INTRODUÇÃO - Irmãs da Sagrada Família
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INTRODUÇÃO - Irmãs da Sagrada Família
INTRODUÇÃO I - ESBOÇO BIOGRÁFICO (1787-1852) Fundadora da Congregação da Sagrada Família, Santa Emília de Rodat teve bons biógrafos, dentre os quais se destacam Léon Aubineau e Gaëtan Bernoville. É sobretudo em referência a eles e aproveitando precisões fornecidas pela arquivista do Instituto, que nos limitaremos a esboçar os traços essenciais dessa vida. 1 1. Infância e adolescência, até a vocação expressa de fundadora (1787-1815) Filha mais velha de Jean-Louis-Guillaume Amans de Rodat e de Henriette de Pomairols-Ginals,2 nasceu em 6 de setembro de 1787 no castelo paterno de Druelle, bem próximo de Rodez. Foi batizada no dia seguinte, na igreja paroquial de SaintMartin de Limouze. Em março de 1789, partiu para Ginals, paróquia de Villeneuve, perto de Villefranche-de-Rouergue, mansão onde morava sua avó materna, Marie-Marguerite de Pomairols, com seu marido Stanislas-Etienne e com sua mãe, Antoinette de Selves. Um fato bastante importante é que, até 1803, Emília não voltou para a casa dos pais senão para breves estadas como, por exemplo, por ocasião do batismo de seu irmão Louis, do qual ela foi a madrinha (1797). Sua primeira educação foi, portanto, assegurada por sua avó, logo ajudada por uma cunhada, Aghate de Pomairols, religiosa da Visitação, expulsa de Villefranche pelos decretos de 17 de agosto de 1792. 1 As notas encontram-se no fim de cada secção. Quando se trata de uma simples referência, por vezes a indicamos no decorrer do texto, entre parênteses. No que se refere ao significado das abreviações, ver a bibliografia, na qual se encontrará a nomenclatura das fontes históricas que acabamos de mencionar. Evidentemente, utilizamos também a Autobiografia (sigla: A seguida de indicação do capítulo). Finalmente, podendo a correspondência de Santa Emília trazer numerosos esclarecimentos, haverá interesse em consultar a terceira secção desta antologia. 2 Nisso precisamos ver uma circunstância providencial: sem dúvida, melhor do que em Druelle, Emília recebeu, ao mesmo tempo, uma instrução suficiente e uma excelente formação moral e espiritual. Muito bem dotada, aproveitou essa educação que teve um cunho de seriedade por causa dos transtornos revolucionários, mas também uma educação de muita abertura e alegre inspiração salesiana. Com a ajuda da graça, cedo começou a combater seus defeitos e a fazer oração pessoal. Recebeu a primeira comunhão das mãos de um dominicano (1798), Pe. Joseph Delbès, que vivia na clandestinidade seu ideal religioso e apostólico. A primeira comunhão marca uma etapa de sua vida interior. Por outro lado, durante suas permanências em Villefranche onde os Pomairols possuem uma casa, ela visita os pobres e os doentes com uma companheira de mais idade e de condição social bem mais simples do que a sua: Marie-Anne Gombert. Em Ginals, sabe apreciar os encantos da natureza e da conversação, por ocasião de passeios com uma jovem, Joséphine du Lac de Montvert. Apaixona-se também pela leitura e pelo estudo, orientada sobretudo pela antiga visitandina. A Sra. de Selves parece ter falecido depois da primeira comunhão de Emília, e Etienne de Pomairols em 1802. Sempre impressionada pelos sentimentos religiosos de sua bisavó, a adolescente retirava-se de bom grado ao seu antigo quarto, para rezar (A cap. 2). Nessa ocasião, Deus permitiu ao tentador que iniciasse um período de tibieza bastante caracterizada: uma noite de 1801, ao que parece, Emília, que parecia não ser medrosa, foi tomada de pânico durante seu recolhimento, a ponto de não mais ousar voltar a esse lugar, e com isso abandonou a oração mental, em seguida espaçou sempre mais confissões e comunhões. Não está dito em que medida sua avó e sua tia observaram e procuraram dar remédio a tal situação. Em setembro de 1803, sendo restabelecida a tranqüilidade social e religiosa, elas se instalaram definitivamente em Villefranche, na casa de uma antiga Ursulina, Srta. de Castanet d’Armagnac, chamada em religião Sra. Saint-Cyr, que tinha reunido numa comunidade fictícia outras religiosas dispersas pela Revolução. 662 3 Emília, a quem suas primeiras saídas, em particular o casamento de um de seus tios, Stanislas-Victor, tinham inspirado o gosto por uma vida menos claustral, não teve a coragem de segui-las e voltou para Druelle. É bem no que diz respeito à oração e nessa crise de independência que devemos situar sobretudo o relaxamento do qual ela fala: suas manifestações sentimentais ou mundanas não apresentam gravidade alguma. Aliás, em breve, no mês de dezembro, é atingida por um enfraquecimento físico. Na primavera de 1804, recupera a saúde, mas o fervor ainda não. Em Druelle, o ambiente era austero, porém não muito religioso, com exceção, no entanto, de Eléonore que permanecia muito piedosa. Durante 18 meses, Emília confessa-se e comunga apenas quatro ou cinco vezes, sem sentir muita preocupação com seu estado. Em Villefranche, evitou mesmo reencontrar um confessor que a convidava a comungar mais vezes para se refazer espiritualmente. De nenhum modo, seria conveniente medir a culpabilidade desse episódio. Ao situá-lo no conjunto de um tal destino, torna-se necessário apontar seu caráter providencialmente “permissivo”, e a intervenção inteiramente gratuita do Senhor para pôr fim a esse mesmo episódio (A cap. 3). Em 1804, o papa Pio VII concede um jubileu pregado por missionários nas paróquias de França, onde refloresce a vida cristã. Na festa do Corpo de Deus, na Igreja de Saint-Martin – a mesma onde Emília foi batizada –, as palavras de um desses missionários ditas no confessionário determinam a sua total e muito pacífica conversão. Como no dia de sua primeira comunhão, porém de modo mais intenso e num nível mais profundo, a jovem experimenta o poder libertador da graça. Vida de oração e vida sacramental, assitência aos miseráveis, pobreza pessoal de muita renúncia tomam novamente um lugar primordial em sua vida, em Druelle, até março de 1805, em seguida em Villefranche, onde Emília volta a viver com sua avó (A cap. 4). Por algum tempo, ela teve a intenção de entrar na Congregação das Filhas de Notre-Dame, em Rodez, onde havia duas irmãs de seu pai, das quais uma era a superiora, falecida em fevereiro de 1805. 4 Circunstâncias exteriores vão influenciar a orientação de seu destino: a abertura recente, pela Sra. Saint-Cyr, de classes reservadas às “senhoritas” da sociedade, e o encontro com um diretor perspicaz e virtuoso, Pe. Antoine Marty.3 Esse sabe moderar o zelo de Emília, nem sempre satisfeita com o individualismo das antigas religiosas. Ao exercitar sua docilidade, ele a ajuda a renunciar à inclinação para o orgulho que poderia ter ocasiões de se acentuar. Guia suas leituras espirituais. Além da Bíblia, da Imitação de Cristo, da Vida dos Santos, acrescenta agora, em forma de trechos escolhidos, obras de Santa Teresa de Ávila, de São Francisco de Sales, de Pe. Surin, de Pe. Berthier, etc. (A cap. 5). Por outro lado, a diretora aproveita a relativa instrução dessa nova pensionista para lhe confiar aulas de catecismo e de geografia, como também vigilâncias, que dão oportunidade a Emília de aperfeiçoar seus dons pedagógicos inatos. O exercício perseverante de uma caridade humilde, provações de saúde bastante sérias moldam ao mesmo tempo seu caráter espiritual (A cap. 6). Após Emília lhe ter comunicado seus projetos de vida, Pe. Marty preferiu esperar quatro anos para que ficassem mais claros. Entretanto, foi ainda necessária uma série de experiências dolorosas para que começasse a se manifestar, embora negativamente, a vontade de Deus. A jovem passou um mês da primavera de 1809 como postulante na Congregação das Religiosas de Nevers, em Figeac. As perturbações de consciência e as angústias que sentia fizeram Pe. Marty concluir que lá não era o lugar dela. Pouco tempo depois, Emília esteve em Cahors, na Congregação das Religiosas da Adoração Perpétua de Picpus. Realizada em suas aspirações contemplativas, ela não se sentia em paz, e Pe. Hippolyte de Launay, superior da comunidade, disse-lhe que devia deixar aquela Congregação. Triste, mas não desanimada com esse duplo fracasso, obteve de seu diretor a permissão para pronunciar os votos privados de religião em 21 de novembro desse mesmo ano (HC 1809, DF 15), permanecendo sob a sua orientação até outubro de 1811. Vários meses antes, ele foi obrigado a fechar a escola eclesiástica que dirigia e cuja reputação ofuscava o brilho do Colégio da Universidade. Sendo assim liberado, Pe. Marty pôde responder ao convite que lhe fez 661 5 660 540 (159-160) (regulamento das “escolas”), 581 (190), 610-611 (213), 626 (121, 1). Alguns pontos particulares: modéstia religiosa, 154, 482 (112), 623 (59, 1). Recreios comuns, 286-287, 483-484 (113). Governo das comunidades religiosas; conselhos para as superioras, etc., 103, 411 (46), 436-437 (75), 476-478 (109) 497-498 (123), 513 (136), 515-518 (138-139), 554-555 (169), 562-563 (178). Um caso especial: os “espíritos difíceis”, 517-518 (139), 522-523 (143), 529 (150), 547-548 (165). Ver também: CONSTITUIÇÕES DA SAGRADA FAMÍLIA. _______________ a Sra. Genyer, fundadora de um seminário e do Instituto das Irmãs da Misericórdia, em Moissac, indo ajudá-la no seu primeiro empreendimento. Durante a sua ausência, Emília teve como confessor Pe. Grimal, do qual obteve a permissão excepcional de comungar com muita freqüência.4 Seu fervor a incentivava a isso, como também, sem dúvida, a necessidade de um tal reconforto nesses meses de hesitações, obscurecidos por um certo desentendimento com seus pais, perplexos e pouco inclinados a favorecer a vocação de sua filha mais velha. Aliás, um novo fracasso a esperava. Tendo a Sra. Genyer e Pe. Marty a encorajado a entrar no novo Instituto, aí chegou em abril de 1812 e logo sofreu uma tempestade de escrúpulos e de sofrimentos espirituais que obrigaram a sua superiora a despedi-la após seis meses. Tendo também enfrentado muitas oposições em Moissac, Pe. Marty voltou para Villefranche. Sem se deter nas censuras que a acusavam de incoerência, Emília retomou suas atividades costumeiras, levada pelo desejo insuficientemente explícito, sem dúvida, de proporcionar formação religiosa a meninas pobres. Ainda não havia revelado seu desejo a Pe. Marty que, por sua vez, pensava nessa extrema necessidade da época. Talvez fossem as freqüentes doenças de sua dirigida que o impediam de lhe falar sobre isso (A cap. 7). A Providência prolongou essa indecisão até maio de 1815. Então, durante uma visita que fazia aos pobres, ouvindo Emília várias mães de família lamentarem a ignorância de seus filhos, sentiu o apelo irrecusável de Deus para socorrê-las numa fundação com essa finalidade. Soube falar disso a Pe. Marty que a encorajou sem reservas (A cap. 8). 6 659 em Silêncio, 132-134 (apaziguamento), 153-154, 166-170, 206-207, 216, 261-263 (característica especial da Casa-mãe), 410 (45), 414 (50). Querendo iniciar sem demora a execução de seu projeto, Emília obteve da Sra. Saint-Cyr a permissão para dar aulas, no seu exíguo quarto, a crianças cujo número chegou rapidamente a quarenta. Pensava sobretudo na fundação que Deus lhe tinha confiado. Logo esboçou um primeiro regulamento, ao mesmo tempo projeto espiritual e programa de vida cotidiano. Pedia conselho a Pe. Marty que lhe designou três companheiras já presentes no mesmo pensionato: Ursule Delbreil, Marie Boutaric, Eléonore Dutriac.5 Rezando juntas e encorajando-se mutuamente, as quatro jovens preparavam a delicada missão junto à Sra. Saint-Cyr, para não somente deixar seu estabelecimento mas ainda para abrir um que aparentemente deveria lhe fazer concorrência. A diretora mostrou-se magnânima quando, em 8 de dezembro de 1815, Emília lhe revelou seu projeto; mas ele deu ocasião a muitas críticas na casa, depois na cidade e por parte das famílias Dutriac e de Rodat. A própria Sra. de Pomairols assim como sua cunhada desaprovavam o Projeto. Apenas dois membros do clero se declaravam favoráveis: os Padres Daures e Grimal. De Cahors, Pe. de Launay, capelão das Religiosas do Sagrado Coração de Picpus, escreveu uma carta encorajadora a Emília, em quem pressentira, em 1809, a vocação original. Nesse ambiente bastante hostil e sem meios financeiros, era difícil achar um local para morar. Entretanto, no início de 1816, a Srta. Victoire Alric prometeu alugar, logo que ficasse desocupado, a metade de um imóvel, aliás insalubre e mal situado. Apesar de todos os inconvenientes, Emília aceitou. Assim, na noite do dia 30 de abril, com suas três companheiras, começou a viver uma rigorosa vida religiosa. Em 3 de maio, a classe gratuita acolheu trinta crianças. Algumas órfãs foram igualmente adotadas: gesto de caridade que a Santa renovará em quase todas as suas fundações. Pe. Marty insistiu para que ela abrisse uma classe de alunas que pagavam, apesar da mensalidade muito baixa e ainda havia exceções. Uma marca de simplicidade e de humildade devia identificar desde o início o Instituto. Além disso, a pobreza efetiva e os vexames não Humildade. Atitudes pessoais de Santa Emília, conselhos recebidos por ela, 7, 13, 54-55, 58-59, 68-69, 92-93, 103, 112, 122, 127, 131, 355, 486-487 (115), 490-492 (118-119), 495-496 (122), 626 (119, 1), 639-640. 2. Fundação e primeiros Villefranche (1815-1822) desenvolvimentos Diretrizes e ensinamento que Santa Emília dá, “conhecimento de si mesmo”, 447-448 (83), 534-535 (156), 625 (83, 1). – Outros aspectos: num plano “individual”, 175-183, 195, 276-280, 303, 342 (2), 344 (12), 346 (32), 392 (26), 399 (33), 405 (39), 406 (40), 421 (57), 425 (61), 457 (92), 469 (103), 584 (193). Num plano “coletivo”, 152, 185-186, 199-200, 280, 316-321, 521-522 (142). Defeitos opostos: vaidade e orgulho que Santa Emília censura em si mesma, 46, 54, 114; a respeito dos quais Santa Emília dá orientações ou advertências, 175-183, 193-194, 225-226, 277-279. “Espírito de infância” e simplicidade. Atitudes pessoais de Santa Emília, conselhos recebidos por ela, 80, 89, 92, 100-101, 124-125, 128-129, 130, 133. Conselhos e orientações que ela dá, 154, 265-267, 314-316, 342 (3), 349 (47), 400-401 (34), 416 (52), 427 (63), 449 (85), 568 (182), 582 (121), 624 (63, 1). Abertura da alma e confiança para com outra pessoa. Prática de Santa Emília, 54-55, 92, 490 (118), 491-492 (119). Conselho que dá a esse respeito, 176, 194-197, 270-271, 381 (15), 400-401 (34), 403-404 (37), 406 (40), 416 (52), 511 (134), 523-524 (144), 524 (145), 565566 (180), 568 (182), 622 (37, 1). “Não julgar”, não se preocupar com “julgamentos”, 192-198, 270-271, 303-304, 326, 408 (43). VIDA RELIGIOSA Primeiras aspirações e tentativas de Santa Emília, 5, 56, 61-63, 369-372 (5). Perseverança e fracasso na vocação, 241-242, 250-251, 536 (158), 605-609 (209-211) (Augustine Carles). Normas gerais, “vida comum”, 151-158, 168-169, 185-186, 217219, 227-228 (relaxamento), 246-248 (Casa-mãe), 336-337 (ilusões possíveis), 389-390 (23) (costumes diversos), 394 (27), 397 (30) (renovação), 398 (32), 479-480 (110), 494-495 (121), 499 (125), 537- 7 658 395 (28), 406 (40), 412 (47), 415 (51), 417 (53), 438 (76), 442 (78), 445-446 (80), 592 (201), 598-599 (205), 623 (47, 1), 623 (52, 1). Penitência. Na vida de Santa Emília, 44, 46, 48, 51, 53, 56, 76, 89-90, 116. Conselhos e orientações de Santa Emília, 401 (34), 481 (111), 625 (111, 1). ESPÍRITO SANTO 93, 94, 102, 124, 266, 296, 318, 434-435 (72). SAGRADA FAMÍLIA 185-186, 199-200, 251, 256, 284-285, 344 (18), 402-403 (36), 414 (49), 421 (56), 455 (90), 499 (125), 555 (170), 579-580 (189). SANTÍSSIMA VIRGEM 41-42, 48, 53, 55, 57, 60, 64-65, 99-101, 108, 118, 292 (16), 385 (19), 403-404 (37), 412 (47), 451-452 (87), 520-521 (141). Congregação da Santíssima Virgem, 8, 10, 32 (8), 158-159, 378379 (12), 440 (77). TEMPERANÇA Diversas formas de ascese evangélica em si mesma e da mortificação. Prática de Santa Emília, 7, 52-53, 63, 70, 91, 93-94, 113-115, 129, 130-131, 145 (41). Ensinamento, orientações, exortações de Santa Emília; fatos que propõe como exemplo, 167, 171, 205-209, 287, 345 (25), 407-408 (42), 446 (81), 483-484 (113), 507 (131). Ver igualmente: ABNEGAÇÃO, AFETIVIDADE, COMBATE ESPIRITUAL, etc. VIRTUDES “INTERIORES” E “PASSIVAS” Generalidades a esse respeito, 232-237, 255-257, 347 (35), 401403 (35-36), 421 (56), 422 (58). eram poupados à jovem comunidade que até os procurava. Mais tarde, Emília reconhecerá que, com suas companheiras, ultrapassava os limites da discrição. Porém, essa retidão generosa agradava ao Senhor que as preservou de toda doença e lhes forneceu, no dia a dia, os socorros indispensáveis. A autoridade diocesana mostrou-se favorável, na pessoa de Dom Guillaume Cousin de Grainville, bispo de Cahors, e de seu vigário-geral, M. Poujade de Ladevèze.6 A admissão de novas Postulantes elevou o efetivo do grupo a oito, em junho. O bispo concedeu a licença para organizar uma capela onde permaneceria o Santíssimo Sacramento, e a primeira Missa foi celebrada no dia 15 de julho pelo Vigário de Notre-Dame (A cap. 9). M. Poujade de Ladevèze tentou conseguir, a pedido de Emília, uma agregação às Ursulinas de Roma (agosto de 1816), tentativa que se revelou quimérica no final de dois anos. Esses contatos permitiram ao menos que a comunidade de Villefranche conhecesse os métodos de uma Ordem rica de uma longa tradição pedagógica e de já especificar algumas características de sua espiritualidade própria. O grande número de alunas tornava necessária a aquisição de um novo local: foi a casa Saint-Cyr, abandonada pelos membros da frágil federação. Emília, que tinha emitido votos públicos temporários no dia de Páscoa (6 de abril de 1817), levou sua comunidade para o novo local, em junho. O Pe. Marty permaneceu como capelão oficial. A Sra. de Pomairols e a antiga visitandina são pensionistas nessa morada bem conhecida. Além de um apoio moral, essas presenças trazem alguma ajuda, mas é ainda em meio à penúria que, no dia da Assunção, quatro religiosas pronunciam votos públicos por um ano. A superiora pensa desde então obter a aprovação do governo e comprar uma casa mais espaçosa, que se preste melhor à observância da clausura. Ela se decide pela compra do antigo convento dos Cordeliers, abandonado desde 1793,7 e assina diversos contratos com os novos proprietários. A Providência suscita ainda sábios conselheiros e benfeitores. Há mesmo, segundo o testemunho de Emília e de vários contemporâneos, acréscimos miraculosos de dinheiro. Em 29 de junho de 1819, a comunidade tomou posse de sua moradia definitiva, onde tudo era organizado para que a 8 clausura se tornasse um meio eficaz de promover a humildade da vida oculta. Nessa época, Emília tomou conhecimento, igualmente, da “Congregação”, associação leiga de oração e apostolado, restaurada em Bordeaux por Pe. G. J. Chaminade e a Srta. Adèle de Trenquelléon, que devia fundar o Instituto das Filhas de Maria de Agen. Vivamente estimulada por ela, a superiora de Villefranche reúne uma Congregação feminina e a anima com suas exortações semanais. Infelizmente, a comunidade ia ser dizimada por uma série de lutos imprevisíveis e bastante misteriosos, uma vez que a epidemia permaneceu localizada no convento. No espaço de algumas semanas, Emília viu desaparecer sua tia-avó, as Irmãs Dutriac e Boutaric, uma órfã, outras religiosas. Afetivamente dilacerada, chegou a se perguntar se Deus queria que a fundação se perpetuasse. É por esse motivo que, em sua correspondência com Adèle de Trenquelléon, vai se precisando pouco a pouco o projeto de uma afiliação às Filhas de Maria. Na primavera de 1820, a fusão parece iminente, depois não se fala mais sobre isso até 1822, ano em que se renuncia ao projeto, não aceitando as religiosas de Villefranche a total renúncia a que estava pronta sua superiora.8 Como a doença continuasse se alastrando, os médicos julgaram necessários freqüentes passeios no campo. Era uma maneira de renunciar à clausura. As religiosas invocaram com insistência São Carlos Borromeu, de modo que, no dia 8 de setembro de 1820, pôde realizar-se a profissão pública perpétua, com a adoção do novo hábito religioso. A superiora emitiu em nome de todas o voto de ensino. Essa data marca igualmente a cura milagrosa de uma noviça, Irmã Françoise Pascal, que, mais tarde, terá um lugar bem especial na correspondência de Madre Emília.9 Passadas as provações desses primeiros tempos, a mesma foi atingida por penosa doença: um pólipo no nariz que muito a fez sofrer e várias vezes ameaçou-a de degenerar em câncer (A cap. 11). Além do mais, em 9 de agosto de 1820, havia começado para ela um período de tentações e de tormentos extraordinários. A respeito desses mistérios de sua vida interior, temos informações na Autobiografia, nas cartas de Pe. Marty e da priora do Carmelo 657 Doutrina e orientações que ela comunica, 124, 167, 174, 254-259, 260-263, 268-280, 365-366 (2), 444 (79). Como encontrar na natureza ocasião de orar, 274-275, 444 (79), 625 (79, 1). Oração “difusa”, recolhimento, união habitual com Deus: na vida pessoal de Santa Emília, 45, 55, 91, 119-120, 127. Como Santa Emília apresenta esse ideal e suas condições, 173-174, 178, 208-209 (trabalho), 256-257 (vida diária), 265-267 (tonalidade “mística”), 268269, 273, 280-282, 413 (48), 414 (50), 424 (60), 435 (73), 463 (98), 494-495 (121), 533 (155), 623 (50, 1), 627 (155, 1). PRUDÊNCIA Verdadeira prudência evangélica, bem distinta da “prudência humana”, 102-103, 130, 196, 418-419 (53), 525 (146). Prudência e “discernimento dos espíritos” que Santa Emília manifesta em suas palavras e em sua correspondência, 175-176, 180, 188-192, 279-280, 343 (6), 382-383 (16), 385 (19), 392 (26), 395-396 (29), 399-400 (33), 403 (37), 404 (38), 405-406 (40), 474-475 (108), 481 (111), 487-489 (116), 497-498 (123), 511 (134), 522-523 (143), 531-532 (153), 554-555 (169), 590 (199), 602-603 (207). RETIRO ANUAL Prática de Santa Emília, 119-121 (resoluções). Orientações e conselhos de Santa Emília, 168-169 (dispensa do retiro num caso particular), 315-316 (acolhimento das Irmãs do retiro), 408-409 (44). Cartas coletivas para preparar o retiro, 570-572 (184), 580-581 (190), 584-586 (194), 588-589 (197), 618-619 (218). SAGRADO CORAÇÃO Uma das formas privilegiadas do “cristocentrismo” de Santa Emília, 100, 122, 125, 132, 151-156, 239, 285, 341-342, 416-417 (52), 452 (88), 565-566 (180), 618 (218), 623 (52, 1). SACRAMENTOS Eucaristia. Lugar eminente na vida pessoal de Santa Emília e de suas companheiras, 5, 7, 47, 48, 50, 53, 55, 62, 68, 71, 76, 90, 101103, 108-109, 122. Conselhos e avisos de Santa Emília a propósito da Missa, da comunhão freqüente, etc., 219-220, 228-229, 346 (30), 362 (1), 394- 9 656 PAIXÃO DE NOSSO SENHOR Trata-se da contemplação do mistério redentor e de sua inserção na vida, sobretudo por ocasião das provações, 101, 108-109, 118, 120, 129, 172-173, 215, 220-221, 285-286, 409-410 (44), 419 (54), 423 (59), 521-522 (142), 544 (162), 559-560 (175), 625 (102, 1). O “mistério da cruz”, 327-328, 429 (66), 468 (102), 484 (114), 500-501 (126), 522-523 (143), 559-560 (175), 564 (179). POBREZA Ideal e prática de Santa Emília e de suas primeiras companheiras, 7, 11, 21, 60, 67, 69, 74, 92, 101-102, 105, 110-112, 117-118, 145 (38), 355, 464 (99), 549-550 (167), 639-640. Ensinamentos, orientações, exortações de Santa Emília, 152, 174, 185, 199-200, 308-309, 522-523 (143), 569 (183). PECADO Confissões de Santa Emília, referentes a seus pecados ou a seus defeitos, 10, 44, 46, 51-52, 54, 80, 104, 111, 112-117, 120, 125-126, 393-394 (27), 398 (32), 499 (125), 528-529 (149). Ensinamento espiritual de Santa Emília para despertar o sentido do pecado, da verdadeira contrição, etc., 215, 288-289, 330-333, 445446 (80), 461 (95), 525 (146), 576 (187), 624 (70, 1) (compunção de modo geral) 627 (146, 1). Sentido das “penas” que são a conseqüência do pecado, 182, 184185, 241, 332-333. Ver igualmente: SACRAMENTOS. ORAÇÃO Atitudes fundamentais de fé, sentido de Deus: na vida pessoal de Santa Emília, 75, 122, 125, 131; o que ensina ou propõe como exemplo sobre esse assunto, 225, 321-324, 432 (66), 456-457 (92). Oração de súplica, 187, 191, 259-263, 349 (45), 430-431 (68), 520 (141), 536 (158), 605-606 (209), 628 (183, 1). Formas diversas da oração vocal, 46, 90-91, 108-110, 145 (45), 292-296. Oração “mental”, meditação: prática de Santa Emília, 3, 4, 46, 47, 52, 56, 76, 91-92, 130. de Figeac, nos depoimentos de Pe. Fabre, confessor-diretor da Santa durante seus doze últimos anos de vida (A cap. 10 e 11). Em 1821, a epidemia diminui, os locais mais bem organizados recebem numerosas alunas. Mas é então que Emília, muito atingida por seu pólipo, é submetida a uma dupla cirurgia de quatro horas consecutivas. Não quis interromper a intervenção com receio de que as freqüentes idas e vindas do cirurgião prejudicassem a clausura. No ano seguinte, de acordo com Pe. Marty, ela opta definitivamente pelo título de “Religiosas da Sagrada Família”. 3. Fundação em Aubin – Trabalho de organização interna: formas diversas de apostolado; Constituições – Fundação em Livinhac (1822-1832) Como em 1822 a enfermidade de Madre Emília se agravasse, Pe. Marty enviou-a a Aubin para consultar-se com um médico que, efetivamente, devia aliviá-la um pouco. Ao mesmo tempo, a Srta. Constans, pensionista em Villefranche e originária da localidade, oferecia a sua casa para acolher eventualmente um grupo de religiosas que a educaram. Emília, que partiu com ela e Irmã Aghate Masbou no dia 28 de agosto, só retornou no início de janeiro de 1823, e durante aquelas semanas suas angústias espirituais deram lugar a uma certa paz. A escola gratuita, e em breve uma secção que pagava, foi aberta no dia 2 de novembro. Uma congregação de senhoras organizou-se tendo como modelo a de Villefranche. Por infelicidade, houve um penoso mal-entendido entre a fundadora e Pe. Marty. Com certeza, a primeira cometeu erros reais: algumas faltas de circunspecção, seguidas de um pouco de diplomacia, sem que existisse mentira propriamente dita, no entanto, a reação de seu diretor foi viva, objetivamente legítima, porém bastante misturada com susceptibilidade. Essa “falta” não deve ser exagerada, uma vez que Madre Emília só tomou consciência da mesma depois de sua volta a Villefranche. O arrependimento extremo que sentiu (assim como de uma ou outra falta confessada em suas cartas), a frieza e a desconfiança que Pe. Marty lhe demonstrou em seguida, 10 655 foram para ela ocasião de uma nova ascensão espiritual (A cap. 11). A comunidade de Aubin fortaleceu-se pouco a pouco, apesar dos mal-entendidos ou processos, suscitados em particular pelos herdeiros da Srta. Constans, e em meio a dificuldades internas devidas à inexperiência das primeiras superioras ou à carência de socorros espirituais. Apesar de tudo, ali foi feito um sólido trabalho apostólico, enxertado no ministério fundamental da educação: cursos primários, religiosos sobretudo, ministrados a pessoas de idade e muito ignorantes; visitas no domicílio pelas Irmãs Conversas, etc. Madre Emília escrevia com freqüência, por vezes passava tempos nessa primeira casa filial que logo recebeu um capelão muito dedicado e bom conselheiro, Pe. Ricard. Rememoremos alguns acontecimentos mais importantes desse período: instalação, em 1823, do primeiro bispo nomeado em Rodez desde a Revolução, Dom Bruno de RamondLalande,10 que escolhe Pe. Marty como vigário-geral. A partida do fundador (17 de junho) é dolorosamente sentida pelas religiosas. Entretanto, ele permanece superior-geral, dá numerosas diretrizes e conselhos, prossegue a redação das Constituições. No início, sobretudo, Emília lhe escreve muitas vezes para a direção espiritual. Várias passagens das cartas que recebeu foram recopiadas e testemunham em favor da solicitude e do discernimento de Pe. Marty. O superior local é então Pe. Joseph Blanc.11 (Véronique Jamès), 457-458 (92) (Lucie Bouyssou), 504-505 (129) (Fébronie Bouquiers), 597-600 (205) (Marie du Calvaire Alaux), 617(217) (Marie Raymond Bonal). A Autobiografia, a correspondência, os depoimentos das testemunhas nos diversos processos canônicos devem ajudarnos a evocar um pouco a vida e a atividade de Madre Emília durante esses anos obscuros. Vivendo uma estrita pobreza material (as descrições de seu quarto são eloqüentes nesse ponto), ela se torna, de início, inteiramente disponível a cada uma de suas religiosas, seguindo com simpatia seus trabalhos pedagógicos e suas obras de misericórdia. Em pleno mistério, leva uma vida contemplativa freqüentemente heróica, mesmo que sua desolação não seja contínua e uniforme, escapando aos PAZ E ALEGRIA MUNDO Julgamentos errôneos e lisonjas do mundo (no sentido pejorativo da palavra), 176-177, 181-183, 232, 418-419, 505-506 (130). “O nada” de toda criatura em comparação com Deus, 424 (60), 489 (117), 532-533 (154), 533 (155), 626 (117, 1). Separação do mundo e clausura, 7-9, 16, 20, 68-69, 72, 88, 104105, 153, 155 e 168 (parlatório), 246-249 e 259-263 (os dois “ramos” do Instituto), 344 (14), 349 (46), 546-547 (164) (parlatório), 548-549 (166) e 561 (177) (viagens), 556-557 (171) (saídas do convento), 573575 (185 e 186) (crise de 1844-1845), 579-580 (189) e 598 (205) (vida oculta). Apresentações particulares do ideal comum, 187-192, 422 (58), 472-473 (106). Religiosas e política, 202-205, 430-431 (68), 466-467 (100). OBEDIÊNCIA Prática de Santa Emília; aviso que ela recebe, 55, 89-90, 93, 100101, 108, 126, 129, 130, 134, 145 (40), 518-520 (140). Doutrina espiritual, orientações práticas e exortações de Santa Emília, 152, 290-291 (autoridade de Deus por intermédio da autoridade dos superiores), 311 (as advertências feitas com deferência), 320-321 (obedecer em assunto pedagógico), 325-326 (obedecer ao confessor), 333-337 (obedecer em tempo de doença), 392 (26), 399-400 (33), 400-401 (34), 420 (55), 422 (58), 454 (89), 554 (168), 594-595 (203), 619-620 (219), 622 (26, 1), 622 (34, 1). Experiência pessoal de Santa Emília; conselhos recebidos, 95, 97, 122, 126-127, 133. Apresentação e exortação feitas por Santa Emília, 153-154, 287288, 329, 378 (11), 381 (14), 384 (18), 395-396 (29), 406-407 (41), 415 (51), 426-427 (62), 428 (64), 450-451 (86), 456 (90), 513 (135), 624 (63, 1). Ver também: CONFORMIDADE COM A VONTADE DIVINA; ESPERANÇA E CONFIANÇA EM DEUS, etc. 11 654 Exortações e avisos dados por ela, 376 (9), 383-384 (17), 428429 (65), 517-518 (139), 558 (173). Paciência, de modo particular, 231-240, 253-254, 301, 385 (19), 534-535 (156), 559 (174), 589-590 (198). Caso especial das “perseguições” de gravidade diversa, sofridas por Santa Emília, por suas companheiras, etc., 6-7, 15, 18, 21-22, 6566, 72, 82, 86-88, 91, 93, 211-213 (Igreja), 520-521 (141), 554 (155), 640-641. GRAÇAS ESPECIAIS Que Santa Emília recebeu, 3-4, 46-48, 51-53, 56, 75, 80-81, 95. Que uma religiosa, Colombe Chresteil, recebeu, 214, 219-220, 222-224. Apreciações e conselhos a respeito dessas graças de modo geral, 206-207, 231, 276-279, 323. Ver também: PAZ E ALEGRIA; PRUDÊNCIA. INTENÇÃO Purificação e retificação sempre necessárias, 198, 200-201, 282, 283-287, 463 (98), 526 (147). LEITURA ESPIRITUAL Praticada por Santa Emília, 4, 47-48, 55. Ver o Apêndice. DOENÇA Na vida pessoal de Santa Emília, 3, 8-9, 11, 22-24, 51, 60, 74, 7981, 82, 91, 92, 116-117, 129, 609 (211), 614-615 (216). Seu modo de agir com as doentes, 123, 144 (35), 168-169, 213214, 515-517 (138), 594-595 (203), 624 (67, 1). Conselhos dados a doentes (trata-se quase exclusivamente das religiosas), 170-174, 333-337, 372 (6), 388-389 (22), 419 (54), 448449 (84), 501-502 (127), 506 (131), 512 (135) (convalescença), 532533 (154). Exemplo de religiosas particularmente edificantes na sua doença, 213-224 e 590-591 (201) (Colombe Chresteil), 425-426 (61) esquemas simplificadores de nossos raciocínios superficiais. Com isto, múltiplas provações de saúde: um pouco de surdez contraída por ocasião de uma visita a Aubin, febres malignas, erisipela, complicações do pólipo, enfraquecimento do estômago, etc. Os lutos da família não lhe são poupados: perde sucessivamente sua mãe (26 de outubro 1827), seu pai (9 de julho 1830), sua avó, a Sra. de Pomairols (10 de agosto de 1831). Em comunidade, algumas mortes lhe são particularmente sensíveis, dentre outras a de sua assistente, Irmã Athanasie Rozié (10 de fevereiro de 1830).12 Se as “santas mortes”, às vezes contadas em circulares necrológicas redigidas pela própria superiora, têm algo de profundamente consolador, algumas saídas não deixam de preocupar e questionar a escolha das vocações. Trabalhos de construção estão sempre em curso, seja em Villefranche, seja em Aubin. Eles não esgotam a generosidade de Madre Emília. Tendo recebido seu dote, quis primeiro destiná-lo à fundação de um Carmelo ou de um convento de religiosas de Picpus. Foi necessária a autoridade de Dom Giraud, bispo de Rodez desde 1830,13 para dissuadi-la. O governo de Carlos X tinha concedido a aprovação legal da Casa-mãe, em 1827. Três anos depois, a Revolução de Julho provoca em Villefranche choques cujo eco repercute nas cartas da superiora: preocupada com o futuro religioso da França, reza e faz rezar, porém evita toda vã curiosidade política. Entre as realizações apostólicas desse período, pode-se mencionar a instituição de diversas confrarias ligadas à capela do convento: a do escapulário em 1825, e do Sagrado Coração no ano seguinte. Não esqueçamos a prática, inaugurada em Aubin com os calorosos encorajamentos de Madre Emília, de instruir também adultos analfabetos. Finalmente, no nível corporal, visto que o inverno de 1829-1830 foi particularmente rigoroso, os serviços de assistência revelaram ainda mais liberalidade e criatividade. No que se refere ao ensino, era preciso que uma organização sistemática sucedesse às experiências do início. Pe. Marty pediu que as professoras se especializassem melhor, que uma mestra de ensino realmente capacitada coordenasse e 12 controlasse os seus trabalhos. Madre Emília às vezes assistia às lições, partilhava com as professoras os frutos de sua própria experiência, insistindo sempre sobre a formação propriamente religiosa e moral. Todas as alunas observavam um regulamento bastante rígido. Se, de um lado, segundo os costumes indiscutíveis desse tempo, a separação das classes sociais permanecia bastante estanque, a simplicidade que vai em auxílio aos pequenos devia ser proposta a todos como ideal evangélico. Aprovadas em 1832 por Dom Giraud, as Constituições não são obra abstrata apenas do fundador, e sim o resultado de sua cooperação com Madre Emília, da experiência adquirida, de uma espécie de jurisprudência elaborada dia a dia. A inspiração e as determinações essenciais do regulamento de 1816 nelas se encontraram ainda: honrar a Sagrada Família pela tendência à perfeição pessoal, à educação cristã e às obras de misericórdia. – Longos tempos de oração cotidiana, a fim de abrir a alma à influência das energias sobrenaturais necessárias a essa vida de dedicação. – Vida comunitária tão desenvolvida quanto possível, na cordialidade e ajuda mútua.14 Quando essas Constituições foram promulgadas, Madre Emília encontrava-se em Livinhac fazia pouco tempo, encarregada pelo bispo de uma missão bastante delicada: “converter em convento da Sagrada Família o estabelecimento das Irmãs da União” (A cap. 12). Sua superiora Séraphine Vallon,15 sentindo o desejo de uma vida religiosa mais intensa e mais bem estruturada, Dom Giraud aconselhou-a a afiliar a comunidade à de Villefranche. Uma vez resolvidas algumas dificuldades preliminares, a fundadora tomou o caminho de Livinhac com três Irmãs de Villefranche, no dia 1º de agosto de 1832. Mas, sobre as cinco religiosas da União, duas apenas, as Irmãs Séraphine e Vincent Boutaric, viam sem reticência a afiliação. As outras tinham bastantes reservas. Foi necessária a delicadeza e a paciência de Madre Emília para conquistá-las. Ela permanece no lugar até 10 de dezembro, em tudo submissa à mais idosa das recalcitrantes. Essa atitude faz desaparecer as desconfianças e deixa transparecer as melhores disposições 653 533 (154), 535 (157), 550 (167), 555-556 (170), 557-558 (172), 560 (176), 574-575 (186), 587-588 (196), 592-593 (201), 635 (196, 1). Atitude oposta: desânimo; na experiência de Santa Emília, 85, 87, 100, 129. Conselhos e ajuda, 175, 323-324, 501-502 (127), 525 (146), 578579 (188), 609-610 (212). Atitude de temor espiritual: caso pessoal de Santa Emília, 112, 115, 128; seu ensinamento sobre esse ponto, 182, 188, 244. EXAME DE CONSCIÊNCIA Valor e significado deste exercício espiritual praticado e aconselhado por Santa Emília, 91, 144 (30), 193-194, 343 (10), 570572 (184). FAMÍLIA A família de Santa Emília, seus relacionamentos, 2-3, 31 (2), 4151, 363-372 (1-5). Algumas advertências dadas por ela sobre as relações das religiosas com sua família, 189, 397-398 (31). Ver também: MUNDO. FINS ÚLTIMOS Morte; a de Santa Emília, 23-24, 95-98, 250-254. “Santas mortes”, 170-171, 222-224 (Colombe Chresteil), 230231 (Marie do Calvaire Alaux), 425-426 (61) (Véronique Jamès), 457-458 (92), (Lucie Bouyssou), 503-504 (128) (Fébronie Bouquiers), 591-593 (201) (Colombe Chresteil), 597-600 (205) (Marie du Calvaire Alaux), 615-617 (217) (Marie Raymond Bonal). Céu, 170-171, 215, 222-223, 230-231, 251-253, 275, 346 (33), 429 (66), 460 (95), 468 (101), 485 (114), 492-493 (120), 500-501 (126), 624 (70, 1). FORÇA E CORAGEM Prática de Santa Emília; conselhos que recebe, 78-79, 85, 92, 108, 116, 127, 134-135, 574 (186), 627 (148, 1). 13 652 EDUCAÇÃO DAS CRIANÇAS Como Santa Emília pessoalmente a praticou, 5, 12, 15, 21, 57-59, 62-64. Ela faz da educação a finalidade primeira de sua Congregação e dá conselhos de ordem ascética e espiritual às religiosas educadoras, 104, 155-156, 157-158, 197-200, 267, 319-321, 338-339, 436-437 (74), 526 (147), 535 (157). Fundação, estatutos, primeiro funcionamento de diversas casas de educação, 436-440 (75), 463-464 (99), 507 (132), 518-520 (140), 549553 (167). Princípios e orientações pedagógicas de Santa Emília e de seus colaboradores e colaboradoras, 232-234, 316-321, 433-434 (71), 443445 (79), 582-583 (192), 595-597 (204), 600-602 (206), 629-635 (192, 1), 635 (204, 1). PROVAÇÕES ESPIRITUAIS Trata-se de diversas formas de desolação, inquietações, repugnâncias para fazer o bem, etc. Ver também o que se refere às tentações e à influência do “mau espírito” sob o título: COMBATE ESPIRITUAL. Experiência pessoal vivida por Santa Emília, 9, 11, 19-20, 61, 69, 74-78, 81, 82-83, 88, 92, 119, 121-123, 125, 127-129, 131-137, 142 (18), 144 (34), 147 (57). Conselhos e encorajamentos dados por Santa Emília; fatos que ela cita como exemplo, etc., 188-192, 206-207, 213, 219-222 [cf. 590591 (201)], 285-286, 322-324, 324-328, 384 (17), 473-474 (107), 504505 (129), 591-592 (201), 626 (217). Ver também: GRAÇAS NOTÁVEIS; PAZ E ALEGRIA. ESPERANÇA E CONFIANÇA EM DEUS Na vida pessoal de Santa Emília (atitudes vividas e conselhos recebidos), 6-7, 18-19, 75, 100-103, 107, 110-112, 116-117, 123-124, 126-27, 131-132, 134, 204-205, 373 (6), 639-640. Ensinamento e exortação de Santa Emília; exemplos citados por ela, 202-205 (numa época de perturbações políticas), 242 (perseverança na vocação), 338-339 (no testamento espiritual de Santa Emília), 368 (5), 386 (20), 416-417 (52), 432 (66), 458-459 (93), 532- ocultas. Em dezembro, a fusão não será integral, mas as religiosas da Sagrada Família poderão viver sem entraves segundo seu Instituto e uma delas será a superiora de todo o grupo. Ainda dessa vez, houve divergências entre Pe. Marty e Madre Emília que afirma, ao menos, não ter consciência de falta análoga à de 1822; porém, o antigo mal-estar foi reavivado, suscitando na fundadora apenas um acréscimo de seu desejo de humilde dependência. 4. Expansão continua: “as escolas”; problemas e crises que suscitam a sua multiplicação até a revisão das Constituições. Apostolados novos. Acontecimentos diversos. Fundações de claustros em Figeac e Montauban-Sapiac (1833-1846) Na primavera de 1833, um falecimento entristeceu muito Madre Emília: o de sua irmã, a Sra. Eléonore Colomb, que ela estimava e amava de um modo todo particular entre os seus. Porém, do ponto de vista da história da Congregação, é o ano de 1834 que aparece decisivo em razão de um acontecimento totalmente imprevisto: a fundação das casas não-clausuradas. Em Aubin e nos arredores, Irmã Marie Vialard, Irmã conversa, dedicava-se aos cuidados dos doentes e, por conta disso, visitava às vezes o vilarejo de La Salle (hoje, Decazeville), que pertencia à paróquia de Vialarels. Ora, fora descoberta, em 1829, naquela região, uma jazida de carvão cuja exploração foi, de início, confiada a mineiros ingleses que, com suas famílias, constituíam verdadeira colônia. Por isso a Sociedade que os empregava teve o cuidado de abrir, para as crianças, uma escola não-confessional. Entretanto, os sofrimentos de muitos imigrantes preocupavam Irmã Marie Vialard, e sua bondade conquistou de tal modo os corações de todos que, freqüentemente, meninas inglesas lhe suplicavam que as instruísse (A cap. 12). Numa conversa espontânea, ela apresentou os fatos à fundadora que, certamente, inspirada pela graça, mas sem medir ainda as repercussões de sua proposta, ofereceu-lhe imediatamente o cargo de superiora de uma pequena escola que se abriria em Vialarels mesmo. 14 A população e as autoridades interessadas aprovaram esse plano. Entretanto, era evidente que, devido às circunstâncias em que era improvisada, a nova casa não podia ter clausura. Foram, pois, Irmãs conversas e noviças que, não tendo ainda pronunciado seus votos, nela se estabeleceram em julho de 1834. Apesar da simpatia que as cercava, essas religiosas, sobrecarregadas de trabalho e vivendo em condições materiais precárias, sofreram uma crise de depressão que a enérgica doçura de sua superiora não conseguia vencer. Passando nessa casa em agosto, Madre Emília teve o doloroso conhecimento do proletariado operário: nova revelação do mistério da pobreza para aquela que vivia ao lado dos humildes camponeses ou dos quarteirões deserdados de Villefranche. Ela conseguiu fortalecer a coragem da comunidade que, em breve, registrou belos resultados, dentre os quais algumas conversões. Sem dúvida, a religiosa que teve mais atividade foi Irmã Thaïs Vallon, antiga superiora de Livinhac. Dom Giraud apoiava muito as escolas. Em alguns meses houve três fundações: Lassouts (final de setembro de 1834), Firmi (30 de abril de 1835), Saint-Beauzély (julho). Um desenvolvimento tão rápido deu uma viva consciência a Pe. Marty e a Madre Emília da originalidade própria da nova realização e da necessidade de lhe fornecer estruturas institucionais adaptadas. Um regulamento ainda pouco preciso, redigido pelo fundador, insistia no fato de que as “Irmãs das escolas” seguiriam em tudo as mesmas diretrizes que as outras, com exceção da clausura, que uma perfeita união deveria harmonizar o estilo de vida e a atividade dos dois “ramos”, embora se admitisse uma certa dependência das nãoclausuradas em relação às outras. Nessa conjuntura por vezes bastante preocupante, Madre Emília teve de preparar, sem muito gosto, uma fundação de clausura que tinha inicialmente adiado e até mesmo recusado: a de Figeac, no Lot (A cap. 13), onde o proprietário de um antigo convento de Clarissas desejava vendê-lo e, ao mesmo tempo, prover às carências do ensino. Emília foi àquela cidade, em fevereiro de 1835, beneficiando-se ainda de um pouco de paz em sua desolação interior, porém, era para enfrentar uma série de situações difíceis. Pe. Debons,16 vigário de uma das 651 CONFORMIDADE COM A VONTADE DIVINA Sob este título estão reagrupadas atitudes que vão da fidelidade ativa até o abandono passivo. Experiência vivida por Santa Emília, 92, 97, 106, 111, 447 (82). Conselhos que recebe, 125, 128, 134, 135-137. Diretrizes e exortações de Santa Emília, fatos propostos como exemplo, etc., 171-174, 218-222, 236-237, 265, 386 (20), 392 (25), 397-398 (31), 400-401 (34), 405 (39), 428 (64), 430 (67), 446 (81), 501-502 (127), 532-533 (154), 549 (166), 553-554 (168), 558 (173), 564-566 (180), 599-600 (205), 624 (63, 1). Decisões e escolhas relativas ao serviço de Deus, 188-192, 344 (13), 487-489 (116), 606-607 (210). CONSTITUIÇÕES DA SAGRADA FAMÍLIA Anotamos as principais passagens nas quais se fala de sua redação e aqueles em que Santa Emília a eles se refere como base de seu ensinamento espiritual, 12-13, 17-20, 22, 33 (14), 81, 98, 161, 249, 251, 257, 339, 352 (82), 444 (79), 448 (83), 469 (102), 472 (106), 515 (138), 537-540 (159-160), 542-544 (161), 548-549 (166), 554-555 (169), 556-557 (171), 561 (177), 562-563 (178), 575-576 (187), 580 (189), 585 (194), 600-602 (206). Ver também: VIDA RELIGIOSA. CONVERSA ESPIRITUAL Praticada por Santa Emília e por suas religiosas, 172-174 (confortar os doentes), 278-279, 286-287, 313-314, 343 (9), 528-529 (149), 627 (149, 1). Ver também: PRUDÊNCIA. SAGRADA ESCRITURA Bastante bem conhecida por Santa Emília, 54-55, 140 (8). Exemplos de sua utilização sob a forma de comentários espirituais, 161, 183-187 (Jonas), 209-213 (São Pedro ad vincula), 222 (Jó), 259-263 (Moisés), 270 e 276 (Salmos), 312-316 e 321-324 (Abraão). 15 650 Perdão das ofensas, 239-240, 576 (187), 608-609 (211). Ver também: VIRTUDES “INTERIORES” E “PASSIVAS”. CASTIDADE Na vida pessoal de Santa Emília, 44, 49-51, 60, 78. No seu ensinamento AFETIVIDADE. espiritual, 153. Ver também: CRISTOCENTRISMO Trata-se sobretudo da contemplação dos mistérios evangélicos e de sua influência sobre as ações e as reações diárias. Ver também: PAIXÃO DE NOSSO SENHOR; SAGRADO CORAÇÃO; SAGRADA FAMÍLIA. 172-173 (doentes), 255-257, 272-273, 281-282, 284-287, 351 (55), 401-402 (35) (o Menino Jesus), 426-427 (62) (Ressurreição), 432 (70) (Ascensão), 435 (73), 454 (89) (Belém), 564 (179), 589 (198) (perseguições). COMBATE ESPIRITUAL Orientações gerais de Santa Emília no que diz respeito a este aspecto da vida cristã, ao “defeito dominante”, à tática de se opor radicalmente às más tendências, 175-183, 194-197, 213, 278-279, 344 (10), 374 (34), 407 (42), 409-410 (44), 413 (48), 530-531 (152), 582 (191). “Vitória sobre si mesmo”, 231-232, 235, 347 (34). Tibieza, 3 e 48-51 (Santa Emília, durante um período de sua infância), 328-333 (diversas espécies de tibieza), 470-471 (104). Tentações: experiência pessoal de Santa Emília; orientações que recebe, 76-78, 81, 84, 119, 128, 130, 131-132, 133-135. Orientações ou encorajamentos dados por Santa Emília, 180-183, 191-192, 195-197, 217-219, 346 (28), 366 (2), 416 (52), 428 (64), 449 (85). Esforços do “mau espírito” para levar a seus fins perversos, 2-3, 48, 84 (diversos aspectos dessa intervenção na vida de Santa Emília); 176, 181, 183, 195, 219-220, 323-324, 385 (19), 467 (101), 473-474 (107), 488 (116), 500-501 (126), 505 (129). Ver também: PROVAÇÕES ESPIRITUAIS. paróquias, acolheu-a favoravelmente, assim como a superiora das Irmãs de Nevers, Eléonore Salgues.17 Por parte dos habitantes de Figeac, de uma maneira geral, foi bem diferente. Censuravam à Madre ter uma ambição desmedida, enquanto o proprietário do convento das Clarissas pedia um preço exorbitante. As três companheiras alugaram um apartamento mais modesto e as aulas começaram em março. Mas então Madre Emília se viu em dificuldades com Dom Hautpoul,18 Bispo de Cahors. Certa de que Pe. Marty tinha pedido as autorizações necessárias, ela não o tinha avisado sobre a sua instalação, e o Bispo, que o soube indiretamente, fez sentir com bastante força seu descontentamento. Uma vez dissipados estes últimos desentendimentos, Madre Emília deixa a nova comunidade reforçada com quatro unidades, mas sempre muito pobre, aos cuidados da Irmã Vincent Vacquié. Sua estada permitiu-lhe conhecer a priora do Carmelo, Madre Thérèse de Saint-Augustin, a única mulher a quem falou de sua provação espiritual. O final de 1835 foi entristecido pelo falecimento de Pe. Marty (15 de novembro), com a idade de 78 anos, bastante cansado há vários meses, porém ativo até o fim. Com o seu afastamento prolongado (desde 1823), tendo em vista as incompreensões que assinalamos, considerando igualmente que Madre Emília recebia sempre mais uma direção quase imediata de Deus, as relações entre o diretor e a dirigida tinham ficado mais espaçadas. Entretanto, Madre Emília, que o conhecia desde 1805, sentiu profundamente essa perda. Pe. Marty tinha, aliás, prestado grandes serviços à diocese, na qualidade de diretor do Colégio de Villefranche, em seguida como vigáriogeral. Sua morte foi ao mesmo tempo simples e nobre, como o relata uma carta de sua governanta, antiga órfã da Casa-mãe.19 Pouco tempo depois, conforme as Constituições, o Capítulo elegeu como superior-geral Pe. Blanc, que já era superior local e na época vigário de uma paróquia vizinha. Estará no seu posto em 1836, tendo assumido também as funções de professor de Filosofia no Colégio. A fundadora continua abrindo escolas num ritmo bastante acelerado: Lugan (agosto de 1836), Montbazens (fevereiro de 1837), Decazeville (abril de 1837, apenas uma transferência de 16 Vialarels). Entretanto, tudo não é simples e triunfal. Foi preciso que um certo número de Irmãs deixasse a clausura (voluntárias e de votos temporários, exceto duas de votos perpétuos) a fim de prover às novas necessidades. Essa medida perturba a superiora que sempre considera a clausura, pelo menos para a sua Congregação, como sendo a manifestação eficaz da “morte para o mundo”, sendo essa “morte” a condição de um apostolado verdadeiramente sobrenatural. Aliás, qualquer que seja o valor das pessoas, o ramo clausurado aparece objetivamente superior ao não-clausurado. De fato, por vezes, o ambiente exterior menos rigoroso favorece algum relaxamento. Diante dessa situação, Madre Emília, habitualmente tão perseverante e que não ignora o bem realizado pelas escolas, pensa, nos últimos meses de 1839, em renunciar a essa nova forma de apostolado. Dom Giraud, porém, informa vigorosamente que não quer saber dessa perda e que uma solução deve ser procurada e encontrada.20 Pe. Blanc e Madre Emília destacam, pois, nas Constituições, o que convém especificamente às escolas, e o Bispo aprova, em janeiro de 1840, um Regulamento enviado às interessadas, com muitas recomendações. O noviciado das futuras não-clausuradas é separado do outro e, em breve, conta com vinte postulantes. Nos meses seguintes, esse efetivo disponível para as tarefas externas permite intensificar a ajuda paroquial, a visita aos doentes, depois, em Villefranche, aos prisioneiros, até então muito abandonados. As religiosas tentam proporcionar-lhes trabalho e conforto material. Santa Emília interessa-se muito por eles e, nos testemunhos relativos a essa obra, várias multiplicações miraculosas de alimentos são mencionadas. Assim, com melhores disposições, os prisioneiros tiraram proveito de um sermão que ao término de uma missão lhes pregou o Pe. Debussy, Jesuíta de Vals-près-Le Puy,21 seguida de um retiro pregado com pleno sucesso pelos Padres Donadieu e Fabre (1844). É necessário apresentar este último que, a partir de agora, desempenhará um papel importante na vida de Santa Emília e da comunidade. Nascido em Orlhaguet (Aveyron) em 1809, ordenado sacerdote em 1837, iniciou suas funções como coadjutor do vigário em Notre-Dame de Villefranche e desde 649 Exercício da misericórdia evangélica junto aos prisioneiros, 17, 85, 545-546 (163); junto às “arrependidas”, 19, 88, 576-579 (188), 616-617 (217). CARIDADE DE DEUS Manifestada na sua misericórdia, 51-52, 237-239, 269-270, 576579 (188), 590-591 (200). Solicitudes da Providência, 65-66, 69-70, 73, 94-95, 102, 106, 202-205, 218-219, 466-467 (100), 492-494 (120), 600-601 (176). Intervenções milagrosas, 8, 17, 56, 73, 95. CARIDADE PARA COM DEUS Sentimentos e comportamentos pessoais de Santa Emília, 46, 75, 89-90, 99-100, 119, 638-639, 641-642. Advertências e conselhos recebidos por ela, 125-126, 134-135, 137. Ensinamentos dados, exemplos que propõe, etc., 201, 387 (21), 412 (47), 436 (74), 581 (190), 600 (205). CARIDADE PARA COM O PRÓXIMO Atitudes vividas por Santa Emília ou que lhe são aconselhadas, 2, 4, 6-7, 11-12, 17, 19, 46, 53, 59, 78, 131, 147 (50), 641-642. Avisos e exortações de Santa Emília (trata-se habitualmente da caridade no interior da comunidade), 153-154, 174 (Irmãs doentes), 203-204, 259-263 (os dois “ramos” do Instituto), 290-291, 300-305 (segundo São Paulo), 312-316 (acolhimento, hospitalidade), 338-339, 344 (20), 423 (59), 425 (61), 450-451 (86), 506 (130), 522 (159), 544 (162), 571 (184). Doçura, de modo mais particular, 233-237, 238-240, 301, 316321, 344 (12), 379 (12), 410 (45), 547-548 (165), 576-579 (188). Defeitos contrários, 192-197 e 470-471 (104) (antipatia), 301-302 (inveja), 478-479 (110) (“fofocas”). 17 648 AFETIVIDADE Modalidades e ocasiões diversas para sua purificação, 242-245, 309-312, 396 (29), 474-475 (108), 497-498 (123), 622 (29, 1), 625 (108, 1), 638-639. Possibilidade e limites de uma amizade no quadro da vida religiosa, 243-245, 309-312, 348 (41), 603-605 (208). Singular aptidão de Santa Emília para simpatizar com outra pessoa, 46-47, 74, 78, 147 (50), 163, 213-224, 300-309, 316-321, 343 (6), 363 (1), 372-373 (6), 380 (13), 386 (20), 388 (22), 391 (24), 405406 (40), 406-407 (41), 408-409 (43), 419 (54), 458-459 (93), 473474 (107), 474-475 (108), 500-501 (126), 522-523 (143), 524 (145), 531-532 (153), 532-533 (154), 536 (158), 544 (162), 557 (172), 559 (174), 564 (179), 568 (182), 589 (198), 590-591 (200), 605-607 (210), 608-609 (212), 621 (6, 1), 640. Pêsames expressos por Santa Emília, na ocasião de um luto, 484486 (114), 492-494 (120), 567 (181). APOSTOLADO Zelo e atividades apostólicas de Santa Emília e de suas religiosas (fora da educação propriamente dita e das obras de assistência), 12, 14-15, 59-60, 83, 382 (16), 581 (190). Conversões ajudadas por elas, 441 (77), 497 (122), 502-504 (128), 510 (133). Amor pela Igreja, oração por sua expansão e sua liberdade, 209213, 298-300, 430 (68), 466-467 (100). Preocupação missionária: a obra da Santa Infância, 35 (32), 239, 611-614 (214-215), 636 (208, 1). ASSISTÊNCIA Obras de misericórdia realizadas junto a indigentes e enfermos: realizações concretas, ideal; conselhos para colocá-lo em prática, 2, 4, 10, 17, 19, 46-47, 60, 62, 83, 85, 306-307, 338-339, 345 (22), 382 (16), 424 (61), 443 (79), 453 (88), 461 (96), 464 (99), 509-510 (133), 514 (137), 540-544 (161), 626 (137, 1), 640. então teve ocasião de celebrar ou de confessar na Sagrada Família. A partir de 1843, é exclusivamente capelão da Casamãe. Santa Emília o tomou como diretor em 1841. Dotado, sem dúvida, de um penetrante discernimento dos espíritos, permitiulhe pronunciar o “voto do mais perfeito” que há tempo ela desejava fazer, e a admitiu à confissão e à comunhão cotidianas. Pe. Fabre continuou suas funções até 1877. Em 1863 e 1874, nos processos canônicos, forneceu testemunhos cheios de interesse sobre sua antiga penitente (Pos, fascículo 2, p.3). Em 1843, Dom J.F. Croizier,22 que sucedera a Dom Giraud, nomeado para Cambrai, tomou uma medida bastante penosa para a superiora: a nomeação de um administrador para todos os bens da Congregação, o Sr. de Saint-Julien, que muitas vezes se mostrou extravagante ou indiscreto. Pouco tempo depois, um desagradável negócio financeiro foi provocado por um advogado, o Sr. Hugounenc: após ter recusado qualquer honorário por longos serviços de cooperação na gestão financeira temporal, de repente exigiu uma importante quantia. Felizmente, contentou-se com uma garantia. Com esses fatos, podemos perceber desde já a repercussão de um mal-estar interno que, ao se acentuar mais tarde, foi uma grande provação para Santa Emília. Assim ainda em 1845, Dom Croizier pediu a Pe. Blanc, que tinha cometido vários erros bastante graves, que renunciasse. O superior obedeceu, mas durante muito tempo desconfiou de Madre Emília, pensando que ela tinha manobrado para obter a sua saída, o que era absolutamente falso. O Bispo nomeou, para substituí-lo provisoriamente, Pe. Turq, vigário de Saint-Joseph, em Villefranche. Essa escolha não respeitava as Constituições que previam a apresentação de um candidato, pelo Capítulo. Por outro lado, Pe. Turq nunca tinha manifestado muita simpatia pela Sagrada Família. As medidas tomadas em janeiro de 1840 produzem um novo surto de fundações escolares: Cadour (janeiro), Rieupeyroux (junho; essa casa, inicialmente um claustro, foi transformada em casa não-clausurada depois de dois anos), Fons (Lot-outubro), Lanuéjouls (março 1841), Parisot (Tarn-etGaronne, junho), Laguépie (Tarn-novembro), Saint-Salvadou 18 (junho), Marmont (julho), Orlhaguet e Cornuéjouls (outubro), Caylus (Tarn-et-Garonne, novembro), Caussade (Tarn-etGaronne, primavera de 1842), Puyjourdes e Alvinhac (Lotoutubro), Verfeil (Tarn-et-Garonne-dezembro), MontaubanVillebourbon (outubro), Elbes e Asprières(1843), L’Hospitalet (setembro 1844), Labastide Saint-Pierre (Tarn-et-Garonne, fevereiro 1845), Senouillac (Tarn, 1845), Paulhe (abril 1846). Para comentar com uma só palavra essa lista, digamos que alguns desses estabelecimentos tiveram de fechar logo depois, seja por uma pobreza material excessiva, seja por dificuldades com o clero local,23 ou pelo número insuficiente de religiosas. Várias delas especializaram-se no cuidado aos doentes ou aos jardins de infância: são as “escolas maternais” (“Salles d’asile”) – a primeira foi aberta em Villefranche em 1841 (A cap. 12). Uma outra importante iniciativa revela o zelo incansável de Madre Emília: a fundação, sempre em Villefranche, de uma casa para ex-prostitutas. É por ocasião das visitas às prisões que a superiora, querendo a todo custo socorrer alguma mãe solteira, foi levada a esse empreendimento. Após ter-se mostrado um pouco reticente, Dom Croizier deu, em seguida, uma total adesão: o Bom Pastor acolheu, desde o dia 25 de março de 1845, quatro dessas mulheres. Talvez Madre Emília pensasse nessa obra desde julho de 1841, época em que adquiriu o convento das Damas do Refúgio, num arrabalde de Montauban, chamado Sapiac. A história desta última fundação de claustro (A cap. 13) põe em relevo as características da espiritualidade vivida e deixada como herança pela primeira superiora da Sagrada Família. Sem presunção nem preguiça, ela confia na Providência para conseguir os fundos necessários para a compra, desde que o consentimento de seu superior a certifique de que Deus quer essa obra. Hospedada com suas duas companheiras no Carmelo, aonde uma mendiga as conduziu, Madre Emília sabe aproveitar os conselhos da Priora24 e passa longos momentos em oração diante de um oratório de Santa Teresa. O bispo25 a acolhe paternalmente, mas em seguida pretende dominar o convento, o que as Constituições não podem admitir. Por isso Madre Emília deve, ao partir, confiar com mais insistência ao Senhor a Comunidade que deixa numa situação de insegurança, sob a 647 ÍNDICE DOS TEMAS PRINCIPAIS N.B. – Tentamos reagrupar os temas com títulos bastante gerais. As distinções interiores e as referências permitirão estabelecer nuanças e relações. Aqui, novamente, o primeiro algarismo se refere à página; o algarismo entre parênteses indica seja uma nota, seja uma carta. ABNEGAÇÃO Atitudes diversas de esquecimento e de reprovação de si indo contra seu amor-próprio. Manifestações de amor-próprio em Santa Emília; conselhos recebidos; sua prática de abnegação, 46, 114, 123, 128, 130, 134, 638. Orientações dadas por Santa Emília; dados objetivos sobre essas questões, 154, 166-167, 381 (14), 391 (24), 404 (38), 409-410 (44), 420-421 (56), 427 (63), 459-460 (94), 468 (101), 469 (102), 529 (50), 530-531 (151-152), 590 (199), 622 (44, 1), 624 (63, 1), 627 (52, 1). – Ver igualmente: COMBATE ESPIRITUAL; TEMPERANÇA; VIRTUDES “INTERIORES” E “PASSIVAS”. AÇÃO DE GRAÇAS E GRATIDÃO Vividas e expressas por Santa Emília, 54, 56, 69, 70, 71, 72, 102, 104, 106-107, 521-522 (142), 527-528 (148), 593-594 (202), 612-613 (215). Conselhos dados a Santa Emília, 123, 133-134. Orientações de Santa Emília, 297-300, 462 (97), 526 (147). Defeito oposto: a “amargura”, 303-304, 498 (124). AÇÃO E CONTEMPLAÇÃO Como uni-las, seja no plano da cooperação entre os dois “ramos” do Instituto, seja no plano individual, 246-249, 259-263, 265-267, 349 (43), 462-463 (98), 535 (157), 627 (157, 1), 641-643. Como evitar o ativismo, 128-129, 395 (29). –Ver igualmente: ORAÇÃO. 19 646 THÉRÈSE DE SAINT- JOSEPH, Irmã, 26, 161. TOMÁS DE AQUINO, Santo, 344 (20). THOMAS A KEMPIS (enquanto autor da Imitação de Jesus Cristo), 4, 232, 275-276, 413 (47), 470 (104). TRÉLISSAC, Dom Jean CHAUDRU de, 34 (25), 551 (167), 566 (180), 628 (167, 1). TRENQUELLÉON, Adèle de, 8, 32 (8), 79, 158, 360. TRONSON, Louis, 492 (118). TURQ, Padre, 18, 21, 574-575 (186). VACQUIÉ, Irmã Philippine, 360, 397 (124), 554 (168), 595 (203), 602 (207), 635 (203, 1). VACQUIÉ, Irmã Vincent, 16, 24, 87, 104, 145 (39), 360, 376 (9), 420 (55), 438 (76), 440(77), 475 (108), 476-477 (109), 478-480 (110), 524 (145), 533 (154), 566 (180), 574 (186). VALLON Sophie (que tomou o nome de Irmã Séraphine na Congregação da União e de Irmã Thaïs, na Sagrada Família), 13, 33 (15), 84, 360, 486-487 (115), 508-510 (133), 541 (161). VIALARD, Irmã Marie, 14, 83, 360, 475 (108), 477 (109), 508-510 (133), 512 (134), 622 (16, 1). VIGNES, Irmã Félicité, 442 (78), 471 (105), 533 (154). VICENTE DE PAULO, São, 266. ________________ responsabilidade de Irmã Foi Bousquet.26 Ela confessa finalmente que durante aquelas semanas não sentiu a paz interior que, habitualmente, acompanhava seus labores de fundadora, mas antes sentiu “uma tristeza mortal”. As medidas tomadas em janeiro de 1840 estavam bem longe de ter feito desaparecer todas as causas de conflitos. A posição jurídica das Irmãs das escolas permanece desproporcional a seu número e a seu serviço apostólico. Seus votos são apenas temporários e não podem participar do governo da Congregação. Em 1844, Madre Emília apresenta essas dificuldades a Dom Croizier que encarrega o Cônego Barthe,27 professor em Saint-Afrique, de rever as Constituições (novembro). Após algumas semanas, este último chega à convicção de que é preciso abolir a clausura. Dom Croizier e seu Conselho aceitam a opinião que o cônego comunica a Villefranche. Para Santa Emília e para a quase unanimidade das Irmãs de clausura, é uma verdadeira catástrofe. Multiplicam-se penitências e orações para obter que o Espírito Santo mude, nesse ponto, a maneira de ver do Bispo. Madre Emília envia também duas religiosas a Saint-Afrique, a fim de apresentar ao Pe. Barthe as dificuldades provenientes de sua solução decisiva (janeiro de 1845). Mas os esforços de Irmã Françoise Pascal e de Irmã Foi Bousquet não abalam as convicções do cônego. Entretanto, três semanas depois, essas mesmas religiosas obtêm dele a promessa de que a clausura será salvaguardada. No decorrer do ano, Pe. Barthe vem expor a Madre Emília e a seu Conselho as principais cláusulas que ele prevê para harmonizar a coexistência dos dois ramos e seu trabalho recebe, em agosto de 1846, a aprovação episcopal. De agora em diante, uma “diretora das escolas” deve ocupar-se, sob o controle da Superiora Geral, de tudo o que diz respeito às Irmãs não-clausuradas. Um conselho de seis membros assiste a diretora das escolas e exerce um poder mais importante que seu homólogo anterior (Conselho Geral). Para favorecer a união, volta-se a um único noviciado.28 Ao mesmo tempo em que se regozijava com a manutenção da clausura, Madre Emília previa que a presença de uma diretora das escolas e as atribuições mais amplas do conselho ocasionariam novos 20 dissabores. Isso não faltou, tendo em vista a personalidade de Madre Foi que, uma vez nomeada diretora, se mostrou pouco respeitosa e maleável, tendo em vista, igualmente, as preocupações sobretudo financeiras do Conselho que prejudicou o ideal de pobreza e de amor aos pobres que a fundadora prezava não menos do que a clausura. 5. Novas fundações e reformas pedagógicas – Aniquilamento progressivo da superiora; seus esforços para assegurar o progresso espiritual da Congregação; suas últimas atividades apostólicas. Última doença (1846-1852) O primeiro acontecimento notável desse período é a designação de um superior definitivo, permanecendo o Pe. Turq como superior local. Dom Croizier confia essa função a seu vigário-geral, o cônego B. Abbal,29 que ratifica a abertura de várias escolas: Najac (novembro de 1846), Camarès (março de 1847), Saint-Amans des Cots (novembro de 1848), Finhan (Tarn-et-Garonne, março de 1849), Bezonnes (setembro de 1851), Valence d’Agen (Tarn-et-Garonne, 1852). Homem prático, Pe. Abbal levou em consideração as queixas de várias religiosas a respeito dos "esbanjamentos" feitos por Santa Emília, a quem se chegou a proibir de dar qualquer esmola sem a permissão expressa do Conselho. Além do mais, esse mesmo Conselho decidiu reduzir o número de órfãs, não admitir postulantes sem dote, nem abatimento nas pensões das alunas. Aliás, para salvaguardar a reputação do ensino ministrado pela Sagrada Família, o superior instituiu exames públicos ornamentados com pequenas apresentações teatrais, até 1851. Madre Emília submeteu-se, mas não escondeu que pudesse haver perigo nessas manifestações, tanto para as alunas como para as religiosas. Como era necessário, entretanto, aprimorar sempre os métodos pedagógicos, Pe. Abbal redigiu, em colaboração com as melhores professoras da Congregação, um manual de ensino que foi publicado em 1850.30 Suas cartas daquela época insistem para que se cuide da instrução das noviças, que tempos livres de cultura pessoal sejam dados às professoras em exercício. 645 POUGET, Irmã Angèle, 34 (29), 328, 630 (192, 1). POUJADE DE LADEVÈZE, Cônego J.C.G., 7, 31 (6). POUX, Irmã Mathilde, 359. RAMOND-LALANDE, Dom Bruno de, 11, 32 (10). RAMONDY, Sr. de (Tetravô de Santa Emília), 41. RANCÉ, Jean Armand BOUTHILIER de, 143 (22). REVEL, Anne, 67, 69. RICARD, Padre. 9, 475 (108), 477 (109), 481 (111), 613 (215). RODAT, Amans de (Pai de Santa Emília), 1, 11, 41-42, 51, 139 (2), 363 (1), 367 (3). RODAT, Charlotte de (Irmã de Santa Emília), 31 (2), 363 (1), 366 (3). RODAT, Eléonore de (Irmã de Santa Emília), ver: COLOMB. RODAT, Henri de (Irmão de Santa Emília), 31 (2), 363 (1), 371 (5), 621 (5, 3). RODAT, Sra. Henriette de (nascida de POMAIROLS, mãe de Santa Emília), 1, 11, 41, 360, 363 (1), 366 (3). RODAT, Louis de (Irmão de Santa Emília), 31 (2). RODRIGUEZ, Afonso, 470 (104). ROSA DE LIMA, Santa, 200-201, 344 (19). ROUSTANG, F., 142 (18), 346 (33), 622 (37, 1). ROZIÉ, Irmã Athanasie, 11, 32 (12), 104, 360, 375 (8), 381 (15), 442 (78), 451 (87), 621 (8, 2), 625 (82, 1). SAINT-CYR, Sra (Srta. De CASTANET d’ARMAGNAC), 3, 4, 6, 50, 54, 57, 60, 62-65, 67. SAINT-JULIEN, o Sr. de, 18, 568 (183). SAINT-JURE, J.B., 140 (10). SALGUES Lucie (religiosa de Nevers sob o nome de Madre Eléonore), 15, 33 (17), 86. SCHNERB, R., 626 (133, 1). SCUDIER, Irmã Mélanie, 34 (28), 541 (161). SELVES, Sra. Antoinette de (bisavó de Santa Emília), 1-2, 41, 45, 47. SÉRAPHIN de FERMO, 347 (34). SERVIÈRES, L., 31 (2), 32 (6, 10, 13), 33 (22), 345 (21). SOL, E., 31 (2), 32 (6). SOUYRI, Irmã Marie-Claver, 541 (161). SURIN, J.J., 4, 140 (10), 277, 327, 350, 364 (1). TARAYRE, Irmã Anne Sophie, 360. TAURIAC, Irmã Marie Séraphine, 39, 140 (11), 160, 175, 187, 240, 242, 250, 350 (51). TERESA DE ÁVILA, Santa, 20, 56, 83, 90, 106, 140 (10), 257, 280, 282, 285, 288, 297, 299, 325-326, 349 (53), 351 (67), 352 (78), 364 (1). TERESA DE LISIEUX, Santa, 142 (18), 348 (38), 625 (102, 1). 644 MARTY, cônego Antoine, 4-7, 9-12, 15, 16, 22, 31 (3), 33 (19), 5456, 60-67, 69, 72, 74, 78-83, 86-94, 117, 119, 121-132, 142 (18), 144 (35), 147 (49), 151, 249, 251, 257, 270, 273-274, 295, 313, 316, 375 (8), 377-78 (11), 380 (13), 395-396 (29), 400 (33), 404 (37), 405 (40), 410 (45), 416 (52), 419 (53), 421 (57), 430 (67), 432 (70), 443-444 (79), 449 (84), 466 (100), 470 (104), 473 (106), 473-474 (107), 481 (111), 482-484 (113), 484-486 (114), 486-488 (115-6), 490-491 (118), 491-492 (119), 507 (132), 511 (134), 513 (136), 527-528 (148), 537 (159), 538 (160), 627 (148, 1), 629 (192, 1). MARTY, Padre Henri, 356. MARTY, Sra. Louise (nascida LOBINHES), 359. MASBOU, Irmã Agathe, 10, 104, 359, 360, 378 (11), 386 (19), 397 (30), 403 (37), 440 (77), 454 (88). MASBOU, Irmã Rose, 104, 359. MENDIZÁBAL, L., 346 (33). MINUCIUS, Félix, 642. NAPOLEÃO I, 204-205, 211, 364 (1). NAPOLEÃO III, 204-205, 211, 345 (24). NOUVIALE, Irmã Théodosie, 361. OLPHE-GALLIARD, M., 147 (57), 348 (37), 624 (63, 1). ORÍGENES, 349 (43). PALANQUE, R., 626 (133, 1), 635 (192, 1). PARENTEAU, H.A., 349 (43), 622 (26, 1). PASCAL, Irmã Françoise, 9, 20, 32 (9), 345 (23), 359, 361, 380 (13), 391 (25), 441 (77), 452 (87), 481 (111), 483 (113), 488 (116), 522 (144), 607 (210), 625 (108, 1), 635 (207, 1). PAUL DE LA CROIX, Santo, 142 (18). PIO VII, 3. PIO IX, 24, 209. PIO XII, 24. PIERRE FAVRE, Bem-aventurado, 628 (183, 1). POMAIROLS, Sra. de (nascida de VILLEFRANCHE, tia de Santa Emília), 23, 49. POMAIROLS, Agathe de (Tia-avó de Santa Emília), 2, 3, 6, 7, 43-44, 71-73, 621 (5, 2). POMAIROLS Charlotte de, 42 POMAIROLS, Sra. Marie-Marguerite de (nascida de SELVES, bisavó de Santa Emília), 1, 3, 6, 8, 11, 41-44, 53-54, 71-72, 367 (3), 371-372 (5), 471-472 (105), 621 (3, 2). POMAIROLS, Stanislas Etienne de (bisavô de Santa Emília), 1, 49. POMAIROLS, Stanislas Victor de (Tio de Santa Emília), 3, 44, 49. POMAIROLS-GRAMMONT, Padre de, 71. 21 Manobras bastante mesquinhas,31 a indiferença de suas mais próximas colaboradoras, deserções particularmente dolorosas para seu coração materno aumentaram o fardo das provações corajosamente carregado pela Santa. Em 1851, aproveitou algumas reformulações recentemente feitas às Constituições para ceder à assistente-geral, Madre Foi, uma grande parte do governo. Isso lhe permitia consagrar mais tempo à oração e à difusão de uma obra conhecida por ela desde 1847, mas pela qual se apaixona então: a Santa Infância. Assim, longe de fechá-la sobre si mesma, as contradições parecem abrir seu coração aos grandes movimentos missionários contemporâneos.32 Por outro lado, ela tinha redigido, nos últimos dias de 1850, um documento de suma importância, o Testamento Espiritual, no qual recomendava a caridade comunitária como o princípio primordial de autenticidade e de eficácia para as obras externas. No ano seguinte, teve a alegria de ver Pe. Barthe adaptar às Constituições o Diretório escrito por Pe. Marty, sem nada modificar de seu espírito.33 Em março de 1852, sofreu de uma úlcera no olho. O mal que parecia benigno aumentou rapidamente e era acompanhado de uma incapacidade crescente de se alimentar. Uma noite de julho, enquanto levava ao parlatório o jantar do filho de uma ex-prostituta, deu uma queda que agravou muito a úlcera: isso foi para ela o sinal de sua morte próxima, pois esse acidente coincidia – com alguns dias de diferença – com uma imprevisível cessação de seus sofrimentos interiores (A cap. 16). Num “grande estado interior de paz”, segundo sua própria expressão, entregou inteiramente suas funções nas mãos de Madre Foi, por ocasião da passagem de Pe. Abbal que veio assistir aos exames escolares do mês de agosto. Por ocasião de sua confissão cotidiana, no dia 3 de setembro, Pe. Fabre observou “algo de extraordinário em toda a sua pessoa” e a viu permanecer vários instantes após a absolvição como absorvida em si mesma.34 Ela não voltaria em vida a essa capela onde tanto rezara. No dia 5, recebeu a absolvição e a unção dos enfermos e mandou pedir permissão ao bispado para comungar em viático, a cada dois dias. No dia 22 seguinte, seu confessor lhe deu a indulgência plenária (A cap. 17). Lúcida e pacificada, aceitou completar o ditado de sua Autobiografia a pedido de Pe. Fabre que recolheu suas memórias, num ritmo de quatro a cinco horas seguidas, de 7 a 11 de setembro. Diante de testemunhas, desligou-o de todo segredo sacramental, “contanto que diga meus pecados” precisou ainda.35 Um número bastante grande de religiosas, reunidas em Villefranche para o retiro anual, pôde ter com ela uma última conversa. Mas recusou deixar entrar sua tia de Pomairols, embora lhe fizesse chegar pequenos presentes como prova de sua afeição. Com doçura, dissuadiu Ursule Delbreil, a única sobrevivente de suas três primeiras companheiras, de vir a Villefranche, embora Pe. Abbal o tivesse permitido. Pouco depois, Madre Emília teve uma forte reação para com uma religiosa não-clausurada de Figeac que, sem esperar a permissão de sua superiora, Irmã Vincent Vacquié, partiu às pressas para a Casa-mãe. Santa Emília ditou uma carta em que censurava a falta de firmeza da Irmã Vincent e só mais tarde recebeu a viajante em prantos. Perfeitamente desapegada, deixava assim exemplos contrastantes de rigor e de bondade, tendo sempre a última palavra. Esta agonia durante a qual Madre Emília ainda sabia interessar-se pelas pessoas e pelos seus trabalhos, pelas órfãs de Villefranche e pelas crianças de missões longínquas, terminou silenciosamente no dia 19 de setembro, no início da tarde, em presença de Pe. Fabre e de duas religiosas. Depois que a comunidade prestou suas primeiras homenagens filiais à defunta, os habitantes de Villefranche, há quinze dias atentos a todas as notícias, quiseram manifestar a sua veneração à “Santa”. O ataúde ficou exposto na capela durante todo o dia 20 e cada um pôde rever o rosto descoberto de Madre Emília ou fazer tocar em suas mãos objetos de piedade que, depois, seriam conservados como relíquias. No dia 21, realizaram-se as exéquias: Missa na Igreja paroquial de São José, percurso quase triunfal e volta aos Cordeliers onde a inumação, no jardim, foi adiada até o dia 25. Um ano depois, em dezembro de 1853, o corpo foi transladado para a capela. Antes, porém, Dom Croizier tinha 643 GRAINVILLE, Dom G. COUSIN de, 7, 31 (6), 68, 71, 621 (1, 1). GRAMMONT, H. de, 49. GRANDMAISON L. de, 350 (47). GRÈZES, Irmã Damien, 359, 542 (161). GRIMAL, Padre F.-H., 6, 31 (4), 62, 65, 73. GUIBERT, J. de, 345 (20), 348 (41), 349 (47), 351 (55), 352 (79), 624 (70, 1), 625 (102, 1), 635 (196, 1). GUYARD, Padre, 556-557 (171), 560 (175), 561 (176), 565 (180). HAMON, A, 341 (1). HAUTPOUL, Dom J.P. d’, 16, 33 (18), 88, 359, 543-544 (161). HOHENLOHE, Sr. L.A. de, 79, 143 (19). HUGOUNENC, Sr., 18, 110-112. HUYGHE, Dom G., 344 (14). ICHES, Irmã Caroline, 359-360. INÁCIO DE LOYOLA, Santo, 146 (48), 147 (56), 342 (2), 343 (10), 344 (13), 346 (32), 347 (34-35), 350 (55), 454 (88), 622 (37, 1), 623 (59, 1), 627 (157, 1). IMBERT, Padre, 87, 143 (23), 525 (146). JAMBERT, Irmã Julitte, 84, 508-509 (133). JAMÈS, Irmã Véronique, 424-426 (61). JOÃO DA CRUZ, São, 142 (18), 327, 346 (28), 346 (32), 352 (78), 622 (44, 1), 628 (183, 1). JOANA DE CHANTAL, Santa, 132, 135-136, 142 (18), 147 (57), 454 (88). JULIE, Irmã (religiosa do Santo Coração de Maria), 313. LAFORIE, Irmã Alphonsine, 34 (28), 161, 361, 611 (213). LA MOTHE, Dom L.F. d’ORLÉANS de, 140 (10), 364 (1). LASTIC, Sr. de, 50. LATREILLE, A, 626 (133, 1), 635 (192, 1). LAUNAY, Hippolyte de, 5, 6, 141 (12). LEFLON, J., 628 (183, 1). LEÃO XIII, 24. LIDWINE, Santa. 215, 346 (29). LIÉVIN, G., 344 (14). LUIS DE GONZAGA, São, 224, 352 (80). LUIS IX, São, 299, 418 (53). LUCIEN MARIE DE SAINT-JOSEPH, 344 (14). MADALENA, Santa, 90, 118, 123, 578 (188). MALEVEZ, L., 350 (47). MARIE-THÉRÈSE DE SAINT-AUGUSTIN, Madre, 16, 105-106, 132-137, 145 (44). MARTELET G., 626 (121, 1). MARTY, Mestre (notário), 87. 642 DAURES, Pe. Joachim, 6, 65. DEBONS, Padre, 15, 33 (16), 86. DEBUSSY, M., 17, 33 (21). DELBÈS, J., 2. DELBREIL, Irmã Anne-Régis, 358, 361, 439 (77), 483 (113). DELBREIL, Irmã Ursule, 6, 23, 31 (5), 64, 67-68, 104. DELCAMP, Irmã Joseph, 34 (28), 192, 361, 377 (11), 379 (12), 511 (134), 610 (212). DELOUS, Irmã Antoinette, 355. DELPECH, Sr., 92. DOMINIQUE L’ENCUIRASSÉ, Santo, 209, 345 (25). DONADIEU, Padre, 206. DUFOUR, Prosper, 34 (30). DU LAC DE MONTVERT, Joséphine, 2, 48, 139 (5). DUTRIAC, Irmã Eléonore, 6, 8, 31 (5), 64, 66-67, 104, 328-329. ELISABETH DE HUNGRIA, Santa. 236, 347 (37). FABRE, Padre Pierre Marie, 9, 17-18, 23-24, 34 (29), 39, 40, 95, 9698, 112, 132, 140 (2), 141 (17), 143 (18), 146 (47), 301, 338, 345 (21), 348 (37), 352 (78). FAURE, Irmã Marie do Sacré-Coeur, 200. FERRIEU Antoinette, 313. FESSARD, G., 142 (19), 627 (157, 1). FLAVIER, Irmã Appolonie, 358, 544 (162). FORBIN-JEANSON, Dom Ch. De, 35 (32). FOULCAULD, Charles de, 346 (32). FRANCISCO DE ASSIS, São, 186, 344 (11), 346 (32). FRANCISCO DE BÓRGIA, São, 212, 346 (27). FRANCISCO DE SALES, São, 4, 73, 118, 121, 147 (57), 194, 342 (3), 347 (34), 365 (2), 379 (12), 623 (45, 1), 624 (60, 1), 625 (101, 1). FRANCISCO XAVIER, São, 263, 266. GAFFARD, Irmã Angélique, 361. GAILLARD, Irmã Angèle, 443 (79), 470-471 (104). GARRIC, Irmã André, 359. GENEVIÈVE DE SAINTE-FLEUR, Madre, 19, 33 (24), 106-107, 550-551 (167), 556 (171). GENYER, Senhora (nascida GOURGES, tornou-se Madre Marie de Jésus), 5, 31 (4), 62. GERMAINE COUSIN, Santa, 92, 95, 117, 125, 145 (35), 639. GIRAUD, Dom Pierre, 12-13, 15, 17-18, 32 (13), 83, 85, 89, 359, 539 (160), 561 (177), 569 (183), 628 (159, 1) GIULIANI, M., 146 (48) GOMBERT, M., 2, 47, 72-73, 139 (5). 23 pedido à nova superiora geral, Madre Foi Bousquet, para reunir documentos tendo em vista uma eventual biografia, assim como os testemunhos de favores atribuídos à intercessão da fundadora. A precisão dos documentos assim reunidos permitiu que o processo diocesano fosse aberto com bastante rapidez (1860 – 1865), cujo dossiê foi entregue à Cúria Romana em fins de 1867. Pio IX introduziu oficialmente a causa no dia 7 de março de 1872, e Leão XIII assinou o decreto de heroicidade das virtudes em 1901. As perseguições na França, em seguida à primeira guerra mundial, interromperam o processo. Foi retomado em 1921 para chegar, com o Papa Pio XII, à Beatificação (9 de junho de 1940) e à Canonização ( 23 de abril de 1950). 24 641 II - CARACTERÍSTICAS GERAIS DESTA PUBLICAÇÃO Neste livro, apresentamos uma escolha de textos tirados das obras de Santa Emília, às quais, por vezes, serão acrescentados documentos cuja bibliografia a seguir indica a proveniência. Os textos estão divididos em três secções: – O que revela, de modo explícito e imediato, a experiência religiosa pessoal da santa. Em primeiro lugar, a importante redação comumente chamada: Autobiografia. Em seguida, textos de natureza análoga e algumas cartas ou trechos de cartas endereçadas a Madre Emília. – Obras que têm um caráter mais didático e objetivo, mas nem por isso desprovidos de personalidade. Na maioria das vezes, são endereçadas a toda a Congregação, à Comunidade da Casamãe ou a uma religiosa em particular: Regulamentos, Conferências ou Diálogos, Testamento espiritual. – Um certo número de cartas em que se encontram indissociavelmente os traços característicos da santa, de sua via espiritual, de sua pedagogia, etc. Uma parte notável da correspondência e vários documentos importantes que assinalaremos como tais na sua introdução são escritos do próprio punho de Santa Emília. As outras cartas e textos foram recopiados dos originais no momento dos processos canônicos e essas cópias estão autenticadas pela assinatura de tabeliães oficialmente mandatários. O restante das obras passou por um ou vários intermediários e por isso BONAL, Irmã Marie-Raymond, 68, 361, 615-617 (217). BOSSUET, Jacques Bénigne, 635 (204, 1). BOUQUIERS, Irmã Fébronie, 379 (12), 490 (117), 495 (122), 502505 (128-129), 626 (122, 1). BOUSQUET, Irmã Foi, 20-22, 24, 34 (26-27), 98, 145 (39), 246, 357, 533 (156), 614-615 (216), 619 (219). BOUTARIC, Irmã Marie, 6, 8, 31 (5), 64, 67, 70, 74. BOUTARIC, Irmã Vincent, 13. BOUYSSOU, Irmã Lucie, 456-458 (92). BOYER, Irmã Justine, 357. BRASSAT-MURAT, L.-F., 79, 80, 143 (20), 375 (8), 550 (167). BUSSY, Sra. Lenormant de, 50-51, 139 (7). CALMELS, Irmã Anne-Marie, 54 (161). CANCÉ, Irmã Jude, 358. CARIONI, J.-B., 347 (34). CARLES, Irmã Antoinette, 358, 360, 505 (130), 511 (134), 512 (135), 533 (154), 603 (208). CARPENTIER, R., 626 (125, 1). CAUSSADE, J.-P. de, 147 (57). CAVALLERA, F., 350 (50). CAZES, Irmã Thérèse, 358, 360, 413 (48), 462 (97), 475 (108). CERTEAU, M. de, 350 (50), 628 (183, 1). CHAMINADE, G.-J., 8, 32 (8), 158. CARLOS BORROMEU, São, 9, 572 (185). CHAUCHARD, Irmã Julie, 86. CHAUGY, Françoise Madeleine de, 147 (57). CHEVALIER, J., 625 (83, 1). CHINCHOLLE, Irmã Tabithe, 357, 567 (182). CHRESTEIL, Irmã Colombe, 206, 213-229, 230, 232, 591-593 (201). CHRESTEIL, Irmã Isidore, 224. CLAVER, Irmã Marie, 542 (161). COLIN, L., 626 (125, 1). COLOMB, Adrien (cunhado de Santa Emília), 139 (2), 370 (5). COLOMB, Eléonore (nascida de Rodat, irmã de Santa Emília), 14, 31 (2), 43, 52, 139 (2), 359, 370-371 (5), 621 (5, 1). COLOMBIÈS, Myon, 68. COMBRES, Irmã Germaine, 358. CONSTANS, Senhorita, 10, 79, 440 (77). COUREL, F., 342 (2). CROIZIER, Dom J.-F., 18-21, 24, 33 (22), 35 (31), 537 (159), 574575 (186), 582 (192). CIPRIANO, São, 642. DANSETTE A., 635 (192, 1). 25 ÍNDICE ONOMÁSTICO N.B. São anotados somente os nomes das pessoas que apresentam alguma importância em função das intenções desta obra. Não foi feito o recenseamento do apêndice (p. 645-655), nem da bibliografia (p. 2730); tampouco se guardou o nome dos autores que, mencionados nesta bibliografia, voltam com muita freqüência (L. Aubineau e G. Bernoville, em particular). A fim de evitar a repetição das referências, faz-se alusão ao catálogo dos correspondentes (p. 357-361). O primeiro algarismo indica a página; o que se encontra entre parênteses indica ora uma nota, ora uma carta. ABBAL, cônego Basile, 21-23, 34 (29, 30), 165, 328, 338, 345 (21), 357, 587 (195), 589 (197), 594-595 (203), 601 (206), 603 (207), 630-635 (192, 1), 635 (204, 1). ALAUX, Irmã Marie du Calvaire, 205-209, 224-229, 230-231, 597600 (205). ALBAGNAC, Irmã Blandine, 357. ALRIC, Victoire, 6, 65, 67, 69, 71, 367 (3). ANDRIEU, Irmã Grégorienne, 361. ARDOUREL, Irmã, 628 (163, 1). D’ANDILLY, ARNAUD 140 (10). AUBERT, R., 626 (133, 1), 629 (183, 1) 635 (192, 1). AGOSTINHO, Santo, 82. BALARD, Irmã Léonide, 357. BALDEYROUX, Irmã Marie-Aurélie, 40, 140 (11). BARTHE, cônego Edouard, 20-22, 33 (14), 34 (27), 160, 183, 282, 350 (52), 573 (185), 589 (197). BAUGUIL, Irmã Euphrasie, 357, 472 (105). BEIRNAERT, L., 627 (146, 1). BELLOC, Irmã Laurent, 110-111, 121, 151, 338, 357, 543 (161), 604 (208), 627 (148, 1). BÉNAVENT, Padre, 33 (23). BENTO LABRE, São, 90, 118, 144 (27), 639. BERNARD, Ch.-A, 635 (196, 1). BERNIÈRES DE LOUVIGNY, Jean de, 140 (9). BERTHIER, Guillaume, 4, 140 (8, 9), 364 (1), 454 (88), 625 (100, 1). BESSIÈRES, Irmã Angélique, 357, 361. BLANC, Padre Joseph, 11, 16-18, 32 (11), 72, 88, 106, 533-534 (155), 545 (163), 551 (167), 554 (168) BLONDEL, Maurice, 642-643. apresenta garantias diversas de autenticidade. Não estabeleceremos uma crítica técnica dos textos, mas simplesmente, daremos indicações gerais sobre a maneira como os escritos foram transmitidos, ou seja, os que não são de próprio punho. Todas as afirmativas que assim podemos comunicar nos foram dadas pela Religiosa atualmente Arquivista da casa generalícia em Villefranche, Irmã Thérèse de Saint-Joseph. Ela supervisionou igualmente as cópias datilografadas que utilizaremos em toda a confiança e que a bibliografia enumera sob a rubrica: “documentação nãoimpressa”. Aproveitamos a ocasião desses esclarecimentos para expressar à Irmã Thérèse de Saint-Joseph e a suas colaboradoras nossa total gratidão. É preciso lembrar, finalmente, que Santa Emília tem forçosamente idéias, reações afetivas, imaginação e modos de expressão próprios de sua época. O leitor de hoje saberá entender e não se chocar com o que poderia desconcertá-lo, mas, com discernimento e simpatia, descobrirá um pensamento ou uma intenção sempre atuais. ___________ 639 26 [TOMAS DE AQUINO, Santo]. Alusão biográfica em C 45 (nº 16). III - BIBLIOGRAFIA E ABREVIAÇÕES 1. Documentação impressa a) De caráter geral BARTHE (E.). - L' Esprit de la Révérende Mère Emilie, 2 vol., Paris, Sarlit, 1863. (Abreviando: B, seguido de um algarismo romano para o volume; de um algarismo arábico para a página). Dictionnaire de spiritualité. Paris, Beauchesne, desde 1937. (DS, algarismo romano para o tomo; arábico para a coluna). DELATTRE (H.), artigo: Emilie de Rodat, V 610614. MARTHIN, artigo: Désolation III 637-638. GUÉLIN (G.). - La Bienheureuse Emilie de Rodat, em La Vie spirituelle, t. 65, 1941, 524-536 e t. 66, 1942, 372-377. Lettre apostolique de la béatification, Acta Apostolicae Sedis (AAS), t. 32, 1940, 398-403. PIO XII - Homélie pour la canonisation, AAS 42, 1950, 321324 (Tradução em La Documentation catholique, t.47, 1950, col. 641-643). SACRA RITUUM CONGREGATIO. – Positio super introductione causae, Roma, 1871(Pos). Positio super fama in genere, 1877. Positio super veliditate processuum, 1889. Positio super virtutibus, 1897. Nova positio super virtutibus, 1899. Novíssima positio super virtutibus, 1901. Positio super validitate processus super miraculis, 1929. Positio super validitate processus super miraculo, 1932. Positio super validitate processum, 1938. Positio super reassumptione causae, 1942. Positio super miraculis pro praeparatoriis, 1949. Novissima positio super miraculis, 1949. Positio super tuto, 1950. b) Biografias. AUBINEAU (L.). - La Vie de la Vénérable Mère Emilie de Rodat, 6ª ed. Lyon, Vitte, 1891(AUB) RAYLET Padre (L.). - Vie abrégée de la V. Mère Emilie de Rodat, Paris, Vic et Amat, 1897. RICARD Dom (E.). - La Vénérable Emilie de Rodat, Col. “Les Saints”, 2ª ed. Paris Lecoffre, 1912. SAVIGNY-VESCO (M.). - La Bienheureuse Emilie de Rodat, Paris, Alsatia, 1941. Vida dos Padres do deserto. HC. Vida das santas mulheres. HC. 27 638 [LUIZA DE FRANÇA, Madame]. Vie de Madame Louise de France. HC. [MACRINA, Santa]. Alusão feita em D 28 (nº 14). Morts édifiantes des damess illustres. HC. Le Père Antoine. L 922. [PIO IX, Papa] DL 115: “Quando foi publicada a biografia de Pio IX, apresentei-a à Madre Emília dizendo: “Minha Madre, venho darlhe momentos agradáveis, tenho certeza de que a senhora lerá com felicidade a biografia de nosso Santo Padre.” [PECRO CLAVER, São]. A beatificação do Padre Pedro Claver. L 927. Vida do Pe. Claver. HC. Possession de Loudun. Ms aut., Questões apresentadas a Pe. Marty, 2ª série, 72ª questão. Prospecto da Santa Infância. L 899; I. 214. [QUÉRIOLET, o Sr. de]. Vida do Sr. de Quériolet. Ms Questões apresentadas a Pe. Marty, 2ª série, 72ª questão. aut., [RANCÉ (Dom Armand BOUTHILIER de)]. A vida do Abade de Rancé. HC. [RODRIGUEZ (Alphonse)]. A vida do Pe. Rodrigues de que fala HC deve ser a de Santo Afonso Rodrigues (v.s. a esse nome). [ROSA DE LIMA, Santa]. Alusão à sua vida em D 84-85 (nº 35; v.s. segunda secção II, nº 9). SALES (Charles-Auguste de). Vida de São Francisco de Sales. HC; AUB 69 (1). *Vie de la Mère Marie-Aimée de Blonay, religieuse de la Visitation. Paris, Sognier e Bray, 1848. [STANISLAS KOSTKA, Santo]. Vida de São Stanislas Kostka. HC. [SURIN (Jean-Joseph)]. A vida do Pe. Surin. HC; cf. Ms aut., Questões apresentadas a Pe. Marty, 2ª série, 74ª questão. [TERESA D’ÁVILA, Santa]. Vida de Santa Teresa d’Ávila. HC. Alusões biográficas em C 13 (nº 6; v.s. segunda secção II, nº 23), 22 (nº 10), 88 (nº 36; ibid., nº 30); D 23(nº 11), 34-35 (nº 16; ibid., nº 37), 37 (nº 17; ibid., nº 27), 65 (nº 26), 125 (nº 59). PLUS, S.J. (R.). - Sainte Emilie de Rodat, Toulouse, Apostolado da Oração, 1950. ARNAL (M.). - L'Aimable Sainte du Rouergue, Toulouse,Apostolado da Oração, 1951. BERNOVILLE (G.). - Sainte Emilie de Rodat, Paris, Grasset, 1959 (Br). RICHOMME (A.) - Sainte Emilie de Rodat, Col. “Belles histoires et belles vies”, Paris, Fleurus, 1965. c) Obras de Santa Emília Cartas..., Publicadas sob os cuidados do Pe. Henri Marty, Paris, Palmé, 1888 (M, seguido de um algarismo arábico indicando a página). Autobiografia, s.l. [Lyon], s.d. [1958] (A, seguido habitualmente da indicação do capítulo). Desde 1916 existe um “Petit Bulletin de la Sainte-Famille”. Sua periodicidade variou de acordo com as circunstâncias. Atualmente é mensal (o número de janeiro de 1965 é 253). Eis alguns trechos da carta pela qual a superiora geral o apresentava à Congregação, em 24 de maio de 1916: “Há muito tempo, desejávamos religar entre elas nossas queridas comunidades dispersas por um laço de interesse afetuoso e fraterno, por tudo o que lhes diz respeito reciprocamente... “Por vezes, no decorrer das páginas desta pequena revista... o passado se misturará com o presente. Não devemos fazer reviver nossa santa fundadora, queridas Irmãs antigas? Não devemos guardar seu espírito, dele nos impregnar, por assim dizer, haurindo com abundância dos tesouros de virtude e de santos exemplos acumulados por elas durante o século que terminou? Por vezes, igualmente, o relato de graças obtidas pela intercessão de nossa venerável Madre, alegrará nosso coração e estimulará nossa confiança!...”. N.B. - Por ocasião de diversas solenidades, a casa-geral de Villefranche publicou os álbuns ou brochuras seguintes: La Bienheureuse Emilie de Rodat, 1941. Gloire à sainte Emilie de Rodat, 1951. Fêtes du centenaire, 1952. Consécration de la chapelle, 1958. Bénédiction des cloches, 1960. 2. Documentação não-impressa. Sempre nos referimos às cópias datilografadas feitas em Villefranche (ver acima). Por vezes, os títulos são abreviados. Em nosso texto ou suas notas, a abreviação será sempre seguida de um algarismo indicando a página, exceto no que se refere à História da Congregação (o algarismo indica a data) e as Cartas (ele reproduz o 637 28 número de ordem). O algarismo entre parênteses, na maioria das vezes, indica uma nota. a) História. Biografia. Testemunhos. (1) Histoire de la Congrégation (composta pela atual arquivista de Villefranche) (HC) (2) Préliminaires à l'Histoire de la Congrégation (mesmo autor) (HC pr). (3) La foi religieuse à Villefranche-de-Rouergue à travers les âges (anônimo) (FR). (4) Carnets de M. Fabre (redigidas pelo Pe. P.M.Fabre, entre 1852 e 1874 (CF). (5) Dépositions de M.Fabre (1863 e 1874) (DF) (6) Dépositions de Soeur Laurent Belloc (1863 e 1873-1874). (DL). (7) Dernière maladie et doux trépas de notre sainte fondatrice (redação da mesma religiosa, depois de 1852). (DM) (8) Dépositions de Soeur Antoinette Delous (primeira postuladora da Causa, 1863 e 1873; só começam com um “sétimo interrogatório”). (DA). (9) Portrait de la Mère Emilie (escrito pela mesma religiosa, em 1877, retocado em 1884). (P) (10) Dépositions de Soeur Marie-Claver Souyri (1863 e 1874). (DC) (11) Dépositions d' ecclésiastiques et autres (DEc.) (12) Dépositions diverses (DD). (13) Copie (partielle) des animadversions (ou objections) du promoteur de la foi et des réponses de l’avocat (1896-1900). (Anim). (14) Chambre de sainte Emilie de Rodat (inventário descritivo feito pela arquivista de Villefranche em 1964). (Ch.) b) Obras de Santa Emília (15) Manuscritos autógrafos (Ms aut). Este fascículo fornece documentos autobiográficos ou históricos, assim como afirmações sobre a origem e a transmissão de certos escritos da Santa. Os textos reunidos não foram todos datilografados de acordo com os autógrafos. Vários o são em conformidade com cópias que têm como garantia a assinaturas de tabeliões canonicamente mandatários por ocasião dos processos diocesano e romano. Designamos essas cópias com o título “Dossiês da Causa” e, em seguida, damos as afirmações contidas nesses Manuscritos autógrafos. (16) Conferências (C) [FRANCISCO DE BÓRGIA, São]. Vida de São Francisco de Bórgia. HC. Cf. C 2 (nº 1; v.s. segunda secção II, nº 11). [FRANCISCO RÉGIS, São]. Vida de São Francisco Régis. HC; citado como exemplo por C 18 (nº 8). [FRANCISCO XAVIER, São]. Vida de São Francisco Xavier. HC; citado como exemplo por C 18 (nº 8) e D 23 (nº 11). GODESCARD (Jean-François). Vie des saints. HC. Héroïnes chrétiennes; 2 vol. HC. [INÁCIO DE LOYOLA, Santo]. Vida de Santo Inácio de Loyola. HC; cf. L 273; I. 89. [IRENÉE, Irmão]. Vie du Frère Irenée. HC. [ISABEL DE HUNGRIA, santa.]. Dada como exemplo por C 18 (nº 11) e 49 (nº 17; v.s. segunda secção, II, nº 17). *JEANCARD. Vie de saint Alphonse de Liguori. Paris, Gauthier, 1828. HC (sem nome do autor). [JOÃO BATISTA DE LA SALLE, São]. Vida do Santo de la Salle. HC. [JOÃO DA CRUZ, São]. Citado como exemplo por D 34 (nº 16; v.s., segunda secção, II, nº 37) [JEANNE DE LESTONNAC, Santa]. Vie de la Mère de Lestonnac. HC. [JOSÉ, São]. L 924 e 927 falam de “impressos em honra de São José”. V.s. III, Mois de saint Joseph. [LA MOTHE (Dom Louis-François d’ORLÉANS de)]. Vida de Dom de La Mothe. HC. Lettres édifiantes. HC. LHOMOND (Charles-François). Histoire de l’Eglise. HC. Livres de l’association du Sacré-Coeur. HC. [LUIZ IX, santo, rei de França]. Traços de sua vida em C 88 (nº 36; v.s. segunda secção, II, nº 30) [LUIZ GONZAGA, São]. Vida de São Luiz de Gonzaga. HC. Citado como exemplo por C 44 (nº 16). [LUIZ STÉPHANELLI, São]. Vie de saint Louis Stéphanelli. HC. 29 636 *ABELLY (Louis). Vie de saint Vincent de Paul, instituteur et premier supérieur général de la Congrégation de la mission... Nouvelle édition, Paris, Debécourt, 1839. HC (sans nom d’auteur). *[AFFRE (Dom Denys-Auguste)]. Vie de Mgr Affre, 1851. HC; cf. L 927. [AGATHON, Abbé]. Traços de sua vida em C 44 (nº 16). *[ALPHONSE RODRIGUEZ, Santo]. Vie du b. Alphonse Rodriguez, frère coadjuteur de la Compagnie de Jésus. Béatifié le 12 juin 1835, par sa Sainteté Léon XII. Lyon, Pélagaud, Lesne e Crozet, sucessores de Rusand, 1836. É certamente la Vie du P. Rodriguez de HC. [ALVAREZ (Balthazar)]. Vie du Père Balthazar Alvarez. HC. L’Ange gardien. L 3; 1. 2. Annales de la Sainte-Enfance. L 879, 899, 901; I. 208, 214, 215. [ARTÉMON, Santo.]. Vie de saint Artémon. HC. [BASILE DE CÉSARÉE, São]. Característica exemplar em C 44 (nº 16) e D 2 (nº 1). Les Basiliennes. L 922. [BENTO LABRE, São]. Vie de saint Benoît Labre. HC. *BION. Vie de François d’Estaing. Rodez, Ratery, 1839. [BOUDON (Jean-Marie)]. Vie du Père Boudon. HC. CAILLAUD. Notre Dame de Roc-Amadour. L 535. [CAYRON (Paul)]. Vie du P. Cayron. HC CHAUGY (Madeleine de). Vie des quatre premières Mères de la Visitation; HC; v.s. III, “Livres de la Visitation”. L 275 (I. 89) pour sainte Jeanne de Chantal. CROISET (Jean). Vie des saints; 17 vol. HC. FLEURY (Claude). Histoire de l’Eglise. HC. [FRANCISCO DE ASSIS, São]. Recordações da leitura de sua vida ou dos Fioretti em C 9 (nº 4; v.s. segunda secção II, nº 4); 26 (nº 10); 27 (nº 11). (17) Diálogos (D). Apresentaremos com mais detalhes estas duas séries de textos, introduzindo os que escolhemos (segunda secção, II). (18) Cartas (L) Um grande número de cartas está datilografado de acordo com os autógrafos; outras conforme cópias dignas de fé (cf. 15); outras, conforme cópias de fontes diversas. Os documentos autógrafos tinham sido encadernados em 6 volumes, numerados com algarismos romanos e paginados com algarismos arábicos. Nesses volumes encontram-se escritos que não são cartas, mas deles teremos de reproduzir alguns. A fim de evitar qualquer confusão, ao nos referirmos a uma das 219 cartas que guardamos para nossa terceira secção, utilizaremos a sigla: L (Cartas) seguida do nº de ordem. É igualmente o número de ordem que figura após L – Ao citarmos uma carta, nós nos referimos, quando for o caso, à edição Marty (ver acima, fontes impressas, c). L (Cartas) por vezes teve de reconstituir palavras riscadas ou esquecidas nos autógrafos: encontram-se entre parênteses e o contexto indica que se trata de parênteses do autor ou da copista. Nos autógrafos e nas cópias utilizadas por L, muitos nomes próprios foram riscados. Alguns puderam ser restabelecidos, outros permanecem ilegíveis: são substituídos por “N”. c) Cartas endereçadas a Santa Emília. (19) Trechos de cartas endereçadas por Pe. Marty a Madre Emília e recopiados por ela mesma num fascículo (trechos) (20) Cartas escritas a Madre Emília pela priora do Carmelo de Figeac, Madre Marie-Thérèse de Saint-Augustin (C). d) Compilações realizadas pela arquivista de Villefranche segundo as obras de Santa Emília e os depoimentos das testemunhas nos processos diocesano e romano. (21) Cópia textual dos documentos originais de Santa Emília de Rodat (DO) (22) Textos originais mais característicos do espírito da Congregação (TO). (23) A caridade de Santa Emília (em comunidade) (Car). N.B. - Estes três últimos volumes não dispensam os escritos já mencionados sob os números (1) a (20). * * 635 30 Significado de algumas abreviações comuns: - Cf. = ver (p.exemplo: cf.p.10 significará: ver página 10). - v.g. = por exemplo ( assim: v.g. São Francisco de Sales significará: por exemplo São Francisco de Sales) - v.i. = ver abaixo (por exemplo: v.i.p. 10 significará ver abaixo página 10). - v.s. = ver acima (p. exemplo: v.s.p.10 significará ver acima página 10). * * Observação geral. Sempre reproduzimos exatamente o texto que nos forneciam as datilógrafas (ou, no que se refere à Autobiografia, o impresso de 1858). As únicas correções que fizemos são de ordem tipográfica (simplificação e uniformização). Nas cópias que reproduzimos só tinham retificadas a ortografia e a pontuação. Graças às correspondências de datas, facilmente poderemos esclarecer e completar uns pelos outros os textos das diversas secções. Nouvelle édition augmentée d’un entretien sur les vertus et les ocupations des religieuses et de plusiers avis salutaires, Lyon, Rusand, 1826. Cité en L 173 sous le titre: Avis à la Mère; de même HC. *Horloge de la Passion. A página do título falta. *Livre d’Or. HC; cf. L 153; I. 51. MASSILON (Jean-Baptiste). Paraphrases. HC. * Petit Câreme. Paris, Tendré, 1820. MEDAILLE (Pierre). Méditations. HC. Mois de Jésus. HC Mois de Marie. HC. Mois de saint Joseph. HC; cf. DL 114: “Entrei um dia em seu quarto (de Madre Emília) e a encontrei ocupada a ler um novo mês de março presenteada pelo autor”; v.i. IV, Hagiographie. *NOUET (Jacques). Méditations spirituelles à l’usage des personnes qui veulent avancer dans la perfection. Paris, Vaton, 1839. HC. *L’Office de la sainte Vierge à l’usage des religieuses de l’Institut de la Sainte-Famille. Villefranche, Védeilhé, 1828. HC. Palais de l’amour divin. L 56. Le Paradis. L 922. Rapports frappants entre le sacrifice de la croix et celui de la messe. L 250; I. 79. Le Religieux mourant. HC. Saints désirs de la mort. HC. Visites au Saint-Sacrement. HC. IV. Hagiografia. História da Igreja. Missões. “Sei que a Venerável serva de Deus dizia a seu confessor ao lhe contar a sua vida: “A leitura da vida dos santos me transportava e me fazia sofrer...” DL 114; cf. A cap. 10; L 6; 1. 4, etc… 31 634 Vie de sainte Chantal; cf. L 273; 1. 89. Pode-se acrescentar: NOTAS DA INTRODUÇÃO ________________ *La manière de donner l’habit et recevoir á la professions les Soeurs de la Visitation de Sainte-Marie. Paris, Hérissant, 1748. III. Vida cristã e religiosa em geral. Leituras espirituais e livros de meditação. Sermões. Manuais de oração. ABELLY (Louis). Méditations. HC. Allégresses de la sainte Vierge. HC; cf. A cap. 5 AVRILLON (Jean-Baptiste). Commentaires sur le Miserere e méditations pour la communion. HC. Pentecôte et Fête-Dieu. HC. BAUDRAND (Barthélémy). *L’âme contemplant les grandeurs de Dieu... Paris, Méquignon, 1817. * L’âme éclairée par les oracles de la sagesse dans les paraboles et les béatitudes evangéliques. Lyon, Périsse, 1830. HC assinala: “Âme contemplative et outros escritos de Baudrand, 1827. L’âme élevée à Dieu”. BOISSIEU (Antoine de). Méditations. HC. BOSSUET. Méditations. HC. BOURDALOUE. Retraite. HC. Catéchisme de Constance. HC; cf. L 250; 1. 79. Catéchisme de Montpellier. HC. Consolation des âmes afligées. HC. CRASSET (Jean). Méditations. HC. DUFRESNE. Méditations. HC. L’Esprit du christianisme. L 2; 1. 1. GONNELIEU (Jerôme de). Manuel du chrétien (Saltério, quatro evangelhos; Atos dos Apóstolos ; Imitação de Jesus Cristo). HC. *Le Guide des supérieures ou avis à une supérieure sur les moyens de se bien conduire les autres, par une religieuse... (2) A respeito das famílias de Rodat e de Pomairols, ver, além das biografias já mencionadas, HC pr 1-4, FR 14-16, A cap. 21. Eis os nomes e anos de nascimento das irmãs e irmãos de Emília: Eléonore (1789) que lhe será intimamente ligada; Charlotte (1795) morta prematuramente com 11 anos de idade; Louis (1797) e Henri (1799). No que se refere à história religiosa local, de vez em quando nos baseamos nas seguintes obras: L. SERVIÈRES, Histoire de l'Église du Rouergue, Rodez, 1874; E. SOL, l'Église de Cahors au XVIII siècle et à l'époque contemporaine, Aurillac, 1848. (3) Pe. Antoine Marty nasceu em Labastide-Capdenac (Aveyron), em 27 de maio de 1757. Primeiro fez seus estudos nos “Doctrinaires” de Villefranche, depois em Rodez e na Sorbonne. Professor de Filosofia no Colégio “du Plessis” em Paris, recusou, em 1791, fazer o juramento constitucional, emigrando para a Alemanha no ano seguinte. Estando de volta ao país natal após a Concordata, exerceu as funções de vigário-coadjutor em Saint-Joseph de Villefranche, de Diretor do Colégio Eclesiástico, de Capelão da Casa Saint-Cyr e da Sagrada Família, finalmente de vigário-geral em Rodez, de 1823 a 1835. Faleceu em 15 de novembro do mesmo ano. AUB 44 (1); HC 1823, 1835. (4) Marie-Jacquette-Roberte Gourges, nascida em Moissac em 1735, viúva em 1802 de Pierre Genyer, falecida a 29 de agosto de 1839. AUB 69(1). François-Henri Grimal, nascido em Cassagnes-Bégonhés em 1755. Prestou grandes serviços durante o Terror, na qualidade de sacerdote não-juramentado. Vigário de Rieupeyroux depois de 1801, faleceu em Villefranche em 18 de abril de 1838. AUB 81(2). (5) Ursule Delbreil, originária de Montauban (16 de março de 1790), falecida em Villefranche em 18 de fevereiro de 1865. Marie Boutaric, originária de Maurs(Cantal), em 1798, falecida em Villefranche em 1819, algumas semanas depois de Eléonore Dutriac que aí havia nascido em 6 de setembro de 1799. AUB 71-73, 103-112; HC 1815, 1819; A cap. 8 e 9. Circulares necrológicas de E. Dutriac e de M. Boutaric em L (Cartas) 17 e 20. (6) A Concordata aceitou a supressão da diocese de Rodez e fundiu-a com a de Cahors (até 1817, teoricamente; de fato, em 1822). Jean-Charles-Gervais Poujade de Ladevèze, originario de SaintBeauzély (Aveyron), em 19 de junho de 1758, emigrou para a 633 32 Espanha durante a Revolução; vigário-geral, em 1802, de Dom Cousin de Grainville; falecido em 1836. AUB 286(2) No que se refere ao episcopado de Dom de Grainville, consultar E.SOL, o.c. 133-243; L. SERVIÈRES, o.c. 593-604. (7) Os Cordeliers estiveram presentes em Villefranche de 1217 a 1792. FR 4; Br 115-116; “Petit Bulletin de la Sainte-Famille”, abril de 1959, nº 190. (8) Adèle de Trenquelléon, nascida em 9 de julho de 1789, no Castelo de Trenquelléon(Lot-et-Garonne), emprende em 1816, em Agen, a fundação do Instituto das Filhas de Maria para a instrução das jovens. Falecida na mesma cidade em 10 de janeiro de 1828. AUB 102 (1); HC 1828; L 219. Guillaume-Joseph Chaminade, nascido em Périgueux em abril de 1761; sacerdote não-juramentado, emigra, por algum tempo, para a Espanha e volta antes da Concordata para exercer seu apostolado nas dioceses de Baza e Bordeaux. Nessa cidade, ele restaura a Congregação da Imaculada Conceição e, em 1817, funda a Sociedade de Maria ("Marianistes"). Falecido em 22 de janeiro de 1850. AUB 133(1); DS II 454-459. (9) Irmã Françoise Pascal, nascida em Villefranche em 1803; superiora de Aubin de 1832 a 1846, depois em 1851-1852; ecônomageral de 1846 a 1851; falecida em Villefranche, em 1880. HC 1820, 1846, 1851. (10) Charles-André-Bruno de Ramond-Lalande, nascido em La Bastiolle (Tarn-et-Garonne) em 1º de novembro de 1761. Embora não-juramentado, permanece em Paris até ser preso pouco antes de 9 Thermidor. Após a Concordata de 1801, foi vigário de Saint-Thomas d’Aquin. Designado Bispo de Rodez, após a Concordata de 1817. As dificuldades gerais de aplicação desse acordo atrasam sua sagração e sua instalação até 1823. Transferido para Sens em 1830, morre durante a viagem (10 de abril). AUB 215(1); HC 1823; 1830; L. SERVIÈRES, o.c. 604-609. (11) Pe. Blanc, nascido em Villefranche em 28 de julho de 1793; aluno de Padre Marty, ordenado em 1819, professor no Colégio de Villefranche e capelão da Sagrada Família; superior local em 1823, superior-geral em 1835. Encontramo-lo em Paris de 1824 a 1831, primeiramente como capelão no Calvário do Mont-Valérien, depois, pároco de Sainte-Marguerite. Deve demitir-se como superior em 1845; falecido em 1876. AUB 304(1); M 167(1); HC 1835, 1845; Pos, fascículo 2 p.12. (12) Charlotte Rozié, nascida em 1798 em Najac. Em religião toma o nome Ir. Athanasie. Exerce cargos importantes: assistente, mestra de noviças, do pensionato. Morre após uma penosa doença SURIN (Jean-Joseph). Les fondements de la vie spirituelle. HC; cf. D 36 (nº 16; v.s. seconde section II, nº 37) e 136 (nº 63; ibid., nº 26); v.i. IV, Hagiographie. *TERESA DE ÁVILA, Santa. Oeuvres de sainte Thérèse.Ttraduites en françois par Arnauld d’Andilly. Nouvelle édition corrigée et augmentée, Paris, Albanel e Martin, 1839 (a biblioteca de Villefranche possui apenas o Tomo 2); v.i. IV, Hagiographie. THOMAS A KEMPIS. Imitation de Jésus Christ. HC; cf. C 10 (nº 5), 47 e 49 (nº 17; v.s. segunda secção II, nº 17); D 135 (nº 63; v.s. ibid., nº 26); 139 (nº 64); 139-140 (nº 65); L 142; 351; 1. 47, 104. *Oeuvres choisies du Vén. Thomas a Kempis, traduites par Repartz e Baudry. Paris, 1848. TRONSON (Louis). Traité de l’obéissance. HC. VICENTE DE PAULO, São. Maximes. HC; v.i. IV, Hagiographie (Abelly). Avis spirituels. HC. VISITAÇÃO (Livros da). De acordo com AUBINEAU, 96 (1): Constitutions, Directoire et Grand Coutumier de la Visitation Petites Coutumes de Annecy. Réponses et Epîtres de la Mère de Chantal (v.s. a respeito desse nome). Lettres circulaires (um volume, in-4º). Vie de quatre premières Soeurs de la Visitation por R. Mère Madeleine de Chaugy (v.i. IV, Hagiographie) Livre des Chapitres. Les vrais Entretiens de saint François de Sales. Vie de saint François de Sales, por seu sobrinho Charles-Auguste (v.i. IV, Hagiographie). 632 33 *HC assinala: Vie dévote, 1824. Traité de l’amour de Dieu e outros escritos de São Francisco de Sales; v.i. “Livres de la Visitation” e IV, Hagiographie. GREGÓRIO le grand, São. Dialogues. HC. INÁCIO DE LOYOLA, Santo. Lettres sur l’obéissance. HC. JOÃO CRISÓSTOMO, São. Homélies. HC. JOÃO CLÍMACO, São. Citado em C 29 (nº 11). * JOÃO DA CRUZ, São. Oeuvres. Paris, Lecoffre, 1849. V.i. IV, Hagiographie. JEANNE-FRANÇOISE FRÉMONT DE CHANTAL, Santa. Ecrits. HC. * Réponses de la bienheureuse Mère Jeanne-Françoise Frémyot, baronne de Chantal... Troisième édition, Paris, 1757. V.i. “Livres de la Visitation”. LA MOTHE (Dom Louis-François d’ORLÉANS de). La Parfaite Religieuse. HC; v.i. IV, Hagiographie. LOUIS DE GRENADE. Oeuvres. HC. OLIER (Jean-Jacques). Introduction aux vertus chrétiennes. HC. RANCÉ (Dom Armand-Jean BOUTHILIER de). Conférences. HC. Conversations de la Trappe. HC; cf. L 204 (“Conversations des enfants de la Trappe”) Relations de la vie et de la mort de quelques religieux de l’abbaye de la Trappe. HC; cf. A ch. 11 Sainteté et devoirs de la vie monastique. HC. RODRIGUEZ (Alphonse). L 326 recomenda os “capítulos 25, 26 e 27 do Quinto Tratado de Rodriguez sobre a oração”; cf. L 351; 1. 104. SCUPOLI (Laurent). Le combat spirituel. HC. heroicamente suportada, em 10 de fevereiro de 1830. AUB 151(1); circular em L nº 304. (13) Pierre Giraud, nascido em Montferrand (Puy-de-Dôme) em 11 de agosto de 1791. Seminarista em Saint-Sulpice em 1812, sacerdote em 1815. Exerce diversos ministérios em sua diocese até 1830. Exerce a função de Bispo de Rodez a partir de 22 de dezembro desse mesmo ano. Permanece em Rodez até a sua nomeação para Cambrai em 1842; Cardeal em 1847, morre em 17 de abril de 1850. AUB 226(1); HC 1830, 1842; L. SERVIÈRES, o.c. 610-623. (14) HC 1832. As Constituições foram redigidas entre 1822 e 1832. Os arquivos da Sagrada Família conservam três manuscritos (1830, 1832, 1834). Acréscimos foram necessários em 1835 e 1840 (por causa das escolas). Remanejamentos profundos em 1845-1846, pelo cônego E. Barthe (HC 1846); leves modificações em 1851; novas redações com poucas diferenças em 1857, 1879, 1934 (Aprovação definitiva em 1944). (15) Sophie Vallon nasceu em Cassagne (Cantal) em 13 de agosto de 1807. Tomou o nome de Séraphine nas Irmãs da União e depois o de Thaïs nas Irmãs da Sagrada Família. Foi a primeira Irmã do ramo não-clausurado. É sobretudo em Decazeville e nos arredores que exerceu seu original e incansável apostolado; falecida em 21 de fevereiro de 1858. AUB 227(1), 237-239, 276-284; HC 1832, 1834, 1837. (16) Pe. Debons, nascido em Figeac em 1754; sacerdote em Cahors em 1778, emigra para a Espanha de 1791 a 1796. Vigário em sua cidade natal de Saint-Thomas e em Saint-Sauveur, falecido em 15 de maio de 1847. AUB 291(1). (17) Lucie Salgues, nascida em 17 de julho de 1796, no castelo de Meuilhac, perto de Figeac. Faz profissão entre as Religiosas de Nevers em 15 de maio de 1815, com o nome de Eléonore, superiorageral de 1842 a 12 de março de 1852, data de sua morte. AUB 292 (1) (18) Paul-Louis-Joseph d’Hautpoul sucedeu, na diocese de Cahors, a Dom de Grainville em 1828, e ocupou a sede até 1842. AUB 302(1) HC 1834; E.SOL, o.c. , 244-268. (19) HC 1835. A respeito das dificuldades que puderam surgir entre Santa Emília e Pe. Marty, ver os últimos parágrafos do cap. 14 da Autobiografia. Terceira secção, abaixo, 1.115 e 119. (20) A cap. 12; C 615; M. 386-387. A propósito de Lugan l. 159, 162. (21) Maxime Debussy, nascido em Rouvray (Somme) em 28 de março de 1791, entrou na Companhia de Jesus desde o restabelecimento da mesma em 1814 e fez seus primeiros votos em 8 de dezembro de 1815. Prefeito dos estudos no Colégio de Saint- 631 34 Acheul, depois diretor espiritual no escolasticado de Vals-près-Le Puy (Haute-Loire). Adquiriu uma grande fama por seus retiros sacerdotais e suas missões. Morreu em 7 de abril de 1852. AUB. 425(1). (22) Jean-François Croizier, nascido em Billon (Puy-de-Dôme) em 2 de novembro de 1787, amigo e condiscípulo de Dom Giraud, sucedeu-lhe em Rodez no ano de 1842; falecido em 2 de abril de 1855. AUB. 428(1); L. SERVIÈRES, o.c., 623-637. (23) Pe. Bénavent, Vigário de Marmont, pretendeu tornar a escola de Marmont independente da Casa-mãe. Escreveu de um modo bastante injurioso a Madre Emília, que lhe respondeu com extrema mansidão. HC 1841; D.L. 169; Anim. 15, 108. (24) Madre Geneviève Sainte-Fleur, cujo nome de família é ignorado, nasceu em Clavier, perto de Figeac em 1765, e fez a sua profissão no Carmelo de Montauban por volta de 1783. Tendo atravessado corajosamente o período revolucionário, teve um papel de suma importância na restauração de numerosas casas de sua Ordem, no Sudoeste. Morreu em Montauban em 31 de janeiro de 1848. AUB. 351-353. (25) Jean Chaudru de Trélissac, bispo de Montauban de 1833 a 1844; na época gravemente enfermo, pediu demissão e foi substituído por Dom Doney. AUB 351(1); HC 1841. (26) Irmã Foi nasceu em 1818, fez profissão em 21 de novembro de 1838. Uma oração repleta de belos sentimentos espirituais, escrita nessa ocasião, ficou conservada (HC 1837-1839). Durante seu superiorato em Montauban-Sapiac, foi acompanhada de perto por Madre Emília que, por vezes, lhe chamou a atenção a respeito de sua independência. Na qualidade de Diretora das Escolas em 1846, fez sofrer Madre Emília (HC 1846) que, entretanto, lhe conservou estima e confiança. Depois de ter sido eleita assistente, em 6 de agosto de 1851, Madre Emília, aos poucos lhe entregou o governo da Congregação. De 1852 a 1882, seu longo generalato forneceu-lhe muitas ocasiões de justificar essas esperanças e esse discernimento. Frente a dificuldades e oposições de todo tipo, soube manter com uma constante energia o ideal original da fundadora. Pos. Fasc. 2, p. 6. (27) O cônego Barthe nasceu em Saint-Afrique, em 1802. Sendo professor do Colégio daquela cidade, escreveu várias obras de filosofia e de teologia e, em 1863, L'Esprit de la Révérende Mère Emilie de Rodat. Sua dedicação perspicaz exerceu-se de modo especial para com a Congregação durante o generalato de Madre Foi. Morreu em 1885, Br. 340 (1); M 479 (1); HC 1845, 1846, 1851. (28) HC 1846: “As duas Mestras de Noviças, Irmã Marie-Mélanie Scudie, para o noviciado de clausura, e Irmã Alphonsine Laforie, para II. Padres da Igreja e autores clássicos de espiritualidade. “Livres de la Visitation.” ALPHONSE de LIGUORI, saint. Obras, HC. *ANSART (André-Joseph). Esprit de saint Vincent de Paul. Lyon, Périsse, s.d. *AUGUSTIN, saint. Les Soliloques, les méditations et le manuel de saint Augustin. Traduction nouvelle... 5ª édition; Lyon, Martin, 1763. HC; cf C 29 (nº 11). BERNARD, saint. Citado em C 29 (nº 11). BERNIÈRES-LOUVIGNY ( Jean de). Le Chrétien intérieur. A. ch.5; cf. notas da primeira secção, 9. CAMUS (Jean-Pierre). Esprit de saint François de Sales, HC. *CLAUDE LA COLOMBIÈRE, bem-aventurado. Oeuvres. Avignon, Seguin, ainé, 1835 (a biblioteca de Villefranche só possui os tomos 6 e 7). *Doctrine spirituelle du Père Berthier, du Père Surin, du Père SaintJure, de M. d’Orléans de La Mothe et de sainte Thérèse. 2ª edição, Paris, Belin, 1803. L 2, 1. 1. FÉNELON (François de SALIGNAC, de LA MOTHE). Oeuvres (précédées de l’éloge de Fénelon par La Harpe). Paris, Ledent, 1837. FRANCISCO DE SALES, santo. Introduction à la vie dévote. HC; L 3; 1. 2 (Saint François de Sales et sa Philothée). *Traité de l’amour de Dieu. Nouvelle édition... revista e ligeiramente corrigida por M. Bonvallet des Brosses..., Paris, Saint-Michel, 1813 (a biblioteca de Villefranche possui apenas o T. 1). 35 630 as linhas impressas dessa etiqueta, se lê, escrito a mão: “Este livro pertence a Madelle de Selves.” Sobre a primeira página branca do início, com uma caligrafia de criança: “Este livro pertence a Emília rodat rodat (sic).” É certo que ela o utilizou em Ginals. I. Sagrada Escritura. *BERTHIER (Guillaume-François). Les Psaumes traduits en français avec des notes et des explications. Paris, Mérigot le jeune, 1785. HC; cf. L 273; 1. 89. BONNETY. Vie de Notre Seigneur Jésus Christ. HC. LHOMOND (Charles-François). Vie de Notre Seigneur Jésus Christ. HC. LIGNY (François de). Vie de Notre Seigneur Jésus Christ. HC; cf. L 574 e D 95 ( nº 41). MÉSANGUI (François –Philippe). Vie de Notre Seigneur Jésus Christ. HC. *OSTERVALD. Nouveau Testament. Paris, Smith, 1831. Le Saint Roi David. Livro pedido com esse título na L 3; 1. 2. * Le sens propre et littéral des Psaumes de David exposé brièvement dans une nouvelle interprétation suivie, avec le sujet de chaque Psaume. Nova edição, Paris, Hérissant, 1755. * Idem. Treizième édition, Paris, Montallant, 1774. - É certamente o que HC chama: Explication des Psaumes. VENCE (Henri-François de). Bible. HC. o noviciado das Escolas, foram substituídas por Irmã Joseph Delcamp.” (29) Basile Abbal foi superior-geral de 1846 a 1858. Nascido em Labiras, paróquia de Mélagues(Aveyron) em 3 de março de 1799, exerceu sucessivamente os cargos de Vigário de Gissac (1832), de secretário e, em seguida, de vigário-geral (1840-1846). Algumas de suas decisões fizeram sofrer Santa Emília (HC 1846, 1851, 1852); contudo, prestou eminentes serviços à Congregação no plano pedagógico em particular, no qual trabalhou em colaboração com Irmã Angèle Pouget. (HC 1849-1852). Deu, igualmente, um vibrante testemunho da santidade de Madre Emília numa carta endereçada a Pe. Fabre, em 24 de junho de 1880 (DEc 16-29). (30) Desde 1849, o superior-geral teve a intenção de redigir um método para os professores e começou o trabalho. Seu Manuel d'enseignement foi publicado em janeiro de 1850, com uma impressão em trezentos exemplares por Prosper Dufour, em Villefranche. HC 1849-1850 V.i., terceira secção, nota da carta 192. (31) Por exemplo, quando a maioria do Clero quis suprimir os exercícios da Confraria de Nossa Senhora das Vitórias, praticados na Capela do Convento, Madre Emília estava prestes a ceder, mas a população de Villefranche, no seu conjunto, tomou o partido das religiosas e enviou uma petição a Dom Croizier, que lhe deu uma resposta favorável. A propósito da devoção marial de Santa Emília, notemos que, favorecida com graças especiais na compreensão do mistério da Paixão, ela acolheu imediatamente a “mensagem” da Salete. Br 331332. v.i. segunda secção, II, nº 29. (32) Para uma noção global do movimento missionário na França, no século XIX, cf. DS V 988-991. A obra da Santa Infância tinha sido fundada em 1843 por Charles de Forbin-Jeanson, bispo de Nancy (1785-1844). HC 1852; Ms aut 46; L 214-215. (33) O texto integral do Testamento Espiritual poderá ser lido na segunda secção, III. Em 2 de março de 1852, Madre Emília escrevia a Pe. Abbal: “Tenho a honra de lhe enviar uma cópia do Diretório. Se o senhor o aprovar, desejamos fazê-lo imprimir. O Sr. Dufour só nos pediu 120 francos para imprimir 350 exemplares.” HC 1852. (34) CF 54 (35) Mais adiante, encontrar-se-ão duas “confissões” escritas por Santa Emília, primeira secção, II, 7. Numerosos relatos da doença e dos últimos momentos da Fundadora nos depoimentos que foram conservados: CF 58ss.; DF 131 ss.; DL 179 ss., DA 64 ss.; DM por inteiro. 36 629 a solicitude dos fundadores em matéria de leitura. Quatro anos mais tarde, em 27 de dezembro de 1828, Madre Emília escreve de Aubin à Comunidade de Villefranche: “Irmã Louise, que saúdo afetuosamente e que agradeço pelas notícias que me dá, me pergunta qual o livro a ser lido durante as refeições. Se houver alguma vida de Santo Inácio e da Santa Madre de Chantal, seria bom fazê-lo. Poderiam ler igualmente a explicação dos salmos de Berthier, um pela manhã, outro à tarde. Será bom renovar-nos a respeito da atenção que devemos dar à leitura às refeições” (L 273; 1. 89). Quanto aos três livros pessoais de Santa Emília, eis sua descrição sumária: Imitação de Jesus Cristo. In-12 de 544 p. As quatro últimas páginas dão as vésperas do domingo. As quarenta e seis primeiras foram perdidas. De acordo com a linguagem e a ortografia, parece ser uma edição do século XIX. Les heures ou Ofíce de la sainte Vierge, à l’usage des Filles de la Visitation. In-12 de XLIV-552 p. Falta a página do título, mas o privilégio do rei data de 1676. Por outro lado, uma etiqueta manuscrita, colada no interior da primeira carta, indica: “As horas ou Ofício de Nossa Senhora ao uso das Filhas da Visitação, impressas em 1726 e da qual nossa Venerável Madre se servia habitualmente.” – A obra contém, além do ofício propriamente dito, muitas outras fórmulas de orações, litúrgicas ou não. Petit Catéchisme historique. In-12 de 182 p. Mais uma vez, a ausência da página do título não permite precisar o lugar e a data da edição. Uma aprovação de louvor feita por Bossuet data de 12 de maio de 1683. Apresentada do mesmo modo que a obra precedente, uma etiqueta impressa diz o seguinte: “Nova edição / Tomo 1 / Paris / em Pierre e François Emery / bairro dos Augustins, na esquina da rua Gist-le-Coeur, ao Escudo de França, M.DCCV.” Pode-se perguntar se essa indicação convém ao livro que não parece comportar vários tomos. Entre 628 6º Autobiografia (A) 7º Manuscritos autográficos (Ms aut.). Às vezes, restituímos o nome dos autores, a maior parte do tempo omitido pela muito rudimentar lista de 1832. Nessa lista e em outras, os títulos são muitas vezes mal escritos. Nós os guardamos e sublinhamos. A casa geral de Villefranche ainda possui alguns livros daquela época. Serão descritos com mais detalhes, e seu título será precedido de um asterisco. Vários desses livros não estão na lista de 1832. Dentro dos quadros da classificação seguinte, a ordem permanece puramente alfabética. A consulta a essa nomenclatura bastante breve não apresenta dificuldades. Algumas notas, entretanto, querem simplificá-la ainda. Foram colocados entre colchetes os nomes das pessoas a respeito das quais um livro foi escrito, ou foi feita alguma alusão. É claro que, muitas vezes, Santa Emília só conhece um autor ou uma obra de modo indireto, por alguns trechos. De início, poderão ser lidas duas citações de interesse muito geral, tiradas da correspondência; em seguida, a descrição de três livros pertencentes a Santa Emília e conservados, hoje, no seu quarto. * * * Uma carta de 24 de junho de 1824, escrita à superiora de Aubin, Irmã Agathe Masbou, já prescreve: “Combinamos com nosso Padre [Marty] que só poderíamos ler os livros indicados no catálogo que lhe envio. Você tem razão ao pensar que estava em falta por causa do que Irmã N. tinha lido. Devia consultar a esse respeito. Essa querida Irmã correu grandes perigos” (L 95, 1. 29). A nomenclatura a que se refere Santa Emília não chegou até nós. Essas linhas têm, pelo menos, o interesse de manifestar PRIMEIRA SECÇÃO ___________ EXPERIÊNCIA RELIGIOSA PESSOAL de SANTA EMÍLIA APÊNDICE __________ Anotações a respeito das leituras espirituais das primeiras religiosas da Sagrada Família e da fundadora Reunimos aqui os títulos de livros espirituais indicados nos seguintes documentos: 1º L. AUBINEAU, Vie de la Vénérable Mère Emilie de Rodat, 6ª ed., 1891, p. 96, nota 1: Lista dos “Livres de la Visitation,” legados à comunidade por Agathe de Pomairols em 1819. 2º Histoire de la Congrégation – Para o ano de 1832, ela faz um inventário sumário de bibilioteca, ao qual acrescenta alguns títulos de livros adquiridos posteriormente (HC). 3º Dépositions de la Soeur Laurent Belloc, 114-115 (DL). 4º Conferências e Diálogos, cujas citações ou simples alusões biográficas fornecem algumas informações (C e D). 5º Cartas, onde às vezes Santa Emília pergunta, julga, aconselha (L; 1. designa uma carta da terceira secção). 39 626 AUTOBIOGRAFIA ___________ Os manuscritos atribuem a este documento o título seguinte: Vida da Madre Marie-Guillemette-Emilie de Rodat, fundadora da Congregação da Sagrada Família, ditada por ela mesma a seu confessor. As deposições de Pe. Fabre atestam que, desde 1843, ele pediu à sua dirigida lhe confiar lembranças autobiográficas, seja de viva voz, seja por escrito. Pertencem a esta última categoria os textos intitulados: Virtudes de seus pais (Ms aut 2-4; cf. A cap. 1 e 2); Tentações (título dado ele também depois, Ms aut 5-7, cf. A cap. 10); Narração dos pecados (Ms aut 7-9). Quatro anos depois, em 1847, ele experimentou, sem dúvida, lançar novamente uma comunicação que devia ser bastante limitada e não terminar de fato senão nos últimos dias da santa. O confessor escreve, com efeito, a propósito do 7 de setembro de 1852: "Eu lhe perguntei (ainda) se ela estava certa de não ter mais nada a me fazer conhecer relativamente à sua vida que eu tinha escrito ditada por ela havia cinco anos mais ou menos. A Madre me respondeu que teria ainda muitas coisas a dizer... Eu escrevi várias páginas ditadas por ela..." 1 Estas últimas confidências situam-se, pois, do 7 ao 11 de setembro de 1852. Tudo convida a crer que Pe. Fabre se mostrou um redator fiel. Entretanto, é preciso assinalar desde agora que existem leves variações entre os autógrafos mencionados acima e os capítulos que lhes correspondem na Autobiografia. Não possuímos as notas tomadas pelo capelão à medida que Santa Emília prosseguia seu relato: entre 1852 e 1863, ele próprio as ditou à Irmã Marie-Séraphine Tauriac. Ainda existe o caderno escrito então por ela. Ele 625 40 foi controlado por Pe. Fabre que uma ou outra vez apôs sua assinatura e corrigiu com sua própria mão uma ou duas expressões apenas. Esse caderno é, por isso, considerado como o "autêntico" e serviu para a edição de 1958. No entanto, ele em nada difere daquele que preencheu, sempre escutando Pe. Fabre, a Irmã MarieAurélie Baldeyroux, por volta de 1872. Ela diz a esse respeito: "O que chamamos a vida da venerável Madre Emília foi ditado por Pe. Fabre a duas ou três religiosas e eu sou uma delas. As outras morreram" (Ms aut 14). Quase todas as assinaturas de Pe. Fabre que figuram no caderno precedente estão aqui reproduzidas, mas, manifestamente, pela mão da escriturária. O leitor encontrará em seguida o texto integral dessa Autobiografia, importante do ponto de vista documentário e notável sobretudo no plano espiritual. Para completar as informações relativas à cronologia e às pessoas de quem ela trata, gostaríamos de nos reportar à introdução e às suas notas. Observemos, definitivamente, que a composição muito simples, o estilo "falado", muitas vezes pouco elaborado, por vezes apenas correto, fornecem uma garantia de autenticidade bastante séria. Veremos aí de bom grado o sinal de um ditado muitas vezes longamente interrompido. A afirmação de Pe. Fabre no final do capítulo 15 parece inteiramente exata: "Eu conservei, tanto quanto possível, a própria expressão da qual se servia a serva de Deus. O que acrescentei foi apenas para tornar mais claro seu pensamento." ________________ _________ (1) Cf. Br 315-384, AUB 362-404, e os discursos reproduzidos em livros comemorativos diversos (v.s. bibiliografia). Não tratamos, nele mesmo, do delicado problema das influências literárias. A de São Francisco de Sales e da Visitação certamente é fundamental. Contribui para dar seu caráter de benevolente doçura à espiritualidade de Santa Emília, sem, entretanto, alegrá-la muito: autores austeros (v.g. Rance, tradutores da Bíblia mais ou menos “jansenistas”, etc.), com certeza desempenharam um papel eficaz (cf. Apêndice). Aliás, Santa Emília sofreu bastante para, ao mesmo tempo, irradiar a paz e estar desprovida de certas formas de contentamento. (2) São CIPRIANO, Líber de bono patientiae III, Patrologia latina, 4, 623; MINUCIUS FÉLIX, Octavius XXXVIII, Ibid, 3, 357. (3) M. BLONDEL, L’Action. Essai d’une critique de la vie et d’une science pratique, Paris, Alcan, 1893, 476-477. 624 refletindo sobre problemas muito tempo negligenciados por seus colegas, retomava com vigor as lições de uma experiência espiritual cristã. Algumas de suas linhas parecerão bem citadas aqui com a finalidade de caracterizar esse gênero de “doutrina”: “Não é necessário saber tudo o que se faz para fazêlo com conhecimento de causa. O pensamento eficaz não é necessariamente um sistema completo de abstrações analíticas... É uma síntese concreta que, em cada disposição interior, pode resumir, na consciência, todo o trabalho da vida... Mesmo sem ser acompanhada de nenhuma justificação teórica, a ação carrega em si uma certeza suficiente; constitui um método concreto; é um experimento no sentido mais científico da palavra: experimento rigoroso e demonstrativo que supre o estudo especulativo, mas que nada pode suprir. O entendimento confirma o método prático mostrando que nem precisa ser confirmado. A conclusão de uma ciência da ação não deve ser: “Eis o que precisa pensar, crer ou fazer”; o que é isso? Deve ser agir de fato. Tudo consiste nisso, tudo. “Assim o caminho direto é aquele que parte do ponto a que o método indireto da ciência quer nos levar. Pois não se trata de um problema a resolver, se possível, e sim de um projeto a realizar se o quisermos: uma solução é sempre inevitável, por isso é mais urgente prepará-la do que prevê-la. Considerando esse fim necessário, a previsão é facultativa, a preparação é obrigatória. Preparar-se abrindo o caminho que não está feito de antemão, agindo segundo a verdade antes de vê-la claramente, enchendo-se de realidade para merecer a luz, é a ciência sempre acessível e única indispensável para quem não possui outra. A ascética é uma verdadeira ciência e a única ciência da direção das consciências: ela ilumina aqueles que nela se exercitam e lhes permite esclarecer os outros pela perfeição de uma delicadeza que dá a esse tato interior da prática toda a precisão da vista.”3 41 CAPÍTULO I Nascimento da Madre. Virtudes dos seus antepassados e de seus pais Nasci em 6 de setembro de 1787, no castelo de Druelle, paróquia de Saint-Martin-de-Limouze, perto de Rodez, Aveyron. Meus pais foram: Jean-Louis-Guillaume-Amans de Rodat e Henriette de Pomairols. Fui batizada no dia seguinte ao do meu nascimento, na Igreja de Saint-Martin-de-Limouze. O Sr. Guillaume de Rodat, meu avô, foi meu padrinho, e Marie-Marguerite de Pomairols, minha avó, a madrinha. Sou de uma família de santos. Se tenho algumas virtudes, devo-as aos bons exemplos que tive sob os olhos e à boa educação que meus pais me deram. O Sr. de Ramondy, meu trisavô, natural de Najac, despojou-se de seus bens em favor dos pobres, num tempo de fome. Os habitantes de Najac votavam-lhe grande veneração. Diziam aos seus filhos: "Quando passarem diante de casa do Sr. De Ramondy, tirem o chapéu; é um Deus sobre a terra." A Sra. de Selves, minha bisavó e filha desse homem de bem, foi digna herdeira das virtudes do pai; nela residia o espírito de misericórdia. Levantava-se às vezes da mesa para dar aos pobres o prato que lhe haviam servido. Teria tirado o pedaço de pão da boca para lhes dar. Todos os dias rezava o Ofício de Nossa Senhora. Sua devoção era generosa, atraente e sem escrúpulos. Atenta ao serviço da casa, vigiava tudo de forma que a mais perfeita ordem reinava nos seus negócios e no seu lar. 42 A boa educação que ela tinha dado a minha avó, sua filha única, comunicara a essa as virtudes das quais ela própria era o modelo. Nossa Senhora a havia conservado por um especial favor e ainda a conservou depois de casada. Eis como se passou isso: pouco depois do seu casamento, minha avó adoeceu de varíola. Esteve tão mal que ninguém esperava sua cura. Um dia, em que estava pior, viram-na, subitamente, em grande agitação; sobreveio abundante suor; julgaram que seu fim havia chegado. Instantes depois abre os olhos e diz: "Estou curada, dêem-me de comer." A primeira coisa que encontraram ali foram umas amêndoas confeitadas que ela comeu com satisfação. Afirmou, em seguida, ter visto dois homens que a queriam carregar, quando, de repente, uma bela dama apareceu e lhes ordenou deixá-la. Essa visão inspirou-lhe terna devoção para com a Santíssima Virgem. Em toda a sua vida conservou preciosamente a lembrança dessa graça que várias vezes me contou. Minha avó tinha sempre consigo uma imagem de sua querida benfeitora e a olhava com amor. Como sua mãe, ela rezava todos os dias o Ofício de Nossa Senhora e era o amparo dos pobres e doentes que vinham pedirlhe remédios, pomadas preparadas por ela própria e que Deus abençoava, pois, muitas vezes, os doentes ficavam muito aliviados e mesmo curados. Havia ainda na família dos Pomairols uma jovem de nome Charlotte, considerada como santa. Muito tempo após a sua morte, encontraram-lhe o corpo perfeitamente conservado. Minha avó paterna tinha grande espírito de fé. Ela deixou sua paróquia de Saint-Martin-de-Limouze porque aí havia um sacerdote intruso e retirou-se para a de Ampiac. Meu pai tinha duas irmãs religiosas de Nossa Senhora em Rodez. Ele era extraordinariamente severo 623 Com certeza, não a encontraremos na originalidade de uma intuição ou de uma síntese dogmática nova, nem mesmo numa invenção institucional no estabelecimento ou na manutenção dos “dois ramos”. Porém, é preciso destacar o sentido profundo dessa disposição: por meio de dois estilos de vida distintos, ela expressa a complementaridade das duas funções que a caridade coordena em toda existência cristã. De um lado, a função “individual,” ora ascética, ora contemplativa passiva; numa palavra, o momento de inspiração animadora, a solidão com Deus no deserto. Por outro lado, a função “social”, ministerial, benfazeja e apostólica: desabrochar concreto do gesto animado pela graça, expressão para o outro da palavra que ela sugere. O ritmo – sempre ameaçado, instável, sujeito à perfeição – dessa complementaridade dinâmica é função da viva caridade “que passa antes de tudo”. É bem por isso que Madre Emília tantas vezes a recomenda em suas exortações, conversas, cartas e, finalmente, em seu testamento espiritual, exaltando, logo depois, o próprio amor de Deus, a união no seio do Instituto e das comunidades que o compõem. Por isso, igualmente, quando se refere a determinações mais particulares, ela insiste, sem ser exclusiva, ora sobre a vida orante e oculta, solitária e penitente, que tem seu exemplo ideal no lar de Nazaré, em seguida na Paixão de Nosso Senhor, ora, sobre a vida de dedicação, entregue aos serviços que aliviam e trazem a paz àqueles que podem ser atingidos de imediato, num mundo que aspira à redenção. Em última análise, o ensinamento de Santa Emília encontra-se sobretudo no exemplo de sua vida e na sua inspiração carismática de fundadora, aliás parecida com outras. “Christiani non magna loquuntur, sed vivunt”, escrevia São Cipriano, retomando uma palavra de Minucius Félix, muitos séculos antes da Santa. Quarenta anos após a morte de Madre Emília, um filósofo, 622 irrevogável determinação que jorra em 1815: “Serei a educadora dos pobres”, prolifera em uma imprevisível seara de realizações: obras e serviços nos quais a beneficência corporal se associa ao ministério da consolação moral e sobrenatural. Essa determinação manifesta, sobretudo nos últimos tempos, o zelo missionário da propagação da fé no meio dos pagãos. É em vista disso que, durante doze anos, o Senhor concedeu cada dia a Santa Emília o perdão sacramental, dando-lhe a paz que vai além dos sentimentos. Enfim, da mesma forma que o serviço exercido pelo Cristo atiçava o furor do adversário e suas perseguições, assim também, em muitas ocasiões, aconteceu com a dedicação da fundadora. Várias de suas tentações e angústias podem, sem dúvida, ser atribuídas à inveja do demônio, assim como certas dificuldades no momento da abertura de novas casas. Ao longo do caminho em que avançava fazendo o bem, apareceram pessoas com má vontade declarada ou disfarçada. Mais misteriosas e dolorosas foram as incompreensões e dureza de quem a cercava, e quem em certos momentos tomava uma inexplicável posição contra a Madre. Isso, para ela, constituía uma forma bem real de “perseguição”, sem causa, sem que o menor desvio mórbido a aumentasse. Esses procedimentos só fizeram suscitar o aniquilamento e o perdão. Esse revelou-se fecundo, levando a maior parte dos culpados a reconhecerem a paciência de Deus manifestada em sua serva. Não pretendemos ter esgotado, nestas linhas, uma descrição da perfeição espiritual de Madre Emília; seus biógrafos e panegiristas abordaram o assunto em outros pontos talvez mais sugestivos. Aliás, pode-se falar de uma “doutrina espiritual” que lhe seria própria? 43 quanto à moral; grande era a sua retidão de caráter. Jamais contrariou na mínima coisa minha vocação. Na velhice converteu-se e praticou muitas virtudes com grande zelo. 2 Minha irmã Eléonore era também um modelo de virtude. Seus exemplos me impressionavam durante a época de minha tibieza e, quando me converti e me entreguei à prática do bem, notei que ela era muito mais piedosa do que eu. CAPÍTULO II Infância de Madre Emília. Primeira Comunhão. Elevada por Deus a sublime grau de oração3 Quando tinha apenas dois anos, minha avó levou-me para Villefranche. Logo que atingi a idade da razão, ensinou-me a amar a Deus. Uma de minhas tias, religiosa Visitandina, prodigalizou-me juntamente com ela, os mais ternos cuidados. Ambas vigiavam-me alternadamente, mas, de modo tão suave, que eu me sentia bem sob essa vigilância, apesar de muito contínua. Elas não queriam perder-me de vista. Se me encarregavam de um recado, recomendavam-me que voltasse logo. Não me deixavam ir só à cozinha. Em lugar de me imporem alguma coisa, quando queriam obtê-la de mim, insinuavam-me, faziam-me desejá-la. Quando eu cometia alguma falta, não me repreendiam nem mesmo me castigavam. Não me lembro de haver sido alguma vez punida; entretanto, nada toleravam contra os meus deveres: um aviso ou simplesmente um olhar era suficiente para que eu reconhecesse minhas faltas. Quando muito pequena, tinha o defeito de amuar-me; ia-me colocar no ângulo de uma janela; então, minha avó dizia-me: "Emília, vem cá, perto de mim." Quando eu satisfazia seu desejo, ela acrescentava: "Olha para mim. É preciso sorrir." Eu emperrava, mas ela persistia até que 44 meu rosto se tivesse desenrugado e retomado seu aspecto comum. Era chorona: suavemente ela trabalhou para corrigir-me desse defeito; exigiu que me confessasse dele, o que muito me custou. Foi preciso que ela me conduzisse ao confessionário. Concedia-me as pequenas satisfações próprias de minha idade e me formava pouco a pouco para coisas mais sérias. Quando fiquei maior, ela controlava muito minhas leituras. Meu tio tinha romances: a entrada em seu gabinete me foi proibida. Um dos principais cuidados de minha avó era o de inspirar-me, em qualquer ocasião, a mais perfeita modéstia: de pé ou deitada, era preciso que meu corpo tivesse uma posição e movimentos corretos. Nos jogos e nos brinquedos, ela exigia de mim a mesma atenção. Formava-me um critério sólido e sentimentos delicados. Chamava-me a atenção para qualquer falta contrária às boas maneiras. Quando eu fazia o bem, recompensava-me com um olhar amável, com um gracioso sorriso. Minha tia fazia a mesma coisa e eu ficava mais satisfeita com isso do que se me tivessem dado um prêmio. À tanta doçura minha avó unia grande firmeza quando isso era necessário. Quando me dava uma ordem, eu tinha de executá-la; se replicasse, ela esperava, mas tinha de fazer o que ela ordenara. Eu era preguiçosa: minha avó esperou pacientemente que a idade me fizesse conhecer o valor do trabalho. Eu era também muito exigente quanto à alimentação, não podendo decidir-me a comer uma grande quantidade de comidas de que não gostava. Ela pensou que apenas a razão me faria vencer minhas repugnâncias, o que aconteceu efetivamente. Minha tia dava-me tarefas escolares e de modo que eu as fizesse com satisfação. Se queria que eu lesse um livro, inspirava-me o desejo dessa leitura. Era a mesma coisa para o estudo. Gostava de surpreendê-la fazendo mais do que ela me mandara. Tomei tal gosto pelo estudo e pela leitura que não podia me saciar. Era um pouco curiosa e queria tudo compreender. Sobrecarregava com 621 vestígios e as semelhanças com o Senhor, no mundo que ele restaura em si mesmo. Bem-aventurança da pobreza. Sabemos com que rigor a jovem, antes mesmo de sua entrada na vida religiosa, partilhava a condição dos pobres no que diz respeito à habitação, ao alimento, ao vestuário, etc. E sempre foi assim: sua devoção para com São Bento Labre ou Santa Germana Cousin manifestava uma disposição interior. Sua cela, sem dúvida, permaneceu uma das mais despojadas do convento, os cortes de tudo que pode favorecer o bem estar se revestem um caráter inimitável, mas desafiam as críticas do bom senso limitado. As doenças freqüentes não a deixaram agir livremente. Espontaneamente e devido a circunstâncias diversas, teve de renunciar às riquezas da cultura e permanecer num nível de vida médio. Geradora de humildade, essa pobreza real vivida em pleno consentimento de espírito lhe dava uma posse antecipada do Reino. Vemos isso no modo muito simples com que tratava de todas as coisas com Deus, com a Sagrada Família e com a Igreja do céu; pelos prodígios materiais realizados; mais profundamente, pela discreta influência que exercia sobre as almas, abrindo-as à soberania do Senhor e ao desejo dos bens messiânicos. Dessa maneira, sua pobreza desabrocha na esperança e num total abandono à Providência. Quer se trate dela mesma quer de seus empreendimentos, após ter feito tudo para um bom resultado, apoiada em Deus, ela lhe confia, com um coração filial e sem preocupações vãs, um sucesso que não depende mais de suas atividades. Livre das reivindicações da cupidez, aquele que vive a familiaridade com Deus só pode irradiar a misericórdia: assim, em Santa Emília, os progressos da desapropriação intensificam a ação e a paixão em vista do alívio dos outros. Sua inteligência cordial adivinha e assume seus sofrimentos. As religiosas podiam falar com ela a qualquer hora e confiar à sua compreensão problemas até mal confessados ou explicitados. A 620 Quando evoca a sua infância, denuncia um amorpróprio sombrio e susceptível, mas a firme educação recebida em Ginals ameniza um pouco as asperezas de seu caráter: sempre terá de deplorar seu orgulho. Fica bem claro que a excepcional luz infundida por Deus devia pôr em relevo os sobressaltos desse defeito comum a todos nós, tanto mais que Emília era inclinada a fazer uma introspecção analítica, sem dúvida excessiva. Um pouco de pessimismo ou, pelo menos, uma certa desconfiança em relação a certos valores naturais e humanos se desenvolveu em razão desse fechamento e de influências religiosas ou culturais exteriores. Várias faltas acusadas pela Santa se compreendem melhor se se toma em consideração uma habitual hipotensão vital compensada, só em parte, por sua energia moral. Entretanto, seria totalmente errado explicar com isso todas as modalidades de sua mortificação ou de suas angústias interiores. O caráter e a saúde frágil, com certeza, as condicionaram. Sua causa verdadeira é de ordem espiritual e sobrenatural. “Bem-aventurados os corações puros...” A autenticidade e exclusividade do amor que dedica a Deus em Jesus Cristo aparecem nos sacrifícios que aceita: separação dolorosa – ela não esconde – dos laços da família; renúncias necessárias para salvaguardar a universalidade assim como a intensidade de sua afeição para com suas religiosas: nesse ponto, igualmente, afirma ter travado duros combates. Essa purificação ativa, aliás em relação aos acontecimentos, é acompanhada de uma purificação passiva da qual o décimo capítulo da Autobiografia só pode dar uma idéia incompleta. Na privação quase contínua dos sentimentos unida habitualmente, às virtudes teologais, ela atinge uma muito humilde familiaridade com Deus. É assim que em sua própria noite ela pode “vê-lo”, não só quando um raio de luz rasga, por um instante, as trevas mas ainda em virtude de uma perspicácia superior que discerne os 45 perguntas a minha avó. Essa alimentava minha ardente curiosidade com boas leituras. A da vida dos santos me comovia muito. Queria seguir-lhes as pegadas e imitar todos os exemplos de virtudes que eles deram. A Sra. de Selves, mãe de minha avó, vivia conosco. Embora estivesse caduca prestou-me grandes serviços. Durante toda a vida havia praticado eminentes virtudes, cujo exercício ainda conservava, apesar de ter perdido uma parte da razão. Eu digo uma parte porque, nas coisas de Deus, ela não dizia tolices. Continuamente voltada para Deus, orava sem cessar. Enferma, não podia trabalhar mas recomendava-me incessantemente que eu mesma o fizesse. Comprazia-me em lhe fazer companhia e ouvi-la rezar com fervor por toda a família. Dizia muitas vezes: "Meu Deus, quando vos verei face a face sem receio de perder-vos? Querer o que Deus quer é a única coisa que nos pacifica", dizia ela ainda muitas vezes, bem como outras aspirações inflamadas. Ela me amava muito e creio dever às suas orações uma parte das graças que Deus me concedeu. Ela tinha obtido esse grande fervor por uma vida plenamente virtuosa, uma paciência que nem as injúrias nem os maus tratos podiam alterar, uma humildade profunda que a mantinha sempre em seu nada. O seu desapego era tão grande que não queria mesmo se fizessem mais roupas para si. Dizia que não era necessário, pois morreria logo. Desfizera-se até de sua aliança. Minha avó, como já o disse, era a perfeita imitadora das virtudes da Sra. de Selves, sua mãe, e os bons exemplos que ambas me davam me comoviam profundamente. Minha avó morreu numa velhice feliz. Ela temera muito a morte durante toda a vida e, quando chegou o momento, suas apreensões transformaram-se em doce confiança. Viu chegar a morte com uma profunda paz. Ela mesma preparou as bolas de algodão que deviam servir para lhe administrar a Extrema-Unção. 46 Volto a falar dos meus defeitos, pois devo acrescentar àqueles de que já falei, que o amor próprio e o orgulho manifestavam-se em todas as ocasiões. A mínima falta de consideração feria-me, tornava-me às vezes mal-humorada. Queria ser respeitada. Um dos meus priminhos quis uma vez beijar-me; repeli-o logo com um tapa. Fiz isso com um movimento espontâneo e natural, sem nenhuma malícia, pois não era maliciosa. Achavam que eu era mansa. Jamais me queixava, exceto quando me ameaçavam de revelar meus defeitos ao confessor; então, murmurava. Amava a verdade. Jamais menti. CONCLUSÃO Caiu-me nas mãos um cântico que produziu em mim um recolhimento profundo e admirável. Começava a amar a Deus de todo o meu coração, embora quase não o conhecesse, pois minha inteligência não estava ainda desenvolvida. Rezava com fervor, pois Deus já me havia dado aquele ardor que faz encontrar verdadeira satisfação na prática do bem. 4 Ao término dessas páginas nas quais foi Santa Emília, sobretudo, quem falou, gostaríamos de destacar alguns aspectos de sua pessoa e de seu ensinamento. Amava muito os pobres e dar-lhes esmola era para mim real contentamento. Conhecedora do meu atrativo, uma moça piedosa, de nome Marianne Gombert, 5 costureira, levava-me às vezes com ela para visitá-los. Dava-lhes o dinheiro que possuía. Um dia, após haver esvaziado minha bolsinha, estava desolada por não ter mais nada para dar. Disse-o a meu avô, pois era ele que ordinariamente a enchia. Vendo minha dor, deram-me mais dinheiro que fui distribuir na companhia de Marianne. Tínhamos um escudo (três francos), visitamos vinte doentes e não demos a cada um menos de trezentos réis; a diversos, quatro e mesmo cinco. Quando terminamos a distribuição, a bolsa que eu própria levava e na qual não havíamos posto senão três francos ainda não estava vazia. Verificando essa multiplicação, Marianne exclamou: "Providência!" Essa moça piedosa fora abandonada por seus pais e, __________ Se considerarmos a “natureza” com que a divina Providência a dotou, percebemos talentos muito apreciáveis ao lado de fraquezas e fragilidades que faziam apelo à solicitude do Senhor. No aspecto intelectual, Emília é, certamente, bem privilegiada. Desde a infância, manifesta gosto e facilidade para o estudo. Mais tarde, sofre por não poder ler por causa da doença. Por um lado, esta inteligência parece ser mais positiva, prática e organizadora do que especulativa. Madre Emília dará provas disso por sua maneira de governar e de administrar. Os contemporâneos lhe reconhecem um realismo feito de intuição, de imaginação criadora, de larga visão e prudência. Uma vez religiosa, nada fez para aumentar, por simples curiosidade ou por orgulho, uma instrução bastante elementar. Seu constante amor à natureza revela finalmente as felizes disposições de seu gosto. Os dons afetivos harmonizam-se nela com os do espírito e a aptidão para realizar. É profundamente boa e simpática, sabe dedicar-se e entrar em comunhão com o outro com retidão. 618 47 entretanto, tratou deles com carinho quando ficaram velhos. Os pobres veneravam-na. Com onze anos de idade, fiz a primeira comunhão na capela do castelo de Ginals, um dos domínios da família de Pomairols, para onde nos tínhamos retirado durante a tormenta revolucionária. Não pude preparar-me bem para esse grande ato devido ao deplorável estado de época, mas estava revestida de inocência. Tinha tão pouca compreensão que, voltando da mesa da comunhão, me surpreendi a brincar com os dedos. Digo isso para que as pessoas escrupulosas não acreditem que tudo está perdido quando uma criança ainda é irrefletida na época de sua primeira comunhão. Se ela é inocente, Deus mesmo se colocará no seu coração e agirá nela como fez comigo. Ele se apoderou de todas as faculdades de minha alma e logo me senti atraída pelo santo exercício da oração mental. Deus a fazia em mim e eu encontrava tanto gosto nesse santo exercício, experimentava nele tanta consolação que não posso falar disso sem chorar. Todas as noites, retirava-me ao quarto em que morreu a Sra. de Selves, minha bisavó, e ali, naquela penumbra favorável, entretinha-me suavemente com Deus, meia hora, às vezes uma hora, conforme o atrativo que sentia. Ninguém sabia o que eu ia fazer ali; percebia, contudo, que meus pais estavam contentíssimos vendo-me tão piedosa. Gostava de contemplar os encantos da natureza, de meditar no campo à margem de um riacho. Apreciava muito a leitura e entregava-me a ela com ardor. Não tinha relações a não ser com os meus parentes e com a família Dulac que era inteiramente patriarcal e cujos membros cumpriam fielmente seus deveres de cristãos. Havia nessa família uma jovem muito piedosa, mais ou menos da minha idade, éramos muito amigas e íamos passear juntas comentando nossas piedosas leituras. Considerava todos os rapazes como meus irmãos e não 48 617 suspeitava que com eles se pudesse praticar algum mal. Inscreveram-me na confraria do Santíssimo Rosário. CAPÍTULO III Na idade de 14 anos, a Madre abandona o santo exercício da oração mental. Passa dezoito meses em estado de tibieza. Perigos a que fica exposta; proteção da divina Providência Tinha eu cerca de 14 anos quando, um dia, rezando, fazendo a meditação no quarto onde morrera minha avó, a Sra. de Selves, de quem já falei, senti um desses pavores infantis: julguei revê-la e saí correndo daquele aposento e não tive mais coragem de retomar o santo exercício da oração mental. Logo que abandonei esse exercício, comecei a relaxar nas minhas confissões. Meu diretor, percebendo que eu decaía, recomendava-me que pedisse fervor a Deus. Determinou que comungasse de quinze em quinze dias. Isso me sustentava um pouco. A diminuição do fervor ia sempre crescendo e logo foi rápida. Deixamos Ginals e voltamos para Villefranche. No começo, a permanência na cidade não me agradou; achei porém, aí, amigas virtuosas, o que mitigou um pouco meu aborrecimento. Às vezes visitava os pobres, mas, na prática do bem, temia ser inspirada por motivos humanos e, depois, queria evitar parecer piedosa. Escondia-me de meus pais para cumprir os exercícios de piedade. Meu confessor disse um dia a alguém que, se eu me desviasse, iria longe. Estava lendo, uma noite, perto de uma mesa, quando ouvi a voz do meu avô, recentemente falecido, que me chamava. Levanto-me, olho em torno e nada vejo. Não senti o mínimo pavor. Gostava de Henri de Grammont, – 196 (1) A confiança não é idêntica à esperança teologal. Parece, porém, que do ponto de vista psicológico (e, por conseguinte, no nível em que evolui o “discernimento dos espíritos”), ela constitui seu aspecto “formal”. É por ela que os elementos personalistas essenciais à esperança teologal são postos em evidência. Cf. J. de GUIBERT, Etudes de théologie mystique (Toulouse, 1930), 241-248; DS II 14051412, IV 1215-1222; Ch. A BERNARD, Théologie de l’espérance selon saint Thomas d’Aquin (Paris, 1961). – 203 (1) Trata-se de Irmã Philippine Vacquié, superiora em Figeac de 1846 a 1851. Sua irmã, destinatária dessa carta, a sucedeu por longos anos (1851-1878). – 204 (1) Permanece difícil determinar quem teve a iniciativa das representações teatrais. Certamente não foi Pe. Abbal que as recusa com vigor (cf. 1.206). Com certeza foi um costume que veio aos poucos. A desconfiança extrema de Santa Emília pode se basear na opinião sustentada por Bossuet em suas Maximes et réflexions sur la comédie (9 de maio de 1694). Porém é preciso lembrar que essa obra severa fica um pouco falsificada pela polêmica contra Pe. Caffaro. Por outro lado, o ambiente de uma representação feita num internato difere essencialmente da de um teatro propriamente dito. – 207 (1) Talvez a destinatária dessa carta seja Irmã Françoise Pascal, uma vez que sua atitude para com Santa Emília logo ficou estranha durante o tempo em que foi ecônoma geral em Villefranche (1846-1851). Cf. nota 9 da Introdução. Em 1851, é nomeada superiora em Aubin e encontra dificuldades com o espinhoso assunto de Irmã Augustine Carles, que devia em breve deixar a Congregação. – 208 (1) Sem dúvida, trata-se da entrega de um boletim da Santa Infância. As cartas seguintes mostrarão com freqüência o interesse de Madre Emília para com essa obra. Cf. introdução, p. 22 e nota 32; l. 214, 215. – 217 (1) O “gênero literário” das circulares necrológicas pode parecer, por vezes, ligeiramente artificial. Entretanto, deve-se observar que Madre Emília, pelo menos uma vez, ousou falar de uma religiosa pouco edificante (l. 104). Aliás, esse gênero tem a vantagem de manifestar a vitalidade espiritual de uma comunidade, com simplicidade e de um modo muito concreto. ___________ 616 O Pe. Abbal, em sua correspondência, dava muitos conselhos dos quais damos algumas amostras (sempre baseados em HC 1850): “Gostaria que alunas e professoras tivessem, em sua casa, tantas horas para trabalhar sozinhas quantas existem nos colégios públicos. Gostaria que as mestras pudessem, cada ano, fazer os mesmos progressos que suas alunas e, por conseguinte, tivessem muito tempo livre... Quase todas, seja por gosto, seja por virtude, aproveitem as horas preciosas que lhe são deixadas para cultivar o espírito... Gostaria, confesso, nunca escutar expressões proibidas pela gramática. Uma mestra, e sobretudo uma mestra religiosa, deve ser irrepreensível em sua linguagem, em sua caligrafia, em suas maneiras, tendo a certeza de que suas faltas causarão prejuízo a toda a Congregação... O tempo de aula deve ser mais curto do que o tempo de estudo... O movimento é quase tão necessário às meninas quanto o ar puro. Gostaria que a proibição de ficar em repouso durante o recreio fosse tão severa quanto a de dançar durante as aulas”(16 de outubro de 1850). “Que todas as lições sejam redigidas pelas alunas. Os cadernos são examinados pela mestra uma vez por semana, pela inspetora quando passar, e publicamente, por ocasião dos exames de fim de ano escolar... Que os deveres sejam conforme à capacidade das alunas”(22 de outubro de 1850). “Que as Irmãs sejam bem persuadidas de que, para serem abençoadas por Deus e pelos homens, devem ser santas e fazer com que suas jovens alunas se tornem boas cristãs... Que respeitem a honra de suas alunas” (6 de novembro de 1850). “Desejaria que, nos exames públicos, as alunas mais aplicadas pudessem responder sobre todo o Catecismo. Em todos os tempos e principalmente em nossos dias, devemos dar grande importância à nossa religião”(1851) Dados objetivos, talvez pessimistas demais, a respeito da insuficiência do ensino dado na França pelas escolas católicas, no início do século XIX, foram apresentadas por ª DANSETTE, Histoire religieuse de la France contemporaine, Paris, Flammarion 1948, t. 1, 202, 242, 273, 318-319. Com a Lei Falloux e os esforços intelectuais da elite do Clero, progressos foram realizados em diversos setores, cf. A.LATREILLE, J.R. PALANQUE, etc..., Histoire du catholicisme en France, Paris, Spes, t. 3, 1962, 321-347; R. AUBERT, Le Pontificat de Pie IX (1846-1878), Paris, Bloud e Gay, 1952, 118-121. DS V, 963-966; 985-986. 49 meu parente, como de um irmão e nada fiz com ele que pudesse desagradar a Deus. Em fevereiro de 1803, realizou-se o casamento de Sr. de Pomairols, meu tio, com a senhorita de Villefranche. Fui assistir às núpcias. Durante o banquete, recebi um pequeno elogio que me agradou: acharam-me espirituosa. Percebendo que certa perturbação se apoderava de meu espírito, tranqüilizei-me dizendo: Deus me guarda. Agia com tanta simplicidade que acreditei, efetivamente, que Deus me preservaria de todo mal. Fiquei uns instantes sozinha com Henri de Grammont, meu parente, a quem dei o braço para o passeio. Fiz isto tão inocentemente que não tive a idéia de que alguém pudesse censurar-me. À noite, minha avó disse-me que eu tinha me comportado bem; entretanto, foi nessas núpcias que tomei gosto pelas "toilettes" mundanas, o que não era um crime. Gostava de trajar com elegância, mas sem pretensão e sem más intenções. Passei a quaresma inteira sem comungar. Na Páscoa, meu confessor repreendeu-me fortemente, por causa de uma pequena maledicência. Depois da quaresma, voltei para Ginals com minha avó e os recém-casados. Meu gosto pela "toilette" aumentou. Agradava-me a convivência das damas que vinham visitar minha jovem tia. Queria imitá-las no timbre da voz. Senti nascer em mim, sem o perceber, um pouco de afeição por M. de Lastic, mas ele partiu logo e acabou-se. Encontrei alguns livros maus. Comecei a leitura de um intitulado: "Mœurs et coutumes des pays". 6 Lendo-o, eu chorava. Minha avó o arrancou das minhas mãos antes que eu tivesse encontrado algum trecho perigoso. Lia todos os dias um formulário com as orações da Missa, mas tinha cuidado de procurar os mais curtos. Permaneci em Ginals durante todo o verão, sem comungar. Só pensava em coisas mundanas. 50 Minha avó, que na juventude se sentira atraída pela vida religiosa, quando enviuvou e casou os filhos, sonhou em recolher-se à casa da Sra. Saint-Cyr, onde viviam várias religiosas de congregações diferentes, que foram obrigadas a deixar seus conventos na época da Revolução. Essas religiosas viviam sob o mesmo teto, seguindo cada uma a própria regra. Minha avó manifestou-me seu desejo e me convidou a segui-la. O interior de um convento causava-me horror. Não gostava de religiosas nem de beatas. Recusei-me a aceitar o convite. Ela me disse então que seria preciso voltar para minha família. A solidão de Druelle era-me tão desagradável quanto o convento. Teria gostado de ficar com minha tia que me amava muito, e a quem, por minha vez, eu amava ternamente. Minha avó opôs-se a isso de maneira formal e compreendi que era preciso obedecer como quando era pequena. Chorei muito. Foi, até então, a maior dor que tive. Enfim, decidi-me a deixar minha avó e minha tia. Parti para Druelle no fim do verão. Tinha cerca de dezesseis anos. Meu pai e minha mãe, que eram de costumes muito austeros, exerceram sobre mim a mais estrita vigilância. Não me consentiam sair sozinha e me observavam continuamente. Após dois ou três meses de permanência em Druelle, fui a Marcillac, à casa do Sr. de Bussy, 7 meu tio. Ali encontrei, por ocasião de umas núpcias a que assisti, os mesmos perigos já encontrados nas do Sr. de Pomairols e me expus a eles sem precaução alguma. Cheguei a tomar parte em uma dança, certa de que nisso nada havia de culpável. Ignorava absolutamente os perigos do meu caminho e entregava-me sem remorso às inclinações naturais do meu coração que, aliás jamais me levaram a ações pecaminosas. Deus me atingiu enviando-me um enfraquecimento físico, o que me causou grande despeito. Não queria 615 2º – Após ter feito a oração vocal, tomando a intenção de ganhar todas as indulgências possíveis durante o dia e que, só por sérios motivos, deixarão de fazer, meditarão um quarto de hora ou pelo menos dez minutos. 3º – Farão todo o possível para assistir cada dia à santa missa, como homenagem de ternura ao Coração de Jesus. 4º – Em qualquer situação, é preciso trabalhar. É uma necessidade e um dever imposto a toda criatura, desde que o pecado entrou no mundo; e infeliz daquela que vive na ociosidade. Antes do trabalho, terão o cuidado de oferecê-lo a Deus. 5º – Na medida do possível, sem faltar com seus deveres, farão, todos os dias, a visita ao Santíssimo Sacramento; utilizarão o livro tão piedoso de Santo Ligório. 6º – Cada dia rezarão duas dezenas do terço e, no domingo, três. 7º – As que tiverem tempo, farão todos os dias pelo menos dez minutos de leitura espiritual. 8º – Depois da oração da noite, farão pelo menos três minutos de exame, renovarão seu ato de contrição. É o momento de ler o assunto da meditação do dia seguinte. Terminarão com três Ave-Marias. 9º – Ao se deitarem, tomem água benta e joguem-na sobre a cama, em forma de cruz. A hora do deitar deve ser determinada como o é a do levantar. 10º – Vocês se confessarão a cada quinze dias e comungarão tantas vezes quantas o seu confessor o permitir. Vivam de modo que possam merecer aproximar-se desse adorável Sacramento. 11º – Uma vez por mês, por ocasião do retiro, levarão esse regulamento, e prestarão contas a seu confessor do modo como o terão vivido. 12º – Todos os anos haverá três dias de retiro. As que tiverem sido membros de uma das Congregações estabelecidas na Comunidade terão o direito de entrar na clausura. Nessa época, será feita a revisão do ano. 51 614 8h30 - Aula até 5 para meio-dia Meio-dia: Almoço – Recreio 1h30 - Aula até 7h, com intervalo às 4h. 7h - Oração – 2 dezenas do Terço – Leitura espiritual – Exame 7h30 – Jantar – Recreio 9h - Deitar Eis alguns dos livros adotados para essa classe: Histoire de l’Eglise (de Lhomond); Ancien Testament (de Mésangui) ou Bible (de Royaumont); Civilité des jeunes personnes (de J.B. Chantal); Paroissien ou Formulaire de prières (para a leitura do latim); Choix de 50 sortes d’écritures (Hachette); Catéchisme du Diocèse; e de Persévérance; Histoires diverses: sainte, ecclésiastique, ancienne, romaine (de Loriquet); du Bas-Empire (Sarion); du Moyen-Age et Moderne (Rendu); de France (a Sra. de Saint-Ouen); Naturelle (F.P.B.); Mythologie à l’usage des Maisons d’Education; Géographies (de F.P.B.); ancienne (de Lefranc); Atlas diversos; Grammaires et Exercices orthographiques (de F.P.B.); Cacographie et Cacologie (de Boinvilliers); Analyses logique et grammaticale (de Noël e Chapsal); Arithmétiques (de F.P.B.); Littérature (de Pe. Gomien); Abeille du Parnasse; Abeille poétique; Narrations (de Filon); Fables choisies (de Fontaine, Florian, Pe. Reyre). A lista dos livros destinada às outras classes é mais ou menos idêntica. O Manual conclui assim: “Que as Irmãs da Sagrada Família estejam persuadidas de que, para serem abençoadas por Deus e pelos homens, elas devem ser santas e fazer com que suas alunas se tornem boas cristãs.” Junto ao Manual está um Regulamento para o tempo das férias, ou para o término dos estudos. Bastante exigente, vale a pena reproduzi-lo como documento e porque pode trazer sugestões ainda aceitas hoje: 1º – Todos os dias vocês se levantarão numa hora determinada: por exemplo, no verão, às seis horas da manhã, e às sete horas, no inverno. Oferecerão o coração a Deus, após ter feito o sinal da cruz. Levantem-se sem demora e rezem o Lembrai-vos, etc., enquanto se vestem. perder os encantos da minha idade juvenil. Sentia-me humilhada ao ver que meu espírito não era mais o mesmo. Voltei para casa doente. Meu pai vigiava minhas leituras. Passei todo o inverno doente e triste. Vomitava continuamente. O médico, não encontrando remédio; quis esperar a estação primaveril para iniciar meu tratamento. Ordenou-me passeios a cavalo. No fim do inverno, recuperei a saúde e não me lembrei de agradecer a Deus, nem de me converter. Esqueci-me de dizer que na casa do Sr. de Bussy, meu tio, experimentei novamente outra afeição por um jovem cavalheiro, mas ele deixou logo a região e tudo terminou. Durante esses dezoito meses de tibieza, confessei-me e comunguei apenas quatro ou cinco vezes. CAPITULO IV Mudança ocorrida na Madre por ocasião de um jubileu. Deus lhe outorga todas as virtudes. Sua correspondência à graça divina Uma vez restabelecida, como acabo de dizer, nem pensei em agradecer a Deus. Fiz mesmo a Comunhão de Páscoa sem advertência alguma de minha consciência. Na festa do Corpo de Deus, era o ano de 1804, por ocasião do Jubileu, confessei-me a um sacerdote piedoso e zeloso. De súbito, compreendi claramente meu estado de tibieza e ressuscitei sem combate algum, sem sofrimento. Fiquei desolada por ter passado tanto tempo longe de Deus, mas essa amargura era suave, pois Deus me cumulava de graças e inundava de consolação a minha alma. Ficava tão penetrada de Deus que teria permanecido sempre com Ele, sobretudo na igreja. Ali, sua presença me absorvia a tal ponto que eu não via nem ouvia o que se passava ao meu redor. Temos, nesse estado, todas as 52 alegrias. A fome da divina Eucaristia era tão ardente que não podia dormir na véspera de minhas comunhões. Ia diariamente à Missa, embora a igreja ficasse a meia hora de distância. Duas vezes por dia rezava a ViaSacra, subindo um pequeno Calvário que não era longe do castelo. Fazendo esse santo exercício, gostava de ajoelhar-me no pavimento, sobre coisas que me mortificassem. No princípio, experimentei um pouco de respeito humano, mas ia ao que me custava e logo fiquei livre dessa tentação. Passava o domingo todo na igreja, com uma moça muito devota. Gozava, nesse santo lugar, de alegrias que não posso expressar, dizendo somente: era o céu. Minha irmã Eleonora, que era muito piedosa, fazia-me em voz alta a meditação, e, por causa de sua grande piedade, pensavam que ela tinha vocação religiosa. Deus, porém, reservou para mim esta graça. Ele se apoderou inteiramente do meu coração e deume gratuitamente todas as virtudes. Sua prática me foi tão fácil como se eu estivesse habituada a elas desde muitos anos. O mundo, que eu tinha amado durante minha tibieza, tornou-se para mim digno de desprezo. Tinha horror a todas as suas máximas. Queria Deus, e Deus unicamente. Via-o em tudo e por toda parte. Desprezei as modas, que não podia mais suportar. Comecei a trajar com grande simplicidade. De Villefranche queriam enviar-me uns adornos. Rejeitei-os. Deus me deu um grande atrativo pela mortificação. Era insaciável e procurava sempre o que mais me mortificava. Entretanto, fui infiel em uma circunstância: uma pessoa tinha ataques de epilepsia. Uma vez, vendo-a cair, não tive coragem de ir socorrê-la. Essa doença impressionava-me de tal modo que eu receava contraí-la. Para vencer-me, fazia passar na minha imaginação tal doença e todas as outras mais humilhantes, mais dolorosas, para aceitá-las diante de Deus. 613 Das visitas – Das alunas novatas – Da admissão das internas – Das doentes – Dos recreios – Dos passeios – Dos meios disciplinares – Do silêncio – Dos sinais – Das ausências – Dos feriados – Da distribuição dos prêmios – Das férias – Das responsáveis pela classe – Da expulsão de alunas. Os dias feriados para as externas são: a quinta-feira, os três últimos dias da Semana Santa, a manhã do Natal, o 1º dia do ano, os dias de cerimônia, os dias de feira. As internas têm um dia de saída por mês. As férias do ano duram um mês. Para a distribuição dos prêmios, só será permitido representar cenas ou poesias mencionadas no catálogo. Os trabalhos manuais feitos pelas alunas serão apresentados numa exposição. Cada classe celebrará a festa de seu padroeiro e naquele dia será dispensada dos trabalhos clássicos. As alunas organizarão uma missa e, à noite, terão uma refeição em comum. A festa da classe Sainte Marie será celebrada no dia 21 de novembro. As alunas de Saint-Casimir e Saint-Louis têm um uniforme. Todas serão convidadas a fazer parte da Obra da Propagação da Fé (para as maiores), da Santa Infância (para as mais jovens). As Congregações das Filhas de Maria e do Menino Jesus estarão em honra. Cada ano, as alunas farão um retiro. As mestras farão cantar cada dia, antes e depois das aulas, pela manhã às 10 horas e antes do Catecismo. As alunas externas serão encorajadas a fazer, cada dia, um quarto de hora de meditação. A mensalidade das alunas da classe Saint-Casimir é de 5 francos ou de 3 francos. A da classe de Saint-Louis é de 3 francos ou de 2 francos. A das classes externas é de 1 Fr 50 ou de 1 Fr. A segunda parte do Manual trata do objetivo e do conteúdo do ensino, dos exercícios diários nas diferentes classes, dos livros adotados, etc. Horário das internas. Os exercícios diários para as internas de Saint-Casimir são os seguintes: 5 h no verão (6 h no inverno): Levantar 5h30 (ou 6h30): Oração da manhã – Meditação de um quarto de hora. 6h - Estudo 7h30 – Café – Recreio 8h – Missa 612 tragédias de Esther e de Athalie; Abrégé des sciences; Cours d’études; Vocabulaire; La Grammaire des grammaires; La Géographie moderne (por Crozat, por Gibrat); Fables choisies (La Fontaine)”. Porém o mais eficaz agente do progresso foi o Pe. Abbal que mandou imprimir, em 1850, um Manuel d’enseignement (cf. nota 30 da Introdução), redigido em colaboração com várias religiosas, principalmente Irmã Angèle Pouget (cf. nota segunda secção, p. 328). Eis a análise fornecida pela Histoire de la Congrégation (1850): “O Manual lembra que, em todas as escolas da Sagrada Família, o ensino é dividido em cinco classes, de acordo com a categoria social à qual pertencem as alunas, a saber: Saint-Casimir, Saint-Louis, Sainte-Marie, Saint-Vincent, Sainte-Ursule. Nas três primeiras classes, o ensino é dado em conformidade com a mensalidade das alunas, nas duas outras, ele é gratuito. As alunas são internas, semi-internas, vigiadas ou externas. As internas compreendem duas categorias: a classe SaintCasimir, a classe Saint-Louis. Nos pensionatos pouco numerosos, podem se acrescentar as alunas vigiadas. Cada classe tem uma mestra que deve prestar contas da classe à superiora, a cada 15 dias. Todos os meses, a superiora reúne as mestras de cada classe a fim de dar avisos em prol do progresso das alunas. Além do mobiliário escolar, haverá em cada classe um crucifixo, uma pia de água benta, uma estátua de Nossa Senhora se possível, gravuras da Sagrada Família, dos Sagrados Corações de Jesus e de Maria, do anjo da guarda, do padroeiro da classe. Nas paredes, sentenças estarão escritas. A mestra responsável deverá zelar pela ordem e limpeza da classe. A mais perfeita união deverá reinar entre as mestras, que só devem ter um único desejo: buscar a glória de Deus e o maior bem de suas alunas. Uma mestra deve ser, em todos os aspectos, o modelo de suas alunas... e recomendá-las, cada dia, à Sagrada Família e a seu anjo da guarda. A primeira parte do Manual contém os seguintes capítulos: Do relacionamento das mestras entre si – Do relacionamento das mestras com suas alunas – Da preparação para a recepção dos sacramentos – Das orações – Do catecismo – Da leitura - Da recitação – Da caligrafia – Da gramática – Da ortografia – Da polidez – Da emulação – Das redações – Das recompensas – Da reunião dominical – Das refeições – Do levantar e do deitar – 53 Por intenso que fosse o frio, durante o inverno, ia fazer a Via-Sacra sobre a montanha e isso nada me custava. Visitava e consolava uma mulher que diziam ser leprosa. A simplicidade das camponesas encantava-me. Era para mim uma felicidade conversar com elas. Nas minhas confissões eu era breve. Meu confessor falava-me pouco, mas esse pouco me bastava. Comungava de quinze em quinze dias ou semanalmente; o amor me conduzia à Sagrada Mesa. Amava muito a solidão e sobretudo era feliz quando não ouvia nenhum ruído das coisas deste mundo. As maravilhas da vida terrestre de Nosso Senhor, de Nossa Senhora e São José eram o objeto da minha contemplação. Nunca me servia de livro para ler e meditar. Entregava-me a Deus e seguia as inspirações de meu coração. Enquanto gozava assim, em minha família, das alegrias tão suaves que provêm de uma volta sincera para Deus, soube que minha avó, de quem havia dezoito meses estava separada, queria me rever. O pensamento de afastar-me dos lugares onde havia recebido tantas graças afligiu-me a princípio, mas a lembrança da contrariedade que minha avó me causou quando me fez voltar para casa de meus pais, me fez pensar que eu faria um ato agradável a Deus se satisfizesse imediatamente o seu desejo. 54 611 CAPITULO V Madre Emília volta para junto da Sra. de Pomairols, sua avó, e de sua tia, cunhada da Sra. de Pomairols. Coloca-se sob a direção de Padre Marty, que a ajuda a progredir nos caminhos de Deus Antes de continuar a narração que o senhor me ordenou, tão contrária ao meu atrativo, deixe-me dizerlhe que desejaria muito uma fundação em Ampiac. Recebi tantas graças na igreja dessa paróquia que a gratidão me faz desejar termos uma casa ali. Tinha dezessete anos e meio quando deixei Druelle a fim de voltar para Villefranche e ir morar na casa da Sra. Saint-Cyr, onde residiam minha avó e minha tia. Primeiramente, propuseram-me fazer um retiro. Não aceitei, porque Deus me falava ao coração e eu preferia seguir assim, docemente, as inspirações de sua graça. Pedia a Deus com insistência que me esclarecesse na escolha de um diretor. Dirigi-me a Pe. Marty que era o confessor da casa. Ele cuidou de minha alma com grande solicitude. Sua direção era assídua e quase diária. Ensinou-me a prestar-lhe conta das minhas disposições interiores e me admitiu à comunhão freqüente. Admirava o modo pelo qual Deus conduzia a minha alma. O demônio inspirou-me, nessa época, muitos pensamentos de vaidade. Dizia tudo ao meu confessor e esses pensamentos me ajudaram muito a obter a humildade. Confessava-me quatro vezes por semana e, quase sempre, acusava-me de faltas contrárias à humildade. Quanto mais me humilhavam, tanto mais eu ficava contente. Meu confessor ajudava-me a descobrir meu orgulho e queria que eu lhe fosse prestar conta das luzes que Deus me dava. Não me ocultava os meus talentos; apenas sua avó e sua tia (cf. Introdução p. 2 e A cap. 2). Pela primeira vez deu provas de sua capacidade pedagógica na casa da Sra. Saint-Cyr (A cap.6). A iluminação interior que afastou qualquer dúvida a respeito da sua vocação lhe confirmou que seria “a educadora dos pobres” (A cap. 8). Em 1834, não hesitou em criar um “segundo ramo,” dedicado de modo mais exclusivo “às escolas” (cf. Introdução, p. 13). Apesar de dificuldades e aborrecimentos, ela se esforçou, em seguida, em responder a todos os pedidos de fundações desse tipo. Houve um momento de perplexidade em 1840, porém reagiu logo e explorou profundamente as possibilidades oferecidas pela dupla forma de vida que caracteriza o Instituto. Madre Emília foi antes a inspiradora e organizadora da instrução e não a técnica. Não elaborou programa nem método de estudos. A leitura de vários trechos da segunda secção pôde dar uma idéia de seu ideal e de suas preferências (cf. I, 2: Regulamento para as internas; II, 7: Sobre o verdadeiro zelo pela glória de Deus; 28: Como orientar sempre nossa vida para Deus; 31: Amor pelo próximo (segundo São Paulo); 35: Mansidão e Caridade, sobretudo para com as crianças). Insiste muito sobre a intenção sobrenatural que deve animar as religiosas educadoras e lhes indica os meios. Dá uma particular atenção à instrução religiosa (L 596, M 374-377), a ponto de, por vezes, deixar na sombra os aspectos mais profanos da questão (cf. Br 271-287). No meio de nossas cartas, guardaremos particularmente as de nº 71 e 76, escritas para as crianças, elas mesmas e 147, 157 para as religiosas educadoras. Pe. Marty não deixou de trabalhar para aperfeiçoar os métodos pedagógicos. Em 1825, recomenda para a instrução religiosa, os livros seguintes: “La vie de Notre Seigneur, por M. Campan ou o Pe. De Ligny; l’Abrégé de l’Histoire de l’Ancien Testament, por Mésangui; les Figures de la Bible; l’Histoire religieuse, por Lhomond” (HC, citando uma carta de 23 de janeiro, cf. também 1829 e 1830). Anotamos uma das perguntas feita pela superiora: (2ª série, nº 9): “Acha bom que acrescentemos ao catálogo dos livros lidos pelas Irmãs o Spectacle de la nature, por Pluche? Seria melhor utilizar a gramática de Restant, de Olivet, de Vailly, etc., ou outra; da qual gosta mais?” Uma lista de livros possuídos pela biblioteca em 1832, por sua vez, esclarece o assunto. É redigida de um modo rudimentar, nós a recopiamos de acordo com a HC. “La Conversion des Protestants; Les Nouvelles des Missions; Le Catéchisme du Concile de Trente; L’Éducation des Filles (Fénelon); Ancien Testament (Mésangui); Sainte Bible (Royaumont); Conversations de Saint-Cyr; Moeurs des Israélites; La Religion (poema de Racine); Algumas cenas das 610 – 159 (1) O bispo é sempre Dom Pierre Giraud (1830-1842); cf. nota 13 da Introdução. – 163 (1) Trata-se de uma certa Irmã Ardourel, da qual muito pouco se sabe de preciso, mas que fez um grande bem a esses prisioneiros, depois que a paz religiosa foi restaurada, após a Revolução, e até a sua morte, em 1820. Cf. AUB 338-340; Br 261. – 167 (1) O bispo de Montauban é então Dom Jean Chaudru de Trélissac. Cf. nota 25 da Introdução. – 174 (1) Vale ressaltar que essas fórmulas de simpatia voltam freqüentemente nas cartas de Madre Emília, tão solícita em se doar totalmente a cada uma de suas correspondentes. – 178 (1) A respeito da elaboração progressiva das Constituições, cf. nota 14 da Introdução. – 183 (1) Com muita freqüência, fala-se de “novenas” ou de outras práticas da oração vocal, nessa correspondência e na história interna da Comunidade em seus começos. Nesse campo, uma multiplicação excessiva pode ser prejudicial (cf. segunda secção, p. 267, com nota 47). Porém, o Espírito é mestre de seus dons: ao lado de casos “excepcionais”, como os de Pe. Doyle (cf. Revue d’ascétique et de mystique, 1921, 128-146), pode-se citar o exemplo do bemaventurado Pierre Favre, um dos primeiros companheiros de Santo Inácio: ele multiplica, com notável facilidade, as orações para toda espécie de intenções (cf. seu Mémorial, traduzido e comentado pelo Sr. de CERTEAU, coleção “Christus”, nº 4, Paris, 1963). O perigo de desvio foi denunciado por São João da Cruz: visa a certas pessoas que “dão tanta eficácia e tanta credulidade a essas práticas por meio das quais querem satisfazer suas devoções, que imaginam que Deus não as atenderá se tiverem faltado a um só ponto ou a uma única circunstância. Tudo isso é inútil e não agrada a Deus. Elas têm mais confiança nessas práticas e cerimônias do que no que constitui o fundamento da oração e não receiam com isso faltar com o respeito devido a Deus e causar-lhe injúria” (Subida... 1. 3, c. 42). Do ponto de vista histórico, é preciso dizer que esses erros foram talvez mais freqüentes no século XIX, na França, por causa de um certo individualismo da piedade, aliás bastante compreensível após as “crises” do século XVIII e antes das primeiras “renovações” litúrgicas inauguradas por Dom Guéranger. Cf. J. LEFLON, La Crise révolutionnaire (1789-1846), Paris Bloud e Gay, 1949, 509 e R. AUBERT, Le Pontificat de Pie IX (1846-1878), Ibid., 1952, 461-462. – 186 (1) Cf. nota 22 da Introdução. – 192 (1) A educação humana e cristã das crianças, assim como a sua instrução, constituem o ministério primordial do Instituto. A própria Santa Emília tinha sido educada de um modo muito feliz por 55 cuidava de referi-los a Deus. Meu desejo da comunhão era sempre grande: quando uma festa se aproximava, ia pressurosa pedir licença ao meu confessor para comungar. Ora ele me permitia e aumentava o meu número já determinado, ora fazia o contrário; recusavame ou diminuía algumas. Quando ele agia assim, eu experimentava extraordinária amargura, mas não desanimava. Enfim, terminei por me abandonar quanto a esse assunto. Padre Marty instruía-me, emprestava-me livros. Inspirava-me grande atrativo pelos salmos. 8 Aprendi de cor o saltério. Deus continuava a prodigalizar-me graças particulares durante a oração. Lembro-me, com grande júbilo, dos lugares onde Deus se manifestava à minha alma. Foi aos dezesseis anos que conheci Nosso Senhor Jesus Cristo. Esse conhecimento de Deus me encantava. Muitas vezes derramava lágrimas, pensando na minha demora em amar um Deus tão bom. Gostava das disposições extáticas. Repetia-as em voz alta; minha tia me proibiu. O Cristão interior, o Bom Pastor, as qualidades de Jesus como esposo, o Cântico dos Cânticos, as alegrias da Santíssima Virgem, eis em geral o objeto de minhas meditações dos dezesseis aos trinta anos. 9 Ordinariamente, durante a Santa Missa, pensava na Paixão do Salvador. Ficava algumas vezes tão absorta em Deus que não podia me levantar. Gostava muito de permanecer ao pé do Tabernáculo. Deram-me um quarto próximo à Capela. Quando me tiraram dali, senti uma pena indizível. Não gostava de ver imperfeições nas religiosas. Se alguma tinha gosto pelo locutório, se apreciava o mundo, isso me desedificava. Gostava de vê-las desprendidas dos bens terrenos, amigas da solidão e do silêncio, e não podia compreender que, após se terem consagrado a Deus, algumas se afastassem dessa linha de conduta. Como Santa Teresa, 10 amava muito os santos 56 desconhecidos; meu Anjo da Guarda me era também muito caro. Invocava-o sempre e atribuo à sua proteção a memória que conservo dos detalhes. Confiava-lhe o que queria dizer e o que temia esquecer. Creio dever à sua proteção ter sido salva de um perigo iminente de perder a vida. Ia à adega, carregada de garrafas; descíamos ali por um alçapão. Eu o julgava fechado, mas estava aberto. Adianto-me e, quando o assoalho desapareceu sob meus pés, ia cair com as garrafas nas mãos. Senti então que alguém me tomava nos braços e me retinha. Pensei logo em agradecer ao meu Anjo da Guarda. Os de casa acorreram, pensando que eu havia caído no porão. Acalmei-os, contando-lhes o ocorrido. Desejava consagrar-me a Deus e entrar em uma Comunidade Religiosa. Uma irmã de meu pai, religiosa no Convento de Nossa Senhora de Rodez, atraía-me. Manifestei meu desejo a Pe. Marty que quis experimentálo durante quatro anos; permitiu-me, contudo, fazer em particular os votos de religião. Fi-los perpétuos, no dia da Apresentação de Nossa Senhora. Parece-me que Deus me concedeu a graça de observá-los fielmente. Eu não era triste. Na casa da Sra. Saint-Cyr, porém, achavam que não era alegre. Pe. Marty deu-me um livro que me ensinava essa arte. Aprendi um pouco. Aquelas senhoras me diziam também que meu fervor seria passageiro. Isso me causava inquietação. Receava voltar novamente ao meu estado de tibieza, o que eu não queria. Gostava muito de receber a santa absolvição, principalmente na sexta-feira da Semana Santa. Um dia, fui confessar–me a Pe. Alet na Igreja da Madalena. Era precisamente a Sexta-feira Santa. Recebi então uma graça extraordinária. Passou-se na minha alma algo indefinível. 609 um pouco mórbida. A abundante literatura consagrada aos escrúpulos sempre tem uma referência a esse assunto. De modo mais resumido e mais técnico, cf. DS II 2651-2654 (culpabilidade patológica); III 1164-1167 (direção propriamente espiritual em tais casos). Cf. L. BEIRNAERT, Expérience chrétienne et psychologie, Paris, L’Epi, 1964; Pour les maîtresses des novices, coleção: “Problèmes de la religieuse d’aujourd’hui”, nº 3, Paris, Le Cerf, 1949. – 148 (1) Na sua Autobiografia, Madre Emília confessa a respeito de Pe. Marty: “Alguns anos antes de sua morte, ele não me era mais útil. Sem dúvida, Deus queria me preparar para o sacrifício” (cap. 14). Acima, ela fala de sua dor “amarga e profunda” por ocasião do falecimento de seu antigo diretor. Podemos concluir, portanto, que, apesar das sombras e do afastamento, a estima e a afeição recíprocas tinham permanecido reais. A este respeito, Irmã Laurent Belloc escreveu o que segue: “Quando faleceu Pe. Marty, uma Irmã rodeira confessou que tinha ido ao correio por ordem da assistente, trouxe uma carta endereçada à Madre e soube a triste notícia. Ao voltar, encontrou a Madre ocupada pondo ordem no refeitório e lhe entregou a carta, mas não disse nada. A Madre, ao receber a carta, notou a fisionomia alterada da Irmã, mas nada perguntou e continuou seu trabalho, sem abrir a carta. Quando tudo terminou, foi à capela e ali, em meio às lagrimas, leu a carta” (DL 156). – 149 (1) É preciso considerar o “exagero”. Já revelamos testemunhos sobre a adaptação e a eficácia da direção espiritual feita por Santa Emília (cf. nota 6 de segunda secção). – 152 (1) Mt 16, 24. Cf. nota 34 da segunda secção. Resumindo, de algum modo, toda a sua experiência pessoal e apostólica do combate espiritual, Santo Inácio pôde escrever: “Cada um deve pensar que progredirá em todas as coisas espirituais na medida em que deixará seu amor, seu querer e seus interesses próprios” (Exercícios espirituais, 189, fim). – 155 (1) Numa edição do Diretório das Irmãs da Sagrada Família (Tulle 1894), o capítulo XXXIV, Da vida interior, adverte contra umas seis “dissipações”: “a dos sentidos, a da imaginação, a do espírito, a do sentimento, a do coração e a da vontade.” – 157 (1) Voltaremos a esse assunto da pedagogia a respeito da carta 192. A complementaridade entre o abandono e a aplicação, quando se trata do serviço de Deus, foi expressa por Santo Inácio numa fórmula paradoxal: “Tal deve ser a regra primordial de suas ações: tenham fé em Deus como se o sucesso dependesse totalmente de vocês, não dele; por outro lado, apliquem-se como se tudo dependesse de Deus e nada de vocês” (cf. G. FESSARD, La Dialectique des Exercices..., Paris, 1956, 281 sv.). 57 608 – 112 (1) Fl 4, 4-6. – 117(1) Essas reflexões caracterizam bastante bem a “espiritualidade” de Santa Emília, perfeitamente ortodoxa no plano teórico (porque não nega o valor das criaturas) e no plano prático (porque deixa um grande espaço às “obras”). Entretanto, haveria uma tendência a um certo “acosmismo”. Coexistindo de modo pacífico com o “humanismo cristão”, uma tal atitude é feliz porque põe em relevo a transcendência divina, os valores escatológicos, etc.: todos eles, bem inalienáveis do cristianismo. – 119 (1) As cartas 115, 118, 119 fornecem um belo testemunho da humildade de Santa Emília: a recusa de se justificar e de obter algumas compensações, o propósito de total submissão, são mais expressivos do que tal ou tal busca de humilhações espetaculares. – 121 (1) Essa afirmação de princípio parece totalmente justa e esclarece a significação de “esposa” da vida religiosa. Para ter uma justificação teológica, ver em particular G. MARTELET, Sainteté de l’Église et vie religieuse (Toulouse, 1964). – 122 (1) Irmã Fébronie Bouquiers é assistente de 1830 a 1832. Cf. l. 128, 129. – 125 (1) Sobre o papel da “Regra” para dar um cunho pessoal e concreto ao movimento que inspira a vida religiosa, cf. L. COLIN, Le culte de la Règle (Paris, 1949), ou, mais resumido, R. CARPENTIER, Témoins de la Cité de Dieu ( 5ª edição, Paris 1958) 120-128. – 133 (1) Para uma descrição geral do desenvolvimento tomado no início do século XIX pelo trabalho industrial, cf. R. SCHNERB, Le XIXe Siècle (Col.”Histoire général des civilisations”, VI, 2ª edição, Paris 1957), cap. III: Les techniques nouvelles de la fabrication et des transports. A respeito das incidências religiosas destes transtornos sociais, cf. R. AUBERT, Le Pontificat de Pie IX (1846-1878), Paris, Bloud e Gay, 1952, 124-128. A.LATREILLE, J.R. PALANQUE, etc, Histoire du catholicisme en France, Paris, Spes, T. 3, 1962, 352-362. – 137 (1) Mt 25, 34. Santa Emília cita esses versículos do Evangelho nas últimas linhas de seu Testamento espiritual (v.s. segunda secção, p. 338). O modo como fala aqui das “obras” às quais o “segundo ramo”do Instituto poderá se dedicar, mostra bem que ela não dá menos valor ao apostolado e à beneficência do que à clausura. – 142 (1) As “estações” designam, sem dúvida, a própria ViaSacra. Historicamente, entretanto, é preciso observar que a devoção às quedas, ao caminhar e às estações do Cristo precedeu e preparou a organização da Via-Sacra, tal como apareceu definitivamente no Ocidente, no século XVII, cf. DS II 2582-2589. – 146 (1) Muitas vezes, como certamente terá sido observado, Santa Emília adverte suas correspondentes contra uma culpabilidade CAPITULO VI A Madre encarrega-se da instrução religiosa das alunas da Sra. Saint-Cyr. Pouco depois, dá aulas de geografia e dirige os recreios. Desempenha conscienciosamente o seu cargo. Deus lhe envia uma provação: a doença Tendo a Sra. Saint-Cyr pedido que me encarregasse da instrução religiosa das alunas, aceitei. Explicava o Catecismo, preparava-as para a recepção dos sacramentos. Algumas senhoras da cidade manifestaram o desejo de assistir às explicações que eu dava às alunas, o que lhes foi concedido. Achavam que eu discorria com facilidade e tinha o talento de persuadir. Aplicava-me em inspirar-lhes grande respeito ao lugar sagrado, dava-lhes grande idéia dos sacramentos da Penitência e da Eucaristia. Indicava-lhes práticas piedosas a fim de se prepararem para recebê-los. Tinha gosto em ornar os altares e chamava algumas de minhas alunas para ajudarme, com o fim de inspirar-lhes amor ao Santíssimo Sacramento. Falava-lhes freqüentemente sobre Nossa Senhora, desejosa de que elas a amassem com ternura. Ensinava-lhes a se prepararem para as festas marianas, a recitarem orações em sua honra, a cultuarem-na sob o título de divina Pastora. Induzia-as ao amor ao Anjo da Guarda, do qual lhes falava com freqüência. Era sempre pela doçura e insinuação que as conduzia; jamais as repreendi. Queria que todas acreditassem que eu as amava igualmente. Por isso não deixava passar um só dia sem dar a cada uma um sinal de afeição, um olhar, um sorriso amável, uma palavra de ternura. Agia de tal maneira que cada uma pudesse dizer: Minha mestra pensou em mim hoje. Se me acontecia 58 empregar uma expressão mais dura, pedia desculpas imediatamente, dizendo: "Perdoem-me e não me imitem." Esses e outros atos de humildade que eu fazia diante de minhas alunas jamais diminuíram o respeito que elas tinham por mim. Empenhava-me em fazê-las reparar delicadamente as suas faltas recíprocas. Nunca as castigava quando me sentia contrariada, por pouco que fosse. Esperava e, na mais perfeita serenidade, advertiaas, castigava-as, fazendo-lhes compreender que era pelo bem delas que assim agia. Não ligava importância ao que me dizia respeito: a honra de Deus, o bem das meninas, era o que eu tinha unicamente em vista. Quando eu queria que minhas alunas praticassem um ato de virtude, praticava-o primeiro; o exemplo às vezes, as levava à imitação. Para animá-las na prática do bem, dava-lhes recompensas, tarefas apostólicas. Ensinava-lhes a fazer tudo por amor a Deus. Poupavalhes o amor-próprio, repreendendo em particular aquelas cujas faltas eram secretas, e na presença das alunas as que poderiam ter dado mau exemplo. Se descobria más inclinações em certas alunas, indicava-lhes alguns meios para vencê-las, fazia-lhes prestar conta dos progressos na virtude. Havia uma que tinha o costume inveterado de mentir. Ajudei-a a contar todos os dias quantas vezes havia mentido. Consegui corrigi-la por esse meio. Costumava tratá-las com ternura de mãe. Via-as em particular para lhes dar avisos e conselhos. Procurava conquistar as rebeldes, tratando-as com carinho, conservando-as com prazer perto de mim, como uma cruz que Deus me enviava. Desejo que minhas filhas façam também assim. Eu tinha uma aluna extraordinariamente irrequieta e dissipada. Amava-a mais que as outras e cuidava dela do melhor modo possível. Fazia atos de humildade diante dela. Ela fez um que julguei ótimo presságio para seu futuro e não me enganei. Essa aluna é 607 oração (cf. segunda secção, p. 274); porém, no que lhe diz respeito pessoalmente, mortificava-se constantemente nesse ponto. – 82 (1) Irmã Athanasie Rozié é assistente de Madre Emília e, portanto, a substitui durante suas ausências, de 1823 a 1830. – 83 (1) O “conhecimento de si mesmo” está na base de toda reflexão e de todo esforço de ordem moral. Num meio cristão, ele é inseparável do “conhecimento de Deus” e é acompanhado de toda uma série de sentimentos espirituais, cuja complementaridade deve assegurar o equilíbrio da vida espiritual. Cf. DS II, 1511-1543, artigo Connaissance de soi; J. CHEVALIER, Histoire de la Pensée (Paris, 1956), II, 835: Le Socratisme chrétien. – 87 (1) Em 8 de dezembro de 1815, Emília obtém da Sra. SaintCyr a permissão de deixar o estabelecimento para fundar sua própria Congregação, com suas três primeiras companheiras (cf. introdução, p. 6). Em 8 de setembro de 1820, realizaram-se as primeiras profissões em circunstâncias bem providenciais. – 89 (1) Lc 2, 51. – 98 (1) Sobre o esforço a ser retomado sempre, para obter que a união com Deus e o trabalho se fortifiquem mutuamente, cf. nota 43, da segunda secção. – 100 (1) Madre Emília possuía um conhecimento bastante amplo da Bíblia, do saltério, em particular. Recomenda a leitura da tradução e dos comentários de Berthier (cf. apêndice e nota 8 da primeira secção). – 101 (1) São Francisco de Sales dá conselhos sobre a maneira de se comportar na tentação, nos capítulos 3 e seguintes da quarta parte da Introduction. – 102 (1) Santa Teresa de Lisieux unirá, mais tarde, uma “espiritualidade” da infância à piedade para com os mistérios da Paixão. De modo semelhante, Santa Emília não separa a contemplação de Nazaré da do Calvário. Cf. J. de GUIBERT, Perfection et mystère de la croix, em Leçons de théologie spirituelle (Toulouse, 1955), p. 194-205; DS II 2607-2624. – 108 (1) Como já pôde ser constatado, as freqüentes cartas enviadas à Irmã Françoise Pascal têm habitualmente como finalidade apaziguá-la; não é, portanto, surpreendente que Madre Emília quisesse evitar entre ela mesma e essa Irmã todo excesso de sensibilidade (v.s., nota da l. 9). – 111 (1) Madre Emília que, apesar de todas as dificuldades pessoais que podia experimentar a esse respeito, dava sempre o exemplo da mais humilde submissão recomendava a suas religiosas que abordassem com espírito de fé o sacramento da penitência e seus ministros. Cf. A cap. 14, DL 96. 606 reverência que exige a situação de cada um, com naturalidade e simplicidade religiosa. Assim, tendo consideração uns com os outros, crescerão em devoção e louvarão a Deus, nosso Senhor, pois cada um deve se esforçar para reconhecer a imagem dele no outro” (Constituições, 3ª parte, cap. 1, nº 4 [250]). – 60 (1) As “aspirações” são uma prática de piedade muito recomendada pela tradição espiritual. São Francisco de Sales a seu respeito assim se expressa: “Neste exercício do retiro e das orações jaculatórias se encontra a grande obra da devoção: pode suprir todas as outras orações, porém a sua falta quase não pode ser substituída por nenhum outro meio. Não se pode viver a vida contemplativa e vive-se mal a vida ativa. O repouso se converte em ociosidade e o trabalho em desorganização” (Traité, 1. 6, ch. 1). – 63 (1) Nós nos enganaríamos muito se fizéssemos do abandono um caminho espiritual fácil e sem valor. Sem dúvida, necessitamos mostrar suas “vantagens”, mas não devemos esconder também que implica uma vida de fé e uma ascese sempre vigilantes. Cf. o artigo consagrado a esse vocábulo no Dictionnaire de spiritualité I, 2-25 e M. OLPHE-GALLIARD, L’Abandon à la Providence divine et la tradition salésienne, na Revue d’ascétique et de mystique, 1962, 324353. – Essa “via” é de modo equivalente recomendada por Santa Emília, quando utiliza os termos de “simplicidade”, “ingenuidade”, “esquecimento de si”, “paz”, etc. Sem fazer teoria sistemática, ela indica os aspectos complementares, negativos e positivos, do abandono. – 67 (1) Santa Emília não se limitou a prescrever a suas religiosas a visita externa aos doentes. Várias vezes insistiu sobre o fato de que, numa comunidade, a presença de membros doentes constitui uma graça. Cf. segunda secção, p. 174, 216; 1. 138. – 70 (1) O fato de se sentir estrangeiro na terra é essencial à “compunção”, tal como a compreende toda uma tradição espiritual católica: “...Quanto à ‘compunção’ o que conta essencialmente é o além, o invisível, as realidades, os bens e os males de ordem sobrenatural... Daí vem todo este conjunto de sentimentos profundos e ternos, comoventes e confiantes, de luta e de paz, cujas expressões incomparáveis estão em nossa liturgia, o Miserere mei Deus e o Salve Regina.” J. de GUIBERT, La componction du coeur, na Revue d’ascétique et de mystique, 1934, 225-240. Cf. DS II 1312-1321. – 79 (1) Tendo vivido sua infância no campo, dotada de uma sensibilidade e de uma imaginação ardentes, Madre Emília sempre experimentou um amor todo especial pela natureza. Sabia recomendar às Irmãs que aproveitassem essa beleza para alimentar e estimular a 59 hoje carmelita em Montauban e edifica a comunidade com sua regularidade. Quando estava em Montauban para a fundação do nosso estabelecimento, tive a oportunidade de vê-la. Agradeceu-me os cuidados que lhe prodigalizara. Sua Superiora contou-me que, quando ela entrou para ser religiosa, subia a escada de quatro em quatro degraus. Suplico às Irmãs que não desanimem diante dos defeitos das postulantes e noviças. Que elas suportem também com muita paciência os defeitos das crianças. Encarregada da vigilância dos recreios, preparava-me como se tivesse que dar uma aula. Brincava pouco com as alunas, mas as fazia brincar, falava-lhes da maneira como as coisas se apresentam na natureza, lembrava-lhes a presença de Deus, sem constrangimento. Não consentia jamais que fossem familiares comigo, a fim de conservar minha dignidade. Ensinei-lhes geografia durante algum tempo. Preparava minhas aulas e, percorrendo em espírito as regiões e as cidades, falava-lhes de tudo que se referisse à Religião ou à piedade. No Catecismo, contava-lhes sempre um fato que se relacionasse com a verdade explicada. Aconselhava-lhes a estudar a própria vocação e lhes inspirava o amor aos pobres, fazendo-as confeccionar, com retalhos, roupas para eles. Empreendi a conversão de uma jovem muito amável que eu desejava curar de uma paixão desordenada. Não tive êxito e percebi mesmo que a linguagem apaixonada dessa jovem me fazia mal. Logo que percebi isso, fui falar ao meu confessor e não me ocupei mais dessa infeliz. Ela se tornou um objeto de escândalo. Fui atingida por uma bronquite, durante a qual não podia falar. Vigiava em silêncio os recreios. As alunas diziam: "Nossa Mestra está doente." Isso me aborrecia um pouco. Com a licença de Pe. Marty, meu confessor, recebi a triste confidência dos erros de uma 60 jovem espanhola que tive a felicidade de reconduzir a Deus. Contudo, meu confessor me censurou por tê-la escutado. Recebi essa admoestação com um prazer tanto maior quanto mais ela me parecia imerecida, pois agi sob as ordens da obediência. Considerava que o desapego das coisas deste mundo era uma das maiores graças que Deus pudesse conceder a uma alma. Estimava tanto a pobreza que nada queria ter em meu quarto e desejava que me permitissem dar tudo que me fosse oferecido. Recusava o que não me era absolutamente necessário para economizar em favor dos pobres que eu continuava sempre a visitar. Não perdia a oportunidade de praticar um ato que julgasse agradável a Deus, mas, ao perceber que alguma coisa lhe causaria prazer, executava-a. Muito me comoviam estas palavras de Nosso Senhor: "Vinde, benditos de meu Pai." Doente de um olho, fiquei impossibilitada, durante algum tempo, de fazer minhas leituras. Aplicavam-me injeções. A postura adotada pelo médico causava-me uma pena extrema. Não ousava dizer-lhe. Recorri a Nossa Senhora. Sobreveio-me uma bronquite, o médico suspendeu o tratamento e eu me restabeleci. Ameaçada por uma doença moral, era preciso empregar um medicamento que feria um pouco o pudor. Consultei Pe. Marty que me deixou livre. Preferi a morte e fiquei curada. Havia, em casa da Sra. Saint-Cyr, uma Clarissa de piedade exemplar e desprezada pelas outras. Torneime sua enfermeira. Deus mesmo me instruía. Eu via nisso uma graça preciosa. Ele me dava grande força e muita energia para combater meus defeitos e aspirar à virtude. Pe. Marty me orientava para o que havia de mais perfeito. 605 modalidade dessa “recompensa”: “A alma que atinge o vazio e o despojamento de todas as coisas... só pode obter de Deus o que ele lhe destina. Quando a alma tem sido generosa, Deus não tarda em se comunicar pelo menos silenciosamente e em segredo” (Ibid). – 45 (1) A mansidão para consigo mesmo é instantemente recomendada por São Francisco de Sales, Introdução, 3ª parte, cap. 9. – 47 (1) Santa Emília deu provas de uma piedade eucarística fervorosa e discreta. Nisso não é contaminada pelo Jansenismo e, relativamente à comunhão freqüente, vê mais longe do que seu tempo, mas sabe também que essa leva a novas exigências (cf. l. 40, 53, etc). – 50 (1) A atual renovação bíblica ajuda a explicitar alguns dos subentendidos dessa carta: “O Êxodo consiste numa ruptura com o mundo pecador, mas é para viver numa intimidade nova com Deus. A imagem do deserto expressa ao mesmo tempo essa ruptura e essa intimidade... Os profetas evocaram esse período privilegiado com uma certa nostalgia” (DS IV 1993). A respeito do eremitismo, pôde-se escrever: “Solidão do monge ou solidão do eremita, mesma solidão, porém relativa, do cristão ‘em retiro’, pertencem autenticamente à espiritualidade cristã. Todo cristão busca a volta para Deus, a presença de Deus, a união com Deus. Nenhum verdadeiro ‘compromisso’ na encarnação leva a contradizer o mistério da divina transcendência, e nenhuma alma eleita pode tomar consciência desse mistério sem compreender e desejar a solidão, da qual o deserto do eremita é o símbolo absoluto” (DS IV 981). – 52 (1) A devoção ao Sagrado Coração sempre foi viva em Santa Emília e no seu Instituto: o primeiro regulamento, que data de 1816, faz alusões explícitas a essa devoção (cf. segunda secção, p. 152); o Sagrado Coração é mencionado na conclusão de numerosas cartas. Cf. nota 1 da segunda secção. – 53 (1) Sobre o sentido, sempre atual, da ação de graças que segue a comunhão sacramental, cf. DS II 1222-1234. – 55 (1) Sobre Irmã Vincent Vacquié, cf. catálogo alfabético dos correspondentes, p. 360. – 59 (1) Santo Inácio de Loyola pretende, também ele, que um certo comportamento exterior pode constituir a manifestação da união profunda com Nosso Senhor: “Eles devem manter-se na paz e na verdadeira humildade da alma, provar essa atitude pelo silêncio, quando deve ser guardado e, quando for o momento de falar, fazê-lo de um modo discreto e edificante, com modéstia no rosto, seriedade no andar e em todos os seus gestos, sem nenhum sinal de impaciência ou de orgulho. Eles se esforçarão e terão o desejo de não se elevar acima dos outros. Em sua alma os considerarão como sendo superiores a eles e manifestarão exteriormente o respeito e a 61 604 – 16 (1) Cf. Introdução, p. 14. As datas de Irmã Marie Vialard são 1799-1835; fez profissão em 1822. Cf. AUB 266 sv., HC 1822, 1834, DL 58. – 19 (1) Agathe Masbou; cf. catálogo alfabético dos correspondentes, p. 358. – 25 (1) At 9,6. – 26 (1) A obediência “de juízo” é proposta habitualmente como o supremo grau dessa virtude. Consiste em o superior e o súdito emitirem um mesmo julgamento prático no que diz respeito a uma determinação moralmente boa, que tende a promover o reino de Deus. Não deve ser confundida pura e simplesmente com a obediência cega, senão em certos casos extremos. Cf. H.-A. PARENTEAU, La notion d’obéissance aveugle, d’après saint Ignace de Loyola. Revue d’ascétique et de mystique, 1962, 31-51 et 170-195. – 27 (1) Essa “confissão” (cf. também l. 32, 125 e 149) deve ser comparada com as que Santa Emília escreveu a Pe. Fabre, em particular. Cf. primeira secção p. 112 e Autobiografia, cap. 10 et 14. – 29 (1) Madre Emília, que teve de combater os excessos de sua afetividade (cf. A cap. 10), sempre se mostra bastante rigorosa sobre esse ponto da amizade que poderia reinar entre membros de uma comunidade religiosa (cf. segunda secção, p. 242; 309). – 32 (1) Esse termo designa a cozinha e suas dependências. – 34 (1) Lc 10, 16. Essa aplicação das palavras de Nosso Senhor ao que os superiores dizem deve ser feita com discernimento: eles não têm o carisma da infalibilidade; porém, uma vez que tudo foi examinado diante de Deus e, se necessário, as “objeções” foram apresentadas, o súdito está certo de cumprir a atual vontade de Deus, executando a ordem recebida. – 37 (1) Todos os orientadores espirituais estão de acordo ao recomendar a abertura de consciência como meio de libertação interior e de objetivação das dificuldades morais e religiosas. Essa finalidade é conseguida antes mesmo da resposta da pessoa a quem é feita a confidência. Cf. Santo Inácio de Loyola – Exercices spirituels, nº 322; F. ROUSTANG, Une Initiation à la vie spirituelle (Paris, 1963), 97. – 44 (1) Segundo São João da Cruz, “Se se quer deixar Deus realizar a união na alma, só existe um método, aquele que liberta, que faz o vazio”(Subida, I, III, 1ª parte, cap. 1). Disso pode resultar, segundo o bel prazer divino, uma graça de união mística propriamente dita: “Quando a alma pronunciou, em Deus, o sim do desapego de todas as coisas... Deus deu sem sim pelo dom total de Sua graça. Nisso consiste o alto estado do matrimônio espiritual entre a alma e o Verbo de Deus” (Flamma, 3ª estrofe, v. 3). Porém, qualquer que seja a CAPITULO VII A madre experimenta a vida religiosa em várias comunidades Não pode fixar-se em nenhuma Como já disse, a atração pela vida religiosa me foi dada logo após minha conversão. Uma de minhas tias convidava-me para a sua Congregação: Nossa Senhora em Rodez. Se a morte não a tivesse levado, talvez eu tivesse ido. Veio-me o pensamento de entrar na Congregação das Damas de Nevers. Falei disso a Pe. Marty que me fez esperar quatro anos, no fim dos quais me permitiu fazer uma experiência. A saúde foi em parte a causa dessa delonga. Amava tanto a meus pais que a separação deles era uma morte para mim. Foi mister, entretanto, despedir-me deles. Parti para Figeac onde havia uma casa das Damas de Nevers. Durante a viagem, fingi dormir para não falar nem me distrair. Apenas entrei nesse convento, Deus me privou de sua presença sensível. Trevas espessas invadiram a minha alma. Não sabia o que fazer. Via faltas em toda a minha vida. Minha aflição era grande. Escrevi a Pe. Marty, a minha carta extraviou-se. Escrevilhe uma segunda. Ele me tranqüilizou, disse que me submetesse à vontade de Deus que tinha outros desígnios sobre mim. Após um mês na casa de Nevers, saí forçada pelas penas interiores. 11 Não receava a humilhação que essa saída me ocasionaria; entretanto, sofria. Experimentava repugnâncias tão grandes que nem podia ouvir a palavra obediência sem chorar. Após haver passado um pouco de tempo em Villefranche veio-me a idéia de entrar no Instituto das Damas do Santíssimo Sacramento de Picpus. Consultei Pe. Marty que não aprovou minha idéia e não quis mais 62 conversa. Fiquei desolada. Depois ele mudou de atitude, permitiu-me entrar naquele Instituto e ali fazer uma experiência. Segui para Cahors, onde havia uma casa daquelas Damas que me acolheram muito bem. Creio que Deus permitiu minha entrada ali para me mostrar modelos de piedade. Meu confessor achava que eu tinha uma consciência muito delicada. Declarou-me que não era chamada a viver naquela Congregação e fui obrigada a deixá-la. 12 A Sra. Genyer, fundadora das Irmãs da Misericórdia de Moissac, escreveu a Pe. Marty pedindo-lhe que se encarregasse da direção de um Seminário que ela acabava de fundar naquela cidade. Pe. Marty aceitou o pedido. A Sra. Genyer escreveu-me em seguida, convidando-me para fazer parte de sua Congregação. O convite agradoume muito e segui para Moissac. Eu me encontrei, quase imediatamente, no mesmo estado que em Figeac: trevas espessas encheram minha alma. Pe. Marty consolou-me e disse-me que Deus não me queria naquela casa. Queria ficar ali, mas a Superiora julgou que eu deveria sair. Voltando a Villefranche, veio-me o pensamento de que eu era inconstante. Voltei para junto de minha avó, na casa da Sra. Saint-Cyr, onde continuei a me dedicar à instrução da juventude, à visita aos pobres e doentes. Para a confissão, dirigia-me a Pe. Grimal. Desejava tão ardentemente a Comunhão que pedi licença para comungar todos os dias. Pe. Marty queria que a instrução religiosa fosse dada às crianças pobres das quais ninguém se ocupava, mas nunca me falou disso. Eu própria havia desejado isso também, mas nada dissera. Falei disso somente à Superiora das Carmelitas de Montauban, que visitei ao voltar de Moissac. Tendo sofrido muito em Moissac, Pe. Marty regressou a Villefranche onde reassumiu a direção da Casa Saint-Cyr. Dirigi-me novamente a ele para as Notas da terceira secção ____________________ N.B. – O primeiro algarismo é o da carta; o segundo é o da nota. – 1 (1) Este bispo é o de Cahors, Dom G. Cousin de Grainville (1802-1828). Praticamente governará a diocese de Rodez até 1822. Cf. nota 6 da Introdução. (2) Para se ter uma idéia aproximativa do conjunto das leituras espirituais, ou pelo menos dos conhecimentos parciais de Santa Emília sobre esse assunto ver o apêndice terminal. (3) Santa Emília parece ter, bastante cedo, renunciado a utilizar a partícula que indica nobreza, na sua assinatura. A partir de agora, assinará: “Irmã Emília”, às vezes acrescentando a menção (mais ou menos abreviada): “religiosa da Sagrada Família.” A partir de 1841, sobretudo, acrescentará muitas vezes o nome de Maria ao de Emília. – 3 (1) Mt 16, 24. (2) “Mamãe” designa a Sra. de Pomairols; na carta 5, Emília a chamará de “vovó.” – 5 (1) Eléonore desposará em janeiro de 1811 o Sr. Colomb, de Rignac. Teve sete filhos, dentre os quais uma filha chamada Emília que foi interna em Villefranche. (2) “Titia” designa Agathe de Polmairols, tia-avó de Emília, antiga Visitandina. (3) Esse Henri é o irmão caçula de Santa Emília, nascido em 1799. Foi aluno do colégio onde Pe. Marty exercia a função de diretor. – 6 (1) Ao terminar suas cartas, Madre Emília saúda habitualmente suas correspondentes religiosas “no Sagrado Coração de Jesus”, ou “nos santos Corações de Jesus, Maria e José”. Esta última fórmula pode parecer insólita, pois São José certamente não ressuscitou. Entretanto, não se vai censurar o autor. Muitas vezes, também, as frases de adeus têm uma intensa tonalidade afetiva. – 8 (1) As iniciais “L.S.J.C” significam: “Louvado seja Jesus Cristo”. É a fórmula ordinária de saudação das religiosas da Sagrada Família (v.s., segunda secção, p. 153); mais tarde, Madre Emília utiliza em geral a sigla: “J.M.J.” (2) Trata-se de Irmã Athanasie Rozié. Cf. nota 12 da Introdução. – 12 (1) Sem dúvida, em razão da influência da tia da fundadora e das preferências de Pe. Marty, a espiritualidade salesiana marcou fortemente Santa Emília e seu Instituto. Cf. índice onomástico: Francisco de Sales, etc. 63 602 Não estou zangada com ninguém, mas quero – porque o bom Deus assim o quer – que, embora se escreva para pedir uma autorização, deve-se aguardar a resposta para agir. Até aqui, nossas Irmãs não-clausuradas e nossas Irmãs rodeiras vieram sem ter sido chamadas. Sempre considerei isso com muita tristeza, mas não acreditei poder dizê-lo. Agora chegou o momento de poder falar. Antes de morrer, quero que saibam que não o aprovei. confissões; ele me encaminhava sempre para o mais perfeito. Quando eu saía para visitar os doentes, evitava ver qualquer coisa. Baixava tão bem os olhos que a ninguém saudava. Eu não tinha lareira no meu quarto; gostava dessa privação. Na cama, tinha apenas um cobertor de algodão. Não procurava saber as novidades do mundo, por isso, arranjava-me para ficar com as alunas nas horas dos recreios. Não gozava de boa saúde. Esforçava-me para não faltar aos meus pequenos deveres. Não poder entregar-me à leitura e à escrita foi para mim grande privação. Saúdo-a com muita afeição e recomendo-lhe não se afligir, pois estou muito feliz. Tarda-me encontrar o bom Deus. CAPITULO VIII Irmã Foi, assistente, escreveu por nossa Madre no seu leito de morte. P. S. Foi nossa santa Madre quem ditou esta carta e até o modo como devia ser assinada. Madre Emília funda a Congregação da Sagrada Família para a educação das meninas pobres Dificuldades que ela encontra no estabelecimento dessa obra Visitava, como já disse, os pobres da cidade, esperando que Deus me desse a conhecer o que queria de mim. Um dia, encontrei várias mulheres na casa de uma doente. Elas falavam de suas pobres crianças que, diziam, cresciam numa grosseira ignorância e no esquecimento de Deus, porque elas não tinham meios de instruí-las. Diziam: "Antes da Revolução, as Ursulinas ensinavam gratuitamente; nós mesmas tivemos a felicidade de ser instruídas por elas." Essas palavras foram como um dardo que veio traspassar-me a alma. Disse-lhes que me enviassem suas filhas, que eu mesma me encarregaria de instruí-las, e, no intimo do coração, prometi a Deus fazer tudo que dependesse de mim para fundar em Villefranche um estabelecimento destinado à instrução de meninas pobres, 64 601 contanto que Pe. Marty o aprovasse. Comuniquei-lhe o meu desejo. Ele me disse ter tido a mesma idéia e me animou a cumprir a promessa. Pedi então licença à Sra. Saint-Cyr para dar aulas no meu quarto às crianças pobres que aparecessem. Ela me autorizou a recebê-las e logo se apresentaram umas quarenta meninas. Como meu quarto era muito pequeno, – era um pouco menos da metade do que ocupo neste momento – vi-me obrigada a colocá-las sobre minha cama. Servia-me de umas para ensinar as outras. Para começar o estabelecimento de que já falei, Pe. Marty designou três jovens professoras da casa. A mais velha das três era a senhorita Ursule Delbreil; as outras eram as senhoritas Marie Boutaric e Eléonore Dutriac. As quatro éramos intimamente unidas e elas tinham um zelo extraordinário. Manifestei-lhes meu desejo e elas o aceitaram com grande satisfação, sobretudo quando viram que era o desejo de Pe. Marty. Juntas deliberamos, então, preparar-nos para a execução desse projeto por meio de orações, nas quais todos os Fundadores de Ordens religiosas eram invocados. Reuníamo-nos todos os dias para rezar o Ofício de Nossa Senhora. Prometemos a Deus que, assim que estivéssemos reunidas em comunidade, erigiríamos um altar a Jesus-Mestre, que rezaríamos a Salve Rainha durante seis meses. A empresa era difícil e muito grande nossa apreensão. A Sra. Saint-Cyr era muito boa para nós. Temíamos que, realizando nosso projeto, prejudicássemos sua obra, o que não queríamos. Rezamos e pedimos orações, depois decidimos comunicar-lhe nosso projeto. Escolhemos para isso o dia da Imaculada Conceição. Nossa Senhora ajudou-nos, pois a Sra. SaintCyr recebeu-nos muito bem, prometeu-nos que seria a primeira a nos auxiliar. Cumpriu sua promessa, dandonos, pouco depois da fundação, vasos sagrados, paramentos e até dinheiro. 219 Última carta de Madre Emília, ditada seis dias antes de seu falecimento. É bastante severa: uma religiosa de Figeac, Irmã Gabrielle, veio sem permissão para ver uma última vez a fundadora. Madre Emília afirma que essa maneira de agir é inadmissível e quer que se saiba disso (L 938, M 575-577). À Madre Vincent, em Figeac. Villefranche, 13 de setembro de 1853. J.M.J. Minha muito querida Madre: Acredito que certamente fez o possível para impedir a viagem de Irmã Gabrielle, entretanto, penso que lhe faltou firmeza. Deveria lhe ter dito: “Não posso deixá-la ir porque não tenho permissão.” É verdade que você escreveu, mas não recebeu resposta. Era preciso que Irmã Gabrielle permanecesse em seu lugar até que a obediência a chamasse. Nem mesmo você deveria ter escrito para solicitar essa permissão. Era preciso dizer à Irmã Gabrielle: “Gostaria de lhe conceder esta consolação, mas não me é possível. Se quiser ir não posso retêla. Saiba, porém, que não a autorizo, sabe que não posso.” Que exemplo para a Congregação! Desejo que diga a todas as Irmãs que Irmã Gabrielle viajou sem autorização da Casa-mãe. Se você reconhece não ter tido firmeza, diga-o à Comunidade e que esse fato sirva de lição para todas as Irmãs. Devem respeitar a autoridade de Deus na autoridade da superiora. Se eu tivesse podido, a Irmã teria voltado imediatamente, mas partirá esta tarde e quero que toda a Congregação saiba que, de forma alguma, aprovo tais ações. Outras Irmãs, além de Irmã Gabrielle, teriam gostado de me ver, mas fizemos votos e, para que eles serviriam se não os observássemos? 600 65 paz, o repouso, a felicidade após um ano agitação, de cansaço? É por isso que seus corações o desejam ardentemente. Paciência, minhas boas Irmãs, paciência. Ainda um mês de trabalho e de sacrifícios e depois todas juntas repousaremos no Sagrado Coração de Jesus. Nesse Coração adorável adquirimos novas forças, inflamaremos nosso zelo, purificaremos nosso coração de tudo o que o contato com o mundo nos tiver trazido de estranho. Obteremos o perdão de nossos pecados por intermédio do Coração de Jesus. Nós nos consagraremos com um renovado ardor ao serviço de Deus e à salvação das almas. Animadas e fortificadas pelo auxílio do alto, retomaremos com ardor nosso trabalho interrompido por um instante. A fim de evitar toda causa de dissipação durante os santos dias do retiro e só ter de nos ocupar dos cuidados de nossa alma, queiram prever as diversas compras a fazer, seja dentro de casa, seja fora. É preciso, minhas muito queridas Irmãs, que nenhum pedido seja feito durante o retiro. Que, durante o mês de agosto, cada superiora envie à Madre Diretora ou à Irmã Ecônoma a relação detalhada de tudo o que quer levar voltando para sua casa. Com toda certeza, vão apreciar essa medida e todas considerarão um dever conformar-se a ela. Sempre fiquei triste ao saber que um bom número de nossas Irmãs se demoram na cidade, em lugar de ir diretamente ao convento. Recomendo-lhes de modo bem particular irem para a Casa-mãe logo ao chegar. A abertura do retiro será no dia 1º de setembro pela manhã. Como nos anos anteriores, só será permitido fazer um pequeno trabalho de tricô. Peço-lhes, minha queridas Irmãs, fazerem uma pequena oferta para ajudar a Casa-mãe nas despesas extraordinárias que ela é obrigada a fazer durante o retiro. Toda de vocês. Irmã Maria Emília. Vencida essa primeira dificuldade, outra sobreveio, a de achar uma casa para alugar. Ninguém confiava em quatro jovens sem recursos para pagar o aluguel. Após muita fadiga, achei uma, atrás do antigo cemitério. Acertamos o aluguel com o proprietário, apesar de ele ser bastante alto. No dia seguinte, devíamos ir à polícia, mas o proprietário havia mudado de opinião, e foi preciso empreender novas buscas. Elas não tiveram resultado durante algum tempo. Nosso projeto era quimérico e considerado loucura mesmo pelos mais criteriosos. Todas as senhoras do pensionato se voltaram contra nós, inclusive minha avó. O clero da cidade, salvo Pe. Grimal e Pe. Daures, também nos desaprovou. Censuravam-nos fortemente. Pe. Marty não podia tomar nossa defesa. Era triste a situação. Embora Pe. Marty não pudesse nos defender publicamente, ajudava-nos em segredo com seus conselhos e avisos. A Providência veio enfim em nosso auxílio, inspirando uma antiga aluna da Sra. Saint-Cyr, a senhorita Alric, a feliz idéia de alugar-nos uma parte da casa por ela habitada. Essa casa era insalubre, mal situada, no centro da cidade, sem jardim, muito escura, pois a rua era estreita, diante de alto muro que a privava de ar e de luz. Apesar de todos esses inconvenientes, parecia-nos ter feito uma grande descoberta e prometemos pagar por ela quatrocentos francos. Essa piedosa moça prometeu-nos emprestar alguns móveis e ajudar-nos no que fosse possível. Enquanto nos ocupávamos ativamente com a nossa empresa, as senhoras da pensão Saint-Cyr pensaram em se organizar como comunidade. Queriam fazer da casa um convento. Falei disso a Pe. Marty que me respondeu: "O vento levará tudo isto." Com efeito, ao cabo de um ano essa casa não mais existia. Quanto a nós, nada tínhamos. Meus pais, bem como os de minhas companheiras, eram inteiramente contrários ao nosso projeto e, por conseguinte, não podíamos contar 66 com eles. Os pais da senhorita Eléonore Dutriac fizeram tudo o que puderam, promessas, ameaças, para dissuadila do seu nobre ideal. Chegaram a dizer-lhe que a mandariam buscar à força e a meteriam no cárcere. Eles o teriam feito se os magistrados não se tivessem oposto a tal injustiça. Minhas companheiras e eu esperávamos com impaciência o momento feliz em que poderíamos entrar em nossa nova casa para ali nos entregarmos aos exercícios de nossa santa vocação. Reuníamo-nos muitas vezes para nos estimular a uma fiel correspondência aos desígnios de Deus, mas não era fácil conseguir esses momentos. As senhoras da casa, que não gostavam de nosso empreendimento, muito nos mortificavam. Assim, quando estávamos sós, em doce intimidade, uma delas vinha impedir-nos de manter nossa piedosa conversa. Em outras ocasiões, encarregavam alguém de nos escutar, de forma que fomos obrigadas a nos reunir durante a noite. Não faltavam zombarias, críticas, censuras. Julgavam com isso prestar-nos serviço, pois nossa obstinação parecia evidente. As pessoas que ajudavam a Sra. Saint-Cyr em seu apostolado zangavamse porque nós queríamos deixá-la e repetiam constantemente que era um crime abandonar essa virtuosa senhora, deixá-la sem mestras e obrigá-la a fechar a sua escola. Nós não queríamos prejudicá-la e, entretanto, fora decidido que devíamos responder ao chamado de Deus a isso estávamos resolvidas. A Providência veio em nosso auxílio. Os inquilinos da casa por nós alugada, que só deviam sair no São João, saíram logo no mês de abril. Ao mesmo tempo, a Sra. Saint-Cyr pensou seriamente em fazer de sua casa um convento, o que nos facilitou a saída. Em 30 de abril, dia de Santa Catarina, fui com a senhorita Eléonore Dutriac ver a casa que havíamos alugado. A senhorita Alric aconselhou-nos que 599 respeito, a afeição de todas as pessoas que tiveram a felicidade de viver sob sua obediência. Os sentimentos comoventes expressados pelas penitentes após a sua morte são a prova inequívoca da afeição que lhes dedicavam. A doença que a afastou delas foi longa e dolorosa. Durante sua agonia não cessava de repetir: “Bom pastor, tenha piedade do rebanho que me confiou.” Alguns instantes antes de falecer, mandou chamá-las e pôde apenas pronunciar estas palavras: "A penitência nos abre o céu." Após ter invocado com amor e confiança os santos nomes de Jesus, Maria e José, adormeceu na paz do Senhor. Embora a santidade de sua vida nos faça acreditar que Deus a tenha recebido em sua santa morada, peço para ela os sufrágios da Congregação.1 Toda sua nos santos Corações. (Sem assinatura) 218 Carta preparatória ao retiro: é no Coração de Nosso Senhor que as religiosas virão encontrar o ânimo necessário à sua vida interior. Cuidar atentamente para que as compras ou outras coisas semelhantes não prejudiquem o recolhimento daqueles dias (L 934). Circular para todas as casas. Villefranche, 1º de agosto de 1852. J.M.J. Minhas muito queridas Irmãs: Tenho certeza de que cada uma vê chegar com alegria o tempo do retiro. Agradeçamos à divina Providência esse novo favor. Façamos o possível, minhas muito queridas Irmãs, para nada perder das graças que Deus, na sua infinita misericórdia, prepara para esses dias de bênção em que a alma recolhida e silenciosa só escuta a voz do seu bem-amado. O retiro não é a 598 todo tipo. Ficava tão atormentada que vivia com a face banhada de lágrimas. Acreditava estar tão longe dele que não ousava mais receber o sacramento de seu amor. Durante sete anos não conseguiu receber na santa comunhão aquele que amava de todo o coração e que acreditava ofender a todo instante. A viagem a Villefranche, longe de acalmar seus males, tornou-os mais amargos. Só via em Deus um juiz terrível, pronto a castigá-la. Nosso capelão, com quem ela falou, descobriu logo o rico tesouro que a divina Providência lhe enviava. Tendo-a escutado uma ou duas vezes, compreendeu que Deus tinha grandes desígnios para essa alma, que ele se comprazia em crucificar. Aos poucos, exerceu uma influência tão grande sobre ela que a fez aproximar-se dos sacramentos, o que custou terrivelmente à sua penitente. Após esse primeiro passo, seu confessor lhe declarou que Deus a queria religiosa da Sagrada Família. Apesar de suas oposições e de suas repugnâncias extremas causadas pelo temor excessivo de não cumprir os deveres do estado religioso, embora fosse de uma exatidão exemplar, submeteu-se e vestiu o santo hábito religioso. Seus sofrimentos continuaram e só ficou livre deles dois dias antes de falecer. Tendo terminado o noviciado, não conseguiu assumir a profissão, só pronunciando os votos alguns anos depois. Viveu num alto grau de generosidade e de espírito de sacrifício. Seu fervor, sua fidelidade às menores prescrições da Regra nunca diminuíram. Seu atrativo particular era viver desconhecida aos olhos dos homens. Por isso, quando foi nomeada superiora do Refúgio ficou numa tristeza tão grande que ficou acamada. Mas quando lhe fizeram compreender o valor da obra das arrependidas e que essas jovens excluídas da sociedade foram objeto da ternura, da solicitude e até das buscas do divino Pastor, quando compreendeu todo o bem que se podia fazer a elas, aceitou com resignação a vontade de Deus e assumiu o governo da casa. Suas filhas adotivas encontraram nela uma mãe terna e dedicada. Todos os seus momentos lhes eram consagrados, só vivia, só respirava por elas. Estabeleceu em sua casa uma perfeita ordem. Soube conquistar a estima, o 67 ficássemos logo companheiras. e mandássemos chamar nossas Escrevi à Sra. Saint-Cyr e, na tarde do mesmo dia, as senhoritas Ursule Delbreil e Marie Boutaric vieram juntar-se a nós. Bendizemos o Senhor por nos ter conduzido enfim à solidão e começamos logo a observar o pequeno regulamento que tínhamos feito, esperando que Pe. Marty nos pudesse dar as Constituições. À noite, tocamos a campainha para anunciar o grande silêncio e nos propusemos honrar particularmente o Sagrado Coração de Jesus e viver inteiramente entregues aos cuidados da divina Providência. Essa casa obscura foi para nós um lugar de delícias, e Deus nos fez experimentar quanto se é feliz ao deixar tudo por seu amor. A senhorita Alric preparou nosso jantar e, como não estávamos habituadas aos trabalhos domésticos, Anne Revel, uma virtuosa viúva que cuidara de mim desde meus primeiros anos e me queria muito bem, encarregou-se do serviço, desde o começo. Ela comprava o trigo, preparava a massa e nos trazia o pão. Encarregava-se ainda de tudo mais de que precisássemos. No dia 1º de maio de 1816, vestimos um hábito muito simples e uniforme. Na cabeça tínhamos uma touca e, duas a duas, fomos à Missa onde comungamos. No dia 3 de maio, à sombra da Cruz, abrimos uma classe gratuita. Abrimos também uma classe denominada Santa Maria para as meninas de condição média. Jeanne Bonal, morta na Congregação com o nome de Ir. MarieRaymond, foi a primeira aluna que se apresentou. Sua tia enviou-nos lenha. Adotamos ao mesmo tempo uma orfãzinha, Myon Colombiès, para atrair as bênçãos de Deus sobre o estabelecimento e, logo depois, encarregamo-nos de duas espanholas. Chegaram numerosas meninas pobres. Para acomodar nossas três orfãzinhas, foi preciso colocar a cama de Irmã Ursule no vão de uma janela e eu mesma fui dormir numa mansarda desabrigada, no alto de uma torre, quase ao ar livre. 68 Um de nossos maiores desejos era possuir o Santíssimo Sacramento em casa. Dom Grainville, bispo de Cahors, 13 que fazia então a visita pastoral da Diocese, achava-se em Villefranche. Fomos cumprimentá-lo e pedir que nos concedesse a Santa Reserva. Respondeunos que era preciso ver primeiro a marcha do estabelecimento. Não podendo observar a clausura, como teríamos desejado, procuramos aproximar-nos o mais possível das religiosas que a observavam. Não fazíamos visitas e as pessoas seculares eram recebidas em um sótão obscuro, que nos servia como parlatório. Entretanto, éramos obrigadas a sair para ir à Missa e realizar uns passeios necessários, o que muito nos mortificava. Apontavam-nos com o dedo e éramos objeto de sarcasmo e desprezo. Embora não tivéssemos guardachuva, íamos à Missa mesmo que chovesse torrencialmente. Desprezando as censuras, cobríamo-nos com velhos chapéus, com aventais de cozinha, o que não contribuía pouco para excitar a hilaridade pública. Em vez de nos contrariarmos com isso, pensávamos ser bom sinal para o êxito de nossa obra. Quando íamos passear, juntávamos gravetos que arrastávamos na volta pelas ruas, a fim de atrair para nós o desprezo. Eu levava um pouco longe esse amor ao desprezo, e o bom Deus permitiu que não nos poupassem. Pe. Marty, então diretor do Colégio, foi obrigado a manter-se afastado, visto ser capelão da Casa de SaintCyr. Eu considerava também como feliz presságio ser ajudada pelos pobres. A senhorita Alric emprestou-nos algumas camas e alguns pratos; uma pobre viúva deu-nos lenha e a metade de um lastro de cama com que mandamos fazer dois bancos. Anne Revel, de quem já falei, assim como outra virtuosa moça, dedicaram-se a nos fornecer as coisas indispensáveis. Não tínhamos provisões. Vivíamos cada dia. O trigo tornou-se muito 597 217 Circular necrológica da Irmã Raymond Bonal, superiora do Refúgio em Villefranche. Foi uma das primeiríssimas alunas, entrou na Congregação em maio de 1816. Madre Emília revela até que ponto essa religiosa sofreu por causa de escrúpulos e angústias interiores, antes e até mesmo depois de entrar no convento. No entanto, nada diminuía seu zelo junto às arrependidas que foram unânimes em sentir a sua falta (L 932). À Madre Léonide em Asprières, e a todas as casas. Villefranche, 27 de junho 1852. J.M.J. Minhas queridas Irmãs: Nossa casa do Refúgio, toda a nossa Congregação, acabam de sofrer uma grande perda com o falecimento de nossa querida Irmã Marie Raymond, que o Senhor chamou, quinta-feira, 24, às 5h30 da tarde. Essa querida Irmã foi nossa primeira aluna. No dia 3 de maio, quando iniciamos a Congregação, ela se apresentou para freqüentar nossa escola. O bom comportamento, a piedade, a doçura que a caracterizavam tornaram-na muito querida de suas mestras. Em pouco tempo foi apresentada como modelo às suas jovens companheiras. Antes que o desejasse, foi obrigada a deixar o estabelecimento para cuidar de uma de suas tias enferma que habitava Mur-deBarrez. Essa tia, embora muito virtuosa, a fez sofrer muito pelas desigualdades de seu caráter que, por vezes, a tornavam insuportável. Nossa querida Irmã tudo suportava com uma paciência admirável. Para pagar as despesas ocasionadas pela doença da tia, teve de se impor duras privações, mas nada lhe custava: fadigas, trabalho, saúde, tudo sacrificava por ela. Após o falecimento da tia, fez uma viagem até Villefranche para acalmar os escrúpulos que a devoravam. Desde sua tenra infância, Deus a tinha provado com sofrimentos interiores de 596 69 Autorizo de bom grado que nossas Irmãs se confessem apenas cada 15 dias. Queira entregar ao Vigário de Cransac os dois boletins que lhe envio da parte de Pe. Bernard. 216 Estando doente e muito enfraquecida há vários meses, a superiora geral pede a Pe. Abbal que a partir de agora envie toda a correspondência administrativa à Madre Foi Bousquet (L 931, M 570). A Pe. Abbal, Vigário geral de Rodez. Villefranche, 23 de junho de 1852. J.M.J. Reverendo Padre: Sofro, há vários meses, de uma doença nos olhos e tenho várias enfermidades que me dão um cansaço contínuo e me impedem de trabalhar. O menor cansaço, seja de espírito, seja de corpo, aumenta meus males. Não tendo condições de me ocupar e resolver os negócios, Madre Foi cuida da casa e da Congregação, de acordo com o Conselho. Ela me consulta e segue meus conselhos. Preside também o Conselho, comunicame as deliberações sobre as quais dou meu parecer antes da conclusão. Estando impossibilitada de tratar de negócios, não podendo ler nem escrever, o senhor não se incomodará que lhe peça para enviar suas cartas à Madre Foi. Ela leu para mim a última que o senhor me fez a honra de escrever, comunicou-a ao Conselho e terá a honra de lhe responder. Sou, com profundo respeito, Reverendo Padre, sua humilde e obediente filha. Irmã Maria Emília. caro. Chuvas que duraram até junho pareciam anunciar a perda completa da colheita. O preço dos víveres subiu excessivamente, a ponto de o hectolitro de trigo ser vendido até por cinqüenta francos. Nesses momentos críticos, confiamos plenamente em Deus e ele não nos abandonou. Inclinou diversas pessoas a nos emprestarem trigo que deveríamos pagar no ano seguinte. Para obter as bênçãos de Deus, já nos tínhamos encarregado de três orfãzinhas. Adotamos uma quarta. Nas classes remuneradas, recebíamos alunas com grandes abatimentos. Bastava que os pais expusessem sua situação precária para que as recebêssemos gratuitamente. Fazíamos a mesma coisa com as internas. Várias pagavam a metade ou a quarta parte da pensão. As jovens que se apresentavam como aspirantes ao estado religioso eram também recebidas gratuitamente. Não lhes pedíamos senão a boa vontade de seguir Jesus Cristo. A Providência não falhou. Nunca nos faltou o necessário, e sempre nos chegavam os auxílios indispensáveis à medida que dele precisávamos. Essa mesma Providência velou ainda sobre nossa saúde. Tínhamos temperamento fraco e delicado e, contudo, nenhuma de nós esteve doente, apesar de muito mal agasalhadas, pobremente alimentadas, pois, como já disse, havíamos dado os quartos mais cômodos da casa às internas, reservando-nos o alto de uma torre, onde o frio e o vento se faziam sentir tanto quanto na rua. No entanto, não tivemos o mais leve resfriado. Nossa alimentação era frugalíssima desde os primeiros dias, mas nossa Irmã Marie Boutaric que se julgava dengosa, embora fosse muito austera, achou que o pão era bom demais e propôs que não se peneirasse a farinha. Seguimos seu conselho e, durante algum tempo, o pão era tão escuro que era preciso ter um apetite muito bom para comê-lo. Ela entendeu ainda que era fresco demais quando o servíamos. Ficou resolvido que faríamos muito pão de cada vez e a resolução foi tão bem 70 executada que nos aconteceu várias vezes comê-lo cinzento de mofo. Nossa cara Irmã, ávida de mortificação, achou que os legumes eram muito bem preparados e indicou uma cozinha muito econômica; algumas cenouras ou batatas cozidas em água com um pouco de banha, que apenas se via, foi todo o tempero. O vinho foi proibido. Essas privações não faziam senão aumentar a alegria de nossas almas. Uma única privação era-nos dolorosa, a de não possuirmos o Santíssimo Sacramento em casa. Pedíamos a Deus essa graça que nos foi concedida em junho do mesmo ano por Dom Grainville, ao passar novamente por Villefranche, quando voltava de sua visita pastoral. Honrou-nos com sua visita, ficou muito satisfeito ao ver a ordem e regularidade que reinavam em nossa casa e concedeu-nos a maior das felicidades por que poderíamos anelar. Possuindo o Santíssimo Sacramento, acreditávamos ter tudo. Logo erigimos um altar, mas nada tínhamos para orná-lo, nem paramentos para a Missa. Pe. de PomairolsGrammont emprestou-nos paramentos que nos deu em seguida. A Sra. de Pomairols, minha tia religiosa, deunos toalhas para a sacristia e outras coisas dentre as quais uma taça de prata que mandamos transformar em um cálice. Minha avó contribuiu também com sua cota, assim como a senhorita Alric. Várias outras pessoas quiseram também contribuir para essa boa obra. Emprestaram-nos uma custódia e, desde então, só nos faltava mandar benzer a capela e encontrar um padre para celebrar a Missa. 595 você está adoentada, teria sido melhor guardá-las e comê-las. Privou-se por minha causa. Cuide de sua saúde, minha querida Madre. O frio não lhe faz bem, faça o possível para não se expor a ele. Levante-se mais tarde, deite-se cedo, enfim, faça tudo que puder para ter condições de me dizer em breve que está perfeitamente restabelecida. Compartilho dos sofrimentos de Pe. Ricard. Hoje, iniciamos uma novena e domingo daremos a intenção na bênção do Santíssimo Sacramento. Tenho a consolação de saber que o retiro das crianças foi um sucesso. Peço ao bom Deus que dele conservem os frutos. Fico contente de saber que fará todo o possível para propagar a obra da Santa Infância. Aqui nossas crianças estão muito animadas. Uma menina da classe de Irmã M. Paul solicitou como um favor ter apenas um pedaço de pão para o jantar, porque a mãe não queria lhe dar um centavo para fazer a inscrição e disse ingenuamente à sua mãe, que lhe oferecia um pedaço de queijo: “Mamãe, guarde o queijo e me dê um centavo.” Já constituímos um certo número de séries. As alunas da classe do Bom Pastor organizaram um sorteio em benefício da obra. Despojaram-se de seus brinquedos, conseguiram prendas e distribuíram bilhetes. Essa turma da Irmã Angèle tem apenas cinco alunas, mas precisa ver com que zelo conseguem prendas e distribuem bilhetes. Eles são vendidos por apenas cinco centavos e elas têm cerca de 80 prêmios. A leitura de um boletim lhes deu essa idéia. Fizeram tudo sozinhas e no início sem eu saber, estavam muito contentes de me fazer uma surpresa. Uma delas trouxe uma lanterna mágica: houve um grande espetáculo. As alunas da classe São Casimiro deviam pagar um centavo para assistir à representação e as da classe Santa Maria e São Vicente pagavam apenas dois centavos. Foi uma brincadeira inocente e transformaram o recreio numa ajuda à Santa Infância. Toda sua. Não tenho mais tempo para continuar. Irmã Maria Emília. 594 71 as maiores das classes gratuitas também deram sua contribuição e as que não têm condição de dar um centavo oferecem um santinho, um pouco de queijo, etc... Peça ao bom Deus que queira sustentar o que ele começou, pois essa devoção é bem própria a fazê-lo amar. Envio-lhe um folheto e uma gravura, assim como 2 quadros, 2 livros. Se precisar de mais, eu os enviarei. Cuide bem da gravura, porque ela não é encontrada facilmente. Queira devolvê-la após tê-la utilizado para animar as crianças. Saúdo afetuosamente nossas queridas Irmãs e peço-lhes que se interessem muito pelos irmãozinhos do Menino Jesus. Eles são tão infelizes e elas podem abrir-lhes a porta do céu oferecendo-lhes a graça do santo batismo. Toda sua. Irmã Maria Emília. 215 Agradecimentos a Françoise Pascal que, juntamente com a carta, enviou algum presente para Madre Emília. Recomendações para cuidar da saúde. Alegria em saber que tudo será feito em Aubin para propagar a obra da Santa Infância, que tem cada vez mais sucesso em Villefranche (L 901, M 547-549). À Madre Françoise, em Aubin. Villefranche, 17 de março de 1852. J.M.J. Minha muito querida Madre: A sua afetuosa carta muito me tocou. Mil vezes obrigada pelos doces, ainda mais por sua atenção, que me é infinitamente mais agradável do que o presente. Não quero dizer que não o aprecio, pelo contrário, mas quero dizer que o sentimento do coração me causou ainda mais prazer do que o próprio presente. Agradeço igualmente as lindas uvas que me mandou. Como CAPITULO IX A Madre manda benzer a capela e procura um sacerdote para celebrar a Santa Missa. Crescendo todos os dias o número das alunas, muda-se de local. Candidatas apresentam-se para receber o hábito religioso. Sua avó e tia vão reunir-se a ela. Marianne Gombert pede para terminar seus dias no novo convento Pe. Martin, pároco de Notre-Dame, foi designado para benzer nossa capelinha, o que ele fez em 15 de julho. Celebrou em seguida a Santa Missa e nos deixou Aquele que não tínhamos cessado de chamar por nossos desejos e preces. Então nos julgamos ricas no meio de nossa pobreza. Apressamo-nos em procurar um sacerdote para celebrar a Santa Missa. Ninguém queria vir, pois ainda éramos censuradas e criticadas, e o fomos durante dois anos. Um sacerdote decidiu-se, enfim. Pe. Jourdain, pároco de Veuzac, e Pe. Blanc, pároco de Saint-Affrique, vinham confessar-nos. Padre Moncan confessava as internas. Eu mesma era sempre dirigida por Pe. Marty. 14 O número das alunas aumentava cada dia. O local que tínhamos alugado não era mais suficiente. Voltamos nosso olhar para a casa da Senhora Saint-Cyr que não era mais habitada. O aluguel que nos propuseram era muito elevado mas, confiando em Deus, prometemos dar 700 francos por ano. Logo que ocupamos a casa, tivemos a consolação de poder observar a clausura. Contratamos definitivamente um capelão que celebrava a Santa Missa e confessava as internas. Podíamos comunicar-nos livremente com Pe. Marty que vinha estimular nosso 72 593 zelo. Apesar de suas numerosas ocupações, quis ser nosso confessor ordinário. privação que lhe é imposta, e gosto de pensar que fará generosamente o sacrifício. Algumas candidatas vieram aumentar nossa pequena comunidade. Um dia, entre outros, cantávamos; de repente, percebemos uma jovem que se apresentava para entrar na Congregação, trazendo-nos um porco. Uma e outro foram bem-vindos. Tudo dirigia nosso reconhecimento para com Deus que jamais faltava em nossas necessidades. Minha avó e minha tia quiseram vir reunir-se conosco. Como na casa da senhora Saint-Cyr, elas pagavam uma boa pensão, o que nos ajudou muito a comprar móveis e a ficar um pouco mais à vontade. Como você pretende viajar para Villefranche, terei ocasião de lhe expressar novamente os sentimentos que você já conhece. Marianne Gombert, aquela moça virtuosa em cuja companhia eu visitava os pobres na minha infância, desejou com ardor vir terminar seus dias entre nós. A princípio recusei, temendo que, embora piedosa, não tivesse ela a nossa maneira de ver e prejudicasse a regularidade. Ao saber que não a aceitaríamos, disse que isso não a impediria de dar-nos tudo o que tinha. Fiquei comovida com tal generosidade e lhe reservei um quarto na casa. Ela nos edificou com seus exemplos de virtude. Sua humildade era tão profunda que se considerava indigna de habitar no convento. Afetada de uma pleurisia, sofria essa doença com uma paciência inalterável. Viu chegar a morte com paz e confiança, na idade de setenta anos. Deixou três mil francos para a casa. Manifestação do zelo de Santa Emília pela obra da Santa Infância. Como as alunas de Villefranche multiplicam donativos e sacrifícios para o resgate dos pequenos pagãos (L 899, M 545-546). Minha tia, Marie Agathe de Pomairols, era Visitandina e fora educada no espírito de São Francisco de Sales. Expulsa do convento depois da Revolução, voltou para sua família. Era muito instruída, mas ocultava sua instrução aos olhos dos homens. Veio terminar seus dias junto a mim. 15 Depois de dois anos de residência na casa da senhora Saint-Cyr, pensamos comprar uma casa. Pe. Grimal, que nos protegia, comprou-nos o antigo convento dos Cordeliers que, desde a Revolução se tornara um café dos Toda sua no divino Coração de Jesus. Irmã Maria Emília. 214 À Madre Vincent, em Figeac. Villefranche, 2 de março de 1852. J.M.J. Minha muito querida Madre: O divino Menino Jesus, que é o presidente da obra da Santa Infância, a recompensará por seu zelo em propagar a amável associação da qual ele é o presidente. Não se deixe amedrontar pelas dificuldades. Que nossas queridas Irmãs tenham muito zelo por essa excelente devoção. Encoraje as crianças e conseguirá tudo. Mas para isso é preciso ter a bênção de Deus que necessita pedir com confiança. Aqui tivemos muita sorte, o ardor de nossas alunas jorrou espontaneamente. Um dia, a mestra de trabalhos manuais da turma..... por acaso fez ler um boletim da Santa Infância, e as alunas foram estimuladas de modo a tudo fazer em favor dos pequenos chineses. Esse ardor propagou-se em todas as turmas. Já temos nove séries, nossas zeladoras se propõem a expandi-la fora, entre as pessoas conhecidas. Essas queridas crianças fizeram o sacrifício (sem serem levadas a isso) de dar seus pequenos brinquedos e outras coisas para o resgate dos pequenos pagãos. As menores como 592 73 afetuosas lembranças. Faça com que nossas Irmãs também vão vê-la com freqüência. Ao terminar minha carta, recebo uma cesta cheia de carne de ganso. Agradeço-lhe afetuosamente e gostaria de todo o meu coração poder retribuir-lhe. Toda sua. Irmã Maria Emília. 213 Encorajamentos a uma noviça (vinda de outra Congregação). Precisão a respeito dos exercícios que ela seguirá ou não, com toda a comunidade (L 895, M 544-545). À Irmã Germaine Combres, em Livinhac. Villefranche, 19 de fevereiro de 1852. J.M.J. Minha querida e amada Irmã: Li a sua carta com muita consolação. Agradeço ao bom Deus as santas disposições que ele coloca em sua alma. Aproveite para progredir sempre mais no caminho da virtude. Gosto de saber que minha última carta lhe causou prazer. Foi por esquecimento que só mencionei o refeitório, pois você poderá igualmente assistir às conferências, continuar a participar dos recreios, ocupar-se da casa na medida de suas forças, ajudar as Irmãs em seus trabalhos. Entretanto, no que se refere ao Capítulo, você não poderá participar dele, conforme o que me escreveram de Rodez. O certo também é você sair do refeitório cada vez que houver alguma prática de penitência, algum aviso a ser dado às Irmãs. Como pensei que ficaria triste em ter de sair do refeitório, escrevi à Madre Alphonsine para suspender as práticas de penitência que costumamos fazer, deixando-as para a reunião do Capítulo. Assim, você só será privada deste último exercício. A liberdade que lhe é deixada para participar de todos os outros compensará a pequena mais freqüentados da cidade. Prometemos dar 24.000 francos, mas, não sendo bastante vasto esse local e não encontrando aí lugar para uma capela, compramos uma casa contígua, onde estava a antiga capela de São Roque, que tinha sido transformada em estrebaria. Custou-nos 10.000 francos. Compramos também o jardim dos Cordeliers por 8.200 francos. Ao todo eram 42.200 francos que devíamos pagar e nada tínhamos. Pe. Grimal auxiliou muito nos consertos que eram numerosos. Um dia, devíamos fazer um pagamento, encontramos 7.000 francos no fundo de um armário, o que nos deixou numa admiração indescritível. Nossas saúdes arruinaram-se quando o bem-estar começou. Irmã Marie-Eléonore foi acometida de uma doença no pulmão e morreu aos 20 anos, perfeitamente resignada à vontade de Deus. Era uma alma generosa, preferia o cuidado dos pobres ao dos ricos. Chorávamos ainda nossa querida Irmã Eléonore, quando Deus quis afligir-nos ainda chamando a si Irmã Marie Boutaric. Alguns dias depois, morreu uma órfã. Todos os meses tínhamos uma pessoa a chorar. Estava eu mesma muito cansada, pois toda a responsabilidade pesava sobre mim. Não podia, na maior parte dos negócios, contar com ninguém. Por isso perdi o sono e minha saúde se foi arruinando. Em 1819, fomos tomar posse da casa que havíamos comprado e emitimos solenemente os primeiros votos. 16 74 591 CAPÍTULO X Sou, com o mais profundo respeito, meu muito querido Padre, Sua muito humilde e obediente filha. Irmã Maria Emília. Deus prova a Madre com tentações contra a fé, a esperança e a caridade Ano de 1852 Ela se encontra num estado extraordinário de sofrimento interior 17 212 No mês de agosto de 1820, começaram as terríveis tentações que tive de combater durante cerca de trinta e um ou trinta e dois anos. Durante esse tempo, tive alguma trégua por ocasião das fundações e durante meus grandes sofrimentos corporais. Essas tentações, que jamais experimentara, caíram sobre mim de repente, como uma tempestade; meu espírito ficou perturbado; as trevas, a tristeza encheram a minha alma. Fui procurar Pe. Marty que não teve palavras para me tranqüilizar; deixou-me entregue a mim mesma e confesso que, sem uma graça particular de Deus, não teria podido resistir, sobretudo no início. Eis, em resumo, o estado em que me encontrava: A respeito da fé, ela parecia extinta. Quanto à esperança, tudo parecia me provar que eu estava perdida e abandonada por Deus. Em relação à caridade, Deus me era representado como inimigo. Essa tentação era excitada a cada momento pela vista dos objetos mais indiferentes: um verme, uma pulga e todos os diferentes desconfortos que afligem o corpo; as aberrações do espírito, sua fraqueza, suas paixões aumentavam minha pena e pareciam dizer-me... (a frase está inacabada.) .. .. .. .. ... .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. Sempre a mesma solicitude afetuosa para com Françoise Pascal. Não desanimar: as intervenções divinas são por vezes tão inesperadas. Fazer com que os sofrimentos sejam um meio de união com Nosso Senhor (L 894, M 555-556). À Madre Françoise, em Aubin. Villefranche, 31 de janeiro de 1852. J.M.J. Minha querida Madre: Penso muitas vezes em você. Saber que sofre me aflige e tarda-me saber como está. Conseguiu pôr as coisas em ordem? De qualquer maneira, não desanime. No momento em que menos esperamos, Deus vem em nosso auxílio. Aproveitemos de nossos sofrimentos para nos unir ao nosso divino Esposo que você ama e deseja fazer amar. Fiquei satisfeita em saber que sua casa vai bem. Madre Joseph me disse que tudo estava bem organizado, que a Regra era observada e que nossas Irmãs, dóceis a suas observações, esforçavam-se para colocá-las em prática. Manifeste-lhes minha alegria, pois não poderia ser maior. Poupe sua saúde e não esqueça de me dar notícias sobre ela quando me escrever. Madre Joseph me disse que você vai muitas vezes visitar a pobre Irmã Brigitte. Como me alegra, minha querida Madre, indo visitar e consolar essa pobre Irmã a quem envio as mais 590 75 211 Fazendo chegar a padre Abbal, alguns artigos modificados das Constituições, Madre Emília lhe anuncia a saída da Irmã Augustine Carles e lhe pede seu parecer sobre algumas necessidades materiais da Irmã. De sua parte, está a favor de todas as concessões (L 888, M 541542). A Padre Abbal, vigário geral em Rodez. Villefranche, 28 de novembro de 1851. J.M.J. Meu muito querido Pai: Tenho a honra de enviar-lhe uma cópia das modificações feitas em nossas Constituições. Lamento dizer-lhe que minhas esperanças a respeito de Irmã Augustine foram cruelmente frustradas. Longe de aceitar minhas propostas de vir até aqui para fazer um retiro, nem quis sequer passar pelo convento. Seu irmão foi buscá-la em Aubin, levou-a para casa. Ela me escreveu uma carta muito tocante, na qual me comunica seu pesar, lamenta ter sucumbido à tentação, está desolada. Pede-me um avental, um véu para a santa comunhão, um livro de meditação e tecido para fazer um vestido e um casaco. Diz que, mais tarde, nos reembolsará. Como para a pensão e o dote ela só pagou 600 francos, nossas Irmãs do Conselho não querem lhe dar o que solicita. Querem que eu decida isso. Não conhecendo suas intenções, temo emitir uma opinião. Os familiares da Irmã Augustine estão tão prevenidos contra nós que, a meu ver, se não lhe dermos o que ela nos pede, isso provocará mal-estar e causará, talvez, um grande prejuízo à Congregação. O médico acaba de me prescrever leite de jumenta. Creio, Padre, que a permissão que o senhor der para satisfazer essa pobre Irmã me fará bem mil vezes mais do que todos os remédios do mundo. Entretanto, eu me conformarei com a mais religiosa exatidão a tudo o que o senhor me prescrever. Quando a essa tentação vinha juntar-se o afastamento da humanidade sagrada de Jesus Cristo, minha aflição aumentava, não tendo a quem recorrer, nenhum apoio. Essa desolação ainda era aumentada pela lembrança da doce união com Deus de que eu gozara outrora. Sentiame, então, como uma pessoa que do posto mais elevado tivesse caído na última indigência. Os terrores que eu experimentava me faziam sentir as angústias de uma pessoa que se visse suspensa à borda de um abismo. Parecia-me que as luzes da fé não mais me guiavam. Achava-me como em noite escura, cercada de inimigos, só e sem nenhuma defesa. Deus ainda permitia que tudo que me dissessem não servisse senão para me afligir, de modo que os remédios se convertiam em veneno. As palavras do meu confessor para pacificar-me aumentavam minha perturbação, me agitavam e faziam o meu tormento. Quando queria me aproximar de Deus, sentia-me repelida. Nesse estado de aflição e terror, era inclinada a dizer: "Para onde fugirei a fim de me subtrair à cólera do Senhor?" A essa pena juntava-se grande aborrecimento por tudo que me cercava. Nada me podia distrair ou pouco me distraía. As pessoas que eu amava se me tornavam importunas, de forma que tinha perdido a faculdade de amar. Todo tipo de alegria era-me proibida e eu não podia senão sofrer. Parecia-me que o bem, em mim, se convertia em mal e os meus atos de virtude se originavam de um mau princípio. A Sagrada Comunhão, que era a minha felicidade, tornou-se meu tormento, bem como o sacramento da penitência. A oração, delícia da minha alma, tornou-se para mim insuportável. Não podia resolver-me a aproximar-me do altar. Contava os momentos que ali passava. Se naquele tempo me viessem bons pensamentos, santos desejos, isso aumentava meu sofrimento de modo indizível. Tinha sempre a morte diante dos olhos e com tal pavor como se fosse cair entre as mãos de um senhor 76 inexorável. A idéia que tinha de Deus, a repulsão que sentia por ele, faziam com que eu nada quisesse fazer por seu amor e, se me dominava, era impelida a murmurar contra Deus e acusá-lo de indiferença pelos serviços que eu lhe prestava, a lançar-lhe em rosto tudo que fazia por ele. O cuidado que eu dispensava às almas tornou-se penosíssimo, o aborrecimento me cansava. Não podia suportar falar nem ouvir falar de Deus. Ainda ficava mais acabrunhada se me viessem contradições e perseguições de fora. Só experimentava fraqueza e não encontrava força alguma ao pé da Cruz. Em lugar de me trazerem alívio, as leituras piedosas aumentavam meu sofrer. Via tudo negro, e o que me podia consolar causava-me desolação. Acontecia-me nada poder compreender do que lia, pois não podia ligar nem as palavras nem as frases. A lembrança das ações dos santos irritava minha dor, bem como a conversa das pessoas piedosas. Minhas paixões pareciam ter-se tornado mais fortes e faziam-me travar rude combate. Parecia-me não ter força alguma para resistir a elas. Alguma coisa, todavia, me impelia a lutar; por outro lado era retida, o que me causava uma pena inexplicável. As faltas que cometia me levavam ao desespero, bem como a lembrança de minha vida passada que me era representada de um modo terrível. A tudo isso vinham juntar-se tentações de preguiça e de gula. Sentia, não sem grande remorso, um amor exagerado por meu corpo. Isso era acompanhado muitas vezes de despeito e ansiedade indefiníveis. Parecia que minha vontade estava de tal modo direcionada para o mal que não podia reagir; se negasse o que sentia, parecia-me ser ilusão e mentira. Sofria ainda mais nas grandes solenidades. A alegria da Igreja fazia com que sentisse mais fortemente a minha dor. Não podia penetrar no espírito do mistério que se celebrava e ficava mais ou menos como uma pessoa que sentiria mais vivamente sua enfermidade ouvindo os 589 gosta tanto, a levaria a uma mudança de idéias, de tal modo que fiquei mais do que surpresa quando recebi a autorização de nosso Pai. Guardei-a por um dia, sempre na esperança de que essa terrível crise passasse. Escrevi-lhe sábado passado, 22. O senhor Simian devia fazer chegar até você a minha carta. Soube que ele a reteve, o que me penalizou. Escrevi-lhe ainda segunda-feira, 24. Ignoro se minha carta já lhe foi entregue. Eu mesma não recebi a que você me escreveu de Aubin e da qual Madre Françoise me fala. A pobre Madre está desolada com a sua saída. Escreveu-me que você lhe havia prometido entrar no convento. Lamento e lamentarei sempre que você não tenha sido fiel a essa promessa. Parece-me que os resultados teriam sido satisfatórios e que, se eu tivesse podido lhe falar, você não teria resistido. Conheço há muito tempo seu coração. Comuniquei seus pedidos a nossas Irmãs do Conselho. Você sabe que, com a nova Regra, não devo ocupar-me das coisas temporais. Nossas Irmãs desejam que você mande seu irmão ou seu cunhado para falar com a ecônoma. Saúdo-a com muita afeição e sou toda sua nos santos Corações. Irmã Maria Emília. 29 – Logo que terminei minha carta, recebi a sua. Estou desolada por não poder lhe enviar o que me pede. Asseguro-lhe que eu consentiria, de boa vontade, despojar-me para prover às suas necessidades, mas faça como eu lhe disse ontem, envie alguém. Não tenho a coragem de escrever no endereço: Senhorita Carles. No entanto, se isso a faz sofrer que lhe enderece as cartas dessa maneira, diga-me e não mais o farei. 588 77 210 Numa última carta, Madre Emília suplica da maneira mais insistente à Irmã Augustine Carles que reveja sua decisão de abandonar a vida religiosa. Fala-lhe sobre seus esforços anteriores, sempre discretos, para retê-la, mas sem a constranger. Expressa-lhe sua aflição atual e a da superiora de Irmã Augustine, Françoise Pascal (L 887, M 537-539). À Irmã Augustine Carles, em Labastide-Capdenac. Villefranche, 28 de novembro de 1851. J.M.J. Minha querida, minha muito querida Irmã Augustine: Deixe-me dar-lhe ainda este nome que sai do meu coração, antes que minha caneta o escreva. Sua iniciativa me afligiu profundamente, mas em nada diminuiu a afeição terna e maternal que sempre tive por você. Ao contrário, desde o início de sua infelicidade, tenho um crescente interesse, um devotamento que nada pode diminuir. Você sofre, eu também. Como me sentiria feliz em poder lhe devolver a tranqüilidade e a paz! Se não a pressionei, solicitei não deixar a Sagrada Família, é porque receava constrangê-la, tornando-a mais infeliz. Ao lhe escrever pedindo para ir diante do crucificado e fazer como você gostaria de ter feito na hora da morte, pensei que essas poucas palavras falariam mais do que os discursos mais ternos e mais patéticos. Nada é mais propício para nos tocar, nos fazer entrar em nosso íntimo, do que a lembrança das grandes verdades da religião. Acalentei a esperança de que esse pensamento sobre a morte a levaria a refletir e que o resultado de suas reflexões seria o de aceitar, se não com coragem, ao menos com resignação, todos os sofrimentos que o bom Deus quisesse enviar-lhe, pois, minha boa Irmã, você bem o sabe, Deus conduz tudo. Ele queria santificá-la por esse caminho. Eu não acreditava que você persistiria no desejo de sair do Instituto. Disseram-me, aliás, que estava mais calma. Pensei que a volta para Aubin da Madre Françoise, de quem você outros a falarem das belas coisas que viam, ou como alguém que, diante de uma mesa com finas iguarias, não pudesse saborear nenhuma delas. Nas tentações que giram, de algum modo, em torno da alma e contra as quais ela combate, sente que não pertence ao inimigo, mas, naquelas em que eu me encontrava, acreditava-me vencida, em poder do inimigo, sem defesa alguma, o que tornava minha tristeza excessivamente grande, pois me julgava em poder do demônio. Apesar disso, podia às vezes lançar gritos inflamados para Deus, os quais teriam podido consolarme na minha aflição, mas parecia-me que essas centelhas vinham de um braseiro que me era estranho. Considerava o santo estado religioso como ele é visto pelo mundo. Minhas filhas, que eram para mim uma cruz, não percebiam meu estado. Deus me dizia que nada deixasse transparecer. Conservava-me alegre exteriormente. Embora minhas filhas me fossem um grande objeto de sofrimento por causa da tentação, só era severa com elas quando suas faltas o exigiam. Para mortificar minha vontade, Pe. Marty queria não somente que eu falasse quando estivesse tão penalizada, mas que começasse a conversação. Deixava-me conduzir pela obediência como um irracional e pensava muitas vezes em Nabucodonosor. Tendo-me assaltado essas tentações pouco tempo antes dos votos perpétuos, custou-me muito fazê-los. Nisso ainda me entreguei à obediência. Durante certo tempo, não podia fazer leitura alguma em francês. Pe. Marty ordenou-me que lesse em latim. Na fundação de Saint-Beauzély, meu pavor em relação a morte tornou-se maior por causa dos esqueletos que encontramos no jardim. Para vencer-me, ia mudá-los de lugar. Para vencer ainda meu grande horror aos cadáveres e um sentimento de pavor que experimentei junto de uma Irmã agonizante, quando ela morreu, passei a noite junto ao seu cadáver. 78 587 Nunca experimentei tentação alguma contra a pureza. Não compreendia o mal. Superiora, compreendi apenas o que era preciso fazer para evitá-lo. Jamais julguei alguém maliciosamente nem tive tentação contra o próximo. Fazia-me grande violência para, combater os sentimentos naturais que experimentava pelas Irmãs que há muito não tinha visto. Deus me levava a renunciar aos reclamos da natureza, em relação a esse ponto, para punir-me de algumas faltas que se tinham mesclado a sentimentos agradáveis. 18 CAPÍTULO XI A Madre é provada por uma doença humilhante e muito dolorosa Pe. Marty a envia a Aubin para consultar um médico afamado Nessa cidade ela funda uma casa da Congregação Antes de me submeter às tentações que acabo de relatar, Deus havia provado o Instituto com a doença ou a morte da maior parte dos seus membros. Amedrontados, os pais das alunas vinham buscar as filhas. Pensei, então, que Deus não queria nossa obra e eu faria melhor unindo nossa comunidade de Villefranche à das Filhas de Maria, muito recentemente fundada em Agen pela Senhora de Trenquelléon. Expus minha idéia a Pe. Marty que a endossou. Desde então, fizemos, de comum acordo, várias diligências para isso, mas sem êxito, porque as Irmãs de Villefranche se opuseram. Escrevi ao príncipe de Hohenlohe 19 para consultá-lo a respeito dessas doenças. Ele me respondeu que era uma perseguição do demônio. É o número 39 que falta à Irmã Laurent.1 Queira fazer chegar esta carta à mãe de Nicolaïde, por uma pessoa de confiança. 209 Madre Emília demonstra uma paciente solicitude para com a Irmã Augustine, que devia efetivamente sair da Congregação algum tempo depois (L 886, M 536). À Madre Françoise, em Aubin. Villefranche, 25 de novembro de 1851. J.M.J. Minha muito querida Madre: Nossa querida Irmã Augustine me disse que está decidida a sair e pede para deixar aqui o santo hábito. Respondi-lhe que tenho confiança de que, longe de deixá-lo, espero que ela o guardará. Espero cada dia por essa Irmã. Deus queira iluminála, fazendo-a compreender o quanto é grande a infelicidade de sair do claustro, sobretudo contra os conselhos de seus superiores. Penso, minha muito querida Madre, que você faz rezar por ela. Não devemos deixar de fazê-lo. Tenhamos confiança de que seremos atendidas. Entregue-lhe minha carta e procure dissuadi-la dos pensamentos que o demônio lhe coloca no espírito. O senhor Simian disse-nos que ela lhe havia escrito e pedia-lhe para vir buscá-la na quartafeira. Ela fará o retiro antes de ir para a casa da irmã e, se Deus quiser, verá melhor as coisas. Toda sua. Irmã Maria Emília. 586 79 pobre Irmã Mélanie (Courtois) que tosse de cortar o coração. O pai de nossa Irmã Marie Gervais veio buscá-la anteontem. Nós a entregamos com prazer, esperando que o clima natal a restabeleça. Ela foi para o convento de Saint-Amans. A pobre Monique sucumbiu à tentação. Seu irmão veio buscá-la e ela não teve força para resistir. Seu irmão prometeulhe que a deixaria voltar se ela tivesse vocação. Irmã Laurent sensibilizou-se com sua lembrança e a oferta que você fez do número dos anais que lhe faltam sem que lhe tenha pedido. Gostaria que você estivesse presente quando ela leu esse parágrafo de sua carta. Pede que aceite seus agradecimentos e a certeza de seu afeto. Ela lhe quer bem, nós todas lhe queremos bem, fique certa de que você deixou muitas saudades. Quanto a mim, minha querida Madre, conhece minha afeição por você, ela não mudou um instante e, se pudesse ler o meu coração, veria como ele está bem disposto a seu favor. Amo muito todas as minhas filhas, todas têm direitos iguais ao meu amor, mas as minhas idosas têm direitos particulares e ninguém pode se ofender com isso! Desejei muito guardá-la junto a mim. Tive que ceder a circunstâncias imperiosas, mas isso não altera em nada meus sentimentos, eles são e serão sempre os mesmos. Se o bom Deus permitir que vivamos separadas, nós nos encontraremos numa vida melhor e será para sempre. A Madre Joseph irá, talvez, passar alguns dias em Aubin. Eu lhe disse isso ao partir. Você pensou que havia colocado o comunicado que recebeu de Bezonnes na carta posta no correio e o esqueceu. Pelo menos, não o recebemos. Adeus, minha muito querida Madre, creia que sou toda sua. Irmã Maria Emília. Após ter encorajado minhas Irmãs, tomado grande parte em seus sofrimentos, pois, de tal modo as amava que morria com aquelas que morriam, caí, eu mesma, doente. Compreendi que o mal vinha do nariz. Fiquei apavorada, mas silenciei. Quando as Irmãs o perceberam, fizeram-me consultar o médico que não descobriu meu mal. Outra consulta foi feita e depois vieram dizer-me que eu estava ameaçada de um câncer. Respondi: "Mesmo dez cânceres seriam preferíveis a um pecado mortal." Eu seguia meu rumo normal. Submeteram-me a uma operação no nariz. Quiseram amarrar-me, receando que eu me agitasse e comprometesse a operação. Não quis. Disse que me bastava o Crucifixo que tinha entre as mãos. Com efeito, Deus me concedeu a graça de permanecer imóvel, o que levou o médico a dizer que em mim havia algo de divino. Trataram-me com remédios muito dolorosos, o que me fez sofrer muito. Obrigada a repousar um pouco, eu me ocupava em cuidar das flores, dos animaizinhos. Receio ter cometido nisso alguma pequena sensualidade, tão grande era a minha satisfação. Pe. Marty enviou-me a Aubin para consultar Dr. Murat e tentar minha cura. 20 A senhorita Constans, pensionista em nossa casa, propôs-me fundar nessa paróquia, seu torrão natal, um educandário para moças. Fomos juntas a Aubin. Não fui bastante reservada nessa viagem, elogiando-a quanto a suas qualidades. Na fundação dessa casa, tive um modo de ver oposto ao de Pe. Marty. Não fui franca. Ocultei-lhe que um inquilino não podia desocupar a casa que nos estava destinada desde nossa chegada. Pe. Marty veio e trouxe as Irmãs. Repreendeu-me um tanto severamente. Suscetibilizei-me demais. Foi o maior pecado que cometi. O que mais me penaliza é ter comungado em seguida sem me ter confessado. Não tardei, entretanto, a compreender o mal que fiz conduzindo-me segundo meu raciocínio, que, aliás, me parecia bom, pois não queria faltar à palavra dada aos 80 habitantes da paróquia. Havia-lhes prometido Irmãs para o princípio de novembro. Fui confessar essas faltas ao próprio Pe. Marty. Minha aflição era tão grande que não podia alimentar-me. Confessei-me uma segunda vez a Pe. Marty. Senti de tal modo a minha falta que quase morria de dor. Reconhecendo meu erro, mudei de atitude e, desde então, as graças se multiplicaram. 21 Para expiar as palavras inúteis ditas nessa casa, apliquei-me ao mais absoluto silêncio. Era muito simples e nada podia esconder de meu Superior. Bastava que um pensamento me custasse a dizer para que eu lhe fosse confessar. Entretanto, ele não me dava muito crédito desde aquele meu modo de agir que já relatei. Pensava sempre que eu não era franca para com ele, o que me causava uma pena tão grande que não sei exprimir. Dr. Murat prescreveu-me um medicamento que muito me aliviou. Mais tarde, querendo renovar a receita, nem ele nem o farmacêutico puderam lembrar-se. Minhas tentações, que se tinham acalmado um pouco durante a fundação, voltaram logo mais fortes. Fiquei numa agitação que nada podia atenuar. Pe. Marty repreendia-me, humilhava-me. "Foi preciso", dizia-me ele, "que Deus aplicasse o ferro e o fogo." Gostava de ser tratada assim. Um dia subi ao último andar da casa, onde li o necrológio dos trapistas. 22 Passou-se em mim alguma coisa que não sei exprimir. Compreendi como se sentiam os mártires em seus sofrimentos. Foi um momento dos mais extraordinários de minha vida. No meu estado de tentação, sentia em mim como duas pessoas que se contradiziam, e os bons pensamentos abundavam em minha alma. A visão de Jesus Cristo subindo ao Calvário sustentava-me. Pe. Marty queria que eu me entregasse à contemplação. Permanecia no coro sem pensar, três, quatro horas, como o faria alguém que estivesse sentado ao lado de uma pessoa. Tinha presentes muitas vezes as palavras do Cântico dos Cânticos: "Aonde levais a pastar vosso rebanho na hora do meio- 585 208 Um certo descontentamento pelo envio de cartas muito curtas e pouco circunstanciadas. Pedido de notícias detalhadas. Ao mesmo tempo, declaração de inalterável afeição (L 879, M 532-534). À Madre Françoise, em Aubin. Villefranche, 1º de novembro de 1851. J.M.J. Minha muito querida Madre: Não estou muito satisfeita com sua secretária, minha cara Madre. Após um silêncio de sete dias, escreve-me uma carta tão curta, sem nenhum detalhe! Você e ela merecem alguma coisa. Sabe que, na Casa-mãe, cada falta é julgada e punida. Então! Sua penitência será de encarregar alguém de me escrever, ou melhor, você mesma (eu ficaria mais satisfeita), uma carta bem detalhada e bem longa. Como está? Como vai sua saúde? Dorme bem? Tem apetite? Tem chorado muito? Tem sido razoável? Quais são suas ocupações? Está acostumada? Tem mais paz? Está satisfeita? Está feliz? E nossas boas Irmãs, como estão? E a Irmã Marie Augustine? Está um pouco mais calma? Você tem a esperança de fazê-la voltar a melhores sentimentos? Como vai a saúde dela? Ela tem apetite? Tem ocupações a fim de que não fique voltada para si mesma? Quais são as ocupações dela? E minha querida Irmã Antoinette está melhor? Todas as nossas queridas Irmãs estão animadas e com bons propósitos? Querem se tornar fervorosas? Você introduziu o costume de proclamar a penitência? As encarregadas da disciplina prestam-lhe conta com exatidão do que vêem de contrário à regularidade, etc.? Espero, minha querida Madre, que lhe tenha dado o esquema de carta que desejo e que ela me chegará logo. Embora você só mereça repreensões, entretanto, não quero repreendê-la, pois o próprio das mães é perdoar! Perdôo-lhe, pois, em vista do seu bom propósito. Isso é o que sua carta vai me provar. Agradeço-lhe pelo interesse que tem por minha saúde. Vou bastante bem. Não temos doentes na enfermaria, exceto nossa 81 584 207 Com grande firmeza de espírito, Madre Emília reconhece como sendo providencial a provação de uma superiora na ocasião de sua passagem por Villefranche, e renova-lhe a certeza de sua afeição (L 859). A uma superiora. Villefranche, 17 de junho de 1851. J.M.J. Minha muito querida Irmã: Creio que o estado em que você se encontrou durante os dias passados aqui foi uma verdadeira permissão de Deus, permissão que, em seus desígnios, tinha alguma finalidade para nós desconhecida e que devemos adorar. Pensei muitas vezes que, se você tivesse voltado, as coisas teriam sido diferentes. A divina Providência destinou-a, sem dúvida, à guarda do rebanho que lhe foi confiado e junto ao qual espero que faça muito bem. Conte sempre, minha muito querida Madre, com minha grande e profunda afeição. Faz muito tempo que esses sentimentos estão no meu coração e estão gravados nele de uma maneira que não poderão enfraquecer. No pouco tempo que Irmã Philippine passou aqui, fiquei muito edificada com suas boas disposições. Apesar do sofrimento de ir para Montauban, sua submissão à santa vontade de Deus foi total. Deus a abençoou. Ela me escreveu dizendo que estava muito feliz. Faça rezar por nossa Irmã Augustine que decidiu sair da Congregação. Convidei-a para vir fazer um retiro aqui antes de realizar uma coisa tão ruim. Nosso bom Pai fez tudo o que pôde para demovê-la do projeto e ele está muito aflito com isso. Não fale sobre isso. Talvez Deus se deixe tocar e ouça nossas preces.1 Toda sua. Irmã Maria Emília. dia?" Abrasada de amor por Deus, desejava se rompessem os meus laços. Não podia ouvir falar de Deus. Estava como que queimada. Era por demais expansiva quando falava em Deus. Foi depois da fundação de nossa casa de Aubin que Pe. Marty começou a elaborar as Constituições. Para que elas terminassem logo, eu fui obrigada a enganá-lo muitas vezes, quando me perguntava a hora. CAPÍTULO XII A Madre, por ordem de Pe. Marty, vai a Livinhac para transformar em casa da Sagrada Família um convento das Irmãs da União. Logo depois, em 1834, ela abre as escolas Em 1823, Pe. Marty foi nomeado vigário-geral de Rodez. Apesar da distância, quis continuar a dirigir-me. Nessa época, fui atacada por uma febre maligna. Sofri muito. Entreguei-me à vontade de Deus. Entretanto, cometi grande imperfeição perguntando se a doença poderia ser mortal. Apenas me restabeleci dessa febre, outra sobreveio. Dessa vez, fui mais generosa, embora sempre tenha sido muito dengosa. A visão dessa fraqueza não me desanimava. Esperava converter-me na idade de Santo Agostinho. Em 1832, Pe. Marty enviou-me a Livinhac para converter em convento da Sagrada Família um estabelecimento de Irmãs da União, existente naquela paróquia. A empresa era um tanto difícil, pois somente a Superiora desejava firmemente agregar-se à nossa Congregação. Segui para Livinhac no dia 1º de agosto de 1832. Com muita deferência para com as Irmãs da União, que eu considerava como minhas superioras e mestras, 82 consegui o fim desejado por meus superiores. Ficou resolvido que viveríamos na mesma casa; elas, observando a própria regra, e nós, observando a nossa e nos dedicando à instrução da juventude. Aquelas que quisessem observar nossa Regra e entrar na Congregação seriam aceitas. Somente a superiora quis. O meu modo de ver foi, ainda aí, contrário ao do meu superior, mas, creio nada ter feito de repreensível. Contudo, Pe. Marty contrariou-se, deixou-me agir por minha conta, e a prevenção de que eu tinha feito nascer na fundação de Aubin aumentou. Ele não estava satisfeito, embora todo mundo me aprovasse; quanto a mim, estava sempre contente, pensando que as perseguições nos eram necessárias como à Igreja universal. Não fazia caso de proteção dos homens. Meu apoio eram os pobres e a Providência. Chamava-os sempre em meu auxílio. Após ter passado vários meses em Livinhac, voltei para Villefranche onde recomeçaram as mesmas lutas interiores, mas Deus concedia-me a graça de me dominar de modo que as Irmãs nada percebiam do meu estado. Um dia, contudo, uma Irmã surpreendeu-me num estado insuperável de tristeza. Fui à Capela e aí Deus me deu a paz. Desejava muito ver um estabelecimento de Carmelitas em Villefranche. Mandei erigir, em casa, um oratório a Santa Teresa para obter essa graça e pedi às Irmãs que rezassem nessa intenção. Como Deus tardasse a atender o meu pedido, cada vez que passava diante do oratório queixava-me à Santa desse longo atraso. Queria dar tudo que tinha recebido de minha família a esse estabelecimento. Pe. Marty não concordou. Pouco mais tarde ele consentiu, mas, no momento em que ia executar meu piedoso projeto, o Sr. Bispo opôs-se. Nossas Irmãs de Aubin eram encarregadas de distribuir aos pobres da paróquia as esmolas fornecidas para esse fim pela prefeitura. Confiamos a distribuição a 583 encenadas pelas alunas, nessas circunstâncias. Vocês não querem que se tornem atrizes, comediantes, elas não podem querer pregar nas igrejas, contestar nos tribunais. É preciso, sem dúvida, que saibam ler convenientemente. Parece-me bom que recitem belos trechos literários que educam e formam o coração, mas, se vamos mais longe, corremos o risco de cair, pouco a pouco, em grandes abusos. As peças mais perigosas serão sempre as mais atraentes. Acharão monótonas aquelas que poderiam ser representadas sem perigo. O pregador de nossa quaresma contou no púlpito a história de M. Baudier que, tendo se saído muito bem nas peças encenadas no convento e não sabendo o que fazer aos 16 anos, sem fortuna, entrou numa companhia de comediantes e obteve muito sucesso no teatro de Paris. Eis, minha querida filha, minha opinião de sempre.” A leitura desta carta me comoveu. Nossas Irmãs daqui partilham meus sentimentos e foi decidido que o número 197 será novamente posto em vigor. Toda de vocês. Irmã Maria Emília. 582 83 Peço para ela as orações da Congregação. Sou toda de vocês nos sagrados Corações de Jesus, de Maria e de José. Irmã Maria Emília. 206 Madre Emília comunica a todas as casas a decisão sem apelo de suprimir as peças teatrais, por ocasião da distribuição dos prêmios (L 856, M 512-513). Às Irmãs de Verfeil e de todas as nossas casas. Villefranche, 9 de maio de 1851. J.M.J. Minhas muito queridas Irmãs: O número 197 de nossas Constituições proíbe apresentar dramatizações durante as provas de fim do ano escolar. Nosso Fundador, de santa e venerável memória, julgou esse ponto tão importante que dele fez uma proibição expressa nas Constituições que nos deixou e que observamos durante tantos anos. Enquanto ele viveu, nenhuma peça foi encenada, nem recitada pelas alunas. Há algum tempo, algumas circunstâncias me levaram à necessidade de permitir não somente a recitação mas também a representação, embora confesse só tenha dado essa permissão a contragosto. É certo que essa tolerância pode levar mais tarde a grandes abusos. Não as assinalarei, minhas boas Irmãs, vocês me compreenderão suficientemente. Escrevi, há uns quinze dias, ao nosso digno Superior Padre Abbal, perguntando-lhe simplesmente se este ano as provas de fim de ano seriam públicas. Após me haver exposto as razões que o levaram a responder de uma maneira afirmativa, conclui com estas palavras: “Não compreendo a utilidade das peças uma jovem Irmã conversa, criteriosa e prudente, chamada Irmã Marie. Ela cumpria com zelo sua missão e, provendo as necessidades do corpo, não negligenciava o cuidado das almas das pessoas que ela assistia. Visitando os pobres da localidade, ela teve ocasião de passar por Vialarels, onde se encontrou com meninas inglesas em cuja conversão muito trabalhou. Essas crianças afeiçoaram-se a ela e, quando a viam retomar o caminho do convento, estendiam-lhe os braços dizendo: "Irmã Marie, venha instruir-nos, fique conosco." E a boa Irmã não podia fugir às suas inocentes carícias. Em uma circunstância em que me achava em Aubin, Irmã Marie veio falar-me da sorte dessas pobres crianças que ela amava com uma grande ternura. Meu coração comoveuse com a narração que ela me fez. Disse-lhe: "Não seria bom, Irmã Marie, abrir uma escola para essas crianças em Decazeville ou em Vialarels? – Oh! Sim, Madre, que boa inspiração Deus lhe enviou!" Disse-lhe então: "Quer ser a superiora?" Em sua simplicidade ela me respondeu: "Sim, minha Madre." Rezei e pedi orações para conhecer a vontade de Deus. Falei em seguida a Pe. Marty e decidimos que fundaríamos uma escola em Decazeville. O vigário da paróquia e a prefeitura aprovaram. As Irmãs: Julitte e Thaïs que não haviam feito voto de clausura, e Irmã Marie, a jovem conversa de que acabo de falar, foram designadas para começar a escola. Demos-lhes um hábito diferente do das Irmãs clausuradas e conversas. Irmã Marie devia ser a Superiora. As três partiram no dia 6 de julho de 1834. Chegaram a Vialarels antes da Missa. O pároco mandou cantar o Veni Creator. Em seguida exortou os pais a mandarem suas filhas à escola que ia se abrir no dia seguinte. Todo mundo viu com satisfação esse estabelecimento. O demônio, ao contrário, ficou enraivecido e não poupou tentações às Irmãs: o desgosto, o tédio, a tristeza, assaltaram ora uma, ora outra. Para cúmulo da aflição, 84 Irmã Marie, alma e sustentáculo da casa, caiu doente. Ela já o estava antes da abertura da escola, pois tinha tido uma hemoptise, mas após algumas semanas em Vialarels, ela sucumbiu e, em poucos dias, seu estado se tornou desesperador. Nessa triste conjuntura, uma das Irmãs experimentou tão furiosa tentação de desânimo que quase fugiu. Esquecendo os próprios sofrimentos, Irmã Marie conseguiu reanimar essa Irmã e restabelecer a paz em sua alma. Fez a mesma coisa com outras que não podiam mais e iam alternadamente confiar-lhe suas fraquezas. Essa querida Irmã teve uma melhora, mas de pouca duração. Morreu em março de 1835. A obra das escolas estava fundada sem esperança de desenvolvimento. Logo após a fundação da escola de Vialarels, pediram-me outra em Lassouts, que eu própria fui inaugurar por ordem do meu superior. Depois, abrimos outra em Saint-Beauzély. O Sr. Bispo queria muito essa obra e eu também, mas receava que ela viesse prejudicar a regularidade dos claustros. Tendo percebido, em 1838 e 1839, que algumas casas não-clausuradas, que eu havia fundado, não eram regulares (alguns membros me causavam pesar devido às suas relações com o exterior), tive um momento de desânimo e quis renunciar a essa obra. Vendo que isso penalizava o Sr. Bispo de Rodez, reanimei-me e tomei as medidas necessárias para regularizar um pouco as ditas casas e reconduzir seus membros a melhor observância. Para entrar perfeitamente nas intenções de Sua Excelência, propus-lhe estabelecer um noviciado à parte para as Irmãs não-clausuradas, a fim de poder formá-las melhor para as obras a que eram destinadas. Separei-as também das noviças clausuradas, porque ninguém queria dedicar-se às escolas. Entretanto, Deus reserva grandes graças àquelas que ele destina a cumprir essa obra de zelo. Logo que esse noviciado foi estabelecido, pensei na visita aos doentes e, com a autorização do Sr. Bispo, 581 tantas vezes quantas quiserem.” A enfermeira perguntou-lhe se a fazia sofrer durante os curativos. “Não me pergunte”, disselhe, faça comigo tudo que quiser.” Quando lhe disseram que logo receberia a unção dos enfermos, disse com alegria: “Estou curada.” Após receber o sacramento, acrescentou: “Nada me falta, deixem-me sozinha com Deus; é preciso orar a Deus durante todo este dia.” Nesse mesmo dia deveriam fazer-lhe cauterizações. Disseram-lhe: “Irmã, vamos fazê-la sofrer.” – “Coloquem tudo o que quiserem e não digam nada.” Não queria que tivessem pena dela e achava que suas dores eram pouca coisa, embora fossem muito fortes e sua posição das mais dolorosas, obrigada a manter-se sempre deitada, sem poder se mexer. Sua fisionomia era serena, um suave sorriso nos lábios anunciava a paz profunda de sua alma que a menor nuvem jamais perturbou. Sua confiança em Deus era inalterável; parecia haver recebido a certeza do céu, que desejava ardorosamente. Sentindo que dentro de pouco tempo seria chamada, a alegria inundou sua alma. Disse-lhe a esse respeito: “Minha Irmã, é preciso aceitar a vontade de Deus e viver, se ele quiser.” – “Sim, minha Madre”, respondeu, “viverei trinta, quarenta anos na situação em que estou, se for preciso; não estou apegada a nada, a absolutamente nada, a nada, aqui na terra.” Seus familiares queriam muito que um médico da família entrasse para vê-la e trocasse idéias com nosso médico. Ela não permitiu. A proposta que lhe foi feita a fez sofrer muito. Durante a doença, só quis comunicar-se com Deus e com as Irmãs enfermeiras, com quem conversava um pouco, durante o recreio. No dia de sua morte, reuniu toda a comunidade e lhes disse que deviam amar a Deus, observar a Regra e rezar, que não era suficiente apenas rezar, mas que todas as nossas ações deviam ser bem feitas. Pouco depois disse: “Deus só, só ele.” (Ela tinha dificuldade em falar.) Acrescentou ainda: “Como desejaria lhes falar! Quantas coisas teria a lhes dizer! Em seguida, disse: “Fechem as cortinas da cama para eu ficar sozinha com Deus.” Pouco tempo depois entregou sua alma ao Criador com tamanha paz, que seu último suspiro foi apenas percebido. 580 doença que a precedeu corresponderam à vida edificante que teve. Seu atrativo principal foi estar escondida em Deus e de sofrer por ele. O desejo do sofrimento a atraía há muito tempo para a Trapa. A idéia de um contínuo silêncio, de uma total mortificação e de separação do mundo a impulsionava de tal maneira que nada poderia retê-la, se não fosse a total aceitação da opinião de seus superiores que, por prudência, queriam uma provação mais longa. Vendo-se privada do que era objeto dos seus mais intensos desejos, mergulhou numa vida de morte e de sacrifício a cada momento, para encontrar aqui essa união íntima com Deus, que era o centro de todos os seus desejos. Encontrou os meios na caridade sem limites que praticou, sendo em todas as ocasiões a serva de todas; na prática de uma humildade que lhe interditava qualquer julgamento ou atenção sobre a conduta das outras, tornando-se alheia a tudo que se passava fora de seu emprego, a não ser que um dever de caridade a obrigasse a fazê-lo. Sua simplicidade assemelhava-se à de uma criança. Via Deus em tudo e suas superioras eram as intérpretes de sua vontade. Por isso seus desejos eram para ela uma ordem. Sua fidelidade aos menores pontos da Regra orientava sua conduta. Seu amor pela pobreza foi além de tudo o que se possa dizer. Sofrimentos interiores longos e fortes foram-lhe também ocasião de morte para si mesma. Após estas provações, Deus, satisfeito com sua generosidade, cumulou-a com os seus mais ternos favores. Quando estava no coro a meditar sobre Jesus escondido nos altares, não via nem ouvia nada do que se passava ao seu redor. Numa ocasião, eu não queria que ela ouvisse um sermão apavorante, cujo tema poderia lhe ser nefasto. Disse-me: “Se a senhora quiser, posso permanecer aqui, pois transporto meu espírito para o Santíssimo Sacramento e não ouvirei nada.” No fim da quaresma, uma dor que sentia de um lado há longos meses, e à qual não deu importância, forçou-a a ficar acamada, num total abandono à vontade de Deus, não desejando cuidados, nem remédios, aceitando-os numa total indiferença. Na véspera de sua morte, mostrou o desejo de não beber. Pouco depois, ela se retrata: “Não me escutem; façam-me beber 85 decidimos que nossas Irmãs das escolas se dedicariam também a isso. Tendo a visita aos doentes nos dado ocasião de ver alguns prisioneiros, encarregamo-nos, com a aprovação de Sua Excelência, de visitá-los também, como aos doentes. Aceitamos igualmente a direção de um abrigo para crianças que um rico negociante de Villefranche ia fundar. 86 579 tudo terminará. Nossas Irmãs do Conselho se ocupam disso, no momento. CAPÍTULO XIII A Madre funda um claustro em Figeac. Cinco anos depois, funda outro em Montauban Um senhor de Figeac veio me propor a fundação de um convento nessa cidade. Como eu não queria fazer nova fundação, fiz o possível para não pensar nisso. Esse senhor escreveu a Pe. Marty, meu superior, propondo-lhe a mesma coisa. Ele projetava vender uma casa e nada negligenciava para que a comprássemos. Pe. Marty me escreveu que fosse a Figeac para ver se me era possível fundar ali um claustro. Parti sem os recursos necessários, embora isso me custasse um pouco, não pela falta de meios mas porque não sentia atrativo para essa fundação. Duas de nossas Irmãs me acompanhavam. Chegamos a Figeac depois de meia-noite. Ao amanhecer, pedimos à empregada da casa onde nos hospedamos que nos conduzisse ao pároco da freguesia. Estava persuadida de que ele me daria os esclarecimentos necessários. Apresentei-me a ele sem nenhuma carta de recomendação. Expus-lhe o objetivo da minha viagem. "Ótimo!" disse-me o bom velhinho. Não quis deixar-nos no albergue. Enviou-nos ao hospício dirigido pelas Damas de Nevers. Assistimos à Missa na Igreja de Nossa Senhora das Dores, depois executamos suas ordens. As Damas de Nevers, sobretudo a Madre Eléonore, acolheram-nos com caridade cordial. Perfeitamente desinteressada, a Madre nos disse: "Praza a Deus que todo mundo profetize." A Madre Julie acompanhou-me às De bom grado permitiria à Irmã Marie Espérance ir passar alguns dias em casa, para a consolação de seus pais que são idosos demais para virem a Villefranche. Porém este ano recusei isso a várias de nossas Irmãs e acho que não convém recusar a umas o que se permite a outras. Vou escrever ao Procurador da República a fim de apresentar-lhe meu pesar por não poder realizar seus desejos. Os recursos de nossas Irmãs de Figeac não lhes permitiriam empreender reparos tão consideráveis, além dos projetos feitos, se a senhorita Fauverge não desse o dinheiro necessário. Queira aceitar a homenagem de meus sentimentos respeitosos, com os quais tenho a honra de ser, meu muito caríssimo Padre, Sua muito humilde e submissa filha. Irmã Maria Emília. 205 Elogio sem restrições à Irmã Marie du Calvaire Alaux, de quem se trata em vários Diálogos (v.s., segunda secção, II, 10, 16): mortificação e caridade, simplicidade e submissão; heroísmo nos últimos momentos (L 855, M 508-511). À Madre Léonide, em Asprières, e a todas as casas Villefranche, 06 de maio de 1851. J.M.J. Minhas muito queridas Irmãs: Nossa muito querida Irmã Marie du Calvaire adormeceu no Senhor esta manhã, dia 6 do corrente mês. Sua morte e a 578 tivesse me afastado dessas representações, a leitura de sua carta teria sido mais do que suficiente para me inspirar aversão a elas. Estou longe de achar sua decisão demasiado severa. Eu a guardarei em nossos arquivos: quero que as Irmãs que virão depois de nós conheçam seu pensamento a respeito dessas futilidades. Além dos perigos que o senhor assinala e que são infelizmente muito reais e muito freqüentes, acrescentarei a perda de tempo que exigem os ensaios, tempo que seria empregado mais utilmente se se ocupassem as alunas em trabalhos manuais, que somos obrigadas a negligenciar totalmente nos últimos meses. Além disso, essas peças são uma fonte de inveja. Todas as alunas aspiram aos principais papéis, ficam descontentes, aborrecidas, os pais são bastante injustos por acatar os ressentimentos de suas filhas. Daí nascem desavenças, invejas e até disputas. Em Caylus, para acabar com as queixas, nossas Irmãs foram obrigadas a proibir a apresentação de peças teatrais. “Senhoras”, - disse a Superiora a algumas mães de família que lhe demonstraram descontentamento – “farei com que todas estejam de acordo. Vocês acham que os papéis desempenhados por suas filhas não estão de acordo com sua posição, sua inteligência, seus talentos. Não digo o contrário, mas concordarão também que não posso dar os primeiros papéis a todas e que, necessariamente, os papéis secundários devem ser preenchidos. Não mais apresentaremos peças teatrais. Assim, evitaremos para nós o cansaço e para vocês o desgosto, quando buscamos lhes ser agradáveis.” Quanto a nós, Padre, por outra razão, proibiremos as apresentações teatrais. Agradeço ao bom Deus por lhe haver inspirado escrever-me essas linhas. Agradeço-lhe ainda mais por eu não ter provocado, de maneira alguma, essa decisão que vejo como a expressão de sua vontade.1 Novamente interroguei a noviça que chegou de SaintAmans. Suas respostas são de uma pessoa que não se sente culpada. Disse-me que, antes de sua partida de Saint-Amans, queria entregar à sua superiora o bilhete de que se trata, mas não o encontrou. Agradeço-lhe, Padre, por me ter falado sobre essa Irmã. Ela não está firme em sua vocação, não sei como 87 diferentes casas. Ficamos vários dias nesse hospício. O capelão queria que eu retornasse a Villefranche, pensando que havia bastantes casas na cidade para a instrução da juventude. Eu lhe opus a obediência: "Ela me foi prescrita," respondi-lhe; "de resto, se essa fundação é obra de Deus, ela se conservará; se ela não o é, se destruirá." Pe. Imbert, vigário dos Carmelitas, que eu fui visitar, acolheu-me muito friamente; contudo, acompanhou-nos e compreendi que era esse mesmo que eu devia escolher como meu diretor. 23 Abri-lhe a minha alma e, desde então, segui seus conselhos. Essa fundação trouxe-nos muitas dificuldades. Quase todo mundo era contra; consideravam-na uma loucura. Pe. Marty, ora me censurava, ora me aprovava. Enviou-me seu sobrinho, o Sr. Marty, tabelião em Villefranche, para examinar o caso. Esse senhor era contra a fundação, porém ao escrever ao tio, nosso Fundador, manifestou-se inteiramente favorável. Estávamos em Figeac sem recursos e cercadas de censuras e de críticas e com isso éramos felizes. Minhas tentações tinham cedido lugar a uma paz tão grande que não saberia expressá-la. Recebia poucos conselhos, mas repetia muitas vezes: "Meu Deus, guie meus passos de tal modo que eles se dirijam todos à observância dos seus preceitos. Dirige gressus meos." Estava sempre alegre. Alugamos, por fim, uma casa, embora nada possuíssemos, como já disse, e abrimos a escola. As alunas chegaram numerosas. Logo as salas alugadas foram insuficientes e algumas vezes fomos obrigadas a dar aulas nas escadas. Todas as Irmãs que vieram para a nova fundação ficaram desanimadas, e era preciso que nas horas de recreio eu procurasse alegrá-las. Pe. Marty enviou-me como superiora uma de nossas Irmãs que estava muito doente. Ela tomou logo posse do seu cargo e, naquela noite começou a se alimentar, um prodígio se operou em sua saúde. Pedi e obtive do Bispo de Cahors a 88 577 licença para ter o Santíssimo em nossa capela. A Regra começou a ser bem observada. Após alguns meses de permanência em Figeac, voltei para Villefranche. Fiz a viagem a pé para não faltar à clausura. Nossas provisões de viagem acabaram-se logo e minhas companheiras não puderam mais caminhar. Para reanimá-las, encontrei apenas uma ameixa que lhes dei. Chegando a Veuzac, fomos pedir hospitalidade ao vigário, que no-la concedeu após frio acolhimento. Ele estava tão prevenido contra a nova fundação que nem uma palavra nos disse sobre Figeac. Continuamos a viagem pela manhã e chegamos felizmente a Villefranche. Pouco tempo após minha volta, Deus chamou a si nosso venerando Pai. Minha dor foi amarga e profunda. Ele projetava destruir a nova fundação. Seu sucessor deixou-a na indecisão. Todo o clero de Figeac era contra e, quando o novo superior foi ver em que ponto andavam as coisas, todos os padres foram a favor. As Irmãs, consultadas para ver se preferiam voltar para Villefranche e abandonar a obra, responderam que queriam ficar. Deus continuou a abençoar a Congregação depois da morte de nosso venerado fundador, e o número de casas do Instituto aumentou. Em 1841, fundamos um claustro em Montauban, no bairro Sapiac. Em quase todas as fundações, tive uma pena, um sofrimento: em Montauban foi um tédio mortal; impossível dizer o que sentia interiormente. 24 Em 1842, fundamos ainda um convento clausurado em Montauban, no bairro Villebourbon. não- Em 1845, foi fundado o Refúgio de Villefranche, do qual me senti feliz em tomar a direção devido à grande compaixão que experimentava pelas infelizes vítimas das paixões humanas. Irmã, suas disposições, pois elas só podem ser o efeito da graça. Não querendo assumir a decisão tão difícil de chamá-la aqui ou de considerar seu estado de saúde como um obstáculo, entreguei a sua carta ao nosso Pai que me respondeu de deixá-la em Figeac e até permite-lhe ir a Livinhac. Quanto a Livinhac, não é preciso ir agora, espere que eu lhe fale. Ajude Madre Philippine1 quanto aos consertos e outras coisas, e sobretudo restabeleça sua saúde que nos é tão cara, particularmente a mim. Reze por nós, pois precisamos muito. Uma vez que o bom Deus não quer, no momento, que estejamos no mesmo lugar, fiquemos unidas no divino Coração de Jesus, onde a afeição é tão forte quanto imutável. Toda sua. Irmã Maria Emília. 204 Com satisfação, Madre Emília fala sobre seu agradecimento ao Padre Abbal, que suprimiu as representações teatrais, mantendo públicas as provas e a distribuição dos prêmios (L 853, M 505-507). Ao padre Abbal, vigário geral em Rodez. Villefranche, 26 de abril de 1851. J.M.J. Meu caríssimo Padre: Perguntando-lhe se haveria exames este ano, estava certa de sua resposta. No entanto, quis conhecer mais particularmente suas intenções, uma vez que nossas Irmãs desejavam sabê-lo. Eu lhes comunicarei sua resposta. Não duvido da presteza delas em assumir seu ponto de vista. Não precisarei estimular-lhes o zelo: a esperança de vê-lo presidir os exercícios inflamará seu ardor. De acordo com seu desejo, o ano escolar será encerrado com exames públicos e com a distribuição solene dos prêmios. Mas será, Deus ajudando, sem que sejam precedidos das peças teatrais. Li com grande satisfação o que o senhor teve a bondade de me dizer a esse respeito. Se, durante toda a minha vida, não 576 89 Para mim seria um grande sofrimento você receber a mensalidade das filhas que o Sr. Cavaignac lhe confia. O bem que ele fez a nossas Irmãs pede que vocês as eduquem com todo o cuidado possível, mas não permitirei que você passe para segundo plano a delicadeza dos sentimentos desse respeitável médico. Sempre que nossas Irmãs precisaram de seus serviços, ele as atendeu com zelo e dedicação, e agora que, graças a Deus, a saúde de todas vocês é bastante boa, não sendo preciso recorrer a ele, seria impossível aceitar seu pagamento. Queira dizer por mim ao Sr. Cavaignac que agradeço os cuidados por ele dispensados, que lhe sou muito grata e peço que os continue quando for necessário. Tenho certeza de que deixará sua filha conosco, sempre nas mesmas condições. Asseguro-lhe que será tratada como as outras e que ninguém saberá se paga em espécie ou de qualquer outra maneira: isto é assunto que só nos diz respeito. Faça-me o favor de mandar chamar Régis, o serralheiro, e diga-lhe que eu ignorava por completo que lhe devêssemos a quantia de 7 francos e 40 centavos. A Irmã ecônoma está ausente e peço que se dirija ao Sr. Joffre, que redigiu o contrato e lhe pagará o que é devido. Toda sua. Irmã Maria Emília. 203 Agradecimentos e orientações à Irmã Vincent Vacquié por ter demonstrado generosa indiferença, no que diz respeito aos cuidados para com a própria saúde (L 849, M 501-502). À Irmã Vincent, em Figeac. Villefranche, 24 de março de 1851. J.M.J. Minha muito querida Irmã: Sua carta de 12 de março tocou-me e edificou-me. Nela vejo o desejo natural de gozar de boa saúde e, ao mesmo tempo, o generoso sacrifício que quer fazer retornando para cá ao menor sinal da obediência. Deus abençoará, minha muito querida CAPÍTULO XIV Disposições interiores da Madre Seus exercícios de piedade Deus me havia chamado; meu desejo era ser dele e dele só. Não podia suportar que alguém o amasse mais do que eu. Não via senão ele em tudo e em toda parte e não desejava senão que o bem se fizesse por mim ou por outros. Ao ouvir dizer que iam fundar um convento em Graves, queria dar meu dote a fim de contribuir para essa boa obra. O Sr. Bispo se opôs a isso. 25 Desejo que minhas Irmãs não vejam senão a Deus e os interesses de sua glória, que elas se alegrem quando virem outras Ordens trabalharem com essa mesma finalidade. Oh! Praza a Deus que todos os homens profetizem! Um dia, o Bispo de Rodez, pensando ter-me penalizado, pediu-me desculpas por ter consentido que as Irmãs de Nevers se estabelecessem na cidade. Respondi a Sua Excelência que ele não me tinha penalizado, que havia ali bastante trabalho para todas e eu conservava sempre grande afeição por esse Instituto onde tinha querido entrar. Nunca disse a mínima palavra contra elas. 26 Nas contradições, lembrava-me do céu. "Contanto que nós nos salvemos," tal era minha divisa. Bastava que tivéssemos, desde o princípio, pessoas capazes para que Deus as levasse. Esse Esposo divino achava maduros os frutos do seu jardim e apressava-se em colhê-los. Pe. Marty me dizia: "É nada o talento; o espírito de sacrifício é tudo." A simplicidade era minha virtude predileta e tinha como lei jamais replicar a meus superiores. Se algumas vezes acontecia-me fazê-lo por inadvertência, confessava-me. Considerava sempre como vindo de Deus tudo que me diziam meus confessores, e a oposição que 90 observara em mim relativamente ao que eles me diziam era para mim um martírio contínuo. Durante muito tempo, tive dois confessores. Tendo outro confessor me aconselhado a deixá-lo, obedeci. No confessionário, não via senão Deus. Eis porque a obediência me era tão fácil. Era sucinta em minhas confissões, exceto quando era preciso prestar contas das minhas disposições interiores. Custou-me muito a confissão cotidiana. Jamais pude deter-me na idéia de uma comunhão sacrílega tanto tinha horror a esse crime. Também não podia ouvir alguém dizer: "Talvez eu vá para o céu." Muitas vezes, sonhava, enquanto dormia, com as coisas de Deus, a santa comunhão, os atos de virtude. Vi um dia, durante o sono, minha mãe em tão mísero estado que me causou compaixão. Vi-a novamente, muito embaraçada, em um caminho penoso. De repente, ela foi transportada com outras para um lugar aprazível, o que muito me consolou. Apreciava muito a vida dos pastores. A do beato Benedito Labre encantava-me. 27 Era sujeita a insônias quase contínuas. A calma profunda da natureza me facilitava a união com Deus. Pedi licença a Pe. Marty para ter um Crucifixo no meu leito devido às tentações de que era vítima. Ele o permitiu. Levava-o comigo quando viajava e o tinha sempre sob os olhos. Madalena ao pé da Cruz e Santa Teresa eram minhas santas prediletas. A leitura da vida dos santos enlevava-me e produzia em mim sofrimentos... (a frase está incompleta). Quando me falavam do fervor de uma Ordem religiosa, ficava igualmente comovida e exclamava: "E minha alma ainda tão apegada à terra!" É impossível compreender o que se sofre quando não se ama bastante a Deus. Durante a noite, eu repetia continuamente os cânticos que sabia, cerca de cinqüenta. Dizia também com o santo Rei Davi: "Alimentai-me com o pão das lágrimas..." 28 e, com a Esposa dos Cânticos: "Procurei aquele que meu 575 Os pobres eram objeto de sua mais terna afeição. No último ano de sua vida, utilizava todas as suas forças para trabalhar por eles. Deus era seu único bem! Um dia ela disse à Irmã enfermeira: “Deixo esta terra desapegada de tudo.” Um outro dia, perguntando-lhe se tinha confiança em Deus, respondeu: “Só tenho confiança nele.” Nossa querida Irmã Colombe, após ter percorrido um caminho tão penoso, após ter experimentado cruéis temores pelos julgamentos de Deus, foi inundada de graças. Alguns dias antes de sua morte, uma paz profunda invadiu sua alma. Deus lhe fez sentir como é bom ter vivido à sombra da cruz. Disse-me um dia, com uma expressão que eu não poderia esquecer: “Estou toda penetrada de confiança, nada poderia me atemorizar. A contemplação de Jesus crucificado fez em mim algo que não posso expressar.” Na noite de sua morte, expressou novamente esses vivos sentimentos de amor e, pegando seu crucifixo, após ter beijado amorosamente as sagradas chagas, disse: “Agradeço-lhe, meu Jesus, por me dar tanta confiança.” Pouco depois, entregou sua alma a Deus, deixando toda a comunidade edificada com o ardor de suas virtudes. Saúdo-as muito afetuosamente, nos sagrados Corações. Irmã Maria Emília. 202 A superiora geral insiste para que se tenha a delicadeza de receber gratuitamente, em Aubin, a filha do médico que tem sido muito caridoso para com a comunidade (L 846, M 498-499). À Madre Philippine Vacquié, superiora em Aubin. Villefranche, 12 de janeiro de 1851. J.M.J. Minha muito querida Madre: 574 Tivemos a dor de perder nossa muito querida Irmã Colombe Chresteil, na noite do dia 5, às 10h45. Há vários anos ela se oferecera a Deus como vítima pelo bem da Congregação. Sua oferta foi aceita pela divina Majestade, pois toda espécie de sofrimentos a afligiu sucessivamente, não somente aos poucos, mas em grande quantidade de uma só vez, de maneira que não havia uma única parte de seu corpo que não sentisse dores agudas. Os sofrimentos interiores foram muito maiores. Disseme várias vezes que suas enfermidades e a intensidade de suas dores nada eram em comparação com o que ela sofria interiormente. Em meio a essas terríveis aflições, sua coragem não diminuiu um só instante. Um dia em que sofria muito, perguntei-lhe se continuava em seu espírito de imolação. Respondeu-me afirmativamente. Seu amor pelo sofrimento não se satisfazia com aquele que lhe era enviado pela justiça divina. Mas até em seus desfalecimentos extremos, recusava uma ameixa, uma pastilha. Achava que a serviam e a alimentavam bem demais. Seu amor pela vida comunitária era de algum modo excessivo. Houve uma época em que ela estava tão fraca a ponto de não poder dar um passo sem cair. No entanto, queria ir à capela sem ajuda, fazer sua cama, etc. E apesar do desejo de aliviá-la, via-me forçada a ceder ao seu atrativo pela mortificação. Seu amor ao Santíssimo Sacramento era dos mais ardentes. Tendo obtido a permissão de rezar segundo sua devoção, passava longas horas em meditação ao pé do altar, num profundo recolhimento. O desejo pela santa comunhão era vivo e a fazia vencer todos os obstáculos. Longas insônias, uma tosse persistente, uma necessidade extrema de tomar algo não podiam diminuir seu ardor, nem impedi-la de prolongar sua ação de graças. Para se alimentar do pão dos anjos, Deus lhe deu, em sua última doença, forças que chegavam a ser prodigiosas. Embora estivesse com muita sede, comungou todos os dias e só uma vez recebeu o Viático. 91 coração ama e não o encontrei." 29 Começava a meditação da manhã pelas duas ou três horas. Tinha muitas vezes a tentação de contar as horas durante a noite, mas só por inadvertência me concedia essa satisfação. Sentia-me atraída, de modo especial, pela mortificação interior e desejo muito que nossas Irmãs se exercitem nesse gênero de mortificação. Pela manhã, examinava os pensamentos que havia tido e as faltas cometidas durante a noite. 30 Nas viagens, tudo me conduzia a Deus. Santificava-as pela oração e não empreendia sem necessidade. Elas constituíam para mim tempos de recolhimento mais profundo. Ordinariamente, meditava sobre a Paixão, durante a Missa. Durante as tentações, lia na Missa os Solilóquios ou a Imitação, por ordem de Pe. Marty. Gostava muito das estações da Via Sacra. As imagens piedosas alimentavam minha piedade. Gostava também das Ladainhas do Santíssimo Nome de Jesus e de Nossa Senhora. Comentava-as. 31 Durante a minha infância nunca deixava de oferecer meu coração a Deus pela manhã e à noite. O Salmo 118 me era muito caro. Lia-o e relia-o e me apropriava dele conforme o estado em que me achava. Gostava do De profundis e do Salmo 144. Era-me ainda muito caro um cântico de São João da Cruz no qual se falava de um estado inteiramente oposto ao meu. Durante minhas doenças, lembrava-me sempre dos salmos ou dos cânticos. 32 Apreciava muito as Bem-aventuranças, sobretudo a primeira e a última, que me encorajavam nos sofrimentos e contradições. Festejava sempre o dia do meu aniversário, da minha entrada em religião, da vestição e profissão. 33 Todas as tardes fazia cerca de duas horas de meditação. Ficava, às vezes, tão absorta em Deus que não ouvia os passos das Irmãs. Era preciso que batessem em mim com força para acordar. Ordinariamente, entretinha-me em doce contemplação. 34 92 Persuadida da necessidade de manter a alma serena, moderava-me em tudo e em toda parte. Meu estado de sofrimento forneceu-me longo exercício nesse ponto, sobretudo devido à minha surdez. No começo, sentia um ruído muito forte no ouvido, mas com a idade ele foi diminuindo. As humilhações que Deus me enviou me deram alguns traços de semelhança com Jesus Cristo. Sempre receei os temperamentos difíceis. Era indiferente aos presentes e donativos. O Nisi Dominus... servia-me para as fundações. Nas minhas doenças, recorria à piedosa pastora de Pibrac e sempre me senti aliviada. Recusei pedir minha cura. 35 Tinha feito uma coleção das cartas de Pe. Marty que mandei transcrever; após sua morte. Consolava-me lendo-as. 36 Receando seguir nisso a natureza, entregueias ao novo superior. Guardei somente aquelas onde havia algumas repreensões. O próprio Pe. Marty me obrigou a queimar algumas antes de sua morte. Quando fiz cair o reboco que tinha sido colocado na parede do meu quarto, foi por receio de dar mau exemplo que o deixei. Passei um ano sem o perceber. 37 Os médicos Delpech, pai e filho, foram-me dados como uma Providência. No governo da Congregação, Deus me dava uma coragem a toda prova. Uma vez conhecida a vontade de Deus, nada me detinha. "Só acontecerá o que Deus quiser," esse pensamento me sustentava. 38 O que mais me fez sofrer foi a desconfiança de nosso venerando Fundador. Ele queria convencer-me de que eu não agia simplesmente e tinha cometido uma falta ali onde minha consciência nada me censurava. A idéia de abandoná-lo não me veio. Por isso, alguns anos antes de sua morte, ele não me era mais útil. Deus queria, sem dúvida, preparar-me para o sacrifício. Amei sempre muito a verdade e nunca menti. Se, em uma carta, houvesse uma sílaba contrária à verdade, embora por pouca coisa, eu a apagava. Eu me teria censurado manifestar um sentimento que não estivesse 573 Ano de 1850 200 Encorajamentos numa provação com múltiplas ramificações. Nenhum sofrimento é esquecido por Deus. Entregar-se o mais possível ao cuidado das crianças (L 843). À Madre Marie Justine, em Marmont. Villefranche, 8 de novembro de 1850. J.M.J. Minha muito querida Madre: Fique certa de que tenho muita pena de você, pois vejo que sofre de todas as formas. Para encorajar-se, pense que o sofrimento é o caminho do repouso. Deus vê o que sofremos e nada esquecerá. Cada sofrimento terá sua recompensa. Tenha paciência, permaneça ainda onde está. Você não pode abandonar a vinha do Senhor. Cuide dessas pobres crianças. Será feliz em levá-las a Deus. Regozijo-me em saber que Irmã Claude está contente. Não preciso falar-lhe sobre o cuidado que é preciso ter com essa querida jovem. Envio-lhe as mais afetuosas lembranças. Toda sua. Irmã Maria Emília. Ano de 1851 201 Circular sobre a Irmã Colombe Chresteil que, durante sua doença, foi a interlocutora em vários Diálogos (v.s. segunda sessão, II, 12-14). Como Deus tomou a sério a oferta de si mesma que ele lhe havia inspirado fazer, em benefício da Congregação: graças e provações que lhe foram prodigalizadas (L 845). Minhas muito queridas Irmãs: Villefranche, 8 de janeiro de 1851. 93 572 paciência. Jesus, nosso adorável mestre e nosso modelo, sofreu muito mais durante sua vida pública, estando cercado e seguido por pessoas que contradiziam sua doutrina e o censuravam sem cessar. No entanto, ele não se afastou de seu convívio. Você desejou muito que mudássemos M., isso foi feito. Agora, é preciso esforçar-se para ter mérito em seus sofrimentos e procurar não somente tirar proveito deles, mas ser extremamente delicada e boa. Você o é, não duvido, mas sempre podemos crescer na virtude. Esforcemo-nos por fazê-lo e Deus nos abençoará. Toda sua. Irmã Maria Emília. 199 É pensando menos em si que se corrige melhor e mais depressa seus defeitos (L 838). À Madre Marie Damien, em Caylus. Villefranche, 23 de dezembro de 1849. J.M.J. Minha muito querida Madre: Desejo que você se entregue sem reserva a Deus. Ele é tão bom! Poderia ele lhe recusar alguma coisa? Não pense em si mesma e por esse meio se corrigirá mais depressa de seus defeitos do que por todos os seus temores. Uma confiança infantil tudo consegue. Tenha coragem, suas filhas confiam em você. Fique certa de que Deus, colocando-as nessa disposição, você fará o bem a elas. Seja sempre muito delicada: a mansidão atrai as bênçãos de Deus. Toda sua. Irmã Maria Emília. em meu coração. Parece-me que vivia em um abandono perfeito entre as mãos de meus superiores. Nunca tive outra cama, a não ser a que me davam, porque Pe. Marty o tinha proibido. Aplicava-me em moderar a precipitação. Se, por exemplo, tivesse tido um desejo muito grande de ler uma carta, teria esperado o dia seguinte. Não me teria permitido aspirar o perfume de uma flor. Impunha privações a meus olhos. Nunca quis tomar café com leite, mesmo em casa. Tendo-me Pe. Marty inculcado a devoção ao Espírito Santo e dito que era preciso esvaziar-me de minha vontade própria, mandei erigir um oratório em honra dessa adorável Pessoa e esperava que ela me tirasse meu próprio espírito para me dar o seu. Uma de minhas conselheiras teve uma tentação extraordinária contra mim, ela reprovava todos os meus atos. Bem feliz, aproveitei a oportunidade para me humilhar. 39 Desejava que me conduzissem como a uma criança. 40 CAPITULO XV Mortificação da Madre na alimentação Favores sobrenaturais que Deus lhe concede As doenças que tive antes dos trinta anos, sobretudo a do nariz, debilitaram-me o estômago a tal ponto que não pude, desde aquela época, digerir senão pequena quantidade de alimentos magros e, mesmo assim, a digestão me cansava muito. Tomava apenas o essencial, e muitas vezes o estômago não podia suportar a pequena quantidade reclamada pela natureza, o que me fazia experimentar contínua fome. Esse sofrimento me perseguiu durante vários anos. Deus me concedeu, enfim, a graça de triunfar dele. Tomava ordinariamente leite, alguns alimentos líquidos, um pouco de creme, algumas maçãs, etc. Jamais procurava variar a alimentação, a menos que o estômago recusasse absolutamente o que me era prescrito. Durante muito tempo, desejei comer uma 571 94 castanha. Deus me concedeu a graça de me dominar bastante e não a comi. Apesar disso, reconheço não ter sido bastante generosa. Pedia ao Espirito Santo que me guiasse. Pe. Marty não sabia o que fazer. Disse-me uma vez ter compreendido que Deus queria alimentar-me. Recusei aceitar, muitas vezes, as amabilidades de minhas Irmãs. Reconheço que não fiz bem. 41 A Providência foi sempre muito boa para nós. Não sabia, muitas vezes, como o dinheiro chegava à bolsa. Acontecia também, com freqüência, que a despesa ultrapassava a receita e nós não tínhamos dívidas. Algumas vezes mesmo não havíamos feito empréstimo; a despesa é, este ano, 40.000 francos, e a receita, trinta (no ano em que ela me ditava). 42 Um dia, no refeitório, levaram pão para as Irmãs das escolas em um cesto. Quando o tornaram a trazer, estava cheio como antes. Em outra ocasião, uma Irmã me chamou três vezes para dizer que o pão havia aumentado. Queixava-me, um dia, porque partiam pão demais. Fui ao refeitório, examinei eu mesma o fato e vi que havia tanto depois como antes da refeição. Se eu escolhia maçãs, elas se multiplicavam assim como os legumes, a banha. As Irmãs me pediam que contasse o dinheiro. Elas acreditam e atestam que ele se multiplicou; assim, preocupava-me muito pouco com os donativos. Nossas casas de Aubin e Villebourbon não podem ter o suficiente porque não são bastante generosas. Eu tinha, sobre a lareira do meu quarto, um frasquinho de óleo que tinha sido benzido sobre o túmulo da bem-aventurada Germana de Pibrac. Estava quase seco. Multiplicou-se uma vez. Ass: Pierre-Marie FABRE Capelão, diretor e confessor, afirmando ser tudo aqui escrito a expressão da verdade. Conservei tanto quanto possível a própria expressão da Serva de Deus. O que acrescentei foi apenas para esclarecer melhor seu pensamento. todas nos prepararmos bem para o retiro. Para esse fim, ofereçam ao bom Deus tudo o que fizerem a partir de agora. Rezem muitas vezes o Veni Creator e o Lembrai-vos. Durante a viagem, mantenham-se muito recolhidas. O sucesso do retiro, para muitas, depende disso. É preciso prever e anotar com antecedência tudo que quiserem dizer ou comprar, a fim de que, chegando aqui, cada uma só tenha que se dedicar inteira e sinceramente à santificação de sua alma. Para o bem de nossa Congregação, pensamos que deveríamos convidar um jesuíta para nos pregar o retiro. Padre Abbal e Padre Barthe também estarão presentes. Sendo consideráveis os honorários do Padre jesuíta, sendo considerável, contamos com sua generosidade para ajudar a Casa-mãe que, como vocês sabem, se encontra em grande dificuldade financeira. Darão sua contribuição como no ano passado, acrescentando a parte do pregador, segundo suas possibilidades. Aguardando com muito prazer vê-las em breve, saúdo-as muito afetuosamente. Irmã Maria Emília. 198 Madre Emília expressa sua compaixão a uma superiora que tem dificuldades com a comunidade, mas lembra-lhe, ao mesmo tempo, que esse tipo de provação é comum e está ligado ao cargo (L 837, M 57). À Madre Caroline, superiora de Aubin. Villefranche, 22 de dezembro de 1849. J.M.J. Minha muito querida Madre: Compartilho sinceramente seus sofrimentos, mas não posso aliviá-los, pelo menos agora. Cada casa tem suas dificuldades, tais são os desígnios da Providência que a cruz cubra toda a terra. Você me dirá: “Isso prejudica o bem.” Em outros conventos existem os mesmos inconvenientes e se tem 570 95 de felicidade, sobretudo muita confiança no bom Jesus.1 Parece-me, por sua carta, que lhe falta essa confiança. Não se apóia bastante na infinita bondade de Deus. Não compreendemos o quanto o Senhor nos ama, o quanto ele cuida de nós. Se nos fosse dado compreendê-lo, asseguro-lhe que o desânimo não teria lugar em nós. Ao contrário, nós nos alegraríamos pelos pequenos males da vida, pois eles devem nos levar ao céu. Não pense que faz sofrer suas Irmãs. Elas a amam, você as ama e tudo termina aí. Recomendo-lhe entregarse sem cessar ao bom Mestre, manter-se alegre junto da cruz. Vamos iniciar o retiro, então virá e nos dará todas as notícias. Não vejo possibilidade de você vir antes disso, faça esse sacrifício. Lembranças afetuosas às nossas queridas Irmãs. Toda sua. Irmã Maria Emília. 197 Em vista do retiro comum em Villefranche: prever a tempo todas as compras e fazê-las antes, para ficar livre e disponível em seguida (L 831, M 493-494). À Madre Appolonie, em Montbazens, e às outras casas secundárias. Villefranche, 7 de agosto de 1849. J.M.J. Minhas muito queridas Irmãs: Como o nosso retiro coincide este ano com o retiro pastoral de Rodez, fomos obrigadas a antecipar o nosso. Começa no 29 do corrente mês. É preciso que estejam aqui na manhã do 29. Só cheguem no 28 ou 29 pela manhã. Não há necessidade de dizer-lhes, minhas boas Irmãs, o quanto é importante para nós CAPITULO XVI Última doença da Madre Administração do Sacramento dos enfermos O estado de tentação de que já falei durou até dois ou três meses antes desta doença mortal. Encontrando-me numa grande paz, compreendi que Deus queria me retirar deste mundo e dar-me, por essa paz, maior ardor para ir a ele. Tendo entregue tudo à minha conselheira, felicitavame por não ser mais Superiora. No dia 4 de setembro, o seu confessor encontrou-a mais doente e lhe disse após a confissão: "Madre, deseja receber os últimos sacramentos? – Sim, não me deixe morrer sem eles. Depois, se ousasse pedi-lo, desejaria muito me concedessem o mesmo favor que recebeu a Superiora do Refúgio: a Santa Comunhão, embora não esteja em jejum. Padre, acredita que eu não faria bem em pedir perdão a todas as Irmãs dos escândalos que lhes dei, das penas que lhes causei; eu era tão orgulhosa, bem o sabe – Eu o farei pela senhora, pois está cansada demais. (Eu sabia que ela se comprazeria em ficar inteiramente unida a seu divino Esposo durante a administração dos sacramentos) – Parece-me, Padre, que eu não deveria ficar deitada, será bastante respeitoso? Terei força para me levantar. – Fique deitada. – Pois bem, como quiser. – Peço-lhe que me perdoe ter recusado o médico; fiz isso para ficar livre das insistências da conselheira, mas estou pronta a obedecer." Quando cheguei ao seu quarto para administrar os sacramentos, apresentei-lhe o Crucifixo. Ela quis beijar todas as chagas e com tal afeição que fazia chorar todas as suas filhas. Quando avistou o Santo Cibório, não pôde deixar de levantar-se. Pedi-lhe que abençoasse todas as 96 569 suas filhas, presentes, ausentes e futuras. Ela as abençoou a todas com indizível bondade. Ass: Pierre-Marie FABRE Capelão e confessor da Madre, afirmando a veracidade de tudo que está contido no caderno. CAPITULO XVII Últimos diálogos da Madre com seu confessor Segunda-feira, 6 de setembro de 1852, Madre Emília manifestou-me, por intermédio de uma de suas Irmãs, o desejo de me ver. Fui logo atendê-la. "Padre, peço-lhe que recomende de modo especial a filhinha de uma mulher do Refúgio chamada Clémentine, a Garrigoune e a Candelette, e depois o Refúgio, ao qual envio as sobras do pão das alunas internas e semi-internas. Digne-se apagar, nas notas que foram dadas pelo Padre Superior, uma frase que deixa entender ser o Refúgio uma causa de despesas para a Casa-mãe, o que não é verdade. Desejo muito que a aproximação existente entre o Refúgio e a Casa-mãe aumente e o tratem sempre com benevolência. Irmã Baptistine tem para com você uma amizade demasiado natural, deve precaver-se, apegar-se à mortificação, sobretudo interior, comprometer-se a cuidar bem de Irmã Césarie, pois me parece, segundo suas cartas, que não tem bastante caridade para com ela, tratar as pessoas com dignidade; não falar em dialeto (parece-me que fazia isso em sua comunidade, pois as Irmãs que nos chegaram o usam muito). Por obediência, ser muito fiel em observar o regulamento e, finalmente, recorrer a uma humilde oração, pois é nisso que encontramos um remédio para todos os nossos males. Desejo de todo o meu coração que todas possam vir fazer o retiro. O vigário, a quem escrevi, julgará se é conveniente. Toda sua. O vigário lhe responderá por mim aos outros itens de sua carta. Nosso Pai está melhor. Mais tarde lhe falaremos sobre a cerimônia. Irmã Maria Emília. Ano de 1849 – Madre, no céu a senhora poderá interessar-se por ele e lhe ser útil. – Não duvido, Padre, que Deus o proteja. Encontro-me em grande paz, sem sentir nada de extraordinário, como sentiram algumas de nossas Irmãs falecidas. – Aconselho-a a oferecer a Deus o sacrifício das consolações mais abundantes que Deus lhe poderia dar, a fim de obter essa graça para suas filhas. – De boa vontade, Padre. Procuro moderar o desejo que tenho da morte. – Acredita que vai morrer? – Oh! sim, tomei apenas um pouquinho de doce e sofri a noite inteira. O estômago recusa tudo, por conseguinte, vou morrer. O 196 Resposta aos votos de feliz ano novo. Abertura a uma confiança sem limites para com Nosso Senhor, a fim de purificar-se dos germens que difundem o desânimo cotidiano (L 826, M 490-491). A uma superiora. Villefranche, 29 de janeiro de 1849. J.M.J. Minha muito querida Madre: Sou-lhe grata pelos votos de feliz ano novo que me enviou. Os meus para você são os mais sinceros. Desejo-lhe toda sorte 568 97 Para lhes facilitar tudo isso, peço-lhes prever, antes de saírem de suas casas, as compras que queiram fazer aqui e as permissões que quiserem solicitar. Quando chegarem, entreguem à ecônoma a nota assinada de tudo que quiserem adquirir na Casa-mãe, seja no que se refere aos livros dos alunos, seja para o hábito das Irmãs. A lista das compras a serem feitas fora deve ser entregue à vice-diretora. Para essas duas Irmãs, será um dever e um prazer servi-las da melhor maneira possível. Solicitamo-lhes que tragam os lençóis, as camisas, as guimpes (golas), as toucas, os lenços e as meias que acharem necessárias, e mais os talheres, um trabalho manual, um livro de orações, um guarda-chuva e, em caso de mudança de tempo, uma camisola e uma saia de inverno. Toda de vocês. Irmã Maria Emília. Ano de 1848 195 ruído que ouço no peito me faz sofrer. Nossas Irmãs poderiam pensar que me queixo. Faço o possível para abafar meus gemidos. – Não tenha medo, Madre. – Quer consentir que eu diga a suas filhas tudo que sei da senhora pela confissão e que poderá ser útil e vantajoso para a glória de Deus, a edificação do Instituto e dos fiéis? – Sabe, Padre, quanto evitava atrair sobre mim a atenção de quem quer que fosse, mas, visto ser sua vontade, submeto-me. Confesso que o senhor me impõe um grande sacrifício. Digne-se recomendar às Irmãs, a prática da caridade e depois procure destruir todas as misérias que conhece, sem que eu as diga. – Dar-lhe-ei a indulgência plenária quando o desejar. – Quando quiser, Padre. – Pensa morrer logo, Madre? – Ainda não. – Pediu alguma vez a Deus morrer em um dia determinado? – Não, Padre. Pensaria exigir demais com isso. Disse algumas palavras ao médico. Queria tanto que ele se convertesse! Desejo muito que nossas Constituições sejam aprovadas pela Igreja, se o Sr. Bispo e o Padre Superior o julgarem oportuno. Logo que compreendi ter chegado ao fim da minha carreira, afastei-me das responsabilidades da direção para acostumar minha conselheira ao governo da casa. Não cesso de rezar por ela a fim de que Deus a assista. Suplico-lhe que ajude minha Irmã Foi para que se aperfeiçoe e se corrija de tudo que nela possa desagradar a Deus." Ass: Pierre-Marie FABRE Pequenos conselhos para verdadeiramente tornar mais fervorosa e radiante a vida religiosa numa pequena escola do vilarejo (L 823). À Irmã Mathilde, superiora de Saint-Beauzély. Villefranche, 19 de outubro de 1848. Minha muito querida Madre: Participo intensamente dos seus sofrimentos. O remédio para todos esses males é uma grande fidelidade aos movimentos interiores da graça. Um outro é o de não se permitir nenhuma familiaridade com quem quer que seja, até com as Irmãs. Como Afirmando a veracidade de tudo que está contido neste suplemento. 98 567 194 II. DOCUMENTOS ANEXADOS À AUTOBIOGRAFIA Os textos seguintes (1 a 9) provêm do fascículo datilografado que tem como título Manuscritos autógrafos (cf. bibliografia, documentação não-impressa, 15). Alguns foram inseridos nas coletâneas de cartas (cf. ibid., 18), outros subsistiram graças às cópias cujo conjunto constitui os “Dossiês da Causa”. Sob os números 10 e 11, reunimos algumas cartas ou trechos de cartas recebidas por Santa Emília (cf. ibid., 19 e 20). Observar-se-á aqui, ainda, que o estilo da fundadora contém, às vezes, pequenas falhas ou pelo menos negligências, sem dúvida em virtude da pressa com que ela redigia, pois nunca pensou que as cartas pudessem ser um dia publicadas. 1. “Ata” de 1810 Referência e texto nos Manuscritos autógrafos 40-41 que reproduz uma passagem dos Dossiês da Causa (fascículos 17, classis quinta). Esta oração está datada de 3 de janeiro de 1810. Emília, pensionista na Casa Saint-Cyr, já havia feito sem sucesso duas tentativas de vida religiosa e emitido os três votos puramente privados, no dia 21 de novembro de 1809 (v. s. p. 5; e nesse mesmo texto uma alusão: “Se eu não o posso por voto...”). O primeiro parágrafo dirige-se a Deus; o seguinte à Santíssima Virgem. Por essa razão, sem dúvida, esse documento aparece por vezes com o título de “Consagração à Santíssima Virgem”, o que não lhe convém de modo algum; v.g. “Sei que a serva de Deus escreveu um ato de consagração à Santíssima Virgem” (DF citado nos Manuscritos autógrafos 40). Com o auxílio de sua santa graça, tomo-o por minha única herança. Sim, só o senhor, sim, só o senhor, eis meu lema. Que Informações sobretudo disciplinares e práticas, antes do retiro anual, mas visando proporcionar, do melhor modo possível, o pleno sucesso espiritual (L 814, M 480-481). À Madre Marie Léonide, em Asprières, e sua comunidade. Villefranche, 7 de agosto de 1847. J.M.J. Minhas muito queridas Irmãs: Tenho a satisfação de anunciar-lhes que o retiro começará na noite de 1º de setembro próximo e terminará no dia 8 do mesmo mês, festa da Natividade da Santíssima Virgem. Se acham que a viagem as fatigará, cheguem um ou dois dias antes do início do retiro para repousarem um pouco. Também as previno para marcar com antecedência o retorno para a noite do encerramento do retiro ou para o dia seguinte. Assim, viajarão sem confusão, por um transporte público, particular ou a cavalo, como o preferirem. Queiram reler os artigos 316 e os seguintes até o 321 de nossas Constituições e conformar-se com o que eles dizem, vindo a Villefranche. Numa palavra, minhas queridas irmãs, esforcemo-nos seriamente para aproveitar, mais do que no passado, de um retiro que nos é oferecido unicamente para nos renovar no espírito de nossos votos e de nossa vocação. Tendo isso em vista, prometam a Deus que evitarão, tanto durante a viagem quanto em Villefranche, as conversas de superiora a superiora, ou de Irmã para Irmã, no que diz respeito às casas ou aos membros de nossa Congregação. Sem isso, aceitem que eu lhes diga, o retiro prejudicará a união, em vez de cimentá-la, e as dissipará, em vez de as recolher. Que cada uma se compenetre de que esses 8 dias de retiro lhes são dados para fortificar suas almas no recolhimento e na oração, e conversar com Deus sobre o grande projeto de sua salvação. 566 99 J.M.J. Minha muito querida Madre: Neste momento é preciso testemunhar seu amor a Deus e encorajar suas filhas a fazerem o mesmo. Abrace a cruz e esteja certa de que ela a levará um dia ao céu. Você teria feito melhor em não escrever ao vigário, mas sim em responder-lhe de viva voz, falando-lhe com grande humildade e respeito. Aconselho-a agora a pedir que ele chegue até o convento ou você vá ao presbitério. Diga-lhe que não quis aborrecê-lo e que, se tivesse pensado que o que foi dito iria produzir um tal efeito, não o teria dito, que você o considera sempre como seu Pai e quer lhe dar satisfação. Acredite que, fazendo assim, você se comportará como uma verdadeira Irmã da Sagrada Família, e o Senhor vigário ficará contente. Faça o sacrifício de confessar-se com ele e leve suas Irmãs a fazerem o mesmo. Nessa circunstância, procurar outro confessor poria tudo a perder. Veja somente Deus na pessoa do confessor e progredirá mais fazendo assim do que de outra maneira. Eu a veria com muito prazer, mas não é o momento de vir. Participo vivamente de seus sofrimentos. Amanhã, toda a comunidade rezará por você e por suas queridas filhas, a quem envio as mais afetuosas lembranças. Não venha, Deus a ajudará. Se quiser que eu escreva ao Senhor vigário, diga-me. Toda sua. Irmã Maria Emília. Mantenha-me a par de tudo, pois tudo me interessa. essas palavras estejam freqüentemente em minha boca e profundamente gravadas em meu coração, mas que eu não me contente em dizê-las. Faça com que sejam para mim, por sua misericórdia, uma grande lição que me ensine a me desapegar de tudo para me unir intimamente ao senhor. Quero, pois, se for preciso, tudo perder, tudo sacrificar pelo senhor, abraçar sua cruz, esconder-me em suas santas chagas, sobretudo no seu Sagrado Coração, e dali, com seu auxílio, ver a terra de longe e viver desconhecida, no retiro, no silêncio, meditando sua santa lei, pondo no senhor toda a minha confiança, pois reconheço, para minha vergonha e confusão, que não a tive bastante. Assim, por maiores que sejam minhas faltas, não perderei nunca a confiança, ajudada com seu auxílio. Se for tentada pelo desânimo, voltarei meus olhos para o meu divino Salvador Jesus, lançar-me-ei nos braços da divina misericórdia e a força me será restituída. Quero também ter mais devoção à Santíssima Virgem e, depois do senhor, repousar inteiramente nela. Sim, será a senhora, Virgem Santíssima, que me obterá a graça de temer docemente as ilusões do meu amor-próprio e que pedirá para mim a graça de não falar demais, de ser prudente e simples ao mesmo tempo, de evitar prejudicar os outros nas mínimas coisas e nunca dizer algo com o fim de atrair a estima dos outros, seja interior, seja exteriormente, de me alimentar das verdades santas que o bom Deus quiser me fazer conhecer, de falar pouco sobre isso, de meditá-las, de não me apoiar em um confessor, mas de considerá-lo como um instrumento do qual devo estar disposta a ver mudar quando Deus quiser. A não procurar nesse instrumento nem consolação nem apoio, mas sim a vontade de sua divina Providência. Será ainda sob sua proteção, Virgem Santíssima, que me lembrarei sempre dos grandes exemplos de virtude que tive nesta santa casa e que me esforçarei por imitá-los. Diga-lhe, eu lhe suplico, que, no excesso de seu amor, ele me torne para sempre sua escrava, que eu lhe obedeça todos os dias de minha vida, obedecendo com inteira simplicidade às pessoas que ele puser acima de mim, que eu seja sempre a escrava do meu dever, de condescender, tanto quanto me for possível, à vontade dos meus semelhantes e mesmo dos meus 100 565 subalternos, a fim de que eu pratique a santa obediência, e, se não puder fazê-lo por voto, pelo menos em desejo e em minhas ações. Que a santa pobreza seja minha fiel companheira. Que eu a pratique também até o meu último suspiro. 2. Crônicas dos anos 1816-1817 Autógrafo (coletâneas de cartas VI 337-340; Manuscritos autógrafos 11-13) que apresenta interesse ao mesmo tempo histórico e espiritual. Vê-se como Santa Emília já recomenda as atitudes de confiança na Providência e de humilde serviço que devem, segundo o seu parecer, caracterizar o exercício do superiorato ( v.s.p. 68-71). O bom Deus nos deu a graça de começar nossa escola no dia 3 de maio de 1816. A escolha desse dia lembrará às Irmãs que elas devem viver e morrer no sagrado monte do Calvário; por conseguinte, renunciar-se sem cessar e não conhecer senão Jesus e Jesus crucificado. No dia 15 de julho do mesmo ano, tivemos a felicidade de possuir o Santíssimo Sacramento em nossa capela, felicidade pela qual ansiávamos com ardor e que temíamos não obter, diante de nossa indignidade. Antes, nossa capela foi benzida e dedicada à Imaculada Conceição da Santíssima Virgem Maria que queremos amar e honrar como nossa boa e terna Mãe que é, depois de Deus, toda a nossa esperança. Tomamos como nosso protetor e advogado junto a Deus o glorioso São José, a quem devemos prestar honra e homenagem toda particular. As Irmãs devem considerar como um de seus primeiros deveres invocar São José todos os dias, e invocá-lo ainda em todas as suas necessidades gerais e particulares. No dia 20 de abril de 1817, pela primeira vez, tivemos a bênção do Santíssimo Sacramento. Não pudemos tê-la antes porque nem tínhamos ostensório nem os outros objetos necessários. por isso que o Sr. Bispo julgou conveniente doar-nos uma parte dos livros dos Irmãos das Escolas Cristãs. Todos os nossos foram mudados, com exceção da História da Igreja, da Cronologia, da História Sagrada antiga e romana. Eis os preços dos livros, primeiramente para vocês e em seguida para os alunos. Será preciso providenciar a despesa do frete. Gramática – 0,85 centavos; para as alunas 1 franco. Exercícios de ortografia – 1,10; para as alunas, 1,25. Leituras autografadas 0,45 centavos; para as alunas 0,50. Livro de exercícios do professor – 1,80. Geografia – 1,10; para as alunas 1,25. Leituras impressas para a mestra – 0,75 centavos Aritmética – 1,30; para as alunas 1,40. Soluções – 1,40 Deveres do cristão, livro de leitura, 0,95 centavos; para as alunas 1 franco. Os Irmãos são os autores de todas as obras que nos vieram de Paris. O terço custa 1 franco, porque os crucifixos que tínhamos não eram resistentes. Encomendamos alguns em Paris e custarão 50 centavos. Calculem os livros e os terços de que precisarem. As alunas devem pagar e enviem-nos o dinheiro pelo correio com o pedido, assim como os terços. Nossa ecônoma está sem dinheiro e não é possível pagar adiantado. A História da França de Lefranc.1 Irmã Maria Emília. Ano de 1847 193 Abraçar a cruz que um dia levará os seus para o céu. Após acontecimento desagradável e de mal-entendidos com o pároco, mostrar-se ainda mais respeitosa e deferente para com ele (L 805). A uma superiora. Villefranche, 21 de janeiro de 1847. 564 101 À Irmã Euphrasie. Villefranche, 14 de setembro de 1846. J.M.J. Minha muito querida Irmã: Não posso deixar de responder imediatamente à consoladora carta que me escreveu e que me causou prazer. Ela me dá as mais doces esperanças. A luz que Deus lhe dá será seguida por seus esforços e você começou bem a fazê-los de acordo com as confidências que fez a nossas Irmãs e a mim também. Não tema, minha querida Irmã, pois elas não diminuirão a terna afeição e a estima que lhe tenho, ambas só podem aumentar. Continue abrindo plenamente sua alma à Irmã N. e fique certa de que Deus medirá suas graças pela sua simplicidade, seja interior, seja exterior, como também pelos esforços que fará para ir ao encontro do que lhe custa. Um dos melhores meios para ter essa coragem é olhar muita vezes nosso terno Salvador em sua Paixão. Nessa divina escola só podemos nos tornar corajosas e dispostas a fazer tudo que Deus nos pede. Peço-lhe que em breve me escreva, pois desejo saber que você está indo cada vez melhor. Sou, com muita afeição, nos santos Corações, toda sua. Irmã Maria Emília. 192 Remessa de uma lista de livros escolares imposta pelo Bispo (L 694). À Madre Léonide, em Asprières. Villefranche, 11 de outubro de 1846. J.M.J. Minha muito querida Madre: Sendo nosso Instituto dedicado à instrução da juventude, é de suma importância estabelecer a uniformidade no ensino. É Deus nos concedeu muitas graças neste primeiro ano de nossa fundação. No tocante ao espiritual, nada nos faltou. De quatro que éramos, somos doze, às quais ele quis dar o desejo de servi-lo. Afastou aquelas que não tinham vocação, de forma que cinco jovens que pensavam ser chamadas por Deus para viver conosco não foram aceitas e saíram, o que deve servir de lição para a superiora e seu conselho, que não deve se apressar em receber jovens sem, antes, consultar humildemente o Espírito Santo e não ter nenhuma visão humana, sobretudo não se decidir pelos bens que a jovem possui, o que deve ser contado como nada. As Irmãs estejam bem certas de que enquanto puserem sua confiança em Deus nada lhes faltará e, mesmo que isso aconteça, devem se alegrar porque têm nisso alguma semelhança com Jesus pobre. É na santa pobreza que encontrarão verdadeiros tesouros que ninguém lhes poderá roubar. Neste primeiro ano, a divina Providência quis prover a todas as nossas necessidades temporais. Humanamente falando, tudo nos deveria faltar e nossa casinha deveria ruir por falta de recursos humanos. Mas Deus nos concedeu a graça de ver as coisas de outra maneira, persuadidas de que ela não desmoronaria por conta disso. Começamos assim mesmo e, para melhor consolidar a obra, recebemos quatro pessoas para alimentar gratuitamente. Não fomos enganadas em nossa esperança, embora este ano tenha sido dos mais difíceis, que tenhamos comprado o trigo por um preço muito alto (até quarenta e dois francos), que todos os outros produtos também tenham custado muito, que tenhamos recebido as jovens que queriam se consagrar a Deus pagando uma pensão muito pequena, que de todos os nossos parentes, somente o pai de uma de nós deu uma pequena pensão à sua filha, que não tendo nenhum móvel, tenha sido preciso comprar os mais necessários. Deus proveu de tal maneira às nossas necessidades que tivemos tanto pão quanto queríamos e mesmo além do que queríamos. Aprendamos, pois, a contar com Deus, que nunca falta. 102 563 À Madre Angélique, em Firmi. Villefranche, 26 de agosto de 1846. Um ano depois de nossa fundação, no dia da Santa Cruz, celebramos o aniversário com santa alegria e todas com boa saúde. Tivemos a exposição do Santíssimo Sacramento o dia todo e a bênção à tarde. Que a superiora se lembre de nada fazer, seja no plano temporal, seja no espiritual, sem antes consultar humildemente o Senhor. Por não tê-lo feito, sinto-me bem confusa. Tive mais trigo do que era necessário para chegar até a colheita. Vendi-o e vejo-me obrigada a comprá-lo por um preço mais alto e tudo isso porque não agi sob os olhos de Deus. Também que ela se lembre de não impor nenhum fardo que ela mesma não tenha carregado antes. Tanto quanto possível, deve assumir o mais penoso e não permitir que as Irmãs a poupem demais. Deve dar o exemplo e sem querer fazer disso um mérito, lembrando-se de que deve ser a mais humilde serva de suas Irmãs. Bem compenetrada dessa verdade, não apresentará semblante cansado nem aborrecido, quantas vezes se recorra a ela. Ao contrário, que se sinta feliz e muito honrada em servir às esposas de Jesus Cristo. 3. Crônicas dos anos 1817-1820 Manuscritos autógrafos 13 (coletâneas de cartas III 5-8). Notar a confissão que se refere ao dia 26 de junho 1818: é típica de um rigorismo que, em Santa Emília, se alia a uma grande e compreensiva bondade. A “classe São Vicente” designa aquela que, inteiramente gratuita, acolhe as crianças mais pobres (v. s. p. 71-74). No dia da Assunção da Santíssima Virgem, em 1817, quatro Irmãs tiveram a felicidade de fazer os votos de pobreza, castidade e obediência por um ano. Eis seus nomes: Ir. Eléonore Dutriac com 19 anos, Irmã Athanasie Rozié de 20 anos, Irmã Rose Masbou de 19 anos, Irmã Vincent Garrigou de 14 anos. J.M.J. Minha muito querida Madre: O retiro que vai se realizar, do qual espero dizer-lhe em breve a data, me dá a oportunidade de conversar com você para levá-la a redobrar de ardor e zelo em suas obrigações particulares e para com o próximo. Faço-o com prazer, pois a sua boa vontade é minha alegria e minha consolação. Para mim, é agradável pensar que, espalhadas pela zona rural, fazem tudo o que depende de vocês para tornar conhecido e amado o melhor de todos os mestres, e que não deixam passar nenhuma ocasião de suscitar o amor à Sagrada Família. Acrescentem a isso, segundo seus desejos, um aumento de vida interior e de caridade e continuarão, por sua exatidão no cumprimento de seus deveres e sua constante regularidade, a amenizar os sofrimentos inseparáveis do cargo que a Providência me confiou. Esforcemo-nos, minhas bem-amadas Irmãs, por nos encorajar por ter um grande desejo de amar o bom Deus de todo o coração e por seu amor amar ternamente nosso próximo. Daqui até o retiro, procuremos fazer todos os atos de amor possíveis e estejamos certas de que esse retiro, que vejo com alegria ser o objeto de seus votos, será um tempo de felicidade e solidificará os laços que nos unem. Que a mais profunda paz seja seu melhor fruto. Saúdo-as afetuosamente, com uma dedicação sem medidas, minhas muito queridas Irmãs. Sua Madre muito afeiçoada. Irmã Maria Emília. 191 Felicitações e encorajamentos a uma religiosa que tomou boas resoluções e que começa a colocá-las em prática. Para ter a coragem de renunciar a si mesma, é preciso contemplar muitas vezes Nosso Senhor em sua Paixão (L 790, M 38-39). 562 103 Quero suprir a privação que experimento por tê-la longe de mim, desejando-lhe um santo Aleluia e a paz que o acompanha, bem inestimável que todas podemos possuir pela prática das obrigações de nosso santo estado, e pela união que nos é fácil ter com Jesus, Maria e José, a quem temos a felicidade de pertencer de um modo particular. Lembremo-nos muitas vezes, minhas muito queridas Irmãs, das virtudes das quais nos deram o exemplo e, sobretudo, desse espírito de recolhimento que tinham na santa e humilde morada de Nazaré. Gostem de viver escondidas, sejam breves no parlatório e não repitam o que tiverem escutado. Lembrem-se de que nosso fundador nos recomendou: fechar cuidadosamente todas as brechas por onde o espírito do mundo poderia entrar na solidão. É pelo amor e pelo espírito de sacrifício que precisamos nos preparar para receber a nova Regra que esperamos. Disseramme que em breve chegará. Façamos tudo que depender de nós a fim de estar repletas de coragem e de zelo para cumprir tudo o que ela nos prescrever. Enquanto esperamos, peço-lhes que façam três comunhões em honra do Sagrado Coração de Jesus, e ofereçam, pela manhã, tudo que fizerem em união com esse divino Coração. Nosso Pai manda lhes dizer que nos envie, por escrito, a relação de tudo que as crianças devem recitar por ocasião da distribuição dos prêmios. Ele não se refere aos livros clássicos, mas aos diálogos, fábulas, textos de história, poesias. Ele deseja ainda que nos enviem a lista dos livros que devem dar como prêmio. Toda sua. Irmã Maria Emília. 190 Mais uma carta em preparação ao retiro. Alegria da superiora geral ao pensar no apostolado feito pelas religiosas. Convite a um aprofundamento da caridade interior e do sentido de sua observância (L 788, M 455-456). 26 de junho de 1818 – Cometi uma falta da qual me arrependo e dela peço perdão a Deus, como também à Santíssima Virgem e a São José: deixei sair uma interna com o vigário da paróquia, porque não agi, naquele momento, sob o olhar de Deus. Com o auxílio da graça, não serei mais tão fraca e me orientarei pela regra de só deixar sair com o pai ou a mãe. Há também algum tempo que deixei uma aluna ir ao parlatório sem ser acompanhada. Disso me arrependo também e me proponho, com o auxílio de Deus, não mais permiti-lo. No dia da Natividade da Santíssima Virgem, em 1820, tivemos a imensa felicidade de emitir os votos perpétuos, recebidos por nosso celebrante em nome de Deus. Éramos sete: Irmã Athanasie, Irmã Rose, Irmã Ursule, Irmã Vincent, Irmã Thérèse, Irmã Agathe e Irmã Emilie, superiora. Três fizeram os votos por um ano: Irmã Augustine, Irmã Angèle e Irmã Euphrasie. Nesse mesmo dia, recebemos o véu e o hábito religioso, que nos foi dado por nosso Pai. Isso nos leva a amá-lo e estimá-lo muito particularmente, pensando que é o próprio Deus que nos quer assim, pois aquele que fica em seu lugar no-lo deu. Nesse mesmo dia, a superiora fez um quarto voto: o de orientar nossa Congregação para a educação da juventude.43 Embora não tenhamos feito um voto particular de clausura, a isso somos igualmente obrigadas, estando esse compromisso incluído nos outros. Não podemos sair por nenhum motivo, nem mesmo para tomar banhos térmicos, embora certas de que eles devolveriam uma saúde perfeita depois de uma longa doença. Não podemos deixar entrar em nossa casa outras pessoas, a não ser por necessidade. Somente no dia de São Vicente, 21 de julho, nos é permitido deixar passear no grande jardim as crianças dessa classe. Para as crianças de outras classes, podemos deixá-las passar pelo pequeno jardim ao longo do muro, para irem à capela, quer para se confessarem, quer para participarem da Missa. As Irmãs que as acompanham devem cuidar para que não se espalhem pelo jardim, apenas deixá-las passar pela porta do pequeno jardim, pela qual se entra na capela. Ao fazer voto de pobreza, não podemos legalmente nos 104 561 despojar da propriedade de nossos bens aos olhos da lei, mas, diante de Deus, renunciamos a ela para sempre, de forma que, se uma Irmã herdasse algum bem, esse não lhe pertenceria, mas à comunidade, a quem deu todos os seus bens presentes e futuros. 4 . Detalhes sobre a fundação de Montauban-Sapiac Manuscritos autógrafos 48-50 (Dossiês da Causa: fascículos 18, classis quinta). Tendo-se realizado a fundação em 1841, o texto deve ser dela sensivelmente contemporâneo. A Madre fala de si própria na 3ª pessoa, por discrição, como de costume. Afetuosa estima pela vida carmelitana, gratidão para com a priora, disposições de obediência e de humildade, tantos “pontos” que caracterizam Santa Emília. Ela confessa a persistência de uma desolação que, entretanto, se acalmava ordinariamente no momento de empreendimentos difíceis, mas não há nesse campo nenhuma lei (v.s.p. 19 e 88). Nossa casa de Montauban foi estabelecida e eis como surgiu a idéia: a superiora das Carmelitas de Figeac foi obrigada a fazer uma viagem para Montauban.44 Durante sua permanência nessa cidade, teve a oportunidade de ver o proprietário de uma antiga casa dos Carmelitas, que desejava muito vendê-la. Ele lhe pediu que nos comunicasse e nos encorajasse a fazer a aquisição para fundar uma de nossas casas nessa cidade. Madre Thérèse fez o que lhe foi pedido e até insistiu para que realizássemos o desejo desse respeitável sacerdote. Nosso Pai interessou-se por esse projeto e concordou que nossa Madre viajasse até lá. Ela se sentia igualmente atraída por essa obra. O objetivo era ver se a casa indicada convinha, mas faltava dinheiro, e toda a esperança de encontrar fundos, pelo menos em grande parte, estava apoiada na divina Providência. Mas a experiência feita tantas vezes de que a divina Providência é o mais seguro de todos os recursos fazia suas vizinhas para se alegrarem com ela. Vocês lhes dirão que os anjos de Deus se alegram com a volta de um pecador e lhes lembrarão as consoladoras palavras do Salvador, exortando-as a meditá-las, a alimentar-se delas, sobretudo nos momentos de perturbação e angústia. É preciso ainda preveni-las contra as astúcias do demônio que quer levá-las à tristeza e ao desânimo. Ele colocará, sem cessar, diante dos olhos delas, as desordens da vida passada, nada negligenciará para levá-las ao desespero. Sustentem-nas então com palavras firmes, digam-lhes que nada têm a temer, contanto que se deixem conduzir. Não se esqueçam de lhes inspirar uma grande devoção para com a santa Virgem. Exortem-nas a invocá-la e a acrescentar à invocação a imitação das virtudes das quais nos deu o exemplo. Finalmente, levemnas a rezar muitas vezes ao anjo da guarda, sobretudo quando forem tentadas. Eis, minhas boas Irmãs, o que queria lhes dizer. Não duvido de que farão todo o possível para seguir as recomendações que lhes faço. Toda de vocês. Irmã Emília. Ano de 1846 189 Votos de Páscoa à comunidade de Montauban-Sapiac. Exortação à vida escondida e solitária, da qual a clausura é o sinal e a garantia. Receptividade acolhedora no que diz respeito às Constituições ansiosamente esperadas (L 786, M 472-473). À Madre Foi, em Montauban-Sapiac. Villefranche, 20 de abril de 1846. J.M.J. Minha muito querida Madre: 560 Imitadoras do divino Mestre, seus corações devem estar repletos de caridade, de compaixão por essas infelizes vítimas das paixões humanas. Essa caridade será demonstrada em todas as suas palavras, em todas as suas ações. Como o bom samaritano, vocês colocarão óleo e vinho nas feridas ainda sangrentas de suas pobres doentes. Evitarão, diante delas, a menor atitude, o menor gesto que lhes possa fazer sentir sua superioridade sobre elas. Seu coração lhes será aberto. Ao abordá-las, não terão elas que temer a frieza que gela, a severidade que afasta e o acanhamento que constrange. Vocês saberão temperar a firmeza com a doçura, a ativa vigilância com as maneiras boas e confiantes. Terão entranhas maternas para cada uma delas, e seus maiores cuidados serão para as mais necessitadas. A ternura materna lhes fará suportar com este espírito de mansidão tão recomendado pelo Salvador, as asperezas do caráter, as desigualdades do humor, as faltas de educação, algumas vezes mesmo a ingratidão e as grosserias ocasionadas pela falta de educação. O zelo, a paciência nos encontros difíceis, não as deixará se abater nem desanimar. Sejam sempre as mesmas em todas as circunstâncias, firmes na confiança em Deus e no desejo de salvar almas, que nada as espantará nem as desencorajará. Nas conversas com suas filhas adotivas, elas poderão perceber que realmente vocês gostam delas, apreciam estar com elas, aproveitam todas as ocasiões para conduzi-las ao bem, à prática da virtude, o amor pela vida solitária que voluntariamente escolheram. Vocês lhes falarão muitas vezes das infinitas misericórdias do Senhor, farão com que vejam Nosso Senhor Jesus Cristo como um pai terno, sempre pronto a recebê-las. Vocês lhes contarão as parábolas tão comovedoras que revelam tão bem os sentimentos do Coração de Jesus para com os pecadores. Por exemplo, o pai do filho pródigo correndo ao encontro de seu filho e mandando matar o novilho gordo para celebrar seu feliz retorno, será assunto de suas conversas; também a samaritana diante do poço de Jacó; Madalena lavando os pés de Jesus com suas lágrimas; o bom pastor carregando em seus ombros a ovelha desgarrada; a mulher que perdeu a dracma e que chama 105 com que houvesse a certeza de que não nos faltaria nessa circunstância, contanto que estivesse nos desígnios de Deus. Ficou, pois, acertado ir ver e voltar em seguida para amadurecer o projeto, mas tínhamos a idéia de que se a Madre fosse, estabeleceria aí a casa antes de sua volta, senão teria suplicado a nosso Padre Marty de não a obrigar a fazer essa viagem se não tivesse quase certeza de êxito. Viajou no dia 5 de julho de 1841. Perguntou a uma pobre mulher onde residiam as Carmelitas: a mulher se ofereceu para conduzi-las até lá. A boa Madre Sainte-Fleur, a quem pediu hospedagem, recebeu-a com a mais terna caridade, ofereceu-lhe um apartamento para ela e suas companheiras, forneceu-lhes tudo e em tudo fez como uma mãe a filhas bem-amadas. Essa boa Madre ajudou-a com seus sábios conselhos, que lhe foram muito úteis, como também as orações que ela e suas queridas filhas fizeram ao Senhor. Nossa Madre, sentindo-se expatriada, sem apoio, sem socorro, encontrava sua consolação junto à venerável carmelita. Em todas as dificuldades e sofrimentos, ela era seu recurso. Gostava tanto de falar com uma filha de Santa Teresa quanto essa grande santa fora sempre objeto de sua terna afeição. Queixava-se de não ter recebido seu nome no batismo e teria gostado de encontrar Carmelitas em toda parte. Vinte anos atrás, antes do começo do Instituto, passando por Montauban, havia entrado nessa mesma casa onde tinha sido acolhida com tanta caridade. Havia falado à superiora do desejo de abrir uma casa destinada à instrução dos pobres e acrescentava que não tinha dinheiro. A boa Madre lhe disse: “Não tema, considere os meios pecuniários como nada; se seu projeto for da vontade de Deus, ele não deixará de realizar-se.” Essas palavras não se apagaram de sua memória e, revendo essa santa casa, sua alma ficou emocionada e alegrou-se por estar novamente sobre o monte sagrado do Carmelo. Gostava de ir rezar junto de um altar que lhe chamara a atenção quando de sua primeira passagem, representando em vários medalhões os diferentes momentos da vida dessa grande santa. Era junto desse altar que ia rezar a Santa Teresa para dela obter intenções puras e que fossem ao menos um pouco 559 106 próximas das suas em semelhantes circunstâncias. Era preciso... e a força de que precisava era-lhe muito necessária, pois, além das dificuldades para encontrar uma casa, teve uma, bem sensível devido às tentações extremas que desolavam sua companheira. Era de não se poder suportar, tão triste e desolada se sentia. Por outro lado, ficou provado que o grande convento dos Carmelitas não podia convir, primeiramente por causa da considerável soma que por ele era pedida, mas sobretudo, porque o desejo de nossa Madre era começar tudo muito simples, tendo compreendido ser essa a vontade de Deus sobre nosso Instituto. Precisava procurar em outra parte. As senhoras do Refúgio queriam vender sua casa. Ela foi vê-la, mas a casa não lhe convinha. Entretanto, o que tornava a decisão mais urgente é que estavam alojadas na casa das Carmelitas que não tinham o suficiente para elas, mas que não queriam retribuição. Parecia que a melhor coisa seria voltar para Villefranche, mas nossa Madre jamais acreditou que essa fosse a vontade de Deus. A não ser por um desejo formal de seu Superior (o que a teria feito partir imediatamente), estava decidida a ir até o impossível e só pensava em socorrer as numerosas crianças não aceitas pelas outras comunidades que eram numerosas em Montauban. glória de Deus. É fazendo desaparecer qualquer espírito partidário que a caridade e a união se estabelecerão sobre bases sólidas. Foi dito ainda de esquecer o passado e só lembrar dele para humilhar-nos diante de Deus por todas as nossas faltas, reconhecendo que todas erramos. Penetradas desse pensamento, ninguém dirá: “Tal Irmã está errada.” Todas juntas diremos: “Queremos agir bem para agradar o bom Deus, consolar nosso primeiro pastor, pela paz que ele verá reinar entre nós. Juntas, tenhamos um só coração e uma só alma, assim como somos uma mesma família.” Toda de vocês nos sagrados Corações. Irmã Maria Emília. 188 Encorajamentos às Irmãs do Refúgio, em Villefranche. Elas fazem o ofício do bom pastor e devem, por seu acolhimento e sua incansável bondade, facilitar a total conversão de suas “filhas adotivas”, como diz delicadamente a Santa. É preciso falar-lhes muitas vezes sobre a misericórdia divina e lembrar-lhes os textos evangélicos mais eloqüentes sobre esse assunto. Ressaltar que tendo a obra do Refúgio evoluído, comporta no momento diferentes modalidades educativas (L 774). Às Irmãs do Refúgio. Villefranche, 23 de novembro de 1845. 5. Orações, primeiras palavras de cânticos e de orações Manuscritos autógrafos 41-46. Foram transcritas aí duas passagens das coletâneas de cartas (V 351 sv. e 356 sv.), respectivamente de 1840 e 1847, provavelmente. O primeiro grupo compreende: “Oração às sagradas chagas de Nosso Senhor Jesus Cristo”; “Oração à Santíssima Virgem”; “Oração durante a santa missa”; “Comunhão espiritual”. Apresentamos a segunda, em que transparece a piedade marial de Santa Emília, e a terceira, na qual se afirma a conexão entre o mistério da Paixão e o mistério Eucarístico. Citaremos apenas um pequeno número de inícios de cânticos (250 mais ou menos) e de orações (15), simplesmente para dar alguma J.M.J. Minhas muito queridas Irmãs: Não sendo possível reuni-las todas para lhes falar, como faço com nossas Irmãs, quero suprir essa privação escrevendolhes uma carta comum para encorajá-las, apoiá-las e guiá-las na realização de sua difícil tarefa. Se as funções de nossas Irmãs junto às crianças são meritórias, as de vocês não o são menos: a educadora guia a infância no início da vida, ensina-lhe a conhecer, amar e servir a Deus. Vocês, minhas queridas Irmãs, fazem o oficio do bom pastor: fazem retornar ao redil as ovelhas infiéis que deixaram uma pastagem fértil para correr atrás das urtigas e dos espinhos. 558 107 idéia do que às vezes podia acalmar um pouco a desolação de Santa Emília ou expressar os impulsos de um fervor momentaneamente sensível. 187 Carta-circular para convidar todas as Irmãs a se prepararem para o retiro anual: oração, desejo de união mais verdadeira dentro da Congregação, espírito filial e dócil na espera das Constituições revisadas (L 767, M 465-466). A todas as Irmãs do Instituto. Villefranche, 9 de agosto de 1845. J.M.J. Minhas muito queridas Irmãs: Eis chegado o momento do retiro anual. Gostaria de fazê-lo com vocês, mas, não sendo possível este ano, eu me unirei a todas em espírito e de coração. Juntas suplicaremos ao bom Deus de nos unir a ele, dando-nos seu divino amor e o do próximo, que tanto nos recomendou, e sobretudo entre todos os membros do Instituto. Daqui até o retiro, ofereçam tudo o que fizerem para obter de Deus a graça de bem fazê-lo. Nessa intenção, todos os dias, rezem o terço completo ou em parte, segundo lhes for mais fácil. Visitem a divina Pastora, com uma oração a São José e algumas invocações ao Espírito Santo. Um Pai Nosso em honra dos santos protetores da Congregação. Se forem movidas a fazer alguma mortificação, façam-na com a mesma finalidade. Façam ainda o seguinte para honrar nossa boa Mãe: que a sacristã, ou aquela que a Madre designar, coloque flores diante de sua imagem, tendo grande cuidado de renová-las, oferecendo-lhe sempre, por todas, a terna expressão de sua afeição filial. Nosso retiro foi dos mais consoladores, pela suave paz que reinou entre nossas Irmãs. Vocês se alegrarão comigo, minhas queridíssimas Irmãs, agradecerão ao Senhor por nos ter concedido tantas graças. Falamos sobre nossa futura Regra e todas a desejam. Ficou decidido por unanimidade que seria recebida como se nos viesse do próprio Deus e, por conseguinte, com uma obediência cega. Nada de interesse particular: clausuradas e nãoclausuradas, todas devemos ter o mesmo desejo, o da maior Oração à Santíssima Virgem: Lembre-se, Santíssima Virgem, de que é minha Mãe e de que eu sou sua filha; de que seu Filho no Calvário me entregou à senhora; não deixe perder um bem que lhe pertence e que lhe foi tão caro que, para o resgatar, ele deu o seu sangue e sua vida. Não permita que eu menospreze esse sangue precioso e que o demônio se vanglorie de ter arrastado para o inferno uma filha de Jesus e de Maria. Oração durante a Santa Missa. Sangue adorável do meu Salvador derramado na cruz para a salvação de todos os homens, eu o adoro e o bendigo de todo o meu coração. Salvador Jesus, que esse sangue recaia sobre mim para me resgatar, sobre o meu coração e o meu corpo para purificá-los, sobre minha vida e minhas ações para consagrá-las ao Senhor. Ó meu Salvador, faça que eu me esqueça tudo e até de mim mesma antes de perder a lembrança deste excesso de caridade com a qual o Senhor entregou aos maiores tormentos e à morte mais ignominiosa pelos pecadores. Que essa piedosa lembrança, ó meu Deus, se grave para sempre em meu espírito, que me desperte durante a noite, me ocupe durante o dia, me ilumine, me fortifique nas tentações contínuas desta vida. Mas que essa piedosa lembrança, ó meu Deus, produza em mim a compaixão, me encha de contrição e me inflame de um amor eterno pelo Senhor. Primeiras palavras de alguns cânticos – Eis Senhor, esta ovelha... – Pequei desde minha infância... – Castigarás, Senhor... – Ah! Tenho vivido sem te amar... – A penitência tem suas doçuras e seus atrativos... – Tudo é suave e nada custa... – Viva Jesus, viva sua cruz... – Cruz augusta, cruz consagrada... – Escutas os anjos. (Escutas lous angels)... – Pastorzinhos (Pastourels)... 108 – “O que mitrobi content dobe quitat lou...” A alegria de ter deixado tudo. – “Demore rabissente, oymable porodis...” Morada encantadora, amável paraíso. – Ó minha doce esperança, Jesus... – Ó Coração divino, coração todo abrasado de amor... – Eu gemia na escravidão... – Jesus encanta minha solidão... – Jesus é minha felicidade... – Jesus, viver sem ti... – Do santo nome de Jesus eu quero cantar a glória... – Contemplemos o Salvador reduzido à agonia... – O Senhor reinou... – Monumento de sua glória, a cruz triunfa neste grande dia... – Jesus é a própria bondade ... – Jesus, dou-te meu coração... – Sim, eu ouço tua voz... – O anjo anuncia o mistério a Maria... – Se eu pudesse sempre com os anjos, Virgem Santíssima... – Eu sou a pastora fiel45... – De uma Mãe querida, celebremos as grandezas... – Que minha sorte tem encantos... – Salvador bondoso... – Que Jesus é um bom mestre... – Tua esposa querida... – Vem, ó meu divino Salvador, vem reinar... – Que belo dia, que felicidade suprema... – Do rei dos céus eu sou o tabernáculo... Primeiras palavras de algumas orações – Eu ousaria falar ao meu Senhor... – Ó Jesus, cuja bondade é infinita... – Senhor, fortalece minha alma... – Ó feliz morada da cidade celeste... –Considera, meu filho, qual será o fruto dos teus trabalhos... – Senhor, qual é o meu apoio nesta vida... 557 Ainda não recebi suas cartas, mas espero logo, e que vocês me darão todos os detalhes possíveis. Não deixo de recomendálas ao bom Deus e à sua santa Mãe. Vocês sabem que escrevi ao senhor Bispo, comunicando-lhe que não viria a Rodez por causa da minha má saúde. Acredito, entretanto, que ainda que a viagem me cansasse um pouco, eu não pioraria. Falem sobre isso a Sua Excelência. Digam-lhe, se acham que essa viagem é para a maior glória de Deus, que desejam minha ida e que a vantagem de me encontrar com o Sr. Bispo compensará amplamente o cansaço da viagem. Padre Turq é de opinião que eu vá com vocês, se for necessário. Aguardarei a sua resposta. Se acharem que minha viagem será útil, partirei imediatamente com Irmã Vincent. É, na união dos santos Corações de Jesus, de Maria e de José que sou com uma terna afeição, minhas queridíssimas Irmãs, sua Madre muito dedicada. Irmã Maria Emília. De maneira alguma desejo ir a Rodez. Se lhes escrevo sobre isso é só pelo desejo de estar nas mãos de Deus, na indiferença de ir ou não, segundo a sua vontade. Da mesma maneira, desejo que não se apressem em me responder, mas antes peçam conselhos à Madre Priora, a quem envio meus afetuosos respeitos. Coloquemos nossa confiança em Deus. Queremos em tudo fazer a sua vontade. Tenhamos uma reta intenção e a divina Providência resolverá tudo para o nosso bem. Estou pronta a vir encontrar-me com vocês, mas não tenho confiança em meus impulsos. Só acredito que minha viagem poderia ser útil se o Sr. Bispo estiver totalmente de acordo, senão prefiro e julgo mais vantajoso ir visitar a divina Pastora. Não preciso recomendar-lhes que permaneçam humildes e bem unidas a Deus. Por favor, que a alegria de me ver em Rodez não interfira em sua determinação. Pe. Turq que, apesar do mau tempo, quer chegar até vocês, as ajudará com seus conselhos. 556 109 inteiramente sob os olhos de Deus. Que aquelas que amam a clausura e querem guardá-la coloquem uma fava branca; aquelas que querem ser Irmãs das escolas coloquem uma fava preta e, repito, que se deixem conduzir unicamente pela consciência. Tenhamos muita confiança. Deus tudo conduzirá. Se você deseja saber qual a decisão de nossas Irmãs daqui, posso dizê-lo. Todas ficaram consternadas após a leitura da carta de Padre Barthe, mas São Carlos as encorajou de tal maneira que, no momento, estão muito confiantes. Consideram como bom presságio as aflições que Deus nos enviou. Durante a novena, tínhamos nove Irmãs doentes, acamadas ao mesmo tempo: tifo, erisipela, febre cerebral, etc. Duas receberam a unção dos enfermos. Todas estão melhores. Irmã Nathalie, a mais doente de todas, está ainda delirando. Mas esperamos que ela fique boa. Toda sua. Irmã Emília Digo-lhe, mas só para você, que um padre daqui, homem muito piedoso e muito bom conselheiro, me dizia num desses dias: “Se acabarem com a clausura destruirão o Instituto.” Acrescentou que todos os fundadores tinham sido também molestados. – Meu filho, é preciso que te dirijas sempre a mim... – Com que te retribuirei, ó meu Deus, por esta infinidade de bens dos quais eu... 6. Disposições de Madre Emília no momento da “Negociação Hugounenc” Manuscritos autógrafos 4-5 (coletâneas de cartas IV, 5-8). A Irmã Laurent Belloc escreve: "Em 1844, o nosso representante Sr. Hugounenc que, desde o começo do Instituto tinha sempre declarado não querer honorários, nos apresentou uma conta, segundo a qual ele pretendia que lhe devíamos 34.000 francos. A serva de Deus que via tudo na linha do sobrenatural, não perdeu sua calma e, colocando toda a sua confiança naquele a quem amava unicamente, esperou de sua bondade que fizesse conhecer a falsidade das pretensões do Sr. Hugounenc. Mandou procurar duas órfãs e as admitiu ao noviciado, rezou e mandou rezar muito, e o Sr. Hugounec se satisfez com a quantia de 2.000 francos que lhe entregamos a título de gratificação. Por ordem do seu confessor, ela consignou suas disposições relativas a esse assunto num texto cujo original eu vi. (DL 128). Apreciar-se-á a grandeza da visão de Santa Emília, que não é, entretanto, uma idealista e, ao mesmo tempo, sua humildade no reconhecimento de várias imperfeições. Ano de 1845 186 Sempre preocupada com o problema da clausura, Madre Emília escreve à Irmã Françoise Pascal que deve encontrar em Rodez o senhor Bispo, dom Croizier,1 dizendo-lhe que ela também irá encontrá-lo, se for preciso, apesar de sua saúde debilitada (L 750, M 461-462). À Madre Françoise, atualmente em Rodez. Villefranche, 28 de janeiro de 1845. J.M.J. Minhas queridas Irmãs: Nas negociações com o Sr. Hugounenc, Deus me deu a graça de ficar num estado de indiferença, seja pelo sucesso, seja pela perda, sendo meu desejo que a santa vontade de Deus se cumprisse e que o negócio servisse para a sua maior glória. Em seguida, a perda de uns 20.000 francos me pareceu pouca coisa em comparação com o menor pecado. Além disso, eu estava persuadida de que estando todos os nossos negócios nas mãos da Providência, essa não deixaria de nos fazer recuperar o que a injustiça dos homens nos fazia perder. Outra consideração que, muitas vezes, me torna indiferente às coisas deste mundo é olhá-las como se eu estivesse à beira do túmulo. Esse pensamento, que me faz lembrar de tudo, serve para me desapegar das coisas terrenas e, embora sinta suas vantagens, preferiria que fosse o amor de 555 110 Deus a produzir essa atitude. Embora nesse processo Deus me tenha preservado de toda preocupação, como se eu não me sentisse atingida pessoalmente, entretanto, devo me censurar por haver dito algo de constrangedor a esse pobre homem, e isso por falta de desprezo a mim mesma, não tendo esta íntima persuasão de que o que eu digo ou nada é a mesma coisa. Além disso, ao falar sobre esse assunto para esclarecê-lo, eu disse muitas coisas inúteis nas quais reconheço ser tanto mais culpada quanto Deus me censura pelas muitas palavras inúteis. Elas provêm de um espírito de auto-suficiência, que é meu defeito dominante. Faltei ainda ao apelo que Deus me faz de confiar só nele, de me apoiar apenas numa humilde oração e em atos de caridade. Algumas vezes me falam do tribunal de justiça, mas eu preferiria de bom grado perder tudo o que o advogado nos pede, a conservar esse dinheiro por semelhante meio. Deus se serviu dessa infeliz questão para me proporcionar bons pensamentos. Disse a mim mesma: se a injustiça de um homem tem algo de tão gritante para com o seu semelhante, qual não deve ser a minha para com Deus! Esse pobre homem está cheio de confusão! A minha ainda deve ser maior, pois sou bem mais culpada, visto que a ingratidão para com Deus é o maior dos crimes. As aflições, as angústias que esse homem experimenta, não sabe o que vai ser dele, pois se acha cercado de todos os lados, sem meios de defesa. Isso me dá uma idéia da alma culpada perseguida pela justiça de Deus.46 7. Narração dos pecados seja concedida, sobretudo se tivermos o cuidado de nos preparar pelo recolhimento e por um grande desejo de nos doar a Deus sem reserva. Não temos necessidade de lhes repetir que uma coisa necessária para bem entrar em retiro é não ter durante esse santo tempo, senão um desejo, um pensamento, que as afaste de tudo que não diz respeito à nossa salvação. A preocupação, qualquer outra coisa, como os desejos inúteis, os apegos, a tristeza, a perturbação privam a alma de uma infinidade de graças. Nosso retiro começará no dia 2 de outubro. Procurem começá-lo naquele dia, sob a proteção dos santos anjos da guarda. Unam-se a nós e nós nos uniremos a vocês, e todas, num mesmo espírito, nos esforçaremos por nos animar a servir melhor do que temos feito até agora o melhor de todos os mestres. A renovação dos votos será na quinta-feira da semana seguinte, ou seja, no dia 10. Saúdo-as com a mais terna afeição. Irmã Maria Emília 185 Tempo difícil em que o voto de clausura está prestes a desaparecer. A superiora geral escreve à Madre Foi para lhe falar sobre os sentimentos das religiosas da Casa- mãe e as modalidades de escrutínio sobre esse assunto (L 744, M 459-460). À Madre Foi, em Montauban-Sapiac. Manuscritos autógrafos 7-9. Este documento encontra-se em dois textos de épocas diferentes (mas não especificadas) de coletâneas de cartas: I 247-250 e VI 333-336. Santa Emília deve ter pedido várias vezes ao seu confessor que fossem reveladas algumas de suas faltas. A última é relatada pelo Padre Fabre, com data de 7 de setembro de 1852: “Pedi-lhe permissão para revelar tudo que sabia sobre ela por meio da confissão e que poderia ser útil para a glória de Deus e a Villefranche, 24 de dezembro de 1844. J.M.J. Minha muito querida Madre: Quanto à adesão que nos é solicitada para a supressão do voto de clausura, é preciso que diga às Irmãs que elas têm total liberdade, que nada devem temer e, conseqüentemente, agir 554 Irmãs da Sagrada Família por sua modéstia, humildade e afastamento do mundo, ocupando-se cuidadosamente de seus alunos e da visita aos doentes, cumprindo com o maior zelo essas duas obras que são tão agradáveis a Deus e tão úteis ao próximo. Uma coisa que devemos recomendar-lhes particularmente é de manterem entre si uma íntima união pela prática da mais terna caridade, que as faça suportar com paz e doçura os defeitos umas das outras, de maneira que cada uma de nossas casas seja a imagem da de Nazaré. Para atingir tal felicidade, reconheçam as faltas cometidas contra a doçura, o respeito e o suporte mútuo. Verifiquem se vocês se esforçam continuamente para chegar a tudo desculpar e a tudo suportar entre si e a se amarem de tal maneira que sejam um só coração e uma só alma. Após terem examinado a maneira como a caridade deve existir entre vocês, vejam se a praticam para com todos os membros do Instituto. Em seguida, para com os doentes: vejam, sob os olhos de Deus, se os visitaram e os consolaram tanto quanto lhes foi possível. Fazendo a revisão de suas obrigações, não esqueçam o espírito de zelo que, abrasando o coração, as leve a desejar ardorosamente realizar tudo para a maior glória de Deus, no cuidado para com as crianças do qual vocês fizeram o voto, voto que será perfeitamente cumprido se tiverem uma verdadeira pureza de intenção. Após um tranqüilo exame, entreguem-se a Deus e, colocando toda a sua confiança nele, tomem boas resoluções. Vocês nos dirão talvez que, não vindo aqui, o retiro não será tão frutuoso. Nada temam. Deus vê seus desejos. Ele não se recusará a lhes dar seu espírito e sabem que ele sopra onde quer. Entrem no retiro com paz, amor, alegria, coragem e confiança, certas de seus frutos. Unidas em espírito e coração a todas, nós rezaremos juntas. Embora distantes, estarão presentes. Estaremos unidas no divino Coração de Jesus, e isso não será em vão. Esperemos que uma renovação de fervor lhes 111 edificação das religiosas e dos fiéis. O senhor sabe, respondeu-me ela, como estive longe de chamar a atenção sobre mim mesma; entretanto, se o senhor quiser, submeto-me: suspendo o segredo da confissão, com a condição de que fará conhecer os meus pecados” (CF 17).47 Referindo-se sem dúvida a 1843, o capelão declara também: “Na época em que exigi da serva de Deus, seguindo o conselho dos meus superiores, que ela me fizesse conhecer tudo o que dizia respeito à sua vida, sua humildade foi atingida. Não me deu seu consentimento senão com a condição de que eu tornasse conhecidos seus pecados e, receando que eu não cumprisse essa incumbência, entregou-me um papel em que os havia escrito” (CF 17). As linhas seguintes são tão claras que dispensariam todo e qualquer comentário. Emília “exagera” evidentemente, mas o bom senso comum revela-se incapaz de delimitar as fronteiras ultrapassadas por esse exagero. Primeira parte Com a idade de 15 anos, eu sentia um grande atrativo pela mortificação, o qual perdi por minha culpa. Ele foi substituído por um terno amor por meu corpo, ocupando-me muito dele, sobretudo quanto à alimentação, cuja lembrança freqüentemente me distraía durante a oração. Favoreci a tentação por freqüentes atos de amor a mim mesma, indo até mesmo à intemperança, comendo frutas em quantidade, dando como desculpa o grande calor que sentia no peito. Eu tinha uma espécie de ilusão quanto a isso e não gostaria de ser vista, enquanto dava mau exemplo a nossas Irmãs. Penso que era uma ilusão. Esse amor para comigo mesma foi, durante longo tempo, a causa de que ninguém podia me contentar, sobretudo num tempo em que me sentia mais doente. Quando me davam leite, desejava que fosse fresco e, para outros alimentos, não ficava satisfeita se não fossem como eu os desejava. Esse mesmo amor por meu corpo me fazia desejar que reservassem para mim o que havia de melhor. Não gostava que me esquecessem em minhas necessidades e que não fossem pontuais a me prestarem serviço. Um dia, magoei uma Irmã que me encontrou deitada, quando veio aquecer a minha cama. Parece-me mesmo que eu me tinha apressado, querendo que ela compreendesse sua negligência. 112 Em outras ocasiões, queixei-me, de uma maneira indireta, da falta de serviço ou de atenção. Freqüentes vezes recusei receber lenitivos e depois eu mesma os tomava. A ocasião me levava a tomá-los. Por exemplo, encontrando pastilhas, bombons, tomava-os, alegando que estava cansada. Nas refeições, perdi muito tempo. Em vez de me conformar com a necessidade provocada pela fraqueza do meu estômago de tomar pouca alimentação, conservava, ou melhor, não a combatia generosamente. A tal hora alimentava-me um pouco, depois outro pouco. Mastigava sem engolir a fim de ter o suco, persuadindo-me de que isso me fortificaria. Desejava sobretudo poder comer pão, persuadindo-me de que era para fazer como as outras. Muitas vezes, permiti-me mais liberdade, prevalecendo-me de minha posição de superiora, e resisti ao atrativo que me levava a uma total abnegação de mim mesma. Freqüentes vezes provei o que estava preparado para o refeitório ou para as doentes, ainda por amor ao meu corpo. Enganava a mim mesma, dizendo que era útil.48 Enfim, sou culpada de tantas e tantas reflexões sobre mim mesma e recordações de amor-próprio, que me é impossível dizê-lo. Disso sou tanto mais culpada, pois a luz não me faltou. Reconheço que a falta de força para me vencer que sempre tive veio do meu orgulho. Não duvido de que Deus não tivesse escutado tantos suspiros dirigidos a ele, se tivessem partido de um coração humilde. Quantas vezes, sentindo o peso das minhas correntes, pedi-lhe que as rompesse. Pesavam-me tanto mais que eu sentia vivamente o preço da liberdade dos verdadeiros filhos de Deus. Uma outra coisa de que me censuro é a confiança que depositei nos socorros da medicina. Queria fazer exatamente o que era prescrito pelo médico, não por espírito sobrenatural, mas pela esperança de ser mais aliviada. Há muitas outras coisas sobre esse infeliz amor de mim mesma, amor-próprio, das quais não me recordo. Percebo que em tudo que acabo de dizer eu me refiro ao passado, como se já estivesse curada. Muito pelo contrário, ainda sou escrava, embora me pareça que há uma pequena melhora. 553 Partilhamos os sofrimentos que lhe são causados por suas dores de cabeça. Vamos iniciar uma novena pedindo que o bom Deus queira aliviá-lo. Sou, com o mais profundo respeito, senhor vigário, sua muito humilde e muito obediente serva. Irmã Maria Emília. 184 Sente-se o peso das dificuldades específicas experimentadas pelas escolas. Por ocasião do retiro anual, Madre Emília convida a um sério exame de consciência, particularmente em tudo que diz respeito à vida de oração, à caridade dentro e fora da comunidade e o mínimo de solidão indispensável (L 739). Às Irmãs de Firmi e outras casas não-clausuradas. Villefranche, 9 de setembro de 1844. J.M.J. Muito queridas e bem-amadas Irmãs: O grande interesse que temos pelo seu crescimento na virtude e a terna afeição que temos por todas levam-nos a desejar ardorosamente ir até cada uma de suas casas para partilhar de seus sofrimentos e de suas consolações, para nos edificar, nos consolar, nos encorajar com seus bons exemplos. Mas não nos sendo isso possível, queremos compensar a privação de falarlhes pessoalmente fazendo-o por escrito e convidando-as a fazer o retiro numa íntima união com suas Irmãs da Casa-mãe, transportando-se em espírito para esses lugares tão caros ao coração de vocês pelos santos compromissos assumidos com o mais terno dos Esposos. Nos dias que dedicarem à solidão, tragam à memória os votos sagrados que as unem a ele. Recordem cuidadosamente as faltas cometidas. Vocês renovarão suas resoluções e seus desejos de ser verdadeiras 552 113 183 Em conseqüência de uma incompreensão, o vigário de uma paróquia onde estavam as Irmãs da Sagrada Família acreditou que as exigências delas eram exorbitantes. A superiora geral esclarece tudo com ponderação e respeito, pedindo simplesmente que seja assegurado o mínimo necessário (L 735, M 451-452). Ao vigário de Asprières. Villefranche, 29 de junho de 1844. J.M.J. Senhor Vigário: Estou extremamente mortificada porque a minha última carta o aborreceu. Com certeza não foi a minha intenção ao lhe escrever. Queria apenas respeitar as intenções do nosso Bispo que não aprova novas fundações sem que seja assegurada às Irmãs uma honesta subsistência. Eu lhe tinha escrito por ocasião da fundação de Asprières e de uma outra que nos pedem. Sua Excelência me respondeu que exige mais do que nunca não fazermos fundação sem que antes seja bem assegurada a conveniente subsistência das Irmãs. Acrescenta que só nessas condições é que dará o seu consentimento para que o projeto seja realizado. Conforme a sua carta, vejo que o senhor não entendeu e pensou que pedíamos mais do que nos pode dar. Não queremos entesourar. Que nossas Irmãs tenham o necessário para poderem viver nos diferentes lugares onde são colocadas, é tudo que desejamos. Tenho certeza de que, enquanto o senhor viver, não lhes faltará coisa alguma. Mas, após sua morte, quem poderá mantê-las? O senhor é bom demais e não quererá que lhes falte o necessário, e quando pedimos essa segurança queríamos nos prevenir disso. Pode ser que eu não tenha exposto bem o meu pensamento e por isso o tenha aborrecido. Se tivéssemos conversado, teríamos entrado em acordo. Deus me livre de desconfiar do senhor, mas é preciso que eu respeite as intenções do senhor Bispo, anteriormente expressas, dizendo formalmente a Padre de Saint-Julien, nosso administrador, que tivesse cuidado para que nenhuma escola fosse aberta sem que a subsistência das Irmãs fosse bem assegurada. Segunda parte O medo penetra-me até a medula dos ossos, motivado pela lembrança das graças de Deus das quais abusei sempre e pelo grande número dos meus pecados. Eu os vejo de todo tipo e em todas as minhas ações, seja como religiosa, seja como superiora. Os maiores são aqueles que cometi no tempo em que gostava do mundo e por ocasião da fundação de nossa casa de Aubin, cujo nome é para mim como o canto do galo. Mas, além desses, cometi e cometo um grande número que, por assim dizer, vai até o infinito. As obras que parecem boas, eu as vejo tão manchadas, tão indignas de ser ofertadas a Deus que me dão grande confusão. Se o meu pensamento se volta para a minha inteligência, vejo que dela fiz mau uso, usei-a mal por minha auto-suficiência proveniente do orgulho, que foi sempre o meu defeito dominante e que muito mal combati. Empreguei minha memória em tantas e tantas coisas vãs que Deus não pode estar satisfeito comigo. Sentia-me atraída a consagrar-lhe minha vontade. Deus a queria toda inteira e eu não lhe obedeci. O amor ao meu corpo me acompanhou como uma sombra e segui seus impulsos, embora soubesse que Deus queria que eu fosse sua vítima. A partir de tudo isso, vejo em mim mesma uma profunda ingratidão e nada me parece mais horrível do que esse mal. Vejo que utilizei tão mal o tempo e que me resta tão pouco para repará-lo. Ainda se, por meio de um coração abrasado de amor, tudo isso pudesse ser consumido por esse fogo divino, mas, sem generosidade não sei o que fazer, a não ser lançar-me cegamente no seio da divina misericórdia. Nosso bemaventurado Padre Marty me havia prometido que chegaria um tempo em que tudo em mim se perderia no amor sagrado e isso nunca acontece. 114 Como superiora, quantos erros cometi por minha falta de prudência e por não ter consultado a Deus na oração. Quantas vezes não tive espírito de misericórdia, faltando à doçura, a essa complacência disponível a tudo e a essa doce caridade que suporta os espíritos mais difíceis. Dei mau exemplo, o que teria provocado um efeito negativo se Deus não tivesse colocado no coração de nossas Irmãs uma grande indulgência para comigo. Cometi faltas em todos os aspectos do governo da Congregação, o que muito me leva a me queixar a Deus por me haver escolhido para fazê-lo servir no Instituto de Jesus, Maria e José. Espero que, na sua extrema bondade, ele suscite alguém para reparar minhas faltas e que, apesar das minhas infidelidades que são inúmeras, ele me conceda o espírito de penitência. Nessa esperança, quando vou me confessar, colocome aos pés de Jesus Cristo e faço um ato de abandono, mas com muita tristeza. Para a santa comunhão, faço a mesma coisa, mas freqüentemente me sinto tão penalizada que sou obrigada a me esforçar para não explodir e deixar transparecer minha dor. Léon Aubineau (o.c., 390) cita um texto cujo autógrafo não foi conservado, mas que, tal qual uma confissão, foi certamente escrito por Madre Emília por ocasião de sua última doença. Desde o começo do meu resfriado, tive a impressão de que ele degeneraria em tuberculose. Isso muito me assustou por causa do estado interior em que me encontro e do grande número de faltas que me faz cometer um amor exagerado ao meu corpo. Por outro lado, um longo período de doença me parecia bem útil para adquirir o espírito de abnegação. Reconheço que não me detive em nenhum desses pensamentos. Disse a mim mesma para pensar apenas no momento presente, não fazer caso de minhas previsões e entregar-me totalmente a Deus na doença e na morte. O temor do meu último momento não me dá nenhum desejo de remédios nem de cuidados. As poucas dores que sinto de lado me causariam prazer se com isso eu tivesse um meio de conhecer o Sagrado Coração de Jesus. 551 182 Madre Emília percebe na superiora de Montauban-Sapiac certa falta de simplicidade na maneira de lhe expor suas dificuldades e problemas de governo. Ela a repreende delicadamente (L 733, M 444445). À Madre Foi, em Montauban-Sapiac. Villefranche, 25 de junho de 1844. J.M.J. Minha muito querida Madre: Irmã Marie du Bon Pasteur me escreve a respeito de seu cargo de ecônoma. Cuidado para que as Irmãs que exercem funções nas casas secundárias sempre se dirijam, em todas as suas dificuldades, à sua respectiva superiora, e essa à superiora da casa de Villefranche. Desejo encontrar em você, minha muito querida Madre, um pouco mais de simplicidade de criança. Você me informa por intermédio de outras pessoas. Penso que isso a aborrece e faz sofrer, e lamento. Creia-me, abandone-se de uma vez por todas e com isso será mais agradável a Deus. O constrangimento em que se encontra não a impede de amar a Deus. Porém, você o amaria mais se pudesse vencer essas dificuldades. Vamos, um pouco de coragem. Não acredita que seus sofrimentos sejam também os meus? Desejo de todo o coração amenizá-los. Eu a asseguro de que a sua lembrança me é muito freqüente. Temo que nosso inimigo comum ponha dúvidas no seu espírito com a finalidade de angustiá-la. Talvez sofra por causa do que aconteceu, mas isso já passou. Escrevi à Madre Tabithe e com certeza ela lhe mostrou a minha resposta. Se tivéssemos dinheiro na época em que você precisava, nós o teríamos enviado. Esperamos que o bom Deus no-lo enviará e, se não chegar, nós a informaremos. (Falta o fim da carta) 115 550 Meu terno afeto a todas as nossas queridas Irmãs. As duas últimas que você nos enviou fazem-lhe honra, pois estão muito bem. Se for aconselhada a cumprimentar o Bispo, não o faça, a não ser que as Carmelitas saiam para isso. Tenho a intenção de escrever a Sua Excelência após a chegada dele. Avise-me a respeito disso. Considero a falta de gosto pelo alimento como um verdadeiro favor, na esperança de obter o espírito de mortificação e de reparar as inúmeras faltas de gula das quais me tornei culpada o tempo todo. 181 Em outros momentos de doença, faltei de confiança em Deus. Quando me diziam que deixasse todo trabalho, eu me preocupava e me dizia: O que vai ser de mim, entregue a mim mesma e a esta multidão de inimigos que me segue por toda parte! No momento, quero abandonar-me totalmente, pouco importa o sofrimento. Aliás, sinto-me tão atraída a me entregar a Deus e a abraçar a cruz de qualquer forma que me seja apresentada, que cometeria falta se assim não o fizesse. A superiora anuncia cautelosamente a uma religiosa o falecimento de seu pai e a encoraja afetuosamente (L 718). 8. Perguntas feitas por Santa Emília a Padre Marty A uma superiora. Villefranche, 20 de fevereiro de 1844. J.M.J. Minha muito querida Madre: Você e eu fomos consagradas à cruz, entregando-nos a Deus. Fizemos o sacrifício de tudo o que nos era caro. Agora é preciso lembrar-lhe isso para que aceite com total resignação a triste notícia do falecimento daquele que você amava com tanta ternura. Deus achou por bem chamá-lo a si há algum tempo. Como você estava doente quando esteve aqui, não tive coragem de dizê-lo. Todas nós pedimos pelo descanso de sua alma, que o Senhor terá recebido na mansão celeste. A paciência com a qual ele suportou a doença e os socorros da religião que ele teve a felicidade de receber, nos confortam. Procure, minha muito querida Madre, não se deixar abater, mas submeta-se totalmente e não fique pensando nessa triste lembrança. Eu lhe direi, para diminuir seu sofrimento, que seu irmão Batista cuida bem da casa e substitui seu pai falecido de uma maneira que deve lhe fazer admirar a Providência. Suas duas irmãs estão no convento de Livinhac. Madre Joseph me escreveu que estava muito satisfeita com ambas e pensava que elas têm vocação. Toda sua. Irmã Maria Emília. Ms aut. 14-31. A superiora da Sagrada Família fez, por cartas, numerosas perguntas a Padre Marty. Delas, temos duas séries: a primeira contém 59 perguntas, a segunda 176. Várias são autógrafas (coletâneas de cartas III 339-362); outras, recopiadas nos Dossiês da Causa (fascículos 26 classis oitava). A maioria diz respeito ao governo da comunidade ou a alguma religiosa em particular (quase nunca nomeada ou pelo menos os nomes foram riscados). Nós só guardaremos aqui perguntas pessoais reveladoras da simplicidade e da submissão de espírito da santa. Conservamos a numeração de Ms aut: trata-se da segunda série. 57ª. Quando trocamos nossas medalhas, eu não troquei a minha porque tocou o corpo de Santa Germana. Fiz bem? Tenho também um cinto que tocou seu santo corpo. Parece-me que um desses objetos me bastaria se, no entanto, o senhor aprovar que eu os guarde. 59ª. Uma caixa me parece necessária no meu quarto para guardar alguns papéis. O senhor me permite usá-la, como também algumas cruzes, a fim de ver a imagem de qualquer lado para o qual eu volte minha vista? 60ª. O senhor me permitiu ter em meu quarto uma imagem de Jesus crucificado com a Madalena abraçando a cruz. Tenho 116 549 uma, que tem um pé de altura. O senhor acha conveniente que eu a guarde? 61ª. Nossas Irmãs têm apenas uma cadeira para seu uso, eu tenho duas. Tenho uma escrivaninha, uma pia de água benta, um vidro para guardar folhas de hera. As outras têm esses objetos em comum, de forma que várias se servem do mesmo. O senhor acha bom que eu tenha isso só para mim, como também um lápis? Tenho sempre água no meu quarto, da qual posso me dispensar, sacrificando-me um pouco para ir buscá-la quando preciso. O que acha disso? 70ª. No coro, temos uma cruz no meio de nós. Recitando o santo ofício, eu queria olhar para ela. Entretanto, não ouso fazêlo, pois o senhor nos aconselhou olhar para nosso breviário. Parece-me que ficaria mais recolhida se tivesse essa liberdade. São Francisco de Sales dava-a àquelas que sabiam o santo ofício de cor. O senhor poderia também fazer o mesmo? 88ª. Algumas vezes tenho a oportunidade de dar um santinho, um relicário. Posso guardá-los em meu quarto, para não precisar de pedi-los à arquivista todas as vezes que necessite? 89ª. O Sr. vigário de Pibrac enviou-me uma imagem à qual Leão XII deu uma bênção particular para a pessoa a quem o Sr. vigário a presenteasse. O senhor quer que eu a coloque num oratório, ou que a guarde em meu quarto? 90ª. Tenho uma estampa de Nossa Senhora das Dores que o senhor teve a bondade de tirar do seu breviário para me dar. Estou um pouco apegada a ela. Posso guardá-la? Tenho outra, em minha chaminé, do bem-aventurado Benoit Labre, pela qual tenho particular afeição. Posso guardá-la? Não tinha apercebido antes que devia pedir-lhe isso.49 91ª. Quando temos pensamentos contra a fé, como combatê-los? 92ª. E quando temos pensamentos contra a esperança? sem lhes dizer a razão. Diga-lhes que é algo que diz respeito à religião. Não comunique nada a Padre Guyard sem me consultar. Gostaria e acredito que você deveria me prestar contas de tudo que se passa na sua casa. Sei por outras pessoas. Ser-me-ia bem mais agradável sabê-lo por meio de você. Não me preocupo pelo fato de suas cartas não serem bem elaboradas, nem bem escritas, mas que sejam minuciosas e que me preste conta de tudo. Recomendo-lhe ainda que não prometa nada, não comunique nada a Padre Guyard. É preciso que eu lhe recomende e, em consciência, não posso me dispensar disto: padre Guyard só pode entrar raramente no convento e ainda por boas razões. Você sabe que nosso Pai só entra aqui para os exames que são feitos três ou quatro vezes durante o ano. Mantenha-se firme nesse ponto. Jeanne envia-lhe respeitosas recomendações e deseja que você nos dê notícias de seus pais, pois os mesmos não respondem a nenhuma de suas cartas. Quanto à Irmã Bernardine, consultamos Madre Vincent; ainda não recebi resposta. Convido você a ter uma grande devoção ao divino Coração de Jesus. Você me pede uma maneira de atrair a bênção de Deus sobre sua pessoa. A melhor é ter uma confiança sem limites e não dizer nem pensar: “Como faremos?” Como faz uma criança adormecida no regaço de sua mãe? – Permanece tranqüila. Precisamos fazer o mesmo. Que idéia foi esta de contar quantos pães vocês comiam por mês? Pensa ser esse o meio de consegui-los? Leia o cântico à Providência e penetre nos sentimentos que expressa. Mas não acredito que seja preciso uma grande confiança em Deus quando se tem uma Casa-mãe. Vamos, seja razoável e pense que a salvação é o que importa. Toda sua. Irmã Maria Emília. 548 117 9. Resoluções de retiro Ano de 1844 180 Uma dificuldade freqüente: a penúria de vocações, o risco de sobrecarregar as Irmãs das quais se dispõe. É preciso ainda que os motivos sobrenaturais preservem de uma paralisia inspirada pela desconfiança. Aliás, a superiora geral lembra formalmente que deseja ser informada claramente de tudo, para que ela mesma possa tomar a decisão final (L 716, M 484-485). À Madre Foi, em Montauban-Sapiac. Villefranche, 29 de janeiro de 1844. J.M.J. Minha muito querida Madre: Não se deixe abater, mas pelo contrário abrace a cruz. Carregue-a e um dia ela a carregará, Deus está com você. Procure pensar muitas vezes no divino Coração de Jesus e tenha certeza de que só pelo sofrimento é que poderá entrar nesse coração. Aceite tudo da mão de Deus, tudo e sem nenhuma reserva. Não tema pelo que se refere às necessidades temporais; enviaremos dinheiro, o mais tardar pela Páscoa. Não se preocupe se for preciso alimentar-se bem. Deus nos dará os meios para isso. Vamos, um pouco de coragem! Quando me escrever, fale detalhadamente do que a aflige. Algumas vezes, Deus permite que isso alivie. Ontem, enviamos Irmã Longin para Montauban. Ela parou em Mémer, onde há uma Irmã muito doente (já recebeu a unção dos enfermos). A Madre Isidore também está um pouco doente e o vigário nos escreve insistindo para que deixemos com ele a Irmã Marie Longin, o que não pudemos recusar, em vista das circunstâncias. Entretanto, preocupo-me por causa de Irmã Marie Agathon. Não se deveria cansá-la demais, sobrecarregando-a com trabalho. Veja se Irmã Paule poderia ajudá-la. Penso, minha muito querida Madre, que é preciso rezar e fazer rezar muito para que o bom Deus a inspire sobre o que você precisa fazer na situação em que se encontra. Peça às Carmelitas e em outros conventos para fazerem novenas, mas Ms aut 9-11. Para o retiro de março de 1827, coletâneas de cartas V 1; para o de 1831, III 2-3. Primeiro texto (1827) Jesus, Maria, José. Num retiro que tive a felicidade de fazer no mês de março de 1827, sob a direção do nosso muito bom e venerando Superior, Deus me deu um poderoso atrativo para me apegar a uma vida de renúncia, tanto para com o corpo como para o espírito. Propus-me, sob a proteção de minha santíssima Mãe, a divina Maria, dedicar-me a uma verdadeira e contínua mortificação: 1º evitar, com cuidado, reflexões sobre mim mesma, vãos pensamentos, desejos inúteis, etc., a fim de encher meu espírito com a lembrança dos meus pecados e da Sagrada Paixão do meu Salvador Jesus Cristo; 2º só conceder ao meu corpo os cuidados necessários, evitar toda afetação, seja na alimentação, seja nas vestes, etc., e levar em tudo a vida comum. Proponho-me tudo isso para reparar minha vida passada que deve ser, até o meu último suspiro, a causa dos meus gemidos e de minhas lágrimas. Resoluções que nosso venerável Superior teve a bondade de me propor: 1º. Para com Deus: espírito de adoração, de submissão, de confiança, de zelo, de uma dedicação sem reserva; a ele toda honra e toda a glória; alegre atividade na execução de seus menores desejos. 2º. Para com o próximo: paciência para suportar, caridade para amar, doçura para exortar, firmeza para corrigir, indulgência para desculpar, afabilidade para encorajar, coração compadecido para consolar, prudência para governar, para guiar, para poupar; nenhuma prevenção, nenhuma acepção de pessoa. 118 3º. Para comigo mesma: humildade, simplicidade, obediência, suportar a si mesma, alegria interior, pouca reflexão, pouco desejo, desapego da atenção e da afeição das criaturas. Segundo texto (1831) Espírito de adoração: 1º. Rezando com toda a atenção possível, em união com a Sagrada Família, e num inteiro aniquilamento diante da grandeza de Deus e da lembrança dos meus pecados; 2º. Fazendo o sinal da cruz e as genuflexões com respeito. 3º. Assistindo ao Santo Sacrifício com fé, ter o cuidado de me recolher desde a segunda chamada. Caridade terna para com minhas Irmãs, que me leve a lhes dar todos os cuidados para com a alma e o corpo, sem me queixar, sem me voltar para mim mesma, sem examinar se estou cansada, considerando-me feliz por lhes dar tudo o que tenho de força, lembrando-me de que sou serva de todas e devo respeitá-las como esposas de Jesus Cristo. Conversando com elas, evitarei com cuidado ser apressada, distraída, cortante e descontente. Responderei com poucas palavras, com doçura, recomendá-las-ei sempre a Deus, pedindo-lhe que me ensine. Supervisionarei os trabalhos, sobretudo o da sacristia. Quero fazer tudo o que depender de mim para que as crianças sejam bem tratadas e que cada programa do ensino seja bem executado. Vigilância sobre os movimentos interiores: evitar os pensamentos vãos, as reflexões sobre mim mesma; lembrança freqüente de Jesus, sobretudo na sua Paixão; pedir humildemente a graça de conhecer a imensidão de seu amor. Em união com ele, suportar os sofrimentos do corpo e da alma, num inteiro abandono; persuasão de tê-los merecido e muito mais; lembrança contínua dos meus pecados; observar o silêncio, evitar as palavras inúteis, aceitar as censuras, não me desculpar nem direta nem indiretamente; não dar importância 547 esse artigo. Sendo assim, é preciso realizá-lo todos os anos no tempo indicado. Leia nas Constituições o artigo sobre a hierarquia entre as Irmãs e verá que não observamos o que está prescrito. Percebemos isso e vamos corrigi-lo. Veja, minha querida Madre, que nós também temos necessidade de melhorar. Irmã Emília. De acordo com as Constituições, as funções de mestra de ordem, de sacristã, de enfermeira, de mestra de trabalhos manuais, etc., devem ser dadas somente às Irmãs de coro. Se não há bastantes Irmãs, acumulam-se os títulos e lhes dão ajudantes. Envie-me a relação das tarefas de cada Irmã. Toda sua. Irmã Maria Emília. 179 Sincera compaixão, tal como Madre Emília sabe experimentar e expressar, ao mesmo tempo em que, segundo seu costume, lembra o mistério central da cruz (L 707). A uma superiora. Villefranche, 8 de agosto de 1843. J.M.J. Minha muito querida Madre: Seus sofrimentos são os meus; partilho-os profundamente. Embora compadecendo-me, julgo-a feliz em seguir Jesus à sombra da cruz. Lembre-se, minha muito querida Madre, que a maior felicidade que possamos ter na terra é viver de sacrifícios. Com isso adquirimos uma verdadeira semelhança com nosso divino Esposo. Tenhamos muita coragem, confiemos em Deus e nosso caminho será menos difícil. Nosso Salvador no-lo aplainará e compreenderemos como é bom sofrer. Comunique-me sempre seus sofrimentos e fique certa de que, como lhe disse, ninguém os partilha como eu. Toda sua. Irmã Emília. 546 As Constituições1 dizem que todas as casas secundárias são organizadas segundo a de Villefranche. De acordo com essa medida, deve haver uma ecônoma, uma mestra de trabalhos, enfim, todas as funções como na Casa-mãe. Isso deve ser observado rigorosamente, visto que é um ponto das Constituições. Você não tem ecônoma. Peço-lhe que nomeie uma, mas é preciso que ela exerça sua função: faça as contas, guarde o dinheiro, organize as compras, as vendas, vá ao parlatório para os negócios. Enfim, que ela faça tudo como está prescrito nas Constituições. Acredite, minha querida Madre, será melhor você deixar todas as funções. Com a de superiora, já tem bastante e procedendo assim contentará a sua comunidade. A confiança atrai confiança. Se suas Irmãs vêem que você tem confiança nelas, terão confiança em você. Mas o principal motivo é que as Constituições são claras nesse ponto. O que lhe disse sobre a ecônoma, vale também para a mestra de trabalhos manuais e para qualquer outra. Dando uma função a uma Irmã, deve dar-lhe autoridade e, como teria essa autoridade se do cargo só tem o nome? Aqui, Irmã Clara faz tudo que diz respeito ao economato, a mestra de trabalhos manuais, igualmente. Ficou decidido que nas casas secundárias será feito da mesma maneira. Escrevi a todas as casas. Você me dirá: "Se vierem chamar ao parlatório a ecônoma e a mestra de trabalhos, estando elas na sala de aula, o que fazer?" Creio que, em pouco tempo, as pessoas de fora se acostumarão com o horário da ecônoma. Se for um caso urgente, você enviará outra Irmã que prestará contas à ecônoma, não tomando iniciativas sem falar com ela. É assim que fazemos aqui. Não peço às rodeiras para fazerem compras. Falo com a ecônoma, é ela quem dá as ordens. O mesmo com os trabalhos manuais. Quando quero que alguém faça algo, digo-o à Irmã encarregada e ela manda. A experiência me ensinou que, quanto menos a superiora aparecer, melhor será. Aliás, o certo é que as Irmãs governem na função que lhes é confiada. Nas Constituições está escrito igualmente que o Capítulo anual não se realiza nas casas secundárias e cabe à superiora geral com o superior geral, nomear as supervisoras gerais, a partir da proposta das superioras locais. Tinha perdido de vista 119 ao que passa; só dar às coisas externas a atenção que o meu dever exige. Depois de Jesus, Maria e José, devoção especial ao santo Anjo da Guarda, suplicando-lhe de me fazer presente o espírito, a fim de evitar as faltas, quando a ocasião se apresentar. Deus é tudo, e eu nada. 10. Trechos de cartas escritas pelo Cônego Marty a Madre Emília Os arquivos da Sagrada Família de Villefranche-de-Rouergue conservam 379 cartas de Pe. Marty, das quais somente 276 são autógrafas (HC 1852). Por sua vez, Madre Emília deixou um fascículo de 43 páginas, que Irmã Laurent Belloc, sua secretária encarregada de catalogar, depois de 1852, documentos biográficos, intitulou: Trechos de algumas cartas de Pe. Marty à nossa venerável Madre e que ela mesma transcreveu. (Cf. A cap. 14, supra, p. 92; onde Emília diz ter ela mesma mandado fazer essa cópia). Encontram-se os originais de vários desses trechos entre os autógrafos de Pe. Marty, porém Santa Emília destruiu alguns (Ms aut 48). Vamos apresentar aqui algumas partes, segundo Ex (v.s., bibiliografia, fontes não-impressas, 19) que faz referência ao fascículo e numerá-los de 1 a 14. Foi preciso limitar-nos e consentir mesmo, aqui ou ali, uma supressão para evitar acúmulo de textos que não provêm da autoria da santa. Mas não poderíamos deixar de mencioná-los. Valem bem mais do que todos os comentários que pudéssemos fazer sobre a provação excepcional de Madre Emília. Se, no início, Pe. Marty se mostrou um pouco desconcertado e ineficaz, sua direção epistolar, impregnada de inspiração bíblica e da tradição espiritual do melhor quilate (São Francisco de Sales, em particular), testemunha em favor do seu discernimento e de sua humanidade compreensiva. G. Bernoville fez outras citações a esse respeito (Br 138-145), e com ele podemos concluir: “A direção de Pe. Marty, por mais fielmente que Irmã Emília a ela tenha correspondido, não afastou a tentação, mas muito contribuiu para neutralizá-la. Foi o apoio sensível de que Santa Emília necessitava em semelhante provação. As cartas [que acabamos de ler] têm uma feição compassiva e afetuosa. É com mão leve e paciente e respeitoso cuidado que Pe. Marty toca nos pontos dolorosos e cuida das feridas. Ele é o diretor, ele é também o amigo” (p. 145). 120 545 177 1 13 de dezembro de 1824 (fasc. p. 1) Deus aceitará agradavelmente o sacrifício de uma confissão e de uma comunhão mais freqüente que sua doença não lhe permite fazer. Você cuidará de substituí-la por comunhões espirituais, multiplicando os atos de união com o Sagrado Coração de Jesus. Esse coração infinitamente amável suprirá todos os apoios que lhe faltam. Aceito ser o depositário de suas resoluções: contrição ao pé da cruz, humildade de julgamento, fé viva e prática, alegria e paz interior. Um edifício apoiado sobre esses quatro pilares não corre o risco de desmoronar. Os temores que a assaltam (sobre a santa comunhão) não devem impedi-la de comungar. Quanto mais você vê em si mesma más disposições e menos tem amor sensível a Deus, tanto mais deve apressar-se em ir aquecer-se no fogo sagrado da divina Eucaristia. Em sua fraqueza, assemelhe-se à hera que não pode sozinha crescer nem se sustentar, mas, apoiada na árvore da vida, você pode progredir e se elevar. Mais uma recusa de viagem à Casa-mãe, tendo em vista o voto de clausura, que é merecedor de tais sacrifícios (L 704, M 441). A uma superiora clausurada. Villefranche, 6 de junho de 1843. J.M.J. Minha muito querida Irmã: Com certeza, teria muito prazer em vê-la, mas não creio que sua viagem até aqui seja agradável a Deus. Você me dirá que no ano passado foi dito que as superioras das casas clausuradas viriam aqui a cada três anos. Isso, no entanto, não foi aprovado pelo Bispo, e as Constituições também não o aprovam. Assim, minha muito querida Madre, é preciso que faça o sacrifício e esteja certa de que, se for feito de bom grado, receberá muitas graças. O sagrado voto de clausura não é tão meritório diante de Deus senão por causa das privações que impõe. Espero que entre plenamente nesse espírito, e alegre o bom Mestre. Toda sua. Irmã Emília. 2 178 30 de março de 1825 (fasc. p. 4) Gostaria que me fosse dado derramar consolação em sua alma. Mas o Senhor tem seus desígnios ao permitir que você ainda esteja na aflição. Cabe a ele fazer suceder o alívio à aflição quando lhe convier. Esperando o momento de uma graça sensível, tenho certeza de que encontrará um pouco de paz interior ao pé da cruz, permanecendo aí com a Santíssima Admoestações a uma superiora local sobre vários pontos das Constituições, em particular deixar o máximo de liberdade às pessoas em suas funções (L 705). À superiora de uma casa clausurada. Villefranche, 10 de junho de 1843. J.M.J. Minha muito querida Madre: 544 121 Ano de 1843 Virgem e o discípulo bem-amado, ou visitando o túmulo com Madalena e as outras santas pessoas. 176 3 Ter cuidado para não ofender a bondade de Deus com exagerados temores. Com simplicidade, confiar na Casa-mãe, pois ela ajudará materialmente, na medida do possível (L 703). À Madre Foi, em Montauban-Sapiac. Villefranche, 3 de junho de 1843. J.M.J. Minha muito querida Madre: Um total abandono e uma confiança sem limites na divina Providência, eis o que Deus pede das Irmãs da Sagrada Família e sobretudo das superioras. Não desconfie, minha querida Madre, da infinita bondade de Deus com seus temores e queixas. Pelo contrário, entregue-se à confiança. Deus cuidará de tudo. Não é ele nosso Pai? Não receie em nos fazer pedidos, não para fazer consertos, pois faltam-nos recursos para isso, mas sim para todas as suas outras necessidades. Com certeza Deus sempre nos dará os meios para prover a tudo o que for necessário. Prometa-me afastar toda e qualquer tristeza. Aguarde um pouco para colocar Irmã N. na sala de aula. Aconselhando-a, poderá fazer um bom trabalho. Reze e faça rezar para obter isso, pois em todas as dificuldades nosso grande recurso deve ser a oração. Nosso Pai não desistiu do projeto da oficina de costura, mas ele não quer que as alunas se comuniquem, de maneira alguma, com as pessoas do convento, a não ser com suas mestras. Seu desejo é que sejam as Irmãs das escolas que se encarreguem dessa obra. Ele gostaria que Padre Guyard não fizesse tantos consertos. No entanto, ele diz que é preciso deixá-lo agir. Sou toda sua. Qualquer dia terei o prazer de escrever um pouco mais longamente a Padre Guyard e a você. Irmã Emília. 30 de maio de 1826 (fasc. p. 38) As doenças das Irmãs, querida Madre, podem lhe ser muito úteis e proporcionar-lhe grande progresso: 1º pelos cuidados que elas exigem de sua caridade; 2º pelos bons exemplos que lhe dão; 3º pela oportunidade que lhe oferecem de fazer sacrifícios: cada uma delas faz o seu, mas você multiplica seus sacrifícios pelo número das Irmãs que adoecem ou morrem. Cada uma até lhe oferece a ocasião de fazer mais de um sacrifício.50 Alegre-se espiritualmente por ter tantos meios de salvação. Não convém, parece-me, que você multiplique suas obrigações, acrescentando um novo voto aos que já fez. Observando esses fielmente, com alegria, com satisfação, com zelo e amor, não somente em sua substância mas em todas as suas ramificações, quantos merecimentos pode adquirir e que coroa lhe será reservada! Você tem ainda a carregar o jugo de suas angústias. Não é bastante para seguir o Cordeiro ao Calvário? Segundo o que ressaltou em sua penúltima carta, vejo que tirou proveito em se ocupar menos de suas faltas, o que me dá mais tranqüilidade para convidá-la a só guardar a remota lembrança de seus pecados e considerar mais profundamente a bondade inefável de Deus e de Nosso Senhor Jesus Cristo para com você. Creio que essas considerações produzirão em seu coração mais compunção e certamente mais paz, mais repouso e mais coragem. Exercite, pouco ou nada, seu raciocínio na meditação; contemple tranqüilamente um mistério ou uma virtude de Nosso Senhor, como se estivesse diante de uma imagem. Agindo menos, você receberá mais da parte de Deus. Desejo que ele se digne introduzi-la na contemplação das grandezas de Jesus Cristo na Eucaristia. Mas é preciso deixá-lo agir. Diga-me se você tem uma estampa da descida do Espírito Santo. Aconselho-a que a contemple de vez em quando. Algo 122 543 importante e muito digno de atenção seria discernir nas Irmãs o modo de rezar que convém a cada uma ou a várias, pois percebe-se que uma única maneira de rezar não proporciona igual proveito a todas. 4 para aí voltar. Reflita muito sobre isso. Escute a voz de sua consciência, que lhe dirá que é preciso suportar com paciência os sofrimentos e as humilhações que a Providência lhe envia. Se eu a transferir, é impossível fazê-lo agora, porque não tenho ninguém para substituí-la. Só na primeira Profissão poderei transferi-la. Enquanto isso, seja fiel e confie na sua boa Madre. Espero que Deus a ilumine e que você mude seu modo de ver as coisas. Toda sua. Irmã Emília. 14 de junho de 1827 (fasc. p. 29) Espero que não se aflija com sua pouca generosidade, visto que já superou muita coisa em si mesma e que Deus lhe dá o ardor para superar ainda mais. Mantenho o princípio de que um bom meio para crescer é ocupar-se mais de Deus do que de si própria e mais da bondade de Deus do que de seus julgamentos. Esse meio inspira confiança, alegria e um crescimento mais ou menos sensível. O agricultor confia à terra suas sementes que ele perde de vista e rega laboriosamente às cegas, na certeza de que seu trabalho há de dar fruto. Quanto mais devemos depositar com segurança no seio de Deus todos os nossos pensamentos, desejos, dificuldades! Não pense que Deus nada realiza em você e que não se opera nenhuma mudança. 5 12 de janeiro de 1828 (fasc. p. 18) Permitindo este mal, Deus adverte-a de que não quer que fique sem algum sofrimento. Talvez tenha deixado à humilde pastora de Pibrac o cuidado de aliviá-la. Entregue esse cuidado à amável Providência e à bondade infinita do Coração de Jesus. Você diz muito bem que a alma se beneficiará das privações do corpo e se beneficiará também das próprias trevas. Os 175 Para retomar a coragem diante das dificuldades que surgem para si como também para sua comunidade, a superiora de MontaubanSapiac contemplará sempre com mais generosidade Jesus no Calvário (L 690). À Madre Foi, em Montauban-Sapiac. Villefranche, 15 de setembro de 1842. J.M.J. Gosto de pensar, minha muito querida Irmã, que você procurou sua força e apoio junto à cruz e que lá aprendeu que as coisas mais amargas são aquelas que um dia serão nossa alegria e nossa paz e, enfim, nossa felicidade eterna. É no caminho doloroso do Calvário que encontramos Jesus. Seguindo-o com fidelidade, aprendemos a conhecê-lo e, conseqüentemente, a amá-lo. Peço-lhe, minha muito querida Irmã, que tenha coragem. Recomendo a todas as Irmãs colocarem sua confiança em Deus. Ele as ajudará e as levará a experimentar como é bom, principalmente para quem se abandona aos seus cuidados paternos. Ajudem-nos com as suas orações. Nós faremos o mesmo. Breve será o retiro, as tomadas de hábito, profissões. Você sabe como tudo isso é importante. Temos outras dificuldades para as quais necessitamos muito de luz. Portanto, rezem. Irmã Emília Leia a carta que escrevi a Padre Guyard. 542 123 173 Uma religiosa se aborrece na casa onde a obediência a colocou. Delicadamente, Madre Emília a convida a buscar Deus em tudo (L 680, M 432-433). À Irmã Anne-Régis, superiora em Livinhac. Villefranche, 17 de junho de 1842. J.M.J. Minha muito querida Irmã: Recebi suas notícias com muito prazer. Há muito tempo não as recebia. Tenho muita pena de você por causa do desânimo em que se encontra. Para encorajar-se a suportar esse sofrimento, pense que se encontra em Livinhac pela voz da santa obediência. Toda a terra pertence ao Senhor e em qualquer lugar em que estejamos podemos amar a Deus, fazer nosso dever e promover a sua glória. Em Livinhac, você está tão perto do paraíso como se estivesse noutro lugar. Console-se, pois, minha querida Irmã, e pense apenas em satisfazer a Deus. Saúdo-a afetuosamente e sou toda sua. Irmã Emília. 174 Ainda alguém que desejaria ser transferida de sua comunidade atual. A superiora geral não se opõe, mas mostra as dificuldades de uma mudança e pede para que a Irmã reflita e reze (L 682). A uma Irmã de Montauban-Sapiac. 29 de junho de 1842. J.M.J. Minha muito querida Irmã: Sinto pena de você1 e gostaria de tê-la perto de mim. Mas, será que quer deixar a casa da qual você é uma das primeiras pedras? Você me disse que gostaria de vir passar alguns dias aqui e que não fez votos. Mas devo agir como se você os tivesse feito. Se for obrigada a retirá-la de Montauban, não será fantasmas da noite aparecem e desaparecem. A noite também tem sua luz. Uma prova disto é a coluna de nuvem tenebrosa durante o dia e luminosa durante a noite, pela qual Deus conduziu seu povo através do deserto. Há em você uma luz que brilha no fundo do espírito, mas que não é colorida e nada tem de sensível. Compadeço-me de suas privações interiores. Mas persista na espera de Deus e numa simples resignação. Quando for o tempo, ele lhe fará sentir sua presença. Não é quando se experimentam mais consolações que se acumulam mais méritos. Parece que você não avança. Deixe o julgamento para Deus: Ele conhece a verdade. Os passageiros tímidos temem monstros e perigos e, no entanto, avançam sem perceber. Esperamos que, com a graça de Deus, nos aconteça o mesmo. Assim, amemos o divino Coração de Jesus, amemos muito a Jesus, Maria, José, em nome dos quais lhe apresento os sentimentos de uma terna afeição. 6 11 de maio de 1828 (fasc. p. 9) A lembrança de suas faltas passadas, que as circunstâncias do lugar são próprias a fazer reviver, renovará em seu coração uma compunção mais doce do que amarga, porque não virá apenas do conhecimento das faltas mas também, sobretudo, da bondade infinita de Deus que as lavou e apagou no sangue de Jesus Cristo, e que delas retirou o maior bem. Lembre-se de que Nosso Senhor perguntou três vezes a São Pedro, à beira-mar, se ele o amava e até se o amava mais que os outros. Pedia dele um amor maior, porque queria lhe confiar o governo de seu rebanho. Suponha que o Senhor lhe dirige as mesmas perguntas que fez a São Pedro e dê-lhe a mesma resposta. Os atrativos que ele lhe inspira, particularmente o dos sofrimentos, a participação em seu cálice e tantos outros sinais de sua amável Providência, devem enchê-la da certeza de que está com ele, e ele com você. Se aflige sua alma, é para prepará-la para a posse 124 541 dele mesmo por toda a eternidade. Se aflige seu corpo, é porque quer torná-lo digno da gloriosa ressurreição. 7 14 de dezembro de 1828 (fasc. p. 31) O espírito de obediência que a anima é certamente uma das grandes graças que o autor de todo bem faz a uma alma religiosa. Mas, concedendo às suas necessidades e às suas orações a perseverança e o progresso nessa virtude, existe outra que o Senhor não recusará à sua situação presente: a de preservá-la do excesso de reflexão sobre si mesma que naturalmente os sofrimentos físicos e morais provocam e de inspirar-lhe o esquecimento de si própria e um abandono cheio de confiança à sua adorável conduta. Essa disposição será seguida de uma terceira graça que não lhe é menos necessária como superiora do que como religiosa, e que consiste numa verdadeira paz interior, independentemente de toda situação, do repouso, da solidão, como das preocupações do governo, da doença como da saúde e que se encontra onde estiver a vontade de Deus, num rio de paz, enfim, do qual fala Isaías51 que inunda ao mesmo tempo todas as faculdades da alma, que não conhece nem dique nem obstáculo, e que atravessa todas as regiões por mais diferentes que sejam, até que vá se perder no oceano. 8 26 de maio de 1831 (fasc. p. 30) Explico, parece-me, como acontece que, sem ter a visão e o gosto de Deus você não cessa de suspirar por ele: o que parece contrário a essa disposição é precisamente a causa dela. Não se desejo que diga uma palavra sobre isso às nossas Irmãs, a fim de que não se prevaleçam de seu exemplo para dar menos importância à clausura. Que tudo o que acabo de lhe dizer não a constranja, pois você foi bem intencionada e essa falta servirá para mantê-la alerta e lhe será muito útil. Exorto-a ainda a continuar a trabalhar pela construção do Reino de Deus com coragem e confiança. Toda sua. Irmã Emília. 172 Uma nova superiora, um pouco desanimada, vê-se carinhosamente convidada a ter confiança e uma visão mais positiva a respeito do bem já realizado (L 679). À Irmã Marie Damien, superiora em Lanuéjouls. Villefranche, 6 de maio de 1842. J.M.J. Minha muito querida Madre: Partilho profundamente todos os seus sofrimentos, mas acho que você não tem bastante confiança em Deus. Por que não se apoiar inteiramente nele? Não é por vontade dele que você tem este cargo? E será que não tem a certeza de que ele mesmo a sustentará? Entregue-se a ele, não fique pensando em si mesma, e seus sofrimentos diminuirão. Em vez de pensar que tudo vai mal, alegre-se com o bem que se faz. Sua confiança atrairá bênçãos sobre você e seus alunos. Bordaremos com prazer os saquinhos para os relógios, mas não queremos pagamento. As mais afetuosas lembranças às nossas queridas Irmãs. Toda sua. Irmã Emília. 540 125 Ano de 1842 171 A superiora de Montauban-Sapiac, irrefletidamente, fez uma visita à priora do Carmelo. Sem a censurar, Madre Emília apressa-se em lhe lembrar as exigências da clausura (L 668, M 441- 443). À Irmã Foi, em Montauban-Sapiac. Villefranche, 15 de janeiro de 1842. J.M.J. Minha muito querida Madre: Alegro-me por você ter encontrado consolação junto à virtuosa Madre priora. Admiro a bondade divina em tê-la tratado com tanto amor, fazendo algo que não é permitido. Mas ele só viu a simplicidade de sua intenção e a retidão de seu coração, pois embora a sua saída para ir conversar com a Madre seja sem antecedentes no Instituto e totalmente contrária às nossas Constituições, estou convencida de que não pecou. Por isso, aconselho-a a ler esse artigo das Constituições, o qual é muito claro. Padre Guyard, dando-lhe essa permissão, não a considerou como uma religiosa, senão ele teria percebido que não podia dá-la. Não creio que nosso Pai pudesse fazê-lo. É preciso ainda lembrar-lhe que uma permissão não é uma ordem, portanto você não poderia aproveitar-se dela porque fez voto de clausura, segundo nossas Constituições. Não refletiu suficientemente e, em assunto de tão grande importância, é necessária uma séria reflexão. Pode ser que você tenha pensado que fui a Figeac para ver a Madre Priora. Se foi assim, enganou-se. Fui vê-la uma ou duas vezes, mas, naquela época, não éramos clausuradas. Em outra ocasião, passei pelo convento das Carmelitas porque se encontrava no meu caminho. Penso não ser necessário dizer a Padre Guyard o que eu lhe disse. Acredito que ele não lhe dará mais semelhante permissão e, se isso acontecer, espero que não se aproveite disso. Se por acaso ele lhe der uma ordem contrária às nossas Constituições (o que não acredito), acho que você deveria nos consultar antes de executá-la. Se for possível, suspira por um bem que se possui, nem mesmo por um bem pelo qual não se tem nenhuma estima. Você procura Deus porque o ama e porque sabe que ele é o seu bem supremo. Você geme porque não o encontra. Por sua vez, ele não se deixa encontrar a fim de que você o procure. É verdade que Nosso Senhor disse: Procurem e encontrarão,52 mas ele não marcou o fim dessa procura porque quer que o procuremos com perseverança, e que nos baste saber que o encontraremos, cedo ou tarde. Entreguemo-nos tranqüilamente à ação divina; ela nos conduzirá enfim ao total desprezo de nós mesmos, bem mais desejável que todas as vantagens da natureza. Não se canse, minha querida Madre, de suportar a humildade com que Deus a envolve, e fique certa de que ele mesmo fará o que suas trevas a impediriam de fazer. Ficaria contrariada se tomasse seu lugar e desejaria um melhor suplente? Vivamos em paz à sombra da vontade divina, até que o dia nos ilumine. N.B. – Os trechos seguintes não estão datados. 9 (fasc. p. 9) Nada deseje, deixe agir Deus que quer santificá-la. Seus receios são sem fundamento. Faça algumas atividades que a levem a esquecê-los e não pense nos que os causa. De resto, se nada a liberta desses temores, suporte essa provação como qualquer outra, até que Deus queira tranqüilizá-la. Jó e Davi foram também assim afligidos. Eles comparam seu sofrimento ao de um homem que fosse transpassado por flechas. Esse terror do qual estavam penetrados não impedia que fossem os amigos de Deus. Seus temores e sofrimentos se tornarão, para você, motivos de consolação. 126 539 10 170 Encorajamentos maternais à nova comunidade de Montauban e à sua superiora (L 656, M 422-423). (fasc. p. 10) Tenha uma inteira confiança e um total abandono nas mãos de Deus que você ama, que procura e que encontrará. Alegre-se com reflexões que lhe dêem alegria, deixando de lado aquelas que podem levá-la à tristeza. Acho, por exemplo, que se apóia demais sobre a apatia de sua alma e sobre a falta de fervor das Irmãs, persuadindo-se de que seus próprios defeitos são a causa disso e concluindo daí que não está em condições de conduzilas. Vejo esses pensamentos e esses raciocínios como tentações do demônio. Não tema faltar à humildade rejeitando-os, e pratique a obediência não dando nenhuma importância a tudo isso. 11 (fasc. p. 19) Nos meios que você usa para combater, procure seguir o atrativo ou a inspiração de Deus, sem se apressar. Mas não reflita para saber se você se apressa. Minha querida Madre, Deus permite esta perplexidade que tanto a penaliza, esta visão das falhas de que está cheia a sua vida, este sentimento de fraqueza e de impotência, esta aflição e esta espécie de abandono, esta tentação de desânimo e esta falta de esperança. Este pavor da morte é para fazê-la conhecer melhor o seu nada, levá-la ao desprezo de si mesma e forçá-la a se entregar sem reserva entre as mãos de Nosso Senhor Jesus Cristo, como seu único recurso. Ele permite tudo isso porque tudo entra no plano de sua santificação e do qual você pode obter grandes vantagens. Diga algumas vezes Ó Crux ave, spes única! Não exercite seu raciocínio, mas sua submissão. Quanto ao pavor de contrair doenças, o que deve fazer é desprezar as repugnâncias e os temores e cumprir com firmeza À Irmã Foi, Superiora de Montauban-Sapiac. Villefranche, 19 de setembro de 1841. J.M.J. Minha muito querida Irmã: Hoje é apenas para cumprimentá-la que me dou o prazer de lhe escrever e para dizer-lhe que fizemos boa viagem. Embora estando em Villefranche, minha querida Irmã, sinto-me muitas vezes no meio de vocês. Sabem que as guardo todas no meu coração e que motivos superiores me levaram a me afastar tão cedo de vocês. Mas tenham coragem, pois o bom Deus está com vocês. Ele não lhes negará sua ajuda, está profundamente comprometido com isso. Assim, minha querida Irmã, peço-lhe o quanto me é possível, aumentar a confiança em sua bondade. O que pode temer sob a proteção de Jesus, Maria e José? Entregue-se sem reservas nas mãos da Sagrada Família e, longe de entristecer-se, alegre-se de ter sido escolhida para torná-la conhecida e amada. O trabalho feito por você, minha querida Irmã, pede, exige essas disposições, e tenho muita confiança de que esse sentimento esteja gravado no seu coração. Deixo-a, mas permaneço com você: preciso enviar minha carta pela diligência. Você encontrará hóstias embaixo da escada grande. Esse lugar é demasiado úmido, é preciso tirá-las de lá. Saúdo-a afetuosamente, assim como a todas as nossas queridas Irmãs, às quais recomendo entregar-se a uma santa alegria. Irmã Emília. 127 538 e abandono a santa vontade de Deus, o que exige o dever e a caridade. 12 169 Escrevendo à mesma correspondente, Madre Emília explica, com seu senso de discernimento dos espíritos, que uma indocilidade de caráter a faz sofrer menos do que uma certa falta de humildade (L 653, M 486-487). À Madre Tabithe, em Rieupeyroux. Montauban. 5 de setembro de 1841. J.M.J. Minha muito querida Madre: Procure não admitir nenhum pensamento triste em seu espírito, mas, pelo contrário, rejubile-se em poder trabalhar para a glória de Deus. Não se aflija com as pequenas contrariedades que são inseparáveis de sua função e procure colocar em prática as advertências das Constituições que se referem à Madre. Constatará que deve permanecer na paz e na alegria. Longe de mim acreditar que sua alma não seja dócil; pelo contrário, acredito que esteja repleta de boa vontade. O que lhe falta, você o sabe, é um pouco de confiança em Deus. De onde vem isso? De uma falta de humildade, virtude que devemos pedir sem cessar. Rogo-lhe que o faça por mim e acredite na minha terna afeição nos santos Corações. Sua dedicada Madre. Irmã Emília. (fasc. p. 20bis ) Você diz que pede sem cessar a lembrança de Jesus e de sua Paixão e que Deus parece rejeitar sua oração. Mas não está evidente que você tem lembrança quando a pede? O que pede, sem dúvida, é estar penetrada de um modo sensível dessa lembrança, mas esse pedido é supérfluo. Quanto aos seus sofrimentos corporais, Deus não pede que você os suporte com alegria; basta a resignação. Aprovo que pratique, em união com Jesus Cristo, a mortificação de não demonstrar inutilmente seus sofrimentos e seus desejos. Mas não convém deixar suas Irmãs adivinharem suas necessidades para obter delas algum alívio: um pedido do que lhe é necessário lhes causará prazer, e está conforme a vontade de Deus que, para sua maior glória, você tenha um cuidado razoável com a sua saúde. Quanto à sua meditação, não tenho nem regra nem método a lhe propor. Isso faria apenas aumentar a sua perturbação. Livre-se disso como puder: permaneça sentada à sombra do bem-amado,53 e sofra em paz seu abandono tanto quanto ele quiser. 13 (fasc. p. 34) Você fará muito bem em se vigiar. Mas para ser bem sucedida com menos sofrimento, observe as três regras seguintes: 1ª. ataque o vício fundamental que é o amor e a preocupação consigo mesma. Se esse defeito for corrigido, 128 todas as dificuldades desaparecerão por si mesmas. 2ª. coloque no seu espírito a máxima de São Paulo: que a prudência da carne é inimiga do espírito de Deus54; conseqüentemente, não calcule tanto e reflita menos sobre a qualidade da alimentação, como também sobre as minúcias dos cuidados que sua saúde exige. 3ª. oriente-se pela obediência; não se fixe demais nas mortificações, antes, limite-se ao que é mais importante e mais necessário. Para evitar as ciladas do demônio, gostaria de menos mortificação e mais simplicidade. Não é necessário agitar as asas para voar imediatamente e pairar nas alturas, como as águias. Contentemo-nos em nos empoleirar numa árvore e arrulhar como a rolinha, ou habitar solitariamente sobre o teto, como um pássaro.55 Não lhe proporei passar fome ou sede de propósito, mas regrar sua alimentação, de maneira que coma alguma coisa em horas fixas e cada dia nas mesmas horas, para impedir de se deixar levar pela fantasia. Gostaria que sua mortificação consistisse unicamente em determinar com antecedência a hora, a qualidade e a quantidade de sua alimentação e a ser fiel a essa determinação.56 É importante mortificar a dissipação em todas as suas ramificações, isto é, a dos sentidos, a da imaginação e a da memória, a do espírito e a do coração, e não confundir a vigilância com a curiosidade. Qual o meio? É exercer a vigilância apenas em espírito de caridade, seja para com Deus, seja para com as pessoas que o Senhor lhe confiou. Não pretender outra coisa senão ir para o céu e para lá conduzir suas Irmãs. Não deter demais seu pensamento sobre suas qualidades ou más inclinações. Pensará pouco nisso se vigiar só por caridade. Então, sua vigilância será fácil e alegre. Do contrário, será acompanhada de tristeza, de cansaço e mesmo de desgosto. 537 168 Em meio às dificuldades do superiorato, particularmente no temor de que Irmãs consideradas como necessárias fossem transferidas, abandonar-se sempre mais à vontade de Deus (L 644, M 416-417). À Madre Tabithe, em Rieupeyroux. Montauban, 21 de julho de 1841. J.M.J. Minha muito querida Madre: Irmã Philippine está muito preocupada com o seu sofrimento e respondo no lugar dela, pois receia que você esteja aborrecida. Cause-me o prazer de poder expressar-lhe o contrário. Tenha muita coragem. Deus está com você, ele será seu apoio. Permaneça num espírito de total abandono. Quanto mais se entregar a ele, mais força terá. Acrescente a isso um verdadeiro amor à cruz. Disponha-se a todos aqueles inerentes ao superiorato. Acolha de bom grado todos os sacrifícios dele decorrentes, disposta a tudo, como, por exemplo, a ver Irmãs adoecerem, a ver tal ou tal Irmã que você achava necessária ser transferida, a ver chegar alguma que você receia acolher e até que poderia causar prejuízo a casa, como por exemplo a Irmã que nosso Pai queria enviar e sobre a qual consultei as Irmãs do Conselho. Se nosso Pai, mudando de idéia, a fizesse voltar para Rieupeyroux, deveríamos acreditar que é para um bem maior e que Deus tem desígnios que nos são desconhecidos. Podemos dizer o mesmo sobre outras coisas que poderiam acontecer. O melhor para conservar a paz da alma é estar pronta para tudo e procurar em todas as coisas fazer a vontade de Deus, que se encontra sempre, para aqueles que obedecem na vontade dos seus superiores. Certa de que fará o possível para entrar nesse caminho de renúncia, saúdo-a de todo o coração, assim como suas muito queridas filhas, a quem desejo um fervor sempre crescente. Irmã Emília. 129 536 conhecidas e assim atrair alunas para o próximo ano. Agora, eis os motivos contrários: se retardarmos o início dos trabalhos, teremos tempo de formar melhor nossas Irmãs, de refletir. Enfim, faremos o que pudermos. O fato de me encontrar aqui me evitaria uma segunda viagem e a despesa que é grande: as passagens custam 10 francos. Sobre todos os aspectos, é melhor começar no verão do que no inverno. Três Irmãs será suficiente para o início. Assim, você vê que é fácil enviá-las. Após ter expressado todos esses motivos, fico feliz em fazer como nosso Pai quiser. Peça a nosso Pai para não falar sobre esse assunto. Toda sua, muitas lembranças minhas e de nossas Irmãs às Irmãs daí. Irmã Emília. A escritura da casa só será feita quando as Irmãs do Refúgio receberem a autorização. Esperando, nós pagaríamos um caução. Antoinette Martin deve vir para visitar sua filha, que mora aqui. Queira me enviar tamancos e a Vida dos Santos ultimamente canonizados, que está em cima da chaminé. A Madre Priora deu-me licença para observar como são ensinadas as crianças no jardim da infância e fomos imediatamente. 14 (fasc. p. 36) Eis como se devem combater os pensamentos contra a fé: somos filhos dos santos, seguimos suas pegadas, queremos chegar aonde eles estão; tinham suas razões como eu tenho a minha; eles creram, quero crer como eles, a fim de me salvar com eles; eles foram provados e tentados como eu, resistiram e venceram; quero resistir para partilhar de sua vitória e de sua coroa; eles colocaram a fé acima de sua razão; farei, como eles, o sacrifício do meu próprio julgamento e do meu orgulho. Eis o que é preciso fazer e isso basta. Quando se é tentado contra a esperança, é preciso refugiarse no Sagrado Coração de Jesus, considerando apenas a sua bondade, por meio de um sentimento puro e sem raciocinar. Caso experimente uma forte tentação de desespero, é preciso lembrar-se de Abraão que São Paulo louva por ter esperado contra toda esperança; rezar um Pai Nosso e uma Ave Maria em honra de São Francisco de Sales, outro em honra da Santa Madre de Chantal. Mas, a uma Irmã da Sagrada Família podem faltar a fé e a esperança? Nada dá tanta coragem como o pensamento profundo de Jesus Cristo, embora seja acompanhado de aridez. Os remédios amargos não deixam de ser eficazes. 130 535 11. Carta e trechos de cartas a Madre Emília escritas pela Priora do Carmelo de Figeac, Madre Marie-Thérèse de Saint-Augustin Por ocasião de sua estadia em Figeac para a fundação de uma casa de clausura (fevereiro-maio de 1835), Emília travou conhecimento com esta carmelita que foi a única, com os Padres Marty e Fabre, a ouvir a confidência de suas provações espirituais. Em seguida, Madre Emília entregou a Pe. Fabre três cartas íntimas da religiosa, como também a cópia de duas outras, cujo original ela havia destruído (HC 152). Nós temos parcialmente três dessas cartas; da primeira (sem data) restou a cópia redigida por Santa Emília (B I 283287); um trecho de cada uma das duas outras foi publicado (B I, 287288 e II, 247-249). que as Irmãs do Refúgio deixem a sua. Há pouco tive uma conversa com a Reverenda Madre que consultei anteriormente. Ela pensa que devemos iniciar nossa comunidade imediatamente e que nos será fácil encontrar uma casa. Procure me responder de modo claro a tudo o que lhe pedi... Como isso poderá ser feito. Peço que não se preocupe conosco. Estamos bem alojadas e bem alimentadas e temos frutas e leite em abundância. Ainda não tivemos contratempos, mas cuidamos de esperá-los. A boa Madre Priora, que fez muitas fundações, é bem talhada para encorajar. Ela teve a complacência de me contar como ela se encontrou, o que nos faz dizer que Deus é admirável em suas obras. Minha carta é longa. Aqui, posso escrever à vontade. Escrevo um pouco agora, outro depois, sem me cansar, pois não estou muito ocupada. Esses textos são interessantes pela luz que projetam sobre o “caso” da santa, pelo discernimento do qual dá prova sua correspondente, as alusões a Santa Joana de Chantal, etc. Nós as numeramos 1, 2, 3. – 1 é tirada de Lth que oferece uma variante, aliás insignificante, com B, na primeira frase. Dê-me notícias de minha querida Irmã Thérésia. Desejo-lhe uma grande união com Jesus, nosso bom Salvador. 1 Acabam de me dizer alguma coisa que me mostra que, se não terminarmos logo, a tempestade cairá. Minha venerável Madre: No tocante às suas disposições interiores, eu as considero sempre admiráveis para você. Não pense que está sob o domínio do demônio, mas sim sob o poder de um amor muito ciumento do nosso divino Mestre. Ele a atormenta de uma maneira muito penosa para a modelar segundo sua vontade. Não tome, pois, como testemunho de sua reprovação o que é a maior marca de sua salvação. Não tema, minha caríssima Madre, deixe o bom Deus agir e acredite que os outros vêem mais claro do que você no seu estado. Não raciocine para saber se os atos que pratica são uma questão de hábito ou não. Parece-me que deve honrar a Deus Peço-lhe que me responda imediatamente. Desejava muito que alguém me abençoasse. Enfim, duas pessoas me concederam essa graça: o superior do Refúgio e o Bispo, que teve a delicadeza de me dar a mão para me levantar. Depois dessas duas bênçãos, tive mais coragem. Se nosso Pai quiser saber as razões de iniciarmos logo, eilas: se esperarmos, será preciso vir durante o inverno e as alunas já estarão nas escolas. Nossa demora tornará os começos mais difíceis, uma vez que os espíritos se ensoberbecem, a inveja se infiltra, etc., etc. Os homens mudam: aquele que nos vê hoje com prazer, dentro de pouco tempo não nos suportará. Começando imediatamente, antes do início do ano escolar, poderemos nos tornar 534 mesmo dia e disse à Madre que tinha pressa. Respondeu-me que, para negócios desse tipo precisava ser rápida. Imediatamente fomos ao Refúgio, percorremos a casa e ficamos edificadas ao ver aquelas virtuosas senhoras que encantam, sobretudo, pela simplicidade. Isso é algo de Deus que edifica e faz descobrir em tais pessoas que elas caminham em sua santa presença. Tivemos o prazer de conversar um pouco com uma jovem Irmã privada do uso dos braços e das pernas, de maneira que é preciso ajudá-la em tudo, como se fosse uma criança. A boa Madre nos disse: “Eis nossa relíquia. É por meio dela que nos vieram todas as bênçãos de Deus.” E nos disse outras coisas sobre a felicidade de ter doentes em casa. Ela sabe também falar sobre os cuidados paternais da Providência. A Madre das Carmelitas faz a mesma coisa, de maneira que, se nos faltar confiança, poderemos buscá-la entre elas. Falam, com muita persuasão, como quem tem certeza de que dois e dois são quatro. Agora, vou rezar. Quando souber de alguma coisa, eu lhe direi. Reze com fervor a fim de que o Espírito Santo dirija todos os nossos movimentos. O superior do Refúgio, que é pároco de Caussade e vigário geral, veio nos visitar com o vigário da paróquia. Fez-me prometer ir pedir ao Bispo a aprovação de nosso projeto e nos acompanhou. O Sr. Bispo nos recebeu bondosamente e expressou a alegria e o desejo de nos ver chegar o mais cedo possível. Ele disse a um padre: “Vão chegar boas religiosas. Nada tenho a pedir senão vê-las antes de morrer.” Como já sabe, o preço da casa é 25.000 francos. É impossível não ficar com a casa pequena, avaliada em 3.000 francos, mas que nos deixam por 2. Tudo custará 27.000 francos. Pergunte ao nosso Superior, a quem apresento meus respeitos, se ele está de acordo com o preço. Quanto às outras casas, ainda não as vi, mas, pela aparência e pelo que me disseram, não nos convêm. Pergunte a nosso Pai se ele me dá a liberdade de agir de acordo com o que achar melhor, e que, se eu for bem sucedida, abriremos o convento antes de minha partida, alugando uma casa ou pedindo uma emprestada, até 131 por um grande silêncio interior e uma total adesão a tudo o que sofre, aceitando maiores trevas se for preciso, para o cumprimento de seus desígnios. Parece-me que deveria seguir o movimento interior que a leva a fazer um pouco mais de meditação e que uma hora em silêncio na presença de Deus e um abandono total às mais cruciantes aflições, trazem mais proveito e glorificam a Deus. Mais tarde verá as imensas riquezas adquiridas nesse cadinho de tribulações. Agora, tudo isso lhe está oculto, mas o dia da divina claridade surgirá. Então se admirará com as maravilhas que Deus tiver realizado em você, no momento dos seus maiores rigores. Não rezarei pela sua conversão. Peço somente que Deus se alegre em você e que o deixe agir com liberdade. Permaneça, minha querida Irmã, em seu estado de sofrimento, desafiando a Deus por orações vocais se não puder fazer de outro modo, que você quer viver de sua morte e alimentar-se de amargura, sem buscar nem gosto, nem sentimento, nem conhecimento, pois esse bom Pai a quer toda, sem reserva, inteiramente abandonada à sua amorosa vontade. Meu Deus! Como você é feliz por estar assim aconchegada a Jesus! Adore em silêncio! Jogue-se em seus braços apesar da repulsa que experimenta. Não tema que ele a rejeite, nem que o demônio leve vantagem sobre você: as revoltas da natureza não a tornam culpada. Deus realiza em você grandes coisas, à sombra de suas misérias. Chegará o dia em que todas essas riquezas lhe serão apresentadas abertamente. Agora é o tempo das trevas: deixe-o agir, silencie, continue seu abandono, é ele quem exige urgentemente, é ele também quem lhe dá essa fome dele, esse aborrecimento de tudo o que é criado. É uma graça muito preciosa. Seu atrativo é a cruz, sonde seu coração. É também o atrativo de Deus para sua alma. Ele se alegra quando você está entregue ao mais doloroso sofrimento. Sua dedicação prova que você quer que ele realize seus desígnios. Não se aflija, pois, com o resto. Quanto mais você morrer para seus interesses, tanto mais facilitará para Deus moldá-la, conforme sua vontade. Suas repugnâncias são graças: o Santo Esposo quer a alma morta para todo desejo e para todo querer próprio. 132 533 O que Deus pede à alma é uma grande indiferença quanto ao estado em que ele a mantém, seja qual for, de modo que ela se glorie da abjeção, de suas disposições martirizantes e humilhantes. Esse contínuo espírito de sacrifício e de abandono lhe é muito agradável. Portanto, que ela não procure outra coisa, alimentando-se de morte, sem querer sair do túmulo. Abandonar-se nas mãos dos outros vale mais do que uma maior mortificação, e a repugnância que se sente por isso vem mais da natureza do que da graça. Célestine de volta. Penso que o bom Deus ficará muito mais satisfeito se você lhe disser de todo o coração: “Meu Deus, não quero nada, a não ser sua vontade e em toda ocasião renunciar a todo desejo para mergulhar na sua vontade.” Tenho pena de nossa querida Irmã Colombe. Espero que você preste serviço à Irmã Marie Marc e que, ao voltar, ela se comporte melhor. Abandonemo-nos a Deus sem reserva: pois quando nos parece estar mais afastadas dele e mais mergulhadas no conhecimento de nossas misérias, ele opera grandes coisas. E para a alma fiel chegará um dia em que, toda mergulhada nele, o bendirá mil vezes por suas angústias e seu pretenso afastamento dele. 167 Uma alma sofredora deve dizer a si mesma: Coragem, suporta com fé firme o exílio que Deus faz experimentar teu coração! Ele se compraz em agir às ocultas, fazendo-te sentir um vazio muito penoso, mas não está menos presente, nunca te amou tanto. Tua posição é penosa; no entanto, é só o que desejaste: mil vezes disseste a Deus que rompesse todas as tuas amarras e que não querias senão a ele. Agora te pegou na palavra. Transtornou tudo, fechou todas as portas a fim de que nem um pouquinho de consolação te fosse dada. Permitiu ao demônio e à natureza que te fizessem sentir suas revoltas, a fim de que sob essas aparências humilhantes ele pudesse te estabelecer num caminho todo de puro amor: pois não se pode dar esse nome ao prazer que se experimenta ao servi-lo no belo dia das consolações. Passam sutilmente em tudo isso muitas misérias que precisam ser purificadas no cadinho no qual te encontras. Aliás, é assim que ele age com seus santos. A Madre de Chantal experimentava esse gênero de aflições. Via-se entregue à tentação, gemia por se ver à frente de suas filhas e dizia experimentar todas as misérias e tentações que elas mesmas suportavam e tudo isso nos últimos anos de sua vida.57 Portanto, que tua oposição a Deus não te perturbe. Não vem do teu coração que lhe pertence. Não gostas de fazer o mal. É um sentimento que ele permite para te manter na humilhação. Madre Emília conta, de uma maneira bastante circunstanciada, sua chegada em companhia de duas Irmãs, a Montauban, para a fundação que se instalou finalmente no bairro de Sapiac (julho-setembro de 1841; conferir acima, primeira sessão, Documentos anexos, 4) (L 639, M 405-409). À Irmã Philippine, assistente em Villefranche. Montauban, 7 de julho de 1841. J.M.J. Minha muito querida Irmã: Eis-nos aqui, pela graça de Deus, chegamos com boa saúde, apesar de termos feito um regime severo durante a viagem. Ninguém tocou nas pequenas provisões e os pobres disso aproveitaram. Foi por eles que fomos acolhidas, ao descermos do transporte. Uma pobre cega recebeu as maçãs cozidas, etc., etc. O Sr. Murat queria nos acompanhar e nos enviar um senhor para nos ensinar as ruas. Nós lhe agradecemos e tomamos uma pobre mendiga que nos levou diretamente até às Carmelitas. Sem nenhum preâmbulo, pedimos hospedagem. A reverenda Madre disse sim um pouco embaraçada, perguntando quantas éramos. Respondendo-lhe sermos três, ela nos disse: “Para três, nós nos arranjamos bem. Pensei que fossem umas doze. Tudo o que temos está à sua disposição.” Ela nos disse isso com tanta franqueza que nós respondemos: “Faremos aqui como se estivéssemos em nossa casa e como gostaríamos que fizessem se estivessem em nosso lugar.” Em seguida, fui à casa do Padre Capmeil; ele estava ausente. Eu queria ver todas as casas no 532 133 166 Recusa fortemente expressa de permitir que uma Irmã viaje à Casa-mãe, pois iria de encontro às Constituições. Convite a entregarse inteiramente, nessa ocasião, à Providência de Deus (L 638, M 404405). A uma Superiora. Villefranche, 22 de junho de 1841. J.M.J. Minha muito querida Madre: Apesar do prazer que teria em vê-la (não posso ir contra o meu pensamento), não acredito que a razão para fazer um retiro seja suficiente para uma Irmã empreender uma viagem. Aliás, as Constituições são taxativas nesse ponto. Leia o artigo da clausura e ficará convencida. Superioras e Irmãs fizeram-me o mesmo pedido e sempre dei a mesma resposta. A graça de Deus, minha querida Madre, independe dos lugares e das pessoas. Ele não abençoaria uma viagem que fosse de encontro às Constituições. Procure fazer esse sacrifício. Eu o farei com você, pois seria muito agradável para mim vê-la, mas é preciso que nos lembremos de que somos religiosas clausuradas e não teremos dificuldade em nos submeter. Saúdo-a com muita afeição e sou toda sua. Irmã Emília. Eis, minha muito querida Madre, uma forma de crescimento que lhe servirá mais que uma viagem: entregar-se a Deus num total abandono, colocando sua confiança nele, independentemente dos meios e de todo apoio, fazendo-lhe generosamente todos os sacrifícios pedidos por ele, estando disposta a aceitar que todas as suas filhas lhe sejam retiradas, se Deus o quiser, seja pela morte, seja pela vontade de seus superiores. Você me demonstrou um grande desejo de ter Irmã Deixa-o agir, dedica-te a tudo que ele quiser, entrega-te como vítima ao seu amor, sem te afligires com tudo que experimentas. Querer sentir outra coisa além da própria fraqueza é imperfeito, visto que Deus o permite. É um sinal de que isso o glorifica. Quanto menos é do teu gosto, mais é do gosto de Deus. 2 Minha venerável Madre: Mil ações de graças pelos votos que nos enviou. Os nossos são recíprocos: receba-os, juntamente com os de suas filhas que certamente não são menos sinceros. Vejo-a sempre sobre a cruz com uma inveja, mas não deveria ter essa inveja, eu que nem sei sofrer nem amar. Apesar disso, invejo as almas destinadas a esta vida de sacrifício. Sim, minha terna Madre, e falo do fundo do coração. Quando penso em você, experimento um sentimento particular. Acredito que você seja mártir do amor: Ele se compraz em atormentá-la a fim de se glorificar em suas angústias e apressar a obra dele. Deixe-o agir, não deseje repouso. Seu estado pertence totalmente a Deus; deixe-se consumir pela dor. A paz virá a seu tempo e ultrapassará a dor experimentada. Sou por demais imperfeita para merecer que você dê atenção ao que tomo a liberdade de lhe dizer. Certamente não é segundo minhas luzes, nada vejo, mas vejome forçada a repetir-lhe que seu estado interior é de Deus, assim como suas outras aflições exteriores: é por esse caminho que ele quer chegar a seus fins, seja em relação a sua alma, seja em relação ao seu Instituto. Estou fazendo uma novena a Santa Chantal para pedir-lhe o espírito dela para mim. Coloquei uma intenção por você. Seu estado tem muita relação com ela. Terminarei a novena no dia da morte dela, 23. Tome uma intenção por mim, que sou bem pobre. Tenho mil razões para tremer pela minha salvação, ao passo que vejo a sua completamente assegurada. 134 531 3 14 de julho... Tenho grande prazer em receber freqüentemente suas cartas, pois me ajudam a suportar as amarguras que às vezes inundam meu coração, vendo que, estando acima de mim, você é tratada ainda mais rigorosamente. Apesar disso, sinto vivamente a tristeza por vê-la sofrer e gostaria de partilhá-la, se fosse possível, a fim de partilhar também seus méritos. Não pense, minha venerável Madre, que me sinta inspirada quando lhe falo. Estou a cem léguas de merecê-lo. O interesse que tenho por você me faz experimentar certos sentimentos que parecem razoáveis: por exemplo, pensando em sua aflição, não vejo aí senão uma conduta toda amorosa da parte de Deus. Se você não sofresse, sua Congregação iria mal, e é por essa cruz contínua que a perfeição de ambas será consumada. Deus encontra glória e prazer em sua vida de morte. Você lhe deu mil vezes seu consentimento, ele se aproveita, deixe-o agir. Tempo virá em que a paz lhe será restituída. Mas, vendo as vantagens que suas angústias e tédios, trazem para você e suas filhas, seria desejável que morresse sobre essa divina cruz. Entretanto, não posso pedir isso. Minha afeição por você é ainda muito humana. Com tristeza vejo-a sofrer. Peço a Deus que a sustente e realize em você e em suas filhas todos os desígnios dele. Parece que Deus é glorificado por todas as fundações que você empreende. Que ele a abençoe e acompanhe todas as suas iniciativas, que lhe dê o seu espírito, multiplique suas filhas como as estrelas do céu: é o desejo que formulo para você e para a maior glória de Deus. Meus sentimentos respeitosos para seu querido rebanho que está perto de você. Gostaria que me fosse dado estar aí também, sem prejuízo do que devo a Santa Teresa. Gostaria de despertar esse desejo em minhas sobrinhas. Preferiria que estivessem perto de você a estarem perto de mim, por causa do bem que lhes adviria. Reze por mim, ou É verdade, mas a terna afeição que lhe tenho é a causa de falarlhe demoradamente a esse respeito. Você me escreveu dizendo que ia muito ao parlatório, o que torna a sua vigilância sobre si mesma ainda mais necessária. Confiando em Deus e desejando estar totalmente sob sua mão, vigie-se sobretudo nos relacionamentos externos. Toda sua. Irmã Emília. Ano de 1841 165 Acompanhar com doçura uma religiosa um pouco difícil e sem senso crítico, mas que é fervorosa e tem boa vontade (L 636 M 342343). À Madre Tabithe, em Rieupeyroux. Villefranche, 4 de abril de 1841. J.M.J. Minha muito querida Madre: Não desanime quanto à Irmã N. Seu caráter na verdade é difícil, mas ela é fervorosa, ama o bom Deus de todo o seu coração. Tem algumas idéias falsas, mas quer fazer bem as coisas. Apesar de seus pequenos desvios, tem boa vontade e faz verdadeiros sacrifícios. Não é preciso apressá-la, mas conduzila com grande doçura, aceitar algumas vezes suas idéias e ajudá-la discretamente a retificar seu pensamento, demonstrarlhe grande ternura e procurar adquirir sua confiança. Estou persuadida de que você já o faz. Prossiga, minha muito querida Madre, pois por meio disso você prepara para si mesma uma brilhante coroa. Esteja certa de que são as pessoas difíceis que nos proporcionarão a felicidade de nos unir a Deus. É, sem dúvida, para nos proporcionar essa preciosa vantagem que Deus permite que haja esse tipo de pessoas em todos os conventos. Toda sua. Irmã Emília. 530 135 saber, e o deixaremos se V. Exa. o quiser, embora já tenhamos começado a gostar dele. É preciso que lhe diga ainda que as pessoas interessadas por essa obra querem comprar o material e outras coisas necessárias. Permita-me, Sr. Bispo, desejar-lhe um bom fim de quaresma e um feliz aleluia. Queira responder-me sim ou não, nesta mesma carta, pois já é bastante que a tenha lido, a qual é muito longa. Mas conto com a sua indulgência e testemunho-lhe o meu respeito. Sua muito humilde e obediente filha. Irmã Emília. 164 Conselhos de moderação e de prudência no parlatório, pois o mesmo poderá tornar-se uma ocasião de dissipação (L 630, M 400401). À Madre Tabithe, em Rieupeyroux. Villefranche, 24 de julho de 1840. J.M.J. Minha muito querida Madre: Considero uma coisa muito importante para uma Superiora manter-se recolhida no parlatório. O meio de chegar a isso é nunca ir ao parlatório sem pedir humildemente ao bom Deus para ficar conosco e nos preservar de tudo que possa desagradar-lhe. O segundo é ir com temor, mesmo com padres e pessoas piedosas, sobretudo quando não são do nosso sexo. Por exemplo, Padre Teulier, que é tão religioso. Então, minha muito querida Madre, isso não é uma razão para dar uma total segurança; pelo contrário, tema sua fraqueza, seu amor-próprio. Procure não ter longas conversas (coisa inevitável, quando não tínhamos parlatório, mas o mesmo facilita), pois isso faz muito mal a uma religiosa, uma vez que ela se volta para o exterior e, conseqüentemente, torna-se mundana, enquanto deve ser o contrário. Para se preservar desse perigo, preocupe-se em fazer um pequeno exame de consciência quando sair do parlatório, procurando conhecer as faltas de prudência humana, de confiança nas criaturas, de um desejo secreto de ser estimada, as muitas palavras ditas, a dissipação, etc. Pensará, talvez, minha querida Madre, que estou insistindo muito nesse assunto. melhor, eleve só uma vez seu espírito a Deus pelas minhas necessidades. Eu o faço freqüentemente por você. 529 163 Providencialmente, uma religiosa foi levada a se ocupar dos detentos e a lhes proporcionar trabalho. Pede-se à Sagrada Família encarregar-se deles. Madre Emília submete esse novo apostolado à aprovação do Bispo de Rodez (L 620, M 394-396). A Dom Giraud, bispo de Rodez. Villefranche, 10 de abril de 1840. J.M.J. Exmo. Sr. Bispo: Padre Cazals, capelão dos prisioneiros, apresentou a uma de nossas Irmãs rodeiras o desejo de encontrar uma pessoa que lhe comprasse estopa para dar trabalho a uma dúzia de mulheres detentas e que essa pessoa lhes distribuísse o trabalho, cuidasse para que tudo fosse feito e o vendesse ou o fizesse vender, para que o apurado fosse dado a essas pobres infelizes. A Irmã, seguindo seu zelo, disse-lhe que se encarregaria de boa vontade dessa tarefa e me comunicou o caso. Consultei Padre Blanc e ele me deu sua aprovação. Várias senhoras ricas e caridosas, sabendo que assumiríamos esse trabalho, ficaram muito satisfeitas. Querem também que prestemos o mesmo serviço aos detentos, o que tornaria nosso trabalho bem maior. A Irmã rodeira não seria suficiente, mas como temos as Irmãs das escolas, podemos facilmente fazê-lo. Padre Blanc pediu-me que lhe falasse, desejando também que só se faça o que for aprovado por V. Exa., pois, mesmo que essa obra seja boa, não podemos assumi-la a não ser conforme a vontade de Deus que nos será manifestada pela sua. O estado de nossos pobres detentos é digno de piedade. Depois da morte de uma santa religiosa que cuidava deles,1 não têm ninguém. Estão sem trabalho e o pedem, mas em vão. Se V. Exa. nos permitir socorrê-los, procuraremos amenizar-lhes a sorte o mais que pudermos. Para o cuidado das detentas, comprometi-me sem o 137 528 Elas foram transcritas para um caderno de felicitações Quanto às respostas do senhor Bispo, foram deixadas no armário da mestra de trabalho, o qual servia também de biblioteca. Saúdo-a afetuosamente e sou toda sua. Irmã Emília. 162 Encorajamentos delicados e espirituais à Irmã Françoise Pascal, que estava muito sofrida. Para a comunidade de Aubin, recomendações sobre o respeito e a caridade mútuos (L 619). À Madre Françoise, em Aubin. Villefranche, 2 de abril de 1840. J.M.J. Minha muito querida Madre: Fiquei muito penalizada por vê-la aflita. Recomendo-lhe colocar todos os seus sofrimentos aos pés da cruz e aceitá-los num total abandono à vontade divina. O que lhe é tão amargo no momento se tornará doce. Tenha coragem e não se feche em si mesma, mas considere os sofrimentos que nosso Salvador enfrentou por nós. Gostaria imensamente de ter falado com todas as nossas Irmãs e dizer-lhes palavras encorajadoras antes de minha partida, mas, como isso não foi possível, peço-lhe de todo o meu coração de cuidar particularmente da prática da caridade, a fim de que não se fique observando o comportamento umas das outras, nada dizendo que possa desmerecer umas às outras, mas respeitando-se mutuamente. Irmã Appolonie deseja ficar com as galochas de Irmã Charité. Peço-lhe que o permita. Toda sua. Irmã Emília. NOTAS DA PRIMEIRA SECÇÃO _______________________ (1) DF 87, 126; 132 (= texto citado). (2) Essa conversão constou, sem dúvida, da passagem de uma honestidade moral de aspecto um tanto "filosófico", à prática religiosa explícita. A irmã de Emília, da qual se trata em seguida, Eléonore (1789-1833), desposou em 1811 o doutor Colomb e teve sete filhos, dos quais uma filha que foi aluna interna na Casa-mãe. HC 1832; C 396. (3) A este capítulo corresponde um original de Santa Emília (Ms aut 2-4, reproduzindo a coletânea de cartas V 251-258) que, entretanto, não lhe é literalmente idêntica. É possível que ela tenha escrito e ditado a mesma coisa, em termos um pouco diferentes, mas também se pode supor que Padre Fabre tenha retocado o autógrafo. Essas modificações, qualquer que tenha sido sua origem, esclarecem o estilo escrito de Santa Emília sem lhe alterar o sentido nem mesmo o caráter familiarmente confidencial. Não há, pois, razão para salientar o pormenor. Assinalemos somente que vários parágrafos de autógrafos se encontram em A cap. 1 (trecho começando por: “O espírito de misericórdia estava com ela”... e termina por: “... muito aliviados e até curados”). A última frase do autógrafo permanecia inacabada: “Ela mesma preparou o algodão que lhe deveria servir...”. O presente capítulo substitui as palavras omitidas e em seguida fornece dados inteiramente novos. (4) Emília ainda não tem dez anos. Já “conhece” a Deus pelo seu catecismo, mas o fervor afetivo e mesmo, ao que parece, o recolhimento contemplativo ultrapassam nela uma ciência que se desenvolverá, sem nunca atingir uma técnica muito acentuada. Esse parágrafo e os seguintes dão um esboço das orientações essenciais de sua vida moral e religiosa: delicadezas divinas de ordem contemplativa (freqüentemente por ocasião dos sacramentos); exercício das “obras de misericórdia”; intervenções providenciais de ordem material. Apesar da diferença de pessoas e circunstâncias, somos levados espontaneamente a aproximar essas confidências às de Santa Teresa de Lisieux, relativas à sua infância. (5) Marianne ou Marie-Anne, da mesma maneira, um pouco mais abaixo, Dulac ou du Lac, os nomes próprios têm às vezes uma ortografia diferente de um documento para outro. (6) Não pudemos identificar mais exatamente esse livro. 138 (7) A senhora François Lenormant de Bussy era irmã da senhora de Rodat. HC 1804. (8) Sobre o lugar dado à Bíblia na cultura espiritual no século XIX cf. DS V 966: “Independentemente da atividade das sociedades bíblicas protestantes (D. ROBERT, Les Eglises réformées de France, 1800-1830, Paris, 1961, p. 253-255, 422-429), a difusão da Bíblia em francês atingiu uma amplitude inesperada. Entre 1781 e 1850, as edições comentadas ou não de Maistre de Sacy, de Vence, de Carrières, de Genoude, chegaram a umas vinte, enquanto os Salmos, o Cântico dos Cânticos ou o Novo Testamento continuam a ser editados à parte. “O sucesso das traduções escriturárias comentadas por Guillaume Berthier pode nos indicar utilmente o espaço que ocupava a Escritura nas preocupações dos clérigos ou dos leigos. Com efeito, os Psaumes traduits avec des notes et des réflexions, publicados pela primeira vez em 1785 em 8 volumes, foram reeditados em 8, 6 ou 5 volumes em 1788, 1801, 1817(duas vezes), 1825 e 1831, ao passo que Isaïe traduit avec des notes et des réflexions era publicado em 5 volumes, primeiro em 1788-1789, depois em 1807, 1828, 1840”. V.i. apêndice I, Sagrada Escritura. (9) De 1804 a 1817, aproximadamente. Padre Fabre declara: “Ela se entregava ao santo exercício da oração. Os temas mais comuns de suas meditações eram a Santíssima Virgem, São José, Jesus Bom Pastor, Jesus Salvador das almas, Jesus esposo das almas, a divina Eucaristia. Algumas vezes, porém raramente, ela se servia de um livro intitulado: le Chrétien intérieur.” DF 11. Jean de Bernières-Louvigny (1602-1659) exerceu uma influência profunda pela sua irradiação mística em Caen, onde ele viveu e em Nouvelle-France, onde tinha relacionamentos pessoais com vários missionários. Foram publicadas quando ainda em vida mas sobretudo depois de sua morte, suas notas íntimas e suas cartas. A história das primeiras edições, bastante movimentada, nem sempre honrou aqueles que as forneceram, a tal ponto que, finalmente, o livro intitulado le Chrétien intérieur foi colocado no Índex em 1690, tendo ficado o pensamento de Bernières, sem dúvida, desfigurado. Entretanto, surgiram nos séculos XVIII e XIX várias reedições. DS II 1521-1527. (10) Santa Teresa de Ávila foi bastante apreciada na França no século XIX (DS V 967-968). Entretanto, as reedições da tradução feita no século XVII por Arnaud d’Andilly começam apenas em 1818. Antes dessa data, Emília pôde servir-se de uma edição antiga. Sem dúvida, ela leu a Doctrine spirituelle du Père Berthier, du Père Surin, du Père 527 dormem e recreiam. As aulas de Santa Maria são na sala das mestras de disciplina e essas estão na grande sala onde era outrora o noviciado. A experiência nos mostrou ser impossível fazer a experiência de sua vocação levando um tipo de vida diferente daquele que elas terão. Agora que estão separadas, saem, visitam os doentes (as noviças também). Em geral, essa obra é bem aceita. Nossas Irmãs têm boa vontade e zelo, o que me dá muita consolação. Visitam mais de quarenta doentes, levando-lhes alguma coisa. Damos o quanto podemos, mas como nossas posses não são muitas, nossa disponibilidade também não o é. Damos pouco, mas sempre de coração, e seria o caso de dizermos que é o óbolo da viúva pobre. Nossas alunas semi-internas consideram como uma recompensa acompanhar nossas Irmãs em suas visitas. Duas dentre elas, de mais ou menos oito anos, diziam à sua mãe: “Mamãe, durante alguns dias, só queremos pão para o almoço e depois dê-nos três centavos para a visita aos doentes.” (Só permito levá-las quando querem dar esmolas.) Uma terceira, que só tem seis anos, guardou o centavo dado por sua mãe para comprar um pequeno patê e assim ter três centavos para levar aos pobres, e alegremente comia seu pão seco, enquanto a irmãzinha, ainda muito criança para perceber o pequeno sacrifício feito pela irmã, comia seu pequeno patê com muito gosto. Vejo isso com singular prazer. Espero muito de crianças ou de um adulto nos quais vejo uma grande afeição pelos pobres. Irmã N. agradece as orações feitas em seu favor. Agradece de todo o coração e pede que continue a recomendá-la a Deus porque tem muita necessidade. Ainda não terminamos nosso Regulamento para as alunas, porque os Regulamentos e as Constituições de nossas Irmãs educadoras tomaram nosso tempo. Mas logo que terminarmos o nosso, tenha certeza de que não será a última a ser servida. Irmã Laurent pede que lhe envie as cartas que escrevemos a Dom d'Hautpoul quando estivemos na casa da senhora Arnaldy, como também a resposta de Sua Excelência. Ela procura fazer a relação do que se passou de mais interessante em nossas diversas fundações e, para terminar a de Figeac, essas cartas lhe são absolutamente necessárias. Irmã N. lhe dirá onde estão. 526 Nossa querida Irmã Thaïs desejava e pedia, havia mais de um ano, para ser enviada a Decazeville a fim de catequizar os ingleses. O que desejava com tanto ardor lhe foi permitido, e Madre Pacôme a substitui em Montbazens na administração da casa. Com a transferência de Irmã Thaïs para Decazeville, chamamos Irmã Symphorienne para ajudar em Montbazens. Essa jovem Irmã está apta a ensinar. Agora, nossa escola de Decazeville está bem provida, nela há organização, Madre N. administra com uma prudência e uma sabedoria bem superiores à sua idade. Sob todos os aspectos, essa comunidade vai bem. Como o número de alunos era bem elevado para as Irmãs que aí trabalhavam, fomos obrigadas a enviar para aquela casa nossa Irmã Palémon que queria ser clausurada. Em Cadour, elas eram apenas duas, após a partida de nossa querida Irmã Anastasie. Não tendo Irmãs para as escolas, tivemos de transferir Irmã Théodule. Em toda parte, pedem-nos escolas e nós não temos Irmãs. Peçam ao Pai de família para enviar operários à sua vinha. Li com muito interesse as cartas das duas jovens aspirantes. Parece que não são economicamente carentes. Cuidem delas a fim de que, se é vontade de Deus, venham para o Instituto da Sagrada Família. Para proporcionar a sua glória, temos grande necessidade de pessoas e, como você sabe, as boas vocações são raras. Como tudo que vem da Casa-mãe lhe interessa de maneira toda particular, temos a alegria de dizer-lhe que, no dia da festa da Purificação, tivemos uma cerimônia de Irmãs das escolas. Eis os nomes delas: Célestine Calmels, agora Irmã Anne-Marie; Brigitte Scudier, Irmã Marie Mélanie; Julie Grèzes, Irmã Marie Damien; Marie Souyri, Irmã Marie Claver. As Irmãs Procule e Léontine fizeram a primeira profissão. Esperamos realizar outra cerimônia para as escolas no dia 3 de maio, ou talvez antes. Recomendamos às suas orações aquelas que participarão dessas cerimônias. No dia da Epifania, separamos as postulantes que se destinam às escolas. Elas têm um noviciado à parte e também observam pontualmente seu regulamento. Só se reúnem com as noviças clausuradas para assistir às aulas de gramática e de cálculo. Moram na Casa São Luís, aí fazem as refeições, 139 Saint-Jure, de M. d’Orléans de La Mothe e de sainte Thérèse, cuja segunda edição foi publicada em 1803. (V.i. apêndice II, Padres da Igreja e autores clássicos de espiritualidade); cf. 1. 1. (11) Nos dois cadernos manuscritos (Tauriac p. 27, Baldeyroux p. 26), lê-se neste lugar: “e também um pouco de relaxamento que percebi na comunidade”, com uma nota explicativa: “ela era dirigida naquele momento por uma superiora que havia perdido o espírito de seu estado.” Foi por inadvertência que a edição de 1958 omitiu essas linhas. (12) Alusão evidente à decisão de Pe. H. de Launay. AUB 66-68; HC 1809. No dia 21 de novembro de 1809, Emília emitiu os votos privados de religião (DF 15); em janeiro de 1810, redigiu a Ata que reproduzimos abaixo (Documentos anexos...1). (13) Os cadernos manuscritos trazem uma nota também presente na edição de 1958: “Desde a Revolução, a Sé episcopal de Rodez estava vacante e a diocese era regida pelo bispo de Cahors.” (14) Cf. Documentos anexos... 2: Crônicas para os anos de 18161817. (15) A antiga visitandina deixou para as religiosas uma biblioteca espiritual que L. Aubineau catalogou de maneira bastante imprecisa: “les Constitutions, le Directoire et le Grand Coutumier de la Visitation, les Petites Coutumes d'Annecy, les Réponses et les Epîtres de la Sainte Mère de Chantal; um vol. in- 4º de lettres circulaires; les Vies de quatre premières Mères de la Visitation pela R.M. Madeleine de Chaugy; le livre des Chapitres; les Vrais Entretiens de saint François de Sales; la Vie de saint François de Sales, pelo seu sobrinho Charles-Auguste; la Vie de sainte Chantal, etc.” – AUB 96 (1); cf. Apêndice, II, “Livres de la Visitation”. (16) Cf. Documentos anexos...3: Crônicas para os anos de 18171820. (17) Esse capítulo está parcialmente duplicado por um autógrafo sem título, escrito, sem dúvida, por volta de 1843 (Ms aut 5-7, que reproduz as páginas 341-347 da coletânea VI das cartas; cf. bibliografia, documentação não-impressa (18). Começa por: “Tentações contra a fé...” e termina por: “lhe é estranho”). Nesse sentido, Padre Fabre relata em suas “cadernetas”: “Essas tentações eram tão violentas, tão tenazes e tão contínuas que pensei não poder eu mesmo expressá-las, e lhe pedi que as escrevesse, o que ela fez” (CF 5). Os últimos parágrafos do capítulo 10, narrados sem dúvida, não são, entretanto, menos duros do que o início. Mas quando, por sua vez, Pe. Fabre ditou suas próprias anotações, sentia-se mais livre para falar. Com efeito, durante sua vida, Madre Emília havia 525 140 feito tudo para ocultar seu sofrimento. Seu confessor declara a esse respeito: “Ela me disse um dia: 'Compreendo o suplício da alma condenada à separação do seu Deus...' Nesse estado lamentável, Madre Emília encontrava bastante força para repelir todos os ataques do demônio e ocupar-se dos seus trabalhos ordinários. 'O cuidado das Irmãs', dizia-me, 'me custa muito.' Entretanto, não cessava seus entretenimentos em público e em particular. Falava-lhes com um semblante sorridente, com uma expressão de bondade sobre as virtudes cristãs e religiosas, sobre as verdades da fé, sobre a confiança em Deus, sobre os exercícios de piedade cristã e, coisa admirável, nessas exortações falava com tanto ardor e unção, que suas filhas, as religiosas, pensavam que sua alma estivesse inundada de consolações. Quando, após a morte da Madre, me foi permitido fazer-lhes conhecer o estado de provação no qual tinha vivido sua Superiora, elas derramaram torrentes de lágrimas.” DF 78; DL 155. Observam-se aqui, como para o 2º capítulo (acima, nota 3), algumas diferenças entre as duas versões: a religiosa falava dela mesma na 3ª pessoa (sem dúvida para salvaguardar o anonimato em qualquer eventualidade). Padre Fabre transpõe para a 1ª pessoa que é sempre usada na Autobiografia. O texto original tem talvez alguma coisa de mais irregular, por ter sido expresso de modo vivo e dramático, para que não fosse omitido pelo confessor. (18) Somente algumas palavras para comentar essas linhas comoventes. Sua sinceridade não causa nenhum problema. Descreve uma situação que se prolongou por trinta e dois anos, mas que estaríamos enganados ao imaginá-la como monolítica, por assim dizer. Ordinariamente, a provação dava uma pequena trégua à Madre por ocasião de suas fundações fora de Villefranche (cf. também as notas 21, 31, 34). Recentemente, não se hesitou em comparar o caso de Santa Emília com os de alguns grandes “desolados” dos quais a história da espiritualidade guardou o nome: os santos João da Cruz, Paulo da Cruz e Afonso de Ligório, Santas Joana de Chantal e Teresa do Menino Jesus (DS III 631-639). O autor dessas comparações esboçou em seguida uma reflexão sobre essa questão da teologia espiritual (639-645). Convém com certeza, e não somente para as necessidades de análise, considerar diversas modalidades e finalidades de um tal desamparo. Concretamente, quando é vivida por longo tempo, os elementos assim distintos devem se emaranhar e às vezes se sobrepor. Permitam-nos referir-nos aos Exercícios Espirituais, de números 317-322, e aos comentários que foram feitos, por exemplo, por G. FESSARD, La Irmã Emília. 161 Feliz por ter podido proporcionar mais regularidade nas diversas casas, durante suas visitas e pela promulgação do Regulamento das escolas, tirado das Constituições, Madre Emília dá notícias. Relata, também, a abertura do noviciado das escolas e as atividades das Irmãs não-clausuradas: visitas aos doentes das quais as alunas participam muitas vezes (L 618, M 390-394). À Madre Vincent, em Figeac. Villefranche, 25 de fevereiro de 1840. J.M.J. Minha muito querida Madre: As orações que lhe pedi produziram seu efeito. Continue, a fim de que aquilo que foi começado com tanto sucesso se mantenha e seja sempre melhor. Estou satisfeita com minha viagem. O fervor, o zelo e a boa vontade de nossas queridas Irmãs das escolas me consolaram muito. Eu me regozijo que o bem se faça e que Deus seja conhecido e amado. Asseguro-lhe, minha querida Madre, que nossas Irmãs me dão muita consolação. Elas amam os doentes, têm prazer em vê-los e lhes oferecer algumas guloseimas. Madre N., particularmente, é toda dedicada a seus doentes. Graças a Deus, todas as Irmãs partilham seus sentimentos. O bem que fazem é incalculável. São amadas e respeitadas. Atualmente, nossas escolas de Montbazens e de Lugan têm o aspecto de uma casa religiosa. Há um parlatório, ninguém entra, todos os exercícios são anunciados por um sino. Enfim, têm o aspecto de um convento, enquanto que antes nada ou quase nada se percebia. Durante mais de uma semana, ia todos os dias de Lugan a Montbazens, e isso, longe de prejudicar a minha saúde, fazia-me muito bem. Sinto-me melhor do que algum tempo atrás. Embora trabalhasse muito, não tinha doença. Ao contrário, dormia melhor e minha digestão se fazia com mais facilidade. Levantávamos muito cedo para ir à santa missa, apesar do frio intenso, isso não nos incomodava. 524 Irmãs, que a morte súbita do nosso superior nos impediu de retocar e de amadurecer, pela reflexão e pela experiência, os diferentes artigos que o compunham. Para vocês ele será, pois, precioso, porque nele reconhecerão o espírito e as máximas de nosso santo fundador. Para vocês ele o será ainda por estar autorizado pelo Sr. Bispo, que muito se interessa pela boa organização de nossas escolas. Esse Regulamento será para vocês o livro de vida. Gostarão de lê-lo e de pautar por ele sua conduta, bem persuadidas de que da exatidão em observá-lo depende o grau de glória que lhes está reservado no céu. Como é consolador para uma religiosa que ama sua consagração e que deseja cumprir suas obrigações, poder testemunhar que a todo momento ela cumpre a santa vontade de Deus! A vantagem do Regulamento é fixar irrevogavelmente o tempo e a duração de cada exercício, proporcionando em todas as nossas escolas esta útil e agradável uniformidade que o espírito ou, se o quiserem, o amor à nossa santa vocação torna indispensável. E o que seria de uma religiosa que só quisesse se submeter às suas idéias e inclinações? Estaria bem longe de realizar o fim a que necessariamente se propôs renunciando ao mundo, abraçando uma vida de mortificação e de penitência que a torna semelhante a Nosso Senhor Jesus Cristo. Não é verdade, minhas queridas Irmãs, que vocês querem ser suas dignas imitadoras? Podemos esperar que esse Regulamento, objeto de seus justos anseios, será para vocês um momento de renovação e que lhes proporcionará uma grande ajuda no cumprimento de suas santas funções? Sim, é bom acreditar nisso e esperamos da parte de vocês zelo e docilidade. Por que não o fariam, uma vez que nele encontrarão a expressão da vontade de Deus manifestada pelos superiores! A Sagrada Família, à qual temos todas a inestimável felicidade de pertencer, as cobrirá com a sua benevolente proteção para ajudá-las a observá-lo com fidelidade e fazer reinar entre todas esta união e esta terna caridade que é a preciosa característica pela qual são reconhecidos os verdadeiros discípulos de Jesus Cristo. Nós as saudamos com os sentimentos da mais íntima e mais cordial afeição e estamos unidas a vocês no amável Coração de Jesus. 141 Dialectique des Exercices spirituels de saint Ignace de Loyola, Paris, Aubier, 1956, 240-246, ou por Fr. ROUSTANG, Une Initiation à la vie spirituelle, Paris, Desclée De Brouwer, 1963, ch. 4. Isso, sem prejuízo, certamente, para os mestres assinalados pela bibiliografia de DS III 645, com os estudos a seu respeito. No tocante à própria Santa Emília, as reflexões de G. BERNOVILLE, op.cit., 129-147, apresentam preciosas nuanças. Nos primeiros tempos, Padre Marty não teve nenhum poder para tranqüilizar sua penitente. Mais tarde, porém, ele devia estabelecer por correspondência uma direção muitas vezes compreensiva e profunda. (Documentos anexos... 10). A partir de 1841, o Padre P.M. Fabre seria também um bom conselheiro. Notemos enfim, os intercâmbios entre Santa Emília e uma carmelita, Madre Marie-Thérèse de Saint Augustin (Documentos anexos...11). (19) Leopoldo-Alexandre, príncipe de Hohenlohe-WaldenbourgSchillingsfurst, nascido em Kupferzell, perto de Waldenbourg em 1794; falecido em 1850. Ordenado sacerdote em 1815. Eram-lhe atribuídos dons taumaturgos. Escreveu vários livros de espiritualidade. Tudo não parece inteiramente digno de fé naquilo que por certo tempo o fez famoso. (20) Louis-François Brassat-Murat nasceu em Aubin, em 1750. Sua reputação “era européia”. “Era consultado, pode-se dizer, por todas as partes do mundo.” Entretanto, ficou confinado em Aubin, dedicandose a todos e aí morreu em 27 de março de 1829. AUB 148 (1). (21) O estado de rejeição e de tentações não é, pois, exclusivo de graças “substanciais”, das quais Madre Emília pode ter um conhecimento reflexivo (v.s., nota 18). DF 120. (22) Trata-se sem dúvida des Relations de la vie et de la mort de quelques réligieux de l'abbaye de la Trappe, escritos pelo Abade de Rancé. AUB 156; Cf. apêndice, II. O texto escriturário citado um pouco mais abaixo é tirado do Cântico dos Cânticos, 1,6. (23) Padre Imbert foi ordenado sacerdote em 1821. Encontramo-lo sucessivamente como vigário de Saint-Céré, vigário de Théminettes, professor no Colégio Real de Avignon (ele o abandona por se ter recusado em consentir, em 1828, regulamentos de tendência anglicana), vigário de Saint-Thomas (ou Igreja do Carmo) de Figeac. Morreu em Saint-Céré, em 1865. AUB 297 (1). (24) Cf. Documentos anexos...4: Detalhes sobre a fundação de Montauban-Sapiac. (25) Essas religiosas são provavelmente de Picpus, HC 1832. De fato, só os Padres de Picpus se estabeleceram em Graves, em 1848. HC 523 142 1848, FR 8. (26) Cf. FR 5: “A Misericórdia: fundada em 1696 e confiada às Damas de Nevers para a distribuição domiciliar de assistência aos “pobres doentes rejeitados.” Ela foi fundada com o hospital SaintLoup, em 1749. Em 1780, tomou o nome de Hotel da Caridade e, em 1796, o nome de Casa da Beneficência; foi vendida em 1853. Madre Emília faz várias alusões às Irmãs da Misericórdia que entravam na Casa para cuidar dos doentes”. HC 1847: Trata-se aqui da maneira como as Irmãs de Nevers tomaram em 1847 a iniciativa de abrir também uma escola, apoiadas pelos vigários de Notre-Dame e de São José. (Pe. Alric e Pe. Turq), e sem pedirem a autorização episcopal. (27) São Bento-José Labre (1748-1783) permanece célebre por suas intermináveis caminhadas de peregrino mendicante e penitente, sobretudo na Itália. Sua reputação de santidade espalhara-se já antes de sua beatificação, em junho de 1859. Cf. Documentos anexos... 8, 90ª questão. (28) Talvez uma citação um pouco inexata do Salmo 79 (80), 6: “Cibabis nos pane lacrymarum, et potum dabis nobis in lacrymis in mensura”. (= “Vós o nutristes com o pão das lágrimas e o fizestes verter um precioso pranto”). (29) Cânticos dos cânticos, 3, 1. (30) Sublinhamos essa importância do “exame”. Pode-se sempre objetar que Santa Emília se deixa levar demais por uma inclinação perigosa à introspecção; mas, além do nosso bom senso psicológico, os santos vêem no exame o meio privilegiado de purificação da consciência: reprovação lúcida de si, em relação com o sacramento da penitência. DS IV 1789-1838. (31) Esse "comentário" é uma forma espontânea do que Santo Inácio de Loyola chama “segunda maneira de rezar: contemplar o sentido de cada uma das palavras de uma oração”. Exercícios espirituais, nn 249-257. Aqui ainda, vemos misturarem-se anotações relativas a uma oração aparentemente fácil, com alusões às horas de grande aridez. Lemos, com efeito, nos depoimentos de Padre Fabre: “Tornara-se estúpida, por assim dizer, não compreendendo nada em nenhum livro escrito em francês. Padre Marty, para ocupar seu espírito, lhe havia dado para ler os Solilóquios de Santo Agostinho, escritos em latim, língua que ela ignorava. Para obedecer, contentava-se em examinar a forma das letras, não podendo fazer outra coisa. Entretanto, não suprimia a menor parte do tempo que tinha prescrito a si mesma para a meditação. Pelo contrário, prolongava-o” (DF 78). É verdade que aqui Santa Emília fala do tempo da missa. (Cf. A cap. 10). (32) Encontram-se alguns trechos e alguns títulos de orações e de desempenharem dignamente a nobre função de instruir a juventude. Lembrem-se, minhas queridas Irmãs, do que está dito no Evangelho: “Que aqueles que ensinam a um ou a vários os caminhos da justiça brilharão durante toda a eternidade como as estrelas do firmamento.” Irmã Emília. 160 Apresentação geral do “Regulamento das Escolas”, fruto da experiência e da reflexão. O mesmo permanece fiel às intenções profundas de Padre Marty. Que ele seja o referencial de uma vida mortificada e ressuscitada em Nosso Senhor (L 617, M 387-390). Às Irmãs de Montbazens e outras comunidades não-clausuradas. Villefranche, 3 de fevereiro de 1840. J.M.J. Minhas muito queridas Irmãs: Há muito tempo sentíamos a necessidade de redigir o Regulamento que diz respeito a vocês. Muitos imprevistos nos impediram de fazê-lo, mas o desejo que expressaram nos levou à conclusão de que todas estavam de acordo sobre esse ponto. Não poderíamos deixar de atendê-las diante das suas insistentes solicitações. Debruçamo-nos seriamente sobre esse importante trabalho e nele nada redigimos que não tenham sido bem refletidos e pesados as vantagens e os inconvenientes. O sentimento mais profundo de respeito e da mais terna afeição que conservamos pelo nosso querido Pai, de quem honramos a memória e veneramos as virtudes, nos levou a afastar-nos o menos possível do cerne do Regulamento que ele nos deu. Se vocês nele encontrarem alguma mudança, temos ao menos a satisfação de poder dizer-lhes que não nos afastamos em nada de suas primeiras intenções. Pelo contrário, assumimos o dever santo e sagrado de segui-las, quando ele mesmo nos autorizou a nele fazer as modificações e acréscimos que julgássemos convenientes. Vocês sabem, minhas queridas 522 143 Procure fazer o sacrifício da carta de seu primo que queimei para que você não ficasse perturbada. Ano de 1840 159 A superiora geral comunica a todas as casas não-clausuradas um trecho das Constituições que diz respeito a seu modo de vida e fazendo continuação ao regulamento elaborado para elas (L 613, M 381-382). Às Irmãs de Lugan e outras casas de escolas. Villefranche, 8 de janeiro de 1840. J.M.J. Minhas muito queridas e bem-amadas Irmãs: Sempre preocupadas com sua felicidade e buscando com cuidado tudo que pode contribuir para o bem e o progresso de suas almas, apresentamos tudo que poderia lhes convir em nossas Constituições. Apresentamos esse trecho ao nosso digno Bispo, que o aprovou e o carimbou. Nós os enviamos hoje, minhas muito queridas Irmãs, com a doce confiança de que será recebido por vocês com profundo respeito e como vindo do próprio Deus. Por muitos motivos ele lhes será caro e precioso tanto mais caro por ser o trabalho de nosso bem-aventurado Pai, e tanto mais precioso por ser para vocês a expressão da vontade do Senhor. O regulamento que receberam lhes causou, sem dúvida, uma grande alegria. Desejamos que aconteça o mesmo com esse texto e que, por sua fidelidade em cumprir escrupulosamente todos os seus artigos, vocês provem a Deus seu amor e seu reconhecimento. Anexamos a esta expedição a fórmula dos votos, tal qual o Bispo1 acaba de aprová-la e que ele mesmo redigiu. O novo compromisso que fizeram consagrando-se aos cuidados da infância será para vocês um impulso mais do que suficiente para redobrarem o zelo e a boa vontade a fim de cânticos, sem dúvida particularmente amados por Santa Emília, nos Documentos anexos... 5. (33) Nascimento de Santa Emília: 6 de setembro de 1787; entrada na vida religiosa: 30 de abril de 1816 e tomada de hábito, em 1º de maio. Os votos do 6 de abril de 1817 parece terem sido apenas temporários: a profissão perpétua realizou-se em 8 de setembro de 1820. (34) Ainda uma “inconseqüência” no desenrolar das provações espirituais. Sobre certas manifestações exteriores do recolhimento contemplativo de Madre Emília, cf. DA 56-57; P 12, 13, 17, 18. Aconteceram muitas vezes por ocasião dos sacramentos da penitência e da eucaristia e na meditação da Paixão (diante de um quadro do Ecce Homo; durante a Via-Sacra). Cf. Pos, 2º fascículo, 496-500 e 508-511. (35) A Madre contraiu sua surdez em janeiro de 1824, por ocasião de uma viagem a Aubin, empreendida por ordem de Pe. Marty. Sobre suas freqüentes doenças, consultar, por exemplo, AUB 127-131; CF 64. Santa Germana Cousin nasceu perto de Toulouse, em Pibrac, pelo ano de 1579, e aí morreu em 1601, depois de uma vida de camponesa pobre, tecida de sofrimentos, de humilhações e de bondade. Em 1644, seu corpo foi encontrado intacto. Um processo canônico começado em 1700 não terminou antes da Revolução. O culto que lhe prestavam não cessou, mas a causa foi retomada somente em 1843. Beatificação: 7 de maio de 1854; canonização: 29 de junho de 1867. Cf. Documentos anexos...8, 57ª e 89ª questões. (36) Pode-se ler um certo número dessas cartas mais adiante, Documentos anexos...10. (37) A propósito desse incidente, cf. HC 1842; DL 158; AUB 394. (38) Belo exemplo do desinteresse e do abandono à Providência por parte de Santa Emília, por ocasião das dificuldades fomentadas pela indelicadeza de um advogado: Documentos anexos...6. Testemunhos diversos sobre essas virtudes na Pos 2º fascículo, 144-149. (39) Talvez se trate de Irmã Vincent Vacquié (1804-1880), várias vezes superiora em Aubin e em Figeac, assistente em Villefranche, de 1846-1851. Irmã Foi Bousquet foi assistente somente a partir daquele ano (Cf. notas da introdução, 26). Sobre as dificuldades criadas contra Madre Emília por seu conselho, durante os cinco ou seis últimos anos, cf. HC 1846; DL 169-170. (40) Sobre a extrema docilidade de julgamento e de vontade manifestada por Santa Emília, ver, por exemplo, (CF 13-15; DF 107112; Pos, 2º fascículo, 454-469. Cf. também os testemunhos dos cônegos Barthe e Abbal, HC 1845 e 1846). (41) Sobre a temperança quase milagrosa da Santa, cf. Pos, 2º 521 144 fascículo, 379-416. (42) Muitos testemunhos atestam multiplicações de víveres e, às vezes, de dinheiro, por exemplo, Pos, 2º fascículo, 527-536. (43) Sabe-se em que circunstâncias dramáticas foi obtida a graça dessa profissão de 8 de setembro de 1820; Br 151-153; HC 1820. O voto de ensino será reconhecido pelas Constituições aprovadas em 1832 (nº 319: “A superiora geral faz o voto de ensino para toda a Congregação, e a superiora local para a sua comunidade”), depois suprimido em 1846. Um empreendimento feito em 1857 para seu restabelecimento não teve êxito. (44) Trata-se de Madre Marie-Thérèse de Saint-Augustin, conhecida de Santa Emília desde 1835 e que lhe escreverá cartas das quais publicamos abaixo alguns fragmentos: Documentos anexos...11. (45) Desde muito tempo, Emília gostava de invocar a Santíssima Virgem sob o título de “divina Pastora”. Dedicou-lhe um oratório no convento de Villefranche. Esse título pode parecer-nos um pouco chocante ou pelo menos antiquado. Entretanto, não devemos ceder nisso ao escândalo dos fracos. Cf. A cap. 6; Br 330-351. A respeito dos cânticos em geral (cânticos “espirituais” ou cânticos “populares”) pode-se notar: “Haverá sempre espíritos que serão tão privados do senso do verdadeiro, que pensarão ter realizado tudo o que um instante os encantou... Mas para os outros, que sentiram o que um alto e claro pensamento contém de virtualidade, é preciso persuadi-los a cantar esses cânticos que lhes vêm como apelos à vida plena e rica, à bela vida cristã... “... Então esses sentimentos de fervor que ultrapassam as disposições reais ou pelo menos habituais da alma, não virão como uma germinação sem enraizamento nessas existências de cristão medíocre. Eles revelam e despertam as possibilidades desta graça que, no batismo, ficou infundida em nossa natureza para fermentá-la divinamente.” (DS II 115). (46) Senso da justiça divina, pensamento sobre a morte, aspiração aos motivos de um amor mais puro. É na integral e harmoniosa complementaridade de tais disposições que se constitui realmente uma espiritualidade pouco suspeita de angelismo abstrato. Isso tanto mais que esses sentimentos se manifestam por ocasião de um negócio sério. (47) Cf. DM, 7, a propósito desse mesmo dia, quando Pe. Fabre pede à moribunda para terminar sua narração: “Resta-me muito a dizer, responde essa doce Madre. O que desejo sobretudo fazer conhecer é a minha juventude, para que os jovens do mundo compreendam todos os perigos nos quais eu quase naufraguei. (48) A quem se escandalizasse com tais declarações, poder-se-ia sem 158 Censuras feitas com aflição, mas com doçura e de modo construtivo, em resposta a uma carta escrita sob o ímpeto da paixão (L 605, M 362-363). A uma Irmã. Villefranche, 7 de maio de 1839. J.M.J. Minha caríssima Irmã: Sabendo da terna afeição que lhe tenho, você tinha muita razão de pensar que sua carta me penalizaria. Causou-me um desgosto tão vivo e tão profundo que o suportaria de bom grado se com isso pudesse lhe ser útil. Só posso rezar, o que farei de todo o coração. As orações das mães são muitas vezes atendidas. Serei feliz se as minhas pertencem a esse número. Volto à sua carta. Meu Deus, como ela me aflige! Entretanto, prefiro pensar que você a escreveu num momento de paixão, e que a sua imaginação, bem mais do que sua vontade, conduziu a pena. Queira, minha muito querida e bem-amada Irmã, esforçar-se para conhecer melhor o preço de sua alma. Se as aflições que você experimenta se fazem sentir tão vivamente por um pouco de tempo, que será das penas de uma eternidade? Aliás, supondo que dissesse preferir ser feliz nesse mundo e infeliz no outro, você se enganaria nesse raciocínio pois não encontrará a felicidade longe de Deus. Ele lhe concedeu a graça de chamá-la e fazê-la sua esposa. Se você lhe for infiel, o remorso a seguirá por toda parte e, longe de evitar o sofrimento, você o experimentará mais forte. Espero que tenha melhores disposições e logo mais me escreverá de uma maneira inteiramente diferente. É nessa esperança que sou, com os sentimentos que você conhece, sua Madre muito dedicada. 520 145 que nada conservará de amargura em relação à Irmã Foi, mas, pelo contrário, aproveitará de todas as ocasiões para dar-lhe provas de uma cordial afeição. Toda sua. Irmã Emília. Ano de 1839 157 A vocação de educadora cristã é tão sublime que se deve ao mesmo tempo desconfiar inteiramente de si e confiar totalmente em Deus e, nessa disposição, doar-se à tarefa (L 603, M 377-378). À Irmã Jude, em Figeac. Villefranche, 2 de abril de 1839. J.M.J. Minha caríssima Irmã: Sendo a instrução da juventude um dos nossos principais deveres, nunca saberíamos refletir bastante sobre a excelência dessa nossa vocação, visto que somos chamadas a ensinar o caminho da salvação às jovens inteligências que aprouve a Deus nos confiar. Para desempenhar dignamente tão nobre função, uma Irmã da Sagrada Família deve ter grande desconfiança de si mesma, não se apoiar em seus próprios meios, nem sobre os recursos que sua experiência pode lhe proporcionar. Sua principal ocupação deve ser de rezar a fim de que a semente lançada nos corações que lhe são confiados frutifique e produza frutos de todas as virtudes. Deve alegrar-se, minha querida, em cumprir essa tarefa e nada poupar, nem cuidados, nem preocupações, nem trabalho, nada enfim para cumpri-la com o zelo e a fidelidade que Deus lhe pede.1 Eu a saúdo com muita afeição e sou toda sua. Irmã Emília. Se estiver bem persuadida do que lhe digo, não pensará em mudar de casa. dúvida fazer ler um grande número de confidências semelhantes, emanadas das mais santas personagens. Citemos pelo menos esta passagem de um escrito, onde Santo Inácio de Loyola anota ordinariamente para seu uso pessoal evidentemente, os grandes favores místicos com os quais ele é favorecido. É o dia 12 de março de 1544: “Achando-me completamente desprovido de socorro, sem poder ter nenhum gosto nas meditações ou nas Pessoas divinas, tão afastado e separado como se eu nunca tivesse sentido nada a seu respeito ou nunca mais devesse sentir, mas ao contrário pensamentos vindos ora contra Jesus, ora contra um outro, e eu me sentia entregue à agitação de diversos pensamentos: sair de casa e alugar um quarto, evitar o barulho ou abster-me de comer, ou recomeçar as missas, ou colocar o altar num andar superior...” Journal spirituel, traduzido e apresentado por Padre GIULIANI, Paris, Desclée De Brouwer, 1959, p. 96. (49) Padre Marty respondeu a essa pergunta: “Não, você não deve, é preciso se desapegar delas. Transfira-as por um tempo para alguma Irmã ou exponha-a em um dos oratórios do convento...” Br 200. As questões 91 e 92 falam muito no seu laconismo: Pe. Marty parece responder a isso numa carta da qual publicamos um extrato: Documentos anexos...10, 14ª questão. (50) Muitos testemunhos evidenciam a caridade de Madre Emília para com os doentes: Pos, 2º fascículo, 289-291; Char 21-23. (51) Is 66, 12. (52) Mt 7, 7. (53) Cf. Ct 2, 3; A cap. 14. Com sua experiência espiritual, Madre Emília não tem certamente necessidade de um método imposto de fora. (54) Rm 8, 6-7. (55) Sl 100 (101), 8. (56) Santo Inácio de Loyola dá diretivas análogas nos Exercícios espirituais, de números 210-217. (57) Ressaltaram-se os progressos que fez realizar na doutrina espiritual de São Francisco de Sales a experiência vivida por Santa Joana de Chantal: DS V 1079-1080 e 1086-1088. O episódio que narra aqui a carmelita foi consignado pela Madre de CHAUGY, Mémoires sur la vie et les vertus de Jeanne-Françoise Frémyot de Chantal; isso se situa em 1641, quando a superiora da Visitação pensa em se demitir do cargo. Ela confia a uma religiosa: "... meu espírito está numa tão má e dolorosa disposição que de todas as tentações espirituais, aflições e aversões das quais me falam minhas filhas, sou de repente atacada por elas. Deus me ensina o que devo dizer-lhes e consolá-las e eu permaneço na minha miséria"(ed. 1865, 466). 519 146 Essas cartas de Pe. Marty e de Madre Marie-Thérèse de SaintAugustin lembram às vezes as de um diretor de consciência, ele também de espírito salesiano e debruçado sobre destinos freqüentes vezes muito provados, Padre J.-P. Caussade, s.j. (1675-1751); cf. suas Lettres spirituelles, publicadas por M. OLPHE-GALLIARD, 2 vol., Paris, Desclée De Brouwer, 1962-1964. pensar pouco e deixar passar as coisas deste mundo como a água no rio. Todos os nossos olhares devem se voltar para o grande empreendimento da salvação. Quando nosso Pai leu para mim a carta de Delagnes escrita para o Sr. Bispo, eu lhe disse que seu conteúdo não estava de acordo com a verdade. Você sabe que isso nos acontece freqüentemente, mas não nos deve preocupar. Aliás, acontece tantas vezes, sobretudo às superioras, serem acusadas injustamente que elas podem facilmente se acostumar com isso. Irmã Emília. Ano de 1838 156 Nos momentos de perseguições ou de simples conflitos com outras pessoas, entrar em nós mesmas para descobrir o que é mais favorável a nos humilhar, diante da verdade que vem do alto (L 601). À Irmã Caroline, superiora em Aubin. 13 de novembro de 1838. J.M.J. Minha muito querida Madre: Finalmente você está tranqüila a respeito do assunto que lhe causou tanta aflição, da qual muito participei. Agora que repousa, procure nada conservar em sua lembrança, e ainda menos no coração, que possa alterar a preciosa virtude da caridade. Lembre-se, pelo contrário, das palavras que teriam podido escapar-lhe sobre tal ou tal pessoa. Encontrei em suas cartas alguma coisa que não me agradou. Concordo que, quando se é vivamente atingida, é difícil conter-se. Mas não devemos nos desculpar porque nosso dever é tudo suportar com paciência. Em vez de considerar o erro que os outros poderiam cometer, pelo contrário, devemos entrar em nós mesmas, humilhar-nos e pedir ao bom Deus que nos esclareça sobre o íntimo de nossa alma. Tenho confiança, minha querida Madre, 518 Sinto muito que Irmã Augustine esteja cansada. Não respondo a ela, mas saúdo-a muito afetuosamente. Diga-lhe que Madre Antoinette vai muito bem, as aulas também. O Sr. Fourgous, que vi um desses dias, disse-me que por ocasião dos exames estavam perfeitamente satisfeitos. Não escrevo à Madre Vincent, mas queira transmitir-lhe minhas afetuosas lembranças. Assim que soube do sofrimento dela, escrevi a Villefranche, pelo correio, para que se enviasse Irmã Félicité. Disse que trouxessem fita de Rodez. Toda sua nos santos Corações. SEGUNDA SECÇÃO Irmã Emília. P.S: Soube com muita satisfação que Irmã Guillemine vai bem. Tarda-me saber o mesmo a respeito de sua saúde. Agradeço à Madre pelo doce. 155 A Madre tranqüiliza sua correspondente relativamente à sua inteira confiança para com ela. É preciso esquecer muito para estabelecer em si o reino de Deus (L 587, M 367-368). À Irmã Thérèse, suplente em Aubin. Villefranche, 20 de outubro de 1837. J.M.J. Minha caríssima Irmã: Asseguro-lhe que você é muito franca e sincera, assim, não se penalize se não posso escrever longamente. Nosso Pai tem a intenção de me chamar a Aubin durante as férias, se Deus nos der vida e saúde. Então, conversaremos à vontade e explicarei o motivo do que lhe disse. Enquanto isso, devolva-me a carta onde existe a palavra “desconfiança”, porque isso a preocupa, e fique bem certa de que confio em você. Leia o artigo sobre a vida interior1 e preste bem atenção que, para estabelecer o reino de Deus em nós, precisamos __________________ A DOUTRINA ESPIRITUAL DA FUNDADORA 517 vive. Sem esses remédios, todo o resto é apenas paliativo que não poderá curar seus males. Afaste-se da idéia de que você não se corrigirá. Ela só lhe é sugerida pelo espírito mau para entristecê-la e mesmo paralisá-la. Minha querida filha, você me falou muitas vezes de uma situação de sofrimento na qual se encontrava com freqüência. Convença-se de que essa falta de paz provém somente da falta de humildade e de obediência. Assim, minha pobre jovem, se quiser experimentar a doçura do serviço de Deus, precisa fazerse esta santa violência que arrebata o céu. Saúdo-a nos santos Corações com muita afeição. Sua Madre muito dedicada. Irmã Emília. 154 Abandono à vontade de Deus por vezes desconcertante. É a isso que deve tender uma doente que um dia compreenderá o significado da sua provação no plano da santidade (L 584, M 366-367). A uma Irmã de Figeac. Decazeville, 7 de setembro de 1837. J.M.J. Minha caríssima Irmã: A confiança em Deus, o abandono à sua santa e adorável vontade, você o sabe, são as disposições nas quais deve entrar o mais plenamente possível. Nosso bom Pai, que nos aflige apenas para o nosso bem, quer que você pertença totalmente a ele e é por isso que a faz participar de sua cruz. Chegará o dia em que você saberá claramente que a doença lhe era necessária e fazia parte do plano de sua santificação. Não tenha medo. Esperemos que este novo acidente não tenha conseqüência; entretanto, aproveite para descobrir que tudo é nada, exceto Deus. A juventude, a saúde, a própria vida nada é, porque tudo passa. Deus só é o único bem e é para ele que devemos tender de todo o nosso coração. A doença é um grande meio de união com ele. Procure nada perder dessa provação. 516 Minha caríssima Irmã: Que lhe direi senão de bem escutar interiormente estas palavras de nosso divino Salvador: “Quem quiser vir após mim, renuncie a si mesmo, carregue sua cruz todos os dias de sua vida e me siga.”1 Felizes as almas que compreendem essas palavras e muito mais felizes as que as põem em prática. Na verdade, para isso é preciso sofrer, mas esse sofrimento é precioso porque une a Deus. É preciso renunciar às suas comodidades, que são substituídas pelas alegrias interiores. É preciso submeter-se aos outros, mas é assim que se adquire a liberdade dos filhos de Deus. É preciso fazer-se violência, mas essa violência arrebata o céu. É preciso continuamente combater contra si mesma, conseqüentemente se obtém uma coroa imortal. Assim, a maior felicidade que possamos ter é caminhar de bom grado sob o estandarte da cruz, em união com nosso dulcíssimo Jesus que quis carregá-la por nós. Peça essa graça para você e para mim, e acredite que sou para sempre nos santos Corações, sua Madre muito dedicada. Irmã Emília. Ano de 1837 153 Compreensiva e firme exortação à humildade para uma postulante que ainda não goza de paz interior (L 578). A uma postulante. Villefranche, 6 de junho de 1837. J.M.J. Minha muito querida filha: Compartilho sinceramente seus sofrimentos do corpo e da alma. É preciso suportar uns e outros com paz e resignação, ser muito mansa e humilde com todas as pessoas com quem você REGULAMENTOS PRIMITIVOS ______________________ 1. Primeiro regulamento e ordem do dia para as religiosas A respeito das “obras” de Santa Emília, Irmã Laurent Belloc depõe: “A Madre escreveu apenas algumas notas curtas, em forma de crônicas, sobre seu Instituto, pequenos regulamentos provisórios para a conduta das Irmãs, nos primórdios do seu Instituto, alunas internas, congregacionistas.”(DL 178). Antes, ela havia anotado que, desde o dia 30 de abril de 1816, as quatro primeiras companheiras começaram a “observar o pequeno regulamento que Emília – a partir de agora chamarei Irmã Emília – havia preparado e do qual tenho em mãos o texto original, aguardando que Padre Marty lhes desse as Constituições.” (DL 27). Esse texto original encontra-se ainda anexado ao volume VI das coletâneas de cartas, nas páginas 313, 314, 323, 324, 321, 322, 319 (Ms aut 35). Citamos primeiramente o que diz respeito às religiosas: diretório bastante desenvolvido e horário. No primeiro, notar-se-á a insistência sobre a devoção ao Sagrado Coração e o desejo de imitar Nosso Senhor pobre e humilhado; depois, vêm considerações sobre as virtudes correspondentes aos três votos, sobre a vida comum (caridade fraterna, pontos mais específicos de disciplina), sobre o ensino dado às crianças pobres, apostolado primordial do Instituto. Primeiro regulamento (1816) Todo o nosso desejo ao nos unirmos e querendo, com a graça de Deus, viver como Irmãs, é amar e honrar o Sagrado Coração de Jesus, tomá-lo como nossa morada e escola onde queremos nos instruir, aprendendo dele a tomar disposições conforme às suas, e sobretudo esforçando-nos por conhecer seus sentimentos sobre a pobreza, os sofrimentos e as humilhações, reconhecendo que nunca seremos verdadeiras 150 filhas desse divino Coração se não nos colocarmos em um estado de vítimas.1 Embora não façamos votos, queremos quebrantar nossa vontade e dela nada nos reservar. Jesus obediente até a morte será nosso modelo. É nisso que devemos particularmente imitálo. Assim consideraremos de algum modo como importantes as menores faltas contra essa santa virtude, que deve ser ainda mais interior do que exterior, que não deve ficar somente na vontade mas ainda no julgamento, pois se reservássemos essa parte de nós mesmas, só faríamos metade do sacrifício.2 515 Toda sua. Irmã Emília. 151 Em visita a Firmi, escola fundada em 1835 e semelhante à de Vialarels, Madre Emília recomenda às religiosas da Casa-mãe a maior caridade fraterna na abnegação individual (L 561, M 365). Às Irmãs da Casa-mãe. Firmi, 31 de julho de 1836. J.M.J. Para obter a graça de conhecer Jesus pobre e humilhado, praticaremos essas virtudes caras ao seu divino Coração, a pobreza e a humildade, vivendo desapegadas de tudo aqui na terra, e cada uma querendo de todo o seu coração ser considerada como a última, amando, por conseguinte, o trabalho mais humilde, o quarto mais incômodo, etc, etc., aguardando de Deus a graça de não termos nada nosso. Embora não ponhamos nossa roupa em comum, nós a colocamos num armário comum. Uma de nós a distribuirá, segundo as necessidades de cada uma, que usará sem nada dizer a que lhe for servida. Nada será dado nem recebido sem permissão, não se terá nada em particular, como linha, fruta, bebida, etc. Os trabalhos serão comuns e não será permitido escolher aquele que se quiser. Uma Irmã ficará encarregada de distribuílos. Se os pais derem dinheiro a alguma Irmã, ela não poderá guardá-lo, mas o entregará à superiora que, entretanto, não o empregará para a casa, mas o guardará, ou então comprará para a Irmã que o entregou aquilo que ela achar melhor. Se uma recebe mais dos seus pais, de forma que possa fazer mais bem a casa do que uma outra, não deve se prevalecer disso, porém, deve considerar o dinheiro como a menor das coisas e pensar que a grande riqueza das casas religiosas é a humildade. Não considerarão como próprios seu quarto, seu hábito, etc., mas estarão dispostas a não tê-los, se isso for considerado conveniente. Dirão sempre: nosso trabalho, nossa cama, etc. Minhas muito queridas Irmãs: Sinto-me feliz em lhes renovar a expressão dos sentimentos afetuosos que sabem que tenho por todas em geral e por cada uma em particular. O desejo mais ardente de meu coração é que sejam intimamente unidas, não tendo senão um só coração e uma só alma e que, à minha chegada, eu as encontre nesta paz e na prática desta doce caridade que faz de uma casa religiosa um paraíso antecipado. Que cada uma de vocês, minhas queridas Irmãs, não tema fazer alguns sacrifícios para conseguir um fim tão desejável. Peçamos a nossos santos anjos da guarda que nos ajudem e apresentem nossas preces a Deus, para que abençoe nossos esforços. Na doce esperança de que nossos desejos serão atendidos, sou, nos santos Corações, sua mãe muito dedicada. Irmã Emília. 152 Segundo o mais radical ensinamento evangélico, a liberdade dos filhos de Deus se adquire pela renúncia ao amor-próprio reivindicador e na submissão a outrem (L 563, M 81-82). À Irmã Jude, em Figeac. Firmi, 7 de agosto de 1836. J.M.J. 514 151 Parece-me que mais vezes eu deveria lhes ter chamado a atenção para reprimirem os vãos desejos e tenderem com todas as forças para a paz da alma, etc.1 Quando será, minha caríssima Madre, que nos será dado conhecer o preço da vida interior, que nos conduzirá ao conhecimento de Jesus, de Maria e de José, nossos preciosos modelos? Envio muitas lembranças às nossas queridas Irmãs. Pode ler para elas esta carta. Não temo que conheçam minhas faltas. Ao contrário, desejo-o a fim de que isso as leve a pedir ao bom Deus que me dê seu espírito, de modo que eu não siga de maneira alguma o movimento do meu. Peço sobretudo às nossas Irmãs que sejam muito caridosas entre si, que jamais se contradigam e, se acontecer alguma contestação, seja apenas para cederem umas às outras e se respeitarem mutuamente. Toda sua nos santos Corações. Irmã Emília. 150 Ainda uma vez Françoise Pascal deve ser encorajada a suportar com paciência certas pessoas difíceis de sua comunidade (L 556) Cf. 1. 138, 139. À Madre Françoise, em Aubin. Villefranche, 3 de abril de 1836. J.M.J. Minha caríssima Madre: Segundo o que você me diz sobre Irmã N., ela exercita sua paciência. Partilho de todo o coração o sofrimento que ela lhe causa, assim como todos os que você tem. Porém, lembremonos de que o que nos aflige nesta terra de exílio fará nossa felicidade no céu. As Irmãs que têm um temperamento difícil são precisamente as que podem adornar nossa coroa. As doenças que Deus nos envia servirão para nos unir a ele e virá um tempo em que nos alegraremos por ter sofrido por seu amor. Esforcemo-nos por nada perder do mérito que elas nos permitem adquirir, de forma que, por meio delas, obtenhamos o santo amor, que é o mais precioso de todos os bens. No tocante à castidade, queremos, com a graça de Deus, praticá-la tanto quanto depender de nós: muito reservadas em nossas palavras, não sair senão raramente, sempre com permissão e nunca sem necessidade, ou pelo menos uma grande utilidade. Os estranhos serão sempre recebidos no parlatório, a menos que, por sérias razões, a superiora julgasse conveniente fazê-los subir, porém antes consultará suas Irmãs. Se chega alguma notícia mesmo que boa, a não ser que se refira ao bem da Igreja, não se deve repeti-la em comunidade. O mundo nos deve ser estranho e, se não estamos separadas dele pela clausura, queremos sê-lo pelo espírito e pela vontade. As Irmãs não olharão pelas janelas. Queremos substituir as austeridades corporais fazendo o melhor possível, com muita ordem e pontualidade, o pouco que fizermos, agindo sempre com alegria, paz interior e no Sagrado Coração de Jesus. Ao despertar as Irmãs, se lhes dirá: “Viva o Sagrado Coração de Jesus”. Elas responderão: “Em todos os lugares da terra.” A mais perfeita união deve reinar entre as Irmãs. Assim, elas se tratarão com respeito e sinceridade, com toda caridade e afeição. Elas se substituirão de bom grado e se sobrecarregarão de boa vontade para aliviar suas Irmãs que estiverem doentes ou que, por outros motivos, não puderam fazer seu trabalho. Não se pode fazer substituir-se sem permissão. Cumprirão o que lhes foi dado a fazer, como se fosse Deus mesmo que as tivesse encarregado dessa tarefa. Elas se aplicarão sobretudo a andar em espírito de simplicidade, lembrando-se de que é preciso se tornar criança para entrar no reino dos céus.3 Não criarão pequenos mistérios, nem terão segredos entre si, não refletirão sobre si mesmas, mas trabalharão bem e de boa vontade, não olhando se uma trabalha mais do que a outra, e farão com alegria o que lhes foi dito de fazer. Quando forem repreendidas, quer tenham razão quer não, não se desculparão. Tratar-se-ão por: minha Irmã, mas não 152 dirão: meu coração, minha amiga e outras palavras de ternura que não condizem com a seriedade religiosa. Elas se esforçarão para ser sempre alegres, mas com uma alegria moderada que deve ser, sobretudo, interior. Evitarão uma alegria barulhenta que as dissiparia e não rirão às gargalhadas. Não se permitirão a menor crítica, sobretudo interiormente, nem palavras de zombaria, lembrando-se de quanto a caridade é delicada. Jamais falarão em dialeto, a não ser em caso de necessidade. Não sairão do apartamento sem permissão. Não farão perguntas inúteis. Não falarão nas ruas, a não ser que a caridade ou a conveniência as obrigue e, nesse caso, não prolongarão a conversa. Quando levarem as crianças a passeio, só falarão entre si quando estiverem fora da cidade. Observarão também o silêncio, indo e vindo da santa Missa. Quando uma Irmã não puder rezar o ofício com as outras, ela o omitirá. Se acontecer que no fim do dia não se tenha feito nem meditação nem leitura, as Irmãs irão se deitar na hora de costume tão tranqüilamente como se elas tivessem rezado muito a Deus, que será mais honrado por sua obediência do que pelo apego a seus exercícios piedosos. Toda excentricidade deve ser banida. Assim, sob o pretexto de mortificação, não devolverão o que lhes tenha sido servido porque o acharam gostoso. Não farão mais orações do que as outras, a não ser com permissão, nem outras práticas de piedade. Elas se cumprimentarão com estas palavras: “Louvado seja Jesus Cristo.” Farão uma hora de adoração na quinta e no domingo. Não sairão sozinhas, a não ser por sérias razões. Não lhes é permitido comer nem beber fora, exceto em caso de necessidade, como também não podem hospedar nem oferecer refeição a ninguém na casa. Se parentes das Irmãs vierem com 513 Receberemos com reconhecimento aquele que V. Exª. julgar por bem dar-nos para nos governar sob suas ordens. Mas, visto que nos permite designá-lo, queira nos permitir também aguardar um pouco a fim de fazermos uma boa escolha. Desejamos que isso seja feito por Deus, e é para obter essa graça que pedimos um tempo para rezar. Enquanto isso, queiranos permitir dirigir-nos diretamente a V. Exª. para as permissões ou outras coisas que teríamos a solicitar. É nessa confiança que sou, com o mais profundo respeito e a mais terna afeição, sua, etc. Irmã Emília. Ano de 1836 149 A superiora acusa-se de negligências e imperfeições na conduta espiritual das religiosas, na maneira de proceder por ocasião dos encontros espirituais. Deseja que esta carta seja lida em comunidade (L 555, M 67-68). À Madre Vincent, em Figeac. Villefranche, 5 de março de 1836. J.M.J. Minha muito querida Madre: Reconheci não ter feito o que dependia de mim para levar nossas Irmãs à prática da vida interior. Por exemplo: durante o retiro anual, com mais atenção, teria podido dispensá-las de uma parte de suas ocupações, mas não refletia e lhes dizia que isso não me era possível. Conseqüentemente, não deram uma tão grande importância a esse tempo tão precioso e também à renovação de seus votos. Vi ainda que quando vinham falar comigo em particular não tinha o cuidado de lhes perguntar se tinham praticado o silêncio interior, a comunhão espiritual e também não as conduzi a não se contentarem em fazê-la durante o dia, cuidadosas em seguirem a voz da consciência quando as advertia a se mortificarem em tal ou tal ocasião. 512 153 Irmã, para lhe dizer tudo o que desejaria sobre esse assunto. Peça ao Senhor para esclarecê-la e ensinar-lhe a bem cumprir as funções de que está encarregada. Sua irmãzinha Julie está aqui há alguns meses e nossas Irmãs estão contentes e ela também. Ela é ainda muito jovem, é preciso esperar que aproveite bastante. Ela sofria um pouco da vista, mas está melhor depois que chegou. Saúdo-a com particular afeição. Irmã Emília. 148 Agradecimento a Dom Giraud pelas condolências por ocasião da morte de Pe. Marty. Expressão de reconhecimento afetuoso para com esse. Pedido de um prazo para a eleição e a indicação do novo Superior Geral (L 554, M 355-356). A Dom Giraud, bispo de Rodez. Villefranche, 18 de novembro de 1835. J.M.J. Sr. Bispo e meu Pai, As demonstrações de afeto são mais valorizadas quando estamos na dor. Por isso tenho vivamente apreciado as que me vêm de sua bondade paterna. Elas me ajudarão a suportar a profunda aflição que sinto com a perda daquele a quem tudo devia. Desde a idade de dezesseis anos, ele dirigia meus passos e sustentava minha fraqueza. A esperança que me resta é que continuará com sua bondade para comigo, estando bem persuadida de que se encontra junto de Deus. Não deixará de solicitar sua infinita misericórdia para com aquela a quem testemunhava uma tão terna caridade e pelo pequeno rebanho que lhe tinha sido confiado.1 Esse rebanho, Sr. Bispo, é de algum modo duplamente seu, e a mais inteira e absoluta obediência será sempre nossa conduta. essa intenção, devem dizer-lhes cordialmente que não é possível. As Irmãs poderão escrever aos pais uma ou duas vezes por ano. Antes de lacrar suas cartas, elas as apresentarão à sua superiora para quem não devem ter nada oculto. Não se chamará ninguém ao parlatório, seja Irmãs, seja internas, sem antes avisar a superiora, que cuidará de moderar as visitas, sobretudo para as Irmãs que renunciaram ao mundo e que, por conseguinte, não devem gostar de receber visitas e nada fazer para atraí-las. Quando forem chamadas ao parlatório, depois de terem pedido a permissão, devem se recolher sob o olhar de Deus e pedir-lhe humildemente a graça de não o ofender. Devemos considerar o cuidado das crianças como fazendo parte de nossa salvação. É o desejo de dar-lhes uma educação cristã que nos reuniu: tudo que temos de força e de saúde deve ser para elas. É preciso viver para elas e nos sentirmos muito honradas de ter sido escolhidas para uma tão nobre tarefa. Devemos pregar-lhes mais pelo exemplo do que por palavras, amá-las em Nosso Senhor Jesus Cristo que as resgatou com seu precioso sangue. Não nos devemos deter no seu exterior, mas amá-las no Sagrado Coração de Jesus, sem preferência por nenhuma, a menos que amemos um pouco mais aquelas que dão mais trabalho. A primeira coisa que devemos fazer quando uma criança nos for confiada, é levá-la aos pés do Senhor, suplicando-lhe recebê-la em sua escola, colocá-la sob a proteção de Maria e de José, e fazê-la conhecer seus deveres que são: maior pontualidade aos exercícios; não falar alto diante da porta da capela e na escada; não falar durante as aulas, a não ser à mestra, nem durante o grande silêncio. Nunca falar em dialeto. Manter-se bem asseada e arrumada, de maneira que não haja nem mancha nem buraco na roupa. Ter o cuidado de lavar as mãos e o rosto, cortar as unhas, pentear-se todos os dias. É preciso adverti-la de que entra numa casa consagrada a Deus e, 511 154 por conseguinte, deve falar sempre a verdade, ser bem obediente, muito recolhida durante a oração e, sobretudo, ser muito aplicada. Mandei entregar, com muito prazer, o terço a seu pai. Toda sua nos santos Corações. Irmã Emília. Ordem do dia para as Irmãs (1816) Levantar às 5 horas; às 5 e meia, a meditação até 6 horas; às 6 horas, as pequenas horas do ofício da Santíssima Virgem, Matinas e Laudes do ofício do Sagrado Coração de Jesus. Em seguida, cada Irmã irá ao seu trabalho. Às 7 horas, a santa Missa; depois da Missa, o café do qual elas não poderão se dispensar sem permissão. Às 8 horas, aula até 10 horas. Às 10 horas irão ao seu emprego. Aquelas que não têm emprego irão trabalhar na sala comum, onde farão meia hora de leitura. Às 11 horas, o silêncio até a ação de graças. Às 11 e meia, irão à capela, rezarão as pequenas horas do Ofício do Sagrado Coração de Jesus, as ladainhas da Providência e farão o exame particular. Almoço ao meio-dia; a uma e meia, um pequeno momento na capela para rezar a Salve Rainha, em seguida, aula até às 15h45. As que não têm nada para fazer na casa, irão à sala comum. Às quatro horas e meia, leitura até às cinco. Às 5 horas, irão rezar o terço que será seguido de Vésperas e Completas; às seis horas e meia, a meditação; às 7 horas, o jantar; às 8 horas e meia, a oração, Matinas e Laudes; o deitar imediatamente. O grande silêncio será desde a oração da noite até o dia seguinte, após a santa Missa. Elas o observarão à tarde, das 4 às 5 horas. 2. Regulamento das internas (1816) Eis agora o que diz respeito a essas crianças que a fundadora se empenhou de coração a instruir e educar de modo cristão. Devia haver alunas “externas” ou “vigiadas” e “internas”, mas estas últimas representam evidentemente a categoria mais importante de alunas, aquela para a qual a influência das educadoras corre o risco de ser a mais determinante. A essas internas podem-se assimilar, sem dúvida, as “órfãs”. Essas não são necessariamente privadas de pai e mãe. Elas podem também ser impedidas de viver em casa por uma razão 147 Madre Emília exalta a vocação de educadoras cristãs das religiosas da Sagrada Família: é um apostolado cuja grandeza deve ajudar a vencer as dificuldades bem reais dessa missão (L 544, M 348349). À Irmã Jude, em Figeac. Villefrandhe, 25 de agosto de 1835. J.M.J. Minha caríssima Irmã: Demorei um pouco a lhe responder, mas também não serei breve em minha carta. Você é bem feliz por ser chamada, como os apóstolos, a trabalhar no cultivo da vinha do Senhor, e por ser escolhida especialmente para semear nos jovens corações confiados a seus cuidados a semente da religião. Oh! que felicidade para uma Irmã da Sagrada Família, poder doar-se totalmente, por assim dizer, a esse assíduo cuidado. É penoso, cansativo e difícil instruir crianças, que na maior parte do tempo só estão atentas ao que lhes ensinam quando sua atenção se fixa em algo que as diverte. Mas que essas dificuldades não diminuam seu zelo. Continue sempre com o mesmo ardor e a mesma constância, sempre em vista de agradar apenas a Deus e terá o prazer de ver que a maldade de várias dessas crianças se transformará em bondade, seus caprichos em doçura, sua falta de devoção em piedade e, enfim, elas se lembrarão sempre do que lhes foi ensinado durante a infância. Se devemos bendizer cada dia o Senhor por nos ter chamado a conhecer, amar e servir Jesus, Maria e José, com maior razão devemos unir à nossa ação de graças o privilégio de ter sido escolhidas para expandir o conhecimento do verdadeiro Deus. Nem uma carta nem duas seriam suficientes, minha querida 510 155 Aliás, se você não tem confiança na Madre, eu me sentirei feliz em substituir o que lhe falta. Nada tema, minha muito querida e amada Irmã, abra-me inteiramente seu coração. É unicamente o desejo de aliviá-la que me leva a fazer esse pedido. Toda sua no sagrado Coração de Jesus. Irmã Emília. qualquer. O original desse texto está nas coletâneas de cartas VI, 309 (Ms aut 38). 1º Nossas senhoritas devem se propor a amar a Deus de todo o seu coração e testemunhá-lo elevando freqüentemente seu coração para ele, e cumprindo, para lhe agradar, todos os seus deveres que são: 146 2º Ter entre si uma doce e cordial caridade que lhes faça evitar todo gesto brusco, as torne muito educadas e as leve a ter atenções mútuas. Que as faltas cotidianas sejam ocasião de humilhação e não de desânimo. Ser sempre dócil e simples em relação ao confessor ou à superiora, porém, reservada no parlatório (L 543, M 347-348). 3º Ser muito submissas a todas as suas mestras, obedecendo-lhes pronta e alegremente, reconhecendo nelas a autoridade de Deus. À Irmã Laurent, em Figeac. Villefranche, 23 de agosto de 1835. J.M.J. Minha muito querida Irmã: Esteja certa de que você se tornará uma boa religiosa. As oposições que encontra para atingir esse precioso fim não devem desanimá-la. Sua grande fraqueza, suas quedas freqüentes só devem humilhá-la.1 Uma grande docilidade aos conselhos de Pe. Imbert, a confiança que você começou a depositar na Madre a tornarão infalivelmente como deseja ser, uma esposa de Jesus, toda cheia do seu santo amor. Sua carta, longe de me entristecer, me dá muita esperança. Dissipou a nuvem provocada por uma notícia, ocasionada sem dúvida pela conversa que você teve com sua mãe. Procure ser mais prudente no futuro, pois é preciso ser tão simples com seus superiores quanto prudente quando se está no parlatório. Desejaria, minha muito querida Irmã, poder escrever-lhe longamente, mas você sabe que não me é possível. Suprirei junto à divina Pastora, da qual não preciso lhe dizer que seja bem devota. Sem dúvida, você não deixa de recorrer de modo particular a Santa Filomena. 4º Observar perfeitamente o silêncio que lhes é prescrito durante seus estudos e ainda mais, depois das 8 horas e meia até o dia seguinte às 7 horas e em todos os lugares da casa, em todos os tempos, exceto quando estão com a Irmã que as vigia. O silêncio não é somente calar-se. Deve-se ainda evitar toda espécie de barulho, como fechar as portas fortemente, andar pesadamente, etc. 5º Ter habitualmente uma atitude simples, modesta e recolhida, evitando uma aparência indolente e afetada, as risadas altas e voz estridente, etc. 6º Uma boa postura que consista em pisar bem, manter o corpo ereto, não andar correndo, etc. 7º Ser extremamente limpas e arranjadas, não usar nunca suas roupas nem manchadas nem rasgadas. 8º Evitar entre elas toda familiaridade, não se apoiando umas nas outras, não se tratando por tu, chamando-se senhorita e não somente pelo nome, etc. 4 156 509 A uma Irmã de Aubin. 3. Regulamento das congregacionistas (por volta de 1820) Saint-Beauzély, 20 de julho de 1835. J.M.J. Desde sua volta da emigração, Pe. G. J. Chaminade "primeiro dedicou seus esforços à criação de poderosas congregações da Imaculada Conceição, para rapazes e moças, pais e mães de família, as quais renovaram o espírito cristão na cidade de Bordeaux, no sudoeste da França, e além daquela região" ( DS II, 454 e 1482-1483). Ele foi eficazmente auxiliado na propagação dessa obra por Adèle de Trenquelléon (v.s. p. 8). Essa que tinha conhecido Emília em Figeac em 1809, escreveu-lhe em 21 de julho de 1819 para convidá-la a praticar esse apostolado (HC 1819). Sem tardar, Madre Emília “fundou uma congregação para as pessoas do seu sexo. As senhoras mais qualificadas da cidade vinham escutar suas instruções”(DL 48). Essa Congregação se manteve até 1825. Autógrafo nas coletâneas de cartas VI, 317-318 ( Ms aut 38). Minha querida Irmã: Consola-me saber que você reconheceu seu erro. Procure, minha muito querida Irmã, vigiar seus primeiros impulsos, veja como eles a enganam. Uma coisa que deveria conseguir seria uma total confiança em Madre Françoise que lhe é muita dedicada. Procure não escutar os erros de sua imaginação. Este coração tão terno, tão afetuoso que Deus lhe deu, por que não voltá-lo um pouco mais para sua superiora, que é certamente uma mãe ainda mais do que uma superiora! Toda sua. Irmã Emília. 145 Viva Jesus, Maria e José! A finalidade principal da Congregação é honrar a Sagrada Família, imitando a obediência de Jesus, a humildade de Maria e o recolhimento de São José. Deve-se reconhecer as congregacionistas ao vê-las praticar essas virtudes às quais devem se apegar tanto mais que se não lhes prescreve nada de difícil e muito poucas orações, tais como: Afetuosa e condescendente solicitude para com uma religiosa que parecia não confiar bastante em sua superiora local para lhe confiar seus sofrimentos. Madre Emília se declara pronta a supri-la, se isso for conveniente (L 541, M 344-345). À Irmã Laurent, em Figeac. Villefranche, 14 de agosto de 1835. J.M.J. Minha caríssima Irmã: 1º Dizer todos os dias: “Jesus, Maria e José, assisti-me agora e na hora de minha morte.” 2º Uma Salve Rainha, todos os sábados, ou um Pai Nosso e uma Ave Maria. 3º Dedicar uma hora, todos os sábados, em honra da Santíssima Virgem. Nossas alunas externas nos disseram que você se aborrece muito. Penso que alguém que foi visitá-la espalhou essa notícia. Em sua carta, você me demonstra estar muito satisfeita de permanecer em Figeac. Madre Vincent parece ignorar o que você pensa. Sem dúvida, não tem confiança nela. Preocupa-me pensar que você sofre e que não ousa ou receia dizer-me. Assim, minha querida Irmã, digo-lhe com a terna e viva afeição que você conhece, que sou sua mãe, no seio da qual você pode depositar com toda confiança tudo que a aflige. Partilharei seus sofrimentos e talvez Deus me concederá a graça de aliviá-los. 157 508 À Madre Françoise, superiora em Aubin. 4º Fazer seu exame de consciência todas as noites. Villefranche, 6 de junho de 1835. J.M.J. Minha muito querida Madre: Compartilho todas as suas aflições, mas vejo que você tem com isso um grande meio de união com Deus. É só pela cruz que podemos nos aproximar dele e nosso verdadeiro bem nesta terra de exílio é viver de sofrimentos. No que me conta de seus sofrimentos, vejo que alguns são muito reais, mas há outros que não são razoáveis e alimentados pela reflexão. Por exemplo: afligir-se pelas coisas materiais, quando estamos bem dispostas a lhe dar tudo o que for necessário, partilhando sempre com você. A respeito do testamento da pobre Henriette, você também não tem razão em se preocupar. Ela não o fez porque não era a vontade de Deus. E se não recebemos bens por esse meio, receberemos por outro. Quanto às queridas Irmãs de quem você me fala, há pouca esperança de conversão: a solução é separá-las. Faça disso seu mérito, aguardando que isso possa ser feito, pense que é sua penitência e fique persuadida de que todas as superioras têm uma mais ou menos semelhante. Também é preciso algum espinho, e por que trazemos uma coroa que é composta deles? Nosso doce Salvador a carregou, ele bem sentiu os espinhos. Não somos nós suas esposas? Um pouco de coragem e confiança em Deus, minha querida Madre, e tudo correrá bem. Irmã Emília. Para esta pobre Irmã N., é preciso ter pena dela e rezar, mas que isso não a inquiete. 144 Precaver-se contra a imaginação e os primeiros impulsos: eles desencaminham as melhores afetividades (L 536, M 69-70). 5º Honrar muito particularmente o santo que lhes for dado como patrono durante o mês. 6º Ser muito exatas nos exercícios da Congregação, não faltar a eles a não ser por legítimas razões. Quaisquer pessoas não podem ser admitidas na Congregação. As que se apresentarem serão apresentadas ao conselho que as admitirá contanto que tenham uma boa conduta e uma boa reputação, sejam fiéis aos ofícios e instruções da paróquia, não freqüentem nenhuma má companhia e estejam vestidas segundo as regras da mais severa decência. Não se deve contentar em recebê-las com a promessa de fazer melhor, mas se esperará algum tempo para ver se estão realmente mudadas. Elas devem saber que não poderão ficar se não cumprirem as condições exigidas na admissão. 158 507 II – CONFERÊNCIAS E DIÁLOGOS Apresentamos simultaneamente estas duas categorias de “obras” que têm em comum não terem sido escritas por Santa Emília. A principal redatora é Irmã Marie-Séraphine Tauriac. Nascida em 1º de março de 1829, em Firmi (Aveyron), fez profissão em 22 de julho de 1845 e morreu no dia 16 de abril de 1863. Todos aqueles que a conheceram são unânimes em louvar seus dons naturais (foi encarregada da instrução profana das noviças de 1845 a 1852), e sua inteligência profunda quanto ao pensamento espiritual da fundadora. No prólogo de L’Esprit, o cônego Barthe diz ter haurido largamente em fontes de primeira mão, dentre as quais “conferências espirituais e conversas particulares recolhidas pela fiel memória de uma de suas mais caras filhas [da santa]” (p. 4-5). Além disso, lemos no Diálogo nº 20, datado de 1º de setembro de 1852, estas palavras trocadas entre Irmã Séraphine e sua superiora já quase em agonia: “Minha Madre,... penso que quer me enviar para uma casa secundária... Deixe-me, visto ser preciso afastar-me da senhora, redigir uma nota dos avisos particulares que me deu e das conferências das quais ainda guardo a lembrança. Foi para lhe obedecer que não escrevi nada. Como ficaria feliz se tivesse agora alguns escritos para levá-los e relê-los, em caso de necessidade! – Quando lhe disse que não escrevesse as conferências e outras coisas, foi porque pensei que o bom Deus não o quisesse. Agora, permito para sua consolação escrever as lembranças que você tem” (p. 43). Assim nos chegaram dois cadernos manuscritos. O dos Diálogos parece inteiramente escrito à mão, por Irmã Séraphine, embora se trate algumas vezes de uma outra interlocutora. Sabia-se que ela preparava documentos para “L’Esprit.” Algumas de suas companheiras, pelo menos, lhe É verdade que eu não esperava a graça que V. Exª. quer nos conceder. Fiquei tão surpresa quanto satisfeita. Peço de todo o meu coração àquele que o tornou dispensador de seus bens que os derrame sobre V. Exª. em profusão. Nossas Irmãs, ao fazerem a via-sacra, não esquecerão aquele que lhes proporciona a felicidade de percorrê-la. Elas lhe expressam sua afetuosa gratidão, como também pela bênção do Santíssimo Sacramento. Ao lhe mostrar a relação das bênçãos que temos, estava longe de pensar que V. Exª. as concederia tão numerosas. Somos muito felizes de ter uma bênção por mês. As Irmãs da Sagrada Família estão acostumadas à pobreza, até nas coisas espirituais, se é que poderemos nos considerar pobres diante de tantos dons que V. Exª. nos concedeu. Apreciamos tanto mais esses dons que, segundo seu parecer, não temos raízes. V. Exª. será consolado se criarmos raízes profundas pela prática de todas as virtudes. É o que esperamos de fazer na escola de Jesus sofredor. O exercício da via-sacra1 muito nos ajudará. Embora tenhamos chegado tarde, ajudadas pelo bom Deus faremos esforços para ter nossa recompensa no fim do dia. A falta de firmeza e de estabilidade de nossa casa de Figeac, assemelhando-a à humilde família da qual temos a honra de possuir o nome, nos dá a esperança de que será útil. Não tenho dúvida de que V. Exª. continuará dando-nos sinais de sua paternal generosidade. Perdoe-me, eu lhe peço, Exª., a liberdade que tomo de lhe escrever ainda esta vez. Até agora sempre o tinha feito para pedir algo. Hoje eu me dou essa consolação unicamente para expressar-lhe meu reconhecimento. Tenho a honra, etc... Irmã Emília. 143 Solidariedade face às penas e sofrimentos reais que enchem a existência. Precaver-se contra aquelas que criamos. Suportar as sérias desavenças entre duas religiosas (L 533). 506 159 mesmo dia de nossa chegada, nós nos colocamos, bem como nossa obra, sob sua especial proteção, e estou bem persuadida de que não será em vão. Quarta-feira unam-se também a nós para rezar bem particularmente a São José. Talvez vocês tenham pena de nós, mas não, não é o que devem fazer. O que é preciso é ajudar-nos, primeiramente pela oração, e, em seguida, pela prática exata das virtudes que Deus nos pede. Que cada uma abandone sua vontade própria, seus gostos, suas idéias. Que cada uma esteja intimamente unida à nossa Irmã Claire pela confiança, respeito e amor terno e cordial que deve ser gravado no coração de todas as Irmãs da Sagrada Família, a respeito daquela que ocupa o lugar de Deus. Ajudem-nos ainda pela fidelidade a seu emprego e às pequenas coisas que lhes são prescritas. Isso nos será bem mais útil do que toda compaixão que poderiam ter para conosco. Seguindo os conselhos que lhes dou, vocês nos ajudarão poderosamente e procurarão a glória de Deus, sendo nosso Moisés e nos obtendo a graça de combater valentemente e mesmo vencer. Repitolhes, não tenham pena de nós, estamos muito contentes e nos sentimos bem honradas em estar trabalhando numa obra que fará conhecer e amar a Sagrada Família. Toda de vocês. Irmã Emília. 142 Efusão de reconhecimento para com Dom d’Hautpoul pelas numerosas bênçãos do Santíssimo Sacramento que ele quis conceder à nova comunidade da Sagrada Família em Figeac, assegurando-lhe total dedicação na abnegação (L 531, M 325-327). Ao Sr. Bispo de Cahors. Figeac, 20 de maio de 1835. J.M.J. Sr. Bispo: comunicaram de bom grado o que sabiam. O caderno das Conferências não apresenta sempre a caligrafia de Irmã Séraphine que permanece, no entanto, a responsável e a redatora principal. Aliás, no começo, ela escreveu estas linhas: “Na maioria das vezes, escrevi sem anotações e me haviam proibido de reler o que escrevia. Conseqüentemente, você encontrará muitos erros.” Fica bem claro que com os sessenta e quatro Diálogos e as trinta e oito Conferências, só é transmitida uma ínfima parte das conversações espirituais e das instruções de Santa Emília. Recorria-se muito a ela para uma direção de consciência própria a completar os conselhos recebidos no tribunal da penitência. O número 339 das Constituições de 1832 prescreve: ‘O Capítulo hebdomadário realiza-se cada sexta-feira. A culpa não é obrigatória e não é feita a não ser com permissão. A superiora dirige às Irmãs uma exortação ou manda fazer uma leitura” (HC 1832). Por sua vez, os Depoimentos diversos fornecem indicações bastante evocativas a esse respeito. É Irmã Alphonsine Laforie quem relata suas reminiscências: “Na maioria das vezes, Madre Emília tomava como assunto de suas conferências algumas passagens da Sagrada Escritura que ela amava muito. As que ouvi dela tinham ordinariamente como tema: Abraão e sua fé; Jacó e sua mortificação; Moisés e sua doçura; Gedeão e seu exército; Samuel e sua obediência; Davi e sua humildade, sua contrição; Roboão e sua fraqueza; Ruth e sua piedade filial; Manassés e sua impenitência; os Macabeus; a vida de Jesus Cristo; Isaac e sua obediência; José e sua semelhança com Jesus Cristo; os milagres do deserto; Heli e sua fraqueza; Saul e sua desobediência, Salomão e sua sabedoria; Ezequias e sua confiança em Deus; Judith, seu jejum e sua oração; Eleazar e sua força de alma; os Salmos; os Atos dos Apóstolos” (DD 51-52).5 Como será preciso fazer uma escolha no conjunto que subsistiu, vamos transcrever para informar mais perfeitamente ao leitor a relação exaustiva das Conferências e dos Diálogos. Os títulos são tomados dos cadernos manuscritos (porém às 160 vezes um pouco abreviados). O nome das interlocutoras e as datas foram, em vários casos, restituídos, com mais ou menos precisão, pela atual arquivista de Villefranche. De imediato, notar-se-ão bastantes diferenças entre a relação seguinte e a que dá ou sugere a passagem citada acima, dos Depoimentos diversos. Índice das trinta e oito Conferências 1 – Sobre a festa de São Pedro acorrentado; 31 de julho de 1849 2 – Sobre a Quaresma 3 – Sobre as peregrinações espirituais; 1852 4 – Sobre a clausura; dezembro de 1844 5 – Sobre a santa compunção 6 – Sobre a oração 7 – Sobre o Sagrado Coração de Jesus; 1846 8 – Sobre o Santíssimo Sacramento 9 – Sobre a maneira de se conduzir durante a doença; abril de 1843 10 – Sobre o relaxamento 11 – Sobre o relaxamento 12 – Sobre a maneira de tomar as refeições e sobre os abusos em que se poderá cair se as superioras não forem bastante vigilantes; 1847 13 – Sobre a maneira de santificar os domingos e as festas 14 – Sobre os exames públicos; agosto de 1847 15 – Sobre o silêncio; mais ou menos 1843 16 – Sobre o silêncio (sem data) 17 – Sobre a paciência; fim de 1851 18 – Sobre a virtude de duas Irmãs doentes, maio de 1851 (inacabada) 19 – Sobre o que deve ser o objeto principal de nossa vocação (inacabada) 20 – Sobre o que deve ser o objeto principal de nossa vocação (inacabada) 21 – Sobre o cuidado com as crianças (inacabada) 22 – Sobre a paz da alma; por ocasião de uma festa de Páscoa 505 que V. Ex.ª não terá filhas mais obedientes e que amem mais ternamente seu pastor. Embora sejam as últimas e as menores de suas ovelhas, V. Exª. não deixará de amá-las como suas filhas queridas. Por sua vez, elas não cessarão de erguer suas mãos aos céus para que a Sagrada Família, da qual temos a honra de trazer o nome, derrame sobre V. Exª. muitas bênçãos. Permita-me, Sr. Bispo, desejar-lhe um santo aleluia, com toda a alegria que o acompanha. Gosto de pensar que V. Exª. nos dará essa grande alegria, concedendo-nos a graça das graças, a de ter a reserva. Queira ainda, eu lhe peço, nos dizer que nos ama, porque a certeza de sua afeição nos encorajará muito em meio às penas e às dificuldades que acompanham um estabelecimento iniciante, para o qual eu lhe peço sua bênção. É na esperança de que V. Exª. nada nos recusará do que lhe peço, que tenho a honra de ser etc. etc. Irmã Emília. 141 Nem tudo vai bem em Figeac. Afastada há quase dois meses, a superiora de Villefranche pede às suas religiosas que a ajudem com a oração e oferta de seu constante esforço de conversão (L 526, M 330331). Às Irmãs de Villefranche (para as professas apenas). Figeac, 17 de abril de 1835. J.M.J. Minhas muito queridas Irmãs: Desde os primeiros dias em que estive em Figeac, ouvi um toque de sino de nosso velho inimigo anunciando-me com certeza que não nos daria repouso, o que vem acontecendo até o presente. Preparou uma emboscada mais forte (eu lhes direi do que se trata em tempo oportuno). Precisamos de um socorro todo particular do céu. Unam-se a nós para pedir a Maria, invocada sob o título de Mãe das Dores. Vocês sabem que, no 504 161 À Dom Hautpoul, em Cahors. Figeac, 16 de abril de 1835. J.M.J. Sr. Bispo: Quando tive a honra de receber sua resposta, hesitei sobre a decisão que deveria tomar. As observações que teve a bondade de me fazer teriam me levado a uma decisão negativa; por outro lado, o senhor me dava permissão. Nessa incerteza a obediência foi meu guia. Consultei e disseram-me que deveria aproveitar essa permissão. Meu Superior, a quem enviei sua carta, viu nas suas observações apenas um efeito de sua bondade e não uma reprovação. De acordo com isso, nós nos estabelecemos em Figeac. Deus quer abençoar a nossa obra: umas cem crianças freqüentam nossa escola, embora tenhamos recusado todas as que se apresentaram mas que já estavam matriculadas em Santa Marta, na Misericórdia e na Congregação. O bem que se apresenta para realizar compensa amplamente as dificuldades que são inevitáveis num estabelecimento iniciante. Estamos bem contentes; entretanto, sentimos a maior de todas as privações, a do Santíssimo Sacramento. Queira, eu lhe suplico, permitir-nos ter uma capela com a reserva. Assim que cheguei a Figeac, meu primeiro dever era lhe pedir a permissão para aqui me estabelecer. O senhor deve ter me julgado ousada por não tê-lo feito, pois soube indiretamente que eu tinha vindo com essa finalidade, antes que eu lhe falasse a respeito. Perdoe-me, eu lhe peço, senhor Bispo. Queira desculpar-me uma semelhante falta, que seria imperdoável se não tivesse havido um mal entendido. Acreditava que meu Superior tivesse cumprido esse dever junto a V. Ex.ª, o que não impedia que eu mesma pedisse essa permissão, porém mais tarde. Aliás, teria sido muito agradável oferecer-lhe a homenagem de meu profundo respeito, de minha inteira obediência e, posso acrescentar, da minha terna afeição, para obrigar-me a fazer essa diligência, mesmo que ela não me tivesse sido ordenada. Nossas Irmãs partilham meus sentimentos e ouso prometer-lhe 23 – Sobre a confissão e a santa comunhão 24 – Sobre a fé e o sacrifício de Abraão 25 – Sobre o prejuízo que traz para uma religiosa o amor muito grande a seus pais 26 – Sobre a vida interior 27 – Sobre a hospitalidade de Abraão; ela deve ser o modelo da nossa 28 – Sobre a oração de Moisés que torna os Israelitas vitoriosos sobre os Amalecitas 29 – Sobre a maneira como devemos usar as coisas deste mundo 30 – Sobre os deveres dos superiores; mais ou menos 1846 31 – Sobre o arrependimento após uma falta 32 – Sobre a obediência (inacabada) 33 – Sobre a luta contra o defeito dominante; pouco antes de uma festa de Pentecostes 34 – Sobre a salvação 35 – Sobre o conhecimento de Jesus Cristo sofredor 36 – Sobre a gratidão para com a Igreja 37 – Sobre o espírito de misericórdia; começo de 1852 38 – Sobre a Paixão de Nosso Senhor, no decorrer de um retiro anual (várias conferências sobre os temas da Via-Sacra; inacabada) Índice dos sessenta e quatro Diálogos 1 – Sobre o desapego; com Irmã S. Tauriac; começo de setembro de 1852 2 – Sobre o amor de Deus; (mesma interlocutora) 3 – Sobre a caridade; (mesma interlocutora), 1845 4 – Sobre as virtudes que deve praticar uma mestra de instrução das noviças; (mesma interlocutora), 1847 5 – Sobre o desapego do coração; (mesma interlocutora), mais ou menos 1852 (inacabada) 6 – Sobre o relacionamento com os sacerdotes; 1849 (inacabada) 7 – Sobre o respeito para com os superiores; agosto de 1846 8 – Com a superiora geral que deveria substituí-la; Madre Foi Bousquet, 6 de setembro de 1852 162 9 – Sobre a amizade das almas piedosas; 1849 10 – Sobre os bilhetes escritos ao confessor ou ao capelão; 1845 11 – Sobre o espírito de clausura; fevereiro de 1848 12 – Sobre a morte de nossas primeiras Irmãs; 1849 13 – Sobre a morte de uma Irmã que era levada a dizer brincadeiras durante o silêncio; 7 de janeiro de 1845 (inacabada) 14 – Sobre o nome dado a uma Irmã noviça ; Irmã Macrine Douziech, 1839 15 – Sobre o combate contra o defeito dominante; Irmã S. Tauriac, 1844 16 – Sobre os sofrimentos interiores 17 – Sobre a presença de Deus 18 – Sobre o respeito humano 19 – Sobre a obediência; agosto de 1849 20 – Sobre a obediência; Irmã S. Tauriac, 1º de setembro de 1852 21 – Sobre os perigos que se corre algumas vezes na vida religiosa; (mesma interlocutora), 1850 (inacabado) 22 – Com a mestra de instrução das noviças sobre seu emprego; (a mesma interlocutora), 1846 23 – Mesmo assunto; 1847 24 – Com uma postulante-noviça sobre a confiança para com a mestra das noviças; 1847 25 – Sobre o espírito de mortificação e de penitência; 1845 26 – Mesmo assunto; Irmã S. Tauriac, 1846 27 – Com uma noviça não-clausurada que deseja fazer voto de clausura; Irmã S. Tauriac, 1846 28 – Com uma noviça sobre a clausura 29 – Com uma religiosa professa sobre a clausura; 1846 30 – Com uma jovem religiosa sobre a tibieza; Irmã Angèle Pouget 31 – Com a mesma religiosa sobre o assunto precedente 32 – Sobre a conduta a manter a respeito de uma professanoviça que se relaxava no serviço de Deus; Irmã S. Tauriac, 1852 33 – Com uma jovem religiosa sobre a confiança nos superiores 503 Embora não tenha respondido às suas cartas no que diz respeito à sua alma, nem por isso deixo de me interessar, porém a falta de tempo foi a causa do meu silêncio. Primeiro, vejo com satisfação que sua alma vai bem. Você quer pertencer totalmente a Deus, amá-lo e fazê-lo amado, eis o principal, e para chegar a esse fim os meios não lhe faltam: a cruz é o maior de todos; portanto, é preciso abraçá-la de todo o coração. Acho que lhe falta um pouco de generosidade. Primeiro, nunca deve se entregar ao desejo de ser dispensada do superiorato; em seguida, não se deixe acabrunhar por causa dos temperamentos difíceis. Querer livrar-se deles é um raciocínio humano, pois existem em todas as comunidades, e Deus os quer de tal modo que, quando uma delas se vai, chega outra. Se uma superiora não tivesse uma em sua casa, seria privada de um traço de semelhança com Jesus em sua vida pública. Se pudéssemos compreender toda vantagem que há em suportar essa dificuldade com toda a paciência, asseguro-lhe que ela se tornaria leve e a paz que resultaria de nossa aceitação produziria uma grande paz em nossa alma e tornaria nossas disposições interiores muito calmas e suaves. Preste atenção: as pessoas que têm mau espírito não são mais culpadas do que uma pessoa que é deficiente. Assim, tomemos a resolução de ser extremamente misericordiosas: “Felizes os misericordiosos, eles serão tratados com misericórdia.” Toda sua. Irmã Emília. 140 Na época da fundação de Figeac (fevereiro de 1835), Madre Emília acreditava de boa fé que Pe. Marty tinha feito as diligências necessárias junto ao bispo de Cahors. Nada disso aconteceu e Dom d'Hautpoul manifestou seu descontentamento. A fundadora lhe escreve para desculpar-se, muito filialmente, desse contratempo (L 565, M 319-322). 502 163 mesmo estado, não nos falam de despedi-la. Aqui, onde tivemos várias atingidas com a mesma doença, não pensamos da mesma maneira. Pelo contrário, acreditamos que elas atrairiam a bênção de Deus, seja sobre a casa, seja em particular sobre as pessoas que as serviram até seu último momento. E temos confiança de que elas são nossas protetoras junto a Deus e de que encontraremos nossa felicidade nos pequenos sacrifícios que elas nos têm dado ocasião de fazer. Devo ainda adverti-la: o que verdadeiramente traz prejuízo a uma casa religiosa é quando o regulamento não é bem observado, quando as Irmãs não permanecem unidas a Deus e inteiramente dependentes de seus superiores. Eis o que prejudica o convento, mas uma doente não o prejudicará. Eu lhe suplico, minha muito querida Irmã, pense um pouco mais sobrenaturalmente e acredite que sou toda sua. Irmã Emília. Peço-lhe amar muito Irmã Hilarie e testemunhar-lhe sua afeição. Essa Irmã não é má e ama o bom Deus de todo o seu coração. Se ela comete faltas, é por inadvertência, não por má vontade. Não as leve em consideração. Ela precisa ser tratada com grande doçura e confiança. Fazendo assim, você obterá dela o que quiser. 139 As superioras devem aceitar que haja sempre algum “temperamento difícil” na sua comunidade: é uma disposição providencial, para que se viva a bem-aventurança dos misericordiosos (L 518, M 340-341). À Madre Françoise, em Aubin. Villefranche, 20 de fevereiro de 1835. J.M.J. Minha muito querida Madre: 34 – Com uma jovem religiosa sobre o verdadeiro zelo pela glória de Deus; 1847 35 – Conselhos a uma de suas filhas sobre a união com Deus; Irmã Marie du Sacré-Coeur, 1848 36 – Sobre diversos assuntos (trata-se sobretudo da vigilância necessária para salvaguardar a castidade) 37 – Com uma religiosa doente (inacabado) 38 – Sobre o Refúgio; 23 de novembro de 1845 39 – Advertência sobre o espírito religioso 40 – Com uma de suas filhas que se entregava à tristeza 41 – Sobre os recreios 42 – Sobre a reparação das pequenas faltas 43 – Sobre a perseverança na vocação; Irmã S. Tauriac, agosto de 1852 44 – Sobre a caridade 45 – Sobre as relações contrárias à caridade 46 – A respeito da República; dezembro de 1848 (inacabado) 47 – Sobre as pequenas práticas de piedade (inacabado) 48 – Com uma religiosa doente; Irmã Colombe Chresteil, 1850 49 – (Mesma interlocutora e mesmo ano) 50 – (Mesma interlocutora e mesmo ano) 51 – Sobre a virtude de uma Irmã doente: Irmã S. Tauriac, 1850 52 – Sobre o espírito de mortificação de Irmã Marie du Calvaire; Irmã S. Tauriac, 1849 (inacabado) 53 – Sobre a morte de Irmã Marie du Calvaire; fevereiro de 1851 54 – Sobre a ignorância do mal que nossas Irmãs devem procurar conservar 55 – Sobre os meios de evitar um apego do coração 56 – Sobre a moderação que é preciso ter no estudo 57 – Mesmo assunto 58 – Sobre a doçura e a caridade, sobretudo para com as crianças 59 – Sobre a obediência 60 – Com duas de suas filhas, durante sua última doença; uma das interlocutoras é Irmã S. Tauriac, noite de 10 a 11 de setembro de 1852 164 61 – Prestação de conta de consciência feita à Madre Emília 62 – Com uma Irmã doente; 1851 63 – Fragmentos de conversações sobre a oração; épocas diversas 64 – Sobre a felicidade da vida interior Uma simples leitura dessas nomenclaturas permite constatar que os dois cadernos foram redigidos sem grande ordem cronológica ou sistemática. Não nos cabe remediar essa situação inserindo na obra critérios puramente internos, sempre frágeis e discutíveis. Conferências e sobretudo diálogos espirituais enxertam-se habitualmente nos problemas que coloca a atualidade cotidiana (por exemplo: sobre a clausura em 1844-1845, exames escolares públicos depois da nomeação e das decisões de Padre Abbal); certos Diálogos se estendem por vários dias, alguns se realizam durante uma conferência, quando a Madre questiona ou é questionada. É evidente também, às vezes, que uma ou outra anotação se deva quer à redatora, quer à religiosa que lhe dita suas recordações. A extensão dos trechos varia muito: em geral, três ou quatro páginas no máximo, datilografadas (sem entrelinhas), ou então para alguns Diálogos, uma meia página. Apesar de algumas exceções (v.g.: lembrar-se de), na maioria das vezes o estilo é correto, mas admite procedimentos artificiais (repetições insistentes de sinônimos; interrogações fictícias, etc.). Impossível dizer até que ponto ele é fiel à formulação original, que não devia ela mesma ter feito o objeto de um considerável esforço literário. Por seu gênero próprio, os Diálogos são ordinariamente mais vivos, pelo menos quando há uma verdadeira conversação (o que não é sempre o caso). Essa vantagem leva a um maior número de erros gramaticais. Com freqüência a expressão parecerá um pouco enfática e arcaica. Ela remonta a cem anos... Embora seja de uma simplicidade doutrinal elementar e de uma orientação pragmática freqüente, a tonalidade espiritual permanece inegavelmente elevada, com tendência ao rigorismo e mesmo a certo anti-humanismo que evoca tais páginas da Imitação de Jesus Cristo. Entretanto, os Diálogos manifestam um autêntico discernimento dos espíritos, uma disponibilidade 501 Minha muito querida Irmã: Nosso Pai teve a bondade de transmitir-me sua carta que fala do triste estado de nossa Ir. N. do qual me compadeço vivamente. Vi também com tristeza que você deseja muito livrar-se dela, sob o pretexto de que isso traz prejuízo à sua casa. Contudo, estou persuadida de que é por falta de meditar ao pé da cruz que você se entregou a esse desejo. Não compreendeu a felicidade de servir aos membros sofredores de Jesus, não se lembrou de que pelos serviços caridosos que lhes prestamos merecemos ouvir um dia estas consoladoras palavras: “Venham, benditos de meu Pai que me visitaram quando estava doente.” Você não pensou que os cuidados oferecidos a essa querida Irmã, as mortificações que ela lhes dá ocasião de fazer são, para todas, um grande meio de salvação e podem lhes merecer uma infinidade de graças. Não se lembrou de que o espírito da Sagrada Família é todo doçura, todo caridade e não releu o artigo de nossas Constituições que fala sobre doentes. Se quiser replicar, dirá a tudo isso: “Essa doença traz prejuízo.” Mas, minha querida Irmã, se o bom Deus lhe enviasse uma doença semelhante, que gostaria que lhe fizessem? Não deve fazer aos outros o que gostaria que lhe fizessem? Você diz que nossa Irmã N. cheira mal. Acredito, mas acredite também que, se a mantivesse bem limpa, ela exalaria menos mau odor. Você não sabe onde colocá-la. Parece-me que ela estaria bem longe das crianças, nesse pequeno quarto comprido que se encontra atrás daquele onde há sanitários e uma alcova. Nessa, há um quarto aquecido e poderá acender o fogo para ela. Assim, ela não irá à cozinha e as internas não a verão. Se for preciso, você levará o alimento ao quarto. É preciso separar a roupa dela. Nós lhe enviaremos o dinheiro da pensão. Assim, ela não lhe será um peso. Você já deve ter recebido 100 francos que enviamos por Pe. Cabantous, quando foi pregar o retiro. Penso que você esqueceu de dizer ao nosso Pai, quando ele foi visitá-la. Nós lhe enviaremos mais dinheiro na primeira ocasião. Volto a falar sobre o prejuízo que Irmã N. pode lhe causar. Mas, em Lassouts, onde está nossa Irmã Timothée quase no 500 165 espirituais e corporais para as quais nosso divino Mestre prometeu uma grande recompensa. No dia do julgamento, ele deve citá-las e apresentá-las a todo o universo: “Venham, benditos do meu Pai, possuir o reino que lhes foi preparado desde o começo do mundo!”1Prestem bem atenção ao motivo destas palavras tão consoladoras: “Pois eu tive fome e me deram de comer, estive doente e vieram visitar-me, etc.” Eis, minhas queridas Irmãs, o que vocês fazem todos os dias. muito benevolente, apesar das exigências sem complacência, uma adaptação singular a cada pessoa e às diversas situações que ela conhece.6 A princípio adotamos uma ordem cronológica, em que se intercalam Conferências e Diálogos; em seguida, reunimos por analogia as partes conservadas não-datadas. Qual não deve ser a alegria de terem sido chamadas a realizar obras tão santas! Mas prestem bem atenção: todas essas obras só podem ser meritórias se forem feitas com uma verdadeira e sincera humildade unida à íntima convicção de que é uma grande honra da qual vocês são infinitamente indignas. (C 42-43; nº 15). Datada de 1843 aproximadamente, esta conferência tem um aspecto inteiramente prático, mas um sentido sobrenatural profundo, valoriza detalhes por vezes banais. Sentido da separação própria a toda vida religiosa, exigências da oração e da união habitual com Deus, do esquecimento de si num comportamento simples e oculto. Envio-lhes ameixas para nossa Irmã Xavier, caso ela queira. Embora a rosca seja para os pobres, podem lhe dar, se ela o desejar. Vocês receberam o aquecedor de cama? Saúdo-as bem afetuosamente e sou sua muito dedicada Madre, Irmã Emília. Nós lhes enviamos 12 camisas, 3 véus, 4 golas (guimpes) e uma saia. 138 Madre Emília censura, com bastante firmeza, a superiora de Aubin, Françoise Pascal, por não ter tido doçura e paciência para com uma religiosa enferma, cujo mal é, na verdade, doloroso também para a comunidade. Não se preocupar com a pensão dela. Villefranche disso se encarrega. Além disso, considerá-la como uma “bênção de Deus” (L 513, M 352–354). À Madre Françoise em Aubin. Villefranche, 10 de janeiro de 1835. J.M.J. 1. Conferência sobre o silêncio Não é sem razão, minhas queridas Irmãs, que todos os fundadores de ordens religiosas fizeram do silêncio uma de suas principais regras. Compreendiam os prejuízos infinitos que causa uma língua mal governada. Por isso atribuíam grande importância à observância dessa regra e puniam com muita severidade os infratores. Numa casa religiosa onde não se observa o silêncio, não existe regularidade, nem espírito interior, nem espírito de oração, a caridade aí não é praticada. Por que se falta ao silêncio? Para satisfazer a curiosidade, para se queixar, para dar a conhecer as contrariedades, os aborrecimentos, os desgostos, para desabafar com uma amiga. Eis os motivos comuns de se faltar ao silêncio. Essas faltas são totalmente contrárias ao espírito interior e a nossos deveres. Quantas religiosas perderam esse espírito interior com essas faltas de silêncio! Uma alma que não é interior, que faz ela, na maioria das vezes, durante a oração? Perde o tempo. Seu espírito divaga de uma coisa para outra como durante o dia. A hora passa e chega o fim da oração sem se ter ainda recolhido. Que frutos produzem tais meditações? Não sei; bem poucos, sempre. E quando, numa comunidade religiosa, não há mais espírito de oração, que mal se sabe o que é fazer oração, em que ponto está o fervor, a regularidade? Pode existir na aparência, mas não é real. Não está mais aqui, fugiu, e o relaxamento veio substituílo. Queremos ficar preservadas dessa infelicidade? Guardemos 166 o silêncio, amemo-lo, tenhamos para com ele o maior carinho. Unamos ao silêncio exterior a prática do silêncio interior que vem em primeiro lugar. É só para chegar a ele que o silêncio exterior foi estabelecido. Mesmo sem falar, se deixarmos nosso espírito divagar, seremos levadas pela curiosidade a examinar tudo o que se nos apresenta: não observamos o silêncio, só fazemos de conta. De que serve a uma religiosa permanecer o dia todo sem dizer uma palavra se seu espírito não cessa de falar? O silêncio e o recolhimento se dão as mãos, um não pode ir sem o outro. Quando temos alguma coisa necessária a dizer, digamo-la em voz baixa e em pouquíssimas palavras. Antes de falar, examinemos se o que temos a dizer pode esperar até o recreio. Se nos for possível, aguardemos aquele momento. Nunca falemos nos lugares de passagem, mesmo por utilidade, isso desedifica. Vamos a um lugar afastado. É preciso igualmente evitar falar em lugares próximos à capela, por respeito ao Santíssimo Sacramento: estes lugares são o vestíbulo do coro, a sacristia, o pátio do parlatório... Existem dois ou três lugares onde temos freqüentes ocasiões de falar: esses lugares são a cozinha, o parlatório, a enfermaria. Quanto à cozinha, nenhuma Irmã ali deve ir sem ordem daquela que é encarregada dos trabalhos ou da superiora. As que ali vão dar algum recado não devem entrar, mas esperar na porta que lhes venham responder. As cozinheiras e suas ajudantes são fortemente encorajadas a falar baixo e o menos possível. Quanto ao parlatório, a porteira deve evitar falar sem necessidade com as pessoas de fora, com as alunas que entram, com as religiosas que entram ou que saem. Quando duas Irmãs saem juntas e que uma deve esperar pela outra, não deve ser no parlatório, mas no vestíbulo do coro. As Irmãs que vão trabalhar no Jardim de infância devem estar atentas a essa recomendação. Quando se tem alguma coisa a dizer à porteira, não se deve ir ao parlatório, mas tocar a campa da Irmã. Ela chegará até o corredor que dá para o pátio. Quanto à enfermaria, tenho muitas recomendações a lhes fazer. A regra diz que não se deve ir até lá sem permissão. Acrescento que só se deve fazer esse pedido com a finalidade de visitar as doentes para lhes falar do bom Deus, distraí-las um pouco. Não se deveria ir para satisfazer o desejo de falar, de 499 Recomendo-lhe muito particularmente a doçura e a firmeza para fazer observar todos os pontos do Regulamento: que a ordem e a regularidade reinem na casa e nas classes; que as crianças sejam bem instruídas e os doentes visitados com cuidado; que a alegria, a paz, o fervor e uma santa união façam de vocês todas um só coração e uma só alma. Enquanto houver caridade na casa, todo o resto irá bem. Desconfie sempre de si mesma, mas ponha toda a sua confiança em Deus. Peça a Jesus, Maria e José que a tomem sob sua proteção. Sou, como você bem sabe, toda sua e a saúdo bem afetuosamente. Irmã Emília. Ano de 1835 137 Respondendo aos votos de Ano Novo apresentados pela comunidade de Vialarels, Madre Emília expressa os seus e faz elogio às obras de misericórdia às quais se dedicam incessantemente essas religiosas (L 511, M 315-316). Às Irmãs de Vialarels. Villefranche, 2 de janeiro de 1835. J.M.J. Minhas caríssimas Irmãs: Recebi com muito prazer a expressão de seus votos e desejos para o novo ano. Os meus não são menores. Desejo-lhes, minhas queridas Irmãs, a abundância dos bens celestiais e eternos e todas as graças das quais nosso santo estado está repleto. Regozijo-me por vê-las em meio às boas obras. Com efeito, nada é mais consolador para a piedade do que visitar os membros sofredores de Nosso Senhor Jesus Cristo e levar-lhes palavras de consolo. Quanto bem vocês podem fazer! Ora, vocês ensinam a um ignorante, consolam um aflito, aliviam um pobre doente, numa palavra, exercem as obras de misericórdia 498 167 em saber que você começa a se alimentar um pouco mais e gosto de pensar que irá melhorando sempre. Tem muita razão em querer e desejar ardentemente que se faça o mais cedo possível o que combinamos. Primeiro na capela, mas aí não vejo possibilidade enquanto não tivermos dinheiro. O primeiro que chegar, após ter pago o mais urgente da dívida de Madre Antoinette, será utilizado para isso. Tem razão em não poder se acostumar a ver pessoas estranhas na clausura. Deus queira que isso termine logo. Nossas Irmãs, sensíveis à sua lembrança, dizem-lhe coisas amáveis e desejam ardentemente o restabelecimento de sua saúde. Deixo-a para ir à santa missa e saúdo-a de todo o meu coração. Irmã Emília. 136 Madre Emília comunica a uma religiosa que Pe. Marty acaba de designá-la como superiora em Vialarels. Recomenda-lhe firmeza e doçura para fazer observar a disciplina e reinar a paz na união mútua (L 504, M 309-310). À Irmã Angélique, em Vialarels. Villefranche, 7 de dezembro de 1834. J.M.J. Minha caríssima Irmã: Nosso Pai acha oportuno que você substitua Irmã Marie até nova ordem. Não se amedronte. Nada podemos por nós mesmas, mas o bom Deus está conosco, ele a ajudará, não duvide. Permaneça bem recolhida e pense muitas vezes que é mais obrigada a isso, pois, sendo a responsável, deve servir de modelo às outras. brincar, para uma longa demora. A enfermaria é um lugar santo, um lugar que chamo o vestíbulo do céu; erraríamos muito fazendo dele um lugar de dissipação. Por conseguinte, nunca devemos ir até lá para falar inutilmente. Que as conversas que tiverem com nossas queridas Irmãs doentes sejam espirituais, rápidas e sempre com permissão. Não se deve falar o dia todo na enfermaria. A Irmã enfermeira, de acordo com as doentes, reserve alguns momentos durante os quais rezam, lêem um pouco, guardam o silêncio. Advirta as Irmãs que as doentes não podem receber visitas durante esse tempo. Quanto às Irmãs que passam apenas alguns dias na enfermaria, por causa de uma indisposição, não devem falar muito, não devem dissipar-se. Em geral, não se deve preferir tomar as refeições na enfermaria, a não ser que haja uma necessidade real. Acho melhor servir eu mesma, no refeitório, as Irmãs doentes que precisam de cuidados particulares, ou mandar servir cada uma segundo a sua necessidade, que deixá-las na enfermaria por causa dos abusos que disso podem resultar. Quando uma Irmã pode assistir aos exercícios da comunidade, circula pela casa, deve pedir para tomar as refeições no refeitório, exceto em casos raros. Somente as superioras compreendem isso. Talvez vocês me considerem um pouco severa, mas acreditem que é para o bem, que só penso em prevenir o relaxamento. Se não tomarmos cuidado, a enfermaria se tornará, em breve, um lugar de irregularidades, um lugar onde se cometerão muitas faltas pela língua. Todas sabem o que nos diz o Espírito Santo em nossos livros sagrados: “Aquele que não peca pela língua é um homem perfeito."7 Quando falamos demais, raramente somos isentos de pecado. Certamente vocês fizeram essa experiência. Eu mesma a fiz, por isso, tomei o propósito de me corrigir. Vocês também, minhas Irmãs, façam o mesmo e se sentirão bem. Precisamos nos advertir mutuamente quando percebermos que faltamos ao silêncio, que dizemos inutilidades ao falar por necessidade. Esta semana eu me vigiei mais do que habitualmente sobre o silêncio. Quando vocês falavam comigo, notei que diziam muitas palavras inúteis. Chamei a atenção de várias. Continuarei a fazê-lo. Algumas talvez digam: “Mas, não faltamos ao silêncio, quando falamos com a superiora.” Podemos faltar ao silêncio com ela, 168 497 assim como com uma outra. Todas nos vigiaremos e seremos, espero, mais fiéis a todos os pontos de nossa regra da qual o silêncio é um dos mais essenciais. interior. Ele envia recomendações e está bem persuadido, como eu, de que você se tornará uma religiosa verdadeiramente segundo o coração de Deus. 2. Conferência sobre a maneira de como se comportar durante a doença A alva do vigário a ocuparia demais, visto que você tem sua roupa a consertar. Queira enviá-la imediatamente pela primeira ocasião segura. Encarrego-me de mandar fazer esse trabalho conforme o gosto do padre. (C 19-21; nº 9). Suas contemporâneas deram inúmeros testemunhos da delicadeza da Santa para com os doentes.8 O relato seguinte nos fornece uma prova disso (abril 1843). A expressão parecerá algumas vezes exagerada mas, ao mesmo tempo, revela muito de humanidade e de sentido sobrenatural, por sua maneira de encarar concretamente a situação da religiosa doente e de elevar essa, como também as que a cercam, a um plano evangélico e cristocêntrico. Ah! minhas Irmãs, que falta imensa nos faz nossa querida Irmã Marie Artémon! Ela nos deixou belos exemplos de piedade. Todas vocês tiveram a oportunidade de admirar suas virtudes e, sobretudo, sua preciosa morte. O que mais me chamou a atenção nos últimos momentos dessa querida Irmã foram estas palavras que várias de vocês ouviram: “Deus só! Deus só!” Ah! que meditação profunda merecem essas palavras: Deus só! Deus só! Como isso é belo!... Apliquemolas, cada uma a nós mesmas. Digamos muitas vezes: “Deus só! Deus só!”, durante a vida, a fim de que, como nossa Irmã, possamos também dizê-lo na hora de nossa morte. A graça de uma morte tão santa merece alguns sacrifícios, alguns atos de generosa dedicação. Nossas primeiras Irmãs sabiam bem fazêlos e foram por eles beneficiadas nos últimos momentos. Deus as fez conhecer e experimentar o quanto é suave entregar a alma nas mãos do seu Criador, a quem se amou e serviu com zelo e dedicação. Podemos adquirir grandes méritos quando estamos com saúde, porém maiores ainda durante a doença, pela paciência, pela resignação com a qual a suportamos e, sobretudo, pela perfeita conformidade de nossa vontade com a vontade de Deus. Deus tem duas maneiras de visitar seus eleitos: a consolação e a desolação. Coloco a doença nesta última forma de visita, porque a nossa natureza a considera Se quiser, direi de viva voz à Madre Antoinette o conteúdo de sua carta sem que você precise escrever. Será exatamente como se o tivesse feito. Escreva-me logo para me dizer como vai. Sabe quanto é grande o interesse que tenho pela sua alma. Toda sua. Irmã Emília. É preciso que eu tenha a alva aqui, amanhã à tarde. 135 Afastar toda tristeza, diz Madre Emília a uma religiosa convalescente. Empenhar-se do melhor modo possível em pequenas ocupações (L 498, M 304-305). À Irmã Vincent, em Livinhac. Villefranche, 13 de outubro de 1834. J.M.J. Minha caríssima Irmã: O que desejo particularmente de você é a alegria. Para cultivá-la, afaste com cuidado todo pensamento triste. Nunca diga que não vai ficar curada, nem mesmo pense nisso sob o pretexto de resignação; nem tampouco se preocupe com Villefranche. Em Livinhac, ocupe-se o melhor possível. Ocupese em pequenas coisas, assim como ajudar a cozinheira a descascar os legumes, cortá-los para a sopa, tanto quanto as forças o permitirem. Se a Madre quiser, eu lhe dou o emprego de ajudante de cozinheira e da despensa. Tenho muito prazer 496 169 que nos disse sê-lo em parte, mas o vigário fará como achar conveniente. Suas boas orações, minhas caras Irmãs, ajudarão as Irmãs daqui na conversão dessas pobres crianças. Irmã Emília. 134 Encorajamentos a alguém cuja fraqueza é ainda resgatada por muita sinceridade (L 496, M 302-303). A Irmã Augustine, em Livinhac. Villefranche, 7 de setembro de 1834. J.M.J. Minha muito querida Irmã: Estou muito contente com sua franqueza e lhe asseguro que só isso é suficiente para que suas faltas, bem menos graves do que você pensa, sejam mais facilmente perdoadas. Não existe em sua alma o mal que acredita ter. É verdade que você é fraca e se deixa levar. Há muitas vezes uma falta de fidelidade aos apelos da graça, mas você o reconhece em seguida e está bem disposta a repará-lo fazendo o melhor. É verdade que logo recai, mas também se levanta da mesma maneira. Pouco a pouco retomará coragem e se tornará mais fiel. Procure adquirir uma grande união com a Sagrada Família. Reserve um quarto de hora todos os dias para pensar nela ou na Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo. Se tiver bastante coragem, fará bem em revelar todas as suas misérias e seus sofrimentos à Irmã Joseph. Esse meio é infalível para lhe obter uma grande paz e conduzi-la à humildade. Não são os lugares que nos aproximam de Deus, mas a boa vontade. É preciso esperar ainda para voltar a Villefranche, pois sua saúde ainda não está bastante restabelecida. Nosso Pai, a quem fiz ler suas cartas, não está tão alarmado sobre seu estado como uma aflição. Se compreendêssemos bem os desígnios de Deus sobre nós quando nos envia alguns sofrimentos, em lugar de nos afligir lhe agradeceríamos. A esse respeito, temos muitos belos exemplos deixados por nossas primeiras Irmãs, exemplos que devemos imitar se queremos como elas chegar à perfeição. Para isso é preciso: 1º Não prever nem a saúde nem a doença e estar tão contentes com uma, como com a outra. 2º Gozando saúde, não devemos desejar adoecer; quando doentes, é preciso não nos deixarmos levar por um exagerado desejo de recuperar a saúde, mas abandonar-nos inteiramente nas mãos de Deus, preferindo a tudo sua vontade. 3º Devemos tomar exatamente todos os remédios prescritos pelo médico, mas sem apego e excesso de preocupação com seu efeito. 4º Não devemos pensar que a cura depende mais ou menos da perícia do médico, mas da bênção que Deus dá aos seus diagnósticos e receitas. Por conseguinte, não devemos nos afligir se ele não compreende ou não cura nosso mal, mas ver a vontade de Deus que assim decidiu. 5º Precisamos não deixar a imaginação procurar à direita ou à esquerda, perguntar a uma e a outra o que pensa do nosso estado, o que poderíamos fazer para conseguir a cura, mas confiar esse cuidado às superioras e nos abandonar entre as mãos de Deus. 6º É necessário também não nos angustiarmos por não poder trabalhar como as outras, mas saber que o sofrimento é um trabalho. Convém contentarmo-nos em fazer o que podemos, sem ansiedade, sem inquietação. Quando não podemos trabalhar, podemos rezar pelas que trabalham, podemos meditar e nos unir a Deus. A enfermeira deve ter o cuidado de variar os exercícios às doentes para que não se aborreçam, proporcionarlhes trabalhos leves que as distraiam; entretê-las com conversas 170 espirituais, trazer-lhes a visita de algumas Irmãs que sabem falar de Deus, do céu, da perfeição. Ela deve ser como uma mãe terna e compreensiva. As doentes devem obedecer às enfermeiras e tomar todos os remédios que lhes são dados. Eis alguns pensamentos que poderão ajudá-las nos momentos mais difíceis. Quando tiverem de tomar algum remédio que lhes custa muito, pensem no que o nosso divino Salvador sofreu na Cruz, derramando o seu precioso sangue por nosso amor, para expiar nossos pecados. Sejam solidárias à Paixão, unindo seus sofrimentos aos do divino Mestre. Nas noites de insônia, façam-lhe companhia rezando sobre a montanha ou agonizando no jardim do Getsêmani. A lembrança da coroação de espinhos as ajudará a suportar as dores de cabeça com mais paciência, eu diria mesmo com alegria, vendo que há alguns pontos de semelhança com ele! Quando vocês forem obrigadas a ficar de cama por causa da transpiração, unam-se à Nosso Senhor suando sangue e água no jardim das oliveiras. Unamos todas nossas dores às de nosso Salvador. Elas se tornarão por isso duplamente meritórias. Também lhes recomendo que, durante a doença, relembrem os exemplos de paciência e de resignação que nos deram os santos em idênticas situações. Em vez de se deterem nos próprios sofrimentos, pensem ora na Paixão do Salvador, ora nos exemplos dos santos, em particular dos que experimentaram algumas das dores que experimentamos. É bom também pensar algumas vezes que o tempo da doença é um tempo de colheita espiritual, um tempo de retiro; para muitas, um tempo de conversão. A doença tem salvado muitas almas que a saúde teria perdido. Várias que se esqueciam de Deus na prosperidade lembraram-se dele na adversidade, no sofrimento, na dor. A doença não é um mal, minhas queridas Irmãs, ela é um bem, um grande bem, quando sabemos recebêla e suportá-la com paciência e resignação. Que deve fazer uma Irmã que, por causa da doença prolongada, é forçada a permanecer um ou dois anos numa 495 que estavam presentes de relembrar-lhe essas palavras durante o dia. Há um grande número de doentes. Nossas Irmãs vão visitá-los todos os dias, duas a duas como vocês sabem, de maneira que as Irmãs Marie e Julitte vão de um lado e as Irmãs Thaïs e Xavier do outro lado. Os assuntos para meditação não faltam aqui. Estes pobres operários que se queimam vivos nos fazem corar diante da nossa covardia. Poderiam ganhar sua vida de outra maneira, mas porque recebem 7 ou 8 francos por dia, permanecem a noite inteira ou o dia todo, segundo seu turno, na boca da fornalha onde sentem tanto calor. Alguns são obrigados a beber grande quantidade de chá refrescante. Trazem-lhes um litro a cada hora, mas apesar disso seus dias são abreviados. Quando é que amaremos tanto o bom Deus? Rezem por mim, minhas muito queridas Irmãs, a fim de que ele me conceda essa graça; tarda-me muito. Peço de todo o coração por vocês todas em geral e por cada uma em particular. Rezem por duas senhoras idosas que queremos encaminhar para Deus. Nossas Irmãs vão visitá-las, são bem recebidas, mas ainda não puderam persuadilas a se confessar. Toda sua nos corações de Jesus, Maria e José. Irmã Emília. Tenham a bondade de mandar visitar Roquette. Desejaria muito colocar alguma coisa na cesta para ela, mas nada tenho, queiram suprir a isso. Nossa Irmã Thaïs e eu lhes enviamos muitas lembranças. Acabo de conversar com três inglesas que são irmãs. A mais velha tem quinze anos. São muito interessantes e seria uma grande pena se não se aproximassem do bom Deus. A mais velha disse-me que queria se batizar após o pagamento (dia do pagamento de todos os operários em Decazeville). Irmã Marie perguntou se ela ia à missa. Respondeu que não tinha tempo, mas que iria após o batismo. Com efeito, não lhe falta trabalho. Sendo a mais velha de sete irmãos que para se alimentarem só têm o trabalho do pai, estou admirada que possa vir à escola. Está disposta a confessar-se e nós esperamos fazer dela e de suas cinco irmãs, boas cristãs. Nenhuma é batizada, exceto uma 494 Minhas caríssimas Irmãs: Embora espere revê-las em breve, não podendo escrever a cada uma em particular, quero ter o prazer de falar a todas juntas, como se estivesse em São Francisco (sala de reuniões), no meio de vocês. O que lhes posso dizer de mais satisfatório é a respeito de suas queridas Irmãs, que vocês amam como a si mesmas. Seus sofrimentos, penas, alegrias, sucessos são os de vocês. Combatemos todas sob o estandarte de Jesus, Maria e José e temos a doce confiança de que, após o combate, repousaremos em sua santa companhia. O demônio não está ocioso nesta região e não deixa de inquietar nossas Irmãs pelo desânimo, o desgosto, a tristeza. Felizmente no momento, todas não são igualmente atingidas. Cada uma passa por sua vez, de modo que uma pode ajudar a outra. No começo, nossa querida Irmã Marie, doente a não mais poder, tinha de sustentar todo esforço do combate e é difícil imaginar quanto era forte. Nossa Irmã Julitte, que me contou isso, não tinha palavras para traduzi-lo. Iam alternadamente com nossa Irmã Thaïs ao encontro dessa pobre doente, que não podia falar e, no entanto, via-se forçada a fazê-lo continuamente. Um dia Irmã Julitte foi ter com ela no auge da tempestade, dizendo-lhe que não podia resistir. Irmã Marie lhe disse: “Bem! Se você abandonar a obra de Deus, ele não a abandonará, antes dessas pedras suscitará alguém.” Irmã Julitte acrescentou que essas palavras a tinham poderosamente animado e determinado a não ter vontade própria. Todo esse trabalho do demônio nada tem que deva surpreender. Pelo contrário, é bom sinal. Esse inimigo da felicidade dos homens vê que esta escolinha prestará algum serviço a Deus e ele não pode suportar isso. Por outro lado, nossas Irmãs estão bastante animadas diante do bem que podem fazer: essas pequenas inglesas a preparar para o batismo, grande número de doentes a consolar e vários a preparar para uma santa morte. É esta última obra que agrada sobretudo à nossa Irmã Thaïs! Quando ela sai para isso, volta radiante, dizendo que não entende como tem tanta facilidade para se expressar. Um pobre doente que ela costumava visitar, após tê-la escutado com muito prazer, recomendava às pessoas 171 enfermaria? Deve considerar esse tempo como o mais precioso que Deus lhe dá para se preparar, ou para a morte, ou para a saúde, segundo aprouver a Deus. Não deve pensar que, pelo fato de estar doente, está dispensada de tudo. Não, ao contrário, ela deve, de acordo com a superiora, organizar o tempo que Deus lhe dá. As doentes não podem fazer longas meditações, mas é preciso que, de vez em quando, durante o dia, elevem seu coração a Deus e recitem de cor, se não podem fazê-lo oralmente, alguma oração: uma vez serão os atos de religião, mais tarde uma dezena do terço ou as ladainhas de Nossa Senhora, etc, etc. As Irmãs que vão vê-las devem lhes falar sobretudo do que se refere a Deus. Desejo muito que as Irmãs que melhor sabem falar de Deus, dêem conferências espirituais,9 vão freqüentemente visitar as doentes que quase não saem da enfermaria. Os dias se tornam longos quando a pessoa está constantemente diante de si, fechada no mesmo quarto. Existe a necessidade de ver alguém que venha encorajar, conversar sobre os bens que nos aguardam na vida futura. Pequenos trabalhos que não sejam cansativos alegram e distraem as doentes. A enfermeira deve ter o cuidado de lhes proporcionar esses trabalhos e variá-los. Repito-lhes o que já disse várias vezes: as doentes são os tesouros das casas religiosas. Inútil dizer-lhes quanto devemos amá-las, estimá-las e sobretudo visitá-las freqüentemente. O avarento não esquece o tesouro que possui. Cem vezes ao dia pensa nele e o visita. Assim também, não esqueçamos nossos tesouros, nossas queridas Irmãs doentes. Visitemo-las muitas vezes para fazer-lhes o bem e para nos beneficiar também com sua paciência e resignação. Algumas Irmãs poderiam pensar e dizer: as longas doenças ocasionam muitas despesas; por isso, não há vantagem em ter Irmãs doentes em nossas casas. Elas se enganam ao falar assim. O que se gasta com elas nunca será perdido. Jamais as doentes empobreceram uma comunidade religiosa. Portanto, nossas Irmãs doentes não devem se angustiar pelas despesas que causam a uma comunidade. Não 172 são nossos bens que elas gastam, mas o bem de Deus, e ele não nos faltará enquanto amarmos seus membros sofredores. 3. Diálogo sobre o combate contra o defeito dominante (D 29-34; nº 15). A interlocutora é Irmã S. Tauriac, que ainda não fez Profissão (1844). Santa Emília dá ainda aqui a prova de sua intuição espiritual e, ao mesmo tempo, de uma firme exigência. Só a reação diametralmente oposta poderá acabar, lentamente, as mais negativas manifestações do orgulho. A Madre enumera algumas delas (teimosia, vaidade na conversação, etc.). Lembra à religiosa algumas de suas faltas nesse ponto, faz alusão a outro caso concreto, mas, sem nomear a pessoa. Sabe também encorajar, pela comparação com o duelo entre Davi e Golias (1 Sam 17, 40-54). A Madre: Venha prestar-me contas de suas vitórias sobre o seu defeito dominante. Tem feito cada dia seu exame de consciência sobre esse ponto? A Irmã: Sim, Madre, contei quantas vezes falei de mim mesma durante o dia, mas não fui fiel em me impor uma penitência como a senhora tinha me dito. Perco a esperança de me tornar humilde, pois, quanto mais me esforço para me tornar humilde, mais sou orgulhosa. Quando não cometo atos, tenho pensamentos de orgulho que não ousaria dizer a ninguém. A Madre: Não se admire disso. Quando nos aplicamos em adquirir uma virtude, ordinariamente somos muito tentadas pelo defeito contrário e, na maioria das vezes, quanto mais a praticamos, tanto mais o defeito parece dominar. Não deixe de se infligir uma pequena penitência, como rezar um ato de contrição, beijar a cruz, visitar um dos oratórios da casa, beijar o chão duas, três, quatro vezes, etc... e, que nunca mais a ouça dizer: "eu desespero." Não devemos desesperar de nada quando temos a ajuda de Deus, e você a tem. Ele lhe dá a luz para conhecer suas faltas, o desejo de se tornar humilde, isso já é muito. Tenho a esperança de que você se tornará humilde. Diga-me os pensamentos de orgulho que tem. 493 coadjutoras a La Salle. Não devemos assumir mais do que podemos. Ensinar a ler, escrever e calcular, eis tudo. Minha opinião é não pedir nada a ninguém. Porém, com a aprovação do Sr. vigário e do prefeito, alugar uma casa que seja conveniente e enviar pessoas que julgarmos capazes, de maneira que sejamos livres e independentes da Empresa. Em seguida, se estiverem satisfeitos com nossos serviços e queiram nos dar alguma coisa, aceitaremos com reconhecimento. Assim, sem falar com outras pessoas, veja se encontra uma casa para alugar. Ainda que o aluguel seja um pouco caro, não tema em arriscar-se. Parece-me que seria melhor se a casa fosse perto da Igreja, o que para nossas Irmãs seria melhor. Por outro lado, talvez pensarão que seria melhor que fosse em La Salle por causa das crianças, pois é preciso adaptar-se a elas. Nossas Irmãs iriam com essa finalidade. Os senhores a quem você falou julgarão da conveniência, mas, eu lhe repito, desejo muito nada receber da Empresa, pelo menos agora. Irmã Emília. Envio-lhe um pouco de macarrão e de doce. Se você deseja alguma coisa, diga-me. 133 A Madre foi a Vialarels, onde fora fundada a primeira escola, com apenas 3 religiosas: Marie Vialard, superiora; Thaïs Vallon, Julitte Jambert. Um grande campo de trabalho apostólico, num meio social até então desconhecido: é o que a fundadora vai descobrindo, por sua vez. O começo foi muito difícil. Foi preciso que Marie Vialard encorajasse suas colaboradoras que estavam a ponto de renunciar a tudo. Aliás, uma outra Irmã acabou de chegar. Madre Emília relata alguns episódios interessantes, evocando o trabalho dos mineiros e a boa vontade das “pequenas inglesas” (L 494, M 297-300). Às Irmãs de Villefranche. Vialarels, 19 de agosto de 1834. J.M.J. 492 173 Agradeço a carta que me escreveu. É sempre com uma alegria renovada que recebo suas notícias, sobretudo quando sei que você está melhor. Desejo que sua saúde vá sempre aumentando. Procure, minha querida Irmã, ser uma boa doente, isto é, muito resignada à santa vontade de Deus, não expressando seus desejos, suas fantasias, seus gostos ou desgostos a não ser à Madre e, mesmo com ela, não o fazendo senão com paz e resignação, disposta a fazer os sacrifícios que ela aconselhar. Você sabe que as doenças nem sempre santificam, porque algumas vezes os doentes se entregam demasiadamente a seus gostos naturais, e assim diminuem a graça e enfraquecem a alma. O meio para evitar essa infelicidade é ser bem dócil a todos os conselhos que lhe dão e praticar uma verdadeira humildade, acompanhada de mortificação, pois podemos e devemos ser mortificadas até na doença, na medida do possível. Saúdo-a muito afetuosamente. Irmã Emília. Ano de 1834 132 O projeto de enviar Irmãs rodeiras a La Salle, como educadoras, abrindo uma classe numa casa não-clausurada, amadurece pouco a pouco no espírito de Santa Emília: é o início das “escolas” (L 484, M 291). A Irmã: Madre, não ouso e, aliás, não me detenho em tudo o que me passa pela cabeça, procuro mesmo não me lembrar disso. A Madre: Quem sabe se não é pelo receio de ser obrigada a revelar esses pensamentos que você os afasta tão depressa e se, nisso, não é guiada pelo orgulho? Veja se me engano. A Irmã: É bem um pouco como a senhora diz. Mas que necessidade há de dizer o que se pensa quando se sabe que isso desagrada, que não há consentimento, que nem demora no pensamento? A Madre: Humilhar-se quando se é orgulhoso é necessário para triunfar desse defeito. Ora, um dos maiores atos de humildade que podemos fazer é revelar todas as misérias, todas as tentações à pessoa que nos dirige e orienta. Certamente, você não está obrigada a me descobrir todos os seus pensamentos de orgulho, mas creio que Deus o pede a você. Vamos, diga-me os seus pensamentos, não a deixarei sair sem que o tenha feito. A Irmã: Creio que será bom, mas não ouso. Voltarei em outro dia e lhe contarei tudo, porém não agora, teria muita vergonha. Se fosse de noite, no escuro, ainda bem, mas agora, a senhora olhando para mim, é humilhante demais. A Madre: Como o demônio é hábil! Você terá mais dificuldade de outra vez do que hoje. Vai se preocupar com isso, enquanto que, se falar hoje, estará terminado. Olho o meu crucifixo, não a vejo. À Madre Françoise, em Aubin. Villefranche, 15 de maio de 1834. J.M.J. Minha caríssima Madre: Nosso Pai pensa como eu, que Irmãs clausuradas não podem ir para o meio rural. Portanto, só podemos enviar as Irmãs A Irmã: Penso, que se quiser, poderei me tornar uma das religiosas mais instruídas da Congregação; que a senhora poderia me dar o emprego da Irmã N., assim, eu me relacionaria com as senhoras N. e N. o que me agradaria. Os senhores M. e N. vieram visitar nossas crianças, fizeram-me alguns elogios que acolhi com prazer. Isso volta ao meu espírito várias vezes ao dia. Tarda-me que esses senhores voltem. 174 Considerando que no Noviciado passei do último ao primeiro lugar, penso que devo ter mais possibilidades do que as outras. Escutei, com prazer, o elogio que nosso Pai fez de mim à Mestra das Noviças, relativamente à instrução. Ele disse a ela que, se me cultivassem, em pouco tempo eu iria longe, por isso que ela não me negligenciasse. Gosto de acompanhar as internas no passeio, porque sempre me dizem algo agradável. Basta, já ouviu o suficiente para deduzir todo o resto. A Madre: É bom, muito bom! Se, em lugar de se tornar uma religiosa mais instruída, pudesse se tornar uma das mais santas, não gostaria da troca? É o que desejo para você. Do cume do orgulho, é preciso que se eleve ao cume da humildade. Você é jovem. Acredite em mim. Empreenda um sério e constante combate contra um defeito que poderia perdê-la. Repito-lhe: do cume do orgulho, lute com todas as suas forças, com todos os meios, empenhando-se cada dia e a cada instante do dia, até o cume da humildade. A Irmã: Madre, não compreendo bem o que a senhora quer dizer. O que é o cume do orgulho, o cume da humildade? Pressinto um pouco o que a senhora vai me responder, e desde já tenho medo, tremo porque não poderei, sem dúvida, fazer o que a senhora me pede. Terei remorso durante toda a minha vida. Por favor, não me proponha uma humildade grande demais. Não gostaria que me passasse pela cabeça o desejo de imitá-la. Eu não poderia, não tenho bastante força. A Madre: "Não me proponha uma humildade grande demais,” não é uma boa disposição que a leva a me fazer esse pedido. Você deveria, ao contrário, me pedir para lhe ensinar o caminho mais curto para consegui-lo, qual o sacrifício que teria de se impor. É da maior importância combater seu defeito dominante. É um general de exército que causa o maior dano às almas. Você precisa combatê-lo custe o que custar, sem se apavorar com a intensidade e a duração dos combates. Deus que é testemunha dos esforços que fazemos, dá habitualmente a vitória à alma que a pede. É por seu amor, por sua glória que combatemos. Ele não recusaria seu socorro. Não tenha medo. 491 Madre Antoinette me escreve que você está muito triste, o que a aflige muito. Penso que a falsa acusação de que você é a causa da transferência das Irmãs Julienne e Augustine, que realmente é doloroso a suportar, a aflige e torna difícil sua estada em Livinhac. Creia-me, coloque-se acima disso. Você em nada influenciou no caso e, se assim fosse, não haveria mal nenhum. Afinal, a opinião dos homens sobre nós tem pouco valor. Madre Antoinette me disse ter dito algumas palavras que foram mal interpretadas! Penso que ela mesma as interpretará para você, no seu verdadeiro sentido. Ela é muito franca. Peçolhe crer no que lhe disser, pois será sempre a verdade exata. Desejo ardentemente que a mais perfeita união reine entre ambas, de maneira que não tenham senão uma só alma. Penso que você deve lhe prestar todos os serviços possíveis, seja no parlatório, no economato, etc. Veja bem que é impossível ela dar conta de tudo, estando o dia todo com as crianças. Disse-me que o vigário só pedia que você se ocupasse dos consertos da casa. Com certeza ele não quer dizer que você recusa prestar serviço quando for solicitada pela Madre. Pelo amor de Deus, peço às duas que procurem agir num perfeito entendimento. Tarda-me saber se vocês tiveram um diálogo cordial. Sou toda sua. Irmã Emília. 131 Conselhos a uma doente que se restabelece progressivamente: muita docilidade, humildade, mortificação dos movimentos espontâneos (L 462, M 278–279). À Irmã Anne-Sophie, em Aubin. Villefranche, 2 de novembro de 1833. J.M.J. Minha caríssima Irmã: 490 175 Temos um jubileu a ganhar. Façamos tudo que depender de nós para nada perder dessa grande graça. Imagino a má impressão que deve ter produzido a transferência de Irmã Julienne. Mas, que fazer? Era um mal necessário. Nosso Pai me escreveu para que a chamasse aqui imediatamente. Adeus, minhas queridas Madres. Estou bem unida a vocês nos santos Corações e termino dizendo que é preciso amar a cruz. É só por meio dela que encontraremos nosso Esposo, a quem demos todo o afeto de nossos corações. Se tivessem visto, como eu, quanto se é feliz por ter sofrido e sofrido bem! Nossa querida Irmã Fébronie o mostrou com seu exemplo. Quanto sofrimento a preparou para a morte! Deus o sabe! E eu também, um pouco. Quantas aflições interiores a inundaram, Deus o sabe! De quantas maneiras os demônios tentavam, Deus o sabe! Fomos testemunhas de seus sofrimentos físicos. Eram de cortar o coração. Agora ela se sente feliz por ter sofrido e repousa serenamente no Senhor. Após sua santa morte, ela parecia dormir. Havia um sorriso em seus lábios e não nos cansávamos de olhá-la. Irmã Emília. 130 Irmã Françoise Pascal encontra-se então em Livinhac, onde Irmã Antoinette Carles foi nomeada superiora no início de dezembro de 1832. Sua competência nos negócios deve prestar bons serviços no início das atividades da nova superiora num tempo de organização e ampliação do local. Porém, já houve dificuldades de pessoas e temperamentos. A superiora de Villefranche tenta remediar isso (L 444, M 259-260). À Madre Françoise, em Livinhac. Villefranche, 25 de março de 1833. J.M.J. Minha caríssima Madre: A Irmã: O que devo fazer? A Madre: Sempre o oposto daquilo que o orgulho lhe sugerir.10 A Irmã: Terei força para isso? A Madre: Deus lhe dará. Imagine que seu orgulho é Golias, o famoso filisteu que combatia contra o exército de Israel. Deus escolheu para combatê-lo e exterminá-lo o que havia de mais fraco na família de Jessé, o jovem Davi, que até então só se ocupara em guardar os rebanhos de seu pai. Ele se encaminha para o gigante armado apenas com cinco pedrinhas – símbolo das cinco chagas de Nosso Senhor – no seu bolso e com uma baleeira. Ele avança na direção do gigante em nome do Senhor por quem ele combate e, com uma jogada, atira uma pedrinha e derruba Golias. Em seguida, armando-se com a própria espada do gigante, acaba de matá-lo. As pequenas paixões que se encontram em sua alma são outros tantos filisteus que seu orgulho conduz. Elas só terão força enquanto você deixar viver esse defeito. Arme-se como Davi com a confiança em Deus, com a lembrança das humilhações de Nosso Senhor Jesus Cristo e, por meio de uma oração fervorosa, peça cada dia e várias vezes ao dia a virtude da humildade. Davi arma-se com a própria espada de Golias para acabar de matá-lo. Transforme todas as astúcias que seu orgulho sugerir para se satisfazer em atos de humildade. Assim, quando cometer algum erro que lhe deve atrair alguma censura, não a evite; você é mal julgada, não faça nada para mudar a opinião a seu respeito; o orgulho a leva a fazer coisas que podem lhe atrair louvores, não as faça, a menos que a obediência a obrigue a isso; gostaria de ser valorizada pelos outros, procure ficar desconhecida, tida como nada; escolha em tudo e por toda parte o último lugar, sem afetação. A Irmã: Como é difícil não evitarmos a censura, deixar-nos julgar desfavoravelmente quando, com uma palavra apenas, 176 poderíamos ser bem vistas pelas pessoas. Não creio ter força para fazer tudo isso. Mas eis o que estou pensando: compreendo que meu orgulho é grande e que poderia me perder. Pois bem, vou pedir ao bom Deus, todos os dias, que me mantenha na humilhação e não permita que possa ter orgulho de nada. Eu lhe direi: “Meu Deus, nutra-me com o pão da humilhação e dê-me de beber a água de minhas lágrimas, desapegai-me do amor que tenho pela honra e estima dos homens, que seja aos olhos deles e aos meus um objeto de desprezo, que tudo o que eu fizer para me elevar se transforme em confusão para mim, de modo que, aqui na terra, viva na lama e no lixo na medida em que quero gozar.” Acrescentarei: “Não permita que possa experimentar outra satisfação que a de amá-lo e de agradá-lo; que o beber, o comer e as outras satisfações que sou obrigada a conceder à minha natureza sejam uma cruz para mim. Só lhe peço uma coisa, ó meu Deus, é a graça de não me perder, de não permitir que me perca eternamente.” Eis, minha Madre, tudo que posso fazer. Comecei mesmo a fazer a Deus esse pedido. Por vezes, tremo ao fazê-lo, por medo de cair em grandes humilhações, mas imediatamente penso que todos esses sofrimentos são pouca coisa se eu me salvar. Reze por mim. A Madre: Eu o farei e espero que você se torne humilde, mas, por favor, não passe um dia sem pedir essa virtude da humildade que nos faz felizes na terra e que atraiu o Filho de Deus. Um dia, veremos às claras o preço da abjeção. Acrediteme, minha Irmã, é uma felicidade repousar no desprezo, ser considerada como nada.. Uma vez que você quer realmente se tornar humilde, vou lhe fazer notar algumas coisas que você fez e nas quais revelou orgulho. Quando Ir. N. lhe disse, na minha presença, que suas alunas eram muito lentas, que várias perdiam tempo por não serem talvez estimuladas pela mestra, você respondeu com vivacidade: “Ah! quanto sofremos com essas crianças, quando não temos sangue de barata.” Você deveria ter simplesmente respondido: “Vou ter mais cuidado para que façam melhor. Se eu mesma fosse mais dedicada, teriam aproveitado mais.” Quando a senhorita N. não soube 489 cama. Juntava as mãos com terna piedade e gozava de uma tão grande calma que o sorriso estava sempre nos seus lábios. Enfim, as suas últimas palavras foram: “Jesus, Maria...”, juntou as mãos e assim expirou, alguns minutos após as 3h30 da manhã. Após sua morte, seu semblante apresentava uma espécie de beatitude. À noite, após o jantar, nós nos reunimos ao redor de seu corpo que não nos inspirava o medo que ordinariamente produz um cadáver. Mas, havia algo que, em nossa dor, nos dava uma secreta consolação. Seu rosto tinha uma expressão de doçura, diria até de contentamento, que parecia dizer-nos: “Não chore por mim, estou bem.” Nós todas nos propusemos seguir os grandes exemplos de virtude que ela nos deu. Meu caro senhor, una-se a nós, siga as pegadas de sua filha. Se soubesse quanto as orações pelo senhor foram ardentes e freqüentes! Quem poderia dizer quantas mortificações fez para obter sua conversão? Que tudo isso não seja perdido. Eis um tempo precioso para nós todos, o da quaresma, ao qual acrescentamos a grande graça do jubileu. Tenho confiança de que o senhor fará o que o melhor dos mestres lhe pede e que não levará a mal o que acabo de lhe dizer. Saúdo com muita afeição sua virtuosa esposa, bem como sua querida família e, sou, com muita consideração, senhor, sua humilde e obediente serva. Irmã Emília. 129 Alusão ao jubileu da redenção e aos grandes sofrimentos suportados, com heroísmo sobrenatural, pela Irmã Fébronie (1. 128) (L 442, M 258-259). À Madre Françoise e Madre Antoinnette, em Livinhac. Villefranche, 10 de março de 1833. J.M.J. 488 177 afastado de Deus, Madre Emília lhe conta os últimos instantes da religiosa e procura obter assim sua conversão (L 441). Ao Sr. Bouquiers. Villefranche, 7 de março de 1833. J.M.J. Prezado Senhor: Sua filha, nossa muito querida Irmã Fébronie, que tivemos a dor de perder, mas cujas eminentes virtudes nos dão a certeza de que agora está no céu ou bem perto de nele entrar – pois se o senhor tivesse visto, como eu, seu equilíbrio de alma, sua paciência, sua doçura, a santa alegria, essa doce paz que acompanha a virtude – se, digo, como eu, o senhor tivesse visto tudo isso na sua virtuosa filha, diria consolado: “Eu tenho uma filha no céu.” É essa virtuosa religiosa, modelo de todas as virtudes, que muitas vezes me falou de uma coisa que a afligia profundamente. É que desde muito tempo o senhor negligencia o grande dever de sua salvação e não se confessa. Perdoe, eu lhe peço, a liberdade que tomo. O que me dá essa liberdade é o grande interesse que tenho pelo pai daquela que tanto amei, que era minha consolação e meu apoio. Pense que é ela quem lhe fala e lhe suplica não atrasar mais o grande dever de sua salvação. Procure, por uma volta sincera a Deus, a felicidade que ela teve na sua bem-aventurada morte, tão tranqüila que se assemelhava mais a um sono do que à morte. Dizem com razão que esse último momento é terrível, mas posso assegurar-lhe que não foi assim para ela. Ao contrário, foi precedido de atos da mais terna piedade. Na noite de sua morte, quando lhe diziam: “Meu Deus, a vontade do Senhor seja feita”, ela prosseguia: “Tanto tempo quanto o Senhor quiser, como quiser e tanto quanto quiser.” Se lhe diziam: “Jesus, Maria, José” ela continuava: “Agora e na hora de minha morte.” Dizia de vez em quando: “Vamos, entremos no lado sagrado de Jesus e estabeleçamos nele nossa morada.” Ela queria segurar em suas mãos uma imagem de São José, que ela olhava com satisfação e dirigia também, muitas vezes, os olhos com devoção para as imagens que estavam ao redor de sua responder ao que lhe perguntava, você disse: “Eu lhe repeti isso cinco ou seis vezes.” Se tivesse ficado calada, teria feito um ato de humildade. Ontem pela manhã, quando visitei as classes para ver se tudo estava em ordem, você subiu depressa para verificar se nada estava fora do lugar. Você deveria ter-me deixado passar primeiro. Quando lhe disse um desses dias que o bolo de pão que você tinha feito para os pobres não era bom, você respondeu: “Em casa não se faz dessas coisas.” Teria feito melhor, se me tivesse dito: "Isto é bem verdade, gostaria que me ensinasse a fazer melhor." Eis pequenas ocasiões de praticar a humildade: não as deixe passar como tem feito até agora. A Irmã: Gostaria que a senhora me dissesse como o orgulho pode perder uma pessoa? A Madre: Pode perdê-la de várias maneiras. Em geral, uma pessoa orgulhosa é temerária, expõe-se sem medo ao perigo. Se ela perece, podemos dizer que foi o orgulho que a perdeu. Uma pessoa orgulhosa está demasiadamente apegada às suas idéias. Acredita ter luzes superiores às dos outros e, se vier a se enganar em alguma coisa, não há meios de fazê-la voltar atrás. Todos os hereges de que se fala na História da Igreja só o foram porque eram orgulhosos. Todo mundo pode se enganar, cometer um erro, mas se a pessoa é humilde, acredita naqueles que lhe chamam a atenção e, sobretudo, na Igreja, que é infalível. Nós aqui, não nos tornaremos hereges, não creio, porém existem muitos erros na cabeça das religiosas e erros perigosos que só a humildade pode curar. Assim, uma religiosa põe na cabeça que fará mais e melhor se voltar para o mundo. Seus superiores, seu confessor que vêem com clareza o perigo, dizem-lhe que é uma loucura da qual se arrependerá e nada omitem para retê-la. Se ela for humilde, reconhecerá que está errada; caso contrário, cairá na cilada do demônio. Ei-la quase perdida e é o orgulho que lhe causou esse mal. Uma outra, que possui muitos talentos e que gosta de fazê-los aparecer, ama os elogios. É advertida para permanecer na sombra, na medida em que suas funções o permitirem, fugir dos louvores dos homens, 178 sobretudo das pessoas do outro sexo, de qualquer idade ou condição. De nada adianta, quer que todo mundo saiba os pequenos sucessos que obtém na sua classe. Sem querer confessá-lo, atrai as visitas do vigário e de seu coadjutor, de algumas outras pessoas capazes de julgar os méritos que acredita ter. Elogiam-na porque se conhece ser esse o seu ponto fraco e quase sempre a prejudicam assim. Se tivesse sido humilde e dócil, isso não lhe teria acontecido. Eis outra que não observa exatamente a Regra. Seu confessor, seus superiores a advertem, impõem-lhe alguma penitência própria para fazê-la corrigir-se. Não cumpre as penitências e achando que o confessor e sua superiora a incomodam demais, abandona o primeiro para ter um outro menos severo e raramente vai comunicar suas disposições à sua superiora e ainda não lhe diz tudo. Essa religiosa encaminha-se para sua perda e é o orgulho que a perderá. Deus odeia o orgulho em todos os homens, mas em suas esposas, de modo particular, não o pode suportar. Assim, os pecados vergonhosos nos quais permite que caiam são um castigo daquele defeito que sempre pune. A apostasia do santo estado religioso é ainda um castigo daquele pecado e esse castigo é, a meu ver, um dos maiores. A Irmã: Isso me causa medo. Peça ao bom Deus que nunca me envie um desses castigos. É melhor eu morrer do que deixar a Congregação ou cair em algum pecado grave. Oh! como tenho medo! A Madre: Um medo moderado lhe será salutar e a guardará. O exemplo seguinte vai lhe mostrar quanto os louvores dos homens fazem mal às almas que são consagradas a Deus. Uma de nossas Irmãs a quem quero muito bem era um anjo de piedade durante o noviciado. Suas delícias eram rezar e se entreter com as coisas de Deus. Enquanto ficou comigo, perseverou nos seus bons sentimentos. Edificava suas companheiras. Com a idade de 22 ou 23 anos, foi enviada a uma casa secundária e recebeu alguns elogios sobre seus talentos e sua piedade. Tinha muitos talentos, recebeu esses 487 fere para uni-la mais a ele. Se algumas vezes se sente desanimada pela duração de sua doença, lembre-se de que, no dia em que pronunciou os santos votos, escolheu Jesus como seu único bem e abraçou sua cruz, bem decidida a carregá-la até seu último suspiro. Essa cruz que a natureza tanto repugna carregar é, todavia, um verdadeiro bem, visto que nos abrirá, um dia, as portas do céu. É quando tivermos a ventura de entrar na morada da verdadeira felicidade que conhecermos todo o seu valor e nós nos felicitaremos por tê-la carregado de bom grado, em seguimento a nosso Esposo. Peço-lhe, minha muito querida Irmã, que não se deixe abater. Deus está com você. Lembre-se com gratidão de todos os sentimentos de amor, de abandono e de resignação que Deus lhe deu tantas vezes, deste espírito de sacrifício que você lhe ofereceu ao pé do altar, do desejo que teve, sobretudo após a santa comunhão, de ser toda dele, querendo unicamente sua santa vontade. Diga-lhe que os renova como se estivesse atualmente em todo o seu vigor e esteja bem decidida, se for do agrado do seu bom Mestre restituir-lhe a saúde, a viver apenas para amá-lo e servi-lo. Procure lembrar-se também muitas vezes das dores cruciantes que nosso Salvador suportou por nós todos e una seus sofrimentos aos dele. Saúdo-a afetuosamente e sou, no seu divino Coração, sua Madre muito dedicada. Irmã Emília. Todas nós rezamos por você e nossas Irmãs lhe dizem mil coisas e tudo que se pode almejar. 128 Irmã Fébronie (Elisabeth) Bouquiers, nascida em Cajarc no dia 14 de fevereiro de 1809, tinha professado no dia 15 de outubro de 1826 e morreu em 4 de março de 1833, em Villefranche. Desempenhou bem as funções de mestra de noviças e de assistente, que exerceu de 1830 a 1832 (cf. 1. 122). Estando seu pai infelizmente 486 179 por nosso amor. Somos suas esposas, devemos esperar sorte melhor do que ele? Ah! se conhecêssemos o valor dos sofrimentos e a vantagem que há em carregar a cruz nas pegadas do nosso bom Mestre, não desejaríamos viver um instante sem ela. Num tempo tão precioso como este que vivemos, vá ao presépio pedir ao Menino Deus recém-nascido, a graça de lhe fazer conhecer a felicidade que há em sofrer por ele. E, a exemplo dos reis magos que festejamos sexta-feira, ofereça-lhe seu coração, sua vontade, seus desejos, para não mais viver senão do seu santo amor. Encorajo-a fortemente a dizer tudo à Madre e a lhe abrir seu coração. Ela é tão boa! O bom Deus abençoará esse meio e esteja certa de que graças bem especiais são ligadas a essa fidelidade. Sensibiliza-me a lembrança de Victoire e de Angèle. Saúde-as de minha parte. Saúdo-a com afeição e sou, toda sua, nos santos Corações. Irmã Emília. 127 Uma doença que se prolonga indefinidamente pode, em certas horas, levar ao desânimo: renovar todos os melhores sentimentos que se pôde experimentar (L 437, M 250-251). À Irmã Anne-Sophie Tarayre, em Aubin. Villefranche, 10 de janeiro de 1833. J.M.J. Minha muito querida Irmã: Soube, pelas cartas de Madre Françoise, que seu estado de saúde continua o mesmo, mas ela não me diz se você conserva a coragem e a confiança em Deus nessa longa provação. Gosto de pensar, minha bem-amada Irmã, que, submissa ao beneplácito divino, você beija a mão que em sua misericórdia a elogios com prazer e, longe de rejeitar o veneno que lhe era oferecido, sem tomar cuidado o absorvia cada vez que o apresentavam, sem medo nenhum. Amou naturalmente as pessoas que tinham para com ela um afeto particular. Essas duas coisas a fizeram degenerar a tal ponto que, alguns anos depois, tendo-a chamado novamente perto de mim, não a reconhecia mais. Só desejava a estima e a afeição das criaturas, tinha um desgosto muito grande pela oração e pelas coisas de Deus. Era com dificuldade que se suportava no claustro. Queria voltar para a casa onde o demônio a havia iludido. Eu me opus fortemente. O demônio lhe sugeriu abandonar a clausura. Mostrei-lhe todos os perigos que encontraria numa escola e que, se alguém precisava de clausura e de retiro para se salvar, era bem ela. Tendo feito apelo a seu coração, à afeição que sempre tive por ela, supliquei-lhe, em nome desse amor de mãe que enchia meu coração por minhas filhas, sobretudo por ela de quem cuidara desde jovem, supliquei-lhe que voltasse a melhores sentimentos. Desmanchou-se em lágrimas e prometeu-me não sair do claustro. O demônio voltou a tentá-la, pondo-lhe na cabeça regressar ao mundo onde poderia dedicar sua afeição a alguma criatura. Mostrei-lhe a tentação e, tomando-a por seu lado fraco que é um coração terno e afetuoso, consegui que voltasse para Deus. Ela não recuperou ainda seu primeiro estado de fervor, mas espero que volte a ele. Os elogios dos homens são um veneno dos mais atraentes e dos mais sedutores. Fuja sempre deles e não evite a censura e a crítica. 180 485 4. Conferência sobre a clausura (C 8-9; nº 4). Este angustiado desabafo deve situar-se em dezembro de 1844, quando foi oficialmente declarada a proposição do cônego Barthe de suprimir a clausura em toda a Congregação. (v.s. introdução p. 20). Para a fundadora, a clausura assegura às suas religiosas uma garantia institucional de obscuridade na qual se prolonga o mistério da vida em Nazaré. No seu tempo, a clausura não era incompatível com as escolas, mas certamente, no tocante a esse assunto, ela teria aceitado as novas exigências do apostolado contemporâneo. (v.i. nnº 5, 21, 24). nossos bem-amados modelos: Jesus, Maria, José.1 Como somos felizes por estar numa tão santa e tão amável companhia! O que não deveríamos fazer para responder à infinita bondade de Deus a nosso respeito? No início deste ano, que desejo seja todo vivido nos santos Corações, reanimemo-nos. Humilhemo-nos e joguemo-nos confiantes no seio da divina misericórdia, abraçando a cruz de nosso doce Salvador. Desejo ardentemente, minhas muito queridas Irmãs, darlhes melhores exemplos do que tenho feito no passado e ser para vocês melhor Madre, pois, quanto à minha ternura por todas, vocês sabem que não há nada a acrescentar. É nesses sentimentos que as saúdo de todo o coração no bom Mestre. “Ainda quarenta dias e Nínive será destruída.” Minhas caras Irmãs, essas palavras do profeta Jonas aos ninivitas me chamaram vivamente a atenção durante a minha meditação. Atravessamos um momento muito difícil. Comparo a nossa situação atual à dos ninivitas, quando Deus lhes envia seu profeta."11 Ainda quarenta dias, ainda um pouco de tempo e um dos elos que nos une a Deus será rompido. Nosso voto de clausura será extinto. Deus não quer destruir Nínive se ela se converte. Não, ele a ameaça somente com uma ruína total se ela persevera na sua idolatria; mas, se mudar, grandes graças lhe são reservadas. Eu também não penso, minhas caras Irmãs, que Deus queira abalar a nossa Congregação nos seus alicerces, tirando-nos a clausura. Não, ele quer somente nos dar uma boa lição, fazendo-nos reconhecer muitas faltas que me parecem a única causa desse castigo. Nesse extremo, sem nos abater nem desanimar, vamos imitar os ninivitas na sua penitência. Antes de lhes falar da quarentena que prometi ao bom Deus que todas nós faríamos, vou dizer-lhes, em poucas palavras, o que irritou o céu contra nós e o que temos de fazer para reparar. Foram os homens os primeiros a pensar em nos privar da clausura? São o senhor Bispo ou os Padres que não crêem na sua subsistência que irão eliminá-la? Não, minhas caras Irmãs, não é assim que vejo a situação e que lhes peço encará-la. As primeiras que prejudicaram a clausura fomos nós, minhas caras Irmãs, e Deus Irmã Emília. Ano de 1833 126 Simpatizando cordialmente com uma religiosa que sofre, Madre Emília procura colocar esta provação numa perspectiva sobrenatural: mistério da cruz, esperança do céu, contemplação do presépio (L 435, M 194-195). À Irmã Augustine, em Aubin. Villefranche, 2 de janeiro de 1833. J.M.J. Minha caríssima Irmã: Fiquei muito penalizada ao ler a sua carta e compartilho bem sinceramente todos os seus sofrimentos, tanto interiores como exteriores. Desejaria poder aliviá-la, mas somente Deus pode fazê-lo. Aguardando que ele o faça, não se deixe abater e procure submeter-se à sua santa vontade. Lembre-se de que os sofrimentos e contradições são, neste mundo, o único caminho que leva ao céu e que tal é o privilégio de um Deus crucificado 484 181 verdadeira humildade que provoca sua dor. Melhor seria pensar em desempenhar bem a sua função do que lamentar-se sobre as dificuldades que tem para exercê-la. Aliás, para que tanta tristeza? Você recebeu esse cargo, será preciso cumpri-lo, quer queira, quer não. Pelo menos, fazendo-o com boa vontade, terá o mérito da resignação. Assim, creia-me, não pense mais nisso e cumpra bem suas obrigações. (A assinatura foi cortada para dá-la a uma pessoa de fora que pedia com a mais viva insistência a assinatura de Madre Emília) 125 Ainda uma vez, Madre Emília acredita dever lembrar suas faltas por ocasião das recentes permanências em Aubin ou Livinhac. Aproveita a oportunidade para exortar a viver com Deus, cumprindo o regulamento (L 434, M 253-254). Às Irmãs de Aubin e Livinhac. Villefranche, 31 de dezembro de 1832. J.M.J. Minhas caríssimas Irmãs: Voltando ao tempo que passei em Aubin, em diferentes ocasiões e especialmente àquele que passei em Livinhac, reconheci que tinha cometido uma infinidade de faltas que foram mau exemplo para vocês. Dentre outras coisas, a respeito do silêncio. Reconheço ter usado de muita liberdade em Santa Marta (cozinha) e no meu quarto, onde muitas vezes falei sem que a necessidade ou a utilidade me obrigasse. Concedi permissões com demasiada facilidade e não fui bastante firme quanto à observância do regulamento. Desde a minha volta, lembro-me sempre destas palavras tão impressionantes: "Aquele que vive do regulamento vive de Deus." Ah! minhas queridas Irmãs, possamos nos penetrar dessa regra santa e amála de tal forma que, gravada no mais íntimo de nossos corações, só vivamos para observá-la e que, amando-a mais do que nossa própria vida, por meio de sua exata observância, honremos não se serve das pessoas que nos fazem sofrer a esse respeito senão como instrumentos vingativos de sua justiça. Em que, me perguntarão vocês, nos tornamos culpadas? Eilo: procuramos elevar-nos além do que devem ser os membros da nossa Congregação, desejamos receber jovens da classe privilegiada. Para isso, não hesitamos em transgredir algumas regras da clausura, o que nunca teríamos feito caso se tratasse de crianças pobres, da classe média. Entretanto, foi somente nos pobres que eu pensei ao fundar a Congregação. Não foi para educar as senhoritas que vocês entraram na Congregação. Não foi para isso, mas para educar os pobres. Preocupamo-nos demais com a opinião das pessoas do mundo, procurando agradá-las, atraindo seus elogios em vez de menosprezá-los. Não procuramos, como o ordenam nossas Constituições, colocar nossa Congregação abaixo das outras. As que são subalternas aspiram aos cargos e as que fazem os trabalhos domésticos desejam ser professoras. Esse comportamento desagradou a Deus e, por um castigo que evitaremos se nos corrigirmos, somos ameaçadas de ver extinto o nosso voto de clausura. Ah! minhas Irmãs, que infelicidade se a clausura vier a ser extinta! Será a temer que a Congregação se arruine, porque o espírito que animou os primeiros membros seria destruído. Então, veríamos as coisas declinarem dia a dia, a regularidade se enfraquecer, o espírito do mundo se introduzir e seríamos apenas fantasmas de religiosas, bastões vestidos. Como gostaria que o bom Deus nos iluminasse, desse a todas nós o verdadeiro espírito que devem ter as Irmãs da Sagrada Família, esse espírito que nos conservará e nos fará viver; mas se tivermos a infelicidade de perdê-lo, logo nos acabaremos. Acreditem-me, minhas caras Irmãs, permaneçamos sempre bem pequenas. Deus olhará para nós. Coloquemos nossa Congregação abaixo das outras e nada perderemos. Se soubermos permanecer na humildade, na simplicidade, na pobreza e, sobretudo, se conservarmos nosso coração isento da ambição de agradar aos homens, de rivalizar em mérito pessoal ou local com os outros Institutos religiosos, não teremos nada a temer pelo futuro da Congregação. Ela será abençoada, a Sagrada Família a conservará e a cobrirá com a sua proteção. Teremos seu espírito que é um bem perfeito. Ter o espírito de 182 Jesus, Maria e José, que felicidade! Então, eu lhes permitirei rivalizar com os demais Institutos religiosos porque não teremos outra ambição senão a de ser as mais pobres, as mais humildes, as mais mortificadas. Ambicionaremos o nome de Irmãs Mínimas de que o mundo não faz caso, Irmãs para os pobres, para todos aqueles que o mundo rejeita. Esse nome de “Mínimas” sempre teve a minha simpatia, desde que conheci São Francisco de Assis.12 Não podemos acrescentá-lo ao de Irmãs da Sagrada Família, mas lembrem-se sempre de que desejo que o acrescentemos em nosso espírito e nos comportemos de maneira coerente com ele. Somos chamadas a imitar a Sagrada Família, a viver como ela, desconhecidas e pequenas. Deveríamos estar constantemente ocupadas em seguir os exemplos dos três modelos que Deus nos deu. Quem mais pobre, mais humilde, mais retraído que a Sagrada Família? Jesus, Maria, José viveram numa obscuridade completa. A cidade de Nazaré era a sua clausura. Dela não sabemos que tenham saído sem a ordem de Deus. Também nós, minhas caras Irmãs, não deixaremos jamais nossa Nazaré, nossa cara solidão, sem ordem expressa do Senhor. Lá imitaremos, mais do que até agora, a Sagrada Família, bem persuadidas de que ela aplacará o céu irritado contra nós. Nosso voto de clausura nos será conservado, nisso tenho plena confiança. Se entre vocês há alguma indecisa, que não ama a clausura ou não queira nela permanecer firme como um rochedo para a conservação da regularidade e da prática de todas as virtudes como acabo de lhes falar, que se decida agora e passe enquanto há liberdade para o ramo não-clausurado. Aí, ela terá mais latitude, um pouco menos de constrangimento do que as que não querem recuar diante de uma decisão tomada, desejando realmente ser mais fervorosas, fazendo tudo que depende de nossa vontade para não abrandar a clausura. Eis o que devemos fazer para que Deus nos seja favorável. Amanhã começaremos uma quarentena, durante a qual faremos vários jejuns, várias comunhões, para obter a conservação da clausura. Aquelas que não puderem jejuar venham me perguntar o que deverão fazer para substituir o jejum. Todas as penitências que deverão ser feitas durante esse tempo, tais como vigílias, disciplinas, humilhações públicas, serão feitas 483 Saúdo-a nos santos Corações. Mil recomendações a nossas Irmãs, a Victoire e às nossas crianças. Irmã Emília. Uma das causas de seu mal-estar interior bem poderia ser o vivo apego que tem para comigo. Preste atenção nisso. Pareceme que a esse respeito, em muitas coisas, você segue os impulsos da natureza. Creio que deveria evitar pensar e falar de mim e não alimentar o desejo de me ver. Acredito ainda que você não aceita, com bastante generosidade, as dificuldades inerentes ao cargo de superiora e se fecha demais em si mesma. Quanto às suas confissões, não pense mais nisso e entregue-se à divina misericórdia. O melhor de todos os meios para curar nossos males é abraçar a cruz de todo o nosso coração. Sexta-feira será a festa de Santo André. Esforcemo-nos para seguir o seu exemplo. Queira dizer a Victoire que lhe responderei pessoalmente. 124 Esclarecimentos a respeito de uma carta na qual esta religiosa manifestava um pouco de amargura. Encorajamentos para aceitar inteiramente a vontade de Deus (L 432, M 252). À Madre Antoinette, em Livinhac. Villefranche, 20 de dezembro de 1832. J.M.J. Minha caríssima Irmã: Não posso responder a Philippine. Envio-lhe as mais afetuosas lembranças e fico triste porque leva tão pouco em consideração o que lhe disse. Encorajo-a a refletir menos e a colocar sua confiança em Deus. O mesmo digo a você. Nosso Pai leu para mim a carta que você lhe escreveu e ficou penalizado. Creio, minha Irmã, que leva o caso longe demais. Lamenta ter se deixado abater pelo sofrimento. Não é uma 482 183 Ontem, nós nos propusemos ser bem devotas hoje e de nos doarmos inteiramente a Deus. As senhoritas Caroline e Rose (jovens que desejam ardentemente ser Irmãs da Sagrada Família e ensinam na classe gratuita) fizeram conosco esse projeto. Mas a tristeza é que não esperávamos ter a santa missa. Ontem o vigário tinha vindo celebrá-la. Eu lhe expus nosso desejo, mas ele me disse que tinha uma missa de 7° dia. Nossa Irmã Laurier, por sua vez, foi pedir ao pároco para nos celebrar a santa missa (pois ela lamenta muito não termos missa). Ele lhe disse que tinha uma missa de 7° dia. Nós nos resignamos, mas o bom Deus, sensível aos nossos desejos, quis entretanto que o vigário viesse celebrá-la. Imaginem nossa alegria, pois sentimos muito mais o valor do santo sacrifício quando dele estamos privadas. com essa mesma finalidade. Que não haja uma só pessoa na Congregação que se omita a participar dessa aflição pública com o objetivo de aplacar o Senhor. Os ninivitas fizeram jejuar as crianças lactentes e os animais e, no entanto, as crianças e os animais não eram, de forma alguma, culpados; é preciso fazer rezar as crianças sem lhes dizer o porquê. As postulantes e as noviças, consideradas como parte da comunidade, devem, como nós, se cobrir de saco e cinza, isto é, rezar, humilhar-se e mortificar-se. Não desanimemos. Deus atenderá às nossas preces. Há pouco, o vigário trouxe uma jovem protestante que quer se converter. Ela deve entrar segunda ou terça-feira. Eu a recomendo às suas orações. 123 Após alguns negócios práticos, Madre Emília adverte Irmã Françoise sobre o excessivo apego que acredita discernir nela a seu respeito (L 428). À Madre Françoise, em Aubin. Livinhac, 26 de novembro de 1832. J.M.J. Com efeito, é muito gratificante para você e para mim estarmos afastadas de todo conserto. O Sr. Vigário se ocupará disso com prazer e nós faremos melhor a oração. Como você sabe, pedimos muitas coisas em Villefranche. Quando você as tiver recebido, poderia enviá-las e a mula voltaria carregada com as batatas e o toucinho. Se tiver bastante óleo, poderia nos enviar também. 5. Diálogo com uma noviça não-clausurada que desejava fazer o voto de clausura (D 65-68; nº 27. Neste diálogo algumas linhas foram omitidas; a supressão está assinalada por pontos de reticência.). Trata-se da Irmã S. Tauriac, em 1845. Madre Emília afirma a importância da clausura, mas se interroga se essa jovem de 15 anos deve assumir tal compromisso, quando antes sentia que Deus a chamava para o ramo não-clausurado. São, pois, dois critérios de escolha individual, e em vista de uma decisão sobrenatural que a superiora propõe, cujos avisos e controle se repartem em várias conversas aqui reagrupadas. Tanto no plano individual como no coletivo, é assunto de discernimento do "melhor," segundo a vontade de Deus.13 184 481 A Irmã: Madre, desde algum tempo sinto-me muito atraída pela clausura. Sou tão fraca que temo não perseverar se for enviada para uma escola. A Madre: Você sentiu esse atrativo antes de entrar no noviciado das Irmãs não-clausuradas ou depois que entrou no convento? A Irmã: Madre, antes, nada conhecia a respeito das Irmãs clausuradas, mas desde que as vi, compreendi a felicidade das pessoas totalmente separadas do mundo e senti o maior desejo de imitá-las, prometendo ao bom Deus que me tornaria Irmã clausurada. Depois, compreendo que, com minha natureza fraca, eu me arriscaria a não ser fiel à minha vocação. Sempre gostei do prazer, do divertimento e facilmente me deixo levar. Mais eu avanço, mais tenho pressa em lhe solicitar essa graça. A Madre: Penso como você que uma inteira separação do mundo lhe seria vantajosa. Você teme e tem motivos suficientes para temer. É necessária muita força de vontade às nossas Irmãs não-clausuradas, sobretudo quando são jovens e tudo lhes sorri. Não sou contra seu desejo de clausura, mas você precisa refletir bastante para depois não se arrepender. Que idade você tem? A Irmã: Tenho 15 anos. A Madre: Você é muito jovem. Acho uma resolução bastante precipitada que poderia mais tarde levá-la ao arrependimento. O melhor será refletir diante de Deus sobre esse passo que deseja dar, pedindo-lhe para esclarecê-la. Reze muito à Santíssima Virgem, faça uma novena em sua honra. Sobre esse assunto, nada comente com as demais noviças. Fale somente à madre mestra,14 a mim e ao bom Deus. A Irmã: Madre, não sei por qual motivo a madre mestra me desencorajou quando lhe disse que desejo ser clausurada. Ela me despediu tão friamente, dizendo-me que não sou bastante mortificada, que não perdesse tempo fazendo castelos no ar. ao porco, limpar o pequeno sanitário, levar lenha à Irmã Marthe, eis minhas ocupações. São muito do meu gosto. Nossas crianças são muito dóceis e, conseqüentemente, não dão trabalho. Nossas Irmãs são bem comportadas e não me ocupam muito, a não ser para lhes fazer algumas conferências. Observamos um grande silêncio, quase não vamos ao parlatório, nada de negócios. Eis em que consiste a minha vida. Nessa calma profunda, não as esqueço, vocês estão muito presentes ao meu espírito. Lembro-me em particular de nossa querida Irmã Fébronie1 que carrega meu fardo com satisfação para vocês e para mim. Estou persuadida de que continuam todas a torná-lo leve, de tal maneira que ela se sinta mais consolada do que cansada. Quanto a vocês, minhas queridas Irmãs de Aubin, façam o mesmo para com Madre Françoise, que agora enxugou suas lágrimas, vendo que isso não adiantava. Fico pensando quanto seríamos felizes se, a exemplo de nossa boa Mãe do céu, nos entregássemos amanhã a Deus sem reservas. As almas que nada recusam a Deus sabem o que significa pertencer-lhe sem reserva. Como essa experiência deve ser doce! Quando é que nós a faremos? A fidelidade nas pequenas coisas é um dos maiores meios. Peçamos a nosso Pai São José e a nossos santos anjos da guarda de no-la obter. Eu as saúdo, minhas muito queridas Irmãs, assim como a todas as nossas crianças. Recomendações a Pe. Cabantous e à Madre Maurice. Irmã Emília. P.S. (Dia 21, continuação). Marie Sophie saberá com prazer que nossa Irmã Laurier é sacristã da paróquia e desempenha muito bem sua função, ao gosto do vigário. E, a propósito do Sr. Vigário, ele nos é muito dedicado. Lamenta ver-nos privadas da santa missa. Esse padre nos dá o exemplo da vigilância e do zelo no cuidado das almas. Na sua paróquia, ele é como uma superiora no seu convento, conhece o interior de cada família, todos os temperamentos, todos os negócios de suas ovelhas. Está em toda parte, concilia todas as desavenças tanto quanto lhe é possível. Interessa-se vivamente pela instrução das crianças e não deixa de ir as casas para buscá-las. 480 185 de graça e de misericórdia, onde somos purificadas e abundantemente nutridas. Aproximemo-nos deles com respeitoso temor acompanhado do mais ardente amor. Não nos acostumemos com os benefícios de Deus. Quando devemos receber a santa absolvição, lembremo-nos dessa graça com muita gratidão, e, após tê-la recebido, façamos o mesmo com a santa comunhão. Que a idéia de fazê-la, bem como sua lembrança nos tornem recolhidas e, sobretudo, nos tornem dispostas aos pequenos sacrifícios que pede aquele que se dá a nós com tanto amor. Sou, com a afeição que vocês conhecem, sua Madre. Irmã Emília. Não voltei mais a falar com ela. Sinto-me feliz por ver que a senhora pensa como eu. A Madre: Pobre criança, sua mestra, como eu, quer o seu bem, sua salvação. O que ela lhe disse não foi para desencorajála. Se seu desejo persistir e você continuar na disposição de fazer os sacrifícios que vou lhe propor, eu lhe permitirei ingressar na clausura. Vai refletir os seguintes pontos: 1º Terei a coragem de permanecer dez, vinte, trinta, quarenta anos no mesmo lugar, sem mudar de casa, sem sair? 2º Se eu adoecer e o médico achar que uma saída é necessária para que recupere a saúde, teria a coragem de oferecer-me como vítima, preferindo morrer a sair da clausura? 122 Madre Emília conta com humor suas ocupações subalternas e expressa sua alegria ao ver a regularidade reinar na comunidade de Livinhac. Elogia o zelo do vigário (L 426, M 241-243). Às Irmãs de Villefranche e de Aubin. Livinhac, 20 de novembro de 1832. J.M.J. Minhas queridas Irmãs: Enquanto vigio a vaca, pensei em escrever-lhes uma palavrinha. É muito fácil vigiar vacas. Certamente, é preciso experimentá-lo para saber. Esse pobre animal se dirige com grande docilidade para o lugar onde deve pastar, não dá nenhuma preocupação e é muito tranqüilo. É justo, minhas caras Irmãs, que após ter partilhado com vocês a preocupação e o trabalho que tive durante algum tempo, eu lhes fale um pouco de meu repouso que é tão grande quanto a ocupação foi considerável. Agora, descascar castanhas, fazer algumas visitas 3º Se meus pais adoecerem e desejarem insistentemente que eu vá vê-los e, se, pedindo, obtiverem essa permissão, teria força para resistir? 4º Se violentas tentações, sofrimentos interiores e outras dolorosas provações me assaltarem na clausura, permanecerei firme? Estou plenamente decidida a morrer antes que desistir da clausura? Medite sobre essas quatro exigências diante do bom Deus e veja quais as suas disposições a respeito delas. Na próxima vez que vier me prestar conta das suas disposições interiores, me dirá o resultado das suas reflexões. A Irmã (alguns dias depois): Minha Madre, dos pontos que a senhora me deu para refletir há dois que me causam um pouco de medo. É de talvez permanecer quarenta anos no mesmo lugar, sobretudo se estiver doente. A esse pensamento sinto-me desfalecer, não teria força, mas, apesar disso, algo me diz que não devo desistir da clausura. Gostaria de abandonar essa idéia, mas não consigo. A Madre: Quando alguém se decide pela clausura, deve oferecer-se como vítima, ofertar a Deus o sacrifício da saúde, 186 da vida. Não deve mais desejar rever o mundo e a família, senão através das grades. ...................................................................................................... A Irmã: Minha Madre, peça a Deus que me conceda a graça de sempre fazer a sua vontade, de me dar a força para corresponder ao seu apelo. 479 esperança de que Deus vai atendê-la que sou, com muita afeição, nos santos Corações, Sua serva muito humilde. Irmã Emília. PS: Estamos solidárias com a doença do Senhor seu cunhado e rezamos por ele. A Madre: Rezarei e farei rezar. Reze também você, porque disso, pode depender a sua salvação. Existem almas para as quais a vida no claustro é necessária à salvação. Você poderia ser do número delas. Falarei disso ao nosso Superior. O bom Deus nos fará conhecer sua vontade. Não se inquiete. 121 A Irmã (alguns dias depois): Minha Madre, nosso Superior me falou sobre a clausura. Disse-me que deveria esperar quatro ou cinco anos para fazer o voto. Meu confessor me disse também que vou bem nas escolas e que devo permanecer nelas, bem tranqüila. E a senhora, o que pensa disso? O único bem a que se pode verdadeiramente aspirar na vida religiosa é a união com Deus; pedi-la com um coração mais pobre; aproximar-se dos sacramentos com um grande espírito de fé (L 425, M 240-241). A Madre: Penso como eles. A primeira vocação é a melhor. Procure fazer o bem no ramo das Irmãs nãoclausuradas. Livinhac, 19 de novembro de 1832. A Irmã: Minha Madre, interiormente, algo me diz que devo ingressar na clausura, apesar do esforço que faço para me libertar dessa idéia. A Madre: Resolvemos que você irá passar algum tempo em N..(casa não-clausurada) para ver se essa idéia passa. Viajará por esses dias. Não se aflija. Se perseverar em pedir a clausura, essa lhe será concedida. A Irmã: Minha Madre, penso que se eu for passar algum tempo numa escola, correrei o risco de perder a minha vocação para a clausura. Gosto tanto do mundo, dos passeios, da superiora de... receio que se for para lá não queira mais voltar para a clausura. É preciso que o bom Deus me atraia fortemente, como ele o faz, para eu pedir a clausura. Não gosto Às Irmãs de Villefranche e de Aubin. J.M.J. Minhas caríssimas Irmãs: A única coisa a que devemos aspirar em nosso santo estado é uma íntima união com Deus.1 Para consegui-la, nada nos deve parecer demasiadamente penoso ou difícil. Nada nos deve desanimar. Assim, aspiremos incessantemente a esse único bem. Que todo o resto nos pareça realmente desprezível, de forma que não ocupe nosso espírito e, ainda menos, o nosso coração que não é feito senão para o único bem. Peçamos sem cessar esse bem único, esse bem soberano que é o tudo da alma religiosa que, tendo renunciado a tudo, se torna infinitamente rica porque na sua pobreza possui o tesouro dos tesouros. Um meio de atingir esse ideal é receber os sacramentos com grande espírito de fé, apreciando com todas as nossas forças esses dons preciosos da divina misericórdia. Nosso santo estado nos proporciona a vantagem de haurir com freqüência nessas fontes 478 187 À Senhora Marty, em Villefranche. Livinhac, 6 de novembro de 1832. J.M.J. Minha caríssima Senhora: Vejo que na sua grande dor Deus a sustenta. Permite essa dolorosa provação para lhe conceder grandes benefícios. Esteja bem certa de que servirá para uni-la a ele e desapegá-la das coisas presentes. Que é a vida? Que são todas as pretensas vantagens que a acompanham senão objetos que passam e não são feitos para nos apegar? Só Deus é o nosso soberano bem. É ele que pode fazer nossa felicidade. Você me diz em sua carta que seus queridos filhos eram o objeto de todas as suas afeições e elas eram justas. Mas essas afeições talvez, por mais justas que fossem, tivessem algo de exagerado, e com isto Deus perdia uma parte de um coração feito só para ele. Creia-me, minha querida senhora, entre nos desígnios da Providência, fique bem persuadida de que ela é tão boa e misericordiosa quanto justa. Um dia verá que aquilo que a aflige tão profundamente será o motivo de sua alegria e que se alegrará eternamente por ter tido uma dor tão cruel. A Sabedoria eterna nos disse: “Bemaventurados os que choram.” E por quê? Porque suas lágrimas serão, durante toda a eternidade, o objeto de um prazer delicioso. Nunca estaremos bastante convencidos de que não somos deste mundo, pois essa verdade, bem compreendida, suavizaria todos os nossos males. O cristão deve habitualmente elevar seus pensamentos e seus desejos para o céu. Se não o faz, sai da ordem estabelecida por Deus. É bem difícil, quando se têm filhos tão amáveis quanto os que Deus lhe deu, que se ame a Deus com o coração bastante puro. Aproveite, minha querida senhora, esse amargo e penoso remédio que a Providência lhe deu para entregar-se inteiramente ao santo amor. Esse fogo divino enxugará suas lágrimas, após ter sido bem aceso em seu coração. Sua divina doçura substituirá com muita vantagem tudo que perdeu. É para lhe obter essa graça que vamos começar uma novena e é na do interior do convento, prefiro o exterior e, no entanto, algo me diz que não devo mais sair. Creio que seria uma infelicidade para mim ir para uma escola. Coloco-me à sua disposição. Agora farei o que a senhora achar melhor. A Madre: Você não irá, eu a compreendo. Reze e rezarei para que em todas as coisas façamos a santa vontade de Deus. A Irmã (no dia seguinte): Minha Madre, passei toda a noite pedindo ao bom Deus que me conceda a graça de entrar hoje no noviciado das Irmãs clausuradas, se tal é a sua vontade. Pedilhe para que a senhora estivesse de acordo. A Madre: Penso que o bom Deus ouviu o seu pedido. As Irmãs do conselho e eu pensamos ser essa a vontade de Deus. Desde esta tarde você entrará no noviciado das Irmãs clausuradas. Entrando para o serviço de Deus, prepare-se para a tentação. A Irmã (um mês depois): Minha Madre, estou sendo muito tentada a respeito da clausura. Parece-me que sufoco, não posso respirar. Aborreço-me demais. Parece que estou encerrada numa caixa muito pequena onde morrerei por falta de ar. Não gosto de nenhuma noviça nem da mestra tampouco. Não era assim. Sentia tanta consolação quando apenas via essas noviças tão fervorosas, sua mestra tão virtuosa. O que significa isso? Se continuar assim, não poderei fazer o voto de clausura. A Madre: Bem pensava eu que você seria tentada como o está sendo, isso não me espanta de modo algum. Você sofrerá ainda, mas logo que fizer o voto de clausura, tudo passará. A Irmã: Minha Madre, poderei fazer o voto de clausura nesse estado? Minha mestra receia muito e está longe de me aconselhar a fazê-lo. Estou triste ao ver que tanto as minhas mestras, seja quando eu estava no noviciado das escolas, seja agora, não pensam como a senhora. 188 477 A Madre: Isso não quer dizer nada. Eu lhe permito a se engajar, agora que a vontade de Deus lhe é conhecida, a fazer não somente o voto de clausura mas os três outros. Você tem 15 anos. Acredito que a Igreja permite fazê-los nessa idade. Vá procurar o padre, pergunte se você é jovem demais e fale-lhe das tentações que tem tido. Enquanto isso, reunirei os membros do capítulo para lhes pedir seu consentimento. Tenha coragem, reze bem à Santíssima Virgem para que a abençoe e lhe conceda a graça de doar-se totalmente a Deus e prossiga no seu caminho. (Tendo a Religiosa emitido o voto de clausura, não mais sentiu tentação a esse respeito). 6. Diálogo com uma postulante-noviça sobre a confiança para com a mestra das noviças (D 56-58; nº 24). Caso típico, sem dúvida, de adaptação da superiora às circunstâncias e às mentalidades individuais. Ela se mostra aqui muito exigente. Será preciso superar generosamente todas as dificuldades e aversões à abertura de consciência. As motivações secretas da aversão são pouco a pouco reveladas e sintetizadas no orgulho entranhado que se revolta facilmente. A “direção” se prolonga por vários dias. Estamos em 1847. A mestra das noviças é Irmã Joseph Delcamp. A Madre: Minha filha, você está se aborrecendo? Está contente? A Noviça (postulante): Minha Madre, não me aborreço de forma alguma. Estou muito contente. Em sua última carta, você me dizia que não tinha tempo de me dizer tudo e que me diria de viva voz, caso viesse. Não fique triste se eu lhe pedir que não me diga nada mais a esse respeito, a não ser que fosse necessário para a glória de Deus e para minha salvação. Gosto do meu Superior, como você sabe, terna e respeitosamente, e quaisquer que sejam seus pensamentos a meu respeito, isso não mudará em nada minha conduta. Ela será, com a graça de Deus, interior e exteriormente submissa e inteiramente abandonada, de maneira que, qualquer coisa que me pedir, seja para minha conduta pessoal, seja para o governo da casa, eu o farei de todo o meu coração. Se ele quiser minha opinião, eu a darei, se for o caso; se não, agirei de olhos fechados. Talvez pense que seria bom informar-me sobre o que pensa nosso Pai. Engana-se, visto que ele me disse tudo. Digolhe isso porque certamente ele se explicou com você e não quis lhe falar quando estava aqui, julgando não ser útil, e, além disso, poderia contristá-la. Contudo, que isso não a aflija. Nem pense, nem fale sobre o assunto, apenas reze a fim de que eu aprenda a amar o bom Deus e a cumprir bem os meus deveres.1 Eu a saúdo com afeição, assim como nossas queridas Irmãs. Irmã Emília. Nossa Irmã Angélique me disse que você pedia estopas. Não me parece possível que as crianças tenham desfiado o grande saco cheio que lhe enviei. Se você pensou ter me devolvido todo o fio, enganou-se, segundo creio. Repare bem e, quando vier para a lavagem da roupa, levará outras. 120 A Madre: Você gosta de todas as suas mestras? A Noviça: Há uma de quem gosto muito, mas da outra não gosto porque está sempre a me julgar. A Madre: Em que esta Irmã a julga mal? Condolências enviadas à correspondente da carta 114, em circunstâncias análogas. Mesma união de simpatia humana com visão sobrenatural (L 423, M 245-247). 476 189 Minha caríssima Madre: Reconheci que não fiz bem em lhe dizer de falar sobre tal ou tal assunto em meu lugar ao nosso Pai e eu mesma não lhe ter dito tudo que pensava, como o fazia outrora. Assim, está terminado. Eu lhe direi tudo com a simplicidade de uma criança. Ele é meu Superior e com ele devo, como diz M. Tronson, derramar minha alma como a água. Assim, não combinaremos mais o que lhe devemos dizer. Sei como devo falar, isto é, como a meu pai; então, não há nada que me possa perturbar. Arrependo-me sinceramente de tudo o que, com ele, pareceu mistério. Não quero que haja nada no meu interior que ele não possa ver, e a mesma coisa no meu exterior. Terei para com ele o mais inteiro abandono, como antes. Lastimo ter agido desse modo. Você e eu lhe diremos a verdade e só. Saúdo-a nos santos Corações. Você pode ler para nossas Irmãs a carta que Irmã Séraphine escreveu às Irmãs da União. A Irmã: Ela pensa que falo durante a aula, que não me aplico. Foi o que disse à Irmã N. Ela será responsável se eu não for aceita com as outras. Isso me aborrece. Gostaria que essa Irmã fosse mudada. A Madre: Está realmente certa de que essa Irmã fala mal de você? A Noviça: Ninguém me disse isso, mas creio não me enganar. Penso que ela também falou de mim à senhora. A Madre: É preciso não ir tão depressa no seu julgamento, porque poderia muito bem se enganar. Mesmo supondo ser verdade o que pensa, é preferível suportá-lo por amor a Deus, lembrando-se de que muitas vezes você cometeu faltas e ninguém a repreendeu. Ame essa Irmã, tenha para com ela um profundo respeito, do contrário você desagradaria a Deus. Irmã Emília. 119 Ainda um protesto de inteira submissão filial a respeito de Padre Marty, embora sejam bastante pejorativas as apreciações por ele dirigidas à Madre Emília (L 421, M 234-235). À Madre Françoise, em Aubin. Livinhac, 30 de outubro de 1832. J.M.J. Minha caríssima Madre: Rose Olivié acaba de me dizer que você a apresentou a nosso Pai e que ele a aceitaria se eu desse meu consentimento. E não quero senão cumprir o parecer dele. Pode julgar de acordo com a resposta que ele deu. A Irmã: Minha Madre, não faço nada para contrariá-la, mas não posso gostar dela como das outras. Tudo nela me aborrece. Parece-me que não está bastante preparada para dar aula quando Irmã N. adoece. A Madre: Embora não simpatize com ela, procure gostar dela por dever, jamais comente com as suas companheiras o que nela acha de desagradável. Quando falar com ela, faça-o sempre com muita humildade. É uma religiosa fervorosa que, sob uma aparência simples e comum, esconde muitas virtudes. Você não gosta dela porque a repreende com freqüência. Sabe o que isto significa, minha filha? Que é uma pequena orgulhosa. Você faz seu exame particular diariamente? A Irmã: Minha Madre, faço dois exames por dia, mas não sei qual é o que se chama de particular. A Madre: É o que fazemos ao meio-dia. É preciso examinar então a maneira como combate o defeito dominante. Conhece o seu? 190 475 A Irmã: Não, Madre. A Madre: É o orgulho. Você é muito jovem. Comece logo a combatê-lo, terá mais facilidade para destruí-lo, antes de o deixar enraizar-se. Conte, cada dia, quantas vezes se desculpou, quantas vezes gostou de que seus talentos e seu pequeno saber fossem notados. A Irmã: Minha Madre, será preciso muito tempo para destruir esse defeito? A Madre: Sim, precisará de muito tempo e será muito se conseguir eliminá-lo de sua alma um quarto de hora antes da sua morte. Mas não precisa saber quanto tempo vai levar para consegui-lo. O essencial é começar logo, com coragem e determinação. São Francisco de Sales levou vinte anos para conseguir a doçura.15 Quando você tiver combatido o orgulho durante vinte anos, penso que terá feito algum progresso na virtude. Venha, cada mês, me dar conta das vitórias que terá conseguido, como também das faltas que cometer. De vez em quando você vai à direção espiritual com a mestra das noviças? A Irmã: Sim, minha Madre, vou. quanto nos cerca nada é quando conhecemos o tudo de Deus?1 Todas juntas aspiremos a isso, minhas muito amadas Irmãs, e numa mesma vontade não busquemos em tudo senão a Deus. Que esse seja nosso desejo unânime, sob a proteção de nossa boa Mãe, a quem depois de Deus dedicamos todas as nossas afeições, de nosso honrado e amado São José, pai nutrício de Jesus e que é também o nosso, e de nosso santo anjo da guarda, a quem devemos muito particularmente amar. Saúdo-as, minhas queridas Irmãs, sou bem e toda de vocês nos santos Corações. Saúdo em particular nossa querida Irmã Catherine que vive há muito tempo ao pé da cruz, cujos frutos, na verdade, são amargos atualmente, mas é bem certo que se tornarão deliciosos. Minhas respeitosas saudações à Madre Maurice. Mil recomendações a todas as queridas crianças. Se me perguntam talvez quando é que nos veremos, não o sei mais do que vocês. Não me pertenço, não devemos querer, vocês e eu, senão o bom querer divino. Continuem a consolar nossa querida Irmã Fébronie que vive unida a Deus e nada tem a temer. Sejam sua alegria e sua coroa assim como a minha, e quando estiverem diante do santo altar, lembrem-se da pequena colmeia de Livinhac e de sua indigna Madre. Irmã Emília. A Madre: Conte-lhe todas as suas tentações, não tenha segredos para ela. É assim que aprenderá para mais tarde nada ocultar aos seus superiores. Uma das maiores tentações que uma noviça possa ter é a desconfiança e a antipatia para com sua mestra. Deve lutar seriamente para vencê-las. Custe o que custar, deve dizer tudo à sua mestra. A Irmã: Minha Madre, digo tudo o que me contraria à minha mestra, mas desde que tomei o hábito ela aborrece sempre, acha que não faço nada certo. Por isso, quando vou lhe falar, não faço outra coisa senão chorar. Esqueço tudo o que pretendia lhe dizer. Isso lhe desagrada e não sei o que fazer. 118 Humilde retratação de tudo que pareceu ser um sinal de oposição, mesmo leve, em relação a Pe. Marty, que Madre Emília quer honrar de modo sempre mais filial (L 420, M 233-234). À Madre Françoise, em Aubin. Livinhac, 26 de outubro de 1832. J.M.J. 474 191 você dá tudo a Deus. Que, chegando a Villefranche, eu a encontre pronta para tomar o santo véu e tenha a consolação de colocá-lo em sua cabeça. Desejando-lhe de todo o coração um bem tão precioso eu sou, com a mais terna afeição nos santos Corações, Toda sua. Irmã Emília. 117 Exortação sobre o nada das coisas temporais, em sua oposição ao tudo de Deus. (L 419, M 235-237). Às Irmãs de Villefranche e de Aubin. Livinhac, 25 de outubro de 1832. J.M.J. Minhas caríssimas Irmãs: Estando impossibilitada da doce consolação de lhes falar pessoalmente, aproveito um instante de lazer para fazê-lo neste pedaço de papel e para unir-me ao fervor de todas, aos seus santos desejos e à sua fidelidade em seguir o Cordeiro. A partir do retiro vocês o escutam melhor, pois estou persuadida de que fizeram calar os gritos da natureza para escutar apenas a sua divina e amável linguagem. Meu Deus, quanto é feliz a alma que não escuta outra linguagem! Para conseguir uma tão grande felicidade, lembremo-nos, minhas muito queridas Irmãs, do conselho que nosso Pai muitas vezes nos deu: de evitar com cuidado toda curiosidade. Evitemos esse defeito pela convicção íntima do nada de tudo que passa. Então, não fazendo caso do que acontece em torno de nós, não teremos grande vontade de conhecê-lo. Na medida em que desprezarmos as coisas temporais, teremos maior estima pelo que é eterno. Com efeito, tudo passa e acaba. Olhemos as coisas como nós as veremos no momento da morte. Essas idéias parecem tristes; entretanto, são o princípio da verdadeira alegria. Não é triste pensar que tudo A Madre: Minha cara filha, tenha paciência, isso passará. Se você faz tudo o que pode para contentá-la, isso basta. É preciso passar por algumas pequenas provações. Se você nada tivesse a sofrer, onde estaria a virtude?... Como praticaria a humildade sem humilhações? Mesmo assim, não deixe de lhe expor todos os seus pensamentos, faça como se nada estivesse acontecendo, e verá como o bom Deus ficará contente. Não deixe de me procurar todos os meses. A Irmã: Minha Madre, minha mestra foi tão severa a última vez em que falei com ela, fez-me sofrer tanto que tomei a resolução de só procurá-la daqui a quinze dias. Tenho um pouco de rancor contra ela. Acho que ela não é justa. A Madre: Calma, calma, o demônio está trabalhando. Se ele pudesse impedir o relacionamento entre você e sua mestra, ficaria muito contente, mas ele não o conseguirá, porque você será fiel em fazer sempre o contrário de tudo o que ele pode lhe sugerir de sofrimentos a esse respeito. Vá imediatamente procurar a sua mestra, diga-lhe a resolução que tomou de não ir vê-la senão daqui a quinze dias e tudo o que o demônio lhe envia como tentações a seu respeito. A Irmã (depois dessa entrevista): Minha Madre, fiz o que a senhora mandou, mas sinto-me tão tentada contra a minha mestra que não posso vê-la perto de mim. Intimamente zombo de tudo o que ela me diz e de tudo que fala durante a conferência. Não gostaria de estar assim, mas não consigo vencer essas tentações. A Madre: Isso não é nada. Precisa combater essa tentação sem se apavorar, ela lhe será proveitosa, pois no íntimo você ama a sua mestra. Vá procurá-la freqüentemente e faça tudo o que lhe disser. Não deixe que as outras noviças conheçam suas tentações, pois isso poderia lhes fazer mal. (A mestra das noviças que agia em tudo, conforme os conselhos de nossa venerável Madre, procedia da seguinte maneira: 1º ordenava-lhe que viesse, diariamente, prestar conta 192 de tudo o que interiormente se passava nela; 2º fez colocar a cama da noviça ao lado da sua; 3º no refeitório, colocou-a na sua frente, de forma que os talheres quase se tocavam; 4º no recreio, devia estar continuamente perto da mestra, testemunhando-lhe uma afeição e sentimentos completamente opostos aos que realmente sentia. A noviça obedecia exatamente, mas a tentação, em lugar de diminuir, tornou-se cada vez mais violenta, provocava todo tipo de pensamentos desfavoráveis em relação à mestra, e toda noite devia relatarlhe tudo. Cansada do combate, a noviça vai procurar a Madre para receber seus conselhos.) A Irmã: Minha Madre, disse tudo que se passa no meu íntimo à minha mestra. Disse-lhe, também, tudo o que penso a seu respeito, mas isto não faz senão aumentar o meu sofrimento. Receio fazê-la sofrer. Sofro um pequeno martírio ao ser obrigada a manter um contínuo relacionamento com ela. A Madre: Você tem, minha cara Irmã, uma ocasião diária de merecimento. Basta-lhe ser fiel a todas as prescrições da sua mestra. Não se aflija, você não tira senão vantagens dessa provação, que vai lhe ensinar como se comportar, se no futuro surgirem semelhantes tentações para com sua superiora. Saberá que jamais se devem ocultar essas tentações, o que poderia arruinar a vocação religiosa, sobretudo quando se é jovem e que se tem necessidade de ser orientada em tudo. Não se deve temer fazer sofrer os superiores dizendo-lhes tudo que se pensa, mesmo que algo os atinja. Eles conhecem a fraqueza humana. Não pense que tais confidências diminuem a sua estima. Há muito mérito em se vencer numa coisa que tanto contraria a natureza. Estou satisfeita com a maneira como você se comporta em relação à Irmã. A Irmã (mais tarde): Cansada da tentação que experimentava em relação à minha mestra, pedi ao bom Deus que me livrasse dela. Ele o fez, mas logo depois, surgiram outras bem mais terríveis, às quais tenho medo de sucumbir (ela lhe confidencia essas novas tentações). 473 À Irmã Séraphine, em Aubin. Livinhac, 7 de outubro de 1832 J.M.J. Minha caríssima Irmã: Por muitas razões, desejo seu regresso a Livinhac. Você é minha filha muito querida, assim como é minha muito amada Irmã. Gosto de tê-la perto de mim. Ficaria muito contente de levá-la comigo a Villefranche. Mas esse motivo será suficiente para fazê-la voltar aqui, quando nosso bom e venerável Pai a aconselhou a sair? Aliás, penso como ele que o meio de atrair uma infinidade de graças sobre você é não hesitar em seguir a voz que a chama. Creia, minha muito querida Irmã, tome São Mateus como seu modelo. Se tivesse escutado todas as reclamações da natureza e todos os motivos para não seguir Nosso Senhor, que atraso não teria sido e, sem dúvida, se tivesse adiado, jamais teria sido um dos doze. Creia-me, parta para Villefranche logo que receber minha carta. Não vacile mais, Deus não se deixa vencer em generosidade. Ele contará todos os seus sacrifícios, recompensará todos os seus esforços. Nada será perdido. Mas, poderá dizer-me: As razões que lhe apresento para voltar a Livinhac não são muito boas? Permita-me dizer-lhe: creio que são pretextos do inimigo de todo bem para fazê-la crer serem boas razões. Eu me encarrego de tudo, providenciarei tudo do melhor modo possível e esperemos que Deus nos dará sua bênção: foi ele quem começou a obra, será ele que continuará e a levará à perfeição. Repito, não se atrase mais, parta sob a proteção da Sagrada Família, nada tema, ela a protegerá. Não leve em consideração os temores da natureza como também os vãos pensamentos que o demônio lhe incute na mente. Caminhe humildemente guiada pela inspiração divina e pelo conselho de nosso bondoso Pai. No que diz respeito aos negócios de família, não se preocupe, tudo se arranjará da melhor maneira. Você não quer se dar toda a Deus? Fale com Madre Françoise ou escreva-me tudo que quer lhe dizer e será a mesma coisa. Aliás, você acaba de ver nosso Pai a quem, sem dúvida, disse o essencial. Vamos, minha querida Irmã, que eu tenha a satisfação de saber que 193 472 Por favor, não se aflija, eu bem o mereço. Nosso Pe. Marty nunca me julgará de uma maneira por demais desfavorável e tudo o que desejo nessa circunstância é nada dizer, pensar ou fazer que desagrade a Deus. Você se engana ao me colocar ao lado das grandes almas. Pense antes que minhas faltas me atraem tudo isso e você não se enganará. Confesso-lhe que receio, quando você estiver aqui, falar desse sofrimento. A natureza leva a desabafar com uma pessoa que se interessa, mas é preciso esperar que você e eu sejamos prudentes e falemos apenas o necessário. Escrevi à Irmã Séraphine. Leia minha carta antes de entregá-la e queira acentuar e corrigir o que não estiver bem. É nos santos Corações que a saúdo de todo o meu coração. Irmã Emília. Agradeço-lhe as boas ameixas que me enviou. Teria sido melhor guardá-las para você. Clotilde não lavou a roupa esta semana. Disse-me que a água estava ainda um pouco suja, mas que quinta-feira estará melhor e que, se você quiser, avise-a para que procure lavadeiras. É da casa da Sra. Tourille que levam minha carta e você pode responder-me do mesmo modo. Diga-me alguma coisa sobre nossa Irmã Séraphine, se ela se decide a ir para Villefranche, e, nessa suposição, se é oportuno chamar sua irmã a Aubin para vê-la. 116 Irmã Séraphine Vallon, da Congregação da União, era a única a desejar sem reticências a fusão do seu convento de Livinhac com a Sagrada Família. Mas era preciso que fizesse em Villefranche um verdadeiro noviciado. Encontrando-se em Aubin, talvez manifeste alguma hesitação e Madre Emília se esforça com firmeza para afastar as ilusões nesse sentido (L 418, M 230-232). A Madre: Você errou em agir sem consultar, pedindo a Deus de livrá-la de uma tentação, na verdade bem dolorosa, mas que a mantinha na humilhação e lhe era vantajosa. Nas tentações, deve-se pedir a Deus não de ficar livre, mas de não sucumbir à tentação. Apraz-me que o bom Deus lhe tenha ensinado, doando-lhe uma cruz mais pesada, quando pedia para livrá-la da que ele carregava com você. Suas novas tentações passarão logo que tiver feito os votos. Você escolheu dar-se a Deus sem reserva. Livremente fez seu sacrifício. Não olhe para trás. “Aquele que põe a mão no arado e olha para trás, não é digno de mim”, diz Jesus Cristo.16 7. Diálogo com uma jovem religiosa sobre o verdadeiro zelo pela glória de Deus (D 83-84; nº 34). Datando de 1847, esta conversa contém, sem dúvida, uma alusão implícita à abertura, pelas religiosas de Nevers que já tinham um hospital, de um Colégio suscetível de causar algum prejuízo real ou imaginário, ao da Sagrada Família. (v.s., p. 89). A Madre: Qual o assunto do recreio de ontem à tarde? A Irmã: Minha Madre, falávamos sobre algumas de nossas alunas que nos deixaram por outro colégio. Isso me contraria e criticamos a atitude das religiosas que atraem as alunas. A Madre: Vocês erraram falando disso, sem terem a certeza de que as religiosas procuram as alunas. Podem estar enganadas. Qual o motivo que as leva a desejar que tenhamos muitas alunas? Será a glória de Deus? Duvido disso! Os outros institutos religiosos podem glorificá-lo e, se é isso que desejam, não têm com que se preocupar. Se for algum outro motivo que as anima, afastem-no, ele é imperfeito. Oh! como estou triste de ver que há um pouco de rivalidade entre certos colégios dedicados à educação da juventude! Isso mostra que o espírito de Deus não move o coração dessas religiosas. Que devemos 194 desejar, querida Irmã? A salvação das almas. Que importa que, para realizá-la, Deus se sirva de nós ou das outras? A Irmã: O que me leva a desejar que tenhamos muitas alunas é somente a prosperidade do colégio. A Madre: Em lugar de pensar dessa forma, deseje e reze para que a Congregação prospere, não tendo senão santas e fervorosas religiosas. Seja você mesma uma dessas religiosas e verá então que o colégio progredirá. Quando o bom Deus nos envia alunas, é preciso recebê-las com prazer, prodigalizar-lhes nossos cuidados e dar-lhes toda a instrução que convém, amando-as e fazendo por elas o que faria a mais terna das mães. E depois, não desejemos ter senão aquelas que o bom Deus nos destinou. Repito-lhe o que me disse a Madre Eléonore, superiora das Damas de Nevers, de Figeac: “Que todo mundo profetize.”17 Eis o que dizem e devem dizer todas as religiosas. Não fale mais como o fez ontem à tarde, você ofenderia o bom Deus. A Irmã: Não repetirei o que disse. Se tivesse um pouco de humildade, não teria assim faltado à caridade. A Madre: Você tem toda razão. Conservemo-nos sempre bem pequenas, bem pequenas. Deus olhará para nós. Coloquemos nossa Congregação abaixo de todas as outras, nada perderemos com isso. Se nos conservarmos sempre na humildade, nenhum risco correrá o futuro da nossa Congregação, ela será abençoada. A Sagrada Família lhe concederá a sua proteção e seu socorro, teremos seu espírito, que é um espírito perfeito. Ter o espírito de Jesus, Maria e José, que felicidade! Temos algo a invejar das outras Congregações religiosas? Não, minha cara Irmã. Façamos todo o possível para não perdermos esta simplicidade, esta pobreza, este silêncio, este recolhimento que contemplamos nos três membros da Sagrada Família e que nossas primeiras Irmãs souberam imitar com tanta perfeição. Somos chamadas a imitar a Sagrada Família, a vivermos como ela desconhecidas e pequenas. Que glória não prestou a Deus em sua obscuridade! Não brilhou aos 471 Você me diz: "Mas eu não tenho mais meus filhos." É verdade, não os tem mais no momento, mas ainda um pouco de tempo e os terá para nunca mais perdê-los. Peço-lhe não refletir sobre a amabilidade deles, a não ser para oferecer o sacrifício. Aliás, não é o que é bom, o que é precioso que é digno de Deus? Um grande meio de consolação ainda é unir-se a Maria ao pé da cruz. Uma outra razão para não se deixar abater é o estado em que se encontra. Você tem o dever de se cuidar em todos os sentidos. Espero que o faça e peço-lhe que me dê notícias. Sou, com muita afeição, no Coração de Jesus Sofredor, sua muito humilde e dedicada serva. Irmã Emília. Nosso Superior me encarrega de lhe dizer que partilha profundamente de sua grande aflição. 115 Alusão à divergência de opinião entre Madre Emília e Pe. Marty, na época da fundação de Livinhac. Desconfiança de si e humildade que ela demonstra (L 417, M 232-233). À Madre Françoise, em Aubin. Livinhac, 7 de outubro de 1832. Minha caríssima Irmã: Sinto muito prazer em tê-la ainda um pouco de tempo aqui, apenas o acho curto. Venha logo que o pedreiro tiver chegado. Sobrenaturalize bem sua intenções. Embora eu tivesse pensado que poderia agir sozinha com o pedreiro, creio que suas idéias me servirão muito, embora nosso Pai ainda não tenha determinado de que maneira se deve fazer este conserto. Se assim for, temos de segui-lo exatamente conforme as suas intenções. Agradeço-lhe sua participação no meu sofrimento. 470 195 114 Carta de condolências a uma mãe, ex-aluna de Madre Emília e sobrinha de Pe. Marty, a qual perdeu vários filhos. Uma verdadeira compaixão humana se une às considerações sobrenaturais. Talvez o estilo por demais sensível dê à carta um cunho artificial (L 412, M 244-245). À Senhora Marty, nascida Lobinhes, Villefranche. Livinhac, 14 de setembro de 1832. J.M.J. Senhora, Assim que soube da profunda aflição em que sua alma estava mergulhada, propus-me escrever-lhe a fim de unir minhas lágrimas às suas e expressar-lhe quanto era grande a minha participação no seu sofrimento. As múltiplas ocupações impediram-me de fazê-lo. Rezei e fiz rezar ao único consolador para aliviar seu sofrimento. Só ele, realmente, pode fazê-lo, pois o que dizer a uma mãe que perdeu seus filhos, e que filhos! Que lhe dizer para acalmar sua grande e justa dor? Só a fé pode fazê-lo, ensinando-lhe que eles não estão perdidos, mas, ao contrário, vivem nos braços de Deus. Seus queridos filhos, que talvez no mundo, apesar da bondade de suas disposições, tivessem sofrido um triste naufrágio, estão agora no porto onde, gozando da mais doce paz, iluminados por uma viva luz, felizes com a felicidade do próprio Deus, poderosos junto dele, intercedem por sua terna mãe, que não pode deixar de chorálos, mesmo na certeza de sua felicidade. Imagine, minha querida senhora, que você os escuta, esses filhos bem-amados, falar-lhe de sua felicidade, de sua alegria e fazer-lhe delicadas repreensões por derramar tantas lágrimas, enquanto eles se encontram tão felizes. Estou persuadida de que muitas vezes você disse essas coisas a si mesma. Que essas doces e consoladoras verdades a tenham fortalecido, tenham dito, de qualquer modo, que você era uma mãe feliz, perdoe-me essa expressão. Não falaria assim se não conhecesse sua religião e sua piedade. olhos dos homens, mas aos olhos de Deus como ela foi grande! Amemos muito a Sagrada Família, imitemo-la. Jesus é de família real. Maria e José não se prevaleceram disso. Eles vivem como simples artesãos e se consideram felizes na sua pobreza. Os santos que não tomaram, como nós, os três membros da Sagrada Família como protetores especiais quiseram, no entanto, imitá-los e, como eles, viver na humildade.18 Nós, Religiosas da Sagrada Família, devemos ser como as violetas plantadas à margem dos riachos; elas aí estão escondidas, bem viçosas. Não correm o risco de ser levadas pelo vento ou pela tempestade, enquanto as grandes árvores plantadas no alto das montanhas, admiradas pelos homens, correm o risco de ser derrubadas e inteiramente desenraizadas. Queremos conservar-nos por muito tempo? Sejamos como essas pequenas violetas, não aspiremos a ser como árvores expostas a todos os ventos. Peçamos ao bom Deus que nos dê sempre um bom espírito, o espírito que convém às Religiosas da Sagrada Família. Alegremo-nos em nossa pobreza, nossa humilhação. 196 8. Advertência de Madre Emília a uma das suas filhas sobre a união a Deus (D 84-85; nº 35). Esta religiosa é Irmã Marie du Sacré-Coeur Faure, educadora por demais preocupada com a proximidade dos exames públicos (1848). Sua superiora pede-lhe com muita insistência prever todas as coisas de tal maneira não precisar, como no ano anterior, pedir dispensas relativamente aos exercícios de piedade. Eles são os tempos fortes de união com Deus. Por conseguinte, do advento de seu reino, único bem absolutamente desejável. Eis-nos, minha cara Irmã, às vésperas da época da distribuição dos prêmios. Previno-a para ficar alerta a fim de fazer com que suas alunas terminem os trabalhos com bastante antecedência, de maneira que não tenha necessidade, como no ano passado, de pedir dispensa da oração e de outros exercícios de piedade. Não lhe darei tal dispensa. É preciso preparar as alunas devagar, sem prejudicar a união de sua alma com Deus. Ah! se soubéssemos o que é perder um minuto a união de nossa alma com o bom Deus, jamais consentiríamos nisso voluntariamente. Você está admirada de que Santa Rosa de Lima sofreu um tormento que ela compara às chamas do purgatório quando, cada dia, lhe parecia perder durante uma hora a união de sua alma com o bom Deus. Ah! você não compreende o que é e o que se passa com uma alma intimamente unida a Deus. Uma hora parecia-lhe ser um século.19 Entristece-me ver que na época dos exercícios do fim de ano, algumas educadoras negligenciam um pouco seus deveres religiosos, algumas meditações e algumas comunhões. Ah! como isto me entristece! Deixar o bom Deus, descuidar-se de sua alma para se preocupar com o êxito ou não de um exame, isso não convém às esposas de Jesus Cristo. O amor de Deus passa antes do amor ao próximo. Devemos, em primeiro lugar, 469 P.S. Acabo de receber sua carta do dia 14 e agradeço os detalhes que me dá. Alegro-me com as boas disposições de nossas queridas Irmãs. Vejo com muita alegria que partilham os sentimentos das que estão aqui, que todas se alegram ao terem mais conhecimento sobre a santidade dos deveres de nosso estado e todas cheias do desejo de se tornarem santas religiosas. Depois da partida do nosso bondoso Pai, todos os recreios se passam a falar das coisas de Deus. Nossas Irmãs dizem que, fazendo assim, todas se sentem dispostas a rezar o ofício divino e, pela manhã, a fazer o trabalho sem dissipação. Desde que fizeram algumas pequenas experiências de mortificação, têm mais alegria interior e, em geral, me dizem que as mortificações que fazem na alimentação lhes servem muito. Aliás, é a que nosso Pe. Marty mais recomendou. Eis o que ele me escreveu ultimamente, a esse respeito: “Bendigo o Senhor, de todo o coração, porque nossas queridas Irmãs finalmente reconheceram que as leis da sobriedade não eram suficientemente observadas e souberam atribuir a esse defeito as infelizes conseqüências da falta de vigor da alma e do corpo. Da mortificação no comer resultará, pelo contrário, uma grande facilidade para a vida espiritual. As conferências contribuirão muito para sustentá-las em suas boas resoluções no caminho da renúncia a tudo que lisonjeia os sentidos." Algumas Irmãs pediram braceletes com pregos para impedi-las de dormir durante a meditação ou no ofício. Isso parece mais fácil do que privar-se de todo excesso no comer, sobretudo quando ainda não se experimentou a picada do bracelete. Que elas experimentem primeiramente o recurso da temperança. Talvez isso seja suficiente para fortificá-las contra o sono. Alegro-me pelo que me diz sobre Julie. Você no-la restituirá curada e fortalecida no bem. O que me diz de Rose Blanquier parece-me razão suficiente para despedi-la, e o melhor é fazê-lo o quanto antes. Irmã Emília. 468 197 Irmã Emília. 113 Felicitações pelo desejo de santificação manifestado pelas Irmãs de Aubin. O mesmo aconteceu em Villefranche, após uma recente passagem de Pe. Marty: os recreios são mais sobrenaturais, uma maior sobriedade alivia a indisposição do corpo (L 402, M 266-268, em parte). À Irmã Thérèse, suplente em Aubin. Villefranche, 18 de julho de 1832. J.M.J. Minha caríssima Irmã: Pediram-nos 4 centavos de frete pelos dois exemplares Leçons d’une mère à sa fille, que você nos devolveu. Não quisemos pagar, pensando que a criança que os trazia os queria para ela. Diga-me o que é preciso fazer. Penso que você não teria enviado por alguém que quisesse fazer pagar o frete, visto que não havia urgência. Não posso escrever muito, tendo mais ocupação do que tempo à disposição. Assim, Irmã Anne-Régis não ficará triste se não lhe responder. Em vez da carta, farei a meditação para que o bom Deus a cumule com seus bens. Pela mesma razão não respondo a Victoire. Diga-lhe que estou bem longe de querer despedi-la, que será preciso procurar um bom emprego que possa beneficiá-la. Por favor, entregue esta carta à Madre Françoise, assim como o bilhete anexo. Há algum tempo não tenho notícias dela. Estaria doente? Peço-lhe, durante o tempo que ela passar em Livinhac, examinar bem a vocação de Rose, de observar se ela gosta do silêncio e de outras coisas do nosso santo estado. Saúdo a todas, com muita afeição, nos Sagrados Corações. Irmã Emília. começar por cumprir todos os nossos deveres que se referem diretamente a Deus, como a meditação, a oração vocal, a assiduidade aos sacramentos, etc., e depois seremos úteis ao próximo.20 Nosso trabalho será abençoado e dará frutos. Se não for aos olhos dos homens, será aos olhos de Deus por quem o fizemos. “Buscai em primeiro lugar o reino de Deus e a sua justiça e todo o resto vos será dado em acréscimo” (Mt 6, 33). Depois de ter prestado ao bom Deus o culto interior e exterior que lhe devemos e que nossas Constituições ordenam, trabalhemos pela instrução da juventude, pela educação da infância o mais perfeitamente possível, sem ansiedade, sem inquietação de espírito, confiando à divina Providência o sucesso dos nossos trabalhos e teremos o acréscimo prometido por Nosso Senhor, em alunas e em méritos. 9. Diálogo sobre a República (D 100-102; nº 46). Como em 1830, porém com pressentimentos menos sinistros (v.i., 1. 102), Madre Emília convida a abandonar-se à divina Providência no que se refere à forma de governo. O conceito “elevado” que ela faz das palavras “liberdade”, “igualdade” e “fraternidade” tem algo um pouco “ingênuo”, sem dúvida. Seus sentimentos realistas e legalistas não alteram sua simpatia pelos Bonapartes. A referência à carestia dos víveres e à excessiva prudência da ecônoma revela circunstâncias históricas gerais (dezembro de 1848) e outras que se referem mais particularmente à Congregação (v. s., p. 21-22). A Madre: Você está com medo da República? Receia que nos aconteça algum mal? A Irmã: Não, minha Madre, nada temo. Aplico-me a amar o bom Deus e a cumprir minhas obrigações. Não penso em outra coisa. A Madre: Faz muito bem, minha cara Irmã. É precisamente nessas disposições que eu desejava encontrá-la. Não há nenhum motivo para ter medo. Essa República estava nos planos de 198 467 Deus desde toda a eternidade. Tudo o que ele faz visa à sua maior glória e ao nosso bem. Só nos acontecerá o que for determinado por sua divina Providência. Muitas vezes, o que nos parece um mal é o que mais contribui para o nosso bem. Será assim quanto a essa República. Ela será uma ocasião para muitos se converterem. A fé ressurgirá nos corações franceses, não tenhamos dúvida. Diga-me se você nada pensou quando o capelão nos falou a respeito da atual situação do governo?21 autorize para você um outro padre dos arredores de Aubin, pois nada deve ser mais livre do que a confissão. Mas acho, no entanto, que se encontram poucos confessores tão bons quanto os Padres Granier, Durand e Ricard.1 Saúdo-a com muita afeição nos Sagrados Corações. A Irmã: Minha Madre, pensei que Deus é um bom Pai e que, se rezarmos e confiarmos nele, nada temos a temer. Nunca estive tão tranqüila como agora. 112 A Madre: Você pensou bem, minha Irmã. Estamos nas mãos de Deus, que ele faça de nós o que bem lhe aprouver. Ele nos tratará sempre como um pai terno e amante se o amarmos e nele confiarmos. Ah! como Deus se compraz em ver uma alma abandonada à sua divina Providência, que não vive apreensiva com a incerteza do futuro, vivendo seu dia-a-dia sem se preocupar com o que lhe pode acontecer, colocando-se nas mãos de Deus a quem unicamente deseja agradar. Essa alma encanta e alegra o coração de Deus, ela nada tem a temer. Não fale a ninguém a respeito da disposição em que se acha e na qual todas as religiosas deveriam encontrar-se. Não fale, tampouco, do que acabamos de conversar. Poucas pessoas seriam capazes de compreendê-lo. A Irmã: Quando ouço cantar uma canção que não conheço, mas da qual consegui distinguir estas palavras: “às armas, cidadãos,” peço para que o bom Deus não seja ofendido, e em seguida me exercito em lutar contra minhas paixões. A Madre: Eu medito essas palavras: “liberdade”, “igualdade”, “fraternidade”. Quão desejável é a liberdade dos filhos de Deus. Essa liberdade que faz com que não nos deixemos escravizar pelas coisas da terra, por nenhuma afeição natural, e que aspiremos continuamente por Deus e pela perfeição. Deseje, minha cara Irmã, essa verdadeira liberdade e, quando a tiver alcançado, faça tudo para conservá-la. Quando Irmã Emília. Votos de alegria pascal na intimidade com Deus e modéstia no exterior (L 394). Às Irmãs de Aubin. Villefranche, 22 de abril de 1832. (Dia de Páscoa) J.M.J. Minhas caríssimas Irmãs: Aleluia! É neste feliz tempo, minhas queridas Irmãs, que lhes peço para cultivar uma santa alegria, lembrando de pôr em prática estas palavras do apóstolo: "Alegrem-se, eu lhes digo ainda uma vez, alegrem-se." E para nos fazer conhecer de que modo nos devemos alegrar, ele acrescenta: "Que sua simplicidade seja conhecida por todos os homens."1 Esse apelo se dirige particularmente a nós, cuja modéstia, proveniente de uma profunda humildade, deve nos distinguir das pessoas do mundo. O apóstolo não quer dizer que nossa alegria deva ser ruidosa, mas bem íntima e toda em Deus. Essa santa alegria, que é mola da piedade, ao dilatar nossa alma a mantém numa grande paz. Desejaria que vocês conversassem a partir destas palavras: "Que sua modéstia." Estou convicta de que encontrarão nelas um fundamento sólido, pois significam muitas coisas. Saúdo-as afetuosamente e sou toda de vocês. Creio que amanhã iremos a Livinhac. Queira Deus que sejamos tão bem acompanhadas como os dois discípulos de Emaús. 466 199 111 A uma religiosa que não quer se confessar ao sacerdote designado para a comunidade. A Madre não se opõe, mas pede-lhe que reflita antes de escolher um outro confessor (L 389, M 204-205). A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 17 de março de 1832. Minha muito querida Irmã: Irmã Françoise me escreveu dizendo que você lhe pediu para escrever a Pe. Cazals porque sente dificuldade para se confessar com Pe. Granier. Ela lhe propôs o vigário de Viviez, mas você lhe respondeu que tinha ainda mais dificuldade com esse, como também com Pe. Ricard. Receio, minha querida Irmã, que essa grande dificuldade de se adaptar aos padres que a Providência lhe dá como diretores espirituais seja uma astúcia do demônio. Tenha cuidado, pois uma alma que busca a Deus com simplicidade, com espírito de fé e que o vê na pessoa de seu ministro; uma alma, digo eu, que vê no sacerdote Jesus Cristo que continua por seu intermédio seu divino ministério; uma alma contrita e verdadeiramente arrependida e que decididamente quer chorar seus pecados e repará-los, para ela pouco importa qual seja o sacerdote a quem se acusa. Basta-lhe que seja autorizado. Não quero, certamente, impedi-la de escrever a Pe. Cazals. Não o desaprovo, mas esteja certa de que a paz de sua alma se encontrará em sua boa vontade de dar tudo a Deus, tanto no plano espiritual como no temporal. É aí que você a encontrará e não numa confiança exclusiva. Ficará bem satisfeita se seguir o exemplo de Irmã N. que, por si mesma, me pediu para deixar Pe. Cazals, e, de fato, o deixou, dizendo-me temer que essa confiança nele não fosse muito sobrenatural. Tudo o que lhe digo, minha querida Irmã, não é para angustiá-la. Sinta-se perfeitamente livre. Pode mesmo pedir a nosso Superior que nos tornamos religiosas, colocamo-nos num estado de submissão e dependência. Mas nossa submissão e dependência nos proporcionam essa liberdade que as pessoas do mundo reclamam neste momento. Rezemos, peçamos insistentemente ao bom Deus para que os homens não abusem da liberdade que obtiveram, mas saibam fazer bom uso dela, a fim de praticar melhor a religião e as boas ações. A Irmã: Ah! se o mundo compreendesse o que é a verdadeira liberdade! Minha Madre, a palavra fraternidade deve encantar seu coração. A Madre: Ah sim! Essa palavra tem toda a minha simpatia. Fraternidade, como isso é belo! Se todos os homens pudessem amar-se como irmãos, não ter senão um só coração e uma só alma, como os primeiros cristãos! A história nos relata como eram felizes na Igreja primitiva porque se amavam mutuamente. Peçamos ao bom Deus que essa caridade reviva, que todos os homens, particularmente as religiosas, tenham um terno amor aos pobres, ajudando-os e abrindo-lhes suas bolsas e seus celeiros. Ah! se esta palavra fraternidade fosse bem compreendida pelos homens, não se veria tanta miséria.22 A palavra “igualdade” deve também despertar em nós santos desejos, levar-nos a tomar generosas decisões. Somos todos chamados a ser como os anjos no céu. Na terra, há bons e maus. Desejemos e peçamos que os maus se convertam, que os pecadores se tornem bons; os tíbios e relaxados, fervorosos e destemidos. Sirvamo-nos de tudo para nos elevar a Deus e fazer o bem. A Irmã: Os alimentos tornaram-se caros e nossa Irmã ecônoma tem pouco dinheiro em caixa. Ela teme não ter o suficiente para alimentar tanta gente. A Madre: Nossa Irmã ecônoma não tem razão de temer.23 Deus que alimenta os pássaros, veste os lírios dos campos, poderia deixar-nos faltar o necessário? Não tenho nenhum receio. No início da Congregação, fiz um pacto com o bom Deus. Pedi-lhe que me ajudasse em todas as necessidades 200 temporais e eu nunca deixaria de ajudar os pobres todas as vezes que a ocasião se apresentasse, confiando nele. Deus jamais me falhou. Não duvidarei da sua bondade. As necessidades materiais não me preocupam, jamais o pão e o necessário nos faltarão. A Irmã: Minha Madre, ouvi dizer que Luís Napoleão, sobrinho de Napoleão I, foi nomeado Presidente da República. É verdade? A Madre: Você soube da notícia. Pensava anunciá-la, hoje à tarde, à comunidade. Enganei-me. Sim, minha Irmã, é verdade. Sempre pensei que essa República contribuiria para a salvação da França. Tudo parece confirmar esse pressentimento. A nomeação de Napoleão III muito me alegrou. Acredito que o bom Deus quer se servir dele para fazer o bem à nossa pátria. Ele será o instrumento da sua misericórdia em nosso favor. Sempre tive uma grande estima por Napoleão I. Na sua infelicidade como na sua prosperidade, rezei por ele e pedi ao Senhor para não o abandonar. Ele era um homem de bons sentimentos. Preparou-se bem para a primeira comunhão. Espero que o bom Deus tenha sido misericordioso para com ele, concedendo-lhe a graça de uma santa morte. Nessa hora, lembrou-se, com alegria, do carrilhão que tinha acompanhado a cerimônia de seu batismo. Se Napoleão I cometeu erros, seu sobrinho há de repará-los. Se deixou de realizar algum benefício em prol da França, seu sobrinho é chamado a fazê-lo. Napoleão III é favorável à religião e ao Santo Padre.24 Rezemos por ele para que o bom Deus o abençoe e lhe conceda a graça de realizar um bom governo. Supliquemos que o guie em todos os seus empreendimentos e, se for para a glória de Deus, que ele seja mais feliz que seu tio. A Irmã: Onde se pode ler que Napoleão I se preparou bem para a sua primeira comunhão? (Inacabado). 465 desta vez, creio tê-las advertido que isso não era certo, assim como para o ofício divino. Sabem que cada vez que vou faço a mesma observação de maneira que isso seja corrigido e, de modo geral, toda falta de respeito no coro. Como observamos numa conferência, será sobretudo pela correção de toda falta a esse respeito, e substituindo-a por um verdadeiro espírito de adoração, que obterão a saúde da Madre. Há dois dias que nossa mestra de cerimônias nos orienta para fazer a meditação sobre a ordem, pois precisamos melhorar nesse ponto. Como somos da mesma família, pode ser que vocês também necessitem disso. Saúdo-as bem afetuosamente, nos Sagrados Corações. A Madre lhes diz o mesmo. Irmã Emília. Seria bom fazer uma escala para lavar os pés. Renovo o pedido que lhes fiz de se tornarem em tudo e em toda parte, conforme o que se faz aqui. Aconteceu-me várias vezes, quando estava em Aubin, de dar responsabilidades às Irmãs rodeiras, no lugar onde me encontrava. Isso é contrário às Constituições, que determinam que a superiora o faça no seu quarto ou no lugar designado. A ecônoma não deve se prevalecer de um exemplo que eu dei, por inadvertência. Madre Vincent desejava que as Irmãs não fossem se aquecer em Santa Marta, porque em Villefranche ninguém o faz e nós não o permitimos. Para que as Irmãs pudessem se aquecer, seria necessária uma lareira na enfermaria ou na sala comum. Outra observação que esqueci de lhes fazer é que me pareceu que não se servia a todas as Irmãs da mesa das doentes a mesma coisa que no refeitório. Desejo saber se são mais pontuais e mais discretas ao expressar sua maneira de pensar, mais cuidadosas e afetuosas no cuidado para com as órfãs. Tenho certeza de que neste santo tempo da quaresma todas se esforçarão para se unir a Deus pela prática exata das obrigações de nossa santa vocação, e quando sua querida Madre lhes for devolvida serão, mais do que nunca, sua consolação e alegria. 464 201 recente visita: críticas mútuas, certas faltas de respeito diante do Santíssimo Sacramento (L 387, M 201-204). 10. Diálogo sobre o espírito de mortificação da Irmã Marie du Calvaire (D 112-114; nº 52). Às Irmãs de Aubin. Villefranche, 14 de março de 1832. J.M.J. Minhas caríssimas Irmãs: Sua querida Madre parece estar um pouco melhor. Vive muito ocupada e sua atividade natural tem de se contentar com o grande número de tarefas que lhe demos, pois, além de todas aquelas que foram mencionadas na carta a Irmã Françoise, é também auxiliar da enfermeira. Por isso está sempre em atividade: ora de avental arregaçado mexe a frigideira ou serve no refeitório, ora leva um chá a esta, coalhada àquela, mostra a maneira de fazer torradas. Ora está arrumando a sacristia, ora vai ajudar numa sala de aula, etc. Continuem a rezar pela recuperação de sua saúde, contanto que a santa vontade de Deus, à qual devemos inteiramente nos submeter, seja conforme os nossos desejos. Tornem suas orações eficazes pelo fervor na correção dos defeitos, sobretudo daqueles que reconheceram quando eu estava entre vocês: o de se julgarem e criticarem mutuamente. Peço à Irmã Françoise ser bem cuidadosa em adverti-las quando recaírem, pois embora tenham um grande desejo de se corrigir, não é possível já o terem conseguido, considerando-se que os hábitos se corrigem muito dificilmente, sobretudo esse, porque o demônio, não querendo que uma religiosa se corrija, faz todo o possível para dissimulá-lo, atenuando suas faltas nesse ponto. Mas, acreditem-me, não o escutem sob qualquer pretexto. Acusem-se, entretanto, sem escrúpulos da menor censura, seja interior, seja exterior, e testemunhem, ao contrário, verdadeiro respeito mútuo. Esqueci de lhes dizer que vocês saem muito facilmente do coro durante os exercícios. Como fazia frio, eu não lhes disse de ficar no antecoro quando chegam atrasadas a um exercício. Logo que Irmã Françoise julgar o tempo bastante ameno, terei bastante prazer de saber que fazem como aqui e que entram juntas e em ordem no lugar santo e fazem o mesmo para sair. Na penúltima vez em que estive em Aubin e também Em 1849, Madre Emília revela à Irmã Tauriac que sua companheira, Irmã Marie du Calvaire Alaux (1821-1851), doente e muito mortificada exteriormente, sofre também grandes provações interiores. Apesar disso, é com grande fervor que ela fala de Deus, embora se mostre muito discreta a respeito de suas próprias experiências espirituais. É nisso, sobretudo, que se deve procurar imitá-la. O leitor não pode deixar de fazer o paralelo com o comportamento da própria santa. A Irmã: Minha Madre, a Irmã Marie do Calvaire, desde algum tempo, não come quase nada. Penso que ela está doente e que não lhe diz nada a esse respeito. A Madre: Ontem mandei chamá-la para saber se está sofrendo. Respondeu-me que não está doente, mas com grande inapetência. Pedi à Irmã refeitoreira para tratá-la com mais cuidado. Ela está, neste momento, muito abatida. Peçamos ao bom Deus por ela. A Irmã: Esta Irmã não deve ter muitas penas interiores. Ela tem sempre a fisionomia tão alegre, tão contente, e depois, quando amamos o bom Deus como ela o ama, só podemos encontrar a felicidade sobre a terra. A Madre: Você julga muito as pessoas. Compara Irmã Marie du Calvaire ao Padre Donadieu. Essas almas tão puras são ordinariamente mais provadas do que as outras. Deus lhes oculta os tesouros de graça que lhes concede para conservá-las na humildade. Nossa Irmã Marie du Calvaire sofre muito interiormente, embora, por virtude, ninguém o perceba. Devemos conservar ocultos os dons recebidos de Deus e, como o sofrimento é um dos maiores, as almas interiores fazem todo o possível para ocultá-los. A Irmã: Parece-me impossível falar do bom Deus com tanto fervor como o faz nossa Irmã Marie du Calvaire, quando 202 estamos em meio a grandes provações interiores. Ao ouvi-la falar do bom Deus à nossa Irmã Colombe, diríamos que nada teme dos seus julgamentos e goza sempre das consolações espirituais. A Madre: Isso não significa nada. Nossa Irmã vive muito unida a Deus, em meio a seus sofrimentos. Ela encontra nos sofrimentos de que alimentar seu amor e estimular seu fervor. Acontece, muitas vezes, que encorajamos alguém ao fervor, quando, pessoalmente, estamos no constrangimento. Os outros pensam que a pessoa é inteiramente “fogo” e “chama” pelas coisas de Deus, quando, ao contrário, experimenta a amargura e a desolação espiritual. A Irmã: Por que nossa Irmã fala tão pouco durante o recreio? Jamais fala do seu relacionamento com Deus. Uma vez, ela quis saber se eu podia fazer a meditação com facilidade, se o bom Deus me favorecia com algumas consolações, ou se eu estava na desolação. Respondi-lhe apenas por monossílabos, como ela costuma fazer. Foi, da minha parte, uma pequena vingança. A Madre: Não devia vingar-se, mas podia não lhe dar explicações sobre esse ponto. Aliás, desejo que não comuniquem entre si o que se passa em suas almas. De fato, é perigoso falar demais sobre esse assunto. Irmã Marie du Calvaire sabe muito bem disso. Seu lema é: “Meu segredo me pertence.” Ela se lembra da recomendação que o Senhor fez a seus apóstolos sobre o Tabor: “Não falem nada do que viram.” Uma alma humilde fala pouco sobre os favores que Deus lhe concede tanto na oração como em outras ocasiões. 463 ela mandou começar uma "alva" cujo bordado leva muito tempo para terminá-la. É preciso esforçar-se para ter o mesmo zelo que ela teve. Outra coisa que lhe recomendo muito particularmente é ter por escrito o que deve fazer para não esquecer e ler várias vezes ao dia as anotações. Irmã Marie lhe será muito útil para informá-la a respeito do que acontece. Peça-lhe que lhe comunique tudo o que perceber que não vai bem. Ela sai para visitar os doentes, mas não para fazer compras. Não quer dizer que não se possa pedir-lhe para resolver alguma coisa quando vai visitar os doentes, mas é preciso lembrar-se de que não foi designada para isso e que suas saídas só têm em vista os doentes. Peça à Irmã N. que a informe sobre todas as queixas que fazem contra o convento. Não tema exceder-se no cuidado com a saúde das Irmãs. Poupe sobretudo Irmã N. e não permita que lhe façam a menor censura. Recomendações à família Carcenac. Visitar Pe. Ricard. Não lastime o tempo que Irmã Marie emprega com os doentes. É Irmã N. quem deve substituir Irmã Augustine na classe quando essa não puder ir. Diga ao médico que tenha a caridade de não cobrar as visitas feitas às órfãs. Anote exatamente as que ele fizer às Irmãs e às internas. Irmã N. não deverá ir ao parlatório para o seu trabalho. Irmã Emília. A Irmã: Minha Madre, está fazendo tanto frio e nossa Irmã Marie du Calvaire não se aquece. Diga-lhe de fazer como as outras. 110 A Madre: Já lhe falei a esse respeito. Ela me respondeu que o fogo a incomodava, que habitualmente estava gelada até a cintura, que se aquece mal durante todo o inverno, mas que isso Notícias à comunidade de Aubin sobre a Madre Vincent que procura se restabelecer em Villefranche. Conselhos claramente formulados a respeito de abusos observados pela fundadora numa 462 203 109 Conselhos à Irmã Françoise Pascal, recentemente nomeada superiora em Aubin. Autodomínio na dependência de Deus, doçura incansável e universal. Ser tanto quanto possível condescendente e delicada para com as mais difíceis (L 386, M 206-207). não prejudica sua saúde. Disse-lhe para se vestir bem e que não gostaria que suportasse o frio por espírito de mortificação. Prometeu atender ao meu pedido, mas o amor de Deus que arde no seu interior faz com que suporte, quase sem perceber, o frio exterior. A Irmã: Ela diz que não é por mortificação que suporta o frio, mas acho que se engana. Isso lhe fará mal e a senhora não será responsável pelo que vier a acontecer. À Madre Françoise, em Aubin. Villefranche, 10 de março de 1832. J.M.J. Minha caríssima Irmã: A primeira coisa que você deve se propor ao chegar a Aubin é manter-se numa grande dependência de Deus, evitando seguir os movimentos naturais e precipitados. A segunda é ter uma extrema doçura, pois é melhor exagerar do que faltar o mínimo que seja, pois bem pode imaginar que não faltarão comparações entre a maneira de administrar de Madre Vincent e a sua. Essa doçura deve ser universal, mas é preciso praticá-la particularmente para com Irmã N., da qual é preciso conquistar a confiança; para com a Irmã N., que lamenta excessivamente a saída da Madre. Evite censurá-la por isso quando lhe falar do assunto, mas, ao contrário, seja solidária com o sofrimento dela. Quanto à Irmã N., ela se sentirá muito bem se for tratada com grande caridade. Evite com cuidado toda aparência de reforma. Não fale de Villefranche, nem de você mesma, nem direta, nem indiretamente. Cuide muito particularmente da classe gratuita, fazendo com que as crianças sejam bem instruídas. Seja atenciosa com Victoire, tratando-a com grande doçura quando ela tiver qualquer problema com a Irmã N. e que essa lhe fizer alguma queixa. Não condene Victoire, mas procure contentar as duas, tanto quanto possível. Tenha um cuidado especial para com as órfãs. Procure estar sempre presente aos recreios. Empenhe-se em realizar os desejos e intenções de Madre Vincent. Por exemplo: A Madre: Talvez ela não possa mesmo se aquecer. Se o bom Deus permite que se engane pensando não se mortificar ali encontrando uma ocasião de mérito, tanto melhor, a vaidade não poderia retirar-lhe o preço do seu sofrimento. A Irmã: O frio nos pés é muito penoso, acho que é uma grande mortificação. A Madre: O frio nos pés faz mal e prejudica a saúde. Não devemos suportá-lo por espírito de mortificação, exceto quando não temos a possibilidade de nos aquecer. Não pense poder imitar Irmã Marie du Calvaire. Não, não, você não pode fazer o que ela faz. Tudo o que pode imitar dela é a sua humildade, doçura e caridade. Admire o resto. A Irmã: Sei muito bem que não poderei imitá-la. Eu a vi fazer certas coisas que me arrepiaram. A Madre: O que era? A Irmã: A senhora sabe que aplicaram nela um vesicatório no estômago. Ontem à tarde ela estava na ante-sala da enfermaria, para fazer o curativo. Retirou a pele que cobria a ferida e esfregou-a até sangrar. A Irmã enfermeira a quem eu disse o que a Irmã fazia, respondeu-me que ela era para si mesma um carrasco e que, cada vez que lhe aplicavam o vesicatório, sentia prazer em se fazer sofrer assim. Não quer permitir que lhe façam o curativo com receio de que não a 204 façam sofrer. Tudo isso não é necessário para ganhar o céu. Não gostaria de sentir atração por semelhante mortificação. A Madre: O atrativo pela mortificação é bem suave. As almas que o possuem encontram mais delícias em se impor o sofrimento que as outras em procurar prazeres e comodidades. Deus não dá a todo mundo o atrativo pelo sofrimento como o concedeu à nossa Irmã Marie du Calvaire, mas todas nós devemos mortificar-nos. As pequenas e contínuas mortificações que se apresentam mil vezes durante o dia, devem ser acolhidas com alegria por nós, que não podemos suportar as grandes. A Irmã: Se a senhora ouvisse a nossa Irmã tomar a disciplina, pensaria que ela quer se destruir, tal a violência com que se flagela. A Madre: Ela quer imitar São Domingos o “encouraçado”, que se flagelava de tal forma que reduzia seu corpo a uma chaga. Ele encontrava delícias no sofrimento. Sabe por que o chamavam de “o encouraçado”? (inacabado).25 11. Conferência sobre a festa de São Pedro acorrentado (C 1-3; nº 1). A indicação da circunstância litúrgica e dos acontecimentos políticos (fuga de Pio IX para Gaeta, atividade do corpo expedicionário francês), permite datar esta exortação em 31 de julho de 1849. Vemos aí o amor e o sentido profundos da Igreja que animam Madre Emília. As perseguições são, a seus olhos, inseparáveis da pregação e da expansão do Reino de Deus. Essa lei verifica-se ainda nos casos individuais: o propósito sério e constante de tender à perfeição provoca tempestades de tentações interiores e exteriores. Amanhã, minhas caras Irmãs, a Igreja celebra o ofício de São Pedro acorrentado. Todas vocês conhecem a história dessa libertação milagrosa, mas gosto de repeti-la porque as jovens religiosas quase não sabem como meditar sobre esse assunto, 461 que ele nos pede. É preciso oferecer-lhe generosamente esse sacrifício com uma vontade inteira, sem queixas, sem reflexão, a não ser para pensar que tudo lhe é devido e que, dando-lhe tudo, não fazemos mais que o nosso dever. Amemos muito o bom Deus, e os sacrifícios, quaisquer que sejam, nos parecerão pouca coisa.1 Fiquei sensibilizada, ao ver o avanço da doença de Irmã Stanislas. Não preciso recomendar-lhe de dar à nossa Irmã todos os cuidados que dependerem de você. Embora Pe. Ricard esteja doente, estou certa de que ele a confessará de boa vontade. Desejo que ela se dirija a ele. Quando era interna, fez com ele uma confissão geral e, sem dúvida, o preferirá a qualquer outro. Aliás, esse padre se interessa por ela e diversas vezes me pediu notícias dela. Não permita que outra Irmã se confesse a Pe. Ricard. É preciso que elas aguardem Pe. Granier, embora algumas não possam comungar. É preciso que se humilhem e que isso lhes seja uma lição para se manterem vigilantes e serem mais fiéis a Deus. Desejo que você conheça Pe. Ricard e que lhe peça conselhos quando se sentir perturbada com alguma coisa. Pedilhe que a orientasse no que ele soubesse ser útil para o bem do convento, a partir de alguma queixa da casa ou outro assunto. Disse-me que o faria. Se você for obrigada a se fazer substituir no parlatório, que o seja por Irmã Marie ou Irmã Thérèse e não por qualquer outra, a não ser que haja impossibilidade. Irmã N. não vai ao parlatório para sua tarefa, é Irmã Y que a substitui e, quando você tiver tempo, será bom ir também. Assim, conhecerá mais rápido os afazeres da casa. Quando Irmã N. for ao parlatório, que a assistente entre com ela. Quando o médico vier, peça-lhe para não cobrar as visitas feitas às órfãs. Poderá acrescentar que Madre Vincent, me pediu para lhe dizer isso. Você sabe muito bem que somente a mestra de instrução fala aos confessores das crianças. Sendo a mestra, somente você deve fazê-lo. Irmã Emília. 460 205 alma. Convença-se ainda de que todos os esforços do inimigo de nossa salvação não terão outro efeito senão o de confundi-la. Desfaça os projetos dele abrindo sua alma à Madre com uma inteira confiança: é o que ele mais teme. Não pense em si mesma. Permaneça sempre ocupada e creia que tudo que sente não é nada. Sem objeção direi sim à sua volta aqui, se nosso Pai aprovar. Enviei sua carta. Devemos, você e eu, não ter outra vontade a não ser a de nosso boníssimo Pai. Afaste para bem longe de si a idéia de que você seria a minha cruz. Pelo contrário, estou certa de que se esforçaria por ser a minha consolação. Amemos muito o bom Deus. Vivamos no divino Coração de Jesus que contém, como diz o nosso querido Pai, Aubin e Villefranche. Sou toda sua nos Sagrados Corações. Irmã Emília. Ano de 1832 108 Foi para não alimentar sentimentos por demais "naturais" que Madre Emília recusou um encontro com a Irmã Françoise, a quem dá explicações. Diretrizes a respeito das confissões e do confessor. Elogio de Padre Ricard (L 385, M 199-200). À Madre Françoise, nova superiora em Aubin. Villefranche, 7 de março de 1832. J.M.J. Minha caríssima Irmã: Certamente não está contente comigo. Em nosso encontro em Montbazens, tratei-a muito friamente e com franqueza, mas isso parecia necessário. Por menos que eu tivesse demorado e demonstrado minha solidariedade no seu sofrimento, isso poderia nos comover e não amenizaria o preço do sacrifício que Deus nos pedia. Não devemos nos contentar em dar a Deus o não retiram todo o ensinamento dessa meditação. Eis o fato:26 algum tempo após a descida do Espírito Santo, São Pedro foi preso e acorrentado pelos judeus. Todas podem avaliar a aflição dos primeiros fiéis e sobretudo dos apóstolos. Estes últimos recolheram-se numa casa para se livrarem da fúria dos judeus. Lá rezavam para obter a libertação daquele que Nosso Senhor lhes tinha dado por chefe. Pedro estava, pois, retido na prisão, por ordem de Herodes que devia mandar executá-lo. Na véspera do dia em que deveria ser morto, dormia, carregado de correntes, entre dois soldados. Havia um corpo de guarda diante da prisão. De repente, um anjo do Senhor apareceu, o recinto ficou cheio de luz (pois era noite), e o anjo, tocando o lado de Pedro, acordou-o e disse: “Levante-se imediatamente.” Num instante as correntes lhe caíram das mãos. “Coloque seu cinto", disse-lhe o anjo, "e calce suas sandálias”, e ele assim o fez. O anjo acrescentou: “Vista-se e siga-me.” Pedro saiu imediatamente e o seguiu sem saber se o que era feito pelo anjo era sonho ou realidade. Ele acreditava ter uma visão. Após terem passado o primeiro e o segundo corpos da guarda, chegaram ao portão de ferro que dá acesso à cidade e que se abriu por si mesmo diante deles. Tendo saído, caminharam até o fim da rua e logo o anjo o deixou. Então Pedro, tendo voltado a si, exclamou: "Vejo que o Senhor enviou seu anjo e que me livrou das mãos de Herodes." Dirigiu-se à casa de Maria, mãe de João Marcos, onde várias pessoas reunidas rezavam. Quando bateu à porta, uma jovem chamada Rhode veio atender. Tendo reconhecido a voz de Pedro, ficou tão contente que, em vez de abrir a porta, correu a anunciar pela casa que era Pedro. Os apóstolos lhe disseram: “Você perdeu a razão.” Mas ela assegurava ser ele e eles diziam: “É o anjo dele.” Entretanto, Pedro continuava a bater. Abriram-lhe a porta e vendo-o, ficaram estupefatos. Contou-lhes como o Senhor o havia tirado da prisão e acrescentou: “Comuniquem o fato a Tiago e aos irmãos.” Depois, retirou-se para um outro lugar. Quando amanheceu, os soldados ficaram preocupados sem saber onde estava Pedro. Herodes mandou procurá-lo. Não tendo sido encontrado, os guardas foram enviados ao suplício. 206 Essa pequena história nos oferece grandes ensinamentos. Primeiramente, mostra-nos como Deus cuida de sua Igreja e daqueles a quem destinou para governá-la. Sem dúvida, envialhes aflições, mas sabe libertá-la na hora e momento marcados nos desígnios de sua Providência. Nosso Santo Padre o Papa, prisioneiro nesse momento, lembra-nos o príncipe dos apóstolos. Nossa aflição é grande. Não é sem razão, pois nossa Mãe Igreja sofre. É mais do que justo juntarmos nossa aflição à dela. Estamos numa circunstância mais ou menos semelhante àquela em que se encontraram os primeiros cristãos. Unamos nossas preces pelo soberano Pontífice às que faziam os primeiros discípulos de Jesus Cristo, para pedir a libertação de São Pedro. Esperamos que, se nossas preces forem fervorosas, Deus as acolherá e reconduzirá a Roma o nosso Santo Padre o Papa, cheio de novas graças e de novos méritos. Rezemos, minhas Irmãs, rezemos muito, não será em vão. Dirijamo-nos a São Pedro, sobretudo amanhã. Peçamos que proteja nosso primeiro pastor, nosso pai em Jesus Cristo. Lembremo-lhes a graça tão grande e tão consoladora para a Igreja que ele recebeu naquele dia. Ele nos protegerá, fiquemos certas disto. É preciso que eu lhes comunique outro pensamento bem consolador: vocês sabem que Napoleão demonstrou menosprezo, por um momento, em relação ao Soberano Pontífice. Sempre me pareceu que seu sobrinho foi chamado a reparar o erro do tio, e que o momento favorável chegou. Luís Napoleão já enviou socorro ao Santo Padre. Nosso exército se dedicará inteiramente a ele. Assim que tiver notícias do que se passa em Roma, eu lhes transmitirei. É nossa Mãe que se acha em aflição. É mais que permitido saber se Deus a consola. A história da prisão de São Pedro nos ensina que, quanto mais as obras de Deus às quais nos dedicamos são aptas a promover sua glória, mais necessárias se tornam as provações e sofrimentos para executá-las. São Pedro foi estabelecido por Jesus Cristo como o chefe da Igreja e chamado a renovar o mundo inteiro. Pois bem, em vez de aplainar os caminhos dispondo os espíritos e os corações a essa mudança, tarefa muito fácil para ele, Deus permite, pelo contrário, que tudo se levante contra São Pedro, que o maltratem, que o prendam e 459 Quando você me manifestou o desejo de vir fazer um retiro em Villefranche, não refleti que seu pedido era contrário às Constituições que dizem que nenhuma Irmã ultrapassará os limites do mosteiro, a não ser para uma fundação ou para ser enviada a uma outra casa. Nosso Pai, não tendo também refletido sobre esse artigo, queria chamá-la, mas mudou de idéia quando constatou que era contrário à obrigação da clausura. Não duvido que o amor que você tem por todos os seus deveres a leve a fazer de bom grado o sacrifício de um desejo que não vem do espírito de Deus, visto que está em oposição aos deveres que ele mesmo lhe impôs. Toda sua. Irmã Emília. 107 A uma de suas Irmãs que sofre, Madre Emília sabe expressar sua delicada compaixão e sua convicção de que só Deus poderá livrá-la dessa provação. Ela convida a reler cartas de Pe. Marty, recebidas em situações semelhantes, e à abertura de consciência para com a superiora local (L 369). A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 2 de dezembro de 1831. J.M.J. Minha caríssima Irmã: Compadeço-me sinceramente do estado de sofrimento em que você se encontra e desejaria que estivesse em meu poder levar consolação à sua alma, mas isso só Deus pode fazer, eu lhe suplico de todo o meu coração. Aconselho-a a ler com atenção as cartas que nosso Pai lhe escreveu em diferentes épocas, quando você se encontrava em situações semelhantes às de agora. Estou persuadida de que sua alma será fortalecida por essa leitura. Esteja certa de que está no bom caminho e que ama a Deus, apesar de todas as más impressões que invadem sua 458 207 isto é, em santidade e adormeceu no Senhor numa paz profunda. No dia em que recebeu a unção dos enfermos, ela mesma preparou tudo o que era necessário à administração desse sacramento. Irmã Félicité encontrou-a fazendo as bolas de algodão para as unções. A morte que ela havia temido durante toda a sua vida, tornou-se o objeto de seus desejos. Você sabe dos favores que devo a essa querida falecida, quase mais que a vida. Em grande parte é ela o instrumento de minha salvação. As orações que quiserem fazer por ela junto a Deus, é como se as fizessem por mim mesma. As coisas presentes, ao que me parece, vão sempre muito mal. Não devemos pensar em fazer paramentos nem para vocês, nem para nós, mas esperar que passe a tempestade e rezar muito para apressar os momentos da divina misericórdia. Recebemos tudo o que você nos anuncia. Irmã Euphrasie escarrou sangue há uns quinze dias. Sua enfermidade parece agravar-se. Ela vai e vem, mas fica sufocada e tosse. Peça ao bom Deus por ela, a fim de que lhe conceda tudo o que lhe for necessário. Penso que você encontrou uma de minhas cartas nas sacolas. Saúdo a todas com muita afeição nos Santos Corações. Irmã Emília. 106 Emília retira a permissão dada precipitadamente de vir fazer o retiro em Villefranche e exorta sua correspondente a ver sobrenaturalmente essa decisão (L 357). À Irmã Anne-Régis, em Aubin. Villefranche, 11 de setembro de 1831. J.M.J. Minha caríssima Irmã: que nas penas e sofrimentos seja realizada a grande missão a ele confiada. Assim, seja qual for a dificuldade, a tentação que experimentemos para cumprir a vontade de Deus quando nos é conhecida, devemos manter-nos sempre firmes e não colocar obstáculo. Os apóstolos não deixaram de pregar o Evangelho por causa das perseguições. Pelo contrário, quanto mais os faziam sofrer, mais a sua coragem aumentava. Pareciam ganhar novas forças nas torturas. Uma das características das obras de Deus é ser perseguida pelos homens. Os demônios, todo o inferno se enfurece contra os escolhidos de Deus para trabalhar nelas. Longe de nos apavorarmos, devemos reanimar-nos e esperar com tanto mais confiança quanto somos perseguidas. Jesus Cristo não resgatou o gênero humano senão entregandose aos maiores sofrimentos. A exemplo de seu mestre, eles deram a vida para sustentar a religião que pregavam. Os santos, a exemplo de Nosso Senhor Jesus Cristo e dos apóstolos, não se consideravam felizes senão quando tinham alguma coisa a sofrer. Consideravam a perseguição dos homens como o sinal mais certo de que suas obras eram agradáveis a Deus. Lemos que São Francisco de Bórgia sentia-se mais feliz quando via os homens perseguirem a Companhia de Jesus. Dizia então: “Deus está do nosso lado. A prova disso é que os homens estão contra.” Quando, pelo contrário, a Companhia era honrada, estimada, falava-se muito do bem que fazia, ele começava a temer a reprovação de Deus, não a considerando digna de sofrer pela glória de seu nome.27 O selo das obras de Deus é a perseguição dos homens, a fúria do inferno que semeia grandes e numerosas dificuldades nos passos daqueles aos quais elas são confiadas. Cada uma de nós tem uma lição pessoal, uma instrução própria na libertação de São Pedro. Temos também um grande trabalho, uma grande obra a realizar. É a destruição do velho homem e a edificação do novo. Para ter êxito nisso, temos uma rude guerra a empreender contra nossas más inclinações. Será necessário converter os vícios em virtudes, o que não é fácil. Os vícios, como os pagãos, se levantarão contra nós e não quererão converter-se. Eles nos perseguirão de todas as maneiras. Às 457 208 vezes, parecem atar as faculdades de nossa alma para impedilas de fazer o bem. Seus assaltos serão tão terríveis que nos consideraremos perdidas.28 Mais que nunca, deveremos esperar e crer contra as aparências que chegaremos a vencer nossas inclinações desregradas. Às vezes, como Pedro, nossa alma se verá prisioneira num corpo que parecerá pôr um obstáculo intransponível à plena realização da obra por ela iniciada. Mas então se, como Pedro, nós confiamos em Deus, ele nos estenderá a mão, quebrará nossas cadeias e nos proporcionará essa liberdade que nos faz correr, voar nos caminhos de Deus. 12-14. Diálogos com uma religiosa enferma (D 104-110; nnº 48, 49, 50) Nas três conversas seguintes, Madre Emília dialoga com uma religiosa de elite, Irmã Colombe Chresteil, nascida em 13 de novembro de 1812 em Thérondels (Aveyron). Fez profissão em 15 de outubro de 1839. Os oito últimos anos de sua vida foram marcados pela doença quase constante e por penosas tentações. Deixou-nos, nessas circunstâncias, o exemplo da mais sobrenatural resignação (AUB 4531). Na sua morte em 5 de janeiro de 1851, a superiora escreveu uma circular (v.i. 1. 147). Na primeira conversa, a doente dá a conhecer numa simplicidade evangélica os motivos que mantêm sua coragem: expiação dos pecados, participação na Paixão de Nosso Senhor. No decorrer da segunda conversa, Santa Emília mostra que, bem aceita, a inobservância da regra imposta pela doença torna-se muito meritória. Prescreve à Irmã Colombe a comunhão eucarística para o dia seguinte, apesar da tibieza da qual a mesma se censura. Ceder a tal impressão seria facilitar o jogo do demônio. A última conversa reúne vários dias. No começo, a doente sofre muito: a Madre, diz uma nota, quase revelou suas próprias provações para encorajá-la. Porém, vemos afirmar-se essa coexistência misteriosa da angústia e da paz que se situa além dos sentimentos. E aflora um pouco à consciência, por ocasião das últimas conversas. nossas Irmãs e conservou essa infeliz disposição até a hora da morte. A divina Providência conduziu nosso bem-aventurado Superior a Villefranche. Veio visitá-la. Ela lhe abriu sua alma, aceitou ver perto dela a Irmã que era objeto de sua rejeição e pediu-lhe perdão pelos erros cometidos. A partir daí, voltou-se sinceramente para Deus e amou-o de todo o coração. Quando lhe administraram a unção dos enfermos, ele ainda edificou muito. Na noite de sua morte, sofrendo extremamente, mas com uma paciência inalterável, atormentada pela sede, dizia com fervor: "Em breve, irei me saciar nas fontes eternas." Adormeceu tranqüilamente nessa doce esperança no dia 2 de julho de 1831. Tinha sido admitida ao noviciado no dia 19 de maio de 1818 e à profissão no dia 8 de setembro de 1820. Toda a instrução que ela adquiriu não foi abençoada por Deus, pois não tinha nenhum sucesso junto às crianças que não a escutavam, prova de que não há nada eficaz senão o que vem de Deus. Irmã Emília. 105 Relato edificante da morte da senhora de Pomairols, avó de Emília, falecida em plena serenidade lúcida, no dia 10 de agosto de 1831, com 90 anos (L 353, M 179-180). À Madre Vincent, em Aubin. Villefranche, 13 de agosto de 1831. J.M.J. Minha caríssima Madre: Agradeço-lhe por querer saber notícias de minha saúde, que está melhor. Tenho mais força, o nariz incomoda menos do que quando estava em Aubin, tomo um pouco de sopa, ovos frescos, frutas, sem dificuldade. Recomendo às suas orações minha boníssima e muito virtuosa avó que Deus retirou deste exílio. Faleceu como viveu, 456 209 12. Primeiro Diálogo Saúdo-a com afeição e sou toda sua. Irmã Emília. 104 Perfil de uma religiosa que nem sempre correspondeu bem aos apelos da graça: ardor excessivo pelo estudo, aversão para com uma de suas Irmãs. Entretanto, pediu perdão antes de seus últimos momentos (L 351). Circular da Irmã Angèle Gaillard. Villefranche, 4 de julho de 1831. J.M.J. Nossa cara Irmã Angèle, nascida em Cajarc no dia 10 de maio de 1802, chegou a nossa casa aos 13 anos de idade. Era dotada de um boníssimo coração e de um espírito perspicaz. Foi admitida para fazer a experiência e a santa profissão, apesar de um pouco de receio inspirado pela dificuldade mal superada que tinha em dar a conhecer sua vida interior, o que muito negligenciou devido a aplicação dada ao estudo motivada pela curiosidade, pelo prazer de saber. Foi tão longe nesse ponto que nosso bem-aventurado Superior se viu obrigado, percebendo o quanto isso lhe era prejudicial, a proibir-lhe toda leitura, exceto a da Imitação de Cristo, de Rodriguez, etc. Ela se submeteu, mas seu coração não mudou. Tendo sido acometida de um enfraquecimento, não tinha a paz nem a calma que víamos nas outras Irmãs. A morte a apavorava e dizia, lembrando-se de seu defeito de pureza de intenção: "Ah, meu Deus, que eu não tivesse feito outra coisa senão varrer." Ela havia se recusado a colocar um vesicatório que lhe havia sido prescrito. Mais tarde, lembrando-se dessa desobediência, dizia na sua dor: "Agora eu colocaria cinqüenta." Apesar de seus bons sentimentos, não estava em Deus e alimentava em sua alma uma antipatia para com uma de A Madre: E então, minha cara Irmã Colombe, como vai a coragem para ajudar Nosso Senhor a levar a cruz? A Irmã: Está muito fraca, Madre. Tenho necessidade de que o bom Deus venha em meu auxílio, sem o que temo perder o fruto do mérito que poderia adquirir com um pouco mais de paciência. A Madre: O bom Deus está com você, minha cara Irmã, e lhe dá uma prova bem tocante do amor que tem por sua alma. Ele a associa a Jesus, seu divino Filho, para subirem juntos o caminho penoso do Calvário. Trata-a como um de seus melhores amigos. Você não é digna dos favores por ele concedidos. Humilhe-se e seja-lhe sempre muito agradecida. Certamente, há momentos em que você compreende que, se a cruz é espinhosa de um lado, está cheia de rosas do outro. A Irmã: Sim, Madre, há momentos em que sinto minha felicidade e o favor insigne que o bom Deus me fez, pondo-me na via do sofrimento. Mesmo que a natureza se revolte algumas vezes, que eu chore, não deixo de ser feliz. A Madre: Compreendi bem, minha cara Irmã. Também, longe de lastimar sua sorte, como fazem algumas de nossas Irmãs, felicito-a e considero-a feliz por ter sido escolhida para assemelhar-se, por suas feridas e dores, a Nosso Senhor Jesus Cristo. Medite sobre os sofrimentos desse divino Salvador e verá que os seus são pouca coisa, representam apenas uma gota d’água no mar. Durante sua enfermidade, escolheu alguma santa como protetora especial? Qual o assunto mais freqüente de sua oração? A Irmã: O número e a importância de meus pecados, que o bom Deus jamais me fará expiar bastante, é o que mais me preocupa. Peço-lhe constantemente perdão. Que sua justiça me maltrate nesta vida, mas me poupe na eternidade. Penso também com freqüência nos sofrimentos de Nosso Senhor, dos 210 quais fui causadora (não cremos que essa Irmã tenha perdido a veste da inocência. Um dos maiores pecados de que se censurava com lágrimas, era de ter chorado no dia de sua primeira comunhão porque não tinham comprado um vestido conforme seu desejo). A Madre: Continue nos sentimentos em que se acha, esperando da bondade de Deus que ele já tenha perdoado seus pecados e que a receberá no paraíso. Todas as Irmãs da Sagrada Família devem para lá caminhar, nenhuma deve duvidar disso. Lembre-se muitas vezes de Santa Lidwine que, como você, foi obrigada a passar a maior parte de sua vida acamada.29 Sua ocupação habitual era meditar sobre a Paixão do Salvador. Imite-a e dela retirará abundantes frutos. 455 Na qualidade de enfermeira, cuide bem da Madre e veja o que ela pode comer. É preciso que ela lhe obedeça: nossas Constituições nos dizem que é necessário obedecer à enfermeira. Saúde-a de minha parte. Tente não se ocupar demais consigo mesma, mas com Deus. Que a lembrança de sua santa presença seja freqüente em seu espírito e somente viva e respire por ele. Quando lhe vierem pensamentos de desânimo, refugie-se no Coração adorável de nosso divino Salvador. Asseguro-lhe que, se viver bem isso, não achará o tempo longo. Saúdo-a afetuosamente e sou toda sua nos Sagrados Corações. Irmã Emília. A Irmã: Quando minhas dores são mais vivas, acontece-me gemer alto. Entretanto, meu desejo seria esconder meus sofrimentos, não deixá-los transparecer. A Madre: Nosso Senhor sobre a cruz queixou-se a seu Pai, dizendo: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes?” (Mt 27,46). Essas palavras, arrancadas pela imensidão de seus sofrimentos, mostram-nos que não podemos sempre, mesmo querendo, ocultar de tal forma nossas dores, a ponto de não serem percebidas. Seu atrativo é bom. Siga-o, não falando de seus sofrimentos senão a mim e à Irmã enfermeira. Com nós duas, aja com toda simplicidade, como se fosse com sua própria mãe. Você gosta muito de ouvir cânticos. Para distraí-la um pouco, cada dia enviarei duas órfãs para cantarem os que mais lhe agradam. Designarei várias Irmãs para virem em rodízio e falar-lhe um pouco do bom Deus. São muito jovens e a presença e conversa com doentes na enfermaria só lhes pode fazer um grande bem. Quantas vantagens você nos proporciona com sua doença! A Irmã: A vantagem de se fazer servir, de ocupar uma pessoa quase o dia todo, não é tão grande bem para os outros e é mais penoso a si própria do que a doença. 103 Os trabalhos de jardinagem devem levar-nos a aprofundar em nós o abismo da miséria e do aniquilamento (L 348, M 177). A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 14 de junho de 1831. J.M.J. Minha caríssima Irmã: Eis que agora você é encarregada da horta. Tenho prazer em saber que sua horta vai indo bem e que você aproveita todo o terreno. Seja bem cuidadosa em colher os morangos para as doentes. Arrancando as ervas daninhas do jardim, procure, com todas as forças, destruir as do seu coração. É cavando bem no abismo de nossa miséria e de nosso nada, que nos tornamos agradáveis a Deus, pois ele não ama nada tanto quanto a humildade. É por isso que quis se tornar semelhante a um verme e se humilhou até o extremo. Aprendamos com seu exemplo a nos tornar mais humildes e façamos dessa virtude nosso principal estudo. 454 211 muito satisfeita com o que me diz a respeito de nossas queridas postulantes. Peço-lhe assegurá-las de minha afeição. Julie, muito agradecida por sua lembrança, saúda-a afetuosamente. Ela vai relativamente bem, tanto espiritual como fisicamente. Sou, com muita afeição, toda sua, nos Corações de Jesus, Maria e José. Irmã Emília. Ano de 1831 102 Apegar-se tranqüilamente à cruz de Nosso Senhor, sair de si mesma para unir-se a ele, o mais possível (L 346, M 176). À Irmã Blandine, em Aubin. Villefranche, 1º de junho de 1831. J.M.J. Minha caríssima Irmã: Estar pregada na cruz de nosso divino Salvador e nela morrer, deve ser nossa divisa. É preciso carregá-la todos os dias de nossa vida, como ele mesmo a carregou por amor a nós. Que seu exemplo nos encoraje. Esforcemo-nos para seguir o modelo que nos foi dado sobre a montanha. A cruz foi o privilégio dos santos: que seja também o nosso e façamos de modo que, pela nossa paciência, se torne para nós uma fonte de salvação.1 Estou muito sensibilizada com a sua bondade, mas por favor, não tenha pena de mim, pois não tenho nem mais nem menos trabalho desde sua partida, visto que uma outra ocupou o seu lugar e faz o que você fazia. Não faço mais do que fazia quando você estava aqui. A Madre: O que está dizendo?... A vantagem de ter doentes, de cuidar delas é muito grande para uma casa religiosa. Não sabe que são as doentes que atraem as bênçãos de Deus sobre a Congregação? As doentes são os tesouros das comunidades religiosas. A Irmã: As boas doentes, porém enfermas como eu, Deus queira que não atraiam a maldição do céu! A Madre: Todas as doentes, boas ou não, são tesouros que devemos estimar mais que o dinheiro. 212 453 Irmã Emília. 13. Segundo Diálogo A Madre: Como vai, minha querida Irmã Colombe? A Irmã: Um pouco melhor, minha boa Madre, mas não faço trabalho, não posso nem me mexer do lugar. A Madre: É preciso ir tomar um pouco de ar, hoje. Isto lhe fará bem. Dê-me o braço. Vamos, caminhemos. Recomendo-lhes não falar com suas alunas sobre assuntos políticos e, se quiserem tornar-se mais agradáveis a Deus, não falem absolutamente com ninguém, a não ser por uma razão particular. Comigo podem falar tanto quanto quiserem. Aqui, em toda a cidade, estão fazendo uma novena em honra de Nossa Senhora. Nós a fazemos também. Consiste na recitação do terço e na ladainha da Santíssima Virgem que dizemos imediatamente após a Hora Nona. Evitem, na oração, dizer: "Pelo rei, etc.” A Irmã: Madre, a senhora é muito fraca. Alguém mais me ajudará. Peço-lhe para esperar por mais alguém. 101 A Madre: Pegue meu braço, vamos. Quero fazê-la a guardiã dos patinhos. Esta tarde, iremos vê-los e depois, cada dia, com a ajuda de sua bengala, caminhará até o fim do jardim. Trarei um pratinho de farelo, um punhado de ervas e você fará a ração desses animais tão inocentes. Uma das meninas de Santa Úrsula, que vou determinar, trará os ingredientes cada vez que quiser-lhes dar de comer. Você só voltará à enfermaria à tarde, pelas sete horas. Mandarei lhe trazer o almoço e a merenda aqui no jardim. Peço-lhe muito para não se deixar levar por nenhum pensamento triste. Convite insistente a não deixar a comunhão por causa de algumas impressões desagradáveis. Esforçar-se para fixar mais firmemente a própria vontade na vontade de Deus (L 333, M 159160). A Irmã: Queria muito obedecer-lhe neste último ponto, mas há dias em que o demônio me tenta tão fortemente, que me parece não poder resistir a ele e afastar as idéias que me vêm. Sofro por você deixar a santa comunhão pois, com as tentações que experimenta, ela é para você um remédio necessário. Siga os conselhos de Pe. Cazals, despreze as sugestões do inimigo. Que pode ele fazer a não ser barulho?1 Sua vontade pertence a Deus. Basta trabalhar para torná-la cada dia mais firme e mais decidida, a fim de que seja sempre orientada para o espírito de sacrifício, no seguimento de Jesus crucificado. Teria gostado de lhe falar antes de partir, mas não foi possível. Neste triste exílio, as contradições acompanham todos os nossos passos. Aproveitemos para nos desapegar e elevar incessantemente ao céu nossos votos e desejos. Estou A Madre: Já lhe disse como deve, nas tentações, suportar as aflições de espírito que o bom Deus lhe envia! Ponha em prática os meios que lhe indiquei e conserve a calma e a paz. Tem ainda alguma coisa que a penalize? A Irmã: Toda a minha vida temi a cruz exterior que Deus me enviou. Entrando nesta casa, pensei em santificar-me pela À Irmã Blandine, em Villefranche. Aubin, 2 de novembro de 1830. Minha caríssima Irmã: 452 Minha caríssima Irmã: Aconselho-a ler atentamente, sob o olhar de Deus e com verdadeira humildade, os Salmos 3, 22, e 261. Depois disso não ficará tão amedrontada. Em seguida, reflita: Poderá acontecer outra coisa senão o que Deus ordena ou permite? Recorde a última estrofe do cântico da Providência. Amemos muito a Deus e façamos nosso caminho para a pátria celeste. Façamolo, digo, com paz, confiança e até alegria interior. As revoluções da terra não nos impedirão de chegar lá. Não tema pelo nosso bom Pai. Nada soube a seu respeito que pudesse nos preocupar. Ficou bem combinado e decidido que as Irmãs não falariam sobre assuntos políticos, que Irmã Félicité não falaria disto nem mesmo comigo e não me daria nem as boas notícias nem as más. Na minha última carta, que você sem dúvida recebeu com o pacote eu lhe dizia que daria algumas notícias depois das refeições. Não o faço mais e não poderia fazê-lo, porque não sei mais do que nossas Irmãs. Isso foi feito apenas nos três primeiros dias. Assim, se você me pede notícias, eu lhe direi que procure outra fonte, pois nada sei. Ficou combinado ainda que o rufar do tambor chamando para o combate (e que ouvimos freqüentemente) nos animaria para o combate espiritual; que os fortes gritos, que a nossa querida solidão não nos impede de ouvir, nos relembrariam os clamores dos judeus quando o nosso querido Salvador estava na cruz. As religiosas não devem se envolver em assuntos políticos. Assim, você não deve assinar nada. Acredite no que digo: no parlatório, não falarão de assuntos atuais. Se alguém começar a lhes falar sobre isso, podem dizer que não é do nosso costume. Esperamos não ter de sair do nosso deserto. Domingo, na conferência, juntas combinamos: "A cada dia basta sua pena." Assim, pensaremos no hoje e não no amanhã. Todas as nossas Irmãs dizem que, depois de tudo isso, elas estão mais unidas a Deus e têm mais habitualmente a lembrança de sua santa presença. Saúdo a todas muito afetuosamente. 213 observância exata do regulamento e eis-me vivendo continuamente de dispensas, desde o noviciado. No mais íntimo de minha alma, tenho um vivo desejo de fazer como todas as minhas Irmãs. Esse desejo aumenta cada dia e cada dia aumenta minha impossibilidade de vê-lo realizar-se. Sei muito bem que Deus não pede o impossível. Mas, apesar de tudo, não posso me impedir de sofrer por uma doença real que não se pode muito compreender. Enquanto minhas Irmãs jejuam, faço quatro refeições; enquanto rezam, repouso em minha cama; enquanto trabalham, nada faço. Deus me atingiu pelo lado mais sensível. Tenho sempre a impressão de estar desedificando minhas Irmãs. Temo ser uma pedra de escândalo, uma pedra de tropeço. A Madre: Não é como você pensa, minha cara Irmã. Nunca será uma pedra de tropeço. O bom Deus quer humilhá-la. Enviou-lhe essa enfermidade e tudo quanto a acompanha para o bem de sua alma. Veja, cara Irmã, que tem dois méritos não cumprindo o regulamento, porque os superiores e o bom Deus não o querem. Primeiramente, tem o mérito das Irmãs que o cumprem, porque você faria como elas, se pudesse. Em segundo lugar, tem o mérito do sacrifício que lhe é inspirado por esse vivo desejo que é preciso sempre reprimir, contrariar. Além disso, eu lhe direi que as leis da Providência passam antes da lei dos homens, que é necessário, de bom coração, curvar a cabeça quando aquelas falam e não reclamar, pois o bom Deus tem seus caminhos em tudo quanto faz ou permite. Você encontraria sua própria satisfação na observância exata do regulamento, mas Deus não o quer. Creia que eu, como superiora, não gostaria de ver todas as minhas Irmãs observarem perfeitamente o regulamento, nunca se dispensarem de um exercício de piedade, vê-las jejuar, trabalhar bastante? Tenho que dar dispensas de todos os pontos do regulamento, suportar toda espécie de enfermidade do corpo e da alma, de todas vocês. Eu me sentiria atormentada da manhã à noite se não curvasse de boa vontade a cabeça a todas as leis da Providência, das quais não conheceremos senão no céu toda necessidade e toda vantagem. 214 A Irmã: Compreendo muito bem que é a natureza que se revolta nesses momentos, e que meu orgulho não quereria essa espécie de humilhação. Mas, aceitei e aceito ainda até à morte esse estado, se for a vontade de Deus. Não pedirei para dele me livrar. A Madre: Você agiria mal se o fizesse, pois ofereceu a Deus um sacrifício que ele aceitou. Ele deu provas da aceitação, dando-lhe os meios de satisfazer sua justiça. Persevere, pois, minha Irmã, em seu estado de vítima. Sei que você é feliz, apesar dos gritos da natureza, você ama o sofrimento porque sabe que é o verdadeiro caminho da salvação. Você sente necessidade de força, é preciso ir buscá-la na santa comunhão. Você a receberá comigo, pela manhã, quatro dias seguidos. A Irmã: Minha Madre, a senhora vê meus sentimentos tão imperfeitos! Não me ordene ir tão depressa. Serei uma profanadora. A Madre: Não quero uma palavra de réplica. Amanhã, você começará a receber a santa comunhão comigo, até eu dizer: é bastante. A Irmã: Então, minha Madre, obedecerei e esta noite pedirei ao bom Deus conceder-me essa graça. 451 Irmãs da Sagrada Família. (A Madre sozinha) Se nossas queridas crianças de Santa Úrsula, de Aubin, têm muitas pulgas e percevejos como as daqui, peço-lhes que façam nelas uma grande limpeza. Hoje, levantei-me à meia noite e acordei nossas Irmãs que dormiam tranqüilamente. Ontem à tarde, a mestra de trabalho determinou a cada uma sua tarefa. A minha foi a de orientar umas e outras. Depois de ter feito a meditação, cuja hora foi avançada por necessidade, trabalhamos, fazendo passar pelas janelas colchões e travesseiros que foram esvaziados e depois lavados. Todo o madeiramento das camas foi lavado com água fervente. Depois das órfãs, foi a vez das internas, de modo que nossas queridas Irmãs se cansaram muito. Ontem à noite, foi recomendado à Irmã cozinheira que preparasse uma boa sopa para o café da manhã, tanto para as Irmãs como para as órfãs. Ela cumpriu bem seu dever, pois a sopa estava deliciosa: feijão e batata a tornaram incomparável. Foi um bom restaurador, mas nossas Irmãs estão muito cansadas. Todas se levantaram, pois combinamos ontem que todas as fadigas teriam licença, e as camas, férias. Depois disso tivemos muito sono. Nossas órfãs, dormirão esta noite em São Francisco, no chão, pois as camas ainda não secaram e queremos rebocar o dormitório e exterminar todos os percevejos, se for possível. A Madre (vários dias depois): Como se acha em relação ao bom Deus? Ralha com você sempre? E a santa comunhão lhe traz uma felicidade sensível? A Irmã: Minha Madre, há momentos em que me sinto num estado de felicidade impossível de expressar. Sinto que Deus está comigo, nada temo. Quase logo depois, recaio no meu estado habitual. Vem-me então o sentimento de que é talvez o demônio o autor de tão grande consolação, que estou em mau estado, e que é para me manter assim que ele se transforma em anjo de luz. Irmã Emília. 100 Abandonar-se mais à Providência, a quem nada escapa, como testemunham os Salmos indicados. Falar o menos possível de assuntos políticos (L 319, M 156-157). A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 9 de agosto de 1830. 450 entanto, não pudemos recebê-las todas. Uma pobre viúva, mãe de cinco filhos, foi procurar nosso Pai e pediu para aceitar sua filha de doze anos. Ele se compadeceu dessa boa mulher e prometeu falar com a nossa Madre. Ele lhe perguntou se podíamos aceitá-la. "Sim, Padre”, respondeu nossa Madre, “se o senhor deseja, temos bastantes recursos e uma órfã a mais não custará nada". Conseqüentemente, a pequena entrou. Durante a ausência de nossa Madre, propuseram outra órfã que corria pelas ruas e pedia esmolas. Nossa Madre queria recebê-la também, mas, como nosso Pai não estava para lhe dizer: "Aceite", ela aguardava uma ocasião oportuna. O bom Deus a fez surgir, permitindo que a mãe de uma de nossas meninas viesse pedir para passar alguns meses no campo com a filha, onde estaria bem, e nossa Madre não quis deixar o lugar desocupado e perder essa oportunidade. Imediatamente mandou chamar a menina que freqüentava a classe gratuita e lhe disse que trouxesse a sua tia, o que ela fez. Assim, ela entrará esta tarde, se Deus quiser. Nossa classe de São Vicente é numerosa e nossa Madre desejaria que o fosse ainda mais. Todos os dias, nossa Madre vai colher couve, acelga, favas, beterrabas, batatas e outros legumes. Manda preparar, ora dez, ora doze cestos cheios e os distribui com as crianças que esperam ao lado da escola. Nossa Madre orienta Irmã Cécile, que não sabe bem como fazer. Somos boas comerciantes. Pelo menos, não há vestígios de que estejamos despertando a ambição dos outros, visto que a bolsa de nossa ecônoma não se enche muito rápido. Ontem à tarde, nossa Madre nos disse que seria preciso dar tudo o que colhemos do jardim para obter do bom Deus que nossas crianças não se dissipem e sejam mais silenciosas. Essa graça que a Sagrada Família nos concederá, se nós lhe pedirmos com confiança, nos é muito necessária. Não tenho outras notícias. Toda a comunidade vai bem. Irmã Jeanne é a mais doente e sofre muito. Recebam, queridas Irmãs, a certeza de nossos sentimentos muito afetuosos e creiam em nossa sincera afeição e terna cordialidade. Suas muito humildes e obedientes Irmãs. 215 A Madre: Não dê ouvidos ao demônio. É um mentiroso. Deus está com você. Comungará às minhas intenções durante oito dias. Não faça nenhuma observação. Prepare-se, é a vontade de Deus. Se, durante a noite, sofre muito com seu estado de fraqueza, não comungue e comunique-me depois. A Irmã: Madre, se me abstenho, nunca será por causa das fraquezas e dos demais sofrimentos que posso sentir. A felicidade de me unir a Deus é grande demais para deixar de recebê-la por tão pouca coisa. Somente meus pecados e minha tibieza poderiam impedir-me. A Madre: A visão de seus pecados e de sua tibieza devem humilhá-la, mas nunca impedi-la de caminhar para Deus. Jamais deixe a santa comunhão por isso. Pelo contrário, estimule-se pensando que sua tibieza se dissipará à medida que se aproximar de Deus. Ninguém se aproxima do fogo sem se aquecer, pelo menos um pouco. Acontece o mesmo em relação a Deus.30 A Irmã: Farei tudo que for possível para lhe obedecer. Se alguma vez não o fizer, não é senão por causa do sofrimento interior que sinto, que me pareceu impossível de superar. 14. Terceiro Diálogo A Madre (sentada sobre a cama da doente): Minha querida Irmã Colombe, como vai? Você continua sempre na cruz com Nosso Senhor? A Irmã: É a senhora, minha Madre, que está sentada tão perto de mim? Que felicidade! Não pensava vê-la tão perto de mim. A Madre: Sim, sou eu, querida Irmã. Cheguei há um tempinho. Estava esperando você parar de tossir. Estou vendo-a chorar. Por que se entrega assim à dor? Anteontem disse-me estar muito contente. Seus sofrimentos físicos aumentaram? 216 449 À Irmã Vincent, em Aubin. A Irmã: Minhas dores físicas são sempre as mesmas. O que sofro no corpo nada é comparado ao que experimento na alma. (Explicou-se com a Madre e não sabemos o que lhe foi dito). Villefranche, 3 de maio de 1830. Minha caríssima Irmã: A Madre: Acredito, minha cara Irmã, você não é a única a experimentar essa espécie de sofrimento. (Pe. Marty nos disse, após a morte dela, que fora tentada a manifestar-lhe suas misérias interiores para consolá-la, mas Deus não o quis). A cruz mais pesada é para os amigos mais íntimos de Deus. Se ele a quer nesse número, aceite. Diga-lhe: “Ainda mais, Senhor, ainda mais, se for sua vontade.” Fiz-me sua vítima, não me poupe, pois não poupou seu divino Filho. Aceito o grau de sofrimento que reservou para mim." Você persevera em seu estado de vítima? A Irmã: Sim, minha Madre, persevero. Aceitei e aceito cada dia meus sofrimentos pelo que foi combinado. De um lado, pareço esmagada, aniquilada sob o peso da justiça divina, e do outro, sinto, por vezes, uma força extraordinária para aceitar novas cruzes. Mesmo esmagada na dor, estou feliz. Não trocaria minha posição atual com a dos mais afortunados do mundo. Nem a rainha nem a imperatriz encontram no trono a felicidade que encontro no meu leito de dor. A Madre: O bom Deus visitou Jó sobre o monturo. Ele se inclina também para você, minha cara Irmã. Pense muitas vezes nesse santo homem, em seus momentos mais penosos. Lembrese destas palavras ditas por ele: “O Senhor me tinha dado tudo e tudo me tirou. Bendito seja seu santo nome.” E estas outras: “Mesmo se me tirasse a vida, esperaria sempre nele.”31 Esse santo homem deve servir-lhe de modelo nos momentos em que parece não haver mais esperança. A Irmã: Lembro-me muitas vezes dele. Acredita, Madre, que viverei muito tempo ainda? Mesmo tendo medo, desejo morrer. Num tempo em que você se encontra tão ocupada, penso na sua alma e temo que se perturbe e se dissipe diante das preocupações e cuidados. Vigie para que ela não seja prejudicada e que sua união com Deus seja fortalecida pelo trabalho que faz por ele.1 O recolhimento deve nos acompanhar por toda parte: é por ele que nossas ações adquirem muito valor; é por ele também que aprendemos a retificar nossas intenções e a não ter outra meta a não ser Deus, e Deus só. É ainda por ele que afastamos as reflexões sobre nossa conduta, e que a lembrança de nosso bem-amado preencha nosso espírito e invada nosso coração. Sou, com a mais terna afeição, toda sua. Irmã Emília. 99 Aspectos da vida em Villefranche: acolhimento o mais generoso possível às órfãs; distribuição de legumes às crianças pobres; luta contra a verminose (L 315, M 151-152 - em parte). À Madre Vincent, em Aubin (carta comum da Madre para as Irmãs). Villefranche, 7 de julho de 1830. Nossas caríssimas Irmãs: Nossa Madre quer que partilhemos com vocês nossas pequenas atividades, a fim de que se alegrem conosco e que não acreditem ser as únicas a quem ela ensinou a fazer o comércio que vocês fazem com o produto do seu jardim. Em primeiro lugar, a classe de Santa Úrsula é muito numerosa e encontramos muitas órfãs que desejavam entrar. No 217 448 R . F . 97 Alegrar-se espiritualmente por pertencer exclusivamente a Deus, pertencendo à Sagrada Família (L 294, M 238). À Irmã Anne-Régis, em Aubin. Villefranche, 16 de outubro de 1829. Minha caríssima Irmã: Diga na alegria de sua alma: "Meu bem-amado é meu, eu sou dele; pertenço à Sagrada Família, sou de Jesus, de Maria e de José e, com a graça de Deus, nada quero fazer, nada dizer, nada pensar que não responda às grandes misericórdias de Deus na minha alma. O Deus do meu coração terá todo o meu amor. Viverei somente para lhe testemunhar o meu reconhecimento e detestar todos os momentos de minha vida que não foram para ele." Eis, minha querida Irmã, qual deve ser sua linguagem. Depois, aplique-se a uma profunda humildade. Quanto à santa comunhão, aconselho-a a desejá-la e fazê-la conforme acharem seu confessor e Irmã Thérèse. Saúdo-a no divino Coração de Jesus. Irmã Emília. Ano de 1830 98 Velar para que o ativismo não prejudique a alma. Que a união com Deus seja fortificada pelo serviço prestado a ele; que o recolhimento contínuo modere os ímpetos que surgem (L 308). A Madre: Não penso que o bom Deus a chame agora. Não se entregue a esse desejo, mas abandone-se inteiramente em suas mãos, desejando apenas sua vontade, sua glória. Adquirimos tanto mérito durante o sofrimento que seria um erro suspirar pelo momento de nos livrarmos dele. A Irmã: O que me leva a desejar a morte é o pensamento de que, desta maneira, me livrarei do poder que tenho de ofender a Deus. Ah! como me tarda não mais pecar! A Madre: A morte a libertará do poder de pecar, mas a deixará na impossibilidade de promover a glória de Deus. Você não poderá adquirir mais nenhum mérito. Diante de todas essas circunstâncias, creio ser melhor abandonar-se e só pensar em aproveitar o tempo que Deus lhe dá para santificar-se, fazendo a vontade dele. A Irmã: Eu me abandono. Não quero senão o que Deus quer. A Madre (alguns dias depois): Como está hoje, minha cara Irmã?... Creio que faz sol. A Irmã: Sim, minha boa Madre, faz sol, o bom Deus me visita. Eis meus pés e minhas mãos inchadas. Estou no limiar da eternidade. Que felicidade! A Madre: Você está perto do fim. Ainda um pouco de tempo, minha cara Irmã, e irá unir-se a seu Esposo. Ele tardava e eis que Deus satisfaz seus desejos. Permaneça bem unida até aquele momento (acrescenta coisas das quais não temos conhecimento). É bom ter amado o bom Deus, ter sofrido durante a vida, não é? A Irmã: Sim, minha cara Madre, é bom morrer. Nunca teria pensado ser tão doce deixar a terra. Toda a minha vida temi a severidade do julgamento de Deus. A senhora sabe quanto eu receava esta última passagem e eis que Deus me inunda de consolação. Não temo mais. Por que temer um Deus tão bom? 218 Ah! meu Salvador, o que fiz eu para que seja tão bom para mim, para morrer por mim numa cruz! (Beijava sua cruz e tornava a beijá-la, depois falou em particular à Madre). A Madre: Bem que eu lhe dizia durante a vida que o bom Deus a trataria assim nos últimos momentos. Humilhe-se sempre por causa de seus pecados, e depois deseje ardentemente seu bem-amado. O sofrimento está bem recompensado, não é? 447 preparou um lugar. Para caminhar corajosamente, precisamos receber o Espírito Santo que virá a nós, se o invocarmos por nossos desejos e nossa fidelidade. A constatação de suas faltas não a deve desanimar, mas, ao contrário, encorajá-la à prática das virtudes contrárias. Contemple muitas vezes seu divino Esposo e apóie-se inteiramente nele. Segunda-feira, 1º de julho, será celebrada uma Missa (para nós) em Pibrac. Não preciso pedir-lhe que se una a ela em intenção. Muitas recomendações a suas alunas e sou toda sua nos Santos Corações. A Irmã: Nada melhor do que ser recompensada no céu. Quando a senhora me falava da bondade de Deus, eu não podia imaginar que chegasse a ser tão feliz. É meu Salvador Jesus quem me concede tantas graças. Quando estarei unida a ele para sempre? A Madre: Você se lembrará de nós, pobres exiladas a rastejar com sofrimento e trabalho nesta terra. A Irmã: Poderia esquecê-la, minha boa Madre, a senhora que me fez tanto bem? Sem o auxílio de suas orações e conselhos, sem dúvida eu não teria aproveitado das cruzes que Deus me enviou. Depois de Deus, devo tudo à sua caridade. Esquecê-la, minha boa Madre, seria impossível. Obrigada, muito obrigada por ter recebido e guardado perto da senhora uma tão miserável pecadora! A Madre: É o bom Deus o autor de todo bem que lhe fizemos. Vai pedir também pela Congregação, a fim de que todos os membros sejam animados de um bom espírito, não é? Coragem! Em breve o bom Deus virá buscá-la e irá juntar-se à sua querida Irmã Isidore (religiosa de nossa Congregação, irmã da própria Irmã Colombe e cuja vida tinha sido semelhante à de São Luís de Gonzaga). A Irmã: Madre, não a estou vendo mais, reconheço-a apenas pela voz. Irmã Emília. 96 Dedicar-se de todo coração à visita aos doentes, numa intenção plenamente sobrenatural, testemunhando-lhes a mais humana afeição (L 289). À Irmã Rose em Aubin. Villefranche, 5 de julho de 1829. Minha caríssima Irmã: Sei que é encarregada da visita aos doentes. Recomendolhe não deixar nenhum deles sem visita. Não é necessário dizerlhe que os ame, pois sei que os ama. No entanto, jamais podemos dizer que amamos bastante, visto que não é a homens que prestamos serviços, mas ao próprio Nosso Senhor. Encorajo-a a olhá-los todos no coração desse amável Jesus. Você os amará e fará por eles tudo o que for possível. Desejaria ter alguma coisa para lhe enviar, mas há algum tempo que não disponho de nada. Contudo, envio-lhe um pedaço de bolo. Desejo-lhe um zelo sempre renovado por esse trabalho. Peço ao menino Jesus que o conceda a você. Toda sua. Irmã Emília. 446 219 que dirão, mas faça-o como uma verdadeira noviça que, sem escutar nem a carne nem o sangue, sabe tudo sacrificar por amor daquele que a escolheu para ser o tudo de sua vida. Você sabe que o caminho da união com Deus não é outro senão o da renúncia e o da santa obediência. Pratique-as se quiser tornar-se uma verdadeira esposa de Jesus. Se não tomar cuidado, o Senhor que a cumulou de graças as retirará e a privará da maior de todas as felicidades. Espero que, quando me escrever, me fará sentir que se tornou generosa e cada vez mais obediente, humilde e mortificada. Então, a Sagrada Família a guardará e a amará como uma verdadeira filha. É nessa esperança que sou, com afeição, sua dedicada Madre, nos Corações de Jesus, Maria e de José. Irmã Emília. R.S.F. 95 Renovar nossa coragem pensando que Nosso Senhor nos prepara um lugar no céu e pedir, para isso, as luzes do Espírito Santo. Não se deixar abater por nenhum pretexto, diante das faltas cotidianas (L 287). A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 29 de junho de 1829. Minha caríssima Irmã: A carta do nosso Pai, que você teve a delicadeza de me enviar, causou-me grande prazer... Havia muito tempo que não tinha notícias dele. Agradeço-lhe também as notícias que me deu de suas queridas doentes e das outras Irmãs. A todas, afetuosas lembranças. As doentes e as que estão bem de saúde, todas, numa santa união, esforcemo-nos para avançar em direção à nossa bem-aventurada pátria, onde nosso chefe nos A Madre: Dê-me sua cruz, minha querida Irmã. Que eu a beije antes de nos deixar. (Beija-a com profundo respeito). A Irmã: Madre, dê-me também sua cruz a beijar. (A Madre a dá). Você vai receber a bênção da Sagrada Família. (Feito isso, a Madre se retira com profundo respeito.) 15. Diálogo sobre a virtude de uma Irmã enferma (D 110-112; nº 51) A interlocutora não é nomeada, mas trata-se sobretudo das Irmãs Marie du Calvaire (v.s. nº 10) e Colombe (v.s. nº 12-14), que ela é convidada a visitar a fim de tornar-se melhor. Deve ir conversar com elas, mesmo se o heroísmo delas assuste um pouco o comum dos mortais. Numerosas alusões às causas de relaxamentos provocados na Congregação pela introdução de novos costumes: exames públicos e distribuição de prêmios, estilo de vida mais liberal, etc. É no decorrer do ano de 1850, um pouco antes de um dos últimos Diálogos precedentes, parece. A Madre: Você está um pouco doente. É preciso que lhe dê por companheira a Irmã Colombe. Irá aprender com ela as virtudes que deve possuir uma religiosa fervorosa. Vai tomar leite de jumenta; portanto, farei substituí-la na classe, durante um mês. Tem toda a liberdade para encontrar essa Irmã. Você lhe dirá que lhes permito conversar, bem entendido, sempre sobre o bom Deus. Examine bem sua conduta e veja como se conduziria se estivesse no lugar dela. A Irmã: Madre, temo um pouco essa Irmã. Ela é demasiado perfeita para mim. Sinto-me confusa quando percebo que os pensamentos dela, bem como os da Irmã Marie du Calvaire são tão opostos aos meus. A Madre: Em que os pensamentos delas são tão opostos aos seus? 220 A Irmã: Madre, para elas, o sofrimento é tudo, e o gozo das satisfações permitidas, mesmo das consolações espirituais nada é, porque apenas o sofrimento merece ser recompensado. Irmã Marie du Calvaire queria ser desprezada, odiada, abandonada por todo mundo, sofrer as mais vivas dores. Irmã Colombe fica abismada em seu nada, penetrada pela grandeza de Deus, reza com uma fé tão viva que, quando rezo com ela, paro para contemplá-la. Quando assisto às pequenas conferências que a senhora lhe permite fazer, encho-me de confusão. Tenho a impressão de que me vêem nua como um verme, isto é, despida de toda virtude. Falo pouco com ambas, sobretudo com a Irmã Marie du Calvaire. Quereria que não me conhecessem. É bastante a senhora conhecer-me. A Madre: Veja como seu orgulho ainda é grande. Você se tornará humilde, tenho confiança. Quanto proveito poderá haurir de seu relacionamento com as Irmãs Marie du Calvaire e Colombe! Não é necessário falar muito. Escute-as e isso lhe fará bem. Gostaria que todas as jovens religiosas como você visitassem sempre essas duas Irmãs. Ah! que almas! Nada somos ao lado delas: desejar o desprezo, o ódio dos homens, o abandono de todas as criaturas, como é perfeito! Vá até elas tanto quanto puder. Estou certa de que lhe farão bem.32 A Irmã (algum tempo depois): Madre, acabo de estar com Irmã Colombe. Encontrei-a tão aniquilada em sua dor que nada pude lhe dizer. Vá consolá-la um pouco! A Madre: Irei já, mas não sei se vou consolá-la. Existem sofrimentos que só Deus conhece e aos quais ninguém pode remediar. Nossa cara Irmã se encontra, às vezes, em um estado tão doloroso, tão penoso, que só podemos lhe desejar a paciência. Fez bem em avisar-me. Irei vê-la daqui a pouco. A Irmã: Estar tão doente e tão aflita ao mesmo tempo é terrível! Ela morrerá logo. A Madre: Essa piora da enfermidade não a levará à morte. Ela se levantará ainda. 445 ele nos sustentará e nos protegerá contra o demônio e contra nós mesmas. Tenha sempre grande confiança em sua Madre. Deus abençoará essa confiança e a fará encontrar calma no meio da tempestade. Sobretudo, não se preocupe consigo mesma, afaste de seu espírito todo pensamento triste. Abandone-se com confiança nas mãos de Deus e na proteção da Sagrada Família. Imite suas virtudes, meditando-as muitas vezes e não se perturbe com nada. O Senhor, que a ama, não será o primeiro a abandoná-la. Na esperança de que você queira ser toda de Deus, sou, nos Santos Corações de Jesus, Maria e José, sua dedicada e afeiçoada Madre. Irmã Emília. R.S.F. 94 A religiosa que teve de interromper o noviciado comunica sua alegria ao assistir às conferências reservadas às noviças. Madre Emília a felicita, lembrando-lhe, no entanto, de que a prática das virtudes é o único verdadeiro caminho para a união com Deus (L 285, M 142143). À Irmã André, em Aubin. Villefranche, 29 de maio de 1829. J.M.J. Minha caríssima Irmã: Com prazer recebi sua carta e estou feliz em constatar a sua felicidade em assistir às conferências do Noviciado. Convido-a a pensar muitas vezes no espírito de obediência, de renúncia e de mortificação que, ordinariamente, constituem o tema dessas conferências. Não basta, minha Irmã, saber e ouvir. Precisamos, no momento certo, provar a Deus que somos ou queremos ser verdadeiras esposas da cruz. Por exemplo, quando a chamam ao parlatório, faça o sacrifício, com boa vontade, sem pensar no 444 221 Cada uma teria desejado com ardor que Deus no-la conservasse por muito tempo ainda, para encontrar nela um modelo e a ajuda poderosa do exemplo. Mas como, em pouco tempo, tinha vivido uma longa carreira e já era um fruto maduro para o céu, seu divino Esposo apressou-se em recompensá-la. Seu estado de saúde piorou, sempre manifestando um ardente desejo de ir para o Esposo, que recebia muitas vezes no sacramento de seu amor, pelo qual tinha grande atrativo. Embora para gozar dessa felicidade tivesse de sofrer com a sede e a necessidade de tomar um pouco de alimento, não deixou nenhuma comunhão e teve a alegria de recebê-la mesmo em jejum até à véspera de sua morte. No dia em que morreu, comungou em viático. À tarde, sentiu que seu último momento estava próximo e disse à nossa Madre:1 "Deus virá me buscar logo, fique aqui para fechar meus olhos." Pediu que rezasse a oração dos agonizantes, que acompanhou também. Em seguida, pronunciou sem cessar os santos nomes de Jesus, Maria e José. Pelas 19h, entregou sua alma a Deus numa calma profunda, de modo que sua morte foi semelhante à sua vida. A Irmã: Ela deseja tanto morrer! A Madre: Pode ser que o bom Deus queira contrariar um pouco o desejo dela. Ela não perde tempo em seu leito de dores. Vai visitá-la muitas vezes? A Irmã: Sim, minha Madre, muitas vezes, mas quando ela está sofrendo como ultimamente, nada me diz. A Madre: Quando ela não está sofrendo, sobre o que vocês conversam? A Irmã: Falamos de Deus, da santa comunhão, do céu. Muitas vezes ela me fala do que sabe sobre nossas primeiras Irmãs. Algumas vezes, falamos também de outra coisa que me leva a bastantes reflexões. A Madre: Que coisa é essa? A Irmã: A senhora tem bastantes aborrecimentos, sem que eu a aflija falando de uma coisa que lhe encherá o coração de amargura. 93 A Madre: Diga-me. No âmago do sofrimento, renovar o propósito de inabalável fidelidade a Deus. Acreditar que, apesar de tudo, ele não nos abandonará. Recorrer confiante às orientações da superiora de Aubin (L 284, M 141). A uma jovem aflita, em Aubin. Villefranche, 24 de maio de 1829. Minha querida amiga: Eis que está sofrendo; no entanto, não se aflija. Esta miserável vida é um lugar de exílio, onde precisamos ter continuamente as armas na mão, para combater. Mas tenhamos coragem. Deus está conosco. Contanto que lhe sejamos fiéis, A Irmã: Ela me diz algumas palavras sobre o relaxamento no qual teme que caiamos. Esclareceu-me bastante. Até o presente, eu acreditava que tudo quanto se fazia de novidade era bom e necessário. Aprovava e quase gostava de muitas coisas que agora vejo não serem para amar nem desejar com tanto ardor. Após a conversa, faço uma profunda meditação sobre as causas do relaxamento que ela me assinala. A Madre: Como faz você essa meditação? A Irmã: Digo a mim mesma: por que os exames públicos, a distribuição de prêmios, acompanhados de apresentações, levarão ao relaxamento? Vejo que os preparativos pedem demasiado tempo e nos preocupam muito. As religiosas 222 443 clausuradas vêem o mundo de muito perto. Esse mundo deixanos um pouco de seu espírito. Se cada ano nos imbuímos um pouco dele, dentro de algum tempo nos invadirá totalmente. Vendo isso, peço ao bom Deus não permitir que isso dure. Outras vezes, observo os motivos que levaram algumas Irmãs a desejarem fazenda mais fina para suas roupas. Vejo que é um secreto motivo de amor-próprio, encoberto sob pretextos de asseio, etc. Vejo também que as religiosas tão atentas ao cuidado do corpo são pouco interiorizadas. Nunca fixo meu pensamento sobre uma pessoa em particular, temendo faltar à caridade. Penso em geral. Quanto à entrada de antigas alunas que obtêm a permissão do nosso Superior, compreendo quanto prejudicam as Irmãs que são obrigadas a ficar o dia inteiro com elas. Na primeira vez, acreditei que essas jovens pediam para entrar a fim de se refazerem um pouco no espírito de piedade. Num dia que passei com elas, cheguei à conclusão de ser uma pura perda de tempo para elas e para nós. Se a Irmã encarregada de ficar com elas é jovem, tenha cuidado para que as suas conversas não a prejudiquem. A Madre: Começamos a bem julgar. Essa meditação vai muito bem. Irmã Colombe não lhe fala de outra coisa sobre o relaxamento? A Irmã: Desculpe-me. Disse, ainda, que o recreio revela se o espírito de fervor reina ou não. As conversas das religiosas devem ser santas e espirituais, quase sempre sobre os interesses da glória de Deus. Não sendo assim, o relaxamento se aproxima. Ela me falou que o que mais deve preocupar uma religiosa é o cuidado com sua perfeição. Ela pensa que para conservar o fervor, é preciso evitar se entregar às coisas exteriores. Esses ensinamentos me abriram os olhos e me fizeram compreender muitas coisas ditas pela senhora, e das quais bem pouco compreendia grande coisa. Gosto também de ouvi-la falar sobre a santa comunhão. A Madre: O que lhe diz ela sobre a santa comunhão? ao mesmo tempo seu diretor, que, se para se tornar religiosa fosse preciso atravessar os mares e ir até o Novo Mundo, ela não hesitaria em empreender a longa viagem. Apresentando-se em nossa casa, nós a recebemos de boa vontade, mesmo sem dote, pois trazia o melhor de todos: a vontade sincera de se entregar inteiramente a Deus. Toda a sua conduta correspondeu às santas disposições que manifestou. Uma fé viva a mantinha profundamente aniquilada diante de Deus, levando-a a fazer suas orações com respeitosa atenção, conservando-a num humilde temor, unido, entretanto, a uma confiança toda filial, que transformava sua alma em um céu sem nuvens. Essa calma profunda irradiava em todo o seu exterior, cujos movimentos anunciavam a sabedoria e o espírito de Deus de que estava repleta. Como sua humildade era profunda, o desprezo que tinha para consigo mesma levava-a a ter toda espécie de atenção pelos outros, sem excluir ninguém. Todas as pessoas da casa eram tratadas por ela com afetuoso respeito, animado ainda por uma caridade das mais vivas que já se viu, sobretudo na função de enfermeira, durante quase todo o tempo em que gozou de boa saúde. É inútil dizer como era amável, com tanta humildade e tanto amor a Deus e ao próximo. Teria sido possível que tivesse alguns momentos de impaciência? Também, sua doçura era invariável, assim como sua humildade, sua paz e sua alegria. Amava a vida comum mais do que a sua própria vida. O silêncio fazia suas delicias. Vivia na prática da mortificação como o peixe na água. Uma paciência inalterável, que uma doença de vários anos não pôde alterar, coroou tantas virtudes. Desde esse tempo, teve alternativas de melhora que nos davam esperanças, mas serviram apenas para prolongar seus sofrimentos e aumentar seu mérito, que foi tanto maior quanto mais se abandonou à vontade divina. Longe de desejar as visitas do médico, bem como os remédios, tinha uma repulsa extrema e não aceitava um e outros, senão por pura resignação. Tendo seu mal aumentado consideravelmente, nós lhe propusemos receber o Sacramento dos Enfermos que ela aceitou com ação de graças. Viveu ainda alguns dias, sempre no sentimento de um amoroso abandono, sempre contente, sempre calma, o que lhe atraía a mais terna afeição e o profundo respeito de todas as Irmãs. 442 223 91 Procurar nunca admitir um pensamento triste; a paz oculta no meio do sofrimento (L 275). A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 8 de janeiro de 1829. Minha querida Irmã: Exorto-a a jamais admitir algum pensamento triste. Tenha muita confiança em Deus. Quanto mais nossos sofrimentos se fazem sentir, contanto que a paz da alma os acompanhe, mais nossa alma se une a Deus. Toda sua. Irmã Emília. 92 Circular sobre uma religiosa notável por seu espírito de fé e sua humildade diante de Deus e das Irmãs de sua comunidade. Sua extrema doçura na missão de enfermeira. Vários anos de enfermidade não alteraram sua paciência. Nos últimos tempos, tudo fez para comungar muitas vezes, apesar da dificuldade que tinha de observar a lei do jejum (L 280). Madre Emília, como acontece várias vezes em suas redações, fala de si mesma na terceira pessoa. Circular de Irmã Lucie Bouyssou. Villefranche, 6 de maio de 1829. Minhas caríssimas Irmãs: Irmã Lucie, de nome Bouyssou, era de Cransac, vilarejo pertinho de Aubin. O desejo que Deus lhe inspirou de se consagrar a ele na solidão era tão ardente que teria ido até o impossível para vê-lo realizado. Dizia ao seu vigário, e que era A Irmã: Nada de particular, mas quando fala é com tão profundo respeito que se diria que ela ainda se encontra diante do Santíssimo Sacramento. Nossas comunhões tornam-se mais freqüentes, repete-me ela muitas vezes. O fervor aumenta em proporção? Uma coisa deve sempre acompanhar a outra. Se nos mandam aproximar-nos da mesa sagrada quando sentimos nossa indignidade e que por esse motivo gostaríamos de nos afastar dela, devemos pensar ser para nos aproximarmos mais rápido de Deus, da santidade. Tenho medo de que minhas comunhões me condenem ao julgamento de Deus. A Madre: Ela teme que as comunhões que faz a condenem. Isso não lhe dá medo? A Irmã: Isso me humilha e me dá compunção. Cada vez que falamos da santa comunhão, senti-me mais recolhida durante vários dias. Finalmente, nunca me aproximo da Irmã sem me sentir mais inclinada para o bem, para a virtude. Ah! como ela é feliz! A Madre: A Irmã teme que suas comunhões a condenem, e, entretanto, ela sente uma fome devoradora desse divino alimento, a ponto de sentir desfalecimentos que a fazem sofrer muito de meia-noite às seis da manhã. Muitas vezes, a necessidade de tomar algum alimento a impede de dormir. Durante todo esse tempo, ela enfrenta as dores das pernas e suas outras dores para se levantar às cinco horas da manhã e encontrar-se com seu Deus. Eu quis dispensá-la da santa comunhão por causa dos suores, mas não foi possível quando senti seu vivo desejo. A Irmã: Algumas vezes pensei que a senhora não nos permite o que permite à Irmã. Se suássemos como ela, teríamos de ficar de cama dois ou três dias. A senhora não suportaria que sentíssemos desfalecimentos da meia-noite às cinco da manhã. A Madre: Você conhece o provérbio: Honram-se os santos como eles são. Na verdade, não permitiria a nenhuma outra o que permito à Irmã Colombe. Reconheço a mão de Deus nos 224 441 sofrimentos dela. Diviso seus planos sobre ela. Por que impedir de caminhar para Deus uma alma que só anseia por ele? Ano de 1829 90 16. Diálogo sobre a morte da Irmã Marie du Calvaire (D 115; nº 53) Testemunho sobre a grande santidade desta religiosa. Maneira única como Madre Emília sabe falar, apreciar, discernir esta “via” providencial (fevereiro/1851). Ver necrologia, 1.205. A Irmã: Madre, estou com medo de que a Irmã Marie du Calvaire morra. A Madre: Eu também tenho medo. A Irmã: A senhora só tem que pedir ao bom Deus para deixá-la conosco. Ele a atenderá. A Madre: Não farei tal coisa. Quer que prive essa alma de ir gozar de seu Deus? Não pedirei que seu exílio seja prolongado. Que a vontade de Deus se cumpra. A Irmã: Temos tanta necessidade de uma religiosa tão boa, e a senhora quer deixá-la partir sem nada dizer ao bom Deus? Por favor, rogue para que ela não morra! Que modelo nós perdemos! A Madre: Não, não pedirei que seu exílio se prolongue. Você não compreende o que sofre aqui uma alma que ama seu Deus e como lhe tarda unir-se a ele. Do contrário, você não me faria pressão para reter essa querida Irmã.33 A Irmã: Se todas aquelas que são tão boas se vão, que faremos? Irmã Colombe morreu, Irmã Marie du Calvaire vai morrer! Não seria melhor que se fosse qualquer uma de nós? Bem que eu tomaria o seu lugar, se o bom Deus quisesse. Elas fariam aqui alguma coisa, seriam edificantes. Votos de Ano Bom: entrar nos sentimentos mútuos dos membros da Sagrada Família em Nazaré. Incomodar-se, se for preciso, para acomodar os outros (L 274, M 137-138). Às Irmãs de Aubin. Villefranche, 5 de janeiro de 1829. J.M.J. Minhas caríssimas Irmãs: Recebo seus votos com muito prazer. Os meus para vocês são fortes e ardentes. Renovemo-nos todas juntas, no início deste ano. Amemos muito a Deus, amemos a Sagrada Família, vivamos no coração de Jesus, vamos a ele por Maria e José. Assim, experimentaremos toda a felicidade de nossa santa vocação. Que uma doce caridade reine entre nós e não nos poupemos em praticá-la para acomodar nossas Irmãs, mesmo que precisemos nos sacrificar e nos incomodar por elas. Obedeçamos sem questionamento e sem réplica, de bom grado, vendo sempre Deus naqueles que o representam. Assim, encontraremos no amável abrigo da Sagrada Família uma suave e abundante paz, bem como férteis pastagens. Recomendo às suas orações nossa querida Irmã Lucie que está muito doente, porém muito contente apesar do seu estado de saúde. Saúdo-as de todo o coração. Irmã Emília. 440 225 que vocês têm para comigo. Esperemos na infinita bondade de Deus que este ano receberemos muitas graças para nos tornarmos verdadeiras esposas de Jesus. Essas graças serão particularmente concedidas pela paz e união que reinarão entre vocês. É essa santa união que compõe o excelente perfume de que fala o profeta. Saúdo-as com uma terna afeição junto ao presépio, e sou toda sua. Irmã Emília. Irmã Louise, a quem saúdo afetuosamente e a quem agradeço os detalhes que me relata, pergunta-me que livro se deve ler à mesa. Se há alguma vida de santos que não se tenha lido desde muito tempo, como a vida de Santo Inácio e da santa Madre de Chantal, seria bom reler. Poderiam também ler a explicação dos Salmos por Berthier, um pela manhã, outro à noite. Faremos bem de nos renovar quanto à atenção que devemos dar à leitura à mesa. Irmã Louise ainda me pergunta se é preciso colocar a biografia de nossas Irmãs falecidas após as crônicas. É necessário começar a escrever sobre a fundação da casa e depois colocaremos a vida das Irmãs, se for preciso. Irmã Aghate escreveu-me uma delicada cartinha, à qual ainda não respondi. Agradeço-lhe muito. Uno-me a ela no cuidado às crianças e, embora sinta a felicidade em fazer conhecer e amar Jesus, exorto-a a apreciar sempre mais esse serviço. Peço a ela e a todas vocês, minhas queridas Irmãs, as que estão junto a essas jovens plantinhas, de lhes desejar, da minha parte, um Feliz Ano Novo e dizer-lhes mil coisas amáveis. A Madre: Deus tem seus desígnios, ao chamar a si essas duas religiosas. Do céu elas poderão nos ajudar melhor do que se estivessem aqui. A vontade de Deus deve passar antes de tudo. A Irmã: Sempre as melhores se vão. A Madre: Elas estão preparadas. Colhe-se um fruto quando está maduro. O bom Deus faz o mesmo. As menos fervorosas ficam para adquirir o grau de perfeição que Deus quer que atinjam antes de se unirem a ele. A Irmã: Quando nada de bom se faz aqui e se ofende sempre o bom Deus, não seria melhor morrer? A Madre: É preciso fazer na terra as coisas para as quais Deus aqui nos colocou e nela permanecer o tempo que ele quiser. Não raciocine tanto. Ponha mãos à obra. Não são os que dizem "Senhor, Senhor, que entrarão no reino dos céus, mas os que fizerem a vontade do Pai celeste." Tenho de ir ao meu quarto. A Irmã: Permite-me ir ver Irmã Marie du Calvaire? Quero falar com ela antes que morra. A Madre: Ofereça esse sacrifício ao bom Deus. Você se sentirá mais contente. A Irmã me pediu para deixá-la sozinha. Está unida a Deus. Por que distraí-la? Seu atrativo para viver escondida e desconhecida perdura. Deus a cumula com suas graças, mas tudo deve permanecer secreto. Após sua morte, diremos alguma coisa, mas é preciso esperar. 17. Conferência sobre a paciência (C 47-49; nº 17) Embora as ocasiões, os exemplos e os pontos de aplicação evocados por Santa Emília no declínio de sua vida (estamos no fim de 1851) sejam tirados da vida cotidiana e banal, esta exortação ultrapassa o nível de um moralismo puramente pragmático. Tudo está fundamentado em motivações sobrenaturais e teologais. Vemos 226 também que o rigorismo da superiora é abrandado pela doçura heroicamente salesiana. “Um homem paciente vale mais que um homem valente. Aquele que sabe vencer-se a si próprio é maior do que aquele que conquista as mais brilhantes vitórias”, diz a Imitação de Cristo.34 Esse versículo bem meditado é próprio para nos encorajar à paciência em tudo o que nos pode contrariar. O mundo estima, ama e aprova o que brilha. Uma pessoa dotada de algumas qualidades do espírito e do coração, que tenha saúde, riqueza, uma boa fama, que trabalhe muito e saiba mandar, que seja poderosa e revestida de autoridade, o mundo – e entendo por mundo aqueles que, não lhe pertencendo, possuem seu espírito – imediatamente a aprova, louva e julga feliz. Ela tem muitos amigos. Se, pelo contrário, uma outra é fraca, pequena, indigente, se apenas sabe orar, meditar, combater seus defeitos, essa tem poucos amigos, pouca estima da parte dos homens. É, segundo ele, uma pessoa inútil, que para nada conta. Assim acontece no mundo e, algumas vezes, mesmo na vida religiosa, quando todos os religiosos não possuem o espírito de Deus, mas ainda são imbuídos do espírito do mundo. E no entanto, não é assim que Deus julga. Não é sobre as aparências, as qualidades físicas e morais que são um puro dom de sua liberalidade, mas sobre a paciência e a humildade com as quais suportamos as penas da vida. É sobre as virtudes interiores que tivermos adquirido que Deus nos julgará.35 Ele não nos perguntará o que os outros disseram ou pensaram de nós, mas o que tivermos feito. Nossa cara Irmã Colombe dizia que não haverá recompensa no outro mundo senão para a paciência com a qual foram suportados os sofrimentos, as penas da vida. Eu também acredito que a aceitação humilde e paciente das penas e das misérias da vida é o que há de mais meritório e o que mais une uma alma a Deus. Onde há satisfação própria, pouco se ganha para o céu, mas, onde há pena, trabalho, sofrimento, há ganho para a eternidade. 439 Não se aflija por não poder jejuar. Substitua essa santa obrigação, que gostaria tanto de poder cumprir, pelo jejum do espírito, por essa mortificação interior que atrai o coração do nosso queridíssimo Esposo. Seu querido papai, que mandei visitar um desses dias, encontra-se mais ou menos no mesmo estado de saúde. Aceita a doença muito cristãmente. Você deve se alegrar com a paciência dele, aceitar os desígnios de Deus sobre ele e ver nas aflições meios eficazes de torná-lo mais santo. Irmã Emília. 89 No ambiente sobrenatural que o presépio irradia e no limiar do "mês de Jesus", será mais fácil se dispor a uma total obediência religiosa. As graças que Deus quer generosamente conceder durante o novo ano frutificarão na medida em que forem recebidas numa comunidade mais unida (L 273, M 135-136). Às Irmãs de Villefranche. Aubin, 27 de dezembro de 1828. J.M.J. Minhas caríssimas Irmãs: Na preciosa festa que acabamos de celebrar, fiquei unida a todas vocês e pedi ao divino Infante que me fizesse participar do santo fervor que certamente tiveram junto ao presépio. Não duvido de que o bom Jesus, envolto em panos, tenha preenchido seus corações com o mais ardente desejo de lhe pertencer sem reserva. Vamos começar o mês de Jesus, procurando não nos limitar às práticas externas que nos são prescritas. Tomemo-lo por modelo, meditemos, sobretudo, as palavras de São Lucas: "Era-lhes submisso." Se as compreendermos, a prática da obediência se tornará para nós deliciosa. É inútil dizer que lhes desejo um feliz ano novo. Conhecem meus sentimentos e eles correspondem à intensidade daqueles 438 227 com ela um coração inteiramente filial. Se alguma de vocês pensa ter bastante ternura para com ela, engana-se. Não saberíamos amar bastante aquela que, depois de Deus, merece toda a afeição de nossos corações. Soube, por uma carta de Irmã Françoise, que estavam fazendo uma novena por mim. É um grande serviço que me prestam, pelo qual não sei como lhes testemunhar minha gratidão. Deus, em sua infinita bondade, as recompensará pelo que fazem por seu amor em meu favor. Recebam, minhas queridas Irmãs, nos Sagrados Corações da Sagrada Família, a expressão do meu sincero afeto. Irmã Emília. 88 Uma piedade profunda para com o Sagrado Coração não pode deixar de gerar a paz no abandono filial e uma delicada caridade no ministério da visita aos doentes (L 272). A uma Irmã de Villefranche. Aubin, 19 de dezembro de 1828. Minha muito querida Irmã: Seria também para mim um grande prazer vê-la, mas é preciso que nos submetamos à santa vontade de Deus e tentemos nos encontrar no divino Coração de Jesus, no qual devemos colocar todo o nosso afeto. Amemos ternamente esse Coração adorável. Rejubilo-me com você pela calma e pela paz de sua alma. Mantenha-as pela fidelidade em seguir as inspirações de Deus, por uma obediência pronta e generosa e por um total abandono de si mesma nos braços do Pai. Aliás, você sente que ele lhe pede isso e agindo de outro modo seria resistir à sua voz. Sirva e visite nossos queridos doentes com verdadeiro espírito de fé, como se visitasse Nosso Senhor pessoalmente. Portanto, paciência, minhas Irmãs, em tudo. Paciência, principalmente, para com as alunas que mais nos fazem sofrer. A propósito de alunas, vocês talvez pensem que são as Irmãs que têm mais disciplina na classe, que não experimentam nenhuma resistência por parte das crianças que fazem o maior bem. Poderiam enganar-se e muito. Uma Irmã pode sofrer muito junto às alunas e só receber delas ingratidão, frieza e fazer-lhes um bem imenso por seus bons exemplos, sua paciência, sua doçura. Muitas vezes o bem está escondido sob uma aparência de mal, mas ele não é menos real, e por isso é menos sujeito a ser corrompido pela vaidade. Portanto, minhas caras Irmãs, paciência com as crianças. Mais elas são turbulentas, de mau humor, desagradáveis, tanto mais é preciso amá-las, armar-se de paciência, rezar, mortificar-se por elas. Se você estiver emocionada, não as castigue no momento, vença sua natureza. Quando estiver mais calma, você as repreenderá com doçura e caridade. Não lhes dê nenhuma palmada. Se uma criança resiste abertamente, ceda no momento. Quando ela estiver mais calma, faça-a conhecer docemente sua falta com caridade. Quanto mais uma criança é difícil, tanto mais se deve ter por ela compaixão, amá-la e afagá-la. Durante o recreio, não falem com nossas Irmãs dos motivos de impaciência que tiveram durante o dia, menos ainda dos defeitos de seus alunos. Isso é imperfeito e contrário à caridade. Vão ao pé da cruz, contem tudo ao bom Deus, se vocês quiserem. Caso tenham necessidade de comunicar a alguém seu sofrimento, podem vir a mim a qualquer hora, assim não terão a tentação de faltar com a caridade. Paciência, minhas Irmãs, no suporte dos temperamentos. Ah! isso é um dos exercícios mais difíceis da caridade cristã, um dos mais meritórios. Suportar os temperamentos supõe uma atenção constante para não ferir a caridade. Vocês são umas sessenta nesta sala. Cada uma tem um caminho diferente para ir a Deus, cada uma tem, igualmente, um caráter diferente. Existem semelhanças entre várias, mas nunca identidade perfeita. Se é assim, precisamos de paciência para nunca nos chocarmos, para que reine entre todos os membros da Congregação um acordo perfeito. Esse acordo, essa caridade é o 228 437 que se pode ver de mais belo, o que há de mais precioso numa comunidade religiosa. Quando esse acordo perfeito, essa virtude prática reinam num convento, pode-se dizer que é um paraíso na terra. Considero a caridade que une os membros de uma comunidade religiosa como o cimento que une e consolida as pedras de um edifício. Se se retira o cimento desse edifício, ele não pode durar, desaba. Uma casa religiosa desabará também quando os religiosos retirarem esse cimento que deve uni-los, não praticando a caridade, a aceitação dos temperamentos. Se, por fraqueza ou distração, isso lhes acontecer, arrependam-se de todo o coração, façam uma pequena penitência, reparem a sua falta e obterão da bondade infinita de Deus a graça de não mais cair. (O final desta carta se perdeu.) Demos alguns exemplos sobre a maneira como é preciso suportar os temperamentos. Eis duas religiosas no mesmo emprego. Uma é viva, ativa; a outra, lenta, fleumática. Que devem fazer essas duas Irmãs cujos caracteres são tão opostos? A que é viva deve moderar sua vivacidade, evitar a pressa, suportar sem se queixar nem murmurar contra a que é lenta. A que tem o temperamento fleumático, levado à lentidão, deve ativar-se e não condenar a que é viva, nem acusá-la de impaciência quando se esquece e sai um pouco dos limites da moderação. Assim se deve fazer para suportar os demais temperamentos. Na impossibilidade de passar a festa da Imaculada Conceição em Villefranche, a Fundadora exorta as religiosas a uma fervorosa gratidão à Santíssima Virgem que guiou o desenvolvimento do Instituto e o estabelecimento da Casa-mãe (L 271, M 134-135). Você vai até à porta para sair; a porteira a faz esperar. Em vez de se impacientar interiormente, de agitar a campainha, de censurá-la quando chegar, tenha paciência, não diga nada. No recreio, poderá dizer-lhe amavelmente que às vezes ela faz esperar demais as pessoas que querem entrar ou sair. Se isso se repetisse com freqüência, deveria me avisar. Freqüentemente, durante o dia, atos semelhantes se apresentam. Precisam ser aproveitados para conquistar vitórias sobre si mesmas. Você vai ao refeitório, com fome, até mesmo com urgente necessidade de tomar alimento e nada encontra no seu lugar, o serviço está atrasado. Em vez de murmurar interiormente, de se impacientar, pense que o bom Deus permite isso para o seu bem. Não diga nada, não pense nada. Você pode me dizer – 87 Às Irmãs de Villefranche. Aubin, 4 de dezembro de 1828. J.M.J. Minhas muito queridas Irmãs: Se Deus não tivesse decidido de outro modo, no dia de nossa boa Mãe eu teria tido a felicidade de me encontrar no meio de vocês, de lhes falar das virtudes dela, de me edificar e me consolar pelos seus bons sentimentos. Privada dessa doce oportunidade, eu me consolo pensando que estou detida pela adorável e santíssima vontade divina, que devemos preferir a tudo. Peço-lhes, queridas Irmãs, como lhes pedi outrora, que sejam a consolação e a alegria de Irmã Athanasie. Suavizem, pelo seu fervor e pontualidade, seu zelo na observância do Regulamento e por uma total obediência, o pesar que lhe causa a minha ausência. Que ao voltar eu as encontre todas animadas do ardente desejo de serem verdadeiras Irmãs da Sagrada Família. A festa da divina Maria é bem própria a aumentar em nós esse desejo. Esse dia é tanto mais precioso para nós quanto aquele que marcou o início da obra para a qual Deus nos chamava.1 Alegremo-nos porque nossa casa começou, cresceu e se sustentou sob a proteção da divina Maria. Tenhamos para 436 229 86 Elogio à caridade que vale o trabalho de numerosos sacrifícios das comodidades individuais: ela é sempre acompanhada da paz que ultrapassa todo sentimento (L 267, M 100-101). Às Irmãs de Villefranche. Aubin, 18 de setembro de 1828. J.M.J. Minhas caríssimas Irmãs: Foi difícil separar-me de vocês sem ter a consolação de entretê-las em comum e de me edificar por meio de conferências espirituais, em que teríamos falado das doçuras e encantos da caridade, essa bela e inestimável virtude, a rainha de todas as outras, que fez descer à terra nosso Salvador, e cuja prática nos assegura a posse do seu divino Coração. Felizes as comunidades religiosas cujos membros são animados pelo espírito de caridade. Podemos dizer que são uma imagem do céu, um jardim fechado onde o santo Esposo encontra suas alegrias e onde derrama suas graças sem medida. Penetremonos, minhas queridas Irmãs, de amor e estima por essa virtude. Não poupemos nossos esforços se, para obtê-la, for necessário fazer sacrifícios e imolar a natureza, calar em tal ou tal ocasião, afastar nossos pensamentos, julgamentos, mortificar nossos gostos e não nos deixar vencer por algum incômodo, o que será bem recompensado não somente no céu mas ainda na terra, pela paz que sentiremos em nossa alma, precioso bem que aplaina o caminho da felicidade. Vocês, com certeza, observaram sem dúvida, quando possuem a paz de Deus, nada lhes é difícil e caminham com santa alegria nos caminhos da virtude. Então! Essa paz que ultrapassa todo sentimento, que Jesus deixou para os seus discípulos, é sempre conseqüência da caridade. Peço-lhes, minhas queridas Irmãs, amem-se umas às outras. Vocês já o fazem, mas façam-o mais ainda, pois o amor nunca diz: é bastante. Amem-se e, para o conseguir, estimem-se, respeitemse umas às outras. Nunca repitam o que uma Irmã disse ou fez e que poderia, mesmo de leve, prejudicá-la. como não pensar nada? Em vez de pensar no que a contraria, pense em Deus, no proveito que pode ter nessa ocasião, para se enriquecer com méritos. Assim, afastará seus pensamentos de impaciência. Você diz: se estivéssemos todas atentas em nos prevenir, em nada fazer que nos contrarie umas às outras, não teríamos isso a sofrer. Por mais atentas que estejamos todas, sempre teremos algo a sofrer, porque Deus assim o quer e, na maioria das vezes, acontece que somos contrariadas sem que haja culpa de ninguém. Pensamos às vezes que acomodamos uma pessoa quando, na realidade, a incomodamos. Muitas vezes uma Irmã encarregada de um serviço fará o possível para bem servir as Irmãs. Não o consegue, ou porque não tem o que precisa, ou ainda porque as Irmãs são um pouco difíceis. De um lado e de outro, exercitem-se na paciência e acomodem-se com mansidão,36 sem que haja a menor falta contra a caridade, a menor imperfeição. Eis muitas ocasiões de praticar a paciência exterior, mas existem ainda muitas outras ocasiões de praticar a paciência interior, suportando com calma e sem perturbação nossas imperfeições, nossas misérias que são bem grandes. Muitas vezes, a dificuldade que temos em suportar nossos próprios defeitos, nossas faltas, é maior do que aquela que nos vem da parte dos outros. Paciência para conosco, paciência nas tentações, nas penas interiores, paciência para esperar por Deus, pelos momentos da graça. Um homem paciente, repito, vale mais do que um homem valente. Aquele que sabe mandar em si próprio é maior do que aquele que manda nos outros. Precisamos colocar-nos numa disposição habitual de receber com paz e doçura tudo que pode nos acontecer de penoso. Não duvidemos de que Deus no-lo envia para aumentar nossos méritos. Nem mesmo devemos prever, para afastá-los, os motivos de impaciência que receamos, mas nos entreguemos nas mãos de Deus, imitando Santa Isabel da Hungria que dizia cada dia ao bom Deus: “Senhor, que há de me acontecer hoje? Nada que não tenha sido previsto pelo Senhor!” Ela aceitava 230 essa vontade de Deus, não se preocupando em saber se o resultado seria bonança ou sofrimento. A fim de manter sua alma na maior paz e pureza, após a morte de Conrad, seu pai espiritual, cada dia lhe fazia uma confissão interior de todos os pecados, pedindo-lhe que lhe obtivesse o perdão; em seguida, mantinha-se numa calma e tranqüilidade perfeitas.37 Imitemos essa Santa e digamos cada dia a Deus: “Aceito tudo o que pode me acontecer hoje de penoso, como penitência por meus pecados e para cumprir sua santa vontade. Concedame não perder uma só ocasião oferecida pelo Senhor para lhe testemunhar meu amor e minha fidelidade.” 435 85 Uma postulante está angustiada pela hesitação. Madre Emília tenta fortalecê-la no que ela pensa ser sua vocação divina e convida-a a se firmar numa humilde docilidade. Trata-se da futura Irmã Laurent Belloc que percorrerá, efetivamente, uma útil e edificante carreira na vida religiosa (L 246, M 119). A uma aspirante, Fanny Belloc (Irmã Laurent). Aconselho-as a que aprendam a oração do cap. 15, livro III da Imitação de Cristo. Começa assim: “Dulcíssimo Jesus, conceda-me sua graça a fim de que permaneça em mim, atue em mim, persevere em mim até o fim, etc..., etc.”. Essa oração é muito bela, merece ser recitada muitas vezes pelas almas desejosas de que a vontade de Deus se cumpra perfeitamente nelas. Aubin, 15 de setembro de 1828. J.M.J. Minha cara filha: Espero, minha querida Fanny, que suas hesitações terminarão e serão substituídas por uma vontade firme e resoluta de dar-se inteiramente a Deus. Muitas vezes, as jovens que tiveram mais dificuldades se tornam as mais firmes. Não desanime, continue a rezar com humildade e fervor e una à oração muita fidelidade a todos os seus deveres. Pratique, sobretudo, uma inteira obediência e uma simplicidade sincera e ingênua. Se o fizer, Deus a abençoará e fará de você sua esposa. Não creio que seja feita para o mundo. Seria com muito pesar que eu a veria voltar a ele. Lamentaria muito se você fosse "habitar na tenda dos pecadores", depois de ter morado tanto tempo na terra feliz de Nazaré!... Saúdo-a com grande afeição. Irmã Emília. Agradeço-lhe a bela imagem com que me presenteou. Eu a guardarei com muito prazer. Inspira piedade e é muito preciosa pelo que representa e porque demonstra a marca de sua sabedoria. 434 231 trabalhos a levarão para o céu. Que poderoso motivo para bem executá-los! Ponha em Deus toda a sua confiança e, quanto à sua vocação, é preciso consolidá-la pela observância exata das Constituições. Sou toda sua. Irmã Emília. 84 Na doença, não ficar triste, viver na indiferença vivificada pela alegria que Deus comunica, isso tanto mais que a destinatária desta carta é uma religiosa que tem a intenção de fazer, em breve, sua profissão perpétua (L 262). A uma Irmã doente. Aubin, 11 de setembro de 1828. Minha caríssima Irmã: Não lhe direi que tenho pena de você por estar doente. Poderia ter pena de algo que lhe dá a feliz ocasião de se parecer com seu divino Esposo, unindo-se a ele, obtendo dele um peso imenso de glória, se você o aceita com verdadeira paciência? Permaneça na paz e na alegria, viva contente por cumprir a santa vontade de Deus e ter um meio de expiar as suas faltas. Abandone-se inteiramente, seja na vida, seja na morte, na saúde, na doença. Nada mais agradável poderá fazer para o seu bem-amado, a quem deseja consagrar-se pelos votos perpétuos, para os quais não me oponho, desde que nosso Pai o aprove. Tornando-se esses laços sagrados indissolúveis, darão à sua alma um novo vigor. Procure conhecer bem seu valor e peça à Santíssima Virgem que a ajude a obter a inteligência desse grande favor. Desejo, tanto quanto você, suposto que Deus a chame a si, assisti-la durante sua doença e quando ele a chamar. Já falei disso ao nosso bom Pai. Adeus, minha caríssima Irmã. Sou, com uma terna afeição, toda sua, nos Corações Sagrados de Jesus, Maria e José. Irmã Emília. 18. Conferência sobre o espírito de misericórdia (C 90-91; nº 37) Como o Pai celeste é misericordioso para com todos, como ele manifesta isso particularmente no comportamento de Nosso Senhor. Podemos irradiar também um pouco da misericórdia que recebemos pela universalidade de intenção das nossas preces e pela aceitação dos defeitos das pessoas que nos cercam (início de 1852). Não se admirem, minhas queridas Irmãs, se lhes falo com tanta freqüência sobre a caridade. Essa virtude é tão bela, agrada tanto ao Coração de Jesus, que eu não saberia dizer-lhes nada melhor.38 Tudo está incluído na caridade. Se nós a possuímos, cumprimos toda a lei que só tem dois preceitos, o do amor de Deus e o do próximo. Não podemos cumprir perfeitamente o primeiro preceito da lei se não cumprimos o segundo que apresenta muitas dificuldades e é transgredido em muitas circunstâncias. O homem é egoísta, só pensa em si, só quer trabalhar para si mesmo, não pensa senão em si, em seu próprio interesse. Seus irmãos, na maioria das vezes, ele os esquece. Pensando trabalhar para si ele se engana, pois estas palavras de Nosso Senhor se realizarão: “Felizes os que são misericordiosos, porque alcançarão misericórdia.” Que significa, pois, minhas queridas Irmãs, “felizes os misericordiosos?” Quer dizer que os que suportam com paciência os defeitos, as fraquezas do próximo e partilham suas penas e pesares, que os assistem conforme suas possibilidades, que choram com os que choram e riem com os que riem, numa palavra: aqueles que se fazem tudo a todos, como diz São Paulo, para ganhá-los todos para Jesus Cristo. Os que assim fazem serão tratados com misericórdia. Deus cumprirá sua palavra. Eles tiveram pena de seus irmãos, Deus os tratará com indulgência; não se irritaram contra o próximo, não encontrarão nele um juiz irritado, mas um juiz cheio de misericórdia. Perdoaram de bom grado as faltas de seus irmãos, não quiseram guardá-las na lembrança, Deus 232 esquecerá suas faltas, as perdoará todas. Usará para com eles a mesma medida que usaram para com seu próximo. Como essa promessa deve nos tocar e nos levar ao espírito de misericórdia! Nada tem a temer na hora da morte a pessoa que pode dizer: “Fui misericordiosa, cumpri a lei, imitei o Senhor que faz levantar o sol sobre os justos como sobre os pecadores. Sim, eu tive para com todos, os bons e os maus, um coração misericordioso.” Oh! minhas Irmãs, nada tem a temer a pessoa que age assim, a pessoa que imita o Pai celeste. Temos em nosso Pai celeste o exemplo da misericórdia. Vejam como ele suporta com paciência os pecadores, os ingratos, os perseguidores de sua Igreja! Por quê? Porque espera deles a penitência. Ele é lento em punir e sempre pronto a perdoar. Nosso Senhor nos diz, no Evangelho, que veio para os pecadores e não para os justos. Durante toda a sua vida só faz atos de misericórdia. Se traz alguma mudança à lei, é só para transformar uma lei de rigor numa lei toda de amor, de caridade. Tudo em Jesus Cristo nos prega a misericórdia, a mansidão. Vejam-no suportando seus apóstolos, homens ignorantes e grosseiros, com paz e doçura, amando-os, concedendo-lhes mil favores, instruindo-os e suportando com paciência que eles não compreendam as lições que lhes dá, usando, com o que deve traí-lo, de todos os cuidados que uma caridade cheia de ternura sabe tão bem usar. Considerem como o Salvador come e bebe com os pecadores para convertê-los, deixa-se aproximar pela multidão que ele instrui, esperando no poço de Jacó a samaritana a quem quer converter. Peçamos a Deus, minhas Irmãs, a graça de bem compreender e praticar estas palavras de Nosso Senhor: “Felizes os que são misericordiosos porque serão tratados com misericórdia.” Se tivermos essa felicidade, seremos em breve perfeitas, teremos essa caridade que tudo desculpa, tudo suporta, que nunca se queixa por mais que a façam sofrer e que evita com cuidado magoar os outros. Nossa caridade deve ser prática e se estender a todos os homens. Somos todos irmãos em Jesus Cristo, nossa caridade deve ser a prova disso. Se não podemos prodigalizar nossos cuidados, nossos serviços a todos os homens, devemos, pelo menos, rezar por eles, oferecer 433 totalmente entregue a Deus. Desde que lhe consagrei meu coração, mudei de residência, de região, de sociedade, e isso aconteceu várias vezes, mas nunca mais eu soube o que era aborrecimento. Não me preocupo com o rebanho. A pastora que me substitui é mais competente do que eu, e, longe de crer que a casa perde com minha ausência, acredito que ganhará.1 A alegria que me causam ao ter notícias das menores coisas que se fazem ou dizem em nossa querida casa, o desejo de saber os menores detalhes, não vêm da preocupação mas do grande interesse que tenho por vocês. Digam-me como fazem minha Irmã Macrine e Irmã Madeleine. Saúdo-as afetuosamente, minhas queridas Irmãs, e tarda-me vê-las. Rezem ao bom Deus por mim, pois tenho medo de ficar preguiçosa aqui, onde nada mais faço a não ser cuidar do meu corpo. Levanto-me tarde, não faço mortificações e temo que semelhante vida me prejudique a alma. Vocês fazem tanto e eu tão pouco! Irmã Emília. 83 Valor do conhecimento de si mesmo que Deus dá algumas vezes: é uma luz que nos guia no caminho do serviço (L 260, M 120). À Irmã André, religiosa em Villefranche. Aubin, 30 de agosto de 1828. J.M.J. Minha caríssima Irmã: Uma das maiores graças que Deus pode conceder a uma alma é o conhecimento de si mesma. Você deve se alegrar com as luzes que ele lhe dá. É preciso servir-se disso para progredir. Sem isso, em lugar de lhes ser vantajosas, serão prejudiciais. É necessário fazer como alguém que está tateando nas trevas, com dificuldade, e, sem fazer grande caminhada, de repente avista uma luz. Ficará muito contente e dirá: “Preciso caminhar enquanto tenho essa luz, com medo de não tê-la sempre." Seus 432 233 81 Num constante desejo de perfeição, aplicar-se a uma mortificação que levará à conformidade com a vontade de Deus (L 257). A uma aspirante. Aubin, 12 de agosto de 1828. J.M.J. Minha caríssima filha: Penso que nada temos a fazer de melhor, você e eu, que nos submeter e nos conformar em tudo à santa vontade do Senhor. Aproveitemos todos os meios de salvação e de perfeição e desejemos de todo o coração nos entregar a uma verdadeira mortificação. Você sabe, minha filha, que essa virtude nos é proposta como base de nosso edifício espiritual. Na esperança de que se aplicará, de todo o coração, à prática dessa virtude, sou com terna afeição, sua mãe muito dedicada. Irmã Emília. 82 As linhas que seguem provam o autêntico abandono de Santa Emília: sem nada negar de sua solicitude pela casa de Villefranche, aceita com inteira confiança e sem lamentações permanecer afastada, enquanto for esta a vontade de Deus (L 258, M 96). Às Irmãs de Villefranche. Aubin, 13 de agosto de 1828. J.M.J. Minhas caríssimas Irmãs: Vocês me causam prazer falando-me com franqueza e simplicidade e lhes responderei igualmente. Só me contrariei uma vez na minha vida e foi quando ainda não estava alguma mortificação, algum sacrifício pela conversão dos pecadores, inspirar às nossas alunas um grande amor pela Propagação da Fé, a obra da Santa Infância, falar-lhes muitas vezes do amor que devem ter para com os pobres. Dentro de casa, temos mil vezes ao dia, a ocasião de realizar esses atos de caridade que tanto agradam ao Coração de Jesus. Você vê uma religiosa cometer uma falta. Em vez de condená-la, desculpe-a, fazendo como se não tivesse percebido a falta, exceto se a caridade pede que você a advirta, a ela ou à superiora. Você vê uma criança que chora, console-a o melhor que puder. Não deixem chorar as crianças. Uma de suas Irmãs está triste durante o recreio, alegre-a; se ela gosta de brincar, de falar de coisas indiferentes que não lhe agradam, não lhe dê a entender que não gosta, interesse-se por sua brincadeira, pelo que ela diz. Falam mal de você, caluniam-na, desculpe em seu coração essas pessoas, veja nelas um instrumento do qual Deus se serve para fazê-la merecer. Existem defeitos de caráter, pessoas com as quais não podemos simpatizar. Considere isso com calma e doçura. Suporte as outras como desejaria que a suportassem, se estivesse no lugar delas. Se for contrariada, se a incomodam em seu trabalho, não fale disso nem mesmo às suas companheiras, não se queixe aqui e acolá. Se for necessário, procure sua superiora, comunique-lhe suas dificuldades sem perturbação, sem inquietação. Se ela não puder mudar a situação, suporte com espírito de misericórdia, de caridade, que a incomodem outra vez. Faça assim em todas as ocasiões. Pedem-lhe um serviço, realize-o o mais breve possível. Uma de suas Irmãs precisa de uma coisa que é útil a você no emprego, comece por dar-lhe aquilo de que ela precisa. Pode ficar certa de que o bom Deus o devolverá a você. Lembre-se destas palavras do Evangelho: “Se lhe pedem o manto, dê também a túnica. Se o convidam a andar cem passos, ande duzentos.” Isso significa, minhas Irmãs, que é preciso fazer sempre além do que pedem de nossa caridade. Não nos poupemos para dar prazer ao próximo. Tudo o que fizermos por 234 431 ele nos será devolvido ao centuplicado. Um copo de água fria dada aos pobres não ficará sem recompensa. 19. Diálogo sobre a perseverança na vocação (D 96-97; nº 43) Em agosto de 1852, Madre Emília diz à Irmã Séraphine Tauriac que uma das principais causas da falta de perseverança é a falta de confiança e de abertura de consciência, o desafeto crescente em relação aos superiores. Irmã Tauriac, temendo por sua própria vocação, pede garantias. A santa responde ainda de maneira evasiva. Só será plenamente afirmativa, de acordo com uma nota de redação, pouco antes de morrer. A Irmã: Minha Madre, sinto-me apavorada vendo que há religiosas que deixam seu estado de vida para voltar ao mundo. Temo que isso me aconteça. A Madre: Minha pobre Irmã, há bastante o que temer em vista do castigo que Deus inflige às almas que não souberam se conservar no fervor, na regularidade. Não é Deus que as faz sair, mas ele o permite. Seria preferível cem vezes a morte a abandonar a vida religiosa, quando se é chamada a ela. Que o exemplo das outras lhe sirva de lição. Não é de repente que se chega à apostasia. Começa-se por pequeninas coisas, por leves infrações à regra, por fechamentos do coração para com os superiores, deixando de revelar as tentações que o demônio provoca. O jugo da obediência começa a pesar, a pobreza e a castidade, que pedem tanta vigilância, tantas precauções para serem bem preservadas, tornam-se constrangedoras. Conseqüentemente, nós nos desviamos com facilidade de nossas obrigações que gostaríamos não ter contraído. Nós nos afastamos cada vez mais do bom Deus pelas faltas voluntárias cometidas cada dia. Perdendo a paz da alma, a felicidade em seu estado de vida, volta-se ao mundo, onde a distração, os divertimentos farão esquecer por um instante a infeliz sorte da religiosa infiel que se deixou seduzir. Entretanto, após essa saída, ela não demora a ver que fez uma bobagem, uma loucura. 80 Advertência a uma religiosa que manifestou repugnância quando chegou sua vez de assumir a ordem e a limpeza da capela. Essa tarefa pode ser a ocasião de numerosos favores espirituais (L 252). À Irmã André em Villefranche. Aubin, 25 de julho de 1828. J.M.J. Minha caríssima Irmã: Uma das maiores graças que possamos ter é a de testemunhar a Deus nosso amor e nosso respeito. E temos ocasião para isso quando nos é dada a felicidade de poder assumir a manutenção da limpeza e do arranjo do lugar onde ele quer habitar, para ser companheiro do nosso exílio. Espero que, reconhecendo que a sua falta, manifestando repugnância por ter de passar a semana nesse trabalho, venha da falta de fé, você tenha se humilhado sinceramente e que, de agora em diante, quando chegar sua vez, vai se sentir feliz, porém ainda indigna e desempenhando esse serviço com um fervor todo particular, como quando Zacarias exercia seu ministério e que o anjo Gabriel lhe apareceu para anunciar que ele se tornaria pai de João Batista. Procuremos, minha caríssima Irmã, conhecer Jesus em seu divino sacramento. É lhe desejando essa preciosa graça que sou toda sua. Irmã Emília. 430 no convento, não saiba bordar. Por quê? Porque a mestra fez uma parte do trabalho e sempre o mais difícil. Igualmente, para fazer ponto de cruz e outros trabalhos. Muitas vezes, depois de ter feito vários pares de meia, uma aluna não sabe começar um sozinho, nem terminar, nem começar o calcanhar, etc. Depois de tudo isso, observa-se um grande prejuízo para a casa. Foi decidido que, se uma aluna tiver feito apenas uma parte de um trabalho, ela o enviará a seus pais e nós os advertiremos, porque ocultar-lhes isso é contrário ao espírito de verdade. Irmã Marie pede-me algumas reflexões sobre a Missa. Faz algum tempo que enviamos umas belíssimas, intituladas: "Maravilhosa relação entre o sacrifício da cruz e o sacrifício da Missa." A Irmã arquivista deve tê-las. É preciso que mande tirar algumas cópias e dê uma à Irmã Marie, contanto que a arquivista tenha o cuidado de guardar uma na biblioteca. 235 Peço ao bom Deus, cada dia, que me conceda uma boa vocação, isto é, a perseverança. Peça-a também. Essa circunstância é bem apropriada para nos despertar. Não adormeçamos, porque o demônio não dorme.39 A Irmã: Sou feliz na minha vocação, mas tenho necessidade de o ser e de encontrar a felicidade junto a Deus. Sem isso, não creio poder me suportar num convento. O medo que tenho de me tornar tíbia e por isso infeliz me faz desejar a morte e até chamá-la. O bom Deus lhe concede tudo quanto a senhora lhe pede: obtenha-me uma morte próxima ou a perseverança. Parece-me que estou em estado de graça. A Madre: Quem lhe disse que Deus concede tudo o que lhe peço? Eu não digo isso. Não posso lhe prometer o que você me pede. (Ela só o prometeu no leito de morte.) Mas tenha confiança, Deus a guardará. Seja fiel. Você se santificará na Sagrada Família, mas terá muito a sofrer. Que os sofrimentos, as dificuldades não a façam parar na sua caminhada. Lembre-se de que o Reino de Deus sofre violência e só os violentos o conquistam.40 Rezarei por você. Não duvide de que um dia você verá o bom Deus. Tenha muita confiança nele, não se apóie nas criaturas humanas. São braços de carne que lhe faltarão quando menos esperar. Deus não procederá dessa maneira se você lhe confiar o cuidado de tudo o que lhe diz respeito. Não tema sobre a maneira como as pessoas a tratam. Se Deus é por você, quem será contra você? Faça dele seu único amigo, o confidente de todos os seus sofrimentos. Ame-o muito. Ele é seu Pai e, mesmo que no estado interior em que você se encontra não sinta essa confiança infantil como outrora, não tema. Deus a ama. 236 429 20. Diálogo sobre o desapego do coração (D 9-11; nº 5) Data aproximativa: 1852. A interlocutora é Irmã S. Tauriac. Colocando-se na perspectiva do exclusivismo ciumento do amor do Senhor, ambas concordam com o perigo das amizades particulares. Madre Emília declara com simplicidade que sua afeição universal se manifesta para com cada religiosa, de um modo pessoal e diversificado. A Irmã: Minha Madre, a senhorita N. nos trouxe este cesto cheio de pêras. A Irmã da portaria me disse que ficaria muito contente se a senhora pudesse enviar um santinho para ela dar como vindo de sua parte. A Madre: Vou ao meu quarto num instante. Eu lhe darei um. Ninguém me espera no parlatório? A Irmã: Não, minha Madre. A Madre: Eis uma Sagrada Família que inspira devoção. A Irmã: Madre, não tenho absolutamente nada, seja no breviário, seja na pasta a meu uso. Gostaria de ter uma lembrança piedosa. Dê-me um santinho a fim de que eu o guarde. A Madre: Continue sem nada. Se eu soubesse que uma Irmã me amasse um pouco mais, em detrimento de seu amor para com Deus, eu a enviaria o mais distante possível de mim. Não suportaria ser uma pedra de tropeço à perfeição para nenhuma de minhas filhas. A Irmã: E eu, Madre, eu me afastaria o mais longe possível de uma pessoa que eu não amasse senão por Deus e segundo Deus. Falo conforme meu pensamento. Nada me desagrada proposta para aquele dia e, em seguida, fazer a recapitulação por meio de perguntas. Vocês sabem que, muitas vezes, permiti a algumas Irmãs, quando tinham um trabalho urgente, levantarem-se antes da hora e deixar a meditação para outra hora do dia. Nosso Pai me disse que não tinha feito bem, que a meditação deve preceder tudo o mais, a não ser que uma necessidade indispensável nos obrigue a isso, que não é justo dar os primeiros momentos ao trabalho. Eles devem ser para Deus. A primeira coisa que devemos fazer é nos aniquilar diante dele, desde o nosso levantar, com espírito de fé e de amor. Quero lhes dizer o que falou nosso bom Pai, quando viajávamos no carro: ele olhava muitas vezes o campo e fazia reflexões sobre a grandeza de Deus, que se manifestava nas maravilhas da natureza. Dentre outras coisas ele me disse: "É tão bela, que os próprios anjos a contemplam." E me disse também: "Tudo o que é belo, tudo o que é bom, somente o é porque há uma pequena marca da divindade.”1 Foi escrito nas Constituições que a leitura de cada dia seria feita em particular. Nosso Pai assim o determinou porque, disse ele, cada uma terá a facilidade de parar para refletir, o que seria mais frutuoso. Procuremos fazê-la de maneira que nos seja bem proveitosa. Saúdo a todas nos Santos Corações. Marguerite me disse que minha Irmã Ursule estava bastante cansada. Desejo saber se está bem agora. Irmã Jeanne continua sempre doente. Irmã Emília R.S.F. P.S. Antes de partir, nosso Pai nos recomendou o cuidado de não permitir que as alunas demonstrem ser mais do que são, de modo que sejam realmente capazes e saibam muito bem o que dizem saber. Por exemplo, a criança diz: "Eu sei fazer uma conta de multiplicar." É preciso que ela seja capaz de provar isso diante de quem quer que seja. A mesma coisa para o trabalho manual. Pode acontecer, disse ele, que uma criança, depois de ter feito vários bordados 428 237 79 Notícias de Villefranche, onde se distribuem, generosamente, às crianças pobres, produtos da horta e do pomar. Felicitações pelo fato de que os catequizandos adultos se tornam mais numerosos. Nunca retardar as meditações da manhã, por mais urgentes que sejam as tarefas. Pe. Marty recomenda grande lealdade pedagógica: não elogiar demais os valores das alunas, não ajudá-las sem necessidade (L 250, M 113-115). Às Irmãs de Aubin. Villefranche, 4 de julho de 1828. J.M.J. Minhas caríssimas Irmãs: Por esta carta, respondo às que me escreveram em particular. Felicito-as primeiramente pelo bom destino que dão aos produtos da horta e posso lhes dizer que temos a mesma vantagem. Todos os dias, nossas queridas crianças não deixam de nos pedir coisas para fazer a sopa, salsa, alface, etc. Um canteiro de cebolas lhes é destinado. Seus porcos, suas jumentas não são esquecidos, e elas têm o cuidado de levar cestos cheios que Rosalie Carles lhes prepara com muita satisfação por ter tal ocupação. Ela é encorajada também a colher as flores que são dadas como recompensa e que lhe dão um grande prazer. A propósito das flores, gostaríamos de dá-las a vocês para adornar seus oratórios, pois temos em quantidade. Irmã Angèle, que me parece estar melhor, as coloca nos nossos em abundância. Possamos nós, todas juntas, unirmo-nos a ela para oferecer ao bom Deus as flores das virtudes. É preciso agradecer a Deus pelo aumento do número de boas mulheres que vêm receber instrução. Não sei se é bom dar um nome a essa classe, não vejo inconveniente nisso. Podem colocá-la sob a proteção de São José. Nosso Pai, que perdemos sexta-feira à tarde, recomendou-nos muito particularmente o cuidado das crianças. Dentre outras coisas, ele me disse que as Irmãs encarregadas da catequese, seguissem o método de Constance, isto é, começar por uma explicação da verdade como as amizades particulares em relação a quem quer que seja. Quando passo diante do oratório do Sagrado Coração de Jesus, suplico-lhe não permitir que meu coração se volte jamais para as criaturas. Amo a liberdade interior mais que as pessoas do mundo amam aquela liberdade tão proclamada. Compreendi o que seja a amizade particular quando o capelão falou à comunidade sobre ela. Desde então, o simples nome me desagrada. A Madre: Tanto melhor, minha cara Irmã, tanto melhor. Não há nada, o Padre sem dúvida lhe disse, que afaste mais uma alma da perfeição, que lhe retire o sentimento do amor a Deus, que a faça perder a vocação à vida religiosa como essas amizades. A experiência ensina mais a esse respeito que tudo quanto poderíamos dizer. Entretanto, essa experiência curou poucas pessoas atingidas por esse mal. A Irmã: Ontem à noite, a Irmã Marie du Sacré-Coeur falava do perigo dessas amizades. Como eu lhe dissesse que pedia, cada dia, ao bom Deus de não me permitir cair nunca numa delas, afirmou-me que eu não corria esse risco. É verdade que nada tenho a temer sobre isso? A Irmã me fez muito bem ontem à noite com suas palavras. Diga-me também que nada tenho a temer. A Madre: Não lhe direi isso. Sabemos bem o que fizemos, mas ignoramos o que faremos mais tarde, sobretudo se somos presunçosas e imprudentes. Tal pessoa que tanto prometera a si mesma jamais cometer tal e tal falta, de não se deixar dominar por tal defeito, caiu nessa falta, nesse defeito, no momento em que menos esperava, no momento em que cessou de temer. Por que essa pessoa caiu? Porque se apoiou em si mesma. Reze, tema sempre e o bom Deus a guardará. A Irmã: Ninguém se deixa envolver por uma amizade particular em relação aos superiores. A Madre: Se eles não fossem amados por Deus e em Deus, mas por causa de suas boas qualidades, do prazer que se sente 238 em estar com eles, a afeição não seria espiritual, porém totalmente material. Diante disso, se não tivesse cuidado e não se procurasse sobrenaturalizar essa afeição, ela se transformaria em uma amizade particular, manifestando-se em atos. Assim sendo, uma amizade dessa natureza prejudicaria uma alma como se ela tivesse uma outra pessoa como objeto. A Irmã: Eu lhe quero muito bem, sinto muito prazer em falar do bom Deus com a senhora, mas nunca a sua lembrança me preocupou durante a oração. Se penso na senhora, é para relembrar as boas coisas que me disse, para pedir ao bom Deus a sua saúde quando está doente. Peço-lhe também que todas nós sejamos para a senhora motivo de muita consolação. Quando a senhora está doente e nós não podemos aliviá-la, peço a Nosso Senhor que encha sua alma de consolo espiritual, a fim de que não sinta tanto as dores físicas. Existe em tudo isso algo que possa desagradar o bom Deus? Será que a amo demais? A Madre: Não. Não há nada. Continue assim. O bom Deus lhe permite dar, em seu coração, uma pequena preferência às superioras, às pessoas que muito se interessam pela nossa salvação. Seus sentimentos por mim devem ser encontrados em todas as religiosas. Você nunca fez nada que mostre serem por demais naturais seus sentimentos para comigo. Acredito também nunca ter feito por você qualquer coisa que leve a crer que a amo mais do que às outras Irmãs. Todas as minhas filhas têm um lugar em meu coração e uma grande parte em minhas afeições, mas nem a todas posso dizer isso; elas não acreditariam. Se não posso fazer o bem em relação a algumas, é porque elas não querem. Há quem se aborreça porque falo sempre com você. Não sabem da necessidade que tem e do proveito que pode retirar para si mesma e para as noviças, pois são essas jovens que tenho em vista em sua formação ao espírito religioso. Seja o que for que possa ouvir em relação à minha afeição por você, não se perturbe, não deixe de vir me consultar. Ambas fazemos juntas o que Deus quer. A Irmã: Nunca pensei que a senhora me amasse mais que a uma outra...(texto inacabado).41 427 pensionato causa-me um grande prazer. Envio a todas mil lembranças afetuosas. Tive grande satisfação ao ler o nome das grandes e das pequenas. Irmã Emília. Peço à Irmã arquivista corrigir os erros de ortografia. 78 Disposições de reconhecimento, respeito e contrição com as quais devemos aproximar-nos da Eucaristia. Fazê-las crescer sempre mais, de maneira a tirar todo o proveito espiritual desejado por Deus dessa fonte inesgotável de graças (L 247, M 107-108). A uma Irmã de Villefranche. Aubin, 3 de junho de 1828. J.M.J. Minha muito querida Irmã: Li sua carta com muito interesse e regozijei-me pela luz que Deus lhe concedeu. Procure aproveitá-la bem. Alimente-se de sentimentos de contrição; deixe-se penetrar de um humilde temor e de um profundo respeito ao se aproximar da mesa sagrada. Se conhecêssemos o que é a santa comunhão, quais não seriam nosso amor e nossa gratidão, mas ao mesmo tempo que sentimento não teríamos da nossa indignidade! Não é o número de nossas comunhões que mostra o nosso progresso, mas a maneira de comungar. Assim, minha querida Irmã, procuremos nos aproximar do pão dos anjos com uma verdadeira pureza de intenção, não buscando outra coisa a não ser contentar o bom Deus que nos dá, nesse sagrado mistério, grandes sinais de seu amor. Fico bem contente ao saber que as crianças estão mais comportadas e envio-lhes muitas lembranças. Quando eu voltar, lembre-me de minha Irmã Félicité. Até lá, faça como Irmã Athanasie quiser. Sou, com íntima afeição, nos Sagrados Corações, toda sua. Irmã Emília. 426 Domingo, iniciamos a congregação. As senhoritas Carcenac, Descrosailles e Constans são nossas primeiras congregacionistas. Temos umas cinqüenta e muitas outras que desejariam entrar. Segunda e terça-feira houve conferências, nas quais a Madre Vincent recebia instruções de uma delas. Todas escutavam com interesse e estão muito satisfeitas. Irmã Agathe terá alegria em saber que várias jovens vêm para aprender o catecismo. Algumas de 18, 20 anos que ainda não fizeram a primeira comunhão e não sabem nem o que é a Santíssima Trindade. Outras que a fizeram há muito tempo não sabem mais do que as primeiras. Um desses dias, veio uma senhora com 50 anos mais ou menos. Tendo Irmã Marie saído, e todo mundo bastante ocupado, fui recebê-la. Ela não conhecia uma palavra do catecismo. Perguntei-lhe o que era Pentecostes, o que tinha acontecido naquele dia. Não sabia mais do que um selvagem, e foi assim para as outras perguntas que lhe fiz. Veio outra que tinha uns 80 anos. Faz uns quarenta anos que não se aproxima dos sacramentos. Com Madre Vincent fomos visitála. Ela ficou toda feliz por ver duas Madres juntas. Por nossa vez, nós a achamos muito amável e também com ótimas disposições para sua salvação. Um desses dias, uma de nossas alunas, com mais ou menos 12 anos de idade, providenciou a graça do batismo a um inglês prestes a morrer. Ao sair da escola, ela ouviu dizer que esse pobre doente não era batizado e que ninguém se preocupava em proporcionar-lhe essa felicidade. Foi procurá-lo e lhe perguntou se desejava o batismo. Ele respondeu-me que sim e ela logo foi buscar um sacerdote que o batizou. O doente faleceu algumas horas depois. Saúdo-as muito afetuosamente, minhas queridas Irmãs. Eis uma longa carta. Não me é comum escrever assim, mas era necessário compensar um pouco a privação de escrever a cada uma em particular. Aliás, eu a retomei diversas vezes e espero que minha Irmã Françoise não me repreenderá. Peço a todas as Irmãs que estão com as crianças que sejam avarentas em castigos e generosas em recompensas e, em particular, peço à Mestra de Instrução prover nossas Irmãs responsáveis de classes. Há muito tempo não tenho informações das classes externas. Tarda-me receber notícias delas, como também das orfãzinhas. A carta de nossas queridas alunas do 239 21. Conversa de Madre Emília com nossa Madre Geral atual, depois de haver dito, em seu leito de morte, que a designava para substituí-la (D 15-16; nº 8) Trata-se, evidentemente, da Madre Foi Bousquet (v.s. p.22). O fato acontece no dia 6 de setembro de 1852. O assunto é a coexistência dos ramos clausurado e não-clausurado, do intercâmbio dos benefícios recíprocos que podem e devem existir entre ambos, tais Marta e Maria. A Irmã: Minha Madre, a senhora sabe o quanto nos perseguiram a respeito da clausura. Disseram e dizem ainda que jamais se viu uma Ordem religiosa como a nossa, e que ela não poderá se manter assim. Receio que, após a sua morte voltem a esse assunto e que a clausura desapareça. A Madre: Creio que a vontade de Deus é que nosso Instituto seja dividido em dois ramos. Ambos podem crescer e dar frutos na mesma árvore. É verdade que não se viu mais na Igreja uma Ordem religiosa como a nossa. O que não se viu até agora, não pode ser visto? O braço de Deus ficou mais curto? Não, minha Irmã. Deus pode fazer cada dia coisas novas e, por conseguinte, não existe dificuldade para ele manter, numa regularidade perfeita, um Instituto com dois ramos: um clausurado e outro não-clausurado. Não se preocupe com isso. Creio, repito, ser essa a vontade de Deus. Há grandes vantagens na união dos dois ramos num só corpo. Primeiro, as Irmãs não-clausuradas têm, no claustro, Irmãs encarregadas de manter o espírito primitivo do Instituto, o que seria difícil e quase impossível se todas as religiosas saíssem e se comunicassem com o mundo. 240 Segundo, tendo elas uma Casa-mãe clausurada, podem haurir nela o espírito de clausura que devemos ter, caso venham a perdê-lo no contato com o mundo, o que é fácil acontecer. Terceiro, o contato que têm durante sua permanência, na Casa-mãe, com as religiosas clausuradas só pode trazer proveito às suas almas, exceto se se relaxarem. No claustro deve haver mais silêncio, recolhimento, regularidade e, em conseqüência, mais união com Deus, do que numa casa não-clausurada. Quanto motivo de consolo para nossas Irmãs das escolas ao pensarem que, quando o mundo as tiver distraído e quase dissipado, não terão senão que entrar no claustro para reencontrar Irmãs cujos exemplos lhes mostrarão o que cada uma foi durante os seus primeiros tempos de vida religiosa e o que devem ser até o fim. Quarto, a vantagem de cada ano poderem fazer o retiro numa casa clausurada, não é pequena. É uma das mais preciosas, pois é bastante entrar numa casa clausurada regular para sentir o recolhimento e a necessidade de tender à perfeição, a Deus. Várias de nossas Irmãs não-clausuradas me disseram ser difícil expressar o conforto espiritual e a felicidade que experimentavam só ao transpor as portas do claustro: “É nosso paraíso terrestre”, afirmaram. Voltavam às suas casas compungidas e cheias de santos anseios. Uma quinta vantagem para nossas Irmãs não-clausuradas é terem como Superiora geral e principais membros do Conselho religiosas clausuradas, religiosas que têm mais tempo para se unir a Deus na oração e que são obrigadas a entregar-se à meditação, escola da verdadeira ciência.42 Em suas orações e meditações freqüentes, elas se enchem do espírito de Deus que deve animá-las para bem governar a Congregação. Existe ainda uma sexta vantagem que nunca se apreciará bastante: é a de fazer o noviciado numa casa clausurada. Fica-se numa completa solidão, passa-se um ano, dois anos sem ter nenhuma comunicação com o mundo, suas máximas ficam quase esquecidas, bem como as mentiras que ele difunde, e se 425 Minhas caríssimas Irmãs: Não podendo ter o prazer de responder a cada uma em particular, quero pelo menos compensar respondendo à sua carta comum, que me dá tanto mais alegria ao perceber as boas disposições em que se encontram. Assim, não é uma lição de moral que quero lhes dar, pois não precisam disso. Eu me contentarei em lhes dar notícias de nossas Irmãs, pois, estando na Casa-mãe, tenho certeza de que todas têm um coração maternal e, conseqüentemente, muita satisfação em saber o que se passa aqui. Nossa pobre Irmã Jeanne encontra-se extremamente doente: grande fastio, muita agitação, dores em todo o corpo e uma ferida em uma das coxas a fazem sofrer muito. Várias vezes lhe falamos para ir ao médico, mas sempre recusou dizendo que o bom Deus a aliviaria se fosse sua vontade. Irmã Anne-Régis teve uma forte dor de ouvidos. Receávamos que fosse um abscesso e, depois de consultarmos a Madre, decidimos aplicar um emplastro na nuca, o que lhe fez muito bem. Agora dorme e se alimenta bem. Nossas outras Irmãs e eu vamos como de costume. Elas lhes enviam as mais afetuosas lembranças e recomendam as crianças às suas orações. As classes aumentam em número. Fazemos o possível para manter tudo em ordem e para atrair as crianças pobres. Para conseguir isso, oferecemo-lhes morangos, groselhas, ameixas, biscoitos, etc., alface às que não têm horta. Há tempo não ensinávamos canto devido à pouca voz de suas professoras. Para suprir essa falta, contratamos a senhorita Montfort, mestra de canto, para a classe Santa Maria, e a senhorita Laforie para a classe São Vicente. Ambas o fazem com muito zelo, e a enfermeira tem o cuidado de lhes dar cerejas na merenda, a fim de lhes fortificar os pulmões. As crianças estão muito contentes de poder cantar. Pensamos também que ensinar a escrever na classe gratuita as atrairia; um grupo trouxe papel, mas que trabalho para ensiná-las! A professora é obrigada a passar nisso várias horas, leva-as à mesa, duas a duas, para ensiná-las a segurar a caneta e a fazer alguns traços. É indescritível o prazer das crianças, por isso a turma aumenta muito e são bem mais assíduas. 424 241 J.M.J. Minhas muito queridas jovens: Quando saí, pensava ausentar-me apenas por uns oito dias e não esperava ficar impedida tanto tempo do prazer que sente uma mãe ao ver os filhos que ela ama com ternura, mas espero revê-las em breve, e então minha alegria aumentará pelas boas notícias que me darão suas mestras de sua aplicação, de sua obediência e, sobretudo, de sua piedade. A graça preciosa que receberam as senhoritas Granier e Cousy deve ter animado a todas vocês e reavivado o amor pelo melhor de todos os mestres. Alegra-me saber que se exercitam em cantar seus louvores. Gosto de pensar que sua simplicidade e recolhimento ao acompanhar o Santo dos Santos na procissão servirão de exemplo. Quem tem de fato obrigação de dar bom exemplo a não ser as alunas da Sagrada Família? A Madre Vincent e todas as nossas Irmãs pensam em vocês e enviam afetuosas lembranças. Agradeço-lhes as orações que fizeram por mim. Estou convencida de que sentirei os efeitos delas. Sou, com terna afeição, nos Sagrados Corações de Jesus, Maria e José, toda de vocês. Irmã Emília. 77 Notícias gerais da comunidade de Aubin, saúde de uma e de outras. Aulas de canto para as crianças, atividades diversas para atrair um maior número, de preferência entre os pobres. Início da congregação. Catequese também para as pessoas idosas, algumas sem nenhuma instrução. Convite à doçura para com as crianças (L 245, M 109-112). Às nossas Irmãs de Villefranche. Aubin, 2 de junho de 1828. J.M.J. fica cheia do espírito de Jesus Cristo, depois se reaparece no mundo como um fruto novo que ele não pode mais colher. Numa casa clausurada, as noviças são rodeadas dos mais belos exemplos de virtude, pois na Casa-mãe só deve haver religiosas-modelo, fervorosas e regulares. Eis algumas das principais vantagens que encontra o ramo não-clausurado por estar unido ao ramo clausurado, vantagens que seria a lastimar não compreender e apreciar, vantagens que todas as religiosas possuidoras do verdadeiro espírito religioso de nosso santo estado desejam conservar para sempre. O ramo clausurado tem também uma grande vantagem em ser unido ao ramo não-clausurado: é a de participar de todas as obras de misericórdia realizadas por nossas Irmãs não-clausuradas. No claustro, reza-se um pouco mais, há mais mortificação para atrair as bênçãos de Deus sobre o Instituto e obter, para nossas Irmãs não-clausuradas, a prosperidade e a pureza de intenção. Os dois ramos são as duas Irmãs da casa de Betânia, na qual costumava muitas vezes hospedar-se nosso amável Salvador. As Irmãs não-clausuradas representam Marta. São destinadas a servir, por suas obras, o bom Mestre, usufruindo de pouco repouso, esgotando sua saúde, suas forças, em busca da salvação de seus irmãos, ao passo que as Irmãs clausuradas, como Maria, permanecem aos pés do bom Mestre, suplicandolhe que derrame sobre suas Irmãs todos os tesouros de seu amor e de suas graças. O bom Mestre contempla umas e outras, ama a ambas, mas deseja que Marta não perturbe Maria em seu doce repouso. Que não a julgue preguiçosa, não considere seu repouso um crime e, sobretudo, não queira subtrair a melhor parte que ela escolheu. Ele deseja também que Maria, sem se prevalecer da preferência concedida pelo bom Mestre, se lembre de sua Irmã e a auxilie todas as vezes em que não estiver aos pés do Salvador.43 A Irmã: Vou transmitir às Irmãs reunidas em conferência o que a senhora acaba de me dizer. 423 242 A Madre: Sim, vá. Diga-lhes que não se preocupem a respeito da clausura. Deus a conservará. Diga-lhes que acredito também que Deus quer os dois ramos na Congregação e os manterá enquanto o merecerem por seu fervor e sua observância. Que as Irmãs não-clausuradas tenham o mesmo zelo pela conservação da clausura quanto as que fizeram o voto. São todas da mesma família e devem caminhar para um mesmo objetivo: buscar a glória de Deus e manter a Congregação como a deixaram seus fundadores. Geralmente eles são inspirados por Deus nos regulamentos que elaboram. Acredito que Pe. Marty o foi, quando escreveu nossas Constituições. Eu o via com freqüência, de caneta na mão, os olhos elevados para o céu, esperando as luzes do Espírito Santo. Ele oferecia muitas orações para obter ser guiado em tudo só pelo Espírito de Deus: “Amem o claustro. Se ele se mantém firme, a Congregação irá bem. Se ele cair, a Congregação perecerá. As escolas são enxertadas numa árvore que não pode morrer sem que esse ramo secundário morra. Permitam serem clausuradas as religiosas não-clausuradas que manifestarem essa vocação. Quanto às vocações, lembrem-se de que elas vêm de Deus e não podem ser desviadas sem que se falte gravemente ao dever. Se as pretendentes pedem a clausura e se se reconhece nelas essa vocação, deve-se em consciência admiti-las no claustro e deixar perfeitamente tranqüilas as que não o pedem. Repito: amem o claustro, consolidem-no.” ainda mais estreito durante minha ausência. Seu zelo pela observância, pelo cuidado das crianças e pela sua própria santificação deve adquirir um novo grau de força. É a vocês que Deus confia os interesses de sua casa. São vocês que, por seu exemplo e por suas sábias deliberações, devem manter a ordem, a regularidade e o fervor. Persuadida de que estão todas com essas disposições, tenho confiança de que, ao regressar, encontrarei tudo, não digo em bom estado, mas em melhor estado, uma vez que devemos avançar e não recuar. Saúdo-as muito afetuosamente, assim como a nossas queridas Irmãs. Rezem pelas crianças daqui de nossa escola. Estamos muito ocupadas em colocar tudo em ordem. A classe gratuita cresceu muito, ultimamente. Tem 36 alunas e outras que chegarão nestes dias. Estamos com o propósito de reabrir a congregação das leigas. Rezem também nessa intenção. Queremos igualmente encontrar meios para que as jovens e as mulheres analfabetas possam facilmente vir aqui para se instruírem. É bom não falar sobre isso, mas rezar. Irmã Emília. R.S.F. Minha opinião é que podemos acolher esta jovem da qual vocês e Irmã Blandine me falam, por 4 francos mensais. Nós lhe daremos alimentação e a prepararemos para fazer sua primeira comunhão, se Deus quiser. No entanto, se pensam de modo diferente, não quero me opor. É preciso observar que, se ela não tem bom comportamento, não podemos recebê-la. 76 Ao lhes expressar a alegria de revê-las em breve, Madre Emília exorta as jovens internas de Villefranche a terem uma reverente piedade eucarística (L 243). Às jovens internas de Villefranche. Aubin, 27 de maio de 1828. 422 243 Minha muito querida Irmã: Gosto muito quando me diz que quer amar o bom Deus de todo o seu coração. Realize esse desejo por uma grande fidelidade em seguir as inspirações da graça. Assim cultivará em sua alma esta santa alegria com a qual tem sido favorecida. O espírito de amor que irá receber a tornará generosa e você não hesitará mais em lhe abrir inteiramente a sua alma. Você sabe, minha muito querida Irmã, que o Esposo é ciumento e não pode suportar a menor reserva. Reze por mim, a fim de que aproveite o tempo de repouso para recordar suas graças e meus deveres. Saúdo-a de todo o coração, nos Sagrados Corações de Jesus, de Maria e de José. Como nossa mestra de ordem esteve doente, achei que nos descuidamos quanto à arrumação. Peço-lhe realizar esse trabalho o mais perfeitamente possível. É o que Deus quer de você. Irmã Emília. 75 Na ausência da superiora, as Irmãs do Conselho devem, pela sinceridade e força de sua caridade, fazer progredir a vida religiosa na casa de Villefranche. Em Aubin, as Irmãs se ocupam em implantar laboriosamente diversas formas de apostolado próprios ao Instituto (L 242, M 106-107). À nossas caras Irmãs Conselheiras. Aubin, 24 de maio de 1828. J.M.J. Minhas muito queridas Irmãs: Para me compensar da privação que experimento de não poder escrever a cada uma em particular, consolo-me em fazêlo às quatro juntas e será como se o fizesse individualmente, uma vez que devem ter um só coração e uma só alma. Todas as pessoas que compõem a comunidade devem ser muito unidas e as conselheiras devem sê-lo de uma maneira ainda mais íntima. O laço sagrado da caridade que as une deve ser, de certo modo, 22. Diálogo de nossa Madre Emília com duas Irmãs, durante sua última enfermidade (v.s., nº 19) O principal interesse desta conversa, que aconteceu na noite de 10 a 11 de setembro de 1852, é manifestar de maneira singela as disposições de Santa Emília em seus últimos momentos e suas mais caras recomendações. Uma das interlocutoras é Irmã S. Tauriac que ainda faz perguntas um tanto angustiadas sobre sua perseverança (v.s. nº 19). A Madre: Quem está de guarda esta noite? Uma Irmã: Sou eu, Madre, e minha Irmã Marie-Séraphine. A Madre: Esse nome, Séraphine, me lembra os bemaventurados Serafins. Oh! como gozam da presença de Deus, como são felizes! Serafins!... Ó bem-aventurados Serafins! Onde está Irmã Marie-Séraphine? A Irmã: Ela foi levar o chá à Irmã Xavier. Vem voltando. A Madre: Aproxime-se, minha cara Irmã, venha cá. Não chore. Pense nos Serafins que gozam da plena visão de Deus... Que belo nome! Serafins!... Quanto são felizes! E você também, minha querida Irmã, é feliz por tê-los como protetores. Será que os ama bastante? Você lhes pede que lhe comuniquem um pouco de sua pureza, de seu amor a Deus? Invoque-os, são bastante poderosos junto a Deus. Peça-lhes que lhe obtenham um coração ardente de amor a Deus. Coragem. Não chore. Vou protegê-la quando estiver perto de Deus. A Irmã: Madre, peço-lhe que obtenha para mim a graça de ver o Deus dos Serafins. 244 421 A Madre (com voz forte): Oh! você duvida? Uma esposa de Nosso Senhor pode perecer? Deve ela sempre temer como você o faz? Uma Irmã da Sagrada Família, por tão pouco que o queira, nada tem a temer por sua salvação. Sendo assim, não tema. Ame seu divino esposo, ame-o e não tema sua vinda. Sabe de cor as promessas escritas por Pe. Marty em nossas Constituições, para as Irmãs da Sagrada Família? A Irmã: Sim, Madre. A Madre: Então, repita-as comigo: “Se uma Irmã da Sagrada Família vive da fé, se faz pouco caso dos recursos humanos, se ela se abandona inteiramente à proteção e à direção de Jesus, de Maria e de José, só procurando evitar o que lhes desagrada, ela nada tem a temer, nem para o Instituto, nem para si mesma. Nada, nem do mundo, nem da natureza, nem do demônio, nada enfim, nem na vida, nem na morte.” Recite com freqüência essas linhas de nossas Constituições. A Irmã: Farei isto, Madre, mas... A Madre: O que quer dizer esse mas?... “Eu temo não ser fiel?” Não tenha tanto medo. Nem tudo está perdido, embora eu me vá. Diga muitas vezes durante sua vida estas palavras que eu mesma repito com felicidade neste momento: “Meu Deus, eu creio, espero, amo e me abandono.” Depois, ria do demônio. Vamos dormir um pouco, as três. A Madre (após uma hora de sono, aproximadamente, com um sorriso inefável): Pensava tê-lo encontrado e ele ainda não chegou. Nós nos sentimos felizes na ilusão de um sonho, como se fosse uma realidade. É necessário esperar ainda. Então! Uma Irmã (à outra): O que ela disse? Não compreendo. O que ela tinha encontrado? A outra Irmã: Ela não diz o nome, mas é fácil entender que se trata do celeste Esposo dos Cânticos. Pensava já estar com o bom Deus e fica admirada porque ele ainda não veio. A todas as Irmãs que me causam prazer com suas cartas, peço que me desculpem por não lhes responder. Elas sabem por que não posso fazê-lo. 73 Como aproveitar a função de sacristã para intensificar a união de amor com Nosso Senhor (L 240, M 108-109). A uma noviça de Villefranche. Aubin, 24 de maio de 1828. J.M.J. Minha muito querida Irmã: Estou muito feliz pelos santos desejos que você me expressa. As graças que vai receber na preciosa festa que iremos celebrar mudarão estas flores em frutos e tenho a confiança de que, ao voltar a Villefranche, terei a doce consolação de vê-la avançada no caminho do santo amor. Sua função favorece a união com o santo Esposo. Desempenhe essa tarefa o mais perfeitamente possível. Há algo mais importante do que a ordem e a limpeza na casa de Deus? Conservando-a com zelo, você participará do mérito de Madalena, quando derramava seus perfumes sobre os pés sagrados de Jesus. Sou toda sua nos Sagrados Corações de Jesus, de Maria e de José. Irmã Emília. 74 O amor de Deus é exclusivo e ciumento, não admite reserva alguma. A ele respondemos positivamente por uma fidelidade constante às inspirações da graça (L 241). A uma noviça em Villefranche. Aubin, 24 de maio de 1828. 245 420 Saúdo-as todas muito afetuosamente e sou, nos Corações de Jesus, Maria e José, sua Madre muito dedicada. Irmã Emília. 72 Ainda distante das religiosas da Casa-mãe, a superiora as felicita por suas boas disposições e as convida a se prepararem, por um renovado recolhimento para a festa de Pentecostes (L 238, M 378379). Às Irmãs de Villefranche. Aubin, 20 de maio de 1828. J.M.J. Minhas muito queridas Irmãs: Soube, com grande satisfação, que gozam de uma santa alegria. Também o que li na carta da Irmã arquivista me causou prazer. Esta resolução unânime de viver numa verdadeira sabedoria é tanto mais consoladora quanto ela será acompanhada do seu fruto. Não pode deixar de sê-lo nesses dias preciosos consagrados à preparação da vinda do Espírito consolador, esse Espírito Santo que ensina todas as coisas às almas recolhidas e dóceis à sua voz. Como seremos felizes, minhas queridas Irmãs, se não colocarmos obstáculo algum à abundante efusão de graças que nos é destinada! Unamo-nos a Maria e aos apóstolos, perseveremos como eles na oração e numa suave e humilde espera dos benefícios do Senhor. Saúdo-as muito afetuosamente e peço-lhes fazer uma novena em honra de São José, a qual consiste em uma hora de silêncio; recolhimento que faça evitar as palavras inúteis; visita ao seu altar e algumas invocações. Irmã Emília. R.S.F. A Irmã: Pergunte-lhe o que estava sonhando. A outra: Não ouso. Não digamos nada. Talvez durma novamente. A Madre (após ter dormido um pouco): A muralha cai, esfacela-se e, quando não houver mais obstáculo, veremos o invisível. A destruição do corpo é pouca coisa. É um benefício para os amigos de Deus, pois, sem esse desmoronamento não podem gozar plenamente de seu Deus. Lembra-se de qual foi o santo que, coberto de chagas, cantava sua felicidade em transportes de alegria? A Irmã: Não Madre, não me lembro. A Madre: Nem eu. Mas lembro-me de que esse solitário foi visitado por algumas pessoas do mundo. Vendo-o tão alegre, perguntaram-lhe o motivo. Ele respondeu: “É porque a muralha está cheia de rachaduras e se desfaz cada dia um pouco. Em breve estaremos na fortaleza de Sion.” A Irmã (chorando): Madre, a senhora acha que está demorando em nos deixar? A Madre: Não é que me demoro em deixá-las, mas é que anseio por ver a Deus. Além disso, não as deixarei. Estaremos unidas. Eu me ocuparei de vocês como se estivesse aqui. Não chorem. A Madre (após ter cochilado um pouco): Que horas são? A Irmã: Duas horas da madrugada. A Madre: Daqui a três horas vão trazer-me o bom Deus. É hoje o dia de receber a comunhão? Esqueci de dizer que não fiquem preocupadas se lhes falo durante o grande silêncio. O Padre me permitiu, por causa do pouco tempo que tenho a 246 419 passar com vocês e também para lhes causar prazer. Não falamos senão do bom Deus. A Irmã: Estamos longe de nos desedificar. Apenas tememos fatigá-la deixando-a falar. A senhora está tão fraca! Se pudesse repousar, ficaríamos mais contentes. A Madre: Isso eu faço tanto quanto posso, mas, no resto do tempo, devo entretê-las. Que a Irmã Séraphine se aproxime. Ainda não me deu de beber nenhuma vez. Por que deixa isso sempre para Irmã Anne-Marie? A Irmã: Madre, não ouso levantá-la um pouco com medo de que isso lhe faça mal. Disse à Irmã que é acostumada a cuidar das doentes que lhe cederia esse prazer. P.S. Gostaria de escrever em particular às nossas caras Irmãs do Conselho, mas como isso me é difícil, peço-lhes que me desculpem e encontrem nesta a resposta à carta que tiveram a bondade de me escrever. 71 Madre Emília se mostrava sempre inclinada à indulgência mais do que à severidade para com as crianças. A carta seguinte o prova, mas vemos também que certas faltas teriam sido incansavelmente corrigidas por ela até uma perfeita correção. Observaremos com que tom respeitoso ela fala a essas alunas (L 237, M 87-88). Às jovens senhoritas da Sagrada Família, em Villefranche. A Madre: Não receie me fazer mal. Em todo caso, para deixá-la à vontade, Irmã Anne-Marie me segurará e você me ajudará a beber. A Irmã: Madre, a senhora é muito boa! A Madre: Vou lhes dizer ainda algumas palavras ainda e depois vamos dormir, as três. É preciso que a Irmã que poderá ser enviada futuramente a trabalhar com crianças não se deixe desconcertar pelas dificuldades que poderão aparecer. Que as faltas das crianças irrefletidas, levianas, não a surpreendam, pois são feitas sem malícia. É preciso até, minha cara Irmã, que as crianças desse tipo sejam o objeto de uma solicitude especial, de uma afeição maior que as outras. Observei que, muitas vezes, crianças levianas, quando pequenas, são as que mais tarde trazem maior consolo. Eu mesma fiz a experiência muitas vezes. Uma delas, sobretudo durante as aulas, não tinha um minuto de sossego. Estava em todas as brincadeiras, em tudo que era permitido às crianças. Além disso, atrapalhava-me durante as aulas, rodopiando e outras coisas mais. Procurava ser paciente. Eu a amava porque via que nela só havia leviandade e também porque o amor aos pobres tinha penetrado em sua alma. Tinha esperanças para o futuro. Não me enganei. Atualmente ela é religiosa. Aubin, 20 de maio 1828. J.M.J. Minhas muito queridas crianças: Não estando junto a vocês para lhes obter o perdão das faltas que sua idade, bem mais do que a má vontade, as faz cometer, eis o meio que devem utilizar: é permanecerem atentas, após terem invocado o seu anjo da guarda, para não cometê-las, e, se sua fraqueza as fizer cair algumas vezes, peço às nossas queridas Irmãs tratá-las com muita indulgência. Refiro-me às pequenas faltas, pois, infelizmente, se se comportam mal na capela, se dizem mentiras, ou por malícia batem umas nas outras, para faltas assim tão graves, não posso pedir às suas mestras que as perdoem. Se o fizesse, não seria uma boa mãe, pois a vantagem para vocês, queridas meninas, é que sejam corrigidas. Se não o fizesse, o que seria de vocês? Mas estou persuadida de que, quando voltar, não me dirão que tenham cometido semelhantes faltas. Vocês manifestam o desejo de me ver. De minha parte, desejo-o ainda mais e ficarei muito feliz quando chegar esse momento. Espero que seja logo. 418 247 lembrar que estamos aqui na terra a caminho da pátria definitiva (L 231, M 102-103). CONFERÊNCIAS E DIÁLOGOS SEM DATAS Às Irmãs de Villefranche. 1º – Temas de Oração Aubin, 8 de maio de 1828. J.M.J. Minhas muito queridas Irmãs: Eis chegado o tempo no qual eu deveria voltar para o meio de vocês, a fim de me encorajar e animar pelos seus exemplos e, ao mesmo tempo, fazer o pequeno trabalho que agradou a Deus me confiar em sua santa casa. O que me atrasou foi uma resposta que aguardo do nosso Pai, que talvez queira que eu permaneça ainda um pouco por causa de alguns remédios que a Madre Vincent quis que eu tomasse. Não tenho confiança alguma neles, mas temo entristecer nossas Irmãs se os recusar obstinadamente. Se me fizerem bem, será devido apenas às suas orações e, se não, amaremos nisso a santa e muito amável vontade de Deus, que tudo dispõe para nosso maior bem. Aguardando o grande prazer de revê-las, peço-lhes que se lembrem muitas vezes do santo Esposo que escolhemos como nosso único bem. Foi a ele que entregamos o nosso coração. Ele deve possui-lo inteiramente. A festa que celebraremos em breve, fazendo-nos antever a feliz morada onde ele nos precedeu, convida-nos ao desapego da terra, que não é nossa pátria, e a viver nela como estrangeiros, para termos nosso coração lá onde está o nosso tesouro.1 Se a nossa fé for viva, todos os sofrimentos da vida, bem como o trabalho e as dificuldades que o acompanham, nos parecerão suaves, por serem o caminho que a ele nos conduz. Vivamos, minhas queridas Irmãs, na paz e na esperança bem como numa santa união, para honrar Jesus, Maria e José, a quem temos a inestimável felicidade de ser consagradas. É em seus Corações que sou, com terno afeto, sua mãe muito dedicada. Irmã Emília. 23. Conferência sobre a oração (C 12-14; nº 6) Madre Emília desenvolve, a seu modo, a doutrina comum do circuito fechado constituído pela oração e uma mortificação tão perseverante quanto possível com a graça: quais os condicionamentos mútuos, qual a causalidade recíproca que as articula indissociavelmente. A oração deve ser o alimento das almas piedosas, sobretudo das almas religiosas. É um grande dom, o dom da oração, o espírito de oração. As religiosas que não o têm são bem infelizes e, entretanto, minhas Irmãs, seu número é considerável, porque não cultivam a vida interior e que, sem vida interior, sem o espírito de mortificação que a ela conduz, não chegamos à união com Deus. Essa união torna muito fácil o exercício da oração. Esse dom da oração, esse espírito de oração é tão necessário que as religiosas que não o possuem, compreendem pouco o que é a vida religiosa e cumprem seus deveres com negligência. Os santos davam a máxima importância à meditação e à oração. Vemos que, seguindo esse caminho, eles se santificaram. Onde hauriam essas luzes tão vivas que nos comunicaram nos livros escritos por eles e cuja leitura faz tanto bem às almas? Na oração. Ali, encontravam estas luzes puras, esta força sobrenatural que os fizeram caminhar a largos passos na via da perfeição, essas luzes que os desapegaram totalmente de tudo que o mundo, a natureza, o demônio oferecem como sedução a quem aspira a Deus, à perfeição. Durante essas horas de absoluta solidão em que a alma se comunica a sós com Deus, eles compreenderam o que é 248 a terra, o que é o céu. Aprenderam a desprezar a primeira e a dar importância somente ao segundo. A oração é a escola da verdadeira ciência, da ciência que faz os santos. É a escola de todas as virtudes. Por mais que se fale de humildade, de silêncio, de recolhimento a quem ignora o que é fazer oração, ele pouco compreende o valor dessas amáveis virtudes. Tudo que brilha, que é elevado aos olhos do mundo, que atrai sua estima, sua aprovação, toca, faz palpitar o coração. As obras piedosas mais brilhantes são logo acolhidas pelos espíritos levianos. A abnegação, a humildade, não são do gosto deles, porque não hauriram na oração o conhecimento das grandes vantagens de uma vida conforme à de Jesus Cristo. Deus é mais honrado por uma alma de oração do que por um grande número de outras, porque naquelas há mais pureza de intenção, mais conversão interior. As outras agem, muitas vezes, segundo seu humor, por capricho, não perscrutam o recôndito de sua alma onde se escondem o amor, o interesse próprio. Essa energia, essa fortaleza de alma que vemos brilhar nos santos, onde a encontravam? Quando lhes era comunicada? Eles a hauriam na oração e na contemplação de Jesus sofredor, de Jesus que se imola à justiça de seu Pai por nossos pecados, que sofre mil vezes mais do que seria preciso para nos resgatar, na contemplação de uma multidão de santos que seguiram os passos do Homem-Deus. Essas considerações inflamavam sua coragem, eles não recuavam diante de nenhum sacrifício, queriam uma vida conforme à do divino Modelo que Deus nos enviou. Eis o que os santificou, o que os fez santos, e grandes santos, pela sua maior ou menor conformidade com o HomemDeus. Se compreendemos pouco nossas obrigações, os caminhos de Deus, os caminhos da perfeição, se somos tão fracas, tão medrosas, culpemo-nos a nós mesmas. Não rezamos bastante, não meditamos suficientemente as grandes verdades de nossa santa religião. Vocês me dirão: “Minha Madre, temos apenas meia hora de meditação pela manhã e à tarde; é bem pouco.” Minhas Irmãs, para nós é bastante, uma vez que a obediência não nos dá mais tempo. A recitação do ofício, a leitura, o exame de consciência, o terço, etc., são excelentes orações. Se esses 417 Saúdo-a muito afetuosamente, bem como a todas as nossas Irmãs. Irmã Emília. 69 Uma religiosa que acaba de fazer seu retiro é convidada a perseverar em suas felizes disposições e a fazê-las frutificar no cumprimento de seus deveres (L 230, M 90-91). A uma Irmã de Villefranche. Aubin, 2 de maio de 1828. J.M.J. Minha caríssima Irmã: É um grande prazer saber que o Esposo a conduziu ao deserto e que lá ele lhe tenha comunicado seus segredos e falado ao seu coração; que, por sua vez, dócil à sua voz tão suave, você se tenha oferecido para fazer sua vontade. Assim, a mais total dedicação e o espírito de zelo, seja para sua santificação, seja para o cuidado das crianças que a bondade de Deus lhe quis confiar, serão de agora em diante sua partilha. Se eu não esperasse ter em breve o prazer de vê-la, eu lhe pediria que me comunicasse suas resoluções, mas será mais consolador para você e para mim falarmos disso de viva voz. Sou toda sua. Irmã Emília. Peço-lhe recomendar-me às crianças. Peço-lhes que sejam bem obedientes. 70 Tendo de ficar em Aubin para tomar remédios preparados com cuidado, Madre Emília pede desculpas às religiosas de Villefranche por não poder regressar ainda. Manifesta grande abandono quanto à sua saúde e aproveita a proximidade da festa da Ascensão para 416 249 Nossas Irmãs escreveram ao nosso Pai pedindo-lhe que viesse, mas ele ainda não respondeu. Tenho prazer como vocês que lhe confiem as criancinhas. Alegre-se com a felicidade de fazê-las conhecer e amar o bom Deus. Lamento de todo o coração a grande perda que você sofreu e as privações que isso lhe ocasionou. Submetamo-nos inteiramente à santa vontade de Deus que nos recompensará pelos sofrimentos que suportarmos por seu amor. Alegro-me porque Deus aumentou em você o espírito de fé, fazendo-a apreciar a felicidade de estar com doentes. Seja fiel à graça e ele não cessará de aumentá-la em você.1 Irmã Emília. 68 Boas notícias a respeito de uma religiosa que, enfim, se corrige generosamente. Alusão aos males da Igreja na França (anticlericalismo e galicanismo que pressagiam a revolução de 1830) (L 229, M 99-100). À Irmã Athanasie, suplente em Villefranche. Aubin, 24 de abril de 1828. Minha muito querida Irmã: Certamente partilhará comigo a grande consolação que me dá Irmã N. Ela mudou completamente. Desde algum tempo ela é de um fervor, de uma obediência e de uma humildade que me causam muita alegria. Que Deus seja louvado! Ela desejou escrever-lhe para reparar as faltas que teria cometido diante de você. Acredito que você tem o cuidado de fazer rezar pelos problemas da Igreja da França, os quais vão sempre de mal a pior. Só a oração nos pode salvar. Unamo-nos a todas as almas fiéis que clamam aos céus e procuremos ser bem fervorosas para aplacar a cólera de Deus, justamente irritado contra nós. diversos exercícios são feitos com o espírito interior que convém, eles nos unem a Deus. E depois, se, durante todo o nosso dia, cuidamos em permanecer nesse espírito de solidão, de calma interior que vemos brilhar em Jesus, Maria e José em Nazaré, nossa oração é contínua. Em todo tempo, em toda ocasião, podemos receber essas luzes, esses toques secretos com os quais os santos foram tantas vezes favorecidos. O essencial para isso é permanecermos unidas a Deus, não de modo absorvente que cative as faculdades de nossa alma e lhes tire a liberdade de agir, mas de um modo suave, pelo qual se permanece na presença de Deus, que faz com que sigamos sempre a voz da consciência, que renunciamos em tudo a nossos gostos, a nossos caprichos para cumprir sempre a vontade de Deus. Uma alma que age assim é feliz, mesmo em meio às maiores provações. Nos momentos de sofrimento, nas contradições que lhe chegam, recorre a Deus que a ajuda a tudo suportar com mérito para o céu. Quando sofre, une-se a Jesus sofredor e se lembra de que os sofrimentos são a semente da alegria. Quando é tentada, une-se a Jesus na sua tentação no deserto e pede-lhe força para resistir. Quando se aborrece acompanha Jesus ao Jardim das Oliveiras, une seu aborrecimento ao desse bom Mestre. Quando é caluniada, pouco estimada, vê Jesus tratado como perturbador da ordem pública, como um demônio. Ela o vê acolher com alegria as maiores humilhações, e então se considera feliz por partilhar um pouco de sua cruz. Quando se sente abandonada por Deus, vítima das maiores provações interiores, une-se a Jesus abandonado por seu Pai. A exemplo de nosso Salvador, abandona-se. Quando goza de consolações celestes, lembra-se de Jesus no Tabor, o qual, em meio a seu triunfo, sua glória, não deixa de pensar em sua Paixão. Como Jesus, ela pensa que a consolação é passageira e será seguida de tentação e de sofrimento. Quando goza de perfeita saúde, quando fica ocupada o dia todo com suas alunas, ela se lembra de Jesus instruindo seus discípulos e o povo e, a seu exemplo, pratica a doçura, a caridade para com as alunas. 250 Eis o que fazem as almas de oração, eis o que torna sua vida tão meritória. Podemos dizer que adoram a Deus em espírito e em verdade. Apliquemo-nos, minhas queridas Irmãs, com toda a nossa alma a viver no silêncio, no recolhimento, para obter o espírito de oração, e não desanimemos por causa das dificuldades que podemos encontrar. Leiamos, de vez em quando, o capítulo da oração que está nas Constituições de nosso Pai, Pe. Marty. Veremos aí as grandes vantagens desse santo exercício para a alma. Às vezes, há religiosas que dizem: “Eu me aborreço durante a meditação, é com dificuldade que permaneço na capela.” Suportem esse aborrecimento e permaneçam na capela. Lembrem-se de que Santa Teresa muitas vezes contou os buracos das grades do coro, durante a oração e que se aborrecia muito durante esse exercício.44 Vocês pensam não fazer meditação quando estão na secura, no desgosto, no aborrecimento. Fazem uma excelente meditação suportando-se a si próprias e combatendo as tentações. Bom seria que, algumas vezes, examinassem com calma por que não podem meditar, para verificar se não haveria algum relaxamento na sua conduta, pondo obstáculo à sua união com o bom Deus. Se essa for a causa, procurem se corrigir. Quando não podem acompanhar o ponto de meditação que é lido na Comunidade, aconselho-as a meditar sobre a Paixão de Nosso Senhor. Tomem, cada dia, uma estação da Via-Sacra como assunto da oração. Algumas vezes, igualmente, nos momentos de aborrecimento, de desgosto, vocês podem recitar um cântico, um salmo, cujas palavras as tocaram. Assim o tempo passará e a oração não será menos perfeita se tiverem feito o possível para se unir a Deus. A melhor de todas as meditações é aquela em que mais nos conformamos com a vontade de Deus. Qualquer que seja a situação em que nos encontremos, quando é Deus que a quer, fica honrado com nossa submissão a seu bel-prazer. 415 Ano de 1828 66 Seguir o caminho real da cruz, na convicção sobrenatural de que ele conduz a Jerusalém celeste (L 223). A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 15 de março de 1828. J.M.J. Minha muito querida Irmã: Você sabe tanto quanto eu que os sofrimentos corporais e espirituais são o caminho real da santa cruz, caminho que conduz à bem-aventurada Jerusalém, onde o mais perfeito repouso e a mais doce paz acompanham aqueles que a habitam. Encorajemo-nos na doce esperança de estar um dia com nosso Esposo nessa morada eterna. Pensando assim, nada nos deve parecer demasiado penoso nem tão difícil. O tempo da renovação de seus votos é bem oportuno para reavivar o seu fervor. Um exercício para se preparar para essa renovação é recorrer freqüentemente à Sagrada Família e a seu anjo da guarda. Peça muitas vezes um coração puro e o esquecimento de si mesma. Irmã Emília. 67 Submissão à vontade de Deus naquilo que satisfaz, como numa perda bastante sensível. Intensificar o olhar da fé que faz discernir a graça, representada numa comunidade, pelas doentes (L 226). A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 14 de abril de 1828. O que lhes peço, acima de tudo, é que não desanimem por causa das dificuldades que poderão encontrar nesse santo J.M.J. Minha muito querida Irmã: 414 251 posso dizer-lhe que é um dos melhores. Torna o demônio muito mais fraco contra nós e nos ajuda a resistir. Tenha muita coragem, minha muito querida Irmã, suas fadigas passarão, bem como suas tentações, e a paz de Deus que ultrapassa todo sentimento será um dia sua recompensa. Mesmo que não lhe fosse concedida nesta vida, não seria bem feliz em possuí-la durante toda a eternidade? Toda sua no Coração Sagrado do bom Jesus. Irmã Emília. 65 Encorajamento a uma postulante que experimentou, sem dúvida, alguns momentos de hesitação. Prosseguir agora com uma coragem inteiramente renovada (L 211). A uma postulante. Villefranche, 2 de setembro de 1827. J.M.J. Minha muito querida Célestine: Muitas vezes recuamos para saltar melhor. Foi o que você fez pensando na sua saída (sem a qual teria avançado mais no santo estado da vida religiosa). Com certeza estará animada com nova coragem para a prática das virtudes que devem conduzi-la à união com Jesus, Maria e José. Nada mais propício do que o exemplo das almas fervorosas para nos ajudar a sacudir nossa preguiça. Cuide para que esta conferência não produza em você um efeito passageiro. Naquele dia, Deus falou ao seu coração. Seja dócil à sua voz. Estou certa de que Rosalie tem os mesmos sentimentos que você. Assegure-lhe minha terna amizade, bem como a de todas as postulantes, sem esquecer nossas noviças e nossas Irmãs. Sou toda sua. Irmã Emília. exercício. Rezem, peçam ao bom Deus que as assista, que lhes conceda a perseverança; tenham confiança, ele o fará. Lembrem-se destas palavras de Nosso Senhor, no santo Evangelho: "Tudo o que pedirdes a meu Pai em meu nome, ele vo-lo dará." Quem fez essa promessa? Nosso Senhor Jesus Cristo, que é a própria Verdade. Ah! dizia ainda esse bom Mestre a seus discípulos: "Se tivésseis fé como um grão de mostarda, transportaríeis as montanhas." Apliquemos essas palavras a nós mesmas. Se rezássemos com fé e confiança, obteríamos tudo que pedíssemos. Se temos pouco é porque pedimos pouco e muito mal. Não digo isso para desanimá-las, apenas para estimulá-las a rezar com mais ardor. Recitemos com atenção e respeito esta oração que se encontra no fim das ladainhas do Santo Nome de Jesus: “Senhor Jesus, que disse aos seus apóstolos: peçam e lhes será dado, busquem e acharão, batam e lhes será aberto, nós lhe suplicamos, dê-nos seu divino amor a fim de que todos os movimentos de nosso coração, todas as nossas palavras, nossas ações sejam orientadas para o Senhor e que o louvemos sem cessar.” Essa oração bem recitada estimulará nossa confiança e nos obterá muitas graças. Vão refletir diante de Deus sobre o que acabamos de dizer e peçam-lhe a graça de bem aproveitar dessa reflexão. 252 413 63 24. Conferência sobre a oração de Moisés que torna os israelitas vitoriosos sobre os amalecitas (C 74-76; nº 28) Procurar esquecer-se de si mesma, evitando particularmente as reflexões e confidências inúteis: o abandono e a simplicidade serão os preciosos frutos desse tipo de mortificação (L 206, M 93). A uma Irmã de Aubin. Alusão ao Êxodo 17, 8-16. A Casa-mãe, privilegiada em relação à clausura e demais observâncias, deve exercer no Instituto este papel de intercessão. Ele supõe, como em Moisés, disposições profundas de doçura amorosa, de oração silenciosa. A fundadora pode situar dessa maneira e coordenar umas em relação às outras as três categorias de religiosas: de coro, conversas (clausuradas ou não), das escolas. Quando os israelitas acamparam em Rafidim, no deserto, os amalecitas vieram combatê-los. Moisés disse a Josué para convocar homens e ir combatê-los, acrescentando: "Amanhã permanecerei no cume da montanha, tendo na mão o bastão de Deus." Josué fez o que Moisés lhe havia dito e combateu contra Amalec. Moisés, Aarão e Hur subiram ao alto da colina e, enquanto Moisés mantinha os braços elevados, Israel era vitorioso. Mas, quando os baixava um pouco, Amalec levava vantagem. Entretanto, as mãos de Moisés estavam cansadas e pesadas. Por isso, eles pegaram uma pedra e, fazendo-o sentarse nela, Aarão e Hur sustentaram-lhe os braços dos dois lados. Durante esse tempo, Josué expulsou Amalec e fez passar o povo dele ao fio da espada. Lendo a Sagrada Escritura, gosto de aplicar aos nossos deveres as verdades nela encontradas e que a eles se referem.45 Parece-me que a passagem que acabo de lhes transmitir é muito instrutiva para nós, religiosas clausuradas e nãoclausuradas, todas pertencentes a uma mesma família. Moisés, Josué e Hur permaneceram na montanha enquanto os israelitas combatiam na planície. Neles, temos a imagem das religiosas clausuradas, que se dedicam especialmente à oração e que, pelo fervor de suas preces, devem atrair as bênçãos de Deus sobre todo o Instituto. Temos ainda neles a imagem das Irmãs da Casa-mãe que devem, mais que as outras, estar cheias do amor Villefranche, 11 de agosto de 1827. J.M.J. Minha muito querida Irmã: Creio que a melhor maneira de se livrar das tentações é darlhes o desprezo, não se ocupar de si mesma, nem de sua imaginação, mas apegar-se à lembrança de nosso dulcíssimo Salvador. É uma perda de tempo contar seus pensamentos detalhadamente. Basta dizer que se tem tal ou tal tentação e, se a Madre julgar que precisa de mais detalhes, saberá lhe pedir. Quanto às mortificações, só deve fazer aquelas que a Madre lhe permitir. A que mais lhe convém é esquecer-se de si mesma. Não tema que eu esqueça esse seu assunto. Eu também não tenho vontade de me perder. Desejo-lhe, minha muito querida Irmã, um inteiro esquecimento de si mesma e uma verdadeira simplicidade e sou, com verdadeira afeição, toda sua. Irmã Emília. 64 Encorajamento em meio a penosas tentações: procurar distrair-se com o trabalho (L 209). A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 17 de agosto de 1827. J.M.J. Minha caríssima Irmã: Que lhe dizer a respeito de todas as suas tentações, senão que é preciso suportá-las de bom grado e na paz, ser fiel a uma obediência inteira e cega, refletir pouco ou nada sobre si mesma, abandonar-se a Deus e submeter-se à sua vontade. O trabalho é um dos meios que você usa para enfraquecê-las e 253 412 De vez em quando, nós lhe dizíamos algumas palavras que ela escutava com uma grande atenção. Todas as vezes que lhe falávamos de Nossa Senhora, o sorriso aflorava a seus lábios. Quando nos ajoelhávamos para rezar, ela se esforçava para rezar conosco. Ao meio-dia, rezou o Angelus, continuou a rezar jaculatórias, e às doze e quinze expirou docemente nos braços de Jesus, de Maria e de José, a cuja família se sentia muito feliz de pertencer. Morreu em 19 de janeiro de 1827. 62 Votos de alegria pascal: conhecer intimamente, tanto quanto possível, a humildade consoladora do Senhor, revelando-se, por exemplo, a santa Madalena ou ao apóstolo Tomé (L 194). Às Irmãs de Aubin. Villefranche, 24 de março de 1827. Minhas muito queridas Irmãs: Embora lhes escreva este bilhete no tempo das dores e das humilhações de nosso divino Mestre, e como só lhes chegará no tempo de seu triunfo, desejo a todas, de todo o meu coração, a santa alegria que acompanha sua gloriosa Ressurreição. Regozijemo-nos nele. Que nossa alegria seja íntima e profunda. Agradeçamo-lhe mil vezes de nos ter colocado tão perto dele, de nos ter dado tantos meios de conhecê-lo e de amá-lo. Por nós foi vitorioso e gozamos os frutos de sua vitória. Vamos a ele com amor, escutemos sua voz como Madalena. Procuremos conhecer suas chagas como São Tomé e faremos a feliz experiência do quanto é bom e amável nosso Esposo. Compreenderemos que por infinitas razões ele merece nosso coração. Dando-o todo inteiro, seremos verdadeiras Irmãs da Sagrada Família. É nos Sagrados Corações de J.M.J. que sou toda de vocês. Irmã Emília. de Deus. Esta casa, na qual vocês têm a felicidade de estar e onde se operam tantas maravilhas da misericórdia de Deus, pode ser considerada como a montanha sobre a qual estavam Moisés, Aarão e Hur. Os membros que a compõem devem ser outros Moisés e, se não podem ir até lá, que sejam pelo menos outros Aarão e Hur. Foi Moisés quem enviou combatentes contra Amalec, que para nós representa o demônio e o mundo. É desta casa e por ordem de Deus que aqui representam Moisés sobre a montanha, que nossas Irmãs não-clausuradas são enviadas ao mundo como a um campo de batalha, para combatê-lo, bem como a seu chefe, o demônio. Enquanto nossas Irmãs desdobram todas as suas forças para instruir a juventude, ensinar aos ignorantes, cuidar dos doentes do corpo e da alma, nós, clausuradas, damos o bom exemplo pela prática de todas as virtudes. As Irmãs da Casa-mãe, por sua união a Deus, seu fervor na oração, fazem alcançar todo tipo de vitórias às suas Irmãs. Que conduta deve ter uma Irmã que vive no claustro para ser como Moisés? Em primeiro lugar, deve imitá-lo em sua caridade. Ele amava a todos os seus irmãos. É a oração do mais afável dos filhos dos homens. Todas nós devemos ter o coração mais generoso possível, o mais devotado para com nossas Irmãs nãoclausuradas, nunca recuar diante de qualquer sacrifício quando se trata de lhes fazer o bem, de fortalecê-las, de sustentá-las. Elas são nossas bem-amadas Irmãs, digo-o do fundo de meu coração. Julgaram, algumas vezes, que eu não as estimava tanto quanto as outras. Não existe diferença alguma em meu coração. Todas me foram dadas por Deus. Creio que todas lhe são igualmente caras, mesmo chamadas a tarefas diferentes. Amoas a todas igualmente, mas não posso guardá-las todas junto a mim, nem confiar-lhes tarefas às quais Deus não as destina. Diante desse terno amor que devemos lhes dedicar, o que devemos fazer? Elevar sempre nossas mãos aos céus, pedindo as graças de Deus sobre todo o Instituto, mas particularmente sobre o ramo não-clausurado, a fim de que prospere sem se envaidecer. Que prospere dentro do espírito que convém ao 254 nosso Instituto, a fim de nunca esquecer sua origem, nem se desvie da finalidade para a qual foi instituído. Cabe a nós, minhas Irmãs, religiosas clausuradas, religiosas da Casa-mãe, conservar na sua perfeição o espírito do Instituto, espírito que estimulou nossas primeiras Irmãs. Para isso, devemos estimar nossa solidão, nosso claustro, vivendo no afastamento, no silêncio e no recolhimento, evitando tudo quanto possa nos trazer o espírito do mundo, tais como as entradas inúteis de pessoas de fora, as saídas desnecessárias de nossas Irmãs rodeiras ou de nossas Irmãs não-clausuradas. Não procuremos nenhuma informação das novidades de fora. Detenhamos até as pessoas que nos quiserem transmiti-las, fazendo-as entender que estamos mortas. Esse ponto é muito importante e punirei severamente as Irmãs rodeiras que transmitirem qualquer coisa de fora e também as mestras que escutarem suas alunas. Vivamos em nosso claustro de oração e de meditação. É isso que deve, principalmente, distinguir as religiosas clausuradas. Após haver cumprido as obrigações que nos são confiadas, enquanto trabalhamos com as mãos guardando o silêncio na sala comum, devemos rezar e meditar. Mesmo cumprindo nossas obrigações, se somos o que devemos ser no claustro, rezaremos e não perderemos jamais o recolhimento. Dessa maneira, minhas caras Irmãs, imitaremos Moisés, cumpriremos nossa tarefa. Sem fraquejar, Moisés manteve o dia inteiro as mãos voltadas para o céu. Sem cessar devemos rezar porque, sem cessar, o Instituto tem necessidade de graças, sem cessar nossas Irmãs não-clausuradas estão expostas aos perigos do mundo. Se elas são cercadas por inimigos obstinados em perdê-las, um grande combate lhes é proposto. Sustentemo-las, sejamos plenas de Deus, de seu santo amor e obteremos dele, como Moisés, tudo quanto desejamos para nós e para nossas caras Irmãs. Não temo pelo Instituto enquanto o claustro caminhar bem e, principalmente, as Irmãs da Casa-mãe. Não, eu lhes repito, não temo por ele, enquanto no claustro houver verdadeiros 411 bastante conforme seu desejo, ela lhes furtava muitas vezes para poder assisti-los. Não somente furtava mas até gostava que todos os necessitados viessem furtar também e levassem lenha e outras coisas do seu pai. Quando isso acontecia, gostaria de torná-los invisíveis, se isso estivesse em seu poder. Essa extrema bondade transparecia nas mínimas coisas. Teria gostado de evitar o sofrimento e a fadiga de todos. Era muito doloroso a seu coração ver as crianças serem punidas, de bom grado teria suportado seus castigos para poupá-las. Muitas vezes se punha de joelhos diante de suas professoras para lhes obter o perdão. Essa grande bondade era acompanhada de uma caridade e de uma simplicidade singular. A seus olhos, ninguém era culpado. Mesmo diante dos erros mais graves, ela encontrava sempre um meio de desculpá-los e cada uma de suas Irmãs era, no seu espírito, um modelo de virtude. Sua humildade era profunda. Colocava-se sempre abaixo dos outros. Compenetrada dos sentimentos do seu nada e da lembrança das faltas cometidas antes de entrar no convento, considerava-se como a última do mosteiro. Dizia-se indigna de morar nele. Sentimentos da mais viva gratidão penetravam sua alma, ao recordar a infinita bondade de Deus que a havia chamado à solidão. Expressava-se sobre isso com tanta veemência que, ao ouvi-la, a pessoa se sentia repleta de consolação. Era inesgotável nesse assunto, nele meditava continuamente e pode-se dizer que sua alma dele transbordava. Sua última doença foi uma disenteria que a enfraqueceu. Sua paciência permaneceu inalterável. Sua alma conservou sempre uma conformidade perfeita, uma paz profunda e uma submissão total à vontade de Deus. Essas felizes disposições a acompanharam até o último suspiro. No dia de sua morte, disseram-lhe que se preparasse para receber os últimos sacramentos. Essa notícia lhe causou alegria. Alimentou-se de seu Deus com amor e gratidão. Após receber a unção dos enfermos, nossa Madre lhe disse que lhe daria a permissão para fazer os votos perpétuos. Ao anúncio desse insigne favor, a alegria iluminou seu semblante. Embora agonizante, parecia ocupar-se apenas com sua felicidade. Pronunciou os santos votos com a vontade bem sincera de só pertencer ao divino Esposo. 410 255 Ano de 1827 60 Perseverar no recolhimento, graças aos exercícios comuns de piedade e pela consideração do nada das coisas passageiras (L 185). A uma aspirante. Villefranche, 12 de janeiro de 1827. Pela sua carta, sei que você persevera em seu desejo de pertencer totalmente a Deus, para responder às suas doces inspirações. Entregue-se a ele sem reservas e experimentará todos os dias sempre mais a suavidade do seu jugo. Procure aproveitar o mais possível de suas meditações e exames de consciência e volte-se freqüentemente para Deus.1 Peça-lhe que a faça conhecer sempre mais o nada e a vaidade de tudo que passa. Agradeço os votos que faz por mim. A eles acrescente a oração, para que Deus, em sua infinita bondade, seja sempre meu apoio. Saúdo-a muito afetuosamente. Irmã Emília. 61 Perfil de uma religiosa pouco dotada intelectualmente, mas muito dotada quanto à bondade compassiva. Esses dons magnificamente reforçados pela graça aparecem particularmente em sua última doença (L 189). (Madre Emília fala de si mesma na 3ª pessoa) 24 de janeiro de 1827. Em lugar da inteligência e dos talentos, nossa querida Irmã Véronique Jamès tinha recebido da liberalidade de Deus uma rara bondade e um coração dos mais agraciados. Amava os pobres com tão viva ternura que não podia resistir diante de suas necessidades e, achando que seus pais não lhes davam Moisés, almas de oração, almas que levarão a caridade até sofrer a rejeição por suas Irmãs. Sobre a montanha, Moisés guardava o silêncio. Para ser uma verdadeira religiosa e sobretudo uma religiosa clausurada, é preciso amar o silêncio da língua, do espírito e do coração. Sem isso, não há recolhimento verdadeiro. E sem recolhimento não há verdadeira oração. A prece sem o espírito de oração é quase sempre ineficaz. Silêncio, pois, no claustro, silêncio na Casa-mãe especialmente. Aarão e Hur, que sustentavam os braços de Moisés, representam nossas Irmãs rodeiras, encarregadas de evitar às Irmãs da clausura toda distração, toda preocupação com as coisas de fora. Usufruem das orações de suas Irmãs, que não podem passar sem elas. Quanto à nossas Irmãs das escolas, devem sentir-se felizes por haver Irmãs que oram e se mortificam enquanto elas trabalham e combatem o demônio. Diz-se que, enquanto Moisés baixava os braços, os amalecitas venciam. Assim será em nossa Congregação. Se o claustro, isto é, as Irmãs que nele residem, perdem a virtude que devem ter e, por conseguinte a clausura seja destruída, a Congregação não subsistirá por muito tempo. O claustro não será destruído entre nós, a não ser por um efeito de cólera de Deus. Lembrem-se sempre de que se essa infelicidade nos acontecesse, o castigo seria terrível e todas, clausuradas e nãoclausuradas, carregaríamos esse desgosto. Assim, as nãoclausuradas têm tanto interesse quanto as outras em manter uma clausura regular. Vocês devem rezar cada dia por suas Irmãs de dentro, a fim de que elas cumpram a missão que lhes foi dada por Deus. Se algumas delas se desviassem de seu dever, deveriam lembrá-lo. Ela é sua Irmã. Sua falta recairá sobre você, que carregará a pena. É como numa família. Se um membro se desonra, toda a família participa dessa desonra. Espero que a bondade de Deus anime com um bom espírito todos os membros da Congregação, fazendo de todas uma só e sustentando-se mutuamente. Infeliz daquela que não o fizesse. Seria um flagelo para sua Congregação.46 256 409 25. Diálogo sobre as pequenas práticas de piedade doçura, humildade e alegria espiritual. É o que lhe desejo com toda a afeição. Irmã Emília. (D 102-104; nº 47) 59 A Madre não condena a multiplicidade de práticas se a graça leva a tal suavemente. Mas, notam-se sobretudo suas idéias sobre a “via de simplicidade passiva.” Parece afirmar que Deus chama a isso com freqüência e confirma, em todo caso, sua conciliação sempre possível com as modalidades e as exigências do gênero de vida dito “ativo”. Nesse ponto, refere-se ao exemplo de São Francisco Xavier. Como presente do dia de ano, é enviado um anel que deve lembrar continuamente a aliança de amor feita com Nosso Senhor. Esforçar-se para fazer de toda a vida uma ação de graças por tudo o que ele nos deu (L 182, M 82-83). Às Irmãs de Aubin. A Irmã: Madre, costumo fazer algumas orações a mais do que as prescritas em nosso regulamento. Também tenho o costume de algumas práticas particulares. A senhora acha que posso continuá-las? A Madre: Diga-me que práticas são essas e lhe responderei. A Irmã: Peço a bênção a Nossa Senhora à noite e pela manhã e no início de cada uma de minhas ações. Faço a genuflexão diante do Santíssimo Sacramento pela manhã ao levantar-me e à noite ao deitar-me. Rezo cada dia, nas idas e vindas dentro de casa, o terço de Nossa Senhora, os sete salmos de penitência, faço sete comunhões espirituais em honra das sete alegrias de Nossa Senhora e oito pequenas mortificações no almoço e no jantar: três para honrar a Sagrada Família e cinco em honra às cinco chagas de Nosso Senhor. Nenhuma dessas práticas ou qualquer outra que possa fazer me impedem de cumprir minhas obrigações. Caso contrário, eu teria pedido seu consentimento. A Madre: Tudo quanto me disse pode ser feito sem uma permissão particular, exceto as genuflexões. Não as proíbo quando você estiver sozinha ou quando ninguém perceber. Do contrário, seria uma singularidade a evitar numa comunidade religiosa. Mesmo sem necessidade de uma permissão particular Villefranche, 29 de dezembro de 1826. Minhas caríssimas Irmãs: Nós lhes enviamos como presente de Ano Novo um anel, sinal da santa aliança que firmamos com nosso divino Esposo. Olhando-o, lembraremos os sinais de sua ternura, os favores singulares que ele nos concedeu. Esse anel nos lembrará, sobretudo, das amabilidades do bem-amado de nosso coração e aumentará o desejo de amá-lo unicamente, de sermos fiéis à sua voz e, enfim, de nada lhe recusar. Aliás, como poderíamos recusar-lhe alguma coisa uma vez que ele tudo nos deu, tudo até seu próprio sangue, tudo até sua vida, nada recusando para assegurar nossa salvação? Poderíamos encontrar algo mais difícil para lhe testemunhar nosso amor? Procuremos, minhas queridas Irmãs, seguir seus passos com generosidade e fervor. Pratiquemos, sobretudo, as virtudes da Sagrada Família: a doçura e a humildade. Não devemos esquecer, ou melhor, precisamos colocar a caridade em primeiro lugar, pois nada é mais agradável a Deus do que a perfeita união dos corações, que se manifesta no semblante, na atitude, nas palavras e ações e as torna semelhantes às de Jesus, que o amor fez descer sobre a terra! É o que lhes desejo de todo o coração nesse início de ano, nos Sagrados Corações de Jesus, Maria e José.1 Irmã Emília. 408 257 Sou, em união de Jesus, de Maria e de José, toda sua, com a mais sincera afeição. Irmã Emília. para as pequenas práticas das quais me falou, foi bom ter-me dito. Uma alma bem obediente e que deseja a santificação evita até as mínimas coisas sem o consentimento de seus superiores, mesmo que o regulamento não se oponha. Continue a caminhar como vem fazendo. Não multiplique suas práticas. Seja apenas fiel às que o bom Deus lhe inspirou, enquanto outro atrativo não venha substituir os atuais. Aceitar de boa vontade as restrições dos superiores concernentes ao parlatório: ocasião de dominar o amor-próprio. Nada de inquietações a respeito das confissões e comunhões passadas. É preferível humilhar-se. A Irmã agora é ecônoma. Se a superiora assume a maior parte dos negócios, felicitar-se por isso (L 178). A Irmã: Pensava lhe pedir autorização para essas práticas, enquanto eu viver. A senhora acredita que não as farei sempre? 58 A uma Irmã, em Aubin. Villefranche, 30 de novembro de 1826. Minha muito querida Irmã: Penso que, em lugar de ficar triste por não ir ao parlatório, deve considerar que é uma grande felicidade. Há coisa mais desagradável para uma religiosa do que entreter-se com o mundo? Aliás, não é o desgosto de estar proibida de falar com as pessoas de fora, é o seu amor-próprio que ficou ferido, e você sabe que nossa felicidade consiste em combatê-lo generosamente. Quando nossos superiores nos ajudam nesse trabalho, devemos nos alegrar. Quanto às faltas cometidas contra a Madre, humilhe-se profundamente e dirija-se com toda a confiança a Jesus obediente. Você terá paz e sossego à medida que se tornar simples e obediente. Não deve se perturbar com suas confissões e comunhões, mas humilhar-se profundamente diante de Deus, reconhecendo não ter sido fiel às inúmeras graças com as quais ele a cumulou. Prometa-lhe reparar o passado e ser toda dele. Quanto ao economato, eu a aconselho a fazer somente o que a Madre julgar conveniente. Se ela quer encarregar-se de uma parte do trabalho, melhor para você. Terá menos responsabilidade e sua alma deve ficar numa grande paz, bem inestimável, que lhe desejo de todo o coração. Vivamos tranqüilamente no seio da Sagrada Família, onde tudo é paz, A Madre: Certamente, minha Irmã. Acredito que chegará o dia em que não terá mais necessidade de todos esses meios para se unir a Deus e, quando chegar, não se perturbe nem pense estar recuando. Previno-a porque poderia angustiar-se pensando nada fazer, perder o tempo, porque não fará quase nenhum ato concreto. Entretanto, estará em permanente estado de união com Deus. Não sentirá nenhum atrativo para fazer algum ato particular, senão à medida que Deus, pelo movimento interior de sua graça, exigirá algum. E serão raros. A Irmã: Madre, não compreendo bem o que me diz. Acreditava ser necessário fazer muitos atos, pelo menos interiores. A Madre: É verdade. É necessário praticar muitos atos de amor a Deus e outras virtudes. Isso é muito bom. Mas, para algumas almas que Deus chama a unir-se intimamente a ele, pede pouco e não lhes permite determinar nem o número, nem a duração desses atos, nem onde devem ser feitos. Ele quer que essas almas permaneçam numa disposição habitual de corresponder a todas as inspirações de sua graça, sem jamais olhar para trás, tentando ver o que já fizeram. Elas sonham tãosomente em progredir, fazer o que Deus quer. A Irmã: Parece-me ser difícil de fazer. A Madre: No início, sim. Mas quando se tomou uma boa resolução de ser toda de Deus, de não mais resistir à voz de sua 258 graça, a dificuldade desaparece. Esse abandono à direção de Deus é o que mais faz avançar uma alma na via da perfeição e o que mais felicidade lhe proporciona. A Irmã: Pode-se assim estar unida a Deus sem contenção de espírito? Pode-se trabalhar bastante nesse estado? A Madre: Certamente que se pode. O trabalho que então se faz é mais perfeito e mais meritório, porque nele se infiltram menos imperfeições. Deus o preside e o abençoa. Vemos isso pelo exemplo que nos deram os santos. Ninguém trabalhou mais que São Francisco Xavier. Entretanto, o autor de sua vida nos diz que ele quase nunca perdia a santa presença de Deus. São Vicente de Paulo e tantos outros faziam o mesmo. Com a mão direita prendiam-se estreitamente a Deus e apenas com a mão esquerda se prestavam às coisas exteriores. Essa mão esquerda, abençoada por Deus que estava sempre ao lado deles, duplicava o trabalho. 407 A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 10 de setembro de 1826. Minha caríssima Irmã: Tudo o que você me diz em sua carta não deve desanimála, mas humilhá-la profundamente, pois com que finalidade deixamos o mundo para vir a esta bendita solidão senão para nos desapegar de nós mesmas? Façamos esforços mais generosos, compenetremo-nos das grandes obrigações que temos para com Deus, a fim de que, sentindo bem o valor de nosso estado, comecemos a reproduzir em todo o nosso comportamento as virtudes que eram praticadas na humilde casa de Nazaré, sobretudo a doçura, a humildade e uma total simplicidade. É com o desejo de vê-la praticar perfeitamente essas virtudes que sou, com verdadeira afeição, toda sua. Irmã Emília. A Irmã: Era muito cômodo. Queira me dizer como passa o dia uma alma que vive no estado do qual falamos. 57 A Madre: Ela o passa mais simplesmente do que se pensa e é essa simplicidade nas ações que a torna feliz. Ao levantar-se pela manhã, oferece-se ao bom Deus a quem ama de todo o coração, para fazer e sofrer tudo quanto ele quiser e renova sua promessa de ser em tudo fiel às inspirações de sua graça. Caminha guiada por seu regulamento, pelas orientações de seus superiores, de seu confessor, dos quais nunca se afasta voluntariamente. Presta atenção à voz do Espírito Santo que reside no interior de sua alma. Cumpre tão perfeitamente quanto possível todos os seus deveres, nunca tomando seu gosto ou seu desgosto como regra de conduta. Vindo a cair, levanta-se e, sem perder a coragem, pune-se por suas faltas. Não ignora ser esta vida um lugar de misérias no qual é necessário que cada um tenha sua parte nos sofrimentos. Resignada em tudo que Deus quiser dela, aceita a pena, a dor, as faltas de consideração com uma espécie de indiferença, ocupando-se apenas de uma única coisa que é cumprir a Evitando os obstáculos provenientes do desânimo ou da presunção, caminhar na imitação de Jesus manso e humilde de coração (L 176). A uma aspirante. Villefranche, 13 de setembro de 1826. Minha querida jovem: Não foi possível dar o seu recado. Há quatro dias nosso Superior está ausente. Farei isso com grande prazer logo que ele voltar, assim como o que você pede junto às nossas Irmãs. Por sua vez, seja fervorosa e fiel à graça, agindo por Deus. Viva na mortificação interior, não consentindo em nenhum pensamento que possa fazê-la cair no desânimo nem na presunção. Busque a vontade de Deus e seja fiel em cumpri-la. Que Jesus manso e humilde de coração seja seu modelo. Imitando-o é que encontrará a verdadeira paz da alma. 259 406 vontade de Deus, e pouco lhe importa de que maneira ela será cumprida. 55 Madre Emília comunica à comunidade de Aubin a nomeação de uma nova superiora. Convicta de suas excelentes disposições, pede que uma inteira docilidade das Irmãs lhe facilite a tarefa (L 166, M 77-78). Às Irmãs de Aubin. Villefranche, 28 de julho de 1826. J.M.J. Minhas muito queridas Irmãs: Quis o bom Deus transferir a pessoa da qual se servia para dirigi-las. Estou convencida de que o mais inteiro abandono à vontade divina é seu desejo e que, vendo apenas a Deus naquela que as dirigirá, ela encontrará em todas vocês uma docilidade de criança e a maior flexibilidade, que é o verdadeiro espírito da Sagrada Família. Irmã Vincent,1 que, graças a Deus, tem verdadeiro desejo de ser mais sua serva do que sua Madre, foi eleita com a maioria dos votos. Amenizem quanto puderem, minhas queridas Irmãs, a tarefa bem pesada que Deus lhe impõe. Cabe a vocês tornar o seu fardo suave e leve. Tenho a doce confiança de que o farão além das minhas esperanças, pois é assim que atrairão sobre vocês as graças mais especiais e os olhares de ternura do santo Esposo de suas almas. Sou toda de vocês. Irmã Emília. 56 A solidão da vida religiosa deve, definitivamente, conduzir ao esquecimento de si mesmo. Contemplar na casa de Nazaré a realização do ideal que ela aponta (L 175). A Irmã: É um estado de perfeição. A senhora crê que nossas Irmãs, dando aula o dia todo, possam ser tão vigilantes sobre si mesmas, manter-se sempre na presença de Deus? A Madre: Existem almas a quem Deus não chama a tão íntima união com ele, mas a maior parte das religiosas a isso são chamadas. Se não o conseguem é por culpa própria. É possível manter-se unida a Deus, viver em sua presença quando se dá aula, como quando se faz qualquer outro trabalho. A instrução que se dá às crianças sob o olhar de Deus lhes é mil vezes mais proveitoso do que deixar-se guiar por si mesma. As crianças logo percebem qual espírito move sua mestra. Se notam nela uma forte base de piedade, uma forte dose do espírito de Deus, concebem uma estima toda especial por essa religiosa e jamais a impressão de sua conduta se apagará de sua memória. Tornando-se mães de família, transmitirão a seus filhos quanto sua mestra era doce, boa, caridosa. Elas lhes mostrarão como ela rezava, qual a sua postura no lugar santo, como lhes inspirava horror à vaidade, à preguiça e ao pecado. Seu nome, sua lembrança serão um bálsamo precioso ao coração dessas felizes mães, pois podem ser chamadas de felizes por terem vivido em sua infância com uma pessoa unida a Deus.47 A Irmã: Existem muitas religiosas que não são tão unidas a Deus e que, entretanto, fazem muito bem. Suas aulas são muito proveitosas. A Madre: O bem que fazem as almas que não são unidas a Deus é mais exterior que interior, mais aparente que sólido (inacabado). 260 405 26. Fragmentos de algumas conversas a respeito da oração (D 131-138; nº 63) Deste conjunto um pouco original (o caderno manuscrito diz expressamente: “eles aconteceram em épocas diversas”, mas levam a supor, sem o afirmar, uma mesma interlocutora, sem muita certeza), retenhamos os dados característicos seguintes: Madre Emília recomenda levar para a oração muita espontaneidade, simplicidade, docilidade, disponibilidade. Ela mostra como o espetáculo da natureza pode ajudar a encontrar a Deus intimamente. Encara ainda a eventualidade de períodos mais passivos e contemplativos que qualificam intrinsecamente, sem mudar a natureza, a meditação dos mistérios evangélicos. Mestre de seus dons, Deus pode comunicar, em todo tempo e em todo lugar, luzes e fervores à alma autenticamente receptiva. Por fim, põe em ação critérios tradicionais de discernimento e de direção a propósito de uma “visão” que julga suspeita. A Madre: Minha Irmã, você não fará retiro este ano. A Irmã: Está bem, Madre, farei como quiser. Sinto-me contente fazendo sua vontade. Procurarei colocar-me na disposição em que se encontra Irmã N. Acredito que isso me será tão proveitoso quanto um retiro. A Madre: E como faz a Irmã N.? A Irmã: Vive unida ao bom Deus e em estado de recolhimento habitual. Penso que ela é sempre fiel à graça, que recebe bem todos os contratempos que Deus lhe envia. Numa palavra, parece existir um pequeno comércio entre ela e Deus. Isso me apraz. Quisera ser assim. A Madre: Você tem razão em pensar que esse estado será mais proveitoso que um retiro. Oh! sim. Essa atenção constante à voz de Deus será melhor que todos os retiros. Imite a Irmã N. e Deus estará contente. Eis como passará seu tempo durante os oito dias de retiro: durante as instruções, irá à cozinha ferver as meios humanos com a firme convicção de que só ele pode abençoá-los. Saúdo-a no divino Coração de Jesus. Irmã Emília. 54 Encorajamentos espirituais na doença: Nosso Senhor sofredor está mais perto de nós, nossas orações lhe são mais agradáveis. Deus abençoa a alma (L 161). À uma Irmã de Aubin. Villefranche, 28 de junho de 1826. J.M.J. Minha muito querida Irmã: A Madre me escreveu que você está doente há algum tempo, mas não me diz exatamente qual a sua doença e desejo sabê-lo por você mesma. Compartilho seu sofrimento e desejaria poder aliviá-la se, todavia, Deus assim o quiser, pois estou convencida de que você prefere sofrer fazendo a vontade dele a ter uma saúde perfeita. Na doença, tem a vantagem de se unir a Jesus sofredor e um meio a mais de conhecê-lo e amá-lo. Entregue-se totalmente a ele. Você já o fez, mas pode fazê-lo mais perfeitamente. Na doença, ele está mais perto de nós e nossas orações lhe são mais agradáveis. O santo amor se acende mais facilmente em nossos corações e é esse o tempo da bênção de Deus em nossa alma. Ocupe-se muitas vezes da Sagrada Família e, ao rezar por você, faça-o também por mim, que sou com terno afeto toda sua. Irmã Emília. 404 fazer bem a ação de graças que não nos permita esquecer Jesus Cristo após tê-lo recebido, mas nos recorde e nos faça conversar com ele durante o dia, de maneira que nossa alma nos esteja mais presente que de costume.1 Outra coisa a que precisamos prestar atenção é de nos instruir bem sobre nossa santa religião. Aqui utilizamos alguns meios para isso. Irmã N. poderia lhe dizer como fazemos no noviciado, onde tudo é dirigido para o estudo da religião. As Irmãs docentes se reúnem antes da santa Missa e dedicam um certo tempo a se instruírem, quer lendo, quer conversando. Veja se poderiam fazer assim todos os dias, ou em vários dias na semana. Num Instituto em que fizemos voto de educar, tudo deve ser dirigido para esse fim. Tenho um grande respeito por M., a quem dedico um particular afeto, tanto por causa de suas virtudes, quanto pela memória de sua querida filha, nossa Irmã N. Compartilho de seu sofrimento e quisera ter algo que pudesse causar-lhe prazer. Envio-lhe alguns figos secos. Se você souber o que lhe pode ser útil, diga-me. A relíquia que está no pequeno relicário que N. lhe levou é das mais autênticas, é uma partícula do crânio de São Luís, rei da França. Por conseguinte, é preciso considerá-la como muito preciosa e respeitá-la. Você me pergunta se fez bem em demonstrar confiança em Pe. N. Nunca devemos demonstrar o que não sentimos. Assim, antes de testemunhá-la era preciso senti-la. Não vejo nada que pudesse impedir você de sentir essa confiança para com ele, pois é natural pensar que um sacerdote respeitável como ele se interesse pela sua casa e por lhe dar bons conselhos. Quanto a tomá-lo como seu confessor extraordinário, acho que se apressou um pouco. Receio que um pouco de prudência humana tenha influenciado o pedido que lhe fez. Rezou e pediu orações antes de tomá-lo como confessor? Aliás, nosso Pai deveria ter sido consultado antes. Agora que já pediu, não deve voltar atrás. Deve escrever ao nosso Pai dizendo o que fez e pedir-lhe a aprovação. Em sua carta, encontro alguma coisa na maneira de se expressar que revela prudência humana. Devolvo-a para que a releia e veja se essas seriam suas disposições. Coloquemos em Deus e somente nele toda a nossa confiança. Utilizemos os 261 panelas e cuidar para que aí nenhuma criança entre. A presença do fogo pode trazer-lhe mil bons pensamentos. Além disso, você proporcionará a nossas Irmãs a vantagem de participarem dos exercícios. Trabalhará para as esposas de Jesus Cristo. Isso deve compensá-la. Após as instruções, irá ao quintal colher frutas, feijões. Deus fala a seus amigos quando quer. Todos os tempos e todos os lugares são próprios para isso. Assim, no quintal como no coro, você pode rezar, unir-se a ele, escutar sua voz. Apenas se mantenha recolhida, sem contenção de espírito. Vá alegre e jovialmente ao bom Deus. Ele ama muito a simplicidade infantil. Sim, ele se compraz com os pequenos, com os humildes. Seja desse número. A Irmã (dias depois): Madre, fiz como a senhora disse durante o retiro. Senti-me tão calma, tão tranqüila!... Falava ao bom Deus como a meu Pai, tudo quanto queria. A parábola do filho pródigo me tocou muito. Vejo-me como esse filho. O bom Deus me trata ainda melhor que o pai do pródigo. Sua ternura vai além de tudo quanto eu poderia pensar. É porque cometi muitos pecados que Deus é tão bom. Estou surpreendida ao ver que se abaixa até a mim, permite-me ir a ele, falar-lhe como à senhora. Permita-me relatar todos os pecados que tive a infelicidade de cometer em minha vida. Verá como é grande a misericórdia de Deus. A Madre: Permito-lhe fazer essa confissão. (A Irmã o faz.) Minha pobre Irmã, a misericórdia de Deus a seu respeito é muito tocante. Ele é um pai e um terno pai para você. Ame-o muito. Apegue-se fortemente. Ame-o porque ele a ama. Deus é bom. Oh! Sim, ele é bom!...Como é liberal!... Não nos trata como mercenárias!... Você pecou muito e é por isso que Deus a ama. Ele esquece sua ingratidão para lembrar-se apenas da misericórdia dele. Constatamos bastante em nossos santos livros que é sobre os pecadores, sobre as almas que mais lhe custaram, que ele expande suas liberalidades, suas graças em profusão. Observe Davi em seus salmos: “O Senhor me perdoará, Senhor, meu pecado porque ele é grande.”48 Porque é grande. Compreende? Existem almas bem inocentes, bem menos culpadas que você e, entretanto, não experimentaram 262 nada dessa felicidade da qual me fala. São tratadas de maneira bem diferente. Não esqueça seus pecados, continue a chorá-los, faça as suas ações em espírito de penitência. Veja sempre no bom Deus um terno pai. É sob esse emblema que quer vê-la chegar até ele: humildade, simplicidade, confiança e amor. Eis o caminho a tomar sem se desviar de si mesma. Seja bem fiel à graça. Aí está o ponto mais importante para você. As inspirações divinas são a voz de Deus que fala ao nosso coração. Jamais resista voluntariamente à graça. O demônio vai lhe armar ciladas desconhecidas, eis porque lhe recomendo vir ter comigo com freqüência. Venha cada vez que o pensamento voltar. Se esse pensamento voltar cada dia e várias vezes ao dia, venha sem hesitar. Quando eu era jovem, Pe. Marty me fez a mesma recomendação. Fui fiel, senti-me muito bem. É um momento crítico, você tem necessidade de que eu forme seu julgamento e lhe ensine muita coisa que ignora. Venha, eu lhe recomendo, não fale a ninguém do que se passa em sua alma Nem de mim, nem do que lhe digo. Procure conciliar a isso sua conduta e seja obediente. Não irá mais à conferência do noviciado. Eu mesma a dirigirei. A Irmã: Gosto de escutar e de falar com a senhora, mas não ousarei vir procurá-la cada dia. Que pensariam nossas Irmãs? A Madre: Que pensarão nossas Irmãs, isso deve lhe importar pouco. Pensarão o que quiserem. Faça o que lhe digo. Ficará inquieta ouvindo dizer que a estimo mais que às outras, que me vem trazer histórias. Disseram isso da Irmã X. Não era verdade, ela o suportou. Será necessário fazer o mesmo, caso isso aconteça. Procuro fazer o bem às almas. Não a amo mais que as outras, porém você tem necessidade de mais. É muito jovem, não tem nenhuma experiência. Pensa ainda como se pensa no mundo em muitos assuntos. Não vê as coisas da vida religiosa sob seu verdadeiro ponto de vista. Aprecia ainda o que estimam muitas religiosas imperfeitas e não aprecia bastante o que merece. Sobre todos esses pontos nos quais talvez errasse, eu a 403 P.S. Aproxima-se a festa do Sagrado Coração. Que seja esse o dia de entrarmos nele. É aí que poderemos aprender a ser inteiramente de Jesus Cristo e dele só. Em seu divino Coração estão encerrados os tesouros de suas infinitas misericórdias. O meio dos meios é nos abandonarmos a Deus nesse refúgio sagrado e inacessível a todos os golpes do inferno. É também por esse Coração, que poderemos agradecer a Deus sua imensa bondade. Deixo-a nessa feliz morada. Aí você aprenderá esta santa indiferença, objeto de seus desejos.1 53 Na recepção da Eucaristia, reagir contra a rotina que ameaça facilmente a vida religiosa. Interesse pelo aperfeiçoamento da instrução religiosa das Irmãs, particularmente das mais jovens. A respeito de um problema bem concreto: cautela contra o excesso de "prudência humana" (L 157). À Madre Agathe, superiora em Aubin. Villefranche, 14 de maio de 1826. Minha muito querida Irmã: Veio-me ao pensamento dizer-lhe que preste particular atenção às comunhões das Irmãs, de forma que, como dizem as Constituições, elas as façam de maneira frutuosa. Para isso, peça muitas vezes as luzes do Espírito Santo. Parece-me que é o assunto para o qual a superiora tem mais necessidade dessas luzes. Procuremos todas ter uma profunda consciência desse celeste alimento. Em geral, as religiosas não são bastante compenetradas do valor da sagrada comunhão, da sua importância, das grandes obrigações que ela nos impõe. Corremos o risco, e muitas vezes nos acontece, de comungar algumas vezes por semana sem pensar que uma comunhão freqüente deve ser seguida da correção dos defeitos, bem como de generosidade e de fervor na prática das virtudes da mortificação, humildade, obediência e recolhimento. Precisamos preparar-nos bem para receber esse pão divino e 402 263 vezes um pouco do Livre d’Or. Gostei de saber que está fazendo flores e que isso lhe rende alguma coisa. Dê-me notícias de sua saúde. Sou toda sua. Irmã Emília. 52 Simplificar as relações com os superiores, ao prestar contas da consciência. Não acreditar facilmente que os enganamos. Eles terão a graça para deduzir. Premente exortação à confiança para com o Sagrado Coração (L 154). A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 17 de abril de 1826. Minha caríssima Irmã: Quanto à idéia que a preocupa de que você engana seus superiores, pode ficar tranqüila. Não receie isso, pois o bom Deus lhes dará bastante luz para conhecer o íntimo de sua alma. Não pense também que eles tenham maior estima por você ao vê-la violentamente tentada. As tentações não são coisas boas; devem, pelo contrário, nos humilhar profundamente, e Deus só as permite para nos instruir sobre a nossa tendência ao mal e para tornar nossa vontade submissa à dele na pessoa daqueles que escolheu para representá-lo. Não deve levar em conta a repugnância que poderá experimentar algumas vezes ao lhes abrir sua alma. Vá com a simplicidade de uma criança, mas evite, ao falar de si mesma, debruçar-se sobre seus problemas. Evite a prolixidade e não deseje que lhe digam muitas palavras. No que diz respeito à sua vida passada, não se aflija, entreguese inteiramente à misericórdia divina. O mais perfeito, o mais inteiro abandono deve ser seu prêmio. Deixe o desejo de se dar a conhecer mais intimamente a seus superiores até a chegada do nosso Pai em Aubin. Ele prometeu ir logo. Então, você lhe dirá tudo o que se passa em seu íntimo e fará o que ele quiser. Saúdo-a bem afetuosamente e sou toda sua. Irmã Emília. esclarecerei. É sobretudo com relação às disposições da alma que precisa ser bem dirigida. Vamos, você se fortalecerá. A Irmã: Madre, não consigo fazer a meditação sem interrupção. Tenho sempre alguma coisa a dizer ao bom Deus quando estou meditando. Estou sempre pedindo que me torne fervorosa, que me dê seu amor. Quando fui infiel à graça, não perco a coragem. Peço-lhe perdão todo o tempo da oração. Posso continuar assim? A Madre: Não somente pode, mas deve. A oração é uma conversa da alma com Deus. Lê-se um ponto, apenas para ajudar a alma a fazer os colóquios. Se durante a meditação se atinge a finalidade proposta pela leitura do ponto e pelas reflexões, deve-se seguir seu atrativo. Continue como está fazendo. Deus a quer simples. Não se desvie desse caminho para refletir. Evite toda curiosidade, seja sobre si mesma, seja sobre os outros. Caminhe na via da obediência como entre duas muralhas, sem se desviar nem para a direita, nem para a esquerda, e verá que agradará a Deus. Quando foi infiel, poderá empregar a oração para se humilhar, pedir perdão a Deus. Que podemos fazer de melhor durante esse exercício do que pedir perdão de nossos pecados, humilhar-nos diante de Deus! Aí está uma boa meditação. Recomendo-lhe ler atentamente a vida de Jesus Cristo. Isto lhe fará muito bem. A Irmã: Madre, desde que comecei a fazer a leitura no santo Evangelho, comecei a conhecer um pouco mais Nosso Senhor, amo-o mais, sinto prazer em ouvi-lo falar, agir. Como ele devia ser amável!... Na meditação, quando se lê um ponto sobre a vida pública de Jesus, tenho a impressão de vê-lo. Sinto prazer em olhá-lo. Penso nisso o tempo todo. Tenho medo de perdê-lo e temo ser a preguiça que me faça permanecer tão tranqüila. A Madre: Não se perde o tempo contemplando a humanidade sagrada de Nosso Senhor. Faz-se a meditação sem nada dizer interiormente, como se estivesse falando. Uma figura de Cristo, uma imagem piedosa, pode levar-nos a isso. Você não fala, mas os exemplos do Salvador lhe falam. Se você contempla seu 264 Corpo Sagrado, diz a si mesma: Ah! como uma pessoa séria, doce, modesta, unida a Deus como nosso Salvador, é amável, leva ao bem, à virtude. Isso lhe dá, sem que o perceba, o desejo de ser assim. Essa caridade que brilha em todos os atos desse bom Mestre ensina-a a ser caridosa, doce, boa. A maneira cheia de doçura com a qual ele trata, instrui os apóstolos e o povo, ensina-a como deve instruir, suportar suas alunas, sobretudo as de caráter difícil. Na contemplação dos mistérios da vida de Nosso Senhor, é ele quem fala. Não se deve crer que se perde o tempo fixando os olhos sobre esse modelo. Não, não é tempo perdido. Entregue-se a esse exercício sem contenção de espírito. A Irmã: Madre, é necessário fazer sempre a preparação à meditação? Muitas vezes sinto-me predisposta a meditar, ao entrar no coro. Humilho-me um instante e depois começo. A Madre: Quando nos sentimos predispostas a meditar desde que entramos no coro para a oração, é preciso que nos entreguemos a esse exercício sem outra preparação que um simples ato de adoração, de humildade. A vigilância que exercemos sobre nós mesmas durante o dia, para nos mantermos unidas a Deus, é uma excelente preparação. Se, às vezes, é necessário tanto tempo para nos colocarmos na presença de Deus, cativar o espírito antes da oração, é devido a não estarmos recolhidas durante o dia. Quando, fazendo a preparação à meditação composta por nosso Pe. Marty, sentimos a alma emocionada, tocada por algumas palavras que a compõem, como por exemplo: “Eis-me diante do Senhor, ó meu Deus, pobre, despida de todo bem, carregada de dúvidas”, ou então estas outras: “O Senhor liberta os cativos, sua luz expulsa as mais espessas trevas”, é necessário parar e não passar além, até que nos sintamos dispostas. Tudo consiste em não perder tempo durante a meditação. Contanto que se ocupe de Deus ou da salvação, é o suficiente. Todas as almas não são conduzidas à oração pelo mesmo caminho. Cada uma deve seguir seu atrativo, entregar-se a isso sem procurar outra coisa. Nosso bem-aventurado Pai diz, em 401 Sem dúvida, minha querida Irmã, desde o início desta Quaresma, você não deixou de entrar na solidão do seu coração para acompanhar ao deserto nosso divino Salvador. Desejo que se sinta tão retirada e tão silenciosa que ouça apenas a voz e a linguagem do Esposo, pois você sabe que é somente no segredo do retiro que ele fala no íntimo da alma fiel. Ele mesmo é seu mestre, a ilumina e a instrui sobre tudo o que pode agradar ao amor.1 Procure, pois, minha cara Irmã, não se fazer de surda, mas, ao contrário, estar atenta ao que ele lhe disser, para depois derramá-lo no coração de suas alunas. Adeus, minha querida Irmã, eu a saúdo muito afetuosamente e sou toda sua. Desculpe-me, minha muito querida Irmã, se não lhe escrevo de próprio punho, estou muito ocupada. De outra vez terei esse prazer. Minhas lembranças a nossas queridas Irmãs. Todas daqui lhes dizem tudo o que se pode dizer de afetuoso. Irmã Emília. 51 Tender a uma confiança ilimitada, aproximar-se muitas vezes e com alegria da Eucaristia, amar uma vida de humilde anonimato junto ao Senhor (L 153). À Irmã Anne-Régis, em Aubin. Villefranche, 9 de abril de 1826. Minha caríssima Irmã: Uma doce confiança deve penetrar e encher sua alma. Só a idéia de sua pertença à Sagrada Família deve inundá-la de santa e deliciosa alegria. Embora não tenha muitas vezes a oportunidade de se confessar, pode sem dificuldade comungar, segundo seu costume. Faça-o com grande amor e com o ardentíssimo desejo de se dar inteiramente àquele que nada reservou para si. Que cada comunhão a faça crescer em sua santa amizade, de tal maneira que, totalmente unida a ele, viva unicamente para sua glória. O melhor meio para chegar a isso é manter-se pequenina e bem humilde. Será bom ler algumas 400 265 Ano de 1826 49 Encorajamentos a alguém que, modestamente, confessou suas faltas. Voltar sempre para junto da Família de Nazaré a fim de adquirir algo do espírito de mansidão que a caracteriza (L 148). A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 4 de janeiro de 1826. Minha caríssima Irmã: A confissão de suas faltas só pode me consolar, dando-me a confiança de que lhe serão um auxílio para não mais cometêlas. Você deve detestá-las, tanto mais que o espírito da Sagrada Família só respira paz, doçura e a mais perfeita caridade. Vivamos, ajamos e respiremos na santa casa dessa Família que é o objeto do nosso amor e da nossa imitação. É desejando-lhe essa felicidade como para mim que eu sou, com o mais vivo afeto, toda sua. Irmã Emília. 50 No limiar da Quaresma, convite a um silêncio do coração que libera todas as possibilidades de atenção à voz do Senhor (L 150, M 75-76). A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 14 de fevereiro de 1826. Minha muito querida Irmã: nossas Constituições, que é preciso seguir, tanto quanto possível, o ponto lido para a comunidade e, em geral, conformar-se a essa recomendação. Entretanto, acredito que ele disse isso tendo em vista as pessoas que perderiam o tempo se não seguissem um plano de meditação, um ponto fixo, meditando. Eis o que devemos fazer para entrar no espírito das Constituições: escutar atentamente a leitura do ponto e depois, se acontecer sentir que um outro assunto absorve todas as afeições da alma, é bom não nos desviarmos, pois correríamos o risco de perder o tempo. A Irmã: Fazemos meditação contemplando a natureza? Ah! como as obras de Deus são magníficas! Ontem à tarde, vários pássaros cantavam perto do coro. Sentia-me feliz escutando-os. Como desejaria ter a inocência deles e como eles cantar os louvores de Deus. Na primavera, quando vejo as árvores cobrindo-se de brotos, plantas surgindo da terra com um novo frescor, nem posso lhe descrever o que sinto. Ah! como é bela a natureza! A Madre: Oh! sim, a natureza é bela, as obras de Deus são magníficas. Fazemos a meditação ao admirar a bondade de Deus numa obra tão admirável. Tudo prega, tudo aqui na terra fala ao coração de uma alma recolhida e atenta. Você não perde tempo escutando o canto dos pássaros, contemplando as árvores que se cobrem de flores e frutos. No recreio, deve, muitas vezes, conversar sobre o espetáculo da natureza e, como não podemos sempre falar a Deus diretamente, falaremos indiretamente. Reúna três ou quatro jovens professas e vocês lerão juntas, cada dia, durante uma meia hora o tratado sobre a natureza,49 e disso falarão durante o recreio. Você sabe dos cantos sobre esse assunto compostos por nosso bem-aventurado Padre? É preciso aprendê-los: “Deus por quem tudo respira”, eis um que é belo. Aprenda também no cântico da missão: “Ó doce Providência”. Pe. Marty, durante as viagens, extasiava-se vendo essa natureza tão bela, sobretudo na primavera e durante o verão. Não sei como é possível que nos voltemos tantas vezes sobre nós mesmas, quando tudo impulsiona a nos elevar a Deus. Viu a ovelha que trouxeram com seu cordeirinho?... Que 266 doçura! Que inocência! Gostaria que todas as Irmãs a vissem. Se tivéssemos essa doçura, essa inocência, como seríamos felizes! Vamos, ame o bom Deus e aproveite de tudo para se elevar até ele. A Irmã: Madre, às vezes sentimos muita felicidade no serviço de Deus. Isso nos tira o gosto por todo o resto. Como será no céu, se na terra Deus é tão bom! 399 recolhimento, de beber com abundância nessa fonte deliciosa. Aconselho-as, para reanimar sua piedade, a ler com atenção o capítulo 4 do livro 4 da Imitação de Cristo.1 Irmã Emília. ( O final desta carta foi retirado.) 48 A Madre: É bem verdade que somos muito felizes. Jamais teríamos ousado pretender, por nós mesmas, o insigne favor de nos ligar tão estreitamente a Deus. Ele a faz compreender um pouco a felicidade que reserva a suas esposas fiéis. Se tudo a aborrece, é preciso suportar esse aborrecimento e a privação de gozar continuamente de Deus em espírito de penitência, com resignação à sua santa vontade, lembrando-se de que as filhas de Eva gemem por causa dos aborrecimentos e amarguras desta vida. A alma que uma vez compreendeu quanto o Senhor é bom, suspira depois pelo fim de seu exílio. O comer a aborrece, o dormir a fatiga, os embaraços e os afazeres do mundo a deixam acabrunhada, os prazeres da terra lhe são insípidos, tudo quanto não é seu bem-amado se torna um peso. Ela exclama: “Quem me livrará deste corpo de pecado! Quando será, ó meu Deus, que não me recordarei senão do Senhor? Quando gozarei de uma plena alegria no Senhor? Quando serei desembaraçada de todo obstáculo numa verdadeira liberdade? Quando virá essa paz sólida, essa paz inalterável, essa paz interna e externa, essa paz que nada poderá alterar?” A alma fervorosa suspira assim pela morada eterna, porque aqui ela não vê seu Deus e teme porque ainda pode pecar. Nesse caso é permitido suspirar pela eternidade. (Muitas vezes, quando se encontrava com Madre Emília para comunicar suas disposições interiores, ela repetia alguns versículos da Imitação, que sabia de cor.) Leia os capítulos 48 e 49 do terceiro livro da Imitação de Cristo. Aí você verá como a alma fala a Deus a respeito do que lhe digo. Eu lhe aconselho muito a leitura da Imitação de Cristo. Será para você muito proveitoso ler um capítulo cada dia. Decore alguns salmos. O Permanecer vigilante e fiel no cumprimento do seu dever de estado e na pureza do coração (L 144). À Irmã Thérèse, suplente em Aubin. Villefranche, 10 de dezembro de 1825. Minha muito querida Irmã: Não poupemos nosso esforço para vigiar, não deixemos a sentinela adormecer. A fortaleza merece e o general promete seu fervor à nossa vigilância. Não deponhamos as armas. Permaneçamos firmes, e as forças não nos faltarão. Segundo sua carta, vejo que tudo vai bem. Estou muito contente com a atitude que tomou junto às Irmãs. Seja fiel em conservá-la pela mansidão e pelo espírito de reconhecimento com que receberá sugestões delas. Afaste cuidadosamente os vãos pensamentos: seu espírito e seu trabalho pertencem a seu Esposo. Alegre-se por lhe pertencer, alegre-se ainda pela duração e indissolubilidade dos sagrados laços que a unem a ele. Sou toda sua, minha querida Irmã e, ao mesmo tempo, minha filha muito amada. Irmã Emília. 398 267 47 Associar-se do melhor possível, qualquer que seja a aridez experimentada, às disposições da Virgem Maria na sua Apresentação ao Templo. Crescer na caridade, sobretudo pela receptividade às graças que o sacrifício e a comunhão eucarística proporcionam (L 142, M 71-72). Às Irmãs de Aubin. Villefranche, 18 de novembro de 1825. Minhas muito queridas Irmãs: Depois de amanhã festejaremos nossa boa Mãe. Consideremo-la ao pé do santo altar, dedicando-se a Deus e se consagrando a ele sem reservas. Como essa hóstia era pura, como era agradável ao Deus três vezes santo! Unamos a oferenda de nós mesmas à da divina Pastora. Assim como ela, demos tudo a Deus. Não temos um coração, como o dessa puríssima Virgem, consumindo-se nas chamas do mais puro amor, mas não deixemos de oferecê-lo, por pobre que seja. Deus é todo poderoso, ele o enriquecerá e lhe derreterá o gelo, ele nos encherá com a dedicação que estava no coração de Maria. Amemos, minhas queridas Irmãs, sirvamo-nos de todos os meios capazes de estimular em nós a prática da caridade e sejamos penetradas de gratidão por nos serem concedidos com tanta abundância. Procuremos, sobretudo, participar do santo sacrifício da Missa com particular devoção. Consideremos aí Jesus como sacerdote e como vítima e peçamos ao Espírito Santo que nos dê a compreensão desse grande sacrifício. Deliciemo-nos ainda ao pensar nesse divino alimento com que a infinita bondade de Deus se apraz em nos saciar tantas vezes e façamos a comunhão sacramental ou espiritual com todo o fervor possível. Como não nos tornarmos fervorosas participando assim da santa Missa e recebendo nosso Deus com vivo desejo! Tomemos, pois, hoje, a firme resolução de aproveitar melhor do que fizemos até agora, desse abundante meio de salvação e de estar em condições, pelo nosso que lhe convém no momento é o Salmo 23: “O Senhor é meu Pastor, nada me faltará! Ele me colocou em excelentes pastagens.” Como essas palavras são belas, confiantes! O Senhor, Pastor! O próprio Nosso Senhor, após Davi, repetiu em seu Evangelho: “Eu sou o Bom Pastor. Sou o Pastor que dá a vida por suas ovelhas.” Nada me faltará. Ele me colocou em excelentes pastagens", diz o salmista. Essas palavras caem bem para nós. Estamos bem colocadas em excelentes pastagens. Ah! como é grande nossa felicidade! Poderemos jamais testemunhar a Deus toda a gratidão que lhe devemos pelo benefício da vocação religiosa? A Irmã: Madre, se durante a oração apenas recebêssemos as luzes que Deus nos comunica, perderíamos tempo? Por exemplo, compreenderemos que há um Deus. Tínhamos ouvido falar disso antes, acreditávamos bastante, mas não o tínhamos compreendido tão intimamente. Ficamos pasma, sem nada dizer. De outra vez, descobrimos a vaidade das coisas da terra, quanto elas pouco merecem nossa afeição. Ficamos comovida com o mistério da Redenção, do amor de Deus. Às vezes, nós nos sentimos perto de Deus, sentimo-nos feliz, mas nada fizemos. Temo que a preguiça esteja numa meditação tranqüila. A Madre: Esse estado de clareza é uma graça de Deus. É preciso recebê-la com humildade. Você faz a meditação ficando ali perfeitamente tranqüila, sem nada dizer. É o bom Deus quem age e não você. Quanto mais recebemos, tanto mais somos devedor. Se o bom Deus lhe dá a graça de compreender, ele lhe pedirá conta das graças recebidas e do proveito que delas tirou. Ele lhe pede mais que a qualquer outra. É necessário que uma constante fidelidade à graça, uma humildade profunda sejam o fundamento do edifício de sua perfeição. Humildade, humildade em tudo e sempre. Humildade em seus pensamentos, em suas palavras, em suas ações, em sua maneira de agir. Humildade sempre e em toda a sua conduta. Seja fiel à inspiração da graça, nunca resista às moções do Espírito Santo, as quais levam a suspirar por Deus, a procurar somente a ele, a desprezar a terra, a mortificar a natureza, a 268 manter a carne sempre submissa ao espírito. Se você abusasse das graças preciosas que o bom Deus lhe concede, talvez ele lhe permitisse cair numa cegueira deplorável. Eis por que tema sempre, permaneça na humilhação, estime viver no último lugar, servir suas Irmãs. Recomendo-lhe particularmente evitar a curiosidade em assuntos espirituais. Isso lhe faria um grande mal. Não leia senão os livros que eu lhe indicar. O que mais lhe convém no presente são: Les fondements de la vie spirituelle de Padre Surin, da Companhia de Jesus.50 Não fale a ninguém do que se passa em sua alma. Venha me consultar todas as vezes que quiser. Vá simplesmente ao bom Deus, mas evite toda curiosidade, como acabo de lhe dizer. Seja fiel à graça, mantenha-se sempre pequenina, abaixo de todo mundo. A Irmã: Madre, recebo luzes particulares enquanto dou aula e durante os recreios. Sinto-me constrangida vendo que não posso conter em mim mesma o que experimento e que por isso recebo alguns elogios. A Madre: Qualquer tempo e qualquer lugar são próprios para Deus operar numa alma. Não se admire de encontrar na classe, no recreio e em qualquer outro lugar a luz divina. Isso não é novidade, mas não se apegue a esses favores. O sol não estará sempre no seu apogeu. Quanto ao que lhe podem dizer, não preste atenção. Hoje será louvada, amanhã será censurada. Você teme que isto a faça orgulhosa. Não vê que tais graças não lhe pertencem, que é a bondade de Deus descendo assim até você? Oh! meu Deus, onde encontraremos em nós mesmas um motivo para nos elevarmos, enquanto temos tantos para nos humilharmos? Você não vale mais quando a louvam do que quando a criticam. Quando Deus a favorece do que quando permite que seja atormentada em todos os sentidos. Fale pouco de si mesma. Às vezes cito pequenas coisas que me aconteceram porque agora não temo a vaidade. Sei que o que é bom não é meu, mas de Deus. Eu lhe falo como se tivesse acontecido a uma outra, para sua experiência. Outrora eu me abstinha. Eu a autorizo a falar algumas vezes às postulantes, às noviças, quando elas se sentem provadas por tentações, dificuldades pelas quais você passou, para encorajá-las. 397 46 Diretrizes gerais a uma superiora sobre a maneira de conceder ou recusar dispensas às religiosas (L 140). À Madre Agathe, superiora em Aubin. Villefranche, 2 de novembro de 1825. Minha caríssima Irmã: Quanto às dispensas das quais alguma Irmã precisa, há algumas que eu deixo livres e outras às quais eu digo: "Façam". Não podemos impor normas sobre isso. Depende do caráter, da inclinação e da necessidade maior ou menor das Irmãs a quem aconselhamos. Mas, em geral, quando percebemos que a pessoa a quem são oferecidos alguns cuidados tem - apesar da recusa que ela faz dos mesmos - um secreto desejo de que insistamos com ela e quase a obriguemos a aceitar alguma dispensa, é bom dizer-lhe que a aceite, mesmo se ela tem pouca necessidade. Acrescento ainda: mesmo se a necessidade estiver apenas na imaginação, porque é preciso contentar os espíritos, na medida do possível. Penso que aquelas das quais você me fala têm necessidade desse repouso. Quanto a você, penso a mesma coisa: está se cansando e seu temperamento é delicado. Proceda com simplicidade e não tema permitir-se o que lhe é necessário. Aliás, poderia se fazer servir, por um certo tempo, como as doentes e depois, quando julgar não ser mais necessário, voltar ao seu ritmo normal. Eu a saúdo muito afetuosamente e envio lembranças a todas as nossas queridas Irmãs. Irmã Emília. 396 269 45 Acalmar a agressividade contra si mesma, colocar em tudo mais amor. Evitar as longas conversas, mesmo com as "responsáveis", além do estrito necessário (L 138). À Madre Agathe, superiora em Aubin. Villefranche, 5 de outubro de 1825. J.M.J. Minha caríssima Irmã: Penso que está se censurando demais. Creia-me, mantenha seu espírito e seu coração com suavidade, assim terá mais proveito.1 Ame o bom Mestre, pois amar é o remédio para tudo. Pense pouco, fale pouco e faça tudo do melhor modo possível. Estou muito satisfeita em saber que minha carta coletiva lhes tenha servido. Penso que o excesso de palavras prejudica extremamente. Um assunto que não podia estar naquela carta e, no entanto, é essencial, é evitar falar mesmo sob pretexto de fazer o bem. Por exemplo, você com Irmã N. deve ser o mais sucinta possível. Se se habituassem a conversar do que se refere a casa, seria um nunca terminar e perderiam muito tempo. Aqui, não falamos nada ou quase nada com Irmã N. nem com as Irmãs do Conselho. Esperamos a segunda-feira e ainda a reunião do Conselho é curtíssima. Outrora, tínhamos o costume de falar do que se passava na casa. Parecia-nos que isso era bom, depois reconhecemos o contrário. Assim, aconselho-as a falar muito pouco quando estiveram juntas. Nosso Pai diz que onde há muitas palavras há pouco espírito de Deus. Faz algum tempo, minha grande aplicação é diminuir o número de palavras, quer sobre mim, quer sobre os outros. O que me causa prazer é constatar que Deus iluminou nossas Irmãs sobre isso. Eu ficarei muito grata se você comunicasse minha carta a M., a quem saúdo. Sou toda sua. Irmã Emília. A Irmã: Minha Madre, ontem, durante o recreio, experimentei um desses momentos nos quais não posso encerrar dentro de mim o que sinto. Senti prazer que algumas Irmãs o tivessem percebido. Ao tomar consciência dessa vaidade, humilhei-me, mas isso me desgosta, e logo após penso que, se tivesse tais tentações de orgulho, não ousaria dizê-las. Elas me desagradam muito. A Madre: É suficiente que alguma coisa a humilhe, custe a dizer, para que deva ir contra si mesma. Não é obrigada a me revelar todos os seus pensamentos, mas faz um ato de virtude. Você é mais agradável a Deus falando do que calando.51 Não faça uma montanha por causa de alguns pensamentos de vaidade que lhe passam pelo espírito. Nada representam, porque não consente neles. Aproveite a ocasião para se humilhar e reconhecer que por si mesma é fraca, pequena e incapaz de conservar os dons de Deus. Peça ao bom Deus para ele mesmo conservar os dons que lhe dá. Não reflita sobre isso e não tema o demônio. Não se abstenha de falar de Deus durante o recreio por causa disso, nem de estimular, tanto quanto possível, no coração das jovens professas, o amor pela virtude e pela oração. Converse sempre com elas sobre coisas espirituais. Mesmo se às vezes surgirem alguns pensamentos de vaidade, não se aflija. O demônio poderia se aproveitar dessas tentações para impedir que você, as jovens professas, as noviças, se fizessem o bem, mutuamente, agradando a Deus por meio de conversas aprazíveis. O que há de bom em nós não é nosso, mas de Deus. Somos, entre suas mãos, vis instrumentos e não outra coisa. A Irmã: Madre, ontem à tarde, durante a meditação, aconteceu-me alguma coisa que não ouso realmente lhe dizer: estava em meu lugar, os olhos fechados, meditando sobre a Paixão de Nosso Senhor, quando de repente vi, sem abrir os olhos, mas de modo tão sensível como se estivesse de olhos abertos, Nosso Senhor Jesus Cristo, Ecce homo. Isso durou apenas alguns minutos. Eu o vi num estado deplorável. Não pude continuar minha meditação. Senti-me perturbada, pois 395 270 nunca semelhante coisa me aconteceu. Apresso-me em vir lhe dizer, porque penso que o demônio poderia fazer esse jogo comigo. Quero muito amar o bom Deus, unir-me a ele, mas não quero coisas extraordinárias, tenho medo delas. A Madre: Penso ter sido o demônio que fez isto, porque você ficou perturbada. Ordinariamente, quando Deus se revela a uma alma, quando lhe concede algum favor especial, a alma o reconhece e não tem medo. Fez muito bem em me dizer. Não me esconda nada do que se passa em você, porque, se for enganada, eu a farei reconhecer. Não pense no que se passou. Despreze-o. Não aspire a coisas extraordinárias que Deus concedeu a alguns de seus amigos mais íntimos. Religiosas da Sagrada Família, somos chamadas a levar uma vida simples e comum aos olhos dos homens, mas muito agradável a Deus. Sem êxtases e arrebatamentos podemos chegar a uma elevada santidade e nos manter intimamente unidas a Deus. Esse é o caminho mais seguro, o menos sujeito a ilusões. Aspire a ser sempre a última e a serva de suas Irmãs. Coloque-se sempre no último lugar, goste de ser desconhecida, contada como nada. Suporte com paciência o desprezo em que a deixarem. Não tema a humilhação. Bem suportada, é a marca de uma sólida virtude. Santa Teresa é admirável em seus êxtases e não é imitável. Porém, ela deve ser imitável em uma coisa que mostra a solidez de sua virtude. Um dia, disseram-lhe que se comportava, sem dúvida, como uma mulher que perdera o juízo, após ter sido olhada durante muito tempo como visionária e elevada a estados sublimes, reconhecidos depois como ilusórios. A santa humildemente respondeu: "Têm razão. Temo mais que vocês que seja assim.” Oh! como esta resposta anuncia a humildade! tudo isso daqui para o retiro, ele será para nós um tempo de bênçãos e a época das maiores graças. Queira dizer à Irmã N. que procure acalmar e pacificar sua alma tanto quanto possível, evitando toda preocupação consigo mesma e anime a todas a praticarem uma obediência cega. Como vai nossa sofredora Irmã N.? Ontem tivemos a dor de ver sair Irmã N. Seus pais quiseram levá-la para casa. Reze por ela, sua doença parece agravar-se sempre. Afetuosas lembranças a todas as nossas queridas Irmãs. As daqui lhe dizem o mesmo. Irmã Emília. 44 Lutar contra o amor-próprio, tomando sempre a contrapartida de suas pretensões, com os olhos fixos em Jesus Cristo humilhado (L 137, M 69). A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 22 de setembro de 1825. J.M.J. Minha muito querida Irmã: Você se queixa do seu amor-próprio e tem razão, pois é um cruel inimigo. É preciso, portanto, fazer-lhe uma guerra contínua, não nos poupando em nada, indo generosamente ao encontro do que nos contraria, evitando com cuidado atrair a atenção dos outros, nunca falando de nós mesmas, a não ser obrigadas pela necessidade, não refletindo sobre nosso eu que tanto amamos e que, entretanto, é o maior obstáculo para nos unir a Deus.1 O meio para fazer tudo isso é ter muitas vezes os olhos fixos em nosso bom Salvador humilhado e aniquilado, esforçando-nos para copiar esse divino modelo. É nele e para ele que sou toda sua. Irmã Emília. 394 271 43 Solidariedade nas provações, mas também algumas censuras por julgamentos precipitados expressos numa carta. Exortação a preparar o retiro anual na abnegação e espírito de fé, na recepção dos sacramentos, etc. (L 135, M 63-64). À Madre Agathe, superiora em Aubin. Villefranche, 22 de agosto de 1825. J.M.J. Minha muito querida Irmã: Compreendo todos os seus sofrimentos e deles participo. É preciso abraçar a cruz do nosso bom Mestre. É o verdadeiro meio de encontrar a paz. Parece-me, pela sua carta, que ao falar com os vigários você não estava bastante recolhida e humilde. Se estivesse, não teria feito falsos julgamentos. Essa maneira de pensar é bem temerária e pode lhe trazer um grande prejuízo. Aconselho-a a fazer um exame sobre a falta de mortificação no julgar. É possível que ele lhe dê a conhecer muitas faltas que lhe passaram despercebidas. Tenha confiança em Deus no que se refere ao confessor. Talvez o sacerdote que lhes darão como vigário seja excelente. Quanto ao seu irmão, tive a honra de vê-lo há pouco tempo. Disse-me que era vigário e que tinha levado Rosette com ele. O caçula está também com ele. Não é ainda sacerdote, mas o será em breve. Um e outro me encarregam de lhe assegurar o desejo que têm de ir visitá-la e que o farão logo que lhes seja possível. Todos os seus estão com saúde. Eis-nos, minha cara Irmã, bem próximas do nosso retiro anual. Devemos fazer todo o possível para nos preparar e preparar nossas Irmãs. A renovação bem feita dos votos deve produzir um grande efeito na alma de uma religiosa. Rezemos ao Espírito Santo para que nos ilumine e nos dê a conhecer toda a importância de um retiro. Reanimemo-nos, invoquemos Maria, renovemo-nos quanto ao valor do santo recolhimento, do silêncio, da abnegação de nós mesmas, do espírito de fé, sobretudo ao nos aproximarmos dos sacramentos. Se fizermos 27. Diálogo sobre a presença de Deus (D 36-37; nº 17) Uma religiosa anônima pergunta como poderá manter a lembrança contínua do Senhor. Madre Emília responde que se trata da lembrança de alguém que se ama... Mas, muito particularmente, uma educadora considerará Jesus nas crianças a ela confiadas que teve a idade delas, etc. Seu desinteresse e sua abnegação irão uni-la efetivamente à maneira de agir de Nosso Senhor. A Irmã: Madre, a senhora me tem recomendado muitas vezes de me manter na presença de Deus. É durante todo o dia que quer que eu tenha Jesus presente ou somente durante o tempo da oração? A Madre: Meu desejo é que você aspire a permanecer num estado contínuo de união com Deus, mas sem nenhuma contenção de espírito. Viva docemente sob seu olhar, chamando-o em socorro nas dificuldades que encontrar, agradecendo-lhe em todo tempo e em todo lugar pelos contínuos benefícios que lhe concede. A Irmã: Parece-me ser isto um pouco difícil quando passamos quase o dia inteiro com as crianças. A Madre: Não é tão difícil quanto pensa, quando amamos bastante a Nosso Senhor. A lembrança de uma pessoa a quem muito amamos, acompanha-nos por toda parte. Um amigo dessa pessoa, uma imagem que o lembre, lhe é cara. Se seu coração se volta inteiramente para Deus, para a sagrada humanidade de Jesus Cristo, tudo a relembrará e você a terá presente cem vezes ao dia. As crianças entregues a seus cuidados são o preço do seu sangue, tesouro precioso do qual você é a guardiã. Nelas você deve ver essa santa humanidade em sua juventude. Como suas alunas, Jesus teve dez, doze, quatorze anos. Era cândido, 393 272 simples como suas pequenas, ocultando sua divindade sob uma aparência comum. Não acha que sentimos felicidade vendo Jesus criança em jovens de doze, quatorze, quinze anos? A Irmã: Ainda não considerei Jesus nessas jovens, mas experimento uma felicidade inexplicável, contemplando a inocência e a candura expressas nessas jovens frontes. Isso me dá um grande desejo de amar a Deus, de me tornar pura como elas. Quanto é bela a jovem que ainda possui toda a sua inocência aos quinze, dezessete, dezoito anos! Lastimo quando as vejo deixar o convento para entrar no mundo. Nele se perde tão rápido essa bela flor da inocência! Diga-me o que devo fazer durante o dia para me manter na presença de Deus. É com afinco que quero trabalhar para me tornar uma fervorosa religiosa. A Madre: Aja no espírito de Nosso Senhor, em união com ele. Assim, você rezará. Una-se a Jesus em oração, procure fazê-lo com o fervor que animava o divino Salvador quando estava na terra. Se estiver dando aula, una-se a Jesus instruindo seus apóstolos e o povo. Em relação a suas almas, conduza-se como o fazia esse divino Salvador. Seja doce, boa, paciente, procure como ele a glória de Deus, a salvação das almas. Tomando as refeições, faça-o com pureza de intenção. Da maneira como tomamos as refeições depende em grande parte o recolhimento do dia. A sensualidade no beber e no comer leva à dissipação, aos desabafos naturais, ao passo que a mortificação, a modéstia nessas duas ações conservam o recolhimento, a compunção. Que suas conversas no recreio sejam santas, animadas pelo espírito de Deus. A boca fala da abundância do coração. Se você ama a Deus, as coisas de Deus, sentirá prazer em falar dele, de tudo quanto se refere à sua glória. Você sofre, tem qualquer desgosto: una-se a Jesus sofrendo e agonizando no Jardim das Oliveiras. Convido-a a ir todas as noites, a exemplo de Santa Teresa, adormecer junto a Nosso Senhor suando sangue e água em sua agonia. mais intimamente a ele. É o que lhe peço de todo coração e sou, com muita afeição, sua Madre muito dedicada. 42 Insistência sobre a temperança adquirida, se necessário, às custas de uma mortificação discreta, porém generosa (L 131). À Madre Agathe, superiora em Aubin. Villefranche, 14 de julho de 1825. Peço-lhe recomendar às Irmãs a prática da temperança. Que não dêem ouvidos às falsas razões da natureza que dela pretendem desviá-las. Diga-lhes que lhes peço não irem mais devagar em seus bons propósitos, mas seguirem fielmente as inspirações da graça, para vencerem a natureza que tem muita força e se revolta sem cessar. Esse combate é difícil e penoso. Só alcançamos a vitória, fazendo-nos muita violência. Mas, se tivermos a coragem de empreendê-lo e de prosseguir nele generosamente, experimentaremos depois os deliciosos frutos da vitória. Encorajo as Irmãs que costumam merendar a fazê-lo sobriamente e, por conseguinte, a não satisfazerem o apetite. Peço-lhes prestar atenção, pois se não tendermos a uma verdadeira mortificação e nos relaxar nesse ponto, nossa alma se tornará fraca e teremos pouquíssima luz para fazer nosso retiro e nenhuma força interior para aproveitar os conselhos que nos serão dados e as inspirações da graça. Irmã Emília. 392 273 Diga-lhe, em meu nome, de não a poupar. Ela pode puni-la mandando reconhecer sua culpa, pedir perdão às pessoas ofendidas ou beijar-lhes os pés, etc., ocupando-a em trabalhos manuais, como lavar a louça, varrer, limpar os sanitários, etc. Ela poderá ainda privá-la da santa comunhão, quando você se entregar às inquietações e não submeter suas idéias às dela. A comunhão freqüente não pode combinar com a falta de fidelidade. Goste você ou não, é preciso cumprir seu dever. Aliás, creio que a luz e a paz lhe serão dadas quando tiver feito esforços para adquirir as virtudes, sobretudo a que lhe fará submeter sua razão para obedecer cegamente. Desejo que me escreva muitas vezes e me diga, com confiança infantil, suas faltas e também suas vitórias. Irmã Emília. 41 Por sua compaixão para com alguém que sofre, Madre Emília estimula docemente a buscar motivos sobrenaturais de serenidade pacificadora (L 129). A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 31 de maio de 1825. Minha caríssima Irmã: Compartilho profundamente seus sofrimentos e gostaria de poder amenizá-los, mas o que deve tornar seu estado menos penoso é que, por ele, chegará a adquirir um grau de semelhança com Nosso Senhor Jesus Cristo e merecerá um dia participar de seu Reino. Não somos bem felizes, minha caríssima Irmã, em poder conquistar o céu a esse preço? Alegre-se, pois, em vez de se deixar dominar pela tristeza, e faça com que sua tibieza seja apenas uma provação da qual não tenha dado lugar por suas infidelidades.1 Redobre o seu fervor e pertença inteiramente a esse bom Mestre que tanto a ama, e que só permite os sofrimentos que está experimentando para uni-la 28. Como orientar sempre nossa vida para Deus (B II 551-572) Aqui e nas várias subseções seguintes, daremos um resumo da obra do cônego E. Barthe: L'Esprit de la Révérende Mère Emilie (Paris, 1863). Com grande liberdade, o autor justapõe passagens de conferências, conversas individuais, depoimentos, etc., referindo-se a um tema determinado. Certamente, ele sentia a mais sincera admiração por Santa Emília e desejava, pelo que dependesse dele, servir a seu Instituto e prolongar sua influência. Para isso, dispunha de bons documentos e podia interrogar religiosas que viveram muitos anos junto à fundadora. Entretanto, certamente “poliu” mais de uma vez o estilo de suas fontes, sem para tanto alterá-las, como diz claramente em seu curto prefácio.52 Como de costume, as orientações seguintes são ao mesmo tempo afetivas e de tendência ascética bastante rigorosa: trata-se de criar condições possíveis para uma comunicação respeitosa e familiar com o Senhor. Porém, somente ele determinará as modalidades do dom dele mesmo no íntimo dos corações. Como lhe acontece muitas vezes M. Barthe introduz por algumas linhas de sua criação as citações de Madre Emília. A bússola permanece invariavelmente voltada para o pólo. Da mesma forma, a atividade de nossa vida deveria permanecer, sem cessar, voltada para Deus, de quem tudo nos vem e tudo esperamos. Por ele e para ele só nós existimos. Para Deus, que é como o pólo adorável onde nossos pensamentos, nossos afetos, nossas palavras, todos os nossos atos deveriam constantemente se orientar, em meio a tudo que poderia parecer próprio a nos afastar dele. A bússola não conserva toda a energia de sua orientação, mesmo sob a ação de uma força contrária? Oh! se compreendêssemos bem esta verdade! Madre Emília tinha recebido em alto grau a inteligência dessa verdade e procurava comunicá-la ao coração de suas filhas: “Saibam, minhas Irmãs, que nenhum de nossos atos, por pequeno que seja, é indiferente aos olhos de Deus. A ele pertencem, e Deus não pode abrir mão de nenhum de seus direitos em prejuízo de sua glória. Nada, pois, é nem pode ser 274 indiferente. No momento em que alguma coisa não lhe é pelo menos indiretamente oferecida, ela não responde à palavra de São Paulo: “Quer comam, quer bebam, façam tudo para a glória de Deus.”53 Mas se todo cristão deve agir para a glória de Deus, mesmo em coisas tão simples como o beber e o comer, quanto mais uma religiosa deve agir por Deus, deve viver em todas as coisas por Deus e nada considerar como indiferente nos menores detalhes de sua conduta! Façamo-lo, pois, com um zelo incessante, lembrando-nos de que, quanto mais tivermos orientado nossa vida para Deus, trabalhado, vivido por Deus nas coisas aparentemente mais indiferentes, tanto mais teremos adquirido méritos preciosos para o céu.” Ela não se contentava em mostrar o dever. Ajudava a cumpri-lo, indicando como meio feliz a união com o divino Jesus nas diversas ações de sua vida mortal: “É suave unir nosso coração ao do nosso bom Mestre, unir nossa vida à sua, e essa prática é bem própria a nos fazer cumprir com perfeição o grande dever de nos orientar para Deus em tudo. O divino Salvador quis, por nosso amor, comer, beber, dormir, levantarse, trabalhar com suas mãos, conversar, rezar, ensinar, tornarse, por assim dizer, o Mestre de seus apóstolos, praticar a pobreza, a obediência, suportar os sofrimentos morais, os sofrimentos corporais e a própria morte. Que encorajamento e que modelo para nós! Sigamo-lo, pois, passo a passo, e fiquemos intimamente unidas a ele. Vocês estão rezando, por exemplo, unam-se a Jesus que reza e ofereçam por vocês mesmas, ao Pai celeste, seu recolhimento e seu fervor. Estão dando aula, unam-se a Jesus instruindo o povo e mais particularmente seus apóstolos. Ofereçam ao Pai celeste seu zelo, sua paciência, sua caridade, sua doçura, a perfeição sublime de suas intenções e procurem conduzir-se com suas alunas assim como ele o fazia com seus discípulos. Vocês estão à mesa, unam-se às refeições que ele quis tomar em Nazaré, com a Santíssima Virgem e São José, ou mesmo em outros lugares, imitando sua modéstia, sua moderação no comer e no beber e oferecendo ao Pai celeste a 391 O que você me diz muito me satisfaz. Tenho confiança de que este retiro terá sido para você, realmente, o feliz momento das misericórdias do Senhor. Viva de abandono e de paz e, acrescento, de humildade. Aquele que começou em você uma boa obra vai continuá-la e aperfeiçoá-la para sua maior glória. Mesmo que você recaia algumas vezes em suas antigas faltas, não desanime, mas procure reerguer-se com um novo desejo de ser inteiramente de Deus. Aceite a repreensão, peça a M. e mesmo a N. que o façam. Quanto a esta última, penso que ela não faz bem dizendo que deve voltar para cá. Não pensemos no futuro (digo o mesmo a você; esteja certa de que não a esquecerei e, se tiver oportunidade para sua volta, farei o possível). Esse futuro não nos pertence, talvez tenhamos apenas o dia de hoje. Faça o mesmo por N. Entregue isso à divina Providência que conduz e rege tudo. O maior de todos os negócios e, por assim dizer, o único, é amar. Seja essa nossa incessante ocupação. Desejo-lhe esse bem como para mim mesma e sou toda sua. Irmã Emília. 40 Madre Emília compartilha das dificuldades de uma religiosa que não se habitua em Aubin, mas lembra-lhe com firmeza vários meios ascéticos a usar diante de certas repugnâncias superáveis (L 127). A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 17 de maio de 1825. Compartilho suas dificuldades e meu coração se ressente vivamente delas. Falei sobre isso ao nosso Pai que quer fazê-la voltar, se as coisas não mudarem. Será que vai nos forçar a isso? Não fará o possível para pôr ordem em sua alma e curála? Parece-nos que os melhores remédios são prestar contas de seu interior à Madre, pelo menos duas vezes na semana, e isso simplesmente, sem rodeios, dizendo-lhe sobretudo suas impaciências, tanto interiores como exteriores, aceitando com docilidade as penitências que ela lhe der. 390 275 adorável pureza de intenção com a qual elevava maravilhosamente bem a baixeza natural daquela ação. 38 Esclarecimento sobre a carta precedente: Madre Emília nunca teve a intenção de "lisonjear" sua correspondente, mas recomenda-lhe, hoje, raciocinar menos e agir mais (L 122). A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 13 de abril de 1825. Não falo de N. N. Você recebeu ultimamente uma carta do Senhor N. Vamos à sua carta. Afirmo que se enganou ao pensar que queria lisonjeá-la. Isso nunca me veio à mente. Aliás, tal coisa não é do meu feitio. Fique certa de que eu vou sempre muito reta e digo-lhe ainda que espero boas notícias de sua vida interior. Dê-me essa consolação, dê-me a alegria de pensar que você quer, de qualquer modo, ser o que deve ser. Portanto, creia, é preciso não pensar, não raciocinar, mas agir. A fidelidade à prática desse conselho lhe trará esta abertura, esta unção interior que você se queixa de não possuir. Sou toda sua. Irmã Emília. 39 A verdadeira humildade produz a vida no abandono e na paz. Assim não seremos vítimas do desânimo, aceitaremos ser repreendidas pelos outros, não nos inquietaremos com o futuro (L 125). A uma Irmã de Aubin. Estão no recreio. Jesus conversou com a sua Santíssima Mãe, com seu pai adotivo, com seus discípulos; mas ele o fez com uma perfeição encantadora para os próprios anjos que disso eram testemunhas. Unam-se à suavidade, ao encanto divino de sua palavra, à sua seriedade que excluía tudo o que podia parecer brincadeira ou tristeza, e que irradiava em torno dele o bom odor de todas as virtudes, e ofereçam ao Pai celeste o mérito perfeito dessa divina conversação. Se 'a boca fala da abundância do coração',54 o que devia sair do coração adorável de Jesus conversando com os homens, senão o pensamento de Deus, o zelo por Deus, o amor de Deus, a vida por Deus, por Deus só? Ah! se nosso coração se parecesse um pouco com o Coração de Jesus, o que sairia de nossa boca durante nossos recreios? E quanto esse exercício de nosso dia religioso se tornaria santificador para os outros e para nós mesmas! Vocês têm sofrimentos (quem não os tem sobre a terra e não seria lastimável para nós se nunca os tivéssemos?). Têm sofrimentos morais, fadigas, dores no corpo a suportar, unam-se a Jesus que tanto sofreu de toda maneira, que quis, de certo modo, esgotar o cálice do sofrimento humano, e que fez tudo isso com uma paciência tão admirável, uma tão prodigiosa dedicação, um amor tão grande. Unam-se particularmente a Jesus no Jardim das Oliveiras e nessa união encontrarão a seiva divina que deve fazer produzir para todos os seus sofrimentos frutos abundantes para o céu. Sobretudo, se tiverem insônias penosas, que Jesus, vigiando e orando sob o peso de uma tristeza mortal, seja seu recurso e sua consolação: Santa Teresa ia todas as noites tomar seu repouso junto a seu bom Jesus agonizante e suando sangue no Jardim do Getsêmani. Villefranche, 11 de maio de 1825. Minha caríssima Irmã: Tenham cuidado todo particular em santificar seu levantar, orientando, logo ao despertar, seu coração para o do seu bem- 276 389 amado Salvador, unindo-se às suas disposições admiráveis de zelo, dedicação e amor para com seu Pai celeste. E à noite, que seu sono se transforme numa prece por sua união a seu sono que nunca interrompeu a oração incessante de sua adorável humanidade.”55 Durante uma conversa particular com uma de suas filhas, a Reverenda Madre insistia sobre a pureza de intenção com a qual era preciso recrear e sobre a maneira de bem santificar esse exercício prescrito pela Regra. Tendo-lhe dito a Irmã que, na maioria das vezes, se encontrava com companheiras que falavam do bom Deus, da perfeição e que gostava, sobretudo, de se entreter com a Irmã encarregada da horta, acrescentara: “Essa Irmã fala admiravelmente da vida de Nosso Senhor Jesus Cristo. Quando fico com ela, a hora do recreio parece durar apenas um momento.” – “Oh! como esta Irmã ama o bom Deus," – respondia Madre Emília! Fala pouco, mas, quando abre a boca, vemos que sua memória é dona de um grande tesouro. Que são todos os seus conhecimentos comparados com os daquela boa Irmã?... Não me admiro de que seja mais instruída do que muitas outras sobre a história de Nosso Senhor e sobre a vida interior. Podemos aplicar-lhe as palavras do divino Mestre: “ Eu te louvo, ó Pai, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos prudentes e as revelaste aos humildes.”56 “Deus se inclina para a alma que é humilde”,57 ele mesmo a ensina, a esclarece a respeito de muitas coisas que os homens em vão se esforçariam por lhe transmitir. Nossa Irmã encarregada da horta é uma daquelas almas simples que vão direto para Deus. Esteja com ela durante os recreios, sua conversa fará bem à sua alma. "Ah! minha Irmã, um recreio assim temperado, ao mesmo tempo em que repousa o corpo, torna-se um santo exercício. Algumas vezes pode ser até mais proveitoso que uma conferência ou meditação. Por isso desejo muito que tal seja o feliz condimento de nossos recreios: o amor de Deus, o espetáculo da bela natureza, a vida de nosso Salvador, os 37 A corajosa confiança no Senhor a fará vencer as contradições que surgem no dia a dia. Colocar muita simplicidade ao prestar contas de sua alma, mesmo que não veja nisso utilidade (L 120). A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 29 de março de 1825. Minha caríssima Irmã: Apesar de todos os seus defeitos, fraquezas e inquietações, com confiança em Deus e coragem, fique certa da vitória sobre si mesma e, com o passar do tempo, chegará a uma vitória total. O maior de todos os meios é uma inteira obediência totalmente simples. Se lhe peço detalhes freqüentes de sua conduta, não é para dar uma lição de moral, nem para dar opinião no tocante a isso. Deixo esse cuidado à Madre Agathe. Faço-o para o bem de sua alma. E não se pergunte a si mesma: Por que nossa Madre quer que eu lhe diga tudo? Contente-se em me dizer e nada pensar.1 Não peço que suas cartas sejam bem organizadas, pouco me importa que sejam rasuradas, mal escritas, com um estilo descuidado. Que elas sejam apenas simples, como costuma fazê-las. Eis tudo que desejo. Na sua primeira carta que me chegar, talvez antes que esta seja enviada, espero alguma vitória. Sou toda sua. Irmã Emília. P.S. Ao receber cada uma de suas cartas, prometo fazer uma visita a mais à divina Pastora, mas não me contentarei apenas com isso, minha muito querida Irmã N. Por bondade, diga à Irmã M. que não lhe escrevo esta tarde. Que ela escreva ao nosso Pai sobre o assunto que tratou comigo. Ela agirá segundo o parecer dele. Desejo a todas um santo e alegre aleluia. 388 277 Ano de 1825 36 Novo elogio das virtudes "passivas", à luz do mistério de Natal; insistente exortação a não se entregar a um remorso desgastante (L 116). A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 23 de janeiro de 1825. Minha caríssima Irmã: Estou bem feliz em poder atender ao seu pedido. Você deseja, sem dúvida, praticar as duas virtudes favoritas do amabilíssimo Jesus, quero dizer: a doçura e a humildade. Ah! minha cara Irmã, é ao pé do pobre berço que aprenderá essas sublimes lições. Suplico-lhe, em nome do nosso Esposo comum, não me esquecer junto a ele. Envio-lhe a fórmula do terço que me pediu. Se as virtudes que pede por esse terço nos são dadas de presente pela Sagrada Família, somos verdadeiramente felizes e podemos, sem medo, nos considerar suas filhas. Parece-me que você se aflige e se alarma demais. Acrediteme, coloque a confiança em Deus e na lembrança de seus benefícios no lugar de todos os seus pensamentos. Caminhe tranqüilamente pelas sendas da Sagrada Família e não tema coisa alguma. Quando perceber o amor-próprio em seu coração, afaste-o e fique tranqüila. Com muito prazer, envio a imagem da Virgem que me pede. Desejo que ela a contemple com seus olhos maternos e a faça entrar no coração de seu divino Filho. Irmã Emília. socorros e as consolações que ele nos deixou na Santa Igreja, os meios para avançarmos no caminho da perfeição. Não oferecem eles um assunto inesgotável para piedosas conversas? Sem dúvida, de modo algum me oponho a que nos distraiamos com os jogos permitidos pela Regra, porém, devemos evitar o apego. Eles devem ser oferecidos a Deus. Devemos jogar sob seu olhar paterno e reservar-nos momentos para falar dele, de assuntos edificantes. Lembrem-se de que uma alma que está cheia de Deus, que está fortemente preocupada com a sua salvação, com sua perfeição, quase não pode falar de outras coisas. Todo o resto pouco lhe interessa. Por sua conversa, conhecemos de que espírito é animada uma religiosa.”58 Em outra ocasião, uma Irmã vinha se queixar de não ter a paz da alma. A Reverenda Madre aproveitou a ocasião para lhe mostrar a importância de orientar-se sempre para Deus com todo o coração, de não agir para com ele com uma ingrata reserva: “Você se admira de não ter a paz da alma, minha cara Irmã. Como poderia tê-la se não fizer tudo que Deus lhe pede? Não digo que cometa um pecado não seguindo todos os conselhos que lhe dou, mas, com certeza, não está isenta de imperfeição, nem de ingratidão para com a bondade divina. Por isso mesmo ela não a deixa tranqüila: você sofre e continuará a sofrer enquanto não estiver correspondendo à graça que a chama, até que tenha tomado a determinação de orientar toda a sua vida para Deus. Não me diga que lhe proponho um caminho perfeito demais: é Deus que lhe propõe. Por que entrou na vida religiosa? Por que é religiosa da Sagrada Família? E o que é que lhe peço que não seja conforme ao espírito de nossa Santa Regra, de nosso querido Instituto?... Você ousaria dizer que lhe peço demais? Santa Teresa, por exemplo, tinha todo o direito de querer para suas filhas a perfeição que Deus pede das carmelitas. E eu não posso, não devo querer para nossas Irmãs a perfeição que Deus espera delas? Pois bem, é tudo que quero, nem mais nem menos. Só quero a perfeição que nos foi indicada por nosso Venerável Fundador, mas quero-a e em você, de modo particular, a quem o Senhor concedeu tantas graças e que parece ter medo de que seu reino se estenda 278 387 demais na sua alma: eu a quero para glória de Deus e para sua felicidade.”59 A orientação contínua da vida para Deus, para a perfeição que ele pede da alma religiosa exige esforços que devemos encorajar e manter. Madre Emília ensinava que o melhor meio é a fidelidade em se punir pelas menores faltas, à medida que são cometidas: “Cair é um mal, mas seria pior não reconhecer a culpa, não se levantar.” O importante mesmo é tirar o bem do mal, como sempre faz a Providência e utilizar uma falta cometida para fazer atos de virtude mais numerosos e mais fervorosos. Que faz um bom soldado quando, na batalha, recebe uma ferida? Permanece no chão? Não, ele se levanta imediatamente, se puder, e reage combatendo com mais ardor. É assim que devemos fazer no combate espiritual: quando por infelicidade falhamos, precisamos nos levantar imediatamente, voltar ao nosso dever com um novo ardor e reagir infligindo uma penitência à nossa natureza má. Porém, é necessário acompanhar essa penitência com um sincero pesar, uma oração ardorosa, cheia de confiança e de amor. Eis um precioso meio de atrair sobre nós os olhares misericordiosos do Senhor e a graça de nos corrigir, de nos unir a ele mais intimamente. “Se é útil nos impormos uma penitência após cada falta cometida, é igualmente útil que haja proporção entre a penitência e a falta. A uma falta pública que prejudicou nossas Irmãs, deve corresponder uma penitência pública. Para uma falta oculta da qual só Deus foi testemunha, a penitência deve ser feita em segredo. E depois devemos tentar reparar o mal impondo-nos atos contrários: se faltarmos ao silêncio, impornos durante o recreio calar algumas coisas das quais seria permitido falar e, no resto do dia, aplicar-nos em guardar a santa regra do silêncio com toda a perfeição possível. Para um ato de vã curiosidade, punirmo-nos privando-nos de olhar, uma ou duas vezes, coisas indiferentes. Se dissemos a uma Irmã palavras pouco caridosas, pedimos-lhe desculpas, pedimos-lhe humildemente perdão e o auxílio de suas preces. Caso tenhamos dito alguma coisa sob o impulso do amor-próprio, 35 É contemplando no presépio o Senhor feito criança que devemos adquirir as virtudes humildes e amáveis (L 114). A uma Irmã de Aubin. 28 de dezembro de 1824. J.M.J. Suas cartas, minha caríssima Irmã, me causam um duplo prazer: primeiro, porque recebo notícias de minha tão querida filha; segundo, porque sei que ela é dócil e quer sê-lo para sempre. Esse pensamento é bem consolador para uma mãe. Permaneça sempre nessa boa disposição, faça-a crescer nestes dias preciosos em que honramos um Deus menino, e que, por nosso amor, se tornou tão pequenino. É ao pé do presépio que devemos nos tornar mansas, humildes, simples e obedientes. Agradeço-lhe por ter rezado por mim e, para testemunhar meu reconhecimento, quero ir imediatamente ao presépio que nossa Irmã M. armou e lá pedirei ao bom Jesus para fazer minha caríssima Irmã N. toda sua, e não há dúvida de que serei atendida, contanto que ponha em prática as boas disposições de que me fala em sua carta. Felicito-a por estar ensinando. É uma boa atividade. Adeus, minha caríssima, deixo-a porque tenho várias cartas a escrever. Todas as nossas Irmãs enviam afetuosas lembranças. Irmã Emília 386 279 34 Confiança em Deus, entregando-se à ação de sua misericórdia. Simplicidade, docilidade respeitosa para com a superiora local (L 109). A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 26 de novembro de 1824. Minha muito querida Irmã: O melhor remédio, como o sabe muito bem, o melhor de todos, é abandonar-se inteiramente e sem reservas nos braços e no coração do mais terno dos Pais e humilhar-se profundamente sob a ação de sua mão misericordiosa. A confiança infantil para com a Madre será para você uma grande ajuda. Ao lhe prestar contas de sua alma, evite usar expressões vivas e fortes, ser prolixa e insistir sobre seus males interiores. Também não deseje que ela lhe diga muitas coisas. Se você for simples como uma criança, algumas palavras devem lhe bastar. Tenha para com essa querida Madre o mais profundo respeito. Lembre-se de que ela é o seu Jesus Cristo na terra. Deus medirá suas graças pela obediência, pela confiança e pela simplicidade que tiver para com ela. Evite sobretudo replicar quando lhe disser alguma coisa. Lembre-se do que disse Nosso Senhor, falando sobre os superiores: "Quem os ouve a mim ouve, e quem os despreza a mim despreza.”1 Todas as vezes que sua atitude, seus gestos, suas palavras não forem marcados pelo respeito para com ela, peça perdão a Deus e deteste sinceramente essa falta. Não acredito que você busque satisfação na confissão, mas penso que não está penetrada de uma grande fé, pois uma pessoa que tem essa fé não olha o ministro mas Deus, cujo lugar ele ocupa. Se você o considerar assim, creio que terá muito mais paz na santa confissão. Desejo-lhe essa paz e sou toda sua. Irmã Emília beijamos o chão com um sentimento de desprezo por nós mesmas e fazemos um ato de amor de Deus: e assim, para as outras faltas. Para adquirirmos a pureza do coração, para nos conservarmos em fervorosas disposições, para progredirmos na correção dos defeitos e na santa união da alma com Deus, o meio por excelência é o cuidado assíduo em nada nos perdoar e sempre trabalhar para agir melhor, sem nunca escutar, nem por um instante, a natureza que se cansa, o amor-próprio que se irrita, o demônio que se esforça para nos desencorajar.”60 Seguem as orientações que reproduzem quase literalmente um Diálogo precedente61 e vários trechos de cartas relacionadas com a caridade fraterna. Como trataremos em breve desse tema e como publicamos na terceira secção uma ou outra dessas cartas, passamos imediatamente aos últimos parágrafos desse capítulo, no tocante à visão da autoridade divina na autoridade exercida pelos superiores religiosos. Aos olhos da Reverenda Madre, Deus, princípio de toda caridade, Deus em cujo amor todos os corações deveriam permanecer estreitamente unidos entre si, era o foco adorável em que uma comunidade devia haurir a união ainda mais estreita dos membros com o chefe. Era, portanto, Deus que se devia ver sempre na pessoa e no governo de uma superiora. Nesse elevado ponto de vista, ela queria que a união sobrenatural das Irmãs fosse como cimentada pelo laço santamente filial que as devia unir àquela que a Providência lhes tinha dado como Mãe. E a fim de que a força desse laço não sofresse alteração, ela desejava que a superiora fosse sempre considerada não de uma maneira humana mas como a imagem viva da autoridade divina, cujo brilho deve fazer desaparecer, aos olhos das súditas, os defeitos inseparáveis de nossa natureza mortal. Falando um dia das religiosas tentadas de não terem para com as superioras a perfeita submissão, a afeição respeitosa que nascem da verdadeira caridade: “Que devemos buscar sobre a terra? Fazer a muito santa, muito justa e sempre muito amável vontade de Deus. Que essa vontade nos seja manifestada por tal ou tal pessoa, se tivermos um pouco de 280 fé e de amor, o que isso pode nos fazer? Contanto que a conheçamos, isso deve nos bastar. Fazem muito mal, muito mais do que pensam, as religiosas que sucumbem às tentações contra a autoridade, sobretudo se deixam transparecer alguma coisa. A pessoa das superioras deve ser sagrada. Só devemos falar delas para dizer o bem, nunca para censurá-las, para criticar a sua conduta. Nunca devemos dizer algo que possa diminuir a confiança que as súditas têm para com elas. Basta, às vezes, meia palavra, um ar, um gesto, para diminuir essa confiança, para fazer com que religiosas que se dirigiam a elas simplesmente, que só viam a Deus numa superiora, agora comecem a examinar o que significava tal palavra, ar, frase. São feitas reflexões a respeito do que foi visto ou ouvido. Por sua vez, somos tentadas a julgar a conduta da Madre; a fazer comentários sobre seus atos; a murmurar em vez de obedecer simplesmente. Esse mal, essa desordem, donde vêm? Da primeira que faltou a seu dever para com a superiora. E ninguém pode dizer até aonde vai a sua responsabilidade diante de Deus. A força de um Instituto está na união dos membros entre si e de todos os membros com o chefe. Ora, essa união não existe quando não há a confiança e o amor dos súditos para com os superiores. Infeliz, pois, a alma que perturba a harmonia perfeita, tão desejável, tão necessária, num corpo religioso!... A Trapa nos oferece um belo modelo desse amor, dessa confiança que deveriam existir no coração de todos os súditos para com seus superiores. Cada trapista só tem um amigo, um confidente de seus sofrimentos, é seu superior. Todos se aplicam em seguir suas orientações, em lhe obedecer como crianças. Oh! que felicidade se, em nosso Instituto, pudéssemos conservar sempre, pelo menos, alguns traços de um tão belo modelo! Que felicidade se trabalhássemos incessantemente para merecer essa graça, esforçando-nos por encontrar no amor de Deus o princípio e o alimento da união inalterável de todos os nossos corações!.”62 385 melhor. Estou muito satisfeita em saber que Irmã N. está melhor e mais cumpridora dos seus deveres. Exorto-a a se corrigir totalmente. Enviei-lhe a carta que a irmã dela escreveu, para que ela tenha o prazer de lê-la, e a que é dirigida à mestra das noviças para você, por ser no momento a mestra dela. Tarda-me receber notícias da saúde da senhorita N. Estará ainda tomando remédios? Todas as vezes que eu lhe causar alguma mágoa em minhas cartas, diga-me com simplicidade. Ficarei grata e tudo será logo sanado. Penso que isso acontece muitas vezes, por exemplo: quando não lhe enviei os casacos de lã. Em vez de explicar o porquê, disse-lhe que a roupeira não tinha mais. Escreva-me o que pensou disso e de outras coisas. Assim, o demônio, que só procura semear a discórdia, perderá sua força e em vão rondará em torno de nós. As notícias que me dá de suas disposições interiores são boas. Será na prática de suas boas resoluções que encontrará a paz de sua alma e um meio de bem conduzir os outros. Procure sobretudo tornar sua vontade bem dócil, quando sentir alguma repugnância em fazer algo de tal ou tal maneira. Humilhe-se, por exemplo, a respeito do tecido do paramento que lhe devia ser enviado. Fez bem, mas fará ainda melhor, quando não tiver apego a isto ou àquilo. Diga muitas vezes a si mesma e inspire também fortemente às suas filhas que a casa de Aubin deve ser para com esta (a de Villefranche) como uma filha para com sua mãe, de modo que, se lhe dão ou se lhe tiram algo, ela deve estar sempre satisfeita. Se agora dissesse: "Envie-nos o paramento branco e mais isso e mais aquilo", então, minha querida Madre, seria preciso ficar contente por qualquer coisa que eu lhe pedisse. Aplique-se a observar esse conselho. Deus ficará contente e você também. Quando escrever ao nosso Pai, será bom perguntar-lhe se permite que você espere M. N. vir a B., para pedir-lhe confessar C. Pode dizer-lhe que essa Irmã se contenta com M.L. Saúdo-a muito afetuosamente. Irmã Emília. 384 281 32 29. Comentário sobre as ladainhas de Nossa Senhora Ainda uma espécie de confissão sobre dois pontos mal observados, uma vez por ocasião da fundação de Aubin: grande silêncio à tarde; pontualidade a um exercício comunitário (L 103, M 66-67). Às Irmãs de Aubin. Villefranche, 7 de setembro de 1824. Fiz duas coisas em Aubin que me causam tristeza: primeiro, por mim mesma, porque errei, e segundo, por causa do exemplo. Um dia falei, em Santa Marta,1 em voz alta, depois das quatro horas. Lá, como em qualquer outro lugar, só devemos falar naquela hora em caso de extrema necessidade, e não era o caso. Peço àquelas que aí se encontravam não utilizarem meu erro para cometerem um semelhante. Outro dia, atrasei-me um pouco e cheguei a um exercício que já tinha começado. Isso me pesa, sobretudo porque a falta de pontualidade é um dos maiores defeitos que possam existir em uma comunidade. Pode ter-me acontecido outras vezes de não ter chegado a tempo, mas porque não ouvi o sino. Peço-lhes que roguem ao bom Deus por mim, a fim de que ele me perdoe em todas as ocasiões em que não lhes ensinei por meus atos o que lhes ensino por minhas palavras. 33 Tendo, com muita simplicidade, pedido perdão da mágoa que poderia ter causado numa carta anterior, Madre Emília recomenda a docilidade submissa da vontade, à base de desapego (L 106). À Madre Agathe, superiora em Aubin. Villefranche, 3 de outubro de 1824. Minha caríssima Irmã: Parece-me que não respondi inteiramente às suas penúltimas cartas. Tenho-as ao meu lado, a fim de responder (B I 377-383) Extremamente simples e despojada, esta paráfrase oferece a oportunidade de fazer conhecer Santa Emília sob um aspecto muito espontâneo e vivo. Deveria ser citada, igualmente, como um testemunho da importância tanto na sua vida pessoal como no seu “ensinamento” espiritual, da piedade marial. Várias vezes, Madre Emília explicou às Irmãs as ladainhas da Santíssima Virgem, comentando com uma expressão comovedora cada um dos versículos que as compõem. Dizia que era preciso recitar com o coração o que os lábios pronunciavam e sugeria os piedosos sentimentos, o entusiasmo que deviam acompanhar as palavras: “Os lábios dizem: Santa Maria; e o coração diz: Ó soberana! ó astro radioso! ó Rainha do mar! Nome tão suave e tão poderoso, seja para sempre escrito no meu coração, ao lado do nome adorável de Jesus! – Os lábios dizem: Santa Mãe de Deus; e o coração diz ao mesmo tempo: a Senhora é, também, minha mãe e para sempre o será! – Os lábios dizem: Santa Virgem das Virgens; e o coração: Virgem por excelência, ó modelo, ó protetora, ó terna e dedicada mãe de todas as virgens, faça-me santamente ciosa do belo título de sua filha e sempre digna de usá-lo! – Mãe de Cristo! A senhora que nos deu o desejado das nações, faça com que deseje ardentemente o progresso de seu reino em minha alma! – Mãe da divina graça! Ah! A senhora me concedeu tantas graças que, por sua intercessão, espero não me perder! – Mãe puríssima! Faça com que eu trabalhe sem cessar para tornar minha alma cada dia mais pura aos olhos do Senhor! – Mãe castíssima! Possa eu sêlo sempre, sempre, seguindo seu exemplo! – Mãe sempre virgem! Oh! que nunca tenha a infelicidade de manchar a beleza sobrenatural de minha alma regenerada pela graça! – Mãe ilibada! Purifique minha alma de toda mancha, a fim de que seja um pouco menos indigna de Jesus e de vós! – Mãe 282 amável! Tudo na Senhora é encanto para o meu coração! – Mãe admirável! Oh, que sempre goste de contemplar suas virtudes, suas encantadoras perfeições! – Mãe do Criador! Que honra para mim, tão pobre criatura, poder me chamar sua filha! – Mãe do Salvador! Pela Senhora, o filho de Deus se fez meu Jesus, tornando-se seu filho! – Virgem prudentíssima! Oh! que em tudo e de todas as maneiras, eu também seja prudente para agradar a Jesus e a Senhora. – Virgem Venerável! A Senhora é e sempre será o que há de maior no mundo, depois de Deus! – Virgem digna de todo louvor! Que eu possa louvá-la e vos bendizê-la eternamente! – Virgem poderosa! Sim, a Senhora é toda poderosa pela oração! – Virgem clemente! Seu coração transborda de caridade e de compaixão pelos homens, e sobretudo pelos pobres pecadores! – Virgem fiel! Nunca houve falha na Senhora. Que por sua intercessão eu seja preservada de toda falta voluntária! – Espelho de justiça! Nunca seu brilho ficou embaçado: sempre foi o maravilhoso reflexo da beleza de Deus, enquanto que nós, infelizmente!... – Sede da sabedoria! Desta sabedoria da qual Salomão estava tão afastado e que a elevou tão alto no céu, eleve-nos consigo nos santos caminhos da sabedoria divina! – Causa da nossa alegria! Com a sua lembrança, meu coração se dilata, sente-se por demais feliz em tê-la como mãe! – Vaso espiritual! Todas as suas ações inspiradas pelo Espírito Santo a elevam sem cessar acima da terra! – Vaso honorífico! Que honra não lhe é devida, depois de seu filho, 'ao qual pertencem unicamente a honra e a glória como ao rei imortal dos séculos.' 63 – Vaso insigne da devoção! Que outro coração soube como o seu render a Deus o culto da adoração e do amor? – Rosa mística! Na Senhora estão contidas todas as virtudes cujas flores são o emblema: se a rosa é a rainha das flores, a Senhora é, e muito mais ainda, a rainha das virtudes! – Torre de Davi! A Senhora é uma fortaleza inexpugnável, contra a qual todos os esforços do inferno são impotentes! – Torre de marfim! A Senhora é revestida da pureza e da força divinas! – Casa de ouro! A Senhora é o que há de mais belo e mais precioso na criação!... – Arca da aliança! Pela Senhora nos vieram a reconciliação e a salvação! – Porta do céu! A Senhora o abriu 383 dúvida, vir com a Madre, mas um pequeno olhar à cruz de nosso bom Mestre fará com que se sinta feliz em lhe oferecer esse sacrifício. Tentaremos conseguir transporte para a volta dela e você aproveitará a ocasião para vir. Todas as nossas Irmãs desejam vê-la e dizem que já é tempo de proporcionarlhes essa consolação. Sou toda sua, no coração do nosso bem-amado. Irmã Emília 31 Madre Emília agradece a Deus a paz que ele concede à Irmã Françoise pela sua resignação por ocasião de um luto. Pede a essa que aprofunde ainda mais esse abandono. (L 100, M 51-52). À Irmã Françoise, em Aubin. Villefranche, 27 de agosto de 1824. L.S.J.C. Só posso agradecer ao bom Deus, minha muito querida Irmã, pela paz que ele lhe concede. É um favor preciosíssimo pelo qual deve dar humilde ação de graças. Não somente deve suportar com paciência a notícia da morte do seu querido irmão, como também, por ter sido uma morte repentina, é preciso confiar que ele tenha sido recebido com misericórdia. Deus o terá conduzido ao porto pela boa ação que fez trazendo você até aí. Reze por ele e ofereça sua aceitação pelo repouso da alma dele. É em momentos penosos como esse que é preciso mostrar que é a esposa de um Deus que morreu por nosso amor. O monte sagrado do Calvário é o monte dos que amam. É lá que se colhem as verdadeiras virtudes. Estou bem convencida, minha muito querida Irmã, de que nessa dolorosa circunstância não permanecerá ociosa. Sou toda sua. Irmã Emília 382 283 pouco sobrenatural.1 Isso prejudica muito a alma que não pode se encher de Deus sem se despojar da natureza. Quanto aos pensamentos que lhe vieram, sirva-se deles para se humilhar sinceramente diante de Deus. É bem verdade que eu não o fiz. Não sei como está redigida a carta de Irmã N. Queira enviar-me ou dizer-me o que nela havia de chocante. Procure afastar de sua alma toda desconfiança, torne-se simples, torne-se criança. Irmã N. não escreveu à Irmã X; você se enganou. Entendo que seria uma grande consolação para você vir nos visitar, como seria também para mim que tão cedo não poderei ir a Aubin. Não me recusarei a isso se nosso Pai o aprovar. Pode lhe escrever a esse respeito. Ontem tive ocasião de fazê-lo. Disselhe que você desejava nos visitar e que lhe escreveria sobre isso. Irmã N. poderia substituí-la por algum tempo, supondo que ele esteja de acordo. Ternas lembranças a todas as nossas Irmãs. Saúdo-as todas em Jesus, Maria e José. Irmã Emília 30 Em nome da comunidade da Casa-mãe, Santa Emília promete um caloroso acolhimento a uma religiosa de Aubin que deve chegar para se renovar em seu primeiro fervor (L 97, M 53). A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 16 de agosto de 1824. J.M.J. Minha muito querida Irmã: Recebi sua carta somente após a chegada de Madre Agathe. O desejo que expressa de rever a Casa-mãe é louvável e muito justo. Para satisfazê-lo, escrevi ao nosso Pai, a fim de obter a permissão que certamente não lhe recusará, uma vez que gosta que suas filhas venham de vez em quando renovar aqui seus desejos e seu fervor. Qual não será sua consolação, minha muito querida Irmã, ao rever os lugares onde teve a graça inestimável de se consagrar a Deus e a Jesus Cristo e onde disse adeus ao mundo e a si mesma. Você teria preferido, sem por seu divino Filho, o abriu aos maiores pecadores que lhe imploram, abra-o para mim, ó terna mãe! – Estrela da manhã! Guie-me sempre no mar tempestuoso do mundo! – Saúde dos enfermos! Cure minha pobre alma, ainda repleta de tantas misérias espirituais! – Refúgio dos pecadores! Nenhum daqueles que a invocaram foi rejeitado pela Senhora. Boa mãe, se tivesse a infelicidade de cair, oh! imediatamente me prostraria aos seus pés, implorando a graça do arrependimento e do perdão! – Consoladora dos aflitos! Em meio aos sofrimentos e dificuldades, elevarei meu olhar suplicante para a Senhora e fará descer em minha alma a resignação, a paciência, a serenidade no meio dos piores males da vida! – Socorro dos cristãos! A Senhora é a sua salvaguarda nos combates e lhes dará a Vitória! – Rainha dos Anjos! A graça de seu divino Filho me fez irmã dele; portanto a Senhora é minha rainha, mas sois também minha mãe! – Rainha dos patriarcas! Como a Senhora os ultrapassou a todos em virtudes e em méritos! – Rainha dos profetas! Eles a anunciaram, viram-na e saudaram-na de longe, eles a exaltaram como sua soberana! – Rainha dos apóstolos! Eles a honraram, escutaram e amaram como a mãe de seu divino mestre! – Rainha dos mártires! Seus sofrimentos foram sem igual e o mérito deles foi incomparável! – Rainha dos confessores! A Senhora os encorajou e sustentou na sua fidelidade constante, por seus exemplos e por sua real proteção! – Rainha das virgens! A Senhora é, portanto, a minha, se sou fiel à minha vocação. Oh! como me sinto honrada, como sou feliz em seguir seus passos, em abrigar-me à sombra de seu cetro virginal! – Rainha de todos os santos! A Senhora é ainda a minha, obtendo-me de, um dia, ser admitida no número dos bem-aventurados eleitos! – Rainha concebida sem pecado! Rainha por excelência, rainha imaculada, que esmagou pelo divino Jesus a cabeça da serpente infernal, ah! faça que até o fim eu seja vitoriosa de todo pecado!...”. Era assim que a Reverenda Madre parafraseava sucessivamente todos os versículos das ladainhas e ensinava suas filhas a recitá-las com uma terna e frutuosa devoção. Numa carta endereçada às Irmãs de Aubin, em 10 de fevereiro de 1832, ela mencionava a recomendação que acabava de fazer 381 284 o venerável M. Marty “de dar uma particular atenção a essas ladainhas...”, e aproveitava a ocasião para falar da Santíssima Virgem em termos que merecem ser destacados: “É nelas que a chamamos o Refúgio dos pecadores: precioso título que nos inspira tanta confiança. Nestas ladainhas é que vemos que ela é e sempre será a consolação das pessoas que sofrem, ela que sofreu mais do que qualquer outra e que é chamada, com toda razão, a Rainha dos mártires. É a ela que Deus confiou o governo do mundo, sob a dependência de Jesus, nosso divino Salvador. Ele é seu rei, ela sua rainha. Foi ele que a elevou acima de todas as criaturas, no céu e na terra, e nenhuma delas poderia lhe ser comparada. A Igreja não cessa de louvá-la, de bendizê-la, de invocá-la. A destruição de todas as heresias lhe é atribuída. Todas as graças nos vêm por ela. Seriam necessárias luzes bem particulares do Espírito Santo para conhecermos apenas uma pequena porção daquelas com que Deus inundou sua alma santíssima. Quem poderia falar dignamente dos atos heróicos de virtude que praticou em toda a sua vida, e sobretudo ao pé da cruz? Quem poderia conhecer a ternura de seu coração para com seu divino Filho e, ao mesmo tempo, sua generosidade e a elevação de sua alma?... Amemos essa terna Mãe, invoquemo-la com amor vivo e ardente e que, depois de Jesus, ela tenha o primeiro lugar em nosso coração! Para honrála, imitemos suas virtudes e demos uma particular atenção a todas as orações que rezarmos em sua honra.”64 comunhão! Procure responder à infinita bondade de nosso Deus a quem devemos amar com todas as nossas forças. Pouca coisa podemos fazer para lhe testemunhar esse amor, mas façamos o mais perfeitamente possível tudo que nos é prescrito e ele, grande como é, ficará satisfeito com essas pequenas coisas. Sua nova função lhe dá condições de exercer uma caridade atenta para com as nossas queridas Irmãs. Não perca a ocasião de lhes testemunhar essa caridade, como se o fizesse ao próprio Jesus Cristo. Evite a preocupação e faça tudo por amor. Saúdo-a muito afetuosamente. Irmã Emília 29 É preciso visar a um total abandono à vontade de Deus para encontrar a paz, renunciando a toda desconfiança. Vigiar a tendência a amar de maneira por demais humana; diminuir as conversas longas demais (L 95). À Madre Agathe, superiora em Aubin. Villefranche, 24 de junho de 1824. Minha caríssima Irmã: Combinamos com nosso Pai que só poderíamos ler os livros indicados no catálogo que lhe envio. Tem razão em pensar que errou pelo fato de ter permitido à Irmã N. ler certos livros. Deveria ter consultado sobre isso. Essa querida Irmã correu grandes perigos. Alegro-me pela facilidade que encontra em seus exercícios espirituais e pela paz que Deus lhe concede quando está em sua presença. Mas o essencial e o mais necessário é o abandono à santa vontade de Deus. É isso que cura nossas impaciências, nossos ressentimentos, nossas inquietações e, enfim, todas as asperezas de nossa alma. Não leve em conta as maneiras de falar ou de agir. Quanto à prolixidade de palavras nas Irmãs, é preciso tentar corrigi-las, pois é um defeito que procede do amor-próprio, porém, é preciso fazê-lo com doçura e paz. Corrija quanto puder essa sua tendência a amar de maneira 380 285 esse sentimento mútuo nem deve ser tão sensível, nem tão manifesto. Lembro-me ainda de ter deixado falar demais do exterior, dos amigos da casa, etc. Lembre-se ainda das outras faltas por meio das quais eu dava mau exemplo e procure reparar o mal que fiz. Não permita absolutamente que as Irmãs não-clausuradas falem algo do que viram ou ouviram, mesmo que o assunto lhes pareça indiferente. Dê-lhes os recados discretamente e que elas procedam da mesma forma.1 Aqui, nem todas as Irmãs sabem que não é permitido falar com os operários quando estamos com eles na casa. Advirta-as novamente. Ia esquecendo de lhe dizer que Irmã N. não é muito cumpridora dos seus deveres, facilmente rompe o silêncio e tem ares e maneiras que não são bastante dignas. Queira observar isso e adverti-la. Tenha cuidado ainda em não se apegar demais à Irmã N. Que entre você e ela não haja nada de humano e que seu afeto seja todo segundo Deus. Não permita que nenhuma manifeste à outra amizade exagerada. Mil lembranças a todas as nossas Irmãs. Irmã Emília. 28 Testemunho da piedade eucarística de Santa Emília. A melhor ação de graças consiste em cumprir o mais perfeitamente possível os deveres comuns de nossa vocação (L 93). A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 15 de junho de 1824. J.M.J. Minha muito querida Irmã: O benefício da santa comunhão nunca será bastante apreciado. Ele é tão grande que se torna impossível falar sobre ele de maneira que corresponda à sua grandeza e extensão. Como nosso estado de vida é feliz, minha querida Irmã, uma vez que nos permite aproximar-nos tantas vezes da santa 30. Conferência sobre a gratidão (C 88-89, nº 36) Nós nos enganaríamos muito se víssemos em Santa Emília uma “asceta” interesseira. A ação de graças, negação por excelência da cupidez, lhe é comum. O lugar dado à Igreja, nas linhas seguintes, lhe confere uma certa atualidade, à qual não se pode ficar insensível. Pensamos adquirir muitas virtudes, esgotamo-nos em desejos. Sempre pedimos graças e isso é muito bom, e devemos fazê-lo, uma vez que Nosso Senhor nos diz: “Peçam e lhes será dado, busquem e acharão.”65 Até nos prometeu que tudo o que pedíssemos a seu Pai, em seu nome, ele no-lo daria.66 Não esqueçamos de pedir, minhas boas Irmãs. Sentimos demais nossas necessidades, nossas misérias espirituais. Porém, há uma coisa que receio nos esqueçamos de fazer. É agradecer a Deus, testemunhar-lhe nossa gratidão pelas numerosas graças que nos concedeu e nos concede ainda, todos os dias. Se não o fizermos, seremos umas ingratas e não merecemos que continue a nos favorecer. Que ultraje não se faz a uma pessoa dizendo-lhe que é uma ingrata. Isso a revolta. Não pode suportá-lo. Nós também não devemos suportar que o bom Deus deva nos censurar por causa da nossa ingratidão, do esquecimento de seus benefícios para conosco e para com todos os homens. A ingratidão esgota a fonte dos benefícios. Quantos motivos temos, minhas queridas Irmãs, de testemunhar a Deus nosso reconhecimento! Vejamos um pouco os benefícios comuns a quase todos os homens: somos cristãs. Compreendemos bem esse belo título de cristãs, essa tão grande graça de não pertencer ao número dos infiéis, dos selvagens que não vivem na verdadeira religião? Santa Teresa, no leito de morte, exclamava: Meu Deus, eu lhe agradeço por me ter feito nascer filha da Igreja Católica, Apostólica e Romana.”67 Esse pensamento de que era filha da Igreja a fazia feliz, tinha compreendido a grande graça que Deus lhe tinha concedido. Devemos, nós também, reconhecer esse benefício, ir vez por outra visitar em espírito o santuário bendito onde Deus nos adotou como filhas. Essa igreja, essa pia batismal devem ser amadas com ternura por nossos 286 corações. A santa que nos é dada como padroeira, no batismo, não devemos esquecer de invocá-la. É nossa mãe, a Santa Igreja, que a ela nos confiou. Embora, ao entrar em religião tenhamos recebido outra padroeira, é a primeira que não devemos esquecer. São Luís, rei de França, tinha tanto respeito pelo lugar de seu batismo que, em vez de assinar, Luís, rei de França, assinava Luís de Poissy, "porque foi em Poissy," dizia o santo rei, "que recebi um novo nascimento, nascimento mil vezes mais precioso do que o primeiro." Esse título de filhas da Igreja, quantos direitos ele nos dá! Nós os conhecemos, minhas queridas Irmãs. Entretanto, digamos uma palavra a respeito desta comunhão dos bens espirituais entre os fiéis. O bem que fazemos é pouco, nem temos a possibilidade de fazer muito, mas temos uma mãe rica que dispõe de todo o preço do sangue de Jesus Cristo, seu divino Esposo, tesouro imenso cujo preço é infinito e que nunca esgotaremos. Esses tesouros nos chegam de toda maneira, por todo tipo de canais. Essa mãe tem ainda os méritos superabundantes dos santos. O que nossos irmãos fizeram a mais, essa mãe o reserva para enriquecer seus filhos pobres, fracos, que mal podem atingir a santidade e depois, minhas Irmãs, essa participação em todas as orações, em boas obras das almas santas deve afervorar nossa gratidão, nosso amor para com essa tão boa mãe. Em todos os tempos, em todos os lugares, a Igreja vela sobre nós, nos envolve com a sua proteção. Amemos muito essa Igreja, é nossa obrigação. Rezemos por sua prosperidade, por sua conservação na França, nossa pátria. Sabemos que a Igreja não perecerá. Jesus Cristo a sustenta e a sustentará contra todos os esforços que os homens e o inferno farão para destruí-la. Mas Deus bem pode, como punição de nossos pecados, nos retirar a fé e dá-la a outros povos. Isso aconteceu em outros lugares. Rezemos pela conservação da fé na França. Respeitemos muito todos os ministros dessa Igreja. Quanto é grande a dignidade do sacerdote, sua pessoa é sagrada. Santa Teresa dizia que, se encontrasse um sacerdote e um anjo, ela se inclinaria primeiro diante do sacerdote e depois diante do anjo. Nós, minhas queridas Irmãs, tenhamos sempre o mais profundo respeito 379 27 Confissões de Madre Emília referentes a várias faltas que ela se censura ter cometido em Aubin: palavras próprias a destacar a Casamãe, recordação inútil do bem realizado, busca de um afeto demasiadamente humano por parte das religiosas (L 92). À Madre Agathe, superiora em Aubin. Villefranche 28 de maio de 1824. Sinto-me triste, minha querida Irmã, por você estar doente. Cuide-se, não fale tanto tempo com as jovens a quem dá instrução. Talvez fosse bom tomar alguns caldos refrescantes. Nossas Irmãs M. e N. chegaram com saúde. Percebendo o forte apego de N. à casa de Aubin, lembrei-me do grande número de faltas que cometi nessa fundação. Tive a infelicidade de falar de uma maneira própria a destacar a Casa-mãe, e o sofrimento que suportou Irmã M. para voltar aqui parece causado por mim. Lembre-se de que eu disse que nos achávamos melhor numa casa secundária; que éramos mais apreciadas pelos habitantes; que não tínhamos tantos temperamentos a suportar, etc., e muitas outras coisas, que são agora a causa da minha dor. Dizia eu que fazíamos o bem e trabalhávamos para a glória de Deus. Isso era um pouco verdade, mas não deveria ter insistido, pois é sempre perigoso olhar o bem do qual somos apenas o instrumento. Não permita que se cometam semelhantes faltas. Que as Irmãs amem Aubin porque Deus as quer aí e que se sintam sempre felizes em voltar ao lugar onde tiveram a felicidade de se consagrar a Deus e a Jesus Cristo. Arrependo-me por ter agido de maneira que as Irmãs fossem levadas a ter para comigo uma ternura excessivamente humana. Eu lhes testemunhava demasiada ternura e não cuidava em moderar as demonstrações de seu afeto para comigo. Agora, sinto que é preciso que nos amemos em Deus e por Deus e que 378 287 26 Convite à humildade: pedi-la na oração; começar a praticá-la na obediência do raciocínio (L 83). A uma Irmã de Aubin. Villefranche, 17 de março de 1824. Minha muito querida Irmã: Regozijo-me com você pelos favores recebidos do santo Esposo. O verdadeiro meio de conservá-los e até de aumentálos é, como você bem o sabe, ser verdadeiramente humilde. Trabalhe, pois, generosamente para a aquisição dessa virtude. Poderá dizer três ou quatro vezes ao dia: "Meu Deus, crie em mim um coração puro"; ou então: "Jesus aniquilado, torne-me semelhante ao Senhor"; "Maria, abismo de humildade, rogue por mim"; "Meu bom anjo, conduza-me pelo verdadeiro caminho da humildade." A humildade, na prática, é a mais absoluta obediência, sobretudo a obediência do raciocínio.1 Esforce-se para praticá-la. pelos ministros de Jesus Cristo. É penoso para os amigos de Deus ver o pouco respeito, os vexames de todo tipo que os sacerdotes sofrem. Isso deve nos afligir e nos encorajar a fazer com que nossos alunos nunca partilhem os sentimentos do mundo a esse respeito, inspirar-lhes de todos os modos um respeito profundo pela sua pessoa e seu caráter. Lembremo-nos destas palavras do Evangelho: “Quem vos escuta me escuta; quem vos despreza me despreza.”68 Do benefício de sermos filhas da Igreja decorrem todos os outros benefícios de que fomos cumuladas. Não lhes relembrarei os cuidados assíduos dessa boa Mãe: a primeira comunhão, a participação dos sacramentos, tão freqüente nas religiosas, são graças extraordinárias. Estamos na fonte das graças. Deus no-las concede em torrentes. É para nós uma corrente contínua de favores. A meditação, a santa missa, a santa comunhão, a leitura, o ofício, freqüentes elevações para Deus são graças de todos os dias que não compreendemos, não apreciamos bastante e, muitas vezes, falhamos em testemunhar a Deus nossa gratidão. Lembremo-nos de que, dos dez leprosos curados por Nosso Senhor, só um veio testemunhar sua gratidão. “Onde estão os outros nove," diz o Mestre, por que não vieram agradecer?”69 Não lhe demos ocasião para uma semelhante censura. Sou toda sua e lhe peço que me recomende a Deus. 2º – Temas sobre a caridade para com o próximo Irmã Emília. Santa Emília volta a este assunto com predileção. Foi-nos possível constatar lendo o que foi relatado anteriormente e o veremos também lendo os trechos da correspondência. Ficamos sempre surpresos com a aliança de universalidade e realismo pessoal que caracteriza a noção de caridade no ensinamento espiritual da fundadora. Ela passa com facilidade da consideração dos motivos e das aplicações imediatas (vida de comunidade, relacionamento com as alunas, etc.), à do campo ilimitado da oração compassiva e apostólica. M. Fabre anota em suas cadernetas: “Em suas conferências, a Madre 288 377 desenvolvia as diversas qualidades enumeradas por São Paulo” (CF 146). Ano de 1824 25 31. Características da caridade segundo São Paulo (B I 61-69) Madre Emília procurava fazer bem compreender às suas filhas as características desta bela e tão importante virtude e citando o que São Paulo diz a respeito da caridade aos fiéis de Corinto: "Vou citar-lhes", dizia ela, “as características da caridade apresentadas por São Paulo, que tão bem a compreendeu: que cada uma de vocês as aprenda de cor e que, em seguida, vez por outra, faça um pequeno exame de consciência para ver se se esforça em reproduzi-las em sua conduta: “A caridade é paciente; é bondosa; não é invejosa, não age com temeridade nem com precipitação; não se vangloria; não é arrogante; não busca seus próprios interesses; não se queixa, não pensa o mal; não se alegra com a injustiça, mas regozija-se com o que é conforme à verdade. Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.”70 "1º A caridade é paciente. Como recebemos as contrariedades que nos vêm de nossos superiores ou de nossas Irmãs, de nossas alunas, das pessoas de fora? Se, ao nos chegar da parte delas algo desagradável, penoso, não deixamos de nos queixar, de murmurar, de demonstrar mau humor, faltamos a essa primeira característica da verdadeira caridade. "2º É suave, benfazeja e cheia de bondade. A religiosa que possui esta segunda característica da verdadeira caridade não esquece que o Salvador Jesus ensina a mansidão antes da humildade, da qual ela é a flor e o fruto. É suave e boa para com todos: para com seus superiores a quem é perfeitamente submissa, nas mãos dos quais ela se deixa moldar; para com suas Irmãs, para quem nunca tem uma palavra mais alta do que a outra, nunca uma atitude desagradável; para com as crianças, junto às quais une à firmeza necessária, alguma coisa de graciosa e amável, fruto da santa presença de Deus da qual Ocupadíssima, Madre Emília não pode responder em particular a cada Irmã que lhe escreveu, mas confia que não deixarão de lhe enviar cartas pessoais que a enchem de consolações (L 79, M 49-50). Às Irmãs de Aubin. Villefranche, 24 de janeiro de 1824. Apesar do desejo de responder em particular às minhas Irmãs Françoise, Marie e Nathalie, vejo-me na obrigação, por causa do meu querido retiro, de escrever não somente às três mas a todas juntas, esperando que isso não vá contrariá-las, e que cada uma de vocês me escreverá pessoalmente, como se eu lhe tivesse escrito em particular, pois o que vocês me dizem me causa um imenso prazer. É o meu mais doce recreio. Suas cartas são boas, muito boas, e são ainda mais do meu gosto porque são feitas sem arte e ditadas pelo coração. Perguntamme quando irei aí? Em breve, fiquem tranqüilas. Amanhã é a conversão de São Paulo. Quando nosso orgulho ficará inteiramente aniquilado? Quando diremos com esse grande apóstolo e de todo o coração: "Senhor, que queres que eu faça?”1. Aspiremos, minhas queridas Irmãs, a esse espírito de generosidade e de sacrifício. Adeus, minhas queridas Irmãs, sou toda de vocês. Irmã Emília Recomendações ao Sr. Vigário. Muitas lembranças às nossas crianças e aos nossos amigos. 289 376 alcançar a graça de se corrigir, tais como: visitar um altar, reconhecer sua falta, deixar de merendar, etc. Um desses dias escreverei às Irmãs sobre a santa obediência. Adeus, minha querida Irmã. Peço-lhe que pacifique sua alma e conte muito com Deus, quer para si, quer para os outros. Irmã Emília 24 Madre Emília indaga com solicitude os progressos de Irmã Françoise Pascal nas virtudes ocultas de paciência e de doçura. Recomenda-lhe nunca admitir, senão uma pacificante compunção (L 75). À Irmã Françoise, em Aubin. Villefranche, 22 de novembro de 1823. Agradeço-lhe afetuosamente as agulhas e o enfiador. Aliás, agradeço a cada uma, pois eram para o bem comum, minha querida Irmã Françoise. Nada tendo que lhe pertença, a não ser o seu bem-amado, pelo qual, de coração e de vontade, ela quer renunciar a tudo e renunciar a si mesma. Tem se esforçado bem depois do retiro? A santa tarefa de adquirir a doçura e a paciência tem progredido? Não tem nenhuma reclamação quanto ao voto de obediência? Dê-me todas essas notícias. Estou muito contente que você deixe todos os seus pesares para trás para sentir apenas a dor suave da santa compunção. Hélène nada me mandou dizer. Fico feliz por saber que terminaram todos os consertos da casa. Assim estarão mais tranqüilas. Adeus, querida Irmã, sou toda sua. Irmã Emília nunca perde a preciosa lembrança. É suave e boa e, por conseguinte, benfazeja. Os corações bons sentem a necessidade de fazer o bem. Só estão satisfeitos quando podem prestar serviço ao próximo, servir a todos. Ah! sem dúvida, mais uma vez o experimentaram assim como eu: como se é feliz quando se causa prazer a alguém! O coração experimenta um sentimento delicioso que não podemos traduzir. "3º A caridade não é invejosa. Não é raro, minhas Irmãs, encontrar pessoas que, em vez de se regozijarem com o que acontece de bom aos outros, ficam tristes. Parece que o que os outros ganham, elas mesmas perdem. Se na sua presença falam bem de uma pessoa, elogiam seus talentos ou suas boas qualidades, eis que, sem ousar contradizer diretamente, elas procuram, por meio de algumas palavras, enfraquecer o elogio que lhes desagrada ou que fere sua inveja: "Sim, sem dúvida, dizem, essa pessoa tem mérito, mas bem que tem seu 'lado fraco'.” E esse lado fraco elas o aumentam muitas vezes, sem pensar que, dessa maneira, chegam até à calúnia. Eis um defeito, infelizmente muito comum no mundo, e as grades de um convento não o impedem sempre de nele penetrar. "4º Não age com temeridade, nem com precipitação. A temeridade vem do orgulho e a precipitação é o fruto da temeridade. Quando não se toma tempo para examinar as coisas que se vai dizer, os atos que se vai fazer, fere-se muitas vezes a caridade. Desconfia-se ou mesmo se julga o próximo com temeridade, expressa-se levianamente o que se pensa dele, e freqüentemente, o que se diz dessa maneira não é nada mais que falsidade e não se tem medo de dizer coisas que podem prejudicar notavelmente o próximo. Não basta, às vezes, uma só palavra para fazer perder a uma pessoa sua reputação, sua honra?... São verdadeiramente línguas de víbora as que ousam proferir a respeito dos outros os juízos temerários que a malícia ou a imaginação lhes sugere. Com um pouco de humildade se agiria de outra maneira. Nunca ou raramente, pelo menos, vocês verão uma pessoa humilde julgar mal seu próximo e falar temerariamente de suas faltas. Quando se é humilde, não se vai depressa, desconfia-se das próprias idéias e pesa-se as palavras. 290 "5º A caridade não se vangloria. Quando tomou posse de uma alma, não lhe permite elevar-se por orgulho acima das outras, mas leva-a a se abaixar para se fazer toda a todos.71 "6º Ela não é arrogante, não busca seus próprios interesses. Qualquer que seja o próximo, por mais humilde que pareça a sua profissão, ou qualquer que seja o defeito que ele manifeste em sua conduta, a alma caridosa que o ama em Deus não o repelirá, nem o julgará pouco digno de seus cuidados e de seus serviços. Ao contrário, o coração que possui a verdadeira caridade se comove à vista dos grandes pecadores, dos miseráveis mais aviltados e sente-se impelido a ajudá-los, sem considerar seus interesses próprios, seu amor-próprio ou as repugnâncias da natureza. É igualmente junto aos pobres que têm mais defeitos exteriores, junto às crianças mais desagradáveis, mais difíceis de governar, que a caridade de uma verdadeira religiosa mostra todos os recursos de uma dedicação generosa. O egoísmo não encontra lugar no seu coração. Não sabe ela que apenas a aparência de um tal vício causa revolta numa alma piedosa que tem a felicidade de se unir freqüentemente a Deus que é a própria Caridade? "7º A caridade não se irrita. Ela sabe que cada um de nós tem seus defeitos e que, se quisermos que nos suportem com paciência, devemos, da mesma forma, suportar os outros e ter uma grande indulgência mútua. Se, pois, uma pessoa vem nos dizer algo que não seja exato, não nos queixemos com amargura, antes pensemos que, mais de uma vez nos aconteceu de nos enganarmos a respeito do outro, de dizer certas coisas mais tarde reconhecidas como errôneas ou exageradas. Pensemos ao menos que, tendo em vista nossa fraqueza, isso poderia nos acontecer, mesmo sem malícia e, em semelhante caso, bem que gostaríamos que não guardassem amargura para conosco. Se nos tratam com palavras duras, que ferem, que fazem sofrer, em vez de responder o que nosso amor-próprio nos inspiraria, lembremo-nos de que Nosso Senhor Jesus Cristo, a própria inocência, teve de sofrer muito mais do que nós das palavras dos que se fizeram seus inimigos... A seu 375 23 Alguns esclarecimentos sobre os costumes de Villefranche. A fundadora preocupa-se, sobretudo, porque as religiosas de Aubin respondem mal à sua superiora, a quem ela aconselha para pôr fim a esse abuso (L 74). À Madre Agathe, superiora em Aubin. Villefranche, 21 de novembro de 1823. Eis a resposta às suas perguntas. Todas as nossas Irmãs estão habitualmente ocupadas em suas tarefas até às seis horas, depois vão à sala comum e não ficam com as noviças. Ocupamse em silêncio da leitura, da escrita, do estudo, da memorização dos salmos, da preparação das aulas, etc. Após o jantar, fazem exercícios para se aquecer, sem barulho, mas batendo os pés fortemente, como vocês viram algumas vezes. Quando não sentem mais frio, sentam-se. Falam habitualmente das coisas de Deus, cantam um hino, etc., até o fim do recreio. As noviças ficam conosco no recreio. Seus exercícios são completamente diferentes dos das Irmãs professas. Se eu não lhe disse tudo, faça-me mais perguntas. Eu as responderei com prazer. Entristece-me saber que nossas boas Irmãs respondem mal. Isto não é bom, mas não se ofenda. Tenha confiança que elas se corrigirão. Seria bom pedir à Irmã N. que lhe permita usar palavras mais mansas e menos autoritárias. Diga-lhe que nunca agi assim e que nossas Irmãs não estando habituadas a isso, poderiam se magoar. Elas diriam, no seu íntimo, que eu nunca fiz assim. Aliás, querida Irmã, o meio de impedi-las de replicar é não lhes dar o motivo pelo qual recusou tal coisa. Diga-lhes simplesmente que você não pode conceder o que pedem, que a vontade de Deus está na submissão. Faça-lhes compreender que uma boa religiosa deve se considerar como um pobre a quem nada é devido. Seja extremamente doce e ao mesmo tempo firme. Lembre-se de que se apanham moscas com mel. Quando uma Irmã tiver replicado, converse em particular sobre a falta cometida e encoraje-a a fazer alguma prática piedosa para 374 291 Não sei onde passou o Panis Angelicus. Vou procurá-lo e lhes enviarei. Adeus, nossas queridas Irmãs, são mais de 9 horas. Deixoas. Irmã Emília 22 Solicitude da Casa-mãe para com a comunidade de Aubin, onde há muitas doentes. Madre Emília se faz pessoalmente o porta-voz dessa preocupação e promete uma visita (L 71, M 36). Às Irmãs de Aubin. Villefranche, 5 de novembro de 1823. L.S.J.C. Soube com muito pesar, minhas queridas Irmãs, que estavam todas um pouco adoentadas. Fiquei muito triste, mas não excessivamente, pensando que a divina Providência tudo dispõe para a santificação de todas. Rogo ao bom Deus que as alivie e gostaria de estar junto de vocês. Farei o possível para ir o quanto antes, de acordo com a determinação do nosso Pai. Até lá, sejam bem fiéis a todos os seus deveres, amem o silêncio e fiquem recolhidas tanto quanto depender de vocês. Nossas Irmãs, que lhes enviam muitas lembranças, vão como de costume. Pedimos ao bom Deus que as cure e vamos continuar dizendo cada uma: "Meu Deus, eu lhe suplico, cure minha alma e meu corpo." Essa oração deve ser freqüente e feita com grande confiança e resignação à vontade divina. Toda a oitava deve ser particularmente destinada a esse pedido, assim como a graça de bem ensinar e a virtude da doçura interior e exterior. Unam-se a nós que continuamos a rezar as ladainhas, no lugar daquelas da Providência que não dizemos, a invocação e o Pater em honra do santo Nome de Jesus. Adeus, queridas Irmãs, sou toda de vocês. Irmã Emília Envio-lhes alguns coelhinhos que podem colocar com os porcos. Quando eu chegar, procuraremos fazer uma pequena coelheira. exemplo, fiquemos caladas, não nos susceptibilizemos. Nunca guardemos ressentimento e de todo o coração perdoemos imediatamente. "8º A caridade não pensa o mal. Menos se é bom, mais se pensa mal dos outros e, pelo contrário, mais um coração é puro e reto, menos é levado a pensar mal de seu próximo. Quando somos tentadas a julgar alguém desfavoravelmente, voltemonos imediatamente contra nós mesmas e digamos, por exemplo: Não seria porque eu mesma, em certa ocasião, agi por algum motivo baixo ou indelicado ou imperfeito que sou levada a pensar que os outros agem da mesma forma?... Nosso Senhor Jesus Cristo nos diz no santo Evangelho: “Não julguem e não serão julgados, não condenem e não serão condenados.”72 E para nos mostrar que, muitas vezes, somos piores do que os que são julgados por nós, acrescenta: “Por que vêem uma palha no olho de seu irmão quando não vêem uma trave no seu?”73 Ah! sejamos dóceis a essa preciosa lição do Salvador: não julguemos, não condenemos. Vejamos só o bem que está nos outros e, quanto aos defeitos do próximo, fechemos os olhos, sejamos cheias de indulgência. "9º A caridade não se alegra com a injustiça, mas regozija-se com o que é conforme à verdade. Estar satisfeito que os outros façam o mal, ofendam o bom Deus, é uma coisa que não se pode supor numa cristã digna desse nome, quanto mais numa religiosa. Por isso, minhas queridas Irmãs, não posso pensar que jamais cometam uma tão grande falta. Gosto de pensar, pelo contrário, que se regozijam sempre diante de Deus, do bem que vêem fazer outras pessoas que se aplicam em praticar a verdade vinda do céu, seja nos preceitos, seja nos conselhos evangélicos. "10º A caridade tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. Quaisquer que sejam os sofrimentos que lhe advenham do próximo, ela os recebe como vindos da mão de Deus, que se serve dos defeitos, dos erros, e mesmo da malícia dos outros para o nosso bem e tem o cuidado de não os afastar, mas faz deles uma piedosa oferenda ao Senhor. – Ela tudo crê, tudo espera. Quando nunca se engana a si próprio, não se pode 373 292 pensar que os outros sejam enganadores, que ajam com astúcia e artifício. Por outro lado, o que a caridade promete ela cumpre e gosta de pensar que os outros farão a mesma coisa, e assim como, de bom grado, acredita todo o bem possível do próximo, do mesmo modo confia na perseverança e, sobretudo, tem o cuidado de nunca desesperar de sua conversão ou de sua salvação. – Ela tudo suporta. Não se pode amar a Deus e ao próximo sem sofrer, pois esse amor exige os sacrifícios da natureza. Assim, a alma que tem a verdadeira caridade suporta com paciência e resignação tudo que pode ter de penoso esse amor sobrenatural: abraça-o com uma santa coragem, sabendo que o amor verdadeiro se prova pelo sacrifício. "Não posso, minhas queridas Irmãs, estender-me como o desejaria sobre todas as características da verdadeira caridade. Mas para que nenhuma de vocês fique privada da felicidade de bem compreendê-las, para se esforçar em se revestir delas e reproduzi-las em toda a sua conduta, vou mandar depositar no coro um pequeno livro no qual elas são explicadas: leiam-no, todas, eu o recomendo e meditem-no bem." 21 A superiora expressa às religiosas de Aubin sua alegria pela generosidade com a qual renunciaram a uma viagem a Villefranche. É preciso chegar a colocar no único Senhor toda a nossa alegria: "É amando que tudo se tornará fácil” (L 67). Às Irmãs de Aubin. Villefranche, 2 de outubro de 1823, de manhã. L.S.J.C. A maneira generosa como fizeram o sacrifício da viagem projetada a Villefranche encheu minha alma de consolação e alegria. Fiquem certas, minhas queridas Irmãs, de que Deus as recompensará, pois ele retribui ao cêntuplo os sacrifícios feitos por seu amor. Vivam alegres e tranqüilas nas mãos de sua paternal Providência. Amem e amem de todo o coração o divino Esposo que tomaram por sua única partilha. É aí que encontrarão a felicidade de nosso santo estado. É amando que tudo se tornará fácil, que os sofrimentos e dores inseparáveis da vida perderão seu amargor, que as dificuldades e obstáculos se aplainarão por si mesmos. É ainda na prática desse divino amor que encontrarão uma paz inalterável, antegozo daquela que devemos usufruir por toda a eternidade, onde estaremos mergulhadas no amor do próprio Deus. Adeus, minhas caríssimas Irmãs, sou toda de vocês. 2 de outubro de 1823, à tarde. Entregaram-me suas cartas um pouco tarde, no momento em que fazíamos uma conferência sobre o distanciamento que uma religiosa deve ter do parlatório. Não pude lhes responder logo. Saúdo-as com todo o meu coração. Matamos um porco e queremos que vocês provem dele. Por isso, lhes enviamos salsicha e torresmos mais do que o necessário, pois talvez queiram ter o prazer de partilhar com outras pessoas. Irmã Victoire manda dizer que a salsicha foi feita por ela e os torresmos por Irmã Marcelline. Gostaríamos de lhes enviar chouriço feito pela senhorita Anastasie, mas não foi possível. Irmã Félicité nunca se sente tão feliz como quando prepara uma cesta para Aubin. 372 293 Estou feliz porque você não tem chorado. Creia-me, guardemos todas as nossas lágrimas para chorar nossos pecados. 32. Diálogo sobre a caridade (D 97-98; nº 44) 20 Encorajamentos afetuosos e sobrenaturais à Irmã Françoise Pascal, dolorosamente aflita. Madre Emília promete-lhe o auxílio de suas orações e da comunidade (L 62, M 50-51). À Irmã Françoise, em Aubin. Villefranche, 21 de agosto de 1823. L.S.J.C. Por mais dolorosa que seja a provação pela qual está passando, estou persuadida, minha querida Irmã, de que a suporta com paz e resignação. Esse golpe é terrível, reconheço, mas, por penoso que seja, é preciso sempre dizer e repetir de coração: "Meu Deus, seja feita a vossa vontade." Essa foi a linguagem dos santos nas maiores aflições e deve ser a nossa. Somos seus descendentes e devemos caminhar seguindo suas pegadas. Devemos reproduzir em nós seus exemplos, sentimentos e palavras, uma vez que aspiramos à mesma recompensa. Procure, minha querida Irmã, não se deixar abater. Por uma inteira submissão, pode lucrar muito, adquirir uma maior união com aquele que escolheu como seu único bem e obter graças para aquele por quem você chora. Adeus, minha querida Irmã. Toda a comunidade reza por você, para que alcance uma verdadeira paz interior. Irmã Emília Estamos numa conferência e a conversa se estabelece a partir do questionamento de uma religiosa. A caridade para com os de fora se manifestará na oração pelos pecadores e no trabalho para prover as necessidades dos pobres. É necessário habituar as crianças a esse gênero de atividade. A caridade comunitária poderá consistir, dentre outras coisas, em emprestar voluntariamente, sem entesourar para si, pequenos bens. A caridade é a rainha das virtudes. É ela que enriquece as demais. Volto com freqüência às palavras do apóstolo São João aos primeiros fiéis, mas eu lhes repito que não sei nem posso dizer outra coisa: “Meus bem-amados," dizia esse apóstolo, "amemo-nos uns aos outros, pois a caridade vem de Deus. Não amemos em palavras, mas em ações de verdade,”74 prestando serviço a nosso próximo todas as vezes que pudermos, incomodando-nos sempre para acomodar os outros. É necessário, minhas caras Irmãs, que nossa caridade se estenda não somente às pessoas que nos cercam, a nossas alunas. Ela deve se estender a toda a humanidade, atravessar os mares, de maneira que todo mundo tenha um lugar em nosso coração e participe das orações, das boas ações que fazemos. Para isso, rezemos muito pela conversão dos pecadores, peçamos a perseverança dos justos e façamos, cada dia, todas as nossas ações por amor a Deus e ao próximo. Uma Irmã: Madre, caso desejemos muito dar esmola, servir aos pobres e não possamos, temos o mesmo mérito como se o fizéssemos? A Madre: Sim, minha Irmã, se o desejo que temos de fazer essas boas obras é sincero e acompanhado pela execução perfeita de tudo quanto podemos fazer nesse ponto, por exemplo: você deseja dar esmola, economize tanto quanto puder, seja no vestir, nos objetos a seu uso, a fim de que a casa possa receber maior número de órfãs. Todas as vezes que tiver 294 ocasião de prestar algum serviço às crianças da classe gratuita, faça-o sem demora. Inspire às suas alunas um grande amor por essa parcela do rebanho querido de nosso bom Mestre. Ensinelhes a fazerem pequenas esmolas, com a permissão dos pais. A esmola cobre a multidão dos pecados. Você abrirá o céu à maioria de suas alunas inspirando-lhes amor aos pobres. O que pensam, minhas caras Irmãs, quando mando as pequenas que não sabem tricotar desfiar retalhos e quando desejo que as outras trabalhem também para os pobres de vez em quando? Não é pelo trabalho que fazem, pois muitas vezes estragam tudo, mas para inspirar-lhes amor aos pobres, para que mais tarde elas tenham a idéia de fazer alguma coisa por eles. A propósito desse trabalho que recomendei ensinar às menores, gostaria de saber se nenhuma de vocês nada tem a se censurar. Uma Irmã: Madre, estou em falta. Não levo trabalho às crianças, pensando exatamente que quase nada fazem. A Madre: Está enganada. Fazem mais do que você pensa. Elas aprendem a não esquecer os pobres, que você mesma não ama bastante. Isso me penaliza. A obediência não raciocina dessa maneira. Além disso, seu coração deveria levá-la a fazer na clausura o que tantas almas caridosas fazem no mundo. Prefiro crer que não refletiu sobre essa negligência. Fará melhor doravante. Minhas queridas Irmãs, sejam cheias de amabilidades umas para com as outras. A Irmã: Se alguém vem pedir emprestada alguma coisa da qual vou precisar, devo emprestá-la? A Madre: Caso o objeto solicitado seja absolutamente necessário, podemos recusar de maneira amável. Do contrário, podendo passar sem ele, devemos emprestar. No mundo se diz: a primeira caridade começa por si. Na vida religiosa não podemos falar assim, mas ceder sempre o que nos pedem, bem persuadidas de que o bom Deus nos dará o meio de nos acomodarmos de outra maneira. Demos sempre o que nos pedem, o bom Deus o substituirá. 371 19 Incentivo à devoção à Santíssima Virgem. Apelo à paz e à paciência interiores, numa simples abertura de consciência para com a superiora local (L 59, M 48-49). À Irmã Françoise, em Aubin. Villefranche, 11 de agosto de 1823. L.S.J.C. Estou muito satisfeita com a boa resolução que me comunica, ela não podia ser melhor. Tem razão em acreditar que junto à divina Pastora nada tem a temer do lobo que deseja tanto as nossas almas. O que ele mais teme é a humilde dependência, a doçura, a confiança infantil, virtudes preciosas que nos põem ao abrigo dos seus ataques e nos conduzem infalivelmente a Deus. Não se assuste com os sonhos que a agitam. Evite a lembrança deles durante o dia e, se eles voltarem contra a sua vontade, afaste seu espírito com paz e tranqüilidade e tenha paciência. Ame particularmente essa virtude. Sabe que para ela deve se voltar a maior parte de seus esforços e sua prática é que deve lhe atrair o olhar do Esposo. Pense de quantas maneiras ele a praticou, tornando-se nosso modelo perfeito. Quando tiver de me enviar cartas por Lacombe, coloque-as todas juntas no mesmo envelope. Sou toda sua. Irmã Emília Nada pode dizer-me que me cause mais alegria do que falar-me da inteira confiança que tem na querida Madre Agathe.1 Ela o merece sob todos os aspectos. Nunca lhe oculte nada e esteja certa de que as maiores graças serão a recompensa da fidelidade em partilhar com ela em espírito de fé, sabendo que representa Deus. 370 295 Irmã Emília 18 Felicitações pelas boas resoluções perspectivas reconfortantes (L 45). tomadas; abertura de À Irmã Françoise, em Aubin. Villefranche, 27 de abril de 1823. Sua carta, minha muito querida Irmã, causou-me o maior prazer. Regozijo-me, sobretudo com o contentamento interior que experimenta. Seja bem fiel às resoluções tomadas e a recompensa será uma paz abundante. Como você é feliz, minha querida Irmã, conduzindo almas para Deus e, por conseguinte, proporcionando-lhe maior glória. Viva alegre, feliz no bendito estado em que a Providência a colocou e seja toda do seu bemamado. Ainda não consegui ver sua querida mamãe. Não disponho de um só momento. Vou pedir-lhe que venha ao parlatório, logo que eu estiver um pouco mais livre, e então darei detalhadamente todos os seus recados. Adeus, minha boníssima Irmã. Irmã Emília Acabo de receber sua segunda carta que me causou um novo prazer. É com grande tristeza que não respondo desta vez às nossas Irmãs. Contudo, eu o farei na primeira ocasião. Peçolhes terem muita coragem, pois não serão por muito tempo tão reduzidas. Não posso voltar ainda. Os problemas da casa de Aubin me prendem aqui tanto quanto o da casa de Villefranche. Tenham paciência e amem ternamente o bom Mestre. Uma Irmã: Nós quase não nos preocupamos em emprestar, porque os objetos que transitam de um lugar para outro se estragam. A Madre: Por acaso, você empresta um bem que lhe pertence? Sua maneira de falar dá a entender que é dona dos objetos a seu uso. Os objetos se estragam quando emprestados. Eis uma astúcia do demônio para impedi-la de praticar a caridade. Os livros, os modelos de caligrafia se estragam, mas quando estiverem gastos serão substituídos. Que tal temor não a impeça de praticar a caridade. Se seus alunos não vão escrever no momento em que uma das Irmãs lhe pede emprestados seus modelos, empreste-os. A verdadeira caridade leva sempre a agir de maneira a acomodar a Irmã que se encontra necessitada. Por acaso, você tem alguns modelos de reserva? A Irmã: Economizando um pouco, pude reservar alguns para o próximo ano. Peço deixá-los comigo, porque o comerciante que os vendeu talvez não volte mais. Sofri tanto tempo até encontrá-los como desejava. A Madre: Vá buscar todos os modelos que tem no armário e entregue-os à ecônoma para que os mande vender. Você sabe muito bem quanto não gosto de que tenhamos reservas. Encontrará bastantes modelos no próximo ano. Poderá suportar ver suas Irmãs em necessidade, enquanto você está na abundância? Sua caridade é bem pouca. Você esqueceu estas palavras de Nosso Senhor no Evangelho: “Quando lhe pedem o manto, dê também a túnica.”75 Não somente não faça isso, mas você age com um espírito de propriedade que não convém de modo algum às religiosas. Desejo que as Irmãs professoras não tenham reservas de papel, penas, modelos de caligrafia, etc., para ceder aos alunos. Todas as que obtiveram com permissão, a partir de hoje devolverão tudo à vice-ecônoma, que as fará distribuir nas classes. 296 369 33. Diálogo sobre os meios de prevenir um apego de coração (D 118-119; nº 55) Com severa firmeza, Madre Emília impõe a presença de uma terceira pessoa nos encontros e conversas da interlocutora e sua amiga. Tendo “suas razões”, ela não admite a discussão e a religiosa, que de início havia replicado um pouco, vem desculpar-se no dia seguinte. A Madre: Em que você emprega o tempo que sobra após as aulas cada dia? A Irmã: Eu o emprego no estudo. A Madre: O que estuda e quanto tempo tem para estudar? A Irmã: Tenho duas horas e meia, mais ou menos. Estudo ora num livro, ora noutro, sobre as matérias de ensino em uso no Instituto. Quero aprender um pouco de cada uma a fim de bem exercer qualquer emprego a mim confiado junto às alunas. Levo a sério instruir-me bem e aproveito todas as ocasiões para isso. A Madre: Com quem costuma resolver suas dificuldades? A Irmã: Com Irmã X. Ela é tão boa! Muitas vezes estudamos juntas as matérias que ela mesma não aprofundou. Excitamo-nos mutuamente a progredir. Nunca me agradou tanto estudar. A Madre: Não diz nenhuma palavra inútil à Irmã X. enquanto estudam juntas e depois, durante os recreios não ficam juntas um pouco demais? A Irmã: É impossível estudar as duas, procurar resolver as dificuldades, sem dizer algumas palavras inúteis. Além disso, se estamos sempre juntas nos recreios não é senão para falar sobre matérias de ensino. Minha Irmã N. lhe disse o que fora decidido a respeito do seu desejo de não sair. Tenha paciência e um dia o verá realizado. Sou toda sua. Irmã Emília 17 Irmã Françoise Pascal é a miraculada de 8 de setembro de 1820 (Cf. nota 9 da Introdução). Os encorajamentos e o afetuoso interesse aqui prodigalizados pela Madre lhe devem ser utilíssimos nesses primeiros tempos em Aubin (L 44). À Irmã Françoise Pascal, em Aubin. Villefranche, 3 de abril de 1823. Minha muito querida Irmã: Queira dar-me notícias de todas as nossas Irmãs, das alunas, da horta, etc. Diga-me ainda o nome das jovens que entraram após a minha saída e se todas se comportam bem. E você, minha querida Irmã, pela sua carta, parece-me um pouco mais animada. Procure sê-lo sempre mais. Anime-se pelo exemplo dos santos. Reconheço que o estado em que se encontrava e em que ainda se encontra é muito doloroso, mas também meritório. Ordinariamente, Deus se serve dessas situações para nos unir a ele. É um meio de fazer penitência e de nos desapegar de nós mesmas. Parece-me que havia procura de si própria quando ia chorar. É melhor tomar um livro, olhar as flores, fazer qualquer outra coisa. Um dos grandes meios para dissipar esse estado de abatimento é ser bem fiel a Deus, evitando com cuidado as faltas que são as mais habituais e prometendo-lhe que nada nos separará do seu amor. Creio que ele permite essas tempestades para que você se torne mais generosa e lhe dê todo o seu coração. Confio que isso passará logo e que Deus curará em você a alma e o corpo. Desde que os remédios lhe façam bem, tenho motivos para esperar que isso aconteça. É preciso ter uma grande paciência e doçura para com a pobre Irmã Augustine. Ela é digna de lástima. Fala-lhe algumas vezes de vir a Villefranche? Sou toda sua. 368 297 16 A destinatária desta carta é a primeira enfermeira da Congregação. Ela devia provocar mais tarde a fundação do ramo nãoclausurado.1 Madre Emília recomenda-lhe uma visão sobrenatural constante no exercício do seu ministério de misericórdia corporal. Reconforta-a também em suas dificuldades espirituais (L 43). À Irmã Marie Vialard, em Aubin. Villefranche, 26 de fevereiro de 1823. Minha muito querida Irmã: Ei-la muito ocupada junto aos seus queridos doentes. Ah! minha querida Irmã, como você é feliz, pois, sem sair da santa obediência, está exercendo as mesmas funções do nosso doce Salvador. Esse divino modelo, ao restituir a saúde ao corpo, curava também a alma, pois era a cura principal que ele tinha em vista. Tenho certeza de que minha Irmã Marie procura imitá-lo nesse ponto e que seu zelo a leva a fazer conhecer e amar a Deus. É verdade que nem sempre encontra corações dóceis e que é preciso recomeçar muitas vezes. Mas que isso não a desanime. Quanto mais dificuldade tiver, tanto maior será sua recompensa. Mesmo que convertesse apenas uma alma, seus trabalhos seriam pagos e até com juros bem altos. Lembrese de que nosso Salvador teria morrido por uma só alma, como o fez pelo mundo inteiro. Eu a convido a purificar sua intenção em tudo que faz, a não procurar senão a maior glória de Deus, a nada atribuir a si mesma, mas a referir a esse bom Mestre o pouco que realiza, olhando-se apenas como um fraco instrumento. Tente nestes quarenta dias ficar com Jesus solitário. Os campos e os bosques que tem ocasião de ver lhe lembrarão o deserto para onde se retirava o celeste Esposo. Fique recolhida tanto quanto puder e pratique uma verdadeira mortificação interior, a fim de que Jesus, Maria e José lhe concedam cada vez mais o espírito de nossa santa vocação. Compartilho do sofrimento que experimenta nas suas tentações e dificuldades espirituais. Seja fiel, minha querida Irmã, e haverá de vencer. Jesus está com você. Progrida no esquecimento de si própria e ele se aproximará ainda mais. A Madre: Não seria impossível estudar as duas sem falar inutilmente, se quisessem. Doravante, não ficarão sozinhas. Chamarão Irmã N. que trabalhará em companhia de vocês, enquanto estudam. Vá dizer-lhe que esteja no jardim às duas horas da tarde. A Irmã: Madre, eu suplico, deixe-nos sós! A Irmã X. se sentirá acanhada com a presença da Irmã N. que estará lá para nos vigiar. Além disso, ela poderá pensar que a senhora desconfia de nós, o que parece verdade. Prefiro não estudar mais com ela, a lhe causar desgosto. A Madre: Irmã, você é uma contestadora. Não fale mais. Vá pedir ao bom Deus para esclarecê-la e não volte hoje para me pedir desculpa de sua pouca docilidade. A Irmã (no dia seguinte): Minha Madre, peço-lhe perdão por tê-la penalizado, replicando. Estou disposta a fazer tudo quanto a senhora quiser. A Madre: Faz bem em reconhecer sua falta e repará-la. Os superiores têm razões para ordenar coisas que contrariam suas súditas. Ambas são bastante jovens. Deus as preserve de entregar-se a afeições muito naturais uma pela outra. Isso seria arriscado, caso eu não pusesse ordem. Também não quero absolutamente que fiquem juntas sozinhas. Ainda não existe nada sobre esse ponto que desagrade ao bom Deus, mas não tardaria a existir qualquer coisa. Para o futuro, quando eu lhe recomendar alguma coisa que a contrarie, recolha-se um momento, vá em espírito diante do Santíssimo Sacramento, e depois me faça a observação que o bom Deus lhe inspirar. Se eu não me render a seus desejos, obedeça sem a mínima réplica. A Irmã: Madre, deixe-me apresentar-lhe alguma coisa. A Irmã X. a teme, acha-a um pouco severa. Receava muito mesmo que isso a indispusesse contra a senhora. 298 A Madre: Sei que irei penalizá-la. Isso deve me impedir de cumprir meu dever e você o seu? Não, minha cara Irmã. Afinal, um pequeno mal que resultará disso, impedirá um mal maior e mais perigoso para ambas. Mesmo que saibamos os aborrecimentos que ocasionamos cumprindo o dever, nem por isso devemos deixar de cumpri-lo perfeitamente. Se a Irmã não sente prazer em ser repreendida enquanto estudam juntas, é melhor se separarem e estudar cada uma em particular. A Irmã: Apesar de tudo, sinto um pouco de desgosto ao notar que a senhora acredita haver entre nós um começo de amizade particular e porque nos envolve com tantas precauções. Entretanto, prometo obedecer-lhe. A Madre: Ainda não existe um começo de amizade particular, mas isso aconteceria e não deve acontecer. Vou ainda impor-lhe outro sacrifício. Vocês são o anjo uma da outra. Não serão mais. Sei que gosta de ser advertida de suas faltas. Então, eu me encarrego de adverti-la. Depois, quando não a vir mais, encarregaremos seu bom anjo da guarda de fazêlo. Além do mais, você tem sua consciência. Ela gritará bastante forte para que a ouça. 367 15 Encorajamentos a uma religiosa que parece engajar-se resolutamente na "via da infância espiritual." Que esse propósito se manifeste particularmente por uma inteira abertura de consciência (L 42, M 37). À Irmã Euphrasie, em Villefranche. Aubin, 10 de fevereiro de 1823. L.S.J.C. Como são boas as notícias que você me dá de si mesma, minha querida Irmã, como me consolam e são agradáveis ao coração! Trazem-me alegria e a mais doce consolação! Que satisfação para mim quando, na minha volta, encontrar minha Irmã Euphrasie com um semblante aberto, alegre e contente e este espírito de infância tão agradável ao amável Jesus. Continue a cumprir suas boas resoluções. Coloque-as sob a proteção especial de Maria. Mesmo recaindo alguma vez, não desanime, mas levante-se com humildade e confiança, entregando-se ao trabalho de bom coração e com alegria. Continue a abrir seu interior à minha querida Irmã Athanasie. Faça-o sem nenhuma reserva, com inteira simplicidade. Essa boa Irmã tem condições em todos os sentidos de bem dirigi-la e você não pode me dar mais doce satisfação do que lhe abrir seu coração com plena confiança. Que sua boa conduta seja consolação e alegria para ela. É na íntima persuasão de que assim o fará que sou toda sua. Irmã Emília Minhas carinhosas lembranças às nossas queridas crianças. 366 299 lastima ter de me deixar partir, mas está decidido e muito bem decidido que viajarei. Brevemente estarei com vocês. Eu lhes direi de viva voz que não têm bastante confiança em Deus. Entristeceu-me saber que Irmã Françoise está doente. Digam-me, por favor, por que e como lhe aplicaram um emplastro, o que é que lhe dói, se ela dorme bem e se tem apetite. Peço-lhe que não chore mais. Séraphine vai voltar bem convertida, como também suas companheiras. Eu as saúdo afetuosamente. Meus cumprimentos a Pe. Lalande. Adeus, sou toda de vocês. Irmã Emília 14 Concisa e densa exortação a um sacrifício sempre mais total, porém na discrição que garante a paz e a suavidade do esforço ( L 41, M 38). À Irmã Euphrasie Bauguil, em Villefranche. Aubin, 5 de fevereiro de 1823. Alegro-me de todo o coração pela calma e pela paz que Deus lhe dá. Cuide de não lembrar os tormentos interiores por reflexões sobre si mesma. Entregue-se a este espírito de sacrifício do qual experimenta as vantagens. Poderá haver maior felicidade do que dar tudo a Deus? Perdendo tudo, não se achará um tudo mais abundante do que a felicidade perdida? Caminhe tranqüilamente, com paz e alegria interiores, ocupando-se apenas do seu trabalho e nunca procurando saber algo do que não lhe diz respeito. Sou toda sua no Sagrado Coração de Jesus. Irmã Emília 34. Conferência sobre a hospitalidade de Abraão: ela deve ser o modelo da nossa (C 72-73; nº 27) Inspirando-se na narração do Gênesis (18, 1-9), Madre Emília mostra como a Casa-mãe deve acolher as religiosas das casas secundárias quando vêm para o retiro anual. Dará prova de uma franca cordialidade, incomodando discretamente a si mesma, se for necessário, porém na simplicidade, sem querer surpreender as hóspedes. Abraão estava no vale de Mambré, sentado à porta de sua tenda, quando três homens, que eram três anjos, apareceram. Logo que os percebeu, diz a Sagrada Escritura, correu ao encontro deles e prostrou-se por terra. “Senhor," disse ele, se achei graça aos seus olhos, não passe diante da casa de seu servo sem parar.” Vendo-os ceder a seu desejo, foi depressa dizer a Sara de assar pães debaixo da cinza. Ele mesmo correu até o rebanho, pegou um excelente novilho, muito tenro, e ordenou que o cozinhassem. Tomou, em seguida, manteiga e leite e serviu-os com o novilho preparado. Quanto a ele, mantinha-se de pé. Essa conduta de Abraão é cheia de ensinamentos para nós. Apenas avistou os estranhos, apressouse em ir ao encontro deles. É assim, minhas caras Irmãs, que devemos ir, em espírito de caridade, ao encontro das Irmãs quando vêm à Casa-mãe. Ir ao encontro de religiosas pertencentes a outra comunidade, quando vêm à nossa casa a fim de passar um ou vários dias, ao encontro de pessoas piedosas que foram aceitas para fazer um retiro aqui, quando a obediência nos permite conversar. Não quero dizer que devamos ir ao encontro dessas diferentes pessoas para manter com elas conversas inúteis, para nos informar de novidades de fora. Não. Assim, faltaríamos a nosso regulamento. Devemos ir neste espírito de união que nos fará ver nelas Irmãs talvez necessitadas de nossos serviços, de nossas delicadezas, enviadas de Deus que trazem graças e 300 bênçãos ao Instituto. Devemos tratá-las em tudo e em toda parte com respeito e veneração, dar-lhes o primeiro lugar nos recreios, no coro, no refeitório. Vejam Abraão: ele se prostra perante os anjos: "Senhor", diz-lhes, se encontrei graça diante do Senhor,” quer dizer: “se não sou indigno de hospedá-los, de proporcionar-lhes cuidados, entrem em minha casa, não vão adiante sem parar um pouco." Eis, mais ou menos, a linguagem que devemos manter com as pessoas estranhas, que somos obrigadas a admitir na casa, a linguagem a manter com as nossas Irmãs das casas secundárias, quando elas se desculpam ao receber delicadezas que cada uma de nós deve prestar. Devemos responder-lhes então: “É para mim uma honra e um grande prazer poder servi-la em alguma coisa.” Abraão trata seus hóspedes de “senhor” e chama a si mesmo de “servo”. Cada uma de nós deve se considerar como a serva de todas as suas Irmãs, porém particularmente como a serva da Irmã Julie e de suas filhas (religiosas do Sagrado Coração de Maria, que passaram duas ou três vezes uns quinze dias aqui na casa); como a serva de Antoinette (serviçal de Padre Marty, a qual se dedicou a casa); como a serva das Irmãs de nossas casas secundárias. Algumas vezes, elas são tímidas quando vêm aqui. É preciso deixá-las bem à vontade. “É sua casa, é seu berço," devemos dizer-lhes. "Não fiquem acanhadas, tudo o que é nosso é de vocês também. Podem manifestar os menores desejos, as necessidades ocultas e procuraremos satisfazê-las do melhor modo possível.” Nos recreios, devemos ir ao encontro delas e entretê-las, tanto quanto possível, com coisas santas, espirituais. Nunca deveria acontecer que uma Irmã nãoclausurada se aproxime de uma Irmã clausurada sem se sentir mais levada ao fervor, ao amor de Deus. Que má edificação não seria para uma Irmã não-clausurada ou para qualquer outra pessoa que crêssemos poder admitir na casa, se uma Irmã dedicada a uma vida retirada e de silêncio procurasse informarse das notícias do mundo, sentindo prazer em escutá-las, se ela não soubesse entreter-se senão de coisas vãs e fúteis. Em vez de fazer bem a suas Irmãs e às outras pessoas que algumas vezes 365 Christine e Janou tiveram a felicidade de fazer sua primeira comunhão. E eu, minhas queridas Irmãs, bem como Irmã Agathe, terminamos nosso retiro. Essa lhes envia carinhosas lembranças. Quanto a mim, sabem bem o que lhes diz meu coração que está entre vocês e que lhes deseja todo o entusiasmo e grandeza do amor. Hoje visitei metade da congregação e falei do bom e amabilíssimo São Francisco de Sales, cuja festa celebraremos quarta-feira. Procurem ter a missa naquele dia para honrá-lo particularmente. Sabem quanto crédito ele tem junto a Deus e qual era a sua mansidão, sua humildade, seu espírito interior, sua doce alegria, seu terno amor para com Deus, com que caridade suportava os defeitos do próximo, por maiores e desagradáveis que fossem. Temos nele um excelente modelo de todas as virtudes; por isso, devemos ser-lhe muito devotas e invocá-lo com grande confiança. Peçamos-lhe ardentemente1... (Falta a continuação dessa carta) 13 A casa de Aubin foi fundada no outono de 1822. Madre Emília permanece como superiora titular até julho de 1823, mas Irmã Vincent Vacquié assume a responsabilidade na ausência dela. A comunidade progride com bastante dificuldade, enfrentando vários processos judiciários. A fundadora escreve-lhe para confortá-la (L 40, M 32-33). Às Irmãs de Aubin. Villefranche, 1º de fevereiro de 1823. L.S.J.C. Tão certo quanto pode ser neste mundo, virei no decorrer da semana, eu o prometo e lhes dou minha palavra. Seus sofrimentos são também os meus. Eu os sinto intensamente e desejo de todo o coração poder amenizá-los. Se eu lhes dissesse o dia da minha chegada, vocês ficariam angustiadas caso não conseguisse realizar minha promessa. Aliás não o sei. Será na semana que começa amanhã, no dia que o bom Deus quiser. Nosso Pai diz que gostaria de ver-me aqui por mais tempo, 364 301 Nada de novo. Ainda não vi as Irmãs em particular. Estou tão atarefada que não visitei os coelhos nem os pombos. Como os porcos estão pertinho do meu quarto tive o prazer de vê-los. Os de Aubin podem se regozijar de estarem na fundação. Estão numa fartura tão grande que os daqui se alegrariam de comer as sobras. Sou toda de vocês, minhas muito queridas Irmãs. Alegrem-se, alegrem-se! Que em nenhuma transpareça tristeza. Vocês estão a serviço do grande Rei, levam consigo a marca do Esposo, estão em missão e devem conquistar almas para Deus. Ora, isso só se pode fazer de semblante alegre, não temendo nada, a não ser a ofensa a Deus. Sintam sua felicidade: poderia ser maior? Vocês a mereceram? Que têm feito para que Deus lhes conceda tantos favores? Sejam humildes, desconfiem de si mesmas, mas confiem em Deus. Irmã Emília. Não há nenhum ponto, nem vírgula; não tive tempo de acentuar. 12 Notícias a respeito dos votos e admissão na comunidade da Casamãe. Elogios a São Francisco de Sales, do qual Madre Emília falou à Congregação (v.s., p.8). (L 39, M 31-32) Às Irmãs de Aubin. Villefranche, 26 de janeiro de 1823. L.S.J.C. Temos mais duas Irmãs: uma como associada, tem o nome de São José, e a outra, Irmã porteira, o de Elisabeth. Esta piedosa cerimônia, realizou-se com muito júbilo. As novas esposas estão na alegria espiritual. As senhoritas Bouquiers e Dufau, que receberam a fita do postulado, se regozijam do primeiro passo que deram na vida religiosa e querem receber o véu nesses três meses. admitimos, ela faria mal e se afastaria do exemplo de Abraão, que não se entretinha com seus hóspedes senão das promessas de Deus, da salvação de seus irmãos. Abraão manda servir a seus hóspedes o que há de melhor: pães assados na cinza, leite e mel e carne de um tenro novilho. Essa refeição simples e modesta ainda é para nós uma lição: o pão é uma coisa muito comum, que todo mundo usa; o leite é ainda um alimento de uso comum; o mel, um pouco mais procurado em certos lugares, não é nada de extraordinário; a carne do novilho é das mais usadas habitualmente. Eis como devemos tratar nas refeições as pessoas que recebemos, oferecendo-lhes o que temos de melhor, mas sem nos afastar da simplicidade habitual em nossa alimentação. Podemos e devemos preparar um pouco melhor para elas os alimentos comuns, oferecer-lhes o melhor pão, os mais belos frutos e, sobretudo, sentir prazer em servi-las com grande cordialidade. Eis o que dilata os corações, os deixa à vontade. Entretanto, não devemos, na maneira de tratar nossas Irmãs das casas secundárias ou as outras pessoas que recebemos, exceto em um caso extraordinário, como na visita do Sr. Bispo, do Superiorgeral, servir iguarias que não usamos e que nem se espera no mundo encontrar nos conventos, tais como doces, pastelaria, café, licores. Servir tais coisas num convento pobre como deve ser o nosso não pode acontecer. Parece-me que isso não seria edificante. São iguarias do mundo e geralmente banidas das casas religiosas. Algumas de vocês puderam ver uma pessoa da casa, doente, a quem permiti usar uma garrafa de licor que lhe deram e algumas pequenas coisas inusitadas entre nós. Tive razões imperiosas para isso e meu coração sangrou bastante ao permiti-lo. Queria ter podido guardar num quarto fechado à chave a mesinha com essas coisas, a fim de serem vistas apenas pela pessoa que as usa. Não foi possível. Peço então, minhas queridas Irmãs, de não seguirem esse exemplo. Na época do retiro, cada uma de nós deve estar disponível para oferecer sua cama a nossas Irmãs que chegam cansadas de 302 363 nossas casas secundárias. Tenho a impressão e é verdade, que a palha e o chão no qual vocês estão deitadas durante esses oito ou dez dias são para vocês bastante suaves. Nós nos sentimos tão felizes em nos mortificar para servir as nossas Irmãs! Vocês devem também emprestar-lhes, oferecer-lhes o que têm em uso e lhes é permitido dispor. É nessa época do ano, sobretudo, que devemos meditar sobre a hospitalidade de Abraão e conformar nossa conduta à dele. As Irmãs cozinheiras, as refeitoreiras, as principais provedoras, que têm relacionamento imediato com nossas Irmãs, devem considerar-se felizes, mesmo se por isso forem impedidas de assistir a todos os exercícios do retiro, porque a caridade passa na frente de tudo. Fazemos o retiro para aprender a ser caridosa, a crescer no amor de Deus. Ora, servindo às Irmãs, por obediência, crescemos em amor e em graça diante de Deus. Repito: a época do retiro é um tempo de colheita para as Irmãs da Casa-mãe, que se conduzem com espírito de fé em relação a todas as nossas Irmãs. 35. Diálogo sobre a doçura e a caridade, sobretudo para com as crianças (D 122-124; nº 58) O projeto pedagógico de Santa Emília é antes de tudo educativo e apostólico: ela deseja primeiramente que as alunas da Sagrada Família se tornem sérias e fervorosas cristãs. Pe. Marty está plenamente de acordo com ela sobre esse ponto. Quando mais tarde for necessário insistir sobre o aperfeiçoamento técnico da instrução, Madre Emília se submeterá, mas deixará outras agirem. Aliás, o que ela diz aqui conservará sempre seu valor, em qualquer contexto que seja. Observamos que o “diálogo” parece bem enquadrado numa reunião com várias religiosas. A Irmã: Minha Madre, eu me acuso de muitas vezes faltar à doçura com as crianças. A Madre: Você faz bem em reconhecê-lo. Humilhe-se diante do bom Deus por ainda não ter aprendido na escola do divino Salvador a ser doce e humilde de coração. Jesus Cristo não nos disse em seu Evangelho: “Aprendam de mim a fazer 11 Tendo de retardar a viagem projetada na carta anterior, Madre Emília compensa dando notícias da comunidade de Villefranche. Anima suas correspondentes, recordando-lhes os motivos essenciais de sua alegria e de sua gratidão para com Deus (L 37, M 29-30). Às Irmãs de Aubin. Villefranche, 21 de janeiro de 1823. L.S.J.C. Vamos, se Deus quiser, dar a fita de postulante às senhoritas Bouquiers e Dufau, o hábito religioso a Marie Raynal e o santo véu à senhorita Delcamp. Rezem por elas, minhas queridas Irmãs, a fim de que tenham, bem como nós, o espírito religioso. Comunicarei o dia dessa cerimônia, para que possam se unir a nós. Penso que será domingo. A senhorita Delcamp escreveu à mãe dela para que providencie tudo o que lhe é necessário. Envio-lhes a carta para que a entreguem logo no dia seguinte. Enviem por Christine, a quem mando lembranças. A menina dela vai bem. Ainda não fez a primeira comunhão, mas está se preparando. Não sei se receberam minha última carta, na qual eu lhes dizia que nosso bom Pai, vendo-me mais cansada, me tinha dito que devia voltar o quanto antes. Não posso determinar o dia, mas será logo que terminar meus afazeres aqui. Minha idéia de permanecer apenas quatro ou cinco dias não corresponde ao que ainda tenho a fazer, mas fiquem tranqüilas, voltarei em breve. Nossas Irmãs e nosso Pai sentem a necessidade de meu regresso a Aubin. Sejam inteiramente de Deus. Observem bem o Regulamento e façam suas orações com particular atenção... Nossas queridas Irmãs lhes dizem tudo o que se pode dizer, especialmente minha Irmã Agathe. Ela desejaria muito escrever-lhes, mas posso certificálas de que isso não lhe é possível. Minhas lembranças a Virginie. Digam-me se está bem comportada. Minha afeição às nossas crianças e saudações aos nossos amigos. 362 303 Meu coração está com vocês, minhas queridas Irmãs, e lhes desejo, como sempre, mil e mil bênçãos, sobretudo coragem e generosidade. Quando tiver terminado nossos negócios, que resolverei o mais rápido possível, irei lhes falar de viva voz. Adeus, não posso hoje lhes dar a mínima notícia. Vivam na paz e na mais perfeita união. Obedeçam à minha cara Irmã Vincent como a mim mesma. Irmã Emília 10 A fundadora deixa entrever às religiosas de Aubin a eventualidade muito provável de uma visita (L 36). Às Irmãs de Aubin. Villefranche, 17 de janeiro de 1823. L.S.J.C. Vejam, minhas boníssimas Irmãs, se não estou cumprindo minha promessa: escrevo-lhes todos os dias e encontro nisso uma doce satisfação. Nada de novo aqui. A alegria de nossas queridas Irmãs só é perturbada pelo receio de me perderem. Anunciei-lhes que em breve deveria deixá-las. Na primeira vez em que lhes disse isso, elas não o podiam suportar. Agora aceitam melhor. Penso que, se não fosse minha saúde, teria sido impossível ir até vocês, apesar de toda a minha boa vontade. Mas, havendo essa razão, terei logo a doce consolação de me encontrar no meio de vocês. Adeus. Sou toda de vocês. Que a paz e a alegria transbordem de seus corações. Irmã Emília milagres, a passar noites em oração, a jejuar”, mas ele nos disse: “Aprendam de mim que sou doce e humilde de coração.”76 A doçura e a humildade são duas virtudes muito caras ao Coração de Jesus, duas virtudes que todo mundo pode praticar. Como uma pessoa doce e humilde ganha almas e honra a piedade! Sabemos, por nossa própria experiência, que muitas vezes obtivemos por meio da doçura o que jamais poderíamos ter obtido empregando a severidade. Sejam doces, minhas caras Irmãs, em suas palavras, jamais dizendo alguma coisa que possa causar desgosto a alguém, mas que seja ditada por uma terna e cordial caridade. Sejam doces para com as crianças não as irritando nunca, mostrando-lhes em todas as ocasiões um coração de mãe. Que elas não as vejam nunca seguir a natureza ao puni-las. “A palavra doce apazigua a cólera, a palavra dura excita o furor.”77 Meditem sobre essas palavras e vejam se sua conduta se conforma a elas. Quando uma criança se obstina em não querer obedecer, vocês a conquistarão pela doçura. Caso contrário, a irritarão. A Irmã: Eu pensava que nunca devia ceder às crianças e que, quando têm uma vontade forte, é preciso ser mais forte que ela. A Madre: Eu disse que é preciso ceder às crianças, mas é preciso algumas vezes fazer de conta que estamos cedendo. Depois, quando percebemos que a criança está calma, é preciso exigir com doçura aquilo que tínhamos pedido antes. As crianças compreendem logo, quando a mestra as castiga, se ela está impaciente ou se está calma, unida a Deus. Todas as vezes que falam às crianças ou a qualquer outra pessoa, façam isso com doçura. A Irmã: Minha Madre, eu acho isso bem difícil. Tentei várias vezes ser doce, mas parece-me que as crianças não me escutam. É preciso me impacientar um pouco, falar um pouco forte. A Madre: As alunas não a escutam quando você fala com doçura porque estão acostumadas a vê-la falar de modo 304 361 contrário. Elas a escutariam muito bem se habitualmente a ouvissem falar com doçura e em voz baixa. O demônio a persuade de que não conseguirá nunca praticar um ato que lhe foi tantas vezes recomendado para fazê-la perder o fruto de seu trabalho, e também para impedir o bem que poderia fazer comportando-se de outra maneira. Chove a cântaros, o que nos impede de... nossa consolação é pensar que é melhor fazer a fundação com a chuva do que com o sol. Dizem que não há lugar mais necessitado dela do que este e esperamos que todos a vejam com bons olhos. Peçolhes, minhas queridas filhas, que me enviem o véuzinho de crepe. Um meio próprio para adquirir essa mansidão que deveria ser encontrada em todas as religiosas é, minhas caras Irmãs, manterem-se em estado de calma interior, de união com Deus, e então todas as suas palavras se impregnarão dessa disposição de sua alma. Adquirem muitos méritos aplicando-se em fazer o que lhes digo. Detestem cada dia suas faltas de doçura. Se for para com as Irmãs que faltaram, peçam perdão e tomem o propósito de melhorar. Mil lembranças a todos os nossos amigos. Transmitam ao nosso querido Pai meu respeito muito afetuoso. Digam-lhe que se lembre, junto ao bom Deus, de suas pobres filhas que estão no meio da Babilônia. Quanto a vocês, minhas queridas Irmãs, alegrem-se por estar perto do santuário. Amem o bom Deus, amem-se umas às outras e sejam extremamente dóceis. Obedeçam a minha Irmã Athanasie2 com prontidão e alegria. Aliviem o seu fardo pela fidelidade a todos os deveres. Assim gozarão de uma grande paz. A Irmã: Minha Madre, eu ouvi dizer de algumas Irmãs que são muito doces, que suportam tudo com paciência, que não têm sangue nas veias, que nunca terão sucesso junto às crianças. Eu não gostaria que se dissesse isso de mim. Aguardando o prazer de vê-las, sou, minhas queridas filhas, no Sagrado Coração de Jesus, toda de vocês. Irmã Emília A Madre: Não quer que se diga isso de você. Qual o motivo que a anima? O amor-próprio. Será que as religiosas devem se deixar guiar por motivos tão baixos, tão imperfeitos? É errado dizer o que acabo de ouvir e você não deve dar-lhe crédito. Os tesouros de mérito adquiridos por muitas religiosas de caráter vivo e petulante, que por esforços contínuos sobre si mesmas parecem cordeiros, são muito grandes. Quantos erros nos julgamentos que fazemos. As coisas nos aparecerão sob outro ponto de vista quando Deus nos conceder um pouco de sua luz interior. Algumas vezes cremos fazer muito e não fazemos nada, porque não é o Espírito Santo que nos move. A Irmã: Minha Madre, se nós formos demasiado tranqüilas, nada fazemos pelas crianças, elas não progridem. Nosso Pai deu ultimamente orientações a respeito da calma e da doçura que ele desejava que tivéssemos. A mim parece não ser possível fazer como ele diz. Ano de 1823 9 Uma breve palavra de encorajamento à comunidade de Aubin, em meio à urgência de múltiplos negócios ( L 35, M 28). Às Irmãs de Aubin. Villefranche, 15 de janeiro de 1823. L.S.J.C. 360 305 Ano de 1822 8 Primeira carta escrita pela superiora às suas religiosas de Villefranche que ela acaba de deixar para proceder à fundação de Aubin. Conta com gracioso otimismo as peripécias da chegada e da instalação provisória e recomenda a docilidade para com a assistente que a substitui na Casa-mãe (L 34, M 26-27). Às Irmãs de Villefranche. A Madre: Tudo é possível a uma religiosa bem obediente e que tem compreensão. Quando Pe. Marty e eu dizemos que é preciso trabalhar na educação da infância sem confusão, sem inquietação, sem preocupação, sem que o cuidado que lhe dispensamos prejudique em nada nossa perfeição, não pretendemos dizer que seja necessário nos acomodar, não buscar o progresso das almas, não é isso que pedimos. Assim faltaríamos à justiça. O que desejamos é que as educadoras não esqueçam em sua conduta e em seu relacionamento, seja com as alunas, seja com os pais, que antes de serem educadoras elas são religiosas, e aquilo que é objeto secundário de nossa vocação não seja colocado no primeiro plano. Seu primeiro objetivo foi o de serem religiosas e não simplesmente educadoras. Aubin, 29 de agosto de 1822. L.S.J.C.1 Minhas caríssimas filhas: Chegamos a Aubin ontem à tarde, acompanhadas de nossa querida fundadora que é muito boa para conosco e tem o cuidado de nos manter alegres. Nossa primeira tarde passou-se sem tristeza e numa certa escassez de bens deste mundo. Apesar disso, jantamos com bom apetite. A noite teria sido bastante tranqüila se não fosse uma tempestade que nos ameaçava de inundação e a chuva entrando em nosso apartamento. Fomos à santa Missa em honra de São João Batista, tomando-o como protetor de nossa fundação, para a qual iremos começar a agir a partir de hoje à tarde. Peçam ao bom Deus que inspire bons pensamentos ao Sr. Vigário e ao Sr. Prefeito. Já vimos todas as nossas ex-alunas e particularmente duas que nos testemunharam muito afeto, sobretudo a Srta. Fournols que nos ofereceu um almoço tão copioso quanto escasso tinha sido o nosso jantar. Acompanhou-nos em seguida à casa do Sr. Murat, que nos acolheu muito bem, pois tem um carinho particular pelas religiosas. Ofereceu-nos o seu jardim para passearmos e aceitamos, visto que fica pertinho de nossa casa e é muito tranqüilo. Estamos hospedadas na casa de uma senhorita que é um modelo de virtude. Ora, minhas Irmãs, várias dentre vocês esquecem hoje esse primeiro objetivo e sonham tornar-se educadoras. A prova disso é o pouco caso que fazem da obediência, do espírito religioso, da observância da Regra. Suas salas de aula as preocupam demais quanto ao material, ao acessório. Vocês não se interessam tanto por fazer de suas alunas santas, quanto em torná-las pequenas sábias. O que é uma mulher instruída se não tem a piedade, o amor pelo trabalho? É uma pessoa muito perigosa e que corre o risco de se perder e de perder os outros. Pensem nisso, minhas Irmãs. Nós não nos dedicamos à educação da juventude para ganhar dinheiro, para atrair a estima e a consideração dos homens, mas para procurar a salvação das almas, a glória de Deus. Para atingirmos esse objetivo, devemos todas ser fervorosas religiosas e depois boas educadoras. Nós o seremos se buscarmos em nosso trabalho, como acabo de dizê-lo, apenas a glória de Deus. Porque então compreenderemos que podemos fazer maior bem a nossas alunas pela oração, pela mortificação, por uma conduta mais regular do que por nossa competência. Quanto bem faz às crianças uma mestra cheia do espírito de Deus, que haure na oração e na meditação a luz, as forças e as graças necessárias para bem cuidar do pequeno rebanho que Deus lhe confiou, uma mestra que, ao mesmo tempo em que instrui, inspira o amor ao bem e à virtude. Ela ensina as crianças a agirem com 306 359 pureza de intenção, a fazerem bem suas orações, a amarem os pobres, os doentes, a fugirem da ociosidade, a amarem o trabalho. Uma mestra deve ser em tudo o modelo de suas alunas. A Irmã: Minha Madre, procuraremos aproveitar de tudo o que a senhora nos disse. A Madre: Será para si mesma que cada uma trabalhará. Se o que fazem for conforme à obediência, obterão uma recompensa; caso contrário, perderão o tempo. As Irmãs que dizem não poder se conformar às recomendações feitas por nosso Pai pensem bem ser o demônio que as persuade disso. Tudo o que fazem além do que a obediência lhes prescreve é perdido para a eternidade. Não se iludam, minhas caras Irmãs, não creiam que seja o espírito de Deus quem guia uma religiosa que, tendo sido advertida para amenizar um pouco suas forças, não falar alto, tratar com mais doçura e caridade suas alunas, dando mais atenção à formação de seu coração e de seu caráter, parece não fazer nenhum caso dessas recomendações para lhes fazer aprender muito de história, de geografia, de gramática. Não, não, não é o espírito de Deus que a move. É a sua própria razão que a dirige, sem mérito para o céu. Como uma religiosa que compreende tão pouco a obediência poderá ensiná-la às suas alunas? Isso não é possível. Há religiosas que julgam fazer-se respeitar assumindo um tom e ares de autoridade, abrindo os olhos, nunca falando às crianças com essa simplicidade que é a verdadeira característica dos discípulos de Jesus Cristo. Elas se enganam muito mesmo. Em sua presença, as alunas se mostram em perfeita ordem, não dizem uma palavra, mas por temor, sem mérito, portanto. Se a mestra se retira, elas falam de seus modos, criticam sua conduta, comparam-na com outras religiosas mais humildes, mais modestas. "Ah!" dizem elas, "Irmã N. é melhor que a Irmã X; ela nos fala sempre com bondade, com doçura, tem sempre alguma coisa amável a nos dizer.” 7 À Senhora de Trenquelléon. Villefranche, 1º de abril de 1820. Aleluia! É com alegria e de todo o meu coração que lhe desejo, minha querida Irmã e a toda a sua comunidade, a alegria, a paz e o santo ardor que nos deve inspirar a grande solenidade que a Igreja celebra. Nosso divino chefe vitorioso e triunfante inspiranos a doce confiança de que todas as tentativas de nossos inimigos só conseguirão proporcionar-lhes uma vergonhosa derrota. Agora, na bela estação, nós a esperamos todos os dias e nos alegramos antecipadamente na esperança de vê-la. Eu, particularmente, sinto grande alegria, certa de que sua viagem será para a maior glória do divino Esposo a quem nos consagramos. Possa sua bondade nos iluminar e ele mesmo aplainar o que poderia dificultar nossa união. Se ela está nos interesses dele, não duvidemos de que seja perturbada pelo inimigo de todo bem. Rezemos para obter uma pura intenção. Não lhe peço notícias de suas queridas filhas, na esperança de tê-las de viva voz. Aguardando essa consolação, sou toda sua no Sagrado Coração de Jesus. Irmã Emília. 307 358 Participo vivamente da tristeza do seu coração ao ver suas queridas filhas na impossibilidade de satisfazer o preceito de nossa boa Mãe. Estou na mesma situação que você, tendo várias Irmãs obrigadas a comer carne, inclusive eu. Quanto ao jejum, apenas uma dentre nós todas pode fazê-lo. Assim, veja que nossa casa está sempre à sombra da cruz, mas, como a escolhemos por nosso quinhão, ela deve ser nosso tesouro. Nossa Irmã porteira esteve muito doente dos pulmões; agora me parece fora de perigo. Eu lhe disse que a sua estava enferma: ela se solidarizou com o mais vivo interesse e me disse que a ama muito, pois a considerava como sua irmã e iria rezar por ela. Todas as nossas Irmãs se alegram ao ouvir falar das suas. Elas pretendiam abraçar afetuosamente a "bonequinha" e a esperavam com ansiedade, mas ela não nos foi entregue. Teremos o prazer de nos encontrar depois da Páscoa. Isso valerá muito mais do que a boneca. Entretanto, é lamentável que depois de ter o trabalho de fazê-la se tenha extraviado. Não conhecendo o portador, não pude reclamar. Mas, voltemos às nossas viagens. Penso que sem isso a união de nossas casas será impossível. Aliás, essa união é desejada por minhas Irmãs e por mim. Assim, minha querida Irmã, espero-a depois da Páscoa e não uma de suas filhas, pois considero conveniente que veja por si própria e não pelos olhos de uma delas, por mais confiança que mereçam. Concordo com você que a responsabilidade é algo bem difícil, e minha impressão é tão forte que nunca pude encará-la. Um ato de confiança cega, eis tudo o que consegui fazer. Adeus, minha muito querida Irmã. Na espera do grande prazer de vê-la, sou toda sua no Sagrado Coração de Jesus1. Emília Rodat. 3º – Temas de provação e de sofrimento 36. Conferência sobre a fé e o sacrifício de Abraão (C 66-67; nº 24) Acontece algumas vezes que a perfeição, verdadeiramente querida e procurada, parece absolutamente inacessível. Uma redobrada renúncia torna-se necessária na confiança contra toda esperança. As intervenções divinas podem ser súbitas e maravilhosas. Deus, minhas caras Irmãs, prometeu a Abraão uma posteridade mais numerosa que as estrelas do firmamento e, para prová-lo, prorrogou por muito, muito tempo, o cumprimento de sua promessa. Abraão acreditou sempre na palavra de Deus. De idade avançada, ele e sua mulher, tudo o levava a crer que não devia mais esperar este filho predito, esta raça da qual Isaac devia ser a haste. Sara duvida, mas Abraão acredita sempre. Firme em sua fé, ele crê contra toda esperança. E Deus, cuja palavra é infalível, lhe dá esse filho tão desejado e tão pacientemente esperado, vinte e cinco anos após a promessa que lhe tinha feito. Como essa conduta de Deus é instrutiva, minhas caras Irmãs. Deus gosta de provar a fé de seus servidores. Ele promete e depois faz esperar por muito tempo o objeto da promessa para ver se a alma não duvidará. Faz surgir mil dificuldades, mil embaraços, capazes de tirar todas as possibilidades, toda esperança de sucesso. Em tudo isso ele não procura senão provar a alma, fazê-la adquirir mérito. Deus dá um filho a Abraão, vinte e cinco anos após a promessa. Acontece a muitas almas esperarem mais do que esperou esse pai dos crentes, para ver se realizarem as promessas que ele lhes fez. Assim, Deus chama uma alma à perfeição, pede-lhe um grau de virtude extraordinário, dá-lhe primeiramente o desejo de atingi-la e deixa mesmo entrever que ele quer da alma essa aspiração. Essa alma, amiga do bem e 308 sobretudo desejosa de cumprir a vontade de Deus, trabalha com toda a sua vontade para adquirir essa virtude, essa perfeição. Para prová-la, Deus permite que, em vez de ser bem sucedida em seu empreendimento, ela se torne, pelo menos aparentemente, menos perfeita, menos virtuosa. Ele a tinha feito perceber que, fazendo o bem, teria a paz da alma, a felicidade. Mas, nada disto. Escrúpulos, provações de toda espécie a assaltam. Antes tinha uma certa facilidade de se dar a Deus. Depois que a ele se devotou, desgraças incessantes caem sobre ela. Hoje, são reveses de fortuna; amanhã, negras calúnias que obscurecem sua reputação. Um pouco mais tarde, penosas tentações que a colocam na iminência de perder-se. Muitas vezes, sente-se perdida, pela impossibilidade aparente que vê de realizar sua salvação. A fé de Abraão deve ser, nessa circunstância, a fé dessa alma. Contra toda esperança ela deve crer que sua salvação será alcançada pela atenção que tem ao cumprir em tudo a vontade de Deus. Evita o mal tanto quanto lhe é possível, por nada ela quereria ofender a Deus, e isso deve lhe bastar. Todo sofrimento que lhe advier dos homens, do demônio e dos abandonos aparentes nos quais Deus a deixa, não serão senão uma prova. Como Abraão, repito, ela deve crer contra toda esperança que se salvará e atingirá o grau de perfeição ao qual Deus a chama. Ele não se contentou em fazer Abraão esperar o objeto de sua promessa, mas o submeteu a uma segunda prova, ordenando-lhe que lhe sacrificasse o filho tão amado e tão longamente esperado. Mas, como o sacrifício de Isaac pode nos fornecer matéria para outra instrução, termino aqui com uma última consideração. Durante sua provação, Abraão foi muitas vezes visitado por Deus que repete as coisas que antes já lhe havia dito uma primeira vez, o que consola e sustenta esse pai dos crentes. Igualmente, a alma de quem Deus prova a fé é de tempos em tempos visitada pelo nosso bom e amado Mestre. Uma iluminação súbita, uma palavra ao coração, um reforço de coragem, uma carícia do Espírito Santo, eis as visitas que Deus faz à alma e pelas quais a fortalece e a prepara para novas provações. 357 Ontem vi o pequeno Henri3: ele está bem e é muito bem comportado; envia-lhe lembranças, bem como para papai e Eléonore. Vovó e titia lhe asseguram sua terna afeição. Ao papai, meu respeitoso afeto e diga a Eléonore que a amo de todo o meu coração. Com muito afeto, sou, minha querida mamãe, sua filha submissa, Emília Rodat P.S. Vovó estranha não ter recebido a resposta de papai a respeito da minha emancipação, que ela lhe havia pedido. Pedelhe que a faça o mais breve possível. Peço-lhe também de me responder, querida mamãe, logo que lhe seja possível. Sinto muito ter de lhe dar tanto trabalho, mas sua amizade por mim me faz esperar que fará tudo com prazer. Ano de 1820 Nas duas cartas seguintes, dirigidas à co-fundadora das Filhas de Maria de Agen, Adèle de Trenquelléon, revela-se a intenção de Madre Emília de unir sua pequena congregação à de sua correspondente. Espera-a brevemente em Villefranche. A "boneca" de que se trata devia vestir o hábito das Filhas de Maria, de maneira a fornecer um modelo às companheiras de Madre Emília (L 23 e 24) (v.s., p. 8-9) 6 À Senhora de Trenquelléon. Villefranche, 10 de março de 1820. Minha muito querida Irmã: Gostaria de lhe dar as informações que me pede, se conhecesse a família Labroquère, mas não me será possível, por não ter dela nenhum conhecimento. 356 peixe fora d'água. Quando saio daqui, sinto-me sem jeito até voltar. E por que acharia a senhora incorreto deixá-la por Deus? Eléonore o faz pelo Sr. Colomb, e a senhora acha isso bom. Aquele que ela escolhe não pode, entretanto, ser comparado com o meu1. As dificuldades de que me fala não são tão grandes quanto pensa. Tenho motivos para esperar ser bem sucedida. Aliás, em toda parte há alguns sofrimentos, e prefiro os que terei aos da minha irmã. Meu desejo não é, como a senhora pensou, de estar na tranqüilidade. Meu repouso é somente cumprir a santa vontade de Deus. Até agora, minha querida mamãe, fiz o possível para não lhe ser um peso e, por essa razão, alegro-me em poder viver do meu trabalho. Quanto ao resto de que precisava, sempre me limitei ao estritamente necessário. Tenho, pois, razão de esperar que fará todos os esforços para não me negar o que lhe peço. Se, à primeira vista, isso lhe pareceu quase impossível, mudará de idéia ao pensar que assim poderá me proporcionar a única forma de felicidade que desejo neste mundo. A senhora ama tanto seus filhos, já lhes deu tantas provas do seu afeto. Vai querer me recusar agora essa prova de seu amor? Aliás, o que fizer por mim, vovó considerará como feito a ela própria: pois, ao pensar que a senhora não quisesse para mim o que suas possibilidades não lhe permitem fazer, ela ficou tão penalizada que não está bem. Aconselhei-a, esta manhã, a tomar alguns remédios. Respondeu-me que antes seria preciso destruir a causa do seu mal. Coloque-se um momento em seu lugar: ela não tem razão em querer ficar sempre aqui? Conhece-me bast