A glória do Filho - palavras do evangelho

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A glória do Filho - palavras do evangelho
A glória
do
Filho
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“The Glory of the Son”
Copyright © 2007 by Assembly Testimony,
49 Glenburn Rd, Dunmurry, Belfast, BT 17 9AN, N Ireland.
Dados
Internacionais
de
Catalogação na
Publicação
Tradução: Rochele
B. Pereira
(Câmara
Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Correção: M. Janeta M.Watterson
Impressão e Acabamento Gráfico — Suprema Gráfica
A Glória do filho / organização da Editora ;
Primeira edição
brasileira —Rochele
Maio de 2012
[tradução
B. Pereira]. -- Pirassununga,
(CIP)
SP : Editora Sã Doutrina, 2012.
Dados
Título original: The glory of the son.
Internacionais
de Catalogação na Publicação
ISBN 978-85-98156-68-2
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
(CIP)
1. Jesus Cristo - Conhecimento 2. Jesus Cristo A Glória do filho
/ organização
da Editora
;
Ensinamentos
3. Jesus
Cristo - Pessoa
e missão.
[tradução Rochele B. Pereira]. -- Pirassununga,
SP : Editora Sã Doutrina, 2012.
Título original: The glory of the son.
ISBN 978-85-98156-68-2
1. Jesus Cristo - Conhecimento 2. Jesus Cristo Ensinamentos 3. Jesus Cristo - Pessoa e missão.
12-05687
CDD-232.954
Índices para catálogo sistemático:
1. Jesus Cristo : Ensinamentos : Cristologia
232.954
12-05687
CDD-232.954
Publicado no Brasil com a devida autorização, e com todos os direitos reservados, por:
Índices para catálogo sistemático:
Editora Sã Doutrina
1. Jesus Cristo : Ensinamentos : Cristologia
Caixa Postal
241 — Pirassununga - SP
232.954
CEP 13630-970 — BRASIL
www.sadoutrina.com
São Carlos-SP
Suprema Gráfica e Editora Ltda – EPP
A glória
do
Filho
Abreviações:
AT���������������Almeida Revista e Revisada fiel ao texto original. Versão
da Bíblia em Português da Sociedade Bíblica Trinitariana.
ARC������������Almeida Revista e Corrigida. Versão da Bíblia em Português da Sociedade Bíblica do Brasil.
ARA������������Almeida Revista e Atualizada. Versão da Bíblia em Português da Sociedade Bíblica do Brasil.
VB���������������Versão Brasileira.
AV���������������Authorized Version. Versão da Bíblia em Inglês.
JND�������������Versão da Bíblia em Inglês de J. N. Darby.
H. e C.���������Hinos e Cânticos.
N. do T.�������Nota do Tradutor
N. do E.�������Nota do Editor
Todas as Escrituras citadas neste livro são da versão Corrigida e
Revisada Fiel ao texto Original, da Sociedade Bíblica Trinitariana
(AT), exceto quando indicado. O uso de outras versões da Bíblia nesta
publicação não implica o endosso destas versões na sua totalidade.
Índice
Abreviações:.....................................................................4
Prefácio à edição em Inglês...........................................6
Introdução.........................................................................7
Prefácio à edição em Português....................................8
Cap. 1 — A eternidade da Sua filiação.........................9
Cap 2 — A deidade da Sua Pessoa..............................27
Cap. 3 — A humanidade da Sua Pessoa.....................43
Cap. 4 — A impecabilidade da Sua Pessoa................53
Cap. 5 — A beleza do Seu ministério.........................72
Cap. 6 — A eficácia do Seu sacrifício..........................93
Cap. 7 — A vitória da Sua ressurreição.................. 108
Cap. 8 — A majestade da Sua ascensão.................. 124
Cap. 9 — A compaixão do Seu sacerdócio............. 134
Cap. 10 — A realidade da Sua vinda........................ 150
Cap. 11 — A glória da Sua aparição......................... 167
Cap. 12 — A supremacia do Seu reino.................... 183
Cap. 13 — A solenidade dos Seus julgamentos..... 196
Prefácio à edição em Inglês
Este livro é o segundo publicado pela revista Assembly Testimony1. O
primeiro, intitulado “A Glória da Sua Graça” foi muito bem recebido por
nossos leitores, e isto nos incentivou a publicar este livro. O objetivo é,
como afirmado no Prefácio do livro anterior, “colocar ensino sadio e Bíblico
nas mãos, especialmente de jovens salvos”. Seria de grande ajuda se santos
mais velhos que lêem estas publicações, encorajassem as gerações mais novas a obterem uma cópia para o seu próprio uso pessoal.
Ao final da sua vida, o apóstolo Paulo escreveu a Timóteo: “Quando
vieres, traze a capa que deixei em Trôade, em casa de Carpo, e os livros,
principalmente os pergaminhos” (II Tm 4:13). Ele queria pergaminhos em
que pudesse escrever e livros para ler. Assim, o valor dos livros é destacado.
Todos os cristãos deveriam ter um desejo de ler, primeiramente a Bíblia, e
depois livros que auxiliam na compreensão das Escrituras. Livros deveriam
ser escolhidos como se escolhe um amigo, e deve-se tomar o cuidado de
confiar somente naqueles que serão de ajuda espiritual. Podemos afirmar
que esta publicação é doutrinariamente pura e auxiliará positivamente todos os que procuram aprender mais sobre o seu amado Senhor e Salvador.
Somos gratos pela pronta colaboração dos autores, todos bem conhecidos pela sua proficiência na exposição das Escrituras. Embora muito ocupados nas suas próprias esferas de serviço para o Senhor, todos assumiram
a tarefa de boa vontade e sem reservas. A natureza deste livro é tal que
alguma repetição é inevitável. Isto é visto como vantajoso, já que enfatiza
verdades divinas. Devemos ressaltar que nenhum dos autores, ou qualquer
pessoa ligada à revista “Assembly Testimony”, recebeu qualquer remuneração por seu trabalho diligente. Foi verdadeiramente um “trabalho de amor”.
O irmão Roy Reynolds cuidou do trabalho editorial no seu costumeiro
modo meticuloso e dedicado. O irmão Walter Boyd deu uma assistência
inestimável, mantendo uma consistência de apresentação e estilo. Nossa
irmã Srta. Joanna Currie gastou horas na tarefa muito necessária, e às vezes
ingrata, de revisão. A estes expressamos nossos profundos e sinceros agradecimentos, sabendo que a sua verdadeira recompensa os aguarda.
Oramos sinceramente para que este livro seja para a honra de nosso
Senhor Jesus e, ao ser lido pelo povo de Deus, que eles cresçam “na graça
e no conhecimento de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo” (II Pe 3:18).
Brian Currie, Irlanda do Norte, março de 2007.
1
Uma revista gratuita publicada por irmãos que se reúnem ao nome do Senhor Jesus
Cristo na Irlanda do Norte. Maiores informações: www.assemblytestimony.org. .
Introdução
Não há nenhuma recordação mais preciosa para o pecador perdoado do que o Nome incomparável do Senhor Jesus Cristo. Não pode haver tema mais envolvente nem assunto mais glorioso do que a Pessoa de
Cristo. No entanto, ao tentar escrever sobre este tópico, nos sentimos tão
inadequados, pois nossas mentes são tão limitadas e nosso vocabulário tão
carente. Sua glória é absolutamente transcendente, Sua vastidão incompreensível, Sua grandeza insondável e Suas belezas indescritíveis. Ele é o
assunto de todas as Escrituras, a substância de todas as sombras e a história
de todos os profetas. Suas glórias singulares, supremas e superlativas desferem raios eternos e imarcescíveis. Ficamos diante de um oceano, infinito
em sua expansão, e ao considerá-lO não podemos senão dizer: “Sim, Ele é
totalmente desejável”. Quão agradecidos devemos ser por ter um conhecimento pessoal dEle como Senhor e Salvador, e por podermos dizer, “Tal é
o meu amado e tal o meu amigo” (Ct 5:16). Que maravilha é que Ele nos
tenha amado!
Neste livro consideramos a Sua eterna e imutável Divindade e O seguimos com corações cheios de admiração e adoração através da Sua encarnação observando a vida humilde e admirável do Irrepreensível Cristo.
Novamente nos regozijamos diante da eficácia do Seu Sacrifício e vemo-lO
agora “assentado na glória onde nossos pecados não mais podem se manifestar” ( J. Denham Smith). Pensamentos sobre a Sua Vinda encorajarão os
nossos débeis esforços e nos capacitarão a “esperar dos céus a Seu Filho” (I
Ts 1:10) com antecipação intensificada.
Somos gratos a todos os nossos amados irmãos que prontamente se
dispuseram a contribuir a este segundo volume de Assembly Testimony.
Todos eles concordariam que mal arranharam a superfície, e a imensidão
da tarefa é enfatizada ao recordarmos as palavras de João 21:25: “Há porém ainda muitas outras coisas que Jesus fez; e se cada uma das quais fosse
escrita, cuido que nem ainda o mundo todo poderia conter os livros que se
escrevessem. Amém”. É a nossa sincera oração que a leitura desta publicação eleve nossos pensamentos a Cristo, inspire adoração e conduza a uma
apreciação mais profunda do incomparável Amado das nossas almas.
Roy Reynolds, Irlanda do Norte, Março de 2007.
Prefácio à edição em Português
O primeiro livro desta série (“A glória da Sua graça”) foi publicado um
ano atrás, e agradecemos a Deus por ele ter sido bem aceito entre nossos
irmãos aqui no Brasil. É nosso prazer publicar agora um livro que fala um
pouco das “riquezas incompreensíveis de Cristo” (Ef 3:8), em quem “habita
corporalmente toda a plenitude da Divindade” (Cl 2:9). É impossível esgotar este assunto — como compreender plenamente esta Pessoa divina que
é “mais sublime do que os Céus”, e “perfeito para sempre” (Hb 7:26, 28)?
Mas podemos (e devemos) nos esforçar para conhece-lO melhor, e é esta a
proposta deste livro. Temos certeza que este estudo sobre a Pessoa e a obra
do nosso amado Salvador, o Senhor Jesus Cristo, irá enriquecer a todos os
salvos que amam aquele que, sendo rico, por amor de nós Se fez pobre, para
que pela Sua pobreza nós pudéssemos enriquecer (II Co 8:9).
Agradecemos aos responsáveis pela revista Assembly Testimony pela sua
cooperação tão importante nesta obra, e pelos diversos irmãos e irmãs que
voluntariamente usaram seu tempo e talentos na produção deste livro. Novamente agradecemos a Deus pela oportunidade que Ele nos deu, através
dos Seus servos na Irlanda do Norte e no Brasil, de oferecer este livro gratuitamente aos nossos irmãos e irmãs no Brasil, Portugal e Angola.
Louvado seja Deus pela Sua glória eterna revelada em Seu glorioso
Filho.
Pirassununga, Maio de 2012.
Poderoso Criador,
Paciente e bom Pastor,
Portentoso Redentor;
Que sublime Salvador!
Pendurado em meu lugar,
Morto para me salvar,
Padecendo por amor!
Que sublime Salvador!
Cap. 1 — A eternidade da Sua filiação
por Walter A. Boyd, Irlanda do Norte
Uma introdução à doutrina
A doutrina da preexistência pessoal de Cristo como uma Pessoa
da Divindade anterior à Sua encarnação, é aceita como algo estabelecido pela maioria dos que defendem a fé ortodoxa como encontrada
nas Santas Escrituras. Entretanto, em alguns círculos, nos últimos cem
anos, houve uma diminuição na fidelidade a isto como uma doutrina
fundamental; e alguns erros, que eram muito comuns nos dias imediatamente posteriores aos apóstolos, têm reaparecido. Alguns negam
completamente a preexistência eterna da Pessoa de Cristo, e geralmente o seu erro é facilmente identificado e prontamente rejeitado como
uma heresia blasfema. Todavia, há uma blasfêmia mais sutil contra a
Divindade que não é sempre reconhecida. Trata-se da ideia enganadora
que Cristo existia antes da Sua encarnação como a Palavra Eterna (o
Verbo), mas veio a ser o Filho somente na Sua encarnação. Aqueles
que espalham este erro alegam aceitar a Sua deidade absoluta, e citam
João 1 como aparente confirmação. Eles até chegam a afirmar que a sua
rejeição da eterna Filiação tem por finalidade proteger a doutrina de
Cristo de erro!
O propósito deste capítulo, então, é mostrar, através das Sagradas
Escrituras, que a Pessoa de nosso Senhor Jesus Cristo existiu eternamente como o Filho de Deus, e Se tornou carne no Seu nascimento. A
encarnação não afetou o relacionamento sem origem de Cristo como
Filho com Seu Pai, nem Sua divindade essencial que é, em todos os aspectos, absoluta. Como em qualquer doutrina, nossa única autoridade é
a Palavra de Deus escrita, e ela será nossa suprema corte de apelo nestas
questões vitais.
A importância da doutrina
O fato triste é que alguns, embora não defendam estes erros, dirão
que não é realmente uma questão tão importante, e que qualquer disputa seria apenas um exercício de minúcias teológicas insignificantes e
periféricas. Este é provavelmente um perigo ainda maior para a integridade da sã doutrina do que um ataque aberto e reconhecível à verdade
concernente à bendita Pessoa do Senhor Jesus.
10
A glória do Filho
Há muitos assuntos sobre as quais os irmãos podem discordar, mas
esta é uma doutrina que é vital à fé, pois está relacionada à realidade da
Pessoa de Cristo e como entendemos essa realidade. A doutrina da eterna Filiação de Cristo não é o resultado de curiosidade intelectual; é o
resultado de uma consideração séria daquilo que as Sagradas Escrituras
ensinam sobre a Pessoa e obra de nosso Senhor Jesus Cristo.
Somente um Cristo que fosse plenamente divino e plenamente humano poderia providenciar a salvação que o homem pecador necessitava. A doutrina da salvação exige um Salvador que, não somente existia
na eternidade, mas também Um cuja existência estava no relacionamento do Filho para com o Pai. Se a doutrina da Sua eterna Filiação
é diminuída, uma reação em cadeia é posta em movimento, que ataca
diversas doutrinas primordiais:
• A infalibilidade da Palavra de Deus, na qual o Pai claramente fala
de Jesus Cristo como Seu Filho antes da encarnação (mais adiante no capitulo examinaremos o testemunho claro de passagens tais
como João 1, Colossenses 1, e Hebreus 1).
• A natureza essencial de Cristo como uma das Pessoas da Divindade, que depois relega a Sua Filiação a um mero cargo ou função
(mais adiante consideraremos Escrituras que ensinam a natureza
essencial do Filho de Deus, que pessoalmente tem os atributos
completos e totais da deidade).
• O ensino das Sagradas Escrituras e a compreensão do próprio
Salvador em relação à expressão Filho de Deus. Quando Cristo
reivindicou ser o Filho de Deus os judeus entenderam que Ele estava reivindicando igualdade com Deus, por isso se enraiveceram e
procuravam matá-lO ( Jo 5:17-23). Estes versículos mostram que
quando Jesus reivindicou ser o Filho de Deus, não era uma afirmação de inferioridade, antes de igualdade com o Pai.
• A eterna Paternidade de Deus; pois, se Cristo não foi sempre o
Filho, então o Pai não foi sempre o Pai. Isto apresenta uma grande
dificuldade para explicar a verdade que “o Pai enviou seu Filho para
Salvador do mundo” (I Jo 4:14).
• A preciosa doutrina da salvação, como encontrada no Filho que
veio a pedido do Pai; pois a salvação tem que ser encontrada no
Filho que o Pai deu para morrer.
A eternidade da Sua filiação 11
A eterna Filiação de Cristo é, portanto, um assunto importante.
É um fundamento inegociável da fé cristã. Temos que usar de grande
cautela na nossa linguagem e tomar todo o cuidado possível ao ocupar
nossas mentes com qualquer coisa relacionada à Pessoa do Filho de
Deus. Não podemos ser displicentes quanto à linguagem, nem inconsistentes no raciocínio.
As implicações da doutrina
Nossas considerações nos ajudarão a compreender as implicações
da doutrina e entender por que o apóstolo João fala sobre isto com tanta
seriedade, na sua segunda epístola. Fazemos bem em atentar para a sua
advertência: “Todo aquele que prevarica, e não persevera na doutrina
de Cristo, não tem a Deus. Quem persevera na doutrina de Cristo, esse
tem tanto ao Pai como ao Filho. Se alguém vem ter conosco, e não traz
essa doutrina, não o recebais em casa, nem tampouco o saudeis. Porque
quem o saúda tem parte nas suas más obras” (II Jo 9-11). João enfatiza
a importância de tomar uma posição firme frente a estas doutrinas, e
destaca três estágios envolvidos na negação da verdade:
• “Todo aquele que prevarica e não persevera na doutrina de Cristo”
(II Jo 9);
• “Se alguém vem ter conosco e não traz essa doutrina” (II Jo 10);
• “Porque quem o saúda tem parte nas suas más obras” (II Jo 11).
O v. 9 claramente se refere àqueles que têm aceitado o erro em relação à doutrina da Pessoa de Cristo e têm se afastado do que as Sagradas
Escrituras ensinam. João diz que isto é pecado. A doutrina de Cristo
abrange tudo que é revelado sobre Ele na Palavra de Deus. Listar estas
doutrinas não deve ser entendido como a criação de um Credo; mas é
claro que precisamos incluir a Sua deidade essencial, Seu nascimento
virginal (isto é, da virgem), Sua humanidade impecável, Sua igualdade
na Divindade, Sua eterna Filiação, Sua morte expiatória, Sua ressurreição corporal, Sua ascensão e Sua volta gloriosa. A doutrina de Cristo,
como revelada nas Escrituras, é vital e fundamental para a fé Cristã, e
precisa ser confirmada e protegida com tal.
O v. 10 parece ir um passo adiante. João identifica não aqueles que
propagam ensino errôneo sobre Cristo, mas aquele que “não traz este
ensino”, isto é, aqueles que nem confirmam nem negam a doutrina de
12
A glória do Filho
Cristo, mas que procuram ficar entre os dois. Estes não são fiéis ao que
João ensinou em relação a Cristo, e deixam a porta bem aberta para a
disseminação do mal corruptível. Não pode haver neutralidade quanto
à doutrina de Cristo: ela é central para a fé cristã e a comunhão. No v. 9
o erro é ir longe demais — além daquilo que está escrito. No v. 10 o erro
é não ir longe o bastante — recusando apegar-se àquilo que está escrito.
O v. 11 leva as coisas a um estágio mais avançado. Não somente
é errado ensinar o erro ou ficar neutro, João deixa claro que é errado
“saudar” aqueles que fazem estas coisas. “Saudar” aqui é desejar a bênção
de Deus sobre a viagem de alguma pessoa e seus objetivos. O ensino de
João é claro: um cristão não deve ter comunhão com (receber em sua
casa), nem mostrar parcialidade a (saudar), qualquer um que ultrapassa
ou que não apóia o que as Escrituras ensinam sobre a Pessoa de Cristo.
A ordem em II Jo 9-11 se aplica àqueles que, deliberadamente, se
afastaram da verdade da doutrina de Cristo, ou que adotam um meio
termo com más intenções. Temos que ser cuidadosos e lembrar do conselho de Judas na sua epístola (vs. 22, 23). Judas faz diferença entre
aqueles que propagam erro, e aqueles que foram, inadvertidamente, levados pela maré do erro, ou que foram confundidos pelos debates, ao
ponto de não saberem mais em que acreditar. Dos tais, ele diz, “apiedai-vos de alguns, usando de discernimento; e salvai alguns com temor,
arrebatando-os do fogo”. Se alguém que lê este livro tem sido exposto
a estes erros, esperamos que a consideração destas grandes verdades o
ajudarão a compreender o que Deus ensina na Sua Palavra em relação
ao Seu eterno Filho.
Ao consideramos a eterna filiação de Cristo, vamos lembrar que é
necessário reconhecer a nossa insuficiência humana para escalar estas
imponentes alturas. Embora as Escrituras nos encorajem a examinar
estes picos majestosos de verdade com reverência, realmente não podemos compreender plenamente Aquele que é eterno e Divino. Nossas
mentes limitadas nunca poderão entender a infinidade de Deus. Todavia, embora nunca possamos entender a Deidade ao ponto de ter
uma plena compreensão, podemos compreender a doutrina de Cristo
ao ponto de ter fé e confiança naquilo que Deus diz.
A eternidade da Sua filiação 13
A história do debate
O título “Filho Unigênito de Deus”, ou “Filho”, em qualquer aspecto, como aplicado ao nosso Senhor Jesus, tem sido uma fonte de
controvérsia desde os tempos dos primeiros pais da igreja. Alguns deles
apoiavam uma grande variedade de pontos de vista errôneos que, através dos séculos, têm levado a muitas teorias e contra-teorias. Origenes
ensinou que Cristo é de Deus, mas não é o Próprio Deus. Ele foi gerado
não no tempo, mas na eternidade. Arius ensinou que Deus não fora
sempre o Pai. Em algum ponto na eternidade Ele estava sozinho, mas
antes da Criação, o eterno Deus fez o Filho e O adotou como Seu Filho.
Em séculos posteriores os Reformadores energicamente rejeitaram o
erro de Arius, mas ao tentar escapar desse erro, alguns deles inventaram
o conceito de “eterna geração”. Entretanto, a doutrina da eterna geração
também não pode ser sustentada como Bíblica. Tudo o que ela faz é empurrar o “quando” da Filiação de Cristo para mais distante no passado,
para mais longe da encarnação, mas sem uma explicação convincente.
Felizmente, alguns Reformadores adotaram o ponto de vista de outros
Pais da Igreja antes deles, e ensinaram que a palavra “gerado” (“unigênito” significa “único gerado”) quando aplicada ao Filho de Deus significa
um relacionamento inexplicável, e não um acontecimento. W. E. Vine
resume isto muito bem ao dizer: “o fato da palavra ‘gerado’ ser aplicada
ao relacionamento do Filho com o Pai não significa um começo da Sua
Filiação. De fato, sugere relacionamento, mas não deve ser confundido com geração como aplicado ao homem. Tentar formar nossas ideias
sobre relacionamento Divino de acordo com o nosso conhecimento de
relacionamentos humanos é simplesmente revelar nossa ignorância. A
mente finita não pode conceber aquilo que é infinito, nossas limitações
de tempo e percepção impedem nossa plena compreensão do eterno”.
Neste último século o debate tem sido mais fácil de acompanhar.
Os pontos principais, ou significativos, estão divididos em dois cabeçalhos: “Filiação Eterna” e “Filiação Temporal”. O ponto de vista da Filiação Temporal nega o ensino das Escrituras e é baseado na falsa premissa
de que o Verbo Eterno se tornou o Filho de Deus no Seu nascimento.
Alguns que apóiam esse ponto de vista podem não estar plenamente
cônscios do erro que ele contém, nem do erro maior que emana dele.
Um leve desvio da linguagem Bíblica leva a um desvio da verdade Bíblica. É necessário que o povo de Deus conheça os sérios erros envolvidos
14
A glória do Filho
e para onde eles podem conduzir.
Nas igrejas exclusivistas na Grã-Bretanha, F. E. Raven mencionou
os erros da “Filiação Temporal” no final do século XVIII. Ele era um
senhor inglês que ocupava um posto nobre no serviço do Governo e
empregou a sua vida no estudo e ensino da Palavra de Deus. Raven se
destacou de modo desfavorável entre seus irmãos em Londres por ensinar que a vida eterna é um estado, e não uma nova vida concedida por
Deus. Ele ensinou ainda que o novo nascimento, ou nascer de novo, era
para crer, e não através do crer. Este erro nada tem a ver com a Filiação
Temporal, mas é mencionado aqui por esta lição salutar: aqui estava um
homem que persistia num tipo de erro, e logo se encontrou absorvendo
e disseminando algo muito mais sério. O primeiro erro será reconhecido
por todos que têm sido expostos aos escritos dos ensinadores Reformadores que ensinavam que, pelo fato dos pecadores estarem mortos
em ofensas e pecados, eles precisam ser “vivificados” antes de poderem
exercer fé em Cristo para a salvação. Persistir na propagação de qualquer erro exige que a mente esteja deliberadamente fechada à verdade
evidente; mas fechar a mente à verdade deixa um cristão suscetível a
outras formas de ensino errôneo. Raven se destacou novamente quando
ensinou que na encarnação nosso Senhor não era um homem real. Estes
pontos de vista também causaram uma terrível divisão e controvérsia.
A comunhão das igrejas que seguiam a Raven foi novamente dividida
pelo aparecimento de um ensino que negava abertamente a Filiação
eterna de Cristo. Infelizmente isto atraiu muitos, que ajudaram na sua
propagação. O Sr. William Kelly escreveu um excelente artigo, expondo
Raven como “heterodoxo quanto à vida eterna sobretudo quanto à Pessoa de Cristo”. Em 1929 James Taylor Sênior trouxe o mesmo ensino,
de um modo mais público. Ele foi apoiado pelo bem conhecido ensinador e escritor prolífico C. A. Coates. Como antes, este erro doutrinário
causou uma divisão generalizada e um sentimento de desconforto entre
irmãos.
O triste fato é que cada um desses homens afirmou, repetidamente,
que a sua doutrina preservaria a pureza do que as Escrituras ensinavam
sobre Cristo! Eles haviam se convencido a si mesmos, e a muitos outros,
que estavam defendendo o caráter de Cristo, e sua sinceridade não é
questionada. Os escritos destes três homens, Raven, Taylor e Coates,
devem ser evitados por todos aqueles que querem evitar o erro deles. O
A eternidade da Sua filiação 15
engano da Filiação Temporal surge de tempos em tempos, e em cada
ocasião provoca controvérsia. Geralmente é mais sábio ocultar a história
de divisão; mas para sermos sábios no presente, e fazer ajustes para o
futuro, temos que conhecer o passado. Um conhecimento de história
é importante. Há pelo menos três lições óbvias neste triste relato. Primeiramente, a propagação forçosa de uma doutrina que não encontra
pronta aceitação de homens sábios e espirituais, causa divisão. Segundo,
o erro tolerado na mente se transforma em completa rejeição de verdades fundamentais. Terceiro, e talvez a mais importante, fechar a mente
para a verdade de Deus, claramente revelada e propagar uma doutrina
errônea, levará a outros erros mais sérios.
Uma objeção comum à doutrinada de Filiação Eterna é que em
nenhum lugar da Bíblia encontramos as palavras “Filho eterno”; nem
há um versículo específico que diz ser Cristo o eterno Filho de Deus.
Adotar esse raciocínio é implementar a lógica imperfeita através da qual
seitas falsas chegam a alguns dos seus ensinos errôneos. Por exemplo,
algumas seitas nos dizem que em nenhum lugar da Bíblia, Cristo é
chamado de “Deus, o Filho”, portanto Ele não é Deus. Com certeza um estudo objetivo e indutivo da Palavra de Deus deveria produzir
uma conclusão mais razoável do que esta, não? A ausência das palavras
“Trindade”, “substituição”, “arrebatamento” ou “milênio” afetam nossa
aceitação destas doutrinas? Certamente que não! Veremos que as Escrituras dão um testemunho claro e adequado do fato que Cristo é o Filho
de Deus e é eterno na Sua Pessoa. De fato, a singularidade do título “o
Filho de Deus” indica Sua preexistência eterna; pois como o Filho Ele
tem todos os atributos da divindade, que incluem a eternidade.
Provas bíblicas
Olharemos agora brevemente várias passagens das Escrituras que
oferecem evidências suficientes da eterna Filiação de Cristo. Seria impossível no âmbito de um único capítulo incluir todas as provas Bíblicas, mas ofereceremos o bastante para satisfazer uma mente racional.
Provérbios 30:4
“Quem subiu ao céu e desceu?
Quem encerrou os ventos nos seus punhos?
Quem amarrou as águas numa roupa?
16
A glória do Filho
Quem estabeleceu todas as extremidades da terra?
Qual é o Seu nome e qual é o nome do Seu Filho, se é que o sabes?”
As respostas às primeiras quatro perguntas são, sem dúvida alguma,
Deus. A última, “e qual é o nome do Seu Filho?” manifesta a existência
do Filho de Deus pelo menos 700 anos antes da encarnação do Senhor
Jesus.
Isaías 9:6
“Porque um Menino nos nasceu, um Filho se nos deu…”.
É muito importante notar a diferença nas palavras usadas aqui pelo
Espírito Santo; um menino “nasceu”, e um Filho “se nos deu”. O Filho
de Deus não nasceu. O nascimento do menino Jesus era a doação do
Filho de Deus ao mundo. Ele já era o Filho, e foi dado como tal.
Miquéias 5:2
Falando de Belém o Espírito de Deus, registra,
“… de ti Me sairá o que governará em Israel e cujas saídas são desde os tempos
antigos, desde os dias da eternidade.”
O futuro Messias, Jesus Cristo o Filho de Deus é “desde os dias da
eternidade”.
Evangelho de João: João 1:1-5; 9-18
“No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele
estava no princípio com Deus. Todas as coisas foram feitas por Ele, e sem Ele
nada do que foi feito se fez. nEle estava a vida, e a vida era a luz dos homens.
E a luz resplandece nas trevas, e as trevas não a compreenderam … Ali estava a Luz verdadeira, que ilumina todo o homem que vem ao mundo. Estava
no mundo, e o mundo foi feito por Ele, e o mundo não O conheceu. Veio para
o que era Seu, e os Seus não O receberam. Mas, a todos quantos O receberam,
deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, aos que crêem no Seu nome; os
quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do
homem, mas de Deus. E o Verbo Se fez carne, e habitou entre nós, e vimos a
Sua glória, como a glória do Unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade.
João testificou dEle, e clamou, dizendo: Este era aquele de quem eu dizia: O
que vem após mim é antes de mim, porque foi primeiro do que eu. E todos
nós recebemos também da Sua plenitude, e graça por graça. Porque a lei foi
dada por Moisés; a graça e a verdade vieram por Jesus Cristo. Deus nunca foi
A eternidade da Sua filiação 17
visto por alguém. O Filho unigênito, que está no seio do Pai, esse O revelou.”
Os primeiros dezoito versículos do Evangelho de João tratam da
Pessoa e obra de Cristo, e contém evidência irrefutável de duas verdades: Sua preexistência eterna e Sua Filiação.
Primeiramente, João mostra que o Verbo, que é eterno e é Deus no
v.1, é Aquele que “Se fez carne e habitou entre nós” (v. 14). O versículo
14 explica que Jesus, o Verbo eterno encarnado, é de fato, o “Unigênito
do Pai”. O v. 18 continua explicando que a expressão “o Unigênito do
Pai” significa que Ele é o “Filho Unigênito”. Isto declara a verdade óbvia
que Jesus, que viveu entre os homens, é o Verbo eterno; e que o Verbo
eterno é o Filho Unigênito de Deus. O “Verbo” e o “Filho” são uma e a
mesma Pessoa eterna.
Em segundo lugar, quanto à Sua obra, João explica que o Verbo
Eterno mediou a Criação completa. “Todas as coisas foram feitas por
Ele e sem Ele nada do que foi feito se fez” (v. 3). Dentro dos limites destes dezoito versículos estão verdades relacionadas à Filiação eterna de
Cristo que são de magnitude eterna. O Verbo é eterno; o Verbo é Deus,
mas não é o Pai; o Verbo foi o Criador de todas as coisas; o Verbo Se fez
carne e habitou entre os homens; o Verbo é o Unigênito Filho de Deus.
Devemos nos curvar em profunda adoração ao contemplarmos a beleza
e a glória das verdades aqui apresentadas. Ele era o Filho enquanto aqui
na Terra. Ele era o Filho na Criação, Ele era o Filho na eternidade antes
da Criação. O Filho de Deus veio a ser Jesus de Nazaré sem deixar de
ser o que Ele sempre era, e eterno Deus! Junto com o testemunho do
Céu acerca do Filho, o v. 15 registra o testemunho do maior dos profetas: João Batista: “Este era aquele de quem eu dizia: O que vem após
mim é antes de mim, porque foi primeiro do que eu”. João nasceu antes
de Jesus, mas Jesus já existia antes do Seu nascimento e do de João.
João 6:33 e 6:62
“Porque o Pão de Deus é Aquele que desce do céu e dá vida ao mundo.”
“Que seria, pois se vísseis subir o Filho do homem para onde primeiro estava?”
Em várias ocasiões João registra o Salvador dizendo que Ele viera
do Céu ( Jo 6:33), e que voltaria para lá ( Jo 6:62); pelo menos dezoito
vezes Ele Se descreve a Si mesmo como tendo sido enviado pelo Pai.
No Evangelho de João é importante compreender a importância das
18
A glória do Filho
afirmações nas quais o Salvador fala acerca da Sua vinda do Pai e para
o Pai. Sua origem como Filho de Deus desde os Céus é muito importante, do contrário Ele não seria nosso Salvador. Foi “o Filho” a Quem
o Pai enviou “para ser o Salvador do mundo” (I Jo 4:14, NVI). Seu destino celestial também é importante, pois a ascensão é o selo celestial de
aprovação da obra sacrificial do Filho para a salvação. O Senhor Jesus
diz que Ele está retornando ao lugar onde Ele estava antes do início da
Sua estadia terrestre.
João 7:28-29
“Clamava, pois, Jesus no templo, ensinando, e dizendo: Vós conheceis-Me e
sabeis de onde Eu sou; e Eu não vim de Mim mesmo, mas aquele que Me
enviou é verdadeiro, o qual vós não conheceis. Mas Eu conheço-O, porque
dEle sou, e Ele me enviou.”
Nestes versículos Cristo declara abertamente que Ele é aquele que
foi enviado pelo Pai; e quando vamos para I João 4:14 lemos que aquele
que o Pai enviou era o Filho: “O Pai enviou Seu Filho para ser o Salvador do mundo”. O Pai enviou aquele que já existia como o Filho; Ele
não veio a ser o Filho para o propósito da missão na qual estava sendo
enviado.
João 8:58
“Disse-lhes Jesus: em verdade, em verdade vos digo que antes que Abraão
existisse, Eu sou.”
A linguagem precisa do Senhor Jesus deve ser observada aqui. “Antes que Abraão existisse, EU SOU”. Ele não disse: “Antes que Abraão
existisse, Eu existia”, mas “Eu sou”. Nos dias do Velho Testamento Deus
usou esta expressão para revelar-Se a Si mesmo como Jeová, o Deus
eterno, e o Filho de Deus a usa no mesmo sentido. O Filho de Deus
é Jeová, o Deus eterno. Independentemente de tempo, Ele existe. Este
versículo ensina Sua deidade e Sua eternidade.
João 12:41
“Isaías disse isto quando viu a Sua glória e falou dEle.”
João acabou de relatar o discurso do Salvador em resposta à pergunta: “Quem é esse Filho do Homem?” ( Jo 12:20-34). Então, em 12:37,
João registra a negrura da incredulidade deles. O Senhor Jesus tinha
feito muitos milagres diante dos seus olhos, e ainda assim não creram
A eternidade da Sua filiação 19
nEle. Citando Isaías 6, João acrescenta um comentário dizendo que Isaías viu a glória de Cristo. Ao citar Isaías 6, João diz, em 12:38-39, que os
judeus não creram em Cristo porque seus olhos haviam sido cegados e
seus corações endurecidos. O que os judeus dos dias de João não viram,
é precisamente o que Isaías vira no seu dia — a glória de Cristo como
o eterno Jeová! Isaías viu a glória do Filho de Deus mais de 700 anos
antes da encarnação.
João 17:1, 5, 11
“Jesus falou assim e, levantando Seus olhos ao céu, disse: Pai, é chegada a hora;
glorifica o Teu Filho, para que também o Teu Filho Te glorifique a Ti … E
agora glorifica-Me Tu, ó Pai, junto de Ti mesmo, com aquela glória que tinha
contigo antes que o mundo existisse … Eu já não estou mais no mundo, mas
eles estão no mundo e Eu vou para Ti”.
Aqui, nos vs. 1 e 5, vemos as palavras do próprio Salvador ao dirigir-Se ao Pai. Isto estabelece o contexto de tudo o que Ele fala em João
17. É o Filho dirigindo-Se ao Pai, e a conversa se dá no contexto daquele relacionamento de Pai e Filho. “Glorifica-me [o Filho], junto de Ti
mesmo, com aquela glória que [Eu, o Filho] tinha contigo [o Pai] antes
que o mundo existisse”. O Senhor Jesus está falando acerca da glória
que Ele tinha, como o Filho junto ao Pai, antes da criação do mundo.
Novamente o testemunho das Escrituras é que Ele já era o Filho de
Deus antes da Criação.
No v. 11, ao antecipar a Sua ascensão e o Seu retorno ao Céu, o
Filho diz ao Pai: “Eu vou para Ti”. Negar que o contexto dos vs. 1-5
é o relacionamento de Pai e Filho tornaria necessário negar também o
relacionamento de Pai e Filho quando o Salvador fala, no v. 11, sobre
Sua ascensão e retorno ao Pai. Fazer isso significa que o Filho não estava retornando ao Pai como o Filho; antes, que Sua Filiação terminou
na ascensão e Ele estaria retornando aos Céus em algum outro relacionamento!
Estas são apenas algumas passagens selecionadas no Evangelho de
João que ensinam sobre a eterna Filiação de Cristo. Ao meditar nelas
e nas outras ocasiões no Evangelho de João quando o Salvador fala de
ter vindo do Pai ou de estar indo para o Pai, lembremos que Aquele que
falou estas palavras, é apresentado por João como “Jesus … o Cristo, o
Filho de Deus” ( Jo 20:31).
20
A glória do Filho
Gálatas 4:4
“Mas, vindo a plenitude dos tempos, Deus enviou Seu Filho, nascido de mulher, nascido sob a lei”.
A palavra traduzida “enviou” é o tempo aoristo grego de exapostello,
que significa “expedir de”; “remeter a”; “mandar embora”; ou “despachar
numa missão”. O radical stello tem dois prefixos1 interessantes. Stello
significa “despachar”, apo quer dizer “desde” e ek significa “fora de”. A
palavra composta significa que o Filho foi enviado desde o e para fora
do Céu para executar uma missão específica sobre a Terra. A ideia clara
é que aquele que foi enviado desde o e para fora do Céu, já existia no
Céu, antes de ser enviado. Aquele que Deus enviou era o Seu Filho; Ele
não se tornou o Filho na ocasião de ser enviado.
Colossenses 1:12-17
“Dando graças ao Pai que nos fez idôneos para participar da herança dos
santos na luz, o qual nos tirou da potestade das trevas, e nos transportou para
o reino do Filho do Seu amor; em quem temos a redenção pelo Seu sangue, a
saber, a remissão dos pecados; o qual é a imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação; porque nEle foram criadas todas as coisas que há nos
céus e na terra, visíveis e invisíveis, sejam tronos, sejam dominações, sejam
principados, sejam potestades. Tudo foi criado por Ele e para Ele. E Ele é
antes de todas as coisas e todas as coisas subsistem por Ele.”
O raciocínio das Escrituras é simples: o Filho do v. 13 é o Filho do
Pai do v. 12, e o criador de todas as coisas do v. 16. O relacionamento
do Pai e do Filho data de antes da Criação. Ele era o Filho antes da
Criação, que aconteceu milhares de anos antes da Sua encarnação.
Hebreus 1:1-3
“Havendo Deus antigamente falado muitas vezes, e de muitas maneiras, aos
pais, pelos profetas, a nós falou-nos nestes últimos dias pelo Filho, a quem
constitui herdeiro de tudo, por quem fez também o mundo. O qual, sendo o
resplendor da Sua glória, e a expressa imagem da Sua Pessoa, e sustentando
todas as coisas pela palavra do Seu poder, havendo feito por Si mesmo a purificação dos nossos pecados, assentou-Se à destra da majestade nas alturas.”
Aqui está uma declaração retumbante da Filiação eterna de Cristo.
Quatro verbos são usados acerca daquele que é descrito no v. 2 como o
1
A palavra aqui é formada de ek + apo + stello: exapostello (N. do E.).
A eternidade da Sua filiação 21
Filho de Deus:
O Filho constituído herdeiro de todas as coisas;
O Filho fez o universo;
O Filho purificou os nossos pecados;
O Filho assentou-Se à destra da majestade nas alturas.
Não há razão para crermos que estes acontecimentos não estão listados na sua ordem cronológica. O Filho foi constituído herdeiro, depois Ele criou o universo, depois disto Ele purificou os nossos pecados
e finalmente Se assentou em glória exaltada no Céu. Isto nos leva diretamente de volta ao Céu antes da Criação. Vemos que a Pessoa que, na
posição de Filho, Se assentou em glória depois da Sua ascensão tinha,
de fato, sido o Filho antes da Criação. Sua obra passada de expiação e
Sua obra presente de mediação estão ligadas à preexistência do Filho
baseado no Seu papel na criação do universo: “E todos os anjos de Deus
O adorem” (Hb 1:6), significa que devemos entender o Filho em termos
de deidade.
Hebreus 2:9
“Vemos, porém, coroado de glória e de honra aquele Jesus que fora feito um
pouco menor do que os anjos, por causa da paixão da morte”.
Para que Jesus fosse feito menor do que os anjos, Ele teria que ter
estado numa posição, no mínimo, de igualdade com eles. Como Deus,
obviamente, Ele tinha uma posição mais elevada do que os anjos; mas o
argumento é que para ser feito menor do que os anjos Ele teria que ter
existido antes daquela posição de humilhação. Isto nos leva de volta ao
“Filho” de 1:2 que, de fato, é Jesus de 2:9. Esta passagem ensina sobre a
Sua preexistência como o Filho.
Hebreus 7:3
“Sem pai, sem mãe, sem genealogia, não tendo princípio de dias nem fim de
vida, mas sendo feito semelhante ao Filho de Deus …”
Lemos de Melquisedeque em Gênesis 14, cerca de 2000 anos antes
da encarnação. O argumento é simples: se o Filho de Deus não existia
naquele tempo, foi Melquisedeque “feito semelhante” a uma entidade
inexistente?
22
A glória do Filho
I João 4:2-3
“Nisto conhecereis o Espírito de Deus: todo espírito que confessa que Jesus
Cristo veio em carne é de Deus; e todo espírito que não confessa que Jesus
Cristo veio em carne não é de Deus; mas este é o espírito do anticristo, do qual
ouvistes que há de vir, e eis que já está no mundo.”
Ao lembrar-se do Salvador a quem amava, João escreve com clareza e simplicidade acerca da sua experiência de acompanhá-lO no Seu
ministério público. No primeiro capítulo da sua epístola, João diz que
O ouviu, O viu, O contemplou e O tocou. O “O” se refere à Palavra da
Vida, que era desde a eternidade. A intenção de João era enfatizar o
fato que Ele era um homem real, com quem João teve contato como
com outros homens. A epístola foi escrita porque alguns estavam negando a Sua encarnação. Em I João 4:2-3 o apóstolo declara que todo
aquele que nega estas verdades reais não é de Deus, e tem o espírito do
anticristo. A encarnação é uma doutrina essencial da fé cristã; negá-la é
negar a Deus e Sua Palavra escrita. A encarnação verdadeira é uma Pessoa Divina assumindo um corpo humano, e requer uma preexistência
verdadeira. Quando João falou sobre “o que era desde o princípio … a
Palavra da Vida” (I Jo 1:1), ele estava se referindo a Cristo e dizendo que
antes da experiência de João com o Cristo encarnado, Ele tivera uma
existência na eternidade. Depois em I João 4:2 ele diz que “Jesus Cristo
veio em carne”. João identifica por nome a Pessoa da Trindade que encarnou: Jesus Cristo. O próximo elo na cadeia do argumento de João se
encontra em I João 3:23, onde João diz : “Seu Filho Jesus Cristo”. Jesus
Cristo é o Filho de Deus. O mesmo Jesus Cristo a quem João serviu
durante o Seu ministério público, aquele Jesus Cristo que é o Filho de
Deus, existia desde a eternidade.
Escrituras problemáticas
Aqueles que negam a eterna Filiação de Cristo geralmente baseiam
sua rejeição sobre, entre outras, duas passagens da Palavra de Deus: Lucas 1:35 e Salmo 2:7. Vamos examinar estes versículos e ver se, como
alguns alegam, eles apresentam Filiação Temporal.
A eternidade da Sua filiação 23
Lucas 1:35
“… por isso também o Santo, que de ti há de nascer, será chamado Filho de
Deus”.
Estas são as palavras ditas pelo anjo a Maria acerca do nascimento
de Cristo. Aqueles que rejeitam a eterna Filiação de Cristo usam estas
palavras do anjo para afirmar que Cristo Se tornou o Filho de Deus
somente no Seu nascimento. As palavras “será chamado” são a tradução do tempo futuro do verbo grego kaleo, que simplesmente significa
“chamar”. Há uma diferença enorme entre “passará a ser o Filho de
Deus” e “será chamado Filho de Deus”. Se Ele começou a ser o Filho
de Deus no Seu nascimento, então Ele não teria tido existência antes
do nascimento.
Neste caso, “será chamado” significa que Aquele que existia previamente na eternidade é agora manifestado entre os homens como a
Pessoa que havia sido prometida como a “tua semente” (Gn 3:15). Há
ainda outra tradução da frase que esclarece o sentido: “Aquele que há
de nascer será chamado santo, o Filho de Deus”. O anúncio do anjo
estava enfatizando que o Filho de Deus que haveria de nascer de Maria
seria conhecido aqui na Terra como santo. Isto corresponde maravilhosamente com a ênfase contida no Evangelho de Lucas sobre o Homem
perfeito. Também é um paralelo com o registro de Mateus da predição
do Antigo Testamento, de que Ele seria caracterizado pela santidade do
Nazireu (Mt 2:23).
Salmo 2:7
“Tu és Meu Filho, Eu hoje Te gerei.”
Esta frase é citada em Atos 13:33 e Hebreus 1:5; 5:5. Primeiramente
devemos notar que as citações na epístola aos Hebreus não identificam
o “quando” da Sua Filiação. Em Hebreus 1:5 a citação serve somente
para mostrar que o nosso Senhor Jesus Cristo é superior aos anjos pelo
fato de ser o Filho de Deus, e anjos nunca foram chamados “Filho”
por Deus. Em Hebreus 5:5, o escritor simplesmente diz que nenhum
homem assume o ofício de sacerdote por si mesmo. Da mesma forma
Cristo recebeu oficialmente, do Seu Pai, a posição de Sumo Sacerdote.
No Salmo 2:7, temos duas expressões muito interessantes: “hoje” e
“Te gerei”.
24
A glória do Filho
“Hoje”. Em hebraico e no grego, um dia1 pode se referir a um período de vinte e quatro horas (Dn 6:10); à luz do dia em oposição à noite
(Gn 1:5); a um ponto específico no tempo (Ez 20:31); a qualquer período de tempo prolongado e não especificado (Hb 3:8; I Pe 2:12; II Pe
3:10, etc.). O uso da palavra “dia” não nos ajuda a identificar o “quando”
da Sua Filiação. O dia mencionado no Salmo 2:7, como citado várias
vezes no Novo Testamento, não é o dia do início da Sua Filiação, mas
da sua manifestação. Como veremos mais adiante, Sua eterna Filiação
foi manifestada em ocasiões diferentes.
“Te gerei”. A palavra usada no Salmo 2:7 não se refere sempre a
uma concepção natural e nascimento como nós o conhecemos. É usada
nas Escrituras em dois sentidos. Primeiro, para falar de geração natural,
que resulta no nascimento de um filho. Segundo, é usada de um relacionamento especial existente entre o Filho e o Seu Pai. Por exemplo,
em Provérbios 27:1 é usado desta maneira: “Não presumas do dia de
amanhã, porque não sabes o que trará à luz (ARA)”. A palavra traduzida “trará à luz” na nossa Bíblia, contém a ideia de um dia gerando os
eventos que acontecem nele. Uma consideração cuidadosa nos mostra
que não está dizendo que este dia específico é responsável por gerar os
eventos que acontecem hoje, no sentido normal da palavra. Está dizendo, sim, que há um relacionamento entre o dia e os eventos que se
dão nele. Em Deuteronômio 32:18 a mesma palavra é usada de Deus
gerando a nação de Israel. Deus não deu à luz a nação de Israel, no sentido normal da palavra, mas Deus deu origem à nação pelo Seu divino
poder, portanto colocou Israel num relacionamento especial com Ele. A
palavra “gerar” não se refere a um acontecimento através do qual o Filho
foi gerado pelo Pai, no sentido normal como entendemos a palavra. É
usada no sentido do relacionamento especial e íntimo que existia entre
o Pai e o Filho. É óbvio que, ao falar do Senhor Jesus, a palavra não
pode ser usada no sentido de geração natural. Na encarnação Ele recebeu um corpo de carne e sangue; e se a expressão fosse usada no seu sentido natural, o gerador também teria tido um corpo de carne e sangue.
Quando aplicada ao Senhor Jesus, então, a palavra precisa ter seu outro
significado, o de um relacionamento especial. Além disso, assim como
“gerar” não se aplica ao nascimento do Salvador, também não se aplica
ao tempo do Seu relacionamento com o Pai. O Pai não transmitiu a Sua
1
No texto da versão em inglês está escrito: “Neste dia Te gerei” (N. do E.).
25
A eternidade da Sua filiação essência Divina ao Filho, pois o Filho era Deus. O Filho possuía todos
os atributos da Deidade, um dos quais é a eternidade — Ele sempre
esteve com o Pai, e é igual ao Pai em todos os aspectos.
Em Atos 13:33 a citação se refere à Sua ressurreição. A ressurreição
é uma daquelas ocasiões na Sua vida que manifestou Cristo como o
eterno Filho de Deus. O Salmo 2:7 era um cântico de vitória para um
rei em Israel que havia derrotado os seus inimigos. A derrota dos inimigos de Israel manifestava que o rei era um homem escolhido por Deus
e indicava o prazer especial de Deus nele. Assim, num sentido mais
elevado, Paulo viu a ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos como
a derrota dos principados, potestades, morte e inferno. Dessa forma,
quando Paulo se refere à Sua ressurreição em Atos 13, ele cita o Salmo
2:7 para mostrar que Cristo, em filiação preexistente, é aquele que foi
escolhido por Deus, aquele no qual Ele tem um prazer especial.
A palavra “unigênito” significa o único de uma espécie, ou singular.
Seu relacionamento com o Pai era o de Filho singular, o único de uma
espécie. Cristo tornou-Se o Filho de Davi, o Filho de Abraão e o Filho
de Maria quando Ele veio a ter um relacionamento com eles, que foi no
Seu nascimento. Se Ele tornou-Se o Filho de Deus no Seu nascimento,
isto significa que Ele não tinha nenhuma ligação ou relação com o Pai
anteriormente. Seguir esta linha de raciocínio significa que se o Filho
não tinha nenhum relacionamento com o Pai antes da encarnação, logo
Ele não tinha nenhum relacionamento com Deus antes do Seu nascimento. Este ponto de vista deve ser totalmente rejeitado.
Conclusão
Negar a eterna Filiação de Cristo é negar a eterna Paternidade de
Deus. Se o Filho Se tornou Filho somente ao nascer, logo o Pai tornou-Se o Pai somente no nascimento de Jesus Cristo. Como era, então,
composta a Trindade antes da encarnação? Este é um assunto no qual
não há espaço para lógica intelectual ou especulação. Temos que abordá-lo em espírito de oração e dependência em Deus para não errarmos
na maneira como falamos do Seu Filho, que é tão querido por Ele. A
doutrina da eterna Filiação de Cristo nos conduz às grandes profundezas de graça e misericórdia que estão no próprio coração de Deus, pois
quando se tratou de fazer algo a respeito da situação dos homens pecadores, Deus não enviou um agente para resolver o problema — Ele veio
26
A glória do Filho
em Pessoa. Deus penetrou nas nossas circunstâncias para restaurar e
redimir a humanidade caída. Este fato é o que dá sentido e confirmação
à verdade que “Deus amou o mundo de tal maneira que deu o Seu Filho
Unigênito” ( Jo 3:16). A linguagem da encarnação pressupõe a preexistência real e pessoal de Cristo; de outro modo não haveria alguém
para se tornar encarnado. A Eterna Filiação de Cristo afeta as grandes
doutrinas de Criação e salvação. Esta verdade sublime deveria produzir
em nossos corações adoração real e sincero comprometimento ao nosso
grande Deus e Salvador, Jesus Cristo.
Cap 2 — A deidade da Sua Pessoa
Por John M. Riddle, Inglaterra
O que pensais vós de Cristo é a prova
Que testa vosso estado e intenção;
Em tudo o mais não tereis razão
Tendo dEle equivocada compreensão1.
(John Newton)
Introdução
“E também o Pai a ninguém julga, mas deu ao Filho todo o juízo; para que
todos honrem o Filho como honram o Pai. Quem não honra o Filho não honra
o Pai que O enviou” ( Jo 5:22-23).
Em resposta à Sua pergunta: “Quem dizem os homens ser o Filho
do homem?” os discípulos responderam: “Uns, João o Batista; outros,
Elias; e outros Jeremias, ou algum dos profetas”. Em resposta à Sua próxima pergunta: “E vós, quem dizeis que Eu sou?” Simão Pedro replicou:
“Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo” (Mt 16:13-16). Mas isso não é
tudo. Um pouco mais tarde, tendo ouvido o que os homens tinham a dizer sobre Ele, e tendo ouvido o que Pedro tinha a dizer sobre Ele, Deus
mesmo declara: “Este é o Meu amado Filho em quem Me comprazo”
(Mt 17:5).
Mas havia incredulidade naquele tempo, como agora; a incredulidade moderna não é nova. Ele não foi reconhecido por muitos e teve
que dizer para a mulher samaritana: “Se tu conheceras o dom de Deus,
e quem é o que te diz, Dá-me de beber, tu Lhe pedirias, e Ele te daria
água viva” ( Jo 4:10). Seus próprios conterrâneos disseram: “De onde
veio a Este a sabedoria e estas maravilhas? Não é Este o filho do carpinteiro? E não se chama Sua mãe Maria, e Seus irmãos Tiago, e José, e Simão, e Judas? E não estão entre nós todas as Suas irmãs? De onde Lhe
veio, pois, tudo isto? E escandalizavam-se nEle” (Mt 13:54-57). Até
mesmo da Sua família foi dito: “nem mesmo seus irmãos criam nEle”
( Jo 7:5) As autoridades religiosas foram além: “Nós bem sabemos que
Deus falou a Moisés, mas este não sabemos de onde é” ( Jo 9:29). O seu
sarcasmo é sutilmente velado. João resume tudo em duas frases: “Estava
1
“What think ye of Christ is the test/ To try both your state and you scheme;/ You cannot
be right in the rest/ Unless you think rightly of Him”.
28
A glória do Filho
no mundo, e o mundo foi feito por Ele, e o mundo não O conheceu.
Veio para o que era Seu e os seus não O receberam” ( Jo 1:10-11).
Foi por causa desta incredulidade e falsa doutrina que dois livros do
Novo Testamento foram escritos: o Evangelho de João e a I Epístola
de João. O apóstolo afirma isto categoricamente perto do final do seu
Evangelho: “Jesus, pois, operou também em presença de Seus discípulos
muitos outros sinais, que não estão escritos neste livro. Estes porém,
foram escritos para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e
para que, crendo, tenhais vida em Seu nome” ( Jo 20:30-31). Devemos
notar que a segurança eterna do cristão se baseia na Divindade de Cristo. Alguém disse que “um Salvador que não é absolutamente Deus é
como uma ponte quebrada bem no final”! Uma afirmação semelhante
ocorre na primeira Epístola de João: “Estas coisas vos escrevi a vós, os
que credes no nome do Filho de Deus, para que saibais que tendes a
vida eterna” (5:13). A Epístola conclui com outra afirmação categórica:
“E sabemos que já o Filho de Deus é vindo, e nos deu entendimento
para conhecermos o que é verdadeiro; e no que é verdadeiro estamos,
isto é, em Seu Filho Jesus Cristo. Este é o verdadeiro Deus [Ele é o
verdadeiro Deus, JND] e a vida eterna” (5:20).
O Evangelho de João foi escrito para dar o conhecimento da salvação: “para que creiais … e para que, crendo, tenhais vida em Seu
nome”. A primeira epístola de João foi escrita para dar a segurança da
salvação: “para que saibais que tendes a vida eterna, vós os que credes”.
Tanto o conhecimento da salvação quanto a segurança da salvação são
garantidas porque o Salvador é o Filho de Deus.
O ensino do Velho Testamento
A deidade de Cristo é ensinada consistentemente através das Escrituras, tanto no Velho como no Novo Testamento. No que diz respeito
ao Velho Testamento, destacamos o seguinte:
Salmo 45:6-7
Falando do Rei, está escrito:
“O Teu trono, ó Deus, é eterno e perpétuo; o cetro do Teu reino é um cetro de
equidade. Tu amas a justiça e odeias a impiedade; por isso Deus, o Teu Deus
Te ungiu com óleo de alegria mais do que a Teus companheiros.”
Esta é uma afirmação muito importante em relação à Sua deidade.
A deidade da Sua Pessoa 29
Trata-se de uma Pessoa Divina dirigindo-Se à outra: “O Teu trono, ó
Deus” — aquele a quem as palavras são dirigidas é Deus. Veja o v. 7:
“por isso Deus, o Teu Deus, Te ungiu” — aquele que fala é Deus. Isto
é confirmado no Novo Testamento: “Mas do Filho diz: Ó Deus, o Teu
trono subsiste pelos séculos dos séculos …” (Hb 1:8-9).
Salmo 110:1
“Disse o Senhor ao meu Senhor: Assenta-Te à Minha mão direita, até que
ponha os Teus inimigos por escabelo dos Teus pés”.
O Hebraico, traduzido literalmente, diz: “O oráculo de Jeová ao
meu Senhor.” Isto faz das próximas palavras uma mensagem direta de
Deus para o Seu Rei. É um oráculo de Jeová — o Deus fiel do concerto,
o Deus imutável. Aqui, o Senhor Jesus é chamado de Adonai, que significa “Soberano Senhor, Mestre, Possuidor, Proprietário” (Newberry).
Também devemos notar Mateus 22:45: “Se Davi, pois, Lhe chama Senhor, como é Seu Filho?”
O Salmo registra a acolhida Divina gozada pelo Senhor Jesus na
Sua ascensão: “Porque Davi não subiu aos céus, mas ele próprio diz:
Disse o Senhor ao meu Senhor: assenta-Te à minha direita, até que ponha os Teus inimigos por escabelo de Teus pés. Saiba, pois, com certeza
toda a casa de Israel que a esse Jesus, a quem vós crucificastes, Deus o
fez Senhor e Cristo” (At 2:34-36). O escritor aos Hebreus pergunta: “E
a qual dos anjos disse jamais, Assenta-Te à minha destra, até que ponha
a Teus inimigos por escabelo de Teus pés?” (Hb 1:13).
Isaías 7:13-14
“Ouvi agora, ó casa de Davi … Eis que a virgem conceberá, e dará à luz um
Filho, e chamará o Seu nome Emanuel”.
O Novo Testamento estabelece com absoluta clareza o significado
desta profecia: “Tudo isso aconteceu para que se cumprisse o que foi
dito da parte do Senhor, pelo profeta, que diz: Eis que a virgem conceberá, e dará à luz um Filho, e chamá-Lo-ão pelo nome de Emanuel,
que traduzido é: Deus conosco” (Mt 1:22-23). Esta é uma afirmação
categórica: “para que se cumprisse”. Não, como em outros casos: “e outra
vez diz a Escritura” ( Jo 19:37), que indica a aplicação de uma passagem do Velho Testamento, em vez da sua interpretação e cumprimento.
As palavras “chamá-lo-ão pelo nome de Emanuel” explicam a razão da
maneira da Sua concepção. E. J. Young, no seu livro The Book of Isaiah
30
A glória do Filho
(O Livro de Isaías) cita João Calvino: “Calvino acertadamente sustenta
que o nome não pode ser aplicado a alguém que não é Deus. Nenhum
outro no Velho Testamento leva este nome. Por estas razões, a profecia
precisa ser interpretada somente em relação àquele a quem estas condições se aplicam, isto é, Jesus Cristo, o Filho da Virgem e o Deus Forte”.
“Emanuel”, que transmite a Sua divindade absoluta, junto com o da Sua
humanidade perfeita, é uma descrição da Sua identidade, mais do que
um nome pelo qual Ele foi conhecido na Terra.
Isaías 9:6
“Porque um menino nos nasceu, um Filho Se nos deu, e o principado está sobre
os Seus ombros, e se chamará o Seu nome: Maravilhoso Conselheiro, Deus
Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz.”
O título “Deus Forte” enfatiza Sua deidade e, portanto, Seu poder.
O trono de Davi parecia especialmente vulnerável quando Acaz reinava
sobre Judá, e depois desapareceu totalmente. O último Reivindicador
foi coroado com espinhos! Mas este trono será ocupado no final pelo
“Deus Forte”! Davi era um rei poderoso, e o Senhor lhe deu “descanso
de todos os seus inimigos em redor” (II Sm 7:1). Mas quem pode se
comparar com o Rei final, de quem é dito: “Eis que reinará um rei com
justiça” (Is 32:1)? “Porque convém que reine até que haja posto a todos
os inimigos debaixo de seus pés” (I Co 15:25).
Isaías 40:3, 9
“Voz do que clama no deserto: Preparai o caminho do Senhor, endireitai no
ermo a vereda a nosso Deus … Tu ó Sião, que anuncias boas novas, sobe a
um monte alto. Tu, ó Jerusalém, que anuncias boas novas, levanta a tua voz
fortemente; levanta-a, não temas, e dize às cidades de Judá: Eis aqui está o
vosso Deus”.
Isto se refere, inicialmente, à pregação de João Batista: “Este é o
anunciado pelo profeta Isaías, que disse: Voz do que clama no deserto:
preparai o caminho do Senhor, endireitai as Suas veredas” (Mt 3:3).
Quando Isaías declara: “Aqui está o vosso Deus”, ele usa a palavra
Elohim para Deus. Isto deve ser comparado com: “Preparai o caminho
do Senhor [Jeová], endireitai no ermo uma vereda a nosso Deus [Elohim]”, e “naquele dia se dirá: Eis que este é o nosso Deus [Elohim] a
quem aguardávamos, e Ele nos salvará; este é o Senhor [Jeová], a quem
aguardávamos; na Sua salvação gozaremos e nos alegraremos” (Is 25:9).
A deidade da Sua Pessoa 31
Estas passagens enfatizam a deidade do Senhor Jesus, de quem João
Batista disse: “Eu na verdade batizo-vos com água, mas eis que vem
aquele que é mais poderoso do que eu, do qual não sou digno de desatar
a correia das alparcas” (Lc 3:16).
Zacarias 13:7
“Ó espada, desperta-te contra o Meu Pastor, e contra o homem que é o Meu
companheiro, diz o Senhor dos exércitos. Fere ao Pastor, e espalhar-se-ão as
ovelhas”.
Isto enfatiza a Sua deidade: “O homem que é o Meu companheiro”.
A palavra “homem” aqui significa “um homem forte”. A palavra “companheiro” tem diversas traduções: “o homem da Minha união”; “um homem coigual Comigo”; “o homem Meu igual”. É preciso dizer mais?
Ele é o Divino Pastor. Ele é igual a Deus. Ele mesmo disse: “Eu e o Pai
somos um” ( Jo 10:30).
Malaquias 3:1
“Eis que Eu envio o Meu mensageiro, que preparará o caminho diante de
Mim, e de repente virá ao Seu templo o Senhor [Adonai], a quem vós buscais …”.
Este versículo enfatiza claramente a deidade do Senhor Jesus. Ele é
o “Deus do juízo”, que diz: “Eis que Eu envio o Meu mensageiro, que
preparará o caminho diante de Mim”. João Batista, “Meu mensageiro”, preparou o caminho para o Senhor Jesus que é, portanto, ninguém
menos que o Próprio Deus. Isto é confirmado pela segunda afirmação:
“… virá ao Seu templo o Senhor [Adonai], a quem vós buscais”. Este
versículo notável enfatiza, portanto, tanto a deidade do Senhor Jesus,
como a Sua identidade distinta.
O ensino do Novo Testamento
Estas belas passagens do Velho Testamento são plenamente corroboradas no Novo Testamento, onde o assunto da deidade do nosso
Senhor é constantemente e consistentemente destacado. Ele é descrito como “a imagem do Deus invisível” (Cl 1:15), “a expressa imagem
da Sua [de Deus] Pessoa” (Hb 1:3). No Novo Testamento, o Espírito
Santo usa duas palavras gregas quando descreve o Senhor Jesus como a
“imagem de Deus”.
32
A glória do Filho
Eikon
Esta palavra é usada em Colossenses 1:15, como vimos acima, e
em II Coríntios 4:4: “para que lhes não resplandeça a luz do evangelho
da glória de Cristo, que é a imagem de Deus”. Como a “imagem de
Deus”, Cristo é “essencialmente e absolutamente a expressão perfeita e
a representação de Deus. Como a ‘imagem do Deus invisível’, Cristo é a
representação visível e a manifestação de Deus aos seres criados” (W. E.
Vine). Compare Hebreus 10:1: “Porque tendo a lei a sombra dos bens
futuros, e não a imagem exata das coisas”.
A mesma palavra eikon ocorre em Mateus 22:20: “de quem é esta
efígie [imagem] e esta inscrição?”; I Coríntios 11:7: “O homem, pois,
não deve cobrir a cabeça, porque é a imagem e a glória de Deus”; Apocalipse 13:15: “E foi-lhe concedido que desse espírito à imagem da besta”.
Em cada caso, “imagem” não é a realidade; ela representa e manifesta a
realidade. No caso de uma moeda, a imagem irá mudar no prosseguir do
reino; mas Cristo não. Ele não envelhece nem degenera! O Senhor Jesus, porém, não simplesmente representa a realidade, Ele é Deus absoluta e essencialmente. Ele não é a semelhança do Deus invisível, mas a
“imagem do Deus invisível”. Somente Ele manifestou a Deus. Veja João
1:18: “Deus nunca foi visto por alguém. O Filho Unigênito, que está no
seio do Pai, esse O revelou”; João 14:9: “Quem Me vê a Mim vê o Pai”.
NEle estão manifestos a própria natureza e atributos de Deus pelo Seu
poder, onisciência, santidade e amor. Neste aspecto temos que distinguir
entre Adão e Cristo. Adão foi feito à “imagem de Deus” (Gn 1:26-27),
e os homens são “feitos à semelhança de Deus” (Tg 3:9). Em contraste,
o Senhor Jesus não foi feito à “imagem de Deus” — Ele é Deus.
Charakter
Esta palavra é usada em Hebreus 1:3: “o qual sendo o resplendor
da Sua glória, e a expressa imagem da Sua [de Deus] Pessoa”. Charakter, que vem de um verbo que significa “estampar”, ou “gravar”, originalmente significava o instrumento usado para estampar, que nós
chamamos de “carimbo”, ou “molde”, mas veio a significar também a
marca feita pelo instrumento. Assim como todas as características da
impressão correspondem exatamente ao instrumento que os faz, também Cristo possui a exata impressão da natureza e caráter divinos (M.
R. Vincent/ W. E. Vine). As palavras “expressa imagem da Sua Pessoa”,
A deidade da Sua Pessoa 33
ou “expressão da Sua substância” ( JND) enfatizam que todos os atributos de Deus pertencem a Ele; nada está faltando. Veja Colossenses 2:9:
“Porque nEle habita corporalmente toda a plenitude da divindade”. Em
relação a isto, temos que notar a ligação com o versículo anterior: “Tende cuidado para que ninguém vos faça presa sua, por meio de filosofias
e vãs sutilezas, segundo a tradição dos homens, segundo os rudimentos
do mundo, e não segundo Cristo, porque nEle habita corporalmente
toda a plenitude da divindade”. Por um lado, temos o vazio da filosofia,
e por outro temos a perfeita revelação de Deus em Cristo. No primeiro
caso é uma especulação, e no segundo é uma revelação. Em Cristo habita toda a plenitude (inteireza) da Divindade absoluta, essencialmente
e perfeitamente: a própria Personalidade de Deus. Como W. Kelly destaca: “a plenitude da Divindade nunca habitou no Pai corporalmente,
nem no Espírito Santo, mas somente em Cristo”. Deus é conhecido
por causa da encarnação. Assim, “nEle habita corporalmente toda a
plenitude da Divindade”. Não há nada de incerteza aqui. O Senhor
Jesus é “Deus [que] se manifestou em carne” (I Tm 3:16). Ele é Aquele
de quem João escreveu: “O que era desde o princípio, o que vimos com
os nossos olhos, o que temos contemplado, e as nossas mãos tocaram da
Palavra da Vida” (I Jo 1:1).
A ênfase de João
Visto que, como notamos, João escreveu “para que creiais que Jesus
é o Cristo, o Filho de Deus” ( Jo 20:31), podemos esperar que o apóstolo
coloque uma grande ênfase neste fato, e agora destacamos a maneira
como ele trata este assunto sobremodo importante. Isto nos levará a
considerar outras passagens do Novo Testamento que tratam de diferentes aspectos deste grande tema.
Se o Senhor Jesus é Deus, Ele precisa ser eterno
Deus é eterno: “O Deus eterno é a tua habitação, e por baixo estão
os braços eternos” (Dt 33:27). João se refere à eternidade do Senhor Jesus no começo do Seu Evangelho: “No princípio era o Verbo, e o Verbo
estava com Deus, e o Verbo era Deus” ( Jo 1:1). A expressão “o Verbo”
equivale de modo abreviado à expressão “Palavra do Senhor” do Velho
Testamento. Ela revela o Deus invisível. Temos que notar rapidamente
o seguinte:
34
A glória do Filho
Sua eternidade
“No princípio era o Verbo”. João não diz “desde o princípio”, mas
“no princípio”. Ele estava eternamente presente. A expressão “no princípio” se refere a uma condição, e não a um começo.
Sua igualdade
“E o Verbo estava com Deus”. Estas palavras são explicadas como
sendo uma “intercomunhão perpétua”. Ele estava e permanece “face a
face com Deus”. Isto é enfatizado em Filipenses 2:6: “Que sendo em
forma de Deus, não teve por usurpação ser igual a Deus”, onde a palavra “igual” está, realmente, no plural. O Senhor Jesus estava e está em
igualdades com Deus. Em todos os aspectos e em cada detalhe, Ele
corresponde à Deidade absoluta.
Sua Deidade
“E o Verbo era Deus.” Olhando novamente para Filipenses 2:6,
temos que notar que embora Ele “tomou a forma de servo, fazendo-Se
semelhante aos homens” (v.7), Ele nunca “tomou sobre Si a forma de
Deus” nem “foi feito à semelhança de Deus”. A palavra sendo, na expressão “sendo em forma de Deus”, enfatiza a Sua eterna deidade. W.E.
Vine ressalta que o verbo “sendo” (huparcho) “evidencia a existência de
uma pessoa anterior ao que é afirmado sobre ela”, e dá uma série de
ilustrações, tiradas do Novo Testamento, incluindo Atos 2:30.
A palavra “forma” (morphe) “indica a forma especial ou característica de uma pessoa” (W.E. Vine). Vine cita Gifford (The Incarnation of
Christ):
“Morphe é propriamente a natureza ou essência … como subsistindo permanentemente no indivíduo, e retida pelo tempo que o
indivíduo existe … morphe Theo (a ‘forma de Deus’) é a natureza
Divina verdadeiramente e inseparavelmente subsistindo na Pessoa
de Cristo”.
A palavra é usada novamente no v.7: “tomou a forma de servo”.
As palavras consideradas acima, “sendo em forma de Deus”, devem ser comparadas com Hebreus 1:3: “O qual sendo o resplendor da
Sua glória”. Isto enfatiza Sua natureza essencial, independentemente
de tempo. Ele é o esplendor, a excelente resplandecência da glória de
A deidade da Sua Pessoa 35
Deus. Foi dito que “a glória divina que foi vista na Shekinah, a nuvem
que repousava sobre o Tabernáculo, é agora plenamente manifestada
em Cristo, a verdadeira Shekinah”. Embora “Deus falou aos pais pelos
profetas” (onde havia uma distinção de identidade entre Deus e os Seus
servos) Ele, nestes últimos dias, “falou-nos … pelo Filho” (onde não há
distinção de natureza entre Deus e Seu Filho). JND diz: “falou-nos na
pessoa do Seu Filho” (Hb 1:1-2).
Sua personalidade distinta
“Ele estava no princípio com Deus”. Embora o Senhor Jesus dissesse: “Eu e Meu Pai somos um” ( Jo 10:30), Ele também disse: “Saí do Pai,
e vim ao mundo; outra vez deixo o mundo, e vou para o Pai” ( Jo 16:28).
João tem mais a dizer em relação a este aspecto da Deidade do Senhor. Em resposta à pergunta: “Ainda não tens cinquenta anos, e viste
Abraão?”, o Senhor disse: “Em verdade, em verdade vos digo que antes
que Abraão existisse, Eu Sou”. Os judeus entenderam perfeitamente a
Sua reivindicação. Ele afirmara a Sua Deidade absoluta. “Então pegaram em pedras para Lhe atirarem” ( Jo 8:57-59). Novamente, tendo dito:
“Eu e o Pai somos um”, os judeus disseram: “Não te apedrejamos por
alguma boa obra, mas pela blasfêmia; porque, sendo tu homem, te fazes
Deus a ti mesmo” ( Jo 10:30-33). Num cenário completamente diferente, é João quem registra as palavras do Senhor: “E agora, glorifica-Me
Tu, ó Pai, junto de Ti mesmo, com aquela glória que tinha contigo antes
que o mundo existisse” ( Jo 17:5). Ele havia glorificado o Pai na Terra
(v. 4), e quem senão o Filho de Deus poderia reivindicar reciprocidade?
Outras passagens que enfatizam Sua eternidade
Há outras Escrituras que enfatizam a eternidade do nosso Senhor.
Por exemplo, Miquéias 5:2: “de ti [Belém Efrata] me sairá O que governará em Israel, e cujas saídas são desde os tempos antigos, desde os
dias da eternidade”. Isto contrasta maravilhosamente com a expressão:
“os dias da Sua carne” (Hb 5:7). Quanto ao futuro Ele é chamado de
o “Pai da Eternidade” (Is 9:6), e Hebreus 1:10-12 também indica Sua
eternidade com as palavras: “Tu, Senhor, no princípio fundaste a terra,
e os céus são obra de Tuas mãos. Eles perecerão, mas Tu permanecerás;
e todos eles, como roupa, envelhecerão, e como um manto os enrolarás,
e serão mudados. Mas Tu és o mesmo, e os Teus anos não acabarão”.
36
A glória do Filho
Se o Senhor Jesus é Deus, Ele precisa ser onipotente
João nos diz que “todas as coisas foram feitas por Ele, e sem Ele,
nada do que foi feito se fez” ( Jo 1:3). Isto deve ser comparado com Colossenses 1:16-17, onde a expressão “todas as coisas”, ou “tudo”, ocorre
quatro vezes. O relacionamento entre o Senhor Jesus e a Criação, nestes
versículos, foi apropriadamente resumida, como segue:
Ele é o Arquiteto da Criação (Cl 1:16a)
“Porque nEle [en] foram criadas todas as coisas, que há nos [en]
céus e na [api, que significa ‘sobre’] terra, visíveis e invisíveis, sejam
tronos, sejam dominações, sejam principados, sejam potestades …” A
preposição en pode ser traduzida: “porque em Ele foram criadas todas
as coisas”. Ele projetou tudo na Criação! Portanto, Ele está obviamente fora da Criação, Ele é distinto da Criação e Ele é maior do que a
Criação. As palavras “tronos … dominações … principados … potestades” evidentemente se referem, não a autoridades humanas, mas a
autoridades invisíveis. Isto fica claro pelo fato delas serem mencionadas
em relação à Criação. Veja também Efésios 6:12, onde “principados e
potestades” certamente se referem ao mundo espiritual.
À Sua voz a Criação surgiu num instante,
Todos os anjos, toda hoste brilhante;
Tronos e domínios, estrelas em seu lugar,
Todas as ordens celestiais, miríades a brilhar!1
(Caroline Maria Noel)
Ele é o Agente da Criação (Cl 1:16b)
“Tudo foi criado por Ele”. A preposição agora é dia, que significa
“através de”. JND diz: “o poder instrumental”. Ele não apenas projetou
o Universo; Ele o construiu. “Todas as coisas foram feitas por Ele, e
sem Ele nada do que foi feito se fez” ( Jo 1:3). “Tu, Senhor, no princípio
fundaste a terra, e os céus são obra de Tuas mãos” (Hb 1:10).
Ele é o Alvo da Criação (Cl 1:16c)
“Tudo foi criado por Ele e para Ele”. Compare com Hebreus 2:10:
1
“At His voice creation sprang at once to sight/ All the angel-faces, all the hosts of light/
Thrones and dominions, stars upon their way/ All the heavenly orders, in their great
array.”
A deidade da Sua Pessoa 37
“Aquele, para quem são todas as coisas, e mediante quem tudo existe”;
Apocalipse 4:11: “Digno és, Senhor, de receber glória, e honra, e poder;
porque Tu criaste todas as coisas, e por Tua vontade [ou, para o Teu
prazer] são e foram criadas”. Podemos, portanto, estar absolutamente
certos de que toda a Criação que “geme e está juntamente com dores
de parto até agora” (Rm 8:22) há de, no final, cumprir o seu propósito, e
proporcionar gozo e prazer ao seu Criador.
Ele é anterior à Criação (Cl 1:17a)
“E Ele é antes [pro] de todas as coisas”. Ele precede a Criação. Ele
precede a Criação porque, ao contrário dela, não tem origem nem derivação. Ele não tem “princípio de dias nem fim de vida” (Hb 7:3).
Ele é o Administrador da Criação (Cl 1:17b)
“E todas as coisas subsistem por Ele”, ou, “Todas as coisas subsistem juntamente por Ele” ( JND). A Criação “se mantém junta” pelo Seu
poder. O Senhor Jesus sustenta “todas as coisas pela palavra do Seu poder” (Hb 1:3). Ele criou “todas as coisas” e Ele mantém “todas as coisas”.
A lei da gravidade e todas as outras “leis” na Criação são Suas leis. Nada
se move nem funciona sem Ele! Cristo é “o poder unificador da Criação,
do contrário, o universo estaria em caos” (T. Bentley).
Os sinais em joão
Não é surpreendente, portanto, que João chame a nossa atenção
para o toque do Deus-Criador nos milagres (sinais) que Ele fez. Já
no primeiro caso, transformando água em vinho, João observa: “Jesus
principiou assim os Seus sinais em Caná da Galiléia, e manifestou a
Sua glória” ( Jo 2:11). É notável que a primeira praga no Egito foi água
transformada em sangue, enquanto que o primeiro sinal dado pelo Senhor Jesus foi água transformada em vinho. Devemos também notar o
seguinte:
• Aquele que disse: “Ajuntem-se as águas debaixo do céu num lugar”
(Gn 1:9), veio andando sobre o mar para os Seus discípulos, embora
o mar estivesse agitado por causa de um grande vento que assoprava ( Jo 6:18-19). Mateus nos diz que “os que estavam no barco
adoraram-no, dizendo: És verdadeiramente o Filho de Deus” (Mt
14:33). Numa ocasião anterior, os discípulos disseram: “Que Ho-
38
A glória do Filho
mem é este, que até os ventos e o mar Lhe obedecem?” (Mt 8:27).
O Criador do vento e das ondas estava presente!
• Aquele que disse: “Povoem-se as águas de enxames de seres viventes” (Gn 1:20, ARA), disse também: “Lançai a rede para o lado
direito do barco, e achareis. Lançaram-na, pois, e já não a podiam
tirar, pela multidão dos peixes” ( Jo 21:6). Não é de se admirar que
João dissesse: “É o Senhor”; ele evidentemente ainda se recordava
de um milagre semelhante, ocorrido cerca de três anos e meio antes.
• Aquele que disse: “Façamos o homem à nossa imagem”, e que “formou o homem do pó da terra” (Gn 1:26; 2:7), concedeu mobilidade
a um homem “que, havia trinta e oito anos se achava enfermo” ( Jo
5:5). Ele deu a vista a um homem que era “cego de nascença” ( Jo
9:1) e deu vida a um homem de quem foi dito: “já cheira mal, pois
é já de quatro dias” ( Jo 11:39).
Muitas outras ilustrações da onipotência do Senhor como Criador
são encontradas nos Evangelhos sinópticos. Por exemplo, aquele que
disse: “Produza a terra erva verde, erva que dê semente, árvore frutífera
que dê fruto segundo a espécie” (Gn 1:11) disse à figueira: “Nunca mais
coma alguém fruto de ti … e eles, passando pela manhã, viram que a
figueira tinha se secado desde as raízes” (Mc 11:14, 20).
O Sábado
Em relação ao Seu trabalho devemos notar as palavras do Senhor:
“Meu Pai trabalha até agora, e Eu trabalho também” ( Jo 5:17). Deus
não guardava o sábado, e o Senhor Jesus continuou o Seu trabalho. Os
judeus responderam a isso: “ainda mais procuravam matá-Lo, porque
não só quebrantava o sábado, mas também dizia que Deus era o Seu
próprio Pai, fazendo-Se igual a Deus” ( Jo 5:18). Compare isto com Romanos 8:32: “nem mesmo a Seu próprio Filho poupou”. Israel é descrito
como filho de Deus (Os 11:1; Ml 1:6), mas aqui é o “Seu próprio Pai”,
enfatizando a Sua igualdade. Por isso Ele disse, logo em seguida: “E
também o Pai a ninguém julga, mas deu ao Filho todo o juízo, para que
todos honrem o Filho como honram o Pai …” ( Jo 5:22-23).
O Primogênito
Mas, tendo dito isto, há pessoas que insistem em dizer que em-
A deidade da Sua Pessoa 39
bora o Senhor Jesus exercesse o Seu poder na Criação, Ele era, Ele
próprio, um ser criado. Para apoiar isto, citam Colossenses 1:15: “O
qual é a imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação”.
Esta afirmação é usada pelas “Testemunhas de Jeová” para apoiar sua
afirmação blasfema de que a primeira criação de Deus foi o Seu Filho.
É importante, portanto, entender corretamente a palavra “primogênito”.
O Senhor Jesus é descrito como o “primogênito”, em cinco ocasiões no
Novo Testamento, que são: Rm 8:24; Cl 1:15, 18; Hb 1:6; Ap 1:5. A palavra é usada no plural em Hebreus 12:23: “igreja dos primogênitos, que
estão inscritos nos céus”. No Velho Testamento o título “primogênito”
não era sinônimo de “primeiro a nascer”. Veja por exemplo I Crônicas
26:10-11: “E de Hosa, dentre os filhos de Merari, foram filhos: Sinri o
chefe (pois embora não fosse o primogênito, seu pai o constituiu chefe).
Hilquias o segundo, Tebalias … Zacarias”. A posição de José ilustra
isto. Veja I Crônicas 5:1-2: “Quanto aos filhos de Rúben, o primogênito
de Israel (pois ele era o primogênito; mas porque profanara a cama de
seu pai, deu-se a sua primogenitura aos filhos de José, filho de Israel; de
modo que não foi contado na genealogia da primogenitura, porque Judá
foi poderoso entre seus irmãos, e dele veio o soberano; porém a primogenitura foi de José)”. Podemos acrescentar os casos de Jacó e Esaú, e de
Efraim e Manassés (Gn 48:5-20), e fica claro pelos acontecimentos nas
famílias patriarcais que a palavra “primogênito” se referia ao cabeça, ou
filho principal, na família. Ela descrevia o relacionamento singular entre
o pai e o filho assim indicado. No Salmo 89:27, Davi é descrito como
“meu primogênito mais elevado do que os reis da terra”. Ele é supremo
entre os monarcas terrenos. Isto se aplica ainda muito mais ao Senhor
Jesus, que é “da casa e família de Davi”! Veja Lucas 2:4.
As “Testemunhas de Jeová” também usam Apocalipse 3:14: “o princípio da criação de Deus”, para apoiar sua doutrina abominável de que
Cristo é um ser criado. Entretanto, a palavra “princípio” significa “originador”. Ele não é, como eles sugerem, “o primeiro a ser criado”, mas o
Criador! Ele é o “originador” da Criação. Como o “primogênito de toda
a criação”, o Senhor Jesus tem tanto a primazia quanto a preeminência
sobre a Criação.
Se o Senhor Jesus é Deus Ele precisa ser onisciente
Samuel, entre outros no Velho Testamento, aprendeu que “o Senhor não vê como vê o homem, pois o homem vê o que está diante dos
40
A glória do Filho
olhos, porém o Senhor olha para o coração” (I Sm 16:7), e Ana disse:
“o Senhor é o Deus de conhecimento, e por Ele são as obras pesadas
na balança” (I Sm 2:3), enfatizando a onisciência de Deus. O Senhor
Jesus também demonstra essa característica, e é João quem enfatiza a
Sua onisciência.
Natanael perguntou: “De onde me conheces Tu?”, e quando o Senhor respondeu: “Antes que Filipe te chamasse te vi Eu, estando tu
debaixo da figueira”, ele disse: “Rabi, Tu és o Filho de Deus; Tu és o Rei
de Israel” ( Jo 1:48-49). Novamente, em João 4:28-29: “Deixou, pois, a
mulher o seu cântaro, e foi à cidade, e disse àqueles homens: Vinde, vede
um homem que me disse tudo quanto tenho feito. Porventura não é este
o Cristo?”. E de novo em João 11:14, Ele podia revelar o que acontecera
em Betânia: “Lázaro está morto”.
A isto temos que acrescentar o domínio completo do Senhor Jesus
sobre cada situação, Seu conhecimento perfeito de acontecimentos vindouros em Jerusalém, relativos à Sua morte e ressurreição, junto com
Seu conhecimento perfeito de acontecimentos no então futuro distante,
como demonstrado no Seu discurso no Monte das Oliveiras, tudo isso
enfatiza a Sua onisciência.
Se o Senhor Jesus é Deus, Ele precisa ser onipresente
O próprio Senhor Jesus enfatizou isto em João 14:23: “Se alguém
Me ama, guardará a Minha palavra, e Meu Pai o amará, e viremos para
ele, e faremos nele morada”.
A Sua onipresença é enfatizada em Mateus 18:20: “Porque, onde
estiverem dois ou três reunidos em Meu nome, aí estou Eu no meio deles”. Compare com Marcos 16:20: “E eles, tendo partido, pregaram por
todas as partes, cooperando com eles o Senhor, e confirmando a palavra
com os sinais que se seguiram”.
Se o Senhor Jesus é Deus, Ele precisa ser absolutamente
Santo
Ana disse: “Não há Santo como o Senhor” (I Sm 2:2), e o Senhor
Jesus, tendo dito aos Seus acusadores: “Vós tendes por pai ao diabo, e
quereis satisfazer os desejos de vosso pai”, continuou: “Quem dentre vós
Me convence de pecado?” ( Jo 8:46). A palavra “convence”, ou, “acusa”,
A deidade da Sua Pessoa 41
indica que eles não somente eram incapazes de realmente acusá-lO de
pecado perante um tribunal, mas também que Ele não era convicto
de pecado na Sua própria consciência. Obviamente, era impossível Sua
consciência acusá-lO, pois “nEle não há pecado” (I Jo 3:5). Compare
com Tiago 1:13: “Deus não pode ser tentado pelo mal, e a ninguém
tenta”. É muito importante lembrar que a tentação no deserto não tinha
por finalidade provar se o Salvador podia ou não pecar, mas era para
demonstrar que Ele não podia pecar.
Se o Senhor Jesus é Deus, Suas palavras precisam ser únicas
João escreve: “Aquele que vem de cima é sobre todos; aquele vem
da terra é da terra e fala da terra. Aquele que vem do céu é sobre todos … Porque aquele que Deus enviou fala as palavras de Deus; pois
não Lhe dá Deus o Espírito por medida” ( Jo 3:31, 34). Portanto, não
é surpreendente que os oficiais enviados para trazê-lo, explicaram seu
fracasso com as palavras: “Nunca homem algum falou assim como este
homem” ( Jo 7:32, 46). Ele disse: “Eu falo do que vi junto de Meu Pai, e
vós fazeis o que também vistes junto de vosso pai” ( Jo 8:38).
Se o Senhor Jesus é Deus, a morte não pode retê-lO
Tomé, confrontado com as chagas mortais num corpo vivo, exclamou: “Senhor meu, e Deus meu!” ( Jo 20:28). A evidência cabal da Deidade do Senhor é a Sua ressurreição, que vindicou cada reivindicação
feita por Ele. Se Ele não fosse Deus, Ele ainda estaria no sepulcro. Mas
Ele “nasceu (ou veio) da descendência de Davi segundo a carne [a palavra ‘nasceu’ aqui significa ‘entrar numa nova condição’], declarado Filho
de Deus em poder, segundo o Espírito de santificação, pela ressurreição
dos mortos” (Rm 1:3-4).
Os apóstolos fizeram disso o carimbo oficial da sua pregação. Veja
Atos 2:24-36: “… ao qual Deus ressuscitou … a este Jesus, Deus ressuscitou, do que todos nós somos testemunhas. De sorte que, exaltado pela
destra de Deus, e tendo recebido do Pai … Porque Davi não subiu aos
céus, mas ele próprio diz: Disse o Senhor ao meu Senhor … ”
Os cristãos hoje deveriam estar “aguardando a bem-aventurada esperança e o aparecimento da glória do grande Deus e nosso Salvador
Jesus Cristo [‘nosso Grande Deus e Salvador Jesus Cristo’, JND]” (Tt
2:13). Nós reconhecemos com prazer a Sua Deidade enquanto aguar-
42
A glória do Filho
damos a Sua vinda, e Israel fará o mesmo na Sua subsequente manifestação: “Eis que este é o nosso Deus, a quem aguardávamos, e Ele
nos salvará; este é o Senhor, a quem aguardávamos; na Sua salvação
gozaremos e nos alegraremos” (Is 25:9).
Na eternidade os santos hão de contemplar o seu Redentor e dizer com Paulo: o “Filho de Deus, o qual me amou, e Se entregou a Si
mesmo por mim”. Talvez não seja fantasioso demais dizer que palavras
semelhantes às bem conhecidas e apreciadas do seguinte hino serão ouvidas no Céu:
Fiel imagem do Infinito
Cuja essência oculta está;
Resplendor da eterna Luz,
O coração de Deus revelado.
Digno, ó Cordeiro de Deus, és Tu,
De que todo joelho se dobre diante de Ti.1
(Josiah Condor)
Neste meio tempo, visto que Ele “é o verdadeiro Deus e a vida eterna” (I Jo 5:20), devemos dar a Ele a nossa devoção total. Como o “verdadeiro Deus”, Ele não pode ter rival nos nossos corações e nas nossas
vidas. Por isso João conclui sua I Epístola dizendo: “Filhinhos, guardai-vos dos ídolos”.
1
“True image of the Infinite/Whose essence is concealed;/Brightness of uncreated light,/
The heart of God revealed./Worthy, o Lamb of God, art Thou,/That every knee to Thee
should bow.”
Cap. 3 — A humanidade da Sua Pessoa
Por James R. Baker, Escócia
Introdução
A palavra “humana” se refere, por definição, àquilo que é do, ou
pertence ao, homem. “Humanidade” refere-se aos atributos que caracterizam a raça humana. Nenhuma destas palavras se encontra na Bíblia,
mas como muitas outras verdades contidas neste volume sagrado, a humanidade do Filho de Deus é um assunto vital para considerar e entender. Tal consideração é extremamente importante à luz da complexidade singular da pessoa de Cristo. Em Sua pessoa Ele é tanto Deus como
homem, e isto é descrito, nas Escrituras, como o “mistério da piedade”
(I Tm 3:16). Num resumo geral e sucinto, é dito que, na Sua encarnação, nosso Senhor Jesus Cristo tornou-Se o que Ele nunca havia sido
antes, sem deixar de ser o que Ele era eternamente. Também, o que Ele
veio a ser em Belém Ele nunca deixará de ser. Estas breves afirmações
descrevem resumidamente o prodígio da encarnação do nosso glorioso
Senhor. Elas também apontam para o Homem exaltado à destra de
Deus em cuja pessoa agora e eternamente habita “corporalmente toda a
plenitude da Divindade” (Cl 2:9).
A promessa da Sua humanidade
Gênesis 3
“Então o Senhor Deus disse à serpente: Porquanto fizeste isto, maldita serás
mais que toda a fera, e mais que todos os animais do campo; sobre o teu ventre
andarás, e pó comerás todos os dias da tua vida. E porei inimizade entre ti e
a mulher, e entre a tua semente e a sua semente; esta te ferirá a cabeça, e tu lhe
ferirás o calcanhar” (Gn 3:14-15).
Estas primeiras palavras registradas de Deus para a serpente no
Jardim do Éden referem-se à “tua semente e a sua semente” (Gn 3:15).
Devemos notar que esta declaração é também a primeira profecia registrada na Bíblia. Embora os detalhes da vinda do Filho de Deus, em
carne, não são vistos nesta passagem, não podemos deixar de notar que
as palavras usadas são muito significativas, e são a primeira menção da
verdade do nascimento virginal. A “semente”, tanto de procriação quanto de descendência, é geralmente descrita nas Escrituras como vinda do
homem, mas nesta passagem Deus está indicando a Satanás que além
44
A glória do Filho
da maldição que cairia sobre ele, imediatamente, ele seria finalmente e
definitivamente ferido na cabeça pelo Libertador prometido, que viria
ao mundo através da mulher. Ele seria o Messias prometido, que é o
único descrito como a Semente da mulher. Veremos mais sobre o nascimento virginal de Cristo mais adiante, mas esta primeira referência
nas Escrituras é clara, e há muito tem sido reconhecida como tal pelos
piedosos de todas as eras.
Isaías 7 e Mateus 1
“Pede para ti ao Senhor teu Deus um sinal; pede-o, ou embaixo nas profundezas, ou em cima nas alturas. Acaz, porém, disse: Não pedirei, nem tentarei ao
Senhor. Então ele disse: Ouvi agora, ó casa de Davi: Pouco vos é afadigardes
aos homens, senão que também afadigareis ao meu Deus? Portanto o mesmo
Senhor vos dará um sinal: Eis que a virgem conceberá, e dará à luz um filho,
e chamará o Seu nome Emanuel” (Is 7:11-14). “Tudo isto aconteceu para
que se cumprisse o que foi dito da parte do Senhor, pelo profeta, que diz: Eis
que a virgem conceberá, e dará à luz um filho. E chamá-Lo-ão pelo nome de
Emanuel, que traduzido é: Deus conosco” (Mt 1:22-23).
Estas palavras inspiradas de Isaías são bem específicas e contém
uma profecia notável. Acaz, o rei ímpio de Judá, havia recebido uma
oferta de conselho, da parte de Jeová, sobre os poderes ameaçadores que
estavam avançando sobre Jerusalém naquele tempo. O sinal oferecido,
que este homem mau recusou, veio a ser a promessa mais fundamental
que Jeová jamais fez à casa de Davi. Uma breve leitura de II Reis 16
revelará o desprezo geral que Acaz tinha pelas coisas sagradas da casa
de Deus, que é consistente com seus atos em Isaías 7.
O sinal a que nos referimos era maior do que aquele que iria atender à necessidade local e temporária dos dias de Isaías. O uso da frase
“casa de Davi” deve ser cuidadosamente observado em relação ao contexto do capítulo como um todo. Revela que Jeová estava olhando para a
Sua provisão Divina e final para o Seu povo escolhido. Todos que já tentaram explicar essa seção reconheceram a dificuldade, e quaisquer que
sejam as complexidades da passagem, a referência no Novo Testamento
(Mt 1:18-25) deixa abundantemente claro que o nascimento virginal
de Cristo era o cumprimento específico desta passagem do Velho Testamento. Não é uma questão de aplicação, a afirmação inspirada é clara:
“tudo isto aconteceu para que se cumprisse …”. Muitos afirmam que a
palavra hebraica alma é usada em outros lugares de uma moça soltei-
A humanidade da Sua Pessoa 45
ra que não é necessariamente uma virgem. Algumas versões modernas
chegaram até a alterar o seu texto para refletir isso. The Theological Wordbook of the Old Testament1 diz o seguinte sobre isto: “Não há nenhum
exemplo onde possa ser provado que alma designa uma jovem que não
é virgem. O fato de virgindade é óbvio em Gênesis 24:43, onde alma é
usada de alguém que estava sendo procurada como uma noiva para Isaque. Também é óbvio em Êxodo 2:8. Cantares 6:8 se refere a três tipos
de mulheres, duas das quais são descritas como rainhas e concubinas.
Seria apenas razoável entender que a palavra que descreve o terceiro
grupo, para o qual é usado o plural de alma, signifique virgens”. Mesmo
que houvesse dúvida sobre a palavra usada em Isaías, é difícil entender
por que alguns tradutores fizeram a mudança para “moça solteira”, ou
“uma jovem”, à luz da clareza de Mateus 1. A passagem está cheia de
evidências de que Maria era uma virgem, e isto é confirmado pelas palavras do anjo a José. É de conhecimento geral que toda virgem é solteira,
mas nem toda solteira é uma virgem. O ensino de ambas as passagens
tem em vista revelar que um evento notável e humanamente impossível
havia acontecido, e que por ele a Criança que nascera estava completamente livre de todo vestígio de pecado. O milagre da encarnação está na
concepção que aconteceu no ventre de Maria.
Isaías 9
“Porque um Menino nos nasceu, um Filho se nos deu, e o principado está sobre
os Seus ombros, e se chamará o Seu nome: Maravilhoso Conselheiro, Deus
Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz. Do aumento deste principado e
da paz não haverá fim, sobre o trono de Davi e no seu reino, para o firmar e
fortificar com juízo e com justiça, desde agora e para sempre” (Is 9:6-7).
Esta profecia adicional confirma, em promessa, os detalhes do que
já foi considerado. O Espírito Santo, através de Isaías, revela que a menção do nascimento de “um menino” confirma a verdadeira humanidade
da criança. É igualmente claro que está criança é o “Filho” que foi dado.
Esta mesma verdade é explicada por Paulo: “Mas vindo a plenitude dos
tempos, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido sob a lei”
(Gl 4:4).
1
“Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento”, Edições Vida Nova, ISBN
978-85-275-0188-0 (N. do E.).
46
A glória do Filho
O propósito da Sua humanidade
Do ponto de vista federativo
“No entanto, a morte reinou desde Adão até Moisés, até sobre aqueles que
não tinham pecado à semelhança da transgressão de Adão, o qual é a figura
dAquele que havia de vir. Mas não é assim o dom gratuito como a ofensa.
Porque, se pela ofensa de um morreram muitos, muito mais a graça de Deus, e
o dom pela graça, que é de um só homem, Jesus Cristo, abundou sobre muitos”
(Rm 5:14-15).
No princípio, Adão foi colocado como cabeça federativo da raça
humana, e no seu ato original e pessoal de pecado ele levou a raça humana toda a uma condição de pecado, e consequentemente a uma condição de morte espiritual. O argumento completo do apóstolo Paulo é
muito claro e é importante compreendê-lo, pois nele é revelada a necessidade de um novo Cabeça federativo, que pudesse criar os meios pelos
quais os membros da raça humana pudessem ser feitos justos diante de
Deus. Esta é a importância da expressão: “a figura dAquele que havia de
vir”. Tudo que foi perdido no primeiro Adão foi reavido, e muito mais,
no último Adão, que é o Senhor Jesus Cristo. A série de contrastes
entre os dois “cabeças federativos” é muito instrutiva e digna de uma
consideração detalhada.
Do ponto de vista doutrinário
“E, visto como os filhos participam da carne e do sangue, também Ele participou das mesmas coisas, para que pela morte aniquilasse o que tinha o império
da morte, isto é, o diabo; e livrasse todos os que, com medo da morte, estavam
por toda a vida sujeitos à servidão” (Hb 2:14-15).
O pano de fundo para este aspecto está em afirmações Bíblicas tais
como: “Esta é uma palavra fiel, e digna de toda a aceitação, que Cristo
Jesus veio ao mundo, para salvar os pecadores, dos quais eu sou o principal” (I Tm 1:15); e “Ele se manifestou para tirar os nossos pecados”
(I Jo 3:5); e “para isto o Filho de Deus se manifestou: para desfazer as
obras do diabo” (I Jo 3:8). Sem a verdadeira humanidade de Cristo estes
aspectos do propósito Divino teriam sido impossíveis. Este é o significado das palavras mencionadas em Hebreus 2, onde se fala de homens e
mulheres, em geral, como coparticipantes da carne e do sangue. Embora
haja, através da humanidade, diferentes características de cor e outros
traços físicos, há em cada um a natureza básica comum, que o escritor
A humanidade da Sua Pessoa 47
está descrevendo. As palavras são usadas cuidadosamente e indicam que
a Sua vinda em carne foi voluntária e que a Sua humanidade era real.
Assim, as Escrituras nos informam que Ele possuía espírito, alma, e
corpo ( Jo 11:33; Jo 12:27 e Hb 10:5-7), e que Ele chorou, dormiu, teve
fome e sede. Muita discussão teológica tem surgido sobre estes aspectos
da humanidade do nosso Senhor, e termos teológicos foram inventados,
numa tentativa de dar uma explicação clara às questões mencionadas,
mas não explicadas, nas Escrituras.
James McBroom observou o seguinte sobre a encarnação:
“Tendo vindo para estar entre os homens, Ele é tudo que um
homem deve ser. Tudo estava perfeitamente em ordem; não havia
nada para diferenciá-lO dos outros homens: ‘assim como os filhos
são participantes de carne e sangue, Ele também participou destas
coisas’; era a simplicidade e a beleza de um homem com todos
os sentimentos próprios da humanidade, numa condição intocada pelo pecado. Ele é o ‘Filho do Homem’, e como tal passou
por cada estágio da vida humana, da manjedoura até a cruz. Em
Mateus, Ele é o Rei dos Reis, em Marcos, o mais fiel dos servos,
em Lucas, o mais bondoso e terno dos homens, e em João, embora
tudo isso esteja presente, Ele é o unigênito do Pai, cheio de graça
e de verdade”.
As palavras do apóstolo Paulo a Timóteo enfatizam ainda mais a
necessidade doutrinária da humanidade do Senhor: “Porque há um só
Deus, e um só Mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo homem”
(I Tm 2:5). O apóstolo está enfatizando que Aquele que veio era “homem, Ele mesmo”, portanto, totalmente competente para ser o único
Mediador idôneo. Associado a essas considerações estão as palavras
importantes e bem-conhecidas de Paulo aos Filipenses: “Cristo Jesus,
que sendo em forma de Deus, não teve por usurpação ser igual a Deus,
mas esvaziou-Se a Si mesmo, tomando a forma de servo, fazendo-Se
semelhante aos homens; e, achado na forma de homem, humilhou-Se
a Si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz.”. Ele não
renunciou nem deixou de ser “em forma de Deus”. Assim, o que Ele
era essencialmente e eternamente, permaneceu; além disso, Ele assumiu uma humanidade santa que será Sua eternamente. A maravilha, o
mistério e a glória da Pessoa de Cristo residem no fato que “nEle habita
corporalmente toda a plenitude da Divindade”.
48
A glória do Filho
Do ponto de vista dispensacional
A comparação do Senhor Jesus com os anjos é a continuação de um
tema apresentado desde o início de Hebreus 2. Ali já foi ensinado que
a era milenar futura não estará sob o controle administrativo dos anjos,
mas sim sob o controle de um homem. O escritor então menciona o
Salmo 8, que tem em vista o primeiro Adão, e revela a posição inicial
de supremacia de um homem sobre toda a Criação. Na descrição dada
no Salmo, não há nenhuma sugestão da queda de Adão ou da entrada
do pecado no jardim.
A passagem de Hebreus, entretanto, faz uma referência clara à entrada do pecado e seus efeitos subsequentes, e enfatiza que o controle
administrativo da Criação foi perdido por causa do pecado e da Queda.
Uma comparação de Hebreus 2 com outras passagens relevantes do NT
irá mostrar que nos dias futuros do milênio o mundo inteiro será transformado num maravilhoso jardim, e seu soberano Controlador será o
último Adão, nosso Senhor Jesus Cristo. A finalidade de Hebreus 2:16
é mostrar que Sua obra sacrificial não era ocupar-se com a causa dos
anjos, mas sim com a causa da semente de Abraão. Embora o reino
de Cristo seja examinado mais detalhadamente em outra parte desse
volume, devemos notar que a apresentação futura de Cristo reinando na
Terra não é um pensamento posterior, como consequência da entrada
do pecado no mundo. Antes, o ponto central dos propósitos divinos era
que Adão seria somente a figura Daquele que havia de vir. O propósito
de Deus sempre foi que Cristo fosse tudo em todos. Isto é esclarecido
nas palavras da epístola aos Efésios: “Descobrindo-nos o mistério da
Sua vontade, segundo o Seu beneplácito, que propusera em Si mesmo,
de tornar a congregar em Cristo todas as coisas, na dispensação da plenitude dos tempos, tanto as que estão nos céus como as que estão na
terra; nEle, digo, em quem também fomos feitos herança, havendo sido
predestinados, conforme o propósito dAquele que faz todas as coisas,
segundo o conselho da Sua vontade” (Ef 1:9-11).
Do ponto de vista moral
“Porquanto o que era impossível à lei, visto como estava enferma pela carne,
Deus, enviando o Seu Filho em semelhança da carne do pecado, pelo pecado
condenou o pecado na carne; para que a justiça da lei se cumprisse em nós, que
não andamos segundo a carne, mas segundo o Espírito” (Rm 8:3-4).
A humanidade da Sua Pessoa 49
Fica claro no registro histórico da Queda, e nas referências a ela no
NT, que a entrada do pecado no mundo alterou radicalmente a condição do homem que vivia sob o olhar onividente1 de Deus, e houve
constantes falhas e pecados que criaram uma barreira. Esta condição
caracterizou a humanidade por muitos séculos, e após a formação e
redenção da nação de Israel, o povo escolhido de Deus disse, antes e
depois da Lei ser dada, que “todas as palavras que o Senhor tem falado,
faremos” (Êx 24:3). Eles estavam obedientemente preparados para se
tornarem um povo que se colocara sob a lei de Jeová. Mas falharam
miseravelmente, e no próprio dia em que as tábuas de pedra escritas por
Deus estavam sendo trazidas por Moisés, eles estavam adorando o ídolo
do bezerro de ouro feito por Arão, e como resultado 3.000 morreram
em um dia. A história posterior de Israel prova, sem sombra de dúvida,
a sua incapacidade de guardar a promessa que haviam feito.
Nos capítulos iniciais da epístola aos Romanos o escritor prova claramente a condição moral e o fracasso de toda a humanidade. Vemos
que o libertino e o erudito têm dentro de si a mesma natureza caída e
arruinada que o judeu, porque em Adão todos, originalmente, pecaram.
Nenhum tipo de esforço, intelectual ou, no caso do judeu, religioso, pode
efetuar uma mudança; todos são pecadores perante Deus. No capítulo
7 é revelado que a lei de Deus é absolutamente santa, mas também é
impotente, e não tem poder em si mesma, para dar alívio do poder e da
penalidade do pecado humano. Na passagem citada do capítulo 8, encontramos a resposta moral de Deus para o que a lei não pôde fazer. O
homem carnal não pode satisfazer o padrão divino dado no Decálogo.
Mas quando Deus enviou o Seu próprio Filho, Ele veio na semelhança
da carne do pecado. Não lemos que Ele veio na “semelhança da carne”,
pois isto negaria a realidade da Sua verdadeira humanidade, e apresentaria somente uma imitação do que os seres humanos são. Sua humanidade era real, mas era também uma humanidade santa. No caso de
Adão, Deus criara uma humanidade inocente, sem mancha alguma de
pecado. Naturalmente, é necessário apreciar que a humanidade inocente
provou ser suscetível ao pecado, mas a humanidade santa de Cristo, o
Filho de Deus, era totalmente inacessível ao pecado.
Devemos compreender que o contraste entre humanidade santa
e humanidade inocente é fundamental, e envolve o contraste entre o
1
Que tudo vê (N. do E.).
50
A glória do Filho
primeiro homem e o segundo Homem. O primeiro homem cedeu à
tentação que lhe foi oferecida por Satanás, mas o segundo Homem condenou o pecado no próprio campo em que ele geralmente opera — a
carne. Este fato é verdadeiro ao se considerar a vida santa de Cristo. Sua
vida foi vivida em meio à humanidade impura por mais de 30 anos. Ele
foi em tudo tentado, mas sem pecado. Assim, o Senhor Jesus revelou
na Sua vida o poder de uma vida santa sobre o pecado, e depois efetuou a morte expiatória sacrificial pelo pecado na Cruz. Este ensino, na
epístola aos Romanos, é apresentado depois das grandes doutrinas do
Evangelho serem estabelecidas e expostas.
O aspecto moral da humanidade de Cristo não deve ser considerado
somente em relação ao princípio de pecado, mas também em relação ao
resultado do pecado na humanidade. Os muitos aspectos morais vistos
na vida de nosso Senhor Jesus Cristo revelam a plenitude das virtudes
que foram inicialmente desejadas por Deus, e que podem trazer prazer
ao coração de Deus ao observar os homens sobre a Terra. Traços dessas
características são vistos em várias pessoas cujas vidas estão registradas
nas Escrituras, mas em cada exemplo há falhas, por causa da natureza
caída de cada indivíduo descrito. Na vida do nosso Senhor Jesus Cristo
havia uma harmonia perfeita de graça e verdade. Ele falou da mansidão
e humildade do Seu próprio coração, e os escritores de outras Escrituras usam o Seu andar, amor, humildade, simplicidade, longanimidade,
mansidão e obediência, junto com outras qualidades, como exemplos na
sua exortação aos santos. Isto nós dá uma ideia do que Deus queria que
a raça humana fosse moralmente. Quão apropriado e quão agradável é
para Deus quando Ele vê estas mesmas características produzidas naqueles que foram redimidos pelo precioso sangue de Cristo, e capacitados pelo Espírito Santo de Deus que neles habita.
A perpetuidade da Sua humanidade
“Onde Jesus, nosso precursor, entrou por nós, feito eternamente sumo sacerdote, segundo a ordem de Melquisedeque” (Hb 6:20).
Nestes versículos finais do capítulo, o escritor está enfatizando que
o verdadeiro crente em Cristo tem uma forte consolação, tendo posto o
seu “refúgio em reter a esperança proposta” (Hb 6:18). À luz das muitas
referências ao Velho Testamento nesta epístola, pode haver aqui uma
referência àqueles que no passado, na hora da necessidade, haviam fugi-
A humanidade da Sua Pessoa 51
do para o santuário e se apegado às pontas do altar. A fraqueza naquele
ato foi provada num caso como o de Joabe que foi morto, enquanto se
apegava àquelas pontas (I Rs 2:28-34). A “esperança proposta” em Hebreus 6 é o fundamento seguro de refúgio que temos em nosso “Senhor
Jesus Cristo, esperança nossa” (I Tm 1:1). Ele está agora além do véu, e
pela fé nos apegamos a Ele. Ele não está além do véu de um santuário
terrestre, mas sim no próprio Céu, e Ele é a única “âncora da alma, segura e firma, e que penetra até ao interior do véu” (Hb 6:19). Contudo,
Ele não está lá somente como a âncora da alma. Ele entrou ali como
precursor.
Na Sua ressurreição o Senhor Jesus Cristo tornou-Se as “primícias
dos que dormem” (I Co 5:20), e na Sua ascensão Ele adentrou os Céus
como “precursor”. O primeiro aspecto assegura ao cristão que todos serão ressuscitados de entre os mortos, porque Ele Se tornou o primeiro
de todos os tais na ocasião da Sua ressurreição corporal. O segundo
aspecto dá uma garantia semelhante ao cristão, de que todos chegarão
à presença de Deus em associação com Aquele que entrou primeiro.
Em ambos estes aspectos, vemos que o ato descrito não foi somente
em espírito, mas foi uma ação corpórea. O versículo que temos considerado ensina que um homem real entrou primeiro; Ele levou consigo
a humanidade para o interior do Céu, e como homem está assentado
sobre o trono de Deus. Quatro vezes na epístola aos Hebreus há uma
referência ao trono, e quatro vezes ao fato que Ele se assentou. Estas
grandes verdades não se restringem à epístola aos Hebreus, mas são o
suficiente para mencionar aqui.
A preeminência da Sua humanidade
“Que, sendo em forma de Deus, não teve por usurpação ser igual a Deus, mas
esvaziou-Se a Si mesmo, tomando a forma de servo, fazendo-Se semelhantes
aos homens; e achado na forma de homem, humilhou-Se a Si mesmo, sendo
obediente até à morte, e morte de cruz. Por isso, também Deus O exaltou soberanamente, e lhe deu um nome que é sobre todo o nome; para que ao nome
de Jesus se dobre todo o joelho dos que estão nos céus, e na terra, e debaixo da
terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para glória de Deus
Pai” (Fp 2:6-11).
Partes desta passagem maravilhosa já foram mencionadas neste capítulo e também em outras partes deste livro. A razão por citá-la aqui é
52
A glória do Filho
para enfatizar que os passos de humilhação tomados, voluntariamente,
pelo Senhor Jesus são todos compensados, dentro desta passagem, por
Deus Seu Pai. Mas também devemos apreciar o fato que Ele, obviamente, não renunciou uma “forma” por outra “forma”, antes, Ele tomou
sobre Si “a forma de um servo” (v. 9). Assim, os estágios de honra e
glória descritos são dados por Deus ao Servo na Sua humanidade. A
Ele se dobrará todo o joelho e toda a língua confessará que Ele é o Senhor; Ele é o “soberanamente exaltado”. Na ocasião da Sua ascensão e
exaltação Jeová O convidou a assentar-Se à Sua destra; o lugar de honra
e prioridade.
A profecia de Isaías prediz a glória futura do Messias de Israel: “Eis
que o Meu servo procederá com prudência; será exaltado, e elevado, e
mui sublime” (52:13). Também no cântico de Asafe: “Seja a Tua mão
sobre o Homem da Tua destra, sobre o Filho do homem, que fortificaste para Ti” (Sl 80:17). As palavras inspiradas da Isaías, na profecia,
resumem a glória preeminente do Homem Jesus Cristo: “Porque um
Menino nos nasceu, um Filho se nos deu, e o principado está sobre
os Seus ombros, e se chamará o Seu nome: Maravilhoso Conselheiro,
Deus forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz. Do aumento deste principado e da paz não haverá fim, sobre o trono de Davi e no seu reino,
para o firmar e o fortificar com juízo e com justiça, desde agora e para
sempre; o zelo do Senhor dos Exércitos fará isto” (Is 9:6-7).
Assim, ao concluirmos, temos que nos curvar diante deste Homem
glorioso e adorar o nosso Deus pela Promessa, o Propósito, a Perpetuidade e a Preeminência da Sua Humanidade.
Cap. 4 — A impecabilidade da Sua Pessoa
Por Tom Wilson, Escócia
Os apóstolos não conspiraram para enganar as pessoas com “fábulas
artificialmente compostas” (II Pe 1:16). Sendo testemunhas oculares,
eles prestaram testemunho ao Senhor Jesus Cristo. João, uma destas
testemunhas oculares, enfatiza duas vezes no seu Evangelho que o seu
registro é verdadeiro (19:35; 21:24; veja também III João 12). Seu testemunho também tinha o selo de aprovação dos outros apóstolos, assim
ele comenta: “… e sabemos que o seu testemunho é verdadeiro” ( Jo
21:24). Lucas, que não era um dos apóstolos que acompanhou o Senhor
Jesus enquanto “Ele andou fazendo o bem” (At 10:38), afirma que os
fatos que entre eles se cumpriram, foram-lhes entregues pelos “mesmos
que os presenciaram desde o princípio” (Lc 1:1-2). Lucas havia recebido
o testemunho apostólico, e sob a direção do Espírito, fê-lo acessível,
na forma escrita, aos santos de muitas gerações. Todos que “conhecem
a Deus” também aceitaram aquele testemunho tal como agora é encontrado no Novo Testamento. De fato, João fornece o seguinte teste
desta realidade: “Nós [os apóstolos] somos de Deus; aquele que conhece a Deus ouve-nos; aquele que não é de Deus não nos ouve. Nisto
conhecemos nós o espírito da verdade e do erro” (I Jo 4:6). Assim, é
para o testemunho dos apóstolos no Novo Testamento que olhamos,
ao considerarmos a impecabilidade de Cristo. Qualquer ensino que não
corresponde com o testemunho apostólico que encontramos no Novo
Testamento, sabemos não ser de Deus.
O apóstolo João testifica da deidade do Senhor no seu Evangelho, e
ao fazê-lo, inclui referências específicas à Sua humanidade. Entretanto,
é na sua primeira epístola que aprendemos que a verdade da encarnação
do Senhor é um aspecto fundamental da “fé que uma vez foi dada aos
santos” ( Jd 3). Ele afirma enfaticamente: “Nisto conhecereis o Espírito
de Deus: todo o espírito que confessa que Jesus Cristo veio em carne
é de Deus; e todo espírito que não confessa que Jesus Cristo veio em
carne não é de Deus; mas este é o espírito do anticristo, do qual ouvistes que há de vir, e eis que já está no mundo” (I Jo 4:2-3). João testifica
que o “Pai enviou seu Filho para Salvador do mundo” (I Jo 4:14). Ele
também deu testemunho da deidade de Cristo: “que Jesus é o Cristo, o
Filho de Deus” ( Jo 20:31). Em I João 1:1 o seu testemunho é ao fato do
Senhor ter-se tornado Homem; para esta condescendência ele fornece
54
A glória do Filho
evidência de que era um passo permanente e irreversível:
• Ele era audível, assim João diz: “… ouvimos”.
• Ele era visível, assim João podia dizer: “… vimos com os nossos
olhos… temos contemplado”.
• Ele era tangível, assim João recorda: “… nossas mãos tocaram…”.
João e os outros apóstolos sabiam que Aquele que eles acompanharam por mais de três anos não era um fantasma. Eles O tocaram. Na
Sua ressurreição de entre os mortos, eles O ouviram dizer: “Apalpai-me
e vede, pois um espírito não tem carne nem ossos, como vedes que Eu
tenho” (Lc 24:39). À luz das suas experiências, os apóstolos sabiam que
o seu Senhor era verdadeiramente Deus e verdadeiramente Homem.
Sabiam também que, ao contrário deles, este Homem era sem pecado,
puro e justo. Eles haviam observado de perto um Homem real que não
era sujeito ao pecado.
Em I João 1, onde a realidade da humanidade de Cristo é estabelecida, João não deixa espaço para a pretensão de que mesmo cristãos
professos não têm pecado, ou que não pecaram (I Jo 1:8, 10). João segue
afirmando que em Cristo “não há pecado” (I Jo 3:5). Que contraste conosco! João também mostra que o Senhor é “puro”, não porque Ele se
purificou, mas num sentido absoluto (I Jo 3:3). Ele também é justo (I Jo
2:29; 3:7), novamente num sentido absoluto. Para João, o mais devoto
dos santos não é sem pecado, mas quer seja inspecionado para aceitação
cerimonial ou judicialmente, o Senhor é absolutamente sem pecado.
O título deste capítulo traz o substantivo “impecabilidade”, que não
aparece nas Escrituras. Sua raiz é a palavra latina impeccãbilis, que significa “sem pecado”. De fato, um dicionário de Inglês oferece o significado
“sem pecado” para o adjetivo “impecável”.1 Entretanto, reconhecemos
que ao falar do nosso Senhor Jesus precisamos prestar atenção e dar a
uma palavra como “impecável” (ou “sem pecado”) o significado pleno e
completo daquilo que o Espírito Santo revela sobre o caráter de Cristo.
Este capítulo irá se opor à blasfêmia daqueles que dizem do Senhor
Jesus Cristo: “Nós sabemos que esse homem é pecador” ( Jo 9:24). Se
1 Essa explicação pode parecer supérflua aqui, mas na Língua Inglesa as palavras de
origem latina são as menos usadas na linguagem coloquial, e portanto menos conhecidas. Não existe semelhança em inglês entres as palavras “pecado” e “impecável” (“sin”
e “impecability”, respectivamente), como acontece na nossa língua (N. do T.).
A impecabilidade da Sua Pessoa 55
oporá também a qualquer que apoia o ponto de vista que, embora o
Senhor não tenha pecado, Ele poderia ter pecado. A mente humana
pode achar esse tipo de ideia atraente, mas ela deve ser repugnante à
mente espiritual. Este capítulo procurará glorificar o Homem perfeito
que glorificou o Seu Deus em toda circunstância. Iremos examinar reverentemente o caráter de Cristo e concluir que:
Somente nEle pode o Espírito observar
Uma vida perfeita aqui na terra.
(M. Peters)1
“Diante de muitas testemunhas” (I Tm 6:12)
Um homem como Timóteo “fez uma boa confissão diante de muitas testemunhas”. Sem dúvida aquelas testemunhas incluíam tanto cristãos quanto outros que se opunham a Deus e a Cristo. Nosso Senhor
deu testemunho de uma boa confissão tanto àqueles que Lhe eram solidários, quanto àqueles que eram malignos na sua oposição. Ele deu
testemunho de uma boa confissão diante de Pilatos, e consideraremos
esta confissão mais adiante, mas outras testemunhas também notaram
Seu testemunho perfeito.
Primeiramente ouvimos o testemunho de um que foi ordenado
pelo próprio Deus para apontar outros a Cristo. Esta testemunha ousada era João Batista. Ele não escreveu epístolas. Embora muito pouco se
sabe acerca dos sermões pregados por ele no período do seu ministério
público, interrompido violentamente por Herodes, ele deixou um testemunho eloquente de uma vida que era irrepreensível, e de Um a quem
o “batismo do arrependimento” (At 19:4) era totalmente inapropriado.
A confissão de João da sua própria indignidade perante Aquele impecável, era tal que às margens do Jordão ele confessou perante Cristo:
“Eu careço de ser batizado por Ti” (Mt 3:14). João reconheceu algo da
distância infinita que separava o mais santo dos santos do totalmente
impecável Cristo. Com satisfação concordamos com as pessoas que, na
sua fraqueza, avaliaram tanto João como o Senhor de João: “Na verdade
João não fez sinal algum, mas tudo quanto João disse deste era verdade”
( Jo 10:41).
Nem todas as testemunhas eram tão favoráveis a Cristo, mas ne-
1
“There only can the Spirit trace/ A perfect life below”.
56
A glória do Filho
nhuma delas podia se levantar para aceitar o desafio lançado pelo próprio Senhor: “Quem dentre vós me convence de pecado?” ( Jo 8:46).
Também devemos ouvir as vozes daquelas outras testemunhas. A
esposa de Pilatos, muito perturbada pelo seu sonho, descreveu-O como
“aquele Homem justo” ( JND). Ela nem sequer estava associada com Joana, a esposa do procurador de Herodes, sem mencionar aquelas outras
mulheres que serviam a Cristo com seus bens (Lc 8:2-3). Nenhuma
necessidade a fizera aproximar-se de Cristo, pelo contrário, ela teria,
com prazer, colocado uma distância ainda maior entre a sua casa e o
Forasteiro da Galiléia. No entanto, ela conhecia o interesse do céu nAquele que ela conhecia como “aquele Homem justo”.
A esposa de Pilatos tentou distanciá-lo do julgamento dAquele
Homem justo, acerca de quem ela sofrera tanto num sonho. Mas Pilatos, o juiz experiente, encontrou-se com Cristo. Ele tinha as habilidades profissionais de um juiz treinado, logo era mais capacitado que a
maioria para avaliar as provas e julgar o acusado. O registro dado pelo
Espírito sobre aquele julgamento falso, é dado pelos quatro escritores
dos Evangelhos. Todavia, é Paulo quem resume o encontro do cruel e
cínico Pilatos com o Cristo impecável: ele nota como “diante de Pôncio
Pilatos” o Senhor “deu o testemunho de boa confissão” (I Tm 6:13).
Pilatos havia olhado nos olhos de muitos acusados, mas nunca estivera
tão certo do fato de estar olhando para um Homem inocente. Três vezes
seguidas ele anunciou seu veredicto: ele não encontrava culpa alguma
no acusado Rei dos judeus. Mas aquele veredicto triplo representa, ainda que inadequadamente, o que o Espírito de Deus diz de Cristo.
Em seguida buscamos outra testemunha que não está entre aqueles que abandonaram tudo para seguir a Cristo. Esta testemunha não
era alguém diplomado numa escola de direito respeitada, mas ele tinha
experiência, de primeira mão, dos procedimentos legais romanos. Ele
estava “do lado errado da lei”, e prestes a pagar o preço máximo pelos seus crimes. Ele estava agora além do ponto de poder protestar sua
inocência. Para seu companheiro ele reconheceu a justiça do processo
contra eles: “E nós na verdade com justiça …”. Entre aqueles dois criminosos condenados, enquanto conversavam naquela ocasião, dois mil
anos atrás, estava Outro; de quem ele disse: “… mas Este nenhum mal
fez” (Lc 23:41). Sua afirmação era absoluta; não precisava de explicação. Ele, um criminoso condenado, prestou um testemunho voluntário
A impecabilidade da Sua Pessoa 57
à impecabilidade de Cristo. O Homem ao seu lado era absolutamente
sem pecado.
A testemunha que acabamos de citar é descrita de várias maneiras
no Novo Testamento. Ele é chamado de:
• Um dos dois salteadores1 — ou melhor, “assaltantes”, pois eles haviam usado de violência (Mt 27:38, 44; Mc 15:27);
• Um dos dois ladrões2 (ARA — ou “transgressores”) com quem a
paródia de justiça de Roma ousou comparar Cristo (Mc 15:27);
• Um dos malfeitores3 que foram crucificados com Cristo (Lc 23:3233, 39).
A linguagem que as Escrituras usam para descrever suas obras nefastas é clara. Notamos que a linguagem bíblica usada acerca de Cristo
igualmente o é.
Mesmo Judas, que traiu o Senhor, falou de ter traído “sangue inocente” (Mt 27:4). Somente quem for cego pode deixar de perceber que
a oportunidade singular que Judas teve para observar o Senhor em público e em particular, deve ter-lhe permitido examinar aquela vida como
poucos outros puderam. Judas viu o Senhor como inculpável. Judas viu
o caráter preciso dos Seus caminhos, e que Sua vida era vivida num
patamar totalmente além do alcance de outros homens. Já foi dito que
“em momentos sublimes de devoção, nós nos dedicamos novamente a
Deus”, mas Judas viu que não havia flutuações periódicas na devoção
do Senhor ao Seu Pai. A avaliação de Judas quanto à vida e caráter
de Cristo era falha, do contrário sua avaliação do sangue que ele foi
culpado de derramar teria sido “precioso” e não “inocente”. Antes de pecar, desobedecendo ao único mandamento expresso de Deus, Adão era
inocente. Ele nunca havia pecado, nem encontrado alguém que pecara.
Consequentemente, ele não conhecia, nem tinha observado os efeitos
do pecado no pecador. Mas como Judas deveria ter sabido, o Senhor
era santo. Mesmo numa sociedade corrompida pelo pecado, o Senhor
era totalmente sem pecado, seja em ato, palavra, pensamento ou moti1
2
3
No Grego, lēstēs: “alguém que rouba abertamente e com violência”.
No Grego, ánomos, “alguém sem lei”, “um violador da lei divina”.
No Grego, kakoûrgos, “alguém que faz o mal”, que “produz, ou é autor, do mal”: a ênfase
está no trabalho árduo empregado para promover a causa do mal.
58
A glória do Filho
vo: Ele era santo, tão santo como quando antes da Sua encarnação, os
serafins clamavam da santidade do Deus triuno: “Santo, santo, santo
é o Senhor dos Exércitos” (Is 6:3). Todavia, notamos que Judas deu
um testemunho espontâneo e absoluto da impecabilidade de Cristo.
Infelizmente, a suficiência do seu testemunho ficou aquém daquilo que
a sua experiência deveria ter revelado dAquele que conhecia o bem e o
mal como nenhum outro homem e, no entanto, permaneceu intrinsecamente santo.
Todos os depoimentos destas muitas testemunhas ainda não são
suficientes para expressar adequadamente a singularidade de Cristo em
relação à Sua impecabilidade. Contudo, reconhecidamente, as palavras
deles deixam uma impressão da profunda convicção que eles tinham
quanto à vida imaculada que haviam observado.
“Outro … testifica” (Jo 5:32)
Em outras partes das Escrituras o Espírito de Deus dá testemunho
eloquente da impecabilidade de Cristo. Há três versículos no Novo Testamento que são corretamente citados quando esta verdade importante
é ensinada:
• “… o qual não cometeu pecado” (I Pe 2:22);
• “Aquele que não conheceu pecado” (II Co 5:21);
• “… nEle não há pecado” (I Jo 3:5).
Estes versículos vêm de diferentes autores, cada um deles muito
mais idôneo para escrever sobre a impecabilidade de Cristo do que o
ladrão que recebeu a devida recompensa dos seus feitos, no Calvário.
Estes versículos, não permitem nenhuma concessão quanto à impecabilidade de Cristo — em obra ou palavra. Mas os termos empregados
são tão profundos que indicam também que Ele não conheceu pecado,
isto é, Ele não tinha “nenhuma consciência” de pecado na Sua experiência pessoal, e nenhuma presença de pecado habitando no Seu ser. O
Senhor Jesus não possuía senso algum de indignidade pessoal. De fato,
Ele podia levantar Seus olhos e, por causa das pessoas ao redor, dizer
publicamente: “Pai, graças Te dou por Me haveres ouvido. Eu bem sei
que sempre me ouves” ( Jo 11:4143), antes de chamar Lázaro para fora
da morte. Todos os homens que tem um desejo crescente de agradar a
Deus tem também uma convicção crescente que os faz temer e con-
A impecabilidade da Sua Pessoa 59
fessar: “Diante de Ti puseste as nossas iniquidades, os nossos pecados
ocultos, à luz do Teu rosto” (Sl 90:8). Mas o Senhor também falou de
estar angustiado na Sua alma. Não era como a angústia de alma que
visivelmente abateu homens como Davi e Pedro quando a convicção
do seu pecado começou a assombrá-los. Era o reconhecimento daquilo
que Ele teria que empreender por causa do pecado de outros que explica
as palavras: “Agora a Minha alma está perturbada: e que direi Eu: Pai,
salva-Me desta hora; mas para isto vim a esta hora”. Não havia consciência de pecado nAquele que em seguida disse: “Pai, glorifica o Teu
nome”; nAquele a Quem a aprovação divina absoluta ressoou dos Céus:
“Já o tenho glorificado, e outra vez o glorificarei” ( Jo 12:27-28).
Já mencionamos acima que, ao falar de nosso Senhor Jesus, devemos tomar cuidado para dar a palavras como “impecável” ou “sem
pecado” o significado total daquilo que o Espírito Santo revela sobre o
caráter de Cristo. O ladrão cujo depoimento foi citado falou do Senhor
Jesus como alguém que “nenhum mal fez”. A frase significa simplesmente que não havia nada fora de lugar, ou fora do limite, na vida que
ele tinha observado por pouco tempo. Sua linguagem não era a de um
teólogo, mas foi um testemunho claro daquilo que ele queria expressar
por impecabilidade, ao testificar do Senhor Jesus. Este artigo irá falar
sobre o que as Escrituras ensinam sobre a impecabilidade de Cristo, que
significa mais do que inculpabilidade visível.
Mais do que inculpabilidade visível:
a importância do nascimento virginal
Devemos salientar que o Senhor Jesus não se tornou impecável.
Desde o momento em que entrou neste mundo como o Bebê envolto
em panos e deitado numa manjedoura, até ser pregado na cruz, Ele
nunca se arrependeu de uma palavra, ato ou pensamento. Ele nunca
corrigiu uma declaração, nunca revisou um processo de pensamento, e
nunca se desculpou por um pecado, fosse ele de comissão ou omissão.
Ele nunca buscou o perdão de Deus ou de algum homem. Muitos olham
com admiração para a singularidade de Cristo, e fazem a pergunta de
Nicodemos: “Como pode ser isso?” ( Jo 3:9). Desde o momento que
Cristo entrou neste mundo, Ele foi absolutamente santo. Davi aprendeu
dolorosamente sobre “a chaga do seu coração” (I Rs 8:38), depois que
a concupiscência o levou ao adultério a ao homicídio. A visita de Natã
60
A glória do Filho
expôs o seu pecado aos outros, e seu estado pessoal ao próprio Davi:
“Eis que em iniquidade fui formado, e em pecado me concebeu minha
mãe” (Sl 51:5). Mas não foi assim com o Senhor de Davi. Como iremos
notar, as maquinações dos homens e demônios apenas revelaram a singularidade do Homem que não tinha um só traço do pecado de Adão.
Na Sua concepção sobrenatural e subsequente nascimento de uma mãe
virgem, Ele não herdou vestígio de pecado transmitido. A importância
do nascimento virginal é evidente ao observarmos o Homem impecável
desde o nascimento. E tamanha é esta importância que este é um fato
veementemente atacado.
Quando Gabriel foi enviado a uma cidade da Galiléia chamada
Nazaré, foi para anunciar a Maria que ela teria um filho, que se chamaria o Filho do Altíssimo. Ela fez uma pergunta semelhante a que
Nicodemos fez, trinta anos mais tarde: “Como se fará isto, visto que não
conheço homem algum?” (Lc 1:26-35). Gabriel falou do Espírito Santo
vindo sobre ela, e do fato de que o “Santo” que haveria de nascer seria
chamado o Filho de Deus. O milagre da concepção daquela Criança
não foi explicado nos detalhes que homens carnais buscam — e permanece fora do alcance de olhos hereges. Mas a fé se deleita em reconhecer
que a santidade do Senhor Jesus foi autenticada pelos Céus mesmo antes do vaso escolhido dizer: “cumpra-se em mim segundo a tua palavra”.
As narrativas do nascimento virginal de Cristo não são adições posteriores aos Evangelhos segundo Mateus e Lucas. Eram parte de, e integrais a, estes Evangelhos inspirados, desde o princípio. As diferenças
entre eles descartam imediatamente qualquer sugestão de manipulação
nas afirmações que fazem sobre uma virgem conceber e dar à luz um
filho. Cada um dos dois relatos de como Cristo Jesus veio ao mundo
descrevem cenas que complementam a narrativa que o outro apresenta.
Há pouca repetição, e certamente não há semelhanças artificialmente produzidas. Cada um é autêntico, e não subordinado ao outro. A
autonomia do seu testemunho é inatacável. Cada um desafia qualquer
pessoa a alegar que foi copiado do outro. Ambos escreveram de Cristo
enquanto centenas de testemunhas de Cristo e do Seu testemunho ainda viviam e poderiam contestar qualquer informação falsa, e centenas
de manuscritos, em diversas línguas, contêm suas afirmações de que
Cristo nasceu de uma virgem. As referências do apóstolo Paulo quanto
à humilhação do Senhor seriam totalmente sem sentido se o Senhor
tivesse vindo ao mundo pelo processo normal de procriação. Paulo fala
A impecabilidade da Sua Pessoa 61
do Senhor esvaziando-Se e tomando Seu lugar na forma e semelhança
dos homens (Fp 2:7). Paulo também fala dAquele que era “nascido de
mulher” (Gl 4:4), uma afirmação sem qualquer sentido, se o Senhor não
nasceu da virgem. Entretanto, se o ensino consistente das Escrituras é
aceito, que o Senhor era a Semente da mulher Maria, mas José não era o
Seu pai, então é uma afirmação que declara o cumprimento da primeira
promessa feita a Adão e Eva depois da Queda.
Mateus e Lucas também não estavam edificando sobre as expectativas judaicas de que o Messias nasceria de uma virgem, apesar de Isaías
7:14: “Eis que a virgem conceberá, e dará à luz um Filho, e chamá-Lo-ão pelo nome de Emanuel, que traduzido é: Deus conosco” (Mt 1:23).
Como J. Orr1 comenta: “os judeus não parecem ter aplicado, em tempo
algum, esta profecia ao Messias — fato que desmente a teoria de que foi
este texto que deu a sugestão à história do nascimento virginal aos primeiros discípulos”. Deixar de aceitar a revelação do nascimento virginal
de Cristo debilita o Evangelho, e frequentemente tem sido acompanhado da negação da ressurreição corporal de Cristo.
Mas, adicionar à revelação de Deus também tem diminuído a glória
de Deus que brilha na concepção milagrosa do primogênito de Maria. O
dogma da Imaculada Conceição propõe2 que Maria era “preservada de
toda a mancha de pecado original”. Este dogma, proclamado pelo Papa
Pio IX em 8 de dezembro de 1854, coloca Maria à parte, como a única
pessoa impecável na humanidade — “sua impecabilidade precedendo e
sendo a condição para a impecabilidade de Cristo”. O dogma firma que,
por causa do pecado original, ela precisava de redenção, exigindo que
ela fosse redimida desde o momento da concepção. Assim, se alega que
Maria foi preservada do pecado original. Que interferência séria com a
Palavra de Deus, que faria Cristo dividir Sua glória exclusiva com outra!
Em diferentes contextos há um aviso solene sobre acrescentar ou tirar
da Palavra de Deus (veja Dt 4:2, Pv 30:6, Ap 22:18-19). Este aviso é
necessário em relação ao nascimento virginal.
As Escrituras definem os limites da participação humana na apa-
1
2
ORR, J. “The Virgin Birth of Christ”, The Fundamentals. Grand Rapids: Kregel Publications,
1990: pág. 272.
OTT, Ludwig. Fundamentals of Catholic Dogma. Traduzido do alemão por Patrick Lynch.
Editado em inglês por James Cano Bastible. Rockford, IL: Tan Books, reimpressão 1974:
pág. 199.
62
A glória do Filho
rição do Salvador na consumação dos séculos, para aniquilar o pecado
(Hb 9:26). É igualmente claro que o Espírito Santo estava envolvido
na concepção que levou Maria a achar-se “ter concebido do Espírito
Santo” (Mt 1:18). O anjo do Senhor pôde, portanto, assegurar a José, o
marido desposado de Maria, que “O que nela está gerado é do Espírito
Santo” (Mt 1:20). Hebreus 10:5 cita o Salmo 40 para confirmar que a
formação do corpo no ventre de Maria era preparação divina: “corpo
Me preparaste”, para que Ele pudesse dizer: “Eis aqui venho para fazer, ó Deus, a Tua vontade” (Hb 10:5-9, citando Sl 40:6-8); para que
o Verbo pudesse se tornar carne e tabernacular entre os homens. Tão
grande era o milagre da encarnação que o Pai, o Filho e o Espírito Santo estavam todos envolvidos na realização do conselho divino. Lemos
que Deus, “enviando o Seu Filho em semelhança da carne do pecado
pelo pecado condenou o pecado na carne” (Rm 8:3); “o Pai enviou Seu
Filho para Salvador do mundo” (I Jo 4:14). Mas o Filho também estava
envolvido: “o Verbo se fez carne, e habitou entre nós” ( Jo 1:14); Ele
“esvaziou-Se a Si mesmo, tomando a forma de servo, fazendo-Se semelhante aos homens” (Fp 2:7). Já notamos a ação do Espírito no que diz
respeito à concepção de Maria.
Romanos 8:3, acima citado, ressalta a importância do nascimento
virginal para o propósito de Deus. O Espírito Santo dirigiu as palavras
usadas para transmitir a necessidade do nascimento virginal. Notamos
que:
• Não é dito que o Senhor veio em semelhança de carne, senão a
realidade da Sua humanidade poderia ser questionada;
• O Senhor não veio em carne de pecado, senão Ele não seria idôneo
para oferecer-Se a Si mesmo imaculado a Deus (Hb 9:14); mas
• Ele foi enviado na semelhança da carne do pecado “pelo pecado”.
Quando Deus enviou Seu Filho, Ele veio de uma mulher (Gl 4:4),
assim proporcionando-Lhe uma ligação com a raça humana. Sem essa
ligação, Ele não poderia ser o nosso Árbitro, que pudesse colocar a Sua
mão tanto sobre Deus quanto sobre os homens ( Jó 9:33). Paulo acrescenta, naquela passagem em Gálatas, que Ele veio também sob a Lei,
para Lhe proporcionar uma ligação com a nação que necessitava da
redenção da servidão da Lei. Em outro lugar ele lembra Timóteo que o
Senhor veio da semente de Davi para que o domínio real possa, um dia,
A impecabilidade da Sua Pessoa 63
pertencer a Ele (II Tm 2:8). Foi a Sua vinda de uma mulher que nos
assegura da verdadeira humanidade de Cristo — Ele podia ser visto,
tocado e apalpado (I Jo 1:1); Ele podia ter fome, sede, e estar cansado.
Mas o Seu nascimento da virgem também traz a garantia de que Ele
não participou da corrupção que caracterizou a raça de Adão. Ele era o
“Santo”. Nós confessamos que “Jesus Cristo veio em carne” (I Jo 4:2),
mas igualmente afirmamos energicamente que Aquele que participou
da carne e do sangue (Hb 2:18) não participou do pecado de Adão.
Disto, Seu nascimento virginal é a garantia.
Sem vestígio do pecado de Adão,
Um Homem singular na concepção.
Comportamento puro, imaculado coração,
Nosso bendito Senhor.
(I. Y. Ewan)
Mas de que maneira o nascimento do Senhor Jesus da virgem está
ligado com a Sua impecabilidade? Se Ele nasceu de uma virgem, certamente não havia um pai humano, mas será que a corrupção que caracteriza a raça humana não seria tão facilmente transmitida pela mãe quanto pelo pai? O fato de não haver pai humano envolvido na concepção
daquele “Santo”, significou que o processo normal de geração humana
foi posto de lado. Deus agiu de uma forma descrita pelo anjo Gabriel:
“descerá sobre ti o Espírito Santo” (Lc 1:35). Assim Deus garantiu que
naquela concepção miraculosa no ventre de Maria não houvesse, desde
o primeiríssimo instante, o menor vestígio de pecado. Deus não revelou
como este milagre foi efetuado. Gabriel anunciou que a obra do Espírito Santo seria incontaminada de pecado: “O que há de nascer será
chamado Santo” (Lc 1:35). A evidência da vida impecável do Senhor
é a confirmação da revelação de Gabriel, permitindo-nos concluir que
o nascimento virginal era essencial para o grande plano de Deus da
salvação.
Mais do que inculpabilidade visível:
a importância da tentação do Senhor
O que sabemos sobre a natureza da tentação? Devemos muito a
Tiago por nos apresentar, em Tiago 1:12-15, a doutrina de tentação
pelo mal, como se aplica aos homens hoje. Ele menciona três fatores
com os quais, infelizmente, todos nós estamos familiarizados: concu-
64
A glória do Filho
piscência, pecado e morte. A natureza da tentação, como é conhecida
por “cada um” (v.14), inclui estes três fatores. A generalização que Tiago
faz abrange todo ser humano, desde que Adão primeiramente pecou até
agora, com exceção do Senhor Jesus. Quando Satanás coloca a tentação
diante de qualquer outra pessoa, sempre há um ponto de partida para
ser usado pelo maligno. Tiago identifica este ponto de partida como a
concupiscência, e identifica esta concupiscência com a pessoa que está
sendo tentada: “a sua própria concupiscência”. Porém, o Senhor Jesus
podia calmamente anunciar aos Seus no cenáculo, naquela noite em
que Ele foi traído: “se aproxima o príncipe deste mundo, e nada tem em
Mim” ( Jo 14:30). Ele estava dizendo que no Seu caráter e caminhos,
Satanás não encontraria ponto de apoio; não havia paixão maligna; não
havia nenhum pecado interior, nenhuma concupiscência para a qual
Satanás podia apelar. O Senhor Jesus nunca pecou, como muitas testemunhas oculares afirmaram. O Senhor Jesus não podia pecar quando
tentado pelo diabo, pois não havia nenhuma inclinação para o pecado,
como há em todo homem desde Adão.
O que aconteceu quando Adão pecou? Já havia concupiscência
no seu coração? Não há fundamento bíblico para afirmar que antes de
Adão ser tentado, já havia espreitando ali a concupiscência que Tiago
identifica na sequência vergonhosa que leva ao pecado e à morte. Igualmente não há nenhuma base bíblica para apoiar qualquer afirmação
de que havia o potencial para pecar no Senhor Jesus. O que podemos
concluir da queda de Adão é que havia dois aspectos daquela entrada
inicial do pecado na raça humana que são identificadas por Paulo como
engano, pois “a mulher, sendo enganada, caiu em transgressão” (I Tm
2:14), e “desobediência [deliberada e voluntariosa] de um só homem”
(Rm 5:19). Somente aqueles presos por Satanás iriam sugerir que o
Senhor Jesus poderia ser enganado ou ser capaz de transgressão deliberada e voluntariosa, “à semelhança da transgressão de Adão” (Rm 5:14).
Era possível enganar Aquele que “bem sabia o que havia no homem”
( Jo 2:25), que testificou que o diabo “não se firmou na verdade porque
não há verdade nele” ( Jo 8:44)? Nem homem nem demônio poderiam
enganá-Lo! Este, que sempre fez “o que agrada” ( Jo 8:29) ao Pai, seria
capaz de transgressão voluntariosa e deliberada? Visto que “todo o engano da injustiça” (II Ts 2:10) não podia atrai-Lo, onde está a evidência
de que Aquele cuja vida era caracterizada por não agradar a Si mesmo
(Rm 15:3) seria capaz de deliberada e voluntariosa transgressão?
A impecabilidade da Sua Pessoa 65
O que foi revelado sobre a tentação do Senhor? Que o Senhor foi
tentado é explicitamente afirmado, tanto nos relatos dos Evangelhos
quanto na Epístola aos Hebreus, onde lemos que Ele “como nós, em
tudo foi tentado, mas sem pecado” (Hb 4:15; veja 2:18). Precisamos
destacar que o nosso Sumo Sacerdote está equipado para condoer-Se
conosco, assolados como somos por fraquezas. Ele provou a rejeição
dos homens, a incompreensão até mesmo no lar onde cresceu, e as privações da vida, conhecidas por tantos. Mas Ele nunca caiu em pecado,
portanto, como nosso Sumo Sacerdote Ele não Se compadece conosco
quando pecamos. Mas como nosso Advogado para com o Pai, desde o
momento em que um cristão peca, Ele Se ocupa em trazê-lo à confissão
e restauração.
Foi dada a três dos quatro evangelistas (Mateus, Marcos e Lucas) a
tarefa de registrar com suprema exatidão uma das mais impressionantes
cenas jamais protagonizadas na história humana. No contexto do ensino de Tiago sobre a tentação, considerado acima, Tiago enfaticamente
afirma: “Deus não pode ser tentado pelo mal” (Tg 1:13). Consequentemente, por causa da sua ênfase na divindade do Senhor Jesus, João não
inclui o relato da tentação de Cristo.
A cena é diferente da cena da transfiguração, pois não houve testemunhas humanas, e assim como na concepção miraculosa no ventre de
Maria, não podemos satisfazer o apetite carnal com explicações sobre
como a tentação se deu. Nenhum dos apóstolos teve acesso àquele deserto onde o Senhor estava sendo tentado pelo diabo durante quarenta
dias. Também não sabemos se o Senhor mesmo comentou sobre aqueles quarenta dias com os Seus. Apesar disso, aprouve ao Espírito de
Deus dar-nos três relatos inspirados do que aconteceu durante aquele
período. Portanto, o que temos não são as “especulações reverentes” dos
apóstolos, mas uma revelação direta de Deus a três homens escolhidos:
Mateus, Marcos e Lucas.
Não houve nada superficial nas tentações que o Senhor enfrentou,
nem foi o seu alcance limitado. Ele enfrentou três áreas de tentação, no
clímax do período de quarenta dias de provação por que passou. Estas
se relacionam a:
• Satisfazer os desejos naturais do corpo por alimento;
• Envolver-se numa exibição espetacular atraente a uma nação in-
66
A glória do Filho
crédula, ao atirar-Se de uma das torres do templo que Herodes
construiu;
• Ceder à impiedade espiritual para adorar Satanás em troca dos
reinos deste mundo.
O Senhor tinha, naquele tempo, cerca de trinta anos de idade. Estas
não foram as únicas áreas de tentação que Ele suportou durante aquele
período. Marcos e Lucas destacam que as três tentações mencionadas
foram o auge de quarenta dias de prova, durante os quais o Senhor jejuou (Mc 1:13; Lc 4:2). Ele foi tentado durante todos os quarenta dias.
Não podemos entrar no período inicial das tentações, mas lembramos
das palavras do Senhor sobre um período de provação que ainda não
chegou à história deste mundo: “todas estas coisas são o princípio de
dores” (Mt 24:8). Nada sabemos da intensidade do período inicial da
tentação que Ele enfrentou, mas sabemos que a tentação causou sofrimento a Cristo. As tentações que ocorreram durante o período de
quarenta dias foram as iniciais, como indicado pela frase de Lucas:
“… terminados eles [os quarenta dias]” (Lc 4:2). W. Kelly insiste que as
primeiras tentações foram além da nossa compreensão, e por esta razão
não foram registradas pelos evangelistas. Certamente o Espírito não
nos deu detalhes das tentações iniciais, mas destacamos o caráter do
Homem que podia suportar tal ataque violento e prolongado do diabo por quarenta dias. Nenhum outro homem poderia ter permanecido
invicto depois de quarenta dias de tentações do diabo. É evidente que
a Sua tentação foi real pela própria linguagem da Escritura: “Ele mesmo, sendo tentado, padeceu” (Hb 2:18). Como alguém tem comentado,
Ele não era um “campeão armado exposto a dardos de brinquedo”. Ele
enfrentou a fúria total do poder e da sabedoria orgulhosa de Satanás.
Toda a malevolência adquirida durante séculos, tentando homens desde
Adão até Cristo, foi descarregada contra o Senhor. E precisamos notar
que foi o próprio Satanás quem tentou Cristo no deserto, e que veio novamente tentá-lO naquelas horas antes e durante a paixão do Salvador.
A tarefa que Satanás sabia ser grande demais para o seu anjo mais poderoso, provou ser também grande demais para aquele que Paulo chama
de “o próprio Satanás” (II Co 11:14). O próprio Satanás não era páreo
para o Filho de Deus.
A intenção de Satanás era colocar no coração de Cristo um desejo
que não era de Deus, assim como ele fora “bem sucedido em insinuar
A impecabilidade da Sua Pessoa 67
uma concupiscência”1 no coração de Adão. Satanás certamente não estava engajado numa prova não destrutiva; ele buscava destruir o próprio
Filho de Deus. Com intenções maléficas ele tentou Cristo, mas descobriu que este não era outro Adão, mas aquele que não podia pecar.
Mesmo depois de quarenta dias, nos quais muito provavelmente vários
estratagemas foram usados, o Senhor permaneceu irredutível.
Vale a pena enfatizar que o Senhor estava sem companhia humana
no deserto, onde Ele foi tentado por quarenta dias. Nenhum dos três
Evangelhos identifica a região específica de deserto ao qual Ele foi impelido pelo Espírito. A palavra em Marcos, “impelido”, pode sugerir
que o Senhor não apenas entrou nas orlas do deserto junto do Jordão,
mas subiu até o deserto solitário ao oeste do Jordão. (A tradição localiza a tentação perto de Jericó.2) O local da Tentação foi num deserto
isolado onde havia feras (Mc 1:13), que surgiram somente depois da
Queda. Naquele deserto, não havia nenhum ser humano para apoiar o
Senhor ou oferecer Lhe conselho, enquanto Ele estava exposto às ciladas do maligno. Ali, o Servo perfeito, totalmente distante de comunhão
humana, suportou a presença do maligno por quarenta dias. De novo,
relembramos que este não era o Éden que Adão conhecera antes da
Queda, pois tanto Mateus como Lucas destacam que durante aqueles quarenta dias o Senhor nada comeu (Mt 4:2; Lc 4:2). No deserto
não havia nenhum jardim onde poderia crescer “toda árvore agradável
à vista, e boa para comida” (Gn 2:9). Não que não houvesse alimento
disponível; contudo Lucas nos fala dEle tendo fome, e Mateus emprega o verbo “jejuar religiosamente”.3 Portanto, concluímos que durante
aqueles quarenta dias de tentação o nosso Senhor permaneceu em santo
exercício perante o Seu Deus.
Os homens não sabiam onde o Senhor estava durante aqueles quarenta dias, mas os Céus O guiaram ao lugar e O mantiveram sob seus
olhares durante aqueles dias notáveis. Sabemos que o olhar do Céu estava sobre aquela cena, pois àquele lugar isolado no deserto vieram “os
anjos e O serviam” (Mt 4:11), mas eles vieram depois que o diabo O
deixou. Concluímos então que o diabo pôde tentar o Senhor Jesus com
1
2
3
Darby, J. N. Notes on the Gospel of Luke. Glasgow: Robert Allan, 1869: pág. 35.
Vincent, M. R. Word Studies in the New Testament. Grand Rapids: Wm Errdmands, Sétima
impressão, 1980: p. 163.
Do Grego nesteuõ (Strong 35222), Mt 4:2.
68
A glória do Filho
aquelas três tentações finais quando o corpo havia suportado a fome por
quarenta dias, quando não havia nenhum ser humano por perto e antes dos anjos virem para servi-Lo. Tudo que qualquer oponente crítico
pudesse ter considerado como um esteio fora removido, e mesmo assim
o diabo teve que retirar-se da contenda como um adversário derrotado.
Reconhecemos que há “uma grande distância entre a inculpabilidade visível e a perfeição impecável”. O que a tentação no deserto provou
foi que o Senhor não era somente exteriormente inocente, isto é, não
havia vestígio de pecado naquela Vida, mas também que este Ser era
totalmente sem pecado, tanto interiormente quanto exteriormente.
Mais do que inculpabilidade visível:
incapaz de pecar
Muitos têm “concepções vagas e nebulosas” sobre a Pessoa de Cristo, e avidamente conjecturam sobre questões das mais sérias. Uma tendência prevalecente onde tais concepções são adotadas é tentar dividir
os pensamentos e atos do Senhor em categorias, algumas relacionadas
à Sua Divindade, outras à Sua humanidade. Eles deixam de reconhecer
que todos os pensamentos do Senhor Jesus e todos os Seus atos foram
os de uma Pessoa indivisível.
A doutrina do NT não é apresentada “em termos que transformariam o Redentor em dois agentes distintos”1. Assim ouvimo-lO dizer:
“Eu e o Pai somos um” ( Jo 10:30), mas como H. P. Liddon destaca,
nunca “Eu e o Filho somos um”, nem “Eu e o Verbo somos um”. A
indivisibilidade da Pessoa do Senhor é um fundamento da fé. Naquela
única Pessoa, “manifestado nestes últimos tempos por amor de vós” (I
Pe 1:20), havia uma vontade distinta. Os homens reconheceram isso
quando disseram: “Se queres, bem podes limpar-me” (Mc 1:40). Eles
sabiam que quando o Senhor falava ou agia, havia a manifestação daquela vontade. Não havia duas vontades operando naquela uma Pessoa.
A vontade que atuava estava, obviamente, sempre em perfeita harmonia
com a vontade de Deus. No Getsêmani, o Senhor não falou de duas
vontades operando na Sua Pessoa. Quando Ele falou da Sua vontade,
Ele usou o pronome possessivo singular. Ele clamou: “Não se faça a Minha vontade”. Como uma Pessoa indivisível, Ele tinha vontade, e a Sua
1
Liddon, H. P. The Divinity of our Lord. London: Rivingtons, 1889: pág. 261.
A impecabilidade da Sua Pessoa 69
vontade era fazer a vontade do Pai. Naquela ocasião, e de fato durante
toda a Sua vida impecável, a Sua vontade correspondia plenamente e
com precisão resoluta com a vontade de Deus. Sua vontade, “embora
um princípio próprio de ação, não estava, nem poderia estar, senão na
mais absoluta harmonia com a vontade de Deus. A impecabilidade de
Cristo é a expressão histórica desta harmonia.”1
Quando o Pai enviou o Filho para ser o Salvador do mundo, sabemos que vindo ao mundo Ele disse: “Eis aqui venho (no princípio do
livro está escrito de Mim) para fazer, ó Deus, a Tua vontade” (Hb 10:7,
citando Sl 40:6-8). A vontade singular daquela uma Pessoa indivisível
é expressa nestas palavras, sem qualificação. Esta vontade singular era
exercida constantemente para o prazer do Pai. Quando Ele teve fome
no deserto, Ele não exerceu o poder que Lhe pertencia de transformar
pedras em pães. Ele não o faria sem uma ordem expressa do Seu Pai.
Tê-lo feito seria fazer a Sua própria vontade, mas Ele viera fazer a vontade do Pai.
Por causa da indivisibilidade da Sua Pessoa, seria um grande erro
sugerir que como Deus o Senhor não podia pecar, mas que como homem Ele poderia ter pecado, embora não o tenha feito. Esta sugestão
difamatória supõe que a Sua vontade como Deus nunca aprovaria pecar,
mas que havia outra vontade operando que poderia ter desejado pecar.
Isto necessitaria duas vontades naquela única Pessoa bendita, se Ele
fosse capaz de pecar.
Sabemos pelo Novo Testamento que Deus não pode:
• Mentir (Tt 1:2; Hb 6:18);
• Negar-se a Si mesmo (II Tm 2:13; Hb 11:11);
• Ser tentado (Tg 1:13).
Há evidências claras de que o nosso Senhor não podia mentir; do
contrário, teríamos que concluir que Ele mentiu quando usou palavras
incondicionais para declarar: “Eu sou … a verdade” ( Jo 14:6). Esta expressão tinha a intenção de transmitir o que os cristãos têm por precioso: a compreensão daquilo que somente o Senhor podia transmitir
ao homem, bem como a absoluta segurança da Sua palavra. Depois da
Sua ressurreição, o Senhor continuou a descrever-Se em termos que
1
Liddon, H. P. ibid., pág. 266.
70
A glória do Filho
são incompatíveis com o potencial de mentir. Ele Se apresentou aos
Laodicenses como “o Amém, a testemunha fiel e verdadeira” (Ap 3:14).
A fidelidade de Deus, que não pode negar-Se a Si mesmo, foi eficaz
em Sara quando ela estava além da idade de conceber (Hb 11:11). Sara
não estava sozinha na sua convicção de que Deus era fiel. Na época de
Jeremias, talvez a época mais negra que o VT registra, ele reconheceu:
“grande é a Tua fidelidade” (Lm 3:23). A evidência disto foi dada em
misericórdias que se renovavam a cada manhã. Paulo afirma a Timóteo
que tal é o caráter de Cristo que Ele “não pode negar-Se a Si mesmo” (II
Tm 2:13). Ele sabia em Quem havia crido, e estava persuadido de que
Ele era capaz de guardar aquilo que Lhe fora confiado até aquele dia (II
Tm 1:12). A eternidade de Paulo dependia dAquele que era sempre leal
a Si mesmo, que não podia negar-Se a Si mesmo.
Uma terceira característica de Deus, que é também expressa em
termos que envolvem negativos como “não pode”, ou “impossível”, foi
declarada por Tiago àqueles que culpavam Deus de tentá-los com o
mal (Tg 1:13). Ao examinarmos os quatro retratos de Cristo dados pelo
Espírito através de Mateus, Marcos, Lucas e João, não vemos nada que
permitiria à mais pervertida das mentes produzir a alegação de que o
Senhor tentou alguém com o mal. As quatro representações de Cristo
também mostram que Ele próprio não podia ser tentado com o mal. Os
homens poderiam ter dito dEle: “Tu és tão puro de olhos que não podes
ver o mal” (Hc 1:13).
Concluímos que, como “Deus não pode ser tentado pelo mal”, assim Cristo também não pode ser tentado pelo mal. Estamos igualmente
persuadidos de que, como Deus não pode pecar, também Cristo não
pode pecar.
Conclusão
O testemunho deixado pelos apóstolos diz respeito a um Homem
real, que não somente não pecou, como também não podia pecar. Ele
era sem pecado e era incapaz de pecar. Que Ele era impecável é o testemunho inequívoco do Novo Testamento. A impecabilidade de Cristo
é um fundamento para nossa compreensão da pessoa e obra de Cristo.
Seu nascimento virginal, Sua vida sem pecado, o fato dEle ser feito
pecado por nós, e Sua ressurreição gloriosa, são todos aceitos pela fé
A impecabilidade da Sua Pessoa 71
através do testemunho apostólico. Não é necessário que nos perguntem:
“Por que se julga incrível entre vós que Deus ressuscite os mortos?” (At
26:8, ARA). Nem precisamos ser perguntados, “por que se julga incrível
entre vós que o Filho eterno de Deus não podia pecar?”
Cap. 5 — A beleza do Seu ministério
por Thomas H. Matthews, Brasil
Descrever a beleza do ministério do Senhor é uma tarefa para a qual
até mesmo a mente angélica seria inadequada. Quão aptas as palavras:
Somente o Pai (glorioso dito!)
Pode o Filho compreender.1
(Josiah Condor)
Que outra mente, além da divina, poderia apreciar plenamente as
palavras dAquele que falou como jamais homem algum falou, e cujas
obras eram tais como nunca homem algum fez? Contudo, é a maior
bênção possível para o cristão ponderar profundamente naquela vida
preciosa e ser assim transportado ao domínio da luz, para ali compartilhar, em parte, os pensamentos do Pai em relação ao Seu Filho.
É evidente que estamos prestes a estudar um ministério singular.
Quem, senão Ele, poderia usar uma linguagem como aquela encontrada
em João 8:38: “Eu falo do que vi junto de Meu Pai”, ou a de João 6:63:
“As palavras que vos disse são espírito e vida”? Quem, senão Ele, poderia dizer: “Quem Me vê a Mim vê o Pai” ( Jo 14:9)? Somente dEle pode
ser dito: “E o Verbo Se fez carne, e habitou entre nós, e vimos a Sua
glória, como a glória do Unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade”
( Jo 1:14).
O esboço do Seu ministério
Apresentar um relato detalhado dos movimentos do Senhor com
exatidão garantida seria uma tarefa tremenda, e não tentaremos fazer
isto neste breve capítulo.
É evidente que houve um ministério inicial na Galiléia, como visto
em João 2:1-11. Fica claro através de João 2:13 que houve uma visita a
Jerusalém, no princípio do Seu ministério, quando houve a purificação
do Templo e também a entrevista com Nicodemos. O período inicial,
na Judéia, acaba em João 4:1-3, quando o Senhor partiu para a Galiléia
passando por Samaria. Uma obra preciosa foi feita em Samaria, e uma
1
“The Father only (glorious claim!) / The Son can comprehend.”
73
A beleza do Seu ministério preciosa verdade foi revelada à mulher samaritana. O ministério da Galiléia parece ter ocupado um período prolongado do tempo do Senhor.
Em diversas ocasiões, Ele deixou a área por um tempo.
Lucas apresenta, em detalhes, a última viagem do Senhor para Jerusalém, começando em 9:51. Muitas regiões foram visitadas nesta viagem
até que, finalmente, Ele veio à cidade de Jerusalém e ao Templo, onde
enfrentou o interrogatório dos principais dos sacerdotes, dos anciãos,
dos escribas, dos fariseus e dos saduceus. Marcos 12:34 apresenta um
comentário apropriado do resultado destas entrevistas: “E já ninguém
ousava perguntar-lhe mais nada”.
A tentação
Mateus, Marcos e Lucas mencionam os quarenta dias no deserto
durante os quais o Senhor foi tentado pelo Diabo. No final do Seu
ministério houve mais uma grande batalha com o adversário. Em Lucas
22:53 Ele disse aos principais dos sacerdotes e capitães do Templo: “esta
é a vossa hora e o poder das trevas”. Estas palavras indicam o terrível
conflito com Satanás que fazia parte do Seu sofrimento e morte. Naquele conflito houve profundezas insondáveis. A vitória no princípio,
no deserto, não somente O manifesta como o verdadeiro Messias, mas
também declara Sua idoneidade para incumbir-se da batalha final na
cruz.
Se o “primeiro homem” foi testado, assim também o “segundo homem” precisa ser posto à prova. Adão foi testado nas circunstâncias mais
favoráveis, no jardim do Éden, com uma abundância de frutos suculentos para satisfazer a sua fome. A existência daquele deserto estéril
onde o Senhor foi tentado era, com certeza, um dos tristes resultados
da queda de Adão. Ninguém irá jamais saber plenamente o sofrimento
que aqueles quarenta dias de tentação trouxeram ao Filho de Deus. Recusando transformar as pedras em pães, Ele manifestou a Sua perfeita
submissão à vontade do Pai. Recusando adorar Satanás Ele declarou
Seu amor e devoção constantes a Deus: “Adorarás o Senhor teu Deus, e
só a Ele servirás” (Lc 4:8). Recusando lançar-Se do pináculo do Templo,
Ele manifestou Sua perfeita confiança em Deus. Aquele que triunfou
no deserto é assim declarado perfeitamente idôneo para o Seu ministério público singular. Como já foi afirmado, Ele também é visto como o
Vencedor garantido da batalha das eras, travada e vencida na cruz.
74
A glória do Filho
A beleza da santidade no Seu ministério
O ministério público do Senhor Jesus contém dois atos notáveis
de julgamento no Templo, um no início e outro perto do final do Seu
ministério ( Jo 2:13-17 e Mc 11:15:17). Aqueles que amam e compreendem a verdadeira santidade, percebem a sua beleza na paixão consumidora com que o Senhor separa o mundano do sagrado, quando o
dinheiro dos cambistas é espalhado e suas mesas viradas ( Jo 2:15). Seu
zelo santo não permitiria que os pátios do Templo fossem usados por
conveniência ou como um atalho para o transporte de vasos.
O conceito do Senhor sendo o “bondoso Jesus, meigo e terno” pode
ser apropriado para um hino infantil. Não é uma descrição errada, mas
Aquele que é essencialmente Santo não podia fazer outra coisa senão
manifestar algo da “ira do Cordeiro” (Ap 6:16), quando confrontado
com o mal na Sua casa. Quão impressionante e solene é ouvir, mais tarde, a declaração de juízo sobre os escribas e fariseus por Aquele a quem
todo juízo foi confiado ( Jo 5:22). Os “ais” do Senhor tocaram fundo na
hipocrisia e horrível falsidade deles. Na presença de um desvio tão grave dos caminhos de Deus, a santidade perfeita foi ultrajada, como não
poderia deixar de ser.
Avançando em pensamento para a hora negra na qual os principais
sacerdotes e fariseus se aproximaram para prendê-lO, podemos testemunhar a beleza do poder repulsivo da santidade quando, mediante
Suas palavras “Sou Eu”, os homens maus recuaram e caíram por terra
( Jo 18:5-6).
Admiráveis são as palavras do Salmo 29:2: “Adorai o Senhor na
beleza da santidade”. A inferência é clara. Divina santidade é apreciada
mais profundamente por aqueles que se aproximam de Deus na beleza
de santidade de vida e caráter pessoais.
As orações do Senhor Jesus
No início de qualquer estudo sobre a vida de oração do Senhor
Jesus, é preciso notar que haverá muito que a diferenciará da de outros.
Não haverá confissão de pecado ou de falha. É interessante também que
não há nenhum relato do Senhor juntando-se a outros em oração. O
estudo precisa ser abordado com certa reserva reverente. Como irá um
Homem perfeito, incapaz de pecar, orar? Como irá Aquele que é Deus,
A beleza do Seu ministério 75
orar? Fica claro que o Filho de Deus se tornou um Homem dependente: “Sobre Ti fui lançado desde a madre” (Sl 22:10). A perfeição, então,
foi vista na fé da Sua dependência e nas orações que Ele pronunciou.
No Evangelho de Lucas, pelo menos dez passagens nos falam de
orações que o Senhor ofereceu. Muitas delas são registradas apenas por
Lucas. As referências são as seguintes: 3:21; 5:16; 6:12; 9:18, 29; 10:21;
11:1; 22:31-32, 39-46; 23:34. As orações do Senhor incluem a comunicação de um membro da Trindade com outro, assim, aqueles poucos
exemplos onde temos as Suas próprias palavras, nos levarão a patamares
realmente sublimes. Considerando passagens como Lucas 10:21; João
11:41; 12:28 e o capítulo 17, fica aparente que o Senhor nunca entrou
na presença do Pai como Alguém que estivera à distância. Ele fala como
Um que estava sempre na presença imediata do Pai. Ele estava sempre
no seio do Pai ( Jo 1:18). Sua vida era uma vida de comunhão ininterrupta.
A oração de João 17 é, de longe, a mais extensa de todas as que
estão registradas. Nela o Senhor fala com Seu Pai como a um igual.
Ele está cônscio de perfeição na realização da obra que Lhe foi dada a
fazer. No v. 24 Ele diz: “Pai, aqueles que Me deste quero que, onde Eu
estiver, também eles estejam comigo, para que vejam a Minha glória que
Me deste”. Aqui vemos a intimidade de igualdade absoluta. Ninguém,
a não ser Ele, poderia usar tal linguagem. O relacionamento entre o
Pai e o Filho é de intimidade inescrutável. Ninguém irá jamais saber
plenamente o que o Filho significava para o Pai, desde a eternidade.
Somente o Pai poderia avaliar plenamente a Sua vida aqui na Terra. Ele
nunca ouviu orações como aquelas proferidas pelo Seu Filho durante a
Sua permanência aqui.
Dia após dia pudeste acordar
Neste ambiente de podridão,
Mas nada contaminava Tua alma,
Nenhum pecado perturbava Tua oração.
(Macleod Wylie)1
1 “Morning by morning Thou didst awake/ Amid this poisoned air,/ Yet no contagion
touched Thy soul, / No sin disturbed Thy prayer”.
76
A glória do Filho
A autoridade do Seu ministério
No início do ministério do Senhor em Cafarnaum, Ele entrou na
sinagoga, no sábado, e os ensinou (Mc 1:21-22). Lemos que eles ficaram admirados com a Sua doutrina, pois Ele os ensinava como quem
tem autoridade. Aqueles que tinham sentido o peso da autoridade do
Seu ensino logo presenciaram a Sua autoridade sobre espíritos imundos
(v. 27).
O exorcismo dos espíritos imundos ressalta diante dos nossos olhos
a autoridade do Seu ensino. Não era a autoridade duvidosa da voz alta
ou da afirmação impetuosa, mas a autoridade genuína claramente demonstrada pelo Seu poder sobre os espíritos imundos. Não havia nenhuma área “cinza” no Seu ensino — tais incertezas existem mesmo em
servos fiéis, devido à falta de uma visão clara, fraqueza e dúvida. Mas
o Seu ensino possuía um apelo moral irresistível, ainda que muitos lhe
dessem as costas. Poderia ser visto como indesejável; mas nunca como
errado. No Seu sermão, conforme apresentado em Mateus 5-7, Ele fala
como o intérprete oficial da Lei, com autoridade inquestionável para
desenvolver o assunto. Seis vezes no cap. 5, por somente dizer: “Eu, porém, vos digo …”, Ele eleva o padrão em relação ao homicídio (vs. 2126), adultério (vs. 27-30), divórcio (vs. 31-32), juramento (vs. 33-37),
atitude para com o mal (vs. 38-42) e atitude em relação aos inimigos
(vs. 43-48).
Pode-se perguntar como seria possível ao homem elevar-se na vida
prática até este padrão altíssimo, visto que ele não é capaz sequer de
guardar a Lei de Moisés. De acordo com o ministério de João (Mt
3:11), o Messias vindouro batizaria com o Espírito Santo. Aquele dia
estava se aproximando. Na Sua exaltação Ele enviou o Espírito, que
além de Se tornar o elemento em que os cristãos foram batizados, também passou a habitar neles pessoalmente. No poder prático disto, a
justiça da Lei pode ser cumprida naqueles que não andam “segundo a
carne, mas segundo o Espírito” (Rm 8:4).
A frase: “assim diz o Senhor” era característica do ministério dos
profetas da antiguidade. Isto indicava autoridade suficiente, mas apresenta um contraste à autoridade dAquele que disse tão frequentemente:
“Na verdade Eu vos digo”. A expressão é encontrada em 25 ocasiões no
Evangelho de João com o duplo “na verdade”. Ele não precisava citar
A beleza do Seu ministério 77
nenhuma outra autoridade a não ser a Sua, embora Ele sempre desse à
Escritura o Seu lugar por direito. Sendo Deus, a autoridade era essencialmente Sua.
As parábolas do Seu ministério
Em Mateus 13 o Senhor começou a ensinar por meio de uma série
de parábolas. Grandes multidões estavam ali para ouvir as Suas palavras.
Os discípulos pareciam estar surpresos de que Ele falasse por parábolas,
e O perguntaram sobre isto. O Senhor, pela Sua resposta (v. 11), indicou
que o método parabólico naquele dia tinha a intenção de ser enigmático a “eles” (as multidões), mas revelador para os discípulos a quem a
revelação dos “mistérios do reino dos céus” era de suma importância. O
Senhor explicou que “neles” se cumpriu a profecia de Isaías: “Ouvindo
ouvireis, mas não compreendereis, e vendo vereis, mas não percebereis.
Porque o coração deste povo está endurecido, e ouviram de mau grado
com seus ouvidos, e fecharam seus olhos; para que não vejam com os
olhos, e ouçam com os ouvidos, e compreendam com o coração, e se
convertam, e Eu os cure” (Mt 13:14-15).
A expressão “os mistérios do reino do céu” (v. 11) é tido como se
referindo a uma esfera de profissão que claramente abrange mais do
que os verdadeiros filhos do Reino. A ideia aqui é diferente daquela
apresentada em João 3:3 e Colossenses 1:13, onde pertencer ao Reino é
claramente limitado aos verdadeiramente salvos.
As primeiras quatro parábolas apresentam desenvolvimento na esfera da profissão cristã, começando com o semear da “palavra do reino”
(v. 19). O ensino desta parábola tem sido uma preparação muito necessária para os servos de Cristo que trabalham no Evangelho. Haverá
trabalho que parecerá infrutífero. Haverá aqueles que permanecerão
apenas por um pouco, mesmo depois de uma aparente recepção jubilosa da mensagem. Felizmente haverá alguns que produzirão fruto que
permanecerá, e assim provarão que são genuinamente salvos, ainda que
entre estes, alguns produzirão somente trinta por um.
Na parábola do joio, a boa semente é explicada como representando
os verdadeiros filhos do reino. O joio são os filhos do maligno (v. 38).
Lemos que enquanto os homens dormiam o inimigo veio e semeou
joio no meio do trigo. Ambos deveriam ficar e crescer juntos até a sega.
78
A glória do Filho
Quanto ao significado, é evidente que com a passagem do tempo, mesmo no primeiro século, os homens “dormiram”. Os avisos das epístolas
finais do Novo Testamento foram negligenciados por muitos. O Inimigo semeou o seu joio e a irrealidade teve sua influência nociva na esfera
da profissão Cristã.
Isto abriu o caminho para crescimento anormal, que é a ideia por
trás da parábola do grão de mostarda (vs. 31-32). A pequenina semente
de mostarda torna-se uma árvore para a qual as aves do Céu vêm e fazem seus ninhos nos seus ramos. Uma coisa grande surge, mas ela deu
lugar para as forças do mal agirem.
A partir disso é apenas um passo para o que é sugerido na parábola
do fermento que uma mulher escondeu em três medidas de farinha
(v. 33). Mulheres más, nas Escrituras, geralmente sugerem corrupção
religiosa. Assim, uma condição realmente lamentável das coisas é predito, para que os servos verdadeiros possam estar preparados.
Mais duas parábolas precisam ser consideradas em vista do quadro sombrio já apresentado. Estará tudo perdido? Os fiéis serão vencidos? As parábolas do tesouro e da pérola de grande preço respondem
com um “não” retumbante! A compra sacrificial de um campo foi feita
por causa de um tesouro escondido nele. Um negociante vendeu “tudo
quanto tinha” para comprar uma pérola de grande preço. Aqui estão
transações que levam nossas mentes à cruz, e à “imensa soma” que foi
paga ali, em termos de sofrimento indescritível e no dar de uma vida
tão preciosa. Nada jamais poderá desfazer o valor daquela obra ou a
permanência eterna dos seus resultados.
O tesouro no campo bem pode ter Israel em vista. O homem comprou o campo. O tesouro ainda está escondido nele. Um dia o Senhor
irá reclamar Seus direitos sobre o “campo”, isto é, o mundo, e manifestar
o “tesouro”, isto é Israel, como a nação líder no Seu Reino Milenar. O
ensino da pérola de grande preço bem pode ser expresso nas palavras:
“Das águas negras e turbulentas do pecado, será ainda apresentado a
Deus a mais brilhante, mais bela e mais resplandecente joia que reluzirá
no Seu seio por todas as eras da eternidade”.1 Esta joia é a Igreja, na
qual são encontradas “as riquezas da glória da Sua herança nos santos”
(Ef 1:18). O Inimigo pode trabalhar. Uma condição de sono pode ca1
Cundick, F. The Kingdom in the Gospel of Matthew. John Ritchie Ltd.
A beleza do Seu ministério 79
racterizar o povo de Deus. Todo o testemunho coletivo pode parecer
estar ameaçado, mas os frutos do Calvário serão colhidos. Israel ainda será a nação soberana no reino Milenar, e neste dia, não importa o
que aconteça, o Senhor Ressurrecto edificará a Sua Igreja. O quadro
apresentado neste capítulo, pelo ministério parabólico do Senhor Jesus,
pode ser escuro de um ponto de vista, mas de outro e mais elevado, é
radiante com a plena garantia da esperança.
A parábola de Lucas 15 foi dirigida aos fariseus e escribas. O capítulo geralmente é visto como contendo três parábolas, mas a referência a
“esta parábola” (v. 3) parece abranger as três partes. O bendito Salvador
era o perfeito Pregador. Para mostrar a avaliação de Deus da salvação
destes desprezados pelos fariseus e escribas, muitos detalhes ilustrativos
são usados.
A importância de uma ovelha perdida é enfatizada com clareza
quando o Senhor fala do homem com suas cem ovelhas, que perdeu
uma, e foi atrás dela, até que veio “a achá-la”. Aqui se vê a atitude do
próprio Senhor para com os perdidos e desprezados. Quão diferente da
atitude dos Seus opositores.
Em seguida, uma mulher é destacada. A figura de uma mulher se
encaixa mais facilmente no conceito de necessidades pecuniárias. Economia, ou outros meios, podem tê-la possibilitado obter as dez moedas
de prata, mas a perda de uma é muito grave. Não é possível ficar sem
ela, e uma busca diligente precisa ser feita “até a achar”. Sem dúvida os
fariseus e escribas podiam passar muito bem sem os “publicanos e pecadores”, mas o coração de Deus é diferente; para Ele a salvação deles é
de suma importância!
A terceira parte é a mais detalhada. Por incluir “filhos”, ela serve
para apresentar a seriedade do pecado e rebelião contra Deus, como
também a realidade do arrependimento. A graça se manifesta abundantemente ao filho arrependido. Esta história deixa claro que a compaixão
de Deus pelos marginalizados de forma alguma faz com que Ele abra
mão da necessidade de convicção de pecado e arrependimento antes da
entrada no gozo do perdão. O irmão mais velho recusou a livre oferta
de uma plena participação em tudo que foi providenciado. O orgulho
religioso e a hipocrisia caracterizavam os fariseus, mas tudo isso cegava
seus olhos para a atuação da graça, como vista nos atos de perdão do
80
A glória do Filho
Senhor para com os párias da sociedade.
Na Sua última semana de ministério público, o Senhor fez uso de
diversas parábolas. Estas são caracterizadas por uma profunda solenidade, com sérias consequências de juízo. O evangelho de Marcos apresenta apenas uma destas várias parábolas (Mc 12:1-9). Ela foi dirigida
aos principais sacerdotes, escribas e anciãos. O seu significado era bem
claro. Aliás, o v. 12 afirma: “… entendiam que contra eles dizia esta
parábola”. Nenhum vinhateiro jamais mostrou a paciência deste. Apesar
dos primeiros servos serem maltratados, e em alguns casos, assassinados,
ele ainda enviou outros, e por fim, em graça maravilhosa, enviou seu
filho. As palavras: “Este é o herdeiro; vamos, matemo-lo, e a herança
será nossa” (v. 7), expõe a intenção daqueles líderes da nação de colocar
Deus para fora da ordem que Ele mesmo havia estabelecido, para que
pudessem lucrar disto. A parábola mostra que o juízo vindouro é plenamente justificado.
Antes de deixarmos as parábolas, seria interessante notar alguns
dos autorretratos do Senhor em algumas delas. O negociante de Mateus 13:45-46, que vendeu tudo quanto tinha para comprar a pérola de
grande preço, certamente destaca o tremendo custo através do qual o
Senhor adquiriu os Seus, no Calvário. II Coríntios 8:9 expressa, de uma
forma linda, a ideia aplicada ao Senhor: “Porque já sabeis a graça de
nosso Senhor Jesus Cristo que, sendo rico, por amor de vós se fez pobre;
para que pela Sua pobreza enriquecêsseis”.
A parábola da vinha, como apresentada no Evangelho de Marcos,
dá um testemunho muito eloquente da eternidade da Filiação do Senhor Jesus. A declaração é: “Tendo Ele, pois, ainda um Seu Filho Amado” (Mc 12:6). Foi um Filho já existente que foi enviado. Compare
com João 3:16. Deus não podia dar um Filho que Ele não possuía! O
relacionamento de Filho é eterno. Não teve princípio. O mesmo pode
ser dito do relacionamento de amor infinito, pois Ele era eternamente
o “Bem-Amado”.
Talvez seja difícil encontrar apoio nas Escrituras para o ponto de
vista de que o Bom Samaritano de Lucas 10:30-35 representa o Senhor
Jesus. Mas parece haver somente Um que corresponde plenamente às
características reveladas. Pense na compaixão do Samaritano. Note o
seu preparo — tudo que era necessário para atender a vítima estava
A beleza do Seu ministério 81
à mão. Note também sua força, no v. 34: “… e pondo-o sobre a sua
cavalgadura”. Nenhum ajudante foi necessário! Ele era todo-suficiente.
Quão semelhante ao Salvador dos homens! Vede a sua riqueza infinita
no v. 35: “… tudo o que de mais gastares, eu to pagarei quando voltar”.
Quem senão o próprio Senhor coloca a Sua riqueza infinita à disposição daqueles que Ele socorreu, e daqueles que O servem?
Os milagres do Seu ministério
Ada R. Habershon, em The Study of the Miracles (“O estudo dos
milagres”), lista 36 milagres realizados pelo Senhor durante o Seu ministério. A estes, obviamente, devem ser acrescentados muitos outros
que não são especificamente mencionados. Mateus 8:16 fala de um dia
quando Ele “curou todos os que estavam enfermos”. De novo em Mateus 9:35 lemos: “E percorria Jesus todas as cidades e aldeias, ensinando
nas sinagogas deles, e pregando o Evangelho do Reino, e curando todas
as enfermidades e moléstias entre o povo”.
Há um significado espiritual nos milagres do Senhor. Eles ilustravam, pelo menos em muitos casos, verdades espirituais. Além de demonstrar poder, eles demonstravam amor e graça. Expressavam o coração compassivo de Deus para com a humanidade caída, bem como
Sua prontidão em dar alívio aos aflitos, e até mesmo a vida aos mortos.
O sentido espiritual dos milagres é muito destacado no Evangelho de
João, onde são chamados de “sinais”. O alimentar dos 5.000 certamente satisfez uma grande necessidade imediata, mas também apresentou
claramente Aquele que é o “pão vivo que desceu do céu”, acerca do qual
é prometido: “se alguém comer deste pão viverá para sempre” ( Jo 6:51).
Dos três casos de restauração de vida, o da filha de Jairo é apresentado três vezes — em Mateus, Marcos e Lucas. O relato da ressurreição
do filho da viúva de Naim e da ressurreição de Lázaro ocorrem uma vez
cada. O caso de Lázaro é apresentado em grande detalhe, começando
com sua doença e continuando até a reação adversa dos principais dos
sacerdotes e fariseus. Este capítulo recompensará uma meditação cuidadosa.
Em João 10:18, o Senhor garante a Sua própria ressurreição com as
palavras: “Ninguém ma tira [a Minha vida] de Mim, mas Eu de Mim
mesmo a dou; tenho poder para a dar, e poder para tornar a tomá-
82
A glória do Filho
-la”. No cap. 11 o Senhor garante a ressurreição de todos os Seus (veja
vs. 25-26).
A história da ressurreição de Lázaro é ampliada formando um relato detalhado dos caminhos de Deus com os Seus. O propósito supremo
da tribulação na vida do cristão é para que, no final, o “Filho de Deus
seja glorificado” (v. 4). É interessante que a manifestação da glória do
Senhor é vista em relação com o primeiro sinal no Evangelho de João
(2:11), e novamente neste sinal do cap. 11. Estas referências à Sua glória
trazem à mente as palavras do evangelista em 1:14: “… e vimos a Sua
glória como a glória do Unigênito do Pai”. Há aqueles que limitam esta
referência à manifestação de glória no Monte da Transfiguração, mas
as ocasiões mencionadas parecem indicar que uma manifestação mais
ampla da Sua glória, do que a do Monte, está em vista aqui. De fato, é
muito claro que no conceito divino, tão explicitamente apresentado no
evangelho de João, até mesmo a Sua morte é vista como uma manifestação da Sua glória ( Jo 12:23).
Logo que o Senhor anunciou que a enfermidade de Lázaro era para
a glória de Deus, temos uma declaração do Seu amor pela família atribulada. Note as palavras precisas do v. 5: “Ora, Jesus amava a Marta,
e a sua irmã, e a Lázaro”. Apesar do Seu amor, Ele permaneceu dois
dias no mesmo lugar em que estava (v. 6). Ele não somente é capaz de
controlar as circunstâncias, mas até mesmo pode ajustá-las de acordo
com a Sua infinita sabedoria e perfeito conhecimento, e também para
o cumprimento do Seu propósito. Sua demora pode ter sugerido falta
de amor, mas isso não poderia estar mais longe da verdade. Em amor
Ele planejou uma experiência mais rica do que a que seria possível caso
Ele tivesse partido instantaneamente. (Parece ao presente escritor que o
Senhor teve uma oportunidade maior de manifestar-Se como o Autor
da ressurreição num futuro ainda distante, ao permitir que Lázaro permanecesse quatro dias na tumba antes de ressuscitá-lo. A corrupção de
dias, anos ou séculos não fará diferença alguma para Ele.)
Na hora de profunda provação, o Senhor está não somente disposto
a realizar um milagre, mas também e talvez principalmente, a ensinar
aos enlutados verdades divinas importantes. Assim, Ele se manifestou
a Marta com as palavras notáveis: “Eu sou a ressurreição e a vida; quem
crê em Mim, ainda que esteja morto, viverá; e todo aquele que vive, e
crê em Mim, nunca morrerá” (v. 25-26). Tais palavras trariam conforto
A beleza do Seu ministério 83
mesmo se nenhum milagre tivesse sido realizado. Na primeira parte,
Ele mostra o que significa a um cristão ter um Salvador que é “a Ressurreição”. Morte física é uma coisa temporária — o corpo será ressuscitado. Na segunda parte, Ele mostra o que significa ter um Salvador
que é “a Vida”. A vida eterna concedida ao cristão não é afetada pela
morte. Havia certa indicação disto junto à sepultura de Lázaro quando
o Salvador dirigiu-Se àquele homem fisicamente morto e disse: “Lázaro, sai para fora”.
Quando Maria veio encontrar o Senhor, ela foi incapaz de conter
sua profunda emoção e as lágrimas que transbordavam dos seus olhos
(vs. 32-33). Nenhum ensino foi dado a ela. O momento não era apropriado. O Senhor, sempre tão pronto a instruir, conteve-Se ao ver o seu
estado emocional. Mas, mesmo em meio à sua aflição, ela sem dúvida
testemunhou Seus gemidos e O viu chorar. Tal manifestação silenciosa
certamente revelou aspectos do Seu Salvador que ela nunca antes conhecera.
Outro assunto de grande importância para os cristãos atribulados
é ventilado nas palavras do Senhor a Marta no v. 40: “Não te hei dito
que, se creres, verás a glória de Deus?” Deus deseja revelar-Se em dias
de provação. Tribulação e perda podem dar vazão a dúvidas e questionamentos. Marta bem poderia ter se perguntado quem jamais vira a
glória de Deus junto a um sepulcro. Na ressurreição do seu irmão ela
estava prestes a ter exatamente essa experiência tão maravilhosa. Não
importa quão grande a provação, o cristão precisa apegar-se ao seu Deus
em simples fé. Talvez ele não veja milagres verdadeiros, mas ele poderá
ter uma visão da glória de Deus, de maneira imprevisível, ao passar pela
provação em comunhão com Ele.
A natureza de muitos dos milagres do Senhor nos fazem lembrar a
profecia de Isaías 35, onde nos vs. 5-6 está registrado que “os olhos dos
cegos serão abertos, e os ouvidos dos surdos se abrirão. Então os coxos
saltarão como cervos, e a língua dos mudos cantará”. Estas profecias serão cumpridas no Milênio. Assim, vemos claramente que nos milagres
do Senhor há vislumbres daquela gloriosa era Milenar. Mas os anos
dos milagres do Senhor podem projetar a mente ainda mais distante.
Dois versículos importantes parecem estar ligados: na primeira parte de
João 1:14 lê-se literalmente: “… e o Verbo se fez carne, e tabernaculou
84
A glória do Filho
entre nós” (Newberry1). Isto nos lembra de Apocalipse 21:3: “E ouvi
uma grande voz do céu, que dizia: Eis aqui o tabernáculo de Deus com
os homens, pois com eles habitará, e eles serão o Seu povo, e o mesmo Deus estará com eles, e será o seu Deus”. Por alguns anos, o Filho
de Deus “tabernaculou” entre os homens. Seu ministério, com todos os
milagres Messiânicos, sugere claramente o intento e propósito divinos
ainda por se cumprir no estado eterno, que é destacado em Apocalipse
21. Em milagres tais como a ressurreição dos mortos e a cura dos enfermos, o cristão estudioso adquire uma prévia do universo vindouro
de resplendor, quando Deus “limpará de seus olhos toda a lágrimas; e
não haverá mais morte, nem pranto, nem clamor, nem dor; porque já as
primeiras coisas são passadas” (Ap 21:4).
O treinamento dos Seus discípulos
Em Marcos 3:14 o escritor diz: “E nomeou [“designou”, Newberry2] doze para que estivessem com Ele e os mandasse a pregar”. Fica
evidente que eles seriam não somente Seus companheiros, mas que na
Sua presença e pelo Seu exemplo e ensino, seriam preparados para sua
missão futura. É bom notar que, em Marcos, eles são nomeados individualmente, enquanto que em Lucas 6:14-16 são nomeados em duplas.
Duas lições importantes são sugeridas: cada servo é individualmente
responsável ao Senhor (isso é visto na listagem individual de Marcos),
mas todos devem aprender a trabalhar harmoniosamente com outros
(isso é sugerido em Lucas pelo agrupamento deles de dois em dois).
O trabalho do Senhor muitas vezes inclui trabalhar com parceiros que
jamais seriam nossa escolha pessoal.
O Senhor instruiu Seus discípulos através de ensino direto. Eles devem ter sido os principais ouvintes do ensino de Mateus 5-7. Compare
5:1 com 7:28. Neste ensino lhes é mostrado o caminho de verdadeira
bem-aventurança (5:1-12); a influência que poderiam ter no mundo
(5:13-16); os padrões que deveriam manter (5:17-48). Em 6:1-18 eles
são ensinados sobre a necessidade de sinceridade, e em seguida as prioridades que deveriam ter (6:19-34). Isto é seguido por instruções concernentes ao seu relacionamento com os outros (7:1-12), e finalmente, a
1
2
O autor se refere à sugestão na margem da versão da Bíblia AV (em inglês) publicada
por Thomas Newberry (N. do E.).
Veja nota no parágrafo anterior (N. do E.).
A beleza do Seu ministério 85
necessidade de diferenciar entre mera conversa e o sincero cumprimento da vontade de Deus (7:13-29).
Intercalada neste ensino está a constante afirmação da provisão do
Pai, aquele que está sempre pronto para fortalecer e suprir as necessidades. Ele é o Recompensador daqueles que trilham o caminho de bem-aventurança peregrina (5:3-12). Eles servem o Pai que vê em secreto e
recompensa publicamente (6:4, 6, 18). Ele conhece as necessidades dos
Seus filhos mesmo antes deles pedirem (6:8). Na questão do perdão,
Ele trata com os Seus de acordo com a sua prontidão de perdoar os
outros (6:14-15). Talvez seja importante distinguir, em relação a estes
versículos, entre “perdão judicial” e “perdão paternal”. O primeiro é o
perdão recebido através da fé em Cristo, que traz absolvição de qualquer
acusação (Rm 8:1). O segundo tem a ver com os cristãos como filhos na
família de Deus. Um espírito não perdoador, o guardar de ressentimentos, provarão ser sementes plantadas que serão colhidas mais tarde. Um
Pai celestial bem pode tratar mais severamente com tais, mesmo embora a sua posição perante Deus como “justificados” permaneça intocada.
Nestes capítulos temos um grande destaque ao recurso da oração.
Tornou-se uma parte essencial da vida dos discípulos. Assim, eles foram ensinados a orar secretamente (6:6), na certeza de uma recompensa
definitiva. Nas suas necessidades eles podiam “pedir”, “buscar” e “bater”
(7:7), tendo certeza da resposta bondosa de Deus.
Numa ocasião posterior, relatada em Mateus 18, os discípulos ouviram o ministério muito importante do seu Senhor sobre como tratar
seus irmãos. O v. 1 começa com uma pergunta feita pelos discípulos
sobre quem era o maior no Reino dos Céus. A resposta transformou-se
num extenso estudo. Nos vs. 1-14 “estes pequeninos” são destacados
(vs. 6, 10, 14). A referência pode descrever aqueles que foram salvos
recentemente, ou aqueles cujo temperamento tinha lhes negado uma
boa aceitação. Estes não devem ser desprezados nem feitos tropeçar,
mas antes amorosamente ajudados. Nos vs. 15-20 a ênfase está no “teu
irmão”. A bem-aventurança da harmonia entre irmãos, nos vs. 19-20,
é contrastada com a seriedade de pecado entre irmãos, e isto deve ser
tratado conforme os vs. 15-18. A porção final do capítulo fala de “conservos ou companheiros” (vs. 28-33). Trata-se de uma expansão da resposta à pergunta de Pedro quanto ao perdão. O conceito de “conservos”
sugere a grande obra de Deus em que os discípulos e, mais tarde, muitos
86
A glória do Filho
outros estariam envolvidos. Os servos nesta grande obra, havendo sido
perdoados de uma dívida de dez mil talentos, deveriam achar nisso incentivo para perdoar os seus companheiros e assim promover a união e
lealdade entre si, tão necessárias para um serviço eficaz.
Aplicar todo o cap. 18 de Mateus aos discípulos pode gerar dificuldades ao leitor, por causa das ameaças solenes do fogo do inferno
(vs. 8-9). Como no “sermão da montanha”, é possível que havia muitos
ouvintes. Também pode ser que a intenção do Senhor era colocar nas
mãos dos Seus discípulos instruções importantes que lhes seriam úteis
no seu trabalho para o Senhor. Certamente poderíamos escrever sobre
a última parte do capítulo o seguinte comentário: “Uma pessoa que não
perdoa, muitas vezes é uma pessoa não perdoada!”
Várias passagens mostram que o Senhor ensinou Seus discípulos
por meio das experiências pelas quais eles passaram com Ele. Em Lucas
5:14, depois de uma noite de esforços infrutíferos, o Senhor manda Simão Pedro sair ao mar alto e lançar as redes. Simão obedeceu, e o resultado foi uma grande multidão de peixes. Aqui estava uma grande lição
sobre o poder ilimitado do Senhor que, sem dúvida, tinha por finalidade
ser aplicado no trabalho de “pescar homens”. Mas havia outra grande
lição para Simão Pedro. Ele sabia que o Senhor, que viu os peixes no
mar, via o seu coração, e imediatamente um profundo senso de indignidade veio sobre ele, expresso nas suas palavras: “Senhor, ausenta-Te
de mim, que sou um homem pecador” (v. 8). Aprender na presença de
Deus sobre a própria insignificância e pecado é uma lição importante
para todos os que querem ser usados por Ele.
Mais lições estavam para ser aprendidas sobre o mar. Em Lucas
8:22 o Senhor manifesta Sua decisão de passar para a outra banda do
lago com Seus discípulos. Seu pedido, com certeza, garantiria tudo que
fosse necessário para chegar à outra margem, mas em meio à tempestade que surgiu, os discípulos não conseguiram pensar assim. Naquele dia
eles tiveram que aprender que nem a Sua presença, nem a obediência
aos Seus mandamentos garantem isenção de tempestades. Eles também
aprenderam que Ele era o Senhor da Criação, capaz de acalmar uma
tempestade. Havia mais uma lição ainda a ser aprendida a respeito dos
seus próprios corações. Quando postos à prova pela tempestade, eles
se mostraram muito fracos na fé (v. 25). Creio que nenhum leitor vai
querer criticá-los!
A beleza do Seu ministério 87
Ao ler os quatro Evangelhos, aqueles que desejam aprender na escola do Mestre podem assistir e se beneficiar quando Ele chama Seus
discípulos para acompanhá-lO enquanto alimenta os cinco mil, ou enquanto Ele passa um tempo atarefado com curas (Mt 8:1-17). Muitos incidentes irão instruir muito, assim como instruíram os discípulos.
Acompanhando os três discípulos privilegiados, o leitor dos Evangelhos
pode contemplar algo da glória do Seu Reino futuro, ao meditar sobre
a cena no Monte da Transfiguração. Pode observar junto com Pedro,
Tiago e João a diferença entre a superficialidade fingida de compaixão
e o poder inegável do Salvador, quando os lamentadores ruidosos são
expulsos e a filha de Jairo é trazida de volta à vida. Guardando a devida
distância exigida pela reverência, o leitor, novamente na companhia dos
três privilegiados, pode contemplar o que custou ao Salvador ir até a
cruz enquanto, entre as árvores do Getsêmani, Ele, contemplando o
cálice que logo se tornaria Seu, é visto na Sua agonia e exclama as sublimes palavras: “Não seja, porém, o que Eu quero, mas o que Tu queres”
(Mc 14:31-42).
Parece claro, então, que as lições que os discípulos aprenderam no
passado enquanto seu Divino Mestre os preparava para a sua grande
comissão, ainda estão disponíveis para todos os que irão se tornar alunos
voluntários na escola de Deus.
O prazer do Pai no ministério do Seu Filho
Muito antes da encarnação do Filho de Deus, Jeová tinha expressado, não somente Seu prazer no Seu caminho de serviço, mas também Sua absoluta confiança na perfeição do Seu Servo, na realização
de tudo que fora confiado a Ele. Aquela confiança é eloquentemente
expressa em Isaías 42:1-4. Nestes versículos a beleza do ministério do
Servo resplandece. Ele era o Servo dependente, sempre sustentado por
Jeová. Ele é chamado de “meu Eleito”. Ele foi escolhido para uma obra
que somente Ele, em todo o Universo, poderia assumir. Ele não apenas
cumpriu a Sua tarefa, mas também fê-lo de tal maneira a trazer infinito
prazer ao Seu Pai. Estes versículos de Isaías 42 são citados em Mateus
12:18-21. Eles harmonizam com as palavras do Pai em Mateus 3:18,
pela ocasião do batismo do Senhor. A expressão do prazer do Pai deixa
claro que o Filho-Servo correspondia em cada detalhe a tudo que dEle
se esperava. Nunca houve possibilidade de uma falha, por menor que
88
A glória do Filho
fosse, ou no mais ínfimo detalhe.
A manifestação renovada do prazer do Pai no Monte da Transfiguração (Mt 17:5) bem pode estar prevendo o futuro quando Ele reinará
sobre toda a Terra, e quando todos “O ouvirão”. Quão absoluta foi a
segurança do Pai de que “o bom prazer do Senhor prosperará na Sua
mão” (Is 53:10), naquele dia futuro de júbilo.
Outra manifestação do prazer do Pai ocorre em João 12:28, ao
aproximar-se “a hora”. A oração do Senhor: “Pai, glorifica o Teu nome”,
parece se referir à morte do Senhor e revela o intenso desejo do Filho
de glorificar o nome do Pai por ir à cruz e realizar ali a obra para a qual
somente Ele era idôneo. Quando a voz respondeu: “Já o tenho glorificado …”, o Pai se referia a cada passo, sim, a cada pulsação na vida e
ministério do Salvador. Ao dizer: “… e outra vez o glorificarei”, Ele deu
Sua confirmação inquestionável, não só da prontidão do Filho de ir à
cruz, mas também de suprir pela Sua morte os meios de prover a salvação do homem, de tal forma a glorificar a Deus eternamente.
Seu ministério final
Já destacamos o “Sermão da Montanha” e sua importância para
os discípulos. Quando este sermão é comparado com o ministério do
Senhor para os Seus no cenáculo ( Jo 13-17), podemos discernir uma
progressão muito clara na doutrina. O Senhor, certamente, não precisava progredir doutrinariamente. Ele sabia tudo, mas há uma revelação
gradual de doutrina através de todo o Velho e Novo Testamentos. No
século XIX foi publicado um livro intitulado The progress of doctrine in
the New Testament (“A progressão da doutrina no Novo Testamento”)
por T. D. Bernard. Esta obra, hoje difícil de se obter, apresenta este assunto interessantíssimo de uma maneira muito útil e proveitosa.
O Sermão do Monte se relaciona mais com o Velho Testamento e
a linguagem dos profetas. Já o ministério do cenáculo se relaciona com
as epístolas do Novo Testamento e a linguagem dos apóstolos. Observe a ausência de referências ao Espírito Santo no Sermão, e as muitas
referências a Ele como o Consolador, no ministério do cenáculo. Esta
revelação do ministério do Espírito é ampliada no restante do Novo
Testamento. O mesmo pode ser dito da referência em João 14:3 à Sua
vinda para receber para Si os que são Seus. Através do ministério de
A beleza do Seu ministério 89
Paulo, esta preciosíssima verdade é apresentada detalhadamente em I
Tessalonicenses 4:13-18 e I Coríntios 15:51-54; etc.
Quando o Senhor fala de oração, em Mateus 5-7, Ele indica como
método de aproximação: “Pai nosso, que estás nos céus, santificado seja
o Teu nome” (Mt 6:9). Em João 14:13-14; 15:16; 16:23, Seus discípulos
são instruídos a pedir em Seu nome. A oração do Senhor Jesus em João
17 revela muito da preciosidade da Sua obra de intercessão presente
pelos Seus, na presença de Deus. Tal revelação serve para enfatizar a
garantia da provisão Divina encontrada no Seu ministério anterior (Mt
6:4, 6, 8, 18, etc.).
Há um contraste muito evidente entre o ministério do Senhor dado
em Mateus caps. 24 e 25 e aquele do cenáculo. Ambos têm em vista
a Sua partida que se aproxima. É evidente que em Mateus 24 e 25 o
Senhor fala aos Seus discípulos como representantes do remanescente
judaico, enquanto que no cenáculo Ele lhes fala como ao núcleo da
Igreja futura, que Ele há de edificar (Mt 16:18)
Os discursos de Sir Winston Churchill durante a segunda guerra
mundial não tentavam encobrir a seriedade da situação e os “muitos e
longos meses de luta e sofrimento” a serem enfrentados. Por outro lado,
ele não hesitou em colocar perante o povo a esperança certa de vitória
final. O bendito Líder dos homens, perante o qual todos os outros se
tornam insignificantes, há muito tempo, usou com perfeição uma tática
semelhante. Assim Ele avisa: “Então vos hão de entregar para serdes
atormentados, e matar-vos-ão; e sereis odiados de todas as nações por
causa do Meu nome … Mas aquele que perseverar até ao fim será salvo”
(Mt 24:9, 13). A luta é certa, mas a salvação final é mais certa ainda.
Quando o v. 13 é visto no seu contexto de severa perseguição, ele serve como um maravilhoso incentivo à paciência e coragem quando sob
pressão, e de forma alguma interfere com a segurança eterna do cristão
ou a liberdade da sua salvação.
Mateus 24 claramente avança para os dias negros da Grande Tribulação. O v. 24 diz: “Porque surgirão falsos cristos e falsos profetas, e
farão tão grandes sinais e prodígios que, se possível fora, enganariam até
os escolhidos”. Se o Senhor usa o futuro, “surgirão”, para confirmar as
provações por vir, Ele também o usa outra vez, enfaticamente, no v. 30:
“Então aparecerá no céu o sinal do Filho do homem; e todas as tribos da
90
A glória do Filho
terra se lamentarão, e verão o Filho do homem, vindo sobre as nuvens
do céu, com poder e grande glória”. Dias negros virão, certamente, mas a
vitória final é garantida para aquele remanescente fiel, através da certeza
da vinda do Filho do Homem à Terra. “E Ele enviará os Seus anjos com
rijo clamor de trombeta, os quais ajuntarão os Seus escolhidos desde os
quatro ventos, de uma à outra extremidade dos céus” (Mt 24:31).
No ministério do cenáculo o Senhor apresenta, pela primeira vez,
a esperança do Seu retorno para os Seus, para recebê-los para Si mesmo e conduzi-los ao lugar preparado ( Jo 14:2-3). Este acontecimento
glorioso pode acontecer a qualquer momento, e certamente acontecerá
antes da Grande Tribulação.
Há uma grande ênfase no ministério de João caps. 13 a 16 sobre a
plena provisão para cada necessidade na obra do Senhor durante a Sua
ausência. Muito é dito acerca da união íntima do Filho com o Pai, e da
influência benéfica da Sua presença junto ao Pai ( Jo 14:12). O resultante poder para bênção se estende à realização das obras que Ele fez, e até
mesmo, além disso, para “obras maiores”. Ele responderá orações dirigidas ao Pai em nome do Filho, e ao assim fazer, o Pai será glorificado
no Filho ( Jo 14:13). Aqui temos verdade da ordem mais elevada, que
nos leva a meditar, com reverente limitação, no profundo significado da
união do Pai e do Filho no Céu.
Em resposta ao pedido do Filho, o Pai há de enviar um “outro Consolador”, que nunca deixará os Seus. Ele estará não somente com eles,
mas neles ( Jo 14:17). Àquele que manifesta terna obediência, o Pai e
o Filho manifestarão Seu amor em toda a sua intensidade divina ( Jo
14:21). De fato, tanto o Pai como o Filho farão nele Sua morada ( Jo
14:23).
O cap. 15 deixa claro que a ausência do Senhor não será um obstáculo ao gozo de uma comunhão íntima com Ele, e tal comunhão será
o segredo da produtividade. A promessa é clara: “Estai em Mim e Eu
em vós; como a vara de si mesma não pode dar fruto, se não estiver na
videira, assim também vós, se não estiverdes em Mim” (v. 4). A oração
eficaz está intimamente ligada à produtividade, e isso também é prometido àqueles que nEle permanecem (v. 7).
O Senhor conclui Seu ministério com palavras de bom ânimo:
“Tenho vos dito isto, para que em Mim tenhais paz; no mundo tereis
A beleza do Seu ministério 91
aflições, mas tende bom ânimo, Eu venci o mundo” (16:33). O discípulo
vive num mundo inimigo, mas ele pertence a outra esfera. Suas ligações
com um Salvador vivo abrem o caminho para paz e bom ânimo num
mundo de rejeição e escárnio.
Sua morte iminente
Cedo no Seu ministério, o Senhor Jesus fez uma menção muito
significativa da Sua morte, na conversa que teve com Nicodemos. Encontramo-la nas palavras bem conhecidas de João 3:14-15: “E como
Moisés levantou a serpente no deserto, assim importa que o Filho do
Homem seja levantado, para que todo aquele que nEle crê não pereça, mas tenha a vida eterna”. Muita verdade é revelada neste versículo,
sobre a absoluta necessidade e a natureza salvadora da morte do Filho
do Homem na cruz. No registro de João do ministério terrestre do Senhor, Suas referências à Sua morte são sobremodo profundas. Pense nas
Suas palavras em João 10:17-18: “Por isto o Pai Me ama, porque dou a
Minha vida para tornar a tomá-la. Ninguém ma tira de Mim, mas Eu
de Mim mesmo a dou; tenho poder para a dar, e poder para tornar a
tomá-la. Este mandamento recebi de Meu Pai”. Estas são afirmações
impressionantes que indicam algo da natureza impenetrável do sacrifício infinito do Senhor Jesus na cruz. João 12 revela muito do profundo
significado da morte do Senhor. A unção do Seu corpo, por Maria,
enquanto Ele ainda estava vivo, mas “para o dia da Sua sepultura”, deixa
claro que uma mulher tinha alguma compreensão do significado especial da morte iminente do seu Senhor. Quando os gregos desejaram “ver
a Jesus” (v. 21), o Senhor fez a impressionante declaração: “é chegada a
hora em que o Filho do Homem há de ser glorificado” (v. 23). Algo do
significado desta afirmação é explicado no próximo versículo: “se o grão
de trigo, caindo na terra, não morrer, fica ele só; mas se morrer, dá muito
fruto”. Na Sua morte, o Filho de Deus tornou a salvação disponível aos
homens. A Sua morte tornou-se o meio da bênção deles. A hora do
Seu sofrimento é assim a hora da Sua maior glória. A glória pode estar
escondida dos olhos dos homens, entretanto está ali.
O Bendito, que brevemente morrerá, terá por Sua morte poder de
atrair todos os homens de todas as raças. Ele os atrairá à Sua Pessoa
(v. 32). Quão claramente a triunfante ressurreição e exaltação do Senhor estão envolvidas neste versículo. De fato, visto que a atração é
92
A glória do Filho
encontrar a salvação nEle, o versículo bem pode encontrar seu pleno
cumprimento somente na cena de Apocalipse 22:3-4: “… e os Seus servos O servirão. E verão o Seu rosto, e nas suas testas estará o Seu nome”.
Conclusão
Estudar sobre a beleza do ministério do Senhor Jesus certamente
é pisar em terra santa. Transporta o estudioso das coisas mundanas da
vida para os domínios do santo e do inescrutável. Bem podemos nos
perguntar se o “maná escondido”, em Apocalipse 2:17, não será alguma
revelação, ao longo da eternidade, daqueles anos nos quais o Filho de
Deus agraciou esta cena terrestre com as Suas pisadas.
Senhor, ao traçarmos o caminho
Que Tu aqui trilhaste,
Vemos sublime graça e amor por nós,
E fidelidade para com Deus.
Fiel em meio à infidelidade,
Nas trevas, somente luz,
De Teu Pai o nome confessaste
E na Sua vontade Te deleitaste.
Irredutível ante o engodo de Satanás,
O sofrimento, humilhação e perda,
Teu caminho sem um sorriso colorido
Conduzia sempre para a Cruz1.
(James G. Deck)
1
“O Lord, when we the path retrace/ Which Thou on earth hast trod,/ To man Thy wondrous love and grace, / Thy faithfulness to God.// Faithful amidst unfaithfulness,/ Midst
darkness only light,/ Thou didst Thy Father’s name confess/ And in His will delight.//
Unmoved by Satan’s subtle wiles,/ By suffering, shame and loss;/Thy path uncheered
by earthly smiles,/ Lead only to the cross”.
Cap. 6 — A eficácia do Seu sacrifício
Por Thomas Bentley, Malásia
Introdução
O assunto diante de nós neste capítulo é vasto, valioso e vital. Desde
os primeiros capítulos de Gênesis até o capítulo final de Apocalipse o
tema prevalece. Além da Pessoa do Senhor Jesus, nenhum outro assunto é tão extenso quanto o da Sua morte, na esfera da revelação Divina.
Com a Sua ajuda iremos focalizar nossa atenção nas prefigurações no
Pentateuco, a percepção nos Salmos e as predições nos Profetas. Os
Evangelhos nos darão uma compreensão clara dos fatos da Sua morte,
enquanto as Epístolas nos revelarão o caráter fundamental da morte
do Salvador em todo aspecto dos relacionamentos divinos. Finalmente,
o livro de Apocalipse revelará a vastidão do fruto da Sua morte, para
aqueles de nós que temos provado o valor da Sua morte; mal podemos
esperar por aquele momento quando iremos nos ajuntar à multidão incontável e aclamar a dignidade do Cordeiro que nos remiu para Deus
pelo Seu sangue.
Prefigurações da Sua morte
Através dos primeiros cinco livros da Bíblia há muitos acontecimentos que prefiguram a Sua morte. Estudar estas grandes figuras exige
tempo e meditação, mas devido ao limite de espaço nossa consideração
ficará restrita aos pontos principais apresentados nos capítulos iniciais
de Levítico, relacionados às ofertas. Ao ler os capítulos relevantes observe que cada um deles tem uma palavra que é essencial ao aspecto em
consideração. Note em Levítico 1 a palavra “fogo”; no cap. 2 a palavra
“farinha”; no cap. 3 a palavra “gordura” nos caps. 4-5:13 a palavra “perdão”; nos capítulos 5:14-6:7 as palavras “quinta parte”.
Olhando para o que era oferecido em holocausto, o bezerro indica
a força de Cristo; o cordeiro simboliza a submissão de Cristo, o bode
indica a imponência de Cristo, no fato de ser um animal de pés firmes,
característica essa que o nosso bendito Senhor demonstrou quando não
“se prostrou” quando o Diabo instou com Ele para que o fizesse, nem
“desceu” quando aquela multidão unida, sem dúvida impelida pelo mesmo Diabo, clamou para que Ele o fizesse, quando estava pendurado
na Cruz. A rola sugere a simplicidade de Cristo, enquanto o pombo
94
A glória do Filho
confirma Sua condição de estrangeiro, pois Ele disse que havia saído
de Deus, e voltava para Deus ( Jo 13:3 — veja também Jo 16:19). Alguns veem uma diminuição no valor dos sacrifícios. Concordamos que
haveria, se considerássemos o tamanho e força de cada uma das espécies
usadas, mas não é assim em figura ou em predição. Embora os animais
especificados para o sacrifício pudessem ser partidos, isso não podia e
não deveria ser feito em relação às aves. As aves são de um domínio
celeste, logo representam Divindade essencial, pois, como sabemos, não
há nada quebrado ou partido no Evangelho de João, a não ser as pernas
dos malfeitores. Por exemplo, não temos o partir do pão nem o rasgar
do véu e outros itens semelhantes não são mencionados, como são nos
Evangelhos de Mateus, Marcos e Lucas. Como é que Abraão sabia que
ele não deveria partir as aves, conforme lemos em Gênesis 15? Se ele
não sabia, certamente foi a mão soberana de Deus. Assim, cantamos:
Deixando cenas de puríssima luz,
Cobrindo glória de brilho e esplendor,
Chegando — ó maravilha — até a Cruz;
Aleluia! Que Salvador!1
(R. D. Edwards)
Antes de deixar este aspecto da morte de Cristo é muito importante
observar a linguagem de Levítico 1:4: “para que seja aceito a favor dele
para a sua expiação”. Aqui está a parte desta oferta que dizia respeito
ao ofertante. Tinha em vista a sua plena aceitação, e não seriam estas
as palavras tocando o coração de Paulo quando ele escreveu em Efésios
5:2: “e Se entregou a Si mesmo por nós, em oferta e sacrifício a Deus,
em cheiro suave”?
A oferta de manjares oferece material rico para meditação, ao compreendermos as belezas da vida do Salvador. Somos levados a pensar na
fineza da farinha; na fluidez do azeite; na fragrância do incenso e na
fidelidade do sal. Estes itens manifestam a perfeição absoluta do Salvador na vida, que deu tanta eficácia à morte que Ele morreu.
A oferta pacífica enfatiza a “gordura”, e é proveitoso observar que:
1
Leaving scenes of purest light,/Veiling glory fair and bright,/Cross of Christ, O, wondrous
sight!/Hallelujah! What a Saviour!
A eficácia do Seu sacrifício 95
• A gordura da fressura mostra a devoção de Cristo. Observe II Coríntios 1:12; 3:17; 8:8 e aprecie o conceito de sinceridade.
• A gordura dos rins mostra o discernimento de Cristo. Observe II
Coríntios 1:2; 4:2,8; 5:11; 6:12 e aprecie o conceito de sensitividade.
• A gordura dos lombos mostra a dependência de Cristo. Observe
II Coríntios 1:15; 2:3; 3:4; 5:6, 8; 7:16 e aprecie o conceito de serenidade.
• A gordura do redenho mostra a distinção de Cristo. Observe II
Coríntios 1:5; 3:10; 4:7; 9:8, 12 e aprecie o conceito de suficiência.
Ao chegarmos às duas figuras restantes, a oferta pelo pecado e a
oferta pela culpa, é importante reconhecer a ênfase de cada uma. Na
oferta pelo pecado a ênfase está na pessoa que pecou, mas na oferta pela
culpa a ênfase está no perdão do pecado que a pessoa cometeu. Observe
as palavras do Senhor Jesus quando Ele tomou o cálice: “Isto é o Meu
sangue, o sangue do Novo Testamento, que é derramado por muitos,
para remissão dos pecados” (Mt 26:28). Isto apresenta aos nossos corações o aspecto da Oferta pela Culpa na morte de Cristo, pois ocupa-se com a remissão dos pecados. Note agora como Marcos registra as
palavras do Salvador (14:24): “Isto é o Meu sangue, o sangue do Novo
Testamento, que por muitos é derramado”. Temos aqui, claramente, a
Oferta pelo Pecado, pois as palavras se referem à pessoa que peca: “por
muitos”. No relato de Lucas lemos em 22:20: “Este cálice é o novo testamento no Meu sangue, que é derramado por vós”. Note a mudança
de ordem. Nos primeiros dois relatos o sangue vem primeiro, pois trata
do que já foi tirado, especificamente os nossos pecados e nós mesmos.
É por isso que tanto em Mateus como em Marcos lemos do Senhor
dizendo: “Deus meu, Deus meu, porque Me desamparaste?”. Como
cantamos frequentemente:
Oh, foi por que nossos pecados
NEle por Deus foram colocados
Que Ele, que nunca havia pecado,
Pelos pecadores foi feito pecado.1
(T. Haweis)
1
Oh, ‘twas because our sins/On Him by God were laid,/He, who Himself had never sinned/
For sinners, sin was made.
96
A glória do Filho
Mas em Lucas, não é o que foi tirado que é enfatizado, antes é o
que foi introduzido, ou seja, o “novo concerto”. Este é, verdadeiramente,
o aspecto da Oferta Pacífica da morte do Salvador.
Percepção da Sua morte
Chegando ao Livro dos Salmos lembramo-nos do valor dos escritos que apresentam a prontidão e a disposição do Senhor Jesus de fazer
a vontade do Seu Deus, qualquer que fosse o preço. Lendo o Salmo 40,
a verdade do aspecto do Holocausto na morte de Cristo é claramente
reconhecida na Sua decisão de efetuar a obra e a vontade de Deus em
sacrifício (vs. 7-8). Outra palavra útil para reforçar esta verdade é sua
Certeza.
No Salmo 22 seria maravilhoso elaborar sobre os fatos que claramente manifestam o aspecto da Oferta pelo Pecado, pois nos vs. 1-21,
vemo-lO “fora do arraial”. Esta verdade reforça a rejeição que o nosso
Senhor suportou na Cruz. Com sentimento, vamos reconhecer a Sua
solidão naquelas palavras angustiantes: “Deus Meu, Deus Meu, porque
Me desamparaste?”. Mas, na continuação do Salmo, vemo-lO “além do
véu” (vs. 22-31). Será possível que enquanto Ele estava na Cruz, sofrendo agonia indizível, o Salvador citou este Salmo? Ele começa com o isolamento que o Seu clamor indica, mas veja também o último versículo,
que certamente é a base da Sua exclamação triunfal: “Está consumado”.
O Salmo 69 é o Salmo que apresenta o aspecto da Oferta pela Culpa na morte do Senhor Jesus. Ninguém lendo este Salmo pode deixar
de perceber a repetição da palavra “afronta”. Assim, este Salmo traz à luz
a afronta que Ele suportou quando Ele aniquilou o pecado pelo sacrifício de Si mesmo (Hb 9:26). Isto traz aos nossos corações, comovidos
pelo Seu amor, a vergonha que foi Sua no Calvário.
Predições da Sua morte
Embora muitas profecias valiosas e verdadeiras relativas à morte
do Salvador abundem de Isaías a Malaquias, temos espaço apenas para
considerar reverentemente os bem conhecidos versículos encontrados
em Isaias 52:13-53:12. Isaías apresenta vinhetas da Sua morte com as
quais já estamos bem familiarizados. É mesmo maravilhoso ver o paralelo nos versículos nesta parte de Isaías com o pano de fundo de Levítico capítulos 1-5.
A eficácia do Seu sacrifício 97
O aspecto do holocausto...................................................52:13-15
O auge da Sua exaltação (v. 13);
A profundeza da Sua humilhação (v. 14);
Os efeitos da Sua glorificação (v. 15).
O aspecto da oferta de manjares........................................... 53:1-3
Rejeitado mas aceitável (v.1);
Indesejado mas desejável (v. 2);
Desprezado mas estimável (v. 3).
O aspecto da oferta pacífica................................................. 53:4-6
Sobrecarregado com as nossas dores (v. 4);
Moído pelas nossas iniquidades (v. 5);
Levando os nossos pecados (v. 6).
O aspecto da oferta pelo pecado........................................... 53:7-9
Silencioso no Seu sofrimento (v. 7);
Separado da Sua semente (v. 8);
Supremo na Sua soberania (v. 9).
O aspecto da oferta pela culpa...........................................53:10-12
Prosperidade após intensidade (v. 10);
Produto após trabalho (v. 11);
Posição após isolamento (v. 12).
Fatos da Sua morte
Certamente seria proveitoso ver em detalhe os relatos da morte do
Salvador, dados respectivamente pelos escritores dos quatro Evangelhos, mas o espaço não permite estes detalhes. O leitor é convidado a
meditar pessoalmente nessas referências, mas neste artigo consideraremos somente as referências à Sua morte no Evangelho de Marcos.
Imperiosidade dos Seus sofrimentos
“E começou a ensinar-lhes que importava que o Filho do Homem padecesse
muito, e que fosse rejeitado pelos anciãos e príncipes dos sacerdotes, e pelos escribas, e que fosse morto, mas que depois de três dias ressuscitaria” (Mc 8:31).
Repare a autoridade — Ele “começou a ensinar-lhes”; a necessidade — “importava”; a sensitividade — “padecesse”; a severidade — “rejeitado”; a unanimidade — “anciãos e príncipes dos sacerdotes … escribas”; a crueldade — “fosse morto”; a vitória — “depois de três dias
ressuscitaria”.
98
A glória do Filho
Importância dos Seus sofrimentos
“Como está escrito do Filho do Homem, que Ele deva padecer muito e ser
aviltado” (Mc 9:12).
Imponderabilidade dos Seus sofrimentos
“Porque ensinava os seus discípulos e lhes dizia: o Filho do Homem será entregue nas mãos dos homens, e matá-Lo-ão; e, morto Ele, ressuscitará ao terceiro dia” (Mc 9:31).
Alguns sugerem que Marcos não apresenta o Salvador como um
ensinador, visto que ele apresenta o Senhor como um Servo. Entretanto,
uma leitura cuidadosa do Evangelho mostrará algo bem diferente, pois
a palavra e a ideia de ensinar aparecem dezessete vezes nos escritos de
Marcos. Observe: a necessidade de instrução: “ensinava os Seus discípulos e lhes dizia …”. As palavras a seguir indicam a necessidade de
compreensão: “eles não entendiam esta palavra …” (v. 32). Estranhamente, “eles”, segundo Marcos, “receavam interrogá-lO”, e isto salienta
enfaticamente a necessidade de comunhão.
Implicações dos Seus sofrimentos
“E iam no caminho, subindo para Jerusalém; e Jesus ia adiante deles. E eles
maravilhavam-se, e seguiam-nO atemorizados. E tornando a tomar consigo
os doze começou a dizer-lhes as coisas que lhe deviam sobrevir, dizendo: Eis
que nós subimos a Jerusalém, e o Filho do homem será entregue aos príncipes
dos sacerdotes, e aos escribas, e O condenarão à morte, e O entregarão aos
gentios. E O escarnecerão, e O açoitarão, e cuspirão nEle, e O matarão; e ao
terceiro dia, ressuscitará” (Mc 10:32-34).
O sentimento dos discípulos deve ser notado. No cap. 9, depois do
Senhor Jesus falar da Sua morte, eles ficaram com medo, mas nesta passagem estão com medo antes dEle falar da Sua morte. Podemos discernir que no v. 33 o Senhor fala aos Seus sobre vários assuntos específicos
concernentes à Sua morte. Temos o destino, “Jerusalém”; a traição, “o
Filho do homem será entregue aos principais dos sacerdotes, e aos escribas”; a farsa “O condenarão à morte”; a indignidade, “O entregarão
aos gentios”; a crueldade, “O escarnecerão, e O açoitarão, e cuspirão
nEle, e O matarão”; a vitória, “e ao terceiro dia, ressuscitará”.
A eficácia do Seu sacrifício 99
Impressão dos Seus sofrimentos
“E aproximaram-se dEle Tiago e João, filhos de Zebedeu, dizendo: Mestre,
queremos que nos faças o que Te pedirmos. E Ele lhes disse: Que quereis que
vos faça? E eles lhe disseram: Concede-nos que na Tua glória nos assentemos,
um à Tua direita, e outro à Tua esquerda. Mas Jesus lhes disse: Não sabeis o
que pedis; podeis vós beber o cálice que Eu bebo, e ser batizados com o batismo
com que Eu sou batizado? E eles lhe disseram: Podemos. Jesus, porém, disse-lhes: Em verdade, vós bebereis o cálice que Eu beber, e sereis batizados com
o batismo com que Eu sou batizado; mas o assentar-se à Minha direita, ou à
Minha esquerda, não Me pertence a Mim concedê-lo, mas isso é para aqueles
a quem está reservado. Os dez, tendo ouvido isto, começaram a indignar-se
contra Tiago e João. Mas Jesus, chamando-os a Si, disse-lhes: Sabeis que os
que julgam ser príncipes dos gentios, deles se assenhoreiam, e os seus grandes
usam de autoridade sobre elas; mas entre vós não será assim; antes, qualquer
que entre vós quiser ser grande, será vosso serviçal e qualquer que dentre vós
quiser ser o primeiro, será servo de todos. Porque o Filho do homem também
não veio para ser servido, mas para servir e dar a Sua vida em resgate de
muitos” (Mc 10:35-45).
Observe o pedido natural dos discípulos Tiago e João: “concede-nos que na Tua glória nos assentemos”. Isto é seguido pela exigência
moral do Salvador ao mencionar “o cálice”, indicando sofrimento interior, e “o batismo”, indicando sofrimento exterior. Em seguida temos os
resultados governamentais da resposta deles quando o Senhor confirma as implicações da sua confissão, “podemos”. Finalmente notamos a
resposta sacrificial do Salvador: “o Filho do homem não veio para ser
servido, mas para servir e dar a Sua vida em resgate de muitos.”
Fundamentos da Sua morte
Uma das características da revelação Divina é o uso de palavras
simples, mas muitas vezes palavras desconsideradas, pelas quais a verdade de Deus é transmitida. O nosso assunto neste artigo é bem evidenciado pelo uso de tais palavras, como veremos na seguinte lista:
• “Por” (huper), que indica a provisão da Sua morte, e é usada mais
de 30 vezes em relação a isto. Por exemplo: Jo 6:51; 10:15; 11:51;
Rm 5:6, 8; I Co 15:3.
• “Por” (anti) que indica a substituição da Sua morte. Veja Mateus
20:28; Marcos 10:45. Note que a palavra “muitos” não significa al-
100
A glória do Filho
guns poucos escolhidos, significa simplesmente “mais do que um”.
Esta palavra nunca mais é usada pelo Espírito Santo em relação à
morte de Cristo, mas note, muito especificamente, como em I Timóteo 2:5-6, ela é ligada à palavra “redenção” (antilutron). Graças a
Deus não há a menor indicação de uma expiação limitada na nossa
Bíblia.
• “Através” (dia)1 indica a mediação da Sua morte. Veja Atos 20:28;
Romanos 5:10, 19; Efésios 1:7.
• “Para” (eis) indica a intenção da Sua morte. Veja Romanos 14:9;
Hebreus 9:26, 28.
• “Em” (en)2 indica a duração da Sua morte (em efeito). Veja Romanos 5:9; Efésios 2:13; Hebreus 10:19: Apocalipse 5:9.
• “Por” (peri) indica a proclamação da Sua morte. Veja Romanos 8:3;
I Pedro 3:18; I João 2:2 (3 vezes); 4:10 (veja I Ts 5:9).
• “Com” (sun) indica a identificação da Sua morte. Veja Romanos
6:6, 8; Gálatas 2:20; Colossenses 2:20.
Durante muitos anos de estudo, fomos muito encorajados ao seguir as múltiplas referências que proporcionam ensino tanto doutrinário quanto prático, como visto em cada livro do Novo Testamento.
Olharemos às referências em I Coríntios, através das quais esperamos
que todos os leitores destas páginas sejam espiritualmente enriquecidos.
• A violência da Sua morte (1:13, 17, 18, 23; 2:2) — este aspecto é
apresentado para combater divisão. Os coríntios se gloriavam na
sua sabedoria mundana e:
Idolatram mensageiros (cap. 1);
Introduzem mistura (cap. 2);
Inovam métodos (cap. 3);
Investigam motivos (cap. 4).
Tudo isso foi julgado na Cruz, onde os homens foram corretamente avaliados. O judeu materialista é visto no “homem rico”, o
1
2
Esta preposição é traduzida de diversas formas na AT: “com” em At 20:28, “pela” em Rm
5:10 e 19, e “pelo” em Ef 1:7 (N. do E.).
Esta preposição é traduzida de diversas formas na AT: “pelo” em Rm 5:9 e Hb 10:19, e
“com” em Ap 5:9 (N. do E.).
A eficácia do Seu sacrifício 101
grego filósofo no “homem sábio”, e o romano imperial no “homem
forte”.
• A virtude da Sua morte (5:7; 6:19; 7:23) — esse aspecto é apresentado para purificar impureza. Os capítulos podem ser considerados
como tratando de:
Pureza corporal (cap. 5);
Pureza pessoal (cap. 6):
Pureza doméstica (cap. 7).
• A voz da Sua morte (8:11; 9:13; 9:18) — este aspecto é apresentado para controlar apostasia. Aqui encontramos:
Comunhão que socorre o fraco;
Comunhão que sustenta o servo;
Comunhão que separa o desobediente.
• A vindicação da Sua morte (11:26) —
­ este aspecto é apresentado
para corrigir desobediência. O cap. 11 pode ser estudado pelo leitor, e as seguintes divisões discernidas:
Nossa aparência e adorno — indica conformidade............. 11:1-16
Nossas ações — se refere à nossa conduta.........................11:17-22
Nossa aproximação — se refere à Sua vinda......................11:23-26
Nossa apreensão — é a nossa concepção...........................11:27-30
Nossa aprovação— tem em vista a certificação.................11:31-34
• A veracidade da Sua morte (capítulo 15) — este aspecto é apresentado para contrapor a incredulidade. Novamente o leitor é convidado a traçar as divisões do capítulo:
A provisão da Sua morte.................................................... 15:1-11
A prova da Sua morte.......................................................15:12-19
O produto da Sua morte...................................................15:20-28
A prática como resultado da Sua morte............................15:29-34
O propósito da Sua morte.................................................15:35-49
A perspectiva da sua morte...............................................15:50-58
102
A glória do Filho
• A vastidão da sua morte (1:30) — este aspecto é apresentado para
confirmar o destino.
Quanto ao meu passado, Cristo é a rocha ferida, e garante a minha
justiça;
Quanto ao meu presente, Cristo é o ocupante do trono e garante a
minha santificação;
Quanto ao meu porvir, Cristo é o senhor que voltará, e garante a
minha redenção.
A morte de Cristo aplicada de
forma prática nas epístolas
Vamos agora à epístola de Paulo aos Gálatas, na qual ele faz referências práticas e valiosas à morte do Salvador.
Um meio de restauração (3:1)
Note como ele descreve os gálatas: “Ó insensatos gálatas!” Aqui ele
está dando uma descrição triste da sua falta de inteligência; eles são
“sem entendimento”. Depois ele enfatiza seu engano em termos sugestivos, como se eles, tristemente, estivessem afetados por artes mágicas.
Eles foram enganados por ilusões (compare Atos 8:9). Agora a questão
se foca no nosso assunto, quando Paulo acrescenta “perante os olhos de
quem Jesus Cristo foi evidenciado, crucificado”. Aquele que primeiramente apresentou Cristo crucificado a eles, agora os lembra da clareza
e realidade da morte de Cristo, e ele está usando isto como um meio
de restauração. Um paralelo útil do Velho Testamento é o que Elias fez,
como registrado em I Reis 18, quando Israel reconheceu a suficiência
do sacrifício e foram assim restaurados.
Um meio de remissão (1:4)
Paulo inicia a epístola com uma de suas introduções mais curtas,
mas ao mesmo tempo rica, pois nela ele menciona a morte de Cristo em
linguagem que se conforma com o aspecto da Sua morte transmitido
na Oferta pela Culpa: “… o qual se deu a Si mesmo por nossos pecados”. Note quão específica a palavra simples “por” (huper) é, ao indicar
a plenitude do resgate. Em seguida, temos a razão: “… para nos livrar
do presente século mau”, que significa tirar-nos do perigo, não somente
A eficácia do Seu sacrifício 103
eternamente como também moralmente. Observe a regência: “segundo
a vontade de Deus nosso Pai”, confirmando o poder administrativo na
nossa libertação.
Um meio de remoção (2:20)
O segredo da vida exemplar de Paulo é transmitido nestas palavras
importantes: “Estou crucificado com Cristo”. Reflita sempre nisto, caro
leitor, isto é algo que nem eu nem você podemos fazer; foi Deus quem
o fez, pois homem nenhum pode crucificar-se a si mesmo. Paulo acrescenta: “… e vivo, não mais eu”. Este é o sinal da sua vida transformada.
A intensidade aumenta na linguagem de Paulo quando ele acrescenta:
“e a vida que agora vivo na carne”, explicando assim o alcance da sua
vida em expansão. Seu próximo enunciado menciona a força da sua
vida excepcional, pois Paulo afirma aos seus leitores que é pela “fé no
Filho de Deus”, isto é, pela “fé colocada no Filho de Deus”, que ele é capacitado a discernir esta bênção. Finalmente, Paulo apresenta o cântico
da sua vida exultante: “o Filho de Deus, o qual me amou, e Se entregou a Si mesmo por mim”. Afirmando assim este aspecto da morte de
Cristo, ele deseja que os gálatas e todos os leitores apreciem aquilo que
mostra o aspecto da Oferta pelo Pecado no sacrifício de Cristo.
Um meio de redenção (3:13; 4:4-6)
• O significado: “resgatar” e “remir”, como usados nestes versículos,
significam “comprar para tirar de”, ou “adquirir”. Veja também Efésios 5:16 e Colossenses 4:5.
• A mensagem: a redenção nos comprou e nos tirou da maldição da
lei. Isto foi feito para Israel oficialmente, e para os salvos desta era,
moralmente.
• O meio: Ele foi feito maldição por nós, como a lei confirma (Dt
21:23).
• A meta: para que fôssemos ricamente abençoados e recebêssemos
a promessa do Espírito.
Note como 4:4-5 começa com a singularidade do Filho e termina
com a pluralidade dos filhos.
104
A glória do Filho
Um meio de regência (5:24)
Associação com Cristo significa mais do que simplesmente pertencer a Ele, significa que somos o produto da Sua morte e o resultado do
poder proveniente da Sua vida, o que exige uma conformidade moral
a tudo que Ele é e tem manifestado ser. Corretamente observamos, a
partir de 2:20, que não podemos crucificar a nós mesmos, mas obviamente temos o poder moral de crucificar a carne com suas paixões e
concupiscências. Logo, a aplicação da cruz é radical e resoluta. Infelizmente, cultivar a carne com suas paixões e concupiscências é muito
mais fácil do que a austeridade do curso que somos obrigar a trilhar.
Nossa associação com a cruz de Cristo exige, e de fato merece, uma
reação mais severa aos poderes do mal no nosso interior, administrando
como deveríamos uma constante mortificação dos poderes que podem
surgir no íntimo.
Como um meio de repreensão (6:12)
Para suavizar a dor do opróbrio, havia nos dias de Paulo aqueles que
promoviam a circuncisão e instigavam os cristãos a se conformarem,
sentindo que por assim fazer, a vergonha da Cruz seria essencialmente
removida. Aqueles mencionados neste versículo tinham uma falsa pretensão. Eles se esforçavam para fazer uma demonstração favorável na
carne, indicando pela sua promoção da circuncisão, uma demonstração
de conformidade religiosa. Na frase seguinte vemos claramente que eles
tinham um falso motivo. Estavam ansiosos para escapar de toda perseguição possível, por terem aderido à verdade da Cruz. O apóstolo tinha
uma fiel convicção, como ele deixa claro pela sua rejeição do irreal; seu
interesse devoto é que a Cruz seja mantida na sua preciosa, e característica, senda de afronta. Nos dias de Paulo era a circuncisão, hoje nos
nossos dias, o guardar dos sacramentos é o suficiente, o que reduz a
Cruz a uma coisa secundária e remove a sua afronta.
Como um meio de regozijo (6:14)
O significado da expressão “a cruz de nosso Senhor Jesus Cristo” é
de vital importância. Muitos hoje se gloriam na cruz, geralmente como
uma peça de adorno, ou em cima de prédios, com a intenção de fazer
dela um meio de identificação, que é um paradoxo indescritível. Mas
para Paulo e todos aqueles que crêem no Senhor Jesus, a cruz de nosso
Senhor Jesus Cristo é aquilo que exige uma verdadeira e real expressão
A eficácia do Seu sacrifício 105
de adoração, prostrando cada coração em adoração e devoção, e o fará
eternamente. Veja a singularidade da verdade: “a não ser na Cruz …”,
pois em que mais podem se regozijar os salvos pela graça, através da
morte do Salvador? Temos também a força do testemunho: “pela qual
o mundo está crucificado para mim, e eu para o mundo”; nada mais
poderia produzir uma identificação tão necessária, que eu espero que
todos nós conhecemos e manifestamos.
Frutos da Sua morte
Encontramos referências significativas à morte do Senhor Jesus em
Apocalipse, nas ocorrências da palavra “sangue”. Uma leitura de 1:4-6
revela o Seu ministério em vida, Seu domínio sobre a morte, e Sua
majestade na glória. Adoração e louvor sobem ao Salvador na expressão “nos amou” e “nos livrou” dos nossos pecados pelo Seu sangue, que
maravilhosamente indica o valor do Seu sangue. A próxima referência
está em 5:10. Aqui é a virtude do Seu sangue, pois fomos redimidos
para Deus de uma variedade de situações e associações nas quais nos
encontrávamos por natureza. Veja agora 7:14, que está relacionado com
os santos da Tribulação que conhecerão experimentalmente a vitória do
Seu sangue, e uma conformidade que lhes garantirá aceitação diante do
Trono de Deus. Encontramos ainda outra referência em 12:11, onde os
santos daquele dia conhecerão a vigilância do Seu sangue, que lhes garantirá poder para vencer num dia da adversidade demoníaca. A última
referência está em 19:13. Obviamente se refere ao próprio Senhor Jesus,
pois mesmo na ocasião do Seu reconhecimento universal como Rei dos
Reis e Senhor dos Senhores, Sua veste salpicada de sangue há de expressar os imensuráveis e indescritíveis efeitos e esplendor do Calvário.
É de tremenda importância notar que no Livro de Apocalipse João
usa a palavra “Cordeiro” vinte e nove vezes, das quais vinte e oito referem-se ao Senhor Jesus. Muitos saberão, por conhecerem a edição da
Bíblia Newberry, que a palavra usada por João significa “um cordeiro
jovem”. Com esta palavra, o Espírito de Deus está afirmando o vigor da
obra da Cruz do Calvário, e nos assegurando que assim será por toda
a eternidade. As últimas sete menções ao Cordeiro são preciosíssimas:
106
A glória do Filho
i) “… a esposa do Cordeiro”
Nossa relação com Ele............................................................. 21:9
ii) “… apóstolos do Cordeiro”
Nosso reconhecimento dEle................................................. 21:14
iii) “o Cordeiro … é o seu templo”
Nossa realização perante Ele................................................. 21:22
iv) “… o Cordeiro é a sua lâmpada”
Nosso resplendor vindo dEle................................................ 21:23
v) “… o livro da vida do Cordeiro”
Nossa recepção através dEle.................................................. 21:27
vi) “… o trono do Cordeiro”
Nosso refrigério nEle.............................................................. 22:1
vii)“… o Cordeiro … Seus servos O servirão”
Nossa disposição para Ele....................................................... 22:3
Se o bendito Salvador, o nosso Senhor Jesus Cristo, nunca tivesse
sofrido a morte sobre a Cruz, as afirmações de verdades, acima mencionadas, não poderiam ser feitas. Mas por essas, e por cada referência à
Sua morte na nossa Bíblia, a eficácia do Seu sacrifício é endossada, experimentada e desfrutada. Talvez alguns que lerão estas palavras recém-escritas não conhecem o valor da Sua morte, portanto, uma conclusão
apropriada é um hino precioso, muitas vezes cantado por aqueles que O
louvarão ao longo de toda a eternidade:
Ouça! As novas do Evangelho proclamam:
Cristo sofreu no madeiro;
Rios de misericórdia se multiplicam,
A graça para todos é rica e gratuita.
Agora, pobre pecador, venha para aquele que morreu por ti.
Ó! Fuja para o monte,
Encontre abrigo nEle hoje;
Cristo te chama para a fonte,
Venha limpar-se dos teus pecados;
Não demore; venha a Cristo enquanto há tempo.
A graça flui como um rio,
Milhões já se saciaram;
A eficácia do Seu sacrifício 107
‘Inda flui, tão viva como antes,
Do lado ferido do Salvador;
Ninguém precisa perecer; todos podem viver, pois Cristo morreu.
Cristo apenas será nossa porção,
Em breve nos encontraremos acima;
Então banharemos no oceano imenso
Do grande amor do Redentor;
Toda Sua plenitude desfrutaremos para sempre.1
(H. Bourne e W. Sanders)
1
[1] Hark! The Gospel news is sounding,/Christ has suffered on the tree;/Streams of mercy
are abounding,/Grace for all is rich and free./Now poor sinner/Come to Him that died
for thee. [2] O! Escape to yonder mountain;/Refuge find in Him today;/Christ invites
you to the fountain,/Come and wash your sins away;/Do not tarry;/Come to Jesus while
you may. [3] Grace is flowing like a river,/Millions there have been supplied;/Still it flows
as fresh as ever/From the Saviour’s wounded side;/None need perish,/All may live for
Christ has died. [4] Christ alone shall be our portion;/Soon we hope to meet above;/
Then we’ll bathe in the full ocean/Of the great Redeemer’s love;/All His fullness/We
shall then forever prove.
Cap. 7 — A vitória da Sua ressurreição
Por James M. Flaningan, Irlanda do Norte
Introdutório
Como aqueles que andam por fé e não por vista, os crentes no
Senhor Jesus não se interessam muito em provar questões relativas à
sua fé. No entanto, há uma grande verdade que é atestada por muitas
provas: a ressurreição de Cristo de entre os mortos (At 1:3). Tal é a
força desta palavra “provas” (do grego tekmerion: 5039 na concordância
de Strong), que os tradutores procuraram indicar e enfatizar esta força
pelo uso da palavra “infalíveis”. O comentarista Adam Clarke escreve:
“… por muitas provas de tal natureza, e ligadas com tais circunstâncias,
de modo a torná-las indubitáveis, pois esse é o peso da palavra grega”.
Algumas dessas provas são práticas e físicas, algumas pessoais e algumas
experimentais, sendo o testemunho e o depoimento de vários indivíduos e grupos de pessoas que realmente viram o Salvador durante aqueles
quarenta dias depois da Sua morte e sepultamento, quando Ele se mostrou novamente vivo, ressuscitado do sepulcro (At 1:3).
Os fatos da Sua morte
Não pode haver a menor dúvida sobre a realidade da morte de Cristo. A ideia proposta por certos críticos de que Ele realmente nunca
morreu, mas apenas desmaiou, é ridícula ao extremo, e será considerada
mais tarde. Depois de seis horas de dor e sofrimento, cravado na cruz, o
Senhor Jesus clamou: “Está consumado”, entregou o Seu espírito a Seu
Pai, inclinou a Sua cabeça e morreu ( Jo 19:30; Lc 23:46). A lança no
Seu lado deu provas de que Ele havia de fato morrido, e o testemunho
do centurião encarregado confirmou isto ao governador romano, que
se maravilhou de que Ele já estivesse morto ( Jo 19:34; Mc 15:44). As
Escrituras, redigidas mais tarde, não deixam lugar para dúvidas acerca
da realidade da morte de Cristo. “Cristo morreu por nossos pecados” (I
Co 15:3); “Cristo morreu pelos ímpios” (Rm 5:6); “Cristo morreu por
nós” (Rm 5:8). Há uma abundância de declarações da Sua morte tanto
no Velho como no Novo Testamento, e nenhuma mente honesta pode
questionar ou duvidar o fato que Jesus morreu.
A vitória da Sua ressurreição 109
A maneira do Seu sepultamento
Já tarde no dia da Sua crucificação dois influentes conselheiros
judeus, José de Arimatéia e Nicodemos, rogaram a Pôncio Pilatos, o
governador, pelo Seu corpo. O governador o concedeu, e tendo tirado
o corpo da cruz os conselheiros O enrolaram numa mortalha com especiarias, e O puseram numa tumba que nunca fora usada antes. Era um
sepulcro puro, novo, nas vizinhanças do Gólgota, o lugar da crucificação
( Jo 19:41). Era um túmulo localizado num jardim, esculpido numa rocha.
Se a lança que perfurou o Seu lado provou que Jesus morrera, agora
a pedra que foi rolada até a entrada da sepultura encerrou a história da
vida maravilhosa que terminara na cruz naquela triste tarde. Jesus de
Nazaré estava morto e sepultado. Sozinho Ele jazia naquele sepulcro
novo e a grande pedra fechava a entrada.
A guarda e o selo
Ninguém duvidava agora que Jesus estivesse morto, e havia também
testemunhas do Seu sepultamento naquele túmulo do jardim, mas os
cínicos sacerdotes e fariseus ainda não estavam satisfeitos. Eles se lembravam de que em vida Jesus dissera: “Depois de três dias ressuscitarei”
(Mt 27:63). Eles agora temiam que de alguma forma Seus discípulos
pudessem vir sorrateiramente durante a noite, roubar o corpo e proclamar ao povo: “Ressuscitou dentre os mortos” (Mt 27:64). Eles levaram
então seus temores a Pilatos, exigindo que o sepulcro fosse guardado.
Pilatos, talvez agora já impaciente com eles, disse: “Tendes a guarda; ide,
guardai-o como entenderdes”. Esta foi a permissão que eles precisavam
para usar um destacamento dos guardas romanos aquartelados na Fortaleza de Antônia junto do Monte do Templo, que às vezes faziam o
serviço de guarda no Templo. Os guardas pontualmente tomaram suas
posições junto ao sepulcro.
Havia, assim, uma segurança tripla no túmulo do Salvador: a pedra,
o selo e os soldados. A grande pedra fechava a entrada. É bem provável
que haveria uma corda esticada na frente da pedra e presa nas paredes
de pedra a cada lado da entrada com um selo de cera (Mt 27:66). A cera
estaria carimbada com o sinete do governador, símbolo da autoridade
do Imperador. E havia também os guardas romanos. Com tantas pre-
110
A glória do Filho
cauções quem iria, ou quem se atreveria a roubar o corpo dAquele que
ali jazia?
O sepulcro vazio
Por três dias houve silêncio. Foram dias tristes e solitários para
aqueles que acompanharam o Salvador durante os anos do Seu ministério. Eles haviam caminhado com Ele, conversado com Ele, comido com Ele. Eles tinham ouvido o Seu ministério, testemunhado os
Seus milagres e feito muitas perguntas; e Ele fora o seu fiel confidente,
companheiro e amigo. Agora Ele se fora. Dois deles que caminhavam
juntos para Emaús disseram tristemente: “… nós esperávamos [confiávamos] …” (Lc 24:21). Eles usaram o tempo passado. Suas esperanças
foram despedaçadas. Durante três dias tudo fora trevas para eles. Haviam porventura cessado de confiar, agora? Mas algo já havia acontecido
naquele primeiro dia da semana, algo do qual eles ainda nada sabiam.
Aqueles que foram ainda de madrugada ao sepulcro foram surpreendidos ao encontrar a pesada pedra removida. O anjo do Senhor havia
descido dos Céus, removendo a pedra da entrada, e se assentado sobre
ela, como que desafiando a morte e a sepultura. Os guardas, estremecidos de terror e desmaiados de pavor, estavam como mortos. E o túmulo
estava vazio! Havia uma mensagem angelical para as mulheres que elas
deveriam transmitir aos discípulos: “Não tenhais medo, pois eu sei que
buscais a Jesus, que foi crucificado. Ele não está aqui, porque já ressuscitou, como havia dito. Vinde, vede o lugar onde o Senhor jazia. Ide pois,
imediatamente, e dizei aos Seus discípulos que já ressuscitou dentre os
mortos” (Mt 28:5-7).
Em vão vigiam seu leito,
Jesus, meu Salvador;
Em vão selam o túmulo,
Jesus, meu Senhor.1
(Robert Lowry)
Portanto, estes são os fatos. O Salvador morreu, e foi sepultado num
túmulo novo. Apesar da guarda romana e do selo oficial, a pedra foi
removida e a sepultura estava vazia no terceiro dia após o sepultamento.
Como se explica o túmulo vazio? Ninguém jamais negou ou duvidou
1
Vainly they watch His bed,/Jesus, my Saviour;/Vainly they seal the dead,/Jesus, my Lord.
A vitória da Sua ressurreição 111
que o túmulo estivesse de fato vazio naquela manhã, mas os infiéis e
céticos em vão se uniram para tentar negar a ressurreição de Cristo de
entre os mortos. Várias teorias foram e são apresentadas para explicar o
túmulo vazio. Estas devem ser consideradas, se somente para mostrar
quão ridículas elas são, e para fortalecer o cristão, mais uma vez, na
grandeza da verdade que Jesus está vivo. Um Homem ressurrecto está
agora exaltado em glória e entronizado nos Céus à destra de Deus na
vitória da Sua Ressurreição.
O sepulcro vazio — as teorias
A primeira teoria foi, assim como todas as que a seguiram, uma
grande mentira. Foi apresentada pelos guardas amedrontados, por instigação dos principais sacerdotes e anciãos dos judeus, senadores do
grande Sinédrio. Estes homens conheciam o poder do suborno! Eles já
haviam subornado Judas Iscariotes para que traísse a Jesus, e agora subornaram os guardas para que espalhassem a mentira de que os discípulos haviam roubado o corpo enquanto eles, os guardas, dormiam. Tendo
dado “muito dinheiro” aos guardas, eles lhes disseram: “Dizei: vieram
de noite os Seus discípulos e, dormindo nós, O furtaram” (Mt 28:13).
Os principais dos sacerdotes e anciãos estavam numa posição extremamente embaraçosa, e vale a pena citar Albert Barnes, na íntegra,
sobre este assunto. Ele escreve:
“Apesar de toda a sua precaução, era evidente que o corpo de Jesus
desaparecera. Era evidente, também, que os discípulos afirmariam que Ele havia ressuscitado. Eles haviam se esforçado tanto
para conseguir a Sua morte. Haviam convencido Pilatos de que
Ele estava morto. Haviam colocado uma guarda com o propósito explícito de evitar que Ele fosse tirado. Seria em vão, depois
disso, fingir que Ele não morrera; que Ele havia desmaiado; que
Ele somente morrera aparentemente. Eles haviam se privado
disso, que teria sido a alegação mais plausível; e qualquer curso
que agora adotassem, era necessário continuar a reconhecer que
Ele realmente estivera morto, e que todas as medidas apropriadas
haviam sido tomadas para prevenir que fosse roubado. Eles concluíram, depois de confabularem entre si, que só restava um meio
— subornar os soldados para induzi-los a contar uma falsidade,
e tentar convencer o mundo que, contra todas as probabilidades e
apesar dos seus esforços, o corpo de Jesus havia sido roubado”.
112
A glória do Filho
Com o suborno veio também a promessa de que, caso isso chegasse
aos ouvidos de Pilatos, eles lhes dariam cobertura e persuadiriam o governador quanto ao que havia acontecido. Pilatos costumava voltar para
a sua casa em Cesaréia depois da festa da Páscoa. Portanto, era possível
que ele não viria a ouvir os detalhes do que acontecera, pelo menos por
um bom tempo. Mas se ele ouvisse, os soldados não precisavam se preocupar, pois os judeus o “persuadiriam”, muito possivelmente com um
suborno. Eles haviam subornado Judas, estavam subornando os soldados e podiam subornar Pilatos. Compare com aquele outro governador
Félix: “Esperando ao mesmo tempo que Paulo lhe desse dinheiro, para
que o soltasse; pelo que também muitas vezes o mandava chamar, e
falava com ele” (At 24:26).
Esta foi então a primeira, a mais antiga das teorias de homens infiéis negando a ressurreição do Salvador. “Seu corpo foi roubado do
sepulcro enquanto dormíamos”, disseram eles. Mas a teoria precisa ser
examinada e seu engano exposto.
O corpo realmente foi roubado?
Esta teoria é crivada de absurdos. É quase inacreditável que alguém
pudesse acreditar numa mentira tão esfarrapada. Tantas perguntas podem ser feitas:
• Será provável que tantos homens dormiriam ao mesmo tempo ao
ar livre?
• Como poderia um guarda romano ter sucumbido ao sono quando,
de acordo com as leis militares romanas, ser achado adormecido em
serviço significava morte instantânea?
• Poderiam eles estar tão profundamente adormecidos a ponto de
não acordar com o barulho que deve ter sido feito para remover a
grande pedra e tirar o corpo?
• Como poderiam os discípulos, abatidos e desacorçoados como estavam, ter tentado eludir a guarda, remover aquela pedra pesada e
levar o corpo embora?
• Poderiam eles ter tido tempo suficiente para fazer tudo isso sem
serem vistos por ninguém?
• Que motivo teriam os discípulos para roubar o corpo? E teriam
A vitória da Sua ressurreição 113
tantos deles arriscado e dado sua vida, mais tarde, pregando uma
ressurreição que eles sabiam não ter acontecido?
• O absurdo mais claro e óbvio é: se aqueles soldados estavam dormindo, como poderiam eles saber que foram os discípulos que roubaram o corpo, ou de fato, que qualquer outra pessoa o tivesse feito?
Mas, a história deles foi repetida entre os judeus, durante muitos
anos (Mt 28:15).
Quase nem vale a pena considerar a teoria de que os inimigos de Jesus roubaram o corpo, embora aparentemente haja quem acredite nisso.
A pergunta que precisa ser feita e respondida é: se de fato os inimigos
roubaram o Seu corpo, por que, quando Seus discípulos começaram a
pregar que Ele ressuscitara de entre os mortos e estava vivo, por que
aqueles que supostamente roubaram o corpo não o apresentaram? Tem
sido dito que se tivesse sido verdade que roubaram o corpo, e se eles o
tivessem apresentado, a Cristandade teria se desfeito numa explosão de
gargalhadas. Teria sido a morte da pregação Apostólica. Naturalmente,
Seus inimigos não tinham razão alguma para roubar o Seu corpo. Eles
estavam mais interessados em mantê-lO no túmulo.
Jesus realmente morreu?
A teoria de que o Salvador não morreu, apenas desmaiou, é crida
e ensinada por muitos até ao dia de hoje. Ela é tão absurda quanto a
primeira teoria e, novamente, é propagada por aqueles que escolhem
negar a verdade da ressurreição corporal de Cristo. O túmulo vazio tem
sido chamado de um “fato teimoso”. É aceito por todos e não é possível
negá-lo. Tanto as autoridades romanas como as judaicas sabiam que,
inegavelmente, o túmulo em que o corpo de Jesus fora posto estava
agora vazio. Mas como? Ou, por quê? Precisava ser explicado de alguma
forma.
Os propagadores desta teoria “do desmaio” querem que os homens
acreditem que seis horas de sofrimento, cravado pelas mãos e pés na
cruz, e por três daquelas horas suspenso sob o sol escaldante de Jerusalém, haviam causado uma profunda condição de entorpecimento em Jesus que parecia ilusoriamente morto. Argumentam que nesta condição,
o Senhor foi carregado para o túmulo, envolto na mortalha de linho por
José e Nicodemos, e posto no sepulcro ainda conservando a aparência
de morte. Após três dias de repouso no frescor do sepulcro escavado na
114
A glória do Filho
pedra, eles dizem que Jesus despertou. Foi, segundo eles ensinam, uma
ressuscitação, e não uma ressurreição.
Em seguida, vem a coisa realmente difícil de acreditar! Não se explica como o Salvador removeu a mortalha que o envolvia, deixando
os lençóis dobrados de forma ordeira no chão do túmulo, nem como
removeu a pedra, escapou da guarda e, de alguma forma Se escondeu até
decidir Se mostrar a Maria, de manhãzinha naquele jardim, e depois,
caminhou por sete milhas até Emaús sobre pés feridos! A que ponto os
homens vão para negar a Sua ressurreição de entre os mortos!
Estariam as mulheres no túmulo errado?
Há ainda outra teoria apresentada por mentes incrédulas. Dizem
que aquelas primeiras visitas ao sepulcro, sendo mulheres aflitas, foram
ao túmulo errado, e não àquele no qual o Salvador fora sepultado. Enfatizam que elas foram de manhã muito cedo, “sendo ainda escuro” ( Jo
20:1). Não teriam elas ido ao túmulo errado? Mas Maria Madalena e
suas companheiras conheciam bem o lugar. Haviam observado enquanto os dois homens cuidaram do sepultamento do Salvador (Mt 27:61).
Além disso, o túmulo era do próprio José. Não teriam ele e Nicodemos corrigido imediatamente qualquer erro que as mulheres tivessem
cometido? E não teriam também as autoridades corrigido a história,
quando os discípulos começaram a pregar sobre a ressurreição de Jesus?
Proponentes desta teoria absurda precisam também explicar se Pedro e
João estavam igualmente equivocados acerca do túmulo quando foram
e o encontraram vazio.
Teorias infiéis ou provas infalíveis?
Com certeza concordamos que todas essas teorias infiéis nada mais
são do que falácias e invenções. São o produto de mentes incrédulas que
rejeitam a autoridade das Sagradas Escrituras e preferem seu próprio
raciocínio carnal. É mais difícil crer nelas do que na simples e gloriosíssima verdade que na terceira manhã depois da Sua morte o Salvador estava vivo, triunfantemente ressuscitado de entre os mortos. Nos
quarenta dias subsequentes, e antes da Sua ascensão aos Céus, Ele “Se
apresentou vivo, com muitas e infalíveis provas” (At 1:3), e é um prazer
examinar agora essas provas, e ouvir os muitos depoimentos que dão
testemunho da Sua ressurreição. Como já notamos, há muitos indiví-
A vitória da Sua ressurreição 115
duos e grupos de homens e mulheres que realmente viram o Salvador
ressurrecto. Eles andaram com Ele e falaram com Ele e pelo menos em
uma ocasião comeram com Ele. Com alegria e boa vontade eles darão
o seu testemunho ao fato que Seu túmulo está vazio pelo simples fato
dEle estar vivo.
O testemunho dos lençóis do sepulcro
Parece que Maria Madalena e o pequeno grupo de mulheres vieram
cedo ao sepulcro, naquela terceira manhã, com a intenção de completar
a unção do corpo de Senhor, que havia sido feita apressadamente na
tarde do dia da Crucificação. Para isso elas levavam consigo as especiarias necessárias (Mc 16:1; Lc 24:1). Entretanto, ao se aproximarem
do sepulcro elas viram que a grande pedra havia sido removida, e logo
pensaram que o corpo de Jesus havia sido removido por alguma pessoa
ou pessoas desconhecidas. Talvez as outras mulheres tenham demorado por ali para investigar, mas Maria Madalena partiu apressadamente
para avisar Pedro e João dizendo: “Levaram o Senhor do sepulcro, e não
sabemos onde O puseram” ( Jo 20:2). Como seria de esperar, aqueles
dois discípulos foram imediatamente ao jardim, e João, o mais novo, ultrapassou Pedro, e chegou primeiro. Ele inclinou-se, olhou para dentro
e viu os lençóis de linho no chão. A palavra traduzida “no chão” é muito
importante. Por que não dizer simplesmente “ele viu os lençóis?” Haveria algo importante sobre a posição dos lençóis que chamou a atenção
do discípulo? Tendo notado este fato João não entrou. Foi então que
Pedro chegou e, típico deste discípulo impulsivo, ele entrou imediatamente no túmulo e viu, ele também, os lençóis “no chão”, e viu também
o “lenço” que envolvera a cabeça do Salvador, como um turbante, não
“no chão” com os lençóis, mas num lugar à parte. João então entrou no
sepulcro e viu, e creu. Tudo ali evidenciava um milagre!
Devemos notar aqui diversos fatos importantes. Primeiro, se de fato
o corpo tivesse sido roubado, por que os ladrões simplesmente não o
levaram como estava enrolado nos lençóis? Por que perderam tempo
removendo os lençóis e deixando-os no túmulo? Seria estranho, para
começar. Mas, em segundo lugar, os lençóis estavam no “chão”, e a palavra no original significa que estavam estendidos exatamente da mesma
forma como quando envolviam o corpo do Salvador, exceto pelo fato
que o peso das especiarias dentro deles causou um achatamento, em-
116
A glória do Filho
bora ainda retivessem o formato de rolo, camada sobre camada. Como
Henry Lathan escreveu, em seu ótimo livro The Risen Master (“O Mestre Ressurrecto”): “Se uma pessoa grega quisesse expressar a ideia de
‘estendido no chão’ ou, ‘deitado estendido’, esta seria a palavra que ele
usaria”. Os lençóis não foram deixados num monte embolado no chão.
Eles “jaziam” estendidos de forma ordeira, mas o corpo desaparecera.
Uma terceira coisa a ser notada, e que é frequentemente ressaltada,
é o fato que nos versículos que registram esses acontecimentos ( Jo 20:58) são usadas três palavras diferentes para “ver”. Quando João chegou
primeiro ao sepulcro ele parou do lado de fora, abaixou-se, olhou para
dentro e “viu” (blepo, 9911) os lençóis no chão. É a palavra comum para
visão, e ver. João simplesmente viu os lençóis no chão do sepulcro. Mas
Pedro, tendo entrado, “viu” (theoro, 2234) a posição dos lençóis. Esta
palavra indica que Pedro estava examinando, considerando o que via,
teorizando, tentando chegar a uma explicação pelo que via. Para citar
Henry Lathan novamente: “João apenas viu o que não podia deixar de
ver através da porta, mas Pedro olhou atentamente, com um propósito
em mente; ele queria entender como o corpo poderia ter sido removido”. Em seguida, João entrou também e “viu” (eido, 1492) e creu. João
agora viu com entendimento. Era, poderíamos dizer, um: “Agora vejo!”
Ele vira, de fato, a evidência de um milagre. A mortalha jazia estendida, camada sobre camada, como já notamos, exatamente como estivera
quando envolvia o corpo de Jesus, mas achatada sob o peso da mirra e
aloés ( Jo 19:39), mas o corpo do Salvador não estava mais nele. Mas
como? Mesmo sem qualquer consideração das Escrituras naquele momento ( Jo 20:9), João estava convencido da veracidade da ressurreição
de Cristo.
Havia ainda o lenço que estivera envolvendo a cabeça do Senhor.
Este não estava “com os lençóis, mas enrolado num lugar à parte” ( Jo
20:7). Devemos lembrar que no túmulo haveria um recesso no qual o
corpo estaria, e no seu final uma saliência, um tipo de degrau, de duas ou
três polegadas de altura, que servia de travesseiro. A maneira oriental de
preparar um corpo para o sepultamento era envolvê-lo todo, colocando
especiarias entre as camadas, exceto a cabeça e o pescoço. A cabeça era
tratada separadamente, envolta com um turbante que deixava o rosto à
vista. Assim preparado, era o costume depositar o corpo com a cabeça
1
Os números nesta seção são da Concordância de James Strong (N. do E.).
A vitória da Sua ressurreição 117
repousando sobre a saliência. O que os discípulos agora viram foi que
o lenço, o pano ou toalha, que envolvera a cabeça do Senhor não estava
“no chão” com os lençóis de linho. Não estava achatado como eles, pois
não teria peso suficiente de especiarias para fazê-lo ceder. Também, não
havia sido caprichosamente dobrado e colocado em algum outro lugar.
Nem fora colocado com os lençóis de linho. Estava num lugar sozinho,
separado dos lençóis, sobre aquele travesseiro de pedra, e ainda enrolado como estivera ao envolver a cabeça do Salvador. Como diz uma
tradução: “não junto com os lençóis, mas enrolado no seu próprio lugar”
(Moffatt).
Os lençóis e o lenço juntos serviram de testemunho para Pedro e
João de que um milagre acontecera. A mortalha fora esvaziada e deixada
intacta como um testemunho à ressurreição. Não nos surpreende ver
que os discípulos saíram “admirando consigo” (Lc 24:12) sobre o que
tinha acontecido. Isso não significa que eles deixaram o sepulcro duvidando. Eles saíram do jardim com admiração, maravilhando-se com o
que tinham visto, pois este é o sentido da palavra “admirando” (thaumazo, 2296).
O testemunho de Maria Madalena
Alguém pode perguntar por que os discípulos foram para casa e
deixaram uma mulher chorando, sozinha no jardim. Pode ser que eles
nem perceberam que ela estava ali. Pode ser que ela tenha se isolado entre as folhagens do jardim, preferindo estar sozinha na sua tristeza. Mas,
quando eles partiram, Maria permaneceu. Ela demorara junto à Sua
cruz, e agora permaneceu junto ao Seu sepulcro. Conforme registrado
em João 20, chorando, ela se abaixou como João fizera, pois a entrada
do sepulcro tinha somente quatro pés de altura (1.2 m), e olhando para
o seu interior por entre lágrimas ela viu dois anjos vestidos de branco
assentados, um à cabeceira e outro aos pés, onde o corpo de Jesus jazera. Maria não estava muito interessada em anjos. Ela bem poderia ter
usado as palavras de outra mulher, que disse: “Vistes aquele a quem ama
a minha alma?” (Ct 3:3). Mas os anjos falaram bondosamente a ela:
“Mulher, por que choras?” (v. 13). Ela respondeu: “Porque levaram o
meu Senhor, e não sei onde O puseram”; e tendo dito isto, ela virou-se.
Parecia haver certa indelicadeza no seu gesto. Será que ela observou os
anjos olhando para além dela, como se estivessem vendo alguém às suas
118
A glória do Filho
costas? Ou teria ela ouvido passos discretos? Seja como for, ela voltou-se e viu Jesus em pé, mas não reconheceu que era Jesus. Ele lhe fez a
mesma pergunta que os anjos haviam feito, mas com a terna adição:
“Mulher, por que choras? A quem buscas?” (v. 15). Com certeza Ele sabia o significado daquelas lágrimas, e sabia também a quem ela buscava.
Pobre Maria, ela supôs que falava com o hortelão, mas se ele soubesse
onde o corpo do seu Senhor estava, então que tão somente o dissesse, e
ela o levaria. Como poderia ela ter feito isso? Entretanto, o amor não se
detém para calcular minúcias. Maria queria aquele a quem ela amava,
e de alguma maneira haveria de levar aquele corpo sagrado. Note que
agora ela dera as costas ao suposto hortelão, mas ao ouvir aquela única
palavra: “Maria”, ela se volta imediatamente para Ele. Seria a forma do
nome que Ele usou: “Miriam”? Ou foi o tom familiar da Sua voz? Ou
foi um momento de revelação àquela alma devota? Sua resposta foi uma
única palavra, assim como a Sua saudação havia sido: “Raboni”, “Meu
Mestre”, ela disse, e se apegou a Ele. Mas Ele disse: “Não me detenhas”,
“Não me segure” (NVI). Ele ainda não havia subido para o Pai, e haveria
outras oportunidades de vê-lO novamente. Por agora, ela deveria ir aos
discípulos e divulgar a nova a todos eles. Quem poderia ter convencido
Maria Madalena de que o seu Senhor não havia ressuscitado de entre
os mortos? Ela nunca esqueceria aquela cena no jardim. Maria O viu, O
tocou e conversou com Ele. Aquele que estivera morto esta novamente
vivo. Havia de fato ressuscitado.
O testemunho das mulheres
Devemos lembrar que outras mulheres também foram ao sepulcro
naquela manhã com Maria, e pode ser que houve outras que, além destas, também visitaram o sepulcro. Em algum momento estas mulheres,
assim como Maria, viram ali um anjo que disse: “Não tenhais medo;
pois eu sei que buscais a Jesus, que foi crucificado. Ele não está aqui,
porque já ressuscitou, como havia dito. Vinde, vede o lugar onde o Senhor jazia. Ide, pois, imediatamente, e dizei aos Seus discípulos que já
ressuscitou dentre os mortos” (Mt 28:1-10). Elas partiram apressadamente, com sentimentos confusos de espanto e grande gozo, para levar
as notícias, mas no caminho Jesus saiu-lhes ao encontro e falou uma
palavra: “Salve”, que significa “Saudações, regozijai” (chairo, 5463). Elas
abraçaram os Seus pés num ato de homenagem e reverência, e O adoraram. Ele então as mandou ir e dizer a Seus irmãos que logo os veria.
A vitória da Sua ressurreição 119
Elas tiveram a garantia através do mensageiro angelical de que o Salvador estava vivo, mas agora, melhor ainda, elas O tinham visto e ouvido
e O tocado. Não restava agora dúvida alguma quanto à Sua ressurreição.
Ninguém poderia persuadir estas mulheres de que o seu Senhor não
havia ressuscitado dentre os mortos.
O testemunho da dupla de Emaús
Foi depois disso, no mesmo dia, que dois discípulos caminhavam
juntos pela estrada de Jerusalém a Emaús, cerca de onze quilômetros
(veja Lc 24:13-35). É fácil crer, como muitos, que eles eram marido e
mulher, embora isso não possa ser provado, mas realmente não importa.
Ao caminharem juntos conversavam entre si e falavam sobre os acontecimentos dos dias anteriores. Estavam tristes, e isso era visível nos seus
rostos. Foi então que o Forasteiro se juntou a eles. Ele falava com eles
sobre os acontecimentos recentes como se fosse, de fato, um viajante
solitário que não estivesse a par de tudo que acontecera. Jesus de Nazaré,
que eles criam ser o Redentor prometido, fora entregue pelos seus líderes e crucificado, eles Lhe disseram. Eles falaram e em seguida Ele lhes
falou, e abriu-lhes as Escrituras que profetizavam sobre os mesmos sofrimentos e morte do Messias que eles haviam testemunhado. Portanto,
não deveria o Cristo ter padecido o que fora profetizado e então entrar
na Sua glória? Eles devem ter crido em tudo que os profetas falaram, e
assim essa conversa continuou até que chegaram à sua casa em Emaús.
Com grande cortesia, Jesus, ainda desconhecido deles, fez como quem
ia para mais adiante, mas eles O constrangeram a ficar com eles, e Ele
sentou-Se à mesa com eles. Quase imperceptivelmente, Ele parece ter
trocado de lugar com eles. Ele se tornou o anfitrião. Agora eles eram
os convidados, quando Ele tomou o pão, o abençoou, o partiu e o deu a
eles. Naquele momento os seus olhos foram abertos e eles O reconheceram, mas Ele desapareceu da vista deles. Mas era o bastante! O Salvador
estava vivo! Eles O viram; O ouviram; conversaram com Ele; e Ele se
assentara à sua mesa com eles. Apressadamente então eles voltaram a
Jerusalém naquela mesma hora, com corações que ardiam, para relatar
a história aos onze que estavam reunidos. Que eloquente orador infiel
poderia persuadir este casal de que Jesus não estava vivo, ressuscitado
dentre os mortos?
120
A glória do Filho
O testemunho de Pedro
Quando a dupla da aldeia chegou ao grupo de discípulos, a grande
nova já os havia precedido. Os onze disseram: “Ressuscitou verdadeiramente o Senhor, e já apareceu a Simão” (Lc 24:34). Muito pouco se sabe
sobre esta aparição do Salvador ressurrecto, mas tal é a sua importância que Paulo a cita como prova da ressurreição de Cristo (I Co 15:5).
Em algum lugar, em algum momento, por alguma razão, acerca da qual
podemos somente fazer suposições, houve uma aparição especial do Senhor ressurrecto a Pedro, também chamado Cefas. Quem ousaria confrontar um homem como Pedro e tentar dizer-lhe que Jesus realmente
não havia ressuscitado dentre os mortos? Ele diria simplesmente: “Mas
eu O vi!”
O testemunho dos dez discípulos
Esta reunião dos “onze” em Lucas 24 é sem dúvida a mesma de
João 20:19, onde Tomé, por alguma razão desconhecida, estava ausente.
Judas tinha partido, e assim o pequeno grupo de apóstolos, inicialmente
conhecido como “os doze”, agora é chamado de “os onze”, embora um
deles estivesse temporariamente ausente. Este termo tinha-se tornado
como o termo “os doze”, usado para descrever aquele grupo apostólico,
para diferenciá-los do grupo maior de discípulos. Eles estavam reunidos
como que secretamente, atrás de portas fechadas por medo dos judeus.
De repente, o Salvador pôs-Se no meio deles, dizendo-lhes que não
temessem, e mostrando-lhes as mãos e os pés como prova de que Ele
era de fato Aquele que eles conheciam. Ele os convidou então a apalpá-Lo para mostrar-lhes que não estavam vendo um fantasma. Ele era de
fato o seu Senhor, ressuscitado dentro os mortos. Aqueles homens mais
tarde pregaram ousadamente da ressurreição de Cristo. Eles O tinham
visto!
O testemunho de Tomé
Como já foi mencionado, Tomé, por alguma razão desconhecida,
estava ausente naquela ocasião. Quanto os discípulos lhe disseram: “Vimos o Senhor” ( Jo 20:25), Tomé ficou cético. Afinal, ele vira o Salvador
cravado na cruz, e sabia que uma lança havia traspassado o Seu lado. Se
fosse para Tomé acreditar que se tratava realmente do Senhor, primeiramente ele precisaria ver e tocar o sinal dos cravos, e pôr a sua mão
A vitória da Sua ressurreição 121
naquele lado traspassado. Do contrário, dizia ele, “de maneira nenhuma
crerei”. Oito dias mais tarde o pequeno grupo estava reunido novamente e Tomé com eles. O Senhor apareceu no seu meio como fizera antes,
e sabendo exatamente o que Tomé dissera Ele, em graça, o convidou
a pôr o seu dedo nas marca dos cravos, e a sua mão no lado que fora
traspassado. Tomé prostrou-se em adoração exclamando: “Senhor meu,
e Deus meu!” Num certo sentido, a ausência de Tomé naquela primeira
reunião provou ser uma bênção! Um cético foi convertido! O homem
que dissera: “de maneira nenhuma o crerei”, é agora um crente convencido. Portanto, não fica insustentável, agora, a posição de incredulidade
de outros? “Bem-aventurados os que não viram e creram” ( Jo 20:29).
O testemunho de sete discípulos junto ao lago
Esta história é contada em João 21. Pedro e Tomé, Natanael, Tiago
e João e outros dois discípulos anônimos estavam reunidos junto ao
Mar da Galiléia. Eles decidiram ir pescar por sugestão de Pedro, mas foi
uma expedição infrutífera. Labutaram a noite toda e nada apanharam.
Ao amanhecer, eles se aproximaram da praia e viram o Desconhecido
na praia do lago. Assim como Maria no jardim, “eles não conheceram
que era Jesus”. Ele lhes disse que lançassem a rede do lado direito do
barco, e ao fazê-lo apanharam uma multidão de peixes. Foi João quem
disse: “É o Senhor”. Logo depois estavam com Ele na praia. Ele acendera um fogo e assara um peixe e pão para eles, e depois de terem comido, Ele conversou ternamente com eles. Estes sete discípulos viram o
Senhor ressurrecto. Mais tarde eles iriam, na sua pregação Pentecostal,
testemunhar da Sua ressurreição.
O testemunho dos quinhentos
Não sabemos nada acerca dessa aparição do Salvador ressurrecto,
além do fato que aconteceu, e isso é o suficiente! Muito provavelmente
se deu na Galiléia, num lugar por Ele designado (Mt 28:16). Paulo,
escrevendo talvez uns vinte e cinco anos mais tarde, podia dizer aos
coríntios: “Depois apareceu, uma vez, a mais de quinhentos irmãos, dos
quais vive ainda a maior parte, mas alguns já dormem também” (I Co
15:6). Quinhentos de uma vez! Alguns já haviam morrido, mas a maioria ainda vivia quando Paulo escreveu, e podiam confirmar que viram de
fato o Salvador ressurrecto. Quem poderia duvidar deles?
122
A glória do Filho
O testemunho de Tiago
Tiago também teve um encontro pessoal particular com o Senhor,
como Pedro tivera, em algum lugar, em alguma hora, por alguma razão, embora os detalhes não nos sejam revelados. Mas aconteceu (I Co
15:7)! A observação do comentarista Albert Barnes é interessante. Comentando que este era Tiago, o irmão do Senhor, ele escreve: “Este Tiago, o autor da epístola que leva o seu nome, estava em Jerusalém. Quando Paulo foi para Jerusalém, depois da sua volta da Arábia, ele teve um
encontro com Tiago (Gl 1:19): ‘E não vi a nenhum outro dos apóstolos,
senão a Tiago, irmão do Senhor’, e é muito provável que Paulo lhe teria
falado da visão que tivera do Senhor, no caminho para Damasco, e que
Tiago também lhe contara que O tinha visto depois da Sua ressurreição.
Esta pode ser a razão por que Paulo menciona o fato; porque o havia
ouvido dos lábios do próprio Tiago”. Fica cada vez mais difícil saber por
que, ou como, os homens ainda podiam negar que Cristo ressuscitara,
quando tantas testemunhas podiam se levantar e dizer: “Nós O vimos”.
O testemunho de Estêvão
A tocante história de Estêvão, o mártir, é contada em sua inteireza
em Atos 6:8-7:58. Certos homens de uma das sinagogas de Jerusalém
haviam disputado com Estêvão, mas foram incapazes de resistir à sabedoria com que lhes falava. Isso os levou a fazer com ele o mesmo que
fizeram com seu Senhor antes dele: “subornaram uns homens, para que
dissessem: Ouvimos-lhe proferir palavras blasfemas contra Moisés e
contra Deus. E excitaram o povo, os anciãos e os escribas; e, investindo
contra ele, o arrebataram e o levaram ao conselho. E apresentaram falsas
testemunhas, que diziam: Este homem não cessa de proferir palavras
blasfemas contra este santo lugar e a lei; porque nós o ouvimos dizer
que esse Jesus Nazareno há de destruir esse lugar e mudar os costumes
que Moisés nos deu”. A blasfêmia com certeza era deles, e quando os do
conselho fitaram Estêvão viram que seu rosto resplandecia como o rosto
de um anjo! Em seguida temos o que é chamado de “a defesa de Estêvão”, e por algum tempo eles lhe deram atenção enquanto lhes falava.
Mas quando ele ousadamente os acusou de não aceitarem a mensagem
dos profetas com relação ao Justo, e da sua rejeição daquele Justo, de
quem eles eram traidores e assassinos, eles, irados, rangeram os dentes
contra ele. Mas Estêvão, cheio do Espírito Santo, olhou para os Céus,
A vitória da Sua ressurreição 123
e viu a glória de Deus e Jesus em pé à destra de Deus. Seu testemunho
para eles foi: “Eis que eu vejo os céus abertos, e o Filho do homem, que
está em pé à mão direita de Deus”. Eles o lançaram fora da cidade e o
apedrejaram até a morte, mas o grande legado de Estêvão, para nós, é
sua visão do Cristo ressurrecto, um Homem na glória à destra de Deus.
O testemunho de Paulo
A história de Paulo é bem conhecida. Ele fora Saulo de Tarso, blasfemo e perseguidor dos cristãos. Ele estivera presente, concordando
com o apedrejamento de Estêvão (At 7:58). Mas ao viajar para Damasco com o propósito de trazer cristãos presos para Jerusalém, ele se
encontrou com o Cristo ressurrecto (At 9:3-6). Ele conta a sua própria
história em Atos 22: “Ora, aconteceu que, indo eu já de caminho, e
chegando perto de Damasco, quase ao meio-dia, de repente me rodeou
uma grande luz do céu. E caí por terra, e ouvi uma voz que me dizia:
Saulo, Saulo, por que Me persegues? E eu respondi: Quem és, Senhor?
E disse-me: Eu sou Jesus Nazareno, a Quem tu persegues.” Foi uma
conversão imediata de um homem que pessoalmente confessa ter sido
“um blasfemo e perseguidor, e um homem insolente e arrogante” (I Tm
1:13, JND), mas que mais tarde escreve: “Para mim o viver é Cristo”
(Fl 1:21). O que mudara tão radicalmente um homem como Saulo de
Tarso? Foi a visão do Cristo ressuscitado, o mesmo Homem na glória
que Estêvão viu. Quem poderia persuadir Paulo de que não houve ressurreição?
O testemunho de João
Embora sejam muito extensas para este breve artigo, as visões que
João teve de Cristo, no livro de Apocalipse, precisam ser acrescentadas à
lista de testemunhos ao Senhor ressurrecto. Vez após vez ao longo deste
último livro do Novo Testamento e de toda a Escritura Sagrada, João
escreve sobre Aquele que ele viu. Ele estava lá, na glória, o Homem que
estivera no Calvário. Ele estava exaltado nos Céus onde multidões O
adoravam e Lhe prestavam culto e onde cantavam daquele que os amou,
e os lavou dos seus pecados com o Seu sangue. As memórias da Sua
cruz e da Sua morte cruel nunca se apagarão, mas Ele diz de Si mesmo:
“Eu sou … o que vivo, e fui morto, mas eis aqui estou vivo para todo o
sempre. Amém” (Ap 1:18). Ele vive no poder de uma vida eterna e na
vitória da Sua ressurreição.
Cap. 8 — A majestade da Sua ascensão
por David E. West, Inglaterra
Quando nos referimos à ascensão de Cristo estamos falando da
Sua retirada gloriosa em relação à Sua presença corporal da Terra, e Sua
entrada no próprio Céu.
•
•
•
•
•
O assunto será considerado sob os seguintes cabeçalhos:
Profecia quanto à Sua ascensão.
Pronunciamentos do Senhor Jesus sobre a Sua ascensão.
A realidade da Sua ascensão.
Os resultados da Sua ascensão:
Para o próprio Senhor Jesus
Para os crentes.
Nossa resposta à Sua ascensão.
Profecia quanto à Sua ascensão
No Velho Testamento vemos ilustrações típicas de um verdadeiro
homem em glória, e Davi, por exemplo, podia falar profeticamente da
exaltação de Cristo à destra de Deus: “Disse o Senhor ao meu Senhor:
Assenta-Te à Minha mão direita, até que ponha os Teus inimigos por
escabelo dos Teus pés” (Sl 110:1). No entanto, parece haver apenas uma
profecia direta, no Velho Testamento, sobre a ascensão do Messias, e
esta se encontra no Salmo 68.
O Salmo 68 é o “Salmo da Vitória”. Este Salmo magnífico traça a
marcha de Deus para a vitória, ligando vitórias passadas relacionadas
com Israel à vitória futura e final de Deus. A passagem Messiânica é o
v. 18: “Tu subiste ao alto, levaste cativo o cativeiro, recebeste dons para
os homens, e até para os rebeldes, para que o Senhor Deus habitasse entre eles”. Historicamente é uma referência ao dia quando Davi “trouxe
a arca de Deus para cima, da casa de Obede-Edom, à cidade de Davi,
com alegria” (II Sm 6:12). A expressão “subiste ao alto” inicialmente
tinha em vista a Arca da Aliança sendo conduzida ao cume do Monte
Sião. Mas embora o Salmo tenha suas raízes históricas no Velho Testamento, seus frutos doutrinários são vistos no Novo Testamento. Assim,
Paulo, em Efésios 4:8, interpreta as três afirmações da seguinte maneira:
A majestade da Sua ascensão 125
• “Subindo ao alto” — a ascensão do Cristo vitorioso;
• “Levou cativo o cativeiro” — a derrota do inimigo, a anulação da
oposição;
• “E deu dons aos homens” — a distribuição de dons para a Igreja.
Nesta terceira frase há uma pequena mudança nas palavras do Salmo 68. Entretanto, a linguagem de Pedro no dia de Pentecostes corresponde diretamente com as palavras do Salmo: “recebeste dons”, pois
ele declara que Cristo, exaltado, recebeu “do Pai a promessa do Espírito
Santo” (At 2:33). O Homem exaltado, Cristo Jesus, recebeu dons que
seriam distribuídos entre os homens.
Pronunciamentos do Senhor Jesus
sobre a Sua ascensão
É o Evangelho de João que nos dá as afirmações do próprio Senhor
a respeito da verdade da Sua ascensão. O Senhor Jesus diz aos Seus
discípulos murmuradores: “Que seria, pois, se vísseis subir o Filho do
homem para onde primeiro estava?” ( Jo 6:62). Em breve, o Filho de
Deus retornaria àquela esfera de absoluta bem-aventurança, mas Ele
voltaria na qualidade de “Filho do homem”. Devemos notar que o Senhor Jesus não declarou categoricamente que estes murmuradores iriam
“vê-Lo” quando ascendesse, mas Ele meramente lhes perguntou se eles
se sentiriam ofendidos com tal visão: “Que seria, pois, se vísseis?”. É
interessante notar como a ascensão de Cristo é evidenciada, em tipo, na
primeira parte de João 6, onde lemos: “Jesus subiu ao monte” (v. 3) e
“tornou a retirar-Se, Ele só, para o monte” (v. 15).
Depois da Sua ressurreição Ele disse a Maria Madalena: “Não Me
detenhas, porque ainda não subi para Meu Pai” ( Jo 20:17). Essas palavras são frequentemente mal interpretadas e erroneamente aplicadas a
uma ascensão secreta, da qual as Escrituras nada dizem. Insistir que essa
é uma referência à apresentação do valor da Sua obra perante o trono
de Deus, antes da Sua ascensão “oficial”, quarenta dias mais tarde (para
se cumprir o tipo do Dia da Expiação), não combina com o ensino do
restante do Novo Testamento. No contexto, o Senhor mesmo indicou
a Maria Madalena que Sua ascensão aconteceria em breve, mas não
“ainda”, e que isso mudaria a sua relação com Ele. Não seria mais uma
presença física tangível (“não Me toques”), mas uma presença espiritual.
126
A glória do Filho
“Eu subo [devemos notar que aqui no Evangelho de João é na virtude do Seu próprio poder intrínseco] para Meu Pai e vosso Pai, Meu
Deus e vosso Deus”. Ele não disse: “Eu subo para nosso Pai”, já que a
Sua Filiação é distinta e única. Os detalhes relativos à ascensão de Cristo não são dados por João, a razão sendo, talvez, que no seu Evangelho
Cristo é visto como estando “no seio do Pai” ( Jo 1:18) e como habitando no Céu enquanto ainda na Terra ( Jo 3:13).
A realidade da Sua ascensão
A ascensão de Cristo foi real, literal e visível. Não há nenhuma referência no Evangelho de Mateus à Sua ascensão. Mateus fala somente
da Sua morte, Seu sepultamento e Sua ressurreição. Este Evangelho
retrata um Rei e o Seu reino; portanto é apropriado que Mateus conclua
seu Evangelho com o Rei na Terra entre o Seu povo. Todavia, Marcos no seu Evangelho nos leva um passo adiante e relata a ascensão de
Cristo; ele o resume numa breve afirmação: Ele “foi recebido no céu, e
assentou-Se à direita de Deus” (Mc 16:19). A palavra “recebido” poderia ser traduzida “levado”; no entanto, Paulo diz que Ele foi “recebido
acima na glória” (I Tm 3:16).
A primeira parte da declaração, “foi recebido [levado] no céu”, estava acessível à observação visual dos discípulos; já a segunda parte: “e
assentou-se à direita de Deus” precisou ser recebida pela fé. É um fato
bem conhecido que o objetivo de Marcos, no seu Evangelho, é apresentar Cristo como o Servo Perfeito de Jeová, e poderíamos perguntar se
“à direita de Deus” é o lugar de um Servo, mas certamente é o lugar do
Filho! Entretanto, Marcos escreve com muito cuidado, sob a direção
do Espírito Santo, preservando a Filiação de Cristo, e ele inicia o seu
Evangelho com as palavras: “Princípio do Evangelho de Jesus Cristo,
Filho de Deus” (1:1). Realmente somente os verdadeiros filhos de Deus
podem servir. Marcos, de acordo com o tema do seu Evangelho, acrescenta no final: “E eles, tendo partido, pregaram por todas as partes, cooperando com eles o Senhor, e confirmando a palavra com os sinais que
se seguiram” (16:20). Embora elevado ao Céu, Ele é ainda o Servo ativo.
O relato de Lucas, no seu Evangelho, é cheio de sugestões espirituais. Como o Pastor, Ele “levou-os fora até Betânia” (Lc 24:50). As
memórias deste lugar devem ter sido fragrantes para o Senhor Jesus; foi
ali que Ele fora amado e adorado. Parece haver uma ênfase nas palavras:
A majestade da Sua ascensão 127
“levou-os fora”; Sua última ação foi mostrar aos Seus que Ele não estaria mais associado com o sistema que O mandara à cruz.
Ele, como um Sacerdote, “levantando as Suas mãos, os abençoou”
(Lc 24:50), sugerindo para eles o serviço que Ele estava para assumir na
Sua posição nas alturas. Cristo não se tornou oficialmente Sacerdote até
ocupar Seu lugar à destra de Deus, mas havia traços sacerdotais nEle,
enquanto Ele estava aqui sobre a Terra, e é apropriado que este ato seja
registrado por Lucas, já que este é o Evangelho sacerdotal. Por isso
também é muito apropriado que há neste Evangelho mais referências
ao Senhor em oração do que nos outros Evangelhos.
Assim, “abençoando-os Ele, se apartou deles e foi elevado ao céu”.
Repare como é empregada a voz ativa: “Se apartou”. A palavra grega
traduzida “elevado” indica o ato de conduzir uma pessoa a um lugar
mais elevado. A ascensão do Senhor Jesus produziu adoração: “E adorando-O eles” (Lc 24:52). Devemos observar que a presença corporal de
Cristo não é necessária para que Seu povo possa adorá-lO. Sua ascensão também gerou gozo: “tornaram com grande júbilo à Jerusalém” (Lc
24:52). Uma apreciação correta da ascensão de Cristo terá os mesmos
efeitos sobre o povo do Senhor, hoje.
Lucas nos dá mais detalhes no seu tratado posterior, o Livro dos
Atos. É nele que aprendemos que um período de quarenta dias (que nas
Escrituras frequentemente significa um período de provação, teste ou
aprovação), se passou entre Sua ressurreição e Sua ascensão: “sendo visto por eles no espaço de quarenta dias” (At 1:3). Quatro vezes em Atos
1 Lucas diz que Ele foi “recebido”; em cada caso é a mesma palavra
grega usada por Marcos em 16:19, mas traduzida “recebido em cima”.
Os pensamentos dos discípulos sobre o estabelecimento imediato de um reino visível (“Senhor, restaurarás Tu neste tempo o reino
a Israel?”, At 1:6), foram eclipsados pela promessa de poder presente
(“recebereis a virtude do Espírito Santo que há de vir sobre vós”, At
1:8), e pelo esboço do plano para seu trabalho futuro (“e ser-Me-eis testemunhas, tanto em Jerusalém, como em toda a Judéia e Samaria, e até
aos confins da terra”, At 1:8). Havia também a perspectiva do retorno
de Cristo em glória: “Esse Jesus, que dentre vós foi recebido em cima
no céu, há de vir assim como para o céu O vistes ir” (At 1:11). De fato
Zacarias havia profetizado: “E naquele dia estarão os Seus pés sobre o
128
A glória do Filho
monte das Oliveiras, que está defronte de Jerusalém para o oriente” (Zc
14:4).
Lucas nos diz que “uma nuvem O recebeu, ocultando-O aos seus
olhos” (At 1:9) e isso quer dizer literalmente que “uma nuvem O levou”.
Não era uma nuvem qualquer, era a nuvem Shekinah da presença de
Deus. Devemos notar que a palavra aramaica Shekinah não se encontra nas Escrituras, mas significa literalmente “residência”, e era usada
posteriormente pelos judeus para expressar a Presença Divina invisível.
O livro dos Atos registra a pregação de três homens principais: Pedro, Estêvão e Paulo, e sua pregação confirma o grande acontecimento
da ascensão de Cristo à destra de Deus. Pedro, no dia de Pentecostes,
pregou que o Senhor Jesus fora exaltado à mão direita de Deus: “De
sorte que, exaltado pela destra de Deus” (At 2:33). Novamente diante
dos líderes de Israel Pedro declarou: “Deus com a Sua destra O elevou
a Príncipe e Salvador” (At 5:31).
A mensagem de Estêvão chega ao seu clímax com a grande verdade
de um Homem na glória: “Eis que vejo os céus abertos, e o Filho do
homem que está em pé, à mão direita de Deus” (At 7:56). Paulo, ao
recontar sua conversão, testifica do fato que “chegando perto de Damasco … de repente me rodeou uma grande luz do céu. E caí por terra, e
ouvi uma voz que me dizia: Saulo, Saulo, por que Me persegues? … Eu
sou Jesus Nazareno, a quem tu persegues” (At 22:6-8). Paulo, como Estêvão, viu o Cristo glorificado, assim ele podia dizer aos coríntios: “Não
vi eu a Jesus Cristo, Senhor nosso?” (I Co 9:1).
Na Epístola aos Hebreus, pouco é dito sobre Cristo saindo da morte, embora o escritor fale do “Deus de paz, que pelo sangue da aliança
eterna tornou a trazer dos mortos a nosso Senhor Jesus, grande Pastor
das ovelhas” (Hb 13:20), mas muito mais é dito sobre a Sua ascensão
da Terra, Sua entrada no Céu e o fato dEle estar assentado à destra de
Deus.
A nuvem ocultou aos olhos dos discípulos a passagem do Senhor
enquanto Ele ascendia (“e uma nuvem O recebeu, ocultando-O aos seus
olhos”, At 1:9). Entretanto, o escritor aos Hebreus nos permite acompanhar Sua jornada: “temos um grande Sumo Sacerdote, Jesus, Filho
de Deus, que penetrou nos céus” (Hb 4:14). É importante notar que a
preposição grega dia, traduzida “nos”, significa “através”. Existem três
A majestade da Sua ascensão 129
céus: a atmosfera, o Céu estrelar e o “terceiro Céu” (II Co 12:2), a habitação eterna de Deus. Cristo somente, entre todos os sacerdotes que
Hebreus conheceu, é chamado de o Grande Sumo Sacerdote. Assim
como Arão no passado passava através do pátio externo do Tabernáculo,
depois através do Lugar Santo, e uma vez por ano entrava no Santo dos
Santos pelo povo, assim Jesus, o Filho de Deus, passou através do Céu
atmosférico e estrelar. Assim, Cristo não somente ascendeu, mas Ele
atravessou os Céus para além dos limites do espaço.
No capítulo inicial da nossa Bíblia lemos: “E fez [isto é, Deus] as
estrelas” (Gn 1:16), mas “todas as coisas foram feitas por Ele [o Verbo]”
( Jo 1:3). Faríamos bem em considerar a vastidão dos Céus estrelados;
há estrelas a tantos anos-luz de distância da Terra, que sua luz ainda não
chegou até nós, mas quando Ele ascendeu, Ele passou “através dos céus”.
Sim, Ele é “feito mais sublime do que os céus” (Hb 7:26), e isso significa
que Ele está exaltado acima dos céus. Nenhuma mente humana pode
compreender plenamente a declaração de Paulo: “Aquele que desceu
é também O mesmo que subiu acima de todos os céus, para cumprir
todas as coisas” (Ef 4:10). Podemos somente nos curvar e adorar.
Enquanto o Céu se regozijou com a Sua chegada, nós na Terra nos
regozijamos sabendo, pela fé, que Ele ali está: “por Seu próprio sangue,
entrou uma vez no santuário” (Hb 9:12). Embora haja uma distinção
entre o lugar santo (“o santuário”, Hb 9:2) e o “Santo dos Santos” (Hb
9:3), em relação ao Tabernáculo terrestre, esta distinção não é feita na
Epístola aos Hebreus quanto ao “verdadeiro tabernáculo” (Hb 8:2) no
Céu. Devemos notar que Ele penetrou “pelo” ou, “na virtude do” Seu
próprio sangue, e não “com” Seu sangue, como alguns entendem. Sua
entrada no “Lugar Santo” não foi para efetuar a redenção, pois esta já
fora obtida no Calvário (“havendo efetuado uma eterna redenção”, Hb
9:12).
O escritor aos Hebreus continua dizendo: “Porque Cristo não entrou num santuário feito por mãos, figura do verdadeiro, porém no mesmo [próprio] céu” (Hb 9:24). Assim o santuário celeste não é cópia do
terrestre, mas as “figuras das coisas que estão nos céus” (Hb 9:23) eram
apenas uma representação terrena, uma cópia temporária, da realidade
celestial. Aquele que trouxe a Deidade à Terra levou a humanidade para
o Céu. Há um Homem na glória! Hebreus 9:24 define onde está o Céu:
“… para agora comparecer perante a face de Deus por nós”. Cristo está
130
A glória do Filho
lá, perante a face de Deus por nós.
Esta parte pode, portanto, ser resumida da seguinte maneira:
• Ele “subiu” (At 1:10);
• Ele passou pelos céus (Hb 4:14);
• Ele “entrou” (Hb 9:12);
• Ele comparece “perante a face de Deus” (Hb 9:24).
Paulo diz: “… levou cativo o cativeiro” (Ef 4:8); na Sua ascensão
triunfal Ele levou cativo aqueles que Ele vencera no Calvário ao passar
pelo domínio do “príncipe das potestades do ar” (Ef 2:2).
Os resultados da Sua ascensão
Para o próprio Senhor Jesus
Vindicação
Embora Ele fosse desprezado e rejeitado quando esteve aqui na
Terra, o Céu agora recebeu o Senhor Jesus e Lhe deu as boas-vindas.
Deus reverteu a avaliação dos homens. Pedro, ao pregar no dia de Pentecostes, disse: “Porque Davi não subiu aos céus, mas Ele próprio diz:
Disse o Senhor ao meu Senhor: Assenta-Te à Minha direita, até que
ponha os Teus inimigos por escabelo de Teus pés. Saiba, pois, com certeza toda a casa de Israel que a esse Jesus, a quem vós crucificastes, Deus
O fez Senhor e Cristo” (At 2:34-36).
Preeminência
É verdade que Cristo tem pleno direito à preeminência, o primeiro
lugar, como o Filho de Deus, a imagem do Deus invisível e o primogênito de toda a criatura, mas na ressurreição e ascensão o Senhor Jesus
entrou numa supremacia maior e mais significativa. Sua supremacia no
Céu se estende além de todas as formas de domínio, autoridade e poder,
quer seja no presente ou no futuro, sejam eles submissos ou hostis. Paulo
escreve que Ele, o Pai da glória, O ressuscitou dentre os mortos, e O
colocou “à Sua direita nos Céus, acima de todo o principado, e poder, e
potestade, e domínio, e de todo nome que se nomeia, não só neste século, mas também no vindouro. E sujeitou todas as coisas a Seus pés, e
sobre todas as coisas O constituiu como cabeça da igreja” (Ef 1:20-22).
A majestade da Sua ascensão 131
Pedro acrescenta seu testemunho: “O qual está à destra de Deus, tendo
subido ao céu, havendo-se Lhe sujeitado os anjos, e as autoridades e as
potências” (I Pe 3:22).
Glorificação
Durante o curso do ministério no cenáculo, o Senhor Jesus disse
aos Seus: “Filhinhos, ainda por um pouco estou convosco. Vós Me buscareis, mas, como tenho dito aos judeus: para onde Eu vou não podeis
vós ir; Eu vo-lo digo também agora” ( Jo 13:33). Evidentemente Ele
estava Se referindo ao Seu retorno ao Pai, que exigia a Sua ascensão.
Entretanto, no contexto Ele diz: “Se Deus é glorificado nEle [o Filho
do homem] também Deus O glorificará em Si mesmo, e logo O há de
glorificar” ( Jo 13:32). Agora tendo glorificado a Deus na Terra, o Filho
do homem seria imediatamente glorificado ao subir aos Céus.
Para os crentes, a ascensão de Cristo trouxe:
A descida do Espírito Santo
A descida do Espírito Santo não poderia acontecer até que o Senhor retornasse ao Céu: “E no último dia, o grande dia da festa, Jesus
pôs-Se em pé, e clamou: Se alguém tem sede, venha a Mim e beba.
Quem crê em Mim, como diz a Escritura, rios de água viva correrão de
seu ventre” ( Jo 7:37-38). Então João, escrevendo sob inspiração divina,
acrescenta uma palavra de explicação: “E isto disse Ele do Espírito Santo que haviam de receber os que nele cressem, porque o Espírito Santo
ainda não fora dado, por ainda Jesus não ter sido glorificado” ( Jo 7:39).
Na noite em que foi traído, o Senhor Jesus disse aos Seus discípulos:
“Vos convém que Eu vá; porque se Eu não for, o Consolador não virá;
mas, quando Eu for, vo-lO enviarei” ( Jo 16:7). Realmente, a descida
do Espírito Santo era evidência da ascensão e exaltação de Cristo. Ao
pregar em Jerusalém no dia de Pentecostes, Pedro disse: “De sorte que,
exaltado pela destra de Deus, e tendo recebido a promessa do Espírito
Santo, derramou isto que vós agora vedes e ouvis” (At 2:33).
A distribuição de dons para a Igreja
Quando Paulo escreveu aos Efésios, ele citou o Salmo 68:18: “Por
isso diz: Subindo ao alto, levou cativo o cativeiro, e deu dons aos homens” (Ef 4:8). Paulo então explica: “E Ele mesmo deu uns para após-
132
A glória do Filho
tolos, e outros para profetas, e outros para evangelistas, e outros para
pastores e doutores, querendo o aperfeiçoamento dos santos, para a obra
do ministério, para edificação do corpo de Cristo” (Ef 4:11-12). Enquanto apóstolos e profetas eram dons fundamentais da Igreja, evangelistas, doutores e pastores estão conosco ainda hoje.
Devemos observar que em cada uma das quatro passagens das
Epístolas no Novo Testamento (Rm 12:4-8; I Co 12:1-11; aqui em Ef
4:7-6 e I Pe 4:10-11) onde o assunto dos dons espirituais é considerado,
a ênfase está no fato que cada cristão recebe um dom. É a responsabilidade de cada um cumprir o ministério específico confiado a ele.
A garantia de nosso lugar no Céu
O escritor aos Hebreus usa a expressão “interior do véu”, e então
acrescenta: “Jesus, nosso precursor entrou por nós, feito eternamente
Sumo Sacerdote segundo a ordem de Melquisedeque” (Hb 6:20). Era
um conceito completamente novo para a mente judaica que o Sumo
Sacerdote pudesse ser um precursor. Sob a antiga ordem das coisas,
o sumo sacerdote entrava uma vez por ano, no Dia da Expiação, no
Santo dos Santos do Tabernáculo, onde ninguém mais podia entrar.
Entretanto, para nós, como cristãos do dia presente, é diferente. Nosso
Sumo Sacerdote é um precursor; Ele entrou “por nós”, significando que
Ele preparou o caminho para nós. Ele não disse aos Seus no cenáculo:
“Vou preparar-vos lugar” ( Jo 14:2)? A entrada do precursor é a garantia
de que um dia nós também estaremos lá com Ele. Aquele que disse:
“… para que onde Eu estiver, estejais vós também” ( Jo 14:3) já garantiu
isso para nós, visto que Ele já foi para onde nós estamos indo.
Nossa resposta à Sua ascensão
Inevitavelmente existem aplicações práticas que surgem de verdades doutrinárias. Considerando a ascensão de Cristo, deveríamos estar
ocupados com coisas espirituais. Nos versículos iniciais de Colossenses
3 temos duas expressões imperativas, “buscai” e “pensai”:
“Buscai [isto é, continue buscando] as coisas que são de cima” (Cl
3:1) — isto aponta para um esforço prático. “As coisas que são de cima”
estão em contraste acentuado com os “rudimentos do mundo” (Cl 2:20),
as ordenanças e os preceitos dos homens. “As coisas que são de cima”
afetam nossas vidas espiritualmente e moralmente, pois são celestiais e
A majestade da Sua ascensão 133
essencialmente santas. Mas Paulo continua: “onde Cristo está assentado
à destra de Deus”. Devemos estar ocupados com Ele e com aquelas coisas que Sua ascensão e exaltação iniciaram; é ocupação de coração com
Cristo que motiva o cristão.
“Pensai [isto é, tenha sua mente] nas coisas que são de cima” (Cl
3:2) — esta será a atitude, ou disposição, interior. Devemos ter nossas
mentes nas coisas que são de cima, em contraste com as “coisas terrenas”
(Fl 3:19). No contraste, “as que são da terra” se refere à religiosidade
terrena dos homens, um assunto que Paulo aborda em Colossenses 2.
O cristão não deve ser controlado pela emoção, mas pela razão, iluminada e instruída pela revelação da mente de Deus, nas Escrituras.
Conclusão
A importância do fato histórico da ascensão corporal de Cristo não
pode ser enfatizada demasiadamente. Este artigo destacou os resultados
da Sua ascensão no que diz respeito a Ele e a nós. Que possamos, em
resposta, dedicar-nos às “coisas que são de cima”.
Não observamos os poucos privilegiados,
Quando Tu subiste entre nuvens,
Erguerem ao Céu seus olhos espantados,
E então caírem ao chão prostrados;
Mas nós cremos que olhos mortais
Viram aquela viagem aos Céus.1
(John Hampden Gurney)
1
We did not mark the chosen few,/When Thou didst through the clouds ascend,/First lift
to heaven their wondering view,/Then to the earth all prostrate bend;/Yet we believe
that mortal eyes/Beheld that journey to the skies.
Cap. 9 — A compaixão do Seu sacerdócio
por J. Paterson Jr., Escócia
Introdução
Os ministérios do nosso Senhor Jesus Cristo como Profeta, Sacerdote e Rei são a chave para o propósito da encarnação. Seu ministério
profético se ocupava com a revelação da mensagem de Deus; o ministério sacerdotal está relacionado com a Sua obra intercessora; Seu ministério real Lhe dá o direito de reinar sobre Israel e toda a Terra. Toda
a intenção Divina destes três ministérios históricos atingiram, perfeitamente, seu ponto culminante no Senhor Jesus Cristo.
Como Profeta
O profeta era a voz através da qual Deus falava à humanidade. Ao
ser estabelecido o ministério profético em Deuteronômio 18:15-18, já
se almejava seu cumprimento final no Senhor Jesus Cristo. Quando Ele
veio, Ele plenamente revelou o Pai ao povo. “Esse O revelou” ( Jo 1:18).
Como Rei
Em Gênesis 49:10 Jacó profetizou que o Messias viria da tribo de
Judá e reinaria como rei. No Salmo 2:6 Deus anunciou que Seu Filho
seria estabelecido como Rei em Jerusalém. O Salmo 110 indica que,
como rei, Ele dominaria, subjugaria e reinaria sobre os Seus inimigos:
“Disse o Senhor ao Meu Senhor: Assenta-Te à Minha direita, até que
ponha os Teus inimigos por escabelo de Teus pés” (Sl 110:1).
Como Sacerdote
Enquanto o profeta revelava Deus ao homem, o sacerdote representava o homem diante de Deus. Antes dos tempos de Moisés, o chefe da
família oferecia os sacrifícios. Nos dias de Abraão o sacerdote era o pai
ou o membro mais velho da família. Historicamente, quando a família
crescia e formava uma tribo, o cabeça, além de sacerdote, se tornava rei;
assim ele era o sacerdote/rei da sua tribo. Quando as doze tribos cresceram e formaram a nação de Israel, que Deus libertou da escravidão,
o sacerdócio foi criado através de Arão, da tribo de Levi, que veio a ser
o sacerdócio levítico, administrando a ordem de ministério sacrificial
como definido por Deus.
A compaixão do Seu sacerdócio 135
Mais tarde outra família, a linhagem de Davi, seria separada para
ser a família real. Nenhum rei poderia ser sacerdote, embora pudesse
ser profeta. Nenhum sacerdote poderia ser rei, embora pudesse também
ser profeta. Entretanto, o Senhor Jesus ocupará as três posições eternamente. Enquanto Ele as mantém eternamente, Ele desempenha os
ministérios cronologicamente. Como profeta Ele é visto durante o Seu
ministério público ( Jo 1:18). Sua posição como profeta é mencionada
em João 4:44: “Porque Jesus mesmo testificou que um profeta não tem
honra na sua própria pátria”. No Seu primeiro advento, Ele foi apresentado como Rei: “Onde está aquele que é nascido Rei dos judeus?”
(Mt 2:2). Entretanto Ele foi rejeitado como Rei: “Não temos rei, senão César” ( Jo 19:15). No Seu segundo advento Ele será reconhecido
como Rei, e oficiará como tal (Mt 25:35-45). No presente Ele mantém
e atua como Sumo Sacerdote: “chamado por Deus Sumo Sacerdote”.
(Hb 5:10)
Grandes são as posições que Ele ocupa,
E radiante Se manifesta Seu caráter
Exaltado sobre o trono.1
(Samuel Medley)
Seu sacerdócio contrastado
O escritor aos Hebreus mostra com clareza que o sacerdócio de
Cristo está em contraste absoluto com o sacerdócio de Arão. Estes contrastes são claramente traçados, e embora não haja oportunidade para
ampliação nesta publicação, vale a pena destacá-los para um posterior
estudo pessoal.
A partir de Hebreus 7:21 vemos que o sacerdote do Velho Testamento tornou-se sacerdote “sem juramento”, enquanto Cristo tornou-Se sacerdote por um juramento (Hb 7:20-21). O sacerdócio da antiga
ordem consistia em “muitos sacerdotes” (Hb 7:23), mas a palavra do Senhor para Ele é: “Tu és sacerdote eternamente” (Hb 7:21), fazendo-O
o único Sacerdote eterno, e removendo a necessidade de um sacerdócio
operando perante Deus a favor do povo. A morte impedia o desempenho prolongado dos sacerdotes da ordem de Arão (Hb 7:23). Isto levou
a um sacerdócio marcado por mudanças contínuas. O contraste com
1
Great are the offices He bears,/And bright His character appears,/Exalted on the throne.
136
A glória do Filho
Cristo é glorioso, porque Ele permanece para sempre. “Mas Este, porque permanece eternamente, tem um sacerdócio perpétuo” (Hb 7:24).
As limitações que caracterizavam os sacerdotes do Velho Testamento
acabaram; o sacerdócio de Cristo é ilimitado, e já que Ele vive para
sempre, pode salvar eternamente (Hb 7:25). O pecado causava a contaminação constante do sacerdote do Velho Testamento, e consequentemente exigia contínua purificação pessoal: “primeiramente por seus
próprios pecados, e depois pelos do povo” (Hb 7:27). Cristo, no entanto,
é “santo, inocente, imaculado, separado dos pecadores” (Hb 7:26). Seu
sacrifício é singular e tem um efeito permanente: “porque isto fez Ele,
uma vez, oferecendo-Se a Si mesmo” (Hb 7:27). O primeiro sacerdócio
era composto de homens que eram sujeitos à enfermidade e, portanto,
fracos, mas Ele é o Filho de Deus “que é perfeito para sempre” (Hb
7:28). O serviço do sacerdote do Velho Testamento era desempenhado
como “exemplo e sombra das coisas celestiais” (8:5), e eles serviam num
tabernáculo terrestre erguido por homens (8:5). Cristo, em contraste,
entrou no verdadeiro tabernáculo que “o Senhor fundou” e realiza o
Seu ministério à destra do trono da “majestade nos céus” (8:1-2). O
sacerdócio do Velho Testamento, não importa quão correto e glorioso,
não podia alcançar o propósito final de Deus para ele. Como resultado,
um “outro sacerdote” precisa substitui-lo (7:17). Agora que Cristo veio,
foi providenciado um sacerdócio e sacrifício melhor, e um meio melhor
para que o cristão possa se aproximar de Deus e chegar-se ao trono da
graça através do sangue de Cristo. Neste novo e melhor concerto vemos
a habilidade salvadora do novo Sacerdote: “E, na verdade, aqueles foram
feitos sacerdotes em grande número, porque pela morte foram impedidos de permanecer, mas Este, porque permanece eternamente, tem um
sacerdócio perpétuo. Portanto, pode também salvar perfeitamente os
que por Ele se chegam a Deus, vivendo sempre para interceder por eles”
(Hb 7:23-25). No sacerdócio de Arão, cada sacerdote tinha um final
definitivo para o seu serviço, causado pela sua própria morte: “E Moisés
despiu a Arão de suas vestes, e as vestiu em Eleazar, seu filho; e morreu
Arão ali sobre o cume do monte” (Nm 20:28). Josué 24:33 diz: “Faleceu
também Eleazar, filho de Arão” ( Josefo menciona 83 sumo sacerdotes
diferentes, começando com Arão e indo até a destruição do Templo
em 70 a. D.). Assim não havia sacerdotes permanentes e duradouros. A
glória do novo sacerdócio é que ele é eterno. A linhagem de Arão era
mutável, transitória, temporal, interrupta e transferível. Em contraste, o
A compaixão do Seu sacerdócio 137
sacerdócio de Nosso Senhor Jesus Cristo é imutável, inalterável, ininterrupto e intransferível. Portanto, Ele é capaz de realizar aquilo que o
sacerdócio do Velho Testamento nunca pôde. Ele é capaz de remover o
pecado pelo Seu Sacrifício perfeito, e a aplicação do sacrifício permanece para sempre devido à Sua vida infinita.
Em 7:15-17 o escritor declara que o sacerdócio de Cristo não se
assemelha à ordem Levítica, mas à ordem de Melquisedeque. A razão
disso é que o sacerdócio de Cristo não está baseado no mandamento
carnal, e sim no poder da Sua vida ressurreta eterna. Este é o fato sendo
estabelecido pelo escritor, ao associar o sacerdócio de Cristo com o de
Melquisedeque — que a pessoa que abençoou Abraão não teve princípio nem fim registrados e, no entanto, ele era um “sacerdote do Deus
Altíssimo” (Gn 14:18). Assim o sacerdócio de Cristo não está confinado
à ordem terrestre do concerto de Moisés. Não é temporal, nem é uma
sombra, mas a própria realidade: “Os quais servem de exemplo e sombra
das coisas celestiais, como Moisés foi divinamente avisado, estando já
para acabar o tabernáculo; porque foi dito: Olha, faze tudo conforme o
modelo que no monte se te mostrou. Mas agora alcançou Ele ministério
tanto mais excelente, quanto é mediador de uma melhor aliança que
está confirmada em melhores promessas” (8:5-6).
Seu sacerdócio comparado
No final de Hebreus 6 e no cap. 7 o escritor retoma sua exposição
sobre o assunto do sacerdócio, e reintroduz Melquisedeque e sua comparação com o Filho de Deus (7:1). A descrição definitiva deste homem
vem no final do v. 3: “permanece sacerdote para sempre”, e se refere à
descrição dele, tipicamente, em relação ao Senhor Jesus. Sabemos muito pouco deste homem além da narrativa de Gênesis 14. Abraão ou o
reconheceu como alguém que adorava o Deus Altíssimo, ou ouviu falar
dele através de outros, porque ele ofereceu livremente o dízimo dos seus
despojos de guerra, e isso indica algum contato ou conhecimento prévio. Abraão recebeu o alimento e a bênção deste sacerdote depois da sua
vitória, e logo em seguida Melquisedeque desaparece da história. Ele é o
primeiro a ser chamado de sacerdote nas Escrituras. Precisamos afirmar
cuidadosamente que seria enganoso tomar como literal a descrição da
genealogia de Melquisedeque, no v. 3. O significado da afirmação é que
não há registro de pai e mãe. No importante registro das genealogias
138
A glória do Filho
do sacerdócio não haveria menção deste nome. Obviamente ele tinha
ascendência natural, e por isso não deve ser considerado uma pessoa
miraculosa e misteriosa; mas sim que sua genealogia não é encontrada
no registro do sacerdócio levítico. Talvez ajude destacar que, embora já
sugerido, a aparição de Melquisedeque em Gênesis 14 não é uma Teofania1. O escritor aos Hebreus declara: “Considerai, pois, quão grande
era este” (Hb 7: 4). Um dos requisitos para ser sacerdote era a necessidade de ascendência humana. Isto é um argumento forte contra esta
aparição ser o Cristo pre-encarnado. Outra razão por não ser Cristo é
que no Velho Testamento, Teofanias vinham e iam. Davam a mensagem
e não ficavam na Terra permanentemente para oficiar como sacerdote
ou rei. Este homem, quem quer que fosse, é mencionado como sendo o
rei de Salém ( Jerusalém). Quando as Escrituras comparam Cristo com
o sacerdócio de Melquisedeque, lemos: “… feito semelhante ao Filho de
Deus” (7:3). O que é enfatizado nas Escrituras são algumas semelhanças
paralelas no ministério, mas não na natureza do seu ser.
Assim, desta maneira ele era um tipo de Cristo no seu papel mediador, mas não era o próprio Cristo. O autor contrasta os dois sacerdócios.
O Senhor Jesus não serviu como sacerdote na Terra porque Ele não era
da tribo de Levi, e sim de Judá: “Visto ser manifesto que nosso Senhor
procedeu de Judá, e concernente a essa tribo Moisés nunca falou de
sacerdócio” (7:14). De novo em 8:4: “Ora, se Ele estivesse na terra, nem
tampouco sacerdote seria, havendo ainda sacerdotes que oferecem dons
segundo a lei”. Como já vimos no Velho Testamento o sacerdote tinha
que ser um descendente de Levi. Os sumo sacerdotes que oficiavam perante Deus tinham que ser descendentes de Arão, bisneto de Levi. Para
ser um sacerdote da ordem de Arão era necessário traçar seus ancestrais
até Arão, mas ser um sacerdote segundo a ordem de Melquisedeque
era por nomeação Divina. Esse sacerdócio visto tipicamente e simbolicamente em Melquisedeque é cumprido essencialmente no Filho de
Deus. Não faria mal algum usar esta verdade como confirmação da eterna Filiação de Cristo. Da Sua relação de Filho com o Pai não há princípio nem fim, nem há qualquer pensamento de sujeição ou inferioridade
no Seu eterno relacionamento de Filho com o Pai.
O Senhor Jesus Se tornou um eterno sacerdote “segundo a ordem
1
“Teofania” é o nome dado a uma aparição do Senhor Jesus Cristo aqui na Terra antes
da Sua encarnação (N. do E.).
A compaixão do Seu sacerdócio 139
de Melquisedeque” (Sl 110:4; Hb 5:6; 6:20 ; 7:11, 17, 21). Ele é o eterno
Filho que uma vez morreu, foi ressuscitado e continua para sempre no
Seu sacerdócio, baseado na “virtude da Sua vida incorruptível” (7:16).
Portanto, Sua função de mediador na ordem do sacerdócio de Melquisedeque é superior. Este novo sacerdócio é baseado na promessa: “e visto
como não é sem prestar juramento (porque certamente aqueles, sem
juramento, foram feitos sacerdotes, mas Este com juramento por aquele
que Lhe disse: Jurou o Senhor, e não Se arrependerá; Tu és sacerdote
eternamente, segundo a ordem de Melquisedeque)” (7:20-21), e também baseado nEle como aquele que o pode garantir como o Mediador
do Novo Concerto (7:22-28). Este é um sacerdócio perfeito que permanece para sempre. Diferente do antigo que mudava, este é administrado
pelo eterno Filho de Deus para todos aqueles que estão na casa de Deus
(9:15-10:21). Enquanto os sacerdotes Levitas ministravam somente a
uma nação, o sacerdócio de Melquisedeque ministra a todos. Melquisedeque também prefigurava o Senhor Jesus, em que seus títulos se referem a Cristo como Rei de justiça e de paz (7:2).
Seu sacerdócio contínuo
O Senhor Jesus, como Filho de Deus, e em conformidade com a
glória na qual Ele entrou através dos Seus sofrimentos e morte, está
elevado muito acima dos anjos. Era necessário que Ele passasse por
sofrimentos e morte conforme o plano divino. Pelos Seus sofrimentos e
morte Ele glorificou o Pai; Ele aniquilou o pecado; Ele aboliu a morte;
Ele destruiu o poder do diabo (Hb 2:14-15), e está coroado de glória e
de honra: “Vemos, porém, coroado de glória e de honra aquele Jesus que
fora feito um pouco menor do que os anjos, por causa da paixão da morte, para que, pela graça de Deus, provasse a morte por todos” (Hb 2:9).
O sacrifício para serviço
O Senhor Jesus ofereceu-Se a Si mesmo a Deus para ser, sobre a
cruz, um sacrifício pelo pecado. O escritor aos Hebreus compara o sacrifício e ministério de Cristo com o dos sacrifícios e serviços levíticos.
Cristo como Sacrifício e Sumo Sacerdote enche o livro. Tipo e antítipo,
sombra e realidade, se misturam para mostrar a natureza do sacrifício
redentor de Cristo e Seu ministério sumo sacerdotal que segue. O Senhor Jesus veio à Terra para efetuar uma obra completa. Antes da cruz
Ele declarou: “Eu glorifiquei-Te na terra, tendo consumado a obra que
140
A glória do Filho
Me deste a fazer” ( Jo 17:4). Para enfatizar o caráter final do Seu sacrifício, o escritor aos Hebreus usa a frase: “pela oblação do corpo de Jesus
Cristo, feita uma vez” (10:10). O sacrifício de Cristo cumpre e substitui
todos os sacrifícios típicos. O sacrifício de Cristo de Si próprio é a dádiva da Sua vida pela humanidade. Este sacrifício é tão eterno quanto Ele
mesmo. Não pode ser repetido. Em contraste com os sacrifícios levíticos, este sumo sacerdote não necessitava “como os sumo sacerdotes, de
oferecer cada dia sacrifícios, primeiramente por seus próprios pecados, e
depois pelos do povo; porque isto fez Ele, uma vez, oferecendo-Se a Si
mesmo” (7:27). O sacerdote levítico se apresentava para oferecer continuamente, sua obra era inconclusa e incompleta. Desde o sacrifício matinal até o sacrifício da tarde havia contínuo derramamento de sangue
e carcaças consumidas pelo fogo. Aqueles sacrifícios apontavam para o
futuro, para o verdadeiro sacrifício pelo pecado, para a verdadeira expiação que seria feita de uma vez por todas por Cristo na cruz. Nele temos
um sacrifício que muito transcende o sacrifício de animais, pois incluiu
o próprio Filho de Deus. Na cruz Ele foi o verdadeiro cordeiro pascal.
Ele entrou no santuário celeste, na presença do Pai em virtude do Seu
sangue, tendo obtido para nós uma eterna redenção. Cristo, uma vez, levou os pecados do homem, na cruz. Ele não os leva mais. “Levando Ele
mesmo em Seu corpo os nossos pecados sobre o madeiro” (I Pe 2:24).
O caráter final da obra redentora de Cristo não deixa espaço para
dúvidas ou argumentos. Seu sacrifício é a solução para a questão do
pecado. Ele não é uma de muitas soluções, Ele é a única solução. Ele
não é um aspecto da verdade, nem um ramo das religiões do mundo. Ele
é a Verdade. Sua obra sacrificial é uma verdade totalmente abrangente, inclusiva e incomparável: “E em nenhum outro há salvação, porque
também debaixo do céu nenhum outro nome há, dado entre os homens, pelo qual devamos ser salvos” (At 4:12). O caráter final da obra
redentora de Cristo para a redenção do homem é a grande verdade
central das Escrituras. Todas as outras verdades são influenciadas por
este tema. A alma pecadora pode ser redimida unicamente através da
obra que Cristo realizou sobre a cruz. A cruz estava sempre diante dEle,
por isso lemos em Hebreus 10:5: “Entrando no mundo diz: Sacrifício
e oferta não quiseste, mas corpo Me preparaste”. A cruz era a Sua hora
designada. Em diversas ocasiões anteriores ao jardim, os homens procuraram matá-lO, mas não puderam, porque “ainda não era chegada a
Sua hora” ( Jo 7:30). Mas quando a Sua hora designada chegou, nada
A compaixão do Seu sacerdócio 141
podia impedir a imolação do sacrifício. A base da obra de Cristo como
Sacerdote é o Seu sangue derramado. O Novo Testamento sempre retrata o sangue de Cristo como tendo qualidades redentoras positivas.
Enquanto o sangue de homens e de animais é corruptível, o sangue de
Cristo, de modo algum, se corrompe. Ele é absolutamente fundamental
na obra de salvação.
Por exemplo, ele purifica: “E o sangue de Jesus Cristo, Seu Filho,
nos purifica de todo o pecado” (I Jo 1:7). Ele justifica: “Sendo justificados gratuitamente pela sua graça, pela redenção que há em Cristo Jesus”
(Rm 3:24)1. Ele reconcilia: “Havendo por Ele feito a paz pelo sangue
da sua cruz, por meio dEle reconciliasse consigo mesmo todas as coisas”
(Cl 1:20). Ele redime: “Em quem temos a redenção pelo Seu sangue,
a remissão das ofensas” (Ef 1:7). Ele Santifica: “Jesus, para santificar
o povo pelo Seu próprio sangue, padeceu fora da porta” (Hb 13:12).
Assim entendemos que o sangue de Cristo é a moeda corrente do Céu.
O pecador não pode apelar para qualquer outra coisa, pois não há nada
mais disponível. O homem pode apelar a Deus somente pelos méritos
do sangue de Cristo e Seu sacrifício perfeito. O cristão nada tem em si
mesmo para oferecer.
Mas sangue mais rico fluiu
De veias mais nobres,
Para purificar a alma da culpa
E limpar as mais rubras manchas.2
(Horatius Bonar)
O alcance do serviço
A função primária de um sumo sacerdote é mediar entre o homem
e Deus. A necessidade desta obra surgiu por causa da separação resultante do pecado. A tentação de Satanás no Jardim do Éden resultou na
desobediência e na queda do homem. Na pessoa do Seu Filho Deus
estendeu a Sua mão e procurou restaurar o homem a Si. Esta reconciliação somente pode ser realizada através da obra reconciliatória de
Cristo, que fez a paz pelo sangue da Sua cruz: “E que, havendo por Ele
feito a paz pelo sangue da Sua cruz, por meio dEle reconciliasse consigo
1
2
Veja também Rm 5:9 (N. do E.).
But richer blood has flowed/From nobler veins,/To purge the soul from guilt/and cleanse
the reddest stains.
142
A glória do Filho
mesmo todas as coisas, tanto as que estão na terra, como as que estão
nos céus” (Cl 1:20). A graça reconciliadora de Deus é operada somente
através de Cristo. Como vimos, a obra sacrificial de Cristo é completa e
forma a base da Sua contínua obra sacerdotal.
Qual é o alcance do presente serviço sumo sacerdotal de nosso Senhor Jesus Cristo? Visto que Ele é um Sacerdote para sempre, é importante entender a obra sacerdotal que Ele continua a realizar. Não
pode ser sacrifício, pois esta obra foi completada de uma vez por todas.
Entretanto, o efeito daquela obra é contínuo; Cristo entrou no Seu ministério Sumo Sacerdotal no poder da Sua obra sacrificial, e em relação
ao cristão, a aplicação da obra redentora é realizada no serviço contínuo
de Cristo no Céu. Cristo não sacrifica mais, mas intercede: “Portanto,
pode também salvar perfeitamente os que por Ele se chegam a Deus,
vivendo sempre para interceder por eles” (Hb 7:25). O sentido literal da
palavra interceder é “passar entre”. Indica a mediação entre dois grupos,
tendo em vista reconciliar divergências. No Novo Testamento a palavra
significa toda forma de ação em nome de outros, mas enfatiza a súplica
pelo favor de Deus para com o homem. Em João 17:9-20 temos uma
visão desta obra, quando o Senhor Jesus orou antes de entrar no jardim:
“Eu rogo por eles; não rogo pelo mundo, mas por aqueles que Me deste,
porque são Teus. E todas as Minhas coisas são Tuas, e as Tuas coisas são
Minhas; e nisso Sou glorificado. E Eu já não estou mais no mundo, mas
eles estão no mundo, e Eu vou para Ti. Pai santo guarda em Teu nome
aqueles que Me deste, para que sejam um, assim como nós. Estando
Eu com eles no mundo, guardava-os em Teu nome. Tenho guardado
aqueles que Tu Me deste, e nenhum deles se perdeu, senão o filho da
perdição, para que a Escritura se cumprisse. Mas agora vou para Ti, e
digo isto no mundo, para que tenham a Minha alegria completa em si
mesmos. Dei-lhes a Tua palavra, e o mundo os odiou, porque não são
do mundo, assim como Eu não sou do mundo. Não peço que os tires
do mundo, mas que os livres do mal. Não são do mundo, como Eu do
mundo não sou. Santifica-os na Tua verdade; a Tua Palavra é a verdade.
Assim como Tu Me enviaste ao mundo, também Eu os enviei ao mundo. E por eles Me santifico a Mim mesmo, para que também eles sejam
santificados na verdade. E não rogo somente por estes, mas também
por aqueles que pela sua palavra hão de crer em Mim”. Estas palavras
mostram algo do coração de Cristo em favor dos Seus, e são um lindo
exemplo da Sua obra intercessora.
A compaixão do Seu sacerdócio 143
Vemos também o trabalho intercessor de Cristo enquanto Ele estava na Terra. No cenáculo, em relação a Simão: “Mas Eu roguei por ti”
(Lc 22:32). Este exemplo na experiência de Pedro mostra Sua atuação
em nosso favor em relação a Satanás. Se Satanás tivesse livre curso,
ele destruiria e arruinaria completamente o filho de Deus na Terra. Se
dependesse da nossa força, logo cairíamos. Mas Ele sabe, Seus olhos
observam o inimigo assim como velam sobre nós. Ainda é assim conosco, Ele intercede por nós mesmo antes que o maligno possa se aproximar, e assim podemos sair vitoriosos do conflito. Seu pedido para que
o Consolador fosse enviado (“E Eu rogarei ao Pai, e Ele vos dará outro
Consolador”, Jo 14: 16), demonstra o Seu interesse na nossa proteção
espiritual.
Duas outras passagens em Hebreus revelam alguns dos benditos
detalhes sobre a presente obra sacerdotal do Senhor Jesus em nosso
favor. “Por isso convinha que em tudo fosse semelhante aos irmãos, para
ser misericordioso e fiel Sumo Sacerdote naquilo que é de Deus, para
expiar os pecados do povo. Porque naquilo que Ele mesmo, sendo tentado, padeceu, pode socorrer aos que são [‘estão sendo’, JND] tentados”
(Hb 2:17-18). “Visto que temos um grande Sumo Sacerdote, Jesus, Filho de Deus, que penetrou nos céus, retenhamos firmemente a nossa
confissão. Porque não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; porém um que, como nós, em tudo foi
tentado, mas sem pecado. Cheguemos, pois, com confiança ao trono da
graça, para que possamos alcançar misericórdia e achar graça, a fim de
sermos ajudados em tempo oportuno” (Hb 4:14-16). A primeira passagem nos fala da propiciação que Ele fez pelos pecados do Seu povo.
Ele sofreu, sendo tentado, e esta é a base do Seu serviço de intercessão.
A passagem do cap. 4 nos diz como Ele foi equipado, enquanto esteve
na Terra, para este grande ofício. Enquanto esteve aqui, Ele foi tentado
em todos os pontos, assim como nós somos, mas sem pecado. Ele nunca
poderia ser tentado pelo pecado interior, pois nEle não há pecado. Ele
passou por toda dificuldade possível que um homem poderia enfrentar
na Terra, com exceção do pecado. Agora Ele pode ser o fiel e misericordioso Sumo Sacerdote, e como tal compreender todas as nossas dores
e provações. Ele se compadece conosco nos nossos conflitos e dificuldades. Todavia, Ele não intercede pela carne, nem se compadece com o
pecado. Pela Sua intercessão misericordiosa e ininterrupta no santuário
Ele nos sustenta individualmente na senda da vida. Ele nos dá forças
144
A glória do Filho
para suportar, pois se não fosse pela Sua intercessão, haveríamos de cair
pelo caminho. Com a provação vem a força para suportá-la, porque o
grande Sumo Sacerdote vive e intercede. Ele sabe tudo sobre as nossas
circunstâncias, e na ternura do Seu amor e na força do Seu poder, Ele
nos toma nos Seus braços amorosos sempre que as provações e tribulações nos sobrevêm. Ele é o nosso representante perante Deus, e estamos
eternamente no Seu coração.
Devido ao ministério sumo sacerdotal de Cristo, todo cristão pode
ter plena confiança e certeza ao se aproximar a Deus. Não há nada que
possa impedir o cristão de entrar na presença de Deus. A compreensão
de que Cristo tem se identificado plenamente com as fraquezas da nossa humanidade é um incentivo para virmos a Deus. Como em Hebreus
4:14-16: “Visto que temos um grande Sumo Sacerdote, Jesus, Filho de
Deus, que penetrou nos céus, retenhamos firmemente a nossa confissão.
Porque não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se
das nossas fraquezas; porém um que, como nós, em tudo foi tentado,
mas sem pecado. Cheguemos, pois, com confiança ao trono da graça,
para que possamos alcançar misericórdia e achar graça, a fim de sermos
ajudados em tempo oportuno”. Adicionalmente, a apreciação de que
Cristo abriu para sempre a entrada, pelo sacrifício de Si mesmo, é um
incentivo para virmos a Deus: “Tendo, pois, irmãos, ousadia para entrar
no santuário, pelo sangue de Jesus” (Hb 10:19).
Diante o trono de Deus acima
Eu tenho uma forte, uma perfeita defesa,
Um grande Sumo Sacerdote, cujo nome é Amor,
Que sempre vive e me defende.1
(C. L. Bancroft)
A compaixão do serviço
Assim, vimos que o Senhor Jesus, nosso grande Sumo Sacerdote,
foi selecionado de entre os homens. Ele era o único por meio de quem
a obra de reconciliar o homem com Deus poderia ser realizada. Em
segundo lugar, vimos a Sua obra sacrificial que foi plenamente aceitável a Deus. Terceiro, vemos Seu trabalho como advogado a nosso favor
perante Deus. Não havia outro que pudesse assumir a nossa causa. Por
1 Before the throne of God above/I have a strong, a perfect plea,/A great High Priest,
whose name is Love,/Who ever lives and pleads for me.
A compaixão do Seu sacerdócio 145
natureza somos pecadores perdidos, merecendo unicamente a condenação, não assistência. Mas Ele se dispôs a nos representar diante de
Deus. Quarto, vemos Cristo na Sua obra de compaixão, exercendo um
ministério de comiseração e incentivo. Embora possa não estar evidenciado no Velho Testamento, um sacerdote piedoso iria mostrar compaixão e compreensão para com aqueles que a ele viessem trazendo sacrifícios pelos seus pecados. O Senhor Jesus no presente intercede pelo
Seu povo. Num sentido, Sua obra é completa, mas Ele ainda tem um
ministério sacerdotal contínuo de intercessão. Ele intercede por nós!
Ele está à destra de Deus a nosso favor. “Portanto, pode também salvar
perfeitamente os que por Ele se chegam a Deus, vivendo sempre para
interceder por eles” (Hb 7:25).
Também, temos um sacerdote que Se compadece conosco nas nossas provações. Quando tentamos compartilhar os sentimentos de outros
que estejam sofrendo, somos limitados, porque talvez não temos provado aquela provação específica pela qual eles estão passando. Entretanto,
o Senhor Jesus entende cada provação pela qual o Seu povo passa, e
pode condoer-se conosco: “Porque não temos um sumo sacerdote que
não possa compadecer-se das nossas fraquezas; porém um que, como
nós em tudo foi tentado, mas sem pecado” (Hb 4:15). O escritor aos
Hebreus usa um duplo negativo para enfatizar a verdade positiva da
declaração feita neste versículo. Nós temos, sim, um Sumo Sacerdote
que conhece, sim, os sentimentos do Seu povo e é tocado por eles. Ele
compreende a nossa situação porque esteve aqui, foi testado e provado
como nós somos, a não ser pelo pecado. Ao lermos os relatos da Sua
vida aqui na Terra nos Evangelhos, vemo-lo à sós, cansado da jornada,
com fome e com sede. Ele foi odiado, rejeitado, zombado, caluniado e
desprezado por muitos. Ele conheceu a pobreza, provou a dor e chorou
junto a uma sepultura. Oh! Quão capacitado Ele é para ter compaixão
de nós quando passamos pelas provações da vida. Aqui na Terra Ele
conheceu toda dificuldade possível, com exceção do pecado. Ele conhece todos os nossos conflitos e problemas aqui no mundo. Pela Sua
intercessão misericordiosa e ininterrupta no santuário, Ele nos preserva,
individualmente, no caminho da vida. Se não fosse por aquela intercessão, cairíamos pelo caminho. O povo de Deus, muitas vezes, teme
as tribulações, dificuldades, perdas e desgraças que possam vir. E não
raramente aquilo que tememos acontece, mas com a tribulação, com a
perda, vem a força para suportar tudo. Isto é porque o Grande Sumo
146
A glória do Filho
Sacerdote vive e intercede. Ele conhece tudo e em todos os momentos
e circunstâncias, Ele é o nosso representante diante de Deus. Ele sabe
que somos como os discípulos: pobres, fracos, pecadores e ignorantes, e
nos trata como os tratou. Ele os amava, velava sobre eles com paciência
incansável; orava por eles para que a sua fé não desfalecesse e compreendia as fraquezas da sua carne. Como nosso Sumo Sacerdote, Ele é cheio
de terna compaixão. Ele tem uma compreensão perfeita, tendo provado
as variadas emoções e sentimentos que nós temos. Ele sabe o que é para
uma alma estar entristecida e sobrecarregada. Portanto, podemos vir a
Ele esperando plena, terna e profunda compaixão. Podemos ser fortalecidos e confortados, sarados e restaurados. Ele receberá o crente pobre,
ferido e banhado em lágrimas, enxugará as suas lágrimas e dirá a nós
como disse a Paulo: “A Minha graça te basta” (II Co 12:9). Ele conhece,
e de fato permite, nossos tempos de necessidade, para que possamos
clamar e receber misericórdia e achar graça para sermos ajudados (Hb
4:16). Ele enviará socorro oportuno antes de sucumbirmos às enfermidades e tentações que vêm sobre nós. O trono de Graça está acessível
e Ele é quem não permitirá que sejamos tentados acima do que podemos suportar. Ele enviará o livramento da provação no momento certo,
quando o propósito da provação tiver sido cumprido, tudo por causa da
Sua obra de compaixão como Grande Sumo Sacerdote.
Ele é nosso Grande Sumo Sacerdote, continuamente perante o
Pai. Todo o socorro que necessitamos está disponível, o trono de Deus
está acessível. Que possamos ir a Ele com ousadia. É interessante que
esta exortação é dada depois que o escritor nos fala do ministério sumo
sacerdotal de Cristo. O fato que Ele intercede por nós nunca deveria
fazer-nos negligenciar a oração. O fato bendito do interesse amoroso do
Senhor por nós e por nossas vidas neste presente século mau, cercados
de perigos e toda sorte de males, será um grande incentivo a nós na nossa vida de oração. Suas orações deveriam nos motivar a orar. Podemos
ir ao Pai e contar-Lhe tudo que nos perturba. Ele Se interessa por nós e
conhece os sentimentos dos nossos corações; portanto podemos ir a Ele
em oração. Ele Se deleita em nos ouvir; Seu ouvido está sempre aberto.
Se ficarmos cansados e afadigados na obra do Senhor, podemos contar
isto a Ele. Se nos sentimos solitários e incompreendidos, ou se os dardos
inflamados do inimigo são lançados contra nós, podemos nos recorrer
à Sua presença em oração. Que maravilhoso Grande Sumo Sacerdote
nós temos. Em que ministério Ele está engajado por nós! Ele morreu
A compaixão do Seu sacerdócio 147
por nós, oferecendo o Seu sangue a Deus para expiar os nossos pecados,
e agora, tendo nos trazido à fé, Ele exerce um ministério contínuo a
nosso favor.
Há uma linda figura deste ministério sumo sacerdotal de Cristo nas
vestes do sumo sacerdote do Velho Testamento. Nos seus ombros havia
duas pedras de ônix, e em cada uma delas estavam gravados os nomes
de seis das tribos. Ele os levava nos seus ombros, que é o lugar de força,
até a presença do Senhor (Êx 28:9-12). Também fazia parte do seu
traje oficial, um peitoral com doze pedras preciosas. Cada uma destas
tinha gravado nela o nome de uma tribo, e eram carregadas pelo sacerdote sobre o seu peito, próximo ao centro das suas afeições, quando ele
comparecia perante o Senhor (Êx 28:15-29). Que figura maravilhosa
das atividades do nosso Grande Sumo Sacerdote. Ele carrega os nossos
fardos e nos leva junto ao Seu coração. O fato destes nomes serem gravados é precioso; se estivessem somente escritos poderiam ser apagados.
Mas estavam gravados, e nunca poderiam ser apagados. Quão bendita é
a verdade da nossa segurança.
No Seu coração nossos nomes estão gravados,
Nos Seus ombros somos carregados.1
(R. C. Chapman)
O desafio do Seu sacerdócio
Quando o escritor aos Hebreus termina o seu argumento quanto
à superioridade de Cristo, ele apresenta sua exortação final do livro. A
seção a partir de 10:19 desafia o leitor quanto à sua responsabilidade
ao Cristo que é superior. Há um Homem na glória; o cristão tem um
Grande Sumo Sacerdote na presença de Deus. Com isso em mente,
podemos assim exercer ousadia (confiança) ao entrarmos no santuário.
O cristão tem liberdade para entrar no santuário, que é a presença de
Deus, onde Cristo está assentado à destra do Pai. Esse acesso tornou-se
possível “pelo sangue de Jesus” (Hb 10:19), e somos instados a fazer uso
dele. O dom é grande demais, e o preço pago alto demais, para deixarmos de aproveitar e entrar. Muitas vezes falhamos ao não aproveitarmos
dos privilégios que temos em Cristo. Há o perigo de negligenciarmos
os benefícios da morte de Cristo e vivermos no nível da cristandade
1
“On His heart our names are graven,/ On His shoulders we are borne.”
148
A glória do Filho
cultural. Um caminho vivo foi aberto, que é novo no sentido que acesso
a Deus como este nunca foi conhecido antes da entronização de Cristo
à destra de Deus. O acesso está disponível, o Sumo Sacerdote está a
postos (10:21), e isto traz as seguintes responsabilidades.
Cheguemo-nos (10:22)
Somos convidados a usar o caminho de acesso que Cristo tornou
disponível. Aqueles que se chegam são descritos como tendo um “coração sincero, em plena certeza de fé, tendo os corações purificados de
uma consciência má, e lavados os corpos com água pura” (Hb 10:22,
VB). Aqueles que foram purificados interiormente e que demonstram
esta purificação externamente foram capacitados a se chegar.
Retenhamos (10:23)
Chegar a Deus possibilita ao cristão apegar-se ou reter. O incentivo
é para que retenhamos a confissão da nossa esperança. Nossa vida e
proceder, como cristãos, são destacados. Sabemos que temos entrada ao
Santo dos Santos, mas esta exortação irá afetar o nosso andar no mundo. De fato, já que Cristo ressuscitou dentre os mortos, podemos reter
a nossa esperança sem vacilar, e a razão pela qual podemos fazer isso é
que aquele que prometeu é fiel.
Consideremo-nos uns aos outros (10:24,25)
Consideração mútua leva a benefício mútuo. Esta consideração é
para encorajar uns aos outros, para que as melhores qualidades sejam
evidenciadas. O resultado benéfico desta exortação é que o cristão ficará
feliz em estar presente onde e quando os outros cristãos se reúnem, e
esta comunhão não será abandonada. Este incentivo mútuo não pode
acontecer se os cristãos negligenciam as reuniões. Incentivo requer um
contato pessoal; temos que estar presentes para encorajar. O perigo na
igreja primitiva era que alguns estavam deixando o ajuntamento dos
santos para retornar à sinagoga judaica. A igreja sabe, desde o princípio,
que estar juntos é uma parte vital da sua habilidade de funcionar, e ao
nos aproximarmos do final da era da Igreja, tanto mais importante se
torna estarmos juntos, encorajando uns aos outros.
O fato de termos um Grande Sumo Sacerdote não é uma verdade
apenas para o Lugar Santíssimo; somos responsáveis por controlar nos-
A compaixão do Seu sacerdócio 149
sas vidas à luz deste grande fato.
Ofereçamos sempre … a Deus sacrifício de louvor (Hb 13:15)
“Portanto, ofereçamos sempre por Ele a Deus sacrifício de louvor,
isto é, o fruto dos lábios que confessam o Seu nome”. O Senhor Jesus na
qualidade de nosso Grande Sumo Sacerdote apresenta a Deus nossos
sacrifícios espirituais. Apresentamos a Deus, através do Senhor Jesus
Cristo, nossa adoração, nossos louvores e nossas orações. Elas são um
tanto incompletas e imperfeitas, mas ao serem apresentadas a Deus por
Ele, elas são aceitáveis a Deus, e por esta razão são um prazer para Ele.
Portanto, não sejamos mesquinhos com nossas ofertas.
Conclusão
“Visto que temos um grande sumo sacerdote, Jesus, Filho de Deus,
que penetrou nos céus” (Hb 4:14). Realmente não sabemos plenamente
quanto devemos à bendita e preciosa obra presente do nosso Senhor na
glória. Que revelação bendita será quando conheceremos como somos
conhecidos, quando contemplaremos as nossas vidas passadas e perceberemos o que a intercessão do Senhor Jesus Cristo realizou por nós e
por todos os santos de Deus.
Cap. 10 — A realidade da Sua vinda
por Brian Currie, Irlanda do Norte
Um leitor casual da Bíblia chegaria à conclusão que ela menciona
três vindas do Senhor Jesus. Duas são ensinados no Velho Testamento e
todas as três são ensinadas no Novo. O Velho Testamento ensina sobre
a Sua vinda em humildade e Sua vinda em glória, e o Novo ensina
essas duas, mas também revela a terceira, que não é ensinada no Velho,
e que é a Sua vinda secreta. Uma destas vindas já aconteceu, Sua vinda
em humildade, enquanto que as outras estão ainda no futuro. Ao lermos um pouco mais atentamente, notaremos que enquanto percebemos
duas vindas futuras, estritamente falando, trata-se somente de uma em
duas fases distintas. Consideremos então estas vindas.
Sua vinda em humildade
Logo no princípio, em Gênesis 3, quando o pecado entrou no mundo, Deus disse à serpente: “E porei inimizade entre ti e a mulher, e entre
a tua semente e a sua Semente; esta te ferirá a cabeça, e tu Lhe ferirás o
calcanhar” (Gn 3:15). Aqui temos a primeira, embora velada, referência
à encarnação do Senhor Jesus, e ao fato que naquela encarnação nenhum homem estaria envolvido. Isto levanta um problema insuperável,
até que a resposta é dada em Isaías 7:14: “Eis que a virgem conceberá, e
dará à luz um filho, e chamará o Seu nome Emanuel”. O lugar é afirmado com clareza em Miquéias 5:2: “E tu, Belém Efrata, posto que pequena entre os milhares de Judá, de ti Me sairá O que governará em Israel,
cujas saídas são desde os tempos antigos, desde os dias da eternidade”.
Depois de se passarem séculos, essas profecias foram cumpridas.
Muitas Escrituras poderiam ser citadas para provar isso, mas as seguintes serão suficientes: “E, respondendo o anjo, disse-lhe: Descerá sobre ti
o Espírito Santo, e a virtude do Altíssimo te cobrirá com a Sua sombra;
por isso também o Santo que de ti há de nascer, será chamado Filho de
Deus” (Lc 1:35). “Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu
o Seu Filho Unigênito, para que todo aquele que nEle crê não pereça,
mas tenha a vida eterna” ( Jo 3:16). “Mas, vindo a plenitude dos tempos,
Deus enviou Seu Filho, nascido de mulher, nascido sob a lei” (Gl 4:4).
“Nisto se manifestou o amor de Deus para conosco; que Deus enviou
Seu Filho Unigênito ao mundo, para que por Ele vivamos. Nisto está
o amor, não em que nós tenhamos amado a Deus, mas em que Ele nos
A realidade da Sua vinda 151
amou a nós, e enviou Seu Filho para propiciação pelos nossos pecados.
E vimos, e testificamos que o Pai enviou Seu Filho para Salvador do
mundo” (I Jo 4:9-10, 14).
A humildade da Sua vinda é enfatizada em Filipenses 2:6-8, onde
lemos acerca do Senhor Jesus: “Que, sendo em forma de Deus, não teve
por usurpação ser igual a Deus, mas esvaziou-Se a Si mesmo, tomando
a forma de servo, fazendo-Se semelhante aos homens; e achado na forma de homem, humilhou-Se a Si mesmo, sendo obediente até a morte,
e morte de cruz”.
Sua vinda em glória
Há muitas Escrituras do Velho Testamento que claramente indicam que Cristo virá novamente em glória e estabelecerá o Seu reino
na Terra: “Porque um Menino nos nasceu, um Filho Se nos deu, e o
principado está sobre os Seus ombros, e se chamará o Seu nome: Maravilhoso Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz.
Do aumento deste principado e da paz não haverá fim, sobre o trono de
Davi e no Seu reino, para o firmar e o fortificar com juízo e com justiça,
desde agora e para sempre; o zelo do Senhor dos Exércitos fará isto” (Is
9:6-7). “Eu estava olhando nas minhas visões de noite, e eis que vinha
nas nuvens do céu um como o Filho do homem; e dirigiu-Se ao Ancião
de dias, e O fizeram chegar até Ele. E foi-Lhe dado o domínio, e a
honra, e o reino, para que todos os povos, nações e línguas O servissem;
o Seu domínio é um domínio eterno, que não passará, e o Seu reino tal,
que não será destruído” (Dn 7:13-14). “Falarão da glória do Teu reino,
e relatarão o Teu poder, para fazer saber aos filhos dos homens as Tuas
proezas e a glória da magnificência do Teu reino. O Teu reino é um
reino eterno; o Teu domínio dura em todas as gerações” (Sl 145:11-13).
Estas profecias precisam ser cumpridas, como afirmado em I Coríntios 15:25 (VB): “Porque é necessário que reine até que ponha todos os seus inimigos debaixo dos Seus pés”. Elas se cumprirão quando
Ele vier em glória, e este é o ensino do Novo Testamento. Há uma
abundância de exemplos: “Então aparecerá no céu o sinal do Filho do
homem; e todas as tribos da terra se lamentarão, e verão o Filho do
homem, vindo sobre as nuvens do céu, com poder e grande glória” (Mt
24:30). “… quando Se manifestar o Senhor Jesus desde o céu com os
anjos do Seu poder, como labareda de fogo, tomando vingança dos que
152
A glória do Filho
não conhecem a Deus e dos que não obedecem ao Evangelho de nosso
Senhor Jesus Cristo; os quais, por castigo, padecerão eterna perdição,
ante a face do Senhor e a glória do Seu poder, quando vier para ser
glorificado nos Seus santos, e para Se fazer admirável naquele dia, em
todos os que crêem” (II Ts 1:7-10).
Para maiores detalhes sobre esta fase da Sua vinda o leitor deve ler
os caps. 11 e 12 deste livro.
Sua vinda secreta
Há muitas referências a isto no Novo Testamento, e nenhuma no
Velho. Esta etapa da Sua vinda é exclusiva ao Novo Testamento, e é a
esperança iminente de todos os salvos desta dispensação.
As pessoas envolvidas
Esta vinda secreta do Senhor Jesus, comumente chamada de Arrebatamento, tem sido a esperança de todo cristão neste “dia da salvação”,
que é o período desde Pentecostes, em Atos 2, até ao momento da Sua
vinda para a Igreja. Alguns têm sugerido que ela inclui somente parte da Igreja, isto é, o elemento espiritual, e que todos os outros serão
deixados para trás. Eles dão a isto o nome de “teoria do arrebatamento
parcial”. Temos que nos certificar se ela tem ou não base bíblica.
Primeiro, considerando a questão do ponto de vista lógico, é uma
tolice, já que a Igreja é uma entidade coesa, seja ela considerada como
um edifício, um corpo ou uma noiva, e parte do edifício, do corpo ou da
noiva não pode ser arrebatado sem demolir o edifício, mutilar o corpo
ou dissecar a noiva.
Segundo, se somente os espirituais serão arrebatados, como poderia
o apóstolo Paulo, sob inspiração, escrever aos Coríntios: “Eis aqui vos
digo um mistério: na verdade, nem todos dormiremos, mas todos seremos transformados” (I Co 15:51). Isto não foi escrito aos espirituais, ele
incluiu todos. Quem eram os “todos”? Ele se refere, inequivocamente,
a alguns dentre eles que eram “carnais” e “meninos em Cristo”. “E eu,
irmãos não vos pude falar como a espirituais, mas como a carnais, como
meninos em Cristo … Porque ainda sois carnais; pois, havendo entre
vós inveja, contendas e dissensões, não sois porventura carnais, e não
andais segundo do homens? Porque dizendo um: Eu sou de Paulo; e
A realidade da Sua vinda 153
outro: Eu de Apolo; porventura não sois carnais?” (I Co 3:1, 3-4). Até
estes estavam incluídos nos “todos” que serão transformados quando
Ele vier. O apóstolo ensinou a mesma verdade em I Tessalonicenses
5:9-10: “Porque Deus não nos destinou para a ira, mas para a aquisição
da salvação, por nosso Senhor Jesus Cristo, que morreu por nós, para
que, quer vigiemos, quer durmamos, vivamos juntamente com Ele”. Os
que vigiam e os que dormem, nestes versículos, não se refere aos que
vivem e aos que já morreram, mas àqueles que estão espiritualmente
atentos e àqueles que se encontram num estado de letargia espiritual.
Estes cristãos, em ambos os estados espirituais, obterão a salvação da
ira, ou seja, da ira da tribulação na Terra.
O período envolvido
Quando acontecerá este Arrebatamento? A vinda do Senhor Jesus em glória é profetizada como sendo acompanhada de sinais. Assim Mateus 24:29-30: “E, logo depois da aflição daqueles dias, o sol
se escurecerá, e a lua não dará a sua luz, e as estrelas cairão dos céus, e
as potências que estão nos céus serão abaladas. Então aparecerá no céu
o sinal do Filho do homem; e todas as tribos da terra se lamentarão, e
verão o Filho do homem, vindo sobre as nuvens do céu, com poder e
grande glória”. “Ora, naqueles dias, depois daquela aflição, o sol se escurecerá, e a lua não dará a sua luz. E as estrelas cairão do céu, e as forças
que estão nos céus serão abaladas. E então verão vir o Filho do homem
nas nuvens, com grande poder e glória” (Mc 13:24-26). “Mostrarei prodígios no céu, e na terra, sangue e fogo, e colunas de fumaça. O sol se
converterá em trevas, e a lua em sangue, antes que venha o grande e
terrível dia do Senhor” ( Jl 2:30,31). “E haverá sinais no sol, na lua e nas
estrelas; e na terra angústia das nações, em perplexidade pelo bramido
do mar e das ondas. Homens desmaiando de terror, na expectação das
coisas que sobrevirão ao mundo; porquanto as virtudes do céu serão
abaladas. E então verão vir o Filho do homem numa nuvem, com poder
e grande glória. Ora, quando estas coisas começarem a acontecer, olhai
para cima e levantai as vossas cabeças, porque a vossa redenção está
próxima” (Lc 21:25-28).
Esta ênfase em sinais está totalmente ausente quando pensamos no
Arrebatamento. Comumente se diz em relação ao Arrebatamento, que
podemos observar sinais mas não procurar por eles. Assim a vinda do
Senhor Jesus aos ares tem sido a esperança de todos os salvos através
154
A glória do Filho
dos séculos desde o dia de Pentecostes. Nunca poderiam ter dito que o
Senhor não poderia vir porque certo acontecimento específico tinha que
se realizar. Podemos, e devemos, esperar por Ele a qualquer momento.
A pergunta: “A Igreja passará pela Tribulação?” é vasta demais para
ser respondida nestas poucas páginas. Entretanto, quando compreendemos que “ira”, na Bíblia, tem a ver com homens vivos sobre a Terra
que provam o desprazer pessoal de Deus, e isto frequentemente inclui o
período da Tribulação, então há vários textos que claramente mostram
que a Igreja não passará por esta Tribulação, e pode ser arrebatada a
qualquer momento. Paulo escreveu aos cristãos tessalonicenses: “… e
esperar dos céus a Seu Filho, a quem ressuscitou dentre os mortos, a
saber, Jesus, que nos livra da ira futura” (I Ts 1:10). JND traduz: “… e
aguardar Seu Filho dos céus, a quem ressuscitou de entre os mortos,
Jesus, nosso libertador da ira futura”. I Tessalonicenses 5:9 já foi citado
acima: “Porque Deus não nos destinou para a ira, mas para a aquisição
da salvação, por nosso Senhor Jesus Cristo”. Nenhuma destas referências diz respeito à salvação do castigo dos pecados, já que isso foi eternamente resolvido no momento em que os tessalonicenses dos ídolos
se converteram a Deus para servir o Deus vivo e verdadeiro (I Ts 1:9).
Trata-se, portanto, da ira da Tribulação que virá sobre a Terra e seus
habitantes, depois da Igreja ter sido arrebatada. Também podemos ler
em Apocalipse 3:10: “Como guardaste a palavra da Minha paciência,
também Eu te guardarei na hora da tentação que há de vir sobre todo
o mundo, para tentar os que habitam na terra”. De que mais pode isto
estar falando senão da Tribulação?
Em figura, o arrebatamento se dá no início de Apocalipse 4, quando João é chamado e trasladado ao Céu. O período da Tribulação não
começa até o primeiro selo ser aberto no início do cap. 6. É óbvio que
a Igreja não poderá estar no Céu e na Terra ao mesmo tempo. Graças
a Deus, todos os que são genuinamente salvos aguardam a vinda do
próprio Senhor aos ares para chamá-los e levá-los à glória.
Uma variedade de Escrituras trata deste grande acontecimento, que
será o próximo acontecimento no calendário do Céu.
• A promessa da Sua vinda — “virei outra vez” ( Jo 14:3);
• A perspectiva da Sua vinda —
­ “esperamos o Salvador” (Fl 3:2021);
A realidade da Sua vinda 155
• O poder da Sua vinda — “seremos transformados” (I Co 15:5158);
• A purificação da Sua vinda — “qualquer que nele tem esta esperança, purifica-se a si mesmo” (I Jo 3:3);
• Os pormenores da Sua vinda — (I Ts 4:13-15).
Os pormenores da Sua vinda
Para economizar espaço, este capítulo se concentrará nesta última
referência (I Ts 4). Ambas as cartas aos Tessalonicenses tem como assunto principal a Vinda do Senhor, mas com as diferenças acima mencionadas, realçadas e salientadas. Os seguintes contrastes são geralmente, mas não exclusivamente, verdadeiros:
• I Tessalonicenses trata da Vinda do Senhor em relação aos santos,
enquanto II Tessalonicenses trata da Vinda do Senhor em relação
à Terra.
• I Tessalonicenses tem em vista a Vinda do Senhor para Seus santos,
enquanto II Tessalonicenses tem em vista a Vinda do Senhor com
os Seus santos.
• I Tessalonicenses trata da Vinda do Senhor para glória e bênção,
mas II Tessalonicenses trata da Vinda do Senhor para condenação
e juízo.
• Em I Tessalonicenses o problema tinha a ver com os mortos: “Não
quero, porém, irmãos, que sejais ignorantes acerca dos que já dormem” (4:13), mas em II Tessalonicenses o problema era com os vivos: “Que não vos movais facilmente do vosso entendimento, nem
vos perturbeis, quer por espírito, quer por palavra, quer por epístola,
como se o dia de Cristo [do Senhor, JND] estivesse já perto” (2:2).
O paralelo com João 14 é inconfundível, e indica claramente que
se referem ao único e mesmo acontecimento (veja tabela na próxima
página).
156
João 14
“Não se turbe o vosso coração”
(v. 1)
“Credes em Deus, crede também
em Mim” (v. 1)
“Se assim não fora, Eu vo-lo
teria dito” (v. 2)
“Virei outra vez” (v. 3)
“Para que onde Eu estiver estejais vós também” (v. 3)
A glória do Filho
I Tessalonicenses 4
“Consolai-vos uns aos outros …”
(v.18)
“Se cremos que Jesus …” (v. 14)
“Dizemo-vos, pois, pela palavra
do Senhor” (v. 15)
“O mesmo Senhor descerá”
(v. 16)
“Estaremos sempre com o Senhor” (v. 17)
A certeza desta emocionante verdade é vista em I Tessalonicenses
4:15-17 pelo emprego de cinco verbos no tempo futuro1.
• Instrução — “Dizemo-vos, pois isto, pela palavra do Senhor: que
nós, os que ficarmos vivos não precederemos os que dormem”.
• Intervenção — “O mesmo Senhor descerá do céu com alarido”
• Ressurreição — “Os que morreram em Cristo ressuscitarão primeiro”
• Translação — “Nós, os que ficarmos vivos, seremos arrebatados”
• Continuação — “Assim estaremos sempre com o Senhor”
A verdade contida em I Tessalonicenses 4:13-18 pode ser estudada
sob os seguinte cabeçalhos:
• Reafirmação — “Não quero, porém, irmãos, que sejais ignorantes
acerca dos que já dormem, para que não vos entristeçais, como os
demais”;
• Razão — “Porque se cremos … assim também”;
• Revelação — “Dizemo-vos, pois, isto, pela Palavra do Senhor”;
1
Na versão AV em inglês, os cinco verbos são precedidos da palavra “shall” (“shall not
prevent”, “shall descend”, “shall rise”, “shall be caught up” e “shall we ever be”), e é esta
repetição que o autor destaca (N. do E.).
A realidade da Sua vinda 157
• Retorno — “Porque o próprio Senhor descerá dos céus”;
• Ressonância — “Com alarido, e com voz de arcanjo, e com a trombeta de Deus”;
• Ressurreição — “Os que morreram em Cristo ressuscitarão primeiro”;
• Retirada — “Depois nós, os que ficarmos vivos, seremos arrebatados”;
• Reunião — “Juntamente com eles nas nuvens”;
• Recepção — “A encontrar o Senhor nos ares”;
• Região — “E assim estaremos sempre com o Senhor”;
• Repouso — “Portanto, consolai-vos uns aos outros com estas palavras.”
Reafirmação
“Não quero, porém, irmãos, que sejais ignorantes acerca dos que já dormem,
para que não vos entristeçais, como os demais, que não têm esperança” (v. 13).
A verdade que Paulo ia transmitir a eles tinha a ver com aqueles que
“dormiam”, e era um assunto que eles ignoravam e que lhes era desconhecido naquele momento.
Ignorância — isso pode ser visto nas outras ocorrências desta palavra:
• Propósito em serviço: “Não quero, porém, irmãos, que ignoreis que
muitas vezes propus ir ter convosco (mas até agora tenho sido impedido)” (Rm 1:13).
• Período de cegueira: “Porque não quero, irmãos, que ignoreis este
segredo (para que não presumais de vós mesmos): que o endurecimento veio em parte sobre Israel, até que a plenitude dos gentios
haja entrado” (Rm 11:25).
• Privilégio dos pais: “Ora, irmãos, não quero que ignoreis que nossos
pais estiveram todos debaixo da nuvem, e todos passaram pelo mar”
(I Co 10:1).
• Prática dos dons: “Acerca dos dons espirituais, não quero, irmãos,
que sejais ignorantes” (I Co 12:1).
158
A glória do Filho
• Perseguição de servos: “Porque não queremos, irmãos, que ignoreis
a tribulação que nos sobreveio na Ásia” (II Co 1:8).
• Pormenores do Arrebatamento: “Não quero, porém, irmãos, que sejais ignorantes” (I Ts 4:13).
Dormem — a frase “os que já dormem” indica aqueles que de tempos em tempos adormecem e continuam adormecidos. É muito importante notar que sono nunca se refere à alma, mas é sempre uma referência ao corpo. Em I Tessalonicenses essa palavra é usada novamente
somente nos vs. 14 e 15, mas não em 5:6, 7, 10, onde uma palavra
diferente é empregada. Por exemplo, a palavra no v. 13 é aquela usada
em Mateus 27:51: “Muitos corpos dos santos que dormiam foram ressuscitados”; João 11:11, “Lázaro, o nosso amigo dorme”; Atos 7:60: “E
tendo dito isto, adormeceu”; I Coríntios 15:6: “mas alguns já dormem”;
15:18: “e também os que dormiram em Cristo estão perdidos”; 15:20,
“foi feito as primícias dos que dormem”; 15:51: “Eis aqui vos digo um
mistério: na verdade, nem todos dormiremos”. Portanto é uma referência clara a santos dormindo na morte
Se a verdade que iria resolver a sua dificuldade era desconhecida a
eles, não poderia ser a ressurreição, pois isto eles já conheciam. “Disse-Lhe Maria: Eu sei que há de ressuscitar na ressurreição do último dia”
( Jo 11:24).
A verdade que ele estava para transmitir tinha por finalidade ajudá-los a superar a sua tristeza. Assim ele escreveu: “para que não vos entristeçais, como os demais, que não têm esperança”. Isto não era para
ensinar-lhes que era errado para um cristão se entristecer, nem é o âmbito da tristeza condenada, mas está dizendo que o caráter da tristeza é
diferente. O Senhor chorou junto ao sepulcro de Lázaro, e Ele também
nunca condenou a tristeza de Jairo ou da viúva de Naim. O descrente
sofre uma tristeza contínua porque eles “não têm esperança”. Esse é o
desespero dos pagãos que não têm esperança após a morte; eles não têm
a perspectiva certa e jubilosa de glória eterna.
Não pode ser que eles não tinham esperança de ressurreição, já que
isto era ensinado no Velho Testamento. Foi ensinado em figura — Isaque: “E disse Abraão aos seus moços: Ficai-vos aqui com o jumento, e
eu e o moço iremos até ali; e havendo adorado, tornaremos a vós” (Gn
22:5). Essa passagem é interpretada em Hebreus 11:18-19: “Conside-
A realidade da Sua vinda 159
rou que Deus era poderoso para até dentre os mortos o ressuscitar; e
daí também em figura ele o recobrou”. Foi ensinado por profecia como
visto em Jó 19:25-26: “Porque eu sei que o meu Redentor vive, e que
por fim se levantará sobre a terra. E depois de consumida a minha pele,
contudo ainda em minha carne verei a Deus”, e em Daniel 12:2: “E
muitos dos que dormem no pó da terra ressuscitarão, uns para a vida
eterna, e outros para vergonha e desprezo eterno”. O próprio Senhor
Jesus o ensinou por preceito em João 5:28-29: “Porque vem a hora
em que todos os que estão nos sepulcros ouvirão a Sua voz. E os que
fizeram o bem sairão para a ressurreição da vida; e os que fizeram o mal
para a ressurreição da condenação”.
Razão
“Porque se cremos que Jesus morreu e ressuscitou, assim também os que em
Jesus dormem, Deus os tornará a trazer com Ele” (v. 14).
Aqui o apóstolo dá a razão pela qual não nos entristecemos como
os demais. É por causa da fé. O argumento aqui é que, visto que cremos
num fato, “assim também” cremos em outro. Nós, em comum com todos
os outros cristãos, “cremos que Jesus morreu e ressuscitou”. Trata-se de
dois acontecimentos completos que não deixam espaço para a ideia de
processo. Chegou um momento quando Ele morreu. Não foi um desmaio, nem um processo prolongado enquanto Sua vida ia se dissipando
até que Ele ficou tão fraco que sucumbiu à morte. Note as palavras de
João 19:28-30: “Depois, sabendo Jesus que todas as coisas estavam terminadas, para que a Escritura se cumprisse, disse: Tenho sede. Estava
pois ali um vaso cheio de vinagre. E encheram de vinagre uma esponja,
e pondo-a num hissope, lha chegaram à boca. E, quando Jesus tomou
o vinagre, disse: Está consumado. E inclinando a cabeça, entregou o
espírito”. Isto está de acordo com o que Ele ensinou em João 10:17-18:
“Por isto o Pai me ama, porque dou a Minha vida para tornar a tomá-la.
Ninguém ma tira de Mim, mas Eu de Mim mesmo a dou; tenho poder
para a dar, e poder para tornar a tomá-la. Este mandamento recebi de
Meu Pai”. Assim também com Sua ressurreição. Não foi a recuperação
lenta de um desmaio, mas um momento exato quando Ele saiu de entre
os mortos.
Agora, Paulo argumenta, já que cremos no fato da Sua morte e
ressurreição, cremos também no fato que eles serão trazidos com Ele.
Logo, a locução adverbial “assim também” governa a nossa convicção.
160
A glória do Filho
O problema tinha relação com aqueles que haviam morrido, descritos como “os que em Jesus dormem”. Literalmente, isso poderia ser
traduzido: “aqueles que foram postos para dormir através de Jesus”. Será
que o versículo significa: “dormem em (através de) Jesus” ou “em (através de) Jesus, Deus tornará a trazer”? JND diz: “assim Deus também
trará com Ele aqueles que adormeceram através de Jesus”. Isto significa
que o “instrumento” que Deus usa para pôr um cristão para dormir é
Jesus. Hebreus 2:14 nos ensina que uma das razões por que Jesus, o
homem Compassivo, passou pela morte foi para que “aniquilasse o que
tinha (‘tem’, JND) o império da morte, isto é, o diabo”. O diabo não tem
poder para tocar o cristão em relação a morte, antes o cristão é posto
para dormir por Jesus. É como se estivéssemos ouvindo dizer que quando o cristão chega ao fim da vida Jesus põe sobre ele a Sua mão e lhe dá
descanso no sono. Que maravilhoso!
A próxima frase: “Deus os tornará a trazer com Ele”, e em especial
a expressão “com Ele”, é a chave para compreendermos o ensino da
passagem. Várias interpretações já foram sugeridas, muitas das quais
são muito improváveis. Aquelas que alcançaram certa popularidade são
as seguintes:
i) Os espíritos dos crentes mortos são trazidos, no Arrebatamento,
para serem reunidos com seus corpos.
ii) Os corpos dos santos são ressuscitados.
iii) Os santos (corpo, alma e espírito) são todos trazidos quando Ele
aparece na Sua gloriosa manifestação para estabelecer o Seu reino.
Qual destas é a verdade?
i) Este não pode ser o ensino da passagem, já que o problema em
Tessalônica não tinha nada a ver com espíritos, e sim com corpos.
ii) O problema em Tessalônica era ressurreição? A resposta é um retumbante não. Já notamos acima que todos, inclusive os santos do
Velho Testamento, tinham conhecimento da ressurreição. Paulo
precisava de algum ensino novo para superar este problema; ele
precisava de uma palavra do Senhor.
iii) A verdade do Arrebatamento era conhecida através do ensino do
próprio Senhor, como já indicado. Entretanto, os pormenores do
Arrebatamento eram desconhecidos até que este capítulo foi escri-
A realidade da Sua vinda 161
to, e estes detalhes, anteriormente ignorados, são agora revelados
para desfazer os temores que os Tessalonicenses tinham em relação
aos seus entes queridos. Eles seriam levados ao Céu, para que quando o Senhor Jesus vier para estabelecer o Seu Reino eles venham
com Ele. Os detalhes sobre isto são explicados nos parágrafos seguintes.
Em Atos 17:7 a acusação feita contra os pregadores era: “todos estes
procedem contra os decretos de César, dizendo que há outro rei, Jesus”.
Tudo que eles sabiam era sobre um Rei vindouro, o que obviamente
significava glória; assim I Tessalonicenses 2:12 diz: “para que vos conduzísseis dignamente para com Deus, que vos chama para o Seu reino e
glória”. Alguns dizem que os tessalonicenses tinham um conhecimento
do Arrebatamento, baseados nas palavras de 1:10: “E esperar do céus a
Seu Filho, a quem ressuscitou dos mortos, a saber, Jesus, que nos livra
da ira futura”. Mas, isso é simplesmente uma declaração daquilo que o
apóstolo iria expor plenamente nestes versículos do cap. 4. Devemos
notar também que 1:10 se refere aos vivos e não esclarece o problema
dos santos mortos.
Alguns haviam morrido, e por causa disto surgiu a pergunta: teriam
eles perdido este reino e a glória? A resposta é, não, eles seriam trazidos
“com Ele”. A palavra “com” traduz a preposição sun, que indica união.
Ensinar que isso significa ressurreição parece forçar demais o significado de sun. Paulo poderia ter escrito que eles serão ressuscitados por Ele,
ou através dEle, mas certamente não “com Ele”.
Pode-se argumentar que sun é usada desta maneira em II Coríntios
4:4: “Sabemos que O que ressuscitou o Senhor Jesus nos ressuscitará
também por Jesus e nos apresentará convosco”. Neste versículo o texto
Nestle1 usa sun, mas o texto Stephens usa dia. Dia é aceito por Wigram,
Bloomfield e Newberry2. É correto afirmar que não há referência clara
1
Os milhares de manuscritos gregos do NT existentes são compilados para formarem
textos completos do NT em grego, e estes textos servem de base para as traduções
da Bíblia. O texto Nestle, atualmente na 27ª Edição, é compilado por E. Nestle e K.
Aland, e forma a base da versão ARA em português (16ª edição de Nestle/Aland); o
texto Stephens foi compilado por R. E. Stephens em 1550 (também chamado de Textus
Receptus), e forma a base das versões AT a ARC em português, e AV em inglês (N. do E.).
2 Os três autores citados, e suas obras, são: George V. Wigram (1805-1879 — The
Englishman’s Greek Concordance of the New Testament), Samuel T. Bloomfield (1790–1869
— Greek New Testament) e Thomas Newberry (1811-1901 — Englishman’s Bible) (N. do
E.).
162
A glória do Filho
no Novo Testamento a sun sendo usada para indicar união em ressurreição. Neste mesmo contexto sun é usada da nossa união com Ele em
glória: “E assim, estaremos sempre com o Senhor” (v. 17).
É interessante que no Novo Testamento de JND ele coloca os
vs. 15-18 entre parênteses, ligando assim “com Ele” aos tempos e estações do cap. 5. As únicas outras referências a tempos e estações estão
em Daniel 2:21 e Atos 1:7, e elas têm a ver com o Reino e os planos de
Deus com a Terra. Assim o apóstolo está ensinando que os santos não
perderam a glória do reino, mas serão trazidos com o Senhor Jesus no
momento da Sua manifestação para estabelecer o Seu reino.
Entretanto, isto apresenta outro problema. Se eles morreram e, por
conseguinte, seus corpos estão na sepultura, como podem eles vir com
Ele desde os Céus? Como que eles vão do sepulcro para a glória? Temos
a resposta nos vs. 15-18 — o Arrebatamento acontecerá.
Revelação
“Dizemo-vos, pois, isto, pela palavra do Senhor; que nós, os que ficarmos vivos para a vinda do Senhor, não precederemos os que dormem” (v. 15).
Providenciar uma solução para esse dilema necessitava de uma revelação do Senhor. Portanto, ele escreve: “Dizemo-vos, pois, isto, pela
palavra do Senhor”. Novamente devemos notar que o Senhor Jesus,
em João 12-14, tinha ensinado sobre a verdade do Arrebatamento, mas
esta era a primeira vez que este ensino havia sido dado por escrito. O
fato geral havia sido afirmado em 1:10, mas mesmo isto não poderia
ser plenamente compreendido até que estes versículos, no cap. 4, foram
escritos. Paulo declara que quando o Senhor vier, nós, os vivos, de modo
nenhum precederemos, ou iremos antes, daqueles que foram postos
para dormir. Isto pode ter soado estranho aos ouvidos e precisava de
mais explicações. Agora ele apresenta os detalhes do que irá acontecer
no Arrebatamento dos santos.
Retorno
“Porque o mesmo Senhor descerá do céu com alarido, e com a voz do arcanjo, e
com a trombeta de Deus, e os que morreram em Cristo ressuscitarão primeiro”
(v. 16).
Quão terna é a expressão: “O mesmo Senhor descerá do céu”. O
Noivo não enviará outro para buscar a Sua Noiva. A Igreja é tão precio-
A realidade da Sua vinda 163
sa que Ele não enviará outro a buscá-la, mas Ele mesmo virá.
Ressonância
“… com alarido [‘grande brado’, VB], com a voz do arcanjo, e com a trombeta
de Deus” (v. 16).
O “brado” introduz uma ordem. Traz a ideia de um grito de estímulo através do qual os animais são estimulados e impelidos pelo homem;
como os cavalos que puxam charretes, ou os cães caçadores. Era usado
como um sinal aos homens, como a remadores, por exemplo, pelo mestre de um navio, ou aos soldados pelo seu comandante. Na Septuaginta
a palavra é usada em Provérbios 30:27: “Os gafanhotos não têm rei; e
contudo todos saem, e em bandos se repartem”. Literalmente, seria: “a
uma palavra de comando, marcham em ordem”.
Obviamente, existe somente um que pode mandar a Igreja deixar
a Terra, e este é aquele que vem, em pessoa, buscar a Sua noiva. Esta
voz é a voz do Senhor. As expressões seguintes procuram descrever este
brado. Não são três vozes ou sons, mas somente um. Sua voz pode ser
descrita do ponto de vista celeste como “voz de arcanjo”, e de um ponto
de vista terrestre como “trombeta de Deus”. Estas expressões são descritas como anartras, isto é, elas não levam o artigo definido e são, portanto, características. Esta é a voz que se ouviu no túmulo de Lázaro em
João 11:43: “E, tendo dito isto, clamou com grande voz: Lázaro, sai para
fora”, e aquele que estava morto foi ressuscitado. A ideia de trombeta
é aquela de I Coríntios 15:52: “Num momento, num abrir e fechar de
olhos, ante a última trombeta”, quando os vivos serão transformados.
Devemos afirmar, para que seja claramente entendido, que esta é a última das trombetas relacionadas a esta dispensação, e não está relacionada
com as trombetas de Apocalipse caps. 8 e 9. É a voz que foi ouvida por
João em Apocalipse 1:10: “Eu fui arrebatado no Espírito no dia do
Senhor, e ouvi detrás de mim uma grande voz, como de trombeta, que
dizia: Eu sou o Alfa e o Ômega, o primeiro e o derradeiro”. Ele ouviu
a mesma voz novamente chamando-o ao Céu em Apocalipse 4:1: “E
eis que estava uma porta aberta no céu; e a primeira voz que, como de
trombeta, ouvira falar comigo, disse: Sobe aqui”. O que aconteceu a João
é uma figura do que acontecerá à Igreja quando I Tessalonicenses 4 for
cumprido e a Igreja arrebatada.
164
A glória do Filho
Ressurreição
“Os que morreram em Cristo ressuscitarão primeiro” (v. 16).
Note a beleza da exatidão das palavras da Bíblia. Note que eles
“dormiram através de Jesus”, mas são mencionados como “mortos em
Cristo”. Foi o toque carinhoso do Compassivo Homem Jesus que fê-los
adormecer, mas é Cristo, o Homem exaltado que vela sobre eles agora. Repare novamente que não há nenhuma sugestão de algum cristão
permanecer na sua sepultura. Todos aqueles que morreram “em Cristo”
serão ressuscitados, e não haverá exceções.
Retirada
“Depois nós, os que ficarmos vivos, seremos arrebatados” (v. 17).
Novamente observamos que não há nenhuma sugestão de dois
grupos, o carnal e o espiritual. Todos os que estiverem vivos, quando
acontecer o Arrebatamento, serão levados. A expressão “seremos arrebatados” não permite nenhuma sugestão de um processo longo e demorado. As outras ocorrências da palavra devem ser examinadas, e o toque
de intensidade e a irresistibilidade da força, devem ser notadas. Mateus
13:19: “Vem o maligno e arrebata o que foi semeado no coração”. João
10:12, 28-29: “O lobo as arrebata e dispersa o rebanho … Dou-lhes a
vida eterna, e nunca hão de perecer, e ninguém as arrebatará da Minha
mão. Meu Pai, que mas deu, e maior do que todos; e ninguém pode
arrebatá-las da mão do Meu Pai”. Atos 8:39: “O Espírito do Senhor
arrebatou a Filipe, e não o viu mais o eunuco”. II Coríntios 12:2, 4:
“Um homem que … foi arrebatado ao terceiro céu … foi arrebatado
ao paraíso, e ouviu palavras inesquecíveis”. Apocalipse 12:5: “E deu à luz
um filho homem que há de reger todas as nações com vara de ferro; e
o seu filho foi arrebatado para Deus e para Seu trono”. Assim todos os
vivos serão irresistivelmente arrebatados da Terra.
Reunião
“Juntamente com eles nas nuvens” (v.17).
Uma reunião maravilhosa acontecerá quando os mortos ressuscitados e os vivos transformados forem arrebatados, juntamente. Quão
deleitável é a palavra “juntamente”. Numa frase, essa palavra geralmente poderia ser omitida e a frase ainda faria sentido. Por exemplo, Salmo 133:1 (VB): “Eis, quão bom e quão agradável é habitarem juntos
os irmãos”. Filipenses 1:27: “Combatendo juntamente com o mesmo
A realidade da Sua vinda 165
ânimo pela fé do evangelho”. Mateus 18:20: “Porque onde estiverem
dois ou três juntamente reunidos em Meu Nome, aí estou Eu no meio
deles” (AV). Em cada uma destas citações a palavra “juntamente” ou
“juntos” inclui todos, assim também aqui no v. 17. Encontrar-nos-emos
todos juntos e então seremos recebidos por Ele.
Recepção
“A encontrar o Senhor nos ares” (v. 17).
As únicas outras ocorrências de “encontrar” ou “ao encontro” estão
em Mateus 25:1, 6: “Dez virgens que, tomando as suas lâmpadas, saíram ao encontro do esposo … e à meia-noite, ouviu-se um clamor: Aí
vem o esposo, saí-lhe ao encontro”. Atos 28:15: “Ouvindo os irmãos
novas de nós, nos saíram ao encontro à Praça de Ápio”. W. E. Vine
cita Moulton, que diz: “Parece que a ideia específica da palavra era dar
as boas-vindas oficiais a um dignitário recém-chegado”. Os santos se
encontrarão com o Senhor, e isto acontecerá “nos ares”.
A passagem menciona três esferas. O Senhor descerá desde o “Céu”,
que é o lugar da habitação de Deus. Os mortos ressuscitados e os vivos
transformados se encontrarão uns com os outros “nas nuvens”, que é
o domínio das aves e da aviação. Eles em seguida avançarão para “os
ares”, que é mais elevado que as nuvens e é o domínio de Satanás, e lá
O encontrarão! Em Lucas 16:22 o mendigo “foi levado pelos anjos para
o seio de Abraão”. A Igreja terá algo muito melhor do que uma escolta
angelical pelo território de Satanás; será o próprio Senhor!
Ele vem, vem para nós;
Logo ouviremos Sua voz acima;
Mortos e vivos, ressurgindo, sendo transformados,
Num piscar de olhos,
Serão arrebatados todos juntos
Para o encontro nos ares;
Com um brado o Senhor, descendo,
Pessoalmente nos aguardará.1
(A. M. Monteath)
1
He is coming, coming for us;/Soon we’ll hear His voice on high;/Dead and living, rising,
changing,/In the twinkling of an eye,/Shall be caught up all together/For the meeting
in the air;/With a shout the Lord descending,/Shall Himself await us there.
166
A glória do Filho
Região
“E assim estaremos sempre com o Senhor” (v. 17).
Que glorioso! Será maravilhoso estar com amigos e com entes queridos, mas isto é sobremodo superior: “estaremos com o Senhor”. E
isto não é tudo. Não é que estaremos com Ele por um período limitado
e passageiro, mas para sempre! Aqueles dois no caminho de Emaús,
em Lucas 24, gozaram da Sua companhia por um pouco, mas depois
Ele partiu; entretanto uma despedida será coisa desconhecida na glória.
Essa união nunca será desfeita, e Sua presença será desfrutada eternamente. Trata-se da expressão de uma verdade espiritual, e não material.
Não está falando de uma proximidade física, mas de um gozo espiritual
e eterno. Isso será vida eterna em toda a sua plenitude, e será o cumprimento da promessa do Senhor: “Virei outra vez, e vos levarei para Mim
mesmo, para que onde Eu estiver, estejais vós também” ( Jo 14:3).
Repouso
“Portanto, consolai-vos uns aos outros com estas palavras” (v. 18).
Aqueles que estavam enlutados poderiam enxugar as suas lágrimas
e encontrar conforto nestas palavras. Aqueles que já haviam ido não
estavam em desvantagem. De fato, eles têm uma vantagem sobre os
vivos. Eles ressuscitarão primeiro e estarão envolvidos naquela grande
reunião, participando plenamente de toda a glória que há de ser revelada. Que bem-aventurança! Quão animador! Que conforto!
Nós todos nos reuniremos no porvir,
Nosso bendito Redentor a contemplar;
Encontraremos amigos que partiram primeiro,
Que encontro então será!1
(Autor desconhecido)
1
We’ll all gather home in the morning/Our blessed Redeemer to see;/We’ll meet with
the friends gone before us;/What a gathering that will be!
Cap. 11 — A glória da Sua aparição
por James B. Currie, Japão
Introdução
A grandeza e a glória da “aparição” de nosso Senhor Jesus, há muito
esperada, é evidente a todos os leitores devotos da Palavra de Deus.
Estas características tão excelentes são especialmente notáveis em duas
breves, mas pitorescas frases que o apóstolo Paulo usa em relação a este
acontecimento culminante, que é continuamente mencionado através
das Sagradas Escrituras. A primeira destas declarações se encontra em
II Tessalonicenses 2:8 onde, no contexto do advento do homem do pecado e sua destruição final, o aparecimento futuro do Senhor é descrito
como “o esplendor da Sua vinda”, palavras que às vezes são traduzidas:
“o excedente resplendor da Sua aparição”. Tal é a grandeza daquele “resplendor” que aquele “cuja vinda é segundo a eficácia de Satanás” será
consumido pelo “assopro da boca do Senhor” ( JND).
A segunda declaração de Paulo está em Tito 2:13, onde o aparecimento é comparado com a “bem-aventurada esperança” do cristão.
Somos exortados a aguardar (ansiosamente) “a bem-aventurada esperança e o aparecimento da glória do grande Deus e nosso Salvador Jesus
Cristo”. É bom observar que “o aparecimento da glória” é do “grande
Deus e nosso Salvador Jesus Cristo”, e constitui a “bem-aventurada esperança” de cada filho de Deus, hoje. O “resplendor da Sua presença”
e o “resplendor da Sua glória” estão, ambos, intrinsecamente incluídos
na expressão Bíblica “a aparição de nosso Senhor Jesus Cristo” (I Tm
6:14), e apontam para aquela bendita ocasião quando Ele virá em glória
manifesta para estabelecer o Seu reino aqui na Terra.
Vários escritores calculam que o assunto da Segunda Vinda é mencionado diretamente cerca de 350 vezes, e é claramente sugerido em
centenas de outras referências através do Velho e do Novo Testamento.
Uma coisa é certa: alguns indivíduos podem rejeitar a veracidade do
ensino, mas ninguém pode negar que ele seja parte da urdidura e trama
dos escritos que reivindicam ser a única revelação de Deus aos homens.
Uma leitura cuidadosa destes escritos mostra que dois adventos separados do Messias, o futuro Rei de Israel e a única Esperança da humanidade, são claramente preditos. Algumas vezes estes dois aspectos
estão tão próximos no registro da revelação que não é fácil distingui-los.
168
A glória do Filho
Talvez o exemplo mais bem conhecido disto se encontra nas palavras
do profeta Isaías, escritas centenas de anos antes do nascimento do Senhor Jesus. Em Isaías 61:1-2, o profeta é levado a escrever: “O Espírito
do Senhor está sobre Mim; porque o Senhor Me ungiu, para pregar
boas novas aos mansos; enviou-Me a restaurar os contritos de coração,
a proclamar liberdade aos cativos, e a abertura da prisão aos presos; a
apregoar o ano aceitável do Senhor e o dia da vingança do nosso Deus”.
“Pregar boas novas aos mansos” e “apregoar … o dia da vingança do
nosso Deus” são duas comissões totalmente diferentes confiadas àquele
sobre quem o Espírito Santo veio. Muitas centenas de anos mais tarde, o próprio Senhor leu estas palavras do rolo de Isaías na sinagoga
em Nazaré, como registrado em Lucas 4. Naquela ocasião, Ele leu até
“anunciar o ano aceitável do Senhor”, e cerrou o livro. Ele omitiu as palavras: “apregoar o dia da vingança do nosso Deus”. Dois ministérios de
caráter inteiramente diferentes estão intimamente ligados no registro
divino. Uma comissão, em graça, para pregar boas-novas, e a outra, em
juízo, para vingar-se daqueles que não obedecem ao Evangelho.
Quando o Senhor Jesus “cerrou o livro” em Lucas 4 Ele deixou,
muito apropriadamente, a frase incompleta. As muitas afirmações das
Escrituras nos fazem ver que, não somente o caráter, mas também o
tempo quando estes ministérios seriam cumpridos seria diferente. Ao
ler as palavras de Isaías naquele dia em Nazaré, Ele veio “não para que
condenasse o mundo”; foi para salvar que Ele veio. Ele veio para ser
o “Salvador do mundo”, e consequentemente “convinha que o Cristo
padecesse, e ao terceiro dia ressuscitasse dentre os mortos” (Lc 24:46).
A segunda parte da profecia, relacionada ao Senhor proclamando o dia
da vingança, permanece como algo a ser cumprido no futuro. Podemos
estar descansados no fato que as palavras proféticas relacionadas ao nascimento do Senhor, o lugar, Sua morte e como ela seria, Sua ressurreição e ascensão, todas foram cumpridas literalmente, e assim as coisas
ditas em relação à Sua segunda vinda em glória terão, igualmente, o seu
cumprimento literal exato.
Portanto, o Espírito Santo, na Sua sabedoria, julgou ser apropriado
apresentar a nós os dois aspectos do advento do Senhor na Sua revelação da mente de Deus, sendo o caráter e o tempo destes dois aspectos
tão diferentes. Para seguir uma interpretação consistente das Escrituras
temos de reconhecer que a Segunda Vinda de nosso Senhor Jesus tem
A glória da Sua aparição 169
também estas duas características complementares, ambas as quais são
excepcionalmente importantes. Para poderem negar isso muitos escritores enfatizam que há somente uma “Segunda Vinda” e afirmam dogmaticamente que quem fala de “dois aspectos” da Vinda está realmente
dizendo que a Segunda Vinda consistirá de dois adventos do Senhor.
Nada poderia estar mais distante da verdade. Que há apenas uma Segunda Vinda do Senhor Jesus é aqui afirmado categoricamente, mas
que as Escrituras ensinam dois acontecimentos distintos, envolvidos
nesta Vinda, precisa ser igualmente afirmado. O acontecimento único
combina duas atividades Divinas em relação à humanidade. Uma é chamada “Arrebatamento”, e a outra “Revelação” ou “Apocalipse”. Ambas
as palavras são biblicamente corretas. A própria palavra “arrebatamento”
não aparece na nossa Bíblia, mas significa “ser levado embora”, “tirado
abruptamente”, concordando com I Tessalonicenses 4:17. “Revelação”
significa “fazer manifesto”, ou “desvendar”, e é a palavra usada em Apocalipse 1:1. As próprias palavras são diferentes, como são também os
conceitos quanto a caráter e tempo.
As muitas diferenças entre o “arrebatamento” e a “revelação” (ou
“aparição”) tornam necessário reconhecer algumas distinções básicas. A
“revelação” (e consequentemente a “aparição”) é um assunto que ocupa
muito espaço no Velho Testamento. O Arrebatamento foi, segundo diz
Paulo, uma “palavra” especial dada a ele pelo Senhor (I Ts 4:15). Em outro lugar ele chama a transformação que há de acontecer de “mistério”;
algo até então encoberto e indecifrável por meios naturais, mas agora
revelado por Deus através do Seu Espírito Santo (I Co 15:51). Isto não
se aplica meramente aos santos mortos sendo ressuscitados, mas tem
em vista o fato que, enquanto os santos mortos ressuscitarão nesta ocasião, haverá outros que, para usar a linguagem dada pelo Senhor a Paulo
em I Tessalonicenses 4, não dormirão, mas serão transformados. Jó sabia
que um dia ele seria ressuscitado de entre os mortos, e estava ciente
do fato que a sua ressurreição aconteceria quando o seu Redentor se
levantar “por fim sobre a terra” ( Jó 19:25). Este parece ser o testemunho
uniforme de todos os santos do Velho Testamento sobre a aparição do
Senhor ( Jó 19:25-26; 14:3; Os 13:10,14), mas os santos mortos desta
era serão ressuscitados e serão, juntamente com “os que ficarem vivos”,
transformados e arrebatados aos ares para estar com o Senhor para sempre. Outras diferenças podem ser encontradas nestes dois aspectos deste
grande acontecimento. Vamos falar delas no devido tempo.
170
A glória do Filho
A palavra parousia, muitas vezes traduzida “vinda”, é usada tanto
da vinda do Senhor para os Seus santos ( Jo 14:3; I Ts 4:17) quanto da
Sua vinda com eles ( Jd 14; I Ts 3:13). Vários eruditos dizem que a palavra significa “vinda”, “presença real” e “presença contínua com”. Estes
três conceitos são muito apropriados quando consideramos a Vinda do
Senhor. Ele vem para os Seus, Ele está com eles durante as atividades
celestiais do Tribunal de Cristo e das Bodas do Cordeiro, e continua
com Seu povo celestial (a Igreja) e terrestre (Israel), quando Ele estabelece o Seu Trono para reinar. É a falha em reconhecer estas três nuanças
do significado, como também a relutância de diferenciar entre Israel
e a Igreja, que causam tanta confusão em relação à segunda vinda do
Senhor Jesus.
A predição da Sua aparição no Velho Testamento
Tendo as afirmações acima como pano de fundo, esta será a primeira consideração. A predição da vinda em glória do Messias de Israel no
VT parece ter como base os concertos dados por Deus. Há oito concertos (alguns escritores vêem mais) nas Escrituras hebraicas, se o “Novo
Concerto” do qual os profetas falaram e que é ampliado no Novo Testamento for incluído. Desses oito concertos três são de grande importância. O Concerto de Abraão (Gn 12:1-3; 13:14-17; 15:18; 17:1-8);
o Concerto de Moisés (Dt 29:1; 30:1-9); e o Concerto de Davi (II Sm
1:19). Cada um dos outros concertos incluíam tanto condições como
bênçãos prometidas, mas estes três, de um modo especial, tinham a ver
com a Semente, a nação e a terra de Abraão, bem como com o trono e
casa de Davi. As promessas proféticas a serem cumpridas na aparição
do Rei tinham por finalidade afirmar, reafirmar e confirmar tudo que
Deus havia garantido, Ele mesmo, que faria no reino do maior dos Filhos de Davi, e Semente de Abraão. A terra foi prometida a Abraão e
à sua Semente. Paulo interpreta a “Semente” no singular, como se referindo ao Senhor Jesus (Gl 3:16). A nação de Abraão se tornaria grande
e todas as nações seriam abençoadas através dele e da sua Semente.
Enquanto a terra e o trono foram prometidos perpetua e incondicionalmente, mais tarde os profetas mostram que as promessas Divinas estavam condicionadas à aparição do próprio Filho de Deus. Nas palavras
de Isaías: “Porque um Menino nos nasceu, um Filho Se nos deu, e o
principado está sobre os Seus ombros, e se chamará o Seu nome: Maravilhoso Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz.
A glória da Sua aparição 171
Do aumento deste principado e da paz não haverá fim, sobre o trono de
Davi e no Seu reino, para o firmar e fortificar com juízo e com justiça,
desde agora e para sempre; o zelo do Senhor dos Exércitos fará isto”
(Is 9:6-7). Em outra parte, este Filho é descrito como tendo o nome
de “Emanuel”, que quer dizer “Deus conosco” (Is 7:14; Mt 1:23). Com
a aparição do Senhor Jesus em glória, acompanhado por Seus santos
e pelos “anjos de Deus” (os “anjos ceifeiros”), que separarão os ímpios
dos justos e os lançarão “na fornalha de fogo” (Mt 13:29-50), o reino
será estabelecido e permanecerá por mil anos (Ap 20:4). Não haverá
nem diminuição de poder, nem fim para a paz que o caracterizará; será
um reino de juízo e justiça onde especialmente os pobres estarão sob o
manto da magnanimidade do Senhor.
As muitas referências às promessas feitas em relação ao estabelecimento e caráter do reino no VT são, com certeza, concernentes à aparição de Cristo. Elas são muito numerosas para serem tratadas aqui, mas
umas poucas serão o suficiente para enfatizar o que já foi ensinado.
Isaías escreveu: “E acontecerá nos últimos dias que se firmará o
monte da casa do Senhor no cume dos montes, e se elevará por cima
dos outeiros; e concorrerão a ele todas as nações. E irão muitos povos, e
dirão: Vinde, subamos ao monte do Senhor … por que de Sião sairá a
lei, e de Jerusalém a palavra do Senhor” (Is 2:2-3). A inauguração deste
reino acontecerá com a aparição daquele de quem Isaías escreveu em 11:
2-4: “E repousará sobre Ele o Espírito do Senhor, o espírito de sabedoria e de entendimento, o espírito de conselho e de fortaleza, o espírito
de conhecimento e de temor do Senhor. E deleitar-Se-á no temor do
Senhor; e não julgará segundo a vista dos Seus olhos, nem repreenderá
segundo o ouvir dos Seus ouvidos. Mas julgará com justiça aos pobres,
e repreenderá com equidade os mansos da terra; e ferirá a terra com a
vara da Sua boca, e com o sopro dos Seus lábios matará o ímpio” (ou
“sem lei”, Newberry). O resultado será um reino cujo caráter é descrito
também por Isaías no mesmo capítulo. Porque “um rei reinará com justiça” (32:1), a própria natureza desfrutará de reconciliação quando não
houver ninguém para “fazer mal ou dano algum em todo o Meu [isto é,
de Deus] santo monte, porque a terra se encherá do conhecimento do
Senhor, como as águas cobrem o mar” (11:6-9).
Cada profeta por sua vez acrescenta algo a esta cena de justiça e
tranquilidade que terá início depois que o “filho da perdição” for des-
172
A glória do Filho
truído (II Ts 2) e aparecer, subitamente, o Filho do Homem para lançar
Sua foice aguda e colher em juízo a seara madura (Ap 14:14-15).
Jeremias observa que, antes de tudo, o tempo “da angústia de Jacó”
ocorrerá quando a tribulação da nação de Israel há de ser tão grande, a
ponto dos próprios homens se tornarem como mulheres que sofrem as
dores de parto. Mas, diz o Senhor: “Farei voltar do cativeiro o Meu povo
Israel; e tornarei a trazê-los à terra que dei à seus pais … ele [ Jacó] será
salvo dela … te restaurarei a saúde, e te curarei as tuas chagas” ( Jr 30:3,
7, 17). Estas coisas acontecerão “no fim dos dias” (30:24), e coincidirão
com a aparição do Senhor, vindo para reinar em glória e sujeitar Seus
inimigos debaixo dos Seus pés.
A essas benditas descrições, Ezequiel acrescenta mais informações
acerca da glória a ser revelada. Ele continua, poderíamos dizer, de onde
Jeremias parou, registrando para nós as palavras do Senhor, que disse:
“E suscitarei sobre elas um só Pastor, e Ele as apascentará; o Meu servo Davi é que as apascentará; Ele lhes servirá de pastor” (34:23). Um
Pastor para cuidar deles; um Príncipe para protegê-los; um concerto de
paz para ser desfrutado por eles, para que, em contraste com a sua situação atual, eles habitem com segurança no deserto, e possam até mesmo
“acampar” nos bosques! Com as “chuvas de bênçãos” caindo sobre eles e
a “Planta de Renome” no seu meio, a “Casa de Israel” será visivelmente
“Meu povo, diz o Senhor Deus” (34:30). A aparição do Senhor em glória causará, com efeito, o renascimento da nação. Água pura será espargida sobre eles, e um novo espírito posto no interior deles (36:25-26), o
que Nicodemos deveria ter entendido ( Jo 3:5). Então a nação, renascida, será levada ao Reino de Deus, do qual João mais tarde escreveu: “Os
reinos do mundo vieram a ser de nosso Senhor, e do seu Cristo, e Ele
reinará para todo o sempre” (Ap 11:15). Assim o reinado de mil anos de
Cristo aqui na Terra, que se iniciará com a Sua “aparição em glória” será
o prelúdio do reino eterno, caracterizado por novos Céus e nova Terra.
Daniel também fala sobre os acontecimentos que levarão à Ascensão do Senhor Jesus ao trono aqui na Terra e, ao fazê-lo, dá ao Senhor
um título muito significativo. No cap. 7 ele escreve: “Eu estava olhando
nas minhas visões da noite, e eis que vinha nas nuvens do céu um como
o Filho do homem; e dirigiu-Se ao Ancião de Dias … e foi-Lhe dado
[ao Filho do homem] o domínio, e a honra, e o reino … Seu domínio
é um domínio eterno, que não passará, e o Seu reino tal, que não será
A glória da Sua aparição 173
destruído” (vs. 13-14). Mais cedo, ao revelar e interpretar o sonho de
Nabucodonosor, ele demonstrou que o sonho estava relacionado com o
“fim dos dias”. A monstruosidade que o rei viu era simbólica de quatro
grandes impérios, dos quais Nabucodonosor era o primeiro. Embora
um “reino, poder, e força e glória” foram dadas a ele e aos reis que o
sucederiam, o destino final daquilo que a estátua gigante representa é
ser reduzido a pedaços e consumido pela pedra do monte, “cortada sem
auxílio de mãos” (2:37, 45). Esta é a Pedra à qual Pedro se refere. Para
o cristão, “pedra viva”, mas para aqueles que tropeçam na palavra e são
desobedientes, “pedra de tropeço, e rocha de escândalo” (I Pe 2:4, 8).
Outros profetas têm muito a dizer sobre este acontecimento tão
auspicioso para o cristão. Os Salmos também não permanecem em silêncio. Davi, a quem a promessa real foi feita, escreveu: “Levantai, ó
portas, as vossas cabeças; levantai-vos, ó entradas eternas, e entrará o
Rei da glória. Quem é este Rei da glória? O Senhor forte e poderoso,
o Senhor poderoso na guerra … Quem é este Rei da glória? O Senhor
dos Exércitos, Ele é o rei da Glória” (Sl 24:7-10). A nação de Israel e a
cidade de Jerusalém, com tais sentimentos, darão as boas-vindas ao seu
Rei no dia da Sua aparição.
A promessa da Sua aparição nos Evangelhos
É amplamente reconhecido que o Evangelho de Mateus forma
uma ponte entre os dois Testamentos. Isso não é apenas por causa do
lugar que este Evangelho ocupa no Cânon1 dos escritos do NT; antes,
é o conteúdo do relato de Mateus que exige que ele seja colocado no
início dos vinte e sete livros. Se tivesse sido posto em qualquer outra
posição, este Evangelho pareceria estar muito fora de sequência. Já que
o primeiro Testamento focava tanto na vinda do Rei e do reino, parece
muito natural que o primeiro livro do Novo Testamento continue desenvolvendo estes assuntos. E é exatamente sobre as duas vindas do Rei,
e o que eles incluem, que Mateus escreve.
As primeiras palavras do Evangelho nos informam qual o assunto
do escritor: “Livro da geração de Jesus Cristo, filho de Davi, filho de
Abraão” (v. 1). Nestas poucas palavras o Senhor Jesus, quanto à Sua
humanidade, é ligado a três dos personagens mais importantes das Es1 “Cânon” quer dizer “relação”, “lista”. Neste contexto, refere-se ~a lista dos livros que
fazem parte do NT (N. do E.).
174
A glória do Filho
crituras Hebraicas: Adão, Davi e Abraão, nesta ordem. Há treze listas
de nomes no VT, que são claramente chamadas de gerações, ou genealogias, tais com: “as gerações de Noé”; as “gerações dos filhos de Noé; as
“gerações de Terá” (Abraão), etc., mas somente a de Adão é chamada de
“livro das gerações”. Adão é o cabeça federativo da antiguidade; nosso
Senhor Jesus Cristo é o Cabeça federativo da nova Criação. Ele também é chamado “Filho de Davi”, e é assim chamado, ao todo, nove vezes
no livro. Ele também é chamado, somente esta vez em Mateus, de o “Filho de Abraão”. Imediatamente após a genealogia o relato declara: “Ora,
o nascimento de Jesus Cristo foi assim” (1:18), e é a este acontecimento
que o apóstolo Paulo se refere: “… aparição de nosso Salvador Jesus
Cristo, o qual aboliu a morte, e trouxe à luz a vida e a incorrupção pelo
evangelho” (II Tm 1:10). Bem no início do NT a primeira “aparição” do
Senhor Jesus é vista como a do Soberano prometido (Filho de Davi) e
Salvador universal (Filho de Abraão).
As credenciais do Messias prometido precisam ser adequadas e
inequívocas, e o escritor do Evangelho as apresenta sem hesitação ou
limitações. Para começar, o Senhor é legalmente reconhecido pelo fato
de ser “Filho de Davi”. Nascido de Maria, através da linhagem real,
o homem que era o seu suposto pai bem poderia ter sido o príncipe
herdeiro se a linhagem real de Judá tivesse continuado. Sábios vieram
de países distantes prestar homenagem ao recém-nascido rei, indicando
que Sua realeza se espalharia para além dos estreitos limites de Israel.
No cap. 3, um Céu aberto dá testemunho da Sua idoneidade absoluta,
e no cap. 4, Sua perfeição moral e impecável é vista no deserto onde o
príncipe deste mundo nada pôde encontrar nEle que correspondesse
às lisonjas oferecidas. Este, e somente este, revela-Se na Sua primeira
aparição como Aquele que é legalmente, humanamente, divinamente
e moralmente qualificado e capacitado para ocupar o trono universal,
exatamente como Deus havia planejado.
Além disso, Sua autoridade é evidente quando Ele enuncia os princípios governantes do Seu reino (caps. 5-7). Nos caps. 8-12, o poder
do Senhor é manifesto em várias esferas através dos muitos milagres
realizados, e do envio dos discípulos. Isto enfatiza a reivindicação que
Ele faria mais tarde: “É me dado todo o poder no céu e na terra” (28:18).
Quando a Sua rejeição pelos líderes da nação se manifesta, Ele então
pode apresentar a característica da era que se distinguirá pela Sua au-
A glória da Sua aparição 175
sência. Ele faz isso em sete parábolas que traçam um esboço profético
até o tempo do estabelecimento do Seu reino (cap. 13)
No seu devido tempo, segundo Mateus, o Senhor leva os acontecimentos até aos tempos finais. No discurso do Monte das Oliveiras
Ele descreve as condições predominantes no curto período imediatamente anterior à Sua revelação em glória. As coisas mencionadas pelos
profetas são reiteradas. Um tempo de grande tribulação; desintegrações
maciças em e ao redor de Israel; o povo judeu novamente em aparente
perigo de aniquilação; um tempo de separar os ímpios dos justos, e o
tempo do juízo. Estas coisas irão acontecer, literalmente, de acordo com
os caps. 24 e 25: “Então aparecerá no céu o sinal do Filho do homem; e
todas as tribos da terra se lamentarão, e verão o Filho do homem, vindo
sobre as nuvens do céu, com poder e grande glória” (24:30).
A “aparição” não é enfatizada tanto em Marcos ou Lucas, mas sempre que o assunto da volta do Senhor é mencionado, está em perfeita
harmonia com as outras Escrituras. Exemplos disso são encontrados em
Marcos 8:38: “… Filho do homem … quando vier na glória de Seu Pai,
com os santos anjos”, e em Lucas 9:26: “… Filho do homem, quando
vier na Sua glória, e na do Pai e dos santos anjos”. A maneira gloriosa
da aparição do Senhor é claramente indicada, assim como a necessidade
de vigilância por parte daqueles que estiverem no limiar deste grande
acontecimento. A triste possibilidade de ser achado dormindo em extrema incredulidade é o assunto da parábola em Marcos 13. O homem
da casa partiu para uma longa viagem, deixando com “o porteiro” a ordem de “vigiar”. O grave perigo é que, se o mestre voltasse inesperadamente, ele poderia encontrar os servos dormindo. Esta é também a força da parábola das dez virgens em Mateus 25:1-13, pois apesar de tudo
que o Senhor faz por Israel, durante o período da sua severa provação,
muitos ainda não estarão dispostos a reconhecer o Rei. Também haverá
muitos entre as nações gentílicas que tomarão partido com o mal contra
aqueles que vigiam e aguardam a vinda do verdadeiro Rei. Assim surge
a necessidade de separar as ovelhas dos bodes, por ocasião da aparição
do Senhor. Tanto Israel quanto as nações vivas estarão incluídas naquele processo de separação. Os justos dentre as nações vivas e os santos
ressuscitados do VT entrarão no reino com o seu Senhor (Mt 25:34).
João, que escreveu muito depois dos Evangelhos sinópticos estarem
disponíveis ao povo de Deus, tem a pureza do Evangelho em mente. Ele
176
A glória do Filho
não trata da “aparição” como tal, mas registra as palavras do Senhor concernentes à Sua vinda para os Seus, no cap. 14, e a menciona também,
de passagem, em 21:22.
A perspectiva da Sua aparição nas epístolas
O livro de Atos dos Apóstolos é transicional, formando a ligação
entre os Evangelhos e as Epístolas. Mostra também como o Evangelho
viajou de Jerusalém, onde o Senhor da Glória foi morto, até Roma,
onde Paulo estava “pregando o reino de Deus, e ensinando com toda
a liberdade as coisas pertencentes ao Senhor Jesus Cristo, sem impedimento algum” (28:31). Não só a localidade mudou, como também a
ênfase da mensagem. O Novo Testamento começa com João Batista
apelando ao povo: “Arrependei-vos, porque é chegado o reino dos céus”
(Mt 3:2). O Rei aparecera, e com Ele o reino dos Céus, juntamente com
todas as suas limitações temporais e terrestres. Uma oferta genuína foi
feita à Nação, e foi rejeitada. Agora Deus se volta para os gentios, e a
participação no reino de Deus é franqueada a todos os homens. Indo
além do que o reino dos Céus é em suas perspectivas básicas e terrenas, o Reino de Deus é universal, e essa era a intenção de Deus desde
a eternidade. Este reino será apresentado sem restrições, e finalmente
consumado pela “aparição” de nosso Senhor Jesus Cristo. Nos meses
que se seguiram à morte do Senhor Jesus, Deus estava ainda estendendo
a Sua misericórdia ao povo judeu. O Senhor ressurrecto andou entre os
Seus discípulos por quarenta dias, falando-lhes “das coisas concernentes ao reino de Deus”, e tal foi a impressão obtida pelos doze que eles
indagaram: “Restaurarás Tu neste tempo o reino a Israel?” (At 1:3, 6).
Mesmo depois da ascensão do Senhor e da vinda do Espírito Santo,
Deus ainda estava, através dos Seus servos, oferecendo “tempos de refrigério” e “tempos da restauração de tudo” (3:19-21). Todavia, tornou-se evidente que “antes que venha o grande e terrível Dia do Senhor”
quando “há de ser que todo aquele que invocar o nome do Senhor será
salvo”, como prometido pelo profeta Joel (2:31-32), sinais e maravilhas
o precederiam. Tais sinais foram dados, como confirmação, durante os
dias da primeira aparição do Senhor, mas aguardam um cumprimento
pleno no tempo futuro do Seu resplandecer em glória (II Ts 2:8).
Entre as primeiras epístolas de Paulo estão as duas cartas escritas aos
cristãos novos de Tessalônica. Durante a sua breve estadia entre eles o
A glória da Sua aparição 177
apóstolo, aparentemente, havia falado muito acerca dos últimos tempos
e da Vinda do Senhor. De alguma forma, os cristãos haviam interpretado mal o ensino de Paulo, e estavam apreensivos quando a alguns dos
detalhes, e algumas cartas supostamente de Paulo não haviam ajudado
em nada. Esta ansiedade vinha da sua incapacidade de distinguir entre
o “Dia de Cristo” (Fp 2:6) e o “Dia do Senhor” (I Ts 5:2). O “Dia de
Cristo” é expresso de diversas maneiras. É mencionado como o “Dia do
Senhor Jesus”; o “dia de Jesus Cristo”; o “Dia do Senhor Jesus Cristo” —
todas estas expressões têm a ver com a vinda do Senhor para os Seus e
com alguns dos acontecimentos que seguirão. Estes incluem o Tribunal
de Cristo (II Co 5:10) e as Bodas do Cordeiro (Ap 19:9). Paulo dissipa
os temores destes novos cristãos, em relação àqueles que “em Jesus dormem”, ao citar a palavra da revelação que lhe foi dada diretamente pelo
Senhor (I Ts 4:13-18). Quanto ao “Dia do Senhor”, nenhuma palavra
era necessária, já que este era o assunto de muitas Escrituras proféticas e
do ensino do próprio Paulo. Ele assegura os tessalonicenses que o “Dia”
não pode vir sem que alguns acontecimentos prévios ocorram (II Ts
2:1-5). Ele lhes roga que não se abalem no seu entendimento, como se
o “dia das trevas” já estivesse sobre eles. Paulo lança mão de duas coisas
para aliviar a sua preocupação; primeiro, a vinda (parousia) do Senhor, e
segundo, o nosso encontro com Ele (o Arrebatamento). Estes são dois
dos “acontecimentos prévios” que devem ocorrer antes que aconteça o
Dia do Senhor. Ele já tinha mostrado que é um justo juízo da parte de
Deus retribuir aqueles que estavam atribulando os cristãos e, ao mesmo tempo, quando ocorrer a aparição do Senhor, garantir descanso e
repouso aos santos (II Ts 1:6-7). Ao encorajar estes novos convertidos
a “crescer em amor uns para com os outros”, ele o faz à luz do fato que
o Senhor haverá de “confirmar os vossos corações, para que sejais irrepreensíveis em santidade diante do nosso Deus e Pai, na vinda de nosso
Senhor Jesus Cristo com todos os Seus santos” (I Ts 3:12-13)
Paulo escreve de maneira semelhante aos cristãos de Corinto, falando deles como aqueles que estão “esperando a manifestação de nosso
Senhor Jesus Cristo, o qual vos confirmará também até ao fim, para
serdes irrepreensíveis no dia de nosso Senhor Jesus Cristo” (I Co 1:7-8).
Ao aguardarem ansiosamente a aparição do Senhor Jesus eles também
são lembrados de que ser achados irrepreensíveis terá seu momento de
revisão (e de recompensa) “no dia de nosso Senhor Jesus Cristo”, apontando para o dia da avaliação celestial.
178
A glória do Filho
Da mesma maneira Pedro também mostra seu desejo de que a fé vitoriosa dos cristãos na Ásia Menor, a quem ele escreve, mesmo no meio
de “várias tentações … se ache em louvor, e honra, e glória, na revelação [aparição] de Jesus Cristo” (I Pe 1:6-7). A fé vencedora do cristão,
mesmo em meio à forte provação e tribulação, é muito mais preciosa do
que o ouro que perece. Traz honra e glória a Deus, e isso será manifesto
no dia da revelação do Senhor. João também escreve: “Quando Ele se
manifestar, seremos semelhantes a Ele; porque assim como é O veremos. E qualquer que nEle tem [coloca] esta esperança purifica-se a si
mesmo, como também Ele é puro” (I Jo 3:2-3). A doutrina da “aparição”
é claramente explicada, e suas exigências são específicas.
O propósito da Sua aparição no Apocalipse
Nenhuma Escritura é mais cheia da maravilha da “aparição de
Cristo” do que o último livro da nossa Bíblia, o Apocalipse, ou Revelação! Este último título é absolutamente apropriado, já que é a primeira
palavra do próprio livro, uma revelação de Jesus Cristo. A primeira visão concedida a João foi aquela do Cristo glorificado andando no meio
das sete igrejas representativas, e mais revelações continuam a traçar os
acontecimentos apocalípticos até que a “voz de trovão” diz: “Aleluia!
Pois já o Deus Todo-Poderoso reina” (19:6). Neste momento, os Céus
são abertos e Aquele “cujo Nome é chamado a Palavra de Deus” aparece
assentado num cavalo branco, com os exércitos do Céu que O seguem,
enquanto Ele “julga e peleja com justiça” (19:11). O poderoso Veterano
de todos os conflitos com o mal, desde os tempos da revolta de Lúcifer,
surge com a Sua veste salpicada de sangue, já que Ele “pisa o lagar do vinho do furor e da ira do Deus Todo-Poderoso”. Seu nome é dado como
“Rei dos reis e Senhor dos senhores” (Ap 19:15-16). Entre as muitas
predições proféticas concernentes àquele acontecimento tão importante, nenhuma é mais significativa do que a de Isaías 63:1-4: “Quem é
este, que vem de Edom, de Bozra, com vestes tintas; este que é glorioso
em Sua vestidura, que marcha com a Sua grande força? Eu, que falo
em justiça, poderoso para salvar. Por que está vermelha a Tua vestidura,
e as Tuas roupas como as daquele que pisa no lagar? Eu sozinho pisei
no lagar, e dos povos ninguém ouve comigo; e os pisei na Minha ira, e
os esmaguei no Meu furor; e o seu sangue salpicou as Minhas vestes, e
manchei toda a Minha vestidura. Porque o dia da vingança estava no
Meu coração; e o ano dos Meus remidos é chegado”. Não é de se admi-
A glória da Sua aparição 179
rar que, pela primeira vez no NT, a palavra “aleluia” aparece, e é usada 4
vezes neste contexto! Para citar as palavras do próprio Senhor: “se estes
se calarem, as próprias pedras clamarão” (Lc 19:40).
É evidente que o livro de Apocalipse é um clímax. Tantas das verdades apresentadas em Gênesis e desenvolvidas em outras partes das
Escrituras são trazidas ao seu pleno cumprimento aqui. Isto é especialmente verdadeiro acerca das coisas relativas ao Rei e Sua aparição em
glória. A própria palavra “reino” é encontrada somente seis vezes em
Apocalipse, mas os primeiros dezenove capítulos são uma introdução
ao advento literal do Rei à Terra, para estabelecer o Seu reino de acordo
com tudo o que fora predito. Ele é apresentado, primeiramente, na glória da Sua Pessoa ao andar entre os santos desta era, e isso Ele faz numa
capacidade judicial (cap. 1). Ao descrever as condições prevalecentes
em sete igrejas locais do século I, o Espírito Santo dá claras indicações
de como as coisas iriam se desenvolver na era da Igreja (caps. 2 e 3). O
arrebatamento da Igreja é, no mínimo, sugerido em 4:1, quando João,
na qualidade de representante, ouve as palavras: “Sobe aqui”, para que
lhe fossem mostradas as coisas que deveriam acontecer “depois destas”.
É muito interessante e instrutivo ver que esta frase exata é usada em
Atos 15, onde é declarado como Deus visitaria os gentios, “para tomar
deles um povo para o Seu nome [a Igreja] … depois disto voltarei, e
reedificarei o tabernáculo de Davi, que está caído” (vs. 14-16). A ordem
no Livro de Apocalipse segue estas palavras exatamente, pois é somente
depois de um povo ser tomado para o Seu nome que a obra de restaurar
a cidade e a casa de Davi é iniciada. Uma vez iniciada esta obra, a Igreja
não é mais mencionada nem vista na terra. Tendo sido arrebatada para
estar com seu Senhor, ela assume um caráter celestial.
Assim como no princípio do ministério terrestre do Senhor, as credenciais e qualificações dAquele que há de vir, que é capaz de restaurar
e reedificar, são dadas, e Ele é aclamado como o único que é “digno de
tomar o livro [com sete selos] e de abrir os seus selos”. O Cordeiro como
havendo sido morto é declarado digno de “receber o poder, e riquezas, e
sabedoria, e força, e honra, e glória, e ações de graças” (5:9, 12).
Tendo considerado o arrebatamento da Igreja para estar com o Senhor, e contemplado a descrição celestial dAquele que é digno de ser
contemplado por todo o Universo, agora a atenção se focaliza na Terra.
Sete selos, sete trombetas e sete últimas pragas de taças de ira, ilus-
180
A glória do Filho
tram o derramamento do furor divino sobre um mundo rebelde. Uma
ditadura cruel debaixo do “homem do pecado”; paz retirada da Terra;
fome; morte em números sem precedentes; terremotos violentos e tempestades, além de explosões de corpos celestes. Tudo isso será de um
caráter tão feroz que muitos buscarão a morte, mas serão incapazes de
encontrá-la. Nem mesmo Israel escapará. Seu tempo de grande tribulação ( Jr 30:7; Mt 24) virá sobre ela numa tal medida que “se aqueles
dias não fossem abreviados, nenhuma carne se salvaria; … serão odiados … surgirão falsos profetas, e enganarão a muitos … e a abominação
da desolação … estará no lugar santo”. Por este tempo haverá terríveis
acontecimentos nos Céus. “O sol escurecerá, e a lua não dará a sua luz,
e as potências do céu serão abaladas. Então aparecerá no céu o sinal do
Filho do homem, e todas as tribos da terra se lamentarão e verão o Filho
do Homem vindo sobre as nuvens do céu com poder e grande glória”
(Mt 24:29-30). A aparição será ubíqua (“assim como o relâmpago sai
do oriente e se mostra até ao ocidente”), e súbita (“como foi nos dias
de Noé, assim será também a vinda do Filho do homem, porquanto,
assim como, nos dias anteriores ao dilúvio, comiam, bebiam, casavam
e davam-se em casamento, até o dia em que Noé entrou na arca, e não
perceberam, até que veio o dilúvio, e os levou a todos” (Mt 24:27, 38).
Em suma, essas são as condições indescritíveis que Israel irá enfrentar
quando “todos os povos em redor vierem contra Jerusalém” (Zc 12:3, 9).
Estas nações estarão reunidas contra Jerusalém, pelo Senhor, como parte do castigo da nação pela sua prolongada incredulidade: “E o Senhor
sairá, e pelejará contra estas nações … E naquele dia estarão os Seus
pés sobre o Monte das Oliveiras” (Zc 14:3-4). O monte será fendido do
oriente para o ocidente, e será aberto um grande vale onde, aparentemente, águas vivas fluirão em ambas as direções, sem dúvida para trazer
grande fertilidade à terra durante os anos do reino. O Senhor prometeu
livramento para muitos na nação, por ocasião da Sua aparição. Ele dará
“fim a todas as nações entre as quais te espalhei; a ti, porém, não darei
fim” ( Jr 30:10-11). O “homem do pecado” (a “besta que saiu do mar”)
com o seu falso profeta (“a besta que subiu da terra” — Ap 13), ambos
serão “lançados vivos no lago de fogo que arde com enxofre”, onde, depois de ter sido preso por mil anos, o diabo também será lançado, para
serem “atormentados para todo o sempre” (Ap 19:20; 20:10).
Estes são alguns dos acontecimentos de peso monumental que
acontecerão por ocasião do aparecimento do Senhor. Ao som da grande
A glória da Sua aparição 181
trombeta, Israel como o eleito será ajuntado desde os quatro ventos, de
uma à outra extremidade do Céu, e todos os seus inimigos serão derrotados (Mt 24:31; Zc 12:9). As nações vivas serão julgadas e os “filhos
do maligno” atados em molhos e lançados na condenação eterna (Mt
13:40; 25:46). Então, a grande trindade do mal (o velho dragão, o filho
da perdição e o falso profeta) serão derrotados e presos. A natureza será
pacificada, e naquele dia o Senhor será rei sobre toda a Terra (Zc 14:9),
aparecendo coroado com muitos diademas de honra e de glória para
ocupar o trono perpetuamente, portando o símbolo da Sua entronização, o cetro de justiça (Ap 19:11-16; Sl 45:3-7).
Pode-se perguntar: como podem todos estes grandes acontecimentos ocorrerem no que se pressupõe ser um curto espaço de tempo, na
ocasião da aparição do Senhor, ou durante a Sua descida à Terra? Em
primeiro lugar, multidões incontáveis de anjos estarão envolvidas, tanto
no julgamento dos vivos, por ocasião da vinda do Senhor, quanto no
ajuntamento da nação de Israel desde os quatro cantos da Terra (Mt
13:39; 24:31). Em segundo lugar, Daniel ouviu dois homens conversando à beira do rio, e ali é feita a pergunta: “Quando será o fim destas
maravilhas?” (Dn 12:6). A resposta dada foi: “desde o tempo em que o
sacrifício contínuo for tirado [na metade da septuagésima semana de
Daniel]1… haverá mil duzentos e noventa dias. Bem-aventurado o que
espera e chega até mil trezentos e trinta e cinco dias” (Dn 12:11, 12).
Os setenta e cinco dias extras, estendidos além da profecia do próprio
Daniel, de três anos e meio, (Dn 9) parecem ser a provisão divina para
que o peso da autoridade real do Senhor alcance os cantos mais remotos do globo. Não haverá somente tempo suficiente, como também as
vastas hostes de agentes são parte da provisão divina para a realização
dos propósitos de Deus.
A existência de Israel como nação, mesmo em incredulidade; os
sentimentos de nacionalismo ardendo através do mundo; os passos largos de extrema apostasia na medida em que muitos se desviam da verdade; a instabilidade política generalizada, e homens que são “amantes
de si mesmos … mais amigos dos deleites do que amigos de Deus”
alardeando os piores tipos de males, sem temor de retribuição; todas
1 O autor se refere à profecia das setenta semanas de Daniel 9:24-27, sessenta e nove
das quais já passaram. Resta apenas a última “semana” (7 anos), que corresponde à
Tribulação (N. do E.).
182
A glória do Filho
estas coisas nos dizem que os “tempos trabalhosos [perigosos]” dos últimos dias (II Tm 3:1) já estão aí, e que o “Juiz está à porta” (Tg 5:9).
Que possamos dar ouvidos à voz do Senhor quando Ele diz: “Eis que
venho sem demora: guarda o que tens para que ninguém tome a tua
coroa” (Ap 3:11).
Quando o Senhor empunhar o cetro de soberania na Sua vinda
para estabelecer o Seu reino e reinar, as palavras de Davi, resumindo as
suas orações reais, são exatas para essa ocasião: “Temer-te-ão enquanto
durarem o sol e a lua, de geração em geração: Ele descerá como chuva
sobre a erva ceifada, como os chuveiros que umedecem a terra … Dominará de mar a mar, e desde o rio até as extremidades da terra … E
todos os reis se prostrarão perante Ele; todas as nações O servirão … O
Seu nome permanecerá eternamente; o Seu nome irá se propagando
de Pai a filhos enquanto o sol durar, e os homens serão abençoados
nEle; todas as nações Lhe chamarão Bem-Aventurado … E bendito
seja para sempre o Seu nome glorioso: e encha-se toda a terra da Sua
glória. Amém e Amém” (Sl 72).
Jesus reinará em todo lugar por onde o Sol
Passa em suas repetidas viagens;
Seu reino estenderá de costa a costa,
Até que a Lua não mais cresça e diminua.
Bênçãos abundam por onde Ele reina,
O prisioneiro salta e solta suas correntes;
Os cansados encontram descanso eterno,
E todos os filhos necessitados são abençoados.
Que toda criatura levante e traga
Honras especiais ao nosso Rei;
Anjos desçam com cânticos novamente,
E a Terra repita o sonoro Amém!
(Isaac. Watts1)
1 Jesus shall reign where e’er the sun/Doth His successive journeys run;/His kingdom
stretch from shore to shore,/Till moons shall wax and wane no more./Blessings abound
where’er He reigns,/The prisoner leaps to lose his chains;/The weary find eternal rest,/
And all the sons of want are blest./Let every creature rise and bring/Peculiar honours
to our King;/Angels descend with songs again;/And earth repeats the loud Amen!
Cap. 12 — A supremacia do Seu reino
por William M. Banks, Escócia
Pano de fundo e definição
O reinado do Senhor Jesus está ligado ao reino vindouro. O assunto
do reino é vasto. Realmente, num certo sentido ele é “o grande tema de
toda a Escritura”. Pode ser visto na história, em mistério e em manifestação; isto é, no passado, no presente e no futuro. A. J. McClain1 já
destacou que
“um reino abrange uma situação total, contendo pelo menos três
elementos essenciais: primeiro, um soberano com autoridade adequada e poder; segundo, um reino de súditos a serem governados;
e terceiro, o exercício efetivo da função de governar”.
No passado o reino foi administrado indiretamente, por exemplo,
através de juízes e reis. No presente o reino tem um aspecto espiritual,
oculto ao olho humano (portanto em mistério), mas percebido onde o
Rei é reconhecido no coração do cristão individual (Rm 14:17), e nas
igrejas de Deus. No futuro o reino será literal, com o Senhor Jesus no
trono — o reino será então manifesto. Ele será o soberano, o Seu domínio será universal e Seu reinado o mais benéfico já conhecido.
Há um sentido no qual o reino é eterno: “o Teu reino é um reino
eterno; o Teu domínio dura em todas as gerações” (Sl 145:13). Deus
está em controle de tudo o que acontece no mundo, guiando tudo até a
realização vitoriosa de todo propósito divino. O reino que vamos considerar aqui, porém, é aquele aspecto específico do governo de Deus a
ser estabelecido sobre a Terra na vinda de Cristo em glória manifesta,
quando Ele reinar com Seu povo ressuscitado e glorificado por mil anos.
Esse período de tempo é mencionado nada menos que seis vezes em
Apocalipse 20, e sem dúvida alguma se refere ao futuro reino milenar.
Há um sentido no qual o Senhor Jesus reinará “para sempre” (Ap 11:15;
Lc 1:33), mas os detalhes disto não são considerados aqui.
O assunto relativo ao reino milenar de Cristo é vasto em si mesmo.
Será necessário focalizar nossa atenção, e é o que faremos a seguir.
1
McClain, A. J. The Greatness of the Kingdom. B. M. H. Books, 1976.
184
A glória do Filho
Introdução
J. G. Bellet destaca, proveitosamente, que os Salmos 92-101 formam um “pequeno livro” dentro do livro dos Salmos, e que tratam do
“mundo vindouro”. Estes Salmos são às vezes chamados de “Os Salmos
da Entronização” e falam, sem dúvida, do reino vindouro do Senhor
Jesus.
1
Podemos ver que isto é realmente um fato pela repetição da expressão “o Senhor reina”, que ocorre nos Salmos 93:1; 96:10; 97:1 e
99:1. Assim, quatro vezes em seguida nestes dez Salmos, temos uma
indicação do fato que o Senhor reina. A única outra ocorrência desta
frase específica está em I Crônicas 16:31, e é interessante que ali se trata,
evidentemente, de uma citação do Salmo 96. Há ainda outros aspectos
recorrentes destes Salmos que indicam serem eles uma unidade coesa.
Por exemplo, a palavra “justiça” ocorre sete2 vezes, e a palavra “juízo”
cinco vezes. Esses são conceitos associados com o reino vindouro. Não
pode haver justiça estabelecida no trono a menos que a iniquidade tenha sido julgada! Os dois conceitos estão ligados no Salmo 94:15, onde
lemos que “o juízo voltará à retidão [justiça]”. Não é de surpreender
que “segui-Lo-ão todos os retos de coração”. Também no Salmo 97:2:
“justiça e juízo são a base do Seu trono”.
A seguir, cada Salmo será considerado por sua vez, e uma ênfase
diferente na supremacia do reino será indicada. Vamos considerar as
circunstâncias nas quais a principal característica é destacada. O efeito
correspondente nos súditos do Seu reino também será notado. O efeito
igualmente importante sobre a Criação não pode ser negligenciado —
ela também aguarda a “manifestação dos filhos de Deus” (Rm 8:19).
Seria proveitoso, enquanto lemos o que segue, ter as Escrituras
abertas nestes Salmos, pois assim obteremos o máximo proveito.
Supremo em repouso — Salmo 92
A ideia de repouso é logo evidente neste Salmo pelo seu título. Observe o que diz: “Salmo e Cântico para o Sábado”. Sem dúvida o salmis1 Bellet, J. G. Meditations on the Psalms. 4º edição. W. H. Broom, 1871.
2 A tradução da palavra hebraica tsadak varia nas versões em Português (“retidão” e
“justiça” na AT). As referências são: Sl 94:15; 96:13; 97:2, 6; 98:2, 9; 99:4 (N. do E.).
A supremacia do Seu reino 185
ta está olhando para o futuro reino milenar de Cristo, que introduzirá
aquele dia de repouso. É o dia pelo qual a Terra anela, e pelo qual está
presentemente “gemendo”, para usar a linguagem de Romanos 8. Neste
Salmo, o futuro Rei está aguardando o Seu reino. Uma das características salientes que o caracterizam é, não apenas as “obras” do Senhor,
mas Seus “pensamentos”, como indicado no v. 5. Estes são descritos
como “mui profundos”, mas naquele dia serão expressos nas obras que
Ele há de executar durante este reino. O resultado será uma época não
somente de descanso, mas junto com o repouso virá também um tempo
de alegria e louvor, como indicado nos vs. 1-5.
Esta mesma ideia de repouso é vista em muitas outras referências
ao milênio, nos livros proféticos. Por exemplo, em Isaías 11 (uma cena
milenar), temos uma referência ao fato que “o Seu repouso será glorioso”
(v. 10). É claro que se este tipo de repouso vai existir, toda a oposição
ao reino terá de ser superada. Isto é indicado no v. 6, onde “o homem
brutal” será julgado e, juntamente com os ímpios e os praticantes da
iniquidade, será destruído perpetuamente. Enquanto este tipo de atividade floresce, não pode haver repouso. O Rei, entretanto, de acordo com
o v. 10, será ungido com “óleo fresco”, que será o ministério de graça
indicado em Lucas 4, e isso resultará no ministério do Sábado, como
também já foi indicado acima em Isaías 11.
Não é de surpreender que o Salmo conclua com uma descrição dos
justos florescendo, com três referências a isso nos últimos quatro versículos. Eles serão como a palmeira, e crescerão como o cedro do Líbano.
Através das Escrituras, o cedro é uma figura de estabilidade e força.
Aqueles assim apropriadamente plantados irão florescer nos átrios de
Deus e produzir fruto, mesmo na velhice. Nenhuma deterioração é
mencionada — frutíferos até o fim!
Certamente esta é uma conclusão apropriada para um Salmo sobre
o Sábado, indicando as características aprazíveis que hão de caracterizar
um reino que tem, como um dos seus traços fundamentais, a supremacia do repouso — tão diferente das características de inquietação e
desassossego que caracterizam os reinos de hoje. Com o afastamento
tão evidente dos princípios Bíblicos nas leis atuais, os justos ao invés
de florescerem, estão constantemente sob pressão. No reino vindouro
essa situação será completamente revertida e a justiça, mais uma vez, há
de imperar sob um Soberano benigno que será Ele mesmo, o próprio
186
A glória do Filho
epítome de repouso.
Supremo em majestade — Salmo 93
O Salmo inicia muito significativamente com uma das expressões
já mencionadas, isto é, “o Senhor reina”. A linguagem do v. 1 é muito
interessante, onde é enfatizado que o monarca reinante “está vestido de
majestade”. A veste indica Seu caráter e as características vistas na Sua
pessoa. Este foi o caso quando os três discípulos estiveram com Ele no
monte santo. Pedro declara: “Nós mesmos vimos a Sua majestade” (II
Pe 1:16). Majestade não é o único traço neste caso — com ela vem o
poder, pois o Senhor não está apenas vestido de majestade, Ele também Se cinge de poder. Não é comum que majestade e poder estejam
inextrincavelmente juntas, mas é assim quando o Senhor reina. Não
é surpreendente que isto exija uma resposta do povo, ao apreciarem o
fato que, tendo estabelecido o Seu repouso, Ele está agora reinando em
majestade. A resposta é muito clara: “O Teu trono está firme desde então: Tu és desde a eternidade”. Quão diferente dos tronos com os quais
estamos familiarizados, que na melhor das hipóteses, nada mais são que
reinos instáveis permanecendo, no máximo, por uns breves anos e se
acabando para sempre. Este reino é muito diferente; seu estabelecimento é antigo, “desde então”, e Aquele que se assenta sobre o trono é, Ele
mesmo, desde a eternidade.
Também não é surpreendente que quando tanta majestade e poder
são indicados, encontramos também oposição. Nos vs. 3-4 do Salmo há
uma indicação de que os rios têm levantado a sua voz: “os rios levantam
as suas ondas”. Não há dúvida que os rios são uma figura de oposição. A
cena turbulenta é apresentada para indicar a severidade desta oposição
à majestade dAquele que Se assenta sobre o trono. Pode até mesmo
haver uma indicação da atividade do submundo que é, algumas vezes,
associada com rios. Assim, as forças do mal ainda estarão em atividade,
embora possivelmente não de forma visível ou óbvia. Todavia, o inimigo será derrotado, já que “o Senhor nas alturas é mais poderosos que o
ruído das grandes águas e do que as grandes ondas do mar”.
O Salmo tem uma conclusão muito interessante, indicando que
onde a majestade está entronizada e o inimigo derrotado, as características que marcam a casa do Senhor são santidade e fidelidade. Estas
não são transitórias, mas de fato, serão as características permanentes do
A supremacia do Seu reino 187
trono e da casa com a qual está associado.
Supremo em juízo — Salmo 94
O estabelecimento do repouso e majestade de que falamos acima
exige que a oposição, na forma de impiedade e iniquidade, esteja totalmente suprimida. Entretanto, há somente um capaz de realizar isso, e
ele é Aquele único a Quem “a vingança pertence” (duas vezes no v. 1). O
clamor do salmista tem sido o clamor dos piedosos através de todas as
eras, isto é, “Até quando?” Três vezes seguidas, nos vs. 3 e 4, este clamor
é ouvido. Há um desejo entre os piedosos de que a soberba oposição
ao trono do Eterno seja dominada e que os ímpios não mais triunfem.
Através das eras, os ímpios têm aparentemente triunfado, e às vezes
isto tem tido um efeito prejudicial nos piedosos. De fato, no Salmo 73
o salmista estava com inveja dos insensatos quando viu a prosperidade
dos ímpios. Ele era incapaz de compreender por que eles eram tão bem-sucedidos na vida, mas chegou a hora quando ele entrou no santuário
e então entendeu o fim deles. Isto fez toda a diferença à sua avaliação, e
mesmo hoje, muitos falham em apreciar que no final o Senhor é o Juiz.
Num futuro reino beneficente não pode haver lugar para aqueles
que matam a viúva, o estrangeiro e os órfãos (v. 6). Realmente, isto é
feito com total desconsideração ao fato que há Um no trono que está
consciente das condições que prevalecem. Eles dizem na sua arrogância:
“o Senhor não verá; nem para isso atenderá o Deus de Jacó” (v. 7). Eles
ignoram que o Senhor não apenas está a par das atividades sendo realizadas, como também aprecia os motivos por trás delas, sabendo que “os
pensamentos dos homens são vaidade” (v. 11). Entretanto, o juízo será
implementado e o resultado final será a exaltação da justiça. Aqueles
que são retos de coração seguirão então no caminho justo assim estabelecido. Portanto, quando os piedosos virem a intervenção dAquele
que reina sobre o trono, julgando os injustos, revertendo a prosperidade
dos ímpios e estabelecendo os justos, eles compreenderão que de fato a
misericórdia de Deus os “susteve” (v. 18).
Há uma indicação muito interessante neste Salmo de que a legislação para o pecado não é algo novo. Pensa-se hoje em dia que a legalização do pecado somente começou a acontecer em décadas recentes. Na
realidade, de acordo com o v. 20 deste Salmo, parece que o fato de forjar
188
A glória do Filho
o “mal por uma lei” já era uma prática comum nos dias do salmista. Em
outras palavras, eles estavam legalizando o pecado naquele tempo, justamente como o pecado é legalizado hoje. Todavia, como naquele dia,
assim hoje, “Ele trará sobre eles a sua própria iniquidade; e os destruirá
na sua própria malícia; o Senhor nosso Deus os destruirá” (v. 23).
Este Salmo, como um todo, é um desenvolvimento interessante
nesta série de Salmos no Saltério1. É um princípio perene na Palavra de
Deus que, se a justiça vai ser estabelecida, então os injustos precisam ser,
primeiramente, destruídos. Se o reino milenar de Cristo vai estabelecer
a justiça, como bem sabemos que vai; logo, o julgamento dos ímpios
é absolutamente essencial. Davi, nas suas últimas palavras (II Sm 23)
indica o mesmo pensamento, quando, tendo estabelecido o fato de que
haverá “uma manhã sem nuvens” (v. 4), ele declara que por isso os filhos
de Belial terão que ser lançados fora. Se fosse possível que eles sobrevivessem nas circunstâncias desse tempo, certamente o dia não seria sem
nuvens! Eles serão totalmente consumidos pelo fogo, para que o reino
milenar previsto por Davi possa ser introduzido e ser como “quando
pelo seu resplendor [o sol da manhã] e pela chuva a erva brota da terra”.
Tendo assim estabelecido um reino, que será majestoso e poderoso,
com toda a oposição removida, não nos surpreende que a próxima característica destacada seja honra suprema.
Supremo em honra — Salmo 95
O salmista agora não consegue se conter. Ele afirma no v. 3 que “o
Senhor é Deus grande, Rei grande sobre todos os deuses”. Sua posição é uma de suprema honra! Se este é o caso, então certamente uma
das coisas que deve resultar desta honra é adoração. Portanto não nos
surpreende descobrir que há um chamado para adorar, e o v. 6 diz: “Ó,
vinde, adoremos e prostremo-nos; ajoelhemos diante do Senhor que
nos criou”. O chamado para louvar é inequívoco. Há um duplo chamado no v. 1: “cantemos” e “jubilemos”. Haverá um apelo para que outros
cantem, no início do Salmo 96, mas certamente seria inapropriado fazer
este apelo a outros sem primeiramente acatarem, eles mesmos, a ideia.
Muitos têm procurado estabelecer sua autoridade, mas sem as qualificações necessárias. O Rei indicado aqui é aquele que está sobre todos.
1
Outro nome para o livro dos Salmos (N. do E.).
A supremacia do Seu reino 189
Não há possibilidade da Sua honra ser sobrepujada. O Seu Reino será
um reino de honra suprema.
Quando Sua grandeza é reconhecida, então a pequenez do Seu
povo certamente é identificada. Há o reconhecimento de que somos
simplesmente “povo do Seu pasto e ovelhas da Sua mão” (v. 7).
Há, todavia, uma advertência. Na passagem parentética de 7b-11, o
salmista apela, de passagem, à história da nação e lhes indica a terrível
possibilidade de deixarem de apreciar o significado pleno e a honra devida àquele que está sobre o trono. Isto resultaria em cessarem de trazer
adoração apropriada a Ele e não entrarem no repouso. Houve provocação e tentação no deserto; Meribá e Massá foram provadas no passado
pela nação. O Senhor ficara desgostoso com aquela geração. O apelo
certamente é o oposto. Deveria haver cuidado para que as mesmas coisas não caracterizassem aquela próxima geração e, certamente, não nos
caracterizem hoje. O escritor aos Hebreus usa esta passagem de uma
maneira prática e muito poderosa para apelar aos leitores dos seus dias
para que não deixassem de entrar no repouso (cessação do trabalho) e
desfrutassem a plenitude das bênçãos da Cristandade.
Supremo em justiça — Salmo 96
Este Salmo apresenta a justiça, um fato que é indicado nas suas palavras finais, onde está escrito: “Julgará o mundo com justiça e os povos
com a Sua verdade”. Este é o clímax ao qual o Salmo estava se dirigindo,
com os versículos anteriores indicando as características que hão de distinguir o reino por causa da justiça que está imperando.
Não nos surpreende, portanto, que o Salmo inicie com um triplo
chamado a cantar. Em cada caso a exortação é: “Cantai ao Senhor”.
Nesta ocasião, entretanto, não é um apelo comum entre o povo, como
no Salmo 95:1, mas um apelo a outros para se juntarem ao remanescente e cantar um “cântico novo”. O novo cântico está, sem dúvida, associado com um novo dia, um novo reino e um novo Rei, e como a justiça é
o normal, o povo se torna um povo adorador.
Entretanto, razões detalhadas são dadas, do v. 4 em diante, indicando que “grande é o Senhor e digno de louvor”. As belezas ligadas com a
justiça são indicadas no v. 6, onde “glória (honra) e majestade estão ante
a Sua face, força e formosura no Seu santuário”.
190
A glória do Filho
É apropriado que o apelo triplo para cantar ao Senhor, nos vs. 1-2,
seja seguido por um apelo triplo para “dar ao Senhor”, nos vs. 7-8. O
aspecto mais elevado do “dar” é a adoração, e assim o apelo tem o seu
clímax no v. 9: “Adorai ao Senhor na beleza de santidade; tremei diante
dEle toda a terra”. As circunstâncias da justiça são supremas e isto os
leva a cantar, dar e adorar — o ambiente quase parece estar vibrando
com a reação irrestrita à grandeza do Soberano.
Mas há mais. Adorar ao Senhor na beleza da santidade pode ser
visto de duas formas. Pode tanto estar indicando a maneira como a
adoração é apresentada, ou o lugar onde é oferecida. A razão por dizer
isto é que uma leitura alternativa do versículo é adorar ao Senhor “no
glorioso santuário”. Independentemente de qual tradução for aceita, o
efeito é o mesmo; temor reverente é o resultado e é provado universalmente. Tudo isso espelha, de uma maneira linda, o Salmo 29:1-2, que
nos apresenta as circunstâncias nas quais “o Senhor se assenta como Rei,
perpetuamente” (Sl 29:10).
A Criação toda (no final do Salmo) é incluída e encorajada a desfrutar o reino magnificente do Rei justo. Os Céus se alegram, a Terra
se regozija, o mar ruge, o campo está jubiloso e as árvores do campo se
regozijam. Nunca antes houve tal ambiente onde toda a Criação está
em sintonia com o seu Criador, apreciando a maravilha do Seu governo
justo.
Estas ideias são refletidas em outras partes das Escrituras. Justiça
será o cinto dos Seus lombos, as palavras da Sua boca, a base do Seu governo e, de fato, o próprio ar que é respirado. Isto tudo antecipa aquele
dia futuro que Pedro descreve (o dia de Deus) quando, nos novos Céus
e na nova Terra, a justiça habitará permanentemente (II Pe 3:13).
Supremo em alegria — Salmo 97
Esta alegria indicada no Salmo é novamente vista no versículo final,
onde temos a seguinte exortação: “Alegrai-vos no Senhor”. Há também
uma ligação muito interessante com o que veio imediatamente antes,
pois o apelo é: “Alegrai-vos, ó justos” (v. 12). A justiça do Salmo anterior sem dúvida forneceu a base para o gozo do presente. Alegria é
o resultado automático de paz e, com certeza, onde há justiça há paz.
“A justiça e a paz se beijaram” (Sl 85:10). Elas estão inseparavelmente
A supremacia do Seu reino 191
ligadas, como o escritor aos Hebreus indica, pois foram características
vistas em Melquisedeque, que foi “primeiramente … rei de justiça e
depois também … rei de paz” (Hb 7:2). É simplesmente impossível
ter uma sem a outra; justiça sempre resulta em paz, e paz é sempre o
resultado de justiça. Este Salmo indica que onde isto acontece, então
inevitavelmente a alegria segue. O corolário também é verdade — onde
não há justiça, não há paz e não pode haver alegria.
Vemos regozijo tanto no início como no final do Salmo. Começa no v. 1: “O Senhor reina; regozije-se a terra”, e conclui no v. 12:
“Alegrai-vos, ó justos, no SENHOR, e daí louvores à memória da Sua
santidade”.
Alguém pode estar curioso por saber por que, nos vs. 1-5, temos
um ambiente de escuridão, fogo abrasador e relâmpago. Não é difícil
encontrar a resposta. Se houver regozijo como resultado da justiça, então o castigo precisa ser imposto sobre os inimigos “em redor”; e tudo o
que se opõe à justiça precisa ser removido para sempre. Até os ídolos são
chamados para “prostrar-se diante dEle”. A conclusão é que todos que
estão ligados à idolatria devem voltar-se dos seus caminhos e reconhecer o verdadeiro Rei, que reina com justiça sobre o trono. Certamente o
Seu próprio povo há de apreciar o Seu reino, já que “os filhos de Judá” se
alegram por causa do juízo executado pelo justo Soberano.
À luz de tudo que veio antes, um apelo é feito no v. 10 a “vós que
amais ao Senhor”; estes devem “odiar o mal”. É interessante a frequência com que, nas Escrituras, o amor e o ódio estão juntos. A passagem
mais conhecida é aquela do Salmo 45, onde o Rei que se assenta supremo ama a justiça e odeia a impiedade.
Há um pensamento que corresponde lindamente com isso no v. 11,
onde é dito que “a luz semeia-se para o justo, e a alegria para os retos de
coração”. É evidente que o justo Soberano irá trazer alegria e satisfação,
onde anteriormente perseguição e oposição eram conhecidas por causa
de fidelidade ao Rei.
Supremo em louvor — Salmo 98
Certamente não nos surpreende que Aquele que é supremo em
justiça e que traz suprema alegria seja o alvo do louvor do Seu povo.
Assim o salmista diz no v. 4: “Exultai no Senhor toda a terra; exclamai e
192
A glória do Filho
alegrai-vos de prazer, e cantai louvores”. Novamente é um novo cântico
que está em vista, de acordo com o v. 1, porque “Ele fez maravilhas”. O
novo cântico está, sem dúvida, ligado ao novo Reino, ao reinado milenar, e a tudo que foi realizado pela “Sua destra e o Seu braço santo”. A
vitória sobre o inimigo foi obtida pela destra e o braço santo; em relação
ao Seu próprio povo, Ele “lembrou-Se da Sua benignidade e da Sua
verdade para com a casa de Israel” (v. 3).
Não é de se admirar, portanto, que temos o chamado para louvar,
e que a exortação é feita para “todo o universo”. O v. 4 diz: “Exultai no
Senhor toda a terra; exclamai e alegrai-vos de prazer, e cantai louvores”.
Aquele que é alvo deste louvor é o próprio Senhor — o Monarca reinante.
O salmista não se contenta com o seu louvor solitário. Ele quer
que a Criação também se una a ele e, em especial, tudo o que a Criação
contém. Assim, a Criação de Deus é convocada para que o salmista não
esteja louvando sozinho, mas que o mar, o mundo e os próprios rios
batam palmas e que as montanhas também se regozijem.
Como já vimos é interessante a frequência com que a Criação é
chamada para entrar em harmonia com seu Criador, nos Salmos. O
Salmista está antecipando que aqueles que habitam na Criação estarão
associados com o chamado, e trarão os seus louvores ao Rei que está
sobre o trono.
Não é a primeira vez que a Criação e seu Criador estão em sintonia.
Por ocasião do nascimento do Senhor Jesus Cristo, uma cena noturna
foi transformada pelo resplendor de “glória do Senhor”, brilhando e envolvendo os pastores (Lc 2:9). Os pastores ficaram admirados ao verem
a visão e ouvirem uma voz tal como nunca tinham ouvido. O Criador
havia entrado na Sua Criação, e ela não pôde ficar indiferente. Contudo,
as circunstâncias foram invertidas no Calvário. Agora era meio-dia, mas
se transformou em meia-noite! O Sol não mais podia brilhar, apesar
de estar no seu zênite; houve trevas sobre toda a Terra por três longas
horas. A Criação novamente estava em sintonia com o seu Criador. Foi
durante aquela escuridão impenetrável que o mistério de expiação foi
realizado; quando o Senhor Jesus estava “sendo feito pecado por nós”.
Nenhum olho humano podia devassar a cena; nenhuma mente humana
compreendê-la na sua plenitude. A Criação encobriu as circunstâncias
com trevas, em total harmonia com as atividades do Criador.
A supremacia do Seu reino 193
Supremo em adoração — Salmo 99
Duas vezes seguidas neste Salmo a ideia de adoração é enfatizada.
No v. 5 a exortação é para exaltar: “Exaltai ao Senhor nosso Deus, e
prostrai-vos diante do escabelo de Seus pés, pois é Santo”. No v. 9 há
uma expressão semelhante: “Exaltai ao Senhor nosso Deus e adorai-O no Seu monte santo, pois o Senhor nosso Deus é santo”. Assim, a
adoração é vista como o objetivo primordial do Salmo, e com certeza é
apropriado que ele esteja ligado com o reinado do Rei. As palavras iniciais do Salmo são, novamente, aquelas que já vimos anteriormente: “O
Senhor reina”. A própria posição do Senhor, mencionada no v. 1, indica
que deve haver adoração: “Ele está assentado entre os querubins”. Estes
seres ímpares estavam associados com o jardim do Éden, com o flanquear e a administração do trono de Deus, e certamente profundamente
associados com a Arca do Concerto. Seja qual fora seu significado específico, há uma indicação clara de que agora Jeová está no meio do Seu
povo, desejando que Sua presença seja reconhecida e que a reverência
associada à Sua presença seja vista sobre a Terra milenar. Por certo só
pode haver uma reação à Sua presença entre o Seu povo, e esta tem que
ser adoração. Afinal, Ele é “grande” (v. 2), Ele é “mais alto que todos os
povos” (v. 2); e Ele é “santo” (v. 5, 9). A reação do Seu povo a um Rei tão
exaltado deve ser automática. Não nos surpreende que equidade e justiça sejam os fatores correspondentes que caracterizam a Sua atividade, e,
portanto, exigem uma reação apropriada.
Isto aconteceu no passado com pessoas como Moisés, Arão e Samuel (v. 6). Eles clamaram e Ele lhes respondeu. Eles foram adequadamente guiados e ajudados no deserto. Não haveria o Monarca reinante
de tratar apropriadamente com o Seu povo e trazê-los às bênçãos do
Seu reino, fazendo com que se prostrassem e adorassem diante do escabelo dos Seus pés?
Certamente será naquele tempo que a verdade de Malaquias 1:11
será implementada: “Desde o nascente do sol até o poente é grande
entre os gentios o Meu nome; e em todo o lugar se oferecerá ao Meu
nome incenso, e uma oferta pura; porque o Meu nome é grande entre
os gentios, diz o Senhor dos Exércitos”. Três vezes seguidas neste versículo, temos uma referência ao “Meu nome”, indicando a auto revelação
da Sua Pessoa! Isto há de produzir adoração universal naquele futuro
reino milenar.
194
A glória do Filho
Supremo em bondade —Salmo 100
O último versículo do Salmo sugere o título. Diz: “O Senhor é
bom”. A palavra bom pode ser traduzida de diversas maneiras. Algumas
vezes quer dizer beleza, formosura, favor, alegria, riqueza ou preciosidade. Fica claro, em razão de tudo que já vimos, que todas estas coisas
vão caracterizar o reino vindouro, e serão todas vistas na sua plenitude!
Porém, o fato do Senhor ser bom, e que bondade pura será o ambiente
do Seu reinado, é algo tão diferente do que se conhece hoje. É interessante também que Sua bondade está ligada com misericórdia e verdade,
ambas as quais são descritas como eternas, ou durando de geração em
geração.
Com base na Sua bondade há um apelo, feito agora não somente
à terra de Israel, mas a todas as terras (v. 1), para servir ao Senhor com
alegria, e vir à Sua presença com cânticos. O apelo é agora muito mais
amplo; está se tornando universal no seu alcance.
O quadro é muito interessante. Obviamente, a partir do v. 3, aquele
que está assim assentado em bondade sobre o Seu trono é também um
Pastor. Nós somos o Seu povo (v. 3), e ovelhas do Seu pasto. Tendo
experimentado algo da bondade do Pastor, as ovelhas se tornam adoradores peregrinos, e entram pelas Suas portas com ações de graças, e nos
Seus átrios com louvor. O Seu nome se torna o tema de bênção e o Seu
povo os receptores da Sua misericórdia.
É uma conclusão apropriada ao Salmo o chamado para servir, vir,
cantar, agradecer e bendizer. Tudo isso, certamente é muito apropriado
no contexto da bondade do Seu reinado.
Supremo em ordem —­Salmo 101
Com certeza este é um clímax apropriado para o grupo de Salmos
(o “pequeno livro”), que temos considerado. O Reino é agora comandado em sintonia com o caráter do Rei. De fato, Bellet comenta de
modo muito esclarecedor, que este Salmo é um clímax apropriado para
“o pequeno e perfeito volume composto dos Salmos 92-101”. Ele diz:
“O próprio Messias o abre e o encerra. No início, Ele prevê a Sua
unção para o reinado, ou a exaltação do Seu poder. No final, Ele
declara como há de ordenar o Seu reinado. E nesse meio tempo
o Seu Israel tem ensaiado suas antecipações do reinado na sua
195
A supremacia do Seu reino retidão judicial e bem-aventurança final. Ó que tivéssemos mais
concórdia com tudo isso nos nossos corações! Ó que estivéssemos
‘afinando nossos instrumentos junto à porta’ — harmonizando
cada vez mais os nossos corações com as alegrias deste reino vindouro! Que possamos velar e orar por uma mente assim, e sermos
habilidosos nos cânticos do Senhor!”
Assim o Rei vindouro é ouvido. Ele cantará de misericórdia e juízo. Ele se conduzirá sabiamente; andará na Sua casa com um coração
perfeito. A impiedade será removida, os soberbos não mais estarão presentes; os caluniadores serão cortados e os fiéis da Terra, em contraste,
juntamente com aqueles que andam num caminho perfeito, estarão servindo com o Senhor. Um Reino ordeiro e em perfeito equilíbrio, serão
as características marcantes daquele dia final.
Conclusão
Tem sido um prazer considerar a supremacia do Seu reino. Será um
reino supremo em repouso, em majestade, em juízo, em honra, em justiça, em alegria, em louvor, em adoração, em bondade e em ordem. Nada
parecido com isto já se viu antes. A beleza desta cena será incomparável.
O paraíso de Deus será reestabelecido. O gozo do Éden será novamente
conhecido. O Justo soberano estará sobre o trono; Seu povo estará sujeito a Ele; sobre Seus ombros estará o governo, e novamente a Criação
estará em harmonia com Seu Criador! A linguagem de Isaías 9:7 se tornará realidade: “Do aumento deste principado e da paz não haverá fim,
sobre o trono de Davi e no seu reino, para o firmar e fortificar com juízo
e com justiça, desde agora e para sempre; o zelo do Senhor dos Exércitos fará isto”. Assim, o reino será próspero, pacífico, poderoso, perfeito
e permanente. Diferentemente dos reinos passageiros dos homens, o
Seu domínio nunca terá fim. A Pedra de Daniel 2, que vai despedaçar a
estátua, se tornará numa grande montanha que encherá toda a Terra. O
reino que o Deus do Céu estabelecerá jamais será destruído, antes quebrará em pedaços e consumirá todos os outros domínios, e permanecerá
para todo o sempre (Dn 2:24).
A glória do Filho será evidenciada na supremacia do Seu reino.
Todo joelho se dobrará perante Ele, e toda língua confessará que “Jesus
Cristo é o Senhor, para glória de Deus Pai” (Fp 2:10-11).
Cap. 13 — A solenidade
dos Seus julgamentos
por S. J. McBride, Irlanda do Norte
Introdução
Esta publicação está apresentando verdades gloriosas relacionadas
à Pessoa do nosso Senhor Jesus, e assim, este capítulo irá se concentrar
nos Seus julgamentos. Entretanto, estaria incompleto, sem que primeiro nos lembrássemos do total alcance dos juízos apresentados nas Escrituras. Qualquer consideração da solene doutrina dos juízos divinos
precisa, sendo coerente e Bíblica, refletir uma apreensão da verdade dispensacional. Isto ajudará a evitar os equívocos que tanto prevalecem no
cristianismo, manifestamente o de reunir todas as cenas futuras de juízos nas Escrituras em um único “juízo final”, onde todos os humanos de
todas as eras serão julgados. Ensino dispensacional sobre estas questões
tem sido uma característica distinta das igrejas locais por mais de cento
e setenta anos. Agora, como nunca, esta verdade precisa ser novamente
enfatizada a uma nova geração.
Juízo: uma doutrina fundamental
É importante notar a importância que as Escrituras dão à doutrina
do Juízo de Deus. É parte da “espinha dorsal”, e não algo que possa ser
considerado como um elemento não essencial ou marginal da doutrina.
Hebreus 6 inclui a doutrina do “juízo eterno” como um ensino fundamental, parte dos “rudimentos” da doutrina de Cristo. Paulo, ao falar
sobre o Evangelho com Félix, o governador, estruturou seu diálogo sob
três cabeçalhos: pecado, justiça e juízo vindouro. Seria muito interessante se pudéssemos ter acesso a uma reprodução daquele encontro, mas
Deus decidiu reter maiores detalhes, uma vez que já deveríamos saber
o suficiente acerca destas doutrinas através de outras partes das Escrituras. Félix tremeu. Esta foi uma medida do impacto do argumento de
Paulo sobre estes assuntos. Todavia, poder na pregação não é garantia
de aceitação do Evangelho pelo pecador. Félix não se arrependeu nem
creu, antes, ele procrastinou (At 24:24-27). O pregador do Evangelho
hoje precisa ter uma boa apreensão da doutrina do juízo vindouro, e
vê-la como integral a uma apresentação balanceada da mensagem do
Evangelho.
A solenidade dos Seus julgamentos
197
Juízo na era presente
Seria bom mencionar agora a afirmação de W. W. Fereday: “Graça
e longanimidade caracterizam os procedimentos divinos na era presente; o juízo será a característica das eras vindouras”1. A dispensação da
graça, algumas vezes chamada de “Era da Igreja”, é caracterizada pela
retenção dos juízos de Deus e pela promulgação do Evangelho da graça
de Deus. A saída da Igreja do mundo (no Arrebatamento) terminará com esta obstrução exercida pela Igreja e pelo Espírito Santo, que
impedem o surgimento do Homem do Pecado (II Ts 2:7). Atividade
divina em juízo será dominante em todos os procedimentos de Deus
com o mundo depois disto.
Não obstante, é salutar destacar o fato que o juízo de Deus não está
ausente na era presente. Ele opera em duas esferas: na igreja (isto é, a
igreja local), e no mundo. O NT deixa claro que há, na igreja de Deus,
uma responsabilidade de executar juízo quando este se torna necessário. De outra forma, pode sobrevir intervenção divina em juízo. Paulo
repreendeu os coríntios por causa da sua lentidão em executar o juízo
que deveriam ter feito.
Podemos imaginar que, em sua defesa, alguns dos coríntios poderiam ter dito: “Ah, mas nós relutamos em julgar. As Escrituras não
dizem que não devemos julgar para que não sejamos julgados? E também, não fomos ensinados que não devemos ser os primeiros a atirar
uma pedra contra o acusado?” Tais sentimentos são conhecidos na vida
da igreja contemporânea, e é comum recuar diante da responsabilidade
de manter a prática das Escrituras e a disciplina na cultura moderna
de “abraçar tudo e julgar nada”, que permeia e invade o Cristianismo
evangélico.
Mas o NT é muito claro. Há certas questões inescapáveis que as
igrejas em geral, e anciãos, especificamente, enfrentam. Nenhuma destas questões é nova, e todas podem ser identificadas nas epístolas e nos
Atos dos Apóstolos. Entretanto, a complexidade exata dos problemas
tende a variar de época para época, de modo que a história não se repete
exatamente igual. Todavia, a mesma diligência prática e fidelidade aos
padrões da Palavra de Deus são exigidas dos santos contemporâneos se
1 Fereday, W. W. Artigo Judgment em Faith and its Foundations. Glasgow, Pickering &
Inglis, s/d.
198
A glória do Filho
o testemunho em nosso país vai sobreviver nas gerações futuras.
Mesmo um ato tão sério de disciplina pela igreja como a excomunhão de um dos seus membros, é visto como um ato de juízo, e juízo
que leva a aprovação divina. Paulo informa os coríntios que ele já havia
julgado o homem (o fornicário) como se estivesse presente. Ele apela à
igreja em Corinto para ratificar seu julgamento pela implementação da
disciplina. Deixar de fazê-lo traria desgraça sobre o testemunho entre
os não salvos e tornaria a igreja sujeita a intervenção direta de Deus, em
juízo.
Durante a era da Igreja, no mundo dos negócios humanos, o juízo
de Deus não está ausente, embora Sua maneira de lidar com os homens
seja predominantemente em graça e misericórdia. Por exemplo, é evidente que a degradação da sociedade, retratada em Romanos 1, é um retrato atualizado do juízo de Deus. Durante a Segunda Guerra Mundial,
o Sr. Harry Lacey1 escreveu um fascinante livro, “Deus e as Nações”, no
qual esboçou princípios Bíblicos, ilustrando a contínua atividade soberana de Deus desde os dias do Velho Testamento até agora, mostrando
que Deus ainda julga e reina sobre as nações. O Sr. Lacey menciona o
“domínio da providência e governo moral no qual Deus, através das
circunstâncias, domina de um modo aparentemente indireto …”2.
O juízo de Deus: passado
O juízo é inevitável. Cada ser humano tem que enfrentar o juízo divino. Esta não é uma verdade bem-vinda, e geralmente é acolhida com
zombaria3. Ainda assim, é evidente que Deus há de julgar o mundo (At
17:31), as nações ( Jl 3:12) e até mesmo os anjos (II Pe 2:4). Avaliação
individual é um aspecto essencial do juízo de Deus, independentemente
de qualquer aspecto corporativo relacionado a entidades nacionais ou
coletivas.
O juízo de Deus pode ser considerado como passado, presente e
futuro. A ênfase principal deste artigo é o juízo futuro, mas vale a pena
notar algo daquilo que as Sagradas Escrituras dizem sobre juízo passado e presente.
1
2
3
Lacey, H. God and the Nations. 2ª edição, John Ritchie Ltda, 1944.
Ibid., pág. 13.
Jó 22:13; Sl 50 e Ec. 12.
A solenidade dos Seus julgamentos
199
Aqueles que são salvos podem desfrutar da bendita realidade que
para eles o juízo é passado. A questão do juízo divino contra o nosso
pecado está encerrada; a penalidade foi sofrida por outro, e nós estamos livres. Não entraremos “em condenação [juízo], mas [passamos] da
morte para a vida” ( Jo 5:24).
O descrente, entretanto, é visto como já tendo sido julgado. João
3:18 registra: “quem crê nEle não é condenado; mas quem não crê já
está condenado, porquanto não crê no nome do Unigênito Filho de
Deus”. O tempo verbal deste versículo expressa tanto o sentido passado
de julgamento já executado, quanto sua presente continuidade: “a ira de
Deus sobre ele permanece”.
Assim, o fato solene que o pregador do Evangelho destaca no seu
ministério fiel é a terrível divisão1 entre aqueles que são salvos e aqueles
que perecem (I Co 1:18). Para os salvos, os pregadores são um cheiro de
vida para a vida, e para aqueles que perecem um cheiro de morte para
a morte. Não nos admira que Paulo dissesse: “Sabendo o temor que se
deve ao Senhor, persuadimos os homens à fé” (II Co 5:11)2.
O juízo de Deus: futuro
Três grandes cenas de julgamento ainda irão acontecer. Em ordem
cronológica, são:
• O Tribunal de Cristo;
• O julgamento das nações vivas e de Israel;
• O Grande Trono Branco.
Além destas, iremos considerar a Grande Tribulação como um
tempo de juízo de Deus.
O Juiz já foi designado e Sua identidade publicada. Todo o juízo foi
confiado ao Filho de Deus, e Sua ressurreição é a garantia de Deus ao
mundo de que o Senhor Jesus há de exercer Seu papel de Juiz ( Jo 5:22;
1
Este tem sido, há muito, um aspecto notável da pregação entre as igrejas que procuram
manter o padrão do NT. Muito do Cristianismo tem ofuscado esta distinção clara entre
os dois grupos de ouvintes. Que sejamos cuidadosos e nos apeguemos ao exemplo
Apostólico.
2 Esta referência ao temor do Senhor está no contexto imediato do Julgamento do
Tribunal de Cristo.
200
A glória do Filho
At 17:30-31).
Princípios do juízo de Deus
Alguns dos grandes princípios básicos, comuns a todos os juízos de
Deus são:
• Todo juízo de Deus é reto em todo detalhe. Uma das primeiras
menções de juízo divino é a sábia censura de Abraão: “Não faria
justiça o juiz de toda a terra?” (Gn 18:25)1;
• A justiça é frequentemente atribuída ao Juízo de Deus:
Ela é segundo a verdade (Rm 2:2);
Não há acepção de pessoas (Rm 2:11), e isto é igualmente verdade
em relação ao Tribunal de Cristo (Cl 3:25);
Todos os segredos serão descobertos (Ec 12:14; I Co 4:5);
Obras serão reveladas conforme os registros de Deus (Sl 50:21;
Dn 7:10; Ap 20:12);
Não haverá nada que poderá ser dito pelos réus. Eles serão convencidos (I Sm 2:9; Jd 15).
O Tribunal de Cristo
Trata-se da avaliação final dos santos da era presente, excluindo os
santos do Velho Testamento. As duas passagens que contém o termo “o
Tribunal de Cristo” são Romanos 14:10 e II Coríntios 5:10. Geralmente vemos que a palavra grega bema é usada para este julgamento. Isto
porque bema é a palavra grega para “tribunal”, e se refere a um tipo de
plataforma onde o juiz se assentava nos tempos de Roma, tanto para
julgar um caso (At 18:12) como para presidir sobre grandes competições atléticas, para avaliar os prêmios dos competidores. Esta associação
com os jogos atléticos e as exigências para os participantes obedecerem
às regras; a necessidade de dedicação e disciplina na preparação; a persistência para perseverar até ao fim, tudo isso é usado pelo apóstolo Paulo, figurativamente, nas suas exortações aos cristãos no que diz respeito
à conduta das nossas vidas à luz da nossa futura avaliação e recompensa.
O Tribunal de Cristo ocorrerá logo após o Arrebatamento, pois
1 É triste que a simples confiança de Abraão na retidão do tratamento de Deus com
Sodoma e Gomorra seja hoje taxada de incorreta pelos teólogos liberais, inclusive por
muitos progressistas evangélicos, assim chamados.
A solenidade dos Seus julgamentos
201
Paulo diz: “Portanto, nada julgueis antes do tempo, até que o Senhor
venha” (I Co 4:5). Tiago nos lembra da iminência deste evento: “Eis que
o Juiz está à porta” (Tg 5:9). A Igreja aparece em público como a Noiva
glorificada de Cristo, em Apocalipse 19:8, por ocasião do Seu retorno
triunfante à Terra para vencer Seus inimigos, libertar Israel e dar início
ao Seu governo milenar. Todas as recompensas já foram entregues, a
maravilhosa apresentação da Noiva imaculada já se deu no Céu, e o
mundo verá o resultado glorioso do amor de Cristo pela Igreja, e a
admiração de todos será evidente (compare Ef 5:27; Cl 3:4, II Ts 1:10).
Sabemos que “agora nenhuma condenação há para os que estão em
Cristo Jesus” (Rm 8:1); logo, o julgamento futuro dos cristãos tem a ver
com uma prestação de contas a Deus pelo nosso serviço e vida para Ele.
“Cada um de nós dará conta de si mesmo a Deus” (Rm 14:12).
Algumas questões avaliadas no Bema
A conduta na igreja local
“Obedecei a vossos pastores, e sujeitai-vos a eles; porque velam por vossas
almas, como aqueles que hão de dar conta delas; para que o façam com alegria
e não gemendo, porque isso não vos seria útil” (Hb 13:17).
Os anciãos têm uma responsabilidade árdua — velar pelas almas
que estão sob os seus cuidados na igreja. Isso nada tem a ver com ser
intruso ou curioso, e nunca se associará com fofoca. Antes, tem a ver
com sua responsabilidade, dada por Deus, de levar adiante a obra que
lhes foi confiada por Ele. O sucesso desse ministério de supervisão será
acompanhado de gozo na grande prestação de contas; mas seu fracasso
será caracterizado por tristeza. Entretanto, a advertência deste versículo
não é somente para os pastores, mas também ao restante da igreja, já
que uma prestação de contas dos anciãos que causa tristeza, “não vos
seria útil [proveitoso]”. Isto indica a possibilidade de uma avaliação negativa no Tribunal, ou alguma outra perda de recompensa para aqueles
que deixam se seguir a orientação piedosa destes pastores conscienciosos. A expressão “os que vos governam” (Hb 13:7, 17; VB) indica, principalmente, aqueles que são vossos “líderes” ou “guias”. Corresponde,
obviamente, com a característica de pastor dos anciãos, manifestada no
seu cuidado e preocupação pelas ovelhas e na sua responsabilidade de
procurar pastagens apropriadas, e de guiar o rebanho a elas, e ao mesmo
202
A glória do Filho
tempo garantir a sua segurança contra ameaças externas1. Este pensamento deveria transmitir uma nota de solenidade a tudo que é feito em
cada igreja local, além de encorajar os cristãos na comunhão da igreja
a seguir o exemplo piedoso de uma geração anterior de ensinadores
e líderes, cujas vidas foram caracterizadas por fidelidade à Palavra de
Deus. Igualmente deveria motivar os anciãos e as congregações, a evitar
inovações não bíblicas na adoração e no serviço — uma ameaça recorrente contra o nosso dever de manter fidelidade aos padrões do Novo
Testamento entre as igrejas, nos nossos dias.
Nossa atividade na igreja local, ao edificarmos sobre o fundamento
apostólico, requer o mais rigoroso cuidado à luz do Tribunal de Cristo
(veja I Co 3:10-17), pois todos os nossos esforços em assim edificar serão testados pelo fogo que “provará qual seja a obra de cada um”. O consumir do trabalho do homem resultará em detrimento, mas sua salvação
não é posta em dúvida: “o tal será salvo, todavia como pelo fogo”. Uma
recompensa (não especificada aqui) aguarda aqueles cuja obra suportar
esta prova de fogo. A frase no v. 13, “o dia a declarará”, se refere ao mesmo dia pelo qual Paulo ansiava em II Timóteo 4:8, que fala da coroa
da justiça que “o Senhor, justo Juiz, me dará naquele dia”. Novamente é
óbvio que o valor dado por Deus ao testemunho da igreja local é algo a
que deveríamos dar mais atenção, pois os incentivos e advertências são
tão solenes e importantes.
Deveres durante a vida
Todos os relacionamentos, e nossos deveres nesse sentido, serão
avaliados e recompensados. Em Colossenses 3:17 lemos: “[tudo] quanto fizerdes por palavras ou por obras”, e isto é muito abrangente. O versículo continua dizendo: “fazei tudo em nome do Senhor Jesus”, e devemos fazer isto fervorosamente. Entretanto, o significado de Colossenses
3:17 não é deixado como uma exortação abrangente e geral. Exemplos
específicos são dados. As áreas da nossa vida que estão incluídas são
os relacionamentos conjugais, de pais e filhos e de mestre e servos. A
promessa de recompensa é acrescentada: “Sabendo que recebereis do
Senhor o galardão da herança, porque a Cristo, o Senhor, servis”. O
versículo seguinte é muito solene, e sugere a possibilidade de perda no
Tribunal de Cristo: “Mas quem fizer agravo receberá o agravo que fizer;
1
I Pe 5:14 também trata da recompensa para os pastores; veja abaixo.
A solenidade dos Seus julgamentos
203
pois não há acepção de pessoas” (Cl 3:24-25). Alguns séculos atrás parecia haver, por parte de escritores piedosos e comentaristas, uma grande ênfase ao tema do dever cristão e da nossa obrigação de cumprir
todos os nossos diversos deveres, de maneira conscienciosa, perante o
Senhor. Talvez estejamos em falta, hoje em dia, quanto a este tema em
ministério, que certamente é muito necessário num dia quando o prazer
individual é mais valorizado do que o dever — como testifica eloquentemente a tendência de colapso em tantas áreas de relacionamento.
Julgar ou andar em amor?
Romanos 14:1-15:7, que é uma das principais passagens que tratam
do Tribunal de Cristo, tem como pano de fundo uma possível manifestação de contenda e atrito causada por questões tais como o comer
carne e a observação de certos dias, etc. As duas principais posições
representadas são o “irmão fraco” e “nós que somos fortes”. O espaço
impede uma consideração detalhada desta passagem, mas devemos notar as instruções dadas, pois isto poderá produzir um equilíbrio na nossa
atitude e conduta para com nossos irmãos em Cristo, que é aceitável
diante de Deus (v. 18). Devemos evitar o perigo de julgar um ao outro — algo a que o irmão fraco com seus escrúpulos é especificamente
propenso, e ao mesmo tempo evitar um perigo semelhante, o de desprezar ou desconsiderar o irmão fraco. Não devemos contristar um irmão
— isto não seria andar em amor — nem devemos fazê-lo tropeçar. O
exemplo de Cristo é apresentado em 15:3: aquele que não agradou a
Si mesmo. Paulo finaliza esta seção de Romanos com a oração: “Ora, o
Deus de paciência e consolação vos conceda o mesmo sentimento uns
para com os outros, segundo Cristo Jesus. Para que concordes, a uma
boca, glorifiqueis ao Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo” (15:5-6).
A passagem inteira induz um exame do coração em relação à nossa conduta para com os outros cristãos, que certamente será avaliada e julgada.
Aprovado ou reprovado?
Paulo descreve a diligência e autodisciplina dos competidores nos
jogos gregos, e destaca que eles faziam tudo isso para obter uma coroa
corruptível — uma mera coroa de louros1 (I Co 9:25). “Nós, porém, uma
incorruptível”, diz ele, mostrando que muito maior cuidado e dedicação
1
A figura da corrida de resistência é usada também para encorajar crentes em conflito
em Hb 13:1-13 — figuras tipicamente Paulinas.
204
A glória do Filho
são realmente bem empregados no serviço do Senhor Jesus Cristo. Ele
tinha como alvo ser aprovado, e não desqualificado (reprovado). Linguagem semelhante é usada em I Coríntios 13:7, onde Paulo apela aos
coríntios em relação à sua conduta à luz do Bema1: “Ora, eu rogo a Deus
que não façais mal algum; não para que sejamos achados aprovados, mas
para que vós façais o bem, embora nós sejamos reprovados”. Aqui ele
mostra que sua motivação é, sobretudo, no sentido de que a coisa certa
fosse feita por ser feita, mais do que meramente pela recompensa futura
que ele espera pelos bons resultados provindos do seu ministério, como
demonstrado pela boa conduta da igreja em Corinto.
Despenseiro, I Coríntios 4:1-5
Paulo retrata a si e aos seus cooperadores como ministros de Cristo
e despenseiros dos mistérios de Deus. Nesta passagem Paulo enfatiza
como ele considera irrelevante que os outros cristãos (no caso, os coríntios) se ocupem em julgá-lo no seu serviço. De fato, ele recusa até
mesmo julgar-se a si mesmo nestas coisas, já que o dia da avaliação
se aproxima, e isto é o que importa. Estas duas palavras, “ministros”2
e “despenseiros”3, transmitem o pensamento de serviço que envolve
responsabilidade delegada para promover as atividades do Mestre, reconhecendo que haverá uma prestação de contas e uma avaliação do
serviço prestado. Assim a fidelidade é enfatizada como um atributo
chave de tal servo, especialmente lembrando que o despenseiro tinha a
responsabilidade de administrar a casa na ausência do seu senhor. Cada
servo será avaliado, individualmente, e cada um receberá de Deus o louvor (v. 5). Mas a avaliação será extremamente detalhada. Coisas ocultas
serão trazidas à luz, e os conselhos dos corações serão manifestos. Assim, cabe ao servo de Deus evitar todos os estratagemas administrativos
de sabedoria mundana, e os axiomas tão comuns dos políticos. A ideia
de que “o fim justifica os meios” não combina com a compreensão de
1
2
3
Embora o Tribunal de Cristo não seja especificamente mencionado, está claramente
em vista.
Huperetes: usada do ministro na sinagoga (Lc 4:20), de oficiais de segurança (At 5:26),
de João Marcos como assistente de Paulo e Barnabé (At 13:5), dos primeiros portadores do testemunho cristão acerca do Senhor Jesus (Lc 1:2) e do papel de Paulo como
comissionado pessoalmente pelo Senhor ressurrecto (At 26:16).
Okinomos: usada acerca de um mordomo (Lc 12:42; 16:1), um administrador municipal
(Rm 16:23), e assim, de ministério cristão (I Co 4:1-2; I Pe 4:10) e dos presbíteros na igreja
(Tt 1:7).
A solenidade dos Seus julgamentos
205
Paulo de serviço cristão.
A recompensa
A recompensa futura, ou galardão, é nos apresentada como algo
que devemos aguardar ansiosamente. Paulo alerta os colossenses sobre o perigo de serem privados do galardão: “Ninguém … tire o vosso
prêmio” (Cl 2:18, VB). Aqui a armadilha era uma mistura de judaísmo
esotérico, ascetismo e misticismo. Paulo chama isto de “os rudimentos
do mundo”1 e seus protagonistas não estão “ligados à Cabeça” (Cl 2:19),
o que significa que não eram sadios quanto à doutrina de Cristo como
o Cabeça exclusivo da Igreja.2
O prêmio de coroas certamente faz parte da recompensa. E mais,
além da coroa incorruptível de I Coríntios 9:25 já mencionada, há a
coroa da justiça. Paulo anela recebê-la “naquele dia” da mão do “Senhor,
o Justo Juiz” (II Tm 4:8). Somos assegurados de que esta recompensa
não é exclusivamente para o apóstolo, mas para “todos os que amarem
a Sua vinda”3. Outras coroas, que são prometidas como recompensa,
incluem a coroa da vida (Tg 1:12) e a coroa de glória (I Pe 5:4)4. Paulo
diz aos tessalonicenses que eles são a “coroa em que exultamos … na
presença de nosso Senhor Jesus Cristo em Sua vinda” (I Ts 2:19, ARA),
mostrando assim o gozo do evangelista plenamente realizado naquele
dia de recompensa. Semelhantemente, apego ao ministério piedoso da
Palavra traz uma recompensa plena (II Jo 8). Nossas coroas e todo o
aparato de glória alcançado pelos membros da Igreja resplandecerão
como um reflexo do esplendor do Salvador, quando Ele vier para reinar.
Assim, já que a nossa motivação mais elevada é a glória de nosso Senhor
Jesus Cristo, vamos lutar para otimizar nossas recompensas — pois isto
1
2
3
4
Com um discernimento divinamente inspirado, Paulo usa o mesmo rótulo tanto para
a escravidão do legalismo judaico na Galácia, como para a filosofia judaico-gentílica
do gnosticismo em Colossos. Em essência, são o mesmo (Gl 3:3-11; Cl 2:8, 20).
Os múltiplos erros que provém disso são evidentes no cristianismo medieval corrupto,
dominado por ordenanças e fomentado pelo ascetismo, com sua espúria hierarquia
de intermediários humanos.
Epiphaneia, isto é, “aparição em glória”. Nosso amor pela Sua aparição deveria fazer-nos desejar maximizar nossa contribuição para aquela glória por meio da qual a
Igreja cumpre a profecia: “Quando vier para ser glorificado nos Seus santos, e Se fazer
admirável em todos os que creem” (II Ts 1:10)
A “coroa da vida, a qual o Senhor tem prometido a todos os que O amam” é para todos
os verdadeiros crentes; a “incorruptível coroa de glória” é prometida aos piedosos
anciãos/pastores por apascentarem o rebanho.
206
A glória do Filho
glorifica a Ele.
O juízo da Grande Tribulação
A Grande Tribulação, também chamada de o Tempo da Angústia
de Jacó e a Septuagésima Semana de Daniel, acontecerá durante o Dia
do Senhor. Será um tempo de juízo incomparável sobre “os que habitam
a terra”, e o livro do Apocalipse detalha três grupos de sete juízos. Estes
são os Sete Selos, as Sete Trombetas e as Sete Taças. O espaço impede
um estudo detalhado deste período de sete anos, mas precisamos notar
que é caracterizado pelo justo juízo de Deus sobre o mundo que rejeitou o Seu Filho, que estabeleceu um governo global contra Deus, que
pretende acabar com o problema judeu de uma vez por todas. A Grande Tribulação culminará com a volta do Senhor Jesus à Terra como o
Messias triunfante e Salvador, e então acontecerão as cenas sangrentas
no Armagedom. Isaías nos lembra de que “será o dia da vingança do
Senhor, ano de retribuições pela contenda de Sião” (Is 34:8)1. O fato
da Grande Tribulação ser um tempo de Juízo é anunciado com clareza na proclamação angelical do Evangelho Eterno, que diz o seguinte:
“Temei a Deus e dai-Lhe glória; porque é vinda a hora do Seu juízo.
E adorai Aquele que fez o céu, e a terra, e o mar, e as fontes de águas”.
Não há relato de qualquer arrependimento ou crença como resultado
desta mensagem do Evangelho — alias, logo em seguida encontramos
os homens atormentados pelas pragas do juízo, blasfemando o nome
de Deus, “e não se arrependeram para Lhe darem glória” (Ap 14:6-7;
16:8-9).
O julgamento das nações vivas
Esse juízo é bem diferente do juízo do Grande Trono Branco, embora ambos os julgamentos sejam muitas vezes confundidos e unidos
por ensinadores anti-dispensacionais.
Esta cena de juízo se dá sobre a Terra. Temos a localização geográfica específica — o vale de Josafá, que fica ao pé do Monte das Oliveiras2.
1
2
A Contenda de Sião não terá uma solução pacífica, apesar de todos os esforços feitos
pelos políticos tolos dos nossos dias.
Veja Joel 3:2, 12 e Zacarias 14:3-9. Haverá transtornos geológicos enormes na terra de
Israel e em torno de Jerusalém quando os pés do Senhor tocarem novamente o monte
das Oliveiras. Isto basta para explicar qualquer dificuldade em identificar precisamente
a localização do vale de Jeosafá.
A solenidade dos Seus julgamentos
207
Este julgamento é conduzido pelo Filho do Homem, assentado sobre o
trono da Sua glória. A ocasião é depois da Grande Tribulação, no início
do Reino Milenar do Senhor Jesus Cristo. Os julgados incluirão tanto
salvos quanto não salvos, e há três classes identificadas, em Mateus 25,
que são: as ovelhas, os bodes e “Meus irmãos”. Considerando o grande
número de mortos entre os seres humanos durante a Grande Tribulação, a maioria dos que entram na Grande Tribulação morrerão, e os não
salvos entre eles não aparecerão para serem julgados até o julgamento
do Grande Trono Branco. Somente os vivos sobre a Terra, por ocasião
do aparecimento glorioso e volta de Cristo, passarão por este julgamento que é individual e pessoal. O critério que distingue cada pessoa
como crente (ou não) no Senhor Jesus Cristo, é como tratou os “Meus
irmãos”.
Lealdade a Cristo é o ponto determinante, “portanto, qualquer que
vos der a beber um copo d’água em Meu nome, porque sois discípulos
de Cristo, em verdade vos digo que não perderá o seu galardão” (Mc
9:41). As ovelhas são separadas para estarem à mão direita do Juiz, e
os bodes à Sua esquerda. Essa é uma separação eterna, sem nenhuma
“chance” posterior. As palavras solenes, “apartai-vos de Mim” tem um
eco terrível de continuidade perpétua. O “apartar” parece significar que
estes malditos serão lançados num curso de eterno movimento para
longe de Deus e de todas as bênçãos do Seu reino. É bem provável
que haverá pessoas nesta cena de juízo que não aceitaram o Evangelho
neste presente Dia de Graça e que sobreviveram à Grande Tribulação e
finalmente estarão entre os bodes. Que esse nunca seja o caso de algum
leitor deste livro.
O julgamento de Israel
Os crentes do Velho Testamento ansiavam por um tempo quando
Deus julgaria o mundo, e julgaria também o Seu povo Israel, recompensando os justos e punindo os ímpios. Esta verdade era preciosa aos
santos primitivos como Enoque, Abraão e Ana1.
Maiores detalhes surgem com os livros posteriores do Velho Testamento e podemos compilar o que segue.
O Salmo 50 retrata a cena do Julgamento de Deus do Seu povo.
1
Judas 15, Gn 18:25; Dt 32:36; I Sm 2:10.
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A glória do Filho
“Chamará os céus do alto, e a terra, para julgar Seu povo”. Este julgamento acontece sobre a Terra, e Ezequiel 20:33-38 sugere que será no
deserto. Inclui ajuntar todos os que estavam espalhados e julgar o rebanho, punindo os opressores entre eles, que parece ser uma referência
específica àqueles judeus que são colaboradores do regime do Anticristo1. Por isso a referência aos “pecadores de Sião” estando assombrados
(Is 33:14). É interessante considerar quão correta foi a resposta dos
principais sacerdotes e fariseus à pergunta do Senhor no final da Sua
parábola da vinha: “Que fará àqueles lavradores? Dizem-lhe eles: Dará
afrontosa morte aos maus, e arrendará a vinha a outros lavradores …”
(Mt 21:40-41). Eles se autocondenaram pela sua resposta, tendo cuidadosamente evitado responder à primeira pergunta sobre a origem do
batismo de João. O tema de separar os maus e os justos, o trigo e o
joio, peixes bons e maus no “fim do mundo” é claramente ensinado nas
parábolas do Reino, em Mateus 13. Isto se refere a este julgamento
dos vivos sobre a Terra, quer judeus ou gentios, por ocasião da volta de
Cristo para estabelecer o Seu reino em glória. Os anjos são os agentes
que ajuntam e separam, e no caso dos ímpios, os lançam no “fogo eterno”. Será neste julgamento que se dará a prestação de contas quanto aos
talentos distribuídos pelo Senhor aos Seus servos. O servo mau, que é
evidentemente destituído de fé, será lançado “nas trevas exteriores; ali
haverá pranto e ranger de dentes” (Mt 24:14-30). Recompensas serão
entregues por serviço fiel feito pelo remanescente crente. Isaías olha
para o julgamento futuro de Israel à luz da recompensa: “Eis que o
Senhor fez ouvir até as extremidades da terra. Dizei à filha de Sião: Eis
que vem a tua salvação; eis que com Ele vem o Seu galardão, e a Sua
obra diante dEle” (Is 62:11).2 O próprio Senhor Jesus Cristo faz diversas referências, nos Evangelhos, à recompensa futura. “Bem aventurados
sois vós, quando vos injuriarem e perseguirem e, mentindo disserem
todo o mal contra vós por minha causa. Exultai e alegrai-vos, porque é
grande o vosso galardão nos céus; porque assim perseguiram os profetas
que foram antes de vós” (Mt 5:11-12). Em Mateus 6:1-18, em relação
à oração e esmolas, os discípulos recebem a promessa: “Teu Pai, que
vê em segredo, te recompensará publicamente”. Este recompensar dos
discípulos acontecerá quando “o Filho do Homem virá na glória do Seu
1
2
Ez 34:11-23; Is 28:14-22. Esta passagem famosa menciona o juízo como a Sua “estranha
obra”.
Compare Is 40:10 e Ap 22:12; a referência do NT é universal, não limitada a Israel.
A solenidade dos Seus julgamentos
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Pai, com os Seus anjos; e então dará a cada um segundo as suas obras”
(Mt 16:27). Isto obviamente não é o Tribunal de Cristo. Estas passagens estão relacionadas, principalmente, com o remanescente de Israel
na dispensação futura depois do Arrebatamento da Igreja.
Os mortos justos
Existem alguns ensinadores que sustentam que todos os santos do
Velho Testamento serão ressuscitados por ocasião do Arrebatamento,
junto com os santos que morreram durante a era da Igreja. Este ponto de
vista não leva em conta adequadamente o fato que, como Paul Benware
afirma, “o arrebatamento abrange aqueles que estão ‘em Cristo’, o que
deve ser entendido como indicando somente aqueles que foram batizados1 na Igreja, o corpo de Cristo. Os crentes do Velho Testamento não
têm esta posição”.2 Este ponto de vista encontra apoio em Apocalipse
11:17-18, onde lemos: “Graças Te damos, Senhor Deus Todo-Poderoso
que és, e que eras, e que hás de vir, que tomaste o Teu grande poder e
reinaste. E iraram-se as nações, e veio a Tua ira, e o tempo dos mortos,
para que sejam julgados, e o tempo de dares o galardão aos profetas,
Teus servos, e aos santos, e aos que temem o Teu nome, a pequenos e a
grandes, e o tempo de destruíres os que destroem a terra”.
Esta ligação de membros vivos do remanescente com os santos do
Velho Testamento, “os profetas, teu servos”, nos lembra de uma ligação
semelhante em Mateus 5:12 (veja acima). O tempo de julgar os mortos
justos, tanto os mártires do Velho Testamento como os da Tribulação,
é aqui mencionado (como também em Ap 20:4), pois os ímpios mortos “não reviveram até que os mil anos se acabaram”. Aqui se encaixa
a esperança de ressurreição de Jó ( Jó 19:25-27; Is 26:19 e Dn 12:2).
(Esta última referência: “uns para a vida eterna, e outros para vergonha
e desprezo eterno”, incorpora o intervalo milenar entre a ressurreição
dos justos e a do Grande Trono Branco.)
Satanás e os anjos caídos
A carreira de Satanás sempre foi em declive. O Senhor Jesus Cristo
testificou: “Eu via Satanás, como raio, cair do céu” (Lc 10:18). Isto pode
1 O autor se refere ao batismo no Espírito Santo, não ao batismo em água (N. do E.).
2 Benware, Paul. The Biblical Doctrine of the Judgments em The Fundamentals for the
Twenty-first Century, editor geral Mal Couch. Kregel Publications, 2000.
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A glória do Filho
ser tomado como uma afirmação concisa de toda a história de Satanás.1
Isaías 14:12-17 e Ezequiel 28:12-19 retratam a rebelião inicial. Em
Apocalipse 12 ele é lançado à Terra como resultado da guerra nos Céus.
Na volta do Senhor Jesus Cristo à Terra, Satanás é preso no Abismo durante o Milênio. Sua atividade final, contra Deus e o Seu povo, culmina
na rebelião de Gogue e Magogue depois do Milênio (Ap 20:7-10). Isto
resulta na sua apreensão final, e em ser lançado no Lago de Fogo onde
a Besta e o Falso Profeta já estão (e estiveram durante todo o Milênio).
II Pedro 2:4 e Judas 6-7 nos falam dos anjos caídos, que neste momento
estão acorrentados em trevas e reservados para o julgamento do grande
dia. Não temos maiores detalhes sobre isto, embora Paulo diz que os
santos hão de julgar os anjos (I Co 6:3), mas se isto se refere a juízo
punitivo dos anjos maus ou à futura supervisão administrativa de anjos
celestes não fica claro.
O julgamento do Grande Trono Branco
Este é o último dos grandes julgamentos futuros, e ocorre no período entre o final do Milênio e o início do Estado Eterno. A descrição
deste julgamento é uma das passagens mais solenes de todas as Escrituras. A tradução que temos é de grande mérito literário, e tem uma
dignidade de linguagem que beneficia o seu tema. Ler esta passagem
em voz alta, numa reunião de evangelização, tem um efeito solene. O
Julgamento do Grande Trono Branco acontece depois do término do
Milênio (Ap 20:5). No v. 11 “os céus e a terra fugiram”, o que se assemelha com a descrição de Pedro do início do Dia de Deus (II Pe
3:10-12). A localização deste julgamento é indefinida no espaço, já que
não resta mais nenhum ponto de referência topográfico a não ser o
Trono do próprio Deus, pois o Céu e a Terra fugiram. Todos que comparecem perante o Trono para julgamento pertencem à categoria dos
mortos não salvos, e foram ressuscitados dos mortos especificamente
para este julgamento e suas consequências. Eles saem do mar, da morte
e do inferno (Hades). Embora o julgamento seja segundo as suas obras,
este julgamento não acontece para decidir o seu destino eterno. Este já
foi decidido pela sua rejeição do Salvador durante a sua vida. Não há
separação de salvos e não salvos neste julgamento. Todos aqueles que
são salvos já foram ressuscitados, previamente, ou entraram diretamente
no Reino de Deus, e a esta altura estão no gozo da plena salvação, no
1
A. Leckie: comunicação pessoal. 1987.
A solenidade dos Seus julgamentos
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estado eterno.
Conclusão
Há uma abundância de referências nas Sagradas Escrituras sobre o
tema dos Juízos de Deus. Nenhum artigo pode tratar um tema tão solene com a meticulosidade, nem com a gravidade que ele merece, mas que
o leitor possa, se for salvo, ser grato por saber que o julgamento do nosso
pecado foi no passado, e que seja vigilante à luz do Tribunal de Cristo
que está por vir. Para os não salvos o recado necessário é: “Fugi da ira
que está para vir” (Lc 3:7), lembrando que “agora é o tempo aceitável,
eis aqui agora o dia da salvação” (II Co 6:2).
Ao concluir, seria apropriado exclamar com o apóstolo Paulo: “Ó
profundidade das riquezas, tanto da sabedoria como da ciência de Deus!
Quão insondáveis são os Seus juízos, e quão inescrutáveis os Seus caminhos!” (Rm 11:33).