Técnica e Prática de Laminação em Composites

Transcrição

Técnica e Prática de Laminação em Composites
Técnica e Prática
de Laminação
em Composites
Jorge Nasseh
Técnica e Prática
de Laminação
em Composites
Rio de Janeiro, 2008
©2008 Jorge Nasseh
Todos os direitos desta edição reservados à Jorge Nasseh.
P.O.Box 5214, Rio de Janeiro, RJ, CEP 22072-970, Rio de Janeiro.
www.barracudatec.com.br
Catalogação de Livros na Fonte
Nasseh, Jorge.
Técnica e Prática de Laminação em Composites / Jorge Nasseh.
Rio de Janeiro. 2008.
1.Barcos - Construção - Manuais, guias, etc. I.
Título.
Texto e Coordenação
Jorge Nasseh
Edição Geral
Cecilia Veiga
Projeto de Capa
Bárbara Cotta
Isis Karol
Diagramação
Bárbara Cotta
Cecilia Veiga
Isis Karol
Fotos
Bárbara Cotta
Isis Karol
Revisão
Célio Albuquerque
Maria Elisa Nunes
Construtores
Edmundo Souto
Thiago Reis
Rodolpho Rebecchi
Rodrigo Nascimento
Sumário
Introdução
1
1
Parte 1 - Laminação Manual
Introdução
Considerações Iniciais
Moldes de Fibra de Vidro
Aplicação da Cera Desmoldante
Aplicação de Filme Desmoldante
Aplicando o Gelcoat
Skin coat - Pré-cortando a Manta
Skin coat - Laminação da Manta
Pré-corte dos Tecidos
Laminação do Tecido Biaxial
Pré Cortando a Espuma de PVC
Colagem da Espuma de PVC
Laminação do Tecido da Camada Interna
Cortando o Flange e Desmoldando
Rebarbando o Flange
Montagem das Peças
5
6
9
13
14
17
20
29
34
58
70
78
94
108
118
122
126
2
Parte 2 - Método Power Flex
Introdução
Método Power Flex
Histórico do Método
O Método Plyglass
Desenhando Planos para Construção em Power Flex
Convertendo Planos para uso do Power Flex
O Projeto do Dingue Andorinha
Ferramentas
Infusão de Placas para o Método Power Flex
Escolha do Método Construtivo
Fundamentos da Infusão
Vantagens do Processo de Infusão
Teoria do Processo
Resinas de Infusão
129
131
133
133
140
142
148
148
150
154
155
156
157
158
Infusão com uma Linha Principal
Meio de Escoamento da Resina
Propriedades da Resina de Infusão
Montagem das Linhas
Preparação da Resina
Construção da Base ou Picadeiro
Pré-corte das Cavernas
Montagem das Cavernas
Montagem dos Painéis
Tapeando pelo Lado Externo
Virando o Casco
Tapeando os Chines pelo Lado Interno
Preparando para a Colagem das Peças do Cockpit e Convés
Peças do Cockpit e Convés
Laminação dos Fuzis Laterais e de Proa
Montagem da Parede Vertical - Antepara Longitudinal
Montagem da Faceta
Montagem da parte Horizontal do Deck
Furo de Drenagem
Corte da Caixa de Bolina
Laminação Externa da Caixa de Bolina
Laminação do Pé de Mastro
Corte e Ajuste do Piso
Gola da Caixa de Bolina
Tubo do Balão
Tubo do Pau de Spinnaker
Castelo de Proa
Aplicando Massa no Casco
Tipos de Massa
Fórmula da Massa Poliéster
Aplicação de Massa no Convés
Espelho de Popa
Lixamento do Casco
Aplicação de Primer no Casco
Primer do Convés
Lixamento do Primer do Convés
Lixamento do Primer do Casco
Pintura do Casco
Tipos de Tintas Marítimas
Sistemas Mono Componente
Sistema de Dois Componentes
Rendimento das Tintas
Pintando o Casco
Pintando o Convés e Antiderrapante
Construção do Pau de Spinnaker
160
163
164
166
168
170
179
182
190
201
208
210
217
218
222
223
224
225
225
231
232
239
243
249
254
258
261
272
274
277
283
286
287
288
290
292
294
297
299
300
301
302
303
304
308
Construção da Bolina
Construção do Leme
Montagem das Ferragens
Desempenho Dingue Andorinha
314
324
328
331
3
Considerações Finais
343
4
Tabela de Conversão
345
5
Agradecimentos
347
6
Notas
349
Introdução
Jorge Nasseh
Quando eu terminei de escrever meu primeiro livro
há alguns anos atrás, inicialmente o meu editor me
encheu de elogios, mas em seguida criticou que a
leitura era muito difícil que eu deveria pensar em
escrever um livro mais simples, para quem estivesse
querendo realmente iniciar na construção de barcos.
Passaram se alguns anos e o meu segundo livro era
então ainda mais complicado que o primeiro. Desta
vez ele somente fez as críticas. Nada mais de elogios.
Disse sem pestanejar que eu estava errado em escrever para um público cada vez menor, e que existia,
e ainda eu acho que deve existir, um grande número
de pessoas que gostariam de aprender os princípios
da construção em composites.
Embora hoje eu gaste a maior parte do meu tempo
tentando desenvolver aplicações de alta tecnologia,
que possam ser empregadas em vários segmentos da
indústria de processamento de materiais compostos,
que produzam componentes de alta performance
com preços competitivos, eu não tenho dúvida que
boa parte dos laminadores e construtores profissionais ainda sentem falta de informações simples do
início da construção em composites.
Hoje em dia muitos laminadores já são treinados
diretamente em processos como laminação a vácuo,
infusão e RTM (resin transfer molding) que quando
se deparam com um problema do dia a dia, simples
de ser revolvido, acabam diante de um muro com
uma placa dizendo, decifra-me ou eu te devoro. Bem,
não é exatamente assim, mas o que acontece é que se
você não passou pelas etapas iniciais do uso destes
1
materiais, da forma mais convencional possível, um
dia vai acabar realmente sendo devorado.
Há um mês atrás, um famoso arquiteto naval veio me
visitar e encontrou sobre minha mesa uma cópia dos
dois livros Marine Design Manual for Fiberglass Reinforced
Plastics e How to Fiberglass a Boat, ambos precursores
da indústria de composites. Os dois foram escritos
no início da década de 60, e são exemplares de colecionador. Depois de conversarmos a respeito do
início de nossas carreiras, e em nosso aprendizado,
então finalmente eu tive a certeza do que meu editor
estava tentando me dizer todo este tempo.
Em menos de duas semanas eu já tinha escrito quase
todo o livro, e a cada linha que eu digitava, eu me
lembrava da época em que eu era um destes laminadores novatos, seco por aprender qualquer coisa
que me ensinasse como construir mais leve, melhor e
mais rápido. A maior parte das estruturas de barcos,
carros e aeronaves que eu projetei no início da minha
carreira foram baseadas nos ensinamentos básicos
destes livros. Não me lembro de nunca ter visto outra
edição destes dois volumes ou mesmo títulos que
tratassem de assunto semelhante nos últimos 50 anos.
Este livro é composto de duas partes. Ambas bem
simples. A primeira descreve com detalhes e centenas
de fotos o processo de laminação manual que gerou
toda a tecnologia existente hoje e com ele foi possível
construir uma infinidade de componentes para aeronaves, barcos, carros, trens e etc. Nesta parte do livro
é mostrada a laminação de uma peça fabricada em
resina poliéster e fibra de vidro no sistema sandwich
utilizando somente ferramentas básicas.
Com certeza, aqui o leitor vai poder entender os
princípios da construção que hoje possibilita a fabricação de componentes complexos e de alta tecnologia utilizando processos menos artesanais. O texto
vem acompanhado pela seqüência de construção que
mostra os mínimos detalhes da fabricação de uma
peça em fiberglass e permite qualquer iniciante se
familiarizar com o processo.
A segunda parte utiliza este processo de laminação
2
manual, acoplado com a técnica de infusão de placas
planas, para construção de peças de engenharia, a
partir de placas coladas entre si. O processo foi desenvolvido pelos engenheiros da Barracuda no ano
passado e tem se tornado uma poderosa opção para
construções simples que exijam alta performance e
baixo peso. O nome dele foi batizado de Power Flex.
Novamente, esta técnica, exige poucas ferramentas e
com alguma habilidade é possível transformar placas
planas em estruturas realmente leves e eficientes. O
produto escolhido para a construção neste livro foi
um barco de pouco mais de 5m de comprimento,
projetado por um famoso escritório de arquitetura
naval brasileiro, que tem todas as características de
um pequeno foguete, quando é bem construído e
velejado.
A descrição da construção é detalhada desde a fabricação das placas pelo método de infusão com
fibra de vidro, espuma de PVC e resina poliéster,
até a montagem do casco, acabamento, pintura e
finalização do barco. Com esta técnica simples foi
possível completar toda a construção em pouco
mais de dois meses utilizando muito poucas horas
de trabalho. Em pouco mais de alguns meses, várias
estruturas de materiais compostos foram produzidos
a partir deste processo e eu não tenho dúvida que
em um futuro próximo veremos mais e mais casos
de aplicação deste processo.
Não poderia deixar de agradecer a participação especial de três gerações de projetistas, construtores e
velejadores de padrão internacional como os meus
amigos Nestor Volker, Horacio Carabelli e Astrid
Barros, que me forneceram as ferramentas e a inspiração para publicação deste novo livro.
Rio de Janeiro, agosto 2008
3
4
Parte 1
Laminação Manual
5
Introdução
Nestor Volker
Quando viajava de automóvel a um estaleiro e recebi
uma mensagem do Jorge Nasseh, já me senti contente
de receber um chamado deste amigo tão capaz.
Quando me comentou que queria que lhe escrevesse
o prefácio de seu novo livro, embora não me sentia
muito idôneo para fazê-lo, senti-me extremamente
honrado e nem me passou pela mente lhe dizer que
não, embora lhe perguntei porquê tinha me eleito.
Me elogiou dizendo que eu tinha feito muito pela
náutica no Brasil e que devido a isso era este o pedido.
Certamente me senti honrado.
Enquanto escrevo o prefácio deste livro, que pelo
que me comentou ele mesmo, é dirigido a um público menos profissional que o anterior, sem lugar
a dúvidas será um excelente ensino para quem quer
construir seu barco de maneira artesanal.
Sempre admirei o Jorge, não só por seus grandes
conhecimentos tanto para calcular laminados e estruturas, e para levar a prática a construção de barcos
(é uma das pessoas mais renomadas em nosso meio,
a nível internacional, em tudo o que se refere a conhecimento estrutural e de materiais), mas sim por
sua grande capacidade para transmitir e ensinar tudo
aquilo que sabe. Além disso o faz com gosto e com
uma grande dedicação.
Foi um prazer compartilhar a construção de muitíssimos desenhos meus com ele, tais como toda a
linha dos veleiros Delta e a linha Skipper para no-
mear somente alguns, como assim em construção de
muitos barcos one off onde sua ajuda sempre foi de
grande utilidade.
Cada vez que recorri a ele, me respondeu com muito
profissionalismo, simplicidade e vontade, coisa não
tão habitual nestes dias.
Não duvido que este novo livro voltará a ser um
excelente ensino para todos aqueles que queiram
desfrutar construindo seus próprios barcos.
Seu livro, “Manual de Construção de Barcos”, é um
exemplo de seu conhecimento e da maneira fácil
que ele sabe escrever e transmitir. Quem transmite
claramente é porque não só tem a facilidade para
fazê-lo, mas também, além disso, deve ter as idéias
extremamente claras.
É um entusiasta do que faz e é por isso que o faz bem.
Jorge segue sempre com essas energias e essa vontade
de ensinar, seja através de seus livros ou nos estaleiros
com suas próprias mãos, que a náutica lhe agradece
e lhe seguirá agradecendo por muito tempo.
Argentina, julho 2008
1
Laminação
Manual
Considerações Iniciais
Embora a laminação manual seja uma das primeiras
etapas no aprendizado de qualquer laminador ou
construtor, hoje em dia, ela é tida como um método
ultraconvencional de se construir qualquer produto
em composites. Com a proliferação de métodos
mais modernos, como a laminação a vácuo, infusão
e RTM (Resin Transfer Molding), a laminação manual
deixou o chão da maioria das fábricas de composite
que tentam ser competitivas.
Não é que exista muita coisa errada com o processo
de laminação manual, mas certamente não é possível
competir em termos de eficiência, resistência, velocidade de construção, consistência e custo, quando
se tem de decidir como vai ser construída uma peça
em resina e fibra hoje em dia.
A laminação manual até funciona em muitos casos,
inclusive na produção de peças como pequenos barcos, piscinas, banheiras, caixas d’água e outras peças
menores, mas nunca vai conseguir superar uma peça
construída em um processo mais avançado.
Então por que se gastar tempo em aprender um
processo já ultrapassado? A resposta é bem simples:
porque ele é a base para o conhecimento dos processos mais complexos. Sem um bom entendimento
dos potenciais erros que qualquer um está propenso
a cometer nesta fase, ninguém vai conseguir ir muito
longe sem saber o que está por trás de um processo
relativamente difícil, que incorpora um tremendo
esforço manual para se conseguir um bom produto.
Qualquer bom laminador já usou a laminação manual, conhecida em inglês por hand-layup, e se você
não for bom neste processo, nunca será um bom
laminador de peças mais técnicas. Afinal por mais que
os engenheiros tentem, a construção em composites
sempre vai ser um processo que necessita de grande
quantidade de mão de obra.
Mesmo os processos mais automatizados como
RTM, SMC (Sheet Molding Compound) ou BMC (Bulk
Molding Compound), sempre vão precisar de uma
mãozinha aqui ou ali para pré-cortar e colocar os
reforços no molde, em seguida, ajustar os parâmetros da injeção e desmoldar a peça. Isto sem contar
o acabamento final, lixamento, pintura e polimento.
Assim, ser um bom laminador pelo processo manual
é o caminho para se tornar no futuro um grande
laminador de barcos, aviões ou carros de corrida.
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O processo de laminação manual se baseia em colocar vários reforços de fibra, que podem ser de vidro,
aramida ou carbono, sobre um molde e em seguida
aplicar resina sobre eles, e com o esforço manual,
tentar dispersar a resina de modo uniforme sobre as
fibras e esperar até a polimerização final da resina.
Se o laminado for muito espesso, vai ser necessário
repetir esta operação várias vezes. Infelizmente, não
é possível laminar mais do que duas ou três camadas de uma só vez, devido à exotermia da resina de
laminação. Fenômeno em que ocorre a liberação
de calor pela catalisação e polimerização da resina.
Dependendo do produto que se está construindo e
da quantidade de camadas, muitos laminados podem
chegar facilmente aos 80ºC.
Apesar do processo de laminação manual ser usado
principalmente para a produção de peças em laminados sólidos, ele também pode ser aplicado na
construção de peças em sistema sandwich, embora
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este último apresente melhor qualidade quando
laminado a vácuo. Entretanto, vários fabricantes de
materiais sandwich desenvolveram técnicas e adesivos
específicos para a laminação manual que podem ser
empregados com sucesso em peças de pequeno e
médio porte.
Mesmo sendo uma técnica muito rudimentar, é
possível laminar manualmente um laminado sólido
com grande probabilidade de sucesso. Contudo, os
laminados sandwich necessitam de um cuidado maior,
principalmente na hora de se instalar o núcleo, pois
uma falha nesta hora pode comprometer o trabalho
inteiro.
A técnica de construção em sandwich requer que as
três partes do laminado: camada externa, núcleo
sandwich e camada interna, trabalhem juntas, e o que
dá esta possibilidade é exatamente a linha de colagem
que existe entre elas.
A maior parte das construções pelo processo manual
requer uma fôrma fêmea para que as fibras sejam
depositadas sobre ela e depois aplicada a resina.
Muitas vezes é possível usar uma fôrma invertida,
mas em, 95% dos casos o construtor vai se deparar
com uma fôrma de fibra de vidro, especialmente
construída para proporcionar a retirada de várias
peças com o mesmo formato, se possível, idênticas
em peso, resistência e custo.
Embora seja quase impossível, a meta de um bom
laminador é sempre minimizar esta diferença e produzir um laminado consistente de forma seqüencial.
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Moldes de Fibra de Vidro
Talvez uma das maiores aplicações, ainda hoje, do
processo de laminação manual seja a construção
de fôrmas para laminação. Mesmo que o processo
final de construção seja um daqueles bem complicados, que envolvem vácuo, pressão e temperatura,
a maioria das peças vai requerer uma fôrma de fibra
de vidro, feita com laminação manual.
Certamente laminar uma fôrma é muito mais difícil
do que laminar uma peça. Não existe comparação.
Lembro-me do primeiro molde que construí quando
tinha uns 16 anos de idade para fabricar um kayak,
se a visse hoje ficaria horrorizado com o resultado.
Consegui laminar vários barcos nesta fôrma, embora
fosse um transtorno terminar cada um deles. Logo
em seguida, descobri o modo correto de evitar os
erros que havia cometido e meu segundo molde ficou
muitas vezes melhor.
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Aplicação da
Cera Desmoldante
A primeira etapa, antes de se iniciar a laminação de
uma peça em fibra de vidro, é preparar a fôrma. Aqui
eu assumo que esta fôrma está em perfeito estado,
ou em bom estado pelo menos, e que a peça vai ter
uma grande probabilidade de sair aceitável. Laminar
qualquer coisa sobre um molde de baixa qualidade
é esperar que se tenha um longo caminho de acabamento pela frente. Há pessoas que não ligam para o
aspecto cosmético, mas se o objetivo é comercializar
um dia este produto, então não há como escapar de
ter um molde decente.
Se o molde for novo, vai ser necessário um tratamento maior com desmoldantes, até que a peça
retenha quantidade suficiente de produto, que não
permitirá que ela cole no molde, o que aliás é possível
acontecer mesmo entre laminadores profissionais.
Se o molde for usado, ele vai precisar ser limpo e se
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contiver excesso de cera, que também colabora para
colar a peça nova no molde, ela terá de ser removida
com solvente para depois se iniciar a aplicação de
desmoldante.
Existem vários tipos de desmoldantes, em número
suficiente para o laminador se confundir. Cada um
promete uma coisa diferente, mas nem todos cumprem o prometido. Existem desmoldantes tipo cera
em pasta, que são os mais comuns, e os desmoldantes
líquidos do tipo semipermanente. Talvez, somente
sobre desmoldantes, em vez de um capítulo, temos
assunto para um livro inteiro. Contudo, os produtos
mais comuns para se retirar uma ou algumas peças de
um molde são a cera em pasta e o álcool polivinílico.
Existe à disposição dos laminadores uma centena de
ceras em pasta e algumas são específicas para a retirada de peças laminadas com resina poliéster. Note
que, os desmoldantes para epoxy são diferentes e os
que usam temperatura devem ter uma formulação
específica, caso contrário as chances de perder a peça
e o molde são grandes.
Para laminação manual, sem adição de temperatura,
algumas camadas de cera são suficientes. Se o molde
for novo, serão necessárias pelo menos seis camadas,
aplicadas com intervalo de uma hora. Algumas ceras
desmoldantes requerem 4 horas entre uma e outra
demão, neste caso quanto maior o intervalo entre as
demãos, melhor vai ser o resultado final. Se o molde
for um destes que é usado todo dia, duas camadas
de cera vão resolver.
Algumas ceras em pasta prometem mais de 20 desmoldagens, somente com as aplicações iniciais, mas
pelo menos no flange deve ser aplicada uma camada
entre uma e outra desmoldagem. Use uma estopa limpa, chamada de estopa de primeira, em movimentos
circulares. Não use estopa de segunda ou reciclada,
pois vai acabar arranhando o molde.
Depois de aplicar a cera, espere alguns minutos e
use uma estopa limpa para removê-la. Pode parecer
estranho, mas é assim mesmo. Primeiro se aplica a
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cera, depois se retira a cera e ao mesmo tempo se
está polindo a superfície da fôrma, deixando uma
fina camada lisa, que vai ser suficiente para desmoldar a peça. Cubra a primeira parte da peça com cera,
depois retire-a, prossiga fazendo a mesma operação
com as outras partes tendo a certeza que nenhuma
parte vai ficar sem cera.
Usar cera demais é tão prejudicial como usar cera
de menos. Excesso de cera gera uma camada grossa
sobre o molde, que acaba reagindo com o gelcoat e a
resina, criando uma camada de resíduo de poliestireno que dificulta a remoção da peça, além de tirar
todo o brilho que o gelcoat deveria proporcionar.
Podem ser usados desmoldantes semipermanentes,
normalmente comercializados na forma líquida, mas
é interessante que sua utilização ocorra onde são
construídas peças em série. Se o molde ficar algum
tempo vazio, entre a laminação de uma e outra peça,
vai ser necessário reaplicar o produto.
Em termos de custo, existe uma grande diferença
entre as ceras em pasta e os desmoldantes líquidos
semipermanentes. As ceras em pasta são muito mais
baratas e têm a vantagem de serem de fácil reativação,
caso o molde fique algum tempo sem uso, mas são
menos eficientes para a retirada de peças em série.
Existem ceras específicas para laminação em composites e outras para mobília e pisos. As ceras para
mobília e piso podem funcionar na desmoldagem,
devem contudo ser testadas com cuidado, pois pode-se até conseguir desmoldar uma ou outra peça, porém elas podem danificar a fôrma rapidamente pelo
excesso de silicone ou retirar totalmente o brilho do
gelcoat por meio do ataque químico à sua superfície.
Seja qual for a escolha do construtor, ele tem que
estar atento de que vale mais usar um produto já
testado do que fazer experiência na hora de sacar um
laminado já curado. O custo de perder uma peça e
o molde pode não compensar as experiências com
produtos de origem desconhecida.
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Aplicação de
Filme Desmoldante
Embora eu nunca tenha sido defensor do uso de
filmes desmoldantes, acredito que eles têm alguma
utilidade para peças de fibra de vidro que utilizam
moldes já bastante usados.
Certamente o uso de álcool polivinílico, também
conhecido como filme desmoldante de PVA, é uma
garantia de que o laminado vai sair do molde de
qualquer maneira.
Se o molde já tiver algumas camadas de cera, é possível aplicar diretamente o álcool polivinílico sobre
ele e em seguida iniciar a laminação.
Normalmente, a primeira camada depois do filme
desmoldante é o gelcoat. O álcool polivinílico tem a
aparência clara de um líquido com uma viscosidade
similar a um óleo bem fino, e é solúvel em água.
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Depois da última aplicação de cera, o molde deve
ser polido. Somente a partir deste ponto, deve-se
aplicar o filme, o que pode ser feito com uma esponja
ou com pistola, mas na maioria das vezes se obtém
melhor resultado com um pedaço de esponja.
O filme pode ser aplicado em várias espessuras e
isto depende única e exclusivamente de quem o está
dispersando sobre o molde. Difícil determinar a
espessura correta e também como manter a mesma
espessura ao longo de todo o molde.
Um dos segredos é usar uma esponja retangular de
forma contínua e gradativamente percorrer de um
lado ao outro do molde até que toda a superfície
tenha sido coberta. Eventualmente um local ou outro vai apresentar uma falha, deve-se, então, passar
novamente a esponja sobre a parte seca.
O uso de uma esponja retangular favorece a medição das larguras em que o filme é aplicado de modo
que sempre seja minimizada a quantidade de locais
com falha.
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Enquanto o filme ainda estiver molhado, é possível
voltar ao lugar seco e aplicar um retoque. Em alguns
locais, principalmente nas áreas onde a esponja toca
inicialmente sobre o molde, pode ficar um acúmulo
de filme, e neste caso ele deve ser retirado assim
que a esponja estiver ficando seca. Se estes pontos
ficarem com maior quantidade de filme, irão influir
no acabamento externo do gelcoat, criando pequenos
buracos na superfície. Este fenômeno acontece com
alguma freqüência nas bordas do molde, onde tende
a ficar mais filme e nos locais de difícil acesso como
as quinas do molde.
Dependendo da pressão que o laminador coloque
sobre a esponja, o filme pode ficar mais espesso ou
mais fino, mas isso pouco influencia no processo de
desmoldagem da peça. Uma camada fina aplicada
com uniformidade pode ser mais eficiente que uma
camada muito espessa e com muitos lugares “abertos” sobre a superfície.
Logo que o álcool começar a evaporar, a tendência
é criar áreas secas sobre a superfície. Algumas delas
podem ser somente relativas à evaporação do álcool,
mas outras podem ser defeitos do filme. Se ele ainda
estiver com aspecto molhado, é possível repassar a
superfície para corrigir os defeitos.
A aplicação do filme na borda é muito importante,
pois este é o local onde muitos laminadores acabam
cortando flanges ou contaminando a superfície com
cera, deixando o local livre para colar a peça sobre
o molde. Quando o álcool polivinílico for aplicado
sobre o flange, deve-se ter cuidado para não deixar
escorrer uma quantidade excessiva de filme para as
bordas de modo que ele não interfira no acabamento
do gelcoat.
Uma das formas utilizadas por alguns construtores
para desmoldar peças em moldes antigos é usar
filme desmoldante e depois, com o laminado seco,
injetar água entre a peça e o molde. Muitos moldes
antigos apresentam dificuldades crônicas para serem
desmoldados e o artifício de usar água sobre o filme
acaba ajudando, mas certamente esta não é a maneira
mais correta e conservadora de se fabricar uma peça
em composite.
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Aplicando o Gelcoat
O gelcoat é a camada superficial aplicada antes da primeira laminação de fibra e resina e tem a finalidade
de proteger o laminado das intempéries e dos raios
UV, além de criar um aspecto cosmético agradável. A
eliminação da pintura final talvez seja a maior virtude
das peças laminadas que têm acabamento com gelcoat.
Poder aplicar uma camada de uma cobertura com
aditivos e corantes diretamente sobre um molde e
em seguida ela ter compatibilidade química para receber as primeiras laminações estruturais é um ganho
de produtividade incrível que somente as peças em
composite podem apresentar.
Poucas pessoas podem imaginar que, por trás do
acabamento liso e espelhado de uma peça de fiberglass terminada com gelcoat, possa estar escondido
um processo cheio de truques e armadilhas, onde
quaisquer modificações nas variáveis da formulação
e no processo de aplicação podem levar o resultado
final a um completo desastre.
O gelcoat é a primeira camada, mais externa, de uma
peça em fiberglass, normalmente de cor branca, mas
pode ser pigmentada com infinitas combinações
de cores. Mesmo construtores com boa técnica,
que conseguem laminar manualmente peças com
qualidade aceitável, acabam sempre reclamando da
dificuldade e dos problemas relativos à aplicação do
gelcoat. É certo que, se uma fábrica consegue tirar
peças acabadas em gelcoat diretamente de um molde
é por ter, com certeza, um sistema de produção
eficiente. É muito difícil uma peça que não tenha
que ter as bordas ou cantos retrabalhados devido a
problemas de aplicação de gelcoat.
Embora o gelcoat seja fabricado à base de resina poliéster, ele é muito mais sensível à quantidade de catalisador do que a resina. A maioria dos fabricantes de
resina poliéster especificam uma taxa de catalisador
Mekp (Peróxido de Metil Etil Cetona) entre 1% e 2%
para a resina de laminação, mas muitos laminadores
usam, em várias ocasiões, menos que 0,4 % de taxa
20
de Mekp. No caso de gelcoat, a taxa de catalisador é
muito mais estreita e nunca se deve utilizar menos
que 1%.
Outro detalhe importante é a temperatura externa e a
umidade durante a aplicação. O gelcoat nunca deve ser
aplicado se a temperatura estiver muito baixa. Não
existe um valor determinado para decidir ou não pela
aplicação sob certas condições, mas, como na resina
poliéster, temperaturas abaixo dos 15 º C dificultam
a cura do gelcoat formulado com resina poliéster.
As quantidades de catalisador normalmente usadas
no gelcoat variam entre 1% e 2%, entretanto o produto
deve ser testado para se determinar o seu geltime. Isto
pode ser feito com auxílio de uma balança eletrônica
e um pote com 100g de gelcoat. Use uma seringa ou
pipeta para colocar o catalisador Mekp na quantidade
correta e registre o tempo de gelificação. Depois de
determinar quanto de catalisador vai ser necessário
para a aplicação, meça a quantidade correta para o
caneco da pistola que vai ser utilizada e então coloque
o catalisador. Mexa por pelo menos 30 segundos até
todo o catalisador estar disperso na mistura e então
aplique o gelcoat.
Para quantidades maiores, deve ser utilizada uma
pistola que traga através de um sistema de pressurização o gelcoat e o catalisador que vão ser misturados
na saída da pistola. Neste sistema vai existir uma
bomba e um ajuste para fixar a quantidade de Mekp
que vai ser usado. Este sistema de aplicação é sempre
preferido quando a quantidade de gelcoat que vai ser
usada exceder 20kg.
A quantidade de catalisador é importante para proporcionar dureza na superfície do gelcoat, o que está
ligado diretamente ao brilho e a sua retenção. Uma
subcura do gelcoat, devido à baixa taxa de catalisador,
irá proporcionar um acabamento muito flexível, com
baixa dureza, e por conseqüência, baixa resistência à
abrasão e às intempéries. A baixa taxa de catalisação
também pode ser responsável pela tendência do gelcoat em absorver maior quantidade de água e gerar
o problema conhecido como osmose.
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Como qualquer produto formulado, não existe uma
fórmula única para o gelcoat. Ele é composto por
uma resina poliéster, que normalmente é uma resina especial para a formulação, nunca uma resina de
laminação e uma série de cargas. A base da resina
pode ser ortoftálica ou isoftálica, algumas delas ainda
incorporam aditivos para aumento da tixotropia e
resistência à hidrólise.
Um dos componentes mais comuns para aumentar
a resistência à água é o NPG (neo pentil glicol), que
vem adicionado em várias resinas isoftálicas específicas para fabricação de gelcoat. Este tipo de glicol
proporciona a formação de uma cadeia polimérica
difícil de ser quebrada pela ação da água.
Muitos laminadores se perguntam por que não
existe gelcoat à base de resina estervinílica, que conhecidamente exibe grande resistência à absorção
de água. O fato é que o radical epoxy dissolvido no
monômero de estireno das resinas estervinílicas
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tem baixa resistência à ação dos raios UV, e mesmo
sendo fabricada em cores escuras este tipo de resina
não é indicado para a laminação de peças. Uma das
exceções do uso de resina estervinílica para gelcoat é
na fabricação de moldes.
Outro item importante na fabricação do gelcoat é a
adição de uma substância tixotrópica que evita que o
gelcoat escorra quando aplicado em paredes verticais.
O produto mais utilizado, em média de 2% a 3%,
é a sílica coloidal, também conhecida pelas marcas
registradas Aerosil ou Cabosil. Estes produtos são
adicionados logo na preparação de uma pasta não-reativa para oferecer estabilidade ao gelcoat.
Ingredientes importantes também são os filtros de
raios UV. Geralmente são incorporados na preparação da pasta de pigmentação feita com uma resina
não-reativa. Estes aditivos são importantes para que a
superfície do gelcoat não perca o brilho e não comece
a amarelar precocemente. Mesmo outras cores, além
da branca, devem usar este aditivo. Dependendo da
quantidade e qualidade do filtro ele pode ter uma
vida útil limitada, não superior a 2 anos, o que irá
comprometer rapidamente o aspecto cosmético
da peça. Estes filtros acabam reagindo com o UV
perdendo o poder de filtragem com o passar do
tempo, deixando uma sensação de empoeiramento
na superfície do gelcoat.
Como o gelcoat deve ser formulado com uma variedade de produtos, já se pode esperar que o seu custo
tenha uma variação substancial. Tanto a qualidade
da resina base quanto a quantidade de aditivos pode
fazer o seu preço variar em 500%. Uma boa formulação, além de ser fácil de aplicar, deve ter resistência
a flexão, dureza, brilho e retenção do aspecto cosmético. Sendo assim, preço é uma variável importante.
Comprar gelcoat pelo preço mais barato significa
comprar um produto que não vai oferecer uma boa
performance. Resinas de boa qualidade, específicas
para fabricação de gelcoat, não são produtos baratos,
assim não se espera que o custo seja um dos elementos chaves da decisão.
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Infelizmente, fabricantes de gelcoat não fazem caridade, e se você estiver aceitando comprar um produto
com preço baixo, tenha a certeza que a qualidade
também será baixa. É possível formular o gelcoat de
uma infinidade de maneiras, compondo o custo que
se quer pagar. Uma das melhores formas de se comprar um produto de qualidade é conhecer e confiar
no fabricante, e, se possível, conversar com ele sobre
as opções de formulação, performance e custo.
Existem várias formas de se aplicar gelcoat, mas certamente o uso de ar comprimido e uma pistola é que
vão proporcionar o melhor acabamento externo.
Além da possibilidade de usar uma pistola de caneco
invertido para uma peça pequena, ou uma máquina
industrial para uma peça maior ou na produção em
série, é também possível aplicar gelcoat com rolo ou
trincha de forma manual. Embora possa parecer mais
simples o uso de um processo totalmente manual
para aplicação de gelcoat, não é fácil. Aplicar gelcoat
com eficiência e cobertura perfeita com o auxílio de
rolo de lã é extremamente difícil.
A aplicação manual sempre vai requerer duas camadas, aplicadas com um espaço de tempo preciso para
que a segunda não danifique a primeira. Se a segunda
camada for aplicada logo em seguida, existe o sério
risco da primeira camada reagir e gerar vários defeitos
na superfície. Caso contrário, se o gelcoat já estiver
há muito tempo curado é possível que uma camada
não tenha aderência sobre a outra ou que induza a
uma desmoldagem precoce somente da camada de
gelcoat. Qualquer que seja a situação o resultado vai
ser um desastre e haverá necessidade de começar
novamente o processo.
Não importa a quantidade de cuidado que se tenha,
a aplicação de gelcoat sempre traz surpresas, mesmo
para o construtor mais experiente. A quantidade recomendada para aplicação sobre uma peça deve ser
entre 600g/m² e 800g/m², em muitos casos este valor
pode chegar até 1.000g/m². Uma camada de gelcoat
abaixo das 600g/m² pode gerar falhas na cobertura,
baixa resistência e pouca proteção ao laminado. Da
mesma forma que, uma camada acima de 1.000g/
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m² vai gerar uma superfície muito rígida sobre o
laminado o que irá criar a possibilidade de trincas
em locais de maior tensão no laminado. Este defeito
é normalmente definido como formação de “pé de
galinha” e costuma aparecer alguns meses depois que
a peça começou a ser usada. Não é preciso dizer que
o reparo é trabalhoso e difícil. A medição de consumo de gelcoat pode ser feita durante a aplicação, com
o auxílio de um medidor de filme. Logo depois da
aplicação se utiliza o medidor sobre o filme de gelcoat
para verificar a espessura. Os medidores podem vir
graduados em mícrons ou em mils, que significa um
milésimo de polegadas. A espessura recomendada
para uma aplicação que varia entre 600g/m² e 800g/
m² deve estar entre 500 e 600 mícrons ou em média
24 mils.
Inúmeros podem ser os problemas na aplicação de
gelcoat. Alguns fabricantes, possuem manuais com os
problemas, causas e como corrigí-los, mas qualquer
que seja o problema, o reparo é difícil e caro, então,
a melhor maneira de reduzir tempo e custo é fazer
uma aplicação bem feita.
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