um enfoque em adolescentes de Vitória de Santo Antão – PE

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um enfoque em adolescentes de Vitória de Santo Antão – PE
Importância da saúde bucal: um enfoque em adolescentes de Vitória de
Santo Antão – PE
Importance of oral health: a study focused on teenagers from Vitória de Santo Antão - PE
Ana Flávia Granville-Garcia1, Alessandro Leite Cavalcanti2, José Eudes Lorena
Sobrinho3, Jennyfer Crystian Araujo3, Valdenice Aparecida de Menezes4,
Amanda Maria Ferreira Barbosa5
Resumo
O objetivo deste trabalho foi analisar a percepção e a importância da saúde bucal
para adolescentes de Vitória de Santo Antão-PE. Foi um estudo transversal de caráter
exploratório, no qual foram entrevistados 277 alunos com idades entre 10 e 16 anos
de escolas pública e particular. Resultados: Os teste estatístico utilizados foram Quiquadrado ou Exato de Fisher, sendo o nível de significância de 5%. Quando indagados
sobre a importância das partes do corpo na sua higiene, os dentes (p=0,024), cabelos
(p<0,01) e axilas (p=0,097) foram mais citados. Em relação à importância dos dentes,
foram destacados à beleza (58%), à comunicação com as pessoas (52,5%) e à mastigação (68,8%), sendo que esta última apresentou diferença significativa entre os tipos
de escola. A doença bucal mais conhecida foi à cárie (57,3%; p<0,001). A maioria
dos alunos considerou sua condição de saúde oral entre boa e regular (p<0,001) e
gostaria de receber orientações sobre como ter uma boca saudável (98,2%). Conclusão:
Verificou-se prioridade para a estética, o desconhecimento sobre as doenças bucais, a
satisfação com a condição bucal, e desejo de informações sobre saúde bucal. A variável
socioeconômica teve influência em questões relacionadas à higiene, às doenças bucais
e na percepção da condição dentária.
Palavras-chave
Comportamento do adolescente, saúde bucal, percepção
Abstract
The objective of this study was to assess the perception and the importance of oral
health among teenagers from Vitória de Santo Antão - PE (Brazil). A cross-sectional
study was performed, in which 277 students with ages between 10 and 16 years,
from public and private schools, were interviewed. The statistical tests used were
1
Doutora em Odontopediatria Professora do Departamento de Odontologia da Universidade Estadual da
Paraíba - UEPBRua. Cap. João Alves Lira 1325/410 Bela Vista-Campina Grande/PB CEP: 58101281
E-mail: [email protected]
2
Doutor em Estomatologia. Professor do Departamento de Odontologia da Universidade Estadual da ParaíbaUEPB.
Alunos de Graduação em Odontologia - Faculdade de Odontologia de Caruaru - Associação Caruaruense
de Ensino Superior-ASCES-PE.
3
Doutora em Odontopediatria. Professora Adjunta do Departamento de Preventiva e Social - FOP-UPE;
Professora Assistente da Faculdade de Odontologia de Caruaru- ASCES-PE.
4
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Aluna do Mestrado em Odontopediatria da Faculdade de Odontologia de Pernambuco- UPE
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A n a F l á v i a G r a n v i l l e - G a rc i a , A l e ss a n d r o L e i t e C a v a l c a n t i , J o s é E u d e s L o r e n a S o b r i n h o ,
J e n n y f e r C r y s t i a n A r a u j o , V a l d e n i c e A p a r e c i d a d e M e n e z e s , A m a n d a M a r i a F e rr e i r a B a r b o s a
the Chi-Square or Exact Fisher, with 5% significance level. When asked about the
importance of parts of their body in hygiene, the teeth (p=0.024), hair (p<0.01) and
armpits (p-0.097) were the most cited. In relation to the importance of the teeth, they
mentioned the beauty (58%), communication with other people (52.5%) and chewing
(68.8%). This last one presented significant difference between the types of school.
The most known oral problem was cavities (57.3%; p<0.01). Most of the students
considered their own health condition as good or regular (p<0.001) and would like
to receive information on how to have a healthy mouth (98.2%). It was observed the
importance of esthetics, the lack of general knowledge of oral problems, satisfaction
with mouth condition and a wish for information on oral health. The socioeconomic
variable had influence in questions related to hygiene, to oral problems and in the
perception of the dental condition.
Key words
Adolescent behaviour, oral health, perception
1. Introdução
Estudar a importância da saúde bucal na adolescência é um desafio, pois esta
fase é caracterizada por modificações físicas, psicológicas, cognitivas e sociais, que
podem deflagrar conflitos pré-existentes e que alteram a estrutura familiar e o
relacionamento com os amigos (Graça, 2000). São jovens recém saídos da infância numa busca constante de identidade, com atitudes singulares e necessidades
igualmente distintas. Além disso, precisam enfrentar a realidade da sociedade:
violência, desigualdade, fome, dissolução familiar, desemprego e a busca de um
padrão estético perfeito (Branco et al., 2006; Elias et al., 2001).
O adolescente apresenta comportamentos extremos, que variam de períodos
exacerbados por suas atitudes positivas, até os francamente negligentes com seus
cuidados com a saúde. Geralmente, a adolescência é tida como um período de
risco aumentado da cárie dentária, em decorrência do precário controle de placa
e redução dos cuidados com a higiene bucal (Thomsen et al., 2002).
Dados do SB Brasil (Brasil, 2003) revelam que 2,5 milhões de adolescentes
(13% da população) nunca foram ao dentista, entretanto é na adolescência que a
cárie dentária, os traumatismos dentários e a doença periodontal (em especial a
gengivite) apresentam valores significantes, sendo os fatores extrabiológicos (nível
socioeconômico, o comportamento, a idade e cuidados com a cavidade bucal)
apontados como responsáveis por essa dimensão (Graça, 2000; Fernandes, 2002;
Santos et al., 2007). Estudos nacionais e internacionais alertam sobre a necessidade
de maior atenção a saúde oral nesse período (Tomita et al., 2001; Broadbent et
al., 2006; Källestål et al., 2006; Freddo et al., 2008).
Entretanto, para realizar programas de prevenção, é preciso educação, conscientização e possibilidade de ação, pois promover a saúde implica mudar padrões de
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comportamento, dieta e higiene, intervir em hábitos que fazem parte da cultura.
A identificação do adolescente como um sujeito ativo nas decisões de saúde,
como também do maior conhecedor de suas necessidades/prioridades e anseios,
representa a possibilidade de interações positivas com os profissionais desta área
e com o meio em que vive. Isso estimularia o seu interesse na busca e na manutenção de hábitos mais saudáveis (Elias et al., 2001; Jeolás & Ferrari, 2003).
Seguindo essa linha de raciocínio, a organização de serviços de saúde para
o adolescente deve estar voltada para as suas necessidades. Destarte, os profissionais de saúde para atender o adolescente, além de lidar com questões biológicas,
têm que ter competência também na esfera comportamental. A educação visa
ampliar o entendimento sobre saúde concorrendo para o processo em que a
comunidade aumente a sua habilidade de resolver seus próprios problemas com
competência e intensifique sua própria participação (Campos & Zuanon, 2004;
Flores & Drehmer, 2003). Entretanto, ainda há poucos estudos que discutem
sobre a saúde bucal do adolescente.
Com essa preocupação, este trabalho tem como objetivo conhecer a valorização da saúde oral dispensada pelos adolescentes de uma escola pública e outra
particular de uma cidade da zona da mata do Estado de Pernambuco.
2. Metodologia
O estudo foi do tipo transversal de caráter exploratório, sendo a amostra
composta por 277 adolescentes com idades entre 10 e 16 anos, selecionados de
forma não-probabilística entre alunos de duas escolas, uma pública municipal
(140) e outra particular (138), de referência da cidade de Vitória de Santo Antão,
Pernambuco. Foram selecionados todos os alunos da faixa etária selecionada em
cada escola, sendo excluídos aqueles que se recusaram a participar ou que os pais
não assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido (n = 10).
Realizou-se a coleta de dados no período de abril a junho de 2006, sendo o
instrumento de pesquisa constituído por um formulário semiestruturado (Graça,
2000), com perguntas abertas e fechadas, no qual foram indagadas sobre as partes
do corpo que o adolescente prioriza na higiene corporal, a importância dos dentes
em sua vida, as doenças bucais dos quais eles têm conhecimento, a autopercepção
da saúde bucal e se os adolescentes gostariam de receber informações sobre como
ter uma boca saudável. O direcionamento das perguntas foi baseado nas percepções e prioridades dos adolescentes relatados em outros estudos (Elias et al., 2001;
Flores & Drehmer, 2003). Apesar das limitações como dificuldade de interpretação
e subjetividade, a utilização de inquéritos para avaliação do conhecimento e das
atitudes dos indivíduos quanto à saúde tem sido empregada (Zchwarz, 1990).
O teste quanto à fidedignidade das respostas aconteceu pelo método de valiCad. Saúde Colet., Rio
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J e n n y f e r C r y s t i a n A r a u j o , V a l d e n i c e A p a r e c i d a d e M e n e z e s , A m a n d a M a r i a F e rr e i r a B a r b o s a
dação de “face” em 10% das entrevistados. Nesse método, o pesquisador solicita
aos adolescentes entrevistadas que explicitem, com suas próprias palavras, o que
entenderam sobre cada pergunta. Assim, em casos de divergências ou dúvidas a
questão é removida ou modificada para melhor entendimento (Frankfort-Nachimias
& Nachimias, 1992).
Foi realizado o treinamento de dois estudantes para a realização das entrevistas. Neste momento, orientou-se para que as perguntas fossem realizadas em
ordem predeterminada, como também fossem observadas possíveis dificuldades
dos entrevistados em responder às questões. Instruções adicionais foram fornecidas
para que as respostas fossem anotadas no momento da entrevista para evitar falha
de memória na transcrição das respostas, prejudicando, assim, a fidedignidade
das informações.
Os resultados foram analisados por meio de técnicas de estatísticas descritivas
através de distribuições absolutas e percentuais, e a associação entre as variáveis
por meio do uso dos testes do Qui-quadrado ou Exato de Fisher. O nível de
significância utilizado foi de 5% (p < 0,05).
Este trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Associação
Caruaruense de Ensino Superior, sob o número de protocolo 70/2006.
3. Resultados
Na Tabela 1 verificam-se as respostas da questão relacionada ao grau de
importância das partes do corpo que o adolescente daria mais atenção na higiene. A maioria citou os dentes como muito importante, seguidos dos cabelos e
das axilas. Salienta-se que as variáveis dentes e cabelos apresentaram diferença
estatística entre os dois tipos de escola (p < 0,05).
Na Tabela 2 verifica-se que para a maioria dos adolescentes os dentes foram
classificados como “muito importante” para a mastigação (p = 0,023), a beleza
(p = 0,691) e a comunicação com outras pessoas (p = 0,790).
As doenças bucais mais conhecidas pelos adolescentes encontram-se na Tabela
3. A cárie dentária apresentou o maior percentual e está entre as doenças que
mostraram diferença estatisticamente significante entre os dois tipos de escola.
Na Tabela 4 a maioria dos adolescentes julgou sua condição dentária como
boa e regular, sendo que nesta questão houve diferença estatística entre os dois
tipos de escola. No geral, apenas 1,8% não gostaria de ter orientações sobre
como ter uma boca saudável (p = 0,370).
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Tabela 1
Grau de importância das partes do corpo, na higiene pessoal, às quais o adolescente costuma
dar mais atenção, segundo o tipo de escola, Vitória de Santo Antão –PE, 2006
(1) teste q-quadrado de Pearson
* Estatisticamente significante a um nível < 0,05
** p<0,05
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Tabela 2
Grau de importância de diferentes variáveis associadas à saúde bucal em duas escolas.
Vitória de Santo Antão – PE, 2006
(1): Teste qui-quadrado de Pearson
* Estatisticamente significante a um nível < 0,05
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Tabela 3
Conhecimento dos estudantes sobre doenças bucais, Vitória de Santo Antão – PE, 2006
(1): Teste Qui-quadrado de Pearson e exato de Fisher
* Estatisticamente significante a um nível α <0,05
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Tabela 4
Percepção da condição bucal e sobre o desejo dos estudantes de receber orientações sobre
saúde oral, Vitória de Santo Antão – PE, 2006
(1) Teste qui-quadrado de Pearson
* Estatisticamente significante a um nível α <0,05
4. Discussão
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), uma em cada cinco pessoas no mundo é um adolescente (Amorim Filho et al., 2006). Nesta fase da vida, a
construção da identidade pessoal inclui necessariamente a relação com o próprio
corpo; e essa relação se faz através da representação mental que o jovem tem do
seu corpo, ou seja, através de sua imagem corporal (Ferriani et al., 2005).
A crescente preocupação na investigação de aspectos relacionados à saúde
dos adolescentes visa ao estabelecimento e à manutenção de condições aceitáveis de saúde, incluindo a saúde bucal, bem como contribuir no sentido de
desmistificar certos pressupostos tradicionalmente aceitos (Antunes et al., 2008;
Flores & Drehmer, 2003; Gushi et al., 2008; Santos et al., 2007). O alerta para
a compreensão dos adolescentes e suas necessidades é de suma importância,
principalmente para que os profissionais de saúde ou educação se esforcem na
tentativa de influenciar positivamente esta parcela da população, que pode atuar
como agentes multiplicadores de saúde.
Os dados deste estudo restringem-se a duas escolas de referência de uma
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população urbana pertencentes a uma cidade de pequeno porte (110.888 habitantes) localizada na zona da mata do estado de Pernambuco. Assim, outros
recortes possivelmente apresentarão dados diferentes dos aqui encontrados, em
face das características e tamanho da amostra analisada (não inferencial), distribuição geográfica, fatores ambientais e sociais, dentre outros. No que tange à
faixa etária, os adolescentes entrevistados apresentavam de 10 a 16 anos. Outro
dado que merece destaque é que o critério socioeconômico utilizado foi o tipo
de escola (Maltz & Silva, 2001).
Os resultados aqui apresentados fazem parte de uma pesquisa maior, na
qual foram explorados diversos aspectos relacionados ao adolescente. Uma limitação desta pesquisa visualiza-se na perda amostral, pois muitos adolescentes
deixaram de responder a algumas perguntas.
A maioria dos adolescentes classificou como muito importante, na sua higiene corporal, as seguintes partes do corpo: dentes (75,2%), cabelos (63,4%), axilas
(63,2%) e pele do rosto (61,4%). Sendo que os dentes e os cabelos apresentaram
diferenças estatisticamente significantes em relação ao tipo de escola. Esses resultados
são corroborados pelos estudos que enfatizam a valorização da estética por parte
dessa clientela (Branco et al., 2006; Elias et al., 2001; Graça, 2000; Stojanowska,
2003). Sheiham (2004) advoga que a maioria dos jovens limpa seus dentes com
regularidade em razão de a escovação estar associada à boa aparência. A higiene dental também está relacionada à preocupação dos jovens com a higiene
pessoal, à sensação de frescor e ao bom hálito (Lisboa & Abegg, 2006). Não se
podem esquecer as propagandas existentes, principalmente nas revistas, que de
uma forma indireta afirmam ser a aparência física responsável pela felicidade e
sucesso (Thomsen et al., 2002).
Valores culturais relacionados à estética e ao maior acesso à informação
sobre saúde são mais evidentes nas classes sociais de maior poder aquisitivo, o
que pode justificar o fato de os adolescentes da escolar particular citarem com
maior frequência os dentes e os cabelos como muito importantes (Campos et al.,
2003; Granville-Garcia et al., 2008).
O desejo de possuir uma boa aparência não é apenas um sinal de vaidade
própria desta fase. Nos serviços considerados de prestígio, ou onde há contato
direto com o público, os funcionários devem possuir uma boa estética dental
(Jenny & Proshek, 1986). Na pesquisa, realizada por Elias et al. (2001), os adolescentes evidenciaram a preocupação de uma boa saúde bucal para a busca de
empregos. Apesar disso, neste estudo, os adolescentes assinalaram que os dentes
estão em quinto lugar para conseguir ocupação (p = 0,107). Na mesma questão, foram eleitas, em ordem decrescente de importância, a mastigação (64%), a
beleza (58%) e a comunicação com outras pessoas (52,5%). Destaca-se que entre
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estes a mastigação foi a única resposta que obteve diferença estatística entre os
dois tipos de escola (p = 0,023).
Majoritariamente, os adolescentes citaram a cárie dentária como a doença
bucal mais conhecida, em especial na escola particular (p < 0,001). Esta é a
doença bucal mais enfocada pela mídia e campanhas educativo-preventivas de
uma forma geral (Granville-Garcia et al., 2008). Nesta questão houve pouca
participação dos adolescentes de escola pública, refletindo a carência de informações sobre saúde em adolescentes desta parcela da população (Tomita et al.,
2001). Esta hipótese é corroborada pelo estudo de Flores & Drehmer (2003)
com escolares do setor público em Porto Alegre (RS). As autoras relataram que
os jovens consideram como doença a enfermidade que interfere na sua rotina e
doenças bucais, como a cárie dentária e a gengivite, são aceitas como normais
e decorrentes de situações de desequilíbrio. Por outro lado, possivelmente essa
confusão de definição esteja relacionada com as próprias informações transmitidas pelos cirurgiões-dentistas, os quais, em muitos casos, para facilitar o entendimento, referem-se à cárie dental como um “bichinho que come o dente”, e não
como doença bucal (Bonan et al., 2003).
No que tange às informações sobre a autoavaliação da saúde bucal, os
adolescentes de escola particular apresentaram-se mais positivos em relação a
sua condição bucal (p < 0,001), estes dados são corroborados por outros estudos
(Doreto & Vieira, 2007; Santos et al., 2007). Entretanto, dados de um estudo
nacional que abordou o tema relatam que quase metade dos adolescentes brasileiros considerou péssima, ruim ou regular a sua condição de saúde bucal (Brasil,
2003). Na questão seguinte foi indagado aos adolescentes se estes gostariam de
receber informações sobre como ter a boca saudável, e a maioria mostrou-se
receptiva, sendo este dado respaldado por pesquisas similares (Cruz et al., 2005;
Flores & Drehmer, 2003).
O Ministério da Saúde considera que a escola representa um ambiente
educacional e social propício para se trabalhar conhecimentos e mudanças de
comportamento. A Organização Mundial de Saúde (OMS) preconiza ainda a
formação de adolescentes multiplicadores, visando promover a qualidade de
vida e a saúde integral do adolescente (Brasil, 1997).
A tarefa que se coloca para a escola, bem como para o setor saúde, é sem
dúvida a de superar as práticas isoladas, procurando promover um trabalho conjunto, intersetorial. As ações deveriam ser contínuas e articuladas, capacitando
os profissionais das entidades sociais (escolas, entidades e programas sociais) que
encaminham os adolescentes para as oficinas no serviço de saúde, para que eles
deem prosseguimento às ações de prevenção (Jolly et al., 2007). Para que sejam
efetivos e promovam a incorporação de hábitos salutares, os programas devem ser
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sensíveis às diferenças sociais e culturais da população-alvo e, consequentemente,
atender a aspectos como: utilização de linguagem específica, continuidade de informações e métodos educativos claros e objetivos (Harrison & Wrong, 2003).
5. Conclusão
Neste estudo, verificou-se a prioridade do adolescente para a estética, o desconhecimento de uma forma geral de doenças bucais, satisfação com a condição
bucal e o desejo de obter informações sobre saúde bucal. A variável socioeconômica teve influência em questões relacionadas à higiene corporal, às doenças
bucais e na percepção da condição dentária.
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Recebido em: 22/09/2008
Reapresentado em: 15/03/2009
Aprovado em: 13/05/2009
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– Cad. Saúde Colet., Rio
de
Janeiro, 17 (2): 361 - 374, 2009

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