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na Igreja e no mundo SUPLEMENTO Leitura Espiritual In caso di mancato recapito rinviare a Uff. Poste Roma Romanina per la restituzione al mittente previo addebito. If undelivered please return to sender, postage prepaid, via Romanina post office, Roma, Italy. En cas de non distribution, renvoyer pour restitution à lʼexpéditeur, en port dû, à: Ufficio Poste Roma Romanina, Italie Diretor: Giulio Andreotti ANO XXIX - N.6 - 2011 R$ 15,00 - € 5 www.30giorni.it MENSILE SPED. IN ABB. POST. Tar. Economy Taxe Percue Tassa Riscossa Roma. ED. TRENTA GIORNI SOC. COOP. A R. L. ISSN 1827-627X nella Chiesa e nel mondo A FÉ DÁ SINAIS NOS ESTADOS UNIDOS Entrevista com o cardeal Donald Wuerl, arcebispo de Washington Um artigo de Miguel Díaz, embaixador dos Estados Unidos junto à Santa Sé, sobre os católicos afro-americanos ano XXIX N. Sumário 6 ano 2011 Na capa: no alto, o cardeal Donald Wuerl, arcebispo de Washington; embaixo, católicos afro-americanos rezando EDITORIAL p. 22 O mais importante são as notícias do exterior 4 — por Giulio Andreotti CAPA ESTADOS UNIDOS A volta à simplicidade da fé católica Entrevista com o cardeal Donald Wuerl — de G. Cubeddu 34 História de uma fidelidade incomum Reportagem da Turquia Um modelo para o novo Oriente Médio 3OGIORNI nella Chiesa e nel mondo Diretor Giulio Andreotti 39 — por Jamie T. Phelps We e nosotros no mosaico dos States 44 — por Miguel H. Díaz NESTE NÚMERO REPORTAGEM DA TURQUIA Um modelo para o novo Oriente Médio 22 — por L. Biondi REDAÇÃO Via Vincenzo Manzini, 45 00173 Roma Tel.+39 06 72.64.041 Fax +39 06 72.63.33.95 Internet: www.30giorni.it E- mail: [email protected] Vice-Diretores Roberto Rotondo - [email protected] Giovanni Cubeddu - [email protected] Secretaria de redação [email protected] 3OGIORNI nella Chiesa e nel mondo é uma publicação mensal registrada junto ao Tribunal de Roma na data 11/11/1993 n. 501. A publicação beneficia-se de subsídios públicos diretos de acordo com a lei de 7 de agosto de 1990, n. 250 Redação Alessandra Francioni - [email protected] Davide Malacaria - [email protected] Paolo Mattei - [email protected] Massimo Quattrucci [email protected] Gianni Valente - [email protected] SOCIEDADE EDITORA Trenta Giorni soc. coop. a r. l. Sede legale: Via Vincenzo Manzini, 45 00173 Roma Gráfica Marco Pigliapoco - [email protected] Vincenzo Scicolone - [email protected] Marco Viola - [email protected] Conselho de Administração Giampaolo Frezza (presidente), Massimo Quattrucci (vice-presidente), Giovanni Cubeddu, Paolo Mattei, Roberto Rotondo, Michele Sancioni, Gianni Valente Imagens Paolo Galosi - [email protected] Colaboradores Pierluca Azzaro, Françoise-Marie Babinet, Marie-Ange Beaugrand, Maurizio Benzi, Lorenzo Bianchi, Massimo Borghesi, Lucio Brunelli, Rodolfo Caporale, Pina Baglioni, Lorenzo Cappelletti, Gianni Cardinale, Stefania Falasca, Giuseppe Frangi, Silvia Kritzenberger, Walter Montini, Jane Nogara, Stefano M. Paci, Felix Palacios, Tommaso Ricci, Giovanni Ricciardi Colaboraram neste número Miguel H. Díaz, Jamie T. Phelphs Escritório Legal Davide Ramazzotti - [email protected] Diretor responsável Roberto Rotondo Tipografia Arti Grafiche La Moderna Via di Tor Cervara, 171 - Roma ESCRITÓRIO PARA ASSINATURA E DIFUSÃO Via Vincenzo Manzini, 45 - 00173 Roma Tel. +39 06 72.64.041 Fax +39 06 72.63.33.95 E-mail: [email protected] De segunda a sexta-feira das 9h às 18h e-mail: [email protected] Este número foi concluído na redação dia 23 de julho de 2011 Impressão concluída no mês de agosto de 2011 “Buscar a democracia sem polarizações ideológicas” Entrevista com Bekir Karliga — por L. Biondi “Este novo ar que se respira na Turquia” Entrevista com Louis Pelâtre — por L. Biondi Suplemento Leitura espiritual: Pontifícia Comissão de Arqueologia Sacra: Capa; pp.1,3,5, 7,8,9,10,11,13,14,17,18-19,20,21,22,23,24. 26 AMÉRICA LATINA Proximidade e misericórdia — por G. Valente 52 Só a humildade nos livra das chantagens Entrevista com Carlos Aguiar Retes — por G. Valente 54 NOVA ET VETERA Introdução 60 — por P. Mattei Lebreton, teólogo crente Um idealismo imprudente — por L. Cappelletti — por L. Cappelletti 64 66 ANIVERSÁRIOS “Uma gratidão que cresce de ano em ano” Entrevista com Georg Ratzinger — por R. Rotondo e S. Kritzenberger CRÉDITOS FOTOGRÁFICOS: Reuters/Contrasto: Capa; pp.21,55,57; Andrew Stern/Redux/Contrasto: Capa; Osservatore Romano: pp.4,5,74; Bbc Video-2008: pp.7,8,11,14,16,17,18,20; Getty Images: pp.22-23,35,37,58; Lorenzo Biondi: pp.23,24,25,26,27,28,29,30,31,32,33; Romano Siciliani: pp.26,48,50,64-65; Rafael Crisostomo/Catholic Standard: pp.34,37,38; Associated Press/LaPresse: pp.35,36,46,48,55,56,57,59; Piotr Spalek/Catholic Press Photo/CNS Photo: p.36; Magnum/Contrasto: pp.40,46,46-47,47,49; Arquivo Mill Hill Missionaries: p.41; Arquivo The Sisters of the Blessed Sacrament: p.42; Arquivo Oblate Sisters of Providence: p.43; Luke Sharrett/Redux/Contrasto: p.44; Paolo Galosi: p.45; Afp/Getty Images: pp.52-53,58,58-59; Gianni Valente: pp.52,53; Celam: p.54; Lalo De Almeida/Contrasto: p.56-57; Keystone/Getty Images: p.72; Corbis: p.74 25 72 SEÇÕES CARTAS DOS MOSTEIROS 6 CARTAS DOS SEMINÁRIOS 13 CARTAS DAS MISSÕES 14 CORREIO DO DIRETOR 19 30DIAS NA IGREJA E NO MUNDO 48 30DIAS Nº 6 - 2011 3 Editorial Sesquicentenário do L’Osservatore Romano O mais importante são as notícias do exterior por Giulio Andreotti Gostaria de me unir aos que festejaram o L’Osservatore Romano que, em 1º de julho de 2011, completou os seus cento e cinquenta anos. Faço-o como decano dos leitores do jornal da Santa Sé porque, como já contei em outras ocasiões, comecei a comprá-lo no ano jubilar 1933, na banca próxima da minha casa, a da via di Campo Marzio. Eu tinha 14 anos e o dinheiro que minha mãe dava para comprar meu lanche eu usava para comprar o L’Osservatore Romano, que na época custava vinte centavos. A motivação era que o fato de comprá-lo dava uma ar quase “nobre” e elitista. Na banca da via di Campo Marzio, eu via sempre um senhor muito elegante com um chapéu-coco que o comprava, e para dar um ar de importância eu também comecei a fazê-lo. Na minha casa não se liam jornais, e meus colegas do colégio que compravam o Corriere dello Sport caçoavam um pouco comigo por esta minha leitura diária, mesmo se, no final da jornada eu tinha chegado às duas fontes (o meu L’Osservatore e o Corriere deles), enquanto que eles a Os distribuidores do L'Osservatore Romano diante da tipografia em uma foto de 1936 O mais importante são as notícias do exterior, porque no conformismo que temos ao nosso redor, ter uma fonte que apresenta as coisas com uma certa objetividade é um privilégio que não se pode deixar escapar. Também é interessante a seleção, a ordem e o modo como são propostas as notícias do exterior 4 30DIAS Nº 6 - 2011 uma só. Eu era um menino e muitas coisas não entendia: como quando uma vez o pároco, ao ver-me com o L’Osservatore, disse-me: “Muito bem, assim você pode saber todos os dias quem foi recebido pelo Santo Padre”. Na época isso não tinha grande importância para mim, já que não me recebia, porém mais tarde pude constatar como se podia dar notícias até mesmo através da listas das audiências. Como quando, em setembro de 1948, foi enviado a Pio XII o laicísssimo embaixador em Washington, Alberto Tarchiani, para explicar ao Papa porque para a Itália teria sido um bem aderir ao Pacto Atlântico, fato pelo qual havia alguns receios por parte do Vaticano: no dia seguinte o L’Osservatore não publicou a notícia da audiência na usual lista da primeira página, mas uma breve nota informava sobre a presença em Roma do embaixador Tarchiani. Fato que, junto com uma reportagem do dia seguinte sobre as desordens que aconteciam na área vermelha de Berlim publicada nas páginas internas, deu a De Gasperi e a mim a sensação de que a audiência teria acontecido e que tinha sido positiva. Acima, Guido Gonella na redação do L'Osservatore Romano Voltando aos vinte anos de regime fascista, é de grande importância recordar que o L’Osservatore era o único instrumento que nos dava notícias sobre os acontecimentos na Itália e no mundo. Com efeito, eram anos nos quais era proibido falar de coisas italianas que não fossem os comunicados do Ministério da Cultura popular do regime, e comprar o L’Osservatore num certo sentido era arriscado, mas qualificava um pouco as pessoas, coisa quase incompreensível hoje que somos todos iguais no nosso conformismo e ao mesmo tempo somos todos diferentes no nosso individualismo. Na época o jornal era boicotado e os fascistas faziam piquetes nas bancas, algumas pessoas foram agredidas ao comprá-lo, como o historiador Claudio Pavone. Apesar disso, o L’Osservatore era tão solicitado que superou a tiragem de duzentos mil exemplares por dia. Principalmente os Acta diurna de Guido Gonella, que na época trabalhava no L’Osservatore como redator de política externa, eram muito solicitados e lidos com atenção, pois eram uma importante janela aberta para o mundo. Gonella, através da sua seção, filtrava notícias de países estrangeiros que a vigiada imprensa italiana ignorava ou apresentava de maneira ultrajante. Os Acta diurna foram um precioso instrumento de informação internacional que aproximou entre outras coisas ao mundo da Igreja também muitos homens que estavam afastados. Mas todo o L’Osservatore teve um papel extraordinário que hoje é importante recordar: como quando publicou as mensagens de solidariedade que o papa Pio XII enviara aos chefes de estado da Bélgica, Holanda e Luxemburgo invadidos pelo exército de Hitler. Na época, para nós jovens, só atravessar o limiar da redação do L’Osservatore era uma honra e um título nobre. Algumas vezes Gonella me recebia abusivamente desobedecendo o regulamento do diretor, o conde Giuseppe Dalla Torre, que não queria visitas na redação. Pensei que não era notado, porém anos mais tarde li uma entrevista do ex-diretor do L’Osservatore na qual ele contava, até divertido, de todas as vezes que entrava no escritório de Gonella e eu me escondia atrás da porta, e depois ele perguntava ao seu redator: “Mas quem é o cujo?”. Uma curiosidade ligada ao conde Giuseppe Dalla Torre: uma vez escrevi-lhe que achava bizarro introduzir todos os discursos do Papa com a premissa: “Assim como recolhemos dos seus augustos lábios” com a indicação entre parênteses das fontes das citações, incluindo as referências do Migne. Respondeu-me: “Por que o senhor não diz diretamente ao Santo Padre?”. E a conversa acabou ali mesmo. Em fases alternadas discute-se sobre a oficialidade ou sobre a oficiosidade do L’Osservatore. Uma vez a oficialidade era férrea. Hoje talvez não, mas não quer dizer que o jornal tenha mudado, porque um jornal reflete uma situação: é que mudaram os tempos e o que era manchete ontem, hoje termina na última página e vice-versa. Creio que também pelas posições a serem assumidas, o caminho do equilíbrio seja sempre o melhor: ser prudentes, não pretender dizer sempre a última palavra, mas ter sempre a convicção de se deter na penúltima. Todavia a tradição tem o seu valor, e ainda hoje apoiar uma tese ou uma citação no L’Osservatore dá uma importância que em outro jornal não existiria. Hoje como então: Palmiro Togliatti motivou o voto favorável aos Pactos Lateranenses na Assembleia constituinte citando “os sinais” do L’Osservatore e convidando Pietro Nenni a não subestimá-los. Mas se tivesse que dizer qual foi a mais surpreendente “reprimenda” dada pelo L’Osservatore que eu lembre, eu diria a do cardeal Ottaviani quando em nível governamental e institucional houve um aumentado desenvolvimento das relações entre a Itália e o governo soviético. No campo eclesiástico houve muito mal humor a que deu voz o cardeal Ottaviani (de resto uma grande figura de sacerdote romano). No dia seguinte, o L’Osservatore escreveu em poucas palavras lapidares que o cardeal Ottaviani “exprimia suas ideias pessoais”. Hoje nos parecem momentos de normal administração, mas na época, para o tempo a que nos referimos, eram viradas que marcavam época. Ter um parecer levemente diferente queria dizer agir por conta própria. Mas hoje, qual poderia ser o papel do L’Osservatore Romano no meio de tanta mídia? O mais importante são as notícias do exterior, porque no conformismo que temos ao nosso redor, ter uma fonte que apresenta as coisas com uma certa objetividade é um privilégio que não se pode deixar escapar. Também é interessante a seleção, a ordem e o modo como são propostas as notícias do exterior. Porque isso também é um juízo – uma avaliação – mesmo se implícita, que revela como se pensa. Quanto ao resto, não sendo do ramo, deixo o juízo sobre a crônica vaticana e sobre os artigos teológicos aos eclesiásticos. Porém gostaria de concluir essa minha mensagem de felicitações ao L’Osservatore com um passo de Vittorio Bachelet, que alguns anos atrás o L’Osservatore Romano publicou na seção de pensamentos espirituais e que conservo sempre entre os meus papéis pela sua perdurável atualidade: “Os tempos ao nosso redor não são fáceis: as dificuldades políticas, as incertezas, as contradições nos advertem que será um caminho muito arriscado, que requererá todo o nosso sentido de responsabilidade, principalmente toda a nossa simples fé, toda a nossa viva esperança, toda a nossa mais verdadeira caridade”. q 30DIAS Nº 6 - 2011 5 Cartas dos mosteiros Cartas dos mosteiros Convite à oração A redação de 30Giorni convida a todos, em particular as pessoas consagradas dos mosteiros de clausura, a rezarem por padre Giacomo Tantardini. Há alguns meses ele vem-se tratando de um câncer de pulmão. Que o Senhor nos conceda pedir com confiança o milagre da cura. Aos pais pedimos a caridade de fazerem os seus filhos rezarem. DOMINICANAS DO MOSTEIRO SAINTE CATHERINE Langeac, França Gosto de 30Jours pelos artigos e pelas fotos Langeac, 16 de março de 2011 Senhor senador, veio parar em minhas mãos a revista 30Jours e gosto muito dela: não só dos artigos, muito interessantes e profundos, mas também das fotos, que reproduzem obras de arte muito bonitas de seu inesgotável patrimônio artístico italiano! Por isso tomo a liberdade de escrever para pedir-lhe a bondade de me enviar o nº 12 de 2010 (e também algumas edições dos anos anteriores, se possível). Agradecendo-lhe profundamente desde já, desejolhe uma santa Quaresma e uma jubilosa festa de Páscoa. irmã Chantal Marie de Jésus BENEDITINOS DO MOSTEIRO SÃO BENTO DA BAHIA Salvador, Bahia, Brasil Quem reza se salva para as crianças da primeira comunhão Salvador, 29 de março de 2011 Me chamo Ir. Anselmo,OSB e sou monge da Arquiabadia de São Bento da Bahia aqui no Brasil. Nós qui somos assinantes da revista 30Dias e sempre a lemos pois traz valiosos textos que servem para o enriquecimento pessoal de cada Irmão da Comunidade Monástica. Exerço aqui no mosteiro um trabalho de catequese para a primeira Comunhão com 55 crianças e estou 6 30DIAS Nº 6 - 2011 enviando este e-mail para pedir se seria possivel o envio de alguns livros Quem reza se salva pois será excelente suporte nos encontros e na experência pessoal de cada um deles com Jesus. Desde já agradeço a atenção. Em Cristo, Ir. Anselmo, O.S.B. FILHAS DE MARIA IMACULADA Roma Lembraremos o senhor e seus colaboradores na oração Roma, 14 de maio de 2011 Estimado senador Giulio Andreotti, nós lhe escrevemos para manifestar-lhe a nossa viva gratidão pela prestigiosa revista 30Giorni, dirigida pelo senhor, que continuamos a receber com muito proveito espiritual e cultural. Expressamos a nossa sincera gratidão lembrando o senhor e seus colaboradores na oração, para que possam ter a luz e a força necessárias para levar adiante o seu precioso serviço em defesa da verdade. A Virgem Santíssima, Trono da Sabedoria e Mãe da Igreja, abençoe e intensifique o grande bem que vocês vêm fazendo neste particular momento histórico. Obrigada de coração e vivíssimos cumprimentos, em Jesus ressuscitado. Pelas irmãs Filhas de Maria Imaculada, irmã Anna Rosa Turco, superiora-geral Cartas dos mosteiros Cartas dos mosteiros CONVENTO DOS CAPUCHINHOS CLARISSAS CAPUCHINHAS SACRAMENTÁRIAS Módica, Ragusa, Itália DO CONVENTO SAN JOSÉ Durango, México 94 anos, vividos como capuchinho, missionário, sacerdote, bispo Nosso Senhor abençoe o seu trabalho e o recompense com o cêntuplo Módica, 19 de maio de 2011 Durango, 19 de maio de 2011 Caro diretor, depois de cinquenta e três anos de missão, trinta e dois dos quais como bispo, voltei à pátria e estou recebendo a sua revista 30Giorni nella Chiesa e nel Mondo. Acompanho o seu trabalho, autenticamente evangélico, leio e releio a revista, agradecendo-lhes por recebê-la e admirando a sua autêntica vida missionária. Encontro-me no convento dos capuchinhos de Módica, onde afago a minha velhice depois de uma longa vida de 94 anos, vividos como capuchinho, missionário, sacerdote, bispo. Agradeço à redação de 30Giorni, dom Giorgio Scarso, bispo emérito, capuchinho Imagens da China As imagens que ilustram estas páginas foram extraídas do documentário Wild China, produzido pela BBC em 2008 Estimado senhor diretor, nós nos dirigimos ao senhor para lhe agradecer pelo envio da revista 30Días. Sua leitura nos foi muito útil e pedimos a Deus que o senhor possa continuar a fazer o bem da Igreja pela glória de Deus e a extensão de seu Reino. Somos clarissas capuchinhas sacramentárias do mosteiro San José, em Durango, no México. Nós o teremos sempre presente em nossa oração e lembraremos também de toda a equipe da redação. Nosso ¬ Cartas dos mosteiros Cartas dos mosteiros Senhor abençoe o seu trabalho e o recompense com o cêntuplo. Muito obrigada. Esperamos continuar a receber sua revista. Fraternalmente, as irmãs clarissas capuchinhas sacramentárias DOMINICANAS CONTEMPLATIVAS DO CONVENTO MADRE DE DIOS Manatí, Porto Rico A meditação sobre a Santa Páscoa nos fez bem Manatí, 25 de maio de 2011 Estimado senhor Giulio Andreotti, é um prazer escrever-lhe para lhe expressar a nossa gratidão por sua fidelidade no envio da revista 30Días. Nós lhe agradecemos porque a leitura da revista, tão interessante, nos é de grande utilidade. Nestes dias de Páscoa de Ressurreição, como encarte da revista, o senhor nos enviou um opúsculo com uma meditação sobre a Santa Páscoa, “El Hijo no puede ha- 8 30DIAS Nº 6 - 2011 cer nada por su cuenta” (Jo 5,19), de padre Giacomo Tantardini. Fascinounos pela profundidade de ideias e pelo modo como são expressas. Foi o tema de uma reflexão bela e profunda em nossas reuniões comunitárias, e eu tive vontade de lhe dizer isto, para que saiba o bem que esses escritos espirituais fazem a todos nós que os recebemos graças a sua bondade. Sigam em frente com a ajuda de Deus e contem com a nossa oração, a fim de que possam continuar a difundir tudo o que pode ajudar espiritualmente tantas pessoas. Todos os dias levamos até diante de Deus o senhor, senador Giulio, seus familiares e seus colaboradores, para que os abençoe abundantemente. Agradeço-lhe em nome de toda esta comunidade de dominicanas contemplativas. irmã María del Amor, O.P. Cartas dos mosteiros Cartas dos mosteiros CLARISSAS DO CONVENTO EUCHARISTIC LORD MOSTEIRO OUR LADY OF ROSARY Tuguegarao City, Filipinas Manila, Filipinas Uma “viagem” através do mundo Who prays is saved para o catecismo das crianças Tuguegarao City, 23 de maio de 2011 Manila, 27 de maio de 2011 Caro diretor Andreotti, que Deus possa dar-lhe paz e toda bênção! Nossa “viagem” com o senhor e os nossos irmãos e irmãs através do mundo representa a nossa sempre crescente experiência de gratidão pelo dom da fé e da nossa vocação contemplativa. Obrigada por ter-nos permitido tocar o rosto de nossos irmãos de diferentes gerações e culturas por intermédio das tocantes palavras e fotografias de seus artigos. É para nós uma grande alegria elevar orações pelas preocupações da Madre Igreja e de toda a humanidade que o senhor traz à nossa consciência por meio dos artigos de 30Giorni. Pelo dom que representa para nós cada edição de sua revista, nós lhe oferecemos o dom do nosso coração, aberto e constantemente à espera de Deus. Ficaremos felizes por rezar por cada intenção sua e de seus colaboradores e pela publicação. Deus o abençoe! irmã Mary Charlemaine A. Asunción, O.S.C., madre abadessa CARMELITAS DO CONVENTO CRISTO REI Paz! Recebemos há vários anos a sua revista, que tem grande influência sobre o nosso caminho espiritual relativamente aos afãs do mundo, que a sua revista nos apresenta. Somos dominicanas de vida contemplativa de Manila e o nosso mosteiro foi fundado em 1979. Como parte do nosso apostolado, nossos leigos dominicanos ensinam faz tempo o catecismo às crianças: seria possível, portanto, receber pelo menos cinquenta exemplares do livro Who prays is saved? Sabemos que talvez estejamos pedindo demais, uma vez que gostaríamos de recebê-los gratuitamente, mas considerem-no uma ajuda à nossa comunidade, caros amigos e benfeitores. Distribuiremos o livro também entre os nossos leigos dominicanos, para que tirem inspiração dele. Nossa sincera gratidão por seu constante apoio a nós, contemplativas. Estejam certos de nossas incessantes orações por seu apostolado. Devotadamente sua, São Francisco, Califórnia, Estados Unidos irmã Maria Dominica bibliotecária Da Califórnia São Francisco, 23 de maio de 2011 DOMINICANAS DO MOSTEIRO DO SANTÍSIMO ROSARIO Paz, em Cristo! Prezado senador Andreotti, poderíamos pedir-lhe um exemplar de 30Giorni em espanhol? Temos muitas irmãs em países de língua espanhola. Jamais terminaremos de expressar a nossa admiração por sua revista e pelos muitos anos que o senhor dedicou à sua realização. Unidos na oração do nosso Senhor Ressuscitado, madre Rosa Maria del Carmelo, O.C.D. Caranqui, Equador De nosso claustro dominicano, nós os acompanhamos com a nossa oração Caranqui, 28 de maio de 2011 Senhor diretor, receba a nossa afetuosa e filial saudação com as orações da comunidade das religiosas do mosteiro do Santísimo Rosario de Caranqui. ¬ 30DIAS Nº 6 - 2011 9 Cartas dos mosteiros Cartas dos mosteiros Escrevo-lhe para agradecer-lhe de coração pela revista, útil e interessante, que nos envia regularmente. Faz bem lê-la e conhecer a realidade da Igreja e do mundo de hoje; é um instrumento de evangelização e de missão para todos aqueles que a recebem. Em nossa comunidade a revista é acolhida muito bem e por isso lhe escrevo: para agradecer-lhe e parabenizá-lo por sua preciosa missão, que, por intermédio da revista, está-se tornando um instrumento eficaz para a nova evangelização. Nós, do nosso claustro dominicano, os acompanhamos com a nossa oração, para que continuem a seguir adiante. Despedimo-nos pedindo-lhe que estenda a nossa saudação a toda a equipe da revista 30Días. Deus abençoe a todos. Fraternalmente, irmã María Natividad Espín, O.P., prioresa, e comunidade CLARISSAS CAPUCHINHAS CONTEMPLATIVAS DO CONVENTO DE MACAPÁ Macapá, Amapá, Brasil Obrigada pela belíssima meditação sobre a Santa Páscoa Macapá, 29 de maio de 2011 A sua excelência Andreotti os nossos obséquios e o desejo de paz e bem! Somos irmãs clarissas capuchinhas contemplativas. O nosso mosteiro nasceu na zona rural, a doze quilômetros de Macapá, capital do Estado do Amapá, no Brasil. Gostaríamos de agradecer não apenas pela revista, que une às virtudes estéticas notícias interessantíssimas e ao estilo inteligente as profundas inspirações da fé, mas também pela belíssima meditação de padre Giacomo Tantardini. Enviamos realmente um grande, fervoroso “obrigada”! as irmãs clarissas capuchinhas 10 30DIAS Nº 6 - 2011 MOSTEIRO EWIGE ANBETUNG Innsbruck, Áustria De um mosteiro do Tirol, aos pés dos Alpes Innsbruck, 29 de maio de 2011 Estimado senhor Andreotti, há muito tempo eu desejava escrever-lhe para agradecer, em meu nome e de todas as minhas irmãs da comunidade, pela tão apreciada revista que nos envia regularmente há muitos anos. Sei que muitos de nossos mosteiros da Adoração Perpétua do Santíssimo Sacramento também gozam do privilégio de recebê-la gratuitamente; por isso, posso apenas dizer: que Deus o recompense e, como dizemos aqui, “Vergelt’s Gott!”. Sou uma freira adoradora chilena, embora hoje pertença a este mosteiro do Tirol, aos pés dos Alpes, nesta bela cidade. A sua revista nos instrui e informa sobre temas escolhidos com cuidado, que ampliam o nosso horizonte de oração pela Igreja e pelo mundo e que, para nós, religiosas de clausura, nem sempre são acessíveis. Gostamos muito de ler os interessantes artigos sobre a Igreja universal e de contemplar as belas imagens dos ícones e das pinturas antigas reproduzidas nessa revista abençoada. Quanta alegria tive ao saber daquela menina romana, apaixonada por Jesus Eucaristia, Antonietta Meo, que rezava uma oração muito semelhante à que rezamos nós, religiosas, todas as vezes que soa o sino para a troca de turno de adoração. Ora, é a minha homônima espiritual! Há três anos foi beatificada em Roma madre Maria Madalena da Encarnação, fundadora da nossa Ordem. Não tendo podido assistir pessoalmente à cerimônia, e vendo o vídeo alguns meses depois, reconheci uma pessoa que eu conhecia: o senhor! Ou estou errada? Seja como for, fiquei muito feliz de que tenha participado da cerimônia de beatificação. O senhor é uma pessoa importante para as nossas comunidades. Estimado senhor, desculpe-me se lhe peço ainda uma coisa: poderia nos enviar um outro exemplar da revista em espanhol? É a minha língua materna e Cartas dos mosteiros Cartas dos mosteiros há textos de teologia ou outros que eu gostaria de entender melhor. Além disso, poderia compartilhar a revista com sacerdotes latino-americanos que fazem o doutorado em Innsbruck, na Universidade dos Jesuítas. Eu, a minha superiora, as minhas dez companheiras austríacas e a nossa postulante alemã rezamos pelo senhor e por toda a sua equipe. Deus conceda ao benfeitor universal da vida contemplativa muita saúde e ainda muitos anos de vida. Com atenção, tualmente, já há muito tempo. Queremos que receba a nossa gratidão por todo o bem que faz, mantendonos informadas sobre a atualidade da Igreja e sobre o que acontece ao seu redor. É um instrumento muito valioso e muito útil, que aproxima mais da Igreja e dos nossos irmãos no mundo. Que o Bom Deus o abençoe e a seus colaboradores pelo trabalho que realizam, por sua grande generosidade e bondade, com abundantes graças e bênçãos. Conte com nossas orações e que nossa Mãe, a Virgem do Carmelo, o guarde em seu Coração imaculado. Gratas e unidas na oração do carmelo, irmã María Antonieta de la Cruz Victoriosa, A.P. madre Ana del Niño Jesús, prioresa, e comunidade CARMELITAS DESCALÇAS DO CONVENTO DEL CARMEN Lima, Peru DOMINICANAS DO ROSÁRIO PERPÉTUO DO CONVENTO PIUS XII De um carmelo de Lima Fátima, Portugal Lima, 3 de junho de 2011 Who prays is saved para os peregrinos de Fátima Caro senhor Giulio Andreotti, deste carmelo de Lima, no Peru, nós lhe enviamos as nossas mais afetuosas e fraternais saudações e queremos lhe agradecer infinitamente pela assinatura gratuita da revista 30Días en la Iglesia y en el Mundo, que com tanta generosidade nos envia, sempre pon- Fátima, 6 de junho de 2011 Prezada redação, obrigada pelo envio regularíssimo de 30Days. Nós lhe somos gratas por isso. ¬ 30DIAS Nº 6 - 2011 11 Cartas dos mosteiros Já que aqui, em Fátima, é época de peregrinações, poderíamos pedir-lhes cinquenta exemplares de Who prays is saved? Iriam acrescentar-se ao pequeno apostolado que fazemos aqui com publicações sobre Fátima, opúsculos e pequenos livros. Sabemos o quanto é importante frisar o valor das orações simples, aquelas que nos foram ensinadas quando éramos crianças. Se cinquenta exemplares forem caros demais para vocês, pedimos que nos informem e providenciaremos o complemento da soma necessária. Agradeço-lhes, sinceramente sua, irmã Mary Lawler IRMÃS DA VISITAÇÃO DA FILADÉLFIA Filadélfia, Pensilvânia, EUA Uma novena ao Sagrado Coração por 30Giorni Filadélfia, 24 de junho de 2011 CAPUCHINHAS DO CONVENTO NOTKERSEGG San Gallo, Suíça Cinquenta exemplares de Quem reza se salva em alemão San Gallo, 16 de junho de 2011 Prezados senhores, usamos um tom solene como convém para contatar a excelente 30Giorni. Queiram mais uma vez aceitar o nosso sincero “Deus os abençoe!” pela belíssima revista 30Giorni, que, como comunidade contemplativa, mês após mês nos é dado receber e que, como espelho da Igreja universal, é sempre muito bem acolhida e lida de “a” a “z”. Agora, porém, estamos aqui mais uma vez para contatá-los por uma “questão de negócios” e gostaríamos de lhes encomendar formalmente cinquenta exemplares do livrinho de orações fundamentais em alemão. Nós o ofereceremos a quem nos vier encontrar para a nossa divina liturgia. Muito obrigada! Ao lado de um respeitosíssimo cumprimento particular ao senhor senador Giulio Andreotti, cumprimento também a vocês, prezados senhores da redação, Caro senhor Andreotti, faz algum tempo que queríamos agradecer-lhe pelo envio gratuito de sua bela e estimulante revista 30Giorni. Possa Deus abençoar e recompensar abundantemente o senhor e todos os seus colaboradores por esse precioso dom espiritual. Somos particularmente gratas pelo excelente artigo de Giovanni Ricciardi “Do not fear anything...”, sobre o Sagrado Coração e Santa Margarida Maria, com as ilustrações originais da túnica da Visitação. Neste momento estamos fazendo uma novena de missas em homenagem ao Sagrado Coração e nela lembraremos todos vós de 30Giorni, pedindo ao Sagrado Coração que derrame sobre vós suas grandes bênçãos. Deus seja louvado, Senhor Giulio Andreotti, agradecemo-lhes vivamente pelo envio regular e gratuito da revista 30Giorni. Nós a apreciamos muito. Ficaríamos muito felizes em receber seis exemplares de “Le Fils ne peut rien faire de lui-même”, a meditação de Páscoa de padre Giacomo Tantardini. Naturalmente os ressarciremos das despesas de expedição. Em grande união na oração, com toda a nossa gratidão. Ir. Frances de Sales pela madre Antoinette Marie Walker, V.H.M. irmã Marie-Odile, ecônoma 12 30DIAS Nº 6 - 2011 irmã M. Gertrud Harder CARMELITAS DO CONVENTO DE COGNAC Cognac, França “Le Fils ne peut rien faire de lui-même” Cognac, 4 de julho de 2011 Cartas dos seminários SEMINÁRIO GOOD SHEPHERD Sydney, Austrália A meditação sobre a Santa Páscoa e 30Giorni para os seminaristas australianos Sydney, 28 de maio de 2011 Prezada redação de 30Days, no mês passado recebi com imenso prazer um exemplar de sua revista e agora chegou outro! Sou muito grato a vocês por isso. A revista se apresenta muito bem, e também os seus conteúdos irradiam a beleza da verdade. Fiquei particularmente impressionado com a meditação sobre a Santa Páscoa intitulada “The Son cannot do anything on his own”. É possível adquirir cinquenta exempla- res, em inglês, para os nossos seminaristas, aqui de Sydney? De que modo posso pagá-los? Informem-me também se continuarão a enviar-me o exemplar mensal de 30Days. Eu ficaria feliz em assiná-la pessoalmente, mas talvez esteja previsto por vocês o envio gratuito aos seminários. Estou certo de que muitos dos nossos seminaristas a assinariam, depois de ordenados. Seu, em Cristo, padre Anthony Percy, reitor SEMINÁRIO ARQUIDIOCESANO SANTO CURA DʼARS DE SEMINÁRIO SÃO CAMILO MERCEDES-LUJÁN Iomerê, Santa Catarina, Brasil Mercedes, Argentina Obrigado do Brasil 30Giorni na Argentina Iomerê, 9 de maio de 2011 Mercedes, 30 de março de 2011 Eu me chamo Juan Cruz Horn e sou um seminarista da arquidiocese de Mercedes-Luján, na Argentina. Estou interessado em assinar a revista, da qual sou um assíduo leitor, mas o preço da assinatura não está ao meu alcance. De fato, para tê-la, tenho de encontrar exemplares de cortesia. Gostaria de saber se existe a possibilidade de ter o benefício de um desconto ou de algo do gênero. Agradeço desde já pela atenção a este pedido. Em Jesus e Maria, Prezados senhores, recebemos regularmente essa excelente revista. Muito obrigado. O último número veio acompanhado do livrinho de meditações sobre a Santa Páscoa. Maravilhoso. Aproveitamos a oportunidade para renovar nossos agradecimentos e pedir sempre suas orações para a nossa Província. Com a maior estima. Juan Cruz Horn padre Carlos Alberto Pigatto 30DIAS Nº 6 - 2011 13 Cartas das missões Cartas das missões Igreja universal e com o mundo. Espero e agradeço que no-la continue a enviar. Muito grato D. Luís Gonzaga Ferreira da Silva, Bispo emérito de Lichinga MISSIONÁRIOS SALESIANOS Ron Phibun, Tailândia Da Tailândia Ron Phibun, 2 de maio de 2011 MISSIONÁRIOS XAVERIANOS Vila Ulongué, Moçambique 30Dias é um laço de união com a Igreja universal e com o mundo Vila Ulongué, 25 de março de 2011 Senador Giulio Andreotti, Saudações fraternas. Vimos por meio desta agradecer com todo o coração a revista 30Dias que temos recebido regularmente com muita alegria. Sou um bispo emérito de Lichinga onde permaneci por 30 anos como pastor daquela diocese, no norte de Moçambique. Quando atingi o limite de idade, pedi para regressar à Missão de S. Francisco Xavier, no distrito de Angónia, onde já tinha estado por oito anos. Aqui continuo o trabalho de missionário, com os jesuítas fundadores desta missão: visito as comunidades, e assisto-as no seu crescimento cristão, ajudo na formação dos animadores das comunidades, dou assistência espiritual às Irmãs missionárias de três paróquias, acompanho os doentes, particularmente os leprosos e atendo os jovens sobretudo os estudantes. Aprecio muito a vossa revista 30Dias. É um laço de união com a 14 30DIAS Nº 6 - 2011 Estimado senador Andreotti, às vésperas da Páscoa, com alegre surpresa recebi sua revista 30Giorni, trazendo os votos de boa Páscoa. Quase pensava que já não chegaria. Tenho de admitir que sou um daqueles afortunados que recebe gratuitamente a sua revista há vários anos (certamente desde 2000 ou 2001). Sempre a li inteira e depois a enviava a outro missionário, que vive a cem quilômetros da minha residência. Escrevi apenas duas vezes para agradecer-lhe (talvez poucas) e desta vez é para confirmar que ainda estou aqui em Ron Phibun (já há pelo menos vinte e oito anos) e para dizer que o n. 3 de 2011 de 30Giorni é realmente interessante. Eu diria necessário. Obrigado também por alguns livros que recebi ao longo dos anos: os escritos de Paulo VI sobre Santo Agostinho, Quem reza se salva (em italiano e em chinês), o belo livro de Mazzolari Anch’io voglio bene al papa... Quando falo com amigos padres tailandeses me dou conta logo de quanto faz falta a eles tamanha literatura cristã e teológica, que nós europeus continuamos a absorver como história e memória de muitos fatos de fé, base para uma mentalidade de Igreja universal. Obrigado. Faço votos de boa saúde e de que traga sempre a Páscoa no coração... e muitas bênçãos. padre Renzo Rossignolo Cartas das missões Cartas das missões MISSIONÁRIOS JESUÍTAS Kannur, Kerala, Índia Muitos usarão Who prays is saved e rezarão e serão salvos Kannur, 10 de maio de 2011 Kannur, 20 de maio de 2011 Caríssimo senador Andreotti, agradeço-lhe de coração pelo envio dos preciosos livrinhos em inglês Who prays is saved. Muitos usarão esse livrinho e rezarão e serão salvos. E o senhor receberá por isso o grande prêmio no céu, pois, como ensina Santo Agostinho, a quem salva uma alma é assegurada a salvação de sua própria. Asseguro-lhe que, ao lado de meus numerosos neófitos, rezamos por seu grande apostolado missionário. Com grande afeto e orações mútuas, continuo seu sempre afeiçoadíssimo comissionário, Prezado senhor diretor, agradeço-lhe de coração pelo segundo envio dos livrinhos em inglês Who prays is saved. Agora gostaria de lhe perguntar se tem em inglês a Súplica a Nossa Senhora de Pompeia, que se encontra em seu livrinho Chi prega si salva em língua italiana. Gostaria de tirar uma cópia na língua local, malayalam, para os meus muitos neófitos. Agradeço-lhe de coração e lhe asseguro minhas orações por seu maravilhoso apostolado missionário. Com grande afeto, sempre em união de oração, permaneço seu afeiçoadíssimo co-missionário, padre L. M. Zucol, S.J. padre L. M. Zucol, S.J. 30DIAS Nº 6 - 2011 15 Cartas das missões MISSIONÁRIAS CAPUCHINHAS Cartas das missões Em união a Jesus e sempre grata, sua irmã, em Cristo, Fianarantsoa, Madagáscar irmã Maria Amata Esta maravilhosa e preciosa revista chega até os confins do mundo PARÓQUIA SAINT ÉTIENNE DʼADJOHOUN Fianarantsoa, 13 de maio de 2011 Porto-Novo, Benin Caro senador Giulio Andreotti, receba um caro, fraternal cumprimento da distante missão de Madagáscar e a expressão da nossa gratidão por sua grande generosidade ao ter-nos enviado os preciosos livrinhos Quem reza se salva, tanto em francês quanto em italiano, e outro material, já nas mãos das jovens que formamos e de todos aqueles que vêm rezar em nossa capelinha. Obrigada de coração. Que o Senhor o recompense por sua grande generosidade e por seu amor por nós e pela oração. Um agradecimento sincero também a todos os seus colaboradores: sem eles esta maravilhosa e preciosa revista não poderia ser conhecida e apreciada por ninguém, mas graças a eles chega até os confins do mundo e a Palavra de Deus e a vida da Igreja e do mundo chegam às mãos de muita gente. Nós lhe asseguramos nossa oração cotidiana pelo senhor e pela redação. Pedimos a oração de vocês. Qui prie sauve son âme para os catecúmenos 16 30DIAS Nº 6 - 2011 Porto-Novo, 18 de maio de 2011 Amigos de 30Jours, peço respeitosamente a benevolência de me enviarem alguns exemplares de seu livro Qui prie sauve son âme, para ajudar os catecúmenos e os outros fiéis no caminho da oração. De fato, como sacerdote, acompanho os catecúmenos e me dedico a eles com todo o coração. Queiram receber a expressão de meus agradecimentos antecipados e de meus sentimentos fraternos em Cristo. padre Gislain Prudencio A. Falade Cartas das missões Cartas das missões PARÓQUIA NOTRE-DAME DE LOURDES DI DANGBO Dangbo, Benin Qui prie sauve son âme, maravilhoso e útil Dangbo, 25 de maio de 2011 Caro senhor, meu nome é Léonora Agomma, sacerdote. Tive a alegria de descobrir na casa de um amigo o livrinho Qui prie sauve son âme. Eu o achei maravilhoso e realmente muito útil para todo cristão. Gostaria de saber como poder obtê-lo, dado que tenho a intenção de propô-lo aos meus catecúmenos, que este ano são 190. Obrigado. padre Léonora Agomma Dangbo, 6 de junho de 2011 Caro senhor, recebi os livrinhos Qui prie sauve son âme e gostaria de expressar, com esta carta, não apenas a minha gratidão, mas também a dos meus catecúmenos e fiéis, aos quais distribuí todos os livrinhos domingo passado, no final da missa da tarde. Foi, para eles, uma satisfação imensa, e aqueles que não o receberam não param de me pedir. Tudo é graça. Deus os abençoe pelo grande bem que fizeram a esses jovens. Agradeço-lhes infinitamente. Se for possível, gostaria de conhecer melhor 30Jours. padre Léonora Agomma MISSIONÁRIOS DO SAGRADO CORAÇÃO São Gabriel da Cachoeira, Amazonas, Brasil Quatrocentos exemplares de Quem reza se salva para o povo indígena da amazônia São Gabriel da Cachoeira, 3 de junho de 2011 Estimado Sr. Giulio Andreotti, saudades! Caro Diretor da revista 30Dias, agradeço imensamente pelo rico trabalho que o senhor presta à Igreja e cordialmente o cumprimento como um irmão menor em Cristo. Tomo a liberdade de apresentar-me. Sou padre Reuberson Ferreira. Faço parte da Congregação dos Missionários do Sagrado Coração. Tenho um ano e meio de padre e trabalho no interior do Amazonas na imensa diocese de São Gabriel da Cachoeira, no extremo norte do Brasil. Desde abril do ano passado fui designado para assumir uma paróquia nesta área. Trata-se de um trabalho necessário, contudo, imensamente árduo. Trabalhamos basicamente com os povos indígenas (mais de 23 etnias). Aqui já há uma história de mais de cem anos de trabalho missionário e de evangelização protagonizado pelos salesianos e coadjuvado pela nossa congregação. Estando nesta região e sentindo a realidade, pude perceber que, em muitos aspectos, o povo tem uma profunda fé e uma prática constante do catolicismo, sobretudo nas gerações mais maduras. Uma preocupação, contudo, tomou-me de assalto, os mais jovens têm pouca formação religiosa e até as orações principais do cristianismo estão sendo desaprendidas. Lendo a revista 30Dias, que o bispo diocesano D. Edson Damian me repassa quando acaba de ler, percebi na riqueza das páginas que descortinam o mundo eclesial, bem como a maravilha que é esse pequeno opúsculo chamado Quem reza se salva. Creio que em nível de subsídio para uma meditação e revisão das orações principais do cristianismo ele seja fabuloso. Revirando a biblioteca da diocese achei um exemplar e ratifiquei meu pensamento. Com disposição em adquirir uma quantidade razoável (cerca de quatrocentos exemplares), decidi pesquisar os valores. Esse fato contudo desanimou-me, a nossa paróquia não tem condições de pagar tão alto custo. Por isso resolvi pedir-lhes que me doassem esse material. Comprometo-me, se preciso, em ajudar a custear as despesas de expedição. Enfim, esse é o ¬ 30DIAS Nº 6 - 2011 17 Cartas das missões meu desejo para poder servir melhor este povo indígena da amazônia. Por fim, despeço-me fraternalmente e aguardo uma resposta sua (oxalá seja positiva). Com afeto, padre Reuberson Ferreira, M.S.C. DIOCESE DE IGLESIAS Nuxis, Carbonia-Iglesias, Itália 30Giorni do Quênia para a Sardenha Nuxis, 19 de junho de 2011 Caros amigos, até o ano passado fui missionário no Quênia (por dezesseis anos), ao lado de outro padre, em Camp Garba, no vicariato apostólico de Isiolo. Recebemos regularmente a revista 30Giorni em inglês, a língua oficial 18 30DIAS Nº 6 - 2011 do Quênia, e ficamos muito felizes por lê-la e ser informados das notícias sobre a Igreja Católica por meio desse importantíssimo meio de informação. Agora estou novamente em casa, pois o bispo da nossa diocese de Iglesias nos chamou de volta, pela nossa idade: eu tenho 82 anos e o meu confrade, 76. Agora a missão está sob a responsabilidade dos Missionários da Consolata de Nairóbi, que estão desenvolvendo um ótimo trabalho. Lembro e tenho saudade da leitura de 30Giorni, que foi também muito útil para aprender inglês, e gostaria de continuar a receber sua revista. Mas, como eu era pobre na missão no Quênia, sou pobre também agora: ajudo numa grande paróquia em Carbonia, onde o dinheiro é pouco. Se o diretor e vocês puderem me ajudar, eu poderia celebrar missas segundo as suas intenções. Deus abençoe a todos vocês, às suas famílias e ao seu trabalho. padre Giulio Ballocco Correio do Diretor ARQUIDIOCESE DE OLINDA E RECIFE Recife, Pernambuco, Brasil Obrigado pelos suplementos de rico teor espiritual e teológico Recife, 31 de maio de 2011 Excelentíssimo senhor diretor, Cumprimentando Vossa Excelência, desejamos agradecer pelo envio, com pontual regularidade, da revista 30Dias, pela qual o senhor empenha seus esforços como diretor, tornando-a uma excelente publicação de referência para todos os que têm o prazer de recebê-la, muitas vezes acompanhada de suplementos de rico teor espiritual e teológico, como a Meditação sobre a Santa Páscoa, do padre Giacomo Tantardini. Nossa gratidão e nosso reconhecimento, igualmente, são a todos os que a tornam generosamente possível para os que a ganham gratuitamente. É COMPANHIA DOS SACERDOTES DE SÃO SULPÍCIO DE MONTREAL Montreal, Quebec, Canadá um sinal de comunhão e apreço por nós, que recebemos de Deus a missão de pastorear a Igreja do Senhor. Para evitar qualquer extravio no recebimento de 30Dias, informo o novo endereço de nossa Cúria Metropolitana. Respeitosamente, Dom Antônio Fernando Saburido, O.S.B. Arcebispo Metropolitano de Olinda e Recife A presente carta é para agradecer calorosamente por todas as edições que recebi e para encorajá-lo a continuar esta obra de educação da inteligência e da fé na Igreja. 30Giorni: obra de educação da inteligência e da fé Jacques D’Arcy, P.S.S., superior provincial EMBAIXADA DA REPÚBLICA DO CONGO Montreal, 10 de maio de 2011 Paris, França Caríssimo senhor Andreotti, já há alguns anos recebo sua esplêndida revista 30Giorni. Sempre me surpreendo, tanto com a qualidade das informações quanto com o belíssimo revestimento gráfico que nos são oferecidos pela revista que o senhor dirige. O senhor nos mantém a par dos principais acontecimentos da Igreja universal com os vários artigos sobre espiritualidade, arte cristã, liturgia e com os artigos de Nova et Vetera. Só posso parabenizá-lo e oferecer-lhe meu apoio para que continue a publicar esta revista, que, sem dúvida alguma, produz grandes frutos espirituais na Igreja. Pedido de Qui prie sauve son âme Paris, 18 de maio de 2011 Senhor diretor, sou uma leitora apaixonada de 30Dias. Felicito-os por todo o trabalho que fazem para nos manter a par da notícias relativas à Igreja e ao mundo. Peço-lhes a gentileza de me enviar quatro exemplares em francês do livrinho Qui prie sauve son âme. Agradeço-lhe do fundo do coração, e cumprimento-o cordialmente. Christine Mavoungou 30DIAS Nº 6 - 2011 19 Correio do Diretor REVISTA LEAVES, DOS MARIANNHILL FATHERS Dearborn, Michigan, EUA Quem traduz para a edição em inglês faz um trabalho excelente Dearborn, 22 de junho de 2011 DIOCESE DE ÁSTI Ásti “Boa imprensa” para o hospital de Ásti Ásti, 17 de junho de 2011 Bom dia, sou um sacerdote da diocese de Ásti, há cerca de dez anos capelão no hospital de minha cidade. Decidi escrever impelido pelo desejo de pôr à disposição dos cerca de quinhentos doentes do hospital e de seus familiares um pouco de “boa imprensa”. Graças a Deus a capela do hospital está numa posição de passagem e é muito frequentada. Há algum tempo instalei um expositor em que quem entra pode encontrar (gratuitamente) revistas e pequenas imagens. A afluência de pessoas é tão grande, que as revistas desaparecem rapidamente (para acabar nos quartos dos doentes) e o expositor fica vazio com frequência. O orçamento da capela não me permite fazer assinaturas e por isso pensei em pedir sua colaboração. Qualquer revista, mesmo números antigos, será bem recebida e talvez esta obra de bem possa-se tornar também um modo de dar a conhecer as suas publicações a um público no mínimo variado e numa condição existencial que o torna muito disponível à mensagem cristã. Fico à espera de uma resposta de sua parte e lhes desejo todo o bem no Senhor, Caro diretor, desejo parabenizá-lo pelos três artigos e pelo comentário à segunda parte do livro do papa Bento XVI Jesus of Nazareth, no número 3 de 2011 de sua revista. Os artigos são: A look at the Jesus of the Gospels and a hearing of His words, do cardeal Georges Cottier, O.P.; Faithful to the declaration ‘Nostra aetate’, de Riccardo Di Segni; e The dividing line runs between trust and skepticism, de Rainer Riesner. Respectivamente escritos por um católico, um judeu e um protestante, os artigos dão três perspectivas equivalentes mas diferentes do pensamento do nosso Papa; e cada um deles afirma o que ele diz. Não achei nenhuma outra revista deste lado do oceano Atlântico com as mesmas análises equilibradas sobre este livro. Mantenham esse excelente jornalismo. Leio há mais de um ano a edição em inglês de sua revista, e devo dizer que o inglês é excelente. Presumo que a maior parte dos artigos sejam em italiano, e por isso está claro que quem traduz para a edição em inglês faz um trabalho excelente! padre Thomas Heier, C.M.M., diretor responsável PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA ARGENTINA “SANTA MARÍA DE LOS BUENOS AIRES” Buenos Aires, Argentina 30Dias, Quem reza se salva e o Credo do povo de Deus na Argentina padre Claudio Sganga Buenos Aires, 9 de junho de 2011 Ásti, 22 de junho de 2011 Recebi ontem o material enviado em cortesia. Obrigado mais uma vez pela generosidade e pela velocidade! padre Claudio Sganga 20 30DIAS Nº 6 - 2011 Estimado senhor, sou um sacerdote do clero diocesano e capelão da Universidade Católica Argentina. Escrevo-lhe A capa de Quem reza se salva em língua chinesa DIOCESE CATÓLICA DE XANGAI Xangai, República Popular da China Quem reza se salva difundido por toda a China Xangai, 15 de julho de 2011 Caro Gianni Valente, calorosas saudações de Xangai! Lamento escrever-lhe uma carta com tanto atraso acerca da publicação do livro Chi prega si salva em língua chinesa. Tínhamos combinado, como vocês sugeriram, que vocês patrocinassem todo o custo da publicação e distribuição do livro. Para dizer a verdade, em maio de 2010 imprimimos vinte mil exemplares dele, distribuindo-os por toda a China. Cada livro custa 5 yuan (55 centavos de euro). Decidimos imprimir mais vinte mil exemplares. Mas precisamos do dinheiro que vocês nos prometeram. Cordiais saudações, Roma, 22 de julho de 2011 Caro padre Anthony Chen, em nome do diretor de 30Giorni, o senador Giulio Andreotti, confirmamos que ficamos muito contentes em poder contribuir para a impressão e difusão do pequeno livro de orações Chi prega si salva em língua chinesa. Segundafeira, 25 de julho, enviaremos nossa contribuição (a operação bancária exigirá alguns dias), como sinal de gratidão e de comunhão. Pela redação de 30Giorni, padre Anthony Chen diretor do Centro de Pesquisas Guangqi e da tipografia da diocese de Xangai para pedir uma assinatura gratuita de sua prestigiosa revista, na edição em língua espanhola. Seria de grande utilidade para a formação de muitas pessoas que encontro em meu trabalho pastoral, particularmente casais e jovens. O motivo do meu pedido é que eu não poderia de modo algum pagar por uma assinatura. Roberto Rotondo diretor responsável Peço-lhe também alguns exemplares do livrinho Chi prega si salva e do Credo do povo de Deus, de Paulo VI. Pedindo a Deus que este meu pedido possa ser respondido, cumprimento-o com cordial estima, no Senhor. padre Omar Horacio Lorente 30DIAS Nº 6 - 2011 21 Reportagem Um modelo para o novo Oriente Médio Na última década, na Turquia, as minorias, também cristãs, encontraram novos espaços de liberdade. E o partido no poder, o AKP, demonstrou que islã e democracia não são inconciliáveis. Um exemplo para a Primavera árabe por Lorenzo Biondi 22 30DIAS Nº 6 - 2011 TURQUIA Acima, monsenhor Ruggero Franceschini celebra a missa na Gruta de São Pedro em Antioquia; ao fundo a mesquita de Ortaköy e a ponte sobre o Bósforo em Istambul ma pequena multidão está à espera diante de uma parede de pedra. É o dia 29 de junho, festa de São Pedro e São Paulo. Estamos nos arredores de Antioquia: encravada na montanha há uma fachada de pedra e uma gruta. Segundo a tradição, os primeiros cristãos encontravam-se aqui para rezar escondidos por causa da perseguição. Entre eles os apóstolos Paulo, Barnabé e Pedro, que foram os primeiros a trazer aqui o anúncio de Jesus. Hoje a “gruta de São Pedro” foi transformada em um museu, com pagamento de ingresso. Dois vigias detêm uma centena de fiéis que gostariam de entrar para rezar para o santo. U Mas a espera não dura muito. Toca o telefone: dos escritórios do governador da província chega a ordem para deixar o ingresso livre. Chega também o bispo, monsenhor Ruggero Franceschini. Os dois vigias se afastam, a gruta fica lotada de peregrinos. A missa pode começar. É uma cena comum em muitos lugares da Turquia. Nos últimos anos as autoridades do Estado assumiram a administração de alguns edifícios de culto abandonados. Foram tirados da degradação e, embora durante o ano deva-se pagar ingresso para visitá-los, em ocasiões especiais estes “lugares santos” são restituídos à devoção dos fiéis. É uma novidade, talvez pequena, mas é um sinal de mu- dança. Por muitas décadas na República fundada por Mustafa Kemal Atatürk a existência de minorias religiosas foi negada. Hoje, mesmo entre resistências e contradições, para a pequena comunidade cristã em terras turcas abriu-se uma estação nova e promissora. Os sinais de uma mudança Sente-se a herança do passado. Na capital Ancara, dominada por ministérios, é impossível encontrar um edifício com alguma cruz no teto. As igrejas existem, mas estão dentro das embaixadas. Em solo extraterritorial e não visíveis. Mesmo as mesquitas na realidade se veem poucas, somente algumas antigas e esmagadas entre edifícios modernos. Se a liberdade dos cristãos na Turquia tem limites, não é simplesmente pelo contraste entre as várias religiões. Isso nos é explicado pelo padre Dositheos, um sacerdote ortodoxo do Patriarcado ecumênico de Istambul: “Cristãos, judeus e muçulmanos sempre conviveram nessa terra. Sabem o que quer dizer convivência pacífica. Nas primeiras décadas da República turca (fundada em 1923) o nacionalismo foi a política dominante do país, mas usou uma máscara: o islã. Na realidade por trás daquela palavra ocultava-se a ideia da nação turca. Na época as minorias perderam seus direitos diante do estatismo kemalista. Foi somente nos últimos dez anos que se iniciou a falar de liberdade religiosa: uma novidade absoluta”. ¬ 30DIAS Nº 6 - 2011 23 Reportagem Procede-se lentamente, um passo de cada vez. Vemos isso em Tarso, cidade natal de São Paulo, onde chegamos em 26 de junho, no domingo anterior à festa dos santos Pedro e Paulo. A comunidade local recebeu a autorização para celebrar a missa na igreja dedicada ao Apóstolo das gentes. Construído pelos cruzados no século XII, com a chegada da República o edifício foi transformado em um depósito. Somente há poucos anos, graças à insistência dos padres capuchinhos e ao apoio do governo, o monumento foi reformado e reaberto. Também nesse caso como museu. Faltam poucas Acima, a fachada na nova igreja sírio-católica de Alexandreta, na província meridional de Hatay; aqui abaixo, o imponente mausoléu de Atatürk em Ancara horas para a celebração: as três irmãs “Filhas da Igreja” que vivem na cidade obtiveram há pouco a permissão para entrar e arrumar a igreja. O tempo para os preparativos é pouco, faz-se tudo meio às pressas. E há ainda menos tempo no final da missa para tirar todas as cadeiras e os paramentos: os fiéis deixam rapidamente o lugar para os turistas que pagam o ingresso. Na “laica” República da Turquia é o Estado que controla para que a atividade religiosa são saia dos limites fixados pela Constituição e pela lei. As Igrejas não têm um reconhecimento legal. Mas há alguns anos a situação das minorias religiosas melhorou sensivelmente. O governo do Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP) mostrou-se atento às suas solicitações. Nem sempre as promessas foram mantidas, mas a nova classe de dirigentes turca manifestou uma disponibilidade ao diálogo que não havia no passado. E o diálogo, em alguns casos, deu frutos muito concretos. O presidente da fundação síriocatólica de Istambul, Zeki Basatemir, conta-nos da vez que foi protestar porque uma antiga igreja síria de Alexandreta – Iskenderun para os turcos – há anos era usada como cinema para filmes eróticos. Restituir o edifício à sua antiga fun- ção era praticamente impossível, mas depois de tê-lo expropriado, o governo mandou demolir e em 2010 construiu, custeando as despesas, uma nova igreja. A fachada, fiel ao tradicional estilo dessas regiões, mostra uma sensibilidade nova aos problemas dos cristãos. Muitas vezes a colaboração nasce nas relações entre as pessoas, mas está alcançando também o plano das instituições. Em setembro desse ano, por exemplo, o município de Istambul publicará junto com a Santa Sé um livro sobre a presença cristã na cidade no século XVII. Pela primeira vez o símbolo de uma instituição turca será imprimido junto ao da Igreja Católica. Infelizmente, justamente nos anos em que as relações entre o governo de Ancara e os cristãos parece mudar, a pequena Igreja da Turquia foi atingida por tragédias como o assassinato do padre Andrea Santoro e de monsenhor Luigi Padovese. Para esclarecer aqueles crimes será preciso ainda muito tempo, mas por enquanto o poder político quis demonstrar a sua proximidade aos amigos das vítimas. Monsenhor Franceschini, arcebispo de Esmirna e administrador pro tempore do vicariato apostólico de Anatólia, conta-nos que o ministro da Justiça, Sadullah Ergin, em solidariedade, foi a Iskenderun para o enterro do bispo assassinado. “Perguntou-me se tínhamos alguma solicitação a fazer”, recorda monsenhor Franceschini. “Respondi-lhe que queríamos saber a verdade, nada mais”. Há pouco mais de um ano de distância, está sendo aberto o processo contra o assassino do bispo e os eventuais mandantes. Muitos nos testemunham a solicitude das autoridades em querer que a justiça siga rapidamente os trâmites. Isso em um lugar, onde em outros tempos, esperar-se-ia uma indiferença ou mesmo aberta hostilidade. O falso mito da islamização “A minoria cristã na Turquia nutre a esperança de que no decorrer do terceiro mandato do partido de governo as questões pendentes, necessárias para os direitos da minoria, possam finalmente al- ¬ TURQUIA. Um modelo para o novo Oriente Médio Entrevista com Bekir Karliga “Buscar a democracia sem polarizações ideológicas” O islã apresenta-se como último elo de uma longa tradição profética. As outras religiões fazem parte do seu patrimônio e devem ser defendidas O primeiro-ministro turco Erdogan entre os colegas Evo Morales e Luiz Inácio Lula da Silva, em um encontro da Aliança das civilizações em 2010 H á uma estreita ligação entre o islamismo moderado do AKP e o diálogo entre as religiões. Falamos sobre isso com o professor Bekir Karliga, conselheiro do primeiro-ministro Erdogan. O professor é também presidente do Comitê Nacional turco da Aliança das Civilizações, um organismo das Nações Unidas criado em 2003 por iniciativa de Erdogan e pelo primeiro-ministro espanhol Zapatero. Como mudou o islã político na Turquia? BEKIR KARLIGA: Os fatores religiosos arraigados na memória coletiva e na vida cotidiana da sociedade turca – colocados de lado no nascimento da República – reapareceram depois da Segunda Guerra Mundial, com a introdução de um sistema democrático e pluralista. Os partidos fundados por Necmettin Erbakan e o AKP são dois exemplos da mesma linha política. Mas o que diferencia o AKP é que este tenta implementar os valores democráticos sem populismo, sem se fechar em esquematismos ideológicos e ligando-se à história do país e à realidade geopolítica. Em matéria de política exterior, o AKP, tem como objetivo uma nova ordem econômica e política seguindo os princípios de justiça universal, equidade e solidariedade, de acordo com a comunidade internacional, sem se reduzir a satélite de outros países e mantendo-se afastado de polarizações ideológicas prejudiciais. É uma hipótese política válida também fora da Turquia? Os dez anos de governo do AKP causaram uma mudança radical no país e no mundo. Considerando os emocionantes eventos que estão acontecendo no Oriente Médio percebe-se a aspiração do islã de encontrar a democracia. O modelo é a Turquia, dirigida pelo primeiro-ministro Erdogan. A religião islâmica considera a ideia do diálogo entre religiões? O islã apresenta-se como o último elo de uma longa tradição profética. As outras religiões fazem parte do seu patrimônio e devem ser defendidas, mesmo além do diálogo com as mesmas. Além disso, o profeta Abraão tem uma importante posição: as três religiões que veneram o único Deus são representantes de uma fé comum. Nos Estados islâmicos a religião, as tradições e os costumes de judeus e cristãos não devem ser impedidos. Graças a esta atitude, milhões de pessoas que pertenciam a mais de vinte confissões religiosas e etnias viveram juntas por muitos séculos em territórios otomanos. Deste ponto de vista a experiência da Turquia pode ser importante para a jovem União Europeia, que tem, ao invés, uma história de convivência mais breve. Como estão as relações entre a Turquia e a Europa? A Turquia procurou, com sincera e boa fé, estabelecer relações com a União Europeia. Infelizmente a Turquia foi deixada à porta, criando descontentamento na nossa opinião pública. A nação turca está estabelecida na Europa desde o século XIV. Em 1959 foi assinado o acordo de colaboração entre a Turquia e Comunidade Europeia. Hoje a União esqueceu-se daquele acordo. Nos últimos anos as relações entre Oriente e Ocidente foram vistas sob a ótica do confronto. A Aliança das Civilizações é uma experiência contracorrente... Foi uma grande novidade para uma humanidade que queria sair do turbilhão do “choque de civilizações”. O grupo é formado por vinte e uma instituições internacionais e 106 países. Na Turquia coordeno um comitê nacional que estuda o diálogo entre culturas, religiões e civilização no país. Em Istambul foi criado um “Instituto de Aliança das Civilizações”, no qual estudantes de várias nações podem obter uma formação de alto nível, para difundir uma cultura de paz e tolerância no país e no mundo. L. B. 30DIAS Nº 6 - 2011 25 Reportagem Tradição e modernidade convivem nas margens do Bósforo. Na foto, o centro financeiro de Istambul que contorna uma mesquita, na parte asiática da cidade cançar a meta desejada”. São palavras de monsenhor Antonio Lucibello, núncio apostólico junto à República da Turquia. “Existem já sinais eloquentes que levam à esta direção”. O resultado das eleições de 12 de junho passado será recordado como um divisor de águas da história turca. A AKP de Recep Tayyip Erdogan conquistou 50 por cento dos votos, um resultado sem precedentes. Andando pelas periferias de Istambul entende-se um dos motivos deste triunfo. Os centros financeiros estão cintilando de arranha-céus de recente construção. Nos novos bairros populares amontoam-se os grandes edifícios, em meio a uma selva de guindastes e canteiros de obras. A economia circula, a classe média aumenta e aumenta o bem-estar. Mas as finanças não são suficientes para explicar o sucesso do partido. “O AKP tornou-se a voz do povo muçulmano esquecido pelo processo de modernização da Turquia”. A explicação é-nos dada por Robert Koptas, jovem diretor da revista semanal em idioma ar meno de Istambul, Agos. Por muitas décadas a Turquia “laica” olhou para a religião como um estorvo. Modernidade – dizia-se – corresponde a secularização. Uma mensagem que os turcos de fé muçulmana muitas vezes tiveram dificuldade em aco- lher. “Hoje, aquela parte da sociedade entrou por sua vez em um processo de moder nização”, prossegue Koptas. “O AKP quer demonstrar que também os muçulmanos podem ser verdadeiros democratas”. Não é a primeira vez que um partido de inspiração islâmica chega ao poder. Tinha acontecido em 1996, quando o governo era administrado por Necmettin Erbakan. No seu Partido do Bemestar muitos apoiavam a introdução da lei islâmica, a sharia, e o próprio primeiro-ministro tinha estreitos contatos com algumas irmandades “sufi” (isto é, de místicos muçulmanos) conhecidas pelo seu apoio à islamização do Es- Entrevista com Louis Pelâtre “Este novo ar que se respira na Turquia” O vigário apostólico de Istambul fala sobre a vida das comunidades cristãs em um país que está mudando por causa da ʻlaicidadeʼ turca, não do islã, que a Igreja não pode existir oficialmente”. Sua excelência monsenhor Louis Pelâtre, vigário apostólico de Istambul, descreve-nos a situação da comunidade cristã na Turquia vista da metrópole sobre o Bósforo. “É Como estão mudando as condições de vida dos cristãos da Turquia? LOUIS PELÂTRE: Uma mudança evidente. Por um lado porque a comunidade católica mudou sua “fachada”: chegou um grande número de imigrantes das Filipinas, dos países da África, enquanto o número dos que provêm dos países do Levante, a região mediterrânea oriental, está diminuindo. Estão indo embora ou para a França ou outros países europeus. Os que vão embora esperam encontrar uma vida mais fácil em um país “cristão”... Mas, 26 30DIAS Nº 6 - 2011 hoje em dia, qual país pode-se dizer cristão? Quando cheguei à Turquia, quarenta anos atrás, pairava um ar de xenofobia. Hoje ainda permanecem alguns problemas para as minorias, mas em outros lugares é diferente? Se na França um imigrante que se chama Mohammed procura trabalho, tem as mesmas chances dos outros para encontrá-lo? No Ocidente – principalmente depois da morte de monsenhor Padovese – ouviu-se falar de uma cristandade “assediada” na Turquia. É verdade? Foi uma tragédia, mas não creio que tenha se tratado de um um fato causado por um sentimento anticristão. Fala-se de um movimento subterrâneo no Estado turco, que agiria contra o atual governo e que emergiu com o caso Ergenekon. Mas ainda hoje é realmente difícil entender as causas daquele assassinato. TURQUIA. Um modelo para o novo Oriente Médio tado. Em menos de um ano do nascimento daquele governo, os militares intervieram maciçamente no jogo político. Em junho de 1997 Erbakan foi obrigado a pedir demissão. Depois a Corte constitucional determinou a ilegalidade do seu partido. Foi então que um grupo de políticos de “nova geração”, entre os quais Erdogan e Abdullah Gül, intuiu a necessidade de uma ruptura com o passado. Como as Democracias cristãs europeias A inspiração islâmica permanece, mas muda o sinal. Aumenta, por exemplo, a influência das associações para o diálogo que se inspiram no filósofo Fethullah Gülen. Cemal Usak – vice-presidente da Fundação dos jornalistas e dos escritores, criada pelo próprio Gülen – conta: “Até o final dos anos Noventa a maior parte dos políticos muçulmanos acreditava que o seu dever era o de instituir um Estado islâmico. Por volta do ano 2000 começaram a entender que a forma de Estado não se pode impor, mas depende do consenso dos eleitores. Erdogan conseguiu vencer apenas quando compreendeu que precisava de uma Mustafa Kemal Atatürk fotografado rezando com outros oficiais do exército. Imagens como estas se encontram em muitas sedes do AKP Alguns dizem que hoje a Turquia seja um país menos “laico” e portanto menos seguro para os cristãos... Não concordo com isso. Sou francês e conheço o lado “duro” da laicidade: na minha Bretanha era proibido construir escolas católicas. E recordo que a laicidade de Atatürk inspirou-se na francesa: a religião é muito contrastada, mesmo a muçulmana. Apenas o aspecto identitário e cultural é absorvido. Erdogan não tem nada de fanático, é um político inteligente: entendeu que precisa dirigir-se ao povo por aquilo que o povo é, não como se gostaria que fosse. Em relação aos cristãos, é por causa da “laicidade” turca – não do islã – que a Igreja Católica não pode existir oficialmente no país. Não me parece que o problema para os cristãos seja devido ao fato que é permitido às jovens usar o lenço na universidade... Pode-se esperar alguma novidade sobre o reconhecimento oficial da Igreja? Atualmente é impossível que o Estado reconheça a Igreja: é contra a Constituição, que não reconhece nenhuma religião, nem mesmo o islã. Porém, parece que o primeiro-ministro Erdogan queira mudar as coisas. Ele mesmo sofreu essa situação, quando era prefeito de Istambul: acabou na prisão por “ataque à laicidade”, ao citar um poeta que definia os minaretes “as nossas baionetas”. Teve muitos problemas por uma citação: mais ou menos como Papa Ratzinger em Regensburg... Antes daquele acontecimento Erdogan e eu nos encontrávamos com frequência, e durante o período de em que es- versão de islã político adequada às necessidades da Turquia”. Alper Dede, politólogo da Universidade Zirve de Gaziantep, reconstrói para nós os primeiros anos do partido de Erdogan. São dinâmicas que recordam a origem das Democracias cristãs europeias: “Quando nasceu o AKP, em 2001, confluíram personalidades de várias proveniências. A cúpula do partido sentiu-se próxima às atuais Democracias cristãs. A maioria dos políticos é de centro-direita, mas não só isso. Muitos vêm da tradição islamista de Erbakan, outros decididamente mais moderados. Alguns provêm dos partidos conservadores de matriz leiga”. Ao contrário de seus predecessores, Erdogan tentou uma síntese entre a Turquia leiga e a religiosa. Nas sedes da AKP encontram-se as imagens de Mustafa Kemal Atatürk. Porém, muitas vezes, escolhe-se a foto que o apresenta absorto em uma oração com seus ¬ teve na prisão, enviou-me alguns bilhetes, também para todas as personalidades públicas da cidade. Ainda hoje muita gente é contrária às mudanças desejadas por ele; mas foi a democracia que nos levou à situação atual e o resultado do voto deve ser respeitado. A Turquia pode representar um “modelo” de convivência entre islã e democracia? Fala-se de “modelo turco” e isso já é interessante. Pode-se não concordar com tudo o que Atatürk fez, mas a laicidade da Turquia teve uma influência extraordinária no Oriente Médio. Hoje a Turquia parece ter encontrado um novo equilíbrio, mas a passagem para além da laicidade “dura” ainda não terminou. L. B. Ofertório na igreja de Santo Antônio de Pádua, em Istambul 30DIAS Nº 6 - 2011 27 Reportagem companheiros, com as mãos voltadas para o céu. Simbolizando que as duas Turquias não são por nada incompatíveis. “Os ocidentais que olham ao AKP”, explica ainda Roberto Koptas, “veem muçulmanos e têm medo. Eu, como armênio, não tenho medo do AKP. É ridículo dizer que o AKP queira introduzir a sharia. São simplesmente muçulmanos, muçulmanos praticantes, como grande parte da po- trário, como a imprensa europeia mostra geralmente. Ao mesmo tempo, uma maioria de turcos pensa que o comportamento geral da sociedade para com a religião tenha mudado, e mudado para melhor. O conflito entre as duas metades da Turquia – secular e religiosa – certamente não se esgotou. A tensão voltou a subir em 2007 quando Abdullah Gül foi eleito presidente da República. Por al- dando – no país como também no exterior. O “modelo turco” Em 2002 era difícil imaginal que o AKP pudesse dar uma virada tão significativa na política turca. Em eleições surpreendentes, nenhum dos partidos de governo teve condições de superar o limite dos 10 por cento para entrar no Parlamento. Conseguiram, justamente, apenas o partido de Erdogan (AKP) e os ke- Fiéis rezando na grande mesquita Uma criança muçulmana de Solimão em Istambul no bairro de Fatih em Istambul “Os ocidentais que olham ao AKP”, explica Roberto Koptas, do semanário Agos, “veem muçulmanos e têm medo. Eu, como armênio, não tenho medo do AKP. É ridículo dizer que o AKP queira introduzir a sharia. São simplesmente muçulmanos, muçulmanos praticantes, como grande parte da população deste país. Aquela parte do país que quer estar presente no Parlamento, nas universidades, e é muito ‘sadio’ que o queira” pulação deste país. Aquela parte do país que quer estar presente no Parlamento, nas universidades, e é muito ‘sadio’ que o queira”. A ideia da islamização da sociedade, analisando realisticamente, não funciona. Em um estudo promovido pelo Centro Tesev – uma instituição financiada na sua maioria pela Open Society de George Soros – mostrava-se que de 1999 a hoje o número de mulheres que usa o lenço diminuiu. Não o con28 30DIAS Nº 6 - 2011 gum tempo pareceu que uma parte do exército estivesse pronta para intervir maciçamente no cenário político. Foi o ano dos assassinatos de Hrant Dink, jornalista armênio na época diretor da Agos, e do padre Andrea Santoro. Em outros tempos a tensão entre laicistas e islâmicos teria levado os militares a intervir para restabelecer a ordem. Mas o golpe de Estado não aconteceu. Era o sinal de que o clima estava mu- malistas do Partido Republicado do Povo (CHP). Os islâmicos moderados encontraram-se com 35% dos votos a controlar os dois terços do Parlamento. “AKP era um partido novo”, comenta ainda o professor Dede, “com experiência apenas nas administrações locais”. Erdogan, seu líder, não pôde nem mesmo se candidatar: quatro anos antes um tribunal tinha-o banido “para sempre” da vida política por “inci- TURQUIA. Um modelo para o novo Oriente Médio tação ao ódio religioso”. Em um comício tinha citado uma poesia turca do início do século XX: “As mesquitas são os nossos quartéis, as cúpulas os nossos elmos, os minaretes as nossas baionetas e os fiéis os nossos soldados”. Foi eleito apenas em 2003, depois da mudança da lei por parte do Parlamento. Nessas condições não eram muitos os que acreditavam na duração da experiência AKP. “Nos primeiros anos de governo”, conta-nos ainda Dede, “falei com muitos expoentes egípcios da Irmandade Muçulmana que eram céticos com o que acontecia na Turquia. A virada na credibilidade do partido chegou com o início do processo Ergenekon”, ou seja, ainda em 2007, quando soube-se que alguns oficiais do exército planejavam um golpe de Estado e acabaram na prisão por isso. Foi então que “o AKP demonstrou ter maior poder do que a antiga burocracia secularista”. Hoje muitos jovens políticos da Irmandade vêm à Turquia para aprender com o AKP. Quase todos os dias discute-se sobre o “modelo turco” nos jornais da Turquia e da região do Oriente Médio. Não há dúvida de que os modelos políticos são difíceis de serem exportados. Isso nos é recordado por Cemal Usak, partindo de uma experiência do seu país: “Nos anos Setenta havia grupos de intelectuais turcos que procuravam importar versões ‘árabes’ do islã. O único êxito foi o de produzir radicalismo”. O mesmo pode valer para papéis invertidos: “Democracia e direitos humanos são valores universais que valem em todos os países, mas cada país deve adaptar aqueles valores dentro de seu próprio contexto”. Robert Koptas também nos alerta com relação às simplificações: “Quando se fala de modelo turco, é preciso entender bem do que se fala. O modelo é a democracia, não a Turquia como tal. Se o modelo fosse a Turquia como foi até hoje – uma democracia ‘protegida’ pelas armas do exército – então não, obrigado. Mas o que agora acontece no país está A avenida beira-mar de Alexandreta. Na Turquia é comum ver mulheres vestidas “à ocidental” que caminham ao lado de mulheres com lenços demonstrando alguma coisa aos que diziam: ‘islã e democracia são incompatíveis’”. Hoje o Oriente Médio olha para a Turquia com interesse. Grande parte disso é mérito do ministro do Exterior Ahmet Davutoglu, reconfirmado no seu cargo depois das eleições. A política de “zerar problemas com os vizinhos” criou ao redor do país um clima favorável à colaboração. Não apenas em campo político: as exportações turcas para os países limítrofes aumentam em ritmo acelerado. O afluxo de turistas está em crescimento constante. Ancara exporta cultura, além de mercadorias. Este soft power “poder suave”, não passou inobservado na Europa. E entre os europeístas mais conscientes, são muitos os que propõem que não se deve perder a ocasião histórica de aproximar Oriente e Ocidente. Depois do voto de junho, Erdogan quis mostrar que ainda está interessado ao diálogo com a União Europeia, instituindo um Ministério especial para isso, sob a direção de Egemen Bagis. Mas as negociações estão paradas. Os seus capítulos mais delicados estão bloqueados. Ao invés de fazer pressões sobre temas importantes – como a tutela dos direitos das minorias – Bruxelas fechou-se em um não que às margens do Bósforo parece ideológico. Reformas e compromissos Na realidade, quanto à tutela das minorias ainda há muito o que fazer. A Constituição atualmente em vigor afirma que a liberdade religiosa pode ser exercida somente até o ponto em que não violar o princípio da laicidade do Estado. A lei turca não reconhece a existência das Igrejas cristãs. Emre Öktem, professor de Direito Internacional na Universidade de Galatasaray, em Istambul, ajuda-nos com um exemplo: “O patriarcado ortodoxo de Istambul não tem personalidade jurídica. Tecnicamente o próprio patriarca é um simples funcionário que trabalha para a fundação que administra a igreja de São Jorge”. As “fundações” são as únicas insti- ¬ 30DIAS Nº 6 - 2011 29 Reportagem A igreja de São Jorge, dentro do Patriarcado ecumênico de Istambul Ancara, mausoléu de Atatürk: um menino brinca imitando os saldados de guarda. O papel do exército no país mudou radicalmente nos últimos anos tuições religiosas admitidas pela lei. Mas até tempos recentes a sua existência foi submetida a pesadas restrições. “Uma lei de 1936 proibia a compra de propriedade ou o direito de herança para as fundações religiosas”, continua o professor. “Se um fiel doava uma propriedade à Igreja, a doação era anulada”. “Em 2002”, prossegue Öktem, “uma modificação da lei sobre as fundações foi colocada nos pacotes de harmonização criados no contexto de reaproximação entre a Turquia e a União Europeia. Foi a primeira lei que consentia a compra de propriedades por parte das fundações. Mais tarde, em 2008, uma nova lei consentia também a restituição das propriedades expropriadas no passado por parte do Estado”. Os apertos de mão do primeiro-ministro Erdogan com os líderes religiosos do país não são gestos puramente simbólicos. Padre Dositheos, no Patriarcado ecumênico de Istambul, conta-nos do encontro entre o chefe de governo e Sua Santidade Bartolomeu I. Era o dia 15 de agosto de 2009. Naquele momento um dos problemas que mais preocupava a comunidade ortodoxa era a questão da cidadania dos bispos. “Segundo a lei turca, todos os bispos que trabalham na Turquia para o patriarcado devem ser cidadãos turcos. Apenas um pequeno número de bispo o era. Na ocasião Erdogan prometeu dar-lhes o direito de cidadania para trabalhar aqui e em perspectiva também ser eleitos patriarcas”. Mantendo aquela promessa o primeiro-ministro ajudou o Sínodo ortodoxo a sobreviver. A benevolência do poder para com a minorias manifestou-se muitas vezes em “favores” deste gênero. Porém muitas vezes ouvimos dizer que os favores – por mais que seja bem aceitos – não são suficientes. É também necessário que alguns direitos sejam formalizados. A advogada Kezban Hatemi, que se dedica há anos às causas das minorias, falanos da hipótese de que Ancara assine acordos com as várias Igrejas cristãs, seguindo o modelo dos Estados europeus e da Alemanha em particular. É uma proposta muito avançada, longe da situação concreta. Ainda por algum tempo poderia ser necessário contentar-se com os favores. Também outras questões muito delicadas permanecem insolúveis. Como a do seminário ortodoxo na ilha de Heybeliada, no mar de Marmara. A Constituição turca impõe que todo o ensinamento religioso seja submetido ao controle do Estado. Nesta situação, é impossível para as Igrejas cristãs seguir os jovens com a vocação ao sacerdócio. Padre Dositheos comenta ainda: “Sua Santidade e o Sínodo têm convicção de que o primeiro-ministro Erdogan queira realmente encontrar uma solução para o problema. Mas o Estado – em Ancara – faz resistência. Esperamos para o ano próximo, com a nova Constituição”. São muitas as expectativas que convergem ao redor da promessa feita pelo AKP de uma reforma constitucional. Mas apesar do enorme sucesso eleitoral, o partido de gover no não dispõe da maioria necessária para mudar a Constituição de modo unilateral – isto é, sem colaborar com outras “Segundo a lei turca, todos os bispos que trabalham na Turquia para o patriarcado devem ser cidadãos turcos. Erdogan concedeu a cidadania a muitos bispos ortodoxos, ajudando assim o Sínodo a sobreviver” 30 30DIAS Nº 6 - 2011 TURQUIA. Um modelo para o novo Oriente Médio “Para mim”, prossegue Koptas, “a tolerância não é o ideal, o ponto de chegada. Porém até hoje os nacionalistas veem gregos, armênios, judeus como perigos para a nação, em confronto com isso, a tolerância é um bem”. Falamos também sobre o genocídio dos armênios de 1915. Por muitas décadas nas escolas turcas ensinou-se às crianças que aqueles eventos nunca tinham acontecido; a opinião pública não pode mudar de ideia de um dia para outro. Mas “caso a Turquia torne-se uma democracia plena, caso seja possível falar abertamente desses problemas, então um governo terá condições de reconhecer o massacre dos armênios”. A mudança de mentalidade já está acontecendo e também os do partido CHP, principal força de oposição, parecem ter-se dado conta. O atual líder, Kemal Kiliçdaroglu, insiste na necessidade de dar atenção ao problema da minoria curda e de dirigir-se também à Turquia mais religiosa. Mas as resistências dentro do próprio partido são muito fortes e não é claro se Kiliçdaroglu conseguirá caracterizar o partido de modo menos nacionalista e mais próximo dos partidos social-democratas europeus. Mas o fato de que discursos desse tipo sejam feitos já é um sinal significativo. Assim, o papel do exército na vida política turca está mudando. Bleda Kurtdarcan, da Universidade de Galatasaray, é um especialista de casos militares. Hoje os pesquisadores como ele têm acesso aos documentos do exército e podem estudar suas estruturas. Alguns anos atrás isso seria impossível. O caso Ergenekon, porém, ainda está aberto. Segundo a procuradoria que investigou esta estrutura secreta, em 2007 um grupo de oficiais do exército planejou alguns homicídios importantes para fomentar o medo de que a Turquia estivesse se transformando em um Estado islâmico. Entre esses, o homicídio do jor nalista ar mênio Hrant Dink, o do padre Andrea Santoro e de três cristãos evangélicos. Segundo alguns observadores – entre os quais o repórter do semanário Agos – também o assassinato de monsenhor Luigi Padovese estaria relacionado a esta conspiração. E nas últimas semanas emergiu dos autos do processo que os golpistas queriam matar também o patriarca ecumênico Bartolomeu I. O complô fracassou. A intervenção dos soldados, que nos ¬ forças políticas e sem pedir o parecer da população através de referendo. A nova Carta não poderá deixar de ser fruto de compromisso entre as diferentes forças partidárias, e em primeiro lugar entre o executivo e os candidatos independentes eleitos como apoio do partido de minoria curda. Entre eles há também Erol Dora, o primeiro cristão a entrar no Parlamento depois de mais de cinquenta anos. Dora pertence à minoria síria e como advogado dedica-se muito às comunidades cristãs. Porém ele faz questão de recordar que foi eleito com votos “muçulmanos As ruínas da antiga Basílica de Nossa Senhora de Éfeso, a primeira igreja e cristãos”. Uma represen- do mundo dedicada à Virgem Maria. No seu interior, em 431, foi realizado o Concílio tação não “sectária” mas que proclamou Maria “Mãe de Deus” dedicada a dar voz a todas as minorias do país no processo de reescrita da Constituição. “A tolerância não basta. Porém...” Os apertos de mão, a eleição de um cristão, a linguagem política que se modifica. Voltemos mais uma vez às palavras de Robert Koptas de Agos: “Até hoje no ‘discurso público’ turco os armênios e os cristãos foram sempre considerados inimigos, mas aquele discurso público está mudando”. A questão das minorias ainda é enfrentada em termos de ‘tolerância’, é verdade. Reportagem planos dos golpistas deviam intervir para ‘restabelecer a ordem’, não encontrou o apoio necessário, nem na Turquia nem no exterior. E as comunidades cristãs, vítimas daquelas agressões, continuam a esperar que um dia possam viver em paz na terra santa da Turquia. Uma presença discreta Considerando as tragédias dos últimos anos, poder-se-ia pensar que os cristãos vivam segregados. A realidade é mais complexa. No dia 13 de junho festeja-se Santo Antônio de Pádua. Visitamos a igreja de Istambul dedicada ao santo; a fachada neogótica dá para a Istiklal Caddesi, uma das ruas de compras, de turismo, de vida noturna. Dentro da igreja é um entra e sai ininterrupto, e apenas alguns dos passantes que entram Acima, mulheres muçulmanas saem do santuário da Casa de Maria, em Éfeso; ao lado, dois jovens acendem uma vela para Santo Antônio de Pádua na igreja de Istambul dedicada ao santo são cristãos. Olham tudo em torno com curiosidade, observando as estátuas dos santos, pedindo informações. Alguns acendem uma vela, ajoelham-se para rezar. Entre eles há também os muçulmanos, e mulheres com lenços na cabeça. Pedem a Santo Antônio pequenas graças: fazer as pazes depois de uma briga, a serenidade em família. A santidade de Antônio é reconhecida por todos, independente das divisões confessionais. Na Turquia convivem duas realidades opostas. Por um lado, os episódios de agressões contra os religiosos. É difícil cancelar déca32 30DIAS Nº 6 - 2011 das de propaganda nacionalista contra “missionários” cristãos – acusados de serem a vanguarda dos colonizadores ocidentais. De outro, as relações de amizade nascidas pela convivência entre cristãos e muçulmanos. As irmãs de Ivrea que administram a escola italiana de Esmirna nos descrevem a estima que a população local tem para com elas: muitos de seus estudantes não são cristãos. Em Antioquia padre Domenico Bertogli conta-nos que as doações efetuadas no minúsculo escritório da Cáritas local são provenientes também de benfeitores muçulmanos. A cir- cunstância não deve surpreender: a Cáritas ajuda os necessitados independente da sua fé. Os muçulmanos sabem disso, e mostram seu reconhecimento com gestos concretos. Porém, nos últimos tempos a organização está atravessando um momento difícil: no passado, graças à ajuda do Vaticano, a Cáritas aparecia como instituição ligada a um país estrangeiro, enquanto hoje a associação está submetida às leis turcas sobre as fundações religiosas. Por isso, não está autorizada a possuir propriedades e, portanto, as suas propriedade estão em nome das pessoas físicas que ali trabalham. Por exemplo, estavam no nome de monsenhor Padovese, antes da sua trágica morte; atualmente os bens em seu nome estão congelados pelo Estado que se recusa a restituí-los à Cáritas. Um problema que não teria sido verificado se estivesse sob uma tutela “internacional”. Os recursos da Cáritas na Turquia são poucos, mas às vezes bas- TURQUIA. Um modelo para o novo Oriente Médio Em Antioquia padre Domenico Bertogli conta-nos que as doações efetuadas no minúsculo escritório da Cáritas local são provenientes também de benfeitores muçulmanos. A Cáritas ajuda os necessitados independente da sua fé. Os muçulmanos sabem disso, e mostram seu reconhecimento com gestos concretos ta pouco para dar um testemunho de fé. “Se olharmos os números”, diz-nos o núncio, monsenhor Antonio Lucibello, “a nossa presença na Turquia é mínima: somos como uma pequena paróquia de uma cidadezinha ocidental. Mesmo assim, o nosso discreto testemunho dá frutos, é estimado e seguido”. Se tivéssemos que ‘medir’ o estado de saúde da Igreja local levando apenas em conta os números, o cenário seria triste. Ao invés, nas pessoas daqui a felicidade que se manifesta pela fé é um fato evidente. “Não é necessária uma presença rumorosa”, continua monsenhor Lucibello, “ao som de tambores. Mas é fundamental um testemunho de vida, que não se impõe com o espetáculo”. Uma irmã, que saiu da Itália nos tempos da morte de Padovese, confessa-nos as suas preocupações na chegada à Turquia. “Sem poder usar o hábito de religiosa, sem poder ensinar religião nos colégios, eu pensava: mas o que eu vou fazer ali! Eu que na Itália estava acostumada a ir a todas as manifestações... Mas quando se chega aqui entende-se que não se trata de fazer ou dizer alguma coisa particular. É suficiente estar aqui, nesta terra santa onde viveram os apóstolos e confiar no Senhor”. A experiência da Igreja da Turquia está toda aqui. É o ar de casa que se respira no meio da criançada no pátio de padre Domenico, em Antioquia. Também em Tarso, quando os religiosos almoçam junto com os fiéis vindos de localidades próximas para festejar São Paulo. Padre Roberto, com seus 85 anos dos quais mais de 60 aqui na Turquia, doa o dinheiro da passagem para uma família que não pode pagar a viagem para voltar para casa. As irmãs dali, durante a refeição, indicam a monsenhor Franceschini um casal de noivos ou uma criança, atualizando-o sobre os matrimônios e os nascimentos. Pode-se perguntar: com tão poucos cristãos, o que têm a fazer os padres na Turquia? Na realidade sempre têm o que fazer entre as necessidades do povo local e a acolhida dos peregrinos. Mas “não se trata de fazer alguma coisa”. É suficiente estar aqui, custo- diar esta terra santa. Santa porque aqui nasceu Paulo, viveram Barnabé e Pedro. São João foi enterrado em Éfeso, sob as ruínas de uma basílica que dá para o mar. Nossa Senhora, que segundo a tradição seguiu João nestes lugares, aqui se “adormentou” e foi elevada ao céu. Os padres capuchinhos fazem questão de recordar do conselho de São Francisco aos frades que partiam para a Ásia Menor. Há dois modos de fazer a missão: “Um modo é que não briguem nem provoquem disputas, mas sejam submetidos a toda criatura humana pelo amor de Deus e confessem ser cristãos”. O testemunho discreto. “O outro modo é que, quando virem que agrada ao Senhor, anunciem a palavra de Deus”. Atentos às coisas do mundo, capazes de seguir e recolher todo o bem que acontece ao seu redor. q Acima, monsenhor Ruggero Franceschini entre alguns sacerdotes; ao lado, o milagre das núpcias de Caná nos mosaicos da igreja de São Salvador em Chora, em Istambul 30DIAS Nº 6 - 2011 33 C A PA A volta à simplicidade da fé católica por Giovanni Cubeddu ncontramos o cardeal Donald Wuerl, arcebispo de Washington, em 29 de junho, no centro pastoral da arquidiocese. E Eminência, o senhor é o bispo da arquidiocese de uma capital tão importante, que ainda é a “capital do mundo”. Lendo suas cartas pastorais, ficamos impressionados com o fato de o senhor se dirigir sempr e às pessoas que se afastaram. Parece ser essa a sua principal preocupação. DONALD WUERL: É nisso que consiste a nova evangelização, e é o motivo pelo qual fizemos da nova evangelização o nosso objetivo na arquidiocese de Washington. É a lente através da qual queremos ver tudo o que fazemos, convidando as pessoas a voltarem à fé e convidando os jovens a começar a estimar, entender e viver a nossa fé católica. A razão pela qual escrevi no ano passado a carta pastoral sobre a nova evangelização Disciples of the Lord: Sharing the Vision (Discípulos do Senhor: a partilha de uma visão) foi precisamente a existência de uma geração de católicos que são batizados mas não são praticantes. Trata-se, na maior parte, de católicos que receberam uma catequese mísera demais durante as décadas de 1970 e 1980, e em parte também de 1990. Vivemos nos Estados Unidos um período em que não havia uma clara atenção ao que era ensinado e aos 34 30DIAS Nº 6 - 2011 textos catequéticos e teológicos que eram fornecidos para a instrução de nossos jovens. O resultado é que, ao lado da influência da revolução cultural das décadas de 1960 e 1970, muitos católicos simplesmente deixaram de ir à igreja. Consideram-se católicos mas não participam da vida da Igreja. Quando o papa João Paulo II começou a falar tão insistentemente da necessidade de uma no- da confissão que chamamos “The light is on for you” [A luz está acesa para você, ndr]. Na tentativa de reapresentar o sacramento da reconciliação, oferecemos a possibilidade de ter acesso a ele em todas as paróquias da arquidiocese ao longo da Quaresma, durante cinco anos consecutivos. Fizemos simplesmente que na comunidade qualquer um – católico, não católico, qualquer pessoa – soubesse O arcebispo Donald Wuerl, em visita à escola Santo Agostinho, em fevereiro de 2010. A escola, fundada em 1858, é a mais antiga de Washington para crianças afro-americanas va evangelização, e nós começamos a compreender o quanto era importante convidar as pessoas a voltar, e quando depois o papa Bento XVI instituiu o Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização, decidimos que nesta arquidiocese a evangelização seria o coração de todas as nossas iniciativas. Queremos garantir que aqueles que se afastaram sejam chamados a retornar. Um exemplo é esse convite ao sacramento que o sacramento da confissão é uma coisa que os católicos fazem e que em algumas das nossas igrejas, toda quarta-feira de Quaresma, das 18h30 à 20h, há um padre à espera para ouvir as confissões e dizer “bom retorno!”. Assim, anunciamos esse convite a voltar para casa no metrô, no rádio, nos ônibus e com grandes cartazes publicitários. Agora, outras dioceses do país e do Canadá aderiram à iniciativa. ESTADOS UNIDOS. Entrevista com o cardeal Donald Wuerl O Credo dos Apóstolos, o sacramento da confissão, a adoração da Eucaristia, o convite às pessoas afastadas, para que retornem à Igreja. Conversa com o arcebispo de Washington, cardeal Donald Wuerl O senhor é muito imediato e concreto em suas catequeses. Em sua carta pastoral God’s Mercy and Loving Presence (A misericórdia de Deus e a presença amorosa) sugeriu aos sacerdotes, aos religiosos e aos leigos da arquidiocese que continuassem com as confissões e aconselhou também ao povo que participasse em conjunto da adoração eucarística, seguindo o exemplo de Santo Afonso Maria de Ligório, que o senhor cita em seus escritos. Foi como se dissesse: “Os sacramentos são a resposta”. Sem dúvida, é isso mesmo. E quando nós, bispos dos Estados Unidos, nos reunimos há alguns anos, dissemos que era preciso fixar prioridades para a Igreja em nosso país. E realmente a primeira das prioridades, sobre a qual todos concordamos, é evangelizar e fazer catequese sobre os sacramentos, trazer as pessoas de volta aos sacramentos. É uma coisa de tamanho bom senso... Jesus, o Verbo encarnado, quando se preparava para voltar ao Pai na glória, estabeleceu uma Igreja que se assemelhasse a ele, que fosse espiritual e visível, que tivesse o Espírito Santo embora fosse feita de seres humanos. O Concílio Vaticano II fala da Igreja como o grande sacramento. Jesus instituiu os sacramentos de forma que a Ele fosse possível tocar-nos, e que nós pu- ¬ O cardeal Wuerl na Basílica do Santuário Nacional da Imaculada Conceição, em Washington Biografia ascido em Pittsburgh, na Pennsylvania, há 71 anos, Donald William Wuerl foi ordenado sacerdote em 1966, depois de ter estudado, entre outros lugares, no Pontifical North American College, o seminário americano de Roma. Foi nomeado bispo em janeiro de 1986 pelo papa João Paulo II. Depois de dois anos em Seattle, foi transferido para sua cidade natal. Em 2006, Bento XVI o escolheu para a arquidiocese de Washington. Em 2008, o arcebispo Wuerl hospedou o papa Bento XVI durante sua viagem apostólica aos Estados Unidos, e no consistório de novembro de 2010 foi criado cardeal. Em maio passado tomou posse da basílica de que é titular em Roma, São Pedro in Vincoli. N Bento XVI impõe o barrete cardinalício a Donald Wuerl por ocasião do Consistório de 22 de novembro de 2010 na Basílica de São Pedro, no Vaticano 30DIAS Nº 6 - 2011 35 C A PA déssemos tocá-lo. Entre todos esses grandes momentos de encontro, o ponto mais alto é a Eucaristia. Jesus disse: “Fazei isto em memória de mim”. E nós entendemos que todas as vezes que o fizéssemos Ele estaria conosco. Creio que os nossos jovens se dão conta de que isso não apenas é simples, mas verdadeiro. O que hoje pedimos que os nossos jovens façam é dar a resposta que Pedro deu quando Jesus perguntou aos discípulos: “E vós, quem dizeis que eu sou?”. Essa é a pergunta que dirigimos aos nossos jovens: “Vós, quem dizeis que é Jesus?”. Simão Pedro respondeu: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo”. Estamos ajudando os nossos jovens a fazer a mesma profissão de fé – a dizer a Jesus Cristo: “Tu és o Filho de Deus, eu creio em ti”. E nos damos conta de que os nossos jovens respondem. Não é complicado. Quando Jesus falava, não era difícil de entender. A meu ver, acontece que a resposta de fé acaba por ser recoberta por parâmetros que são mundanos. Por isso os nossos jovens hoje nos têm pedido: “Falem-nos de Jesus, falem-nos do seu Evangelho”. Em sua carta pastoral de 2007, God’s Mercy and the Sacrament of Penance (A misericórdia de Deus e o sacramento da penitência), o senhor lembra que a “nova criação” é simplesmente um homem que é redimido. São Paulo nos diz que a batalha dentro de nós é entre o homem velho que quer resistir ainda e o homem novo, a nova criação que se manifesta, o homem em graça, o homem que é redimido na graça. Acaso não foi justamente isso que Jesus veio fazer? Curar tudo o que estava quebrado. A nova criação, a criação da graça, é o Reino – a presença de Deus, da paz, do amor, da justiça, da compaixão, da cura. A nova criação começa para cada um de nós no batismo. Cada um se torna no batismo criatura da nova criação. Só que a velha criação está ainda lutando para nos dominar e a nova criação busca abrir uma brecha nisso tudo. Cada um de nós é um cidadão do Reino. E o Reino vem justamente agora, cada vez que um 36 30DIAS Nº 6 - 2011 crente, alguém que segue a Cristo, age com benevolência, com amor, com verdade e com justiça. Todas as ações que tornam visível a presença de Cristo em nós são o que faz existir o Reino. Uma vez um homem que se apresentou como ateu me perguntou: “O que traz gente como vocês ao mundo?”, entendendo por “gente como vocês” a Igreja. Eu lhe respondi: “A que se assemelharia o mundo se nos séculos passados, nos milênios passados, não nos tivessem sido ensinados os dez mandamentos? Se não nos tivesse sido dito Nos EUA também, os católicos vivem em meio a forças que muitas vezes se opõem. De um lado, como lembram os bispos norte-americanos no documento In Support of Catechetical Ministry (Em ajuda do ministério do catecismo), “vivemos numa sociedade cada vez mais secularizada e materialista”; de outro lado, há as minorias hispânicas, negras e asiáticas, que são portadoras de uma abordagem diferente... À esquerda, o cardeal Wuerl em oração diante das correntes de São Pedro, guardadas na basílica romana de São Pedro in Vincoli, por ocasião da tomada de posse, domingo, 8 de maio de 2011; abaixo, o cardeal com duas religiosas, em sua chegada para a missa de Páscoa na Basílica do Santuário Nacional da Imaculada Conceição, em Washington, a 24 de abril de 2011 que nos devemos tratar uns aos outros com dignidade, se não nos tivesse sido dito que somos chamados ao amor recíproco e a cuidar do último dos nossos irmãos? Como você acredita que seria o mundo?”. E ele replicou, e de modo louvável: “Seria um desastre”. Esses são todos sinais do Reino que abre uma brecha no mundo. Uma das alegrias de ser bispo é que você tem de circular por toda a diocese. Nas paróquias desta Igreja local vejo gente que vive sua fé e tenta seguir Cristo criando seus filhos, procurando ajudar seus filhos a seguirem o caminho de Cristo. Vemos pessoas que cuidam dos idosos e dos doentes, que vão ao encontro de quem é necessitado, tentando fazer todas as coisas que Jesus disse. Entre as coisas que reconhecemos e que o papa Bento XVI nos lembrou quando esteve aqui há três anos, em 2008, penso que existam três barreiras para a proclamação do Evangelho nos Estados Unidos, que são o secularismo, o materialismo e o individualismo. Tudo isso é cada vez mais evidente em nossa cultura. Muito do que nos é proposto como cultura americana é gerado pelas indústrias de entretenimento e de informação. Quando vamos até o povo, nas paróquias, no mundo em que as pessoas trabalham, há realmente ainda muito dos valores cristãos de base. Raramente ouvimos falar deles na mídia. Esses valores são censurados. Qualquer coisa que tenha relação com a religião, a fé, a espiritualidade do povo é censurada e somos tentados a crer que ESTADOS UNIDOS. Entrevista com o cardeal Donald Wuerl À esquerda, o arcebispo de Washington, Donald Wuerl, ao final de um encontro de oração na Old Saint Mary’s Catholic Church; à direita, no Verizon Center, para celebrar a missa com vinte mil jovens por ocasião da reunião anual pela vida, em janeiro de 2010 o que vemos na tevê ou ouvimos no rádio ou lemos nos jornais é tudo. Não é. Mas, de outro lado, como o senhor sugeria, temos hoje todos esses migrantes que chegam. Nesta arquidiocese celebramos a missa em vinte línguas diferentes todo fim de semana... vinte! É uma bênção esse reflexo da Igreja universal, na capital dos Estados Unidos. Os imigrantes trazem consigo a riqueza da fé. Muitos deles trazem consigo um sentimento da comunidade e da família, tão dramaticamente necessário em nossos Estados Unidos secularizados. Estamos assistindo à introdução do que é definido o “matrimônio homossexual”, como se o matrimônio já tivesse deixado de ser a realidade verificável de um homem e de uma mulher que se unem, prometendo viver juntos, gerar e educar filhos. Os imigrantes trazem consigo um sentimento de comunidade e de comunhão eclesial. Sua experiência da fé é uma experiência que inclui a Igreja e por conseguinte a doutrina cristã, a tradição apostólica e os bispos como sucessores dos apóstolos. Isso se afasta da herança protestante arraigada nos Estados Unidos, segundo a qual “Jesus é o meu salvador, e não preciso de mais nada”. A Igreja Católica sempre disse, ao contrário, que “Jesus instituiu uma família, uma família de fé”. Parte da tarefa que temos à nossa frente, após a afluência de imigrantes, é a necessidade de afirmar os valores tradicionais da família e da comunidade. No documento que acabamos de citar, os bispos norteamericanos sublinham que os valores democráticos são uma coisa, e a fé católica, outra. Levando em conta essa distinção clara, como o senhor se relaciona com os poderes civis? Na minha opinião, devemos ter várias coisas em mente. A primeira: esta é uma sociedade democrática e pluralista. A segunda: que, como bispo da Igreja Católica, tenho uma mensagem a levar a esta sociedade democrática e pluralista. Na cerimônia da tomada de posse da diocese, há cinco anos, eu disse na homilia que parte da responsabilidade da Igreja na capital da nossa nação, nesta “capital do mundo”, é anunciar o Evangelho em meio a todas as outras vozes. Não condenamos as outras vozes, mas esperamos ter a liberdade de fazer ouvir a nossa. A minha experiência em Washington é que se você está preparado para o diálogo, para discutir e ouvir, então às vezes tem a possibilidade de levar o Evangelho para dentro da discussão. É muito importante para a Igreja estar presente. Deve estar presente nos esforços que caracterizam hoje o ambiente político, social e cultural. Devemos ser fiéis apenas a nós mesmos. Devemos ser fiéis ao Evangelho, claros ao dizer o que é e o que não é, o que é certo e o que é errado. Um exemplo disso é a voz da arquidiocese no movimento pela vida, motivo pelo qual temos tanto orgulho de ter todos os anos uma reunião de jovens e a missa pela vida. No ano passado havia trinta e cinco mil jovens, vinte mil na missa no Verizon Center, dez mil no D. C. Armory e outros cinco mil nas igrejas de toda a arquidiocese. Por meio das vozes de todos esses jovens, a Igreja dizia simplesmente, no mundo político em que vivemos, que a vida humana é um dom de Deus. Em seu país, o debate sobre a reforma da saúde não terminou. A Igreja Católica não pode apoiar quem promove o aborto, mas isso é bem diferente de se opor a uma lei que garanta assistência social e de saúde a pessoas que nunca teriam condições de tê-la. Às vezes parece que a Igreja Católica nos EUA se engajou apenas na batalha pro life (pela vida), numa batalha contra o governo. Essa é maneira como às vezes a Igreja Católica é pintada, como se estivesse interessada apenas na tentativa de abolir o aborto. Depois do governo, o maior provedor de assistência nos Estados Unidos é a Igreja Católica. Estamos em todos os níveis da assistência à saúde, da administração do serviço social, do cuidado com os sem-teto, dando apoio aos pobres por meio dos bancos de alimentos e dos dispensários paroquiais. Somos também, depois do governo, a maior entidade dedicada à educação, particularmente dos pobres e dos necessitados. A Igreja Católica está comprometida com tudo o que está ligado à ordem que Jesus nos deu de alimentar os famintos, dar de beber aos que têm sede, vestir os nus e visitar os doentes e os encarcerados. Nós o estamos fazendo. Mas ¬ 30DIAS Nº 6 - 2011 37 C A PA nunca somos descritos dessa forma, não obtemos nenhum reconhecimento. Em 2007, os bispos americanos publicaram um documento chamado Faithful Citizenship (Cidadania fiel), que é um guia para os católicos que entram no processo eleitoral. Creio que esse texto contenha um ensinamento muito sólido. E gozou do consenso unânime dos bispos americanos. Faithful Citizenship diz aos católicos e a quem quer que o leia que há um amplo leque de temas, e que é preciso considerá-los todos. Jesus nos pede que cuidemos da mulher quando dá à luz a sua criança, mas depois que assistamos a ambos, como também que acudamos os idosos e quem necessita de assistência. Todas essas coisas são parte do grande quadro de referência do serviço da justiça social católica. só. Quando Saulo perguntou: “Quem és tu?”, a voz lhe respondeu: “Eu sou Jesus, que tu persegues”. A Igreja e Cristo são uma coisa só. Paulo foi o meio dessa revelação. Hoje de manhã, ao celebrar a missa, eu disse que não podemos celebrar os santos Pedro e Paulo sem reconhecer que temos um laço com Roma. Quando tive o grande privilégio de tomar posse da igreja titular de São Pedro in Vincoli, em Roma, lembrei às pessoas presentes que todos temos um vínculo especial, todo católico tem um vínculo com Pedro. Nós o temos porque ele é a pedra de comparação da nossa fé. Ele vive hoje, carrega hoje o nome de Bento e é Pedro, a quem nos dirigimos quando queremos saber o que Jesus nos diz hoje. Como arcebispo de Washington, qual é a sua experiência mais cara? “Há não muito tempo, terminada a missa de Páscoa, um homem se aproximou perguntando-me se realmente tinha pretendido afirmar o que ele ouvira na homilia: ‘O senhor disse que Jesus ressuscitou em seu corpo, não unicamente em sua mensagem’”. Ele ressuscitou. Em certas escolas as pessoas podem ter recebido o ensinamento de que a ressurreição era mais um modo de dizer que qualquer outra coisa, e que Ele ressuscitou no sentido de sua capacidade de influenciar. Nós dizemos: “Não, não! Ressuscitou no Seu corpo”. Uma vez, na universidade, um de meus alunos me disse: “O senhor afirma que Jesus ressuscitou dos mortos”. “Sim, porque é o que a Igreja nos ensina”, respondi. E ele: “Bem, mas o senhor quer dizer realmente no seu corpo e...”. À esquerda, o cardeal Wuerl com os padres franciscanos do Franciscan Monastery of the Holy Land, em Washington; à direita, um jovem deficiente recebe a bênção do arcebispo ao final da “missa branca” na Catedral de São Mateus Apóstolo, em Washington, em outubro de 2010. Pessoas com necessidades especiais, ao lado de familiares e amigos, participam dessa missa, que leva o nome da cor da veste batismal Hoje é a festa dos santos Pedro e Paulo. De manhã, na missa no Franciscan Monastery of the Holy Land, aqui em Washington, ouvi o sacerdote dizer na homilia que o Senhor extraiu dois grandes santos de duas personalidades improváveis: um pescador e um perseguidor. É o modo como trabalha o Senhor. Quem pensaria numa coisa dessas... que a rocha sobre a qual Cristo iria construir sua Igreja seria um rude e impetuoso pescador... No entanto, com a graça de Deus ele se tornou a rocha sobre a qual se apoia a Igreja. E havia Paulo, que perseguia a Igreja, e com a graça de Deus se tornou o canal para revelar que a Igreja e Jesus são uma coisa 38 30DIAS Nº 6 - 2011 Para mim, hoje, a característica mais alegre da Igreja é perceber que estamos bem no meio de uma nova evangelização. Nós nos assemelhamos à Igreja do início, que sai e diz às pessoas pela primeira vez quem é Jesus. Ele ressuscitou, está conosco. Hoje muita gente está ouvindo isso pela primeira vez. Creem tê-lo ouvido e já o saber, mas na realidade o estão ouvindo talvez pela primeira vez. A emoção é que hoje a Igreja se abre a um futuro totalmente novo, e isso é motivo para estarmos contentes. Daqui a cinquenta anos o povo olhará para trás e talvez diga que aqueles eram os dias em que toda a renovação da Igreja estava começando. Num de seus artigos o senhor recentemente escreveu: “Sim, é nisso que consiste a ressurreição”, eu disse. Ele não sabia que a Igreja crê nisso. Agora sabe. Estou contente por contar aos jovens quem é Jesus realmente. Tudo aquilo de que precisamos é o Credo dos Apóstolos. Quando estou em Roma resido sempre no Pontifício Colégio Norte-Americano, pois foi o meu seminário e é para lá que ainda hoje vão os seminaristas de Washington. Toda vez que vou para lá levo todos os seminaristas de Washington à Basílica de São Pedro. Celebramos a missa às 7 da manhã, depois subimos da cripta e ficamos na frente do altar da confissão para rezar todos juntos o Credo dos Apóstolos. E digo a eles: “Este é realmente o lugar certo”. q OS CATÓLICOS AFRO-AMERICANOS História de uma fidelidade incomum Notas sobre os black catholics, num diálogo com Jamie T. Phelps, da Xavier University of Louisiana s católicos negros nos Estados Unidos, os black catholics, são os protagonistas de uma história esquecida, na qual pessoas tocadas pela fé conquistaram aos poucos uma identidade também perante a história e a cultura. É a história de uma fidelidade incomum à Igreja, apesar da imposição de uma invisibilidade geral em relação tanto aos outros católicos quanto aos protestantes. Os Estados Unidos são um país wasp, branco, anglo-saxão e protestante, onde vivem mais protestantes que católicos, e nós, negros católicos, nos sentimos marginalizados: mesmo muitos correligionários não conhecem exatamente o nosso itinerário. Na minha infância, não me esqueço de que, quando confessava a minha fé diante de outros católicos, às vezes me respondiam: “Tudo bem, mas você deveria ser protestante...”. De fato, existia uma certo costume pelo qual um negro que se aproximasse de uma paróquia católica era “encaminhado” para a comunidade protestante, e era uma época em que era dada uma interpretação rígida da extra Ecclesiam nulla salus. Enfim, padeciam uma dupla marginalização. Naturalmente, como black catholic, se você se vê vivendo numa comunidade católica estruturada, por exemplo a irlandesa, acaba por festejar o dia de São Patrício, por aprender as danças dos irlandeses e absorver toda a sua cultura. Foi o que aconteceu também comigo, que aos poucos absorvi um pouco de catolicismo dos italianos – pela festa da Mesa de São José –, dos poloneses, dos alemães, e assim O por diante... e tudo isso simplesmente indo à escola. Minoria “não irrelevante” Foi só a partir da década de 1960 que começamos a querer mudar a impressão negativa que os outros tinham de nós. Pensamos que, enquanto comunidade, teríamos de nos dar um nome, de nos sentir em paz com a cor da nossa pele, aliás, de ser orgulhosos dela. E depois voltamos a descobrir também que tínhamos raízes firmes no cristianismo dos primeiros séculos na África do Norte. Tínhamos de recuperar essa história. Nesse esforço, os números nos ajudaram. Há hoje 270 milhões de católicos de origem africana no mundo todo, mais ou menos um quinto dos católicos do globo. E 3 milhões de católicos afro-americanos de rito católico romano, vivem nos Estados Unidos. Há quem considere a nós, black catholics, “estatisticamente” irrelevantes, embora em alguns Estados federais sejamos uma tradição que já chegou à terceira ou quarta geração, como em New Orleans, em Baltimore ou em Chicago. Mas três milhões, num total de cerca de 60 milhões de católicos nos Estados Unidos, representam exatamente o mesmo número de fiéis que se encontram na Irlanda! Há hoje no país cerca de mil e trezentos lugares de culto católicos que recebem principalmente negros ou que são de alguma forma referência como paróquias etnicamente mistas, e não conhecemos o número de nós que recebem os sacramentos nas paróquias predominantemente Jamie T. Phelps, O.P., é diretora do Institute for Black Catholic Studies da Xavier University of Louisiana. A Universidade foi fundada no princípio do século XX por Santa Catarina Drexel e pelas irmãs do Santíssimo Sacramento “brancas”. São afro-americanos 250 sacerdotes católicos, 380 diáconos permanentes, 300 religiosas, e não existe uma contabilidade certa a respeito dos irmãos leigos e de quem é voluntário na Igreja. Eu também não saberia dizer com exatidão quantos de nós da “diáspora africana” – padres, diáconos, religiosos e religiosas ou leigos africanos continentais, afro-caribenhos ou afro-latinos – desenvolvem hoje um ministério na Igreja. Em que acreditam os black catholics Em que acreditam os católicos afroamericanos? Creem no que crê a Igreja Católica Romana, talvez salientando ou acentuando algumas coisas de um modo característico, como acontece em qualquer comunidade particular de fiéis. Em termos de práticas de devoção, os black catholics são fiéis à oração diária. Quando nos deparamos com uma comunidade afroamericana, descobrimos que ela é realmente hospitaleira, reconhece e ama a humanidade das pessoas, pois é a mesma humanidade que Jesus teve, e nada deve nos sepa- ¬ 30DIAS Nº 6 - 2011 39 C A PA A tradicional bênção do rio Mississippi rar dessa santidade “ferial”. Nós acolhemos qualquer um: ainda nos lembramos bem da América do século XIX, quando as igrejas para os brancos eram separadas das igrejas para os negros – em linha com a cultura daquele tempo e com as normas legais – e, embora as missas fossem celebradas para todos segundo o rito latino, as assembleias dos fiéis eram compostas a partir do critério étnico. Documentos conciliares como a Gaudium et spes estão em profunda consonância com a sensibilidade dos black catholics. A necessidade da Igreja de ir para o mundo é algo que nos pertencia mesmo antes do Concílio: sempre convidamos os outros a fazer parte da Igreja. Meus amigos protestantes, por exemplo, me convidam sempre a participar de suas celebrações religiosas, e algumas vezes aceito. Desde criança 40 30DIAS Nº 6 - 2011 sentia a pressão de viver num bairro “ecumênico”, em que havia duas igrejas protestantes – uma presbiteriana, a leste, e outra batista, a oeste – e duas católicas – uma ao norte e outra ao sul. Eu era obrigada a caminhar mais que as pessoas da minha idade para ir à missa, e isso exigia de mim um certo esforço. Até porque, ainda por cima, não entendia bem quando via certos católicos se comportarem de maneira muito pouco cristã e certos protestantes serem, ao contrário, “muito” cristãos, e não entendia a interpretação dominante da extra Ecclesiam nulla salus. Graças a Deus muitas coisas mudaram desde então. Um outro texto basilar para nós, black catholics, é A justiça no mundo, procedente do Sínodo Mundial dos Bispos de 1971. Meu coração cantou quando li ali que “agir pela justiça e participar da transformação do mundo nos parecem claramente dimensão constitutiva da pregação do Evangelho, ou seja, da missão da Igreja pela redenção do gênero humano e a libertação de qualquer estado de coisas opressivo”. Crescendo como pessoas negras, aprendemos o que significava marginalização e o que era o descrédito. Mesmo que isso não nos tenha definido, tínhamos consciência de quão pouco nos consideravam os grupos culturalmente dominantes. Quando a Igreja nos ensina de novo que a justiça é um elemento central do Evangelho, conforta-nos saber que não é verdadeira Igreja aquela que não busca a justiça. Evangelização e justiça social são as nossas dimensões quando somos Igreja em missão. A vida nos interessa, e como todos os fiéis católicos somos realmente contrários ao aborto, e o so- OS CATÓLICOS AFRO-AMERICANOS mos de maneira ativa. Afinal, nos Estados Unidos a realidade é que o maior número de abortos atinge as crianças afro-americanas. Eu gostaria também de mencionar a questão da homossexualidade. A comunidade negra nunca marginalizou os homossexuais: a Igreja nos ensinou que a prática da homossexualidade é um pecado, e, mesmo tendo aprendido isso desde pequena, nunca perdemos de vista a humanidade. Os jovens homossexuais que faziam parte do nosso ambiente eram bem-vindos, participávamos todos com sinceridade da vida da comunidade, tanto os homossexuais quanto os heterossexuais. E creio que a doutrina da Igreja indica exatamente isso. A Igreja nos ensina que devemos cuidar dos pobres. A maioria dos negros americanos é gente de baixa renda, e não porque sejam preguiçosos: é simplesmente a posição assinalada para eles nos Estados Unidos. É fácil para nós obedecer a esse preceito, pois frequentemente o pobre é o nosso irmão, a nossa irmã, a nossa tia ou o homem no fim da rua. Nós não somos pessoas que fazem habitualmente valer seus parentescos: se você vive no bairro, para mim é um ir mão ou uma ir mã; quando uma família programa um piquenique, já sabe que todas as crianças da vizinhança irão também. É isso, somos facilmente uma família ampliada... E é natural que entre os ensinamentos da doutrina social o da dignidade das pessoas tenha ressonância em nosso espírito. As raízes e a conversão “um a um” Chegamos agora às raízes. A nossa história começa na África, com o florescimento do cristianismo nos séculos III e IV. No Norte da África, a comunidade cristã era culturalmente romana e mediterrânea, mas também bérbera e negra. E são “nossos” Padres como Orígenes, Agostinho, Cirilo de Alexandria, as santas mártires Perpétua e Felicidade, Santo Antão, São Moisés, o Monge do Deserto, os santos papas africanos Vítor, Melquíades e Gelásio: nós os reclamamos com grande orgulho, os sentimos parte de nós. Como sentimos nossa a história da Igreja no Egito ou na Etiópia. Lem- bramos também o Congo do século XVI, sob o rei Afonso, que convidou os missionários portugueses a difundir o cristianismo. A sua atividade, porém, foi de certa forma contígua ao comércio de escravos, e esse é o lado amargo da história, em que o mal esteve lado a lado com o bem. Sabemos, porém, que, mesmo que nos tenham estimado menos do que valíamos, nos deram a fé. Na realidade, pelo fato de termos sido por longo tempo escravos, podem-se encontrar espalhados um pouco por toda parte católicos romanos de origem africana. É o caso, por exemplo, de Benedito, o Mouro, na Itália, e de São Martin de Porres, no Peru. Provavelmente muitos dessa “diáspora” não se reconheceriam na definição de black catholics, e começaria entre nós uma discussão – como acontece por exemplo com os afro-caribenhos – sobre os limites do conceito e sobre sua inclusividade. Pois, se eu me declarasse afro-americana a um africano continental, acentuaria as nossas diferenças, enquanto, se me definisse simplesmente “negra”, apostaria na nossa origem africana comum e indiscutível, e “negro” se tornaria assim uma bela palavra de boas-vindas... Segundo a história dos black catholics redigida pelo beneditino Cyprian Davis, o primeiro católico afro-americano foi Esteban, um escravo batizado na Espanha que chegou aos Estados Unidos em 1536 com alguns exploradores de língua espanhola. Entre os séculos XVI e XIX, os batismos na Igreja Católica de escravos africanos conduzidos às colônias eram administrados com o consentimento dos senhores. Aqueles que fugiam dos assentamentos ingleses na Carolina e na Geórgia eram convidados pelos espanhóis a encontrar a liberdade na Flórida, onde lhes era oferecida a possibilidade de aceitar o catolicismo romano. Uma das metas dos africanos era a cidade de Saint Augustine, na Flórida, onde, entre os séculos XVIII e XIX, eles, segundo os testemunhos de documentos oficiais, viviam como escravos, libertos ou soldados. Antes da Guerra Civil Americana muitas razões impediam uma ampla atividade missionária em favor dos negros, livres ou escravos, para que fossem evangelizados e batizados. Nós fomos convertidos “um por um”. Não em grupos ou como comunidades: não tivemos nenhuma aplicação do cuius regio eius religio. O agravante era, quando muito, que nos Estados Unidos ser católicos despertava imediatamente suspeitas. A “fundação” ¬ Padre Herbert Vaughan, fundador da Sociedade Missionária de São José de Mill Hill, sentado, no centro da foto, com alguns padres missionários e colaboradores. Na primeira fila, com o rosário nas mãos, podem ser reconhecidos dois afro-americanos, Baltimore, 1870 30DIAS Nº 6 - 2011 41 C A PA do Estado – uso intencionalmente as aspas porque a América já era habitada pelos nativos – foi obra dos wasp, e os católicos que migravam para a América eram malvistos e considerados emissários do Papa com o mandato de sufocar a autonomia conquistada em relação à Europa. Para não irritar ainda mais os brancos anglo-saxões protestantes, que eram também administradores do comércio de negros, a Igreja Católica foi relutante em denunciar a escravidão, para não A escravidão e “as congregações negras” Mas é preciso admitir que a relação do catolicismo com quem era negro foi um pouco... complexa. Do século XVI ao XIX, bispos, clero e laicado católicos interpretaram a escravidão como “uma instituição socioeconômica legal”. No período colonial anterior à Guerra Civil Americana, a Igreja não combatia a escravidão, como eu já disse, mas pedia que se tornasse mais humana. Foi apenas em 1839 que o papa Gregório XVI, referindo-se ao Brasil, condenou o “indigno comércio com o qual os negros são reduzidos à escravidão”. O debate do século XIX focalizou-se na dimensão moral do comércio de escravos e o resultado foi que alguns permaneceram neutros, outros abolicionistas, outros ainda antiabolicionistas, ao mesmo tempo em que houve quem desejasse uma abolição gradual. Apesar disso, existiam aqui e ali bispos e sacerdotes que continuavam, de modo às vezes necessariamente esporádico, a batizar os escravos e a darlhes a vida sacramental e a instrução religiosa. Antes da Guerra Civil foi promovida pelo episcopado a fun- 1831, e, alguns anos depois, das Irmãs da Sagrada Família. Mas o que significa exatamente “congregação de religiosas negras”? Tanto as leis então vigentes quanto a prática faziam que, quando homens e mulheres negros se candidatavam à vida sacerdotal ou religiosa, simplesmente não fossem aceitos. Não havia uma norma no ordenamento canônico que os recusasse, mas a prática era que a situação fosse manipulada para mantê-los de fora, alegando alguma razão que soasse legítima: talvez porque fossem filhos de um matrimônio não canônico, ou porque não havia certeza de que tivessem sido católicos a vida inteira. Os obstáculos que em outros casos eram normalmente removidos se tornavam, aqui, absolutos para quem tinha ascendência africana. O fruto disso foram justamente as “congregações separadas”. Na prática, porém, as Irmãs Oblatas da Providência acolheram e instruíram também crianças não negras, filhas de europeus. dação de duas “congregações de religiosas negras” para dar instrução aos escravos e aos libertos, contornando a proibição legal que existia nesse sentido. O bispo de Charleston, na Carolina do Sul, John England, e o bispo de Saint Luis, Peter Kenrick, fundaram escolas especificamente dedicadas às crianças negras e contribuíram para o nascimento das congregações religiosas das Irmãs Oblatas da Providência, em Baltimore, criadas em 1829 e reconhecidas oficialmente em federal, uma nova atenção aos exescravos surgiu no segundo (1866) e no terceiro (1884) Concílio Plenário de Baltimore, e no Concílio Vaticano I (1870). Os debates que aí se desenvolveram levaram os Estados Unidos a tomar consciência de suas obrigações, enquanto um pequeno número de sacerdotes diocesanos e de religiosas trabalhava já entre os negros emancipados. As principais congregações dedicadas ao ministério entre os negros foram criadas depois do Vaticano I, Depois da Guerra Civil Depois da Guerra Civil e no momento da reconstrução do Estado Acima, Santa Catarina Drexel, fundadora das Irmãs do Santíssimo Sacramento, em visita a uma escola em Beaumont, no Texas, em 1917; à direita, com dois frades franciscanos, entre os índios navajo em Lukachukai, no Arizona, em 1927 comprometer sua reputação assumindo uma posição de antítese à ordem constituída. O catolicismo, tendo chegado aos Estados Unidos com as várias etnias dos imigrantes, lançou raízes graças a irlandeses, alemães, poloneses, lituanos e assim por diante. Cada etnia trazia consigo seus sacerdotes e respeitava o modelo já estabelecido de “segregação cultural do ministério”. Um resíduo ainda visível desse fenômeno é a presença nos quatro cantos de algumas praças das cidades americanas de quatro diferentes igrejas católicas, uma por etnia. Assim, de um certo ponto de vista, o surgimento de uma comunidade específica de black catholics foi coerente com esse esquema. 42 30DIAS Nº 6 - 2011 OS CATÓLICOS AFRO-AMERICANOS e sacerdotes, religiosas e leigos “brancos” também ajudaram de alguma forma. Entre essas novas congregações se distinguiram os padres josefitas – Josephite Fathers, descendência direta dos missionários ingleses de Mill Hill –, graças à iniciativa de John Slattery. John era um jovem de origem irlandesa nascido em Nova York, que se tornou sacerdote na Grã-Bretanha, na Sociedade Missionária de São José de Mill Hill, para depois voltar à América e fundar os padres josefitas, que tiveram a tarefa específica – objeto de um voto religioso – de exercer seu ministério entre as pessoas negras. Padre Slattery estava convencido, e podemos ler isso em sua correspondência, de que, se além dos sacerdotes negros aceitasse em seu instituto também padres de ascendência europeia, estes últimos acabariam por gravitar de preferência ao redor dos ambientes que lhes eram culturalmente afins, deixando de lado os negros. É esse o motivo do “voto negro” dos padres josefitas. Ainda hoje eles trabalham quase exclusivamente com os afro-americanos. Sua escola Santo Agostinho, em New Orleans, existe ainda hoje e tem uma história gloriosa. Nasceram depois a Sociedade do Verbo Divino, os Padres do Santo Espírito e os edmundinos. Os Padres do Santo Espírito abriram uma escola para jovens em Rockcastle, na Virgínia, chamada “Academia Militar Santa Ema”; a Sociedade do Verbo Divino fundou o seminário menor “Santo Agostinho”, no Mississippi. Das numerosas congregações masculinas e femininas fundadas para a missão exclusiva entre os negros, muitas, fora as que citei agora, acabaram cedo, por se dirigirem a todos, sem levar em conta a cor da pele. Manteve-se fiel ao mandato inicial a congregação das Irmãs do Santíssimo Sacramento – fundada por Catarina Drexel, canonizada há onze anos –, cuja missão era e é promover paróquias e escolas para os negros e os nativos americanos. Também o instituto onde hoje leciono, a Xavier University, em Louisiana, foi fundado por Santa Catarina Drexel. A nossa iniciativa leiga Existe uma iniciativa leiga dos black catholics, e merece ser mencionada para encerrar. Ela começou antes que o termo “ministério leigo” se tornasse uma espécie de mantra nos documentos eclesiásticos, como certamente acontece hoje nos Estados Unidos. Quem deu vida a essa iniciativa leiga foi Daniel Rudd, que descobriu e conheceu as organizações católicas na Europa e importou seu modelo para os EUA no século XIX, gerando, a partir de 1889, os congressos dos católicos negros, o National Black Catholic Congresses. Em vida, organizou cinco, em que bispos, sacerdotes e leigos negros – tenho em arquivo fotos desses encontros e, sinceramente, não vemos nelas muitas mulheres... – ponder às mudanças que ocorriam na Igreja e às introduzidas pelos movimentos pelos direitos civis, resgatamos justamente a tradição dos congressos e a mantivemos nas décadas seguintes. A herança do século XIX foi revivida no XX, até a criação da Agência Nacional para os Católicos Negros, o National Office for Black Catholics, em 1970. Na mesma linha está o Catholic Interracial Council, em que brancos e negros trabalham lado a lado nos mesmos projetos. Na época da luta pelos direitos civis foi criado também o National Black Catholic Clergy Caucus, uma fraternidade de sacerdotes afro-americanos com a missão da ajuda mútua e a todo o clero. Já que nos ajudar e ajudar os outros é um anseio que sempre nos acompanhou, o Instituto para Estu- Uma religiosa das Oblatas da Providência com uma criança no Mount Providence Child Development Center de Baltimore, no Estado de Maryland procuravam desenhar uma plataforma comum, até para ter mais voz no ministério eclesial geral. Era natural que Rudd se encontrasse trabalhando lado a lado com padre Slattery, como de fato aconteceu. No início do século XX, Thomas Wyatt Turner fundou um grupo denominado Federação dos Católicos de Cor, Federate Colored Catholics. Ele estava realmente amargurado pelas constantes desordens raciais e tinha assistido ao linchamento sem processo de 75 negros. Quando um sistema doente e racista não aceita mudanças, erupções de violência devem infelizmente ser esperadas. Wyatt procurou, no entanto, soluções construtivas e tentou ajudar a Igreja com sua federação. Quando, na década de 1960, nos vimos na necessidade de res- dos sobre os Católicos Negros, o Institute for Black Catholic Studies, da Xavier University, tem também essa paixão original. No início foi frequentado por qualquer um, branco ou negro, que quisesse aproximar-se da história dos black catholics; hoje é um destino buscado principalmente por afro-americanos. Eu gostaria de sugerir a quem for aos Estados Unidos por razões de trabalho sacerdotal ou religioso que o visite. É um centro missionário, que nasceu para permitir justamente a quem não é negro que venha ao nosso encontro mais facilmente, e toque com suas próprias mãos o que a comunidade negra deu e dá à nossa Igreja. (Texto transcrito por Giovanni Cubeddu e revisto pela autora) 30DIAS Nº 6 - 2011 43 C A PA We e nosotros no mosaico dos States por Miguel H. Díaz último U. S. Census [censo da população norte-americana, ndr] nos diz que nos Estados Unidos temos 195,8 milhões de brancos, 37,7 milhões de negros, 50,5 milhões de hispânicos e 14,5 milhões de asiáticos. Mas, se fizermos aos hispânicos uma pergunta acerca da sua O 44 30DIAS Nº 6 - 2011 identidade, alguns responderão que se sentem também blacks, negros, estabelecendo assim evidentemente um vínculo com a comunidade negra americana. Mesmo antes de ser um diplomata junto à Santa Sé, eu me perguntava como os católicos afroamericanos contribuíam para a tentativa de construir pontes de compreensão e colaboração, tentativa que hoje representa o principal compromisso de minha missão em Roma. E tive de admitir que muito devemos aprender da maneira como eles olham para o mundo, para as pessoas e para o encontro entre a religião e a sociedade. OS CATÓLICOS AFRO-AMERICANOS A ascensão das minorias hispânicas e afro-americanas torna cada vez mais concreto o “e pluribus unum” e ajuda os Estados Unidos a entenderem melhor o mundo. Com a palavra Miguel H. Díaz, embaixador dos Estados Unidos junto à Santa Sé À esquerda, o presidente Barack Obama ao final de um comício sobre a reforma da saúde em College Park, no Estado de Maryland, em setembro de 2009; abaixo, a anual Queens Hispanic Parade pelas ruas de Nova York reitos civis – que produziram personalidades como Martin Luther King Jr. – e enfim as leis sobre os direitos civis. O presidente Obama é o herdeiro desse longo caminho. Estamos diante de homens que lutaram para que, no mesmo contexto da sua humanidade e da sua dignidade, também a sua blackness – a sua negritude – fosse acolhida. A história dos católicos negros foi a história de uma fidelidade incomum: tiveram seus profetas, tiveram grande paciência e constância, e sobretudo acreditaram que no fim o bem triunfaria sobre o mal. E é evidente, sobretudo em seus cantos spirituals, que para afirmar a sua humanidade diante de quem os definia menos que humanos eles se inspiraram em todo um mundo de tradições religiosas de culturas diferentes. Quem hoje sofre ou Miguel H. Díaz, embaixador dos Estados Unidos junto à Santa Sé A história dos afro-americanos, e dos católicos negros em particular, é marcada pelo sofrimento, pelas violências que sofreram – que chegaram mesmo a linchamentos sem processo –, e atravessa o período colonial, a escravidão, a Guerra Civil, a emancipação, os movimentos pelos di- procura a sua liberdade pode por isso com facilidade olhar para o exemplo dos afro-americanos e dos black catholics, ou seja, para uma história de fidelidade e esperança. Do ponto de vista da antropologia, os católicos afro-americanos, de modo semelhante aos ¬ 30DIAS Nº 6 - 2011 45 C A PA O compositor Abaixo, Martin Luther King Jr., inglês John Henry o quarto a partir da direita, durante uma marcha Newton (1725-1807) pela igualdade racial e o direito de voto, em Selma, no Estado do Alabama, em 1965 O filósofo norte-americano Josiah Royce (1855-1916) hispânicos, possuem uma tradição essencialmente comunitária, têm uma concepção relacional da pessoa em sua comunidade. Comunidade concebida por sua vez como “beloved community”, segundo a definição do filósofo Josiah Royce (1855-1916), expressão depois tornada popular por Martin Luther King Jr. Em outras palavras, é a ideia, baseada na experiência, de que pertence à minha família quem vive à minha volta, quem reza comigo na missa e o homem do edifício ao lado. É uma interdependência que no mundo atual tem um grande valor, pois dá às diferenças entre pessoas um peso positivo. Quem se sentiu por tanto tempo percebido e não aceito enquanto “outro” entende bem tudo isso. Os afro-americanos podem hoje testemunhar e nos ensinar a beleza da interdependência, da hospitalidade e da regra áurea do amor ao próximo. Há alguns anos relatei num ensaio os resultados de um debate entre intelectuais negros e hispânicos sobre a compreensão que cada um dos dois grupos tinha a propósito de ser “outro”. Disso emergia todo o valor da comunidade, e por isso o acento não era posto no eu, mas na pessoa como parte do nós. Isso em espanhol eles exprimiam dizendo “nosotros”, uma palavra poderosa, que equivale ao inglês we, mas que literalmente carrega o significado de “comunidade que inclui os outros”, acolhendo 46 30DIAS Nº 6 - 2011 as diferenças. Não são apenas duas palavras nos dicionários dos afro-americanos e dos hispanoamericanos, mas têm consequências concretas e explicam toda a atenção que essas comunidades têm à justiça social. Martin Luther King Jr. dizia “ter o sonho de uma sociedade melhor”, e isso concretamente significava assistência social e de saúde para todos, um sistema de educação acessível, iniciativas para enfrentar a pobreza e a falta de moradia. Esse é, em outros termos, o tema da inclusão, que é global e pode extrair dessas comunidades, precisamente, ideias e soluções justas e verificadas pela experiência. Não surpreende, então, que um candidato afro-ame- Barack Obama com o reverendo Luis Cortés Jr., presidente da Esperanza, associação evangélica de comunidades hispânicas americanas, no National Hispanic Prayer Breakfast and Conference, Washington, a 12 de maio de 2011 OS CATÓLICOS AFRO-AMERICANOS ricano à presidência tenha-se tornado presidente dos Estados Unidos, tendo norteado sua campanha pelo modelo central do yes we can, que nos diz que podemos alcançar maiores resultados se estamos juntos, e não um contra o outro, começando pelo bairro e indo até o nível das relações internacionais. Quando, nos Estados Unidos, nos estendemos em debates sobre a secularização e alguém afirma que não existe lugar na sociedade para os portadores de ideias religiosas, a comunidade afro-americana já tem a resposta pronta. Mesmo sem incomodar mais uma vez Martin Luther tem raízes na fé e que tanto contribuiu para a construção do imaginário coletivo dos americanos. A comunidade afro-americana não separa o secular do sagrado; ela encontra a maneira de perceber a santidade dos comportamentos nos detalhes da vida cotidiana. E creio que isso tenha um valor, pois lembra também aos diplomatas e aos políticos que muitas vezes a religião pode ser usada erroneamente – e ainda o será, pois isso está na história deste mundo –, mas mesmo assim continua a ser uma força que constrói o bem comum. Enfim, talvez alguém possa ter medo de que nos Estados Unidos nos States. Creio que a propósito disso a imagem do mosaico – ou, se quiserem, da paella... – seja mais pertinente que a do melting pot. Pois no mosaico são preservadas todas as partes que compõem o rosto final, e na paella todos os ingredientes são importantes para dar sabor: isso é, justamente, “e pluribus unum”. Isso influenciará positivamente também a nossa política externa, pois os Estados Unidos – tornando-se cada vez mais o microcosmo do nosso planeta –, graças também a suas dinâmicas inter nas, poderão compreender melhor as dinâmicas globais. Acima, um rabino dirige a oração Toda comunidade que entrou nos Estados Unidos veio para fazer parte deles, não desembarcou numa terra deserta. E agora nos ajuda dando sua contribuição original. Por exemplo, uma maior presença de latinos nos EUA traz consigo também uma história e uma cultura hispânica densa de relações com o mundo judaico e islâmico, preciosa num momento em que o encontro com o mundo mediterrâneo se torna prioridade. E é evidente quanta ajuda a comunidade negra americana deu também e pode dar ao país em termos estratégicos. Mas é o olhar para a sua fidelidade incomum que sempre traremos em nosso íntimo. do Shabbat com as crianças numa sinagoga de Nova York; à esquerda, afro-americanos nas ruas do Harlem, em Nova York, assistem à transmissão ao vivo pela tevê da cerimônia de posse no Capitólio de Barack Obama, 44º presidente dos Estados Unidos da América, em 20 de janeiro de 2009 King Jr., podemos repetir que nada da história dessa comunidade pode ser contado e explicado sem uma referência à fé. A começar dos cantos gospel que aspiravam à libertação da escravidão – inclusive a própria Amazing Grace [Graça maravilhosa, canção do compositor John Newton, escrita no final do século XVIII e que se tornou também um hino antiescravagista, ndr] –, até toda a produção cultural que essas minorias, os latinos ou os negros, tornem-se relevantes, e que a cultura que definimos wasp possa rejeitar a novidade, com resultados dramáticos no futuro. Continuo a considerar, ao contrário, que os fundamentos dos Estados Unidos continuarão sólidos, pois nós somos “e pluribus unum”. Não é a primeira vez que experimentamos fermentos demográficos e que comunidades inteiras entram (Texto transcrito por Giovanni Cubeddu e revisto pelo autor) 30DIAS Nº 6 - 2011 47 Curtas Curtas Curtas Cu 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUN O PRESIDENTE PERES, O DIRETOR DE 30DIAS E A PAZ NA TERRA SANTA “Conheci todos os líderes italianos. Porém, um que muito me impressionou foi Andreotti. A primeira vez que o encontrei era ministro da Defesa, como eu. Muitos anos atrás. E já me impressionava a sua sagacidade. Uma vez perguntei-lhe como tinha feito para sobreviver a tantos governos. Respondeu-me: ‘Veja, é suficiente não considerar os ministros como amigos. Para ficar com os amigos, vai-se em férias: trabalhar no governo é uma outra história’. Sempre gostei desta sua sagacidade”. São palavras do presidente do Estado de Israel Shimon Peres publicadas no Corriere della Sera de 2 de junho. Na entrevista, também foi feita uma observação sobre a paz entre Israel e palestinos: “Creio que seja preciso abrir negociações diretas e conduzi-las com discrição. Porque é preciso sempre distinguir entre posições de abertura e iniciativas nos bastidores [...]. O caminho certo é abrir as negociações publicamente e depois conduzi-las com discrição, para alcançar um verdadeiro acordo”. SAGRADO COLÉGIO A morte de Sterzinsky e Swiatek No dia 30 de junho depois de uma longa doença faleceu o cardeal Georg Maximilian Sterzinsky, 75 anos, arcebispo emérito de Berlim. No dia 2 de julho foi nomeado o seu sucessor: monsenhor Rainer Maria Woelki, 55 anos, desde 2003 auxiliar de Colônia. No dia 21 de julho faleceu o cardeal bielo-russo Kazimierz Swiatek, 96 anos, arcebispo emérito de Minsk. Com a sua morte o Colégio cardinalício fica com 196 purpurados, dos quais 114 eleitores. Roma, foi nomeado bispo de Sabina-Poggio Mirteto. Em 24 de junho monsenhor Giovanni Tani, 64 anos, desde 2003 reitor do Pontifício Seminário Maior Romano, foi nomeado arcebispo de Urbino-UrbaniaSant’Angelo in Vado. Em 28 de junho o cardeal Angelo Scola, 70 anos em novembro, desde 2002 patriarca de Veneza, foi nomeado arcebispo de Milão. Em 2 de julho foram acei- ITÁLIA Novos bispos em Sabina, Urbino, Milão. Demissões em Oppido Mamertina No dia 10 de junho monsenhor Ernesto Mandara, 58 anos, desde 2004 auxiliar de 48 Angelo Scola 30DIAS Nº 6 - 2011 Shimon Peres tas as demissões de monsenhor Luciano Bux, que completou 75 anos em 29 de junho, do cargo de bispo de Oppido Mamertina-Palmi. IGREJA/1 Do povo cristão ao “catolicismo militante” O jornal La Repubblica publicou, em 7 de julho, uma síntese feita por Michele Smargiassi sobre o conteúdo de um estudo do catolicismo na Itália, Geografia dell’Italia cattolica, de Roberto Cartocci, professor de Ciências Políticas em Bolonha. Segundo o estudo, “nos últimos anos aconteceu, silenciosamente, um terremoto nos costumes religiosos nacionais. Uma transição de consciências, uma decantação, uma eletrólise que despedaçaram o país em duas partes: no Norte a secularização, e no Sul a devoção”. Trata-se de um processo lento “que corrói somente o que os sociólogos chamam ‘cato- licismo de maioria’, aquela massa de italianos em torno de cinquenta por cento da população que se limita a respeitar os preceitos mais gerais e ir à igreja no Natal e na Páscoa. Resiste, ao invés, pelo menos há vinte anos, ao redor de trinta por cento, o ‘catolicismo de minoria’ de quem vai à missa todos os domingos, dentro do qual se reforça até mesmo, e isso é uma herança do impulso de Wojtyla, um dez por cento de ‘catolicismo militante’ formado por animadores de paróquias e de membros ativos dos movimentos eclesiais”. IGREJA/2 O desaparecimento da fé tradicional No jornal La Repubblica de 7 de julho Giancarlo Zizola comenta o estudo de Roberto Cartocci, Geografia dell’Italia cattolica, explicando que “nas ruínas do catolicismo” insinua-se por todos os lados “um modelo ¬ urtas Curtas Curtas Curtas NDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO ORIENTE MÉDIO Abraham Yehoshua e a proclamação do Estado palestino Crianças palestinas observam uma manifestação de judeus ortodoxos na cidade antiga de Jerusalém “A campanha realizada por Israel contra a iniciativa palestina para obter o reconhecimento de um Estado próprio na Assembleia das Nações Unidas em setembro próximo, na minha opinião, é política e moralmente incorreta e ligada à questão do reconhecimento internacional das fronteiras de 1967”. São palavras de Abraham Yehoshua, publicadas no La Stampa de 13 de julho. O artigo, depois de uma digressão histórica sobre a resolução da ONU de 1947, que estabelece o nascimento de dois Estados, “um judaico – Israel – , e um árabe – a Palestina”, e sobre as sucessivas guerras árabo-israelenses, continua explicando como: “o reconhecimento de um Estado palestino dentro das fronteiras de 1967 estabelecerá a decisão tomada pelas Nações Unidas em novembro de 1947 com relação à repartição da região, sustentada na época por Israel e sobre a qual se baseia a sua legitimidade internacional. Portanto se o governo de Israel é sincero em querer reconhecer um Estado palestino – como declarou várias vezes – por que se opõe tanto à prevista resolução de setembro? Creio que a única razão seja a referência às fronteiras de 1967”. Clara alusão, a última, às teses de alguns políticos israelenses que denunciaram a impossibilidade de defender tais fronteiras. Porém, segundo Yehoshua, uma prudente presença militar, israelense e internacional, seria suficiente para afastar do Estado israelense eventuais perigos. Tais proteções militares, segundo o escritor, “não danificariam a identidade nacional palestina (assim como as bases militares estrangeiras na Europa e em outras regiões durante a Guerra Fria). Uma presença militar é substancialmente temporária e num amanhã, mudadas as circunstâncias, seria possível removê-la. Do mesmo modo, os civis israelenses em encrave no interior do estado palestino seriam uma constante provocação que reacenderia ódios e desavenças”. O artigo conclui-se assim: “A eventualidade de uma multidão de civis palestinos, entre os quais mulheres e crianças, que tomam conta das ruas dos vilarejos e cidades para manifestar de modo não violento (como acontece ultimamente em vários países árabes) contra postos de guarda e assentamentos israelenses na Cisjordânia depois da decisão da ONU em setembro me deixa muito inquieto. A ANP saberia controlar tais manifestações? E o que faria Israel? Enviaria o exército para reprimilas com a força? E os extremistas israelenses como reagiriam às manifestações diante de suas casas? Tal cenário pode ser evitado se o governo de Israel apoiar em setembro a resolução das Nações Unidas e encaminhar logo negociações diretas sobre todas as questões controversas, como convidou a fazê-lo o presidente dos Estados Unidos”. 30DIAS Nº 6 - 2011 49 Curtas Curtas Curtas Cu 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUN CÚRIA/2 Nomeações no Pontifício Conselho dos Leigos e do Campo da Saúde Fiéis na missa de domingo de religião de ‘ateus devotos’ que continua imperturbável a integrar Deus como elemento central do sistema burguês, completamente funcional aos interesses dos poderes dominantes. A própria fé em Deus acaba por ser reduzida, neste contexto cultural, a um distintivo identidário, um modo para revestir os interesses com manto religioso”. E prossegue: “É precisamente esse desenvolvimento contraditório que é chamado em causa pelo colapso das estruturas da cristandade estabelecida, que continua ainda assim imperturbável a autocelebrar-se na beira do abismo. A Igreja que emerge destes gráficos é uma grande e gloriosa instituição muito cansada e entorpecida sobre o próprio poder burocrático”. E continua com a citação de um escrito do jesuíta padre Bartolomeo Sorge, segundo o qual a atual crise da cristandade representa “um sinal do fim do ‘regime de cristandade’: a sobreposição entre fé e política, trono e altar, espada e crucifixo, tinha caracterizado os séculos ‘constantinianos’, mas agora essa ‘parece definitivamente superada’, tanto no plano histórico (depois dos processos de secularização) como no plano teológico (pelo Concílio Vaticano II)”. O artigo conclui- 50 se assim: “De resto o próprio Ratzinger não tinha dúvidas, em uma entrevista de 1997, ao sugerir o abandono da ideia de Igreja nacional de massa: ‘Diante de nós, é provável que exista uma época diferente’, dizia, ‘na qual o cristianismo poderá se encontrar na situação da semente de mostarda, um grupo de pequenas dimensões, aparentemente não influente, que todavia vive intensamente contra o mal e leva ao mundo o bem’”. Título do artigo: Bem-vindos ao país que perdeu a fé “tradicional”. CÚRIA/1 Mudança na cúpula da Apsa No dia 7 de julho foram aceitas as demissões do presidente da Apsa, Administração do Patrimônio Apostólico da Santa Sé, cardeal Attilio Nicora, 74 anos, desde 19 de janeiro de 2011 presidente da Autoridade de informação financeira. O seu substituto será o arcebispo Domenico Calcagno, 68 anos, desde 2007 secretário do dicastério. O novo secretário é monsenhor Luigi Mistò, 59 anos, ordenado sacerdote em 1976 na arquidiocese de Milão. 30DIAS Nº 6 - 2011 No dia 18 de junho o espanhol monsenhor Miguel Delgado Galindo, 48 anos, do clero do Opus Dei, foi nomeado subsecretário do Pontifício Conselho para os Leigos, onde até então era chefe de departamento. Em 14 de julho monsenhor Jean-Marie Mate Musivi Mupendawatu, 56 anos, da República Democrática do Congo, foi nomeado secretário do Pontifício Conselho para a Pastoral no Campo da Saúde, onde era subsecretário desde julho de 2009. Neste último encargo foi substituído pelo camiliano italiano padre Augusto Chendi, 53 anos, até então oficial da Congregação para a Doutrina da Fé. DIPLOMACIA/1 Novos núncios na Hungria, junto à Asean, no Chile, Belarus e Uzebequistão No dia 6 de junho o arcebispo Alberto Bottari de Castello, 69 anos, desde 2005 núncio no Japão, foi nomeado representante pontifício na Hungria. Em 18 de junho foi nomeado o primeiro núncio apostólico junto à Asean (Associação das Nações do Sudeste Asiático). Trata-se do arcebispo Leopoldo Girelli, 58 anos, desde janeiro passado núncio apostólico em Singapura e Timor Leste, delegado apostólico na Malásia (com a qual, no dia 18 de julho, depois da audiência do Primeiro-Ministro com o Papa, foi anunciado o estabelecimento de plenas relações diplomáticas) e no Brunei e representante pontifício não residente para o Vietnã. Em 15 de julho o arcebispo Ivo Scapolo, 58 anos, desde 2008 representante pontifício em Ruanda, foi nomeado núncio no Chile. Ainda no dia 15 de julho o arcebispo Claudio Gugerotti, 55 anos, desde 2001 núncio na Georgia, Armênia e Azerbaidjão, foi nomeado representante pontifício na Belarus. Em 22 de julho o arcebispo Ivan Jurkovic, 59 anos, desde fevereiro passado núncio na Rússia, foi nomeado também núncio no Uzebequistão. DIPLOMACIA/2 Novos embaixadores não residentes Attilio Nicora. No dia 9 de junho Bento XVI recebeu em audiência seis novos embaixadores junto à Santa Sé que não residem em Roma. Trata-se dos representantes da Moldávia (Stefan Gorda), Guiné Equatorial (Narciso Ntugu Abeso Oyana), Belize (Henry Llewellyn Lawrence), Síria (Hussan Edin Aala), Gana (Geneviève Delali Tsegah) e Nova Zelândia (George Robert Furness Troup). q Reportagem Os bispos que participaram da última Assembleia do Conselho Episcopal Latino-Americano falam da “Missão Continental” das Igrejas latino-americanas. Não são projetos de hegemonia cultural, mas uma “conversão pastoral” para facilitar a fé do povo. E ir ao encontro de todos. Entre processos de secularização e tentações de neoclericalismo Proximidade e misericórdia por Gianni Valente ábado de manhã, na estação de Constitución, bairro nada “nobre” de Buenos Aires, tudo parece em movimento, como sempre: os ônibus, os táxis, as pessoas que entram e saem do terminal, mulheres com compras, policiais, vendedores ambulantes com seus carrinhos. Os jovens das paróquias de Santa Elisa e da Virgen de Caacupé armaram a sua tenda amarela bem ao lado desse remoinho perpétuo de movimento humano, ao lado do monumento erigido ao inspirador da Consti- S 52 30DIAS Nº 6 - 2011 AMÉRICA LATINA e de emprego para si e para os outros, orações e missas pelos entes queridos falecidos, a alegria e o descanso da lida. À frente do padre Flávio formou-se uma fila, feita dos muitos que se confessam. “Bautismos aquí, batismos aqui”, está escrito numa faixa pendurada numa árvore. Embaixo, numa mesinha, dois jovens tomam nota dos pedidos de novos batismos. Até mesmo de pessoas que se aproximam por simples e instintiva curiosidade. Desde a noite anterior, quando começou a misión, ali, na frente mesmo da “Carpa Católica”, foram celebrados treze batismos de jovens e adultos, que já tinham sido preparados pelos catequistas leigos com que depois prosseguirão a catequese pós-batismal. De repente e sem aviso prévio, chega o próprio arcebispo, dom Jorge Mario Bergoglio. Ele cumprimenta um por um os jovens e as jovens, e abraça padre Facundo, que logo derrama a sua voz de trovão no megafone: “Adelante, aproximem-se todos da Carpa Misionera; daqui a alguns minutos celebraremos a missa”. Até um bêbado para. Às onze de manhã, já está um pouco embriagado. Aproxima-se de BergoAcima, peregrinos com a imagem de Nossa Senhora Aparecida na grande esplanada da Basílica de Aparecida, no Brasil Na página ao lado e à direita, duas fotos da Carpa Misionera na Plaza de la Constitución, em Buenos Aires, durante a missa A capela Santa María Madre celebrada pelo cardeal del Pueblo, no bairro Bajo Flores, Jorge Mario Bergoglio em Buenos Aires tuição argentina, o maçom Juan Bautista Alberdi. Chamam-na Carpa Misionera, Tenda Missionária da Igreja Católica. Trouxeram com eles uma imagem da Virgem de Luján, a Nossa Senhora venerada no santuário nacional. Ao seu redor, dispuseram mesas com pequenas imagens do Menino Jesus e de Santo Expedito, o santo das causas urgentes. E depois alguns deles começam a circular por toda a área da estação, distribuindo a quem passa e às pessoas paradas um santinho com a imagem de Jesus e uma oração. Muitos se aproximam, pedem uma bênção, deixam nas caixinhas nas mesas pequenas mensagens com pedidos de saúde glio. Mede-o de cima a baixo, quase perplexo: “Já vi você em algum lugar...”, murmura. E acrescenta: “Você é católico? Então diga você a missa!”. Padre Facundo pede a mesma coisa, trazendo-lhe os paramentos para a celebração. Depois, diante de um pequeno grupo de jovens, velhinhos, mães com crianças e passantes que fica- ¬ 30DIAS Nº 6 - 2011 53 Reportagem ram lá por acaso, o cardeal jesuíta faz uma homilia de poucas palavras. “Peçamos a Jesus tudo aquilo de que necessitamos. Peçamos tudo isso ao Pai em nome d’Ele, peçamos a Ele, para que Ele peça ao Pai. Como os pobres que Lhe pediam tudo, quando passava pelas ruas e eles o cercavam. Jesus gosta muito de estar conosco, com todos nós, com todos aqueles que passam pela rua. É uma coisa que antes de tudo Lhe inte- ressa. Se houvesse no mundo inteiro um só homem ou uma só mulher, Ele teria oferecido a sua vida do mesmo jeito, por aquele único homem ou aquela única mulher”. Por isso, pensa Bergoglio – e também Facundo, padre Flavio e todos os padres de Buenos Aires que de vez em quando vão fazer batizados e confissões nas estações, nas praças, até sob o obelisco da Plaza de la República, na Foto dos participantes da 33ª Assembleia do Conselho Episcopal Latino-Americano (Celam), realizada em Montevidéu de 15 a 20 de maio de 2011 imensa Avenida 9 de Julio –, a coisa mais importante é facilitar, não fazer seleções, não impor obstáculos a esse desejo de Jesus. Abraçando cada aceno de espera que jorra gratuitamente nas circunstâncias fortuitas e fugazes que o tempo presente oferece. Fazer como fez o apóstolo Filipe, com o eunuco a quem anunciara a Boa Nova ao longo do caminho. “Aqui temos água. Que impede que eu seja batizado?”, perguntara o eunuco quando passavam perto de um riacho. “Filipe batizou o eunuco. Quando saíram da água, o Espírito do Senhor arrebatou Filipe. O eunuco não o viu mais e prosseguiu sua viagem, cheio de alegria” (At 8,36-39). Cresce o sentimento de precariedade, mas crescem também as possibilidades de encontro “No Evangelho”, repetia o cardeal Aloísio Lorscheider, “os encontros mais belos de Deus com a humanidade aconteciam na rua. Séculos de história de cristianismo não nos dizem outra coisa”. Entrevista com Carlos Aguiar Retes, novo presidente do Celam Só a humildade nos livra das chantagens C arlos Aguiar Retes, 61 anos, arcebispo de Tlalnepantla (México), foi designado presidente do Conselho Episcopal Latino-Americano (Celam) em 19 de maio passado, em Montevidéu, durante a trigésima terceira assembleia ordinária do organismo representativo dos episcopados de toda a América Latina. Os bispos e os outros delegados de todas as Igrejas latino-americanas o escolheram para o cargo, por amplíssima maioria, para um mandato de quatro anos. Graduado em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Gregoriana e ex-professor de Sagrada Escritura na Pontifícia Universidade do México, Aguiar está em seu segundo mandato como presidente da Conferência Episcopal Mexicana. Por sensibilidade pessoal e origem, representa bem a área composta por bispos que depois da contraposição e das radi- 54 30DIAS Nº 6 - 2011 calizações ideológicas intraeclesiais das décadas passadas percebeu com maior solicitude a urgência da “conversão pastoral” prefigurada pelo documento da Assembleia do Celam de Aparecida (2007) como horizonte presente da obra apostólica de todas as Igrejas latino-americanas. Excelência, o senhor se torna presidente do Celam numa época em que todas as Igrejas latino-americanas são chamadas à “Missão Continental”. O que é essa missão? É apenas uma nova fórmula para o apelo à mobilização “de sempre”? CARLOS AGUIAR RETES: A Missão Continental não nasceu do nada, como um projeto de gabinete. Já antes da Assembleia Geral do Celam em Aparecida, houve a experiência de muitas dioceses que começaram a se Acima, à esquerda, um grupo de meninas peruanas no dia de sua Primeira Comunhão na igreja de Las Mercedes, de Lima; à direita, o refeitório para os pobres no convento de los Descalzos, em Lima, Peru, onde os franciscanos oferecem uma sopa chamada Porciúncula No tempo atual, toda a América Latina parece uma imensa estação em que tudo se move e nada está parado em seu lugar. Em que processos econômicos e sócioculturais imponentes mudam e às vezes reviram a vida dos indivíduos e das multidões. A missa e os batismos administrados na estação de Constitución são uma imagem concreta – entre as muitas possíveis – da Missão Continental que as Igrejas latino-americanas, neste contexto de rápidas mudanças, prescreveram a si mesmas em 2007, em Aparecida, na última Assembleia Geral do Episcopado Latino-Americano. Quatro anos depois, os bispos e os outros convocados para a 33ª Assembleia do Conselho Episcopal Latino-Americano, realizada em Montevidéu de 15 a 20 de maio passado, verificaram juntos o caminho feito até aqui. Questionaram-se e se confrontaram novamente com as intuições e o olhar lançado sobre o Continente expressos na conferência de Aparecida. Nas palavras e nos juízos de alguns deles, recolhidos por 30Giorni nesse encontro, o discernimento compartilhado pelos representantes do episcopado se apresenta como um caminho posicionar do ponto de vista pastoral nessa perspectiva. Em Aparecida, essas experiências convergentes se encontraram e se reconheceram, e todo o episcopado latino-americano escolheu caminhar pela estrada que elas sugeriam. Que elementos favorecem essa nova unidade de intenções compartilhada? A constatação de que estamos passando para um novo contexto social. É um processo que percebemos sobretudo nas grandes áreas urbanas, que continuam a crescer. Nesse sentido, a missão proposta em Aparecida foi preparada também pela reflexão sobre as megalópoles. A migração do campo para as cidades é uma constante na vida da América Latina. Mas hoje esses fenômenos marcam a passagem de um tempo em que os valores cristãos eram aceitos por todos para uma situação em que os modelos mudam e vai-se formando uma sociedade pluricultural. E o que isso comporta, do ponto de vista pastoral? Não podemos pensar que a nossa tarefa prioritária seja ficar o tempo inteiro parados na porta de entrada, verificando se as pessoas possuem ou não os requisitos administrativos para fazer parte da Igreja. Este é o tempo de um anúncio do essencial do cristianismo, a todos. Às pessoas tal como elas são, na condição concreta em que vivem hoje, com as expectativas que têm agora. Na área do México em que me encontro, há doze aberto e em pleno andamento. No qual – como sempre acontece – as intuições mais cheias de esperança evangélica florescem e desabrocham na trama cotidiana dos pastores mais envolvidos na vida concreta do povo de Deus. Um primeiro dado ajuda a eliminar equívocos muitas vezes fomentados pelas propagandas clericais e anticlericais: os bispos pastoralmente mais sensíveis têm cada vez mais claro que a missão continental não é uma estratégia ou um programa. Nem um apelo a novas militâncias para reconquistar posições perdidas. “A missão continental delineada em ¬ dioceses formadas por pessoas que vão e vêm todos os dias, para satisfazer a suas necessidades vitais. Assim, é preciso que nos encarreguemos de todas as novas condições da convivência. Por exemplo, facilitando o acesso aos sacramentos, de forma que os requisitos exigidos pela paróquia não se tornem um motivo para perder qualquer contato com a Igreja. Nas décadas passadas, a chamada Nova Evangelização apostava muito nos grupos e nos movimentos organizados. Hoje, que reflexões são sugeridas pelo que ocorreu com os Legionários de Cristo? Esse episódio nos diz que é preciso ter uma atitude de humildade, a atitude que Bento XVI tem-nos mostrado sempre. Reconhecer que a fragilidade humana comporta necessariamente a possibilidade real de quedas, do pecado. É inútil que nos apresentemos diante da sociedade pretendendo que a Igreja seja uma espécie de instituição humana perfeita, em que tudo funciona. Essa, certamente, é uma boa intenção. Mas sabemos também que entre nós as fragilidades e as misérias humanas levam a situações lamentáveis de escândalo e contratestemunho. E a atitude de humildade sugerida por Bento XVI nasce da confiança de que a graça de Deus opera, e pode mudar as coisas. Só assim não somos reféns das expressões da mídia que se esforçam por denegrir a instituição eclesiástica. ¬ 30DIAS Nº 6 - 2011 55 Reportagem À esquerda, fiéis brasileiros no Santuário de Nossa Senhora Aparecida; acima, uma foto aérea da favela de Paraisópolis, em São Paulo, Brasil Aparecida”, explica com palavras tão simples quanto decididas Ricardo Ezzati Andrello, arcebispo de Santiago do Chile, “não é e não pode ser entendida como um projeto de reconquista das porções de poder sociológico que a Igreja está perdendo na América Latina”. Até porque, como salienta Rubén Salazar Gómez, arcebispo de Bogotá, “a Igreja enquanto tal não interessa, não importa. É apenas um instrumento. O Concílio Vaticano II repete que a Igreja é sacramento, e um sacramento em si mesmo só tem sentido como sinal e instrumento. Isso é a Igreja. Existe apenas para servir os homens indicando a eles o rosto de Cristo”. Assim, na América Latina parece já ter passado também a época de quem Muitos continuam a olhar para as Igrejas latinoamericanas com os olhos das décadas de 1960 e 1970. Continuam a denunciar como insídia mais grave a redução da mensagem cristã a ideologia política. É nesse pé mesmo que estão as coisas? Já há anos o esforço de construir e impor um “mapeamento” ideológico dos membros da Igreja parece inútil e superado, se é que alguma vez essa já tenha sido uma chave de interpretação adequada para conhecer realmente os rostos e as experiências das Igrejas da América Latina. Aparecida viu a Igreja tal como ela é hoje, e o que o Espírito Santo lhe inspira agora. Eu creio que esse documento tenha sido um sinal evidente de como essas leituras ideológicas caíram por completo. Na comunhão da Igreja podem viver lado a lado sensibilidades diferentes e diferentes abordagens ao enfocar as coisas. Frequentemente a mídia e mesmo as agências de imprensa católicas descrevem os homens de Igreja como representantes de uma força “antagonista” em relação a governos e grupos políticos que vêm prevalecendo na América Latina. É uma imagem plausível? Com relação ao itinerário histórico da América Latina, vem crescendo a convicção de que a Igreja tem de ser muito livre perante os governos. Respeitando a autoridade constituída, procurando favorecer todas as co- 56 30DIAS Nº 6 - 2011 apostava tudo na fórmula quase mágica da “evangelização da cultura”, entregando nas mãos de elites militantes a tarefa de readquirir para a igreja um espaço culturalmente influente no cenário público, como se dizia nas décadas de 1980 e 1990. A missão continental, repete o brasileiro Geraldo Lyrio Rocha, arcebispo de Mariana, “não é uma laborações possíveis, mas ao mesmo tempo livre para dizer o que pensa sobre como deve ser a sociedade. Infelizmente, esse esquematismo ideológico de que eu falava antes, e que é totalmente inapropriado para olhar para a Igreja, não parece totalmente superado em alguns países. Alguns ainda consideram fundamental o discurso ideológico para orientar seu governo e suas políticas, e orientar também as massas. Mas, ao lado dos exemplos de uma continuidade na rígida posição ideológica de antigamente, existem outros, mais pragmáticos, de pessoas que pensam nas políticas sociais como instrumentos para resolver os problemas. E em sua nação, qual é o problema que marca mais o tempo atual? No México, um problema grave é o impacto geral do tráfico de drogas e de dinheiro ilegal. Problemas que não podem ser resolvidos se faltar uma verdadeira colaboração internacional. De modo particular, a dos Estados Unidos. Eles deveriam ter uma posição muito mais rígida para impedir a passagem das armas para o México. O México não produz armas, não há lá uma única fábrica de armas e de armamentos militares. Como é possível que as armas sejam encontradas com tanta facilidade do outro lado da fronteira? Isso certamente é consequência de uma prática criminosa. G.V. AMÉRICA LATINA tarem-se de todas as “ultrapassadas estruturas que já não favoreçam a transmissão da fé” (n. 365), a não serem complacentes com a retórica do “Continente da Esperança” e a não “dar nada como pressuposto e óbvio” (n. 549). O mesmo documento eliminou também os pretextos de que se podiam valer os profissionais da queixa e da recriminação, fazendo votos – com uma citação da Evangelii nuntiandi de Paulo VI – de que “o mundo atual” pos- inermidade de uma criança salva das águas. Sinal gratuito e surpreendente da afeição por Jesus e sua Mãe ainda viva nos corações de grande parte dos latinoamericanos. De uma ideia de Igreja como reguladora da fé à de uma Igreja facilitadora da fé No número 264, o mesmo documento descreve a piedade popular como uma duradoura e grandiosa “confissão do Deus vivo que Acima, à esquerda, nas proximidades da igreja de San Cayetano, em Buenos Aires, fiéis recebem a bênção por ocasião da festa do santo padroeiro do trabalho e do pão; à direita, distribuição de comida em um refeitório de bairro em Buenos Aires mobilização, ou uma lista de coisas novas a fazer e de momentos a organizar, mas um certo espírito que deveria ser a marca de cada expressão e articulação da vida da Igreja. Em momentos de passagem e de grandes mudanças como os que estamos atravessando, aumentam as preocupações e o sentimento de precariedade, mas também as possibilidades de encontro. Por exemplo, com os oitenta por cento dos brasileiros que, no Brasil católico, vivem a sua vida longe das práticas cotidianas da Igreja”. O documento de Aparecida chamou a atenção também para o fato de que na América Latina estão em andamento processos de secularização e de que a fé, que por cinco séculos animou a Igreja e a vida do continente, já não se transmite de geração em geração com a mesma facilidade de antes. O texto convidou as Igrejas latino-americanas a liber- sa “receber a Boa Nova, não de evangelizadores tristes e desalentados, impacientes ou ansiosos, mas de ministros do Evangelho, cuja vida irradia o fervor de quem recebeu, antes de tudo em si mesmos, a alegria de Cristo” (n. 552). Mesmo em meio às muitas reflexões, indicações e sugestões, a missão continental não foi delineada como o termo de um trabalho dos agentes de pastoral, o fruto de quem pretende construir a Igreja com seu esforço, às vezes partindo do zero. Pois “o mais decisivo na Igreja é sempre a ação santa de seu Senhor” (Introdução, n. 5). E cada passo novo “só pode acontecer se valorizarmos positivamente o que o Espírito Santo já semeou” (n. 262). O ponto de partida é essa fé que, mesmo em meio a todos os esquecimentos, as fraquezas e os possíveis desregramentos, continua a mostrar-se nas devoções mais simples do povo, com a atua na história”. Um dado diante do qual a Igreja tem o mandato de no mínimo não complicar o que é simples. “A questão é passar de uma ideia de Igreja como reguladora da fé para a de uma Igreja facilitadora da fé”, diz, usando uma frase um pouco de efeito mas eficaz, Eduardo Horacio García, bispo auxiliar de Buenos Aires encarregado da pastoral para a arquidiocese portenha. Talvez esteja toda aqui a conversão pastoral que o documento de Aparecida delineia como fruto da gratidão e tarefa própria das Igrejas latino-americanas para o tempo presente. Nas reflexões de muitos bispos, a palavra mais recorrente, não por acaso, é cercanía, proximidade. Traço distintivo de uma Igreja que se ofereça a todos como uma “mãe que vai ao encontro, uma casa acolhedora” (n. 370). Assim, os bispos desta época eclesial reatam os fios de continuidade ¬ 30DIAS Nº 6 - 2011 57 Reportagem também com as gerações de seus antecessores. De modo particular, com as gerações de pastores que depois do Concílio Vaticano II fizeram também do Celam um instrumento eficaz para testemunhar a partilha cotidiana dos destinos e das vidas dos povos do Continente pelas Igrejas locais. “Além de tudo”, observa o venezuelano Baltazar Enrique Porras Cardozo, arcebispo de Mérida, “mesmo nesta fase de grandes mudanças estar próximo dos desejos e dos sofrimentos dos homens continua a ser um traço distintivo das Igrejas latino-americanas, e as pessoas reconhecem isso. Mesmo diante do crescimento da violência e dos fenômenos de degradação social, pagos cada vez mais pelos fracos, todos sabem que encontram na Igreja uma realidade em sintonia real com seus desejos de paz, de vida tranquila, de segurança, e uma ajuda concreta nas dificuldades e nos sofrimentos”. Suas palavras são ecoadas pelo frade capuchinho Andrés Stanovnik, arcebispo de Corrientes: “De modo geral, e deixando de lado os casos individuais, se existe uma realidade humana que em nossos países mantém os pés na vida cotidiana, essa realidade é justamente a Igreja. As nossas Igrejas não são constituídas apenas pelos encontros dos bispos, como o de Aparecida. Esses mesmos bispos caminham todos os dias com seu povo. Os padres não vivem reclusos nas paróquias. Estão todos os dias com as pessoas, na rua, nos Da esquerda para a direita, o presidente uruguaio José Mujica, a presidente argentina Cristina Fernández de Kirchner, o então presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente do Paraguai Fernando Lugo, na “foto de família” do Mercosul, durante a reunião de cúpula realizada em Foz do Iguaçu, no Brasil, em 17 de dezembro de 2010 refeitórios para os pobres, nas escolas rurais, em todas as infinitas obras sociais e caritativas em que encontram realmente o esforço de muita gente para seguir adiante. Só dentro da concretude das circunstâncias da vida cotidiana é possível compartilhar a fé e a alegria pela presença viva de Cristo. Do contrário, qualquer caminho comunitário com o tempo fecha o horizonte e se transforma numa segregação com pretextos religiosos”. A volta de um certo tipo de clericalismo: o velho perfil do padre “príncipe” Segundo alguns bispos, o boicote mais insidioso à perspectiva “da proximidade” sugerida pela Conferência de Aparecida não vem do relativismo ou da secularização, ou dos preconceitos de grupos hostis à Igreja. “As maiores resistências”, observa o franciscano peruano Héctor Miguel Cabrejos Vidarte, arcebispo de Trujillo, “coincidem com a volta de uma espécie de clericalismo. Até por isso, a conversão pastoral delineada em Aparecida diz respeito em primeiro lugar aos padres e aos bispos. E também a alguns grupos e movimentos organizados, que às vezes agem como consórcios em busca de prestígio e de poder na Igreja”. Em algumas situações, parece reaparecer o velho perfil do eclesiástico “príncipe”, representante de uma casta privilegiada, funcionário de um poder religioso, que trata até mesmo os sacramentos como coisas suas, para afirmar sua supremacia sobre os fiéis leigos. E fazem isso às vezes jogando na cara do povo as suas fragilidades e as suas feridas, mortificando a abertura e as expectativas daqueles que não estariam de acordo com os “pré-requisitos” de preparação doutrinal e de condição moral impostos pelo crescente neorrigorismo clerical. Um desses estilos e estruturas que o documento de Aparecida define “ultrapassados”, e que não favorecem e sim dificultam a transmissão da fé. À esquerda, católicos venezuelanos durante a procissão do Domingo de Ramos, em Maracaibo À direita, a tradicional procissão do Domingo de Ramos em Cali, no departamento de Valle del Cauca, na Colômbia 58 30DIAS Nº 6 - 2011 AMÉRICA LATINA “É inevitável”, observa o arcebispo Stanovnik, “que quando alguém pensa construir, ‘fazer’ a Igreja como projeto e conquista próprios, acaba por fazer uma autocelebração”. Acrescenta os arcebispo Porras: “Pretensões como essa marcam a história do catolicismo latino-americano desde o início. Basta ler os documentos publicados pelo Vaticano no quinto centenário da descoberta da América. Na época, havia quem, por rigidez disciplinar, pretendesse que os sacerdotes ou os religiosos fossem filhos legítimos, crescidos em famílias regulares, capazes de fornecer um dote. Já naquela época, entre os séculos XVI e XVIII, chegavam de Roma centenas e centenas de dispensas, para contornar essas pretensões rigoristas”. Uma Igreja contrapoder? O Celam, desde os tempos em que quem o guiava e inspirava eram espíritos livres como o bispo chileno Manuel Larraín e dom Hélder Câmara, sempre refletiu o sentimento predominante dos episcopados latino-americanos diante das mutáveis geografias sociais e políticas da região, esse cruzamento de povos e nações que dom Hélder definia com razão “o continente cristão do Terceiro Mundo”, quando chamava seus confrades a combater a miséria “que destrói a imagem de Deus que existe em cada homem”. Hoje se consolida com o tempo nesses países e aumenta cada vez mais a fila de governos de es- querda, com líderes de diferentes proveniências e posturas – exguerrilheiros, ex-militares, nacional-populistas, pragmático-reformistas –, chamados, de uma forma ou de outra, a administrar uma conjuntura econômica em expansão, processos reais de integração política, desequilíbrios crescentes e programas sociais compensatórios que impactam as condições de vida de milhões de pessoas. Uma efervescência continental em cuja representação pela mídia os homens de Igreja normalmente são relegados ao papel fixo de censores severos. Seriam eles emissários de uma corporação sempre em luta com líderes políticos e governos e ancorada à agenda dos temas eticamente sensíveis: defesa da vida, da família, da liberdade de educação. O fato é que entre os bispos convocados a Montevidéu durante a última assembleia do Celam ninguém pareceu ter a intenção de dar crédito e quem sabe relançar o perfil hipermediatizado da Igreja como bloco “beligerante” alternativo aos poderes mundanos. Para todos, os traços distintivos inatos à ação eclesial são os do fervor apostólico e da mansidão. “A imagem de uma Igreja como força antagonista”, explica o arcebispo venezuelano Porras, “é útil a governos e regimes populistas que frequentemente caem na divinização do próprio poder. Quando isso acontece, a Igreja, justamente por sua imanência ao povo e pelo olhar livre de messianismos com que avalia os problemas so- ciais, é representada como uma corporação em busca de privilégios”. Segundo o arcebispo chileno Ricardo Ezzati, “na linguagem política há quem às vezes quer fazer passar a ideia de que a estrutura eclesiástica é um fator de atraso que freia a sociedade e as consciências, e denuncia sua pretensa tentativa de recuperar um monopólio social e cultural perdido. A meu ver, é preciso evitar confirmar esse estereótipo. E evidenciar que a Igreja não busca nenhum poder, nenhuma hegemonia. Quer apenas comunicar ao nosso povo uma mensagem de libertação boa para todos”. Também o cardeal Julio Terrazas Sandoval, arcebispo de Santa Cruz de la Sierra, define como caricatura cômoda aquela que reduz a Igreja a um contrapoder: “Na Bolívia, nos últimos anos, a Igreja manteve-se em silêncio à espera de que acontecessem as mudanças tão desejadas pelo povo. Só começamos a falar quando ouvimos discursos que convidavam a eliminar o ‘Deus dos cristãos’ e afirmavam a divisão entre duas Igrejas, a dos ricos e a dos pobres”. Conclui o colombiano Rubén Salazar Gómez: “É uma deformação imposta pela mídia, que enfatiza apenas os discursos dos eclesiásticos sobre temas de moral sexual. A Igreja deve fazer o possível para escapar do mecanismo daqueles que a pintam como uma corporação política antagonista. Deve fazer isso mostrando a todos, com humildade, que não busca nada para si mesma”. q Fiéis com a imagem do papa João Paulo II durante uma missa campal no dia de sua beatificação, na Cidade de Guatemala 30DIAS Nº 6 - 2011 59 Um comentário à frase de padre Luigi Giussani Introdução por Paolo Mattei A frase de padre Luigi Giussani dirigida a João Paulo II no início da década de 1990, “não, Santidade, não é o agnosticismo; o gnosticismo, este sim, é que é o perigo para a fé cristã”, despertou o interesse não apenas dos nossos leitores. O jornal italiano Avvenire recordou-a num pequeno artigo que resume com precisão as palavras e as intenções de padre Giussani. Nós o transcrevemos integralmente: “Na última edição de 30Giorni há uma frase de padre Luigi Giussani: ‘Não é o agnosticismo; o gnosticismo, este sim, é que é o perigo para a fé cristã’; assim dizia a João Paulo II no início da década de 1990. Escreve Lorenzo Cappelletti, introduzindo a republicação de um artigo de Massimo Borghesi de 2003 (O pacto com a Serpente): ‘Passados vinte anos, podemos nos dar conta do quanto foi antecipadora essa guinada de padre Giussani. Guinada que pode ser exemplificada também por uma entrevista, concedida em abril de 1992, em que o mesmo Giussani fala da perseguição àqueles ‘que se movem na simplicidade da Tradição’. Quando o entrevistador lhe pergunta se ele se referia a uma perseguição de fato, Dom Giussani responde: ‘Isso mesmo. A ira do mundo, hoje, não se ergue diante da palavra Igreja, fica quieta até diante da ideia de alguém se dizer católico, ou diante da figura do Papa como autoridade moral. Aliás, existe uma reverência formal e até sincera. O ódio explode – mal se contém, e logo transborda – diante de católicos que se apresentam como tais, católicos que se movem na simplicidade da Tradição’”1. Padre Giussani, naqueles anos, não apenas evidenciou a relação entre o gnosticismo e a perseguição àqueles “que se movem na simplicidade da Tra- 1 60 Don Luigi Giussani: ‘Il pericolo oggi è lo gnosticismo’. In Avvenire, 14 jul. 2011, p. 27. 30DIAS Nº 6 - 2011 Nova vetera et www.30giorni.it nella Chiesa e nel mondo MENSILE SPED. IN ABB. POST. Tar. Economy Taxe Percue Tassa Riscossa Roma. ED. TRENTA GIORNI SOC. COOP. A R. L. ISSN 1827-6288 En hommage LES CHANTS DE LA TRADITION dição”, mas esclareceu também a forma pela qual o gnosticismo se torna perigo para a fé «Le vrai danger cristã. pour la foi chrétienne, ce n’est pas l’agnosticisme, Num discurso fantástico, pronunciado durante mais le gnosticisme» os exercícios espirituais de universitários de Comunhão e Libertação, em 12 de dezembro de 1998, dizia assim: “A história é feita de alternâncias dramáticas: os pontos de objeção parecem para dilatar-se mais que os do passado. O seu prevale«El peligrotiana s ri c fe la mo, cimento é estatisticamente a observação agnosticis no es el nosticismo», g sino el mais amarga e dramática que um cristão auussani n Luigi Gi le dijo do Pablo II a Juan nta têntico possa fazer realmente sobre a situaaños nove ios de los a princip ção da Igreja. Hoje o fato de Cristo existir – “Não é o agnost quem é, onde está, que caminho percorrer o gnosticismo, icismo; este sim, para chegar até Ele – é vivido por pouquíssié que é o perig para a fé cristã o ” mos, quase um resto de Israel, e mesmo esses muitas vezes infiltrados ou imobilizados pela influência da mentalidade comum”2. O gnosticismo é o perigo para a fé não, de per si, enquanto cultura mundana. Isso não im„Nicht sonde im Agnostiz plica que o cristão não possa julgar a cultura rn im Gnost ismus, lieg den c t die Gefah izismus do mundo, evidenciando criticamente, poderíahristli chen r für Glaub en“ mos dizer laicamente, suas instâncias positivas, limites e erros (cf. 1Ts 5,21). Deste ponto de vista, a frase de Giussani, “não é o agnosticismo; o gnosticismo, este sim, é que é o perigo para a , m is c nosti fé cristã”, poderia sugerir uma hipótese de lei“Not ag sticism but Gno anger tura da cultura mundana moderna, ou seja, a is the d an faith” Christi e th r hipótese de que a cultura do mundo moderfo no não seja caracterizada, contrariamente à definição costumeira que se dá dela, pela laicização radical do cristianismo, mas por uma recompreensão da novidade cristã den- ¬ Directeur: Giulio Andreotti i dreott lio An or: Giu Direct mundo y en el Iglesia En la Don Luigi Giussani dans un entretien avec Jean Paul II au début des années Quatre-vingt-dix MENS Percue R. L. my Taxe COOP. A Tar. Econo GIORNI SOC. A ED. TRENT 2228 ISSN 0328- mond o e ne l Ch ies a Johann Wolfgang von Goethe ne lla ÓN TRADICI rni.it www.30gio IN ABB. POST. Riscossa Roma. Tassa ILE SPED. DE LA CANTOS nto LOS Supleme Carl Gustav Jung Georg Wilhelm Friedrich Hegel dans l’Église et dans le monde MENSILE SPED. ABB. POST. 45% D.L. 353/2003 (CONV. IN L. 27/02/04 N.46) ART.1, COMMA 1 DCB - ROMA. e ANNÉE In caso di mancato recapito rinviare a Ufficio XXIX Poste Roma Romanina N.4/5 - 2011 - € 5 per la restituzione mittente previorecapito addebito. Inal caso di mancato rinviare a Uff. Poste Roma Romanina per la restituzione al mittente previo addebito. ISSN 0390-4539 If undelivered please return to sender, postage prepaid, via Romanina post office, Roma, Italy. DA TRADIÇ ÃO nell nella a Chie Chiesa sa e e nel nel mon mondo do Friedrich Hegel Diretor: Giul io Andreotti Georg Wilhelm Johann Wolfg e ang von Goeth na Igreja e no mun do www.30giorni.it v Jung Carl Gusta Suplemento OS CANTOS MENSILE SPED. IN ABB. POST. Tar. Economy Taxe Percue Tassa Riscossa ED. TRENTA Roma. GIORNI SOC. COOP. A R. ISSN 1827-627 L. X ich Hegel lm Friedr Georg Wilhe En cas de non distribution, renvoyer pour restitution à lʼexpéditeur, en port dû, à: Ufficio Poste Roma Romanina, Italie 1 - €5 - 201 addebito. te previo N. 4/5 03 mitten . Italy. XXIX zione al D.L. 353/20 - ROMA L AÑO Roma, ina, Italie la restitu office, POST. 45%, COMMA 1 DCBRoma Romanina ina per ina post Roma Roman MENSUA ART.1 ISTA Poste SPED. ABB. Roma Roman d, via Roman à Ufficio Poste e a Ufficio MENSILE L. 27/02/04 N.46) rinviar dû, a Uff. Postepostage prepai en port to REVaddebto ito. IN rinviare diteur, (CONV. mancato recapi te previo sender, to recapi di return to tion à lʼexpé di manca al mitten In caso zione In caso vered please er pour restitu If undeli renvoy per la restitu 539 distribution, ISSN 0390-4 cas de non Beila ge D IE GE SAN GE D ER TR ADIT ION ne lla Ch ie sa e ne l m on do von Goethe in Ki rche und Wel t Palavras de Dom Luigi Giussani a João Paulo II no início da década de 1990 MEN i.it SILE SPE Tar. Eco D. IN ED. TRE nomy Taxe ABB. POS T. Perc NTA ISS N ue GIO 093 9-34 RNI SOC Tassa Risc ossa . COO 47 Rom P. A R. a. L. Carl Gustav Jung En www.3 0giorn Johann Wolfgang Chef reda kteu r: G iulio MENSILE SPED. ABB. POST. (CONV. IN L. An 27/02/04 N.46) 45% D.L. 353/2003 In dr casoeo di mancato recapito ART.1, COMMA 1 DCB - ROMA. ttie al mittenterinviare aANO per la restituzion XXIX Ufficio Poste - N.4/5 Roma ISSN 0390-4539In caso di mancato previo addebito. recapito - 2011 R$ oyer Pos rn to NUMM sender,te Roma Rom pour ER 4/ anin restituti postage a per prep 5-€ on à la rest aid, lʼexp 5 éditeur, via Rom ituzione en port anina pos al mitt t offic ente prev dû, à Uffic e, io Pos Roma, io addebit o. te Rom Italy. a Rom anin a, Itali e dreotti o An Giuli d by Directe elm Georg Wilh , renv rld the Wo and in Church In the Hegel Friedrich MEN SILE (CONV. SPE D. In caso IN L. 27/0 ABB. POS per la di mancato2/04 N.46 T. 45% D.L. 353 ISSN restituzione recapito ) ART.1, 0390-45 In al mitt rinviare COMMA /2003 29. 1 DCB ente 39 caso di prev a Ufficio man JAHR- ROM catoio add En cas A. If reca ebit Poste GANG Rom pito o. de nonundelive a Rom distribu red plea rinviare anin-a20 se retu a Uff. 11 tion L. ILE Percu P. A R. MENS omy Taxe SOC. COO Tar. Econ TA GIORNI ED. TREN -243 5 0897 ISSN Don Lu Gesprä igi Giussan ITION i in ch TRAD Anfan mit Johann einem E CHANTS OF g der es TH nd o l mo neunzi SuppPleamuen l t e ne ie sa ger Ja II. Ch ne lla hre . . iorni.it POST ssa Roma www.30gSPED. IN ABB. e Tassa Risco drich Hegel Georg Wilhelm Frie Carl Gus tav Jun g Goethe g von Goethe av Jung Carl Gust iussani Luigi G Thus Don hn Paul II ineties to Jo of the ’n ginning at the be von Wolfgang Johann Wolfgan Johann Romanina rinviare a 15,00 If undelivere €5 d please return Uff. Poste Roma Romanina En cas de non to sender, postage distribution, per la restituzion renvoyer pour prepaid, via e restitution à Romanina post al mittente previo addebito. lʼexpéditeur, office, Roma, en port dû, Italy. à Ufficio Poste Roma Romanina , Italie 2 / €5 bito. $8 o adde nte previ - 2011 e al mitte Roma, Italy. nina, Italie 4/5 uzion , 003 A. MBER Roma office la restit NUanina D.L. 353/21 DCB - ROM nina perRomanina postio Poste Roma IX Rom T. 45% MA R XX Roma Roma . POS 1, COM id, via Roma dû, à Uffic . ABB YEA io Poste Poste ge prepa ur, en port SPED /04 N.46) ART. re a Uffic re a Uff. er, posta édite 27/02 MENSILE ito rinvia o addebito. ito rinvia n to send à lʼexp recap V. IN L. previ retur ato recap (CON di mancato restitution manc please mittente e al caso di undelivered renvoyer pour In caso In If n, restituzion per la distributio 0390-4539 de non ISSN En cas Giussani,L. Cristo é parte presente do real. 30Dias, n. 12, dez. 1998, p. 61. 30DIAS Nº 6 - 2011 61 Um comentário à frase de padre Luigi Giussani tro das categorias já conhecidas do gnosticismo. Essa hipótese teve em Augusto Del Noce o seu redator sistemático3. Mas, à parte essa inteligente e interessante hipótese de leitura do moderno, o gnosticismo é o perigo para a fé cristã enquanto “frequentemente se infiltra e imobiliza”, para usar as palavras tão claras de Giussani, o pequeno rebanho, “quase um resto de Israel”, que é a Igreja. Hegel, Goethe e Jung, para citar três grandes mestres do gnosticismo moderno, cujas imagens ilustram a capa da última edição de 30Giorni, não são de per si um perigo, mas o é aquele que na Igreja, de maneira mais ou menos oculta (“oculto e horrendo veneno” é a expressão que Santo Agostinho usava para se referir à heresia pelagiana4), “frequentemente se infiltra e imobiliza”, e portanto desnatura, a simplicidade da Tradição. Também a tragédia do massacre de Oslo de 22 de julho pode indicar como o desnaturamento da fé da Antiga e da Nova Aliança pode transbordar no ódio mais desumano e mais diabólico. De fato, se, em vez de confiar unicamente a Deus na oração a revelação de Seu mistério (e Apocalipse significa revelação), o homem quer construí-lo e antecipar por si mesmo, renova a presunção diabólica de ser como Deus (cf. Gn 3,4-5). Alguns leitores pediram que lhes fosse esclarecido da maneira mais simples possível o que é o gnosticismo. Parece-nos que as breves palavras do discípulo predileto, em sua segunda Carta, digam com insuperável simplicidade o que se entende por gnosticismo, ou seja, por gnose (aliás, melhor dizendo, por falsa gnose, pois a fé em Jesus Cristo também é conhecimento, despertado pela atração da Sua graça). Escreve São João: “Todo aquele que se adianta e não permanece na doutrina de Cristo, não possui a Deus. Aquele que permanece na doutrina, esse possui o Pai e o Filho” (2Jo 9). O perigo do gnosticismo para a fé cristã se expressa na tentativa de ir além da doutrina de Cristo, além da fé dos apóstolos. Poderíamos dizer também que o gnóstico não permanece na humanidade de Jesus, essa humanidade que segundo o apóstolo Paulo contém em superabundante plenitude “todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento” (Cl 2,3). Aqui, Paulo, para indicar o “conhecimento”, usa justamente o termo grego “gnose”. Para possibilitar uma maior compreensão das palavras de padre Giussani republicamos, acompanhado de um breve perfil biográfico, o artigo de padre Jules Lebreton sobre Orígenes (185-254), teólogo da Igreja de Alexandria. Escreve Lebreton que a teologia de Orígenes é “um idealismo que crê se aproximar de Deus perdendo de vista a humanidade de Cristo”. 3 Del Noce, A. Il problema dell’ateismo. Bologna: 1964. Cf., particularmente, p. 27 e 192. Agostinho. Contra Iulianum opus imperfectum II, 146: “Occultum et horrendus virus haeresis vestrae”. 4 62 30DIAS Nº 6 - 2011 Nova vetera et Luca Signorelli, Pregação do Anticristo, capela de São Brício, Catedral de Orvieto. Ao redor do Anticristo, que ouve as sugestões do demônio e realiza prodígios, encontram-se reunidas muitas pessoas, homens e mulheres, pobres e ricos, jovens e velhos, gente comum e personalidades ilustres, laicos e eclesiásticos que conversam umas com as outras Algumas teses de Orígenes foram condenadas pelo magistério da Igreja. Isso não implica que sua teologia não possa e não deva ser valorizada em tudo o que propõe de positivo e de útil para a compreensão da doutrina cristã. São-nos caras, nesse sentido, as palavras de Santo Agostinho: “A regra absolutamente autêntica e inviolável da verdade mostra que deve ser desaprovado e corrigido em cada um aquilo que existe de falso e vicioso, enquanto deve ser reconhecido e aceito o que há de verdadeiro e reto”5. Boa leitura. 5 Agostinho. De unico baptismo contra Petilianum, 9, 16. 30DIAS Nº 6 - 2011 63 Um comentário à frase de padre Luigi Giussani Lebreton, teólogo crente Francês, jesuíta, publicou escritos fundamentais sobre os primeiros séculos da Igreja. Muitos grandes nomes lhe são devedores. No entanto, nos mais recentes dicionários teológicos não há vestígios dele. Porque amava a fé da tradição antes e mais que os debates dos homens cultos. Perfil desse personagem por Lorenzo Cappelletti O recentíssimo Dizionario dei teologi não o nomeia. Não encontramos um perfil dele nem mesmo entre os cento e dez retratos propostos no Lessico dei teologi del secolo XX, último volume da famosíssima obra dogmática (que se gaba de ter Von Balthasar e Rahner entre seus eminentes colaboradores) Mysterium salutis. Mesmo assim, reconheceram-se devedores do padre Jules Lebreton quase todos os chamados grandes, de Chenu a Danielou, de Leclerq a Lyonnet, de Bouyer a Marrou, tanto que Emile Blanchet, reitor do Institut Catholique de Paris, dando notícia de sua morte, ocorrida em julho de 1956, escrevia que na realidade “jamais saberemos qual foi a profundidade e a extensão da influência do padre Lebreton”. Nascido em Tours em 1873, Jules Lebreton entrou aos dezessete anos na Companhia de Jesus e depois de ter bilhantemente obtido 64 30DIAS Nº 6 - 2011 os títulos acadêmicos não se pôde esquivar de assumir cargos de docência. Em 1907, em plena crise modernista, foi a ele que foi confiada a responsabilidade pela cátedra de História das Origens Cristãs, criada ex novo no Institut Catholique de Paris para cuidar do delicadíssimo setor histórico-teológico dos estudos sobre a Igreja primitiva. Padre de la Potterie lembra de tê-lo encontrado em Paris muitos anos depois, ocasião em que Lebreton confidenciou-lhe que, quando chegara, nos primeiros anos do século XX, “un vent glacé soufflait sur Paris”. Seria aquele jovem professor capaz de suportar o vento gélido do modernismo? Colegas nem sempre bem intencionados desdenhavam: “Os seus superiores devem estar loucos para permitir que você aceite um cargo como este”. “Não briguei para obter esta posição”, respondia Lebreton. “Chamaram-me para cá. Vim”. Com humildade Essa atitude de soberana e humilde indiferença sempre o acompanhará. “A sua espiritualidade austera contrastava por completo com qualquer busca de aventura e evasão. O padre não expressava desejos”, escreve René d’Ouince na lembrança que lhe dedicou em Études, de 1956. De fato, também do ponto de vista científico, o padre Lebreton gastou a maior parte de sua vida em obras que custam esforço e não trazem glória, ao menos a que é ganha entre os homens, demarcando a própria pretensa originalidade. Deus sabe o que custa ser um professor sempre disponível por quase quarenta anos, sintetizar corretamente em dois volumes a história da Igreja até Constantino para a grande obra dirigida por Fliche e Martin, além de estar sempre trabalhando como escritor para revistas como Études e Recherches de science religieuse (que funda- A r q u i v o d e 3 0 D i a s - O u t u b ro d e 1 9 9 4 Padre Jules Lebreton. Nasceu em Tours em 1873, morreu em Paris em 1956 ra em 1910 com o padre De Grandmaison e cuja direção assumiu também, após a morte deste); mas sobretudo resenhar, para o Bulletin d’histoire dessa revista, até o fim da década de 1940, inúmeros trabalhos alheios. Por meio século, as obras de uma certa importância de todos os exegetas neotestamentários, dos patrólogos e dos historiadores do dogma passaram pela avaliação atenta de suas análises críticas. Tão medidas, que para encontrar seu relevo é preciso lê-las nas entrelinhas. Trigésimo quarto ano de Recherches de science religieuse, apresentação de Surnaturel, do padre De Lubac: “Todo cristão sabe que Deus propõe como fim último para a sua vida a visão beatífica, pela qual ele se unirá eternamente ao seu Criador e Salvador; ele sabe que essa visão lhe é prometida e lhe será concedida por pura graça de Deus; mas pode perguntar-se se esse fim foi proposto à humanidade a partir do momento da criação do primeiro homem ou apenas depois da queda, em previsão dos méritos do Redentor; nessa segunda hipótese, devemos ser representados por Adão, antes de seu pecado, enquanto orientado por Deus a uma beatitude natural, merecida por uma vida piedosa e justa, como as forças da natureza podiam assegurar? Se essa hipótese de uma natureza pura orientada para um fim natural tiver de ser descartada...”. É como se dissesse: os cristãos sabem em que devem crer, hipóteses são hipóteses e ninguém disse que a da natureza pura deve ser descartada... O padre Lebreton deixou incompleta a única obra que lhe poderia ter dado glória. L’histoire du dogme de la Trinité des origines au Concile de Nicée não chegou a Niceia, parou em Santo Irineu. Mas talvez não tenha sido por acaso. A fé de Lebreton era um pouco como a de Irineu. Nova vetera et Como Irineu, o padre Lebreton – escreve ainda René d’Ouince – “normalmente se contentava em expor com firmeza a doutrina tradicional da Igreja”. Segundo essa mesma regula fidei que fora de Irineu e que Lebreton assume no prefácio à Histoire du dogme, lemos: “A corrente viva da nossa tradição nos une ainda mais estreitamente e mais seguramente ao passado que os comentários dos exegetas e as dissertações dos historiadores”. O velho servidor A desconfiança perante as especulações da gnose cristã de Clemente de Alexandria e de Orígenes volta em alguns de seus artigos da década de 1920 (publicados na Itália pela Jaca Book em 1972 sob o título Il disaccordo tra fede popolare e teologia dotta nella Chiesa del terzo secolo, dos quais apresentamos amplos trechos nas páginas seguintes). Segundo Orígenes, os simples fiéis são como lactantes, ligados a conhecimentos elementares: “Não conhecem senão Jesus Cristo e Jesus Cristo crucificado, pensando que o Logos feito carne é todo o Logos; eles conhecem apenas Cristo segundo a carne: e essa é a loucura daqueles que são chamados crentes”. Mas padre Lebreton quis viver e morrer como eles. Voltando a ser como uma criança nos últimos anos de sua vida em decorrência de uma grave doença, confidenciou a uma religiosa idosa e doente como ele: “A senhora entende como eu, minha madre. O que o Senhor quer encontrar nos seus velhos servidores é a confiança n’Ele. Uma criança não tem medo de voltar à casa pater na. Mês após mês as forças diminuem. Esta tarde irei ao médico para tomar as injeções mensais que me ajudam a viver, a pensar, a lembrarme das coisas. Quando já não fizerem efeito, deixarei de lado tudo isso e viverei na casa paterna como uma criança dócil e confiante, repetindo a palavra: ‘Scio cui credidi. Sei em que depositei a minha confiança’. Não vai me decepcionar”. q 30DIAS Nº 6 - 2011 65 Um comentário à frase de padre Luigi Giussani Nesta e nas páginas seguintes, algumas imagens do ciclo de afrescos conservados no interior do mosteiro de clausura das Agostinianas dos Santos Quatro Coroados, em Roma. Aqui, acima, a representação da arte Gramática Um idealismo imprudente Jules Lebreton escreveu na década de 1920 dois artigos sobre Orígenes. A teologia do mestre de Alexandria é “um idealismo que crê aproximar-se de Deus perdendo de vista a humanidade de Cristo” por Lorenzo Cappelletti 66 30DIAS Nº 6 - 2011 A r q u i v o d e 3 0 D i a s - O u t u b ro d e 1 9 9 4 a edição 12 de 1922 de Recherches de science religieuse, padre Jules Lebreton (que tinha fundado a revista em 1910, com padre De Grandmaison) publicava um artigo intitulado “Les degrés de la connaissance religieuse d’après Origène”. Sobre o mesmo tema, nos anos de 1923 e 1924, a Revue d’histoire ecclésiastique hospedava um longo artigo (dividido em duas partes), também do padre Lebreton, intitulado “Le désaccord de la foi populaire e de la théologie savante dans l’Eglise chrétienne du III siècle”. Com esse título, Il disaccordo tra fede popolare e teologia dotta nella Chiesa del terzo secolo, em 1972, a Jaca Book publicava em italiano ambos os artigos de Lebreton, formando com eles um pequeno livro da coleção Strumenti per un Lavoro Teologico (trazendo – diga-se, pensando numa eventual reedição – incorretamente as datas do segundo artigo). Embora tenham-se passado mais de vinte anos dessa edição e mais de setenta da publicação dos originais, a lucidez com que Lebreton lê o origenismo, salientando seu afastamento do depositum fidei, é insuperável; uma lição atualíssima, além de tudo, porque o origenismo nesse meio-tempo certamente não desapareceu. Os números das páginas que indicamos entre parênteses referem-se ao texto italiano editado pela Jaca Book, de cuja tradução (aliás, fiel), feita por Riccardo Mazzarol, às vezes nos afastaremos. N 1. Da filosofia à heresia “Para os simples fiéis, como para São Clemente de Roma, o mistério da Trindade, Pai, Filho e Espírito Santo, é a fé e a esperança dos eleitos; eles veem tudo na perspectiva da salvação e, no centro de tudo, a cruz de Cristo, a sua morte redentora, a sua ressurreição, penhor da deles. Eles podem dizer, como lhes reprovava Orígenes, que não conhecem outra coisa senão Jesus Cristo e Jesus Cristo crucificado. Os doutos veem no mesmo mistério a solução de todos os enigmas do mundo: como um Deus Nova vetera et infinitamente perfeito pôde criar? Com o seu Verbo. Como esse Deus invisível se deu a conhecer? Mais uma vez, com o seu Verbo. Criação com o Verbo, revelação com o Verbo: são sem dúvida doutrinas autenticamente cristãs; mas nos escritores anteriores essas doutrinas são consideradas sobretudo em suas relações com o dogma da salvação: se Deus criou o mundo, é para a sua Igreja, para seus santos. Essas considerações, aqui [para os alexandrinos], são menos evidentes; o que está em primeiro plano é o problema filosófico que preocupava a todos os pensadores. [...] Atraídos para o terreno dos filósofos, os teólogos cristãos sofrem a sua influência; a geração do Verbo de Deus é descrita por eles em função do problema cosmológico: para criar o mundo, Deus, que desde a eternidade tem em si o seu Verbo, profere-o exteriormente” (p. 42-43). 2. A humanidade de Jesus Cristo Portanto, essa carne que o Filho tomou de Maria e que foi por ela dada à luz não é evidenciada como o lugar da salvação, mas é funcional à resolução de um problema filosófico. “‘Uma vez que somos impelidos’, diz Orígenes, ‘por uma virtude celeste e mais que celeste a adorar unicamente o nosso Criador, negligenciamos os ensinamentos primordiais de Cristo, ou seja, o ensinamento elementar, e elevamo-nos à perfeição, para que a sabedoria que é manifestada aos perfeitos seja manifestada também a nós’ (cf. Periarchon 4,1,7). Essa virtude ‘celeste’ é a que nos permite ir além do ensinamento elementar, para alcançar as realidades inteligíveis, o mundo ‘celeste’” (p. 97-98). Lebreton se apressa a observar: “Sem dúvida se trata de uma concepção bastante falsa e perigosa da encarnação do Filho de Deus e de seu rebaixamento; mas esse erro é intrínseco ao origenismo, um idealismo imprudente que crê aproximar-se de Deus perdendo de vista a humanidade de Cristo” (p. 89). Atenção! Em Orígenes o cristianismo espiritual não exclui o corporal, o cristianismo secreto não exclui o manifesto, ¬ 30DIAS Nº 6 - 2011 67 Um comentário à frase de padre Luigi Giussani São Pedro nos ombros da personificação da virtude da caridade, sob cujos pés jaz o vício do ódio, representado por Nero 68 30DIAS Nº 6 - 2011 o Evangelho eterno não exclui o Evangelho tal como é entendido pelos simples cristãos. Lebreton chega a escrever que, para Orígenes, “a fé simples, que tem por objeto central Jesus Cristo crucificado, é sem dúvida um conhecimento salutar, mas elementar, como o leite para as crianças; a misericórdia de Deus a propõe, na falta de melhor opção, àqueles que são fracos demais para poder-se elevar mais para o alto, para ‘conhecer a Deus na sabedoria de Deus’. Assim, não nos surpreenda ver Orígenes (cf. Contra Celsum 3, 79) defender essa fé dos simples afirmando que não é a melhor coisa em absoluto, mas a melhor possível, dada a enfermidade daqueles aos quais deve ser proposta” (p. 73). Mas justamente essa motivação, trazida em defesa da fé dos simples, a esvazia. Lebreton cita o que Orígenes escreve no Comentário a João: “Escreve Orígenes: ‘O evangelho que os simples creem entender contém a sombra dos mistérios do Cristo. Mas o evangelho eterno, de que fala João, e que chamaremos propriamente evangelho espiritual, apresenta claramente àqueles que entendem tudo o que diz respeito ao Filho de Deus, tanto os mistérios que seus discursos permitem vislumbrar quanto as realidades das quais suas ações eram símbolos. [...] Pedro e Paulo, que a princípio eram manifestamente judeus e circuncisos, receberam depois de Jesus a graça de sê-lo em segredo. Eram visivelmente judeus para a salvação da massa; não só o confessavam com suas palavras, mas o manifestavam com suas ações. O mesmo deve ser dito de seu cristianismo. E, como Paulo não pode socorrer os judeus segundo a carne, se, quando a razão o requer não circuncide Timóteo, e se, quando é o momento, não se corta os cabelos e não faz a oferta, numa palavra, se não se faz judeu com os judeus para ganhar os judeus, assim ele, que se dedica à salvação de muitos [Orígenes fala de si mesmo], não pode socorrer eficazmente com o cristianismo secreto aqueles que ainda estão ligados aos elementos do cristianismo manifesto, torná-los melhores e fazê-los che- A r q u i v o d e 3 0 D i a s - O u t u b ro d e 1 9 9 4 Nova vetera et gar ao que é mais perfeito e mais elevado. Por isso, é preciso que o cristianismo seja espiritual e corporal; e, quando é preciso anunciar o Evangelho corporal, e dizer em meio àqueles que são carnais que não conhecemos outra coisa senão Jesus Cristo e Jesus Cristo crucificado, devemos fazê-lo. Mas, quando nos encontramos diante de aperfeiçoados pelo Espírito, que trazem frutos n’Ele e são apaixonados pela sabedoria celeste, é preciso comunicar a eles o discurso que se eleva da encarnação até o que estava junto de Deus’” (p. 77-78). 3. A tradição secreta A tradição única da Igreja, de que fala Irineu e que é confiada em primeiro lugar à custódia do bispo de Roma, cinde-se inevitavelmente, depois de Orígenes, numa dupla tradição. “De um lado a Igreja visível, que mostra, como em Irineu ou Tertuliano, a sucessão episcopal que a liga por meio dos apóstolos a Cristo; de outro lado uma elite, conhecida apenas por Deus, oculta aos olhos dos homens, que também remete a uma tradição apostólica, mas confidencial, secreta e transmitida clandestinamente” (p. 94). Se formos a fundo não apenas descobriremos que as tradições se tornam duas, uma exotérica (pública, ou seja, católica), a outra, a que conta, esotérica (secreta, ou seja, gnóstica), mas também que não transmitem o mesmo depositum. Nem quanto ao objeto: “O ensinamento reservado aos simples é o moral; a revelação dos mistérios, particularmente da Trindade, é o segredo dos perfeitos. [...] Os dois ensinamentos, um proposto à massa, o outro reservado aos perfeitos, se distinguem por seu objeto: para uns a intimação dos preceitos morais, para outros a revelação dos segredos divinos. [...] Orígenes frequentemente opõe o conhecimento da humanidade de Cristo ao da sua divindade: aos carnais não é possível pregar outra coisa senão Jesus Cristo crucificado, mas àqueles que estão apaixonados pela sapiência celeste será ¬ São Paulo nos ombros da personificação da virtude da concórdia, sob cujos pés jaz o vício da discórdia, representado provavelmente por Ário 30DIAS Nº 6 - 2011 69 Um comentário à frase de padre Luigi Giussani revelado o Verbo que está junto de Deus. [...] Em primeiro plano põe aqueles ‘que participam do Logos que existia no princípio, que estava junto de Deus, o Logos Deus’; depois aqueles ‘que conhecem apenas Jesus Cristo e Jesus Cristo crucificado, pensando que o Logos feito carne é todo o Logos; estes conhecem só o Cristo segundo a carne: e é a massa daqueles que são ditos crentes’” (p. 79-80). Nem quanto ao método. As verdades, diferentes quanto ao objeto, o são também quanto ao método de conhecimento: “Uns creem, os outros conhecem; os primeiros remetem a uma autoridade superior garantida pelos milagres e a sua fé é frágil; os segundos contemplam as verdades religiosas às quais aderem e a sua adesão é estável” (p. 81). Aliás, é possível até chegar a dizer que na tradição pública não é transmitida nenhuma verdade, mas apenas mentiras devotas: “Mas as verdades elementares que são ensinadas ao Povo dos simples são ao menos sempre verdades em sentido estrito? Orígenes afirma-o com muita frequência e desse ponto de vista se opõe aos gnósticos, mas encontramos também algumas páginas inquietantes em que o ensinamento elementar aparece como uma mentira salutar: Deus engana a alma para formá-la” (p. 95). Enfim, na relação subordinada entre verdades elementares e verdades mais elevadas, as primeiras acabam por resultar fábulas. Nas homilias sobre o profeta Jeremias, Orígenes compara a ação de Deus à educação que os adultos dão às crianças. Segundo Orígenes, “nós as enganamos com espantalhos que de início são necessários, mas cujo vazio elas reconhecem em seguida” (p. 99). 4. Roma, guardiã da fé Lebreton esclarece bem como Roma desde o início resistiu a essa contaminação da fé. Descreve a contraposição de Hipólito a Zeferino e depois a Calixto (da qual surgiu, no início do século III, o primeiro cisma na sé romana) co70 30DIAS Nº 6 - 2011 mo contraposição de uma fé culta a uma fé simples. Lebreton recorda como nos Philosophoumena Hipólito põe na boca de seus inimigos expressões que em suas intenções deveriam ser desqualificantes: “Zeferino repete: ‘Eu não conheço senão um Deus, Jesus Cristo, e, além dele, nenhum Deus gerado que sofreu’; e outras vezes: ‘Não foi o Pai que morreu, mas o Filho’. Essas passagens são confirmadas pelo conjunto do tratado: Hipólito é um teólogo, orgulhoso de sua ciência, grande leitor dos filósofos gregos, os quais denuncia como pais de todas as heresias [mesmo essa condenação inflexível da heresia a partir, não da simplicidade da tradição eclesial, mas da cultura – permitamnos observar – é muito instrutiva: será a mesma em Orígenes e em muitos outros que se desviarão da fé]. Apresenta-nos os seus adversários: Zeferino, um espírito limitado, Calixto, um intrigante, seus seguidores, inteligências vulgares e espíritos sórdidos” (p. 9). Ora, a essa contraposição cismática contra os legítimos bispos de Roma não esteve Orígenes alheio. Orígenes chegou a Roma, de fato, justamente na época em que Zeferino era bispo (199-217) e aderiu, parece, ao cisma de Hipólito. Foi provavelmente por isso que alguns anos depois, em 230, quando Orígenes for deposto por seu bispo de Alexandria do Egito, papa Ponciano reunirá em Roma prontamente um sínodo para aprovar essa decisão, condenando também a Orígenes. Coisa que não fizeram muitos outros bispos da Arábia, da Palestina, da Capadócia. Passam-se alguns anos e, perante um discípulo de Orígenes, Dionísio, que se tornara bispo em 247 na sé alexandrina, o então bispo de Roma (também chamado Dionísio) toma a palavra denunciando suas teses perigosas. Escreve Lebreton: “Diante dessas teses, a posição tomada por Dionísio de Roma e seu concílio é a posição tradicional da Igreja de Roma. [...] Aqui, como nos outros documentos romanos, o que encontramos é a expressão autêntica da fé: nenhuma especulação teológica, nenhuma sutile- A r q u i v o d e 3 0 D i a s - O u t u b ro d e 1 9 9 4 São Lourenço nos ombros da personificação da virtude da liberalidade, sob cujos pés jaz o vício da avareza, representado por Judas Nova vetera et za dialética, pouca erudição escriturística, mas a declaração categórica da fé professada pela Igreja. Dionísio de Roma, também pessoalmente, era homem de grande valor: Dionísio de Alexandria dá testemunho disso e São Basílio também lhe faz um grande elogio, mas aqui não é nem o erudito nem o teólogo que fala, é o Papa. Ele não se compraz nas especulações teológicas e pouco se preocupa com as dos outros. Fica claro que a sua argumentação não leva em conta distinções alexandrinas sutis sobre as três pessoas ou sobre o duplo estado do Logos. Ele só se preocupa com conclusões mais evidentes, quer tenham sido formuladas pelos próprios autores dessas doutrinas, quer lhe pareçam nascer espontaneamente; e, sendo que essas conclusões são um perigo para a fé, rejeita-as, e rejeita também a teologia da qual provêm. A carta de Dionísio de Alexandria, apesar das suas imprudências e do seu desleixo, estava certamente bem distante do ensinamento de Ário; mas a carta de Dionísio de Roma tem já o acento de Niceia: a mesma preocupação com a unidade divina, a mesma firmeza soberana e categórica na definição da fé. Essa barreira insuperável, contra a qual se quebrará sessenta anos mais tarde a heresia, é a que detém desde então uma teologia aventureira. Os fragmentos de Dionísio de Alexandria, como já observamos, têm um caráter bem diferente da carta de Dionísio de Roma: não encontramos nele um juiz da fé, mas um exegeta, e sobretudo um metafísico apaixonado por suas belas especulações. Ele se compraz delas ainda nessa Apologia destinada inteiramente a evidenciar a sua ortodoxia, e da qual conhecemos a maior parte dos fragmentos pela seleção respeitosa e cuidadosa feita por Santo Atanásio. Se, malgrado a solicitude do próprio escritor e de seu defensor, o seu pensamento nos parece muito menos firme e exato que o do bispo de Roma, concluiremos que sua especulação era para ele um guia menos seguro que aquele que era a fé comum para Dionísio de Roma” (p. 35-36). q ¬ 30DIAS Nº 6 - 2011 71 Aniversários “Uma gratidão que cresce de ano em ano” Entrevista com monsenhor Georg Ratzinger, que sessenta anos atrás foi ordenado sacerdote junto com seu irmão Joseph A família Ratzinger depois da primeira missa dos dois irmãos em 8 de julho de 1951 por Roberto Rotondo e Silvia Kritzenberger dia mais importante da minha vida”: assim Joseph Ratzinger sempre definiu o dia da sua ordenação sacerdotal, que ocorreu em 29 de junho de 1951. E, como todos sabem, naquele dia, junto com ele, na Catedral de Freising na Baviera, foi ordenado sacerdote também o seu irmão Georg. Por isso, “O 72 30DIAS Nº 6 - 2011 por ocasião do 60º aniversário de sacerdócio do Papa, pedimos a monsenhor Georg Ratzinger, testemunha excepcional, que nos conte suas recordações daquela manhã de verão de 1951. Partindo do jubileu festejado há pouco. Monsenhor Ratzinger, o que fica no seu coração de- pois destes festejamentos do 60º aniversário de sacerdócio? GEORG RATZINGER: Não escondo que inicialmente eu queria festejar de modo privado, sem participar de cerimônias solenes, porque ainda não me recuperei bem da minha operação no joelho e as cerimônias requerem uma certa BENTO XVI. Os sessenta anos de sacerdócio tranquilidade mental e física. Mas fico muito contente por ter festejado, porque houve momentos muito comovedores, como a belíssima celebração organizada na Catedral de Freising pelo Instituto Bento XVI, que organiza a publicação da opera omnia do Santo Padre. A catedral de Freising é o lugar onde eu e meu irmão fomos ordenados sacerdotes e sentia-se que a atmosfera era realmente familiar. Pela manhã houve a recitação das laudes e mais tarde, depois das saudações e alguns discursos, foi organizado um almoço com os altos prelados, alguns cardeais, os bispos auxiliares e, naturalmente, os velhos amigos de sempre. O segundo momento importante foi a missa na minha solene paróquia de São Quando nos vemos é sempre uma grande alegria. Em toda a nossa vida sempre nos reencontramos e naturalmente não queremos renunciar a isso agora na nossa velhice, na qual sentimos de modo particular este sentimento de pertença de um ao outro. O que o senhor pensou naquele 29 de junho de 1951? O Papa, ao recordar o dia de sua ordenação, disse: “Não vos chamo mais servos, mas amigos. Depois de sessenta anos do dia da minha ordenação sacerdotal ainda sinto ressoar dentro de mim essas palavras de Jesus, que o nosso grande arcebispo, o cardeal Faulhaber, dirigiu a nós, novos sacerdotes no dia da ordenação”... ção sacerdotal comporta uma particular amizade com Cristo, dado que confere um mandato especial. E doa a surpresa e a consciência de ver como o Senhor “interfere diretamente”, assim por dizer, na nossa vida humana. E em família, como foi vivido aquele dia? Foi uma experiência de alegria única. Na nossa vida familiar, que até aquele momento tinha sido a vida de uma normal família, deu-se um evento que naquele tempo era considerado um dom: o sacerdócio, algo que leva à eternidade, a uma outra esfera. Eu tinha três anos amais do que meu irmão, mas foi muito bonito compartilharmos juntos a ordenação e a primeira missa, mesmo se era apenas No dia 29 de junho de 1951, na Catedral de Freising, o cardeal Faulhaber Os irmãos Ratzinger na saída da Catedral ordena sacerdotes mais de quarenta seminaristas entre os quais Georg e de Freising no dia de sua ordenação sacerdotal Joseph Ratzinger João Batista: a igreja estava lotada e a atmosfera era solene. Enfim, o terceiro festejamento foi a missa na Basílica de São Pedro em Roma: havia um comovedor pensamento de que o nosso jubileu estava ligado à solenidade de recordação dos santos Pedro e Paulo, tão importantes para Roma e para a Igreja universal. Para o seu irmão deve ser uma alegria ter o senhor ao seu lado nestes dias... Pensei que era uma virada na minha vida, como na vida de todo o homem que se torna sacerdote, porque a ordenação sacerdotal dá ao homem uma nova qualidade de vida e torna-o um “encarregado” de Cristo, que deve levar o mistério e a palavra de Jesus Cristo ao mundo. Com o passar dos anos pude compreender o quando fossem verdadeiras as palavras do Evangelho de João que o cardeal Faulhaber dirigiu-nos: porque a ordena- consequência da guerra que tinha abalado os projetos de cada um de nós. Naqueles anos no seminário de Freising, com efeito, as diferenças de idade dos aspirantes sacerdotes eram grandes. Nos anos de seminário quais foram as pessoas que mais influenciaram na sua formação como sacer dotes e cristãos? Uma figura chave no “Domberg” de Freising foi o nosso rei- ¬ 30DIAS Nº 6 - 2011 73 Aniversários tor Michael Höck, que voltava depois de ter passado cinco anos no campo de concentração de Dachau. O seu caminho era o de um padre piedoso, devoto e comprometido. Tinha algo de paterno, bondoso, compreensivo, e foi considerado mais um pai do que um superior. A sua maior preocupação era ajudar cada um de nós a encontrar, naqueles tempos difíceis, a estrada que leva a uma boa meta. O Papa, durante o almoço com o senhor e os cardeais, ao relembrar aquele dia de 1951, sublinhou que na época o mundo era completamente diferente de hoje e que a Alemanha deveria ser material e moralmente reconstruída. Vocês, tornando-se sacerdotes, sentiam-se participantes desta reconstrução? Somos todos condicionados pela época que vivemos, compartilhamos com os homens da nossa época as dificuldades, as preocupações do nosso tempo, mas também as alegrias. Neste sentido, tivemos uma contribuição muito grande no trabalho de reconstrução. Mas também é verdade que não foi um processo unívoco, porque à medida que a economia crescia, e com esta a riqueza e o bemestar, foi introduzida também uma certa decadência moral e, sem que pudéssemos imaginar isso, outros elementos negativos acompanharam o processo de reconstrução. A Catedral de Freising na Baviera 74 30DIAS Nº 6 - 2011 O almoço oferecido a Bento XVI pelo Colégio cardinalício por ocasião do sexagésimo aniversário da ordenação sacerdotal, Sala Ducal, 1º de julho de 2011 Desde os anos de seminário, vocês sabiam que tomariam caminhos diferentes. O senhor a música, seu irmão o ensino teológico... Sim, o bom Deus fez-nos percorrer caminhos diferentes. Eu sempre pedia ao Senhor, se possível, poder trabalhar com a música sacra, poder cantar-Lhe as laudes através da música. E se agora penso na minha vida posso dizer que o Senhor atendeu as minhas orações de modo realmente maravilhoso. Permitiu-me trabalhar no coral da Catedral de São Pedro em Regensbur g, o Regensburger Domspatzen, que aprecio muito e que tem qualidades, talvez únicas no mundo católico. Na sua opinião, qual é a situação atual da música sacra na Igreja? A situação varia de lugar para lugar e de país para país. No que se refere à minha experiência, posso dizer que a Catedral de Regensburg tem uma longa tradição de cuidado particularmente do canto gregoriano e da polifonia vocal clássica, que foi bem conservada depois do Concílio, mas que também, de algum modo, teve seu progresso. A música sempre teve uma importância fundamental para a vida religiosa porque a palavra falada alcança apenas a ratio enquanto a música envolve todo o homem nas laudes a Deus. E mesmo se as modalidades possam variar, a música sacra terá sempre uma sua importância. Devemos garantir que a música seja preparada de modo a poder alcançar plenamente o efeito que lhe é próprio: o de levar os homens a Deus. Uma última pergunta: recordando aquele 29 de junho de sessenta anos atrás, o que permaneceu em seu irmão daquele jovem padre de 24 anos? Muito, porque lhe ficou a gratidão por ter recebido a graça de ser padre. Que é a minha mesma gratidão por ter recebido essa chamada. Aliás, espero que essa gratidão cresça de ano em ano. q ASSINATURAS COMO ASSINAR Enviar o formulário ao endereço do escritório de assinaturas escrito abaixo Destinação Período de assinatura 1 ano 2 anos Preço (€) Brasil, África 25,00 Itália 45,00 Europa 60,00 Resto do mundo 70,00 Brasil, África 40,00 Itália 80,00 Europa 110,00 Resto do mundo 125,00 é a revista mensal internacional mais informada sobre a vida da Igreja. Nas suas páginas estão presentes os acontecimentos políticos e eclesiásticos mais importantes comentados pelos protagonistas. Em cada número, reconstruções históricas, reportagens e serviços especiais de todo o mundo, eventos literários e artísticos, inéditos. 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