CinE urUGuAi

Transcrição

CinE urUGuAi
Ci nE u rUG uAi
Cine Uruguai
Ferreira, Leonardo Luiz (org.)
1ª Edição
Agosto de 2016
ISBN 978-85-66110-26-5
Coordenação editorial & Revisão de textos Leonardo Luiz Ferreira
Capa & Projeto gráfico Guilherme Lopes Moura
Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução deste livro
com fins comerciais sem prévia autorização dos organizadores.
A
CAIXA é uma empresa pública brasileira que prima pelo respeito à
diversidade, e mantém comitês internos atuantes para promover
entre os seus empregados campanhas, programas e ações volta-
dos para disseminar ideias, conhecimentos e atitudes de respeito e tolerância à diversidade de gênero, raça, orientação sexual e todas as demais
diferenças que caracterizam a sociedade.
A CAIXA também é uma das principais patrocinadoras da cultura brasileira, e destina, anualmente, mais de R$ 80 milhões de seu orçamento
para patrocínio a projetos nas suas unidades da CAIXA Cultural além de
outros espaços, com ênfase para exposições, peças de teatro, espetáculos de dança, shows, cinema, festivais de teatro e dança e artesanato
brasileiro. Os projetos patrocinados são selecionados via edital público,
uma opção da CAIXA para tornar mais democrática e acessível a participação de produtores e artistas de todo o país.
No panorama recente do cinema latino-americano, o Uruguai ocupa
uma posição no mínimo intrigante: apesar de produzir pouco, a qualidade fílmica impressiona muito.
Trazer para o Brasil um painel contemporâneo e retrospectivo do
cinema de um país vizinho, pioneiro em políticas sociais, envolve o
público em uma reflexão e busca de identidade latino-americana um
pouco perdida entre o Brasil e o Uruguai.
Ao patrocinar mais esta mostra para o público carioca, a CAIXA reafirma sua política cultural de estimular a discussão e a disseminação de
ideias, promover a pluralidade de pensamento, mantendo viva sua vocação de democratizar o acesso à produção artística contemporânea.
Caixa Econômica Federal
Q
uando vim em 2012 morar no Uruguai, as únicas personalidades que eu já conhecia eram Eduardo Galeano, Torres García
e Forlan, assim como a maioria dos brasileiros que conheço.
Sendo eu uma cantora, tratei de me envolver e conhecer a cena musical
e os músicos daqui, e logo montei uma banda. Os shows começaram a
aparecer rapidamente, mas ainda conhecia muito pouco da arte que é
produzida por aqui.
Umas das pessoas importantes nesse processo de introdução a música popular uruguaia foi meu amigo músico de Artigas (fronteira Brasil
e Uruguai) e também autor, Ernesto Diaz. Ele me emprestou 12 discos, e
depois me passou inúmeros links de canções, de tudo que ele achava
importante dentro desse universo sonoro totalmente desconhecido por
nós, eu lhe perguntava: O que é a música feita no Uruguai?
Eu passei meses ouvindo esses mesmos disco todos os dias, e ouvindo uma vez mais, ali conheci a seiva da MPU com “los reyes” Eduardo
Mateo, Ruben Rada e Hugo Fattoruso. Foi um choque. Há muito tempo
nada mexia tanto comigo. Conhecendo um pouco mais deste “meu novo
mundo” pintou a curiosidade de entender de onde vinha tanta liberdade na arte de criar.
O Uruguai é um país pequeno, com cerca de 3 milhões de habitantes,
sendo que a metade mora na capital Montevidéu, o mundo empresarial
da arte, artistas milionários que andam de avião próprio e vivem em
mansões, não existe neste universo paralelo artístico uruguaio, e na minha humilde teoria, isso se reflete diretamente na arte e na criação das
pessoas deste país.
Se um artista não consegue enxergar a possibilidade de se tornar em
seu próprio país uma super estrela milionária, por que ele vai se atar,
calcular a sua criação, relacionar sua arte com metas de sucesso, cederse a qualquer enquadramento de qualquer tipo de mercado?
Sim, acreditem, os artistas neste país são livres para criar o que quiserem, não existe o som da moda, nem o produtor da moda, nem o escritor ou pintor “hypado”, aqui quem manda é a arte, aquela que eriça
os pelos do braço e faz a gente refletir por horas a fio.
No cinema acontece o mesmo: as histórias são fantásticas (até porque a educação e a leitura no Uruguai são coisas sérias). E o orçamento? Para o padrão do Brasil é impossível, fictício. Surreal os filmes que
fazem os diretores daqui com tão pouca grana. Eles praticamente continuam a pensar cinema como Glauber Rocha (“uma câmera na mão e
uma ideia na cabeça”).
Ano passado, depois de um show que fiz no Rio de Janeiro, onde cantei autores uruguaios e falei do país e da minha vivência na cidade de
Montevidéu, Mariana Bezerra, produtora da mostra Cine Uruguai, me
procurou e falou: “Vamos fazer uma mostra de cinema uruguaio no Rio?
Mesmo eu não sendo uma especialista em cinema, topei imediatamente; me pareceu mais uma bela oportunidade de mostrar o Uruguai e
suas cabeças brilhantes para o Brasil. Fazer essa curadoria foi uma delícia! Assistir filmes, fazer uma lista com os mais importantes, contatar
diretores, traduzir cartas, conseguir papeis assinados e trazer os filmes
para o Brasil. Foram 4 meses de trabalho onde conheci muita gente legal e vi muitos bons filmes, Whisky, Reus, Maracanã, Tus Padres Volverán
e Tanta Água são alguns exemplos de filmes que contam a história deste
povo e tentam retratar também a sua idiossincrasia.
Na verdade, isso tudo me chama atenção: a postura e os resultados
da parcela criativa desse país, a feitura de uma arte pura, sem o envenenamento do dinheiro e do poder, que muitas vezes maquia a arte.
É por isso que eu gosto de dizer: Viva “nuestro vecino”. Viva o Uruguai e sua força cultural, que mesmo sendo tão pequenino em tamanho
“es inmenso y nos llena el corazón com tanta belleza, lucha y talento”.
Tamy é curadora da mostra Cine Uruguai. Autora, cantora e instrumentista, ela começou sua
carreira, em 2002, em Vitória, capital do Espírito Santo, cidade onde nasceu. Em 2006 lança seu
primeiro álbum, o Soul Mais Bossa, disco que abriu portas e iniciou uma carreira internacional
para a cantora. Para 2016, Tamy finaliza Parador Neptunia, seu quarto álbum, feito entre Uruguai e Brasil, onde mistura música brasileira e candombe, ritmo do folclore uruguaio.
Sumário
artigos
14 »
A Experiência Cinematográfica Uruguaia » Marcelo La Carretta
34 »
Uma História do Documentário Uruguaio » Ricardo Casas
40 »
Cinefilia Charrua » Fabián Núñez
48 »
O Cinema Uruguaio Contemporâneo » Guilherme de Alencar Pinto
Fortuna Crítica
60 »
O Banheiro do Papa » Paulo Santos Lima
66 »
A Casa » Luis Henrique Boaventura
72 »
Clever » Robledo Milani
76 »
Gigante » Rodrigo de Oliveira
82 »
Os Inimigos da Dor » Sérgio Alpendre
86 »
Maracanã » Rodrigo de Oliveira
90 »
Reus » Rogério de Moraes
94 »
Sr. Kaplan » Francisco Russo
98 » Tanta
102 »
Água » Alysson de Oliveira
A Vida Útil – Um Conto de Cinema » Carlos Alberto Mattos
106 » Whisky » Marcelo Janot
110 »
Oficina de Produção Executiva em Documentário
124 »
Agradecimentos
125 »
Créditos
Artigos
A Experiência
Cinematográfica
Uruguaia
Marcelo La Carretta1
15
pletou 64 anos no ano de 2016. Comportando atualmente sete
salas de projeção espalhadas pelos shoppings e ruas da ca-
pital, ela possui em seu acervo 14 mil títulos e, em 2000, por exemplo,
exibiu nada menos que 1.200 programas para um público de 450 mil
pessoas. Para manter-se (trata-se de uma agência privada), essa cinemateca conta com estratégias constantes de marketing cultural e com
10 mil sócios, que pagam o equivalente a cerca de R$20 mensais (mais
ou menos 210 Pesos uruguaios), além do funcionamento da videoteca
e da escola de cinema2. Fundada em 21 de abril de 1952, primeiramente
como cinema universitário, a cinemateca foi tomando forma a partir da
conscientização e posterior amadurecimento de alguns dos jovens que
lotavam as exibições. Hoje, aqueles jovens são historiadores e críticos da
maior influência, não somente no país de origem, mas respeitados pelo
mundo. Os dados impressionam ainda mais quando se revela que a cinemateca em questão é a do Uruguai, país com pouco mais de 3,2 milhões
de pessoas, o equivalente a um bairro de São Paulo. Mais que números,
1
2
Uruguaio, professor de técnicas audiovisuais da Puc Minas.
A monumental cinemateca de Montevidéu. Diário O Paraense. Acesso em 28 fev. 2003. Dis-
ponível em: <http://www.oparaense.com/cultura12.htm
Cine Uruguai
A
cinemateca mais antiga em atividade da América Latina com-
16
estes dados refletem o cuidado e a determinação do povo uruguaio com
a preservação e divulgação de sua cultura cinematográfica. Como se não
bastasse ter o próprio circuito de exibição, a Cinemateca Uruguaia ainda desenvolve projetos de formação de plateias em colégios da rede pública e consegue abrir espaço para títulos de perfil menos comercial até
nos famosos complexos multinacionais de cinemas. Com o sugestivo slogan “¡Viva la diferencia!”, mantém sessões semanais nas principais salas
Cine Uruguai
de projeção em shoppings e multiplex, ampliando consideravelmente seu
público e oferecendo alternativas aos blockbusters. Que essa saudável
diferença, única na América Latina, continue sempre viva3. A Cinemateca tem um papel fundamental no desenvolvimento do cinema uruguaio
a partir do momento em que se destina à salvaguarda e, principalmente,
divulgação da produção local. O que é válido, uma vez que o povo uruguaio, em sua maioria, cultua seu passado cultural. As iniciativas de divulgação deste cinema atingem particularmente os jovens, propiciando
rapidamente uma absorção do papel cultural desta arte. Isso pode parecer lúdico comparado ao Brasil, um país de dimensões continentais, mas
trata-se de um país de dimensões diminutas e concentrado em praticamente apenas uma cidade importante, Montevidéu.
A história cinematográfica do Uruguai não começou diferente de outras partes do mundo. Um filme composto por um monte de silhuetas
realizado em 1839 mostrava o General Rivera entrando triunfante no
chamado Monte VI Del Oeste, mais tarde conhecido como a cidade de
Montevidéu. Outros brinquedos óticos vieram, em sua maioria importados da França, tendo marcado presença o Gran Cosmorama, o Gabinete
Óptico, Fuegos Diamantinos e os Daguerreoticos (evolução do aparelho
3
A monumental cinemateca de Montevidéu. Diário O Paraense. Acesso em 28 fev. 2003. Dis-
ponível em: <http://www.oparaense.com/cultura12.htm
17
fotográfico Daguerreótipo). A primeira crônica sobre cinema escrita no
país e publicada no jornal El Siglo já mencionava, em 28 de dezembro
de 1896, os ‘fantásticos films Salida de los Obreros..., La llegada de un
Tren’, relatando a primeira exibição privada que ocorrera em 18 de julho
daquele ano. O local da exibição, Le Salon Rouge, localizava-se à Rua 25
de maio nº. 287, na mesma sala onde antes se encontrava o Dianorama.
(ZAPPIOLA, 1989 p.3). Importante observar que a data (18 de julho) não
foi escolhida ao acaso: trata-se do aniversário da assinatura da primeitraram a novidade: O diário La Razón falava em 20 de julho daquele ano
da “maravilhosa aplicação da fotografia instantânea ultimamente descoberta. Na ocasião, estavam presentes um número reduzido de convidados, que admirados, aplaudiram as bonitas vistas que o aparelho
oferecia”. Já em 21 de julho, saíram notas sobre o invento nos jornais El
Siglo, El Día e Tribuna Popular. La Razón noticiaria novamente no dia 22,
mas o relato mais crítico e detalhado do evento seria dado pela revista
Caras y Caretas em 26 de julho de 1896: “É o mais notável e surpreendente que se pode conceber, e é perfeitamente impossível que alguém
consiga descrever de antemão antes de vê-lo. Por isso, não deixe de ir”.
(SARATSOLA, 2005 p.224).
Ávidos consumidores das ideias que vinham do velho continente, os
uruguaios acabaram confundindo o nome daquele engenhoso aparelho
dos irmãos Lumière. Ao invés de Cinematógrafo, insistiam em chamá-lo
de Biógrafo, na verdade outro invento similar entre os vários que competiram com o dos Lumière. (ALVAREZ, 1957 p.5). Mas talvez neste equívoco os uruguaios tenham compreendido muito bem uma das funções
do novo invento: contar fatos e costumes com precisão biográfica. Não
tardaram as produções nacionais, como a de Félix Olivier que, com uma
Cine Uruguai
ra Constituição do país (1830). Na ocasião, vários jornais da época regis-
18
câmera comprada dos Lumière, realizou em 1898 o primeiro filme uruguaio de que se tem notícia: Una Carrera de Ciclismo en el Velodromo de
Arroyo Seco. Em 1900, Olivier trabalhou com Georges Méliès4 e aprendeu
alguns de seus truques. Acabou fazendo filmes próprios, onde ele mesmo
atuava, para promover suas atividades de pintor e letrista. Félix Olivier foi
também projecionista, abrindo um pequeno cinema na Avenida 18 de Julio. Coincidência ou não, esta avenida, que é uma das mais importantes
Cine Uruguai
da capital, abriga hoje a principal sala de exibição da Cinemateca.
Merece destaque neste período a figura de Lorenzo Adroher. Ao comprar sete câmeras e um projetor dos Lumière no ano de 1909, Adroher
formou com seu irmão, Juan Adroher, a primeira empresa cinematográfica do Uruguai. Instalaram seu Biógrafo Lumière na Rua Florida (local
que seria mais tarde o Cine Independência), realizando entre 1910 e 1914
importantes filmes documentários, num processo parecido com o dos
cavadores5 no Brasil. Infelizmente, todas essas produções estão hoje
desaparecidas. Dos filmes realizados, a saber, Desfile de la Marinería Española por las Calles 18 de Julio y Sarandí, Carreras en Maroñas e Procesión de Corpus Christ, sobraram apenas resenhas e críticas da época6.
Do período silencioso, restaram poucos documentários, salvos de
constantes incêndios. Esse problema reflete-se na história da Cinemateca, e por vezes até na história do próprio país. Manuel Carril e Guillermo Zapiola, descrevem no prólogo do livro La Historia no Oficial del Cine
Uruguayo, um fato curioso dos primórdios do cinema nacional:
4
George Méliès (1861-1938) ilusionista francês, realizador de diversos e engenhosos filmes
no período mudo.
5
Cavadores: Primeiros documentaristas brasileiros, que eram chamados assim por ‘cavarem’
serviços de registro cinematográfico, vendendo seu trabalho a grandes empresários, governantes e industriais.
6
Disponível em: http://www.geocities.com/Hollywood/Picture/4369/Enlaces.htm
19
Almas de la Costa (1923, Juan Borges) foi o primeiro filme uruguaio; em 1938,
Vocación?, de Rina Massardi, foi a primeira película lírica sul-americana;
mas, em 1979, El Lugar del Humo, que ainda por cima era uma co-produção
argentina de Eva Landek, foi novamente anunciada como o primeiro longametragem uruguaio; e apenas quinze anos depois, El Dirigible, de Pablo Dotta, era novamente (anúncio oficial em Cannes) “o primeiro filme do cinema
uruguaio”. Nunca, em nenhum país, o cinema nasceu tantas vezes. O que eleva a suspeita de que os cineastas emergentes nunca tinham visto o cinema
ciso começar de novo. A rigor, pelo que se sabe, longas-metragens uruguaios
existem desde 1919 (Pervanche, de Leon Ibañes Saavedra, tio-avô do atual
presidente do país), mas agora parece difícil saber até onde este distante
antecedente (destruído pouco depois da estreia por um marido enciumado
pela pecaminosa atriz protagonista) era realmente uma primeira ficção de
longa duração. Desde então, foram realizados mais de cinquenta longas, fora
o fato de o cinema nacional existir desde 1898, quando o armador catalão
emigrado, Félix Oliver, filma Carrera de Bicicletas en el Velódromo de Arroyo
Seco. (CARRIL , ZAPPIOLA , 2002, p.03).
O cinema uruguaio possui, desde seus primórdios, uma identidade
em crise, o mesmo problema que aflige vários países subdesenvolvidos
e suas cinematografias. Seus cineastas sempre procuraram referências
cinematográficas fora de seu país, e talvez por isso o descaso com as
produções locais.
Os primeiros documentários uruguaios foram produzidos na época da extensa guerra civil entre Blancos e Colorados7, mas os cineastas
7
Partidos vigentes até hoje no Uruguai; corresponderiam aos partidos Democrata e Republi-
cano norte-americanos, ou às facções de Ruralistas x Urbanistas.
Cine Uruguai
do seu país, ou esse cinema morria depois de cada filme lançado, e era pre-
20
uruguaios preferiram filmar a aristocracia andando em luxuosos carros,
festas, piqueniques, corrida de bicicletas em parques urbanos a registrar às sangrentas batalhas. Este descaso acabou propiciando um equívoco histórico gigantesco, atingindo inclusive os livros de história uruguaios. A guerra civil entre Blancos e Colorados, iniciada em meados de
1839 e só terminada em 1904, quando o presidente José Batlle y Ordoñez
finalmente controlou com méritos a fúria dos Blancos, era assim conta-
Cine Uruguai
da nos livros de história: os Colorados, heróis da resistência, eram ovacionados pelo caráter e raça que demonstraram diante de uma situação
tão adversa. Mas era tudo mentira. Um documentário de 1904, e recentemente descoberto na República Tcheca, revelou que a guerra terminou
em um simples acordo entre cavalheiros, sem nenhum ato heróico. A
película de 50 minutos caiu como uma bomba nas arraigadas convicções
alimentadas por superficiais livros de história. Atualmente este documentário encontra-se devidamente arquivado na Cinemateca Uruguaia.
“A força das imagens destruiu todos os mitos criados pelos historiadores sobre a guerra de 1904”, comentou às gargalhadas Manuel Martínez Carril, presidente da Cinemateca: “As imagens, guardadas em alguma prateleira de Praga, ajudaram a reformular todo o conceito que
tínhamos sobre o fato.”8 Um francês de sobrenome Corbicier, enviado a
Montevidéu pela empresa argentina Lepage em busca de imagens para
um primórdio de cinejornal intitulado Noticiário de Actualidades, teria
realizado o polêmico filme, intitulado La Paz de 1904.
Desde 1895 documentaristas têm registrado a trajetória da humanidade. Ainda na Cinemateca Uruguaia estão armazenadas latas que contêm flagrantes da Espanha pré-Guerra Civil, imagens raras, analisadas
8
Disponível em: http://www2.correioweb.com.br/cw/2000-11-12/mat_16483.htm
21
Fonte Imagem: ZAPPIOLA, CARRIL, 2002, p.6.
com regularidade por estudiosos de todos os cantos do mundo. É o cinema preenchendo as lacunas da documentação escrita, dando vida
aos conceitos, revelando verdades factuais e corrigindo as falsas interpretações dos historiadores oficiais. Dos primeiros longas-metragens
de ficção, realizados desde 1919, apenas um acabou sendo lançado, em
1923: Almas de la Costa, produção da empresa uruguaia Charrúa Films,
dirigida por Juan Antonio Borges. O filme foi bem aceito por parte do público, até então habituado a assistir a pequenos documentários, ficando
em cartaz por dois anos. De Almas de la Costa, restam hoje apenas quarenta e três minutos9.
El Pequeño Héroe del Arroyo de Oro (1929), filme ficcional do documentarista Carlos Alonso, é considerado pelos uruguaios a maior obra
do cinema mudo nacional, algo parecido com o culto da crítica brasileira ao filme Limite (1930), de Mário Peixoto. Não pelas histórias, que
atingem polos opostos, já que Limite elabora metáforas para angústias
existenciais e El Pequeño Héroe... brilha pela caracterização realista e
9
Disponível em: http://www2.correioweb.com.br/cw/2000-11-12/mat_16483.htm
Cine Uruguai
Fig. 01 – Fotograma extraído do filme La paz de 1904.
22
extremamente detalhada dos fatos da trama, mas por terem sido realizados com parcos recursos, numa mesma época, e por serem o único
longa-metragem da carreira de seus respectivos diretores.
Baseado em um caso real, uma tragédia que chocou a população no
dia 29 de maio de 1929, o filme uruguaio possui roteiro adaptado por
Carlos Alonso a partir de uma crônica escrita por José Sanches Flores.
Alonso valeu-se também do frescor dos fatos, filmando nos locais onde
Cine Uruguai
o crime aconteceu, reconstituindo-o nos mínimos detalhes. O menino
Dionísio Dias chega numa delegacia, gravemente ferido, com um bebê
nos braços. Num flashback, conta aos policiais que seu pai, velho camponês da comarca de Treinta e Tres, havia enlouquecido e atacado a família a punhaladas. Um vizinho que tentou impedir acabou morto. Somente o menino, num ato de coragem, conseguiu fugir com a irmãzinha,
andando quilômetros até a delegacia mais próxima. Depois de contar
sua história, Dionísio Dias morre a caminho do hospital. O filme reconta
com sutilezas e extrema precisão o ocorrido, dando a impressão aos espectadores que eles assistiam à tragédia no exato momento em que ela
ocorria. (ZAPPIOLA , 1989 p. 9).
Mesmo diante de sua importância para o resgate da memória audiovisual do Uruguai, El Pequeño Héroe del Arroyo de Oro chegou perto de
cair no esquecimento: a viúva de Carlos Alonso vendeu numa tenda as
latas do filme10. Manuel Martínez Carril viajava a passeio pelo interior
nos anos 1970, e descobriu tiras de um filme decorando as portas e janelas de um rancho. Imediatamente reconheceu a película. Mais tarde,
10
Vender os pertences na rua, em pequenas bancas e tendas, é uma prática comum da popu-
lação uruguaia. As feiras de antiguidades funcionam a céu aberto em vários pontos da capital,
vendendo pratarias de família, objetos de bronze, aparelhos de barbear, postais antigos e
qualquer outra coisa que possa ter valor.
23
encontrou outros pedaços de cenas em tendas de antiguidades. Graças a
essas felizes coincidências, Carril acredita estar faltando, além dos intertítulos, apenas um minuto do filme original. El Pequeño Héroe del Arroyo
de Oro teve tanta identificação com o público que chegou a ser reeditado
em uma versão sonorizada (perdida), e o menino Dionísio Dias considerado uma espécie de herói nacional, sendo o filme exibido nas escolas com
fins didáticos. (NAZÁRIO, 1999).
Cine Uruguai
Fig. 02 – El Pequeño Héroe del Arroyo de Oro. Fonte
Imagem: ALVAREZ, 1957, p.3.
Nos anos seguintes, com a chegada do cinema falado e da 1ª Guerra
Mundial, a produção uruguaia deu uma estagnada. Durante muito tempo ninguém se atreveu a fazer um filme; a sonorização da película e os
custos do negativo, que vinham da Europa inflacionados com a guerra,
impediam qualquer investida.
Em 1930, o cinema uruguaio, ainda mudo, produziu o documentário
Campeonato Mundial de Football de 1930. Exibido pela primeira vez na íntegra durante os festejos do centenário da FIFA, em 2004, este filme representa uma das primeiras coberturas de uma competição esportiva de porte
internacional antes do filme Olympia (1932), sobre as olimpíadas de Berlim,
24
realizado por Leni Riefenstahl11. Atualmente, o documentário pode ser visto no museu do Futebol, localizado no estádio Centenário em Montevidéu.
Se a transição do cinema mudo para o sonoro foi deficitária em todos os países da América Latina pelo alto custo tecnológico, no Uruguai o quadro era agravado pela quase inexistência de infraestrutura
mesmo para a realização de películas mudas. Somente em 1936 foi realizado o primeiro filme sonoro uruguaio, Dos Destinos, do diretor Juan
Cine Uruguai
Etchebehere. (ALVAREZ , 1957, p.10). Este filme, estrelado pelo cantor El
Parisino, assim como Radio Candelario (1938), de Rafael Abella, protagonizado pelo comentarista Eduardo Depauli, revelavam que os Talkies12
uruguaios se limitavam apenas a apresentar ícones do rádio, na base da
improvisação e sem nenhum rigor estético ou identidade, chegando a
imitar o que de pior se produzia em Buenos Aires.
O ano de 1949 é decisivo para o cinema uruguaio: cineastas como
Adolfo L. Fabregat e Enrico Gras movimentaram o mercado cinematográfico e tem lugar o Primeiro Concurso Cinematográfico de Aficionados,
evento organizado pelo Cine Club del Uruguay 13, ocasião em que o filme
Redención, de Nelson Covián, conquista o primeiro prêmio. Logo Gras
realiza o belo Pupila al Viento, filme poético de inspiração expressionista. Também em 1949 é lançado o filme Detective a Contramano, de Fabregat, uma paródia dos filmes policiais estrangeiros e que lembra muito as chanchadas brasileiras.
11
A película foi recebida com assombro pelos espectadores presentes, pois se tratava de
material nunca antes exibido. A Cinemateca Uruguaia guarda este documentário como um
tesouro, conservado com 45% de umidade e lavado a cada quatro anos. Fonte: Jornal El País,
22/05/2004.
12
13
Como eram chamados em Hollywood os primeiros filmes falados.
Premios de la producción uruguaya de cine. Acesso em 31 mai. 2004. Disponível em:
<http://www.geocities.com/vhnieto/main.htm>
25
Fonte Imagem: ZAPPIOLA, CARRIL, 2002, p.7.
Em 1950, Gras realizou o documentário Artigas, protetor de los pueblos
libres. Narrado através de quadros, monumentos e proclames, o filme alcançou uma qualidade estética até então rara na cinematografia uruguaia.
Em 1951, surgem os primeiros Concursos Relâmpagos, revelando a safra de cineastas jovens que se formavam nas faculdades, como um reflexo do Cine Club. Em 1952, a Cinemateca Uruguaia inicia suas atividades,
sendo a mais antiga da América do Sul. No mesmo ano, inicia-se uma
busca pelo cinema histórico nacional. É produzido El Desembarco de los
Treinta e Tres Orientales, de Miguel Angel Melino, ambicioso épico sobre
a independência uruguaia, que ficou perdido por quase vinte anos. Somente em 1975, por iniciativa do governo militar, é que foram efetuados
trabalhos de investigação para encontrar a película, operação efetuada
com sucesso: restaurada, ela foi exibida por ocasião das comemorações
do centenário da Orientalidade14.
Nos anos 1960, curtas-metragens de conteúdo político marcaram a
cinematografia uruguaia, sendo categorizados num ciclo intitulado Ciclo
14
Disponível em: http://www.geocities.com/vhnieto/main.htm
Cine Uruguai
Fig. 03 – fotograma extraído do filme Pupila al Viento.
26
Militante. O filme Como el Uruguay no Hay (1960), de Hugo Ulive, inaugura essa tendência. Mario Handler realiza, em 1965, Carlos, cineretrato de
un caminante montevideano, cujo roteiro usa o pretexto de seguir um
vagabundo para mostrar uma sociedade em crise. Handler e Ulive trabalharam juntos em 1966 no filme Elecciones. Dentre outros curtas militantes estão Me Gustan los Estudiantes (1968), de Mario Handler, e Líber
Arce, Liberarse (1969), de Mario Handler, Mario Jacob e Marcos Banchero.
Cine Uruguai
Esse ciclo é fechado com outro filme de Handler: Uruguay 69: el problema de la carne. (ZAPPIOLA , CARRIL, 2002). Os filmes do Ciclo Militante
eram quase todos realizados em Super-8, preto e branco, sob precárias
condições técnicas. Para piorar, boa parte desse material só sobreviveu
em cópias VHS, o que dificulta ainda mais sua conservação.
Nos anos 1980, cresceu a participação da Cinemateca Uruguaia no
mercado cinematográfico nacional, o que possibilitou que auxiliasse na
produção de longas-metragens nacionais. Com o apoio desta instituição, Juan Carlos Rodriguez Castro realizou em 1982 o filme Mataron a
Venancio Flores, estreando na Sala Cinemateca 18, a já citada sala principal da Cinemateca, na Avenida 18 de Julio.
Uma nova estagnação da produção nos anos 1990 fez o país reduzir
a quase zero a continuidade de sua história cinematográfica. A população também se afastou dos cinemas que exibiam películas uruguaias (em
1996 foi vendido menos de um milhão de entradas, número muito inferior aos 18 milhões de 1959). As produções em vídeo ganhavam cada vez
mais adeptos, já que as em película nem mesmo pagavam o investimento.
Em 2001, a crise dos países do Mercosul, em especial da Argentina,
lançou os uruguaios numa recessão econômica que atingiu todos os setores da sociedade. A Cinemateca Uruguaia teve suas contas financeiras
bloqueadas pelo Banco Central. O dinheiro necessário à manutenção da
27
escola de cinema e das sete salas de exibição mantidas pela entidade
— algo em torno de um milhão de pesos — ainda continua retido, ameaçando o bom funcionamento da Cinemateca. A instituição mantinha um
laboratório de restauração em Camino Maldonado, único na América Latina, mas com a crise sua produção caiu drasticamente. Quase falida,
a Cinemateca apelou para a sociedade uruguaia com o lançamento de
um fundo de emergência no valor de 75 pesos (o equivalente a quase
R$10) para cada cidadão e um acréscimo de igual valor para os sócios15.
de seu acervo, tendo já provado seu valor: o laboratório da Cinemateca Uruguaia auxiliou na preservação de verdadeiros ícones do cinema
mundial, como a versão com viragens de O Gabinete do Dr. Caligari (Das
Kabinett des Dr. Caligari, 1920), de Robert Wiene16.
Por tudo isso, e principalmente por se tratar de um país de reduzida
população, a produção de longas-metragens até os anos 2000 não chegou a ultrapassar dois filmes por ano, sendo estes resultado de coproduções com as vizinhas Argentina e Brasil e algumas parcerias com a Europa. O pequeno mercado uruguaio é insuficiente para recuperar os custos
de qualquer filme realizado. Realizar longas como El Dirigible (1994), de
Pablo Dotta, que custou U$800 mil para ser produzido, foi uma audácia.
O cinema uruguaio conseguiu sustentar-se ao longo dos anos através de
baratas produções em vídeo, como La Historia casi Verdadera de Pepita
la Pistolera (1993), de Beatriz Flores Silva. (ZAPPIOLA , CARRIL, 2002 p.22).
Se o final da década de 1990 foi marcado pela duplicação e modernização das salas de cinema pelo país, a década seguinte assistiu ao res15
A monumental cinemateca de Montevidéu. Diário O Paraense. Acesso em 28 fev. 2003. Dis-
ponível em: <http://www.oparaense.com/cultura12.htm.
16
Cinemateca Uruguaia. Acesso em 25 jun. 2005. Disponível em: <www.cinemateca.org.uy>
Cine Uruguai
A Cinemateca precisa, sobretudo, de verba para restauração dos filmes
28
surgimento dos filmes nacionais. A Escola de Cinema da Cinemateca Uruguaia realizou em 1999 o filme 8 Histórias de Amor (oito curtas de 15
minutos tendo como locação comum o Hotel Carrasco), revelando novos
talentos cinematográficos (Juan Alvarez, Marisa Barboza, Gabriel Bossio,
Luis González, Darío Medina, Sergio Miranda, Gabriel Pérez e Ariel Wolff).
(http://super.abril.uol.com.br/aberta/colunas/index_cinema_28_11_03.
html). Sergio Miranda acabou tornando-se o diretor da Escola de Cine-
Cine Uruguai
ma da Cinemateca Uruguaia (ECU), movimentando ainda mais este novo
ciclo de produções.
Com mostras, concursos, filmes e escolas, a Cinemateca Uruguaia é
hoje a mais ativa das Américas. (CATÁLOGO FESTIVAL INTERNACIONAL DE
ESCUELAS DE CINE). Complementando a Retomada estão: En la Puta Vida
(2001), de Beatriz Flores Silva, vencedor do Festival de Cinema Ibero-Americano de Huelva (Espanha); 25 Watts (2001), de Juan Pablo Rebella e
Pablo Stoll, um dos maiores sucessos da cinematografia uruguaia; Aparte (2002), de Mario Handler, documentário assinado por esse remanescente do Ciclo Militante; Viaje Hacia el Mar (2003), de Guillermo Casanova, também vencedor do Festival de Cinema Ibero-Americano daquele
ano (Diário El País, 2004); e Whisky (2004), segundo longa dos diretores
Stoll e Rebella, exibido em Cannes e vencedor do Festival de Gramado.
Estas produções reforçam que a cinematografia uruguaia está mais forte
e mais viva do que nunca (Jornal O Paraense, 2003). O cinema uruguaio
ainda recebeu um duro golpe com o suicídio de um dos diretores deste
filme, o jovem Juan Pablo Rebella, em 2006, realizador já bem-sucedido
em plena atividade criativa. (Internet Movie Database). Whisky foi seu
maior sucesso e tornou-se ícone da nova geração, trazendo reconhecimento e recursos para o cinema nacional como um todo. Estima-se
que em 2007 foram produzidos pelo menos 13 filmes nacionais. Dentre
29
eles, destaca-se El Baño del Papa, filme de Enrique Fernández e César
Charlone e produzido pela O2 filmes, do cineasta brasileiro Fernando
Meirelles. O filme, que retrata a expectativa das pessoas de um pequeno povoado do Uruguai de enriquecerem usando a visita de João Paulo
II, ganhou quatro Kikitos em Gramado (escolha do público, melhor ator,
melhor atriz, melhor roteiro), e foi o representante uruguaio do festival
de Cannes, seguindo o caminho de sucesso de Whisky.
O ano de 2005 marca o único Oscar uruguaio: Jorge Drexler cantarolou
realizar um discurso. O singelo gesto representava, na verdade, um protesto. O uruguaio havia sido proibido de cantar sua música na cerimônia
pelos organizadores, por Drexler ser um desconhecido do grande público americano. Sua música foi interpretada por Carlos Santana e Antônio
Banderas, o que gerou uma enorme polêmica (Gael García, inclusive, não
foi ao evento em solidariedade ao cantor). De qualquer maneira, Jorge
Drexler também quebrava outra marca: em 77 anos do Oscar, nenhuma
música-tema em espanhol havia até então ganhado o prêmio17.
Em 2008, o filme Polvo Nuestro que estás en los Cielos leva às salas
de cinema 5.700 pessoas no primeiro fim de semana. Sua diretora, Beatríz Flores Silva (que também detém o recorde de público uruguaio com
o filme En la Puta Vida, de 2001), ultrapassou o recorde de exibição de
estreia com um enredo que conta sobre os ideais uruguaios pré-golpe
militar (1973). Curiosamente, ambientação similar possui o igualmente lançado em 2008 Matar a Todos, de Esteban Schroeder, que detinha
o referido recorde até então (4.500 bilhetes vendidos)18. Com o recorde
17
http://news.bbc.co.uk/hi/spanish/misc/newsid_4303000/4303973.stm. Ativo em 24 maio
de 2016.
18
http://www.pochoclos.com
Cine Uruguai
a música-tema de Diários de Motocicleta, Al outro lado del rio, ao invés de
30
de público batido duas vezes no mesmo ano, estas produções apontam
para uma maior identificação do público com seus filmes, constituindo memória audiovisual nacional, importantíssima para posterior reconhecimento como patrimônio histórico. Sem contar que os números
expressivos podem significar finalmente a chegada da consolidação do
cinema uruguaio19.
No entanto, e apesar dos progressos na área cinematográfica, a res-
Cine Uruguai
tauração de filmes e sua divulgação ainda sofrem com o atraso tecnológico. Somente em 2003 a Cinemateca Uruguaia conseguiu firmar um
convênio para a migração dos filmes uruguaios em DVD, prática mais
adiantada em outros países sul-americanos. (NAZARIO, 2004). Comercialmente, apenas em 2008 foi lançado em DVD pelo selo Buen Cine a
coleção “5 películas que hicieron historia”, com parte significativa das
produções do cinema uruguaio contemporâneo20. Mas esse atraso reflete algo maior e mais grave, o do próprio mercado consumidor, com poucos, ainda em 2008, tendo acesso a um aparelho de DVD. Infelizmente,
o passado cinematográfico do Uruguai está longe de estar assegurado.
Ainda se pensa em uma lei específica para fomentar o cinema uruguaio.
Mas esse país, acostumado a produzir cinema nas mais adversas condições, encontrará uma maneira de preservar seus filmes. A ativa Cinemateca Uruguaia é a maior prova de que esse é o desejo dos milhares de
cinéfilos que a frequentam e sustentam o projeto da construção e conservação da memória audiovisual.

* Artigo escrito a partir da dissertação de mestrado intitulada Filmes, memória audiovisual do mundo, defendida pelo autor em 2005.
19
20
http://www2.uol.com.br/JC/_1999/0407/in0407f.htm
http://www.elpais.com.uy/08/05/24/pespec_348288.asp
31
Database.
Marcelo La Carretta é uruguaio e professor de técnicas audiovisuais da Puc Minas.
Referências bibliográficas:
ALVAREZ, José Carlos. Breve historia del cine uruguayo. Montevidéu: Cinemateca Uruguaya, 1957.
NAZARIO, Luiz (org). Catálogo Filmoteca Mineira. Belo Horizonte, 2004.
NAZARIO, Luiz. As sombras móveis: atualidade do cinema mudo. Belo Horizonte: Ed. UFMG,
Laboratório Multimídia da Escola de Belas Artes da UFMG, 1999.
SARATSOLA, Osvaldo. Función completa, por favor: um siglo de cine em Montevideo. Montevidéu: Ediciones Trilce, 2005.
ZAPPIOLA, Guillermo. El cine mudo en Uruguay. Montevidéu: Cinemateca Uruguaya, 1989.
ZAPPIOLA, Guillermo; CARRIL, Manuel Martínez. La historia no oficial del cine uruguayo.
Montevidéu: Cinemateca Uruguaya e Ed. Banda Oriental, 2002.
CATÁLOGO FESTIVAL INTERNACIONAL DE ESCUELAS DE CINE. Montevidéu: Cinemateca Uruguaya, 2003.
Referências eletrônicas:
A monumental cinemateca de Montevidéu. Diário O Paraense. Acesso em 28 fev. 2003. Disponível em: <http://www.oparaense.com/cultura12.htm>
Bloqueio financeiro ameaça cinemateca de Montevidéu. Diário O Paraense. Acesso em 12
mai. 2004. Disponível em: <http://www.oparaense.com/cultura-45.htm>
Cinemateca Uruguaia. Acesso em 25 jun. 2005. Disponível em: <www.cinemateca.org.uy>
Premios de la producción uruguaya de cine. Acesso em 31 mai. 2004. Disponível em:
<http://www.geocities.com/vhnieto/main.htm>
Cine Uruguai
Fig. 04 – Whisky (2004). Fonte Imagem: Internet Movie
32
Cresce produção de cinema e TV no Uruguai. Jornal do Commercio. Acesso em 22 jun.
2005. Disponível em: <http://www2.uol.com.br/JC/_1999/0407/in0407f.htm>
Difundiendo nuestro cine. Diário El País. Acesso em 22 jun. 2005. Disponível em: <http://
www.elpais.com.uy/ >
Futuro imperfeito. Correio Brasiliense. Acesso em 20 dez. 2004. Disponível em: <http://
www2.correioweb.com.br/cw/2000-11-12/mat_16483.htm>
História del cine latinoamericano. Acesso em 20 jun. 2005. Disponível em: <http://www.
geocities.com/Hollywood/Picture/4369/Enlaces.htm>
Internet Movie Database. Acesso em 15 mai. 2005. Disponível em: <http://www.imdb.com>
La AUF y Cinemateca tenían guardado un tesoro mundial. Diário El País. Acesso em 22 mai.
2004. Disponível em: <http://www.elpais.com.uy>
Cine Uruguai
Los 50 de la Cinemateca. Diário El País. Acesso em 22 jun. 2004. Disponível em: <http://
www.elpais.com.uy>
Los uruguayos enfrentados a una pantalla: História del cine
latinoamericano. Acesso em 14 fev. 2005. Disponível em:
<http://www.geocities.com/Hollywood/Picture/4369/Enlaces.htm>
O Uruguai e seu tempo detido em El Viaje Hacia El Mar. Revista Super Interessante Online. Acesso em 15 mai. 2004. Disponível em: <http://super.abril.uol.com.br/aberta/colunas/
index_cinema_28_11_03.html>
Pochoclos, Blog sobre Cine. Acesso em 28 out. 2008. Disponível em: <http://www.pochoclos.com>
Rediciones en dvd de valioso cine uruguayo. Diário El País. Acesso em 28 out. 2008. Disponível em: http://www.elpais.com.uy/08/05/24/pespec_348288.asp
Drexler gana primer Oscar uruguayo. BBC. Acesso em 28 out. 2008. Disponível em: http://
news.bbc.co.uk/hi/spanish/misc/newsid_4303000/4303973.stm
33
Cine Uruguai
Uma História do
Documentário
Uruguaio
Ricardo Casas
Tradução do espanhol por José Luis Doldan
35
final do século XIX, um pioneiro do nosso cinema, o catalão Félix Oliver, foi o primeiro a pegar uma câmera e começar a re-
gistrar eventos da vida cotidiana de Montevidéu. Seus primeiros curtasmetragens são de 1898 e alguns deles, felizmente, ainda se conservam.
Durante as três primeiras décadas do século XX, realizaram-se numerosos noticiários geralmente financiados pelas distribuidoras e exibidoras da época, dentre as quais a empresa Glücksmann. Alguns destes
noticiários se conservam até hoje e podem ser percebidos como verdadeiros documentos, ou “documentários” da época.
De todas as formas, avançado o século XX surgem, assim mesmo, cur-
tas e longas que refletem um interesse dos realizadores por registrar a
realidade que os comovia, como é o caso de El Pequeño Héroe del Arroyo
del Oro, um filme de ficção de 1929 para o qual o diretor Carlos Alonso
baseou-se no caso real da tragédia de uma criança do interior do país.
Seguindo pelas duas próximas décadas surge uma geração intermediária que trabalhava pelo amor à arte, tentando registrar acontecimentos e dando espaço também para a poesia. O escritor Enrique Amorin registra, entre outros, García Lorca numa visita ao Uruguai, única filmagem
que se possui do escritor espanhol. O arquiteto Alberto Mántaras faz um
Cine Uruguai
O
cinema uruguaio nasce documentário, como todo o cinema. No
36
documentário sobre Pablo Neruda de visita na sua casa de Atlântida. Um
italiano, Enrico Gras, chega em 1949 e filma Pupila al Viento, com Rafael
Alberti recitando na trilha sonora. Alcançando bom resultado, ele é contratado pelo governo da época para realizar um média-metragem documental sobre o prócer José Artigas, nosso herói nacional (Artigas, 1950).
A partir dessas experiências pioneiras, algumas de grande valor artístico, surgem jovens realizadores que vão perfilando um interesse social
Cine Uruguai
e cultural muito claro. Trata-se de gente que se dedicou a estudar cinema quando não existiam nem escolas nem indústria, a partir de alguns
laboratórios existentes e com a vontade de registrar o que acontecia no
seu país. Uma das suas principais “ESCOLAS”, para falar de alguma forma,
foi o Festival de Cine Documentário e Experimental del SODRE, que serviu como fermento para conhecer as grandes correntes do documentário
da metade do século XX. Esse aprendizado e esses esforços se tornaram
pequenas peças antológicas, como um delicioso registro da praia Pocitos,
de Montevidéu, a cargo de Ferruccio Musitelli (La Ciudad en a Playa, 1963).
Em outro registro e com outras inquietudes, Alberto Miller, um pioneiro
do documentário social, filma os cantegriles (bairros pobres), o Conventillo (cortiço) del Medio Mundo e a Feira de Tristán Narvaja.
Entrados os anos 60, surge uma camada de cineastas igualmente preocupados pelo social, mas com um viés mais comprometido com os conflitos
políticos destes anos tão inquietos. Alguns deles são apoiados pelo ICUR
(Instituto de Cine de la Universidad de la República), criado e dirigido pelo
Dr. Rodolfo Tálice, com Mario Handler, de quem se destacam Carlos, Elecciones, dirigida em conjunto com Ugo Ulive, e Me Gustan los Estudiantes. Nessa
tônica se cria a Cinemateca del Tercer Mundo, que junta a presença decisiva de Handler com a habilidade como produtor e a “alma-mater” de Walter
Achugar, e talentos como Mario Jacob, Walter Tournier e Alejandro Legaspi.
37
Em 1973 se dá o golpe de estado no Uruguai e a maioria dos realizadores de documentários se vê obrigado a emigrar. Acontece então um
vazio geracional que de alguma forma se reverte quando um grupo de
“súper-oitistas” independentes funda o Grupo Hacedor, enquanto Esteban Schroeder e Eduardo Casanova criam, junto com outros proeminentes cineastas, a produtora CEMA e começam a registrar a saída para
a democracia. O CEMA produz títulos-chave como El Cordón de la Vereda, do próprio Schroeder e Mamá era Punk, de Guillermo Casanova. Em
Jacob funda a produtora IMÁGENES, onde se geram obras como Bañados de Rocha, dirigida por Hilary Sandison, Sin Pedir Permiso, dirigido
junto com Maida Moubayed e Idea, do próprio Jacob. Também se abre
um espaço mais amplo, em outras condições, a partir do surgimento de
ASOPROD (Asociação de Productores e Realizadores de Cine e Video del
Uruguay), um grêmio que finalmente junta os criadores e promove mudanças. Essas mudanças culminam numa Lei de Cinema e na criação do
ICAU (Instituto de Cine e Audiovisual del Uruguay) no ano 2008.
A partir de 1996, quando se cria o FONA, um fundo na Municipalidade
de Montevidéu, financiado por um percentual que devem pagar os canais privados de TV, começa uma produção com continuidade e fundos
mínimos para a produção. Simultaneamente se efetiva o instituto público e regional chamado Ibermedia. Com o apoio destas duas instituições,
se produz uma notória melhora na quantidade e na qualidade dos documentários. Mais de uma dúzia destes têm ganhado prêmios nos festivais
mais exigentes do gênero, dentre os quais Ácratas, de Virginia Martínez,
e Aparte, de Mario Handler, dois bons exemplos da diversidade nas propostas e nos pontos de vista dos realizadores. O primeiro se baseia na
investigação histórica, o segundo num retrato da juventude marginali-
Cine Uruguai
1985, com a volta para um regime democrático, retornam os exilados.
38
zada de Montevidéu. Sem esquecer-se de Mario Jacob (Idea, O Recurso
de a Memoria, Tierra Olvidada), uma referência que tem se dedicado à
produção de documentários nos últimos anos.
Do ano 2000 em diante tem surgido uma nova geração de jovens (alguns nem tão jovens assim) realizadores que hoje dão um perfil próprio
a esta produção de documentários. Entre eles destaca-se Aldo Garay (Yo
la más Tremendo, Bichuchi, Cerca de las Nubes, El Círculo, El Casamien-
Cine Uruguai
to), um especialista em entrevistar pessoas e em chegar a personagens
que não são aqueles que vemos habitualmente na TV. Também seu colega e amigo José Pedro Charlo (A las Cinco en Punto, El Círculo, El Almanaque), com um perfil mais social e político, analisa a realidade atual
a partir de uma perspectiva histórica. A esta geração também pertence quem agora vos escreve, assim como outro grande documentarista,
Gonzalo Arijón, radicado em Paris. Não podemos esquecer de Kristina
Konrad, uma suíça que passou pelo Uruguai e deixou a sua marca, sobretudo no retrato de mulheres anônimas, porém fortes.
Depois temos os mais jovens, realizadores que estão rondando os
40 anos, diversos e comprometidos com um documentário mais pessoal, mais preocupados em um ponto de vista próprio e criativo do que
em registrar uma realidade imponente. Entre eles podemos mencionar
Gabriel Szollosy, Mariana Viñoles, Sebastián Bednarik, Federico Lemos,
Juan Alvarez Neme, Juan Ignacio Fernández, todos eles com uma obra
interessante e em plena maturidade narrativa. Por um lado as personagens que chamam a atenção pelas suas caraterísticas pessoais ou a sua
circunstância, por outro, o gosto pelos esportes, sobretudo o futebol,
chegando a um público maior. Mas também essa aposta em uma qualidade técnica e uma busca em evitar os clichês, os lugares já transitados
e que não acrescentam nada novo ao gênero.
39
Finalmente os mais jovens, também são tão diversos quanto a sua
formação e experiência audiovisual, entre eles Ramiro Ozer Ami, Pablo
Martínez Pessi, Emiliano Mazza, Miguel Presno, Carolina Lupo e Federico Pritsch, no início de uma carreira que promete um caminho venturoso. Quase todos eles ganhadores de prêmios no festival Atlantidoc, um
evento que já tem 10 anos de atividade ininterrupta e se criou como um
espaço para o documentário de qualidade, de todo o mundo e especialmente no Uruguai, onde este gênero segue sendo o primo pobre.
anos somente, e não podemos falar de uma expressão nacional só se referindo ao econômico. Sempre houve e sempre haverá realizadores que
deixam tudo pelo caminho para poder fazer uma obra de criação, dessas
que não ganham concursos, mas sim recebem o carinho do público, muitas vezes dos públicos, porque se os números não são muito generosos
no Uruguai, se complementam com outras cifras conseguidas fora do país,
avalizando uma indústria quase artesanal, quase dependente do alento pessoal ou de grupos de pessoas, tão consequentes como ignoradas.
Em definitivo, a coprodução é o alimento de nossa produção audiovisual, muitas vezes uma saída para o documentário. Porque o gênero não
tem um êxito massivo nas salas de cinema, mas é a única possibilidade
para que um trabalho de anos se veja beneficiado com a obra terminada. Nesse sentido os países vizinhos são os sócios ideais, mais do que
sócios, irmãos na aventura de criar novos e bons documentários.
Ricardo Casas é cineasta e curador do Festival Atlantidoc (Festival Internacional de Cine Documental de Uruguay). Estudou cinema no Uruguai (Cinemateca) e em outros países (Brasil,
Suíça e Argentina). Realizou vários curtas-metragens premiados. Diretor do documentário El
Padre de Gardel, que foi exibido no Festival de Gramado e Trieste, entre outros. Lança em 2016
um documentário, Libres en El Sonido, sobre a compositora Graciela Paraskevaídis, e finaliza
outro sobre o ex-presidente Máximo Santos.
Cine Uruguai
Se bem que os fundos ao cinema uruguaio têm uma vigência de 20
Cinefilia
Charrua
A cultura cinematográfica uruguaia
na história do cinema latino-americano
Fabián Núñez
41
paradoxo: um país que possui uma arraigada cultura cinematográfica, mas que tem uma produção fílmica pífia. Irônica e estra-
nhamente, os uruguaios gostam — e muito — de ver filmes, mas não de
fazê-los. Na verdade, não é uma questão de “gostar de fazer”, mas, sim,
de condições para fazer. Assim, boa parte da escrita das “histórias do cinema uruguaio” se volta num determinado momento do texto para essa
reflexão e levanta algumas hipóteses, como a existência de um mercado doméstico pequeno que não bastaria para sustentar uma indústria
cinematográfica local. A isso, se soma o tradicional desinteresse do Estado pela área ao longo de todo o século passado.1 Diante desse cenário desestimulante local, restava ao uruguaio com sonhos em trabalhar
com cinema partir para o outro lado do Rio da Prata, fixando-se na vigorosa indústria cinematográfica argentina, cujos estúdios tornaram-se
célebres por toda a América Latina e Espanha, uma vez que seus filmes
dominaram as nossas telas nos anos 1930. E desse modo, nos esbarramos ocasionalmente com pitorescas histórias que os uruguaios tanto
se saboreiam em contar, ao frisar a orientalidade de aspectos da cultu1
A chamada lei do cinema no Uruguai é promulgada somente em 2008. Trata-se da Lei nº
18.284, que cria o Instituto Nacional do Cinema e Audiovisual do Uruguai (ICAU).
Cine Uruguai
E
m termos cinematográficos, a fama do Uruguai se centra sob um
42
ra argentina, cujo aspecto máximo pode ser encontrado na indústria do
tango. E, em especial, em seus elementos mais icônicos, como o fato de
o autor de La Cumparsita, “o tango dos tangos”, ser um uruguaio tão nativo quanto o mítico Carlos Gardel — apesar de tal debate ser geralmente tratado com total desprezo pelos vizinhos argentinos. No entanto, para
além de jactâncias nacionalistas e ironias maldosas, a fama da cinefilia
uruguaia não é em vão. E é justamente graças a essa cinefilia, catalisada
Cine Uruguai
pelos cineclubes, pela crítica e pelas cinematecas, que o Uruguai ocupou
um importante espaço na história do cinema latino-americano.
Muito se fala da relevância da Cinemateca Uruguaia que, sem sombra
de dúvida é, ao lado da Filmoteca da UNAM no México, a instituição mais
importante, respeitada e célebre da área de preservação audiovisual na
América Latina, com um acervo com mais de 11 mil títulos e que, em seu
período áureo, chegou a contar com 15 mil sócios (em um país até então
com quase 3 milhões de habitantes). Porém, não podemos nos esquecer
da relevância e do pioneirismo do Cine Arte do SODRE (Serviço Oficial
de Difusão, Radiotelevisão e Espetáculos).2 Em 1943, é criado o Departamento de Cinema do SODRE, tornando-se oficialmente na primeira cinemateca a ser criada no Uruguai, filiando-se em 1945 à FIAF (Federação
Internacional de Arquivos de Filmes), ou seja, antes mesmo da criação
da célebre Cinemateca Uruguaia, ocorrida em 1952. Portanto, o SODRE
é a primeira cinemateca latino-americana a ser tornar membro da FIAF,
antes da atual Cinemateca Brasileira, que, graças aos contatos de Paulo Emílio Salles Gomes, teve a sua solicitação de filiação aceita em 1948,
anteriormente à criação de fato da instituição, ocorrida no ano seguin2
Em 1985, o Cine Arte do SODRE passa a ser denominado Arquivo Nacional da Imagem, que
posteriormente é fundido com o Museu da Palavra, convertendo-se no atual Arquivo Nacional da Imagem e da Palavra (ANIP).
43
te. Em 1954, o SODRE inicia a organização dos Festivais de Cinema Documental e Experimental, de caráter bienal, até a sua extinção, no começo
dos anos 1970. Assim como os Festivais de Viña del Mar e de Mérida na
segunda metade da década de 1960 são considerados os certames de
aglutinação e visibilidade do Nuevo Cine Latinoamericano (NCL), a historiografia também frisa o pioneirismo do I Congresso de Cineastas Latino-Americanos Independentes, ocorrido em 1958 durante um dos festivais organizados pelo SODRE. Nesse certame, por exemplo, estiveram
Birri. Portanto, esses festivais são considerados importantes para uma
então nova geração de cineastas do continente, em prol da formulação
de um cinema de caráter social e político, que se consagrará em breve sob o termo de NCL. Assim, os “festivais do SODRE” eram encarados
como o contraponto aos Festivais de Punta del Este, considerados como
um certame burguês e estrangeirizado, pela militância de esquerda, enquanto que os do SODRE estariam realmente voltados para as questões
em torno de um cinema autenticamente latino-americano. Será num desses festivais que ocorre o caso Un vintén p’al Judas (1959), de Ugo Ulive
— filme considerado o marco inicial do cinema militante na cinematografia uruguaia e que é proibido pelas autoridades a participar do evento, o
que causa uma forte reação por parte da crítica e da militância. O filme,
considerado perdido, infelizmente não chegou até nós, mas a história em
torno dele ficou registrada — o que lhe dá, ainda mais, um caráter mítico.
O aumento de uma cultura de esquerda no Uruguai se intensifica nos
anos 1960, o que acarreta transformações no cenário cinematográfico
local. Em 1967, o célebre festival de cinema organizado pelo semanário
Marcha, que possuía um respeitável corpo de redatores em sua crítica
cinematográfica, é inteiramente dedicado a então recente produção de
Cine Uruguai
presentes o brasileiro Nelson Pereira dos Santos e o argentino Fernando
44
filmes políticos. O entusiasmo provocado pelo evento faz com que a direção de Marcha decida criar um departamento de cinema em setembro de 1968 e, no ano seguinte, é fundado o Cineclube de Marcha. Nesse
mesmo ano, 1969, o núcleo desse cineclube dá origem à Cinemateca del
Tecer Mundo (C3M), que apesar de sua efêmera existência, teve uma intensa atividade movida por sua singular proposta. Fundada por dezessete pessoas, oriundas de vários cineclubes e instituições, como o Cine
Cine Uruguai
Arte do SODRE, a C3M postula, como sua missão institucional, a coleta
e a difusão do cinema latino-americano de “caráter crítico e militante”.
Além de constituir uma eficaz rede de exibição (cineclubes, sindicatos,
salas de cinema e teatros) e de formar um acervo, graças aos contatos
do distribuidor Walter Achugar, um dos cabeças da instituição, a C3M
também chega a produzir quatro documentários e uma animação, além
de publicar uma importante revista, a Cine del Tercer Mundo, que contou com duas edições. No entanto, o aumento do autoritarismo no país
põe fim, de modo abrupto e traumático, a essa rica experiência. Em 1972,
a cinemateca é invadida, saqueada e dois de seus membros, Eduardo
Terra e Walter Achugar, são presos e torturados. Uma campanha internacional, liderada pela UCAL (União de Cinematecas da América Latina),
denuncia a arbitrariedade e a tensa situação política no Uruguai, que
culmina com a instauração da ditadura, em junho de 1973. Nesse mesmo
ano, a cinemateca é extinta, uma vez que a maioria de seus membros é
forçada a partir para o exílio. Em 1974, o semanário Marcha, em atividade desde 1939, deixa de circular.
A proposta da C3M voltada para a difusão e, sobretudo, a realização
de um cinema considerado autenticamente latino-americano é o melhor exemplo de uma ideia que fremiu as cinematecas latino-americanas nesse período — sobre o qual seria o papel de uma cinemateca na
45
América Latina. É exatamente em terras uruguaias onde essa ideia toma
força durante o V Congresso da UCAL, realizado em julho de 1971 e sediado na Cinemateca Uruguaia. Essa “virada terceiro-mundista” se dá,
no que foi conhecido nos debates da UCAL, como redefinição do conceito de cinemateca, que se traduz na chamada “Declaração de Montevidéu”. Em seu parágrafo final, essa declaração proclama que “o ato
cultural por excelência na América Latina é a libertação de nossos povos e é ao seu serviço que devem ser colocadas as atividades cinemaCidade do México em 1972, a radicalização continua e, com ela, o início
das dissidências. O SODRE (uma instituição estatal) se recusa a assinar
a declaração oficial, movido por temor a futuras repreensões do governo. No entanto, o rompimento no seio da UCAL se dá em 1976, em outro
congresso no México, quando os delegados das Cinematecas Uruguaia e
Argentina desautorizam a UCAL diante da FIAF. Não nos interessa relatar
aqui as disputas internas, mas sim o quanto a cinefilia pode se manifestar de vários modos nesses conturbados anos. Comenta-se que, durante os esperançosos anos da formação da Frente Ampla, os militantes
comunistas se vinculavam mais às atividades da Cinemateca Uruguaia,
enquanto que a C3M se inclinava ideologicamente mais aos Tupamaros.
Inclusive, Manuel Martínez Carril, a peça-chave da Cinemateca Uruguaia,
era identificado como um duro crítico ao sectarismo do cinema militante, apesar de sua postura esquerdista. Durante os anos de chumbo da
ditadura, enquanto figuras do meio cinematográfico uruguaio se exilavam ou eram presos, Martínez Carril conseguiu habilmente manter a
existência de uma cinemateca que, graças ao seu eficiente trabalho, se
tornou um centro de resistência cultural. Colecionam-se “causos”, como
as duas detenções sofridas por Martínez Carril e a história do comissá-
Cine Uruguai
tográficas do continente”. No congresso seguinte da UCAL, ocorrido na
46
rio de polícia responsável pela censura que, depois de vários momentos
tensos com Manolo e sua equipe, acabou por se tornar sócio da Cinemateca. Como gostava de contar Martínez Carril, a resistência da Cinemateca Uruguaia à ditadura se deu por meio de ações que são simplesmente
a razão de ser de uma cinemateca: preservar filmes. Em tempos de destruição (infelizmente tão comum em um continente de contínuo desmemoriamento), esse ato é, por si só, profundamente subversivo. Em suma,
Cine Uruguai
a cinefilia — em seu culto ao cinema — também pode ser um caminho
para pensar e construir uma nação. Eis uma lição a ser tirada para todos
nós em tempos difíceis.
Fábian Núñez é professor adjunto do departamento de cinema e vídeo da Universidade Federal Fluminense (UFF). Pesquisador da Plataforma de Reflexão sobre o Audiovisual Latino-Americano (PRALA) e do Laboratório Universitário de Preservação Audiovisual (LUPA).
47
Cine Uruguai
O Cinema
Uruguaio
Contemporâneo:
Encontrando
caminhos
Guilherme de Alencar Pinto
49
surpreendi ao encontrar um ambiente que era um gozo para
qualquer cinéfilo. Havia muitas salas de exibição comercial,
mas a principal diferença era dada pela Cinemateca. Esta não era simplesmente um ponto de reunião dos habituais “ratos de cinemateca”:
era um circuito de exibição alternativo, com seis salas repartidas pela
zona central da cidade e milhares de sócios. Além de retrospectivas e
mostras, estreava filmes de arte, exibia como “última chance” filmes do
circuito comercial recém-saídos de cartaz, e organizava um festival sensacional com mais de cem títulos. Havia outros cineclubes aumentando
ainda mais a oferta alternativa. Cinema era assunto de discussão constante entre muitas pessoas de classe média e estudantes. Havia muitos
críticos, e vários deles eram enciclopédias de cinema ambulantes: ser
amigo desses caras era o mais parecido que existia, naquela época pré-Internet, a se conectar com a IMDb ou Wikipédia. Meu único contato
prévio com a cultura cinematográfica uruguaia era a Cinemateca Revista,
que tinha conhecido através de um arquivista da Cinemateca do MAM,
no Rio, que opinava que nos dossiês dessa revista sempre estavam as
filmografias mais completas e confiáveis. Esse ambiente se relacionava
com outros fatores notáveis de um país que, apesar de estar recém-saí-
Cine Uruguai
Q
uando cheguei a Montevidéu pela primeira vez, em 1985, me
50
do (como a Argentina e o Brasil) de uma ditadura, se caracterizava ainda por um altíssimo nível de educação, e cujos problemas sociais eram
menos drásticos que os dos gigantes vizinhos.
Em contraste com esse ambiente generoso para o consumo e a discussão, a prática de cinema era quase inexistente. A publicidade era
medíocre, a televisão muito ruim, a maioria dos atores tinha tido muito
pouco contato com o audiovisual e tinham um estilo “teatral”. Num país
Cine Uruguai
tão pequeno (pouco mais de três milhões de habitantes), com pouca
capacidade de exportação de cultura, fazer cinema era uma pretensão
quixotesca. Claro que num ambiente cultural fervilhante como o uruguaio, sempre aparecem quixotes. Um deles foi Juan Carlos Rodríguez
Castro, que em 1982 tinha feito Mataron a Venancio Flores, um filme histórico com insinuações políticas muito indiretas para contornar a censura ditatorial, e que foi um dos longas de ficção que interromperam o
silêncio e tentaram recomeçar o cinema local. Produzido a duras penas
com o apoio da Cinemateca (uma tentativa isolada de passar da conservação e da exibição para a produção), o filme foi saudado como “o nascimento do cinema uruguaio”. Mas, claro, o balanço econômico parecia
provar que o bebê tinha nascido morto. Decorreriam onze anos mais até
o seguinte longa de ficção uruguaio.
Mataron a Venancio Flores não foi a primeira vez que o cinema uruguaio “nasceu”. A data objetiva desse nascimento seria 1898, quando o
empresário Félix Oliver comprou uma câmera e começou a filmar registros da realidade à maneira de Lumière. O primeiro longa, Pervanche, de
León Ibáñez Saavedra, é de 1919. Suas últimas cópias foram destruídas
pelo marido da atriz principal, supostamente para proteger sua honra. O
segundo longa foi Almas de la Costa (1923), um melodrama ambientado
num povoado de pescadores, e é o mais antigo filme uruguaio a que se
51
pode assistir atualmente, graças a uns quarenta anos de esforços e obstinação para restaurá-lo a partir de fragmentos e indícios.
A produção sempre foi descontínua, com longos períodos (1930-1935,
1960-1978, 1983-1992) em que não houve nenhum longa de ficção (a produção desses períodos se reduziu a cinejornais e documentários). Houve alguns marcos: o último filme mudo, El Pequeño Héroe del Arroyo de
Oro (1929) foi um sucesso enorme. Nos anos sessenta, Mario Handler
e Ugo Ulive, dois documentaristas com câmeras nas mãos e ideias nas
nou numa experiência interessantíssima: a Cinemateca del Tercer Mundo (1969-73), que exibiu filmes combativos, publicou reflexões teórico-ideológicas e produziu filmes (inclusive um desenho animado). Esse
movimento foi a contribuição uruguaia ao “novo cinema latino-americano” dos anos sessenta.
No biênio 1993-1994, o cinema uruguaio voltou a “nascer”, com um
filme bastante popular (a comédia social La Historia casi Verdadera de
Pepita la Pistolera, de Beatriz Flores Silva) e outro, de produção relativamente ambiciosa, que não teve muito público, mas chamou a atenção
por seu arrojo criativo e uma inesperada qualidade e personalidade visual (El Dirigible). Os números, como sempre, não fecharam, mas dessa
vez, em contraste com os “nascimentos” prévios, este vingou: a produção teve continuidade e se estende até hoje. Esse cinema foi empurrado
pelos mesmos impulsos de entusiasmo e cinefilia que já existiam antes,
mas desta vez se encontrou com condições novas que o permitiram florescer. Os fatores podem ter sido vários: nos anos posteriores a Mataron
a Venancio Flores o vídeo possibilitou a realização de filmes independentes a um custo menos proibitivo (tinha sido o caso de Pepita), e embora várias dessas produções não tenham chegado às salas de cinema,
Cine Uruguai
cabeças, deram origem a um movimento de cinema político que culmi-
52
ajudaram a gerar experiência prática, a formar profissionais e artistas,
a circular “ ideias práticas” sobre cinema (e não só “ ideias teóricas”). O
resultado já se notava, em 1990, na melhoria da qualidade da produção
de publicidade, de videoclipes e de vídeo-arte. Em poucos anos, passouse de um padrão que em qualquer lugar do mundo seria considerado
amador e provinciano, a um de respeitável profissionalismo, principalmente nas áreas implicadas na produção publicitária (fotografia, direção
Cine Uruguai
de arte, montagem a curto prazo, organização de equipes, disponibilidade de bons equipamentos). As áreas mais específicas do longa de ficção (roteiros, atuação, montagem a longo prazo) eram ainda terrenos a
conquistar. O Mercosul, fundado em 1991, facilitou a coprodução com
os países vizinhos. Talvez como fruto do entusiasmo por Pepita e El Dirigible, em 1995 se estabelece o Fondo para el Fomento y Desarrollo de
la Producción Audiovisual Nacional (FONA), primeiro organismo público
destinado a financiar cinema. Nesse mesmo ano se funda a Escuela de
Cine del Uruguay, primeira de seu tipo (que logo seria acompanhada por
outras, de nível técnico ou universitário).
Dois dos exemplos da etapa inicial pós-Dirigible, e que ilustram a diversidade que se instaura no cinema uruguaio, são El Chevrolé (1998) e
El Viaje Hacia el Mar (2003): a primeira delas relativamente veloz e fragmentada, interpretada por vários personagens famosos da cultura popular e de massas uruguaia; a segunda é uma estória mínima e contemplativa, com um elenco de notáveis atores de teatro. Tanto El Dirigible
como El Chevrolé exibem o empenho de condensar visões pessoais sobre a identidade do país (El Dirigible com uma perspectiva erudita, com
referências históricas, literárias e arquitetônicas, godardianamente associadas a elementos de cultura de massas, como a presença do cômico
televisivo Ricardo Espalter; El Chevrolé com um enfoque mais popular
53
urbano). El Viaje Hacia el Mar opera num âmbito mais delimitado e explora com certa nostalgia aspectos da cultura do interior e do passado.
Outro marco no cinema uruguaio foram os dois longas codirigidos
por Pablo Stoll e Juan Carlos Rebella, 25 Watts (2001) e Whisky (2004).
Ambos vêm encabeçando reiteradamente listas de “os melhores filmes
uruguaios de todos os tempos” e tiveram uma notável repercussão internacional. Serviram também para difundir ao que vem sendo, por agora, chamado como a única corrente de cinema de ficção uruguaio. Esse
primeiros curtas de um grupo de amigos, que inclui, além de Stoll e
Rebella, Daniel Hendler, Federico Veiroj, Arauco Hernández, Adrián Biniez, Manolo Nieto e Fernando Epstein, entre outros. As referências mais
evidentes são Aki Kaurismäki, Jim Jarmusch e o “novo cinema argentino” (principalmente Raúl Perrone e Martín Rejtman). São dramas cortados por muitos elementos de comédia quirky, ou comédias cortadas por
certo ar de desolação e desesperança, com personagens de poucas palavras, sem objetivos claros nem propósitos fortes, que se deixam levar
pelos acontecimentos ou por impulsos que nem mesmo eles parecem
ser capazes de explicar. São filmes feitos na justa medida de seus parcos
orçamentos. Gigante (2009), A Vida Útil (2010) e Os Inimigos da Dor (2014)
foram gerados por integrantes desse grupo, e Tanta Água (2013) e Mr.
Kaplan (2014) exemplificam sua influência para além do grupo original.
Essa espécie de linha estética chama a atenção por sua particularidade, quantidade e qualidade dos filmes. Nenhum deles ostenta o propósito de condensar o “Uruguai” à maneira de El Dirigible ou El Chevrolé, mas
se vinculam claramente (e em forma às vezes afetuosa, às vezes cínica e
irônica, às vezes amarga) com certos aspectos da uruguayez (“uruguaidade”), referidos à situação de um país pequeno, com escassa população,
Cine Uruguai
movimento começou a se esboçar poucos anos antes de 25 Watts, nos
54
onde prima uma autoimagem de que os problemas não são agudos, mas
as perspectivas são muito limitadas. Esse tipo de questões pode aparecer, no entanto, com um estilo cinematográfico mais clássico, como é o
caso de O Banheiro do Papa (2007), que gozou de especial popularidade
no Brasil e projetou a fama internacional do ator César Troncoso (cujo
primeiro longa tinha sido El Viaje Hacia el Mar).
Como acontece em cinematografias de países pequenos, a maior parte
Cine Uruguai
da produção circula em festivais, o que propicia uma tendência ao “cinema de arte”. Paradoxalmente, o cinema de gênero num contexto desses
se converte num objetivo a conquistar. É um objetivo difícil, devido à falta
de massa crítica de público (para que se gerem gêneros próprios) e à falta
de know-how para lidar com parâmetros estabelecidos em países mais
ricos e com produção mais abundante. A Casa (2010) é o mais reconhecido dos filmes de terror uruguaios. Reus (2011) assume um enfoque policial-social. Anina (2013) é um desenho animado para crianças que funciona muito bem para adultos (sua realização artesanal levou dez anos).
O inicio do milênio foi um momento de otimismo para o cinema uruguaio: havia surpresa do público ante a existência, finalmente, de um
cinema próprio, com um nível médio bastante alto e inesperada repercussão internacional (em prêmios, aprovação crítica e pequenos sucessos de culto). O Uruguai era um país fanático por cinema, mas que quase
nunca tinha aparecido nos cinemas. Inclusive, nos dois filmes internacionais mais famosos cuja ação transcorre no Uruguai ou entre uruguaios — Estado de Sítio (1972), de Costa Gavras, e Vivos (1993), de Frank
Marshall — o país não é sequer nomeado. Havia avidez por vê-lo refletido nas telas, com uruguaios, por uruguaios e para uruguaios. A maior
parte dos filmes dessa época teve um bom público. Em particular, o segundo longa de Beatriz Flores Silva, En la Puta Vida (2001), que teve um
55
sucesso excepcional (foi o filme mais visto do ano no país, independente
de nacionalidade). Esta situação, infelizmente, não durou: o entusiasmo
do público se desvaneceu e a sensibilidade passou para o lado oposto
(“os filmes uruguaios são chatos e deprimentes”). O apoio estatal ao cinema nacional é tímido e insuficiente, as empresas privadas não consideram vantajoso associar suas marcas a uma forma de expressão carente de glamour, as companhias exibidoras e as emissoras de televisão não
se caracterizam por uma atitude entusiasta a respeito. O modelo anterior
enfrenta a Cinemateca, que poucas décadas antes florescia.
A produção de documentários tem se mantido, relativamente, abundante em proporção à população. Vários deles se referem a assuntos
centrais da sensibilidade de massas uruguaia com possível repercussão
internacional: Maracanã (2014) apela à saga futebolística da seleção uruguaia na Copa de 1950, Mujica, o poder está no coração (2013) acompanha
o popular “presidente mais pobre do mundo”. Tus Padres Volverán (2015)
aborda um episódio interessante durante a abertura política no final da
ditadura, e suas consequências para quem viveu esse processo. El Padre
de Gardel (2013) usa como apelo o mais popular dos cantores uruguaios
de todos os tempos, mas sua ênfase, tal como expressa o título, é a interessante figura de seu pai e, através dele, a estrutura patriarcal da alta
burguesia uruguaia de fins do século XIX. El Casamiento (2011) é o único
que tem uma perspectiva mais “micro” e não especialmente “nacional”: é
um dos vários filmes que seu diretor Aldo Garay realizou sobre travestis e
transexuais uruguaios, neste caso acompanhando um casal já idoso (um
operário e sua companheira, uma ex-travesti, agora operada).
A produção regular, o interesse do país pelo cinema, a proliferação de
escolas, as facilidades para praticar com tecnologia acessível, vêm re-
Cine Uruguai
de cinefilia entrou em crise — A Vida Útil aborda os graves problemas que
56
sultando num aumento considerável do nível técnico. O curta Ataque de
Pânico (2009) tornou-se viral no Youtube, e terminou propiciando a contratação por Sam Raimi de seu diretor, Fede Álvarez, para trabalhar em
Hollywood. É um dos artistas e técnicos uruguaios que trabalham com
destaque no “cinemão” do exterior (outros são o fotógrafo César Charlone, codiretor de O Banheiro do Papa, e Mariela Besuievski, produtora de
El Dirigible). Esse nível técnico, aliado aos custos relativamente baixos,
Cine Uruguai
tem feito do Uruguai um país interessante para coproduções, principalmente para atenuar os orçamentos e facilitar outros aspectos de realizações dos países vizinhos (Argentina e Brasil). Mais da metade dos filmes
de ficção “uruguaios” estreados em 2015 têm uma participação local muito minoritária e que não se transmite à textura dos próprios filmes. O público assiste Boi Neon como filme brasileiro, e La Luz Incidente como filme
argentino, e a participação uruguaia é um mero dado formal. A produção
de longas de ficção propriamente uruguaios (dirigidos por uruguaios e filmados principalmente no Uruguai) decresceu muito nos últimos anos. Em
2015 só houve três estreias de longas de ficção propriamente uruguaios
(Os Inimigos da Dor foi um deles). O futuro é incerto. Mas a energia criativa, a vontade de fazer, a experiência acumulada nestes vinte anos de produção provavelmente encontrarão seu caminho.
Guilherme de Alencar Pinto é jornalista, pesquisador, professor, músico. Mora em Montevidéu desde 1986. Desde 1984 colabora com artigos sobre música e/ou cinema para várias
publicações do Uruguai e, eventualmente, da Argentina. É professor (música e cinema) da
Universidad Ort, Montevidéu. Publicou dois livros: Razones locas/El paso de Eduardo Mateo
por la música uruguaya (1994) e Los que Iban Cantando/Detrás de las voces (2013). Em cinema trabalhou como técnico (assistente de direção, de produção, de montagem de imagem
e de som, produção musical) na França e no Brasil, em publicidade e em longas-metragens.
Realizou (direção, roteiro, câmera, montagem, som) dois curtas experimentais em Super-8
no Brasil: Rua sem Saída (É proibido jogar lixo neste local) (1983) e O Mar Quando Quebra na
Praia é Bonito é Bonito (1984).
57
Cine Uruguai
Cine Uruguai
58
59
Cine Uruguai
Fortuna crítica
61
O Banheiro do Papa
Paulo Santos Lima
guai-Brasil, O Banheiro do Papa é um filme não só de sua época, como um que quer falar justamente sobre a atualidade. Não
bem nessas palavras, mas é isso que César Charlone, que codirige o longa ao lado de Enrique Fernández, deixou claro numa das sessões da 31a
Mostra. Sua ideia era mostrar seu Uruguai querido, e, evidentemente é o
Uruguai de hoje, porque Charlone fala do presente. O detalhe é que recorre a um momento emblemático para deixar discorrer questões afetivas e dramáticas sobre os seus.
Beto é um contrabandista que malha a pedaladas umas tantas dezenas de quilômetros para traficar bens de consumo (pilhas, mantimentos;
tudo coisa do bem, que fique claro) entre Brasil e Uruguai, sob o risco de
uma polícia fronteiriça corrupta e de um fiscal atroz. A visita do Papa ao
Uruguai, em 1988, é o eldorado para as pessoas de Melo, pois poderão
vender toda a sorte de coisas para os brasileiros que cruzarão a fronteira ao encontro com o João de Deus, conhecido como Papa João Paulo II.
Não somente a ingenuidade popular (que assim é mostrada a nós pelo
filme, um tanto ambíguo na abordagem, às vezes superior, meio olhando do alto e já sabedor do equívoco dos pobres de Melo), mas também
a mídia é responsável pela falsa esperança — o que aliás é ressaltado,
Cine Uruguai
A
mbientado em 1988, na pequena cidade de Melo, fronteira Uru-
62
com a presença marcante da TV no bar central.
Em meio a essa suave “crítica política” — suave mesmo, até porque,
ao final, um diálogo diz que o Papa não tinha conhecimento do que
Melo estava passando naquele dia (não mesmo? o Papa não tinha olhos
para ver as coisas?) — há o episódio da latrina, que dá título ao longa.
Se alguns dali armam-se com medalhinhas de santos e flâmulas comemorativas, outros com barraquinhas de chouriços e quitutes, Beto deci-
Cine Uruguai
de construir um banheiro a fim de matar as necessidades dos viajantes.
Ele aumenta o número de viagens contrabandistas, força à beça o seu
joelho maltratado pelas pedaladas com a bicicleta super-carregada, e
mesmo assim falta-lhe dinheiro para finalizar o WC, com a dita privada.
É, sobretudo, acerca dessa questão, e também da representação bem
interessante que Charlone-Fernández fazem daquele povoado, que o filme ganha semblante de comédia popular italiana dos anos 50. Interessante, mas um tanto tumultuado pelo excesso de assuntos sendo tratados a
velocidade supersônica: a filha de Beto e seu sonho de ser uma apresentadora de TV, o que a coloca em conflito com o pai, que é um tanto mais
rústico e preso à terra, a já citada mídia, a penúria latino-americana desprezada pelo Primeiro Mundo, a ameaça que corre o protagonista nessas
viagens vãs, a consequente crise matrimonial de Beto e sua mulher etc.
Esse ritmo de hélice de liquidificador em potência máxima encontra
sua imagem no estilo de Charlone, cuja fotografia e operação de câmera
é dos mais expressivos hoje. Expressivo, aqui, usado como “expressão”,
marca que se faz reconhecível numa primeira olhada (ainda que não seja
única), uma vez que tanto os feitos mirabolantes de Charlone em Cidade
de Deus criaram uma certa escola seguida por muitos; como a semelhança com alguns trabalhos anteriores, como o de Rodrigo Prieto em Amores
Brutos, colocam-no mais como uma expressão contemporânea. E, aqui
63
meio passando pelo que Rodrigo Oliveira fala em seu artigo na Contracampo para comentar outras coisas, o filme se faz contemporâneo, do seu
tempo, pela evidência da própria imagem, com montagem ágil, filtros de
luz, fotografia granulada, câmera na mão que a tudo olha, mas com foco
nos humanos — algo seguindo a linha de cinema “humanista”, ainda que
por sorte tenha pouco de humanismo e mais um esforço pelo humano.
A pauta política é, certamente, o que mais prejudica o filme, porque o
respeito à especificidade daquelas pessoas (que são elas próprias, ennão consegue deixar (e talvez nem queira) de emular toda uma condição
maior e a partir daqueles ali. Com uma câmera usada num estilo tipicamente “latinomericano-social” para mostrar pessoas desabastecidas,
não há como não conectar assuntos que estão ali apontados no filme, e
que estão também na pauta da política mundial.
Mas é justamente a fluidez veloz de acontecimentos, traço também
bastante “contemporâneo” (cujo ótimo exemplo é o que Eric Gautier faz
com Assayas e o péssimo exemplo está nos filmes de Michael Bay), que
deixa as coisas bastante banais, em que a experiência dos personagens
se faz gráfica, pictórica, circunscrita ao momento de cena que já é bastante poluído com o tumulto do thriller, drama pessoal, fábula política
e tudo mais que este O Banheiro do Papa nos mostra freneticamente.
Trata-se, em suma, de um filme de seu tempo: assinado por alguém,
César Charlone, que é dos grandes diretores de fotografia de seu tempo,
com todas as felicidades e problemas que isso traz consigo.
*Texto originalmente publicado no site Revista Cinética (www.revistacinetica.com.br) e gentilmente cedido pelo autor.
Cine Uruguai
trosadas com aquele espaço diegético, o que é uma virtude deste filme)
Cine Uruguai
64
Paulo Santos Lima é crítico de cinema e jornalista. É redator na Revista Cinética, colaborador
da Revista Monet e já escreveu para veículos como revista Bravo! e jornal Folha de S. Paulo.
Ministrou cursos sobre John Cassavetes, Michael Cimino, Werner Herzog, filmes de gângster,
cinema norte-americano e francês (SESC), e também cursos sobre Martin Scorsese (Espaço
Itaú de Cinema) e Brian De Palma (Caixa Cultural). Fez curadoria de mostras como “O cinema
francês pós-Nouvelle Vague” e “Do curta ao longa - A criação autoral no cinema paulista da
retomada”, e, em 2015 a curadoria, com Francis Vogner dos Reis, das mostras “Easy Riders O Cinema da Nova Hollywood” e “Jerry Lewis - O Rei da Comédia”, todas no Centro Cultural
Banco do Brasil.
65
Cine Uruguai
67
A Casa
Luis Henrique Boaventura
Um pico da trilha.
Um sobressalto no escuro.
O
s artífices que operam em um susto são velhos feiticeiros remanescentes de rodas em fogueiras e histórias de viajantes,
muito antes de qualquer coisa remotamente parecida com ci-
nema habitar a doida imaginação dos homens.
Quando Gustavo Hernández ganhou US$ 6.000,00 para fazer seu pri-
meiro longa-metragem, sabia que se o projeto simplesmente funcionasse enquanto filme comerciável já seria um grande milagre. Uma ou duas
fontes de luz, uma dúzia de pessoas na equipe e somente uma câmera
(digital). A Casa (La Casa Muda, 2010) deve sua notoriedade e sua própria
existência às circunstâncias em que foi filmado. Todas as decisões criativas derivam de suas limitações técnicas, começando pela própria ideia
de filmar um terror. Com pretensões tão baixas (mas ao mesmo tempo
tão altas), Hernández refugiou-se no horror, gênero que rastejou entre
seus pares ao longo do último século como um espécime pseudoartístico, movido a futilidades e truques baratos. Se muito pouco é necessário
para filmar um horror eficiente, muito mais claro ao espectador se reve-
Cine Uruguai
Um silêncio insuspeito.
68
la a mão do cineasta. Despido de um roteiro elaborado, de um texto com
pretensões literárias, de interpretações grandiosas e demais elementos
que forjam a 7ª com a liga de todas as outras artes, desponta límpida e
translúcida a mise-en-scène do seu autor. Nada mais adequado, portanto, a um diretor novato louco para mostrar serviço, do que abraçar este
horror marginal, o menos nobre dos grandes gêneros, em um filme que
tenta desesperadamente não se trair em um erro de movimento ou no
Cine Uruguai
reflexo de um espelho.
Hernández sabe que numa produção independente (e mais ainda em
um projeto micro-budget) vale antes o poder fazer do que o querer fazer, por mais que o segundo encontre maneiras improváveis de se sobressair ao primeiro. Os três passos descritos no topo do texto definem
toda a dinâmica de A Casa, uma lógica que o cinema, como arte nova e
provinda que é, incorporou com naturalidade. Se em um terror comercial ela é usada como uma ferramenta a mais para criar tensão, aqui é
empunhada como único recurso disponível. É somente em função dessa
fórmula que todos os esforços serão empenhados.
O uso de uma única câmera e a ideia do falso plano-sequência até
fecham várias possibilidades, mas abrem outras bem interessantes. Primeiro que a existência de apenas uma perspectiva submete quase que
naturalmente o filme de Hernández à força do fora de plano. A iminência de perigo, matéria-prima de A Casa, é alimentada por tudo que circunda a câmera e seu ponto inviolável de foco: Laura. O espectador depende de cada movimento de Laura como se houvesse cabos invisíveis
amarrando ela à câmera. Com exceção de um ou dois momentos, jamais
vemos o que Laura vê. A limitação de recursos traz também uma interessante limitação do olhar. Sem a incidência do corte e demais artifícios
que denunciem a falsidade de seu universo, A Casa mantém o especta-
69
dor muito bem trancado dentro de si apesar de uma imediata contradição
desta ideia (e que poderia colocar tudo a perder): a atenção do espectador para a existência de uma câmera no ambiente é algo incontornável.
A Casa tem ares bem óbvios de mockumentary, porém com uma diferença fundamental: a existência da câmera transparece, mas não é jamais assumida pelo filme (nem deveria). A solução encontrada para que
a ilusão não se quebre é exatamente outra vez a fidelidade da lente sobre Laura, de tal modo que a câmera não adquire uma volúpia própria,
de sua vontade. A noção de solidão que ela enfrenta termina sendo muito mais forte do que os efeitos colaterais da câmera na mão. Hernández
concebe uma imersão por demais profunda para ser vencida pelos momentos de negação da realidade, meramente intermitentes diante da
maciça constância da atmosfera.
Como ponto dominante em cena, Laura é também um alvo vulnerável. Em A Casa, o espaço exerce a todo o momento sua opressão sobre
o corpo. Teme-se não pelo que a câmera mostra, mas pelo que foge ao
seu enquadramento, parte em que som e iluminação possuem especial
importância. O perigo não vem jamais pelo campo que a lente capta,
composto basicamente por Laura, um lampião e muitos cantos escuros,
mas pelo que está aos lados e, principalmente, atrás da linha de visão.
Passos no andar de cima, uma sombra que se move, indícios de uma
presença que não é revelada ao espectador, aqui sob a égide mais elementar de sua velha definição: um ente passivo, submetido à ilusão do
perigo, mas incapaz de virar o pescoço para apreender a origem do hálito quente que lhe desperta os pelos da nuca. Em determinada cena, é
um braço que salta de trás da câmera e agarra Laura pelos cabelos; em
outra, é Laura que lança seu olhar para o que está às costas do espec-
Cine Uruguai
pelo contrário, está sempre presa à sua protagonista, sempre à mercê
70
tador, caminhando em sua direção enquanto este dá passos sem saber
para onde vai.
É claro que A Casa tem problemas, a passar pelo fato de que se sairia
muito melhor como média-metragem (os vários minutos que Laura desperdiça investigando paredes são completamente estéreis), mas isso
significa ignorar uma das premissas que, afinal de contas, levaram-no
a Cannes, Sundance e ao Festival do Rio, que deram ao filme este raro
Cine Uruguai
espacinho no circuito, o que sinceramente me parece seu maior mérito.
De tudo isto fica a escolha do horror como abrigo quando não há
quase nada a ser feito. O mais suscetível dos gêneros às intempéries da
mente por trás da câmera, o mais permissivo às insanidades do artista, o mais lúdico e dissoluto. Quando não restarem mais as ideias e os
recursos, quando desaparecerem as pessoas e até os equipamentos, o
horror sempre terá condições de oferecer três coisas: um silêncio insuspeito. Um pico da trilha. Um sobressalto no escuro.
*Texto originalmente publicado no site CinePlayers (www.cineplayers.com) e gentilmente cedido pelo autor.
Luis Henrique Boaventura é crítico de cinema, mestre em Letras (UPF) e doutorando em Linguística (UPF).
71
Cine Uruguai
73
Clever
Robledo Milani
ternacional — principalmente se o mesmo estiver ocorrendo no
exterior — é a possibilidade de conferir de perto filmes estran-
geiros que, de outra forma, nunca teríamos acesso. É importante ter isso
em mente, pois o Brasil é um país muito fechado às demais cinematografias além da norte-americana, algumas europeias (inglesa, francesa,
espanhola, italiana, alemã) ou argentina — e, nestes últimos casos, chegam até nós somente os grandes sucessos, sejam de público ou de crítica. É raro termos por aqui longas australianos, iranianos, sul-africanos,
japoneses, venezuelanos, mexicanos, islandeses, russos, árabes e, por
incrível que pareça, até mesmo uruguaios. Pois é neste nicho que se encaixa Clever, a primeira produção do país a ser exibida dentro da programação do 19° Festival Internacional de Cine de Punta Del Este.
O Uruguai não é um lugar com produção cinematográfica expressiva.
No entanto, para termos de comparação, trata-se de um país do tamanho do estado do Rio Grande do Sul, mas que produz cerca de 10 longas-metragens por ano, em média (no RS foram lançados 6 produções
neste formato em 2015, e apenas quatro delas tiveram distribuição nacional). Além disso, longas uruguaios já foram premiados em festivais
como Cannes (Whisky, 2004) e Berlim (La Demora, 2012), por exemplo.
Cine Uruguai
U
ma das melhores coisas de se estar presente em um festival in-
74
Portanto, é bom estar atento ao que nossos hermanos produzem. Mas
se estes títulos de maior destaque investiam em um tom melancólico e
dramático, é com uma grata surpresa que tomamos contato com Clever,
uma história que poderia ter sido facilmente dirigida por Wes Anderson
(pelo rigor técnico) ou pelos irmãos Joel e Ethan Coen (pelos personagens
idiotamente adoráveis). Se eles, é claro, estivessem filmando no Uruguai.
Clever — expressão que, em inglês, significa inteligente, o que não
Cine Uruguai
deixa de ser uma saborosa ironia — é também o nome do protagonista,
interpretado pelo novato Hugo Piccinini (Sr. Kaplan, 2014). Nas primeiras
cenas descobrimos que ele está se separando da esposa e, ao deixá-la
em casa após assinarem os papéis, tenta mais uma investida, apenas
para ser rechaçado. Quando ela sai do carro batendo porta, o vemos à
distância, em seu Chevette antigo, tendo apenas a buzina como companhia. Seis meses se passam e ele está novamente no mesmo lugar, dessa vez, porém, para buscar o filho para passar o fim de semana com ele.
O que mudou, além do seu visual — a dedicação às artes marciais chama atenção no corpo musculoso e no olhar determinado — é o próprio
veículo que conduz. Continua o mesmo, porém mais turbinado, remodelado, poderoso. De imediato percebemos como ele andou se ocupando
nestes últimos meses.
Seria somente mais um sábado como qualquer outro caso não visse
na rua um carro similar ao seu, porém com uma pintura de chamas flamejantes no capô. Aquela visão parece dominá-lo, tomando-o como objetivo de vida. Primeira missão: descobrir quem fez o desenho. Depois,
arrumar quem poderia cuidar da criança no seu lugar. Por fim, juntar
suas economias e partir para o interior em busca do artista que poderá
realizar seu desejo. Já que não pode mais ter a mulher de sua vida — que
agora está de caso com um dono de um Uno, veja só! — ao menos terá
75
uma máquina como nenhuma outra. Suas intenções são claras, e parecem se resumir a algo de fácil alcance. Porém estamos longe das grandes cidades, e os tipos que vão surgindo em seu caminho durante essa
jornada, por si só, já renderiam boas histórias.
Discorrendo sobre questões como provincianismo, pátria, arte, homossexualidade, discriminação, política e segurança pública, os diretores
e roteiristas Federico Borgia e Guillermo Madeiro criam um enredo com
momentos de pura sátira, intercalados por outros que exploram bem a
a participação de Horacio Camandule (protagonista de Gigante, 2009),
como um chupador de picolé de vinho tinto dono da peruca mais anacrônica dos últimos tempos — sua presença transita na linha tênue entre o
absurdo e o improvável. Antonio Osta, como o fisiculturista de identidade
sexual indefinida, também é um achado, criando um tipo pelo qual torcemos sem nem ao mesmo entender direito o que busca. No fim, Clever é
exatamente o que anuncia: tímido, discreto e quase tolo, porém com muito mais a dizer do que se poderia imaginar num primeiro contato.
*Texto originalmente publicado no site Papo de Cinema (www.papodecinema.com.br) e gentilmente cedido pelo autor.
Robledo Milani é crítico de cinema, vice-presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul, e membro da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de
Cinema. Formado em Comunicação Social pela UFRGS, é também sócio-diretor da Phosphoros Novas Ideias, empresa de assessoria de imprensa e produção de conteúdo. Criador do
portal Papo de Cinema.
Cine Uruguai
tensão e o estranhamento entre os personagens. Chama atenção também
77
Gigante
“Esta é a imagem que o cliente tem de mim”
Rodrigo de Oliveira
os funcionários de um supermercado uruguaio precisam se arrumar diariamente antes de encarar o trabalho com o público.
Quando Jara, o segurança grandalhão de Gigante, aparece diante do espelho, fica evidente que sua imagem é daquelas que não se quer ter associada a qualquer negócio — salvo os negócios do cinema de sensibilidade duvidosa, cheio de tiques de emudecimento como valor estético
a priori, onde opera uma questão de economia, matemática estrita em
toda sua armação estrutural de silêncio absoluto + planos fixos longos
e personagens erráticos = vida. Essa é uma conta que nunca fecha, não
importa o quão insistentes estes filmes sejam.
De fato, o importante da frase é menos a imagem e mais a ideia de
que ela precisa servir a uma clientela, e os primeiros momentos do filme de Adrián Biniez não escondem que ele está jogando para a plateia consumidora desse tipo de desafeição ao mesmo tempo corpórea e
conceitual: temos, de um lado, um ogro em busca de uma princesinha,
e todo o trajeto marcará sempre que seu ponto de vista é o da distância intransponível (ou desse “abismo que separa a todos nós”); do outro,
uma busca que se dará via câmeras de vigilância, um dispositivo pronto a todo tipo de elucubração gaiata sobre o domínio do olhar no mun-
Cine Uruguai
A
frase do título do texto aparece colada no alto do espelho onde
78
do de hoje: a vídeo-perseguição do indivíduo por um observador que
nunca se anuncia, a câmera tão disseminada por todos os espaços de
convivência humana a ponto de ressurgir aqui como o único lugar onde
uma história de amor moderna pode se dar. Sorte nossa, e de Gigante, é
que toda metáfora cabível sobre o dispositivo da vigilância não é mais
que um artifício, como bem são os planos fixos alongados, a direção de
atores abusando do primitivismo de seu “homem das cavernas”, a ence-
Cine Uruguai
nação que desconsidera qualquer coisa próxima a uma pulsação, algum
batimento cardíaco não-pixelizado pela imagem em preto-e-branco tomada do alto de uma parede. Porque o que interessa a Adrián Biniez, de
verdade, é outro conceito: Gigante é a tentativa de sobrepor à estrutura da desafeição estética a uma outra, mais antiga e aparentemente incongruente à primeira, que é a comédia romântica. Ou mais radical que
isso, a da comédia de gags pura e simples.
Jara não é um descendente proto-camusiano encarnado num Lee Kangsheng qualquer. Desde as primeiras aparições de Horacio Camandule em
cena, devorando rosquinhas enquanto se distrai do trabalho de vigilância, atrapalhado com uma revistinha de palavras cruzadas ou brincando
de ser Rocky Balboa com o colega segurança, fica claro que Biniez quer
mesmo é retirar o Shrek que ele sabe existir em seu personagem. Há um
quociente psicótico claro neste sujeito que é incapaz de se aproximar fisicamente de seu objeto de desejo (não à toa, uma jovem magra e linda,
em oposição a seu porte mastodôntico), e que, por isso mesmo, começa a
persegui-la de maneira obsessiva. Mas há algo no modo de operação de
Jara que acaba contaminando a maneira como o próprio filme lidará com
esse limite entre a afetação distanciada e o risco de contato. O segurança não apenas observa, ele de fato intervém na vida de sua amada, tenta
cercá-la de todo mal através de uma série de instrumentos que sua posi-
79
ção de poder diante do monitor de vídeo oferece.
Como em todo conto de fadas, há o patrão malvado, o príncipe encantado mais bonito que o sapo, as pequenas falhas de caráter da mocinha que, na verdade, só a deixam mais encantadora, e para cada problema surgido, o segurança consegue rapidamente arranjar uma saída pela
tangente. Do mesmo jeito que Jara só consegue agir no entorno, o filme
também trabalhará provocando uma sequência crescente de situações
que, diferente desse cinema que acredita que alongar o plano é emusadas, como uma peça de ficção que opera pela causa-e-consequência
mais estrita (o timing desse tipo de comédia, afinal, não tem nada a ver
com o tempo da vida: precisa da agilidade, depende do corte muito mais
que do plano-sequência — no que aliás Biniez se distancia de sua referência contemporânea mais próxima, Aki Kaurismäki). O que tira Gigante desse corpo de cinema em que, a princípio, ele parece afundar, é que
aqui não se tem vergonha nenhuma de sujar as mãos.
Não à toa, as várias imagens de vigilância que teremos no filme não
registrarão nunca os clientes do supermercado. O interesse de Jara é
numa funcionária, o interesse do filme é na interação entre eles, não há
tempo a se perder com aquilo que não colabora para o acúmulo de esquetes que se quer produzir. E é esse o espírito mesmo: temos a cena
clássica do sujeito que fica mudando de fileira o tempo todo no cinema
para chegar mais perto de sua amada e, no caminho, enchendo o saco
dos outros espectadores (isso é Seinfeld, não Kim Ki-Duk); a porrada no
taxista que ousa chamar a mocinha de “gostosa”; o acionamento proposital do sistema anti-incêndio para evitar um desastre afetivo (isso é de
filmes do Ben Affleck, não do Lisandro Alonso). Quando finalmente o feitiço virar contra o feiticeiro, e for Jara o objeto de atenção das câmeras,
Cine Uruguai
lar “o tempo da existência”, estão ali se anunciando como criações pen-
80
Adrián Biniez entregará de vez o seu projeto de cinema: Gigante quer significar mais que apenas o tímido conto moral brutamontes que descobre
saber amar. É também um desafio à moda Davi e Golias do pequeno gênero fútil que, atrevido, vampiriza a grande estrutura estética vigente num
certo circuito de arte — justo ela, tão afeita a esse tipo de estratégia. Não
se tira daí mais que um bom exercício de engenho dramático e apelo à ingenuidade. Mas pode ser exatamente isso que se precise fazer para que,
Cine Uruguai
a essa altura do campeonato, um final feliz pareça feliz de fato.
*Texto originalmente publicado no site Revista Cinética (www.revistacinetica.com.br) e gentilmente cedido pelo autor.
Rodrigo de Oliveira é crítico e cineasta. Organizador do livro Diário de Sintra – Reflexões sobre o filme de Paula Gaitán (ed. Confraria do Vento/2011), roteirista do longa-metragem Exilados do Vulcão e roteirista e diretor do curta Eclipse Solar e dos longas As Horas Vulgares e
Teobaldo Morto, Romeu Exilado.
81
Cine Uruguai
83
Os Inimigos da Dor
Sérgio Alpendre
ça de Os Inimigos da Dor, longa de estreia do uruguaio Arauco
Hernández.
O jovem alemão sem nome que anda pelas ruas de Montevidéu en-
contra em sua mochila uma embalagem com belas flores luminosas.
Dentro dessa embalagem, por cima das flores, vemos se abrir e depois
ocupar toda a tela uma outra imagem que mostra esse mesmo homem
atravessando uma rua.
Um simples efeito cinematográfico, existente desde os tempos de
Georges Méliès, explica bem o mundo mágico que vemos se desenrolar:
um mundo onde cabem a solidão, a miséria humana, a insensatez, mas
também a compaixão, a poesia e a beleza.
Esse alemão, que é meio esquisito, saberemos aos poucos, é ator. Foi
abandonado pela mulher e parte à procura dela pela capital uruguaia.
Teve mala extraviada, e por isso passa um frio danado. É então ajudado por um segurança que também foi deixado pela mulher, e por outros
habitantes da noite.
Os problemas são agravados pelo fato de que ele não fala quase nada
de espanhol, e ninguém à sua volta fala alemão. Como a trama se passa
nos anos 1980, não é tão comum encontrar pessoas que falam inglês, lín-
Cine Uruguai
U
ma fusão entre duas imagens concentra simbolicamente a for-
84
gua universal após a globalização (ou devemos dizer americanização?)
ocorrida nos anos 1990.
Não se pode esperar de Os Inimigos da Dor um desenvolvimento ordenado e facilmente compreensível. Isso porque a lógica narrativa é a
de um sonho (e muitas vezes, de um mau sonho), na linha de David Lynch
ou de Depois de Horas, o belo longa de Martin Scorsese.
Formalmente, lembra mais um certo cinema alemão dos anos 80, com
Cine Uruguai
trilha cafona (e bacana) de música progressiva eletrônica e efeitos e enquadramentos maneiristas.
Eis um autêntico filme alienígena, com evidentes problemas, mas
com estranheza o suficiente para que não desgrudemos o olho da tela.
É uma coprodução brasileira, mas não há praticamente nada nele que
provoque alguma identificação com o público brasileiro. E isso, afinal,
pouco importa.
*Texto originalmente publicado na Folha de São Paulo, caderno Ilustrada, no dia 05/05/2016
e gentilmente cedido pelo jornal e o autor.
Sérgio Alpendre é crítico de cinema, professor, pesquisador e jornalista. Escreve na Folha de
São Paulo e edita o site www.revistainterludio.com.br. Mestre em Meios e Processos Audiovisuais pela ECA – USP. Doutorando em Comunicação pela Anhembi-Morumbi. Coordenador
do Núcleo de História e Crítica da Escola Inspiratorium. Ministra cursos e oficinas de crítica
por todo o Brasil.
85
Cine Uruguai
87
Maracanã
Rodrigo de Oliveira
construído Maracanã, pode ser considerada um dos eventos esportivos mais traumáticos no país. Com clima de campeão an-
tecipado, o escrete brasileiro enfrentou o Uruguai e precisava apenas de
um empate para levantar a taça. Depois de goleadas contra as seleções
da Suécia (7x1) e da Espanha (6x1), a tarefa não parecia difícil. Os jornais já davam como certa a vitória. A soberba, no entanto, não fez bem a
equipe comandada por Flávio Costa. Um Maracanã abarrotado (200 mil
pessoas, alguns dizem) observou atônito o naufrágio do sonho de vencer o mundial em casa. O chute de Ghiggia que invadiu a meta defendida
por Barbosa fechou os 2x1 necessários para que o Uruguai conquistasse
seu segundo campeonato. Esta história é a temática do documentário
Maracanã, coprodução entre os dois países rivais naquela final.
Os diretores Sebastián Bednarik e Andrés Varela se debruçam em
imagens de arquivo — muitas delas inéditas — e trazem ao espectador
uma forma diferente de contar aquela trama. Dizem que a história é
contada sempre pelos vencedores. Neste caso, o foco da narração é dividido. Ora sob a ótica dos campeões, ora sob a ótica dos perdedores.
Deste modo, temos como ver os dois lados da questão e observar que,
por mais que seja traumática a final da Copa de 1950 para os brasileiros,
Cine Uruguai
A
final da Copa do Mundo de 1950, realizada no Brasil, no recém-
88
os boleiros do nosso país conseguiram dar a volta por cima, vencendo
outros cinco campeonatos. Já do lado do Uruguai, aquela final histórica
representou seu último sucesso. Por essas e outras que Andrés Varela,
em entrevistas, tem mencionado que o fantasma uruguaio não espanta
apenas os brasileiros.
A pesquisa de imagens de época é o ponto alto de Maracanã. São 64
anos que nos separam daquele mundial e o documentário propõe este
Cine Uruguai
passeio ao passado. Além de cenas históricas dos jogos, os bastidores
são mostrados. A concentração das seleções é um toque interessante. O
filme mostra a diferença entre a badalação dos brasileiros em relação
à tranquilidade dos uruguaios em suas acomodações, afastadas do fervo do mundial.
O arquivo não é apenas de imagens. Entrevistas com os principais nomes daquela partida, com destaque para Barbosa, goleiro do Brasil, e
Ghiggia, o ponta-direita uruguaio que fez o gol do título, são importantes complementos para a história sendo contada. No caso do defensor
brasileiro, os dois gols tomados naquela partida o assombraram a vida
toda. Assim como o resto dos jogadores, nunca mais foi escalado para
representar o Brasil. Do lado uruguaio, descobrimos que o país saía de
uma época dura, com greves que paralisaram o futebol no país. O retorno da seleção do Uruguai foi difícil e o torneio se transformaria em um
triunfo sem igual.
Ainda que impressione pelas imagens, o documentário acaba caindo
no lugar comum em diversos momentos. A generalização de afirmações
(“O Brasil inteiro estava identificado com a seleção”) joga contra o filme.
Como saber isso? Quem disse? O clima de “já ganhou” pode ser um parâmetro, mas não é o único para entender aquele momento.
Maracanã foi exibido no Brasil em festivais e até na TV fechada, no ca-
89
nal ESPN. Deve ganhar a chance de chegar aos cinemas, mas só depois
do mundial. Em tempos de Copa do Mundo novamente no Brasil, com o
Uruguai chegando como uma das principais seleções a disputar o torneio, existe aquela possibilidade de a história se repetir. Uma nova decisão entre as duas seleções que disputaram o Maracanaço (como ficou
conhecida a partida final do campeonato de 1950) é pouco provável,
mas teria seu charme poético. Qual seria o resultado?
Cine Uruguai
*Texto originalmente publicado no site Papo de Cinema (www.papodecinema.com.br) e gentilmente cedido pelo autor.
Rodrigo de Oliveira é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola,
transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
91
Reus
Rogério de Moraes
possa dizer algo para além de sua moldura. Assim, recortes da
realidade só se tornam pertinentes à medida que são capazes
de revelar aquilo que ultrapassa as bordas do quadro.
Em Reus, o bairro homônimo de Montevidéu, no Uruguai, é o recor-
te. A violência crescente, a decadência inevitável e um forte sentimento
de pertencimento de sua comunidade compõem esse quadro. São esses
mesmos elementos que ampliam os conflitos internos latentes.
Há a criminalidade rasteira, de viciados e trombadinhas, que leva o
crack para as esquinas. Há a criminalidade organizada, que vive a mesma pobreza, mas encontra amparo no sentido de família, de proteção
dos seus e no poder de intimidação. E há os comerciantes, formados por
uma comunidade judaica fortemente enraizada no bairro, que se sentem cada vez mais oprimidos pelo crime.
Com uma textura seca, o filme desenha esse microcosmo com eficiência e credibilidade. Sequências de tensão crescente e atuações intensas
ajudam a mergulhar o espectador no universo de seus personagens. O
problema é não conseguir ir muito além disso.
A montagem, contaminada por maneirismos de uma estética de ação,
prejudica a fluidez da narrativa. A organicidade natural das relações en-
Cine Uruguai
U
m retrato é só um retrato, a não ser que aquilo que o componha
92
tre grupos e pessoas se dispersa em cortes apressados, excessivos, ávidos por criar tensão. O que o filme ganha como recorte cru e eficiente de
uma realidade, perde ao não construir nuances capazes de levar a questões para além do quadro.
A riqueza que se poderia extrair da oposição de classes e culturas dentro desse espaço urbano, fica na intenção. Ao não estabelecer vínculos
e relações mais complexas, termina por acomodar-se em retrato opaco.
Cine Uruguai
Sem grande profundidade, fica limitado aos contornos de sua moldura.
*Texto originalmente publicado no site Cinequanon (www.cinequanon.art.br) e gentilmente
cedido pelo autor.
Rogério de Moraes é jornalista e redator freelancer. Tem trabalhos publicados no jornal Folha de S.Paulo e nas revistas Brasileiros e Época São Paulo. Também colaborou com os sites
especializados em cinema Cineclick, Pipoca Moderna e Cinequanon. Escreve regularmente na
página: medium.com/rogério-de-moraes
93
Cine Uruguai
95
Sr. Kaplan
Francisco Russo
tes dos jovens, parece deixar de lado questões relacionadas à
terceira idade. Vez ou outra surge um filme que aborda o as-
sunto, como Elsa & Fred ou Vênus, mas são casos esporádicos vindos de
filmografias bem distintas. Desta vez, quem apresenta um exemplar sobre o tema é o cinema uruguaio. É de lá que vem este simples e singelo
Sr. Kaplan, um filme de pessoas que estão em busca de reconhecimento.
O personagem principal é Jacobo Kaplan, 76 anos, que está entediado. Além de ter que lidar com as limitações impostas pela idade, ele sente que não deixou sua marca ainda, aquela pela qual será lembrado pela
eternidade — e isto o incomoda, muito! Quando, por acaso, sua neta comenta sobre um velho alemão que vive isolado em uma praia distante,
Jacobo logo o associa à história de Adolph Eichmann, o criador da logística de extermínio dos judeus durante a Segunda Guerra Mundial que,
após a derrocada de Hitler, se refugiou na Argentina.
Descoberto pelo serviço secreto israelense, ele foi capturado e levado às escondidas para ser julgado. Jacobo quer o mesmo, não propriamente para que o suposto nazista seja punido, mas para que fique registrado na História.
É claro que, quando as investigações começam de fato, há muitas pon-
Cine Uruguai
O
cinema contemporâneo, tão incisivo em atingir corações e men-
96
tas soltas facilmente identificáveis pelo espectador. O esforço de Jacobo
naquela que, talvez, seja a última aventura de sua vida ganha tons obsessivos e esperançosos, especialmente para seu companheiro de investigação, Wilson Contreras, cuja vida é repleta de desilusões. No fundo, o
que ambos querem é valorização, pelo que fazem e o que podem fazer. É
esta a grande jornada empregada pela dupla, que ganha ares de faroeste na reta final. Homenagem explícita ao gênero feita pelo diretor Álva-
Cine Uruguai
ro Brechner, com uma pitada de ironia devido à idade dos envolvidos.
Sr. Kaplan é um filme bem intencionado que prende a atenção, apesar
de muito mais devido às peculiaridades de seus personagens principais
do que propriamente à qualidade da história, que conta com algumas situações mal resolvidas. Interessante pelo tema e aspirações retratadas.
*Texto originalmente publicado no site Adoro Cinema (www.adorocinema.com) e gentilmente cedido pelo autor.
Francisco Russo é crítico de cinema, membro da ACCRJ (Associação de Críticos de Cinema do
Rio de Janeiro) e editor do portal AdoroCinema (www.adorocinema.com).
97
Cine Uruguai
99
Tanta Água
Alysson Oliveira
Coppola — a protagonista é uma jovem descobrindo o amor e
os percalços da vida — mas, nem por isso é uma cópia ou ca-
rece de originalidade ou personalidade. Pelo contrário, as estreantes
Ana Guevara e Leticia Jorge sabem exatamente o tamanho de seu filme
e seus personagens, e com isso criam uma trama delicada sobre o amadurecimento de uma adolescente de 14 anos.
Em Tanta Água chove o tempo todo, mas outra tempestade acontece:
a descarga de hormônios juvenis em Lucía (Malú Chouza), que em companhia do pai, Alberto (Néstor Guzzini), e do irmão pequeno, Federico
(Joaquin Castiglioni), vai passar as férias de verão numa colônia e chove
o tempo todo. Sem poder aproveitar a piscina, a garota começa a explorar o local, faz uma nova amiga, Madelin (Sofia Azambuya), e se encanta
por Santi (Pedro Duarte) — que acaba se tornando o elemento da discórdia entre elas.
Lucía é o foco, e o filme é construído a partir dela investigando suas
relações pessoais com os personagens que a cercam nessa temporada.
Desde o pai meio omisso que tenta se reconectar com os filhos — e também se envolvendo com uma moradora local — até a amizade meio conturbada com Madelin e a paixão que nunca se concretiza, com Santi. Lu-
Cine Uruguai
A
comédia dramática uruguaia Tanta Água tem um quê de Sofia
100
cía é uma menina tímida, um pouco criança ainda, especialmente quando
está perto do irmão, que descobre o mundo e suas possibilidades exatamente nessas férias, quando não tem muito o que fazer.
Transitando entre o humor e a melancolia, as diretoras encontram na
jovem atriz a intérprete ideal para fazer essa personagem tão cheia de
dúvidas e sentimentos à flor da pele, em busca de descobertas e satis-
Cine Uruguai
fações que só a sua idade pode lhe dar.
*Texto originalmente publicado no site Cineweb (www.cineweb.com.br) e gentilmente cedido pelo autor.
Alysson Oliveira é jornalista, e crítico no site Cineweb, no qual cobre cinema para a Agência
Reuters e UOL. Mestre em Letras pela FFLCH-USP, com uma dissertação sobre 11 de setembro,
apocalipse e a obra de Cormac McCarthy, é doutorando na mesma instituição, onde pesquisa sobre as relações entre ficção-científica, utopia e política nas obras de Ursula K. Le Guin
e Kim Stanley Robinson.
101
Cine Uruguai
103
A Vida Útil –
Um Conto de Cinema
Carlos Alberto Mattos
queno conto filosófico sobre o fim de um certo tipo de cinema e
o princípio de um amor. O filme de Federico Veiroj carrega uma
melancolia muito tipicamente uruguaia, sobretudo em sua primeira metade, que se passa nos interiores da Cinemateca de Montevidéu. Muitas
cinematecas latino-americanas têm hoje em dia esse aspecto melancólico, como bichos em extinção. Apesar do letreiro inicial que nega maior
semelhança, é fácil deduzir que a história ficcional não está muito longe da realidade.
No filme, a cinemateca está perdendo sócios e apoio, a ponto de ser
despejada. O quadro é de aluguel em atraso, sessões semivazias, equipamento defasado, programação pouco atraente. Na primeira sequência, o
diretor da cinemateca — ele mesmo, Manuel Martínez Carril — e seu auxiliar
Jorge (vivido pelo crítico Jorge Jellinek) dividem as tarefas de um ciclo de cinema islandês. Depois os veremos em tarefas prosaicas como ler num microfone a tradução dos intertítulos de clássicos mudos, explicar a cineastas as razões da má projeção de seus filmes na sala mal equipada, revisar
cadeiras ruidosas e gravar mensagens pedindo ajuda dos frequentadores.
Jorge é um faz-tudo da cinemateca. Trabalha ali há 25 anos e, pelo visto, ultimamente passa a maior parte do seu tempo andando de lá para cá,
Cine Uruguai
S
ucesso de estima na cinefilia internacional, La Vida Útil é um pe-
104
com seu jeito de Alfred Molina bonachão. Quando a situação da entidade enfim se define, ele sai com sua bolsa em busca de novas aventuras. É
aí que o filme também faz uma inflexão no rumo da comédia romântica.
Nada que se pareça com filmes de George Clooney e Julia Roberts, mas
sim um delicado ensaio de superação que se aproxima mais — e bastante
— dos filmes de Chaplin, Ozu e do neorrealismo italiano.
Esta é a maneira como Federico Veiroj trabalha sua homenagem ao
Cine Uruguai
cinema clássico e ao mesmo tempo faz a crônica do fim de um tipo de
consumo desse mesmo cinema clássico. As cinematecas que resistem
são as que se reinventam, adotam o cinema digital e olham simultaneamente para o passado e o futuro.
Jorge sai da cinemateca para entrar na vida, a vida útil do título, ou
seja lá o que isso for. Caminhando pela cidade em busca de um certo
encontro, ele abandona a contemplação e se torna personagem do seu
próprio filme particular. Pode fingir que é um professor ou improvisarse num Gene Kelly desajeitado. O elogio da mentira, que ele apresenta aos alunos de uma faculdade numa das melhores cenas do filme, é o
elogio da ficção pura e simples, base de toda representação. O crítico se
finge de ator, a cinemateca encena seu próprio declínio, o filme de 2010
assume uma aparência de 1950.
La Vida Útil foi filmado em película colorida e copiado em preto e
branco com uma máscara para ficar com a imagem quadrada como os
filmes de seis décadas atrás. Os créditos foram todos colocados no início para que no final se tenha somente a velha e dura cartela de “Fim”.
Em tudo isso vai um misto de carinho e distanciamento em relação ao
“filme de cinemateca”. No fundo, é como um haikai de rima invertida,
que nos afaga e perturba ao mesmo tempo.
105
Cine Uruguai
*Texto originalmente publicado no site Críticos.com.br (www.criticos.com.br) e gentilmente
cedido pelo autor.
Carlos Alberto Mattos é crítico e pesquisador de cinema, autor ou coautor de sete livros sobre cineastas brasileiros, mantém o blog carmattos.com.
107
Whisky
Marcelo Janot
um tratado sobre a solidão, a decadência e a falta de comunicação entre gente comum como Jacobo, dono de uma velha
fábrica de meias em Montevidéu, e Marta, sua funcionária mais antiga e
aplicada. Prestes a receber a visita do irmão que migrou para o Brasil e
foi bem-sucedido, ele resolve preparar uma farsa para tentar fingir que
sua vida deu certo, e para isso contrata Marta para fingir que é sua mulher. Sem nunca desrespeitar a “farsa nupcial”, ela desenvolve uma contida afeição pelo patrão.
A opção estética dos diretores Juan Pablo Rebella e Pablo Stoll descarta o
caminho fácil da comédia rasgada, e se vale de tons cinzentos e longos planos fixos para melhor traduzir, com pitadas de humor negro, a imobilidade e
melancolia que envolve os personagens. Em diversos aspectos, Whisky remete, sob a perspectiva terceiro-mundista, ao filme Encontros e Desencontros,
de Sofia Coppola. Só que, naquele, os personagens são pessoas bem-sucedidas financeiramente, cujas vidas estão presas às engrenagens do mundo
capitalista, sem que o dinheiro possa comprar a felicidade. Em Whisky, o dinheiro, quando surge ao acaso, traz a felicidade para Jacobo apenas na medida que seu grau de resignação e pragmatismo permite, contrastando com
tudo o que Marta tem dentro de si para colocar pra fora e não pode.
Cine Uruguai
M
elancólico, poético, dramático, mas bem humorado, Whisky é
Cine Uruguai
108
*Texto originalmente publicado no site Críticos.com.br (www.criticos.com.br) e gentilmente
cedido pelo autor.
Marcelo Janot é crítico do jornal O Globo desde 2006, fundador e editor do site Críticos.com.
br e colunista do programa Revista do Cinema Brasileiro. Trabalhou antes no Jornal do Brasil,
O Dia e Tribuna da Imprensa. Foi crítico do canal Telecine Cult durante 8 anos (2006-2013) e
presidiu a Associação de Críticos de Cinema do Rio de Janeiro por dois mandatos. Foi jurado da Fipresci nos festivais de San Sebastian, Rotterdam, Havana, Chicago, Montreal, entre
outros. Ministra regularmente cursos de cinema no Polo do Pensamento Contemporâneo.
109
Cine Uruguai
111
Oficina de
produção executiva
Estudo de caso do Documentário
Tus Padres Volverán
passo, o trabalho de Produção Executiva que se realizou para o
filme documentário Tus Padres Volverán. A intenção é aproxi-
mar o aluno da experiência de produzir um longa-metragem documentário, com base teórica levada à prática. É um estudo de caso do filme,
no qual se analisarão todas as etapas da produção com exemplos da
sua aplicação real, revisando os materiais que foram criados e como
foram usados para produzir o filme. Ao mesmo tempo, se efetuará uma
comparação do processo de produção do filme com a situação atual do
cinema no Uruguai e como trabalham os produtores e diretores para poder fazer cinema num país com um mercado pouco expressivo.
1. Produtor Executivo/Produtor Criativo.
2. Pensar a produção do filme/Rota crítica de produção/Destino da obra.
3. Orçamentos/Percentuais e lucros.
4. Desenvolvimento
5. Pasta do projeto: diagramação e conteúdo (versões).
6. Materiais do projeto: Tema / Logline / Sinopse curta / Sinopse / Motivação / Tratamento (forma/conteúdo/história) / Certificados / Marco
legal / Traduções.
Cine Uruguai
A
oficina apresentada na mostra Cine Uruguai analisa, passo a
112
7. Pitching do projeto.
8. Oficinas para desenvolvimento: roteiro/produção/direção.
9. Fundos (como aplicar, por que, o que se consegue): desenvolvimento/
produção/finalização.
10. Coprodução: coproduzir ou não coproduzir. Vantagens e desvantagens.
11. Etapas da produção: tempos e rotas recomendáveis.
12. Equipe de trabalho para documentário.
Cine Uruguai
13. Equipamento de filmagem para documentário: filmar no país e filmar
no estrangeiro.
14. Finalização: edição/pós-produção/cor/som/cópias master.
15. Campanhas de Promoção/Campanha social/Equipe de trabalho/Estratégias.
16. Distribuição no Uruguai: salas, percentuais, bilheteria.
Esta oficina dá uma experiência muito rica, fundamentalmente, porque
a partir da teoria irão se ver aplicações reais de como a pasta do projeto e todos os seus documentos são espelho do filme. Com muito esforço e trabalho prévio à etapa de filmagem pode-se alcançar o filme desejado. É uma oficina destinada a estudantes de cinema, jornalismo de
investigação e para profissionais que desejam saber sobre a produção
executiva de um filme uruguaio e queiram compará-lo com as suas experiências pessoais.
Sobre o Docente Pablo Martínez Pessi:
É um realizador e produtor executivo uruguaio, diplomado em Comunicação Audiovisual na Universidade ORT Uruguai. Ganhou bolsa pela
Fundação Carolina para o “Curso de desenvolvimento de projetos ibero-americanos” de elaboração de roteiro. Também recebeu bolsa de es-
113
tudo de Produção Executiva em Morelia Lab e em EICTV. Participou em
diferentes foros de coprodução e assessorias internacionais de projetos
cinematográficos. Desde o ano 2006, desenvolve projetos na Gabinete
filmes, onde trabalha como diretor, produtor e editor. Lecionou “Montagem Cinematográfica” na Universidade de Montevidéu, na Escola de Cinema do Uruguai e na Faculdade de Comunicações da Universidade ORT
Uruguai. No ano 2009, estreou a seu primeiro filme, Desde las Aguas,
melhor documentário do Uruguai no ATLANTIDOC 2009. Dirigiu o documentários Semillitas (2006), Guarino (2007) e os curtas de ficção Besos
en la Boca (2009), Los Aviones (2008) e Palabras Cruzadas (2005). É diretor e produtor de Tus Padres Volverán (Documentário, 80 min, 2015).
Mais informações:
Data: 20 de agosto, sábado, às 14h
Local: CAIXA Cultural/RJ – Cinema 1, Av. Almirante Barroso, 25, Centro.
Telefone: (21) 3980-3815
Os interessados devem se inscrever através do e-mail: [email protected]
No corpo da mensagem deve ser informado o nome completo, número do RG, mais telefones para contato. Anexar currículo. As vagas são limitadas. As inscrições são por análise dos
currículos.
Será preciso aguardar uma resposta de confirmação por parte da produção.
As vagas são válidas até 15 minutos após o início do encontro. A pessoa inscrita que ultrapassar esse tempo de tolerância perderá a vaga. Ao final, será entregue um certificado de
participação.
A produção recomenda que os inscritos cheguem meia hora antes do início e se dirijam para
o Cinema 1.
Cine Uruguai
mentário de média-metragem Normal (2012), os curta-metragens docu-
Sinopses e
Fichas Técnicas
115
Uruguai, 1923
Direção Juan Antonio Borges
Com Luisa Von Thielmann, Remigio Guichón e Carlos Russi
Duração 60 min
Sinopse Mulher vive com seu filho na costa de Montevidéu. Ela sofre de tuberculose e somente uma temporada no hospital pode salvá-la. Primeiro filme de longa-metragem uruguaio. Raridade que foi dada como perdida após um incêndio e
restaurada pela Cinemateca.
Classificação indicativa 14 anos
ANINA
Colômbia/Uruguai, 2013
Direção Alfredo Soderguit
Duração 80 min
Sinopse Anina estuda em uma escola primária de Montevidéu. Num dia, ela briga
com uma colega e recebe uma suspensão. Durante esse período, a menina comenta
a sua vida: os pais, seus sentimentos, alegrias e medos. Prêmio do Público no BAFICI.
Classificação indicativa Livre
Cine Uruguai
ALMAS DE LA COSTA
116
O BANHEIRO DO PAPA (El Baño del Papa)
Brasil/França/Uruguai, 2007
Direção César Charlone e Enrique Fernandéz
Com César Troncoso, Virginia Méndez e Mario Silva
Duração 97 min
Sinopse Na fronteira entre o Brasil e o Uruguai, uma cidade está agitada devido à
visita do Papa. Milhares de turistas são esperados, o que anima a população local,
que vê no evento uma oportunidade para ganhar dinheiro. Seleção Oficial de Can-
Cine Uruguai
nes – Mostra Um Certo Olhar.
Classificação indicativa 14 anos
A CASA (La Casa Muda)
Uruguai, 2010
Direção Gustavo Hernández
Com Florencia Colucci, Abel Tripaldi e Gustavo Alonso
Duração 86 min
Sinopse Laura e seu pai chegam a uma casa de campo numa área remota a fim de
repará-la, uma vez que o seu proprietário irá colocar o local à venda. Tudo parece
ir bem até Laura ouvir um som que vem do exterior, e que fica cada vez mais alto
no andar superior da casa. Rodado com apenas 6 mil dólares, o filme teve os direitos comprados em Hollywood que produziu um remake em inglês intitulado A
Casa Silenciosa (2011). Seleção Oficial de Cannes.
Classificação indicativa 18 anos
CLEVER
Uruguai, 2015
Direção Federico Borgia e Guilhermo Madeiro
Com Santiago Agüero, Horacio Camandule e Soledad Frugone
Duração 83 min
Sinopse Clever é um instrutor de artes marciais, divorciado e pai. Obcecado com
alguns efeitos especiais, ele decide viajar para uma aldeia para encontrar um ar-
117
tista. Mas, ao longo do caminho, personagens excêntricos e misteriosos irão levá-lo a um destino inesperado. Vencedor do Festival Cine Ceará 2016.
Classificação indicativa 16 anos
EL CASAMIENTO
Uruguai, 2011
Direção Aldo Garay
Duração 71 min
Sinopse Documentário que narra a história de amor entre uma transexual e um
do Festival de Cinema de Gramado.
Classificação indicativa 16 anos
EL DIRIGIBLE
Cuba/EUA/França/Itália/México/Reino Unido/Uruguai, 1994
Direção Pablo Dotta
Com Ricardo Espalter, Laura Schneider e Marcelo Buquet
Duração 80 min
Sinopse Uma jovem jornalista francesa convoca a imprensa anunciando o regresso, depois de anos de exílio, do famoso escritor Juan Carlos Onetti, mas as imagens de sua chegada desapareceram. O Graf Zeppelin sobrevoa a cidade envolvendo os personagens numa inquietante intriga. Produção mais cara da história do
cinema uruguaio, cerca de 1 milhão de dólares. Seleção Oficial de Cannes.
Classificação indicativa 14 anos
EL PADRE DE GARDEL
Uruguai, 2013
Direção Ricardo Casas
Duração 78 min
Sinopse Documentário que gira em torno de uma investigação sobre a nacionalidade de Carlos Gardel. O fio narrativo tem como centro as relações de parentesco
Cine Uruguai
pedreiro que se encontraram no Natal e estão casados há 21 anos. Seleção Oficial
118
com o coronel Carlos Escayola. Uma história secreta por décadas. Seleção Oficial
do Festival de Cine de Mar Del Plata.
Classificação indicativa 14 anos
GIGANTE
Alemanha/Argentina/Espanha/Holanda/Uruguai, 2009
Direção Adrián Biniez
Com Horacio Camandule, Leonor Svarcas e Ignacio Alcuri
Cine Uruguai
Duração 84 min
Sinopse Jara é um tímido segurança de supermercado que descobre Julia pelas
câmeras de vigilância. Ela trabalha como faxineira no local e passa a ser acompanhada por Jara. Apaixonado por ela, o segurança passa a conduzir sua vida em torno do desejo em conhecê-la. Grande Prêmio do Júri no Festival de Berlim.
Classificação indicativa 14 anos
OS INIMIGOS DA DOR (Los Enemigos Del Dolor)
Brasil/Uruguai, 2014
Direção Arauco Hernández Holz
Com Pedro Dalton, Lucio Hernández e Felix Marchand
Duração 80 min
Sinopse Em visita a Montevidéu, um ator alemão acaba se perdendo na cidade e se
choca com um grupo de jovens que tenta roubá-lo. Então, ele encontra um ex-viciado que o ajuda e dá a ele um lugar para ficar. Seleção Oficial do Festival de Locarno.
Classificação indicativa 14 anos
MARACANÃ (Maracaná)
Brasil/Uruguai, 2014
Direção Sebástian Bednarik e Andrés Varela
Duração 75 min
Sinopse Em 1950, cinco anos após o fim da Segunda Guerra Mundial, o Brasil é a
sede da Copa do Mundo de Futebol. Toda a nação brasileira anseia pela vitória.
119
Entretanto, minutos antes do fim da última partida, o capitão da equipe uruguaia
destrói a esperança dos brasileiros. Seleção Oficial do CINEfoot.
Classificação indicativa 14 anos
MATARON A VENANCIO FLORES
Uruguai, 1982
Direção Juan Carlos Rodríguez Castro
Com Dante Alfonso, Roberto Fontana e Antonio Cruz
Duração 91 min
sassinato do General Venancio Flores, então Presidente da República, e integrante do Partido Colorado. Após alguns anos sem longas-metragens, a Cinemateca
uruguaia resolveu apoiar e produzir um filme que conta com mensagens indiretas
sobre a Ditadura.
Classificação indicativa 16 anos
MUJICA, O PODER ESTÁ NO CORAÇÃO (Je Suis José Mujica, Le pouvoir
est dans le coeur)
França/Uruguai, 2013
Direção Lucía Wainberg-Sasson
Duração 52 min
Sinopse Uma viagem poética ao coração do poder. Documentário que captura a
política de outra forma: um olhar sensível para o futuro da democracia através de
um perfil do revolucionário Mujica. Uma entrevista pessoal, íntima, se transforma
em uma mensagem universal sobre o futuro. O projeto tem inspiração no texto da
autora Hannah Arendt, A política ainda faz sentido?.
Classificação indicativa 12 anos
REUS
Brasil/Uruguai, 2010
Direção Alejandro Pi e Eduardo Piñeiro
Cine Uruguai
Sinopse Historicamente, o filme reconstitui fevereiro de 1868, quando houve o as-
120
Com Alberto Acosta, Camilo Parodi e Juan Ignacio Pita
Duração 90 min
Sinopse No mítico bairro de Reus, duas famílias brigam pelo poder nas ruas, tornando quase insustentável a situação de moradores vizinhos. Na trama, uma morte e a nova droga do momento quebram os velhos códigos de ética do bairro. Seleção Oficial do Festival de Cine Del Cornubano.
Classificação indicativa 16 anos
Cine Uruguai
SR. KAPLAN (Mr. Kaplan)
Alemanha/Espanha/Uruguai, 2014
Direção Álvaro Brechner
Com Héctor Noguera, Néstor Guzzini e Rolf Becker
Duração 98 min
Sinopse Jacobo está cansado da rotina. Ansioso em fazer algo pelo qual será lembrado, ele fica com a pulga atrás da orelha após sua neta lhe contar que conhece
um alemão que tem o apelido de “nazista”. Impulsionado pela história, ele acredita que o alemão é um foragido do exército de Hitler e parte com a intenção de
capturá-lo. Prêmio de Melhor Roteiro no Festival de Huelva.
Classificação indicativa 12 anos
TANTA ÁGUA (Tanta Agua)
Alemanha/Holanda/México/Uruguai, 2013
Direção Ana Guevara Pose e Leticia Jorge Romero
Com Néstor Guzzini, Malú Chouza e Joaquín Castiglioni
Duração 102 min
Sinopse Nas férias de verão, Alberto planeja uma viagem com seus dois filhos,
com os quais não convive desde que se separou da mãe deles. Mas, ao chegar ao
local escolhido, chove sem parar e eles têm de encontrar outras formas de diversão. Grande Prêmio do Júri no Festival de Miami.
Classificação indicativa 14 anos
121
TUS PADRES VOLVERÁN
Uruguai, 2015
Direção Pablo Martínez Pessi
Duração 80 min
Sinopse Em 1983, dois anos antes do fim da ditadura uruguaia, chega a Montevidéu um avião repleto de crianças, filhas de exilados políticos, enviados pelos pais
para conhecer seus familiares. Seis deles falam da importância do episódio. Seleção Oficial do Festival É Tudo Verdade/ It´s All True.
Classificação indicativa 12 anos
Argentina/Uruguai, 2014
Direção Germán Tejeira
Duração 78 min
Sinopse Durante a véspera de Ano Novo, três personagens solitários viajam para
uma cidade perdida no interior do Uruguai: um homem que quer recuperar o
amor; um mágico; e um músico. Todos terão a chance de mudar o destino em uma
noite mágica. Melhor Filme no Festival de Zurique.
Classificação indicativa Livre
A Vida Útil – Um Conto de Cinema (La Vida Útil)
Espanha/Uruguai, 2010
Direção Federico Veiroj
Com Jorge Jellinek, Manuel Martinez Carril e Paola Venditto
Duração 67 min
Sinopse Jorge tem 45 anos de idade e ainda vive com seus pais. Nos últimos 25
anos de sua vida, ele trabalha no departamento de arquivos da Cinemateca de
Montevidéu. A partir de então, ele busca uma forma de alterar seu modo de vida
a fim de se adaptar a um novo mundo que surge à sua frente. Prêmio Especial do
Júri no Festival de Istambul.
Classificação indicativa 12 anos
Cine Uruguai
UNA NOCHE SIN LUNA
122
WHISKY
Alemanha/Argentina/Espanha/Uruguai, 2004
Direção Pablo Stoll e Juan Pablo Rebella
Com Andrés Pazos, Mirella Pascual e Jorge Bolani
Duração 99 min
Sinopse Em Montevidéu, Jacobo vive sozinho desde a morte de sua mãe. Até um
dia, no qual seu irmão avisa que irá visitá-lo para participar de uma celebração
judaica. A visita desperta a velha competição entre os irmãos, que faz com que ele
Cine Uruguai
peça a uma amiga para que seja sua esposa de mentira. O filme mais aclamado
por crítica e público dos últimos 20 anos no cinema uruguaio. Prêmio da Crítica
Internacional no Festival de Cannes.
Classificação indicativa 14 anos
123
Cine Uruguai
124
Agradecimentos
Adriana Gaspar
Maria Monteiro
Beto Rodrigues
Ministro Oscar Demaria e José Luis
Doldan - Consulado Geral do Uruguai
no Rio de Janeiro
Bibiana Osório
Bruno Martins
Caio
Cine Uruguai
Carlos Pereyra - Dirección del Cine y
Audiovisual Nacional - ICAU
Carol Prado
Catia Muller
Célio Faria
Cid Nader
Elias Oliveira
Emídia Maria
Fábio Andrade
Fernando Oriente
Folha de São Paulo
Francisco Vervloet
Fred
Gabi Moscardini
Gazú Media
Hugo Casarini
Jean Thomas Bernardini
Leonor Araújo
Lucia Labrada
Lucía Wainberg Sasson
Marcus Mello
Pablo Dotta
Soledad Martínez - Ministério de
Relações Exteriores - Uruguai
Tamy
Tatiana Sager
Thaísa Zanardi
125
Créditos
idealização Mariana Bezerra
coordenação geral Claudia Oliveira & Mariana Bezerra
curadoria Tamy
produção executiva Breno Lira Gomes
Assistente de curadoria Leonardo Luiz Ferreira
assistente de produção Daniela Barbosa
web designer Fernando Alvarez
marketing Daniela Barbosa
monitoria Yasmin Cavalcanti & Urion Castilho
alimentação Silvia Nascimento
coordenação editorial & revisão Leonardo Luiz Ferreira
projeto gráfico Guilherme Lopes Moura
vinheta Fernanda Teixeira
assessoria de imprensa Claudia Oliveira
registro fotográfico Miguel Pinheiro
9 a 21 de agosto de 2016
CAIXA Cultural Rio de Janeiro
Cinema 1
Av. Almirante Barroso, 25, Centro
www.caixacultural.gov.br
Baixe o aplicativo CAIXA Cultural
facebook.com/CaixaCulturalRioDeJaneiro
Tel: 21 3980-3815
R$ 4,00 (inteira) e R$ 2,00 (meia entrada)
www.cineuruguai.com.br
www.facebook.com/cineuruguai
Alvará de Funcionamento da CAIXA Cultural RJ: nº 041667, de 31/03/2009, sem vencimento.
Cine Uruguai
coordenação de redes sociais Gabi Moscardini
Cine Uruguai
126
127
Cine Uruguai
Cine Uruguai
128
Este catálogo foi composto com as famílias tipográficas Fira Sans e
Rockwell, o miolo foi impresso em papel couché matte 150g/m2, e
a capa em papel Supremo Duo Design 300g/m2 na Gráfica Stamppa.
ISBN 978-85-66110-26-5
realização
patrocínio

Documentos relacionados