Introdução - Redireito

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Introdução - Redireito
IGUALDADE EDUCACIONAL DOS DEFICIENTES
ÍRIS STEINER CORSO1
MANUELA PÓLVORA CRUZ2
NATÁLIA MARIA REIS OLIVEIRA FURTADO3
RESUMO: Objetiva analisar os princípios que envolvem os direitos da pessoa com
deficiência em âmbito educacional e conscientizar a sociedade do seu papel na busca da
inclusão social. Dessa forma, disserta acerca dos valores constitucionais, faz um breve
panorama das legislações internacional e nacional, caracteriza a escola e o desafio da
inclusão. Para tanto, realiza uma revisão bibliográfica jurídico-factual. Conclui que a inclusão
dos deficientes deve ser completa, de forma a efetivar o direito à igualdade e dignidade.
Palavras-chave: inclusão; direito à educação; isonomia.
Introdução
As sociedades modernas precisam ter a consciência cada vez mais clara da
importância da educação como fator de desenvolvimento. A educação é o alicerce
fundamental para o desenvolvimento de uma nação. Os países mais desenvolvidos, com
progressos em múltiplas áreas, possuem os sistemas de acesso mais igualitários. Diante dessa
perspectiva, discutiremos sobre as pessoas com necessidades especiais e seu direito à
educação. É imprescindível que os deficientes, como seres humanos considerados em sua
dignidade e cidadania, tenham acesso aos ambientes escolares. A escolha do tema adveio do
interesse em se posicionar diante de uma questão tão importante e vilipendiada na
contemporaneidade. Objetivamos contribuir para construção de bases teóricas capazes de
1
Acadêmica do curso de Direito da Universidade Estadual da Santa Cruz, membro do CEPECH. E-mail:
[email protected]
2
Acadêmica do curso de Direito da Universidade Estadual da Santa Cruz, membro do CEPECH. E-mail:
[email protected]
3
Acadêmica do curso de Direito da Faculdade de Ilhéus, Doutora em Educação pela Universidade Federal da
Bahia, Profa do Departamento de Filosofia e Ciências Humanas – UESC- membros do CEPECH - E-mail:
[email protected]
1
subsidiar uma reflexão responsável acerca da questão do acesso e permanência do deficiente
no espaço escolar. Visamos outrossim subsidiar os cidadãos na luta pelos dos deficientes.
A questão em tela vem sendo tratada por diversos estudiosos, que publicaram
livros e artigos sobre o tema. Em relação ao tema questiona-se: qual será o melhor modelo
educacional a ser adotado nas escolas para se garantir o mais alto padrão de inclusão? Isso
posto, procuraremos, ao longo do estudo, subsidiados por um trabalho de pesquisa
bibliográfica, apresentar os instrumentos de tutela permeados pelas posições doutrinárias de
educadores e juristas.
Constatamos que os deficientes já conquistaram um grande espaço na legislação
positiva, entretanto, ainda há um longo processo para que se consiga concretizar na prática os
direitos consagrados. Um Estado, realmente democrático, precisa garantir que entre os seus
cidadãos haja igualdade e convivência sem preconceitos.
1 Da pessoa com deficiência
A sociedade é formada por uma diversidade de indivíduos que apresentam
características particulares e se diferenciam em cor, sexo, cultura, idade, crença ou grau de
desenvolvimento. Dentre a multiplicidade de indivíduos que compõem essa comunidade, há
indivíduos que possuem “necessidades especiais”. Relatórios internacionais, coordenados pela
Organização das Nações Unidas (ONU), estimam que cerca de dez por cento da população
mundial é constituída por indivíduos que possuem alguma deficiência. Entretanto, apesar do
elevado número, a visibilidade dessas pessoas na comunidade e a concretização dos seus
direitos ainda são temas pouco desenvolvidos.
A palavra deficiência é trazida, na maioria das vezes, com uma conotação
negativa e relacionada às ideias de insuficiência, ausência ou perda de algo importante
(ATIQUE; VELTRONI, 2007). Em uma visão preconceituosa, a sociedade esquece-se de
considerar os deficientes como seres humanos e, portanto, ignoram a sua dignidade e
humanidade.
O ordenamento jurídico brasileiro, através da Lei Federal n. 10.098/2000,
conceituou que a “pessoa portadora de deficiência ou mobilidade reduzida é aquela que
temporária ou permanentemente tem limitada sua capacidade de relacionar-se com o meio e
de utilizá-lo” (BRASIL apud ATIQUE; VELTRONI, 2007, online). Ressalta-se a dificuldade
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mais acentuada que o excepcional possui de se integrar ou se relacionar com a sociedade. Ele
apresenta uma capacidade de desempenho reduzida, em relação aos demais indivíduos, para a
prática de atividades diárias, em virtude de um déficit na sua estrutura psicológica, fisiológica
ou anatômica.
É importante destacar que as deficiências não podem ser medidas e definidas,
unicamente, por meio de avaliações e aparatos educacionais, médicos e psicológicos.
Considera-se, ainda, a condição pessoal do indivíduo, resultado da interação entre as
características próprias do seu ser e o ambiente no qual está inserida. Essa nova ideia adveio
da Organização Mundial da Saúde (OMS), com o objetivo de reforçar os princípios inclusivos
de transformação dos meios de convívio das pessoas, em geral, para que possam adequar-se
às peculiaridades permanentes e circunstanciais dos seres humanos (BRASIL, 2004).
Segundo Ferreira (2001), todo deficiente aspira e contempla: ser cidadão com
dignidade. A cidadania corresponde ao resultado da integração social, em um processo de
adquirir direitos e deveres positivados nas leis e costumes locais. A ela soma-se a democracia
e a solidariedade. Para o portador de deficiência concretizar a sua dignidade, o princípio da
liberdade deve estar consolidado no intelecto de cada ser humano.
2 Direito à Educação
A modernidade precisa tornar evidente a importância da educação como fator de
desenvolvimento, acompanhando a progressiva complexidade das relações entre seus
membros. Sendo ela um alicerce fundamental, a valorização do sistema educacional garante
maiores chances de progresso acadêmico-científico e de crescimento econômico (ATIQUE;
VELTRONI, 2007).
A educação é um direito humano fundamental e indisponível. Mais do que um dos
direitos humanos, é o medular deste, pois constitui a fonte de humanização do homem,
através dela e com fulcro em seus frutos é que são promovidos os demais direitos inerentes ao
homem. Destarte, todos os indivíduos devem ter acesso à educação. Além disso, é também
uma obrigação quando se tratar da instrução elementar, isto é, do Ensino Fundamental.
Segundo Fávero (2004) a escola é a instituição particular ou pública onde se
ministra, sistematicamente, o ensino coletivo. A escola estabelece-se como o local adequado e
privilegiado para se edificar o ensino educacional, utilizando como critérios as finalidades
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estipuladas pela Constituição. As instituições de ensino são os locais mais propícios para que
haja a inserção das crianças e adolescentes de forma geral, em especial dos que possuem
deficiência, já que nesse ambiente eles tem a possibilidade de desenvolver seu intelecto,
habilidades e formas de relacionamento.
A segregação social vai de encontro com os dispositivos constitucionais que, ao
propor como fim da educação o aperfeiçoamento da cidadania e o pleno desenvolvimento
humano, concomitantemente pressupõem uma sala de aula heterogênea. A diversidade no
ambiente escolar é, pois, a alternativa eficaz na construção da cidadania e de uma educação
voltada para os direitos humanos, na medida em que apenas ela reproduz a sociedade
composta por pessoas com e sem deficiência.
Verifica-se a urgência para que a escola comum se adapte às diferenças e possa
gozar dos benefícios em acolher a todos em suas salas de aula. Ainda que alguns alunos
necessitem de atendimento especializado, isso não denota restrição do aluno com deficiência
à convivência com os demais educandos. Esse atendimento deve ser oferecido,
preferencialmente, na própria rede de ensino ou em outra instituição especializada, em turno
oposto ao do ensino comum. Objetiva-se, assim, que o atendimento, que é uma garantia
constitucional (art. 208, III), se configure como um subsídio ao aluno deficiente, e não o
subtraía o direito de aprender as matérias de ensino regular no mesmo momento em que os
alunos sem deficiência também o fazem. O atendimento especializado destina-se a atender às
especificidades dos alunos com deficiência, abrangendo principalmente instrumentos
necessários à eliminação das barreiras (MANTOAN, 2004).
As escolas especiais, portanto, não podem suprir toda a demanda diária dos alunos
com deficiência, visto que, tal configuração privaria tais pessoas da convivência com os
alunos que não possuem limitações motoras, sensoriais ou mentais. Por outro lado, se torna
inviável que as escolas abram suas portas para todos e, ao mesmo tempo, não realizem
nenhum aperfeiçoamento pedagógico com escopo de garantir a inserção dos alunos com
necessidades especiais, bem como lhes proporcionar qualidade de ensino. Sendo assim,
propõe-se a revolução inclusiva como uma saída para esse dilema, pois abarca em sua
execução os princípios postulados pela Revolução Francesa - liberdade, igualdade e
fraternidade.
Segundo Mantoan (2004), para a consolidação da escola inclusiva aduz ser
premente a redefinição da educação, estando esta voltada à cidadania global, plena e disposta
a reconhecer as diferenças entre as pessoas. A fixidez organizacional dos serviços escolares é
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um grande obstáculo a ser vencido nesse contexto. O aluno abstrato justifica a maneira
excludente com que as instituições de ensino abarcam as diferenças. Acaba-se por
marginalizar os alunos que fogem desse padrão. Justamente por isso, a divulgação de novas
práticas pedagógicas, as experiências de sucesso e os saberes adquiridos em estudos
desenvolvidos no cotidiano das nossas escolas podem ajudar no processo.
3 Inclusão vs. Integração: a valorização do sistema inclusivo
Os vocábulos “integração” e “inclusão”, conquanto tenham significados
próximos, são empregados para expressar situações de inserção diversa e se fundamentam em
posicionamentos teórico-metodológicos divergentes. A conquista dos excepcionais, em ter
acesso ao ensino na rede regular, é recente no contexto mundial. No início dessa luta, a
“integração” era vista como o meio mais eficiente de garantir a igualdade de todos os
educandos. Atualmente, defende-se o processo de “inclusão” em substituição ao anterior.
No modelo das instituições que adotam a integração, o acesso dos discentes à
classe comum é condicionada por um critério de escolha. A integração propõe que o
deficiente se adapte às condições oferecidas pela escola, ao invés de transferir à sociedade o
papel de criar condições para evitar a exclusão. Devido a isso, fomenta a permanência dos
excepcionais em escolas segregadas e classes especiais.
Na educação inclusiva, por sua vez, segue-se uma tendência mais democrática e
há uma verdadeira revolução (FÁVERO, 2004). Por revolução, entendem-se grandes
transformações sociais e políticas aptas a criarem novas relações de poder e autoridade
(BLACKBURN apud FÁVERO, 2004). Dessa forma, a inclusão implica mudanças
significativas nos ambientes de ensino, rompendo com o antigo paradigma educacional.
A inclusão propõe o reconhecimento e a valorização da diversidade como
condição humana que beneficia a aprendizagem (PRIETO, 2005). O “novo paradigma”
apresentado pela educação inclusiva exige uma ruptura com o clássico modelo sistemático
para se adotar uma pedagogia ativa e dialética. Em contraste com a visão unidirecional,
individualizada e hierárquica do saber, há uma busca pela valorização das diversidades. A
inclusão propõe o respeito aos diferentes ritmos e condições pessoais, para que haja a
assimilação da matéria. O importante é que as instituições de ensino ofereçam oportunidades
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para que os deficientes possam ingressar nas salas de aula, permanecer naquele meio e por
fim, alcançar o almejado progresso.
Uma educação de qualidade para todos implica também em mudanças relativas à
administração e aos papéis dos membros da organização escolar. Gestores precisam mudar
suas ações para que possam orientar toda a comunidade escolar, em especial os professores.
Os docentes têm a obrigação de se especializar para conseguir atender a esses alunos. Eles
devem nutrir uma elevada expectativa pela aprendizagem do discente e propiciar
oportunidades para que o aluno aprenda a partir do que sabe e chegar até onde for capaz de
progredir (BRASIL, 2004).
A preferência legislativa pelo ensino dos portadores de necessidades especiais na
rede regular de ensino anseia fortalecer o papel da escola como o ambiente mais propício ao
relacionamento dos alunos com seus pares e o incentivo do seu desenvolvimento cognitivo,
motor e afetivo (BRASIL, 2004). As classes especiais, portanto, contrariam tal proposta, que
defende apenas atendimentos especializados como um meio complementar à Educação Básica
e Superior.
A inclusão segue a máxima “tratar igualmente os iguais e desigualmente, os
desiguais”. A desigualdade de tratamento é uma maneira de conseguir que a igualdade seja
aclamada entre os indivíduos. Dessa forma, nas propostas inclusivas, há uma busca por uma
educação plural, democrática e transgressora (MANTOAN apud SILVEIRA; DRAGO,
2010). A mudança parte da escola e dos sujeitos que fazem parte desse sistema.
4 Marcos Legais
Há milênios, a história ilumina que os direitos humanos se manifestam na vida
real de forma desigual para grupos sociais diferentes. É importante destacar que a ação de
movimentos sociais diversos já eliminou ou minimizou inúmeras barreiras para promover e
ampliar os direitos humanos de grupos sociais vulneráveis. Entretanto, ainda persiste a
desigualdade traduzida, por exemplo, na falta de oportunidades de acesso à educação de
qualidade (FERREIRA, 2001). A discriminação contra grupos em condição social de
subalternidade são tão frequentes que, historicamente, se tornou imprescindível a publicação
de documentos legais que tratam do tema.
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No Brasil, nas décadas de 60 e 70, vão sendo estruturadas propostas de
atendimento educacional para os excepcionais com a pretensão de que elas pudessem ter
direitos iguais aos demais. Movimentos coletivos de e para pessoas com necessidades
especiais reivindicavam seu direito a ter acesso aos bens e serviços sociais disponíveis para os
demais segmentos da sociedade (PRIETO, 2005).
A condição de “invisibilidade” dos excepcionais no âmbito da comunidade trouxe
a necessidade da positivação de normas que elevem o deficiente à condição de ser humano.
Dessa forma, os documentos nacionais e internacionais delinearam diretrizes e políticas
públicas a serem seguidas pelo Estado.
4.1 Legislações Internacionais
A violação dos direitos que condizem aos deficientes tornou-se tão explícita que o
tema passou a ser objeto de discussão mundialmente. Os primeiros movimentos de
atendimento aos excepcionais se desenvolveram na Europa em 1620, com a edição da obra
“Redação das letras e arte de ensinar os mudos a falar” (MAZZOTA apud SILVEIRA;
DRAGO, 2010).
Na década de 90, a ONU trouxe deliberações em que as crianças foram tema
principal. A Convenção dos Direitos da Criança realizada em 1989 consolidou mecanismos
legais que protegem e garantem bem-estar às crianças, tendo alguns dispositivos tratando da
inclusão. Destacamos o artigo 23, que analisa especificamente questões relativas aos direitos
de crianças e jovens com deficiência.
Continuando as deliberações sobre a matéria, em 1994, ocorreu a Declaração de
Salamanca, feita pela Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura
(UNESCO), que teve papel chave na implementação de políticas públicas e ações para
assegurar os direitos à educação dessas pessoas. A Declaração defendeu a escola inclusiva e
ratificou a tese de que as escolas e comunidades devem, então, estar preparadas para trabalhar
com a diversidade humana.
Em 2008, a Convenção dos Direitos da Pessoa com Deficiência, da ONU,
estabeleceu um documento que trouxe como princípios gerais o respeito à dignidade,
autonomia individual, liberdade de escolha, inclusão na sociedade, aceitação das diferenças,
igualdade de oportunidades e o respeito pelas suas capacidades.
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4.2 Legislações Nacionais
No Brasil, segundo o Censo Demográfico de 2000, do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), 14,5% da população nacional apresenta algum tipo de
incapacidade ou deficiência (apud FERREIRA, 2013). Diante desse percentual, é
indispensável que se consolidem instrumentos legais para dissertar sobre os portadores de
necessidades especiais. As experiências brasileiras no tema foram inspiradas nos exemplos
europeus e norte americano. O primeiro órgão responsável pela política da educação especial
foi o Centro Nacional de Educação Especial (CENESP) ligado ao Ministério da Educação
(MEC). O CENESP veio se consolidando nos anos 90, principalmente após a Declaração de
Salamanca (SILVEIRA; DRAGO, 2010).
Através da Emenda n. 1 à Constituição de 1967 surge, de forma inicial, a vaga
referência à educação dos excepcionais. Com o passar do tempo, há progresso, mas o avanço
mais relevante se concretiza com a Constituição de 1988, que instituiu a proteção ao trabalho,
a educação e ao acesso aos logradouros públicos e ratificou que os princípios da igualdade,
cidadania e dignidade humana eram para todos os homens, independente das suas
características (FERREIRA, 2001). Na Constituição anterior, a Educação Especial era matéria
tratada no âmbito da assistência e não, da educação geral.
A nossa Lei Maior, quando estabelece como objetivos gerais da nação construir
uma sociedade livre, justa e solidária e promover o bem de todos, está impondo o dever da
República de promover ações contra a exclusão (ATIQUE; VELTRONI, 2007). A
Constituição consolida direitos individuais, coletivos e sociais que são inerentes a todos,
independentemente de ser ou não portador de deficiência.
De forma mais específica o art. 23, inciso II, da Constituição Federal (1988)
atribui como competência dos entes federados cuidar da saúde, da assistência pública e da
proteção dos excepcionais. Com relação à educação, há uma forma mais detalhada dessa
matéria no artigo 205, que preceitua ser a educação um direito de todos e um dever do Estado
e da família, devendo ser promovida com a colaboração da sociedade. Bem como, estabelece
os fins da educação nacional, que são: pleno desenvolvimento do homem, seu preparo para o
exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Para que o ensino atenda aos valores consagrados pela nação brasileira, ele se
pauta em determinados princípios, delineados pelo artigo 206. Dente eles, destacamos a
igualdade de condições para o ingresso e permanência na escola e a necessidade de um padrão
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de qualidade nas instituições. Nos artigos seguintes, a Constituição incumbe o Estado realizar
atendimento educacional especializado aos excepcionais, preferencialmente na rede regular de
ensino. A Carta de 1988 inovou ao substituir a Educação Especial pelo atendimento
educacional especializado. A proposta de inseri-los na rede regular de ensino caracteriza a
intenção governamental em promover a inclusão.
Em prol da defesa dos deficientes, foram surgindo outras leis infraconstitucionais
para esclarecem e especificarem seus direitos. Primeiramente, merece atenção a Lei n.
7.853/89 que garantiu apoio aos deficientes, em especial com relação a sua integração social e
a tutela jurisdicional sobre os direitos coletivos ou difusos. Houve no documento a busca por
assegurar o pleno exercício dos direitos básicos, sendo um deles a educação. Essa lei
restaurou a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência,
órgão responsável pela coordenação das ações governamentais relacionadas aos deficientes.
O grande marco para a educação brasileira veio, em 1996, com a Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei n. 9.394. A LDB reforçou a finalidade máxima da
educação que é formar cidadãos independentes. Ampliou a abrangência do Texto Supremo ao
garantir o acesso de todos ao Ensino Superior. Segue as ideias constitucionais no que tange à
educação dos deficientes.
A Lei n. 9.394/96 inova ao trazer um capítulo específico relativo aos excepcionais
que contempla os artigos 58, 59 e 60. O capítulo V denominado “Da Educação Especial”
informa em seu artigo 58, parágrafo 1º, que “haverá, quando necessário, serviços de apoio
especializado, na escola regular, para atender às peculiaridades da clientela de educação
especial” (BRASIL apud ATIQUE; VELTRONI, 2007, online).
Em 1999, destaca-se a “Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as
Formas de Discriminação contra a Pessoa Portadora de Deficiência”, celebrada na Guatemala.
O Brasil é signatário desse documento desde 2001, o qual esclarece a impossibilidade de
tratamento diferente com base na deficiência. A discriminação é vista como qualquer forma
de diferenciação, exclusão ou restrição consequente da deficiência, que tenha por efeito ou
intuito anular o reconhecimento dos direitos e liberdades fundamentais (BRASIL, 2004). O
texto da Convenção esclarece a necessidade de um tratamento desigual para no fim se chegar
a tão pretendida igualdade.
Apesar dos diversos aparatos jurídicos a esse grupo da sociedade, ainda não
conseguimos firmar um cumprimento na prática de todos os direitos garantidos nas
legislações. É imprescindível uma postura ativa da sociedade para que haja a efetivação
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desses instrumentos. Vencer a discriminação é um ato desempenhado com a união dos
diversos setores sociais.
5 O Desafio da Inclusão
A promulgação de leis nacionais e ratificação de tratados internacionais pelo
Brasil, principalmente a Declaração de Salamanca (1994), tem proporcionado um maior
conhecimento acerca do direito e importância do acesso dos deficientes nas instituições de
ensino regular. Concomitantemente, tem havido uma maior demanda desse grupo junto às
redes de ensino. No entanto, ainda falta muito para que haja de fato uma inclusão. Afinal, a
maioria das escolas brasileiras se mantém inertes às constantes mudanças no pensar
pedagógico e na emergência dos fundamentos teóricos-metodológicos inclusivos.
Apesar dos benefícios proporcionados pela educação inclusiva, bem como sua
consistência teórica, na realidade factual, para ser adotada, são necessárias profundas
transformações na política e no sistema de ensino vigentes. Uma pesquisa feita por Sant’Ana
(2005) apresenta os principais obstáculos para a proposta de inclusão, partindo de uma coleta
de opiniões de professores e diretores de escolas. Concluiu-se que dentre as principais
dificuldades estão: a falta de preparo dos professores para atuar junto a alunos excepcionais,
ausência de equipe multidisciplinar, assim como a frágil participação da família e comunidade
e carência de consulta com os gestores escolares para que os órgãos educacionais possam
decidir os rumos da educação.
Com o espaço de reverter esse quadro, Guijarro (2005) define três esferas a serem
seguidas no intuito de promover o avanço para escolas inclusivas. São elas: o das concepções
e atitudes; o das políticas e o das práticas. No que se refere ao âmbito de mudança nas
concepções e atitudes, faz-se mister incitar a diversidade como viés favorável ao processo de
aprendizagem e a formação do indivíduo respeitador das diferenças interpessoais. Dentre as
mudanças no espaço político e nos sistemas educacionais, encontram-se a necessidade de
expansão e melhora na qualidade dos programas educacionais. Tais transformações exigem
um aumento nos recursos de apoio para aqueles que atuam nessa área.
O processo inclusivo é favorável para todo o ambiente escolar, não restando
dúvidas quanto a sua viabilidade. O próximo passo, portanto, é por em prática sua medidas,
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que podem até ser exaustivas, em um primeiro momento, mas logo farão parte da rotina
escolar e a instituição poderá colher os frutos dessa adaptação.
Considerações Finais
Tendo em vista a expressiva e sempre crescente parcela da população composta
por deficientes, precisamos que se promova definitivamente o exercício desses direitos para a
prática da cidadania. Toda pessoa ao nascer adquire personalidade e junto a ela, sua
dignidade. Somente com a consagração do princípio da dignidade é que uma nação pode ser
considerada efetivamente um Estado desenvolvido e democrático. O deficiente deve ser visto
como cidadão com todos os direitos e deveres que lhes são inerentes. A sua humanização é
um processo constante que devemos enfrentar.
A educação deve ser sempre ministrada considerando-se todo tipo e grau de
limitação do educando. Por ser na escola onde se exercita de forma mais incisiva a integração
dos excepcionais à sociedade, muito há que se concretizar para o bom desempenho das
instituições de ensino, em todos os seus níveis.
A escola inclusiva assume um papel de destaque, pois consagra os valores da
Dignidade e da Igualdade. É imprescindível uma postura ativa da sociedade para que haja a
efetivação dos direitos já positivados. Vencer a discriminação é um ato desempenhado com a
união dos diversos setores e classes sociais.
Referências:
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Brasil e a pessoa portadora de deficiência: as obrigações das instituições de ensino superior.
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