sentido às práticas territoriais, posto que se há ator, há interesses e, se há interesse, há uma ação e, se as ações são múltiplas e se interrelacionam, cria-se um evento e, se o evento modifica as organizações espaciais anteriores, desfaz ou suprime identidades pretéritas e define novas identidades. Essas identidades se associam às formas, funções, configurações e processos sociais e espaciais que se reúnem e se tornam concretos em determinados territórios, com suas paisagens e lugares. Eventos também se manifestam em diferentes escalas e tais escalas são definidas não somente por suas dimensões espaciais e distâncias geográficas, mas, sobretudo, pelo critério interpretativo de se considerar um fenômeno social, econômico e cultural em sua intensidade, expressão e localização e, por estes esquemas interpretativos, como um modo de se apreender um evento espacial em sua natureza e representatividade. Mais recentemente surge outra linha de análise territorial, também preocupada com os modos de apropriação simbólicos e culturais, definida pelas “microterritorialidades”. Segundo Fortuna (2012), a microterritorialidade seria uma modalidade de socialização articulada a valores, subjetividades e afetos, reconhecendo formas de organização social não-institucionais e transformações radicais de valores e estilos de vida. A microterritorialidade 74 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 pode também ser abordada como uma escala interpretativa dos eventos motivadores de ações territoriais, sendo notada de forma mais concreta através dos estilos de vida urbanos e suas manifestações coletivas e individuais. 2.3 – Desterritorialização, reterritorialização e redes geográficas A territorialização é definida pelo movimento de enraizamento e introversão em territórios específicos, com constituição de identidades regionais e qualificação simbólica e funcional que define a estabilidade relativa de um território para comunidade, tribos e nações. A desterritorialização, em seu oposto, representa a extroversão e desenraizamento de povos, atividades sociais e econômicas e comunidades de seus territórios, correspondendo à perda de identidades e do enraizamento. A reterritorialização, por sua vez, compreende o movimento de reconstrução e retomada de laços de identidade e inserção territorial sob novas bases de qualificação. Diante desse quadro (T-D-R), a territorialização e desterritorialização dos atores sociais, na atualidade, passa necessariamente pela influência dos elementos da globalização e dos fluxos técnico-científico-informacionais. As configurações espaciais possíveis para esses movimentos envolvem a configuração de redes e os aglomerados. As redes são definidas pela conexão e ligação que está na base de fluxos de mercadorias e de informações. Segundo Dias (2006), os nós das redes são lugares de conexão, lugares de poder e de referência, solidarizando os elementos espaciais. Os fluxos de informação, na atualidade, são decisivos na constituição de movimentos materiais e imateriais e na articulação de objetos e ações em rede. Santos (1996) compreende que as redes são infraestruturas com fluidez de comunicação e interrelações sociais, não sendo mais apenas territoriais, pois envolvem a participação de objetos técnicos, como computadores e telecomunicação. As redes são responsáveis hoje pela divisão do trabalho e operam de maneira dialética, por dois motivos:a) Estabelecem a relação entre os territórios nos níveis mundial, nacional e local, conectando a sociedade local que executa 75 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 o trabalho propriamente dito, com o território nacional, que realiza o trabalho político, com suas leis, incentivos e planos, e o nível global, que demanda trabalho e realiza investimentos produtivos ou especulativos; b) A necessidade de fluidez sócio-técnica através da intensificação da circulação interagindo com as novas formas de organização que geram simultaneamente, em perspectiva geográfica, ordem e desordem, organização e desorganização. Na escala global e nacional, a redes organizam o espaço de atuação das grandes corporações, buscando reduzir o tempo de circulação entre escalas; já em escala local, as redes geram desordem, pois, buscam a desregulamentação e o ajuste das leis locais aos organismos internacionais, criando problemas de exclusão social e marginalização vistos, de forma mais densa, em centros e aglomerados urbanos. No entanto, apesar da crença generalizada no fim dos territórios e regiões devido à homogeneização e indiferenciação espacial, ocorre o contrário, a comunicação através de novas redes se pauta na seletividade espacial e na importância estratégia da localização geográfica (DIAS, 2006). O que está a ocorrer atualmente e em virtude da organização espacial em rede, é a sucessão cada vez mais rápida de movimentos de territorialização, desterritorialização e de reterritorialização, tanto do capital em movimento quanto das sociedades locais e regionais. Haesbaert (2006) enfatiza que a produção do espaço envolve, concomitantemente, a desterritorialização e a reterritorialização. O sentido de desterritorialização está atrelado tanto à superação de barreiras de distâncias físicas quanto à mobilidade da sociedade e das finanças e, essa superação, têm como elementos de condução as redes de transportes e de informações e comunicações. Por outro lado, traz também o sentido de desenraizamento pela perda de fronteiras políticas e destruição de referenciais de apropriação simbólico-culturais. Desterritorializar indica perder a conexão entre territórios no sentido político e cultural, processo este provocado por elementos e processos de cunho econômico e político. 76 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Entendemos desaparecimento que a desterritorialização significa de territórios e mais a mobilidade entre menos o territórios (Multiterritorialização), a capacidade atual que as tecnologias de difusão de informações e comunicações dão ao capitalismo para estar localizado em vários lugares e neles buscar formas de fixação nos âmbitos local e regional, ao mesmo tempo que também requer mobilidade e poucas amarras fronteiriças para operar nos âmbitos nacional e global. Trata-se, então, mais de uma multiterritorialização do que de uma desterritorialização. Portanto, a reterritorialização tem o sentido de reconstrução dos aspectos políticos e culturais definidores das dimensões sociais fundamentais do território, dimensões que envolvem as relações e sentimentos de identidade, enraizamento e controle. Assim, ressurgem os limites, fronteiras e as relações horizontais de produção local entre cidades, meios rurais e pessoas. Os efeitos perversos da territorialização contemplam práticas sociais e espaciais segregacionistas, o conservadorismo político, social e cultural e o fechamento dos territórios ao seu entorno exterior. A rede, portanto, seria uma marca de desterritorialização, ou daquilo que faz a mediação entre a organização e desorganização, destruição e reconstrução, a ordem e a desordem. As redes geralmente estão muito associadas aos circuitos de fluidez do capital internacional, portanto, seriam logo associadas à desterritorialização. No entanto, se envolvem também em outras escalas e tempos passados ou futuros em uma perspectiva reterritorializante. Coloca-se, portanto, a necessidade de se diferenciar, segundo Randolph (1993, apud HAESBAERT, 2006), as redes estratégicas técnico-funcionais, de lógica de ação global e mais desterritorializadas; das redes sociais de solidariedade, com caráter reterritorializador e mais ligadas à lógica de ação local. Atuam sobre os territórios, simultaneamente, um tipo de ação vertical, baseada na modernização e distribuição de produtos e créditos para os lugares através de redes articuladas pelo grande capital, pautadas em uma solidariedade organizacional. E opera também uma lógica de ação horizontal, a 77 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 partir de ações localmente constituídas, permitindo a ampliação da coesão da sociedade civil a serviço do interesse coletivo, construindo um cotidiano homólogo consubstanciado em uma solidariedade ativa e maior eficácia política (SANTOS, 1996; HAESBAERT, 2006). Segundo Haesbaert (1999), uma das marcas centrais do movimento de desterritorialização moderno e globalizado seria a produção de aglomerados, símbolos da chamada “desterritorialização extrema” e “precária”, que nos trazem a perspectiva de uma massa disfuncional sem identidade e espacialmente definida por um ponto, linha ou superfície. Haesbaert (2006) e Haesbaert; Ramos (2004), quando realizou sua fundamental reflexão sobre a desterritorialização do capital e da população e cunhou a relação entre redes e aglomerados, dá enfoque aos conjuntos populacionais em situações de exclusão social e marginalização econômica. Ao sistematizar uma tipologia para aglomerados, aparecem três tipos centrais: aglomerados radicais, marcados pelas condições de vida precárias e extremas, como os refugiados e deslocados em áreas de países pobres; aglomerados tradicionais, vivendo em situações endêmicas de exclusão e fome (Ex.: sertão nordestino brasileiro); e os aglomerados transitórios ou conjunturais, geralmente de caráter ilegal ou clandestino e marcados pela violência e medo (Ex.: favelas dominadas pelo narcotráfico). 3 - Considerações finais Para Santos (2002), o retorno do território, como noção importante para a análise social, se dá como superação do conceito herdado da modernidade que limitava o território como fundamento do Estado-nação, que o moldava. Assim, com a transnacionalização do território, criam-se novas sinergias e novos vetores de funcionamento do território, como as perspectivas dialéticas que colocam lado a lado as horizontalidades e verticalidades, os lugares contíguos e os lugares em rede, o acontecer homólogo e o acontecer hierárquico, as normas locais e as normas globais. Trata-se, na verdade, de diferentes formas de entendimento da relação entre objetos e ações que definem o espaço humano ou habitado em contexto 78 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 de intercâmbios crescentes e uma integração entre ciência, tecnologia e informação cada vez mais especializadas. Desse modo, consideramos relevante retornar à análise dos discursos produzidos até então sobre o conceito de território e que já pode ser considerado um corpo denso de produção que se coloca à disposição da ciência geográfica brasileira desde fins dos anos 1990, sobretudo. Consideramos que há duas leituras significativas dessa apreensão renovada do “território”: sobre as “territorialidades” e a “territorialização”, não negando outras possíveis compreensões. E nessa leitura inicial, identificamos que a relação entre territorialidade e identidades (e eventos) e territorialização e redes se colocam hoje como importantes paradigmas da leitura geográfica sobre os processos e eventos que marcam nosso tempo, em termos políticos, econômicos e culturais4. Referências BENKO, G. A recomposição dos espaços. Revista Internacional de Desenvolvimento Local - Interações, Universidade Católica Dom Bosco/MS, v. 1, n. 2, p. 7-12, março de 2001. DIAS, L. C. Redes: Emergência e organização. In: CASTRO, I. E., et. al., Geografia: Conceitos e temas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006. FORTUNA, C. (Micro)territorialidades: Metáfora dissidente do social. Terra Plural, Ponta Grossa/PR, UFPG, v.6, n.2, p. 199-214, jul./dez. 2012. GILLY, J.P.; PECQUEUR, B. La dimensión local de la regulación. In: BOYER, R.; SAILLARD, Y. (org.), Teoría de la regulación: Estado de los conocimientos. Volume II. Argentina: Oficina de Publicaciones da CBC, 1997, p. 115-124. HAESBAERT, R. O mito da desterritorialização: Do “fim dos territórios” à multiterritorialidade. 2a. ed., Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006. HAESBAERT, R. Territórios alternativos. SP/RJ: Contexto e EdUFF, 2002. 4 Esse ensaio teórico é também resultado de reflexões que temos feito no âmbito da disciplina “Região, Espaço e Território” do curso de graduação em Geografia da Unesp-Ourinhos. 79 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 HAESBAERT, R. A desterritorialização: Entre as redes e os aglomerados de exclusão. In: CASTRO, I. E., et al., Geografia: Conceitos e temas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1999, p. 165-206. HAESBAERT, R.; RAMOS, M. T. O mito da desterritorialização econômica. Geographia, ano 6, n. 12, p. 25-48, 2004. SANTOS, M. O retorno do território. In: SANTOS, M.; SOUZA, M. A. A.; SILVEIRA, M. L., Território: Globalização e fragmentação. 5ª. Ed., São Paulo: Hucitec/Anpur, 2002. SANTOS, M. A natureza do espaço: Técnica e tempo, razão e emoção. São Paulo: Hucitec, 1996. SANTOS, M. Espaço e método. 3ª. Ed. SP: Nobel, 1992. SANTOS, M.; SILVEIRA, M. L. O Brasil: Território e sociedade no início do século XXI. 10 a. ed., São Paulo/Rio de Janeiro: Record, 2010. SAQUET, M. A. Abordagens e concepções de território. São Paulo: Expressão Popular, 2007. STORPER, M.; WALKER, R. The Capitalist Imperative: Territory, Technology and Industrial Growth. New York: Basil Blackwell, 1989. SPÓSITO, E. S. Geografia e Filosofia: Contribuições para o ensino do pensamento geográfico. São Paulo: Edunesp, 2004. 80 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 O PODER NA GEOGRAFIA: RUPTURA ATRAVÉS DE KROPOTKIN E FOUCAULT Gabriel Fernandes Rios Juliana Lopes Dos Santos Introdução O texto O que a Geografia deve ser escrito pelo anarquista e geógrafo Piotr Kroptkin, no final do século XIX, no qual ainda havia um cenário de nacionalismos e disputas entre países europeus por terra e que, segundo o autor, refletia até mesmo no ensino. Kropotkin não acreditava no ensino em serviço ao Estado e aos interesses colonialistas. Criticando, nesse sentido, o tipo de geografia que era ensinado nas escolas e a sua perspectiva nacionalista, preconceituosa – nesse caso, qualquer tipo de racismo ou de discriminação por etnias ou “raças” – relacionando a humanidade com o seu meio ambiente de forma harmônica. Assim, o ensino não deve ser apenas discursivo, mas também relacionando com trabalhos de campo e observação da realidade. Nada interessa tanto às crianças como as viagens; e nada é mais árido e menos atrativo, em muitas escolas, do que aquilo que nelas é batizado com o nome de geografia. O mesmo podemos dizer, quase que com as mesmas palavras e com raras exceções, em relação à física, à química, à botânica, à geologia, à história e às matemáticas. Uma reforma em profundidade no ensino de todas as ciências e tão necessária quanto uma reforma na educação geográfica. (KROPOTKIN, 2011, p. 35) Para ele, até aquele momento a natureza e a sociedade são retratadas como componentes fragmentados, sem relações, no entanto “as crianças não são verdadeiras admiradoras da natureza enquanto esta não tiver alguma ligação com o homem” (2011, p. 36). Isso porque a criança tem maior interesse pelas atividades humanas, seus dramas, etc. Assim, “a melhor maneira de suscitar-lhe o desejo de estudar a natureza é pelos relatos de pescadores e caçadores, de navegantes, de enfrentamentos com os perigos, de costumes e hábitos, de tradições e migrações”, (2011, 36) e utilizando a contribuição da imaginação da criança para o raciocínio científico. 81 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Pode-se dizer que a Geografia proposta pelo anarquista Kropotkin tem uma relação com o poder segundo Michel Foucault, afinal, o ensino deve ser uma forma de criar um indivíduo pensante e crítico e não um instrumento de dominação e de manipulação pensada do corpo, de seus elementos, de seus gestos e de seus comportamentos, ou seja, há no ensino de Geografia tradicional a necessidade de disciplina na qual há fabricação de corpos submissos e “corpos dóceis” (FOUCAULT, 2002). Nesse sentido, o corpo se torna útil tanto quanto obediente – o objetivo de Kropotkin é subverter tal relação de poder. Tais relações de poder e disciplina, na análise de Foucault, podem nascer em espaços diferentes, como uma fábrica ou uma penitenciária e o mesmo pode-se repetir nas escolas, na qual há o isolamento dos discentes, mas também há fácil localização, e uma boa articulação para essa distribuição para a aplicação de controle. Bem como há o controle da atividade – descrito por Foucault – que se refere às quatro formas de controle das atividades dos indivíduos, são elas: o horário, no qual há “controle ininterrupto, pressões fiscais, anulação de tudo o que possa perturbar e distrair” (2002, p.128), ou seja, constituição de tempo integralmente útil; a elaboração temporal do ato, cada movimento é obrigado a seguir um caminho pré-determinado, ajustando o corpo a imperativos sociais; em terceiro lugar são donde o corpo e o gesto são postos em correlação, no qual “um corpo bem disciplinado [que] é a base de um gesto eficiente” (2002, p. 130); e a articulação corpo-objeto. A Geografia tradicional, tal como a escola, busca exercer tal relação de poder tornando o corpo mais submisso através de tais pressões, como os horários rígidos. A disciplina deve, então, construir uma máquina cujo efeito será aumentar ao máximo através da articulação combinada de suas peças principais, na qual há três formas de obtenção, são elas: o corpo vira capaz de articular e mover com outros; o tempo de uns deve se moldar ao tempo dos outros para maior extração de força e combinar com um melhor resultado; e, finalmente, “toda a atividade do indivíduo disciplinar deve ser repartida e 82 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 sustentada por injunções cuja eficiência repousa na brevidade e na clareza” (2002, p. 159). Em contrapartida, Kropotkin afirma que a tarefa da ciência geográfica na primeira infância é de tomar “a humanidade como intermediária, desenvolver nas crianças o interesse pelos grandes fenômenos da natureza, despertar seu desejo de conhecê-los e explicá-los” (2011, p. 38), e não simplesmente ser um objeto de fácil manipulação a serviço do Estado, sempre correspondendo suas expectativas e anseios. Já em um segundo momento da função da Geografia, Kropotkin critica o nacionalismo exacerbado das sociedades europeias em fase expansionista e cita que ela deve ter um caráter de irmandade, ou seja, deve ser “um meio para anular esses ódios ou estereótipos e construir outros sentimentos mais dignos e humanos” (2011, p. 38), anulando, também, os segmentos da sociedade, as divisões que existem dentro da sociedade, demonstrando como cada nacionalidade é essencial para o desenvolvimento geral da sociedade. A terceira função da Geografia, segundo ele, é de demonstrar que não existe “raça inferior” – esse caso volta à questão da colonização de sociedades asiáticas e africanas, que eram ditas como inferiores às europeias. Contudo, é necessário oferecer uma ciência melhor, que abrange o conhecimento das forças da natureza, a ciência moderna em prol de um mundo melhor e mais justo. Ou seja, O ensino de Geografia deve, pois perseguir um triplo objetivo: despertar em nossas crianças o gosto por todas as ciências naturais; precisa ensinar-lhes que todos os homens são irmãos, seja qual for a sua nacionalidade; e deve ensiná-las a respeitar as “raças inferiores”. Assim entendida, a reforma da educação geográfica é imensa: é nada menos que uma reforma de todo o sistema de educação seguido em nossas escolas (KROPOTKIN, 2011, p 41-42). Objetivo O presente trabalho tem os seguintes objetivos: Em um primeiro momento analisar a obra O que a Geografia deve ser, escrita por Kropotkin e o poder segundo Foucault; 83 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 A posteriori, traçar uma relação da ruptura do ensino de Geografia enquanto instrumento de poder. Consideração Final Através das análises de Foucault e Kropotkin percebe-se que está presente a preocupação sobre como o poder é imposto e exercido de diferentes formas e em diferentes espaços, inclusive no ambiente escolar, disfarçado de boa intenção no objetivo de auxiliar no processo de ensinoaprendizagem. Além disso, como Kropotkin descreve, a pedagogia deve ser renovada, ao passo que possibilita o educando a pensar por si só, não destruindo sua originalidade e criatividade, mas também possibilidade essa relação entre educador e educando de respeito e companheirismo, rompendo com as práticas autoritárias dentro da ação docente. Referências FOUCAULT, M. Vigiar e Punir – Nascimento da prisão. Vozes, 2005. KROPOTKIN, Piotr. O que a Geografia deve ser. In: Escritos sobre educação e geografia. Biblioteca Terra Livre, 2011, pp. 33-72. 84 ESPAÇOS DE DIÁLOGO Eixo 3 Geografia ambiente física e meio IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 IDENTIFICAÇÃO DE MATÉRIA ORGÂNICA NA AREIA DESTINADA À CONSTRUÇÃO CIVIL: POSSÍVEL COMPROMETIMENTO DA QUALIDADE DO MATERIAL Angélica Scheffer da Motta Abrantes1 Maria Cristina Perusi2 Jakson José Ferreira3 1 - Introdução O solo é constituído de um sistema composto pôr três fases: líquida, sólida e gasosa. A fase sólida é formada por material orgânico e mineral. A porção mineral consiste de partículas de vários tamanhos, resultantes da decomposição química e desagregação física das rochas que o originaram. A fração orgânica tem sua origem no acúmulo dos resíduos vegetais e animais, a qual ocorre nos solos em diferentes estágios de decomposição, além de contar também com organismos vivos e em atividade (KIEHL, 1979). Os componentes orgânicos, de maior interesse neste trabalho, têm como fonte principal os tecidos vegetais. Os animais constituem uma fonte secundária de matéria orgânica, de maneira geral, por se alimentarem das plantas, sua maior contribuição vem de seus excrementos, como também da incorporação de suas carcaças ao solo. Ambos os resíduos, vegetais e animais, serão alvos de microorganismos, tais como fungos e bactérias, os quais habitam o solo e atuam na decomposição da matéria orgânica. Outros animais, como por exemplo, minhocas e formigas, exercem também um papel importante, além das já citadas, quanto ao transporte dos resíduos orgânicos (KIEHL, 1979). A natureza e a quantidade destes componentes no solo estão diretamente ligadas a outros fatores: tipo de vegetação, topografia, propriedades do solo, tempo e clima da região, e a sua presença é sinal de boa fertilidade. Guerra (1990) adiciona a estes fatores a drenagem e o uso da terra. 1 Discente do curso de Geografia, UNESP/Câmpus de Ourinhos. [email protected]. 2 Professora do curso de Geografia, UNESP/Câmpus de Ourinhos. [email protected]. 3 Técnico do Laboratório de Geologia, Pedologia e Geomorfologia, UNESP/ Câmpus de Ourinhos. [email protected] 86 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Sendo assim, “o acúmulo ou a destruição sofrem o efeito da atividade dos microorganismos, os quais são afetados pelas condições de umidade, temperatura e reação do meio (pH), além do indispensável suprimento de nutrientes e de fontes energéticas” (KIEHL,1979, p. 230). Desta forma: Todo resíduo vegetal ou animal que se forme no solo ou a ele seja incorporado recebe a denominação genérica de matéria orgânica (...). Quando a matéria orgânica, por decomposição biológica, atinge uma forma mais resistente a novas transformações e aos ataques dos microorganismos, adquirindo propriedades peculiares, recebe a denominação de húmus. Portanto, nem toda matéria orgânica é considerada húmus, enquanto que todo húmus é matéria orgânica (KIEHL, 1979, p. 24). Para Guerra (1990, p. 44) “como uma regra geral, os constituintes minerais do solo são essenciais na formação de húmus, porque os efeitos químicos do húmus podem reagir com as substâncias minerais para formar o chamado complexo argila-húmus”, ou seja, esta matéria orgânica humificada, juntamente com a fração de argila, recebe a denominação de complexo coloidal do solo. Em geral, de acordo com Craswell e Lefroy (2001, p. 3): A função mais importante da matéria orgânica é a reserva de nitrogênio e outros nutrientes necessários para o crescimento das plantas e, por conseqüência, para a população humana. Outras funções que poderiam ser citadas são: formação de agregados estáveis e proteção da superfície do solo; manutenção das amplas funções biológicas, incluindo a imobilização e liberação de nutrientes; oferta de sítios de troca catiônica; e estocagem de carbono terrestre. Porém, a mesma matéria orgânica que é essencial para fertilidade do solo, quando presentes nos materiais destinados à construção civil, principalmente na areia, passa a ser classificada como substância deletéria. De acordo com o Portal de Apoio ao Pequeno Produtor Mineral (PORMIN) do Ministério de Minas e Energia (BRASIL, s.n.) o teor tolerável de matéria orgânica deve ser de 0,5 a 1%; assim como também os torrões de argila, siltito e partículas friáveis (1 a 3%); material pulverulento (1%); minerais de fácil decomposição: óxidos, sulfetos e micas, fragmentos ferromagnesianos, 87 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 feldspato; minerais que reagem mal com o cimento; calcedônia, pirita, gipsita, minerais alcalinos; salinidade (sais solúveis) representam ameaças à qualidade do produto final. Como o processo de extração da areia no município de Ourinhos/SP é por cava submersa, deve-se levar em consideração também o comportamento da matéria orgânica em meio aquático. De acordo com a CETESB (s.n.), matéria orgânica é todo o material de origem vegetal ou animal produzido no próprio ambiente aquático (autóctone) ou introduzido nele por meio de despejos ou pelo arraste por água de chuva (alóctone). Em meio aquático, a matéria orgânica sofre um processo de decomposição que implica no consumo do oxigênio presente no meio. Esse processo é acelerado com o aumento da temperatura, isto é, altas concentrações de matéria orgânica, sobretudo em temperaturas acima de 20°C, irão acarretar na redução do oxigênio dissolvido, podendo levar a mortandades maciças. Segundo a CETESB (s.n., n.p.): Com a decomposição da matéria orgânica liberam-se nutrientes para o meio que serão utilizados pelas algas e vegetais superiores para o seu crescimento. Geralmente, em ambientes naturais há baixa concentração de matéria orgânica e escassez de nutrientes, limitando o crescimento das algas. A entrada de matéria orgânica de origem antrópica no meio aquático aumenta muito a quantidade de nutrientes disponíveis no meio, desequilibrando assim, os processos de fotossíntese e decomposição. O processo de enriquecimento das águas por matéria orgânica é denominado eutrofização e, frequentemente, é causado pelo despejo de esgotos ou ainda de produtos como o vinhoto, acarretando graves problemas ambientais, que podem ter sido introduzidos também, pelo grande volume de solo transportado por agentes erosivos. Portanto, a areia destinada a construção civil: Deve ser sempre isenta de sais, óleos, graxas, materiais orgânicos, barro, detritos e outros. Podem ser usadas as de rio e ou do solo (barranco). Não devem ser usadas a areias de praia (por conter sal) e a areia com matéria orgânica, que provocam trincas nas argamassas e prejudicam a ação química do cimento (BUENO, 2000, p. 3). 88 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Deste modo, a ABNT com NBR NM 49/2001 (ABNT, 2001) determina as impurezas orgânicas para agregado miúdo (areia), cujo objetivo desta norma é estabelecer o método de determinação colorimétrica de impurezas orgânicas em agregado miúdo destinado ao preparo do concreto. Serão esses os parâmetros usados nessa etapa da pesquisa. A hipótese concerne no uso e ocupação da terra ao longo do rio Paranapanema, principal fonte da areia do município de Ourinhos/SP, bem como o despejo de esgoto sem tratamento prévio podem ser a causa de contaminação do referido recurso mineral utilizado na construção civil do município. 2 - Objetivo geral Determinar o teor de matéria orgânica nas amostras de areia oriundas diretamente das dragas de dois portos de areia e de duas lojas de materiais de construção, localizados no município de Ourinhos/SP. 3 - Procedimentos metodológicos Trabalhou-se com 11 amostras de areia oriundas de dois portos localizados ao longo do rio Paranapanema (Figura 1) as quais foram coletadas em duas etapas, sendo amostras do porto 1: areia grossa 1, areia industrial 2, 8 e 10 e areia mista 3, 9 e 11. As amostras do porto 2 são: areia fina 5 e 11, areia média 6, areia natural 4 (coletada direto da draga). E 05 amostras desse material oriundas de 02 lojas de material de construção localizadas no município de Ourinhos/SP, cuja areia fina 12, média 13 e grossa 14 (é a mesma areia que a industrial do Porto 1) são da Loja 1 e areia fina 15 e grossa 16 da Loja 2. 89 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 2 1 Figura 1. Localização dos portos de areia amostrados na pesquisa, município de Ourinhos/SP. Os aparelhos e materiais utilizados na análise de matéria orgânica foram: cachimbo para medidas de 1cm³ de areia; dispensador para 10 ml de solução de Na2Cr2O7; mesa agitadora com movimento circular horizontal; bandeja de isopor com 25 copos descartáveis; espectrofotômetro. Os materiais utilizados para preparação das soluções e amostras para curva padrão foram: Solução contendo 0,667 de dicromato de sódio e 5mol/l de ácido sulfúrico; sete amostras de solo, sendo três destas para curva-padrão e quatro para controle. Para viabilização do objetivo proposto foram utilizadas as amostras coletadas dos portos e das lojas de material de construção, as quais foram submetidas à análise de matéria orgânica no Laboratório de Geologia, Pedologia e Geomorfologia, UNESP/Ourinhos, com o auxílio do técnico do laboratório e acompanhamento da bolsista em todas as etapas do trabalho. As amostras que foram coletadas no referido período estavam devidamente embaladas, em condições adequadas para análise. Sendo assim, foi aplicado o método colorimétrico para determinação da matéria orgânica, proposto por Cantarella et al. (2001). De acordo com este método, a 90 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 determinação da quantidade de matéria orgânica baseia-se na sua oxidação por íons dicromato, em meio fortemente ácido. Segundo os referidos autores, “pode-se determinar diretamente a quantidade de Cr (III) por colorimetria, medindo-se a intensidade da cor esverdeada produzida por esses íons em solução” (CANTARELLA et al., 2001, p.173). A mencionada oxidação se dá pela fórmula: A determinação por colorimetria requer a montagem de uma curva padrão de calibração, a referida curva é feita com uma série de amostras de solo, nas quais o teor de matéria orgânica já é conhecido. Sendo assim, a curva-padrão corresponde à relação gráfica entre os valores de absorbância e os de concentração. Então, com base na análise gráfica é possível verificar a linearidade da reação e calcular um fator de conversão de valores de absorbância em concentração (BENFATO, s.n.). Deste modo, o método colorimétrico: Baseia-se na leitura colorimétrica da cor verde do íon Cr (III) reduzido pelo carbono orgânico. Esse método utiliza o dicromato de sódio no lugar do de potássio devido a maior solubilidade do primeiro. Além disso, a oxidação da matéria orgânica é feita a frio, apenas agitando o solo em uma solução contendo dicromato de sódio e ácido sulfúrico. (CANTARELLA et al., 2001, p.174). Sendo assim, o procedimento adotado foi transferir 1cm³ de cada uma das amostras para o copo plástico de 180 ml (sendo que para cada amostra foram realizados três repetições) e uma prova em branco completa, sem areia. Depois, adicionou-se, com dispensador, 10 ml da solução de Na2Cr2O7 em ácido sulfúrico. Em seguida, foi agitado durante dez minutos na mesa de agitação orbital, com velocidade mínima de 180 rpm. Após um repouso de uma hora foram adicionados 50 ml de água deionizada, usando dispensador com um jato forte para promover a mistura das soluções; ficou decantando durante a noite. 91 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 No dia seguinte, transferiu-se o líquido sobrenadante para a cela de medida do espectrofotômetro, com filtro de transmissão máxima de 650nm. Regulou-se o zero do aparelho com a prova em branco completa, para em seguida começar a medição das amostras e por fim, os dados foram compilados para o MS Excel para o cálculo dos resultados a partir da curvapadrão, preparada com os resultados das amostras dos solos cujos teores de matéria orgânica já eram conhecidos. 4 - Resultados Como as análises de matéria orgânica foram feitas em duas etapas, foram geradas duas curvas-padrão de calibração (Figuras 2 e 3). Com base na análise gráfica é possível verificar a linearidade da reação e calcular um fator de conversão de valores de absorbância em concentração, ou seja, quanto mais próximos os valores (representados pelos pontos da Série 1) da reta, maior confiabilidade terá a análise. Figura 2. Curva-padrão de calibração da primeira análise. Figura 3. Curva-padrão de calibração da segunda análise. A partir da análise realizada com as diferentes amostras de areia, foram obtidos os resultados apresentados nas Tabelas 1 e 2. 92 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Tabela 1. Resultado das amostras de areia (primeiro dia de análise) submetidas à análise pelo AMOSTA ABS* g/dm³ % Areia natural grossa 1 Areia natural grossa 1’ Areia natural grossa 1’’ Areia industrial 2 Porto 1 Areia industrial 2’ Areia industrial 2’’ Areia mista 3 Areia mista 3’ Areia mista 3’’ 0,009 0,006 0,007 0,007 0,006 0,004 0,006 0,004 0,006 4 3 4 4 3 3 3 3 3 0,4 0,3 0,4 0,4 0,3 0,3 0,3 0,3 0,3 Areia natural (draga) 4 Areia natural (draga) 4’ Areia natural (draga) 4’’ Areia fina 5 Porto 2 Areia fina 5’ Areia fina 5’’ Areia média 6 Areia média 6’ Areia média 6’’ 0,005 0,005 0,005 0,002 0,002 0,003 0,000 0,000 0,002 3 3 3 2 2 2 2 2 2 0,3 0,3 0,3 0,2 0,2 0,2 0,2 0,2 0,2 *absorbância Tabela 2. Resultado das amostras de areia (segundo dia de análise) submetidas à análise pelo método de colorimetria. Amostras ABS* g/dm³ % Areia industrial 7 0,004 2 0,2 Areia industrial 7’ 0,004 2 0,2 Areia industrial 7’’ 0,008 3 0,3 Areia mista 8 0,006 3 0,3 Areia mista 8’ 0,007 3 0,3 Areia mista 8’’ 0,007 3 0,3 Porto 1 Areia industrial 9 0,012 4 0,4 Areia industrial 9’ 0,012 4 0,4 Areia industrial 9’’ 0,012 4 0,4 Areia mista 10 0,007 3 0,3 Areia mista 10’ 0,004 2 0,2 Areia mista 10’’ 0,007 3 0,3 93 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Tabela 3. (Continuação) Resultado das amostras de areia (segundo dia de análise) submetidas à análise pelo método de colorimetria. Amostras ABS* g/dm³ % Areia fina 11 1 0,1 0 1 0,1 Porto 2 Areia fina 11’ Areia fina 11’’ 0 1 0,1 Areia fina 12 Areia fina 12’ Areia fina 12’’ Areia média 13 LOJA 1 Areia média 13’ Areia média 13’’ Areia grossa 14 Areia grossa 14’ Areia grossa 14’’ 0,001 0,001 0,009 0,004 0,005 0,005 0,005 0,006 0,004 2 2 4 2 3 3 3 3 2 0,2 0,2 0,4 0,2 0,3 0,3 0,3 0,3 0,2 Areia fina 15 Areia fina 15’ Areia fina 15’’ LOJA 2 Areia grossa 16 Areia grossa 16’ Areia grossa 16’’ 0,002 0,003 0,003 0,008 0,010 0,007 2 2 2 3 4 3 0,2 0,2 0,2 0,3 0,4 0,3 *absorbância Os referidos valores indicam que as amostras de areia oriundas do rio Paranapanema como também das duas lojas de materiais de construção se encontram abaixo da porcentagem, segundo Pormin (s.n.), para serem consideradas uma substância deletéria na areia para construção civil. Entretanto, estão muito próximas dos valores para serem consideradas como fator limitante para seu uso na construção civil, principalmente, as oriundas do Porto 1. 5- Considerações finais O baixo teor de matéria orgânica na areia deve-se, provavelmente, ao fato desta ser menos densa que a areia, a qual se encontra no leito do rio, e 94 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 assim fica mais próxima a superfície. Entretanto, encontra-se próximo dos níveis críticos para a construção civil, descritos como substâncias deletérias. Deve-se atentar que se a água tiver um nível alto de matéria orgânica, e a mesma for utilizada no preparo do reboco durante as construções, esta areia que teria um baixo teor de matéria orgânica será contaminada novamente, e assim, gerará um ambiente propício para a proliferação dos fungos e bactérias decompositoras. 6- Referências ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR NM 49:2001 Versão Corrigida:2001. Agregado miúdo - Determinação de impurezas orgânicas. Disponível em: <http://www.abntcatalogo.com.br/norma.aspx?ID=3090>. Acesso em: ago. 2013. BRASIL. Ministério de Minas e Energia. Portal do Pequeno Produtor Mineral. Agregados Minerais Para Construção Civil: Areia, Brita e Cascalho. Brasília: PORMIN, s.n. Disponível em: <http://www.leffa.pro.br/textos/abnt.htm#5.18>. Acesso em: 22 jul. 2013. BUENO, C. F. H. Tecnologia de materiais de construção. Viçosa: UFV, 2000. Disponível em: <http://www.ufv.br/dea/ambiagro/arquivos/materiais_contrucao.pdf>. Acesso em: 20 ago. 2013 COMPANHIA DE TECNOLOGIA DE SANEAMENTO AMBIENTAL. Alterações físico-químicas: matéria orgânica e nutrientes. CETESB, s.n. Disponível em: <http://www.cetesb.sp.gov.br/mortandade/causas_materia.php>. Acesso em: 24 ago. 2013. CRASWELL, E. T.; LEFROY, R. D. B. A função da matéria orgânica nos solos tropicais. In: MACHADO, P. L. O. A. Manejo da matéria orgânica de solos tropicais. Rio de Janeiro: Embrapa Solos, 2001. Disponível em: <http://www.cnps.embrapa.br/publicacoes/pdfs/doc242001solostropicais.pdf>. Acesso em: 20 ago. 2013. GUERRA, A. J. T. O papel da matéria orgânica e dos agregados na erodibilldade dos solos. Anuário do Instituto de Geociências, Rio de Janeiro, v. 13, p. 43-52. 1990. Disponível em: <http://ppegeo.igc.usp.br/pdf/anigeo/v13/v13a07.pdf>. Acesso em: 14 ago. 2013. KIEHL, E. J. Manual de edafologia: relação solo-planta. São Paulo: Ed. Agronômica CERES, 1979. 95 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 AVALIAÇÃO DE IMPACTOS E MUDANÇAS ANTRÓPICAS NO CÓRREGO DA UNESP, NO MEIO URBANO DO MUNICÍPIO DE PRESIDENTE PRUDENTE – SP Nayara Rodrigues da Silva1 Isabel Cristina Moroz – Caccia Gouveia2 1 - Introdução As bacias hidrográficas possuem grande importância para os estudos voltados às análises dos problemas decorrentes da relação sociedadenatureza, pois nelas se evidenciam as dinâmicas naturais dos meios físico e biótico e as mudanças nas taxas, frequências e magnitude de processos decorrentes das intervenções antrópicas. A água, além de ser um recurso natural essencial à vida, tem como função na geomorfologia a modificação e esculturação do relevo, portanto é elemento transformador da paisagem. Porém é importante compreender a dinâmica das águas (fluviais e pluviais) nos ambientes urbanos, já que essa dinâmica é alterada drasticamente pela ausência de cobertura vegetal e pela impermeabilização do solo. Nas bacias hidrográficas inseridas em ambientes já urbanizados, ficam evidentes as transformações causadas pela a crescente industrialização, especulação imobiliária e a falta de planejamento urbano adequado nos municípios, o que implica em sérios problemas ambientais, pois a ausência ações de planejamento ou ações equivocadas compromete toda a dinâmica da natureza. Deste modo se faz necessário repensar o uso/ocupação do solo dos municípios, a utilização dos recursos naturais e o manejo adequado das bacias hidrográficas. Principalmente as bacias hidrográficas que estão localizadas no meio urbano, nas quais se tem observado problemas como aumento dos processos erosivos e aumento do escoamento superficial da água devido à impermeabilização do solo gerando enxurradas e inundações. Tais problemas 1 Graduanda no curso de Geografia, Nayara Rodrigues da Silva, Universidade Estatual Paulista – Júlio de Mesquita Filho, Campus Presidente Prudente. [email protected] 2 Professora Assistente Doutora da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Campus Presidente Prudente. [email protected] 96 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 podem se intensificar caso haja a retificação ou canalização dos cursos d’água. Na bacia hidrográfica do “Córrego da Unesp”, localizada no perímetro urbano de Presidente Prudente, embora apresente pequenas dimensões, é possível identificar os diferentes problemas mencionados. 2 - Objetivos A presente pesquisa tem como objetivo geral identificar, avaliar e espacializar as modificações impostas ao meio físico pelo processo de urbanização, na bacia do Córrego da Unesp, no município de Presidente Prudente – SP. Para alcançar tal objetivo, serão utilizadas imagens aéreas e imagens de satélite para identificar as mudanças do curso d’água. Também pretende-se fazer o levantamento histórico do uso e ocupação do solo para compreender as mudanças e ações antrópicas. Num segundo momento, pretende-se o levantamento de dados juntamente com as leis federais e municipais para estabelecer o planejamento ambiental adequado para o local. Acredita-se que os resultados obtidos podem mostrar para os órgãos competentes a necessidade de preservação desta área e trazer discussões sobre o que a ação antrópica pode causar. 3 - Resultados A degradação ambiental em Presidente Prudente teve seu inicio com a cultura cafeeira e a implantação da estrada de ferro Sorocabana, porém o principal gradiente para a degradação ambiental foi a especulação imobiliária que acompanhou a urbanização do município. O Plano Diretor do município garante a necessidade da criação de zonas de preservação e proteção ambiental (ZPPA). Conforme o artigo art. 23 da lei complementar nº 153/2008: As Zonas de Preservação e Proteção Ambiental - ZPPA destinam-se exclusivamente a preservação e proteção de mananciais, fundos de vales, nascentes, córregos, ribeirões, matas e vegetações nativas. Quaisquer obras nestas zonas restringem-se a correções de escoamento de águas pluviais, saneamento, combate à erosão ou de infraestrutura, e equipamentos de suporte às atividades de lazer e recreação. (Presidente Prudente, Lei nº 153, de 2008. Dispõe sobre a Lei de Zoneamento do 97 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Uso e Ocupação do Solo, da Área Urbana do Município de Presidente Prudente e dá outras providenciais. Capitulo IV. Art. 23). Segundo o novo código florestal a responsabilidade pela adequação das áreas verdes urbanas é de responsabilidade do município, conforme a seção III Do Regime de Proteção das Áreas Verdes Urbanas, art. 25. Na seção I da delimitação das áreas de preservação permanente, art. 4º: Considera-se área de preservação permanente, em zonas rurais oi urbanas, para os efeitos da lei: I- As faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha ao leito regular (BRASIL, Lei nº 12.651, de maio de 2012). O uso e a ocupação do solo em Presidente Prudente não foram realizados de forma correta, mesmo com leis municipais e federais que garantem a proteção de áreas verdes próximas aos cursos d’água. A falta de órgãos governamentais para fiscalizar as apropriações, acarretou uma série de problemas ambientais e problemas sociais, pois não houve planejamento urbano. Devido aos processos de urbanização houve a criação de bairros e loteamentos próximos aos cursos d’água, grande impermeabilização do solo e inúmeras canalizações de córregos e rios, intensificando processos de inundação. A partir das figuras abaixo é possível observar a evolução da ocupação da bacia hidrográfica Córrego da Unesp. Figura 1. Fotografia área de 1977 do Córrego da Unesp (à direita) e Imagem de satélite de 2013 (à esquerda). Observam-se as ocupações próximas às margens do curso d’água (destacado em azul). 98 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 4 - Considerações finais Embora a pesquisa encontre-se em andamento podemos destacar como resultados parciais, a apropriação de áreas de preservação permanente (APPs), o que pressupõe o desrespeito à legislação ambiental e ao próprio plano diretor do município, e a ausência de medidas de planejamento ambiental e fiscalização por parte do município. 5 - Bibliografia ALMEIDA, G. H. S.; ARAÚJO, J. R. & GUERRA, A. J. T (2010). Gestão ambiental de áreas degradadas. Editora Berthand Brasil, Rio de Janeiro. BRASIL LEI Nº 12.651, de 25 de maio de 2012. Institui o Novo Código Florestal.Disponívelem:<http://legislacao.planalto.gov.br/legisla/legislacao.nsf/ Viw_Identificacao/lei%2012.651-2012?OpenDocument>, acessado em 20 de outubro de 2013. GUERRA, A. J. T. Geomorfologia urbana. (2011). Editora Bertrand Brasil, Rio de Janeiro. MELAZZO, E. S. & NETO, A. C. Dinâmica imobiliária e estruturação intraurbana: produção e consumo do espaço urbano em uma cidade de porte médio paulista. In: 12º Encuentro de Geógrafos de América Latina, 2009, Montevideo. Anales de 12º Encuentro de Geógrafos de América Latina. Montevideo, Uruguai: Easy Planners, 2009. v. 1. p. 1-19. MENEGUETTE, ARLETE. Simpósio do fundo de vale da Unesp. Disponível em: <http://arlete.meneguette.zip.net/>, acessado em 02 de setembro de 2013. MOROZ – CACCIA GOUVEIA, I. C. Da originalidade do sítio urbano de São Paulo às formas antrópicas: aplicação da abordagem da geomorfologia antropogênica na bacia hidrográfica do rio Tamanduateí, na região metropolitana de São Paulo. Tese de doutorado (Departamento de Geografia da FFLCH), Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010. PRESIDENTE PRUDENTE, Prefeitura Municipal. Plano Diretor do Município, 2008.Disponívelem:<http://www.presidenteprudente.sp.gov.br/site/Documento. do?cod=612>, acessado em 20 de outubro de 2013. ROSS, J. L. S. (1995) Análises e sínteses na abordagem geográfica da pesquisa para o planejamento ambiental. Revista do Departamento de Geografia nº.9. FFLCH-USP: São Paulo. 65-75p. ROSS, J. L. S. (1994) Análise empírica da fragilidade dos ambientes naturais e antropizados. Revista do Departamento de Geografia nº.8. FFLCH-USP: São Paulo. 99 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 ROSS, J. L. S. (1990) Geomorfologia, Ambiente e Planejamento, Editora Contexto, São Paulo, 85p. ROSS, J. L. S. & FIERZ, M. de S. M. Algumas Técnicas de Pesquisa em Geomorfologia in: VENTURI, L. A. B. Praticando Geografia: técnicas de campo e laboratório, Oficina de Textos, São Paulo, 2009. 100 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 CARACTERIZAÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DOS EXTREMOS DE PRECIPITAÇÃO ATRAVÉS DAS TÉCNICAS ESTATÍSTICAS DO DESVIO PADRÃO E PERCENTIL, NA CIDADE DE UBATUBA/SP (2000 - 2010) Washington Paulo Gomes1 Margarete C. de C. T. Amorim2 Introdução As transformações no espaço natural sempre ocorreram, entretanto, o homem tem acelerado ainda mais esse processo, com o objetivo de adaptá-lo às suas necessidades. Deste modo, segundo Monteiro (2011), na medida em que se expande o processo de urbanização, ocorre também um aumento das preocupações com os impactos dos desastres naturais sobre a sociedade. A forma como as relações espaciais entre o meio urbano e a natureza vem se dando não ocorre de maneira equilibrada, assim, a falta de planejamento adequado frente a esse crescimento está introduzindo nas cidades problemas expressivos. Os desastres naturais mais frequentes no Brasil são as inundações urbanas, os deslizamentos de terra, as secas e a erosão. Neste sentido, os estudos dos impactos e o volume e a intensidade das precipitações têm um grande significado nas áreas urbanas brasileiras. (MONTEIRO, 2011). Chuvas intensas em curtos períodos de tempo associados ao uso e ocupação nas áreas de riscos, resulta em centenas de vítimas e graves danos ambientais e econômicos para o município de Ubatuba-SP. (ROSEGHINI, 2007). Objetivos Este trabalho tem como objetivo realizar uma classificação da precipitação no município de Ubatuba-SP, com base nas técnicas estatísticas do desvio padrão e do percentil, com o intuito de identificar os eventos extremos e comparar essas duas técnicas no período de 2000 a 2010. 1 Graduando de Geografia da FCT/UNESP – E-mail: [email protected] – Bolsista CNPq/PIBIC 2 Profª Dra. Departamento de Geografia da FCT/UNESP – E-mail: [email protected] 101 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Procedimentos metodológicos Para o desenvolvimento do trabalho, os dados de precipitação (20002010) foram coletados da estação meteorológica do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), através do banco de dados do Centro Integrado de Informações Agrometeorológicas (CIIAGRO)3. Os dados foram agrupados no software Microsoft Office Excel 20074 levando em consideração os totais pluviométricos mensais. Posteriormente, foram utilizados parâmetros estatísticos de tratamento, por meio da aplicação dos cálculos de tendência central (média), dispersão (desvio padrão) e o percentil. Assim sendo, as medidas de centralidade têm como objetivo determinar o valor central na escala de valores observados. - Média aritmética: é a soma de todos os valores de uma série dividindose o resultado pelo número total de ocorrências. N Ʃ Xi X= i= I N X = média aritmética; Ʃ = somatória; Xi = dados de cada unidade; N = número de observações. As medidas de dispersão avaliam a distribuição de valores de uma série levando em conta o conjunto destas ou em relação ao valor central. Segundo Roseghini (2007), o desvio padrão (DP) é representado como a raiz quadrada da variância, e sua função na climatologia é de fundamental 3 4 < http://www.ciiagro.sp.gov.br> Acessado em outubro de 2012. Excel é marca registrada da Microsoft Co. 102 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 importância, pois indica a variação, irregularidade e o afastamento dos valores observados em relação a média. N Ʃ (Xi - X)² S= i= I N-1 Ʃ = somatória; X = média; Xi = dados de cada unidade; N = número de observações. Os dados de precipitação sofreram um tratamento estatístico visando distribuir em classes a variável em estudo, de modo a caracterizar os meses de anomalia de acordo com a intensidade do evento. Assim como podemos observar na figura 01 (A), a definição de ano padrão foi realizada com base nos estudos desenvolvidos por Sant’ Anna Neto (1995). Do mesmo modo, utilizamos a classificação de chuvoso ( tendente a chuvoso ( + ½ DP), habitual ( + DP), DP), tendente a seco ( – ½ DP) e seco ( – DP), para a série analisada. Figura 01 – Modelo de classificação dos anos padrões e do percentil. (A) (B) 103 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Desvio Padrão Percentil Chuvoso Extremamente Acima do Normal 1,00 - X +DP 0,90 Acima do Normal 0,80 Tendente a Chuvoso Habitual - X + ½ DP Ligeiramente Acima do Normal - Normal - Ligeiramente Abaixo do Normal X +- DP 0,70 0,30 Tendente a Seco X - ½ DP 0,20 Abaixo do Normal Seco - X - DP 0,10 Extremamente Abaixo do Normal 0,00 Fonte: (A) Sant’Anna Neto (1995); (B) Fortes, et al. (2006). Org: GOMES, W. P. Depois de realizada a análise empregando o desvio padrão utilizamos também a técnica do percentil para identificação dos meses mais chuvosos de toda a série. Assim sendo, segundo Fante e Sant’Anna Neto (2011), percentis são valores numéricos que dividem um conjunto de dados em partes proporcionais, portanto, se a intenção for calcular o percentil “x” de uma série aleatória de dados, o resultado será um único número que separa esta série em duas partes. Portanto, segundo Barbosal, et al (2010) a série temporal pode ser distribuída da seguinte forma: {x1, x2,x3, ..., xn}, onde x1 representa o menor valor e xn o maior valor da série. Deste modo, o percentil pode ser dividido em até cem partes. Entretanto, para este trabalho, optou-se por realizar uma divisão em 7 classes com relação aos valores mensais que podem ser observados na figura 104 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 01 (B), sendo: extremamente abaixo do normal (10%), abaixo do normal (20%), ligeiramente abaixo do normal (30%), normal (70%), ligeiramente acima do normal (80%), acima do normal (90%) e extremamente acima do normal (100%). Tais dados foram identificados por meio da função do software Excel: = PERCENTIL (Matriz; Percentil) Matriz = série de dados analisada. Percentil = número real entre zero e um, que representa o percentil utilizado. Resultados Na tabela 01 verificam-se os meses que se apresentaram acima do desvio padrão positivo (em azul), com totais de precipitação acumulados superiores a 277,4 mm. Ainda, pode-se verificar os meses abaixo do desvio padrão negativo (em vermelho), apresentando totais menores que 78 mm. Na tabela 02, foi utilizado o percentil 0,1 para os meses extremamente abaixo do normal, com totais pluviométricos menores do que 35,3 mm e o percentil 0,9 para os meses considerados extremamente acima do normal, com totais superiores a 338,6 mm. Deste modo, podemos identificar também na tabela 01, que em um total de 120 meses, 62 foram considerados extremos, ou seja, mais da metade, sendo, 31 extremos chuvosos e 31 extremos secos. Em relação ao desvio padrão negativo, podemos destacar que praticamente ocorre uma concentração do período seco nos meses de inverno e em alguns casos chegando até ao outono e a primavera. No desvio padrão positivo, percebemos que o período chuvoso predomina nos meses de verão, chegando também nos meses de outono e primavera, além de apresentar um caso excepcional, no mês de julho de 2004, chegando a 281,7 mm de precipitação no período de inverno. 105 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Tabela 01 – Totais mensais de precipitação – Desvio Padrão. Totais Mensais de Precipitação - Desvio Padrão Anos 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 Média jan 367 244.4 209.7 323.5 352.7 446.2 138.7 287.7 220.3 159.1 140.6 177.7 fev 324.7 162.9 397.6 100.1 297.7 174.9 352.7 180.4 283.8 172.2 160.7 177.7 mar 280.6 193.3 197.2 402.9 127 422.5 251.1 65.2 137.8 119.5 74.1 177.7 abr mai 63.2 97.4 169.6 69.5 294.6 672.6 174.7 219.8 166.8 67.5 176.0 177.7 22.4 166.3 0 56.5 171.5 134.3 95.6 123.9 15.8 80.7 114.9 177.7 jun 36.7 72.6 134 24.4 72 99.5 31.9 98.3 15.7 32.1 2.3 177.7 jul 78.3 113.4 35.1 29.9 281.7 128.2 55.1 147.3 0.8 153.2 112.9 177.7 ago 78.1 61.2 41.5 79.8 29.7 31.3 127 17 114.5 140.9 49.3 177.7 set 169.8 167.4 98 77 143.8 274.7 179.6 67.5 61.1 114.0 100.6 177.7 out 157 121.3 204.4 319.7 159.7 321.9 285.1 138 65.06 182.9 273.6 177.7 nov 283.8 128 281.4 280.9 266.9 346.6 341.6 183.4 156.3 92.5 87.3 177.7 dez 340.1 240.7 568.5 266 182.5 303.5 288.2 117.5 293 619.9 654.4 177.7 LEGENDA Desvio Padão + > 277.4 Desvio Padrão - < 78 Fonte: Estação meteorológica do IAC. Org: GOMES, W. P. Já a tabela 02, apresenta-se somente 28 meses considerados extremos, sendo, 14 extremamente acima do normal e 14 extremamente abaixo do normal. Desta forma, verifica-se que o cálculo do percentil possui uma maior precisão em relação ao desvio padrão (tabela 01), sendo, destacado apenas os 10% mais extremos de toda a série, tanto positivo, quanto negativo. Tabela 02 – Totais mensais de precipitação – Percentil. Totais Mensais de Precipitação - Percentil Anos 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 Média jan 367 244.4 209.7 323.5 352.7 446.2 138.7 287.7 220.3 159.1 140.6 177.7 fev 324.7 162.9 397.6 100.1 297.7 174.9 352.7 180.4 283.8 172.2 160.7 177.7 mar 280.6 193.3 197.2 402.9 127 422.5 251.1 65.2 137.8 119.5 74.1 177.7 abr 63.2 97.4 169.6 69.5 294.6 672.6 174.7 219.8 166.8 67.5 176.0 177.7 mai 22.4 166.3 0 56.5 171.5 134.3 95.6 123.9 15.8 80.7 114.9 177.7 jun 36.7 72.6 134 24.4 72 99.5 31.9 98.3 15.7 32.1 2.3 177.7 jul 78.3 113.4 35.1 29.9 281.7 128.2 55.1 147.3 0.8 153.2 112.9 177.7 ago 78.1 61.2 41.5 79.8 29.7 31.3 127 17 114.5 140.9 49.3 177.7 set 169.8 167.4 98 77 143.8 274.7 179.6 67.5 61.1 114.0 100.6 177.7 out 157 121.3 204.4 319.7 159.7 321.9 285.1 138 65.06 182.9 273.6 177.7 nov 283.8 128 281.4 280.9 266.9 346.6 341.6 183.4 156.3 92.5 87.3 177.7 dez 340.1 240.7 568.5 266 182.5 303.5 288.2 117.5 293 619.9 654.4 177.7 LEGENDA Percentil (0,9) > 338.6 Percentil (0,1) < 35.3 Fonte: Estação meteorológica do IAC. Org: GOMES, W. P. Levando-se em consideração a tabela 03, na qual realizamos uma classificação dos valores de acordo com o desvio padrão (5 classes), podemos 106 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 observar de modo geral que o município, bem como outras cidades tropicais brasileiras, apresenta estações bem definidas com períodos de baixos totais pluviométricos no inverno e um aumento gradual nas estações de outono e primavera até chegar nos totais mais altos na estação do verão. Tabela 03 – Classificação da precipitação com base no percentil. Totais Mensais de Precipitação - Desvio Padrão Anos jan 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 Média - X - DP Seco 367 244.4 209.7 323.5 352.7 446.2 138.7 287.7 220.3 159.1 140.6 177.7 fev 324.7 162.9 397.6 100.1 297.7 174.9 352.7 180.4 283.8 172.2 160.7 177.7 mar 280.6 193.3 197.2 402.9 127 422.5 251.1 65.2 137.8 119.5 74.1 177.7 - abr 63.2 97.4 169.6 69.5 294.6 672.6 174.7 219.8 166.8 67.5 176.0 177.7 mai 36.7 72.6 134 24.4 72 99.5 31.9 98.3 15.7 32.1 2.3 177.7 LEGENDA - jul 78.3 113.4 35.1 29.9 281.7 128.2 55.1 147.3 0.8 153.2 112.9 177.7 ago 78.1 61.2 41.5 79.8 29.7 31.3 127 17 114.5 140.9 49.3 177.7 set 169.8 167.4 98 77 143.8 274.7 179.6 67.5 61.1 114.0 100.6 177.7 - out 157 121.3 204.4 319.7 159.7 321.9 285.1 138 65.06 182.9 273.6 177.7 nov 283.8 128 281.4 280.9 266.9 346.6 341.6 183.4 156.3 92.5 87.3 177.7 dez 340.1 240.7 568.5 266 182.5 303.5 288.2 117.5 293 619.9 654.4 177.7 - X +- DP X + ½ DP X +DP Habitual Tendente a Chuvoso Chuvoso X - ½ DP Tendente a Seco jun 22.4 166.3 0 56.5 171.5 134.3 95.6 123.9 15.8 80.7 114.9 177.7 Fonte: Estação meteorológica do IAC. Org: GOMES, W. P. Na tabela 04, realizamos a classificação considerando o percentil (7 classes), fragmentando mais a série trabalhada, com o intuito de chegar a uma maior precisão para os extremos e deixando uma ampla classe para o normal (40%). Desta forma, podemos observar que 52 meses permaneceram na classe do normal (41,6% do total), sendo, a grande maioria nos meses de outono e primavera. 107 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Tabela 04 – Classificação da precipitação com base no desvio padrão. Totais Mensais de Precipitação - Percentil Anos jan fev 367 244.4 209.7 323.5 352.7 446.2 138.7 287.7 220.3 159.1 140.6 177.7 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 Média mar 324.7 162.9 397.6 100.1 297.7 174.9 352.7 180.4 283.8 172.2 160.7 177.7 280.6 193.3 197.2 402.9 127 422.5 251.1 65.2 137.8 119.5 74.1 177.7 abr 63.2 97.4 169.6 69.5 294.6 672.6 174.7 219.8 166.8 67.5 176.0 177.7 mai 22.4 166.3 0 56.5 171.5 134.3 95.6 123.9 15.8 80.7 114.9 177.7 jun 36.7 72.6 134 24.4 72 99.5 31.9 98.3 15.7 32.1 2.3 177.7 jul ago 78.3 113.4 35.1 29.9 281.7 128.2 55.1 147.3 0.8 153.2 112.9 177.7 78.1 61.2 41.5 79.8 29.7 31.3 127 17 114.5 140.9 49.3 177.7 set out 169.8 167.4 98 77 143.8 274.7 179.6 67.5 61.1 114.0 100.6 177.7 nov 157 121.3 204.4 319.7 159.7 321.9 285.1 138 65.06 182.9 273.6 177.7 283.8 128 281.4 280.9 266.9 346.6 341.6 183.4 156.3 92.5 87.3 177.7 dez 340.1 240.7 568.5 266 182.5 303.5 288.2 117.5 293 619.9 654.4 177.7 Extremamente Abaixo do Normal Ligeiramente Abaixo do Normal Normal Abaixo do Normal Ligeiramente Acima do Normal 1,00 0,90 0,80 0,70 0,30 0,20 0,10 0,00 LEGENDA Extremamente Acima do Normal Acima do Normal Fonte: Estação meteorológica do IAC. Org: GOMES, W. P. Considerações finais Estes modelos de classificação permitem selecionar de forma objetiva os eventos climáticos atípicos e de interesse para os estudos em um determinado ano, mês, ou até mesmo dias, assim como episódios extremos secos e chuvosos, bem como o padrão normal. Deste modo, ter a possibilidade de realizar estes tipos de classificações e entender quando ocorrem de forma mais frequente os eventos extremos, nos fornecerá maiores precisões para identificarmos os períodos mais propícios para a ocorrência dos impactos relacionados aos eventos extremos de precipitação no município de Ubatuba-SP, além de servir como referência para trabalhos futuros em outros locais. Os impactos causados pelos eventos extremos de precipitação têm provocado muitas situações negativas, com perdas materiais e também em alguns casos, com perdas de vidas humanas. 108 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Podemos ver diariamente notícias de ocorrências de enchentes em vários pontos do país, provocando sérios problemas com registros de danos econômicos, sociais e ambientais significativos. De certo modo, é justamente nos períodos em que ocorrem os eventos mais significativos de precipitação, com totais pluviométricos mais elevados e de grande intensidade, em conjunto com o mau uso e ocupação do solo por meio do processo de urbanização inadequado, é que vão ocorrer os impactos e os desastres naturais, até mesmo em regiões que não costumavam ser atingidas. Referências BARBOSAL, E. N. et al. Climatologia e Variabilidade de Precipitação no Nordeste do Pará com foco no Município de Castanhal e Mosqueiro (Distrito da Cidade de Belém) no Período de 1982 a 2009. In: XVI Congresso de Meteorologia, Belém, 2010. BRIGATTI, N. Variação do nível do mar associada às situações sinóticas na gênese dos episódios extremos no município de Ubatuba/SP. (Dissertação de Mestrado) – Universidade Estadual Paulista, Presidente Prudente, 2008. CIIAGRO/IAC – Centro Integrado de Informações Agrometeorológicas/ Instituto Agronômico de Campinas. Disponível em: <http://www.ciiagro.sp.gov.br> Acessado em outubro de 2012. FANTE, K. P.; SANT’ ANNA NETO, J. L. Identificação dos extremos das temperaturas máximas e mínimas, por meio da técnica estatística percentil, na cidade de Avaré/SP (1961/2009). In: XXIII Congresso de Iniciação Cientifica da UNESP, Presidente Prudente, 2011. FORTES, L. T. G. et al. ANÁLISE DE MÉTODOS ALTERNATIVOS PARA MAPEAR ANOMALIAS DE PRECIPITAÇÃO. XIV Congresso Brasileiro de Meteorologia, Florianópolis, 2006. MONTEIRO, J. B. CHOVER, MAS CHOVER DE MANSINHO: desastres naturais e chuvas extremas no Estado do Ceará. (Dissertação de Mestrado) – Universidade Estadual do Ceará, Fortaleza, 2011. PINHEIRO, A. Enchentes e Inundações. In: SANTOS, R. F. (Org.). VULNERABILIDADE AMBIENTAL desastres naturais ou fenômenos induzidos?. MMA, Cap. 7, pg. 95 – 106, 2007. SANT’ANNA NETO, J. L. As chuvas no Estado de São Paulo: contribuição ao estudo da variabilidade e tendências da pluviosidade na perspectiva da análise geográfica. (Tese de Doutorado). Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, SP, 1995. 109 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 _____________________. Da Climatologia Geográfica à Geografia do Clima: gênese, paradigmas e aplicações do clima como fenômeno geográfico. Revista da ANPEGE. V. 4, 2008. ROSEGHINI, W. F. F. Ocorrência de eventos climáticos extremos e sua repercussão sócio-ambiental no litoral norte paulista. (Dissertação de Mestrado) - Universidade Estadual Paulista, Presidente Prudente, 2007. SOUZA, C.R.G. Risco a inundações, enchentes e alagamentos em regiões costeiras. In: Simpósio Brasileiro de Desastres Naturais, Florianópolis, 2004, p. 231-247. XAVIER, T. M. B.; XAVIER, A. F. S. CARACTERIZAÇÃO DE PERÍODOS SECOS OU EXCESSIVAMENTE CHUVOSOS NO ESTADO DO CEARÁ ATRAVÉS DA TÉCNICA DOS QUANTIS : 1964-1998. Revista Brasileira de Meteorologia, v.14, n.2, p. 63-78, 1999. 110 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 ESPACIALIZAÇÃO DOS TEORES DE FLUOR EM ÁGUAS SUPERFICIAIS DO MUNICÍPIO DE SANTO ANTÔNIO DA PLATINA - PR E AS POSSÍVEIS IMPLICAÇÕES NA SAÚDE COLETIVA Naibi Souza Jayme1 Heitor Matos da Silveira2 Aline Ross3 João Carlos Alves4 José Paulo Peccinini Pinese5 1 - Introdução A Geografia ao longo de seu desenvolvimento vem buscando uma maior interdisciplinaridade ao analisar o espaço geográfico. Para tanto, tem buscado em outras ciências como na geologia, biologia, química entre outras, ferramentas que fortaleça as pesquisas de modo a permitir resultados concisos promovendo um manejo mais adequado do meio natural. Nos últimos anos estudos relacionados à hidrogeoquímica tem contribuindo na quantificação dos parâmetros físicos químicos das águas superficiais de diversas bacias hidrográficas, favorecendo a medição dos índices de contaminação por poluentes orgânicos e metais pesados, por conta de algumas atividades antrópicas ou até mesmo por causas naturais. Esta atenção tem também resultado em largo reconhecimento de que os fatores que poluem as água superficiais podem gerar uma séria ameaça à saúde. Diante de tais questões tem-se buscado nos estudos relacionados a hidrogeoquímica identificar e quantificar as principais propriedades e constituintes químicos das águas superficiais, procurando estabelecer uma relação com o meio físico (SANTOS, 1997). Inúmeros são os casos de contaminação dos recursos hídricos por poluentes orgânicos e metais pesados 1 Mestranda em Geografia Dinâmica Espaço Ambiental, Departamento de Geociências, Universidade Estadual de Londrina. [email protected]. 2 Graduando em Geografia, Departamento de Geociências, Universidade Estadual de Londrina. [email protected]. 3 Mestranda em Geografia Dinâmica Espaço Ambiental, Departamento de Geociências, Universidade Estadual de Londrina. [email protected]. E-mail. 4 Professor Departamento de Química,Universidade Estadual de [email protected]. 5 Professor Departamento de Geociências,Universidade Estadual de Londrina. [email protected]. 111 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 por conta de algumas atividades industriais, esgotos domésticos e áreas de cultivo agrícola e a demanda dos recursos minerais nos mais diversificados usos. Alguns dos elementos químicos que existiam na natureza em pequenas quantidades, tiveram suas concentrações elevadas em várias regiões do planeta promovendo sérios danos ambientais (ARTIOLA, 1996; SALOMONS; FOSTER, 1984). Vários pesquisadores passaram a incorporar a hidrogeoquímica nos estudos relacionados à saúde, na qual buscam por meio dos parâmetros físicos químicos, análises bacteriológicas e microbiológicas, a partir de levantamentos baseados na coleta de amostras de água ou sedimentos de fundo de bacias hidrográficas, identificarem as possíveis áreas de anomalias e posteriormente confronta-las com dados de saúde, podendo ser utilizada como instrumento de investigação de riscos ambientais à saúde humana. Desta forma o presente estudo tem por objetivo determinar os índices de concentração de fluoretos em águas superficiais do município de Santo Antônio da Platina e correlaciona-los aos índices permitidos pela legislação vigente, bem como, relaciona - las as condições socioambientais da região abrangente aos pontos de coleta e às características geoquímicas dos minerais que compõe o material geológico, visando aferir o que levou a existência das concentrações anômalas de flúor. 2 - A hidrogeoquímica e sua contribuição aos estudos da geografia da saúde A água em sua totalidade é um recurso indispensável para sobrevivência dos seres humanos, pois exerce um papel fundamental na manutenção do ecossistema bem como no desenvolvimento estratégico e econômico de algumas regiões do pais e no mundo. A crescente degradação dos recursos hídricos em especial as águas superficiais tem chamado atenção das agências reguladoras, tanto federais, quanto estaduais e dos usuários, tendo em vista 112 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 que a poluição tem sido encontrada mais disseminada de que se supunha há alguns anos atrás. A Geografia da Saúde como colocado anteriormente se preocupa em estudar a espacialização de doenças e os conseqüentes agravos á saúde coletiva, contribuindo aos órgãos públicos e privados, na prática de planejamento e minimização de impactos ambientais em relação à saúde coletiva da área, cabendo dentre as inúmeras endemias, estudarem aquelas de veiculação hídrica, onde água atua como veículo de agentes infecciosos ou por determinadas substâncias químicas, orgânicas ou inorgânicas, presentes na água em concentrações inadequadas (MACÊDO; PORTELA, 2009). O estudo hidrogeoquímico tem por finalidade identificar e quantificar as principais propriedades e constituintes químicos das águas superficiais e subterrâneas, procurando estabelecer uma relação com o meio físico (SANTOS, 1997). Inúmeros são os casos de contaminação dos recursos hídricos por poluentes orgânicos e metais pesados por conta de algumas atividades industriais, esgotos domésticos e áreas de cultivo agrícola e a demanda dos recursos minerais nos mais diversificados usos. Os elementos químicos que existiam na natureza em pequenas quantidades, tiveram suas concentrações elevadas em várias regiões do planeta promovendo sérios danos ambientais (ARTIOLA, 1996; SALOMONS; FOSTER, 1984). Nesta perspectiva pesquisadores passaram a incorporar a hidrogeoquímica nos estudos relacionados à saúde, na qual buscam por meio dos parâmetros físicos químicos, análises bacteriológicas e microbiológicas, a partir de levantamentos baseados na coleta de amostras de água ou sedimentos de fundo de bacias hidrográficas, identificarem as possíveis áreas de anomalias e posteriormente confronta-las com dados de saúde, podendo ser utilizada como instrumento de investigação de riscos ambientais à saúde humana. Levantamentos geoquímicos têm sido empregados desde a década de 1970 por diversas organizações estatais e privadas no Estado do Paraná, tendo em vista identificar anomalias e províncias geoquímicas permitindo 113 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 evidenciar com clareza as relações de causa – efeito em algumas áreas de risco à saúde. A ocorrência de áreas de anomalias hidrogeoquímicas em diversas regiões paranaenses e sua repercussão sobre a saúde humana e animal vêm sendo apontados em estudos recentes (LICHT, O.A.B. & MORITA, M. C., 1995; LICHT, O.A. B, MORITA, M. C. & TARVAINEN, T., 1996, PINESE ET AL., 2001). Alguns elementos podem existir naturalmente no manancial ou resultarem da poluição, em geral superiores às especificadas nos padrões para águas de consumo humano, como no caso, da anomalia multielementar do Norte do Paraná, as quais destacam as elevadas concentrações do Flúor em Itambaracá (PINESE et al., 2002). Estudos realizados por Licht (2006) constataram a existência de uma elevação do teor de fundo de cloretos nas águas de bacias hidrográficas da região norte do Paraná que podem estar associadas às elevadas taxas de mortalidade por neoplasia hepática causados pela anomalia geoquímica de Cl - (Cloreto) acumulada por décadas nas áreas de culturas de café e algodão. Diante de tais questões torna-se clara a necessidade em desenvolver e aprimorar os estudos relacionados à hidrogeoquímica visando fundamentalmente à proteção da saúde pública e o controle de substâncias potencialmente prejudiciais à saúde fornecendo numa escala local, regional e nacional, subsídios para a construção de um banco de dados voltado ao planejamento e monitoramento ambiental. 3 - Materiais e métodos A área de estudo abrange os municípios de Santo Antônio da Platina e Jacarezinho encontra-se localizado na mesorregião do Norte Pioneiro do Estado do Paraná, com uma área de aproximadamente 1326,294 km² e uma população de 81.809 mil habitantes (IPARDES, 2012). A economia do município é dinamizada pelo forte desenvolvimento das atividades voltado para o setor agropecuário, sendo as principais atividades a agricultura, silvicultura, criação de animais, extração vegetal e pesca. Outros 114 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 setores importante para economia do município corresponde ao relacionado as atividades voltadas para indústria química de produção farmacêutica, Indústria têxtil, do vestuário e artefatos de tecidos e comércio varejista que emprega grande parte da população do município. Em relação ao abastecimento de água do município, este é estabelecido pela Companhia de Saneamento do Paraná – SANEPAR, segundo dados fornecidos pelo IPARDES, (2012) o abastecimento encontra-se divididos em distintas categorias sendo estas o abastecimento de área residencial, industrial, comercial, utilidade pública e poder público. Como pode ser observado na tabela. 1, de modo geral o uso mais significante dos recursos hídricos é para o abastecimento público correspondendo cerca de 24.921 unidades atendidas pela SANEPAR, seguida pela demanda dos estabelecimentos comercial com 1.643 unidades, o poder público 246 unidades e de utilidade Pública com 174 unidades. Para reunir os subsídios necessários à elaboração do presente trabalho, a primeira etapa consistiu em uma pesquisa bibliográfica junto ao dados textuais e referências disponíveis em livros, periódicos, revistas, dissertações. O trabalho prático consistiu na coleta das amostras de águas superficiais na porção superior da bacia hirogáfica do Rio das Cinzas distribuídas no perímetro do município, Santo Antônio da Platina e Jacarezinho. Assim, visando contemplar a área em estudo, esta sendo realizada a coleta de amostras na qual serão exposta a princípio sete amostras, visto que o estudo continua em andamente. A partir de orientações técnicas, para a armazenagem in loco, as amostras foram armazenadas e individualmente em frascos de polietileno já enxaguados, por no mínimo seis vezes, de modo que evitasse alguma interferência nos resultados desejados. Em campo os pontos de coleta foram georreferenciados com o auxílio de hardware, Global Positioning System (GPS) para que os mesmos pudessem ser mapeados. Com a amostra já identificado foi preenchido um laudo de campo com os seguintes registros: data, horário, se 115 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 choveu ou não no dia anterior, água de uso coletivo ou individual, tipo de poço, características do entorno do ponto de coleta. Juntamente ao Laboratório de Química Analítica da Universidade Estadual de Londrina, foram efetuadas as análises químicas das amostras para obter a quantidade de íons de fluoreto em solução. Para identificar a quantidade de íons de fluoreto utilizou-se o método de potenciometria direta com um eletrodo seletivo combinado de fluoreto e um eletrodo de referencia de calomelano. O aparelho utilizado no processo foi calibrado com cinco padrões de concentrações variáveis que darão origem ao gráfico de calibração necessário na obtenção dos íons de fluoreto presentes na amostra (FERNANDES et al., 2001 apud PIRES, 2008). Posteriormente com o auxílio do software Arcgis 9.0 foram confeccionados os mapas referentes a rede de drenagem espacializando a localização dos pontos de coleta. A partir dos dados organizados, foi possível determinar os índices de concentração de flúor em águas superficiais e correlaciona-los aos índices permitido pela Resolução CONAMA 020/86 no qual determina que o teor máximo de consumo adequado seja de 0,6 mg/L a 0,8 mg/L de flúor. Já com os índices organizados foi possível correlacionar as condições socioambientais da região abrangente aos pontos de coleta e às características geoquímicas dos minerais que compõe o material geológico, visando aferir o que levou a existência das concentrações anômalas de flúor. 4 - Resultados e discussões Deve-se entender, num primeiro momento, que, assim como os demais elementos químicos, há uma certa oposição entre os efeitos dos mesmos no organismo humano. De modo geral, em concentrações baixas, tais elementos apresentam-se benéficos para a saúde; todavia, se ingeridos em altas dosagens, podem acarretar diversos problemas, desde problemas intestinais, tonturas, dores de cabeça e até levar a morte. 116 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 As propriedades preventivas do flúor, aliado ao problema de cárie dental que assumiu dimensões muito preocupantes no Brasil, por volta de 1950, levou a adoção de um projeto de fluoretação da água, com o intuito de auxiliar no combate à cárie da população, sendo que esse processo de fluoretação consiste na aplicação de flúor na água, levando em conta os níveis de flúor que são considerados não agressivos à saúde humana (BRASIL, 2012). O flúor é um elemento químico do grupo dos halogênios, sendo o único isótopo e o mais eletronegativo dos elementos químicos. Em sua forma livre, possui uma coloração amarela e é altamente corrosivo, fazendo-o reagir com praticamente todas as substâncias orgânicas e inorgânicas (MARIMOM, 2006). Relembrando Whitford (1996), existe um consenso quanto a utilização do Flúor para o combate da cárie dentária, todavia, é conhecido a toxidade do referido elemento. Em altas dosagens, os efeitos desencadeados por ele variam desde distúrbios gástricos, permeando problemas como fluorose dentária e fluorose óssea, como sugere Scarpelli (2003) na tabela 2. Tabela 2 – Efeitos do flúor sobre a saúde humana Efeitos do íon flúor dissolvido em água sobre a saúde humana Concentração em mg/L Efeitos sobre a saúde 0,00 Limitação do crescimento 0,00 – 0,5 Não evita a cárie dental 0,5 – 1,0 Evita o enfraquecimento dos dentes Fluorose dental grave e fluorose 1,0 – 1,4 esquelética >1,4 Fluorose deformante Fonte: Adaptado de SCARPELLI (2003) A partir do tratamento dos dados foi possível estabelecer os valores relacionados aos teores de flúor em águas superficiais do município de Santo Antônio da Platina. Como pode ser observado na figura 2 os teores de flúor, encontrados na porção superior da bacia hidrográfica do rio das Cinzas variaram de 0,1mg/L a 1,19 mg/L. 117 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 O teor mais elevado está bem acima do recomendado pela OMS (1984), que de acordo com Scarpelli (2013, apud Canesso, 2007) se consumido por prolongado tempo e em doses excessivas pode vir a causar fluorose dental grave e fluorose esquelética. Figura 2 – Mapa representando os Teores de Flúor no Município de Santo Antônio da Platina, no Estado do Paraná Fonte: Silveira (2013). 5 - Considerações finais O trabalho procurou explanar de modo preliminar um diagnóstico das concentrações de íons de fluoreto presentes em águas superficiais da porção superior na bacia hidrográfica do rio das Cinzas, município de Santo Antônio da Platina. Diante de tais levantamentos verificou-se a presença de teor elevado de flúor superior ao padrão estabelecido pela Organização Mundial da Saúde. Logo, a constatação da presença de teor elevado evidencia a necessidade de se pensar em políticas integradas que permeie estudos 118 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 relacionados à qualidade da água na região, bem como a permanente fiscalização dos teores de flúor na mesma, planejamento para o abastecimento tendo em vista orientar o público do município, uma vez que o elevado teor encontrado pode comprometer a saúde e bem estar da população 6- Referências ARTIOLA, J.F. Industrial Sources of Pollution. In: Pepper, I.L.; Gerba, C.P. e Brusseau, M.L. Pollution Science. California: Academic Press, San Diego, Califórnia, 1996. 456 p. GUIMARÃES, S. M. Investigação da ocorrência de fluorose associada ao consumo de água subterrânea na região nordeste do estado de Goiás utilizando sistema de informações geográficas. 2006. Trabalho de Conclusão de Curso. (Graduação em Tecnologia em Geoprocessamento) Centro Federal de Educação Tecnológica do Estado de Goiás, Goiânia, 2006. IAPAR – Instituto Agronômico do Paraná. Médias Históricas. Disponível em: http://www.iapar.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=889. Acessado em: 10/01/2013. IPARDES - Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social. Caderno Estatístico do Município de Santo Antônio da Platina. Disponível em:http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/cadernos_municipios /santoantoniodaplatina2012.pdf. Acessado: 12/01/2013. Ano, 2012. IPARDES - Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social. Caderno Estatístico do Município de Jacarezinho. Disponível em: http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/cadernos_municipios/jac arezinho2012. pdf. Acessado: 12/01/2013. Ano, 2012 LICHT, O. A. B.; BITTENCOURT, André Virmond Lima . Mapas geoquímicos na delimitação de regiões de risco à saúde - estudos de casos no Estado do Paraná, Brasil. In: VIII Congresso Brasileiro de Geoquímica e I Simpósio de Geoquímica dos Países do MERCOSUL, 2001, Curitiba. Anais do VIII CBGq. Rio de Janeiro : Sociedade Brasileira de geoquímica, 2001. MARIMON, M. P. C. O flúor nas águas subterrâneas da formação Santa Cruz do Sul e Venâncio Aires, RS, Brasil. 2006. (Doutorado em Geociências) - Departamento de Geoquímica, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2006. ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE (OMS). Aplicaciones de la epidemiología al estudio de los ancianos. Informe de un grupo científico de la OMS sobre la epidemiología del envejecimiento. Genebra,1984. PINESE, J.P.P.; ALVES, J.C .; LICHT, O.A.B., PIRES, E. O. & MARAFON, E. Características geoquímicas naturais da água de abastecimento público 119 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 da porção extremo norte do Estado do Paraná. Brasil. João Pessoa: Anais do XLI Congresso Brasileiro de Geologia: a Geologia e o Homem, 2002. PIRES, E. O. Ambiente e saúde: o caso das águas superficiais em Itambaracá-PR. 2005. Monografia (Bacharelado em Geografia) – Universidade Estadual de Londrina, Londrina. 2005. PIRES, E. O. Geografia da saúde e geologia médica como instrumentos de planejamento e gestão em saúde ambiental : o caso das anomalias de flúor e da fluorose dentária em Itambaracá-Pr. 2008. Dissertação (Mestrado em Geografia) Universidade Estadual de Londrina, Londrina ,2008. SOUZA, D. F.;PINTO, A. L.; MENDES, A. M. S.; OLIVEIRAA, G. H. Classificação CONAMA das limitações de uso da água superficial da Lagoa Maior, Três Lagoas/MS. Revista Geonorte, Edição Especial, V.3, N. 4, p. 771780, 2012. BRASIL. Manual de Fluoretação da água para consumo humano. Fundação Nacional de Saúde, Brasília: FUNASA, 2012. Agradecimentos A Fundação Araucária do Estado do Paraná pelo suporte financeiro, bolsa produtividade, através do Projeto 25.247/2012. 120 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 MONITORAMENTO DO INÍCIO DO CICLO VEGETATIVO DA SOJA NO ESTADO DO PARANÁ UTILIZANDO IMAGENS EVI/MODIS, ANO SAFRA DE 2010/2011 Daniela Fernanda da Silva-Fuzzo1 Mateus Brossi dos Santos2 Jansle Vieira Rocha3 1 - Introdução O Brasil apresenta-se como segundo maior produtor mundial da cultura da soja responsável por 25% da safra mundial (Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO, 2010), sendo 25 milhões de toneladas da cultura produzida na região Centro Sul, ocupando o segundo lugar a região Sul com mais de 20 milhões de toneladas produzida, seguida das regiões sudeste e nordeste (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, 2010). Segundo Nani et al. (2007), tendo em vista a importância econômica da cultura a cada safra, é necessário um novo levantamento de dados referente às culturas agrícolas no país, estado ou em uma determinada região, a fim de auxiliar no planejamento e na tomada de decisão. No Brasil os dados referentes à produção agrícola são em função da área colhida e da produtividade obtida, pois apresentam baixo custo e mais simples, porém essas informações são obtidas por métodos subjetivos, fundamentados em opiniões de agentes do setor agropecuário (agricultores, financiadores, etc...). Com o lançamento dos satélites TERRA (dezembro de 1999) e AQUA (maio de 2002), ambos portando o sensor MODIS (Moderate Resolution Imaging Spectroradiometer), séries temporais de imagens com resolução temporal adequada e espacial moderada, com correção atmosférica e precisão 1 Universidade Estadual de Campinas / UNICAMP, Faculdade de engenharia Agrícola / FEAGRI. Laboratório de Geoprocessamento. Av. Cândido Rondon, 501, Barão Geraldo – Campinas/ SP – Cep: 3083-875. Email: [email protected]. 2 [email protected] 3 [email protected]. 121 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 na geolocalização, passam a ser disponíveis para a estimativa do inicio do ciclo vegetativo e da duração do ciclo de cultivo da soja por meio de sensoriamento remoto. No que diz respeito à resposta espectral da vegetação em relação a resposta espectral dos solos são utilizados os índices de vegetação (JACKSON, 1983). Os índices de vegetação são combinações matemáticas da resposta espectral de diferentes bandas do espectro eletromagnético, que faz com que a vegetação seja realçada em relação aos demais alvos, facilitando a sua identificação e o seu monitoramento a partir de dados de sensoriamento remoto. Desta forma, a utilização do sensoriamento remoto para agricultura, viabiliza o monitoramento de culturas desde o plantio até a colheita, e por meio do perfil do desenvolvimento da cultura de verão, registrado por imagens multiespectrais, podem viabilizar um método de mapeamento e determinação do início do ciclo vegetativo da cultura, com a vantagem de localizar esta informação e diferenciá-la dentro de uma região (ARAUJO, 2010). 2 - Objetivo O objetivo deste trabalho foi monitorar o inicio do ciclo vegetativo da cultura da soja no estado do Paraná na safra de 2010/2011, utilizando imagens EVI/MODIS. 3 - Procedimentos metodológicos O universo de análise engloba o estado do Paraná (Figura 1), localizado na região sul do país onde o clima predominante é temperado mesotérmico e superúmido, tipo climático Cfa – segundo a classificação climática de Koppen, com temperaturas moderadas, chuvas bem distribuídas e verão quente. Nos meses de inverno a média da temperatura é inferior a 16°C e nos meses de verão as máximas superam 30°C, sendo a média anual 21°C, ao sul do estado a temperatura tende a ficar abaixo de 18°C (mesotérmico), sendo a média da temperatura em torno de 22°C. (ARAUJO, 2010). Será analisado o ano agrícola da soja de 2010/2011. 122 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Figura 4. Mapa de localização do estado do Paraná. Foi utilizado as composições de imagens de 16 dias do sensor Modis/Terra (produto MOD13q1, Tile H13V11) com resolução espacial de 250m, referente ao índice de vegetação EVI (Enhanced Vegetation Index) representado pela equação 1, proposto por Huete et al. (1999) segundo os autores este índice de vegetação tem se mostrado interessante para o monitoramento agrícola, pois substitui com vantagens o NDVI (Normalized Difference Vegetation Index) por ser mais sensível à variação da estrutura, arquitetura do dossel e à fisiologia da planta ( HUNTE et al., 2002) EVI G * IVP VER IVP C 1 * VER C 2 * AZL L (1) onde: AZL = refletância no azul; C1 e C2 = são os coeficientes de ajuste para efeito de aerossóis na atmosfera; L= fator de ajuste do solo; G= fator de ganho ajustado. Estes produtos são disponibilizados gratuitamente em formato HDF (Hierarchy Data Format) no site da Embrapa (2012) em forma de Tiles. Disponível em: <http://www.modis.cnptia.embrapa.br/geonetwork/srv/pt/main.ho me>. 123 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Foi aplicado o algoritmo de suavização Hants (Harmonic Analysis of EVI Time-Series), onde cada pixel das imagem é ajustado eliminando variações bruscas nos valores espectrais do Índice de Vegetação. As imagens foram recortadas para o estado do Paraná, e préprocessadas pela linguagem de programação IDL (Interactive Data Language), versão 7.0, com este programa foi possível fazer o recorte da área, unir as imagens multitemporais, passar o filtro Hants, gerar as imagens RGB e o perfil automático de cada safra. O processamento das imagens do Sensor MODIS foi realizado por meio de software ENVI 4.5 (The Enviroment for Visualizing Imagens). Após mapear a cultura da soja através da composição RGB foi realizado a classificação da cultura, de modo a destacar apenas a cultura em questão. Assim as imagens que apresentaram o maior vigor vegetativo foram colocadas no canal R, em seguida as imagens de menor vigor nos canais G e B. Para visualização dos resultados e processamento dos dados foi utilizado o software ArcGis 9.3. A Figura 2 apresenta as principais etapas realizadas na confecção das máscaras da cultura da soja. Figura 2. Fluxograma geral das gerações das mascaras. 124 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 4 - Resultados A melhor forma encontrada para mapear a época de semeadura da cultura da soja no estado do Paraná foi através de composição decendiais de imagens RGB, mostrando apenas as regiões onde havia plantio. Na confecção das máscaras, foram separadas as áreas com a cultura da soja das demais coberturas do solo. Para os canais da composição colorida RGB constatou-se que o melhor resultado de corte para geração das máscaras foi obtido com R 240, GB 150, para o ano-safra de 2010/11, ou seja, foram selecionados os pixels com número de cinza (NC) >240 no canal R e NC < 150 nos canais GB. O resultado da distribuição espacial pelo estado, das áreas cultivadas com a soja é mostrado pela figura 3 pelas máscaras. Fica evidente pelos mapas a região do “cinturão da soja” que vai da região Oeste até a região Norte do estado, além de uma concentração da região Centro-Sul e Centro – Oriental. 125 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Figura 3. Máscara do inicio do ciclo vegetativo da cultura da soja no Estado do Paraná, Safra 2010/11. A cultura da soja no estado do Paraná para a safra de 2010/11 iniciou sua fase de semeadura a partir da segunda quinzena do mês de setembro, localizada na região do “cinturão da soja”. A partir da primeira quinzena de novembro inicia-se o cultivo na região centro sul e centro-oriental, reduzindo na região oeste. Na segunda quinzena do mês de novembro é possível observar que alguns municípios da região centro-sul do estado ainda estão iniciando seus plantios, diminuindo consideravelmente na porção oeste, do mesmo modo alguns municípios iniciaram seus plantios na primeira quinzena do mês de dezembro. Já para a segunda quinzena de dezembro foram muito poucos as localidades que apresentaram início de plantio da cultura da soja nessa época para o estado do Paraná. 5 - Considerações finais O planejamento e monitoramento do ciclo de produção agrícola são atividades fundamentais, porém muitas vezes prejudicadas pela falta de 126 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 informação ou subjetividade da mesma e tempo hábil para execução. Desta forma, o uso do sensoriamento remoto torna-se cada vez mais importante, contribuindo significativamente no monitoramento de áreas agrícolas, permitindo alcançar metodologias eficazes e de baixo custo. Por meio de composição RGB de imagens de mínimos e máximos de EVI, foi possível mapear o inicio do ciclo vegetativo para a safra de 2010/11, para o Estado do Paraná. As grandes vantagens da metodologia proposta para monitoramento das áreas cultivadas com soja são: o baixo custo (uso de imagens gratuitas), rapidez, objetividade, além de ser possível o conhecimento da distribuição espacial pelo estado. A utilização de composições RGB de mínimos e máximos foi eficaz para mapear a cultura da soja, porém resultados mais satisfatórios serão encontrados se utilizado sensor com melhor resolução espacial, assim, seria possível identificar áreas de ocupação da cultura bem como quantificá-la de forma precisa. 6 - Agradecimentos A faculdade de Engenharia Agrícola (FEAGRI) da UNICAMP , PIBIC e CAPEs 7 - Bibliografia ARAUJO,G.K.D. Determinação e mapeamento do início do ciclo para culturas de verão no estado do Paraná por meio de imagens de satélites e dados de precipitação. 2010. 157f. Dissertação (Mestrado), Universidade Estadual de Campinas,UNICAMP, Campinas. EMBRAPA MILHO E SORGO. Disponível em: http://www.cnpms.embrapa.br/publicacoes/milho/index.htm. Acesso em 25 de setembro de 2012. FAO FOOD and AGRICULTURE ORGANIZATION – Faostat. Dados estatísticos sobre a produção mundial de soja e milho. Disponível em: http://faostat.fao.org/site/567/default.aspx#ancor. JACKSON, R. D.; HUETE, A.R. Interpreting vegetation indices. Preventive Veterinary Medicine, v.11, n.3-4, p.185-200. 1991. 127 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 HUETE, A. R. A soil adjusted vegetation index (SAVI). Remote Sensing of Environment, v.25, p. 295-309. 1988. HUNTE, A.D.L.;MIURA, T.; RODRIGUES, E.P.; GAO, X.; FERREIRA, L.G.; Overview of the radiometric and biophysical performance of the MODIS vegetation indices. Remote Sensing of the Enviroment. v. 83, n.1-2, p.195213, nov, 2002. IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Banco de dados agregados – sistemas IBGE de recuperação automática – SIDRA. 2011. Disponível em: <http:www.sidra.ibge.gov.br>. Acesso em 25 de setembro de 2012. NANI, R.M.;GROFF,C.E.;CHICATI,L.M. Utilização de imagens de satélite na estimativa de produtividade em áreas de soja. Anais... XIII Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto, Florianópolis, Brasil, 21-26 abril 2007, INPE, p. 985-992. 128 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 ESTIMATIVA DA PRODUTIVIDADE DA SOJA NO MUNICÍPIO DE OURINHOS-SP POR MEIO DE MODELAGEM AGROMETEOROLÓGICA Daniela Fernanda da Silva-Fuzzo1 Angélica Prela-Pantano2 Marcelo Bento Paes de Camargo3 1 - Introdução Quanto melhor o conhecimento a respeito das condições ambientais de uma determinada região, melhor é a seleção das culturas adequadas, das épocas de plantio/semeadura e dos sistemas de cultivo, buscando sempre uma agricultura mais produtiva. Com isso modelos agrometeorológicos de deficiência e excedentes hídricos podem ser utilizados para estimar a produtividade de culturas. Modelos agrometeorológicos visam representar de forma simplificada as relações existentes entre a resposta fisiológica das plantas e as variáveis ambientais durante os diferentes estádios fenológicos de uma cultura (FONSECA et al., 2005) Do mesmo modo, Picini (1998) afirma que esses modelos consideram que cada fator climático exerce determinado controle na produtividade da cultura, funcionando como um fator de eficiência e os métodos para estabelecer a relação planta-clima variam desde a simples correlação até modelos mais complexos, nos quais diferentes parâmetros são considerados. Com intuito de melhorar a estimativa da produtividade da soja, uma vez que a precipitação é provavelmente a variável que apresenta maior variabilidade espacial, e com a baixa densidade de postos meteorológicos na região do Vale do Médio Paranapanema, tem sido uma ferramenta 1 Doutoranda pela Universidade Estadual de Campinas / UNICAMP, Faculdade de Engenharia Agrícola/FEAGRI. Laboratório de Geoprocessamento. Campinas/SP Email: [email protected] 2 Instituto Agronômico de Campinas (IAC/APTA/SAA), Campinas-SP, Brasil, Pesquisador Científico, IAC/APTA/SAA, Campinas-SP, Brasil; Email: [email protected] 3 [email protected] 129 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 extremamente útil segundo trabalhos (COLLISCHONN et al., 2007 e SILVA et al. 2013) a utilização de dados estimados por satélites meteorológicos. 2 - Objetivo Os objetivos foram testar modelos agrometeorológicos que levam em consideração deficiências e excedentes hídricos para a estimativa da produtividade da cultura da soja para o município de Ourinhos, considerando dados meteorológicos das estações convencionais e dados de precipitação estimados pelo satélite TRMM (Tropical Rainfall Measuring Mission). Para os anos agrícolas de 1998/99 a 2007/2008. 3 - Procedimentos metodológicos O município de Ourinhos encontra-se no Vale do Médio Paranapanema, está localizada no Sudoeste Paulista. Segundo Prado et al. (2003), a temperatura média da região fica em torno de 20,6° C e a precipitação pluvial anual 1.217 mmm, segundo a classificação climática de Koppen o tipo dominante é o “Cwa” (definido como mesotérmico de inverno seco), porém a região se encontra em uma área de transição climática para “Cfa” (mesotérmico e úmido). Para a análise e teste dos modelos agrometeorológicos foram utilizados dados de produtividade de soja (kg.ha-1) do Instituto de Economia Agrícola (IEA), referentes aos anos agrícolas de 1998/99 a 2007/08 e os dados referente à precipitação pluvial foram obtidos por estações convencionais do Centro Integrado de Informações Agrometeorológicas (CIIAGRO) do Centro de Ecofisiologia e Biofísica do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), e através do satélite TRMM, com o intuito de melhorar análise, uma vez que os dados estimado pelo satélite corresponde uma maior resolução espacial ( 25° x 25°) comparado ao dado da estação meteorológica convencional (SILVA, 2013) o sensor do TRMM utilizado foi o PR (Radar de Precipitação). Os valores de temperatura máxima e mínima do ar foram obtidos junto ao banco de dados do (CIIAGRO/IAC). A estimativa do balanço hídrico foi 130 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 baseadas no método de Thornthwaite e Mather (1955), em escala decendial, o qual fornece estimativas de: evapotranspiração real (ETr), armazenamento de água no solo (ARM), deficiência (DEF) e excedente hídricos (EXC) que foram utilizadas nos modelos agrometeorológicos. O primeiro modelo utilizado foi baseado em Doorenbos e Kassam (1979), que considera o produtório das relações ETr/ETp em nível decendial, reduzindo a produção à medida que as necessidades hídricas da cultura da soja deixam de ser satisfeitas durante os estádios fenológicos considerados. Ya 4 Yp i 1 ETr 1 ky i 1 ETp i Onde, (Modelo 1) -1 significa produtório, Ya é a produtividade estimada (kg.ha ); Yp, a produtividade potencial (kg.ha-1); ETr, a evapotranspiração real (mm); ETp, a evapotranspiração potencial (mm); e o kyi é, o coeficiente de penalização da produtividade por deficiência hídrica para cada estádio fenológico. O segundo modelo utilizado também, baseado em Doorembos e Kassam (1979) e modificado por Camargo (1986), o qual leva em consideração um fator relacionado à penalização para excedentes hídricos, denominado fator excedente (fs). A inclusão desse fator no modelo tende a melhorar o desempenho do modelo, visto que períodos com excesso de chuva, especialmente durante o florescimento até a maturação, resultam em considerável redução na produtividade de grãos. Ya Yp 4 = i 1 ETr * [1 - ke i (1 - fs i )] 1 - ky i 1 ETp i sendo fs 1 EXC ETp EXC (Modelo 2) Onde, os valores de ky foram os mesmos do modelo 1, e ke o coeficiente de penalização da produtividade por excedente hídrico, proposto por CAMARGO et al. (1986), com valores de 0,0 para o estádio do desenvolvimento vegetativo e de 0,1 para os estádios do florescimento, formação de vagens e enchimento de 131 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 grãos e maturação. O fator excedente (fs) é a relação entre o excedente do balanço hídrico (EXC) e a ETp em períodos decendiais. Para a avaliação dos resultados foram utilizadas as análises estatística de regressão linear relacionando dados estimados com os observados e encontrados os valores de R2, d de Wilmot, EMA (Erro Médio), Es (Erro Sitemático), Ea (Erro Aleatório), e o índice C . 4 - Resultados Foram analisados dados referentes à produção agrícola da cultura da soja no período de 1998/99 a 2007/08 (Figura 1). A produtividade variou de 1200 a 2880 kg.ha-1. Figura 1. Produtividade Agrícola para o município de Ourinhos Nas tabelas 1 e 2, estão apresentados as análise estatística tanto para o modelo1 que considera deficiência hídrica, quanto para o modelo 2 que considera deficiência hídrica e excedente hídrico, respectivamente. Podemos observar que o índice “d” de Willmott, o coeficiente de correlação R, o coeficiente de determinação (R²), o índice ‘c’, bem como outras informações relevantes como, EMA, Ea e Es, apresentaram uma melhora considerável dos valores analisados quando testados com dados do satélite TRMM (Tabela 2). Estes resultados podem ser considerados devido a uma maior cobertura espacial do TRMM quando correlacionados com dados regionais de produtividade. 132 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Tabela 1. Análise estatística dos Modelos Agrometeorológicos (Estações Convencionais) Modelo1 Modelo2 d R R² C EMA Ea Es 0,85 0,76 0,84 0,85 0,70 0,72 0,71 0,65 394,63 515,46 337,64 266,45 319,50 529,08 Tabela 2. Análise estatística dos modelos agrometeorológicos (Dados TRMM) d Modelo1 Modelo2 R 0,87 0,91 0,93 0,90 R² 0,87 0,81 C 0,81 0,82 EMA 298,33 198,45 Ea 146,96 170,70 Es 320,92 213,35 A margem de erro associado aos dados desses dois modelos justifica-se devido à utilização da temperatura média utilizada para todo o período da região de Assis. Isto porque os dados de temperatura de Assis não apresenta falhas e representa a média da região considerada, o que não apresenta grandes variações altimétricas Quando foram utilizados os dados estimados de precipitação pluvial do satélite TRMM (Figura 3), houve considerável aumento nos valores de R² e do índice d no desempenho dos modelos. Esta melhora se deu uma vez que os pontos do satélite TRMM apresentam uma maior cobertura espacial (25°x 25°), em relação às estações meteorológicas convencionais, que são pontuais e que representam cobertura média de 5 km por 5 km (CAMARGO et al., 2005). Figura 2. Modelo Agrometeorológico testado com dados obtidos em Estação Meteorológica Convencional e dados de produtividade do IEA, período de 1998/99 a 2008/09. 133 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Figura 4. Modelo Agrometeorológico testado com dados obtidos de precipitação pelo TRMM e dados de produtividade do IEA, período de 1998/99 a 2008/09. Na figura 5 podemos observar melhor que o modelo 2 que leva em consideração os valores de precipitação pluvial estimados pelo satélite TRMM aproximou-se mais dos valores de produtividade da cultura da soja para o município de Ourinhos. Figura 4. Produtividade Observada, produtividade estimada pelo Modelo Agrometeorológico 1 e por meio do Modelo Agrometeorológico 2. . 5 - Considerações finais O modelo agrometeorológico mostrou melhor desempenho quando testado com valores obtidos a partir de dados de precipitação pluvial estimados pelo satélite TRMM. 134 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Os modelos avaliados apresentaram semelhança e desempenho satisfatório para estimativa de produtividade da soja para o município de Ourinhos, com valores altos de R², R e d de Wilmott. Dados estimados de precipitação pluvial estimado pelo satélite meteorológico TRMM pode ser utilizado como ferramenta útil na utilização e calibração dos modelos Agrometeorológicos. 6 - Bibliografia CAMARGO, M.B.P.; BRUNINI, O. & MIRANDA, M. A. C. Modelo agrometeorológico para estimativa da produtividade para a cultura da soja no Estado de São Paulo. Bragantia, Campinas, v. 45, n. 2, p. 279-292, 1986. COLLISCHONN, B.; ALLASIA, D.; COLLISCHONN, W.; TUCCI, C.E.M. Desempenho do satélite TRMM na estimativa de precipitação sobre a bacia do Paraguai superior. Revista Brasileira de Cartografia, Porto Alegre, v. 59, n. 1. p. 93-99, 2007 DOORENBOS, J.; KASSAM, A. H. Yield response to water. Rome, FAO, 1979. 197p. FONSECA, E.L. da; FORMAGGIO, A.R.; PONZONI, F.J. Parametrização de modelo agrometeorológico - espectral para estimativa da produção de pastagens do bioma Campos Sulinos (RS). In: XVII SIMPÓSIO BRASILEIRO DE SENSORIAMENTO REMOTO, 2005, Goiânia, Anais... São José dos Campos: INPE, 2005. p. 127-134. PICINI, A.G. Desenvolvimento e teste de modelos agrometeorológicos para a estimativa de produtividade do cafeeiro (Coffea arabica L.) a partir do monitoramento da disponibilidade hídrica do solo. 1998. 132f. Dissertação (Mestrado em Agronomia) - Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”Esalq, Piracicaba. PRADO, H; MENK, J.R.F; TREMOCOLDI, W.A; JORGE, J.A. Levantamento Pedológico detalhado do Pólo Regional de desenvolvimento tecnológico dos Agronegócios do Médio Paranapanema, Assis (SP). Campinas: Instituto Agrônomico: 2003 (Série Pesquisa APTA. Boletim Científico, 07). 19p. SILVA. D,F, PRELA-PANTANO, A. CAMARGO. M.B.P. Análise de dados de precipitação estimados pelo satélite TRMM para o Vale do Médio Paranapanema – SP. Revista Engenharia na Agricultura Viçosa – MG v.21 n2, março/abril 2013. THORNTHWAITE, C.W.; MATHER, J.R. The water balance. In: Centerton, N. J. (ed), (Publ. in Climatology, v. 8, n. 1), 1955. 104p. 135 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 TRMM. Tropical Rainfall Measuring Mission. Disponível em: http://trmm.gsfc.nasa.gov/data_dir/data.html. Acessado em 05 de setembro de 2010. WILLMOTT, C.J., ACKLESON, S.G.; DAVIS, J.J. Statistics for the evaluation and comparison of models. Journal of Geography Research. v. 90, n. 5, p. 8995-9005, 1985 136 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 A UTILIZAÇÃO DO GEOPROCESSAMENTO APLICADA À ANÁLISE MORFOESTRUTURAL Aline Natasha Pereira1 Marcilene dos Santos2 Alexandre Catania Greco de Oliveira3 1 - Introdução Mesmo antes da geomorfologia se tornar uma ciência sistematizada, filósofos gregos, até mesmo Leonardo da Vinci, indagavam sobre a força e os mecanismos criadores da paisagem natural (SUMMERFIELD, 1991). Durante o desenvolvimento da geomorfologia, as formas do relevo como objeto de estudo e toda sua dinâmica e evolução adquirem um papel preponderante. Isso ocorre devido à forma incisiva que a configuração do relevo se insere no cotidiano das pessoas, constantemente redefinindo a sua relação com o espaço, sendo decisiva nos aspectos mais básicos como moradia e todas as implicações de risco que isso envolve. Dentro do estudo da geomorfologia uma área que se destaca é o estudo morfoestrutural e morfotectônico sendo que tais conceitos fundamentam-se na premissa penckiana do jogo de forças, internas e externas, que através de um conjunto de processos responde pela gênese do modelado do relevo terrestre (CASSETI, 2005). Segundo Saadi et al. (2005), morfoestrutura refere-se às formas de relevo adaptadas, no momento de sua formação, à presença de estruturas geológicas passivas, estabilizadas, incluindo falhas, distintamente da morfotectônica, definida como o estudo das relações de causa-efeito entre a atividade tectônica e a geomorfogênese. Para a realização das análises morfoestruturais cada vez mais a utilização dos SIG´s se tornou difundida, já que, segundo Fitz (2009), essas 1 Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho” Campus Experimental de OurinhosUNESP, [email protected]. 2 Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho” Campus Experimental de OurinhosUNESP, [email protected]. 3 Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho” Campus Experimental de OurinhosUNESP, [email protected]. 137 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 ferramentas começam a se destacar diante da utilização de mapas físicos. Avanços nas mais diversas áreas em meados do século XX, principalmente na tecnologia da informação proporcionaram significativas mudanças no modo de representar os mapas cartográficos e gerenciamento dessas informações, segundo (CÂMARA e DAVIS, 2004, apud MOREIRA, 2011, P. 202), “tornou-se possível armazenar e representar tais informações em ambiente computacional, abrindo espaço para o surgimento do Geoprocessamento”. A Geomorfologia, uma ciência integradora de conceitos e teorias de diversos campos do conhecimento científico como pedologia, geologia, climatologia, hidrologia entre outras, utiliza o SIG como ferramenta de auxílio para interpretação da dinâmica da paisagem. Pressupondo da crescente interatividade e disponibilidade tecnológica atual, pode-se assegurar que o meio digital e analógico (impresso) devem ser amplamente divulgados e de fácil acesso aos usuários. Mediante tal constatação, o presente trabalho vem detalhar os métodos e procedimentos adotados para elaboração de mapas de lineamentos estruturais e diagramas de rosetas, e perfis topográficos voltada à análise morfoestrutural da bacia do rio das Cinzas. 2 - Caracterização da área de estudo A bacia do rio das Cinzas (Figura 1) localiza-se no norte do estado do Paraná, entre as coordenadas UTM 7462 883m e 7293 709 m N e 536 782 e 624 483 m E, e faz parte do Comitê de Bacias Norte Pioneiro, unidade de gestão integrante da UGRH Paranapanema na porção paranaense. Com uma área de drenagem de 9.754 km2, a referida bacia, de significativa importância econômica para o nordeste do Paraná, nasce na Serra de Furnas, na porção ocidental da escarpa devoniana, e deságua à margem esquerda no rio Paranapanema, delineando o limite intermunicipal entre os municípios paranaenses de Itambaracá e Santa Mariana (BRASIL, 2012). Segundo dados de Brasil (2012), a geologia da bacia do rio das Cinzas é constituída por diversas unidades paleozóicas e mesozóicas da Bacia do 138 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Paraná (formações Furnas, Ponta Grossa, Rio Bonito, Serra Alta, Teresina, Rio do Rasto, Grupos São Bento e Itararé), predominando, em termos de área, as rochas basálticas da Formação Serra Geral (Jurássico-Cretáceo) e as rochas sedimentares (siltitos, argilitos, tilitos, diamictitos e folhelhos) do Grupo Itararé (Carbonífero). Figura 1: Localização da Bacia do Rio das Cinzas no Estado do Paraná Fonte: Santos e Oliveira (2013) De acordo com Oka-Fiori e Santos (2006), a Bacia do Rio das Cinzas está na unidade morfoestrutural da Bacia do Paraná, contendo as unidades morfoesculturais, denominadas de Segundo Planalto Paranaense (alto e médio curso) e Terceiro Planalto Paranaense (baixo curso). 139 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 3 - Metodologia Diversos estudos trabalhos voltados para os estudos morfoestruturais, utilizam na sua metodologia as técnicas de geoprocessamento, dentre os quais pode-se citar, a título de exemplo, Araújo et al (2003), na análise morfoestrutural de áreas da Bacia do Paraná, Couto et al (2011) em que fazem a análise morfoestrutural de Faxinal (PR), Etchebehere et al. (2005) no Vale do Rio do Peixe, Ghromann (2004) na borda leste do Quadrilátero Ferrífero, Hiruma e Riccomini (1999) em seu trabalho acerca da neotectônica no Planalto de Campo de Jordão. No caso da bacia do rio das Cinzas, apresentado neste trabalho, utilizouse o Arcgis 9.3 para a geração de mapas de declividade, hidrografia, curvas de nível, lineamentos e estabeleceu-se algumas áreas prioritárias para os trabalhos de campo. Inicialmente, foram utilizadas como base as cartas topográficas do Brasil de escala 1: 250000 produzidas pelo IBGE – Diretoria de Geodésia e Cartografia, quais sejam as folhas SF-22-Z-A, SF-22-Z-C e SF-22-X-A referentes à Marília, Cornélio Procópio e Telêmaco Borba respectivamente. As referidas cartas abrangem a área de bacia do rio das Cinzas e foram necessárias para localização das imagens SRTM (Shuttle Radar Topography Mission) disponíveis no site da Embrapa (www.relevobr.cnpm.embrapa.br) que possibilitaram a elaboração de mapas detalhados do relevo da região. Para uma correta amostragem e simplificação da área de estudo foi necessária a delimitação da bacia através da vetorização de um polígono que posteriormente foi utilizado para que a área pudesse ser recortada das imagens SRTM e respectivas cartas topográficas. Para a elaboração do MDT (Modelo Digital do Terreno) foram geradas as curvas de nível na ferramenta spatial analyst tools e em seguida foi gerado o MDT com a ferramenta create/modify TIN, sobrepondo assim a hipsometria. Em seguida, fez-se um recorte da área de estudo específica. 140 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Também foi utilizado o software Global Mapper 14 para a retirada dos perfis topográficos através da ferramenta 3D Path Profile/Line of Sight Tool; traçandose uma reta na área do MDT o perfil é gerado automaticamente. Os lineamentos de drenagem e de relevo da bacia foram demarcados a partir de segmentos retilíneos de drenagem e de escarpas de relevo retilíneas, bem como de cristas alinhadas com base nas folhas topográficas do IBGE na escala 1:250.000, quais sejam "Marília, Telêmaco Borba, Cornélio Procópio" (Folhas FS 22-Z-A, SF 22- Z-C e SG- 22- X- A), assim como nas imagens SRTM da referida área, tratadas no ArcGis 9.3 e no Global Mapper para a elaboração do Modelo Digital do Terreno. Os lineamentos foram vetorizados através do MDT e a partir destes, foram feitos os diagramas de rosetas para a freqüência absoluta e comprimento absoluto, objetivando uma análise mais detalhada dos mesmos e sua relação com a assimetria da bacia. 4 - Resultados e discussão A partir do MDT gerado, foi possível realizar a análise geomorfológica preliminar da área, na medida em que este permite a visualização do relevo e a classificação das suas diversas altitudes e distintos compartimentos. Desta forma, o MDT facilitou a definição dos trechos e direções prioritárias para o traçado dos perfis topográficos, caracterizando com maior precisão as principais mudanças altimétricas, bem como mudanças no padrão de dissecação e de lineamentos de drenagem e de relevo. Tais produtos auxiliaram no planejamento e definição dos pontos e trechos chaves para a pesquisa empírica em campo, visando à delimitação dos compartimentos morfoestruturais da área. Além disso, a confecção da base digital georreferenciada a partir das imagens SRTM, bem como do MDT, possibilitou a visualização integrada de diversos elementos considerados em um estudo morfoestrutural, como os lineamentos estruturais, a geologia e a geomorfologia, as declividade (Figura 2), o padrão de dissecação e a hipsometria, permitindo um melhor entendimento do comportamento morfoestrutural geral da área. 141 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Figura 2: Mapa de declividade da bacia do rio das Cinzas Fonte: Pereira e Oliveira (2013) Através da sobreposição do MDT e dos lineamentos foi possível verificar a presença de lineamentos bem marcados (Figura 3) nas direções NW (noroeste), NE (nordeste), E-W (leste-oeste) a ENE (leste-nordeste) e N-S (norte-sul). Posteriomente, verificou-se em campo que tais lineamentos correspondem a zonas de fraturamento e zonas de falhas presentes nas diferentes formações geológicas, podendo estar associadas a estruturas mais antigas ligadas à última orogênese bem como a reativações neotectônicas. 142 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Figura 3: Principais lineamentos estruturais da bacia do rio das Cinzas superpostos no mapa hipsométrico. Fonte: Santos e Oliveira (2013) Os presentes perfis (Figura 4) permitiram a análise detalhada das diferenças altimétricas presentes na área, sendo estas utilizadas para a realização da compartimentação morfoestrutural. Cabe destacar o perfil U- V, onde é verificada a diminuição de altimetria ao Norte marcando o vale do Rio Jacarezinho e as maiores altitudes localizadas ao Sul da bacia. Já o perfil C-D demonstra a presença da estrutura 143 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Nordeste que corta a bacia, essa mudança de altitude também pode ser observada no perfil S-T ocorrendo uma mudança brusca de altitude com cerca de 200 metros de desnível. Tais perfis também destacaram o forte basculamento para oeste-noroeste na área estudada. Através das rosetas (Figura 5) é possível identificar as áreas com maior frequência e os diferentes níveis de comprimento dos lineamentos, tornando a análise dos lineamentos mais precisa. Desta forma, na presente área de estudo, é possível verificar tanto em relação ao comprimento quanto em relação à frequência que há uma maior ocorrência de lineamentos NW- SE e uma forte concentração de lineamentos NE-SW. Destes, os lineamentos NWSE ocorrem com maior frequência e comprimento em N40W e N50W, já os lineamentos NE-SW possuem o seu comprimento principalmente na direção N50E e N60E, e a frequência em N40E e N50E. Já os lineamentos EW e NS são encontrados em menor quantidade, sendo os lineamentos EW com frequência e concentração em E80W, e os lineamentos NS com maior concentração e frequência em N10S. Figura 4: Perfis topográficos traçados a partir do MDT da área da bacia do rio das Cinzas. Fonte: Pereira (2013) 144 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Através das rosetas (Figura 5) é possível identificar as áreas com maior frequência e os diferentes níveis de comprimento dos lineamentos, tornando a análise dos lineamentos mais precisa. Desta forma, na presente área de estudo, é possível verificar tanto em relação ao comprimento quanto em relação à frequência que há uma maior ocorrência de lineamentos NW- SE e uma forte concentração de lineamentos NE-SW. Destes, os lineamentos NW-SE ocorrem com maior frequência e comprimento em N40W e N50W, já os lineamentos NE-SW possuem o seu comprimento principalmente na direção N50E e N60E, e a frequência em N40E e N50E. Já os lineamentos EW e NS são encontrados em menor quantidade, sendo os lineamentos EW com frequência e concentração em E80W, e os lineamentos NS com maior concentração e frequência em N10S. Figura 5: Diagramas de rosetas a partir dos lineamentos estruturais levantados. Fonte: Santos e Oliveira (2013) 5 - Conclusões É possível concluir dessa forma que as técnicas de geoprocessamento são fundamentais nas análises geomorfológicas, permitindo uma melhor análise integrada dos dados de natureza distinta. 145 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Tais técnicas também permitem uma otimização dos trabalhos de campo em estudos morfoestruturais, pois indicam os setores prioritários para verificação e análise empírica. 6 - Agradecimentos À Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo pelo apoio financeiro ao projeto. - Processo 2012/04514-6 7 - Referências 2- ARAÚJO, C. C.; YAMAMOTO, J.K.; MADRUCCI, V. Análise morfoestrutural em área de decorrência de arenito asfáltico, Bacia do Paraná, São Paulo. Revista do Instituto Geológico, São Paulo, 24(1/2), p.25-41, 2003. BRASIL. Conselho Nacional de Recursos Hídricos Paranapanema: Caracterização Geral. v. 2. <http://www.paranapanema.org> Acesso em : 6 fev. 2012. CNRH. In: Disponível UGRH em: CASSETI, V. Geomorfologia. [S.l.]: [2005]. Disponível <http://www.funape.org.br/geomorfologia/>. Acesso em: 08/01/2013 em: COUTO, E. V.; MANIERI, D. D.; MANOSSO, F. C. ; FORTES, E. Correlação morfoestrutural da rede de drenagem e lineamentos da borda planáltica, Faxinal, Paraná. Geociênc. (São Paulo) [online]. 2011, vol.30, n.3, pp. 315-326. EMBRAPA. Embrapa Monitoramento por Satélite. Campinas, 2005. Disponível em: <www.relevobr.cnpm.embrapa.br>. Acesso em: 6 fev. 2013. FITZ, P. R. Geoprocessamento sem complicação. São Paulo: Oficina de Textos, 2009. FIORI S. R. Mapas para o turismo e a interatividade proposta teórica e prática. Tese de Doutorado – FFLCH USP – 2007. GROHMANN, C. H.: Morphometric analysis in geographic information systems: applications of free software GRASS and R, Comput. Geosci., 30, 1055–1067, 2004. HIRUMA, S.T.; RICCOMINI. C. Análise morfométrica em neotectônica: o exemplo do Planalto de Campos do Jordão, SP. Revista do Instituto Geológico, 20 (1/2), p. 5-19, jan/dez 1999. MOREIRA, M. A. Fundamentos do sensoriamento remoto e metodologias de aplicação. – 4ª ed. atual. e ampl. – Viçosa, MG: Ed. UFV, 2011. OKA FIORI, C.; SANTOS, L. J. C. (Coord.). Atlas geomorfológico do Estado do Paraná Escala base 1: 250.000, modelos reduzidos 1:500.000. Minerais do Paraná/Universidade Federal do Paraná. Curitiba, 2006. SAADI, A.; BEZERRA, F.H.R.B.; COSTA, R.D.; IGREJA, H.L.S.; FRANZINELLI, E. Neotectônica da Plataforma Brasileira. In: SOUZA, C.R.; SUGUIO, K. ; OLIVEIRA, A.M.S.; OLIVEIRA, P.E. (Eds.). Quaternário do Brasil. Ribeirão Preto: Holos, 2005. Cap.10. 146 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 SUMMERFIELD, M. A. - 1991 - Global Geomorphology .Longman Scientific & Technical, 537p. 147 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 MAPEAMENTO DO USO DO SOLO NA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIBEIRÃO BARRA FUNDA, EM LONDRINA, PR Heitor Matos da Silveira1 Nazareno Agustín Escobar2 Naibi Souza Jayme3 Introdução O desenvolvimento tecnológico nas últimas décadas trouxe (re)evoluções na ciência, principalmente nos estudos científicos. Este desenvolvimento tecnológico propiciou avanços nos estudos da Terra a partir de sistemas de satélites, tanto os chamados geoestacionários e polares. Tais estudos visam contribuir um monitoramento da terra a partir de uma escala ampliada, permitindo estudos referentes a clima, solo, relevo, desmatamento, uso do solo, perda de solo por problemas ambientais, queimadas, dentre outros. Nisto, o Sensoriamento Remoto se faz como uma área que busca, a partir de imagens obtidas por sensores instalados em satélites, estudar o espaço com outra ótica. O Sensoriamento Remoto é o “conjunto de técnicas destinado à obtenção de informação sobre objetos, sem que haja contato físico entre eles” (NOVO; PONZONI, 2001). As informações obtidas tem um elemento fundamental que propicia a obtenção dessas informações: a REM (Radiação Eletromagnética). A REM “é caracterizada em comprimentos de onda que representam a distância entre dois pontos de igual intensidade dos campos elétrico e magnético” (NOVO; PONZONI, 2001). Este conjunto de comprimentos de onda na qual compõem a REM é conhecido como espectro eletromagnético, que varia dos raios gama (ondas pequenas) para ondas grandes como as de rádio (NOVO; PONZONI, 2001). As interações entre REM, sensor receptor das ondas eletromagnéticas e alvo propiciam a obtenção pelos satélites de imagens orbitais. Satélites como 1 Graduando em Geografia pela Universidade Estadual de Londrina. [email protected] 2 Graduando em Geografia pela Universidade Estadual de Londrina. [email protected]. 3 Mestranda em Geografia pela Universidade Estadual de Londrina. [email protected] 148 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Landsat e Ikonos são exemplos dos satélites utilizados em estudos ambientais e urbanos. Dentre estes, o satélite clássico utilizados em diversos estudos é o Landsat, mais atualmente, o Landsat 5 e 7. Um dos principais satélites da série Landsat é o Landsat 5, lançado em 1984 e em funcionamento até hoje, “muito além do seu tempo previsto de vida útil” (LIU, 2006). Junto do desenvolvimento tecnológico e computacional vivido, ocorreu, também, desenvolvimento de softwares para processamento rápido de dados espaciais; nisto, ocorre surgimento do Geoprocessamento. O Geoprocessamento constitui na disciplina que utiliza técnicas matemáticas e computacionais para o tratamento da informação geográfica e que vem influenciando de maneira cresce as áreas de Cartografia, Análise de Recursos Naturais, Transportes, Comunicações, Energia e Planejamento Urbano e Regional (CÂMARA; DAVIS, 2001). Para este processamento, foram desenvolvidas ferramentas computacionais, os chamados SIG, que “permitem realizar análises complexas, ao integrar dados de diversas fontes e ao criar bancos de dados georeferenciados” (CÂMARA; DAVIS, 2001). Ainda, entende-se que um SIG “[...] dispõe de ferramentas que permitem cruzamento de diferentes temas, bem como análise de natureza espacial complexa como proximidade e conectividade, fundamentais em estudos e projetos que se utilizam desse tipo de dados” (TEIXEIRA; MORETTI; CHRISTOFOLETTI, 1992). Um dos softwares de SIG que se destacam nacionalmente pela sua gratuidade e pelo seu processamento rápido de imagens de satélite é o SPRING – Sistema de Processamento de Informações Georeferenciadas (http://www.dpi.inpe.br/spring/), desenvolvido pelo INPE – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, visando permitir aos pesquisadores ter em mãos um software rápido, completo e confiável, principalmente no que concerne ao Processamento Digital de Imagens. Em trabalhos realizados que fazem uso destes recursos para mapeamento digital, temos o mapeamento referente ao uso do solo como um dos tipos de mapeamentos mais importantes no que concerne a revelar as 149 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 faces das ações que os fatores antrópicos provocam em um determinado ambiente, mais comumente uma bacia hidrográfica. Uma bacia hidrográfica é resultante “de esforços endógenos e exógenos, sendo assim modeladas pelas especificidades geológicas e climáticas locais, além de sofrerem interferências dos fatores antrópicos, em suas estruturas físicas e químicas, decorrentes do uso do solo” (OLIVEIRA; FRAGA, 2008). Para o presente trabalho, fora estudada a bacia hidrográfica do Ribeirão Barra Funda, localizada no município de Londrina, na parte sul do mesmo, onde a figura 1 demonstra a localização da bacia. Figura 5 - Localização da bacia hidrográfica do Ribeirão Barra Funda em Londrina, Paraná Org: Silveira, 2013 O presente trabalho tem como norte realizar o mapeamento do uso do solo da bacia hidrográfica do Ribeirão Barra Funda. Com este mapeamento e estudo, buscou-se entender quais são os tipos de uso na bacia e o quanto 150 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 esses usos ocupam na bacia, delimitando se a bacia se faz como uma bacia que está se configurando com um uso voltado para a agricultura. Para isto, foram utilizadas técnicas de Geoprocessamento usando imagens orbitais obtidas pelo satélite Landsat 5. Materiais e métodos Visando alcançar os objetivos deste trabalho, foram utilizadas imagens do satélite Landsat 5 com o sensor Thematic Mapper (TM), na órbita 222, ponto 076, do dia 26/06/2010, utilizando-se das bandas 3, 4 e 5. Para processamento digital das imagens, utilizou-se o software SPRING 5.1.8, desenvolvido pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE. Neste software, as imagens foram contrastadas, resultando em uma composição sintética R5G4B3. Com a imagem Landsat contrastada, gerou-se o mapa de uso do solo, utilizando o classificador MaxVer (Máxima Verossimilhança), com Rejeição de 0%, Desempenho médio de 92,15% e Confusão média de 7,85%. Ainda, foram geradas cartas de declividade e hipsometria da referida bacia, utilizando imagens de radar SRTM (Shuttle Radar Topographic Mission). O layout das cartas foram realizadas no software CorelDraw X6. Resultados e discussões A partir das imagens SRTM, em ambiente SPRING, foram geradas curvas de nível e a análise exploratória estatística para visualizar a altitude máxima e mínima. Com tal informação, fora realizado o fatiamento das classes de altitude (em metros) e em seguida foram associadas às fatias com as classes temáticas. Em seguida, gerou-se a grade de declividade e, novamente, análise exploratória estatística para visualizar o mínimo e o máximo de declividade na bacia, juntamente com o fatiamento das classes de declividade e associação com as classes temáticas. Nisto, geraram-se cartas de hipsometria e de declividade. Destarte, fora possível entender o quadro de altimetria na região onde se localiza a bacia. A figura 2 disponibiliza a visualização da hipsometria local. 151 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Figura 6 - Carta de hipsometria da bacia do Ribeirão Barra Funda, gerada no software SPRING Fonte: SRTM – Embrapa. Org: Silveira e Escobar, 2013. A bacia do ribeirão Barra Funda apresenta altitudes que variam de 410830 m. Todavia, ao se realizar a medição de classes em ambiente SPRING das classes de hipsometria, fora possível visualizar que as altitudes predominantes na bacia são as que variam de 610-730, tendo esta variação um valor total de 49.62 km², de acordo com os dados disponibilizados na tabela 1. Nisto, podese inferir que a bacia apresenta uma altitudes médias e não apresenta partes tão elevadas, considerando-a em seu total. 152 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Tabela 4 - Medidas de classes de hipsometria, em km² Medidas de Classes de Hipsometria Altitudes em metros Área em km² 410-450 1.17 450-490 3.32 490-530 7.28 530-570 12.09 570-610 13.29 610-650 16.02 650-690 17.27 690-730 16.33 730-770 13.88 770-810 6.47 810-830 0.43 Área total 107.55 Org: Silveira, 2013 Considerando o quadro de altimetria da bacia, buscou-se entender o quadro clinográfico da mesma. Nisto, a partir de produtos SRTM e técnicas de Geoprocessamento em ambiente SPRING, gerou-se o mapa de declividade, sendo estre ilustrado pela figura 3. Figura 7 - Carta de Declividade do bacia hidrográfica do Ribeirão Barra Funda, Londrina, Paraná Fonte: SRTM – Embrapa. Orgs: Silveira e Escobar, 2013 153 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 O fatiamento das classes de declividade foi feito considerando intervalos de 10% entre eles, uma vez que, a partir da análise exploratória, verificou-se que as declividades na bacia variavam de 0 a 52% de declividade. As classes de declividades predominantes são as que vão de 2 a 12% e as de 12 a 22%, onde representam 49,67km² e 40.87km², respectivamente. Nisto, entende-se que a bacia apresenta um relevo que varia de suavemente plano para ondulado, o que não impede certos tipos de ocupações e de atividades econômicas tais como agricultura. Tabela 5 - Medidas de classes de declividade, em km² Medidas de Classes de Declividade Declividade em % Área em km² 0a2 2.13 2 a 12 49.67 12 a 22 40.87 22 a 32 9.56 32 a 42 1.22 42 a 52 0.03 Área Total 103.48 Org: Silveira, 2013 Após a verificação do quadro altimétrico e clinográfico da bacia em estudo, fora realizado o mapeamento do uso do solo da bacia. Para o mapeamento, utilizou-se uma imagem Landsat 5 do sensor TM, do dia 26/06/2010, órbita 222, ponto 076. Nisto, a imagem foi processada no software SPRING, contrastada e gerou-se a imagem sintética R5G4B3, conforme figura 3. 154 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Figura 8 - Composição sintética R5B4G3 da imagem Landsat 5 Fonte: INPE. Orgs: Silveira e Escobar, 2013 Com a imagem sintética gerada, criou-se o PI temático para o mapa de uso do solo e iniciou-se o procedimento. Nisto, foram criadas classes de uso do solo como vegetação, pastagem, solo nu, cultura e solo úmido. Para cada classe de uso do solo foram coletadas, em treinamento, aproximadamente 35 amostras para processamento do software. Após a realização do treinamento, a imagem foi classificada pelo SPRING, onde se teve uma rejeição de 0%, desempenho médio de 92,15% e confusão média de 7,85%. A figura 3 ilustra o mapa final de uso do solo. 155 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Figura 9 - Carta de uso do solo da bacia do Ribeirão Barra Funda, Londrina, Paraná Fonte: INPE. Orgs: Silveira e Escobar, 2013. Em uma breve análise, verifica-se que a bacia apresenta áreas extensas destinadas à cultura, com recortes de vegetação que se apresentam como remanescentes florestais bem acentuados e espalhados. Todavia, considera-se uma presença maciça de solos nus (também chamados de solos expostos), poucas áreas destinadas à pastagem e áreas com presença de solos úmidos, o que indica que essas áreas passaram processos de umidificação visando seu uso para outras áreas de culturas. Buscando evidenciar tais classes e a área que ocupam na bacia, gerou-se o gráfico 1. 156 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Gráfico 1 - Medidas dos tipos de uso do solo na bacia do ribeirão Barra Funda, em Londrina, PR Org: Escobar, 2013 A partir do gráfico e do mapa, verifica-se o que fora discutido anteriormente. Do total de km² da bacia hidrográfica, 55,74km² são representados por áreas de solo nu (ou exposto); 27,98km² representados por áreas de mata; 14km² representados por áreas de culturas; 0,89km² representados por áreas de solo úmido e 0,85km² representados por áreas destinadas ao pasto. Considerações finais Considera-se que a imagem Landsat 5 foi suficiente para o mapeamento do uso do solo, uma vez que a mesma não apresentou erros referentes a resolução radiométrica ou resolução espectral. Mesmo os satélites da série Landsat fornecerem imagens com resoluções espaciais não comparáveis a de outros satélites, o seu uso ainda se faz viável, dependendo do tipo de estudo na qual será aplicada. Nisto, para o presente estudo, a imagem Landsat fora utilizada uma vez que a mesma pode ser obtida gratuitamente via banco de dados do INPE e por apresentar resultados satisfatórios no final da pesquisa, mesmo que satélites como IKONOS, QuickBird dentre outros com resoluções 157 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 espaciais melhores sejam mais coerentes para um estudo, entende-se que as imagens do Landsat não devem ser esquecidas pela sua contínua qualidade. A bacia em estudo apresentou valores altos no que se refere a áreas ocupadas por solos expostos e áreas destinadas a cultura. Infere-se que, a partir disto, a bacia apresentou um intenso desmatamento para uma atividade agrícola intensa, contendo, ainda, um valor expressivo de matas, que podem ser classificadas como áreas de reflorestamento ou áreas de preservação. A presença de solos com feição úmida transpõe que esses solos foram trabalhados para a inserção de outras atividades agrícola, acentuando o que já fora discutido no que diz respeito ao fato da bacia se fazer essencialmente agrícola. Também, entende-se que esse fato se dá naturalmente, uma vez que a mesma não possui áreas urbanas em seu território. Referências CÂMARA, G.; DAVIS, C. Introdução. In: CÂMARA, G.; DAVIS, C.; MONTEIRO, A. M. V (Orgs.). Introdução à Ciência da Geoinformação. São José dos Campos: INPE, 2001. INPE. Catálogo de Imagens. Disponível em: <http://www.dgi.inpe.br/CDSR/>. Acesso em: 25 ago. 2013. LIU, W. T. H. Aplicações de Sensoriamento Remoto. Campo Grande: Ed. UNIDERP, 2006. NOVO, E. M. L. de M.; PONZONI, F. J. Introdução ao Sensoriamento Remoto. São José dos Campos: INPE, 2001. OLIVEIRA, A. I. L.; FRAGA, N. C. Geoprocessamento e gestão de águas: delimitação de bacias hidrográficas uma análise da região do Leste da Bahia. Percurso: Sociedade, Natureza e Cultura, Curitiba, v. 2, n. 8, p. 81-100, 2008. TEIXEIRA, A. L. de A.; MORETTI, E.; CHRISTOFOLETTI, A. Introdução aos Sistemas de Informação Geográfica. Rio Claro: Edição do Autor, 1992. 158 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 KOSI EWE KOSI ORIXA1: A MANUTENÇÃO DAS RELIGIÕES AFRO EM TEMPOS DE CRISE AMBIENTAL Diego F. R. Azorli2 Salvem as folhas brasileiras Salvem as folhas pra mim Se me der a folha certa E eu cantar como aprendi Vou livrar a Terra inteira De tudo que é ruim3 Introdução A relação homem/natureza tem se dado de formas diferentes conforme o passar dos tempos. De um modo geral, as sociedades sempre tentaram submeter a natureza mas essas práticas se intensificaram após a Revolução Industrial. Para Gonçalves (2002, p. 23), “toda sociedade, toda cultura cria, inventa, institui uma determinada ideia do que seja a natureza, nesse sentido, o conceito de natureza não é natural, sendo na verdade criado e instituído pelos homens”. Para esse autor, essa relação acaba por constituir um dos pilares sobre o qual os homens constroem suas relações sociais, materiais, espirituais e culturais. Para Gonçalves (2002), o conceito de natureza foi, desde sempre, revestido de uma oposição ao progresso. É a partir da domesticação da natureza que se formam “os berços das civilizações na Mesopotâmia, no Egito, na China, etc. Dominar a natureza é dominar a inconstância, o imprevisível; é dominar o instinto, as pulsões, as paixões.”4 (GONÇALVES, 2002, p. 26). 1 Expressão religiosa iorubá. Significa literalmente “sem folha, sem orixá”. Licenciado em Geografia pela UNESP/Ourinhos. Mestrando em História pela UNESP/Assis. E-mial: [email protected]. Orientado por: Prof.ª Drª. Fabiana Lopes da Cunha. 3 Kirimurê. J Velloso. [Compositores]. In: MAR DE SOPHIA. [S. I.]: Biscoito Fino, p. 2006. 1 CD. Faixa 9. 4 “O Estado, a lei e a ordem são tomados como necessários para evitar o primado da natureza, onde reina o caos ou, no máximo, a ‘lei da selva’ onde todos lutam contra todos.” (GONÇALVES, 2002, p. 26) 2 159 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Para que pudesse submeter a natureza, o homem, foi ao longo do tempo, instituindo um pensamento de que não fazia parte dela. Para Gonçalves (2002) a separação entre homem-natureza é um pensamento marcante no mundo ocidental e foi herdado da Grécia e Roma. Mas o autor, deixa claro que não se está fazendo menção a um pensamento que se firma por ser superior ao outros. É com Platão e Aristóteles que começa a surgir um certo desprezo por plantas e pedras, no esclarece o autor,5 e passa-se a privilegiar os homens e as ideias. Natureza e religião Para Gonçalvez, foi com a influência do pensamento “judaico-cristão que a oposição homem-natureza e espírito-matéria adquiriu maior dimensão” (2002, p. 32). A partir desse pensamento, quando Deus cria o homem à sua imagem e semelhança, dota-lhe de um privilégio sobre a natureza. O cristianismo acaba por firmar o conceito de que os “deuses já não habitam mais esse mundo 6” imperfeito. Será esse antropocentrismo que “consagrará a capacidade humana de dominar a natureza” (Gonçalves, 2002, p. 34). A terra, que não é mais habitada pelos deuses, torna-se um objeto. Mas será a instituição do capitalismo que levará essa tendência aos extremos. Foi com base nessa concepção, que desenvolveram-se práticas, por meio de um processo de industrialização, em que a acumulação se realizava por meio da exploração intensa dos recursos naturais, com efeito perversos para a natureza e os homens. (BERNARDES; FERREIRA, 2003, p. 17) Essa mentalidade cunha um desenvolvimento econômico ilimitado através da dominação da natureza. Nos anos 1960 e 1970, ganham força as ideias que os recursos naturais não são inesgotáveis e esse crescimento desenfreado começava a se revelar insustentável. 5 6 Gonçalves, 2002, p. 26. Idem. Em oposição a concepção dos pré-socráticos. 160 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Sem folha não tem nada7 Nos terreiros de candomblé que se encontram espalhados, em sua grande maioria, pelas periferias das cidades brasileiras8 existe uma relação de dependência religiosa associada à preservação ambiental. Segundo a cosmogonia do candomblé, o mundo é criado pelos deuses (assim como no caso judaico-cristão). O homem é criado para resolver o problema do ócio reinante, satisfazendo os deuses9. O ser humano é criado para ser como os deuses. Homens e deuses vivem em harmonia, até que um ser humano comete um crime: desrespeita o céu10. Olorum, o senhor supremo do céu, cria uma separação entre céu e terra. Ocorre que os Orixás sentem falta do mundo dos humanos e acabam por conseguir autorização para conviver no meio dos homens, ainda que fosse de forma regulada. Os homens passam a cultuar essas divindades e se criam laços afetivos entre homens e deuses. Os Orixás são considerados espíritos da natureza que, desde tempos imemoriais, passaram a ser cultuados como divindades. Eles detêm o poder dos elementos naturais, e os governam (Prandi, 2005). Os iorubas tementes dos perigos da natureza que punham em risco constante a vida humana, perigos que eles não podiam controlar [...], ofereciam sacrifícios para aplacar a fúria dessas forças, doando a própria comida (Verger, 1981, p. 22). Essa devoção começou a estabelecer fortes laços entre os povos iorubás e o território, visto que as divindades cultuadas personificavam o trovão, os cursos d’água, as árvores, as florestas, etc. 7 Referência à música: Salve as folhas. GERÔNIMO; ILDÁSIO TAVARES. [Compositores]. In: MEMÓRIA DA PELE. [S. I.]: Polygram/Philips, p. 1989. 1 CD. Faixa 6. 8 Tratamos dos possíveis fatores que teriam levado os terreiros de candomblé a se localizar nas periferias das cidades em outro trabalho. Ver AZORLI (2012). 9 Ogbebara (2010). 10 Prandi (2009, p. 526). 161 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 O candomblé, como religião de matriz africana que cultua os orixás, herdou esse envolvimento com a natureza11. As diversas cerimônias rituais não podem ser executadas sem o uso de determinada espécies vegetais que têm papel religioso e terapêutico. Esses complexos rituais, são específicos para cada pessoa e necessitam de tipos vegetais específicos12. A crescente expansão do agronegócio ameaça a existência de diversas espécies. O desaparecimento ou extinção dessas plantas, ameaça o culto do candomblé. Essa realidade, acaba por obrigar os praticantes a terem pequenos e diversificados jardins em suas casas de culto13 (ou terreiros), visto que são produtos cada vez mais raros. Isso tem gerado um campo de pesquisa em torno da preservação dessas espécies. Que comprova as propriedades curativas14 associadas a esse saber popular e ancestral. Também é importante destacar, que a algumas dessas plantas não são nativas do Brasil, e esse “acervo” sofreu influências indígenas e européias. Desse modo, o fragmento do início desse trabalho, acaba por sintetizar essa visão de mundo: o poder das folhas para esta comunidade é tamanho, que com elas todos os problemas seriam resolvidos. Objetivos Esse trabalho tem como objetivo estabelecer uma relação entre a visão de mundo dos praticantes do candomblé com as preocupações ambientais atuais que ameaçam a reprodução desta religião. 11 “Destruir a natureza seria destruir a nossa religião, os próprios orixás” (Neto [et. al.], 2010, p. 569). “Nosso orixá é a natureza, então se ela morrer, morre também nossos orixás. Como é que vamos cultuar um orixá que é a Natureza, destruindo a Natureza?” (ibidem) 12 O ritual de retirada dessas folhas respeito estremo 13 “Devido a todo o contexto de expansão da urbanização nos dia atuais, está cada vez mais difícil encontrar espaços que possuam algum tipo de natureza selvagem” (NETO [et. al], 2010, p. 570) 14 PIRES [et. al.] (2009); BARROS (2009). 162 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Procedimentos metodológicos Através de um levantamento bibliográfico sobre o assunto e entrevistas15 discutimos a nossa temática em busca dos diferentes resultados que a crise ambiental atual cria para os praticantes do candomblé. Resultados Pudemos perceber que o candomblé como religião, possui uma ligação estreita e intrínseca com o meio ambiente, uma vez que depende dele para continuar existindo. Considerações finais A separação entre o homem e a natureza é um fenômeno antigo e muito presente em nosso pensamento ocidental. Se por um lado algumas religiões possuem uma relação íntima com a natureza, pois dela depende o seu futuro, como é o caso do candomblé, outras, não veem nela um grande foco de preocupação, uma vez que não necessitam de elementos naturais para continuar se reproduzindo como religião. Mas nem por isso concluímos que a preocupação (ou despreocupação) religiosa condicione os praticantes a se importarem ou não com o meio ambiente, uma vez que cada um adapta a ideia de religião que mais lhe agrada ou interessa pra aplicar à sua existência social. Referências AZORLI, Diego F. R. Terreiros de Candomblé: a microterritorialidade afroreligiosa em Ourinhos-SP. In: II Seminário Internacional sobre Microterritorialidades nas Cidades. Presidente Prudente: Unesp, 2012. Pp. 605-617. Disponível em: < http://pt.scribd.com/doc/126601712/Anais-Do-IISIMTC-Final> BARROS, José Flávio Pessoa. Ewé Orisá: uso litúrgico e terapêutico dos vegetais nas casas de candomblé Jêje-nagô. Rio de Janeiro. Bertrand Brasil, 4ª ed., 2009. 15 Esse trabalho é um dos desdobramentos de nossa pesquisa de campo realizada a cerca de quatro anos no terreiro de candomblé Ile Ase Omi Oju Aro localizado na cidade de Ourinhos. 163 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 BERNARDES, Júlio Adão; FERREIRA, Francisco Pontes de Miranda. Sociedade e Natureza. In: CUNHA, S. B; GUERRA, A. J. T. (Orgs). A questão ambiental; diferentes abordagens. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003. GONÇALVES, Carlos Walter Porto. Os (des)caminhos do meio ambiente. 10ª ed. São Paulo: Contexto, 2002. NETO, L.; [et. al]. A natureza sagrada do Candomblé: análise da construção mística acerca da natureza em terreiros de candomblé no nordeste de Brasil. Interciência, vol. 35. Nº 8, agosto, 2010. Pp. 568-574. OGBEBARA, Awofa. Igbadu, a cabaça da existência: mitos nagôs revelados. 2ª. ed. 3ª. rei. Rio de Janeiro: Pallas, 2010. PIRES, M. V. [et. al]. Etnobotânica de terreiros de candomblé nos municípios de Ilhéus e Itabuna, Bahia, Brasil. Revista Brasileira de Biociências. Porto Alegre, v. 7, nº 1, p. 3-8, jan./mar. 2009. PRANDI, Reginaldo. Mitologia dos Orixás. 11ª. reim. São Paulo: Companhia das Letras, 2009. ______. Segredos Guardados: Orixás de alma brasileira. São Paulo: Companhia das Letras, 2005. SILVA, José Maria Cardoso.; PAGLIA, Adriano. A biodiversidade ameaçada no Brasil: como garantir a sua proteção? Disponível em < http://www.fbds.org.br/fbds/Apresentacoes/8_Biodiversidade_Silva%26Paglia.p df>. Acesso em: 20 de Out. de 2013. VERGER, Pierre. Orixás: Deuses iorubás na África e no Novo Mundo. Tradução de Maria Aparecida da Nóbrega. São Paulo: Corrupio, 1981. 164 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 A PRESENÇA DA MACROFAUNA COMO INDICADORA DE QUALIDADE DO SOLO EM DIFERENTES USOS NO MUNICÍPIO DE SÃO PEDRO DO TURVO/SP Jakson José Ferreira1 Maria Cristina Perusi2 1 - Introdução O solo pode ser entendido como um dos ecossistemas mais complexos e dinâmicos do planeta, no qual, tanto na escala de nanômetros quanto quilômetros, as alterações podem ser observadas, quantificadas e qualificadas. Possui uma ampla biodiversidade que dá à biosfera, o suporte para suas interações biológicas e reações químicas que, por sua vez, desempenha papel fundamental para o suporte da vida (MOREIRA; BRUSSARD, 2008). Neste contexto, pode-se representá-lo como um sistema composto por diversas estruturas, nas quais estão os seres vivos e a matéria orgânica que, uma vez degradada, serve como alimento e abrigo para parte desses seres vivos. Outra parte importante do solo é a estrutura mineral, que correlacionando com estas duas outras estruturas, resultam nas propriedades físicas, químicas e biológicas do solo. Portando, destaca-se a fauna como parte integrante e importante dessa estrutura (GIRACCA, 2000). O uso inadequado do solo contribuiu para o declínio constante de sua fertilidade natural, e coopera negativamente para o processo de degradação da matéria orgânica, causando comprometimento significativo das propriedades físicas, químicas e biológicas do solo, aumentando os processos de erosão, reduzindo a capacidade produtiva (CALEGARI, 2000 apud CORDEIRO, 2004). Indicadores ambientais é uma forma muito comum para se diagnosticar um meio ambiente. Muitos pesquisadores se baseiam na presença ou ausência de determinada espécie, planta ou animal, em uma determinada área, comparando os resultados com características ambientais naturais (TURCO; 1 Assistente de Suporte Acadêmico II, UNESP/Câmpus de Ourinhos. [email protected]. 2 Professora Assistente Doutora do curso de Geografia, UNESP/Câmpus de Ourinhos. [email protected]. 165 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 BLUME, 1999 apud CORDEIRO, 2004), para identificar o grau de comprometimento do meio analisado. Nesse trabalho, a macrofauna do solo foi analisada para fins qualificação de solos rurais sob diferentes usos. 2 - Objetivos O objetivo deste trabalho foi quantificar e qualificar a macrofauna do solo, entendida aqui como indicador de qualidade desse recurso natural, nas seguintes condições: área de pastagem, mata (cerrado) e erosão; comparar os resultados de algumas propriedades químicas e biológicas sob os referidos usos. 3 - Procedimentos metodológicos A área de pesquisa está localizada no município de São Pedro do Turvo/SP. Em 778,15 km², o referido município conta com uma população de 7.208 habitantes. Além disso, caracteriza-se pela forte produção agropecuária a qual é base de renda do município (IBGE 2010). Inserido neste contexto, trabalhou-se em área de pastagem, cerrado e erosão hídrica de grandes proporções, que se encontram no bairro rural Água do Sousa, município de São Pedro do Turvo/SP (Figura 01). Figura 01: Recorte de carta topográfica de São Pedro do Turvo/SP, com destaque para a área da pesquisa Escala 1:50.000 Fonte: IBGE (1973) Para a determinação da densidade da Macrofauna edáfica, utilizou-se a metodologia preconizada pela Tropical Soil Biologyand Fertility, modificada pela 166 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Embrapa Agroecologia (DIAS, 2001). Esse procedimento consiste na retirada do solo em bloco (Figura 2); extração da macrofauna; conservação dos animais em fixadores químicos; contagem e identificação das espécies presente no solo. Figura 02: Demarcação com gabarito da área de coleta Foto: Perusi (2012) A separação da macrofauna do solo foi realizada no laboratório de Geologia, Geomorfologia e Pedologia da UNESP/Câmpus de Ourinhos, com utilização de bandejas de alumínio, lupa e pinça metálica. Os saquinhos foram abertos e o material despejado. Quebrados os torrões cuidadosamente, retirando todo o material biológico e armazenando-o em frascos identificados e conservados em álcool 70 %. Para classificação da macrofauna utilizou-se um estereoscópio acoplado com câmera fotográfica, onde foram feitas as microfotografias que colaboraram para a classificação até o nível de Ordem. Feita a separação, ordenou-se em grupos conforme sua ordem taxonômica e quantificada a riqueza. Os resultados foram expressos em densidade da macrofauna por metro quadrado. 3.1. Procedimentos laboratoriais para análise química As análises químicas: Na, P, Ca, Mg, CTC, pH, Al+H, SB e saturação de bases foram feitas no Laboratório de Solos e Plantas das Faculdades Integradas de Ourinhos-SP (FIO), acompanhadas pelo autor. A análise biológica do solo foi executada pelo autor nas instalações do laboratório de 167 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Geologia e Pedologia da UNESP/Câmpus de Ourinhos, de acordo com os protocolos da Embrapa (1997). 4 - Resultados e discussão 4.1 - Resultados da análise quantitativa e qualitativa da macrofauna Os resultados obtidos na área de mata foram os mais significativos. Como pode ser observado na Tabela 1, o número total de biomassa por metro quadrado foi de 321 indivíduos. Observa-se que na coleta com profundidades de 20-30 cm, o número de indivíduos diminui principalmente pela falta de alimentos, mais abundante na superfície do terreno. Tabela 1: Análise da macrofauna do solo em mata de cerrado Macrofauna Nome comum Cupins Tesourinha Formiga Aranha Minhoca Centopeia Mosca Besouro Tatu bola Molusco Total Macrofauna Ordem Isoptera Dermapdera Hymenoptera Aranea Haplotaxida Scolopendra Diptera Coleoptera Isopoda Pulmonata ------------------ Riqueza Serapilheira Riqueza 0-10 cm 0 2 13 0 2 1 2 9 0 0 29 51 3 20 5 16 5 5 20 1 0 126 Riqueza Riqueza 10- 20 cm 20-30 cm 54 5 33 0 10 1 3 4 0 1 111 9 0 23 0 3 3 5 12 0 0 55 Observando a Figura 03 é possível constatar a importância da mata de cerrado, pois serve não somente como reserva para flora, mas também para macrofauna, como demostra o número total de 321 indivíduos. Figura 03: Quantidade de número de indivíduos por m² macrofauna dos pontos amostrados na mata 168 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Na área de pastagem (Tabela 2) é possível observar a queda no número de indivíduos por metro quadrado, sendo os cupins o maior número de indivíduos coletados nesta área. Isso se dá pelo fato de que esses insetos se alimentam de celulose, o que é possível encontrar até nas pastagens degradadas. O número de formigas também é baixo, apresentando somente um individuo por metro quadrado, isso pode ocorrer porque formigas cortadeiras (Saúva), costumam cortar folhas de plantas arbóreas. Na área não foi encontrado nenhum formigueiro e sim trilhas das formigas cortadeiras, que adentravam em direção a mata (Tabela 2). Tabela 2: Análise da Macrofauna do solo em área de pastagem Macrofauna Nome comum Cupins Tesourinha Formiga Aranha Minhoca Centopeia Mosca Besouro Tatu bola Molusco Total Macrofauna Ordem Isoptera Dermapdera Hymenoptera Aranea Haplotaxida Scolopendra Diptera Coleoptera Isopoda Pulmonata ------------------ Serapilheira 0 0 0 1 0 0 0 3 0 0 4 Riqueza 0-10cm Riqueza 10-20 cm Riqueza 20-30 cm 0 0 1 0 6 0 1 3 0 0 11 0 0 0 0 0 0 2 3 0 0 5 0 0 0 0 0 0 4 3 0 0 7 Um fato que geralmente apresenta declínio de insetos em pastagem é a vermifugação do gado, ou seja. Ao dar ou aplicar vermicidas, pelas fezes ou urina, o resíduo chega ao solo, onde os indivíduos que se alimentam dos restos metabólicos do gado, ou vivem dentro de uma teia alimentar relacionada com este solo, se intoxicam e vem a óbito, declinando a biodiversidade deste local. Este fato pode ser a resposta para o declínio constante do número de indivíduos da Macrofauna na pastagem. Comparando a Figura 03 com a 04, identifica-se que a queda de biomassa por metro quadrado é considerável, de 321 para 27 indivíduos na soma dos sete pontos amostrados na área de pastagem. Desta forma, é possível observar a degradação biológica da pastagem. 169 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Figura 04: Macrofauna área de pastagem Como era esperado, a área mais crítica foi na erosão hídrica, como se pode observar na Tabela 3. Nenhum individuo foi encontrado nos sete pontos amostrados. Esse fato se dá pela pouca quantidade de alimento que há no local. Com a instabilidade dos taludes e dos horizontes superficiais, há poucas gramíneas. Sendo os vegetais os produtores primários, nessas condições, não há possibilidade de suporte de vida para os consumidores, extinguindo-se a cadeia alimentar. Tabela 3: Análise da macrofauna do solo em área de erosão hídrica Macrofauna Macrofauna Nome comum Profundidade Ordem Serapilheira Riqueza 0-10 cm Riqueza 10- 20 cm Riqueza 20-30 cm 0 0 0 Cupins Isoptera Tesourinha Dermapdera 0 0 0 0 Formiga Hymenoptera 0 0 0 0 Aranha Aranea 0 0 0 0 Minhoca Haplotaxida 0 0 0 0 Centopeia Scolopendra 0 0 0 0 Mosca Diptera 0 0 0 0 Besouro Coleoptera 0 0 0 0 0 0 0 0 Total 4.2 Resultados das análises químicas Nas amostras analisadas nas áreas de mata, pastagem e erosão (Tabela 4), pode-se observar o alto índice de hidrogênio e alumínio, resultando 170 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 no nível de acidez classificada como muito alta, conforme a EMBRAPA (2006). Esse comportamento caracteriza o bioma cerrado, no qual as plantas já estão adaptadas naturalmente a essas condições. Freire (2006) explica que na solução química do solo, o hidrogênio e o alumínio são os elementos que dão a característica ácida. Porém, a presença de elementos como Mg, K, Ca, Na dão ao solo, conforme suas concentrações, a característica de alcalino. Tabela 4: Resultados das análises químicas do solo Amostra MO pH P K Ca Mg mmolc/ H+Al dm SB 3 Sat. Sat. Sat. Ca Mg K CaCl2 resina 12 4,0 3 0,8 11 4 38 16 21 8 1 PASTAGEM 7 4,3 2 0,8 11 2 24 14 30 5 2 EROSÂO 3 4,2 0 0,8 11 2 21 14 32 5 2 MATA CERRADO Teores altos de matéria orgânica promovem uma qualidade que é fundamental para macrofauna do solo, pois estes organismos a degradam e a transformam em alimento ou para o cultivo de fungos, que futuramente servirão de alimento para o ninho. Portanto, a presença da matéria orgânica acaba sendo um fator fundamental quando o assunto é macrofauna do solo. Como era esperado, das áreas amostradas, a que apresenta maior quantidade dessa propriedade é a mata. Porém, abaixo do valor ideal como se pode observar na Tabela 04. 5. Conclusão A partir das análises química e biológica, é possível constatar o grau de degradação da biodiversidade das áreas de pastagem e erosão. Essa afirmação é baseada na quantidade, diversidade ou ausência de indivíduos. Sendo assim, baseados nos procedimentos adotados e nos resultados obtidos, é possível elencar as seguintes conclusões: A falta de um manejo adequado com práticas conservacionista levou a implantação de um quadro de voçorocamento; 171 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 A pastagem vem sendo degradada principalmente pelo pisoteio e alimentação dos bovinos, onde a cultura vem tolerando a falta de nutrientes, acidez e toxidez por alumínio, dificultando a formação de folhas que contribuam para amenização do impacto por salpicamento e erosão hídrica; A necessidade urgente de intervenção do poder público com o intuito de implantar no local um plano de manejo de microbacia com estradas que colaborem com o pequeno agricultor e amenize a erosão hídrica; O reflorestamento das áreas de preservação permanente, como das reservas legais, favoreceria não só a proteção dos rios e mananciais, uma vez que promoveriam a estruturação do solo como um todo, resultando em minerais estáveis aos microrganismos que estão na topo da cadeia alimentar, contribuindo com o fluxo de energia deste sistema; A macrofauna do solo demonstrou ser um excelente indicador para avaliar qualidade do referido recurso. 6 Referências AQUINO, A.M. Manual para Macrofauna do solo. Seropédica: Embrapa agrobiologia, maio 2001. 21p. (Embrapa-CNPAB. Documentos, 130). COMITÊ DE BACIAS HIDROGRAFICAS MÉDIO PARANAPANEMA. Caracterização da UGRHI- 17.São Paulo UGRI-17. Disponivel em: http://www.paranapanema.org/index.php?option=com_content&view=article&id =52. Acess em: 16 de ago. 2012. CORDEIRO F. C.; DIAS, F.C.; MERLIM, A.O.; CORREIA, AQUINO, A.M.; BROWN, G. Diversidade da macrofauna invertebrada do solo como indicadora da qualidade do solo em sistema de manejo orgânico de produção. Rev. Univ. Rural, Sér. Ci. Vida. Seropédica, RJ, EDUR, v. 24, n.2, jul-dez., p.29-34, 2004. Disponível em: <http://www.editora.ufrrj.br/rcv2/vida24-2/5.pdf> Acesso em: 16 ago. 2012. EMBRAPA. Manual de métodos de analise de solos. 2. ed. Rio de Janeiro: EMBRAPA Solos, 1997. EMBRAPA. Sistema brasileiro de classificação de solos. Rio de Janeiro: EMBRAPA solos, 2006. FREIRE, O. Solos das regiões tropicais. Botucatu: FEPAF (Fundação de estudos e Pesquisas Agrícolas e Florestais), 2006. 172 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 GIRACCA,E.M.N.; ANTONIOLLI, Z. I.; ELTZ, F. L. F.; BENEDETTI, E.; LASTA, E. ; VENTURINI, S. F.; BENEDETTI, TATIANA. Levantamento da meso e macrofauna do solo na microbacia do Arroio Lino, agudo/RS Rev. bras. Agrociência, v. 9, n. 3, p. 257-261, jul-set, 2003: Disponível em: <http://www.ufpel.tche.br/faem/agrociencia/v9n3/artigo13.pdf> Acesso em 16 ago. 2012 INSTITUTO BRASILEIRO DE GEGRAFIA E ESTATISTICA.Senso IBGE.; Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010/tabelas_pdf/tot al_populacao_sao_paulo.pdf> Acesso em: 16 ago. 2012. MOREIRA, F.M.S.; SIQUEIRA, J. O.; BRUSSARD, L. Biodiversidade do Solo em Ecossistemas Brasileiros. Lavras/Mg: UFLA, 2008, 728p. 173 ESPAÇOS DE DIÁLOGO Eixo 4 Processos espaciais IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 O BANCO MUNDIAL E O PROGRAMA VILA RURAL NO ESTADO DO PARANÁ: UMA REFLEXÃO SOBRE POSSÍVEIS APROXIMAÇÕES1 Alessandro Viceli2 1 - Introdução A questão do acesso à terra no Brasil é objeto de vários debates, pesquisas e posições políticas, que por sua vez também englobam fatores das escalas regional, nacional e global. Nesta pesquisa, focalizaremos sobre a ação do Banco Mundial no Brasil, delimitando a pesquisa sobre a possibilidade de relação deste Banco com o Programa Vila Rural desenvolvido no Estado do Paraná. Isso demonstra que a escala de análise proposta dentro deste projeto transitará entre o global, nacional e regional, como uma forma de abranger a totalidade do contexto espacial delimitado. Vale ressaltar que o Banco Mundial é uma Instituição financeira internacional criada logo após a 2ª Guerra Mundial, com a finalidade de ajudar na reconstrução dos países atingidos pelos conflitos. E, com o passar das décadas, essa Instituição passou a financiar projetos de Infraestrutura em países “em desenvolvimento”. Logo após esse processo intenso de financeirização, e com o consequente endividamento dos países periféricos, o Banco Mundial passou a exigir que esses países executassem reformas estruturais, como forma de ampliar a circulação de capital. Essas reformas geraram consequências negativas, principalmente na órbita social. Englobado neste mesmo contexto, mais precisamente em 1995, o então Governador do Estado do Paraná lança o Programa Vila Rural, que por sua vez estava englobado dentro do Projeto Paraná 12 meses, cujo principal objetivo era o de aliviar a pobreza de boa parte da população paranaense. 1 Trabalho orientado pelo Prof. Dr. Leandro Bruno Santos. E-mail. [email protected] 2 Graduando em Geografia na Universidade Estadual Paulista – Campus de Ourinhos. E-mail: [email protected]. 175 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 O Programa Vila Rural tinha como principal objetivo trazer o trabalhador volante de volta para o meio rural, oferecendo-lhe uma casa e um lote para a produção de subsistência. Portanto, neste recorte temporal havia, de um lado, o Banco Mundial redirecionando a sua posição perante as políticas de cunho social, propagando um discurso de reversão das desigualdades sociais e, de outro lado, o Governo de matiz neoliberal no Estado do Paraná executando uma nova proposta de acesso à terra. 2 - Objetivos Geral Partindo do referido recorte temporal, buscaremos realizar uma aproximação entre as ações multiescalares do Banco Mundial relacionadas com a efetivação do Programa Vila Rural no Estado do Paraná. Específico 3- Analisar a conjuntura política e econômica que resultou na elaboração do Programa Vila Rural; 4- Apontar os elementos que fazem parte da lógica de funcionamento das políticas do Banco Mundial; 5- Esclarecer se houve uma interferência do Banco Mundial sobre o Programa Vila Rural. 3 - Resultados Como a pesquisa ainda está em uma fase inicial, durante esta primeira aproximação com a bibliografia relacionada ao objeto, vimos que, com a implementação das reformas propostas pelo Banco Mundial, houve alterações nas dinâmicas políticas, econômicas e sociais no Brasil. A questão do acesso à terra e a intensificação da pobreza urbana e rural estavam dentro desta nova configuração. O Banco Mundial tinha conhecimento dos efeitos negativos destas reformas e, por isso, propuseram que o governo brasileiro elaborasse projetos de alívio da pobreza. Outro fato importante foi a desideologização da questão 176 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 agrária promovida pelo Banco Mundial, diluindo tal problemática apenas na distribuição de pequenos lotes de terras para famílias pobres. A esse respeito, Sauer e Pereira (2006, p. 174) apontam que, “segundo a leitura dominante, falar desse tema no início dos anos 1990 significava, no máximo, a defesa de ações pontuais de alívio da pobreza rural, sem qualquer intencionalidade redistributiva”. Ainda dentro deste contexto, Pereira (2006, p. 374) considera que “a distribuição de “ativos” (terras, por exemplo) passou a ser vista como um instrumento mais eficiente e barato no “combate à pobreza” do que transferências de renda permanentes”. Como essa “distribuição de terras” se faria via lógica do mercado, o Estado teria o papel de mediador e os recursos financeiros para a aquisição das terras proviriam do Banco Mundial. Com o desenvolvimento das leituras, nos deparamos com o elemento chamado de “desfederalização”, cujo conceito está relacionado ao processo de transferência de responsabilidades da União para os Estados. Sobre essa questão, Trajano (2006, p. 6) salienta que “houve a desfederalização da política de reforma agrária, transferindo para a esfera estadual a competência para a condução de todo o processo mais amplo de “reforma do Estado”[...]”. No bojo dessa desfederalização, o Governo do Paraná elabora o Programa Vila Rural, cujo principal objetivo era trazer o trabalhador volante de volta para o meio rural, dando assim uma maior qualidade de vida a esses indivíduos, pois os mesmos seriam contemplados com uma casa de alvenaria e um terreno para a produção de alimentos para a subsistência (GOVERNO DO PARANÁ, 1995). 4 - Considerações finais Podemos considerar até o momento, com base nas informações coletadas nesta fase inicial da pesquisa, que houve um certo grau de interferência das ações do Banco Mundial sobre os meios político, econômico e social brasileiro. Estas mesmas ações fundamentaram e até modelaram as estratégias políticas desenvolvidas pelo governo brasileiro, que foram estendidas principalmente com sobre a dinâmica fundiária do país. 177 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Portanto, nas etapas seguintes da pesquisa, buscaremos realizar o paralelo dessa dinâmica nas escalas global e nacional com a escala regional. Isto significa que aprofundaremos no estudo e na reflexão de toda a lógica que estruturou a elaboração do Programa Vila Rural no Estado do Paraná. 5 - Referências CARNASCIALI, Carlos Humberto. et al. Consequências sociais das transformações tecnológicas na agricultura do Paraná. In. MARTINE, George e GARCIA, Ronaldo Coutinho (Org.). Os impactos sociais na modernização agrícola. São Paulo: Caetés, 1987 GOVERNO DO ESTADO DO PARANÁ. Normas operacionais do Programa Vila Rural. Curitiba: SEPL/PR, 1995. GRAZIANO DA SILVA, José .O que é Questão Agrária. 2ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1993. MARTINS, Mônica Dias. (Org.) O Banco Mundial e a terra: ofensiva e resistência na América Latina, África e Ásia. São Paulo: Viramundo, 2004. PEREIRA, João M. M. A política agrária do Banco Mundial em questão. Estudos Avançados [online]. 2006. Vol. 20. n 57. Pp. 355-383. ISSN 0103-4014 PONTE, Karina Furini da. Reflexões sobre o Programa Vila Rural a partir de algumas ideias propostas por Ignácio Rangel. Revista do Departamento de Geociências da Universidade Estadual de Londrina, vol. 11, n. 2, Jul/Dez. 2002 SAUER, S.; PEREIRA, J.M.M., Capturando a Terra: Banco Mundial, Políticas fundiárias neoliberais e reforma agrária de mercado. São Paulo: Expressão Popular, 2006, p. 174. TRAJANO, Janaina. A Reforma Agrária nos Governos FHC e Lula. In: II Seminário Nacional Sociologia e Política: Tendências e desafios contemporâneos, 2º, 2006 Curitiba. 178 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 A INDUSTRIALIZAÇÃO EM PERSPECTIVA ESPACIAL MULTIESCALAR: BRASIL, SÃO PAULO E OURINHOS Jean Carlos Izzo1 Lucas Labigalini Fuini2 1 - Introdução e objetivos Esse estudo tem como objetivo realizar uma breve revisão histórica do processo de industrialização brasileiro e paulista, fornecendo subsídios para o entendimento do processo de territorialização da indústria em Ourinhos, município localizado a sudoeste do Estado de São Paulo. Nesse sentido, partimos da hipótese de pesquisa de que a industrialização do sudoeste paulista e, mais precisamente de Ourinhos, é decorrente de um processo, ao mesmo tempo, associado aos fatores externos decorrentes da desconcentração industrial dos anos 1970, a partir da metrópole paulista e, devido à própria formação histórica, social e cultural regional, como núcleo de industrialização isolado no quadro paulista (SELINGARDI-SAMPAIO, 2009). 2 - Procedimentos metodológicos Em termos metodológicos, este trabalho usa dos recursos da revisão histórica e bibliográfica para definir o processo de industrialização e sua territorialização em Ourinhos, considerando algumas das influências econômicas, políticas e sociais desse processo de reestruturação espacial. 3 - Discussão e Resultados 3.1 - A industrialização brasileira tardia O desenvolvimento industrial no Brasil, apesar de ter sido um processo de desenvolvimento atrasado e vítima de inúmeras falhas, não poderia 1 Aluno de Licenciatura/Bacharelado do Curso de Geografia da Univ. Estadual Paulista/Unesp, câmpus de Ourinhos. É bolsista de Iniciação científica do Programa Jovens Talentos (Prope/Unesp). Email: [email protected]. 2 Professor Assistente Doutor do Curso de Geografia da Univ Estadual Paulista/Unesp, câmpus de Ourinhos. É coordenador do projeto regular de pesquisa FAPESP (2011/20203-8) , integrante do Grupo de Pesquisa/CNPq sobre Processos e Dinâmicas Territoriais (DITER) e coordenador do Laboratório de Geografia Humana. Email: [email protected]. 179 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 prescindir da orientação do Estado, que começou a atuar ativamente e fomentar o setor industrial a partir dos anos 1930, com as primeiras indústrias de base, se acentuando nos anos 1950. Em sua origem, esse desenvolvimento estava atrelado ao setor agrícolaexportador, por depender do capital dos produtos manufaturados exportados. A demanda por produtos manufaturados exportados cresceu significativamente, pois, através deles é que se gerava renda nas atividades do mercado interno (SUZIGAN, 1988). A partir dos anos 1950, o Estado começou a intervir de forma mais sistemática na estrutura do setor industrial, com o chamado Plano de Metas estabelecido no governo de Juscelino Kubitschek, o famoso 50 anos em cinco e, com o estabelecimento de metas industriais criadas para coordenar a implantação de algumas indústrias específicas. Foram desenvolvidas também algumas políticas de protecionismo ao mercado interno e controle de taxas de câmbio. Assim, o Estado passa a fomentar o desenvolvimento de alguns setores industriais, sendo eles, segmentos da indústria pesada, da indústria de bens de consumo duráveis e da indústria de bens de capital, permitindo que alguns produtos deixassem de ser importados e passassem a ser industrializados no Brasil. Essa tendência se tornaria a base do crescimento da produção industrial no país na fase do ciclo expansivo que foi de 1968 a 1974. Deve-se destacar que o país, até então, apresentou dois períodos de política industrial: o desencadeado pelo Plano de Metas, a partir dos anos 1950 e, o desencadeado pelos Planos Nacionais de Desenvolvimento (PNDs), durante o governo militar. Logo após a fase do ciclo expansivo, a partir dos anos 1980, o papel do Estado em relação à indústria no país passou a ser passivo e ausente, devido à interrupção do fluxo de poupança externa e pela perda da capacidade de poupança e de investimento por parte do próprio Estado. Houve também uma ausência de estratégia de longo prazo para com o setor industrial, sendo que, isso era absolutamente essencial neste período, ou seja, o progresso 180 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 econômico se tornou uma regressão, promovendo uma profunda recessão industrial em meado dos anos 1981-1983. Segundo Suzigan (1988, p.12), (…) o resultado foi a pior recessão da história da industrialização brasileira. Em três anos (1981-1983), a produção industrial caiu cerca de 17%, os níveis de investimento foram reduzidos à metade, o nível de emprego na indústria caiu 20% (com perda de 940.000 empregos), e a indústria passou a operar com uma capacidade ociosa de, em média, 25%. Um ano depois (1984), houve uma recuperação da produção industrial que veio através da exportação dos produtos manufaturados, que, segundo Suzigan (1988, p.12) “tem sido mencionada por economistas liberais como prova de excelência do ajustamento através das políticas macroeconômicas”. Tendo em vista que a ausência de um processo de desenvolvimento científico e tecnológico articulado a uma política industrial cria uma incapacidade de exportação intensiva de produtos industrializados, isso faz com que o país tenha mais dificuldades de se integrar com competitividade à economia mundial, considerando também seus problemas estruturais como economia periférica (subdesenvolvida) com processo de industrialização tardio (FURTADO, 2000). 3.2 - A industrialização paulista Considerando os elementos que deram primazia a São Paulo no processo de industrialização, definindo a grande concentração econômica paulista, Cano (1997, p.101) coloca que (...) desde meados da década de 30, o estado de São Paulo passou a ser o mais populoso do país (17% do total nacional)... Em grande medida diante do enorme afluxo de imigrantes (primeiro estrangeiros, e depois nacionais) que para ali se dirigia, dadas as maiores e melhores oportunidades de trabalho geradas pela sua economia. Assim, o crescimento industrial paulista tornou-se elemento fundamental para caracterizar seu papel como grande centro dinâmico e modernizante do país. Segundo dados organizados por Cano (1997), o peso industrial paulista 181 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 chega ao ápice em 1970, quando 58,2% do valor da transformação industrial (VTI) brasileiro se concentra no Estado, considerando a seguinte evolução: 1939 (40,7%), 1949 (48,9%), 1959 (55,6%). Em relação às demais regiões do país, São Paulo se destacava pelo seu veloz ritmo de crescimento diversificado, tanto no setor agrícola, quanto na indústria, promovendo um processo de urbanização ainda mais acelerado, resultando não só em um aumento populacional, como também, na expansão da mais dinâmica economia terciária nacional. Segundo Cano (1997, p.101) “a participação de São Paulo na geração de renda terciária do país aumentou, dos 32,7% em 1939, atingindo seu maior nível (36,7%) em 1995”. As disparidades entre as regiões brasileiras em relação a São Paulo eram nítidas, mas, não era, apenas, devido à concentração da produção industrial, da agricultura e também do setor terciário, mas também, porque a economia nacional antes da década de 1930 não era ainda integrada. O processo de integração do mercado nacional alterou o quadro de relações inter-regionais, justamente através de relações economicamente estabelecidas entre São Paulo e o restante do Brasil, mantendo, no entanto, as desigualdades de renda entre as unidades subnacionais. Todo o restante do país, durante 1930 e 1970, foi tomado por taxas elevadas de crescimento, portanto, esta concentração industrial paulista, de certo modo, não foi o fator preponderante a causar estagnação às demais regiões, devendo-se buscar outras causas, como a estrutura fundiária concentrada, as relações de "coronelismo", o ciclo cafeeiro, entre outros, como elementos históricos da formação socioespacial nacional que conduziram ao quadro de disparidades regionais em território brasileiro. A partir dos anos 1970 inicia-se um processo de desconcentração industrial, mais fortemente da região metropolitana de São Paulo para o interior e, em menor intensidade, para outros Estados da federação. Cano (1997) atrela esse processo, que levou à queda do VTI da metrópole, aos seguintes aspectos: a) políticas de descentralização do governo do Estado de São Paulo; b) políticas de atração municipal instauradas por municípios (subsídios, 182 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 infraestrutura, distritos industriais); c) custos da concentração na grande São Paulo; d) investimentos federais implantados no interior (refinarias e centros de pesquisa); e) políticas de incentivo às exportações e ao Pró-álcool. Santos; Silveira (2010) observam que no período de 1970-1990, o número de estabelecimentos industriais (de 6,95% para 15,26%) e o valor da transformação industrial (de 13,13% para 21,7%) crescem no interior do Estado, concluindo que, diante da reorganização industrial na região concentrada paulista, os Estados sulinos e o interior do Estado de São Paulo ganham com a emigração de estabelecimentos da região metropolitana de São Paulo, com a criação de novas indústrias e dispersão do valor da transformação industrial. Considerando essa nova repartição do trabalho industrial e sua distribuição geográfica por ramos da indústria, Selingardi-Sampaio (2009) identifica, a partir dos anos 1980, centros urbano-industriais isolados ou dispersos no Estado de São Paulo, sendo representativos os casos regionais de Bauru, Marília, Araçatuba, S. José do Rio Preto, Catanduva e Franca. Segundo Selingardi-Sampaio (2009, p. 299), A existência de centros regionais dispersos pode ser dominantemente creditada, pois, as forças endógenas, ou seja, certas especializações produtivas foram nele criadas e aperfeiçoadas, dotando-as de pujança econômica suficiente e, mais tarde, com certos recursos específicos, para se sustentar e progredir (embora, sem poder de polarização suficiente para se estender no espaço ou fazer surgir novas aglomerações). Influências exógenas poderosas seriam as demandas representadas pelos mercados nacional e internacional. 3.3 - A industrialização de Ourinhos A necessidade de acesso a atividades primárias e agrícolas foi um dos fatores que mais influenciou no processo de desconcentração econômica paulista e, isso repercutiu no interior paulista, no caso de Ourinhos/SP. O município de Ourinhos apresentou quatro ciclos históricos de desenvolvimento de seu território: o primeiro, que vai do início da formação do município até os anos 1940, associado à expansão da cafeicultura paulista junto à rede ferroviária, que colocou Ourinhos em posição de centralidade na 183 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 circulação econômica e permitiu o advento de uma urbanização local; o segundo, que vai dos anos 1950 aos 1980, que levou à proliferação de pequenas e médias indústrias e agroindústrias na cidade, com aumento populacional e modernização urbana, realçando a função de polo regional agora em um sistema rodoferroviário; o terceiro, que perpassa os anos 1980 até início dos 1990, caracterizado por certa recessão econômica, levando ao declínio da indústria cerâmica local e da intensidade do uso da rede ferroviária, com concentração de capitais nos principais ramos da indústria, agora localizados em distritos industriais; e o quarto, que vai de meados dos 1990 até o período atual, marcado pela continuação do processo de concentração econômica nos segmentos metal-mecânico, têxtil, sucroalcoleiro, alimentício e cerâmico, com impactos da desconcentração industrial paulista e expansão do segmento de serviços (SILVEIRA et. al, 2011; DEL RIOS, 1992). Quadro para cotextualização Nesse sentido, para os últimos dez anos (2000-2009), os dados (IBGE: PIB dos municípios e Atlas IDH; Seade: IPRS) nos mostram que o PIB de Ourinhos aumentou cerca de 114%, enquanto o do Estado de São Paulo teve aumento de 281%, levando a participação do município na economia paulista a cair de 0,16% para 0,13%. O PIB per capita, no entanto, não acompanhou o ritmo de crescimento do PIB, apresentando expansão de 94,6%, face a média paulista de aumento que foi de mais de 130%. O valor adicionado também percebeu aumentos e variações. Apresentou aumento de 116%, menor que o paulista, de pouco mais de 154%. A atividade de serviços responde por 73,2% do Valor Adicionado (VA) municipal; a indústria, 24,9%, e a agropecuária, 1,7%, percebendo-se nos últimos dez anos, em porcentagens, um aumento maior da indústria e agropecuária, face aos serviços. Quanto ao ritmo, apenas a indústria teve aumento (137%) decenal superior aos valores do Estado. O Valor Adicionado Fiscal (VAF), no entanto, entre 1993 e 2010, apresentou queda de 46,2%, ante o aumento do VAF paulista de 14%. Quanto às condições sociais, Ourinhos apresentou, em 2000, IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) elevado, de 0,813, abaixo, no entanto, da média paulista de 0,814, com aumento, entre 1980-2000, de 11,8%. Atualizando e complementando os dados do IDH com o IPRS (Índice Paulista de Responsabilidade Social), observa-se ainda um quadro de desigualdades socioeconômicas colocadas diante do relativo dinamismo econômico recente. O IPRS do município o coloca no grupo 4, dentre os municípios com “baixos níveis de riqueza e nível 184 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 intermediário de longevidade e/ou escolaridade”, sendo que em 2000 o município ocupava o grupo 3, daqueles com “níveis de riqueza baixos, mas com bons indicadores nas demais dimensões”. Com crescimento, entre 2000-2008, nos índices de longevidade (9,8%) e escolaridade (53,4%), o município apresentou declínio no índice de riqueza (9%), situação que levou à sua queda no índice. A cidade, atualmente com 102.955 habitantes, estando 97,4% localizados na área urbana (IBGE, 2010), tem sua formação histórica atrelada à base logística da ferrovia Sorocabana em sua expansão rumo ao interior paulista, sendo que a configuração territorial e expansão urbana de Ourinhos/SP são marcadas pelo traçado férreo margeando trilhos e estradas. Assim, foi se definindo socioespacialmente a reprodução de algumas atividades do setor primário, como por exemplo, madeira, café, gado, cana de açúcar entre outros (SILVEIRA, et al., 2011). Segundo Silveira, et. al(2011, p. 21): A porção Oeste do estado de São Paulo e a porção Norte do estado do Paraná sofrem dois processos de povoamento. O primeiro denomina-se “fase pastoril” e o segundo denomina-se “pioneirismo agrícola”. Alguns autores destacam um terceiro movimento, o povoamento derivado do processo de desconcentração da metrópole paulista através da reestruturação produtiva, ou seja, do processo de desconcentração urbano-industrial a partir da década de 1970. A partir disso, é possível notar como se deu o desenvolvimento da região de Ourinhos/SP e sua relativa associação com a desconcentração da metrópole paulista. Mas, o que ainda cabe aqui apontar, é como se deu o processo de territorialização de indústrias hoje presentes no município. As ferrovias têm suma importância nesse processo, realizando interações espaciais de caráter socioeconômico entre áreas produtoras. Este sistema de transporte via trilhos acompanha um processo histórico de expansão dos cafezais para o Oeste, segundo Silveira (2011, p. 21) “configurando-se como ferrovias leste-oeste e/ou interior-litoral no atendimento das demandas internacionais de café, sistema agroexportador”, ao mesmo tempo em que isso acontecia, um grande contingente de imigrantes destinavam-se para essa região do estado. 185 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Uma pesquisa feita em campo na disciplina “Geografia econômica”, coordenada pelo docente Lucas Fuini, da Unesp, no próprio município de Ourinhos, possibilitou a análise do processo de territorialização do capital industrial, no qual, migrantes de Botucatu/SP, uma cidade localizada no centrooeste paulista, começaram a trabalhar com a extração de argila e fabricação de telhas e tijolos (olarias) em um bairro chamado Vila Odilon, a partir dos anos de 1920 e 1930. Podemos afirmar, portanto, que Ourinhos/SP teve seu primeiro ciclo de industrialização atrelado à indústria cerâmica. Mas, nos anos de 1980, houve uma crise da cerâmica na região, muitas cerâmicas fecharam por não se desenvolverem tecnologicamente, não atendendo, assim, às demandas do mercado moderno. O desenvolvimento tecnológico e a modernização do setor, nos anos 1980, foram responsáveis pelo fechamento de muitas cerâmicas na região, trazendo assim, aquilo que Haesbaert (2004) chama de “desterritorialização econômica”. Porém, esse tipo de desterritorialização, não se restabeleceu em nenhum outro lugar, simplesmente as fábricas foram desativadas e não se “reterritorializaram”. Ou seja, o modo capitalista de produção modernoiza “desterritorializou” os modos de produção preexistentes para “reterritorializar” segundo novos parâmetros. Para os casos das cerâmicas da cidade de Ourinhos/SP durante as décadas de 1980 e 1990, não houve um processo de “re-territorialização”. Segundo Haesbaert (2004, p. 26): (...) Num sentido mais amplo, a desterritorialização é vista praticamente como sinônimo de globalização econômica ou, pelo menos, como um de seus vetores ou características fundamentais, na medida em que ocorre a formação de um mercado mundial com fluxos comerciais, financeiros e de informações cada vez mais independentes de bases territoriais bem definidas, como as dos Estados nações. A crise da cerâmica em Ourinhos/SP levou ao abandono de espaços e instalações localizados próximos ao centro da cidade, criando um problema de fluidez territorial. Esse tipo de abandono territorial também se encaixa no conceito de “rugosidades”, assim definido por Santos (1996). Segundo o autor, rugosidades seriam aquelas formas que ficam do passado do espaço 186 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 construído, aquilo que resta de divisões do trabalho passadas, restos de tipos de capital utilizados e suas combinações técnicas e sociais com o passado. Atualmente, Ourinhos/SP tem 12 cerâmicas (nos anos 1970 eram mais de 80) e ainda é um dos principais pólos produtores desse setor no estado de São Paulo. Tomado o exemplo das cerâmicas como base de um dos movimentos de industrialização e territorialização no âmbito do processo de desenvolvimento econômico do município de Ourinhos/SP, cabe aqui lembrar que não foi o único. Aproveitando a questão territorial abordada acima, outros fatores da dinâmica industrial atrelados ao fator histórico da linha férrea se manifestaram no surgimento do complexo agroindustrial canavieiro, as chamadas “usinas de cana”, que são indústrias de transformação, pois, transformam a matéria-prima da cana em açúcar e álcool. Esse complexo territorial agroindustrial (SELINGARDI-SAMPAIO, 2009) destaca-se pela presença em Ourinhos da Usina S. Luiz, do Grupo Quagliato, fundada em 1958. Segundo Santos; Silveira (2010, p. 127), A instauração do Programa Nacional do Álcool (Próalcool) em 1975, perante a crise mundial do petróleo, provocou uma expansão para o vale do Paranapanema (rio que passa por Ourinhos) e para as regiões de Araçatuba e Bauru, no oeste paulista. As plantações do Estado de São Paulo passaram de 621.000 hectares em 1975, para 1.008.184 hectares em 1980, e para 2.493.180 hectares em 1994. Outro fator importante que deve ser apontado são as indústrias localizadas nos distritos industriais de Ourinhos/SP (I-Aldo Matachana Tomé; IIHélio Silva), cuja instalação, ou melhor, sua territorialização ocorreu por parte de um incentivo fiscal, ou seja, um auxilio da prefeitura municipal a fim de fomentar o desenvolvimento industrial local, sendo assim, fornecendo a essas indústrias um incentivo territorial para instalação e redução e isenção de impostos. Segundo Santos; Silveira (2010), essas estratégias são utilizadas naquilo que denominam de “guerra dos lugares”, ou seja, as localidades competem entre si para instalação de empresas com atrativos de ordem natural, técnica e normativo, com oferta de incentivos fiscais, infraestrutura de 187 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 energia, comunicações e circulação, terrenos, centros de formação/treinamento de mão de obra, implicando em um custo social que nem sempre as instalações industriais conseguem equilibrar. As indústrias atreladas às indústrias de base, também chamadas de indústria de bens intermediários ou indústrias pesadas, que, normalmente, transportam grande quantidade de matéria-prima, costumam localizar-se próximas às rodovias e ferrovias, porque se facilita o recebimento e escoamento da produção. Em Ourinhos essas indústrias incluem, principalmente, o ramo metalúrgico e mecânico, fabricando materiais e equipamentos que serão utilizados em outras atividades industriais. O início dessas atividades no município ocorre, a princípio, nos anos 1940, com a instalação de pequenas serralherias e indústrias mecânicas próximas ao centro da cidade, tendo grande impulso com a produção de maquinário para atividades agrícolas. Alguns dos principais exemplos de empresas desse ramo no município são: a) Zanuto indústria mecânica, que é responsável pela fabricação e montagem de estruturas metálicas. Sua área de atuação abrange desde estruturas metálicas até fábricas de levedura e caldeirarias; b) Alliance, que produz máquinas para extração de óleo a partir de grãos, industrialização de peças e equipamentos em caldeiraria, estruturas metálicas, entre outros e; c) Tecnal, uma das mais antigas no município, também especializada em equipamentos industriais para beneficiamento de grãos. 4 - Considerações finais O presente artigo buscou analisar o processo histórico e atual de industrialização (ou territorialização industrial) de Ourinhos, inserido no contexto de industrialização do Estado de São Paulo e do Brasil. Consideramos que a relação histórica entre indústria e território nessa região do Estado foi definida por um processo prévio de expansão ferroviária e cafeeira e, posteriormente, pela constituição de centros dispersos ou isolados da indústria 188 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 paulista atrelados à desconcentração da metrópole, às pequenas fábricas oriundas de recursos locais e, à expansão das áreas agrícolas modernas. Desse modo, podemos concluir esse o processo de territorialização industrial em Ourinhos pode ser tratado, teoricamente, a partir de duas concepções: a) a de Storper (1994, apud HAESBAERT, 2004) que define uma atividade como territorializada quando sua efetivação depende da localização e tem raízes em recursos não existentes em muitos outros espaços ou difíceis de serem criados ou imitados em outros locais; b) a de Santos; Silveira (2010), de território usado ou de uso do território, definido pela implantação de infraestruturas ou sistemas de engenharia, bem como pelo dinamismo da economia e da sociedade. 5 - Bibliografia CANO, W. Concentração e desconcentração econômica e regional no Brasil: 1970-1995. Economia e Sociedade, Campinas, Unicamp, n. 8, p. 101-141, jun. 1997. DEL RIOS, J. Ourinhos: Memórias de uma cidade paulista. Ourinhos: Prefeitura municipal, 1992. HAESBAERT, R. O mito da desterritorialização: Do “fim dos territórios” à multiterritorialidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004. SANTOS, M. A natureza do espaço: Técnica e tempo, Razão e emoção. São Paulo: Hucitec, 1996. SANTOS, M. e SILVEIRA, M. L. O Brasil: Território e sociedade no início do século XXI. 10ª. Ed., São Paulo/Rio de Janeiro: Record, 2010. SELINGARDI-SAMPAIO, S. Indústria e Território em São Paulo: A estruturação do multicomplexo territorial industrial paulista (1950-2005). São Paulo: Alínea, 2009. SILVEIRA, M. R., et. al. Ourinhos: Formação e desenvolvimento de uma economia regional e demais estudos. Bauru: Joarte, 2011. SUZIGAN, W. Estado e industrialização no Brasil. Revista Economia Política, Centro de Economia Política, São Paulo, v.8,n.4, out./dez. 1988. 189 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 OS CICLOS ECONÔMICOS E SUAS MANIFESTAÇÕES NO BRASIL1 Washington Soares Silva2 1 - Introdução O modo de produção capitalista sempre foi regido por períodos de expansão e retração, as crises periódicas, sejam estas de superprodução, setoriais etc. tiveram continuamente essa característica. Alias Engels já havia identificado essa tendência ao assinalar a crise europeia de 1848. Em meados da década de 1920 Nikolai Kondratiev propôs a teoria das ondas longas. Tanto Engels quanto Kondratiev sabiam que a sociedade, assim como a natureza, são regidas por leis, o próprio Marx, analisando o funcionamento da economia capitalista analisou e sistematizou várias delas (mais valia etc.). O estudo das leis que regem o sistema capitalista possibilitou verificar suas flutuações cíclicas dando origem a teoria dos ciclos econômicos. No Brasil, Ignácio Rangel (1914-1994), foi praticamente o único a trabalhar com a ideia de ciclos econômicos (mas precisamente as ondas longas da conjuntura ou ciclos de Kondratiev), que posteriormente foram bastante uteis para que o referido autor desenvolvesse a tese da dualidade da economia brasileira, segundo essa visão o Brasil sendo uma formação social periférica, reage de forma dinâmica aos impulsos vindos do centro do sistema (ciclos Kondratiev) sempre combinando modos de produção distintos ao longo de suas etapas de desenvolvimento histórico. A tese da dualidade básica da economia brasileira possibilitou compreender o país a partir da sua formação econômica e social, assim como Lênin fez em O desenvolvimento do capitalismo na Rússia, apreender a gênese, desenvolvimento e tendências futuras de uma determinada sociedade3. Entretanto, apesar de utilizada por inúmeros pensadores W. C. 1 O artigo, como algumas modificações, tem por base a prova escrita junto ao Programa de Pós-Graduação em Geografia Humana FFLCH/USP. Área: Geografia Econômica. 2 Aluno do Programa de Pós-Graduação em Geografia Humana da Universidade de São Paulo, sob a orientação do Prof. Dr. Armen Mamigonian. E-mail: [email protected] 3 “A aplicação da ideia marxista de formação social levou Lênin a escrever em 1899 o Desenvolvimento do capitalismo na Rússia, estudo ao mesmo tempo de economia política e de geografia econômica.” (MAMIGONIAN, 2004, p. XII) 190 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Mitchell, J. Schumpeter, E. Mandel, G. Haberler, M. Kalecki, A. Mamigonian dentre outros, a teoria dos ciclos econômicos sempre gerou certa desconfiança, economistas, sociólogos, geógrafos, etc. principalmente a partir da década de 1980 se referiam a ela como modismo “era moda na época... Hoje já não serve”, as mistificações ocasionadas pela “globalização” e as políticas neoliberais que assolaram os países de Terceiro Mundo, obviamente, também são explicadas como modismo, assim, como as crises no capitalismo são chamadas de recessões, “pausa para respirar”, ou, crescimento insuficiente. É preciso ressaltar que essas crises cíclicas não “brotam do chão”. A ideia de ciclos na economia é bastante útil para entender o movimento de fusões e aquisições de empresas, as tendências a queda da taxa de lucro, a forma como se gesta e se propaga a tecnologia e, a divisão internacional e territorial do trabalho, desde se saiba usa-la de forma criativa e original. 2 - Os ciclos econômicos Os ciclos econômicos já faziam parte do ideário marxista, principalmente os de curta duração estudados por Marx e Engels, como os ciclos juglarianos 4. Já as ondas longas da economia, como os ciclos de Kondratiev, que duram aproximadamente meio século, tendo, um quarto de século de período expansivo, ou, fase A e, um quarto de século de período depressivo, ou, fase B, eram uma novidade um tanto estranha. Até hoje existem marxistas que preferem negar, ou, simplesmente ignorar sua existência5. 4 “A revolução industrial dos fins do séc. XVIII inaugurou os ritmos indústrias de várias durações, principalmente os ciclos decenais (juglarianos) e os longos, de cinquenta anos (Kondratieff), cada ciclo com fase expansiva (“a”) a fase depressiva (“b”). Marx e Engels constataram os ciclos decenais entre 1848 e 1857, que foram sistematizados estatisticamente por Juglar em 1860. Engels assinalou também a chamada ‘longa depressão do final do séc. XIX’ e a sistematização estatística dos ciclos longos foi feita entre 1918-21 por N. Kondratieff (1926).” (MAMIGONIAN, 1999, p. 152). 5 Para o leitor pouco familiarizado com o assunto vale a pena apresentar a periodização utilizada por Nikolai Kondratiev, a saber: Primeiro ciclo longo: fase A: 1790-1815/fase B: 1815-1847 Segundo ciclo longo: fase A: 1847-1873/fase B: 1873-1896 Terceiro ciclo longo: fase A: 1896-1920/fase B: 1920-1948 Quarto ciclo longo: fase A: 1948-1973/fase B: 1973? Claro está que Kondratiev não poderia ir além de 1920, pois dele não se tem noticias desde daquela década, mas a extrapolação é perfeitamente admissível. 191 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Nos anos de 1950, logo após o segundo pós-guerra, velhas teorias sobre o comportamento da economia a longo prazo voltaram a ser debatidas, entre elas, as ondas longas da conjuntura, ou, ciclos de Kondratiev batizadas por Joseph A. Schumpeter com o nome do economista russo que os estudou mais aprofundadamente, Nikolai Kondratiev, que realizou suas descobertas fundamentais na década de 1920, mas que foi renegado pelos seus compatrícios. Na União Soviética foi cassado e enviado para a Sibéria, não se sabe exatamente o motivo, no Ocidente suas ideias foram rejeitadas. Em sua pátria é possível que a ideia de que o capitalismo pudesse renascer das cinzas depois de um período de intensa crise, corolário inescapável de sua teoria, coetânea dos planos quinquenais que se estavam arquitetando, tivesse que disputar não com um capitalismo enfraquecido, mas em franca expansão não foi bem visto pela batalha político-ideológico travada na época. No Ocidente a ideia de fortalecimento do sistema capitalista, desmentindo a concepção leninista da crise geral, também não foi bem aceita (a não ser por alguns homens de gênio, com Schumpeter6 à frente), pois deixava implícito que depois de um período de intenso crescimento econômico, viria uma crise tão violenta como tinha sido idílica a fase ascendente. Não à toa Kondratiev se tornou um profeta maldito nos dois lados da “cortina de ferro”; quanto a nós não há como não admirar o gênio que dispondo de tão poucos recursos conseguiu estabelecer um quadro que se afigura incrivelmente revelador. 3 - A dinâmica dos ciclos de Kondratiev O ciclo longo é um ciclo ligado a uma base, ou seja, possui uma raiz, uma matriz tecnológica, sendo um processo que ocorre porque a tecnologia criada por uma revolução industrial tem vida própria, ligada a política econômica que os países adotam e, chegava um ponto que este dinamismo tecnológico perdia velocidade deixando de ser tecnologia realmente lucrativa. 6 Joseph Schumpeter lecionou por diversos anos nos Estados Unidos, “pregando” as ideias de Nikolai Kondratiev, por toda a América vários neoschumpeterianos, tiveram como base de seus estudos a teoria das ondas longas. 192 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Esta tecnologia envelhecia. Em suma, o ciclo nasce com a revolução industrial, se esgota, havendo necessidade de uma nova revolução tecnológica que por sua vez levava dois ciclos Kondratiev, já que a economia capitalista carecendo de novos avanços tecnológicos impulsionava nova revolução industrial (MAMIGONIAN, 2008). 193 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 4 - Os ciclos econômicos e suas manifestações no Brasil Apesar dos ciclos econômicos, originarem-se no centro dinâmico do sistema capitalista e, serem, portanto, um fenômeno exógeno a economia brasileira, o fato é que o Brasil, como um país de economia periférica e de capitalismo tardio, costuma seguir os impulsos que vem do centro dinâmico, não pacificamente, mas de forma bastante dinâmica, como destacou Ignácio Rangel. Conforme o referido autor, o sistema capitalista possui fases de expansão e fases de recessão (depressão), isto é, cresce em ciclos longos (kondratiev, cuja duração possui em torno de cinquenta anos, tendo vinte e cinco anos de ascensão e vinte cinco anos de declínio, ou, “crise”) e os ciclos médios (juglarianos de dez anos). No Brasil, às fases expansivas são caracterizadas, pelo aumento da demanda agroexportadora ampliando as importações e exportações; nas fases de retração, ocorrem os mecanismos “naturais” de substituição de importações devido à redução nas divisas e aumento do déficit na balança comercial. Isto acontece porque ao contrário do centro do sistema, no Brasil a industrialização se manifestou primeiramente, a partir de um D II industrial (bens de consumo) e, depois um D I pré-industrial (bens de produção), ocasionando um processo de substituição escalonada, setor após setor, assim, em suma a contração do comércio internacional equivale à substituição de importações. Na fase B do primeiro Kondratiev (1815-48), a autossuficiência, foi buscada via diversificação da produção dentro das fazendas de escravos, as unidades básicas fundamentais (produção de tecidos, roupas etc. para uso interno). Com o advento da fase B do segundo Kondratiev (1873-96) impunha-se novamente um novo esforço de substituição de importações, agora com a proliferação de unidades artesanais, tendo, algumas manufaturas préindustriais (produção mercantil nas cidades; comerciantes exportação e importação surgem precocemente). Ao se iniciar a fase A do terceiro Kondratiev (1896-1921) o coeficiente da economia nacional volta a crescer, aumenta o intercâmbio com o exterior, 194 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 contudo, nas notórias condições da I Guerra Mundial e, a subsequente crise do terceiro ciclo longo (1921-48), “primeiro nas regiões mais desenvolvidas do país e, depois, na economia nacional como um todo, o esforço mercantil de substituições de importações desbordou seu quadros primitivos, isto é, escalonadamente... a substituição de importações ia assumindo feição industrial. Esse movimento tinha de comum com os anteriores o fato de constituir uma forma de substituição de importações; mas distinguia-se deles pelo fato de ser industrial” (RANGEL, 2005 [1985] p. 691). Entretanto vale ressaltar, para Rangel, numa substituição de importações escalonada, a dinamização de cada setor deve ser precedida pela criação de condições jurídico-institucionais novas, as quais, ao mesmo tempo em que favorecem alguns tipos de indústrias, desfavorecem outros. Por exemplo, na década de 1930 (Governo Getúlio Vargas), o Estado viabilizou importações de bens de produção; encareceu (aumentou impostos) para a importação de bens de consumo, favorecendo alguns segmentos econômicos em detrimento de outros; esses segmentos favorecidos (novos) dão origem à formação de excesso de capacidade (super-acumulação) originando no dizer do autor uma dialética da capacidade ociosa 7. Em outras palavras, o Estado investe em novos setores e em ciclo posterior em novíssimos e assim sucessivamente até a aproximação tecnológica com o centro do sistema, D II e D I. 5 - Considerações finais Entretanto, no caso brasileiro, como resolver os desafios impostos pela dinâmica dos ciclos de Kondratiev e do nosso próprio ciclo interno, juglariano? Acreditamos que Ignácio Rangel (2005 [1983-1987]) tenha decifrado o enigma ao apontar, principalmente, a partir da década de 1960, discutindo a dialética da capacidade ociosa, que determinados setores da economia se desenvolvem 7 “Por outras palavras, a superprodução não costuma manifestar-se como um fenômeno mais ou menos generalizado pelo organismo econômico, mas como um fato relativamente localizado, restrito a algumas atividades, o que não exclui o aparecimento concomitante, noutro grupo de atividades de agudos pontos de estrangulamento, a pressionarem por investimentos que rompam e, de passagem, reativem a demanda global do sistema e convertam, afinal, com o passar do tempo, os pontos de estrangulamento referidos, em zonas de ociosidade, definindo assim o pólo de ociosidade de outro ciclo.” (RANGEL, 2005[1969-1981] p. 31.) 195 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 mais do que outros nas fases ascendentes dos nossos ciclos breves e, para que a economia brasileira não entre em recessão é imprescindível o estabelecimento de uma intermediação financeira que coloque os recursos ociosos do setor dinâmico para o setor deficitário do organismo econômico nacional. Ora, como já referido anteriormente, o Brasil começou seu processo de industrialização pelo Departamento II (bens de consumo), depois pelo Departamento I (bens de produção). Acontece que por seguir uma ordem inversa dos países que compõe o centro do sistema capitalista que se industrializaram pelo setor de bens de produção (máquinas e equipamentos), no Brasil um determinado setor da economia se desenvolve subutilizando seu potencial produtivo (ociosidade), enquanto outros apresentam dificuldades em acompanhar o setor dinâmico da economia (antiociosidade), assim uma intermediação financeira que pudessem realocar os recursos dos setores dinâmicos (que compõe a poupança da economia nacional) representada atualmente pelo setor privado, para os setores deficitários (antiociosidade) representados pelos serviços de utilidade publica (que corresponde ao setor de investimentos), faria com que a economia nacional conseguisse superar a crise provocada pelo seu ciclo interno (juglariano)8. Isto é, o Estado investe em novos setores e em ciclo posterior em novíssimos e assim em diante, até a aproximação tecnológica com o centro do sistema. 6 - Referências9 MAMIGONIAN, A. Palestra “A crise mundial e a América Latina Hoje”, UNESP, 2008. 8 “Isso posto, não será difícil de perceber o destacado papel que o ciclo econômico brasileiro reserva para o serviço de intermediação financeira – vale dizer, o estratégico papel atribuído, no seio da problemática econômica geral, para a questão financeira. Por outras palavras, a retomada do ritmo de crescimento não resulta, essencialmente, do reinvestimento dos lucros de cada empresa em sua própria expansão, mas do investimento, em um setor, de lucros originários da atividade de outros setores, trazendo implícita a questão dos meios e modos usados para captar, diretamente, ou via setor família, ou Estado, no polo de ociosidade, o excedente econômico que surgirá como investimento no polo oposto, isto é, no polo de antiociosidade ou área dos pontos de estrangulamento.” (RANGEL, 2005. [1969-1981] p. 323). 9 As datas entre colchetes se referem ao ano de publicação original do texto, no caso de haver uma reedição. 196 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 ______. Ciclos econômicos e organização do Florianópolis, v. 14, n. 28, p. 152-157, jul./dez. 1999. espaço. In: Geosul, ______. Estudos de geografia econômica e de pensamento geográfico. 264 pags. Tese (Livre docência). São Paulo: FFLCH/USP, 2004. RANGEL, I. A dinâmica da dualidade brasileira. In: ______. Obras reunidas, Vol. II. Rio de Janeiro: Contraponto, 2005. p. 552-566 [1962]. ______. Ciclo, tecnologia e crescimento. Idem. p. 255-408 [1969-1981]. ______. Dualidade e “escravismo colonial”. Idem. p. 623-635 [1978]. ______. Economia brasileira contemporânea. Idem. p. 409-549 [1983-1987]. 197 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A POLÍTICA ESTATAL CHINESA Washington Soares Silva1 1 - Introdução Durante o século XIX a China foi saqueada, esquartejada e inferiorizada pelos seus exploradores externos, associados aos seus inimigos internos. Contudo, a realidade contemporânea é outra... A sabedoria convencional sempre preconizou que a República Popular da China estava gradativamente se transformando numa economia de mercado, sobretudo, após a dissolução da União Soviética; o fato é que conforme destacou Milton Santos (2011) “não é verdade que a China esteja se tornando capitalista, podendo se utilizar do capital sem ser capitalista” e é justamente isso, a união entre economia de mercado e planejamento estatal2. O presente ensaio busca analisar a gênese e desenvolvimento da política estatal chinesa, tendo em vista, as experiências socialistas (economia planificada) e, sua atuação no comércio exterior. 2 - Metodologia Como principio metodológico norteador para a elaboração deste trabalho, utilizou-se basicamente o levantamento bibliográfico acerca da temática abordada, oriundo de diferentes suportes e fontes. Isso, porque esta pesquisa realiza uma análise essencialmente teórica do assunto por ele abordado. 3 - Gênese e desenvolvimento da política estatal chinesa Desde a revolução o Partido Comunista Chinês procurou fazer uma política estatal que abrangesse os setores considerados prioritários pelo 1 Aluno do Programa de Pós-Graduação em Geografia Humana da Universidade de São Paulo, sob a orientação do Prof. Dr. Armen Mamigonian. E-mail: [email protected] 2 Cabe destacar que Raúl Prebisch também esboçou o mesmo pensamento, para o caso latino americano, referindo-se ao processo de substituição de importações, isto é, planejar a substituição de importações para que não seja apenas um fenômeno passageiro, mas sim continuo. 198 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 governo (agricultura, indústria, educação dentre outros); mas foi com Deng Xiaoping que o planejamento estatal chinês ganhou impulso decisivo. Deng seguiu em grande parte o modelo japonês (Inovação Meiji). Ora, se os japoneses conseguiram através da Revolução Meiji promover o desenvolvimento do Japão através de uma política econômica planejada onde a maneira prussiana o capitalismo foi implantado de cima para baixo, o Estado monta as bases para o desenvolvimento capitalista (OKABE, 1974), os chineses estão destinados segundo Deng Xiaoping através do PC Chinês a promover uma revolução parecida, explorando o potencial do proletariado. Ideologicamente, isso significava que o socialismo seria capaz de competir com eficiência, melhor do que as lideranças do mundo capitalista, ou seja, aliar a visão marxista do mundo e a tradição chinesa, pois o que moldou a sociedade chinesa foram filosofias e não religiões (se na Europa Ocidental o homem tinha que “ganhar o pão com o suor do seu rosto”, pois o meio em qual viviam era inóspito, no Oriente, especificamente na China o rio Amarelo praticamente criou e sustentou toda uma civilização, assim como o Egito “Dádiva do Nilo”, criando assim uma visão otimista da natureza), pensamento baseado na realidade “as coisas surgem de baixo para cima”, nascem do cotidiano, Confúcio. Assim, em relação ao Estado a autoridade deve ser aceita, a obediência exercida, praticada, para Deng o marxismo não pode ser igualado a uma religião é preciso tirar da realidade os fatos, os caminhos a serem trilhados (MAMIGONIAN, 2007). Isso se deve em grande parte a dois ensinamentos que os chineses, observando a história mundial e das experiências socialistas, conseguiram apreender de forma rápida e eficaz: primeiro é preciso fazer a revolução e institucionaliza-la; é preciso transformar a tomada de poder, ato revolucionário em uma situação institucional. É necessário ter clareza sobre estes dois momentos. Exemplo: J. Stalin enfrentou situações revolucionarias praticamente o tempo todo; Deng sabia disso, tanto é que seu governo constituía-se numa continuação e ao mesmo tempo ruptura em relação ao governo de Mao Zedong (conservação com superação, cf. Hegel), pois com este a China já era uma potência industrial; o segundo 199 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 ensinamento, tirado de Lênin, é que o camponês é igualitário, mas tem tendência ao enriquecimento, e, no caso da China sem apoio dos camponeses pobres a possibilidade de uma revolução socialista ficaria muito reduzida. A construção do socialismo se faz com a concepção de enriquecimento. Assim, durante a revolução e com base no processo histórico, principalmente das economias mais avançadas no mundo capitalista e das experiências socialistas (economia planificada), a política estatal chinesa, pouco a pouco, foi moldando-se até alcançar o dinamismo que possui atualmente, porque esse dinamismo baseia-se no enfrentamento dos oligopólios internos e, ao estimulo a propriedade privada, aliado a desestatização de alguns setores. Mas o que significa isso? Significa que o governo chinês percebeu que o desenvolvendo a concorrência interna seria uma boa medida de favorecer o desenvolvimento do setor de Import/Export fortalecendo o comercio exterior controlado pelo Estado, em suma, promove o surgimento de iniciativa privada, estimulo para financiamento de fabricas (montagem e construção com a vantagem de diminuir o número de empregados ociosos), acabar com as siderurgias antigas evitando o atraso tecnológico e a poluição, fazendo com que conglomerados industriais mais dinâmicos se internacionalizem obrigados a ser mais eficazes por causa da concorrência interna e externa, tornando-se assim vasos comunicantes da economia. 4 - Considerações finais Em suma a China estava atrasada em relação ao resto do mundo, mas esse atraso, não significava passividade, “o privilegio do atraso” conforme Trotsky significa o reconhecimento de que há insuficiências. Grosso modo, a política estatal chinesa, absorveu os ensinamentos da experiência japonesa (Inovação Meiji) e Soviética (Planos Quinquenais); percebeu as especificidades do marxismo na China (diferenças entre as Revoluções Russa e Chinesa) o que possibilitou que a presença do Estado na economia atua-se na correção de distorções, sobretudo, no reforçamento dos monopólios Estatais. As Quatro 200 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Modernizações que impulsionaram setores estratégicos como indústria, armamentos, inovação cientificas dentre outros, agiram nesse sentido. Cabe ainda acrescentar algumas palavras sobre as estratégias políticas e econômicas do maior país em desenvolvimento do planeta que podem ser sintetizadas da seguinte forma: 1) respeito pela soberania e integridade territorial; 2) não agressão mutua; 3) não interferência nos assuntos internos de outros países e 4) coexistência pacífica, segundo Zhou Shixiu, da Universidade de Hubei (Jornal da Universidade de São Paulo, julho de 2013). 5 - Referências MAMIGONIAN, A. As bases naturais e sociais da civilização chinesa. In: Dossiê Ásia/China. Geografia econômica, anais de Geografia econômica e social, UFSC, 2007. ______. Palestra “Desenvolvimento regional Latino Americano: alternativas para a crise”, UNESP, 2007. OKABE, H. Algumas reflexões sobre a formação do capitalismo japonês, Argumento nº 3, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1974. OLIVEIRA, Amaury Porto de. A revolução chinesa passada no calidoscópio. UNICAMP. Grupo de Estudos Brasil/China, 2011 [mimeo]. ______. Brasil/China: buscar convergências nas TE. Seminário Inst. Brasil/China. UFRJ, 2011 [mimeo]. SANTOS, M. Por uma outra globalização. Rio de Janeiro: BestBolso, 2011. Periódicos Jornal da Universidade de São Paulo. 201 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 TERRITÓRIO E MOBILIDADE: CONTRIBUIÇÕES PARA A COMPREENSÃO DOS FLUXOS DE REFUGIADOS CONTEMPORÂNEOS Raphael Henrique de Moraes Gregorio1 Samir Eid Pessanha2 Paulo Fernando Cirino Mourão³ 1- Introdução Apesar do deslocamento de pessoas de uma determinada região para outra em busca de segurança ser tão antiga quanto à própria história humana, a problemática envolvendo só refugiados ganhou importância nos foros internacionais e nas agendas de discussão entre líderes políticos apenas após o período da Segunda Guerra Mundial (1939-45), quando houve “o deslocamento de aproximadamente mais de 40 milhões de pessoas no interior da Europa” (MOREIRA, 2006, p. 02). Nesse cenário, na data de 14 de dezembro de 1950, foi criado pela assembleia geral das Nações Unidas (ONU), o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), com o objetivo de assegurar os direitos e o bem-estar dos refugiados (ACNUR, 2012b). A partir desse momento, foram realizados diversos encontros entre autoridades e instituições internacionais, com o objetivo de se discutir essa questão e alcançar uma definição jurídica que identificasse os indivíduos em situação de refúgio e possibilitariam o desenvolvimento de ações na busca de mitigar os problemas dessa população. Os marcos internacionais para criação de instrumentos para definição jurídica de refugiado datam do pós-Segunda Guerra Mundial, traduzidos na ‘Convenção de 1951 relativa ao Estatuto do Refugiado’ e, posteriormente, no ‘Protocolo de 1967 relativo ao Estatuto dos Refugiados’ da Organização das Nações Unidas. Em 1984, os países da América Latina e Central adotam definição mais ampla de refugiado com a ‘Declaração de Cartagena’. (DOMINGUEZ; BAENINGER, 2007, p. 01). 1 Graduado em Licenciatura em Geografia e Graduando em Bacharelado em Geografia pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – Câmpus de Ourinhos. [email protected]. 2 Graduando em Bacharelado e Licenciatura em Geografia pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – Câmpus de Ourinhos. [email protected]. ³ Orientador e professor da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – Câmpus de Ourinhos. [email protected]. 202 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Os refugiados deixam seu país de origem, quando nele, sua vida e segurança já não são garantidas, diferentemente dos migrantes que deslocamse por diferentes motivações, sendo o fator econômico o mais frequente. Segundo a clássica definição da Convenção de 1951, uma pessoa deve ser reconhecida como refugiado se: Temendo ser perseguida por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, se encontra fora do país de sua nacionalidade e que não pode ou, em virtude desse temor, não quer valer-se da proteção desse país. (ACNUR, 2012d). Os motivos que originam o refúgio podem ser os mais diversos como, por exemplo, perseguição religiosa, filiação a um determinado grupo social ou político, por questões étnicas, econômicas, conflitos armados e outros tipos de violência, tragédias ambientais como tsunamis, terremotos e também epidemias. Com o fim da Segunda Guerra Mundial e com a recuperação econômica dos países europeus e do Japão, havia uma expectativa de que os fluxos de refugiados diminuiriam consideravelmente. Contudo, nas décadas seguintes, observou-se o surgimento de novos conflitos, a intensificação dos fluxos e que estes não se restringiam apenas ao continente europeu. De forma geral as produções acadêmicas que analisam a história do capitalismo no período do pós Segunda Guerra Mundial, qualificam exageradamente o período como os Anos Gloriosos, ignorando a articulação necessária do relativo “sucesso” do desenvolvimento capitalista da Europa Ocidental e Japão, com a pauperização de amplos territórios no planeta, como América Latina, África e Ásia. (CARVALHAL, 2004, p. 208). Segundo Bauman (2005), a expansão global da forma de vida moderna que caracterizou as décadas seguintes, foi responsável por colocar em movimento uma enorme quantidade de pessoas destituídas de formas e meios de sobrevivência. Além disso, a expansão do capital atingiu todo o planeta, não havendo mais espaços vazios que antes serviam para a remoção dessas pessoas que ele classifica de “redundantes” ou “refugos”. 203 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Agora, esse contingente não pode ser territorialmente excluído, sendo necessário de alguma forma realocá-los. Essa tarefa se torna papel do Estado a partir do momento em que ele renuncia o controle da economia, em nome do livre mercado, e busca na segurança uma nova justificativa para sua legitimação. Atualmente, existem mais de 45 milhões de pessoas que foram obrigadas a abandonar o local de origem e buscar proteção em regiões mais distantes. Apenas no ano de 2012 surgiram 7,6 milhões de novos casos de deslocados, seja dentro do território do país de nacionalidade ou atravessando suas fronteiras. No caso do Brasil, além da questão geográfica, pois faz fronteira com a Colômbia que hoje é o país que mais emite refugiados no continente devido aos conflitos armados em seu território, sua economia emergente faz com que o país se torne um destino mais atrativo para esse contingente. No ano de 2012 o número de solicitações de refúgio no país aumentou 275% se comparado com o ano de 2010. Sendo que 45% de todas as solicitações de refúgio tem como destino o estado de São Paulo. Contudo, apesar da questão dos refugiados ganhar importância em todo o mundo e tornar-se cada vez mais presente nas agendas de discussões entre líderes políticos e instituições internacionais, não encontra-se na literatura brasileira, um conjunto significativo de trabalhos sobre a referida temática. Tendo em vista a relevância do tema dos refugiados, vale destacar que existe uma vasta literatura internacional, principalmente composta por publicações do ACNUR e por obras de línguas inglesas e espanholas. Por outro lado, no âmbito nacional, o tema é relativamente novo, havendo poucos autores que se aprofundaram nesse estudo. (MOREIRA, 2006, p. 04). Os refugiados constituem um objeto de estudo ainda recente no país, sendo que a maioria das publicações sobre o tema dedica-se ao estudo desse tema nos países desenvolvidos ou em países em desenvolvimento que recebem grande fluxo de refugiado. “A discussão teórica no ambiente 204 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 acadêmico nacional ainda se encontra em estágio incipiente, sendo importante desenvolver essa área de pesquisa” (MOREIRA, 2012, p. 11). 3 - Mobilidade e dinâmicas territoriais Para se compreender os processos que constituem as dinâmicas territoriais desse fenomêno, se faz necessário definir o modo como será abordado o conceito de território. Trata-se de um conceito polissêmico, de múltiplos entendimentos e aplicações, variando sua definição de acordo com as linhas teórico-conceituais adotadas (HAESBAERT, 2006, p. 35-36). Raffestin (1993) compreende o território como um substrato do espaço geográfico, enfatizando em sua análise, seu caráter políticoadministrativo, como o espaço físico de um Estado, por exemplo, configurado pelas diversas relações de poder em seu interior e pela projeção do trabalho humano. É essencial compreender bem que o espaço é anterior ao território. O território se forma a partir do espaço, é o resultado de uma ação conduzida por um ator sintagmático (ator que realiza um programa) em qualquer nível. Ao se apropriar de um espaço, concreta ou abstratamente [...] o ator “territorializa” o espaço. (RAFFESTIN, 1993, p. 143). Nesse sentido, Raffestin (1993) diz que é mais importante analisar o papel dos atores e as relações de força que provocam o deslocamento dos refugiados e constituem as dinâmicas territoriais, do que a própria natureza que o determina, como por exemplo, as guerras e os demais conflitos. Segundo o autor, há dois tipos distintos de mobilidade: a mobilidade autônoma e a mobilidade heteronômica. A mobilidade autônoma é aquela onde o individuo opta, por vontade própria, pelo deslocamento de uma região para a outra, mesmo nas situações onde ele decide deixar seu país de origem por sua vida estar em perigo ou sofrer algum tipo de violência, buscando segurança em outro, como no caso dos refugiados. 205 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Trata-se de uma mobilidade autônoma o caso daqueles que têm para escolher entre o deslocamento ou a morte? A alternativa é brutal, mas devemos admitir que ainda há uma escolha, quando resulta de uma decisão própria do migrante” (RAFFESTIN, 1993, p. 88). Mesmo no caso da mobilidade autônoma, as organizações adotam diversas estratégias para aumentar o movimento ou, ao contrário, para freá-lo. As políticas migratórias são de uma extrema importância porque controlam e administram os fluxos no espaço. (IDEM) Já a mobilidade heteronômica, trata do deslocamento à força imposto por uma autoridade qualquer a um individuo, já que as políticas imigratórias não são atributos exclusivos do Estado, mas sim de múltiplos grupos no seu interior e que, com frequência, possuem interesses distintos e contraditórios. Esse tipo de mobilidade coerciva caracteriza o momento em que o ACNUR desloca os refugiados de um acampamento qualquer para inseri-los em outro país. Nesse contexto, os refugiados primeiramente passam por um processo de desterritorialização e de mobilidade autônoma ao deixar sua terra natal para reterritorializar-se no campo de refugiados. Em um segundo momento, os mesmos desterritorializam-se novamente e passam por uma mobilização heteronômica, deixando esse campo com destino a um terceiro país, onde ocorre um novo processo de reterritorialização. Simplificadamente podemos afirmar que a desterritorialização é o movimento pelo qual se abandona o território, “é a operação da linha de fuga”, e a reterritorialização é o movimento de construção do território. (DELEUZE; GUATTARI, 1997b, apud HAESBAERT 2006, p. 127). Concorda-se com Haesbaert que toda desterritorialização é acompanhada de uma reterritorialização. As diferenças desse complexo processo se dão segundo a classe econômica e grupo cultural em que este indivíduo ou grupo pertence, o acesso a infraestrutura e serviços básicos no país de destino, o acesso a direitos de cidadania, e a existência de espaços específicos que possibilitem a manutenção de suas identidades culturais. (HAESBAERT, 2006, p. 250). 206 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Os Estados, as instituições nacionais e internacionais, as organizações não governamentais e todos os envolvidos no processo do refúgio, de sua geração à criação de políticas e ações que buscam sua mitigação, assim como os que exercem todo tipo de controle ou influência do espaço são denominados de “atores sintagmáticos” (RAFFESTIN,1993, p. 40). Desde o início, o processo de desenvolvimento do capitalismo se mostrou também como um processo de racionalização da organização das atividades sociais em geral, compreendendo as políticas, as econômicas, as jurídicas, as religiosas, as educacionais entre outras. “Aos poucos, as mais diversas esferas da vida social são burocratizadas, organizadas em termos de calculabilidade, contabilidade, eficácia, produtividade, lucratividade.” (IANNI, 1997, p.113). Essa racionalização norteia a ação dos atores sintagmáticos, as legislações e os foros de discussão acerca do tema refugiados. 4 - Objetivos O objetivo do presente trabalho é compreender as dinâmicas territoriais que configuram o fenômeno do refúgio, analisando os processos de mobilidade que caracterizam esse tipo de deslocamento e o papel dos atores constituintes dessa relação. 5 - Procedimentos metodológicos Para realizar os objetivos propostos, será realizado a revisão bibliográficas pertinentes aos temas abordados, sobre o refúgio e a legislação brasileira, dinâmicas territoriais, mobilidade e o papel dos atores sociais envolvidos nesse processo. Apoiando-se na pesquisa bibliográfica, buscaremos realizar uma discussão que nos possibilite alcançar uma maior compreensão desses processos que caracterizam o fenômeno do refúgio. 6 - Resultados O fenômeno do refúgio é constituido por complexas dinâmicas territoriais, caracterizando esse processo desde o momento em que o indivíduo 207 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 abandona seu local de origem até o momento em que é inserido em uma nova sociedade. Além de colocar em movimento um grande contingente, a expansão territorial do capital para as mais diversas regiões do planeta, não deixa mais espaços vazios que antes serviam para a remoção dessas pessoas, não sendo possivel exclui-las territorialmente. Nesse contexto, um número variado de atores estão envolvidos no controle do espaço e determinam ou influenciam de maneira direta os fluxos contidos nele. Entre eles, estão envolvidos os Estados, instituições internacionais e mais um conjunto diverso de atores que sob a orientação do capital e segundo suas necessidades de acumulação, gerenciam a mobilidade realizada por esses deslocados e desenvolvem as políticas que determinam sua inserção no país de destino. Ainda sob essas orientações, o Estado abandona o controle da econômia em nome do livre mercado busca legitimar-se se ocupando com a segurança, se tornando responsável por essa tarefa. Priorizando a análise acerca do papel desses atores e as relações de força constituídos na gênese desse movimento, quando ainda no país de origem e desterritorializa-se, os refugiados passam por um processo de mobilidade autônoma. Mesmo que nesse local sua segurança não é mais garantida pelo Estado e a necessidade de fuga se torna real, a mobilidade parte da escolha do indivíduo. Já quando este se encontra em um campo de refugiado ou em um país onde sua permanencia não é garantida, esses refugiados são encaminhados a um outro local onde o direito de permanecer refugiado nesse território é assegurado, tratando-se de uma mobilidade heteronômica, imposta pelos Estados através de mecanismos jurídicos, tratados multilaterais e pelo ACNUR. 7 - Considerações finais A expansão territorial do capital observado a partir da segunda metade do Século XX engendrou um conjunto variado de transformações em toda 208 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 forma de organização dentro das sociedades capitalistas. Como as diversas contradições sistemicas que caracterizam o capitalismo, a territorialização do capital resulta em muitos casos, na desterritorialização do homem, se não de maneira direta, mas também em consequencias das multiplas determinações inerentes ao processo de acumulação do capital. O processo de refúgio é controlado por um variedade de atores que determinam a direção e destino desses fluxos e influenciam diretamente no processo de integração desse contingente no país de destino. O Estado, buscando legitimar-se se ocupa em orientar esse processo, já que, não é possível exclui-los territorialmente. A análise do fenômeno do refúgio como resultado de uma síntese de múltiplas determinações proporciona novas perspectivas para a compreensão desse fenômeno cada vez mais frequente em todo o mundo e as estratégias para amenizar ou mitigar os problemas enfrentados por essa população no em território brasileiro. 8 - Referências ALTO COMISSARIADO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA REFUGIADOS. Breve Histórico do ACNUR. 2012a http://www.acnur.org/t3/portugues/informacaogeral/breve-historico-do-acnur/Acesso em: 12/08/2012. ______. Refugiados. 2012b. Disponível <http://www.acnur.org/t3/portugues/a-quem-ajudamos/refugiados/>. em: 06/07/2012. em: Acesso ______. Tendencias Globales 2012: Desplazamiento – El Nuevo Reto del Siglo XXI. 2013. Disponível em: <http://unhcr.org/globaltrendsjune2013/Tendencias_Globales_2012_baja.pdf>. Acesso em: 03/09/2013. BAUMAN, Zygmunt. Vidas Desperdiçadas. Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005. Tradução: Carlos Alberto CARVALHAL, Marcelo Dornelis. A Dimensão Territorializante da Qualificação Profissional em São Paulo: a ação dos sindicatos. 2004. 337 f. Tese (Doutorado em Geografia) – Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista, Presidente Prudente, 2004. DOMINGUEZ, Juliana Arantes; BAENINGER, Rosana. Programa de Reassentamento de Refugiados no Brasil. 2007 Disponível em: 209 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 <http://www.migrante.org.br/programadereassentamento.pdf> 06/07/2012. acesso em: HAESBAERT, Rogério. O Mito da Desterritorialização. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006. IANNI, Octavio. Teorias da Globalização. São Paulo: Civilização Brasileira, 1997. MOREIRA, Julia Bertino. A questão dos refugiados no contexto internacional (de 1943 aos dias atuais). 2006. 198 f. Dissertação (Mestrado em Relações Internacionais) – Instituto de de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2006. ______. Política em relação aos refugiados no Brasil (1947-2010). 2012. 377 f. Tese (Doutorado em Ciência Política) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2012. RAFFESTIN, Claude. Por uma geografia do poder. Tradução de Maria Cecília França. São Paulo: Ática, 1993. 210 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 A INSERÇÃO DOS REFUGIADOS NO MERCADO DE TRABALHO NO ESTADO DE SÃO PAULO Raphael Henrique de Moraes Gregorio1 Marcelo Dornelis Carvalhal² 1- Introdução A segunda metade do século XX e início do século XXI apresentam-se como um período marcado por profundas transformações na forma de organização social em todo o planeta em decorrencia do processo de expansão do capital. Nesse contexto, o trabalho torna-se o centro dessas mudanças como consequência da busca de acumulação e expansão do capital ao longo desse período, porém, essas modificações não ficaram restritas ao processo produtivo, atingindo e transformando toda a estrutura das sociedades capitalistas. Nos países centrais onde o capitalismo se encontrava em um estágio mais avançado, a reestruturação produtiva, a reorientação das funções do Estado e a financeirização do capital marcaram as transformações ocorridas no âmbito do trabalho e desenvolveram-se como estratégias na busca de respostas e caminhos para a superação da crise de acumulação que ocorreu durante a década de 1970. “A reestruturação produtiva teve como diretriz a reorganização do papel das forças produtivas na recomposição do ciclo de reprodução do capital, na esfera da produção e das relações sociais.” (SILVA, 2006, p. 15). Essa estratégia foi fundamental na determinação das transmutações ocorridas no mundo do trabalho, cujas manifestações se traduzem, entre outras, em um novo modo de se organizar a produção, novas formas de gestão, precarização das relações e condições de trabalho, diminuição da oferta de empregos, formação de um grande excedente populacional e diminuição dos laços de solidariedade no âmbito do trabalho. 1 Graduado em Licenciatura em Geografia e Graduando em Bacharelado em Geografia pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – Câmpus de Ourinhos. [email protected]. ² Orientador e professor da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – Câmpus de Ourinhos. [email protected]. 211 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Já nos países periféricos, situação que inclui o Brasil, as mudanças ocorreram em ritmos e épocas diferentes de acordo com as particularidades do cenário econômico, político e social de cada um. Contudo, essas transformações desenvolveram-se em condições subordinadas aos países centrais, que impunham regras utilizando instituições financeiras internacionais como mecanismo de coerção, em decorrência da dívida externa adquirida por esses países ao longo das décadas anteriores (SILVA, 2006, p. 16). Segundo Carvalhal (2004), as recentes transformações além de serem respostas à crise de acumulação vivenciada durante a década de 1970, estas não estão restritas apenas ao processo produtivo mas ocasionaram também um conjunto variado de transformações na organização das sociedades capitalistas, influenciando o cenário econômico, político e social dos países capitalistas. Ao longo desse período observou-se profundos impactos negativos nas sociedades influenciadas por essas mudanças, gerando novos fenômenos sociais ou intensificando os já existentes, como nunca antes observado na história, como o significativo aumento do número de trabalhadores rurais destituídos de suas terras, pessoas desempregadas e em situação de rua, assim como o surgimento de um grande contingente de refugiados e deslocados em todo o mundo, consequência de conflitos e da degradação das condições de sobrevivência acentuadas nesse cenário. Apesar do deslocamento de pessoas de uma determinada região para outra em busca de segurança ser tão antiga quanto à própria história humana, esse assunto ganhou devida atenção no cenário político internacional apenas após o período da Segunda Guerra Mundial (1939-45), quando houve “o deslocamento de aproximadamente 40 milhões de pessoas no interior da Europa” (MOREIRA, 2006, p. 02). Observou-se desde então, a intensificação desses fluxos de deslocados e que esse fenômeno não se restringia apenas ao continente europeu, ocorrendo nas mais diversas regiões do planeta. Segundo o ACNUR (2013), existem atualmente mais de 45 milhões de deslocados sendo que, só no ano de 2012 registraram-se 7,6 milhões de novos 212 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 casos, ou seja, em média 23.000 pessoas a cada dia são obrigadas a deixarem suas casas e buscar proteção e seguranças em outras regiões dentro do seu próprio país de origem ou além de suas fronteiras. No Brasil, o número de solicitações de refúgio aumentou 275% entre o período de 2010 à 2012. Sozinho, o estado de São Paulo recebe 45% de todas essas solicitações. Os estudos sobre mobilidade social e migração receberam maior atenção dos pesquisadores nas últimas décadas, sobretudo no estado de São Paulo, que além de contar com um contingente diverso, é o maior palco dos movimentos das mais variadas modalidades. JANNUZZI (2000), enfatiza ainda, como a investigação das transformações estruturais do mercado de trabalho e a inserção do imigrante nesse contexto, ocupam um papel de destaque para a compreensão desse fenômeno As articulações entre mobilidade social e migração tem sido objeto de estudo de um corpo expressivo de pesquisadores no país nas últimas décadas […] ora tomando a investigação da mobilidade socioocupacional ou as transformações estruturais do mercado de trabalho como preocupação principal, a questão da inserção ocupacional do migrante no mercado de trabalho e da sua adaptação social na sociedade de destino tem sido um tema recorrente na literatura. (JANNUZZI, 2000, p. 05). 2 - Trabalho e o processo de integração social dos refugiados no estado de São Paulo Ao longo do processo de inserção dos refugiados em São Paulo, surgiram diversas manifestações de descontentamento por parte dos refugiados através de veículos de comunicações locais, sendo inclusive, realizado um protesto por parte de alguns desses refugiados, que acamparam na frente do escritório do ACNUR localizado na cidade de Brasília/DF, reivindicando melhores condições e até solicitando a mudança de país, para que pudessem buscar em outro lugar as condições dignas de sobrevivência que não lhes foram fornecidas (AGÊNCIA BRASIL, 2008; ANDRADE, 2008; FERNANDES, 2008). Entre os principais problemas apontados pelos refugiados estão relacionados ao desemprego ou péssimas condições de trabalho e salários; 213 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 dificuldades no aprendizado da língua local; atendimento e acesso precário a tratamentos e consultas médicas; ausência de documentação; omissão por parte do Governo Federal e do ACNUR quanto às assistências previstas; e reclamações referentes ao valor insuficiente e pequeno prazo do auxílio em dinheiro fornecido. Um fator de grande preocupação por parte dos refugiados trata-se do auxílio em dinheiro enviado pelo ACNUR. O valor do auxílio fornecido seria de aproximadamente R$ 350,00 (AGÊNCIA BRASIL, 2008; ANDRADE, 2008; MURAKAWA, 2011; RESENDE, 2011a), valor este inferior a um salário mínimo no Brasil, apontado como insuficiente para cumprir com os compromissos, como pagamento de contas e alimentação, por exemplo. Além disso, o prazo de duração de dois anos dessa assistência é considerado pequeno para que essas pessoas alcancem a autossuficiência e independência financeira, e deixem de necessitar desse auxílio para sua sobrevivência (PREFEITURA MUNICIPAL DE MOGI DAS CRUZES, 2009; D’ANDRADE, 2009; RUIZ, 2009; MURAKAWA, 2011). Quando essas pessoas não se encontram desempregadas, estão exercendo trabalhos com baixa remuneração, geralmente trabalhos domésticos e no mercado informal, impossibilitando que estes tenham acesso aos direitos e benefícios trabalhistas assegurados a estrangeiros (FERNANDES, 2008; D’ANDRADE, 2009; UNICRIO, 2010; RESENDE, 2011b). Nessa questão podemos tratar da inserção dessa mão de obra no que Milton Santos (2004) denomina de “Circuito Inferior da Economia Urbana”, característica da economia urbana dos países subdesenvolvidos, criada pelos diferentes níveis de consumo da população. Esse circuito é responsável por empregar, em grande parte, a população menos favorecida, frequentemente com baixa remuneração e trabalhos temporário: O emprego, no circuito inferior, raramente é permanente, e sua remuneração situa-se com frequência no limite ou abaixo do mínimo vital. O contrato frequentemente assume a forma de um acordo pessoal entre patrão e empregado, mas a importância do trabalho familiar, [...] e do trabalho autônomo é grande. (SANTOS, 2004, p. 45). 214 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Observamos relativa facilidade para a inserção de migrantes desprovidos de capital e qualificação profissional, já que as vagas desse circuito se direcionam, em grande parte, para mão de obra barata e porque, essas pessoas supostamente estariam mais dispostas a aceitar essas condições inferiores de trabalho (SANTOS, 2004, p. 206). A mesma facilidade não é observada para os empregos que necessitam de determinada formação profissional ou conhecimento técnico, onde encontram-se salários maiores e melhores condições para promover a inserção social dessa população. Ainda sobre essa questão, a inserção no mercado de trabalho ou o desafio de encontrar empregos com melhores condições e salários, demonstrou muito complicada, sobretudo, pela qualificação profissional exigida e pela dificuldade de se aprender a língua portuguesa, já que segundo a Agência Brasil (2008), as grandes jornadas de trabalho que eles são submetidos os impossibilitam de prosseguir com os estudos da língua local. A linguagem, segundo Raffestin (1993), também é um instrumento de poder, com isso, uma opressão linguística também é possível, com isso, a ocorrência de todos os tipos de relações dissimétricas e desvantajosas tornam-se possíveis entre estes e a população local. A dificuldade de aprendizado da língua portuguesa é comum entre os idosos e adultos, já os mais jovens, que estão matriculados normalmente em escolas públicas, é mais comum o domínio do idioma, o que facilita muito sua inserção no mercado de trabalho. (D’ANDRADE, 2009; PREFEITURA MUNICIPAL DE MOGI DAS CRUZES, 2009). O refugiado tem garantido, após seu reconhecimento pelo CONARE, acesso a documentos que possibilitam sua permanência no país, direito ao acesso a políticas públicas e ao emprego, porém como publicado pela Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes (2009), algumas dessas pessoas não teriam recebido essa documentação, o que dificulta ainda mais sua integração e permanência. Segundo Andrade (2008) e Resende (2011a) o apoio por parte do Governo Federal e do ACNUR é modesto, contudo, destaca-se o papel 215 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 fundamental das ONGs no auxílio e desenvolvimento de projetos que contemplem e auxiliem os refugiados. De acordo com as reportagens que consultamos sobre essa questão, os refugiados encontram muitas dificuldades de adaptação por causa da ausência de políticas públicas ou acesso a elas, que os possibilitem alcançar a independência financeira, deixando de depender de assistencialismo (D’ANDRADE, 2009; RUIZ, 2009; UNICRIO, 2010; RESENDE, 2011b). Grande parte dessas pessoas chegam ao Brasil sem nenhum conhecimento da cultura local, e conforme coloca o refugiado Mustafá, na reportagem realizada por Cláudia Andrade para o Portal UOL de Notícias, nos outros países os refugiados aprendem sobre a Geografia e a História do lugar, o que não acontece no Brasil. Além disso, a conscientização da população local sobre quem são os refugiados é uma ferramenta fundamental para a permanência dessa população em seu país de refúgio. O preconceito por possuir uma cultura distinta e o desconhecimento de qual é a situação de um refugiado, muitas vezes julgados de maneira equivocada, dificultam ainda mais seu processo de adaptação e integração social, como por exemplo, o acesso destes ao mercado de trabalho (RESENDE, 2011b). “A relação de trabalho é particularmente dissimétrica para os grupos raciais ou étnicos submetidos à discriminação” (RAFFESTIN, 1993, p.135). 4 - Objetivos Estudar o processo de inserção territorial dos refugiados no estado de São Paulo a partir da criação da legislação de 1997 referente ao tema, analizando o processo de inserção desse contingente no mercado de trabalho, considerando a dinâmica territorial do capital e as recentes transformações no mundo do trabalho. 5 - Procedimentos metodológicos Para alcançarmos os objetivos propostos, realizaremos uma revisão bibliográfica sobre as transformações contemporâneas no capitalismo, 216 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 sobretudo quanto às mudanças no mundo do trabalho e à dinâmica territorial do capital, particularmente do tema dos refugiados no Brasil e no Mundo, consultando à legislação pertinente, os processos histórico-geográficos dos locais de origem, sobre as dinâmicas territoriais e geográficas que abrangem o tema, além de publicações e reportagens realizadas com os refugiados. A partir da pesquisa bibliográfica, será realizado uma análise critica sobre as condições de vida desse contingente e as características de inserção no mercado de trabalho e integração dos refugiados no estado de São Paulo. 6 - Resultados O processo de expansão territorial do capital ocorrido a partir da segunda metade do século passado engendrou um conjunto variado de transformações nas sociedades inseridas no contexto capitalista. Essas modificações não se restringiram ao processo produtivo mas influenciaram toda a forma de organização no interior dessas sociedades. Nesse contexto, notouse entre diversos fatores, o aumento e a diversificação dos fluxos de deslocados em todo o mundo, pessoas que abandonaram seus lares em busca de proteção e segurança para si e para sua família. Entre as variadas contradições que caracterizam o sistema capitalista, observa-se que a territorialização do capital pode significar na desterritorialização do indivíduo. Já que o surgimento dos conflitos e das diversas situações que se originam os deslocamentos desse contingente, são resultantes de uma síntese de múltiplas determinações do processo de acumulação intrínseco às sociedades capitalistas. Além de ser responsável pelo deslocamento dessas pessoas, a integração destes no país de destino está condicionada também às orientações do capital, onde inserção no mercado de trabalho se torna ação intermediante e fundamental. Na busca da autossuficiência financeira, os refugiados buscam a qualificação profissional, sendo esta norteada e relativa às necessidades de expansão do capital, as mesmas necessidades que os colocaram em condição de deslocados. 217 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Em alguns casos devido a dificuldade de acesso à documentação que lhes permitam trabalhar, a barreira imposta pela dificuldade de aprender a língua local e os preconceitos que sofrem esses refugiados, a opção que lhes restam é a inserção no circuito inferior da economia, realizando atividades com baixa remuneração, em más condições e sem acesso aos direitos assegurados ao trabalhador estrangeiro. As longas jornadas que caracterizam o trabalho nesse setor impossibilitam o estudo da língua local, situação que dificulta a busca desse contingente por empregos melhores. A ausência de uma política verdadeira de integração do refugiado no Brasil, o baixo valor do auxílio e o curto prazo do mesmo, são fatores que contribuem para a manutenção dessa situação e não possibilita, ao seu término, a independência financeira dessas pessoas mantendo-as reféns de políticas assistencialistas. Com isso, o processo de integração de um número significativo de refugiados no estado de São Paulo não é realizado com sucesso, não possibilitando a esse contingente suprir suas necessidades e alcançar a segurança almejada desde o momento que se tornaram deslocados. 7 - Considerações finais A integração dos refugiados em São Paulo é dificultada por um conjunto variado de fatores e a inserção desse contingente no mercado de trabalho apresenta-se como ação intermediante do homem com o meio na busca de alcançar a autossuficiência financeira e ultrapassara dependência do assistencialismo promovido pelos Estados, instituições internacionais e pela sociedade civil e conseguir se integrar nesse local. Devido a dificuldade de aprendizado da língua local, a demora de emissão dos documentos que legalizam esse contingente é um fator que impulsiona a entrada destes no mercado informal ou desenvolver atividades econômicas familiares de baixa remuneração e sem acesso aos direitos trabalhistas assegurados para estrangeiros no Brasil. A qualificação profissional se torna uma condicionante para que eles consigam empregos com melhores condições, e em um contexto de formação 218 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 de uma população que atenda às necessidades dessa expansão do capital, há uma orientação nessa qualificação profissional para a inserção desse contingente no mercado de trabalho, atendendo as mesmas necessidades de expansão e acumulação do capital responsáveis por criar a situação que os colocou em movimento. Cabe aos países que se comprometem com o acolhimento dessas pessoas, desenvolver políticas públicas que garantam a inserção destes da melhor maneira possível e da forma mais rápida, transpondo as dificuldades enfrentadas pelos refugiados e possibilitando que esse contingente alcance a segurança e proteção almejada desde o momento do abandono de seus lares. 8 - Referências AGÊNCIA BRASIL. Palestinos acampados em Brasília querem deixar o país. Folha de São Paulo, São Paulo: 23 jun. 2008. Mundo. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u415157.shtml>. Acesso em: 17/09/2012. ALTO COMISSARIADO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA REFUGIADOS. Tendencias Globales 2012: Desplazamiento – El Nuevo Reto del Siglo XXI. 2013. Disponível em: <http://unhcr.org/globaltrendsjune2013/Tendencias_Glo bales_2012_baja.pdf>. Acesso em: 03/09/2013. ANDRADE, Cláudia. Refugiados palestinos reclamam das condições de vida precárias e querem deixar o Brasil. UOL Notícias, Brasília, 28/06/2008. Disponível em: <http://noticias.uol.com.br/cotidiano/2008/06/28/ult5772u202.jht m>. Acesso em: 18/09/2012. CARVALHAL, Marcelo Dornelis. A Dimensão Territorializante da Qualificação Profissional em São Paulo: a ação dos sindicatos. 2004. 337 f. Tese (Doutorado em Geografia) – Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista, Presidente Prudente, 2004. CENTRO DE INFORMAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS – RIO DE JANEIRO. Refugiados palestinos completam três anos de reassentamento no Brasil. Rio de Janeiro, UNIC-RJ, 2010. Disponível em: <http://unicrio.org.br/refugiadospalestinos-completam-tres-anos-de-reassentamento-no-brasil/>. Acesso em: 12/09/2012. D'ANDRADE, WLADIMIR. Frustrado, grupo de palestinos quer ir embora do Brasil, Estadão. Publicado em: 14/01/2009. Disponível em: <http://www.estadao.com.br/noticias/geral,frustrado-grupo-de-palestinos-quer-i r-embora-do-brasil,307076,0.htm> Acesso em: 12/09/2012. 219 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 FERNANDES, SOFIA. Refugiados acampam em Brasília por reassentamento. Folha de São Paulo, Brasília, 24/12/2008. Mundo. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u482893.shtml>. Acesso em: 17/09/2012. JANNUZZI, Paulo de Martino. Migração e mobilidade social: migrantes no mercado de trabalho paulista. Campinas, SP: Autores Associados, 2000. MOREIRA, Julia Bertino. A questão dos refugiados no contexto internacional (de 1943 aos dias atuais). 2006. 198 f. Dissertação (Mestrado em Relações Internacionais) – Instituto de de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2006. MURAKAWA, Fabio. Palestinos ficam sem pensão e Minha Casa, Minha Vida: Refugiados em Mogi das Cruzes reclamam que estão sem assistência no Brasil. R7 Noticias. São Paulo, 01/04/2011. Brasil. Disponível em: <http://noticias.r7.com/brasil/noticias/palestinos-ficam-sem-pensao-e-minha-cas a-minha-vida-20110401.html>. Acesso em: 17/09/2012. PREFEITURA MUNICIPAL DE MOGI DAS CRUZES. História. 2012. Disponível em: <http://www.mogidascruzes.sp.gov.br/turismo/historia.php>. Acesso em: 12/09/2012. RAFFESTIN, Claude. Por uma geografia do poder. Tradução de Maria Cecília França. São Paulo: Ática, 1993. RESENDE, Paula. Brasil oferece poucas políticas sociais para refugiados, dizem especialistas: Serviços deficientes dificultam o processo de integração do asilado no país, R7. São Paulo, 01/04/2011a. Brasil. Disponível em: <http://noticias.r7.com/brasil/noticias/brasil-oferece-poucas-politicas-sociais-par a-refugiados-dizem-especialistas-20110401.html>. Acesso em: 18/09/2012. RUIZ, Nayara. Famílias refugiadas têm medo do futuro incerto. Mogi News, Mogi das Cruzes/SP, 31/07/2009. Matérias. Disponível em: <http://www.mogine ws.com.br/materias/matimp.aspx?idmat=38582>. Acesso em: 18/09/2012. SANTOS, Milton. O espaço dividido. São Paulo: Edusp, 2004. SILVA, Maria Lucia Lopes da. Mudanças Recentes no Mundo do Trabalho e Fenômeno População em Situação de Rua no Brasil 1995-2005. 2006. 220 f. Dissertação (Mestrado em Política Social) - Departamento de Serviço Social, Universidade de Brasília, Brasília, 2006. 220 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 ANÁLISE DA INSERÇÃO DA COLÔMBIA NOS FLUXOS MUNDIAIS DE IED E DE COMERCIO ENTRE OS ANOS 1990 E 2010 Sergio Marcelino P.S Cezario1 Leandro Bruno Santos2 Introdução Os dados divulgados pela Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) e pela Comissão Econômica para o Desenvolvimento da América Latina e Caribe (CEPAL) têm demonstrado que há uma expansão dos Investimentos Estrangeiros Diretos (IED) realizados por empresas de países da periferia capitalista. A taxa percentual dos países periféricos nos fluxos mundiais de IED elevou-se de 1% no começo dos anos 1970 para em torno de 32% em 2010. A Colômbia teve um aumento de 92% de entrada de IED, pois alcançou o máxico histórico de US$ 13.234 milhões, e a maioria dos investimentos foi destinada ao setor de recursos naturais. Este trabalho busca aportar elementos que ajudem a compreender o impacto da Colômbia no cenário sul-americano, dado o seu elevado crescimento econômico e a maior participação nos fluxos mundiais. Para a realização da pesquisa, houve a seleção e leitura bibliográficas, além da coleta de dados e informações divulgados em relatórios anuais de instituições como Banco Comércio e Indústria (BCI), Departamento Estadístico de La Colômbia (DANE), CEPAL e UNCTAD. Nos últimos anos, a Colômbia vem se destacando no cenário econômico mundial, principalmente da América do Sul. Atualmente é a terceira principal economia da região, estando atrás somente do Brasil e Argentina, respectivamente. Com base nos prognósticos das principais instituições mundiais (entre elas, CEPAL), a Colômbia ultrapassará a economia argentina 1 Aluno do curso de Graduação em Geografia, Universidade Estadual Paulista (UNESP), Campus de Ourinhos. E-mail: [email protected]. Bolsista PET. 2 Professor do Curso de Geografia da Unesp, Campus de Ourinhos, e membro do grupo Processos e Dinâmicas territoriais (DITER). E-mail. [email protected] 221 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 em 2014 e se tornará a segunda principal economia da região e a terceira da América Latina. Por isso, torna-se necessária a realização de uma pesquisa que busque demonstrar o atual papel que cumpre a Colômbia na divisão internacional do trabalho. Segundo o DANE, os principais produtos de exportação colombianos provêm do setor primário, com destaque para o petróleo (terceiro principal exportador da América Latina para os Estados Unidos), carvão (maior reserva comprovada da América do Sul), esmeralda (principal produtor mundial), couro, café, cana-de-açúcar, ouro, entre outros. Discussão bibliográfica Segundo a CEPAL(1995), as principais exportações da Colômbia para os mercados (analisados) correspondem a recursos naturais, tais comoo café, petróleo e carvão. Essa predominância desaparece quando o foco é a América Latina, para a qual são exportados produtos químicos, farmacêuticos e vestuário, e as manufaturas não baseadas em recursos naturais. Deste modo, a estrutura de exportação mostra uma elevada concentração em setores estacionárias do comércio internacional, com exceção do mercado América Latina, onde a concentração é em setores considerados dinâmicos. À luz desses resultados, pode-se dizer que a Colômbia estaria perdendo a oportunidade dinâmica conferida aos países subdesenvolvidos para melhorar a sua integração na economia internacional através de ganhos de participação de mercado nos setores mais dinâmicos do comércio internacional. Só no mercado latino-americano está aproveitando essa oportunidade seria que é cada vez maior cota desses mercados em setores dinâmicos. A pergunta que surge é: quais políticas ou estratégias são adequadas para atingir a inclusão de países dentro da competitividade internacional? Em que estes devem ter em conta as seguintes diretrizes gerais, segundo a CEPAL (1995): - Proporcionar ambiente favorável para o crescimento com adoção de políticas estáveis e orientadas para a exportação: inflação baixa, posição panorâmica fiscal equilibrada e elevados níveis de poupança e investimento. 222 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 - Oferecer, simultaneamente, incentivos para elevar as exportações e sujeitar os beneficiários ao cumprimento de Rendimentos expressados em metas de exportação. - Implementação de políticas públicas visando reduzir o custos de investimentos direcionados à produção de bens de exportação. - Cometimento de empresários privados à disciplina severa de concorrência e rígidos controles do governo. - A infraestrutura, educação e tecnologia devem receber a mais alta prioridade. O investimento público em educação deve ser a base para o desenvolvimento - Elaborar políticas Financeiras e trocas destinadas a impedir a ocorrência de uma troca flutuações apreciação ou marcados importante. Enquanto a maioria dessas diretrizes políticas foi adotada na Estratégia Nacional de Competitividade, uma avaliação pormenorizada delas indica que houve alguns problemas de implementação. Para a CEPAL (1997), não houve execuções, algumas ações foram realizadas. Estas incluem: a criação de centros de produtividade e desenvolvimento tecnológico ligadas a vários setores da produção, a criação de um centro de controle de qualidade para um sistema desenvolvimento Nacional de Normalização, a fim de desenvolver recursos humanos, a celebração de acordos com empresas que têm seus próprios programas de treinamento, enfim, para financiar projetos industriais, coube ao Instituto de desenvolvimento Industrial elaborar uma prioridade investimentos que incorporem novas tecnologias. Outra maneira de conseguir a integração do país na competitividade internacional e, portanto, a expansão de suas exportações, é a sua integração no sistema de produção integrada internacional liderada pelas corporações transnacionais. Para a CEPAL (1997), a extensão da globalização tem acometido alguns “países em desenvolvimento”, sobretudo por meio dos IEDrealizados por subsidiárias das corporações “transnacionais”. Isso tem permitido a inclusão de alguns países no sistema internacional de produção integrada. Um exemplo é o México, onde se logrou a consolidação 223 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 do setor automotivo local com a instalação de empresas subsidiarias de multinacionais norte-americanas, entre elas Ford, General Motors e Chrysler. Outro exemplo é o dos países do Sudeste Asiático, que receberam elevados investimentos (em especial do Japão), principalmente nas áreas de eletrônica, informática e veículos. Para se inserirem nos sistemas internacionais de produção integrada, os países asiáticos “em desenvolvimento” têm atraído capitais e tecnologias estrangeiros, além da introdução de indústrias emergentes dinâmicas (microeletrônica, principalmente), o que levou a um incremento notável seu setor de exportação e a um crescimento econômico sustentado. Para um país como a Colômbia conseguir atrair essas empresas e consolidar um processo deste tipo devem ser reforçados, nomeadamente: a educação e formação dos trabalhadores, a formação de recursos humanos e a melhoria da infraestrutura e serviços públicos básicos. Estes foram chamados "fatores de imóveis de produção internacional" e é o mínimo indispensável para uma corporação “transnacional” de um país. De qualquer maneira e para além do debate sobre as melhores formas de programar políticas comerciais, o caminho seguido pela maioria dos países que atualmente crescem de forma constante tem sido aprofundar/dinamizar seus setores de inserção dinâmica no comércio internacional. Por isso, entende-se que, à luz das experiências dos países do sudeste asiático, esse fenômeno deve ser motivo de análises pelas instâncias estatais da Colômbia. A Divisão Internacional do Trabalho (DIT) ajuda a explicar a influência e inserção política e econômica dos países, posto que, na nova etapa da DIT, os países subdesenvolvidos industrializados cumprem o papel de remeter aos países desenvolvidos matérias-primas, produtos industriais, lucros das empresas multinacionais e do capital especulativo, pagamento de juros e da dívida externa e royalties pela propriedade intelectual, enquanto os países desenvolvidos exportam os produtos industrializados, tecnologia, investimentos diretos e empréstimos financeiros (SPOSITO; SANTOS, 2012). 224 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Chesnais (1996), diante da autonomia do capital financeiro sobre as demais formas do capital, aponta: [...] que o sistema tenda a se fechar sobre si mesmo, a se instalar no “dualismo”, e que seus dirigentes acompanhados por uma parcela significativa da população, se empenham em construir novos tempos, fortalezas para conter os bárbaros na periferia e arame farpado em volta de seus grupos internos (CHESNAIS, 1996, p. 313). A Colômbia, como um país subdesenvolvido, cumpre uma integração dos países periféricos que, segundo Sposito; Santos (2012) se atrelam ao processo de acumulação de capital que ocorre de maneira descontínua no tempo e de forma heterogênea no espaço. Os fluxos de IED na Colômbia tem um aumento notório nos últimos anos, o que pode criar um neorregionalismo na América latina e uma maior concorrência com o Brasil no que diz a respeito a mercados consumidores de seus respectivos produtos exportados e até mesmo as suas influências políticas nos demais países. Ao mesmo tempo, pode ocorrer o aumento da integração econômica entre o Brasil e a Colômbia, a ponto de engendrar benefícios mútuos na balança comercial. O gráfico 1 mostra a evolução dos fluxos de IED originários de países em desenvolvimento da Ásia e da América Latina, entre 1970 e 2010: Figura 1: Fluxos América Latina e Ásia (IED)-1970-2010 (em U $ $ milhões/ano) Fonte: UNCTAD, 2013. Org.: Sergio Marcelino Cezario, 2013. 225 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 No caso da América latina, não parece ser uma coincidência o fato de que o significativo aumento dos fluxos de IED ocorrer justamente a partir dos anos de 1990, quando as economias da região adotaram planos de estabilização monetária e reformas orientadas para o mercado a partir do receituário neoliberal do fundo monetário internacional (FMI) e do Banco mundial. Mais aberta a uma crescente competição oligopólica, alguns países latino-americanos viram algumas de suas empresas desenvolverem estratégicas visando o alcance global do mercado, bem como o acesso ao capital e a tecnologia (SANTOS, 2010). É necessário destacar que os investimentos externos de empresas em países periféricos do sistema capitalista não é algo novo, pois há um contexto histórico de ondas de investimento externos. Nos anos de 1980, por exemplo, por conta da crise geral na economia latino americana, a Ásia (exceto o Japão) foi o loucs de maiores investimentos, ao passo que, a partir da década de 1990, as Mutilatinas aumentaram significativamente seus IED, apesar de permanecerem atrás das empresas asiáticas, quanto aos valores investidos. É nesse contento que se espera aportar elementos que ajudem a explicar por que a Colômbia, nos últimos anos, emergiu como um importante realizador de IED na América do Sul. Para Sposito (2008), pode-se afirmar que as multinacionais do terceiro mundo estão superando a lógica das fronteiras, superando distâncias, trabalhando com a simultaneidade das informações entre diferentes nações, desencadeando certa interdependência de grandes firmas, quando afirma que: A rapidez de resposta às turbulências do capitalismo internacionalizado é de fundamental para todas as empresas - sejam criadoras de empregos (as que investem na compra de outras, na associação com outras ou na criação de unidades produtivas) no Brasil, sejam destruidoras de empregos (as que se internacionalizam, investem no estrangeiro e voltam as costas para o território brasileiro) – se adaptarem às ondas de valorização ou desvalorização de moedas, de mercadorias ou força de trabalho (SPOSITO, 2008, p.101). E assim se tem as diversas contradições que poderão comparecer na pesquisa, pois, se de um lado, a expansão está cada vez mais consolidada, de 226 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 outro lado, há o agravamento da pobreza, a depredação de recursos naturais. Paralelo a isso temos a concentração de capital e poder de alguns países, entre os quais podemos destacar os Estados Unidos como o principal centro hegemônico, e porque não falarmos no papel que a China hoje já desempenha no cenário econômico e até mesmo algumas influências políticas mesmo que mais regionais, comparadas aos Estados Unidos, como Harvey (2004), descreve. Objetivos Geral Entender o papel da Colômbia na divisão internacional do trabalho, com enfoque na atração e a realização de IED e na inserção comercial. O recorte temporal abrange os anos 1990 até os dias atuais. Específicos Compreender a política macroeconômica adotada na Colômbia desde os anos 1990, com enfoque nas políticas industriais e de desenvolvimento; Compreender os fluxos de importação e exportação colombiana por setores, evidenciando o setor primário, que é o principal no país para a acumulação do PIB (produto interno bruto); Analisar os fluxos de IED da Colômbia, por meio da análise de relatórios anuais divulgados por CEPAL, DANE, UNCTAD e BCI. Procedimentos metodológicos Visando realizar os objetivos propostos, foram adotados procedimentos que auxiliaram na compreensão da inserção recente da Colômbia na divisão internacional do trabalho, tais como: levantamento e seleção bibliográficos e compilação de dados junto às instituições (DANE, BIC, UNCTAD e CEPAL). Espera-se contribuir com o debate do tema sugerido. A etapa do levantamento e seleção bibliográficos correspondeu à pesquisa de trabalhos, sob a forma de livros, capítulos de livros, artigos de 227 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 periódicos, dissertações e teses etc., disponíveis na internet e nas principais bibliotecas sobre a industrialização colombiana, as ondas de IED realizados pelo país e a sua inserção no comércio mundial. Resultados Os IED são um componente importante da macroeconomia, pois os mesmos refletem de forma efetiva na produção do espaço e na configuração do território, trazendo impactos positivos e negativos. A análise dos fluxos comerciais colombianos contribui também no entendimento do papel que esse país exerce na atual divisão internacional do trabalho. Em 2011, a indústria mineral recebeu menos investimento que no ano anterior, entretanto, a entrada de investimentos no setor de petróleo aumentou notavelmente que chegou a representar 40% do total de investimentos. O motor principal dos IED das empresas colombianas tem sido a busca de mercados. Nos últimos anos, fatores como o bom desempenho na economia contribuiu para o aumento das empresas e passou a fomentar os investimentos na região. Os setores de destino desses fluxos são, na sequência, recursos naturais, serviços financeiros, eletricidade, alimentos, petróleo e cimento. Considerações finais O trabalho é de suma importância para entender como as políticas macroeconômicas interferem na produção do espaço. A análise dos fluxos de IED permite entender a inserção da Colômbia no mercado mundial e suas trocas comerciais. Neste século, a Colômbia surgiu como um relevante investidor na América Latina, com o avanço de empresas de alimentos (Nutresa), cimento (Argos), petróleo (Ecopetrol), construção (ISA) e finanças (Aval, Sura e Davivienda). Essa internacionalização reflete o crescimento econômico da Colômbia num mundo em desaceleração. 228 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Referências CHESNAIS, F. A mundialização do capital. São Paulo: Xamã, 1996. CEPAL. (Comissão Econômica para América Latina), Panorama de inserção internacional da América Latina e o Caribe. Santiago, 1997. ____ Análises de competitividade dos países. Santiago, 1995. HARVEY, D. O novo imperialismo. São Paulo: Loyola, 2004. SANTOS, L. B. A emergência das empresas multilatinas. Geografia, v. 35, p. 115-131, Jan/Abr. 2010. SPOSITO, E. S. Cenários recentes da expansão do capitalismo: as multinacionais emergem no Terceiro Mundo. In: OLIVEIRA, M. P.; COELHO, M. C. N; CORRÊA, A. M. (Org.). O Brasil, a América Latina e o mundo: espacialidades contemporâneas. v. 1. Rio de Janeiro: Lamparina, 2008, p. 92103. SPOSITO, E. S.; SANTOS, L. B. O capitalismo industrial e as multinacionais brasileiras. São Paulo: Outras expressões, 2012. UNCTAD. Word investment report transnational corporations extractive industries and development, Unite de Nations. Geneva: 2008. 229 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 ESTADO COMO AGENTE DE EXCLUSÃO SOCIAL E CONFIGURAÇÃO ESPACIAL URBANA Alessandro Bernardes Pereira¹ Sérgio Marcelino P. S. Cezario² Manoel Vinícius M. Souza³ 1 - Introdução O presente artigo visa elucidar questões quanto às ações do Estado frente ao processo de exclusão social, procurando também, através de revisão bibliográfica, entender tais processos como constituintes do modelo econômico atual. Mas para que as propostas sejam contempladas se faz necessário compreender o espaço urbano e seus os agentes de produção caracterizados por Corrêa (2005). Assim se faz compreender que o espaço geográfico possui dinamicidade e diversas determinações, de modo que apreendendo-o de maneira lógica (organizacional) e legislativa tem-se o capital como catalisador e agente ativo de transformações, no espaço urbano o mesmo designa a apropriação de áreas residenciais, comerciais, gestionárias, entre outras, produzindo de tal forma situações de segregação, formação de centralidades e fragmentação. “Mas o espaço urbano é simultaneamente fragmentado e articulado: cada uma de suas partes mantém relações espaciais com as demais, ainda que de intensidade muito variável” (CORRÊA, 2005, p.7). Sendo fragmentado e articulado, o espaço urbano tem, enfaticamente, a atuação de agentes que assim o determinam, estes agentes, também propostos por Corrêa (2005) são: proprietários dos meios de produção; proprietários fundiários; promotores imobiliários; Estado; e grupos sociais excluídos. O espaço urbano se consolida, no sistema capitalista, na divisão do trabalho que amplamente adquire complexidade e redefine a rede urbana, levando à situações de conflitos como a segregação espacial urbana, dos problemas de mobilidade, violência, etc. 230 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Tais elementos são destacados por Corrêa (2005), Souza (2008 e 2010). O uso, delimitação e ação no espaço urbano não são equilibradas ou igualitárias, e as relações de poder que o alimentam ocorrem sob a tutela de um Estado que atende aos interesses de setores hegemônicos e a reprodução das desigualdades capitalistas. A fim de entender às desigualdades concretizadas e cada vez mais complexas nas cidades, faz-se necessário compreender o agente Estado como organizador e reprodutor das relações sociais vigentes, sendo-o também agente capaz de realizar transformações e de organizar os espaços. De mesmo modo se torna essencial entender os eixos que definem a qualidade de vida e de justiça social que, em sua realização, tangem ao Estado. 2 - Objetivos Analisar os processos de exclusão social e segregação sócioespacial tendo como princípio a compreensão dos principais agentes condutores e causadores. Além disso, acreditamos que a percepção das ações e funções do Estado são pertinentes para compreensão do espaço urbano e sua relação com tais agentes. A partir disso, é de suma importância entender como atuam esses agentes e quais as suas relações com o espaço. Por fim, é necessária a reflexão do modo como o espaço está organizado e configurado, quem são os favorecidos e desfavorecidos. 3 - Procedimentos metodológicos A partir da leitura e discussão de diversos autores que analisam o espaço urbano e as relações econômicas, não só da Geografia, como Correa, Melazzo, Souza e outros, mas também da Sociologia, como LeFebvre e Nascimento, e ainda Ciências Econômicas, cito Bursztyn e Chesnais, podemos relacionar de forma interdisciplinar o espaço vivido e percebido no dia a dia, principalmente nas grandes e médias cidades brasileiras. 231 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 4 - Estado como agente urbano e as suas dinâmicas na produção espacial O Estado desempenha múltiplos papéis na produção e organização do espaço, atuando paralelamente como um agente urbano, que por sua vez reflete na dinâmica da cidade tanto em seu planejamento como em seus conflitos. Para Corrêa (1989), os múltiplos papeis que o Estado desempenha decorre do fato dele construir uma arena nas quais interesses e conflitos se enfrentam, conforme a complexidade das ações, o trabalho busca delinear como o Estado brasileiro age tal como um agente urbano, transformando as relações do espaço. Em primeiro ressaltamos, que o Estado atua de diferentes maneiras, seja como proprietário fundiário, promotor imobiliário, como também um agente de regulação do uso do solo e alvos dos chamados movimentos urbanos. Sabendo que o Estado configura o espaço urbano podemos usar o exemplo das terras públicas que são por sua vez uma reserva fundiária que o Estado dispõe para uso diversos, até mesmo para negociar com outros agentes urbanos, podendo enxergar como promotor imobiliário. Segundo Corrêa (1989) é através da implantação de serviços públicos, como sistema viário, calçamento, água, esgoto, iluminação, parques, coleta de lixo entre outras tarefas, que a atuação do Estado se faz efetiva. A elaboração de leis normas vinculadas as uso do solo, entre outras normas do zoneamento e o código de obras, constituem outro atributo do estado no que se refere ao espaço urbano. E decorrente de seu desempenho espacialmente desigual enquanto provedor de serviços públicos, especialmente aqueles que servem à população, que o Estado se torna alvo de certas reivindicações de segmento da população urbana (CORRÊA, 1989, p.25). O referido autor ainda elabora uma série de conjuntos que o Estado pode empregar na produção e configuração do espaço que são: a) Direito de desapropriação e procedência na compra de terras; b) Regulamentação do uso do solo; c) Controle e limitação dos preços de terras; 232 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 d) Limitação da superfície da terra de que cada um pode se apropriar; e) Impostos fundiários e imobiliários que podem variar segundo a dimensão do imóvel, uso da terra e localização; f) Taxação de terrenos livres, levando a uma utilização mais completa do espaço urbano; g) Mobilização de reservas fundiárias públicas, afetando o preço da terra e orientando espacialmente a ocupação do espaço; h) Investimento público na produção do espaço, através de obras de drenagem, desmontes, aterros e implantação da infraestrutura; i) Organização de mecanismos de crédito à habitação; j) Pesquisa, operações teste sobre materiais e procedimento de construção, bem como o controle de produção e do mercado deste material. As ações acima destacadas podem estar atreladas a diferentes membros da sociedade de classes bem como os segmentos das classes dominantes, que a cada momento estão no poder. É necessário destacar que a ação do Estado acontece em três níveis políticos administrativos diferentes: federal, estadual e municipal. Para Corrêa (1989) a atuação do estado se faz mentalmente e em última análise, visando criar condições de realização e reprodução da sociedade capitalista, isto são condições que viabilizem o processo de acumulação e a reprodução das classes sociais. 5 - Processos de exclusão social As desigualdades socioespaciais se configuram em poder do Estado quanto ao acesso aos equipamentos e serviços urbanos que se posicionam sobre o Poder Público, tais desigualdades se consolidam pelo não acesso à qualidade de vida e à justiça social como aponta Souza (2010). Ora, aqui se define um quadro que compreende a luta diária da heterogeneidade do espaço urbano envolvida sobre a lógica capitalista, essa lógica legitima espaços e serviços para determinados setores da sociedade, enquanto outros são marginalizados nos processos de exclusão social; pode-se constatar na tabela a seguir o que cabe à qualidade de vida e à justiça social. 233 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Quadro I: Eixos da desigualdade Qualidade de Vida Mobilidade Urbana Saneamento Básico Vias Públicas Espaços Públicos revitalizados Políticas Ambientais Justiça Social Transporte Saúde Habitação Cultura Educação O acesso à qualidade de vida perpassa pelo investimento de qualidade na mobilidade urbana, saneamento básico, vias públicas, espaços públicos revitalizados, políticas sustentáveis e tudo que se relaciona ao bem estar de uma vida urbana saudável; quanto à justiça social tem-se em mente o acesso de qualidade à Educação, Saúde, Transporte, Habitação, Cultura, entre outros elementos que configuram a cidade. Ambas as situações são complementares, uma depende da outra para concretizar. Basta abrir os olhos para compreender a vida cotidiana daquele que corre de sua moradia para a estação mais próxima ou distante, para o metrô superlotado, para o escritório ou para a fábrica, para retomar à tarde o mesmo caminho e voltar para casa a fim de recuperar as forças para recomeçar tudo no dia seguinte. O quadro dessa miséria generalizada não poderia deixar de se fazer acompanhar pelo quadro das ‘satisfações’ que a dissimulam e que se tornam os meios de eludi-la e de evadir-se dela. (LEFBVRE, 2008, p. 118). Tem-se nessas perspectivas a necessidade de se entender a segregação socioespacial e o direito à cidade, ou seja, de observar e entender como são apropriados e como deveriam ser distribuídos os equipamentos e serviços urbanos que salvaguardariam a qualidade de vida e a justiça social. Em diversas cidades brasileiras podemos notar um grande contingente de população que mora em favelas, nas ruas e em áreas periféricas, no qual sofrem com a falta de equipamentos urbanos e consequentemente a exclusão social, por outro lado, também vemos áreas de condomínios fechados e bairros nobres, onde habitam uma população que recebe dez ou até mais vezes o salário da grande maioria da população, sendo assim evidenciada a desigualdade social. 234 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 O governo que deveria garantir o bem estar social, promove a segregação espacial apresentando a realidade concreta das imensas diferenças e desigualdades sociais e econômicas, sendo a gestão política umas das causadoras da exclusão social”. Não é por falta de planos urbanísticos que as cidades brasileiras apresentam problemas graves. Não é também, necessariamente, devido à má qualidade dos planos, mas porque seu crescimento se faz ao largo dos planos aprovados nas Câmeras Municipais, que seguem interesses tradicionais da política local e grupos específicos ligados ao governo de plantão. (MARICATO, 2000 apud MELAZZO; GUIMARÃES, 2010, p.18) Sendo assim, há cidadãos favorecidos enquanto outros são desfavorecidos pela própria política pública. Yázigi (2000, p.337) assim afirma que “para cidadãos integrados há bons mecanismos e para os excluídos, coerção ou até terror”. Ou seja, o próprio Estado também é causador da hierarquização do espaço ao investir com mais ênfase em determinados locais da cidade e em melhorias da infraestrutura do município gerando especulação imobiliária e valorizando algumas áreas mais do que outras. Na citação a seguir, Nascimento elucida a ação segregacionista das políticas públicas e sua relação com o crescente contingente de moradores de rua de população perambulantes: As políticas públicas, paralelamente à valorização das áreas centrais, resultante das melhorias de infraestrutura urbana, operaram como força centrífuga, empurrando a miséria para a periferia. Por outro lado, a própria precariedade das condições de vida nas periferias, juntamente com as também precárias perspectivas nas zonas rurais de economia tradicional e estagnada, funciona como força centrípeta, atraindo a miséria para os núcleos centrais das grandes cidades. Em grande medida o confronto entre forças centrífugas e forças centrípetas, num contexto de estrangulamento do mercado de trabalho, explica a existência de um crescente contingente de moradores de rua e de população perambulantes. (NASCIMENTO, 2000, p.49) Enquanto o Estado favorece determinada população com a acessibilidade de estabelecimentos das áreas da saúde, educação, lazer, trabalho, entre outros, outra parte da população se torna excluída de tais bens de consumo básicos. Segundo Melazzo; Guimarães et al (2010) tais processos 235 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 caracterizam a exclusão social, pois essa pode ser definida como a ausência de recursos mínimos, pelo acesso precário ou mesmo pela falta de acesso a recursos e aos bens de consumo básicos, como a falta de acesso à educação, à saúde e ao mercado de trabalho, não significando que para a efetivação do processo, o indivíduo tenha que atingir todos esses critérios. A ruptura designa a máxima exclusão. Porém, aliado com o Estado, o modelo econômico também produz a desigualdade e consequentemente a exclusão social. Nascimento (2000) afirma que o novo movimento de internacionalização da economia, associado à hegemonia neoliberal, com o desenvolvimento da tecnologia e consequentemente o desemprego, produz consideravelmente um aumento da desigualdade social, criando grupos sociais excluídos do trabalho, podendo se tornar depois de um tempo desnecessários ao circuito econômico, vivendo do descarte do consumo e sendo descartadas pela sociedade, alcançando até mesmo a pobreza extrema, vivendo na rua e da rua, do lixo dos ricos. Marcel Bursztyn (2000) afirma que o novo-pobre que poderia ser um ator empobrecido, com condição de vida reduzida por rendimentos reais é cada vez mais a expressão do fenômeno crescente da exclusão social, no qual não está a margem, mas sim fora do sistema econômico e social prevalente. Não tem acesso ao mercado de trabalho (nem mesmo informal) e fica de fora dos mecanismos de proteção social, sendo conduzidas no sentido de rebaixamento na hierarquia social, perdendo vínculos que possam permitir uma reinserção. Ambos os processos, sejam provocados pelo Estado ou os demais agentes econômicos, se configuram no espaço e o território assume o importante papel de produção do mesmo, configurando as relações sociais e socioeconômicas nas quaisse tornam hierarquizadas pelo domínio do espaço por determinadas classes sociais. O território produzido e consumido a partir das relações sociais só poderá ser plenamente compreendido se, em sua elaboração, for incluído o fundamento dos processos sociais: as relações de exclusão e inclusão que permanentemente são repostas reelaboradas e retrabalhadas como relações hierarquizadas de desigualdades sociais, já que se trata de 236 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 relações de conflito e poder entre classes sociais antagônicas. (MELAZZO; GUIMARÃES et al, 2010, p. 31). Portanto, as relações sociais e as dinâmicas territoriais estão imbricadas, pois as mesmas criam condições objetivas e subjetivas de exclusões sociais ao definir os diferentes lugares onde se materializam situações específicas de exclusão. 6 - Resultados Em suma, averiguamos que o Estado visto como agente urbano é de caráter fundamental para entender as relações socioespaciais, seja ela em escalas municipais, estaduais, nacionais ou até mesmo globais, pois mostramos como os processos de globalização e mundialização afetam o local. Todavia o Estado tem como papel promover o “bem comum” para a sociedade, desde educação, saúde, transporte público, segurança entre outros; por outro lado destacamos como a força do capital, e da divisão técnica do trabalho acentua às diversas desigualdades territoriais, regionais, e sociais criando até mesmo outros agentes de produção do espaço urbano como os dos excluídos. 7 - Considerações finais O espaço urbano é locus de produção de diversos agentes, o Estado e os agentes econômicos operam de acordo com o sistema vigente e suas colaboram para a configuração do espaço de forma hegemônica. Neste trabalho, podemos observar a ação do Estado de concentrar os investimentos em determinado local, seja nos investimentos em infraestrutura ou em estabelecimentos públicos, ocasionando a valorização imobiliária em determinados localidades criando áreas de inclusão social na qual determinada população é favorecida com a melhor acessibilidade aos serviços públicos, enquanto locais com menos investimentos se tornam lócus de exclusão social, pois a população que é excluída do mercado de trabalho está inserida de forma precária devido ao avanço da tecnologia com condições financeiras inferiores e 237 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 se estabelecem em locais com menor acessibilidade aos serviços e estabelecimentos públicos. 8 - Referências BURSZTYN, M. Da pobreza à miséria, da miséria à exclusão: o caso das populações de rua In: BURSZTYN, M. (Org.). No meio da rua: nômades excluídos e viradores. Rio de Janeiro: Garamond, 2000. p. 27-54. CHESNAIS, F. A mundialização do capital. São Paulo: Xamã, 1996. CORRÊA, R. L. O espaço Urbano. São Paulo: Atica, 1989. LEFEBVRE, Henri. O direito à cidade. 5ª Ed. São Paulo: Centauro, 2008. MELAZZO, Everaldo; GUIMARÃES, Raul Borges. Exclusão social em cidades brasileiras. São Paulo: Editora Unesp, 2010. NASCIMENTO, E. P. Juventude: novo alvo da exclusão social. In: --BURSZTYN, M. (Org.). No meio da rua: nômades excluídos e viradores. Rio de Janeiro: Garamond, 2000. p. 121-138. SOUZA, Marcelo Lopes. ABC do desenvolvimento urbano. 4.ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2008. ______. Mudar a cidade: uma introdução crítica ao planejamento e gestão urbanos. 7ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2010. YÁZIGI, Eduardo. O mundo das calçadas: por uma política democrática de espaços públicos. São Paulo: Humanitas. 2000. 238 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 PROCESSO DE MODERNIZAÇÃO NO CAPITALISMO PERIFÉRICO E O CONCEITO DE TRABALHO EM ROBERT KURZ Bárbara Regina Bertoni Letta1 Marcelo Dornelis Carvalhal2 1 - Introdução A proposição de pensar a realidade do mundo moderno frente à simultaneidade do processo de efetivação do capital no capitalismo periférico, através da reflexão filosófico-analítica de categorias proeminentes da relação capital trabalho, é preponderar sobre a crítica radical desta mesma sociedade (ALFREDO, 2006). Criticar sua lógica imanente posta na reprodução de relações sociais de produção. (MARTINS, 2008) Através da dialética na relação capital-trabalho, tomando por base o polo negativo da contradição, entendendo a alteridade enquanto a forma de ser e do não ser, como elemento identitário das formas desta reprodução mediada por abstrações concretas (ALFREDO, 2006), tão logo o trabalho no moderno se expressa no ser da mediação a qual reproduz os pressupostos da lógica imanente da produção mercadológica, entender isto é constatar como se efetiva a dominação sem sujeito arraigada à consciência do indivíduo moderno imposto através do trabalho abstrato, sem conteúdo a humanidade a não ser a produção de valor ao capital (KURZ,1992). Pela análise da relação estabelecida entre centro e periferia do sistema do modo de produção capitalista (OLIVEIRA, 2007), frente suas formas de reprodução desta forma de sociabilidade concreta, se entende a modernização periférica enquanto o ser da imposição e da retificação das relações de 1 Discente do curso de graduação em Geografia, UNESP/Ourinhos, [email protected]. Este trabalho é parte do Trabalho de Conclusão do Curso: Imposição do trabalho abstrato pelo capital na modernização periférica: uma proposição reflexiva, do curso de graduação em Geografia, UNESP, campus de Ourinhos, sob orientação do Prof. Dr. Marcelo Dornelis Carvalhal. 2 Professor do curso de graduação em Geografia, UNESP/Ourinhos e do Programa de PósGraduação em Geografia, UNESP/Presidente Prudente, membro do Centro de Estudos em Geografia do Trabalho (CEGeT) e coordenador do CEGeT-Ourinhos e Centro de Memória Popular Eder Sader (CEMEPES) 239 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 sociabilização modernas, ou seja, imputadas através da imposição do trabalho no mundo moderno. Assim requerido o processo de modernização periférica, as ciências humanas e sociais tratadas dialeticamente, ao que tange ao trato de uma ciência crítica teórica, frente aos discursos políticos de desenvolvimento econômico, reproduziram e reproduzem as relações sociais de produção nesta sociedade, fabricando o espaço e constituindo as formas de dominação. (ARANTES, 1992) Conceber o mundo moderno enquanto um movimento do processo modernizante desde a gênese do capital implica em escarafunchar o sistema colonial, e a sociabilidade da sociedade de trocas mercantis e monetarizadas, enquanto o momento da imposição do trabalho desprovido de conteúdo, como a maneira de ser deste momento modernizante, na periferia do sistema. (ALFREDO, 2006) Proveniente de um padrão analítico que trabalha na aproximação entre a forma literária e processo social, sendo o meio para desvelar conteúdos e sentidos específicos do desenvolvimento do modo de produção capitalista no Brasil, seguiremos as ideias de Lefebvre (2008) quando ele analisa a crítica de Karl Marx em “O Capital”. No tempo de Marx, a ciência econômica se perdia na enumeração, na descrição, na contabilização dos objetos produzidos. Marx substituiu o estudo das coisas pela análise crítica produtora das coisas. Retornando a iniciativa dos grandes economistas (Smith e Ricardo) e a ela acrescentando a análise crítica do modo de produção (capitalista), ele elevou o conhecimento a um nível superior. [...]. (LEFEBVRE, 2008, p.33). 2 - Objetivo Conceber o Brasil já moderno desde sua gênese implica em escarafunchar o sistema colonial do mundo moderno para se entender a dinâmica deste processo modernizante. Pensar historicamente, tanto material quanto dialeticamente, com a necessidade da análise integrada entre pensadores nacionais e internacionais, 240 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 bem como a preocupação com a aplicação dos próprios termos envolvidos na explicação para dar conta de se produzir um conhecimento sobre a complexidade do tema. Nesta podemos utilizar inclusive os diversos campos do saber, envolvidos na Geografia Humana. Trata-se de questões pertinentes ao entendimento da civilização para pensar o desenvolvimento nacional conjuntamente com o desenvolvimento do modo de produção capitalista, através da simultaneidade deste processo global, num movimento dialético, cuja dimensão espacial não é fragmentária. Manifesta-se na produção do espaço de diferentes formas, porém a racionalidade e a finalidade deste processo o qual não se altera uma vez arraigado aos modos desta sociabilidade concreta, mediadas por trocas mercantis. Significa entender que no capitalismo periférico se desdobrou na efetiva implantação das premissas lógicas imanentes do capital, ou seja, do moderno em que o trabalho media as relações de produção enquanto formas de sociabilidades abstratas concretas (ALFREDO, 2006). Assim dominando a consciência do sujeito para que este se limite a perpetuar o sistema de relações sociais produtoras de mercadoria. 3 - Resultados Para se chegar a estes contornos reflexivos é primeiramente necessário o entendimento de que a lógica imanente destas formas de sociabilidade se formou a partir de e na subjetividade efetivada no consciente do sujeito. Está é a categoria filosófico-analítica fruto do moderno, na qual permite perceber as mediações abstratas desta sociedade de instituições mercadológicas, a perturbação do reconhecimento do seu próprio ser, o qual não percebe que a determinação natural de uma lógica organizacional arraigada à consciência do indivíduo moderno, nada tem de natural ao Homem. Por tanto se configura apenas na gênese de uma determinação estritamente social de relações sociais de produção específicas, e, portanto não a-históricas, visto que, desde a gênese do capital ocorre a imposição do trabalho abstrato (KURZ, 2004). 241 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Assim, o povo do campo, tendo sua base fundiária expropriada a força e dela sendo expulso e transformado em vagabundos foi enquadrado por leis grotescas e terroristas numa disciplina necessária ao sistema de trabalho assalariado, por meio do açoite, do ferro em brasa e da tortura. (MARX, 1988, p. 267) Através do método do materialismo histórico e dialético proveniente dos escritos de Marx (1998), em “O Capital” e o “Manifesto do Partido Comunista” Marx; Engels (2001), utilizados como apoio deste pretenso trabalho, edifica o corpo conceitual, teórico e metodológico consistente para uma analise crítica do mundo moderno, ou seja, do capital. Utilizando a crítica de Kurz (1992) sobre o trabalho já descrito em Marx (1988) toma-se o entendimento de que essa é a forma real de sujeição que o capital imputa aos homens na terra, a dominação sem sujeito. 4 - Considerações finais Daí a necessidade da retomada aos escritos marxianos e sua revalidação da teoria do valor e do fetiche da mercadoria, frente ao capital do novo século que engendra uma divisão de classes bem mais complexa de que a divisão sociológica, entre burgueses e proletariado. O qual processa uma dominação muito mais absorvida a estrutura de ser do próprio ser. Ao longo dos séculos, estudos sobre o capital e o desenvolvimento do modo de produção capitalista no mundo, provenientes de leituras marxianas, interpretaram a base clássica europeia, da gênese e desenvolvimento do capital como a forma do mesmo de se efetivar no espaço independentemente da simultaneidade deste processo de produção do valor e de mercadorias, segundo Kurz (1992), propiciando um estudo histórico linear da efetivação sucessiva de tempos no espaço, o que para Alfredo (2006) também não ocorre, trata-se na realidade de se pensar o espaço por outra racionalidade, a fim de entender o moderno e a vida humana neste contexto de dominação social sem precedentes na História. (MARX, 1998) 242 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 A crítica veemente de Robert Kurz (1992) e Anselmo Alfredo (2006) ao capital se faz na medida em que enquanto estudiosos das obras de Marx, se tornam também críticos do próprio marxismo. Através do prisma da crítica, para se entender a evolução do sistema capitalista, não se cabe, portanto, contrapor modelos ideais de sociedade. Kurz (1992) discuti este movimento de desenvolvimento do capital conjuntamente com o desenvolvimento do sistema mundial de produção de mercadorias, a partir da simultaneidade do processo no Brasil e no mundo. Este trabalho se preocupa, contudo, em falar do problema que é aceitar as relações sociais de produção e do trabalho moderno sem expor a dominação e nega-la almejando sua superação. Porém, há uma diferenciação crucial no entendimento da relação capital e Homem trabalhador do e no mundo moderno. Pois aqui, não é entendido enquanto um momento positivo da evolução humana, a sociedade de trocas encerrada sobre si mesma, e, sim um problema reflexivo. Os contornos desta dominação, uma vez expostos pela crítica se configura no exercício do pensar, em ser o primeiro passo para a superação, ao menos no âmbito da prática teórica. Para se entender novamente em relação ao meio a posição do humano, elucubrar sobre uma possibilidade de um devir de superação desta dominação. Traduzindo a realidade brasileira na qual a imposição do dito trabalho, como forma de ser do simultâneo universal da modernização periférica, está posto desde o início, vê-se o aguçamento da relação nebulosa entre o Estado, o sujeito e a sociedade institucionalizada, a qual através de suas ideologias mistura, engendram e perturbam o indivíduo que não consegue se enxergar para além dos muros da reprodução capitalista das relações sociais, frente à dominação do trabalho enquanto à serviço do modo de produção específica do mundo moderno. (MOREIRA, 2007) O exercício reflexível é o movimento do pensar que se coloca enquanto possiblidade de um vir a ser de superação, possibilidade está remota até o momento da reflexão. 243 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 5 – Referências ALFREDO, Anselmo. O mundo moderno e o espaço: Apreciações sobre a contribuição de Henri Lefebvre. GEOUSP - Espaço e Tempo, São Paulo, Nº 19, pp. 53 - 79, 2006. ARANTES, Paulo E. Sentimento da Dialética na experiência intelectual brasileira: dialética e dualidade segundo Antonio Candido e Roberto Schuwarz. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992. KURZ, Robert. O Colapso da Modernização. Tradução de Karen Elsabe Barbosa. 6. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992. LEFEBVRE, Henri. Espaço e política. Tradução Margarida Maria de Andrade e Sérgio Martins. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008. MARTINS, Sérgio. Prefácio à tradução brasileira. In LEFEBVRE, Henri. Espaço e política. Tradução Margarida Maria de Andrade e Sérgio Martins. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008. MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política. Tradução de Regis Barbosa e Flávio R. Kothe. 3.ed. São Paulo: Nova Cultural, 1988. MARX, Karl; ENGELS, F. Manifesto do Partido Comunista. Tradução de Sueli Tomazzini Barros Cassal. Porto Alegre: L&PM, 2001. MOREIRA, Ruy. Pensar e ser em Geografia: ensaios de história, epistemologia e ontologia do espaço geográfico. 1.ed., 1.reimpr. São Paulo: Contexto, 2008. OLIVEIRA, Francisco. Um crítico na periferia do capitalismo. In CEVASCO, Maria E. e OHATA, Milton (org.). Um crítico na periferia do capitalismo: Reflexões sobre a obra de Roberto Schwarz. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. 244 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 A POLÍTICA DE EMIGRAÇÃO PORTUGUESA PARA AS COLÔNIAS AFRICANAS AO LONGO DO TERCEIRO IMPÉRIO PORTUGUÊS (1890 – 1974) Thiago Henrique Sampaio1 Resumo Portugal foi uma das primeiras nações a formar seu Império Colonial e a última a desmantelá-lo. Após a independência do Brasil (1822), sua colônia mais desenvolvida, a nação portuguesa começa a observar o continente africano como fonte de riqueza e desenvolvimento. O período compreendido de 1822 à 1974 é do Terceiro Império Português, quando a política de colonização voltou-se inteiramente ao continente africano o. Mesmo com a proclamação da República, o incentivo da colonização se pendurou ao longo do século XX e se intensificou com a Ditadura do Estado Novo (1933 – 1974). O presente trabalho tem como objetivo analisar a política de emigração para as colônias africanas compreendendo o período de 1890 – 1974, e mostrar como colonização e emigração sempre caminharam juntas nesta época. Palavras-Chaves: Terceiro Império Português, Emigração Portuguesa, Colônias Portuguesas na África, Política Colonial Portuguesa Abstract Portugal was one of the first nations to form their colonial empire and the last to dismantle it. After the independence of Brazil (1822), his most developed colony, the Portuguese nation begins to observe the African continent as a source of wealth and development. The period 1822 to 1974 is the Third Portuguese Empire, when the policy of colonization turned entirely to the black continent. Even with the proclamation of the Republic, the encouragement of colonization hung throughout the twentieth century and intensified with the dictatorship of the Estado Novo (1933-1974). This study aims to analyze the policy of emigration to the African colonies comprising the period from 1890 - 1974, and show how colonization and emigration have always gone together this time. Key Words: Third Portuguese Empire, Emigration Portuguese, Portuguese colonies in Africa, Portuguese Colonial Politics 1 - Introdução Com a perda do Brasil, Portugal começou a enxergar na África sua mais nova fonte de renda econômica. Até então, a função dos territórios portugueses no continente negro era essencialmente o fornecimento de mão de obra escrava ao Brasil. 1 Graduando em História pela Faculdade de Ciências e Letras / UNESP – Assis. Bolsista Fapesp. 245 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Em 1834, Sá da Bandeira apresentou um projeto para o desenvolvimento dos territórios africanos. Um dos pontos do projeto defendia a abolição do tráfico negreiro, decretado em 10 de dezembro de 1836, para que se pudessem aproveitar os habitantes na produção agrícola local. Mas, isso seria possível apenas com investimento de capital. O projeto acabou fracassando, devido às resistências encontradas principalmente em Angola e Moçambique por falta de uma maior dominação e interesse dos traficantes de escravos. Não podemos esquecer que a presença portuguesa em África pouco evoluiu ao longo dos séculos XVI até a primeira metade do século XIX. Em Moçambique a ocupação era precária e dava largo espaço para o desenvolvimento de sociedades africanas2. A partir da década de 1850, período de relativa estabilidade política, Sá da Bandeira, agora como presidente do Conselho Ultramarino relançou seu projeto colonial. Os objetivos eram os seguintes: expansão territorial, maiores relações entre a metrópole e as colônias e o início de uma economia agrícola. A proposta colonial obteve poucos resultados até a década de 1880. Segundo Valentim Alexandre (1998), em Angola, a tentativa de ocupação do litoral norte rumo à foz do Congo, iniciou-se por Ambriz (tomada em 1855), face ao duplo obstáculo representado pela resistência das populações da zona e pela pressão britânica; no interior, a história do período faz-se de fluxos e refluxos em escala limitada, sem avanços significativos. Em Moçambique, a luta conduzida contra os senhores dos ‘prazos’ da Zambézia (mestiços africanizados ao domínio português) saldou-se por um fracasso, culminando na derrota da expedição enviada de Portugal em 1869. No campo mercantil, há um efetivo aumento das relações entre metrópole e ultramar3. No último quartel do século XIX, os objetivos portugueses na África se balancearam ao processo de expansão colonial de outras nações européias, devido à ampliação da industrialização a outros lugares do globo. Os países 2 BETHENCOURT, Francisco; CHAUDHURI, Kirti. História da Expansão Portuguesa: Do Brasil para África (1808 – 1930). Lisboa: Círculo de Leitores, 1998, p. 163. 3 ALEXANDRE, Valentim. “Portugal em África (1825-1974) - Uma perspectiva global”. Pénelope: fazer e desfazer a história. Lisboa, n. 11, 1993. 246 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 que começaram a se industrializar entraram na fase do capitalismo concorrencial, a partir disto, fica determinada à urgência da expansão das fronteiras de controle, a dominação das fontes de matérias-primas, a transferência para lugares periféricos de produção de alimentos e a busca de mão de obra a baixo custo4. O projeto de colonização em finais de XIX inseriu-se nas transformações sofridas pela sociedade europeia e no desenvolvimento do capitalismo em Portugal. Apesar de ser uma sociedade capitalista dependente de outras regiões, seus ideais coloniais tiveram forte teor nacionalista5. Portugal era uma nação essencialmente agrícola, sobretudo quando comparada a outras potências que já haviam passado pelo processo de industrialização, suas poucas indústrias tinham grande dependência econômica inglesa6. A dominação portuguesa no território moçambicano, até a última década do século XIX, limitou-se à costa litorânea e a pontos isolados no interior, ou seja, a ocupação era praticamente a mesma do início do século XVII 7. Em Angola, o processo apresentava algumas diferenças, contava com melhor organização administrativa e maior população portuguesa. Os objetivos portugueses nas províncias ultramarinas não eram os mesmos (até) meados de Oitocentos: Angola servia como fornecedora de escravos e Moçambique como um porto estratégico para o fornecimento de materiais à Índia Portuguesa, Macau e Timor. 2 - Delimitação territorial das colônias portuguesas em África (1887 – 1891) A partir das expedições para o interior da África, a Sociedade de Geografia de Lisboa elaborou um plano de ocupação das zonas intermediárias 4 CABAÇO, José Luis. Moçambique: Identidade, colonialismo e libertação. São Paulo: Editora Unesp, 2009, p. 29. 5 PEREIRA, Miriam Halpern. Das Revoluções Liberais ao Estado Novo. Lisboa: Editorial Presença, 1994, p. 157. 6 PEREIRA, Miriam Halpern. Livre-câmbio e desenvolvimento econômico: Portugal na segunda metade do século XIX. Lisboa: Edições Cosmos, 1971, p. 20. 7 ANDERSON, Perry. Portugal e o ultracolonialismo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1966, p. 27. 247 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 (região que atualmente corresponde a Zâmbia, Zimbábue e Malawi) entre Angola e Moçambique. O projeto de dominação dos territórios, denominado por “mapa cor-de-rosa”, objetivava relançar os direitos históricos portugueses sobre uma vasta área8. A reivindicação portuguesa dos territórios chegou a ser reconhecida por outras nações. Em 1886, o governo português assinou com a França e a Alemanha dois acordos que definiram os limites fronteiriços de suas colônias. Oliveira Marques (1998) afirma que, Portugal perdeu vários territórios na bacia do Casamansa, compensados em parte pelo fato de a França reconhecer a fronteira norte de Cabinda. Pelo tratado com a Alemanha, a fronteira meridional de Angola era fixada no rio Cunene e a de Moçambique no curso do rio Rovuma. Ambas estas linhas de fronteira sacrificavam os interesses e as pretensões tradicionais de Portugal, a costa angolana até o Cabo, pelo apoio de Bismarck à política do mapa cor-de-rosa9. O amparo desses países a Portugal era importantíssimo no período, principalmente da Alemanha que se industrializara rapidamente após a unificação. A Inglaterra não reconheceu os acordos. No final de 1889, Portugal iniciou uma campanha militar no interior da área reivindicada contra o povo mokololo. A Inglaterra estrategicamente declarou proteção à etnia, para justificar seus interesses na região. No dia 5 de janeiro de 1890, foi entregue pelo embaixador britânico em Lisboa um despacho ao ministro Barros Gomes que contém informações do que está acontecendo nas expedições portuguesas. No comunicado foi exigido que Portugal declarasse categoricamente que não tentaria resolver pela força as questões pendentes, nem exercer jurisdição nos países dos mokololos ou dos machonas, sem prévio acordo entre os dois países. Acrescentou ao despacho que se essa declaração não fosse feita até a tarde do dia 8, o governo britânico tomaria as providências que julgasse necessárias à sua segurança e conveniência. (MARTINS, 1946, p. 195) 8 CABAÇO, José Luis. op. cit., p. 62 MARQUES, A. H de Oliveira. História de Portugal: das revoluções liberais aos nossos dias. Vol. II. Lisboa: Palar Editores, 1998, p. 172. 9 248 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Uma arbitragem internacional sobre o território foi requisitada pelo governo português, recorreram ao artigo 12° da Ata Geral da Conferência de Berlim10 que diz quando ocorrer disputas graves entre as potências signatárias em território da zona de livre comércio caberia a mediação de uma outra potência. Em 10 de janeiro de 1890, o governo recebeu um telegrama em que não se fazia nenhuma referência ao pedido de arbitragem. Foi exigida a imediata retirada das tropas militares estabelecidas na área. Em 11 de janeiro de 1890, o governo britânico apresentou o ultimatum, intimando o governo português à imediata retirada de suas tropas sob ameaça de quebra das relações diplomáticas e com possível retaliação militar. De acordo com o ultimatum11: O Governo de Sua Majestade Britânica não pode aceitar, como satisfatórias ou suficientes, a seguranças dadas pelo Governo Português, tais como as interpreta. O Cônsul interino de Sua Majestade em Moçambique telegrafou, citando o próprio major Serpa Pinto, que a expedição estava ainda ocupando o Chire, e que Katunga e outros lugares mais no território dos Makololos iam ser fortificados e receberiam guarnições. O que o Governo de Sua Majestade deseja e em que mais insiste é no seguinte: Que se enviem ao governador de Moçambique instruções telegráficas imediatas para que todas e quaisquer forças militares portuguesas actualmente no Chire e nos países dos Makololos e Mashonas se retirem. O Governo de Sua Majestade entende que, sem isto, as seguranças dadas pelo Governo Português são ilusórias. Mr. Petre ver-se-á obrigado, à vista das suas instruções, a deixar imediatamente Lisboa, com todos os membros da sua legação, se uma resposta satisfatória à precedente intimação não for por ele recebida esta tarde; e o navio de Sua Majestade, Enchantress, está em Vigo esperando as suas ordens. (MARTINS, 1946, p. 195) 10 Artigo 12°. Caso um desentendimento sério, nascido do assunto ou dos limites dos territórios mencionados no artigo 1° e colocador sob o regime da liberdade comercial, vier a surgir entre as Potências signatárias da presente Ata ou Potências que, a seguir, a ela aderirem, essas Potências se comprometem, antes do apelo às armas, a recorrer à mediação de uma ou de várias Potências amigas. No mesmo caso, as mesmas Potências se reservam o recurso facultativo ao procedimento da arbitragem. ATA GERAL DA CONFERÊNCIA DE BERLIM apud Kátia M. de Queiróz Mattoso. Textos de documentos para o estudo da História Contemporânea (1789-1963). São Paulo: Hucitec, 1982. pp. 117-121. 11 Delegação Britânica, 11 de Janeiro de 1890. Neste período o governo britânico era chefiado pelo primeiro-ministro Lord Salisbury e o ultimatum foi entregue na forma de um memorando. 249 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 O que diferenciou o ultimatum dos demais comunicados? Antonio Enes afirmava que Se essas ordens (de retirada) não fossem dadas até às 10 da noite de ontem (11 de janeiro), mr. Petre telegrafaria à corveta Enchantress, fundeada em Vigo, para vir a Lisboa, e retirar-se-ia então de Portugal com todo o pessoal da legação. (MARTINS, 1946, p. 197) O significado de tal atitude corresponde ao corte das relações diplomáticas e o desenrolar da disputa não aconteceria de forma ‘burocrática’. Caso ocorresse uma guerra em decorrência dos territórios perdidos, Portugal não teria capacidade bélica e nem pessoas suficientes para enfrentar uma intervenção inglesa. Portugal frente à ameaça do ultimatum, em um primeiro momento, mandou evacuar os territórios dentro do prazo estipulado. Durante os meses que se seguiram, o governo de Lisboa tentou conseguir da Inglaterra algum recurso. Além disso, solicitou-se arbitragem internacional, envolvendo a França e a Alemanha, para decidir sobre as áreas reivindicadas. Tal iniciativa, porém, não obteve resultados. Visto que as tentativas de arbitragem internacional não funcionavam a única solução encontrada foi a negociação com a Inglaterra. Em 18 de janeiro de 1890, o ministro dos Negócios Estrangeiros Hintze Ribeiro entra em contato com o embaixador inglês em Lisboa confirmando a aceitação do ultimatum e invocando a histórica Aliança inglesa para possíveis negociações. As negociações com a Inglaterra começam finalmente em julho. Um telegrama datado de 19 de julho de 1890, que o embaixador português em Londres, Barjona de Freitas teria tido conversas com o ministro inglês e que esperasse um acordo amigável entre ambas as potências. O debate político no mês de agosto sobre a confecção de um Tratado despertou em alguns políticos que Portugal entregasse Moçambique aos ingleses para garantir uma vasta área na região de Angola, visto que era a colônia com maiores relações comerciais com a metrópole12. 12 CABAÇO, José Luís. Op. cit, p. 62. 250 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Algumas versões do Tratado antes da sua aprovação foram divulgadas pela mídia portuguesa. O acordo mais uma vez feria o orgulho nacional, devido ao fato de Portugal conceder benefícios demais aos ingleses e com isso perderia mercado. A garantia de livre navegação dos rios na esfera portuguesa para os ingleses prejudicaria o comércio na costa oriental e ocidental da África, segundo Antônio Enes: O tratado é, inegavelmente, a ruína, quase a alienação gratuita, de Moçambique, e com o seu desastre, essa malfadada província vai afetar também a Angola! Angola há de ver igualmente a bandeira inglesa navegar livremente nos seus rios; o comércio inglês estender livremente no interior as redes das suas operações – que em muitas hipóteses poderão tomar ilusórias as pretensões pautais e diferenciais, que ainda ficam subsistindo nos portos situados na costa e só nela – e os missionários protestantes ensinarem aos indígenas menos a religião e a moral do que a revolta! Também em Angola conseguira a Inglaterra firmar em pé, e onde ela põe o pé deixa pegada e abre trilho. Desde a data da aprovação do tratado, começara para a costa portuguesa da África a crise, tanto econômica, como política, a que Moçambique já sucumbiu, e os seus comerciantes podem contar que dentro em breve perderão todos os mercados das regiões do interior, aonde puderem chegar as mercadorias inglesas, legalmente ou por fraude, aproveitando os caminhos que lhes abrimos e as franquias e isenções que lhes outorgamos. (MARTINS, 1946, p. 350 – 351) Para acalmar a população o governo publicava possíveis versões do Tratado em periódicos listando suas vantagens. Em 30 de Agosto de 1890, o governo publica o resultado final do Tratado. Com os resumos oficiais sendo divulgados anteriormente e contendo revoltas, após a publicação final que faltava ser aprovada pelo Parlamento é evidenciado uma grande afronta aos direitos coloniais portugueses. A delimitação territorial era coerente com o que fora comunicado a população, mas a respeito do regime comercial as cláusulas foram consideradas confusas por conter exceções às regras impostas. A frase “sem consentimento da Inglaterra” se repete cinco vezes ao longo do tratado, esta passagem repetida ao longo do acordo foi duramente criticada devido ao fato de rebaixar categoricamente o governo de Portugal ao status de um protetorado inglês13. 13 MARTINS, F. A. Oliveira. op. cit. p. 371. 251 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 A Associação Comercial do Porto, de Lisboa e de Coimbra protestaram contra o Tratado, redigiram textos que foram mandados para o Parlamento e organizaram manifestações. Associações operárias e a Associação Industrial Portuguesa apoiaram as manifestações e tomam posições contrárias ao acordo14. No dia 9 de Setembro de 1890, a Sociedade de Geografia de Lisboa publica um manifesto que propõe alterações ao texto do Tratado 15. No dia 12 de Setembro de 1890, foi organizado uma manifestação universitária em Lisboa, o Congresso Acadêmico, para protestar sobre os termos empregados pelo Tratado. Para controlar as manifestações o governo toma algumas medidas de segurança, forças militares se espalham por Lisboa No dia da abertura do Parlamento para a votação do Tratado, 15 de setembro de 1890, o comércio e a indústria pelo país ficaram totalmente paralisados como forma de protesto, grupos de pessoas foram ao Palácio das Cortes para mostrar sua indignação perante o Tratado. Em decorrência das revoltas e manifestações que se alastraram por todo o país, o Tratado não é aprovado pelo Parlamento. O Partido Regenerador cai do governo, “pela terceira vez na história de Portugal, o governo caía por um motivo de política externa e sob pressão da opinião pública 16” (TEIXEIRA, 1987, p. 702). Em menos de um ano formava-se pela segunda vez um novo gabinete ministerial. D. Carlos convida o general João Crisóstomo para a formação de um novo gabinete, após um período de vazio político de 28 dias é formado um novo governo em 15 de Outubro. O Partido Regenerador e o Partido Progressista deram amplo apoio ao novo ministério17. 14 TEIXEIRA, Nuno Severiano.“Política externa e política interna no Portugal de 1890: o Ultimatum inglês”. Análise Social. Lisboa: v. 23, n. 98, 1987, p. 715. 15 O Século, 11 de janeiro de 1890, p. 1. 16 TEIXEIRA, Nuno Severiano. op. cit, p. 702. 17 Diário da Câmara dos Senhores Deputados, sessão de 15 de Outubro de 1890, p. 18961897. 252 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 É reaberto diálogo com Londres para a aprovação de um acordo provisório até o desfecho de um novo Tratado. O acordo temporário é assinado em 14 de Novembro de 1890 e divulgado pela imprensa dias depois. Cecil Rhodes, na época primeiro-ministro da colônia do Cabo, começa a dificultar novas negociações. Se o Tratado de 20 de agosto fosse ratificado a região de Manica, área de cobiça da South Africa Company, seria ganho para os portugueses. Movimentações militares começam a acontecer no território em disputa, preocupados com a situação, o governo português acaba por ceder a área, em troca de uma localidade mais vasta, só que com menos recursos. Um tratado definitivo é ratificado pelo Parlamento em 27 de junho de 1891. O acordo definiu as fronteiras atuais de Angola e Moçambique e “estimulou os portugueses a levar a efeito uma exploração integral dos territórios que lhes couberam, tarefa empreendida na última década do século XIX e na primeira do século XX18”. 3 - Fluxos populacionais para as colônias em África (1890 – 1974) Os portugueses estiveram presentes no litoral de Angola desde o final do século XV, mas o interior do território foi conquistado apenas no século XX. No período de 1885 à 1910, as questões de ocupação das colônias africanas estiveram fortemente presentes na política portuguesa. Entre 1891 a 1902, houve um crescimento anual de pessoas indo para o continente negro, entre mil à dois mil indivíduos19. Ao analisar dados emigratórios da época, percebe-se que o número de habitantes indo para as colônias em África mesmo tendo aumentando era insignificante perto do fluxo migratório total. Segundo Afonso Costa (1911): Depois (de 1888), com a chegada das nossas crises, a emigração saltou para 23981 em 1888, 29421 em 1890, 30383 em 1893, até chegar a 44746 em 1895! Foi este o ponto culminante da nossa emigração, como foi também um dos pontos culminantes dos nossos desastres 18 MARQUES, A. H de Oliveira. op. cit, p. 124.. PEREIRA, Miriam Halpern. Livre-câmbio e desenvolvimento econômico: Portugal na segunda metade do século XIX. Lisboa: Edições Cosmos, 1971, p. 47. 19 253 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 econômicos e das nossas crises políticas, caracterizadas por uma feroz reação.(COSTA, 1911, p. 141) Nos dados apresentados por Afonso Costa, percebe-se que o fluxo migratório desde 1888 até 1895 sofreu um aumento. Mas, este aumento não influenciou a ida de indivíduos para as colônias africanas. Em dados anteriores ao período, percebemos que as colônias portuguesas em África nem aparecem citadas em dados sobre fluxos migratórios pela quantidade insignificante que representava: As zonas de proveniência da emigração e os países de destino (1855 – 1865) Países de Destino Brasil Estados Unidos Demerara20 Jamaica Saint-Kito21 Surinam TOTAL Rio de Janeiro Porto Viana 56.387 1.677 56.387 43.228 1.677 1.671 ZONAS DE PROVENIÊNCIAS Funchal Angra Horta 1.369 2 4.629 357 213 30 6.600 1.369 3.938 4.236 3.008 3.938 3.583 7.244 1.103 Ponta Delgada 3.371 3.371 2.742 FONTE: FREITAS, R. – Notice sur Le Portugal, Lisboa, 1867, p. 10. Ocorreram diversas propostas de desviar as correntes migratórias Portugal-Brasil para as colônias africanas. O desvio do fluxo migratório do Brasil para a África foi anunciada na imprensa da época e incentivada, por acreditar que favoreceria trabalhadores desempregados: Tem-se ultimamente pronunciada a tendência da emigração para África, concorrendo para isso a falta de trabalho para algumas classes. (...) Já felizmente as nossas colônias não inspiram o horror dos antigos tempos22. Críticas pela tentativa do governo desviar o fluxo populacional do Brasil para a África ocorreram, entre elas estava que as colônias não ofereceriam as atividades profissionais existentes na metrópole e a maioria dos emigrantes era 20 É uma região histórica entre as Guianas, na costa norte da América do Sul. Atual Quito, capital do Equador. 22 A emigração para a África. O Conimbricence. Nº 4.589, de 25 de agosto de 1 891, p. 1. 21 254 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 operários, aprendizes e comerciantes prejudicando a fraca produção industrial existente em Portugal. Oliveira Martins afirmava: Desviar do Brasil para África a corrente de emigração proletária que para além vai, em demanda de trabalho, seria um erro econômico sem alcance nem vantagem política. Agravaria os nossos orçamentos coloniais, sem esperança de um benefício correspondente. (...) No mecanismo atual da economia portuguesa a emigração para o Brasil representou um papel inevitável por dois motivos: 1º porque é o vazadouro de gente sem ocupação no reino e 2º porque é a fonte de subsídio que anualmente nos ajuda a viver. (MARTINS, 1956, p. 240 241) Oliveira Martins criticou fortemente a forma de exploração na África e a ocupação portuguesa nas colônias afirmando: O que os portugueses cumpre é explorar, e não colonizar a África. Do que ela carece não é de trabalhadores, mas sim daquilo a que os ingleses chamam skilled labour, o trabalho dirigente de oficinas, capatazes, contra-mestres, regentes, engenheiros, administradores, sob cujas ordens o braço preto, dócil e forte como é, extraia da terra as riquezas que ela pode dar. (MARTINS, 1956, p. 239) Em 1896, os passaportes para as colônias passaram a ser gratuitos e foram dispensados aos viajantes a partir de 190723, mantendo-se a exigência de passaportes apenas para os emigrantes. Como dispensaram os passaportes para as colônias, a emigração registrada para a África desceu bruscamente pela falta de registros oficiais24. Durante a I República Portuguesa ocorreram inúmeros incentivos do governo para o envio de população as colônias. Alguns habitantes chegavam a viajar para Moçambique e depois se mudavam em direção a União Sul-Africana (atual África do Sul), por causa da crescente mineração de diamantes, ouro e ferro nas províncias do Transvaal e Orange. Quando ocorreu a implantação do Estado Novo (1933), uma das maiores forças de sustentação política de Salazar era a classe latifundiária do Alentejo, em Portugal. Porém, a pressão por uma reforma agrária em Portugal tornava-se a cada dia mais forte e “as ricas terras coloniais subdesenvolvidas e 23 Cartas de Lei de 23 de Abril de 1896, artigo 3º e de 25 de abril de 1907, artigo 1º. LEITE, J. Costa. “Emigração portuguesa: a lei e os números (1855 – 1914). Análise Social. Lisboa: vol. 23, n. 97, 1987,p. 471. 24 255 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 subpovoadas eram o complemento natural da agricultura da metrópole. Elas receberiam o excedente da população metropolitana, que o Brasil não desejava absorver25”. Em função disso, e, sobretudo após a revisão constitucional de 1951, Portugal tomou a contramão dos seus parceiros colonizadores, entrando em uma política de emigração para as colônias de portugueses sem recursos, principalmente camponeses pobres. Porém, se viesse para a África apenas como assalariada, essa mão de obra nunca poderia competir com a força de trabalho africana, que recebia um pagamento reduzido, uma vez que uma parte do seu sustento era assegurada por suas famílias nos moldes tradicionais. Assim, os portugueses somente poderiam transferir-se para as colônias, se fossem amparados por uma política de colonização, entendida como uma reforma agrária, embora executa nas terras de população nativa. Tal política exigiu grandes investimentos do Estado, cada família ao chegar às colônias recebia uma propriedade como casa, gado e sementes. Estas vilas eram réplicas das aldeias metropolitanas, se espalharam rapidamente nas colônias. Enquanto isso, a população africana desprovida de direitos era reprimida nos casos de contestação. Em 1950, 44% dos brancos adultos ou em idade escolar, residentes em Angola, eram analfabetos e recebiam o status de ‘civilizado’ apenas pelo critério racial. As etapas a cumprir para trocar o estatuto de indígena pelo de civilizado nunca foram, obviamente, aplicadas asas população brancas, por mais atrasadas que fossem26. Na década de 1940, o regime de Salazar encorajou a emigração de seus cidadãos para as colônias, como parte de um programa de desenvolvimento econômico e visando diminuir a pobreza existente na metrópole portuguesa. Quando se iniciou as guerras de independência das colônias portuguesas em África, estavam instalados em Angola cerca de 200 mil 25 SALAZAR apud KI-ZERBO, Joseph. Histoire de l’Áfrique noire. Paris: Hatler, 1972, p. 544. NETO, Maria da Conceição. “Ideologias, contradições e mistificações da colonização de Angola no século XX”. Lusotopie: Lusotropicalisme: Ideologie coloniale ET identités nationales dans lês mondes lusophones. Paris: Karthala, 1997, pp. 327 – 359. 26 256 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 portugueses e 80 mil em Moçambique, que correspondiam respectivamente 4,5% e 1% da população27. 4 - Considerações Finais No início do Terceiro Império Português, a ocupação em África teve um caráter secundário até a proibição do tráfico de escravos que mudou toda a sua política referente a estas terras. A partir do ultimatum britânico, o despertar do nacionalismo português referente as terras africanas ganhou espaço na política do governo de Lisboa. Ocorreram incentivos para o aumento do fluxo populacional para as colônias, mas não surtiram efeitos. Sendo o Brasil a rota preferida das migrações portuguesas no final da monarquia e início da república. No Estado Novo, a política de colonização se tornou o centro das questões política. O império colonial era o orgulho nacional português, diante disso, Salazar incentivou a ida de camponeses a colônia e houve um aumento do fluxo populacional ao longo do período. No período das independências, os imigrantes portugueses serviram na Guerra Colonial Portuguesa para tentarem salvar o Império Ultramarino Português. Percebemos que ao longo da história do Terceiro Império Português a colonização e migração sempre caminharam juntos. 5 - Referências ALEXANDRE, Valentim. “Portugal em África (1825-1974) - Uma perspectiva global”. Pénelope: fazer e desfazer a história. Lisboa, n. 11, 1993. ANDERSON, Perry. Portugal e o ultracolonialismo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1966. BETHENCOURT, Francisco; CHAUDHURI, Kirti. História da Expansão Portuguesa: Do Brasil para África (1808 – 1930). Lisboa: Círculo de Leitores, 1998. CABAÇO, José Luis. Moçambique: Identidade, colonialismo e libertação. São Paulo: Editora Unesp, 2009. 27 GUERRA, João Paulo. Descolonização Portuguesa – O regresso das caravelas. Lisboa: Oficina do Livro, 2009. 257 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 COSTA, Afonso. Estudos de Economia Nacional: o Problema da Emigração. Lisboa: Imprensa Nacional, 1911. FURET, François. “A história quantitativa e a construção do fato histórico”. IN SILVA, Maria B. Nizza da. Teoria e História. São Paulo: Cultrix, 1977, pp. 1-19 GUERRA, João Paulo. Descolonização Portuguesa – O regresso das caravelas. Lisboa: Oficina do Livro, 2009. LEITE, J. Costa. “Emigração portuguesa: a lei e os números (1855 – 1914). Análise Social. Lisboa: vol. 23, n. 97, 1987. MARQUES, A. H de Oliveira. História de Portugal: das revoluções liberais aos nossos dias. Vol. II. Lisboa: Palar Editores, 1998. MARTINS, F. A. Oliveira. O Ultimatum visto por Antônio Enes (com um estudo biográfico). Lisboa: Parceria A. M. Pereira, 1946. MARTINS, João Pedro de Oliveira. A emigração portuguesa. Obras completas. Lisboa: Guimarães & C. Editores, 1956. NETO, Maria da Conceição. “Ideologias, contradições e mistificações da colonização de Angola no século XX”. Lusotopie: Lusotropicalisme: Ideologie coloniale ET identités nationales dans lês mondes lusophones. Paris: Karthala, 1997. PEREIRA, Miriam Halpern. Das Revoluções Liberais ao Estado Novo. Lisboa: Editorial Presença, 1994. PEREIRA, Miriam Halpern. Livre-câmbio e desenvolvimento econômico: Portugal na segunda metade do século XIX. Lisboa: Edições Cosmos, 1971. PRADO Jr., Caio. “História quantitativa e o método da historiografia”. Debate & Crítica, n. 6, 1975, pp. 1 – 19. ROSANVALLON, Pierre. Por uma História Conceitual do Político. Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 15, n. 30, pp. 9-12, 1995. TEIXEIRA, Nuno Severiano.“Política externa e política interna no Portugal de 1890: o Ultimatum inglês”. Análise Social. Lisboa: v. 23, n. 98, 1987. SOBOUL, Albert. “Descrição e medida em história social” IN A História Social: problemas, fontes e métodos. Colóquio da Escola Normal Superior de SaintCloud (15-16 de maio de 1965). Lisboa: Edições Cosmos, 1973, pp. 25-45. 258 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 JEAN-PAUL SARTRE E A GUERRA DE INDEPENDÊNCIA DA ARGÉLIA (1954 – 1962) Thiago Henrique Sampaio1 Resumo O presente trabalho tem como objetivo analisar publicações de Jean-Paul Sartre na revista Les Temps Modernes, no período de 1956 a 1962, e verificar seus posicionamentos sobre o sistema colonial francês na Argélia e a luta de libertação colonial. Os resultados preliminares apresentam que o sistema colonial para ele não é algo abstrato, mas concreto, e seu funcionamento pode ser visto e analisado ao longo do tempo. E, finalmente, que o movimento de libertação colonial da Argélia é interpretado como uma experiência da luta de classes: de um lado o campesinato, representado pelo Exército da Frente de Libertação Nacional (FLN) contra a burguesia colonialista, representada pela França. Palavras-chave: Jean-Paul Sartre; Colonialismo; Descolonização; Imperialismo. Abstract This study aims to analyze publications of Jean-Paul Sartre in the journal Les Temps Modernes, in the period 1956-1962, and verify their positions on the French colonial system in Algeria and colonial liberation struggle occurred. The preliminary results that the colonial system for isn’t something abstract, but concrete, its operation can be seen and analyzed over time. And finally, the liberation movement colonial Algeria is interpreted as an experience of the class struggle: on the one hand the peasantry, represented by the Army of National Liberation Front (FLN) against the colonialist bourgeoisie, represented by France. Keywords: Jean-Paul Sartre, Colonialism, Decolonization; Imperialism. 1 – Introdução A Guerra da Argélia faz parte dos movimentos de descolonização que afetaram os Impérios Coloniais Europeus após a Segunda Guerra Mundial. Diferente das demais colônias francesas, a Argélia era tratada como um prolongamento da metrópole2. A Argélia no período de 1525 até 1830 era o principal pólo de poder do Império Otomano na região do Magreb, região estratégica que os turcos 1 Graduando em História pela Faculdade de Ciências e Letras / UNESP – Assis. Bolsista Fapesp. 2 FERRO, Marc. História das Colonizações: das Conquistas às Independências (século XIII a XX). São Paulo: Companhia das Letras, 1996, p. 149. 259 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 usaram pra praticar ataques contra o transporte marítimo europeu 3. Até a ocupação francesa de 1830, se tornou a área principal de pirataria no Mediterrâneo. A invasão francesa em Argélia se inicia em 1830 com bombardeios navais na cidade de Argel, rapidamente as tropas do governante otomano são derrotadas e começa uma resistência tribal generalizada no território. O período de pacificação do território pela metrópole durou por por mais de quatro décadas. Em 1848, os territórios ocupados foram organizados em três departamentos. Na época, o rei Carlos X da França usou a ocupação territorial da Argélia para desviar a atenção da população francesa aos problemas sociais que o país vinha seguindo e conseguir apoio das massas4. Ao anexar o território argelino, a França decretou que todos que renunciassem ao estatuto civil de muçulmano – bem como preceitos religiosos tribais que seguisse – ganhariam a cidadania francesa. Poucas pessoas aceitaram tal lei, o que evidenciou no período uma forte resistência local ao domínio francês. Até início do século XX, a Argélia representava uma enorme extensão de terra ocupada por tribos primitivas, árabes e berberes de maioria muçulmana5. A França reestruturou a produção agrícola para atender o mercado metropolitano, anteriormente ao período de ocupação ocorria a produção de cereais e a partir do domínio colonial passa a ser a viticultura. Os colonos passaram a controlar grande parte das terras cultiváveis por compras ou doações do Estado que tomava dos nativos. Segundo Mustafa Yazbek (2010, p. 46.) a política de confisco de terras fazia com que, já no início dos anos 1950, um terço das terras cultiváveis de todo o país tivesse em mãos de colonos europeus. 3 ABUN-NASR, Jamil. A history of the Magrib in the Islamic period. Cambridge: University Press, 1987, p. 151. 4 No mês de julho de 1830, aconteceu manifestações do povo em Paris contra o rei Carlos X, apoiada por sociedades republicanas e lideradas pela burguesia liberal que culminou com sua abdicação ao trono francês. Este movimento se alastrou para o restante da Europa e deu origem a diversos movimentos liberais que ficaram conhecidos como Revoluções de 1830. 5 YAZBEK, Mustafa. A Revolução Argelina. São Paulo: Unesp, 2010, p. 46. 260 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Inicialmente a Argélia foi tratada pela metrópole como uma colônia de povoamento. O Estado Francês incentivou a migração de grandes contingentes populacionais de camponeses pobres para a região6, os colonos ficaram conhecidos como pieds-noirs, pés negros em francês. Em 1865, Napoleão III concedeu cidadania francesa aos nativos da Argélia e em 1870 deu estatuto civil aos judeus que migraram para a região. Os colonos não aceitaram serem tratados da mesma forma que a população local. No ano de 1881, foi publicado um código de leis que distinguia os cidadãos franceses (de origem europeia) com os da população nativa (que havia ganhado cidadania), estes últimos foram privados de seus direitos políticos. Como forma de dominação da sociedade argelina, os colonos impuseram o francês como língua oficial e única de ensino, o idioma árabe foi tratado como língua estrangeira e ocorreu proibição de livros nesta linguagem. Mesmo a França sendo um país secular, estes princípios foram abandonados na administração colonial na Argélia, pois os colonizadores aplicaram leis que os muçulmanos não poderiam crescer socialmente ou participarem da administração do território. A França, temendo uma organização da população contra seu domínio, concedeu autonomia administrativa e financeira para a colônia e criou uma Assembleia em 1898. Mas, a participação era restrita aos portadores de cidadania francesa, ou seja, aos próprios colonizadores. Em 1914, o controle do país estava nas mãos dos europeus que habitavam o território, possuindo representantes no Parlamento francês, porém, sem considerar os interesses da população árabe nos processos políticos. Na década de 1930, começa-se a formação do nacionalismo argelino, isto é decorrente de jovens estudantes que passaram a completar sua formação na metrópole e com o maior acesso ao conhecimento retornam a colônia buscando melhorias sociais. 6 SARTRE, Jean-Paul. Colonialismo e Neocolonialismo (Situações, V). Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1968, p. 23. 261 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Em 1936, ocorreu o Congresso Muçulmano (7 de março) que elaborou uma “carta reivindicatória do povo argelino” exigindo melhorias sociais, igualdade e respeito ao estatuto pessoal muçulmano7. No período, a França era governada por Léon Blun (Frente Popular) que decidiu responder parcialmente às demandas da colônia, elaborou um projeto de lei que concedia o direito de voto à elite muçulmana e sem o abandono de seus direitos religiosos. Em 1937, foi criado o Partido do Povo Argelino (PPA) que defendia a emancipação da Argélia. No mesmo ano é organizado a Federação dos Muçulmanos Eleitos (FME), diferente do PPA, era reivindicada a incorporação dos argelinos nos processos políticos para assim conseguirem os mesmos direitos que os colonos, sem exigir independência da Argélia. O Partido Comunista Argelino teve papel de destaque no período de formação do nacionalismo na colônia, ele agia conforme as diretrizes do Partido Comunista Francês, mas foi posto na ilegalidade em 1939. Em 1941, Ferhat Abbas enviou uma carta ao marechal Pétain (presidente da França de Vichy) que apresentava propostas sobre a assimilação e uma possível confederação com a França. Em 1943, Abbas lançou o “Manifesto do Povo Argelino” que tinha como princípio a autodeterminação dos argelinos e a condenação da colonização francesa. Neste documento é chamado o povo para uma ressurreição na formação de um Estado democrático e liberal8. Ao longo da Segunda Guerra Mundial, muitos soldados argelinos haviam sido enviados para combater o Eixo, pois acreditavam que o país seria libertado do domínio francês após a vitória dos Países Aliados. Eles confiaram nas promessas feitas pelos comandantes militares da França Livre e que foram fortemente defendidas pelo general Charles de Gaulle, que havia promovido melhorias sociais e políticas na colônia, mas não agradaram as expectativas da população. 7 COMITÊ CIENTÍFICO INTERNACIONAL DA UNESCO. História Geral da África: África desde 1935. Brasília: Unesco, 2010, p. 47. 8 COMITÊ CIENTÍFICO INTERNACIONAL DA UNESCO. op. cit., p. 60. 262 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Após o término do conflito mundial, a França recusou-se a conceder a independência da Argélia, o que provocou diversas manifestações nas maiores cidades que foram duramente reprimidas pelas forças francesas. As falsas promessas feitas pela França e a repressão a um protesto inicialmente pacífico, geraram forte descontentamento fazendo com que os argelinos revidassem atacando alguns centros de colonização o que levou à morte de colonos europeus. Com a Constituição Francesa de 1946, chegou-se a permitir representações das colônias no Parlamento, mas nas eleições de 1948 na Argélia, os franceses utilizaram medidas autoritárias para impedir a vitória de candidatos nacionalistas. 2 - Guerra de Independência da Argélia Diante de manifestações e revoltas da população, o governo francês não abriu mão do controle da sua colônia. A idéia da Argélia como parte integrante do território da metrópole não era contestado, o ideal de “Argélia francesa” prevalecia entre membros do governo que defendiam “todos os meios para salvar a França”. Na década de 1950, com a descoberta de petróleo e gás natural no deserto do Saara fortaleceu o mito da Argélia francesa. A França, pela primeira vez, dispunha de considerável quantidade de combustível natural em seu território. As decisões tomadas pelo governo durante a guerra de independência da Argélia foram baseadas na capitação que o país poderia ter com sua política petrolífera. A população apoiou fortemente os nacionalistas que buscaram a independência do país, devido as péssimas condições de vida em que se encontrava a maioria do povo argelino e a revolta geral das pessoas frente o descaso do governo francês. Em 1954, 23% das terras aráveis estavam sob controle dos colonos. O crescimento da população árabe comparada com os europeus entre 1936 e 1954 era surpreendente. Mesmo sendo maioria da população, os árabes viviam em economias de subsistência e a maioria deles 263 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 morava nos campos. O número de pessoas desempregadas estava crescendo e forçava muitos a migrarem para a metrópole em busca de melhores condições de vida9. A divisão da renda na Argélia no ano de 1955 era algo muito desproporcional para a população árabe: População (milhões) (%) Renda (milhões de francos 298.000 Participação na renda nacional (%) 47 Não1,0 10 muçulmanos Muçulmanos 5,3 55 117.000 18 Rurais Não-rurais 3,4 35 222.000 35 Total 9,7 100 637.000 100 FONTE: S. Amim, The Maghreb in the modern world, 1970, Penguin Books, Hardmondsworth. Apud COMITÊ CIENTÍFICO INTERNACIONAL DA UNESCO. op. cit., p. 159. Em 1º de novembro de 1954, foi fundado a Frente de Libertação Nacional (FLN) pelo Comitê Revolucionário de Unidade e Ação (CRUA), que desempenhou o papel de organização político e militar para a obtenção da independência frente a França. A maioria dos partidos nacionalistas se dissolveram e integraram a FLN. Ao longo da guerra, a FLN, levou o caso da independência da Argélia para a Organização das Nações Unidas, contando com apoio de diversos países árabes, asiáticos e socialistas. Diversos regimes apoiaram a causa argelina de diversas formas: financiamento de empréstimos, fornecimento de armamentos e ajuda na formação militar10. Em 1955, na Conferência de Bandung, a FLN enviou observadores para participar das discussões acerca do colonialismo europeu. A França, após a conferência, reconheceu as particularidades da Argélia, mas a FLN não aceitou as propostas da antiga 9 COMITÊ CIENTÍFICO INTERNACIONAL DA UNESCO. op. cit., p. 158. COMITÊ CIENTÍFICO INTERNACIONAL DA UNESCO. op. cit., p. 161. 10 264 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 metrópole e não aceitariam outra proposta a não ser a autodeterminação da Argélia. Em 1956, foi organizado o primeiro congresso da FLN no vale da Soummam na Cabília, participaram membros de diversas regiões da Argélia e foram debatidos problemas políticos acercas das perspectivas e do futuro da nação argelina. Uma orientação política foi adotada ao longo do encontro: criação de uma ordem socialista e uma reforma agrária radical. A guerra da Argélia teve considerável influência na França, o governo da IV República concedeu numerosos poderes para os generais conduzirem a guerra. Os militares franceses organizaram diversas estratégias como: reagrupamento de pequenas cidades para desorganizar o apoio a FLN e causar terror psicológico na população, com o objetivo de enfraquecer o apoio a causa emancipatória11. Em 1958, a crise política gerada pela guerra na França causou uma revolta dos generais na Argélia. Os militares exigiam a volta do general De Gaulle, acreditando que ele seria capaz de assegurar a vitória francesa. Quando De Gaulle assumiu o poder, duas forças políticas estavam o apoiando: grandes companhias financeiras francesas e os colonos franceses12. De Gaulle anunciou o “Plano de Constantine” que visava industrializar o território argelino e garantir melhorias significativas para a população. No mesmo ano, a FLN proclamou a formação de um governo no exílio, o GPRA (Governo Provisório da República Argelina), criado em 19 de setembro de 1958 no Cairo. Após sucessivas derrotas militares francesas, De Gaulle aceita abrir negociações sobre o destino da Argélia. Em 1961, colonos franceses não aceitaram as negociações da França com a Argélia e criaram a Organização Armada Secreta (OAS), que tinha como finalidade a preservação do território argelino como colônia francesa e cometiam atos terroristas contra a população árabe. O Acordo de Évian, em 1962, assinado entre a FLN e a França anunciaram um cessar-fogo e garantiram um referendum sobre o destino da 11 12 COMITÊ CIENTÍFICO INTERNACIONAL DA UNESCO. op. cit., p.162. COMITÊ CIENTÍFICO INTERNACIONAL DA UNESCO. op. cit., p. 163. 265 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Argélia. Em julho de 1962, foi realizado o referendo e contou com a maioria favorável a independência. A OAS, nos últimos dias de dominação colonial francesa, organizaram atos de destruição de prédios, massacres e assassinatos. Tais atos, impossibilitaram a permanecia da população europeia na Argélia, causando um maciço deslocamento populacional de volta para a metrópole. A proclamação de independência da Argélia, em 1962, significou o fim do colonialismo francês na região do Magreb. 3 - Sartre e suas críticas a Guerra da Argélia Jean-Paul Sartre (21 de junho de 1905, Paris – 15 de abril de 1980, Paris) foi escritor, filósofo, crítico literário, ativista político, romancista e conhecido pelo seu pensamento filosófico existencialista e seu engajamento político com a esquerda. Ganhou o prêmio Nobel de Literatura de 1964, mas recusou-se a recebê-lo. Nunca foi afiliado ao Partido Comunista Francês, mas foi simpático ao pensamento comunista e desempenhou um papel de destaque nas críticas ao colonialismo francês na Argélia. A partir de 1956, Sartre e a revista Les Temps modernes tomaram posicionamento contrários a idéia de Argélia Francesa e apoiaram fortemente o desejo de emancipação do povo argelino. Este posicionamento sobre a Guerra trará algumas conseqüências, como seu apartamento ser atacado duas vezes e a sede da revista cinco vezes por membros da Organização Armada Secreta. A Guerra da Argélia foi interpretada por Sartre como uma experiência da luta de classes: de um lado o campesinato, representado pelo Exército da Frente de Libertação Nacional (FLN) contra a burguesia colonialista, representada pela França13. Sartre encara o problema do colonialismo francês na Argélia em três aspectos: econômico, social e psicológico14. As dificuldades econômicas se 13 ALMEIDA, Rodrigo Davi. As posições políticas de Jean-Paul Sartre e o Terceiro Mundo (1947 – 1979). (Tese). Assis: 2010, p. 83 14 SARTRE, Jean-Paul.op.cit., p. 21. 266 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 devem ao longo período de exploração do território e pouco investimento feito pela metrópole. Os obstáculos sociais são resultados da política colonial segregacionistas entre nativos e colonizadores, o impedimento da ascensão social que os árabes poderiam ter na localidade. Finalmente, os problemas psicológicos se devem ao complexo de inferioridade do colonizado diante do colonizador, as medidas adotadas pela colonização de tratar o outro como inferior. O colonialismo teve que enfraquecer as tribos existentes na Argélia para conseguir a exploração total do território. Com a aplicabilidade do código civil francês aos muçulmanos ocorreu um grave enfraquecimento interno das sociedades tribais15. O enfraquecimento tribal possibilitou a conquista de áreas cultiváveis cada vez maiores. Em 1850 eram 11.500 hectares dominados pelos colonos, em 1950 este número passa a ser 2.703.000 hectares16. O colono também se torna vítima da política colonialista de sua metrópole, Sartre (1968) afirmava: O Estado francês entrega a terra árabe aos colonos para criar-lhes um poder de compra que permita aos industriais metropolitanos vender-lhes seus produtos, os colonos vendem aos mercados da metrópole os frutos da terra roubada. (SARTRE, 1968, p. 27) Por não possuírem meios para garantir a sobrevivência, os argelinos começam a migrar para a metrópole em busca de empregos e melhores condições de vida. È buscado na França, aquilo que ela os tomou17. Ao longo do tempo, a língua se tornou uma forma de dominação dos colonizadores para os colonizados. No caso da Argélia não foi diferente, Sartre (1968) afirmava que a proibição da língua era uma maneira de controlar o nacionalismo argelino: Isto entra necessariamente no sistema colonialista, que tenta barrar a estrada da história dos colonizados, como as reivindicações nacionais, na Europa são sempre apoiadas na unidade da língua, negaram aos muçulmanos o uso da própria língua. Desde 1830, a língua árabe foi 15 SARTRE, Jean-Paul.op.cit., p. 26. SARTRE, Jean-Paul.op.cit., p. 27. 17 SARTRE, Jean-Paul.op.cit., p. 31. 16 267 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 considerada na Argélia como uma língua estrangeira, falam-se ainda, mas ela não é língua escrita, senão eventualmente. (SARTRE, 1968, p. 31) O despertar do nacionalismo dos povos afro-asiáticos é encarado como o acontecimento mais considerável da segunda metade do século18. A exploração colonial da Argélia foi uma das formas de colonialismo mais brutal que existiu, levando os nativos colonizados a perderem seu próprio caráter humano. Sartre assinalou que não restava mais nada a eles perderem e o desesperou os levou a uma revolta: Sub-alimentados, incultos, miseráveis, o sistema os rechaçava, impiedosamente para os confins do Saara, para os limites do humano; sob o aumento demográfico, seu nível de vida abaixava de um ano para outro. Quando o desespero os levou à revolta, precisava que extinguissem, esses sub-homens, ou que afirmassem sua humanidade contra nós: rejeitaram todos os nossos valores, nossa cultura, nossas pretensas superioridade: foi o mesmo para eles reivindicar o título de homem e recusar a nacionalidade francesa. (SARTRE, 1968, p. 69) A Guerra da Argélia teve um caráter militar e político 19. Seu caráter militar se deve o poder dos generais no território argelino conseguirem conduzir De Gaulle de volta ao poder20. E político pela possibilidade da França mostrar que tinha capacidade de enfrentar um povo “inferior”, após as humilhações passadas pela Segunda Guerra Mundial. Ao longo do conflito ficou visível que a derrota da França perante os argelinos iria ocorrer, então para o sistema colonial se manter foi empregado cada vez medidas mais duras para a população local e mais desumanas 21. As lembranças do massacre de Sétif estavam vivas na memória da população, para Sartre (1987) um dos motivos que determinaram a derrota francesa na Guerra da Argélia: No momento em que ia nascer o Tribunal de Nuremberg, os franceses massacraram em Sétif setenta mil argelinos. (...) Exterminando a esse subproletariado, se arruinaram a si mesmos. Por não poder liquidar a 18 SARTRE, Jean-Paul.op.cit., p. 99. SARTRE, Jean-Paul.op.cit., p. 102. 20 SARTRE, Jean-Paul.op.cit., p.84. 21 SARTRE, Jean-Paul.op.cit., p.34. 19 268 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 população argelina nem poder integrá-la, os franceses perderam a guerra da Argélia. (SARTRE, 1987, p. 191) A insatisfação da população francesa perante o conflito ficou evidente no referendum sobre o futuro da Argélia22. A população estava cansada de perder membros da família para a Guerra. Sartre interpreta que o referendum serviria para preservar uma suposta paz adquirida e a possibilidade do exército francês continuar por um tempo ainda no território argelino23. Ao final do conflito bélico, Sartre encara que as conseqüências da guerra para a França e a Argélia tornaram ambas perdedoras. A única coisa que ele afirma que saiu vencedor foi De Gaulle que conseguiu se reconduzir no poder do governo francês24. 4 - Considerações Finais Para Sartre o sistema colonial enfraquece a si próprio e para se manter começa a usar cada vez mais a violência contra os nativos. O excesso de exploração e violência são os principais frutos do colonialismo. Não podemos considerar a compreensão deste sistema como algo abstrato, pois ele existe e funciona. Enxergamos seus efeitos e suas práticas na realidade25. Quando o colonialismo esta preste a se arruinar, a metrópole e a colônia são vítimas de seu enfraquecimento. Tudo que foi lucrado com o sistema, a metrópole perde para tentar manter a colonização. E a colônia se enfraquece demasiadamente por causa da violência exercida pelos colonizadores 26. 5 - Referências ABUN-NASR, Jamil. A history of the Magrib in the Islamic period. Cambridge: University Press, 1987. ALMEIDA, Rodrigo Davi. As posições políticas de Jean-Paul Sartre e o Terceiro Mundo (1947 – 1979). (Tese). Assis: 2010. 22 SARTRE, Jean-Paul. Colonialismo e Neocolonialismo (Situações, V). Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1968, p.106. 23 SARTRE, Jean-Paul.op.cit., p.121. 24 SARTRE, Jean-Paul.op.cit., p.115. 25 SARTRE, Jean-Paul.op.cit., p.36. 26 SARTRE, Jean-Paul.op.cit., p. 98. 269 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 COMITÊ CIENTÍFICO INTERNACIONAL DA UNESCO. História Geral da África: África desde 1935. Brasília: Unesco, 2010. FERRO, Marc. História das Colonizações: das Conquistas às Independências (século XIII a XX). São Paulo: Companhia das Letras, 1996. SARTRE, Jean-Paul. Colonialismo e Neocolonialismo (Situações, V). Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1968. SARTRE, Jean-Paul. Escritos Políticos 2: Sobre El Colonialismo. Madri: Editora Alianza, 1987. YAZBEK, Mustafa. A Revolução Argelina. São Paulo: Unesp, 2010. 270 ESPAÇOS DE DIÁLOGO Eixo 5 Dinâmicas territoriais IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 A PERMACULTURA COMO MEDIDA DE MITIGAÇÃO À SECA: UMA ABORDAGEM SOBRE ÉTICA E A PRÁTICA Sarah Cledia Malta Ferreira1 1 - Introdução e objetivos Os intensos processos de apropriação dos recursos naturais, reflexo do modelo de progresso adotado na revolução industrial, geraram uma série de problemáticas que culminaram na atual crise ambiental. Esta crise se destaca pelo seu caráter global e irreparável, ou seja, atinge de maneira direta ou indireta qualquer lugar do mundo e gera severos constrangimentos na reestruturação do equilíbrio ecológico, que por vezes não são contornados sem o comprometimento de alguns nichos gerando assim prejuízos incalculáveis ao sistema natural. A produção científica contemporânea baseada nos modelos e cenários do IPCC tem mostrado, cenários futuros que atestam com maior ou menor catastrofismo as consequências para a humanidade caso o ritmo desse sistema de consumo e produção seja mantido. Considerando essas contestações sobre o paradigma de crescimento imposto pelo sistema capitalista e suas consequências desastrosas para o ambiente da década de 1960, surgiram uma série de teorias que se dedicaram a apresentar alternativas a organização da sociedade, pautadas em ideais distintos daqueles aos quais se baseiam o sócio econômico vigente. Dentre essas alternativas de organização social este trabalho se debruçará sobre as ideias difundidas pela permacultura, com o objetivo de mostrar a importância de novas abordagens mais holísticas e menos deterministas de adaptação ao meio e por conseguinte de convivência com os riscos impostos pela localidade. 1 Doutoranda em Território, [email protected]. Risco e Políticas Públicas, Universidade de Lisboa, 272 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 2 - Procedimentos metodológicos A investigação optou por uma metodologia baseada na revisão bibliográfica. Este processo de análise conceitual foi baseado na grounded theory2 que consiste na revisão bibliográfica, especificamente de assuntos relacionados assuntos ligados à epistemologia da geografia, permacultura, importância e crítica às ONG. Após estas etapas iniciais formam analisados sites de ONGs que atuam no semi-árido brasileiro e português com o intuito de verificar quais medidas são adotadas para propiciar uma convivência harmoniosa com ambientes que enfrentam a escassez hídrica. 3 - Resultados 3.1 - A importância do estudo do micro na alteração do macro Durante as últimas décadas, estudos voltados à compreensão do espaço geográfico estiveram muito ligados às questões das técnicas, ações em grande escala e seus reflexos na vida das pessoas, de modo a considerar que o poder da mudança encontra-se nas mãos de restrito número de atores sociais detentores de relevante importância na configuração das estruturas globais. Como mostra Santos (2006, p,52), ao salientar que apesar do indivíduo ser um importante instrumento de transformação se seu meio, há processos e atores hegemônicos que cinge a ação individual. Nesta ótica de análise da organização do espaço geográfico, sobrevaloriza-se as grandes ações globais e minimiza-se a importância dos pequenos atores sociais na configuração das mudanças espaciais. Como o próprio Santos (2006) afirmou, as projeções da escala nos estudos geográficos são ilimitadas, indo do “corpo do homem ao próprio mundo” (2006, p.52), assim, propõem-se uma alteração deste paradigma, com a valorização das pequenas ações humanas no ordenamento espacial, pois mesmo que limitadas pelos sistemas hegemônicos, as ações locais são 2 Metodologia qualitativa indutiva, baseada na análise sistemática de dados de maneira mais detalhada e flexível de material escrito, verbal ou visual, que não é convertido em pontos ou escalas numéricas, nem é considerado um espelho de uma realidade externa objetiva. 273 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 persistentes em vários pontos do mundo e capazes de alterar as condições de vida de milhares de pessoas ao redor do globo. Assim este trabalho se aproximara da visão sustentada por Tuan (1991, p.99), na qual se afirma-se que “Geography is the study of earth as the home os people”. Para este autor o estudo da Geografia se alicerça em três grandes pilares, a terra (como ambiente físico), os humanos (através da complexidade provinda das capacidades de alteração do meio e como seres culturais, sóciopolíticos e psicológicos, capazes de realizar a sinergia entre a terra e a vida) e lugar (como um conceito muito elástico que pretende compreender a complexidade do espaço organizado mentalmente e materialmente de modo a satisfazer a necessidades percepcionadas por um grupo de pessoas). Sendo assim, as modificações ocorridas no espaço ao longo da história se dão a partir de observações abstraídas a partir do meio. Ou seja, a vivência no lugar permite o grande conhecimento de suas dinâmicas naturais e por conseguinte dos seus riscos, assim o homem cria seu “casulo ordenado” que lhe possibilita a sensação de segurança perante os diversos riscos que o ambiente natural lhe impõe. Nesse contexto verifica-se que a ações comunitárias são capazes de modificar a organização do espaço, visto que o mundo é composto de lugares e estes são resultado da ação do homem, que o transforma de acordo com suas percepções e vivências. Assim, acredita-se as forças hegemônicas, não sejam determinantes das ações humanas, mas a modificação do espaço se dê sobretudo através do conjunto de processos mentais e sentimentos que são fruto de uma filtro individual. 3.2 - A simbiose entre o homem e o meio em situação de desastres Como afirma Dubos (1980), há uma progressiva humanização do planeta e por outro lado uma planetização da espécie humana. Todavia Tuan ressalta que o poder da Terra nessa simbiose não é negligenciável, ao limitar e criar incertezas na transformação do homem em relação ao meio, através de eventos como secas, cheias e outras manifestações, “Humans are not as much 274 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 in control as they would like to think they are, and their frailty is exposed not only by threat of chaos but also in the existence of orderly processes and patterns that are not part of human intention” (TUAN, 1991, p.103-104). Este autor acrescenta que se por um lado a natureza limita as ações do homem, por outro, a liberdade sobrevém quando se reconhece esses limites, já que as necessidade humanas se restringem a pequenos espaços com estreitas relações com o meio e a comunidade. Ao saber disso, o ser humano consegue conviver com a dualidade de estar “preso” pelas ações da natureza e ser “livre” para satisfazer suas necessidades mais básicas e latentes. Salienta-se que a própria manifestação da natureza pode ser encarada como uma possibilidade de mudança, aprendizado e até libertação. Como é visto com o manejo de riscos e desastres de grande magnitude como é apresentado por Birkmann et al (2010), na qual as mudanças informais realizadas pela participação ativa dos atores sociais locais alteram seu espaço de modo a solucionar alguns problemas resultantes do distúrbio e criam-se novas medidas de resiliência baseadas na percepção do lugar e memória do risco, a fim de mitigar as consequências de ocorrências futuras de fenômenos de estresse.3 Como afirma Tuan (1991), é natural ao ser humano procurar restabelecer “a bounded world in which they can pursue a familiar way of life”(p.104) ou seja, a busca pela reconstrução e adaptação ao lugar é fundamental e é inerente a este processo a ação ativa da comunidade, que pode criá-lo com características renovadas, onde pode haver maior respeito e cautela frente as forças naturais. Este envolvimento social pode ser verificado sobretudo nos pequenos desastres, onde os impactos são menos salientes e por isso contam com menor respaldo externo (ex. Seca). Segundo Voss e Wagner (2010) estes pequenos impactos criam situações capazes de gerar aprendizados relevantes na gestão do risco, pois 3 Salienta-se que esta é apenas uma das possibilidades apontadas no estudo Birkmann et al de mudanças informais pós-desastres, que podem se dar através da criação de mediadas incrementadoras da resiliência até a migração em massa. 275 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 ao contrário dos desastres “normais” os pequenos exigem adaptações e ajustamentos nas esferas social, cognitiva e cultural, o que não ocorre nos desastres que são assistidos pelos serviços de emergência, isto indica que a pequena tensão exige maior engajamento por parte da população, pois por ser menor não desperta o interesse e atenção de forças auxiliadoras estrangeiras ao local atingido pelo estresse. Assim, mesmo em situações onde a natureza se torna imponente e rende o homem a uma situação de espectador, há a possibilidade de mudança e liberdade, como afirma Tuan: “Freedom, paradoxically, depends on the recognition of limits-of con-straint. A major effort in liberal education is to teach how "unfree" humans are.” (1991, p. 104). O reconhecimento dos limites da nossa “não-liberdade” e a necessidade de conscientização da degradação ambiental durante muito tempo foram deturpados, prevalecendo assim, as ideias difundidas pelo Iluminismo e Revolução Industrial quando houve “a convicção de que a vocação humana não era apenas controlar a Natureza como conquistá-la e utilizá-la como fonte de riqueza”. (DUBOS, 1980, p. 118). Esta tendência adentrou também a ciência dos riscos que a partir do início da industrialização sobrevalorizou a capacidade de transformação do homem perante a natureza com a ideia de controle sobre os riscos e ameaças. Porém os acontecimentos verificados na pós-modernidade de descontrole do uso e gestão dos recursos naturais exige uma nova abordagem frente aos riscos,pois verifica-se que a técnica, além de não ser capaz de solucionar todos os problemas da enfrentados perante os riscos naturais tem o potencial a criar mais perigos para a humanidade, através dos riscos tecnológicos (MELA, BELLONI E DAVICO,2001; GIDDENS, 1991; BECK, 1992). Assim, uma revisão do modo como lidamos com o meio, tanto em relação aos seus riscos, como aos seus recursos naturais deve ser feita. Nesse contexto, a permacultura surge como uma possibilidade de efetivação dessas ideias de valorização do local, incentivando as práticas de democracia e participação de todos os integrantes do grupo, na procura de realidades 276 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 capazes de satisfazer as necessidade de liberdade e criação do homem, aliando a isso o incentivo a simbiose positiva entre o homem e o meio, de modo haver um incremento da planetização do homem, de modo a quebrar e equilibrar a acelerada e longa tendência a humanização do planeta. 3.3 - A permacultura, seu histórico e aplicação A permacultura surgiu na década de 1970, teve como idealizadores Bill Mollison e David Holmgren, que procuraram desenvolver alternativas capazes de harmonizar a simbiose entre o homem e o meio, através do manejo consciente e integrado, por meio da produção permanente e sustentável de culturas (MOLLISON, 1991). Salienta-se que a aquisição de tais conhecimentos baseiam-se na observação da natureza, no reconhecimento e valorização da especificidade e de cada local, assim, a sapiência das dinâmicas do lugar é um dos elementos cruciais no sucesso da permacultura. (VETETO e LOCKYER,2008) Estas ideias vieram ao encontro das exigências estabelecidas pelo até então incipiente movimento ambientalista, sobretudo às criticas tecidas em 1962 por Rachel Charson no livro “Primavera Silenciosa” ocorrendo um primeiro questionamento sobre o uso indiscriminado de elementos altamente contaminantes e perigosos, como os CFCs, no controle de pestes comuns no sistema agrícola. Assim, abordagens que valorizaram a agricultura biológica baseada na noção de sustentabilidade foram progressivamente difundidas e paulatinamente aplicadas em diversos sistemas ao redor do mundo. Este processo de aceitação e crescimento das técnicas de permacultura e do movimento ambientalista ocorreu concomitantemente ao período de ampliação das redes de telecomunicações, isto implicou na utilização de meios como a internet nas discussões sobre a temática ambiental. Visto que se trata de um aprendizado sensivelmente prático no qual as discussões teórico-conceituais não detém grande representatividade nas 277 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 publicações desta temática4, a troca de informações se dá sobretudo através de internet, que assume relevância no processo de consolidação e ampliação da permacultura. Com a difusão de vídeos práticos, blogs explicativos, jornais e revistas focados na aplicação e melhoramento de técnicas relacionadas a agricultura biológica, aproveitamento e eficiência no uso dos recursos, há a disseminação deste conhecimento aos mais diversos públicos. Assim trata-se de uma concepção de fácil acesso a grande número de pessoas, que conseguem através da simplicidade de suas técnicas colocam em prática alguns dos fundamentos da permacultura. Isto é possível pois a maior parte dos processos e técnicas desenvolvidas não exigem grandes recursos financeiros, já que uma das premissas da permacultura é a poupança de matéria-prima e energia, com a valorização dos recursos autóctones. Nesse sentido a permacultura ultrapassa a simples aplicação de práticas agrícola pouco impactantes, e procura promover o bem-estar através da junção da tecnologia no desenvolvimento de técnicas capazes de facilitar o trabalho humano, contribuindo assim para que se despenda maiores energias em questões ligadas a autogestão, incentivo a educação ambiental e promoção de discussões que estimulem a ação cívica das pessoas, de modo a contribuir para a maior conscientização social e ambiental local e global. 3.4 - Permacultura, risco da seca e o papel das ONGs no semi-árido A aplicação de ideias ligadas a permacultura podem promover a mudança na conscientização das pessoas, sobretudo, de grupos comunitários carentes que sofrem diretamente com as manifestações da natureza. Como exemplo pode-se analisar comunidades que convivem com as secas no Nordeste brasileiro, onde além de haver a escassez de água, há grande precariedade em relação as políticas públicas capazes de mitigar este risco, visto que a manutenção da situação de pobreza cria uma situação favorável 4 Esta carência no desenvolvimento teórico pautado nas exigências estabelecidas pela comunidade científica tem suas raízes na falta de aceitação destas ideias por parte da academia, que considerava tal teoria utópica e impraticável. (VETETO e LOCKYER, 2008). 278 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 aos políticos populistas locais, que em períodos de crise são enaltecidos por lograrem alimentos e recursos da federação. Neste contexto, torna-se importante a ação de órgãos capazes de contribuir para a difusão dessas ideias e que incentivam a postura mais ativa da população através de sua capacitação com métodos adequados a incrementação da resiliência individual e coletiva do risco. Visto que por vezes o Estado não é capaz de suprir essas lacunas, as ONGs podem auxiliar na mitigação do risco ao agir de maneira mais incisiva no território, pois para muitos críticos este subterfúgio ao bem-estar social mostrase como uma interessante conexão entre a população mais carente e o Estado, podendo ser um bom contrapeso ao poder deste ao abrir possibilidades de informação e comunicação entre a população e poder público. (EDWARDS e HULME, 1995). Assim, as ONGs tornam-se mais representativas em territórios onde a ação do Estado é pouco satisfatória, seja em situações de emergência onde o governo não é capaz de agir frente a uma situação repentina de estresse ou pela crônica falta de interesse de investimentos em dada área. Desde modo foi possível constatar através das analises dos trabalhos realizados e publicados nos web sites de ONGs brasileiras e portuguesas que a aplicação e ensino técnicas de permacultura possibilitado por ONGs no Brasil e Portugal procuram aumentar a resiliência social e minimizar a vulnerabilidade das famílias através da implementação de princípios de educação ambiental, busca pela convivência harmônica com o meio, e incentivo à participação ativa das pessoas de modo a valorizar suas percepções sobre o lugar e seus respectivos riscos. Através do trabalho conjunto com a população é verificado que os benefícios da permacultura vão além da aplicação de práticas agrícolas sustentáveis e podem contribuir para a mudança de atitude da população frente a ações públicas e comunitárias. Através de uma mudança de postura o cidadão passa a compreender e resgatar conhecimentos ligados às limitações que o meio caracterizado pela carência hídrica impõe aos seus habitantes. 279 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 4 - Considerações finais A crise ambiental está sendo analisada desde as década de 1960, porém as ações dos grandes atores hegemônicos negligenciam frente a essas questões. Em contrapartida existem vários pequenos grupos que se põem contra os rumos ao quais o sistema prossegue seguindo. Ao se adotar a escala o micro e sua capacidade de alterar o macro, há a possibilidade de escolha do destaque a ser dado as ações mais pontuais, pois acredita-se que os estudos focados no micro propiciam a análise das medidas de resiliência, eficiência de políticas públicas e ação de ONGs no local. A permacultura pode agir como importante fomentadora de ações locais com práticas holísticas capazes de criar alternativas no processo de mudança deste cenário sem a necessidade grandes investimentos financeiros. Todavia, a analise da eficiência da permacultura é algo que precisa ser realizado, pois existem diversas práticas baseadas neste pensamento aplicadas por ONGs, porém há uma escassez de produção crítica de conhecimento científica que aborde e confronte esta temática, pois trata-se de um conhecimento que está sendo praticado, mas não é dada grande importância no meio acadêmico. Assim uma abordagem crítica destas aplicações pode contribuir para o melhoramento da execução deste pensamento que tem suas bases em um movimento de contestação da estrutura dominante de poder e suas consequências para o futuro ambiental, logo o emprego da permacultura deve ir de encontro a essas questionamentos e quebrar esta estrutura, mesmo que em pequenas áreas, através da educação e conscientização. 5 - Referências BECK, U. Risk Society: Towards a New Modernity, London: Sage,1992. BIRKMANN J.; BUCKLE P.; JAEGER J.; PELLING M.; SETIADI N.; GARSCHAGEN M.; FERNANDO N.; KROPP J. Extreme events and disasters: a window of opportunity for change? Analysis of organizational, institutional and political changes, formal and informal responses after mega-disasters. Nat Hazards. v.55, p.637–655, 2010. 280 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 CARSON, R. Primavera Silenciosa, São Paulo: Melhoramentos, 1967. DUBOS, R. Namorando a Terra, São Paulo: Melhoramentos, 1980. EDWARDS M.; HULME D. Non-governmental Organisations:Performance and Accountability Beyond the Magic Bullet, London: Earthscan, 1995. GIDDENS, A. Modernity and Self-Identity : Self and Society in the Late Modern Age, Cambridge: Polity Press, 1991. MELA A.; BELLONI M. DAVICO L. A Sociologia do Ambiente, Lisboa: Editorial Estampa, 2001. MOLLINSON B. Introduction to Permaculture. Sidney: Tagain Publications, 1991. SANTOS M. A Natureza do Espaço: técnica e tempo, razão e emoção, São Paulo:Edusp, 2006. TUAN Y. Topofilia: um estudo da percepção, atitudes e valores do meio ambiente, São Paulo: Difel/ Difusão Territorial S.A., 1980. TUAN Y. A view of Geography. Geographical Review. v: 81, n.1, p: 99-107, 1991. VETETO J.; LOCKYER J. Environmental Anthropology Engaging Permaculture: Moving Theory and Practice Toward Sustainability Culture & Agriculture , v:30 n.1, p: 47–58, 2008. VOSS M.; WAGNER K. Learning from (small) disasters Nat Hazards, v: 55, p: 657–669, 2010. 281 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 A INDUSTRIALIZAÇÃO NO VALE DO PARAÍBA PAULISTA: ESCALAS POSSÍVEIS PARA ENTENDER AS PECULIARIDADES NO DESENVOLVIMENTO DO SETOR INDUSTRIAL Ítalo Franco Ribeiro1 O presente texto objetiva demonstrar os principais agentes envolvidos no processo de industrialização da região do Vale do Paraíba paulista, ressaltando, contudo, como ocorreu esse processo nas duas principais cidades da região, Taubaté e São José dos Campos. Esse recorte de análise se justifica por permitir distinguir as generalizações encontradas amplamente na literatura sobre o tema, as quais tratam do processo de industrialização como consequência direta da economia cafeeira, de processos que guardam particularidades que fogem a essa regra, sobretudo, devido a ação de diferentes agentes que fomentaram a industrialização no Vale do Paraíba. Nos textos de Dean (1971), Cano (1977), Melo (1982), Negri (1996) e Andrade (1996), embora guardem em suas leituras diferentes posicionamentos teóricos, o surgimento das atividades industriais no Brasil é decorrente da acumulação de capital que se realizava dentro dos marcos da agro-exportação cafeeira. Diante essa argumentação recorrente nos trabalhos sobre a industrialização no estado de São Paulo, a explicação do conjunto de atividades interdependentes que se formaram a partir a da produção e beneficiamento do café no planalto ocidental e mais a oeste e norte do estado de São Paulo, para o Vale do Paraíba essa assertiva é questionável, pois a economia cafeeira na região não pode ser descolada de uma formação sócioespacial específica, de heranças coloniais, escravocrata e de uma aristocracia que tinha na acumulação de capital, fonte para manter ligação com padrões de vida europeus, diferentemente da formação sócioespacial das novas áreas cafeicultoras, de força de trabalho assalariada, com nucleamentos urbanos que se seguiam à ferrovia, integrando territorialmente o estado, 1 Mestrando em Geografia pela FCT-UNESP/Presidente Prudente. Bolsista Fapesp. 282 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 constituição de rede bancária e com intensa relação de produção e circulação de base capitalista. A industrialização do Vale do Paraíba ocorre em função das dificuldades impostas à produção do café. O declínio do café na região é resultado da expansão da produção para o Oeste Paulista, aliado ao esgotamento progressivo das terras, ausência de técnicas modernas de cultivo, erosão de terras mais antigas, endividamento dos proprietários rurais, leis abolicionistas e a permanência da mentalidade conservadora dos fazendeiros e, como “último golpe” na já frágil economia, a crise de 1929. Para Müller, a região do Vale do Paraíba passou por 3 fases de industrialização: 1ª) de 1881-1914, sobretudo do ramo têxtil; 2ª), de 1914-1943, com o surgimento de estabelecimentos de transformação de minerais não metálicos e de beneficiamento de produtos agrícolas e; 3ª), que se caracteriza pela indústria moderna, especificamente, dos ramos metalúrgico e mecânico. Segundo Müller, “além de corresponder à ação de condicionamentos de ordem geral, refletiu, também, a atuação de fatores específicos à região” (p. 81). Os primeiros estabelecimentos industriais da região foram implantados ainda no século XIX. Em São Luiz do Paraitinga foi instalada a primeira fábrica têxtil da região no ano de 1875, por uma família tradicionalmente produtora de café (RICCI, 2006). Para Ricci, a fábrica foi criada com o fito de produzir sacarias para o armazenamento e transporte de café, aproveitando-se do cultivo de algodão realizada no município. Ainda no século XIX podemos destacar outras duas importantes fábricas do setor têxtil instaladas na região. Em 1879, uma fábrica de meias entrou em funcionamento na cidade de Jacareí e no ano de 1891 surge a principal fábrica do setor no Vale do Paraíba, a Companhia Taubaté Industrial – CTI (RICCI, 2005). Com base no que foi exposto, temos um cenário de transformação da economia da região, pois em fins do século XIX pode-se evidenciar a decadência da produção do café na região e o deslocamento do cultivo para a porção mais a oeste do estado. As primeiras fábricas surgem, provavelmente, 283 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 do redirecionamento da produção agrícola para a cultura do algodão, que era mantida para subsidiar a produção do café. Para Müller (1969, p.12), o processo de urbanização do Vale do Paraíba é resultante de processos espaciais que remetem ao tempo longo, levando-se em consideração a história de nosso país. Portanto, o desenvolvimento urbano dessa região, enquanto processo, data de três séculos, sendo assim, “uma das mais antigas áreas de ocupação do Estado [...] oferecendo, por essa razão, perspectiva razoável do processo de urbanização em nosso território, dentro de condicionantes e de ritmos variáveis”. Na presente obra de Nice Lecqoc Müller, a autora apresenta sua forma de análise do processo de urbanização do Vale do Paraíba, abordando a origem e o desenvolvimento dos núcleos urbanos em três distintos períodos que classifica como: a fase do devassamento (séc. XVII); do ciclo do ouro (séc. XVIII); ciclo do café (Sec. XIX) e o período industrializante (séc. XX). Apesar de considerar o ciclo do café como o período que permitiu a “eclosão da urbanização” no Vale do Paraíba é somente no período em que há um novo direcionamento econômico da região para o estabelecimento de novas atividades produtivas, especificamente, a industrial, que a região entra no que classifica de urbanização moderna. Essa urbanização moderna é fruto do aproveitamento de infraestruturas corolário do período cafeeiro e de novas instalações, sobretudo vias de comunicação e transporte, como a ampliação da Estrada de Ferro Central do Brasil (antiga D. Pedro II) e a abertura da rodovia BR-116 Presidente Dutra, interligando as duas principais capitais nacionais, o que consubstanciou a localização privilegiada dos centros urbanos do Vale do Paraíba para a atração de empresas ao longo desta área. No que se refere a reorganização da produção industrial no estado de São Paulo, a região tornou-se atrativa pelo fato de haver mão de obra abundante e barata, pois com a decadência do café várias atividades subsidiárias que se mantinham das economias geradas pelo cultivo e beneficiamento daquele produto se extinguiram deixando uma massa de trabalhadores sem inserção no mercado de trabalho além de capitais que 284 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 foram acumulados na economia cafeeira ficarem disponíveis para novos investimentos. Esses fatores, intrínsecos a “urbanização moderna”, modificaram divisão do trabalho em escala regional. Se no período que se segue ao chamado ciclo do café, Taubaté, pólo regional, obtinha maior quantidade populacional urbana, chegando ao ano de 1934 com 21.840 pessoas2, seguida de Guaratinguetá, com 15.169 e Cruzeiro, com um total de 11.701 pessoas, já no ano de 1964, vê-se uma mudança nessa hierarquização, pois Taubaté contava com 72.845 pessoas habitando áreas urbanas, São José dos Campos logo em seguida com 68.924, Guaratinguetá com 39.679 e Jacareí com 35.754 no total de população urbana. A variação porcentual desse número entre os anos demonstrados revelam o que Müller classificou como crescimento extraordinário (populacional) nos centros urbanos de São José dos Campos (539,2%) e Taubaté (196,9%) e grande crescimento em Jacareí (157,5%) e Guaratinguetá (152,4). Tomando como base esse pequeno excerto do livro de Müller, podemos depreender a real importância que tiveram as infraestruturas advindas de três séculos de urbanização para os municípios de Taubaté e Guaratinguetá, sobretudo ao que foi constituído ao longo do ciclo do café nesses dois municípios. Entretanto São José dos Campos não esteve intimamente ligado as estruturas que permitiram o desenvolvimento de um aparato técnico nos anos de auge da economia agro-exportadora do café. Como aponta o crescimento populacional, no ínterim de 30 anos o município de São José dos Campos já demonstrava sua potencialidade de ascender hierarquicamente. Se no ano de 1934 Taubaté mantinha posição de “‘capital regional’ dominando todo o conjunto” de centros urbanos do Vale do Paraíba, com até mesmo irradiação de influência que extrapolava a rede de urbana que estava inserido (Sul de Minas Gerais, Vale do Paraíba Fluminense, e arredores do que hoje é a 2 Dados do total populacional urbano e rural foram extraídos por Müller do Recenseamento demográfico, escolar e agrícola-zootécnico do Estado de São Paulo (1934). Conferir MÜLLER, Nice Lecqoc. O Fato Urbano na Bacia do Rio Paraíba – São Paulo. Biblioteca Geográfica Brasileira, Série A, Publicação 23. Rio de Janeiro: Fundação IBGE, 1969, p. 68. 285 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 grade São Paulo, como Mogi das Cruzes), no ano de 1960, Segundo Müller, São José dos Campos se junta a Taubaté no que se refere “ao primeiro escalão de hierarquia urbana [...] que, praticamente, estaria ‘em seus calcanhares’” (p. 300-301). Essa reconstrução histórica do desenvolvimento industrial paulista e, consequentemente, vale paraibano está amparada em uma visão geral do processo histórico ocorrido nesta região mencionada, porém, um estudo mais detido da bibliografia que toma por foco a análise de dois municípios do Vale mostra que o geral não foi regra. Dessa forma elegemos Taubaté e São José dos Campos como foco de análise do processo histórico de desenvolvimento, trata-se de um esforço comparativo e ilustrativo, além disso, salientamos que todo recorte determina algum tipo de perda, contudo, acreditamos ter selecionado cidades fundamentais para o que se pretende pois: 1) trata-se atualmente dos dois principais pólos industriais do Vale do Paraíba, 2) e as especificidades históricas desse desenvolvimento industrial nos dão a visão de duas vertentes distintas para esse processo. A cidade de Taubaté, central em nossa discussão, foi uma das principais cidades produtoras de café do século XIX e a maior produtora no início do século XX (MILLIET, 1946). A ascensão política dos dirigentes e produtores da região foi condicionada pelos ganhos proporcionados pela exportação do produto por pouco mais de meio século de produção. Não é por menos que a principal política de valorização do café, já mencionado anteriormente através das palavras de Furtado (2004), o Convênio de Taubaté, foi realizado na região, precisamente na cidade que dá nome ao convênio. O Convenio foi firmado em um período de decadência da produção cafeeira na região, o qual permitiu um afluxo de capitais para a região, os quais, em certa medida, foram aplicados em outros setores da economia pelos antigos produtores. Entretanto, não temos uma afirmação contundente sobre essa ideia, mas ao que tudo indica, a indústria na região foi impulsionada pela política de defesa dos preços do café. 286 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Soma-se a esses fatores o deslocamento da mão de obra ligada às atividades agrícolas em franca decadência, com grande contingente de imigrantes (italianos) e libertos (ANDRADE, 1996). O autor afirma que “muitos desses imigrantes tinham formação profissional qualificada e assim, puderam ser reaproveitados como mão de obra especializada, nas primeiras indústrias que começaram a despontar em nossa região, ainda no final do século passado” (1996, p. 262)3. Assim, a cidade de Taubaté, que já obtinha algumas fábricas instaladas na cidade, sobretudo ligadas ao setor têxtil, pode contar com os capitais oriundos da economia cafeeira, tanto do retorno referente ao comércio do produto como da política de retenção dos excedentes. De acordo com o exposto, para o desenvolvimento industrial taubateano foi fundamental todo o aparato criado pela monocultura cafeeira, ou seja, a presença de uma mão de obra em grande quantidade (seja ela especializada ou não), a criação de uma infraestrutura urbana, o sistema de transporte utilizado para o escoamento do café. Em suma, as referências bibliográficas apresentadas indicam que fora o café o responsável por dar as bases à industrialização do Vale do Paraíba. Mas como explicar o desenvolvimento econômico de São José dos Campos quando este município tem sua origem atrelada às funções de cidade sanatório? Segundo Lessa, as economias geradas pelo café não foram determinantes para a constituição da paisagem atual da cidade de São José dos Campos (LESSA, 2001). Em sua tese de doutoramento, demonstra as ações deliberadas do Estado planejador como indutor de processos espaciais (CORREA, 2007) em um município até então desprovido de infraestruturas para receber grandes investimentos, transformando as potencialidades do seu ambiente natural, para a cura da tísica, em potencialidades que logo foram 3 O autor está pautado numa leitura amplamente criticada que coloca os imigrantes europeus como mais laboriosos que os trabalhadores nacionais, quando na verdade, já é sabido que a maior parte desses trabalhadores imigrantes eram oriundos do campo. Para tanto, conferir: ANDREWS, George Reid. Negros e brancos em São Paulo (1888-1988). São Paulo: EDUSC, 1998; LARA, Silvia Humboldt. Escravidão, cidadania e história do trabalho social no Brasil. Projeto História, São Paulo, n°16, fev/1998. 287 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 exploradas pelas condições aparentes de sua situação e localização geográfica. Em São José dos Campos o primeiro processo econômico a ser destacado foi o de concentração e especialização nos investimentos e nos equipamentos da cidade, caracterizada então como Cidade Sanatorial, devido a procura dos doentes de tuberculose pelo ambiente propício ao tratamento da doença, pois que dependia a princípio do desenvolvimento do setor terciário para atendimento dos doentes. Esse período do XIX ao XX já apresentou o direcionamento de investimentos públicos e privados para a constituição da estrutura necessária com o objetivo de repelir um dos problemas urbanos da capital, a doença (LESSA, 2001; 2008). A existência desse fluxo foi observada pelo Estado que inaugura para São José dos Campos já em 1932, o primeiro plano urbanístico com zoneamento urbano da cidade, que realmente se efetivará no ano de 1938, definindo a divisão da cidade em zonas: residencial, comercial, sanatorial e, posteriormente, industrial; e demais outras intervenções de outras esferas do Poder Público, como a instituição da cidade em Estância Climatérica em 1935, inclusive com o repasse de dinheiro do Estado para o município. Portanto, o projeto urbanístico da cidade ocorre primeiramente pelas demandas da doença (LESSA, 2001). O planejamento estatal efetivado no Brasil foi fortemente atrelado ao capital privado nacional e internacional. Nesse contexto, em fins da década de 1930, durante governo Vargas, foi elaborado o primeiro plano para a região do Vale do Paraíba, que se encontrava em total decadência econômica. O plano em questão, marco das ações planejadoras do governo federal na região, denominou-se “Das providencias preliminares para um programa de reerguimento econômico do Vale do Paraíba no Estado de São Paulo”, sob o governo do interventor estadual Adhemar de Barros, plano apresentado na cidade de Taubaté, principal da região naquela data (LESSA, 2001). O plano tinha como pressupostos econômicos potencializar o e reorganizar a produção agropecuária na região, sob a supervisão e controle do 288 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 IAC (Instituto Agronômico de Campinas) e, por conseguinte, incentivar políticas de atração e investimentos dos setores industrial e comercial. O IAC, no que se refere ao planejamento estatal, concluiu o primeiro plano de cunho regional no Brasil, conhecido como “aspectos do Vale do Paraíba e de seu reerguimento no Governo Adhemar de Barros”4. Como pano de fundo desse programa estavam os interesses do Governo Federal em instalar, no Brasil, potencial energético e hidroviário que permitisse, ao mais importante estado do país, direcionar seus recursos ao processo de industrialização. Além da instalação da CSN (Companhia Siderúrgica Nacional) no Vale do Paraíba Fluminense, no ano de 1946, foi instalado, na cidade de São José dos Campos, o CTA (Centro Técnico Aeroespacial) em acordo com os objetivos estratégicos centrados na região do Vale do Paraíba pelo Estado Novo. Esse grande projeto, inscrito nas estratégias tanto industrializantes como geopolítico militar do Governo Federal, teve como premissa, no tocante a escala local, a prerrogativa de sobreposição de uma cidade sanatorial, marcada pelas peculiaridades da doença, para uma cidade que apresentasse o padrão modernista do urbanismo. Nesse contexto, o projeto do CTA é elaborado por Oscar Niemeyer, para edificação da grande obra que daria novos rumos para a cidade e início a novos vetores e eixos de expansão para o setor que a liga a via Dutra. Vale ressaltar que os traços modernistas de Niemeyer também estão presentes na arquitetura de empresas da cidade, como é o caso da Ericson, que tem uma planta fabril as margens da rodovia presidente Dutra (LESSA, 2001). A ligação da cidade militar moderna a cidade sanatório, por meio de projetos urbanísticos de Niemeyer, coloca São José dos Campos como foco de novos agentes empreendedores que transformam as funções urbanas do município que até então voltadas para ao tratamento dos doentes por tuberculose, para as atividades industriais com alto incremento de tecnologia. 4 “Este plano orientou o governo no trato da questão agropecuária, propondo a ocupação das várzeas do Paraíba com horti-fruti-granjeiros e pecuária leiteira (Bacia leiteira do Paraíba), em minifúndios, que visava principalmente o mercado da Capital” (LESSA, 2001, p. 90). 289 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Portanto, se para Taubaté, e demais cidades da região com grande vulto de produção cafeeira, o café foi a base para a indústria (não porque tenha redirecionado seu capital, mas por conta da estrutura propiciada pela monocultura), em São José dos Campos a industrialização está inserida na política de planejamento pensado para o desenvolvimento do estado. Desde os interesses governamentais acerca do processo de industrialização do país, os interesses estratégicos militares, como a instauração no município de uma produção bélica ou nas políticas de cunho neoclássicas, de setores industriais que geram economias de localização, com a implantação de empresas estatais como a Embraer e Petrobras, representam ações pilares do planejamento do Estado. De forma implícita, São José dos Campos passa, a partir do Estado Planejador, a desempenhar papeis regionais diferenciados, pois em curto período de tempo (1930 – 1960) passa de cidade local a pólo regional. Se até a década de 1960 o município de Taubaté era o único que obtinha posição de destaque econômico em toda a região, assumindo até mesmo o papel de capital regional, pela característica dos significativos equipamentos urbanos e estabelecimentos industriais, do comércio atacadista e varejista e do setor de serviços, com uma área de influência que extrapolava os limites regionais, é a partir de meados dos anos de 1960 que São José dos Campos começa a rivalizar com a centralidade exercida pela cidade de Taubaté, que demonstrava já naquele momento, “sintomas de mudança, tendendo ela a igualar-se a São José dos Campos” (MÜLLER, 1969, p.344). Portanto, no período que se seguiu, fez-se prevalecer os efeitos das intervenções de planejamento de cunho estatal na redefinição dos graus de hierarquia urbana na conformação da rede de cidades da região, com primazia considerável centrada na cidade de São José dos Campos até os dias atuais. Diante o que foi apresentado, somente podemos entender a primazia da cidade de São José dos Campos como pólo regional se desviarmos nosso enfoque para o processo de sua formação socioespacial, que foi fortemente atrelado a projetos e planos do Poder público, em suas diversas instâncias. 290 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Não é nossa intenção desconsiderar outros diversos agentes que atuaram na produção do espaço dessa cidade, mas tentar demonstrar recortes analíticos que possibilitam efetivar diferentes recortes analíticos sobre um mesmo tema, sobretudo, por meio da interlocução com estudos históricos. Mesmo que obtido de forma parcial, o processo de urbanização de São José dos Campos nos mostra características de diferentes períodos em que diversos processos se sobrepuseram de forma combinada e contraditória e que, no período atual, ampliam a sua área de influência em escalas de maior abrangência territorial. Atualmente, para entendermos a ampliação dos papéis do pólo regional de São José dos Campos, não se podem negligenciar as lógicas de mundialização da economia que se esquadrinhou em escala global, sobretudo a partir da década de 1970, período no qual, novas territorialidades se desenharam a partir da desconcentração territorial das atividades produtivas da metrópole para o interior, principalmente, em direção as cidades de porte médio e aglomerações não metropolitanas (SPOSITO, 2004). No que circunscreve a região do Vale do Paraíba paulista, tais programas não foram de alguma forma impulsionadores do processo de industrialização, já que tal região foi outrora foco de investimentos diretos de um modelo interventor do estado e já expressava processos espaciais aglomerados para a instalação de novas lógicas econômicas que se constituíram em escala nacional e global. Referências ANDRADE, Antonio Carlos de Argôllo. Histórico da industrialização de Taubaté. In: ANDRADE, Antonio Carlos de Argôllo; ABREU, Maria Morgado de. História de Taubaté através de textos. Revista Taubateana, número 17, 1996, p.262263. CANO, Wilson. Desequilíbrios regionais e concentração industrial no Brasil: 1930 - 1970. São Paulo: Global, 1985. DEAN, Warren. A industrialização de São Paulo (1880-1945). Tradução Octavio Mendes Cajado. São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1971. 291 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 LESSA, Simone Narciso. A construção do Pólo Regional do Vale do Paraíba: Planejamento Regional e Ordenamento Territorial de São José dos Campos. In: ZANETTI, Valéria (org). Os Campos da Cidade: São José Revisitada. Vol.1. São Paulo: Intergraf, 2008. MELLO, João M. C. de. O Capitalismo Tardio. São Paulo: Brasiliense, 1982. MÜLLER, Nice Lecqoc. O Fato Urbano na Bacia do Rio Paraíba – São Paulo. Biblioteca Geográfica Brasileira, Série A, Publicação 23. Rio de Janeiro: Fundação IBGE, 1969.NEGRI, Barjas. Concentração e Desconcentração industrial em São Paulo (1880-1990). Campinas; São Paulo: Editora da Unicamp, 1996. RICCI, Fábio. O desenvolvimento regional e a dinâmica do movimento do capital. Revista Brasileira de Gestão e Desenvolvimento Regional, Taubaté, v. 1, n. 2, p. 3-15, mai/ago 2005. SPOSITO, Maria Encarnação. A Divisão Territorial do Trabalho e as Cidades Médias no Estado de São Paulo. Caderno Prudentino de Geografia. Presidente Prudente: AGB, v.26, dez. 2004. 292 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 MUDANZAS TERRITORIALES Y RIESGOS AMBIENTALES EN EL ESTADO DE HIDALGO POR EL PROYECTO DE LA REFINERÍA BICENTENARIO Luis Alberto Luna Gómez1 La refinería Bicentenario es un proyecto novedoso que está en aras de construcción y consecuentemente se está modificando el territorio en favor de establecer condiciones predilectas y hegemónicas para la industria y los servicios en detrimento y riesgo de la agricultura, lo cual pone en riesgo la producción de alimentos, el medio ambiente y la salud de los pobladores de la región. La dilucidación presente evidencía la forma en que las actividades agrícolas y la naturaleza son subsumidas por capital que en su forma concreta busca obtener la máxima ganancia dentro del capitalismo neoliberal. Las características poblacionales muestran un mayor crecimiento poblacional en el municipio de Atitalaquia (24.3%) que en Tula (19.6%) del año 2000 al 2010. A continuación mostramos las cantidades brutas de población y total de hombres y mujeres para los años 2000 y 2010. Municipios Atitalaquia Tula de Allende Población 2000 Total Femenina Masculina 21636 10888 10748 86840 44534 42306 Población 2010 Municipios Atitalaquia Tula de Allende Total Femenina Masculina 26904 13651 13253 103919 53429 50490 En cuanto a la producción agricola podemos señalar que ambos municipios, Atitalaquia y Tula, pertenecen a lo que se denomina el granero del 1 Doutorando de Geografía em Universidade Estadual Paulista, Campus Rio Claro. E-mail: [email protected]; [email protected] 293 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 estado de Hidalgo, debido a esta región llega el agua residual de la Ciudad de México. TABLA I: Producción agricola en la región, 2007 Producto Avena Forrajera Cebada grano Frijol Maíz amarillo Maíz blanco Otros cultivos Municipio Superficie sembrada Producción obtenida Hectáreas Toneladas ATITALAQUIA 18.69 430.22 TULA ATITALAQUIA 85.77 39.82 1 929.09 155.28 TULA ATITALAQUIA 7.79 63.67 21.36 99.80 TULA ATITALAQUIA 446.73 51.68 375.18 414.70 TULA ATITALAQUIA 867.56 1 239.08 1 578.26 10 003.29 TULA ATITALAQUIA 5 163.08 107.71 20 272.55 3 289.86 198.31 1 540.72 TULA Asimismo, el ámbito económico, dentro de la región, se percibió que en el año 2000, la remuneraciones en el sector de industrias manufactureras se equiparaban demasiado los dos municipios de la región dado que era el área donde mayor número de unidades económicas, (70 Atitalaquia vs 301 de Tula); en la población ocupada eran (4,999 Atitalaquia vs 1,953 en Tula); y remuneraciones en miles de pesos (515,199 en Atitalaquia vs 152,151 en Tula) (INEGI, 1999). Podemos vislumbrar que en Atitalaquia resaltan las industrias manufactureras dado que las unidades económicas representan: 154, personal ocupado 9,614 y remuneraciones 2,201,239 miles de pesos. No obstante en Tula el sector cambia dado que es el comercio al por menor donde hay mayor número de unidades económicas (1,835), personal ocupado (5,562) y remuneraciones (1,21,699 miles de pesos), (INEGI, 2009b). En la región podemos encontrar que hay una mayor concentración de localidades rurales, ello establecido con el criterio de considerar éstas con un tamaño de población menor a los 2 mil 500 habitantes, no obstante hay al menos cinco localidades 294 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 que rebasan la cantidad de 5 mil habitantes, tal como se muestra en la siguiente tabla. Tamaño de localidades en el año 2000 20 18 16 14 12 10 8 6 4 2 0 ATITALAQUIA TULA (INEGI, 2000) El proyecto de la refinería Bicentenario se elaboró como estrategia para hacer frente a la crisis mundial del 2008, la instalación de la misma propició un tema de conflicto territorial, siendo en particular los gobiernos de Guanajuato e Hidalgo, quienes estuvieron en pugna, resultando ganador el segundo. A partir de allí nace una cantidad de promesas favorables a los pobladores de la región Atitalaquia, Tlaxcoapan y Tula, Hidalgo, donde se está llevando a cabo la refineria, sin embargo, las condiciones para la población no han sido tan beneficas como ellos esperaban. La Zona Metropolitana de Tula ha crecido entre plantas industriales, por ejemplo las cementeras Cruz Azul, Cemex, Lafarge, Holcim Apasco, una termoeléctrica, la hulera Galgo, la textilera Zaga y la panificadora Bimbo, entre 295 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 otras, siendo la más notoria desde 1976, la refinería Miguel Hidalgo, ya que los uniformes beige de los petroleros son parte del paisaje cotidiano en la ciudad. La zona industrial de Tula es una de las más contaminantes del país. En 2006 la procuraduría ambiental del Estado de México denunció que las termoeléctricas, las refinerías y las industrias del corredor de Tula son las principales fuentes de contaminación que se registran en el Valle de México: 70% de las partículas menores a 10 micras y de dióxidos de azufre (SO 2) (querella 01/UEIDAPLE/DA/B/2/2005). Frente a esta situación PEMEX sostiene que la nueva refinería tendrá una capacidad de producción de 300 mil barriles diarios, lo que es una vanguardia en términos técnicos y de impacto ambiental. Todos los productos destilados serán de ultrabajo azufre y se aprovecharán insumos residuales como el combustóleo de la refinería actual y otros complejos. El gobierno estatal y los gobiernos municipales hacen hincapié en el tema, refiriéndose al proyecto como la refinería verde, sin que aún sea pública medición alguna sobre los impactos ambientales. El gobierno municipal de Tula ha perfilado algunas soluciones a los retos que se avecinan, el plan municipal de desarrollo prevé incrementar el transporte público, canalizar los nuevos proyectos de vivienda hacia el norte y el occidente de la ciudad para evitar más congestionamiento en la zona centro. Proyecta construir un centro comercial, un auditorio y traer a Tula una universidad pública. La Secretaría de Planeación y Desarrollo Regional de Hidalgo, también advierte que su Plan de Desarrollo Municipal no basta, pues debe complementarse con un plan regional, puesto que son varios los municipios involucrados. Por su parte el gobierno federal instalará en el municipio de Atitalaquia una macroplanta de tratamiento de aguas residuales para limpiar las descargas del drenaje que llegan allí desde el Distrito Federal. Cabe mencionar que se carece de un diagnóstico ambiental que proporcione datos de las condiciones climáticas de la región, el balance hídrico, datos meteorológicos, partículas en el aire y velocidad y dirección de los vientos, tal como lo muestra la refinería Paulínia de Sao Paolo, Brasil. 296 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Mientras los habitantes de Tula, Tlaxcoapan y Atitalaquia tiene una expectativa favorable respecto a la nueva refinería, algunos analistas cuestionan la decisión de PEMEX de construir una nueva refinería: “¿De dónde se va a sacar el petróleo para abastecerla?”, señala David Shields al observar los diagnósticos que marcan el declive en la producción de los yacimientos de Cantarell y Ku Maloob Zaab, mismos que estarán muy avanzados cuando la refinería opere, aunado al retraso que ésta lleva. El mismo analista opina que el gobierno debería enfocarse a concluir las seis refinerías existentes, pues asegura, esto es más rentable que construir una nueva. Aunque PEMEX tampoco se ha distinguido por ser eficiente en la reconfiguración de refinerías (Galarza & Vazquez, 2009). El gobierno de Hidalgo señala estar mejorando significativamente su infraestructura carretera y por ende sus conexiones terrestres hacia la zona centro, las costas y la frontera. Con el nuevo corredor Arco Norte se está a 40 minutos de Querétaro y a menos de una hora del corredor de Cuautitlan Izcalli. En los últimos dos años, la entidad ha sido una de las que más inversiones ha recibido y también la que más empleos ha generado, por ejemplo en Atitalaquia la estadounidense Home Deppot invirtió 30 MDD para construir un centro de distribución de mercancías, el más grande de la firma en el país. La obra se inauguró a finales de marzo y generó 250 empleos directos y 500 indirectos. El concepto central de este análisis es la producción social del espacio en la región de Atitalaquia, Tlaxcoapan y Tula, Hgo. Tal categoría acuñada por Lefebvre plantea la cuestión del espacio a nivel de la práctica espacial donde está presupuesto o de alguna manera subsumido, de tal manera que se lo apropia, lo desvanece y oculta, no obstante éste se devela una vez que es comprendido y entendido por los sujetos sociales, por ejemplo, tenemos el caso de muchos actores sociales que en la actualidad de sus movimientos sociales centraron su demanda en el espacio: los campesinos de Atenco, los Zapatistas y en América Latina los Sin-Tierra de Brasil. 297 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 En la geografía latinoamericana se gesta la acentuación de la relación que hay entre espacio y tiempo la cual está mediada por la técnica, misma que arroja indicios de los diferentes modos de producción, pues mientras hay una constante innovación tecnológica en los procesos de PEMEX, no se hizo una fuerte promoción en el cambio tecnologico agrícola, lo que ponen en riesgo no sólo a los habitantes de la región, sino a toda la nación pues no se garantiza la seguridad alimentaria, a través de su autonomía (Santos, 2000). La producción del espacio es derivada de la práctica espacial de los actores, individuos e instituciones que operan en diversas escalas. Tal práctica se refiere a la red espacial de relaciones y actividades, conexiones espaciales y localizaciones con las que opera un determinado grupo social. Cabe señalar que siendo la práctica espacial de una manera desigual, la creación de la territorialidad, detona una geografía del poder caracterizada por la desigualdad, la escisión, tensión y el conflicto. De esta manera hemos presentado la condición empírica del problema que conlleva la construcción de la refinería Bicentenario, respecto al conflicto que se detonó entre dos estados de la República, la descampesinización ocurrida en las hectáreas adquiridad por el gobierno guanajuatense, así como la larga espera y la nula capacitación que padecen los antiguos dueños de la tierra donde se está llevando a cabo el proyecto de la paraestatal, mismo que se puso en marcha a través de una licitación otorgada a ICA. La configuración, le permitirá a la contructora plantear requisitos para las subsecuentes licitaciones, mismas en las que participa de manera tácita en la esquisita reglamentación y como concursante, es decir, como juez y parte. Por las anteriores razones se vuelve impresindible el análisis de la producción social del espacio, mismo que refleja los riegos ambientales de salud y alimentarios, a través de las prácticas espaciales que realizan actores sociales como: el Gobierno del estado de Hidalgo; el Gobierno Federal; los Gobierno municipales de Atitalaquia, Tlaxcoapan y Tula; PEMEX, el STPRM; el Sindicato Nacional de Trabajadores y Empleados Felipe Carrillo Puerto; ICA y los habitantes de la región quienes con sus prácticas espaciales se están 298 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 beneficiando o bien no se ven favorecidos en un contexto dominante que estructura la normatividad y las condiciones de vida a través de una hegemonía. El enfoque teórico que permitirá interpretar los datos arrojados por la investigación empírica del fenomeno de las mudanzas territoriales que producen un espacio social de riesgo ambiental, alimentario y de salud es el estructuralismo, mismo que considera que es el andamiaje social el que determina las acciones de los actores, por medio de una inercia y función en el presente y la idea de futuro. Ligado a este enfoque se encuentra el fenómeno de riesgo social, que es definido por Bauman (2002) como la versión líquida de la modernidad que permite pensar la inestabilidad que acontece con las acciones que no se pueden fijar en el tiempo y en el espacio, es decir, fluyen, se derraman, lo más sólido que garantiza la estabilidad de una sociedad es la norma, por ello licuificarla y mudarla en algo flexible y e inestable es el proceso que se propuso guiar la nuevo orden social. El interés de revisar los riesgos ambientales, en la salud y la alimentación a partir de las mudanzas territoriales en una refinería instalada en la región centro de México es para dar cuenta de los procesos espaciotemporales y las relaciones causales que producen dichas condiciones de riesgo. Sobre el riesgo se tienen tres dimensiones sociales, la primera es la dimensión real, la siguiente es la dimensión simbólica y la tercera es la dimensión imaginaria, tales dimensiones estructuran la escala temporal y espacial para la formulación del riesgo. Las tres dimensiones se conjuntan en la misma cantidad de vértices que comprenden la complejidad para comprender el riesgo ambiental. Sobre lo real podemos señalar la relación material existente entre el objeto y el sujeto, puerta para la entender el mundo de las cuestiones ambientales, respecto a lo simbólico podemos señalar los elementos representativos que tienen una carga subjetiva por ser un referente 299 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 de las proyecciones humanas a lo adverso y negativo; lo imaginario consiste en la formulación de un territorio idealizado por los agentes sociales. El análisis de los riesgos ambientales, alimentarios y de salud en las mudanzas territoriales derivadas de la producción social del espacio se realizará basado en la premisa cartesiana: “Pienso, luego existo”, misma que permitirá analizar los factores reales del riesgo en una zona que está rodeada de una planicie costera y una franja volcánica que cubre en rededor la región de estudio. Cabe señalar que actualmente, son fundamentales los Sistemas de Información Geográfica, mismos que integran software, ideas, personas, innovación y creatividad, pronta para formular preguntas y dar respuesta a las mismas. Se parte del convencimiento que no es la tecnología un garante de los resultados científicos que se deben presentar en este estudio, no obstante en el siglo XXI sería una anacronismo no aprovechar las tecnologías de nuestro tiempo para ligar de manera sincrónica, tiempo, espacio, naturaleza y el hombre en un contexto de riesgo y vulnerabilidad. Los Sistemas de Información Geográfica son un soporte necesario para el análisis de la información científica, en la medida que se dispone de imágenes y una variedad de datos, con la finalidad de modelizar el territorio, entendiendo que ello no es en sí el territorio, pero es un acercamiento que permite su comprensión En términos generales el proyecto se plantea con una base fuerte en los Sistemas de Información Geográfica, contando así con bases de datos, diseño informático e imágenes espaciales. El Sistema generado para la modelización del territorio permitirá la comprensión y análisis y hacer una representación de manera ágil y dinámica para dar cuenta y explicar en gran medida los factores que generan el riesgo ambiental en la región de Atitalaquia y Tula. A sabiendas de que analizaremos riesgos ambientales, es indispensable escudriñar en torno a cómo se concibe la naturaleza en la presente investigación. 300 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Partimos de que cualquier forma de definir la naturaleza es una condición social. La conciencia misma nos permite comprender la representación de la naturaleza, de tal suerte que dicha referencia a la naturaleza es una relación social, por lo tanto una postura política que puede estar dentro de los parámetros de la formulación hegemónica o bien subalterna. Tal hecho es analizado por uno de los padres de la sociología, Weber quien menciona en su texto sobre “Algunas formas primitivas de clasificación” que la forma de ordenar la realidad, primero es una forma de ordenar las relaciones sociales, siendo el parentesco el lazo social más próximo para llevar a cabo tal acción. Entonces, hablar de recursos naturales, zona de reserva ecológica, zona de preservación o conceptos varios, no es una condición dada por la naturaleza, sino por las relaciones sociales que estructuran a partir del vuelco social a la realidad tipificaciones varias para ordenar la realidad (Durkheim, 1984). Asimismo, cabe señalar que fue otro sociólogo el que realizó un planteamiento partiendo de elementos de la realidad para explicar el funcionamiento social, pues se refirió a la estructura social como una estructura orgánica que tiene un funcionamiento propio, independiente a las decisiones individuales, por ello la definición de la realidad, en este caso de la naturaleza ya está estructurada y formulada con una inercia histórica, por lo cual cualquier definición que se pueda concebir como innovadora y transgresora de la estructura, será un eufemismo, pues se configura sobre los pilares de la estructura y no la trasgrede en sus cimientos puesto que la misma se configura desde la propia necesidad del hombre por organizar la realidad y encontrar el orden que garantice su estabilidad. La estructura posee una inercia temporal que modificar las formas de conceptualización social de la naturaleza le llevarán mucho tiempo en mudar y aunque se han postulado posturas subalternas que pretenden mudar la conceptualización de la naturaleza y de las relaciones sociales, la estructura ha mostrado su rigidez y no se ha podido modificar de raíz la manera de concebir 301 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 la naturaleza y de cobrar el daño a los causantes de la afectación del agua, aire y suelo en la continua búsqueda de extraer la máxima ganancia. Es sobre la base del tiempo que podemos obtener una explicación de las condiciones actuales de la naturaleza, la historia de las acciones humanas conlleva una trayectoria que no se puede modificar de la noche a la mañana. No obstante, esta investigación no pretende eliminar toda alternativa de modificación de la percepción acción sobre la naturaleza, sino al contrario, será con un proyecto de los sujetos sociales postulen y vayan sumando aliados para colocar su objetivo como hegemónico en la estructura social. Referências Batalla, B. (1969). Las regiones geográficas en México. México: Siglo XXI. Celis, D. (2012). Arranca Pemex etapa más visible de la Refinería Bicentenario y trae ICA 3 o 4 paquetes más. Excelsior. Durkheim, (1984). Algunas formas primitivas de clasificación. En: Grandes Cientistas Sociales. Espinosa, V. (2009). 933 hectáreas... ¿para qué? Proceso. Flores, N. (2012). Pemex: compras por 1 mil millones de dólares en fin de sexenio. Galarza, R. y., & Vazquez, G. (2009). A cosechar gasolina. Expansión. Harvey, D. (2004). La condición de la posmodernidad. investigación sobre los orígenes del cambio cultural. Buenos Aires: Amorrortu. INEGI. (2010a). Censo de Población y Vivienda 2010. México: INEGI. INEGI. (2010b). Módulo sobre Disponibilidad y Uso de las Tecnologías de la Información y comunicación en los Hogares. Aguascalientes: INEGI. Lefebvre, H. (1991). The Production of Space. Ney York: Blackwell Publishing. Mota, D. (2011). Deja Refinería Bicentenario incertidumbre y frustración. El Universal. Ramírez, J. (2009). Gana Guanajuato batalla por refinería. El Sol de Irapuato. Santos, M. (2000). La naturaleza del espacio: técnica y tiempo. Razón y emoción. Barcelona: Ariel. Soto, O. (2010). El espejismo de la refinería. Expansión. 302 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 A CIDADE DE SÃO PAULO E A CONTEXTUALIZAÇÃO DO MEGAEVENTO COPA DO MUNDO EM ITAQUERA Daniel Bruno Vasconcelos1 Introdução Este trabalho é fruto de uma pesquisa de mestrado em andamento que busca mostrar as transformações no espaço urbano na cidade de São Paulo, e principalmente em região de Itaquera, onde será o palco de abertura da Copa do Mundo de 2014. O trabalho mostra as características e o cenário da cidade no período pré Copa do Mundo, e as transformações que estão acontecendo na esfera do urbano. Neste trabalho são analisadas às temáticas sobre produção e reprodução do espaço urbano, com base teórica nos autores: Carlos (2008), Corrêa (2011), Moreira (2004), Santos (1979), Singer (1968), dentre outros. No trabalho são analisados os acontecimentos para escolha de Itaquera como região onde terá beneficiamentos com infraestruturas públicas, em uma escala pequena do tempo, com vista na Copa do Mundo. Os resultados adquiridos até o momento não são os definitivos da pesquisa em desenvolvimento. A pesquisa tem seu término em julho/2014, até está data muitas ocorrências podem acontecer na região estudada, e o desenvolvimento da pesquisa poderá tomar novos rumos. Objetivos A discussão em linhas gerais busca revelar a influência que o estádio em Itaquera e as obras que estão sendo desenvolvidas para manter o padrão FIFA no local, geram como agentes catalisadores de “um certo tipo de desenvolvimento” para a cidade e em principal a região de Itaquera. 1 Mestrando pelo Programa de Geografia Humana do Departamento de Geografia, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo (USP). Contato: [email protected]. 303 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Será mostrado durante o trabalho o outro lado da moeda, evidenciando como esses agentes são os grandes reprodutores das desigualdades sociais do espaço urbano e que, na mesma medida em que estabelecem uma requalificação de certas partes da cidade, e a inserção de alguns bairros no centro especulativo do mercado imobiliário de São Paulo, também podem configurar no adensamento e na precarização de outras partes da cidade as quais irão necessariamente receber uma parte da população que não se encaixa no novo perfil de consumo, estabelecido pelos próprios agentes. Não é nosso objetivo realizar uma análise direta das finanças ou da gestão das obras, apesar dessas informações serem relevantes para entender o ritmo e o direcionamento das transformações do espaço urbano. Procuramos avaliar mais especificamente os efeitos desse empreendimento na (re)produção do espaço da Zona Leste, salientando as contradições entre os interesses da população local e dos novos investidores. Ao fazê-lo, acreditamos poder estabelecer um estudo de caso que se insere em uma longa tradição da Geografia e, sobretudo, da Geografia desenvolvida na Universidade de São Paulo. A copa do mundo estabelece um conjunto de iniciativas de reforma urbana que alteram formas e fluxos em um curto período de tempo, justificado pelo evento internacional. Em meio à requalificação do bairro, definem-se critérios de adequação que podem servir de modelo para outras intervenções em espaços periféricos. Procedimentos metodológicos e resultados Este trabalho trata da reprodução e produção do espaço urbano na cidade de São Paulo no período pré Copa do Mundo, ou seja, desde outubro de 20072. Percebe-se que há uma grande dinâmica na cidade. Esta dinâmica traz consigo o consumo e a produção do capital, tanto no que se refere ao valor de uso material e espacial, quanto ao valor informacional e/ou virtual. A produção do capital no que tange o valor de uso material e espacial está 2 Fonte da informação no site oficial da FIFA. Brasil confirmado como país-sede em 2014. Disponível em http://pt.fifa.com/worldcup/news/newsid=1170092/. Acessado em 06/06/2013. 304 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 relacionada às transformações físicas do espaço, e, o valor informacional e/ou virtual que se relaciona com a produção do capital se referem às redes de informações globais que dinamizam e reproduzem o espaço – internet, rádio, TV, telegrama, sistemas telefônicos, dentre outros meios de comunicação. O município de São Paulo tem cerca de 11.250.000 habitantes, com uma densidade demográfica (hab./km²) de 7.387,693. Ao averiguar os dados pode-se imaginar a dimensão desse espaço usado por milhões de pessoas, e o consumo (alimentício, informacional, de bens duráveis etc.) que a cidade mobiliza a cada dia que passa. É possível então afirmar que a produção e reprodução deste espaço urbano cotidianamente, por si só, já configura fenômeno notável e dotado de sentidos geográficos importantes. Serão abordados os agentes de produção e reprodução do espaço urbano neste trabalho, em vista de discutir os processos que transformam a cidade de São Paulo. Primeiro será discorrido uma citação de Corrêa (2011), que nos tange sobre os agentes sociais da produção do espaço. Os agentes sociais da produção do espaço estão inseridos na temporalidade e espacialidade de cada formação socioespacial capitalista. Refletem, assim, necessidades e possibilidades sociais, criadas por processos e mecanismos que muitos deles criaram. E são os agentes que materializam os processos sociais na forma de um ambiente construído [...]. Afirma-se que os processos sociais e agentes sociais são inseparáveis, elementos fundamentais da sociedade e de seu movimento.(CORRÊA, 2011: p.43-44) Analisando esta citação, percebe-se que os processos e agentes sociais inseridos no espaço urbano, movimentam e transformam o espaço urbano. Contudo, não são apenas estes processos que produzem e reproduzem o espaço. A reprodução do capital age no espaço de forma exorbitante a se reproduzir, e, os processos e os agentes sociais participam juntos com a reprodução do capital, uma transformação espacial no que tange materialidade e sociabilidade do espaço urbano. 3 Fonte da informação no site do IBGE – Cidades@. Censo 2010 – Cidade de São Paulo. Disponível em http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1. Acessado em 30/10/2012. 305 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Carlos (2008) nos trará uma ideia da teoria de reprodução do espaço urbano, para que possa ter-se-á uma base sobre o processo de reprodução do capital na cidade de São Paulo no período pré Copa do Mundo. De acordo com a autora: A reprodução do espaço urbano recria constantemente as condições gerais a partir das quais se realiza o processo de reprodução do capital. Se um lado aproxima a indústria, as matérias primas (e auxiliares), os meios de circulação (distribuição e troca de mercadorias produzidas), a força de trabalho e o exército industrial de reserva, de outro “aproxima” pessoas consideradas como consumidoras. (CARLOS, 2008: p.83) A reprodução do espaço urbano de São Paulo é desde o final do século XIX e início do século XX, acelerada e movida por interesses privados variados, fato que a qualificou como centro do capital no Brasil (Singer, 1968: p.49). Contudo, a cidade abstraiu neste pouco mais de um século, patrimônios e consolidação de bairros tradicionais com diversas especialidades, cada um com suas espacialidades diversas, com os exemplos da cultura japonesa no bairro da Liberdade, chegando à cultura italiana no bairro da Mooca, entre outros com culturas regionais do Brasil. Ressaltando que esses bairros hoje em dia, perderam um pouco de suas características originais do passado, por conta da produção do capital e da especulação imobiliária em linhas gerais (Moreira, 2004). A discussão sobre a reprodução do espaço geográfico na cidade de São Paulo é muito ampla, pois na esfera do urbano podemos discernir está reprodução em inúmeros segmentos: reprodução de paisagem, reprodução de capital, reprodução da vida, dentre outras. A cidade possui uma escala de reprodução espacial indescritível em uma análise da totalidade, que passa do extremo periférico da cidade até os bairros de mais alto padrão, e, está ligada intrinsicamente a reprodução do capital, dos mais diversos segmentos da economia, advindo do circuito inferior ao circuito superior da economia (Santos,1979). O espaço urbano de São Paulo se produz e reproduz ao mesmo tempo, de forma em que diversas áreas da cidade vão se consolidando e em muitos 306 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 casos tornando-se uma gentrificação (Smith, 2006). Este é o caso da região de Itaquera (região onde se localiza o futuro estádio de abertura da Copa do Mundo – Arena Corinthians), onde casas de baixo padrão infraestrutural estão supervalorizadas e, muitas famílias que moram em casas de aluguel (em principal) estão saindo da região pelos altos valores. A produção do espaço acontece de forma mais intensa nas periferias da cidade, onde encontramos áreas de menor valor econômico e não ocupadas (vazios urbanos). Assim, o tecido urbano se dilui a cada dia, de forma horizontal, nos vazios urbanos do município (Bonduki, 2011). Bonduki sugere “dar um melhor aproveitamento aos espaços urbanizados, de modo a propiciar melhor qualidade tanto para os usos já existentes como as necessidades futuras” (BONDUKI, 2011: p.31). A especulação imobiliária é em suma uma grande chave desse movimento produção e reprodução espacial da cidade. No caso da Zona Leste (ZL) de São Paulo, percebe-se claramente que está havendo uma projeção para especulação do solo urbano nessa região. O sistema de produção e reprodução do espaço urbano atualmente está conectado na especulação financeira do capital. Contudo, esta especulação, usa o solo urbano como espécie de mercadoria promissora, que terá investimentos públicos e privados de diversos setores, para uma melhor qualidade de vida e habitar na região. Assim, os preços se elevam, supervalorizando o solo urbano, e, os investimentos públicos e privados não chegam na mesma velocidade – menor – em que acontece a especulação imobiliária. Fica esclarecido desde já, que não é a Copa do Mundo que faz ou fará uma transformação no espaço urbano de São Paulo. A Copa do Mundo por ser um megaevento de escala midiática mundial, intensifica as transformações no espaço urbano de São Paulo, de forma mais acelerada. Essa intensificação surge a partir do marketing que este evento traz para a cidade, sendo ela uma cidade-região global em um país em desenvolvimento (Scott et alli, 2001). A realização do megaevento internacional Copa do Mundo de 2014, tem um impacto significativo no ritmo interesses de produção do capital na cidade. 307 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 São Paulo sendo a grande potencia econômica das cidades brasileiras, se tange em um novo ciclo de investimentos e melhorias urbanas, justificados por este evento internacional e também para usos e frutos de sua população, que por sua vez é o principal alvo desses investimentos fixos que a cidade reproduz. Visando o histórico que a cidade de São Paulo viveu nesses últimos anos, desde outubro de 2007, quando o Brasil foi eleito oficialmente pela Fédération Internationale de Football Association (FIFA) como sede da Copa do Mundo, notou-se um momento grande de especulação financeira na cidade de São Paulo, por ainda não ter a definição de quais seriam as cidades sedes dos jogos. A partir deste momento, São Paulo começou a viver o período pré Copa do Mundo, na qual a cidade teria que se adaptar a algumas normas da FIFA para poder ser sede dos jogos. A reprodução do espaço urbano começou a se acelerar de forma que o universo de financiamentos e capital de giro se tornou o agente determinante desse processo, e o projeto de infraestrutura urbana que a cidade apresentou para sediar o evento fez com que a cidade tivesse êxito na escolha como uma das cidades sedes. . A definição da sede como catalisadora de atividade especulativa foi ainda mais intensa com a visibilidade pública na mídia da requalificação da área em torno de Itaquera. Em 2008, quando ainda não havia certeza sobre onde seria o palco de abertura dos jogos, a cidade entrou em uma disputa política para definir em que local seria o estádio desse grande evento. Clubes de futebol como Sport Club Corinthians Paulista, São Paulo Futebol Clube e Sociedade Esportiva Palmeiras entraram nessa disputa para sediar o mundial de seleções. Em 31 de agosto de 2010, o Sport Club Corinthians Paulista anunciou a construção de seu estádio4 que, meses mais tarde, seria escolhido pela Prefeitura Municipal de São Paulo como estádio sede da Copa do Mundo 2014 em São Paulo. No dia 13 de julho de 2011, a FIFA anunciou o estádio do Sport Club Corinthians Paulista, como uma das sedes dos jogos 4 Fonte da informação no site da ODEBRECHT. Corinthians e Odebrecht firmam aliança para construir estádio. Disponível em http://www.odebrecht.com/node/14781. Acessado em 24/06/2013. 308 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 internacionais5. No dia 20 de outubro de 2011, a FIFA confirmou que o estádio Arena Corinthians será usado como abertura oficial da Copa do Mundo de 20146. Nesse processo, não apenas houve a confirmação da valorização da área em torno do estádio, como também se estabeleceu um compromisso público-privado de apresentar essa área como o "cartão de visitas" ou a "via de acesso" dos brasileiros diante ao público mundial, e do capital internacional. A partir de 31 de agosto de 2010, a Zona Leste (ZL) – em principal Itaquera – de São Paulo se concretizou como a região onde haverá investimentos públicos e privados intensos em um curto período de tempo. Esses investimentos do setor público estão ligados à mobilidade urbana, educação, centros comerciais e órgãos do setor público. Este projeto visa ao crescimento econômico da ZL, por intermédio de novos serviços e novos equipamentos urbanos que permitem exercer maior poder de atração sobre o capital internacional. Esses investimentos públicos assim que concretizados, trarão para região de Itaquera uma melhoria na qualidade de vida das pessoas que ali residem, nos setores de educação, de transportes e de serviços públicos, que terão um aumento gradativo na região com o passar do tempo. Nas proximidades do futuro estádio existem bairros de classe baixa, favelas e alguns conjuntos habitacionais populares. Isso nos revela o tipo de lugar que temos antes dessa obra se concretizar e desse plano ser aplicado em sua totalidade. A Figura 1 a seguir servirá para mostrar o cenário dessa região. 5 Fonte da informação no site oficial da FIFA. COL aceita as garantias financeiras para Arena de São Paulo. Disponível em http://pt.fifa.com/worldcup/news/newsid=1474434/. Acessado em 24/06/2013. 6 Fonte da informação no site da Copa 2014. São Paulo recebe seleção brasileira na abertura do mundial. Disponível em http://www.copa2014.gov.br/pt-br/noticia/sao-paulo-recebe-selecaobrasileira-na-abertura-do-mundial. Acessado em 05/11/2012. 309 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Figura 1: Bairro de classe baixa e conjuntos habitacionais populares ao lado do Shopping Metrô Itaquera7 Parte do pressuposto que no decorrer dos anos pós Copa do Mundo, a região de Itaquera deixará de ter este cenário de imóveis com características de baixo padrão. A especulação imobiliária traz desde já, uma nova mudança nas características físicas da ZL e de marketing de um novo padrão de relações interpessoais que a região tomará nos próximos anos. Contudo, este processo está em uma escala temporal de curto-médio prazo, neste caso a Copa do Mundo é o agente de aceleração do processo, onde a segregação socioespacial e a gentrificação atuarão neste espaço sem nenhuma modéstia, com vista apenas na reprodução do capital. Considerações Finais Este trabalho por ser fruto de uma pesquisa em desenvolvimento possui apenas conclusões prévias do percurso de transformações que São Paulo e Itaquera estão passando no decorrer desses anos pré Copa do Mundo. Pode-se afirmar que Itaquera hoje é o alvo dos grandes investidores, em principal às construtoras do ramo imobiliário. A requalificação acelerada no 7 Fonte: Foto de Daniel Bruno Vasconcelos, 27/03/2011. 310 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 bairro com vista nos jogos da Copa do Mundo, fez com que o bairro sofresse uma transformação de usos diferentes aos seus já estabelecidos desde sua formação. O uso do investidor e da produção de capital, e não do enraizamento cultural, territorial e de identidade de sua população. A Copa do Mundo a ser realizada na cidade de São Paulo, não apenas servirá para intensificar uma segregação socioespacial e produzir capital através da especulação, mas também como um momento para a sua população pensar no tipo de desenvolvimento que ela quer para o seu país, cidade, bairro. Contudo, os movimentos sociais de resistência devem lutar e agir em função dos seus ideais, que em sua grande maioria pensam em uma melhor qualidade de vida para a população excluída do sistema. Os movimentos de resistência hoje mostram nas ruas sua indignação com a atual conjuntura política do Brasil. A falta de investimentos nos setores públicos primordiais, como saúde, educação, habitação, transporte, segurança, dentre outros, trazem o grito preso na garganta há anos, de uma população socialmente excluída e indignada com o sistema jurídico, político e econômico do Brasil. Os megaeventos estão sendo o estopim das indignações populares com o Governo (neste caso em todas as esferas). Bibliografia BONDUKI, Nabil. O modelo de desenvolvimento urbano de São Paulo precisa ser revertido. Revista Estudos Avançados, volume 25, número 71. São Paulo: IEA, 2011, pp. 23-36. CARLOS, Ana Fani A. . A (re)produção do espaço urbano. 1. ed., 1. reimpr. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2008. COPA 2014. São Paulo recebe seleção brasileira na abertura do mundial. Disponível em http://www.copa2014.gov.br/pt-br/noticia/sao-paulo-recebe-selecaobrasileira-na-abertura-do-mundial. Acessado em 05/11/2012. CORRÊA, Roberto Lobato. “Sobre agentes sociais, escala e produção do espaço: um texto para discussão” in CARLOS; SOUZA e SPOSITO (orgs.). A produção do espaço urbano. São Paulo: Contexto, 2011. FÉDÉRATION INTERNATIONALE DE FOOTBALL ASSOCIATION (FIFA). Brasil confirmado como país-sede em 2014. Disponível em http://pt.fifa.com/worldcup/news/ newsid=1170092/. Acessado em 06/06/2013. 311 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 FÉDÉRATION INTERNATIONALE DE FOOTBALL ASSOCIATION (FIFA). COL aceita as garantias financeiras para Arena de São Paulo. Disponível em http://pt.fifa.com/worldcup/news/newsid=1474434/. Acessado em 24/06/2013. IBGE – CIDADES@. CENSO 2010 – Cidade de São Paulo. Disponível em http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1. Acessado em 30/10/2012. MOREIRA, Clarissa da Costa. A cidade contemporânea entre a tabula rasa e a preservação: cenários para o porto do Rio de Janeiro. São Paulo: Editora UNESP, 2004. ODEBRECHT. Corinthians e Odebrecht firmam aliança para construir estádio. Disponível em http://www.odebrecht.com/node/14781. Acessado em 24/06/2013. SANTOS, Milton. O Espaço dividido. Os dois circuitos da economia urbana nos países subdesenvolvidos. Rio de Janeiro: Livraria Martins Fontes. 1979. SINGER, Paul Israel. Desenvolvimento econômico e evolução urbana: análise da evolução econômica de São Paulo, Blumenau, Porto Alegre, Belo Horizonte e Recife. São Paulo: Editora Nacional e Editora da Universidade de São Paulo, 1968. SMITH, Neil. “A gentrificação generalizada: de uma anomalia local à ‘regeneração’ urbana como estratégia urbana global” in BIDOUZACHARIASEN (cood). De volta à cidade. São Paulo: Annablume, 2006, pp. 59-88. TOURINHO, Andréa de Oliveira. “Centro e centralidade: uma questão recente” in CARLOS, A. F. A. e OLIVEIRA, A. U. de (orgs). Geografias da metrópole, São Paulo: Contexto, 2006, pp. 277-300. 312 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 TABOÃO DA SERRA - SP: UMA NOVA CENTRALIDADE NA REGIÃO SUDOESTE DA METRÓPOLE PAULISTANA1 Isaac Rodrigues dos Santos2 1 - Introdução Taboão da Serra é um município da Região Metropolitana de São Paulo. Assim como a grande maioria dos demais municípios que fazem parte de uma área metropolitana, tem como característica, uma grande dependência da cidade principal. Dentre essas dependências podemos apontar a absorção de mão-de-obra, pois embora a Região Metropolitana disponha de um significativo mercado de trabalho, muitos desses municípios não conseguem absorver a maioria dos trabalhadores em suas indústrias e estabelecimentos comerciais e de serviços, fazendo com que boa parte das pessoas desses municípios trabalhe na capital paulista; o consumo é outro fator importante, - o qual será por nós analisado no caso de Taboão da Serra e as cidades próximas: Embu, Itapecerica da Serra, São Lourenço da Serra e Cotia – pois muitos municípios da área metropolitana não disponibilizam importantes centros comerciais e de lazer, os quais se fazem presentes em abundância na capital, principalmente no que diz respeito aos shoppings centers. Com uma população de 244.528 habitantes (IBGE 2010), e uma área territorial de 20, 387 km², o município de Taboão da Serra faz divisas importantes com Embu das Artes e com São Paulo. Com o crescimento urbano da capital, Tanto Taboão quanto os demais municípios da região Sudoeste foram fortemente influenciados pela expansão metropolitana. Embora Taboão da Serra tenha conhecido no passado uma relativa industrialização, o município sempre teve como uma de suas características, ser uma “cidade dormitório”, pois as indústrias instaladas no município não ofereciam quantidades suficientes de postos de trabalho à população 1 Este artigo é parte da dissertação de mestrado em andamento, desenvolvida sob a orientação da Profa. Dra. Regina Célia Bega dos Santos. 2 Aluno do curso de mestrado em Geografia pelo Instituto de Geociências da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP. Contato: [email protected]. 313 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 economicamente ativa, fazendo com que a maior parte dos trabalhadores fosse exercer suas atividades profissionais na capital paulista. Entretanto esta não é uma particularidade apenas de Taboão, pois muitos municípios metropolitanos, sobretudo os mais periféricos, funcionam como depósito de mão de obra industrial, o que foi um dos fatores para que ocorresse a expansão metropolitana. Abaixo temos o mapa da Região Metropolitana de São Paulo com as suas respectivas sub-regiões. Taboão da Serra está na sub-região Sudoeste da metrópole. Figura 1 - Região Metropolitana de São Paulo3 Entretanto, nas últimas décadas do século XX, Taboão da Serra criou uma forte relação com o município de Embu das Artes através de suas periferias, onde os setores formal e informal se relacionam em uma área periférica em que a expansão urbana conurbou Taboão da Serra com Embu das Artes. E no início do século XXI grandes grupos varejistas se instalam no município. Entretanto o que reafirmou a centralidade do município foi a instalação do Shopping Taboão, pois este tem a potencialidade de atrair consumidores 3 de outros municípios da região Sudoeste da região Fonte: Governo do Estado de São Paulo: Secretaria dos Transportes Metropolitano. 314 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 metropolitana, cujos consumidores geralmente freqüentavam os shopping centers da capital paulista. 2 - Objetivos Nosso objetivo é entender a metrópole de São Paulo enquanto um espaço em que o capital se reproduz de muitas maneiras, incluindo a criação de diversas centralidades. Nesse sentido, o município de Taboão da Serra, nos últimos anos, vem ganhando um destaque importante na economia metropolitana, fazendo com que na atualidade seja um município que tem uma função de centralidade na região Sudoeste da Região Metropolitana de São Paulo. 3 - Procedimentos metodológicos Como procedimentos metodológicos fizemos trabalho de campo nos municípios de Taboão da Serra, Embu das Artes, Itapecerica da Serra, São Lourenço e Juquitiba, observando e colhendo dados econômicos e populacionais; fizemos diversas visitas ao Shopping Taboão, além da periferia de Taboão da Serra; fizemos leituras bibliográficas e coleta de dados metropolitanos nos sites das instituições: EMPLASA, FUNDAÇÃO SEADE, IBGE, entre outras instituições. 4 - Resultados A construção desse empreendimento é a reprodução do espaço urbano pelo capital com o objetivo de aumentar seus lucros, tendo o shopping center como um de seus fetiches. E em busca de mercadorias, lazer e entretenimento, as pessoas de diversos lugares vão ao shopping center, que é um dos maiores signos de nossa modernidade. O município de Taboão da Serra foi escolhido para a implantação de um shopping porque oferecia condições para atrair consumidores de outros municípios, a partir de infraestruturas como a Rodovia Régis Bittencourt e o Rodoanel, além da possibilidade de crescimento vertical em torno do shopping. 315 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Silvana M. Pintaudi (1987) nos explica como é o processo de escolha dos lugares para a instalação desse equipamento urbano: Basicamente, no Brasil, encontramos dois tipos de locais onde se instalam os shopping-centers, a saber, na área já urbanizada, mas que oferece ainda espaços livres e de tamanho suficiente grande para comportar esse equipamento comercial, ou em áreas muito próximas à cidade e da (s) rodovia (s) que ligam a outros centros urbanos. (PINTAUDI, 1987, p. 32). Com isso, no município de Taboão da Serra, a instalação desse importante equipamento urbano redefiniu a dinâmica comercial interurbana criando uma nova centralidade. No entorno do shopping há diversos empreendimentos imobiliários como construção de edifícios e condomínio para a classe média e média alta. É o processo de valorização do espaço urbano em torno do shopping. Abaixo temos uma vista da Rodovia Régis Bittencourt (BR 116), na altura do shopping Center, que possui potencialidade na interligação dos municípios próximos à Taboão da Serra, sobretudo os da sub-região Sudoeste e a capital paulista. Figura 2 - Rodovia Régis Bittencourt (BR 116)4 4 Fonte: Taboão em Foco. Disponível em www.taboaoemfoco.com.br. 316 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Sendo assim, os grandes empreendimentos comerciais, no caso em questão, o shopping center, alem de atrair consumidores de outros municípios, tem a capacidade de atrair os empreendimentos imobiliários ao seu redor valorizando o espaço urbano. Nesse sentido, o ato de criar shopping center revela o objetivo do capital de se reproduzir. Com a presença de um grande mercado consumidor, essa região a qual foi centralizada pelo shopping (que compreende além de Taboão da Serra, os municípios de Embu, Itapecerica da Serra, Cotia e Juquitiba, além de parte do município de São Paulo) oferece muitas vantagens para os investidores do shopping. Além de venderem mercadorias, valorizaram o espaço urbano do entorno do shopping. E a presença do Estado, em parceria com os investidores do shopping, foi importante, pois houve a implantação de infraestruturas para que as pessoas se locomovam com facilidade ao shopping center. Algumas dessas infraestruturas são: a construção de uma ponte para pedestres, a qual termina no portão do shopping; pontos de ônibus localizados nos dois lados do shopping. Com isso há linhas de ônibus que tem acesso de praticamente todos os bairros do município de Taboão da Serra com o Shopping Taboão. Os municípios de Embu, Itapecerica da Serra, São Lourenço da Serra e Juquitiba (que fazem parte da sub-região Sudoeste, assim como Taboão) são interligados com Taboão da Serra pela Rodovia Régis Bittencourt. No caso de Cotia, a ligação com essa rodovia se dá pelo Rodoanel, outro importante equipamento de infraestrutura urbana. O Rodoanel foi outro fator que potencializou a instalação do shopping center em questão nesse setor da área metropolitana. Sendo um dos principais signos de nossa modernidade, o shopping center retrata o atual estágio de valorização da mercadoria, inclusive do próprio espaço. O lucro obtido com essa mercadoria é o principal objetivo numa sociedade capitalista em que o dinheiro passa a ser o mediador das relações entre as pessoas. E o ato de criar shopping centers significa aumentar os lucros tanto dos investidores e dos lojistas, quanto dos empreendedores imobiliários. 317 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 “O shopping representa pois a penetração do capital imobiliário na esfera do capital mercantil e a sujeição do comércio varejista e dos serviços ao capital imobiliário e – através deste – ao financeiro” (VILLAÇA, 2001. p. 304). Algumas informações a respeito do Shopping Taboão que dão a dimensão desse empreendimento: Consumidores: 1.500.000 mensais; Veículos mensais: 300.000 Área Bruta Locável (ABL): 46.915.24 m² Estacionamento: 2.160 vagas; Lojas e quiosques: 205 Salas de cinema: 5, totalizando 1.500 lugares; Praça de alimentação: 1.000 lugares. Embora exista no município este importante shopping center, o qual desempenha essa importante centralidade, é na periferia do município que existe uma maior dinâmica comercial tanto para o setor formal e informal da economia urbana, embora essa parte do município não desempenha uma significativa centralidade. Durante o século XX a população mais pobre do município se concentrou em muitos bairros sem infraestrutura urbana e desprovidos de transportes públicos eficientes. Nessa área do município é onde localizavam as moradias dos operários industriais. A maior parte da população do município se concentra nessa área, que compreende muitos bairros. Destacaremos apenas alguns pela sua importância para o comércio do município, que são: Jardim Santo Onofre, Jardim Santa Cruz, Jardim São Salvador, Jardim Mituzi e Jardim Roberto. Todos estes bairros são chamados pelos munícipes genericamente de “Pirajuçara”, pois esta parte do município se desenvolveu nas bordas do rio Pirajuçara, um dos principais afluentes do rio Pinheiros, em São Paulo. No decorrer do século XX, o Pirajuçara era uma área do município com a predominância do comércio informal, pois a existência do comércio ambulante era significativa, além de estabelecimentos comerciais sem licença 318 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 para o funcionamento. Nas décadas finais do século XX muitas lojas se concentraram neste bairro, potencializado pela presença de um grande mercado consumidor. No início do século XXI grandes grupos varejistas se instalam nesta área, tais como: Casas Bahia, Ponto Frio, Lojas Marabrás, O Boticário, Supermercado Compre Bem, pertencente ao Grupo Pão de Açúcar e atualmente com bandeira Supermercado Extra. Para a construção deste supermercado houve desapropriações de algumas residências e do comércio informal dessa área. Abaixo temos a imagem da Avenida Kizaemon Takeuti, na periferia do município de Taboão da Serra, onde os comércios formal e informal se relacionam. Esta avenida faz contiguidade com a Avenida Rotary, a qual pertence ou município de Embu das Artes. Esta área comercial está no interior de uma imensa mancha urbana que se estende por dois municípios metropolitanos e ao mesmo tempo formando uma importante centralidade no interior da metrópole. Figura 3 – Vista parcial da Avenida Kizaemon Takeuti5 5 Fonte: Taboão em Foco. Disponível em www.taboaoemfoco.com.br. 319 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Atualmente nessa área existem quatro agências bancárias, que são: Bradesco, Itaú, Santander e o Banco da Caixa, e ainda há uma forte tendência de aumentar esse número. Outro fator importante que está ocorrendo nesses bairros é o aumento nos preços dos aluguéis tanto residenciais quanto comerciais, pois esses bairros têm a capacidade de oferecer muitos serviços de que a população necessita; além disso, nesses bairros gradativamente está ocorrendo, embora ainda incipiente, um processo de verticalização, com a construção de edifícios destinados para a classe média. Nestes bairros acima mencionados há uma grande concentração de lojas e serviços diversos, sobretudo na Avenida Kizaemon Takeuti, que faz contigüidade com a Avenida Rotary, a qual pertence ao município de Embu. Nesta parte do município o nível de conurbação com o município de Embu das Artes é intenso, pois existe uma intensa contigüidade espacial manifestada pela forte presença de moradias, comércios e linhas de ônibus para muitos lugares dos dois municípios. Nessa região, tanto para o município de Taboão da Serra quanto para Embu das Artes, há uma grande concentração populacional que outrora excluídas e desprovidas de infraestruturas urbanas, hoje vivem em uma centralidade intraurbana importante com uma migração pendular para os dois lados como se saíssem de um bairro para outro. Mas, o papel relevante no que diz respeito à centralidade, atraindo consumidores de outros municípios, é uma função desempenhada pelo Shopping Taboão. Nesse sentido, percebemos como o espaço urbano vai se modificando através do tempo tendo a sociedade como a autora desse processo. E o movimento constante de produção e reprodução do espaço urbano, é pura e simplesmente a própria reprodução do capital. Sendo assim, a criação desse centro comercial modificou de forma importante o espaço urbano no município de Taboão da Serra com significativas implicações nos municípios próximos, pois os consumidores desses municípios passaram a ter nesse shopping em questão, o maior centro de compras da região Sudoeste da Região Metropolitana de São Paulo. 320 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 5 - Considerações finais A dinâmica da centralidade urbana na metrópole contemporânea obedece a um processo de movimento perpétuo, pois como há a escassez de espaço para a reprodução do capital, este migra para outras áreas procurando espaços que oferecem potencialidades para sua reprodução. Nesse contexto, novas centralidades são criadas e recriadas num processo constante de produção, destruição, e reprodução do espaço, concomitantemente e paralelamente, reproduzindo o capital investido naquele lugar. Nesse sentido, a problemática abordada nesse artigo procurou discutir como o capital se apropria do espaço urbano para a sua reprodução, no caso em questão, no município de Taboão da Serra. Tal fato fez com que a valorização do espaço urbano em diversas partes do município se tornasse ainda mais valorizadas por conta dos diversos investimentos anteriormente discutidos. Nesse sentido percebemos como o capital com o aparato do Estado tem um poder tanto regulatório quanto político e econômico para a apropriação do espaço urbano metropolitano. Assim o processo de produção e reprodução do capital no espaço urbano obedece a um processo repetitivo e infinito para o acúmulo de capital em uma sociedade em que as pessoas muitas vezes não têm tempo para refletir. Nesse sentido, o Shopping Taboão tem uma importância significativa tanto para o acúmulo de capital, quanto para a valorização do espaço urbano na sub-região Sudoeste da Região Metropolitana de São Paulo. 6 - Referências CARLOS, Ana Fani A. A Cidade. São Paulo: Contexto, 2008. CARLOS. Ana. F. A. Espaço-Tempo na Metrópole: a fragmentação da vida cotidiana. São Paulo: Contexto, 2001. CARLOS, Ana. F. A. Espaço e Indústria, 9.ed. São Paulo: Contexto, 2001. CARLOS, Ana. F. A. O Lugar No/Do Mundo. São Paulo: Hucitec, 1996. CHESNAIS, FRANÇOIS. A Mundialização do Capital. São Paulo: Xamã, 1996. DEAN, Warren. A Industrialização de São Paulo (1880-1945). São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1971. 321 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 GOTTDIENER, Mark. A Produção Social do Espaço Urbano. São Paulo: Edusp, 2010. HARVEY, David. O Enigma do Capital e as Crises do Capitalismo. São Paulo: Boitempo, 2011. LEFEBVRE, Henri. O Direito à Cidade. São Paulo: Centauro, 2008, 5 ed. PINTAUDI, Silvana. M. Mudanças nas Formas de Comércio Varejista e a Implantação dos Supermercados na Grande São Paulo – S.P – Brasil. Boletim Paulista de geografia. AGB. N. 66. São Paulo, 1998. PINTAUDI, Silvana. M. O Templo da Mercadoria: estudo sobre os Shoppings Centers do Estado de São Paulo. Tese de doutorado apresentada junto ao Departamento de Geografia, na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo no ano de 1989. (mímeo). PINTAUDI, Silvana. M. Os Shopping Centers Brasileiros e o Processo de Valorização do Espaço Urbano. Boletim Paulista de Geografia. AGB. N.65. São Paulo, 1987. pp – 29 - 48. PINTAUDI, Silvana. M. Os Supermercados na Grande São Paulo. Tese de mestrado apresentada ao Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo no ano de 1981. (mímeo). PINTAUDI, Silvana. M; FRÚGOLI, Heitor. JR. (Orgs). Shopping Center: Espaço, Cultura e Modernidade nas Cidades Brasileiras. Editora Unesp. São Paulo: 1992. SANTOS, Milton. O Espaço Dividido: os dois circuitos da economia urbana dos países subdesenvolvidos. São Paulo: Edusp, 2008. 3 ed. SANTOS, Milton. Pobreza Urbana. São Paulo: Edusp, 2009, 3 ed. SANTOS, Regina C. Bega. As Cidades e a Urbanização na Contemporaneidade. Crise nas Cidades ou Crise das Cidades?. São Paulo: Revista Terra Livre. Ano 26, V1, n. 34. Jan-Jun/2010, pp. 69-78. SPOSITO, Maria. Encarnação. B. O Centro e as Formas de Expressão da Centralidade Urbana. In: Revista de Geografia. São Paulo: Unesp, 1991, v 10, p 1-18 VILLAÇA, Flávio. O Espaço Intra-Urbano no Brasil. São Paulo: Studio Nobel, 2001. 322 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 A COMUNIDADE CAIÇARA DA PRAIA DO SONO E O TURISMO Sergio Elias Caperuci1 Luciene Cristina Risso2 Introdução A comunidade estudada é a comunidade caiçara da praia do Sono, localizada na área de abrangência do município de Paraty – RJ. Atualmente possui cerca de 300 moradores, a denominação caiçara ocorre em virtude de suas características culturais e sua localização geográfica (litoral brasileiro). O aumento exponencial da atividade turística gerou muitas transformações no cotidiano dessa comunidade, que ainda se adaptam à nova realidade. Desta forma, o objetivo principal é entender a percepção dos moradores da comunidade em questão em relação ao turismo. Metodologia A pesquisa englobou revisões bibliográficas, trabalhos de campo para observações e coleta informações para obtenção de dados primários. Foram aplicados quinze (15) questionários com os moradores nativos mais antigos e lideranças da praia do Sono. Desenvolvimento do turismo em comunidades caiçaras, o caso da Praia do Sono –RJ Sobre turismo, Cruz (2003) aponta que segundo a OMT (Organização Mundial do Turismo) é uma modalidade de deslocamento espacial, que envolve a utilização de algum meio de transporte e ao menos uma pernoite no destino; esse deslocamento pode ser motivado pelas mais diversas razões como lazer, negócios, congressos, saúde e outros motivos, desde que não correspondam a formas de remuneração direta. 1 2 Geógrafo. E-mail. Profa.Dra.UNESP, Ourinhos. E-mail: [email protected] 323 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Sabe-se que a definição de turismo caracteriza-se de forma muito abrangente, pois dentro dessa prática existem muitas subdivisões, ou seja, existem inúmeros tipos de turismo variando de acordo com os lugares de destino, as pessoas que o realizam e as atividades que são desenvolvidas durante esse período. Obviamente para cada modalidade diferente ocorrem perfis diferentes de pessoas, com intenções de lazer diferentes e que desenvolvem atividades diferentes no período de férias ou passeio. O tipo de turismo que se desenvolve na área de estudo é o que o mercado batizou de “ecoturismo”, ou “turismo de aventura”. Segundo Cruz (2003) turismo alternativo (turismo de natureza, ecológico, ou ecoturismo) tem nos espaços naturais seu principal objetivo ou objeto de consumo. Ao contrário do turismo de massa, este requer uma gama restrita ou reduzida de infraestrutura e serviços, embora, muitas vezes, não dispensem a sofisticação de ambos. Até meados dos anos 1970 a região do sul do Rio de Janeiro, passava por um longo período de estagnação econômica, em virtude da ausência de um acesso que ligasse os grandes centros econômicos a essa localidade. Tal fato chegou a contribuir para uma baixa na densidade demográfica desse município, pois os moradores buscavam aspirações laborais em áreas que estavam em períodos mais prósperos. A partir do fim da década de 1970 e começo de 1980, com o segundo trecho da rodovia Rio – Santos concluída, ligando o litoral norte de São Paulo ao município de Paraty e Angra dos Reis, propiciou-se uma nova fase na história da comunidade. A estrada permitiu o desenvolvimento de um grande fluxo de pessoas a essa área, levando trabalho e movimentando novamente a economia. Houve um crescente interesse de grandes corporações nacionais e internacionais que trabalham com turismo pelo potencial dessa área, no que diz respeito aos recursos paisagísticos. Esse conjunto de fatores fez com que nas décadas posteriores houvesse uma verdadeira invasão de pessoas interessadas em ganhar a vida nessa região a qual se adaptou a receber visitantes e demonstrou uma grande 324 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 capacidade de se desenvolver em virtude dos recursos trazidos pelo turismo. (PLANO DIRETOR DE DESENVOLVIMENTO TURÍSTICO DE PARATY, 2003). O aumento substancial nessa atividade turística está gerando profundas transformações nas localidades de destino. A partir do aumento da demanda ocorre a necessidade de ampliação e melhorias na infraestrutura local, visando atender os interesses das pessoas de fora que visitam as comunidades, para que dessa forma possam se alocar com comodidade e usufruir dos recursos oferecidos pelo local. Essas melhorias nem sempre são possíveis, devido geralmente à falta de recursos dos moradores das comunidades de destinos do ecoturismo, aliado muitas vezes ao descaso do poder público. Como esses moradores muitas vezes não possuem condições financeiras para realizar as “adaptações necessárias”, as transformações se dão pela iniciativa privada, por agentes externos, empresas já consolidadas em outras localidades, e que apresentam vantagem discrepante sobre os “empreendedores locais”. Na comunidade do Sono os moradores apontam que os primeiros turistas chegaram a partir dos anos 1990. Os pioneiros aventuravam-se pelas trilhas em meio à mata nativa. Em um processo que aos poucos foi ganhando popularidade. Durante longos períodos a comunidade não sabia como lidar direito com o turismo, e nem com os turistas, devido a falta de fiscalização, regulamentação e até conhecimento sobre o assunto. Muitas pessoas de fora se aproveitavam dos moradores, acampando em áreas proibidas, na praia, fazendo fogueiras e retirando recursos indevidos das matas e das trilhas. Vale ressaltar que, nesse contexto, a criação da área de proteção ambiental- APA federal (1982) denominada Cairuçú, depois sobreposta com a reserva estadual da Juatinga (1992), desenvolveu um importante papel no auxílio à conservação ambiental. Mesmo com imposições, falta de diálogo e em muitos conflitos, a comunidade que vivencia esse fluxo de pessoas que cresce 325 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 a cada dia observa uma preocupação com a conservação da reserva vinda da administração da Unidade. Durante pouco mais de 20 anos vivenciando o aumento do número de turistas a passarem por essa localidade, os moradores cada vez mais vão se aprimorando no sentido de buscar formas de se otimizar os recursos captados e minimizar os impactos gerados pelo fluxo de pessoas. Resultados Aproximadamente 60% dos entrevistados concordaram que o turismo atualmente já tem uma relevância econômica muito grande dentro da comunidade, principalmente para aqueles que têm algum vínculo com estabelecimentos como bares, restaurantes e pousadas, mas segundo os próprios moradores, vive-se do turismo principalmente nas altas temporadas. Essa sazonalidade do turismo foi observada nos campos. Na baixa temporada muitos caiçaras com a ausência de uma fonte de renda mais sólida acabam por buscar outras atividades na cidade, causando uma evasão significativa. No Sono, por exemplo, muitas casas ficam fechadas durante grande parte do ano, e nas altas temporadas se transformam em pousadas. Quando questionados sobre os impactos que o turismo dentro da comunidade, tem-se uma evidência de que aproximadamente 64% dos moradores concordam que o aumento do turismo interfere no modo de vida dos moradores e nas suas atividades mais comuns. Na mesma linha, 40% dos entrevistados têm plena convicção de que o aumento do turismo nos últimos anos já ocasionou um substancial aumento no consumo de drogas e alguns furtos, tendo como justificativa para esses fatos a ausência de qualquer policiamento e fiscalização dentro da comunidade. Entre os resultados mais polêmicos, tem-se o surpreendente número de 44% dos moradores que apontam o turismo desregulado como possível gerador de violência e impactos sociais e ambientais irreversíveis, devido majoritariamente à conduta desagradável de muitos visitantes. 326 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Considerações Finais Com base nos resultados diagnosticados, salienta-se que desenvolvimento turístico não é sinônimo de desenvolvimento. De acordo com Silva (2003), o desenvolvimento deve ser visto no seu sentido amplo. Para se conseguir tal meta se deve engajar a comunidade como um todo, discutindo os problemas e buscando soluções viáveis que contemplem os interesses econômicos sem deixar de lado os interesses sociais e ambientais. Referências ADAMS, Cristina. As populações caiçaras e o mito do bom selvagem: a necessidade de uma nova abordagem interdisciplinar. São Paulo: Revista Antropologia, vol.43 n.1, 2000. ALMEIDA, Maria Geralda. Desenvolvimento do turismo ou desenvolvimento local? Algumas reflexões. In: ENTBL, 2004, Curitiba. Anais... Curitiba: ENTB, 2004. BALLABIO, Sati Albuquerque. 2011. Viagem ao Sono: relações de tradicionalidade e consumo na Praia do Sono – Paraty/RJ. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais). Universidade Estadual Paulista, Marília – SP, 2011. CANDIDO, Antonio. Os parceiros do Rio Bonito. 5 ed. São Paulo: Livraria duas cidades Ltda, 1979. CLAVAL, Paul. A geografia cultural. 3º ed. Florianópolis: UFSC, 2007. CRUZ, Rita D. Cassia. Introdução a geografia do turismo – 2º ed. São Paulo: Roca, 2003. CRUZ, R. A. Turismo e o mito do desenvolvimento. Espaço e geografia. Vol.3, jan-jun. 2000, pp. 21-31. FIRTH, Raymond. Elementos da organização social. 4.ed. Rio de Janeiro, Zahar, 1974. FRANÇA, A. A Ilha de São Sebastião: estudo de Geografia Humana, São Paulo, FFCL - USP, 1954 (Boletim 178). MALINAWSKI, Bronislaw. Uma teoria científica da cultura. 2.ed. Rio de Janeiro, Zahar editores, 1970. MARCÍLIO, M. L. Caiçara: terra e população. Estudo de demografia histórica e da história social de Ubatuba, São Paulo: Edições Paulinas/CEDHAL, 1986. MUSSOLINI, Gioconda. Ensaios de uma antropologia indígena e caiçara. Rio de Janeiro: Paz e Terra, v.38, 1980. 327 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 NOFFS, Paulo da Silva. 1983. Os Caiçaras do Toque Toque Pequeno: um estudo de mudança espacial. Dissertação (Mestrado em Geografia Humana). Faculdade de Filosofia Ciência e Letras da Universidade de São Paulo, São Paulo, 1983. PLANO DIRETOR DO DESENVOLVIMENTO TURÍSTICO DO MUNICÍPIO DE PARATY, vol. I. Paraty, 2003 RISSO, Luciene Cristina. 1998. Cultura caiçara: Chave para a conservação ambiental – Um estudo em Picinguaba – Ubatuba – SP. Trabalho de conclusão de curso (Graduação em Geografia). Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 1998. ______Mapeamento de áreas suscetíveis à prática agroecológica no núcleo Picinguaba, Parque estadual da Serra do Mar, Ubatuba – SP. GEOGRAFIA, Rio Claro, vol. 30, n° 1, pag. 141 – 158, de jan/abr. 2005. SETTI, Kilza. Ubatuba nos cantos das praias: estudo do caiçara paulista e sua produção musical. São Paulo: Ática, 1985. SILVA, S. B. M. O turismo como instrumento de desenvolvimento e redução da pobreza: uma perspectiva territorial. In: CORIOLANO, L. N. M. T. LIMA, L. C. (orgs) Turismo comunitário e responsabilidade sócio-ambiental. Fortaleza: FUNECE, 2003, p.100-109. SOUZA, Milena Ramirez; BARRELA, Walter. Conhecimento popular sobre peixes numa comunidade caiçara da estação ecológica da Juréia – Itatins- SP. Boletim do Instituto de Pesca, São Paulo, 27 (2), p.123-130, 2001. Agradecimentos Agradecemos a comunidade da praia do Sono (RJ) pela confiança e oportunidade de pesquisa. 328 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 TRANSFORMAÇÕES SOCIOESPACIAIS NO DISTRITO DE GARDÊNIA, MUNICÍPIO DE RANCHARIA – SP: UMA PROPOSTA DE CONSCIENTIZAÇÃO TURÍSTICA Sueli Aparecida de Souza 1 Rosângela C. Cortez Tomaz2 Introdução O processo de reestruturação produtiva implicou em transformações socioespaciais nas mais diversas escalas geográficas. A política de modernização da agricultura notadamente, estabelecida pelo Governo a partir de 1950, simultânea aos processos de industrialização e urbanização contribuíram sobremedida com as alterações nas relações produtivas e trabalhistas no campo (HESPANHOL A. N. HESPANHOL R. A. M., 2006). Objetivos Desta forma, o presente estudo tem como objetivo elucidar de maneira sucinta as mudanças e implicações socioespaciais desse processo no Distrito de Gardênia (figura 1), Município de Rancharia – SP e, sobretudo no que tange ao uso e apropriação do espaço para o turismo (pesqueiros, ranchos e condomínios de segundas residências, etc.). Resultados Esse trabalho compõe uma pesquisa a priori3 o qual a princípio foi realizado uma pesquisa bibliográfica acerca do tema de pequenas cidades, 1 Mestranda do Programa de Pós-graduação em Geografia da UNESP/ Campus de Presidente Prudente-SP. [email protected] 2 Orientadora e professora assistente doutora do Curso de Turismo da UNESP – Campus Rosana/ SP e do Programa de Pós – Graduação em Geografia da FCT/UNESP, Pós - Doutora em Turismo pela Universidade de Santiago de Compostela - ES e Coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisa em Turismo no Espaço Rural – GEPTER: E-mail: [email protected] 3 Refere-se à pesquisa de conclusão de curso: TRANSFORMAÇÕES SOCIOESPACIAIS NO DISTRITO DE GARDÊNIA, MUNICÍPIO DE RANCHARIA – SP. 2012. 116 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Geografia) – FCT/UNESP, Presidente Prudente. 2012. (não publicado) sob a orientação do profº Drº Everaldo Santos Melazzo. 329 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 relações cidade/campo, a análise de registros fotográficos, fontes orais, além de dados secundários coletados em órgãos governamentais (prefeitura, IBGE, etc). A escolha do Distrito como recorte de pesquisa deveu-se por inquietações pessoais acerca dos empreendimentos turísticos, e pelo conhecimento de algumas de suas características. Município de Rancharia e Distritos, localização. Fonte: Prefeitura Municipal, 2011. (Org. SOUZA, 2011). Souza (2012) verificou que no Distrito de Gardênia, assim como em todo o país, essa política governamental, que com o intuito de aumentar a produção agrícola induziu a implementação de insumos modernos, máquinas e equipamentos agrícolas, implicou em mudanças e fragilidades nas dimensões sociais, econômicas e espaciais. Portanto, considerando o recorte temporal de 1950, ocorreu com a decadência da agricultura tradicional uma progressiva perda populacional (tabela 1) em decorrência do desemprego no campo, e um quadro de letargia econômica em relação a outros períodos. 330 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Tabela 1: Município de Rancharia e Distritos de Agissê e Gardênia, dados populacionais. Fonte :IBGE, censos demográficos, 1970, 1980, 1991 e 2010) Conforme constatado por Souza (2012) a modernização da agricultura, acompanhada da instabilidade dos custos dos insumos, ausência de uma política de preços mínimos, o descaso do Governo, aliado aos gradativos endividamentos contribuíram para que grande parte dos agricultores que não tiveram condições de se adequar e acompanhar as exigências do novo padrão de produção abandonassem as atividades agrícolas. Outro fato observado foi que simultâneo a esse cenário de crises e transformações na agricultura surge a o Programa Nacional do Álcool (PROÁLCOOL4) nos fins da década de 1980, contribuindo por aumentar consideravelmente o número de arrendamentos de terras (47,4%) por parte de ex-agricultores e agravar o desemprego local (SILVA, 1998 apud SOUZA, 2012). Assim, foi observado que visando reverter o quadro de fragilidade socioeconômico no Distrito de Gardênia, houve então, a partir de 1997 as primeiras iniciativas que consistiam em formular projetos de aproveitamento turístico visando o desenvolvimento local, com ênfase tanto no Balneário Municipal como na Represa Capivara, no Distrito. A partir de 1990, esses projetos foram se aprimorando sob a orientação e mediação do Serviço 4 Esse programa criado pelo Governo Federal tinha como objetivo estimular a produção do álcool, visando o atendimento das necessidades do mercado interno e externo e da política de combustíveis automotivos, além de incentivar a substituição em larga escala dos derivados de petróleo. Disponível em: http://www.biodieselbr.com/proalcool/pro alcool/programa-etanol.htm.Acesso em 14/10/2012 331 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), inclusive inserindo o Município de Rancharia no projeto Circuito Turístico Oeste Rios5. No entanto, mesmo com os aprimoramentos, a criação de uma Secretaria do Turismo, Esporte e Cultura (SECTEL) em 2005, não garantiu que houvesse um efetivo gerenciamento por parte dos agentes públicos responsáveis. Nesse âmbito, Braun (2011, p.54) em seus estudos corrobora apontando que, a expansão de áreas de condomínios, chácaras e lotes no Distrito de Gardênia, está ocorrendo de maneira desorganizada, sem o planejamento que a atividade exige.Os engenheiros e técnicos responsáveis do poder público precisam atuar de maneira mais incisiva na fiscalização a ocupação urbana e rural que vem acontecendo no local.Aspectos como tamanho das edificações, a destinação do lixo e esgotos devem ser considerados. A inserção do Município no projeto Oeste Rios é positiva, porém não deve ser a única alternativa. È necessário buscar outras parcerias, especialmente para oferecer cursos técnicos visando à formação de mão de obra especializada [...]. Além dessas adversidades destacadas por Braun (2011), e Souza (2012) verificou que, há também diferenciação socioespacial, especulação imobiliária e a não inserção da população local na atividade turística, que são contrários à proposta inicial de desenvolvimento local. Ainda no tocante a maneira como está ocorrendo o turismo no Distrito, as autoras, consideram a necessidade e a relevância da sensibilização da população receptora (local) através da parceria entre a Secretaria do Turismo com a Secretaria da Educação como possibilidade de amenizar os impactos negativos e garantir um turismo com melhor qualidade e desenvolvimento socioespacial. Considerações finais Diante do explicitado, podemos ratificar que as transformações que ocorrem no espaço vêm atestar a instabilidade dos ciclos econômicos que 5 Projeto vinculado às políticas Federais de turismo e sob a mediação do SEBRAE passa atender territórios agrupados pelo Rio Paraná e pelo Rio Paranapanema. Seu objetivo principal “é desenvolver e fortalecer a região através do setor de turismo de forma sustentável, buscando o desenvolvimento regional [...] transformando e consolidando a região como polo turístico” SEBRAE. Serviço Brasileiro de Apoio a Micro e Pequenas Empresas. Circuito Turístico Oeste Rios. 2010. 332 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 ocorrem em todas as escalas geográficas a cada momento histórico. Dessa forma, essa dinâmica veio demonstrar que até mesmo “os pacatos Núcleos Urbanos” com relações urbanas simples, como o Distrito em questão, não estão ilesos a esse processo. Assim, conforme constatado as implicações das transformações socioespaciais no Distrito de Gardênia, em específico pelo uso e a apropriação do espaço pelo turismo nas práticas espaciais da população local tem-se revelado contrários a proposta inicial de inserção da população e desenvolvimento local. Portanto, esse fato instigou-nos a desenvolver uma pesquisa no âmbito da educação6 numa abordagem geográfica visando a sensibilização e a percepção dessa atividade com os alunos do 9º ano do ensino fundamental da Escola Municipal do Distrito. Consideramos que o ensino da geografia numa perspectiva interdisciplinar, contempla os requisitos básicos para a compreensão dos fenômenos que ocorrem no espaço, além de ser uma possibilidade de conscientização da relevância da participação ativa dos sujeitos em questão nos projetos de implementação turística, seu monitoramento e sua gestão a fim de garantir um turismo com menos impacto. Referências BRAUN, Edulina Rubira Fernandes. Turismo como alternativa de renda no Município de Rancharia. 2011. 75 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Geografia) – FCT/UNESP, Presidente Prudente, 2011. HESPANHOL, A. N.; HESPANHOL, R. A. M. Dinâmicas do espaço rural e novas perspectivas da análise das relações Campo- Cidade no Brasil. Terra Livre, 2006. SOUZA, Sueli Ap. de. Transformações socioespaciais no Distrito de Gardênia, Município de Rancharia/SP. 2012. 116 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em geografia) – FCT/ UNESP, Presidente Prudente, 2012. SEBRAE. Serviço Brasileiro de Apoio a Micro e Pequenas Empresas. Circuito Turístico Oeste Rios. SEBRAE, SP, 2010. 6 Projeto de Pesquisa intitulado: “A percepção do lugar no ensino de geografia: uma proposta de contribuição para a sensibilização turística no Distrito de Gardênia, Município de Rancharia/SP.” (no prelo). 333 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 A ESTRUTURA DA GOVERNANÇA DO PARQUE TECNOLÓGICO “ALEXANDRE BELDI NETTO”: O CASO DO MUNICÍPIO DE SOROCABA Ivana Iyulka Hori1 Lucas Labigalini Fuini2 1 - Introdução, objetivos e metodologia Há uma distância de aproximadamente 90 km da capital, São Paulo, Sorocaba é um importante município paulista com uma população de mais de 580.000 habitantes (IBGE, 2010), sendo que sua área urbana se destaca pela concentração industrial e de serviços, o que lhe garante uma posição importante na rede urbana paulista e na regionalização estadual, já que se constitui em um importante polo econômico e comanda uma região de governo. Considerando a densidade econômica sorocabana, a cidade recebe, partir do ano de 2012, o Parque Tecnológico “Alexandre Beldi Netto” – PTS instalado numa área de 1,2 milhões de m², localizada na Avenida Itavuvu com acesso a Rodovia Castelo Branco. A implantação do PTS considerou a localização geográfica privilegiada da cidade, que se encontra próxima ao aeroporto internacional de Cumbica e Viracopos, do porto de Santos e do terminal intermodal hidroviário de Conchas. Já em um segundo momento, a escolha do terreno dentro da cidade se deu a partir da criação de uma nova zona industrial, revitalizando a Zona Norte do município. O presente texto, extraído de pesquisa de iniciação científica e trabalho de conclusão de curso, busca identificar os principais atores envolvidos no projeto do PTS, entendendo sua interação e articulação. Busca-se analisar também, a estrutura da governança através dos conceitos desenvolvidos por Colletis, Gilly, et. al (1999) e Dallabrida; Becker (2003). Utilizou-se a 1 Licenciada e aluna de Bacharelado do Curso de Geografia da Univ. Estadual Paulista/Unesp, Campus de Ourinhos. É bolsista de Iniciação científica da Fapesp. Email: [email protected]. 2 Professor Assistente Doutor do Curso de Geografia da Univ. Estadual Paulista/Unesp, Campus de Ourinhos. É coordenador do projeto regular de pesquisa FAPESP (2011/20203-8), integrante do Grupo de Pesquisa/CNPq sobre Processos e Dinâmicas territoriais (DITER) e coordenador do Laboratório de Geografia Humana. Email: [email protected]. 334 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 metodologia baseada em pesquisa bibliográfica, consulta de dados secundários (SEADE, IBGE, RAIS, etc) e entrevistas, tendo como principais autores: Scott e Storper (1988), Benko (2002), Germano (2002), Santos (1996), Suzigan; Garcia; Furtado (2002), entre outros. 2 – Discussão e Resultados 2.1 - A dinâmica econômica e o perfil industrial do município de Sorocaba Em 1970, o modelo de acumulação flexível impôs uma nova forma de “desenvolvimento” baseada na concentração espacial das indústrias de maneira dinâmica e em rede, com a emergência da indústria de alta tecnologia materializando suas ações nos chamados Sistemas Locais de Inovação – SLI3 (GERMANO, 2002) e, dentro deste modelo, destacando-se os parques tecnológicos. As indústrias de alta tecnologia buscam espaços que agregam determinadas características. Segundo Scott e Storper (1988), a explicação para este comportamento contemporâneo consiste nas forças por detrás da formação dos novos centros de crescimento que envolvem a divisão do trabalho, as relações transacionais entre as empresas e as economias de aglomeração, algumas delas surgindo endogenamente nas localidades receptoras. Assim, Parques tecnológicos4 podem ser entendidos como empreendimentos de inovação implantados em áreas públicas ou privadas em forma de condomínio, constituídos e estruturados com a específica missão: visam transformar conhecimento em riqueza, desenvolver pesquisa e tecnologia. Tais projetos visam estimular a cooperação entre instituições de pesquisa, universidades e empresas. Para compreender um Sistema de Inovação Localizado torna-se importante analisar a dinâmica de funcionamento dos agentes produtivos que o 3 Os SLIs podem ser entendidos como a capacidade das localidades de se organizarem de maneira informacional e em busca de inovação, em face do processo de adaptação ao ambiente global (GERMANO, 2002). 4 Concepção adotada pelo Sistema Paulista de Parques Tecnológicos baseada na definição oficial de 2002 da International Association of Science Parks (IASP). 335 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 compõem. Segundo Suzigan; Garcia; Furtado (2002, p.7), a discussão da governança da atividade produtiva em sistemas localizados passa necessariamente pela questão das formas de organização da cadeia produtiva em que os produtores locais estão inseridos. Nesse sentido, além do dinamismo econômico, alguns fatores agregam grande valor ao município de Sorocaba. Baseado na teoria da localização da indústria de alta tecnologia, segundo Benko (2002), encontram-se a força de trabalho (o capital humano), o atrativo da paisagem, a infraestrutra de transporte, os serviços, o clima político e dos negócios e, por fim, a instalação de universidades e institutos de pequisa, representados quantativamente a seguir (Tabela 1 e Figura 1). Tabela 1: Fatores quantitativos do município de Sorocaba. Aspectos Indicadores Socioeconômicos Valor adicionado Ensino Resultados PIB R$ 14,182.60 Milhões PIB per capita R$ 24,272.26 Mil Indústrias 1.114 Estabelecimentos Prestadores de serviços 11.744 Estabelecimentos Comércio 13.579 Estabelecimentos Exportações R$1.250.355.897 Billhões Importações R$1.397.216.984 Bilhões Investimentos 3.205 Bilhões (2006-2009) Universidade 5 Unidades Outras Instituições de Ensino Superior Escolas Técnicas Escolas Técnicas Profissionalizantes 13 Unidades 5 Unidades 400 Unidades Fonte: inovasorocaba.org.br. Organizado por Hori. 336 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Figura 1- Espacialização dos principais estabelecimentos de Ensino no município de Sorocaba. Todos esses elementos são entendidos como um conjunto de condições necessárias e anteriores ao nascimento dos complexos de alta tecnologia. Essas condições artificialmente criadas colocaram o município de Sorocaba em evidência, pois, ofereceram ao processo produtivo vantagens comparativas de localização determinantes (SANTOS, 1996). Sobre a dinâmica produtiva do município de Sorocaba é importante ressaltar que a composição setorial do Valor Adicionado (SEADE, 2010) demonstra, a partir do século XXI, uma concentração da participação do setor de serviços (67,25%), seguido pela indústria (32,69%) e agropecuária (0,05%). Observa-se, também, que durante os anos de 2000 a 2010, a participação do Valor Adicionado da indústria cresceu aproximadamente 5%, com um índice de 37,53% (4.999,94 milhões de reais), enquanto o Valor 337 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Adicionado do serviço reduziu sua participação para 62,32% (8.303,67 milhões de reais), demonstrando a importância do setor secundário para a economia sorocabana. No ano de 2010, identificamos no município de Sorocaba, de acordo com a Relação Anual de Informações Sociais – RAIS, 58 estabelecimentos considerados de Alta Tecnologia, sendo 1 de construção e montagem de aeronaves, 22 de manutenção e reparação de aeronaves, 30 de equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos, 2 de softwares e 3 de produtos farmacêuticos e farmoquímicos. No total de empregos ocupados nestes setores, encontramos aproximadamente 5.079 pessoas. Sobre os estabelecimentos de Médio-Alta e Baixa Tecnologia, Sorocaba possui, segundo o Atlas da Competitividade da Indústria do Estado de São Paulo/FIESP (2010), números significativos no sub-setor metal-mecânico com total de 696 estabelecimentos. Segundo a Pesquisa dos Investimentos do Estado de São Paulo – PIESP/SEADE, os valores anunciados para investimentos na Região Administrativa de Sorocaba somaram, em 2010, R$ 971,8 milhões de reais. A maioria deste montante está concentrada em dois sub-setores: o automotivo, representado pela construção da fábrica da Toyota (600 milhões de reais) em Sorocaba e, na metalurgia básica, com a ampliação da unidade da Companhia Brasileira de Alumínio – CBA (224 milhões de reais), o que comprova a “continuidade ao processo de consolidação da indústria regional”. Apenas no município de Sorocaba, no mesmo ano corrente, foi investido pelo governo municipal e estadual mais de R$ 70 milhões de reais na primeira fase de obras do projeto Parque Tecnológico de Sorocaba “Alexandre Beldi Netto”. Dessa maneira, a escolha do município de Sorocaba para a implantação do Parque Tecnológico decorre, de acordo com os autores estudados, da influência de fatores locacionais responsáveis pelo dinamismo empírico da região. 338 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 2.2 - Governança em Sistemas Produtivos Locais O conceito de governança surge no século XIV, "como referência a regimes especiais de governo em províncias anexadas" e se desenvolve, ao longo do tempo, dando origem a inúmeras expressões e formas de governança (PIRES, et. al, 2011). De acordo com a própria polissemia do termo (corporativa, política e territorial), é importante estabelecer aqui uma definição que seja condizente com a perspectiva analítica que é do processo de governança na construção dos Parques Tecnológicos. Dessa maneira, utilizaremos a definição estabelecida por Quintar (2006) e Pires (et al., 2011), de que a governança “indica formas de coordenação das dinâmicas econômicas e sociais nas quais estão envolvidas múltiplas instituições públicas, privadas e sociais”, abarcando articulações e interdependências entre atores sociais na definição de formas de coordenação horizontal e vertical da ação pública e regulação dos processos econômicos e sociais territoriais (HORI; FUINI, 2013). A governança, deste modo, se torna um mecanismo efetivo para pôr em funcionamento as estratégias de desenvolvimento, interferindo na competitividade e produzindo sobre o território nacional um poder fragmentado especializado por setores econômicos. No caso dos Sistemas Locais de Inovação, a governança é desenhada a partir da interação entre empresas, governo e universidades, sendo o estímulo ao desenvolvimento de pesquisa, tecnologia e inovação o fator decisivo de análise em tal estrutura. Portanto, a estrutura da governança de um SLI considera as características sociais, institucionais e culturais, pois influenciam a capacidade de inovação de um local ou região, conformando diferentes dinâmicas organizacionais. 2.3 - Metodologias para estudo da governança Quando analisamos aglomerados produtivos territorializados no âmbito da Geografia, observamos diferentes tipos de estrutura da governança, as quais envolvem processos simultâneos de coordenação e conflitos 339 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 estabelecidos entre um conjunto de atores que representam, economicamente e politicamente, um determinado território, sendo eles públicos ou privados. Existem assim, inúmeras metodologias que analisam o tipo de governança construída. Entre elas está à metodologia desenvolvida por Dallabrida; Becker (2003), que através de uma perspectiva territorial, analisaram o processo de construção da governança baseado (...) no exercício do poder e autoridade, por parte dos cidadãos ou grupos devidamente articulados nas suas instituições e organizações regionais, incluindo todos os processos, com o objetivo de diagnosticar a realidade, definir prioridades, planejar a implementação das ações e, assim, determinar como os recursos financeiros, materiais e humanos devam ser alocados, para a dinamização das potencialidades e superação dos desafios, visando ao desenvolvimento de uma região ou território (DALLABRIDA; BECKER, 2003, p.80). Assim, os elementos que compõem essa abordagem são consolidados na história e na cultura da sociedade envolvida (dinâmica territorial), na qual um grupo de atores historicamente importante (bloco socioterritorial) assume o comando estratégico de desenvolvimento do território, conformando lideranças responsáveis pela gestão descentralizada (concertação social), consolidadas através dos acordos e ajustes advindos dos diferentes representantes da sociedade (pactos socioterritoriais). Dinamicamente ocorrerá um processo de transição das principais estruturas de poder (lideranças), tornando-as hegemônicas em um determinado momento da história e caracterizando modelos e práticas específicos de cada sociedade organizada territorialmente (redes de poder socioterritorial). Já segundo Fuini (2013, no prelo), a partir da análise dos objetivos atribuídos e dos modos de apropriação dos agentes territoriais, Colletis, Gilly, et. al (1999) construíram uma metodologia de governança em função do caráter público ou privado dessas formas de apropriação. A primeira é caracterizada pela dominação dos agentes privados na coordenação de projetos e recursos do território; a governança privada, 340 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 normalmente exemplificada através da grande empresa. A segunda, governança privada-coletiva, configura-se na liderança dos projetos por "uma instituição formal que agrupa operadores privados", como os sindicatos profissionais e empresariais. A terceira, governança pública, difere da apropriação privada, sendo os membros gestores advindos das instituições públicas, produzindo bens e serviços coletivos. E, por último, a quarta manifestação, entendida como governança mista, é caracterizada pela associação das diferentes formas de governança, sendo uma delas dominante, "o que permite caracterizar cada território como um caso específico dentro de uma categoria geral com uma dosagem específica e variável". 2.4 - Análise da estrutura da governança do Parque Tecnológico de Sorocaba Para entendermos a organização territorial do projeto parque tecnológico de Sorocaba “Alexandre Beldi Netto“ foram realizadas entrevistas com os principais atores responsáveis pela sua consolidação, além do levantamento de dados referentes ao tema através de jornais locais, revistas e recursos audiovisuais. Esta metodologia buscou definir a estrutura da governança estabelecida neste projeto, analisando a participação ou não dos atores que compõem a sociedade sorocabana nesse processo de construção territorial (COLLETIS; GILLY, et. al, 1999). De acordo com a metodologia de Dallabrida & Becker (2003) e das análises concluídas a partir da pesquisa bibliográfica e entrevistas, o bloco socioterritorial do PTS é constituído principalmente pela Prefeitura Municipal, indústrias (CIESP) e empresas , Instituições de ensino (técnico e superior), os Serviços Sociais Autonônomos como o SEBRAE e o SENAI e os sindicatos (Sindicato dos Metalúrgicos Sorocaba e Região - Smetal). Assim, a dinâmica territorial construída em Sorocaba está baseada no poder público, em todas as esferas e, no poder privado, composto pelas indústrias e empresas, bem como nas entidades paraestatais. No decorrer da história, constatou-se a consolidação de um perfil industrial metal-mecânico no 341 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 município, a qual só foi possível a partir da intervenção pública municipal, estadual e federal e dos fatos urbanos ocorridos no estado de São Paulo. Nesta primeira transição no perfil industrial de Sorocaba, que até então era baseada na indústria têxtil, pode-se observar a forte atuação do poder público local (SONODA, 2006). Já neste segundo momento, com o desenvolvimento e a criação de um projeto de parque tecnológico que intrinsecamente implica em uma nova mudança no perfil industrial, também se consolidou na iniciativa do poder público. O que observamos é a transformação rápida da paisagem, a adaptação e a inserção destes espaços em redes de fluxos, emergindo movimentos “neoterritorialistas de (re) enraizamento, que muitas vezes promovem a (re) construção de identidades tradicionais” (HAESBAERT, 2006). No entanto, na fase de construção do PTS, a atuação de um segundo ator foi relevante, o poder privado, materializado na indústria automobilística "Toyota" que se estabeleceu como empresa âncora, contribuindo para a atração de investimentos e infraestrutura dentro do PTS. Segundo o vereador Izidio de Brito (PT), a prefeitura não buscou a participação efetiva de todos os segmentos sociais de Sorocaba, como a dos movimentos sindicais. O SMETAL afirma que lutou para que este segmento participasse nas discussões sobre o PTS. Observa-se nesse momento, a questão das redes de poder socioterritorialis trabalhada por Dallabrida; Becker (2003). Deste modo, mesmo com a grande diversidade de atores/agentes que constituem este espaço, a concertação social, no caso do PTS, ficou restrita ao poder público municipal, sendo que a participação dos outro atores se alicerçou nos pactos socioterritoriais, isto é, nas parcerias e acordos desenvolvidos na fase de implantação dos laboratórios. Segundo Mário Tanigawa (2013), ex-secretário de Desenvolvimento Econômico e atualmente diretor de Operações Técnicas do PTS, até o momento, há parcerias com o Sistema Paulista de Parques Tecnológicos, SENAI, SEBRAE e com as instituições de ensino superior de Sorocaba, que 342 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 envolvem a cooperação institucional, a criação de projetos e a mão-de-obra especializada, entre elas: UNESP, UFSCAR, PUC, USP, etc. Em relação à estrutura da governança, Mário Tanigawa (2013) acredita que o poder público foi o principal indutor do PTS, criando seu planejamento estratégico, operacional, infraestrutura do parque e a própria Empresa Municipal Parque Tecnológico de Sorocaba (EMPTS), responsável atualmente pela execução e controle do projeto (Transcrição de entrevista). O Conselho de Administração da Empresa Municipal "Parque Tecnológico de Sorocaba" – EMPTS é composto por: Tabela 2 - Principais Formadores do Conselho de Administração da EMPTS – 2013. Nome Cargo Coordenadora de C&T da Secretaria de Desenvolvimento Desirée Zouain Econômico, Ciência e Tecnologia do estado de São Paulo Ary Plonski Ex-presidente da ANPROTEC Antonio Carlos Pannunzio Presidente da EMPTS Presidente do Parque Tecnológico de Sorocaba (exVitor Lippi prefeito de Sorocaba) Julio Cezar Durigan Reitor da UNESP Targino de Araújo Filho Reitor da UFSCAR Marcos Cameiro da Silva FACENS Antonio Roberto Beldi CIESP/FIESP Fonte: EMPTS, 2013. Organizado por Hori, 2013. Como é a EMPTS a responsável formal pela administração do PTS, a governança se caracteriza, segundo Colletis; Gilly, et. al (1999), como governança pública, já que é representada por instituições públicas a serviço de interesses privados, ou seja, do sucesso econômico das empresas instaladas no Parque Tecnológico. Nesse sentido, concordamos com Santos (1996) que a difusão da ciência e da técnica pelo espaço tende a ser bastante desigual, pois, os investimentos de capital buscam os melhores lugares para sua localização, considerando os elementos de ordem técnica e organizacional. Tais elementos vão definir a produtividade diferencial dos espaços, com um caráter espacial 343 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 altamente seletivo relacionado ao meio técnico-científico-informacional, a “cara geográfica” da globalização. Podemos afirmar que essa ação específica de desenvolvimento econômica articulada pela política do Estado versus a política das empresas, se insere naquilo que se chama de “guerra dos lugares”, considerando que (...) os lugares se especializam em função de suas virtualidades naturais, de sua realidade técnica e de suas vantagens de ordem social. Isso responde a uma maior exigência de maior segurança e rentabilidade para os capitais abrigados a uma competitividade sempre crescente (SANTOS, 1996, p. 123). 3 - Considerações Finais Este trabalho buscou analisar e identificar, de forma introdutória, a estrutura da governança construída no projeto do PTS, a partir das metodologias desenvolvidas por Dallabrida; Becker (2003) e Colletis, Gilly, et. al (1999). Assim sendo, conclui-se que a articulação inicial para a criação do projeto PTS se concentrou no atores poder público municipal e estadual, sendo os responsáveis pelo planejamento urbano e pelo desenvolvimento de políticas e diretrizes inovadoras que deram suporte a um projeto como este, bem como financiadora e fomentadora de recursos. Logo, os mecanismos de articulação entre os atores desta sociedade surgiram após a fase de criação do projeto, em um segundo plano, como parceiros e colaboradores da missão fundamentada pelo PTS. 4 - Referências BENKO, G. Economia, Espaço e Globalização: na aurora do século XXI. São Paulo: Hucitec, 1996. COLLETIS, G., GILLY, J.-P., et. al. Construction territoriale et Dynamiques productives. Revue Sciences de la Societé, n. 48, Outubro de 1999. DALLABRIDA, V. R.; BECKER, D. F. Governança Territorial: Um primeiro passo na construção de uma proposta teórico-metodológica. Desenvolvimento em Questão, ano 1, n. 2, Ijuí/RS, jul./dez./2003, p. 73-98. 344 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 FUINI, L. L. (no prelo). A governança em Arranjos Produtivos Locais (APLs): Algumas considerações teóricas e metodológicas. Geotextos, UFBA, 2013. HAESBAERT, R. O Mito da Desterritorialização: do “Fim dos Territórios” à Multiterritorialidade. 2ª ed. – Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006. HORI, I, I; FUINI, L, L. Uma análise sobre o desenvolvimento territorial: O caso dos parques tecnológicos. VI Seminário Internacional sobre Desenvolvimento Regional. Santa Cruz do Sul – RS: UNISC, 2013. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/ 35> Acesso em: 24 nov. 2011. PIRES, E. L. S; FUINI, L. L., [et al]. Governança territorial: conceitos, fato e modalidade. Rio Claro: UNESP – IGCE: Programa de Pós-Graduação de Geografia, 2011. RELAÇÃO ANUAL DE INFORMAÇÕES SOCIAIS – RAIS: Disponível em: <www.rais.gov.br> Acesso em: 14 de Julho de 2013. SANTOS, M. A natureza do espaço: Técnica e tempo, razão e emoção. São Paulo: Hucitec, 1996. SCOTT, A. J.; STORPER, M. Indústria de alta tecnologia e desenvolvimento regional: uma crítica e reconstrução teórica. Espaço & Debates, São Paulo, Ano VIII, n. 25, p. 30-44, 1988. SUZIGAN, W; GARCIA, R; FURTADO, J. Estruturas de governança em arranjos ou sistemas locais de produção. Gest. Prod., São Carlos, v.14, n.2, 2007, p.425-439. 345 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 O ENTORNO DA UNIVERSIDADE: A IMPORTÂNCIA DA PROXIMIDADE GEOGRÁFICA PARA EMPRESAS GRADUADAS PELA INCAMP Lucas Baldoni1 1 - Introdução As novas configurações espaciais dos sistemas de inovação agrupam locais de inter-relação entre empresas e universidades (U-E). No Brasil, principalmente a partir da década de 90, nota-se o início de uma nova estratégia da universidade como ator importante nos sistemas regionais e nacionais de inovação. De acordo com Chaves (2009), essa estratégia veio despontar desde o momento em que a universidade começou a executar atividades ligadas ao setor produtivo, por exemplo, participando ativamente na criação de suas próprias empresas. Segundo Ondategui (2006), um aspecto importante que recentemente deve ser analisado refere-se à distribuição geográfica do desenvolvimento tecnológico, pois ele é capaz de gerar redes de informação que se configuram espacialmente tanto na escala global quanto local. Essas redes de informação materializam-se no espaço geográfico e são propiciadas pela proximidade entre empresas e outras instituições, como no caso, a universidade e seu entorno. A proximidade geográfica favorece a interação e troca de conhecimento em atividades ligadas ao desenvolvimento tecnológico. Conforme Torre (2003), a proximidade territorial permite contatos face a face, que se desenvolvem nos espaços em que se observa um ambiente cultural compartilhado. Os produtores tendem a se agrupar para se beneficiarem dessas externalidades positivas de proximidade, isto é, da informação que circula com maior facilidade. Scott e Storper (1986) consideram que a razão para que essas atividades se aproximem geograficamente consiste no seu anseio de minimizar 1 Aluno de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Geografia, Instituto de Geociências UNICAMP. Email: [email protected] 346 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 os custos, pois o contato com fornecedores e clientes pode aumentar as chances de encontrar os insumos necessários e escoar seus produtos finais com maior eficácia. Em Campinas (SP), a percepção de que havia um potencial elo entre a pesquisa e a produção industrial fez com que o poder público do município passasse a promover iniciativas em conjunto com a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) a fim de alavancar o desenvolvimento tecnológico do município e da região. Castro (2006) afirma que atualmente a Unicamp estabelece mecanismos mais ativos por meio de sua Agência de Inovação (Inova- Unicamp) com o objetivo de fortalecer parcerias entre a Unicamp, empresas e órgãos do governo, além de incentivar o ambiente empreendedor na Universidade. A Inova-Unicamp foi criada em 2003 e um dos seus objetivos consiste em apoiar e estimular novas empresas de base tecnológica (EBTs), além de aprimorar o papel da Incubadora de Empresas de Base Tecnológicas da Unicamp (Incamp) que fora fundada em 2001 com administração transferida para a Inova-Unicamp afim de implantar uma estrutura propícia e apoiar a criação e o desenvolvimento das empresas incubadas e graduadas. Para tanto, o presente trabalho buscou contribuir para o entendimento das relações U-E (Universidade-Empresa) no que tange a importância da proximidade geográfica como fator relevante na localização das empresas graduadas pela Incamp. 2 - Objetivos A pesquisa visou analisar a importância da proximidade geográfica no que corresponde no que diz respeito à atual localização das empresas graduadas pela Incamp, sobretudo, às vantagens e desvantagens em manterse no entorno do Campus da Unicamp. 3 - Metodologia de pesquisa Para a consolidação da presente pesquisa foi fornecido pela InovaUnicamp o Banco de Dados contendo o atual endereço das empresas e razão 347 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 social. Em seguida, houve a coleta do setor de atuação das empresas graduadas pela Incamp, o ano de fundação, setor de atuação e número de empregados. Para complementar o referido estudo houve o contato com as empresas localizadas nos bairros do entorno do Campus da Unicamp, mais especificamente no Distrito de Barão Geraldo, localizado na Macrozona 3, segundo o Plano Diretor (2006) do município de Campinas (SP). Por último, para complementar a pesquisa foram contatadas as empresas graduadas pela Incamp que localizam-se no entorno da Unicamp afim de identificar algumas das vantagens e desvantagens em manter proximidade com a referida universidade. 4 - Resultados A proximidade geográfica é fator relevante nos estudos sobre as relações U-E não somente devido a dimensão, como também a importância da troca de conhecimento entre a universidade e as empresas que coexistem em um mesmo território. De acordo com Garcia et al (2011), a proximidade geográfica pode ser um fator importante para o estímulo das interações entre U-E, pois a concentração espacial desses dois agentes pode estimular a manutenção de contatos frequentes permitindo a formação de redes locais de conhecimento. Nesse sentido, Agrawal e Cockburn (2003) afirmam que os canais através dos quais esse conhecimento transita entre universidade e empresas pode ser investigado a partir de uma série de perspectivas, uma vez que diferentes canais têm diferentes implicações para os efeitos da proximidade geográfica, principalmente no espaço local. Agrawal e Henderson (2002) e Colyvas et. al (2002) em seus estudos também afirmam a importância dos canais de transferência de conhecimento, que são beneficiados devido a proximidade geográfica. Esses canais, segundo, Cohen et. al (1998, 2002) são as atividades que envolvem a estratégia de cooperação entre o meio acadêmico e o setor produtivo através de interação e transferência de conhecimento. Essas atividades, de acordo com Lester (2005), 348 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 umentam a capacidade de desenvolver o espaço local. Por exemplo, apoio para a criação e desenvolvimento de EBTs evidencia que as universidades podem contribuir, dando acesso a empresas localmente instaladas no seu Campus e no seu entorno. Conforme Frick (2009), a Incamp foi fundada em 2001 e esta instalada no Campus da Unicamp. Seu Plano de Negócios atua no sentido de: a) alimentar o espírito empreendedor e a criatividade, para que se manifeste na forma de desenvolvimento, produção e comercialização de produtos e serviços; b) dar suporte à criação, desenvolvimento e consolidação de micro e pequenas EBTs; c) auxiliar na transformação do conhecimento gerado em produtos, processos e serviços; d) ampliar o sucesso comercial dos empreendimentos; e) formar empresários com vínculo com a Unicamp, de forma a fortalecer e valorizar a interação Unicamp-empresa; f) incentivar a aplicação do capital humano gerado pela Unicamp, afim de colaborar para o desenvolvimento do Estado e da região. Com ênfase no número de empresas graduadas pela Incamp, no que se refere aos seus dez anos de atuação, a presente pesquisa teve como foco analisar qual a atual localização das empresas graduadas a fim de entender a importância, ou seja, as vantagens e desvantagens dessas empresas manterem suas instalações nos bairros localizados no entorno do Campus da Unicamp, especificamente na Macrozona 3 do Distrito de Barão Geraldo no munícipio de Campinas, São Paulo. De acordo com a análise dos dados e o recorte espacial estabelecido, constata-se que do total de empresas graduadas pela Incamp, a maior parte localiza-se no município de Campinas (SP). Também, constata-se que a maioria das empresas que graduaram pela Incamp localizam-se no entorno da Unicamp, ou seja, os bairros inseridos no Distrito de Barão Geraldo, Macro zona 3 do muncípio, cujo planejamento prevê áreas reservadas para empreendimentos de alta tecnologia, que visam ampliar a interação entre organizações públicas e privadas, voltadas para o desenvolvimento de P&D de Campinas. Contudo, podemos considerar que as empresas graduadas que se 349 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 localizam nesta área podem se beneficiar de um ambiente voltado às atividades inovativas, com a presença da Unicamp e outros empreendimentos ligados à indústria de alta tecnologia. Portanto, a proximidade geográfica entre esses atores pode ser fator relevante para as empresas deste estudo de caso. Tendo em vista a vocação de Campinas, e, consequentemente os objetivos previstos para a Macrozona 3, em que se localiza o Distrito de Barão Geraldo, nota-se o predomínio do setor de Tecnologia da Informação dentre as empresas graduadas. Nesse cenário, observa-se que o maior número de empregados das empresas graduadas pela Incamp, localizadas em Barão Geraldo também corresponde ao setor de Tecnologia da Informação. Portanto, entende-se que o predomínio das empresas da área de Tecnologia da Informação, neste local pode ser considerado um atributo de valor para as empresas graduadas, pois elas podem beneficiar-se da vocação tecnológica do múncípio, sobretudo, a proximidade com a Unicamp e com os empreendimentos ligados às atividades de alta tecnologia. Por último, para complementar a pesquisa foram entrevistadas algumas empresas graduadas pela Incamp que localizam-se no entorno da Unicamp afim de identificar algumas das vantagens e desvantagens em proximidade geográfica com a referida universidade. O relato dessas empresas demonstra que existem vantagens e desvantagens em manter seus escritórios nas proximidades da Unicamp. Nota-se que o contato com a Incamp prevalece após a saída da empresa graduada, devido o compartilhamento da infraestrutura de laborátórios e recursos humanos da universidade, apesar dos custos de locação de imóveis comerciais ser o primeiro obstáculo para a empresa graduada quando sai da Incamp. Entretanto, os atrativos consistem nas relações formais e informais que essas empresas podem estabelecer com toda a comunidade universitária, beneficiando-se, por exemplo, de projetos de pesquisa; com a participação em seminários e workshops de promoção e intercâmbio de informações técnicas, da oferta e recrutamento de alunos que movimentam a dinâmica dos bairros próximos à Unicamp. 350 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 5 - Considerações finais A proximidade geográfica entre produtores, fornecedores e usuários pode ser um requisito valoroso para o desenvolvimento local e, sobretudo no desenvolvimento das empresas graduadas pela Incamp. Portanto, a menor distância geográfica entre os agentes envolvidos desempenha um papel significativo, dado que a transmissão de informações entre eles tem possibilidade promover os contatos face a face. As relações U-E promovidas pela proximidade entre as empresas graduadas que mantêm suas instalações localizadas no Distrito de Barão Geraldo, no entorno da Unicamp, fazem com que o espaço local seja agente facilitador no desenvolvimento dessas EBTs, pois o fato da empresa graduada localizar-se no Distrito de Barão Geraldo implica na possibilidade de aproveitamento de uma série de externalidades, por exemplo, a infraestrutura Científico-Tecnológica do entorno da Unicamp e os recursos humanos provenientes da própria universidade, mesmo que a especulação imobiliária seja uma problemática cotidiana para essas empresas. Em suma, a interação e a cooperação via fluxo de informações e de conhecimentos entre produtores, usuários, recursos humanos, indústrias correlatas, serviços e laboratórios são imprescindíveis para a inovação tecnológica e para a descoberta de novos produtos e processos para as empresas graduadas pela Incamp que mantêm sinergias com a Unicamp devido a proximidade geográfica. 6 - Agradecimento À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP, pelo auxílio recebido, mediante Processo número 2013/07702-0. A Agência de Inovação da Unicamp. 7 - Referências AGRAWAL, A.; COCKBURN, I. The anchor tenant hypothesis: exploring the role of large, local, R&D-intensive firms in regional innovation systems. International Journal of Industrial Organization, v. 21, n. 9, 2003, p. 1227-1253. 351 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 AGRAWAL,A.,HENDERSON,R.Putting patents in context: exploring knowledge transfer from MIT. Management Science 48 (1), 2002, pag. 44–60 CASTRO, A. C. Produção e Disseminação de Informação Tecnológica: A Atuação da Inova – Agência de Inovação da Unicamp. Dissertação de Mestrado Apresentada ao Programa de Pós Graduação em Tecnologia da Informação da Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Puc- Campinas, 2006 CHAVES, D.C.R. A Universidade Empreendedora do séc. XXI: O Papel Estratégico da Propriedade Industrial. Dissertação de Mestrado apresentada à Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, Portugal, 2009. COHEN,W.,LEVINTHAL,D.Innovation and learning: the two faces of R&D. The Economic Journal 99, 1989, pag. 569–596. COHEN,W.,NELSON,R.,WALSH,J.Links and impacts: the influence of public research on industrial R&D. Management Science 48 (1), 2002, pag 1–23. COLYVAS,J.,CROW,M.,GELIGNS,A.,MAZZOLENI,A.,NELSON,R.,ROSENBER G,N.,SAMPAT,B.How do University inventions get into practice? Management Science 48 (1), 2002, pag 61–72. FRICK, A.M. A Importância Das Externalidades Para Empresas Incubadas: O Caso Da Incubadora De Base Tecnológica Da Unicamp. Trabalho de Conclusão de Curso. IGCE – Unesp. Rio Claro, 2009. GARCIA. R.; ARAÚJO,V.C. MASCARINI, S.; SANTOS, E. G. Os efeitos da proximidade geográfica para o estímulo da interação universidade-empresa. In. Revista de Economia, v. 37, n. especial, Editora UFPR , 2011, p. 307-330 LESTER, R. K. Universities, Innovation, and the Competitiveness of Local Economies: Summary Report from the Local Innovation Project. Industrial Performance Center, Working Papers Series, MIT, 2005. ONDATEGUI, J.C. Distritos Industriales, Ciudades Inteligentes y Regiões Del Conocimento: El Arte de Innovar y El Território de Las Possibilidades. Industria y Ciudad em España: Nuevas Realidades, Nuevos Retos. Estudos y Monografias de Económia. Madrid: Ed. Thomson Civitas, 2006, pag 75-110. SCOTT, A. J. ;STORPER, M. Industrial change and territorial organization: a summing up. Production, Work, Territory. The geographical anatomy of indsutrial capitalism. Massachussets: Allen & Unwin Publishers, 1986. TORRE, A. Desenvolvimento Local e Relações de Proximidade: Conceitos e Questões.Revista Internacional de Desenvolvimento. V 4 nº 7. Setembro, 2003. 352 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 O NOVO ESPAÇO DE CT&I EM CAMPINAS- SP: PARQUE CIENTÍFICO E TECNOLÓGICO DA INCAMP Lucas Baldoni1 1 - Introdução A atual estratégia empreendedora da universidade aliada à preocupação com a inovação tecnológica mostra-se de fundamental importância para o estudo das ações da Unicamp. E, tais ações correspondem às iniciativas que estimulam a produção, gestão e transferência de tecnologias. Desde os anos 80, para enfrentar a escassez de recursos, as universidades redefiniram suas estratégias de atuação para atender às necessidades do novo ambiente, introduzindo novas estruturas organizacionais voltadas para o fortalecimento e atuação através de redes de cooperação. (BRISOLLA et al, 1997). As novas configurações espaciais dos sistemas de inovação agrupam redes de inter-relação entre empresas, universidades e institutos de pesquisa. Nessas redes, que se constituem na base da nova sociedade do conhecimento, a universidade possui um papel de destaque tendo em vista o desenvolvimento regional por meio da formação de recursos humanos, através da pesquisa e implantação de Parques Tecnológicos nas suas proximidades. Segundo Gomes (1995), existe uma tendência das políticas de inovação dos países industrializados no sentido de fortalecer as iniciativas locais, visando à ampliação industrial e econômica. Essa se expressa pela criação de mecanismos dirigidos a promover o estreitamento da interação entre universidade e setor produtivo local. Entretanto, há de se destacar a existência de definições que distinguem os Parques Tecnológicos, Parques Científicos e Polos Tecnológicos (Tecnopolos). E, essas definições devem ser ver levadas em consideração ao descrevê-los. 1 Aluno de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Geografia, Instituto de Geociências UNICAMP. Email: [email protected] 353 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 A ANPROTEC (Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores) define o Parque Tecnológico como um complexo produtivo industrial e de serviços de base científico-tecnológica, planejado, de caráter formal, concentrado e cooperativo, que agrega empresas cuja produção se baseia em pesquisa tecnológica desenvolvida nos centros de P&D vinculados ao Parque. Trata-se de um empreendimento urbanístico promotor da cultura da inovação, da competitividade, do aumento da capacitação empresarial, fundamentado na transferência de conhecimento e tecnologia. Diferente do Parque de Tecnológico, o Parque Científico se destaca devido o compartilhamento das infraestruturas entre universidades e empresas para elaboração e execução de projetos por tempo determinado. Atualmente, o modelo de Parque Científico pode assumir dois eixos, o primeiro, voltado para projetos entre universidade e grandes empresas, e, o segundo, voltado à incubação de novos negócios, por exemplo, incubadora de empresas para viabilização de novos negócios em áreas de interesse. (INOVA-UNICAMP, 2010). Quando nos referimos à ampliação das sinergias e a proporção dos Parques, obtemos a possibilidade de expandir o conceito original de Parque Tecnológico e Científico e integrá-lo a uma concepção mais global, que dá origem aos Pólos Tecnológicos. Os Polos de Alta Tecnologia ou Tecnopólos, segundo Benko (1996), são interpretados como um centro marcado pelas atividades industriais de alta tecnologia que fazem referência à existência de estruturas e instituições voltadas à P&D inseridas por um território, que passam a ser reconhecidos por suas funções de polarização regional. Em suma, o tecnopolo é uma forma territorial de polarização que se inscreve em determinada região com intuito de desenvolvimento territorial. O tecnopolo se mantém entre as relações de proximidade que criam os seus recursos e o horizonte mundial no qual se desenvolve a dinâmica de suas estruturas. Nos espaços metropolitanos eles “oferecem economias de 354 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 aglomeração, forte concentração dos setores de técnica elevada e transição possível entre antigas e novas tecnologias”. (BENKO, 1996, p.160). O precursor Stanford Research Park possui até hoje renome como um dos maiores e mais bem sucedidos Parques Tecnológicos, oferecendo às empresas associadas um conjunto particular de benefícios além de localizar-se no entorno do Campus da Universidade de Stanford. O ambiente inovador criado ao redor da Universidade provê ao Parque simplificado acesso a ensejos de negócios, educação e cultura disponível, pois a proximidade geográfica entre a universidade e as empresas propicia a cooperação e facilita a mobilidade profissional. Tal sistema faz parte do modelo flexível de desenvolvimento local da região do Silicon Valley. Portanto, é possível notar que recentemente tem-se consolidado uma estratégia empreendedora na comunidade acadêmica e observamos que o exemplo do Stanford Research Park inspirou outras regiões como sendo uma alternativa de desenvolvimento local. (SAXENIAN, 1994). No Brasil, a partir principalmente da década de 90, nota-se o início de uma nova estratégia da universidade como ator institucional importante nos sistemas regionais e nacionais de inovação.E, como aconteceu na região do Silicon Valley, um crescente número de investigadores universitários têm participado ativamente na criação de suas próprias empresas. (CHAVES, 2009). No município de Campinas, a percepção de que havia um potencial elo entre a pesquisa e a produção industrial fez com que o poder público do município passasse a promover empreendimentos tecnológicos a fim de alavancar o desenvolvimento tecnológico do município e da região. Paralelo a esse período, criou-se a Unicamp em 1962 (Lei Estadual nº7655, de 28/12/1962) com o objetivo principal de conter uma nova visão que desse ênfase especial à pesquisa tecnológica e mantivesse forte vínculo com o setor produtivo regional. (CASTRO, 2006). O Parque da Unicamp teve sua gênese a partir de uma proposta apresentada à Secretaria de Desenvolvimento do Governo do Estado de São 355 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Paulo no ano 2008, e, atualmente, encontra-se na etapa final de instalação das infraestruturas que fazem limite com as áreas do Campus “Zeferino Vaz” da Unicamp, Distrito de Barão Geraldo em Campinas (SP). A proximidade entre a Unicamp e as empresas que serão instaladas no referido Parque caracteriza a estratégia empreendedora da universidade e estabelece maiores oportunidades para a execução dos objetivos principais da Agência de Inovação (Inova-Unicamp). Em resumo, verifica-se que a trajetória para se chegar à implantação do referido “Parque Científico e Tecnológico da Unicamp” seguiu três etapas: a primeira, na década de 70 onde se enxergava as potencialidades de Campinas para implantação de um Polo Tecnológico devido às ligações entre pesquisa e setor produtivo, a segunda, a partir da década de 80 com a criação de instituições capazes de implantar empreendimentos ligados à geração e transferência de tecnologia, e, a terceira, em que a universidade internaliza a função de transferência de tecnologia, ou seja, o momento em que ocorre a presença de uma estratégia de caráter mais empreendedor da Unicamp por intermédio de sua Agência de Inovação. Assim sendo, a presente pesquisa visa analisar e caracterizar tal estratégia empreendedora da Universidade Estadual de Campinas tendo em vista suas ações para a consolidação do Parque Científico e Tecnológico. 2 - Objetivos O presente estudo tem como objetivo caracterizar e analisar a atual estratégia da Unicamp para a consolidação de um Parque Científico e Tecnológico dinâmico em seu entorno. E, para que o estudo possa ocorrer haverá: Identificação das ações empreendedoras do corpo docente; Análise as ações da Inova-Unicamp; Acompanhamento das Deliberações da Unicamp relativas ao referido Parque; 356 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Mapeamento dos laboratórios e centros de pesquisa de empresas associadas à Unicamp localizados no interior do Campus “Zeferino Vaz”; Mapeamento dos Empreendimentos ligados à indústria de alta tecnologia que circundam o campus da Unicamp. 3 - Metodologia de pesquisa O ponto de partida do trabalho se dá pela observação direta da realidade acadêmica da Unicamp. Tal observação da realidade nos possibilita detectar a existência de uma série ações que permitem estreitar as relações entre a universidade e seu entorno. E, para alimentar a leitura da realidade, torna-se imprescindível o levantamento bibliográfico sobre obras a respeito da temática. Para a realização da pesquisa haverá a necessidade de se acompanhar as deliberações relativas à implantação do Parque, sobretudo, as ações da Agência de Inovação da Unicamp, as movimentações da Direção do Campus e Prefeitura Municipal por meio da análise de documentos oficiais, bem como os projetos aprovados e/ou em construção e perspectivas para as áreas da “Fazenda Argentina” (propriedades que fazem limite com o Campus da Unicamp). Além da coleta de dados disponíveis por órgãos públicos e privados, teremos o uso de técnicas, como a aplicação de entrevistas aos atores que justificam as ações da Unicamp quanto à temática proposta. Por último, no presente projeto, a escala de análise consiste no espaço local, ou seja, o recorte espacial da pesquisa consiste no Campus “Zeferino Vaz” da Unicamp e também seu entorno. Por isso, para a viabilização da pesquisa torna-se importante o uso de softwares para representação cartográfica, que no momento de sistematização dos resultados irão permitir o mapeamento dos laboratórios e centros de pesquisa de empresas associadas ao Campus da Unicamp, como também propiciarão o mapeamento dos empreendimentos ligados à indústria de alta tecnologia que circundam o campus da Universidade. Para tanto, no referido momento será selecionado o melhor Software para realização do trabalho, como também o uso das imagens de satélite para mapeamento de ocupação urbana, que terão a melhor 357 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 resolução para elaboração dos mapas temáticos. Haverá a avaliação da Planta Cadastral do Terreno e os mapas gerados pela Equipe do Plano Diretor do Campus da Universidade a fim de complementar as informações de mapeamento do Campus “Zeferino Vaz” e seu entorno. Por fim, o levantamento bibliográfico e a compreensão das deliberações referentes à implantação do Parque possibilitarão estabelecer tipologias, que aplicadas aos mapas atingirão o objetivo de caracterizar a ocupação interna e externa ao Campus e analisar a atual estratégia da Unicamp para a consolidação de um Parque Científico e Tecnológico em seu entorno. 4 - Resultados esperados Na década de 1970, em paralelo à instalação da Unicamp, surgiu o PATC (Parque de Alta Tecnologia de Campinas) enquanto política pública municipal. Nele estava presente a ideia de transformar Campinas no Silicon Valley brasileiro. Para tanto, foi estabelecido o PPDI (Plano Preliminar de Desenvolvimento Integrado) a partir de uma iniciativa do Governo Federal, com o intuito de iniciar a implantação do empreendimento. Para os profissionais que defendiam o Parque de Alta Tecnologia de Campinas como uma proposta inovadora, tal idealização indicava que Campinas poderia se tornar no futuro um Pólo de Alta Tecnologia devido à existência de infraestruturas de C&T de excelente qualidade, como as universidades, o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento da Telebrás que fora criado em 1976 denominado de CPqD, além da qualidade dos sistemas de transportes do município: ferrovias, rodovias e o aeroporto. Nesse primeiro momento de implantação do PATC há forte presença do poder público federal e de alguns membros da comunidade de pesquisa, especialmente da Unicamp. Os membros da comunidade acadêmica da Unicamp participaram ativamente do processo de elaboração da política pública que deveria assentar o potencial de C&T a serviço da produção industrial de Campinas e Região. Em destaque, o Físico e Professor da 358 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Unicamp, Rogério Cezar Cerqueira Leite, que foi um dos criadores e Presidente da Companhia de Desenvolvimento Tecnológico.(SILVA, 2010) No início dos anos 1980 a ideia de criar o PATC encontrou um ambiente favorável junto ao poder público municipal e ao governo do estado de São Paulo. Assim sendo, em 1983 foi criado o CIATEC (Centro de Indústrias de Alta Tecnologia) pela Prefeitura Municipal com o objetivo de prover as condições de infraestrutura que favorecessem a proximidade e a integração das atividades dos setores de indústria, comércio, educação, serviços, tecnologia, pesquisa e desenvolvimento. Em 1986, o Decreto Municipal n° 8847 designou uma área de 682 mil m², de propriedade da FEPASA (Ferrovia Paulista), para a implantação de empresas de base tecnológica. A área passou a ser denominada de Parque Tecnológico CIATEC-I, local em que, conforme a Lei Municipal n° 5700, de 11/7/1986, as empresas de base tecnológica que viessem a se instalar eram isentas do pagamento de ISS e IPTU, até 31/12/1990. Atualmente, tem-se a instituição formal das estruturas do Parque Tecnológico CIATEC- II, situado em uma área de aproximadamente 7 milhões de m², composta por várias propriedades particulares, e inserida nas proximidades da Unicamp. (GOMES, 1995). Inserida nessa dinâmica de proximidade geográfica com empreendimentos de alta tecnologia, a Unicamp preocupou-se em estabelecer estratégias locacionais dentro e fora das delimitações do seu Campus “Zeferino Vaz” com objetivo de desenvolver suas capacidades de P&D. Para tanto, estabeleceu mecanismos mais ativos por meio da Agência de Inovação da Unicamp (Inova-Unicamp) para fortalecer parcerias entre a Unicamp, empresas e órgãos do governo, além de incentivar a cultura e ambiente inovador e empreendedor na Universidade. (CASTRO, 2006). A Inova-Unicamp foi criada em através da Resolução GR-051/2003, de 23/07/2003, junto ao Gabinete do Reitor com o objetivo de estreitar as relações da Unicamp com o setor produtivo local e regional, além de implantar estratégias de cunho empreendedor no Campus da Universidade. Conforme o Artigo 8° Resolução GR-051/2003 a Diretoria da Inova-Unicamp é composta 359 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 por um Diretor Executivo e outros três Diretores, com as seguintes atribuições: 1) Diretor Executivo, responsável pelas ações executivas da Agência, responsabilizando-se pelas relações no âmbito da Universidade e externamente, com os setores público e privado; 2) Diretor de Desenvolvimento de Parcerias e Projetos Cooperativos, responsável pelo desenvolvimento de ações e relacionamento com empresas, órgãos públicos, oferecendo apoio à elaboração de projetos; 3) Diretor de Propriedade Intelectual, responsável pelo registro de propriedade intelectual, abertura e acompanhamento de processos de licenciamento e demais questões referentes à propriedade intelectual; 4) Diretor de Parques Tecnológicos e de Programas de Incubadora de Empresas de Base Tecnológica, responsável pela implantação de parques, incubadoras e fortalecimento de empresas de base tecnológica. Essa última Diretoria desloca seus esforços para a implantação do “Pólo de Pesquisa e Inovação da Unicamp” que recentemente passou a ser denominado de “Parque Científico e Tecnológico da Unicamp” pela Deliberação CONSU-A-028/2012, de 27/11/2012. Verifica-se que os autores utilizados como referência na área de Geografia da Inovação evoluem com relação a um referencial convencional sobre a tríade território, inovação e setor produtivo. Entretanto, tendo em vista os poucos estudos realizados a respeito de Parques Tecnológicos na América do Sul, mais especificamente no Brasil, o presente estudo permitirá estabelecer considerações sobre a implementação do “Parque Científico e Tecnológico da Unicamp”. 5 - Considerações finais Os Parques Tecnológicos costumam localizar-se próximos de universidades para que as empresas que ali se instalam possam se beneficiar da proximidade com laboratórios e recursos humanos destas instituições. Destaca-se neste trabalho a presença da Universidade como ator principal para a implantação de um Parque Ciêntífico e Tecnológico no interior do seu Campus. Portanto, as perspectivas apontam que o referido Parque irá 360 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 contribuir para o desenvolvimento tecnológico da cidade, visto que Campinas conta com uma importante infraestrutura que permite torná-la um dos principais corredores na produção de atividades inovativas do país. Entretanto, nota-se que apesar da vocação tecnológica de Campinas, em alguns momentos houveram algumas ações estratégicas de modo relativamente desestruturado que levaram à desaceleração e progressiva desarticulação do projeto tecnológico na região, para tanto, observa-se como resultado a incipiente dinâmica de alguns Parques Tecnológicos instalados na cidade. Por último, entendemos que o Parque Ciêntífico e Tecnológico da Unicamp, ainda em fase de instalação, principalmente neste estudo de caso, caracteriza-se como espaço articulado e integrado, que acima de tudo, faz-se passível de ser tratado como um novo formato de empreendimento que possibilita ao território inovador de Campinas um conjunto de elementos para toná-la um dos centros urbanos e metropolitanos de destaque em CT&I. 6 - Agradecimento À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP, pelo auxílio recebido, mediante Processo número 2013/07702-0. 7- Referências BENKO, Georges. Economia, Espaço e Globalização na aurora do século XXI. São Paulo: Hucitec, 1996. BRISOLLA, S. et al. As relações universidade-empresa-governo: um estudo sobre a Universidade Estadual de Campinas. Educação & Sociedade, ano XVIII, n. 61, p. 187-209, dez. 1997. CASTRO, A. C. Produção e Disseminação de Informação Tecnológica: A Atuação da Inova – Agência de Inovação da Unicamp. Dissertação de Mestrado Apresentada ao Programa de Pós Graduação em Tecnologia da Informação da Pontifícia Universidade Católica de Campinas, PUCCAMPINAS, 2006. CHAVES, D.C.R. A Universidade Empreendedora do séc. XXI: O Papel Estratégico da Propriedade Industrial. Dissertação de Mestrado apresentada à Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, Portugal, 2009. 361 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 GOMES, E. J. A experiência brasileira de Pólos Tecnológicos: uma abordagem político- institucional. Dissertação de Mestrado apresentada ao Depto. De Política Científica e Tecnológica do Instituto de Geociências da Unicamp, 1995. INOVA UNICAMP. Projeto de Ciência Tecnologia e Inovação do Polo de Inovação da Unicamp e dos Parques Científicos e Tecnológicos de Campinas. Campinas. UNICAMP, Inova Unicamp, 2010. LEMOS, M. B. O parque tecnológico de Belo Horizonte. Cluster- Revista brasileira de competitividade . Belo Horizonte, ano 2, n. 4, p. 20-25, abril/julho 2002. SAXENIAN, A. Regional advantage: Culture and competition in Silicon Valley and route 128. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1994. SILVA, R. B. Pólo e Parque de Alta Tecnologia de Campinas: uma análise da política pública. Campinas. Editora RG, 2010. ANPROTEC: http://anprotec.org.br/site/a-anprotec/. Visualizado em 17/02/2013 362 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 INDÚSTRIA DE COUROS NO BRASIL: O CASO DO GRUPO FUGA COURO Targino Pereira de Sousa Filho1 Paulo Fernando Cirino Mourão2 Resumo: Esse texto pretende entender o processo de evolução do grupo Fuga Couros e da sua espacialização pelo território nacional gerando desenvolvimento nas diversas cidades como Marau – RS, Tangará – SC, Jales – SP, Dirce Reis – SP, Aparecida d´Oeste – SP, Aparecida do Taboado – MS, Paranaíba – MS, Várzea Grande – MT, Ji-Paraná – RO, Hirdolândia - GO. Esse Grupo se constituiu através da imigração italiana na metade do século XX, esses imigrantes desempenharam um papel extremamente importante no processo da industrialização brasileira partindo de pequenas oficinas e transformando em grandes Grupos. Ao analisar o seu contexto histórico vemos as suas diversificações das diferentes áreas que o Grupo vem atuando (frigoríficos, processadoras de subprodutos, pett food, agropecuária e biodiesel).Toda essa desconcetração de segmentos advém da concorrência que o Grupo está enfrentando no setor, onde grandes empresas brasileiras estão se fundindo e criando complexos coureiros distribuidos em diversas regiões no país. Diante disso o Grupo procura novas estratégias e novos nichos de mercado para se consolidar e não sofrer perda de espaço no que tange ao comércio nacional e internacional. Palavras-chaves: Localização Industrial. Indústria de couros. Desenvolvimento Industrial. Introdução A indústria de couros participa de diferentes cadeias produtivas. Ela depende essencialmente da pecuária de corte e dos frigoríficos que fornecem a sua matéria-prima, posteriormente o couro destina-se a diferentes indústrias que utilizam-no como um de seus insumos: calçados e artefatos, vestuário, móveis e automobilística. Esse segmento do couro é caracterizado por sua heterogeneidade de seu produto final, pois os frigoríficos e curtumes podem produzir o couro em diversas etapas, desde o estágio de salga onde o produto tem um menor valor agregado, até o couro acabado onde é possível obter uma superioridade do valor agregado, passando por fases de Wet blue (deriva do seu tom azulado e 1 Estudante do 4º ano do curso de Geografia, Unesp – Câmpus de [email protected]. 2 Professor do Curso de Geografia, Unesp – Câmpus de Ourinhos. [email protected]. 363 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 molhado, resultado de um banho de cromo) e Crust (produto fruto secagemestágio semi-acabado. O processo de produção é marcado pela simplicidade, onde tem o uso de uma tecnologia madura e utilização de uma mão-de-obra pouco qualificada, o que leva redução de barreiras à entrada de novas empresas no setor. Hoje sobretudo há uma predominância quantitativa de curtumes pequenos e de médio porte convivendo com uma concentração de parcela relevante de produção e emprego em um conjunto reduzido de grandes curtumes, e de forma cada vez mais importante em alguns frigoríficos verticalmente integrados. Cabe destacar também a existência de pequenos curtumes artesanais que contribuem para grande parte dos empregos informais da indústria brasileira de couro. No caso do Grupo Fuga Couros tentaremos no transcorrer desse trabalho fazer uma análise, a partir do processo histórico, sobre o desenvolvimento econômico gerado pelas indústrias do Grupo instaladas e sua importância como agente reprodutivo e transformador além de compreender a evolução e o desenvolvimento do Grupo Fuga Couros e identificar as estratégias que permitiram a superação de algumas indústrias de couro em fases recessivas. Utilizamos como auxílio em relação a pesquisa diversos trabalhos de campo na cidade de Dirce Reis, Jales e Aparecida d’ Oeste - SP, buscando entrevistas com os funcionários - do “chão de fábrica” até os proprietários, “protagonistas” do processo histórico econômico do Grupo; além de levantamento de dados estatísticos apoiados principalmente em órgãos oficiais como IBGE, CATI, EMBRAPA; SEADE; No ano de 1947, na cidade de Marau (RS), um Grupo de sócios fundadores de imigrantes italianos acabou criando o Grupo Fuga Couros S/A, tendo como sócio fundador J. Fuga, filho de imigrantes italianos, seu pai sustentava a família com o trabalho artesanal em uma selaria, sempre atencioso pelo que seu pai fazia cresceu fabricando artefatos para montaria, calçados e eventualmente curtia pelegos. A vida de J. Fuga se baseou em 364 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 torno do curtume, tanto que a sua casa foi instalada dentro da área da empresa. O pequeno empreendimento iniciou com o Curtume Marauense Ltda. Na época, a produção desse curtume não passava de 20 couros de porco ao dia. Em meados de 1955, o curtume já realizava sua primeira exportação para os Estados Unidos. Desde então, seu crescimento foi constante e acelerado, propiciado também pela introdução do couro vacum 3. Hoje, além dos curtumes o Grupo Fuga Couros diversificou sua atuação em diversos setores investindo em negócios relacionados ao couro, como frigoríficos, processadoras de subprodutos, fábricas de Pet food e biodiesel, essa diversidade gerou um alto crescimento. O desenvolvimento do Grupo está intimamente ligado ao desenvolvimento capitalista após a 2ª Guerra Mundial, esse foi marcado por uma intensificação do processo de internacionalização do capital. O que mostra que este momento é o de consolidação da fase monopolista do sistema capitalista, cujo componente espacial será a incorporação de novas áreas geográficas ao processo de acumulação capitalista, através de uma industrialização local ou do deslocamento geográfico das empresas, com a implementação de filiais (MOURÃO, 2002). A espacialização do Grupo pelo território nacional perpassa pelo momento da divisão internacional do trabalho, que se abre nos anos 50, com uma relativa dispersão do processo de industrialização em termos mundiais, abrem-se novas oportunidades de localização industrial, que vai estimular a procura de lugares mais rentáveis para a instalação de uma unidade industrial (RANGEL,1985). A atuação do Grupo em diversos mercados proporcionou durante as décadas um índice de 70% – 80% destinado de sua produção apenas para exportação, produzindo atualmente um total de vendas anuais acima de 100 milhões de dólares. É importante ressaltar que o crescimento do Grupo perpassa pela diversidade dos mercados onde o Grupo atua, atendendo a 3 Couro Vacum refere-se a couros de origem bovina. 365 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 países da América do Norte, América do Sul, Europa, , África, Oceania, e Ásia. Devido o amplo mercado o Grupo consequentemente cresce em números de instalações pelo território nacional como é visto logo abaixo no mapa de localizações das Unidades Produtoras. Fonte: SOUSA FILHO, 2013. Resultados Em trabalho de campo e entrevista feito na Processadora de Subproduto na cidade de Dirce Reis – SP nós obtivemos as informações que a vinda da empresa para as cidades de Dirce Reis e Jales - SP aconteceu devido a 366 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 grande quantidade de couros e subprodutos que tinha na região por conta dos vários frigoríficos instalados e para o Grupo era extremamente viável montar um curtume ao redor. Segundo (MAMIGONIAN, 1969) as instalações de indústrias próximas as suas matérias-primas leva uma redução de gastos em transporte (fretes) e redução de tempo de venda e compra o que é chamado de Localização Industrial. Em entrevista com o Gerente Administrativo foi relatado que as matérias – primas utilizadas são, o couro no caso do curtume de Jales, e em Dirce Reis é aonde vêm o subproduto do boi (barrigada, todo abate de desossa). No curtume há o processo de descarnação do couro e esse descarne em seguida é levado para a Processadora de Subproduto para ser processado gerando o sebo e a farinha de sangue que é usado na indústria de sabão e para ração animal. Os produtos gerados em Dirce Reis como sebos são destinados para a FERTIBOM empresa de combustível (Catanduva - SP), e Gessy Lever (Grupo Unilever/Valinhos - SP) e a farinha de osso é distribuída em Bastos - SP, o alto consumo de farinha é devido às granjas, e a farinha de sangue é vendida para as empresas Guabi, Purina (Grupo Nestlé). Em termos de exportação a Processadora de Subproduto exporta em torno de 150 toneladas mensal entre farinha de carne e farinha de sangue para o Vietnam e para Taiwan. No que corresponde à expansão da empresa no território nacional condiz com a expansão das Processadoras de Subproduto ou Graxarias que cresceu muito, segundo o gerente administrativo a empresa resolveu investir nesse setor além dos curtumes devido a grande necessidade de coleta de sangue nos frigoríficos no estado de São Paulo, esse sangue era pouco utilizado devido ao trabalho de processamento. O entrevistado4 ressalvou que o Grupo resolveu investir nesses secadores de sangue, em Dirce Reis é processado em torno de 80 a 90 mil litros de sangue por dia, com isso é feito a parceria de coletar nos açougues e 4 Trabalho de Campo realizado na processadora de Subprodutos em Dirce Reis, com entrevista com o gerente administrativo Adriano César Colombo, 08/10/12. 367 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 frigoríficos ao redor o sangue e o subproduto. Entretanto nas décadas de 1990 e 2000 que o Grupo tem a sua maior expansão em processadoras de subprodutos sendo abertas filiais Sebo Várzea Grande (Várzea Grande/MT), Sebo Mariense (Vila Maria/RS), Sebo Hidrolândia (Hidrolândia/GO), Sebo Tangará (Tangará/SC) e por último Sebo Ji-Paraná/RO. E há a probabilidade de ser aberta uma processadora de subproduto no estado da Bahia e no Tocantins. Considerações Finais Analisamos como foi que a indústria de couros está se diversificando em diferentes nichos de mercado e podemos apontar que existem certamente diversos desafios principalmente para as pequenas e médias indústrias que acabam perdendo espaços em ambientes competitivos, entretanto, desde as dificuldades de enfrentamento com a concorrência internacional e das barreiras técnicas impostas por importantes consumidores externos. Referências CHOLLEY, A. Observações sobre alguns pontos de vista geográficos. In. Boletim Geográfico. Ano XXII, n. 179 e 180. Rio de Janeiro: IBGE, 1964. LENINE,V. I. Obras escolhidas, Lisboa-Moscou, Edições Avante – Edições Progresso,1979. MAMIGONIAN, Armen. Notas sobre o processo de industrialização do Brasil. In: Boletim do Departamento de Geografia. Presidente Prudente: Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Presidente Prudente, n° 2, 1969. p.55-63. MAMIGONIAN, Armen. O Processo de Industrialização em São Paulo. In: Boletim Paulista de Geografia,n°50. São Paulo: 1976.p.83-101. MONBEIG, Pierre. Pioneiros e fazendeiros de São Paulo. São Paulo: Hucitec, 1998. MOURÃO, Paulo Fernando Cirino. Reestruturação Produtiva da Indústria e Desenvolvimento Regional: A Região de Marília. São Paulo – SP, 2002 (tese de doutorado). NETO, Delfim. Moscou, Freiburg e Brasília: ensaios. Rio de Janeiro: Topbooks, 1990. 368 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 RANGEL, Ignácio. Economia, milagre e antimilagre. Rio de Janeiro: Zahar, 1985. SANTOS, Milton. Sociedade e espaço: a formação social como categoria e como método. Boletim Paulista de Geografia, n. 54, p. 81-100. 1977. SANTOS, Milton; SILVEIRA, Maria Laura. Brasil: território e sociedade no início do século XXI. Rio de Janeiro: Record, 2001. 369 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 PROCEDIMENTOS DE PESQUISA EM GEOGRAFIA DO COMÉRCIO: DELIMITAÇÃO, INTENSIDADE E ESPECIALIZAÇÃO DE ÁREAS COMERCIAIS. ANÁLISES EM LONDRINA-PR, PRESIDENTE PRUDENTE-SP E RIBEIRÃO PRETO-SP Talita Lopes Ruano1 Arthur Magon Whitacker2 1 - Introdução Num contexto em que as cidades se tornam o principal cenário de ação do Homem, um conjunto profundo de transformações vem ocorrendo. Nesta pesquisa destacaremos as mudanças sucedidas através da reestruturação produtiva, que se associam: à ampliação das formas de deslocamento; à melhoria dos meios de comunicação; à tendência geral da concentração econômica; à ampliação do número de conglomerados econômicos que atuam em diferentes ramos e setores de atividade econômica; à flexibilização dos contratos de trabalho; e à modificação das plantas industriais e suas localizações. Busca-se compreender, através deste estudo, a redefinição nas lógicas de produção dos espaços urbanos destinados ao consumo de bens e serviços. A delimitação destas áreas comerciais e de serviços será realizada por meio da comparação da realidade, observada in loco, e indiretamente, via obtenção e mapeamento de dados oriundos do Cadastro Nacional de Endereços para Fins Estatísticos, comparando com as delimitações estabelecidas pelo zoneamento urbano e/ou pelos planos diretores das cidades de Londrina (PR), Presidente Prudente (SP) e Ribeirão Preto (SP) (Figura 1). 1 Aluna do curso de Graduação em Geografia da Faculdade de Ciências e Tecnologia – FCT – Universidade Estadual Paulista – Campus de Presidente Prudente / e-mail: [email protected] 2 Professor Doutor do Departamento de Geografia da Faculdade de Ciências e Tecnologia – FCT Universidade Estadual Paulista – Campus de Presidente Prudente / e-mail: [email protected] 370 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Figura 1 – Mapa de localização dos municípios de estudo na pesquisa (Londrina-PR, Presidente Prudente-SP e Ribeirão Preto-SP). 2 - OBJETIVOS 2.1 - Objetivo Geral Através deste estudo, busca-se identificar a delimitação, intensidade e especialização das áreas de concentração de atividades comerciais e/ou de serviços, de Londrina-PR, Presidente Prudente-SP, e Ribeirão Preto-SP, assim como novas possibilidades de mapeamento, através da produção de cartas funcionais. 2.2 - Objetivos Específicos Identificar a delimitação, intensidade e especialização das áreas de concentração de atividades comerciais e/ou de serviços; Investigar novas possibilidades de mapeamento e produção de cartas funcionais; Comparar os resultados obtidos com a investigação da delimitação e especialização de áreas comerciais e/ou de serviços com o zoneamento 371 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 oficial e com a identificação de tais áreas nos planos diretores municipais; Estabelecer comparações entre as tipologias observadas e aquelas definidas nos referenciais teóricos. 3 - Procedimentos metodológicos Os procedimentos iniciais de investigação desta pesquisa consistem em: levantamento, leitura e sistematização da literatura sobre o tema da pesquisa; identificação das áreas centrais e/ou de concentração de atividades de comércio e serviços no zoneamento ou nos planos diretores municipais; comparar estas áreas com aquelas em que a concentração de atividades levantadas por meio do CNEFE3 for mais alta; estabelecer uma tipologia dos usos do solo nestas áreas, considerando o centro, subcentros e áreas ou eixos de concentração de atividades comerciais e/ou de serviços que não se enquadrem nas duas categorias acima, classificando os estabelecimentos disponibilizados pelo CNEFE por meio da CNAE4. Para que este estudo mantivesse o seu cronograma está sendo realizado um levantamento bibliográfico acerca de temas referentes à pesquisa, que nos oferecessem um embasamento teórico para a execução do trabalho. Iniciamos com algumas obras de fundamental importância para a temática de análise, a fim de situar a discussão específica da Geografia do Consumo, numa mais abrangente, a da Geografia Urbana. Além disso, buscouse em diferentes leituras, um material que contribuísse para a caracterização geral das três cidades de estudo. Paralelamente, foram classificadas as tabelas dos municípios de estudo através do CNEFE/CNAE, com o objetivo de identificar a concentração de atividades de comércio e serviço. A metodologia dessa classificação consiste em baixar no site do IBGE5, o arquivo referente ao CNEFE dentro da pasta do Censo 2010, escolher o 3 Cadastro Nacional de Endereços para Fins Estatísticos Classificação Nacional de Atividades Econômicas 5 http://downloads.ibge.gov.br/downloads_estatisticas.htm 4 372 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 município de análise e baixar. Quando realizamos o download, o arquivo se encontra no formato “.txt” (formato de texto/bloco de notas). Para o tratamento e organização dos dados é necessário converter o arquivo “.txt” em um arquivo “.xls” (planilha/excel). Após realizar essa conversão do formato, podemos iniciar a classificação dos estabelecimentos do município de análise baseado na CNAE. O Cadastro Nacional de Endereços para Fins Estatísticos é um banco de dados do IBGE6, que consiste em uma lista com os endereços tanto urbanos quanto rurais do país lançada em 25/11/2011, tendo como base o banco de dados do Censo Demográfico de 2010. O CNEFE permite filtrar alguma informação desejada, como edificações em construção, estabelecimentos agropecuários, estabelecimentos de saúde, domicílio particular, dentre outros. É através do site do IBGE, no item que consta o CNEFE que podemos baixar as informações do Distrito Sede das Cidades que estamos trabalhando e iniciar os estudos sobre uso e ocupação do solo neste distrito. Já a Classificação Nacional de Atividades Econômicas que também foi desenvolvida pelo IBGE, tendo como referência a International Standard Industrial Classification – ISIC, aprovada pela Comissão Estatística das Nações Unidas em 1989 e recomenda como instrumento de harmonização na produção e disseminação das estatísticas econômicas no âmbito internacional. A CNAE padroniza os códigos de identificação das unidades produtivas do país nos cadastros e registros da administração pública nas três esferas do governo. Na etapa atual do estudo está sendo feita a identificação das áreas centrais e/ou de concentração de atividades de comércio e serviços, através do zoneamento urbano e dos planos diretores de cada município. Posteriormente será definida qual será a técnica e o Software de SIG (Sistema de Informação Geográfica) adotado para mapear os estabelecimentos comerciais e/ou de serviços nas respectivas cidades de análise. 6 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística 373 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 4 - Resultados Por se tratar de um estudo recente, em fase inicial, têm-se como primeiros resultados, algumas leituras fundamentais para o tema de pesquisa, e a classificação via CNAE/CNEFE dos empreendimentos com atividades comerciais e/ou de serviços dos municípios de análise. Importante salientar que o levantamento bibliográfico que foi, e está sendo realizado, contribui para o enriquecimento teórico do estudo, e posteriormente será necessário para a compreensão e análise dos resultados alcançados nas três cidades em questão. Nesse sentido, a primeira leitura que trazemos para a discussão, foi “O Espaço Urbano” de CORRÊA (1989). O presente livro possui como abordagem principal a cidade, considerando esta como espaço urbano, e através disso o autor procura trazer definições sobre tal espaço. O autor define o espaço urbano como sendo o espaço dos diferentes usos da terra na cidade justapostos entre si. Entre estes usos destacam-se as áreas comerciais, industriais, de serviços, de lazer, residenciais etc. O espaço urbano, desta forma, torna-se fragmentado e cada uma das partes mantém relações espaciais com as demais, mas com diferentes intensidades. Para o autor, o núcleo de todas as relações é o centro da cidade. É nesta área onde ocorrem as principais relações sociais, econômicas e políticas. Porém, juntamente a esse grande número de relações e fluxos, surgem as desigualdades, pois por fazer parte de um modelo capitalista de produção, tende a ocorrer divisão de classes socioeconômicas na sociedade, que no espaço urbano vai resultar na diferenciação socioespacial. Corrêa (1989) aponta na terceira parte do livro quem são os verdadeiros responsáveis em produzir o espaço urbano, destacando que a ação de agentes capitalistas é complexa, derivando da dinâmica de acumulação de capital, das necessidades mutáveis de reprodução das relações de produção, e dos conflitos de classe que dela emergem. Partindo dessa perspectiva o autor destaca cinco agentes que fazem e refazem a cidade: proprietários dos meios de produção; proprietários fundiários; promotores imobiliários; o Estado; e os 374 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 grupos sociais excluídos. A seguir, com base no autor, identificamos cada um destes agentes: Os proprietários dos meios de produção são os detentores das indústrias e das grandes empresas comerciais, sendo grandes consumidores do espaço urbano. Necessitam de terrenos amplos e baratos que satisfaçam requisitos locacionais pertinentes às atividades de sua empresa. A ação espacial dos proprietários industriais leva à criação de amplas áreas fabris próximas as áreas proletárias. Deste modo, a ação destes agentes modela a cidade, produzindo o seu próprio espaço e interferindo decisivamente na localização de outros usos da terra. Os proprietários fundiários são aqueles que possuem a propriedade da terra, e atuam no sentido de obterem maior renda fundiária de suas propriedades, de modo com que estas tenham o uso que seja o mais remunerado possível, especialmente para fins comerciais e residenciais (de alto padrão). Esses agentes têm interesse na expansão da malha urbana na medida em que a terra urbana é mais valorizada que a rural. A variação da demanda por terras depende do aparecimento de novas camadas sociais, oriundas em parte de fluxos migratórios e que detém nível de renda que as torna capacitadas a participar do mercado de terras e habitações. Os promotores imobiliários, que em suas operações se inclui, o proprietário construtor do terreno e as firmas incorporadoras, especializadas na construção ou em uma etapa do processo produtivo. Vale ressaltar que grandes bancos e o Estado atuam também como promotores imobiliários. A atuação dos promotores imobiliários se faz de modo desigual, criando e reforçando a segregação residencial que caracteriza a cidade capitalista, através da exclusão das camadas populares. O Estado atua diretamente como grande industrial, consumidor de espaço e de localizações específicas, proprietário fundiário e promotor imobiliário, sem deixar de ser também um agente de regulação do uso do solo e o alvo dos chamados movimentos sociais urbanos. As terras públicas são 375 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 uma reserva fundiária que o Estado dispõe para usos diversos no futuro, inclusive para negociações com outros agentes sociais. A ação do Estado é marcada por conflitos de interesses dos diferentes membros da sociedade de classes, bem como das alianças entre eles. A segregação residencial é um dos conflitos que pode resultar também de uma ação direta e explícita do Estado através do planejamento, quando da criação, de núcleos urbanos. Por último, são através dos grupos sociais excluídos que se verificam as diferenças sociais no que se refere aos bens e serviços. É na no processo de ocupação irregular (favelas), em terrenos públicos e privados invadidos, que os grupos sociais excluídos tornam-se, efetivamente, agentes modeladores, produzindo o seu próprio espaço, na maioria dos casos independentemente e a despeito dos outros agentes. Por fim, o autor retrata os processos e as formas espaciais, onde menciona que os processos espaciais são os responsáveis imediatos pela organização espacial desigual e mutável da cidade capitalista. Portanto, este texto é de grande importância para o presente estudo, pois Corrêa (1989) traz uma importante análise sobre o espaço urbano, abordando como este se constituiu, quais agentes este concentra, como se dão as relações neste espaço e quais os aspectos e ações que o modificam. Além disso, possibilita em nossa análise, a compreensão dos papéis dos diferentes agentes produtores do espaço urbano para a formação/transformação das áreas que exercem centralidade para os empreendimentos de comércio e serviços. Outra obra que nos proporcionou uma visão geral a respeito da geografia urbana foi “Manual de Geografia Urbana” de Santos (1989), que abrange diversos assuntos principais da geografia urbana. Os principais eixos abordados neste livro são: a urbanização nos países subdesenvolvidos; a população urbana; economia urbana e estruturas sociais; as profissões e empregos nas cidades; fatores de crescimento econômico; o 376 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 controle dos fatores de crescimento; o papel do Estado; redes urbanas e tecidos urbanos. O autor nos traz um debate acerca da industrialização nos países subdesenvolvidos, onde a urbanização foi desenvolvida com o advento do capitalismo que apareceu na Europa como fato moderno logo após a revolução industrial. Mais recentemente e paralelamente à modernização ela se generaliza nos países subdesenvolvidos, por isso, costuma-se associar a ideia de urbanização à de industrialização. Dessa forma, não haveria industrialização sem o avanço da urbanização. O aumento da urbanização está ligado diretamente à migração da população, devido às maiores oportunidades de subsistência nas cidades, o que influenciou fortemente para o crescimento urbano. O crescimento devido ao movimento migratório é muitas vezes, superior ao crescimento natural. Aspectos que podemos resgatar do livro para a nossa pesquisa é sobre as diferentes estruturas sociais, nas quais as camadas bem definidas da população (pobres e ricos) têm poderes de compra diferentes. Sendo este consumo variável em qualidade, quantidade e em frequência. Através dessa realidade podemos traçar o perfil do consumidor, assim como os produtos consumidos e em quais locais são consumidos. Outra discussão pertinente que o autor aborda para nossa pesquisa, é sobre as regiões de influência de uma cidade. Santos (1989) afirma que quanto menor for o volume das compras de produtos de subsistência que a cidade realiza fora da região ou no estrangeiro, tanto maior será sua influência na região que a circunda. Assim como Milton Santos e Roberto Lobato Corrêa, estamos utilizando diversas outras bibliografias que pode contribuir com os aspectos a serem trabalhados e discutidos na pesquisa, como por exemplo, as diversas estruturas sociais, empregos nas cidades, fatores de crescimento, entre outros. Por fim, ressaltamos que o trabalho de quantificar os estabelecimentos comerciais e/ou de serviços nas respectivas cidades de análise será complementado com a descrição qualitativa, através da CNAE, para que sejam 377 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 classificados com precisão os estabelecimentos levantados combinando o banco de dados disponibilizado no CNEFE com o sistema de classificação estabelecido pela CNAE. Nossos resultados são ainda parciais. Temos classificado a tabela de uso e ocupação do solo baseado nos códigos da CNAE, assim como leituras acerca do tema que foram realizadas. As próximas etapas de trabalho consistem na identificação das áreas centrais e mapeamento dos estabelecimentos classificados via um SIG a ser escolhido. 4 - Considerações finais Os dados levantados nesta pesquisa, após receberem tratamento estatístico e cartográfico, serão analisados, procurando-se identificar e classificar os espaços de consumo, denominados como áreas de concentração de atividades de comércio e serviços. Com as proposições, análises e estudos que serviram de referencial teórico inicial, tentaremos promover uma apreciação entre o lido e o observado, com o objetivo de, mesmo compreendendo-se tratar de uma pesquisa de iniciação científica, contribuir com o debate científico. Assim, compreendemos que tal estudo é de fundamental importância para os estudos da geografia urbana, pois busca analisar dados concretos e de confiabilidade, para enfim se entender como as áreas comerciais e de serviços estão dispostas pelas cidades de estudo. 5 - Referências ABREU, D. S. Formação histórica de uma cidade pioneira paulista: Presidente Prudente. Presidente Prudente: Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, 1972. 339 p. BARBOSA, L. Sociedade de Consumo. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed., 2004. 68 p. CORRÊA, R. L.. O Espaço Urbano. Editora Ática, 1989. 94 p. GONÇALVES, J. H. R.. Quando a imagem publicitária vira evidência factual: versões e reversões do Norte do Paraná – 1930-1970. In: DIAS, 378 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Reginaldo e GONÇALVES, J.H. Rollo (coords). Maringá e o Norte do Paraná. Maringá: EDUEM, 1999, p. 88-121. LONDRINA. Plano Municipal de Saneamento Básico de Londrina – PR. 2009. 476p. MÜLLER, N. L. Contribuição ao estudo do Norte do Paraná. Boletim Paulista de Geografia, São Paulo, n. 22, 1956. PIERRE, G. Geografia do Consumo. São Paulo: Difel, 1971. 119 p. SANTOS, M. Manual de Geografia Urbana. São Paulo, Hucitec, 1989. 214 p. SPOSITO, M. E. B. O chão em Presidente Prudente: A lógica da expansão territorial urbana.. Dissertação – Departamento de Geografia Humana e Regional, IPEAPP-UNESP, Rio Claro. 1983, 230p 379 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 TERRITÓRIO E INDÚSTRIA NA REGIÃO DE OURINHOS: ENTENDENDO A GOVERNANÇA DAS AGLOMERAÇÕES PRODUTIVAS Lucas Labigalini Fuini1 Bibiana Conceição Rezende2 1 - Introdução, objetivos e metodologia O presente estudo se orienta à análise da relação entre território, governança e a atividade industrial, organizada espacialmente e economicamente na forma de aglomerações produtivas locais, na região de governo de Ourinhos, localizada no sudoeste do Estado de São Paulo, na região administrativa de Marília. Pretende-se analisar a governança das aglomerações e arranjos produtivos localizados como forma de entender o processo de construção do território e definição de seus usos nesta porção do Estado. As hipóteses que norteiam essa pesquisa são de que os estabelecimentos industriais tendem a se concentrar em determinados territórios locais e regionais em razão da existência de fatores econômicos (externalidades, fontes de recursos naturais, bacias de mão de obra, incentivos fiscais, rede de serviços) e histórico-culturais (saber fazer consolidado em atividades específicas), definindo especializações territoriais produtivas no quadro da divisão territorial do trabalho (SILVEIRA, 2011). E um dos elementos que permite um prolongamento da inserção territorial das empresas é quanto às suas formas e estratégias de governança, em articulação com os poderes públicos locais e outras entidades públicas e privadas. Nosso contexto espacial de estudo é a Região de Governo Ourinhos (RGO), composta por doze municípios e que tem no município sede seu 1 Professor Assistente Doutor do Curso de Geografia da Univ. Estadual Paulista/Unesp, câmpus de Ourinhos. É coordenador do projeto regular de pesquisa FAPESP (2011/20203-8), integrante do Grupo de Pesquisa/CNPq sobre Processos e Dinâmicas territoriais (DITER) e coordenador do Laboratório de Geografia Humana. Email: [email protected]. 2 Discente do curso de graduação em Geografia da Univ. Estadual Paulista/Unesp, câmpus de Ourinhos. É bolsista de Treinamento Técnico do projeto regular de pesquisa da Fapesp (2011/20203-8). Email: [email protected]. 380 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 principal polo econômico e populacional, sendo de pequeno porte o restante dos municípios. Trata-se de uma região localizada a oeste do Estado de São Paulo, acerca de 370 km da capital, com uma população de 217.741 (0,52% do Estado), Produto Interno Bruto/PIB de pouco mais de R$ 3,2 bilhões de reais (0,3% do Estado) e atividade industrial correspondente a 0,33% do valor adicionado industrial paulista. Assim, pensando na referida região e em seu quadro econômico, observa-se, na atualidade, a existência de um conjunto de aglomerações industriais, com diferentes níveis de relevância e de representatividade no plano estadual e nacional, que se apresentam em situação potencial ou embrionária de serem tratadas como Arranjos Produtivos Locais/APLs (CASSIOLATO e LASTRES, 2003), mas sua inserção ainda se dá em estruturas de governança frágeis e limitadas. Essa problemática oferece-nos o ponto de partida de nossa análise. Essa pesquisa está operacionalizada, quanto ao método, em torno de três planos fundamentais: da teoria, dos conceitos e das ferramentas práticas (dados estatísticos, documentos históricos, entrevistas), mesclando descrição, análise e síntese. De forma geral, seguimos o método hipotético dedutivo, partindo de hipóteses e ideias gerais que compartilhamos com outros autores e verificaremos à luz da realidade concreta. No plano teórico, seguimos uma leitura crítico-dialética do território, em nível multiescalar, buscando observar, historicamente, as contradições presentes nas aglomerações e arranjos produtivos identificados e estudados, tratando também de produzir uma síntese que se apresente como um mosaico das diferentes formas de governança dos territórios de aglomerações industriais especializadas. Os APLs aparecem no Brasil e no Estado de São Paulo como ferramenta de política industrial pública federal e estadual, com enfoque setorial, que busca, mediante transferência de recursos financeiros públicos e privados, fomentar e capacitar os negócios de pequenas empresas concentradas em aglomerações territoriais especializadas, articuladas por uma estrutura ou núcleo de governança (FUINI, 2010; FUINI, 2012). 381 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 A governança poderia ser definida, em termos mais gerais, como os diferentes modos de coordenação e compromissos que articulam os atores geograficamente próximos (econômicos, políticos, socioinstitucionais), através de regras do jogo, buscando resolver assuntos públicos e problemas inéditos que envolvem a mediação entre fenômenos que ocorrem em escala local e global, em relações de poder hierarquizadas (GILLY e PECQUEUR, 1997; PIRES, FUINI, et. al, 2011). Colletis, et al. (1998) propõe uma tipologia da dinâmica de desenvolvimento dos territórios locais e regionais adequada aos contextos de sistemas produtivos e instituições locais que buscam a passagem de economias de simples aglomerações (concentração de empresas devido às economias externas e de escala) para a crescente especialização (atração de atividades com características similares e com ativos/recursos específicos) e especificação (estruturas de coordenação locais) de recursos territoriais (Benko e Pecqueur, 2001). Seriam quatro, portanto, os tipos de governança: governança privada; governança privada-coletiva; governança pública e governança mista ou conjunta (Anexo 1): Em termos metodológicos, adotamos o critério utilizado pela Secretaria de Desenvolvimento, Ciência e Tecnologia, que organiza a política de APLs para o Estado de São Paulo, estabelecendo três tipos de categorias, seguindo elementos quantitativos e qualitativos para tratar dos APLs segundo seu nível de consolidação: APLs consolidados (importantes para o desenvolvimento local ou para o setor em que estão inseridos, com governança local consolidada); APLs em desenvolvimento (importantes para o desenvolvimento local ou possuem participação expressiva no setor industrial em que estão inseridos, mas ainda não têm uma governança consolidada) e APLs embrionários (concentrações de empresas com pouca representatividade para o setor industrial, mas com potencial para o desenvolvimento da economia local, sem governança consolidada) (SDCT, 2005, seguindo parâmetro de SUZIGAN (2004). 382 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 2 - Discussão e resultados A região de governo de Ourinhos pode ser considerada uma área de industrialização periférica do Estado de São Paulo, a 32ª. no valor adicionado da indústria entre 45 regiões de governo paulistas. Sua formação e desenvolvimento acompanham os diferentes ciclos econômicos ocorridos no Brasil, mais especificamente no Estado de São Paulo, que vão desde o início do século XX, com a expansão cafeeira e ferroviária para o oeste paulista, até o atual século XXI, quando se estabelece o predomínio da agroindústria globalizada associada às monoculturas de soja e cana-de-açúcar. Desde os anos 1940 até os dias atuais, a região é também marcada por fases de industrialização incipientes, iniciadas com pequenas empresas familiares e semiartesanais ligadas a fontes de matérias-primas, até se chegar aos dias atuais com certo nível de modernização tecnológica atrelada a empresas de maior porte instaladas em distritos industriais e que são envolvidas naquilo que Santos (1996) chama de guerra dos lugares, ou seja, a concorrência entre localidades para atração de investimentos conforme seus elementos naturais, técnicos e normativos que definem a produtividade dos espaços. Lencione (2002) identifica entre 1980 e 1987 um aumento modesto da participação das regiões de Marília (onde se insere a região de Ourinhos), Presidente Prudente, Araçatuba e S. José do Rio Preto do valor da transformação industrial paulista, de 2,3% a 2,5%. Selingardi-Sampaio (2009) aponta também outra evidência estatística da industrialização do "oeste paulista". Em 1996, a região administrativa de Marília (onde se localiza a região de Ourinhos) detinha apenas 0,6% do valor adicionado da indústria no Estado (Seade), subindo para 1,2% em 2009. E os setores que se destacaram nesta região, face à dinâmica espaço-temporal da indústria paulista, no período de 1970-1980, foram os de produtos alimentares, óleos vegetais, madeira e bebidas, não ocorrendo a modernização tecnológico-industrial associada com segmentos industriais de bens de capital e de consumo duráveis. Em certos aspectos, como cidade de porte médio (mais de 100 mil habitantes) que se articula à metrópole paulistana por eixos rodoviários e 383 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 ferroviários (eixos de desenvolvimento, como a Raposo Tavares e a Castelo Branco), Ourinhos vê surgir em seu entorno territorial algumas especializações produtivas, aglutinadas ou não em condomínios e distritos industriais planejados. Assim, é possível reconhecer a constituição de centros urbanoindustriais isolados, como os da região de Marília, durante as décadas de 1960, 1970 e 1980, considerados fora do alcance do poder de atração industrial estendido da metrópole paulistana. A formação desses centros industriais dispersos, como o caso da indústria de produtos alimentares da região de Marília, pode ser creditada às forças endógenas de especializações produtivas criadas e aperfeiçoadas, com certa pujança econômica e recursos específicos para sustentação e progresso e devido às influências exógenas das demandas representadas pelos mercados nacional e internacional (SELINGARDISAMPAIO, 2009; MOURÃO, 2009). Segundo dados da Rais, a atividade industrial com maior número de estabelecimentos na região em 2011 é a de “confecção de peças do vestuário” (54), concentrada, sobretudo, em Ourinhos, e presente em menor intensidade em quase todos os municípios da região. Esse segmento foi um dos que apresentou maior crescimento em número de estabelecimentos, com cerca de 24,1% no período de 2002 a 2011. É também o terceiro segmento que mais gera empregos formais na indústria regional (811), apresentando um crescimento de 29,7% na “quase década” assinalada anteriormente. Se adicionarmos as atividades de “confecção de roupas profissionais” e “confecção de roupas íntimas, blusas, camisas e semelhantes” ao ramo de “confecção de peças do vestuário”, a dimensão do aglomerado de confecções aumenta em 33,3%. A segunda atividade mais relevante em estabelecimentos (34) é a de "cerâmica para uso na construção civil", produzindo telhas, blocos e tijolos. Esta atividade assinala um movimento de queda de 2,9% entre 2002 a 2011. Se tomarmos em consideração a atividade de “fabricação de produtos cerâmicos” de forma mais ampla, que envolve desde a produção de itens para construção civil até itens para cerâmica decorativa e artística, a queda 384 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 registrada foi de 16,6%. É a quinta atividade que mais gerou empregos formais na RGO em 2011 (458), com pequeno crescimento de 4,8% no montante. A produção cerâmica está fortemente concentrada em Ourinhos. A terceira atividade com maior incidência de estabelecimentos, e que está inserida na indústria de alimentos, é a de “fabricação de produtos de padaria, confeitaria e pastelaria” (24) que, no entanto, percebeu uma queda de 16,6% entre 2002-2011 na quantidade de estabelecimentos formais. A atividade de “beneficiamento e fabricação de produtos de arroz”, também da indústria de alimentos, é uma daquelas que mais cresceu no quesito empregos (805), 51%. Esta última atividade de produção está concentrada regionalmente em Santa Cruz do Rio Pardo, para a produção de arroz e amiláceos e em Ourinhos para os demais produtos alimentícios. Santa Cruz do Rio Pardo aparece como o principal centro de beneficiamento e produção de arroz do Estado de São Paulo em número de estabelecimentos, segundo dados da Rais-2011. A quarta atividade mais relevante regionalmente em quantidade de estabelecimentos da indústria é a de “fabricação de calçados de couro” (23), assinalando uma queda de 13,3% no número de estabelecimentos entre 20022011. Aparece como a sexta atividade que mais empregou em 2011, denotando, no entanto, uma queda de 11,2% de vínculos empregatícios no período assinalado. Essa produção está fortemente concentrada no município de Santa Cruz do Rio Pardo. A quinta atividade industrial mais relevante é a de “fabricação de máquinas e equipamentos de uso específico e geral” (31) e que apresentou um aumento bastante significativo, de cerca de 64,7% em sua dimensão produtiva regional, pautada em número de estabelecimentos, considerando o período de 2002 a 2011. No entanto, quanto aos vínculos empregatícios, esse ramo de atividade apresentou queda de 41,1% no mesmo período assinalado. Outra aparente aglomeração industrial se encontra no conjunto de atividades de “fabricação de esquadrias, casas, estruturas de madeira e artigos de carpintaria”, “fabricação de artefatos diversos de madeira, palha, cortiça e 385 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 material trançado”, “desdobramento de madeira” e “fabricação de móveis de madeira”. Esse conjunto de atividades se colocaria como o terceiro de maior relevância em estabelecimentos até 2002 (31), aparecendo como prenúncio de constituição de um aglomerado regional moveleiro e madeireiro. No que tange ao número de vínculos empregatícios, a atividade madeireira mais bem colocada (fabricação de esquadrias, casas, estruturas de madeira e de carpintaria) é apenas a 18ª. na dimensão econômica regional, apresentando notável queda de empregos entre 2002 e 2011 (aproximadamente 45%). Essas indústrias estão concentradas nos municípios de Ipaussu e Ourinhos. A atividade regional industrial que mais gerou empregos em 2011 foi a de “usinas de açúcar”, que apresentou um crescimento de 66,9% de seus vínculos empregatícios entre 2002 e 2011. No entanto, não aparece como uma atividade muito expressiva em número de estabelecimentos produtivos, pois a dimensão de sua unidade produtiva difere das demais analisadas. A atividade de "produção de álcool", outra atividade agroindustrial que compõe a cadeia produtiva sucroalcooleira, totalizava em 2002, junto com a produção de açúcar, 15,6% dos empregos da indústria na RGO. Esse segmento sucroalcooleiro e o de máquinas e equipamentos para beneficiamento de grãos e soja se enquadram na perspectiva de modernização da agricultura (SANTOS; SILVEIRA, 2010), com a importância dos capitais fixos (estradas, ferrovias, silos, portos, frigoríficos, usinas), constantes (máquinas, tratores, sementes, fertilizantes) e as normas (calendários agrícolas, instrutivos de produtos) para a produção crescentemente especializada e para maior eficiência das instâncias de circulação e consumo. Nesse sentido, a divisão territorial do trabalho leva à pulverização espacial das empresas, aumentando a necessidade de intercâmbios que estimulam a especialização dos lugares, associada à especialização do trabalho, expressando-se como um saber-fazer ancorado em um dado arranjo de objetos voltados à produção (SILVEIRA, 2011). Essa visão se aproxima da ideia de aglomeração territorial de empresas como um conglomerado territorial ou um conjunto de unidades de produção reunidas em um território bem 386 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 delimitado, como a cidade ou a região, articuladas a um mesmo setor de atividades (e independentes entre si) ou a uma cadeia produtiva (estreitamente interdependentes). A maioria das aglomerações, no entanto, configuram apenas APLs embrionários ou em desenvolvimento. Possuem relevância para a economia de certas localidades ou regiões (de governo e administrativas), mas não são representativas no setor industrial estadual e nacional e não apresentam estrutura de governança consolidada. A única aglomeração considerada APL pela Secretaria de Desenvolvimento Econômico, dentro do Programa paulista de fomento, foi a de “couro e calçados” de Sta. Cruz do Rio Pardo, através do projeto do “4º. Polo calçadista do Estado de São Paulo” de 2006. Desse modo, a aglomeração calçadista acabou por construir uma estrutura de governança em torno do Sindicato calçadista patronal, o núcleo gestor, em parceria com o Sebrae, a Secretaria estadual e a Prefeitura municipal. No entanto, crises na atividade dificultaram a manutenção do projeto APL devido a oscilações da demanda e queda da produção e também pelo fim do projeto em parceria com o Sebrae, levando a indústria local à desestruturação territorial, segundo concepção de Colletis, et. al, 1998. Tal desestruturação conduz o sistema/arranjo produtivo a sair de um patamar de especificação de recursos territoriais e caminhar para patamares inferiores de especialização, devido às crises da atividade e do produto, que podem ser tanto interna do tecido econômico quanto podem vir de um choque exógeno, marcando a transição de estrutura de organização comum para um comportamento mais individualizado dos atores para lidar com a crise. Atualmente a governança do segmento calçadista de Sta. Cruz se resume à ação do Sindicato das Indústrias de calçados e vestuário e seu presidente, empresário e liderança conhecida no segmento, sendo, portanto, uma governança de tipo privada-coletiva. As demais indústrias identificadas se encontram em patamares de APLs potenciais (alimentos/arroz, cerâmica) e embrionários (confecções, madeira/móveis, máquinas e equipamentos). Todas elas se encontram em 387 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 níveis de aglomeração e de especialização. As aglomerações designam concentrações espaciais de atividades econômicas heterogêneas, não necessariamente complementares, ligadas a economias externas e de escala, ligadas a certos recursos e políticas públicas. As especializações são fortes estruturas organizacionais do tecido econômico dominadas por uma atividade industrial ou produto, sendo que essas concentrações geográficas de atividades são ligadas por características produtivas, organizacionais e de mercado. Considerando as tipologias de governança, todas as outras referências de coordenação socioinstitucionais giram em torno de sindicatos e associações de produtores de segmentos específicos, com pequena ou fraca articulação dos empresários com os poderes públicos locais e com os sindicatos de trabalhadores dos segmentos analisados. Assim, predominam, nas aglomerações produtivas da região, estruturas de governanças ainda primitivas e precárias (FIGUEIREDO FILHO e FUINI, 2013), principalmente do tipo privado e privado-coletivo. No caso da atividade cerâmica, as ações no segmento são individualizadas por empresas, já que a Associação local se encontra "desestruturada" por conflitos entre industriais do segmento. Trata-se, ao momento, de uma situação de (des)governança (VEIGA, 2013), com dificuldades de se chegar a acordos pois questões financeiras (crise do segmento nos anos 2000) tornaram os empresários mais preocupados com seus próprios negócios, sendo que muitas empresas encerraram suas atividades. Podemos pensar também em uma governança situada entre o privado e o privado-coletivo, sem indústria motriz e sem sindicato representativo dos operadores privados. Ainda que se trate de uma especialização produtiva, com concentração geográfica de atividades ligadas por características produtivas e de mercado, corre-se o risco de se caminhar para um cenário de aglomeração, com a possível pulverização do tecido produtivo local em empresas individualizadas sem relação entre si. É importante considerar que as formas de governança constituídas, ou ainda a construir, se submetem tanto à dinâmica territorial dos sistemas 388 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 produtivos locais e instituições locais quanto aos macrossistemas produtivos e instituições globais (COLLETIS, et. al 1998). Assim, a governança territorial se insere em um quadro maior de regulação nacional e global. É o caso, por exemplo, da concentração regional de agroindústrias produtoras de açúcar e álcool que se comporta como formato de governança privada, associada a grupos de empresários locais, nacionais e internacionais (alguns deles consorciados) que administram as usinas, mas com lógica de governança em escala estadual e nacional, escalas governamentais pelas quais são encaminhadas as demandas do segmento produtor de commodities agrícolas. 3 - Considerações finais O presente estudo tratou das diversas formas de governança reconhecidas nas aglomerações e arranjos produtivos territorializados na região de governo de Ourinhos. A pesquisa pôde mostrar que essa parte do Estado de São Paulo, tratada como núcleo isolado de industrialização paulista (SELINGARDI-SAMPAIO, 2009), apresenta em seu tecido econômico um conjunto de aglomerações industriais que se territorializaram historicamente e estabeleceram diferentes formas de relações políticas e institucionais em âmbito local/regional, relações essas chamadas de governança. No que tange à dinâmica territorial da governança, observamos que a totalidade das aglomerações industriais identificadas na pesquisa (alimentos e arroz; confecções; cerâmica; madeira e artefatos; açúcar e álcool; calçados; metal-mecânica e equipamentos) pode ser considerada APLs em estágio embrionário ou em desenvolvimento, estando ainda nos níveis de aglomeração de atividades econômicas ou especialização de atividades produtivas, conforme os determinantes da divisão territorial do trabalho. Quanto à governança dos sistemas produtivos regionais, identifica-se no tecido produtivo regional um estágio ainda incipiente de construção de estruturas de coordenação socioinstitucionais mais sólidas, podendo-se afirmar que as sete aglomerações estudadas ainda se articulam em formatos de governança privadas ou privado-coletivas, sendo inclusive mais indicado 389 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 afirmar que algumas delas se encontram ainda em estágio de desgovernança, sem um claro padrão de regulação de rede de relações entre unidades produtivas, seja por projeto, pacto, consórcio ou outra forma de gestão, envolvendo atores públicos e da sociedade civil. Portanto, a realidade dessas governanças está longe do cenário idealizado como democrático, plural e participativo, estando mais próximo da realidade de assimetrias e hierarquias de poder. 4 - Referências BENKO, G. Economia, Espaço e Globalização: Na aurora do século XXI. São Paulo: Hucitec, 1996. BENKO, G.; PECQUEUR, B. Os recursos de territórios e os territórios de recursos. Geosul, Florianópolis, v. 16, n. 32, p. 31-50, jul. /dez, 2001. CASSIOLATO, J. E.; LASTRES, H. M. M. O foco em Arranjos produtivos e inovativos locais de micro e pequenas empresas. In: LASTRES, H. M. M; CASSIOLATO, J. E.; MACIEL, M.L. (orgs), Pequena empresa: Cooperação e desenvolvimento local, Rio de Janeiro, Relume Dumará, 2003. COLLETIS, G., GILLY, J.-P., et. al. Construction territoriale et dynamiques productives. Revue Sciences de la Societé, n. 48, Outubro de 1998. COSTA, S. L. (Des)governo, (in)governabilidade e (des)governança? RAPRevista de Administração Pública, Rio de Janeiro, FGV, v.1, n. 34, p. 42-74, mrç/abr 1997. FIESP; Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDICEx). Manual de atuação em Arranjos Produtivos Locais. Brasília: Depto. de Competitividade e Tecnologia da Fiesp/Depto. de MPMEs, 2004. FIGUEIREDO FILHO, W.; FUINI, L. L. As fragilidades da governança territorial no desenvolvimento regional. Anais do X Encontro Nacional da Associação Nacional de Pós-graduação e pesquisa em Geografia-ENANPEGE, Campinas, Unicamp, Anpege, outubro de 2013. FUINI, L. L. Manifestações da governança territorial no Brasil: Uma análise do Circuito das águas paulista e do Circuito das malhas do Sul de Minas Gerais. Tese (Doutorado em Geografia), Rio Claro, Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista, 2010, 191 f. GILLY, J. P.; PECQUEUR, B. La dimensión local de la regulación. In: BOYER, R.; SAILLARD, Y. (org.), Teoría de la regulación: Estado de los conocimientos. Volume II. Argentina: Oficina de Publicaciones da CBC, 1997, p. 115-124. 390 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 HAESBAERT, R. O mito da desterritorialização: Do “fim dos territórios” à multiterritorialidade. 2ª. Ed., Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006. LENCIONE, S. Reestruturação urbano-industrial no Estado de São Paulo: A região da metrópole desconcentrada. In: SANTOS, M., et al. (org.), Território, Globalização e Fragmentação. 5ª. Edição, São Paulo: Hucitec/Anpur, 2002, p. 198-210. MOURÃO, P. F. C. Reestruturação produtiva e industrialização no oeste paulista. In: SILVEIRA, M. R.; LAMOSO, L. P.; MOURÃO, P. F.C., Questões nacionais e regionais do Território Brasileiro. São Paulo: Expressão Popular, 2009 PIRES, E. L. S.; FUINI, L. L.; MANCINI, R. F.; PICCOLI NETO, D. Governança territorial: Conceito, fatos e modalidades. Rio Claro: Unesp-IGCE-Programa de pós-graduação em Geografia, 2011. SANTOS, M. A natureza do espaço: Técnica e tempo, Razão e emoção. São Paulo: Hucitec, 1996. SANTOS, M. e SILVEIRA, M. L. O Brasil: Território e sociedade no início do século XXI. 10ª. Ed., São Paulo/Rio de Janeiro: Record, 2010. SELINGARDI-SAMPAIO, S. Indústria e Território em São Paulo: A estruturação do multicomplexo territorial industrial paulista (1950-2005). SP: Alínea, 2009. SILVEIRA, M. L.. Território usado: Dinâmicas de especialização, dinâmicas de diversidade. Ciência Geográfica, Bauru/SP, AGB, v. 15, n. 1, p. 4-12, jan./dez. de 2011. SPÓSITO, E. S. Geografia e Filosofia: Contribuições para o ensino do pensamento geográfico. São Paulo: Edunesp, 2004. STORPER, M. e HARRISON, B. Flexibilidade, Hierarquia e Desenvolvimento Regional: As mudanças de estrutura dos Sistemas Produtivos Industriais e seus novos modos de Governância nos anos 90. In: BENKO, G. e LIPIETZ, A. (org.), As Regiões Ganhadoras. Distritos e Redes: Os novos paradigmas da Geografia Econômica. Oeiras: Celta Editora, 1994, p. 171-188. SUZIGAN, W., et al. Clusters ou sistemas locais de produção: Mapeamento, tipologia e sugestões de políticas. Revista de Economia Política, São Paulo: Centro de Economia Política, v. 24, n. 4 (96), p. 543-561, out./dez. 2004. VEIGA, J. E. A (des)governança mundial da sustentabilidade. SP: 34, 2013. 391 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Anexo Quadro 1 - Tipologia da governança nas dinâmicas produtivas de construção de territórios Tipos de governança Características Governança privada Governança privada-coletiva Governança pública Governança mista ou conjunta São os atores privados dominantes que impulsionam e dirigem os dispositivos de coordenação e criação de recursos segundo o objetivo de apropriação privada. Este é o modelo da firma motriz, o estabelecimento de um grande grupo, por exemplo, que estrutura o espaço produtivo local. Neste caso, o ator-chave é uma instituição formal que reagrupa os operadores privados e impulsiona uma coordenação de suas estratégias. Encontramos, neste caso, as câmaras de comércio, os sindicatos profissionais e todo tipo de clubes que reagrupam operadores privados. As instituições públicas utilizam métodos de gestão de recursos que diferem da apropriação privada, notadamente através da produção de bens e serviços coletivos que por definição são utilizados por todos os atores, sem rivalidade nem exclusão de uso. Estes seriam, principalmente, o caso do Estado, das autarquias locais e todas as formas de intercomunidades (distritos, sindicatos de planejamento/ordenamento territorial, sindicatos de comunidades urbanas), mas também os centros de pesquisa públicos. Raras são as situações puras, mas em muitas vezes são uma combinação destas diferentes formas, mas com um dominante. Assim, é possível caracterizar cada território como casos especiais de uma classe geral (Mais pública ou mais privada) com uma dosagem específica e variável. Fonte: Colletis; et al., 1998. 392 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 DE FAZENDA A ASSENTAMENTO: O processo de territorialização do Assentamento Oito de Abril em Jardim Alegre/PR Cleiton Costa Denez3 Vitor Hugo Ribeiro4 Resumo: O presente trabalho apresenta o processo de territorialização do Assentamento Oito de Abril em Jardim Alegre/PR, demostrando as etapas e tensões pela disputa do espaço da Fazenda “Sete Mil”. Para tanto, a pesquisa se fundamentou em uma revisão bibliográfica parcial sobre o assunto, entrevistas com assentados e moradores da cidade de Jardim Alegre/PR, e ainda, observações e relatos colhidos em trabalho de campo para compreender como ocorreu a ocupação da propriedade pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Segundo as entrevistas e demais informações de campo, conclui-se que a propriedade foi ocupada por etapas, onde o MST articulou a vinda de várias famílias para o local, contribuindo para o sucesso do controle de parte da Fazenda à tomada da sede e resistência, até que ocorresse a compra da propriedade pela União, após oitos anos de conflitos. Palavras-Chave: Acampamento; Assentamento; MST; Territorialização. Introdução O presente trabalho tem o objetivo de discutir o processo de territorialização do Assentamento Oito de Abril, em Jardim Alegre/PR, destacando como ocorreu o processo de ocupação, em que se travou a disputa pelo espaço entre os sem-terra e o proprietário da fazenda, até a compra da propriedade pela União. Assim, questiona-se como ocorre a territorialização sem terra e como se processa a dinâmica de uma propriedade ocupada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). A hipótese é que a partir da organização do MST ocorreu a possibilidade da aglomeração, articulação e organização de famílias sem terra para disputar o espaço em questão. O Movimento iniciou sua territorialização no espaço jardim-alegrense, onde havia a Fazenda Corumbataí, também conhecida como Fazenda “Sete Mil”, em 8 de abril de 1997. A fazenda permaneceu ocupada de 1997 a 2004, 3 Doutorando em Geografia pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Integrante Grupo de Pesquisa Redes de Poder, Migrações e Dinâmicas Territoriais (GEPES). Bolsista Fundação Araucária. E-mail: [email protected] 4 Doutorando em Geografia pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Integrante do Núcleo de Estudos de Mobilidade e Mobilização (NEMO). Bolsista da Fundação Araucária. E-mail: [email protected] 393 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 como um acampamento do MST, quando se dá a aquisição pela União, passando a ser um assentamento. Para tanto, realizou-se uma pequena revisão bibliográfica sobre o MST, território, territorialização e territorialidades em Raffestin (1993), Fernandes (1999), Haesbaert (2004) e Saquet (2004; 2010). Utilizou-se, ainda, como procedimento metodológico, entrevistas com assentados e moradores da cidade de Jardim Alegre/PR, bem como observações e relatos de campo. Com a territorialização dos acampados do MST, a partir das territorialidades do movimento, em confronto com a estrutura territorial anterior, possibilitou a posse efetiva do território do assentamento após longo processo de ocupação e conflitos. O processo de disputa e tomada do espaço para territorialização do assentamento ocorreu por meio da organização do MST, o qual possibilitou a vinda de trabalhadores rurais de diferentes locais, que ocuparam apenas um trecho da fazenda. Após certo tempo, a estratégia foi avançar sobre as guaritas que continham o avanço dos acampados, com a ocupação da sede da propriedade e resistência na Fazenda em um processo que durou mais de oito anos, de 1996 a 2004, quando ocorreu a aquisição da área pelo Governo Federal. A aquisição foi realizada após levantamentos e estudos feitos pelo Instituto Nacional de Reforma Agrária (INCRA), pela União, por um valor de R$ 108.000.000.00 (cento e oito milhões de reais). O MST nos “arredores” de Jardim Alegre A chegada do MST no município de Jardim Alegre propiciou, em primeira etapa, um ‘choque de territorialidades’, com famílias vindas de diferentes locais a essa área, sob a égide desse movimento social. A territorialidade é construída de forma relacional e representa a ação no interior do território ou na produção de territórios pautadas nas relações de poder que regem determinados espaços. Assim, “se manifesta em todas as escalas espaciais e sociais; ela é consubstancial a todas as relações e seria possível dizer que, de certa forma, é a face vivida da face agida do poder” (RAFFESTIN, 1993, p. 161-162). Como mencionado por Saquet (2004), a territorialidade é 394 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 resultado e condição do processo de produção de cada território. Ocorre dessa forma, em Jardim Alegre, um ‘choque de territorialidades’, marcado pelos costumes corriqueiros de uma pequena cidade versus as ações do MST. Com a ocupação às margens da rodovia, próximo ao núcleo urbano de Jardim Alegre, os sem terra iniciaram o processo de territorialização no município em questão, com a apropriação do espaço e produção de um novo território. Mapa1: Área territorial do Assentamento Oito de Abril no município de Jardim Alegre Jardim Alegre se construiu com a produção cafeeira permeada por pequenas, médias e grandes propriedades, sendo uma delas, ocupando quase a metade do perímetro municipal, a Fazenda Corumbataí, ou como ficou popularmente conhecida: Fazenda Sete Mil. Fazenda que sempre esteve isolada pela distância e pela proteção realizada pelos seus funcionários nas 395 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 imediações, uma área praticamente desconhecida pelos moradores de Jardim Alegre e municípios vizinhos. De Jardim Alegre, das margens da BR-466, alojados em barracos de lona, os acampados partiram em direção ao município de Godoy Moreira, e de lá, ocuparam parte da Fazenda Corumbataí, em um processo de disputas e conflitos pela terra. De fazenda a acampamento: a disputa pela terra Para o desenvolvimento deste tópico, foram sistematizadas entrevistas, observações e relatos colhidos em trabalho de campo. Para preservar a identidade dos assentados, optou-se por usar apenas as iniciais dos nomes dos entrevistados. Dessa forma, serão utilizadas inicias como J.M5, D.M6 e V.B7, para se referir aos entrevistados: assentados, professores do Oito de Abril, moradores do município de Jardim Alegre e servidores do poder público local. O MST se organizou em uma primeira etapa, próximo à BR-466 em Jardim Alegre, acampados nessa área. Em seguida, ocupou-se uma parte da Fazenda Corumbataí, nas proximidades limítrofes com Godoy Moreira, chamado retiro8 do Xaxim, assim como consta no PDA9 do Oito de Abril. Conforme entrevistas e informações da COTRARA (Cooperativa de Trabalhadores Rurais Assentados), o processo de organização de ocupação teve início no dia 3 de setembro de 1996. A partir de então, reuniram-se mais 5 Entrevista concedida a Cleiton Costa Denez, em 8 de Fevereiro de 2010, no Assentamento 08 de Abril. 6 Entrevista concedida a Cleiton Costa Denez, em 8 de Fevereiro de 2010, no Assentamento 08 de Abril. 7 Entrevista concedida a Cleiton Costa Denez, em 6 de Março de 2010, no Assentamento 08 de Abril. 8 Lugar solitário ou fazenda onde fica o gado durante certa parte do ano, distribuído em nove retiros denominados: Xaxim, Canadá, Bananeira, Central, Grotão, Corimba, Perobal, Café e a Sede. As famílias montaram acampamento no retiro Xaxim (COTRARA, 2006, p. 60). 9 Plano de Desenvolvimento do Assentamento. É um estudo, na forma de um livro, que mostra a realidade do Assentamento a partir das suas condições de solo, clima, vegetação e água; levando em consideração as pessoas do assentamento, suas histórias de vida, seus sonhos e suas vontades, para definir as ações que devem ser tomadas pelos assentados, INCRA, prefeituras e outras instituições. Para o desenvolvimento das famílias assentadas, o PDA do Assentamento 8 de Abril foi organizado pela Cooperativa de Trabalhadores Rurais Assentados - COTRARA. 396 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 de setecentas famílias de agricultores sem terra, que durante sete meses se organizaram para a ocupação da Fazenda Corumbataí. Nesse contexto, Fernandes (1999), destaca que as ocupações têm sido uma forma de reivindicação para a realização da reforma agrária, como ocorreu no dia 8 de abril de 1997 na ocupação da Fazenda Corumbataí. Unidos a outras famílias acampadas, da região em que se encontra atualmente o Assentamento, o grupo reuniu forças para entrar em um dos retiros (Xaxim) que formavam a Fazenda. Todo processo de organização reuniu várias pessoas, cada uma com uma história de vida, porém, com algo em comum: a possibilidade de apropriação de um espaço à construção de um território e reprodução econômica e social. Raffestin (1993), ressalta que o território é algo construído sobre o espaço. Nesse sentido, o território não é o espaço, mas uma construção humana sobre ele. “O espaço é a ‘prisão original’, o território é a prisão que os homens constroem para si” (RAFFESTIN, 1993, p. 114). Como o poder é uma relação social, o território é a expressão espacial dessa relação e a relação humana que se produz sobre o espaço. Segundo o assentado D.M (2010), a ocupação, no início, era só com o pessoal da região e com quem já estava acampado anteriormente na rodovia. Ele conta que se juntaram ao movimento duzentas pessoas que vieram do sudoeste do Paraná quando já estavam no retiro do Xaxim. D.M, ainda explica que houve uma alternância de pessoas, com a organização do trabalho de recrutamento liderado pelo MST e, nesse processo, algumas pessoas saíram e outras vieram, como o caso das famílias do Sudoeste do Paraná. Conforme J.M (2010), enquanto estiveram acampados no retiro do Xaxim, sofreram pressão por parte dos funcionários da Fazenda, pois o acampamento era cercado por guaritas e constantemente ouviam-se tiros. J.M (2010), explicou que no início, quando houve a ocupação de parte do retiro do Xaxim, havia em torno de 400 famílias sob a pressão exercida pelo proprietário da Fazenda. Para Haesbaert (2006), o território é o produto de uma relação desigual de forças, em que há o domínio ou o controle do espaço, ora 397 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 conjugadas e mutuamente forçadas, ora desconectadas e contraditoriamente articuladas. Ao analisar a história, observa-se que a apropriação do espaço para a sobrevivência sempre esteve em posse de determinados grupos, levando à exclusão de outros e, assim, sua existência se dá pela contradição. Nesse momento, foi característico o modelo de acampamento do MST, com barracos de lona amontoados em meio à pressão dos funcionários da Fazenda contra os acampados. J.M (2010), relatou que no começo da ocupação as famílias eram supridas por alimentos que trouxeram. Elas estavam preparadas para passar um tempo, embora algumas fossem supridas por cestas básicas. Após três meses de acampamento, os sem terra já estavam plantando em uma área de duzentos alqueires na propriedade. Na cidade de Jardim Alegre, parte da população, nesse período, sentiase receosa em relação à presença do acampamento. Essa parcela da população alimentava uma visão de que o MST promovia a desordem e a baderna. “A maioria não gostou quando eles chegaram, porque invadiram a Fazenda e mataram o gado. Isso deu uma revolta grande na população. No começo havia revolta e preconceito. Acho que mais preconceito. Agora, já aceitam mais, mas tem receio ainda” (S. L10, 2011). Para suprir a população que estava na área e aumentar o controle sobre a propriedade, os acampados chegaram à conclusão de que era necessário avançar além das guaritas e tomar a Fazenda por completo, isso porque a área que estavam, segundo os assentados, não era mais suficiente para o número de famílias. De acordo com a COTRARA (2006), em 1997, o INCRA iniciou a vistoria na área, e após seis meses de ocupação, os trabalhadores receberam o decreto de desapropriação de 5.830 alqueires de terra. Porém, o então proprietário das terras entrou com ação na justiça e no prazo de um mês conseguiu revogar o decreto de desapropriação. Esta situação aumentou o clima de instabilidade entre os acampados persistindo por um longo período. 10 Entrevista concedida a Cleiton Costa Denez, em 4 de Janeiro de 2011, em Jardim Alegre. 398 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Sobre o início do movimento na região, D.M (2010) destacou a ocupação do retiro do Xaxim e os conflitos com os “funcionários” da fazenda e a desarticulação do movimento. Era necessário iniciar o trabalho de base para recrutamento de mais pessoas para a ocupação da propriedade. Segundo ele, a estratégia utilizada na ocupação era tomar o controle da sede da propriedade, que ainda estava sob a posse dos “funcionários”. Esse relato, demonstra a organização e o medo que acompanhava as pessoas do acampamento. O confronto direto dos sem terra com os “funcionários” da propriedade é um exemplo do clássico conflito no campo acompanhado de violência, a qual faz parte da territorialização do Assentamento Oito de Abril. Com a ocupação ocorreu a primeira etapa para a territorialização dos sem terra, vindos de várias localidades do estado e do país. Após ocuparem a sede da propriedade, os acampados resistiram a várias formas de pressão, como um dia na colheita que, segundo D.M (2010), os jagunços abriram fogo e feriram um acampado. J.M (2010) frisou que tentaram envenenar uma mina d’água utilizada para abastecer as famílias do acampamento. Ainda houve a destruição de uma área de sete alqueires, por um ato criminoso com herbicidas, dentre outras formas de pressão e violência contra os acampados. Com o tempo, os acampados começaram a pressionar, tomar as guaritas e avançar em direção à sede da Fazenda. Tomaram as primeiras guaritas que tinham o papel de fazer a contensão do pessoal do acampamento no retiro do Xaxim, porém, as guaritas logo foram reconstruídas mais à frente. A ordem nas guaritas da fazenda era não deixar ninguém passar. Para Fernandes (1999), o acampamento é um espaço de resistência já materializado e um processo de territorialização da luta, como podemos verificar com o relato da assentada J.M, sobre como foi a tomada da sede da propriedade pelos acampados: O pessoal conseguiu tomar posse da central onde havia famílias que trabalhavam para o fazendeiro e havia também outra equipe de pistoleiros. O nosso povo pegou o rádio amador e fez o pedido de reforço, ficando uma turma escondida no capim da estrada e quando o pessoal chegou com a pistolagem aqui, o nosso povo tomou eles 399 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 também. Pegaram o Jipe que eles andavam e colocaram eles na frente amarrados e o nosso povo atrás, e tomamos a sede (J.M, 2010). Os acampados chegam até à sede da Fazenda e o MST, a partir dos acampados, se territorializam sobre a propriedade, eliminando os conflitos entre os funcionários da propriedade e os acampados. Após a ocupação, segundo J. M. (2010), só houve ameaças de despejo e de que a polícia estava para chegar, boatos para assustar as pessoas, pressionando-as a deixar a propriedade. Ao mencionar que o MST se territorializou, tal crédito fica ao movimento por ter organizado todo o processo para que essas famílias chegassem à propriedade. Quem organizou estas famílias em Laranjeira do Sul? Quem as informou sobre a Fazenda Sete Mil? Quem as trouxe à Fazenda? Todas estas indagações só levam a uma resposta: o MST e o conjunto de relações estabelecidas entre os acampados que produziram as territorialidades necessárias para disputar o espaço e se territorializar. O MST foi o autor da ocupação da Fazenda Sete Mil e também das várias territorialidades que se fizeram presentes no período de acampamento até a compra da propriedade, em que o acampamento passa a ser assentamento. Considerações Finais O MST organizou o processo de ocupação da Fazenda “Sete Mil”, recrutou trabalhadores e utilizou a estrutura em rede que o movimento possui para a territorialização na propriedade. Essa etapa foi longa, de 1996 a 2004, data da aquisição da propriedade pela União. Foram oito anos de espera, sob barracos de lona, para que as famílias sem terra se apropriassem de um território. De acordo com as entrevistas, verificamos que a ocupação da Fazenda ocorreu de forma gradual, pela grande extensão territorial da área, 13.788,88 hectares. Os sem terra se articularam, primeiro com as pessoas da região, onde está inserido o município de Jardim Alegre. Essa ação possibilitou o trabalho de base e recrutamento do MST. 400 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Após a fixação em Jardim Alegre, o próximo passo foi ocupar parte da Fazenda “Sete Mil”, unindo forças com outros acampamentos para entrar na área. Com a entrada na Fazenda por Godoy Moreira, o acampamento ficou recuado em meio às guaritas. Os acampados sofriam pressão direta por parte dos funcionários da Fazenda e de forma indireta, por parte da população das cidades vizinhas, que nutriam um sentimento de receio e desconfiança em relação aos acampados, que eram criminalizados pela ocupação. Muitos desistiram por esses fatores e pela morosidade do processo. A chegada das famílias organizadas pelo MST, de várias regiões possibilitou a tomada das guaritas e finalmente o controle da sede da propriedade. Esses passos demonstram um pouco das disputas travadas sobre o espaço e re-territorialização de um grupo de pessoas. O território é resultado das relações efetivadas pelo homem e, nesse aspecto, as territorialidades do MST organizaram a ocupação da Fazenda “Sete Mil”, produziram um território e alteraram a organização espacial do município de Jardim Alegre. A territorialização é realizada a partir das territorialidades, que são sobrepostas a este espaço. A partir dessa territorialização, os acampados trouxeram consigo uma nova dinâmica territorial, alterando as relações sociais, tanto dentro como fora do espaço delimitado. As relações construíram a delimitação sobre o espaço ocupado pelo assentamento, sendo relações internas e externas, em um campo de força social, econômico e político. Saquet (2009) lembra que a territorialização se constitui e é substantivada por diferentes temporalidades e territorialidades que se apresentam multidimensionais, plurais e estão em unidades, como pode ser verificado no Assentamento Oito de Abril. As relações sociais estabelecidas sobre o espaço produziram territorialidades que transformaram uma fazenda em acampamento e um acampamento em assentamento, em que não está esgotada a discussão, pois cabe um esforço de reflexão maior sobre a organização e produção do território do Assentamento Oito de Abril e outros casos semelhantes. 401 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Referências COTRARA. PDA: Plano de Desenvolvimento de Assentamento do Oito de Abril. Santa Maria do Oeste – PR. 2006. FERNANDES, Bernardo Mançano. Contribuição ao Estudo do Campesinato Brasileiro: formação e territorialização do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST (1979 –1999). Tese (Doutorado em Geografia) Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, 1999. HAESBAERT, Rogério. O mito da desterritorialização: do “fim dos territórios” à multi-territorialidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004. RAFFESTIN, Claude. Por uma geografia do poder. Tradução de Maria Cecília França. São Paulo: Ática, 1993. SAQUET, Marcos Aurélio. Abordagens e concepções de território. São Paulo: Expressão Popular, 2ªed. 2009. ________________. O território: diferentes interpretações na literatura italiana. In: Território e Desenvolvimento: diferentes abordagens. Francisco Beltrão. PR. Unioeste, 2004. 402 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 AS REDES DE CONSUMO E SEU IMPACTO EM PEQUENAS CIDADES: O CASO DE IPEÚNA - SP Karlise Klafke1 Silvia A. G. Ortigoza2 1 - Introdução Diante da alteração do processo de produção fordista para o de produção flexível, as tradicionais hierarquias urbanas cederam espaço às novas dinâmicas espaciais caracterizadas pela mobilidade e conectividade. Com isso os papéis exercidos pelas cidades em seu cotexto regional foram modificados de forma a intervir em sua participação nas redes urbanas. Essas mudanças se refletiram em especial no mercado consumidor, alterando os fluxos de pessoas em busca de mercadorias de um contexto hierárquico para um contexto de complementaridade e concorrência (SPOSITO et al, 2007). As redes urbanas constituem-se pela articulação espacial e/ou tecnológica entre cidades. Tais articulações são definidas segundo Villaça (2001) pela circulação e possibilidade de deslocamento material e imaterial. Nesse sentido expressam-se dois tipos de articulação regional, aquelas determinadas pela continuidade territorial e aquelas que se estruturam a partir dos fluxos de informação. A continuidade territorial é determinante das relações estabelecidas entre as cidades de forma hierárquica, que dependem do sistema de transporte como meio de circulação. As teorias desenvolvidas no âmbito da economia urbana e regional (Ex. Von Thunnen, Christaller, Weber e Losch) propuseram padrões de organização de redes e cidades (tomadas como lugares centrais) e da localização de indústrias e das atividades primárias e terciárias em função dos custos de transportes, mão de obra, energia, etc., definindo tamanhos e vantagens da aglomeração urbana e a amplitude dos mercados. Nesse sentido, Salgueiro (1992) determina a influência de uma cidade pela distância a 1 Graduanda em Geografia, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Rio Claro. [email protected] 2 Professora Adjunta, Departamento de Geografia, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Rio Claro. [email protected] 403 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 que uma população esta disposta a deslocar-se para consumir bens e serviços. Por esse motivo, segundo a autora, as atividades tendem a aglomerar-se em centros onde há maior potencial de atração. Neste contexto, Ullman (1959) ainda afirma que o advento do automóvel e de vias de rápido acesso foi fundamental para reafirmação de algumas centralidades em detrimento de outras. Portanto a acessibilidade se torna crucial na formação de redes urbanas e definição de centralidades dentro dessas. Por outro lado, com a organização do meio técnico-científicoinformacional (SANTOS, 1996) a formação dessa rede deixa de depender da continuidade territorial, imposta pelas redes hierárquicas, e passa a estabelecer relações de acordo com conectividade entre diferentes centros. Assim, como afirma Sposito et. al (2007), os fluxos ultrapassam as regiões de comando de um determinado centro, podendo interagir com cidades fora de sua área de ação em uma dinâmica de complementaridade ou de concorrência. Portanto o fluxo de informações é determinante no estabelecimento de relações entre cidades, de modo que, segundo Carlos (1996) se estabeleça relações entre o local e o mundial. Além disso, Ortigoza (2001) destaca que agregado a esse processo ocorre a homogeneização dos modos de vida, comportamentos, cultura e consumo promovido pela globalização, cujos meios de telecomunicação possuem papel essencial em informar e criar necessidades aos consumidores. Assim a autora conclui que o consumidor deixa de ser nacional e torna-se mundial e, as demandas de consumo são buscadas em lugares cada vez mais distantes com a facilidade proporcionada pelo aparato informacional. Entretanto, apesar das alterações desencadeadas a partir das novas tecnologias, essa nova configuração não determina o fim das relações hierárquicas, essas duas formas de centralidade coexistem, contribuindo em maior ou menor grau para a (re) estruturação das cidades. Portanto para analisar tais dinâmicas é preciso compreender o papel das cidades na rede urbana em que “toda cidade, independente de seu tamanho, 404 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 será foco de organização, atração ou centralização de uma região (...), por isso, intensifica-se funcionalmente e diversifica-se, levando a uma gradativa expansão funcional” (HENRIQUE, 2012, p.65). No entanto, segundo o autor, as cidades possuem diferentes potencialidades de articulação, o que define a centralidade exercida por cada uma dentro da região. As pequenas cidades nesse quadro correspondem aquelas de menor centralidade, o que para a sociedade fordista significava que essas cidades não exerciam influência sobre as demais, no entanto no contexto da flexibilização produtiva essas possuem seus papéis ampliados. Assim em um primeiro momento, Salgueiro (1992) explica que as pequenas cidades não possuíam potencial de atração em relação à outras cidades e assim suas funções eram reduzidas, uma vez que seu mercado consumidor era atraído por centros estabelecidos em cidades maiores. Nesse sentido como bem destacou Corrêa (1999, p. 49) sobre as pequena cidades, “a ampliação da acessibilidade corrobora para a perda de centralidade”. Impossibilitadas de competir com outros centros as pequenas cidades voltavam sua produção para atividades não-centrais, basicamente ligadas ao meio rural. Dessa forma a centralidade por elas exercida se limitava a sua hinterlândia (CORRÊA, 1999), ou seja, o meio-urbano tinha seu desenvolvimento pautado no atendimento às demandas do campo. Já com a mudança no sistema produtivo, as cidades passam a se articular pela contiguidade e conectividade (SPOSITO et. al, 2007), assim torna-se possível a comunicação e relação direta com cidades de centros longínquos. Tal fato permitiu a desconcentração industrial, estabelecendo novas possibilidades para cidades médias e pequenas. Com isso, segundo Santos (1993), o campo sofre uma modernização e o meio urbano se sobrepõe a este resultando na diversificação produtiva das cidades. Tal diversificação, significa apenas novas possibilidades e não o aumento de atividades desenvolvidas. Nesse sentido, as pequenas cidades, para Henrique (2012) acolheriam uma atividade específica da qual seriam dependentes. 405 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Nesse contexto, Corrêa (2011) propõe a ocorrência de cinco estruturas produtivas em pequenas cidades: 1) lugar central em que há predomínio de atividades agrícolas; 2) centro especializado, onde verifica-se a dependência em relação a uma atividade industrial específica; 3) reservatório de força de trabalho, servindo a uma atividade econômica; 4) centro que vive de recursos externos, ou seja, as receitas federais tornam-se a principal fonte de renda e; 5) subúrbio-dormitório, próximos a um centro maior de forma que permita a migração pendular. No caso específico brasileiro devemos levar em consideração o tamanho de seu território e a heterogeneidade de sua produção que foi se concretizando desde a gênese da ocupação do espaço, portanto, não podemos generalizar as interpretações das dinâmicas urbanas no nível interurbano e nem no intraurbano. Assim cada cidade, de acordo com as especificidades de sua região, desenvolve de formas diversas sua centralidade no que concerne a influência exercida por suas atividades. Diante desse contexto, Ipeúna – SP possui uma dinâmica peculiar em relação a sua região, tornando-se um interessante objeto de estudo. 1.1 - Caracterização geográfica de Ipeúna Ipeúna é uma pequena cidade localizada no Oeste Paulista, com uma área municipal de 190.010km², da qual pequena parcela é destinada a área urbana, embora comporte nessa área 86% de seus 6.016 habitantes (IBGE – Censo 2010). O município pertence à região administrativa de Campinas, cuja rede urbana, de acordo com as regiões de influência é constituída da seguinte forma: Campinas (capital Regional A) – Piracicaba (capital Regional C) – Rio Claro (Capital Sub-Regional A) – Ipeúna (Centro local) (REGIC – 2007). Conforme Mapa 1, extraído do Regic (2007), que mapeia as regiões de influência a que cada município esta inserido de acordo com as relações e fluxos estabelecidos por cada cidade, Ipeúna está diretamente a um nível 406 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 inferior a Rio Claro conforme a rede citada, no entanto pode se relacionar diretamente com as cidades que compõe a rede, inclusive com as de mesmo nível hierárquico (como Charqueada), ou com cidades fora da região de influência a que se insere. Mapa 1 - Região de Influência Campinas - SP Fonte: Regic (2007). Essa região possui seu desenvolvimento pautado na expansão do café nas últimas décadas do século XIX, no qual a construção de ferrovias, visando o escoamento do café do interior para o litoral paulista, pode ser considerada o “agente propulsor do progresso na região” (MACHADO, 2004). Foram criados, segundo Monbeig (1984), núcleos de povoamento a cada 10 ou 15 quilômetros de distância, configurando uma rede urbana com numerosos pequenos centros. A ocupação da ampla área onde se encontra Ipeúna, segundo Machado (2004), se deu a partir da doação de sesmarias, constituindo o “Sítio Invernada” onde se fixou uma Igreja, formando-se um povoado ao seu entorno, já em 1896 é possível observar a presença de loteamentos com arruamentos e a presença de um cemitério. 407 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 No início do século XX, com a crise do café, as fazendas que cercavam Ipeúna foram divididas e desenvolveram pequenas produções voltadas para o mercado interno, possibilitando assim o desenvolvimento da atividade das “caieiras”, conforme Machado (2004): “Essa nova atividade econômica trouxe mudanças importantes para o Distrito em formação. Inicialmente, causou um aumento real de população, uma vez que a atividade exigia um grande número de trabalhadores. Além disso, na trilha da produção de cal, inúmeras atividades correlatas começaram a ser desenvolvidas tais como novas casas de comércio, que surgiram para atender a demanda do aumento populacional, e “frotas” de carros boi, que eram organizadas para dar conta do transporte da cal” (MACHADO, 2004, p.58). Nasce assim a partir da atividade das caieiras as atividades comerciais e de serviços a fim de suprir a demanda criada pela mesma. A atividade também permitiu a criação de uma infraestrutura básica (água encanada, rede de esgoto, saneamento básico) inexistente no distrito até então, que permitiu que anos mais tarde, em 1964, a independência de Ipeúna em relação a Rio Claro, se constituindo como município através da lei nº 8.092 de 28 de fevereiro de 1964. No entanto após alcançar sua independência Ipeúna pouco se desenvolveu, tão pouco aumentou seu contingente populacional e, segundo Machado (2004) conserva até hoje a dinâmica do momento de sua emancipação, caracterizada pela resistência a “individualização” da vida moderna observada nas cidades de seu entorno. Assim, se faz necessária a análise das relações de consumo entre Ipeúna e as cidades da rede em que esta inserida, a fim de compreender de que forma as demandas comerciais de seus habitantes são atendidas. 2 - Resultados esperados O desenvolvimento do trabalho se dará em um primeiro momento pela observação direta da realidade urbano-reginal de Ipeúna, que acrescida de levantamento bibliográfico pertinente e de dados empírico-teóricos permitirá visualizar a incipiência de atividades comerciais para atender a demanda 408 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 populacional de Ipeúna – SP, considerando também as relações de consumo que são amplamente complexas e contraditórias, tendo em vista a dinâmica regional em que esta inserida. Tal fato nos remete a uma dependência das pequenas cidades em relação às cidades médias no que tange ao comércio varejista, no caso específico, Ipeúna sofre dependência da rede em que esta inserida: Rio Claro, Piracicaba e em uma instância global Campinas e São Paulo. Tomando como ponto de partida o desenvolvimento das atividades econômicas de Ipeúna, será possível observar a predominância do setor terciário em relação as outras atividades, de acordo com os pressupostos teóricos que indicam a ampliação desse setor com a flexibilização do processo produtivo. Sobretudo no que se refere a mão de obra ocupada e ao produto interno bruto, uma vez que ocorreu a retração das outras atividades no processo de formação econômica da cidade. Portanto além de prevalecerem as atividades terciárias não se dão em função de outra atividade, existem por si. Nesse sentido, os segmentos comerciais presentes são aqueles que atendem a demanda imediata da população e, as atividades mais sofisticadas serão buscadas em outras cidades. Tal fato se deve a presença da rodovia Irineu Penteado, que liga Ipeúna a Rodovia Washington Luis, de forma que a facilidade de acesso e as sofisticadas e diversificadas atividades comerciais de cidades maiores (Rio Claro, Piracicaba, Campinas) impedem a ampliação da mesma na cidade de Ipeúna. Também colabora com tal fato a facilidade de consumo permitida pela informatização da informação. Além disso, acredita-se que não há a aglomeração de atividades comerciais de forma a caracterizar um centro, em primeiro lugar pela área do espaço urbano da cidade e, em segundo lugar por não desenvolver um potencial de atração de mercado consumidor em relação às cidades de seu entorno. Por fim, a ideia central é construir uma análise profunda da dinâmica comercial e de consumo na cidade de Ipeúna, para que se possa contribuir 409 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 com futuras pesquisas sobre o tema, haja vista que, a maioria dos trabalhos sobre esta temática tem priorizado as metrópoles, grandes e médias cidades. 3 - Referências CARLOS, A. F. A., O Lugar no/do Mundo. Hucitec, São Paulo, 1996. CORRÊA, R. L., A rede urbana. Ática, São Paulo, 1989. ___, Globalização e Reestruturação da Rede Urbana – uma nota sobre as pequenas cidades. In Revista Território, ano IV, nº 6, Garamond, 1999. ___, As pequenas cidades na confluência do urbano e do rural, GEOUSP Espaço e Tempo, São Paulo, Nº 30, pp. 05 - 12, 2011. HENRIQUE, W., Do rural ao Urbano: dos arquétipos à espacialização em cidades pequenas. In DIAS, P. C., SANTOS, J. (orgs), Cidades Médias e Pequenas: contradições, mudanças e permanências nos espaços urbanos. SEI, Salvador, 2012. IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e estatística. Censo 2010. Disponível em: www.ibge.gov.br MACHADO, H. M. de F. G.. Uma história para Ipeúna. Dissertação de Mestrado. Pós Graduação em Geografia, Rio Claro, 2004. MONBEIG, P., Pioneiros e Fazendeiros de São Paulo.Huitec Polis, São Paulo, 1984. ORTIGOZA, S. A. G., O Tempo e o Espaço da Alimentação no Centro da Metrópole Paulista. Tese de Doutorado, IGCE – Unesp Rio Claro, 2001. REGIC, 2007 – Região de Influência das Cidades. Disponível em: www.ibge.gov.br/home/geociencias/geografia/regic.shtm SALGUEIRO, T. B., A Cidade em Portugal: uma geografia urbana. Edições Afrontamento, 2ª Edição, Porto, 1992. SANTOS, M., A urbanização brasileira. Hucitec, São Paulo, 1993. ___. A natureza do espaço. Hucitec, São Paulo, 1996. SPOSITO, M. E. B., ELIAS, D., SOARES, B. R., MAIA, D. S., GOMES, E. T. A., O Estudo das Cidades Médias Brasileiras: uma proposta metodológica. In SPOSITO, M. E. B. (org), Cidades Médias: espaços em transição. Expressão Popular, São Paulo, 2007. ULLMAN, E., A Theory of Location for Cities. In MAYER, H. M., KOHN, C. F. (org), Readings in Urban Geography, University of Chicago Press, Chicago, 1959. VILLAÇA, F., O Espaço Intra-urbano no Brasil. Estúdio Nobel, São Paulo, 2001. 410 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 TERRITÓRIO E TERRITORIALIDADE DOS INDÍGENAS DA ETNIA TERÊNA DA ALDEIA EKERUÁ – AVAÍ/SP Angela dos Santos Machado1 Luciene Cristina Risso2 1 - Introdução A ideia de realizar este projeto surgiu de um trabalho de campo realizado na Aldeia indígena Ekeruá localizada na cidade de Avaí, interior de São Paulo, durante a disciplina de biogeografia. Foi a primeira vez que a maioria dos estudantes que realizou o campo teve a oportunidade de conhecer uma tribo indígena e a ideia que tínhamos era muito diversa com o que presenciamos na realidade, a aculturação foi uma das principais evidencias que percebemos, mas também a vontade de preservar a cultura. Assim, nasceu este trabalho que busca entender as relações que permeiam as diversas faces do território e a percepção indígena sobre sua territorialidade. Na Geografia as discussões acerca das relações de poder que ocorrem em determinado espaço, pressupõe o uso do conceito de território. Conceito amplo visto na concepção de Haesbaert (2004a), a partir de diversas noções que abordaremos a seguir. De acordo com o autor, podemos analisar o território segundo a concepção política ou jurídico-politica (relações de poder institucionalizadas) em que o território está ligado a um espaço delimitado e controlado, muitas vezes pelo Estado. Existe a concepção cultural ou simbólico-cultural, relacionada a um caráter mais subjetivo, em que o território é visto como produto da apropriação simbólica de um grupo em relação ao seu espaço vivido. Há diversas outras noções de território, como a concepção econômica, a idealista, a integradora, ou seja, integra as diferentes dimensões da sociedade 1 Graduanda em Geografia na Universidade Estadual Paulista, campus de Ourinhos. E-mail: [email protected]. 2 Professora Doutora na Universidade Estadual Paulista, campus de Ourinhos. E-mail: [email protected] 411 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 e da natureza e ainda, a ideia do território como um híbrido, “[...] híbrido entre sociedade e natureza, entre política, economia e cultura, e entre materialidade e ‘idealidade’, numa completa interação tempo-espaço [...]” (HAESBAERT 2004a, p. 116). A territorialidade é o caráter simbólico ou cultural do território, produtor de identidade, pois os indivíduos que compartilham o mesmo território tendem a ser vistos como iguais por se sujeitarem ao mesmo tipo de controle interno, quanto também pela relação de diferença que se estabelece entre esses indivíduos e os que se encontram fora dos limites do território, “o território provoca sentimentos, medo para quem dele é excluído, satisfação para aqueles que dele usufruem ou com o qual se identificam” (HAESBAERT 2004b, p.44). 2. A questão da terra no Brasil: breve análise histórica Segundo Andrade (2004), a problemática da desigualdade na distribuição de terras no Brasil tem origem no período colonial, com a doação de grandes propriedades a pessoas influentes da época, e a prática da expropriação indígena: A doação de terras em sesmarias [...] provocou o processo de sua ocupação e apropriação, sob a égide da grande propriedade e definiu um processo de dominação do latifúndio que ainda hoje ocorre no país. Durante três séculos, os donatários e o governador geral distribuíram sesmarias, nos vários quadrantes do país, as pessoas gradas e influentes e que participavam direta ou indiretamente da ação da conquista e da expropriação das tribos indígenas. (ANDRADE 2004, p.54). A questão se agrava com a Lei de Terras (lei nº 601, de 18 de setembro de 1850) que estabelece que a partir desse momento a aquisição de propriedades só poderia ocorrer por compra e venda, isso significa a exclusão de muitas pessoas que não tinham condições de realizar a compra, inclusive escravos libertos, mas que continuaram a margem da sociedade (Andrade, 2004). 412 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Sendo assim, percebemos que a questão da terra no Brasil desfavoreceu em sua maior parte a população indígena, negra, brancos pobres, mestiços, posseiros e pequenos proprietários. 3 - Os terenas: do território do chaco às terras brasileiras Segundo Carvalho (1979), os indígenas da etnia Terena são oriundos do Chaco, que no século XVIII, “era um país habitado apenas por índios, divididos em treze nações, ainda não submetidas à dominação colonial, embora todo o território fosse cercado por províncias conquistadas e povoadas por espanhóis”. As nações indígenas eram distintas cultural e linguisticamente, sendo que as mais importantes eram a Chiriguana (Guarani) com população entre 40 a 50 mil pessoas; a Mbayá com 3 a 4 mil pessoas, muito temida pelos espanhóis e por outros grupos tribais; e a Guaná com cerca de 30 mil índigenas, a mais pacifica e dócil que agrega além dos Terena ou Etelena, também os Layana ou Chaná, os Echoaladi, os Neguicagatemi, e os Equinikiao. Havia também outras nações: Mataguaya, Vilela, Lule, Macobi, Abipon, Lengua, Payaguá, Zamuca e Yacure. Segundo o mesmo autor, o ambiente natural em que habitavam esses povos era subandino, se deslocaram para o Chaco por haver relações de hostilidade com grupos vizinhos. As existências de enclaves aruaques na Província de Chiquitos e na área mato-grossense, linguisticamente diferente, revelam que as migrações devem ter ocorrido pelo Chané, região oeste da Amazônia e pelo Paressi, no alto do Xingu. O desinteresse em colonizar a área chaquenha existia porque os colonizadores a consideravam economicamente marginal, improdutiva. O solo era árido com vegetação xerófila, havia, porém, a presença de vários rios. Os povos que ali habitavam, sobreviviam basicamente de coleta, pesca e caça, não existiam padrões agrícolas regulares. Os Guaná cultivavam a terra e tinham que pagar um tributo aos Mbayá, em troca de proteção. Os Terenas ou Eterena, também eram chamados pelos Mbayá de Etelena ou Thelenoes, viviam em dois aldeamentos denominados pelos Mbayá como Alomegodigi e 413 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Nagatag-Edódigi, localizados entre os paralelos 20º e 21º. A cultura dos Terenas no século XVIII era uma mistura de elementos Chané- Aruaque próprios e Mbayá/Guaicuru (Carvalho, 1979). De acordo com Losnak (2008), houve um processo de genocídio na região do Chaco implantado pelos colonizadores, que intensificou os deslocamentos desses povos nativos para outras regiões, no século XVIII e XIX. Os Terenas seguiram o sentido sul pelo Rio Paraguai em direção ao atual estado do Mato Grosso do Sul. Os Terenas imigrantes localizam-se próximo a cidade de Miranda, no Mato Grosso do Sul (fig.1), em 1848 estimava-se por volta de dois mil a três mil indígenas de diversas etnias na região (Carvalho 1979). Em 1910 foi criado o Serviço de Proteção Indígena (SPI), política indianista do governo Marechal Rondon- descendente de índio- cujo propósito era a criação de reservas, onde os indígenas foram confinados e controlados como patrimônio federal, deixando de viver em uma organização social associativa e experimentando o modelo de núcleo familiar. A tribo indígena (TI) Araribá localizada na cidade de Avaí (fig. 2 e 3), interior do estado de São Paulo, foi criada em 1916, mas os primeiros Terênas chegaram a TI em 1932 trazidos do Mato Grosso do Sul, para repovoamento da reserva, logo após a gripe espanhola ter praticamente dizimado a população guarani e caingangue que ali habitavam (Losnak 2008). A construção da Estrada de Ferro Noroeste com ponto inicial em Bauru, ligada à sorocabana e a Companhia Paulista de Estradas de Ferro, apontava que “a região pela qual deveria passar a estrada de ferro constava nos mapas da época como ‘zona desconhecida e habitada por índios’”, juntamente com a linha férrea na região apareceram sertanejos, aventureiros, caçadores de índios, e surgiram as primeiras povoações. Antes de se chamar Avaí, a cidade recebia o nome de Jacutinga. À medida que os trilhos da Estrada de Ferro avançavam, os indígenas que habitavam a região iam sendo empurrados para longe, muitos ataques de índios Coroados ocorreram contra os trabalhadores que construíam a estrada de ferro. Como resposta, o governo federal fornecia 414 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 armas e munições aos trabalhadores e fornecia imigrantes para se estabelecer ao longo da linha. “A finalidade das construções era atrair novos povoadores e não servir às populações já existentes”. (Carvalho, 1979, p. 69). Segundo o mesmo autor, os Terenas tinham um alto nível de desenvolvimento técnico, produziam alimentos para comercialização (farinha, milho, arroz, polvilho, rapadura, melado etc.), também artesanatos de penas, de prata e outros metais, além de produtos de olaria, não só cerâmica de uso doméstico como também telhas, tijolos etc., produzidos comercialmente. Além disso, faziam tecelagem de redes de algodão chapéus de palha, selaria, sapataria e trabalhavam até como operários semiespecializados em obras de engenharia civil. Os Terenas participavam até mesmo da tarefa de “amansar”, “civilizar”, ou mesmo, “reduzir a vida civil” outros índios mais primitivos. Há a constatação de que toda a região da TI Araribá era uma velha zona decadente de café, substituída por capinzais e criação de gado. Os indígenas Terêna de Araribá vivem isolados de seu grupo étnico, distantes de suas terras de origem, tutelados pelo Estado e segregados pela sociedade, como seus antepassados. Do modo de vida anterior, guardam a língua e a dança do bate-pau, revivida pelos moradores no “Dia do Índio” e em apresentações realizadas aos visitantes da aldeia Ekeruá, seguem lutando pelas suas tradições e culturas (Losnak, 2008). 415 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Figura 10. Território indígena Terena no Mato Grosso do Sul. Fonte: Vargas, 2003. Figura 11. Localização da cidade de Avaí-SP. Fonte: Governo do Estado de São Paulo. 416 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Figura 12. Imagem se satélite do território indígena Araribá em Avaí-SP. Fonte: Google Earth. 4 - Objetivo O objetivo geral da pesquisa é compreender os processos territoriais sofridos pelos indígenas da etnia Terêna da Aldeia Ekeruá em Avaí-SP, bem como, a percepção que possuem a cerca de seu território. Destacamos alguns objetivos específicos: a) Compreender o processo de formação territorial brasileiro realizando uma análise histórica. b) Entender as relações de poder que envolvem a demarcação de terras indígenas buscando compreender o papel das entidades governamentais. c) Analisar a relação dos indígenas da Aldeia Ekeruá com o espaço, a fim de compreender a relação da comunidade com o meio em que estão inseridos, com destaque aos problemas enfrentados devido a proximidade com o meio urbano. 5 - Metodologia Primeiramente, realizar pesquisa bibliográfica no acervo da biblioteca da Universidade Estadual Paulista (UNESP) - campus de Ourinhos e em bancos de dados de órgãos competentes como Ministério do Meio Ambiente, Instituto Nacional de colonização e Reforma Agrária (INCRA), dentre outros, e em 417 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 artigos científicos publicados em revistas. Em seguida, realizar a discussão da literatura com a orientadora do trabalho. Realizar trabalhos de campo e entrevistas que permitam compreender a relação dos indígenas da aldeia Ekeruá com o território em que vivem e os conflitos e questões territoriais que afetam a comunidade. As informações obtidas serão analisadas sob a luz das leituras realizadas e os resultados parciais apresentados em eventos científicos. Por fim, será realizado o relatório final da pesquisa. 6 - Resultados A pesquisa encontra-se em fase de levantamento bibliográfico não possuindo assim, resultados parciais. 7 - Considerações finais Os indígenas foram os primeiros povos a habitar o Brasil sendo praticamente dizimados com a chegada do homem branco, os que restaram foram desapropriados de suas terras e até os dias de hoje precisam disputar os pequenos territórios que lhes restaram com latifundiários e diversos outros donos do poder. É preciso compreender o sentimento de pertencimento das comunidades tradicionais com a terra (territorialidade), que inclui até mesmo, mitos e religiões. Além disso, é necessário romper diversos estereótipos que geram preconceitos e a marginalização do indígena na sociedade, entendendo que passaram por um forte processo de aculturação, que pode ser revelado tanto pela suas vestimentas, religião, suas casas etc., mas buscam também proteger sua cultura como, por exemplo, ensinando sua língua e tradições aos mais novos. Este trabalho é o início de uma pesquisa na qual esperamos trazer alguma contribuição para a melhor compreensão da territorialidade dos indígenas da aldeia Ekeruá. 8 - Referências ANDRADE, M.C. A questão do Território no Brasil. São Paulo: Hucitec, 1995. 418 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 CARVALHO, E. A. As alternativas dos vencidos: índios Terêna no Estado de são Paulo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979. GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO. Programa de Moradia Indígena. Disponível em: <http://www.cdhu.sp.gov.br/download/manual/ProgramaMoradia Indigena.pdf> . Acesso em: 25/10/2013. HAESBAERT, R. Des-caminhos e perspectivas do território. In: RIBAS, A.D.; SPÓSITO, E.S.; SAQUET, M.A. Território e desenvolvimento: diferentes abordagens. Francisco Bestrão: Unioeste, 2004 a. ______. O mito da desterritorialização: do “fim dos territórios” à multiterritorialidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004b. ______. Territórios Alternativos. Niterói: EDUFF, 2002. LOSNAK, S. R. Re-significação da identidade cultural dos Terenas de Ekeruá: uma abordagem da produção cultural subalterna. USP, 2008. Disponível em: <http://www.usp.br/celacc/ojs/index.php/extraprensa/article/vie w/epx3-a1/epx3-a1 > Acesso em:26 jul. 2013. ROUSSEAU, J. J. Discurso sobre a origem da desigualdade entre os homens. 2001. Disponível em: <http://www.ebooksbrasil.org/adobeebook/desig ualdade.pdf>. Acesso em: 26 jul. 2013. VARGAS, V.L.F. A construção do território Terena (1870-1966): uma sociedade entre a imposição e a opção. Universidade Federal do Mato Grosso do Sul. Dourados, 2003. 419 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 TERRAS, ÁGUAS E FRONTEIRAS: O USO E OCUPAÇÃO DO SOLO NA INTERFACE PERIURBANA DO MUNICÍPIO DE FOZ DO IGUAÇU, PR Exzolvildres Queiroz Neto1 Andrea Montano Lourtet2 William Dellai3 Karoline Ribeiro4 Resumo: As áreas periurbanas são expansões urbanas que se dá à custa da ocupação das áreas rurais: a interfase periurbana, nesse sentido, é uma zona de expansão urbana, onde atividades urbanas e agrícolas coexistem. Para ver o uso e ocupação do solo nessas áreas de expansão se faz necessário identificar como se envolve toda a sociedade no planejamento e gestão da cidade, identificar como as relações sociais entre os atores são produtoras do espaço e se manifestam nessa expansão. Neste trabalho, analisando o Plano Diretor de Foz do Iguaçu-PR, sobre o qual distingue quatro ciclos fundamentais na formação econômica e social da cidade, de entre quais se destaca a instalação da Usina Hidrelétrica de Itaipu na década de setenta pôr a explosão demográfica que provocou em questão de poucos anos. Por meio desses ciclos gerou um uso e ocupação do solo de forma desordenada e não planejada, com fragmentação de espaços dentro da própria cidade. Palavras-chaves: Planejamento, Periurbano, Território, Plano Diretor, Especulação. Introdução A cidade de Foz do Iguaçu localizada a Oeste do Estado do Paraná - PR se encontra na região conhecida como Tríplice Fronteira: os rios Iguaçu e Paraná á separam de Argentina e Paraguai respectivamente. Uma cidade de destinos turísticos mais importantes do Brasil: as Cataratas do Iguaçu e a Usina Hidrelétrica de Itaipu são os fortes do turismo da região, somados a Ciudad del Este como lugar de turismo de consumo. A formação econômica e social de Foz do Iguaçu se pode esquematizar em quatro ciclo, segundo informações do IBGE tomadas pelo próprio Plano 1 Prof. Dr. Orientador. Universidade Federal [email protected] 2 Acadêmica de Economia. Universidade Federal [email protected] 3 Acadêmico de DRSA. Universidade Federal [email protected] 4 Acadêmica de DRSA. Universidade Federal [email protected] Latino-Americana (UNILA). Latino-Americana (UNILA). Latino-Americana (UNILA). Latino-Americana (UNILA). 420 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Diretor. A luz destes ciclos se podem visualizar a dinâmica demográfica da cidade. O Primeiro ciclo vai de 1870 a 1970: a atividade econômica predominante era a extração de madeira e cultivo de erva-mate, ao tempo que se começam a uma agricultura familiar com os gaúchos e catarinenses que chegaram a região. A população neste ciclo se localizava em 33.966 habitantes. O segundo ciclo se compreende da década de 1970 a 1980: a construção de Itaipu provocou a atração de grande contingente de mão de obra, se triplicou a população em dez anos, passando a ser de 102.355 habitantes. Suposto a expulsão de comunidades e inundação de extensos territórios pela formação do Lago de Itaipu. Neste período Paraguai se constituí como zona de livre comercio. O terceiro ciclo compreende de 1980 a 1995: se intensifica o comercio de compras com Paraguai, se desenvolve capacidade hoteleira e de turismo em geral, a tempo que aumenta o desemprego logo da terminada da construção da Usina de Itaipu. Se registrou uma diminuída na população, sendo localizada em 74.861 habitantes. Por último, o quarto ciclo de 1995 a 2003: se caracteriza por a abertura de Mercados no marco da globalização, especificamente localizamos aqui a formação do Mercosul. Se observa um desaparecimento de grande parte do setor exportados, se reduz comercio de compras e turismo hoteleiro. O persistente desemprego e economia informal produtos da abertura comercial com Paraguai e da massa de desempregados que deixou a obra da hidrelétrica deram lugar a processos de favelização, que na atualidade é um dos maiores problemas que enfrenta a Prefeitura no que diz respeito ao uso e ocupação do solo no município. Em este último período novamente se registrou um aumento populacional, com 108.007 habitantes. Partindo desses quatros ciclos, a construção de Itaipu constituí talvez, para este estudo a etapa mais interessante desde o ponto de vista demográfico, já que é a partir de ali onde a cidade toma a forma que hoje têm: 421 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 uma cidade profundamente fragmentada socialmente e territorialmente. A expulsão de comunidades originais, a chegada de trabalhadores de numerosas regiões, e o posterior desemprego foram fatores fundamentais no aumento da pobreza e a indigência na cidade. Na atualidade e segundo dado do Censo de 2010 do IBGE, a população de Foz do Iguaçu é de 256.088 habitantes. O uso e ocupação do solo em Foz do Iguaçu O tema central de nossa pesquisa é o estudo do uso e ocupação do solo na cidade de Foz do Iguaçu, especificamente na interfase periurbana da cidade, entendida pelo poder público local como aquelas áreas de expansão da cidade; zonas nas atividades urbanas e rurais coexistem. Dita expansão se dá em direção a área rural, área que se caracteriza segundo a Prefeitura Municipal como aquela em que se realizam atividades estritamente agrícolas, contrário a área urbana no que também de poder realizasse diversos tipos de atividades enquanto a uso e ocupação (residência, indústria, turismo, comercio) o poder público está mais presente, via serviços públicos como saneamento, eletricidade e infraestrutura básica. Assim, a zona rural e urbana se diferenciam más enquanto a presença de serviços públicos e não especificamente por atividades realizadas. As zonas de expansão surgem a partir da elaboração do zoneamento do município; dito zoneamento se dá em função das atividades permitidas em determinadas zonas, e não em função de tipos de solo. Temos então, por um lado um zoneamento que se define por tipos de atividades, permitidas, e por outro lado uma diferenciação entre o urbano e o rural que não necessariamente considera o tipo de atividade realizada em cada um. A chamada interfase periurbana, zonas de expansão, se caracteriza por ser áreas onde coexistem várias atividades, não sendo especificamente áreas destinadas a atividades urbanas ou atividades rurais estritamente. Segundo Brandão e Feder (1995) citados por Reydon (2006): 422 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 “Nas bordas de áreas urbanas, coexistem as atividades rurais e a expectativa de ganho dos proprietários, dos especuladores e dos incorporadores imobiliários. Isso condiciona um tipo de dinâmica no mercado de terras dessas áreas.” Para ver a forma em que se dá o uso e ocupação do solo abordamos dois conceitos que consideramos como chave: o planejamento e a gestão do território; dois elementos que longe se contrapor se complementam. Tomando uma referência de Souza (2004) podemos disser que o planejamento é fundamental para a gestão, ao ser a gestão a execução do planejamento futuro. Seria contraditório pensar gestão sem planejamento, e vice-versa, nas cidades de hoje. Atividades de distintas ordem no tempo. “O planejamento é a preparação para a gestão futura, buscando-se evitar ou minimizar problemas e ampliar margens de manobra; e a gestão é a efetivação, ao menos em parte (pois o imprevisível e o indeterminado estão sempre presentes, o que torna a incapacidade de improvisação e flexibilidade sempre imprescindíveis), das condições que o planejamento feito no passado ajudou a construir” (Souza, 2004. Pág. 46). O Plano Diretor é uma ferramenta de planejamento, uma norma exigida por lei como princípio primordial para todo o que refere organização, planejamento e desenvolvimento municipal, para cidades com mais de 20 mil habitantes. Estabelecido pela Constituição Federal de 1998 e regulado por o Estatuto das Cidades sobre os Artículos182 e 183 a política de desenvolvimento urbano executado pelo Poder Público Municipal, conforme diretrizes fixadas por lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem de seus habitantes (Art. 182 da Constituição Federal). O Plano Diretor estabelece diretrizes a respeito com desenvolvimento territorial do município, deve acima de tudo contar com a participação da população em suas etapas de construção bem como no cumprimento e fiscalização frente ao poder público municipal na implantação das ações previstas no Plano Diretor. 423 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Objetivos Analisar como os atores sociais (moradores, instituições públicas e privadas) produzem o uso e ocupação do solo na interface periurbana e quais a políticas públicas de planejamento no município de Foz do Iguaçu, PR? Metodologia No trabalho a metodologia adotada se baseou em pesquisas Bibliográficas, teóricas, qualitativas e quantitativas. O ponto de partida e fio condutor há sido o Plano Diretor do Municipal de Foz do Iguaçu, e o Estatuto da Cidade como base legal do Plano Diretor. Temos considerado de fundamental importância estes instrumentos por sua instrumentalização em matéria de planejamento socioeconômica do município no que refere ao uso e ocupação do solo. Foram realizadas entrevistas em alguns setores da Prefeitura Municipal de Foz do Iguaçu vinculados a área de planejamento e gestão territorial, que tiveram participação de alguma maneira na elaboração dos sucessivos Planos Diretores da cidade. Resultados Respeito aos problemas de uso e ocupação do solo que a Secretaria enfrenta hoje, um dos mais importantes é o dos processos de favelização. Ditos processos começaram com a mecanização do campo e o consequente adensamento da cidade, e se intensificou quando terminou a obra de Itaipu. Com o fim da construção da Usina se esperava que muitas famílias saíssem do Município, porém terminada a construção se prendeu a fixação de enorme contingentes em áreas próximas a Usina de Itaipu, na Vila “C” e a ocupação irregular de áreas de proteção ambiental as margens do Rio Paraná e assim desencadeando a formação de favelas. Sem recursos e sem possibilidades de trabalho essa massa de desempregados passou a ocupar a cidade como poderia. 424 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 “Uma favela não pode ser tratada no seu isolamento, sob a visão de um ambiente construído, mas, sim, sob o olhar de um desenho urbano, consequente de um fenómeno urbano, onde se fazem presentes as relações socioeconómicas, políticas e culturais, testemunhadas pela sua morfologia, isto é, pela sua configuração, sua forma” (NEGRI, 2007). Um dos problemas que enfrenta a expansão territorial da cidade são os vazios urbanos. A grande presença de vazios urbanos principalmente na área central dificulta na expansão para outras áreas. Tais vazios urbanos se volvem a fontes de especulação imobiliária dos quais o poder municipal encontra dificuldades para resolvê-los. Na ausência fiscalizadora da sociedade durante os tramites e analises para a elaboração do Plano Diretor, se identifica que distintos interesses influencia e dificultam a aprovação de leis que impediriam a ociosidade da terra urbana e consequentemente o exercício especulativo. Nas entrevistas realizadas, identifica que muitos dos problemas municipais enquanto a gestão advém de certa inoperância do poder público em seguir o que está colocado no Plano Diretor, pela subjetividade de interesses políticos assim como por uma falta de diálogo entre os diferentes níveis de representação da municipalidade. Não se trabalha com uma visão sistêmica de planejamento e execução, fazendo que seguida as decisões tomadas e as ações implementadas permaneçam muitas vezes isoladas. Considerações Finais Com base no Plano Diretor e as entrevistas realizadas, ficou-se evidente a importância de um sistema de planejamento estratégico do município. O Plano Diretor vigente (2006) ainda recolhe os mesmos problemas que aqueles que recolhiam os dois Planos Diretores anteriores, produto de não se pensar estrategicamente a cidade e de se utilizar mecanismos que resolvam apenas os problemas de hoje. Faz-se necessário estabelecer uma formulação mais participativa da comunidade e que seja eficaz a resolver o sistema num todo e não por partes. Esse planejamento deveria contemplar tanto as áreas urbanas como as rurais, com sistema de planejamento diferenciado que atenda a realidade dos espaços que compõem o município. 425 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 As políticas públicas orientadas à planificação e gestão do território encontram-se numa fase de desequilíbrio: por um lado tem-se um setor público muito dividido e marcado por interesses subjetivos, com políticas que refletem a contradição entre discurso e realidade. Por outro lado uma sociedade que não está preparada para participar ativamente na gestão do território, o que faz desacreditar na ideia da gestão democrática e participativa que coloca o Plano Diretor. Referências Brasil, Ministério do Desenvolvimento Agrário. Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural. Mercados de terras do Brasil: estrutura e dinâmicas. Organizadores Bastiaan Philip Reydon. Francisca Neide Maemura Cornélio. Brasília; NEAD, 2006. DE SOUZA, Clemente Edson Belo. DINÂMICA SOCIOESPACIAL DA REGIÃO OESTE DO PARANÁ: UM ESTUDO PRELIMINAR DOS REFLEXOS NA FRONTEIRA COM O PARAGUAI e ARGENTINA. S/a. Graziano da Silva, José. Del Grossi, Mauro. Campanhola, Clayton. O que há de novo no rural? IPARDES. Caderno estatístico Foz do Iguaçu. Junho 2012. NIGRO, Carlos Domingo. (In)sustentabilidade urbana. Curitiba. Ibpex 2007. OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino. Modo de produção capitalista, agricultura e reforma agraria. São Paulo.1º ed.; FFLCH, 2007. OLIVEIRA, Nara. Foz do Iguaçu intercultural: cotidiano e narrativas da alteridade. Foz do Iguaçu, PR. Epigrafe, 2012. PLANO DIRETOR. Foz do Iguaçu, 2006. SOUZA, Marcelo Lopes. Mudar a cidade; uma introdução crítica ao planejamento e a gestão urbanos. Rio de Janeiro,3º ed.; Bertrand Brasil, 2004. STEINBERGER, Marília. Território, ambiente e políticas públicas espaciais. Brasília: Paralelo 15 e LGE Editora, 2006. 426 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 EM BUSCA DA MEMÓRIA DE JACAREZINHO/PR: A CIDADE E SEUS SÍMBOLOS EM MEADOS DO SÉCULO XX Juliana Carolina da Silva1 Luciana Brito2 Introdução Tendo por base a fala de Italo Calvino de que "a memória é redundante: repete símbolos para que a cidade comece a existir" (2003, p. 23), admitimos que não só com prédios se edifica uma cidade, pois a urbe é formada, progride ou se esparsa conforme a percepção de seus transeuntes, havendo uma íntima relação formada entre os símbolos e as cidades. Da mesma forma, a memória pode ser vista como o que caracteriza as cidades, dando lhe identidade, cuja busca é uma das atividades fundamentais dos indivíduos e das sociedades de hoje. Mas a memória coletiva não é somente uma conquista, é também um instrumento e objeto de poder no mundo contemporâneo. Assim, no presente estudo, propomos observar a “vida própria” da cidade de Jacarezinho/PR, seus símbolos (fertilidade da terra e a religiosidade) e as relações destes com a identidade local e a formação do espaço urbano, através do estudo de vestígios da memória impressa da passagem da primeira metade do século XX para a segunda metade do mesmo centenário. Visando tais objetivos, observamos fotografias das décadas de 1950 a 1960, que documentam o ambiente urbano de Jacarezinho, pertencentes ao acervo do senhor Celso Rossi. Dentre as imagens vistas, capturamos três, dentre as quais separamos uma para cada década observada de forma a estudá-las durante o desenvolver dessa comunicação, a fim de encontrarmos conexões simbólicas que permaneceram na composição material da urbe e, a partir delas, analisar a religiosidade como manifestação identitária na cidade. 1 Graduanda em História na Universidade Estadual do Norte do Paraná – Campus Jacarezinho. Bolsista PIBIC – Fundação Araucária. E-mail: [email protected]. 2 Doutora em Letras, atuante na Universidade Estadual do Norte do Paraná – Centro de Comunicação, Linguagens e Artes - Campus Jacarezinho. E-mail: [email protected]. 427 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Além do acervo fotográfico, foi consultado o jornal Tribuna do Norte, do ano de 1961, pertencente também ao acervo Celso Rossi e a revista O Norte Paraná Ilustrado, do acervo da Biblioteca Prof.º Sílvio Tavares, da Universidade Estadual do Norte do Paraná, que compõe, sem data exata, a década de 1930. Concomitante, refizemos parte da história de Jacarezinho através dos relatos orais que integram os livros do senhor Tomaz Aimone, referenciados na bibliografia deste estudo e pertencentes também ao acervo da Biblioteca Prof.º Sílvio Tavares, da citada universidade. Fundação de Jacarezinho, construção simbólica e a fertilidade das terras como identidade local Por volta de 1884, o mineiro Severo Baptista, que residia no interior de São Paulo, passou a ser um grande produtor agrário no atual Norte do Paraná, devido ao declínio econômico pelos quais os proprietários de Minas Gerais passavam desde o século XIX. Pois como explica Ruy Wachowicz, Para tentar manter seus ganhos, passaram a dedicar-se à condução de tropas do Rio Grande do Sul. Obrigatoriamente tinham que passar pelo registro de Itararé, localizado onde hoje é a divisa entre Paraná com São Paulo. Tomaram então conhecimento de que, pouco mais ao norte, havia vastas extensões de terras férteis e devolutas. Mas foi sobretudo após o fracasso da revolução liberal de 1842, que essas terras começaram a ser consideradas. Muitos desses fazendeiros e/ou tropeiros começaram a migrar. (WACHOWICZ, 1988, p. 245). Provavelmente, foi esse fluxo migratório que proporcionou que Severo Baptista, em 1885, adquirisse as terras que abrangiam a atual cidade de Jacarezinho, inicialmente chamada de Nova Alcântara. Com base em Tomaz Aimone, “em Julho de 1889 foi iniciada a derrubada das matas do patrimônio e começaram a construir casas [...]. As plantações surgiram com exuberância em todos os recantos, sendo as principais plantas: o milho, feijão, cana de açúcar, mandioca e também o trigo e o arroz” (AIMONE, 1992, p. 5). 428 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Em 1904, o patrimônio de Nova Alcântara é denominado Jacarezinho e em 1911, adquire a designação de cidade. Feitos tais esclarecimentos, devemos notar que a fertilidade das terras as quais Jacarezinho pertence, se torna um símbolo da cidade no início do século XX, como fator atrativo a economia e identitário, configurando determinado prisma intangível na construção da percepção sobre a cidade, ou seja, sua reputação, demarcando fronteiras materiais e simbólicas. Os símbolos, sejam eles espontâneos ou intencionalmente criados, são sempre sugestionados com significados que marcam a elaboração dos laços afetivos entre as pessoas e as cidades, e nascendo de sentidos que geram os sentimentos e as apreensões em relação ao espaço social, a razão de ser do gostar ou não. Quando se fala de simbolismo e imaginário no contexto das cidades, devemos buscar entender e encontrar os elementos que definem a sua identidade, ou melhor, as linhas que traçam e nos permitem reconhecer a unicidade do lugar, elementos que a diferenciam, definem e estabelecem o processo de identificação dos indivíduos. Então, podemos considerar a seguir o relato de Astolfo Severo Batista, contendo traços do elemento identitário que definia a Jacarezinho da primeira metade do século XX: Com a instalação do Termo, Jacarezinho tomou impulso: a sua importância começou a crescer dia a dia com a chegada de novas e numerosas caravanas de mineiros e paulistas encantados por suas terras que ‘Deus fez e perdeu a receita’, como diziam vulgarmente. (TRIBUNA DO NORTE, 1960, p. 6). Ou mesmo, conforme vemos em anúncio da década de 1930: Figura 1 – Terras do Município de Jacarezinho – O Norte Paraná Ilustrado, década de 1930. 429 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 A cidade de Jacarezinho como identidade cultural e construção social A formação do espaço urbano em Jacarezinho, em sua ocupação, [...] foi orientada pela declividade do sítio urbano, que é bastante acentuado pelo fato de estar localizado sobre a escarpa arenito-balsática. Ao mesmo tempo, permite entender que a partir de 1889, quando houve a instalação definitiva do núcleo urbano, este fora orientado por uma ocupação regular, seguindo a forma principal de quadrícula. (FRESCA, 2010, p. 90). Conforme o trecho acima, as ruas, no período estudado, apresentavam a forma de um tabuleiro de xadrez, marcadas pelo declive que as torna íngremes aos transeuntes e nos levanta a problemática acerca da imagem urbana. Como esclarece Maria Stella Brescianni: As cidades são antes de tudo uma experiência visual. Traçado de ruas, essas vias de circulação ladeadas de construções, os vazios das praças cercadas por igrejas e edifícios públicos, o movimento de pessoas e agitação das atividades concentradas num mesmo espaço. E mais, um lugar saturado de significações acumuladas através do tempo, uma produção social sempre referida a alguma de suas formas de inserção topográfica ou particularidades arquitetônicas (BRESCIANNI, 2007, p. 237). Essa experiência visual, por outro lado, são compostas pelos condicionantes geográficos, pelas decisões e ações de grupos específicos, os ditos desbravadores que se apropriaram e cederam a terra, projetaram o traçado urbano, as construções institucionais, a infraestrutura, assim como pelas ações em escala micro, na arquitetura e no colorido das casas e edifícios comerciais. Logo, a cidade de Jacarezinho é uma obra artística, construída histórica e coletivamente, de acordo com Freire (1997, p.58), [...] a relação entre a cidade e o imaginário social envolve outras categorias além do racionalismo que torna a imagem da cidade uma série de traçados objetivos. Como terreno de fantasias, projeções inconscientes e lembranças, a cidade abriga monumentos, que são visíveis ou invisíveis e que se situam além do dado empírico. Podem articular o mundo interior ao exterior, as memórias individuais à memória coletiva, sonho à vigília (FREIRE, 1997, P. 58). 430 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Em outras palavras, os agentes sociais elaboram a cidade e criam leituras dessa construção através de suas subjetividades. Há finalidades de mostrar o poder através da materialidade, mas, não essencialmente todos compartilham dessa experiência de forma semelhante. Leitura de imagens da cidade na passagem das metades do século XX Postas tais considerações, para ficar mais clara a questão de construção social da experiência visual de uma cidade e da intenção de quem projetou sua obra, trazemos duas fotografias aéreas da cidade: Figura 2 – Jacarezinho, vista aérea, 1946. Acervo Celso Rossi Figura 3 – Jacarezinho, vista aérea, anos 1960. Acervo Celso Rossi. Antes de trabalharmos essas fotografias, é necessário nos nortearmos pelas considerações de Burke (2004, p.43), quando diz que “imagens não foram criadas, pelo menos em sua grande maioria, tendo em vista futuros historiadores” e que elas “dão acesso não ao mundo social diretamente, mas sim visões contemporâneas daquele mundo” (BURKE, 2004, p. 236). Logo, não concebemos que a fotografia tenha um olhar inofensivo, pois na verdade, partimos de que lidamos com imagens feitas por um profissional no intuito de promover a visão do crescimento urbano da cidade, pois os fotógrafos partiam de perspectivas aéreas, prática nada popular para o contexto histórico da confecção dessas evidências históricas. Na figura 2, tirada em 1946, devido à tecnologia do período e pela deterioração causada pelo tempo no documento, não temos uma imagem muito nítida, mas apesar disso é possível ver o edifício da catedral truncado, 431 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 suas torres não estavam erguidas, o Colégio Cristo Rei está à esquerda e na Rua Paraná, colateral à Avenida Getúlio. Na primeira esquina, da esquerda para a direita, o prédio do Banestado (atual Itaú) e na segunda esquina o antigo Banco do Brasil (hoje Bradesco), ambos em construção e com suas fachadas voltadas para o observador da imagem. Contudo, nessa imagem, os prédios mais destacáveis são a catedral e o colégio. Observamos da mesma maneira, como o arvoredo espalhado pela cidade, que na figura 2 mostrava menor tamanho, na figura 3 já ganhara a notoriedade que possui atualmente, pelas sombras que proporcionam. Existem algumas árvores dividindo espaço com edifícios em boa parte dos quarteirões. A figura 3, por sua vez, demonstra a intenção do fotógrafo em emoldurar, na parte abaixo do retrato, o Colégio Imaculada Conceição à direita, a Capela de São Benedito à esquerda, estando o Colégio Cristo Rei e a catedral à direita superior. Juntam-se, à paisagem, casas, edifícios comerciais e públicos que recortam o espaço, em maior ou menor grau, com algumas árvores. Logo, em ambas as fotografias, vemos a preocupação em capturar os edifícios religiosos. Talvez por tal motivo, a figura 3 oferece, sobremaneira, indícios, quando olhamos as partes superiores da imagem, que denunciam a vivência de espaços desabitados, mas que aparecem apenas em parte, por conta dos enquadramentos que visavam a captar a imagem da Igreja e do Colégio Cristo Rei, na figura 2, ou, na figura 3, da catedral, do Colégio Cristo Rei e do Colégio Imaculada, por exemplo. A religiosidade como símbolo da cidade de Jacarezinho Assim chegamos ao pensamento de Kevin Lynch (1999), que desenvolve ideias sobre a imaginabilidade, que seria a qualidade física própria de cada objeto, que garantiria grandes chances de conjurar uma imagem importante que depende da aptidão perceptiva dos agentes sociais de decodificar os valores culturais inerentes à realidade apresentada. 432 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Os fatores do tamanho arquitetônico e posição fazem com que a catedral se configure como um símbolo na cidade, um tipo de referência, para Lynch, e que elementos de evocações como este, [...] tipicamente vistos de muitos ângulos e distâncias, acima do ponto mais alto mais alto de elementos menores e usados como referências radiais. Podem estar dentro da cidade ou a uma distância tal que, para todos os fins práticos, simbolizam uma direção constante (LYNCH, 1999, p. 53). Seriam, portanto, símbolos identitários na construção psíquica do formato urbano, que definiriam a orientação e a interpretação da organização espacial que, por fim, estão também relacionados a uma “didática” religiosa de exaltar o templo como referência de grandiosidade, como também podemos observar na imagem a seguir: Figura 4 – Praça da Matriz, 1930. Acervo Celso Rossi. Essa mesma referência é enfatizada pelos memorialistas da cidade, que retratam e fazem perpetuar fotografias da Igreja. A paisagem urbana é resultado das ações da sociedade, colocando significados que caracterizam a cultura e, consequentemente, a sociedade que a produz como reflexo e notamos a necessidade do início do século XX de unificar as diversas identidades. Dentre os migrantes vindos de outras localidades e etnias, havia os indígenas, autóctones desta região e os escravos negros, que como assinala Tomaz Aimone no trecho a seguir, “com a chegada da família Alcântara e dos milhares escravos que ignoravam já possuírem a liberdade, Jacarezinho se transformou numa vila em poucos meses” (AIMONE, 1992, p. 26). 433 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Mas, essas diversas culturas e os conflitos ocorridos entre elas assumem diferentes formas, como a incorporação, distorção, resistência, negociação ou recuperação. Não podemos dizer ao certo sobre as crenças e religiões de Jacarezinho no início do século passado, mas como nos dá pistas, Tomaz Aimone rememora: Quem passava aos domingos, pelas proximidades da atual rua Costa Júnior, pois naquela época não possuía nenhum nome, ficavam admirados em ver uma grande quantidade de pessoas: homens, mulheres, crianças, todos negros cantando e dançando suas congadas; ficavam admirados de ver a ordem e a disciplina reinante entre eles. (AIMONE,1992, p. 30). Através de tais indícios, podemos entrever a coexistências de diferentes religiões e crenças na cidade. Porém, a cidade, muitas vezes, converte o poder em formas e devido a este fator, ao longo do tempo, homogeneíza os conflitos e manifestações simbólicas de diferentes culturas e os símbolos que a definem se prendem à cultura hegemônica do local, sendo percebidos de forma unitária e, superficialmente, harmoniosa. Considerações finais Na passagem da primeira para a segunda metade do século XX, com o processo migratório pelo qual passou a região, houve um grande fluxo de trabalhadores vindos para Jacarezinho em busca de emprego e progresso econômico. Assim, com relação à concepção popular de fertilidade das terras de Jacarezinho, tidas como férteis “sem igual”, esta seria derivada da concepção de progresso em função da urbanização nacional e do desejo de ascensão dos migrantes, visto que [...] a paisagem urbana desempenha, por intermédio daqueles que a controlam e definem novos significados, a tarefa de apagar ou minimizar aquelas relações e conflitos e, ao mesmo tempo, promover aquilo que seus controladores desejam, isto é, transformá-la em produto espontâneo, natural e fruto de uma tradição da qual a harmonia social e o desejo de progresso são partes integrantes. (CORRÊA; ROSENDAHL, 2003, p. 181). 434 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Entretanto, a recém-fundada cidade teve de se edificar sobre uma construção cultural comum, que lhe definisse e diferenciasse para finalidades comerciais, turísticas, administrativas e populacionais. Por diversos fatores, dentre eles a relação de cooperação estabelecida de Igreja e Estado na década de 30, a cultura hegemônica que se estabeleceu em Jacarezinho, foi ordenada através dos “habitus” postos pela Igreja Católica e da maioria dos habitantes da cidade. Embora no referido período e naqueles subsequentes, haja coexistência de várias culturas, religiões e crenças habitando Jacarezinho, podemos dizer que todas as pessoas que tinham alguma espécie de interesse em relação à cidade como seus habitantes, administradores públicos, turistas, investidores, formadores de opinião, instituições, dentre outros, influenciaram e foram influenciados pela identidade da cidade, seus símbolos, sua cultura e “modo de ser”. Somos construtores desse imaginário e o papel de nossas escolhas, nossas ações e valores marcam nosso espaço social, construindo símbolos que identificarão e darão face ao espaço urbano, que em meado do século XX em Jacarezinho, se via marcado pela ideia de fertilidade da terra e da religiosidade católica, que deixariam suas marcas na percepção e na imaginabilidade contemporânea que se faz sobre a cidade. Referências AIMONE, Thomaz. Jacarezinho, seus pioneiros desbravadores e os que labutaram para o progresso desta terra. Fund. Fac. Est. De Fil. Ciências e Letras de Jacarezinho. Jacarezinho-PR: Editora Gráfica Universitária, 1975. ______. Meu ginásio Rui Barbosa de Jacarezinho. Jacarezinho: [s.n.], 1992. BRESCIANI, Maria Stella. História e Historiografia das cidades, um percurso. IN: FREITAS, Marcos Cezar (Org.). Historiografia brasileira em perspectiva. São Paulo: Contexto, 2007. BURKE, Peter. Testemunha ocular: história e imagem. Bauru - SP: Edusc, 2004. CALVINO, Ítalo. Cidades Invisíveis. Rio de Janeiro: O Globo; São Paulo: Folha de São Paulo, 2003. 435 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 CORREA, Roberto Lobato; ROSENDAHL, Zeny (Orgs.). Introdução à Geografia Cultural. Rio Janeiro: Bertrand Brasil, 2003. FREIRE, Cristina. Além dos mapas: os monumentos no imaginário urbano contemporâneo. São Paulo: SESC/Annablume, 1997. FRESCA, Tania Maria. A rede urbana do norte do Paraná. Londrina-PR: Eduel, 2004. LYNCH, Kevin. A imagem na cidade. São Paulo: Martins Fontes, 1994. TRIBUNA DO NORTE. História de Jacarezinho. Jacarezinho: 12 ago 1960. WACHOWICZ, Ruy. História do Paraná. Curitiba: Gráfica Vicentina, 1988. 436 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 CONSTRUÇÃO DO TURISMO RELIGIOSO EM OURINHOS, ENTRE A FÉ, A MEMÓRIA E A REALIDADE Alessandro Bernardes Pereira1 1 - Introdução As definições de turismo imbricam práticas sociais e culturais que vem sendo analisadas e conceituadas por diversos autores e instituições internacionais. A noção de turismo recebe especificidades e classificações que inserem o comportamento e atividades humanas. A fé e a catolicidade, elementos marcantes da história e cultura da população brasileira, é capaz de atrair multidões e marcar a espacialidade de diversos locais, sendo um fator importante para a atração de recursos econômicos e promoção da fé. A tragédia ocorrida no dia 31 de julho de 1954 no município, dada pelo choque entre um caminhão e o vagão de um trem, causando uma enorme explosão e matando três pessoas, desencadeia um movimento de fé e misticismo na população. O fato de que tal tragédia poderia ter sido maior se o fogo se alastrasse até um depósito de combustível localizado bem próximo ao acidente, e do aparecimento da imagem de Nossa Senhora Aparecida de forma extraordinária e inexplicável para a maioria dos católicos, cria a potencialidade do desenvolvimento do turismo religioso no município. Porém, nestes 57 anos, diversos acontecimentos marcaram a história do catolicismo da cidade, rendendo altos e baixos da expectativa de tornar o turismo religioso uma realidade na cidade. Neste trabalho, pretende-se analisar elementos e especificidades importantes para o desenvolvimento do turismo religioso em Ourinhos. 2 - Objetivos Discutir os principais conceitos de turismo e suas características, em especial as atividades e peculiaridades do turismo religioso. Analisar esse tipo de turismo em Ourinhos, identificando através de sua história, os fatos e 1 Aluno da graduação da Unesp Ourinhos. Email: [email protected]. 437 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 fenômenos que contribuíram para a construção da devoção à Nossa Senhora Aparecida do Vagão Queimado, e se essa devoção constitui de fato uma realidade ou potencialidade do turismo religioso. 3 - Procedimentos metodológicos A pesquisa de campo consistiu na visita ao santuário a fim de analisar se há infraestrutura e sinalização que ofereçam apoio ao turista, além de canais de informações que narram os fatos que precedem a história do Santuário Nossa Senhora Aparecida do Vagão Queimado. Além de tais visitas, as participações nas santas missas foram necessárias para a observação da presença ou não de turistas. Por fim, as entrevistas e consultas de documentos antigos contribuíram para elencar informações importantes para o trabalho. 4 - Conceitos de turismo Na segunda metade do século XVIII, diversos jovens aristocratas ingleses passaram a fazer um estilo de viagem a que se denominou a Grand Tour, uma viagem de aproximadamente três anos pelo continente europeu com fins educativos. O termo touriste nasce ao designar as pessoas que faziam a Tour, introduzido na França por Stendhal nas suas “Mèmoires d’un Touriste”. Diversas outras línguas adotaram, posteriormente, as palavras francesas tourisme e touriste com o sentido restrito de viagem feita sem fim lucrativo, por distração, repouso, descanso ou satisfação da curiosidade de conhecer outros locais e outras pessoas. A definição de turista e turismo sempre foi algo difícil de caracterizar, pois diversos elementos devem ser englobados, como o motivo da viagem, duração da mesma e até mesmo que tipo de atividades foram feitas. Existem quatro elementos a serem considerados naquela que é a definição moderna do termo turista, tais elementos são: deslocamento, residência, duração da permanência e remuneração. 438 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 A definição de turista não tem sido tarefa fácil em virtude da dificuldade em enquadrar no mesmo conceito realidades, por vezes, muito distintas, mas com pontos comuns inseparáveis e gerando fenômenos semelhantes, mas nem sempre produzindo resultados iguais. Como ponto de referência, a classificação de organismos oficiais do turismo deve ser relevante, porém são criticados por diversos especialistas que afirmam não atrelar diversas realidades. Atualmente a OMT – Organização Mundial do Turismo – classifica visitante, turistas e excursionistas dos seguintes modos: Visitante: toda a pessoa que se desloca temporariamente para fora da sua residência habitual, quer seja no seu próprio país ou no estrangeiro, por uma razão que não seja a de aí exercer uma atividade remunerada; Turista: todo visitante temporário que permanece no local visitado mais de 24 horas; Excursionista: todo o visitante temporário que permanece fora da sua residência habitual menos de 24 horas. O turismo pode ser definido como uma modalidade de deslocamento espacial que envolve a utilização de algum meio de transporte e ao menos uma pernoite no destino. Esse deslocamento pode ser motivado pelas mais diversas razões e sem o intuito de receber remuneração. Segundo Barreto (1995) apud Ansarah (2001, p:19), alguns elementos devem ser analisados ao definir o turismo: Embora ainda alguns círculos, principalmente leigos, vejam o turismo apenas como a “indústria de viagens de prazer”, trata-se de algo mais complexo do que um simples negócio ou comércio [...] o turismo é uma amálgama de fenômenos e relações, fenômenos estes que surgem por causa do movimento de pessoas e sua permanência em vários destinos. Há no turismo um elemento dinâmico – a viagem – e um elemento estático – a estada. A noção do conceito de turismo segundo Barreto (1995), compreende a junção dos dois elementos, a viagem e a estadia. A atividade do turismo na maioria dos casos, tem como objetivo principal o lazer e o prazer. É por esse motivo que inúmeras pessoas se deslocam para o litoral, serras, florestas, rios, 439 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 resorts, embora em algumas atividades de turismo isso não possa ser observado, como no turismo de negócios. O turismo religioso merece destaque, porque para a maioria das pessoas que pratica essa atividade, não é por prazer e nem mesmo por lazer, e também não há “obrigação” de se deslocar, como no caso do turismo de negócios. Qual seria o motivo que leva em muitos casos, multidões de pessoas a se deslocarem para um santuário? A beleza da arquitetura? O patrimônio histórico? A fé? 5 -Turismo religioso Os deslocamentos humanos, individuais e coletivos, motivados pela fé tem sido uma realidade por todo o mundo. Cidades como Meca, Roma e Jerusalém há séculos recebem milhares de fiéis de todo o mundo. No Brasil, a cidade de Aparecida do Norte, no interior de São Paulo recebe 7 milhões de pessoas todos os anos. Em Belém, no Pará, os quinze dias de festa do Círio de Nazaré recebem anualmente cerca de 1,5 milhões de pessoas. Esse fenômeno ocorre em diversas cidades e estados brasileiros. Segundo a EMBRATUR, no Brasil, 15 milhões de pessoas se deslocam por fins religiosos por ano. Recentemente, em julho de 2013, o Ministério do Turismo investiu $650,0 mil em cidades de todas as regiões no país, que tradicionalmente recebem grandes parcelas de turistas religiosos. As cidades selecionadas foram Aparecida do Norte, capital das romarias; Trindade, conhecida por suas festas do divino Pai Eterno; Nova Trento, referência desde a beatificação da Santa Madre Paulina, em 1991; Bragança, tradição local de devoção a São Benedito, desde 1978 e Santa Cruz, que possui a maior estátua de Santa Rita de Cássia na América Latina, com 56 metros. Ao caracterizar o turismo religioso, Andrade (2000, p.77) explica que: “o conjunto de atividades, com utilidades parcial ou total de equipamentos, e a realização de visitas a receptivos que expressam sentimentos místicos ou suscitam a fé, a esperança e a caridade aos crentes ou pessoas vinculadas a religiões, denomina-se turismo 440 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 religioso”. Andrade (2000, p.79), ao analisar as classificações das diversas atividades de turismo, destaca o turismo religioso, ao ressaltar que: [...] ressalvados os turismo de férias e de negócios, o tipo de turismo que mais cresce é o religioso, porque – além dos aspectos místicos e dogmáticos – as religiões assumem o papel de agentes culturais importantes, em todas as suas manifestações de proteção a valores antigos, de intervenção na sociedade atual e de prevenção no que diz respeito ao futuro dos indivíduos e das sociedades. O Brasil por ser um país tradicionalmente cristão, e que conserva o respeito à fé, tem o seu turismo religioso “inventado e reinventado”, podendo se expandir para diversos locais, sem a necessidade de planejamentos do governo e outros agentes, e sim tendo como o principal motivo a fé. Assim afirma Andrade (2000, p:79): Atualmente, a história se repete e multiplicam-se receptivos, à medida que surgem boatos ou fatos de aparições de seres celestiais ou de realizações de milagres e curas efetuados por algum religioso ou místico. As notícias, o marketing direto ou indireto e as ações de promotores e comerciantes instalados nas micro-regiões ou nos locais onde acontecem os fatos extraordinários acionam os agentes turísticos, que, em geral antecipam-se a qualquer manifestação de autoridades religiosas. Desta forma, a maioria dos pontos de turismo religioso são produtos da fé da população, locais que não receberam planejamentos turísticos e que começaram a receber grandes fluxos de turistas através da espontaneidade da população e fatos ocorridos milagrosamente. No Brasil, existem diversos locais nos quais a população, principalmente católica, acredita no acontecimento de tais fenômenos, seja a aparição de seres celestiais ou acontecimentos inexplicáveis. O exemplo mais conhecido é o “aparecimento” da imagem de Nossa Senhora de pele negra em Aparecida do Norte (SP). Outros casos pouco conhecidos, são o aparecimento da imagem de Nossa Senhora do Rocio, em Paranaguá (PR), local que recebeu investimentos do próprio estado, como a construção do Santuário Estadual de Nossa Senhora do Rocio. Outro exemplo é o caso da imagem de Nossa 441 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Senhora Aparecida do Vagão Queimado, na cidade de Ourinhos, que embora não receba tanto fluxo de turistas religiosos como as cidades citadas, também merece destaque pelas crenças, acontecimentos e história. No entanto, existem locais que recebem grandes fluxos de turistas religiosos devido ao planejamento prévio e intenções que sucederam a vinda de multidões de católicos. Pode-se citar como exemplo, os casos de Cachoeira Paulista, no interior paulista; da Comunidade Católica Canção Nova, que trabalha com eventos religiosos e recebem palestrantes conhecidos mundialmente e é beneficiada pelo fato de estar bem localizada, distando apenas 30 km de Aparecida do Norte e próxima a grandes concentrações populacionais (São Paulo e Rio de Janeiro), além de estar à beira da rodovia Presidente Dutra e oferecer acessibilidade e atrativos para multidões de católicos. 6 - Fé, misticismo e memórias unidas em um acontecimento O dia 31 de julho de 1954 foi um dia que ficou para a história no município de Ourinhos, devido a uma catástrofe e a intervenção que muitos católicos acreditam que foi miraculosa por intervenção de Nossa Senhora Aparecida. Maurício de Aquino (2011) relata que na passagem de nível da linha férrea Sorocabana, na Vila Moraes, na cidade de Ourinhos, ocorreu um incêndio de grandes proporções entre um caminhão tanque e um trem misto com oito vagões carregados de combustível. Com o impacto, houve uma grande explosão e o fogo se alastrou rapidamente em grandes proporções, causando pânico entre os presentes. Além do susto, a grande preocupação se devia ao fato que, a poucos metros do local do acidente, havia um enorme depósito com milhões de litros de combustível. O corpo de bombeiros e centenas de curiosos rezava para que o fogo não alastrasse até o depósito de combustível. Em meio a tanta oração, preocupação e desespero, eis que o vento muda para o sentido oposto do reservatório e do vagão de passageiros. Tal 442 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 acontecimento surpreendeu a todos os presentes que indagavam dando graças à Deus. No artigo do jornal ourinhense, intitulado “Tremenda colisão provoca violento incêndio, de três de agosto de 1954 consta: Por verdadeiro milagre o fogo não se propagou aos carros de passageiros. Com a chegada do avião dos corpos de bombeiros de São Paulo, o fogo é controlado, porém infelizmente três pessoas morreram, o motorista do caminhão, o maquinista e o foguista. Como se não bastasse, surpresas maiores estariam por vir. Começa o trabalho de rescaldo dos vagões, durante o qual é encontrada uma caixa. Nela, envolta em um lenço de seda, uma imagem de Nossa Senhora Aparecida. Um verdadeiro milagre, afinal tudo o que estava em volta havia sido queimado, tal fato se espalhou rapidamente por toda a cidade. Segundo matéria de três de agosto de 1954, do Correio de Notícia: Nota curiosa e que impressionou profundamente a nossa população, foi o encontro pelos bombeiros, de uma imagem de Nossa Senhora Aparecida, inteiramente intacta entre as cinzas das bagagens contidas no vagão incendiado que separava os carros de passageiros dos carros tanques. É de se registrar que o conteúdo daquele vagão, por várias horas foi totalmente incinerado, somente escapando a sua carcaça por ser de aço. Sofreu ainda durante rescaldo ação contínua de abundantes jatos de água e nada sofreu a imagem encontrada pelos bombeiros. Primeiro, o “vento salvador” que deslocou o sentido do vento e impediu uma tragédia maior ao afastar da direção dos depósitos de combustível; depois, uma imagem de Nossa Senhora Aparecida encontrada no meio do vagão totalmente consumido pelo fogo. Não houve dúvidas: foi um milagre de Nossa Senhora. Por muitos anos, a imagem ficou na Matriz do Bom Jesus, sendo que em 1968, durante uma reforma, o Padre Arnaldo Beltrame doou algumas imagens, entre elas a de Nossa Senhora. Posteriormente, o Padre Osvaldo Violante promoveu uma campanha para localizá-la, sendo encontrada em Ipaussu com o casal Jean e Irene Nicolau. Para buscar a imagem, foi feita uma carreata com cerca de 1000 veículos, de acordo com o Padre Aristheu. Em 1979, é construído o Santuário de Nossa Senhora Aparecida do Vagão Queimado. No dia 12 de outubro de 1999, o Bispo Salvador Paruzzo, concedeu à capela o 443 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 título de Santuário Diocesano, que posteriormente, no dia 12 de outubro de 2001, tornou-se paróquia. Atualmente, a imagem encontra-se em uma caixa de vidro no Santuário Diocesano do Vagão Queimado. 7 - Resultados A partir de 1999, com a criação da Diocese de Ourinhos, começaram os investimentos no culto da Santa do Vagão Queimado, no mesmo ano, a igreja aprovou o culto à Santa e elevou a capela ao grau de santuário. O projeto envolvia a Igreja Católica, a Faculdade Estácio de Sá, a FIO e administração municipal, que viram a potencialidade do turismo religioso em Ourinhos e investiram para que essa potencialidade se tornasse realidade. O ex-prefeito Claudemir Ozório da Silva (PTB) criou um monumento na avenida Gastão Vidigal dedicado à Nossa Senhora da Aparecida do Vagão Queimado. Havia projeto de turismo religioso envolvendo a região inteira e faculdades investiram em pesquisas. O culto foi construído ao longo de 50 anos, com altos e baixos, e de 1999 a 2004 houve a tentativa de vender a ideia à toda região. A imagem peregrinou nas cidades vizinhas durante procissões, mas a devoção cresceu localmente como o símbolo do catolicismo de Ourinhos. Há lei aprovada na Câmara do município em 2006 que institui a data, dia 31 de julho, influenciada pelo trabalho da Igreja, prefeitura e imprensa. No entanto, a devoção não conseguiu atrair turistas, e mesmo em Ourinhos as memórias foram sendo apagadas ou desvalorizadas. Alguns eventos históricos contribuíram para que o culto não se estendesse. Em 1954, quando a imagem foi encontrada, a população teve o fato como um milagre. Fotos foram tiradas do corpo de bombeiros entregando a santa para o então prefeito, Domingos Carmelingo Caló. Intensas visitas foram feitas à imagem, porém a Igreja negou o milagre e não cultivou o culto. Em 1965, o padre Arnaldo Beltrame tirou a imagem do altar da Igreja Matriz Bom Senhor Jesus e os fiéis sequer notaram a ausência da imagem; somente vinte anos depois, o monsenhor Osvaldo Violante soube da história. 444 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Atualmente são celebradas missas diariamente no Santuário, recebemse poucos fiéis, e em muitas missas o padre pergunta para os fiéis quem veio de “fora”, sendo que o número dificilmente alcança 10 pessoas. A iniciativa de retomada ao investimento do turismo religioso de Ourinhos é inexistente. No Santuário não existem placas ou algo do tipo que dê referências ao “milagre” e que possam reavivar a memória da população ourinhense. 8 - Considerações finais O fenômeno, ocorrido no dia 31 de julho de 1954 em Ourinhos, chamou a atenção de toda a cidade, artigos da época evidenciam que a população acreditou ter sido de fato uma intervenção miraculosa de Nossa Senhora Aparecida. A fé misturou-se ao misticismo e todas as características apontavam para o surgimento de uma tipologia peculiar do turismo, o religioso. Nessa mesma época, a mesma santa levava milhares de romeiros à Aparecida do Norte (SP). A romaria e a devoção à Nossa Senhora Aparecida já eram consolidadas em todo o Brasil e não havia nada semelhante que atraísse a população católica na região. Conclui-se que se passaram 59 anos e a potencialidade do turismo regilioso devido ao fato religioso aqui apresentado não se tornou uma realidade. As causas podem ter sido diversas, a falta de apoio dos líderes religiosos, principalmente na época em que ocorreu o fato, os quais sempre declararam a inexistência do milagre, a falta de promoção e propaganda do acontecimento, e por fim, os “sumiços” da santa. Considerando-se as intensas mudanças sociais e culturais que a sociedade tem passado e os períodos de ascenção e declínio da devoção, no decorrer destes 59 anos, pode-se afirmar que Ourinhos perdeu a sua principal oportunidade de promover o turismo religioso. 9 - Referências ANDRADE, José V. de. Turismo fundamentos e dimensões. São Paulo: Ática, 2000. 445 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 ANSARAH, MARILIA GOMES DOS REIS. Turismo-Como Aprender, Como Ensinar. Senac, 2000. AQUINO, Maurício de. "História e Devoção." A construção social do culto a Nossa Senhora do Vagão Queimado de Ourinhos. Bauru 1 (2011). AZEVEDO, Francisco Diogo Abreu Santos Moniz. "O papel do sector do turismo na reabilitação urbana da baixa do Porto." (2012). BARRETO, M. Manual de Iniciação ao Estudo do Turismo. Campinas: Papirus/Unicamp, 1995. CARVALHO, Pedro Guedes de, and Rui Lourenço. "Turismo de prática desportiva: um segmento do mercado do turismo desportivo." Revista Portuguesa de Ciências do Desporto 9.2 (2009): 122-132. DIAS, Reinaldo; AGUIAR, Marina Rodrigues de. Fundamentos do turismo: conceitos, normas e definições. Campinas: Alínea, v. 287, p. 287, 2002. IGNARRA, Luiz Renato. Fundamentos do turismo. Cengage Learning Editores, 2003. MAIO, Carlos Alberto. "Turismo Religioso e desenvolvimento local." Publicatio UEPG: Ciências Sociais Aplicadas 12.1 (2009) Governo quer promover turismo religioso em e cidades brasileiras. Disponível em < http://g1.globo.com/turismo-e-viagem/noticia/2013/07/governoquer-promover-turismo-religioso-em-5-cidades-brasileiras.html> Acesso em:16/09/2013. Turismo religioso ajuda a cultuar santa. Disponível em: http://www.jcnet.com.br/busca/busca_detalhe2011.php?codigo=203149 < 446 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO NA CADEIA PRODUTIVA DA RECICLAGEM: UM OLHAR SOBRE A QUESTÃO DE GÊNERO Carolina Michelle Brito1 Rodrigo Macario 2 Yume Kikuda Silveira3 2 Introdução Segundo os dados apresentados pela CEMPRE4 (2012) o setor da reciclagem no Brasil movimenta anualmente cerca de R$ 12 bilhões. Em relação aos índices de recuperação de latas de alumínio, de acordo com a ABRELPE (Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais) em 2010 foi recuperado 97,6% do total, o que corresponde a cerca de 240.000 toneladas recicladas no ano. A recuperação de PET (Polietireno Tereftalato), no mesmo período foi de 55,6%, em relação à reciclagem de papeis o país registrou taxa de 46,0% (ABRELPE, 2010). No cenário nacional as atividades desenvolvidas pelos catadores estão na base do processo produtivo, porém, os seus ganhos são menores, além das péssimas condições de trabalho, muitas vezes desenvolvidas em lixões e aterros. O presente artigo tem como objetivo discutir a precarização das relações de trabalho no circuito da reciclagem, a partir do recorte da divisão sexual do trabalho e os seus impactos na vida dos trabalhadores, neste caso, dos catadores de materiais recicláveis. Ao identificarmos os principais aspectos que estruturam essas relações, a questão de gênero torna-se fundamental para compreender o processo de precarização, em especial na cadeia da reciclagem. 1 Graduando em Geografia pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Campus de Ourinhos. Bolsista da Incubadora de Cooperativas Populares da UNESP – Núcleo de Ourinhos. [email protected] 2 Graduando em Geografia pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Campus de Ourinhos. Bolsista da Incubadora de Cooperativas Populares da UNESP – Núcleo de Ourinhos. [email protected] 3 Graduando em Geografia pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Campus de Ourinhos. [email protected] 4 Associação do Compromisso Empresarial para a Reciclagem. 447 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 A partir da problemática apresentada, organizamos nossa análise em três eixos: primeiro, a caracterização e reflexão teórica sobre as relações na cadeia produtiva da reciclagem; no segundo momento procuramos estabelecer os principais pontos e aspectos da relação de gênero presente no circuito econômico da reciclagem; e por fim através de entrevistas realizadas com catadoras que atuaram em lixões e aterros, mas atualmente trabalham em cooperativa populares, levantamos as principais experiências e percepções desse grupo de mulheres. Lixo: valor de uso e de troca Para compreender as relações de trabalho que marcam a configuração do circuito econômico da reciclagem, considerando seus agentes, fluxos, organização sócio-espacial e em especial, o processo de inserção dos catadores, faz-se necessário discutir a (re)inserção do lixo, entendido como resíduos sólidos passíveis de reutilização, na dinâmica de produção capitalista. A partir da ótica de produção de valor de troca, consumo e descarte, o ‘lixo’ torna-se o subproduto dos “resíduos sólidos” após a triagem do material que interessa à indústria da reciclagem. Refletindo sobre a essa lógica, segundo Godoy (2005), o “lixo” é um resto de valor de uso para a sociedade em geral, contudo, para o mercado de reciclagem ele passa a ter um valor de uso e um valor de troca. O circuito econômico da reciclagem é resultado das amplas e complexas interações entre diversos segmentos econômicos e agentes sociais, que atuam desde a gestão de resíduos sólidos passíveis de reciclagem, até o processo de transformação final do resíduo e sua comercialização. Segundo Moreira: “[...] diferentes agentes se relacionam, dentre os quais se podem citar; catadores de materiais recicláveis, empresas privadas, prefeituras, indústrias, geradores de resíduos recicláveis, entre outros” (2012, p. 20). Entretanto, os vantajosos ganhos proporcionados pela reciclagem decorrem do fato de que, conforme aponta Bosi (2008): […] a reciclagem no Brasil só tornou-se possível em grande escala 448 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 quando o recolhimento e a separação dos resíduos se mostraram uma tarefa viável e de baixo custo, isto é, realizável por trabalhadores cuja remuneração compensasse investimentos de tecnologia (p. 104). Apesar de conter setores dinâmicos da econômica como a indústria recicladora que, segundo Costas e Chaves (2013), a territorialização agrega os demais agentes (catadores, compradores, atravessadores e prefeituras), no contexto nacional as atividades desenvolvidas pelos catadores estão na base estrutural do processo produtivo. No entanto, tais atividades são desenvolvidas em péssimas condições de trabalho, o que caracterizando relações de trabalho precário, dependência e vulnerabilidade econômica dos catadores. O fragmento abaixo expõe tal contexto: Os catadores de materiais recicláveis realizam a coleta de materiais há décadas nos chamados lixões, nos aterros e nas áreas urbanas, na maioria dos casos iniciam a atividade de maneira individual ou familiar. A atividade, quando realizada nos lixões e aterros, consiste na coleta de materiais passíveis de reciclagem encontrados junto aos resíduos sólidos provenientes da coleta comum e despejados na área de disposição, após a coleta, ou mesmo durante esta, ocorre a triagem dos materiais para posterior comercialização que costuma ocorrer no próprio local. Já, nos casos em que a coleta de materiais é realizada nas ruas, os cata dores buscam, principalmente nos centros comerciais, materiais passíveis de reciclagem, coletam, realizam a triagem dos materiais e os comercializam (MOREIRA, 2012, p. 22). Sem local para estocar o material e equipamentos adequados, os catadores vivem somente da venda dos materiais coletados e separados diariamente, comercializados com atravessadores por baixos valores. Dessa forma, os indicadores do circuito econômico da reciclagem, apresentados no inicio do texto, são alcançados através do processo de informalidade e precarização das relações de trabalho. Sob o ponto de vista histórico, as estratégias de reciclagem e reutilização de resíduos surgem na emergência da questão ambiental e do discurso de sustentabilidade, que ganham o cenário internacional a partir da década de 1970, contudo, segundo Chaves e Costas devemos compreender esse debate como: [...] conjunto com os aspectos socioeconômicos e políticos, se insere com 449 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 força nos diferentes espaços e instituições, exigindo possibilidades outras de análise e compreensão das relações estabelecidas entre as diferentes esferas do tecido social (econômico, político e ambiental) engendrando embates aos ideais de desenvolvimento econômico e instaurando complexidades, contradições e tensões no campo acadêmico e social (2013, p.01). A crise no padrão de acumulação fordista desencadeou um conjunto de transformações sociais, econômicas e tecnológicas, como novas formas de organização da produção, desregulamentação das relações de trabalho e estratégias de mercado, o que levou ao processo denominado de reestruturação produtiva. Esse conjunto de medidas tinham como objetivo restabelecer as taxas de acumulação, através de dois mecanismos centrais: flexibilização das relações de trabalho e fragmentação produtiva. A partir da década de 1990 foi bastante expressivo o aparecimento de atividades “informais” de trabalho, como uma saída encontradas por uma considerável parcela dos trabalhadores para garantir o seu sustento e um dos meios do capital garantir sua própria reprodução, já que ampla parcela da população que tem encontrado dificuldades inclusive para vender sua força de trabalho. O crescente índice de informalidade permite também o aumento do trabalho excedente e consequentemente o ampliação da taxa de mais valia, seja ela absoluta ou relativa (Almeida, Carvalho e Freitas, 2011). Em relação ao aumento da informalidade Gonçalves (2009) afirma que: Como vimos, o referencial teórico utilizado até o começo dos anos 80 apresentava o Setor Informal como campo de atuação dos trabalhadores desqualificados, e das empresas de baixo capital e produtividade, situação que sofrerá novas mudanças a partir da reestruturação econômica do capitalismo no âmbito mundial, sendo as novas formas de utilização do trabalho no capitalismo um dos determinantes que irá heterogeneizar ainda mais os trabalhadores e as unidades econômicas assim classificadas. Desta forma, seguindo a lógica do movimento de reestruturação produtiva do capital global que afeta as formas de exploração do trabalho e a conformação política dos Estados nacionais, a informalidade deixa, em seu novo contexto, de ser um fenômeno restrito aos países não industrializados, ou com um padrão de industrialização (p.133). As relações de trabalho na cadeia produtiva da reciclagem podem ser mencionadas como exemplo desse processo sob dois aspectos: primeiro, o 450 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 reaproveitamento de materiais na esfera da otimização dos custos; e segundo, a quase totalidade dos trabalhadores inseridos nesta atividade são “informais” já que não reconhecimento ou amparo legal. Nesse sentido, as atividades executadas pelos catadores, apresentando condições mínimas de segurança para o seu desenvolvimento e baixa remuneração, estão no rol de atividade de caráter flexível. Precarização do trabalho e a questão de gênero O Brasil, de acordo com Singer (2002), a partir da metade da década de 1980, com as crises do fim do período militar, a adoção de medidas neoliberais no país e pelos resultados do processo de reestruturação produtiva nas empresas, começou a desenvolver atividades relacionadas às cooperativas. Além disso, ressalta que a crise econômica brasileira entre 1981 e 1983 e a crise desencadeada pela abertura dos mercados no governo Collor nos anos 90, tiveram como principal resultado o fechamento e falência de diversas fábricas, aumentando dessa forma, o índice de desemprego estrutural no país, fazendo com que outras alternativas de renda fossem buscadas. Com a intensa abertura econômica e a terceirização da economia, verifica-se que a tendência crescente da incorporação da mulher no mercado de trabalho tem aumentado tanto no mercado formal quanto nas atividades informais, sobretudo no setor de serviços. Para entender a questão em torno da divisão sexual do trabalho, é feita a incorporação da dimensão do gênero, apresentando um efeito desmistificador da divisão do trabalho. Sob esta perspectiva, tal divisão não está pautada em uma questão somente econômica, mas que também abrange uma dimensão simbólica e cultural, que só poderá ser compreendida através do uso da categoria gênero. A qual pode ser observada pela seguinte perspectiva: “pode-se afirmar que as sociedades, ao longo da história, produziram/produzem e mantêm as diferenças de gênero, através de processos sociais. Por conseguinte, a diferenciação de gênero reproduz o sistema de relações sociais incorporado na maneira como as instituições, especificamente o mercado de trabalho, são organizadas, diferenciando os sexos. Neste contexto, a construção do gênero no mercado de 451 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 trabalho é produto das formas pelas quais são designadas as funções baseadas no sexo, ou seja, determinadas funções reconhecidas como mais apropriadas para as mulheres e outras para os homens. Assim sendo, normalmente o trabalho executado por homens é mais valorizado do que o executado pelas mulheres. Há construções de relações de gênero no emprego, por parte de patrões e empregados como também em várias esferas do mundo do trabalho (Ramos, 2011, p.4). Dessa forma, as relações de gênero podem ser observadas como construções históricas e sociais as quais formam um sistema de reprodução da hierarquia, relacionando o sexo com os conteúdos e elementos culturais segundo o período histórico. Em concordância com Araújo e Scalon (2005), em relação à participação das mulheres em atividades remuneradas, notou-se que estão mais expostas ao desemprego e a atividades precárias e as informais, destacando-se o trabalho doméstico. Ademais, as ocupações de cuidado continuam sendo consideradas responsabilidade da mulher, sendo a maternidade um ponto predominante. No decorrer da última década, as iniciativas socieconômicas coletivas solidárias tiveram um aumento relevante. Tais atividades visam a promoção da cooperação ativa entre trabalhadores e trabalhadoras em atividades de produção, de comercialização, de crédito, de consumo e de prestação de serviços. Nesse contexto de exclusão do mercado de trabalho e rendimentos familiares baixos, a catação de materiais recicláveis se tornou uma alternativa à renda. Conforme Ramos(2012) as cooperativas de catadores de resíduos sólidos estão sendo criadas em diversos municípios do Brasil como uma alternativa para a humanização e formalização do trabalho dos catadores, os quais desenvolvem um papel muito importante e essencial na cadeia produtiva da reciclagem. Na atualidade, a maioria dos grupos de pessoas que sobrevivem ou vivem do material reciclável são formados por mulheres. A percepção dos trabalhadores: relato das entrevistas Como recorte da categoria escolhemos entrevistar os trabalhadores da Recicla Ourinhos, mais especificamente para identificar a precarização do 452 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 trabalho, os cooperados que já trabalharam no lixão e que depois foram trabalhar na cooperativa. As 10 entrevistas foram realizadas no dia 20 de setembro na própria Recicla Ourinhos, fomos no horário de trabalho, logo após o almoço, a entrevista teve que ser dividida em duas partes, pois o grupo que já trabalhou no lixão não é tão grande, considerando os mais de 80 catadores cooperados. Metade do grupo de 10 catadores estava na rua trabalhando e a outra metade estava na cooperativa. Então fizemos as entrevistas com dois grupos, sendo que ambos trabalharam no lixão e hoje trabalham na recicla. Utilizamos um questionário com perguntas norteadoras com respostas bem abertas, para gerar uma roda de conversa. Sobre as idades a mais baixa encontrada foi 31 anos e a mais alta 61 anos, as outras idades variaram entre 40 aos 60 anos. O tempo máximo trabalhado na Recicla Ourinhos foi de 10 anos, o seu tempo total de existência desde a sua criação em 2003 e quem trabalha há menos tempo trabalha há 4 anos. Percebe-se que todos trabalham nesse ramo há mais de 10 anos, que há pouca flexibilidade de empregos nesta área, pois a maioria deles começou a trabalhar no lixão, e depois foi para a cooperativa e continua lá deste então, chegando a trabalhar ao todo contando com os anos do lixão e da recicla vinte anos. As principais mudanças e diferenças entre trabalhar no lixão e na recicla para os trabalhadores foi unanimidade quanto às estruturas físicas, todos os trabalhadores concordaram que no lixão trabalhava-se em céu aberto, no sol e na chuva, sem exceção, não havia nenhum local apropriado para se alimentarem, Logo depois de comerem voltavam ao trabalho, pois a renda dos trabalhadores no lixão no final do mês era composta de quanto eles conseguiram catar de resíduos, um dia não trabalhado era um dia a menos de “renda”, pois não tinham um salário fixo. Não ter um valor fixo na renda é um ponto comum de reclamação. Sobre a jornada de trabalho no lixão eles entravam as 7h e saiam as 18h, saiam de suas casas ao amanhecer para ir trabalhar, sem horário de almoço determinado, diferente de trabalhar na 453 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 Recicla Ourinhos, pois entra-se as 9h e saí as 18h, mas tem horário de almoço, um local adequado para comerem, um refeitório, que a própria recicla dá os almoços aos trabalhadores, Outro ponto sobre as estruturas físicas, que agora eles trabalham nos galpões e na mais no embaixo de sol o dia todo, há maquinários para ajudá-los na separação dos resíduos e armazenamento. A questão sobre porque na recicla trabalham mais mulheres do que homens, alguns responderam que não sabiam, mas também responderam que as mulheres se esforçam mais, trabalham mais, que os homens desistem desse tipo de trabalho mais facilmente. Outra resposta foi que os homens tem mais oportunidades de emprego, mais opções de trabalho. Pode-se ver que os trabalhadores gostam do seu trabalho, se der catadores de materiais recicláveis, que sabem da importância de seu emprego, preferem estar na Cooperativa Recicla Ourinhos ao lixão, se sentem mais seguros com este trabalho. E que ainda gostam do seu ambiente de trabalho, dos companheiros, da estrutura física do local e da função que exercem. Uma das criticas de uma trabalhadora foi que os cooperados mais jovens, que não trabalharam no lixão, que não passaram por toda aquela experiência não valorizam tanto o trabalho na recicla atualmente, que antes era muito mais precarizado o trabalho, que houveram sim mudanças drásticas entre os dois ambientes de trabalho. Considerações finais Nessa perspectiva, o lixo é resultado do trabalho humano, mesmo que tenha sido dispensado pelo seu possuidor após perder sua “vida” útil. A partir da recuperação e reutilização através do processo de coleta, triagem, beneficiamento por meio do trabalho humano o lixo torna-se novamente mercadoria de interesses aos setores econômicos ligados a reciclagem. O funcionamento do processo produtivo da reciclagem é composto por diferentes etapas, envolvendo diversos agentes que atuam desde a gestão de resíduos sólidos passíveis de reciclagem, até o processo de transformação final do material e comercialização, no entanto, as relações são assimétricas, 454 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 com diferenças de ganhos e condições de trabalha entre os agentes. Nesse processo podemos destacar as atividades dos catadores que estão na base do processo produtivo, assim, a recuperação de resíduos passíveis de reciclagem tornou-se possível e viável na medida em que as tarefas desempenhada pelo catadores são de baixo custo e compensasse investimentos de tecnologia. Como citado anteriormente verificamos uma presença preponderante do gênero feminino em trabalhos atípicos, como os temporários, parciais, trabalho em domicílio e o trabalho informal, contribuinte para a dependência e perpetuação das relações hierárquicas entre homem e mulher no mercado de trabalho e outras dimensões da vida social. Este processo se reflete entre os catadores, no atual contexto a maioria dos grupos de pessoas que sobrevivem ou vivem do material reciclável são formados por mulheres. Dessa forma, podemos concluir que as mulheres estão mais expostas aos aspectos de precarização das relações de trabalho, em que as relações de gênero podem ser observadas como construções históricas e sociais. Percebeu-se ainda a grande mudança que houve do lixão para a cooperativa, os trabalhadores que passaram por estas duas fases relataram como o trabalho no lixão era precarizado com danos à saúde, horas e horas embaixo de sol, se alimentando mal junto à sujeira, e um local de trabalho inapropriado. E que a partir da organização e trabalho em cooperativa popular houve mudanças drásticas nas condições de trabalho, como jornada de trabalho apropriada, infraestrutura como local de trabalho, refeitório, maquinários para separar os resíduos entre outros. Referências ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EMPRESAS DE LIMPEZA PÚBLICA E RESÍDUOS ESPECIAIS – ABRELPE. Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil 2010. Disponível em<www.abrelpe.org.br/panorama_apresentato.cfm>. Acesso em: 12 de abril de 2013. ASSOCIAÇÃO COMPROMISSO EMPRESARIAL PARA A RECICLAGEM – CEMPRE. Disponível em: <www.cempre.org.br/informamais>. Acesso em: 20 de setembro de 2013. 455 IX SEMANA DE GEOGRAFIA O espaço brasileiro contemporâneo: leituras sobre campo, cidade e região De 5 a 8 de novembro de 2013 ALMEIDA, R; CARVALHO, T; e FREITAS C. O trabalhador catador em situação de lumperproletariado na moderna configuração do capital. Revista Pegada Eletrônica, Presidente Prudente, volume especial, 2011. BOSI, Antônio. A organização capitalista do trabalho “informal”: o caso dos catadores de recicláveis. Revista Brasileira de Ciências Sociais, n. 67 v. 23, São Paulo, 2008. COSTA, B e Chaves, M. O lixo como valor de uso e de troca: as contradições dos capital e Geografia no campos do debate. In: Encuentro de Geógrafos de América Latina EGAL, 2013, Lima, Peru. Anais Encuentro de Geógrafos de América Latina EGAL, 2013. GODOY, Tatiane Marina Pinto. O Espaço de Produção Solidária dos Catadores de Materiais Recicláveis: usos e contradições. Dissertação de Mestrado em Geografia pela Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho – UNESP, Campus de Rio Claro, 2005. GONGALVES, Marcelino. Cooperativas e Associações de Catadores: formação e organização do trabalho na raia divisória SP– PR– MS. Pegada, Revista Eletrônica: CEGeT, 2009. Disponível em: <www2prudente.unesp.br/ceget/pegada/peg2n3.htm.>. Acesso em 15 de abril de 2013. MOREIRA, Marcela Stanko. Gestão de resíduos sólidos recicláveis com a participação de catadores: o caso da Cooperativa de Catadores de Materiais Recicláveis de Ourinhos. Trabalho de conclusão de curso de Bacharel em Geografia pela Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho – UNESP, Campus de Ourinhos, 2012. SINGER, P. Introdução à Economia Solidária. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2002. RAMOS, Thiago Almeida. Análise das mulheres na reciclagem: Trabalho precário/desumano ou emancipação frente ao desemprego e à exclusão social?. São Paulo: FAPESP, 2012. 456