estructura biofísica de la economía ecuatoriana

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estructura biofísica de la economía ecuatoriana
Copyright © 2014 de los autores. Publicado bajo licencia de Redibec
URL: http://www.redibec.org/IVO/rev22_05.pdf
Andrade y Mollina 2014 . Revista Iberoamericana de Economía Ecológica Vol. 22:69-84
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“Fronteiras planetárias” e limites ao crescimento: algumas
implicações de política econômica
Daniel Caixeta Andrade
Instituto de Economia, Universidade Federal de Uberlândia, Brasil.
[email protected]
Petterson Mollina Vale
Department of International Development, London School of Economics and Political Science,
Reino Unido.
[email protected]
Fecha de recepción: 05/02/2013. Fecha de aceptación: 16/05/2014
Resumo
A questão ambiental tem se firmado como um tema de grande relevância no cenário acadêmico e político. Embora os
debates em torno dessa problemática tenham testemunhado grande disseminação, discussões acerca dos limites ao
crescimento econômico impostos por restrições de ordem ecológica ainda não se encontram totalmente inseridas nas
agendas de pesquisa da maioria das correntes do pensamento econômico. Este artigo tem por objetivo principal
sistematizar as principais contribuições em termos de propostas de política econômica para uma macroeconomia
compatível com as condições de finitude ecossistêmica (macroeconomia ecológica). A limitação da expansão da escala
da economia diante da capacidade dos ecossistemas, o estímulo ao florescimento das capacitações humanas e o
desenho de uma macroeconomia que lide explicitamente com o problema da distribuição de renda constituem os
princípios gerais de um plano para o desenvolvimento sustentável.
Palavras-chave: Escala, fronteiras planetárias, macroeconomia ecológica, economia do estado-estável, economia
ecológica.
Abstract
The environmental issue has emerged as one of great importance in the academic and political scene. While the debate
surrounding this issue has witnessed large spread, discussions about the limits to growth imposed by environmental
constraints have not yet fully entered the research agendas of most currents of economic thought. This paper’s main
objective is to systematize the main contributions in terms of economic policy proposals for a macroeconomics compatible
with finite ecosystem conditions (ecological macroeconomics). Limiting the expansion of the scale of the economy
according to ecosystems carrying capacity, stimulating the flourishing of human capabilities, and the designing of a
macroeconomics that deals explicitly with the problem of income distribution are general principles of a sustainable
development plan.
Keywords: scale, planetary boundaries, ecological macroeconomics, steady-state economy, ecological economics.
JEL Codes: Q50, Q57.
1. Introdução
Talvez o mais importante distintivo da
economia ecológica em relação à análise
econômica convencional seja sua visão préanalítica de que o sistema econômico
está contido num sistema maior que o
sustenta e do qual é dependente. O
argumento consectário de tal visão é que as
bases para a prosperidade das sociedades
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------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------humanas não devem estar amparadas
exclusivamente no crescimento econômico1,
uma vez que este último é limitado em última
instância pelos limites biofísicos do planeta
Terra ou "fronteiras planetárias", expressão
tomada de empréstimo de Rockström et al.
(2009a)2.
Embora o elo comum entre o heterogêneo
grupo dos economistas ecológicos seja o
entendimento de que, de fato, não é possível
prolongar indefinidamente o crescimento
econômico, essa unanimidade não é
observada no corpo teórico mais amplo das
ciências
econômicas.
Mesmo
que
economistas não ecológicos tendam a
reconhecer a problemática ambiental como
importante,
aquela
visão
pré-analítica
diferenciadora não é incorporada nos
esquemas analíticos convencionais. A bem
da verdade, estes últimos ainda se encontram
firmemente ancorados na ideia de que o
crescimento econômico é a solução viável
para os problemas atuais, sejam eles de
natureza econômica, social ou ambiental
(Daly 1999). Haja vista os recentes esforços
utilizados para a superação dos efeitos
perversos causados pela crise financeira do
fim da primeira década do século XXI, os
quais privilegiaram a replicação de tal
modelo, despertando críticas advindas
principalmente da economia ecológica (Daly
2010; Oliveira & Andrade 2012).
Embora ainda largamente negligenciado pela
maioria dos economistas, postula-se que não
deve ser postergado o debate sobre as
limitações
biofísicas
ao
crescimento
econômico, além do que não é desejável que
tal debate fique restrito a grupos marginais
que frequentemente não têm influência
decisiva no processo de elaboração e
implementação de políticas econômicas.
Neste contexto, este artigo procura contribuir
para o alargamento dessa discussão,
partindo-se do princípio de que dois
questionamentos principais devem ser
1
Neste trabalho, a expressão crescimento econômico se
refere exclusivamente à expansão física do sistema econômico
e, por conseguinte, alude à sua métrica usual, qual seja, o
Produto Interno Bruto (PIB) de uma nação.
2
Uma síntese do trabalho foi publicada pela revista Nature
(Rockström et al. 2009a) e uma versão mais completa pode
ser encontrada em Rockström et al. (2009b).
divulgados e refletidos como meio de se
reconhecer as limitações do esquema
analítico tradicional. São eles: i) qual a
escala3 atual do sistema econômico e as
possíveis
consequências
de
um
“overshooting” dos limiares ecossistêmicos?;
ii) quais são as implicações de política
econômica em um sistema adaptado às
condições de finitude?
Este texto apresenta contribuições recentes
do campo da economia ecológica que
respondem preliminarmente às questões
acima. A contribuição, portanto, é a de
sistematizar e divulgar as principais ideias
sobre “fronteiras planetárias”, macroeconomia
ecológica
e
implicações
de
política
econômica. A intenção precípua é incitar o
diálogo sobre questões que são cruciais entre
todos
aqueles
preocupados
com
o
desenvolvimento sustentável4.
A próxima seção apresenta as principais
evidências sobre a aproximação da escala
humana em direção às chamadas “fronteiras
planetárias”. A segunda e terceira seções
apresentam,
respectivamente,
algumas
implicações de política econômica numa
perspectiva de macroeconomia ecológica5 e
evidências teóricas e empíricas sobre seu
potencial (Victor 2009). Por fim, as
considerações finais ressaltam que as ideias
aqui contidas não devem ser restritas a
correntes específicas dentro da Economia,
mas sim conhecidas e debatidas por todas
elas. A questão ambiental é um tema
transversal que requer a integração de várias
perspectivas para a busca de soluções que
considerem
simultaneamente
a
sustentabilidade
ecológica,
a
justiça
distributiva e a eficiência econômica.
3
Neste trabalho, as expressões “escala”, “escala humana” e
“escala do sistema econômico” são sinônimas e utilizadas
indistintamente. É um importante conceito dentro da economia
ecológica (Daly 1993) que reflete a ideia de relação entre o
tamanho físico do sistema global e do sistema econômico.
4
O conceito de desenvolvimento sustentável utilizado é o
mesmo popularizado pelo relatório “Nosso Futuro Comum”
(Brundtland 1987).
5
Não é objetivo aqui tratar da evolução das ideias para a
construção de uma macroeconomia ecológica. Para tanto, ver
Saes (2013) para uma revisão compreensiva das principais
contribuições de autores importantes da economia ecológica.
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------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------1.1. Do Holoceno ao Antropoceno:
evidências sobre a ultrapassagem de
alguns limiares ecossistêmicos
Em meados do século XVIII, o período que se
inicia com a Revolução Industrial, cuja
característica central é a industrialização e o
uso massivo de combustíveis fósseis, marca
o fim de uma fase de estabilidade geológica
em que os mecanismos naturais do planeta
Terra eram capazes de absorver os impactos
endógenos e exógenos sofridos pela ecosfera
terrestre. Tal período, conhecido como
Holoceno, acompanhou grande parte da
trajetória da civilização humana, na qual o
homem passou de caçador, coletor e nômade
para estágios de intervenção cada vez mais
agressivos ao meio ambiente.
Steffen et al. (2007) reconhecem que as
sociedades
pré-industriais
causaram
mudanças ambientais. Estas, porém, eram
majoritariamente locais e transitórias, estando
dentro dos limites da variabilidade natural do
meio ambiente. Para os autores, as
sociedades de então não possuíam
organização
econômica
e
tecnologia
suficientes para dominarem as grandes
forças da natureza.
Esse quadro, porém, sofre mudanças
significativas na era industrial, cujo início
sinalizou o alvorecer de um novo período – o
Antropoceno –, no qual a estabilidade
característica do Holoceno deixou de ser o
traço marcante.
A
centralidade
das
intervenções antrópicas nos desequilíbrios
dos sistemas naturais terrestres e a ameaça
à resiliência do ecossistema global marcam a
nova era (Steffen et al. 2007; Rockström et al.
2009a). Elevaram-se os riscos de perdas
irreversíveis e potencialmente catastróficas e
são cada vez mais claros os sinais de
mudanças globais, entendendo-se estas
como
alterações
biofísicas
e
socioeconômicas que modificam a estrutura e
o modo de funcionamento do sistema
terrestre.
podem limitar as escolhas econômicas: i) a
disrupção
de
serviços
ecossistêmicos
essenciais para a manutenção das condições
de vida devido ao aumento da participação
humana nos ciclos biogeoquímicos; e ii) a
depleção de combustíveis fósseis ou recursos
energéticos não renováveis que viabilizaram
o advento e consolidação da civilização
industrial.
Com efeito, nota-se a intensificação do
debate sobre as consequências nefastas do
aumento sem precedentes da escala do
sistema econômico sobre o capital natural da
Terra. A expressão “something new under the
Sun”, título da obra de J.R. McNeill (Mcneil
2000), ficou conhecida como epíteto da
elevação incomum da capacidade humana
em interferir nos ciclos naturais da Terra ao
longo do século passado e início deste. Para
este autor, “there has never been anything
like the 20th century” (p. 3).
Para Krausmann et al. (2009), o crescente
metabolismo social e industrial da civilização
humana tem sido um dos principais fatores
para o crescimento da escala do sistema
econômico. Estes autores estimam que
durante o século XX a extração global de
materiais aumentou por um fator 8,
alcançando, em 2005, cerca de 59 x 109
toneladas por ano de materiais extraídos e
usados ao redor do mundo. Todas as
análises conduzidas corroboram a afirmação
de que no período após a 2ª Guerra Mundial
houve um aumento inédito da taxa de uso
“per capita” de materiais6.
Como consequência, a elevação da escala
das atividades humanas tem provocado
extensivas e rápidas mudanças nos
ecossistemas da Terra. De acordo com o
Millennium Ecosystem Assessment (MEA
2005),
as
alterações
sofridas
pelos
ecossistemas
do
planeta
não
são
comparáveis a nenhum outro período da
6
West & Schandl (2013) investigaram os padrões no uso de
materiais e a eficiência material nos países da América Latina
e Caribe entre 1970 e 2008. Os resultados mostraram um
rápido crescimento no consumo de materiais primários, ao
mesmo tempo em que os países da região têm se tornado
menos eficientes na geração de renda a partir da extração
destes recursos. Esse quadro sugere importantes desafios
para a sustentabilidade ecológica da região, principalmente
quando se leva em conta as tendências de sua especialização
produtiva.
A magnitude dos impactos do Antropoceno e
seus desdobramentos sobre a capacidade de
resiliência
dos
ecossistemas
vêm
aumentando enormemente desde o fim da
Segunda Guerra Mundial. Cleveland & Ruth
(1997) apontam que dois importantes fatores
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------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------história humana e, embora tais mudanças
tenham contribuído significativamente para
ganhos líquidos em termos de crescimento
econômico, trouxeram consigo custos
crescentes na forma de degradação de
serviços ecossistêmicos.
Existem sérias lacunas no que diz respeito à
mensuração
das
escalas
ecológica
sustentável e atual do sistema econômico7.
Avaliações biofísicas e econômicas dos
impactos humanos sobre os ecossistemas e
sua resiliência são condição “sine qua non”
para elaboração e implementação de políticas
que visem ao desenvolvimento sustentável.
Mesmo que incertezas e a falta de uma
completa compreensão dos processos
ecológicos dificultem ou mesmo inviabilizem
análises sobre a magnitude da escala
humana,
é
preciso
a
integração
transdisciplinar para a construção de
referenciais que elucidem limiares seguros
até os quais a atividade econômica pode
avançar (escala ecológica sustentável) ou até
onde é desejável que ela avance (escala
macroeconômica ótima8).
Uma primeira tentativa na direção de se
enfrentar o desafio acima colocado foi
publicada por um grupo de 29 cientistas entre
economistas
e
outros
pesquisadores
(Rockström et al. 2009a). Este estudo é
interessante porque apresenta de maneira
explícita o que os autores chamam de
“fronteiras planetárias”, dentro das quais se
espera que a espécie humana possa “operar”
de maneira segura. A transgressão
(“overshooting”) de uma ou mais fronteiras
pode desencadear mudanças abruptas e não
lineares em escalas continentais ou mesmo
em escala global. Este último aspecto é
reforçado pela crescente interdependência
entre as nações, o que torna singular os
potenciais efeitos deletérios de processos de
colapsos civilizatórios (Diamond 2005).
Rockström et al. (2009a) identificaram 9
fronteiras planetárias9 e, a partir do
conhecimento científico disponível, foi
possível obter mensurações para 7 delas
(Tabela 1).
Percebe-se que a escala humana vem
transgredindo três fronteiras planetárias (taxa
de perda de biodiversidade, ciclo do
nitrogênio e mudança climática). Isto significa
que os valores seguros para operação da
atividade humana foram ultrapassados nestes
sistemas, indicando uma possibilidade (ainda
desconhecida) de mudanças ambientais
potencialmente catastróficas. Tais resultados
são ainda mais alarmantes quando se
constata que as várias fronteiras são interrelacionadas, o que faz com que o
“overshooting” de algumas delas possa levar
à disrupção de outros sistemas.
No caso da perda de biodiversidade, a taxa
antropogênica de perda de biodiversidade é
considerada como sendo 1.000 vezes mais
rápida do que a taxa natural de extinção
típica dos ciclos terrestres (Sukhdev 2008).
Em se tratando do ciclo do nitrogênio, as
estimativas mostram que a captura de N2 é
cerca de 246% superior ao que seria
recomendável para a não perturbação deste
sistema. Para a mudança climática, o valor do
estado atual (387 ppm de CO2, segundo
estimativas realizadas)10 é tido como10,57%
superior ao que seria um nível seguro para
evitar o fenômeno de mudança climática e
38,21% superior ao valor pré-industrial.
Rockström et al. (2009a) foram pioneiros em
empreender
esforços
explícitos
para
quantificação das escalas sustentáveis e do
atual “desempenho” da atividade humana
7
O mesmo também se pode dizer com relação à escala ótima
do sistema econômico. Ver Lawn (2001) para uma análise
sobre os conceitos de escala máxima sustentável, relativa à
resilência e capacidade de suporte dos ecossistemas, e escala
ótima do sistema econômico, referente aos custos e benefícios
provenientes da expansão do sistema econômico. Malghan
(2006) apresenta uma estrutura analítica para o estudo da
escala e sua relação entre sistema econômico e ecossistemas.
8
A escala macroeconômica ótima define o ponto a partir do
qual o incremento do PIB (crescimento econômico na
terminologia convencional) se torna antieconômico, originando
o fenômeno do crescimento não econômico (Daly 1999; Lawn
2001).
9
Os autores reconhecem o caráter preliminar das estimativas,
principalmente quando se considera as incertezas envolvidas e
as lacunas do conhecimento científico.
10
Diferentemente de outras fronteiras, o nível de CO2 em
partes por milhão é uma estatística conhecida e disseminada
entre os estudiosos do fenômeno das mudanças climáticas.
Segundo a fonte CO2Now.org, a média de concentração de
CO2 para o mês de outubro de 2013 foi de 393,66 ppm. Ainda
segundo a mesma fonte, foi por volta do ano de 1990 que a
concentração atmosférica de CO2 ultrapassou a fronteira
proposta de 350ppm. Para maiores detalhes, visitar o sítio
eletrônico: http://co2now.org/.
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Tabela 1: Fronteiras planetárias de sistemas terrestres selecionados.
Sistema
considerado
Parâmetro
i.
concentração
de
dióxido de carbono (CO2)
atmosférico em ppm (partes
por milhão por volume);
Mudança climática
Taxa de perda de
biodiversidade
Ciclo do nitrogênio*
Ciclo do fósforo**
ii.
mudança
no
forçamento radiativo (watts
por metro quadrado)
Taxa de extinção (número de
espécies por milhão por ano)
Quantidade de N2 retirada da
atmosfera para uso humano
(milhões de toneladas por ano)
Quantidade de fósforo (P) que
flui em direção aos oceanos
(milhões de toneladas por ano)
Fronteira
Proposta
Estado
Atual
Valores
préindustriais
350
387
280
1
1,5
0
10
>100
0,1-1
35
121
0
11
8,5-9,5
-1
Depleção do ozônio
atmosférico
Concentração
de
(unidade de Dobson)
ozônio
276
283
290
Acidificação
oceânica***
Estado de saturação média
global de aragonita na água da
superfície do mar
Consumo humano de água
3
doce (km por ano)
2,75
2,90
3,44
4.000
2.600
415
Mudanças no uso do
solo
Porcentagem da cobertura
terrestre convertidas para
terras agrícolas
15
11,7
baixa
Carregamento
aerosol
Concentração
geral
de
partículas na atmosfera, em
uma base regional
A ser determinada
Uso global de água
doce
Poluição química
Por exemplo, quantidades
emitidas, concentração de
poluentes
orgânicos
persistentes,
plásticos,
desreguladores
endócrinos,
metais pesados e lixo nuclear
(no ambiente global ou os
efeitos sobre os ecossistemas
e ciclos terrestres)
A ser determinada
Fonte: Rockström et al. (2009a: 473).
* parte de uma fronteira com o ciclo do fósforo;
** parte de uma fronteira com o ciclo do nitrogênio;
*** aragonita é uma forma de carbonato de cálcio usada para mensurar a acidificação. Quando a acidez das águas oceânicas
aumenta, reduz-se a saturação de aragonita.
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------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------com relação aos valores considerados
seguros para a preservação da estabilidade
típica do Holoceno. Em função dessa
transgressão,
mudanças
repentinas
e
irreversíveis são cada vez mais prováveis.
Mais recentemente, Barnosky et al. (2012)
sintetizaram evidências de que a interferência
humana nos ciclos naturais estão forçando
uma nova transição crítica de escala
planetária para um estado desconhecido pela
experiência humana. Tal análise pode ser
convergente, por exemplo, com o argumento
sobre a “vingança de Gaia” (Lovelock 2006),
segundo o qual o sistema Terra – um
complexo sistema em perene interação
(teoria de Gaia) – pode reagir adversamente
a mudanças profundas provocadas por
intervenções antrópicas.
Barnosky et al. (2012) afirmam que uma
característica comum às grandes mudanças
de estado planetárias é a presença de forças
globais. Atualmente, os autores sugerem que
os
mecanismos
que
podem
ser
caracterizados como forças globais são o
crescimento da população humana (e o
consequente consumo de recursos), a
transformação e fragmentação de hábitats, a
produção e consumo de energia e mudanças
climáticas. Como fator subjacente a todos
estes “drivers” está o crescimento da
população e consumo “per capita”, o que,
segundo
os
economistas
ecológicos,
determina em primeira instância a escala do
sistema
econômico.
Seu
aumento
exponencial torna possíveis – e prováveis –
substanciais
perdas
de
serviços
ecossistêmicos requeridos para suportar a
população humana.
A discussão sobre os limites ao crescimento
impostos pela resiliência dos ecossistemas
terrestres
vem
se
intensificando
principalmente no âmbito das disciplinas que
visam à integração analítica de várias
perspectivas. Todavia, tal discussão somente
ganhará maior aderência a partir do momento
em que forem estabelecidas as fronteiras que
devem ser respeitadas. Em especial, este
debate apenas será importante para a
Economia caso for amplamente aceito o
caráter entrópico das atividades econômicas
(Georgescu-Roegen
1971)
e
seu
protagonismo no processo de degradação
das condições ambientais.
2.Macroeconomia ecológica, prosperidade
sem crescimento e condição estável:
algumas
implicações
de
política
econômica
A consideração da visão econômicoecológica e dos limites à expansão física do
sistema econômico implica a adoção de um
arcabouço
teórico
que
considere
explicitamente as restrições ecossistêmicas
ao crescimento econômico. Isso sugere a
necessidade da emergência do que se pode
chamar de macroeconomia ecológica, cujo
objetivo maior seria o de pensar e propor
políticas econômicas que promovam o
desenvolvimento socioeconômico dentro de
um quadro de limites ecológicos. A
manutenção de um nível de emprego
adequado é um dos seus principais desafios,
uma vez que correntemente este depende do
crescimento econômico.
A necessidade de uma macroeconomia
ecológica foi pioneiramente reconhecida por
Daly (1991a). Desde então, existem esforços
no sentido de satisfazer os principais
argumentos inicialmente levantados (Heyes
2000; Lawn 2003, por exemplo), mas
certamente estes não foram disseminados
e/ou sólidos o suficiente para permitirem sua
consolidação. Segundo Saes (2013), a
evolução recente de contribuições para o
advento de uma macroeconomia ecológica
tem se direcionado para o debate de
perspectivas teóricas (condição estável,
prosperidade
sem
crescimento
e
decrescimento) e para a modelagem
macroeconômica, destacando-se a carência
de abordagens que lidam especificamente
com
a
situação
de
países
em
desenvolvimento.
Jackson (2009) é autor da mais fecunda
tentativa de complementar a visão de
desenvolvimento como liberdade (“capability
to flourish”) com a ideia de limites à escala da
(“bounded capabilities”), o que originou o
debate em torno da “prosperidade sem
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------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------crescimento”. Segundo essa perspectiva, o
foco do desenvolvimento é a habilidade para
se prosperar: fisicamente, psicologicamente e
socialmente, e isso depende em parte de
bens materiais, mas somente na medida em
que livram o homem do medo do amanhã.
Depois disso, a expansão das liberdades
humanas exige uma combinação de
instituições que ultrapassa em muito o papel
dos mercados, da troca e do consumo. O
desafio da sustentabilidade exige que se
minimize o papel que as mercadorias
exercem sobre o bem-estar (popularidade,
imagem e sucesso financeiro), e que se
maximize o papel de formas diretas de
sociabilidade: autoestima, família, identidade,
amizade, participação, propósito na vida e
pertencimento a uma comunidade. Em suma,
uma maior coesão social.
Quanto maior a afluência material, maior a
necessidade de baixa entropia para se
manter um mesmo nível de satisfação
psicológica. Não há um ponto de suficiência,
pois quanto mais se tem, mais se precisa. É
necessário, então, que se corrijam os
perversos incentivos para a competição de
“status”
–
totalmente
improdutiva
e
insustentável – e que se estabeleçam
estruturas habilitadas a fornecer capacitações
às pessoas sem a necessidade do consumo
material.
Tecnologias,
infraestruturas,
instituições e normas sociais devem ser
redirecionadas para a promoção do
altruísmo11 e para o fim da necessidade de
constante consumo de novidades. Isso
poderá favorecer o investimento de longo
prazo para a sustentabilidade (Jackson
2009).
O paradigma da condição estável12 parte de
restrições materiais (complexidade ecológica
11
Romeiro (2000) propõe um modelo alternativo no qual o
comportamento altruístico dos agentes econômicos é
determinante principal das mudanças institucionais requeridas
para o alcance do desenvolvimento sustentável.
12
Esta condição estável, cuja origem está nos trabalhos de
Herman Daly (Daly 1991b; Czech & Daly 2004), é parte
integrante do aqui se chama de macroeconomia ecológica e se
aplica principalmente aos países desenvolvidos. Para países
emergentes e em vias de desenvolvimento admite-se que o
debate deve ser aprofundado no sentido de que ainda são
necessários incrementos físicos ao sistema econômico como
forma de satisfazer as necessidades básicas de suas
populações. Assim, torna-se claro que as diferenças nos níveis
e termodinâmica) para então ajustar as
possíveis trajetórias das variáveis não físicas.
Considera
um
sistema
biofísico
materialmente
fechado
no
qual
a
termodinâmica
impõe
restrições
ecossistêmicas à sustentabilidade.
As propostas práticas para uma economia de
condição estável podem ser resumidas a três
grandes objetivos, que são destrinchados em
doze estratégias e um conjunto de ações
(Quadro 1). Os eixos estratégicos são
referentes
à:
i)
operacionalização/implementação dos limites
ecossistêmicos; ii) política pública voltada
para o mercado de trabalho para a redução
das desigualdades e para a reformulação dos
valores; e iii) política macroeconômica strictu
sensu.
O conjunto de medidas voltadas a limitar o
transumo pode ser chamado de “cap-andtrade” generalizado, pois imporia limites
quantitativos à utilização total e “per capita”
de recursos naturais. A regulação da
intensidade de uso dos recursos só pode
resolver o problema se a diminuição da
intensidade for mais rápida do que o
crescimento do uso dos recursos13, o que não
tem se demonstrado possível até o momento.
Por isso, os instrumentos adequados são a
taxação ou a imposição de limites (aliados a
uma reforma tributária ecológica que onere o
transumo e desonere renda e trabalho). Cada
um tem uma série de prós e contras, mas o
que realmente interessa é que algum deles
seja implementado.
A execução de programas de “cap-and-trade”
já é realidade em diversos países, tanto para
o caso de emissões de CO2 quanto para a
regulação de outros recursos de uso comum,
e vem ganhando cada vez mais simpatia por
parte dos establishments políticos. Já o
debate da transferência tecnológica, que
deve acompanhar uma estratégia global de
de evolução socioeconômica entre os diversos países devem
ser consideradas.
13
Essa é uma condição necessária para se evitar o chamado
efeito rebote ou o paradoxo de Jevons (Polimeni et al. 2008).
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Quadro 1. Objetivos, estratégias e ações para uma macroeconomia ecológica (condição estável)
(I) Operacionalizar
Limites Ecológicos
Objetivo
Estratégia
(1) Limitar o
uso de recursos
e a poluição.
(2) Reforma
fiscal para a
sustentabilidade.
(3) Estabilizar a
população.
Ação
"Cap-and-trade" generalizado para recursos exauríveis, imposto “pigouviano”
generalizado para recursos renováveis; "cap-and-tax" como alternativa para ambos.
Reforma tributária ecológica: taxar os "maus" ecológicos (poluição, degradação) ao
invés dos "bens" econômicos (renda, trabalho); transferência de capacitações entre
países por meio de fundo alimentado por imposto de Tobin.
8 bilhões de habitantes, segundo a projeção mais otimista da ONU para 2041; programas
bem estabelecidos de planejamento familiar em países subdesenvolvidos.
(III) Construir uma macroeconomia
sustentável
(macroeconomia ecológica)
(II) Capacitações para o florescimento
(4) Limitar a
Revisar a estrutura de imposto de renda; estabelecer patamares mínimos e máximos de
desigualdade de
renda; legislação anti-discriminação.
renda (e outras).
(5) Dividir o
emprego entre
todos os
cidadãos.
Diminuir jornada de trabalho; maior possibilidade de escolha do trabalhador sobre o
horário de trabalho; políticas para diminuir a discriminação do trabalho “part-time” em
relação à promoção na carreira, nível de salários, treinamento, segurança no emprego,
etc.; substituir impostos específicos sobre o trabalho para "ad valorem" para favorecer a
contratação.
(6) Medidas
adequadas de
prosperidade.
Felicidade Interna Bruta, "Dutch Capabilities Index", Índice de Progresso Genuíno,
Relatório Stiglitz, etc.
(7) Reforçar o
capital humano
e social.
Criar e proteger espaços públicos (transmissões públicas de rádio e TV, financiamento
de museus, livrarias públicas, parques e áreas verdes); reforçar iniciativas comunitárias
para a sustentabilidade; prover treinamentos para empregos ligados à indústria verde.
Educação básica universal; saúde melhor para todos; redução de subsídios perversos
agrícolas; orçamento para erradicação da pobreza; desregular a difusão do conhecimento
(patentes).
(9) Reverter a
Forte regulação da mídia comercial (lei cidade limpa); maior apoio à transmissão
cultura do
pública de rádio e TV; padrões mais efetivos de defesa do consumidor em termos de
consumismo.
durabilidade dos produtos e comércio justo.
Não contabilizar consumo de capital natural como renda; separar custos (perda de bemestar derivada da desigualdade social, degradação ambiental, gastos defensivos,
(10) Reformar
consumo conspícuo e outros) de benefícios (valor dos serviços proporcionados por todos
contas
os tipos de capital acumulado, inclusive o capital natural); conta capital inventário de
nacionais.
estoques e fundos; contabilização sistemática de suas variações e da distribuição de
propriedade.
Geração de empregos para criação e manutenção de bens públicos; investimentos em
(11)
energias renováveis; infraestrutura de transporte público e espaços públicos; remodelar
Redirecionar o
construções com medidas de economia de energia e carbono; investimentos em proteção
investimento da
e manutenção de ecossistemas; oferta de estímulo fiscal e de apoio a negócios
economia.
sustentáveis, tecnologias limpas e eficiência no uso de recursos (eco-eficiência).
Reformar a regulação dos mercados financeiros nacionais e internacionais; aumentar o
(12) Aumentar a
controle público sobre a oferta de moeda; incentivar a poupança nacional por meio de
prudência fiscal
"títulos verdes" e outros instrumentos; produzir maior proteção em relação ao débito dos
e financeira.
consumidores.
(8) Erradicar a
pobreza.
Fontes: Daly (1996), Daly & Farley (2004),Brown (2008), Jackson (2009) e Victor (2009).
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precificação do carbono, precisará avançar
bastante para se tornar viável.
Em particular, é imprescindível a criação de
capacitação
tecnológica
nos
países
subdesenvolvidos, ao invés da simples venda
da tecnologia criada nos países avançados
(ao
preço
das
patentes),
pois
o
desenvolvimento tecnológico do Sul precisa
se tornar independente da benevolência do
Norte.
O primeiro item da política social é
necessariamente
a
estabilização
populacional, cuja absoluta prioridade é
consenso entre os analistas. A proposta mais
concreta, de Brown (2008), é a de que as
políticas de controle populacional consigam
estabilizar a população mundial em 8 bilhões
de habitantes em 2041, de acordo com o
cenário mais otimista da Organização das
Nações Unidas (ONU). Mais controversa, no
entanto, é a proposta de enfrentamento da
desigualdade por meio do estabelecimento de
patamares mínimos e máximos de renda.
Essa é uma questão de crucial importância, já
que são elevados os potenciais ganhos de
bem-estar decorrentes da redução da
desigualdade, mas que numa sociedade
democrática requer um processo político de
tomada
de
decisão
que
beira
a
impossibilidade. Assim, é bem mais prudente
privilegiar a revisão da estrutura de imposto
de renda, no sentido de transferir a taxação
para o consumo de bens intensivos em
poluição e depredação natural. Além disso, é
necessário um papel regulatório mais
contundente do Estado sobre a mídia
comercial por meio de educação inclusiva
com vistas a reverter a cultura do
consumismo e de hábitos materialistas. Ao
mesmo tempo, o governo deve estimular
iniciativas comunitárias voltadas ao uso de
espaços públicos, à realização de atividades
de lazer e educação não materialistas e ao
planejamento familiar.
Quanto ao mercado de trabalho, vislumbra-se
uma economia em que o emprego seja
dividido mais igualitariamente entre os
cidadãos de modo a garantir ao mesmo
tempo renda e lazer para a maior parte dos
trabalhadores. Trata-se de redução da
jornada de trabalho, na mesma direção já
tomada por muitos países europeus, e de
valorização do trabalho “part-time”, com
políticas específicas para essa categoria. As
medidas de prosperidade mais amplas devem
ser estudadas e adotadas, e o usufruto do
tempo
para
a
manutenção
de
relacionamentos comunitários saudáveis
deve ser estimulado por meio do incentivo ao
associativismo e às atividades comunitárias.
Com relação à pobreza, Victor (2009)
apresenta um dado interessante: resolver o
problema no Canadá implicaria em redistribuir
1,8% de todas as rendas auferidas no país.
Ou seja, um esforço economicamente
factível, mas politicamente complicadíssimo.
Mesmo assim, o problema ultrapassa em
muito a restrição de renda e um conjunto bem
mais amplo de medidas é necessário. Entre
elas estão: promoção de coesão social e
solidariedade por meio de educação cívica,
manutenção de uma rede de seguridade bem
constituída, melhoria do mercado de trabalho
por meio de treinamento e informação,
medidas direcionadas ao desenvolvimento de
capital social, como incentivos para a criação
de
organização
de
desenvolvimento
comunitário,
medidas
antidiscriminação,
investimentos em prevenção contra drogas,
HIV e gravidez prematura, entre outras.
A política macroeconômica em todo o mundo
foi alvo de um intenso processo de
alinhamento nas últimas décadas. Os bancos
centrais e ministérios de finanças passaram a
adotar crescentemente uma agenda comum
de reformas e diretrizes. Isso faz com que as
propostas do eixo estratégico ligado a essa
temática tendam a ser de bem mais fácil
aceitação. A primeira estratégia é a já
conhecida reformulação da contabilidade
macroeconômica, cuja implementação poderá
ganhar fôlego com os resultados da
conhecida comissão Stiglitz (Stiglitz-SenFitossi 2009)14.
14
“Commission on the measurement of economic performance
and social progress”, constituída pelo governo francês e
encabeçada por Joseph Stiglitz e Amartya Sen, com o objetivo
de rever os indicadores de progresso e apontar caminhos para
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------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Outro fator importante é o redirecionamento
dos investimentos: “the pattern of investment
should reflect and support the changing
direction in how people lead their lives: more
leisure and recreation, more time with family,
friends and community, more public goods
and fewer private, status goods” (Victor 2009:
214).
O desenho de um sistema tributário que
desincentive a produção de bens nocivos ao
meio ambiente e imponha limites ao fluxo de
matéria e energia por meio de imposto ou de
limites quantitativos fará com que diminua o
retorno de investimentos em atividades de
elevado transumo e cresça a remuneração do
capital investido em atividades alinhadas com
a economia verde15. Mas se as medidas já
mencionadas não forem suficientes para
desencorajar o investimento em áreas
nocivas,
devem-se
aplicar
impostos
específicos sobre tais investimentos. Além
disso, é necessária uma reforma dos
mercados financeiros com vistas à retomada
do controle do Estado sobre a oferta de
moeda, desestímulo do consumo via crédito e
geração de poupança para investimentos na
indústria verde (por meio de “títulos verdes”).
O tema da governança é central para a
possibilidade de estruturação de uma
macroeconomia
ecológica.
Como
a
prosperidade comum será atingida numa
sociedade pluralista? Como o autointeresse
será balanceado com o interesse comum?
uma medição do bem-estar mais adequada do que a (não)
feita por meio do PIB. O primeiro relatório deixou claro que são
totalmente anacrônicas as atuais ferramentas de mensuração
do desempenho econômico e social, mas desfez ao mesmo
tempo qualquer ilusão sobre a possibilidade de que o processo
de superação venha a ser rápido e previsível (Veiga 2010).
Mesmo assim, é importante que esteja sendo questionada
institucionalmente, por parte de um dos mais importantes
“players” no cenário político mundial, a ideia de que o
progresso se confunde unicamente com o crescimento do PIB.
O questionamento da relação biunívoca entre PIB e bem-estar
geral é um das mais importantes premissas de uma
macroeconomia ecológica.
15
Economia Verde ou Green Economy é uma iniciativa que
intenta discutir a adoção de políticas aptas a pavimentar a
transição do sistema econômico para uma trajetória de
desenvolvimento sustentável no médio e longo prazo. O
movimento parte do entendimento de que há, atualmente, o
amálgama de várias crises (mudança climática, perda de
biodiversidade, escasseamento da água), cujo enfrentamento
requer novas estratégias para garantir a permanência das
condições de vida na Terra. Para maiores detalhes ver UNEP
(2009).
Quais são os mecanismos para se atingir
este balanço? Na crise financeira mais
recente (2008), o papel do Estado foi revisto.
A esse mesmo papel deve ser incorporada a
gestão de uma socioeconomia voltada para a
sustentabilidade. Não existe hipótese do
mercado eficiente nesse campo. A discussão
da escolha pública, na qual o eterno debate
entre liberdade individual e bem comum se
desenrola, é retomada sob um enfoque bem
mais
amplo,
envolvendo
escolhas
intertemporais de prazos nunca antes
imaginados (centenas de anos). As
sociedades precisam tomar decisões quanto
a investimentos muitas vezes contrários à
preferência
pelo
consumo
presente
manifestada por agentes econômicos míopes.
Para a maior parte dos economistas, o
aumento da produtividade do trabalho é a
receita certa para o desenvolvimento.
Quando cresce a produtividade da mão de
obra, deve haver crescimento do produto
para que a mesma quantidade de
trabalhadores tenha emprego. Mas os
aumentos da produtividade do trabalho
também podem servir para diminuir a jornada
média de trabalho. Em um contexto de
“mundo cheio” (Daly 2005; Andrade et al.
2012), é necessário que se aumente a
produtividade dos recursos naturais por meio
de eficiência energética e de materiais. Em
tudo isso, a tecnologia é a peça fundamental.
É importante, contudo, que além dos
incentivos para que o investimento se dirija à
pesquisa em atividades sustentáveis, tenhase clareza das tecnologias a ser evitadas em
função de suas externalidades negativas.
Isso implica em análise direta e constante dos
métodos de produção e dos produtos que são
comercializados no mercado a fim de frear a
expansão de tecnologias potencialmente
danosas.
Um “green new deal” (Costanza 2008), a
chamada solução keynesiana, pode favorecer
setores que, ao mesmo tempo, aumentem a
produtividade do capital natural (eficiência
energética, reciclagem) e sejam altamente
trabalho-intensivos. O financiamento de um
pacote como esses pode vir do déficit público,
mas também de um sistema de “cap-anddividend” ou da criação de “títulos verdes”,
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------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------específicos para financiamento da indústria
verde.
O estímulo verde é a solução adequada para
enfrentar a crise e o desafio ambiental no
curto prazo. Mas isso não é necessariamente
válido para o longo prazo, pois a estratégia
keynesiana se baseia no aumento do
consumo. O que se precisa é de uma
macroeconomia
alinhada
com
o
desenvolvimento
materialmente
estável.
Enfrentar a loucura do consumismo é uma
estratégia necessária para essa tarefa. Ou
seja, a substituição da esfera mercantil pela
sociabilidade, dentro da qual sejam
valorizados o trabalho voluntário, os esportes,
a educação (formal, informal, ambiental), etc.
A maneira como é feita a publicidade em
nossa sociedade está na raiz do consumismo
desenfreado e da mercantilização da vida. O
governo é o principal agente dessa mudança
estrutural.
A análise das propostas acima deixa claro
que não é impossível a implementação de
políticas
públicas
voltadas
para
o
desenvolvimento
socioeconômico
com
transumo estável. Muitas das ações já estão
sendo implementadas e discutidas em
diversas partes do mundo e/ou entrarão em
fase de teste nos próximos anos. Outra
significativa parte poderá encontrar ambiente
político fértil no movimento de esverdeamento
que se está encaminhando em países-chave
da geopolítica global. O que se nota,
portanto, é a possibilidade de construção, no
curto prazo, de uma economia verde com
crescimento
liderado
pela
eficiência
energética, na linha da solução keynesiana.
Mas essa solução só será efetiva se abrir
caminho para a implementação, no médio e
longo prazos, de políticas mais agressivas
voltadas para a real estabilização da
transformação de matéria e energia.
Felizmente, há razões para se acreditar na
exequibilidade deste cenário, embora se
admita a existência de monumentais desafios
políticos.
3.Macroeconomia
ecológica
versus
macroeconomia convencional: evidências
preliminares com base em Victor (2009)
Não há consenso sobre a viabilidade de um
sistema capitalista democrático baseado em
políticas restritivas ao crescimento econômico
(Lawn 2005; Lawn 2011). Como explicou
Keynes, a economia capitalista depende
fundamentalmente de investimentos, que
geram
salários
e
consequentemente
consumo. A realização dos investimentos
depende do “animal spirit” dos empresários,
cujo componente principal é a expectativa em
relação à taxa de lucros futura. Caso
vislumbrem alta rentabilidade, os empresários
investirão e movimentarão a economia. Os
lucros, por sua vez, dependem do consumo.
Mas tanto lucro quanto consumo estão
presos a um padrão altamente nocivo ao
meio ambiente, embora toda esta dinâmica
seja policitamente necessária (Ayres 1995).
Em meio a discussões dessa natureza, o
questionamento mais comum que surge está
relacionado à possibilidade de se desvincular
totalmente a economia capitalista do avanço
sobre os estoques de recursos naturais e
sobre os fundos de serviços ecossistêmicos.
Independente da resposta, um dos grandes
desafios da humanidade no século XXI é a
criação de um modo de organização
socioeconômica que não seja exclusivamente
dependente de sua expansão física para
evitar o seu próprio colapso.
Uma das principais contribuições recentes
para o enfrentamento destes desafios está no
trabalho de Victor (2009), que simulou
computacionalmente, com base em modelos
macroeconômicos
convencionais,
as
possíveis repercussões de uma estratégia de
desenvolvimento com foco em variáveis
humanas (redução da pobreza, distribuição
de renda) em vez de econômicas (PIB). A
realidade que ele simula pode ser
basicamente descrita pela seguinte proposta:
mudanças na estrutura do investimento e do
mercado de trabalho. O investimento líquido
privado é reduzido, há um redirecionamento
do foco do investimento de bens privados
para bens públicos por meio de taxação e
gasto público, o que exige aumento da
poupança e redução do consumo. Além
disso, a quantidade total e média de horas
trabalhadas são reduzidas, resultando em
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------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------uma divisão do trabalho disponível mais
equânime entre a população.
No modelo de Victor (2009), o consumo ainda
é parte fundamental da demanda agregada
apesar de não crescer às taxas atuais. Mas o
investimento privado dá lugar ao investimento
público. Se a alocação de mercado não
funciona para bens públicos, pois não
existem preços de equilíbrio determinados
por interação entre oferta e demanda, o
Estado deve provê-los (às vezes por meio de
parcerias com o setor privado). Enquanto o
investimento privado em bens privados gera
produção para o consumo privado por meio
de ganhos de produtividade de mão de obra e
inovação de produtos, o investimento público
produz bens que serão utilizados pela
sociedade como um todo, que, neste caso,
são
representados
pelos
serviços
ecossistêmicos e capital natural por meio da
maior eficiência do uso dos recursos naturais
e da inovação para a sustentabilidade. O
investimento em bens públicos, no entanto,
não tem um multiplicador keynesiano tão
elevado quanto o investimento em bens
privados, pois estes são projetos com retorno
difuso no longo prazo.
Victor (2009) procura modelar uma economia
de PIB estacionário e não transumo
estacionário, como prevê a proposta mais
convencionalmente aceita. Sem existir uma
métrica consensual do fluxo de matéria e
energia, a opção pragmática seria, para ele, a
de estudar as consequências da estabilização
do PIB, cuja métrica é bem estabelecida, pois
a demonstração de que uma economia sem
crescimento do produto que não resulta em
catástrofe seria a mesma para o caso de
ausência de crescimento de transumo.
determina os resultados. As partes do modelo
interagem
dinamicamente
produzindo
igualdade entre oferta e demanda no final de
cada período (equilíbrio geral). No total, o
modelo é composto por treze equações cujos
parâmetros
são
estimados
econometricamente com dados relativos ao
Canadá para o período de 1981 a 2005.
O exercício de simulação permite que se
testem os resultados de um conjunto de
cenários relativos às principais variáveis do
modelo. É possível supor, por exemplo, que a
economia continuará operando da mesma
maneira que no passado (cenários business
as usual – BAU) e que, por conseguinte,
serão feitos os investimentos necessários
para se obter crescimento econômico rápido.
O modelo então simulará a realidade, de
acordo com a descrição que lhe foi fornecida
(as 13 equações), e produzirá resultados em
termos de valores de um conjunto de
variáveis de output (PIB “per capita”, taxa de
desemprego, relação dívida/PIB, taxa de
pobreza,
emissões
de
gases-estufa,
consumo, investimento, gastos do governo e
balança comercial). Com isso, será possível
avaliar os resultados da estratégia BAU em
termos das variáveis econômicas, sociais e
ambientais mais relevantes. É possível,
alternativamente, simular um cenário em que
o objetivo principal da política econômica seja
a redução da pobreza e da concentração de
renda. Nesse caso, são feitas suposições
diferentes em relação ao nível e à estrutura
do investimento, à estrutura ocupacional e à
regulação ambiental, comparando-se ao final
os resultados com o cenário-base.
Numa simulação para trinta anos, o cenário
BAU gerou um PIB “per capita” 113% maior
do que o de 2005 e uma relação dívida/PIB
O
modelo
adotado,
denominado
74% menor, com demanda agregada
LOWGROWTH, apresenta as convencionais
impulsionada
pelo
consumo
(58,6%),
funções de demanda agregada (Y=C+I+G+Xinvestimento privado (19,2%), gasto do
M) e de oferta agregada (Y=f(K,L,t)), e
governo (20,3%) e balança comercial (1,9%).
setores
de
dinâmica
populacional
As emissões de gases-estufa ficariam 77%
(exogenamente determinado), fiscal, de
superiores às de 2005, o índice de pobreza
florestas, de trabalho e utilização da
36% superior e a taxa de desemprego 22%
capacidade produtiva, de emissões de gases
maior. A partir daí, conclui-se que a simples
do efeito-estufa e de dinâmica da pobreza.
continuação das políticas focadas no
Em cada um desses compartimentos há
crescimento do produto não produz, por si só,
equações em que um conjunto de variáveis
bem-estar social e ambiental.
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------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------O cenário oposto, de redução súbita do
crescimento populacional, do investimento e
do crescimento do produto, é aterrorizante. O
PIB “per capita” cresce 11% em trinta anos,
mas a relação dívida/PIB aumenta 231%, o
desemprego 258% e o índice de pobreza
130%. A redução de 14% das emissões de
gases-estufa é o único resultado positivo
dessa péssima opção de gestão a partir de
uma macroeconomia ecológica. A redução de
seis pontos percentuais do investimento
privado, necessária para estabilizar o PIB, é
responsável pela maior taxa de desemprego
e pelo aumento da pobreza. Num efeito
“crowding-out” ao contrário, o governo precisa
aumentar os seus gastos na mesma
proporção da redução do investimento
privado para manter a demanda agregada
estável e assim não haver decréscimo do
produto, o que leva à explosão da dívida
pública.
Claramente, para que a “growthmania” seja
superada é preciso que haja uma opção de
transição bem mais suave do que essa.
Felizmente, existe uma saída menos
catastrófica. As outras seis simulações feitas
por Victor (2009) apontam para cenários em
que desemprego, pobreza e relação
dívida/PIB diminuem pelo menos 50% em
trinta anos, enquanto o PIB “per capita”
cresce ao redor de 50% e as emissões de
gases-estufa crescem 30% ou diminuem
31%, a depender da adoção de um
mecanismo de precificação de carbono.
Nesses casos, os gastos do governo
aumentam levemente para melhorar as
condições de educação e saúde, o sistema
tributário
é
calibrado
para
gerar
transferências progressivas de renda e
eliminar a pobreza, além do que a jornada de
trabalho é diminuída para contrabalancear a
menor oferta de emprego.
contraproducente antes mesmo de passados
trinta anos. Essa impossibilidade não aparece
no modelo porque a função de produção não
inclui o capital natural, o que faz com que
maior degradação ambiental não gere efeitos
negativos sobre o PIB. Ou seja, presume-se
que os compartimentos econômicos geram
efeitos sobre o compartimento ambiental
(gases-estufa e florestas), mas que estes não
reduzem as possibilidades de expansão da
economia.
De qualquer maneira, se apenas as
conclusões do exercício de Victor (2009)
tiverem repercussão sobre os analistas mais
céticos, o exercício terá sido positivo, pois
“the scenarios suggest that in terms of
employment, poverty, leisure and greenhouse
gases, there is a coherent macroeconomic
configuration of the Canadian economy that is
not predicted on the never-ending pursuit of
economic growth” (Victor 2009: 184).
Exercícios de modelagem, combinados com o
aprimoramento de perspectivas teóricas,
suportam a afirmação de que em tese é
possível – sem incorrer em colapso – adotar
um conjunto de políticas alinhadas com uma
macroeconomia ecológica. Isso não significa,
porém, que a compatibilização com a
macroeconomia convencional será um
processo espontâneo e suave. A prevalência
de políticas econômicas dentro do paradigma
convencional
(prioridade
máxima
ao
crescimento econômico) se deve em grande
aos interesses constituídos cristalizados.
4.Considerações finais
Um esquema analítico voltado para a
problemática da degradação do capital
natural não pode ser pensado dentro da visão
pré-analítica da economia convencional. Isso
porque esta última parte do pressuposto de
que sua perda não representa um obstáculo
para a expansão do sistema econômico, pois
o progresso tecnológico e a substituibilidade
entre capital natural e produzido garantem
que as atividades econômicas podem
prescindir de seu suporte básico.
O exercício de simulação a partir de modelos
convencionais objetiva evitar o ceticismo da
maior parte dos economistas. Mas essa
postura não vem sem problemas. Victor
(2009) admite que o cenário BAU é, muito
provavelmente, impossível de ser atingido,
mesmo que se queira, pois o crescimento tão
Dada a inadequação dessa perspectiva, a
forte do PIB produziria “feedbacks” negativos
busca de soluções para o problema da
crescentes ao ponto de se tornar
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------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------depleção do capital natural deve ser
direcionada por enfoques que considerem
explicitamente a dependência humana sobre
o capital natural e seus benefícios, rejeitando
a crença de que o sistema econômico não
possui
limites
à
sua
expansão.
Particularmente, é imprescindível que as
análises econômicas incorporem a ideia de
que há limites ao crescimento econômico
impostos pela resiliência dos ecossistemas
(fronteiras
planetárias).
A
partir
do
reconhecimento destas limitações biofísicas,
é preciso se pensar em políticas econômicas
adaptadas às condições de finitude.
Este artigo abordou a ideia de escala
sustentável, bem como tentativas recentes de
mensuração das fronteiras até as quais o
sistema econômico pode avançar. Foi visto
que em alguns sistemas naturais a escala
humana já ultrapassou os níveis seguros de
operação, o que pode desencadear
repentinas mudanças globais que podem,
inclusive,
afetar
irreversivelmente
a
capacidade de o ecossistema global suportar
as atividades econômicas.
A partir da discussão de limites à expansão
econômica,
foram
sistematizadas
as
principais contribuições em termos de política
econômica
no
contexto
de
uma
macroeconomia ecológica. Basicamente, são
três
pontos
relevantes
que
devem
considerados. Em primeiro lugar, deve-se
pensar em uma macroeconomia em que a
contabilização da base de ativos da
sociedade incorpore os estoques de recursos
naturais e os serviços ecossistêmicos, corrija
a contagem de gastos defensivos e incorpore
outras modificações já largamente discutidas
pela
economia
ecológica.
Esta
macroeconomia também requer que o
investimento agregado seja direcionado para
a oferta de bens públicos, ligados a
atividades de lazer e para o desenvolvimento
de negócios sustentáveis. Além disso, será
imprescindível um mercado financeiro voltado
para a disponibilização de recursos que
viabilizem os investimentos mencionados e
que ao mesmo tempo desestimule o crédito
para consumo.
Em segundo lugar, deve-se admitir o
protagonismo do Estado no direcionamento
do desenvolvimento socioeconômico como
importante
condição
para
uma
macroeconomia condicionada aos limites
termodinâmicos. A crescente desigualdade
deverá ser enfrentada (começando-se pela
de renda, mas não restrita a ela),
possivelmente por meio de algum tipo de
restrição tanto a rendas excessivamente
elevadas quanto ao polo contrário. Ademais,
a educação terá de retomar o seu papel
central na formação dos valores da
sociedade, principalmente no sentido de
desestimular o consumo material e de
incentivar a aferição de bem-estar a partir de
valores
intrínsecos:
amizade,
família,
participação da comunidade, etc. O governo
também terá papel central na regulamentação
da atividade da mídia comercial, no sentido
de não permitir estratégias empresariais em
que se criem, por meio da publicidade,
demandas descoladas das necessidades
reais do ser humano.
Por último, as restrições ecossistêmicas
exigirão políticas explicitamente voltadas para
a limitação das possibilidades de usufruto e
exploração de recursos naturais. Há diversas
ações possíveis para isso, mas nenhuma terá
eficácia se não vierem acompanhadas do
estabelecimento de tetos quantitativos para a
extração de recursos exauríveis e para a
utilização dos recursos renováveis. O
inventário representado pelos recursos não
renováveis apenas poderá ser utilizado (com
parcimônia) desde que suas rendas sejam
direcionadas
ao
desenvolvimento
de
alternativas renováveis.
Este trabalho teve ainda a intenção de
mostrar que as políticas econômicas do tipo
keynesiano são ainda as mais pertinentes,
mas devem ser ampliadas a fim de poder
lidar com novas problemáticas colocadas
(limitações termodinâmicas à expansão
perpétua do sistema econômico). Isso indica
que um debate lúcido sobre a adoção de
políticas anticíclicas não deve prescindir de
uma análise cuidadosa sobre desafios
impostos pela realidade do século XXI.
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Andrade y Mollina 2014 . Revista Iberoamericana de Economía Ecológica Vol. 22:69-84
------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------O efetivo reconhecimento da existência de
limites biofísicos ao crescimento econômico
produzirá importantes efeitos na concepção e
prática de política econômica. Afinal, se se
parte do princípio de que a biosfera terrestre
é o único lar da espécie humana e que o
significado etimológico de “Economia” é
“organização/administração da casa”, nada
mais natural que economistas comecem a
lidar seriamente com as considerações aqui
colocadas. Experiências como o Projeto
Biosfera II demonstraram a impossibilidade
de se criar artificialmente um novo ambiente,
sugerindo a urgência de se criarem
mecanismos de manutenção das condições
de vida como requisito para o florescimento
das capacidades humanas e como garantia
de vida das gerações vindouras.
Não apenas economistas devem incorporar
as ideias subjacentes a uma macroeconomia
ecológica. Em conformidade com o que é
discutido por Czech (2002), reconhece-se a
necessidade de que os ecólogos e cientistas
naturais deem maior ênfase às questões de
macroeconomia a fim de que possam
contribuir
para
alternativas
de
compatibilização entre a evolução do sistema
econômico e a manutenção da integridade
ecológica.
Além do contínuo aprimoramento das
propostas de política econômica dentro de
uma macroeconomia do desenvolvimento
materialmente estável, é premente ainda o
avanço no que diz respeito às diferenciações
necessárias em termos de estratégias
específicas para o conjunto de países em
desenvolvimento e menos desenvolvidos.
Suas
especificidades
históricas
e
socioeconômicas
certamente
qualificam
distintamente o papel do crescimento
econômico.
Sem o intuito de resvalar para o discurso de
sustentabilidade ambiental como panaceia,
bem como para posições maniqueístas do
tipo “crescer ou não crescer”, as ideias aqui
apresentadas reforçam a convicção de que o
conjunto das visões críticas à teoria
econômica convencional deve ter como
elemento primário e comum a busca contínua
de estratégias para identificação da melhor
escala possível do sistema econômico que,
simultaneamente, garanta a harmonia
ecológica e a maximização do bem-estar
humano.
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