08 Santo Tomás de Aquino

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08 Santo Tomás de Aquino
SANTO TOMÁS DE AQUINO:
A Igreja e o pensamento ocidental
Elaine Gai Torres*
RESUMO
Este artigo propõe uma visão de Santo Tomás de Aquino dentro da Escolástica, a influência de
Aristóteles u em seus escritos, trazendo ao presente as implicações de seu legado à educação, assim
como a influência religiosa no pensamento ocidental. Numerosos estudos têm sido feitos ao longo
dos tempos sobre sua vida e sua obra e nem por isso se exaure o valor de seus ensinamentos; ao
contrário, proporciona elementos valiosos para pensar o mundo e o momento atual à luz de
verdades eternas. Considerado um dos maiores filósofos da Idade Média, suas obras refletem o
amor que devotava a Cristo, personificadas em amor incondicional ao próximo.
Palavras – chaves: Aquino; Igreja; Educação.
1 INTRODUÇÃO
Vida e obra de Santo Tomás de Aquino.
Tomás de Aquino nasceu em Nápoles em 1224/5, EM Aquino, na Itália. Foi cedo para o
mosteiro de Monte beneditino Cassino. Cursou a Universidade de Nápoles, onde conheceu a ordem
dominicana e com dezoito anos tornou-se frade. Dali voltou para Nápoles, depois Paris e dali para
Colônia, na Alemanha, onde foi discípulo de Santo Alberto Magno. Morreu na Abadia de Fossanova
(Itália) em 1274, a caminho de Lião. Após sua morte, recebeu o título de Doutor Angélico pela
elevação espiritual e perfeição de sua existência. Foi declarado Santo pelo Papa João XXII em 1323;
em 1567, Paulo V o declarou Doutor da Igreja e Leão XIII o proclamou padroeiro das escolas
católicas em 1879.
Quase todo o seu tempo foi dedicado ao ensino e à reflexão. Nos últimos anos, voltou à
Universidade de Nápoles para lecionar. Em 1252, em Paris para obter o título de mestre e doutor,
escreveu comentários ao livro de Pedro Lombardo, sobre o Profeta Isaías e o Evangelho de São
Mateus. Em 1256, já doutor, escreveu Suma contra os Gentios, em quatro volumes. Sua obra mais
*Licenciada em Letras, especialista em Educação e Gestão Ambiental. Apresentação em 14/08/2006.
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importante, a Suma Teológica, é dividida em três partes, ficando a terceira incompleta; mais tarde
foi completada pelo amigo Reginaldo de Piperno. Outros trabalhos: Questões que tratam sobre a
verdade, a alma, o mal, a beatitude e vários Opúsculos Filosóficos sobre assuntos variados, como o
Ente e a Essência, Sobre as falácias, além de comentários sobre as obras de Aristóteles.
3 A ESCOLÁSTICA, A INFLUÊNCIA DE ARISTÓTELES EM AQUINO E A INFLUÊNCIA
DA IGREJA NO PENSAMENTO OCIDENTAL
Esse período de quase mil anos em que a Igreja Católica teve um poderio militar, moral e
financeiro, pareado com os principais reinos europeus impuseram um papel importante na política e
na cultura medieval. Inicialmente com o ensino restrito às suas instituições religiosas, com a
Escolástica, voltou-se à educação moral de seus membros e do povo cristão. Seu pressuposto
fundamental assentava-se na fé como base da sabedoria humana, representada pela crença às
verdades reveladas por Deus contidas na Bíblia e interpretadas segundo a religião cristã. O ensino era
dividido em trívium (gramática, retórica, dialética) e quadrívium (aritmética, geometria, astronomia,
música), as chamadas artes liberais.
Santo Tomás tomou conhecimento da obra de Aristóteles quando estudava em Nápoles.
Nessa época, seus escritos haviam desaparecido na Europa; porém, preservado no Oriente,
reapareceu por comentadores árabes. Embora sua influência mais marcante seja a do pensamento
aristotélico, buscou conhecer Platão, os muçulmanos Avicena e Averróis e Maimônides, filósofo e
teólogo judeu. Essa universalidade do conhecimento talvez seja a justificativa da qualidade
atemporal de sua obra, cujo único compromisso era com a verdade das coisas. Guillermo de Tocco,
biógrafo de Aquino (apud JACQUES LE GOFF, 1971, p.252) escreveu: “El hermano Tomás
planteaba em sus cursos problemas nuevos, descubría nuevos métodos, empleaba nuevos conjuntos
de pruebas”
Para Aristóteles, a razão e a investigação intelectual vinham em primeiro plano, e a fonte
principal do conhecimento científico era a realidade material. Coube à Aquino conciliar um filósofo
grego pagão com o Cristianismo. Jostein Gaarder, em seu livro “O Mundo de Sofia” (1995, p.198),
diz que Tomás cristianizou Aristóteles da mesma forma que Agostinho o fez com Platão.
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Enquanto escrevia a Suma Teológica, a cristandade era abalada politicamente: guerras ao sul
da França e norte da Itália; os mosteiros monacais1 e o episcopado esvaziavam-se de forças morais;
porém isso não impediu a Igreja de responder a esse declínio com a construção de catedrais e
universidades, a fim de iniciar e ampliar a conquista da cultura mundial. A Universidade de Paris foi
a arena onde Aquino concretizou sua Suma Teológica, frente aos mais acirrados debates intelectuais,
tentando provar que a investigação racional e a fé poderiam andar juntas, posto que embora a razão
esteja subordinada à fé, funciona de modo independente, sem precisar de uma verdade divina no
interior do indivíduo para que seja conhecida.
Entretanto, entre os longos anos que separam Idade Média e o mundo contemporâneo, mesmo
após a separação entre Igreja e Estado, sua influência ainda hoje está presente em vários aspectos do
nosso cotidiano. As práticas de controle e disciplina foram traços importantes da educação religiosa e
se encontram vivos em muitas instituições educacionais de cunho religioso, bem como o forte
sentimento de humanismo, a caridade e a justiça proclamados pelo cristianismo.
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LEGADO DE SANTO TOMÁS DE AQUINO À EDUCAÇÃO
Segundo Santo Tomás, o conhecimento divide-se em dois tipos: o sensível, captado pelos
sentidos, através do contato direto, e o intelectivo, alcançado pela razão, permitindo abstrações,
buscando a essência das coisas, objeto da ciência. O princípio fundamental do pensamento
aristotélico e da filosofia escolástica diz que para chegar à essência das coisas, é preciso transformar
em ato algo que já existe potencialmente – a inteligência ativa realiza esse processo. A inteligência
passiva vem como complemento da primeira, onde cada um é capaz de formar seus próprios
conceitos.
Em educação, significa dizer que o conhecimento é construído pelo aluno, e não transmitido
pelo professor. No desenvolvimento da essência de cada um, alicerçado pela razão, a felicidade e a
conduta correta caminham abraçadas. Nas suas palavras encontra-se também um paralelo à obra de
educadores atuais, como Paulo Freire e Carlos Rodrigues Brandão. Como eles, Aquino considerava a
linguagem do povo um depósito de sabedoria. De acordo com Lauand (1990, p.27): “A limitação do
conhecimento humano se reflete na sua linguagem. Não podemos expressar o que as coisas são, na
medida em que não sabemos completamente o que elas são”. Quando se fala em educação, os
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Monaquismo: “Organização de homens que fizeram votos especiais de vida religiosa e viviam de acordo com regras
que determinavam a conduta nos seus menores detalhes” (PILETTI, 2002, p.57).
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ensinamentos de Aquino são tão atuais quanto o foram em sua época. Certamente não é acaso a
filosofia retornar aos currículos de primeiro e segundo graus, mas antes reflexo de uma sociedade
carente dos valores proclamados por Aquino.
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CONCLUSÃO
Com Aquino, a Escolástica trouxe uma contribuição de indiscutível valor e atualidade para a
unidade cristã e para a educação. Desde cedo, Tomás mostrou ser um jovem inclinado mais à
reflexão do que às brincadeiras, destacando-se no meio acadêmico e da Igreja. Sua admirável
habilidade com as letras e as palavras trouxe para o cristianismo Aristóteles, que não concebia um
Deus criador nem vida após a morte. Foi nesse contexto que a própria Igreja viu nas obras do
filósofo-teólogo Aquino uma sólida defesa contra o declínio da soberania eclesiástica.
Seus ensinamentos refletem uma universalidade quando aplicados não só aos valores
religiosos, pois que sua vida e obra foram permeadas de saber moral, difundindo bondade,
desprendimento, disciplina. Falando do conhecimento sensível e do intelectivo, introduziu na
educação um conceito pedagógico novo, de que é o próprio aluno que constrói seu conhecimento.
A Igreja enquanto instituição política, social e religiosa, reinou soberana por um vasto
período. Além de interferir na ordem política e econômica dos países, influenciou sobremaneira a
educação, mantendo essa influência, em alguns aspectos, até os nossos dias, como as noções de
disciplina e severa rigidez. No campo religioso, ainda hoje o teor humanitário de caridade e justiça
conferido pela religião continua presente nos discursos do clero.
6 REFERÊNCIAS
GAARDER, Jostein. O Mundo de Sofia. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
GOFF, Jacques L. La Baja Edad Media. 15 ed. México: Siglo Veintiuno, 1971.
LAUAND, Luiz Jean. Filosofia e linguagem comum. Com 3 ensaios de Josef Pieper. Curitiba:
Educa, 1990.
PILETTI, Claudino; PILETTI, Nelson. História da Educação. 7. ed. São Paulo: Ática, 2002.
FERRARI, Marcio. Tomás de Aquino. O mestre da razão e da prudência. Nova Escola, São Paulo:
Abril, ed. 183, jun. 2005.
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CARVALHO. Côn. José Geraldo V. de. Tomás de Aquino: Um filósofo admirável. Disponível em:
<http: www.consciencia/medieval/aquinovidigal>. Acesso em 12 ago. 2006.
Estudo introdutório de Jean Lauand ao livro Tomás de Aquino Verdade e Conhecimento. Disponível em: <http:// jean_lauand.tripod.com/page28.html>. Acesso em 12 ago. 2006.