PARQUE INFANTIL E BRINCAR DE FAZ-DE
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PARQUE INFANTIL E BRINCAR DE FAZ-DE
PARQUE INFANTIL E BRINCAR DE FAZ-DE-CONTA: UMA PARCERIA RETRATADA NO COTIDIANO INFANTIL BELTRAME, Lisaura Maria [email protected] OLIVEIRA, Luciana de [email protected] Eixo Temático: Educação da Infância Agência Financiadora: não contou com financiamento Resumo Este trabalho apresenta parte de uma pesquisa realizada com professoras de Educação Infantil da Rede Municipal de Ensino de Chapecó-SC, e tem como finalidade refletir, propor discussão sobre o papel da brincadeira de faz-de-conta e do parque infantil como ações preferidas e presentes no cotidiano da criança. Na infância o brincar não é somente importante como necessário, sendo a principal atividade na vida da criança, fazendo parte do processo de aprendizagem e desenvolvimento (social, intelectual, afetivo e interpessoal) da criança. É no momento do faz-de-conta que a mesma expressa suas vivencias cotidianas e compreende o mundo a sua volta. Este texto primeiramente apresenta e resgata a história e criação dos primeiros parques infantis no Brasil, esclarecendo seu papel, a seguir faz uma abordagem sobre a importância do brincar de faz-de-conta procurando dar elos de presença desta no momento do parque infantil. E por último apresenta os resultados da pesquisa cujo foco foi o brincar de faz-de-conta e o momento do parque infantil. A metodologia utilizada nesta pesquisa foi a observação, entrevista com os professores de diferentes CEI´s, com questões relacionadas ao desenvolvimento da criança, parque infantil e a brincadeira do faz-de-conta. Em relação ao parque infantil constatou-se que é uma das ações preferidas pelas crianças, além de prazeroso traz benefícios riquíssimos, pois neste espaço a criança tem liberdade de escolha, desenvolve habilidades motoras, e amplia seu processo de desenvolvimento de relações sociais. É um espaço no qual a imaginação aflora, o faz-de-conta e a interação entre as crianças esta presente. O parque infantil e brincar de faz-de-conta formam uma parceria perfeita, no contexto da educação infantil. Palavras-Chaves: Prática educativa, Crianças, Parque Infantil e Brincar de faz-de-conta. A Prática Educativa A relação teoria e a prática pedagógica constituem na atualidade, um tema que induz a pensar em avanços metodológicos, oportunizando reflexão ação e transformação no processo educativo. Inúmeros estudos têm se ocupado do desafio de debruçar-se sobre os modos 4340 através dos quais a educação infantil vem dialogar sobre o brincar de faz-de-conta e o parque infantil neste contexto. Segundo Carvalho (2004) cabe à teoria educacional pensar sobre a educação, mas também subsidiar a prática, pois a relação teoria e prática é indissociável. O objetivo a que se propõe neste artigo é refletir e discutir sobre a prática no cotidiano educativo, na concepção dos professores e na visão das crianças em relação ao papel do parque infantil e brincar de faz-de-conta. Segundo Almeida (1990, p. 79) [...] brincar não é um ato ingênuo, indefinido, imprevisível, mas um ato histórico (tempo), cultural (valores), social (relações), psicológico (inteligente), afetivo e existencial (concreto) e acima de tudo político, pois, numa sociedade de classes, nenhuma ação é simplesmente neutra, sem consciência de seus propósitos. O reconhecimento da importancia do brincar e as discussões no âmbito da educação infantil tem sido presentes na sociedade atual. Neste sentido novos e importantes estudos estão surgindo nas diferentes especificidades infantis. O estudo enfoca o brincar de faz-deconta como atividade principal da criança e o parque infantil como ação constante no cotidiano da educação infantil. A partir disso, percebeu-se a importância de um estudo do brincar de faz-de-conta no momento do parque infantil. Desde os primórdios a brincadeira faz parte da vida das crianças. O faz-de-conta é uma atividade principal na vida da criança. Sobre isso, Leontiev (1988, p. 122) afirma [...] Chamamos atividade principal aquela em conexão com a qual ocorrem as mais importantes mudança no desenvolvimento psíquico da criança e dentro da qual se desenvolvem processos psíquicos que preparam o caminho da transição da criança para um novo e mais elevado nível de desenvolvimento. A afirmação deixa-nos claro o quanto o brincar é necessário na vida da criança, na construção de suas funções psicológicas superiores e para o processo de aprendizagem e desenvolvimento infantil. Como afirma Vygotsky (1988) o brincar de faz-de-conta é uma importante fonte de promoção da aprendizagem e desenvolvimento. Este momento possibilita a criança a atuar numa esfera cognitiva que depende de motivações internas. Utiliza materiais que podem representar uma realidade ausente, sendo capaz de imaginar, abstrair as características dos objetos reais, e se deter no resultado definido pela brincadeira. 4341 A criança na brincadeira assume um papel social, ao qual será protagonista, se transforma no pai, na mãe, na professora, enfim sempre transpondo uma relação entre real e imaginário, saindo por determinado momento do mundo real e entrando num mundo imaginário e vice-versa. O parque infantil é propício para a brincadeira de faz-de-conta, é nele que a criança fica livre para imaginar e criar, de forma lúdica, as mais diversas brincadeiras, expressando seus sentimentos, sua forma de ver o mundo. Toda a criança tem necessidade vital de se expressar, de colocar para fora o que ela pensa e sente. Através da atividade lúdica a criança coloca todo seu ser, a atividade é como espelho de sua personalidade. Assim, todos os seus desejos e necessidades, toda sua imaginação e fantasia, seus conflitos e tensões emocionais são manifestadas através do brinquedo. (SANTA CATARINA, 1985, p.05) No espaço do parque a criança amplia suas escolhas, seu repertório de ações, sente-se livre, autônoma, criativa, desenvolvem suas habilidades motoras, relações sociais, interativas, afetivas e interpessoais como a amizade, a solidariedade. No momento do parque infantil a criança procura demonstrar seus sentimentos, sua imaginação, transformando fatos de sua realidade em brincadeiras de faz-de-conta. A mesma fica livre para se expressar e representar suas vivências. O parque infantil: historicizando e discutindo seu papel O surgimento do parque infantil tem uma grande história, em 1935 surgiram os primeiros parques infantis na cidade de São Paulo. De acordo com Faria (1999), foi Mario de Andrade um dos criadores do parque infantil, com o objetivo de uma educação não escolar, para os filhos da classe operária que, enquanto seus pais tivessem trabalhando as crianças teriam um lugar garantido e apropriado para elas, com direito a infância, a brincar, cantar, pular, enfim, conviver com as crianças de sua idade garantindo o seu direito de brincar e estudar. Em 1935 foi criado o Serviço Municipal de Jogos e de Recreio para crianças, onde mais tarde passou a ser chamado de Serviço Municipal dos Parques Infantis (PIs). Na época foram uma prova de grande interesse em relação a educação extra-escolar. Eles não eram escolas e nem pré-escolas, como as já existentes. Tratava-se de um projeto para os alunos da escola que freqüentavam em período alternado, e também para aqueles em idade pré-escolar: 4342 [...] os outros que aos 12, 13 ou 15 anos não encontraram escola; e mais os que, egressos do curso primário ainda não puderam tomar rumo por falta de idade; ei-los todos formando um exercito imenso, os “chomeurs” da educação e os “sem recreação” porque lhes faltam os meios de brincarem como os de educarem. (FARIA, 1999, p.124) Os parques infantis criados por Mario Andrade podem ser considerados um dos pontos de origem para a criação da educação infantil. “O êxito do PIs foi uma coisa entusiasmante, a educação da criança de modo insensível, incutindo-lhe os sentimentos da camaradagem, da sociabilidade, da lealdade e da amizade por meio de atividades lúdicas”. (FARIA, 1999, p.127). De acordo com Faria (1999) as atividades desenvolvidas nesses locais garantiam um trabalho integrado em vários níveis: A criança, o jogo, a cultura, a educação e a saúde estavam sempre juntos, integrado ao Departamento de Cultura, ou seja, aos campos de atletismo, divertimentos públicos, bibliotecas, documentação social entre outros. Mais tarde através das observações e da experiência no parque infantil, foi-se conhecendo também a criança das famílias operárias e constatando suas carências, dando atenção também à saúde, à higiene e à alimentação dos seus usuários, sem descuidar dos outros aspectos educativos. Assim os primeiros instrutores para trabalhar nos PIs, foram contratados por um ano, para depois serem efetivados por meio de um concurso envolvendo provas e títulos. As exigências para os cargos revelaram a preocupação com a qualidade da educação esperada. Nos PIs, estavam integradas cultura-educação-saúde para crianças pequenas, e, portando, ele não era entendido como um programa apenas assistencial, mas também cultural. A cultura também era trabalhada com grande ênfase nesses espaços, Mario de Andrade baseava-se na idéia de que a criança é portadora de tradições culturais, por isso é fundamental conhecer a nacionalidade de suas famílias como mais um indicador dos elementos constitutivos da cultura brasileira, portanto, as instrutoras tinham grande insistência nesta questão, seja para conhecer os hábitos naturais das crianças, seja para ensina-lhes os costumes nacionais. Neste sentido Mario Andrade afirma que “Através das manifestações populares, folclóricas, artísticas e estéticas a infância e o operariado estavam presentes consumindo e produzindo cultura, abrasileirando o país.” (FARIA 1999, p.155). 4343 Para Mario Andrade a forma de instrumentalizar o jogo e as brincadeiras, retirando o aspecto gratuito do prazer pelo prazer, parecem não estarem presentes em suas preocupações. O lúdico estava presente nos PIs utilizando-se de danças, apresentações folclóricas e o artístico. Através das manifestações folclóricas as crianças estavam conhecendo vários tipos de regras de sociedades diferentes, momentos históricos, distintos, podendo, com isso, ter variadas experiências lúdicas entre as referidas extremidades: da mera obediência disciplinadora à pura fantasia ociosa. É relevante destacar que os aspectos da educação ministrados no parque infantil, pela sua originalidade em relação às outras propostas de educação infantil, as áreas abertas e o nacionalismo, ao lado da não separação educação cultura, mais saúde e higiene e do lúdico enquanto integrante da cultura dos povos, tanto a educação estética e a preocupação com o folclore como as raízes múltiplas do brasileiro caracterizam o parque infantil. O Jogo, enquanto atividade lúdica, ociosa, muitas vezes foi negligenciado por aqueles que, embora valorizando a recreação na educação primária e nos jardins da infância destacavam sua finalidade de facilitar a tarefa da escola primária [...] o parque infantil oferecia [...] a oportunidade de se expressarem artisticamente, brincarem, jogarem, enfim de continuarem crianças, complementando o aluno que a escola pretende modelar: um ser incompleto que precisa ser completado com os conhecimentos científicos de que o adulto dispõe, deixando de lado outros conhecimentos como aqueles produzidos pela própria criança.(FARIA, 1999, p. 155-161) O parque infantil aparece como sendo um centro de educação extra-escolar, tal como o Departamento Cultural, onde a ênfase do parque infantil estava no aspecto lúdico, nas brincadeiras, nos jogos tradicionais infantis e os objetos oficiais dessas escolas populares de saúde e alegria, pretendiam educação moral, higiênica e estética. As educadoras deveriam brincar com as crianças, ensiná-las a brincar e não lhes perturbar ou ameaçar a liberdade e a espontaneidade. O adulto educador tinha como função ser educado estudando a criança nos seus aspectos higiênicos, psicológicos e sociais. Fugindo das características da escola tradicional cheia de horários e normas a seguir, “[...] escola rápida – expressa: quatro horas de aula; recreio em quinze minutos escassos de intervalo para lanches, ‘é proibido correr’, ‘é proibido brincar’ é ‘proibido gritar’ é ‘proibido rir’, ‘é proibido ser alegre’, por que temos pressa.” (FARIA, 1999, p. 157). 4344 O brincar de faz-de-conta no contexto do parque infantil É no momento do parque infantil que a criança brinca livremente e manifesta seu imaginário por meio da brincadeira do faz-de-conta que ela mesma cria. Brincar no PI além se ser prazeroso traz inúmeros benefícios às crianças. “O jogo espontâneo infantil possui [...] dois aspectos bastante interessantes e simples de serem observados: o prazer e, ao mesmo tempo, a atitude de seriedade com que a criança se dedica à brincadeira.” (CRAIDY, 2001, p. 89). No PI a criança tem sua capacidade de escolha mais ampliada, podendo escolher os brinquedos que desejam por ser um ambiente aberto, a criança desenvolve suas habilidades motoras, melhora suas relações sociais, imagina e cria através do faz-de-conta, brincando de maneira livre e tento o mundo em suas mãos, ela interage com o meio, com outro, faz trocas de experiências, relata e representa o que vive e sua cultura. O faz-de-conta contribui para uma formação sólida da criança para sua vida em sociedade, para sua construção quando cidadão. No momento do parque que o diálogo, a linguagem e certas regras como aprender esperar sua vez e os cuidados com o corpo se sobressaem. Mesmo quando a criança brinca livremente no parque infantil, ela desenvolve novas habilidades e competências. Neste momento, o professor poderá observar a criança, nas suas relações com outros colegas, nas relações estabelecidas com os objetos, e ainda, nas descobertas e desafios que cada professor poderá conduzir e orientar a brincadeira, tornando-a mais atraente, desafiadora. (CRAIDY, 2001, p. 91) Na atividade lúdica, o que importa não é apenas o produto da atividade, o que dela resulta, mas a própria ação, o momento vivido. Possibilita a quem a vivencia, momentos de encontro consigo e com o outro, momentos de fantasia e de realidade, de ressignificação e percepção, momentos de autoconhecimento e conhecimento do outro, de cuidar de si e olhar para o outro, momentos de vida. Segundo Wajskop , é desde os primórdios da educação grego-romana, que utilizava o brinquedo na educação, associando a idéia de estudar ao prazer. Na antiguidade, utilizavam-se dados, assim como doces guloseimas em forma de letras e números, para o ensino das crianças. “A brincadeira é uma atividade humana na qual as crianças são introduzidas construindo-se em um modo de assimilar e recriar a experiência sócio-cultural dos adultos”. (1995, p. 35). Mais que um comportamento específico, a brincadeira define uma situação 4345 onde esse comportamento adquire uma nova significação. A brincadeira é uma mutação do sentido, da realidade, nele as coisas transformam-se em outras através do faz-de-conta “A brincadeira é uma forma de comportamento social, que se destaca da atividade do trabalho e do ritmo cotidiano da vida, reconstruindo-os para compreendê-los segundo uma lógica própria, circunscrito e organizado no tempo e no espaço”. (WAJSKOP, 1995, p. 36) A unidade fundamental da brincadeira de faz-de-conta é o papel que é assumido pelas crianças e que revela e possibilita o desenvolvimento das regras e da imaginação, através dos gestos e ações significativas, ainda, também constroem relações entre elas, se organizando e convivendo sozinhas. “É na brincadeira que a criança se comporta além do comportamento habitual de sua idade, além de seu comportamento diário. A criança vivencia uma experiência no brinquedo como se fosse maior do que é”. (VYGOTSKY, 1999, p. 95). Nós adultos temos nas brincadeiras com as crianças a oportunidade de conhecê-las e de nos alfabetizarmos novamente nas diversas linguagens infantis, resgatando as dimensões humanas que foram sendo esquecidas ou deixadas de lado em nós. Santa Catarina (1985) menciona que a atividade lúdica não se define, apenas, no que a criança está fazendo, e sim no que está sentindo em relação ao que faz naquele momento. É brincando que a criança convive com os medos, com as raivas, com as ansiedades e estabelece equilíbrio entre o mundo interior e externo, conseguindo com isso o ajustamento e, conseqüentemente, a solução para sua problemática. [...] a criança exprime seu estado afetivo do momento por palavras, comportamentos e atitudes, transferindo seu estado emocional ou sua afetividade para brinquedos, brincadeiras, desenhos, dramatizações, etc. Através delas as crianças se unem, trabalham juntas, convivendo em harmonia, estabelecendo a cooperação, reciprocidade e respeito mútuo. (SANTA CATARINA, 1985, p. 05) Nas suas brincadeiras de faz-de-conta a criança está, em todos os momentos, aprendendo a respeito da realidade, das características e leis do mundo em que vive e transforma a realidade de acordo com suas próprias necessidades, e constrói uma linguagem simbólica que é só dela. O pedagogo Freinet já nos afirmava que o brincar para a criança é como um trabalho, é um meio de expressar-se. Claparëde afirmava em relação ao brincar que nada mais sério do que uma criança brincando. A brincadeira permite a criança experimentar o que for que se 4346 encontre em sua realidade psíquica, pessoal, que é a base do sentido de identidade, que ainda está sendo construído por ela em sua infância. O ato de brincar só é válido quando vem da necessidade da criança, pois é ali que flui sua liberdade de criança, e ela utiliza-se de sua personalidade integralmente. É sendo criativa que ela descobre o seu eu. Klisys (2007) coloca que nas brincadeiras de faz-de-conta, o jogo simbólico é um dos pontos essenciais para o desenvolvimento da criança, onde a mesma desenvolve a capacidade de representar e de simbolizar. Uma caneta é um objeto que serve para escrever, mas nas mãos de uma criança pode virar um termômetro, cigarro, pente, lixa, entre outros. A vivencia lúdica sem dúvida é a essência para o desenvolvimento criativo. O faz-de-conta é apostar que é possível ter uma solução criativa para se ter, ser, viver o que se quer. O brincar caracteriza-se como uma mescla entre as apropriações culturais e a possibilidade de expressão da criança, resultado de sua forma particular de pensar e interagir com o mundo. Podemos afirmar que para as crianças desenvolver seu processo criativo, é imprescindível que haja liberdade, riqueza e diversidade nas experiências que lhe são oferecidas nas instituições, seja elas mais voltadas as brincadeiras ou as aprendizagens que ocorrem por meio de uma intervenção direta. Brincar funciona como um cenário no qual as crianças tornam-se capazes não só de imitar a vida como também de transformá-la. No ato de brincar, os signos, os gestos, os objetos e os espaços valem e significam outra coisa daquilo que apresentam ser. Ao brincar as crianças recriam e repensam os acontecimentos que lhe deram origem, sabendo que estão brincando. [...] torna-se autoras de seus papéis, escolhendo, elaborando e colocando em prática suas fantasias e conhecimentos, sem a intervenção direta do adulto, podendo pensar e solucionar problemas livre das pressões situadas da realidade imediata. (BRASIL, 1998, p.22-23) As crianças utilizam-se da linguagem do faz-de-conta e enriquecem sua identidade, por que podem experimentar outras formas de ser e pensar, ampliando suas concepções sobre as coisas e as pessoas ao desempenhar vários papéis sociais ou personagens. Na brincadeira, vivenciam concretamente a elaboração e negociação de regras de convivência, assim como a elaboração de um sistema de representação dos diversos sentimentos, das emoções e construções humanas. Como nos diz Vygotsky (1999) através do brincar a criança atinge uma definição funcional de conceitos e objetos, e as palavras passam a se tornar parte de algo concreto. 4347 A motivação da brincadeira é sempre individual e depende dos recursos emocionais de cada criança, que são compartilhados em situações de interação social. Por meio da repetição de algumas ações imaginárias que são baseadas nas polaridades presença/ ausência, bom/mau, prazer/desprazer, dentro/fora, feio/bonito, entre outros as crianças também podem elaborar e internalizar suas emoções e sentimentos, desenvolvendo um sentido próprio de moral e justiça. Apesar de saber que a criança nunca brinca por brincar, mesmo que aparentemente, aos nossos olhos de adultos, isso pareça acontecer, podemos nos questionar sobre o papel da intervenção do adulto nesse momento é a interação que se estabelece. E ainda, se é necessário apenas deixar “brincar por brincar” no espaço escolar, qual a prioridade da escola, se é que esta deva ter uma prioridade nas múltiplas modalidades da brincadeira. (FANTIN, 2000, p.115) Wajskop (1995) a partir dos estudos de Vygotsy (1999) afirma que uma das funções básicas do brincar de faz-de-conta é permitir que a criança aprenda a elaborar/ resolver situações que vivencia no seu dia-a-dia. Mas para isso a criança utilizará algumas capacidades, tais quais as de observação, imitação, imaginação e a de interação, pois aprende a lidar com o limite e para tanto os jogos com regras são fundamentais. As crianças evoluem por intermédio de suas próprias brincadeiras e das intervenções das brincadeiras por outras crianças e adultos, deste modo, elas desenvolvem a linguagem e a narrativa e nesse processo vão adquirindo uma melhor compreensão de si próprias e do outro, pela contraposição com coisas e pessoas que fazem parte do seu meio. Toda criança brinca porque gosta. Para as que ainda não falam, brincar é uma forma de expressar o que estão sentindo, suas experiências e vivencias interiores. Brincar para a criança é tão vital quanto comer e dormir. A infância é a idade das brincadeiras. Por meio delas, as crianças satisfazem grande parte de seus desejos e interesses particulares. O aprendizado da brincadeira, pela criança, propicia a liberação de energias, a expansão da criatividade, fortalece a sociabilidade e estimula a liberdade do desempenho. (CÓRIA-SABINI e LUCENA, 2004, p. 27) No espaço das brincadeiras o uso de certos brinquedos permite, ao mesmo tempo, manipular os códigos culturais e sociais, projetar ou exprimir, por meio de comportamentos e dos discursos que os acompanham, uma relação particular com esse código. (FANTIN, 2000, p. 111). Quando a criança brinca, utilizando materiais, aprende o que pode fazer e como 4348 controlar as coisas em torno dela. Quando a criança disponibiliza de espaços, brinquedos e momentos para brincar livre ela está em um momento próprio onde ela possui um domínio de tudo, mas Fantin (2000) considera igualmente importante organizar essas condições para que o brincar aconteça, provocando algumas situações que transformem o brincar livremente em algo “mais rico”. Sendo o brincar e o parque infantil um rico meio de aprendizagens, descobertas, de desenvolvimento da interação social e da afetividade entre as crianças faz-se necessário a mediação do professor enriquecendo e oportunizando as crianças o acesso ao conhecimento, novas descobertas do mundo físico e social, ampliando assim novas zonas de desenvolvimento real e propulsando o processo de aprendizagem e desenvolvimento infantil. Cabe ao professor mediar a brincadeira da criança, seja ela livre ou dirigida, pois o parque infantil é um espaço educativo tão importante quanto à sala de aula e pensar em atividades para ele é fundamental. O faz-de-conta é capaz de desenvolver atitudes na criança que serão usadas como base, mesmo depois de adulta. O professor deve organizar suas atividades selecionando aquelas mais significativas para seus alunos, criando situações para que essas atividades sejam realmente proveitosas, para que o objetivo desejado seja alcançado. A brincadeira livre é importante para a criança, mas nem por isso o professor deve deixar de lado a construção de um planejamento para diferenciar um pouco a ida até o PI, as brincadeiras que ocorrem nesse espaço, os brinquedos que são utilizados, fazendo com que o conhecimento desenvolvido nesse ambiente se amplie e não se restrinja sempre à mesma brincadeira. Mais brincadeira significa mais aprendizagem, mais trocas de experiências entre as crianças e novas vivencias para a mesma. O PI é um lugar livre, então as brincadeiras pensadas para esse momento precisam ser para todos os dias e nem para todos os momentos, mas sim para diferenciar o dia-a-dia do parque. Resultados da pesquisa A partir da pesquisa realizada através das observações constatou-se que o parque infantil é um ambiente que oferece momentos propícios para a brincadeira do faz-de-conta, para as manifestações lúdicas. É um momento livre em que a criança expressa seu jogo simbólico particular, pois brincar é uma atividade dotada de uma significação social. O momento do parque infantil é tido como percussor do lúdico, do imaginário e da liberdade de 4349 escolha, é ali que são imitados fatos da realidade, desejos, conhecimentos e vivências das crianças, pelas próprias crianças, é na imitação que a criança se desenvolve socialmente e fisicamente. Constatou-se na pesquisa que o momento do parque é uma das ações mais preferidas das crianças. Observamos também que brincam com os brinquedos do parque, como também de faz-de-conta. Analisando a brincadeira das crianças no PI, percebeu-se que as mais presentes são as que fazem parte da representação, da imitação do seu dia-a-dia, do que elas presenciam em casa com seus pais em seu meio cultural, tais como brincadeira de casinha, fazer comidinha, papai e filhos, imitam o pica-pau, o trabalho dos pais, tomam chimarrão, brincadeiras que representam o seu próprio cotidiano, programas que assistem na televisão, e/ou relacionadas as profissões dos pais ou responsáveis. Enquanto brinca de faz-de-conta, o consciente da criança está reproduzindo sua realidade, tudo o que ela tem como princípios, desenvolvidos até então em sua vida como sua cultura, modo de viver, de se alimentar, sua rotina diária. Se em seu lar ela vivencia momentos em que sua mãe, tia ou avó lava, passa, faz o serviço doméstico ela representará isso, a mulher trabalhando em casa, conforme sua realidade será sua brincadeira. As experiências que cada criança vivencia são essenciais para seu desenvolvimento e é no momento da brincadeira de faz-de-conta que todos esses sentimentos são expressos, a criança se sente maior do que é se imagina no mundo adulto, incorpora-se na vida cotidiana das pessoas com quem convive. Percebeu-se que a maioria das educadoras têm o faz-de-conta como essencial para o desenvolvimento da criança utilizando o parque infantil com prática constante, mas não conseguem fazer a diferença em relação ao seu papel de mediador junto as crianças, interferindo apenas em momentos de conflitos ou quando solicitadas pelas crianças. Utilizam quando sobra tempo, sem acontecer um planejamento pensado e estruturado. Parque infantil e brincar aparecem como uma prática espontânea, momento livre apenas. Em alguns momentos observou-se a ausência do educador no parque deixando as crianças com as auxiliares para realizar outras ações necessárias como organizar a sala de aula e planejar. A educação infantil tem suas bases voltadas para o lúdico, o faz-de-conta, o imaginário da criança, então o Centro de Educação Infantil, precisa voltar-se para o momento do PI, já que o mesmo é um lugar onde as crianças estão em constante brincadeira, utilizando de todas as artimanhas. 4350 As atividades lúdicas, planejadas, bem direcionadas e com objetivos claros, são um importante meio de educação, assim como o parque infantil neste contexto. Promovem a sociabilização e integração entre os elementos do grupo. O PI ainda disponibiliza uma porção de conteúdos para o uso dos professores, trabalha diversas linguagens, é interdisciplinar, o olhar do professor deve ser foco nesse momento, pois ele disponibiliza descobrir fatos da realidade, perceber como a criança lida com situações de seu cotidiano, assim é possível ver quais as necessidades da criança. Através da observação o professor detecta os conteúdos e as dificuldades das crianças, podendo extrair idéias para trabalhar também em sala partindo da realidade da criança e sua real necessidade percebida e manifestada no parque. Observamos que no momento do parque, nem sempre tem a mediação dos professores, pois os mesmos geralmente interferem apenas nos momentos de conflito entre as crianças usando o parque para a criança brincar livre. As representações das crianças através do faz-deconta, demonstradas no parque, não são utilizadas pelos professores no planejamento das aulas, nem observadas para uma posterior análise, embora saibam o quanto é importante para o desenvolvimento da criança. Brincar no parque requer regras e atitudes do professor e crianças. O professor precisa saber como intervir em situações de conflito ou de perigo. Considerações finais Salienta-se a necessidade de reflexão e discussões à respeito de como utilizar e planejar o faz-de-conta e o momento do parque infantil na ação educativa cotidiana com as crianças, além da urgente atenção em relação ao papel do educador como mediador nesse processo, ou seja, o momento do parque infantil e do brincar de faz-de-conta devem ser tratados como momento sério, de riquíssimas aprendizagens e não apenas como passatempo ou divertimento da criança. No espaço do parque a criança tem uma oportunidade de escolha ampliada, podendo escolher com autonomia e liberdade qual brinquedo quer, ou ação a desenvolver. O espaço é rico, no qual a imaginação, o faz-de-conta aflora, por isso deve ser revisto, refletido e aproveitado como ato educativo. Pode ser mais uma ação pedagógica do professor a ser explorado, um momento significativo de aprendizagem, a ser planejado, pensado e explorado. REFERÊNCIAS 4351 ALMEIDA, Paulo Nunes de. 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