JORNALISMO E EXCESSO DE INFORMAÇÃO sites RECORDES
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JORNALISMO E EXCESSO DE INFORMAÇÃO sites RECORDES
26-01-2009 JORNAL 44a47:44a47.qxd 15:04 sites Page 44 Por Mário Rui Cardoso > [email protected] http://www.cjr.org/feature/overload_1.php JORNALISMO E EXCESSO DE INFORMAÇÃO > Recomenda-se muito vivamente a leitura do artigo de capa da última edição de 2008 da revista Columbia Journalism Review (CJR). Intitulado “Overload!”, o texto, apesar de longo, merece uma leitura integral para nos fazer – pelo menos – reflectir sobre alguns valores primordiais do Jornalismo. A peça trata da luta do Jornalismo para sobreviver nestes tempos de excesso de informação que – tudo o indica – estão não a atrair mas a afastar as pessoas das notícias. Em 2007, como parte do planeamento estratégico para a sua adaptação à nova idade digital da informação, a Associated Press encomendou um estudo sobre a forma como os jovens adultos consomem notícias em todo o mundo. A conclusão foi surpreendente. Os inquiridos lamentaram que a informação disponível seja, quase sempre, uma sucessão interminável de factos apresentados de forma desligada e superficial e queixaram-se da dificuldade em encontrar informação com profundidade. Ou seja, o estudo concluía que “a abundância de notícias e a ubiquidade da escolha não se traduzem necessariamente num melhor ambiente noticioso para os consumidores”, podendo, pelo contrário, gerar cansaço relativamente às notícias. Ainda mais surpreendente foi ter-se constatado que essa fadiga das notícias provocou nos inquiridos “uma incapacidade de mudar a forma de consumirem as notícias. Num tempo em que têm mais controlo e mais escolha do que nunca, quando as notícias os deitaram abaixo os participantes mostraram uma tendência para receberem passivamente as notícias, em vez de as procurarem activamente”. Parece paradoxal. Há hoje mais de 70 milhões de blogues e 150 milhões de “websites”. Aparecem, em cada hora, mais dez mil. Só em 2006, o mundo produziu 161 exabytes de dados digitais, o equivalente a 3 milhões de vezes a informação contida em todos os livros que já foram escritos. E, no entanto, «o padrão básico é a quantidade de informação que as pessoas têm e os seus conhecimentos políticos não serem nem melhores nem piores hoje do que foram nos últimos 60 anos», como refere Michael Delli Carpini, decano da Annenberg School for Communication. A verdade é que, havendo mais informação disponível, também há mais factores de distracção, e as empresas de notícias, na sua luta para sobreviver na idade da informação, talvez só estejam a complicar a situação, ao saturar o público de informação. Como muito bem ilustra este artigo da http://10000words.net/newyorktimes-election-timelapse.html RECORDES DA WEB NAS ELEIÇÕES AMERICANAS 44 |Out/Dez 2008|JJ 44a47:44a47.qxd 26-01-2009 15:04 Page 45 CJR, vivemos num tempo de multitarefas, em que a atenção do público é um bem cada vez mais escasso. Esta rotina de estímulos simultâneos e constantes interrupções da atenção de que é feito o nosso quotidiano é, de resto, uma realidade mensurável em custos para as empresas. Nos EUA, ela é responsável por quebras de produtividade correspondentes a uma média de 30% de um dia de trabalho nas profissões intelectuais e custam, anualmente, 650 mil milhões de dólares, de acordo com o relatório Excesso de Informação: Vimos o Inimigo e Ele é Nós, da Basex. Porém, as empresas de notícias competem pela atenção do público, num ambiente já saturado de informação, acrescentando mais informação, juntando mais blogues, mais vídeos, mais audios, mais isto, mais aquilo. É como ter muita gente dentro de uma sala e estarem todos a gritar ao mesmo tempo para serem ouvidos. Ou como ter um bombeiro a tentar apagar um fogo com napalm. Neste contexto, a CJR acredita que o futuro do Jornalismo passa por ajudar a dar sentido a este mar de informação, para atrair gente às notícias e não > As 23h00 de terça-feira, 4 de Novembro (04h00 da madrugada de quarta-feira, 5, hora de Portugal continental), foi o momento em que os “websites” noticiosos receberam o maior número de visitantes, desde que há registos de acessos. Foi essa a altura em que se soube que Barack Obama vencera as eleições presidenciais americanas e a quantidade de acessos – uma média de 8 milhões e meio de visitantes a acederem a sítios de notícias, em cada minuto, em todo o mundo, durante uma hora – demonstrou que a Web ascende imparavelmente à condição de meio privilegiado para a obtenção de notícias. Para alguns “sites”, como a MSNBC, a CNN ou a ABC, essa terça-feira foi o dia em que registaram o deixar que se crie o efeito de saturação. Jornalistas que confrontem as diferentes visões de um problema, que façam a big picture do mundo, são cada vez mais necessários, num tempo em que as pessoas podem escolher a informação que querem e tendem a ficar apenas com aquilo com que se identificam ou que lhes interessa – um tempo de «my news, my world», prejudicial à democracia. Depois, o primado da velocidade e do volume de informação canaliza muitos recursos para a actualização noticiosa, com prejuízo do Jornalismo explicativo, que permite assimilar, compreender e dar um sentido às notícias. Os jornalistas devem converter informação em conhecimento necessário para entender o mundo. E as pessoas respondem bem a esse tipo de proposta, como o demonstram alguns exemplos referidos no artigo da CJR. Por último, mais do que nunca cabe aos jornalistas serem filtros de informação, seleccionadores competentes do que é realmente importante. O exemplo descrito no artigo da CJR é o da revista The Week (www.theweek.com), considerada quase insuperável na forma como digere e regurgita as notícias verdadeiramente importantes da semana – e daí retirando, também, os sempre tão ansiados proveitos comerciais. maior número de visitantes de sempre. De resto, o tráfego na Internet tem crescido sempre, de umas eleiçoes para as outras. É de realçar, também, o facto de, em alguns casos, se terem registado aumentos do número de visitantes no dia seguinte à eleição. O Washingtonpost.com teve uma audiência recorde de 17,5 milhões de “pageviews” na quarta-feira – contra 13,2 milhões no dia da eleição; e o “site” do New York Times (www.nytimes.com) contabilizou, igualmente, um máximo de 61,6 milhões de visitantes na quarta-feira, contra 55,1 milhões na véspera. O endereço que colocamos em cima exibe uma curiosa apresentação em vídeo da forma como o New York Times foi acompanhando a noite eleitoral na Web. JJ|Out/Dez 2008|45 26-01-2009 JORNAL 44a47:44a47.qxd 15:05 Page 46 sites http://images.google.com/hosted/life TODO O ARQUIVO DA LIFE EM NOSSA CASA > Admitindo que seja novidade apenas para muito poucos, sempre servirá para recordar algo que merece absolutamente ser relembrado: o arquivo fotográfico da revista Life, composto por cerca de 10 milhões de imagens – remontando até 1750 – está a ser integralmente digitalizado pelo Google. Quando o projecto se iniciou, em meados de Setembro, estava disponível cerca de 20% desse acervo – pesquisável no Google Image Search. Sendo que os responsáveis garantiam que, em poucos meses, teriam toda a colecção digitalizada. Isto significa poder aceder gratuitamente – e em cópias de alta resolução – às obras completas de fotógrafos como Gjon Mili, Nina Leen, Margaret BourkeWhite ou Alfred Eisenstaedt, autor da fotografia que aqui reproduzimos e que mostra a reacção de uma plateia de crianças no momento em que, numa apresentação em marionetas de “São Jorge e o Dragão”, no Jardim das Tulherias, em Paris, em 1963, o animal é morto pelo cavaleiro. A maior parte destas imagens que passaram a estar disponíveis na Net nunca foram exibidas em público. E se, vendo alguma delas, decidir que a quer ter emoldurada, numa impressão de altíssima qualidade, basta pedi-la à Life, através da Internet. 46 |Out/Dez 2008|JJ 44a47:44a47.qxd 26-01-2009 15:05 Page 47 http://serialconsign.com/node/126 A EVOLUÇÃO DE UMA PRIMEIRA PÁGINA > Um estudante canadiano de mestrado, Greg J. Smith, decidiu comparar as primeiras páginas do Los Angeles Times desde o nascimento do jornal, em 1881. Verifica-se, pela comparação de manchas de cor aplicadas aos diversos conteúdos – editoriais (azul), visuais (amarelo) e publicitários (laranja) – que, ao longo das décadas, o jornal foi sendo sempre muito conservador e avesso a mudanças no seu rosto. O primado da imagem sobre o texto, na primeira página, só aconteceu no momento em que a fotografia se estabeleceu na imprensa como novidade, nos primeiros anos do século XX, e, depois, já no século XXI, num momento de luta desesperada para contrariar a tendência de quebra nas vendas. Quanto à publicidade na capa do jornal, desapareceu em 1925 e nunca foi retomada. O Los Angeles Times só voltou a combinar conteúdos editoriais e publicitários na página de abertura do seu “site” na Web, também ela estudada por Greg J. Smith e, essa sim, sujeita a reconfigurações radicais, ao longo do período analisado (1996-2006) – em busca da forma de sobreviver num meio completamente novo e muito competitivo.