prece no limiar

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prece no limiar
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. . . . . . . . . . . . S U M Á R I O. . . . . . . . . . . .
AS DIVERSAS LINGUAGENS NA MEDIAÇÃO
DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA
INTRODUÇÃO............................................................................................
03
1
CAPÍTULO 1 - MEDIAÇÃO ESCOLAR E INCLUSÃO E AS QUESTÕES
PARADIGMÁTICAS ..................................................................................
06
2
CAPÍTULO 2 - ATENDIMENTO EDUCACIONAL AOS DEFICIENTES.
NECESSIDADE ESPECIAIS......................................................................
12
CAPÍTULO 3 - HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA NO BRASIL.....
22
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..........................................................
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3
PRECE NO LIMIAR
Senhor, no silêncio deste dia
Que amanhece,
Venho pedir-te a paz, a sabedoria e a força.
Quero olhar hoje o mundo com
os olhos cheios de amor;
ser paciente, compreensível, manso e prudente.
Quero ver os meus irmãos
além das aparências;
Quero vê-los como Tu mesmo os vês,
e assim não ver senão o bem em cada um.
Cerra meus ouvidos a toda calúnia.
Guarda a minha língua de toda a maldade.
Que só de bênçãos se encha o meu espírito.
Que eu seja tão bondoso e alegre,
que todos quantos se achegarem a mim
sintam a tua presença.
Reveste-me da tua graça, Senhor,
e que no decurso deste dia eu não
te ofenda, e te revele a todos.
3
INTRODUÇÃO
Visamos desenvolver com estas reflexões a capacidade de sentir, de
compreender, de gerar insights, sobre a sociedade brasileira, dentro do desafio de (re)
construí-las mais harmonizadas, equilibradas, igualitárias. É indispensável para o
educador, psicólogo, médico etc., para o aluno, esta capacidade que nos leve a
compreender1 – além de entender – a sociedade como um todo, constituída pela
“soma” dos indivíduos, dos lares, pela formação das instituições, pela constituição do
Estado.
Necessário perceber a panorâmica dos problemas atuais que estamos
vivendo: desemprego, violência e criminalidade, poluição, falta de saúde, de
educação, desigualdade social, falta de habitação, entre outros, onde o indivíduo é o
epicentro.
A violência está crescendo a cada dia, principalmente nas grandes
cidades brasileiras. Os crimes estão cada vez mais presentes no cotidiano das
pessoas.
O problema ambiental tem afetado diretamente a saúde das pessoas em
nosso país. Os rios estão sendo poluídos por lixo doméstico e industrial, trazendo
doenças e afetando os ecossistemas. Lembremo-nos do caso de rompimento da
barragem de rejeitos da mineradora Samarco, cujos donos são a Vale a angloaustraliana BHP, que causou uma enxurrada de lama que inundou várias casas no
distrito de Bento Rodrigues, em Mariana, na Região Central de Minas Gerais, na
tarde do dia 05.11.2015.
O ar, principalmente nas grandes cidades, está recendo toneladas de
gases poluentes, derivados da queima de combustíveis fósseis.
Nos dias de hoje, pessoas que possuem uma condição financeira melhor
estão procurando os planos de saúde e o sistema privado, pois a saúde pública
encontra-se em estado de crise aguda. A disseminação do zika vírus e sua provável
ligação com casos de microcefalia tornaram-se uma emergência de saúde pública
internacional, declarou no dia 01.02.2016 a Organização Mundial da Saúde (OMS).
A educação pública encontra vários problemas e dificuldades: prédios mal
conservados, falta de professores, poucos recursos didáticos, baixos salários,
greves, violência dentro das escolas, entre outros. (nosso fulcro)
O que fazer? Educar! Como?
A construção da identidade pessoal é um processo de construção de
sujeito, enquanto pessoa, enquanto ser humano. O indivíduo forma-se a partir da
educação recebida no Lar, por seus pais ou responsáveis. Desempenhará seus papéis
sociais de forma competente, amável, responsável, em conformidade com os exemplos
que receba no Lar, primeiramente. Este fato se consolida, principalmente, quando é
ensinado a fazer constantes autoavaliações, num constante relacionamento saudável
consigo mesmo.
1
Compreender, em sentido próprio, supõe algo mais do que o frio entendimento de uma mensagem objetiva:
envolve, de algum modo, a captação de um alguém, um alguém vivo e concreto que expressou aquela mensagem.
Nesses contextos, "compreender" não se deixa substituir por "entender", "conhecer" etc.
4
A posteriori, virá a Escola e a Igreja. Estas duas Instituições formarão,
respectivamente, a cidadania e religiosidade, isto é, a vivência das virtudes. Daí, a
concepção de sujeito humano como portador da capacidade de simbolizar, de
representar, de criar e compartilhar significados em relação aos seres humanos e
aos objetos com os quais convive.
Um dos vetores com enorme potencial transformador é a mídia. Então, como
contribuir para um processo social educativo, no sentido de esclarecer os limites e
possibilidades para o avanço das práticas pedagógicas, tendo como tema a influência
da televisão (mídia mais usada) na vida do educando? Nada contra os programas
televisivos, mas o FS, o SS, o BBB o que ensinam para uma vida saudável, com um
bom gerenciamento das emoções, dos impulsos?
Nessa esteira que estamos, podemos citar, pelo menos, mais um vetor: a
globalização.
O termo globalização aponta para duas imagens: a primeira pressupõe a
extensão de uma determinada cultura até seu limite, o globo. Na segunda as culturas
heterogêneas tornam-se incorporadas e integradas a uma cultura dominante, que
acaba por cobrir o mundo inteiro. Coisas que eram mantidas separadas são agora
colocadas em contato e em justaposição. As culturas se acumulam umas sobre
as outras, se empilham, sem princípios óbvios de organização.
Esta definição nos garante que todos nós já estamos incluídos de algum
modo em todos os espaços, inclusive num sistema de comunicação. No entanto,
observamos que a discussão sobre o tema é acirrada, principalmente no meio
intelectual brasileiro: quais diferenças terão permissão para permanecer nessa
incorporação de culturas? Qual é o problema a ser observado se a globalização mescla
mundo, mistura valores? Por que nos inquietarmos diante desse fenômeno e por que a
exclusão fica tão evidente?
Se existe necessidade de falarmos sobre inclusão é porque estamos em
dúvida sobre o conceito de pessoa humana. E se este conceito está sob suspeita é
porque as formas de conhecimento de que dispomos estão desequilibradas em relação
ao nosso modo de ser e de agir no cotidiano.
Diante desta realidade novas perguntas podem ser formuladas
complementando as primeiras: o que está acontecendo com a pessoa humana e a
consciência humana? Por que ela está confusa com relação às imagens da realidade?
E que realidade é esta que nos invade, disfarçada, escondida em simbolismos
dissimulados e manipuladores?
Essas inquietações nos atingem como profissionais da educação, da
aprendizagem humana, da psicologia, da sociologia, da psicopedagogia, além de
outros profissionais.
Durante o processo de desenvolvimento normal a identidade infantil vai se
constituindo através das formas sociais que ela compreende e vivencia conforme são
sintetizadas no mundo psíquico em desenvolvimento; o adolescente, na continuidade
da vida infantil, integrará as imagens adequadamente; o adulto as disponibiliza em
sistemas coerentes de valores no mundo do trabalho e das relações afetivas; o idoso
torna-se generativo, íntegro e sábio.
A educação prioriza os aspectos cognitivos do aluno em detrimento de
outros fatores também importantes para o processo educativo. Não devemos pensar
apenas na cabeça do aluno, pois o coração também é importante. A inteligência
emocional, não obstante Daniel Goleman trazer o excelente contributo no final da
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década de 90,2 está esquecida e a inteligência volitiva nem sequer é considerada. Ora
não somente o pensar, mas também o sentir e o querer integram a inteligência.
Ora, ao examinarmos a Pedagogia do Afeto pensamos na designação das
relações interpessoais de afetividade em sala de aula, fundamentada na Psicologia
Transpessoal conhecida como a quarta força, oriunda dos estudos de Maslow, Sutich,
Fadiman e Grof, muito embora Jung tenha sido o pioneiro a considerar a dimensão
espiritual do ser humano.
Nessa linha é que se fundamenta esse modelo de ensino voltado para o ser,
pela necessidade de se pensar nas mudanças que ocorrem na contemporaneidade no
que tange à educação dos indivíduos.
Maturana3 define bem quando afirma que vivemos uma cultura na qual
desvaloriza as emoções, e não vemos o entrelaçamento cotidiano entre razão e
emoção, que constitui o viver humano, e não nos damos conta de que todo sistema
racional tem um fundamento emocional.
A Pedagogia do Afeto pode complementar o trabalho da Psicopedagogia
Preventiva, não só no seu objetivo de evitar dificuldades de aprendizagem, mas de
otimizar relações humanas afetivas no ambiente escolar.
O hábito do estudo sistematizado, o domínio da interpretação através do
mundo da leitura que nos leve a leitura do mundo, para que vivamos contextualizados,
agindo com eficiência e competência, diante dos enfrentamentos necessários ao bom
viver.
Refletindo sobre FUNDAMENTOS DA PSICOPEDAGÓGIA CLÍNICA E
INSTITUICIONAL, pensamos no ser humano baseado no seu potencial de
realização, para que as atitudes sociais sejam concretizadas na organização de
serviços e recursos educacionais integrativos, transformando-nos, em cidadãos
críticos, criativos, responsáveis, fluindo uma vida social digna, saudável, feliz, portanto,
cidadã.
Edgar Morin, filósofo contemporâneo, escreveu um lindo livro: Os sete
saberes necessários à Educação do Futuro4, que visa uma educação construtiva da
totalidade, para o ser humano integral e não apenas a um de seus componentes. Sete
eixos/caminhos para uma construção educativa interdisciplinar, cidadã.
2
GOLEMAN, Daniel. Trabalhando com a inteligência emocional. Rio de Janeiro: Objetiva, 1999.
MATURANA, Humberto. Emoções e linguagem na educação e na política. Belo Horizonte: Editora
UFMG, 1998
4
MORIN, Edgar. Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro. 8ª ed. Editora Cortez. São
Paulo, 2003.
3
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CAPÍTULO 1
MEDIAÇÃO ESCOLAR, INCLUSÃO E
AS QUESTÕES PARADIGMÁTICAS
Iniciaremos este capítulo perguntando se vocês conhecem relativamente
bem sobre as questões paradigmáticas. O que é um paradigma?
PARADIGMA – de acordo com Thomas S. Kuhn, filósofo e historiador da
ciência, paradigma significa “a constelação de crenças, valores e técnicas
partilhadas pelos membros de uma comunidade científica.” É o modelo, a maneira,
a forma que permite a explicação de certos aspectos da realidade. É um conjunto de
regras e padrões que nos mostra como resolver problemas dentro de certos limites.
É, de forma simplista, como percebemos o mundo.
PARADIGMA MATERIALISTA - percebe a realidade de uma forma
material, mecânica. Interpreta a “realidade” de uma forma newtoniana/cartesiana,
isto é, de modo reducionista. Este paradigma reduz e limita o ser humano a um
conjunto atômico que, através de um epifenômeno, produz inteligência. Tem o foco
nas partes do conjunto e, mesmo quando enxerga o todo não o relaciona com as
partes.
PARADIGMA HOLÍSTICO – percebe a realidade de uma maneira mais
ampla, mais total. Tem o foco no todo relacionando com as partes, sabendo que o
todo é maior que a soma das partes. Nesta dimensão o ser humano é analisado com
todas as suas potencialidades: biológicas, psicológicas, sociais e espirituais (não
necessariamente um termo religioso).
Veja, então, se entendeu bem. Quantos quadrados podemos formar com
a figura abaixo?
Esta questão dos quadrados - digamos - é
bem simples se comparadas a outras que esbarram
justamente em crenças mais profundas.
Vejamos! O que podem dizer da figura
abaixo?
Vejamos com uma ciência, a Psicologia, por exemplo, como ficariam estas
questões paradigmáticas.
A PSICOLOGIA ocidental nasceu de duas fontes distintas: de um lado, da
ciência experimental e laboratorial, e, do outro, de interesses clínicos e
hospitalares. Em seu esforço para legitimá-la enquanto ciência, seus praticantes
tomaram como modelo a física clássica, concentrando-se no observável e
7
esquivando-se do inobservável: o mundo da experiência interior. Assim, a psicologia
experimental foi dominada pelo behaviorismo5, ou 1ª FORÇA.
A psicologia e a psiquiatria clínicas, por outro lado, nasceram de uma
preocupação pelo tratamento das patologias. Já que muito do sofrimento do ser
humano decorre de forças inconscientes, o trabalho clínico se concentrou no
subjetivo e no inconsciente. A psiquiatria e a psicologia clínicas foram dominadas
pela psicanálise6, ou 2ª FORÇA. Assim, a psicanálise e o behaviorismo lançaram as
bases da psicologia clínica e experimental, sobre as quais reinaram soberanas ao
longo da maior parte do século XX, tornando-se as principais forças dentro da
psicologia ocidental.
Contudo, em torno da década de 1960 levantou-se a suspeita de que, ao
lado das inúmeras contribuições trazidas por essas linhas de pensamento, elas haviam
acarretado também distorções e limitações significativas: Ficou cada vez mais aparente
a sua incapacidade de fazer justiça à totalidade da experiência humana. Elas se
concentravam na psicopatologia ou traçavam generalizações acerca das
complexidades da vida cotidiana a partir de condições simples controladas em
laboratório, ignorando dimensões cruciais da experiência humana, como a
consciência e o bem-estar psicológico.
Além disso, elas às vezes consideraram patológicas certas experiências
transpessoais vitais. Freud, por exemplo, interpretou essas experiências como reflexos
da impotência infantil, ao passo que outros psicanalistas as viram como "formas de
regresso à união com o seio" ou "neuroses narcisistas". Como notou o filósofo Jacob
Needleman, "o freudianismo institucionalizou uma subestimação das possibilidades
humanas".
A psicologia humanista, ou 3ª FORÇA, surgiu em reação a tais
imposições. Nas palavras de Abraham Maslow, um dos fundadores da psicologia
humanista e transpessoal:
Nosso ponto de vista não nega de forma alguma o quadro freudiano habitual,
mas representa um acréscimo e um suplemento a este. Simplificando um
pouco, é como se Freud nos tivesse fornecido a metade doente da
psicologia e agora tivéssemos de completá-la, acrescentando-lhe a metade
sã. Talvez essa psicologia da saúde venha a nos dar mais condições de
controlar e melhorar nossas vidas, tornando-nos pessoas melhores. (grifos
nossos)
Os psicólogos humanistas queriam estudar a experiência humana e tudo o
que há de mais essencial à vida e ao bem-estar, e não o que é fácil de medir em
laboratório. Uma das descobertas, em particular, viria a ter um impacto imenso, dando
origem finalmente à psicologia transpessoal, ou 4ª FORÇA. As pessoas que gozam
de excepcional saúde psicológica tendem a viver aquilo que chamamos de
"experiências de pico": experiências de expansão da identidade e de união com o
universo, breves porém extremamente intensas, cheias de sentido e júbilo, além de
5
Behaviorismo ou Psicologia Comportamental – criada por John B. Watson. Reformulou os conceitos de
consciência e imaginação, negando o valor da introspecção. Watson rejeitou tudo o que não pudesse ser
mensurável, replicável ou observável em laboratório. Segundo ele, somente o comportamento manifesto era
possível de ser validado cientificamente. Os estudos posteriores demonstraram que essa postura não era correta em
alguns aspectos, mesmo assim os estudos de Watson foram determinantes para a expansão da psicologia.
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Psicanálise – criada por Sigmund Freud, o estudo psicanalítico focaliza prioritariamente a patologia e o extremo
sofrimento diante da própria impotência e da limitação humana. Freud teve inúmeros seguidores e muitos de seus
postulados sobre a psique continuam válidos e dão suporte às outras escolas que se desenvolveram a partir da
psicanálise. Freud também teve dissidentes que evidenciaram outros aspectos importantes da psique humana que
ele não admitia. O principal discípulo de Freud foi Carl Gustav Jung que é considerado um dos precursores da
Psicologia Transpessoal devido aos seus inúmeros estudos sobre o ocultismo.
8
benéficas. Experiências semelhantes têm sido registradas ao longo da história e
chamadas de místicas, espirituais e unitivas ou, no Oriente, de samadhi e satori.
COMO NASCE UM PARADIGMA?
O CASO DOS MACACOS QUE NUNCA QUESTIONAVAM
Damásio de Jesus (com adaptações)
–
Contam que “um grupo de cientistas colocou cinco macacos numa jaula. No meio,
uma escada e sobre ela um cacho de bananas. Quando um macaco subia na escada para
pegar as bananas, os cientistas jogavam um jato de água fria nos que estavam no chão.
Depois de certo tempo, quando um macaco ia subir a escada, os outros o pegavam e o
enchiam de pancadas. Com mais algum tempo, nenhum macaco subia mais a escada, apesar
da tentação das bananas.
Então, os cientistas substituíram um dos macacos por um novo. A primeira coisa
que ele fez foi subir a escada, sendo retirado pelos outros, que o surraram. Depois de algumas
surras, o novo integrante do grupo não subia mais a escada.
Um segundo macaco foi substituído e o mesmo ocorreu, tendo o primeiro substituto
participado com entusiasmo da surra do novato.
Um terceiro foi trocado, um quarto, até que o último dos veteranos foi substituído.
Os cientistas então ficaram com um grupo de cinco macacos que, mesmo nunca tendo tomado
o jato d’água, continuavam batendo naquele que tentasse pegar as bananas. Se fosse possível
perguntar a algum deles por que eles batiam em quem tentasse subir a escada, com certeza a
resposta seria: “Não sei, mas as coisas sempre foram assim por aqui”. Passou a ser lei
entre eles a proibição de subir a escada para apanhar as bananas, e a pena era severa. Mas
nenhum deles conhecia e nem questionava a razão da proibição.
Aprendi muitos princípios na faculdade e nos livros e nunca os questionei. Escrevi
livros sobre eles, aceitando passivamente a proibição ou permissão sem indagar o fundamento,
ou, conhecendo-o, sem procurar saber se estava certo ou errado.
Durante muito tempo, como na experiência dos símios, fui um “macaco novo”,
levando surras sem saber a razão e contrariando a natureza das coisas pela comodidade de
não controverter. Mas comecei a questionar. Daí por que passei a adotar a subjetividade como
integrando o conhecimento científico, os sentimentos superiores, como o amor, a compaixão, a
humildade, a paciência, como fatores imprescindíveis na teoria/prática pedagógica no contexto
educacional, a escola como sendo o melhor lugar para ensinar a aprender...
Hoje, posso apanhar, mas quero saber porque estou apanhando.
Depois
destas
reflexões
perguntamos:
QUEM
É
VOCÊ?
___________________________________________________________________.
Entremos, então, nas questões da inclusividade, analisando como andam as
nossas visões a respeito...
Há documentos gerados ao longo dos anos por organizações internacionais
que tratam da garantia do direito universal à educação e do processo de inclusão, tais
como: Declaração Mundial sobre Educação para Todos - UNESCO, em 1990;
aprovada pela Conferência Mundial sobre Educação para Todos - Tailândia, em 1990;
Declaração de Santiago, em 1993; Declaração de Salamanca, de Princípios, Política e
Prática em Educação Especial - UNESCO, em 1994. Vale destacar que os documentos
da UNESCO em 1990 e em 1994 são considerados internacionalmente momentos
históricos a favor da Educação Inclusiva.
O Brasil estabeleceu leis e documentos na intenção de garantir o sucesso da
inclusão. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1998 garante a oferta do
atendimento
educacional
especializado
aos
portadores
de
deficiência,
preferencialmente na rede regular de ensino. Os Parâmetros Curriculares Nacionais de
9
1999 é exemplo de documento que defende e assegura o direito de todos à educação.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) nº 9394 de 20 de
dezembro de 1996 define, no capítulo V, que a educação para alunos com deficiência
deve ser oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, assegurando aos
mesmos: currículo, técnicas, recursos educativos específicos para atender às suas
necessidades, métodos dentre outros recursos e adaptações.
A filosofia de inclusão tornou-se um movimento mundial, impulsionada pela
Convenção de Salamanca. A inclusão de crianças, principalmente, precisava de ajuda
em classes já existentes, muitas vezes com grande número de alunos e professores,
estes, sem formação para o mister. A colocação de um profissional especializado na
sala de aula, a fim de acompanhar uma criança ou adolescente em parceria com o
professor de classe foi uma solução imediatamente pensada. Com o crescimento e
propagação da ideia do mediador escolar, despontou a necessidade de se estudar
mais a fundo o assunto, apesar do pouco material teórico disponível sobre o tema.
Os muitos nomes adotados dificultaram as pesquisas mais amplas:
facilitador escolar, tutor escolar, assistente educacional etc. O conceito de professor
mediador já foi utilizado em outro contexto para caracterizar aquele que trabalha com a
mediação pedagógica, significando uma atitude e um comportamento do docente
colocando-se como um facilitador, incentivador ou motivador da aprendizagem, que
ativamente colabora para que o aprendiz chegue aos seus objetivos.
Necessário uma equipe multiprofissional que inclua professores,
fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, psicólogos, assistentes sociais, além dos
pais. Esta equipe deve ser a primeira a ajudar uma criança ou um pequeno grupo de
crianças com deficiências.
As reflexões sobre a Educação Inclusiva possibilitará uma apreensão mais
profunda dos fatos e problemas que envolvem a realidade educacional vivida por
professores e alunos.
A escola está inserida no contexto da sociedade brasileira, marcada pelas
desigualdades do sistema capitalista. Compreender as relações entre esta escola e o
contexto político, econômico e social é de fundamental importância. O que se quer é
buscar subsídios teóricos e instrumentos de reflexão que contribuam para colocar os
alunos de frente para a escola e para a sociedade no sentido de (re)conhecê-la em
seus múltiplos aspectos. Nesta proposta, está em jogo a compreensão das razões que,
até hoje, impossibilitaram superar ou amenizar o problema educacional, sobretudo a
Educação Inclusiva, procurando formas de contribuir para essa superação.
A escola brasileira está inserida no sistema social mais amplo do país,
marcado pelo sistema capitalista. Embora com características comuns, o capitalismo
não se realiza da mesma maneira em todos os lugares. É preciso identificar suas
diferentes formas de realização: na coleta de peixes na Amazônia, na extração de
minérios do Brasil Central ou, ainda, nas relações que se desenvolvem no campo ou na
cidade. É preciso não só desvendá-lo, mas também buscar na realidade escolar, no
funcionamento das escolas e das práticas docentes, mecanismos que revelem traços
ou necessidades dessa escola, situada nessa realidade específica.
Os estudos que têm sido realizados sobre a escola, a partir de vários
enfoques – sociológicos, políticos, ideológicos – têm mostrado que um dos pontos
críticos dessa escola são os mecanismos de seletividade nela presentes,
responsáveis pela repetência, expulsão de parcelas significativas de alunos, e
exclusão, em geral originários das populações mais pobres.
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Temos claro que a solução desse problema não é meramente técnica, é
política, e passa pela capacidade de organização e de pressão da população, o que
inclui pais, alunos, professores, funcionários, autoridades e trabalhadores de modo
geral.
De família reconhecidamente bem-educada pode resultar filho mal-educado,
assim como mãe pedagoga não implica capacidade aprimorada de educar. Talvez até
se pudesse insinuar – na fofoca das comadres – que geralmente filho de pedagogo é
mais mal-educado, assim como filho de psicólogo pode ser ainda mais maluco. Mesmo
assim, costumamos acreditar em “berço”, insinuando aí que o contexto familiar
positivo tem influência profunda na vida dos filhos.
Apesar de todas as mudanças profundas pelas quais passa a família, talvez
ainda estivéssemos inclinados a aceitar que o melhor lugar para educar um filho é
numa família estável, tendencialmente tradicional.
Por baixo da afabilidade de muitas culturas, pode se esconder desigualdade
acerba, como é o caso da sociedade brasileira, aparentemente divertida, alegre, mas
uma das mais desiguais do planeta. Por isso mesmo, as avaliações quantitativas da
educação são muito frágeis, quando contamos os anos de estudos e os tomamos como
indicadores de educação: pode haver pessoas analfabetas mais “finas” que outras
com curso superior, se nossa intenção é avaliar a nobreza humana, não a ascendência
intelectual.
A relação com o mercado também é complicada, a começar pela
constatação simples de que educação, como regra, não produz emprego, tendo que se
encaixar na estrutura vigente da demanda. O estreitamento do mercado, no entanto,
em vez de desvalorizar, aguça ainda mais a busca por educação, porque dificilmente
haveria outro meio mais eficaz de concorrência, o que aproxima educação de um dos
efeitos mais dúbios da globalização - a competitividade.
Enquanto as melhores teorias e práticas educacionais visualizam a
importância da educação, como plataforma para a vida em termos de formação e ética,
o mercado, cada vez mais absurdamente competitivo, busca submetê-la às suas
expectativas, invertendo a boa lógica das coisas: educação é fim, mercado é meio.
Olhando a nossa volta, não será difícil observar que pessoas bem
estudadas, que tiveram oportunidade de freqüentar escolas e universidades de ponta,
tendem a apresentar nível de vida e bem-estar mais elevado, ainda que seja fátuo
deduzir que a educação sozinha tenha esse poder. Como regra, ocorre o inverso:
pessoas com condição socioeconômica elevada mais facilmente têm acesso
privilegiado à educação, funcionando esta muito mais como expediente de
confirmação/exacerbação dos privilégios, do que de mobilidade social ascendente.
A esperança do pobre de que educação pública e gratuita de qualidade
pudesse ser sua grande sorte vira pelo avesso – será excluído dela, não só por falta
de condições socioeconômicas de concorrência (não consegue passar nas provas de
seleção), mas igualmente por armadilhas legais, sendo a principal a noção perversa
de acesso igual.
Esconde-se que pessoas tão desiguais não podem ter acesso igual, o que
indica claramente que uma lei feita pelo ladrão só pode favorecer o ladrão. Se todos
dispusessem das mesmas armas, poderíamos falar de acesso igual. Como isso é
exatamente o grande problema, é ironia supor igualdade de acesso, resultando que
somente os ricos o têm. Ainda assim, essa perversidade não desfaz o argumento – se
o pobre pudesse aproveitar escola pública e gratuita de qualidade, teria melhores
oportunidades, não só frente ao mercado, mas, acima de tudo, perante a vida.
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Apesar da virulência do neoliberalismo, há países europeus que mantêm um
sistema de educação público e gratuito por inteiro, há mais de 200 anos, indicando que,
mesmo no capitalismo, é possível implantar a idéia de que educação não se compra,
não se vende, porque é direito humano fundamental.
Nesse processo de transformação o professor, por sua atuação, pode
contribuir de maneira decisiva, seja com dos ditos normais ou com os ditos
deficientes.
Contudo, a realidade exige, além de vontade de mudança, que se deixe de
acreditar na inferioridade do nosso povo, que se tire a máscara do preconceito
dissimulado, e que efetivamente se busque transformar a ação no dia a dia.
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CAPÍTULO 2
ATENDIMENTO EDUCACIONAL AOS DEFICIENTES.
NECESSIDADES ESPECIAIS
Depois da leitura do primeiro capítulo, perguntamos se, até o presente
momento conseguimos:,



Vermo-nos como seres que passam por processos vivenciando-os de
determinadas formas;
Dialogarmos sobre diferentes processos de educação, socialização e
cultura, percebendo não existir um tipo ideal único. Ao contrário, cada
grupo social acaba produzindo maneiras diferentes de ser, segundo sua
história;
Compreendemos o homem como ser histórico, criador de novas formas
de vida, ao mesmo tempo capaz, por sua memória, escrita ou oral, de
acumular experiências.
O processo educativo que procura tornar o indivíduo um membro da
sociedade é chamado de socialização. A socialização e, por decorrência, a educação
dependem da capacidade que os homens têm de influírem uns no comportamento dos
outros, modificando-se mutuamente, no processo de interação social. Em outras
palavras, é a capacidade de os homens agirem, de serem capazes de atuar junto a
outros homens, aprendendo e ensinando, que torna possível a educação.
Na socialização atuam em interação os indivíduos e a sociedade. A
socialização é um processo em construção, cujos agentes são o ser humano e o grupo
social que o cerca. Nesse processo o indivíduo, ao mesmo tempo em que se aproxima
da conduta do grupo em que vive, incorporando determinados padrões sociais, age,
também, sobre o grupo, tendo a possibilidade de modificá-lo.
A socialização e a interação social, elementos do processo educativo, são
também as condições e o resultado da vida social.
É grande a influência dos padrões sociais na vida dos indivíduos. Esses
padrões chegam mesmo a interferir nos processos fisiológicos do organismo, na
percepção do eu, do outro, do mundo. É possível, por exemplo, constatarmos que
funções vitais, como a alimentação, estão sujeitas a determinações socialmente
impostas. Temos fome em horários previamente determinados, aos quais nosso
organismo se adapta.
O processo de socialização não termina com a inserção da criança na
sociedade. A socialização é um processo permanente, que progressivamente passa a
fazer parte do conjunto de experiências do indivíduo.
A defesa da cidadania e do direito à educação das pessoas deficientes é
atitude recente em nossa sociedade. Manifestando-se através de medidas isoladas, de
indivíduos ou grupos, a conquista e o reconhecimento de alguns direitos dos
portadores de deficiências podem ser identificados como elementos integrantes de
políticas sociais, a partir de meados deste século.
Ignorando sua longa construção sociocultural, muitos têm sido os que
entendem a situação atual como resultado exclusivo de suas próprias ações ou de
contemporâneos seus. Em razão disso, é extremamente valioso clarificar alguns
momentos da evolução das atitudes sociais e sua materialização, particularmente
aquelas voltadas para a educação do portador de necessidade especiais. Nesse
sentido, cabe alertar que, tanto na literatura educacional quanto em documentos
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técnicos, é freqüente a referência a situações de atendimento a pessoas deficientes
(crianças e/ou adultos) como sendo apenas educacionais, quando uma análise mais
cuidadosa revela tratar-se de situações organizadas com outros propósitos que não o
educacional.
Buscando na história da educação informações significativas sobre o
atendimento educacional dos deficientes, pode-se constatar que, até o século XVIII, as
noções a respeito da deficiência eram basicamente ligadas a misticismo e ocultismo,
não havendo base científica para o desenvolvimento de noções realísticas. O conceito
de diferenças individuais não era compreendido ou avaliado. "As noções de
democracia e igualdade eram ainda meras centelhas na imaginação de alguns
indivíduos criadores.
Considero que, de modo geral, as coisas e situações desconhecidas causam
temor, a falta de conhecimento sobre as deficiências em muito contribuiu para que as
pessoas deficientes, por "serem diferentes", fossem marginalizadas, ignoradas.
A própria religião, com toda sua força cultural, ao colocar o homem como
"imagem e semelhança de Deus", ser perfeito, inculcava a idéia da condição humana
como incluindo perfeição física e mental. E não sendo "parecidos com Deus", os
deficientes (ou imperfeições) eram postos à margem da condição humana.
Por outro lado, observa-se que um consenso social pessimista,
fundamentado essencialmente na idéia de que a condição de 'incapacitado',
'deficiente', 'inválido' é uma condição imutável, levou à completa omissão da sociedade
em relação à organização de serviços para atender às necessidades individuais
específicas dessa população.
Assim, somente quando as crenças, valores, ideias, conhecimentos, dentro
de um determinado momento histórico apresentou as condições favoráveis é que
determinadas pessoas, homens ou mulheres, leigos ou profissionais, deficientes ou
não, despontaram como líderes da sociedade em que viviam, para sensibilizar,
impulsionar, propor, organizar medidas para o atendimento às pessoas deficientes.
Esses líderes, enquanto representantes dos interesses e necessidades das pessoas
deficientes, ou com elas identificadas, abriram espaços nas várias áreas da vida social
para a construção de conhecimento e de alternativas de atuação com vistas à melhoria
das condições de vida de tais pessoas.
Embora estas ações em nenhum momento tenham sido obra de um só
homem, é importante conhecer algumas medidas tomadas por alguns desses líderes
que, de uma forma ou de outra, tiveram importância decisiva na evolução da educação
Inclusiva.
Foi principalmente na Europa que os primeiros movimentos pelo
atendimento aos deficientes, refletindo mudanças na atitude dos grupos sociais, se
concretizaram em medidas educacionais. Tais medidas educacionais foram se
expandindo, tendo sido primeiramente levadas para os Estados Unidos e Canadá e
posteriormente para outros países, inclusive o Brasil.
Uma investigação sobre estas medidas mostra que até o final do século XIX
diversas expressões eram utilizadas para referir-se ao atendimento educacional aos
deficientes: Pedagogia de Anormais, Pedagogia Teratológica, Pedagogia Curativa ou
Terapêutica, Pedagogia da Assistência Social, Pedagogia Emendativa. Algumas
dessas expressões, ainda hoje, são utilizadas, a despeito de sua impropriedade,
segundo meu ponto de vista.
14
A análise criteriosa das informações possibilitou constatar que a primeira
obra impressa sobre a educação de deficientes – os chamados deficientes físicos –
teve autoria de Jean-Paul Bonet e foi editada na França em 1620 com o título Redação
das Letras e Arte de Ensinar os Mudos a Falar. Constatou-se, também, que a primeira
instituição Inclusivaizada para a educação de "surdos-mudos" foi fundada pelo abade
Charles M. Eppée em 1770, em Paris. O abade Eppée inventou o método dos sinais,
destinado a completar o alfabeto manual, bem como a designar muitos objetos que não
podem ser percebidos pelos sentidos. Sua obra escrita mais importante foi publicada
em 1776 com o título A Verdadeira Maneira de Instruir os Surdos-Mudos.
Heinecke inventou o chamado método oral para ensinar os "surdos-mudos"
a ler e falar mediante movimentos normais dos lábios, hoje denominado "leitura labial
ou leitura orofacial". Tal método veio em oposição ao método de sinais e desde aquela
época tem havido discussões e controvérsias sobre a validade de um e de outro
método.
No atendimento aos deficientes da visão, deve ser destacado o papel de
Valentin Haiiy, que fundou em Paris o Instituto Nacional dos Jovens Cegos, no ano de
1784. Naquela época Haiiy já utilizava letras em relevo para o ensino de cegos, tendo
merecido a aprovação da Academia de Ciências de Paris. Por não se caracterizar
simplesmente como asilo, mas incluindo a preocupação com o ensino dos cegos
(principalmente a leitura), o Instituto despertou reações bastante positivas e marcou
seu início com grande sucesso.
Com o passar dos anos o seu sucesso foi tão grande que Haiiy acabou
sendo convidado a comparecer à corte de Luiz XVI para fazer uma detalhada
exposição quanto ao empreendimento, um pouco antes da eclosão da Revolução
Francesa que desacelerou ou eliminou muito do que fizera antes a França com o
apoio da nobreza.
Mas, logo após a regularização da vida do país, novas escolas para
cegos foram abertas. E isso aconteceu também em diversos outros países da
Europa, quase todas elas seguindo o novo modelo apregoado por Hatiy. Os
exemplos mais positivos dessas escolas foram as de Liverpool em 1791, de Londres
no ano de 1799 e, já no século XIX, de Viena em 1805 e de Berlim em 1806.7
Em 1819, esteve no Instituto Nacional dos Jovens Cegos, em Paris, o oficial
do exército francês Charles Barbier com uma sugestão que julgava ser bastante útil
aos professores e alunos. Tratava-se de um processo de escrita, por ele idealizado,
próprio para a transmissão de mensagens no campo de batalha à noite, sem utilização
de luz para não atrair a atenção dos inimigos. Tal processo de escrita, codificada e
expressa por pontos salientes, representava os trinta e seis sons básicos da língua
francesa. A idéia de Barbier despertou o interesse de alguns professores e logo
começou a ser utilizada pelos alunos internados no Instituto.
Em 1829, um jovem cego francês, Louis Braille (1809-1852), estudante
daquele Instituto, fez uma adaptação do código militar de comunicação noturna, criado
por Barbier, para as necessidades dos cegos. De início, tal adaptação foi denominada
de sonografia e, mais tarde, de braile. Até hoje não foi encontrado outro meio, de leitura
e escrita, mais eficiente e útil para uso das pessoas cegas. Baseado em seis pontos
salientes na célula braile, este "código" possibilita sessenta e três combinações.
Cada célula braile precisa de um quarto de polegada, pouco mais de 6
milímetros de espaço na linha. Muita economia de espaço tem sido feita, pela adição
de novos aspectos ao código original, sob a forma de sinais, abreviações e contrações.
7
SILVA, Otto M. da. A Epopéia Ignorada. São Paulo, CEDAS, 1986, p. 256
15
Sistemas especiais de notação para a apresentação da Matemática em
braile tornaram possível à criança cega aprender Aritmética pela escrita braile.
Sistemas de notações para símbolos científicos têm sido também desenvolvidos. A
notação musical em braile torna possível fornecer padrões musicais para qualquer
instrumento musical ou para a voz. De fato há provas de que a intenção original de
Louis BrailIe era fornecer um meio tátil de notação musical. Uma forma mais
abreviada ou contraída de braile é útil como taquigrafia para o estenógrafo cego ou
para os apontamentos dos estudantes.8
Contando hoje com simbologia específica para Matemática, Música,
Química, Física, mais do que um "código", este importante meio de leitura e escrita
compõe o sistema braile.
Em relação aos deficientes, registra-se que em 1832 teve início em Munique,
Alemanha, uma obra eficaz para a educação deles, com a fundação de "uma instituição
encarregada de educar os coxos, os manetas, os paralíticos...
Também nesta época, começo do século XIX, iniciou-se o atendimento
educacional aos "débeis" ou ditos "deficientes mentais".
O médico Jean Marc ltard (1774-1838) mostrou a educabilidade de um
"idiota", o denominado "selvagem de Aveyron".
Reconhecido como a primeira pessoa a usar métodos sistematizados para o
ensino de deficientes ou retardados mentais, Itard trabalhou durante cinco anos com
Vítor, uma criança de doze anos, menino selvagem capturado na floresta de Aveyron,
no sul da França, por volta de 1800. Em 1801, publicou em Paris o livro onde registrou
suas tentativas e que é tido como o primeiro manual de educação de retardados.
Em 1846, em Paris, Seguin editou seu livro Traitement Moral, Hygiene et
Éducation des Idiots, sendo recebido com indiferença. Apontado como pessoa de
"caráter muito rígido", colérico e pouco benevolente, emigrou para os Estados Unidos,
onde, em 1907, publicou seu segundo livro Idiocy and its Treatment by lhe
Physiological Melhod. Nesta obra apresentou um programa para escola residencial.
Johann J. Guggenbuhl (1816-1863), médico que viveu na mesma época que
Seguin, embora não tenha obtido grande êxito no seu trabalho com retardados mentais
severos, tornou-se famoso por seu trabalho, em um internato em Abendberg nos Alpes
Suíços, baseado na combinação de tratamento médico e educacional, focalizando
exercícios de treinamento sensorial.
Outra importante educadora que contribuiu grandemente para a evolução da
educação Inclusiva foi Maria Montessori (1870-1956), médica italiana que aprimorou os
processos de ltard e Seguin, desenvolvendo um programa de treinamento para
crianças retardadas mentais nos internatos de Roma. Suas técnicas para o ensino de
retardados mentais foram experimentadas em vários países da Europa e da Ásia.
Montessori enfatizou a "autoeducação" pelo uso de materiais didáticos que incluíam,
dentre outros, blocos, encaixes, recortes, objetos coloridos e letras em relevo. Definiu
dez regras de educação que parecia considerar adequadas tanto a crianças normais
em idade pré-escolar, como a crianças treináveis, em idade escolar:
1. As crianças são diferentes dos adultos e necessitam ser tratadas de
modo diferente.
2. A aprendizagem vem de dentro e é espontânea; a criança deve estar
interessada numa atividade para se sentir motivada.
8
ASHCROFT, S. C. Crianças Cegas e Amblíopes. In: DUNN, L. M. Crianças Excepcionais. Seus
Problemas. Sua Educação. Rio de Janeiro, Ao Livro Técnico, 1971, v. 2, p. 336.
16
3. As crianças têm necessidade de ambiente infantil que possibilite brincar
livremente, jogar e manusear materiais coloridos.
4. As crianças amam a ordem.
5. As crianças devem ter liberdade de escolha; por isso necessitam de
material suficiente para que possam passar de uma atividade a outra,
conforme o índice de interesse e de atenção o exijam.
6. As crianças amam o silêncio.
7. As crianças preferem trabalhar a brincar.
8. As crianças amam a repetição.
9. As crianças têm senso de dignidade pessoal; assim, não podemos
esperar que façam exatamente o que mandamos.
10. As crianças utilizam o meio que as cerca para se aperfeiçoar, enquanto
os adultos usam-se a si mesmos para aperfeiçoar seu meio.
Ainda na Europa, destaca-se Alice Descoeudres (1928), médica belga, que
elaborou uma proposta curricular para os retardados mentais leves. Sua orientação era
a de que as atividades educativas deveriam ser desenvolvidas em ambiente natural,
mediante instrução individual e grupal, focalizando deficiências sensoriais e cognitivas.
Nos Estados Unidos, a primeira escola pública para surdos foi a American
School, de West Hartford, Connecticut, fundada em 1817, pelo Reverendo Thomas H.
Gallaudet. A primeira escola canadense, a lnstitution Catholique des Sourds-Muets,
para meninos, foi fundada em Montreal em 1848.
No ano de 1848, em Massachusetts, foi criado o primeiro internato público
para os chamados deficientes mentais, introduzindo o método desenvolvido por
Seguin. O responsável pela orientação de tal escola foi Samuel Gridley Howe.
Como lembra Cruickshank, “o período de 1817 a 1850, no Este, foi de
grande atividade em benefício das crianças deficientes. Nesta época apareceram
escolas para os cegos, surdos e retardados mentais”.
No período de 1850 a 1920, nos Estados Unidos, houve um aumento
crescente das escolas residenciais, que eram um modelo europeu. Na última década
do século XIX, entretanto, as escolas residenciais não eram mais consideradas
instituições apropriadas para a educação do deficiente mental. Passaram a ser vistas
como instituições para tutela de crianças e adultos sem esperança de vida
independente e, portanto, sem possibilidades de educação. Em razão disso,
começaram a ser desenvolvidos os programas de externato. Assim é que, em 1896, foi
aberta a primeira classe Inclusiva diária para retardados mentais, em Previdence,
Rhode Island. Em 1900, em Chicago, criou-se a primeira classe para cegos e a
primeira classe de escola pública para "crianças aleijadas". Em dez anos Newark, Nova
York, Cincinnati, Cleveland, Milwaukee e Racine abriram classes para cegos. Em 1913
começou a funcionar em Boston a primeira classe de "amblíopes".
Por volta de 1940, um anúncio publicado no Times de Nova York pelo pai de
uma criança com paralisia cerebral, levou a uma organização dos pais destas crianças
no sentido de fundarem a New York State Cerebral Palsy Association. Nesta
Associação, os pais levantaram fundos tanto para centros de tratamento quanto para
pesquisa, além de estimularem organizações governamentais para uma nova
legislação que proporcionasse recursos para pesquisa, treinamento profissional e
tratamento.
17
Foi ainda Cruickshank quem fez a importante observação de que "até o
crescimento em atitudes e o amadurecimento social serem "experienciados" pela
comunidade, os pais não eram livres para expressar sentimentos reais a respeito do
problema que enfrentavam diariamente. (...) Como uma conseqüência do crescimento
que foi "experienciado" imediatamente antes e durante a Segunda Guerra Mundial, os
pais através do país, no Canadá e alhures, começaram a se organizar no interesse de
seus próprios filhos". 9
Da mesma maneira que os fundadores da New York State Cerebral Palsy
Association, por volta de 1950 os pais de crianças com desenvolvimento mental
retardado começaram a se organizar. Até então, tais crianças, principalmente as
chamadas "retardadas mentais treináveis", eram excluídas da escola, em virtude
da existência de leis e regulamentos obstaculizadores. Com o objetivo principal de
proporcionar atendimento a essas crianças e jovens nas escolas públicas primárias, os
pais de retardados mentais se organizaram na National Association for Retarded
Children - NARC.
A NARC exerceu grande influência em vários países, tendo sido a
inspiradora da criação das Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais - APAEs no Brasil.
Vejamos uma história fantástica!
CHIMAMANDA ADICHIE: “O PERIGO DE UMA ÚNICA HISTÓRIA”.
http://www.ted.com/talks/lang/por_br/chimamanda_adichie_the_danger_of_a_single_story.html
Eu sou uma contadora de histórias e gostaria de contar a vocês algumas histórias
pessoais sobre o que eu gosto de chamar "o perigo de uma história única".
Eu cresci num campus universitário no leste da Nigéria. Minha mãe diz que eu
comecei a ler com dois anos, mas eu acho que quatro é provavelmente mais próximo da
verdade. Então, eu fui uma leitora precoce. E o que eu lia eram livros infantis britânicos e
americanos. Eu fui também uma escritora precoce. E quando comecei a escrever, por volta dos
sete anos, histórias com ilustrações em giz de cera, que minha pobre mãe era obrigada a ler, eu
escrevia exatamente os tipos de histórias que eu lia. Todos os meus personagens eram brancos
de olhos azuis. Eles brincavam na neve. Comiam maçãs. (Risos da plateia) E eles falavam muito
sobre o tempo, em como era maravilhoso o sol ter aparecido. (Risos da plateia), apesar do fato
que eu morava na Nigéria.
Eu nunca havia estado fora da Nigéria. Nós não tínhamos neve, nós comíamos
mangas. E nós nunca falávamos sobre o tempo porque não era necessário. Meus personagens
também bebiam muita cerveja de gengibre porque as personagens dos livros britânicos que eu
lia bebiam cerveja de gengibre. Não importava que eu não tivesse a mínima ideia do que era
cerveja de gengibre. (Risos da plateia) E por muitos anos depois, eu desejei desesperadamente
experimentar cerveja de gengibre. Mas isso é outra história. A meu ver, o que isso demonstra é
como nós somos impressionáveis e vulneráveis em face de uma história, principalmente
quando somos crianças. Porque tudo que eu havia lido eram livros nos quais as personagens
eram estrangeiras, eu convenci-me de que os livros, por sua própria natureza, tinham que ter
estrangeiros e tinham que ser sobre coisas com as quais eu não podia me identificar. Bem, as
coisas mudaram quando eu descobri os livros africanos. Não havia muitos disponíveis e eles
não eram tão fáceis de encontrar quanto os livros estrangeiros, mas devido a escritores como
Chinua Achebe e Camara Laye eu passei por uma mudança mental em minha percepção da
9
CRUICKSHANK, W. M., A Educação da Criança e do Jovem Excepcional. Porto Alegre, Globo,
1974, v. 1, p. 11.
18
literatura. Eu percebi que pessoas como eu, meninas com a pele da cor de chocolate, cujos
cabelos crespos não poderiam formar rabos-de-cavalo, também podiam existir na literatura.
Eu comecei a escrever sobre coisas que eu reconhecia. Bem, eu amava aqueles
livros americanos e britânicos que eu lia. Eles mexiam com a minha imaginação, me abriam
novos mundos. Mas a consequência inesperada foi que eu não sabia que pessoas como eu
podiam existir na literatura. Então o que a descoberta dos escritores africanos fez por mim foi:
salvou-me de ter uma única história sobre o que os livros são.
Eu venho de uma família nigeriana convencional, de classe média. Meu pai era
professor. Minha mãe, administradora. Então nós tínhamos como era normal, empregada
doméstica, que frequentemente vinha das aldeias rurais próximas. Então, quando eu fiz oito
anos, arranjamos um novo menino para a casa. Seu nome era Fide. A única coisa que minha
mãe nos disse sobre ele foi que sua família era muito pobre. Minha mãe enviava inhames, arroz
e nossas roupas usadas para sua família. E quando eu não comia tudo no jantar, minha mãe
dizia: "Termine sua comida! Você não sabe que pessoas como a família de Fide não tem nada?"
Então eu sentia uma enorme pena da família de Fide.
Então, num sábado, nós fomos visitar a sua aldeia e sua mãe nos mostrou um cesto
com um padrão lindo, feito de ráfia seca por seu irmão. Eu fiquei atônita! Nunca havia pensado
que alguém em sua família pudesse realmente criar alguma coisa. Tudo que eu tinha ouvido
sobre eles era como eram pobres, assim havia se tornado impossível pra mim vê-los como
alguma coisa além de pobres. Sua pobreza era minha história única sobre eles.
Anos mais tarde, pensei nisso quando deixei a Nigéria para cursar universidade nos
Estados Unidos. Eu tinha 19 anos. Minha colega de quarto americana ficou chocada comigo. Ela
perguntou onde eu tinha aprendido a falar inglês tão bem e ficou confusa quando eu disse que,
por acaso, a Nigéria tinha o inglês como sua língua oficial. Ela perguntou se podia ouvir o que
ela chamou de minha "música tribal" e, consequentemente, ficou muito desapontada quando
eu toquei minha fita da Mariah Carey. (Risos da plateia) Ela presumiu que eu não sabia como
usar um fogão.
O que me impressionou foi que: ela sentiu pena de mim antes mesmo de ter me
visto. Sua posição padrão para comigo, como uma africana, era um tipo de arrogância bem
intencionada, piedade. Minha colega de quarto tinha uma única história sobre a África. Uma
única história de catástrofe. Nessa única história não havia possibilidade de os africanos serem
iguais a ela, de jeito nenhum. Nenhuma possibilidade de sentimentos mais complexos do que
piedade.
Nenhuma possibilidade de uma conexão como humanos iguais. Eu devo dizer que
antes de ir para os Estados Unidos, eu não me identificava, conscientemente, como uma
africana. Mas nos EUA, sempre que o tema África surgia, as pessoas recorriam a mim. Não
importava que eu não soubesse nada sobre lugares como a Namíbia. Mas eu acabei por abraçar
essa nova identidade. E, de muitas maneiras, agora eu penso em mim mesma como uma
africana. Entretanto, ainda fico um pouco irritada quando se referem à África como um país. O
exemplo mais recente foi meu maravilhoso voo de Lagos, dois dias atrás, não fosse um anúncio
de um voo da Virgin sobre o trabalho de caridade na "Índia, África e outros países". (Risos da
plateia)
Então, após ter passado vários anos nos EUA como uma africana, eu comecei a
entender a reação de minha colega para comigo. Se eu não tivesse crescido na Nigéria e se tudo
que eu conhecesse sobre a África viesse das imagens populares, eu também pensaria que a
África fosse um lugar de lindas paisagens, lindos animais e pessoas incompreensíveis, lutando
19
guerras sem sentido, morrendo de pobreza e AIDS, incapazes de falar por elas mesmas e
esperando serem salvos por um estrangeiro branco e gentil. Eu veria os africanos do mesmo
jeito que eu, quando criança, havia visto a família de Fide.
Eu acho que essa única história da África vem da literatura ocidental. Então, aqui
temos uma citação de um mercador londrino chamado John Locke, que navegou até o oeste da
África em 1561 e manteve um fascinante relato de sua viagem. Após referir-se aos negros
africanos como "bestas que não tem casas", ele escreve: "Eles também são pessoas sem
cabeças, que “têm sua boca e olhos em seus seios.” Eu rio toda vez que leio isso, e deve-se
admirar a imaginação de John Locke. Mas o que é importante sobre sua escrita é que ela
representa o início de uma tradição de contar histórias africanas no Ocidente. Uma tradição da
África subsaariana como um lugar negativo, de diferenças, de escuridão, de pessoas que, nas
palavras do maravilhoso poeta, Rudyard Kipling, são "metade demônio, metade criança".
E então eu comecei a perceber que minha colega de quarto americana deve ter, por
toda sua vida, visto e ouvido diferentes versões de uma única história. Como um professor, que
uma vez me disse que meu romance não era "autenticamente africano". Bem, eu estava
completamente disposta a afirmar que havia uma série de coisas erradas com o romance, que
ele havia falhado em vários lugares. Mas eu nunca teria imaginado que ele havia falhado em
alcançar alguma coisa chamada autenticidade africana. Na verdade, eu não sabia o que era
"autenticidade africana". O professor me disse que minhas personagens pareciam-se muito
com ele, um homem educado de classe média. Minhas personagens dirigiam carros, elas não
estavam famintas. Por isso elas não eram autenticamente africanas.
Mas eu devo rapidamente acrescentar que eu também sou culpada na questão da
única história. Alguns anos atrás, eu visitei o México saindo dos EUA. O clima político nos EUA
àquela época era tenso. E havia debates sobre imigração. E, como frequentemente acontece na
América, imigração tornou-se sinônimo de mexicanos. Havia histórias infindáveis de mexicanos
como pessoas que estavam espoliando o sistema de saúde, passando às escondidas pela
fronteira, sendo presos na fronteira, esse tipo de coisa. Eu me lembro de andar no meu
primeiro dia por Guadalajara, vendo as pessoas indo trabalhar, enrolando tortilhas no
supermercado, fumando, rindo. Eu me lembro que meu primeiro sentimento foi surpresa. E
então eu fiquei oprimida pela vergonha. Eu percebi que eu havia estado tão imersa na
cobertura da mídia sobre os mexicanos que eles haviam se tornado uma coisa em minha
mente: o imigrante abjeto. Eu tinha assimilado a única história sobre os mexicanos e eu não
podia estar mais envergonhada de mim mesma. Então, é assim que se cria uma única história:
mostre um povo como uma coisa, como somente uma coisa, repetidamente, e será o que ele se
tornará.
É impossível falar sobre única história sem falar sobre poder. Há uma palavra, uma
palavra da tribo Igbo, que eu lembro sempre que penso sobre as estruturas de poder do
mundo, e a palavra é "nkali". É um substantivo que livremente se traduz: "ser maior do que o
outro". Como nossos mundos econômico e político, histórias também são definidas pelo
princípio do "nkali". Como é contadas, quem as conta, quando e quantas histórias são
contadas, tudo realmente depende do poder. Poder é a habilidade de não só contar a história
de outra pessoa, mas de fazê-la a história definitiva daquela pessoa. O poeta palestino Mourid
Barghouti escreve que se você quer destituir uma pessoa, o jeito mais simples é contar sua
história, e começar com "em segundo lugar". Comece uma história com as flechas dos nativos
americanos, e não com a chegada dos britânicos, e você tem uma história totalmente diferente.
Comece a história com o fracasso do estado africano e não com a criação colonial do estado
africano e você tem uma história totalmente diferente.
20
Recentemente, eu palestrei numa universidade onde um estudante me disse que
era uma vergonha que homens nigerianos fossem agressores físicos como a personagem do pai
no meu romance. Eu disse a ele que eu havia terminado de ler um romance chamado
"Psicopata Americano" - (Risos da plateia) e que era uma grande pena que jovens americanos
fossem assassinos em série. (Risos da plateia e aplausos) É óbvio que eu disse isso num leve
ataque de irritação. (Risos da plateia)
Nunca havia me ocorrido pensar que só porque eu havia lido um romance no qual
uma personagem era um assassino em série, que isso era, de alguma forma, representativo de
todos os americanos. E agora, isso não é porque eu sou uma pessoa melhor do que aquele
estudante, mas, devido ao poder cultural e econômico da América, eu tinha muitas histórias
sobre a América. Eu havia lido Tyler, Updike, Steinbeck e Gaitskill. Eu não tinha uma única
história sobre a América.
Quando eu soube, alguns anos atrás, que escritores deveriam ter tido infâncias
realmente infelizes para ter sucesso, eu comecei a pensar sobre como eu poderia inventar
coisas horríveis que meus pais teriam feito comigo. (Risos da plateia) Mas a verdade é que eu
tive uma infância muito feliz, cheia de risos e amor, em uma família muito unida.
Mas também tive avós que morreram em campos de refugiados. Meu primo Polle
morreu porque não teve assistência médica adequada. Um dos meus amigos mais próximos,
Okoloma, morreu num acidente aéreo porque nossos caminhões de bombeiros não tinham
água. Eu cresci sob governos militares repressivos que desvalorizavam a educação, então, por
vezes, meus pais não recebiam seus salários. E então, ainda criança, eu vi a geleia desaparecer
do café-da-manhã, depois a margarina desapareceu, depois o pão tornou- se muito caro,
depois o leite ficou racionado. E acima de tudo, um tipo de medo político normalizado invadiu
nossas vidas.
Todas essas histórias fazem de mim quem eu sou. Mas insistir somente nessas
histórias negativas é superficializar minha experiência e negligenciar as muitas outras histórias
que me formaram. A “única história cria estereótipos”. E o problema com estereótipos não é
que eles sejam mentira, mas que eles sejam incompletos. Eles fazem um história tornar-se a
única história.
Claro, África é um continente repleto de catástrofes. Há as enormes, como as
terríveis violações no Congo. E há as depressivas, como o fato de 5.000 pessoas candidataremse a uma vaga de emprego na Nigéria. Mas há outras histórias que não são sobre catástrofes. E
é muito importante, é igualmente importante, falar sobre elas. Eu sempre achei que era
impossível relacionar-me adequadamente com um lugar ou uma pessoa sem relacionar-me
com todas as histórias daquele lugar ou pessoa. A consequência de uma única história é essa:
ela rouba das pessoas sua dignidade. Faz o reconhecimento de nossa humanidade
compartilhada difícil.
Enfatiza como nós somos diferentes ao invés de como somos semelhantes. E se
antes de minha viagem ao México eu tivesse acompanhado os debates sobre imigração de
ambos os lados, dos Estados Unidos e do México? E se minha mãe nos tivesse contado que a
família de Fide era pobre E trabalhadora? E se nós tivéssemos uma rede televisiva africana que
transmitisse diversas histórias africanas para todo o mundo? O que o escritor nigeriano Chinua
Achebe chama "um equilíbrio de histórias."
E se minha colega de quarto soubesse do meu editor nigeriano, Mukta Bakaray, um
homem notável que deixou seu trabalho em um banco para seguir seu sonho e começar uma
editora?
21
Bem, a sabedoria popular era que nigerianos não gostam de literatura. Ele
discordava. Ele sentiu que pessoas que podiam ler, leriam se a literatura se tornasse acessível e
disponível para elas.
Logo após ele publicar meu primeiro romance, eu fui a uma estação de TV em Lagos
para uma entrevista. E uma mulher que trabalhava lá como mensageira veio a mim e disse: "Eu
realmente gostei do seu romance, mas não gostei do final. Agora você tem que escrever uma
sequência, e isso é o que vai acontecer..." (Risos da plateia) E continuou a me dizer o que
escrever na sequência. Agora eu não estava apenas encantada, eu estava comovida. Ali estava
uma mulher, parte das massas comuns de nigerianos, que não se supunham ser leitores. Ela
não só tinha lido o livro, mas ela havia se apossado dele e se sentia no direito de me dizer o que
escrever na sequência.
Agora, e se minha colega de quarto soubesse de minha amiga Fumi Onda, uma
mulher destemida que apresenta um show de TV em Lagos, e que está determinada a contar as
histórias que nós preferimos esquecer? E se minha colega de quarto soubesse sobre a cirurgia
cardíaca que foi realizada no hospital de Lagos na semana passada? E se minha colega de
quarto soubesse sobre a música nigeriana contemporânea? Pessoas talentosas cantando em
inglês e Pidgin, e Igbo e Yoruba e Ijo, misturando influências de Jay-Z a Fela, de Bob Marley a
seus avós. E se minha colega de quarto soubesse sobre a advogada que recentemente foi ao
tribunal na Nigéria para desafiar uma lei ridícula que exigia que as mulheres tivessem o
consentimento de seus maridos antes de renovarem seus passaportes? E se minha colega de
quarto soubesse sobre Nollywood, cheia de pessoas inovadoras fazendo filmes apesar de
grandes questões técnicas? Filmes tão populares que são realmente os melhores exemplos de
que nigerianos consomem o que produzem. E se minha colega de quarto soubesse da minha
maravilhosamente ambiciosa trançadora de cabelos, que acabou de começar seu próprio
negócio de vendas de extensões de cabelos? Ou sobre os milhões de outros nigerianos que
começam negócios e às vezes fracassam, mas continuam a fomentar ambição?
Toda vez que estou em casa, sou confrontada com as fontes comuns de irritação da
maioria dos nigerianos: nossa infraestrutura fracassada, nosso governo falho. Mas também pela
incrível resistência do povo que prospera apesar do governo, ao invés de devido a ele. Eu
ensino em workshops de escrita em Lagos todo verão. E é extraordinário pra mim ver quantas
pessoas se inscrevem, quantas pessoas estão ansiosas por escrever, por contar histórias. Meu
editor nigeriano e eu começamos uma ONG chamada Farafina Trust. E nós temos grandes
sonhos de construir bibliotecas e recuperar bibliotecas que já existem e fornecer livros para
escolas estaduais que não têm nada em suas bibliotecas, e também organizar muitos e muitos
workshops, de leitura e escrita para todas as pessoas que estão ansiosas para contar nossas
muitas histórias. Histórias importam. Muitas histórias importam. Histórias têm sido usadas para
expropriar e tornar maligno. Mas histórias podem também ser usadas para capacitar e
humanizar. Histórias podem destruir a dignidade de um povo, mas histórias também podem
reparar essa dignidade perdida. A escritora americana Alice Walker escreveu isso sobre seus
parentes do sul que haviam se mudado para o norte. Ela os apresentou a um livro sobre a vida
sulista que eles tinham deixado para trás. "Eles sentaram-se em volta, lendo o livro por si
próprios, ouvindo-me ler o livro e um tipo de paraíso foi reconquistado." Eu gostaria de finalizar
com esse pensamento: Quando nós rejeitamos uma única história, quando percebemos que
nunca há apenas uma história sobre nenhum lugar, nós reconquistamos um tipo de paraíso.
Obrigada. (Aplausos).
22
CAPÍTULO 3
HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA NO BRASIL
Inspirados em experiências concretizadas na Europa e Estados Unidos da
América do Norte, alguns brasileiros iniciaram, já no século XIX, a organização de
serviços para atendimento a deficientes: cegos, surdos, deficientes mentais e
deficientes físicos. Durante um século, tais providências caracterizaram-se como
iniciativas oficiais e particulares isoladas, refletindo o interesse de alguns educadores
pelo atendimento educacional dos portadores de deficiências.
A inclusão da "educação de deficientes", da "educação dos excepcionais" ou
da "educação Inclusiva" na política educacional brasileira vem a ocorrer somente no
final dos anos cinqüenta e início da década de sessenta do século XX.
O atendimento escolar Inclusiva aos deficientes teve seu início, no Brasil, na
década de cinqüenta do século retrasado. Foi precisamente em 12 de setembro de
1854 que a primeira providência neste sentido foi concretizada por D. Pedro II. Naquela
data, através do Decreto Imperial n.° 1428, D. Pedro II fundou, na cidade do Rio de
Janeiro, o Imperial Instituto dos Meninos Cegos.
Em 24 de janeiro de 1891, portanto, já no governo republicano, pelo Decreto
n.° 1320, a escola passou a denominar-se Benjamin Constant (IBC), em homenagem a
seu ilustre e atuante ex-professor de Matemática e ex-diretor, Benjamin Constant
Botelho de Magalhães.
Foi ainda D. Pedro II que, pela Lei n.° 839, de 26 de setembro de 1857,
portanto, três anos depois da criação do IBC, fundou, também no Rio de Janeiro, o
Imperial Instituto dos Surdos-Mudos. Em 1957, ou seja, cem anos após sua fundação,
pela Lei n.° 3198, de 06.06, passou a denominar-se Instituto Nacional de Educação de
Surdos – INES.
Alguns importantes indicadores do interesse da sociedade para com a
educação dos portadores de deficiência, no começo do século XX, são os trabalhos
científicos e técnicos publicados. Como exemplo cabe destacar que, em 1900, durante
o 4° Congresso Brasileiro de Medicina e Cirurgia, no Rio de Janeiro, o Dr. Carlos Eiras
apresentou a monografia intitulada Da Educação e Tratamento Médico-Pedagógico dos
Idiotas. Por volta de 1915 foram publicados três outros importantes trabalhos sobre a
educação de deficientes mentais: A Educação da Infância Anormal da Inteligência no
Brasil, de autoria do Professor Clementino Quaglio, de São Paulo, e Tratamento e
Educação das Crianças Anormais da Inteligência e A Educação da Infância Anormal e
das Crianças Mentalmente Atrasadas na América Latina, obras de Basílio de
Magalhães, do Rio de Janeiro. Na década de vinte, o importante livro do Professor
Norberto de Souza Pinto, de Campinas (SP), intitulado Infância Retardatária.
Na primeira metade do século XX, portanto, até 1950, havia quarenta
estabelecimentos de ensino regular mantidos pelo poder público, sendo um federal e
os demais estaduais, que prestavam algum tipo de atendimento escolar Inclusiva a
deficientes mentais. Ainda, catorze estabelecimentos de ensino regular, dos quais um
federal, nove estaduais e quatro particulares, atendiam também alunos com outras
deficiências.
No mesmo período, três instituições Inclusivaizadas (uma estadual e duas
particulares) atendiam deficientes mentais e outras oito (três estaduais e cinco
particulares) dedicavam-se à educação de outros deficientes.
23
Dentre os cinqüenta e quatro estabelecimentos de ensino regular e as onze
instituições que vivenciaram a inclusividade destacam-se: em Santa Catarina, no
município de Joinville, o Colégio dos Santos Anjos, de ensino regular particular fundado
em 1909, com atendimento a deficientes mentais; no Rio de Janeiro, a Escola
Rodrigues Alves, estadual regular para deficientes físicos e visuais, criada em 1905; a
Sociedade Pestalozzi, criada em 1948 para atender deficientes mentais; em Minas
Gerais, na capital Belo Horizonte, a Escola Estadual São Rafael, no ensino de cegos,
criada em 1925; a Escola Estadual Instituto Pestalozzi, em deficientes auditivos e
mentais, criada em 1935; na Bahia, criado em Salvador em 1936, o Instituto de Cegos
da Bahia; em Pernambuco, o Instituto de Cegos criado em 1935, e a Escola Ulisses
Pernambucano, estadual, em deficientes mentais, instalada em 1941; no Rio Grande
do Sul, em Canoas, o Instituto Pestalozzi criado em 1926, em deficientes mentais, em
Porto Alegre o Grupo Escolar Paula Soares, estadual regular com atendimento a DM,
criado em 1927, e o Instituto Santa Luzia, para deficientes visuais, criado em 1941; no
Paraná, em Curitiba, o Instituto Paranaense de Cegos, estadual, criado em 1944; em
São Paulo, na cidade de Taubaté, o Instituto São Rafael, particular, em deficientes
visuais, criado em 1940; em Lins, a Associação Linense para Cegos, particular, criada
em 1948, na Capital, o Instituto Estadual de Educação Padre Anchieta, estadual regular
com atendimento a deficientes auditivos, criado em 1913, e tantas outras.
Seja por sua importância no momento mesmo de sua criação ou pela força
que vieram a adquirir no seu funcionamento ou, ainda, pelo papel desempenhado na
evolução da educação Inclusiva, alguns destes estabelecimentos de ensino e
instituições inclusivas, bem como outros que não constaram desta relação, devem ser
mais bem conhecidos. A abrangência e a atuação atual de tais estabelecimentos não
serão aqui contempladas, já que o propósito é o de ilustrar, com sua instalação e
características, a educação Inclusiva até meados deste século.
Vale ressaltar aqui, a criação da Associação de Assistência à Criança
Defeituosa – AACD, fundada em 14 de setembro de 1950. Mantenedora de um dos
mais importantes Centros de Reabilitação do Brasil, teve como seu primeiro presidente
e diretor clínico o médico Dr. Renato da Costa Bonfim, que nestas funções permaneceu
até 10 de junho de 1976, quando faleceu. Instituição particular, de grande ação na
inclusão no atendimento a deficientes físicos não-sensoriais, de modo Inclusiva
portadores de paralisia cerebral e pacientes com problemas ortopédicos, mantém
convênios com órgãos públicos e privados, nacionais e estrangeiros.
Em 1962 a AACD passou a manter intercâmbio científico com a World
Rehabilitation Fund (WRF) de Nova York. Através deste intercâmbio com a WRF a
AACD vem realizando cursos internacionais para a formação de técnicos em aparelhos
ortopédicos e membros artificiais.
A partir de 1966 vem mantendo convênio com a Secretaria de Educação do
Estado de São Paulo para a prestação de serviços terapêuticos Inclusivaizados
(médico, psicológico, fonoaudiológico, de fisioterapia, terapia ocupacional e serviço
social), transporte Inclusiva dos alunos deficientes físicos e alimentação orientada. Por
tal convênio, atende os alunos de duas escolas estaduais que contam com unidades de
classes especiais para deficientes físicos: Grupo Escolar Buenos Ayres, em Santana e
Grupo Escolar Rodrigues Alves, na Avenida Paulista. Atualmente tais escolas
denominam-se Escolas Estaduais de 1° Grau e não mais Grupos Escolares.
Em 1976 as funções de diretor clínico da Associação de Assistência à
Criança Defeituosa foram assumidas pelo renomado médico Dr. Ivan Ferraretto.
24
Em 1979, o Serviço de Educação Inclusiva da Coordenadoria de Estudos e
Normas Pedagógicas - CENP - da Secretaria da Educação, propôs alteração do
referido convênio AACD/SE, tendo resultado em novo termo de convênio que dá, aos
serviços Inclusivaizados prestados pela AACD, um caráter de suporte ou
suplementação da educação escolar.
Vale ressaltar, pelo trabalho que vem desempenhando em meio século,
fundada no dia 11 de dezembro de 1954, na cidade do Rio de Janeiro, a primeira
Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais – APAE. Dentre seus fundadores,
conforme artigo publicado na Revista Mensagem da APAE, ano 6, n° 16, estavam os
seguintes nomes: Ercília Braga Carvalho, Acyr Guimarães Fonseca, Henry Hoyer,
Armando Lameira Filho, Juracy Lameira e Alda Neves da Rocha Maia. Juntamente com
outros pais interessados, este grupo teve o apoio, estímulo e orientação do casal norteamericano Beatrice e George Bemis, membros da National Association for Retarded
Children - NARC - organização fundada em 1950 nos Estados Unidos. Uma vez criada,
a APAE do Rio de Janeiro teve como seu primeiro presidente o Almirante Henry
Broadbent Hoyer. Com o apoio do governo federal, através do Presidente Castelo
Branco, foi "adquirido um prédio, com boa área de terreno, à Rua Bom Pastor, onde se
encontra a sede da APAE. (...) O desenrolar e a manifestação do movimento apaeano
induziram autoridades do Executivo e do Legislativo a tratarem do problema do
excepcional. Algumas leis foram votadas. Alguns governos passaram a conceder ajuda
às APAEs que se instalavam. 10
Em 1973, por ato do Presidente Médici, a APAE- Rio recebeu, em comodato,
uma área na Rua Prefeito Olímpio de MeIo, onde instalou o Centro de Treinamento
Profissional.
A criação da APAE- Rio foi seguida da fundação de várias APAEs: Volta
Redonda (1956), São Lourenço, Goiânia, Niterói, Jundiaí, João Pessoa e Caxias do Sul
(1957), Natal (1959), Muriaé (1960), São Paulo (1961), contando hoje com uma
importante Federação Nacional das APAEs, com mais de mil entidades associadas.
O atendimento educacional aos deficientes, os chamados excepcionais foi
explicitamente assumido, a nível nacional, pelo governo federal, com a criação de
Campanhas especificamente voltadas para este fim.
A primeira a ser instituída foi a Campanha para a Educação do Surdo
Brasileiro - C.E.S.B. - pelo Decreto Federal n° 42.728, de 3 de dezembro de 1957. As
instruções para sua organização e execução foram objeto da Portaria Ministerial n°
114, de 21 de março de 1958, publicada no Diário Oficial da União de 23 de março de
1958.
Instalada no Instituto Nacional de Educação de Surdos - INES, no Rio de
Janeiro, tinha por finalidade promover, por todos os meios a seu alcance, as medidas
necessárias à educação e assistência, no mais amplo sentido, em todo o Território
Nacional.
Podendo desenvolver suas ações diretamente ou mediante convênios com
entidades públicas ou particulares, a C.E.S.B. teve como primeira dirigente a
Professora Ana Rímoli de Faria Dória, então diretora do Instituto Nacional de Educação
de Surdos.
10
MENDES, Gal. Floriano Moura Brasil. Mensagem da APAE, ano 6, n.° 16, abril/junho 1979.
25
Conforme observa Lemos11, talvez por ter confundido suas atividades com
as do Instituto Nacional de Educação de Surdos, alguns anos depois a Campanha foi
desativada pela supressão de dotações orçamentárias.
Em 1958, "por inspiração e idéia de José Espínola Veiga", pelo Decreto n°
44.236 de 1° de agosto, foi criada a Campanha Nacional de Educação e Reabilitação
de Deficientes da Visão, vinculada à direção do Instituto Benjamin Constant, no Rio de
Janeiro. Sua organização e execução foram regulamentadas pela Portaria n° 477 de 17
de setembro de 1958.
No dia 29 de novembro daquele mesmo ano, pela Portaria n° 566, uma
comissão diretora foi constituída sob presidência do Ministro de Estado da Educação e
Cultura, Clóvis Salgado. Os demais integrantes da comissão eram: Wilton Ferreira,
José Espínola Veiga e Joaquim Bittencourt Fernandes de Sá, representantes do
Instituto Benjamin Constant, Rogério Vieira, representante do Conselho Regional para
o Bem-Estar dos Cegos, e Dorina de Gouvêa Nowill, da Fundação para o Livro do
Cego no Brasil.
Depois de um ano e meio de sua criação, a referida Campanha sofreu
algumas mudanças estruturais pelo Decreto n° 48.252, de 31 de maio de 1960. Deixou
de ser vinculada ao Instituto Benjamin Constant e com a denominação de Campanha
Nacional de Educação de Cegos - CNEC - passou a subordinar-se diretamente ao
Gabinete do Ministro da Educação e Cultura. Em 1962, assumiu o cargo de diretora
executiva da CNEC, a Professora Dorina de Gouvêa Nowill.
Uma outra campanha foi instituída em 1960, desta feita por influência de
movimentos liderados pela Sociedade Pestalozzi e Associação de Pais e Amigos dos
Excepcionais, ambas do Rio de Janeiro. Com o apoio do então Ministro da Educação e
Cultura, Pedro Paulo Penido, pelo Decreto na 48.961, de 22 de setembro de 1960,
publicado no Diário Oficial da União de 23 de setembro de 1960, foi instituída, junto ao
Gabinete do Ministro da Educação e Cultura, a Campanha Nacional de Educação e
Reabilitação de Deficientes Mentais - CADEME. O referido decreto dispôs que a
CADEME seria conduzida por uma comissão de três membros sob a presidência do
Ministro da Educação e Cultura, que designaria um dos membros para as funções de
diretor executivo, responsável por sua administração e execução.
Três anos depois da criação da CADEME, foi criado o CENESP pelo
Decreto n° 72.425, do Presidente Emílio Garrastazu Médici, em 3 de julho de 1973,
com a finalidade de promover, em todo o território nacional, a expansão e melhoria do
atendimento aos excepcionais.
Com sua criação, foram extintas a Campanha Nacional de Educação de
Cegos e a Campanha Nacional de Educação e Reabilitação de Deficientes Mentais. Ao
novo órgão, Centro Nacional de Educação Inclusiva, reverteu o acervo financeiro e
patrimonial, daquelas Campanhas. Também do CENESP passou a fazer parte
integrante o acervo financeiro, pessoal e patrimonial dos Institutos Benjamin Constant e
Nacional de Educação de Surdos.
Logo após sua criação, foi nomeada diretora geral do CENESP a até então
diretora executiva da CADEME, Sarah Couro César, que ali permaneceu até 1979.
Criado como órgão central de direção superior, com suas atividades sob a
supervisão da Secretaria Geral do Ministério da Educação e Cultura e gozando de
autonomia administrativa e financeira, o CENESP teve sua organização, competência e
11
LEMOS, E. R. Educação de Excepcionais – Evolução Histórica e Desenvolvimento no Brasil.
Tese de Livre Docência. UFF, 1981.
26
atribuições estabelecidas no Regimento Interno aprovado pela Portaria n° 550,
assinada pelo Ministro Ney Braga em 29 de outubro de 1975.
Sediado no Rio de Janeiro à Avenida Pasteur, n° 350-A, ao lado do Instituto
Benjamin Constant, o Centro Nacional de Educação Inclusiva -CENESP teve sua
diretora geral substituída em 1979, com a nomeação da médica Dra Helena Bandeira
de Figueiredo, pelo Presidente da República João Baptista de Oliveira Figueiredo.
Em 15 de dezembro de 1981, a Portaria n° 696, do Ministro Rubem Ludwig,
aprovou um novo Regimento Interno do CENESP, revogando o anterior. Conservando
basicamente as mesmas competências e atribuições definidas no Regimento anterior,
as alterações principais foram quanto à supervisão de suas atividades, que passaram a
ficar sujeitas à nova Secretaria de Ensino de 1º e 2° graus, SEPS/MEC, e quanto à sua
organização administrativa, agora com sete unidades: Conselho Consultivo, Diretor
Geral, Departamento de Planejamento e Execução de Projetos, Departamento de
Apoio Técnico, Departamento Administrativo e Financeiro, Instituto Benjamin Constant IBC e Instituto Nacional de Educação de Surdos -INES .
O CENESP teve ainda uma terceira diretora, Dra Lizair G. Guerreiro,
advogada, ligada à Sociedade Pestalozzi do Rio de Janeiro, cujo mandato se estendeu
de 1983 a 1986, quando o órgão foi transformado na Secretaria de Educação Inclusiva
-SESPEI9. Criada na estrutura básica do Ministério da Edu- cação como órgão central
de direção superior, a Secretaria de Educação Inclusiva manteve, basicamente, as
competências e a estrutura do CENESP, sendo extinto apenas o Conselho Consultivo.
A estrutura da SESPE passou a ter as seguintes unidades: Subsecretaria de Educação
e Aprimoramento da Edu- cação Inclusiva (Coordenadoria de Estudos, Pesquisas e
Inovações e Coordenadoria de Aperfeiçoamento e Atualização ), Sub- secretaria de
Articulação e Apoio à Educação Inclusiva (Coordenadoria de Apoio ao Sistema Público
de Ensino e Coordenadoria de Apoio às Instituições e Entidades Particulares),
Coordenadoria de Planejamento e Orçamento e Divisão de Serviços Administrativos. O
Instituto Benjamin Constant e o Instituto Nacional de Educação de Surdos
permaneceram como órgãos autônomos, vinculados à SESPE para efeito de
supervisão ministerial.
Neste ponto, em que estamos acompanhando mais de perto a história da
Educação Inclusiva no Brasil, ressalto que em 1992, com a queda do Presidente
Fernando Collor de Mello, houve outra reorganização dos Ministérios e na nova
estrutura reapareceu a Secretaria de Educação Inclusiva – SEESP – como órgão
específico do Ministério da Educação e do Desporto. Verificamos várias oscilações na
condução do trabalho educativo e social com os deficientes, sem dúvida, por opções
políticas diferentes que, por sua vez, criam desdobramentos nos campos financeiro,
administrativo e pedagógico.
Penso imperioso ressaltar que, embora um homem sozinho não possa
construir uma obra social, alguns homens e mulheres desempenham o importante
papel de impulsionadores do movimento de organização institucional do atendimento
aos deficientes. Fossem outros os agentes individuais, muito provavelmente outra teria
sido a trajetória da educação Inclusiva. E não se pode esquecer que suas propostas,
bem como suas ações políticas, decorrem de condições sociais, econômicas e políticas
historicamente determinadas.
Com a criação da SESPE, a Educação Inclusiva, a nível nacional, teve sua
coordenação geral transferida do Rio de Janeiro, onde sempre estivera localizada, para
Brasília. No novo contexto político, denominado "Nova República", foi nomeado
Secretário de Educação Inclusiva o Dr. Romulo Galvão de Carvalho, advogado,
27
professor universitário e ex-deputado federal pela Bahia, que até então não tivera
qualquer atuação em educação Inclusiva.
A título de ilustração, vale salientar o fato de que as iniciativas
governamentais sobre educação Inclusiva, de âmbito nacional, aparecem em um
momento político tipicamente populista (1955-1964). E, como lembra Fábio Comparato:
Os chefes populistas têm como idéia fundamental, como diretriz básica,
nunca afrontar os movimentos populares. Eles vao se aproveitando das idéias que
medram no povo, vão se utilizando dos movimentos populares para benefício
pessoal, mas nunca se manifestam claramente contra.12
Estas e outras circunstâncias justificariam o desenvolvimento de pesquisas
com vistas ao melhor conhecimento das implicações da atuação desses agentes
individuais que exerceram funções de liderança e sua contribuição para a construção
da educação Inclusiva no Brasil.
Historicamente, os pais têm sido uma importante força para as mudanças no
atendimento aos deficientes. Os grupos de pressão por eles organizados têm seu
poder político concretizado na obtenção de serviços e recursos especiais para grupos
de deficientes, particularmente para deficientes mentais e deficientes auditivos.
Estudos realizados na Inglaterra, afirmam que pais de crianças "deficientes"
usualmente manifestam preferência por recursos integrados na escola comum. No
Brasil, a despeito de figurar tal preferência, na Constituição Federal e diversos textos
oficiais, historicamente se observa a busca de organização de instituições Inclusivas
gerenciadas pelos próprios pais. Este é um importante aspecto a ser pesquisado junto
aos grupos de pais afim de consolidar a tão desejada parceria entre sociedade civil e
ação governamental. A relevância das iniciativas particulares encetadas pelas
associações de pais, principalmente as Sociedades Pestalozzi e APAEs, não pode ser
desconsiderada.
Por outro lado, mais recentemente se tem registrado a organização dos
movimentos de portadores de deficiência. Tais grupos têm levado suas necessidades
ao conhecimento dos organismos governamentais em todos os níveis da organização
social e pouco apouco vêm-se fazendo esforços para assegurar que, de alguma forma,
suas necessidades sejam satisfeitas de modo mais eficiente.
Reconhecer a evolução de atitudes dos não-deficientes e dos deficientes em
busca do conhecimento e aceitação mútua, bem como a importância da organização
de tais movimentos sociais, implica não cometer o equívoco de concordar com
posições tais como aquela segundo a qual "quem entende de deficiente é o deficiente".
Agindo segundo esta posição, tanto os "deficientes" quanto os "não-deficientes"
solidificam, cada vez mais, a abordagem estática das relações entre as pessoas e das
pessoas com seu ambiente. Reconhecer a importância da participação dos portadores
de deficiência no planejamento e na execução dos serviços e recursos a eles
destinados é, sem dúvida, um imperativo de uma sociedade que pretende ser
democrática. A capacidade de pressão dos grupos organizados por deficientes tem
sido evidenciada na própria elaboração da legislação sobre os vários aspectos da vida
social, nos últimos dez anos no Brasil. Exemplo maior está nas conquistas efetivadas
na Constituição Federal de 1988 e nas Constituições Estaduais a partir dela.
Na área da educação não são, ainda, tão objetivos os resultados de tais
movimentos, mas em reabilitação, seguridade social, trabalho e transporte elas são
facilmente identificadas.
12
COMPARATO, F. K. Educação, Estado e Poder. São Paulo, Brasiliense, 1987, p. 65.
28
O nascimento de uma criança representa sua entrada num mundo que
oferece uma riqueza aparentemente infinita de experiências. Grande parte dessas
experiências não se reveste de caráter social. Evidentemente a criança ainda não sabe
estabelecer essa espécie de distinção. Só em retrospecto torna-se possível a
diferenciação entre os componentes não-sociais e sociais de suas experiências. Mas,
uma vez estabelecida essa distinção, podemos afirmar que a experiência social
também começa com o nascimento. O mundo da criança é habitado por outras
pessoas. Ela logo aprende a distinguir essas pessoas, e algumas delas assumem uma
importância toda Inclusiva. Desde o início a criança desenvolve uma interação não
apenas com o próprio corpo e o ambiente, mas também com outros seres humanos. A
biografia do indivíduo desde o nascimento é a história de suas relações com outras
pessoas.
Os indivíduos organizam sua vida em sociedade formando instituições
sociais. As instituições sociais são formas de ação ou de vivência a que os homens
recorrem, sistematicamente, visando a satisfazer determinadas necessidades. Essa
recorrência sistemática vai organizando essas formas de ação, de tal modo que as
instituições se destacam do todo social por terem uma função ou finalidade, um
objetivo que satisfaça a determinadas necessidades do homem, e uma estrutura, isto é,
regras que organizam tanto as relações humanas dos que dela participam, como o
espaço físico onde acontecem estas relações. A família, a escola, o Estado, a Igreja, o
partido político etc. são exemplos de instituições sociais. As instituições sociais têm
papel fundamental no processo de socialização.
A recorrência sistemática às instituições sociais pode dar a elas uma
aparência estática, imutável, um caráter de permanência. Contudo, ao olharmos a
história, vemos que há momentos em que as instituições sofrem profundas mudanças.
A instituição familiar é um bom exemplo para compreendermos essa questão, dadas as
transformações havidas nas relações entre pais e filhos nos últimos 30 anos,
principalmente em famílias residentes nos centros urbanos. As mudanças nas
instituições políticas do Estado brasileiro, nesse mesmo período, também mostram que
as instituições se modificam pela ação dos homens.
Dentre as instituições sociais, destaca-se uma, primordial à vida em
sociedade, que nem sempre é observada com atenção, embora seja uma das primeiras
instituições com que o indivíduo se defronta. É a linguagem.
Se definirmos a instituição social como sendo uma força que atua sobre a
conduta individual, logo perceberemos que qualquer outra instituição, sejam quais
forem suas características e finalidades, depende dos padrões da linguagem. sejam
quais forem as outras características das outras instituições – família, Estado,
economia, sistema educacional etc. – as mesmas dependem dum arcabouço lingüístico
de classificações, conceitos e imperativos dirigidos à conduta individual; em outras
palavras, dependem de um universo de significados construídos através da linguagem
e que só por meio dela podem permanecer atuantes.
É através da linguagem que atribuímos significados às relações que
estabelecemos com o ambiente ou com os outros homens.
O estudo da linguagem serve, também, para mostrar a permanência e a
mudança das instituições sociais.
As diferentes formas de linguagem – oral, escrita, ou gestual – não tiveram
sempre o mesmo peso.
29
Embora a linguagem escrita, nos dias atuais, tenha ganhado uma
importância sem precedentes, a oralidade ainda é, em muitas situações, a única forma
para conhecermos as manifestações culturais de muitos grupos humanos.
As linguagens oral e escrita sofrem continuamente modificações. Novos
termos ou expressões são incorporados e outros colocados em desuso.
Assim, embora tenham uma aparente estabilidade, as instituições
sociais que formam a sociedade devem servir ao homem. É exatamente sobre
essa relação homem/instituições sociais que deve incidir o olhar do sociólogo,
do psicólogo, do educador, do professor, do pedagogo: nas tensões entre
instituições e vida. Nos casos em que as instituições, ou parte delas, tornam-se
rígidas, distanciando-se dos motivos pelos quais foram criadas, cabe ver que isso não
acontece como uma tendência natural. As instituições são sociais, criadas a partir das
relações existentes entre os homens. Sempre, nas instituições, estão presentes grupos
de homens a quem interessa ou não a manutenção das instituições na forma como
estão. As razões da manutenção ou da mudança das instituições são, portanto, sociais
e históricas, devendo ser analisadas nessas dimensões. Nas instituições há sempre
uma certa tensão. Na família, por exemplo, a tensão entre gerações; no Estado, a
tensão entre grupos ou classes distintas; na Igreja, a tensão entre elementos da
hierarquia que a organiza etc. Na análise que faz das instituições, devemos contribuir
para o reconhecimento da existência dessa tensão, indicando as razões da tendência
conservadora ou inovadora das instituições.
As instituições sociais foram criadas pelos homens. Elas não são
naturais, isto é, não existem senão por vontade dos homens. Não serão
modificadas por simples ação da natureza, mas pelos homens em sua ação e
interação social. Elas são históricas: foram criadas em determinadas condições
de vida social e devem ser mudadas sempre que necessário.
Isto também acontece com a instituição social escola, que não existe
da mesma forma nas diferentes sociedades, sendo inexistente em algumas, ainda
que nessas estejam presentes múltiplas modalidades de educação.
Portanto, se os homens são produtos das instituições sociais, eles também
agem para criá-las e modificá-las.
Ao longo de sua história, em momentos e em sociedades determinadas, o
homem criou instituições encarregadas de transmitir certas formas de educação e de
saber. Então surgiram as escolas; contudo, nem assim a educação se dá de forma
única, variando de uma escola para outra.
Um dado popular afirma: “saber é poder”. Que explicação podemos dar a
esse ditado? A qual tipo de saber se refere? Àquele obtido pela educação escolar ou
àquele que se obtém fora da escola?
As diferenças entre os homens, ligadas ao saber que se transforma em
poder, explicam-se pelo uso que os homens fazem do conhecimento: se o repartem
igualmente ou se o utilizam como posse e poder de alguns sobre muitos. É com o
trabalho que os homens produzem suas condições de vida. Há sociedades em que o
resultado do trabalho, tal como o conhecimento produzido com ele, é dividido de forma
mais igualitária.
A escola é um direito. Homens e mulheres devem ter acesso a um local
onde aprofundem sua capacidade de construtores de conhecimentos, também pelo
acesso àqueles conhecimentos já obtidos pelo desenvolvimento das ciências. A escola,
inclusive, deve se organizar para superar os limites que a divisão de trabalho existente
30
na produção, coloca aos trabalhadores, retornando a eles o conhecimento produzido
nas situações coletivas de trabalho. A escola deve ser um meio que possibilite ao
conjunto da população a discussão e a interferência na direção da sociedade, nos
níveis econômico, político e social.
Com esse objetivo, é preciso que as escolas rompam com os limites que
restringem a atividade escolar à mera repetição do conteúdo arrolado pelos livros
didáticos, procurando a formulação de propostas curriculares que integrem os
conteúdos das diferentes disciplinas na explicação da realidade presente interna e
externamente à escola, integrando, concomitantemente todos àqueles que nela
convivem: alunos, professores, secretários, diretores, funcionários, pais, sendo eles
chamados normais ou chamados deficientes.
A afirmação da importância da escola não descarta, mas, ao contrário, exige
uma análise crítica dessa instituição que, como tal, não é natural nem imutável, deve
servir ao homem e à melhoria de sua vida, esteja livre para ir e vir ou, de certa forma,
limitado nesse ir e vir. Essa deve ser a chave de análise da escola, possibilitando
verificar até que ponto a escola contribui, de fato, para que o saber possa,
efetivamente, ser de todos e não apenas de alguns, não, por acaso, os que detêm o
poder econômico e político.
Para compreender a escola e seu resultado é preciso recorrer ao sentido
amplo da palavra cultura, isto é, o conjunto de costumes, dos modos de viver, de vestir,
de morar, das maneiras de pensar, das expressões de linguagem, dos valores de um
povo ou de diferentes grupos sociais.
Vamos realizar o nosso segundo exercício? A nossa segunda reflexão?
Observe a figura 1 e a figura 2 (abaixo) e descreva o que vê. Anote no
espaço reservado.
FIG. 1: ________________
______________________
______________________
FIG. 2: ________________
______________________
______________________.
Depois do segundo exercício, vamos pensar um pouco...
Que tipo de saber é o educativo?
Será que as bases sobre as quais se assenta o conhecimento educativo são
pertinentes, ou se, ao contrário, podem ser submetidas à revisão e à crítica?
O tema não é trivial já que o homem, ainda que veja e observe a realidade,
não é capaz de comunicar o resultado de sua observação de forma fidedigna, ou seja,
não pode comunicar com precisão aos outros homens suas experiências sobre a
realidade observada. E isso vale não apenas no momento de comunicar o que é e
como é a realidade educativa observada, mas, também, na hora de transmitir suas
impressões sobre a natureza ou sobre as outras realidades sociais. Em suma,
31
conseguimos transmitir simplificações ou esquematizações da realidade o que, a partir
de uma posição pedagógica, acreditamos que seja algo que nos deva preocupar.
Efetivamente, sabemos que o educar só se legitima por meio da aprendizagem de
conhecimentos – definitivamente, se informa para formar –, o que significa que a
cultura escolar – o saber que se transmite na escola – é só um saber aproximado da
realidade. Ou talvez, como insinuávamos, seja um saber equívoco sobre a realidade.
Há um paradoxo que se processa nas salas de aula, que enfatiza no máximo
o interesse pelo saber construído na escola. A transmissão do saber ocupa sempre um
lugar ou um espaço, perguntando-se a seguir se realmente a escola é o lugar idôneo
para realizar a transmissão do conhecimento, já que nela, em primeiro lugar, não se
produzem referências reais do saber que se transmite, visto que a escola é um espaço
artificial, isolado da realidade. Além disso, não é o lugar onde se produz o saber,
motivo pelo qual está descontextualizado. Por fim, nem sequer é o lugar onde o saber é
aplicado, por isso dificilmente se intui sua necessidade.
A escola é, então, um lugar à parte e afastado dos processos fundamentais
do saber que, por sua vez, encontra dificuldade no momento de sua transmissão pela
incapacidade codificadora que o homem possui da realidade. Daí que tal situação nos
sugira a necessidade de uma opção na funcionalidade escolar: ensinar os saberes ou
ensinar as formas que o homem possui para conhecer o saber? Se por acaso
ficássemos com a última opção – ensinar como conhecer –, a escola deixaria de ser
o lugar descontextualizado do saber – para se transformar, ao menos, em um lugar
onde se simularia a produção do saber, com o que se teria a experiência direta da
diferenciação que há entre conhecer a realidade e comunicar tal conhecimento.
Apesar do que foi mencionado, também cabe constatar que foram feitas
tentativas e aproximações que tiveram como finalidade fazer com que a comunicação
sobre como é a realidade se desse, entre os homens, da maneira mais precisa,
pertinente e inequívoca. De qualquer forma, o problema talvez seja mais profundo e
complexo do que o que foi insinuado até agora, já que possivelmente não se trate
apenas de um problema de comunicação interindividual, mas de nossa própria
capacidade de percepção; ou seja, o que vemos é realmente o que existe ou é
unicamente o que percebemos ? Ou, o que seria ainda pior para nossas
intenções de transmissão do saber: a realidade é como se nos apresenta ou,
simplesmente, percebemos uma manifestação aparente dela? Enfim, tudo é
como nos parece ser?
Complexas e problemáticas dicotomias, pois se trata de discernir entre o que
vemos e sentimos como certo e a própria realidade. Tudo isso levando em conta,
além do mais, que, como dizíamos, há um problema anterior ao dessas interrogações,
que não convém esquecer, que é, seja lá como for, se temos possibilidade de explicar
o que percebemos. Trata-se, pois, de como podemos ter certeza da realidade e até que
ponto podemos comunicar essa certeza. Se transcrevêssemos essa mesma questão
em negativo, a coisa pareceria ainda pior, já que nos encontraríamos diante da
situação de dizer que a realidade não é como a percebemos e que aquilo que
percebemos não é comunicável.
Não há dúvida de que a percepção é pessoal, própria, e por isso se encerra
em nós mesmos. Se queremos comunicar o que percebemos, se queremos explicar o
que vemos, devemos lançar mão da linguagem, da palavra e, enfim, do discurso. As
explicações exigem então a narratividade. Nossa percepção se torna narração quando
queremos que seja participada, e a narração, imanentemente, se torna metáfora da
realidade comunicada. A escola então arbitraria metáforas sobre o conhecimento mais
do que sobre a transmissão de conhecimentos.
32
Por outro lado, quando são dois os sujeitos que pretendem comunicar uma
mesma realidade, com certeza as narrações de um e de outro poderão ser diferentes,
já que, querendo-se ou não, a narração depende do sujeito, independente de ele está
ou não limitado ou parcialmente limita por uma necessidade Inclusiva. Não obstante, e
apesar de tal subjetivismo, com a narratividade, paradoxalmente, o eu se consolida
com maior objetividade, já que, sendo nossas narrações o que comunica aos demais a
visão que temos dos objetos e do mundo, adquirimos nossa própria identidade à
medida que elaboramos o discurso.
A narração é possível ainda que aquilo que narremos não seja a realidade
que sensorialmente podemos perceber; ou seja, nossa realidade narrada – que só se
torna evidente por meio do discurso – configura uma comunicação sobre o que
percebemos, mas que talvez não seja sobre o que realmente existe ou é. Apesar disso,
o homem se realiza, se constitui como ser comunicante em relação a si mesmo e aos
demais, por meio da linguagem. O discurso mantém o homem em contato com o
mundo – o discurso cria seu mundo – e em contato com os demais – o mesmo é criado
por meio do discurso – partindo da percepção e da perspectiva do outro.
Não é de estranhar, então, que o homem tenha tentado objetivar a
comunicação, ou seja, mostrar ao outro exatamente o que vê ou o que sente.
Com a narração, o homem pretende ser o que é e não o que os outros sentem
que ele seja; ou ensinar o que vê como vê e não como o outro acredita que ele veja.
Quer dizer, o homem insistiu em melhorar o elemento mediador entre seu eu e os
demais; pretendeu, em suma, objetivar o discurso, a fim de que sua narração se
ajustasse o melhor possível à sua percepção.
Vemos, então o desenvolvimento das capacidades humanas em busca de
comunicar-se com o outro – que também possui capacidades similares – sabe,
conhece exatamente, aquilo que lhe querem transmitir. Portanto, podemos dizer que
nosso objetivo é questionar algumas das metáforas utilizadas pelo homem sobre o
mundo.
O problema da transmissão daquilo que se sabe – daquilo que se conhece –
não é uma simples questão de comunicação ou da possibilidade de construir uma
narração objetiva, já que previamente se deve dar a justa percepção da realidade. Em
conseqüência, apesar da possibilidade ou não da objetividade do discurso, nos
deparamos, ao mesmo tempo, com a possibilidade ou não de perceber a realidade tal
qual ela é. A comunicação depende, pois, de duas codificações: a do eu em referência
ao mundo e a do mundo referenciado em relação à narração que faço dele aos demais.
Essas codificações representam conjuntamente o fato da razão – a racionalidade – ou
processo em que o verbo codifica minha percepção e a construção narrativa
consecutiva, de tal maneira que a palavra institui o pensamento ao mesmo tempo em
que o pensamento gera a palavra. Não nos cause estranheza, então, o fato de
Aristóteles considerar a poesia como uma forma racional de saber.
De tal dialética ou relação surgem os significados, e, porque a palavra
coisifica a realidade, nascem os conceitos, verdadeiras metáforas instrumentalizadas
pelo pensamento. Nesse sentido, a narração objetiva, adequada então à percepção
que realizamos da realidade – o que vemos ou ao que, em realidade, vemos –, seria
aquela na qual as palavras utilizadas se ajustassem ao máximo ao conceitopensamento que queremos transmitir.
Pois bem, na civilização ocidental, é sabido que foram utilizadas diversas
estratégias comunicativas para objetivar o conhecimento. O discurso próprio da filosofia
serviu para tal fim durante séculos, ainda que também seja bem conhecido que,
33
quando se pretendeu a narração sobre os fenômenos naturais, externos ao ser, a
filosofia foi perdendo confiabilidade, e, em conseqüência, credibilidade. De fato, já na
Grécia clássica, a filosofia foi narração sobre o ser, ou seja, um discurso além do físico,
tal como Descartes sentencia muitos séculos depois, ao delimitar a res cogitans – a
fenomenologia própria do ser – e a res extensa – os fatos e acontecimentos externos
ao mesmo.
Conhecer o que é externo ao eu já foi o objetivo de um tipo de
discurso, que veio a se denominar científico, entendendo por isso, grosso modo, as
narrações objetivas, ou seja, aquelas que pretendem comunicar o que é exatamente
como é, tornando claro ou tentando clarificar a subjetividade de qualquer narração.
Quer dizer, pretende-se aplicar o pensamento racional, ou seja, a mais justa relação
entre o objeto – o fenômeno que se quer comunicar – e o conceito mediador dessa
comunicação. Da mesma maneira que as narrações objetivas, o discurso científico é o
que, por meio da razão, nos dá a razão das coisas. Não nos cause estranheza, então,
que se tenha dito à exaustão que a forma inequívoca de conhecimento por excelência
que ocorre em nosso contexto cultural é o denominado conhecimento racional, cuja
localização se encontra, fundamentalmente e tal como se menciona, no contexto da
ciência.
A transmissão do saber se apresenta como problemática ao se dar a
impossibilidade de comunicar aos demais nossas percepções de forma exata. A
linguagem contamina o sentido do objeto assim como o pensamento que graças a ela,
possuímos de tal objeto. Em todo caso, as condições da linguagem científica,
baseadas na racionalidade que nos propicia a razão das coisas, se apresentam diante
de nós e no contexto da nossa cultura como a forma mais idônea de comunicação dos
fenômenos que concorrem na objetividade sempre externa ao eu. A metáfora científica
é a mais considerada no momento de transmitir nossa experiência sobre a realidade.
INTEGRAÇÃO/INTERAÇÃO DE ALUNOS COM
ESPECIAIS. CONTEXTOS DE APRENDIZAGEM
E
SEM
NECESSIDADES
No Brasil convivem uma Bélgica e uma Índia. De fato, de um lado a parte
semelhante à Bélgica, país desenvolvido da Europa, onde se vive em plenos direitos
sociais, políticos e econômicos. Alguns brasileiros têm padrão de vida compatível com
o da Bélgica. Do outro lado a Índia, país subdesenvolvido da Ásia, onde a miséria e a
ausência de direitos. Muitos brasileiros vivem assim.
Essa diferença social é própria do sistema econômico em que vivemos, o
capitalismo. Há diferenças marcantes entre o capital e os que trabalham para produzilos. A globalização aproximou as condições de vida da burguesia, detentora do capital,
nos países desenvolvidos e subdesenvolvidos, contudo, o mesmo não aconteceu com
a classe trabalhadora.
Na escolarização não é diferente. A classe de maior renda, uma minoria,
dispõe de maior escolaridade e de maior acesso aos bens culturais, como jornais,
revistas, livros, bibliotecas, teatros, cinemas, viagens, etc. A classe de menor renda
dispõe da sobra. Veja o gráfico abaixo:
34
Distribuição da população
por faixa de renda:
Distribuição da escolaridade e do
acesso aos bens culturais:
O gráfico da pirâmides invertidas mostra que a escola não conseguiu
modificar essas desigualdades. Anos de estudo e cursos concluídos parecem ser
privilégios daqueles que têm poder, perpetuando a dupla relação: poder é saber e
saber é poder.
Vemos essa relação de desigualdades mais evidente quando nos referimos
aos deficientes. Aqueles que têm poder econômico têm possibilidades de acumular o
saber, com amplas condições de ampliá-lo pelos processos de pesquisa e de criação
de que dispõem.
É importante destacar que essa
análise
minuciosa
não
deve
levar
a
fragmentações da realidade. Ao contrário, ela
deve conduzir a uma análise global, que, longe
de ser paralisante, guarde a perspectiva do
movimento de transformação da própria
realidade. Cabe lembrar que a noção de
totalidade no método dialético não significa a
mera soma das partes. Neste método, o "todo"
tem uma dinâmica própria, que ultrapassa a
justaposição de partes. É fundamental, para a
análise marxista, superar a fragmentação e buscar a compreensão da totalidade.
Os preconceitos circulam livremente na escola, favorecendo situações de
dominação. São percebidos nas falas, nas atitudes em geral de professores e outros
profissionais nela presentes, e até mesmo entre os alunos.
Há preconceito, nitidamente expresso, contra o favelado, o pobre e o
portador de necessidades especiais.
Os educadores não aprofundam a discussão, no sentido de detectar as
causas de tanto insucesso. Através da classificação que fazem, os professores
contribuem para o fracasso e, na verdade, criam o fracasso.
Vamos realizar o nosso terceiro exercício? A nossa terceira reflexão?
Leia o texto abaixo e reflita sobre a possibilidade de mudança em nossas
aulas, em nossa escola...
35
COMPORTAMENTOS, HÁBITOS E TENDÊNCIAS
Recentemente conversei com um empresário dono de restaurante. O tema
era a redução de custos que estava efetuando em seu estabelecimento, motivado
pela alta concorrência que vinha sofrendo.
Dentro da sua metodologia de trabalho, havia diagnosticado que o seu
estabelecimento estava jogando no lixo uma grande quantidade de alimentos
considerados próprios para consumo. O próximo passo foi de redesenhar o
processo de trabalho que existia. Criou dois novos conceitos, que foram o “alimento
sobra” e o “alimento resto”.
“Alimento sobra” significava o alimento que fora para a mesa do cliente e que
não havia sido tocado, podendo, portanto, ser reaproveitado sem comprometer a
qualidade e a segurança do cliente.
“Alimento resto” significava que a comida não tinha mais condições de uso e
que deveria ir para o lixo, pois foi tocada pelo cliente ou por algum processo no
servir. Ele argumentava que, em sua casa, quando sobrava comida do almoço, ela
era servida no jantar tranqüilamente, pois não tinha sido tocada. O que ele fez foi
introduzir este conceito no restaurante.
Conta este empresário que, por ocasião de um almoço, sobrou uma travessa
grande de arroz, que nem havia sido tocada. Voltou para a cozinha da mesma
forma que havia saído. Dentro da conceituação que foi definida para o redesenho
do processo, esse arroz seria classificado como “alimento sobra” e, portanto,
poderia ser reaproveitado novamente sem prejudicar a segurança do cliente.
No entanto, ao entrar na cozinha ele viu toda aquela bandeja, que era grande
por sinal, no lixo. Perguntou para a cozinheira: “Por que você jogou este arroz no
lixo se você sabia que era sobra?”. Ela respondeu que para ele tudo que voltava
das mesas era resto.
O empresário argumentou que havia a classificação dos alimentos e que
todos foram avisados sobre isso.
Conhecedor da situação difícil pela qual a funcionária e a família passavam o marido dela estava desempregado -, o empresário disse-lhe que se ela tivesse
pedido este arroz para sua família que estava passando necessidades, ele teria
dado de bom coração, pois o alimento estava em condições de ser consumido e
que ele havia entrado na cozinha para pedir que servissem aquele arroz para ele e
seus filhos que ali se encontravam. Mas para surpresa dele, a resposta que obteve
da cozinheira foi que ela jamais daria resto de comida para seus filhos.
Este exemplo mostra como não podemos apenas mudar os processos de
trabalho, como se fossem a programação de uma máquina, e considerar que tudo
vai funcionar perfeitamente bem. As mudanças necessitam que as pessoas mudem
também os seus hábitos e comportamentos, caso contrário os novos processos, por
melhores que sejam, não irão atender os objetivos a que se propõem.
O atendimento das diferentes necessidades educativas dos alunos é
certamente o desafio mais importante que o professor tem de enfrentar em nossos
dias. Efetivamente, depois que a lógica da heterogeneidade foi paulatinamente
substituindo a lógica da homogeneidade, novas exigências e de natureza nova se
colocaram aos sistemas educativos, em geral, e aos professores, em particular.
Um dos traços característicos do nosso tempo é o fenômeno da
globalização, cujas manifestações se estendem a todas as dimensões da vida humana:
política, economia, sociedade, cultura, educação... Mas, concomitantemente, nunca
como hoje as minorias, os grupos, as regiões ou as mais diminutas comunidades
tiveram tão grande visibilidade, afirmação e reconhecimento. A par de um movimento
avassalador de homogeneização e normalização, outro se está processando, não
menos dinâmico, de defesa da diferença, da heterogeneidade e da diversidade.
36
No âmbito da educação, a lógica da heterogeneidade traduz-se pelo
reconhecimento e aceitação das diferenças individuais entre os alunos. São diferentes
suas motivações, expectativas e interesses quando iniciam a escolaridade, assim como
são diferentes os seus conhecimentos, vivências e experiências prévias. E se as
diferenças resultantes de características físicas, étnicas, culturais ou socioeconômicas
são imediatamente visíveis e evidentes, o mesmo não se poderá afirmar das
características cognitivas, ou seja, o estilo, o ritmo e os percursos preferenciais de
aprendizagem ou o tempo necessário para aprender e os modos mais eficazes de o
fazer.
Curiosamente, foi o movimento de escolarização universal, conhecido por
"escola de massas", que pôs em evidência o caráter elitista e classista da escola
tradicional como instrumento a serviço da divulgação e da inculcação dos interesses e
valores da classe dominante. De igual modo, depressa se tornou evidente que os
procedimentos metodológicos e pedagógico-didáticos até então adaptados no decurso
do processo educativo não davam resposta às exigências de uma escola que
reproduzia em seu seio a multiplicidade e a complexidade da sociedade em geral. Com
efeito, se se reconhecem, admitem e aceitam as diferenças individuais entre os alunos,
torna-se necessário desenvolver estratégias de ensino-aprendizagem diferenciadas e
adequadas, que decorram da e visem a assunção dessas mesmas diferenças entre os
alunos.
Na lógica da homogeneidade, a escola tradicional procedia de acordo com
as idéias de nível e uniformidade, obrigando que os alunos se adaptassem às
exigências do sistema. Propondo um ensino igual para todos, porque todos são
iguais, a escola marginalizava e segregava liminarmente aqueles que
aparecessem como diferentes. Era o caso dos alunos com necessidades educativas
especiais, quer elas fossem decorrentes de limitações físicas e/ou intelectuais, quer de
dificuldades de aprendizagem ou qualquer outra etiologia. Na lógica da
heterogeneidade, ao contrário, as diferenças individuais entre os alunos não apenas
são reconhecidas e aceitas, como constituem (devem constituir) a base para a
construção de uma nova e inovadora abordagem pedagógica, onde não há mais lugar
para exclusões ou segregações.
Na abordagem tradicional, igualdade era sinônimo de uniformidade e
uniformização. Numa abordagem de atenção à diversidade, igualdade significa respeito
pelas diferenças e pelas necessidades individuais, ou seja, pretende-se o
desenvolvimento ótimo das potencialidades de cada aluno através de percursos
individualizados de aprendizagem e no respeito de ritmos e características próprias.
"A diversidade e a heterogeneidade da escola não advêm de se estar
implementando a escolarização de crianças e jovens com necessidades educativas
especiais em classes regulares, mas simplesmente do fato de que a própria sociedade
é heterogênea e multifacetada. Os alunos ditos com necessidades educativas
especiais são apenas um caso no seio da diversidade da população escolar, embora
sejam aqueles que carecem de maior atenção e acompanhamento.
A classe homogênea, tão do agrado do professor num passado ainda
recente, em que os alunos realizavam as mesmas tarefas, da mesma maneira, ao
mesmo tempo e com os mesmos recursos didáticos, terá de ceder lugar à classe
heterogênea (que sempre foi), na qual alunos com as mais variadas e diversas
expectativas, competências e possibilidades não só convivem, como são
pretexto e contexto da própria definição e organização do processo ensinoaprendizagem.
37
O ideal de "escola para todos", acordado pelos Estados do mundo inteiro na
Conferência de Jomtien (Tailândia, 1990), não pode ser entendido como redutor de
"todos na escola". Se esse importante documento programático pretendia, em primeiro
lugar, alertar as autoridades mundiais para a necessidade de acabar com o
analfabetismo e com as gritantes discriminações em taxas de escolarização entre
grupos de uma mesma sociedade (mulheres, minorias étnicas, pobres urbanos,
marginalizados...) e entre países desenvolvidos e países em vias de desenvolvimento,
deveria igualmente ser objeto de outra leitura, de vertente pedagógica e organizativa,
no sentido de que cada aluno encontre na escola os recursos necessários e adequados
à satisfação das suas necessidades educativas, isto é, que a escola seja de fato para
todos.
As conseqüências para a organização e gestão dos sistemas educativos e
das escolas em geral e para as práticas quotidianas da sala de aula em particular,
decorrentes dessa perspectiva de atenção à diversidade, têm sido objeto de múltiplos
estudos e reflexões. Embora por vezes divergentes quanto aos princípios, às
modalidades e ao âmbito de intervenção, podemos sintetizar essas diferentes
propostas em três eixos fundamentais: transformações curriculares, metodológicas e
organizativas.
O melhor contributo que pessoalmente podemos dar para a procura de vias
de resposta às diversificadas necessidades educativas dos alunos, no âmbito do
trabalho quotidiano em sala de aula, é chamar a atenção de professores, formadores e
investigadores para o papel decisivo que a competência profissional (organizar e gerir a
classe) desempenha em todo o processo ensino-aprendizagem. Tomando como
referência investigações de Inclusivas e as nossas próprias, pretendemos destacar
como as formas concretas de organizar e gerir a classe tornam possível ou inviabilizam
a resposta a determinadas necessidades educativas.
Nas últimas décadas, têm sido realizadas inúmeras investigações sobre a
organização e gestão da sala de aula. A emergência dessa temática está
intimamente relacionada com o desenvolvimento da pesquisa acerca da atividade
docente na perspectiva do paradigma "pensamento pedagógico do professor".
Os estudos sobre as fases pré-ativa e ativa (ou interativa) e a articulação entre ambas,
bem como as investigações comparativas entre o pensamento e a ação dos
professores experientes e dos professores em início de carreira, dentre outras,
tornaram evidente que a competência para organizar e gerir a classe não só é
fundamental em si mesma, como é condição para o domínio de muitas outras
competências.
As primeiras investigações sobre a organização e gestão da classe foram
realizadas na perspectiva da eficácia docente sob o paradigma processo-produto, com
o intuito de estudar a manutenção da ordem e da disciplina. Não havia ainda a
percepção da articulação indissociável, como duas faces da mesma moeda, entre a
função de gestão e a função de ensino. O próprio Doyle (1986) fala de duas tarefas
fundamentais do professor: a primeira, a de ensinar, ou seja, explicar a matéria,
selecionar as atividades de ensino-aprendizagem etc.; a segunda, a de estabelecer
regras e procedimentos, reagir aos comportamentos inaceitáveis, organizar e orientar
os grupos ou o trabalho individual etc.
No entanto, a extensão e a profundidade das investigações realizadas
mostraram com evidência que não só a disciplina e a ordem não podem ser
dissociadas do ensino eficaz da matéria, como a "produção" da aprendizagem não é
independente da forma como todo o ambiente e todo o processo são organizados e
conduzidos. Hoje em dia, entende-se por organização e gestão de classe o conjunto
38
dos atos refletidos, seqüenciais e simultâneos que os professores realizam para
estabelecer e manter um bom clima de trabalho e um ambiente favorável à
aprendizagem, ou seja, reporta-se a tudo o que preside à planificação, à organização e
à gestão das situações de ensino-aprendizagem.
Durante muito tempo, na linha das denominadas "pedagogias por objetivos"
e "pedagogia para a maestria", entendeu-se a planificação do ensino-aprendizagem
como um processo linear decorrente da pura racionalidade técnica, em que a seleção e
a organização das atividades de ensino eram função exclusivamente das
características da matéria a ser ensinada, da bondade dos métodos, dos objetivos
visados e, eventualmente, das necessidades dos alunos e dos recursos disponíveis.
Em nosso entender, ao contrário, todas as decisões do professor relativas a "o que
ensinar" e "como ensinar", entram em linha de conta em primeiro lugar com o contexto,
isto é, com o quadro geral de organização e funcionamento da classe.
Antes de pensar em ensinar seja o que for em suas aulas, o professor terá
de:
1) organizar e implementar um esquema geral de funcionamento da classe;
2) conceber uma estrutura de organização do espaço, do tempo, dos recursos, dos
alunos etc.;
3) conceber e implementar uma estrutura de atividades de ensino, com seqüências e
encadeamentos perfeitamente rotinizados.
Isso significa que o professor, sobretudo o do ensino obrigatório inicial, deve
fazer sua leitura e interpretação dos programas para um quadro pré-existente de
organização e funcionamento da classe e de uma estrutura coerente de atividades de
ensino. A situação de ensino-aprendizagem é complexa, imprevisível e sujeita à
pressão do tempo. Durante a aula, os alunos não podem ficar esperando que o
professor recolha dados, faça sua análise, pondere alternativas e tome decisões. Como
o professor deve gerir, então, essa situação? Recorrendo à sua experiência como
aluno, às suas práticas de formação e à sua experiência profissional, o professor vai
desenhando "planos de ação", elaborando guias bastante detalhadas das atividades a
serem desenvolvidas na aula (quem faz o quê, com quem, com quê, como, onde e
quando?). Com as repetições sucessivas de atividades similares, os professores
adquirem repertórios de planos.
Dessa forma, o professor evita a necessidade de constantemente tomar
decisões sobre a estrutura e a apresentação das atividades. Guardados na memória,
esses planos estarão aptos a ser reutilizados. À medida que o professor adquire
experiência, os planos (guias) vão sendo adaptados para responder de forma mais
ajustada às novas situações, às novas condições ou a novos percursos de
aprendizagem.
As guias são representações esquemáticas de experiências familiares ou
quotidianas: por exemplo, ir ao supermercado ou ao cinema. Trata-se de
conhecimentos espaço-temporais sobre pessoas, objetos, acontecimentos e lugares;
são conhecimentos concretos, estereotipados, que se adquirem através das rotinas do
dia a dia. Com este exemplo tradicional do restaurante é fácil ilustrar as vantagens das
guias. Ao entrar no restaurante, pela observação e interpretação do que se passa à
nossa volta, acedemos aos esquemas adequados, de forma a reagir em conformidade
com as situações concretas com que nos defrontamos: escolher uma mesa, consultar a
ementa, encomendar etc., mesmo quando há variantes (acompanham-nos à mesa, o
empregado recita a ementa e aconselha os pratos...). Possuímos, por conseguinte,
uma seqüência temporal das ações a realizar, um esquema para desenvolver cada
39
ação (escolher mesa, encomendar...) e esquemas de ajustamento a situações novas
ou aspectos novos das situações.
A compreensão do pensamento e da ação do professor relacionada à
estruturação e gestão do espaço seria explicada pelo esquema de cenário. O cenário
é um conhecimento sobre lugares. Representa uma reprodução e um inventário
perfeitamente estabelecidos de pessoas e objetos e das suas relações espaciais. O
esquema de cenário define-se por dois fatores: o inventário dos elementos e da
informação, que se apresentam tipicamente sobre o cenário; as relações topológicas.
Os cenários são esquematizações que possibilitam dar organização e
coerência ao espaço sala de aula. Essa organização tomará possível o desenrolar de
determinadas atividades (e de determinada maneira) e inibirá outras. Para os
professores experientes, isso é de tal forma evidente que, perante uma fotografia de
uma sala de aula, são capazes de descrever o que se está a passar, qual o momento
da aula, o que fazem os alunos etc. O cenário global da sala de aula ou os cenários
parciais (por exemplo: cantinho da leitura e sua localização) também dizem de imediato
ao observador experiente quais as orientações pedagógico-didáticas do professor e
como são conduzidas as atividades de ensino.
A condução eficaz do processo ensino-aprendizagem só é possível porque o
professor desenvolveu e interiorizou um conjunto de rotinas, entendidas como
conjuntos de procedimentos estabelecidos, que têm como função controlar e coordenar
seqüências específicas de comportamentos. As rotinas abrangem tanto os
comportamentos relacionados com a planificação do ensino, como com sua condução
durante a aula.
O professor dispõe, assim, de rotinas para todos os aspectos do processo:
começar uma lição, transitar para a atividade seguinte, organizar grupos de trabalho,
distribuir tarefas etc. Na imprevisibilidade que caracteriza quotidianamente a situação
da sala de aula, essas rotinas são indispensáveis, o professor possui, então, um
repertório de condutas interiorizadas, estabelecidas, automáticas, que lhe permitem
resolver rapidamente a situação e prestar atenção a outros aspectos. Mas nem sempre
as rotinas serão ajustadas à situação. Ou seja, o professor tem de tomar decisões, isto
é, fazer a escolha consciente entre manter a mesma conduta e comportar-se de outra
maneira. Algumas dessas decisões terão de ser imediatas, intuitivas, rápidas, de modo
a minimizar a desorganização que possam criar na classe e os problemas levantados.
Outras decisões poderão ser mais refletidas e tomadas com base numa avaliação
cuidadosa dos custos e benefícios.
Para umas e outras, é fundamental a experiência do professor e, sobretudo,
o desenvolvimento de estratégias adequadas de tomada de decisões. Às vezes, o
professor parece recorrer diretamente ao seu "repertório de planos"; outras vezes,
parece realizar aquilo a que se designou por improvisação: durante a ação e em
resposta à ação, o professor escolhe dentre um inventário de estratégias e táticas
possíveis, com base na sua percepção da situação e nos resultados anteriores obtidos
com a aplicação desses mesmos esquemas de ação.
As decisões interativas podem ter como resultado o ajustamento, a
adaptação ao contexto ou ao aluno. Mas também podem provocar desajustamento;
nesse caso, o professor terá de escolher outra alternativa ou mesmo continuar com a
estratégia desajustada, se perceber que os benefícios resultantes de uma nova
adaptação são superiores a seus custos.
O início do ano letivo, as primeiras aulas, segundo algumas investigações,
ou as primeiras semanas, segundo outras, são de importância decisiva. Normalmente,
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os professores começam com as estruturas organizacionais mais simples e mais
conhecidas dos alunos, introduzindo paulatinamente novas rotinas ou novas estruturas.
As instruções são simples e claras, e o trabalho é apoiado e acompanhado, corrigindo
de imediato desvios e hesitações. Além de organizarem o ambiente físico e social da
aula, os professores avaliam as capacidades e necessidades dos alunos e os ajudam a
familiarizar-se com novos procedimentos.
Mas, por vezes, as situações apresentam-se com dimensões substancialmente diferentes, e o professor não dispõe de esquemas ajustados a elas. Nesse caso,
é essencial sua capacidade de análise e reflexão.
Quando o professor é um bom gestor da aula, as atividades decorrem sem
sobressaltos, os alunos concentram-se mais no trabalho e a aprendizagem é otimizada.
É claro que a gestão tem um forte componente pessoal, que é importante compreender
e respeitar.
O professor não pode criar e inovar todos os dias. As rotinas libertam-no e
permitem-lhe maior disponibilidade para os alunos e para o acompanhamento e apoio à
aprendizagem.
Tudo quanto foi dito não pretendeu mais do que chamar a atenção (se
necessário fosse) para a importância das investigações no domínio da organização e
gestão da classe. Os aspectos mínimos que abordamos pretendem apenas sugerir o
mundo de possibilidades que nos são oferecidas.
O atendimento à diversidade e às necessidades educativas especiais em
particular exigirão do professor um enorme esforço de ajustamento dos seus esquemas
(rotinas). Como recorda Correia (1997), que tipo de mudanças será necessário efetuarse na classe regular quanto à sua organização, gestão e apropriação curricular?
As mudanças deverão necessariamente começar nas concepções
pedagógicas dos professores e em suas atitudes para com os alunos em dificuldade. A
perspectiva pessoal do professor informará toda a sua construção e implementação de
esquemas e rotinas.
Durante a formação inicial de professores, deveriam ser definidas metas
precisas relativas aos diversos componentes da competência organização e gestão da
classe. Após tomar consciência de seus contornos e de sua importância, os formandos
deveriam ser ajudados a definir e experimentar na aula as estratégias e habilidades
específicas de organização e gestão, a avaliar os resultados e a introduzir correções,
quando necessário. Essas tentativas refletidas e apoiadas tornar-se-iam, certamente,
"esquemas de ação". Simultaneamente, os formandos interiorizariam estratégias de
detecção, análise e rotinização, que certamente seriam preciosas no seu futuro
profissional.
A formação contínua atual tende a valorizar os contextos de trabalho e a
cooperação como fatores e motores de desenvolvimento profissional. Por outro lado,
defende-se a reflexão como estratégia geral indispensável à inovação e à mudança.
A presença de alunos com necessidades educativas especiais no contexto
quotidiano da sala de aula obrigará o professor a adaptações e ajustamentos, por
vezes substanciais, como dissemos anteriormente. Antes de mais nada, o professor
deverá analisar se os cenários de organização do ambiente de aprendizagem
proporcionam lugar e condição para as necessidades desses alunos; em segundo
lugar, terá de decidir se as rotinas de organização e gestão da aula incluem ou excluem
as necessidades especiais; em terceiro lugar, deverá verificar se as guias das
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atividades e sua organização seqüencial respeitam os percursos e ritmos de
aprendizagem de todos os alunos.
Todas as mudanças introduzidas deverão, desejavelmente, ser realizadas
com assessoria e em cooperação. Embora a ajuda de Inclusivaistas externos não deva
ser dispensada e por vezes seja determinante, os professores de uma mesma escola
têm condições para se ajudarem, cooperando e resolvendo a maior parte dos
problemas que se Ihes deparam.
Um exemplo estratégico: um grupo de seis a oito professores decide apoiarse mutuamente. Em cada reunião, cada elemento do grupo apresenta um problema,
uma situação, uma decisão que teve de tomar e lhe parece problemática. Após ouvirem
todos os elementos, escolhe-se um problema para analisar e o proponente é convidado
a explicitar detalhadamente o caso ou situação, as medidas já tomadas, os resultados,
em suma, tudo o que ajude a compreender totalmente o caso. Os outros elementos
pedem esclarecimentos adicionais e quando julgam estar suficientemente informados
fazem sugestões, dizem como fariam ou como fizeram em situações semelhantes.
Com a ajuda do grupo, o proponente toma uma decisão e escolhe um esquema de
ação. Procede-se do mesmo modo para todos os casos apresentados ao grupo e a
reunião seguinte servirá para fazer o ponto da situação.
Resultados:
A inteligência emocional é a capacidade de percepção de nossos próprios
sentimentos, e a partir desta percepção saber lidar com eles, dominando-os quando
negativos, desenvolvendo-os quando positivos, de modo a se conquistar o equilíbrio
emocional. Este equilíbrio nos permite a motivação para uma vida mais harmonizada.
Esta capacidade proporciona a percepção dos sentimentos dos outros e nos habilita a
sermos competentes em nossos relacionamentos interpessoais.
Podemos dividir, didaticamente, a inteligência emocional em dois tipos,
inteligência intrapessoal e inteligência interpessoal.
A inteligência intrapessoal se refere às habilidades pertinentes a própria
pessoa. É desenvolvida a partir de 3 condições básicas:
1. AUTOCONHECIMENTO
O autoconhecimento nada mais é do que o antigo axioma ensinado pelos
mais antigos filósofos como Sócrates: “Conheci-te a ti mesmo”. Isto significa
ter consciência de si mesmo, percepção dos próprios sentimentos, conhecer
o sentido da própria vida.
2. AUTODOMÍNIO
O autodomínio é resultado da autoconhecimento. A partir da auto percepção
podemos ter o domínio dos nossos sentimentos; lidar com as próprias
emoções transmutando aquelas que são inadequadas, ao invés de
reprimias, substituindo-as por emoções condizentes com uma postura
proativa diante da vida. Significa desenvolver equilíbrio emocional para
poder ter uma vida mais harmonizada e feliz.
3. AUTOMOTIVAÇÃO
Automotivação significa estar motivado para a vida. Também é resultado do
autoconhecimento que gera a percepção do verdadeiro sentido da vida.
42
Quando percebemos a vida em seu sentido verdadeiro utilizamos os
sentimentos de entusiasmo, perseverança e tenacidade para conquistar o
nosso propósito existencial, missão de vida, objetivos e metas de uma forma
bem direcionada e segura.
A Inteligência Interpessoal se refere às habilidades de relacionamento com
outras pessoas. É desenvolvida a partir de 2 condições básicas:
4. EMPATIA
A empatia é o movimento da solidariedade, que significa sentir com os
outros, ter compaixão e compreender os sentimentos dos outros.
5. APTIDÕES SOCIAIS
Aptidões sociais significa lidar bem com as emoções nos relacionamentos;
interagir com facilidade; utilizar essas habilidades para liderar, negociar e
solucionar conflitos, estabelecer vínculos de cooperação e trabalho em
equipe. Ter alegria no convívio com as pessoas, vendo a vida de forma
proativa.
Vamos unir o desenvolvimento da inteligência emocional com a proposta
holística abaixo:
ANTIGO PARADIGMA
PARADIGMA HOLÍSTICO
CONCEITO DE 
EDUCAÇÃO


Informação

Ensino limitado ao intelecto
Instrução se dirigindo à memória
e a razão.
CONCEITO DE 
ESTUDANTE
Aluno considerado como “objeto” 
de ensino, como mecanismo
automático de registro.
Lado esquerdo do cérebro

SISTEMA
NERVOSO


CAMPO
AÇÃO
DE 
Aquisição de conhecimentos; 
ênfase sobre o conteúdo. Troca
de opiniões

AGENTE
EDUCATIVO

A escola como agente da 
educação intelectual, a família
como auxiliar da escola. O
professor como corpo docente.
CONCEITO
EVOLUÇÃO
DE 
A
evolução
para
na 
adolescência.
Maturidade 
limitada
ao
intelecto,
à
capacidade de procriar e de
trabalhar. Esta evolução é
pessoal.
TIPO DE FOR- 
MAÇÃO E ORIEN
TAÇÃO
DE
VALORES
Predominância
Inclusivaização
pragmáticos.
da 
Valores
Formação. Educação da pessoa.
Processo de harmonização e
pleno
desenvolvimento
da
sensação,
do sentimento, da
razão e da intuição
Aluno considerado como sujeito
estudando, como participante
ativo do processo educativo.
Lado esquerdo e direito do
cérebro.
Todo o sistema nervoso cérebroespinhal.
Transformação da personalidade
em seu conjunto.
Troca de opiniões, de atitude e
de comportamento efetivo.
A família, a escola e a sociedade
em um esforço concentrado. O
educador
como
animador,
facilitador, ou mesmo catalisador
de evolução.
A evolução continua no adulto.
Maturidade vista como um
estado de consciência ampliado,
harmonia, plenitude e paz, de
natureza pessoal e transpessoal.
Formação geral precede à
Inclusivaização. Valores pragmáticos e éticos.
43

Consumismo, competição, poder, 
possibilidade de celebridade.
MÉTODOS
DE 
EDUCAÇÃO


Exposição verbal, oral, comple- 
mentada por livros e manuais.
Método passivo.
Recompensas e punições em um
sistema seletivo e competitivo.
Professora ensina, o aluno

escuta.
Escola separada da comunidade.
O professor “induz” opiniões,
atitudes e mudanças de compor
tamentos.



Simplicidade
voluntária,
cooperação,
generosidade,
igualdade, equanimidade.
Pesquisa e trabalho individual e
em grupo. Exposições verbais e
orais para os estudantes e o
professor. Método ativo. Métodos
audiovisuais.
Exposições,
excursões, visitas.
O estudante é ativo, pesquisa e
ensina aos outros. O professor
como conselheiro, consulente,
orientador.
Escola integrada à comunidade.
O educador é um exemplo de
integração de princípios e
comportamento que recomenda.
A escola pública de qualidade é possível. É necessário mudança de
comportamento, quebra de paradigmas.
Nós, brasileiros, quase sempre culpamos o governo, a legislação, os
políticos por todos os males da economia e, por outro lado, cultivamos o hábito de
esperar por soluções milagrosas que resolvam os mesmos males. Talvez, no fundo,
ainda temos o hábito de acreditar que Papai Noel existe e que vai nos trazer um
presentão para resolver todos os nossos problemas. Temos o hábito de viver no mundo
do "se" e do "quando": "Se eu ganhar na loto...", "Se eu passar de ano...", "Se eu
ganhar mais...", "Quando eu me formar...", "Quando eu conquistar...", etc.
Os comportamentos acabam acompanhando nossos hábitos. Como vivemos
com os hábitos de esperar algo acontecer, adquirimos os comportamentos típicos de
quem fica esperando.
O que acontece com as pessoas que ficam esperando por algo?
Têm de estruturar o seu tempo para que ele possa passar. E qual a melhor
forma de esperar algo? Tomando um refrigerante com batatinha frita. Sim, infelizmente,
a maioria tem o comportamento de ficar apáticos no mundo. Estruturamos no nosso
tempo para que algo de importante aconteça em nossas vidas e não adquirimos os
comportamentos necessários para fazer as coisas acontecerem.
Estudos mostram que o Brasil pode crescer a 8,5% do PIB ao ano durante
10 anos. Sabe o que isso significa? Que ao final desse período conseguiríamos a
façanha de dobrar a renda per capita, que hoje está em U$ 3 mil para U$ 6 mil. Já
imaginou dobrar o que você ganha? Já pensou dobrar o salário de todos os brasileiros?
Seria ótimo, não? Só que temos um grande entrave para que esse sonho se torne
realidade. A nossa produtividade é baixa, muito baixa, baixíssima comparada com
economia americana ou até com outras economias menores do que a nossa.
Estudos realizados por empresas conceituadas no mercado internacional,
mostram que o Brasil pode aumentar a sua produtividade, em curto espaço de tempo,
em quase 40% apenas com arrumação. Organização e métodos dentro das empresas,
lares, escritórios e em todos os lugares, poderiam levar o país a dar este salto
espantoso.
Comparada com a dos Estados Unidos, nossa produtividade atinge a
apenas 37% da produtividade deles. Podemos dar um salto dos atuais 37% para quase
44
65% adquirindo novos hábitos e comportamentos de organização e controles mais
eficientes. Parece simples, não? Mas não é. Essa mudança exige esforços muito
grandes.
Conta-se que uma mãe queria que seu filho parasse de comer doces. Como
não conseguia convencê-lo, pensou em levá-lo para conversar com Gandhi, na
esperança de que este o convencesse. Lá chegando, ela explicou a Gandhi o problema
e este, por sua vez, pediu para que retornasse dentro de uma semana.
Decorrida a semana, voltaram mãe e filho para falar com Gandhi. Lá
chegando, foram recebidos pelo mesmo, que olhou para os olhos do menino e disse:
- Pare de comer doce.
A mãe ficou indignada:
- O quê! Uma semana para só dizer isso?
No que Gandhi respondeu:
- É que há uma semana atrás eu comia doce...
E aqui fica o grande desafio para que possamos mudar a educação
brasileira e participarmos no mundo globalizado com sucesso: cada um de nós deve
iniciar o processo de mudanças de hábitos e comportamentos e servir de exemplo para
o demais. Não espere que o outro mude. Mude já! Mude você. Seja cidadão, seja
inclusivo.
Com isto teremos, com certeza, uma escola para todos. Para todos que seja
chamados de normais ou de deficientes.
Um forte abraço.
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