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RESENHA BffiLIOGRAFICA R. A. AMARAL VIEIRA O Federalismo e a revisão da forma de Estado. Paulo Bonavides. Revista de Informação Legi~lativa, ano 10, n. 37. Em seu mais recente traba-lho, o professor Paulo Bonavides, da Universidade do Ceará, analisa os problemas atuais do Estado brasileiro a partir de um tema freqüentemente descurado pela maioria dos críticos de nossa crise politica: a Federação em agonia. Bonavides estuda o nosso federalismo dentro do contexto histórico do País, o que lhe enseja fundar o desenvolvimento de suas teses em um a priori inquestionável: o artificialismo da fórmula de Estado adotada pela República. Uma revisão histórica mostra à sociedade a construção unitária do Estado brasileiro, paralelamente à tendência a um governo central e forte. A tradição do Império é unitarista, embora já se fizesse, a par com a pregação republicana, a propugnação pot· um Estado federal. Embora alguns monarquistas. defendessem a adoção do sistema federal - caso das pregações de Nabuco e Rui Barbosa, entre outros - é fora de dúvida que a federação aparecia no cenário das dicussões politicas como uma forma a mais de oposição ao poder imperial. A Federação, estimavam seu adeptos, fortaleceria os estados em detrimento do governo central e, conseqüentemente, subtrairia das mãos do Imperador considerável soma de poder. Segundo Bonavides, a adoção federalista (Decreto n. 0 1) "foi apenas o coroamento vitorioso de velhas aspirações autonomistas que, não se podendo fazer nos quadros institucionais do Império por um ato reformista, se fizeram pela via imprevista da ação revolucionária de 15 de novembro de 1889, resultando assim na implantação do sistema republicano." Essas velhas aspirações autonomistas a que se reporta Bonavides, todavia, jamais representaram, quer uma aspiração nacional, quer o coroamento natural R. Ci. pol., Rio de Janeiro, 7(4) : 137-147, out./dez. 1973 de sua formação política. Ao contrário, o Brasil foi sempre um estado unitário; mesmo a experiência do legislativo provincial jamais representou uma dose considerável de descentralização poLítica, até porque o modelo que inspiraria a redação do Decreto n. 0 1 - a experiência americana -partira de uma evolução histórica que percorrera às avessas a construção do Estado brasileiro, pretensamente descentralizado pela federação, contrariando sua formação unitária desde o berço. Já o Estado americano encontrara na federação a forma de associação de estados tradicionalmente autônomos. A idéia federalista, todavia, como diversas vezes assinala Bonavides não apareceu de sopetão com o 15 de novembro nem era desconhecida de Rui Barbosa, que a defendera em longa campanha de imprensa durante o Impél"io, como uma solução para a Monarquia, partilhando da mesma doutrina de Nabuco; ao contrário da maioria dos republicanos que defendiam pura e simplesmente a queda da Monarquia e a implantação da República, deixando de lado preocupações de ordem formal como a decisão pela manutenção do Estado unitário ou a sua substituição pela descentralização oferecida pela federação. De qualquer maneira, é fora de dúvida que os republicanos conquistados pela propagação federalista simplesmente viram nessa forma de governo mais um entrave ao centralismo representado pelo Império que procuravam apear. De outra pru:te, afigura-se-nos uma postura de incrível ingenuidade política "a veleidade federativa sobre as bases de um sistema com índole manifestamente centralizadora, qual o do Império". A Federação, todavia, não logrou salvar o Império e terminou por infiltrar-se na República. " A medida que o Império entrava em declínio, o movimento federalista tomava corpo e avançava impetuosamente, de par com idéias tanto monarquistas como republicanas. O projeto de Nabuco, de 1885, e a campanha de imprensa desfechada por Rui Barbosa em prol de uma definição federativa para as instituições do Império denotam suficientemente que a tese chegara amadurecida, tanto para a solução dada no Decreto n. 0 1 do Governo Provisório como para sua consagração irretratável pelos constituintes de 1890." Cabe discutir o grau de amadurecimento da idéia federalista a que se refere Bonavides. De fato , a Federação não chegou a representar uma saída para o Império e o enxerto de que resultou sua adoção republicana fez-se ao arrepio da tradição brasileira e encimada de vícios que comprometem sua pureza doutrinária. É o próprio Bonavides quem afirma que "Quando se deu o ato republicano de instituição do sistema federativo, as províncias l38 R .C.P. 4/73 foram declaradas sobe1·anas por decreto tecnicamente errôneo dos federalistas da pl"oclamação da República, menos versados talvez em teoria federativa do que os da Constituição de 1890/ 1891 e, portanto, sem nenhuma lição teórica daqueles fatos desenrolados na guerra civil dos Estados Unidos, país que, por um paradoxo, lhes serviu de modelo ao projeto federativo e onde os adeptos da causa vitoriosa foram às armas justamente para provar que não há nem é possível haver Federação de Estados soberanos e, portanto, aptos à secessão." Onde, portanto, o amadurecimento doutrinário? Aos Estados criados pela federação republicana, como às províncias imperiajs, falecia "a face mais importante com que na doutrina (federalista) se identificam as características políticas da autonomia, a saber, a capacidade autodeterminativa cuja presença empresta ao poder o caráter de estabilidade." A Federação, por fimJ esbarrava num obstáculo at~ aqui inafastável: o "vício do executivo forte", como o denomina Bonavides, a saber, a tradição que uniu ao Estado unitário, o governo central e forte. Com a Federação, excluídas algumas exceções episódicas, ·esse vício tem-se agravado de tal sorte que o executivo forte parece hoje constituir uma característica natural e histórica, inajustável. Presentemente, essa tendência se observa na formação do poder em todo o mundo agravada na América Latina graças à contribuição dos problemas econômicos e políticos fermentados pelo subdesenvolvimento. De fato, e::cectttivo forte é a característica de governo dos Estados Unidos, da União Soviética, da China, da França etc. Executivo forte é a marca do governo do Brasil, do Paraguai, da Bolívia, do Peru e agora, do Chile. Nesses países (a relação podia ser muito mais extensa, incluindo Espanha, Portugal, Grécia, Cuba e todos os países socialistas e quase todos os países subdesenvolvidos), a par do executivo fo1·te pode-se assinalar a tendência para formação de governos claramente militares (Peru, Chile, Grécia etc.) ou custodeados por militares (União Soviética, Estados Unidos e França entre os grandes e Uruguai, Argentina, Portugal, entre os pequenos). Nb caso brasileiro, o executivo forte que, além de absorver as prerrogativas do legislativo limitou a ação do Judiciário inumeráveis vezes, não é um mero acidente das duas últimas décadas, mas uma inclinação que nos acompanha desde os primeiros passos do Império: '"!'ivemos, assim, Executivo forte para fazer a Independência, forte . também, para consolidá-la, não menos forte para golpear a Constituinte, em 1823, e de vocação "Sempre forte, quando objeto de contestação no decurso das crises que traumatizaram a comunhão política do País. Aí sua fraqueza ocasional foi sempre pretexto Resenha bibLiográfica 139 para levantá-lo depois copioso de forças e carregado de onímodas prerrogativas, conforme tem acontecido até aos nossos dias. Assim na Abdicação, na Maioridade, na República, na Revolução Liberal, no Estado Novo, na Redemocratização, no suicídio de Vargas, na renúncia de Jânio Quadros, na deposição de Goulart, servindo todos esses momentos históricos de marcos com que assinalar uma inclinação pendular do País para o advento do executivo forte. Aqueles episódios ou antecederam ou sucederam a estados passageiros de fraqueza e abatimento e desorganização política, logo ultrapassados pelo estabelecimento da autoridade, dotada de instrumentos fortes de ação executiva." Bonavides esqueceu-se de incluir entre os exemplos de fraqueza. ocasional favorecendo seu fortalecimento, a crise que dominou a última fase do governo Costa e Silva, de que resultou a imposição do Ato Institucional número 5. Bonavides analisa ainda a natureza preponderantemente política do federalismo da primeira república e o fracasso do que denomina "ilusão recente de um federalismo cooperativo". Segundo Bonavides, o federalismo da primeira república praticamente desconheceu ingredientes financeiros e econômicos e, mesmo institucionalizado, jamais se apartou do combate pela domesticidade do Poder Executivo. Foi sempre um federalismo de índole exclusivamente política, no qual, mesmo a guerra interna das tarifas, "foi antes uma controvérsia jurídica à face de uma correta aplicação do texto constitucional do que propriamente um conflito econômico de vasta potencialidade política, como o que de último estala no federalismo contemporâneo, com o País se repartindo economicamente em Regiões". Presentemente, entre os múltiplos fatores antifederalistas criados pelo governo central está a política tributária que asfixia ainda mais as economias regionais em proveito, quer da União, quer dos Estados fortes, como é o caso brasileiro do imposto de circulação de mercadorias, instrumento a mais no esvaziamento dos estados consumidores, a Nação praticamente em proveito dos estados produtores (Rio-São Paulo) . Mas o Estado brasileiro presente não é apenas esse. É um estado no qual o desnível das economias regionais aniquila toda e qualquer possibilidade de autonomia econômica da maioria absoluta dos estados, cujas economias1 por outro lado, continuam sendo esgotadas pela sangria financeira proporcionada tanto pela tributação, quanto pelo controle do sistema bancário e creditício que, com suas bases em apenas dois ou três estados da Federação, transforma-os no desaguadouro de todas as reservas do País. Esse desnível, que tende a agravar-se nos planos estadual e regional, desmente a possibilidade de uma 140 R .C.P . 4/73 federação e ainda, fortalece e justifica a intervenção do Estado na economia e política regionais. Nenhuma economia regional, exceção feita à Guanabara e São Paulo, pode hoje subsistir à outrance da União. Para completar, por razões políticas e econômicas, o Estado brasileiro é crescentemente intervencionista e planejador, um estado centralizador que, se não tiver detida sua marcha, descambará inevitavelmente para um "Estado unitário monolítico, desenvolvimentista, tecnocrático, autoritário, superintendente dos objetivos econômicos permanentes, que nada deixaria ocioso ou autônomo às esferas intermediárias." Nesse panorama, não há como falar em federação. Mesmo porque os fundamentos ideológicos da federação, à frente o liberalismo chocam-se diante da realidade do Estado moderno, não só centralizador e intervencionista, mas também antiliberal. "De último, o conceito de federalismo, se o traduzirmos na linguagem clássica da sociedade liberal, tende a desvanecer-se. Os fatos fizeram ontem a teoria federativa (sociedade do lai$sez-faire), os fatos estão hoje a desmanchar essa teoria (sociedade do intervencionismo estatal). Breve, ou a palavra federação estará riscada do vocabulário polftico ou nos chamados países federalistas uma Constituição ousada já não terá necessidade de empregá-la, a menos que saiba utilizar aquele termo com respeito a uma estrutura organizada de Estado que nada tenha a ver com a doutrina dos compêndios nos quais leram outras gerações, atormentadas de problemas diferentes e movidas de distintas preocupações políticas." Diante do .h acasso do federalismo dualista, Bonavides sugere, como solução para a crise política brasileira, um federalismo das regiões, "não porque o vejamos já desenhado sociologicamente nos traços mais r€centes de nossa evolução, mas por afigurar-senos a única alternativa ao Estado unitário de asfixiante centralização". Bonavides parte do pressuposto de que a tarefa que se coloca historicamente diante da nação é a da restauração federativa, a.o afirmar que "não se deve redemocratizar o País sem cogitar por igual na modalidade de federalismo que se perfilhar." É fora de dúvida que os estados de índole federalista tendem mais ao exercício democrático, ao passo que a centralização favorece aos estados unitários, sempre de vocação absolutista. Mas o problema não está na forma, mesmo porque não ficou demonstrado que a Federação é insubstituível. No momento presente o que se deve colocar ao cientista político é a restauração do Estado democrático e desenvolvimentista posto que não está igualmente comprovada a tese totalitária segundo a qual desenResenha bibliográfica 141 volvimento e liberdade não podem andar de mãos juntas. É verdade que "os vícios que mataram o federalismo das autonomias não poderão conviver com uma estrutura legitimamente democrática", mas isso não deve adiar a conquista democrática. Ao contrário, redemocratizado o País, urge construir um novo sistema, federativo ou não, qtte se harmonize com o novo Estado democrático. Invertendo a proposição de Bonavides, entendemos que não basta pleitear um novo quadro federativo para o Brasil, se sua implantaçpão não for antecedida pela consagração de novo modelo político de relações de governo, no âmbito de um retorno democrático. E no caso retorno não é o pleito do passado mas a reatualização de seu valores ainda que ombro a ombro com valores da sociedade presente: executivo forte, centralismo e planejamento estatal. Bonavides parte do sentimento regionalista da representação política do nordeste, a que denomina B ancada da SUDENEJ para construir sua teoria do federalismo das regiões. Parece-me que aí está exagerada a importância do auditório dessa bancada (o Congresso) , de um lado, e de outro, desprezado o real caráter da representação política entre nós. A união das diversas bancadas nordestinas é uma exccssão no quadro político brasUeiro e formada muito antes da SUDENE é uma tentativa de fortalecimento qualitativo por intermédio da associação quantitativa. Os deputaados e senadores nordestinos sempre estiveram juntos, seja reunindo votos para lograr uma representatividade digna nos quadros das duas Casas, seja no combate às mazelas comuns (as secas à frente), seja, por conseguinte na batalha pelos mesmos benefícios. De fato, as agências do governo eram e são comuns a todos os estados da Região (DNOCS, SUDENE, BNB) , como era e é comum a poHtica tributária etc. Mas se as delegações nordestinas precisavam unir-se, pois unidas, as diversas bancadas da região tinham a força de um dos grandes estados da federação - o mesmo não sucedia com os estados mais aquinhoados, os quais desde cedo sempre tiveram audiência na República, inclusíve com mando político e exercício direto do governo. Basta um rápido exame da galeria dos presidentes da República e ministros de estado. Mas se há a bancada da SUDENE inexistem outras bancadas regionais, enquanto ba·ncada.s outras formam-se independentemente da representatividade regional de seus membros, temos a bancada dos pecuaristas, a dos usineiros, dos banqueh·os, dos industriais e até as bancadas políticas ... Por outro lado, Estados há que pertencem a várias regiões e, dentro de uma mesma região, há sub-regiões e interesses distintos. O nordeste do litol'al compõe um quadro de interesses 142 R .C.P. 4/73 divez·sos do nordeste do sertão; o nordeste do São Francisco é uma região com interesses distintos do nordeste da zona da mata; o nordeste industrializado é uma região cujos interesses não se compatibilizam com os interesses do nordeste agrícola e latifundiário, com o nordeste dos usineiros etc. O mesmo aplica-se a outras regiões e estados, como Minas, onde se destacam a Minas dos Bancos e a Minas industrializada. a Minas da pecuária e a Minas extrativa. J á não são os mesmos os interesses de gaúchos e catarinenses, maranhenses e paraenses. Sobre todos paira a Uniao, a quem caberia a "tarefa básica de operar a composição política dos interesses discrepantes", desde que a composição econômica ainda segundo Bonavides, já se teria alcançado desde o advento do planejamento econômico, "concebido em bases regionais, ao passo que a composição política com base regional s6 se alcançará mediante uma reforma profunda da Carta Constitucional, que coloque o País em dia com as suas novas dimensões e realidades no campo federativo." Sem precisar demonstrar a irrelevância atual de qualquer reforma constitucional, dadas as facilidades formais de que dispõe o Estado, é bom lembrar que a União não é uma entidade arbitrária ideal, mas ao contrário, possui representatividade própria. Ela resulta da própria composição de poder da República, que é a consagração dos interesses da economia majoritária e, por via de conseqüência, do Estado ou dos estados mais fortes. Como desaguadouro desses interesses é que a União interfere. Se o intervencionismo estatal opera-se promovendo o desenvolvimento regional, o mecanismo que criou a SUDENE, a ... SUDAM e mais recentemente a SUDECO, é o mesmo que instituiu a EMBRATUR e a SUDEPE. Mesmo dentro dos estados, há as superintendências de desenvolvimentó regional, como um exemplo dentre muitos a Superintendência do Desenvolvi'l'nento do L itoral Paulista. Essa política encontra-se em quase todos os estados como uma verticalização da política nacional do planejamento. "No conjunto atual, o remédio que o País emprega para curar os males das tensões e desequilíbrios lhe é ministrado tãosomente pelo braço executivo federal, cujo poder centraliza todas as faculdades decisórias. As providências concretas de coneção dos agravos econômicos contra os quais bradam as regiões desfavorecidas e injuriadas, partem unilateralmente daquele poder. Toda iniciativa e decisão lhe pertence. Posto numa elevação olímpica, dali contempla, dali dirige, dali inspeciona o quadro interno dos interesses em conflito e das súplicas regionais. .Tuiz ReseTllta bibliogrnfica 143 supremo e onipotente, esse poder de cima tanto poderá ser . dadivoso como avarento, sendo a incerteza a nota que sempre afligirá os pugnazes interesses regionais." O fracasso do federalismo dualista, as ameaças decorrentes dos desníveis regionais crescentes, a necessidade de opor obstáculos à marcha até aqui livre do Estado Leviatã encontrariam remédio, segundo Bonavides, no federalismo das regiões: "A Região oferece ao País a saída exclusiva para a renovação de um federalismo cujas bases foram aluídas. O federalismo contemporâneo no Brasil é cada vez menos um problema de Estados e cada vez mais um problema de Regiões. Como a enfermidade politica das autonomias estaduais, que sempre reputamos incurável no seio de uma organização de pluralismo liberal já ultrapassado, fez sucumbir por inteiro a autodeterminação dos Estados, é de esperar que a Federação possa ressurgir na legitimidade de seus traços mais característicos, mediante as linhas estruturais de um federalismo regional. Fora daí, a alternativa será o Estado unitário com nome de federação, esse contra-senso que repugna e fere a delicadeza do sentimento federalista, arraigado em cento e cinqüenta anos de existência pátria e cuja trasladação à ordem constitucional, tendo sido já objeto de tantos litígios desde o Império à República, viria enfim parecer às mãos de um possível Estado Leviatã erguido à sombra de esquemas centralizadores." Bonavides não vê alternativa democrática duradoura senão à sombra da retomada federalista, pois "a raiz da centralização fará renascer o Estado unitário de vocação absolutista, que dificilmente se compadece com o Estado de direito". Restou indefinido o Estado de direito a que se refere pois segundo entendemos, a Grécia, o Peru, a Bolívia, a Espanha, são estados de direito tanto quanto os Estados Unidos e a Suécia uma vez que, estado de direito é todo aquele que obedece a um determinado estatuto, aquele que segue regras por ele próprio ditadas. Na classificação de estado de direito, que é o mesmo estado legal não interferem julgamentos de valor, ou seja, não se discute o valor dessas regras mas simplesmente sua existência formal. Se um estado revolucionário não é um estado legal, é estado de direito aquele que se sucede ao regime revolucionário, desde que sua atividade paute as regras de um estatuto pré-designado. Esse estado de direito só descamba para o estado de fato, perdendo sua legalidade, quando altera as regras do jogo em andamento, vira a mesa. 144 R.C.P . 4/73 P1·agmá.tica da comunicação humana. Paul Watzlawick, Janet Helmick Beavin, Don D. Jackson. S. Paulo, Cultrix, 1973. Pragmática da comunicação humana, que é um estudo dos padrões, patologias e paradoxos da interação, analisa os efeitos da comunicação na conduta humana. Mas o faz, ao contrário do que ocorre com grande parte da bibliografia especializada, mormente a nacional, em linguagem clara, direta, sucinta, ou seja, com a preocupação permanente de transmitir idéias, comunicar. Essa característica formal valoriza ainda mais a obra que constitui um valioso instrumento de trabalho nas mãos de psicólogos, psiquiatras e comunicadores em geral. Enquanto muitos dos nossos textos preocupam-se em criar um jargão pretensamente científico e terminam indecifráveis sem lograr qualquer forma de comunicação, o livro dos professores do Instituto de Pesquisa Mental de Pala Alto, Califórnia, alcança um excelente nível de comunicação, sem qualquer prejuízo para o caráter altamente científico do texto, na medida que a psicologia pode alcançar um estágio de abstração cientüica. O livro não é escrito em comuniqu.ês e é profundo. Exije leitura atenta, diria mesmo releitura, pressupõe uma série de conhecimentos prévios, como de resto toda obra científica, mas não se destina ao falso deleite de uma igrejinha de pretensos iniciados no falso isoterismo da comunicação, que afinal é coisa simples. Os autores estão preocupados com os efeitos pragmáticos da comunicação, com a sua instrumentalidade como modificadora do comportamento. Se há uma tese central, esta é a negativa de qualquer hipótese de não comunicação, pois até o silêncio comunica. ("Atividade ou inatividade, palavra ou silêncio, tudo possui um valor de mensagem; influenciam outros e estes outros, por sua vez, não podem não responder a essas comunicações e, portanto, também estão comunicando" p. 45). Me::;mo o esquizofrênico assim definido o que se distancia do meio, o que perde a linguagem do seu grupo - se comunica. Há até o esquizofrenês, linguagem sem dúvida patológica, mas que mesmo assim não deixa de ser comunicante, pois transmite a mensagem: "Esquizofrenês" é, pois, uma linguagem que deixa ao ouvinte fazer a escolha entre muitos significados possíveis, os quais não são só diferentes mas podem até ser mutuamente incompatíveis. Assim, torna-se possível negar qualquer ou todos os aspectos de uma mensagem. Se instada a esclarecer o que quisera dizer com a sua declaração, Resenha bibliográfica 145 a paciente (acima] talvez responda, apenas, num tom displicente: 'Oh, não sei. Devo estar maluca.'! Se lhe fosse pedida uma elucidação de qualquer dos aspectos da frase, ela poderia responder: 'Oh, não, não foi isso o que eu quis dizer, absolutamente ... ' Mas, apesar de condensada de molde a impedir um reconhecimento imediato, a declaração da moça é uma descrição lógica e coerente da situação paradoxal em que ela se encontra e o próprio comentário 'devo estar maluca' pode ser inteiramente adequado, tendo em vista a soma de auto-sugestão necessária para adaptar-se a esse universo paradoxal." (p. 67) Tornando o texto menos denso, os autores, além de casos clínicos, lançam mão de casos retirados da literatura, como quando analisam os aspectos comunicacionais da peça Quem tem medo de Vírginia. Wolf?. Não torcem o nariz de cientistas ao texto literário, ao contrário, aproveitam-se das relações que guardam mais ou menos próximas do contexto humano. Desprezam o estudo da mônade (uma entidade isolada) para se dedicarem ao estudo das dfades ou trlades (relação entre duas ou três entidades), sem jamais perderem de vista o caráter interacional (interação: troca de mensagens entre comunicantes), da comunicação e também o fato de nos movimentarmos entre sistemas de comunicação. Analisam ainda e muito bem, o sistema de comunicação familiar. Há exemplos muito interessantes: um casal cuja mulher tinha fobia a elevador e o marido fobia a reuniões, estabeleceu um acordo tácito: não iriam a reuniões em andares altos, por causa da fobia da mulher. Dessa forma, a fobia do marido ficava escamoteada. . . Outro exemplo é oferecido por um analfabeto casado com mulher de relativa instrução. Quando, por tratamento psicoterapêutico, ele venceu os bloqueios e começou a ler, o casamento se desfez. Muitas vezes a homeostase das uniões matrimoniais tem base em fundamentos neuróticos que, destruídos pela psicoterapia, podem levar de roldão o próprio casamento. Desse ponto de vista, o casamento pode ser encarado como um equili'brio entre estados suplementares ou complementares de neuroses. O livro, assim, examina os efeitos pragmáticos (comportamentais), da comunicação humana, dedicando especial atenção aos distúrbios do comportamento. Os dados da pragmática são não só as palavras, suas configurações e significados que constituem os dados da sintaxe e da semântica, mas também os seus concomitantes não-verbais e a linguagem do corpo. t46 R.C.P. 4/73 O fenômeno geral da comunicação é encarado como fator de mudança do comportamento humano. A perspectiva da pragmática conduz à afirmação de que todo comportamento, não s6 a fala, é comunicação; e toda a comunicação - mesmo as pistas comunicacionais num contexto impessoal - afeta o comportamento. (p. 19) A possibilidade da não comunicação é contraposta a comunicação como conditio sine qua non da vida social: "A impossibilidade de não comunicar faz com que todas as situações de duasou-mais pessoas sejam interpessoais, comunicativas; o aspecto de relação de tal comunicação especifica ainda mais esse ponto" (p. 65) . LIVRARIAS DA FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS Guanabara Praia de Botafogo 188 -C.P. 21.120- ZC-05- Tel.: 266-1512- R. 110 Av. Graça Aranha 26 - lojas H e C - Tel.: 222-4142 São Paulo Av. Nove de Julho 2029 - C.P. 5.534 - Tel.: 288-3893 Brasil ia S.Q. 104 - Bloco 1 - loja 11 - Tel.: 24·3008 As edições da Fundação Getulio Vargas são ainda encontradas nas principais livrarias do Pais. Os pedidos de Reembolso Postal devem ser dirigidos ao Serviço de Publicações, Praia de Botafogo 188 C.P. 21.120 - ZC-05 - Rio de Janeiro - GB. Re1enha bibliográfico 147 A EXPERitNCIA DO SABER A SERVIÇO DO DESENVOLVIMENTO administração economia planejamento comunicação são alguns dos assuntos tratados pelos autores editados pela fgv. Edgar Morin e outros- Cultura e comunicação de massas U Thanteoutros- Guerra à poluição BID - Dez anosdelutapelaAmérica Latina Raúl Prebisch- Transtonnaçào e desenvolvimento- A grande tarefa da América Latina A.Balinky- A economiadeMarx:anáüse e critica BID -Os mercadosdecapitaisdaA mérica lAtina EDITORA DA FGV -LIVROS PARA O DESENVOLVIMENTO •f l'f'dl4ts ,..... •·ad&fi• CrtaUe '1'&'1:1! Praia Bttaf~•· 188 ZC-05- RIO- CB - BltASlL RESENHA BffiLIOGRAFICA A comunicação de massa nos Estados Unidos. Leo Bogart. In: Diálogo, v. 5, n. 4. R. A. AMARAL VIEIRA Partindo de um 4 priori inquestionável, a inviabilidade de uma sociedade industrial avançada sem o apoio de um sistema bem coordenado de comunicação de massa, Leo Bogart, vice-presiden~ te do Bureau of Adve.r tising of the American N ewspaper Publishers Association, analisa a comnosição dos veículos de comunicação de massa, nos Estados Unidos. A primeira vista, os números que manipula sugerem perfeita liberdade de informação assegurada por uma rede de veículos tão extensa que praticamente teria reduzido a zero a possibilidade de qualquer minoria sem apoio num canal de comunicação de massa. Escreve: "Nenhuma sociedade passada desfrutou (ou sofreu) de uma tão vasta e variada produção de comunicações de massa quanto os Estados Unidos contemporâneo. Um recenseamento recente apurou a existência de 1 749 jornais diários, 573 jornais dominicais, 8 012 semanários, 652 revistas, 2 316 publicações regulares identificadas como órgãos de profissões ou de setores de negócios, além de inumeráveis publicações escolares, sindicais e de outros ramos especiais, refletindo interesses altamente localizados ou transitórios. Existem 832 emissoras de televisão, incluindo 167 emissoras de TV educativa e 6 480 enússoras de rádio, incluindo 355 unidades educativas ou de serviços públicos. Um total de 767 editoras produzem 203 470 mil livros didáticos e 88 400 mil livros comerciais por ano (11% destes últimos são de ficção e 89% de não ficção). Há 10 034 salas de cinema e 3 685 drive-ins, que exibem tanto os 178 filmes produzidos anualmente por Hollywood como filmes estrangeiros. Isto não inclui a totalidade dos recursos de comunicação usados pelos anunciantes, que investem seis bilhões R. Ci. pol., Rio de Janeiro, 7 (3): 169-174, jul/set. 1973 de dólares em cartazes de rua e em veículos públicos, folhetos de propaganda pelo correio e várias outras formas de exposição e promoção de vendas. Esta variedade de veículos de contato significa que as pessoas não estão na dependência de um determinado meio de comunicação de massa como fonte de informação, recreio ou opinião." Esta verdadeira babei de canais de informação, todavia, esbarra na concentração de seus leitores e ouvintes, de sorte que a variedade de veículos não importa variedade de opções. É o que se infere do texto seguinte: "O sistema americano de comunicações de massa não é propício à fácil e ampla difusão de gostos e opiniões inconformistas, ainda que proporcione muitas saídas para aqueles que se esforçam por manifestá-las. Revistas pequenas, periódicos acadêmicos e eruditos, jornais de opinião política minoritária, são de fácil acesso apenas a uma facção da população. As sérias críticas de livros só se encontram em meia dúzia de jornais. Existem comparativamente poucas livrarias que vendam livros sérios (2 081 lojas independentes, 858 seções de livros em grandes magazines e 1815 livrarias universitárias) . Em sua seleção de experiências dos veiculas de comunicação, como no caso de outros artigos, o público dispõe sempre de uma gama restrita de opções." Essa ausência de opções, como resultado paradoxal do aumento de canais, é fruto da massificação. Em outras palavras, a dispersão dos canais não se fez em atenção à necessidade de construir um sistema democrático no qual todas as tendências de pensamento da sociedade encontrassem abrigo, mas como resposta a um complexo de fatores dentre os quais sobrelevam interesses industriais (produção em massa), comerciais e de ma1'keting. Os dados são ainda oferecidos por Bogart: "Numa palavra, embora exista uma grande variedade de canais de comunicação de massa, a tendência é para que o público esteja exposto à concentração numa estreita faixa do espectro de opções existentes. A circulação das 20 maiores revistas para o grande público corresponde a 41% da circulação total de revistas (652). Mesmo em veículos locais, como os jornais diários, os 50 jornais de maior circulação cobrem 39% da circulação total de cotidianos (1 749). As três redes dominantes de televisão atraem 92% do público telespectador durante o chamado horário nobre, das 19.30 às 23 horas." Esse quadro, que põe por terra toda e qualquer esperança de encontrar, nos Estados Unidos, um sistema de comunicação de massas democrático, posto que fundado num largo espectro de 170 R.C.P. 3/73 opções, não está longe de ser identificado entre nós. Faltam-nos, a propósito, dados e informações estatísticas, mas é fácil verificar, mesmo numa análise superficial, que estamos caminhando, também em termos de comunicação, para as concentrações que transformam os grandes veículos em monopolistas da informação e ditadores da opinião. Se nos últimos 10 anos o número de canais de televisão quase que duplicou, esses veículos, ainda quando não integram cadeias ou redes, reduziram, no seu conjunto, as opções do público brasileiro, desde que a programação de uns e de outros está subordinada à programação das duas redes nacionais dominantes, os "associados" e a "Globo". As duas distribuem por todo o País a programação elaborada no Rio-S. Paulo; mesmo as emissoras independentes estão divididas em dois grupos: o dos que adquirem os programas da Globo e os que adquirem os programas da Tupi. Em outras palavras, queremos dizer que ao aumento do número de canais não correspondeu o aumento das opções, antes determinou sua concentração, vez que, de uma forma ou de outra, o público está condenado a optar por uma ou outra das duas programações. De certa forma o mesmo se deu em termos de imprensa escrita. No Rio de Janeiro, a grande concorrência que se fazia, quase que em igualdade de condições, entre os chamados órgãos lideres, Jornal do Brasil, O Globo, última Hora (duas edições diárias), Diário de Notícias, o Jornal e Correio da Manhã, se reduziu, nos dias de hoje, a uma disputa entre os dois primeiros veículos mencionados. Em São Paulo, a disputa quase que se dá nos mesmos termos, com o Estadão de um lado e, bem distante, As Folhas. O resto, tanto lá como cá, não pesa, seja como veículos formadores de opinião, seja como simples veículos difusores de informação. O mesmo se poderá dizer das emissoras de rádio, das revistas de grande público, etc. Tanto nos Estados Unidos quanto entre nós, a grande liberdade representada pelo discutível direito de cada cidadão ou grupo de minoria política poder montar seu próprio veículo é sufoeada pela concentração de recursos que destrói as condições de uma concorrência perfeita e possibilita a concentração das audiências e das tiragens, de forma esmagadora, nas mãos de poucos, pouquíssimos veículos. Pondo de lado análises particulares aos Estados Unidos, Bogart se refere a uma das características mais notáveis da televisão, em todo o mundo, que é a de transformar os acontecimentos que transmite. A emissão se confunde com o próprio fato e assim, modifica-o: ' 1A capacidade da televisão de transformar os acontecimentos que transmite tornou-se uma questão de cresResenha, bibliográfica, 171 cente preocupação, tanto para os programadores como para a sociedade. Quando os manifestantes de rua atuam para as câmaras e gritam: 'o mundo inteiro está nos olhando', é evidente que o meio suscita a mensagem e não se limita, meramente, a transmiti-la. Mas, embora o efeito revolucionário da televisão sobre a política seja, ao mesmo tempo, evidente e novo, o noticiarista nunca foi apenas um observador passivo dos acontecimentos. Ele também é um ator que dispõe do poder de alterar o curso tomado pelos eventos." A recente história americana, como também a nossa, está repleta de exemplos dessa ordem, desde o famoso debate dos candidatos Kennedy e Nixon que teria determinado a apertada vit6ria eleitoral do primeiro, até, mais recentemente, à transmissão do interrogat6rio das testemunhas e acusados de W atergate. Passando da televisão para a imprensa escrita, Bogart filiase ao grande grupo de cientistas políticos para os quai~ o jornal gutenberguiano é um elemento de individualização e interiorização, levando o homem não apenas à leitura selecionada, fragmentada, mas principalmente privatizada. Ao contrário de McLuhan e seguidores, Bogart vê hoje os meios de comunicação de massa fundados nos auxiliares visuais, a televisão e o cinema à frente, repetindo a mesma trajetória individualista e interiorizante dos veículos gutenberguianos. Escreve Bogart: "A comunicação de massa (excetuando o cinema) tende, historicamente, a representar experiências cada vez mais individuais para suas audiências. Quando apenas um escasso número de pessoas sabia ler, elas liam para outras. Com o fenômeno atual de uma alfabetização quase universal, ler converteu-se agora num assunto inteiramente privado, exceto no caso dos pais que lêem para seus filhos pequenos. Com o desenvolvimento do transistor, o rádio- outrora o centro de entretenimento da família - tornou-se portátil, pessoal e íntimo. Isto também está acontecendo agora com a televisão, à medida que as familias adquirem mais de um aparelho. Entretanto, subsiste uma diferença entre o registro visível, tátil e permanente da comunicação impressa e a natureza intangível, evanescente, das mensagens telecomunicadas. O material impresso é propício à generalização e abstração; a emissão é dirigida ao imediato e específico." Essa tendência à interiorização propiciada pela televisão é acentuada, presentemente, não só pelos videocassettes, mas também pela televisão por cabo. Depois que o Time Inc. vendeu suas estações de televisão e rádio para se concentrar em atividades audiovisuais como o vi172 R.C.P. 3/73 deocassette e a televisão de cabo (CATV), muitos for am os que passaram a temer, nos Estados Unidos, pelo futuro das grandes cadeias de televisão. Ameaçando as emissões de massa - nos Estados Unidos as transmissões coast-to-coast, no Brasil os famosos "via Embratel para todo o Brasil" - a televisão CATV inaugura a programação personalizada. Seu sucesso determinará o fim das pesquisas de opinião e o inicio da escolha do programa e da informação que mais interessem a cada um. Prevê-se, até, programações absolutamente individuais. O sistema CATV, hoje um fenômeno urbano, surgiu para atender à necessidade tipicamente rural: levar a imagem televisada a pequenos lugares até onde não chegavam ou chegavam com grandes deficiências as emissões normais. A imagem inicialmente era captada por uma antena coletiva e transmitida, lar a lar, por fio, oferecendo uma imagem perfeita, sem as desagradáveis interferências produzidas pelos obstáculos físicos. A partir desse emprego quase doméstico, o processo se desenvolveu até a instalação de estações destinadas ao sistema de transmissão por cabo. Uma emissora pode oferecer simultaneamente (para escolha do assinante) até 60 ou 100 programas diferentes, a um custo baixíssimo, pois as instalações transmissoras, por força do fio, dispensam os grandes investimentos dos sofisticados transmissores dos canais comerciais. Essa característica técnica chega ao quase milagre de proporcionar custos baixíssimos em transmissões para grandes centros urbanos e para pequenos circuitos como um bairro, uma rede bancária, etc. Que proporciona a CATV? Seu emprego, pode-se dizer, vai até onde possa chegar nossa imaginação. Pode ser utilizada numa rede comercial possibilitando, por exemplo, realização de compras pela televisão; ligação de r esidências, redações de jornais, universidades, a um centro de computação; interligação de centros de pesquisa; interligação de complexos industriais ou estabelecimentos comerciais; realização de debates públicos conduzidos por televisão bidirecional; transmissão de programas educativos; realizaç.ã o de cursos; cotações personalizadas da bolsa de valores; ligação da bolsa ~om escritórios de corretores, bancos e financeiras; programas destinados a pequenos círculos; debates de matérias e assuntos vedados ao grande público. Pode, ainda, alcançar o cúmulo da sofisticação de possibilitar a um assinante a escolha de um determinado programa e sua recepção na hora, em casa, numa transmissão privada, pessoal, exclusivamente destinada ao seu receptor. No campo da educação, inumeráveis são as formas de seu emprego. Na Resenha bibliográfica 173 imprensa, pode ligar sucursais entre si, redações e centros de impressão, empresas noticiosas e seus diversos assinantes e, por fim, propiciar a emissão do jornal audiovisual. O grande salto ~erá oferecido pela associação da CATV aos gravadores de videotapes portáteis e aos videocassettes. Sua dissenúnação se fez de forma muito rápida. Em 1965, nos Estados Unidos, era de cerca de 2 milhões o número de assinantes do sistema CATV; essa cifra elevava-se já em 1971 para quase 5 milhões e cerca de 2 500 estações transmissoras. Para 1980 as previsões estimam em 27 milhões o número de assinantes. A figura do assinante proporcionará a essa televisão a possibilidade, negada pela televisão aberta, de programações em absoluto acordo com a qualificação do telespectador. Assim, serão possíveis emissões destinadas, por exemplo, a donas de casa, médicos, advogados, executivos, de que resultará, a um tempo, tanto a possibilidade de verticalização da informação quanto a eficiência da mensagem, emitida diretamente ao público a que se destina, num caso e noutro, promovendo, cada vez mais, a individualização e a privatização. Mas a CATV poderá constituir-se numa esperança futura do monopólio que ameaça a imprensa, falada , escrita e principalmente televisada. Possivelmente, os inconvenientes da interiorização, do individualismo, num mundo em que a competição estimula o individualismo, serão compensados pelo aumento de opções proporcionado pela CATV. Aliás, aumento de opções que pode ser proporcionado pelo sistema de CATV desde que este não caia, também, sob o controle do Estado ou dos mesmos cartéis que manipulam e estandardizam as outras emissões. Infelizmente nada nos assegura que o sistema CATV possa ser implantado de forma diversa do monopólio que controla a imprensa americana, como descrito por Bogart. Conheça as obras de Ciência PoHtica editadas pela Fundação Getulio Vargas. Peça nosso catálogo. O endereço é: F. G. V., Serviço de Publicações, Praia de Botafogo, 188, Caixa Postal 21.120, ZC-05, Rio de Janeiro, GB, Brasil 174 R.C.P. 3/73 RESENHA BmLIOGRAFICA R.A. AMARAL VIEIRA A LUTA PELA INDEPEND:tl:NCIA DAS AMÉRICAS - IDSTóRIA DE SEUS HERóiS E MARTIRES, Osvaldo Orico, Edições Atelier de Arte, 1972. Trata-se de uma edição que, do ponto de vista gráfico, caracteriza-se pelo cuidado e bom gosto. A encadernação é rica e engenhosa, a impressão quase perfeita, a diagramação em geral e a escolha de tipos e corpos sempre feliz. Nossos parabéns ao Atelier de Arte. Uma única restrição pode ser feita à mancha tipográfica que, adotando uma linha de composição de 28 cíceros (sete, pelo menos, a mais que a linha comum), terminou por constituir-se em elemento perturbador da leitw·a. Mas, por outro lado, fun.cionou muito bem o aproveitamento da idéia - já concretizada em outros livros - de fugir à axiomática impressão em preto, optando os podutores do livro por um tom suave e repousante entre o azul e o verde. Quanto à organização editorial qa obra, todavia, cabem alguns reparos. O mesmo editor que se lembrou de destacar o justo copyright de Osvaldo Orico, esqueceu-se do dever de explicitar os demais créditosJ como, por exemplo, o do autor ou autores das 22 ilustrações que abrem os 22 capítulos em que se divide a obra. Não há, também, a menor referência a Vitor Meirelles, embora a capa do livro e a folha de rosto sejam montadas a partir de sua tela clássica. O sumário indica os heróis que mereceram o destaque de um capítulo, mas não fornece a página em que cada um tem início. Fica, assim, praticamente sem função, tornando difícil a pesquisa e a localização do texto do interesse do leitor. Outra critica pode ser formulada quanto à bibliografia. De fato, não se compreende que obra dessa natureza - que já se ressente da ausência de um índice analítico - de professado ~I R. Ci. pol., Rio de Janeiro, 7{1): 119-128, jan./mar. 1973 caráter científico e didático, abordando o processo libertário em todas as Américas e refazendo a biografia de nada menos de 22 heróis nacionais, possa ser escrita sem auxílio de uma extensa bibliografia, alimentando-se apenas da erudição e da memória do autor. :f: que não há menção, de qualquer natureza, à bibliografia acaso consultada. No prefácio há uma referência a "levantamento" de William Borders, mas o leitor termina sem saber onde o autor foi colher os elementos que manipula: "Segundo um levantamento de William Borders, debate-se agora, em toda a África Negra, qual deve ser a língua oficial dos novos países chegados à maioridade política, em face do conceito expendido por um colunista nig.e riano: Aceitar um idioma ·estrangeiro para sempre é continuar escravo dele." Onde foi localizado o levantamento do Sr. William Borders? Quem é esse "colunista nigeriano'~ e de onde foi retirada a irase que lhe é atribuida? Adiante (p. 12), encontramos: "A tese" (nacionalismo linguístico) "ganha dimensões: em Dacar, diretores de cinema senegaleses substituem os letreiros em francês pela língua wolof) enquanto as aeromoças de Nairobi, Quênia e outras regiões nacionalistas se dirigem em swahilZ a passageiros que só entendem o inglês." De quem é a autoria do texto entre aspas? De Borders? Do incógnito "colunista nigeriano"? De um terceiro especialista? Orico não informa. Além dos 22 ensaios biog.ráficos - analisando as figuras de W ashlngton, Jefferson, Tiradentes, Miranda, Bolívar, San Martin, O'Higgins, Carrera, Santander, Sucre, Toussant-Louverture, Morazan, José Bonifácio, Pedro I, Hidalgo, Morelos, Juárez, Cavallero, Francia, Artigas, Montalvo e Martí - Osvaldo Orico nos oferece, em prefácio, um estudo globalizante do movimento pela independência das Américas, com destaque, nos sucessos do papel de cada um dos diversos heróis. Nesse estudo introdutório, Orico minimiza os efeitos do enfoque que caracteriza as diversas biograrias, nas quais tende a confundir o fato em si com o papel nele desempenhado pelos diversos heróis, despojando a história de seus determinantes econômicos, culturais, etc. No prefácio, todavia, o estudo que sobreleva é a análise do desenvolvimento contemporâneo das jovens nações africanas, despertadas para a independência e para o progresso. A um tempo, o autor identifica a presença do 120 R.C.P. 1/73 Brasil nas origens da luta libertária africana e reclama nossa participação, desinteressada, no processo de construção econômica dos novos países. Após admitir que o conceito de independência, em nossos dias, adquire conotações diversas das conhecidas nos fins do século XVIIT (escreve: ''Dividida hoje a Humanidade em duas grandes órbitas, que se disputam até o domínio dos astros, a palavra independência perdeu as características que possuía nos fins do século XVIII e nos começos do século XIX, quando se processou a autonomia das colônias americanas") Osvaldo Orico, sem definir a nova independência afirma a perda, pelo conceito clássico, das características ideológicas em proveito do "novo caráter" do choque racial: "A luta entre Leste e Oeste, acordando os instintos do pau-americanismo e acendendo o rastilho das reivindicações à Asia e à Africa, tirou do vocábulo o sentido ideológico, para imprimir-lhe uma caracterfstica diferente: o choque racial". Parece-nos - seja permitida a projeção em vista dos poucos elementos fornecidos - que o autor se aproxima dos que, hoje, aceitam a substituição do conceito político de independência pela noção de interdependência, fórmula, que consagraria não apenas a disputa Leste-Oeste mas, sobretudo, a administração em condomínio da humanidade, mormente dos países integrados no chamado "terceiro mundo": América Latina, África e Ásia. O registro do novo tratado de Tordesilhas só tem sentido ao escritor do terceiro mundo quando, ao lado dessa afirmação, segue-se a pronta negação de seus fundamentos e o propósito de sua denúncia, sem o que nenhum país, quer africano, quer latino-americano, quer asiático, alcançará, seja a independência políticfl, seja a interdependência político-econômica, essa escamoteada num conceito abstrato de independência harmonizada aos interesses das duas potências líderes. Embora tendendo a aceitar o conceito de interdependência e portanto, pois é a ele imanente, a fatalidade histórica que destinou um país ao leste e outro oeste - Osvaldo Orico põe em relevo, no conturbado quadro da luta pela independência na África, a contradição dos interesses econômicos: "Ninguém desconhece a luta de interesses que se esconde atrás da benevolência com que certos países colonialistas transigem diante do fato político e social, para poderem preservar o domínio econômico. Disso era índice o caso do Congo. Pela sua posição geográfica, que o transforma em trampolim em pleno coração da Africa, tem o Congo uma enorme importância estratégica para o mundo ocidental. Talvez as inquietações políticas dos negros e os seus sonhos de sobeResenha. bibliográfica 121 tania não sofressem maiores atropelos se, por baixo deles, não se encontrassem as jazidas de cobre e urânio da província de Katanga''. Na história africana contemporânea, Osvaldo Orico vê a presença da índole brasileira, representada pelo africano-brasileiro que fez a viagem de volta às origens étnicas e culturais: 11 É curioso assinalar nas manifestações com que a Africa reclama sua libertação às raizes americanas de seus heróis. Vinculam-se a elas escravos brasileiros emigrados ou restituídos ao continente negro após a abolição do cativeiro e que ali continuaram a viver. Desses velhos clãs familiares estão saindo muitos dos caudilhos que abrem caminho às novas soberanias africanas. Entre eles, Sekou Touré, presidente da Guiné, neto de brasileiros. Fizeram a viagem de volta. Muitos trazem ainda no nome a marca da origem: no Toga, o primeiro-ministro Silvano Olímpio, o ministro dos Serviços Públicos Paulino Freitas e o líder nacionalista, Agostinho dos Santos. "O atestado mais positivo de nossa influência no processo emancipador das colônias africanas está nas cores verde e amarelo da bandeira nacional do Togo, que traduzem as que escolhemos para o nosso pavilhão. "Segundo o depoimento do escritor Amilcar Alencastre" (Onde? Qual o texto do depoimento? Em que obra foi publicado?), "que se especializou na observação e estudo do processo emancipador das colônias africanas, encontram-se vários descendentes de escravos brasileiros atuando ativamente no Camerum, no Mali, em Gana, no Congo, em quase todo o litoral da Nigéria. Dos Estados Unidos também fizeram ·a viagem de volta escravos americanos; mas estes, restituídos ao habitat de, seus antepassados preferiram constituir núcleos à parte, estabelecendo dois grupos sociais distintos: os liberiano-americanos e os lorma-africanos. Acenderam entre si uma divergência íntima, de que só agora se estão libertando para vencer os antagonismos e chegar a um plano de integração nacional, ao passo que os descendentes de escravos brasileiros, retornando à Africa, levaram na sola dos pés as marcas da convivência pacífica com outros grupos humanos." Osvaldo Orico opõe-se ao apa:rtheid e à discriminação racial. Mas não consegue livrar seu raciocínio das armadilhas do pensamento idealista: "Esta ( ... ) deixou de ser uma simples revolta da cor contra a chibata e a espoliação; adquiriu fundamentos filosóficos e morais que desafiam o respeito dos brancos." 122 R.C.P. 1/73 Está implícito, no texto assim posto, o reconhecimento da superioridade do branco sobre o preto - e isto é discriminação - e o respeito do branco, como colocado, soa como uma concessão. A discriminação só desaparece, efetivamente, quando em nossas bases de valores - e portanto na formulação de nosso raciocínio - não precisamos de distinguir os homens en1re si, entre brancos e negros por exemplo. A indicação do fator econômico como centro da luta colonialista na África contemporânea, tese que se destaca no ensaio de Orico, é repetida quando (p.ll) reafirma: "Alguns Estados a{ricanos padecem ainda de certa imaturidade econômica que lhes garanta a maioridade política." Em outras palavras, o que se lê é que na A.frica - e por extensão na Asia e na América Latina - a luta pelo desenvolvimento econômico permanece como o caminho mais seguro para a emancipação política. A independência é um mito que se consome na retórica se não se faz acompanhar da soberania econômica. Como tal não nos referimos à auto-suficiência, cada vez mais distante no mundo da tecnologia, mas às bases mínimas de uma estrutura econômica que assegura ao Estado os meios de prover seu próprio desenvolvimento. Osvaldo Orico, todavia, na mesma página 11, desenvolve uma tese perigosa, máxime quando seu autor vive em um país que não possui economicamente mais de 50% do vasto território que domina politicamente. Desdobrando a idéia, corretíssima, do desenvolvimento econômico cimentando a independência econômica, chega porém a admitir a necessidade de tutelas aos não desenvolvidos: " ( ... ) Não há, porém, o que reprovar e criticar, se levarmos em conta que, decorrido meio século e mais ·após suas mudanças essenciais, a América inglesa e a América Latina ainda apresentam áreas incapazes de merecer economicamente a soberania política, necessitando de serem tuteladas ou orientadas na gradual conquista de sua autonomia". Esse paternalismo colonialista muito mal colocado na pena de um escritor latino-americano é o grande argumento de que se servem as nações que ainda tutelam a .África e a Asia, no esforço de oferecer à opinião pública uma justificativa moral para a imoralidade em que se constitui a opressão de povos e nações. Parece-nos uma fratura em seu pensamento claramente antiracista a procura de elementos raciais pouco identificados nas razões de diferentes formações políticas no continente africano. Osvaldo Orico afirma que as colônias administradas por ingleses, portugueses e espanhóis desfrutam de certa normalidade política, enquanto as nações puramente africanas apresentam-se num deResenha. bibliográfica 123 sassossego político. Em hnguagem de sintese, o sangue europeu, nas primeiras, teria determinado o "progresso" e a estabilidade; o sangue africano seria o responsável pelo atraso e pela agitação política: ·~nquanto as colônias inglesas, portuguesas e espanholas da América se acomodaram aos regimes escolhidos para autogovernar-se, as jovens nações africanas experimentam um desassossego íntimo que as faz escravas de sua própria inquietação, sacudidas a cada momento pela ameaça de golpes militares". Se a realidade africana é, realmente, essa dicotomia entre estabilidade e desassossego, é do melhor conselho científico extrair da análise os preconceitos raciais e procurar nas estruturas econômicas, nos determinantes políticos, as causas profundas e reais da inquietação, essa na verdade, como o próprio Osvaldo Orico sugere em outras passagens de seu livro, provocada e estimulada de fora para dentro pelas grandes potências que disputam entre si o subsolo do continente negro. A instabilidade política e os golpes militares são, de fato, apenas uma das faces da mesma moeda, a forma de que se utilizam as nações colonialistas para conduzir na direção dos seus próprios interesses a vida das nações que precisam explorar. Visto assim, em suas linhas gerais, o pensamento que dominou a elaboração da obra, resta-nos ingressar na análise de seu texto propriamente dito, e sobre os ensaios biográficos. Na impossibilidade de comentar os 22 ensaios biográficos, optamos pela análise do estudo da vida do protomártir de nossa Independência. Osvaldo Orico inicia o estudo sobre Tiradentes reclamando da injustiça dos pósteros no delineamento da imagem do herói <la lndependência que não teria, nos quadros de nossa história, o destaque que seu papel exigiria. Atribui a esse pouco destaque ( ... ) o fato de Tiradentes, com a Inconfidência, haver-se levantado, de uma só vez, contra Portugal e contra a Monarquia (p. 43). Mesmo com a Independência, não se poderia fazer justiça ao Alferes, afirma, pois, se D. Pedro I chegaria ao ponto de nos libertar rompendo com a pátria-mãe, não poderia restabelecer a memória daquele que fora condenado por sua avó-Rainha justamente pelo crime de haver intentado separar o Brasil de Portugal e destituir aqui o poder reinal. Segundo Osvald<> Orico, somente um Estado republicano poderia consagrar Tiradentes que fora, a um tempo, libertador e republicano. Daí o pouco prestigio desfrutado por Tiradentes ( ... ) . Til'ante o discutído interesse da monarquia do Brasil independente em exaltar a figura do primeiro mártir dessa mesma Independência, resta lembrar que a República já dispõe de 83 anos ... , tempo bastante para o restabelecimento da imagem do alferes. E, por concessão da Monarquia ou méritos post124 R.C.P. 1/73 republicanos, o fato é que, ao contrário do que afirma Osvaldo Orico, de todos os vultos de nossa história, o que mais avulta na consciência de nossa gente é a figura de José Joaquim da Silva Xavier, cantado, em seu heroísmo em prosa e verso, herói não apenas à vista dos estudiosos mas, fato excepcional, do homem comum que o idolatra como a um santo, tema até do cancioneiro popular. Ao contrário do que afirma Orico, nos textos para a juventude, particularmente nos textos didáticos, pouco se fala nos cimentadores de nossa nacionalidade, reduzindo-se mesmo a Inconfidência à figura do Alferes. Qualquer ginasiano nos contará a história de Tiradentes, mas poucos, pouquíssimos, poderão arrolar seus companheiros de subversão, ou destacar o papel de Alvarenga, Cláudio Manuel da Costa ou Tomaz Antonio Gonzaga. José Bonifácio, outra figura maior de nossa história, é simples coadjuvante nas biografias de D. Pedro I e este, só agora, começa a ter seu verdadeiro papel delineado. Até bem pouco, os méritos de estadista eram escondidos por uma crônica que se limitava a descrever-lhe a impetuosidade, a imaturidade e o mulherismo. Ainda hoje ensina-se ao nosso colegial as aventuras do jovem Imperador com a Marquesa de Santos, ao tempo que se omite a figura do herói do cerco do Porto, do responsável pela implantação do liberalismo em Portugal. Mesmo no livro de Osvaldo Orico, enquanto o ensaio sobre Tiradentes atinge a 15 páginas, o estudo sobre José Bonifácio não vai além de seis páginas e o dedicado a D. Pedro I fica em oito páginas ... Infelizmente, o texto sobre Tiradentes não é uma obra "reparadora" mas até certo ponto, desabonadora da conduta de seus companheiros de subversão. À página 44, por exemplo, escreve 1 Orico: ' Tiradentes1 herói popular direito e antilivresco, antecipará o sonho do homem americano nas terras da coroa portuguesa, e suportará sozinho, sem companheiros nem hesitações, todas as culpas e todos os riscos do direito de opinião. Enquanto os cúmplices de conspiração procuravam atalhos para desertar das malhas do processo, ele evocava a responsabilidade total do movimento, reunindo todas as parcelas da Inconfidência Mineira numa só expressão humana". Entendemos o episódio de outra forma. Se os membros da Inconfidência- intelectuais, poetas e escritores levados ao sonho por impulsos mal medidos - tiveram, nas horas mais duras da repressão, momentos de crise e de fuga, nada há de condenável nessa conduta. Não cabe àqueles revolucionários colaborar com as forças de Barbacena e era legítima toda a tentativa de negar o fato e dificultar a ação policial. A Resenhq. bibliográfica, 125 tortura, de que todos foram vítimas, foi, aliás, o instrumento de que se valeu a repressão exatamente para arrancar de cada um a co~ssão que daria fundamento jurídico ao processo e forneceria munição para o desbaratamento do resto da conjuração. Trradentes - a1 estão os Autos da Devassa - no primeiro momento, teve o mesmo comportamento de seus cúmplices, isto é, negou e negaceou, procurou todos os atalhos possíveis para fugir da condenação; só na segunda fase do processo é que admitiu a culpa e assumiu a responsabilidade pelo movimento. Outro reparo necessário é quanto à classificação do delito de Tiradentes. Osvaldo Or ico entende que os conjurados arrastaram contra si "os riscos do direito de opinião". Há uma distância, que não é um simples liame, entre os delitos de opinião e o de sublevação, com mudança da ordem jurídica. A Inconfidência não foi um movimento de opinião, mas uma tentativa de subversão da ordem constituída que se consubstanciaria na ruptura de nossos laços com Portugal, na destituição dos governantes e na implantação de novo regime, o Republicano. Depois de afirmar que Tiradentes era um herói "antilivresco" (p. 44) , Osvaldo Orico intenta pr ovar a difícil ascendência cultu- ral de Tiradentes sobre os companheiros de ação, e daí, a liderança do grupo. Escreve (p. 48): ''Não lhe faltaram missões de confiança impostas pelo desempenho cabal de funções que, embora modestas, atestavam lisura de conduta, capacidade de ação e sentido de comando. Os testemunhos recolhidos sobre sua folha no Serviço de Cavalaria indicam um militar compenetrado, que levava a sério as obrigações contraídas na tropa, completando-se com estudos que o situam no plano dos estudiosos de problemas hidrológicos. Não se limitou a aprender com o padrinho, Sebastião Ferreira Leitão, cirurgião licenciado, a técnica de extrair dentes. Interessou-se pelas questões de canalização de águas, tendo, em uma de suas permanências no Rio de Janeiro, dedicado atenção ao abastecimento de água da cidade, com um plano para o aproveitamento dos rios Maracanã e Andaraí. Se não foram aceitas as sugestões que então ofereceu, nem por isso deixou de ser reconhecida pelos técnicos a viabilidade de seus planos, que lhe conferem um atestado de capacidade no assunto. "Esses dados escassos mas suficientes para nos certificarem de sua idoneidade intelectual põem de lado a idéia de que sua alcunha inscreve no rol dos Inconfidentes a presença de um simples sacamoelas, que houvesse sido vítima apenas da língua solta, no processo a que respondeu perante a história." 126 R.C.P. 1173 Ora, na própria afirmação de Osvaldo Orico, a Inconfidência era "uma conspiração acadêmica, planejada por magistrados e poetas": o desembargador Cláudio Manuel da Costa, o ouvidor Tomaz Antonio Gonzaga, o doutor José Alvares Maciel e o ouvi~ dor Inácio José de Alvarenga Peixoto. Ao passo em que faz essa afirmação, Osvaldo Orico deixa claro o esforço de Tiradentes para acompanhar as viagens intelectuais de seus companheiros e ter acesso ao catecismo da Inconfidência, à Constituição dos Estados Unidos: ''o caso mais típico e expressivo é o do alferes Xavier, que aprende francês" (há dúvidas quanto a isso) "e nele se exercita, recorrendo ao porta-estandarte do regimento a que pertencera e aos padres que se filiaram ao movimento, para chegar a ler os capítulos de um livro em francês, publicado na Suíça, que di~ vulgava o texto da Constituição dos Estados Unidos". Resta não estabelecida a figura intelectual de Tiradentes. Esse comentário se faz - ressalte-se - em vista do texto de Osvaldo Orico, pois não entendemos que Tiradentes necessitasse desse atributo quer para desempenhar seu real papel, quer para merecer a posição de destaque que desfruta na coluna de nossos heróis. Há porém, no texto de Osvaldo Orico, uma passagem que deixa mal o alferes. É seu encontro com Joaquim Silvério, assim descrito: "Encontrando-se no cruzamento de uma estrada com o alferes Xavier, o coronel Joaquim Silvério dos Reis, cujos negócios andavam muito mal parados em conseqüência de suas dívidas e rixas com o fisco, manifestou-lhe seu desagrado com o governo da Ca~ pitania, por ele classificado como abominável e odioso. Ouvindo-o, o alferes sentiu nesse desabafo a oportunidade de conquistar mais um elemento para a rebelião. Seduzido por tais manifestações, o aUeres não teve dúvidas em requisitá-lo para o levante, contandolhe os planos já elaborados e o cálculo das probabilidades favoráveis aos inconfidentes. Teria sido leviano? Falastrão? Ainda que a fluência de seus argumentos lhe acarrete a responsabilidade de boquirroto, não se pode culpá-lo pelas conseqüências que sobrevieram daquele colóquio inesperado. Ao sair dele, esperava o al~ feres ter conquistado mais uma adesão para sua causa, enquanto Joaquim Silvério encontrava uma solução para seus problemas." Na p. 55, Osvaldo Orico se insurge contra a expressão Inconfidência Escreve: "Muita coisa está errada na caracterização e julgamento da conspiração mineira, a partir do nome com que é mais conhecida e registrada nos anais da História: o de Inconfidência. Reaen1lll bibliográfica, 127 Embora usado geralmente como sinônimo de conjuração, inconfidência signifca infidelidade ou traição ao Rei. Ora, se o movimento originário de Vila Rica visava a autonomia da colônia e sua transformação numa república independente, se havia um programa para libertar o povo da tutela de Portugal e dar-lhe condições econômicas e políticas diversas daquelas a que estava submetido, se havia um programa estabelecido ao arrepio das normas que o encadeavam a uma tutela estranha aos seus anseios e necessidades, a conjuração mineira deixava de ser uma traição ao Rei para ganhar a autenticidade de um movimento de independência tão natural como o que legitimou a revolta das colônias inglesas da América." Por tudo isso é que o movimento foi uma inconfidência. Que pretendia o movimento, senão separar o Brasil de Portugal, derrubar a administração colonial e instalar a República? Tratava-se, portanto, de um quadro de subversão da ordem com o emprego, inclusive, da violência. Era portanto um movimento que, malgrado atendesse aos anseios mais cívicos da nacionalidade brasileira, e talvez por isso mesmo, era um movimento contra Portugal e a Rainha. Ao fim do texto, a idéia que Osvaldo Orico nos deixa da Inconfidência é a de um movimento sem raízes mais profundas, sem perspectiva nacional, municipal e provinciano, "sem voz ativa na tropa e sem retaguarda nos quartéis", gerado e perdido por intelectuais idealistas mas ingênuos. Um movimento sem maior profundidade, enfim, destacado e 1·eprimido com extremo rigor, não pelo que representava em si, mas, principalmente, como instrumento para uma advertência a todo aquele que intentasse contra o Reino. 128 R.C.P . 1/73 RESENHA BffiLIOGRAFICA R.A. AMARAL VIEIRA 1. Pensamento Marxista y Sociología. Henri Lefebvre, apud Revista. Mexicana de Ciência Política, n. 62. A Revista Mexicana de Ciência. Política inaugura o número 62, dedicado à visão da sociologia contemporânea, com o artigo Pensamiento marxista y sociología, do discutido pensador francês Henri Lefebvre. Trata-se, de fato, do primeiro capítulo de seu livro Sociologie de Ma1·x, editado na França em 1966 pela Presses Universitaires de France e lançado no Brasil em 1968, pela Cia. Editora Forense, sob o título Sociologia de Marx. O artigo vale o livro (do qual, aliás, é o primeiro capítulo), e assim está justificada esta resenha. Henri Lefebvre, pensador independente apesar de sua filiação marxista, dá curso a projeto audacioso intentado inicialmente com o livro Marx, sa. vie, son oeuvre, avec un exposé de sa philosophie (Paris, Presses Universitaires de France, 1964) : uma nova leitura de Marx. Não é uma releitura, mas o que claramente denomina de revisão do marxismo. Sua revisão foi imediatamente confundida (pelo marxismo ortodoxo) como traição ao texto original, embora, convenhamos, revisão não implique, necessariamente, em revi.sionismo, no sentido pejorativo com o qual o marxismo oficial impugna as incursões doutrinárias menos ortodoxas, como esta de Lefebvre. Bem entendido o propósito do pensador francês, não se trata de retirar as categorias fundamentais do marxismo, ou mesmo contradizê-las, ou lê-las com outras palavras, mas reler procurando R. Cl. pol., Rio de Janeiro, 6(4): 107-122, out./dez. 1972 criar, se o texto original é criador ou ensejador de criação. (Re) Ler levando em conta toda a experiência humana acumulada a partir da morte de Marx. Sem entrar no mérito das proposições de Lefebvre, inserimos seu estudo entre as mais recentes contribuições européias visando à análise crítica de uma filosofia, no caso o socialismo, posto em questão pelo que ele mesmo (Lefebvre) denomina, sem definir, de "desenvolvimento contraditório do pensamento marxista e do mundo moderno". Não lhe ocorrendo a necessidade de quaisquer explicações, ou esclarecimentos, cabe ao leitor identificar, de sua parte, o que terá sido esse "desenvolvimento contraditório". O stalinismo ou a desestalinização? A CJ:ise sinosoviética? O burocratismo? A ditadura? A invasão da Hungria? Praga? Não define nem esclarece. Como o projeto não está concluído, pode ser que o esclarecimento e a definição surjam mais tarde. A partir da consciência desses desvios, Lefebvre propõe-se a uma tarefa extraordinária e que certamente deitou ciúmes nos centros ou institutos de estudos marxistas dos países socialistas: manter firme o espírito dialético em oposição ao dogmatismo. Ora, o projeto, em si, na sua simples formulação já envolvia uma grave denúncia. Pressupunha a soberania do dogmatismo sobre a dialética. Eis uma tentativa de explicação: o stalinismo - antidialético - suprimira a construção doutrinária, ensejando o desenvolvimento de verdadeiros quistos, antíteses (que ironia!) dentro do corpo do marxismo-leninismo. Seu filho dileto - o tecnoburocratismo soviético e a política chauvinista de grande potência dele decorrente - seria fruto dessa fase de negação. Esse é o quadro atual que se apresenta a Lefebvre. Lembrando Sartre, Lefebvre procura corrigir o marxismo, pelo qual se confessa irresistivelmente atraído, malgrado as ostensivas reservas dos ortodoxos que não aceitam quer o filósofo da náusea, quer o pretenso revisor do marxismo. Se Sartre intentou incorporar ao marxismo categorias fenomenológicas da primeira fase (idealista-heideggeriana) de seu existencialismo, Lefebvre lançar-se-ia a uma tarefa ainda mais audaz, e de resto irrealizada, que é a revisão, no sentido já fixado, de toda a doutrina. Nesse ponto surge a crítica a Lefebvre, acusado de fraturar, negando-os, os fundamentos de uma doutrina que se procura manter viva e enriquecida, com a criação. Estranhamente, Lefebvre, que combate a dogmatização da doutrina, é acusado, pelos dogmáticos, de haver tentado violentá-la. Ora, a consciência da crise (o desenvolvimento contraditório do pensamento marxista) e a decisão de (contribuir para) superá-la (tarefa esboçada 108 R.C.P. 4/72 em Sociologie de Marx) não autorizam - eis a objeção fundamental a Lefebvre - aceitar como socialismo criador a revisão dos pontos básicos (seu projeto) fundamentais e estruturais da doutrina. Mas não foi essa a missão a que Lefebvre se propôs. De qualquer sorte, o campo deixado livre às intervenções do filósofo (de Lefebvre e outros), todavia, j~ inexplorado: revisão do que foi feito sem suficiência, explicação de textos obscuros, adaptação do pensamento original às situações modernas que o filósofo e historiador (seja permitida essa afirmação) não pôde prever. Lefebvre mais uma vez parece vítima de incompreensões. O que seu interessante ensaio defende, precisamente em Pensamiento marxista y sociología, é a existência de uma sociologia de ou em Marx. E isso não é um crime, nem mesmo à luz do marxismo. Mas também nesse ponto seu pensamento encontra restrições junto de muitos filósofos engajados para os quais o materialismo histórico se bastaria como sociologia geral, ao conter as leis gerais de toda a sociedade. Não se justificam as críticas a Lefebvre, até porque, seja na crítica ao oficialismo {ou ortodoxismo), seja na formulação da tese ge1·al, o filósofo francês não inova nem cria: s,implesmente relê {e portanto não re-visa), mantendo-se assim rigorosamente dentro dos limites de seus propósitos iniciais. Não se trata de (mais uma vez) ressuscitar o jovem Marx (Althusser) , pois, é inescamoteável; seus escritos, quer políticos, quer históricos, quer econômicos, desenvolveram-se sob o prisma sociológico, razão pela qual mesmo os fenômenos históricos e econômicos são estudados pela perspectiva do fenômeno social total (global). Um mérito a mais destaca-se do ensaio: Lefebvre afasta as interpretações historicistas e economicistas sem incidir no erro, comum, de substituir o historicismo ou o economicismo pelo sociologismo. Neste ponto é injusta qualquer acusação de haver abandonado as nascentes de seu pensamento. Assim e por isso não deveria haver uma sociologia em Marx, se o materialismo histórico é a sociologia do marxismo, esta entendida como a teoria geral do desenvolvimento social: seu objeto é o estudo dos fenômenos históricos, econômicos etc., não apenas segundo suas leis particulares, mas segundo a perspectiva do fato social em sua integralidade. A crítica comum dos marxistas a Lefebvre é, em síntese, a de que não haveria sociologia, mas marxismo. Para essa corrente, mesmo a existência de uma sociologia em Marx (uma capitis deminutio no materialismo histórico?) não permitiria ver sua obra pelo prisma das divisões disciplinares; tratar-se-ia de um método Resenha bibliogTáfiea 109 Visando a uma totalidade que, não sendo unívoca, é diferenciada. Resistiria, assim, por exemplo, aos apelos às especializações e à tendência à concepção interdisciplinar com que no Ocidente procuramos superar a compartimentalização. Lefebvre sugere a existência nos textos dos filósofos "de Tréves - e em O capital notadamente - de uma sociologia das cidades e do campo, dos grupos sociais, das classes, das sociedades em seu conjunto, do conhecimento, do Estado etc. Ora, se o fundamento da existência social é a atividade efetiva de sujeitos humanos concretos (Marx) , a afirmação de Lefebvre não é uma heresia. A criação, ou sua tentativa honesta, não pode ser questionada por nenhuma filosofia, muito menos por uma doutrina que se afirma dialética, em construção, um sistema, um método de análise e uma doutrina política. Se ela não é uma obra acabada, se tudo, e também a doutrina, é mutação num mundo que é um projeto, é justo e honesto o projeto de Lefebvre. O projeto continuado de Lefebvre não é rever, mas reler (e por que não rever?); competirá ao leitor (a quem sugerimos o texto completo Sociologia de Marx, edição da Forense), decidir se a revisão (ou simples releitura) redundou em revisionismo, ou seja, se houve emulação ou criação. 2. O Arquivo Nacional e as comemorações do Sesquicentenário Contribuindo para as comemorações do Sesquicentenário da Independência, o Arquivo Nacional editou As Cartas Régias de 1.0 , 2 e 6 de agosto de 1822 e O constitucionalismo de D. Pedro I no BrasiL e em Portugal. O primeiro volume reúne o fac-símile das famosas cartas de D. João dirigidas ao Príncipe Regente e que teriam dado motivo ao Grito do Ipiranga. São essas cartas: 1. Carta Régia mandando anular a Convocação do Conselho de Procuradores. 2. Carta Régia mandando investigar os moti'\l'os do não-compárecimento dos deputados de Minas Gerais às Cortes. 3. Carta Régia sobre a residência do Príncipe, instalação das juntas governativas e nomeação de Ministros para o Brasil. 4. Carta Régia mandando processar os membros da Juntil Provisória do Governo da Província de São Paulo e os signatários do discurso dirigido ao Príncipe Regente. De acordo com vários estudiosos, historiadores, essas teriam sido as cartas que o Mensageiro real, Bregaro, teria levado ao encontro do Príncipe, acompanhadas de cartas da Princesa D. Leopoldina e de José Bonifácio incitando o Príncipe à independência. De fato, essas cartas só chegariam ao Brasil e 110 R.C.P. 4172 às mãos do Príncipe depois da nação emancipada. O que D. Leopoldina e José Bonifácio enviaram ao Príncipe, alcançando-o às margens do Ipiranga, foram antecipações dessas cartas, notícias chegadas ao Rio com o brigue Três Corações que aportara a 7 de setembro. As cartas, datadas de 1.0 , 2 e 6 de agosto jamais chegariam ao Rio em tempo de motivar o grito de independência (7 de setembro). Talvez por isso mesmo tenham sido preservadas, incólumes. Na apresentagão do volume, escreve Raul Lima, diretor do Arquivo Nacional: "O Arquivo Nacional guarda, entre as preciosidades do seu imenso acervo, as Cartas Régias que D. João VI, comunicando decisões das Cortes portuguesas, dirigiu ao Príncipe Regente D. Pedro, datadas de 1.0 , 2 e 6 de agosto de 1822. Contêm elas as medidas, além de outras, das quais a 28 do mesmo mês a Princesa D. Leopoldina e José Bonifácio de Andrada e Silva tiveram notícias com a chegada do brigue Três Corações, entrado no porto naquele dia. E que foram transmitidas ao Príncipe a 7 de setembro, às margens do Ipiranga, provocando o grito memorável. Chegadas quando a nação já se emancipara, as cartas são pouco conhecidas na íntegra. Varnhagem refere-se apenas às de 1.0 e 2 de agosto, publicadas pelo Visconde de Cairu. Entretanto, elas, mais do que tudo, justificariam a decisão libertadora. Estão aqui reproduzidas em fac-símile, uma delas com os respectivos anexos, em publicação comemorativa do Sesquicentenário da Independência promovido pelo Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e a Comissão Executiva Central do Sesquicentenário da Independência com a colaboração do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo". O segundo volume, O constitucionalismo de D. Pedro I no Brasil e em Portugal contém, antecedidos de introdução de Afonso Arinos de Melo Franco: fac-símiles de um trecho de carta de D. Pedro I; artigos da Constituição escritos pelo Conselheiro Francisco Gomes da Silva, o Chalaça; e de trecho da Constituição escrito pelo mesmo Conselheiro, com emendas em caracteres maiores e mais fortes da caligrafia do Imperador. Anotações, adições e emendas do Conselheiro Francisco Gomes da Silva à Constituição do Império do Brasil para adaptá-la como Carta Constitucional da Monarquia Portuguesa. Anotações, adaptações e emendas à Constituição do lmpérito do Brasil por D . Pedro I sobre as adaptações sugeridas pelo Conselheiro Francisco Gomes da Silva. Texto final da Carta Constitucional da Monarquia Resenha bibliográfica 111 Portuguesa resultant-e de adaptação, feita por D. Pedro I e pelo Conselheiro Francisco Gomes da Silva, da Constituição do Império do Brasil. Na apresentação, escreve Raul Lima: "D. Pedro I passa à história como o fundador do constitucionalismo no Brasil e em Portugal . Nesse papel teve a colaboração intensa, até hoje ainda não devidamente reconhecida em profundidade, como o permitem os documentos, do Conselheiro Francisco Gomes da Silva, o Chalaça. O Arquivo Nacional, neste ano do Sesquicentenário da Independência do Brasil, resolveu publicar testemunhos do trabalho realizado por ambos no sentido de adaptar a recém-jurada Constituição do Império do Brasil para, emendando abundantemente exemplares do Projeto, cujo texto, aliás, é definitivo, elaborar a Carta Constitucional de Portugal, do qual o nosso Imperador era o Rei, como sucessor de D. João VI, embora às vésperas de abdicar em favor de sua filha Maria da Glória que, por sua vez, menor, ficaria sob a tutela do pai até 1834 . Em estudo de alta categoria doutrinária que o eminente jurista e historiador Afonso Arinos de Melo Franco escreveu para esta publicação encontram-se as origens e razões daqueles impulsos constitucionalistas e das idéias aí em ebulição. Apreciando com mais vagar os documentos que vão aqui reproduzidos e outros que, por dificuldades técnicas, deixam de figurar embora interessando ao exame geral e mais profundo do episódio, o Serviço de Pesquisa Histórica do Arquivo Nacional chamou a atenção para outras observações que se podem fazer sobre os pontos de vista, as posições firmes e pretensões dos dois redatores constitucionalistas. Os andaimes da Carta Constitucional da Monarquia Portuguesa que aqui se reúnem não são de- todo desconhecidos. Otávio Tarquínio de Souza, em sua obra História dos fundadores do Império, v. 3. p. 662, limitou suas pesquisas, no caso, aos documentos incorporados ao Arquivo do Museu Imperial, detendo-se apenas no texto emendado por D. Pedro I. Não conheceu o outro exemplar que jazia na Seção de Documentação Histórica, entre os papéis vindos do Palácio de São Cristóvão em 1891, e é o que permite verificar com segurança a verdadeira posição do Conselheiro Francisco Gomes da Silva naquele lance de bastidores da 112 R.C.P . 4/72 história portuguesa. O :referido documento, em virtude de permuta cuidadosamente realizada com o Museu Imperial, possibilitando ao Arquivo Nacional reintegrar valiosa coleção que fora desfalcada indevidamente, passou a pertencer também ao acervo daquele Museu. Não obstante, seu ilustre Diretor, Prof. Lourenço Luis Lacombe, não fez qualquer objeção a esta reprodução. Está aberto aos estudiosos um campo bem interessante para analisar a natureza e o teor das idéias dos colaboradores, cotejando-se as sugestões, aceitações e rejeições por parte de cada um, do que talvez resulte o reconhecimento de papel porventura mais importante do Chalaça. Nota-se sobretudo seu empenho em consignar dispositivos em que o interesse do Brasil prevalecia sobre o de Portugal. Assim a obrigatoriedade de socorro de força armada portuguesa em defesa do Império do Brasü, sem reciprocidade. Chamam atenção suas idéias sobre a nobreza hereditária, rejeitadas prudentemente pelo Imperador. Raciocinando com vistas ao ex.ercfcio, pelo gove1·no do Brasil, da regência sobre o 'Reino de Portugal, a qual deveria normalmente se estender até a declaração de maioridade de D. Maria da Glória, em 1837, cogitou em notas esparsas de artigos disciplinadores dessa regência por todo o período que, entretanto, foi drasticamente reduzido pela antecipação da declaração de maioridade de D. Maria II, em 1834. Mais ainda. No que ficou sendo o art. 96 da Carta, prevendo impossibilidade física ou moral do Rei para governar, situação essa reconhecida por pluralidade de cada uma das Câmaras das Cortes, pretendia que assim também o declarasse a Assembléia brasileira, para em lugar do Rei governar como Regente o Príncipe Real, se for maior de 18 anos. Assim, além dos documentos aqui reunidos, precedidos de tão valioso estudo, fornecerem material de variada curiosidade, que esperamos seja exercida, ainda se encontram nos arquivos outros papéis que podem levar ao conhecimento de detalhes de um dos instantes em que mais esteve interligada, intimamente associada a história dos dois povos, um consolidando a sua Independência e outro iniciando a gestação de novo e atormentado período da vida nacional em que o Rei outorgante da Carta Constitucional foi intervir, como guerreiro e herói, em defesa do trono de sua filha." Resenha. bibliográfica 113 REGISTROS BRASIL AÇUCAREIRO. Publicação do Min.istério da Indústria e do Comércio, Instituto do Açúcar e do Alcool, em seu ano 40 a 79, número 6, de junho de 1972 contém: N ota.s e comentários. IAA: Trinta e nove anos de criação; Apoio à administração; Voto de congratulações; O IAA em Campos; Refinaria no Nordeste; Transportes de cana; Nelson Barbalho; Folclore premia; Nova diretoria; ICCJ do IAA; Homenagem; Coleção "Dimensões do BrasiP'; Homenagem; Ensino técnico; Museus de arte; Lux-Jomal; Recursos; Diálogo; Roteiro cultural; Brasil cinema; Congresso ISSCT; Campanha da Cigarrinha na Câmara. Tecnologia açucareira no mundo. Efeito da impureza na nucleação e cristalização da Sucrose; Entomologia; Chilo Agamemnon Bles; Eldano Wlk. Sacarina; Diatrae Sacaralis na sua dupla variedade; Eulacaspis Tegalensis; Composição química e ação de Sclex; Caso extraordinário da POJ no México; "Sucrose Chemicals" ; Realizações do New York Sugar Trade Laboratory de 70771; Matéria estranha à cana e sua produção econômica. Panorama canavieiro. Fusões; IAA assina convênio com sindicato da orla marítima: preservados os salários dos trabalhadores no porto do Recife; Brasil/ desenvolvimento- plano de saneamento; Ocorrência de cigarrinhas em canaviais de Santa Catarina. A. K. Dodson; O teor fósforo no caldo de algumas variedades de cana-de-açúcar. Marco Antônio Azeredo Cesar, Moacir Roberto Mazzari, Enio Roque de Oliveira; Levantamento das variedades de cana-de-açúcar cultivadas nos estados de São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Goiás. G.M. Azzi; Tecnologia do açúcar (Notas de laboratório e fabricação) Diário real; Medições e pesos; Açúcar aproveitável; Relatório semanal. Cunha Bayma; Estudo sobre o comportamento da cana "bis" em relação às suas características agro-industriais (li). Marco Antôrúo Azeredo César; Cana, engenho e açúcar (I) . Raymundo Souza Dantas; Açúcar no sangue e música na alma. Claribalte Passos; Combate às cigarrinhas; Mercados interno e externo. F. Watson; Fundo de Assistência Financeira; Atos; Bibliografia; Açúcar - congressos e convenções; Destaque. NOTICIAS GRAFICAS. Revista de Economia Política e Desenvolvimento editada no Rio de Janeiro, Brasil, em seu ano 2, n. 13 contém: A vez do Centro-Oeste; A crise do dólar e o comércio internacional; Irracionalismo destruidor; O imposto sobre o valor agregado. 114 R.C .P. 4/72 REFORMA AGRARIA. Boletim da Associação Brasileira de Reforma Agrária. ABRA. Do número 6 de junho de 1972, ano 2, consta: Editorial. Terra, problema também no Sul. Aspectos dos arrendamentos de terras no Rio Grande do Sul. José Luiz Marasco Cavalheiro Leite; O fenômeno migratório e o trabalhador rural no Rio Grande do Sul. Arabela Rota Chiarelli. Notícias. O que vai pelo mundo; Novidades na América Latina; Notícias do Brasil. Livros novos. Leitores escrevem. REVISTA LATINOAMERICANA DE SIDERURGIA. Publicação mensal do Instituto Latinoamericano Del Fierro Y Acero. ILAFA. O número 145 do ano 13 de maio de 1972 trás: Página de reclacción. Los empresarios se reúnen para agilizar el intercambio siderúrgico. Inforntaciones de actualidad. IV Reu.nión Técnica COPANT- ILAFA de Normalización de Productos Tubulares de Acero. Noticiário latinoamericano. Temas técnicos. Consideraciones para el establecimiento de una planta SL-RN de hierroesponja. Ing. René Barbis D.; Práctica moderna de la producción de arrabio en el alto horno. G. Sommer y E. Beppler. Normalización siderúrgica. Actividades de miembros afiliados de Ilafa. Resumen síderúrgico mundial. Guia para. compradores. DNEF. Revista trimestral em seu ano 4, número 20 (março de 1972) publica: Inaugurada a ligação Oiticica-Castelo-Altos; Trânsito de superfície problema em busca de equação nos EUA; Custos médios na E.F. Dona Tereza Cristina; Ferrovia x rodovia; Discurso de posse do eng.0 Roberto Freire Costa na chefia do 3.0 Distrito Ferroviário; São Francisco terá metrô elevado e túnel sob a baía; Novas placas de sinalização ferroviária; Hovertrem britânico inicia testes em trilhos; As relações entre o governo e suas ferrovias; Trens superexpressos operados por computador; Transporte ferroviário de passageiro; Instantâneos ferroviários; Instituição do "Dia Sem Automóvel" numa cidade-satélite de Tóquio; Direito ferroviário. PESQUISAS AGROPECUARIAS NO NORDESTE. Publicação semestral da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste. O número 2 volume 3 relativo a junho/ dezembro de 1971, inclui no seu sumário: Melhoramento genético do algodoeiro anual no Nordeste do Brasil. J. Boulanger; A poda do algodoeiro Mocó -Resultados dos enResenha bibliográfica 115 saios executados na Estação Experimental do Seridó Cruzeta - RN João da Mata Toscano Neto e Oderval Leandro dos Santos; Estudo químico e tecnológico da banana e do caju. Geraldo Arraes Maia,. Luciano Flávio Frota de Holanda e Carlos Brunet Martins; Informações tecnológicas sobre processamento de sucos (caju, maracujá e abacaxi). Vicente Tavares Filho; Indicação para o feijoeíro Macáçar- (Vigna Sinensís L.) na Zona da Mata do Nordeste (I). Sarah Krutman, Manoel Duarte Lopes, Roberto J. de Melo Moura li e Edna Gomes Bastos; Adubação mineral em feijão (Phaseolus Vulgaris L.) na serra da Ipiapaba, Ceará L. Gerson C. Cunha, J. Jackson L. Albuquerque e Neile Gomes L. Verde; Observações sobre algumas argilas dos solos da zona litoral - mata de Pernambuco. Arão Horowitz e Ivan Ferreira Gomes; O anel vermelho do coqueiro, ;no estado do Ceará. J. Júho da Ponte, J. Albérsio Araújo Lima e Egídio Brandine; Informações técnicas; Melhoramento e experimentação com milho (Zea Mays) , no estado do Ceará (1967/ 68) - ii. Maria Arlene Cavalcante Nogueira. O DIREITO. Revista de Ciências Jurídicas e Administração Pública. Subsidiada pelo I Instituto de Alta Cultura (Propriedade de Cancela de Abreu e Marcello Caetano) , publica no fascículo 4, ano 103, outubro/ dezembro de 1971: Artigos doutrinais. Acidentes de viação. Aspectos da responsabilidade civil. A. Carlos Lima; Obrigações convertíveis em ações (conclusão). Rui Pena; Notas e comentários. Contribuição industrial. Custos: amortização de concessões de carreiras. A. Carlos Lima; J'U:risprudêncict. Assento do Supremo Tribunal de Justiça, de 27 de janeiro de 1971, anotado por Eridano de Abreu; Fatos e documentos. Coexistência e cultura no mundo contemporâneo. Henrique Martins Carvalho; Medalha comemorativa do centenário de O Direito. CORREIO. Publicação de Centro Regional de Pesquisas Educacionais do Rio Grande do Sul. Instituto N acionai de E.jstudos Pedagógicos. Divulga em seu número 62, de outubro/ novembro/ dezembro de 1971: Controle e eficiência do processo ensino-aprendizagem. Flávia Maria Sant'Anna; Vultos rio-grandenses. Prof. Antônio da Rocha Almeida e Walter Spalding; Efeitos de vários tipos de reforço no condicionamento verbal. Euza Maria de R. Bonarnigo; Vinte e cinco anos em prol de um mundo melhor; Obra de arte, objeto estético e suas relações. Silvio Augusto Crespo Filho; Curso de recursos audiovisuais de baixo custo; Curso sobre metodologia do 116 R.C.P. 4/72 ensino para professores universitários da área da saúde. Louremi Ercolani Saldanha; Técnicas de dinâmica de grupos; MOBRAL - sua atuação no Rio Grande do Sul; Pesquisa sobre matemática reformulada; Visitantes do INEP; Ensino supletivo e a nova Lei do Ensino de 1.0 e 2.0 Graus. Neusa Norma da Silveira; Lançamentos de editoras gaúchas; Bibliografia para a disciplina de estrutura e funcionamento do ensino de 2.0 grau; Bibliografia sobre filosofia da educação. Compilada por Maria Luiza Leite; Edições do CRPE/RS. INTRODUÇÃO AOS DIREITOS TECNOLóGICOS. Autoria de Walter T. Alvares- Coordenador do Instituto de Direito da Eletricidade, Belo Horizonte, 1972. Cadernos Jurídicos da Eletricidade, 12. Do seu sumário consta: l.a parte. Dimensões 1wrnw.tivas da. ciência e da. tecnologia.. Cap. I. Disciplina da pesquisa científica e da aplicação tecnológica ao meio social; Cap. li. Tecnologia como extensão humana; Cap. m. Cibernética e tecnologia. 2.a parte. Noção de direitos tecnológicos. Cap. IV. Continuum jurídico; Cap. V. Acoplamento de direito e tecnologia; Cap. VI. Atividade jurídica em era tecnológica. 3.8 parte. Grupos de direitos tecnotógicos. Cap. VII. a) b) Cap. VIII. a) b) Grupo direito marítimo: Direito submarino; Direto marítimo. Grupo direito da energia: Direito atômico; Direito da eletricidade. Cap. IX. Grupo direito espacial: a) b) Direito astronáutico; Direito aeronáutico. índice analítico. Resenhtl bibliogrdfica. 117 JUR1DICA. Revista trimestral editada pelo Instituto do Açúcar e do Alcool, Ministério da Indústria e do Comércio. No número 116, ano 17, janeiro/ março de 1972 divulga: Temas em destaqu-e. Conselho Internacional de Magistrados. Alfredo Buzaid; A influência portuguesa no direito brasileiro. Pontes de Miranda; Machado Villela, primeiro jurista luso-brasileiro. Haroldo Valadão; Viagem na minha terra. Eliézer Rosa; Comunidade luso-brasileira. Clovis Ramalhete; Das fontes lusas do direito agrário brasileiro. J. Motta Maia; Execução da pena em Portugal. Carlos de Araújo Lima; As sociedades por quotas de responsabilidades limitadas, no direito português e no direito brasileiro. Otto Gil; A "execução para prestação de fato" do direito português e a reforma do processo civil brasileiro. José Carlos Barbosa Moreira; O novo código civil português e o projeto brasileiro. Amoldo Wald; A comunidade luso-brasileira. Egberto da Silva Mafra; Código civil português. João de Oliveira Filho; A instituição dos Forais. Samuel Duarte; O princípio da boa fé no código civil português. Orlando Gomes; História do direito luso-brasileiro. Arthur Cezar Ferreira Reis; O direito agrário português. Carlos F. Mignone; A prisão-escola no panorama prisional português. Armida Bergamini Miotto; Um bolseiro brasileiro na Universidade de Lisboa - A ação popular - Direito português e brasileiro. Ivo Frey; Responsabilidade civil do Estado no Brasil e em Portugal. José Aguiar Dias; D. Pedro I e a ordem jurídica brasileira. Thomas Leonardo; A idéia de reforma agrária na legislação medieval portuguesa. José Arthur Rios; Breve histórico da justiça colonial e da justiça imperial prasileira. Luiz Antônio da Costa Carvalho; Considerações sobre o art. 1.0 da Constituição portuguesa. Luís Ivani de Amorim Araújo; A mulher no mundo; a mulher em Portugal. Maria Irene Dionísio de Arriaga; Ghana - A mina dos portugueses, a costa do ouro dos franceses e dos ingleses. Diva de Miranda Moura; A liberdade da moeda do contrato no código civil português. Reginaldo Nunes; Santo Ivo, Portugal e o Brasil Artur de Castro Borges; Rumos da cultura jurídica. Cristovam Breiner; Personalidades femininas portuguesas. Zeia Pinho Rezende. Documentário. Leis, decretos e resoluções. Resenha. Registro biblíográfico. REFESA. Publicação bimestral do Departamento de Relações Públicas da RFFSA. O número relativo a maio/ junho de 1972 contém: 118 R.C.P. 4/72 Os corredores de exportação; Um técnico na presidência da RFFSA; Todo o conforto ao passageiro; Maquinista - uma vida de emoções; Cartão de crédito viaja de trem; RFFSA mostra seu trabalho; As barreiras da comunicação; Uma capela tomba na linha do minério; Vagão-escola; A comunidade dos transportes; RFFSA vai abastecer terminal açucareiro; Paraopeba: corredor de minérios; Exportação tem novas obras; Novo acesso para o trigo; Mãe ferroviária - dia do trabalho; Apoio a Fepasa; Ferrovia por toda a parte; Ferroviários comemoram o 21 de abril; NorfolkWestern; Curso de locomotivas; Uma nova estrada Rio-São Paulo; No mundo dos transportes; Gente; Fim de linha. REVISTA DO DIREITO AUTORAL. Editada pelo Serviço de Defesa do Direito Autoral, em seu ano 1, número 2, agosto 1972, publica: A palavr-a. do dir-etor; Distribuição unificada agradou e foi aplaudida; Justiça autoral se faz também através da assistência social Em destaque. Repercutiu bem o aparecimento da Revista. do Direito Autoral; A procura de autores para pagar direitos; Breves e semibreves. Distribuição autoral: do usuário ao autor, um louco complexo e oneroso trajeto; Viúvas dos compositores confirmam: "Direitos autorais continuam sendo pagos - não temos queixas das sociedades"; Do exterior. Reprint: Herivelto Martins (reeleito para o sindicato por mais 4 anos) e a luta pela aposentadoria do autor; O direito de autor nas constituições brasileiras; Como, quando, onde e quanto pagar de direitos autorais; Jorn.al do SDDA. O edifício do SDDA. Catálogo geral de música popular; O estado e a propriedade literária e artística; Bibliografia básica sobre direitos autorais e direitos conexos. NOT1CIAS GRAFICAS. Revista de economia política e desenvolvimento, editada no Rio de Janeiro, Brasil, ano 1, número 11, de setembro de 1971, contém dentre outros artigos: Porque 200 milhas; São Paulo não deve parar; Brasil: 8.a nação mais populosa do mundo; Estratégia de desenvolvimento e política tecnol6gica. U9 de pragas que atacam o milho; Combate às verminoses requer planificação. Seções fixas: Conve1·sa. informal. Cartas dos leitores. Novas publicações. Flagrantes. Novos prod'U.tos. Qual é o seu problema? RAE- Revista da Associação de Engenheiros da EFCB. O número relativo a julho/ agosto de 1972, no seu ano 15, número 118 publlca: A nova diretoria da AECB; Membro da nova diretoria; A tração elétrica no mundo; Um urubu perigoso; Odontologia da empresa. Notícias e comentários. Bolsas de estudo; A RFFSA tem novo presidente; País das tulipas; Fer1·ofocas. Sociais e aniversariantes. Engenheiros e técnicos da RFF fazem cursos sobre locomativas; Brasil inspirou um microscópio premiado; Palavras cruzadas. Atas do Conselho Deliberativo; Novos salários para os engenheiros regidos pela CLT. REVISTA JUR!DICA. Revista trimestral editada pelo Instituto do Açúcar e do Alcool, Ministério da Indústria e do Comércio. No número 117, ano 17, abril/junho de 1972, divulga: Temas em destaque. O direito do fornecedor de cana à majoração da cota de fornecimento como decorrência de sua capacidade de produção. João Soares Palmeira; Imunidades dos cônsules acerca dos atos oficiais e funcionais. Haroldo Valladão; Honorários de advogado, segundo as regras do código de ética, as do estatuto da OAB e da lei das duplicatas. Otto Gil; Ensino J urídjco na UNB. lgor Tenório; História do direito luso-brasileiro. Carlos de Araujo Lima; Novos rumos para o mercado de capitais. Amoldo Wald; Os Alimentos no código civil de 1966. L. P. Moitinho de Almeida; Estrangeiros, condição jurídica, admissão e expulsão. Luís lvani de Amorim Araujo; Natureza jurídica da "Embratel". M. T. de Carvalho Britto Davis; Perigo de vida no novo CP. Damásio E. de Jesus; Fundamento do valor obrigatório do direito internacional público. Magdalena Londero; Anteprojeto do Código de obrigações. Jupira Palhano de Jesus; A mulher advogada. Nailê Russomano de Mendonça Lima; A empresa na filosofia da reforma agrária. J. Paulo Bittencourt; Considerações sobre o poder de polícia. Diogo de Figueiredo Moreira Neto; A justiça e o tempo. Homero Freire; Pela estabilidade das normas legais alusivas ao reflorestamento. Otávio Mello Alvarenga; Direito apli· ca.do. Documentário. Leis, decrett;>s e resoluções. Institt,to do Açúcar e do Alcool. Resenha. Registro bibliográfico. 122 R.C.P . 4/72 PORTUGAL. Turismo cultura e informação. Publicação do Centro de Turismo de Portugal no Brasil, em seu número 7 de julho de 1972, publica: Portugal: 10 anos de progresso; Angola: mais de 1.300 centrais eléctricas; Termas de Portugal, uma estação rupestre, 50.0 aniversário da 1. a travessia do Atlântico sul; li Bienal Internacional do Livro; 6.0 Congresso Mundial das Agências de Viagens; Intercâmbio teatral luso-brasileiro; Moderna poesia portuguesa; Flagrantes. CAMARA DE COMERCIO DEL BRASIL EN ESPANA. Boletfn de información, números 19 e 20, setembro e outubro de 1972, Madrid, contém: 7 de septiembre de 1822: "Independencia o muerte"; Aspectos del desarrollo brasileíío a partir de 1920; Confianza extranjera en la economía del Brasil; Grandes ventajas que ofrece Brasil a las inversiones extranjeras; Aspectos de la mecanización de la agriculturales; Espana: oportunidades comerciales. Ofertas; ofertas de empresas espaííolas (socios de la cámara); Espana. Oportunidades comerciales (pedidos de Espaíía) . Firmas espanolas interesadas en productos brasilefios; Espana: consultas hecbas e la Cámara por empresas espaiiolas (exportadores); Brasil: importadores; Las cinco etapas de las naciones; Noticiaria general; El régimen de importación brasileíío ( continuación) ; La gran exposición industrial espaiíola en Brasil: abril de 1973; Sesiones de la Cámara realizadas bajo la nueva Junta directiva; La 50 Feria Muestrario Internacional de Valencia (Bodas de Oro) ; Cartas de los lectores sobre nuestra revista; Comercio entre Espana y Brasil en 1971; Brasil: planificación económica y dei territorio; Espana en la actualidad; Nuevos socios activos; Actividad de nuestros socios. BOLETIM DO INTERIOR. órgão informativo da Secretaria do Interior do Governo do Estado de São Paulo elaborado pelo Centro de Estudos e Pesquisas de Administração Municipal. O número 28, relativo a janeiro, fevereiro, março de 1972 .no seu ano 5, contém: Comunicações diversas; Estudos-pareceres-jurisprudência; Legislação federal; Legislação estadual; índice. BOLETiN DE LA VIDA LOCAL. Revista editada pelo Instituto de Estudios de Administración Local. Em seu número 53 de junho de 1972 contém: Editorial. En el acto de clausura. Cronica N acionat. Audiência de SS.AA.RR. los Príncipes de Es~aíía a los funcionarias munici120 R.C.P . 4172 pales iberoamericanos participantes en el Ili Curso de D.ixección Pública Local; Importante discurso del Director General de Administraci6n Local en La Corufia; Don Francisco Ruiz Fernández, Vicepresidente del Colegio Nacional de Secretarias, Interventores y Depositarias de Adm.i.nistraci6n Local; Don Federico Garcia Perrote, D.ixector general segundo dei Banco de Crédito Local; La labor docente e investigadora en el Instituto de Estudios de Administración Local se computará para opositar a cátedras de universidad. Cronica. del XIV Congresso Intera.merica.no de Municípios. Espafuz., miembro de pleno derecko de la. Orga.nizadón I1~terame ricana. de Coopera.ción Intermunicipal (OICI). Entrevista con el professor De la Vallina Velarde. VIII Seminario Universittirio Intera.mericano sobre Assuntos Municipa.les. Conferencia. del doctOT Don Carlos Acedo Mendoza. sobre "Fundacomun". Cronica. del Instituto. Seminarios de investigación; Simpósios de experiencia y proyectos; Seminarios permanentes de investigación aplicada; Fondo de documentos de las corporaciones locales; Promoci6n de publicaciones; Escuela Nacional de Administración LocaL Agenda municipal. REVISTA DE ESTUDOS DE LA VIDA LOCAL. Editada trimestralmente pelo Instituto de Estudios de Administración Local, traz em seu número 174, relativo a abril/ maio/ junho de 1972, no seu ano 31: Sección doctrinal. El régimen local dei Sáhara . .Tosé Antônio Manzanedo Mateos; Los escollos de la regionallzación. Ramón Martin Mateo; La doctrina dei silencio positivo en la aprobación de los Planes de Ordenación urbana. Jose-Mario Corella Monedero. El recurso ordinario de apelación con respecto a la impugnación jurisdiccional de nombramientos de funcionarios locales. José Hernández Corredor; Cronicas. IT Coloquio Nacional de Municípios de Lourenço Marques. Gumersindo Guerra-Librero y Arroyo. Esta.dístic4. Los censos de edificios y de viviendas de 1970. lgancio Ballester Ros. Jurispru.dencia.. Acción popular para impugnar en vía contenciosa la inactividad de la administración ante infracciones de normas urbanísticas. N emesio Rodríguez Moro. Bibli~a. fia.. Revista de revistas. O DIRIGENTE RURAL. Publicação relativa a julho/ agosto de 1972, volume 11, número 9-10,,contém: Em busca da auto-suficiência; Ciclo lavoura-pasto é chave do êxito de pecuarista; Nova técnica à vista: semeadura sem aração; Os caminhos para uma estrada melhor; Ainda se descura do controle Resenha bibliográfica 121 RESENHA BffiLIOGRAFICA R. A. AMARAL VIEIRA LmERDADE E NECESSIDADE, Joan Robinson, Zabar Editores, Rio, 1971 Na Biblioteca de Ciências Sociais, Zabar Editores lançam Liberdade e necessidade (uma introdução ao estudo da sociedade), de autoria de Joan Rob.inson, da Universidade de Cambridge. Tratase de excelente abordagem histórico-econômica do processo civilizatório que, partindo de momentos imemoriais e estruturas primitivas, chega a nossos dias como a sociedade tecnotrônica construída pela revolução tecnológica. A obra da ilustre professora de Cambridge discorre, mesmo de forma sumária mas sem superficialidade, sobre o processo de formação social tendo como ponto de referência o fundamento econômico das relações sociais. Por isso mesmo, sua orientação é francamente histórica. Ao apreciar a origem da sociedade, detém-se na análise do grupo e aí sua orientação é solidarista. Abandona por completo as criações do jusnaturalisrno e questiona a imanência da sociabilidade humana. O sedentarismo, por exemplo, é justificado pela ambiência: onde o suprimento de comida se acha mais ou menos espalhado de modo uniforme por grandes áreas, é possível um estilo gregário de vida; doutra forma, a dificuldade de suprimentos determinaria o nomadismo - os herbívoros das pradarias geralmente vivem em rebanhos e a alimentação com plâncton permite a vida grupal às baleias. O grupo, em síntese, responde a uma fase do processo evolutivo e atende à necessidade de fortalecimento do indivíduo. Reportando-se a Washburn e Hamburg (Primate Behavior), justifica o grupo como resultado da aprendizagem necessária: "O grupo constitui local de conhecimento e experiência que excedem em muito os do membro individual. É no grupo que a experiência R. 01. pol., Rio de Janeiro, v. 6, n. 2, p. 151-159, al;>r./jun. 1972 se reúne e as gerações se ligam. A função adaptativa de uma prolongada juventude biológica é dar ao animal tempo para aprender. Durante esse período, enquanto aprende dos outros membros do grupo, é protegido por eles. O desenvolvimento lento, em isolação, significaria simplesmente a desg1·aça para o individuo e a extinção para a espécie". Ou seja, segundo as próprias palavras de Robinson: "Com o desenvolvimento placentário e diversos anos de crescimento até chegar à maturidade, a vida em grupo tornou-se necessária. Em algumas espécies, o grupo constitui uma "familia nuclear" de um casal com os seus filhotes; noutras, um grande rebanho ou tropa de muitas famllias". A ilustração dessa tese pode ser dada com a familia do gorila e a horda do chimpanzé. Justificando uma e outra teríamos a força de um e a fraqueza de outro na luta contra a natureza? Segundo entendemos, a sociabilidade foi uma conquista experimental do homem. Posto diante e no meio da natureza circundante, a um tempo fonte de vida e morte - e não há distinção entre sua história e a da natureza - o indivíduo, para sobreviver como espécie, teve de fortalecer-se no convívio plural. Culturalmente, repetiria o mesmo processo de autodefesa, de salto qualitativo pela soma de unidades observado na biologia: em algumas espécies do reino animal, observa-se uma tendência ao comportamento gregário, em outras as condutas são mais individualizadas, como ilustram os já oferecidos exemplos do chimpanzé e do gorila. As condições de vida tendem a aumentar, criando mecanismos ou reflexos condicionados cada vez mais refinados; a integração social determina condutas estereotipadas nos antropóides (homo sa.piens) . Parece haver uma relação direta entre a forma de existência (tendência maior ou menor à integração) e a sociabilidade, que é uma das características do homem. Na luta pela vida, o homem curvou-se ao império da vida social; a experiência dos primeiros embates mostrou a conveniência de fortalecer-se mediante o concurso de todos, na vida em sociedade, para, desta forma, superar as deficiências - solidarizou-se, venceu. A solidariedade, de que deriva a sociabilidade, é experimental. Robinson vê o aparecimento do direito como ulterior à sociabilidade, e derivado do relacionamento: "a vida social exige a transmissão de conhecimentos e habilidades através da aprendizagem; ela dá origem ao problema moral básico - um conflito de interesses entre o indivíduo e o grupo - que é solucionado pela capacidade de submeter-se a um código aceito de comportamento". Em outras palavras, a lei admitida numa coletividade é algo que se suporta e não uma regra livremente consentida. 152 R.C.P. 2/72 A propriedade privada (ver capítulo Terra e mão-de-obra) é apresentada como uma conseqüência da descoberta da agricultura; as necessidades de sobrevivência determinaram no homem uma maneira nova de ganhar a vida; assim, partiu, por exemplo, da predação de rebanhos de animais, como o búfalo ou a rena, para sua domesticação. "Onde havia água disponível, a agricultura e a lavoura se uniram pelo arado e o cultivo estabelecido tornou-se a base da vida". É construído o conceito da propriedade privada. Não se trata da propriedade da taba, da oca, do cocar, mas dos instrumentos de produção; do comunismo primitivo, caracterizado pela propriedade comum dos meios de produção, e dos bens deles resultantes, o homem salta para uma economia de produção, fundada na propriedade privada dos meios de produção. As famílias podiam ter tanta terra quanto mão-de-obra e sementes tivessem para cultivá-la. Ou seja, instaurava-se o regime de riqueza fundado na apropriação de bens (a que Robinson não se refere): quanto maior a apropriação de bens, maior a acumulação de riquezas; quanto maior a utilização de mão-de-obra, maior a apropriação de bens. A escravidão, fruto das dívidas saldadas com o braço escravo e as guerras de conquista de força de trabalho são a resultante desse regime. Joan Robinson vai encontrar no instituto da herança- uma conseqüência da propriedade privada - os fundamentos para o culto da virgindade e do conceito de honra da filha, irmã e esposa: "A castidade das mulheres", como disse o Dr. Johnson, 1 "é de máxima importância, uma vez que toda propriedade depende dela". Fruto dessa ou daquela razão (pode-se falar, até, nas noções mágicas das sociedades primitivas), a virgindade fez-se sempre acompanhar da instituição da prostituição, "a fim de reconciliar a sexualidade masculina excessiva com os requisitos do sistema familiar". A virgindade só seria possível num regime monogâmico, ou, pelo me;nos, naqueles em que predominasse o macho (os diversos regimes poligâl:nicos). Na poliandria, regime em que uma mulher poderia ser fecundada por diversos homens, era impossível estabelecer a linha de parentesco a partir do pai, restando a linha uterina como única indicação familiar. Talvez esteja nesse fato a origem das expressões matrimônio para significar a união do 1 Boswekk, James. Life of Dr. Johnson. Allen and Unwin, v. 2, p. 86. Resenh~ bibliográfica 153 homem com a mulher, e patrimônio, a riqueza do casal, quase sempre trazida pelo homem. Na poliandria, a indicação do parentesco era pela linha materna; daí matrimônio? A propriedade privada dividiu a sociedade em segmentos sociais a partir de situações econômicas; o senhor da terra e o trabalhador da terra, vale dizer, os proprietários dos meios de produção e os que "alugam" esses meios; os proprietários e os rendeiros. "Uma família que não possuísse terras teria de trabalhar muito mais. Um rendeiro que tem de dar a metade do produto bruto de um terreno a fim de que lhe permitam trabalhar nele terá de trabalhar mais de duas vêzes que uma família livre que controle a mesma ái·ea, se é que deseja comer tão bem quanto ela (mais de duas vezes, na realidade, porque entrega a metade do produto bruto e tem de tirar as sementes de sua pr6pria metade)". Os excedentes de produção (p. 45) são apresentados como decorrentes da propriedade privada: "se não houvesse proprietários de terras, não haveria excedentes, porque as famílias livres não teriam motivo para produzir mais do que necessitariam para consumir". O regime da propriedade gerou as guerras e essas estimularam a produção dos excedentes, com os quais as tropas eram alimentadas: "Os fidalgos lutam e organizam as lutas, enquanto que os agricultores são obrigados a apoiá-los, fornecendo um excedente agrícola acima e além de seu pr6prio consumo e deixando que seus filhos sejam recrutados para as fileiras dos exércitos. Os agricultores de cada região possuem um motivo poderoso para apoiar seus pr6prios fidalgos, porque, se não o fizerem, os fidalgos de outras regiões os assaltarão e matarão". Se a utilização de braços já se fizera necessária para aumentar a apropriação de bens, ela agora se impõe para substituir os braços utilizados na guerra e, num círculo vicioso, a captura de escravos se transformou numa utilização econômica da guerra: "O sistema de utilizar escravos para cultivar as terras enquanto os fidalgos se achavam ocupados com a guerra foi encontrado num certo número de reinos africanos. Seu exemplo mais famoso (fora dos tempos modernos) foi o do império ateniense: Esparta dependia menos dos escravos capturados que de uma população nativa que utilizava como serva. Uma sociedade, contudo, não pode consistir apenas de gentis-homens e escravos. Tem de haver uma população livre suficientemente grande, de categoria mais baixa, que se identifique com os fidalgos e lhes permita manter os escravos em ordem. Em Atenas, a aristocracia era constituída por R.C.P. 2/72 aquelas famílias que possuíam terras e escravos suficientes para sustentar seus filhos como cavaleiros, enquanto que a infantaria era fornecida por pequenos fazendeiros que tinham poucos escravos, eles próprios trabalhando. Os administradores e capangas necessários para dirigir as grandes propriedades eram amiúde escravos promovidos pelos fidalgos, a fim de manter trabalhando seus companheiros de escravidão. Quanto aos escravos domésticos, como o Tio Tom, havia menos necessidade de força para mante-los em ordem. A guerra continuada era necessária para manter o suprimento de novos cativos". O excedente de produção, portanto, era consumido em parte para manter um estabelecimento militar e em parte para sustentar o padrão de vida da classe fidalga (p. 48) . Fundado nessa mesma visão histórica, Joan Robinson considera, ainda, a expansão capitalista (partindo de Ricardo, analisa a crítica de Marx e os conselhos de Marshall); passa em revista o boom das quatro primeiras décadas do século; as relações entre a indústria e o Estado do pós-guerra; as caracterfsticas do capitalismo protecionista de nossos dias, a que denomina "o novo mercantilismo", o caminho chinês e sua heterodoxia, o terceiro mundo constituido pelas nações subdesenvolvidas; estuda as idéias de Adam Smith, Mill e Keynes que, a seu ver, salvou o sistema capitalista ao convencer os governos que eles tinham o poder e o dever de conservar um emprego quase pleno (p. 115) . O último capítulo denomina-se Ciência e moralidade: "Os economistas da escola do laissez-faire pretenderam abolir o problema moral demonstrando que a busca do auto-interesse por cada indivíduo resulta no beneficio de todos. A tarefa da geração atualmente em revolta é reafirmar a autoridade da moralidade sobre a tecnologia; a missão dos cientistas sociais é auxiliá-la a ver quão necessária e dificil essa tarefa vai ser''. É discutível, portanto, todo sistema econômico que, objetivando uma maior produção e acumulação de riquezas e a maior produtividade dos fatores da produção, esqueça que o objetivo final de tudo isso é o bem-estar da sociedade. Contrario senso, de que serve a riqueza? CI~CIA POLíTICA, Paulo Bonavides, Fundação Getulio Vargas, Rio, 1972 A editora da Fundação Getulio Vargas acaba de lançar a 2.8 edição da obra fundamental do professor Paulo Bonavides. Sobre a anterior (1967), a presente - que é praticamente um outro Resenha. bibliogTáfica. 155 livro - além de melhorada, revista e ampliada (vários capítulos foram acrescidos), apresenta-se valorizada por um minucioso mdice analítico e uma referenciação bibliográfica cuja ausência empobrecia o primeiro texto. A obra do professor Bonavides é um manual na melhor tradição européia e seu texto está à altura das grandes contribuições de Duverger e Gurvitch. A bibliografia brasileira, assim, está enriquecida com esse livro que é, pelo menos, um dos mais completos já postos à disposição dos estudantes e dos estudiosos em geral de ciência política. E aqui já se destaca uma das suas qualidades: texto didático, concebido para esse fim, não se limita a uma exposição superficial da história e do desenvolvimento das idéias e das teorias políticas; sem se tornar por isso um texto de diffcil acesso, ou obra unilateral de um pensador, o manual do professor Bonavides desce ao âmago das questões, expõe as principais tendências doutrinárias, mas revela sempre o pensamento crítico do autor. Além de enfrentar as questões "clássicas" da ciência política, e como tal inserimos a discussão terminológica, as relações entre sociedade e Estado e seus elementos constitutivos, legalidade e legitimidade do poder político; institutos como o da soberania, a separação de poderes, as diversas formas de Estado, as formas de governo, os sistemas representativos ,e eleitorais, o sufrágio, a democracia, os sistemas de pressão, etc., o professor Bonavides focaliza temas em regra abandonados pelos manuais de teoria geral do Estado, a saber, revolução e golpe de Estado, grupos de pressão e tecnocracia, opinião pública, o partido político no Brasil, etc. Sua obra revela, além de honestidade científica, argúcia cdtica e extraordinária atualização com o processo histórico que, em nossos dias, num ritmo estatelante, transforma as instituições politico-sociais. Ao tratar dos grupos de pressão, por exemplo, alude à emergência da tecnocracia com uma clareza e uma profundidade científicas tais que seu estudo, sem dúvida, ficará como um clássico na matéria: "A temática do planejamento econômico e educacional, a chamada política nuclear, as relações exteriores, a segurança nacional, o sistema tributário, o combate à inflação, a valorização e a desvalorização da moeda constituem problemas capitais do Estado na segunda metade deste século, exigindo da cúpula governante uma preparação prévia e rigorosa, para a qual não se acham qualificados os parlamentos tradicionais nem tampouco aptos os executivos herdados à sociedade do nosso tempo pelo Est-ado li156 R.C.P. 2/72 beral. Daqui a crise recentíssima que .resultou na formação da nova elite de tecnocratas. Sua intervenção silenciosa ou ostensiva será sempre perturbadora do princípio democrático, que parece impelido a um retrocesso insuportável e aos olhos de muitos já irremediável. A tecnocracia descamba no monopólio da decisão política sonegada ao povo e seus representantes. Na melhor das hipóteses lhes concede tão-somente a possibilidade de uma participação plebiscitária, ilustrativa do novo cesarismo - o tecnológico- que politizou a sociedade, e no qual ela se precipita vertiginosamente, governada pelos novos principes do vocabulário político de Debré". No capítulo dedicado à opinião pública, que não constava da edição anterior, cumpre, por sua atualidade, referir ao item relativo à relação cada vez mais íntima entre a opinião pública e os meios de propaganda: "Na sociedade de massas, de índole coletivista, a opinião aparece "racionalizada" em suas fontes formadoras, mediante o emprego da técnica, com todos os recursos cientificas de comunicação de massas - a imprensa, o rádio e a televisão - deliberadamente conjugados, a compor um extenso laboratório de "criação" da opinião, para atender a interesses maciços de grupos ou poderes governantes, acreditando-se, no entanto, cada vez menos, no teor racional dessa opinião, que todos reconhecem ou proclamam uma força feita irretorquivelmente de sentimentos e emoções". Não se entenda como propagand-a, portanto, tão simplesmente, a utilização dos veículos de massa (mass-commu.nication) ou instrumentos do processo de vendas e consumo. Insere-se aqui, também, sua utilização como meio de propaganda do Estado. De fato, a revolução dos meios de informação, especialmente os recursos advindos dos auxiliares audiovisuais, aumentaram as possibilidades de intervenção do Estado e criaram meios extraordinários de informação. A reivindicação liberal clássica consistente no direito à formação da opinião pública (e de influir nessa formação através da imprensa livre) corresponde o direito, da opinião pública, de informar-se. E a propaganda, nas mãos do Estado ou dos grupos, ou de ambos, é o veículo formador da opinião. Em outras palavras, é questionável a legitimidade da ação externa da propaganda, ou do controle da imprensa e da comunicação de massa, visando a intervir no processo elaborativo da opinião pública. Não apenas as tentativas de condução da opinião pública, por intermédio da imprensa, de forma direta, ou seja, o jornalismo de opinião ou a censura da imprensa são formas de intervenção indébita, pois é preciso destacar, igualmente, os processos que restringem a defesa do ouvinte-objeto, a emissão suResenha bibliográfica 157 blim.inar, por exemplo, orientando muitas vezes o consumo para interesses que não os da população; levando-a a utilizar alimentos de qualidade inferior, ao hábito do fumo, da bebida, etc., criando mitos, transformando seus valores. Tanto a massificação (de que a propaganda é instrumento) quanto o consumismo sugerem não apenas o esmagamento da vontade individual, como também, o que se nos afigura igualmente grave, a manipulação da vontade geral em direção a objetivos prefixados pelos controladores dos meios e instrumentos de comunicação. Essa intervenção na sociedade contemporânea, sobre ser corrente, é uma das caracterIsticas, possivelmente a mais marcante, de nossa civilização. Os meios de comunicação, não apenas pelo que informam ou pela maneira como (de) formam mas, principalmente, pelo que deixam de informar, ditam as opiniões de cada ser humano, determinando-lhe as paixões e 6dios. A liberdade individual parece esboroar-se à medida que a sociedade tecnológica liberta o homem da natureza. Imagine-se, agora, os instrumentos atuais de comunicação {propaganda) associados à informática, à computação de dados e da informação a serviço desse mecanismo kafkiano ... A intervenção desconhece limites éticos, e os instrumentos que a realizam podem deixar de ser lícitos. O instrumento básico da manipulação é a propaganda, direta, indireta ou subliminar; seu objetivo pode ser polftico (manipulado ou não pelo Estado) e puramente comercial. Se a propaganda governamental pode dirigir a população para os objetivos mais sagrados (a quem compete mensurar essa graduação?) da civilização como um todo e do pais em particular, pode igualmente ser instrumento de pressão política. Esse expediente é usualmente utilizado visando à conservação do poder pela classe dirigente ou, ainda por força desse objetivo, utilizado para, violentando a fonnação cultural da população, moldá-la aos objetivos momentâneos do Estado, impondo-lhe nova filosofia de vida, etc. Por seu turno, a propaganda comercial não raro induz a população em erro, levando-a a preferir produtos nem sempre os mais indicados ou mais baratos, determinando o consumismo com a transformação do consumo em instrumento da produção. Deixa então o processo produtivo de visar ao atendimento das necessidades, para cair no circulo vicioso do consumo pelo consumo. Pode-se, ainda, questionar a existência de uma progaganda comercial pura, ou seja, totalmente voltada para o aumento das vendas. Na programação comercial, imanente, há um fundo ideológico raramente escamoteável 158 R.C.P. 2/72 A ciência política, tal como a exerce Bonavides, não é uma ciência pura, contemplativa; mergulha no fato social e daí retira conclusões, antevê crises e sugere opções. E nessa perseguição do factual talvez esteja a distância entre o ensino clássico da teoria geral do Estado e a configuração de uma disciplina universitária que pressupõe o rompimento da departamentalização do conhecimento e das ciências sociais. Como assinalado na apresentação do editor, a ciência política, embora já esteja armada de orientação metodológica e de objetividade da pesquisa, opera ainda em terreno que, afora movediço, não tem suas fronteiras claramente fixadas; é a um só tempo, ainda que à procura de seu próprio escopo, ciência jurídica, sociologia e filosofia. Mas é certo que sua autonomia, seja metodológica, seja científica, existirá na medida em que, afastando-se do juridico, caminhe para a compreensão do fenômeno político como um elemento denn·e as variáveis e as determinantes sociológicas, vale dizer, quanto menos teoria do Estado e mais sociologia. Esse distanciamento elaborará o processo criativo, político-filosófico, que deve ser o grande objetivo do cientista político. Presa à sua origem jurídica, limitada até ainda há pouco ao estudo nas escolas de direito, versada exclusivamente por juristas, padece ainda a ciência polftica, no Brasil, de um jurisdicismo que a inibe e a afasta de discussões como, por exemplo, as que têm sido objeto de preocupação de Morin na França e Galbraith nos Estados Unidos. Registra-se, porém, com a extensão dos estudos científico-políticos a uma área bem maior da universidade, uma tendência à libertação da ciência política. A obra do Professor Bonavides revela uma opção nesse sentido, embora a concepção do manual tenha pretendido inicialmente prover os cursos jurídicos com um texto básico. O Instituto de Organização Racional do Trabalho da Guanabara - IDORT-GB - como seus congêneres de outros Estados, propõe-se a realizar e proporcionar a seus associados e demais interessados: Intercâmbio internacional Forum de estudos Treinamento Assistência técnica Sede: Revista Biblioteca Prêmio de organização e administração Congressos Praia de Botafogo 186, Rio de Janeiro, GB. Resenha bibliogTá.fica 159 RESENHA BIBLIOGRÁFICA R. A. AMARAL VIEIRA L'AVENIR DE LA PRESSE li:CRITE. Francisco C.P. Balsemão. Apud Revista deZ Instituto de Cienciaes Sociales, n. 16, p. 151 e segs. A revolução da informação pôs em xeque o futuro da imprensa escrita. Na medida em que explodem a informação e os meios de comunicação de massa, transformando o grande universo na pequena aldeia global de que nos fala Marshall McLuhan, definham os órgãos tradicionais de imprensa. Nos Estados Unidos já é longa a relação dos jornais e revistas com suas atividades encerradas. Qual o desarranjo que, na era da comunicação, estaria condenando à morte os veículos tradicionais de informação - o jornal, a revista e o livro? Dêste, diz-se que já era, expressão que procura significar sua irremediável superação. A revista, o livro, estariam vivendo a hora da verdade, derrotados pelo poder da televisão, que deu à notícia o extraordinário caráter de contemporaneidade do fato. Enquanto o jornal, no maior esfôrço, consegue noticiar o fato ocorrido há pelo menos 12 horas, e a revista o comenta com uma distância de cêrca de uma semana, a televisão não precisa de noticiar ou comentar: mostra-o sob todos os ângulos, no momento mesmo de sua ocorrência. Os jornais noticiaram a chegada do primeiro homem à Lua; as revistas trouxeram as primeiras fotografias coloridas e o relato dos principais sucessos; a televisão apresentou ao mundo, incrédulo, o fato histórico extraordinário em tôdas as suas nuanças, com o impacto inigualável da experiência visual. Nós, os espectadores de todo o mundo, não mais somos apenas contemporâneos da história, mas, de certa forma, testemunhas e partícipes. R. Ci. pol., Rio de Janeiro, 5(4): 177-198, out./dez. 19'11 1cérebro do administra realiza mais operaçõe~ do que ocomputador. RAP REiiiSTRA. REVISTA DE ADMINISTRAÇIO POBUCJ UMA PUBLICAÇAO DA FUNDAÇAO GETÚUO VARGAS O homem que antes lia a descrição do fato (jornal) passou em seguida a ouvir a revelação do acontecimento (rádio) e agora, a ver com os próprios olhos, dispensando a versão do noticiarista ou do narrador. Conforme já tivemos oportunidade de assinalar (cf. Juventude em crise. p. 56) o homem contemporâneo, tornando obsoletos os conceitos modernos de informação, realiza a grande revolução das comunicações. Depois do transistor - que violentou as barreiras da cultura, levando a informação aos pontos mais longínquos do globo, conduzindo notícia do que ocorria no mundo ao interior da Amazônia, da China e da índia; depois da televisão - que trouxe ao seio do mundo as imagens da guerra e da violência, que misturou hábitos e crenças, que aproximou o homem simples dos lideres e dos ídolos - o satélite e a computarização dos dados. No mundo da tecnologia parece não haver lugar para os livros, para as revistas, para a imprensa escrita. Que será feito dos jornais, com seu longo período de elaboração e sua circulação lenta e restrita? Poder-se-á dizer que o livro já era? ~sse o tema de Francisco C. P. Balsemão. Mas, antes de entrar na análise pr9priamente dita do seu texto, afirmemos, lembrando Heráçlito, a mutabilidade de tôdas as coisas, ou, segundo Hegel, tudo é e nada é. Vale dizer: tudo se acha em perpétuo fluxo, a realidade está sujeita a um vir-a-ser contínuo. A partir dessa noção dialética de ser e não ser, afigura-se difícil garantir que o livro sobreviverá ou sucumbirá devorado pela revolução da informação. Que livro? Que é livro? Recuemos um pouco na história e procuremos, dentro dela, situar o livro. Para êsse efeito, o livro será apenas um instrumento de comunicação entre os homens, mais precisamente, o instrumento que se caracteriza pela transmissão da informação escrita. Na história do homem, situemos sumàriamente, a história da comunicação. Desde que o homem é um animal político e, portanto, animal que só se desenvolve em sociedade', é um animal que depende, para sobreviver, da interação de indivíduos, grupos ou clãs. Essa interação é também intercomunicação. O homem, vivendo em sociedade, tinha como pressuposto a comunicação entre os grupos e, dentro do grupo, de seus membros entre si. 178 R.C.P. 4/71 Segundo as necessidades, tivemos e teremos diversas formas de comunicação. A primeira delas, retrato das condições precárias da estrutura social primitiva, terá sido a expressão corporal, a gesticulação, o rictus facial. De certa forma, à medida que evolui, o homem se distancia de seu semelhante, mas não tem prejudicado seu relacionamento, desde que preenche o vácuo do espaço físico com instrumentos de comunicação que entra a criar. Com êsse distanciamento, o rictus faci.al ou a gesticulação tornaram-se ineficazes como instrumentos de comunicação. Surge a linguagem oral e, a seguir, a descoberta da emissão de sons por meio de instrumentos de percussão, aparece um código de símbolos e sinais possibilitando a comunicação a médias distâncias. O tambor terá sido o satélite da aldeia, reunindo em tôrno de si tôda a tribo. Ao alargar as distâncias, a mensagem precisou de ser levada até onde não chegavam os sons; nasce a comunicação semafórica e o código de sinais, a transmissão da mensagem (notícia) mediante sinais produzidos, por exemplo, pela fumaça. Mas o desenvolvimento da sociedade imporia novas necessidades no campo da comunicação, entre elas a fixação da mensagem e sua emissão para longas distâncias. Surge a linguagem escrita, possibilitando a conservação, reconsulta e recuperação da informação, e assim a documentação, ao mesmo tempo que, transportada pelo mensageiro, a pé, no lombo de animais ou por intermédio das primeiras navegações, podia alcançar distâncias a que jamais chegariam os processos anteriores. A descoberta e alargamento do mundo do homem, aumentando as distâncias, criaram a necessidade de instrumentos de comunicação mais rápidos; emerge o telégrafo com fio, o eletromagnetismo, o telégrafo de Morse, o cabo submarino, o telefone, o avião e, por fim, o satélite. Durante todo êsse período, existindo a escrita e o livro, êsse conservaria a mesma finalidade, embora variasse grandemente em seu aspecto formal, nada mais havendo em comum entre os primeiros papiros e a brochura ou o pocket book contemporâneos, a não ser o princípio da conservação da informação pela impressão de caracteres. Com o aparecimento da arte da escritura, pode-se também registrar o nascimento do livro e do periódico, ou seja, o instrumento de transmissão da informação (antes pela tradição oral), agora por meio da palavra escrita, no livro documentando a mensagem, no periódico transmitindo-a mais ràpidamente. Reser~ha Bíbliográfiéa. 179 Desde já podemos imaginar o que teriam respondido os primeiros copistas à pergunta dos futurólogos sôbre o amanhã do livro. É fora de dúvida que não lhes seria possível, aos escreventes dos papiros, supor a sobrevivência do livro como o instrumento conhecido de nossos dias, impresso em papel, copiável em milhares de exemplares, volumoso, ilustrado, leve, barato, etc. A distância que nos separa dos papiros é ainda menor que a observada entre a brochura de hoje e o livro inimaginável do amanhã. Os pontos em comum, no último caso, serão talvez ainda menos significativos e em menor grau que no primeiro período. Mas o livro terá sobrevivido, ou seja, ter-se-á transformado, desde que, mutação, não terá fim, mas adaptação. Qual o amanhã do livro? Segundo Francisco C. P. Balsemão, valendo-se de dados da UNEJSCO, estaríamos diante não apenas da revolução da informação (de que resultou beneficiada a televisão), mas também, da revolução da imprensa, a mais importante em seus quatro séculos de história: "Les remarquables progrês technique affectués depuis 1950 ont contribué au dévelopement de la Presse, bien que, dans la plupart des pays, un petit nombre seulement de ces techniques ait été, jusqu'à maintenant, appliqué à une grande échelle. n semble toutefois évident que la Presse est sw· le point de connaitre la révolution la plus importante de ses quatre siêcles d'histo~e". Que eventos, fatos notáveis, avanços sensacionais, caracterizariam essa revolução? Segundo estudos da UNESCO, divulgados desde 1966, estamos próximos do jo1-nal mundial. Balsemão descreve o jornal que é uma simbiose do jornal tradicional com a televisão. Cada assinante, ao invés de esperar a chegada do jornaleiro, limitar-se-á a discar um número de telefone (utilizando-se do aparelho comum) e, imediatamente, na tela de seu aparelho de televisão a êle acoplado, aparecerá a primeira página de seu jornal; o simples girar de um botão, fará a segunda página surgir a seus olhos, e assim por diante, qualquer que seja o jornal, local ou não, a página escolhida, à hora desejada. Poderá fixar a imagem, deter-se e demorar-se em determinado ponto, ir adiante e voltar, como quiser. 180 R.C.P. 4/71 Ainda no campo da prospecção, durante a Conferência Geral da UNESCO, reunida em Paris, novembro de 1968, Alphonse Ouimet, presidente da subcomissão de Informação, previu, segundo informa Balsemão: "Dans une genération, des supercerveaux électroniques assureront la distribution d'informations à domicile, comme celle du gaz ou de l'électricité ( ... ) . Le début de cette phase nouvelle será signalé par l'instalation, dans les grands centres urbaines, de centrales de communication munies de supercerveaux électroniques, qui distribueront l'information à domicile au moyen devastes réseaux de câbles souterrains, véritables conduits d'information, nous reliant à une centrale d'information locale ou regionale, à laquelle nous serons abonnés. Ces banques d'information seront, à leur tour, reliés entre elles pa1 des satellites ou par des pipe-lines souterrains ou transocéaniques qui permettront aux abonés de chaque centrale d'accês à toute l'information, visuelle ou sonore, accumulé dans le monde entier. Nous disposerons, chez nous, d'un centre de communications électroniques qui nous donnera la possibilité de choisir entre des centaines d'emissions de Télévision et de Radio. Nous pourrons consulter les plus grandes bibliothêques du monde sans nous déplacer. Nos journaux et nos revues seront imprimés chez nous, en un format réduit, car nous ne recevrons que ce qui nous intéressera". A despeito de imparciais e fidedignos, êsses dados oriundos da UNESCO, são prospecção, ainda que os fatos possam assegurar grande margem de segurança à estimativa. Vejamos agora, acompanhando Balsemão, o que de concreto já se operou como revolução na imprensa. As tendências da revolução nesse campo podem ser reduzidas a dois itens. O primeiro, de realização a longo prazo, resultaria no desaparecimento da imprensa clássica (jornal, revista, livro), e cujas possibilidades foram vistas nos últimos exemplos, ou seja, a transformação do jornal tradicional num órgão da nova ordem, por cujas características como veículo divulgador de notícias e de opinião poderá até continuar sendo identificado como jornal, mesmo que, material e formalmente, nada mais tenha em comum com qualquer dos Jornais de hoje. O segundo, compreende aquelas transformaçoes por Resenha Bibliográfica 181 que passarão os jornais atuais, graças à incorporação à sua tecnologia das conquistas provocadas pela revolução da comunicação, especialmente os computadores e os satélites. Com o advento do rádio e da televisão, os jornais perderam as caucterísticas de únicos veículos de informação, e tiveram de adaptar-se às novas condições criadas pela presença de meios de transmissão mais rápida de noticias. Mesmo com vistas à publicidade, de que depende para sobreviver, a imprensa escrita se orientou de maneira a não entrar em competição direta com a TV (tôdas as vêzes em que tentou. saiu perdendo), não mais se preocupando em realizar e oferecer a cobertura instantânea das noticias. O caminho escolhido foi, assinala Balsemão, o da convergência, que consiste em oferecer aos leitores uma cobertura completa e uma informação em profundidade que os demais veículos - o rádio e a televisão - não podem assegurar, tais como a exatidão e oportunidade dos comentários, as opiniões interpretativas ou orientadoras. Mais do que nunca, a televisão se conduz como veículo de informação, e o jornal, a revista e o livro como veículos de formação de opinião, mediante tratamento valorativo da informação veiculada pela televisão. Mesmo assim, malgrado conservarem suas características clássicas e não pretenderem concorrer, seja com a televisão seja com o rádio, os jornais, para cumpTirem essa missão, teriam de sofrer reformulação tecnológica: os sistemas de comunicação, de composição, de impressão, de gravura e mesmo de redação, deveriam ser mais rápidos e mais eficientes. Para o aumento dessa eficiência e rapidez não bastaria a introdução do teletipo, da radiofoto, da composição fria e da impressão otfset. Dentre as principais transformações, dentre os mais signíficativos modelos de modernização da imprensa, na impossibilidade de referir-se a todos, Balsemão relaciona as modificações mais diretamente ligadas à atividade jornalística. A primeira dessas inovações é a introdução do computador eletrônico na sala de redação. Atualmente, no Brasil e no mundo, a coleta de informação pelo repórter obedece mais ou menos ao seguinte rito: o jornalista vai ao local onde se desenvolveu a ação, faz sua pesquisa e anotações, entrevista quem julgar necessário e retorna ao seu jornal onde então redigirá a matéria, que a seguir será copidescada e submetida ao editor correspondente. A chegada da noticia, já redigida, em alguns casos, poderá ser abreviada, dispensando a presença do repórter: poderá ser transmitida pelo telefone, 182 - ~ R.C. P . 4/71 - -- radiotelefone, pelo telégrafo, pelo telex, pelo correio ou por portador , quando o jornalista é um informante. No nôvo sistema, o repórter em serviço externo leva consigo uma telemáquina de escrever portátil. Concluído o trabalho de coleta de dados, a matéria será redigida in loco, na máquina, como se estivesse na redação. Concluída a datilografia, poderá reler o texto, corrigi-lo, etc., o repórter tomará das páginas escritas e as introduzirá no dispositivo de emissão em fac-símile, ligará o microfone de um telefone comum à extremidade do dispositivo de fac-similação e discará normalmente o número da redação, onde o texto aparecerá reproduzido num dispositivo de recepção de fac-símiles, também ligado ao telefone. ~sse sistema, que parece história de mil e uma noites, foi utilizado, com pleno sucesso, pela Telepress Xerox, na cobertura do Campeonato Aberto de Gôlfe dos Estados Unidos, em 1968. Ainda nem sequer se pensou na produção dêsses aparelhos em escala industrial, e já existem planos mais ousados. Agora, o repórter fará a ligação entre a máquina e a redação, antes de iniciar a escrever. O texto, à medida que fôr sendo datilografado, será recebido pelo computador instalado na sede da redação. Lá, no momento exato em que precisar da matéria do repórter, o editor comprimirá um botão instalado em sua própria mesa e imediatamente todo o texto surgirá no vídeo da televisão à sua frente. Com a ajuda de um lápis luminoso, depois de ler todo o texto, o editor poderá emendá-lo, corrigi-lo, alterá-lo, substituindo .ou acrescentando letras, palavras ou proposições completas. Poderá tanto escrever novos parágrafos, como suprimh· outros. Corrigido o texto, êste será devolvido ao computador que imediatamente irá compô-lo automàticamente, procedendo às separações silábicas e à justificação dos espaços, segundo a programação que receber. Outro recurso à disposição dos jornais contemporâneos é a utilização do computador como banco de notícias pelas agências telegráficas. Segundo Balsemão, ao invés de enviar as notícias diretamente aos jornais, através do teletipo por exemplo, como fazem atualmente, as agências acumularão as noticias em um computador que as utilizará à medida que novos acontecimentos sejam registrados. Assim, exemplificando, o editor internacional de um jornal receberá sôbre o vídeo de sua teResenha Bibliográfica 183 levisão o resumo das notícias do dia, escolherá as que julgar mais importantes e instruirá o computador da agência (ao qual o da redação está ligado) para que as envie ao jornal. Com sua máquina de escrever ou com o lápis luminoso, procederá, na forma já conhecida, às correções necessárias. Se a notícia é das que podem ser atualizadas no curso da elaboração da edição - tais como o andamento da apuração de um pleito eleitoral - o editor manterá de sobreaviso o computador da agência, de forma que o do jornal seja alimentado com a matéria complementar, até a hora limite de envio de material à composição. As possibilidades abertas pela máquina de fac-símile estendem-se, evidentemente, à transmissão de fotografias ou de tôda sorte de documentos. BaJsemão registra uma experiência histórica efetivada em 1967, com transmissões em facsímile. A primeira página do Daily Express de 17 de outubro daquele ano foi transmitida a San Juan de Pôrto Rico, numa distância de mais de 10 mil quilômetros, e publicada naquele mesmo dia no jornal local EZ Mundo. A imagem recebida, de qualidade excelente, foi transmitida em 14 minutos e fêz o seguinte percurso: Londres-Comualha, por um fio cuja capacidade equivale a 12 linhas telefônicas funcionando si.multâneamente; Carnualha-satélite Early Bird-Nova Escócia por microondas; Nova Escócia-Flórida por cabo terrestre; Flórida-Pôrto Rico por cabo submarino. A propósito, Arthur C. Clark (apud Comunicação na era espacial. Fundação Getúlio Vargas, 1969. p. 52) registra a composição simultânea de edições internacionais. É a vez dos jornais orbitais, transmitidos de um centro a todos os quadrantes da terra. Essa experiência será particularmente importante para países continentais como os Estados Unidos, a União Soviética, o Brasil e a China. De todos os programas atualmente em execução, Balsemão considera com razoão como o mais estatelante o d~momi nado ANPAT, American Newspaper Publishers Abstracting Technique Association, organizado pela ANPA, American Newspaper Publishers Association. O ANPAT permite ao computador IBM 1130 receber uma fita perfurada TTS de qualquer serviço telegráfico e resumi-la, a qualquer tamanho, segundo as necessidades do editor. o computadox lê o texto, atribui a cada palavra um valor numérico e, graças às fórmulas matemáticas com que trabalha, decide o que é mais importante, o que é supérfluo e reduz a nota telegráfica às 184 R.C.P. 4/71 dimensões desejadas pela redação. O fato extraordinário está sem dúvida na nova tarefa atribuída ao computador: pela pri~ meira vez a máquina executa um trabalho jornalístico e nisso reside seu caráter de excepcionalidade. O avanço inusitado e insólito, adverte Balsemão, inquietante por si, não nos deve levar a fechar os olhos, ou pensar em destruir o aparelho. Afigura-se a êle, e a nós, mais racional e inteligente, descobrír novas funções para o computador LES ASPECTES QUALITATIFS DE LA PLANIFICATION DE LWUCATION. Preparado por C. E. Beeby. UNESCO, Instltut Intematlonal de Planificatlon de l'éducatlon, 1971. PLANIFICAÇAO DA EDUOAÇAO. Fundação Getúlio Vargas, 1971, versão brasileira de La plan11icat1on de l'éducatlon, edição original da UNESCO. O primeiro dêsses livros resultou de um colóquio organizado pelo Institut International de Planüication de l'Education, IIPE, durante o qual foram estudados os aspectos qualitativos do planejamento da educação, particularmente nos países subdesenvolvidos. Durante os debates enfeixados no volume - intervieram, além dos dirigentes do IIPE e da UNESCO, 17 especialistas recrutados nos mais diversos países: Bélgica, Estados Unidos, França, Grécia, índia, Japão, Nova Zelândia, Líbano, Polônia, Reino Unido, Senegal e SUécia (o Brasil, nada obstante seu desenvolvimento, permanece estranhamente ausente dos simpósios promovidos pela UNESCO e outras organizações internacionais, às quais não tem chegado com sua contribuição). Alguns dêsses especialistas, além de teóricos de reconhecido valor, ofereceram ao simpósio larga e rica experiência pessoal; a reunião de especialistas experimentados, ao lado de teóricos da educação sem experiência prática, foi proposital, desde que o objetivo do simpósio, plenamente alcançado, pelo que se depreende do texto produzido, era, desprezando as soluções práticas e concretas - de difícil transposição sem risco de mecanismo - fixar idéias comuns, básicas, precisar o sentido das palavras, esclarecer os conceitos permanentemente empregados no corrente da linguagem dos planejadores e cujo significado exato a ninguém, até aqui, havia parecido possível, embora necessário, determinar. Resenha Bibliográfica 185 O simpósio, assim, foi mais uma tentativa visando a, com evidentes vantagens para a técnica do planejamento na educação, estabelecer os têrmos comuns com que trabalham os especialistas nos diversos países. Definidas as noções comuns, o texto põe à disposição dos diversos países a soma das experiências dos planejamentos já efetivados, dando condição ao teórico ou ao planej ador de, a partir da experiência multinacional, flrmar os têrmos com que o planejamento deve ser introduzido em uma sociedade, respeitados os parâmetros culturais que individualizam cada experiência. Les aspects qualitatijs de la planification de l'éducation, porém, não se constitui em simples resumo do colóquio, mas da contribuição de cada um dos participantes, com o que foi pôsto ao alcance dos leitores a oportunidade de formular suas próprias impressões e projetar suas próprias generalizações, evidentemente, a partir do texto básico. No capítulo 1, Philip Coombs situa a questão em têrmos de análise e avaliação qualitativa das diversas experiências de planejamento da educação. Sua tese é que a expressão linear, deliberadamente escolhida, há pouco tempo, pela maioria <;ias sistemas de educação, tornar-se-á inviável e deverá ser substituída, com a maior urgência, por uma outra concepção de expansão, na qual os aspectos qualitativos (relegados a segundo plano pelos países subdesenvolvidos, vitimas da pressão de baixo para cima representada pelo choque provocado pela inadequação entre a população em idade escolar e a possibilidade de absorção da escola), sobrelevarão de importância. C. E. Beeby, também coordenador do livro, é o responsável pelo capítulo 2. Procura, por uma questão de método, colocar-se na condição de um ministro de educação de um imaginário país subdesenvolvido participante do colóquio. Os capitulas 3 e 4, partindo dos dois principais documentos de trabalho teórico, refletem a melhor parte das discussões do colóquio. Resumem uma longa discussão sôbre a medida de avaliação da qualidade da educação, formulada nos têrmos da seguinte questão: como as normas de qualidade, que até aqui têm sido elaboradas pelos países desenvolvidos, podem atender aos interêsses e às conveniências de um país subdesenvolvido? É fora de dúvida que, qualquer que seja essa 186 R.C.P. 4/71 norma, ela se mostrará ineficaz se a sua aplicação não se fizer mediante a prévia redução às características culturais e econômicas da sociedade subdesenvolvida. A propósito, parece-nos pertinente lembrar a advertência de Jan Tinbergen (Programação para o desenvolvimento. 2. ed. Rio, FGV, 1969. p. 73) : "Há por que suspeitar que nem sempre é feita a devida escolha" (refere-se à escolha da tecnologia). "Um dos motivos para isso é a tendência a copiarse a técnica dos países desenvolvidos. Muitos técnicos acreditam que a tecnologia avançada é algo desejável por si mesmo. Baseiam-se, em parte, talvez, na maior perfeição técnica do produto. Como as suas responsabilidades são muito acanhadas, não logram, muitas vêzes, perceber as conseqüências sociais das suas escolhas: um nível de emprêgo menor que o que seria possível obter com outros processos de produção". Leitura indispensável e complementar a Les aspects qualitatifs de la planification de l'éducation é a coletânea Planificação da educação, também da UNESCO, e recentemente lançada em versão portuguêsa pela Editôra da Fundação Getúlio Vargas. Enquanto no primeiro livro o escopo é a busca de ideais qualitativos e a indicação de instrumentos e critérios para sua medida, o objeto já agora é simplesmente o de estender o planejamento à área da educação, até esta parte, na maioria dos países subdesenvolvidos, contida pela oposição a tôda sorte de contrôle, regulação e, por fim, planejamento. O texto de Planificação da educação decorre de uma Conferência Internacional sôbre a Educação promovida pela UNESCO e realizada em Paris de 6 a 14 de agôsto de 1968. Evitando a discussão de temas genéricos, a educação em geral, a conferência fixou-se nos problemas oriundos do planejamento educacional nas fases de preparação e execução, ainda que permanecesse difícil - o que é observado na primeira leitura do texto - estabelecer uma distinção clara e inequívoca entre planejamento educacional - tema central e específico do colóquio -, de um lado, e política da educação, ou problemas educativos específicos, de outro. É evidente, contudo, que não é possível elaborar um plano ou projeto de educação sem uma prévia definição (política) de objetivos mediatos. Haverá um plano, sim, mas subordinado a uma tática e a uma estratégia, a objetivos de curto, médio e longo prazos, todos êles, por seu turno, subordinados aos objetivos maiores do planejamento global da sociedade, no qual estão inseridos e do qual são uma facêta, ainda que, em Resenha Bibliográfica 187 determinado momento histórico, a mais importante. Neste ponto os objetivos a serem alcançados confundem-se com a própria discussão da substância mesma da educação que se propõe planejar. Planificaçãa da educação não é um manual de planejamento; sua leitura não oferecerá os instrumentos necessârios à elaboração técnica de um planejamento; mas, colocando a discussão no nível politico, oferece os instrumentos indispensáveis à elaboração de uma politica educacional que tenha por base o planejamento. Em outras palavras, não se destinando a divulgar técnicas de planejamento, transformou-se em leitura indispensável a quantos compete traçar uma política educacional fundada no planejamento. Cresce dessa forma sua importância prática, desde que a opção pelo planejamento já se transformou numa regra, especialmente entre os subdesenvolvidos às voltas não apenas com a necessidade de progresso econômico e social, mas com o problema maior que é a realização dêsse progresso de forma a mais intensa e rápida possível, superando, com o prejuízo de poucas gerações, o gap tecnológico e cultulral que os separa das nações industriais e pós-industriais. Um dos instrumentos decisivos para êsse salto é - ao lado da superação do liberalismo econômico - a introdução do planejamento como técnica inerente a tôdas as atividades sociais. O planejamento em qualquer nivel, mas na educação em particular, não é monopólio de nenhum sistema administrativo, político ou cultural, nem está automàticamente ligado à tecnocracia ou à burocracia. Como salienta o prefácio dessa obra utilíssima, os especialistas parecem estar cada vez mais conscientes de que um planejamento educacional realista e eficaz supõe a informação e a consulta ao conjunto da sociedade, e de que êle próprio se constitui num instrumento de democracia e educação". ESCOLHA E ACASO. Briam Skyrms, edição brasileira da Edltôra Cultrlx, São Paulo, 1971. Escolha e acaso é uma introdução à lógica indutiva, cujo prestígio procura restaurar. De resto, o livro investe, restabelecendo a verdade cientifica, contra uma série de noções errôneas incorporadas ao acervo da cultura. Neste caso, o conceito de argumento e as noções, na lógica formal, da deduçãa e da indução. Trata-se do entendimento, que Skyrms mostra falho, segundo o qual as duas grandes pilastras da 188 R.C.P. 4/71 lógica formal poderiam ser distinguidas uma da outra pela simples identificação do geral e do específico. Escreve, a prcr pósito: "Um dos erros mais comuns, no campo da lógica, é o de supor que os argumentos dedutivos partem do geral para o especifico, e que os argumentos indutivos partem do específico para o geral. Isso é absurdo porque os argumentos não se distribuem em duas categorias: os dedutivos e os indutivos. Não se daria que todos os argumentos válidos partem do geral para o particular e que que todos os argumentos indutivamente fortes partem do particular para o geral? Isso não é absurdo - é simplesmente errôneo. Há argumentos dedutivamente válidos que partem do geral para o geral: Todos os gorilas são macacos. Todos os macacos são mamiferos. Todos os gorilas são mamiferos. do particular para o particular. Ezequiel é um lôbo. Ezequiel tem cauda. A cauda de Ezequiel é de lôbo. e do particular para o geral: Um é número de sorte. Três é número de sorte. Cinco é número de sorte. Sete é número de sorte. Nove é número de sorte. Todos os números ímpares de zero a 10 são de sorte." Escola e acaso está dividido em cinco partes: 1. Probabilidade e indução, 2. O problema da indução: enfoque tradicional, 3. O paradoxo de Goodman e os novos enigmas da indução, 4. Alicerce da lógica indutiva - amostragem e estatística e 5. Interpretação do cálculo de probabilidades. Brian Skyrms - ilustre professor da Universidade de Michigan, EUA - elaborou o texto visando a destiná-lo ao uso nos cursos de lógica nas diversas áreas do ensino supeResenha Bibliográfica 189 rior. Dado o caráter introdutório do volume e a clareza com que o texto foi escrito, pode ser utilizado não apenas por alunos dos cursos especializados de filosofia, mas igualmente como livro de apoio nos cursos de matemática, filosofia da ciência e em todos aquêles em que a lógica ou os estudos de metodologia constituam preocupação curricular. A edição se faz em convênio da Editô1·a Cultrix com a Editôra da Universidade de São Paulo. A tradução do inglês para o nosso idioma é da responsabilidade dos professôres Leônidas Hegenber e Octanny Silveira da Mota, ambos do Instituto Tecnológico de Aeronáutica, ITA. Brochura de 228 páginas é vendida ao preço de 11,00. REGISTROS 1 . Metafísica, para quê? Adísia Sá. Imprensa Universitária do Ceará, 1971. A partir do título provocante, Adísia Sá consegue reunir num pequeno volume de 110 páginas suas notas de aula como professôra de problemas metafísicos na Faculdade de Filosofia do Ceará. Ao mestre em filosofia, veio juntar-se a antiga jornalista profissional, dessa associação resultando um texto escorreito e leve, proporcionador de leitura agradável e amena em tema invariàvelmente carregado de aridez. É evidente que a clareza do texto tem muito a ver com o enfoque oferecido à matéria; no caso do livro de Adísia Sá pode-se dizer que a limpidez do texto lembra os córregos, que são claros por não serem profundos. Nessa observação, todavia, não se deve recolher qualquer restrição ao ensaio; é evidente que a autora não se propôs a um tratado, mas a uma exposição sistemática de suas aulas, o que só merece elogios, seja pela contribuição representada pelo texto em si, seja pela coragem de expor idéias e pôr a nu sua didática. 2. Metodologia para avaliação do desempenho da rêde do ensino industrial. Arlindo Lopes Corrêa e Edson Machado de Souza. MEC, 1971. Responde a encomenda do Departamento de Ensino Médio do Ministério da Educação e seu desenvolvimento parte de dois a priori: a) a ·conscientização da importância do setor educacional no processo desenvolvimentista das nações e b) a certeza de que essa contribuição não se efetivará se os órgãos que atuam no setor educacional não estiverem apoiados numa sólida infra-estrutura administrativa caracterizada pelo planejamento. Mas em todo o pais, 190 R.C.P. 4/ 71 nos mais diversos setores, particularmente nas áreas ligadas à educação, a improvisação tem sido a tônica, seja à ausência de uma política de planejamento, seja por notória carência de pessoal especializado. Essa última deficiência determinou o trabalho dos economistas Arlindo Corrêa e Edson de Souza, que procuram estender ao setor educacional, particularmente ao ensino industrial, as noções de produtividade, rendimento e eficiência. 3 . A política de transportes marítimos do Brasü (crônica de uma batalha). Murillo Gurgel Valente, edição do Serviço de Documentação do Ministério dos Transportes. Rio, 1971. Obra classüicada em primeiro lugar no n Concurso de Monografias promovido pelo Serviço de Documentação do Ministério dos Transportes. A comissão julgadora estêve constituída pelos engenheiros Eliseu Resende e Horácio Madureira e presidida pelo General Ayrton Pereira Tourinho. Na apresentação, o embaixador George Alvares Maciel, nosso representante junto à Organização dos Estados Americanos, observa: "Um dia, alguém publicará todos os pormenores da longa luta. É preciso esperar o dia em que esteja plenamente vitoriosa e aceita a tese brasileira em todo o mundo. Não tenho dúvida de que isso acontecerá; e em futuro não muito distante. O público conhecerá então as peripécias do extenso caminho que vai desde a implantação de modesta semente na Carta de Argel, de outubro de 1967, até a ata ou tratado solene que consagrará a posição que nos coube defender. Deverão sobreviver a teoria da liberdade do alto-mar e a de liberdade de navegação, inclusive a de passagem inocente no mar territorial de três ou de duzentas milhas. O que não pode perdurar é o corolário ilegitimo em nossos dias de plena liberdade de acesso às cargas, sem qualquer quaUficação. Como não poderá persistir a confusão entre a teoria da liberdade e a sua aplicação prática internacional, que a nega concretamente. Os argumentos teóricos contribuirão para desfazer um e outro; entretanto, mais decisivas serão provàvelmente as medidas governamentais que se vão tomando no Brasil e em outros paises. Creio que o trabalho de Murillo Gurgel Valente indica e justüica tal prognóstico". 4. Meu primeiro ano no Tribunal Superior do Trabalho. Mozart Victor Russomano. José Konfino Editor, Rio, 1971. Professor eminente, jurista consagrado, um de nossos principais tratadistas de direito do trabalho, Mozart Victor RusResenha Bibliográttca 191 somano teria de ser excelente juiz. Suas decisões no primeiro ano de judicatura, enfeixadas na obra, não constituem apenas uma seleção jurisprudencial valiosíssima ao advogado militante; não só isso; ao lado de seu alto valor jurisprudencial, sobreleva a importância da construção doutrinária. 5. Revista da Universidade Federal do Pará, 1 (1) 1971. Num pais pobre de publicações técnicas, e de público reduzido para o consumo de obras científicas, transformando em aventura a imprensa especializada, é sempre motivo de prazer registrar a intervenção, na área, das universidades brasileiras, de que hoje, mais do que nunca, está a depender a sobrevivência dos poucos órgãos de cultura especializada. Por definição, sem público que lhes permita a sobrevivência econômica, as revistas especializadas não contam, por outro lado, com a contribuição oficial, limitada ao livro (os programas do INL desconhecem êsse tipo de imprensa). Assim, os periódicos que não tiverem atrás de si uma instituição ao mesmo tempo rica e de indiscutivel idoneidade cientfiica, estão sujeitas ao breve desaparecimento, ou à vida espasmódica, como o Jornal de Letras. Dentro dêsse quadro, portanto, cumpre às universidades brasileiras uma missão do maior significado cultural: criar novos instrumentos de cultura, assistir aos atualmente existentes, e garantir a sobrevivência e o nível científico de ambos. Preenchendo tôdas essas finalidades, surge a Revista da Universidade Federal do Pará. Pensada e escrita em Belém, composta e impressa em Belém, nas oficinas da Imprensa Universitária, essa Revista é bem o shnbolo e o retrato de uma das mais pujantes universidades brasileiras aquela em que, talvez, seja mais clara a consciência da missão da universidade como instrumento de desenvolvimento e libertação cultural e econômica. Na apresentação do nôvo órgão, o reitor Aloisio Costa Chaves mostra-se consciente dessa missão histórica: "A revista que ora se edita corresponde a um imperativo cultural de tôda Universidade, em geral, e particularmente da nossa, após a Reforma Universitária, em fase de implantação". O primeiro número, em referência, oferece, entre outros estudos, uma análise sôbre O ensino superior no Pará trabalho de pesquisa do Professor Armando Dias Mendes, já nosso conhecido como autor de Viabilidade econ6mica da Amaz6nia, obra de fôlego e lançamento editorial recente da Imprensa 192 R.C.P. 4/71 Universitária do Pará. Na mesma revista, o professor Adherbal Meira Mattos se insurge contra a tendência que se observa nos diversos projetos de reforma (currículo) universitária e que visa a suprimir do programa de direito o ensino de direito internacional público. Ãpio Paes Costa aborda o tema Dante - poeta cristão e Simão Chicre Miguel Bitar traduz e explica As bucólicas, de Virgilio (que escreve com e). 6. Brasil Açucareiro, n. 6. Circulando a revista do Instituto do Açúcar e do Alcool, trazendo em seu sumário: I.A.A. : Trinta e oito anos; Estação experimental de cana-de-açúcar do I.A.A., Araras, São Paulo; Tecnologia açucareira no mundo; As nuvens ficaram escmas num amanhecer de junho; Comentário econômico- cotas de produção; Brasil/ desenvolvimento; Cana-de-açúcar- planejamento na formação de viveiros; A importâncias dos levantamentos fitossanitários no contrôle das pragas; Definições que os dicionários não registram e cada um adota o que quiser; Um plano e uma consternação. 7. Revista do Instituto de Direito da Eletricidade, n. 13, agôsto de 1971, editada pela Faculdade Mineira de Direito, da Universidade Católica de Minas Gerais, com o patrocínio da ELETROBRAS (Centrais Elétricas Brasileiras S.A.) e pela CEMIG (Centrais Elétricas de ML'las Gerais S.A.). Dentre os diversos artigos, destacam-se: Os jovens de hoje e o contrôle do futmo, palestra pronunciada pelo engenheiro João Camilo Alvim Penna na abertura da I Semana de Engenharia Elétrica; Criterios generales para el establecimiento de tarifas electricas, trabalho apresentado pelo engenheiro Jorge E. Caballero ao III Congresso Pan-americano de Engenharia Mecânica e Elétrica, realizado em San Juan de Puer'to Rico; Análise sumária do consumo de energia elétrica (considerações teóricas e um exemplo comparativo entre três estados da Federação), Antonio Fernando de Menezes Duarte do Instituto de Direito de Eletricidade; Fornecimento gratuito de energia elétrica, José Luiz Ladeira Bueno, do Instituto de Direito da Eletricidade; A avaliação de faixa de servidão para linhas transmissoras de energia elétrica, José Carlos Pellegrino; Natureza jurídica da eletricidade, Walter T. Alvares. 8. A cidade de Frei Carlos, Pe. Antonio Gomes de Araújo, edição da Faculdade de Filosofia do Ct·ato, coleção Estudos e Pesquisas, introdução do Prof. José Newton Alves de Souza. O volume é o primeil·o das obras do Pe. Antonio Gomes de Resenha Bibliográfica 193 Araújo, na coleção num plano de cinco volumes. O primeiro volume, A cidade de Frei Carlos, é integrada pelos seguintes estudos: 1. O Pe. Antonio Gomes de Araújo e a pesquisa histórica no Cariri, José Newton Alves de Souza; 2. A cidade de Frei Carlos (Missão do Miranda); 3. Naturalidade de Bárbara de Alencar- a heroína do Crato; 4. A cidade de Frei Carlos; 5. Mitos e realidades; 6. Qual a versão certa da casa em que nasceu o Pe. Cícero, em Crato? 7. O Instituto Frei Carlos e o Jardim da Praça da Sé; 8. Primeiro vigário de Crato; 9. Crato não foi Curato; 10. A comunidade originária; 11. Aldeamento da Missão do Miranda e revelação de sua arqueologia; 12. Alvorada da glória; 13. As armas do Município; e As armas do município do Crato. 9 . A desnacionalização e a crise da pequena e média empresa. Departamento de Imprensa Nacional, B1·asília, 1971. Reunião de dois discursos pronunciados pelo Deputado Federal Freitas Nobre, nas sessões de 13 de abril e 17 de maio de 1971. 10. De1·echo penal alemán. Prof. Hans Welzel, Editorial Jurídica de Chile, 11. edição. O texto alemão foi traduzido pelos professôres Juan Bustos Ramírez e Sergio Yáfíez Pérez, ambos do Instituto de Ciencias Penales de Chile, que patrocinou a edição. O plano da obra é o que se segue: 1. Introducción: sentido y misión dei derecho penal; resefía histórica dei derecho penal alemán; Fuentes y literatura del derecho penal; Concepto del Derecho Penal; Derecho Penal y Iey penal; El ámbito de validez dei derecho penal a1emán; 2. La conducta punible y su autor; Introducción: Misión y objeto de la teoria general del derecho penal; La estructura dei delito y la naturaleza dei autor; La Teoría de la acción; Lo injusto y su hachor; Lo injusto de los delitos dolosos; Lo injusto de los delitos culposos; ITI) La culpabilidad; IV) Las etapas de desarrollo dei delito: la tentativa; V) La misión punible; VI) Unidad y pluralidad de delitos; VII) Las penas y las medidas de seguridad. 11. Revista Cámara de Comercio de Bogotá, editada pela Câmara de Comércio de Bogotá. Em seu primeiro número destacam-se dois estudos: Metas de exportación de los produetos no tradicionales colombianos para 1971 e La política del Café. 12. Revista Mexicana de Ciencia Política (Revista de Ciencias Políticas y Sociales). Em seu número 61, lê-se: Las l'elaciones internacionales y los derechos humanos (Héctor Cua194 R.C.P. 4/71 didático, calamidade pública, Deputado Padre Nobre e Poder Legislativo - considerações gerais, Paulo Affonso Martins de Oliveira. 15. Jurisprudência, publicação do Tribunal de Justiça do estado de Santa Catarina, reunindo os principais julgados e decisões de 1970. Os acórdãos são dispostos segundo a classificação processual, agravo de instrumento, agraV'o de petição, apelação cível, apelação criminal, apelação de desquite, Conselho disciplinar da magistratura, habeas-corpus; habeascorpus, recursos de; mandado de segurança; mandado de segurança, recursos de; recurso criminal; revisão criminal. Dentro de cada categoria, a matéria é exposta na ordem cronológica. A publicação é enriquecida e a consulta facilitada por um minucioso índice alfabético. 16. Revista de Estudios de la Vi.d a Local, editada pelo Instituto de Estudios da Administración Local (Madri, Espanha). O número 169 apresenta os seguintes estudos, ao lado de crônicas, trabalhos estatísticos, jurisprudência e bibliografia: Limites constitucionales de la reforma de la Ley de Regimen local en materia de elecciones municipales, Fernando Garrido Falia; Vigencia y revisión de los planes de Urbanismo, José Ma. Boquera e El porvenir de la descentralización ante el proceso planificador ~ Esquema para um planteamiento actual del tema, Gaspar Ariiio Ortiz. 17. Aviação - presença antiga na integração nacional. Senador Vasconcelos Torres. Brasília, 1971. Reunião de discursos, projetos de lei, requerimentos proferidos ou apresentados pelo senador pelo Estado do Rio e relativos à problemática da aviação no Brasil. 18. Revista del Instituto de Ciencias Sociales. Mais uma vez a famosa e excelente revista de Xifra Heras dedica-se à análise dos problemas relativos à informação e suas conseqüências no conjunto dos direitos individuais. O número 16, subordinado à temática Informação e pessoa humana, está dividido, ainda, em Información y cultura de masas e Información y Educación. Dentre os inúmeros trabalhos que constituem o número, destacamos: La persona, entre la educación y la información: Communication and the human condition; Les moyens d'information et la personalité humaine; Prensa, integración social y libertad; Status giuridico della persona umana ed informazione demodossalogica; La solidaridad como forma de comunicación social em algunos relatos de 196 R.C.P. 4/71 guerra autobiográficos; Notas sobre la ambiguedad de la sociologia de la cultura de masas en Espana; Receptor o consumidor? El individuo frente a la oferta de los medios de comunicación; L'avenh· de la presse écrite; L'informazione statistica nella vita moderna; L'information objet de recherche scientifique; Información y nueva generación; Mass media and continuing life-long education; Los medias de información y la deseducación permanente; Le journaliste, doit-il être "l'instituteur des adultes"? Información y educación permanente; Mass communication as an educational influence; Objetivos educacionales de la radio; El proyecto inglés de la "Universidad del Aire" o "Universidad Abierta"; Información y salud mental; La Comunicación en la classe como grupo; Israel's collective-democratic education. 19. Cadernos de Formação e Cultura (nova série), n. 1-3, 1971. Destacam-se dois trabalhos, o primeiro, Homem e mulher, o drama da convivência, é assinado pelo Pe. Pedro Américo (S.J.) e o segundo, aliás o mais interessante, é um Dicionário crítico do moderno romano-brasileiro. Não há, porém, assinatura, o que nos impede de conhecer a autoria dos verbetes. 20. Revista de Estudios de la Vida Local. O número de 170 apresenta os estudos seguintes: Problemas estructurales del Derecho de la organización administrativa, José Ortiz Diaz; Autogobierno y centralismo en los orígenes del Regimen local francês, José Antonio Manzanedo Mateos, e as modernas actividades de la Administración pública, Francisco Rodriguez Haro. 21. Cadernos de Jornalismo e Comunicação, edições Jornal do Brasil n. 30. O último número em circulação (maio/junho de 1971), trouxe as seguintes matérias: 1. Observações, Alberto Dines; 2. Um jornal em debate; 3. Informação, mudança e envolvimento urbano, Rubem George Oliven, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 4. O processo sondável da opinião pública, Josse Melange, do Instituto Belga de Informação e Documentação; 5. Central de Informática: modêlo de programação, João Jorge da Cunha, do Instituto de Estudos Avançados; Coniere, um grande jornal provinciano? Araújo Netto; Edição, um conceito em fase de transição, Marc Saporta; O subdesenvolvimento da publicidade na França, Mareei Blausntein-Blanchet. Resenha Bibliográfica 197 22. Açúcar e álcool, ontem e hoje. Hamilton Fernandes. Rio, 1971, Coleção Canavieira n. 4, divulgação do Ministério da Indústria e Comércio, Instituto do Açúcar e do Alcool, Divisão Administrativa, Serviço de Documentação. Obra de divulgação, bastante ilustrada e atendendo a uma concepção editorial que visa a aumentar a comunicação com o leitor. Em seu sumário (errôneamente chamado, no livro, de indice), lêse: O que é o açúcar; E tudo começa com a história; O Engenho Real Sergipe do Conde; Ainda os antigos engenhos; A usina moderna; Clarificação do caldo; Decantador contínuo; Filtragem da bôrra; Filtro rotativo; Evaporação; Vácuo; Cristalizadores; Turbinas; Difusão; A usina e o engenho; Subprodutos; Obtenção do álcool; A destilaria e o alambique; Refinação do açúcar; O açúcar na economia humana. 23. Trilha perdida. Martins, 1971. Romance de Maslowa Gomes Venturi. A obra e a autora são apresentadas, com entusiasmo, por Jorge Amado em nota de 4. a de capa. 24. Duas faces. Edições Encontro. Nôvo livro de poesias de Cesar de Araújo. :G:sse volume é apresentado por Pascoal Carlos Magno. 25. Pássaro ele fogo. Cid Carvalho. Edição da Imprensa Universitária do Ceará. Seleta de poesia do jovem poeta cearense. 26. A formação do símbolo na criança, de Jean Piaget, é um dos mais recentes lançamentos de Zahar Editôres. Examina as realidades que conduzem à simbolização como fenômeno vital, e que a configuram transitoriamente: a imitação, o jôgo, o sonho, a imagem projetada e a representa~ão. :tste interessante livro de Piaget, o último em versão portuguêsa, destina-se não só a psicólogos, como também a uma vasta camada de leitores cultos, desejosos de ampliar seus conhecimentos de psicologia genética. 27. Gênese das estruturas lógicas elementares. Piaget e Inhelder. Na sua linha de psicologia genética, a Zahar Editôra lança em obra conjunta de Jean Piaget e Barbel Inhelder, resultado de um acúmulo de pesquisas e experiências exaustivamente trabalhadas, a partir do interrogatório a que responderam nada menos de 2 159 crianças. 198 R.C.P. 4/71 RESENHA BffiLIOGRAFICA R. A. AMARAL VIEIRA AMOR e FOME - Os institutos primitivos encarados à luz do futuro. Bodo Mansteln. São Paulo, Edições Melhoramentos, 1971. No ano 2000 a população do mundo atingirá a fabulosa cifra dos 7 bilhões, 63% na Asia com a China, 15% na Europa com a União Soviética. O que alarma aos analistas dos processos demográficos é o ritmo galopante em que a população aumenta, e se multiplica. Em 1650 a população da Terra era de 500 milhões; daqui a 55 anos, no ano 2026, essa população ter-se-á tornado tão grande que os homens esmagar-se-ã.o uns contra os outros. Essa, a macabra profecia do físico Heinz von Foerster, mil vêzes mais trágica que o fantasma malthusiano do crescimento populacional. Até o fim do nosso século, ou seja, nos próximos 29 anos, o número de habitantes de nosso planêta saltará de um pouco mais de três bilhões para seis, seis e meio. A informação é do Professor Fritz Baade, que acrescenta: "Isso (o aumento nessa proporção) nunca houve antes na história humana: um aumento em dôbro da população em pouco mais de trinta anos. Nos trinta e dois anos que temos na nossa frente o aumento numérico dos homens será maior do que em todo o tempo desde o nascimento de Cristo até o presente". (p. 245). A verificação dêsses dados, alarmantes, tem despertado a atenção das autoridades internacionais, especialmente dos técnicos da FAO, para o problema resultante da escassez de meios para suprir com alimentos essa população que cresce em ritmo vertiginoso. Em outras palavras, ressuscita-se a teoria de Malthus. A única forma de evitar, amanhã, o trágico desaparecimento de nossa espécie, por inanição, está no contrôle da natalidade. R. Cl. pol., Rio de Janeiro, 5(3) : 169-187, Jul./set. 1971 • Antes de tratar mais detidamente das teses levantadas pelo Professor Bodo Manstein, em seu excelente A11WT' e Fome, cumpre, pois, retomar a doutrina mathusiana. A lei malthusiana do crescimento populacional, reduzida a têrmos matemáticos, ensina que a população tende a crescer em progressão geométrica enquanto a produção dos gêneros de subsistência aumenta em proporção aritmética. No desdobramento de sua teoria, Malthus afirma que é imanente no homem a capacidade de procriação ilimitada, pelo que o número de indivíduos de cada espécie encontraria um limite fatal nos meios de subsistência disponíveis. Assim, o fantasma do malthusianismo seria, exatamente, a certeza do impulso incontrolável no sentido da multiplicação indefinida da população, contra o desaparecimento inevitável das condições de subsistência. Por via-de-conseqüência, o pastor protestante aconselharia reações cautelares visando a limitar a explosão demográfica. Mas, mesmo quando o faz, é tão-somente encarando êsse contrôle como possibilidade unicamente teórica, sem fôrças para anular a conclusão fundamental de sua lei: a morte inexorável, rondando sôbre nosso futuro como sombrio fantasma. Fácil de ver o engano da teoria elaborada com aparato e ostentação cient1fica. Malthus viu inerte um mundo em desenvolvimento. Seu primeiro êrro foi o de basear-se em observação comprovadamente falsa. O esquematismo da explosão demográfica não resistiria a análise mais profunda. F. v. Kleinwhater (in Economia política, Barcelona, 2. ed. Gustavo Gil Editor, 1929. p. 180) assinala que "la experiencia de los hechos ensefía que el aumento de población no se realiza de um modo tan esquemático como se suele suponer seguiendo la teoria de Malthus. Todos sabenws que en la antigu.a Roma se exteriarizaban las quijas sobre el debil aumento de la población y los distintos privilegias que se concedieron al padre de tres o más hijos, por el justrium liberorum, atestiguan que el Estado consideraba como una calamidad el escaso aumento de la población y procuraba contrarestarlo. El limitado numero de nascimientos prodoce una gran preocupación a la Francia de nuestros dias; pero también en Austria y Alemania se hacen patentes quejas de que el aumento de población queda muy por debajo del alcanzado en Rusia. Los magiares asimisrrw afirmam que en su pais la natalidad es muy escassa. Aqui no podemos decidir, como facilmente 170 R . C.P. 3/71 (1831), nem o telégrafo de Morse (1832), a utilização do arado de aço na economia americana (1832), as sociedades cooperativas de trabalhadores (1843), o cabo submarino (1852), ou o processo Bessemer de fabricação de aço (1856). Que dizer, então, da revolução tecnológica? Malthus não estimou as inovações que deram partida à revolução industrial, acelerando as técnicas de produção e o processo de formação de capital. Ter-lhe-á surpreendido e aos corüeus de seu fatalismo o desenvolvimento da civilização industrial: em sua primeira fase, caracterizado, até os anos setenta do século passado, pelo que Celso Furtado (in Subdesenvolvimento na América Latina. Rio, Ed. Civilização Brasileira, 1966. p. 4-5) denomina de preeminência de ação de fatôres de ordem econômica, principalmente ligados à transformação estrutural de oferta de bens e serviços: "A moderna tecnologia ia sendo aplicada na criação de novos processos produtivos, os quais entravam em choque com o velho sistema de produção artesanal, acarretando modificações na estrutura social através da concentração das atividades produtivas e de urbanização. ~m razão da elasticidade de oferta de mão-de-obm,, os salários reais tendiam a permanecer estáveis, concentrando-se os frutos do momento de produtividade em maiores lucros, parte substancial dos quais seria aplicada em novas indústrias, o que permitiria que a transformação da velha estrutura econômica e social prosseguisse em ritmo cada vez mais intenso." Se não chegara a tão pouco, Malthus jamais suporia a possibilidade da revolução tecnológica contemporânea e sua importância no desenvolvimento do capitalismo que logrou conhecer em sua plenitude. Se ao teórico clássico pode-se explicar a falência da elucubração aparentemente cientifica, aos discipulos retardatários não se permite o desconhecimento da economia moderna, o progresso tecnológico constituindo o fator básico do crescimento e da estabilidade social. Sua teoria, por ausência de visão histórica, é impregnada de pessimismo e descrença com relação à sociedade de cuja análise resulta seu pensamento. Na abertura de sua obra fundamental, lemos: - aNuma investigação concernente à melhoria da sociedade, o tratamento que a mesma tem a seguir é: 172 R.O.P. S/'11 se comprende, si la reducción del número de nascimientos es un fenómeno que se presenta automaticamente en todos los pueblos que han alcanzado un elevado nível cultural y 'l.(.n gran bienestar o si es una peculiaridad de determinadas razas. Pero, en todo caso, pane de manifesto este tenómeno que el fantasma de la "superpoblación'-' de Malthus non es tan peligroso como se podria suponer a primera vista." Há uma incontrastável relação- ainda que subestimada por alguns teóricos contemporâneos -entre. subdesenvolvimento econômico e explosão demográfica. O simplismo de Malthus, todavia, daria ênfase ao problema populacional. Em sua economia política o destaque dado à explosão demográfica reduziria a segundo plano o estudo do aumento da produtividade. Entenderia que se o número de nascimentos cor-. respondesse ao de óbitos, a terra seria um reino de fartura: todo recém-nascido encontraria seu lugar no mundo, inexistindo, assim., pobreza, miséria e fome. A "questão social" nada mais seria que o fruto da diferença entre o número de nascimentos e o de vagas abertas no quadro populacional. Escrevendo nos fins do século XVIII (seu Essay on the principle of population veio a lume em 1789), não teve meios de enxergar a grande revolução que sacudiria o mundo, transformando em escombros as teorias prêsas ao imobilismo histórico. Ou seja, como afirmado, Malthus viu parado um mundo em movimento, embora tivesse sido contemporâneo do alvorecer da revolução industrial. Da época em que deve ter concebido sua teoria: as primeiras máquinas de fiar patenteadas na Inglaterra (1738), a fabricação do primeiro laminador de ferro (Colt, 1754) a primeira fábrica inglêsa de fiação (1771), a máquina a vapor de Watt (1775), a construção do balão pelos irmãos Montgolfier (1779), os teares a vapor de Cartwright (1785), o barco a vapor de Patrick Miller (1787), a máquina de descaroçar algodão de Eli Whitney (1794), a abolição da escravatura nas colônias francesas (1794) o arado de ferro patenteado por Charles Newbold (1793), o início das exportações de ferro da Inglaterra (1797) e a invenção da pilha vóltica (1798). A Malthus que presenciara todos êsses inventos e fatos marcantes dos primeiros momentos da Revolução Industrial, faltou a necessária imaginação para antever os progressos que estavam reservados para os próxim.os anos. Sua teoria não comportaria o acumulador de Ritter (1802), nem a locomotiva de Richar Truithick (1804), ou o eletromagnetismo Resenha Bibliográfica 171 1 . investigar as causas que impediram, até agora, a evolução da humanidade à felicidade; e 2. examinar as possibilidades de supressão total ou parcial dessas causas no futuro." Trata-se, pois, como bem assinala Temperani Pereira (op. cit., p. 322), de "um descrente, um pessimista com relação às condições da sociedade do seu tempo". Falta-lhe, ainda, frieza. Dominado pelos preconceitos de sua formação cultural, cometeria o êrro do mecanicismo grosseiro, das generalizações apressadas, transplantando para todo o mundo a experiência da anâlise da sua Inglaterra. Desrespeitaria espaço e tempo, condições mesológicas e históricas. O mesmo Temperani: ucom esta simples idéia - a de que a causa que impediria a evolução da humanidade era a tendência a aumentar, a reproduzir-se além do que permitem os recursos disponíveis para a subsistência - desenvolveu êle o conhecido antagonismo entre o crescimento da população e a produção de gêneros. fartindo da observação de sua ilha, a Inglaterra, e depois generalizando o assunto ao todo universal, e baseado na idéia que impressionava sua formação cultural, que era a idéia religiosa - dado que descendia de uma família de curas, de pastores protestantes - achava ile que as gerações sucediam-se de 20 em 20 anos, dobrando a população na face da terra, enquanto que os meios de subsistência não acompanhavam esta mesma prcrporção. O resto, é sabido. Para evitar - ou retardar - êsse sombrio destino humano, Malthu.s aconselhava, estamos em 1798, o constrangimento moral com relação à procriação. Mais precisamente, a disciplina sexual, o retardamento do casamento e a limitação dos filhos. Destroem-se as pilastras do malthusianismo, mas se revigora o contrôle da natalidade, já agora sem apoio em uma teoria econômica digna de crédito científico. Dois postulados se repelem. O princípio malthusiano do crescimento das populações e a capacidade produtiva da sociedade. Se aceitamos o primeiro estamos, como assinala Paulo Bonavides (in CMncia política. Rio, Ed. Fundação Getúlio Vargas, 1967. p. 40), "aceitando as enfermidades sociais como oriundas de determinismo social, das leis da natureza, contra as quais nada pode o homem em sociedade". Vamos Resenha Bibliográfica 173 um pouco além do publicista. A aceitação do malthusianismo valeria reconhecer a incapacidade do homem de agir sôbre a natureza; implicaria em descrer do progresso e do desenvolvimento tecnológico que nos cercam no mundo atual; implicaria em negar o que vemos, tocamos e sentimos. Ao contrário, o futuro da humanidade é anunciado por um otimismo lúcido, uma honesta certeza de progresso e desenvolvimento. A produção de gêneros alimenticios - para nos atermos aos elementos da teoria em exame - não se trata de um fator isolado, fixo. A produtividade da economia inglêsa contemporânea não é a mesma de 1798. . . O desenvolvimento da humanidade, os diversos ciclos econômicos, correspondem a diversas fases de exploração dos bens da natureza. O número de indivíduos alimentados pela agricultura é determinado pelas relações de produção. As novas técnicas, a racionalização do trabalho, os novos meios empregados, o uso de instrumental técnico aprimorado, desde o arado primitivo às máquinas modernas, as novas relações de produção, por fim, são fatôres de produtividade. Mas dêles Malthus descurou. O conhecimento que temos do mundo e do potencial humano, só nos pode convencer da certeza do desenvolvimento sempre crescente de novas técnicas e meios de produção, a superação das necessidades, à proporção que são aumentadas pelas conquistas da ciência, determinando, por seu turno, um sofisticado processo de desenvolvimento, numa cadeia sem fim, incluindo, desde o aperfeiçoamento do instrumental utilizado na atividade produtiva, à evolução das características das formas politicas e sociais e das relações de produção a ela inerentes. Bonavides (op. cit., p. 42) refere-se aos contestadores do malthusianismo: ''Em que se apóia fundamentalmente a crítica antimalthusiana? Num otimismo que não vacüa acêrca ãas possibilidades da técnica e da ciência, no seu desenvolvimento, no seu contínuo progresso, de criarem para o /tomem as mais risonhas e promissoras perspectivas de libertação econ6mica. Em conseqüência, a resposta da: ciência é clara e otimista: a ciência, por meio de técnica adiantada e racional, técnica altamente aprimorada, pode produzir, com capacidade ilimitada, quase iTIJfinita, os bens necessários à existência humana. Basta que se atente na libertação de fôrças poderosíssimas, por exemplo, ãa desintegração do átomo. A era nuclear, que já se está oferecendo ~ realidade, na antemanhã de suas melhores promessas, dana resposta irre174 R.O.P. 3/71 torquível aos que vêem cobertas de cinza as idades vindouras da hum(mi~ade". Ao lado do incontível desenvolvimento tecnológico existem, pari passu, ostensiva ou veladamente, as transformações políticas e sociais, a superação de velhas instituições, a reformulação de conceitos de govêrno e administração, as reformas estruturais e institucionais, emprêgo da planificação econômica, e a intervenção do Estado no domínio econômico, possibilitando a: utilização da técnica e da ciência na transformação das estruturas arcaicas que contêm o progresso, tornando realidade, com o soerguimento da condição humana, os anseios de felicidade e bem-estar. Os velhos regimes não mais çonstituem empecilho à utilização do patrimônio técnico .c ultural da humanidade em proveito da construção de uma existência digna. Mais do que excedente populacional, o problema seria a imperfeita distribuição da riqueza. E êste problema é o objeto da economia moderna. E o livro de Manstein? O título pouco significativo entre nós e ensejador de interpretações errôneas (original alemão: Lieàe und Hunger, Die Ultriebe im Licht der Zukunfd) quanto ao seu conteúdo, esconde uma das obras mais sérias já editadas em nosso País, sôbre a matéria. :É um livro ao qual se pode dar, sem susto de precipitação, a classificação de trabalho científico. Manstein filia-se à linha dos que preconizam o contrôle de natalidade. Como a grande maioria dos autores naturais desenvolvidos, desde que não encontrem meios de conter a atual taxa de desenvolvimento demográfico. Contrastando, porém, com a maioria dos escritores que trataram do assunto, especialmente americanos, Manstein evita as generalizações e as globalizações. Se o problema da natalidade pode constituir-se em preocupação para a humanidade como um todo, há de ser encarado particularmente, país a pais. Manstein distingue a situação dos países desenvolvidos dos subdesenvolvidos, e dentre êsses destaca a Asia e nela a índia. Evita, assim, o êrro grosseiro dos técnicos que arrolam sob o título de subdesenvolvidos, a um só tempo, o Brasil e a índia, e a ambos receitam o mesmo tratamento de choque do contrôle da ' natalidade. :É fora de dúvida que o problema não pode ser visto em sua globalidade, mas em seus aspectos particulares. Não a Resenha Bíbliográfíca 175 humanidade como um todo, ou mesmo os subdesenvolvidos como um bloco uniforme; dentre êsses há a explosão populacional indiana e a baixa taxa demográfica brasileira, com os desertos populacionais da Amazônia e do centro-oeste, perigosamente ricos e desocupados, num mundo que já começa a falar, outra vez, em "espaço vital". Fritz Baad, colaborador de Manstein, divide a humanidade, em têrmos de relação população-produção de bens, em três grupos: a) países nos quais a produção de alimentos cresce mais depressa do que o número de habitantes que devem ser alimentados (Europa Ocidental, América do Norte, Austrãlia, Nova Zelândia e mais alguns pafses menores); b) países nos quais a produção de alimentos cresce mais ou menos tão depressa quanto o número de habitantes (União Soviética e China); e c) paises nos quais a atual produção de alimentos não acompanha o crescimento populacional (América Latina, Atrica, grande parte da Asia). Verifica-se~ assim, que o problema se agrava, tão-somente, nos países mais atrasados, sem tecnologia, carentes de capital. A medida que êsses países resolvam seus problemas é razoável esperar-se que, a exemplo da União Soviética e da China e, remontamente, a exemplo dos pafses enquadrados na primeira faixa, 1mperem seus problemas internos e entrem a produzir o necessário para atender às necessidades de suas populações. É evidente que Manstein prefere aconselhar o contrôle da natalidade nos países às voltas com gap de produção de alimentos. Baad refere-se à uma série de medidas tendentes tôdas elas a promover a superação dessas diferenciações: substâncias nutritivas para as plantas e combate às pragas da lavoura; aumento da produtividade por hectare; maior aproveitamento da água e cta energia; utilização das reservas alimentares dos oceanos. Todos os autores são acordes em apontar uma relação direta entre o contrôle espontâneo e as populações ricas e cultas; por outro lado, em regra, as populações pobres e incultas estão a braços com elevadas taxas de natalidade. Tem-se mostrado remédio da maior eficácia a alfabetização das populações. Além dos resultados diretos (higiene, aprendizagem de métodos de contrôle etc.), a alfabetização é até agora o melhor instrumento conhecido para a realização de uma economia agrária progressista, e assim, produtiva. 1T6 R.C.P. 3j71 Afigura-se-nos, pois, plenamente exequível e ao alcance de nossas fôrças "construir uma técnica de produção, propor uma planificação, adotar um dirigismo econ6mico que vençam de futuro todo êste desdobrar de tatos ameaçadores, os quais, na aparência, e tão-somente na aparência, confirmam o triste vaticínio malthusiano" (Bonavides. op. cit., p. 42}. Segundo os autorizados dados da ONU, já em 1951 a discriminação das rendas nacionaiS por habitante construiria quadro elucidativo: a Europa (incluída a URSS} e a América do Norte, juntas, constituindo 32% da população mundial, detinham 83% da renda do globo; por outro lado, a Africa e a América Latina, representando juntas cêrca de 14% da população mundial, detinham, respectivamente, 4,5% e 2% da renda mundial ... O problema da renda nacional, sempre relegado a segundo plano, precisa de entrar na liça: "Um têrço dos sêres humanos vive em países cuja renda nacional por habitante e por ano é inferior a 50 dólares e mais da metade dos homens se encontra em Estados cujas rendas por pessoa são inferiores a 100 dólares. Em 1954, para o conjunto dos países subdesenvolvidos, a renda nacional por habitante e por ano era de 586 dólares para o grupo dos países desenvolvidos (1 . 870 nos Estados Unidos). "Além disso, êsse desnível, já considerável, cresce ràpidamente, dado que os paises desenvolvidos progridem bem mais ràpidamente que os outros. Assim, a renda nacional por habitante nos Estados Unidos era 15 vêzes mais elevada que a da tndia, antes da guerra. Vinte anos mais tarde, seria necessário multiplicar para 35 a renda de um indiano para igualála à de um ianque" (Lacoste, Yves. Geografia do subdesenvolvimento. São Paulo, Difusão Européia do Livro1 1966. p. 12). Não por acaso a tndia é um país subdesenvolvido às voltas com explosão demográfica, e os Estados Unidos superdesenvolvidos, desconhecem essa ameaça. Repita-se: o "problema" crucial da explosão demográfica está exatamente no desnível do crescimento populacional frente ao crescimento da produção de bens de subsistência. O problema, pois, é de nível econômico: desenvolvimento nacional. Controlar a natalidade, tão simplesmente, ou apenas isso, seria reconhecer nossa incapacidade de promover o desenvolvimento econômico . .Resenha Bibliográfica 177 Não deve constituir mera coincidência o fato de dois dos paises mais populosos, a União Soviética e os Estados Unidos, o primeiro o mais populoso da Europa, o segundo, das Américas, desconhecerem o fantasma da superpopulação, por serem, ao mesmo tempo, as duas nações mais desenvolvidas do mundo. Seria ridículo, e nenhum organismo governamental se atreveria a tanto, propor às populações soviética e americana o contrôle da natalidade para evitar a fome, quando aquêles países se dão ao luxo de grandes populações ... e grande produção. Mas tanto em um como no outro, nas épocas históricas corretas, o problema foi atacado pela raiz: o desenvolvimento econômico. No âmbito dos subdesenvolvidos, afora o atraso econômico, existe o desperdicio da produção. O desequilíbrio entre os recursos naturais e o efetivo da população poderá ser anulado, não só pela produção de gêneros de subsistência, mas também pela racionalização dos processos de produção, pelo planejamento econômico, pela adoção de uma politica de incremento, com a introdução de técnicas modernas, contrôle de mercado etc. E a corrida armamentista, o desperdicio com a guerra, imolando vidas úteis, destruindo recursos naturais, arrasando economias, desviando para a esterilidade riquezas que, escoadas para o aumento da produção, teriam resolvido, por sem dúvida, os problemas atuais? Fritz Baad indica a solução para o problema que é hoje alimentar a população do globo: parar com os armamentos. Vale a pena transcrever êsse trecho (p. 261): "O problema de alimentar os habitantes da terra, que até o fim de nosso século terão aumentado para mais de seis bilhões, só pode ser solucionado se forem reduzidas de muito as despesas com armamentos, empregando-se em atividades produtivas, sobretudo no terreno intelectual, os recursos assim poupados. Esta é a fórmula mágica tanto para os países que dão ajuda como para os que a recebem. O primeiro a dizê-lo aos que ajudam outros foi Sir John Boyd Orr, autoridade máxima em economia agrícola. Em seu livro The white man's dilenuna escreveu êle que os Estados Unidos com seus aliados e a União Soviética com seus satélites deviam pôr à disposição de uma autoridade internacional, que representasse os interêsse de todos os povos, 10% das somas que gastam com armamentos e que os recursos assim obti178 R.C.P. 3/'ll mais em educação do que em qualquer outra região subdesenvolvida. Desgraçadamente, o mundo gasta três vêzes mais com armas que com saúde pública, é o que declara a UNESCO (cf. El Correo de la UNESCO, novembro de 1970), onde se lê: No periodo de 70 anos, desde 1900, o aumento médio da carga teal representada pelos armamentos no mundo inteiro atingiu a 5% anuais. A partir de 1948 a percentagem subiu para 6%. Isto significa que, de 1948 a 1968 o custo real dos armamentos TRIPLICOU. Se o aumento de gastos com armamentos prossegue no ritmo de nossos dias, e infelizmente nada nos conduz a prever o contrário, o despêndio terá outra vez dobrado daqui a nove anos, em 1980. O total mundial de gastos em 1968, segundo os preços de 1960, foi de 153. 498 milhões de dólares (americanos). Já em 1980 será de 306 . 966 milhões. Vejam~se êsses dados conclusivos: O Vietnã (do Norte e do Sul), gastara;m, em 1968, em armamentos pesados, 1. 200 milhões de dólares. Essa cifra extraordinária aplicada em regime de paz, teria acabado com a pobreza, a fome e o analfabetismo naquela populosa e conflagrada região do globo. Faz-se desnecessário estimar o quanto resultaria em riqueza, nessa região, a inversão das inimagináveis somas que os Estados Unidos consomem atualmente, no esfôrço de guerra. São as tristes irracionalidades a que se refere Bodo Manstein: "E:x;i.stem pois irraciona.lidades difíceis ou impossíveis de calcular, às quais pertencem tôda a escala de condutas religiosas, políticas, econômicas e biológicas dos povos. tstes povos, de tão diferentes civilizações, estarão prontos a aceitar novas idéias, que por um lado são condição prévia para tôdas as medidas de grande alcance a serem introduzidas, mas por outro lado, em muitos casos, trazem consigo uma total ou parcial dissolução de sistemas que se tornaram hábito antigo? Mal é de se esperar que o estejam, quando se v~ com que objetivos, em nossos dias, quando em muitos países morre gente de tome na beira da rua, se travam guerras e como permanecem sem solução os problemas raciais". Em seu livro, por demais importante, Manstein aborda o problema populacional sob os mais diversos ângulos, o bio180 R . C.P . S/71 dos deviam ser empregados na luta contra a fome e contra a pobreza. No ano de 1967 o Papa Paulo VI, na Encíclica Populorum Progressio, secundou. esta. proposta. com as seguintes palavras: "Em Bombaim pedimos a instituição de um grande fundo internacional, que devia ser constituído por uma parte dos recursos gastos para fins militares, destinado a socorrer os mais pobres. O que se aplica à. luta direta contra a miséria é de importância também para a ajuda ao desenvolvimento. Quando tantos povos sofrem fome, quando tantas familias vivem na miséria, quando tantas criaturas humanas vegetam na ignorância, quando falta construir tantos hospitais, tantas escolas e moradias decentes, todo e qualquer esbanjamento de dinheiros públicos e mesmo privados, tôda e qualquer despesa feita para satisfazer ambições nacionais ou pessoais, tôda corrida armamentista que esgota as fôrças da nação, constituem escândalo intolerável". Nesta declaração está formulada de mlV neira clássica a mobilização das reservas humanas do mu~ do para a luta universal contra a fome, no que se refere às nações ricas e em condições de ajudar. Mas também para os países que recebem ajuda esta deve ser a fórmula para a eliminação de seus deficits alimentares. Só quando a fórmula indiana - gastos com armamentos trés v€-zes maiores do que os gastos destinados d instrução - f~ substituída pela fórmula mexicana - quatro vêzes mais verbas para instrução do que para armamentos - podemos ter esperanças de ver as reservas humanas da Terra mobilizadas de maneira tal que também as reservas materiais se tornem produtivas e que a luta mundial contra a fome e a pobreza termine com a vitória da Humanidade". Se verdadeiras as estatisticas do Serviço de Desarmamento e Contrôle de Armamentos dos Estados Unidos (cf. meu livro Juventude em crise. p. 90), tudo faz crer que a América Latina, finalmente, compreendeu o sentido da advertência de MacNamara (No mundo moderno, a defesa, a segurança nacional, consiste, em boa verdade, no desenvoZ.. vimento econômico e científico. Por vkes, é-nos difícil perceber isso, nós que alimentamos opiniões um tanto estereotipadas, consistindo em calcular a segurança em térmos puramente militares) partindo para investimentos maciços no setor da educação. O Serviço de Desarmamento realizou uma pesquisa a respeito do que se gasta em Fôrças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica), cuja conclusão, honrosa para nós, é a de que os pafses da América Latina despendem R&enha Bfbltográjfca 179 mais em educação do que em qualquer outra região subdesenvolvida. Desgraçadamente, o mundo gasta três vêzes mais com armas que com saúde pública, é o que declara a UNESCO (cf. El Correo de la UNESCO, novembro de 1970) , onde se lê: No período de 70 anos, desde 1900, o aumento médio da carga real representada pelos armamentos no mundo inteiro atingiu a 5% anuais. A partir de 1948 a percentagem subiu para 6%. Isto significa que, de 1948 a 1968 o custo real dos armamentos TRIPLICOU. Se o aumento de gastos com armamentos prossegue no ritmo de nossos dias, e infelizmente nada nos conduz a prever o contrário, o despêndio terá outra vez dobrado daqui a nove anos, em 1980. O total mundial de gastos em 1968, segundo os preços de 1960, foi de 153.498 milhões de dólares (americanos). Já em 1980 será de 306.966 milhões. Vejam-se êsses dados conclusivos: O Vietnã (do Norte e do Sul), gastaram, em 1968, em armamentos pesados, 1. 200 milhões de dólares. Essa cifra extraordinária aplicada em regime de paz, teria acabado com a pobreza, a fome e o analfabetismo naquela populosa e conflagrada região do globo. Faz-se desnecessário estimar o quanto resultaria em riqueza, nessa região, a inversão das inimagináveis somas que os Estados Unidos consomem atualmente, no esfôrço de guerra. São as tristes irracionalidades a que se refere Bodo Manstein: uExistem pois irracionalidades difíceis ou impossíveis de calcular, às quais pertencem tôda a escala de condutas religiosas, políticas, econômicas e biológicas dos povos. tstes povos, de tão diferentes civilizações, estarão prontos a aceitar novas idéias, que por um lado são condição prévia para tôdas as medidas de grande alcance a serem introduZídas, mas por outro lado, em muitos casos, trazem consigo uma total ou parcial dissolução de sistemas que se tornaram hábito antigo? Mal é de se esperar que o estejam, quando se vê com que objetivos, em nossos dias, quando em muitos países morre gente de fome na beira da rua, se travam guerras e como permanecem sem solução os problemas raciais". Em seu livro, por demais importante, Manstein aborda o problema populacional sob os mais diversos ângulos, o bio180 R .C.P. 3/'11 lógico, o político, o econômico etc. Inicia-o tratando da Regulagem e Ordem biológica, seguindo-se os seguintes capitulas: Avalancha incontida de filhos, Em tôrno do Equador da Fome, Extensão e riscos do abôrto propositado, Métodos de regulagem da prole, O Espaço vital dos netos. A segunda parte é constituída pela reunião do texto de diversos debates assinados pelas mais destacadas autoridades européias: Alimentação universal exemplos de um prognóstico, Prof. Dr. Georg Picht; Contrôle da natalidade segundo o Direito da República Federal da Alemanha, Dr. Fritz Bauer; Em tôrno do futuro do amor, Prof. Dr. Friedrich Heer; Planejamento do futuro e economia do lucro, Jean Améry; O eros politizado, Dr. Rainer Kabel; Emancipação feminina e grupos subdesenvolvidos, Dra. Hedda Heuser; Malôgro da nova geração - culpa da velha, Peter-Wolfang Engelmeir; Condições fundamentais para um planejamento bem sucedido na família e jat6res que o entravam, Prof. Dr. Joachim D. Beekmann; Como vencer na l'ltta mundial contra a tome, Prof. Dr. Drs. h. c. Fritz Baade. Desconheço as caracteristicas do original alemão, mas não perdôo à Editôra Melhoramentos haver publicado êsse livro sem armá-lo com um minucioso índice analltico. Obras dessa natureza, obras para serem lidas, anotadas e guardadas na estante para novas consultas, não podem prescindir de índices analíticos, único instrumento válido para a localização e recuperação da informação. O CONCEITO DE DffiEITO NATURAL EM JOHANNES MESSNER. E. Serrano. Apud Revtsta de la Faculdad de Derecho, Untversidad del Zulia. A revista da Faculdade de Direito da Universidade de Zulia, Macaraibo, Venezuela, em seu número 29, traz, entre outros trabalhos, El concepto de derecho natural em Johannes Messner, assinado pelo Dr. Alberto E. Serrano. O Dr. Serrano, propondo-se a uma anãli$e de Ética social, politica y económica a la luz del derecho natur al, versão castelhana de Das Naturrecht, obra básica de Messner, realiza um pequeno estudo acêrca do conceito de direito natural na doutrina do jurisconsulto alemão. Seu estudo é despretencioso, limitando-se a extrair da obra do mestre alemão os aspectos mais caracteristicos, de forma a oferecer ao leitor. sem maiores considerações, seu conceito de direito natural. Resenha Bibliográfica 181 A importância do conceito de direito natural em Messner deriva de sua posição absolutamente pessoal, rompendo com os quadros tradicionais da classüicação jusnaturalista. É sabido que, em linhas gerais, as direções tradicionais do jusnaturalismo podem ser reduzidas a dois grupos de autores: a) os que assinalam uma instância supramundana como origem e fonte dos princípios básicos do direito natural (Deus); e b) os que derivam êsses princípios básicos a partir da razão humana. A saber, essas perspectivas, embora distintas, mantêm em comum o método dedutivo, pôsto que partem de um princípio geral - Deus ou a razão - para uma série de princípios ou verdades particulares, os direitos naturais fundamentais. Nesse quadro, como se situa Messner? Parte para uma terceira posição, indutiva. De uma série de verdades ou princípios particulares (dados recolhidos das ciências empíricas), obtém princípios ou verdades mais gerais (princípios de direito natural primário) em virtude de um processo de apstrações sucessivas. De certa forma, o pensamento de Messner pode ser encarado como uma volta, ou redescoberta contemporânea, do jusnaturalismo de Santo Tomás. Sem embargo dessa evidência, sua doutrina mostra pontos de contato com o existencialismo sartreano, não obstante a conservação do apêlo deísta impugnado pelo autor francês. Segundo Messner (Das Naturrecht, tradução castelhana referida, p. 36), a conduta exigida para a plena realização da natureza do homem vem determinada pelos fins traçados nos instintos corporais e espirituais de sua natureza. A saber: êsses instintos tendem a atualizar-se, como fôrças que são, em cada homem, em cada sujeito considerado individualmente, e a atualização de referidos instintos deve passar através da autodeterminaçã,o de cada homem individual na medida que é existência, liberdade, capacidade de propor-se possibilidades e escolber uma dentre essas possibilidades (favoráveis) propostas. A partir dêsse ponto de vista podemos afirmar que referidos instintos - denominados por Messner fins existenciais - tendem a um fim. Messner se preocupa com o homem enquanto uma existência em situação, seja, na medida que é um sujeito hic et nunc. Messner, lê-se na resenha de Serrano, localiza no ser humano uma série de estruturas e impulsos básicos ao largo de tôda a história e de tôda a geografia do glo'bo terrestre. 182 R.C.P. 3/71 Essas estruturas e impulsos básicos constituem os instintos corporais e espirituais que se encontram inscritos na natureza peculiar do homem; como exemplo dos primeiros teriamos o impulso à reprodução, enquanto que, como exemplo dos segundos, poderíamos assinalar a busca de conhecimento, que é um impulso vital característico do ser humano. Ainda em Das Naturrecht, Messner indica quais são os impulsos básicos ou fins existenciais do ser humano: a própria conservação, assim entendendo-se a inta.ngibilidade corporal e a consideração social (honra pessoal). A própria perfeição física e espiritual, nela compreendido também o desenvolvimento de suas capacidades para o melhoramento de suas condições de vida, assim como de previsão de seu bem-estar econômico através da garantia da propriedade ou da renda necessária à sobrevivência. A ampliação da experiência do saber e da aptidão para apreciar a beleza. A reprodução mediante a coabitação e a educação dos filhos. A participação do bem-estar espiritual e material dos demais homens como um ser humano dotado da mesma dignidade. A união social para o fomento da utilidade geral, que consiste no asseguramento da paz e da ordem, e de tomar possivel o aperfeiçoamento humano de todos os membros da sociedade por meio de uma participação proporcional na quantidade de bens disponíveis. Por fim, o conhecimento e o culto de Deus e o definitivo cumprimento do destino do homem mediante a união com :f!!le. :€ fora de dúvida que, salvante o último, como bem assinala Serrano, os demais fins existenciais são perfilhados por todos os homens, ou quase todos. ASPECTOS DA ECONOMIA BRASILEIRA. Jayme Magrassi de Sá. Rio-São Paulo. Editôra Alba. Como o próprio titulo indica, não estamos diante de um manual para aproveitamento didático, ou de um texto acadêmico. Mesmo o desenvolvimento doutrinário é relegado a segundo plano, em proveito do tratamento conjuntural: análise de aspectos concretos da economia brasileira. A elaboração não obedece a um plano pré-estabelecido, constituindo-se mais precisamente em uma bem selecionada coletânea de textos autônomos, ainda que necessàriamente harmonizados. Resenha Bibliográfica 183 Reunião de artigos publicados em épocas distintas na imprensa diária do Rio de Janeiro, o livro do economista Jayme Magrassi de Sá, na medida que perde em profundidade (incompativel com o tratamento jornalístico a que se propôs), ganha em comunicação. O autor procura deliberadamente e quase sempre atinge um tratament<1 claro e ameno, pois não lhe faltam nível científico e competência técnica bastantes para descer aos meandros da economia brasileira contemporânea. Livro escrito nas vagas dos fins-de-semana, dirige-se àquele segmento de leitor que os jornalistas denominam de "grande público não iniciado em matéria econômica", mas despertado por um interêsse crescente: profissionais liberais, homens de negócio, estudantes e outros. Talvez por isso mesmo, alguns dos assuntos abordados cheguem a constituir-se em temas polêmicos, como por exemplo a correção monetária. Pedra de toque para mal-entendidos, envolve as preocupações de todo o Pais, desde os escalões mais altos da adlninistração federal até a economia do lru: mais modesto: alcançando a todos de forma inflexível, embora em doses discriminatôriamente distintas, a correção monetária tem provocado os mais vivos e desconcertantes debates, muitos de ordem puramente técnica, muitos timbrados pela tônica emocional. Inconvenientemente convertida em tabu por seus primeiros teóricos, a correção monetária é apresentada como obra acabada: intocável, intangível, imaculável, constitui mesmo irreverência tentar a mais inocentes das críticas. Os corüeus da correção não admitem, ao menos, que se examine, cientificamente, o seu comportamento e seus resultados; se a correção monetária era a solução boa, bons devem ser seus resultados. Para que mensurá-los? Aos que propugnam a análise dos resultados para a retificação das distorções acaso detetadas, se objeta o anátema de "inimigos da correção", o que por si basta para encerrar qualquer debate. Mas a verificação dos resultados se impõe: é que sua adoção- medida correta e inafastável, reconhece Magrassi - prescindiu, até por fôrça mesmo das condições emergenciais características do momento político em que se implantou, de análise prospectiva mais detida. Passados seis anos de sua vigência, será simples ataque ao instituto sugerir a verificação dos resultados? Mas a posição contrãria, ensejando a manutenção dos desvios de cur184 R . C.P. 3/71 so, poderá conduzir à condenação em bloco da correção, o que não é solução, mas saída ainda mais desastrosa. O temor das pequenas correções alimenta as distorções que poderão comprometer o próprio instituto. Veja-se um exemplo: projetada em 1964, quando a situação crítica da economia brasileira impunha o tratamento antiinflacionário de choque, a correção permanece a mesma ainda hoje, quando a inflação se mostra sob contrôle. Ora, como explica Magrassi, a correção já agora está gerando, ante a redução da taxa de inflação, a criação de determinada faixa de renda real, mas em favor dos credores; êsses, passam a auferir dois tipos de renda: a decorrente de juros, comissões etc., e a que lhes chega implícita no produto da correção. Ou seja, transferiuse para os credores as vantagens que a inflação atlibuía aos devedores. Por outro lado, se está havendo - e não há como negar - uma absorção gradual da inflação, não será heresia pretender uma absorção gradativa do próprio instrumento da correção, que apenas se justifica pela existência da inflação, e na sua medida. Não deve, portanto, a aplicação, obedecer a um esquema rígido, mas acompanhar a própria evolução da economia. Entre nós, todavia, mantém-se intocada a alvíssara de sua introdução. Daí, algumas distorções humanamente inevitáveis, tais como sua lenta absorção que, não promovendo o decréscimo da taxa de desvalorização, não pode estar, evidentemente, ajudando o esfôrço antiinflacionário. Os que acusam a existência de discrepâncias no exercício da inflação partem do reconhecimento de que está definitivamente vitoriosa a política econômico-financeira do govêrno; e essa vitória mesma é quem fornece ao govêrno meios e instrumentos que tornam ridículo qualquer receio ou mêdo de manter a correção em rédeas mais curtas. A gradual absorção da inflação deve assegurar a tranqüila correção da correção, eliminando, por exemplo, a assimetria de comportamento e a exiguidade dos prazos de reajustamento, ou, reduzindo o percentual da inflação, fazendo-o igual a uma dada percentagem da taxa de inflação possível. Segundo Magrassi de Sá, e assim conclui seu ensaio, "o que se impõe é uma orientação ponderada, caminhando~ se para a erradicação, no momento oportuno e com os cuidados necessários, de algo que só pode existir numa ecoResenha Btbliográfica 185 nomia enfêrma e cuja aplicação, se imperfeita, acaba concorrendo para alimentar o estado de enfermidade. Dentro de uma política antiinflacionária gradualista, tal orientação só pode desenvolver-se gradualmente, sob pena de incompatibilidades e precipitações. Mas, há que iniciá-la com urgência". De resto, o que parece inquestionável é o anticientüismo da posição dos que consideram intocáveis a correção e os processos utilizados para aplicá-la. A ciência, inclusive e principalmente a ciência econômica, é incompatível com os tabus. Mas, A "Ccm-eção" da Correção é apenas um dos aspectos da economia brasileira enfocados por Magrassi de Sá. Em seu livro são abordados ainda os mais variados temas, entre os quais cumpre registrar: Recuperação financeira do Brasil, O sistema financeiro e o desenvolvimento, Desenvolvimento regional integrado, O mercado de capitais, Contr6le dos preços, Contróle da natalidade, O uso do agregado produto e muitos outros. LANÇAMENTOS RECENTES Zahar Edltôres Teorias do desenvolvimento econ6mico, William O. Thweatt, da Vanderbilt Universit, e diretor, até bem pouco, dos cursos de pós-graduação em Economia da Universidade de São Paulo. Seu mais recente livro focaliza as diversas teorias que, a seu ver, contribuíram para a formação do quadro atual da economia brasileira. Perspectivas do capitalismo moderno, coordenação do Professor Luiz Pereira, da Universidade de São Paulo. Reúne alguns dos mais destacados especialistas. Uma introdução d sociologia, Wil!red A. Andersen e Frederick B. Parker, das Universidades de Cornell e Delaware. Com clareza e segurança analisa as principais correntes do pensamento sociológico, dispensando gráficos e diagramas. A emprêsa privada e o interêsse público, Gordon C. Bjork. Partindo de um estudo sôbre a lógica do desenvolvimento capitalista nos Estados Unidos, analisa a for186 R.C.P. 3/'11 mação econômica americana, e o impacto que sObre ela provocaram as diversas correntes econômicas, principalmente o pensamento marxista. Editor Borsol Curso de direito internacional público, Luis Ivanl de Amorim Araújo. Manual didático, dedicado aos alunos dos cursos jurídicos. O primeiro volume, o único lançado, vai, desde o Conceito de Direito Internacional Público à anãlise dos mecanismos reguladores da Extradição. Os temas são tratados de forma sumária, direta e acessivel. Não há indice analltlco, ao menos nesse volume. PUBLICAÇÕES DA CAMARA DOS DEPUTADOS 1. Deputados õra.sflefros (Repertório biográfico dos membros do. Câmara dos Deputados - 6.• legislatura) 4. Anat! da CâmaTa dos Deputados Anais da Constituição de 1967 Partü:tpação do trabalhador nos lucros da empr~sa (Série 7. Referência legtslattva. 2. 3. Documentos Parlamentares) 5. Súmula de difcursos 6. Sérte Emendas à Constftutçllo de 1946 8. Resenha legislativa 9. 10. 11 . 12. 13. Bibztografia sôbre Federalismo (separata) Bibliografia sôbre a Universidade de Brasília (separata) Apartheid. Bibliografia 86bre a pOlítica de segregaç4o ra,ctal na A.frl.ca do Sul Politü:a de desenvolvimento e atuação da SUDENE (Bibliografia) (separata) Btbltogralfa de José Bcmttácto de Andrada e Silva (0 Pa- triarca da Independência) (separata) A venda. nas Uvrarlas da. FGV ou pelo reembõlso postal. Pedidos paro. o. Fundação Getúlio Vargas, Serviço de Publicações, Prl\ia. de Botatogo 188, Caixa Postal 21.120, ZC-05, Rio de Janeiro, OB . Ruenha Bibliográfica 187 i· ~-m-~_R_IA_S_D_A_m_v~' ~~----A_G~_T_E_s__~l ~~---A-SS_IN_Aru_R_AS~~ =r: "": ~ ----lt!l ..._- ~.:*.L~- )0.1 llllja t c I 111. M-414l l:..t": I.. lloco A l.tja 11 - Ttl. Du><MI - C,,,_, ltlill lldt. ""'""-AIIIü.!IZ · III I~ 3lll 11111- ,, C.."' *l•11111Hit•ll "''' .. lclll>p, 111 ~~ l - l t t/111 110. Wl(l. . Cl 4l- wu:u lt c:..u-~~·---·~ ~ ~t:"J:' . . .111 ~ ~'Q ~·ra~ IIUIJ[t • Clotl c..~ • ::.~cm~· 111 c. »1 ~-~•twT.._ IIIOao'*" .. L._ t ta-r..:t.~;A IWSIIIA 11 llU - lliiL .... ........ ~lfll --11 ... _ _ ltall I'{ tntiC'oieotCWbtl ~U&t''". ......,!I>IL'1111Tolo~ M IIIDION :~1tE1 f{"" "''"0. S64 t/IOI T&i• 4-l315 t ..... a..... - LIVRARIAS . . . .'tÚO .. " " ' .....,...,..,tlltii•Stl lltlltl IIU ... """' t SoiiYIGClM - liiWI b Allk•V.- ':ito~ll~ *'"'o .... ".... UI< ..~ lllbfo ... ...,._,1\oiiSCMft TtiiOif l<IUOI 11 !..-. · .l(loc• tllori<lt u .......... mt•- .. r-lt.llitt ~li I s~ 1>1\ii.O '' ~~~:~1.!'.t1~'i!:: 1:"'.. SAD PAUlO l' .. _ .. -..w Q;rilllol 11 I_..,.__ _........ ~-· .......llr.. ~~DA -. liAm • ''""'" I C.lnJo U4t ~ ~Ául~' ,r~ lll rorr.teedou dt PIAI,~'et' lf(Aiell MM dt Otoo~o M:ft' ~~·w·· ZlO , " u.... .,.• -~-lliiL l l...illlll- ....." . . . _0~1111 ltt UOII-10 11 a.rna. ... . .....oç~o- .. ~ !CaiO Jlllii:IS NlllltNW II)O(IAII[I10 . a - - • 1101. • c.ltttt Udt. .., Dr. v.~ N"~ UI ... o.,.,. • -.,m ~-~··- CUIIIIM 11 ... .,....... -· tJ.jlo .. lilll ..... MOIUIIliS . . • . . _ lUli/IIIS ,.... GOWIIA 10 .1 RESENHA BffiLIOGRAFICA R. A. AMABAL VIEIRA As idéias de McLuha:n. Miller, Jonathan. Editora Cultrix, Editora da Universidade de São Paulo, São Paulo, 1973. Apesar da sugestão do titulo, As idéias de McLuha.n (no original americano: McLuha.n) , não se trata de simples exposição do elenco de idéias do autor de Understa.nding media. Com esse livro, Jonathan Miller não pretende oferecer um inventário do que há de mais importante na temática mcluhaniana; ao contrário, destinando-se mais aos conhecedores da obra polêmica de McLuhan, embora declare dirigir-se ao leitor "não iniciado", é um estudo contestador. A exposição das idéias de McLuhan desenvolve-se a partir das críticas e das reservas de Miller. Neste sentido, trata-se de um livro de contestação, o que certamente justifica o estilo não só contraditório mas também hostil que o caracteriza, da primeira à última página: "Na exposição, adotei deliberadamente um tom hostil, em parte porque - devo admitir - estou em quase total discordância com o conjunto principal das idéias de McLuhan, mas em parte, ainda, para emprestar certo vigor r etórico à discussão. Meu meio é parte de minha mensagem." Para a apresentação caleidosc6pica das idéias de McLuhan autor de cerca de 11 livros e de copiosa colaboração em revistas e jornais - Jonathan Miller não necessitou, porém, de lançar mão de toda a sua bibliografia limitando-se, basicamente, a uma só de suas obras, de certo a obra fundamentai do conjunto mcluhaniano. A partir de A galáxia de Gu.temberg (publicada no Brasil em 1972 pela Editora Nacional), Miller intenta apresentar e criticar o conjunto das idéias de McLuhan. Para o autor, a limitação não impôs qualquer ordem de dificuldades ao seu projeto: "Embora McLuhan tenha mostrado, em anos recentes, espantosa produtividade, seu único livro em condições de reclamar procedentemente R. Ci. pol., Rio de Janeiro, 17(1): 157-163, jan./mar. 1974 nossa estima foi publicado e largamente comentado no início da década de 1960. Posteriormente, a maior parte do que ele disse foi repetição, ou melhor, constituiu-se em uma série de glosas, espirituosas, a propósito dos temas abordados em A galáxia de Gutenberg. Entendo que, resumindo a linha básica em torno da qual esse livro se desenvolve, poderei fazer adequada apresentação das principais idéias de McLuhan, embora reconheça que há notáveis ineditismos epigramáticos disseminados por quase tudo o que ele publicou até nossos dias." Os pontos básicos da exposição e, portanto, da crítica são: 1. A superioridade da comunicação fundada na linguagem oral sobre a comunicação com base nos recursos visuais, pois o can~ da audição é intrinsecamente mais rico, ou seja, na linguagem mcluhaniana, mais quente do que o da visão. ("Como conseqüência, ainda que não existissem outras vias sensórias acompanhando o uso da fala, aquele que ouve continuaria a receber mensagem mais rica, mais quente do que a que lhe chegaria exclusivamente através dos olhos.") Segundo McLuhan, quanto maior o número de sentidos em pauta, melhor a possibilidade de transmitir uma cópia fiel; a capacidade de um meio qualquer agir depende do número de canais sensórios que ele chame a atuar. De todos, o que menos exige é o meio tipográfico, enquanto, pelas mesmas razões, avultam os meios baseados nos recursos audiovisuais, os m.a.is qtumtes. 2. A primazia dos audiovisuais decorre da reunião dos meios frios da visão aos quentes, representados pela linguageJD, audição e tato (McLuhan afirma que o tele:spectador chega a "tocar" na imagem ... ). Se a linguagem era enriquecedora, a escrita viria a ser empobrecedora. Assim Miller resume essas idéias: "Por ambas essas razões, McLuhan afirma que a linguagem falada exerce irresistível poder sobre a imaginação de quem ouve e que as palavras adquiriram o status daquilo que o filósofo Usener denominou 'de idades que duram um momento'. O homem primitivo, que se apóia, de maneira quase total, em trocas orais, vive conseqüentemente, numa condição de fértil encantamento imaginativo, com o espirito estimulado em toda a extensão e largura de suas gamas sensitivas. Segundo McLuhan, a invenção da escrita violou essa multiplicidade sagrada e forçou os homens a se concentrarem na visão, em detrimento de todos os outros canais sensórios. Para usar uma metáfora que não é de McLuhan, diremos que a mensagem transmitida através de um manuscrito semelha-se à melodia sinfônica e executada por um violino, ao 158 R.C.P. l/74 passo que a mesma idéia expressa por meio de palavras faladas reflete a execução de todo o conjunto orquestral." 3. O empobrecimento propiciado pela descoberta da linguagem escrita seria levado ao seu paroxismo pela invenção de Gutenberg. "A clara legibilidade dos tipos tornou possível que o olho corresse sobre a superfície 'asfaltada' de um texto, absorvendo, num descuidado lançar de vista, noções que poderiam ser mais sutilmente moduladas e matizadas, se emitidas como expressão verbal." Esse empobrecimento implicaria, ainda, em um segundo momento, a diminuição do raciocínio criativo, substituído pelo racioclnio lógico formal, linear, estéril: "O homem-Gutenberg é, pois, segundo McLuhan, explicito, lógico e literal; permitindo que os bem enfileirados regimentos do texto o tornassem superdisciplinado, o homem fechou seu espírito a possibilidades mais amplas de expressão imaginativa." 4. A uniformidade tipográfica facilitou o enquadramento da individualidade; a standardíza.ção da informação {do meio) , facilitou a standardização da vida. "O homem que vive da letra impressa e por meio dela, submete-se, sem queixas, a quadros de horário, a listas de pesos e medidas, à instrução formal e a todos os outros racionalizados fiats da vida moderna. O homem-Gutemberg é pontual, produtivo e tem senso de oportunidade; e como, além disso, ele agora absorve tanto conhecimento sem jamais ter de colocar-se diante da fonte individual humana, seu sentimento de comunidade espiritual tendeu a desaparecer, enquanto florescia a sua capacidade técnica. " Esse inventário permitiu a Miller a organização de uma série de críticas e a formulação de outras tantas teorias a propósito das idéias de McLuhan, que nos será apresentado como um escritor r eacionário, beato, preso a raízes rurais e retardatário adversário do progresso, representado pela introdução das máquinas. É bom lembrar que a invenção de Gutenberg foi tipicamente da máquina que possibilitou a fabricação de tipos móveis de cobre e outros metais resistentes, de que resultou a tipografia, vale dizer, a reprodução em massa, a vulgarização da cultura. Para Miller, na critica ao homem-Gutenberg, McLuhan "assume a posição de um luddista refinado, distinguindo-se daqueles que o precederam no ataque à máquina pela maneira como acentua que a descoberta da imprensa constituiu-se num pecado original de onde derivaram todos os infortúnios subseqüentes da civilização industrial ." Retenha bibliográfica 159 • A posição de McLuhan, todavia, desse ponto de vista, seria contraditória, desde que "olha os mais recentes desenvolvimentos da tecnologia eletrônica em termos de uma abertura que, inspirada por Deus, permite fuga da escravidão exercida por engrenagens e alavancas. De modo algo confuso, ele identificou os circuitos de engenharia elétrica aos do próprio sistema nervoso humano e convida-nos a reconhecer que, através da televisão e do rádio, concedemo-nos a oportunidade de estabelecer comunicação reciproca utilizando vias capazes de reproduzir a simultaneidade plural do próprio pensamento. Utilizando essas vias, as imagens e os sons podem ser prontamente transmitidos a um espírito atento, com velocidade telepática; e, como os vários mecanismos podem ser relacionados entre si, de modo a constituírem uma vasta r ede, o homem-eletrônico voltou a encontrar-se numa aldeia tribal de escala planetária. " A análise às idéias de McLuhan exigiria prévio estudo do meio que o formou e permanece influenciando toda a sua produção. O Canadá de McLuhan, segundo Miller, é o Canadá agrário e católico, a um tempo preso à cultura-mãe da Europa, conquanto sinta-se livre do que algumas vezes considera o peso morto de uma tradição exaurida, inveja, ao mesmo tempo, sua complexa herança viva. Para o mesmo Miller as idéias do distributivismo agrário, herdados do ambiente em que se criou, bem como seu catolicismo, formam o principal tema subjacente da obra que o tornou conhecido. Segundo Miller, o jovem (rural) McLuhan, recém-chegado a Cambridge para o curso de pós-graduação de English studies, dedicaria todas as suas simpatias intelectuais a F . R. Leaves, cujas idéias são resumidas no texto a seguir: "Essa fortaleza do inglês pertence ao próprio espírito da língua-espírito que se formou quando o povo inglês que lhe deu origem vivia predominantemente no campo (. .. ) E quão mais rica era a vida naquela ordem antiga e predominantemente rural do que no moderno mundo suburbano! ( ... ) Quando a isso se acrescenta que, dentro da velha ordem, em vez de ler ou de ouvir rádio, a arte popularmente cultivada era a do falar (o que tornava Shakespeare possível), faz-se claro que a promessa de regeneração por meio da gíria norte-americana, idioma citadino corriqueiro, ou a invenção dos cosmopolitanos de transição, correspondem a um débil consolo para a perda que sofremos." Para Miller os ideais do distributivismo agrário foram consagrados por McLuhan, de "forma sutilmente disfarçada" na A galáxia de Gutenberg, que jamais foi uma versão desapaixonada dos efeitos das novas tecnologias sobre os sentidos do homem. 160 R.C.P. 1{74 O catolicismo é, na visão de Miller, outra característica, conflituosa, do pensamento de McLuhan. "A pretensão de imparcialidade de McLuhan lança luzes sobre uma peculiar feição de seu pensamento. De fato, conquanto ele se proclame inteiramente isento de valores, sua obra encontra alicerce no ardente desejo de ver prevalecerem certos princípios éticos muito claros. Revoltado, como patentemente se mostra, contra o racionalismo cientifico ateu, não deixa de mostrar, ao mesmo tempo, grande sujeição ao prestigio intelectual daquela corrente de idéias. E, para dar maior força aos argumentos que contra ela dirige, adotou o que entende ser a posição do cientista, para derrotar seus oponentes no próprio campo em que estes atuam. Infelizmente, adotou a posição sem conhecer as regras que a disciplinam. Tal como ocorre com seu companheiro de beatice, Teilhard de Chardin, só consegue impressionar aqueles cujo horror à ciência apenas é igulado ou ultrapassado pela suscetibilidade que revelam para com o especial jargão científico." "Comparar McLuhan a Teilhard de Chardin seria injusto, mas, com freqüência, torna-se útil classificar as variedades de desatino intelectual e evidenciar que exemplos aparentemente dispares de pensamento desorientado pertencem, efetivamente, a certas categorias muito conhecidas. McLuhan e Teilhard de Chardin colocam-se na mesma categoria; naquela que Sir Peter Medawar condenou em seu famoso ensaio: The phenomenon of Chardin: The phenomenon of man é de caráter anti científico (os cientistas são mostrados como pessoas sem profundidade, patinando sobre a superfície das coisas) e - como se isso não constituísse recomendação bastante - foi escrito por um cientista, circunstância que parece imprimir-lhe particular autoridade e peso. Os leigos acreditam que entre os cientistas se encontre uma espécie única de pessoas. Ignoram que os diferentes ramos da ciência exigem aptidões e graus de capacidade muito diversos. Teilhard cultivou um tipo de ciência intelectualmente incorreto, no qual veio a alcançar moderada proficiência. Não tem sensibilidade para o que seja um argumento lógico ou para o que se erija em prova. Não mantém nem mesmo a compostura comum. da redação científica, embora seu livro seja, declaradamente, um tratado científico." "V em escrito de modo quase totalmente inintellgível, o que é apresentado como evidência prima facie de profundidade. É por Teilhard de Chardin oferecer esses pensamentos de tão maraviRewnha bibli.ogrdfica 161 lhosa profu:ndidade que se torna dilicil acompanhá-lo - situa-se para além de minha capacidade cerebral e não é isso exatamente que mostra quão profundo e importante deve ser?" (The art of the soZu.bZe. p. 79-80) . Miller, a seguir, aproxima McLuh~n de Teilhard de Chardin, dentro do enunciado propósito de demonstrar que "a massa da obra de McLuhan está fortemente penetrada de devoção católica e que a proclamação de imparcialidade é, em parte, recurso tático para iludir o inimigo." Uma crítica que se pode fazer a McLuhan, e da qual Miller não cogita, é relativa à tendência, da televisão, à oralidade e à individualidade, características por ele emprestadas à comunicação gutenberguiana. A televisão, segundo entendemos, com sua riqueza de imagens e sons é, de algum modo, a volta à oralidade. A linguagem era originariamente oral. Mesmo com os manuscritos, a comUnicação é uma espécie de conversação. A leitura solitária era uma leitura em voz alta, e em voz alta o texto era transmitido pelo mestre (leitor) aos discípulos. Mesmo na Renascença, depois da separação das palavras e depois do advento da palavra impressa, o ato de ler continuou sendo feito em voz alta. Se hoje em dia o movimento labial é indicador de baixa cultura, se o leitor letrado lê silenciosamente, a leitura em voz alta foi por muito tempo a melhor forma de publicação dos livros. As recitações da Idade Média repetem-se atualmente quando o professor é um repetidor de leituras; repetem-se na cultura puramente oral dos cantadores, cronistas de sua sociedade, e na literatura de cordel, que ainda resiste, heroicamente, no interior do nordeste brasileiro. A um tempo jornal e romance, essa literatura - hoje gravemente atingida pela penetração da televisão - destina-se a um público quase sempre contraditoriamente inatingível, por ser analfabeto. O vendedor de cordel é, antes de mais nada, um contador de histórias, um violeiro e um recitador, lendo e recitando em voz alta, nas feiras e nas praças dos povoados. Hoje, em toda parte, a fanu'lia se prostra diante da televisão, o novo pajé. Mantida essa característica, a Tv constituiria, hoje, um instrumento intimista, fortalecedor do eu e do individualismo. Se a leitura é uma ocupação introvertida, solitária, reforçaclara da interiorização e da individualidade (McLuhan), a comunicação eletrônica - e a televisão é ainda exemplo válido - arranca o homem de si mesmo, transporta-o para o fato ou traz o evento para dentro de casa, comunica-se interiorizando. 162 R .C .P. 1/74 lhosa profundidade que se torna difícil acompanhá-lo - situa-se para além de minha capacidade cerebral e não é isso exatamente que mostra quão profundo e importante deve ser?" (The art of the sotubte. p. 79-80) . Miller, a seguir, aproxima McLuhan de Teilhard de Chardin, dentro do enunciado propósito de demonstrar que "a massa da obra de McLuhan está fortemente penetrada de devoção católica e que a proclamação de imparcialidade é, em parte, recurso tático para iludir o inimigo." Uma crítica que se pode fazer a McLuhan, e da qual Miller não cogita, é relativa à tendência, da televisão, à oralidade e à individualidade, características por ele emprestadas à comunicação gutenberguiana . A televisão, segundo entendemos, com sua riqueza de imagens e sons é, de algum modo, a volta à oralidade. A linguagem era originariamente oral. Mesmo com os manuscritos, a comunicação é uma espécie de conversação. A leitura solitária era uma leitura em voz alta, e em voz alta o texto era transmitido pelo mestre (leitor) aos discípulos. Mesmo na Renascença, depois da separação das palavras e depois do advento da palavra impressa, o ato de ler continuou sendo feito em voz alta. Se hoje em dia o movimento labial é indicador de baixa cultura, se o leitor letrado lê silenciosamente, a leitura em voz alta foi por muito tempo a melhor forma de publicação dos livros. As recitações da Idade Média repetem-se atualmente quando o professor é um repetidor de leituras; repetem-se na cultura puramente oral dos cantadores, cronistas de sua sociedade, e na literatura de cordel, que ainda resiste, heroicamente, no interior do nordeste brasileiro. A um tempo jornal e romance, essa literatura - hoje gravemente atingida pela penetração da televisão - destina-se a um público quase sempre contraditoriamente inatingível, por ser analfabeto. O vendedor de cordel é, antes de mais nada, um contador de histórias, um violeiro e um recitador, lendo e recitando em voz alta, nas feiras e nas praças dos povoados. Hoje, em toda parte, a família se prostra diante da televisão, o novo pajé. Mantida essa característica, a Tv constituiria, hoje> um instrumento intimista, fortalecedor do eu e do individualismo. Se a leitura é uma ocupação introvertida, solitária, reforçadora da interiorização e da individualidade (McLuhan) , a comunicação eletrônica - e a televisão é ainda exemplo válido - arranca o homem de si mesmo, transporta-o para o fato ou traz o evento para dentro de casa, comunica-se interiorizando. 162 R.C.P. 1/74 Se a televisão é e pode ser assistida em grupo, não há integração no grupo; não é o grupo que assiste ao programa, mas todas as pessoas que o integram, isoladamente. A exemplo da assistência cinematográfica, os telespectadores exigem silêncio, não-intervenção, não-interrupção. 1!: possivel ficar só, assistindo individualmente à televisão, embora esteja-se em grupo diante do vfdeo. Se a televisão traz os acontecimentos até nossa casa e nos transporta para todo o mundo (e nesse sentido é o instrumento que nos conduzirá à planetarização) , a um tempo - de tão completa como veículo de informação e comunicação - pode-nos isolar do mundo, transformando-se no nosso mundo pessoal, solitário, instrospectivo, individualista, neurótico. Nessa medida, construindo o homem à imagem do individualismo gutenberguiano, o que deveria (ou deverá) destruir? REEMBOLSO POSTAL OBSERVAÇAO IMPORTANTE: A fim de simplíticar e tornar mais rápido o envio de pedidos de publicações da Fundação Getulio Vargas, sugerimos o uso do reembolso postal, que beneficiará principalmente às pessoas residentes em locais afastados dos grandes centros. Assim, na ausência, em sua cidade, de representantes credenciados ou livrarias especializadas, dirija-se diretamente pelo reembolso ao SERVIÇO DE PUBLICAÇOES PRAIA DE BOTAFOGO, 188- CAIXA POSTAL, 21.120, ZC·05, RIO DE JANEIRO- GB. Resenha. bibliográfica 163 A EXPERitNCIA DO SABER A SERVIÇO DO DESENVOLVIMENTO . administração economia planejamento comunicação são alguns dos assuntos tratados pelos autores editados pela Cgv. ... Edgar Morin e outros- Cultura e comunicaç4o de massas UThanteoutros- Guerraàpoluição BID- Dez anos de luta pela América Latina Raúl Prebisch -Transformação e desenvolvimento- A grande tarefa da América Latina A. Balinky- A economia de Marx: análise e critica BID-Os merc:ados de capitais da Amériça lAtina EDITORA DA FGV - LIVROS PARA O DESENVOLVIMENTO re4w.,.,.. Fu4afie w hlh v.,.,. J>rúa ~e a.wer-. 111 - I lU SIL zc.os- 110- CI