Luis CLáuDio Da siLva ChavEs
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Luis CLáuDio Da siLva ChavEs
2º semestre de 2009 Editora Del Rey | Ano XI | Edição 22 Direito Civil Primeiras considerações sobre a recente reforma na lei de Locações de Imóveis Urbanos Leonardo de Faria Beraldo Filosofia do Direito A Resolução número 75 do CNJ e a importância da Filosofia do Direito Fernando Armando Ribeiro Direito Constitucional Nosso Distrito Federal é mesmo Federal? Ricardo Arnaldo Malheiros Fiuza Crônica O Estado é laico? João Baptista Villela Ensino Jurídico Direito e Literatura Paulo Roberto Gouvêa Medina www.livrariadelrey.com.br Entrevista com o advogado Luis Cláudio da Silva Chaves Presidente da Seção de Minas Gerais da Ordem dos Advogados do Brasil. EDITORIAL Cláudia Cunha A riqueza dos temas desta Revista Arnaldo Oliveira Continuando em sua missão divulgadora da Ciência Jurídica, a Livraria e Editora Del Rey tem o prazer de entregar a seus clientes, amigos e colaboradores – todos a exercerem seus misteres no campo do Direito – mais uma edição de sua revista “Del Rey Jurídica”, já consagrada no Brasil e em Portugal. Esta Edição 22, correspondente ao 2° semestre de 2009, vem plena de importantes artigos sobre temas do momento, como a situação esdrúxula do nosso Distrito Federal; a nova Lei do Mandado de Segurança, a suscitar críticas; a nova Lei de Locações de Imóveis Urbanos, com suas novidades; a importância da Filosofia do Direito para os operadores do Direito; o estudo instigante sobre a SAP – Síndrome da Alienação Parental; a “Guerra Justa” do Presidente Obama; os novos Juizados Especiais da Fazenda Pública estadual e municipal; o tópico da extradição e o papel do STF; e diversos outros temas de atual interesse. As colunas especiais “Crônica” e “Ensino Jurídico” dão, como sempre o toque literário a esta edição. Por último, mas não por menos, destaca-se a matéria de capa: a entrevista com o novo Presidente da OAB-MG, professor Luis Cláudio da Silva Chaves, versando sobre assuntos tais como a importância da advocacia preventiva, a defesa das prerrogativas do advogado, o combate geral à corrupção e o necessário entrosamento construtivo da Ordem com os órgãos do Poder estatal. Com relação à OAB-MG, a Del Rey pretende trabalhar em conjunto com esse prestigioso órgão de classe, por meio da realização de palestras, seminários e a publicação de obras jurídicas, começando com a edição do livreto “Direito, Cidadania, Ética”, com uma tiragem de 100 mil exemplares, a serem distribuídos em todas as faculdades de Direito, aos advogados e estagiários. Essa publicação contém a famosa “Oração aos Moços”, de Rui Barbosa, o artigo “A importância do bacharel em Direito”, do professor Ricardo Arnaldo Malheiros Fiuza, o “Código de Ética e Disciplina da OAB” e “Os 10 Mandamentos do Advogado”, notável e sucinto texto de Couture. Belo Horizonte, dezembro de 2009. Diretor-Presidente e Fundador da Livraria e Editora Del Rey. Editorial Arnaldo Oliveira Diretor-Presidente da Livraria e Editora Del Rey 3 SUMÁRIO EDITORIAL 3 ENTREVISTA 5 A riqueza dos temas desta revista Arnaldo Oliveira Luis Cláudio da Silva Chaves Presidente da OAB-MG DIREITO DE FAMÍLIA 38 Da relativização da Coisa Julgada nas Ações de investigação de Paternidade Carolina da Cunha Pereira França Magalhães DIREITO DO CONSUMIDOR 42 DIREITO CONSTITUCIONAL 10 Banco de dados – Atraso no cancelamento de restrições – Prazo – Relação de Consumo – Cancelar quem deve Edelberto Gomes Lima DIREITO CONSTITUCIONAL 14 O direito e os limites do ex-empregado ao plano de saúde Marlus Keller Riani DIREITO PÚBLICO 16 Juizados Especiais da Fazenda Pública Dalmar Pimenta Nosso Distrito Federal é mesmo Federal? Ricardo Arnaldo Malheiros Fiuza A nova Lei do Mandado de Segurança: Retrocessos Zênia Cernov Ao Estado tudo, aos Cidadãos o rigor da lei! Rodrigo Badaró de Castro DIREITO PENAL 18 Considerações acerca dos crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores descritos na Lei n° 9.613, de 03 de março de 1998. Geraldo Vieira DIREITO INTERNACIONAL 20 A doutrina Obama da “Guerra Justa” André Bandeira DIREITO INTERNACIONAL 22 A extradição e seu controle pelo STF Carlos Velloso DIREITO DO CONSUMIDOR 44 DIREITO PROCESSUAL 46 DIREITO JUDICIÁRIO 48 Mutirões do Judiciário José Fernandes Filho DIREITO EMPRESARIAL 50 Nome empresarial, nome de domínio, título de estabelecimento e marca: Contribuições doutrinárias e jurisprudenciais Rodrigo Bernardes Braga DIREITO TRIBUTÁRIO INTERNACIONAL 54 Brazilian Law and the Internationalization of law as positive factors for foreign and domestic investment João Dácio Rolim DIREITO TRIBUTÁRIO 56 DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 24 Incidência de PIS e Cofins sobre receitas decorrentes do pagamento de juros sobre capital próprio Flávio de Sá Munhoz DIREITO CIVIL 26 A resolução número 75 do CNJ e a importância da Filosofia do Direito Fernando J. Armando Ribeiro DIREITO AMBIENTAL 30 O Estado é laico: abaixo os impostos! João Baptista Villela Os princípios jurídicos na fase de execução trabalhista e a busca pela efetividade do direito material Davidson Malacco Ferreira Primeiras considerações sobre a recente reforma na Lei de Locações de Imóveis Urbanos (Lei. Nº 12/112/2009) Leonardo de Faria Beraldo Autonomia do Direito Ambiental Célia Pimenta Barroso Pitchon DIREITO AUTORAL 32 A nova roupagem do plágio em face das inovações tecnológicas Arnaldo Oliveira Junior FILOSOFIA DO DIREITO 60 CRÔNICA 62 ENSINO JURÍDICO 64 Direito e Literatura Paulo Roberto de Gouvêa Medina DIREITO DE FAMÍLIA 36 Quero te amar, mas não devo: A síndrome da alienação parental como elemento fomentador das famílias compostas por crianças órfãs de pais vivos Ana Surany Martins Costa Del Rey Jurídica, Ano 11, nº 22 | Produzida pela Editora Del Rey | ISSN:1981-7649 | Diretor-Presidente: Arnaldo Oliveira| Direção Cultural e Científica: Carlos Alberto Penna | Editor: Ricardo Arnaldo Malheiros Fiuza MG 01874 JP | Editora Assistente: Waneska Diniz | Coordenadora Editorial: Letícia Neves Redação: Av. do Contorno, 4355, Funcionários, Belo Horizonte, MG, Tel.: (31) 3284-5845, [email protected] | Publicidade: (31) 3245-4665 | (31) 3213-1484, [email protected], [email protected] | Projeto Gráfico e Diagramação: CYB - Corrêa Y Barra Comunicação | Foto: Assessoria OAB - MG | Tiragem: 30 mil exemplares | Auditada por: Krypton Consulting. 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Editora Del Rey São Paulo | Rua Humaitá, 569 | Bela Vista | 01321-010 | São Paulo, SP | (11) 3101 9775 | [email protected] 4 Revista Del Rey Jurídica ENTREVISTA Luis Cláudio da Silva Chaves Foto: Assessoria OAB - MG A IMPORTÂNCIA DA ADVOCACIA PREVENTIVA O advogado Luis Cláudio da Silva Chaves é o novo presidente da Seção de Minas Gerais da Ordem dos Advogados do Brasil.Eleito em 21 de novembro deste ano de 2009, chegou ao cargo após brilhante carreira na administração da entidade, onde fundou e foi o primeiro presidente da Comissão OAB Jovem e atuou como tesoureiro e vice-presidente na diretoria. Além de advogado militante ele também se dedica ao magistério, lecionando na Faculdade Milton Campos e Entrevista na Faculdade Dom Helder. Nesta entrevista, concedida aos jornalistas Luiz Carlos Bernardes, Orlando Leite e Daniel Tolentino, especialmente para a revista “Del Rey Jurídica”, ele fala sobre os planos de sua diretoria para a gestão dos próximos três anos e aborda aspectos importantes das atividades de defesa da cidadania e do Estado Democrático de Direito, histórica vocação de entidade. 5 Del Rey Jurídica – Quais as principais metas de seu programa de trabalho à frente da OAB/MG? Luis Cláudio – Nossa conduta à frente da OAB será a de lutar pela defesa das prerrogativas da advocacia, com o entendimento de que elas constituem elemento fundamental para o Estado Democrático de Direito. Somente um advogado autônomo e independente poderá defender o seu cliente, em juízo ou fora dele, de forma a atender o direito de defesa e de ação. De outro lado, nosso compromisso é também o da defesa da cidadania, lutando pelo cumprimento da Constituição da República, pelo aperfeiçoamento da legislação, especialmente a processual, pela melhoria da prestação jurisdicional em todo o Estado de Minas Gerais e nas grandes campanhas de mobilização em prol dos movimentos sociais, de combate às drogas, da diminuição da violência urbana, do resgate do respeito e da moralidade administrativa. Essas são nossas metas fundamentais. DRJ – Há alguma campanha em vista, em parceria com outras entidades da sociedade civil, de combate à corrupção? LC – Nosso objetivo, especialmente neste ano de 2010, é o de fazer uma campanha de conscientização da importância do voto e da busca da referência ao currículo do candidato. Já que não é ainda cabível o uso de uma legislação sobre o candidato chamado “ficha suja”, é importante que o eleitor saiba quem é o cidadão que pretende ser eleito, qual o seu passado, qual a sua especialização e o que ele poderá fazer em prol da coletividade e não a favor de seus interesses individuais. Essa campanha já está estruturada para ser veiculada na mídia a partir do mês de junho próximo, em parceria com a CNBB e outras entidades que nos ajudem a fazer a veiculação, principalmente as entidades ligadas à imprensa. DRJ – Na eleição passada, o TRE de Minas divulgou a lista dos “ficha limpa” e dos “ficha suja”. Uma ação idêntica poderia ser adotada pela OAB? LC – O caminho que temos que adotar é o de mostrar a importância da adoção de medidas preventivas pela sociedade, seja para a solução dos conflitos pessoais, que é o papel do advogado, seja na solução dos conflitos sociais, políticos e econômicos. Se eu moro em um condomínio e lá existe um regimento interno bem elaborado, a possibilidade de haver conflitos é muito menor. Isso nós queremos mostrar à sociedade, destacando a importância da advocacia preventiva, o cidadão procurando o advogado para fazer sua consulta, intensificar o acesso ao advogado pacificador. Por exemplo, quantas pessoas no Brasil fazem testamento? 6 Quantas fazem pactos antenupciais antes de casar? Muito poucas. As pessoas só procuram o advogado depois que o conflito está armado. Isso aumenta muito o número de demandas judiciais. Queremos mostrar o advogado como agente preventivo dos litígios. E isso vale também para o plano político e econômico, pois, a partir do momento em que o cidadão perquirir quem é o candidato a cargo eletivo, se ele responde a processo, se tem histórico de improbidade administrativa, ele pode deixar de votar nele e escolher outro que tenha conduta ilibada. Isso vai refletir em benefício para a nação. DRJ – Além dessa participação na formação do cidadão no que diz respeito à escolha de seus candidatos, de que outra forma a entidade pode ajudar na formação do cidadão para que ele tenha maior consciência de seus direitos? LC – Estamos estudando um projeto através da Comissão OAB/Jovem, que se chama “A OAB vai à escola”, com o objetivo de formar o cidadão do futuro, explicitando especialmente o estudo da Constituição da República, do Direito Constitucional de uma forma mais moderna, para alunos do ensino fundamental e médio. Para isso a OAB Jovem irá trabalhar em conjunto com a Comissão de Direito Constitucional para que possamos ensinar à nossa juventude, não só a importância de conhecer seus direitos, mas também a de cumprir seus deveres como cidadão. Hoje o cidadão brasileiro já entrou na era do direito, mas ainda não incorporou a era dos deveres. Exemplo: todos clamam por um meio ambiente mais saudável, mas a população continua jogando lixo no rio, entupindo os bueiros, jogando o copinho de plástico na rua, no mar. Então ele já está ciente dos direitos que a Constituição lhe deu, mas não tem ainda a visão cidadã de seu dever em relação ao outro. Não precisaríamos de tantas leis restringindo o fumo se todos tivessem respeito ao próximo. O Brasil tem um excesso de leis exatamente porque o brasileiro só respeita efetivamente o que se torna preceito e sanção. DRJ – A Ordem tem realizado, em anos eleitorais, debates com os candidatos, além de instalar a Ouvidoria Eleitoral. O senhor pretende continuar com esse programa? LC – Sim, nosso objetivo é o de intensificar os debates, projetando-os na mídia e cobrando dos candidatos o cumprimento das promessas de campanha, além de campanhas propositivas, transparência na utilização dos recursos financeiros. A meu ver, Minas tem que ser Revista Del Rey Jurídica ENTREVISTA Luis Cláudio da Silva Chaves DRJ – Entre suas metas apresentadas durante a campanha para a eleição na Ordem, o senhor propunha uma gestão participativa, com o advogado mais presente na instituição. Em razão disso foram criadas várias Comissões. Qual a importância dessas Comissões? LC – A administração da OAB, para ser atuante e eficiente, deve ser participativa e contar com o trabalho de inúmeros colegas voluntários que nos ajudem a defender as prerrogativas da advocacia e a cumprir nossos compromissos de campanha. No campo da prerrogativa, por exemplo, nosso objetivo é, além de ampliar o “Disque Prerrogativa”, distribuir uma “Cartilha das Prerrogativas” para todos os advogados mineiros e para as autoridades judiciárias, fazer grandes congressos sobre o assunto, e instalar postos avançados de defesa das prerrogativas em todo o estado de Minas Gerais, contando com mais de 300 companheiros que vão nos auxiliar nesse trabalho, todos eles especialistas na área criminal. O objetivo é o de que possamos equiparar o arsenal do Tribunal de Ética e Disciplina com o de defesa das prerrogativas. Sabemos da importância da ética dentro da OAB, mas não podemos utilizar mais recursos para defender a ética do que para defender as prerrogativas. Temos que empatar essas contas. Outras Comissões importantes também vão receber a mesma atenção, como a de Direitos Humanos. É inconcebível que a OAB não tenha uma participação ativa na luta pelos Direitos Humanos, que não se refere apenas ao direito da vítima. O que se busca com os Direitos Humanos é o cumprimento da Constituição no que se refere à dignidade da pessoa humana, qualquer que seja o ponto do conflito em que a pessoa estiver. Temos que defender o Estado Democrático de Direito e lutar por Entrevista um Judiciário eficiente, para banir qualquer ideia de impunidade e de autotutela. DRJ – O que pode ser feito para termos um Judiciário eficiente? LC – Vamos analisar uma situação prática: o Legislativo cria determinado número de comarcas no Interior do estado. Grande parte dessas comarcas não são instaladas por falta de recursos materiais e humanos. Então para que serve uma Lei de Organização Judiciária que cria Varas e abre vagas para juízes, se o Executivo e o Judiciário não se obrigam a instalar esses postos? Temos hoje em Minas várias comarcas que estão sem juízes. E uma comunidade que não tem um juiz acaba virando uma terra sem lei, pois o aplicador da lei é o magistrado. Assim, um cidadão, por exemplo, se acha no direito de sustar, sem qualquer motivo, um cheque de sua emissão porque sabe que não há ninguém para executálo. Ou acha que pode agredir sua mulher por saber que não haverá consequência. Então a ideia de uma sociedade sem uma estruturação forte do Judiciário, mostra ser uma sociedade desorganizada. Também se percebe, com frequência, a ausência de Defensores Públicos e a utilização de defensores dativos. São necessários investimentos maciços no Judiciário para que se possa obrigá-lo a cumprir a Lei de Organização Judiciária. Foto: Assessoria OAB - MG exemplo para o país e temos a percepção de que a eleição federal deste ano, necessariamente irá passar, com grande importância, pelo eleitorado mineiro. DRJ – Como será o trabalho de criação de novas Subseções da OAB no Interior, especialmente nas cidades menores? LC – Sou a favor da criação de Subseções porque o trabalho dos diretores da Ordem é voluntário, não remunerado, e onde houver pessoas bem intencionadas e interessadas em executar o trabalho de defesa da cidadania 7 ENTREVISTA Luis Cláudio da Silva Chaves e das prerrogativas dos advogados, temos que dar ênfase à criação dessas unidades. Existindo o número mínimo de 15 advogados, adimplentes com a OAB, e havendo sede de comarca na cidade, vamos criar Subseções. Basta haver um pedido dos interessados para compor a diretoria. custos. A não instalação desse Tribunal revela um aspecto muito ruim: a União não tem interesse em celeridade nos tribunais federais porque ela, na maior parte das vezes, é a ré nos processos. O poder público é o maior demandista na Justiça brasileira. DRJ – Como será a parceria entre a OAB de Minas e a OAB federal? LC – O Conselho Federal da Ordem deveria responder com mais empenho aos pedidos dos advogados por um acompanhamento legislativo que impedisse a aprovação de algumas leis que não só atrapalham o advogado como a rotina forense. Exemplo: a extinção das férias coletivas do Judiciário e a criação dos Juizados Especiais Cíveis, no que se refere à dispensa do advogado nas causas de valor até 20 salários mínimos. A primeira delas desorganizou todo o sistema de férias forenses. Hoje é muito difícil haver julgamento nas Câmaras dos Tribunais que dependam do número completo de desembargadores. Os magistrados têm 60 dias de férias por ano e, geralmente, tiram essas férias fora do período de recesso do fim do ano, do dia 20 de dezembro a 6 de janeiro. O advogado tem então que se contentar apenas com esse breve recesso entre o Natal e o Ano Novo, que sabemos que é um período muito conturbado para se descansar. E depois, durante o ano, ao executar o seu trabalho, pressionado por seu cliente que quer celeridade, ele vê seu julgamento prejudicado pela ausência do juiz, ou do promotor, ou do defensor. A solução é a adoção de férias coletivas durante o mês de janeiro para todos, correndo apenas os processos de urgência que são solucionados pelos plantões. No que se refere aos Juizados Especiais, criou-se a legislação como um desafogo do Judiciário, dispensando-se o advogado. Como resultado, vemos que os Juizados estão congestionados e o cidadão vai sem advogado e, muitas vezes, fica prejudicado por fazer um acordo muito aquém de seus direitos, o que desmerece a ideia que defendemos de que a assistência judiciária deve ser garantida pelo Estado a todos os cidadãos. DRJ – No recente episódio envolvendo o Legislativo e o Executivo do Distrito Federal, o Judiciário poderia intervir de alguma forma para que os fatos divulgados sejam discutidos e julgados? LC – O Judiciário pode ser chamado a intervir através de uma ação de improbidade administrativa, na qual os envolvidos teriam o seu direito de defesa. No que se refere ao impeachment, por força da Constituição, o assunto está entregue ao Legislativo local. O que a OAB pode fazer e tem feito é campanha pela mobilização popular para pressionar os políticos. O episódio do afastamento do presidente Collor é emblemático. DRJ – Uma das prioridades da OAB/MG é a continuação da luta pela instalação de um Tribunal Regional Federal em Minas. Isso irá colaborar para aumentar a celeridade da Justiça Federal no estado? LC – Sem dúvida. Minas Gerais já merece há muito tempo a instalação de um TRF. Grande parte dos processos que tramitam no Tribunal da 1ª Região é oriunda de Minas. É uma questão não só de celeridade como de redução de 8 DRJ – Como o senhor encara o estabelecimento de parcerias entre a Ordem e empresas privadas ou entidades públicas? LC - É importante salientar que a OAB, apesar de ter um papel de defesa da cidadania, não recebe nenhuma verba pública. Sobrevive exclusivamente com as anuidades pagas pelos advogados. Mas ela tem a obrigação de, não só ser uma entidade de natureza corporativista, mas assume um compromisso bem maior que é o da defesa da cidadania. Para melhor cumprir esse compromisso ela necessita fazer parcerias que resultem em recursos materiais de modo a permitir que ela se manifeste publicamente. Por essa razão buscamos parceiros na iniciativa privada ou pública, desde que os parceiros tenham o mesmo compromisso que temos com a coletividade. DRJ – Como a OAB pretende exercer a fiscalização da qualidade do ensino jurídico no estado? LC – Seguindo a orientação do Conselho Federal, a OAB de Minas tem se mantido na oposição à criação de qualquer curso jurídico se não apresentar alguma inovação ou se ele não se destinar a atender a uma região desassistida, o que em Minas Gerais é muito pouco provável que aconteça, pois temos cursos pulverizados por todo o estado. A OAB não será tolerante com a comercialização do ensino jurídico. Deve-se destacar também que, com a unificação do Exame de Ordem, passamos a ter um importante instrumento de avaliação dos cursos jurídicos, no plano da Ordem. É claro que esse não é o único meio de avaliação. Revista Del Rey Jurídica DIREITO CONSTITUCIONAL sxc.hu Fernando Fiuza NOSSO DISTRITO FEDERAL É MESMO FEDERAL? Ricardo Arnaldo Malheiros Fiuza Professor convidado de Teoria do Estado da Faculdade de Direito “Milton Campos”. Membro da Academia Mineira de Letras Jurídicas. Editor da revista “Del Rey Jurídica”. Diretor da “Revista do Instituto dos Advogados de Minas Gerais”. 10 O Estado Federal ou Federação, forma de Estado criada pela Constituição Americana (1787) e adotada pelo Brasil em 1891, tem características marcantes que devem ser seguidas pelos países, ou melhor, pelos Estados que a adotam, sob pena de, em não as obedecendo, deformar tal forma. Uma dessas características, básica aliás, é a existência de dois planos de governo completos por sobre os municípios: o plano federal, sede da soberania da União, e o plano estadual, situado nos estados-membros ou estados federados, onde mora a autonomia política. Tanto a União quanto os estadosmembros dispõem dos três órgãos montesquianos do Poder Estatal: o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. Suas competências estão elencadas na Constituição Federal (o parâmetro obrigatório) e nas Constituições Estaduais. Os que estão a ler este artigo decerto irão pensar que o escrevo em razão da vergonhosa situação moral que se abate sobre a terra brasiliense. Porém os meus alunos da “Milton Campos” sabem que sempre falei da posição exdrúxula da capital do Brasil. E, afinal, qual é a capital do Brasil? Brasília ou o Distrito Federal? *** Quando do Império, o Brasil era um Estado Unitário, dividido em províncias administrativas, sem autonomia política. E a Cidade do Rio de Janeiro, capital imperial, era corretamente considerada um município neutro. Com sua conhecida clareza, Kildare Gonçalves Carvalho (Direito Constitucional, 15ª ed., Del Rey, 2009) explica: “O Distrito Federal sucedeu ao Município neutro que era a sede do Governo e Capital do Império. Ao município neutro era atribuída organização própria, diversa dos demais municípios. Não integrava o território de nenhuma província, sendo a Cidade do Rio de Janeiro a sede do Governo com o estabelecimento da Família Imperial em seu território”. Portanto, ali “mandava” a Coroa... *** O art. 2º da Constituição de 1891 (que adotou a Federação e a República) estabeleceu que cada uma das antigas províncias passava a ser um estado-membro da União e que o antigo “município neutro” (Rio de Janeiro) passava à condição de Distrito Federal (DF), Revista Del Rey Jurídica continuando a ser a Capital do Brasil, enquanto não houvesse a mudança para o Planalto Central (a previsão já havia). E o art. 34, tratando da competência privativa do Congresso, decretava, em seu nº 30, caber ao Legislativo da União legislar sobre a organização municipal do DF, bem como sobre a polícia, o ensino superior e os demais serviços que na Capital fossem reservados para o Governo da União. *** A Constituição (legítima) de 1934, de efêmera duração, por causa do golpe do Estado Novo, em seu art. 1º falava na “união indissolúvel dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios”. E, em seu art. 5º, inciso XVI, dizia caber privativamente à União organizar a administração dos Territórios e do DF e dos serviços neles reservados ao Governo Federal. O art. 15 estabelecia claramente que o DF deveria ser administrado por um prefeito, nomeado pelo Presidente da República, com aprovação do Senado Federal, cabendo funções apenas deliberativas a uma Câmara Municipal eleita. E não legislativas. *** A Constituição (outorgada) de 1937, em seu art. 7º, prescrevia secamente que o então Distrito Federal (Rio de Janeiro), enquanto sede do Governo da República, seria administrado pela União. Nesse ponto, a nosso juízo, andou bem a tão criticada Constituição de Vargas. O art. 30 arrematava a questão, determinando que o prefeito (nada de governador) do DF seria nomeado e demitido pelo Presidente da República, cabendo as funções deliberativas para o DF ao Conselho Federal (câmara alta do Parlamento Federal, o qual nunca, diga-se de passagem, foi eleito e instalado no Estado Novo...). Não aceitando evidentemente a Ditadura que então se implantou (1937 a 1945), merece, Direito Constitucional “O Governo Federal precisa estar em sua casa”. (João Barbalho Ulhôa Cavalcanti) porém, elogio o tratamento dado na Carta à Capital Federal. *** A democrática Constituição de 1946, em seu art. 1º, §1º, estabelecia que a União compreendia, além dos Estados (membros), o Distrito Federal e os Territórios. No §2º ditava que o DF era a Capital da União. O art. 26, começou, a nosso entender, a complicar a questão, ao determinar que o DF fosse administrado por um Prefeito, nomeado pelo Presidente da República (até aí, tudo bem) e que tivesse uma Câmara, eleita, com funções legislativas. O art. 60 complicou mais ainda, ao estabelecer: “O Senado Federal compõese de representantes dos Estados e do Distrito Federal (...)”. Por quê senadores para uma entidade federal? Sabe-se que, em uma federação autêntica, os componentes da câmara alta são os representantes da autonomia política dos estados-membros perante o Legislativo da União (é o bicameralismo federal). A EC n. 2, de 3/7/56, foi mais além, ao estatuir que o DF passava a ser administrado por um Prefeito, cabendo as funções legislativas a uma Câmara de Vereadores eleitos, estes e aqueles, por sufrágio direto. Na verdade, o que estava acontecendo, então? A estranha transformação de um distrito federal em uma unidade curiosamente dotada de autonomia política sui generis, com a possibilidade da eleição de deputados federais (o que pode ser aceitável, pois os componentes da câmara baixa são representantes do povo, conjunto de eleitores, e, na capital republicana, obviamente há povo!) e senadores ( o que não já se justifica, como dito anteriormente). Washington-DC, capital dos Estados Unidos da América, não tem representantes com voto no Capitólio, é bom que se diga. *** A Constituição de 1967, também outorgada, equiparou, de certa forma, o DF aos Territórios Federais, ao localizar essas entidades federais em um capítulo especial do seu Título I. No art. 42, inciso III, aparece a figura de um governador, nomeado pelo Presidente da República (como nos Territórios), ouvido o Senado. Cabendo, ainda, a essa câmara alta discutir “os projetos de lei concernentes ao serviço público, ao pessoal, ao orçamento e aos tributos do Distrito Federal”. A EC n. 25/1985 elevou, de maneira incorreta, s.m.j., o DF à condição de ente federativo autônomo. *** Finalmente, a “Constituição Cidadã” (1988), em seu art. 32, liquida o assunto, não o corrigindo e, sim, a nosso ver, agravando a situação. Senão vejamos, com a simples leitura do caput e dos quatro parágrafos do referido artigo. O topo do dispositivo proíbe que o DF seja dividido em municípios. Cria a necessidade de uma lei orgânica (uma “constituiçãozinha”?) a ser elaborada e aprovada pela Câmara Legislativa “distrital” (uma “assembleinha” constituinte decorrente?). O §1º estabelece que o DF terá as competências atribuídas aos estados-membros e aos municípios (?!). O §2º cuida da eleição do Governador e do Vice-Governador e dos deputados distritais. O §3º dá aos deputados distritais, e à própria Câmara, as garantias, prerrogativas e vantagens concedidas aos deputados estaduais. O §4º toca em um ponto delicado ao prescrever que “lei federal disporá sobre a utilização, pelo Governo do Distrito 11 DIREITO CONSTITUCIONAL Uma autarquia especialíssima, a ser administrada diretamente pelo Governo da União, com suas contas submetidas ao Congresso Nacional, após parecer do Tribunal de Contas da União (nada de internacionais questionaram os fatos acontecidos na Capital da República, sede do Governo da União, sem que este nada pudesse fazer! E até que poderia, mas já seria uma intervenção (art. 34, incisos II e VII, b da CRFB)! *** Rui Barbosa, em seus Comentários à nossa primeira Constituição Republicana, já dizia que o nosso DF era “um semi-estado, um quase-estado”. É de se imaginar o que diria o grande baiano ao analisar o DF de agora, assim esquisitamente estruturado por motivos obviamente políticos e eleitoreiros. Entendemos que nada disso deveria acontecer. O DF deveria ser, em nossa opinião, como que uma autarquia federal, como o são os territórios federais, estruturada por lei federal. TCDF!...). O Administrador do DF (nem prefeito e muito menos governador) seria um servidor público, a ser designado e demitido pelo Chefe do Executivo Nacional. Para coadjudivar esse grande síndico, um Conselho Deliberativo, a elaborar posturas, de acordo com lei federal. O professor americano Robin Brett Parnes, em objetivo artigo (http:// viagem.hsw.uol.com.br), explica que, em contraste com os Estados (federados), as posturas e os orçamentos do DC (Washington) são revisados e modificados pelo Congresso dos Estados Unidos. Quanto ao Judiciário, notese que, no DF, esse órgão do Poder é organizado e mantido pela União, mas é um judiciário local e não integra a Justiça Federal. Vê-se aí logo um tem- Arquivo CYB Federal, das polícias civil e militar e do corpo de bombeiros”. É bom lembrar aqui da recente ação desastrada da PMDF, a deixar perplexos os observadores do mundo inteiro. Os noticiários 12 pero de confusão. É bom lembrar que os Magistrados de Brasília, primeira e segunda instâncias, já o são do Distrito Federal e Territórios. Lembra o citado Parnes que, diferentemente dos Estados, os quais organizam seu Judiciário e nomeiam seus juízes e tribunais, no DC, o Presidente dos Estados Unidos é que é os nomeia, à maneira dos Juízes Federais. *** Os que, porventura (por ventura minha), lerem este artigo, por favor não pensem nas pessoas atuais, que exercem as funções de Governador, de ViceGovernador, de deputados distritais e até de Presidente da República e, sim, na estrutura técnica que possa ser a melhor para nossa Capital Federal, livre dessa política pequena e dessa dubiedade de comandos que hoje ali reinam ou imperam (no pior sentido das palavras). E pensem no grande João Barbalho, citado em destaque: uma casa com dois chefes gera o caos. (Dezembro de 2009). Livros indicados: DIREITO CONSTITUCIONAL COMPARADO 4ª edição Ricardo Arnaldo Malheiros Fiuza Editora Del Rey AULAS DE TEORIA DO ESTADO 2ª edição Ricardo Arnaldo Malheiros Fiuza, Mônica Aragão M. F. e Costa Editora Del Rey www.delreyonline.com.br Revista Del Rey Jurídica DIREITO CONSTITUCIONAL Arquivo CYB Amagis A NOVA LEI DO MANDADO DE SEGURANÇA: RETROCESSOS Zênia Cernov Advogada. 14 A advocacia tem pouco a comemorar com a promulgação da nova Lei do Mandado de Segurança. Embora tivesse em seu bojo a intenção de atualizar esse remédio processual à regência da Constituição Federal e consolidar o entendimento jurisprudencial a respeito do tema, veio ao mundo jurídico permeada de retrocessos e inconstitucionalidades flagrantes. Alguns pontos das previsões contidas na Lei nº. 12.016, de 7 de agosto de 2009, devem ser destacados. A nova lei insere a pessoa jurídica de direito público a que pertença a autoridade impetrada como verdadeira parte processual, e confere-lhe prerrogativas de inequívoco e abusivo protecionismo ao Estado. Isso se conclui da regência do art. 6º, que determina que o impetrante indique, além da autoridade impetrada, a “pessoa jurídica que esta integra, a qual se acha vinculada ou da qual exerce atribuições”, tendo a lei conferido a tal pessoa jurídica prerrogativas como: a) a de ser cientificada do conteúdo do mandado de segurança, com cópia da inicial (art. 7º, II); b) de “ingressar no feito” (art. 7º, II, última parte); c) de ser cientificada em 48 horas da concessão de liminar, pelas autoridades administrativas, as quais ainda devem indicar-lhe os elementos necessários a instruir pedido de suspensão da medida e a defesa do ato impetrado (art. 9); c) de ser ouvida antes de despachado o pedido de liminar, no caso de mandado de segurança coletivo (art. 22, § 2º). Essas prerrogativas estão ainda ancoradas de outros elementos protecionistas, pois que, se a pessoa jurídica de direito público obtiver a suspensão da segurança, o agravo da parte impetrante contra tal decisão não terá efeito suspensivo (art. 15) e, caso provido, o ente público poderá renovar o pedido de suspensão de segurança diretamente ao STJ e ao STF, conforme for o caso de possível cabimento de recurso especial ou extraordinário, ou seja, a lei brindou o Estado com meios de protelar ao máximo a exequibilidade do mandado de segurança. Soma-se a isso a extensão do direito de recorrer dado à autoridade coatora (art. 14), a manutenção da vedação à concessão de liminar para reclassificação ou equiparação de servidores públicos, concessão de aumento ou extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza (art. 7º, § 2º) e ainda a inserção, pelo mesmo artigo, de vedação à concessão de liminar que tenha por objeto a compensação de Revista Del Rey Jurídica LANÇAMENTOS Direito Constitucional Livros indicados: O Mandado de Segurança segundo a Lei nº. 12.016 Foto: Dúnia Catelli Werther Botelho Spagnol, o autor e Augusto Tolentino. Foto: Dúnia Catelli lei, aliado aos entraves em desfavor do cidadão, limitam a eficácia do mandado de segurança, em total detrimento de sua função constitucional de proteger a cidadania contra os abusos administrativos. Cria-se mais uma vez a infeliz – e já costumeira - violação ao direito de tratamento igualitário entre as partes processuais, pois que a balança da justiça brasileira tem pendido cada vez mais em favor do poder público e pesando de modo desumano nas costas de nosso povo. Arnaldo Oliveira, da Del Rey, o autor, Fernando Gonzaga Jayme e José Anchieta da Silva, Presidente do IAMG. *** Em 11 de agosto, Dia do Advogado, na Galeria Portinari, do Ritz Plaza Hotel, em Juiz de Fora, houve o lançamento do livro “Editais de Licitação – Técnicas de Elaboração e Sistema de Registro de Preços”, de autoria do advogado Wladimir de Oliveira Andrade, e prefaciado pelo professor Carlos Pinto Coelho Motta. Foto: Thiago Soares Nossos legisladores, além de imporem ao cidadão o ônus de arcar com a verba honorária, dificultaram mais ainda o seu acesso à utilização do writ. Humberto Theodoro Junior Editora Forense O autor, Wladimir Andrade e Márcia Scoralick. Nova Lei do Mandado de Segurança Cássio Scarpinella Bueno Editora Saraiva www.delreyonline.com.br Foto: Thiago Soares créditos tributários ou a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior. Na contramão constitucional, a nova lei defende a presença direta do Estado no rito do mandamus, mas fixa serem incabíveis honorários de advogados (art. 25). Não se pode afirmar que se trata de mera absorção das Súmulas 105 do STJ, e 512 do STF pois essas foram editadas na vigência da Lei 1.533/51, na qual a presença do Estado era menos importante e tais honorários seriam, a princípio, suportados pela autoridade impetrada. Na nova regência, o Estado “ingressa no feito”, como previsto no art. 7º, II, e passa a integrar diretamente a lide, portanto deveria arcar com os ônus da sucumbência. E soma-se a esse argumento a incompatibilidade de tal dispositivo com a previsão constitucional de ser o advogado indispensável à administração da justiça, marcando de inquestionável inconstitucionalidade o dispositivo, que está sendo questionado pela sempre vigilante Ordem dos Advogados do Brasil, mediante a competente ADIN. Nossos legisladores, além de imporem ao cidadão o ônus de arcar com a verba honorária, dificultaram mais ainda o seu acesso à utilização do writ, ao possibilitar que seja exigido do impetrante a prestação de caução, fiança ou depósito como pressuposto da concessão de liminar, com o objetivo de “assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica” (art. 7º, III), dispositivo que foi classificado pelo presidente da Comissão Nacional de Legislação da OAB, Marcus Vinícius Furtado Coelho, como um verdadeiro apartheid no Judiciário. Como se vê, o protecionismo evidente ao Estado, por meio de privilégios inseridos ou mantidos pela No dia 6 de agosto, na Livraria Del Rey Aimorés, em Belo Horizonte, foi realizado lançamento do livro “Teoria e Prática da Arbitragem”, do advogado Rodrigo Bernardes Braga, gerente geral da Vale Soluções em Energia e membro do CBAr – Comitê Brasileiro de Arbitragem. Prefaciado pelo professor Humberto Theodoro Júnior. João César Novaes, Wladimir Andrade e Tarcísio Delgado 15 DIREITO PÚBLICO Arquivo pessoal AO ESTADO TUDO, AOS CIDADÃOS O RIGOR DA LEI! Advogado Sócio da Azevedo Sette Advogados. Pós-Graduado em Direito Empresarial pela FGV-DF e Conselheiro Federal eleito da OAB pela Seccional do Distrito Federal. 16 Arquivo CYB Rodrigo Badaró de Castro Lendo a biografia do Stalin fiquei imaginando como o ditador russo estaria, se vivo hoje, a aplaudir os acontecimentos políticos promovidos por alguns líderes do Cone Sul, principalmente os caricatos Hugo Chavez e Evo Morales, e agora a mais recente pantomima política e diplomática de Honduras. Voltando os olhos e pensamentos para minha advocacia e o Brasil, motivado pela leitura sobre a história de tão marcante personagem, causaram-me preocupação o teor das novas leis publicadas e os projetos de lei em curso, sem falar no uso inadequado daquelas já em vigor. Logo pensei na antiga e conhecida máxima, de autoria atribuída pela incerteza a Pinheiro Machado ou Getúlio Vargas, recomendando: “aos amigos tudo e aos inimigos o rigor da lei”. Com efeito, tomando emprestada a afirmativa acima, não é absurdo considerar hoje que vivemos num país onde prevalece para os cidadãos o rigor da Lei, enquanto que o Estado tenta sempre escapar do imperativo dever de seu cumprimento. Ao mesmo tempo em que notamos o aumento da discricionariedade e do poder dos agentes públicos, há nas novas leis evidente tentativa de limitação de defesa e uma proteção excessiva dos atos administrativos. Cito como exemplo o corriqueiro abuso das penalidades administrativas previstas na Lei de Licitação. O que vemos hoje são agentes públicos ameaçando e aplicando penas de forma abusiva e desproporcional, como atestado de inidoneidade ou suspensão de contratar com órgãos públicos atingindo mortalmente as empresas que têm o Estado como maior cliente, às vezes sem respeito aos princípios básicos da Constituição e das normas administrativas, como a ampla defesa, razoabilidade, e impessoalidade. Além disso, deparamo-nos com a nova lei do Mandado de Segurança, que cria um apartheid judicial ao engessar este remédio heróico, criando barreiras em seus termos que somente beneficiam o Estado. Lembro ainda o Projeto de Lei 5139/2009 - propondo mudança na Lei que regula as Ações Civis Públicas - que vem limitar direitos de defesa, promover a execução imediata logo após o sentenciamento, ampliar os legitimados a se valerem de um procedimento especial. Relembro a absurda PEC 12, conhecida como o CALOTE OFICIAL dos precatórios, infelizmente aprovada em novembro deste ano pela Câmara dos Deputados. Nela, como já é de conhecimento de todos, os credores do ESTADO ficarão à mercê de uma estrutura desigual que aumentará em muitos anos, ou ad eternum, o tempo de recebimento do que lhes é devido. Ao revés, o ESTADO pode tudo, Revista Del Rey Jurídica LANÇAMENTOS Direito Público Livros indicados: Nós, Povo Soberano. Fundamentos do Direito Constitucional Coleção Del Rey Internacional Foto: Eugênio Goulart Tribunal de Contas da União. Pois já querem limitar os efeitos das decisões do TCU e “abrandar” apenas para o Estado as limitações da Lei das Concorrências (Ao Estado Tudo!). Terminando de ler a biografia do famoso e cruel ditador, e acompanhando a evolução legislativa ora comentada, fico a imaginar se um dia não acordaremos a parafrasear o famoso Sr. K, de Franz Kafka, e indagar: “Mas como posso ser detido? E desta maneira?”. Jorge Henrique de Oliveira Souza, autor. Jorge Henrique de Oliveira Souza e Roque Antonio Carrazza. *** A Escola Judicial “Des. Edésio Fernandes”, do TJMG, e a Livraria Del Rey Editora promoveram, no dia 27 de agosto, importante conferência sobre o tema “Os Tribunais internacionais contemporâneos e o direito de acesso à Justiça Internacional”, proferida pelo conhecido jurista mineiro Antônio Augusto Cançado Trindade, que foi Juiz Presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos, na Costa Rica, e atualmente é Juiz da Corte Internacional de Haia. Autor de diversos livros jurídicos, entre os quais “Direito das Organizações Internacionais” , cuja 4ª edição, revista e atualizada, foi lançada pela Del Rey logo após a conferência. Fotos: Rossana Souza A Lei 12.016/09 que modificou o processamento do Mandado de Segurança, vem impor aos cidadãos restrições ao uso desta medida judicial. Bruce Ackerman Editora Del Rey Transformação do Direito Constitucional. Nós, Povo Soberano Coleção Del Rey Internacional Cançado Trindade e Des. Reynaldo Ximenes. Fotos: Rossana Souza por meio dos procedimentos especiais para execução fiscal, a intransigência na cobrança e voracidade na fiscalização. A Lei 12.016/09, citada nesta observação, que modificou o processamento do Mandado de Segurança, que sempre serviu de contrabalanceamento aos abusos dos agentes públicos, vem impor aos cidadãos restrições ao uso desta medida judicial, dificultando o acesso ao Judiciário e ainda diminuindo a possibilidade legal de contenção de abusos. Temos fundadas dúvidas sobre a constitucionalidade dessas restrições, enfim da nova lei. Como exemplo, a Lei, logo em seu primeiro artigo começa a restringir, pois pelo § 2º do artigo 1º fica vedado o uso do Mandado de Segurança contra atos de gestão comercial praticados pelos administradores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço público. As condições para concessão da liminar em Mandado de Segurança são absurdas para se tornarem objeto de previsão legal, tais como a exigência de realização prévia de caução, depósito ou fiança para o deferimento da medida liminar, além da surreal e estapafúrdia exigência de oitiva prévia do representante da pessoa jurídica de Direito Público, como condição para a concessão da liminar em Mandado de Segurança coletivo. Em outra esfera, aproveitando a alegria coletiva pelas Olimpíadas do Rio de Janeiro, fico imaginando os riscos e os problemas que serão vividos pelos empresários que irão prestar serviço ao Estado, diante das restrições legais hoje existentes para questionar abusos do administrador público, a banalidade na aplicação das penas, sem falar na necessidade de ficar vigilante à louvável e forte atuação técnica do Foto: Eugênio Goulart No dia 20 de agosto, na Livraria Martins Fontes, em São Paulo, aconteceu o lançamento do livro “Tributação e Meio Ambiente” (Del Rey), do advogado Jorge Henrique de Oliveira Souza, mestre em Direito Tributário pela PUC São Paulo, prefaciada pelo professor Roque Antonio Carrazza. Bruce Ackerman Editora Del Rey www.delreyonline.com.br Cançado Trindade e Arnaldo Oliveira. 17 DIREITO PENAL Arquivo CYB Arquivo pessoal Considerações acerca dos crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores descritos na Lei nº 9.613, de 03 de março de 1998 Geraldo Vieira Advogado. Presidente do Grupo GV. Mestre pela FECAP–SP em Contabilidade e Controladoria, em Administração pela FEAD-MG e mestrando em Planejamento Tributário pela FUCAP - ES. 18 A expressão “lavagem de dinheiro” tem origem nos Estados Unidos (money laundering), a partir da década de 1920 quando lavanderias na cidade de Chicago teriam sido utilizadas por gangsters para despistar a origem ilícita do dinheiro, ou seja, por intermédio de um comércio legalizado, buscava-se justificar a origem criminosa do dinheiro arrecadado com a venda ilegal de drogas e bebidas. Pela definição mais comum, a lavagem de dinheiro constitui um conjunto de operações comerciais ou financeiras que buscam a incorporação na economia de cada país dos recursos, bens e serviços que se originam ou estão ligados a atos ilícitos. Lavagem de dinheiro é o processo pelo qual o criminoso transforma recursos ganhos em atividades ilegais em ativos com uma origem aparentemente legal. Essa prática geralmente envolve múltiplas transações, usadas para ocultar a origem dos ativos financeiros e permitir que eles sejam utilizados sem comprometer os criminosos. A dissimulação é, portanto, a base para toda operação de lavagem que envolva dinheiro proveniente de um crime antecedente. Em termos mais gerais, lavar recursos é fazer com que produtos de crime pareçam ter sido adquiridos legalmente. Especialistas estimam que cerca de US$500 bilhões em “dinheiro sujo” – cerca de 2% do PIB mundial - transitam anualmente na economia. Trata-se de uma ameaça global crescente e as medidas para controlar o problema tornaram-se foco de um intenso esforço internacional. Durante os últimos dez anos, inúmeras organizações envolveram-se na luta contra a lavagem de dinheiro, promovendo a cooperação para assegurar que as instituições financeiras tomem as providências necessárias a fim de minimizar os efeitos danosos dessa prática. Conceitualmente, a lavagem de dinheiro merece séria consideração sob Revista Del Rey Jurídica EM DESTAQUE PRINCÍPIOS UNIDROIT Direito Penal Foto: Arquivo Pessoal param para pensar sobre a gravidade do problema, principalmente porque a lavagem de dinheiro parece distante de nossa realidade. Entretanto, observa-se que, assim como todo tipo de crime organizado, o tema tem merecido bastante reflexão tanto por parte dos operadores do direito como por parte da sociedade tendo em vista constituir-se uma ameaça global crescente que desafia o estudo de medidas para seu controle, tendo o problema se tornado foco de um intenso esforço internacional. Durante os últimos dez anos, inúmeras organizações envolveram-se na luta contra a lavagem de dinheiro, promovendo a cooperação para assegurar que as instituições financeiras tomem as providências necessárias a fim de minimizar os efeitos danosos dessa prática. Livros indicados: Lavagem de Dinheiro Aspectos Penais da Lei nº. 9.613/98 André Luis Callagari Editora Livraria do Advogado Lavagem de Dinheiro Análise Crítica da Lei nº. 9613/98 Flagrantes do lançamento. VISITA A Editora Del Rey recebeu a visita do Ministro Adhemar Ferreira Maciel, Presidente da Academia Mineira de Letras Jurídicas, sendo recepcionado pelos Editores Arnaldo Oliveira e Ricardo Fiuza. Foto: Arquivo Del Rey dois principais aspectos. Primeiro, permite a traficantes, contrabandistas de armas, terroristas ou funcionários corruptos - entre outros - continuarem com suas atividades criminosas, facilitando seu acesso aos lucros ilícitos. Além disso, o crime de lavagem de dinheiro mancha as instituições financeiras e, se não controlado, pode minar a confiança pública em sua integridade. Numa época de rápido avanço tecnológico e globalização, a lavagem de dinheiro pode comprometer a estabilidade financeira dos países. Vigilância constante é necessária por parte de reguladores, bancos, centros financeiros e outras instituições vulneráveis para evitar que o problema se intensifique. Nas duas últimas décadas, a lavagem de dinheiro e os crimes correlatos – entre os quais, narcotráfico, corrupção, sequestro e terrorismo – tornaram-se delitos cujo impacto não pode mais ser medido em escala local. Se antes essa prática estava restrita a determinadas regiões, seus efeitos perniciosos hoje se espalham para além das fronteiras nacionais, desestabilizando sistemas financeiros e comprometendo atividades econômicas. Por causa da natureza clandestina da lavagem de dinheiro, fica difícil estimar o volume total de fundos lavados que circulam internacionalmente. As técnicas de análise disponíveis envolvem a mensuração do volume de comércio em atividades ilegais tais como tráfico de drogas, de armas ou fraude. Por essa razão, o tema tornou-se objeto central de inúmeras discussões realizadas em todo o mundo. Chefes de Estado e de governo, bem como organismos internacionais, passaram a dispensar mais atenção à questão. Poucas pessoas Foi lançada na cidade de São Paulo, na Sala Visconde de São Leopoldo da Faculdade de Direito da USP, no dia 27 de agosto, a edição brasileira dos Princípios UNIDROIT Relativos aos Contratos Comerciais Internacionais/2004. A obra, que saiu pelo selo da Editora Quartier Latin do Brasil, tem apresentação de José Ângelo de Estrella Faria, Secretário-Geral do Instituto Internacional para a Unificação do Direito Privado (UNIDROIT), sediado em Roma. A edição brasileira deste importantíssimo instrumento jurídico para regular as trocas econômicas internacionais é o fruto de um meticuloso empreendimento dirigido pelo Prof. João Baptista Villela, autor que também publica pela Editora Del Rey, e executado por um grupo de trabalho constituído prevalentemente de jovens professores ou egressos da Faculdade de Direito da UFMG. Carlos Márcio Rissi Macedo Editora Juruá www.delreyonline.com.br 19 DIREITO INTERNACIONAL André Bandeira Diplomata e Auditor do Instituto de Defesa Nacional, presentemente exercendo funções diplomáticas como Cônsul de Portugal em Minas Gerais, foi anteriormente Conselheiro de Investigação do Colégio de Defesa da OTAN, em Roma 20 Na Idade Média, S. Tomás de Aquino, a meio do Séc. XIII, numa Revolução que nada teve de trevas, disse claramente “Ergo bellare semper est peccatum…” (Summa Theologiae, Secunda Secundae, Quaestio 39, a 3). Havia exceções mas, em princípio, guerrear era sempre pecado. Não nos adianta que Obama diga do alto duma cátedra, que pode haver Guerra justa e que uma “Guerra Santa” nunca é justa, mesmo se as cruzadas foram coisas terríveis. Entristece ouvir da parte dele que há glória nos soldados que morrem pela sua Pátria ou pelos seus camaradas, mas que a Guerra nunca é gloriosa. Como pode haver glória, na infâmia? Ao fim, justifica este paradoxo: temos que continuar a admitir o facto da Guerra e, mesmo assim, lutar pela Paz, pois, de outro modo, não haveria progresso. O «Professor Obama» diz que não há “Guerra justa”, sem “Paz justa” mas interessa-lhe a Paz, ou interessa-lhe o Progresso? Uma “Paz” cheia de adjetivos é algo que, nem os soldados nas trincheiras todos os dias, sujeitos a obuses e cargas, nem ninguém, acreditam. Obama admite que é necessário “imaginação moral” e que a temos de ir sempre alargando. Nisso consiste a moral de Obama… puxar pela cabeça para dar uma volta aos problemas que se têm de enfrentar, passando por estreitos morais pouco abertos. É certo que, sem um esforço moral, não saberíamos escolher as leis mais certas, e teríamos apenas normas técnicas. É certo que, no Paraíso, Adão e Eva conheceram o Bem e o Mal, mas não criaram o Bem e o Mal. Por duas vezes, Obama repete no seu discurso que “o mal existe”. Talvez ele deGoogle.com.br/gforum.tv Arquivo pessoal A Doutrina Obama da “Guerra Justa” Obama fez um discurso em Oslo, ao receber um prêmio Nobel da Paz que não mereceu. Ele merece ainda o nosso apoio mas quem lhe deu este prêmio, deixou-o cair no chão. O discurso de Obama repete vários precedentes no Direito Internacional. Como no caso Caroline (Caso Caroline, de 1837 que determina, na jurisprudência internacionalística norte-americana, o direito de legítima defesa anticipatória, se a “Necessity of self-defence is instant, overwhelming, leaving no choice of means and no time for deliberation”), de novo os EUA reafirmam o seu direito de atuar unilateralmente, em legítima defesa antecipada e até em intervenção humanitária quando tal entenderem. Tudo isto, ao arrepio do art.51 da Carta das Nações Unidas que revogou o Direito anterior em matéria de legítima defesa, o qual já tinha sido revogado pelo Tratado Briand-Kellog. Mas Obama é Presidente dos Estados Unidos e jurou defender a segurança da sua Nação. Por isso, enviou mais 30.000 soldados para uma guerra do Afeganistão, que é alimentada pela droga, quer do lado governamental, quer dos guerrilheiros, e por uma população paquistanesa com armas e mísseis que receberam dos próprios americanos, quando os soviéticos estavam em Cabul. Revista Del Rey Jurídica vesse usar a sua “imaginação moral” para descobrir que o mal não existe apenas no adversário, em quem pensa diferente dele, mas que o mal a que se refere, é uma realidade transversal que não escolhe partido, nem confissão, nem um tipo de guerra justa, mais justa que a do adversário. Nesta confusão, Obama dá-nos um ou dois tópicos: é justa a guerra humanitária, nomeadamente contra o genocídio e não se pode dizer que um país falhado onde os Direitos Humanos não são respeitados, esteja “em paz”. De novo, Obama é impreciso: os Direitos Humanos não são direitos políticos, são direitos constitucionais, inseparáveis uns dos outros, não se pode dar o direito à palavra a uma população que nem consegue abrir a boca para mastigar os grãos de trigo que apanha no chão. Mas Obama não se detém e diz que é tão importante no seu conceito de “Paz justa” a firmeza do soldado numa missão de paz, como a coragem do jovem manifestante num país sem liberdade de expressão, como uma mulher que junta os seus tostões para mandar a filha para a escola, num país fundamentalista. Ora, Obama esquece-se que o “soldado da paz”, envolvido numa “Guerra justa”, não escapa à lei histórica da Guerra, ou seja a de que morrem cada vez mais civis do que militares, apesar de as armas serem todas cada vez mais sofisticadas. Esquece-se que o jovem se manifesta mas que o seu pai faz parte do sistema e o vive de um modo diferente, permitindo ao jovem manifestante comer e dormir quando volta da manifestação. E Obama esquece-se que o fundamentalista que entende que a menina não deve ir à escola, perdeu metade da família, perdeu um olho e um pé, durante trinta anos de guerra, fugindo com a menina às costas por Direito Internacional vales e montanhas, escapando a um invasor que disparou sobre ele em nome da paz e do progresso. Ora a História, como justificação, não é só o Progresso, é também dor e regresso. O mal de Obama é que não consegue vencer uma contradição essencial, que se diria até juvenil, da sua parte: os princípios universais que pretende aplicar, não lhe passa sequer pela cabeça, que também tem de os aplicar a si próprio. Mas ninguém o consegue interromper, no fluxo encadeado das suas belas palavras pois quem fala tão bem como ele, não pode deixar de ter razão e que, portanto, o seu modo de aplicar e combinar os princípios defendidos é tão perfeito quanto a fluência do seu discurso e a cadência dos aplausos. Em suma, Obama teve a situação infeliz de receber o Prémio Nobel da Paz, em 2009. Nem o Comité Nobel o obrigou a nada, nem ele se sentiu obrigado. De novo venceu a lei de uma competição estúpida em que o único vencedor é aquele que chega primeiro. O Comitê Nobel pensou que se anteciparia e Obama pensou que anteciparia o sentido do prêmio Nobel. Nem um nem outro o conseguiram e algures, no Paquistão, ou na Chechênia, na Indonésia ou em África, alguém receberá um outro prêmio, em outra Língua, que soará mais ou menos como Ansar-al-Islam, o “Companheiro da Paz Universal”. Obama, até agora, não conseguiu suscitar consenso entre as Nações e os sujeitos de Direito Internacional para lançar o seu precedente de “Guerra justa” (Vd. Ian Brownlie in Principles of Public International Law, Cambridge University Press, Cambridge, 2ºEdição,p. 4). Na verdade, próximos que estamos duma Guerra que escalou até às bombas atômicas de Hiroshima e Nagasaki, falar em “Guerra justa” é igual a falar em «massacre justo». Um precedente, para ser lançado em Direito Internacional, não precisa apenas de que se grite mais alto. É preciso apanhar a comunidade internacional a jeito, mesmo que não saibamos quem compõe esta Comunidade Internacional… e não são somente as grandes potências. Os soldados de amanhã não serão apenas militares. Eles serão construtores, médicos, engenheiros, enfermeiros, assistentes sociais. Farão Segurança e Defesa em todo o lado. Não sei se farão a Guerra. Essa ficará para os que não são soldados, mesmo que, orgulhosamente, continuem sendo guerreiros. Mas não serão soldados. Livros indicados: Direito das Organizações Internacionais 4ª edição Antônio Augusto Cançado Trindade Editora Del Rey Direito Internacional Público 4ª edição Roberto Luiz Silva Editora Del Rey www.delreyonline.com.br 21 DIREITO INTERNACIONAL Arquivo CYB Arquivo Pessoal A EXTRADIÇÃO E SEU CONTROLE PELO STF Carlos Velloso Ministro, ex-Presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) e do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), professor emérito da Universidade de Brasília (UnB) e da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), em cujas Faculdades de Direito foi professor titular de Direito Constitucional e Teoria Geral do Direito Público, autor do ensaio “A Extradição e seu Controle pelo Supremo Tribunal Federal”, em “Terrorismo e Direito”, Forense, 2003, é advogado. 22 O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da extradição de Cesare Battisti, pedida com base no Tratado existente entre o Brasil e a Itália, decidiu que a decisão do ministro da Justiça, concessiva do refúgio, fora proferida contra a lei brasileira e a Convenção de Genebra de 1951, além de usurpar competência do Supremo Tribunal. É que a Convenção de Genebra, de 1951, estabelece que não será concedido refúgio a quem haja praticado crime de direito comum. A lei brasileira, Lei 9.474, de 1997, artigo 3º, inciso III, veda a concessão de refúgio aos que tenham cometido crime hediondo. O CONARE – Comitê Nacional para os Refugiados, órgão técnico do Ministério da Justiça, indeferira o pedido de refúgio formulado por Battisti, porque Battisti fora condenado pela Justiça italiana pela prática de quatro homicídios qualificados que, pela lei penal brasileira, são crimes hediondos. Convém esclarecer que as sentenças condenatórias foram confirmadas pela Corte de Cassação italiana. A Justiça francesa, em atenção ao pedido de extradição formulado pela Itália, deferira o pedido, pelas suas mais altas instâncias, o Tribunal de Apelação de Paris, a Corte de Cassação e o Conselho de Estado. Battisti recorreu à Corte Européia de Direitos Humanos, que negou provimento ao recurso. Havia, pois, desfavoráveis a Battisti, sete decisões: duas decisões da Justiça italiana, três da Justiça francesa, a decisão da Corte Européia de Direitos Humanos e a decisão brasileira do CONARE. O decidido pelo Supremo Tribunal não teve, de conseguinte, sabor de novidade. Esclareça-se, ademais, que o Estatuto dos Estrangeiros, Lei 6.815/80, artigo 77, inciso VII, §§ 1º e 2º, estabelece que “caberá, exclusivamente, ao Supremo Tribunal Federal, a apreciação do caráter da infração”, ou seja, se o crime praticado pelo extraditando é político, ou se “o fato constituir, principalmente, infração da lei penal comum, ou quando o crime comum, conexo ao delito político, constituir o fato principal.” O Tribunal, em seguida, deferiu a extradição, pelo voto dos ministros Cezar Peluso, Ricardo Levandowski, Ellen Gracie, Carlos Britto e Gilmar Mendes. Até aí, tudo bem. A Corte, simplesmente exercera competência que lhe é Revista Del Rey Jurídica LANÇAMENTOS Direitos Internacional base na Constituição (C.F., art. 102, I, “g”), na lei (Lei 6.815/80, artigos 76-94) e no RI/STF (artigos 207 a 214). O que há é que a entrega do extraditando poderá ser adiada, se estiver ele acometido de moléstia grave comprovada por laudo médico (art.89, parágrafo único). Não há, nos dispositivos mencionados, constitucionais ou infraconstitucionais, vale repetir, nada que autorize o Presidente da República a deixar de cumprir o decidido pelo Supremo Tribunal. A menos que seja ressuscitado o que o constitucionalismo sepultou há mais de duzentos anos: o direito divino dos reis e imperadores, que podiam decidir contra a lei. (Artigo publicado originariamente na “Folha de São Paulo”, de 25.11.2009) Foto: Arquivo Pessoal O autor e convidadas. *** Na noite de 24 de setembro , na sede da Academia Mineira de Letras, foi lançado o livro “Política, ainda é possível?”, escrito pelo professor Antônio Carlos Doorgal de Andrada, Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais e ex-Deputado Estadual. Foto: Alessandro Prenassi Livro indicado: Desembargadora Federal Vera Lúcia Jucovsky(SP), Henrique A. Mourão, Beatriz Souza Costa e Lúcio Aparecido Souza e Silva, diretor da CAA/MG. Foto: Arquivo Pessoal Não há na lei, portanto, uma só palavra que autorize o Presidente da República a deixar de cumprir a decisão concessiva da extradição. Humanização do Direito Internacional Antônio Augusto Cançado Trindade Editora Del Rey www.delreyonline.com.br O autor e o acadêmico Murilo Badaró, Presidente da Academia Mineira de Letras. Foto: Alessandro Prenassi conferida pela Constituição. A surpresa veio depois. O Supremo, por cinco votos a quatro, decidiu que, mesmo tendo sido deferida a extradição, caberia ao Presidente da República a palavra final. É dizer, o Supremo autolimitou-se, o que é inédito, porque nunca ocorrera a hipótese de o Presidente da República descumprir decisão concessiva de extradição. E essa hipótese nunca ocorreu, porque nem a lei nem a Constituição isso autoriza. Em Estado de Direito tudo se faz de conformidade com a lei. A lei brasileira, Lei 6.815/80, o Estatuto dos Estrangeiros, artigos 76 a 94, cuida minuciosamente do tema. Concedida a extradição, será o fato comunicado, pelo Ministério das Relações Exteriores, à Missão diplomática do Estado requerente, que, no prazo de sessenta dias, deverá retirar o extraditando do território nacional (art.86). Se não o fizer, o extraditando será posto em liberdade, sem prejuízo da expulsão, se o motivo da extradição o recomendar (art. 87). É que o Brasil não pode transformar-se em valhacouto de criminosos. Se o extraditando estiver sendo processado, ou tiver sido condenado no Brasil, a extradição será executada depois da conclusão da ação penal ou do cumprimento da pena, ressalvado o disposto no art. 67 (art. 89). É dizer, ele poderá ser expulso, ainda que haja processo ou tenha ocorrido condenação (art. 67). Todavia, o Governo poderá entregar o extraditando, ainda que responda a processo ou esteja condenado por contravenção (art. 90; Extradições 947-Paraguai; 859-Uruguai). Seguem-se os trâmites finais da extradição (art. 91). Depois de entregue ao Estado estrangeiro, se ele escapar à ação da Justiça e homiziar-se no Brasil, será detido, mediante pedido feito por via diplomática, e de novo entregue sem outras formalidades. Não há na lei, portanto, uma só palavra que autorize o Presidente da República a deixar de cumprir a decisão concessiva da extradição, decisão que encontra Em 17 de setembro, no Minascentro, em Belo Horzionte, realizou-se o lançamento do livro “Patrimônio Cultural como um bem difuso – O Direito Ambiental brasileiro e a defesa dos interesses coletivos por organizações não governamentais”, escrito pelo professor Henrique Augusto Mourão. O autor e o Desembargador José Tarcízio de Almeida Melo, Presidente do TRE-MG. 23 DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO Arquivo Pessoal OS PRINCÍPIOS JURÍDICOS NA FASE DE EXECUÇÃO TRABALHISTA E A BUSCA PELA EFETIVIDADE DO DIREITO MATERIAL Davidson Malacco Ferreira Mestre em Direito do Trabalho pela PUC Minas; Advogado e Professor de Direito do Trabalho da PUC Minas. 24 O escopo do presente trabalho é o apontamento avaliativo dos princípios jurídicos aplicáveis no âmbito trabalhista, à luz do mandamento constitucional e processual, refletindo essencialmente sua relevância quanto à efetividade da tutela jurisdicional satisfativa. Insta esclarecer inicialmente a derradeira temática da função jurisdicional, do ponto de vista do eminente Rosemiro Pereira Leal, atrelada à construção histórica do conceito de Processo, hoje definida como garantia principiológica assegurada nas leis fundamentais, enfatizando o entendimento de que “a Jurisdição, por si mesma, não pressupõe critérios de julgar ou proceder, mas atividade de decidir subordinada ao dever de fazê-lo segundo os princípios fundamentais do Processo”. (Teoria Geral do Processo. 5 ed., São Paulo: Thonsom IOB, 2004, p. 41) Destarte, a criação de institutos jurídicos atinentes a ramos de Direito autônomo deve levar em consideração a efetiva atuação da norma material posta, a fim de não se tornar a mesma letra morta ou norma meramente utópica. Assim não o fosse, a Ciência do Direito permaneceria estagnada e travaria seus debates, no campo dogmático, arquétipo e cânone, prescindindo a crítica científica consistente da atividade produtora de conhecimentos e de esclarecimentos do conhecimento para desenvolver, aperfeiçoar e melhorar a técnica. Modernamente, no contexto acadêmico-dogmático, surgem novos debates sobre o significado dos princípios constitucionais no ordenamento jurídico, citando desta forma as teorias adotadas por Robert Alexy e Ronald Dworkin, já que ambos formam pensamentosmodelo da hermenêutica jurídica ocidental. Tomando por base as reflexões do emérito professor Marcelo Campos Galuppo, explicando a teoria de Alexy na defesa do entendimento de que os princípios não se aplicam integral e plenamente em qualquer situação. Antes, esses princípios são identificados como “mandado de otimização”. Assim como as regras, os princípios são normas, mas, diferentemente das regras, eles são normas jurídicas que dizem que algo deve ser realizado na maior medida possível. Tal como Alexy menciona, “princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível, dentro das possibilidades jurídicas e reais existentes. Portanto, os princípios são mandados de otimização, que estão caracterizados pelo fato de que podem ser cumpridos em diferentes graus, e que a medida devida de seu cumprimento não só depende das possibilidades reais, como também das jurídicas (Revista de Informação Legislativa, Brasília, 36 n. 143 jul/set, 1999, p. 191-209). Já Dworkin, citado por Galuppo, na concepção das democracias contemporâneas, destacando a aplicação dos princípios, salienta que “na prática, por causa da exigência de integridade, apenas os argumentos de princípio podem desempenhar a tarefa de resolver os casos difíceis sem se comprometer a democracia. Uma vez que os argumentos de princípio estabelecem direitos individuais e os argumentos de orientação política estabelecem metas coletivas”. (Revista de Informação Legislativa, Brasília, 36 n. 143 jul/set, 1999). Lapidar a lição do insigne José Joaquim Gomes Canotilho, destacando o caráter fundamental dos princípios jurídicos visto que estes são, “no plano da justificação, o fundamento formal normativo dos demais direitos, o seu ponto de partida. Os princípios, entre outras características, possuem o caráter de fundamentabilidade do sistema, e, portanto uma natureza normogenética, uma vez que são fundamentos de regra, isto é, são normas que estão na base ou constituem a ratio de regras jurídicas”. (Direito Constitucional, 6 ed., Coimbra: Almedina, 1993, p. 167). Injusto restaria este escrito, se não sublinhasse a definição de Plá Rodriguez que princípios são “linhas diretrizes que informam algumas normas e inspiram direta ou indiretamente uma série de soluções, pelo que podem servir para promover e embasar a aprovação de novas normas, orientar a Revista Del Rey Jurídica interpretação das existentes e resolver casos não previstos”. (Los Princípios de Derecho del Trabajo, Montevidéu, 1975., P. 17). Relativamente aos específicos trabalhistas depreende-se que poucos são os autores duvidosos da existência de princípios próprios do Direito Processual do Trabalho. Todavia, seguindo os passos do ilustre Wagner Giglio, ficaremos apenas com os efetivamente próprios, ou seja, privativos da disciplina acima mencionada. Não parece a idéia de hierarquizar tais fundamentos basilares do fenômeno jurídico, todavia, o princípio protecionista, além de essencial no domínio trabalhista, na presente reflexão denota, a meu ver, o caminho para efetividade do ordenamento juslaboral. Como dito, Giglio vaticina que “o caráter tutelar do Direito Material do Trabalho se transmite e vigora também no Direito Processual do Trabalho”. (Direito Processual do Trabalho. 16 ed., São Paulo: Saraiva, 2007, p. 85). Por oportuno, a temática executória deve ser explorada em seu conceito, mesmo que singelo, a fim de levar ao leitor, a posteriori, seu objetivo precípuo e via de consequência partir para a análise da efetividade, sob o manto desses mandamentos basilares. Manoel Antônio Teixeira Filho, no ensaio de um conceito específico sobre a execução forçada, no âmbito do processo do trabalho, preleciona: “Execução forçada é a atividade jurisdicional do Estado, de índole essencialmente coercitiva, desenvolvida por órgão competente, de ofício ou mediante iniciativa do interessado, com o objetivo de compelir o devedor ao cumprimento da obrigação contida em sentença condenatória transitada em julgado ou em acordo judicial inadimplido ou em título extrajudicial previsto em lei”. (Execução Direitos Processual do Trabalho no Processo do Trabalho. 5 ed. São Paulo: LTr, 2001 p. 33) Enfatizando, ainda, o escopo de tal procedimento, leciona Cleber Lúcio que: “A execução tem objetivo, em suma, a satisfação do direito reconhecido na sentença (título executivo judicial) ou em ato negocial ao qual a lei confere força executiva (título executivo extrajudicial), ou segundo Francesco Carnelutti, proporcionar ao titular do Direito subjetivo ou do interesse protegido, a satisfação sem ou contra a vontade do obrigado”. (Direito Processual do Trabalho. Ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2006, p. 830). Pelo contexto acima delineado, o que se depreende é a indicação conceitual da essência satisfativa, por excelência, do processo executório, sendo certo que, nesta fase, a atividade jurisdicional deve se tangenciar ao estrito cumprimento do comando sentencial, respeitando, por óbvio, as garantias processo - constitucionais do Estado Democrático de Direito. Mais do que isso, o legislador deverá criar mecanismos de avanços de modo a impedir ao devedor retardar o cumprimento da coisa julgada injustificadamente, ocorrendo em certos casos de a execução prolongar-se por muito mais tempo que a fase anterior cognitiva, o que de pronto, se torna inadmissível. As presentes indicações e reflexões, em torno dos princípios jurídicos, não deixam dúvidas que para o caminho da efetividade da norma jurídica posta em sociedade, o operador do Direito deve se despir do apego à proteção formal ao devedor e buscar acima de tudo, porém com o digno tratamento jurídico e social, a essência satisfativa do processo executório, em prestígio, inclusive, da própria decisão jurisdicional. Sem nos esquecer, contudo, de que todo provimento executivo tem a sua eficácia constantemente ameaçada pelo transcurso do tempo, que usualmente é visto como vilão declarado e incansável do processo, hoje, inclusive com prerrogativa constitucional indicativa no título dos direitos e garantias fundamentais, qual seja, o tempo razoável de duração do processo. Especificamente, em matéria trabalhista, os princípios jurídicos aplicáveis não permitem delongas, não só pela urgência ditada pela necessidade de satisfação econômica de direitos, em grande parte de natureza alimentar, como também em decorrência dos imperativos sociais e políticos. A solução, como dito, passa pela efetividade e correta aplicação dos princípios dessa ciência jurídica, ademais pelos fins colimados pelo Direito do Trabalho, ou melhor, pelo “direito fundamental ao trabalho digno e protegido”. Livros indicados: Direito Processual do Trabalho 3ª edição Cleber Lúcio de Almeida Editora Del Rey Direito Processual do Trabalho Comparado Manoel Carlos Toledo Filho, Vitor Salino de Moura Eça (coordenadores) Editora Del Rey www.delreyonline.com.br 25 DIREITO CIVIL Arquivo CYB Arquivo pessoal PRIMEIRAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A RECENTE REFORMA NA LEI DE LOCAÇÕES DE IMÓVEIS URBANOS (LEI N. 12.112/2009) Leonardo de Faria Beraldo Advogado em Belo Horizonte. Mestre em Direito pela PUC Minas. Especialista em Processo Civil. Professor em cursos de graduação e pós-graduação de Direito Civil e Processual Civil. Membro da Lista de Árbitros e do Conselho Deliberativo da CAMARB – Câmara de Arbitragem Empresarial Brasil. Diretor-Segundo Secretário do Instituto dos Advogados de Minas Gerais. Diretor SecretárioGeral e Professor da Escola Superior de Advocacia da OAB/MG. 26 1. INTRODUÇÃO No dia 9 de dezembro de 2009 foi publicada no Diário Oficial da União a Lei n. 12.112, que altera a Lei n. 8.245/91 (Lei de Locação), para aperfeiçoar as regras e procedimentos sobre locação de imóvel urbano. Algumas alterações são novidades, por outro lado, outras são apenas a positivação de questões que já estavam consolidadas nos nossos tribunais, em especial pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ. A lei entra em vigor no dia 23 de janeiro de 2010. Como não há prazo expresso para a sua vigência, a vacatio legis é de 45 dias, nos termos do art. 1º da Lei de Introdução ao Código Civil e, para fins da contagem desse prazo, aplicar-se-á o disposto no art. 8º, § 1º, da Lei Complementar n. 95 de 1998. Cumpre, ainda, informar que o Instituto Brasileiro de Defesa dos Lojistas de Shoppings (IDELOS) ajuizou, no Supremo Tribunal Federal STF, a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn) n. 4.366, sob a relatoria da Ministra Ellen Gracie, arguindo que o art. 59, § 1º, IX (despejo liminar por falta de pagamento de aluguel ou acessórios), da nova lei, é inconstitucional. Alega o referido instituto que o dispositivo legal afronta os arts. 1º, III; 5º, LV; e 170, caput, todos da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. A nosso ver, trata-se de tentativa desesperadora e infeliz de impedir que a nova lei cumpra o seu verdadeiro papel na nossa sociedade, que é o de punir o mau locatário, e, ao mesmo tempo, o de proteger o locador que está em dia com suas obrigações. 2. AS APARENTES NOVIDADES A mídia vem trazendo alguns temas como se fossem grandes novidades, porém, conforme demonstraremos a seguir, já existiam na Lei n. 8.245/91 ou então já eram matérias pacificadas na jurisprudência. O art. 4º possui uma nova redação: “Durante o prazo estipulado para a duração do contrato, não poderá o locador reaver o imóvel alugado. O locatário, todavia, poderá devolvê-lo, pagando a multa pactuada, proporcionalmente ao período de cumprimento do contrato, ou, na sua falta, a que for judicialmente estipulada”. Ocorre que, antes da nova Lei, o locatário já poderia devolver o imóvel antes de findo o contrato e pagar multa proporcional. A diferença é que a disposição legal anterior fazia menção ao art. 924 do Código Civil de 1916, correspondente ao art. 413 do Código Civil de 2002, que permite ao juiz reduzir a cláusula penal de forma proporcional. Portanto, a conclusão a que se chega é a de que isso não é nenhuma inovação. Revista Del Rey Jurídica Também vem sendo falado que a nova lei beneficia o fiador, tendo em vista que o art. 12, § 2º, dispõe que “o fiador poderá exonerar-se das suas responsabilidades no prazo de 30 (trinta) dias contado do recebimento da comunicação oferecida pelo sub-rogado, ficando responsável pelos efeitos da fiança durante 120 (cento e vinte) dias após a notificação ao locador”. Contudo, já estava assentada na jurisprudência tal possibilidade (STJ, REsp n. 540.669/RJ ou REsp n. 316.173/ RJ), até mesmo em razão da primitiva redação do parágrafo único do mencionado artigo, que hoje deixou de existir, pois possui redação melhorada e com nova numeração. Segundo os jornais de grande circulação, com a nova lei, o fiador ficará vinculado ao contrato mesmo que ele seja prorrogado, automaticamente, por prazo indeterminado, haja vista o teor do art. 39: “Salvo disposição contratual em contrário, qualquer das garantias da locação se estende até a efetiva devolução do imóvel, ainda que prorrogada a locação por prazo indeterminado, por força desta Lei”. Todavia, ocorre que o STJ já vem decidindo, desde o ano de 2006, que “continuam os fiadores responsáveis pelos débitos locatícios posteriores à prorrogação legal do contrato se anuíram expressamente a essa possibilidade e não se exoneraram nas formas dos artigos 1.500 do CC/16 ou 835 do CC/02, a depender da época que firmaram a avença” (STJ, REsp n. 821.953/ RS ou AgRg no Ag n. 776.039/MG). Por fim, outra alteração que se tem colocado como uma novidade supostamente benéfica ao fiador é a da possibilidade de ele poder se exonerar do seu dever de garante da obrigação de pagamento do locatário, desde que o contrato seja prorrogado por prazo indeterminado. Para tanto, basta que ocorra a “prorrogação da locação por prazo indeterminado uma vez notificado o locador pelo fiador de sua intenção de desoneração, ficando Direito Civil obrigado por todos os efeitos da fiança, durante 120 (cento e vinte) dias após a notificação ao locador” (art. 40, X). Nessa hipótese, o fiador poderá se livrar de seu encargo e o locador poderá exigir, do locatário, uma nova garantia. Aqui, uma vez mais, pode-se afirmar que não há qualquer novidade, pois ele já poderia assim proceder, tendo em vista o disposto nos arts. 1.500 do CC/1916 ou 835 do CC/2002. A jurisprudência do STJ era tranqüila a esse respeito e permitia facilmente a sua concretização. 3. AS INOVAÇÕES MAIS RELEVANTES Nesse tópico analisaremos, superficialmente, algumas das reais novidades trazidas pela Lei n. 12.112. A propósito, nem mesmo todas elas podem ser vistas como novas criações do nosso legislador, pois, em alguns casos, já existia solução semelhante no nosso ordenamento jurídico. A nosso ver, a mais importante delas diz respeito à ação de despejo. O art. 59, § 1º, trouxe quatro novas hipóteses do chamado despejo liminar, isto é, situações nas quais o locatário será citado para sair do imóvel em apenas quinze dias. Os únicos dois requisitos para que isso aconteça são: i) a ocorrência de uma das situações previstas no § 1º do art. 59 e ii) que o locador preste caução de valor referente a três meses de aluguel. Vale lembrar que essa decisão judicial deve ser tomada sem a audiência do réu e desafia o recurso de agravo de instrumento, que, em nenhuma hipótese, poderá ser convertido em agravo retido pelo tribunal, pois nessas circunstâncias sempre haverá risco de dano irreparável ou de difícil reparação. Com efeito, os quatro novos incisos (VI a IX) de despejo sumário do rol do art. 59, § 1º, que é taxativo, são os seguintes: “VI – o disposto no inciso IV do art. 9º, havendo a necessidade de se produzir reparações urgentes no imóvel, determinadas pelo poder público, que não possam ser normalmente executadas com a permanência do locatário, ou, podendo, ele se recuse a consenti-las; VII – o término do prazo notificatório previsto no parágrafo único do art. 40, sem apresentação de nova garantia apta a manter a segurança inaugural do contrato; VIII – o término do prazo da locação não residencial, tendo sido proposta a ação em até 30 (trinta) dias do termo ou do cumprimento de notificação comunicando o intento de retomada; IX – a falta de pagamento de aluguel e acessórios da locação no vencimento, estando o contrato desprovido de qualquer das garantias previstas no art. 37, por não ter sido contratada ou em caso de extinção ou pedido de exoneração dela, independentemente de motivo”. O mais importante de todos é, sem dúvida, o inciso IX, pois permite o despejo imediato do locatário que não honra com a sua obrigação de pagar o aluguel e acessórios (v.g., o condomínio e o IPTU) em dia. Não se pode tolerar mais que o inquilino não cumpra a sua obrigação e, mesmo assim, ainda possa ficar residindo no imóvel até o deslinde da demanda. Destarte, após uma leitura dos incisos acima transcritos, podemos formular os seguintes questionamentos: 1º) Caso o locatário apresente um novo fiador, com 5 dias de atraso, poderá o locador despejá-lo com fulcro no inciso VII? Na nossa opinião, cabe ao juiz verificar as particularidades do caso concreto. Como o inadimplemento deu-se por pouquíssimos dias, e se se constatar que o locatário sempre cumpriu com afinco e pontualidade suas obrigações, não há porque não permitir que ele fique no imóvel. 2º) Será possível o ajuizamento de ação de despejo nas locações comerciais, com base no inciso VIII, poucos dias após o término dos trinta dias previstos na lei? Ou seria esse um prazo decadencial? Nesse 27 DIREITO CIVIL 28 legal é completamente desprovido de lógica. Por que é que o locador que tem uma garantia deve esperar a sentença ser proferida para tirar o locatário inadimplente do imóvel, que, aliás, corre inclusive o risco de nunca receber os valores devidos, e o locador sem qualquer garantia dispõe do benefício do despejo sumário? Com todo o respeito, trata-se de uma opção legislativa equivocada e que deve ser obtemperada pelos advo- cador? Essas respostas certamente não são fáceis de ser respondidas, e demandariam muitas linhas para tanto, o que infelizmente não dispomos nessa oportunidade, mas é algo que a comunidade jurídica deve parar para pensar. Com efeito, no tocante aos questionamentos de números 2 e 4, vale lembrar que, caso a liminar seja indeferida com base no descumprimento da letra fria da lei, sempre será viável o pedido de antecipação de tutela, na forma do art. 273 do CPC, e que certamente será deferida, desde que os requisitos estejam presentes, conforme já decidiu o STJ inúmeras vezes. Dentre elas, destacase o Recurso Especial n. 445.863/SP. Outra criação da lei nova foi a de possibilitar que o fiador possa purgar a mora do locatário na ação de despejo (art. 62, II). Antigamente, essa faculdade era exclusiva do locatário. Portanto, vê-se que essas são algumas situações que facilmente irão surgir e caberá à jurisprudência resolvê-las da melhor maneira possível, sempre valendo-se dos princípios da boa-fé objetiva, da razoabilidade e da proporcionalidade. Arquivo CYB mesmo artigo já havia um inciso que permitia a concessão de liminar. Estamos nos referindo ao inciso III, que permite o despejo liminar desde que ocorra o seguinte: “o término do prazo da locação para temporada, tendo sido proposta a ação de despejo em até trinta dias após o vencimento do contrato”. Na doutrina especializada sobre o tema, todos são unânimes em não admitir a possibilidade de deferimento da liminar na ação de despejo, se ultrapassados os tais 30 dias. Todavia, o fundamento legal utilizado por todos é o fato de o art. 50 e o seu parágrafo único disporem que, caso não seja ajuizada a ação no prazo legal, presumir-se-á prorrogada a locação por tempo indeterminado, somente podendo ser desfeita após 30 meses ou nas hipóteses do art. 47 (denúncia cheia). Por outro lado, a nova hipótese trazida pela Lei n. 12.112 não cria uma conseqüência para o não cumprimento do prazo. Destarte, fica a dúvida se esse prazo seria ou não decadencial. A nosso ver, trata-se de decadência sim, e, caso seja inobservado, caducará o direito de obter a liminar na forma do inciso VIII do art. 59. 3º) E com relação ao despejo por falta de pagamento? Ele será cabível, com amparo no inciso IX, mesmo quando o locatário tiver apresentado alguma garantia? Apesar de ser muito mais fácil concordar com o legislador e não permitir o despejo sumário quando o contrato de locação tiver sido garantido por um fiador, preferimos defender a tese contrária, na medida em que o dispositivo gados e magistrados. 4º) E quando o locatário tiver realizado benfeitorias no imóvel, e o locador não as quiser compensar com o valor do aluguel? Qual será a medida legal que o locatário deverá tomar para ilidir o despejo liminar do inciso IX? Seria possível manejar a ação de consignação em pagamento para impedir a efetivação da liminar de despejo? Ou o caminho correto seria pagar o valor do integral do aluguel e, logo em seguida, ajuizar uma ação de cobrança em face do lo- 4. DIREITO INTERTEMPORAL Quando falamos em direito intertemporal, estamos nos referindo à dúvida que pode vir a existir sobre qual lei deverá ser aplicada ao caso concreto, a revogada ou a vigente. Nesse caso, Revista Del Rey Jurídica então, existem duas regras básicas que devem ser observadas pelo aplicador do Direito: i) a lei processual tem aplicação imediata; ii) o direito das obrigações é regido, na formação do vínculo, pela lei vigente no momento da celebração do pacto; iii) os seus efeitos, contudo, são regulados pela lei nova, ex vi do disposto no art. 2.035 do CC/2002; e iv) não retroage, respeitando-se o ato jurídico perfeito, a coisa julgada e o direito adquirido. Para melhor compreensão disso, passemos à análise de três exemplos. No primeiro, verifiquemos o teor do art. 62, parágrafo único: “Não se admitirá a emenda da mora se o locatário já houver utilizado essa faculdade nos 24 (vinte e quatro) meses imediatamente anteriores à propositura da ação”. Poder-se-ia pretender sustentar que a purgação da mora a que se faz menção seria apenas aquela que teria ocorrido já na vigência da nova lei. Entretanto, esse não parece ser o melhor entendimento. A nosso ver, se no dia 11/01/2009, ou seja, um ano antes da vigência da nova lei, o locatário purgou a mora ao ser citado para responder a uma ação de despejo, e, no dia 18/05/2010 ele é citado para responder a uma outra ação de despejo, do mesmo imóvel, ele não poderá purgar a mora dessa vez. A vedação decorre da regra acima mencionada que, certamente, tem aplicação imediata. Dessa forma, podemos afirmar que o art. 62, parágrafo único deve ser aplicado mesmo se a purgação da primeira mora tenha ocorrido antes da vigência da Lei n. 12.112. No segundo, fica a dúvida se algumas das hipóteses de despejo liminar do art. 59 poderão ser aplicadas, a partir da vigência da lei nova, aos processos que já estão tramitando. A nossa resposta é positiva. Assim, se Direito Civil foi ajuizada uma ação de despejo por falta de pagamento no ano de 2008 ou 2009, e o réu (locatário-devedor) ainda continua no imóvel, não há porque não permitir que lhe seja dado o prazo de 15 dias para entregar o bem espontaneamente, sob pena de despejo compulsório. A lei não está retroagindo, está apenas efetivando um novo direito do locador, e assim o faz sem violar situações consolidadas à luz da lei velha. No terceiro, vejamos o que dispõe o art. 64: “Salvo nas hipóteses das ações fundadas no art. 9º, a execução provisória do despejo dependerá de caução não inferior a 6 (seis) meses nem superior a 12 (doze) meses do aluguel, atualizado até a data da prestação da caução”. Dessa feita, se a ação de conhecimento iniciouse à luz da lei velha, será perfeitamente possível que a execução provisória ou o cumprimento provisório de sentença, que comece já sob a vigência da nova lei, se valha dessa caução mais branda. Ora, se a lei produz efeitos imediatamente, não há porque pretender aplicá-la apenas aos processos ajuizados a partir de 23 de janeiro de 2010. Caso, no entanto, já esteja em andamento a execução provisória, e a caução já tiver sido prestada, não poderá o juiz permitir que o exeqüente levante a diferença, pois, nessa situação, estamos diante de ato processual já consumado à luz da lei velha, que não pode ser alcançado pela lei nova. Portanto, o que se pode perceber é que a lei posterior pode atingir a fase estática da situação jurídica, sem que, com isso, se ofenda os ditames legais e constitucionais acerca da vigência da lei no tempo. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Após essa análise breve e sem muita profundidade da Lei n. 12.112, podemos concluir que a nova lei veio para trazer maior proteção para o locador, sem, contudo, injustiçar o bom e honesto locatário. Aquele locatário que cumprir com suas obrigações, conforme avençado, não terá o menor problema durante o prazo de vigência do contrato e nem mesmo será penalizado. O fiador, por sua vez, deve pensar bem antes de garantir algum inquilino, pois as conseqüências do inadimplemento dele são muito sérias, podendo o fiador, até mesmo, perder o seu bem de família, conforme já decidiu, por várias vezes, o STF e o STJ. Finalmente, quanto ao Judiciário, este deve buscar compreender o melhor sentido da norma, dentro, claro, do ordenamento jurídico como um todo. A idéia, como já asseveramos, é a de se proteger o locador e a de se punir, cada vez mais, o mau locatário. Há uma série de situações que ocorrerão, e obviamente nem todas foram abordadas nesse sucinto artigo, que não têm uma solução pronta e acabada na lei e que deverão ser criadas, sempre diante do caso concreto, pelo magistrado. Princípios como o da boa-fé objetiva, o da razoabilidade e o da proporcionalidade sempre devem ser lembrados e aplicados, seja nos casos nos quais a lei parece ser clara, mas é injusta, seja naqueles em que a lei é obscura. Livro indicado: Inovações na Lei do Inquilinato Lei nº.12.112 Humberto Theodoro Junior Editora GZ www.delreyonline.com.br 29 DIREITO AMBIENTAL Arquivo CYB Cláudia Cunha AUTONOMIA DO DIREITO AMBIENTAL Célia Pimenta Barroso Pitchon Advogada ambientalista. Representou a OAB no Conselho de Política Ambiental do Estado de Minas Gerais e no Conselho Estadual da Instituição. Foi Diretora da Escola de Advocacia no ramo do Direito Ambiental e Juíza do Tribunal Regional Eleitoral do Estado de Minas Gerais, representando a classe dos advogados. Presidenta do Movimento das Advogadas Mineiras - MAM 30 A crescente produção de normas motivada pelos justificados anseios sociais para o controle das atividades do homem sobre o meio ambiente impactou o sistema jurídico, que protegia os recursos naturais apenas de forma periférica e assistemática. A construção da nova doutrina e da jurisprudência representa instigante desafio para os juristas na solução das complexidades oriundas da adaptação do sistema jurídico ao novo ramo do direito e seus princípios. A divergência sobre a autonomia do direito ambiental é apenas uma das questões jurídico-ambientais com as quais se deparam os operadores do direito e sua elucidação necessária para a adequada pedagogia do tema, que se revela de fundamental importância para o homem contemporâneo. As mais diversas correntes doutrinárias perpassam pelo entendimento acerca da completa autonomia do direito ambiental , para aquela que o caracteriza como direito especializado e, finalmente, abrigar a que nega a sua independência como ramo autônomo do direito. Os defensores da autonomia sustentam que o surgimento de princípios próprios e peculiares, por si só, caracterizaria a independência do direito ambiental. A doutrina que defende a especialização busca solucionar o antagonismo decorrente da constatação da presença de normas ambientais em inúmeros outros ramos do direito, coexistência que dá sustentação aos juristas que asseguram a inexistência da autonomia do direito ambiental. O ilustrado Prof. Hely Lopes Meirelles, em artigo denominado “Proteção Ambiental e Ação Civil Pública” (Revista Justitia, volume n° 135 ) sustenta a tese da autonomia do Direito Ambiental: “(...) A proteção ambiental visa à preservação da Natureza em todos os elementos essenciais à vida humana e à manutenção do equilíbrio ecológico, diante do ímpeto predatório das nações civilizadas que, em nome do desenvolvimento, devastam florestas, exaurem o solo, exterminam a fauna, poluem as águas e o ar. Essa ação destruidora da Natureza é universal e milenar, mas agravou-se neste século em razão do desmedido crescimento das populações e do Revista Del Rey Jurídica avanço científico e tecnológico, que propiciou à humanidade a mais completa dominação da terra, das águas e do espaço aéreo. Viu-se, assim, o Estado moderno, na contingência de preservar o meio ambiente para assegurar a sobrevivência das gerações futuras em condições satisfatórias de alimentação, saúde e bem-estar. Para tanto, criou-se um direito novo - o direito ambiental - destinado ao estudo dos princípios e regras tendentes a impedir a destruição ou a degradação dos elementos da Natureza. Daí o surgimento das limitações de proteção ambiental, sob os aspectos de: a) controle da poluição; b) preservação dos recursos naturais; c) restauração dos elementos destruídos; d) ação civil pública (...)” Édis Milaré entende que “... o Direito do Ambiente, pelo fato de estabelecer-se sobre princípios específicos- alguns deles quase com caráter de exclusividade – vem erigindo-se em ramo científico acentuadamente peculiar ( seria prematuro chamá-lo autônomo). Este fenômeno não é particular às ciências jurídicas, vez que o mesmo ocorre com outras ciências que se ocupam do meio ambiente, como a Ecologia e a Economia, que dão origem a novos conhecimentos científicos interdisciplinares, alguns deles já autônomos...” ... “O movimento de cidadãos conquista espaços políticos que se materializam em leis de conteúdo, função e perspectivas bastante diversos do conhecido pela ordem jurídica tradicional. O Direito Ambiental inclui-se entre os novos direitos como um dos mais importantes. Vale dizer, um ramo especializado dentro da velha árvore da ciência jurídica renovada. Sim, um Direito especializado- e não autônomo –, certo que o Direito é um só, no qual a influência e a relação contínua entre os seus diversos raDireito Ambiental mos é inevitável (Milaré, Edis. Direito do Ambiente. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 2005, p.173/175). Toshio Mukai não reconhece a autonomia do direito ambiental por vislumbrar um conjunto de normas e institutos jurídicos pertencentes a vários ramos do Direito, reunidos por sua função instrumental para a disciplina do comportamento humano em relação ao seu meio ambiente (MUKAI, Toshio. Direito ambiental sistematizado. 4ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002, p. 11/13 ). Se o dano ambiental não respeita fronteiras políticas, o mesmo se pode dizer das fronteiras do direito ambiental, que não se contêm em seu próprio arcabouço. Porém, o fenômeno da extraordinária ramificação das regras ambientais no sistema jurídico não é capaz de sustentar a conclusão de que não há autonomia do novo ramo do direito. Evidentemente , não há autonomia absoluta de qualquer especialidade do direito, todos têm autonomia relativa, como membros de um único corpo. A presença de normas de cunho ambiental nos mais diversos ramos do direito decorre da supremacia do bem que o direito ambiental pretende proteger que, em última análise, é a vida humana. Pela importância vital do bem protegido, as normas são projetadas para outros ramos do direito, o que não descaracteriza a autonomia mas ao contrário reforça sua relevância e a independência . O direito ambiental é um ramo autônomo do direito, possui princípios singulares e suas regras, pela importância vital do bem protegido, transpassam pela ordem jurídica, como feixe de luz. Aos juristas interessados na proteção ecológica cabe a inescusável missão de explicitar o conteúdo e o alcance das novas regras para a sociedade e contribuir para a construção da nova doutrina, elucidando sérias questões jurídicas como, por exemplo, a legitimidade concorrente do direito do usuário dos recursos naturais , do empreendedor e do proprietário da terra, da ampla competência ambiental, material e legislativa , atribuída aos entes da federação , gerando uma complexa teia normativa de difícil compreensão e o aparente choque de princípios entre diferentes ramos do direito e aqueles introduzidos pelo direito ambiental. O enfrentamento de tais questões pela doutrina se traduzirá em contribuição inestimável para o alcance do desenvolvimento sustentável, em prol da qualidade de vida da presente e futuras gerações. Livros indicados: Introdução ao Direito Ambiental Talden Farias Editora Del Rey Patrimônio Cultural como um Bem Difuso Henrique Augusto Mourão Editora Del Rey www.delreyonline.com.br 31 DIREITO AUTORAL Arnaldo Oliveira Junior Advogado, Editor e Especializando em Direito Processual Civil pela Universidade Gama Filho 32 O plágio na era moderna tem sido facilitado diante das novas formas de expressão dos trabalhos intelectuais, propiciando neste novo formato a facilitação do uso ou furto das ideias alheias. Se fosse necessário dizer em poucas palavras o que é o plágio, bastava dizer que se trata da atividade de copiar algum autor de trabalho intelectual, tendo todo o cuidado de esconder a identidade do verdadeiro criador. Em alguns momentos, pode-se pensar que os plagiários são sujeitos sem criatividade. Ao contrário do que muitos pensam, às vezes são criativos até demais. Plagiário ou plagiato é aquele que surrupia a obra alheia, se apropria de seu conteúdo como se fosse ele próprio o criador. É assim que começou o plágio, como bem explica Elisângela Menezes: “A idéia do plágio não é nova. Já na antiguidade romana, os chamados plagiários eram verdadeiros assaltantes, que roubavam dos viajantes os bens artísticos que esses levavam consigo, tais como pinturas, poemas, letras de músicas, para mais tarde se apresentarem como autores dessas obras, propondo sua venda. Seu comportamento era abominado pela sociedade.” (Curso de Direito Autoral. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 132). Certa feita, um professor de um curso de pós-graduação de referência no Brasil relatava a esperteza de um dos seus orientandos que apresentou um texto plagiado como de sua autoria na maior parte de sua dissertação. Só que o texto original foi publicado em outro país e o “criativo” plagiário teve ainda o labor de traduzir toda obra. Dessa feita, não esperava que seu orientador conhecesse o texto original, o que lhe rendeu reprovação em sua pós-graduação. Nota-se, no entanto, que o plágio é uma forma de reconstrução de texto, que tem como base um texto pré-existente, e, para configurarse, é necessário que o plagiador omita a referência do texto original. Para que seja feito, é fundamental a vontade do agente plagiador em apropriar-se do que não lhe pertence e tentar dar o seu perfil. É como o crime de furto tipificado no CP no qual o indivíduo toma para si ou para outrem coisa alheia móvel. Tem que ser feito na surdina, para que não seja desmascarado. O infrator burla um livro da noite para o dia. Pedro Orlando os descreve como animais, ao dizer: “Entretanto, como verdadeiras aves de rapina, aí estão e por aí pululam, os aproveitadores do trabalho alheio, os quais vivem a se locupletar à custa do esforço e do valor dos que produzem, dos que vencem pela idéia, pela concepção de um mundo melhor, de uma vida melhor, escrevendo, compondo, traduzindo, construindo, para uso e gozo da coletividade (...)” (Direitos Autorais. Rio de Janeiro: Nova Jurisprudência, p. 9). Para caracterização do plágio é imprescindível que o plagiador dê publicidade ao material plagiado, tornando-o acessível ao público. Da mesma maneira, pode-se afirmar que só é possível plagiar obra que esteja também disponível ao público. Pouco importando, no caso in concreto, se essa disponibilização se dá de forma gratuita ou onerosa, e, ainda, seja qual for a sua forma, se editada e publicada, se disponibilizada em formato eletrônico, áudio, ou qualquer outro tipo de mídia. Mesmo que esta forma de disponibilização seja distinta da forma original da obra plagiada, bastando para a sua consumação a simples divulgação da obra plagiada. (PONTES NETO, Hildebrando. Aspectos sobre o plágio in ADOLFO, Luiz Gonzaga Silva; MORAES, Rodrigo. Propriedade intelectual em perspectiva. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 136) google.com/ipd.gov.hk Arquivo pessoal A NOVA ROUPAGEM DO “PLÁGIO” EM FACE DAS INOVAÇOES TECNOLÓGICAS Revista Del Rey Jurídica Tendo em mente que o plágio não pode ser constatado pelo simples fato do uso de uma idéia alheia, uma vez que as idéias não são abrangidas na proteção autoral, tão pouco se for copiada somente a forma de expressão, sobra então a composição. Esta, sim, é a raiz, onde nasce o plágio. Para que o mesmo ocorra é necessário que uma ideia tome forma expressa sob uma composição singular. Nesse sentido, Carvalho Santos afirma que “temos, então, em toda obra, três elementos fundamentais: idéia, composição e forma de expressão. Ora, como o primeiro e o último são previamente conhecidos, conclui-se em última análise, a exclusividade do Direito Autoral é restrita à proteção da composição.” (Repertório enciclopédico do direito brasileiro. Rio de Janeiro: Borsoi, 1947, v. XXXVII, p. 190-191). Torna-se necessário sempre avaliar o que de fato é o objeto do plágio. Visto que apenas ideias, ainda sem forma, não são objeto de proteção. No entanto, com as facilidades tecnológicas, está mais fácil o acesso ao material que ainda não tomou uma forma ou sequer fora divulgado. Através de um hacker uma obra intelectual pode ser acessada antes mesmo que seu criador a divulgasse. Recentemente no Brasil dois programas de televisão tiveram um embate: Casa dos Artistas e o Big Brother. O primeiro foi acusado, no âmbito judicial, de ter incorrido em plágio ao levar ao ar um programa parecido com o segundo, antes mesmo que este estivesse estreado no Brasil. Não houve confirmação de plágio, uma vez que a ideia e a forma até poderiam ser parecidas, mas a composição era totalmente diferente. Sob a afirmação do ilustre e saudoso jurista Carvalho Santos, “haverá, portanto, plágio quando houver semelhança no tratamento da composição da obra plagiada; salvo quando, pela própria natureza do assunto da obra (anatomia, geografia, cosmografia, etc.), sua Direito Autoral composição não comportar tratamento diverso.” (CARVALHO SANTOS, 1947). Muito utilizado no meio universitário, o plágio virtual é uma das influências das novas tecnologias. Trata-se de plágio como outro qualquer, sendo que o diferencial são os meios utilizados em face da facilidade tecnológica. O mesmo se dá no âmbito da informática, onde é possível encontrar na internet sites específicos em dar suporte a alunos para arranjos com o fim de se fazer um trabalho ou monografia. Nesses casos o plagiário se utiliza de textos disponíveis na rede e através de pequenos ajustes e/ou correções transforma a autoria do trabalho ou texto em discussão para sua própria autoria. Esse furto intelectual, termo utilizado por Pedro Orlando, é que tem contribuído para uma baixa produção acadêmica nas universidades brasileiras, visto que o individuo capaz de cometer tal infração é um indivíduo com poucas possibilidades de contribuir num futuro próximo com a criação ou qualquer novidade intelectual. Será sempre uma pessoa escorada nas idéias de outros e dificilmente terá êxito em suas tentativas de criação. Muito embora a tecnologia seja extremamente útil, e mais, motivando e induzindo as pessoas a ler e escrever mais, traz consigo o comodismo e a facilidade de trazer para os leitores algo que verdadeiramente não reflete o íntimo do suposto autor. Esse tipo de prática ilícita tem se tornado cada vez mais comum e alcançado até mesmo pós-graduandos. É o famoso control c, control v, quando se copia e na sequência se cola o conteúdo copiado. Verdadeiramente aqui se aplica o dito popular de que nada se cria, tudo se copia. Alguns professores, já cansados de ter que ficar pesquisando se determinados textos são oriundos ou não de um plágio virtual, estão exigindo, em pleno século XXI, que os trabalhos acadêmicos sejam entregues em formato manuscrito. Já que o indivíduo vai copiar mesmo, pelo menos que tenha o trabalho de escrever, para, por consequência, ler o que está entregando. Afinal, com tal facilidade de tecnologia, as pessoas não estão se dando ao trabalho de sequer lê-lo. E o problema não vem de agora. Pedro Orlando, em pleno início da década de 1940, já trazia a lume as dificuldades da vida moderna daquela época dizendo: “Frente aos imprevistos da hora atual, em face dos imperativos da vida moderna, nada há mais frequente, nem mais inevitável do que o furto intelectual de obras literárias, artísticas, técnicas ou científicas. Nada há mais inconteste do que o direito de autor, dadas as próprias características da obra. Nada há mais característico, por exemplo, do que o estilo, o plano do trabalho, o assunto, o motivo, a origem, a forma usada e quantos pontos de referência possam ser apontados em abono da propriedade literária, científica ou artística.” (ORLANDO). Livros indicados: Curso de Direito Autoral Elisângela Dias Menezes Os contratos de cesão de direitos autorais e as licenças virtuais creatives commons 2ª edição Hildebrando Pontes www.delreyonline.com.br 33 34 Revista Del Rey Jurídica Direitos Humanos 35 Ana Surany Martins Costa Especialista em Direito Previdenciário. Advogada militante. 36 QUERO TE AMAR, MAS NÃO DEVO: A SÍNDROME DA ALIENAÇÃO PARENTAL COMO ELEMENTO FOMENTADOR DAS FAMÍLIAS COMPOSTAS POR CRIANÇAS ÓRFÃS DE PAIS VIVOS A responsabilidade parental que desenvolveu a consciência dos direitos da personalidade dos filhos e dos genitores, ampliando o exercício das funções parentais, trouxe alguns aspectos negativos, tais como a SAP – Síndrome da Alienação Parental, implantação de falsas memórias ou ainda Síndrome de Medeia. A SAP consiste em programar uma criança para que, depois da separação odeie um dos pais, sendo mais praticada por quem possui a guarda do filho, por meio de artifícios condenáveis, tais como a maledicência, mentiras, acusações falsas etc. O combate a tal Síndrome é relevante, tendo em vista que a sociedade é composta de indivíduos que têm sua bagagem psíquica construída com base na educação recebida pelos pais, reiterando o comportamento destes. A SAP se torna perniciosa ao Judiciário, mormente, por meio de falsas denúncias de abuso sexual (incesto) via manejo de ação cautelar, seja na forma incidental ou preparatória. Dessarte a cautelar se torna um instrumento jurídico perigoso por, geralmente, concretizar, de modo rápido, a pretensão do alienador que consegue ver deferida sua pretensão de ver suspensa a visitação do pai ao filho. Ademais, tem-se ainda a responsabilização do pai acusado em processo-crime, face à necessidade de se apurar o incesto noticiado, o que é feito por meio do exame de corpo de delito. Acerca de tal exame, há que se ter em mente que o registro de vestígios de violência do suposto abuso, tais como manchas, marcas roxas ou lesões símiles, além de membros quebrados etc, podem ser um ardil da mãe alienadora que pode ter se aproveitado, por exemplo, de um acidente doméstico ocorrido com o filho para imputar falsamente aquele incesto ao genitor nãoguardião. A morosidade da apuração dessas denúncias ocasiona a perda de precioso tempo de convivência pai-filho, em função da suspensão das visitas, por ser essa a primeira providência a ser tomada em casos de denúncia de abuso sexual. Nesse passo, verbera-se a necessidade de o Direito não servir de veículo a retaliações pessoais, já que sua função primeira é a Justiça, a qual, na concepção aristotélica, corresponde a dar a cada um o seu. Os operadores da ciência jurídica devem ter atenção na identificação do real intento da parte que pleiteie a suspensão da visitação ou até mesmo a destituição do poder familiar ao argumento de existência de incesto, seja por meio de cautelares ou por manifestação em processo ainda em curso. O magistrado deve analisar com atenção as provas detectadoras da SAP, que têm como principal espécie aplicável a de cunho pericial, já que esta é ricamente elaborada (através de entrevistas, estudos sociais, testes etc), sendo incomum magistrados que possuem formação específica em psicanálise e/ ou psiquiatria. Arquivo CYB Arquivo pessoal DIREITO DE FAMÍLIA Revista Del Rey Jurídica Isso eleva o labor dos peritos e assistentes técnicos em tais áreas da medicina como longa manus do Estado para o alcance do Direto e do ideal de justiça, contribuindo para que o juiz da seara familiar valore a prova pericial com acuidade extrema. Punitivamente, contra a SAP, é possível a indenização do dano moral sofrido pelo não guardião, já que a cumulação de dano material e moral é cabível quando advindos do mesmo fato, pois a regra civil indenizatória é genérica e projetável para todo o ordenamento jurídico. Também se pode responsabilizar o alienador por meio da reversão da guarda, da destituição do poder familiar, multa, fixação de visitas, advertências e encaminhamento dos pais a tratamento psicológico ou psiquiátrico. A guarda compartilhada também serve de solução, podendo-se lançar mão da psicoterapia familiar ou individual. Futuramente, será possível visualizar a SAP através de um salutar corpo normativo, tal como o do Projeto de Lei nº 4.053/2008 que se destaca por adicionar outros membros da família como possíveis agentes alienadores, determinando que os peritos apresentem histórico profissional ou acadêmico que lhes assegurem conhecimento do que seja a alienação parental e de como caracterizá-la. Em que pese as medidas punitivas, a principal arma para combater a SAP consiste no uso da razão, observação, acuidade e prudência, atributos esses que não estão tão distantes assim do homem-médio. É preciso empenho pelos membros do Judiciário, notadamente, em primeira instância, no exercício da observação, pois dos relatos contraditórios, comportamentos exagerados, gestos bruscos ou controlados ao extremo, timbres de vozes alteradas, olhares vingativos ou perdidos, pequenos lapsos, reiterações, omissões, Direito de Família A guarda compartilhada também serve de solução, podendo-se lançar mão da psicoterapia familiar ou individual. associação entre assuntos aparentemente díspares, recordações, expressões faciais etc, torna-se possível identificar, parcial ou totalmente, a SAP, vez que o discurso latente do sujeito franqueia o acesso à sua dinâmica intrapsíquica, ou seja, ao seu animus. Está-se diante de uma questão de sensibilidade, já que o verbo sentir não se aplica apenas e tão somente às sensações individuais, mas também em relação ao outro com alteridade, sendo mister nesse milênio que se judique sentindo o outro, interpretando-se a personalidade psíquica dos agentes em foco (indivíduos alienador e alienado). Nesse ambiente, papel relevantíssimo será o desempenhado pelo juiz que é o pai social, ou seja, a porta inaugural por onde a lide passa e recebe primeira assistência jurídica, cabendo a ele ter atenção e sensibilidade com todos os aspectos do processo, notadamente, por ocasião das audiências, tendo atenção redobrada com as palavras proferidas pelas partes em juízo, vez que a boca fala o que vai cheio o coração. E lutar contra a SAP é uma obrigação social, devendo-se velar pela observância dos direitos fundamentais apostos na CF/88 (caput do seu art. 227), bem como no ECA (notadamente em seu art. 18), onde se asseguram prerrogativas às crianças/adolescentes, tais como a inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral. A SAP deve ser combatida e, se possível, minada por consistir em verdadeira amputação psíquica que extirpa o amor paterno-filial que guarda liame com o afeto que se resume no locus do Direito de Família no século XXI, por colocar em risco a higidez psicológica de vários infantes e adolescentes que podem até mesmo ser vitimados por anos por tal Síndrome. Portanto, a alienação parental deve ser eficazmente combatida para que os menores vivenciem, amplamente, os elementos preenchedores da célula familiar, ou seja, a convivência arrimada no amparo, solidariedade, afeto e, sobretudo, na liberdade de amar e ser amado, tanto por seu pai, quanto por sua mãe, ou até mesmo por um terceiro, se for o caso, deixando de serem crianças órfãs de pais vivos, para que a SAP, que sob a ótica infantil pode ser traduzida sinteticamente na frase quero te amar, mas não devo, ceda lugar a outra oração, qual seja, quero e posso te amar. Livros indicados: Direito de Família 2ª edição Dimas Messias Editora Del Rey Código das Famílias Comentado Leonardo Barreto Moreira Alves (coordenador) Editora Del Rey Afeto e Estruturas Familiares Maria Berenice Dias, Eliene Ferreira Bastos e Naime Márcio Martins Moraes (coordenadores) Editora Del Rey www.delreyonline.com.br 37 DIREITO DE FAMÍLIA Arquivo CYB Arquivo pessoal DA RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA NAS AÇÕES DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE Carolina da Cunha Pereira França Magalhães A força da coisa julgada ante os desafios da verdade biológica Formada pela Universidade FUMEC, pós-graduada e especialista em Direito Civil pela Fundação Getúlio Vargas. Atua como advogada no escritório França Magalhães e Advogados Associados S/C. 38 Com o surgimento do exame de DNA, a questão da imutabilidade da coisa julgada, nas ações de investigação de paternidade, passou a ser questionada, trazendo a lume a discussão sobre a relativização desse instituto. Até meados da década de 1990, o entendimento predominante era o da irreversibilidade das decisões transitadas em julgado. Somente se admitia a sua modificação em sede de ação rescisória, nos casos previstos em lei. Diante da evolução científica, com a precisão trazida pelo exame de DNA, nasceu a discussão da possibilidade de relativizar a coisa julgada nas ações de investigação de paternidade, quando essa já houver sido declarada. Torna-se necessária a indagação acerca da sustentação da imutabilidade do julgado, advindo da presunção relativa, consubstanciada numa decisão judicial que forma uma verdade ficta, distante de uma verdade real. A discussão maior gira em torno da relativização da coisa julgada material. Ainda que enumerada constitucionalmente como direito fundamental, ela não pode apresentar caráter absoluto, quando em confronto com outros princípios também protegidos pelo sistema jurídico. A Constituição da República lista outros direitos fundamentais, tais como o acesso à ordem jurídica justa, a proporcionalidade, a legalidade, a boa-fé, a dignidade da pessoa humana, entre outros. Considerando os conceitos de coisa julgada formal e material, defende-se aqui a tese de que, nas ações de investigação de paternidade, não ocorrerá o fenômeno da coisa julgada material quando não houver exaustão na produção das provas, permitindo-se a sua ocorrência somente nos casos em que foram esgotados todos os meios de prova convencionais e, inclusive, o exame pericial de DNA. A doutrina e a jurisprudência vêm consolidando o entendimento de que, em se tratando de ações de estado, que tratam de direitos indisponíveis da pessoa, Revista Del Rey Jurídica a autoridade da coisa julgada deve ser relativizada, sob pena da segurança jurídica se sobrepor à própria justiça. É o embate entre dois princípios constitucionais: o da segurança jurídica, certificado pela coisa julgada e o direito de estado de filiação, princípio da dignidade humana. O rigor do instituto da coisa julgada, em inúmeros casos, conduz à injustiça, o que leva ao entendimento de que devem ser impostos limites à imutabilidade dos efeitos do julgado, buscando-se sempre a verdade real, e não a verdade do trânsito em julgado de uma sentença. Isto principalmente, quando é sabido que o Estado não proporciona à pessoa amplo acesso aos meios probatórios essenciais à averiguação da paternidade. Na maioria das vezes o indivíduo não possui recursos para arcar com o preço do exame de DNA, e o Estado informa que não há possibilidade de realizá-lo de pronto, em razão do elevado número de pessoas aguardando na mesma situação. Diante disso e de inúmeros outros fatores, nos deparamos com casos em que ou a paternidade é injustamente declarada com base em provas escassas ou, até mesmo, declarada pela revelia do investigado, que se queda inerte por desconhecer as consequências jurídicas do seu ato. Diante de decisões declaratórias da paternidade, que poderão ser contraditadas no futuro, seja pelo surgimento de um DNA negativo, seja pela descoberta de que o indivíduo não pode ter filhos, ou até mesmo pela simples revelação da verdadeira paternidade pela mãe biológica ao suposto pai, o argumento da força da coisa julgada é questionável, tendo em vista que ali se encontram Direito de Família O rigor do instituto da coisa julgada, em inúmeros casos, conduz à injustiça, o que leva ao entendimento de que devem ser impostos limites à imutabilidade dos efeitos do julgado, buscando-se sempre a verdade real. interesses indisponíveis de todas as partes. Não é crível que o rigor formal, justificado pela segurança jurídica, se sobreponha à justiça, impedindo o indivíduo de obter a prova necessária em juízo para declarar a verdadeira paternidade. Trata-se de um direito de mão dupla, e não apenas de uma das partes interessadas. Em precedente firmado no Superior Tribunal de Justiça concluiuse pela relativização da coisa julgada nas questões de estado, em que o interesse público avulta com maior intensidade na efetivação do direito da personalidade, baseando-se nas transformações familiares e nas descobertas genéticas, que colocam o magistrado diante do grau máximo de certeza, nada justificando que se ponha no mundo jurídico o que não está na verdade biológica. (Recurso Especial 226.436-PR, de relatoria do Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira). Nesse sentido, o Ministro do STJ José Augusto Delgado comenta: “Há de se ter como certo que a segurança jurídica deve ser imposta. Contudo, essa segurança jurídica cede quando princípios de maior hierarquia postos no ordenamento jurídico são violados pela sentença, por, acima de todo esse aparato de estabilidade jurídica, ser necessário prevalecer o sentimento do justo e da confiabilidade nas instituições”. Com a promulgação da Lei n. 12.004/2009, que alterou a Lei n. 8.560, consolidando o entendimento de presunção da paternidade nos casos em que o suposto pai se nega a realizar o exame de DNA ou submeter-se a qualquer outro meio científico de prova, restou claro o entendimento de que a recusa aos exames torna verdadeira a paternidade. Essa presunção não deve ser mantida quando do surgimento de prova nova, realizada inclusive com o consentimento das duas partes envolvidas. Não há porque perpetuar uma situação de fato inverídica, punindo o indivíduo com uma declaração falsa, atribuindo a ele uma responsabilidade que não é sua. De acordo com o texto constitucional e infraconstitucional, por tratar-se de direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, pode-se questionar a condição de filho, ou de pai, com base em novos elementos, reabrindo a discussão na justiça. Considerando essas questões e o entendimento predominante na doutrina e jurisprudência pátrias, tem-se que a coisa julgada deve ser preservada quando realmente proteger o direito que está, em tese, garantido à parte. Mas quando ela, como instituto processual, obstaculizar o exercício de um direito que não pôde ser exercido por insuficiência de provas, em determinada época, não deverá sobrepor-se à verdade real. Não se trata de assolar o Estado com novas ações de investigação de paternidade ajuizadas posteriormente à aludida declaração. 39 Arquivo CYB DIREITO DE FAMÍLIA Ocorre que, tendo o indivíduo prova nova e robusta, que contraria a decisão judicial, deve ser concedido a ele o direito de questionar aquela declaração. Assim, diante da fragilidade das provas colhidas no curso das ações de estado, entende-se por demais injusto aceitar a imutabilidade das verdades oriundas das decisões judiciais, presumidas pelo julgador e atribuídas aos indivíduos por toda a vida, implicando inclusive em direitos sucessórios. Como visto, os direitos da personalidade devem ser sopesados com os demais direitos consagrados no texto constitucional. Quando ocorre a colisão de interesses e valores presentes na sociedade é aceitável reduzi-la a uma colisão de direitos fundamentais, averiguando o peso e valor de cada um. Todas essas considerações nos levam a ponderar e repensar o equilíbrio dos valores de justiça e de 40 segurança. No estado democrático de direito não deve ser permitida a superestimação da proteção constitucional da coisa julgada, uma vez que essa proteção é relativa diante de situações como esta. Admitir que as normas ditadas pelo Estado se sobreponham ao direito ao verdadeiro reconhecimento à origem da pessoa, portanto, de sua dignidade, é aceitar que esse direito perca seu principal suporte para uma sociedade desprovida de qualquer discernimento entre o justo e o injusto, entre o certo e o errado. O estado de pai e filho não impera devido a uma sentença judicial, mas nasce com o ser humano, se desenvolve pela vida e cria vínculos muito mais complexos do que aqueles nascidos em um processo. Não se impõe a ninguém uma filiação biológica, tampouco afetiva. Nesse contexto de diversas opiniões, princípios e ideologias impera a validade dos valores consagrados ao longo dos anos. Diante de prova nova autoexcludente, resta ao Estado fazer valer esses valores, alcançando a verdade e a justiça. Por último, fazendo uma analogia à idéia de justiça, cabe apenas a citação do que foi dito por Antígona, na tragédia grega de Sófocles: Mas Zeus não foi o Arauto delas para mim, nem essas leis são as ditadas entre os homens pela Justiça... E nem me pareceu que tuas determinações tivessem força para impor aos mortais até a obrigação de transgredir normas divinas, não escritas, inevitáveis: não é de hoje, não é de ontem, é desde os tempos mais remotos que elas vigem, sem que ninguém possa dizer quando surgiram. Livros indicados: DNA, Paternidade e Filiação Daniel Blikstein Editora Del Rey Manual de Direito das Famílias e das Sucessões Ana Carolina Brochado Teixeira Editora Del Rey www.delreyonline.com.br Revista Del Rey Jurídica Direito de Família 41 DIREITO DO CONSUMIDOR Cláudio Cunha BANCO DE DADOS - ATRASO NO CANCELAMENTO DE RESTRIÇÕES – PRAZO - RELAÇÃO DE CONSUMO - CANCELAR QUEM DEVE Edelberto Augusto Gomes Lima Advogado e membro do Conselho Editorial da Editora Del Rey 42 O consumidor-devedor quita, junto ao credor, a dívida que ocasionou a negativação de seu nome em Bancos de Dados, popularizados com a denominação de SPC. Ao pagar, crê estar habilitado para contrair novos créditos, mas é surpreendido ao ver o seu nome ainda negativado. Esse artigo pretende trazer algumas considerações em torno. Quando há menção ao tema, o Código de Defesa do Consumidor dispõe: ”Deixar de corrigir imediatamente informação sobre consumidor constante do cadastro, banco de dados, fichas ou registros que sabe ou deveria saber inexata: Pena de um a seis meses ou multa”. (art.73). A dificuldade é conceituar o tempo da expressão “imediatamente”. Após as mais variadas interpretações, a questão foi submetida ao STJ, que por sua vez não contribuiu para a segurança jurídica, posto que nos diversos julgamentos realizados evitou apresentar o conceito. Cito apenas três. Na 4ª Turma, no AgRg no AI 606174-DF, o Relator, no que foi acompanhado pelos seus Pares, declarou que “...sideral é a distância entre a lei e a dura realidade da complexa sociedade em que vivemos. Com efeito, as dimensões da instituição bancária apelada-...., com diversos setores para fins de baixa na contabilidade de dívida que perdurava há mais de um ano, afasta eventual reconhecimento de ilicitude na permanência da negativação do nome dos apelantes por cerca de um mês e alguns dias. (...). Por sua vez a 3ª Turma, também em votação unânime, manteve acórdão de tribunal regional vazado nos seguintes termos: “O dano moral se configura não pelo tempo de permanência indevida da anotação (no caso 5 meses), mas pela simples manutenção indevida dela e independentemente de prova de ocorrência de algum dissabor ou vexame concreto”. (Resp. 292045). Finalmente, a mesma 3ª Turma, no AI 350506-MG, decidiu que “–A expressão ‘imediatamente’, constante do tipo do art. 73 da lei n.º 8.078/90 deve ser interpretada caso a caso. A correção de dados sobre a inadimplência do consumidor em cadastro de restrição ao crédito pode ser feita dias depois do pagamento, se as circunstâncias do caso indicarem ser razoável o prazo”. Como se observa, os precedentes não contribuem para a segurança jurídica tão essencial em uma sociedade civilizada e democrática, de modo a não deixar livre a interpretação do texto legal. Para evitar essa imprevisibilidade e insegurança, o STJ tem a missão constitucional de unificar a interpretação do direito federal de modo a criar balizas claras e objetivas. Para alcançar esse desiderato, a interpretação da expressão “imediatamente” deve e pode ser feita em sintonia com a do §3º do art.43 do CDC, cuja redação é a seguinte: “O consumidor sempre que encontrar inexatidão nos seus dados e cadastros poderá exigir sua imediata correção, devendo o arquivista, no prazo de cinco dias úteis, comunicar a alteração aos eventuais destinatários das informações incorretas”. A contagem do prazo inicia-se do primeiro dia útil subsequente. A conjugação dos dois artigos com o sistema operacional dos Bancos de Dados permite a criação de uma interpretação lógica, benéfica a todos. Os Bancos de Dados no país, embora cada um tenha personalidade jurídica própria, funcionam, com raras exceções, interligados através de um eficiente sistema de informatização e, mediante convênios que celebram, repassam entre si, via essa rede eletrônica, os dados contidos em seus cadastros. Dessa forma, o credor ao constatar uma inadimplência envia o nome do devedor a um Banco de Dados e esse o repassa imediatamente (on line) para os conveniados. Esse sistema, quando se trata de negativar, funciona como uma engrenagem de modo a não dar tempo para quem for negativado obter crédito em outro local. O Banco de Dados, que, em face da eficiente informatização do sistema, demorar cinco dias úteis para negativar um devedor estará sujeito, ante a concorrência, a ficar ultrapassado. Se a negativação ocorre em tempo quase que real essa mesma engrenagem pode e deve funcionar quando for para beneficiar o consumidor, seja para corrigir inexatidões, seja para cancelar restrições. Revista Del Rey Jurídica Obviamente, os Bancos de Dados não possuem o poder da onipresença. Daí, se a iniciativa for do credor, deverá o mesmo, até cinco dias úteis após receber a dívida, avisar ao Banco de Dados para o qual enviou originalmente o pedido de negativação. O Banco de Dados que primeiro negativou tem mais cinco dias úteis para avisar as demais redes de cadastros de inadimplentes conveniadas. Alguns Bancos de Dados fazem a cobrança em nome do credor. Nesse caso, não há necessidade de aviso do credor. Qualquer credor ou Banco de Dados que romper a engrenagem estaria cometendo ilícito, passível de indenização. O consumidor, ao apurar que continuou negativado, pode aforar ação judicial de indenização por dano moral e material, se for o caso, c/c cancelamento da restrição contra os que mantiveram a negativação e também contra o credor, caso não tenha tomado a iniciativa. Dentro desse critério, não haverá dificuldades em apurar se já decorreram os prazos para cancelamentos. O consumidor poderá propor a ação no foro de seu domicílio, independentemente da localização dos Réus no território nacional. Em que pese a solidariedade, somente o caso concreto propiciará apurar quem deverá figurar no polo passivo. O que não se pode é transferir para o consumidor o dever de avisar aos Bancos de Dados. Por sua vez, todas as partes envolvidas estarão diante de critérios objetivos. O STJ, por sua 3ª Turma, decidiu que “não tem força a argumentação que pretende impor ao devedor que quita a sua dívida o dever de solicitar seja cancelado o cadastro negativo (...). Quitada a dívida, sabe o credor que não mais é exata a anotação que providenciou, cabendolhe, imediatamente, cancelá-la”. (Resp. 292045). A 4ª Turma, por sua vez, através Direito do Consumidor do voto do ministro relator, decidiu que “paralelamente, ao direito de negativar o devedor, há, em contrapartida, o de, em havendo quitação, providenciar, aquele mesmo que o inscreveu, a atualização dos dados cadastrais, apontando o pagamento e, em consequência, o desaparecimento do fato que motivou a restrição ao crédito, para que as entidades que mantem o serviço façam a baixa respectiva”. (Resp. 299456). Muitas vezes os Bancos de Dados municiam-se com informações extraídas de dados públicos, tais com Cartórios de Protestos de Títulos e da distribuição de processos judiciais. Cancelado o protesto e o processo judicial por qualquer meio extintivo de obrigações, esses cadastros, independentemente de serem avisados, deverão cancelar as restrições no prazo de cinco dias úteis, contados da data do cancelamento do protesto e da em que o Diário oficial publica a extinção da ação. O risco em extrair esses dados públicos e repassá-los a terceiros é dos Bancos de Dados, risco esse inerente a atividade econômica. Quanto aos extraídos do CCF (Cadastro de Cheques Sem Fundos do Banco Central) o procedimento é outro. O emitente do cheque procura o credor e resgata a posse do cheque e, com o comprovante de pagamento, procura o Banco sacado (que enviou o seu nome ao CCF) para que esse providencie, imediatamente (em cinco dias úteis) o cancelamento no CCF. Os Bancos de Dados que utilizam do CCF para negativar a partir daí terão os mesmos cinco dias úteis para cancelar. Em ocorrendo prescrição, ainda que a dívida não seja paga, os Bancos de Dados devem, por iniciativa própria, cancelá-la no prazo de cinco dias úteis. A matéria foi objeto da Súmula 323 do STJ, cujo enunciado é o seguinte: “A inscrição de inadimplente pode ser mantida nos serviços de proteção ao crédito por, no maximo, cinco anos”. A contagem do prazo prescricional, segundo entendo, inicia-se a partir do dia subsequente ao vencimento da obrigação e não da data da negativação e será sempre de cinco anos, não importando a existência de prazo prescricional maior. Na existência de outros registros desabonadores, o eventual atraso no cancelamento não gerará dano moral, embora persista o dever de proceder ao cancelamento. Aplicável na espécie a Súmula 385 do STJ, cujo enunciado é o seguinte: “Da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito do cancelamento”. Como essa Súmula pode estimular os Bancos de Dados a manter a negativação, eis que a única penalidade será cancelar a restrição, entendo que, nessa conjuntura, se o devedor notificar o Banco de Dados para efetuar o cancelamento no prazo de cinco dias úteis (§3º do art.43 do CDC) e esse se mantiver omisso, haverá a ocorrência do dano moral. Quanto ao protesto, em havendo relação de consumo, segundo precedentes do STJ, caberia ao credor cancelá-lo junto ao Cartório de Protesto, de acordo com os arts. 43, §3º, e 73 do CDC. Essa posição do STJ embora correta, deveria ser aplicada se o protesto tiver sido ilícito. Contudo, tratando-se de protesto regular, lavrado em face de inadimplência, o seu cancelamento, em decorrência da quitação, deveria ser de iniciativa de quem deu causa, no caso o devedor. O artigo 26 da Lei 9492/97 (disciplina o cancelamento de títulos) em que pese não regular relações de consumo, poderia ser aplicado na espécie, até por se tratar de uma lei especial sobre protestos de títulos cambiais. 43 DIREITO DO CONSUMIDOR Arquivo CYB Arquivo pessoal O DIREITO E OS LIMITES DO EX-EMPREGADO AO PLANO DE SAÚDE Marlus Keller Riani Especialista Jurídico da Unimed Belo Horizonte. Conselheiro Fiscal da BRASILCON Nacional. Coordenador do Curso de Direito do Consumidor da Escola Superior de Advocacia da OAB/ MG. 44 A atividade econômica desenvolvida por determinadas empresas no segmento de plano de saúde foi amplamente regulamentada com o advento da Lei Federal nº 9.656 de 1998. Entre várias novidades trazidas pela legislação específica ao setor de saúde suplementar, destacamos a possibilidade de permanência do ex-empregado no plano de saúde coletivo empresarial ou coletivo por adesão, assunto pouco difundido no meio jurídico, apesar dos 10 anos de vigência da lei de plano de saúde. Está esculpido no artigo 30, caput, da Lei nº 9.656/98 que “Ao consumidor que contribuir para produtos de que tratam o inciso I e o §1º do art. 1º desta Lei, em decorrência de vínculo empregatício, no caso de rescisão ou exoneração do contrato de trabalho sem justa causa, é assegurado o direito de manter sua condição de beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral.”. Do referido dispositivo legal percebemos que só é possível o direito do exempregado manter-se no plano de saúde caso preencha os seguintes requisitos: a) demitido sem justa causa (quer dizer, por liberalidade do empregador); b) ter contribuído (pagar ou ser descontado qualquer valor da mensalidade). A justa causa é de fácil comprovação, basta a conferência no TRCT (Termo de Rescisão do Contrato de Trabalho). Em relação à contribuição, vale destacar que não há uma estipulação, seja legal ou infralegal, do valor para se alcançar a efetividade deste requisito, bastando ser de R$0,01 (um centavo) até a integralidade da mensalidade. Registre-se que para os planos de saúde que utilizam o fator moderador denominado “coparticipação”, ele por si só não satisfaz o requisito da contribuição quando o empregado paga, apenas e tão somente, valor referente à “co-participação”, devendo, como já dissemos pagar pelo menos R$0,01 (um centavo) a título de mensalidade. Não nos esqueçamos que, caso o ex-empregado opte por permanecer no plano de saúde contratado pelo empregador, deverá arcar com o custo integral da mensalidade, ou seja, com o que ele contribuía enquanto estava na ativa e com a contribuição que era dada por sua empresa empregadora. Pode o ex-empregado ficar sine die vinculado ao contrato de sua ex-empresa empregadora? A resposta é não. A própria Lei nº. 9.656/98 impôs limites, determinando duas situações distintas. A primeira delas diz respeito ao prazo determinado do tempo de permanência do Revista Del Rey Jurídica ex-empregado no plano de saúde, estando consignado no § 1º do artigo 30 que diz: “O período de manutenção da condição de beneficiário a que se refere o caput será de um terço do tempo de permanência nos produtos de que tratam o inciso I e o §1º, ou sucessores, com um mínimo assegurado de seis meses e um máximo de vinte quatro meses.”. A contagem do tempo será apurada mediante equação matemática simples, ou seja, anota-se os meses em que o empregado laborou, divide -se por 3 e multiplica-se por 1, sendo que resultado nunca pode ser inferior a 6 meses. Para melhor visualização, imagine que o empregado permaneceu na empresa por 12 meses, dividido por 3 e multiplicado por 1, encontramos 4 meses. Caso o ex-empregado opte por permanecer no plano de saúde não ficará somente 4 meses, mas sim 6 meses que é o mínimo legal. Lembrese que o prazo máximo é de 24 (vinte e quatro) meses. Já a segunda limitação está prevista no § 5º do mesmo artigo, ao afirmar: “A condição prevista no caput deste artigo deixará de existir quando da admissão do consumidor titular em novo emprego.”. Tal situação é de difícil aplicação e implementação na prática, pois tanto a operadora quanto a ex-empregadora não têm mecanismos eficazes para controlar a entrada e saída de cidadãos no mercado de trabalho. O artigo 30 da Lei nº 9.656/98 foi regulamentado pelo Conselho de Saúde Suplementar (CONSU) por meio da Resolução nº 20, de 23 de março de 1999. Vale registrar que o referido CONSU foi criado pela Lei nº 9.656/98 (art. 35-A). Dentre as normas positivadas, destacamos o artigo 2º da Resolução nº 20/99 “Para manutenção do exoDireito do Consumidor nerado ou demitido como beneficiário de plano ou seguro de assistência à saúde, as empresas empregadoras devem oferecer plano próprio ou contratado e as empresas operadoras ou administradoras de planos ou seguros de assistência à saúde devem oferecer à empresa empregadora, que o solicitar, plano de assistência à saúde para ativos e exonerados ou demitidos.”. Do citado ato normativo extraise que é dever da empresa empregadora oferecer ao seu ex-empregado o direito de opção pela manutenção ou não do plano de saúde, de acordo com as regras já mencionadas pela Lei nº 9.656/98. Deve, também, a empresa empregadora solicitar esta modalidade de contratação (para exempregado) às operadoras de plano de saúde, pois de acordo com a Resolução Normativa nº 195/2009 que estabeleceu nova redação ao art. 2º, § 2º da Resolução nº 20/99, temos que: “§ 2º No caso de manutenção de planos separados para ativos e inativos, e ambos os planos forem contratados com operadoras, é obrigatório que a empresa empregadora firme contratos coletivos empresariais para os ativos e para os inativos, em nome dos empregados e ex-empregados, respectivamente, para ambos os planos, com uma única operadora, devendo, também o plano de inativos, abrigar o universo de aposentados”. Nesse sentido, enfatize-se que as operadoras de plano de saúde não são as responsáveis pelo oferecimento do plano de saúde para o ex-empregado, mas sim, as empresas empregadoras, cabendo as primeiras terem o produto registrado perante a Agência Nacional de Saúde Suplementar para quando solicitado pelas segundas disponibilizá-lo para a devida contratação, garantindo-se assim, o direito do trabalhador e o fiel cumprimento da legislação. Cumpre-se apontar que a operadora de plano de saúde tem obrigação, por força da Resolução Normativa ANS nº. 100/2005, quando da contratação inicial com a empresa empregadora, informar e estabelecer no pacto firmado entre as partes, os direitos do ex-empregado e aposentado. É importante afirmar que as coberturas assistenciais serão as mesmas que haviam sido contratadas quando o ex-empregado estava na ativa, alterada a forma do pagamento, passando a receber boleto de cobrança diretamente da operadora, sendo que o “não-pagamento da mensalidade por período superior a sessenta dias, consecutivos ou não” (art. 13, Lei nº. 9.656/98), implicará na extinção da nova relação jurídica que foi estabelecida entre o exempregado e a operadora. Caso o empregador não cumpra a sua parte, deixando de oferecer o plano ao ex-empregado, entende-se que ele poderá ajuizar a competente ação perante a Justiça do Trabalho ou na Justiça Comum, no intuito de fazer valer seu direito ao plano de saúde dentro dos limites legais. Livro indicado: Planos de Saúde – saúde e contrato na CONTEMPORANEIDADE Gabriel Schulman Editora Renovar www.delreyonline.com.br 45 DIREITO PROCESSUAL Arquivo CYB Arquivo pessoal JUIZADOS ESPECIAIS DA FAZENDA PÚBLICA Dalmar Pimenta Advogado, Sócio do Escritório Dalmar Pimenta Advogados Associados, Membro do Conselho Editorial da Editora Del Rey. 46 Com a celebração do II Pacto Republicano em 13 de abril de 2009, pelos Chefes dos Três Poderes da União, entre as várias medidas definidas como prioritárias constava aquela que determinava de tornar-se mais célere o processo judicial. Com isto, acelerou-se a tramitação do Projeto oriundo do Senado de n°. 7087/06 que, aprovado nas duas casas legislativas se transformou em 23 de dezembro último, na Lei n°. 12.153. Pela simples leitura da referida lei, constata-se que a mesma possui enorme semelhança com a Lei n°. 10.529/01, que trata dos Juizados Especiais Federais. Vê-se pela lei, que os Juizados Especiais da Fazenda Pública serão orientados pelos princípios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual, celeridade, conciliação, publicidade e gratuidade no primeiro grau de jurisdição, sem prejuízo, contudo, da condenação do litigante declarado de máfé. Como previsto na lei, a mesma entrará em vigor cento e oitenta dias após a sua publicação oficial, ou seja, em 23 de junho de 2010, preenchendo assim uma lacuna existente na composição dos atuais Juizados Especiais. Também de acordo com a lei, os novos Juizados Especiais da Fazenda Pública deverão ser criados no prazo máximo de dois anos e os Tribunais de Justiça dos Estados poderão, segundo a lei, aproveitar totalmente ou parcialmente as estruturas das atuais varas da Fazenda Pública. Referidos Juizados terão competência absoluta para processar, conciliar e julgar causas cíveis além da discussão da cobrança de ICMS, IPTU e IPVA, multas de trânsito e ambiental de interesse dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios, dos Municípios, bem como de autarquias, fundações e empresas públicas a eles vinculadas. Excluem-se de sua competência as ações de mandado de segurança, execuções fiscais, demandas sobre direitos ou interesses difusos e coletivos, entre outros citados no parágrafo 1º do artigo 2º da Lei 12.153/09. O valor da causa não poderá ultrapassar 60 salários mínimos, hoje em Revista Del Rey Jurídica torno de R$ 30.600,00. Como determina o inciso I, do artigo 5º da referida lei, as pessoas físicas, microempresas e empresas de pequeno porte, terão doravante, reais possibilidades de discutir questões antes relegadas a empresas e pessoas físicas que possuíam condições financeiras de arcar com as custas judiciais, trazendo com isto, uma maior efetividade ao combate às ilegalidades administrativas em governos estaduais e municipais. As citações e intimações deverão observar as disposições contidas no Código de Processo Civil, tornando dispensável a intimação pessoal dos representantes das Fazendas Públicas Estaduais e Municipais, bastando para tanto aquela realizada através do Diário de Justiça. Tornaram-se dispensável, também, os prazos diferenciados para as pessoas jurídicas de direito público. Assim, não haverá prazo diferenciado para os representantes das Fazendas Públicas Estaduais e Municipais, sendo que audiência inicial de conciliação deverá ser agendada com antecedência mínima de trinta dias. É de se frisar que após implantação dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, os mesmos terão competência absoluta para processar e julgar ações até o valor de 60 salários mínimos, afastando assim, a competência das Varas de Fazenda Pública. Entretanto, diferentemente da competência inderrogável para julgar até o valor de 60 salários mínimos, infelizmente a lei, quanto à execução de sentença através de RPV (Requisição de Pequeno Valor) será de 40 salários mínimos quanto aos Estados e Distrito Federal e de 30 salários mínimos, quanto aos municípios, até que uma nova lei de cada ente da Federação defina o seu pequeno valor. Os valores acima dos patamares anteriormente fixados e que não ultrapassem 60 salários míDireito Processual Com certeza a lei n°. 12.153/09 representa um significativo avanço para o Judiciário e em especial para as pessoas físicas, microempresas e empresas de pequeno porte. nimos serão objeto do famigerado rito do precatório, objeto de “calote oficial” através da Emenda Constitucional n°. 62/09. A lei reforça a possibilidade de conciliação entre as partes, determinando em seu artigo 8º que “os representantes judiciais dos réus presentes à audiência poderão conciliar, transigir ou desistir nos processos da competência dos Juizados Especiais, nos termos e nas hipóteses previstas na lei do respectivo ente da Federação. Uma indagação ainda pendente de resposta está na obrigatoriedade ou não de assistência por parte de advogado. A lei se omite quanto a este aspecto, determinando, porém, que se deve aplicar subsidiariamente, o C.P.C. e as leis 9.099/95 e 10.259/01, que tratam dos demais Juizados Especiais. Entendemos que pela maior semelhança desta nova lei com a de n°. 10.259/01, que criou os Juizados Especiais Federais, provavelmente a assistência de advogado nos Juizados Especiais da Fazenda Pública será facultativa. A nova lei confere ao Juiz poderes para deferir qualquer providência cautelar e antecipatória no curso do processo, para se evitar dano de difícil reparação. Outro aspecto interessante da lei é que, devido à busca incessante pela celeridade processual, somente será admitido recurso contra a sentença e contra as decisões liminares proferidas em caráter de urgência. Porém, não proíbe a utilização de embargos declaratórios frente a qualquer decisão obscura, omissa ou contraditória. Com certeza a lei n°. 12.153/09 representa um significativo avanço para o Judiciário e em especial para as pessoas físicas, microempresas e empresas de pequeno porte que passam a ter um fórum especial para discussão de suas pendências com Estados e Municípios. Porém, o fato de que a maioria das microempresas e empresas de pequeno porte, estarem hoje inscritas no regime simplificado do Supersimples, as grandes causas tributárias ainda continuarão a ser decididas no Judiciário comum. O avanço também se dá quanto à sociedade em geral, com a determinação de designação de Juízes Leigos o que demonstrará a participação popular na administração da Justiça, um dos grandes pilares do Estado Democrático de Direito. Livros indicados: O Processo nos Juizados Especiais Cíveis Estaduais Antônio Pereira Gaio Júnior Editora Del Rey Comentários à Nova Lei dos Juizados Especiais da Fazenda Pública Luiz Manoel Gomes Junior e outros Editora Revista dos Tribunais www.delreyonline.com.br 47 DIREITO JUDICIÁRIO Arquivo CYB MUTIRÕES DO JUDICIÁRIO José Fernandes Filho Ex-Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. 48 Há quase dois decênios, a magistratura mineira se impôs ao respeito nacional: reduziu em dois terços a massa de processos pendentes de decisão. Trabalho de muitas mãos, também dos advogados e do Ministério Público, a vitoriosa iniciativa nos permitiu olhar nos olhos do jurisdicionado, sem medo ou remorso. O tempo passou, o acervo de pendências cresceu, chegando hoje a números assustadores. Explosiva, a demanda revela confiança nos homens da lei. Mas também lhes arqueia os ombros, clamando por julgamentos que não se eternizem, mesmo porque preceito constitucional “a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”. Muito já se escreveu sobre a chamada crise do Judiciário. Na verdade, crise de homens e instituições, porque estas, ao final, serão grandes ou pequenas como eles. A chamada opinião pública – mais “publicada” do que pública – atribui ao Judiciário duas graves omissões: não res- ponder prontamente à demanda crescente e não oferecer segurança jurídica às partes, porque os julgamentos, singulares ou coletivos, cabeça de cada juiz, geram reconhecida insegurança. Improcede a segunda queixa: rica e dinâmica, a jurisprudência, mesmo pacificada, deve obediência à lei, sobre refletir os anseios de uma sociedade em constante processo de transformação. Mais duradouros do que as normas, e delas inspiração, os princípios, estes sim, são permanentes, orientando e referenciando o magistrado. Procede, porém, a primeira objeção, diante da lentidão do Judiciário, que não consegue aplacar a angústia da legião de injustiçados, a clamarem, ainda reverentes, pela reparação de seus direitos. Em pregação recorrente, tenho sustentado que a prática da conciliação é o melhor caminho para a redução dos acervos processuais e, também, ensolarada janela aberta para a construção da paz social. Revista Del Rey Jurídica LANÇAMENTOS Direito Judiciário Livros indicados: Compromisso com o Direito e a Justiça Foto: Arquivo Pessoal Leonardo Barreto Moreira Alves (coordenador) e Patrícia Diniz Gonçalves Moreira Alves (coautora). Foto: Arquivo Del Rey na massa, isto é, os juízes. De nada valerão as boas intenções desacompanhadas de gestos de grandeza e compreensão do CNJ, que, sozinho, nada conseguirá. Baixar resoluções, que fixam prazos e metas, é fácil. Difícil é criar a cultura de que, todos, somos responsáveis pelo desafio. É hora de mudança, mas também de entrega, de doação, de crença na economia do bem: sem estes valores, faltará alma a qualquer projeto. Leonardo Barreto Moreira Alves, Rômulo de Carvalho Ferraz (Presidente da AMMP), Dimas Messias de Carvalho e convidados. *** Em 17 de novembro, na Livraria Del Rey Aimorés, foi lançada a obra coletiva “Abordagem Multidisciplinar sobre a Moralidade no Brasil”, coordenada pela advogada Célia Pimenta Barroso Pitchon, Presidente do MAM – Movimento das Advogadas Mineiras, entidade responsável pela coedição do livro. Foto: Cláudio Cunha Cumpre proclamar, entretanto, que os mutirões carecem de uma chama, pequena que seja, mas candeia acesa, que ilumine e aqueça, faça chuva ou sopre o vento. Sálvio de Figueiredo Teixeira Editora Del Rey Célia Pitchon, Misabel Derzi e Antonio Augusto Anastasia. Prática da Mediação e Acesso à Justiça Foto: Cláudio Cunha Redescobertos pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), os mutirões judiciários poderão mudar a imagem, nada lisonjeira, que se abate sobre nós. Além disso, ensejarão imperdível oportunidade para o exercício da solidariedade entre os juízes, abrindo-lhes infinitos horizontes, nem sempre alcançáveis no solitário ofício de julgar. Os mutirões já realizados pelo CNJ em penitenciárias têm restituído a liberdade a muitas pessoas que permaneciam detidas sem qualquer justificação. Resgata-se-lhes a dignidade, na medida em que, devolvidas ao convívio social, podem vivenciar a cidadania, de que estavam despossuídas por cruel omissão do Estado. Outro fato, digno de registro, é a louvável tentativa de sentenciamento nos processos distribuídos até 31 de dezembro de 2005. O grande acervo processual poderá impedir o cumprimento integral da chamada “Meta 2”, do mesmo Conselho. Não importa; importa, sim, o propósito de mudar, reclamado pela sociedade. Importa, também, o testemunho dos magistrados, sabidamente exaustos, à desumana sobrecarga de trabalho. Cumpre proclamar, entretanto, que os mutirões carecem de uma chama, pequena que seja, mas candeia acesa, que ilumine e aqueça, faça chuva ou sopre o vento. Impostos, desprovidos de amorosa adesão, terão o amargo sabor de encargo adicional para quem já trabalha muito. Assumidos e consentidos, serão obra de cada participante, pacificados ao resultado obtido, que redime e liberta. O louvável propósito do Conselho Nacional de Justiça só vingará se seus condutores souberem envolver aqueles que porão a mão Em 27 de outubro, na Livraria Del Rey Aimorés, realizou-se o lançamento do livro coletivo “Código das Famílias Comentado”, coordenado pelo professor Leonardo Barreto Moreira Alves, Promotor de Justiça em Minas Gerais e membro do IBDFAM, que é coeditor da obra. Walsir Edson Rodrigues Junior Editora Del Rey www.delreyonline.com.br Arnaldo Oliveira e colaboradores da obra coletiva. 49 DIREITO EMPRESARIAL Rodrigo Bernardes Braga Advogado, Gerente Geral Jurídico da Vale Soluções em Energia S.A., membro da Associação Brasileira da Propriedade Intelectual e do Comitê Brasileiro de Arbitragem. 50 1. Harmonizando os conceitos: O que é nome empresarial? O que é nome de domínio? O que é título de estabelecimento? O que é marca? Vejamos: Nome empresarial é aquele com que o empresário, pessoa física ou jurídica, se apresenta em suas relações com terceiros. É, em linhas gerais, o nome usado pelo empresário para individualizá-lo e distingui-lo de outros. Está, portanto, diretamente vinculado ao sujeito que exerce a atividade empresarial. D e v e atender aos princípios da veracidade e da novidade. A veracidade se traduz na necessidade do nome empresarial ser fidedigno com o nome, por extenso ou abreviado, do c o m e rc i a n t e individual, ou com o nome do sócio ou sócios que compõem a sociedade, quando se tratar de firma ou razão social. Já a novidade requer que o nome empresarial seja único, uma vez que o legislador quis tutelar o crédito e a clientela, evitando confusões que pudessem colocar o empresário idôneo na condição de devedor, bem como preservar a clientela que poderia ser enganada facilmente. No exame de eventual colidência entre nomes empresariais terá preferência aquele que depositou os seus atos constitutivos em primeiro lugar, aplicando-se o princípio da anterioridade. O texto da Convenção da União de Paris (CUP), de 20 de março de 1883, da qual o Brasil foi signatário e aderente, estatui que “o nome comercial será protegido em todos os países da União sem obrigação de depósito ou de registro, quer faça ou não parte de uma marca de fábrica ou de comércio.” Esse princípio de proteção do nome empresarial sem registro nunca foi acolhido entre nós, prestigiando o empresário estrangeiro em detrimento do nacional. A atual Lei de Registro Mercantil (Lei n. 8.934, de 18 de novembro de 1994) é expressa ao determinar o arquivamento (art. 32, II): - a) dos documentos relativos à constituição, alteração, dissolução e extinção das firmas mercantis individuais, sociedades mercantis e cooperativas. E, em seu art. 33, está referido que: “ A proteção ao nome empresarial decorre automaticamente do arquivamento dos atos constitutivos de firma individual e de sociedades, ou de suas alterações.” Já o nome de domínio é a identificação do empresário em página da rede mundial de computadores. Em realidade, trata-se de uma combinação única de letras ou nomes perceptíveis à linguagem humana, números ou travessões e códigos que encaminham informações entre usuários do sistema. O título de estabelecimento é o elemento de identificação do próprio estabelecimento explorado pelo empresário. Daí porque a sua Arquivo CYB Arquivo Pessoal Nome Empresarial, Nome de Domínio, Título de Estabelecimento e Marca: Contribuições Doutrinárias e Jurisprudenciais. Revista Del Rey Jurídica estreita ligação com o ponto. O título, não raro, vem estampado na fachada da loja como sinal distintivo perceptível pelos consumidores, também chamado de expressão de fantasia. Por fim, marca é o sinal gráfico escrito ou simbolizado, que serve para distinguir um produto ou um serviço de outro igual ou semelhante. A marca está indissociavelmente vinculada ao produto ou serviço do empresário, enquanto o nome empresarial está vinculado ao sujeito. A qualidade da marca distinguir o produto do empresário chama-se capacidade distintiva. O registro da marca no INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial) confere direito de propriedade, assegurando ao requerente o uso exclusivo em todo o território nacional. Diz-se, portanto, que o registro tem efeito constitutivo. Nesse particular, convém expor a nossa opinião. Para fins do direito marcário, entendemos que o registro no INPI, efetivamente, é atributivo, isto é, atribui a propriedade da marca ao empresário. Contudo, entendemos que a lei põe a salvo os direitos de uso da marca independentemente de registro para evitar a concorrência desleal. É o que veremos em seguida. 2. Tutela legal dos institutos: A proteção legal do nome empresarial decorre automaticamente do registro. É o que diz a lei. Em 1996, o Decreto n. 1.800, de 30 de janeiro, que regulamentou a Lei de Registros Mercantis (Lei 8.934/1994), afirmou que a proteção ao nome comercial decorre do arquivamento dos atos constitutivos da empresa, mas que tal proteção se circunscreve à unidade federativa de jurisdição da Junta Comercial, a teor dos exatos termos do art. 61, parágrafo 1º. Direito Empresarial Por fim, marca é o sinal gráfico escrito ou simbolizado, que serve para distinguir um produto ou um serviço de outro igual ou semelhante. O efeito da proteção há de ser limitado e restrito, por força de expressa disposição legal. Tanto é que o parágrafo 2º do mesmo art. 61 diz que a proteção ao nome empresarial poderá ser estendida a outras unidades da Federação, a requerimento da empresa interessada, observada instrução normativa do Departamento Nacional do Registro do Comércio (DNRC). O Código Civil, em seu art. 1.166, reafirma o âmbito limitado da proteção conferida ao nome empresarial, deixando a cargo do interessado a faculdade de estendê-la de acordo com a lei especial, in casu, a lei de registros mercantis. Em frontal violação às normas que regem o registro de nome empresarial, algumas decisões têm sustentado a extensão da proteção legal em nível nacional e, para além de tudo isso, em nível internacional, com esteio na Convenção da União de Paris – CUP, art. 8. Ocorre que a CUP, internalizada no ordenamento jurídico brasileiro por meio do Decreto n. 75.572, de 08/04/1975, coloca-se em rota de colisão com o Código Civil, com a Lei de Registro Mercantil e mesmo com a nossa Constituição Federal. Isto porque ela estaria conferindo ao empresário estrangeiro um privilégio condenável – proteção sem registro – em completa dissintonia com o tratamento dispensado ao nacional, que carece do registro na Junta Comercial. Esse tratamento desigual fere a Constituição (art. 5º, inc. XXIX). A esse respeito, confira jul- gado do STJ, EEARES 200400493190 – 653.609-RJ, 4ª T., Rel. Min. Jorge Scartezzini, DJ 27.06.05, p. 408. 2.1 Defesa do nome empresarial e da marca pela via indireta: a concorrência desleal A despeito de a proteção legal ao nome empresarial cingir-se ao estado onde a Junta exerce a sua jurisdição, nada impede que se busque a sua tutela em âmbito nacional com fundamento no direito da concorrência (inc. V do art. 124 e inc. III do art. 195 da Lei n. 9.279/96 - Lei da Propriedade Industrial). Com efeito, a proteção ao nome empresarial se dará, assim, indiretamente, pela tutela que a lei confere à leal concorrência. Como essa tutela é de âmbito nacional, o prejudicado poderá ter seu nome de empresa resguardado para além dos limites de jurisdição da Junta em que a sociedade estiver registrada. Nota-se, porém, que a pretensão terá de ser alicerçada em provas robustas da concorrência desleal, o que supõe o uso indevido por aquele que atua no mesmo ramo de comércio do titular da ação judicial, enquanto o registro dos atos constitutivos da empresa nas unidades federativas de seu interesse protege o empresário quanto ao uso de nome idêntico independentemente do ramo de comércio em que atua o usurpador. Já a proteção da marca pressupõe o registro no INPI, cujo título confere direito de propriedade, oponível erga omnes. O registro, efetivamente, é atributivo, mas o direito marcário só se completa pela equação: registro + uso. O uso, per se, sem registro, confere direitos equivalentes ao da posse. A diferença entre a marca registrada e a marca sem registro é que enquanto a primeira investe o seu 51 Arquivo CYB DIREITO EMPRESARIAL titular de um direito exclusivo oponível erga omnes, a segunda coloca o seu detentor na condição de defender o direito apenas contra aquele que com ele concorre, provando-se o ato confusório com a eventual possibilidade de desvio de clientela. 3. Conflito entre nome empresarial, marca e título de estabelecimento O conflito entre nome empresarial, marca e título de estabelecimento é plenamente possível, sobretudo quando a marca emerge de parte ou da totalidade do nome de terceiro, sendo parte integrante deste. Diz-se que o critério a ser observado nesses casos é o que vincula a atividade social ao elemento individualizador da denominação, evitando-se o registro ou o uso de nomes que reproduzam ou imitem outro nome empresarial ou marca registrada ou depositada de outrem. Não discrepa a jurisprudência, que manda aplicar, em casos tais, os princípios da anterioridade e da espe52 cificidade (REsp n. 32.263, DJU 18-111996). No mesmo sentido: AgRg nos EDcl no AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 805.623 - PR(2006/0178880-5), RELATOR MINISTRO ARI PARGENDLER. Desta forma, assentado o conflito, deve este resolver-se segundo os princípios da especificidade e anterioridade, aplicáveis a situações em que a leal concorrência, em geral, se vê abalada ou minimamente ameaçada. Se inexistente a concorrência, isto é, se as empresas atuam em ramos distintos, não dando margem a confusões entre a clientela, nada impede a convivência simultânea das marcas e nomes comerciais no universo mercantil. Já a proteção da marca pressupõe o registro no INPI, cujo título confere direito de propriedade, oponível erga omnes. de âmbito nacional e o nome empresarial é registrado na junta comercial de âmbito estadual - e com fins diversos. A solução que a jurisprudência vem dando é a aplicação dos princípios da especificidade – verificação da atuação no mesmo ramo de atividade – e da anterioridade – registro prévio ou antecedente ao do concorrente. Para efeito do direito concorrencial sequer se tem levado em consideração o próprio registro, pois o uso da marca sem registro também tem se prestado a esse propósito, máxime em caso de marca de alto renome, se o sujeito prova que exerce o direito a longos anos antes do concorrente. Livros indicados: Curso Avançado de Direito Comercial Marcelo M. Bertoldi Editora RT 4. Conclusões: Por vezes, determinadas marcas são idênticas ou muito similares a nomes empresariais alheios (arts. 124, V, e 195, V, da LPI), havendo um conflito, cuja solução gera certa dificuldade, na medida em que são bens registrados em órgãos diversos - a marca é registrada no INPI Manual de Direito Comercial - Direito de Empresa Fábio Ulhoa Coelho Editora Saraiva www.delreyonline.com.br Revista Del Rey Jurídica Direito Empresarial 53 DIREITO TRIBUTÁRIO INTERNACIONAL João Dácio Rolim Founding partner of Rolim, Godoi, Viotti & Leite Campos Advogados, LLM at London School of Economics, PhD at UFMG, Fellow researcher at QMUL, professor of Tax Law at FGV. 54 Bilateral investment treaties, bilateral or regional free trade agreements, double taxation conventions, World Trade Organization (WTO) and World Intellectual Property Organization (WIPO) agreements, human rights conventions and several other species of international treaties are increasingly frequent. The doctrine of Westphalia, based on absolute national sovereignty in the name of equality between countries, may be but a part of history. With the countless bilateral and multilateral treaties currently in force, a criterion for evaluating which countries are good hosts to foreign investment might provide the international business community with minimum standards of protection and certain fundamental values, promoting reciprocal trust and sustainable cooperation. Let us take as an example the countries held as the most promising actors in the international stage, from the social, political and economic standpoint: the BRIC group (Brazil, Russia, India and China). Despite China is not yet a party to human rights conventions, or to OECD’s anti-corruption convention, it integrates the WTO and WIPO and it participates in several bilateral investment treaties, double taxation agreements and other regional trade agreements (Among which is the commercial agreement entered into by China with the Association of Southeast Asian Nations (ASEAN), a regional free trade area composed by ten countries. According to the Asian Development Bank, the number of bilateral free trade agreements in Asia has grown from 25 in 1995 to over 150 in 2009 (The Economist, September 5th 2009, p. 68)). Similarly, even if Russia is still not a party to the WTO or to OECD’s anti-corruption convention, it integrates the European Convention of Human Rights, WIPO and others. Also, although India has not adopted the European Convention of Human Rights, it is a party to WTO, WIPO and several treaties, commercial or not. Finally, Brazil is already a party to the WTO, the WIPO, and Mercosur, having also entered into several treaties, commercial agreements and double taxation conventions, in addition to the Inter-American Convention of Human Rights and the OECD anti-corruption convention. It is likewise probably a matter of time before Brazil enters into bilateral investments treaties (The main protections provided by investment treaties are the “fair and equitable” treatment, the right to indemnification for fair expropriation and international arbitration. Still, if the treaty does not set forth the possibility of arbitration, fair and equitable treatment must be granted according to domestic law, as an obligation imposed on the Judiciary Branch). Still concerning the international legal order as a whole, is also reArquivo CYB Arquivo pessoal Brazilian Law and the Internationalization of Law as Positive Factors for Foreign and Domestic Investment Revista Del Rey Jurídica LANÇAMENTOS Direito Tributário Internacional Artigo escrito para a London School of Economics. Livros indicados: Sistema Constitucional Tributário Foto: Cláudio Cunha O coautor Ricardo Fiuza e parte da Família Malheiros Fiuza. Foto: Cláudio Cunha tween investors. However, there are legal mechanisms, as well as precedents of penalties and foreign economic agents, including those from BRIC, evidencing that it is possible to promote large investments in Brazil without resorting to unlawful competition, corruption or human rights violation. In summary, from the institutional standpoint, Brazil is on the path to the “international rule of law”, creating reasonable guarantees and stability for investors, which are fairly and equitably treated by Brazilian institutions. O coautor com membros da Família Ferreira Pinto. *** No dia 1° de dezembro, no Carpe Diem Restaurante, em Brasília, DF, lançou-se a obra coletiva “Família e Jurisdição III”, coordenada por Eliene Ferreira Bastos, Arnoldo Camanho de Assis e Marlouve Moreno Sampaio Santos, todos altos dirigentes do IBDFAM-DF, entidade parceira na edição. Foto: Arquivo Pessoal Brazilian multinationals are prepared to operate overseas in conditions of equality with its foreign counterparts. Humberto Ávila Editora Saraiva Ministro Cláudio Santos e Eliene Bastos, Lúcia e Ministro Aldir Passarinho Júnior. Tributação e Meio Ambiente Foto: Arquivo Pessoal markable that even within the European Union nationals of third countries enjoy freedom of movement of capital, even if they have no liaison to or establishment in Europe. From the outlook of liens with international legal systems, Brazil may the best-placed BRIC country. Domestic law is relatively predictable, certain and protective of foreign investments. The existence of a Judiciary Branch struggling for swiftness but without losing its relative consistency, and of modern legislative initiatives that protect private investments without ignoring social consequences, are specially noticeable characteristics of the seemingly complex dynamics of Brazilian domestic law. The number of Brazilian companies not only competing in the international market, but also controlling other companies and performing industrial activities or rendering services abroad is systematically increasing. Brazilian multinationals, having developed in an apparently complex but relatively safe legal environment, are prepared to operate overseas in conditions of equality with its foreign counterparts. Entrepreneurs from BRIC countries may feel safer to invest in Brazil than investors from developed countries, which may represent an intangible competitive advantage for the first. This is due to the fact that such entrepreneurs have their own domestic legislations as a basis for comparison, which, according to a western concept of international rule of law, would be held as being relatively less safe than that of Brazil. Naturally, there is a wide gap between formal and actual freedoms and guarantees, since the simple fact of signing anti-corruption, human rights or intellectual property conventions and taking the appropriate legal measures to implement them does not, by itself, ensure fair and actual competition be- Em ambiente verdadeiramente familiar, na manhã do sábado, dia 21 de novembro, na Livraria Del Rey Aimorés, foi lançada a obra “Encontro de duas famílias”, escrito pelos juristas e acadêmicos Diogo Leite de Campos (Portugal) e Ricardo Arnaldo Malheiros Fiuza (Brasil). Editado pela tipografia Guerra, de Viseu /Portugal, o livro é uma coletânea ilustrada de crônicas sobre fatos e costumes das famílias dos coautores. Jorge Henrique de Oliveira Souza Editora Del Rey www.delreyonline.com.br Ministro José Castro Meira e Terezinha, Ministro Cláudio Santos, Desembargador Arnoldo Camanho e Eliene Bastos. 55 DIREITO TRIBUTÁRIO Arquivo CYB Arquivo pessoal Incidência de PIS e Cofins sobre receitas decorrentes do pagamento de juros sobre capital próprio Flávio de Sá Munhoz A definição acerca da natureza jurídica dos juros sobre o capital próprio instituídos pelo artigo 9º da Lei nº 9.249/95 é de suma importância para a determinação da incidência das contribuições PIS e Cofins, em face do que dispõem os artigos 1º, §§1º e 3º, inciso V, “b” das Leis nºs 10.637/2002 e 10.833/2003 que, a despeito de determinarem como base de cálculo das referidas contribuições a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica, excluem da tributação as receitas de dividendos. Os juros sobre o capital próprio têm origem na figura societária denominada “juros de construção”, instituídos pelo Decreto-Lei 2.627/40, que assim dispunha: Advogado. ExConselheiro da Câmara Superior de Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda 56 “Art. 129. (…) Parágrafo único. Feito o inventário do ativo e passivo, a estimação do ativo obedecerá às seguintes regras: e) nas despesas de instalação deverão ser incluídos os juros pagos aos acionistas durante o período que anteceder o início das operações sociais. Os estatutos fixarão a taxa de juro, que não poderá exceder de 6 % (seis por cento) ao ano, e o prazo para a amortização.” O pagamento de juros aos acionistas também foi tratado pelo art. 179, inciso V da Lei nº 6.404/76: “Art. 179. As contas serão classificadas do seguinte modo: V - no ativo diferido: as aplicações de recursos em despesas que contribuirão para a formação do resultado de mais de um exercício social, inclusive os juros pagos ou creditados aos acionistas durante o período que anteceder o início das operações sociais.” Tendo em vista a extinção da correção monetária de balanço (artigos 4º e 36 da Lei nº 9.249/95) e em face da necessidade de manter o equilíbrio das demonstrações financeiras, a Lei nº 9.249/95, no seu art. 9º, criou a possibilidade de dedução, para efeito de apuração do lucro real, do valor pago a título de juros sobre o capital próprio, nestes termos: Art. 4º Fica revogada a correção monetária das demonstrações financeiras de que tratam a Lei nº 7.799, de 10 de julho de 1989 e o art. 1º da Lei nº 8.200, de 28 de junho de 1991. Revista Del Rey Jurídica Parágrafo único. Fica vedada a utilização de qualquer sistema de correção monetária de demonstrações financeiras, inclusive para fins societários.” Art. 36. Ficam revogadas as disposições em contrário, especialmente: II - os art. 2º a 19 da Lei nº 7.799, de 10 de julho de 1989;” (Correção Monetária das Demonstrações Financeiras) “Art. 9º A pessoa jurídica poderá deduzir, para efeitos da apuração do lucro real, os juros pagos ou creditados individualizadamente a titular, sócios ou acionistas, a título de remuneração do capital próprio, calculados sobre as contas do patrimônio líquido e limitados à variação, pró rata dia, da Taxa de Juros de Longo Prazo - TJLP.” Assim, surgiu a figura dos Juros sobre o Capital Próprio - JCP, com as seguintes características: (i) pagamento ou creditamento individualizado a titular, sócios ou acionistas, (ii) a título de remuneração do capital próprio, (iii) calculado sobre as contas do patrimônio líquido, (iv) limitado à variação, pró-rata dia, da Taxa de Juros de Longo Prazo – TJLP. Cumpre destacar que os juros sobre o capital próprio previstos na legislação tributária são diferentes daqueles dispostos na legislação societária. Neste sentido, vale transcrever a regulamentação baixada pela Secretaria da Receita Federal, aplicável no âmbito tributário, e a regulamentação adotada pela Comissão de Valores Mobiliários, a ser observada no âmbito societário: IN SRF nº 11, de 21/2/1996, art. 29, § 4º, a: Art. 29. (…) § 4º Os juros a que se refere este artigo, inclusive quando exercida a opção de que trata o § 1º ou quando imputados aos dividendos, auferidos por beneficiário pessoa jurídica submetida ao regime de tributação com base no: a) lucro real, serão registrados em Direito Tributário De rigor observar que a maior parte dos países da Europa e os Estados Unidos consideram que os juros sobre capital próprio têm natureza de dividendos, enquanto que países como a Espanha e o Chile atribuem à figura natureza de receita financeira. conta de receita financeira e integrarão lucro real e a base de cálculo da contribuição social sobre o lucro; IN SRF nº 41, de 22/4/1998, art. 4º: Art. 4º Na hipótese de beneficiário pessoa jurídica o valor dos juros creditados ou pagos deve ser escriturado como receita, observado o regime de competência dos exercícios. Deliberação CVM nº 207/96 (…) no conceito de lucro da lei societária, remuneração do capital próprio, paga/creditada aos acionistas, configura distribuição de resultado e não despesa” “I- Os juros pagos ou creditados pelas companhias abertas, a título de remuneração do capital próprio, na forma do art. 9º da Lei nº 9.249/95, devem ser contabilizados, diretamente à conta de Lucros Acumulados, sem afetar o resultado do exercício. Verifica-se, portanto, que na regulamentação da legislação tributária, baixada pela Secretaria da Receita Federal, os juros sobre o capital próprio recebidos por pessoa jurídica são tratados como “receita financeira”, enquanto na regulamentação da legislação societária, adotada pela CVM, o tratamento dispensado é de “dividendo”. De rigor observar que a maior parte dos países da Europa e os Estados Unidos consideram que os juros sobre capital próprio têm natureza de dividendos, enquanto que países como a Espanha e o Chile atribuem à figura natureza de receita financeira. A doutrina também diverge a respeito da sua caracterização. Fábio Ulhôa Coelho (Curso de Direito Comercial, vol. 2, Saraiva, São Paulo, 2002, p. 342) e Edmar Oliveira Andrade Filho (Perfil jurídico do juro sobre o capital social no direito tributário e no direito societário, MP Editora, São Paulo, 2006, p. 44) sustentam a natureza de receita financeira, ao passo que Modesto Carvalhosa (Comentários à Lei das Sociedades Anônimas, vol. 1, Saraiva, São Paulo, 1997, p. 139) e Bulhões Pedreira (Imposto sobre a Renda – Pessoas Jurídicas, vol. I, Justec, Rio de Janeiro, 1979, p. 474) (que trata dos juros sobre a remuneração do capital de um modo geral e não dos JCP previstos na Lei nº 9.249/95) adotam a classificação de dividendos. Algumas características aproximam os juros sobre o capital próprio dos dividendos. Dentre elas, pode-se destacar que os JCP são calculados sobre o patrimônio e pressupõem a existência de lucro, nos termos do que estabelece o art. 9º, §1º da Lei nº 9.249/95: § 1º O efetivo pagamento ou crédito dos juros fica condicionado à existência de lucros, computados antes da dedução dos juros, ou de lucros acumulados e reservas de lucros, em montante igual ou superior ao valor de duas vezes os juros a serem pagos ou creditados. Além disso, os juros sobre o capital próprio podem ser imputados aos dividendos obrigatórios, conforme dispõe o art. 9º, §7º da Lei nº 9.249/95: § 7º O valor dos juros pagos ou creditados pela pessoa jurídica, a título de 57 Arquivo CYB DIREITO TRIBUTÁRIO remuneração do capital próprio, poderá ser imputado ao valor dos dividendos de que trata o art. 202 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, sem prejuízo do disposto no § 2º.” Por outro lado, ainda que o fato de serem calculados sobre o patrimônio aproxime os juros sobre o capital próprio dos dividendos, é importante ressaltar que o seu pagamento é facultado mesmo em casos em que há impossibilidade de distribuição de dividendos, como na situação em que eventuais prejuízos acumulados em anos anteriores absorvam o lucro corrente; o que nos parece decisivo para comprometer a caracterização dos juros sobre o capital próprio como dividendos. Com efeito, a legislação tributária utiliza conceito de “lucro líquido” distinto do Direito Societário. Entre eles há uma distinção de objetos. Conceito de Lucro Líquido: Direito Tributário RIR/99: Art. 248. O lucro líquido do período de apuração é a soma algébrica do lucro operacional (Capítulo V), dos resultados não operacionais (Capítulo VII), e das participações, e deverá ser 58 determinado com observância dos preceitos da lei comercial.” Conceito de Lucro Líquido: Direito Societário Lei n º 6.404/76: Art. 191. Lucro líquido do exercício é o resultado do exercício que remanescer depois de deduzidas as participações de que trata o Art. 190. Art. 190. As participações estatutárias de empregados, administradores e partes beneficiárias serão determinadas, sucessivamente e nessa ordem, com base nos lucros que remanescerem depois de deduzida a participação anteriormente calculada. Art. 189. Do resultado do exercício serão deduzidos, antes de qualquer participação, os prejuízos acumulados e a provisão para o imposto sobre a renda.” Portanto, o conceito de “lucro líquido” atribuído pelo art. 248 do RIR/99 é distinto do conceito de “lucro líquido” da legislação societária. O “lucro líquido”, de acordo com a legislação tributária, não sofre dedução de prejuízos acumulados e da provisão para o imposto de renda. A conseqüência é que a Lei nº 9.249/95, de natureza tributária, não poderia atribuir (e não atribuiu) aos juros sobre capital próprio, “figura societária”, caráter de “lucro ou dividendo”. Além disso, a imputação dos juros sobre o capital próprio ao valor dos dividendos obrigatórios constitui mera faculdade, que depende da aprovação dos acionistas/ quotistas ou de disposição estatuária/ contratual. Caso caracterizassem espécie de dividendos, não haveria a necessidade da determinação constante do art. 9°, § 7º da Lei n° 9.249/95. Sob tais fundamentos, pode-se concluir que os juros sobre o capital próprio recebidos por pessoa jurídica não constituem dividendos. Tendo em vista que resultam de investimentos dos sócios, enquadram-se no conceito de “receita”. Em razão de utilizarem índice financeiro (Taxa de Juros de Longo Prazo – TJLP) para cálculo da remuneração, se enquadram no conceito de “receita financeira”, alcançada pela tributação das contribuições PIS e Cofins. Livro indicado : Direito Tributário – Constituição e Código Tributário Leandro Paulsen Editora Livraria do Advogado www.delreyonline.com.br Revista Del Rey Jurídica Novidades e reedições Del Rey Código Civil Comentado 3ª Edição José Costa Loures e Taís Maria Loures Dolabela Guimarães Curso completo de Direito Penal 10ª Edição Romeu de Almeida Salles Júnior e Roberto de Almeida Salles O Desembargador José Costa Loures, ex-Presidente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em parceria com a advogada Taís Maria Loures Dolabela Guimarães, analisa e comenta os artigos do Código Civil (Lei n. 10.406/2002) e suas mais recentes alterações. O autor, com experiência acumulada em trinta e sete anos de magistratura e trinta e quatro de magistério, traz para os estudantes e profissionais do Direito uma visão amadurecida e ampla dessa importante construção legislativa. Com índice alfabético-remissivo aos artigos facilitando a consulta e localização dos assuntos, proporciona ao leitor instrumentos valiosos para compreender alterações, preocupando-se em mostrar e abrir novos caminhos para os profissionais do Direito. O Curso Completo de Direito Penal procura concentrar num único volume os ensinamentos básicos desse importante ramo do Direito. Traz comentários resumidos, de todos os artigos do Código Penal. Preocupa-se em fornecer os contornos de cada instituto e as características essenciais de cada delito, procurando apontar as orientações dominantes sobre cada tema. Na Parte Geral aborda os princípios sobre os quais se apoia todo o sistema penal e na Parte Especial os delitos em espécie enfocados sistematicamente. Traz comentários às Leis n.12.012/09 e 12.015/09. A obra reúne, em um só volume, toda a matéria de Direito Civil, em linguagem clara, convidativa e não dogmatizada, um manual crítico de Direito Civil, em sua concepção mais moderna e inovadora, dentro de uma visão constitucional, que exige o Estado Democrático de Direito. Busca-se os fundamentos constitucionais para os diversos institutos do Direito Civil, sem perder de vista a ótica do próprio Direito Civil, procurando aprofundar-se nos temas controversos, como a definição de negócio jurídico e de contrato, de propriedade e de família. 2009 – ISBN 978-85-384-0044-8/Broch. – 528p. 17,0x24,0 cm – Del Rey 2010 - ISBN: 978-85-384-0075-2 / Capa Dura – 1184p. – 17,0 x 24,00cm – Del Rey Direito Processual do Trabalho 3ª Edição Cleber Lúcio de Almeida Manual de Direito das Famílias e das Sucessões Ana Carolina Brochado Teixeira Gustavo Pereira Leite Ribeiro (coordenadores) ISBN 978-85-384-0077-6 Brochura. – 1186p. – 17,0x24,0 cm – Del Rey PROCESSO CIVIL – Curso completo 4ª Edição Luiz Guilherme da Costa Wagner Junior O livro é resultado da sólida experiência do autor, professor da matéria há mais de dez anos. Abrange, em um só volume, os temas clássicos do Direito Processual Civil, devidamente atualizados de acordo com as mais recentes reformas que atingiram a matéria, e, em especial, analisados à luz de importantes posicionamentos jurisprudenciais e doutrinários. Revela-se ferramenta de estudo importante aos universitários, concursandos, professores e profissionais do Direito. 2010 – ISBN 978-85-384-0074-5 / Capa Dura – 880p. – 17,0x24,0cm – Del Rey Direito Constitucional 16ª Edição Kildare Gonçalves Carvalho Um guia seguro para o estudo teórico e aplicação prática dos que atuam na área do Direito Público. O autor faz uma análise minuciosa e profunda do Estado, do poder político, dos regimes políticos e sistemas de governo, além do estudo atualizado da Constituição Federal de 1988. Atualizado até a Emenda Constitucional n° 61/2009. Contém comentário à nova Lei do Mandado de Segurança. 2010 – 978-85-384-0073-8 /Capa Dura – 1612p. 17,0x24,0 cm – Del Rey Direito Tributário A obra trata, de forma clara e didática, dos institutos do direito processual do trabalho com a atenção voltada para as necessidades dos estudantes e profissionais do Direito, sem descuidar da importância de propor bases para a reflexão crítica sobre as normas, princípios e a função social do direito processual do trabalho. 2009 – ISBN 978-85-384-0048-6 / Broch. – 994p. – 17,0x24,0cm – Del Rey Direito Civil – Atualidades IV César Fiuza / Maria de Fátima Freire de Sá / Bruno Torquato de Oliveira Naves (coordenadores) Direito Civil Atualidades IV é o quarto volume da série, organizada pelos civilistas César Fiuza, Maria de Fátima F. de Sá e Bruno Torquato, traz como tema “Teoria e Prática no Direito Privado”. Composta por artigos de professores civilistas, abordam matérias diversas do direito civil como: anencefalia; transexualidade; biotecnologia; genética; paternidade; poder familiar; direitos do portador de deficiência mental; função social do contrato; planos de saúde; condomínios; direitos autorais; registro de marcas; entre outros. 2010 - ISBN: 978853780035 / Broch. – 708p. 15,5 x 22,5cm – Del Rey Direito Civil - Curso completo 14ª Edição César Fiuza É uma obra singular “no contexto do direito civil contemporâneo, quer pelo conjunto de autores reunidos, quer pela temática enfrentada, quer pela perspectiva metodológica que os instiga”. Os temas tratados nesta obra coletiva são de total atualidade, decorrentes da Lei Maior, do Código Civil e de legislações recentíssimas. São assuntos que nos foros e nos tribunais estão em grande discussão. 2008 – ISBN 978-85-7604-184-9 / Capa dura – 886p. – 17,0x24,0cm - Del Rey - Mandamentos Introdução ao Direito Ambiental 1ª Edição Talden Farias O livro Introdução ao Direito Ambiental tem por objetivo fazer com que o estudante de graduação e de pós-graduação, bem como os profissionais do Direito e das demais áreas que trabalham com o meio ambiente, tenham uma visão geral e ao mesmo tempo prática do Direito Ambiental. A partir de uma abordagem crítica, contempla os principais temas da disciplina, ao mesmo tempo em que se enfatiza assuntos pouco trabalhados pela maior parte da doutrina especializada. 2009 – ISBN: 9788538400219 / Broch. 280p. 21 x 14 x 2cm – Del Rey 59 59 FILOSOFIA DO DIREITO Fernando J. Armando Ribeiro Pós-doutor pela University of Carlifornia Berkeley (bolsista da Fulbright) Juiz Togado do Tribunal de Justiça Militar de Minas Gerais Professor da PUCMinas 60 A crise de paradigmas que acompanha a própria evolução do Direito na modernidade, enquanto rito de superação histórica, faz-se sumamente aguda no século XX – e mais especificamente no após Segunda Guerra – quando as soluções propostas pelo Estado de Direito viram-se defrontar com as alarmantes disparidades produzidas por tantas de suas próprias bases de sustentação. Assim em um tempo de culto à razão e à produção do conhecimento científico, fizeram-se os juristas muitas vezes reféns de açodado tecnicismo, legando a um quase esquecimento o complexo e sofisticado arcabouço de sentidos que estrutura e conforma o Direito como ciência social e humana. Assim, é com recobrada alegria que vemos a edição da Resolução número 75 do CNJ. Esta, ao dispor sobre a uniformização de regras para a realização de concursos públicos para a magistratura nacional, veio a inserir como disciplinas obrigatórias das provas subjetivas a Filosofia do Direito, a Teoria Geral do Direito, a Teoria Política, a Hermenêutica e a Sociologia Jurídica. A elevação das denominadas disciplinas zetéticas ao nicho de matérias obrigatórias do universo dos concursos públicos pode acarretar certas indagações, mas penso serem muito maiores as esperanças que esta renovação propicia. O esgotamento dos postulados positivistas e cientificistas dos séculos XIX e XX exige dos juristas o afastamento de toda concepção que possa ver no Direito um mero artifício técnico ou abstrato, isolado da sociedade e da história, infenso a questionamentos e problematizações. Aristóteles, repetindo ensinamento platônico, dizia que a Filosofia começou com a perplexidade (thauma), ou melhor, com a atitude de assombro do homem perante a natureza, o que o leva a problematizála (aporia) em um crescendo de dúvidas, iniciando por buscar a unidade na multiplicidade e a permanência na mudança até se atingir a euporia (solução). A Filosofia não existiria se todos os filósofos culminassem em conclusões uniformes, idênticas. A Filosofia é, ao contrário, uma atividade perene do espírito ditada pelo desejo de renovar-se sempre a universalidade de certos problemas, embora a diversidade das situações de lugar e de tempo possa condicionar a formulação diversa de antigas perguntas. O que distingue, porém, a Filosofia é que as perguntas formuladas por Platão ou Aristóteles, ou Kant ou Hegel, não perdem a sua atualidade, visto possuírem um significado universal, que ultrapassa os horizontes dos ciclos históricos. Reconhecer a importância das disciplinas teóricas para o chamado Scuola di Atenas - Raffaello Sanzio - Palácio Apostólico, Vaticano - Detalhe Platão e Aristóteles Arquivo Pessoal A Resolução número 75 do CNJ e a importância da Filosofia do Direito Revista Del Rey Jurídica operador jurídico é afastar um dos legados mais obtusos da tradição positivista. Esta, ao se estabelecer enquanto discurso de clarificação e cientificização do jurídico, em homenagem à construção epistemológica prevalente nas ciências naturais e exatas, esqueciase de problematizar os seus próprios pressupostos e pré-suposições. Daí o seu afastamento da filosofia que, como ensina Joaquim Carlos S a l g a d o , g ra n d e j u s f i l ó s o f o mineiro, não é uma reflexão sobre a realidade imediatamente dada à consciência, mas uma reflexão sobre a realidade mediatizada pelo conhecimento científico. A filosofia é, nesse sentido, uma reflexão a partir do conhecimento científico do seu tempo, sendo intrínseca e necessariamente crítica. Retornar à Filosofia e ao nicho de disciplinas que lhe são conexas representa, a um só tempo, rechaçar o dogmatismo que, sob o argumento de garantir segurança e certeza, deixava de lado elementos insuprimíveis à manifestação do Direito e à própria condição humana, bem como assegurar a necessária inserção de toda produção cultural humana no mundo da vida. Acima de tudo, busca-se assegurar o fundamental predicado humano, essencialmente humano, de pensar. Apesar de invisível, o pensamento tem força ingente sobre a vivência humana. Sócrates, um dos precursores do pensamento filosófico na Grécia antiga, chegou mesmo a compará-lo com os ventos. Apesar de invisíveis possuem uma força manifesta para todos, e sentimos sempre a sua aproximação e o seu impacto. Ademais, a história nos tem demonstrado a força das ideias e do pensamento como Filosofia do Direito instrumento de transformação da realidade. Certamente, as revoluções modernas das quais resultaria a criação do Estado de Direito não teriam sido possíveis sem a força das ideias de Jean Jacques Rousseau, Montesquieu e Kant, assim como as transformações criadoras do chamado Estado Social, do qual brotariam os direitos sociais, não teriam sido possíveis sem o impacto do pensamento socialista e da doutrina social da Igreja. Como nunca cansava de advertir o notável advogado Geraldo Ataliba, “nada mais prático do que uma boa teoria”. Com a resolução n. 75, o CNJ vem a conectar-se a todo um movimento que se tem consagrado à laboriosa tarefa de repensar não apenas as possibilidades do fazer científico jurídico, o método e a práxis jurídica, como também a problematizar a própria questão do fundamento do Direito. Tem-se a partir daí a possibilidade de uma construção científico-jurídica que se distancie da abstração da pura epistemologia de feições positivistas, abrace a concretude da faticidade histórica, e realize-se como “acontecer” (Ereignen) da “problemáticojudicativa realização concreta do Direito”, na síntese feliz de Castanheira Neves. O esquecimento da filosofia acarreta um esvaziamento do sentido humano e humanístico de que se deve nutrir sempre o Direito. Ademais, traz como consequência direta o esquecimento hermenêutico, mantendo a questão do conhecimento e da interpretação em bases puramente instrumentalistas, infensas às grandes contribuições que o pensamento filosófico – sobretudo no século XX – veio a legar. Como tem sido constatado por sérios estudiosos, trabalhar a hermenêutica em moldes instrumen- talistas e o Direito apenas nas dimensões sintático-semânticas termina por ser uma das razões do déficit de racionalidade, eficácia e coerência que tantas vezes tem atingido o Direito brasileiro, tornando a própria Constituição refém das aporias advindas da metódica das velhas teorias da interpretação. São visões abstracionistas que terminam por continuar justificando conceitos como o de “normas constitucionais programáticas”, identidade entre texto legal e norma, e “vontade do legislador”, dentre muitos outros exemplos. O jurista que se esquece da filosofia esquece-se mesmo do fundamental. Após a denominada reviravolta linguística e hermenêutica operada no século XX, especialmente após Gadamer podemos dizer, sem nenhum exagero, que sem filosofia não há hermenêutica, e sem hermenêutica não há Direito, apenas textos! Livros indicados: Fundamentos de História do Direito 5ª edição Antonio Carlos Wolkmer (Organizador) Editora Del Rey Hermenêutica Constitucional Coleção Del Rey Internacional Laurence Tribe, Michael Dorf www.delreyonline.com.br 61 CRÔNICA João Baptista Villela Professor Emérito na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais 62 A julgar pela frequência com que se invoca a condição laica do Estado brasileiro, conclui-se que a expressão caiu mesmo no gosto popular. Do real significado de Estado laico parece, contudo, que não se pode dizer o mesmo. Nem é para menos. Estado laico é conceito que carrega seu quanto de ambiguidades. Se nos perguntarmos, por exemplo, a que se opõe Estado laico, uma possível resposta é Estado teocrático. Ocorre que um Estado pode não ser laico sem ser teocrático. Por exemplo, o Reino Unido ou a Dinamarca. Até o ano 2000 também a Suécia. No Reino Unido e na Dinamarca, o Estado assume oficialmente uma cor religiosa, digamos assim: o anglicanismo no primeiro e o protestantismo luterano na segunda. Mas, sendo monarquias regidas por estatutos democráticos, não promovem a sua religião, não hostilizam as demais e garantem a todas a livre manifestação do culto e da palavra. Não é o caso das teocracias islâmicas. Os Estados islâmicos são projetos políticos preordenados à implantação de uma sociedade universal recortada segundo as leis do Alcorão. De resto, este foi também o figurino pelo qual se regeram as sociedades europeias ao tempo das Cruzadas e na época dos Descobrimentos. Empenhavam-se em expandir a fé católica, de modo a que chegasse também aos chamados infiéis e aos gentios. Neste empreendimento abrigavam ademais ambições políticas e econômicas, que resultariam em sangrentos conflitos e um vasto espectro de destruição. Seria um erro pensar que os Estados que não são laicos padecem de atraso institucional. Voltando ao Reino Unido e ao Reino da Dinamarca, por exemplo, sabe-se que estão hoje entre os países com os melhores índices de desenvolvimento econômico e educacional. O Reino Unido tem o sexto maior PIB do mundo e deu absolutamente notáveis contribuições à ciência, às artes e à cultura. Quanto à Dinamarca, não só foi classificada como o segundo país mais pacífico do mundo, depois apenas da Nova Zelândia, como detém, junto com a Suécia, a condição de o menos corrupto de todos os Estados, segundo dados de 2008. Por sua vez, o Brasil, que é uma República laica, ocupava em 2004 o nada lisonjeiro 74º lugar no ranking da corrupção. E quando foi Império, associado à Igreja Católica, teve um dos períodos de maior estabilidade política de toda sua história. Quer isso então dizer que é ruim ser laico e bom ser confessional? De modo algum. Tampouco o inverso faz qualquer sentido. O que conduz, nas democracias ocidentais, qualquer país a optar pelo formato confessional ou laico são fatores de natureza histórica ou até mesmo puramente acidental, como foi o caso da Inglaterra. Todos sabem que a Inglaterra esteve unida à Igreja de Roma e dela só se separou quando e porque o Rei Henrique VIII não obteve do Papa Clemente VII a anulação de seu casamento com Catarina de Aragão. Vigorava na época o princípio segundo o qual cada um tinha de professar a religião de seu Estado: cujus regio, ejus religio. Uma curiosa exceção ocorreu em Sachsen, quando o Príncipe Eleitor Frederico Augusto I manifestou a ambição de se candidatar a Rei http://esquecimeuendereco.files.wordpress.com/2009/07/safebelt.jpg Arquivo Pessoal O ESTADO É LAICO: ABAIXO OS IMPOSTOS! Revista Del Rey Jurídica da Polônia, para o que era necessário ser católico. Augusto abjurou então da fé luterana e “converteu-se” ao catolicismo. Encontrou, porém, forte resistência de seus súditos e de sua própria mulher, que se conservaram protestantes. Configurou-se então o caso singular de um Estado de população protestante, regido por um soberano católico. Quando uma Nação faz a escolha de se constituir em Estado democrático laico, não está tomando posição contrária a qualquer religião ou sistema de valores, senão apenas distanciando-se prudentemente de todos para melhor assegurar à sua população o livre exercício das próprias opções. Não é de estranhar por isso que a laicidade costume vir acompanhada de outra nota que, de certo modo, a explica e a complementa: o pluralismo. A República Federativa do Brasil, por exemplo, já pelo Preâmbulo de sua Constituição, quer ser “uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos”. Mais enfática declaração de respeito aos credos e religiões, impossível. Pouco importa, para este fim, que a República se declare laica ou confessional. Aqui cabem todos com igual título de cidadania: católicos, protestantes, evangélicos, budistas, muçulmanos, etc., mas também ateus, agnósticos, hereges, santarrões e anticlericais. Equivoca-se, pois, e gravemente, quem toma a laicidade como amoralidade ou assepsia política em relação aos valores de qualquer credo religioso. A moral intrínseca da laicidade está mais no respeito à diversidade das crenças do que na olímpica distância daquilo que elas propõem. Lugar-comum sazonal que costuma aparecer na mídia e nos foros de discussão sempre que o tema do aborto ganha o interesse público é a Crônica exaltação da laicidade para contrastá-la com a posição da Igreja Católica. Diz-se, nesses momentos de intenso fervor laico, que o aborto deve, sim, ser admitido porque o Estado não está sujeito às posições da Igreja, que é contrária à interrupção voluntária da gravidez. Como se ao Estado laico tudo fosse permitido e a Igreja Católica tivesse o poder de marcar com o selo da malignidade política todas as posições que assume. Essa forma de raciocinar fundamenta-se em pilares rigorosamente negativos. Um é negativo porque nada diz em favor do aborto. Ora, o aborto deveria ser discutido a partir de matriz ética, examinados e ponderados os argumentos favoráveis e os contrários. Não em função do que pensam as igrejas. Outro pilar é também negativo porque estigmatiza, gratuitamente, a posição da Igreja Católica. Como alguém que dissesse: “Ah, a Igreja Católica é contra? Então o correto é ser a favor”. Ora, uma política de Estado não é obscura porque coincide com a de um credo religioso. Nem esclarecida só porque a contraria. Não fosse assim, um mínimo de coerência nos levaria a extrair conclusões que, de tão bizarras, nem o mais fero detrator da Igreja Católica estaria disposto a subscrever. Vejamos uma só delas. Sabe-se que a tradição da Igreja sempre foi pela admissão dos direitos de o Estado recolher tributos. No célebre episódio em que fariseus e herodianos tentam embaraçar Jesus, perguntando-lhe se era lícito pagar o tributo a César, a resposta os reenvia à própria iniquidade (cf. Mateus, 22, 15-22). Ali estavam os arquipatronos dos sonegadores de todos os tempos e lugares. Diz o Evangelista que queriam confundir a Jesus. Mas isso, creio, não é tudo. Certamente perseguiam também o aval da religião para sua cupidez e suas fraudes. Hoje, em termos populares, diríamos que foram apanhar lã e saíram tosquiados. Em vão buscará o direito constitucional mais adequada legitimação do poder do Estado de tributar que a histórica e lapidar resposta de Jesus: “Dai a César o que é de César”. Primeira conclusão, portanto: Os impostos são uma instituição perversa porque os Evangelhos, dos quais a Igreja é guardiã e propagadora, os admitem. Mas, se os impostos estão aí, o que fazer? Muito fácil. Querem ver? No Catecismo da Igreja Católica, baixado com a Constituição Apostólica Fidei Depositum (1992), do Papa João Paulo II, depois de se exaltar o dever do cidadão de participar da vida pública, sentencia-se: “A fraude e outros subterfúgios pelos quais alguns escapam às malhas da lei e às prescrições do dever social devem ser firmemente condenados, por serem incompatíveis com as exigências da justiça” (cânon 1916). Ora - continuando no rigor do raciocínio - se a Igreja condena “a fraude e outros subterfúgios”, só pode ser porque eles são práticas sadias e virtuosas, às quais há que se opor. A solução, vê-se logo, está na ponta dos dedos. Ou no bolso das calças (cintos, cuecas e meias também servem): Os impostos devem ser radicalmente eliminados, como se viu. Enquanto esse patamar de fina evolução não se alcança, a ordem é fraudar. Fraudar com obstinação política e ardor cívico. Simples assim. Está aí, portanto, o que nos faltava para dar a largada do grande festim antitributário. Impostos não é preciso, sonegar é preciso. 63 ENSINO JURÍDICO Paulo Roberto de Gouvêa Medina Professor Emérito da UFJF. Conselheiro Federal da OAB. 64 A literatura sempre encontrou nas Faculdades de Direito ambiente propício ao seu florescimento. Poetas e prosadores de todos os tempos saíram das nossas instituições de ensino jurídico, que, em muitos casos, lhes proporcionaram, durante os cinco anos do curso, mais do que o ensino do Direito, oportunidade de armazenar cultura e cultivar o verbo. Bacharéis em Direito foram José de Alencar, Jorge Amado, Luiz da Câmara Cascudo, dentre tantos outros. Bacharéis foram também poetas iluminados como Augusto dos Anjos, Raul de Leoni, Raimundo Corrêa, Alphonsus de Guimaraens – os dois últimos, aliás, Juízes de Direito, cabendo frisar que, ao autor de Ismália, Carlos Drummond de Andrade, num belo poema, cognominou de “Meritíssimo poeta do luar”. Significativamente, nas Arcadas do Largo de São Francisco, lêem-se logo na entrada, gravados em grandes vitrais, os nomes de três ex-alunos que se destacaram menos pelo senso jurídico do que pela inspiração poética – Álvares de Azevedo, Castro Alves e Fagundes Varela. Afonso Arinos de Mello Franco, que fez seu curso na antiga Faculdade Nacional de Direito, na década de vinte do século passado, observa, nas memórias, que as preocupações dominantes entre os estudantes de seu tempo eram muito mais literárias do que jurídicas. A despeito disso, é recente a utilização da literatura como forma de aprendizado jurídico, nos nossos cursos de Direito. Descobriuse, efetivamente, nos últimos anos, que textos literários prestam-se, muitas vezes, à análise jurídica, podendo, assim, servir de motivação aos estudantes para o estudo de determinados temas jurídicos. Além de tornarem mais ameno o trato de certos assuntos técnico-jurídicos, quando utilizados com propriedade podem acrescentar boa soma de conhecimentos humanísticos à formação dos acadêmicos de Direito. As habilidades e competências que as vigentes diretrizes curriculares recomendam para os cursos jurídicos, como a leitura, compreensão e elaboração de textos, assim como o desenvolvimento do raciocínio jurídico, podem realizar-se de forma sem dúvida mais agradável e proveitosa por meio de textos literários conjugados às matérias jurídicas. Uma nova perspectiva se abre, pois, para o ensino do Direito, na medida em que este passa a prevalecer-se da literatura para o exame de alguns dos seus temas. Publicações vindas a lume no último decênio evidenciam a importância que se tem atribuído ao binômio Literatura-Direito na formação dos novos bacharéis. A série “Direito e Literatura” lançada pela Livraria do Advogado, de Porto Alegre é exemplo marcante do que se vem de dizer. Nesse contexto, não pode deixar de ser mencionado o livro pioneiro da Profa. Eliane Botelho Junqueira, “Literatura e Direito” – “Uma outra leitura do mundo das leis”, editado, em convênio, por Letra Capital Editora e IDES, Instituto Direito e Sociedade, do Rio de Janeiro, em 1998. De nossa parte, temos também contribuído, ainda que modestamente, para a bibliografia dedicada a essa temática, como dão conta os trabalhos Arquivo CYB Waneska Diniz Direito e Literatura reunidos em “Ensino Jurídico, Literatura e Ética”, que a Editora OAB publicou em 2006. Se essas obras, ao traçar o perfil de certos personagens que aparecem nos romances e contos de Machado de Assis e Lima Barrreto, especialmente, fornecem-nos farto material para uma análise sócio-jurídica da atuação dos bacharéis no Segundo Império, outros textos da literatura universal, enfocando problemas de natureza essencialmente jurídica, na trama de preciosos contos, fábulas e peças teatrais, podem servir de instrumentos auxiliares à metodologia do ensino jurídico. Algumas dessas obras foram por nós referidas em recente palestra sobre o tema. Tomando como objeto de análise a fábula O lobo e o cordeiro, de La Fontaine, procuramos mostrar como aquele texto clássico, de certa forma, antecipa-se à Emenda nº 5 à Constituição dos Estados Unidos, ao chamar atenção para a importância do devido processo legal no comentário do autor sobre as circunstâncias em que o pobre cordeiro foi sacrificado – sans autre forme de procès. Na mesma linha de orientação, referimo-nos a um exemplo típico de processo kafkaniano – aquele a que responde o desditoso verdureiro Crainquebille, no conto de Anatole France. Em torno da peça de Sófocles, Antígona, tecemos considerações sobre o direito de sepulcro, sobre os limites da autoridade, sobre a distinção que cumpre estabelecer entre a vontade do soberano e o papel do Estado, sobre pontos fundamentais, em suma, de Ciência Política e de Direitos Humanos. Detendo-nos no exame das implicações jurídicas de O Mercador de Veneza, de Shakespeare, salientamos que, ali, se encontrava do ponto de vista do direito civil, exemplo surreal de contrato leonino, agravado pela imposição de uma condição puramente Ensino Jurídico A literatura é um dos pilares do humanismo, de par com a história, a filosofia e a sociologia. E o humanismo é o pano de fundo da cena social em que atua o Direito. potestativa e fisicamente impossível, além de caracterizar-se, na cena, sob o aspecto processual, curiosa forma de julgamento, em que alguém, fazendo-se passar pelo magistrado, praticava ato jurídico inexistente, ao mesmo tempo que protagonizava surpreendente forma de justiça por equidade, ao condicionar a extração de uma libra de carne, do corpo do devedor – Antonio -- a que o credor – o judeu Shylock --, assim procedendo, não lhe retirasse uma gota de sangue sequer, já que isso não estava previsto no contrato... A literatura é um dos pilares do humanismo, de par com a história, a filosofia e a sociologia. E o humanismo é o pano de fundo da cena social em que atua o Direito. Desde os tempos de Cícero, a humanitas exprime a educação do homem como tal, constituindo preocupação dos que lhe pretendem infundir uma base cultural condizente com o sentido da vida humana. Se a filosofia aponta a busca da felicidade como o objetivo supremo do homem, o Direito tem em vista reger a vida social em condições tais que permitam o desenvolvimento das aspirações de cada um, em harmonia com as de seus concidadãos, na realização daquele ideal. O Direito não pode perder de vista, pois, o desenvolvimento das potencialidades do homem, de forma a alcançar uma vida feliz, no exato sentido do termo. E, para tanto, como diria Drummond, as leis não bastam, os lírios não nascem das leis... É preciso que as normas e os princípios jurídicos sejam temperados pelo sal da vida - o que quer dizer: por tudo o que o espírito humano é capaz de conceber, no sentido de tornar a vida mais amena, alegre e feliz. Aí é que entra o papel da poesia, da imaginação literária, da tessitura dos romances, como elementos formadores do espírito humanista. Ademais, a literatura é fonte de cultura. E um rico cabedal de conhecimentos é indispensável ao jurista. Henri Robert dizia que o advogado deveria ter amplo conhecimento dos clássicos da literatura e do direito e “um estilo claro, exato, apropriado e conforme com o que os magistrados têm o hábito de ouvir.”. Eis aí outro ponto a assinalar a importância da literatura na formação do futuro advogado. Este deve ter um estilo apurado, que torne as peças de sua lavra agradáveis de ler e capazes de produzir o convencimento de quem as leia. O jargão forense hermético e pesado, que os críticos costumam qualificar de juridiquês, deve ser substituído pelas frases bem construídas, pelo estilo límpido, pelo bom vernáculo. Ao longo de todas as épocas, os advogados que mais se destacaram na sua profissão foram aqueles que souberam aliar, ao conhecimento seguro do Direito, um linguajar escorreito, despido de ornamentos e vulgaridades. São exemplos de profissionais da advocacia que, peticionando em Juízo, foram sempre escritores primorosos, Lafayette Rodrigues Pereira, Rui Barbosa, San Tiago Dantas, Dario de Almeida Magalhães, dentre tantos outros. Ora, para escrever bem é preciso ler os bons autores. O estilo se apura na medida em que nos abeberamos nas boas fontes. E o Direito requer uma expressão correta, pura, cristalina, seja nas leis, seja na doutrina, seja nos julgados. 65 COLEÇÃO DIREITO CIVIL - DEL REY “Com a exceção de alguns pouquíssimos bons autores, não há nas prateleiras jurídicas um bom curso de Direito Civil, que reúna em vários volumes toda a matéria que compõe o currículo da graduação e da práxis forense. A Coleção Direito Civil, dividida em oito volumes, foi pensando assim que a Editora Del Rey, hoje consagrada em todo o Brasil, reuniu grandes nomes da civilística mineira (entre os quais tive a honra de ser incluído), a fim de apresentar ao público. “ (César Fiuza) contratos Volume III César Fiuza Teoria geral do direito civil EM BREVE Volume VI Adriano Stanley Responsabilidade Civil DIREITO de família Volume IV Leonardo Macedo Poli Volume I José Jairo Gomes EM BREVE PREÇO: R$ 68,00 Direito de Empresa DIREITO das obrigações Volume V Rodrigo Almeida Volume II César Fiuza EM BREVE EM BREVE DIREITO das coisas PREÇO: R$ 48,00 Volume VII - 2ª edição Dimas Messias de Carvalho PREÇO: R$ 78,00 DIREITO DAS SUCESSÕES Volume VIII - 2ª edição Dimas Messias de Carvalho, Dimas Daniel de Carvalho PREÇO: R$ 58,00 PROMOÇÃO VOLTA ÀS AULAS Arquivo Del Rey Realizou-se em 17 de outubro de 2009 o sorteio da “Promoção Volta às Aulas Del Rey”. Foram contemplados os estudantes: 1. Fernanda Rodrigues Menezes, da FAPAM – Pará de Minas (Livraria Del Rey Assembleia); 2. Leandro Gomes de Paula – PUC Minas/ BH (Livraria Del Rey Goitacases); 3. Leandro Ribeiro Ambrósio – Universidade Federal de Uberlândia (Livraria Del Rey Aimorés); e 4. Giselle Ribeiro Costa – Faculdade Inforium/BH (Livraria Del Rey Contorno). Cada um deles ganhou R$ 500,00 em títulos Del Rey, em sorteio presidido pelo Professor Ronaldo Brêtas, na presença dos Gerentes Marcos Almeida e Bruno Lomasso. 66 Revista Del Rey Jurídica O melhor da literatura jurídica, num só clique, onde você estiver! Acesse e confira! www.livrariadelrey.com.br Milhares de títulos de autores e editoras consagradas ao seu alcance! Agora com muito mais dinamismo, interatividade e eficiência.