ANAIS PIBIC-2011-2012

Transcrição

ANAIS PIBIC-2011-2012
Revista
Pesquisa & Criação
Publicação Científica da Fundação Universidade Federal de Rondônia
Produzida pela PROPesq
Ano: 2012, Volume 11, Número Especial: Anais do XXI PIBIC/UNIR/CNPq
ISSN: 1677-3993
NÚMERO ESPECIAL
ANAIS DO XXI SEMINÁRIO FINAL DO
PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSAS E
TRABALHO VOLUNTÁRIO DE INICIAÇÃO
CIENTÍFICA
PIBIC/UNIR/CNPq
REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
MINISTÉRIO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA
FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA - PROPesq
DIRETORIA DE PESQUISA E DESENVOLVIMENTO
PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSAS E TRABALHO VOLUNTÁRIO DE INICIAÇÃO
CIENTÍFICA - PIBIC/UNIR/CNPq
ANAIS
XXI SEMINÁRIO FINAL DO PROGRAMA INSTITUCIONAL DE
BOLSAS E TRABALHO VOLUNTÁRIO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA
ISSN 1677-3993
Realização:
Parceiros:
1
FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA
Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa
Programa Institucional de Bolsas e Trabalho Voluntário de Iniciação Científica (PIBIC)
XXI Seminário Final do Programa Institucional de Bolsas e Trabalho
Voluntário de Iniciação Científica (PIBIC)
COMISSÃO ORGANIZADORA
Prof. Dr. Ari Miguel Teixeira Ott - Presidente
Profa. Dra. Marli Lúcia Tonatto Zibetti - UNIR
TAE Ms. Ilma Erse Campos - UNIR
TAE Esp. Alex Santana Costa - UNIR
COMISSÃO DE APOIO À INFRAESTRUTURA E LOGÍSTICA
TAE Esp. Alex Santana Costa - PROPesq/PIBIC
TAE Ms. Ilma Erse Campos - PROPesq/PIBIC
Acadêmica Adriele Gonçalves Cardoso - PROPesq/PIBIC
Acadêmico João Vitor Demétrio Nogueira - PROPesq/PIBIC
TAE Esp. Laércio do Carmo Rodrigues - NCH/UNIR
ADM Maênia Araújo Mendes Vaz de Souto - PROPesq
TAE Esp. Angélica Maria da Cunha Barbosa - PROPesq
Acadêmica Elis Aparecida Lacerda Gonçalves - PROPesq
Acadêmica Adriana Correia de Oliveira - PROPesq
Acadêmica Sônia Maria Silveira da Costa - UNIR
Prof. Dr. Dorisvalder Dias Nunes - Coordenador do Laboratório de Geografia e Planejamento
Ambiental - LABOGEOPA/UNIR
Prof. Dr. Wanderley Rodrigues Bastos - Coordenador do Laboratório de Geoquímica
Ambiental/UNIR
Prof. Dr. Carlos Mergulhão Júnior - Campus de Ji-Paraná
Prof. Dr. Orestes Zivieri Neto - Diretor do Campus de Rolim de Moura
Profa. Dra. Marilsa Miranda de Souza - Campus de Rolim de Moura
COMISSÃO DE ORGANIZAÇÃO DOS ANAIS
Prof. Dr. Ari Miguel Teixeira Ott - Pró-Reitor/PROPesq
TAE Esp. Alex Santana Costa - PROPesq/PIBIC/UNIR
Prof. Dr. José Lucas Pedreira Bueno - UNIR
Profa. Dra. Juracy Machado Pacífico
2
FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA
Profª. Drª. Maria Berenice Alho da Costa Tourinho
Reitora
Prof.ª Dr.ª Maria Cristina Victorino de França
Vice-Reitora
Prof. Ms. Adilson Siqueira de Andrade
Chefe de Gabinete
Prof. Dr. Ari Miguel Teixeira Ott
Pró-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa
Prof. Dr. Jorge Luiz Coimbra de Oliveira
Pró-Reitor de Graduação
Prof. Dr. Osmar Siena
Pró-Reitor de Planejamento
Ms. Ivanda Soares da Silva
Pró-Reitora de Administração
Prof. Ms. Rubens Vaz Cavalcante
Pró-Reitor de Cultura, Extensão e Assuntos Estudantis
Prof.ª Ms. Andréa Aparecida Cattaneo de Melo
Assessora de Comunicação
Prof. Dr. Valdir Aparecido de Souza
Diretor de Pesquisa e Pós-Graduação – PROPesq
3
COMITÊ TÉCNICO CIENTÍFICO INSTITUCIONAL
Prof. Dr. Ari Miguel Teixeira Ott
Presidente
CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS I
Prof. Dr. Júlio César Barreto Rocha
Profa. Dra. Juracy Machado Pacífico
Prof. Dr. José Lucas Pedreira Bueno
Profa. Dra. Josélia Gomes Neves
Profa. Dra. Marilsa Miranda de Souza
Profa. Dra. Milena Cláudia Magalhães Santos Guidio
Prof. Dr. Orestes Zivieri Neto
CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS II
Profa. Dra. Lilian Reichert Coêlho
Profa. Dra. Maria Lúcia Cereda Gomide
CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA
Prof. Dr. Carlos Mergulhão Júnior
Prof. Dr. Dorisvalder Dias Nunes
Prof. Dr. Emanuel Fernando Maia de Souza
Profa. Dra. Maria Luiza Lopes de Oliveira Santos
Prof. Dr. Rosalvo Stachiw
Prof. Dr. Sandro de Vargas Schons
Profa. Dra. Silvia das Dores Rissino
CIÊNCIAS DA VIDA E SAÚDE
Profa. Dra. Kátia Fernanda Alves Moreira
Prof. Dr. Paulo Renato Vitória Calheiros
4
COMITÊ TÉCNICO CIENTÍFICO - EXTERNO/CNPq
Profa. Dra. Rosa Ester Rossini
USP/Ciências Humanas e Sociais II
Prof. Dr. Silvio Simione da Silva
UFAC/ Ciências Humanas e Sociais II
Profa. Dra. Suely Aparecida do Nascimento Mascarenhas
UFAM- Ciências Humanas e Sociais I
Prof. Dr. Mark Clark Assen de Carvalho
UFAC - Ciências Humanas e Sociais I
Prof. Dr. Olaf Malm
UFRJ - Ciências Exatas e da Terra
Dr. Márcio Rodrigues Miranda
UFRJ - Ciências Exatas e da Terra
Dr. Fernando Luíz de Oliveira Corrêa
CEPLAC - Ciências Exatas e da Terra
Dr. Alexandre Martins Abdão dos Passos
EMBRAPA - Ciências Exatas e da Terra
Dra. Ana Karina Dias Salman
EMBRAPA - Ciências Exatas e da Terra
Dr. Cléberson de Freitas Fernandes
EMBRAPA - Ciências Exatas e da Terra
Dr. Eduardo Schmitt
EMBRAPA - Ciências Exatas e da Terra
Dr. Andreimar Martins Soares
FIOCRUZ - Ciências da Vida e Saúde
Dra. Carla Freire Celedonio Fernandes
IPEPATRO - Ciências da Vida e Saúde
5
FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA
FICHA TÉCNICA
FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
Diretoria de Pesquisa e Desenvolvimento
Programa Institucional de Bolsas e Trabalho Voluntário de Iniciação Científica
BR-364, Km 9,5 - CEP: 76. 801-974 - TEL/FAX/ (69) 2182-2214; 2182-2172
E-mail: [email protected]; [email protected]; [email protected]
REVISTA PESQUISA & CRIAÇÃO DE NÚMERO ESPECIAL PARA OS RESUMOS
EXPANDIDOS DO XXI SEMINÁRIO FINAL DO PROGRAMA INSTITUCIONAL
DE BOLSAS E TRABALHO VOLUNTÁRIO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA
ISSN: 1677-3993
XXI SEMINÁRIO FINAL DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA - PIBIC/UNIR/CNPq
2011/2012
EQUIPE DA COORDENAÇÃO DO PIBIC/PROPesq/UNIR
Alex Santana Costa
Ilma Erse Campos
6
Coração de Estudante
Quero falar de uma coisa
Adivinha onde ela anda
Deve estar dentro do peito
Ou caminha pelo ar
Pode estar aqui do lado
Bem mais perto que pensamos
A folha da juventude
É o nome certo desse amor
Já podaram seus momentos
Desviaram seu destino
Seu sorriso de menino
Quantas vezes se escondeu
Mas renova-se a esperança
Nova aurora, cada dia
E há que se cuidar do broto
Pra que a vida nos dê
Flor e fruto
Coração de estudante
Há que se cuidar da vida
Há que se cuidar do mundo
Tomar conta da amizade
Alegria e muito sonho
Espalhados no caminho
Verdes, planta e sentimento
Folhas, coração,
Juventude e fé.
(Milton Nascimento)
7
O conteúdo dos resumos expandidos destes anais é de exclusiva responsabilidade de seus
autores (orientadores e orientandos). A comissão organizadora interfere apenas na
formatação e exclusão de co-orientadores e colaboradores, haja vista que os projetos e
subprojetos de pesquisa registrados no PIBIC não os admitem.
8
SUMÁRIO
HISTÓRIA E MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO DE RONDÔNIA: O MUNICÍPIO PIONEIRO
DE GUAJARÁ-MIRIM ........................................................................................................... 21
O ENSINO E A APRENDIZAGEM DE FRAÇÕES E NÚMEROS DECIMAIS NA
ESCOLA. CAMINHOS A SEREM SUPERADOS ................................................................. 22
PROGRAMAS DE MELHORIA DA QUALIDADE DE ENSINO NA REDE PÚBLICA
MUNICIPAL URBANA EM PORTO VELHO..................................... ................................. 35
PROJETO
POLÍTICO-PEDAGÓGICO:
QUANTO
SOBRE
ADAPTAÇÕES
CURRICULARES PODE SER VISTO NESTE DOCUMENTO?..................................... .... 46
ALFABETIZAÇÃO DE RIBEIRINHOS NA AMAZÔNIA ................................................... 60
EXPERIÊNCIAS COMPARTILHADAS NO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO DE
ALUNOS COM SÍNDROME DE DOWN (SD) NAS ESCOLAS REGULARES NO
MUNICÍPIO DE JI-PARANÁ/RO .......................................................................................... 68
A INVENCIONICE DA TRADIÇÃO EM RONALDO CORREIA DE BRITO .................... 77
A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO EDUCATIVO E A FORMAÇÃO DOCENTE COMO
ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DE SUSTENTAÇÃO DAS RELAÇÕES DE PODER NO
AMBIENTE ESCOLAR .......................................................................................................... 82
O CURSO DE PEDAGOGIA NA MODALIDADE A DISTÂNCIA: DESAFIOS PARA A
GESTÃO DO TRABALHO PEDAGÓGICO: ESTADO DA ARTE DA PESQUISA EM
EDUCAÇÃO SUPERIOR EM RONDÔNIA .......................................................................... 96
AVALIAR, MEDIR, TESTAR... CRUZES! UM ESTUDO SOBRE A PRÁTICA DA
AVALIAÇÃO EDUCACIONAL NAS ESCOLAS DA REDE PÚBLICA DE ROLIM DE
MOURA/RO........................................................................................................................... 109
AS CURVAS DA MEMÓRIA DE JOCA REINERS TERRON” ......................................... 120
ASPECTOS
DO
CAPITALISMO
BUROCRÁTICO
NA
EDUCAÇÃO:
CORPORATIVISMO SINDICAL E A LUTA PELA GESTÃO DEMOCRÁTICA DA
ESCOLA PÚBLICA ............................................................................................................. 125
O LIVRO SHENIPABU MIYUI: EXISTÊNCIA E ESPECIFICIDADES DA LITERATURA
INDÍGENA POR MEIO DO ESTUDO DE EDIÇÕES DE MITOS KAXINAWÁ.............. 138
PROGRAMAS DE MELHORIA DA QUALIDADE DE ENSINO NA REDE PÚBLICA
ESTADUAL DE PORTO VELHO (RO) ............................................................................... 144
PRÁTICAS PSICOLÓGICAS: CONSIDERAÇÕES A CERCA DA ATUAÇÃO DO
PSICÓLOGO NO CONTEXTO ESCOLAR/EDUCACIONAL EM PORTO VELHO-RO 155
O (NÃO) TEMPO NAS DOBRAS DO (IR) REAL .............................................................. 165
9
MATEMÁTICA: ESTRATÉGIAS PARA ENSINAR E APRENDER NA EDUCAÇÃO
INFANTIL .............................................................................................................................. 178
AVALIAÇÃO PSICOEDUCACIONAL DO ALUNO COM SUSPEITA DE DEFICIÊNCIA
INTELECTUAL: CONCEPÇÕES E PRÁTICAS ................................................................. 188
SUB-PROJETO: EDUCAÇAO LINGUISTICA: FORMAÇÃO DOCENTE E ENSINO DE
LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DA FRONTEIRA BRASIL - BOLÍVIA ........ 193
LITERATURA INDÍGENA CONTEMPORÂNEA POR MEIO DA EDIÇÃO DE DUAS
VERSÕES DE MITOS DESANA ......................................................................................... 195
AVALIAÇÃO EDUCACIONAL, PROGRAMAS NACIONAIS DE AVALIAÇÃO E A
AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM: UM ESTUDO NAS ESCOLAS ESTADUAIS DE
ROLIM DE MOURA/RO ...................................................................................................... 205
A ORDEM SINTÁTICA DA L1 (TUPI-KAWAHIB): NA ESCRITA EM L2 (LÍNGUA
PORTUGUESA)..................................................................................... ............................... 217
O ESTUDO DA LITERATURA INDÍGENA CONTEMPORÂNEA SAKURABIAT E
SURUÍ PAITER E A CULTURA DO IMPRESSO............................................................... 223
O PROFESSOR ALFABETIZADOR DA REDE MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE
PORTO VELHO/RO E O SEU PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO PROFISSIONAL....... 229
O FANTÁSTICO: INTERSECÇÕES CRÍTICAS RELAÇÕES ENTRE EDIFICAÇÕES
FANTÁSTICAS E MODO NARRATIVO NA OBRA DE JORGE LUIS BORGES .......... 237
INFLUÊNCIA DOS FATORES EXTRALINGUÍSTICOS NO DIALETO DE VILHENA .... ..
................................................................................................................................................ 242
ONOMÁSTICA RONDONIANA: A APLICAÇÃO CONCRETA DE NORMAS SOBRE
NOMES DE LUGARES EM PORTO VELHO
.............................................................................................................................................. ..255
A EXPRESSÃO DE GÊNERO E NÚMERO DA L1 (TUPI-KAWAHIB) NA ESCRITA EM
L2 (LÍNGUA PORTUGUESA). ............................................................................................ 260
INFORMATIZANDO A LITERATURA DE RONDÔNIA ................................................. 267
AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS EM CURSO NAS ESCOLAS DA REDE ESTADUAL
DE ENSINO NA ZONA DA MATA RONDONIENSE: DE ONDE VEM, PARA ONDE
VÃO? ...................................................................................................................................... 271
AVALIAÇÃO EDUCACIONAL: UM ESTUDO DA PRÁTICA AVALIATIVA DOS
PROFESSORES DAS ESCOLAS ESTADUAIS DO MUNICÍPIO DE ROLIM DE
MOURA/RO........................................................................................................................... 283
10
OS DESAFIOS DA TECNOLOGIA DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO NA
EDUCAÇÃO: O CASO DO PROJETO DE EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA NO CAMPUS
JOSÉ RIBEIRO FILHO ......................................................................................................... 294
O ENSINO E A APRENDIZAGEM DE NÚMEROS E CÁLCULO ARITMÉTICO NA
ESCOLA: POSSIBILIDADES E LIMITES .......................................................................... 303
GRUPO DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO DA AMAZÔNIA - GPEA PURUBORÁ UM
POVO INDÍGENA RESGATANDO SUA IDENTIDADE E CULTURA ........................... 316
RENDIMENTO ESCOLAR E PROGRAMAS DE MELHORIA DA QUALIDADE DE
ENSINO EM ESCOLAS PÚBLICAS ESTADUAIS DE PORTO VELHO.. ....................... 323
FEIÇÕES DA VIOLÊNCIA INSTITUCIONAL EM CRIANÇAS INDÍGENAS NAS
ESCOLAS PÚBLICAS URBANAS DO ESTADO DE RONDÔNIA NA PERSPECTIVA DE
SEUS FAMILIARES ............................................................................................................. 338
LITERATURA INDÍGENA E OS MITOS YANOMAMI: UM ESTUDO COMPARATIVO
DAS OBRAS MITOPOEMAS YANOMAMI E NARO, O GAMBÁ - MITOS DOS ÍNDIOS
YANOMAMI ......................................................................................................................... 345
AS RELAÇÕES SEMIFEUDAIS NO AMBIENTE ESCOLAR: SE VOCÊ MANDA, EU
OBEDEÇO! ............................................................................................................................ 354
A TEORIA NA PRÁTICA: O CASO DO PROGRAMA DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
NA UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA. CAMPUS UNIVERSITÁRIO JOSÉ
RIBEIRO FILHO EM PORTO VELHO ................................................................................ 367
RELACIONAMENTOS INTERORGANIZACIONAIS NO AGRONEGÓCIO LEITE NO
MUNICÍPIO DE ARIQUEMES EM RONDÔNIA - CONSTRUÇÃO DO
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: IMPORTÂNCIA DO RELACIONAMENTO
INTERORGANIZACIONAL ENTRE OS AGENTES DO AGRONEGÓCIO LEITE NO
MUNICÍPIO DE JI-PARANÁ E AS ORGANIZAÇÕES PÚBLICAS E PRIVADAS......... 376
HISTÓRIA E REPRESENTAÇÕES SOCIAIS: A UNIR AO LONGO DOS 30 ANOS DE
ATUAÇÃO EM RONDÔNIA (1982 A 2011)*...................................... ............................... 383
MAL-ESTAR SUBJETIVO DE JOVENS MULHERES E SUAS DEMANDAS
RELIGIOSAS ......................................................................................................................... 390
ASSENTAMENTO RURAL SOB ENFOQUE DE GÊNERO: UMA ANÁLISE DO PDSA
NAZARÉ E BOA VITÓRIA.................................................................................................. 397
PAITER SURUI ..................................................................................................................... 406
A OCUPAÇÃO PRÉ-COLONIAL NA CACHOEIRA DO TEOTÔNIO: ABORDAGEM
TECNOLÓGICA DA CULTURA MATERIAL CERÂMICA DOS SÍTIOS SANTA PAULA
E TEOTÔNIO ........................................................................................................................ 415
ESTADO PENAL MÍNIMO E DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA ............................. 427
11
MAL-ESTAR SUBJETIVO DO SUJEITO PÓS-MODERNO E SUA RELAÇÃO COM O
CAPITALISMO ..................................................................................................................... 435
HISTÓRIA E REPRESENTAÇÕES SOCIAIS: A UNIR AO LONGO DOS 30 ANOS DE
ATUAÇÃO EM RONDÔNIA (1982 A 2011)* ..................................................................... 451
ANÁLISE DA CULTURA MATERIAL CERÂMICA DO SÍTIO DO BREJO, PORTO
VELHO-RO ............................................................................................................................ 470
O DIREITO A TER DIREITOS NA ERA DA HORIZONTALIDADE DEMOCRÁTICA ESTADO PENAL: O ENCARCERAMENTO SOCIAL....................................................... 480
SISTEMA DE INFORMAÇÕES GERENCIAIS NA GESTÃO DA AGRICULTURA
FAMILIAR ............................................................................................................................. 490
AS COMUNIDADES REMANESCENTES DE QUILOMBOLS DO MÉDIO GUAPORÉ:
OS QUILOMBOLAS DE SANTA FÉ E FORTE PRÍNCIPE DA BEIRA, UM ESTUDO DE
CASOS ................................................................................................................................... 500
ASSOCIAÇÕES E COOPERATIVAS QUE COMPÕEM A CADEIA-REDE DO
ALGODÃO AGROECOLÓGICO - JUSTA TRAMA .......................................................... 505
AVALIAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO NO MUNICÍPIO DE PORTO VELHO
ATRAVÉS DE INDICADORES ECONOMICOS, SOCIAIS E AMBIENTAIS:
ELABORAÇÃO DO IDH (SOCIAL) E IDH (AMBIENTAL) ............................................. 508
EQUIDADE DE GÊNERO NO ASSENTAMENTO RURAL JOANA D’ARC III ............. 513
DIREITOS HUMANOS: UMA ABORDAGEM TRANSVERSAL DOS AGENTES
EDUCACIONAIS .................................................................................................................. 527
A EVOLUÇÃO DO DIREITO FEMININO NO ORDENAMENTO JURÍDICO
BRASILEIRO......................................................................................................................... 544
JUDEU CABOCLO ............................................................................................................... 557
MAL-ESTAR SUBJETIVO NA VELHICE E A BUSCA PELA FUNÇÃO PATERNA NAS
RELIGIÕES CRISTÃS .......................................................................................................... 564
CADEIA-REDE DE COOPERAÇÃO SUSTENTÁVEL. ATIVIDADES ECONÔMICAS E
SOCIAIS DA COOPERATIVA AÇAÍ, NO MUNICÍPIO DE PORTO VELHO ................. 572
AS ESTRATEGIAS E RELACIONALIDADE NA TOMADA DE DECISÃO DE
EXTRATIVISTAS NA COMERCIALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO DE CASTANHA NA
CADEIA-REDE CASTANHA-DA-AMAZONIA ................................................................ 577
MAL- ESTAR SUBJETIVO NAS FAMÍLIAS MONOPARENTAIS SEM A PRESENÇA
DO PAI ................................................................................................................................... 585
12
AVALIAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO NO MUNICÍPIO DE PORTO VELHO
ATRAVÉS DE INDICADORES ECONÔMICOS, SOCIAIS E AMBIENTAIS PARA A
ELABORAÇÃO DO IDH MUNICIPAL AMPLIADO: ELABORAÇÃO DO IDH DAS
DIMENSÕES ECONOMIA E INSTITUCIONAL................................................................ 592
A INTELIGÊNCIA ENQUANTO PROCESSO BIOLÓGICO DE ADAPTAÇÃO ............. 597
MOVIMENTOS SOCIAIS E EQUIDADE DE GÊNERO NA ÁREA RIBEIRINHA ......... 610
GÊNERO E CAMPESINATO: UM ESTUDO DAS RELAÇÕES DE GÊNERO NO
ASSENTAMENTO RURAL JOANA D’ARC III ................................................................. 621
HISTÓRIA E MEMÓRIA DE PESSOAS LIGADAS DIRETAMENTE OU
INDIRETAMENTE A UNIR ................................................................................................. 631
EVOLUÇÃO DA MORTALIDADE EM CRIANÇAS DE 1 A 4 ANOS EM PORTO
VELHO-RO NO PERÍODO DE 2006 A 2010: MORBIMORTALIDADE EM PORTO
VELHO-RO: POPULAÇÃO DO ENTORNO DAS USINAS HIDRELÉTRICAS DE SANTO
ANTÔNIO E JIRAU .............................................................................................................. 638
ANÁLISE CLÍNICO-EPIDEMIOLÓGICO DOS CASOS DE ENVENENAMENTO POR
SERPENTES DE PACIENTES DO CENTRO DE MEDICINA TROPICAL DE
RONDÔNIA (CEMETRON): ANÁLISE LABORATORIAL DE HEPATOTOXICIDADE,
NEFROTOXICIDADE E MIOTOXICIDADE...................................................................... 645
AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DE VIDA E SUA INFLUENCIA SOBRE O PERFIL
HEMATOLÓGICO DE ADULTOS EM TRATAMENTO QUIMIOTERÁPICO ............... 647
AVALIAÇÃO DE DOR PÉLVICA CRÔNICA EM PACIENTES ONCOLÓGICAS
SUBMETIDAS À RADIOTERAPIA PÉLVICA: CARACTERÍSTICAS DA DOR PÉLVICA
CRÔNICA E ANÁLISE DOS SINTOMAS QUE ATINGEM PACIENTES APÓS
RADIOTERAPIA PÉLVICA E NÃO PÉLVICA. ................................................................. 654
VERIFICAÇÃO DE ATIVIDADE ANTIMICROBIANA DA OCELLATIN-K1 DE
Leptodactylus knudseni em Plasmodium falciparum e Leishmania amazonenses ................ 660
INVESTIGAÇÃO DO USO DE DROGAS LÍCITAS E ILÍCITAS POR ESTUDANTES DA
UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA DO CAMPUS DE PORTO VELHO: UMA
ANÁLISE SOCIAL E EPIDEMIOLÓGICA ......................................................................... 669
POLIMORFISMOS DO GENE CYP2E1 DO CITOCROMO P450 EM POPULAÇÕES DE
RONDÔNIA, AMAZÔNIA OCIDENTAL BRASILEIRA, REGIÃO ENDÊMICA DE
MALÁRIA CARACTERIZAÇÃO DE POPULAÇÕES HUMANAS DE RONDÔNIA
ATRAVÉS DA ANÁLISE DE POLIMORFISMOS DE DNA ............................................. 675
PURIFICAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DE PEPTÍDEOS DE INTERESSE
BIOTECNOLÓGICO DO VENENO DE BOTHROPS ATROX .......................................... 682
GENOTIPAGEM DO POLIMORFISMO DO GENE IL28B E PROGNÓSTICO
TERAPÊUTICO EM INDIVÍDUOS PORTADORES DE HEPATOPATIA CRÔNICA PELO
13
VÍRUS C ACOMPANHADOS NO AMBULATÓRIO ESPECIALIZADO DE
HEPATITE...... ....................................................................................................................... 690
AVALIAÇÃO DO PERFIL SOCIO-DEMOGRÁFICO, SINTOMAS DE ANSIEDADE E
DEPRESSÃO ENTRE PACIENTES USUÁRIOS DE CRACK EM TRATAMENTO NAS
PRINCIPAIS CIDADES DO ESTADO DE RONDÔNIA .................................................... 695
AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DE VIDA E SUA INFLUENCIA SOBRE O SISTEMA
IMUNOLÓGICO DE CRIANÇAS EM TRATAMENTO QUIMIOTERÁPICO ................. 700
AYAHUASCA INVESTIGAÇÃO TERAPÊUTICA DO USO RITUALÍSTICO ................ 706
PURIFICAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO BIOQUÍMICA DE FOSFOLIPASE A2
MIOTÓXICA DO VENENO DA SERPENTE Bothrops atrox ........................................... 715
CARACTERIZAÇÃO GENOTÍPICA DOS POLIMORFISMOS DO GENE IL28B ENTRE
PORTADORES DE HEPATOPATIA CRÔNICA PELO VÍRUS C EM PORTO VELHO,
RONDÔNIA ........................................................................................................................... 722
ADOLESCENTES ESCOLARES EM USO DE ÁLCOOL E DROGAS NO MUNICIPIO DE
PORTO VELHO: USO DE DROGAS NA ADOLESCÊNCIA E SEUS IMPACTOS NO
ÂMBITO FAMILIAR NO MUNICIPIO .............................................................................. 727
CONSTRUÇÃO DO PERFIL EPIDEMIOLÓGICO DE CÂNCER NA CLÍNICA SÃO
PELLEGRINO EM PORTO VELHO - RO .......................................................................... 736
FATORES ESTRESSORES E A RELAÇÃO SAÚDE X TRABALHO DO ESTUDANTE
DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA................................. 746
O IDOSO ACAMADO E A DINÂMICA FAMILIAR: AS VANTAGENS DO USO DA
MACADEIRA ...................................................................................................................... 755
MORTE ENCEFÁLICA E DOAÇÃO DE ÓRGÃOS: OPINIÃO DE FAMILIARES DE
PACIENTES INTERNADOS NAS ENFERMARIAS DO HOSPITAL DE BASE DR. ARY
PINHEIRO ............................................................................................................................ 763
CUIDANDO DO CUIDADOR: A MUDANÇA DA RELAÇÃO SISTÊMICA FAMILIAR
DO DOENTE NA MACADEIRA ......................................................................................... 771
FATORES ESTRESSORES E A RELAÇÃO SAÚDE X TRABALHO DO ESTUDANTE
DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA................................. 776
POLIMORFISMOS DO GENE GSTT1 DE GLUTATIÃO S-TRANSFERASE EM
AMOSTRA DE POPULAÇÃO DE RONDÔNIA, AMAZÔNIA OCIDENTAL
BRASILEIRA, REGIÃO ENDÊMICA DE MALÁRIA ...................................................... 784
USO DE DROGAS PSICODÉLICAS EM CONTEXTOS NÃO RELIGIOSOS ................ 794
14
INTERVENÇÃO BREVE AO TRATAMENTO DO TABAGISMO SUBPROJETO:
INTERVENÇÃO BREVE AO TRATAMENTO DO TABAGISMO: ANÁLISE DE SUA
EFETIVIDADE ...................................................................................................................... 803
IMPLICAÇÕES DAS MANIFESTAÇÕES DE VIOLÊNCIA/BULLYING NAS RELAÇÕES
SOCIAIS E CLIMA ESCOLAR, SEGUNDO OS PROFESSORES E COLABORADORES
.... ............................................................................................................................................ 804
MORTALIDADE INFANTIL POR CAUSAS EVITÁVEIS NO MUNICÍPIO DE PORTO
VELHO-RO, NO PERÍODO DE 2006 A 2010 ..................................................................... 809
IDENTIFICAÇÃO DO CONTEÚDO ENZIMÁTICO DO VENENO DE ANUROS
BUFONÍDEOS (Rhaebo guttatus e Rhinella ......................................................................... 816
PERFIL DOS AFASTAMENTOS POR TRANSTORNOS MENTAIS RELACIONADOS
AO TRABALHO ENTRE SERVIDORES PÚBLICOS FEDERAIS DE RONDÔNIA ...... 827
INTERVENÇÃO BREVE AO TRATAMENTO DO TABAGISMO: CONTRIBUIÇÕES DO
TESTE MINI ......................................................................................................................... 836
DETERMINAÇÃO DO HORÁRIO EFETIVO DE POLINIZAÇÃO MANUAL EM
MARACUJAZEIRO AMARELO NA ZONA DA MATA RONDONIENSE ..................... 854
INSTALAÇÃO DE DOIS ENSAIOS DE CAMPO DE APODRECIMENTO DA MADEIRA
E ACOMPANHAMENTO DA SUA DEGRADAÇÃO BIOLÓGICA ............................... 860
EFEITO DE FONTES DE SUBSTRATO PROTÉICO-ENERGÉTICO-MINERAL SOBRE
A QUALIDADE DA FARINHA DE MINHOCAS DA ESPÉCIE EUDRILUS EUGENIAE E
INDICADORES ECONÔMICOS DE PRODUÇÃO ........................................................... 866
ANÁLISE DA INVERSÃO SEXUAL EM Satanoperca jurupari (HECKEL, 1840)
(Perciformes, Cichlidae) NA BACIA DO RIO MADEIRA .................................................. 874
ESTRATÉGIAS DE LEITURA NA FORMAÇÃO INICIAL EM QUÍMICA: UMA
ANÁLISE DE DOIS CASOS A PARTIR DO USO DE LITERATURA CIENTÍFICA ...... 878
DISPOSIÇÃO E QUANTIFICAÇÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO CIVIL
GERADOS NOS CANTEIROS DE OBRAS DO MUNICÍPIO DE PORTO VELHO/RO........
................................................................................................................................................ 888
ANÁLISE
DA
DEPURAÇÃO
NATURAL
DO
RIO
JI-PARANÁ,
EM
DIFERENTESPERÍODOS DO CICLO HIDROLÓGICO .................................................... 897
LEVANTAMENTO DAS NECESSIDADES DE ALTITUDE E PRECIPITAÇÃO DAS
ESPÉCIES MADEIREIRAS PROMISSORAS E CARACTERIZAÇÃO DE ALTITUDE E
PRECIPITAÇÃO DA ZONA DA MATA RONDONIENSE................................................ 899
AVALIAÇÃO DA QUALIDADE SANITÁRIA DE SEMENTES DE ARROZ (Oryza sativa
L.), FEIJÃO (Phaseolus vulgaris L.) E MILHO (Zea mays L.), PRODUZIADAS NA ZONA
DA MATA RONDONIENSE ................................................................................................ 904
15
QUALIDADE DO HÚMUS DE MINHOCAS DA ESPÉCIE GIGANTE AFRICANA (E.
EUGENIAE) PRODUZIDO EM DIFERENTES SUBSTRATOS......................................... 916
DESEMPENHO PRODUTIVO DE MINHOCAS DA ESPÉCIE GIGANTE AFRICANA EM
SUBSTRATOS PROTÉICO, ENERGÉTICO E MINERAL ................................................ 924
CURVA DE NEUTRALIZAÇÃO DA ACIDEZ EM SOLOS DE RONDÔNIA
UTILIZANDO CARBONATO DE CÁLCIO COMERCIAL ............................................... 930
PRODUÇÃO DE GRAOS E MATERIA SECA DE CULTURAS SOB DIFERENTES
SISTEMAS DE PREPARO DE SOLO E PLANTIO ............................................................ 934
LEVANTAMENTO
DO
NÚMERO
DE
POPULAÇÕES
TRADICIONAIS
ENCONTRADOS NA ZONA DA MATA DE RONDÔNIA ............................................... 941
DIVERSIDADE GENÉTICA EM SATANOPERCA SP. NA BACIA DO RIO MADEIRA
(RO) ........................................................................................................................................ 948
ESTUDO DA EXTRAÇÃO DOS PIGMENTOS DO FRUTO DE TUCUMÃ (Astrocaryum
aculeatum) .............................................................................................................................. 954
ATIVIDADE ANTIOXIDANTE DE Protium apiculatum Swart ......................................... 958
PRODUÇÃO DE MATÉRIA SECA DE BRACHIARIA SPP EM FUNÇÃO DE
DIFERENTES DOSES DE NITROGÊNIO E POTÁSSIORECUPERAÇÃO DE
PASTAGEM NA AMAZÔNIA LEGAL ............................................................................... 964
LEVANTAMENTO FITOSSOCIOLÓGICO DAS ESPÉCIES NATIVAS COM
POTENCIAL PARA PRODUÇÃO DE REMÉDIOS TRADICIONAIS NA REGIÃO DA
ZONA DA MATA, ESTADO DE RONDÔNIA ................................................................... 969
ANÁLISE DO CUSTO DE OPORTUNIDADE PARA CONSERVAÇÃO DA FLORESTA
AMAZÔNICA NA REGIÃO DA ZONA DA MATA DO ESTADO DE RONDÔNIA ...... 982
INSTALAÇÃO DE DOIS ENSAIOS DE CAMPO DE APODRECIMENTO DA MADEIRA
E ACOMPANHAMENTO DA SUA DEGRADAÇÃO BIOLÓGICA ................................ 989
CRESCIMENTO DO FEIJOEIRO INFLUENCIADO POR DOSES DE NITROGÊNIO ....... ..
................................................................................................................................................ 995
ANÁLISE DA ACIDEZ E CONDUTIVIDADE ELÉTRICA PARA A DEPOSIÇÃO TOTAL
NA CIDADE DE JI-PARANÁ RO ...................................................................................... 1001
MODELO TEÓRICO PARA DETERMINAÇÃO DA DIFUSIVIDADE TÉRMICA
EMFILMES COM CAMADAS ........................................................................................... 1011
ESPOROS DE FUNGOS MICORRÍZICOS ARBUSCULARES EM ECOSSISTEMAS DE
CERRADO O (NÃO) ........................................................................................................... 1018
16
MONITORAMENTO DE TOCAS DE CINGULATA EM ÁREA DE EXPLORAÇÃO
FLORESTAL MANEJADA NA FLORESTA NACIONAL DO JAMARI, ITAPUÃ DO
OESTE/RO ........................................................................................................................... 1031
PRODUÇÃO DE MATÉRIA SECA DE BRACHIARIA SPP EM FUNÇÃO DE
DIFERENTES NÍVEIS DE CALAGEM ............................................................................. 1034
PRODUÇÃO DE MUDAS DE CAFEEIRO (Coffea arabica L.) SOB APLICAÇÃO VIA
SOLO E FOLIAR DE DIFERENTES DOSES DE EXTRATO ETANÓLICO DE PRÓPOLIS
(EEP) .................................................................................................................................... 1038
ATIVIDADE ANTIOXIDANTE DE Piper krukoffi Yunker cf .......................................... 1047
INTOXICAÇÃO EXPERIMENTAL POR Amorimia sepium EM COELHOS .................. 1056
DIVERSIDADE DE ICHNEUMONOIDEA (INSECTA, HYMENOPTERA) DA ESTAÇÃO
ECOLÓGICA DO CUNIÃ, PORTO VELHO, RONDÔNIA .............................................. 1062
ANÁLISE DA CONCENTRAÇÃO DE MERCÚRIO EM AMOSTRAS DE SOLO
COLETADAS NA LIXEIRA CONTROLADA INATIVA DO MUNICÍPIO DE JI-PARANÁ
- RO: RESULTADOS PRELIMINARES ............................................................................ 1073
MAPEAMENTO DAS ÁREAS VERDES E DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE NA
ÁREA URBANA DE PORTO VELHO-RO UTILIZANDO IMAGENS DE SATÉLITE DE
ALTA RESOLUÇÃO .......................................................................................................... 1080
ESTUDO DAS INSTABILIDADES INDUZIDAS EM UMA AMOSTRA DE CRISTAL
LÍQUIDO NEMÁTICO L .................................................................................................... 1093
TRANSMISSION-LINE MATRIX - DIAKÓPTICAS: FERRAMENTA DE SIMULAÇÃO
DE CAMPOS BIDIMENSIONAIS EM ELETROMAGNETISMO E PROPAGAÇÃO
TÉRMICA EM TECIDOS BIOLÓGICOS PARA APLICAÇÕES DE BEM/EMC ........... 1098
QUALIDADE FÍSICO-QUÍMICA DE FRUTOS DE MARACUJAZEIRO-AMARELO EM
DIFERENTES LÂMINAS DE IRRIGAÇÃO NAS CONDIÇÕES EDAFOCLIMÁTICAS
DA ZONA DA MATA RONDONIENSE ........................................................................... 1120
DISPOSIÇÃO E QUANTIFICAÇÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO CIVIL
GERADOS NOS CANTEIROS DE OBRAS DO MUNICÍPIO DE PORTO VELHO/RO
.............................................................................................................................................. 1126
BIOLOGIA REPRODUTIVA DE PIMELODUS BLOCHII (VALENCIENNES, 1840) DO
TRECHO DE CORREDEIRAS DO RIO MADEIRA ......................................................... 1133
CURVA DE NEUTRALIZAÇÃO DA ACIDEZ EM SOLOS DE RONDÔNIA
UTILIZANDO CALCÁRIO COMERCIAL) ...................................................................... 1139
DESENVOLVIMENTO DE METODOLOGIAS PARA MEDIÇÃO DOS NÍVEIS DE
CAMPOS MAGNÉTICOS GERADOS POR EQUIPAMENTOS ELÉTRICOS PARA
ANÁLISE DOS EFEITOS SOBRE A SAÚDE HUMANA ................................................ 1143
17
PRODUÇÃO E QUALIDADE COMERCIAL DE FRUTOS DO MARACUJAZEIROAMARELO SUBMETIDO A DIFERENTES LÂMINAS DE IRRIGAÇÃO NAS
CONDIÇÕES EDAFOCLIMÁTICAS DA ZONA DA MATA RONDONIENSE............. 1155
COMPREENSÃO DO PROCESSO CHUVA-VAZÃO DO IGARAPÉ DA PENAL ........ 1161
ESTUDO E ANÁLISE DE EQUIPAMENTOS DE ALTA TECNOLOGIA E BAIXO
CUSTO PARA O ENSINO DE FÍSICA NAS ENGENHARIAS ....................................... 1170
IDENTIFICAÇÃO, CLASSIFICAÇÃO E TRATAMENTO DAS INCOMPLETUDES EM
BANCO DE DADOS RELACIONAL UTILIZANDO LÓGICA NÃO-CLÁSSICA
PARACONSISTENTE......................................................................................................... 1175
O USO DE SIG COMO FERRAMENTA PARA O ESTUDO DE APTIDÃO DE ALGUMAS
ESPÉCIES MADEIREIRAS DA ZONA DA MATA RONDONIENSE ............................ 1180
PRODUÇÃO E QUALIDADE COMERCIAL DE FRUTOS DO MARACUJAZEIROAMARELO SUBMETIDO A DIFERENTES LÂMINAS DE IRRIGAÇÃO NAS
CONDIÇÕES EDAFOCLIMÁTICAS DA ZONA DA MATA RONDONIENSE............. 1185
ANÁLISE DO CUSTO DE OPORTUNIDADE PARA CONSERVAÇÃO DA FLORESTA
AMAZÔNICA NA REGIÃO DA ZONA DA MATA DO ESTADO DE RONDÔNIA ............
.............................................................................................................................................. 1195
ESTUDO MORFO-ANATÔMICO DE MELASTOMATACEAE DA ESTAÇÃO
ECOLÓGICA DE CUNIÃ (ESECC) ................................................................................... 1207
AVALIAÇÕES DAS ALTERAÇÕES HEMATOLÓGICAS DE OVINOS EM REBANHOS
COM PRESENÇA DE RESISTÊNCIA ANTI- HELMÍNTICA DA REGIÃO DA ZONA DA
MATA RONDONIENSE ..................................................................................................... 1219
LEVANTAMENTO DE VARIEDADES DE MANDIOCA PLANTADAS NO MUNICÍPIO
DE ROLIM DE MOURA - RO ............................................................................................ 1225
FENOLOGIA DA MANIHOT ESCULENTA SUBSP. FLABELLIFOLIA: A FORMA
SILVESTRE DA MANDIOCA ...................................................................................... .....1231
IDADE E CRESCIMENTO DE PIRAMUTABA (BRACHYPLATYSTOMA VAILLANTII),
NA BACIA DO RIO MADEIRA, RONDÔNIA ................................................................. 1238
DETERMINAÇÃO DOS PADRÕES QUÍMICOS E FÍSICO-QUÍMICOS DAS ÁGUAS DE
POÇOS RASOS E SUPERFICIAIS DA CIDADE DE ROLIM DE MOURA-RO ............ 1240
INFLUÊNCIA DE MACRONUTRIENTES NO CRESCIMENTO DE MICROCYSTIS
PANNIFOMIS (CYANOBACTERIA) E NA PRODUÇÃO DE MICROCISTINA POR UMA
CEPA ISOLADA DO RESERVATÓRIO DA USINA HIDRELÉTRICA DE SAMUEL
(RONDÔNIA). ..................................................................................................................... 1253
CONSERVAÇÃO PÓS-COLHEITA DE FRUTOS DO MARACUJAZEIRO-AMARELO
NA ZONA DA MATA RONDONIENSE ........................................................................... 1255
18
GEOPROCESSAMENTO E SENSORIAMENTO REMOTO NA ELABORAÇÃO DO
ZONEAMENTO GEOAMBIENTAL DA BACIA DO RIO DAS GARÇAS_RO:
MAPEAMENTO DAS CARACTERÍSTCAS GEOAMBIENTAIS DA BACIA DO RIO DAS
GARÇAS,COMO SUBSÍDIO AO ZONEAMENTO GEOAMBIENTAL ......................... 1260
MAPEAMENTO, DIAGNÓSTICO, AVALIAÇÃO E MONITORAMENTO DAS ÁREAS
DE RISCO NAS CABECEIRAS DO IGARAPÉ GRANDE LOCALIZADA NO SETOR
TUCUMANZAL .................................................................................................................. 1271
CARBONO DA BIOMASSA MICROBIANA E NO SOLO SOB DIFERENTES SISTEMAS
DE PREPARO DO SOLO E ROTAÇÃO DE CULTURAS NEMÁTICO L ...................... 1283
VARIABILIDADE GENÉTICA DE HEMIODUS UNIMACULATUS A JUSANTE E A
MONTANTE DA CACHOEIRA DE SANTO ANTÔNIO (RIO MADEIRA). ................. 1290
AVALIAÇÃO PARASITOLÓGICA DE PEIXES DE INTERESSE ECONÔMICO DO
ESTADO DE RONDÔNIA-BRASIL .................................................................................. 1292
ATIVIDADE ANTIOXIDANTE DA PIPER HUMILLIMUM PELO MÉTODO DPPH ... 1300
FLORÍSTICA E FITOSSOCIOLOGIA DE ESPÉCIES ARBÓREAS EM UM FRAGMENTO
DE FLORESTA OMBRÓFILA ABERTA SUBMONTANA ............................................. 1306
ESTUDO E ANÁLISE DE EQUIPAMENTOS DE ALTA TECNOLOGIA E BAIXO
CUSTO PARA O ENSINO DE FÍSICA NAS ENGENHARIAS ....................................... 1314
NPK NA FORMAÇÃO DE Coffea canéfora .......................................................................... 1319
AVALIAÇÃO DA RESISTÊNCIA ANTI-HELMÍNTICA A QUATRO DIFERENTES
PRINCÍPIOS ATIVOS ANTI-HELMÍNTICOS EM REBANHOS OVINOS DA REGIÃO
DA ZONA DA MATA RONDONIENSE ........................................................................... 1325
MONITORAMENTO DA MASTOFAUNA TERRESTRE DE MÉDIO E GRANDE PORTE
ATRAVÉS DO MÉTODO DE ARMADILHAMENTO FOTOGRÁFICO EM ÁREA DE
CONCESSÃO PARA EXPLORAÇÃO FLORESTAL NA FLONA DO JAMARI - ITAPOÃ
DO OESTE/RO.....................................................................................................................1330
MAPEAMENTO, DIAGNÓSTICO, AVALIAÇÃO E MONITORAMENTO DAS ÁREAS
DE RISCO NAS CABECEIRAS DO IGARAPÉ GRANDE LOCALIZADA NO SETOR
ROQUE E MATO GROSSO ............................................................................................... 1335
DIAGNÓSTICO, MAPEAMENTO E MONITORAMENTO DAS ÁREAS DE RISCO NA
BACIA DO IGARAPÉ GRANDE - SETOR BAIRRO FLORESTA E MATO GROSSO.........
.............................................................................................................................................. 1349
LEVANTAMENTO QUANTITATIVO SAZONAL DE ÁGUA SUPERFICIAL EM SUBBACIA TOTALMENTE URBANIZADA .......................................................................... 1365
COLONIZAÇÃO MICORRÍZICA NO SISTEMA RADICULAR DAS GRAMÍNEAS EM
PASTAGENS E SILVIPASTAGENS EM CERRADO NO ESTADO DE RONDÔNIA ..........
19
.............................................................................................................................................. 1370
MODELAGEM POR EQUAÇÕES DIFERENCIAIS À AÇÃO DAS RESPOSTAS
HUMORAL E CELULAR A INFECÇÃO MALÁRICA (PLASMODIUM FALCIPARUM).....
.............................................................................................................................................. 1376
FENOLOGIA E PRODUÇÃO DO MARACUJAZEIRO-AMARELO SUBMETIDO A
DIFERENTES LÂMINAS DE IRRIGAÇÃO NAS CONDIÇÕES EDAFOCLIMÁTICAS
DA ZONA DA MATA RONDONIENSE ........................................................................... 1381
ALGUNS ASPECTOS DA INTERAÇÃO ENTRE FORMIGAS (INSECTA, FORMICIDAE)
MAIETA GUIANENSIS AUBLET. (MELASTOMATACEAE) .......................................... 1386
DETERMINAÇÃO DOS PADRÕES MICROBIOLÓGICOS DA ÁGUA DE POÇOS
RASOS E SUPERFICIAIS DA CIDADE DE ROLIM DE MOURA-RO1 ......................... 1391
IDENTIFICAÇÃO DE ESPÉCIES ARBÓREAS AMOSTRADAS EM FRAGMENTO DE
FLORESTA OMBRÓFILA ABERTA SUBMONTANA ................................................... 1398
O DESENVOLVIMENTO DA ARGUMENTAÇÃO E DA LINGUAGEM CIENTÍFICA
POR GRADUANDOS EM QUÍMICA MEDIANTE A PRODUÇÃO TEXTUAL............ 1402
QUANTIFICAÇÃO DE COCAÍNA E IDENTIFICAÇÃO DE DILUENTES E
ADULTERANTES EM AMOSTRAS DE ENTORPECENTES APREENDIDAS EM
PORTO VELHO - RO: IMPLEMENTAÇÃO DE MÉTODO DE QUANTIFICAÇÃO POR
CG-EM ................................................................................................................................. 1410
LEVANTAMENTO DAS CONDIÇÕES NATURAIS DO TIPO DE SOLO E
TEMPERATURA MÉDIA ANUAL DAS ESPÉCIES MADEIREIRAS PROMISSORAS E
CARACTERIZAÇÃO DO TIPO DE SOLO E DA TEMPERATURA MÉDIA ANUAL DA
ZONA DA MATA NEMÁTICO L ...................................................................................... 1415
20
RESUMOS EXPANDIDOS
CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS I
21
HISTÓRIA E MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO DE RONDÔNIA: O MUNICÍPIO
PIONEIRO DE GUAJARÁ-MIRIM
Aleksandra Morge Rabelo1
Dorosnil Alves Moreira2
RESUMO
O estudo objetiva investigar os processos de formação dos professores pioneiros e implantação das
primeiras escolas públicas no município de Guajará-Mirim/RO, com a finalidade de proceder a um
estudo sobre a história da Educação no referido município. Este objetivo está orientado pelo seguinte
problema de pesquisa: “Como foi construída a prática pedagógica dos professores pioneiros na rede
publica, considerando a História e a memória da Educação no município de Guajará-Mirim/RO?” A
pesquisa teve como objetivos específicos: reconstituir, a partir da História Oral e análise documental, a
história do processo de implantação das primeiras escolas públicas no município de GuajaráMirim/RO; investigar o modelo de gestão educacional praticado nas primeiras escolas rede pública do
município de Guajará-Mirim; realizar entrevistas com professores pioneiros no município de GuajaráMirim/RO; constituir um banco de dados biográficos dos referidos professores; identificar as práticas
didáticos pedagógicas utilizadas pelos professores pioneiros; socializar os resultados dos estudos e das
pesquisas em encontros, seminários e fóruns locais, nacionais e internacionais; manter um programa
regular de publicações e produção científica do grupo. A pesquisa teve abordagem qualitativa, do
tipo Estudo de Caso, tendo como participantes os professores pioneiros das escolas públicas do
município de Guajará-Mirim/RO. O estudo foi desenvolvido em quatro etapas: a primeira etapa tratou
do estudo bibliográfico com ênfase na formação de professores pioneiros do município de GuajaráMirim, considerando suas histórias e memórias. A segunda etapa consistiu no registro das histórias e
memórias da formação de professores pioneiros. A terceira etapa dirigiu-se para a análise dos dados e
informações coletadas referentes à formação de professores pioneiros do município de GuajaráMirim, considerando suas histórias e memórias. A quarta etapa consistiu na elaboração e socialização
dos resultados da pesquisa em eventos acadêmicos e científicos. Os sujeitos da pesquisa foram seis
professores: Alexandrina do Nascimento Gomes, Cecília Policarpo Pimenta, Firmino Barbosa de
Brito, Izabel de Oliveira Assunção, Lilian da Silva Ferreira e Marisa de Oliveira Carvalho. Os nomes
acima relacionados foram obtidos através de conversas informais com educadores da rede pública de
ensino, bem como nos arquivos da universidade referentes aos encontros de educação e linguagem.
As entrevistas aplicadas aos professores foram gravadas, transcritas, editadas e, previamente,
analisadas e os resultados foram socializados através de relatório. Os resultados preliminares
demonstraram que no exercício da profissão docente sempre haverá dificuldades. Nas entrevistas, os
professores deixaram bem claro que lecionar na época deles, não era mais fácil, porém, atualmente,
existe uma série de problemas na educação que interferem nas escolas, na organização curricular e no
trabalho dos professores, e alguns desses problemas relatados por eles são a multiplicidade de papeis,
a burocratização, as inumeras leis que de certa forma tira a autoridade dos professores fazendo com
que eles percam o respeito dos alunos e o que eles mais acham grave que é a indisciplina ea violência
que vem se agravando nos ultimos tempos. Todos concordam em um ponto: a profissão docente é
muito importante para o desenvolvimento de uma sociedade e, apesar de ser muito importante, o
professor não tem o devido reconhecimento.
Palavras-chave: Educação. História. Formação de Professores.
1
Orientanda – Acadêmica do curso de pedagogia da Fundação Universidade Federal de Rondônia,
Campus de Guajará-Mirim.
2
Orientador.
22
O ENSINO E A APRENDIZAGEM DE FRAÇÕES E NÚMEROS DECIMAIS NA
ESCOLA. CAMINHOS A SEREM SUPERADOS.
Aline Silva de Oliveira¹
Orestes Zivieri Neto²
RESUMO
O artigo integra os resultados finais do subprojeto “Como se ensina e como se aprende frações
e números decimais em matemática nas séries iniciais do ensino fundamental” 3, com objetivo
de mostrar as dificuldades que professores e alunos enfrentam, quando ensinam e aprendem
frações e números decimais. O projeto foi desenvolvido em duas escolas públicas estaduais do
município de Rolim de Moura - Rondônia, em salas de 4º e 5º Ano do Ensino Fundamental e,
traz uma abordagem qualitativa, utilizando, os seguintes instrumentos de coleta de dados:
levantamento bibliográfico, análise dos cadernos e dos livros didáticos, observação
participante e entrevistas com professores e alunos. Em suas preocupações procura
compreender as razões que levam a redução dos conceitos de frações e o tratamento
dicotomizado entre os conteúdos de frações e números decimais.
Palavras chaves: Frações e números decimais. Subconstructos. Ensino-aprendizagem.
INTRODUÇÃO
O presente artigo busca apresentar os resultados finais alcançados pela investigação
realizada através do subprojeto “Como se ensina e como se aprende frações e números
decimais em matemática nas séries iniciais do ensino fundamental”, realizado em duas escolas
pública estaduais do município de Rolim de Moura - Rondônia, que integra o projeto “Mas eu
ensino! As dificuldades inerentes ao processo de ensinar e de aprender matemática nas séries
iniciais”. O objetivo da nossa pesquisa está focado em investigar como se dá a prática
pedagógica no ensino da matemática e como está é planejada e desenvolvida, analisando se as
escolhas procedimentais atendem as necessidades dos alunos e se essas escolhas favorecem a
formação do conceito e sua consequente generalização.
Nossa investigação parte da seguinte problemática: Ensinam-se frações e números
decimais na escola? Como e de que modo, conceitualmente e procedimentalmente o problema
3
¹Acadêmica da Universidade Federal de Rondônia – UNIR / Campus de Rolim de Moura
²Prof. Dr. da Universidade Federal de Rondônia – UNIR / Campus de Rolim de Moura
Pesquisa financiada pelo Edital MCT/CNPq N º 14/2010 - Universal / Edital MCT/CNPq 14/2010,
sobre o registro nº 472664/2010-7, intitulada “Mas eu ensino! A dificuldades inerentes ao processo de ensinar e
de aprender matemática nas séries iniciais do ensino fundamental”.
23
previamente enfrentado nas operações de multiplicação e divisão interfere no processo de
aprendizagem com frações e decimais na escola?
Um elemento inquietante tem nos chamado atenção, é o fato dos professores
apresentarem o conteúdo de fração sem nenhuma conexão com o subconstructo quociente,que
o levaria a escrita decimal, atribuindo essa dificuldade ao fato de não encontrarem contextos
cotidianos de aplicações que vão além de situações de parte e todo. Por essa razão, frações e
números decimais não integrariam a mesma natureza de conhecimento, a dos números
racionais.
Dessa forma teremos a separação, um tratamento para fração reduzida ao vetor a/b
numa representação que cuida do todo divido em partes, porém em um processo de dupla
contagem para numerador e denominador, reduzindo, assim, seu sentido e significado. Já o
tratamento de números decimais contará com as relações com os sistemas de medidas e
monetário para lhe conferir mais sentido e significados.
Assim, inicialmente faremos uma incursão nos estudos já realizados na área temática,
seguido pelos materiais e métodos utilizados pela investigação. Por fim, apresentamos os
resultados e discussões com quatro categorias levantadas e, finalizaremos com as
considerações finais que relatam as reflexões obtidas ao longo do nosso período de pesquisa
nesses dois anos de investigação.
UM OLHAR MAIS PENETRANTE SOBRE O ENSINO DE FRAÇÕES E NÚMEROS
DECIMAIS
Ao se ensinar frações e números decimais nas salas de aula, percebe-se uma redução ao
subconstructo parte-todo, em parte isso se deve ao fato dos próprios professores acreditarem
que fazer associações com barra de chocolate, pizza, etc, torna mais fácil à aprendizagem de
seus alunos.
Segundo Valera (2003), os números racionais são conteúdos que os alunos, tanto do
ensino fundamental quanto do ensino médio, sentem dificuldades em aprender. Isso se deve
ao fato de que os números fracionários geralmente são encontrados na sociedade em sua
forma decimal, e as crianças ao chegarem à escola encontram dificuldades em reconhecê-los
pela ausência de uma memória de referência em seu dia-a-dia.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs (1998), por sua vez, já alertavam sobre a
aprendizagem desse conteúdo indicando que: “Embora as representações fracionárias e
decimais dos números racionais sejam conteúdos desenvolvidos nos ciclos iniciais, o que se
24
constata é que os estudantes chegam ao terceiro ciclo sem compreender os diferentes
significados associado a esse tipo de número e tampouco os procedimentos de cálculo”
(BRASIL, 1998, p.100).
Adicionava, ainda, que no ensino de frações fica evidente que o contato dos alunos com
essa representação é pouco frequente em seu cotidiano, pois, fica limitado apenas em
metades, terços, quartos, e em sua maioria mais por meio de linguagem oral do que
representações propriamente ditas. O documento sugere que a prática mais comum para
explorar o conceito de frações é a que recorre a situações em que está implícita a relação
parte-todo. Os PCN’s (1998) sugerem que o segundo ciclo do Ensino Fundamental sejam
trabalhados três significados: parte-todo, razão e quociente, e somente no terceiro ciclo do
Ensino Fundamental sejam introduzidos o significado do operador multiplicativo.
Os estudos de Kieren (1993, p.57) destacam a necessidade de que o conceito de número
racional pode ser construído a partir da categorização de quatro seguintes subconstructos:
quociente, operador multiplicativo, medidas e razões. Para Kieren (1993), os quatros
subconstructos citados já englobariam o subconstructo parte-todo, pois entende que as idéias
que o constituem já estariam implícitas aos mesmos.
No entanto, Kieren (apud Silva; Lima, 2004) mostra a fragilidade de adotar
exclusivamente o modelo parte/todo quando afirma que essa metodologia leva ao processo de
dupla contagem e não introduz a criança no campo dos quocientes. Essa forma de ensino faz
com que a criança desenvolva no modelo geométrico um processo de dupla contagem para
aprender a linguagem de frações. Os alunos aprendem que devem contar o número total de
partes em que foi dividido o inteiro e usar esse número como o denominador e que devem
contar o número de partes pintadas na figura e usá-lo para o numerador da fração. Isso então
leva os alunos, provavelmente, não compreenderem porque esse novo número não pertence
aos conjuntos dos inteiros, visto que estão sempre contando a quantidade de partes. Eles não
relacionam esses dois inteiros, pois a interpretação de quociente não lhes é apresentada e com
isso a relação entre numerador e denominador fica perdida, não se desenvolvendo a ideia de
número fracionário representando também uma quantidade.
Outro aspecto observável está ligado à maneira e ao modo em que se é ensinado fração,
a metodologia que cada professor utiliza, pois, muitas vezes as dificuldades de aprendizagem
do conceito de fração podem estar relacionadas ao fato dos professores desconhecerem o uso
social e as possíveis relações e associações com números fracionários, tornando a
aprendizagem de frações e números decimais mais complexas e desprovida de sentido e
significado.
25
É comum ouvir de alguns professores “para que ensinar frações se é um
conteúdo pouco utilizado na vida” Esse tipo de fala demonstra que os
próprios professores não conseguem estabelecer relações com números
racionais e o seu uso social tem dificuldades de lidar com esse assunto em
sala porque também não conseguem compreende-los. (NASCIMENTO,
2010, p.197-198).
Desse modo, o estudo de frações não deve recorrer à memorização mecânica do todo e
de suas partes, numa lógica aparente que tenta aproximar as pequenas divisões cotidianas de
barras de chocolates e pizzas, como se esse fosse o único conceito e função social. A
implicação dessa concepção pode erroneamente levar os alunos a não relacionarem o
conteúdo a suas aplicações diárias e não legitimar os seus usos cotidianos e, ainda levar a uma
falsa impressão de que conhecem profundamente frações. À exemplo do que nos diz
Malaspina (2007):
A prática mais comum para explorar o conceito de fração é a que recorre a
situação em que está implícita a relação parte-todo, como é o caso das
tradicionais divisões de um chocolate ou de uma pizza em partes iguais. As
crianças são informadas que o numero total de partes é o denominador, e que
o numero de partes pintadas, o numerador. Desta forma, introduzir fração
pode fazer com que as crianças tenham a impressão que sabem muito sobre
frações, mas isso pode ser um engano, uma vez que as situações são
limitadas [...] (MALASPINA, 2007, p.16).
Reforçando está ideia de Malaspina (2007), Nunes e Bryant (1997) destacam:
Com as frações as aparências enganam. Às vezes as crianças parecem ter
uma compreensão completa das frações e ainda não a têm. Elas usam os
termos fracionários certos; falam sobre frações coerentemente, resolvem
alguns problemas fracionais; mas diversos aspectos cruciais das frações
ainda lhes escapam. De fato, as aparências podem ser tão enganosas que é
possível que alguns alunos passem pela escola sem dominar as dificuldades
das frações, e sem que ninguém perceba. (NUNES & BRYANT, 1997,
p.191).
Os professores devem trazer consigo a preocupação de sempre contextualizar o conceito
que se propõe ensinar e, de preferência discutir a sua funcionalidade social, para que assim
valide os tipos de conhecimentos fora da escola, dando a ele um pouco mais de sentido e
significado.
26
No que diz respeito ao livro didático, Bezerra (2001) chama atenção, para a necessidade
de que os subconstructos garantam a formação dos conceitos, uma vez que em alguns casos,
os manuais, não se apresentam de maneira clara levando, consequentemente, o aluno a não
compreender o seu significado. Isso tudo acaba por recair a culpa sobre o professor quando
não analisa criticamente o conceito apresentado pelo livro.
Percebemos que o livro didático acaba enfocando uma ou outra concepção
para o conteúdo de frações... Porém se o professor tivesse uma melhor
formação para desenvolver as habilidades e competência dos alunos,
permitiria a estes a construção de seu próprio conhecimento. Assim, se as
frações pudessem ser exploradas sob os vários modelos, consequentemente
as crianças ampliariam seu campo conceitual. (BEZERRA, 2001, p.13).
Em alguns casos e, especificamente em alguns conteúdos os livros didáticos é um dos
principais instrumentos para o aprendizado em sala de aula, pois nele é possível encontrar
ilustrações, tabelas, analogias e diagramas, além de conter atividades, cujo único objetivo
inicial é auxiliar a produção de significados para o aluno. É preciso observar, no entanto, que
aquilo que está no livro, não é tudo que existe em relação a determinado conteúdo, por isso é
importante que o professor busque novas informações, inove seu processo de ensino com
atividades e materiais diferenciados.
Por isso, concorda-se com Miorim (1995) que a abordagem de números racionais, traz a
perspectiva de compreender frações e números decimais de forma agregadas constituindo,
inclusive, a base para outros conteúdos de cunho fortemente social como é o estudo das
medidas e sistema monetário, proporcionalidade, aproximando-se ao estudo da matemática
comercial e financeira, e, certamente possibilitando uma maior significação e sentido.
Enquanto tudo isso não acontece, os professores das escolas públicas continuam sua
triste sina de ensinar e não compreenderem porque as crianças não aprendem.
MATERIAIS E MÉTODOS
A pesquisa esteve em desenvolvimento em duas escolas estaduais da rede pública do
município de Rolim de Moura - RO, suas escolhas se deram com base no Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) de 2009, a escola “A”4 com aproximadamente,
1520 alunos matriculados, sendo 420 alunos de 1º ao 5º ano, 633 alunos do 6º ao 9º ano e 467
alunos cursando o ensino médio. O número de professores é de 53 no total, sendo 19 docentes
4
Para garantir o anonimato da escola chamaremos de “A” e “B”.
27
de 1º ao 5º ano e os demais dos outros anos. A escola ficou dentro da meta projetada e acima
da média alcançada pelo município no IDEB (2009), com uma pontuação de 4.8. A escola
“B” atende um número aproximadamente de 240 alunos de 1º ao 5º ano, o número de
professores efetivos é de 15, que atuam respectivamente nas séries iniciais oferecidas pela
escola. A escola teve sua pontuação no IDEB (2009) acima da meta projetada e abaixo da
média alcançada pelo município com 4,4.
A investigação é de caráter qualitativo, utilizando como instrumentos de coleta de
dados, levantamento bibliográfico, as análises dos cadernos dos alunos e dos livros didáticos
adotados para o 4º e 5º ano do ensino fundamental, observação em salas de aula e entrevistas
realizadas juntamente com alunos e professores.
As análises realizadas nos livros5 didáticos e cadernos, a observação realizada em salas
de aula e as entrevistas com alunos e professores, trouxeram de certa forma uma contribuição
expressiva para nossa investigação de ter inicialmente uma percepção mínima sobre como se
ensina e como se aprende frações e números decimais, assim como os fundamentos implícitos
no ato de ensino e, consequentemente, o aprendizado do conceito privilegiado.
Finalmente, com as entrevista pudemos encontrar de forma bastante consistente,
possíveis soluções para o problema de nossa investigação ou, mesmo evidências que apontem
novas indagações para futuras investigações.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
À medida que se adicionava cada instrumento de coleta de dados relacionados a cada
período da pesquisa, as informações geraram a perspectiva de serem tratadas e analisadas
levando em conta as frequências com que cada dado aparece e levando em conta o acúmulo
das informações levantadas, passaremos a adotar quatro categorias com a finalidade de
melhor apresentarmos os resultados evidenciados durante o período de investigação,
a) A perspectiva do ensino a partir dos livros didáticos adotados pelas escolas
Em relação à análise dos livros didáticos adotados pelas escolas “A” e “B”, nota-se que
seus conteúdos são tratados em separados e o grande destaque são as inúmeras ilustrações
com a função de reforçar o subconstructo parte-todo, sendo este proposto pelos próprios
autores. Sendo que nos livros aparecem os subconstructos quociente e operador
5
Os livros analisados são da editora Scipione, da coleção “A escola é nossa” dos autores Fábio Vieira,
Jackson Ribeiro e Karina Pessôa, em sua 2ª edição de 2010.
28
multiplicativo. As ilustrações procuram relacionar os conteúdos com o cotidiano das crianças
e, em relação a sua dosagem é dada com mais ênfase no 5º ano, quando se conclui as quatro
operações - multiplicação e divisão, no 4º ano é apenas uma introdução aos conteúdos, para
familiarizar as crianças a estes números.
Os estudos de Magina et. al. (2008), mostram realmente o que ocorrem quando os
professores escolhem os livros didáticos, pois optam por aqueles que apresentam um maior
número de figuras e ilustrações, por considerarem um recurso para suas explicações e, ao
mesmo tempo, de mais fácil compreensão para os alunos construírem os seus conceitos de
frações e números decimais.
Por fim, fica evidente que o livro didático é e sempre será um instrumento auxiliador no
processo de ensino e aprendizagem, ao docente cabe torná-lo o mais significativo possível
para os alunos, pois não adianta ter bons livros didáticos se nas mãos de professores
despreparados seriam facilmente transformadas em muleta, já um mau livro na mão de um
bom professor, certamente o obrigará a complementá-lo. E nessa perspectiva, como podemos
escolher bons livros didáticos sem cair nas armadilhas de uma boa ilustração e péssimas
escolhas teóricas metodológicas?
b) Quanto o assunto é frações e números decimais o cadernos dos alunos se
transforma em um apêndice do livro didático?
Ao apresentarmos a análise realizada nos cadernos dos alunos, pode-se comprovar a
intensidade em que os constructos de frações e números decimais são trabalhados pelos
professores com seus alunos em sala de aula, não há nenhuma outra atividade proposta que
não seja ou não esteja apresentada pelo livro didático. Nos cadernos é encontrado um grande
número de atividades que se associam com situações cotidianas, situações-problemas, as
frações sempre enfatizando conceito parte-todo representado por meio de figuras, mas,
também, são apresentados os subconstructos operador multiplicativo e quociente, estes por
sua vez em menor quantidade.
Na análise realizada nos cadernos dos alunos, fica comprovada a intensidade em que os
subconstructos de frações e números decimais são trabalhados pelos professores com seus
alunos em sala de aula. É evidente o acompanhamento da lógica proposta pelos livros
didáticos, tratando frações e números decimais como conteúdos isolados e não adotando a
abordagem de números racionais, sempre enfatizando o subconstructo parte-todo.
29
Finalmente, o que tudo isso nos revela? Há pelo menos três possibilidades de
entendimento. Numa primeira, levando em conta a separação dos dois conteúdos e a eleição
de um único subconstructo, de que ausência de formação continuada aos professores colocaos sempre em situação de arcaicos e em posição de desvantagem em relação ao domínio
conceitual e científico que constituí na atualidade a ideia de fração e de números decimais;
A segunda, seria a de que os professores considerando seus alunos incapazes de
apreenderem tais conceitos decidem diminuir a carga intelectual de compreensão sobre os
dois conteúdos. Os alunos, por sua vez, começam a acreditar em suas incapacidades e iniciam
um processo de anulação do conhecimento em matemática;
E a terceira, e última possibilidade seria a de que o uso do livro didático não estaria
auxiliando o professor no momento de transmitir o conceito de números racionais aos seus
alunos, exatamente pelo fato, dos livros abordarem esse conteúdo de modo separado
condicionando-os as vezes a adotarem as mesmas preferências metodológicas por falta de
uma autonomia intelectual que lhe permitiria contestá-la.
c) A insistência da escola pelo tratamento dicotomizado entre frações e números
decimais.
A separação que se dá entre a fração e os números decimais pelos professores, ainda que
inconscientemente, não acompanha a lógica dos números racionais, primeiro pela ausência do
subconstructo quociente, que traria a ideia de toda fração como um número decimal e,
segundo porque a insistência na dupla contagem na fração de numerador e denominador pelo
número de partes divididas e de partes pintadas não os desvinculam da ideia da fração como
outro número não mais natural.
Outro dado preocupante foi a observação de que muitos professores não tinham a
preocupação em ensinar o conteúdo de fração e decimal, e quando estes eram trabalhados o
único subconstructo utilizado era o parte-todo, mesmo que algumas atividades viessem
contrárias ao uso do parte-todo, e a consequência disso tudo era que grande parte dos alunos
não conseguiam concluir as atividades propostas
Ainda em relação aos livros didáticos e a sua redução no momento de ensinar, fica
evidente como alguns professores assumem ser o único material disponível para auxiliá-los:
Pesquisadora: Quando você tem que dar aula desse conteúdo como você
prepara essa aula? Professor “G”: Eu uso o livro e explico no quadro, porque
30
não dá muito tempo de usar outro material [...] (Entrevista realizada dia
22/05/2012, professor “G”, 5º ano escola “B”).
Com isso, fica certo que a diminuição do ensino esta voltada apenas para o
subconstructo parte-todo, que por sua vez é dado como ideia básica pelo manual do professor,
assim coloca-se uma “barreira” entre o aluno e a aquisição dos demais significados de
subconstructo, talvez devido a essa redução que o número de acerto do significado parte-todo
da fração prevalece sobre os demais significados. Comparando o índice de acerto em relação
aos problemas que contemplam os significados parte-todo e operador multiplicativo,
constamos que há uma diferença significativa em favor do parte-todo. Entretanto, esse
resultado sobre o significado parte-todo, por sua vez ainda não é satisfatório.
Diante das respostas dadas pelos professores quando questionados sobre o que eles
destacam dentro dos tópicos de frações, fica evidente o uso do subsconstructo parte-todo no
momento de ensinar seus alunos, e podemos comprovar esse trabalho quando um dos alunos
nas entrevistas responde, quando perguntado:
Pesquisadora: Você lembra alguma coisa que aprendeu com frações e
números decimais?
O aluno “X” respondeu: Eu lembro que também, fração tem que pintar
escrever e dividir.
Com essa resposta novamente ela é questionada: E como se divide?
A resposta da criança é a seguinte: Dividi em partes, pode dividir em quantas
partes quiser. (Entrevista realizada dia 30/05/2012, com alunos do 5° ano da
escola “B”)
Com isso Nunes (2003), em seus estudos indica os perigos das crianças utilizarem da
linguagem fracionária sem compreender completamente sua natureza, trazendo em sua
pesquisa consignações sobre as ameaças que envolvem a complexidade e a variedade dos
conceitos envolvendo frações.
Finalmente, quando materializamos a experiência de observação participante em sala de
aula e entrevista com os alunos e professores, todo o ciclo de frações e números decimais
torna passiveis de serem compreendidos tanto pela ótica reducionista do subconstructo,
quanto pela necessidade dos professores em investirem em formações continuadas para
superarem fobias e aversões de conteúdos, que antes de serem classificados previamente
como complexos seriam superadas pela ausência de autonomia intelectual e falta de
flexibilização de práticas pedagógicas alternativas para o ensino e aprendizagem de números
racionais.
31
d) A ótica reducionista do subconstructo parte-todo no processo de ensino e
aprendizagem de frações e números decimais.
A redução do ensino de frações ao subconstructo parte-todo, fazendo com que o aluno
restrinja seu conhecimento apenas a divisão de partes pintadas, juntamente com as
dificuldades de ensino dos demais subconstructos podem estar ligadas, também, ao fato de os
próprios professores não terem uma noção de como trabalhar estes conteúdos.
Nascimento (2010), por exemplo, realça em seus estudos a importância do próprio
professor gestar o conteúdo e a sala de aula para que isso resulte numa aprendizagem
significativa por parte dos alunos. É necessário que as atividades propostas pelo professor em
sala de aula tenham a finalidade de promover uma real obtenção do conteúdo privilegiando
um ensino no qual seja dada oportunidade ao aluno de compartilhar suas experiências.
O que se observou em sala de aula e nas entrevistas é que mesmo com todo o esforço,
por parte dos professores em selecionar atividades diferenciadas, ainda assim há um
predomínio e uma redução a um mesmo subconstructo. Isso tudo, como o próprio Bertoni
(1998) enfatiza pode estar ligado ao fato de os números racionais serem pouco utilizados em
nossa civilização, provocando uma grande dificuldade em seu processo de ensino e de
aprendizagem, pois certamente o aluno trará para escola pouca ou nenhuma vivência com
frações, embora sabendo tratar-se de números de grande valia para a matemática.
E sem querer culpabilizar alguém pelo fracasso no ensino e aprendizagem de frações, é
necessário destacar que ao recorrer ao livro didático os professores o usam como peça chave
para o trabalho em sala de aula, no entanto, sem o domínio necessário para trabalhar outros
subconstructos além do parte-todo, mesmo que, ainda, nos livros apareçam esses
subconstructos como o operador multiplicativo e o quociente, vistos nas categorias anteriores.
Sua formação lhe permite que apresente apenas o subconstructo parte-todo, por compreendêlo e por ser igualmente fácil para seus alunos também compreenderem. Com isso, mais uma
vez, afirmamos a necessidade da formação contínua de professores trabalharem com alguns
conteúdos que previamente podem ser complexos, para que os docentes possam mais
autonomamente oferecer atividades que venham de encontro com as necessidades de seus
alunos e lhe dê uma maior mobilidade cognitiva e de escolha e seleção das atividades.
Devemos voltar nossos olhos para a qualificação do professor, e levar em conta as
preocupações que estes têm em garantir ao aluno um ensino de qualidade, como nos revela
um dos professores entrevistados:
32
Pesquisadora: Você tem domínio do que se deve ensinar em frações e
números decimais ou necessita do auxilio de um bom livro didático?
Professor “M”: Sempre eu procuro ajuda, sempre, porque quando eu estava
nessa fase de aprender frações foi uma situação muito complicada que eu
vivi na época, a professora queria de todo jeito “enfiar” frações de “guela
abaixo”, daí de lá para cá, assim, eu arrasto porque como eu tenho filha que
já passou por essa fase de frações e eu estou na segunda filha que passa por
isso, sempre tento buscar por isso, que eu trago pizza eu vou variando, para
mim também estar entendendo e interagindo. Eu vou buscando outras
formas. (Entrevista realizada dia 17/04/2012, professor “M”, 4º ano, escola
“B”).
Talvez, assim, possamos pressupor o motivo que leva a escola e os professores optarem
pelo subconstructo parte-todo, pois tudo colabora para tentar amenizar ou invisibilizar o
problema com multiplicação e divisão que grande maioria dos alunos apresentam ao chegar
no 4º e 5º anos. No entanto, essa escolha reducionista do conteúdo de frações e números
decimais pode estar associada a falta de habilidades multiplicativas e divisoras de seus alunos,
pois aqueles que apresentariam essas dificuldades estariam previamente excluídos do
processo de aprendizagem, caso todos os subconstructos fossem levados adiante. O
subconstructo parte-todo não é, portanto, uma escolha e sim o que se é possível de se realizar.
Sobra boa vontade por parte dos professores, mas, no entanto falta-lhe conhecimento e
habilidades mais aprofundando sobre o assunto.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo de nosso estudo buscou-se destacar as dificuldades em ensinar e aprender
frações e números decimais e é a partir das investigações já realizada que se observa o grande
número de trabalhos, que além de confirmarem tal preocupação também mostra o vasto
campo de possibilidades que se abrem para que de fato tenha-se uma maior lucidez sobre
como se ensina e como se aprende frações.
Nos últimos anos, as pesquisas sobre o ensino e a aprendizagem desse tema
têm detectado inúmeros problemas e levantado hipóteses que, entretanto, não
abrangem a totalidade da problemática, nem são conclusivas. Talvez devido
a isso, propostas de ensino incorporando esses resultados são apenas
incipientes. O mais comum de se encontrar são as mesmas propostas de
sempre, que começam informando as crianças sobre nomes e símbolos de
frações, apresentando quadrados, retângulos ou círculos divididos e
parcialmente pintados. (BERTONI, 1998, p.02)
Buscou-se com parte dos fundamentos teóricos fazer as aproximações entre o que se
foi levantado e o que os estudos nos revelam, podendo assim, fazer associações, como,
33
inclusive o conselho apresentado por Malaspina (2007) em suas conclusões finais de estudo,
de forma incisiva por nós apresentado, quando considera razoável supor que introduzir
frações a partir do significado operador multiplicativo e quociente mostra ser o melhor
caminho para aprendizagem da fração, mesmo com crianças pequenas (8 anos).
(MALASPINA, 2007, p.167)
Nas análises dos livros didáticos e dos cadernos dos alunos encontra-se parte nossa
preocupação, pois apesar de alguns livros didáticos trazerem três e até quatro subconstructos
para a construção do conceito de frações e números decimais, os cadernos dos alunos indicam
uma redução ao conceito “parte-todo”, antes e idealmente eleito como o de mais fácil
compreensão pelos alunos, mas certamente redutor em sua possibilidade conceitual. Quanto a
associação com os conteúdos de sistemas de medidas, monetários, proporcionalidade estes
parece ser um consenso para o livro e o caderno dos alunos.
Evidenciamos com a observação em sala e as entrevistas, que a ausência de formação
permanente para o professor expõe suas poucas habilidades em suas gestões com o conteúdo
de frações e números decimais, resultando em uma abordagem dicotômica entre os mesmos e
reduzindo-os a um único subconstructo, mesmo os livros trazendo os demais subconstructos,
ainda sim, por desconhecimento, os mesmos optam por trabalhar com o parte-todo, reduzindo
o seu processo de aquisição de sentido e significado.
Finalmente, nota-se que a não utilização do subconstructos quociente e operador
multiplicativo deve-se a um problema prévio que possivelmente os alunos enfrentam com a
multiplicação e a divisão, e que no caso conceitual irá reduzir o aprendizado do novo
conteúdo. O novo conteúdo, não será inviabilizado de ser apresentado, nem tampouco as
quatro operações com frações e números decimais, o seu sentido e significado é que perderá
sua potencialidade, tendo apenas o subconstructo parte-todo como referência.
REFERÊNCIAS
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Frações
e
números
fracionários.
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34
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MAGINA, S; CAMPOS, V. A fração na perspectiva do professor e do aluno das séries
iniciais da escolarização brasileira. Bolema: Mathematics Education Bulletin = Bolema:
Boletim de Educação Matemática, Vol. 21, No 31 2008. Pontifícia Universidade Católica de
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MALASPINA, M. C. O. O inicio do ensino de fração: uma intervenção com alunos de 2ª
série
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Publicado
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2007.
Disponivel
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<http://www.pucsp.br/pos/edmat/ma/MALASPINA_maria_conceicao_oliveira.html>. Acesso
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Doutorado.
Campinas:
FE/UNICAMP,
1995.
Disponível
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NASCIMENTO, do Juliane. O ensino e a aprendizagem das frações no contexto das novas
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2010.
NUNES, T. Criança pode aprender frações. E gosta! In: GROSSI, E. P. (Org.). Por que
ainda há quem não aprende?A teoria. Rio de Janeiro: Vozes, 2003, p. 119-148.
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Disponível
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www.sbem.com.br/files/viii/pdf/01/PO03800969432.pdfSimilares>. Acesso em: 27 jun. 2011.
VALERA, A. R. Uso social e escolar dos números racionais: representação fracionária e
decimal. 164f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Filosofia e Ciências,
Marília/SP, 2003.
35
PROGRAMAS DE MELHORIA DA QUALIDADE DE ENSINO NA REDE PÚBLICA
MUNICIPAL URBANA EM PORTO VELHO
Ana Paula da Silva Oliveira6
Juracy Machado Pacífico7
RESUMO
O estudo apresenta os resultados da pesquisa que trata dos programas de melhoria da
qualidade de ensino na rede pública municipal urbana em Porto Velho. Investiga as políticas
públicas educacionais implementadas no período de 2001 a 2011, pela Secretaria Municipal
de Educação (SEMED), direcionadas à melhoria da qualidade do ensino nos anos iniciais do
ensino fundamental nas escolas públicas urbanas em Porto Velho. A partir dos estudos de
Azevedo (2003), Höfling (2001), Klein (2006), Souza (2011), Moraes (2009) dentre outros,
discute os temas política pública, políticas públicas educacionais, qualidade de ensino e fluxo
escolar. Com uma abordagem qualitativa, fundamentada em Bogdan e Biklen (1994),
desenvolveu um levantamento junto à SEMED sobre os programas de melhoria da qualidade
de ensino na rede pública e realizou entrevistas com gestores da SEMED. Os resultados
demonstram que vários programas foram desenvolvidos, mas que a maioria foi elaborada pelo
governo federal e implementada em parceria com o município. Verifica-se ainda que em
todos os programas a justificava principal é a melhoria da qualidade do ensino e da
aprendizagem. A partir dos resultados deduz-se que, para a SEMED, o fracasso escolar é,
principalmente, conseqüência da má formação docente.
Palavra-chave: Escolarização. Políticas Públicas. Qualidade de Ensino.
1 INTRODUÇÃO
O estudo apresenta os resultados da pesquisa desenvolvida a partir do plano de
trabalho “Programas de melhoria da qualidade de ensino na rede pública municipal urbana
em Porto Velho”, que tem como objetivo investigar as políticas implementadas no período de
2001 a 2011, pela Secretaria Municipal de Educação (SEMED), direcionadas à melhoria da
qualidade dos anos iniciais do ensino fundamental nas escolas públicas urbanas em Porto
Velho. Procuramos identificar e analisar apenas os programas e ações que tenham em seus
objetivos a intenção de incidir diretamente sobre a melhoria da qualidade do ensino oferecido
às crianças e adolescentes dos anos iniciais do ensino fundamental.
6
Bolsista do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação Científica – PIBIC/CNPq. Acadêmica do 5°
Período do Curso de Matemática – UNIR - Campus de Porto Velho. Integrante do Grupo Amazônico de Estudos
e Pesquisas em Psicologia e Educação - GAEPPE. E-mail: [email protected].
7
Orientadora. Departamento de Ciências da Educação – UNIR/Campus de Porto Velho. Integrante do
Grupo Amazônico de Estudos e Pesquisas em Psicologia e Educação - GAEPPE. E-mail: [email protected].
36
A partir dos anos de 1990, e principalmente, como conseqüência dos ideais garantidos
legalmente por ocasião da promulgação da Constituição Federal de 1988, no que tange ao
ensino fundamental foram sendo implementadas políticas de distribuição de recursos
(FUNDEF e FUNDEB), políticas de planejamento (Planos Nacionais de Educação), Políticas
de ampliação da jornada (Ensino Fundamental de Nove anos, ampliação do tempo de
permanência na escola) entre outras. Neste mesmo período vários programas federais se
estenderam para os estados e municípios voltados para a democratização da gestão, melhorias
do transporte escolar e também da alimentação, além de programas de formação de
professores.
No entanto, alguns dos investimentos, mesmo tendo como objetivo a melhoria da
qualidade da educação, não tiveram grandes impactos, se considerarmos os resultados das
avaliações nacionais. Para se ter uma idéia, em 2011, os anos iniciais do ensino fundamental
das escolas públicas municipais de Porto Velho apresentaram um resultado ainda muito alto
de índices de reprovação: 17.30, 14.50, 13.30 e 7.60, para o 2°, 3°, 4° e 5° ano
respectivamente. Tais dados demonstram a existência de problemas no processo já que os
resultados não são nada animadores, demonstrando que as políticas públicas precisam de
ajustes.
Segundo Höfling (2001, p. 31), política pública significa “[...] o Estado implantando
um projeto de governo, através de programas, de ações voltadas para setores específicos da
sociedade.” A educação se apresenta como uma “[...] política pública social, uma política
pública de corte social, de responsabilidade do Estado - mas não pensada somente por seus
organismos.” Klein (2006, p. 140) deixa claro que as políticas implementadas “[...] precisam
ser avaliadas para verificar sua eficácia e se há necessidade de mudanças.”
Para Souza (2008, p. 6), “[...], entender as políticas públicas é compreender como os
educadores, alunos e gestores vivenciam sua implantação e participam de sua concepção.”
Portanto, é de suma importância entender como esses agentes vivenciam as políticas
implementadas, pois só assim podemos verificar sua eficácia.
Em termos gerais a política educacional tem dois grandes desafios: acelerar o acúmulo
de escolarização da população, o que implica a ampliação do acesso e da permanência da
população nas escolas, em todos os níveis e modalidades da educação brasileira, e melhorar a
qualidade do ensino, prestando atenção redobrada às novas necessidades de conhecimentos e
habilidades requeridos no processo de desenvolvimento econômico e social atual. (CASTRO,
2009). Podemos perceber, portanto, que a melhoria da qualidade de ensino é um desafio que
37
não poderá ser enfrentado de forma isolada, mas está diretamente relacionada ao
desenvolvimento econômico e social atual do país.
Assim, o plano de trabalho vinculado ao subprojeto da orientadora intitulado Políticas
públicas de educação para o enfrentamento das dificuldades escolares na rede municipal na
cidade de Porto Velho/RO, buscou responder à seguinte pergunta: quais foram as políticas
públicas (planos, programas, projetos) implementadas no período de 2001 a 2011 pela
Secretaria Municipal de Educação (SEMED) direcionadas à melhoria da qualidade dos anos
iniciais do fundamental nas escolas públicas urbanas em Porto Velho?
2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Esta pesquisa fundamenta-se numa abordagem qualitativa e quanto a seus objetivos,
caracteriza-se como descritiva. Foi desenvolvida no município de Porto Velho, com dados da
rede pública municipal de educação envolvendo somente o perímetro urbano. Teve como
sujeitos os profissionais da SEMED que coordenam programas voltados a melhoria da
qualidade do ensino.
Para obtermos os dados necessários para realização desta pesquisa fizemos uso de
pesquisa bibliográfica, documental e entrevistas. Na pesquisa bibliográfica realizamos o
levantamento de bibliografias voltadas ao tema com as quais realizamos leituras com
elaboração de fichamentos. Na pesquisa documental fizemos o levantamento dos programas
de melhoria da qualidade do ensino junto à SEMED e também levantamos informações no
site oficial da Prefeitura Municipal de Porto Velho e do MEC. Para realizamos as entrevistas,
contamos com a participação de duas profissionais da educação que respondem por vários
programas na SEMED.
3 RESULTADOS E DISCUSSÕES
Apresentamos neste tópico os resultados finais desta pesquisa, incluindo os dados
levantados em sites oficiais do MEC e dados levantados junto à SEMED.
3.1 PROGRAMAS DE MELHORIA DA QUALIDADE DO ENSINO IMPLEMENTADOS
NA REDE MUNICIPAL DE PORTO VELHO
Conforme objetivos deste estudo, que é investigar as políticas implementadas pela
Secretaria Municipal de Educação (SEMED), direcionadas à melhoria da qualidade do ensino
38
dos anos iniciais do ensino fundamental nas escolas públicas em Porto Velho, no período de
2001 a 2011, realizamos um levantamento dos programas educacionais implementados pela
SEMED voltados para os anos iniciais das escolas públicas municipais de ensino fundamental
urbano em Porto Velho. Tais programas foram organizados em três grandes grupos, sendo
eles: a) Programas de formação docente. Neste grande grupo levantamos junto à SEMED dez
programas voltados à melhoria da qualidade do ensino desenvolvidos no período proposto de
2001 a 2011. Considerando que a soma total dos programas dos três grupos é igual a 18
programas, observa-se que os programas de formação docente representam a grande maioria;
b) Programas de formação de outros profissionais da educação. Neste grupo coletamos dados
de cinco programas que estiveram ou estão em vigor no município de Porto Velho. Percebe-se
que neste grupo de formação de outros profissionais da educação a atenção volta-se para a
formação dos gestores, de onde se pode inferir que, para a SEMED, é preciso uma gestão
competente para que haja um melhor andamento das questões escolares e até mesmo para um
melhor relacionamento entre os profissionais da educação e envolvidos; c) Programas de
reorganização dos tempos escolares e funcionamento da escola (práticas pedagógicas e
avaliação), que, segundo a SEMED, são desenvolvidos em parceria com pais, alunos,
professores e comunidade em geral.
Quadro 1 - Programas voltados para a melhoria da qualidade do ensino implementados pela
SEMED no período de 2001 a 2011 - rede municipal urbana.
1 - PROGRAMAS DE FORMAÇÃO DOCENTE
Programa
Programa
de
Desenvolvimento
Profissional Continuado PCN em Ação
Universidade Aberta do
Brasil (UAB) - Pedagogia
Programa de Formação de
Professores
Alfabetizadores (PROFA)
Plano
Nacional
de
Formação de Professores
da
Educação
Básica
Vinculação
(Federal, Estadual
Municipal)
Governo Federal
meio do Ministério
Educação
(MEC)
Governo Federal
meio do Ministério
Educação
(MEC)
Governo Federal
meio do Ministério
Educação
(MEC)
Governo Federal
meio do Ministério
Educação
Período
de
ou Desenvolvime Público Alvo
nto
por Entre 2001 a Professores
da 2003
Coordenadores
pedagógicos.
por da
Profissionais
Educação.
por 2010 a 2012
da
Professores
Coordenadores
pedagógicos.
por Iniciado
da 2011
e
da
e
em Professores
da
rede pública de
ensino.
39
(PARFOR),
via
Plataforma Freire
Programa
Gestão
da
Aprendizagem
Escolar
(GESTAR I - Urbano e
rural).
Programa de Formação
Continuada de Professore
das séries iniciais do
Ensino Fundamental (PróLetramento)
Mobilização
pela
Qualidade da Educação
Programa Nacional de
Formação Continuada em
Tecnologia Educacional
(ProInfo Integrado)
Programa de Habilitação e
Capacitação
de
Professores
Leigos
(PROHACAP).
Programa de Formação de
Professores em exercício
(PROFORMAÇÃO).
(MEC)
Governo
meio do
Educação
(MEC)
Governo
meio do
Educação
(MEC)
Governo
meio do
Educação
(MEC)
Governo
meio do
Educação
(MEC)
Governo
meio do
Educação
(MEC)
Programa de Educação na Muncipal
Amazônia: Ensinar a
Ensinar.
Federal por Turmas desde Professores do 2º
Ministério da 2007
ao 5º ano do
ensino
fundamental.
Federal por Turmas desde Professores
das
Ministério da 2009
séries iniciais do
Ensino
Fundamental.
Federal por
Ministério da Desde 2008
Professores
Gestores.
e
Federal por Ministério da
Professores
gestores
e
Federal por 2000-RO
Ministério da
Professores
no
exercício
da
docência e sem
ensino médio.
2000 a 2004
Docentes
que
atuam nas áreas
rurais
e
em
escolas urbanas.
DE OUTROS PROFISSIONAIS DA
2 - PROGRAMAS DE FORMAÇÃO
EDUCAÇÃO
Programa de Formação Governo Federal por
Inicial em Serviço dos meio do Ministério da
Profissionais da Educação Educação
Básica dos Sistemas de (MEC)
Ensino Público
(Profuncionário)
Programa Formação pela Governo Federal por
Escola
meio do Ministério da
Educação
(MEC)
Pós-Graduação
em Governo Federal por
Coordenação Pedagógica - meio do Ministério da
Programa
Escola
de Educação
Gestores
(MEC)
Pós-Graduação
em Governo Federal por
Tecnologia Educacional
meio do Ministério da
Educação
(MEC)
Pós Graduação em Gestão Governo Federal por
-
Funcionários
Escola
da
2010 e 2011
Profissionais
Educação
comunidade.
da
e
2010 a 2012
Coordenadores
Pedagógicos
Orientadores
educacionais
Profissionais
educação
-
2008 a 2010
e
da
Gestores (Diretor e
40
Escolar
meio do Ministério da
Educação
(MEC)
3 - PROGRAMAS DE REORGANIZAÇÃO
FUNCIONAMENTO DA ESCOLA
Mais Educação
Governo Federal por
meio do Ministério da
Educação
(MEC)
Correção de Fluxo - Se Governo Federal por
liga e Acelera Brasil
meio do Ministério da
Educação
(MEC)
Programa de incentivo a Governo Federal por
leitura e produção textual meio do Ministério da
“livro-carta-mural”
Educação
(MEC) e Municipal
vice-Diretor).
DOS TEMPOS ESCOLARES E
Iniciado
2008.
em Alunos do Ensino
Fundamental de 1º a
9º ano
Iniciado
2009.
em Alunos de até 15
anos
Iniciado
2009.
em Alunos do 3º ao 5º
ano, professores e
demais servidores.
Fonte: Elaborado pelos/as autores/as a partir de informações coletadas junto às Divisãoões da SEMED e site do
MEC, em fevereiro e junho de 2012.
Através dos programas acima citados e descritos podemos verificar que a maioria tem
vinculação com o governo federal em parceria com a prefeitura, recebendo, portanto repasses
financeiros federais, mas sempre com colaboração da própria SEMED para a realização dos
programas.
É necessário compreender as relações entre as políticas implementadas pelo governo
federal e os programas desenvolvidos pelo município de Porto Velho no período de
abrangência da pesquisa e fazer análise dos programas desenvolvidos, se são do governo
federal ou do município e quem eram os prefeitos, governadores e governo federal.
Observa-se que no período de 2001 a 2004 há uma constante troca de secretários
municipais de educação, chegando ao absurdo de, a cada ano, um novo secretário ou
secretária assumir a função. Porém, o prefeito permanecia o mesmo, o que é preocupante, pois
nos parece que a educação foi colocada como espaço de “qualquer um/uma”, ou, quem sabe, e
não passa de inferências, isso teria relação com quem possibilitava, ou não, a manobra dos
recursos que deveriam ser investidos em educação. Observa-se também que houve troca de
governadores e presidentes nesses primeiros quatro anos de nosso recorte, com siglas
partidárias também diferentes. No entanto, o período de 2005 a 2011 é marcado por
administrações petistas, tanto em âmbito municipal quanto federal.
É comum os programas passarem por alterações conforme a mudança de autoridade, e
é isso que Durham (2010, p. 176) afirma: “parte deles foi reformulada [...], parte foi
41
abandonada, alguns foram ampliados e outros foram criados”. Este fato se repete nos
departamentos e divisões da SEMED, nos quais ela se organiza.
Conforme fomos coletando dados junto a SEMED, fomos também percebendo a
dificuldade de colher informações de períodos anteriores ao dos responsáveis atuais pelos
departamentos. Isso nos pareceu que não há uma organização sistematizada dos programas
que foram implementados em períodos anteriores. Esse fato veio dificultar o aprofundamento
das características de alguns programas.
Ao realizarmos o levantamento dos programas de melhoria da qualidade do ensino
percebemos que a maioria dos programas tem vinculação com o governo federal. Isso ocorre
porque segundo uma das entrevistadas “quando esses programas são oferecidos a rede
prontamente adere, já entende que isso vai beneficiar nossos alunos, nossos professores”.
(Entrevista 2 - Representante da Divisão de Ensino Fundamental/SEMED - Porto Velho,
2012).
Consideramos a afirmativa de Durham (2010, p. 153), para quem “[...] as políticas
estaduais e municipais são tão ou mais importantes do que as intervenções federais para
assegurar a frequência à escola e melhorar o desempenho dos alunos.” O autor fala justamente
sobre essa especificidade que é necessária ao se pensar uma política pública educacional.
3.2 PLANEJAMENTO E AVALIAÇÃO DOS PROGRAMAS PELA SEMED
Conforme já informamos anteriormente, grande parte dos programas, no município de
Porto Velho, destinados a melhoria da qualidade do ensino tem vinculação com o governo
federal e são pensados em nível nacional. Ou seja, a maioria dos programas é planejada em
nível federal e, conforme entrevistas, implementada imediatamente ou com base no
Planejamento Estratégico, nas audiências públicas, nos dados do IDEB e nos diagnósticos
junto à rede municipal de ensino. Portanto, resta entender ainda a forma como a SEMED vem
acompanhando e avaliando estes programas.
A SEMED informou que na implementação e execução, “os procedimentos são
utilizados em consonância com as características de cada programa” (Entrevista 1 Representante da Divisão Formação/SEMED - Porto Velho, 2012), e que “o primeiro passo é
conhecer o programa [...] são feitos cursos, são feitos encontros para conhecer esse
programa.” (Entrevista 2 - Representante da Divisão de Ensino Fundamental/SEMED - Porto
Velho, 2012). Ou seja, é preciso conhecer para implementar. Com relação ao
acompanhamento, uma das entrevistadas diz:
42
Dependendo do programa o acompanhamento é feito de maneira direta na
escola ou através das atividades realizadas junto aos alunos e apresentadas
pelos professores cursistas. O governo federal mantém o acompanhamento
dos programas através de relatórios e/ou atividades durante a realização dos
cursos. (Entrevista 1 - Representante da Divisão Formação/SEMED - Porto
Velho, 2012).
O conteúdo dessa entrevista nos informa que além do acompanhamento pela
Secretaria Municipal de Educação e pela própria escola, existe também o acompanhamento do
governo federal considerando que a maioria tem vinculação com a esfera federal. A
entrevistada 2 diz ainda que o “acompanhamento é extremamente rigoroso”, que a SEMED
acompanha as escolas e que se o programa recebe apoio financeiro esse acompanhamento é
ainda mais rigoroso, através de plataformas e acompanhamento direto. (Entrevista 2 Representante da Divisão de Ensino Fundamental/SEMED - Porto Velho, 2012).
Conforme entrevistada 1 “a avaliação tem sido realizada por meio de instrumentais
específicos dos programas, das produções dos cursistas, dos relatórios, do SIMAFOR
(Sistema
de
Monitoramento
e
Avaliação
das
Formações/SEMED,
em
fase
de
experimentação)” e que “como a avaliação acontece sobre as ações de cada programa, possui
um caráter mais focado em contribuir para melhoria direta das ações de formação” (Entrevista
1 - Representante da Divisão Formação/SEMED - Porto Velho, 2012). Essa contribuição mais
específica no campo da formação docente nos possibilita inferir que se deve ao fato de que a
SEMED entende que é aí que se encontra o maior problema da educação no município.
Segundo a entrevistada 2, não adianta só investir na formação dos professores se esse
professor não tem tempo de participar de um curso, um programa de formação fornecido pela
SEMED, então é preciso que se invista neste professor, flexibilizando uma carga horária para
ele, possibilitando-o a participar de algo que será bom para a sua capacitação profissional e
para a melhoria da qualidade do ensino.
Segundo a entrevistada 1, “É preciso avançar mais, tendo por base avaliações mais
detalhadas de todas essas ações possibilitando os ajustes necessários”. (Entrevista 1 Representante da Divisão Formação/SEMED - Porto Velho, 2012). Ela vem ressaltando a
necessidade de avaliações mais detalhadas sobre as ações que envolvem os programas, pois é
preciso saber até onde o programa está apresentando melhoria e ao que se limita.
Não é demais, porém, retomar o que nos disseram Ribeiro, Ribeiro e Gusmão (2005,
p. 239), onde, tomando como foco a qualidade da escola, estabeleceram sete diferentes
dimensões para traduzir a ampla concepção de qualidade educativa. Isso porque a qualidade
43
da educação não se limita a alguns aspectos, mas a vários: “1. Ambiente educativo 2. Prática
pedagógica 3. Avaliação 4. Gestão escolar democrática 5. Formação e condições de trabalho
dos profissionais da escola 6. Ambiente físico escolar 7. Acesso, permanência e sucesso na
escola.” Logo acreditamos que para que haja essa avaliação sistematizada dos programas de
melhoria da qualidade do ensino é preciso que sejam consideradas todas essas dimensões
apontadas acima como possibilidades de se aproximar da qualidade do ensino.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tendo como base a fundamentação teórica estudada, podemos concluir que as
políticas públicas educacionais, materializadas em programas e ações, têm por objetivo
incidirem diretamente sobre a melhoria da qualidade de ensino e/ou enfrentamento das
dificuldades escolares.
Nesse sentido, a partir das concepções dos vários autores e autoras estudados,
concluímos que um sistema educacional é de qualidade quando seus alunos e alunas
aprendem e avançam na escolarização, ou seja, são bem sucedidos na escola. Mas garantir a
aprendizagem e o avanço ainda não é suficiente, pois a qualidade também implica em atender
a todas as crianças e jovens em idade escolar.
Observamos que vários programas foram desenvolvidos pela SEMED e que, de modo
geral, a preocupação que os fundamentou e os fundamenta a é a qualidade de ensino. O
levantamento quantitativo dos programas de melhoria da qualidade de ensino em Porto Velho
nos possibilitou verificar que a preocupação quanto ao fracasso escolar tem incidido mais
sobre a formação. Tais concepções recaem, portanto, no estudo de Angelucci et al (2004) no
que se refere à tendência das políticas públicas em diagnosticar o fracasso escolar como
problema técnico, ou seja, por inadequação de metodologias e que a formação docente iria
resolver tal problemática.
Outro dado que nos chamou atenção foi o fato de a grande maioria dos programas
serem pensados pelo governo federal e adotado pela Secretaria Municipal de Educação, não
considerando as características únicas do município, mas que conforme as entrevistas
realizadas tem surtido resultados positivos mesmo que de forma gradativa e pouco perceptiva.
Mas fica-nos a certeza de que é necessário que haja uma política de educação
igualitária para que assim os estudantes tenham os mesmos direitos, sem discriminação de
sexo, raça, etnia, religião e capacidade, tendo acesso, permanência e sucesso nas etapas da
educação. (CURY, 2005). “[...] a educação básica deve ser objeto de uma política educacional
44
de igualdade concreta e que faça jus à educação como o primeiro dos direitos sociais inscrito
em nossa Constituição” (p. 29).
Podemos inferir, ao término desta pesquisa, que há ainda muito a se estudar com
relação às políticas públicas educacionais no município de Porto Velho, já que muitas
perguntas precisam ser respondidas. Conhecer os programas voltados à melhoria da qualidade
do ensino é um estudo constante que precisa considerar cada vez mais as especificidades de
cada etapa da educação, bem como considerar o olhar dos diretamente envolvidos: os sujeitos
da escola, o que pretendemos em nosso próximo plano de trabalho.
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46
PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO: QUANTO SOBRE ADAPTAÇÕES
CURRICULARES PODE SER VISTO NESTE DOCUMENTO?
Angélica Aparecida Máximo8
Flávia Pansini9
RESUMO
O artigo tem por objetivo divulgar os resultados de uma pesquisa que investiga como as
adaptações curriculares para o atendimento aos estudantes com Necessidades Educacionais
Especiais instituídas pelo Ministério da Educação em 1998, estão sendo inseridas nos Projetos
Político-Pedagógicos de 10 escolas públicas estaduais do município de Rolim de Moura Rondônia. A partir de uma abordagem qualitativa, utilizou-se como instrumentos de coleta de
dados análises documentais e entrevista individual. Os resultados apontam que os PPP’s
abordam as questões sobre adaptações curriculares de modo superficial, dificultando o
estabelecimento de práticas capazes de promover uma inclusão sem prejuízo para a
aprendizagem escolar desses alunos.
Palavras-chave: Inclusão escolar. Adaptação curricular. Pessoa com deficiência
INTRODUÇÃO
A preocupação com a inclusão de crianças com necessidades especiais na educação
brasileira tem se intensificado desde a década de 1980, com a iniciativa de movimentos
sociais engajados na luta em defesa dos direitos das pessoas com deficiência. No entanto, essa
preocupação se torna ainda mais intensa a partir de 1990 com a realização da “Conferência
Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais: acesso e qualidade” promovida pela
Organização das Nações Unidas para a educação, a ciência e a cultura (UNESCO) em 1994
na Espanha.
Esta conferência resultou na elaboração da “Declaração de Salamanca”, documento
contendo 17 páginas nas quais se preconiza o acesso a escola preferencialmente no convívio
com outras pessoas sem deficiência, “reconhecendo a necessidade e urgência do
providenciamento de educação para as crianças, jovens e adultos com necessidades
educacionais especiais dentro do sistema regular de ensino” (UNESCO, 1996, p. 01).
A Declaração, portanto, parte do princípio de que as “escolas devem acomodar todas
as crianças independentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais,
linguísticas ou outras” (idem, p. 03). Para tanto, necessitam se adaptar às necessidades
8
9
Bolsista PIBIC/UNIR
Orientadora
47
desses estudantes, estabelecendo mudanças em vários aspectos da escolarização, como no
“[...] currículo, prédios, organização escolar, pedagogia, avaliação, pessoal, filosofia da escola
e atividades extra-curriculares” (UNESCO, 1996, p. 08).
Para que este desafio pudesse ser superado de forma gradual pelas escolas, nos últimos
anos o Ministério da Educação (MEC) e as Secretarias de Educação têm lançado mão de um
conjunto de leis, diretrizes e documentos orientadores a fim de subsidiar as instituições
educativas. Dentre estes, é possível citar no âmbito nacional: Lei nº 9394/96 que institui as
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 2010); Resolução CNE/CEB Nº 2/2001
que institui as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica (BRASIL,
2001); Parâmetros Curriculares Nacionais: Adaptações Curriculares (BRASIL, 1998);
Decreto nº 7.611/2011 que dispõe sobre a educação especial, o atendimento educacional
especializado e dá outras providências (BRASIL, 2011), entre outros. No âmbito Estadual a
educação especial é regida principalmente pelas Resoluções nº 138/1999 - CEE/RO e
n°552/2009 - CEE/RO - que regulamenta os dispositivos da Lei 9394/96 a serem observados
pelos sistemas de Ensino no Estado (RONDÔNIA, 1999) e institui as Diretrizes e Normas
Para a Educação Especial (RONDÔNIA, 2009).
Procurando entender os impactos e mudanças produzidas por estes documentos no
cotidiano das escolas públicas a pesquisa intitulada “Adaptações curriculares na rede estadual
de Rolim de Moura - RO: o que revelam os Projetos Político-Pedagógicos e as práticas
desenvolvidas pelas escolas”, tem por objetivo principal conhecer como têm sido realizadas as
adaptações curriculares no interior das escolas estaduais de Rolim de Moura - Rondônia, bem
como as contribuições que estas têm trazido para a inclusão de crianças com necessidades
educacionais matriculadas na rede regular de ensino.
Este artigo, portanto, apresenta alguns resultados obtidos nesta investigação.
Organizamos o texto em três partes. Na primeira destacamos o conceito de adaptações
curriculares e o modo como vêm sendo contempladas nos Projetos Político-Pedagógicos
escolares na opinião de diferentes autores. Na segunda explicitamos os procedimentos
metodológicos utilizados, seguindo-se dos resultados e discussões, a partir de fragmentos
selecionados dos projetos das escolas, bem como da entrevista realizada com a coordenadora
da Educação Especial da Representação de ensino (REN) de Rolim de Moura - RO.
48
ADAPTAÇÕES CURRICULARES E PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO: A
VISÃO DO PCN E OUTROS AUTORES
De acordo com estudos de Reali e Nóbrega (2011, p.04), as discussões sobre
adaptações curriculares no cenário brasileiro se intensificaram após a promulgação da Lei
9394/96, “[...] quando o paradigma da inclusão escolar é inserido em textos oficiais
especificamente referentes à educação de modo a buscar apoiar a prática pedagógica
desenvolvida em escolas regulares”.
Consequentemente, dois anos após a promulgação da LDB o MEC publica o
documento “Adaptações curriculares: Estratégias para a educação de alunos com
necessidades educacionais especiais”, contendo orientações que definem o que são as
adaptações e como devem acontecer na escola. A partir de então, surgem diversos trabalhos
que baseados neste documento, discutem e problematizam o conceito de adaptações
curriculares (FRANCO, 2000; OLIVEIRA; MACHADO, 2007; FERNANDES; ANTUNES;
GLAT, 2007; HEREDERO, 2010).
Para Oliveira e Machado (2007), as adaptações são na realidade uma forma de se
repensar as condições da escola para acolher bem a diversidade dos alunos. Estas partem do
princípio de que um currículo único poderia “acentuar as práticas excludentes, agora sob a
forma do descaso e do abandono destes alunos ao ‘fundo da sala de aula’ e aos perigosos
rótulos das ‘dificuldades de aprendizagem’” (p. 40 - grifos das autoras).
As autoras também estabelecem uma diferenciação entre adaptações de acesso ao
currículo e adaptações curriculares propriamente ditas; enquanto a primeira compreende a
adequação do ambiente escolar por meio da criação de condições físicas, ambientais e
materiais, as adaptações curriculares “permitem a eliminação ou a introdução de objetivos
específicos, complementares e/ou alternativos e de conteúdos, como forma de favorecer o
desenvolvimento e a aprendizagem dos alunos com necessidades educacionais específicas”
(OLIVEIRA; MACHADO, 2007, p. 45).
Com relação ao que é proposto pelo PCN (BRASIL, 1998), este enfatiza que as
adaptações devem ser realizadas em condições de transversalidade, envolvendo todos os
níveis de ensino, podendo ser significativas e não significativas, além de realizarem-se em três
níveis: no Projeto Político-Pedagógico, no currículo desenvolvido em sala de aula e no âmbito
individualizado. No que diz respeito ao Projeto Político-Pedagógico, este deve orientar a
operacionalização do currículo, como um recurso para promover o desenvolvimento e a
aprendizagem dos alunos, considerando-se os seguintes aspectos:
49
•
•
•
•
•
atitude favorável da escola para diversificar e flexibilizar o
processo de ensino-aprendizagem, de modo a atender às diferenças
individuais dos alunos;
identificação das necessidades educacionais especiais para
justificar a priorização de recursos e meios favoráveis à sua
educação;
adoção de currículos abertos e propostas curriculares
diversificadas, em lugar de uma concepção uniforme e
homogeneizadora de currículo;
flexibilidade quanto à organização e ao funcionamento da escola,
para atender à demanda diversificada dos alunos;
possibilidade de incluir professores especializados, serviços de
apoio e outros, não convencionais, para favorecer o processo
educacional (BRASIL, 1998, p. 32).
Mas, se por um lado, o PCN orienta que as escolas façam uma previsão desses
elementos no Projeto Político-Pedagógico, por outro, autores têm se preocupado com a forma
como as adaptações têm sido inseridas nesse documento. De acordo com Moreira e Baumel
(2001, p. 133).
[...] devemos lembrar, de um lado, que o projeto pedagógico da escola não
pode se traduzir simplesmente em princípios e normas de ações úteis e
eficazes, denotando um caráter eminentemente prescritivo para definir a
prática. E de outro, a forma como vem sendo incluído o “aluno especial” no
ensino regular, com escolas que, em sua grande maioria, não atendem suas
necessidades básicas e com professores que não receberam ao longo de sua
formação, inicial ou continuada, subsídios concretos acerca desses alunos.
Indagamos, então, em que condições serão realizadas as adaptações
curriculares?
No mesmo sentido, Glat, Pletsch e Fontes (2007), alertam que é necessário refletir
sobre o próprio conceito de inclusão uma vez que para tornarem-se inclusivas as escolas
precisam “avaliar e re-desenhar sua estrutura, organização, projeto político-pedagógico,
recursos didáticos, práticas avaliativas, metodologias e estratégias de ensino” (p. 344).
Opinião esta, também defendida por Heredero (2010) ao enfatizar que para propor um
planejamento que dê atenção às crianças e jovens que possuem algum tipo de deficiência, a
primeira atuação da escola deverá ser no sentido de descrever no Projeto Político Pedagógico,
“[...] o desejo de fazer da atenção à diversidade uma forma de trabalho da escola que responda
às suas necessidades educativas especiais” (2010, p. 194).
Do mesmo modo, Oliveira e Leite (2007) acreditam que o Projeto Político-Pedagógico
deve ser o foco das adaptações curriculares, uma vez que, a implementação de um sistema
50
inclusivo implica um “[...] trabalho unificado de toda equipe escolar, como também de
suporte e assessoria de profissionais de outros setores municipais, como saúde, transporte,
assistência social entre outros (p. 519).
Tendo em vista as preocupações manifestadas por estes autores, a seguir descrevemos
o aporte metodológico utilizado para em seguida discutir, como as escolas tem inserido tais
discussões sobre adaptações curriculares nos seus Projetos Político-Pedagógicos.
A PESQUISA
A investigação objeto deste estudo realizou-se nos anos de 2011 e 2012 a partir de
uma abordagem qualitativa da pesquisa em educação, tendo como foco dez escolas públicas
estaduais da área urbana de Rolim de Moura que atendem os anos iniciais do ensino
fundamental. Nela foram utilizados como fonte de dados análise documental e entrevista
individual.
Das dez escolas participantes, nove recebiam as crianças com deficiência nas salas de
aula regular e uma somente por meio da sala de recurso, pois não possuía turmas dos anos
iniciais do Ensino Fundamental, tendo sido incluída por atuar como serviço de apoio
especializado. Uma delas atendia somente os anos iniciais do ensino fundamental, duas os
anos iniciais e finais e as demais até o Ensino Médio. O número de alunos com necessidades
educacionais especiais matriculados variava de 02 a 15. Havia entre os PPPs destas escolas
uma diferença significativa no ano de sua elaboração, sendo os mais antigos de 2007 a 2009 e
os mais recentes de 2010 e 2011.
No que diz respeito à coordenadora de educação especial entrevistada, esta tinha idade
de 36 anos e possuía graduação em educação física e pós-graduação (especialização) em
educação inclusiva; atuava na educação há 12 anos, sendo que os três últimos foram
dedicados a educação inclusiva na Secretaria de Educação de Rondônia com 40 horas de
trabalho semanal.
Com relação à coleta do material, os Projetos Político-Pedagógicos foram recolhidos
entre os meses de outubro e novembro de 2011 e a entrevista foi realizada no início de 2012.
Com os dados em mãos, realizamos uma leitura flutuante dos projetos onde, segundo
Bardin apud Franco (2005, p.48), devem acontecer os primeiros “contatos com os
documentos a serem analisados e conhecer os textos e mensagens neles contidas”. Em
seguida, os dados foram confrontados e postos em relação com as informações da entrevista.
A partir de então, formulamos questões indicadoras que serviram de índices para a elaboração
51
das categorias que foram analisadas “à luz das teorias explicativas” (FRANCO, 2005)
utilizadas na fundamentação teórica.
AS ÊNFASES E AS OMISSÕES NOS PROJETOS DAS ESCOLAS
Visando garantir a organização dos dados, para a análise as escolas foram dispostas
em ordem alfabética e caracterizadas utilizando-se as letras do alfabeto. Sendo assim, sempre
que forem citadas serão utilizadas as respectivas letras A, B, C, D, E, F, G, H, I e J.
Ao nos debruçarmos sobre a ocorrência de questões relativas às adaptações
curriculares presentes nos Projetos, a primeira questão observada nos remete ao fato de que a
discussão em torno da legislação que garante o acesso com qualidade das crianças com
deficiência na escola fica restrita a simples menção de leis sem qualquer tipo de explicação ou
detalhe do que se aborda em cada uma delas, tampouco suas implicações para a permanência
das crianças na escola.
Ao ser indagada sobre isso, a coordenadora de Educação Especial relata que as escolas
tomam por base para a aplicação de adaptações curriculares ou outros assuntos referentes à
educação especial as Resoluções nº 138/1999 e 552/2009, ambas do Conselho Estadual de
Educação.
Ao analisarmos os dois documentos, percebe-se que em vários pontos eles tomam
rumos diferentes, tornando-se por vezes contraditórios em relação às recomendações
apontadas por documentos nacionais. Um exemplo disso se dá em relação ao número de
alunos a serem atendidos nas salas de aulas. Enquanto a resolução 552/2009 regulamenta no
artigo 7º que “para o ingresso e o atendimento aos alunos com necessidades educacionais
especiais, os mantenedores e/ou as instituições de ensino devem prever e prover: [...]
organização de turmas com número reduzido de alunos, evitando-se a inserção de alunos com
diferentes deficiências” (RONDONIA, 2009, p. 03), a Resolução 138/1999 regulamenta em
seu artigo Art. 39 que para o atendimento aos educandos portadores de necessidades
educativas especiais nas classes comuns das escolas regulares serão observados os seguintes
critérios gerais, para as necessidades especificadas:
§ 1º Deficiência Mental: no máximo 04 alunos em turmas de 30 alunos; [...]
§ 2º Deficiência Visual: a) cegos - máximo de 02 alunos por turma de 25
alunos; b) visão subnormal - máximo de 04 alunos por turmas de 25 alunos.
[...] § 3º Deficiência Auditiva: máximo 02 alunos por turma de 25 alunos;
(RONDONIA, 1999, p. 16).
52
Cabe perguntar então, qual será o entendimento dos responsáveis pela Educação
Especial sobre o que seria um “número reduzido de alunos”? É interessante mencionar que os
números citados na resolução 138, são bem menores quando se trata de classes e escolas
especiais o que pode ser entendido como um posicionamento político que visa “facilitar” a
permanência de crianças em escolas especiais quando a lei alega preferência pela matrícula
em salas regulares.
Ainda que de forma implícita, o pensamento presente nestas resoluções corrobora as
afirmações de Silva (2003, p. 90) para quem uma das conseqüências dessas prioridades “foi o
reforço do atendimento em instituições especializadas e a subvenção quantitativamente maior
de verbas públicas para esses trabalhos e atendimentos, tornando-se ‘políticas oficiais’” (grifo
da autora). Em outras palavras, quais pais ou mães desejarão retirar seu filho de uma escola
especial em que há um pequeno número de crianças sobre os cuidados de vários profissionais
para colocá-los em uma escola pública regular que pelas condições estruturais e humanas não
lhes dão garantia de sucesso para seus filhos?
A esse respeito, no Projeto da Escola A, percebe-se um descontentamento dos atores
em relação ao número de alunos ao mencionar que:
[...] os alunos matriculados na escola portadores de NEE serão distribuídos
de acordo com o número de salas disponíveis de forma que não
sobrecarregue a nenhuma, sendo que nas salas que tenham alunos especiais
matriculados o número de alunos deve ser menor que nas outras. [...] Em
relação a Resolução nº 138/99 - CEE/RO, na verdade, a Inclusão está
acontecendo, mas a equipe está preocupada com a forma metodológica
aplicada, tendo em vista que o trabalho realizado não está de encontro
suficiente com as necessidades que os alunos apresentam [...] podemos dizer
que os suportes e recursos também não são adequados e nem suficientes para
atender as necessidades apresentadas pelos alunos. [...] Assim sendo, acaba
gerando insegurança e insatisfação da parte dos profissionais bem como da
escola num todo. [...] na verdade a Inclusão está acontecendo, mas não
dentro do desejado (Escola A, 2010, pp. 56-57).
Tal descontentamento nos lembra as palavras de Arelaro (2003, p. 30) ao dizer que na
formulação de leis e na elaboração do próprio Pcn não se “ouviram os professores das redes
públicas, de qualquer região do país, sobre como trabalhavam, nem quais eram suas
dificuldades e como pensavam enfrentá-las ou superá-las”. Para a autora, o fracasso na
aplicação das propostas do Pcn sobre adaptações curriculares nas escolas pode ser explicado
pelo fato de que:
53
Ao lado do discurso falsamente autônomo e descentralizador, de que as
comunidades e os professores deveriam construir e propor seu projeto
pedagógico inovador [...] são elaborados ‘Parâmetros Curriculares’, a partir
de propostas ‘modernas’ de bem-sucedidas escolas privadas, da região
sudeste, de clientela de alto poder aquisitivo (Idem, p. 29 - grifos da autora).
Essa dissonância também é sentida pela coordenadora de Educação Especial ao
afirmar que o alto número de alunos em sala era a principal dificuldade encontrada no
momento de auxiliar as escolas. Nas suas palavras: “a dificuldade da inclusão é o número de
alunos em sala, o professor questiona que é difícil trabalhar em uma sala com 30 alunos e um
com NEE e não tem cuidador. É só o professor mesmo! Então é muito difícil, mas a escola
não pode dizer não!”
Da mesma forma como ocorre com a legislação, observamos que são mais recorrentes
nos projetos as discussões em torno de adaptações de acesso ao currículo, ao passo em que
aspectos relativos às adaptações pedagógicas propriamente ditas são abordados de modo
superficial ou mesmo não mencionados.
Em relação às adaptações de acesso ao currículo, as referências se restringem à
especificação das condições físicas e suas possíveis readequações, como apresentado nos
trechos a seguir.
As dependências estão adaptadas para os alunos com necessidades
educacionais especiais (rampas, sanitários adaptados, portas alargadas,
sinalização) (Escola D, 2010, p. 10).
Instalação de barras de apoio para os espaços necessários, placas de
borrachas nas rampas existentes. [...] Alargamento das portas para atender os
portadores de necessidades especiais (Escola J, 2009, p. 68).
Todavia, embora as questões físicas apareçam com maior frequência, a necessidade de
materiais e equipamentos é pouco abordada. Há ainda, pouca menção sobre as barreiras
comunicacionais, não apresentando informações sobre como será estabelecida a comunicação
entre os alunos com NEE e seus professores, os demais funcionários e alunos. Assim, o
acesso ao currículo ocorre de modo limitado, pois não contempla as “condições de acesso à
locomoção, comunicação, informação e conhecimento para todas as pessoas” (FERNANDES,
ANTUNES E GLAT, 2007, p.54) de modo satisfatório.
Para Fernandes, Antunes e Glat (2007, p.55) as barreiras de comunicação têm uma
grande importância “[...], pois afetam não só o acesso à informação de modo geral, mas
também prejudica diretamente a aprendizagem escolar”. Entre os projetos que mencionam
adaptações na comunicação e nos materiais temos:
54
São distribuídas obras didáticas em Braille de língua portuguesa,
matemática, ciência, historia geografia e dicionários. (Escola C, 2010, p. 44)
Buscar junto às autoridades competentes e responsáveis a criação de um
espaço inclusivo [...] materiais didáticos: livros de acordo com a necessidade
ou deficiência - tecnológico: TV, vídeo, DVD, fitas, computador com
programa apropriado para cada situação inclusiva e outras adaptações que
julgar necessário. (Escola E, 2007, p. 35)
Confecção de materiais concretos para manuseio dos alunos; (Escola J,
2009, p. 72).
Percebe-se que não há maiores detalhes sobre a forma como acontecerá a
operacionalização para que as ações se tornem realidade, como por exemplo, a importância de
ouvir a família e outros profissionais para buscar a melhor alternativa de material e
comunicação, tal como previsto nas diretrizes Nacionais da Educação Especial.
Outro elemento problemático diz respeito à dificuldade financeira das escolas, que
muitas vezes são as únicas responsáveis pelas adequações. Nesse sentido, a coordenadora
relata que em relação às adaptações físicas, as mudanças foram sentidas mais por aquelas
escolas contempladas com o Programa Acessibilidade do governo federal e com as salas de
recursos que no município são apenas duas. As demais precisam utilizar recursos do Plano de
Desenvolvimento da Escola (PDE) para a aquisição de equipamentos, livros e outros materiais
adequados para o atendimento as crianças com deficiência. A dificuldade, segundo ela, está
justamente no fato das escolas terem inúmeras questões consideradas prioritárias, de modo
que, a educação especial, área ainda segregada tanto na educação quanto na sociedade, acaba
ficando sempre para um segundo plano. Para Arelaro (2003, p. 33)
Nesta lógica, entramos num “beco sem saída” para a cidadania da maioria
(pobre) da população, pois se não contamos mais com nenhuma “folga” ou
“disponibilidade” orçamentária, e ainda faltam tantos “milhões” sem
atendimento educacional, a única alternativa do Governo é o rebaixamento
do padrão de qualidade de ensino, para que ele “caiba” na disponibilidade
financeira atual (grifos da autora).
Neste sentido, questionamos o próprio modo como as escolas têm se utilizado dos seus
PPP’s, uma vez que estes não apontam para ações concretas a serem realizadas a curto, médio
e longo prazo. Essa ausência se agrava ainda mais em relação às adaptações pedagógicas que,
segundo Oliveira e Machado (2007, p. 45), dizem respeito as:
[...] modificações no número máximo de alunos que uma sala de aula pode
comportar, a definição da sistemática de trabalho cooperativo entre os
professores do ensino Regular e do Ensino Especial, bem como em ajustes
no tempo de permanência de um aluno em uma determinada série. [...]
55
modificações realizadas no planejamento, nos objetivos da escola, nas
estratégias de aplicação desse conteúdo e de avaliação, no currículo como
um todo ou em aspectos dele.
Em relação aos aspectos mencionados pelas autoras, a maioria dos projetos expressa
preocupação em garantir o respeito à diversidade, porém de modo genérico como é possível
perceber nos projetos das escolas E e D ao mencionarem que “[...] para a ação pedagógica os
professores deverão adaptar os currículos, os conteúdos e as avaliações” (Escola E, 2007 p.
35) e “Adaptar o currículo às necessidades dos alunos é fundamental para a criação de
melhores oportunidades educativas, dando espaço à otimização das ações educacionais.
(Escola D, 2010, p. 05).
Ainda de acordo com a escola D, a adequação curricular aplica-se “[...] tanto a
condições gerais da escola, como da sala de aula, das metodologias e das atividades de ensino,
desdobrando-se a nível individual se necessário”. (Escola D, 2010, p. 05). Entretanto, esta
preocupação não se materializa em discussões mais específicas sobre objetivos, conteúdos,
avaliação, temporalidade, entre outros, necessários para que a escola possa garantir as
adequações citadas. Em relação à avaliação, por exemplo, os Projetos das Escolas D, B e J, se
limitam a mencionar que:
A avaliação deverá referir-se aos objetivos propostos nos planos de ensino,
de modo a subsidiar o professor a avaliar as condições em que os mesmos
foram atingidos para, a partir desses dados, redirecionar os seus planos e
refletir sobre sua prática educativa. A Avaliação da aprendizagem é
contínua, cumulativa, processual e coletiva. Tem por objetivo a verificação
do aproveitamento e desenvolvimento do educando, aferindo mudanças de
comportamento do (a) aluno (a), bem como a apuração do rendimento
escolar para fins de promoção. [...] A verificação do rendimento escolar
compreende a avaliação do aproveitamento e a apuração da assiduidade. Os
critérios a serem avaliados são: I testes escritos ou teóricos; II pesquisas; III
trabalhos escritos; IV participação nas atividades; V comportamento (Escola
D, 2010, p. 47).
A escola segue as orientações da portaria nº 398/GAB/SEDUC que trata do
sistema de avaliação para as escolas. No regimento escolar também contém
as orientações necessárias às adaptações que regem o sistema de avaliação
de nossa escola. Ocorre de forma sistemática, contínua, cumulativa,
processual e coletiva, baseadas em objetivos claramente definidos
realizando-se em função do aluno, respeitando os aspectos sócio-emocional,
psicomotor e cognitivo. (Escola B, 2007, p. 46 - grifo nosso).
Pretendemos oferecer uma educação que possibilite aos nossos alunos a
construção do conhecimento a partir do seu contexto social, considerando os
seus aspectos cognitivos, emocional e social, não dissocie o saber do fazer e
a teoria da prática e a avaliação seja formativa, somativa e especializada
(esta última em caso de alunos “especiais”). (Escola J, 2009, p. 58 - grifo
nosso).
56
Ou seja, não há nenhuma referência sobre adaptações a serem realizadas nos
procedimentos avaliativos para alunos com deficiência, muito menos quando, como e com
quais materiais isso irá acontecer. Tampouco se leva em consideração as orientações do PCN
segundo o qual é necessário adequar os critérios de avaliação mediante eliminação ou
introdução de novos critérios, mudanças na temporalidade das disciplinas e dos objetivos,
entre outros (BRASIL, 1998).
Quanto a isso, salientamos que o PCN é bastante específico ao tratar sobre “avaliação
e promoção” (BRASIL, 1998, p. 57) trazendo aspectos a serem focalizados em relação ao
aluno, ao contexto educacional e familiar, bem como aos aspectos a serem “considerados para
orientar a promoção ou a retenção do aluno na série, etapa, ciclo (ou outros níveis)” (p. 58),
aspectos estes pouco elucidados nestes projetos, principalmente em relação à temporalidade
que, segundo orientações do MEC, precisa estar presente em todos os projetos. De acordo
com Pletsch (2009), a ausência de definições sobre temporalidade e as relações entre o que
pode ser aprendido por estas crianças ao longo de sua escolarização faz com que as escolas
adotem posturas nas quais estes alunos sejam promovidos de uma série para outra, sem que
haja uma preocupação com a efetivação da aprendizagem.
Todavia, percebe-se que se por um lado, há “falhas” nos documentos no que diz
respeito à delimitação dos procedimentos avaliativos, por outro isso não significa que não
haja uma preocupação por parte dos docentes. Tal afirmação se justifica pelo fato de que ao
questionarmos a Coordenadora de Educação Especial durante a entrevista sobre quais eram as
principais solicitações por parte das escolas e professores esta relata que: “a principal
solicitação é como avaliar esses alunos; querem um modelo de avaliação pronto mais fica
difícil, pois cada um necessita de um tipo de avaliação então não se pode formular um tipo de
avaliação cabível a todos os alunos com NEE, isso é impossível. Outra é como trabalhar com
esses alunos, uma questão voltada mais a área pedagógica” (Coordenadora de Educação
Especial).
A pergunta que se faz é, como auxiliar as escolas nestas solicitações, quando a
coordenação de Educação Especial conta com apenas uma pessoa para atender vários
municípios? Além disso, como atender as diferentes demandas das escolas quando se tem um
grande número de atribuições? Vale ressaltar que, ao falar sobre o trabalho que desenvolve, a
coordenadora de Educação Especial destaca que:
às famílias dos alunos. (Coordenadora de Educação Especial Sou
responsável pela formação de professores das salas de aula inclusivas, de dar
57
apoio para eles quando pedem. Eu também coordeno o trabalho das
professoras das salas de recursos que são nove no nosso regional e aqui em
Rolim são duas; organizo avaliações para alunos com NEE dessas salas;
Trabalho com os professores as políticas públicas voltadas para a discussão
que contemple a educação inclusiva; participo de algumas reuniões nas
escolas quando elas me pedem para falar de Educação Especial. Eu também
faço atendimento).
Assim, ao analisarmos os apontamentos trazidos pela coordenadora, a primeira
impressão que fica é a de que a ausência de discussões sobre adaptações curriculares nos PPPs
das dez escolas nada mais é do que um reflexo das ações desencadeadas por seus dirigentes,
neste caso a SEDUC, em relação ao tema.
Esta situação nos faz acreditar que ao se deparar com alunos com NEE em sala
regular, os professores terão dificuldades para responderem aos seguintes questionamentos:
adaptar como? Realizar avaliação de que forma? Com que critérios? Será realmente difícil
para ele definir todas estas questões, tendo como norteador das práticas educativas, um
documento que trate destes aspectos de forma tão fragilizada.
CONSIDERAÇÕES
Baseando-se no que é apresentado nos projetos das escolas, acreditamos que para estas
escolas a inclusão de crianças com necessidades educacionais especiais nesta realidade
enfrenta muitas dificuldades no que diz respeito a sua operacionalização uma vez que seus
profissionais não dispõem de um documento que lhes possibilitem pensar em um conjunto de
ações administrativas, estruturais e pedagógicas para atender estes alunos na forma como
destacado nas inúmeras leis, orientações e dispositivos que regem a educação especial em
nosso país.
Percebemos ainda, que se por um lado o Ministério da Educação lança mão de
diferentes documentos para subsidiar as escolas na tarefa de promover adaptações, por outro
isso não basta uma vez que ao tentarem colocar em prática essas orientações as escolas
esbarram em diversas barreiras impostas pelo próprio sistema como a ausência de uma
política de formação profissional, ausência de recursos financeiros, etc.
Isso evidencia que as instituições escolares não devem ser simplesmente
culpabilizadas pelo fato de não possuírem em seus projetos proposições mais claras e
abrangentes em relação à educação especial e as adaptações curriculares.
58
REFERÊNCIAS
ARELARO, L. R. G. Direitos sociais e política educacional: alguns ainda são mais iguais que
outros. In: SILVA, S; VIZIM, M. Políticas públicas: educação, tecnologias e pessoas com
deficiência. (orgs.) Campinas, SP: Mercado de Letras: Associação de Leitura do Brasil
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atendimento educacional especializado e dá outras providências. Disponível em:
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Rio de Janeiro: 7 LETRAS, 2007.
59
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que fixa diretrizes e bases para a educação nacional, a serem observados pelos sistemas de
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discurso de uma política pública de direitos e praticar a privatização. In: ______; VIZIM, M.
Políticas públicas: educação, tecnologias e pessoas com deficiência. (orgs.) Campinas, SP:
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UNESCO. Declaração de Salamanca: sobre princípios, política e prática na área das
necessidades educativas especiais. Procedimentos-Padrões das Nações Unidas para
Equalização de Oportunidades para Pessoas Portadoras de Deficiências, A/RES/48/96,
Resolução das Nações Unidas adotada em Assembléia Geral.
60
RESUMO EXPANDIDO DO RELATÓRIO PIBIC 2012
UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA - UNIR
PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA - PIBIC
PROJETO-MÃE: Alfabetização de Ribeirinhos na Amazônia
PROJETO DA ORIENTADORA: Linguagem de Ribeirinhos na Amazônia:
Atitudes e comportamentos sociais
SUB-PROJETO DO ALUNO: Leitura na Sala de Aula: “Prazer momentâneo e lucro
duradouro!”
PESQUISADORA: Antonia Pereira da Silva Lima
ORIENTADORA: Profª Drª Iracema Gabler
RESUMO
Esta pesquisa pretendeu estudar os efeitos das atividades de leitura em sala de aula e foi
desenvolvida com alunos do 5º ano do ensino fundamental da Escola Estadual Franklin
Roosevelt, comunidade ribeirinha localizada à margem direita do Rio Madeira, no Bairro
Triângulo, Porto Velho/RO. O objetivo maior foi contribuir com o processo de ensinoaprendizagem, e assim, proporcionar aos alunos momentos de reflexão, contato e valorização
à leitura e à linguagem oral e escrita. Para tanto, foram realizadas atividades como: leitura
compartilhada, debate, dramatização, contação, recontação, ilustração, escrita e reescrita de
histórias e outras, pontuando e destacando a importância da literatura infanto-juvenil (contos
de fada). Tomou-se como referência teórica BALDI, E. 2009; BAMBERGER, R. 2000;
SOUZA, L.V. 1992 entre outros. Durante a pesquisa foram desenvolvidas atividades que
possibilitaram aos integrantes da pesquisa conhecer os materiais linguísticos impressos
circulantes na escola; identificar as preferências de leituras dos alunos, os meios encontrados
e as barreiras ao acesso à leitura; investigar as práticas sociais e pedagógicas das professoras
diante das barreiras de acesso aos livros de literatura infanto-juvenil. Estas observações e
ações contribuíram no processo de ensino-aprendizagem da comunidade escolar e
redirecionaram as práticas acadêmicas, despertando nos pesquisadores e em outros estudantes
do Curso de Letras da UNIR a vocação científica.
Palavras-chave: Leitura. Literatura Infanto-Juvenil. Aquisição da Escrita. Alfabetização.
1 INTRODUÇÃO
61
Vivemos em uma sociedade multicultural. Linguagens e vivências se entrecruzam em
todos os aspectos. Este percurso, rico em interação, experiências e aprendizado também gera
desconfortos como, por exemplo, os preconceitos, rivalidades e desfavorecimentos e como
almejamos uma melhor convivência entre os povos, entendemos ser de suma importância
vivenciar e experienciar o cotidiano e a realidade linguística de uma comunidade ribeirinha
periférica da região norte. Optamos, nesta pesquisa, por enfocar os vários usos da linguagem
através da leitura por entendermos que ler o mundo e as palavras é determinante para a
aprendizagem do ser humano, enriquece o vocabulário, amplia conhecimentos variados,
potencializa o raciocínio e a capacidade de interpretação, além de propiciar
espaços e
prazeres momentâneos e/ou duradouros.
O sub-projeto “Linguagem de ribeirinhos na Amazônia: atitudes e comportamentos
sociais” pretende refletir, entender e conhecer a linguagem efetivamente usada pela
comunidade do bairro Triângulo, zona periférica ribeirinha, localizada à margem direita do
Rio Madeira, na cidade de Porto Velho-RO. Para tanto, estabelecemos o nosso Plano de
Trabalho com o sub-projeto “Leitura na sala de aula: prazer momentâneo e lucro duradouro”,
com o objetivo de verificar a inclusão da leitura e seus efeitos na escola Estadual Franklin
Roosevelt, observando, registrando e analisando o comportamento dos alunos de dois quintos
anos (2011 e 2012).
Uma escola que ofereça condições de leituras prazerosas é o espaço onde o aluno
aprende a gostar de ler, a se interessar pela leitura e pelo livro, ou por qualquer atividade que
permita uma interpretação, uma conexão com o imaginário, uma história. Partindo da reflexão
sobre o papel que a leitura exerce sobre o leitor, fica fácil afirmar que a leitura torna-se o mais
importante elemento do imaginário. Portanto a ato de ler significa refletir, sonhar, pensar,
emitir opiniões a favor ou contra, mudar de opiniões, posicionar-se, enfim, exercer desde cedo
à cidadania.
O objetivo geral da pesquisa foi contribuir com o processo de ensino-aprendizagem, e
assim, proporcionar aos alunos a reflexão e a valorização da leitura como suporte para a
aquisição da linguagem escrita e oral. Para isso, realizamos atividades de leitura
compartilhada, debate, contação, recontação, ilustração, dramatização, entre outras, sempre
pontuando a importância da literatura infanto-juvenil.
2 MÉTODO E MATERIAL
62
A pesquisa pode ser definida como bibliográfico-descritiva, e, considerando os
procedimentos teórico-metodológicos, como uma pesquisa-ação.
A população pesquisada foi os alunos da turma de 5º ano/2011 e 5º ano/2012 do
ensino fundamental da Escola Estadual Franklin Roosevelt.
O corpus foi composto de informações não registradas de conversas informais com
alunos, professores, pais e pesquisadores, textos orais produzidos a partir das propostas de
atividades de leitura em sala de aula e textos escritos produzidos pelos alunos das referidas
turma.
O material lúdico/pedagógico, assim como todo material de leitura, foi disponibilizado
pela bibliotecária voluntária Glória Valadares Grangeiro e pelos bolsista/pesquisadores.
Elegemos os contos de fada como gênero literário principal em nossas atividades por
entendermos que ele carrega a magia do extraordinário, ele metamorfoseia os fatos, ele vem
com o encantamento que seduz o leitor.
As principais atividades de leitura, realizadas duas vezes por semana, em horários
estabelecidos em um cronograma elaborado em conjunto com a professora das turmas, foram
as seguintes:
a)pesquisa bibliográfica - despertar nos “futuros leitores” o prazer da curiosidade e descoberta
de suas inquietações;
b)debate - gerar uma resposta coletiva e consensual, satisfatória para todos;
c)rodas de leitura - gerar momentos prazerosos;
d)adivinhações - sociabilizar os mais tímidos ou menos interessados.
No final de cada semestre, todos os alunos organizaram individualmente um livro com
suas produções, feito manualmente, escrito e ilustrado por eles próprios. Ao final, houve
apresentação coletiva dos trabalhos.
3 DA BASE TEÓRICA E CONCEITUAL
Para embasar a questão das formas de ler e da variedade de atividades de leitura nos
embasamos em BALDI, 2009; BAMBERGER, 2000; SOUZA, 1992 entre outros.
Ler é uma das aptidões mais importantes a serem desenvolvidas com o aluno,
principalmente após recentes pesquisas que registram ser esta uma das mais consideráveis
deficiências do aluno brasileiro. O meio escolhido para observar esta deficiência foi o
ambiente escolar que nos permitiu sentir as influências diretas da leitura em um espaço social.
Não basta identificar as palavras, faz-se necessário dar-lhes sentido, entender, interpretar,
63
estabelecer relação entre elas, além de conservar na memória o que for mais relevante. Na
escolha de determinado livro, revista ou jornal, sempre existe um propósito para justificar a
escolha.
Para abordagem da leitura na sala de aula usamos o olhar de BALDI (2009, p.8)
concordando com ela quando afirma que “É preciso alimentar a imaginação de nossos alunos,
compartilhar leituras com eles e oferecer-lhes experiências de fruição para que descubram os
encantos da literatura como uma forma de arte que possibilita conhecerem melhor a si
mesmos, ao mundo e aos que os cercam, para que se tornem mais sensíveis, mais críticas,
mais criativas.” O processo de construção e reconstrução dos saberes formais ocorre em
espaços como a escola e a sala de aula. Neste contexto, o professor tem a responsabilidade de
selecionar criteriosamente as obras que utilizará para desenvolver as atividades pedagógicas.
A leitura é considerada, por BAMBERGER (2000 p.10), como: “[...] A leitura é um
dos meios mais eficazes de desenvolvimento sistemático da linguagem e da personalidade”.
Falar da importância da leitura na educação é atribuir-lhe o valor de instrumento de
ação reflexiva, que proporciona melhoria da condição social e humana. A escola tem o papel
fundamental no processo de aquisição do hábito da leitura e formação do leitor, apesar de suas
limitações, a escola é o espaço reservado ao aprendizado da leitura. Cabe ao professor ser
estimulador de leituras, não podendo ficar omisso diante dos acontecimentos internos e
externos à vida do aluno. As leituras, guiadas pelo professor, podem ter diferentes objetivos,
produzir efeitos diferentes e alterar a ação e visão do leitor diante do texto.
Na abordagem do tema leitura, podemos partir do ponto que a leitura é uma prática
sociocultural. Para melhor definição, SOUZA (1992) afirma: “Leitura é, basicamente, o ato de
perceber e atribuir significados através de uma conjunção de fatores pessoais com o momento
e o lugar, com as circunstâncias. Ler é interpretar uma percepção sob as influências de um
determinado contexto. Esse processo leva o indivíduo a uma compreensão particular da
realidade”, ou seja, é necessário que haja essa relação e essa percepção entre o leitor e o texto.
Entende-se que a leitura é um dos caminhos de integração do ser humano no mundo e
lhe permite satisfação e prazer. Atividades de leitura coletiva (alunos lendo para alunos,
alunos lendo para professores e pesquisadores, pesquisadores lendo para alunos, professores
lendo para alunos) são práticas educativas e prazerosas que promovem a formação continuada
dos leitores envolvidos e propiciam reflexões sobre a condição dos sujeitos leitores.
4 RESULTADOS
64
No decorrer do desenvolvimento do projeto, notou-se que houve mudanças
significativas no comportamento e na conscientização dos alunos e da professora, pois a
leitura passou a ser tratada como uma atividade agradável e integrada ao dia-a-dia,
reforçando, assim, seu papel no processo de ensino-aprendizagem, buscando sempre o
incentivo à construção do hábito de ler, ao prazer da leitura e à realização de pesquisas.
Observamos que a leitura compartilhada é uma das atividades que mais auxilia os
alunos a entenderem a história, pois lhes dá oportunidade de expor sua compreensão ou suas
dúvidas ao mesmo tempo em que ouvem e refletem sobre os questionamentos dos colegas; a
dramatização mostrou-se uma atividade envolvente, prazerosa e afetiva, pois os alunos tem
nela a oportunidade de se sentirem parte integrante dela, agindo como personagens e
relacionando os enredos às suas próprias experiências.
Histórias contadas na hora da leitura tiveram repercussão satisfatória na sala de aula,
foram momentos de interação e compartilhamento de identidades, vivências e conhecimento
de mundo.
Para iniciar as atividades de contação de histórias para as turmas, foi necessário,
primeiramente, fazermos uma exposição teórica sobre gêneros textuais e uma reflexão
conjunta sobre o que são os contos de fada, a que gênero literário/textual pertencem, qual sua
estrutura e o que os difere de outros gêneros.
Tivemos a oportunidade de comparar duas produções (escrita e reescrita) de um
mesmo aluno. Na escrita o aluno não havia sido orientado a escrever observando a estrutura
do gênero narrativo (conto de fadas). Na reescrita, o aluno já havia recebido estas
informações, já havíamos contado novos contos, eles já haviam dramatizado, ilustrado,
recontado oralmente. O texto reescrito traz exitosamente a estrutura da narrativa, atendendo
satisfatoriamente os objetivos da aula. São as atividades de leitura interferindo positivamente
nas ações do cotidiano pedagógico.
Para ilustrar, trouxemos uma análise breve, clara e objetiva desta reescrita.
Categorizamos os aspectos textuais e discursivos presentes no texto reescrito e ilustramos
com fragmentos do referido texto narrativo reescrito pelo aluno:
1)Elementos estruturais da narrativa:
a)Fato - o que se vai narrar (O quê?)
O drama do “menino pobre que vendia frutas em um sinal de trânsito”.
b)Tempo - quando o fato ocorreu (Quando?)
“Era uma vez um alinda cidade distante...”
65
c)Lugar - onde o fato se deu (Onde?) “em um sinal de trânsito”, “O anjo levou Joãozinho
para morar em um lindo abrigo...”
d)Personagens - quem participou ou observou o ocorrido (Com quem?)
“Um menino pobre que vendia frutas em um sinal de trânsito”, “o homem que estava
dirigindo o carro”, “um velho feio muito estranho...”, “uma nave cheia de luz bem colorida”,
“um belo anjo azul brilhante”.
e)Causa - motivo que determinou a ocorrência (Por quê?)
“...o menino se aproximou de um carro e perguntou se o homem queria comprar frutas.”
f)Modo - como se deu o fato (Como?)
“...o menino se aproximou de um carro e perguntou se o homem que estava dirigindo o carro
queria comprar frutas, o motorista olhou para o menino se recusando a comprar.”
g)Consequências (Geralmente provoca determinado desfecho)
-Tumulto: “Os carros buzinavam, as pessoas começavam a chamar o menino de ladrão,
mendigo...”
-Surgimento do novo personagem: “um velho feio muito estranho...” que propõe: “... você
so precisa rouba as bouças que estão nos carros...”
-Magia: “Então aconteceu veio uma nave cheia de luz bem colorida e saiu uma voz la de
dentro...”, “... sou seu anjo protetor vou tirar você desse lugar...”
-desfecho: “Ele viveram felizes para sempre!”
2) A magia dos contos de fada:
-“Então aconteceu veio uma nave cheia de luz bem colorida e saiu uma voz la de dentro.
Joãozinho ficou paralizado...”, “...é quando sai de dentro da luz um belo anjo azul brilhante..”,
“... sou seu anjo protetor vou tirar você desse lugar...”
3) Os recursos linguísticos comumente encontrados nos contos de fada:
- “Era uma vez uma linda cidade...”,
- “... quando o sinal fechou...”,
- “foi quando apareceu um carro...”,
-“ ...meu bom menino qual é seu nome?”,
- “Ele foram felizes para sempre!”;
4) Discurso direto/indireto livre característico das narrativas:
- Meu bom menino qual é seu nome?
- Meu nome é Joãozinho.
- O que você faz nessa esquina?
- Eu vendo bombom aqui.
66
Além desses aspectos, não podíamos deixar de mencionar a intimidade e a identidade
do autor com o texto por ele produzido, principalmente, na reprodução. Se esta história não é
a do autor, ele a conhece muito bem. Ela faz parte do seu cotidiano, da sua cultura, do seu
mundo. Um indício dessa afirmação é o lapso de memória que ele comete quanto ao produto
que o Joãozinho vende no sinal: frutas (início do texto) e bombom (final do texto). É muito
comum encontrarmos adultos e crianças vendendo frutas ou bombons nas esquinas/sinais das
ruas de Porto Velho. É o cotidiano se fazendo presente nas produções através da experiência e
contato com os contos de fada!
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O
envolvimento
institucional
PIBIC/UNIR
no
desenvolvimento
desta
pesquisa/extensão na escola “Franklin Roosevelt possibilitou observação, reflexão, percepção
e interação entre pesquisadores, alunos e professores. Vivenciamos o dia-dia em sala de aula e
como são planejadas, organizadas e executadas as atividades pedagógicas. Esta experiência
foi de suma importância para todos os envolvidos, principalmente para nós, pesquisadores.
Na formação acadêmica, projetos como este, mostram que é possível a aplicação da
teoria adquirida nas aulas aliadas às atividades práticas e esta dupla função faz do acadêmico,
futuro professor, um ser humano, um cidadão mais completo, mais pronto a encarar a
profissão que está abraçando. Em sala de aula, cabe ao profissional de educação exercer real
influência sobre a qualidade dos saberes, alimentar a imaginação e despertar nos alunos a
importância da leitura para tornarem-se mais criativos e mais críticos.
Nossa presença impôs, de certa forma, mudanças no perfil das atividades, no
programa, no plano de aula que já tem um formato pronto e semi-acabado e as propostas de
variadas atividades de leitura, de produção oral e escrita e reescrita, de dramatização, de
ilustração de histórias, entre outras, não estavam nos planos.
Com o decorrer do tempo, a frequência com que nos fazíamos presentes na sala de
aula, as muitas conversas informais, as muitas histórias contadas e as diversas atividades
apresentadas e desenvolvidas ganhamos a confiança da turma e da professora e percebemos
maior interesse, maior envolvimento e até empolgação de muitos, em participar com alegria e
prazer das atividades que propúnhamos. Tornaram-se participantes ativos, críticos e dotados
de falas consistentes, de palpites pertinentes, de narração de algumas histórias ouvidas e/ou
vividas.
67
Exploramos materiais que primaram pelo desenvolvimento da oralidade, das ideias, da
linguagem, dos valores, dos sentimentos, bem como a formação crítica dos nossos leitores
através do lúdico e do prazer. A maioria dos alunos já expõem (ainda que com algumas
dificuldades) suas ideais por escrito, estão desenvolvendo a arte de interpretar criativamente,
de relacionar suas experiências pessoais àquelas presentes nos contos lidos.
Os próprios alunos tiveram oportunidade de avaliar e expor suas opiniões sobre o
desenvolvimento do projeto e o que ouvimos foi que aprenderam a ler por prazer, a expor suas
ideias, além de ler o que gostam e da maneira como gostam. Uma das provas dessa mudança
de comportamento é que muitos passaram a frequentar e participar do Projeto “Leitura no
Sítio” pelo desejo de conhecer novos livros, novas experiências, novos horizontes, novos
mundos... a biblioteca da escola já ficou pequena, o prazer é (ou não) instantâneo, mas o lucro
já se mostra duradouro!
REFERÊNCIAS
BALDI, Elizabeth - Leituras nas séries iniciais: uma proposta para formação de leitores de
literatura. Porto Alegre: Ed. Projeto, 2009.
BAMBERGER, Richard. Como Incentivar o Hábito da Leitura. São Paulo: Ática, 2000.
SOUZA, L. V. As proezas das crianças em textos de opinião. Campinas, SP: Mercado de
Letras, 1992.
68
EXPERIÊNCIAS COMPARTILHADAS NO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO DE
ALUNOS COM SÍNDROME DE DOWN (SD) NAS ESCOLAS REGULARES NO
MUNICÍPIO DE JI-PARANÁ/RO
Camila Camargo Senhorinho Santos10
Anamaria Silveira11
RESUMO
O presente texto resulta da pesquisa “Experiências compartilhadas na alfabetização de alunos
com Síndrome de Down (SD)” em seis escolas regulares inclusivas onde nove professoras
lecionam. Objetivou-se comprovar as mudanças, especificamente à alfabetização de alunos
sindrômicos no que tange ao currículo e à proposta pedagógica das escolas em questão. Para
isso, utilizou-se como metodologia a Pesquisa Qualitativa, entrevistas com o uso de
gravadores e a aplicação de um questionário aberto semi-estruturado.
Palavras-chave: Alfabetização. Síndrome de Down. Professor
INTRODUÇÃO
Quando um aluno com Síndrome de Down (SD) é matriculado em uma escola comum
regular (conhecida hoje como escola inclusiva), seus pais ou responsáveis desejam que esse
aluno não seja apenas alfabetizado, mas esperam que esse aluno seja acolhido com carinho
pelos seus colegas de classe e professores, que possa interagir com a turma. Sabemos que a
educação se sustenta com uma legislação forte que protege todo o seu alunado, inclusive os
deficientes. Atualmente a Educação Especial é um direito garantido pela Constituição de
1988, reforçado pela Declaração Mundial sobre Educação para Todos (1990); Declaração de
Salamanca (1994); Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996) e a Convenção
sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2007).
Não basta apenas aceitar o aluno deficiente, é preciso incluí-lo nas atividades diárias
da escola, há que se fazer adaptações para recepciona-lo, não apenas arquitetônicas, como
rampas de acesso, bebedouros adaptados, sinalização de LIBRAS (Língua Brasileira de
Sinais) para alunos surdos, etc., é necessário mudar o currículo escolar, a proposta pedagógica
da escola e principalmente o pensamento anacrônico de que o aluno deficiênte é considerado
incapaz.
REFERENCIAL TEÓRICO
10
11
Bolsista PIBIC/CNPq. Acadêmica do 6º Período de Pedagogia – UNIR – Campus de Ji-Paraná
Profª Drª do Departamento de Ciências Humanas e Sociais – DCHS – Campus de Ji-Paraná
69
A formação do professor que vai atuar na educação básica regular precisa passar por
uma reestruturação em seu currículo profissional, pois para alfabetizar alunos deficientes o
desafio é grande, exige o comprometimento da família do aluno e da equipe pedagógica
escolar, implicando assim mudanças de posturas, quebrando os protótipos e levando o
educador a transformar sua prática educativa. A escola inclusiva é aquela que foca no
desenvolvimento, interação, aprendizagem e conhecimento do aluno deficiênte, não é aquela
escola que vê apenas a deficiência.
Após a revisão da legislação atual, e a leitura de autores como: Leite (1985); Faria
(1993); Costa (1997); Stainback (1999); Schwartzman (2003); Saad (2003); Alves (2007);
Soares (2007); Voivodic (2008); Martins (2008); Tada (2009); Silveira (2010); Figueiredo
(2010); Mendes (2010); Bibas (2012) e Milanesi (2012) perceberam-se as discussões e
preocupações com a alfabetização de alunos deficientes e especificamente aqueles com
Síndromes de Down.
Conforme a leitura destes autores, compreendemos que a inclusão escolar (em
escolas regulares), é um grande desafio, havendo também a necessidade da alfabetização
deste educando. As escolas regulares estão hoje, mais receptivas para trabalhar com esses
alunos, o que faz diferença na vida não apenas dos alunos deficientes que se sentem aceitos
por todos, mas é importante para as outras crianças em sala de aula como aquelas que não
possuem deficiência, pois serão adultos mais sensíveis e respeitarão o ser humano com todas a
suas diferenças.
Através dos estudos de Jannuzzi (2004); Mendes (2006); Milanesi (2012) e outros
pesquisadores, percebemos que a Educação Especial no Brasil é foco de preocupações desde
1700, antes do Império, cuja as primeiras experiências com as pessoas deficientes surgiram
nos asilos (onde eram consideradas ‘doentes mentais’) e das rodas dos expostos, já em 1717
com a criação da Santa Casa de Misericórdia em São Paulo, as crianças permaneciam até aos
sete anos e logo depois iam para os Seminários e estudavam até a idade que pudessem sair
para trabalhar (Jannuzzi, 2004).
Esta mesma autora alerta “É importante notar o intuito dessas medidas
administrativas pela Santa Casa em garantir o trabalho futuro, atitudes nem sempre comum na
época” (p. 9). Ao longo destes anos, muito se tem feito para incluir as pessoas deficientes em
nossa sociedade e nas escolas, conforme as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na
Educação Básica (2001), em seu artigo 2º é determinado:
70
Os sistemas de ensino devem matricular todos os alunos, cabendo às escolas
organizarem-se para o atendimento aos educandos com necessidades
educacionais especiais, assegurando as condições necessárias de qualidade
para todos (MEC/SEESP12, 2001).
Porém o trabalho com a criança deficiênte deve começar antes da escola regular, a
Resolução CNE/CEB nº 02 de 2011 estabelece as Diretrizes Nacionais para Educação
Especial na Educação Básica, seu parágrafo único, art. 1º, menciona o atendimento dos alunos
deficientes da seguinte forma:
O atendimento escolar desses alunos terá início na educação infantil, nas
creches e pré-escolas, assegurando-lhes os serviços de educação especial
sempre que se evidencie, mediante avaliação e interação com a família e a
comunidade, a necessidade de atendimento educacional especializado
(MEC/SEEP, 2001).
Tal parágrafo avigora o que autores como Schwartzman (2003) e Mendes (2010),
alegam que o estímulo da criança deficiênte deve começar logo nos primeiros dias de vida,
através da família e depois partir para as escolas começando nas creches e/ou pré-escolas. No
ensino fundamental o atendimento não pode parar, ele tem que ser ministrado por um
professor específico no Atendimento Educacional Especializado (AEE) das Salas de Recurso
Multifuncional (SRM). O Decreto 7.612 de 2011 em seu Art. 2º considera as pessoas com
deficiências “[...] aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental,
intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras [...]” e o Decreto 7.611
de 2011 complementa “[...] considera-se público-alvo da educação especial as pessoas com
deficiência,
com
transtorno
globais
do
desenvolvimento
e
com
altas
habilidades/superdotação”.
Assim, ficou claro que a Educação Especial através das escolas inclusivas regulares é
de grande relevância não apenas para a família da criança deficiênte, mas seus futuros colegas
de classe, para o corpo pedagógico, a sociedade e principalmente os alunos deficientes, sendo
este um grande beneficiado da inclusão, pois será aceito e incluído.
12
Em 16 de Maio de 2011, com o Decreto nº 7.480, extinguiu a Secretaria de Educação Especial
(SEESP), passando assim suas atribuições à Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e
Inclusão (SECADI)
71
METODOLOGIA
A pesquisa em questão refere-se a um estudo do tipo qualitativo onde foi
inicialmente aplicado um questionário aberto semi-estruturado, seguido de entrevistas
gravadas. Conforme a leitura de autores como: Duarte (2004); Martins (2004); Minayo
(2004); Franco (2006); Terene (2006) e Belei et al (2008).
Minayo (2004) afirma “[...] o objetivo das Ciências Sociais é essencialmente
qualitativo.” (p. 21). Desta forma, André (1995) esclarece-nos sobre o uso desta metodologia
nas pesquisas:
Qualitativa, porque se contrapõe ao esquema quantitativo de pesquisa (que
divide a realidade em unidades possíveis de mensuração, estudando-as
isoladamente), defendendo uma visão holística dos fenômenos isto é, que
leva em conta todos os componentes de uma situação em suas interações e
influências recíprocas (p. 17)
A escolha nesta pesquisa, pela abordagem qualitativa, é a interação que o
pesquisador tem com o objeto pesquisado, Firestone (1987) citado por Santos Filho (1995)
discute a diferença do pesquisador em pesquisas quantitativas e qualitativas: “O pesquisador
quantitativo ideal distancia-se do fato pesquisado a fim de evitar vieses. O pesquisador
qualitativo imerge-se no fenômeno de interesse”. (grifo do autor) (SANTOS FILHO, 1995, p.
45). Em pesquisa qualitativa o pesquisador estuda o ‘como’ e não os ‘por quês’ das questões.
Em nosso estudo ‘Como’ se processa a alfabetização desses alunos, ‘como’ as professoras
chegaram a tal conclusão, ‘como’ elas avaliam seus alunos...
Aplicou-se um questionário semi-estruturado, conforme sugere Minayo (2004); Balei
et al (2008); Milanesi (2012) entre outros. Manzini (2004) citado por Belei et al (2008) alertanos e explica:
Entende-se por entrevista estruturada aquela que contém perguntas fechadas,
semelhantes a formulários, sem apresentar flexibilidade; semi-estuturada a
direcionada por um roteiro previamente elaborado, composto geralmente por
questões abertas; não estruturada aquela que oferece ampla liberdade na
formulação de perguntas e na intervenção da fala do entrevistado (BELEI et
al 2008, p. 189).
Para que as entrevistas pudessem ser registradas utilizamos o gravador de áudio, pois
segundo Belei et al (2008) “[...] o gravador preserva o conteúdo original sem aumentar a
acurácia dos dados coletados. Registram palavras, silêncios, vacilações e mudanças no tom de
72
voz, além de permitir maior atenção ao entrevistado” (p. 189). Há autores que sugere o uso da
vídeo-gravação para que os dados sejam confiáveis ao mostrar para terceiros, porém optamos
apenas pela gravação da voz das professoras pesquisadas. Assim, Belei sobre a transcrição
das entrevistas sugere-nos que esta seja feita “de preferência em ambiente silencioso e
distante da circulação de outras pessoas. É aconselhável que a transcrição seja realizada pelo
próprio pesquisador [...] Após a transcrição das informações, inicia-se a análise dos dados”
(p.190).
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Após o estudo bibliográfico e escolha da metodologia ideal, partiu-se para a pesquisa
de campo. Como dito anteriormente foram pesquisadas seis escolas inclusivas, sendo duas
escolas estaduais e quatro municipais. Após os primeiros contatos com a gestão escolar,
entramos em contato com as professoras que lecionam para alunos com SD. Houve uma
conversa informal onde a bolsista falou sobre o projeto de pesquisa, e sanou as dúvidas sobre
a pesquisa, marcou-se uma data para que a bolsista fizesse a entrevista.
A entrevista tem onze perguntas, sendo as cinco primeiras para conhecer a professora
no que tange ao trabalho com alunos deficientes, e as seis seguintes sobre suas experiências
com o seu atual aluno sindrômico, as perguntas foram: 01. Gênero; 02. Idade; 03. Possui
Graduação? Especialização?; 04. Há quanto tempo trabalha como professor?; 05. Exceto o
aluno com SD você já lecionou para outro aluno deficiênte? Qual era a deficiência?; 06.Quais
são as mudanças necessárias para você alfabetizar um aluno SD?; 07. Qual a diferença do
aluno SD para os demais alunos com e sem deficiência? 08. Qual experiência você pode
compartilhar? 09. Qual a sua dificuldade em alfabetizar o aluno SD?; 10. Você sabe o que
currículo funcional? Trabalha assim com seu aluno?; 11. Como avalia o seu aluno SD?
Utiliza o portfólio? Você acredita que esse método tem resultado positivo? Por quê?
Assim, percebeu-se que 100% das professoras pesquisadas são do gênero feminino; a
idade varia de 32 à 51anos; o tempo de serviço como professora regular varia de 2 meses há
21anos; uma professora não é formada, tendo o registro do Magistério e as outras sete
professoras são formadas em Pedagogia, três professoras não possuem Pós-Graduação ou
Especialização, cinco professoras tem Pós-Graduação as mesmas disseram sentir dificuldade
ao trabalhar com alunos deficientes; 100% das professoras já lecionaram para alunos
deficientes onde três alunos eram SD, um aluno era Surdo, dois tinham Paralisia Cerebral e
dois alunos Autista.
73
As seis questões seguintes ouviu-se várias respostas: a falta de capacitação específica
e contínua foi a dificuldade mais citada de trabalho destas professoras, seguido de sala lotadas
com mais de dois alunos deficientes por turma, falta de horário para planejamento haja vista
que seis professoras trabalham 40hs semanais e têm 4 horas para o planejamento, falta de
professor na Sala de Recurso Multifuncional (SRM), das escolas pesquisadas, seis possuem
SRM porém um escola não possui, e outra escola tem a SRM mas não tem professor para
atuar na mesma; todas professoras falaram não haver diferença do SD para os outros alunos,
porém uma professora disse haver um cuidado diferenciado e não diferença do aluno com
outros; sobre a experiência, todas as professoras relataram que o seu primeiro contato com o
aluno foi uma grande experiência pessoal para as mesmas; sobre a dificuldade em alfabetizar
o aluno, obteve-se respostas parecidas, à pergunta sobre as mudanças necessárias para
alfabetizar o aluno, no entanto duas professoras relatam que suas dificuldades em trabalhar
com o aluno, é relacionada a linguagem dos mesmos, pois estes não frequentam um
fonoaudiólogo; sobre o currículo funcional, três professora disseram não saber o significado
do mesmo, e as outras cinco sabem e trabalham desta forma com seus alunos; e, por ultimo,
na forma de avaliação, as duas professoras das escolas estaduais falaram que não utilizam
portfólio para avaliar suas alunas, pois o município utiliza este método para avaliação, as
outras seis professoras, quatro não fizeram portfólio ainda, e as duas que já avaliaram desta
maneira disseram que veem resultado positivo.
Assim, a bolsista viu que muito há para se fazer no que se refere à alfabetização de
alunos deficientes, até o sistema escolar que muitas vezes ignora a presença do aluno
deficiente nos gráficos de aprovação escolar nacional como a Prova Brasil, o IDEB entre
outras, no entanto muito já foi realizado. Porém foi notório a alegria e o entusiasmo das
professoras pesquisadas ao falar dos avanços de seus alunos, que progrediu desde que entrou
na escola, reforçando a idéia de uma escola inclusiva.
A acadêmica compreendeu que os alunos estão progredindo em suas vidas pessoais e
acadêmicas, e no futuro quem sabe chegar à Universidade, pois este e outros estudos
mostraram que alunos deficientes são capazes, muito capazes, basta apenas o professor crer
em seu trabalho e acreditar no potencial de seu aluno.
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74
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FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE
RONDÔNIA/CAMPUS VILHENA
DELL - DEPARTAMENTO DE ESTUDOS
LINGUÍSTICOS E LITERÁRIOS
GEPŒC - GRUPO DE PESQUISA EM POÉTICA
BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA
RESUMO EXPANDIDO DO SUBPROJETO “A INVENCIONICE DA TRADIÇÃO
EM RONALDO CORREIA DE BRITO”
IDENTIFICAÇÃO: Projeto de Pesquisa “Traços de regionalidade na literatura brasileira
contemporânea”, vinculado ao GEPŒC - Grupo de Pesquisa em Poética Brasileira
Contemporânea
SUBPROJETO: A invencionice da tradição em Ronaldo Correia de Brito
PESQUISADORA/PIBIC/CNPq: Prof.ª Dr.ª Milena Cláudia Magalhães Santos Guidio
Bolsista: Carla Piovezan da Silva
LOCAL DE EXECUÇÃO: UNIR/Campus de Vilhena-RO
VIGÊNCIA: de agosto/2011 a julho/2012
Este texto expõe os resultados do trabalho de pesquisa “A invencionice da tradição em
Ronaldo Correia de Brito” vinculado ao projeto “Traços de regionalidade na literatura
brasileira contemporânea”. Dois objetivos são norteadores: 1) problematizar, por intermédio
de estudos da sua gênese, o conceito de regionalismo mediante a identificação de traços de
regionalidade na produção literária brasileira contemporânea; 2) estudar a obra do escritor
Ronaldo Correia de Brito. Em outras palavras, este trabalho conjuga uma investigação
teórico-crítica. Mais especificamente, analisa-se Livro dos homens, reunião de contos que, a
78
exemplo de outros livros do autor, permite pensar as relações da tradição ante as mudanças do
presente. É uma invenção que se estrutura no sertão cearense, com seus espaços de terra, rios,
chuvas esparsas, gente entranhada de superstições e crenças e que esquecem, ao mesmo
tempo, essas crenças e superstições. A investigação da tensa relação entre passado e presente
se dá, desse modo, mediante a problematização do conceito de regionalismo literário, numa
tentativa de destituir oposições binárias que, muitas vezes, se mostram inconsistentes:
regional/universal; nacional/estrangeiro; identidade/alteridade.
Diversas reconfigurações nos estudos literários ora apresentam o conceito com uma
visão positiva ora visão negativa. A gênese do conceito formulada por escritores como
Antônio Cândido, Alfredo Bosi e Afrânio Coutinho, em geral, é reafirmada pela crítica
brasileira, que, entretanto, lhe dá modulações diversas ao tratar do contemporâneo. A
recorrência do tema pôde ser percebida nos escritos de vários autores, dentre eles Ligia
Chiappini, Maria Luiza Berwanger da Silva, José Clemente Pozenato, Tânia Pellegrini, Flora
Süssekind, Tânia Pellegrini, Humberto Hermenegildo de Araújo, André Tessaro Pelinser,
Denise Mallmann Vallerius, Geraldo Nogueira de Amorim, Lourdes Kaminski Alves,
Walnice Nogueira Galvão, Rogério Haesbaert, Maria Adélia Menegazzo, Laurindo Mékie
Pereira e Maria Zilda Cury. Pode-se observar como exemplo o texto intitulado “Do beco ao
belo: dez teses sobre o regionalismo na literatura”, de Ligia Chiappini, que discute as “teses”
que causam desconforto ao estudioso que pretende estudar o regionalismo literário. Nas teses
apresentadas, ela não se contenta com o rótulo de literatura inferior, ultrapassada e retrógrada
dado pela crítica, pois o regionalismo indaga e afronta questões da crítica e da histórica
literárias desde o seu surgimento. Por outro lado, em vários momentos, parece concordar com
algumas das proposições colocadas. Essa “indecisão” se apresenta em vários outros textos.
Assim, a abordagem do conceito de regional orientada pela pesquisa coloca em
dúvida essa visão da crítica que comumente associa o regionalismo literário a ficções que
enfatizam o pitoresco, o exótico, os costumes locais. Para nós, seriam visões que se negam a
colocar em movimento a própria história da literatura, no sentido de que apenas num período
demarcado historicamente aconteceram manifestações literárias com as características
aludidas anteriormente. A ficção contemporânea que trata de espaços marcados
simbolicamente, como o Nordeste de Ronaldo Correia de Brito, não o faz para exaltar uma
identidade “perdida” que deva ser resgatada. Pelo contrário, assinala uma identidade
cambiante, não fixa. Desse modo, é muito mais do que um elemento que ajuda a estruturar as
narrativas. Muitas vezes, como se constatou na literatura do autor estudado, constitui aquilo
79
que diferencia um projeto literário, pois é o tratamento do espaço que legitima sua obra e, por
fim, a sua condição de escritor.
A reinvenção da tradição, marcada pelo tom poético, está presente em todos os livros
de Brito: Faca (2003), Livro dos homens (2005), Galiléia (2008), Retratos imorais (2010), O
baile do menino Deus (2011), Arlequim de carnaval (2011). Estamos diante de um escritor
que, mais do que a descrição do espaço, remete-o a um tempo/espaço mítico que é e não é ao
mesmo tempo passível de presentificação. As influências de Brito são muitas, e isso se
reproduz na constituição da sua literatura, fazendo com que, de imediato, a tipicidade da
região, no caso a nordestina, seja descartada. A imersão que suas narrativas faz no imaginário
nordestino, evocando a sua rica tradição oral em textos com alta densidade lírica, toca a
questão do humano em suas múltiplas identidades que ora transita pelo modo mais visível de
vida do sertanejo ora pelo impacto do tempo presente sobre essas vidas. Em Livro dos
homens, os arranjos narrativos constituídos por Brito amparam-se no misticismo, nas crenças
populares, nas violências cotidianas e, sobretudo, na tradição nordestina. E também mostram
que a demarcação do espaço físico ajusta-se somente para posicionar as personagens e
descrever a transição entre a vida do sertanejo e o impacto do tempo presente sobre essas
vidas. O autor evidencia a influência da tradição em seus livros, mas sem desconsiderar a
transitividade própria das questões contemporâneas que modificam a visão mesma do que seja
tradição, do que seja tocar em costumes de um povo num momento em que os espaços de
confluência são cada vez maiores.
Palavras-chave: Literatura Contemporânea. Regionalismo. Ronaldo Correia de Brito.
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82
A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO EDUCATIVO E A FORMAÇÃO DOCENTE
COMO ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DE SUSTENTAÇÃO DAS RELAÇÕES DE
PODER NO AMBIENTE ESCOLAR.13
Caroline de Carvalho Mazzo14
Profª Drª Marilsa Miranda de Souza15
RESUMO
O presente trabalho tem por finalidade O objetivo desse subprojeto é conhecer como se
operacionalizam as políticas educacionais em termos de infraestrutura escolar e a forma de
oferta dos diferentes níveis de ensino, organização do trabalho educativo e a formação de
professores. A análise parte do conceito de capitalismo burocrático que é o tipo de capitalismo
engendrado nos países semicoloniais e semifeudais. As políticas educacionais de formação de
professores e gestores das escolas estaduais da Zona da Mata rondoniense são
hegemonicamente formuladas, dirigidas e financiadas pelo Banco Mundial. A análise dos
dados coletados aponta que as relações de poder na escola são determinadas pelo coronelismo
que age indiretamente por meio de coação ou da persuasão dos professores para se
submeterem às políticas educacionais ditadas pelo Banco Mundial/MEC e que os professores
se submetem por medo de perseguições.
Palavras-chave: Formação docente. Capitalismo Burocrático. Coronelismo
INTRODUÇÃO
O presente trabalho é um resumo do relatório final que tem origem no
desenvolvimento da pesquisa intitulada: Capitalismo Burocrático, políticas educacionais e
relações de poder na educação escolar em Rondônia financiada pelo PIBIC/UNIR (02
bolsistas) através do desdobramento de seu subprojeto: A organização do trabalho educativo
e a formação docente como elementos fundamentais de sustentação das relações de poder no
ambiente escolar. O objetivo desse subprojeto é conhecer como se operacionalizam as
políticas educacionais em termos de organização do trabalho educativo e a formação de
professores.
A problemática dessa pesquisa centra-se no descompasso entre os conhecimentos e
prática social dos sujeitos da escola pública rondoniense e os conhecimentos impostos pelo
conjunto das políticas educacionais. Os educadores ficam alheios à reflexão sobre as políticas
13
Subprojeto da pesquisa Capitalismo Burocrático, políticas educacionais e relações de poder na
educação escolar em Rondônia coordenada pela Profª Drª Marilsa Miranda de Souza.
14
Graduanda em pedagogia da UNIR, Campus de Rolim de Moura, Voluntária PIBIC/UNIR.
15
Professora do Departamento de Educação da UNIR, campus de Rolim de Moura e orientadora da
Pesquisa.
83
educacionais em curso devido à má formação, às condições precárias em que desenvolvem
seu trabalho educativo, além da alienação inculcada pelos aparelhos ideológicos da sociedade
que obscurecem a realidade.
Escolhemos 01 (uma) escola de cada um dos cinco municípios que compõe essa região
do Estado de Rondônia totalizando 05 (cinco) escolas que são: Escola Estadual de Ensino
Fundamental e Médio Candido Portinari em Rolim de Moura, Escola Estadual de Ensino
Médio Aurélio Buarque de Holanda Ferreira em Nova Brasilândia D’Oeste, Escola Estadual
de Ensino Fundamental e Médio Pe. Ezequiel Ramim em Alta Floresta D’Oeste, Escola
estadual de ensino fundamental e médio Juscelino Kubitschek em Santa Luzia D’Oeste e a
Escola de Ensino Fundamental e Médio Marechal Rondon em Novo Horizonte D’Oeste. O
critério para a escolha dessas escolas foi o número de alunos. Escolhemos a maior escola de
cada um dos municípios em termos de número de alunos.
O método que utilizamos nesse trabalho é o método do materialismo históricodialético, entendido como um instrumento de captação dos fatos sociais e interpretação que
possibilite a intervenção transformadora da realidade. Nossa maior preocupação foi com a
constante integração empírico-teórica num vai e vem do todo às partes, das partes ao todo
para dar coerência e significados aos elementos de nosso estudo. A parte é o grupo
pesquisado. O sujeito é o grupo, não o indivíduo, portanto, procuramos calçar nossa análise na
dialética das classes sociais onde encontramos a categoria de professores.
A análise dos dados tem como eixo central a aplicação do método dialético, mediante
o qual buscamos interpretar a realidade objetiva e subjetiva em termos de categorias básicas:
totalidade, contradição, ideologia e práxis e ainda duas categorias históricas que são:
imperialismo e capitalismo burocrático.
A coleta de dados iniciou-se no segundo semestre de 2011. Num primeiro momento
realizamos visitas juntamente com a orientadora em todas as escolas com a finalidade
apresentar o projeto e conhecer os gestores, os supervisores/ coordenadores pedagógicos e os
professores e discutir com eles os objetivos desse trabalho. Ao apresentar o trabalho,
enfatizamos o caráter da pesquisa e esclarecemos que nenhum dos entrevistados seria
identificado. Nem mesmo as escolas, que foram renomeadas como Escola A, B, C, D e E
quando citadas na análise. Observamos que há um medo expresso em falar da problemática
que os envolvem no âmbito da escola e das relações de poder nela estabelecidas.
A fundamentação teórica centrou-se nos conceitos e nas categorias de análise que
utilizaremos para compreender as políticas educacionais recentes nos aspectos ideológicos,
sociais, políticos, econômicos e culturais que se inserem numa realidade mais ampla que é
84
capitalismo burocrático brasileiro. A revisão da literatura privilegiou nesse primeiro momento
as principais obras que tratam do assunto numa perspectiva materialista e histórico-dialética.
As entrevistas com os professores, com os supervisores e diretores, coordenadores de
programas e/ou projetos educacionais em curso foram organizadas a partir de duas
modalidades de entrevistas: Entrevistas semiestruturadas individuais como instrumento
básico para conhecer a opinião dos professores e da equipe gestora as relações de poder
estabelecidas dentro e fora da escola e por meio de Entrevistas coletivas. Nessa primeira fase
da pesquisa realizamos apenas as entrevistas individuais. As entrevistas coletivas deverão ser
feitas no segundo semestre de 2012 quando da continuidade do projeto.
Realizamos
entrevista individual com diretores, supervisores/coordenadores pedagógicos e professores do
Ensino Fundamental e Médio das escolas pesquisadas. O objetivo era entrevistar 06
professores de Ensino Fundamental e Médio de cada escola pesquisada. Na Escola Estadual
de Ensino Médio Aurélio Buarque de Holanda Ferreira onde só há Ensino Médio, foi
necessário escolher os 06 professores desse mesmo nível de ensino. Na Escola Estadual de
Ensino Fundamental e Médio Juscelino Kubitschek superamos o previsto e entrevistamos 7
professores. As perguntas foram as mesmas a todos os entrevistados, para possibilitar uma
comparação entre as escolas.
AS AÇÕES DO IMPERIALISMO E AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS NO
CAPITALISMO BUROCRÁTICO: CORONELISMO E SEMIFEUDALIDADE
Os estudos bibliográficos nessa primeira fase da pesquisa priorizaram a compreensão
das categorias históricas de análise buscando na teoria marxista o conceito de Estado e sua
função na sociedade. O Estado, na visão Marxista, surgiu em consequência da apropriação
privada de riqueza e da luta de classes. Para Lênin, “o Estado é o produto e a manifestação do
antagonismo inconciliável das classes. O Estado aparece onde e na medida em que os
antagonismos de classes não podem objetivamente ser conciliados. E reciprocamente, a
existência do Estado prova que as contradições de classe são inconciliáveis” (LÊNIN, 1978,
p. 9). O governo moderno não é senão um comitê para gerir os negócios comuns de toda a
classe burguesa (MARX E ENGELS, 2008, p.25). O conceito de Estado remete à categoria
histórica que empregaremos em nossa análise que é o imperialismo.
Para Lênin o imperialismo é a fase superior do capitalismo referenciado nos Estados
Unidos da América do Norte. É no seio do Imperialismo norte-americano que os monopólios
adquirem a máxima solidez ao reunirem nas mãos a maior parte das fontes de matéria-prima e
85
a vigorosa interferência das associações internacionais que se esforçam por retirar do
adversário toda possibilidade de concorrência, por adquirir as terras que contém minérios,
jazidas de petróleo, etc. (LÊNIN, 1979).
Segundo Lênin, (1979), o imperialismo é o
aprofundamento das relações de dominação do capital monopolista sobre a vida econômica e
consiste, na divisão do mundo entre países opressores e oprimidos, sustentada no domínio do
capital financeiro, na exportação de capitais e na política colonial. O imperialismo ao dividir o
mundo define suas colônias e semicolônias mantendo-as dependentes. Essa dependência dos
países dominados pelo imperialismo se desenvolve por meio da ação de empresas
multinacionais para explorar a matéria-prima e a mão-de-obra barata desses locais, por meio
de empréstimos ao Estado e investimentos em fontes de recursos naturais, etc. mantendo uma
relação de dominação e controle de suas economias.
O conceito de Capitalismo Burocrático é definido por Guzmán como “o capitalismo
que o imperialismo impulsiona num país atrasado; o tipo de capitalismo, a forma especial de
capitalismo, que impõe um país imperialista a um país atrasado, seja semifeudal, semicolonial” (GUZMÁN, 1974, p. 1).
O capitalismo burocrático tem duas colunas: semicolonialismo e semifeudalidade
(grande propriedade, semisservidão, gamonalismo ou coronelismo) que são interdependentes
e interligadas. O Brasil é um país de capitalismo burocrático, porque permanece semifeudal e
semicolonial, dominado por uma potência estrangeira. Por nunca ter realizado a revolução
burguesa, manteve dois grandes problemas: o problema nacional (nunca teve soberania e em
cada época é dominado por uma potência imperialista) e o problema da terra, ostentando uma
das maiores concentrações de terra do mundo. Essa condição fez com que o Brasil
permanecesse como um país semifeudal e semicolonial e, portanto, um país de capitalismo
burocrático (SOUZA, 2010).
Conforme a análise de Souza (2010) nas ultimas décadas o imperialismo ao instaurar
uma nova ordem política, chamada de neoliberalismo, instituiu também uma nova ordem
cultural por meio de seus organismos multilaterais como o Fundo Monetário Internacional
(FMI), a Organização Mundial do Comércio (OMC), o Banco Mundial, etc. Santomé (2003,
p. 19) diz que esses organismos são “o cérebro das políticas neoliberais”. Esses organismos,
em especial o Banco Mundial impõe suas ideologias com o objetivo de produzir seres
humanos com “habilidades e competências” para o trabalho semisservil e precário por meio
das políticas educacionais dirigidas e financiadas pelo imperialismo, especialmente o
estadunidense. A principal agência responsável pela difusão das ideologias imperialistas na
86
atualidade é, sem dúvida, o Banco Mundial. Souza (2010, p.171) explica sobre os objetivos
do Banco:
Na verdade, o objetivo educacional do banco é controlar as populações
pobres por meio dos principais aparelhos ideológicos. Pretende-se formar
seres dóceis e passivos diante das imposições do capital e da miséria que se
intensifica com as novas formas de organização econômica forjada da crise
capitalista. É o mercado que regula tudo. As relações educacionais passam a
ser também relações mercantis. A escola deve funcionar como uma empresa
capitalista e servir ao mercado na produção de mão-de-obra barata,
qualificada e semisservil que garanta maior produtividade ao capital
monopolista. Na verdade, a educação passou a ser entendida como
investimento, pois ela prepara recursos humanos para atender ao mercado
capitalista. Se a força de trabalho dos trabalhadores possui maior
qualificação técnica, maior possibilidade de apropriação de capital, maior
extração de mais-valia, de produtividade.
Atualmente sob está em pleno vigor em Rondônia o projeto Fundescola, que se
subdividiu em Fundescola I, Fundescola II e Fundescola III. Nos municípios de Rondônia
foram implantados vários programas do Fundescola: PDE, Escola Ativa, Gestar, Pró-Gestão,
Proler e outros programas também com financiamento e orientações do Banco Mundial como
o Pró-Letramento, Pró-Infantil, Pró-Jovem Pró-Info, Além das Letras e Brasil Alfabetizado,
etc. (SOUZA, 2010 e SILVA, 2011).
Conforme análise de Souza (2010), Esses programas fundamentam-se na concepção
de que o professor deve ser munido de muitas atividades práticas, separadas por conteúdos e
módulos. O professor deve aplicar essas atividades na sala de aula e depois avaliar seus
resultados com os tutores. “A preocupação está centrada no fazer e não no conhecimento
teórico. É o conhecimento técnico de como fazer, como executar as atividades que já vêm
elaboradas nos módulos” (SOUZA, 2010, p.226).
AS
POLÍTICAS
DE
FORMAÇÃO
DOCENTE
COMO
ELEMENTOS
FUNDAMENTAIS DE SUSTENTAÇÃO DAS RELAÇÕES DE PODER NO
AMBIENTE ESCOLAR
Nas entrevistas realizadas nas escolas estaduais da Zona da Mata Rondoniense
captamos as diversas maneiras como o capitalismo burocrático se impõe nas políticas
pedagógicas. Nossa análise vai desde a formação continuada de docentes, ditos como
programas que aprimoram a atuação em sala de aula, até os fatores externos à escola. Nas
87
escolas pesquisadas encontramos o PDE, o Gestar, o Pro-Letramento, o Proinfo, Escola de
Gestores, entre outros programas de formação.
A institucionalização da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n° 9.394/96
no Brasil se forjou em meio a essas pressões realizadas pelo Banco Mundial e conflitos entre
fomentadores de políticas, prevalecendo às imposições do Banco Mundial, de uma formação
técnica do professorado. Os cursos de formação de professores no Brasil, que têm sido
realizados em sua maioria à distância e em serviço, uma vez, que muitos são concomitantes
com períodos de aula enquanto os professores exercem a docência (SILVA, 2002).
A pesquisa identificou que os programas são impostos e os professores são
pressionados a participarem. Quando indagados sobre o funcionamento dos programas de
formação que foram implantados nas escolas, como o GESTAR, PRÓ-LETRAMENTO,
PROINFO, etc., muitos professores afirmaram que são pressionados de alguma forma a
aderirem aos programas e permanecerem nos cursos oferecidos. Ao serem perguntados “Se
vocês decidirem não participar dos programas de formação, não seguirem as normas
instituídas, não aceitarem as relações autoritárias na escola o que ocorre?” obtivemos o
seguinte resultado:
PRINCIPAIS RESPOSTAS DOS PROFESSORES SOBRE A
Qua
“DESOBEDIÊNCIA”
nt.
Há uma pressão velada; “facilidades e bonificações” para quem
13
participa; a direção/supervisão força a participação por convencimento;
Pressão excessiva para que participem; há punição; ameaça de envio de
07
relatório à SEDUC.
Não tem pressão; não há punição; acredita que não acontece nada
07
Nunca descumprimos por receio de punição; por medo
01
Não sabe o que acontece se não participar e seguir as normas;
03
TOTAL
31
%
41,9
22,6
22,6
3,2
9,7
100
%
Conforme o quadro acima 64,5% dos professores afirmou que há pressão para que
participem dos programas de formação. A situação mais grave identificadas nas Escola B e E
foi o fato de que participam “porque conta como dia letivo, registramos horas. A escola faz
acordos com os professores (...) A REN cobra dos diretores e estes negociam com professores
para que participem”.
Para levantar as contradições existentes nas relações estabelecidas entre professores e
gestores perguntamos aos supervisores e diretores sobre esses mecanismos de pressão: “Como
são as relações entre gestores e professores na escola? O que ocorre quando um professor não
88
cumpre com as regras estabelecidas, não participa dos programas e das atividades propostas?”
As respostas contradizem às informações prestadas pelos professores. O posicionamento é de
negação ou de “pressão leve” que ocorre pelo “convencimento” como podemos ver no quadro
abaixo:
PRINCIPAIS RESPOSTAS DOS SUPERVISORES E DIRETORES Qua
SOBRE A “DESOBEDIÊNCIA”DO PROFESSOR
nt.
Tem boa relação; há conversas de forma amigável sem punição; não há
4
pressão
Há pressão leve, se estabelece “acordos”; alguns participam e outros não;
5
há convencimento
Tem que pressionar mesmo, pois não pode deixar as coisas “soltas”
1
(Supervisora)
Não cabe à supervisão esse papel, seu papel é pedagógico; relatamos à
1
direção; (Supervisora)
TOTAL
11
%
36,3
6
45,4
5
9,09
9,09
100
%
Ao implantar esses programas de formação a pesquisa identificou que se busca a
adesão dos professores de três formas: Primeiro busca-se o “convencimento” de que o
programa oferece materiais pedagógicos que resolverão os problemas do fracasso escolar.
Quando essa forma não funciona, se oferece vantagens, como redução da carga horária.
Muitos entrevistados ingressaram nesses programas devido a essa redução. Se nenhuma das
duas primeiras formas de inserção dos professores nos programas funcionarem, então se apela
para a pressão, logicamente tácita, isolando-os. Os professores que se recusam a participar são
chamados de desinteressados, individualistas por não se integrarem ao grupo. Assim, mesmo
que seja apenas para agir como a maioria, os professores acabam se inserindo nos cursos de
formação do Gestar ou do Pró-Letramento. No caso dos diretores das escolas a obrigação de
matricularem-se nos cursos de formação do Programa Escolas de Gestores está prescrito no
próprio Decreto nº 16.202, de 20 de setembro de 2011 que institui eleições para diretores e
vice-diretores das escolas do Estado de Rondônia.
Muitos professores são “convencidos” ou pressionados a aderirem aos programas de
formação, mas quando são questionados a respeito destes, 67,6% os consideram bons, 15,74%
os consideram ruins, 10% se mostraram indiferentes e 6,66% não participam dos mesmos. Já
a direção e a supervisão, 80% afirmaram ser bons, 10% ruins e 10% não souberam como
opinar.
Nas entrevistas, os professores, mesmo os que disseram que os programas de formação
são “bons”, reclamaram e desqualificaram alguns programas, argumentando que deles pouco
89
se aproveita: “Não consegui engolir o Pró-Letramento, pois veio um curso fraco. Não deu
para engolir um curso de matemática também do Pró-Letramento, não dá... é como se eu
estivesse indo para atrás."(Professora da Escola A). Os professores da Escola D afirmaram
que os cursos são muito repetitivos, aligeirados; que no PROINFO os equipamentos não
funcionam; que o único que se aplicou foi o PROFA por ter bons formadores e que nos
demais programas os formadores são ruins; que os conteúdos estão longe da realidade e
finalmente, que concretamente pouco se aproveita dos programas de formação. Segundo uma
das professoras, “é inaplicável o que se aprende nos cursos, não tem como operacionalizar”.
Muitos dos que não participam tem consciência do que eles significam como expressou um
professor da Escola D: “São programas que servem para colocar professores numa
"forminha", como o governo e os organismos internacionais querem. São cursos tecnicistas”.
Uma professora da Escola A, em sua entrevista, deixou claro que, por mais que sua graduação
proporcionasse criticidade, o ambiente escolar não oferece suporte para o aprofundamento da
crítica numa visão que integre aspectos sociais, econômicos, políticos e ideológicos. Essa
professora afirmou sentir-se um “tanto engessada pelos programas repetitivos que em nada
contribuem para uma educação problematizadora” e que, em consequência disso, não percebe
“nenhum movimento transformador da realidade”.
Os professores não conhecem as origens das políticas educacionais implantadas na
escola e não percebem as formas de dominação e controle delas decorrentes. Não sabem quem
formula nem quem financia esses programas existentes na escola, se são condizentes com a
realidade ou não. Perguntamos nas entrevistas se sabiam quem formula, orienta e financia os
programas de formação que participam e obtivemos as seguintes respostas:86,66% declararam
abertamente não saberem, 3,34% não opinaram e os 10% que disseram saber não tinham
propriedade sobre a origem dos mesmos. Professores, diretores e supervisores/coordenação
pedagógicas afirmaram que desconhecem a real origem desses programas, em suas respostas
declararam que pensam que estes são elaborados e financiados pelo MEC, Governo do
Estado, FNDE e até mesmo os que concordam e participam dos programas desconhecem
quem os formula. Não conhecem, nem discutem as políticas educacionais, vivendo na mais
completa obscuridade. Esses programas já são formulados para inibir a reflexão, a criticidade,
tornando sempre maçantes e repetitivos, desmotivando os professores que fazem esses cursos,
às vezes além de sua carga horária e não garante nenhum incentivo financeiro.
A formação do professor, neste contexto, passa por perdas incalculáveis. Esta
formação vem sendo feita, prioritariamente, de forma aligeirada, pragmática, onde estão
sendo criados os “práticos da educação”. Há que se compreender que seus encaminhamentos
90
inserem-se no processo de ajuste da educação às novas exigências dos organismos
internacionais, em particular do Banco Mundial e do FMI e visa adequar a formação de
profissionais ao atendimento das demandas de um mercado globalizado. Nessa direção, a
atual LDB negou à educação o estatuto epistemológico da ciência, descaracterizando o
profissional de educação como intelectual, atribuindo-lhe uma dimensão tarefeira, para a qual
não precisa se apropriar dos conteúdos da ciência e da pesquisa.
Assim, entende-se que à grande maioria compete a função de divulgação do
conhecimento produzido em níveis diferenciados, para o que se propõe uma qualificação
também diferenciada e tão mais aligeirada e menos especializada quanto mais se destine às
classes subalternas, objeto “natural” de exclusão, para o que não se justifica longos e caros
investimentos, principalmente no que diz respeito à sua formação na universidade. Vê-se,
pois, que o arcabouço teórico está sendo diminuído em face da conotação prática que a
formação está tomando.
Os órgãos oficiais divulgam, contraditoriamente, que a escola tem autonomia para
elaborar seu projeto político pedagógico e os diversos encaminhamentos dele decorrente,
porém, na prática, deve seguir determinações de instâncias superiores a exemplo dos
Parâmetros Curriculares Nacionais. Compreende-se, assim, que as postulações advindas do
Ministério da Educação apresentadas como forma de atender às necessidades da nação, na
verdade estão de acordo com os interesses do Estado, e este, por sua vez, é um Estado
burguês; logo as orientações do MEC atendem, não aos interesses dos alunos e dos
professores, mas aos interesses da classe burguesa, que é defender a manutenção do modo de
produção capitalista.
Decorrente dessas determinações, a formação do educador, de forma fragmentada,
baseada no modelo taylorista/fordista em que cada “especialista” - diretor, orientador,
supervisor, coordenador - desenvolve seu trabalho de forma isolada, cada um cumprindo sua
função. Por outro lado, na perspectiva toyotista, são formados os educadores para atenderem
aos mais variados ramos da educação, porém, sem compreenderem a educação como um todo
e sem, portanto, ver na formação do educador uma possibilidade de unitariedade. Forja-se,
assim, a formação de professores multitarefeiros, polivalentes, que atuam em várias funções
no interior da escola, que formam o trabalhador/consumidor e não um membro da sociedade
capaz de compreender as contradições da sociedade de classes em que vive.
Neste processo, grande parte dos professores não se identifica como classe
trabalhadora, os quais acabam aderindo ao projeto político da burguesia, passando os
conceitos de empreendedorismo, competitividade, inteligência emocional, polivalência, com
91
uma formação conduzida à articulação entre competência e compromisso, precarizando assim
a formação dos professores. A fragmentação é usada também para que o professor não se veja
como pertencente a uma categoria. Com a divisão das especialidades - administrador,
supervisor, orientador, coordenador - ele não se identifica mais como professor, e trabalhando
em várias escolas, não se identifica nem com a escola em que trabalha, nem com os
problemas da mesma. Todavia esta divisão do trabalho escolar tem origem na separação entre
propriedade dos meios de produção e força de trabalho, e não na divisão técnica do trabalho.
Porém, percebe-se a compreensão e o interesse que a classe dominante tem em relação
à escola, quando considera que compete a ela dar uma formação que possibilite o manuseio
das máquinas que serão utilizadas nos mercados de trabalho e de consumo. Esta é a função da
escola no novo modo de vida: preparar as pessoas com um certo grau de conhecimento conhecimentos úteis para que possam realizar suas tarefas, mas não com o conhecimento do
processo produtivo como um todo, pois caso o trabalhador tenha acesso a uma educação mais
complexa, poderá perceber sua condição de explorado.
A implantação dessas políticas educacionais é possível devido às relações
coronelícias, hierarquizadas dentro da escola. As relações semifeudais existentes na esfera
educacional garantem o repasse de vários “pacotes” que ela deve utilizar. São "inovações
compartilhadas", impostas e alheias aos professores, supervisores e diretores. O autoritarismo
é rigoroso. A maioria dos professores entrevistados afirmaram que a relação com a supervisão
e direção da escola é uma relação “relação indiferente, distante, autoritária, burocrática e
hierarquizada, apenas há informes e repasses”, como podemos ver no quadro abaixo:
RELACIONAMENTO DOS PROFESSORES COM A SUPERVISÃO
Situações
Quantidade
%
Boa relação. Há um diálogo sobre as questões pedagógicas;
08
25,8
Tranqüila e harmoniosa
04
12,9
Relação conflituosa, supervisão burocrata; autoritária; dominadora
13
41,9
Relação razoável; supervisão não impõe, mas não contribui no
02
trabalho pedagógico.
6,5
Há muita transferência de supervisores. Há número insuficiente de
01
supervisores
3,2
Relação indiferente e distante, apenas há informes e repasses.
03
9,7
TOTAL
31
100,0
(Continuação)
RELACIONAMENTO DOS PROFESSORES COM A DIREÇÃO
Tipo de relação
Quantidade
Conflituosa; autoritária; burocrática, hierarquizada e distante do
10
%
32,26
92
trabalho coletivo.
Relação harmoniosa, democrática; contribui com o trabalho
coletivo
Relação hierarquizada, distante; sem autoritarismo; não estimula
nem interfere no trabalho coletivo;
Não respondeu;
TOTAL
10
32,26
10
32,26
01
3,23
O coronelismo é um fenômeno que ocorre em várias dimensões de forma hierárquica,
como demonstram as relações dos supervisores e diretores com a Representação de EnsinoREN, o órgão de chefia imediata da Secretaria de Educação do estado de Rondônia.
Perguntados “Como é seu relacionamento com a representação de ensino? Você cumpre tudo
o que a SEDUC determina? O que ocorre se você discordar?” obtivemos as seguintes
respostas:
PRINCIPAIS RESPOSTAS DOS SUPERVISORES E DIRETORES
Relacionamento distante e burocrático. Em alguns casos rejeitamos
algumas propostas. Em outros casos não tem força para rejeitar. A
maioria das ações é determinação; cumprem as determinações mesmo
questionando.
Nada é imposto. A escola é autônoma. Só não podemos desrespeitar a
Lei.
Cumpre todas as determinações da SEDUC; não há questionamento; não
há autonomia; falta suporte para solucionar problemas.
Sem informação; Não Respondeu.
TOTAL
Qua
nt.
%
08
72,73
01
9,09
01
9,09
01
11
9,09
100%
Os sujeitos da prática educativa não participam de nenhuma formulação pedagógica,
apenas repetem e planejam o que já vem pronto. 39,52% dos professores alegaram que não
participam das decisões pedagógicas em ambiente escolar, 50,94% responderam que “não
somos consultados; nossa participação é formal, pois apenas nos comunicam das decisões;
não respeitam a vontade do coletivo; a escola não tem autonomia; a SEDUC impõe as coisas e
a direção/supervisão só reproduz; reuniões burocratizadas; não há discussão pedagógica”.
Afirmaram que “há participação apenas em alguns espaços, mas em caráter de ajustes e
sugestões; no geral as reuniões servem para legitimar o que vem pronto; as reuniões são
apenas informativas; a SEDUC restringe muito o tempo para discussão”. Os outros 9,54%
decidiram por não responder a questão para evitar qualquer situação conflituosa ou
constrangedora.
93
Se a maioria afirma que há relações autoritárias, que os programas de formação são
impostos, que discordam do processo de avaliação de desempenho realizado pelo Ministério
da Educação, que não participam das decisões gerais nem da própria escola, então
perguntamos aos professores, “porque aceitam as imposições do governo?” Eis as respostas:
PRINCIPAIS RESPOSTAS DOS PROFESSORES
Por medo de perseguição e punição; por não conhecer seus direitos
(jovens); serem alienados; medo de perder o salário.
Por acomodação; maioria já em fim de carreira; cansados de lutar;
consideram que não tem força
Há muita luta contra as imposições; mesmo impondo não aceitamos tudo;
há resistência
Atualmente o governo não impõe; há diálogo com os professores; não são
punidas, mas há pequenos benefícios;
Não sabe; não respondeu
TOTAL
Qua
nt.
%
22
71,0
05
16,1
02
6,5
01
3,2
01
31
3,2
100
%
Embora de forma parcial e preliminar, a partir de nossos estudos, já podemos afirmar
que há relações semisservís e autoritárias entre gestores e professores e entre estes e os
gestores da SEDUC e que todos eles se submetem a diversas formas de opressão do sistema
educacional. Os programas são impostos sem nenhuma participação da comunidade escolar.
A escola não possui autonomia alguma para a tomada de decisões. Essas relações
autoritárias ocorrem através da ação dos governantes ou até mesmo dos próprios colegas de
trabalho, estabelecidas pelo coronelismo vigente nas mais amplas relações sociais do
capitalismo burocrático.
Presente em ambientes escolares, as imposições autoritárias partem inicialmente de
governantes, que encaminham suas ordens aos agentes indiretos, aos órgãos educacionais
responsáveis pelas escolas de cada município até chegarem aos gestores e professores;
formando degraus, em que as ordens são implantadas de cima para baixo e impreterivelmente
cumpridas. Quando a educação é imposta, configura-se o que se convencionou chamar, na
América Latina, de gamonalismo ou caciquismo, e que no Brasil denominamos coronelismo.
Retomando nossa categoria histórica de análise o capitalismo burocrático tem duas
colunas:
semicolonialismo
e
semifeudalidade
(grande
propriedade,
semisservidão,
gamonalismo) conforme Guzmán (1974). O semicolonialismo é externo e a semifeudalidade
é interna (SOUZA, 2010). A semifeudalidade caracteriza-se pela existência da grande
propriedade, da semisservidão e do gamonalismo (coronelismo). O gamonalismo não está
94
representado somente pelos gamoneles (latifundiários) propriamente ditos. Compreende uma
grande hierarquia de funcionários, intermediários, agentes, parasitas, etc. (MARIÁTEGUI,
2008, p. 54). Coronelismo é, portanto, a estrutura hierárquica que vai gerar a organização do
Estado que sustenta as relações de semisservidão. Segundo Mariátegui, o coronelismo ou
gamonalismo não designa apenas uma categoria social e econômica dos latifundiários, mas
agentes públicos:
O termo gamonalismo não designa apenas uma categoria social e econômica
dos latifundiários ou grandes proprietários agrícolas. Designa todo um
fenômeno. O gamonalismo não está representado somente pelos gamonales
propriamente ditos. Compreende uma grande hierarquia de funcionários,
intermediários, agentes, parasitas, etc. (MARIÁTEGUI, 2008, p. 54).
O coronelismo caracteriza-se por uma estrutura política e administrativa das
instituições do Estado. Os cargos técnicos e políticos concentram-se nas mãos de pessoas
escolhidas e nomeadas pelos detentores do poder local para executar seus projetos que
raramente são escolhidas por critérios profissionais. Os agentes indiretos do imperialismo e
tem seus subordinados nos setores da administração pública. Professores ocupando cargos
técnicos nas instituições dirigentes da educação se transformam em opressores de sua própria
classe porque se colocam a serviço dos interesses do grupo detentor do poder.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O resultado da parcial da pesquisa definiu as questões principais desenvolvidas neste
estudo que são:
a) O Brasil é um país de capitalismo burocrático, que é o tipo de capitalismo
engendrado pelo imperialismo nos países atrasados, ou seja, semifeudal e semicolonial,
mediante o domínio do imperialismo sobre toda a sua estrutura econômica e social
(GUZMÁN, 1974, p. 2);
b) As políticas educacionais de formação de professores e gestores das escolas
estaduais da Zona da Mata são hegemonicamente formuladas, dirigidas e financiadas pelo
imperialismo, por meio de uma de suas principais agências, o Banco Mundial, e se efetivam
nos programas implantados na educação por meio do coronelismo existente no âmbito do
poder local; A análise dos dados coletados apresentaram resultados preliminares apontando
que as relações de poder na escola são determinadas pelo coronelismo que age indiretamente
por meio de coação ou da persuasão dos professores para se submeterem às políticas
95
educacionais ditadas pelo Banco Mundial/MEC, sob risco de perseguições por parte do poder
local.
REFERÊNCIA
BRASIL. Ministério de Educação. Fundescola. Manual de operacionalização e
monitoramento do Programa Gestão da Aprendizagem Escolar - GESTAR. Brasília:
MEC, 2000.
GUZMÁN, A. La problemática nacional: discurso pronunciado no Sindicato de Docentes
de Huamanga, Lima, Peru, 1974. Disponível em: <http://www.blythe.org/perupcp/docs_sp/nacional.htm>. Acesso em: jan. 2009.
LÊNIN, V. I. O imperialismo: fase superior do capitalismo. Tradução de Olinto
Beckerman. 1. ed. São Paulo: Global, 1979.
MARIÁTEGUI, J. C. Sete ensaios de interpretação da realidade peruana. São Paulo:
Expressão Popular, 2008.
MARX, K; ENGELS, F. Manifesto do Partido Comunista. Rio de Janeiro: Frente
Revolucionária de Defesa dos Direitos do Povo, 2008.
SANTOMÉ, J. T. A educação em tempos de neoliberalismo. Porto Alegre: Artmed, 2003.
SILVA, P. A. D. Repercussões das concepções pedagógicas nas políticas educacionais em
Rondônia entre 1995 e 2010. Dissertação de Mestrado, UNIR, 2011.
SOUZA, M. M. Imperialismo e Educação do Campo: Uma análise das políticas
educacionais a partir de 1990. Tese de doutorado, Faculdade de Ciências e Letras,
Universidade Estadual Paulista- UNESP, Araraquara, 2010.
SILVA, M. A. Intervenção e Consentimento: a política educacional do Banco Mundial.
Campinas - SP: Autores Associados - Fapesp, 2002.
96
O CURSO DE PEDAGOGIA NA MODALIDADE A DISTÂNCIA: DESAFIOS PARA A
GESTÃO DO TRABALHO PEDAGÓGICO
ESTADO DA ARTE DA PESQUISA EM EDUCAÇÃO SUPERIOR EM RONDÔNIA
Cáthlen Lemos Silva16
[email protected]
Carmen Tereza Velanga17
[email protected]
RESUMO
A fundação Universidade Federal de Rondônia - UNIR tem, como umas de suas principais e
históricas missões institucionais o continuam desenvolvimento de ações voltadas para a
melhoria da Educação no Estado, desafio que vem sendo enfrentado ao longo de sua trajetória
por aqueles que reconhecem a relevância social e o papel das licenciaturas na construção
deste objetivo. As facilidades oferecidas pelas ferramentas tecnológicas permitem a
comunicação e orientação a distância, e o acesso a grandes volumes de informações, de forma
diferenciada em termos de espaço e tempo de aprendizado. Altera-se o conceito do
“presencial” e também o conceito de “aula”, sendo que o espaço e o tempo de aula passam a
ser cada vez mais flexíveis. As atuais tecnologias, principalmente a INTERNET, nos
impulsionam a modificações na forma de ensinar e aprender tanto nos cursos presenciais.
como nos de educação continuada e à distância. Cada vez mais a aquisição da informação
depende menos da presença do professor e, portanto, o estar junto fisicamente passa a ter
significado quando algo importante acontece; o papel do professor passa a ser o de
organizador e motivador da aprendizagem, auxiliando o aluno a interpretar as informações,
relacioná-las e contextualizá-las. Esta pesquisa buscou conhecer as principais características
desta modalidade de ensino, bem como ressaltar os principais pontos positivos e negativos e
as dificuldades dos participantes deste processo (Gestores, Professores, Tutores e Alunos), na
Educação a Distancia especificamente o curso de Pedagogia ofertado pela UNIR em parceria
com a Universidade Aberta do Brasil-UAB.
Palavras-chave: Gestão. Educação a Distancia. Formação de Professores.
ABSTRACT
The foundation of the Federal University of Rondônia - UNIR, has, as one of its main
historical and institutional missions, the continued development of actions aimed at improving
education in the State, a challenge that is being faced throughout his career by those who
recognize the social relevance and the role of graduates in the construction of this goal. The
facilities offered by the technological tools allow you to communicate the distance and
orientation, and access to large volumes of information in different ways in terms of space
and time for learning. Changes to the concept of "face" and also the concept of "class", and
16
17
Acadêmica do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Rondônia
Profª. do departamento de Educação
97
that space and time class become increasingly flexible. The current technologies, especially
Internet, in driving the changes in the way of teaching and learning in both courses. as in
continuing education and distance learning. Increasingly, information acquisition depends less
on the teacher's presence and, therefore, being together physically is to have meaning when
something important happens, the role of the teacher becomes an organizer and motivator of
learning, helping students to interpret information, and relate them to contextualize them. This
research sought to identify the principal characteristics of this type of education, as well as
highlight the main strengths and weaknesses and difficulties of the participants in this process
(Managers, Teachers, Tutors and Students) in Distance Education Faculty of Education
specifically offered by UNITE in partnership with the Open University of Brazil-UAB.
Keywords: Management. Distance Education. Teacher Training.
INTRODUÇÃO
O Plano de Trabalho ora proposto decorre de uma pesquisa financiada pelo
CNPq/PIBIC, iniciado em 2009, intitulado “A Construção do curso de Pedagogia a Distância
da Universidade Federal de Rondônia: Desafios e Utopias”, que cumpriu na primeira etapa
com o objetivo de historicizar o referido curso levantando a historia e a memória, que surgiu a
partir da demanda por professores formados em toda a região e a oferta do Ministério da
Educação na educação a distancia.
Na UNIR, o Curso foi proposto em 2005, mas somente teria sua primeira turma de
ingressantes em 2008. Mesmo em meio a promulgação das novas Diretrizes Curriculares
Nacionais para a formação do pedagogo (2006), o Projeto Político Pedagógico do curso ainda
não atendia as reais demandas e peculiaridades regionais amazônicas, e passou por uma
reformulação curricular ainda em 2009. Este novo PPP foi implantado em 2010. Que foi
objeto de estudo no plano de trabalho de 2010 a 2011, buscando-se a partir da implantação da
reformulação curricular, estudar o currículo do Curso de Pedagogia da UNIR na modalidade a
distância mediante a reformulação provocada pelas novas Diretrizes Curriculares Nacionais
(2006) e a sua implementação bem como as implicações da docência universitária para a
efetivação deste currículo e para a formação do pedagogo no estado de Rondônia e continuou
contemplando os estudos da historia e a memória desse curso, bem como os documentos
legais que o constituem. E se propôs a identificar o perfil sócio-cultural dos principais atores
envolvidos no processo pedagógico da EAD - Curso de Pedagogia da UNIR - no que se refere
ás representações de suas funções e papéis, dificuldades e necessidades diante da estrutura e
98
organização da educação a distância na tarefa de formar o pedagogo no estado de Rondônia
delineando a construção de um curso de Pedagogia que se propõe à formação a distancia.
METODOLOGIA
Como metodologia, utilizou-se a abordagem qualitativa e pesquisa do tipo estudo de
caso, uma vez é uma pesquisa descritiva em suas diversas formas, onde focaliza a gestão do
trabalho pedagógico e suas consequências para a formação do pedagogo na Universidade
Federal de Rondônia bem como a problematização que se faz inserida em um Estado
multicultural, amazônico, de dimensões geopolíticas e
sociais, determinando aspectos
relevantes a serem considerados nesta modalidade de formação de professores. O estudo de
caso, conta com uma variedade de fontes de informação, onde o pesquisador recorre.
Considerando que o Estado ainda necessita desses quadros formados para atender a demanda
crescente no ensino fundamental, cabe-nos estudar os limites, os desafios e as utopias
necessárias à construção desse Curso, e suas consequentes mudanças paradigmáticas. Estudar
a gestão educacional em uma perspectiva democrática implica em reconhecer neste
paradigma, o sentido para obter a qualidade de ensino necessária a formação de docentes para
uma sociedade cidadã e para a formação do sujeito de direitos e deveres.
GESTÃO NOS SISTEMAS DE EDUCAÇÃO A DISTANCIA
A expansão e desenvolvimento da educação a distancia em todos os países do mundo
estão associados à popularização e democratização do acesso às tecnologias de informação e
de comunicação. O documento do ministério da educação Referenciais de Qualidade para a
educação a distância destaca a importância do processo de gestão para o desenvolvimento de
um bom sistema de educação a distância ( Brasil, 2007). Considera-se a gestão educacional
um campo de suma importância para que se compreenda o conjunto do processo de ensinoaprendizagem na educação básica e superior, assim como na educação presencial ou a
distância.
Para Luck 2006, boas escolas emergem mais facilmente de sistemas de ensino bem
organizados e orientados, a partir de uma concepção clara sobre educação e sobre o seu papel
de gestão para promove-la. O termo Gestão Escolar começou a ser utilizado recentemente e
está relacionado à ação que objetiva promover a organização, a mobilização e a articulação de
todas as condições materiais e humanas necessárias para garantir o avanço dos processos
99
sócio-educacionais nos locais de ensino, onde a gestão visa a promoção efetiva da
aprendizagem pelos alunos.
O conceito de gestão escolar nasceu para superar um possível enfoque limitado do
termo administração escolar. Foi construído a partir dos movimentos de abertura politica do
pais, que começaram a promover novos conceitos e valores, associados, sobretudo a ideia de
autonomia escolar, à participação da sociedade e da comunidade .A pratica da gestão escolar é
de extrema importância, na medida em que se almeja uma escola que atenda exigências da
vida social, ou seja, uma escola que: forme cidadãos, desenvolvendo suas competências e
habilidades necessárias à inserção social.
A gestão escolar está classificada em três áreas, de modo integrado ou sistêmico:
Gestão Pedagógica, Gestão de Recursos Humanos e Gestão Administrativa. Neste momento
prioriza-se a gestão pedagógica. A gestão pedagógica é considerada como a mais importante e
significativa no sistema escolar, visto que cuida do gerenciamento da área educativa da escola
e da educação escolar. Além de Estabelecer e traçar objetivos: gerais e específicos, para o
ensino. Define as linhas de atuação, em função dos objetivos e do perfil da comunidade e dos
alunos. Elabora os conteúdos curriculares, acompanha e avalia o rendimento das propostas
pedagógicas, dos objetivos e o cumprimento de metas. Avalia o desempenho dos alunos, do
corpo docente e da equipe escolar como um todo.
Luck (2000) percebe a gestão escolar como sendo uma dimensão, um enfoque de
atuação, um meio e não um fim em si mesmo, uma vez que o objetivo final da gestão é a
aprendizagem efetiva e significativa dos alunos, de modo que, no cotidiano que vivenciam na
escola, desenvolvam as competências que a sociedade demanda, dentre as quais se
evidenciam: pensar criativamente Logo se entende que:
Gestão é a atividade que procura garantir o sucesso de um
empreendimento novo coletivo, que conhece e compreende a
organização detalhadamente. A gestão fornece ferramentas para que
os gestores possam ao mesmo tempo compreender, analisar e tentar
melhorar ainda mais o seu desempenho operacional, e para se alcançar
esses objetivos a gestão deve utilizar uma metodologia voltada para o
auto-conhecimento, compreensão e determinação do ambiente,
definições de estratégias, controle avaliativo, entre outros
procedimentos. (BURIN; VARVOKIS; MORINI, 2006).
A implantação de um sistema de gestão de Educação a Distancia requer de todos os
envolvidos conhecimento amplo da organização, uma qualificação adequada e um
desempenho grupal para que o projeto seja colocado em prática e os objetivos alcançados,
gerando assim resultados pedagógicos e educacionais eficientes. O gestor deve contribuir na
100
qualificação dos tutores, apoiá-los em todo processo de ensino, planejamento o programa e
disponibilizar a estrutura necessária para que eles produzam o material aos alunos o acesso às
informações necessárias para que eles possam desenvolver as atividades.
Costa (2001) aponta três modelos institucionais de Educação a Distância: autônomo,
misto e em rede. No Brasil, a grande maioria de sistemas de educação a distância desenvolvese no âmbito das universidades já consolidadas no ramo de educação presencial (Costa, 2001;
Mille,2002). Os recursos tecnológicos e físicos, os modelos de ensino adotados, a gestão dos
recursos financeiros, a gestão de pessoal, a formação de professores e tutores, a elaboração e
distribuição de material, a tecnologia adotada, os procedimentos acadêmicos e os sistemas de
monitoramento e avaliação são princípios fundamentais para que a gestão do programa seja
implantada com eficácia. É importante que a gestão respeite os requisitos referentes às
diretrizes e critérios de qualidades exigidas por Leis, das instituições que oferecem essa
modalidade de ensino. (AMARAL; CASTRO, 2005).
Portanto, cabe ao gestor a reponsabilidade pela direção, organização planejamento e
controle dos processos de formação pela modalidade. Há muitas condições decorrentes do
processo que merecem atenção dos gestores, condições de disponibilidade dos recursos do
processo administrativo: instalações, espaço, tempo, dinheiro, informações e pessoas.
Os procedimentos de administração ou gestão como conhecemos hoje são
extremamente complexos e organizados: planejar, sistematizar, coordenar e supervisionar são
objetos de pensadores até hoje. Os sistemas de gestão atualmente implementados todos
possuem uma história rica e antiga. Eles têm suas raízes em princípios científicos há tempos
socializados - alguns anteriores a Revolução Industrial.
LEGISLAÇÃO EM EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (nº 9.394, de 20 de
Dezembro de 1996) estabeleceu-se o estatuto de maioridade para a Educação a Distancia.
Garantindo o incentivo do poder publico, espaço amplo de atuação e tratamento privilegiado
no que se refere a utilização de canais de radiodifusão. Os requisitos para a realização de
exames e registros de diplomas seriam dados pela união e a demais dimensões (produção,
controle, avaliação e autorização). Em seu art. 80º, a LDB estabelece:
101
Art. 80ª O Poder Publico incentivará o desenvolvimento veiculação de
programas de ensino a distancia, em todos os níveis e modalidade de ensino,
educação continuada.
§1º A educação à distancia, organizada com abertura e regime especiais, será
oferecida por instituições especificamente credenciadas pela união.
§ 2º a união regulamentará os requisitos para a realização de exames e
registros de diplomas relativos a cursos de educação à distancia.
§ 3º. As normas para a produção, controle e avaliação de programas de
educação à distancia e a autorização para sua implementação, caberá aos
respectivos sistemas de ensino, podendo haver cooperação e integração entre
os diferentes sistemas.
§4º. A educação à distancia gozar de tratamento diferenciado, que incluirá:
I-custos de transmissão reduzida em canais comerciais de radiodifusão sonora
e de sons e imagens.
II-concessão de canais com finalidades exclusivamente educativas;
III-reserva de tempo mínimo, sem ônus para o Poder Publico, pelos
concessionários de canais comerciais.
Em 10 de Fevereiro de 1998, o decreto nº 2.494 foi criado e destinado a regulamentar
o Art. 80, onde conceitua a educação a distancia, estipula diretrizes para a regulamentação,
autorização e credenciamentos das instituições, estabelecendo tempo de validade para esses
atos regulatórios, distribui competências, aborda assuntos referentes a matriculas,
transferências, aproveitamento de estudos, certificados, diplomas de avaliação de rendimento,
estabelece penalidades para o não atendimento dos padrões de qualidade e outras
regularidades e determina a divulgação periódica, pelo Ministério da Educação, da listagem
das instituições credenciadas e cursos autorizados. Fica estabelecido no Decreto nº 2.494:
(a) Os cursos à distancia serão organizados em regime especial, com
flexibilidade, requisitos para admissão, horários e duração, obedecendo,
quanto for o caso, as diretrizes curriculares nacionais.
(b) As instituições para oferecerem cursos de EAD que conduzam a certificação
de conclusão ou diploma de EJA, Educação Profissional, ensino médio e
graduação necessitam de credenciamento especial do MEC.
(c) Os credenciamentos e autorizações terão prazo limitado de cinco anos.
(d) É facultado a transferência e o aproveitamento de créditos dos alunos de
cursos presenciais para cursos de EAD e vice-versa.
102
(e) Os diplomas e certificados de EAD terão validade nacional.
(f) As avaliações com fins de promoção, certificação ou diplomação serão
realizadas por meio de exames presenciais, sob responsabilidade da instituição
credenciada.
O Decreto nº 2.561, publicado em 27 de abril de 1998, corrigindo o disposto nos art.
11º e 12º do decreto acima citado. Refere-se a competência dos sistemas estaduais e
municipais. No decreto nº 2.494, esses sistemas podiam regular a oferta de EaD destinada ao
ensino fundamental de jovens e Adultos e ao Ensino Médio. Enquanto o decreto de abril
expandiu essa proposta acrescentando o ensino profissional de nível técnico.
Em 19 de dezembro de 2005, foi publicado o Decreto nº 5.622, que mais viria a ser
complementado,
pelo Decreto nº 6.303, de 12 de dezembro de 2007. Esses decretos
regulamentam o Art. 80 presente na Lei de Diretrizes e Bases da Educação, de forma mais
sucinta e concreta. Os documentos estabelecem normas para a educação a distancia,
credenciamento das instituições, autorização e reconhecimento de cursos destinados para a
educação a distancia.
Nestes decretos estão presentes de forma detalhada, as normas e exigências para os
procedimentos de autorização, reconhecimento de cursos, credenciamento de polos,
identificação de irregularidades e suas devidas ações corretivas, formação de parceria entre as
instituições, acordos convênios, dentre outras possibilidades.
CURSO DE PEDAGOGIA A DISTÂNCIA UNIR/UAB
O curso de pedagogia a distancia na UNIR foi projetado em 2005, projeto este que
sofreu várias transformações até a sua efetiva implantação em 2008. A oferta dos cursos a
distância em Rondônia UNIR/UAB, estão nas seguintes localidades: Ariquemes, Ji-paraná,
Chupinguaia, Rolim de Moura, Porto Velho, Nova Mamoré e Buritis.
A modalidade a distância no curso de formação de professores na Unir atendem a
divisão de carga horária conforme RESOLUÇÃO CNE/CP 2, 19 de Fevereiro de 2002, em
seu Art.º 1º que estabelece que a carga horária de duração em 2.800 nos cursos de formação
de professores, dividindo-as em atividades de pesquisa, estágio supervisionado e atividades de
aprofundamento teórico-práticas para aprofundamento em áreas especificas.
A implantação do curso resultado da parceria UNIR/UAB, que visa formação de
professores no estado de Rondônia se justifica pela necessidade de um público de professores
que já atuavam nas séries iniciais e que em consequência da lei nº 9.394/96, que tornou
103
obrigatório a graduação dos professores da Educação Básica, aumenta a procura pelos cursos
de ensino superior, além do mais levar o ensino superior a localidades distantes da capital e de
difícil acesso. O objetivo do curso é formar profissionais voltados para atuação na Educação
Básica e gestores dos espaços escolares. Como consta no Projeto Pedagógico do Curso de
Pedagogia, o objetivo geral é:
Formar professores que compreendam o processo educativo
escolar com suas múltiplas inter-relações: pedagógicas,
historias, sociais, econômicas, politicas e culturais, com
domínio de fundamentos teóricos básicos das ciências que
integram o currículo dos anos iniciais e, concomitantemente,
seu tratamento didático-metodológico, exigido em nível destes
anos (PPP do curso, 2007,p. 12).
AMBIENTE VIRTUAL DO CURSO DE PEDAGOGIA UNIR/UAB
Modular Object-Oriented Dyanamic Learnig Environment - MOODLE é o ambiente virtual
utilizado no curso de pedagogia a distancia ofertado pela UNIR. A capacitação para o uso do
Moodle para os tutores, professores e coordenadores de polo é oferecida pela coordenadoria
de educação a distancia da UNIR, para os discentes, a capacitação é proporcionada nos
primeiros dias de aula, onde se constitui uma aula inaugural presencial em cada cidade onde o
curso é ofertado.
APRESENTAÇÃO DOS DADOS E ANALISE
Atualmente o curso de Pedagogia na modalidade a Distância UNIR/UAB é
coordenado pela Professora Drª. Carmen Tereza Velanga graduada em Pedagogia na UNESP,
com especialidade em Administração Escolar e Educação especial (UNESP), mestrado em
Educação e Politicas Públicas (UFRJ) e Doutorado em Educação (PUC-SP), assumindo o
posto de coordenadora pedagógica em 2008.
O curso em sua trajetória teve seu currículo reformulado para atender as exigências
das novas Diretrizes Curriculares Nacionais 2006 - DCNs. O Modelo do Curso está proposto
no seu Projeto Politico Pedagógico, cuja matriz curricular prevê disciplinas e atividades
curriculares de pesquisa, eixos temáticos propondo a interdisciplinaridade, estágio curricular.
A proposta baseia-se na linha de pensamento sócio interacionista.
104
O Curso de Pedagogia EAD da UNIR tem dois Projetos Politico Pedagógico, o
primeiro foi elaborado com alguns professores do DED antes de 2008, e ainda antes das DCN
de 2006 serem implantadas. Foi necessário refazer o Projeto Politico Pedagógico dessas
primeiras turmas em atendimento às DCN. Participaram dessa construção alguns professores
do DED, que já estavam trabalhando para desenvolver o curso. Foi construído por um grupo
de professores do DED, que também passaram a participar como professores do curso a
distancia.
As
principais
características
do
curso,
em
seu
modelo
curricular
são:
Interdisciplinaridade, ambos os PPPs promovem eixos temáticos ao final de um período,
contribuindo para o encontro dos alunos, dos conhecimentos adquiridos nas disciplinas
daquele período ou semestre, com apresentação de trabalhos temáticos propostos por um
Coordenador do Eixo Temático, que deve ser escolhido entre os professores do semestre. Este
professor acompanha a apresentação dos seminários temáticos, juntamente com tutores do
Curso, e, quando o orçamento do curso possibilita, outros professores também são convidados
a participar. Caso não haja possibilidade orçamentária de reunir este grupo presencialmente, a
proposta é manter um encontro virtual, manter um fórum também, onde se registram os
trabalhos.
O Curso hoje trabalha com dois PPP: O primeiro para as turmas antigas, que já estão
no 6 semestre ( e já teriam terminado não fossem os problemas enfrentados na UNR e na
gestão da DIRED). O segundo PPP está iniciando, pois abrange as novas turmas, que vão
cursar o 2º período assim que o curso for retomado.
O Curso prevê estágios, totalizando 300 horas, em espaços escolares e não escolares,
com acompanhamento supervisionado para os alunos. Prevê oficinas culturais, que são
atividades práticas e também propõe seminários e eventos oferecidos pelo próprio polo a fim
de que os alunos possam ter suas atividades complementares (principalmente nos municípios
onde tais eventos educacionais são mais raros).
PRODUÇÃO DO MATERIAL DIDÁTICO
O material didático para o curso de Pedagogia foi e está sendo construído por
professores convidados da UNIR, que trabalham na área específica do componente curricular.
Este material segue a proposta geral para o ensino a distância, ou seja, necessita incluir uma
dinâmica para esta modalidade, como: uma linguagem interativa com o aluno, remete-lo a
105
ambientes virtuais de pesquisas, apontando links para pesquisar, sites, indicando leituras
complementares, livros, filmes e vídeos.
A Coordenação do Curso faz o convite ao professor, que ao aceitar, assina um termo
de compromisso indicando sua responsabilidade juntamente aquele material, que inclui ceder
os direitos autorais para a UAB, deve ter o cuidado para não cometer plágios (pois isso é um
problema muito sério neste tipo de produção), também são enviados alguns modelos de outros
materiais que são considerados bons, com a linguagem para EAD adequada, bem como
manuais que temos de outras universidades, além das orientações da equipe da DIRED, que
cuida exatamente da diagramação e da edição desses materiais. O professor tem um tempo
para produzir, encaminha o material em cd-room, a equipe da DIRED trabalha com esse
material, se for o caso, se reúne com o professor propondo algumas modificações ou
sugestões para sua melhoria, até que vi editá-lo. A Coordenação disponibiliza a apostila ou
material no ambiente virtual para os alunos terem acesso. Ou seja, é de responsabilidade da
Coordenação do Curso encaminhar e acompanhar esse processo até que o material esteja
disponível para o aluno no AVA (Ambiente Virtual de Avaliação), para que ele possa cumprir
adequadamente a disciplina.
A equipe da tutoria tem um papel fundamental e muito relevante no curso de
pedagogia a distancia, os professores são formados em Pedagogia e especialistas em alguma
área pedagógica com experiência na modalidade a distancia.
Para a coordenadora pedagógica, as especializações dos tutores contribuem
significativamente, “surpreende o professor da disciplina positivamente, e assim eles passam a
agir como parceiros para diminuir as dificuldades do curso junto ao aluno”. A equipe de
tutoria está formada por: 01 Coordenador de Tutoria, uma equipe de tutores presenciais e
outra equipe de tutores a distância.
Os tutores presenciais trabalham diretamente nos polos do curso, eles tem uma agenda
de trabalho que é publicada no polo, atendendo aos alunos presencialmente. Ajudam os alunos
nas suas dificuldades de compreensão das atividades e às vezes até do conteúdo do material
fornecido. Buscam esse aluno quando percebem que está desistindo por algum motivo,
telefonam e mesmo vão até suas casas (pois residem no mesmo município), tentando traze-los
de volta ao curso. Os tutores apresentam as dificuldades dos alunos e mantem um contato via
internet com a coordenação e com os professores.
Os tutores a distancia tem o papel de mediar a ação pedagógica do professor
ministrante com o aluno. Eles são divididos por polo, conforme o numero de alunos, e
trabalham diretamente com a coordenação de tutoria e do Curso, na UNIR em Porto Velho.
106
Mantem uma agenda semanal de encontros para discutir como estão indo as turmas naquela
determinada disciplina, quais são os problemas detectados - desde problemas de acesso ao
ambiente, tecnológicos até os pedagógicos. São estes tutores que mantem quase que um
trabalho de monitoria junto ao professor ministrante e ao mesmo tempo coletam os dados do
tutor presencial para discuti-los e resolve-los nas reuniões semanais.
Os professores ministrantes precisam ter vinculo com a UNIR e geralmente são
apontados pelos departamentos. A Coordenação do Curso envia a demanda para os
departamentos, que, em suas reuniões, coloca as necessidades e envia a Coordenação do
Curso os nomes e contatos dos professores que desejam ministrar as disciplinas que serão
ofertadas naquele semestre.
A Coordenação tem um documento intitulado “Orientações Metodológicas”, o qual é
orientador desde o ambiente virtual (na abertura das salas ambientes) , até o registro das aulas
e entrega das notas. Além desse documento, quando se faz necessário ou seja, quando o
professor não tem nenhuma experiência com EaD, por exemplo), a Coordenação propõe uma
capacitação breve para o professor se ambientalizar com a plataforma Moodle, que é utilizada
no curso, e também conhecer as ferramentas pedagógicas, como: postagem de material nos
lugares adequados, fóruns, chats, diário de bordo, enfim, saber operar na modalidade.
com a disciplina, propor-se a acompanhar o aluno, etc).
As reuniões pedagógicas envolviam a todos, que se conheciam, conheciam os papeis
de cada um, percebiam que uns complementariam as funções dos outros, perceberiam o
caráter interdisciplinar do curso e se esforçariam para agir dessa maneira, desde o
planejamento da disciplina. Este modelo adotado inicialmente, foi enfraquecendo devido ao
alto custo de deslocar professores e também das responsabilidades que eles passariam a
assumir dentro do curso pelo menos naquele semestre. Houve resistências para adesão deste
modelo de gestão no trabalho pedagógico, quando o curso entrou em crise, como todos os
demais junto a DIRED e UAB.
Os professores ministrantes tem uma disciplina que fica 28 dias on-line. Os alunos
cumprem uma disciplina por vez. Cada uma delas fica no AVA por 28 dias e neste período o
professor recolhe as atividades, as devolve e fecha suas notas. É acompanhado pelo tutor a
distancia até fechar notas. Quando há necessidade de recuperação, se ela não foi feita
concomitantemente (paralela a disciplina), então há um prazo para isso, para que o aluno
tenha a chance de refazer atividades ou outras atividades e recuperar seu desempenho. Após
esse período vem a avaliação, que encerra a disciplina.
107
Os professores são constantemente monitorados pela tutoria a distancia, recebem as
informações dos tutores presenciais (sobre desempenho e dificuldade dos alunos) e tem
completa liberdade junto a Coordenação do Curso, pois todos devem estar empenhados no
desenvolvimento da aprendizagem do aluno.
Os polos eram visitados constantemente em equipe, no início da implantação do curso,
todos os meses, ou bimestralmente. Foram realizadas reuniões mensais com os coordenadores
dos polos na DIRED onde se tratavam dos assuntos pedagógicos e administrativos do Curso.
Depois essas reuniões foram sendo diminuída por conta da escassez de recursos, isso diminui
a qualidade do curso. O acompanhamento se dá de duas formas: por e-mail e telefone e em
reuniões presenciais. Isso tudo repercute na qualidade do curso, na crise que foi se
instaurando e finalmente na paralização do curso.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente pesquisa desenvolveu estudos sobre gestão pedagógica na modalidade de
ensino a distancia, especificamente no Curso de Pedagogia ofertado pela Universidade
Federal de Rondônia e a Universidade aberta do Brasil. Além de fazer um breve relato sobre o
a construção do curso. Diante dos resultados, a pesquisa constatou que a Unir sempre esteve
preocupada em todo com a formação de profissionais para que possam atender as demandas
do mercado de trabalho do estado de Rondônia.
Hoje o curso de Pedagogia na modalidade a distancia encontra mais um desafio à
retomada de suas atividades. Fica nítido a gestão integrada nos sistemas de ensino em EaD,
onde cada participante do processo (COORDENADOR, PROFESSOR, TUTOR e ALUNOS)
fazem contribuições significativas no processo de construção do curso a luz de uma gestão
democrática, é evidente que esta modalidade de ensino, desperta nos alunos outra dimensão
no que se diz respeito a aprendizagem, o aluno se torna mais autônomo e procura novas
formas de buscar o conhecimento, fazendo seus próprios horários, explorando novas
ferramentas. Este curso possui uma concepção de ensino e estrutura curricular diferenciada.
REFERÊNCIAS
PARO,Vitor Henrique. Administração Escolar: introdução crítica. São Paulo: Cortez, 1986.
LUCK, Heloísa. Gestão Educacional: Uma Questão Paradigmática. Editora: Vozes, 2006.
108
LUCK, Heloísa. Ação Integrada: administração, supervisão e orientação educacional.
Editora: Vozes, 2002.
SOUZA, José Vieira. Teorias Administrativas. Brasília: Universidade de Brasília, 2006. (Pró
Funcionário - Curso Técnico de Formação para funcionários da educação).
VELANGA, C.T; BRASILEIRO, T.S.A.; COLARES, M.L. I. S.; COLARES, A. A.
(Orgs.). Gestão educacional e escolar: desafios e possibilidades na contemporaneidade. São
Carlos: Pedro & João Editores; Porto velho: EDUFRO, 2009.
COSTA, M. G. P. Ecologia da escola: capacitação de professores por meio da educação a
distância. Educação em Foco, Belo Horizonte: FAE/CBH/UEMG, 2001.
BRASIL. Ministério da Educação, Secretaria de Educação a Distância. Referenciais de
qualidade para educação superior a distância. Brasília: MEC-SEED, 2007.
______ Leis, Decretos, etc. Decreto n. 3.276, de 6 de dezembro de 1999. Dispõe sobre a
formação em nível superior de professores para atuar na Educação Básica e dá outras
providências.
______ Leis, Decretos, etc. Lei n. 9394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes
e bases da educação nacional.
______ MEC/Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CP 1 de 18 de fevereiro de
2002. Institui diretrizes nacionais para a formação de professores da educação Básica, em
nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena.
______ MEC/Conselho Nacional de Educação. Versão Preliminar: Proposta de Diretrizes
para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica, em Cursos de Nível Superior.
Fevereiro de 2001.
AGRADECIMENTOS:
Ao CNPQ;
Ao PIBIC;
A minha orientadora Carmen Tereza Velanga;
A todos que contribuíram de forma direta e indireta.
109
AVALIAR, MEDIR, TESTAR... CRUZES! UM ESTUDO SOBRE A PRÁTICA DA
AVALIAÇÃO EDUCACIONAL NAS ESCOLAS DA REDE PÚBLICA DE ROLIM DE
MOURA/RO
Cleonice Nunes Fernandes Fraga18
Flavine Assis de Miranda19
RESUMO
Este estudo tem como objetivo confrontar o discurso do professor e sua atuação prática
quanto à avaliação educacional e sua relação com o planejamento de ensino. Foram utilizados
como procedimentos metodológicos: pesquisa bibliográfica, observações diretas em campo e
entrevista. Tomamos como base as concepções de Luckesi (2006), Haydt (1994), Hoffman
(1992) e Turra (1982). Resultados da pesquisa evidenciaram o uso da pedagogia do exame
onde as provas foram utilizadas para punição de alunos e não como instrumento auxiliar da
aprendizagem.
Palavras-chave: Avaliação da Aprendizagem. Planejamento Educacional. Prática docente.
INTRODUÇÃO
Avaliar, medir, testar... Cruzes! Exclamações como essa são frequentes no ambiente
escolar quando o assunto é avaliação educacional. Dentre as indagações e constatações que
permeiam este universo, um fato que tem sido recorrente é o medo de avaliar, testar e medir.
Os objetivos da pesquisa são: identificar por meio de observação a prática avaliativa
dos professores referente à verificação da aprendizagem e do desempenho escolar do aluno, e
os instrumentos de avaliação utilizados; Identificar a concepção pedagógica do professor, seu
planejamento de ensino e proposta de avaliação; e relacionar o discurso do professor e sua
atuação prática quanto à avaliação educacional e sua relação com o planejamento de ensino.
A metodologia que dá suporte ao estudo se pauta na pesquisa educacional qualitativa
por meio de procedimentos como observação direta em campo, pesquisa bibliográfica e
entrevista estruturada. Foram investigadas turmas do ensino fundamental em diferentes
escolas municipais de Rolim de Moura/RO.
18
Aluna do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Rondônia – UNIR/Campus de Rolim de
Moura, bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC/UNIR/CNPQ.
19
Professora da Universidade Federal de Rondônia – UNIR/Campus de Rolim de Moura. Doutora em
Educação pela UNESP/FCLAR e Líder do Grupo de Pesquisa em Política, Gestão e Avaliação da Educação –
GPPGAE/UNIR.
110
A fundamentação teórica que está subdividida em quatro tópicos, sendo que o
primeiro vem discutindo os conceitos de avaliar, testar e medir segundo as abordagens de
Haydt (1994), Hoffman (1992), Lea Depresbiteris (1991), Luckesi (2006) e Moreto (2002). O
segundo discute conceitos como os de avaliação diagnóstica, formativa e somativa que
passaram a fazer parte do repertório teórico de avaliação. O terceiro tópico da fundamentação
trata da importância do planejamento para a avaliação educacional. E o quarto tópico discute
as tendências pedagógicas.
Os resultados apresentados foram divididos em duas partes: uma para apresentar os
dados das observações de campo e outra para os dados obtidos com as entrevistas; por fim,
apresentam-se as considerações finais, apontando as evidencias que se destacaram no
desenvolvimento da pesquisa.
O QUE É AVALIAR, MEDIR E TESTAR?
A avaliação é muito importante e não se aplica somente na escola, mas em qualquer
outra prática. Refletir é avaliar, e avaliar é planejar, estabelecer objetivos. Haydt (1994, p.10)
afirma que “Avaliar é julgar ou fazer a apreciação de alguém ou alguma coisa, tendo como
base uma escala de valores [...] consiste na coleta de dados quantitativos e qualitativos e na
interpretação desses resultados com base em critérios previamente definidos”.
Na opinião de Luckesi (2006, p. 180) o ato de avaliar “[...] por sua constituição
mesma não se destina a um julgamento ‘definitivo sobre alguma coisa, pessoa ou situação,
pois que não é um ato seletivo’. A avaliação se destina ao diagnóstico e, por isso mesmo, a
inclusão;”
Durante muito tempo, principalmente depois do aperfeiçoamento dos instrumentos de
medida em educação, o termo avaliar foi usado como sinônimo de medir. Mas medir é apenas
um procedimento da avaliação. Haydt (1994, p.9) afirma que “Medir significa determinar a
quantidade, a extensão ou o grau de alguma coisa, tendo por base um sistema de unidades
convencionais”. Segundo os estudos de Hoffman (1992) Scriven afirma que a medida é cortar
ou numerar de tal forma que se possa descrever mais exatamente o quanto alguma coisa é
grande, pequena, longa, etc. Portanto a medida não pode ser confundida com a avaliação, pois
medir é cortar, determinar quantidade e avaliação é muito mais que os números.
Testar é um procedimento da avaliação que consiste basicamente em examinar,
experimentar e provar uma situação de forma padronizada. Haydt (1994, p. 9) afirma que:
111
“Testar significa submeter a um teste ou experiência, isto é, consiste em verificar o
desempenho de alguém ou alguma coisa (um material, uma máquina etc.)”.
Luckesi (2006) aponta que uma das características mais evidentes da nossa prática
avaliativa educacional é o que ele denomina de “pedagogia do exame”, segundo ele “o ensino
centra-se no exercício de resolver provas a partir de determinados conteúdos [...]” (2006,
p.17). Os estudos de Moreto (1991) apontam que os alunos ao longo dos anos passam a
estudar só: se tiver prova, se vai cair na prova e para a prova. Luckesi (2006, p.19) aponta
ainda que:
Os professores utilizam as provas como instrumentos de ameaça e tortura
prévia dos alunos, protestando ser um elemento motivador da aprendizagem.
Quando o professor sente que seu trabalho não esta surtindo o efeito
esperado, anuncia aos seus alunos: “Estudem! Caso contrário, vocês
poderão se dar mal no dia da prova”.
Mas como um objeto de tortura e ameaça pode ser motivador para aprendizagem?
Como estudar de forma significativa se o medo da prova está presente a todo o momento na
sala de aula?
FUNÇÕES DA AVALIAÇÃO
Expressões e conceitos como os de avaliação diagnóstica, formativa e somativa
passaram a fazer parte do repertório teórico de avaliação. Mas o que significa estas
expressões?
A avaliação diagnóstica é aquela realizada no início de um curso, período letivo ou
unidade de ensino, com a intenção de constatar se os alunos apresentam ou não o domínio dos
pré-requisitos necessários, isto é, se possuem os conhecimentos e habilidades imprescindíveis
para as novas aprendizagens.
A avaliação formativa, com função de controle, é realizada durante todo o decorrer do
período letivo com o intuito de verificar se os alunos estão atingindo os objetivos previstos,
isto é, quais os resultados alcançados durante o desenvolvimento das atividades.
A avaliação somativa, com função classificatória, realiza-se ao final de um curso,
período letivo ou unidade de ensino, e consiste em classificar os alunos de acordo com níveis
de aproveitamento previamente estabelecidos, geralmente tendo em vista sua promoção de
uma série para outra, ou de um grau para outro.
112
Na perspectiva teórica de Haydt (1994) para garantir a eficiência do sistema de
avaliação do processo ensino-aprendizagem o professor deve fazer uso das três modalidades
da avaliação. Enquanto que na perspectiva de Luckesi (2006) a avaliação tem que ser
diagnóstica e não classificatória como vem sendo praticada nas escolas.
AVALIAÇÃO EDUCACIONAL E O PLANEJAMENTO
Para Freire (2008, p.170) “O planejamento nasce da avaliação”, pois o ato de planejar
envolve olhar o passado projetando o futuro para se construir o presente. Desse modo, as
ações a serem planejadas partem de uma avaliação que possibilite esse diálogo com o que
temos e o que desejamos conquistar em termos de conhecimento e formação do sujeito. E o
planejamento permite direcionar a prática pedagógica para a busca dos objetivos propostos a
fim de concretizá-los. O ato de planejar é a atividade intencional pela qual se projetam fins e
se estabelecem meios para atingi-los. Por isso, não é neutro, mas ideologicamente
comprometido.
Segundo Luckesi (2006, p. 118) “a avaliação atravessa o ato de planejar e de executar.
Por isso, contribui em todo o percurso da ação planificada.” O planejamento deve ser uma
base para a avaliação, pois é através dele que o professor pode orientar o seu trabalho,
estabelecer objetivos, critérios para a análise. Para Luckesi (2006, p. 165)
[...] planejamento e avaliação são atos que estão a serviço da construção de
resultados satisfatórios. Enquanto o planejamento traça previamente os
caminhos, a avaliação subsidia os redirecionamentos que venham a se fazer
necessários no percurso da ação. A avaliação é um ato de investigar a
qualidade dos resultados intermediários ou finais de uma ação, subsidiando
sempre sua melhora.
O professor deve avaliar seus alunos através de seus objetivos planejados no início
do ano letivo. Pois avaliar é verificar se os resultados desejados foram alcançados, e quanto
mais técnicas e instrumentos de avaliação usar melhores resultados poderão obter. E todos os
instrumentos de avaliação terão um bom resultado se forem usados de acordo com os
objetivos previstos.
113
TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS
A tendência tradicional parte do pressuposto de que o aluno deveria ser protegido de
estímulos externos para concentrar sua atenção nas explicações do professor, considerava-se
que os conhecimentos científicos transmitidos prontos às crianças. Como afirma Saviani
(2005, p. 06) “A escola organiza-se como uma agência centrada no professor, o qual transmite
segundo uma graduação lógica, o acervo cultural aos alunos. A estes cabe assimilar os
conhecimentos que lhes foram transmitidos.”
Saviani (2005) aponta também que as tendências progressistas partem de uma análise
crítica das realidades sociais, sustentam implicitamente as finalidades sociopolíticas da
educação. A tendência progressista, que se ramifica em três correntes: libertadora, libertária e
histórico-crítica.
A tendência libertadora vincula a educação à luta e organização de classe do oprimido,
busca a transformação social, a condição de se libertar através da elaboração da consciência
crítica passo a passo com sua organização de classe.
A tendência libertária parte do pressuposto de que apenas o vivenciado pelo aluno é
incorporado e empregado em situações novas, por isso o saber sistematizado só terá
relevância se for possível seu uso prático.
A tendência histórico-crítica prioriza os conteúdos no seu confronto com as realidades
sociais, instrui o aluno para o mundo adulto, com participação organizada e ativa na
democratização da sociedade; por meio da aquisição de conteúdos e da socialização. O
professor é o mediador entre conteúdos e alunos, o ensino/aprendizagem tem como centro o
aluno.
Segundo os estudos de Silva (2012) aponta que para Libâneo a pedagogia liberal
defende a ideia de que a escola tem a função de preparar os alunos para a atuação de papéis
sociais, de acordo com as aptidões individuais. Isso pressupõe que o aluno precisa adaptar-se
aos valores e normas vigentes na sociedade de classe, através do desenvolvimento da cultura
individual.
RESULTADOS E DISCUSSÕES DAS OBSERVAÇÕES DE CAMPO
Os dados apresentados aqui são referentes à observação de campo realizado em 2011
nas turmas do ensino fundamental das escolas municipais. As categorias de analise foram às
114
seguintes: prática pedagógica e as concepções pedagógicas; planejamento pedagógico e
avaliativo; funções da avaliação: somativa, formativa e diagnóstica; prática avaliativa.
Podemos constatar que 83,33% dos professores observados nas escolas municipais
apresentaram apenas a pauta do dia. Relata-se que nesta pauta, de maneira geral, são relatados
apenas aspectos como:
Oração, leitura, problema matemático, português leitura e interpretação do
texto: “o gato e a barata” (professora X, 3º ano EF, escola Y).
Apesar da precariedade dos planejamentos 40% deles foram desenvolvidos
completamente durante a aula. Apesar da importância do planejamento para prática
pedagógica podemos identificar que os professores utilizam esse instrumento apenas para
cumprir com uma exigência da escola e não como uma ferramenta necessária para sua prática
em sala de aula.
Podemos perceber, ainda, que os professores observados segue a tendência da escola
tradicional, onde as tarefas são passadas no quadro para os alunos copiarem e logo depois
corrige, em geral, deixa pouco tempo para os alunos encontrarem as respostas. Os professores
também estão muito presos ao livro didático.
As provas foram aplicadas de forma rígida, tradicional, onde os alunos deviam ficar
organizados em filas, sem nenhum tipo de conversa, e a orientação do professor para não
olharem para as provas dos colegas, pois ele estaria olhando. O professor também deixou
claro que não iria ajudar nenhum aluno, pois era prova.
Hoje é dia de prova não vou explicar nada no quadro, se você não sabe deixa
sem fazer. (professora R, 3º ano EF, escola W).
Podemos perceber que a prova foi utilizada para punir os alunos, pois durante todo o
ensino do conteúdo o professor dizia que:
Fiquem quietos isso vai cair na prova! Prestem atenção, vai ter prova desse
conteúdo em! (professora R, 3º ano EF, escola W).
Entretanto essa não deveria ser uma das funções da avaliação, conforme aponta Haydt
(1994, p. 26) “a avaliação deve ser um instrumento para estimular o interesse e motivar o
aluno para o maior esforço e aproveitamento e não uma arma de tortura ou punição.” A prova
115
como punição não ajuda em nada, a não ser deixar os alunos traumatizados em relação às
provas.
Podemos perceber que só a função somativa foi encontrada nas escolas. Onde os
alunos são classificados pelas notas obtidas nas provas, entretanto o professor deve fazer uso
conjugado das três modalidades de avaliação: formativa, somativa e diagnóstica.
RESULTADOS E DISCUSSÕES DAS ENTREVISTAS
Os resultados apontados pelas entrevistas são referentes às escolas do ensino
fundamental do município, dados obtidos em 2012, foram entrevistados 5 dos 6 professores
observados durante a pesquisa de campo com a finalidade de relacionar o discurso do
professor e sua atuação prática quanto à avaliação educacional e sua relação com o
planejamento de ensino.
Todos os sujeitos entrevistados tem formação superior e possuem pós-graduação na
área de formação. O tempo de atuação como docente pode ser expresso da seguinte forma: 3
sujeitos entre 6 a 15 anos de efetivo exercício e 2 sujeitos entre 16 a 30 anos de exercício.
No que se refere à questão sobre aos conteúdos estudados na formação inicial e ou
continuada sobre a avaliação educacional, dois professores afirmam terem estudado sobre a
avaliação, mas não se lembram de quais conteúdos específicos.
Sobre as considerações de como o sujeito aprende verifica-se três respostas que se
adéquam a tendência progressista da educação e uma se situa na tendência liberal. Como
exemplo da tendência progressista pode ser observado no fragmento abaixo:
[...] o aluno é o construtor principal da sua própria aprendizagem, é
influenciado pela inteligência, motivação com estímulos e impulsos [...]
(professora X, 4º ano EF, escola Y)
Conforme os estudos de Saviani (2005) as tendências progressistas partem de uma
análise crítica das realidades sociais, sustentam implicitamente as finalidades sociopolíticas da
educação. O conteúdo a ser estudado deve ser extraído da realidade dos alunos e deve levá-lo
a conscientização de sua história.
Exemplo da tendência liberal pode ser observado no fragmento a seguir:
Para mim, o aluno aprende a aprender com a convivência e atitudes do
cotidiano que desenvolve e que estimula ou não aptidões cognitivas... Quem
deve promover, e levar o aluno a aprender é o professor... Se os alunos não
116
aprender a aprender, se ele não foi ensinado a aprender, ele nunca vai
aprender de verdade. (professora Z, 2º ano EF, escola W)
Segundo os estudos de SILVA (2012) aponta que Libâneo afirma que na pedagogia
liberal o aluno aprende a aprender, a escola deve proporcionar meios para que permitam o
aluno educar-se.
Quando questionados sobre a avaliação realizada na e pela escola pode ser
considerado adequado? Verifica-se pelas respostas obtidas que mesmo não considerando
adequada a avaliação feita na e pela escola os sujeitos da pesquisa não identificam quais os
principais desafios a serem enfrentados, ou mesmo não apresentam propostas desafiadoras
para mudar a forma de avaliar a aprendizagem dos alunos.
[...] acredito que não, porque ela é muito tradicional usada ainda hoje né...
Consiste em atribuir nota ou conceito aos aluno... então ela acaba sendo uma
forma de discriminação. (professora R, 3º ano EF, escola W)
Quanto às competências para o desenvolvimento do trabalho de avaliação da
aprendizagem dos alunos, as respostas apresentam aspectos como: “ter um bom
planejamento”; “a pensar, aprender a aprender”; “respeitar as diferenças de cada aluno”; “um
profissional criativo, observador, mediador, inovador”.
Ao responderem sobre como realizam a avaliação de seus alunos em sala de aula,
verifica-se a necessidade de seguir um sistema de provas e geração de notas determinados
pela escola, bem como se verifica a existência de respostas que afirma a utilização da função
formativa da avaliação por meios qualitativos como observação e registro do cotidiano do
aluno em sala de aula.
[...] eu tenho que acatar o que a escola me passa, mas eu tenho a minha
forma diferenciada para avaliar meu aluno... Não levo em consideração só a
avaliação que o aluno fez, observo o aluno... Eu coloco a avaliação como
uma forma de buscar aquilo que esta faltando... (professor K, 2º ano EF,
escola S)
Verifica-se que mesmo tendo uma “norma” para ser seguida os professores afirmam
que tem sua forma diferenciada de avaliar utilizando a observação e o registro, Haydt (1994)
aponta que uma das melhores técnicas que o professor dispõe para conhecer o comportamento
de seus alunos é a observação, pois é através dela que ele identifica suas dificuldades e avalia
seu desempenho nas várias atividades realizadas e seu progresso na aprendizagem. Mas essa
observação tem que ser registrada!
117
No que se refere ao uso dos instrumentos de avaliação verifica-se que os sujeitos
entrevistados afirmam a necessidade de um uso variado destes, o que pode ser observado pela
fala a seguir:
Eu acredito que não... o professor... deve usar... diversos instrumentos não
tem que priorizar um ou outro [...]. (professora R, 3º ano EF, escola W)
Podemos compreender que mesmo havendo a predominância da utilização de provas
como instrumento avaliativo os professores entrevistados demonstram que tal predominância
ou priorização não é adequada ao processo de avaliação da aprendizagem. Esta orientação
quanto ao uso de instrumentos de avaliação diversificados pode ser encontrada em autores
como Luckesi (2006), Hoffman (1992), Silva (1992), Haydt (1994) entre outros.
Quanto à prática da avaliação que predomina neste contexto infere-se pelas respostas
dos sujeitos uma concepção de que esta deva ser continua e não punitiva, que deva respeitar
as individualidade dos alunos e que responda a objetivos e conteúdos previamente elaborados
e estruturados segundo os aspectos do planejamento, além de utilizar instrumentos de
avaliação que sejam adequados ao aluno no que se refere ao grau de dificuldade. Vejam as
falas a seguir:
Trabalhando com clareza e os objetivos de acordo com as dificuldades do
aluno, usando instrumentos de avaliação diversificada [...] (professora Z, 2º
ano EF, escola W)
[...] sem que o aluno perceba você pode estar fazendo essa avaliação ou sem
estar usando aquela avaliação como uma arma [...] (professor K, 2º ano EF,
escola S)
A fala do professor K corrobora com as perspectivas de Haydt (1994), Luckesi (2006)
onde a avaliação não deve ser usada como uma arma de tortura ou punição e sim como um
instrumento para estimular o interesse e motivar o aluno.
Com base nas respostas analisadas verifica-se que a contribuição da avaliação se da
quando esta acontece de forma contínua e formativa, quando seus resultados são utilizados
pelo professor e equipe pedagógica para a verificação dos avanços educacionais dos alunos,
podemos observar pelos fragmentos abaixo:
[...] quando usamos as avaliações para fazer intervenções e reflexões
necessárias redimensionando o planejamento adequado às necessidades do
aluno [...] (professora Z, 2º ano EF, escola W)
118
[...] acompanhando dentro do processo de avaliação o mais importante que é
seguir de perto o desenvolvimento do aluno e detectar as suas atitudes e suas
habilidades. (professora X, 4º ano EF, escola Y)
Tais respostas nos levam a compreender que o planejamento e avaliação são atos que
estão a serviço da construção de resultados satisfatórios, como afirma Luckesi (p. 165, 2006)
“enquanto o planejamento traça previamente os caminhos, a avaliação subsidia os
redirecionamentos que venham a se fazer necessários no percurso da ação... é um ato de
investigar a qualidade dos resultados intermediários ou finais de uma ação”. Esta orientação
quanto ao uso do planejamento como prática reflexiva para a melhoria da ação avaliativa
também pode ser encontrada em autores como Moreto (2002), Silva (1992), Freire (2008).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após concluirmos o nosso trabalho compreendemos que avaliar é uma atividade
complexa e que deveria ser usada em prol do educando para auxiliá-lo em sua aprendizagem e
não para puni-lo ou ameaçá-lo. Os dados da pesquisa apontam a utilização da prova como um
instrumento de avaliação disciplinador e punitivo, exercendo função classificatória e
excludente, para fins de aprovação e reprovação.
Esse fato corrobora com a perspectiva de Luckesi (2006) quanto à pedagogia do
exame se manter presente nas escolas de educação básica orientando o processo de ensinoaprendizagem à preparação do aluno para responder a testes, provas e exames.
Os dados da pesquisa apontam, ainda, que a falta de um planejamento consistente das
ações pedagógicas do professor, aliada aos equívocos deste quanto ao entendimento de que as
ações de avaliar, medir e testar são distintas e não análogas, corroboram para a manutenção do
que Luckesi aponta ser uma pedagogia do exame.
As observações e as entrevistas realizadas nas escolas da rede municipal do ensino
fundamental nos revelam que a prática pedagógica destes professores ainda está pautada em
um ensino tradicional.
Em relação ao planejamento podemos constatar que apesar dos professores terem
conhecimento de sua estrutura e sua importância para prática pedagógica poucos utilizam
deste instrumento no seu dia a dia, apenas utilizam a pauta, que muitas vezes não garante para
os professores indicadores para avaliação das atividades realizadas, desta forma, o professor
fica sem informações para repensar suas ações e reencaminhar a sua prática.
119
Os professores participantes deste estudo, apesar de terem representações sobre as
concepções pedagógicas, liberais e progressistas revelados nas entrevistas, na observação
constataram uma concepção tradicional e algumas uma posturas em que o professor se coloca
como único detentor do saber. Dito isto, podemos analisar que apesar dos professores
conhecer (teoricamente) concepções pedagógicas, ainda não consegue de forma efetiva fazer
a transposição didática para que de fato essas ações estejam reveladas em sua prática.
REFERÊNCIAS
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1975.
120
FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE
RONDÔNIA/CAMPUS VILHENA
DELL - DEPARTAMENTO DE ESTUDOS
LINGUÍSTICOS E LITERÁRIOS
GEPŒC - GRUPO DE PESQUISA EM POÉTICA
BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA
RESUMO EXPANDIDO DO SUBPROJETO “AS CURVAS
DA MEMÓRIA DE JOCA REINERS TERRON”
IDENTIFICAÇÃO: Projeto de Pesquisa “O regional como questão na Literatura brasileira
contemporânea. GEPŒC - Grupo de Pesquisa em Poética Brasileira Contemporânea”
SUBPROJETO: As curvas da memória de Joca Reiners Terron
PESQUISADORA/PIBIC/CNPq: Prof.ª Dr.ª Milena Cláudia Magalhães Santos Guidio
BOLSISTA: Cristiane Kelly Schmitka
LOCAL DE EXECUÇÃO: UNIR/Campus de Vilhena-RO
VIGÊNCIA: agosto/2011 a julho/2012
Neste trabalho, analisa-se a obra de Joca Reiners Terron. Mais especificamente, Curva
de rio sujo, livro lançado em 2003, que serviu para que a crítica identificasse em Terron um
possível representante da “renovação” da literatura dita regional. Há uma evocação da
memória do local que não passa despercebida em razão da atmosfera de “casos” próprios da
região. Concomitantemente, a problematização das noções de regionalismo literário
possibilita que se entreveja, na obra desse autor, o esgarçamento da noção tradicional de
regional.
A pesquisa deteve-se, inicialmente, no levantamento bibliográfico de textos cujo tema é
o regional/regionalismo/regionalidade na literatura brasileira contemporânea. Por isso, houve
necessidade de ler textos de autores que tratam do regionalismo literário tanto sob perspectiva
negativa como positiva. Fizeram parte do nosso rol de nossas leituras os seguintes autores:
José Clemente Pozenato, Afrânio Coutinho, Antonio Candido, Flora Süssekind, Tânia
121
Pellegrini, Humberto Hermenegildo de Araújo, André Tessaro Pelinser, Denise Mallmann
Vallerius, Geraldo Nogueira de Amorim, Lourdes Kaminski Alve, Walnice Nogueira Galvão,
Ligia Chiapinni Maria Luiza Berwanger da Silva, Karl Eric Schollhammer, Leyla PerroneMoisés, Stuart Hall, Rogério Haesbaert, Maria Adélia Menegazzo, Milena Magalhães,
Laurindo Mékie Pereira e Maria Zilda Cury.
Percebemos a partir da leitura desses autores que o regionalismo é uma questão bastante
incômoda na literatura, diríamos que é uma questão mal resolvida. Se por um lado, temos
críticos que o colocam num posição de marginalidade, como é o caso de Afrânio Coutinho, há
quem o procura tirar desse beco, como a estudiosa Maria Adélia Menegazzo. Historicamente,
o que se vê é a permanência dessa tendência ora com a finalidade de construir uma identidade
local, uma espécie de autoafirmação na relação campo x cidade - como aconteceu no
Romantismo brasileiro, ora como forma de tensionar essa mesma identidade, como pode ser
visto no livro Curva de rio sujo, de Joca Reiners Terron.
Terron estreou na literatura em 1998 com Eletroencefalodrama, livro de poemas que
também marcou a criação de sua editora, Ciência do acidente. Publicou os romances Não há
nada lá (2001) e Hotel Hell (2003), além dos poemas de Animal anônimo (2002) e as
narrativas de Curva de rio sujo (2003), editado no Brasil e em Portugal, e de Sonho
interrompido por guilhotina (2006). Seus textos também já foram publicados na Itália, nos
Estados Unidos, na Argentina e no México.
Em Curva de rio sujo, há o indicativo do espaço mato-grossense contado a partir de
um discurso fragmentado, por pequenas narrativas que transitam, através de rastros, as linhas
da reminiscência de uma região de rios (Mato Grosso), além das referências culturais do
universo pop associadas à literatura, característica dos romances policiais. Terron procura
emergir o Estado do Mato Grosso como um cenário mítico, atravessado por rios, pelas
lembranças da juventude e pela violência. A narrativa de Terron encontra-se em meio ao
peculiar transposto por um lirismo que nasce do bloqueio aparentemente invencível do atípico
e do não comum.
Pensando, assim, Curva de rio sujo, pode ser visto como uma narrativa, ou melhor,
como micronarrativas, que rompem com a hegemonia espaço-temporal e o caminho
encontrado para isso é o traço memorialista. Segundo Bauman, no livro Modernidade líquida
(2001), vivemos o tempo do imediatismo e do dinamismo. Isso suplanta as formas
tradicionais de vida, processo pelo qual passou e passa a sociedade, ou seja, as ideias passam
por uma fluidez, como os líquidos, e adaptam-se ao recipiente no qual são postas.
122
A narrativa memorialista reitera o tempo passado mais distante através da história do
lugar, ao passo que são representadas a partir de descrições imagéticas do espaço para facilitar
a compreensão da história narrada. O conflito existencial, típico do homem pós-moderno, cria
uma realidade inquietante que acarreta uma desconstrução interna do ser e de sua relação
direta com o espaço, desta maneira ocorre uma não uniformidade, ou seja, uma espécie de
recolocação ou reterritorialização do ser.
É na configuração desse memorialismo que o “caso” Terron é, de certo modo,
exemplar para negar as visões da crítica que comumente associam o regionalismo literário a
ficções que descrevem o ambiente de forma pitoresca. Em Terron, mais propriamente Em
curva de rio sujo, a evocação da memória do local se mistura a um grande número de
referências literárias e artísticas. Os sentidos do espaço como um lugar de fronteira,
distanciado dos grandes centros, adquirem novas conotações. Essas conotações não apontam
para a ideia fácil de “universalidade”, mas, sim, para a inserção de elementos diferenciados
em um espaço que, em geral, é visto a partir de estereotipias. Algo da ordem de afirmar que,
no Mato Grosso, há rios, bichos, matas, motocicletas, televisão; tudo misturado. O que neste
livro soou como lirismo - prontamente renegado pelo escritor - é, em grande parte, evocação a
lendas, mitos, da região, mediante um processo de “sujeira” que apaga qualquer visão idílica
do lugar. O espaço “civilizado” é marcado fortemente por uma natureza de denúncia, sua
narrativa adota o feitio de forte busca às reminiscências da memória. Assim como uma região
de união de rios sinuosos, faz- se construir a narrativa fragmentada que permite a relocação
dos costumes, espaços e culturas.
A literatura de Terron contribui para suspender a relação atraso = campo/ avanço =
cidade, que cria outra: literatura regional = retardo/ literatura urbana = cosmopolitismo. Aqui,
as noções de região contaminam-se de outros sentidos. O espaço mato-grossense é posto em
“mini-histórias” mediante traços da memória que revisitam rios, paisagens, mitos, sem lançar
mão de qualquer elemento “exótico”. Terron incide por vezes invasões pela prosa
experimental, propositalmente abarrotada de alusões citadinas, com escracho, deixando, desta
maneira, transpor os diferentes feitios da conduta humana: “Curva de rio sujo só junta
tranqueira”.
Palavras-chave: Literatura contemporânea. Regionalismo. Joca Reiners Terron.
123
REFERÊNCIAS
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125
ASPECTOS DO CAPITALISMO BUROCRÁTICO NA EDUCAÇÃO:
CORPORATIVISMO SINDICAL E A LUTA PELA GESTÃO DEMOCRÁTICA DA
ESCOLA PÚBLICA20
Eliane de Jesus Paula21
Profª Drª Marilsa Miranda de Souza22
RESUMO
O presente trabalho tem por finalidade analisar as propostas e lutas do Sindicato dos
Trabalhadores em Educação do Estado de Rondônia pela Gestão Democrática, bem como
identificar as contradições no processo de luta e organização sindical na atualidade. Observase um elevado nível de corporativismo que procuramos identificar por meio desta pesquisa,
que utilizou o método do materialismo histórico-dialético, onde buscamos interpretar a
realidade objetiva e subjetiva através das categorias de análise totalidade, contradição,
ideologia e práxis.
Palavras-chave: SINTERO. Capitalismo Burocrático. Corporativismo sindical
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem por finalidade apresentar o atual desenvolvimento da
pesquisa “Capitalismo Burocrático, Políticas Educacionais e Relações de Poder na Educação
Escolar em Rondônia”, tendo como referência as primeiras investigações do subprojeto
“Aspectos do Capitalismo Burocrático na Educação: Corporativismo Sindical e a Luta pela
Gestão Democrática da Escola Pública” que tem como objetivo Identificar e analisar as
propostas e lutas do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado de Rondônia pela
Gestão Democrática.
Após o prévio conhecimento dos objetivos da pesquisa e seu referencial teórico,
iniciamos o trabalho de coleta de dados realizado por meio de entrevistas semi-estruturadas
que envolveram profissionais da Educação da rede pública estadual nos municípios da Zona
da Mata rondoniense. Como nossa análise do subprojeto envolve a discussão em torno da
Gestão democrática e do corporativismo sindical, nosso trabalho em específico, buscou
20
Subprojeto da pesquisa Capitalismo Burocrático, Políticas Educacionais e Relações de Poder na
Educação Escolar em Rondônia, coordenada pela Profª Drª Marilsa Miranda de Souza.
21
Graduanda em História da UNIR, Campus de Rolim de Moura, Bolsista PIBIC/UNIR.
22
Professora do Departamento de Educação da UNIR, campus de Rolim de Moura e orientadora da
Pesquisa.
126
entrevistar dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado de Rondônia SINTERO, que depois de transcritas serão analisadas.
Faz-se necessário ainda, uma análise mais aprofundada sobre a história do
Movimento Sindical brasileiro, sobretudo, a organização dos trabalhadores em Educação.
Iniciamos nossa pesquisa bibliográfica levando em conta o processo de organização do
movimento operário no Brasil e a intervenção estatal através do corporativismo sindical
instituído pela Era Vargas, conforme a análise Oliveira (1994), Fausto (2000), Antunes
(1982), Boito Júnior (1991 e 1994) e Carone (1970 e 1979).
No que se refere ao processo histórico de organização sindical dos trabalhadores em
Educação, temos como principal fonte bibliográfica o trabalho de Fontoura, Gindin e Gentili
(2009), que identificam de forma sucinta a história e o processo de luta dos trabalhadores da
Educação, sobretudo no período da década de 1990 em que se intensificam os choques com o
Estado no processo de expansão neoliberal que culminou com cortes de direitos, fim da
estabilidade, reforma previdenciária, etc.
Além da análise historiográfica temos buscado analisar a partir da pesquisa
bibliográfica e das entrevistas com dirigentes sindicais o nível de consciência política
enquanto classe social e quais críticas se constroem em torno das políticas educacionais
(pedagógicas e de gestão) que chegam à escola.
Utilizamos como ferramenta de análise o método do materialismo histórico-dialético,
entendido como um instrumento de compreensão da realidade enquanto práxis e de
interpretação que possibilite uma intervenção transformadora. Na análise e interpretação dos
dados buscamos interpretar a realidade objetiva e subjetiva em termos das categorias
totalidade, contradição, ideologia e práxis, estudando as relações sociais e econômicas que
determinam a educação e a produção das ações concretas dos sujeitos históricos que dela
fazem parte. Também aplicamos duas categorias históricas fundamentais que nos ajudam a
elucidar as relações de dominação existentes na esfera socioeconômica, política e cultural e
que incidem sobre as políticas educacionais e as relações de poder estabelecidas no ambiente
escolar e nas relações sociais de produção da sociedade. São elas: imperialismo e capitalismo
burocrático. A aplicação destas categorias nos permitirá compreender o sindicato como
aparelho ideológico do Estado a serviço da grande burguesia e do imperialismo na atualidade.
Além da análise em andamento de documentos disponibilizados pela Regional da
Zona da Mata23 do SINTERO realizamos entrevistas com dirigentes sindicais, professores,
23
Dentro da estrutura sindical do SINTERO, a base territorial é dividida em 11 regionais. A regional da
Zona da Mata, que tem como sede o município de Rolim de Moura, abrange um total de 05 municípios.
127
supervisores e diretores das escolas. Este tipo de entrevista nos permitiu ao mesmo tempo,
conhecer o que pensam os professores/as sobre a ação do SINTERO nessa importante
bandeira de luta dos trabalhadores em Educação que é a gestão democrática e a própria prática
sindical dos dirigentes observada pela base.
Nossa análise parte do método dialético
considerando que este possibilita ir do fato empírico (fenômeno) identificando as
determinações fundamentais e secundárias do problema, conforme a análise de Marx de que
“o curso do pensamento abstrato que se eleva do mais simples ao complexo” enquanto
constante movimento de contradição (MARX, 1982, p. 15).
A análise dialética busca identificar as contradições no seio do espaço escolar.
Contudo, precisamos identificar que as contradições expressas no micro espaço escolar são
reflexos de contradições existentes na totalidade das relações sociais e econômicas
dominantes. Neste sentido, partimos da análise de Lênin (1979) de que vivemos atualmente a
etapa de desenvolvimento do capitalismo onde se dá a concentração da produção por meio do
monopólio, o fortalecimento do capital financeiro associados à partilha territorial do globo
entre as grandes potências capitalistas.
Nesta fase imperialista, vivemos uma contradição principal entre imperialismo e país
dominado semicolonial. Nos países semicoloniais impera relações de caráter semifeudal e
desenvolve-se um tipo de capitalismo atrasado, dependente, um capitalismo burocrático24, já
que nestes países não se concretizaram revoluções burguesas, havendo uma persistência do
problema agrário, como é o caso do Brasil (MARTÍN MARTÍN, 2007).
O estudo dos documentos nessa primeira fase centrou-se nas normas para escolha de
diretores escolares dispostas no Decreto n. 16.202, de 20 de setembro de 2011 e em
documentos do SINTERO que tratam da temática, mas que requerem uma análise mais
aprofundada e confrontada com a realidade objetiva.
SINDICATO, CORPORATIVISMO E ATRELAMENTO AO ESTADO
As primeiras experiências de organização dos trabalhadores surgem ao longo do
século XIX e são dirigidas principalmente por Europeus que se instalam no Brasil. A
Confederação Operária Brasileira fundada em 1908, uma das primeiras organizações
sindicais, foi uma das associações mais representativas no Brasil, cujos ideais eram guiados
24
Conforme a conceituação de Guzmán, “o capitalismo que o imperialismo impulsiona num país
atrasado; o tipo de capitalismo, a forma especial de capitalismo, que impõe um país imperialista a um país
atrasado, seja semifeudal, semi-colonial” (GUZMÁN, 1974, p. 1)
128
pelo anarcosindicalismo. O sindicalismo brasileiro nasceu, pelas mãos dos imigrantes
espanhóis, italianos, portugueses, etc., ligados ao anarcosindicalismo, no princípio do século
XX. Fora dos sindicatos, mas exercendo intensa atividade política, o anarquismo foi a
principal corrente política também no meio operário, ao lado dos esforços de socialistas e da
Igreja Católica (OLIVEIRA, 2004).
O Brasil inseriu-se num forte período de “corporativismo inclusivo” entre os anos de
1930 a 1945. Este modelo sindical corporativo nos anos de 1930, no governo de Getúlio
Vargas, foi resultado de uma profunda intervenção do Estado na organização sindical. O
Estado passou a assumir-se como mediador dos conflitos entre o capital e trabalho, como
resultado disso, as ações sindicais ficaram voltadas para o assistencialismo, com o apoio de
recursos públicos: uma extensão ou apêndice do Estado.
Então, o Sindicato no Brasil se estrutura, a partir da década de 1930, como um órgão
articulado diretamente ao Estado. Conforme o artigo 513 da CLT, o principio fundamental da
estrutura sindical é a colaboração de classes, o corporativismo. O poder dos sindicatos para
representar os trabalhadores é dado pelo Estado. Esta intervenção, atribuída a Getúlio Vargas,
visava por rédeas aos Sindicatos que durante as primeiras décadas do século XX
protagonizaram inúmeras greves massivas dirigidas por anarquistas, socialistas e comunistas.
Uma das estratégias adotadas por Vargas para garantir o controle dos sindicatos e estimular a
criação de sindicatos oficiais foi vincular a concessão de benefícios trabalhistas à
representação por sindicato reconhecido (MATTOS, 2003, p. 14).
O surgimento do novo sindicalismo através das oposições sindicais (1964-1978)
levaria a uma crítica desta estrutura sindical. O sindicalismo classista toma por base a luta de
classes. Há muitas contradições no processo de luta e organização sindical na atualidade. O
Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado de Rondônia - SINTERO há alguns anos
aparentemente não vem atuando em defesa da gestão democrática das escolas rondonienses e
observa-se um elevado nível de corporativismo que procuraremos identificar por meio desta
pesquisa.
Se o chamado Novo Sindicalismo se apresentava como um sindicalismo de massa e
de confronto no final da década de 1970, a partir dos anos de 1990 apresenta-se como um
sindicalismo neocorporativo de participação, a exemplo da CUT, como explica Boito Júnior:
Desde o seu surgimento como movimento de massa em 1978, transitou de
um sindicalismo que ‘tendia’ à ação unificada de amplos setores das classes
trabalhadoras contra a política de desenvolvimento pró-monopolista e
próimperialista do Estado burguês brasileiro - ou, pelo menos, contra a
política salarial que era um aspecto fundamental da política de
desenvolvimento - para uma ação sindical na qual os diferentes setores das
129
classes trabalhadoras isolam-se em suas reivindicações específicas,
desenvolvem uma nova segmentação corporativa, e procuram reduzir as
perdas de seu setor particular numa conjuntura de crise, mesmo quando a
redução das perdas implica a aceitação ativa da política de desenvolvimento
pró-monopolista e pró-imperialista (BOITO JR., 1994, p. 23).
O Corporativismo sindical a partir do governo Collor, se intensifica com as
tendências ‘neocorporativas’ de participação e/ou negociação que passaram a se tornar
hegemônicas no sindicalismo brasileiro. Alves (2000) considera que, a partir da era
neoliberal, consolidaram-se no interior da CUT posturas moderadas que caminham para um
processo de conciliação de classes, num claro movimento de defensiva frente ao processo de
avanço neoliberal de reorganização do trabalho.
Como resposta à sua própria crise, iniciou-se um processo de reorganização
do capital e de seu sistema ideológico e político de dominação, cujos
contornos mais evidentes foram o advento do neoliberalismo, com a
privatização do Estado, a desregulamentação dos direitos do trabalho e a
desmontagem do setor produtivo estatal (ANTUNES, 1999, p. 31).
Com isso, paulatinamente se tem uma mudança significativa de discurso que não
mais representam proposições de mudanças profundas, mas de algo que, no máximo, chega a
defender “políticas públicas” voltadas para superar as “desigualdades” e a “exclusão social”,
expressas, principalmente, a partir do momento em que o projeto eleitoral do PT chega ao
objetivo que era o de conquistar a presidência da república em 2002. Há um processo de
acomodação e de colaboração direta entre o movimento sindical e social que será engessado e
cooptado com papel de colaboradores nas políticas neoliberais (ROCHA, 2011, p. 43).
Um exemplo concreto deste processo de cooptação é o ato do Governo em sancionar
no ano 2008 a Lei 11.648 que instituiu as centrais sindicais, um dos atos mais explícitos de
corporativismo escancarado que atrela ainda mais ao Estado o movimento sindical brasileiro,
já que através da referida lei as Centrais sindicais passaram a ganhar 10% da contribuição
sindical, tributo pago obrigatoriamente pelos trabalhadores, recolhidos pelo Estado e
repassado às centrais e sindicatos como se esses fossem autarquias do Governo Federal.
SINTERO: CONTRADIÇÕES ENTRE O DISCURSO E A PRÁTICA
130
O Sindicato dos Trabalhadores em Educação no Estado de Rondônia - SINTERO foi
fundado
25
nos dias 25 e 26 de fevereiro de 1989 em um Congresso realizado na cidade de
Ouro Preto do Oeste. Em seu breve histórico na página do Sindicato consta um apanhado
geral das diversas lutas que os trabalhadores em educação travaram, mas que se resumem à
sua maioria em lutas salariais. Diferente das disputas que ocorriam em outras regiões do país,
a fundação do SINTERO foi fruto de um trabalho político do Partido dos Trabalhadores - PT
que inicialmente polarizou com PC do B, mas que se tornou a direção hegemônica da
fundação até a atualidade. Como boa parte de sua direção pertence ao quadro do Partido dos
Trabalhadores, esse sindicato também compõe a base da CUT - Central Única dos
Trabalhadores, que também é dirigida pelo PT e da CNTE - Confederação Nacional dos
Trabalhadores em Educação. Estas organizações sindicais não têm aprofundado qualquer
análise sobre as políticas educacionais impostas pelo MEC com a exceção da discussão acerca
do Piso Nacional de Educação e do Plano Nacional de Educação, ou seja, as discussões
variam de forma superficial no que se refere à reajustes salariais da categoria e luta em torno
do financiamento da Educação. O discurso produzido de que o Sindicato tem o papel de lutar
por uma educação de qualidade não tem gerado qualquer espaço de discussão para debater,
por exemplo, o conjunto de políticas educacionais de caráter neoliberal e conservador que
chegam à escola pública através de diversos programas do MEC e Governo do Estado. Não
há qualquer análise ou manifestação sobre as “formações” existentes que são ofertadas aos
trabalhadores em educação de Rondônia ou qualquer discussão que possibilite contrapor o
que está posto.
Os atuais dirigentes regionais do SINTERO encontram-se no segundo mandato e as
principais abordagens com base nas perguntas referem-se a um conjunto de lutas que tem
respectivamente, esta ordem de prioridade: valorização salarial, ambiente de trabalho e
redução da jornada semanal. Há uma crítica ao autoritarismo do governo, mas expresso num
certo conformismo ao realizarem uma comparação com o governo anterior. Em relação à
Gestão democrática, a afirmação é a de que esta é uma bandeira histórica dos trabalhadores
em educação, mas que ao longo do tempo foi se perdendo o foco. Reconhecem que há um
descrédito da categoria, mas identificam como um problema da “base”, ou seja, “muitas vezes
culpa do trabalhador, em não buscar informação”. Em dado momento, transferem a
responsabilidade para a categoria frente à desmobilização: “Eu diria que os trabalhadores
estão cansados, são poucos que ainda tem fôlegos para irem para luta e cobrar de todos”. As
25
Informações extraídas do site do SINTERO. Disponível em: www.sintero.org.br. Acesso em:
18/01/2012.
131
falas de dirigentes, contrastadas com as dos entrevistados, professores, supervisores e
orientadores, são divergentes. Em sua maioria há uma crítica à direção do Sindicato, como
observamos em uma das entrevistas:
Já foi o tempo em que os sindicatos representavam a categoria. Antes era
muito mais fácil mobilizar, quando falavam algo lá em cima, você
acreditava. Hoje, pra mobilizar a categoria é muito mais difícil porque você
sabe que existe um monte de politiqueiro lá em cima. Nosso sindicato hoje é
do PT e não da categoria. Se mudar fica de outro partido então temos um
sindicato partidário. Eu faço parte da oposição, nós somos os que não
prestam e eles são os que querem preservar o sindicato, mas preservar do
jeito deles?! [...] O sindicato quanto a gente criou era diferente, hoje virou
politiqueiro faz politicagem pra ir subindo pra ver se vira um deputado, um
prefeito, vê o Sobrinho, prefeito de Porto Velho, foi o nosso primeiro
presidente do SINTERO. Foi virou vereador, até virar prefeito, assim tantos
outros, às vezes dá errado, o Nereu nós elegemos e depois não conseguiu a
reeleição. Quem apronta muito acaba sendo marcado pela categoria.
Infelizmente o SINTERO de hoje não é mais o mesmo de quando criamos há
20 anos e participei da fundação do SINTERO [...]. (PROFESSOR DA
ESCOLA A)
Entre dirigentes regionais do Sindicato e demais entrevistados o que identificamos
preliminarmente em comum é que há uma crítica ao autoritarismo existente na rede pública
estadual, considerando que o atual modelo de Gestão democrática foi instituído por decreto e
os critérios não atendiam aos interesses da comunidade escolar que sequer participou
efetivamente da elaboração de critérios. Contudo, as críticas apresentam-se de forma
superficial observando-se que há certo desconhecimento das políticas educacionais tanto na
esfera estadual, como federal.
A educação em Rondônia apresenta traços de semifeudalidade através de uma prática
coronelícia onde toda estrutura administrativa das instituições do Estado, seus cargos técnicos
e políticos concentram-se nas mãos de pessoal nomeado pelos detentores do poder local e
para estar a seu serviço, mesmo aqueles professores que ocupam cargos e passam a ser
opressores de sua própria classe (SOUZA, 2010, p. 270). Esta relação de subordinação por
que passa os trabalhadores em Educação da rede pública estadual é conhecida. Mesmo no
processo de construção da “Gestão democrática” do governo do Estado os dirigentes sindicais
dizem que não há autonomia e através de um conformismo identificam que os trabalhadores
têm que se adequar à estrutura e que antes era muito pior:
Não garante autonomia, tem algumas coisinhas que ainda tem que ser
discutidas. Querendo ou não querendo, os trabalhadores têm que se adequar.
Tem que mudar tem que ser rediscutido. E era pior, porque no regime
132
passado era ditatorial, opressão mesmo. Foi uma coisa que veio de cima para
baixo. Falta muita coisa pra garantir, tudo é muito complexo. Questão de
formação, isso engloba a questão democrática (DIRIGENTE SINDICAL 1).
Segundo Souza (2010), por se tratarem de políticas gestadas no escritório do Banco
Mundial e distribuído como modelo até a mais humilde secretaria de educação municipal que
recebe ordens de efetivação dessas políticas, “o processo de implantação é doloroso, cheio de
contradições, mas que aos poucos vai envolvendo os professores, que acabam se encantando”
pelo discurso de que estes são os “novos” modelos de educação, incentivados e até coagidos a
ingressarem nesses programas “educacionais” que privilegiam publicações vazias. Uma parte
considerável desses trabalhadores sofre um processo de precarização do trabalho docente,
“não possuem autonomia didático-científica, não possuem autonomia de gestão e se
submetem aos processos mais rudes de obrigação e servidão às políticas implantadas nas
escolas”, onde acabam por se “adaptar” às imposições externas (SOUZA, 2010, p. 270 e 271).
É preciso analisar de forma mais concreta como o capital identifica os trabalhadores
em Educação, considerando que estes têm um papel fundamental na formação da “única
mercadoria sobre a qual depende o sistema capitalista: a força de trabalho” e são “perigosos
porque estão intimamente ligados à produção social da força de trabalho”, (HILL, 2003, p. 4)
razão pela qual precisam ser tutelados pelos Programas governamentais e terem a ilusão de
que uma democracia tutelada seria uma democracia ampla. Nos deparamos com realidades
adversas no que se refere à Educação Pública, com escolas sem oferecer estrutura de
qualidade e profissionais desmotivados em relação à desvalorização salarial.
Ao serem entrevistados os dirigentes sindicais e professores há uma enorme
contradição na prática sindicalista desenvolvida no Estado. Ou seja, para os dirigentes há uma
grande satisfação com a atuação enquanto aparelho de extensão do poder do estado. Entre os
profissionais da educação há uma indignação com as praticas maquiavélicas dos agentes
sindicais.
Fica evidente uma enorme distância entre o discurso e a prática dos dirigentes
sindicais. Isto é demonstrado nas afirmações dos professores entrevistados, coletadas em
nossa pesquisa de campo. Questionados sobre a atuação do SINTERO e se este tem lutado
pela gestão democrática e contra as políticas do governo para a educação, as respostas
apresentadas foram, em sua maioria, apontando críticas severas e negativas. Dos 31
entrevistados, 21 apresentou críticas contundentes à atuação da direção do Sindicato,
representando 67,7%. Outros 22,6% consideram o sindicato atuante, mas ponderaram os
problemas na Educação. É um número que consideramos alto, ocasionado, entre outros
133
fatores, pela atuação da direção do SINTERO frente às negociações com o governo, nas
últimas greves da educação. Vejamos:
QUADRO I - PRINCIPAIS RESPOSTAS DOS PROFESSORES*
Qua
nt.
%
21
67,7
07
22,6
01
02
31
3,2
6,5
100
%
Sindicato pelego; não tem trabalho de base; faz negociata com governo;
direção oportunista; não informa a base; não se preocupa com os
problemas da educação; Sindicato é trampolim político
Sindicato atuante nos problemas da educação embora com problemas na
direção; O problema do sindicato é a base que não é atuante; sindicato
somos nós e a luta deve ser de todos.
Sindicato inoperante; pouca ação; falta experiência para conduzir a luta
Não respondeu; não quis opinar; não participa
TOTAL
*Quadro elaborado pela equipe de pesquisadores a partir da sistematização das entrevistas
Entre os diretores e supervisores, as críticas permaneceram. Entre estes, a crítica
mais direta e dura, de denúncia à direção do Sindicato, representa 54,55%.
QUADRO II - PRINCIPAIS RESPOSTAS SUPERVISORES E
DIRETORES*
Sindicato pelego; não tem trabalho de base; faz negociata com governo;
direção oportunista; não informa a base; não se preocupa com os
problemas da educação; Sindicato é trampolim político
Sindicato atuante embora com problemas na direção; O problema do
sindicato é reflexo da base; a luta só é salarial sem se envolver em outras
questões.
Sindicato inoperante; pouca ação; distante;
Qua
nt.
Não respondeu; não quis opinar; não participa
TOTAL
%
6
54,5
5
2
18,1
8
2
1
11
18,1
8
9,09
100
%
*Quadro elaborado pela equipe de pesquisadores a partir da sistematização das entrevistas
Observamos que a base do SINTERO enfatiza que os avanços registrados pela
categoria até o presente momento são de pouca validez, visto que o sindicato simplesmente
não pensa em sua base como um todo. Alguns trabalhadores acreditam, e puderam
testemunhar na prática, que os representantes sindicais estão na direção pelo simples fato de
fazer nome político, e não atendem aos verdadeiros interesses que a classe trabalhadora da
educação precisa.
Nossa compreensão em relação ao SINTERO é a de que existem múltiplas falhas que
são apresentadas na pratica de sua organização social. Para os trabalhadores em educação fica
134
o questionamento de diversos assuntos que a direção do SINTERO esqueceu-se durante o
tempo. E um dos mais questionáveis é a luta pela gestão democrática, que no início da
formação do sindicato se falava na gestão democrática e se lutava por ela também. Porém nos
dias atuais o que era uma das principais pautas de luta sindical, a gestão democrática nas
escolas, tornou-se algo distante e sem discussão.
Os dirigentes culpam a base em não buscar informações ou de se mobilizar, mas é
importante destacar que a base espera no mínimo uma ação concreta de quem está à frente da
direção. A direção sindical fica em débito até mesmo quando é preciso discutir as políticas
educacionais, que são impostas tanto do governo Estadual e quem dirá do governo Federal. A
classe trabalhadora necessita de condições adequadas para trabalhar, inclusive um salário
digno. No entanto, para o sindicato a sua principal bandeira de luta é a questão salarial, mas
apesar de falar tanto em melhorias salariais o próprio SINTERO não consegue organizar uma
pauta de reivindicação salarial, que atendesse sua base como um todo. Neste contexto, assim
nos diz Mattos (2009):
(...) É a classe trabalhadora quem continua a depender desses serviços
públicos cada vez mais sucateados, de educação e saúde etc. Unir nas lutas
os trabalhadores do serviço público e seus usuários, também trabalhadores,
deveria ser pauta prioritária do movimento sindical. (MATTOS, 2009,
p.151).
Entendemos que os agentes sindicais não trabalham para atender os trabalhadores em
educação. Os dirigentes, segundo a maioria dos entrevistados, são guiados e manipulados pelo
PT, que são à base do governo estadual. O SINTERO não se preocupa com os problemas dos
trabalhadores, devido à passividade dos dirigentes pelegos.
CONCLUSÃO
Com base nas informações colhidas, percebe-se o quanto ainda está presente a
questão do SINTERO não funcionar de acordo com as necessidades que os servidores da
educação necessitam em seu meio social, inclusive a participação ativa deste sindicato nas
escolas, expondo aos educadores os verdadeiros problemas em que a categoria passa. No
entanto, é preciso que o sindicato envolva a comunidade escolar, a verdadeira essência dos
problemas recorrentes na qual, os servidores da educação enfrentam. E com isso, buscar
soluções, ouvindo a comunidade escolar e não simplesmente passar a funcionar apenas num
135
escritório sem um contato direto com verdadeiros problemas da educação. Na pesquisa
realizada, concluímos que:
a) O Brasil é um país de capitalismo burocrático, que é o tipo de capitalismo engendrado pelo
imperialismo nos países atrasados, ou seja, semifeudal e semicolonial, dominado pelo
imperialismo em sua estrutura econômica e social (LENIN, 1979, GUZMÁN, 1974);
b) As políticas educacionais de formação de professores e gestores das escolas estaduais da
Zona da Mata são hegemonicamente formuladas, dirigidas e financiadas pelo
imperialismo, e suas origens são desconhecidas tanto do conjunto dos professores, quanto
pelos dirigentes sindicais.
A análise final dos dados coletados apresentou resultados apontando que:
a)
O trabalho dos professores é compreendido como semifeudal, uma vez que se submetem
às mais precárias condições de trabalho e emprego, não possuem autonomia didáticocientífica, não possuem autonomia de gestão e se sujeitam às políticas implantadas nas
escolas e aos processos falseadores de gestão democrática.
b) O sindicato como parte de uma estrutura corporativa, age como apêndice do Estado
mesmo se apresentando como espaço questionador das práticas estatais, aqui
identificadas apenas para justificar a sua existência. Há um crescente descontentamento
da categoria diante das práticas oportunistas da direção sindical,
c)
Há um nível de alienação de dirigentes sindicais quanto às causas do sucateamento da
educação pública e da natureza das políticas educacionais orientadas pelo imperialismo e
suas agências multilaterais. Este nível de incompreensão política é reproduzido para o
conjunto dos trabalhadores em Educação.
Nossa perspectiva era a de encerrar essa primeira fase da pesquisa no mês de julho de
2012, mas dado a dimensão do problema evidenciado durante a investigação haverá que
aprofundar os estudos acerca da História do movimento sindical dos trabalhadores em
Educação em Rondônia, aprofundamento bibliográfico sobre a história do movimento sindical
docente no Brasil e sobre as políticas neoliberais orquestradas pelos Organismos
Internacionais e postas em prática pelo Estado como forma de manter o controle ideológico
sobre a escola através da submissão dos trabalhadores em Educação e o conseqüente processo
de perda de identidade enquanto agentes de transformação.
Tais análises são fundamentais para compreendermos mais a fundo como se
processam as contradições: capital X trabalho; Práticas coronelícias X Práticas libertadoras;
Sindicato corporativo burocrata X Sindicato classista com trabalho de base; para que
possamos ao final a compreensão do fenômeno no seio da Educação pública da Zona da Mata.
136
Neste sentido, nossa pesquisa ainda carece de mais tempo para resultados mais objetivos
frente à complexidade de variantes apresentadas até o momento.
REFERÊNCIAS
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brasileiro nos anos 90. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1994.
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2009.
137
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OLIVEIRA, F. Quem canta de novo a L'Internationalle. In: SANTOS, B. de S. (Org.).
Trabalhar o mundo, os caminhos do novo internacionalismo operário. Porto:
Afrontamento, p. 113-142, 2004.
ROCHA, W. P. A CUT nos governos Lula e a reorganização sindical: o caso do SindRede/BH. Dissertação de Mestrado em Sociologia. Coimbra: Universidade de Coimbra,
2011.
SOUZA, M. M. Imperialismo e Educação do Campo: Uma análise das políticas
educacionais a partir de 1990. Tese de doutorado, Faculdade de Ciências e Letras,
Universidade Estadual Paulista - UNESP, Araraquara, 2010.
138
O LIVRO SHENIPABU MIYUI: EXISTÊNCIA E ESPECIFICIDADES DA
LITERATURA INDÍGENA POR MEIO DO ESTUDO DE EDIÇÕES DE MITOS
KAXINAWÁ
Acadêmica Érica dos Santos Lima
Voluntária PIBIC/ UNIR/2011-2012
Profª Drª Cynthia de Cássia Santos Barra
Orientadora
RESUMO
A presente pesquisa pretende discutir um movimento editorial recente no Brasil que alguns
autores afirmam (ALMEIDA, 2004; GOLDEMBERG, 2009) se tratar de um movimento de
natureza literária. Em suas pesquisas (1999), Maria Inês de Almeida afirma ter encontrado
entre os anos de 1996 e 1998 mais de 100 títulos de autoria indígena. A atitude de publicar
livros é uma prática que vem sendo adotada por vários povos indígenas do Brasil nas últimas
décadas. Estes livros estão ganhando espaço gradativamente na cultura do impresso tanto no
nosso circuito literário nacional quanto dentro das próprias comunidades indígenas. Pretendese, por meio deste trabalho, entender as condições de elaboração, edição e difusão destas
obras publicadas por povos indígenas no Brasil nas últimas três décadas, visando a melhor
compreensão da autoria e do movimento editorial indígena. Também se pretende analisar
características destas obras que melhor representam as especificidades do movimento literário
emergente. Serão destacadas, especificamente, a produção literária do povo Kaxinawá que
habita terras indígenas no Acre. Esta etnia se sobressai por suas inúmeras produções, sendo
uma delas, o livro ShenipabuMiyui: história dos antigos (1995; 2000), indicado como leitura
obrigatória para vestibular de duas universidades federais brasileiras (UFMG, 2001; UFVJM,
2011).
Palavras-chave: Literatura. Povos Indígenas. Autoria Indígena. Kaxinawá
ABSTRACT
This research discusses a recent editorial movement in Brazil that some authors claim
(Almeida, 2004; GOLDMBERG, 2009) it is a movement of literary nature. In her research,
Maria Ines de Almeida claims to have found between the years 1996 and 1998 more than 100
titles of indigenous authorship. This attitude of publishing books is a practice that has been
adopted by various indigenous peoples of Brazil. These books are gradually gaining ground in
the culture of the printed circuit both in our national literary and within indigenous
communities themselves. We intend through this article, understand the conditions of
preparation, editing and dissemination of these works published by indigenous peoples in
Brazil in the last three decades aimed at better understanding of indigenous publishing
movement. We also intend to analyze the characteristics of these works that best represent the
characteristics of this emerging literary movement. Highlight specifically the literary
production of the people inhabiting Kaxinawá indigenous lands in Acre. This ethnic group
139
stands out for his numerous productions, one of them, the book Shenipabu Miyui: ancient
history, indicated as required reading for vestibular two Brazilian federal universities.
Keywords: Literature. Indigenous Peoples. Indigenous Authorship. Kaxinawá
1 INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas do século XX, observamos a mudança de postura dos povos
indígenas. Eles decidiram que não mais esperariam que alguém ou alguma organização
intercedesse por seus interesses de terem seus direitos reconhecidos pelo Estado brasileiro
(OLIVEIRA, 2006). Os índios passaram a realizar suas manifestações políticas por conta
própria, construindo representações, fazendo alianças e levando seus pleitos à opinião pública.
A organização política dos índios também colaborou para o surgimento de uma
literatura produzida por escritores indígenas de forma sistemática e com características
próprias. Desse modo, assistimos ao surgimento do que podemos sem dúvida caracterizar
como um novo movimento literário26: aproximadamente quarenta povos indígenas do Brasil
estão publicando textos em livros. Se fizermos uma comparação desses livros, os chamados
“livros da floresta” (ALMEIDA, 2004), com o material produzido pelos europeus que
descreviam as belezas e as novidades da terra recém descoberta no século XVI, temos a
impressão de que se trata de uma nova apresentação da terra descoberta, só que dessa vez pelo
olhar dos índios.
Essa literatura que surge é resultado de esforços em conjunto entre os professores e
pensadores indígenas e assessores não-indígenas. Os livros de autoria indígena são, na
maioria das vezes, custeados por órgãos oficiais (MEC) ou por ONGs, como, por exemplo, o
livro Arte Indígena Umutina, da etnia Umutina (MT), financiado pelo Ministério da
Educação. Raramente esses livros são publicados por editoras privadas. Podemos atribuir o
surgimento dessa literatura nova, principalmente, aos professores das mais de 1.500 escolas
indígenas que estão construindo a literatura de suas comunidades. Entretanto, esta literatura
ainda é pouco estudada em seus aspectos contemporâneos.
26
Conferir (ALMEIDA, 2004) e (GOLDEMBERG, 2009); encontramos, nessas obras, pesquisas e dados
que afirmam a existência de um novo movimento literário com características próprias: a literatura de autoria
indígena.
140
2 O MOVIMENTO EDITORIAL INDÍGENA
Baseando-se nas pesquisas de Maria Inês de Almeida, que mostram a existência de
mais de 100 títulos de autoria indígena entre os anos de 1996 e 1998 e também levando em
consideração a pesquisa bibliográfica realizada no programa de iniciação científica
(PIBIC/UNIR/CNPq 2011-201227), podemos observar a existência de um movimento editorial
de autoria indígena.
No passado, tudo que era produzido sobre as culturas indígenas ou que discutiam
questões relacionadas à temática indígena tinha um cunho antropológico ou linguístico. Nas
três últimas décadas do século XX e primeiras décadas do século XXI, vimos essa realidade
ser mudada com a publicação de dois títulos: Mitopoemas Yanoman (1978) e Antes o mundo
não existia (1980). Tais obras representam os primórdios da co-autoria e da autoria indígena,
respectivamente, e já não podemos classificá-las como obras antropológicas ou linguísticas,
pois não são mais relatos de viajantes que se infiltraram na rotina das etnias, agora são os
próprios indígenas é quem falam, ainda que com assessoria de não indígenas. E percebemos a
preocupação dessas obras com a questão da linguagem esteticamente eficaz. São obras muito
bem ilustradas e pensadas de forma que melhor representem a beleza e a força cognitiva do
pensamento e da cultura de cada etnia.
A partir desses dois títulos surgiu a necessidade de se pensar uma nova categoria no
âmbito das letras nacionais: a literatura de autoria indígena. Podemos classificar essas duas
obras como o inicio de um movimento editorial que se expandiu por várias etnias no Brasil.
Ao revisitarmos alguns conceitos da teoria literária ocidental, nós podemos perceber que
estamos, de fato, diante de um movimento literário emergente. Porém, é preciso ter cautela ao
utilizar os conceitos da literatura ocidental para ler a literatura de autoria indígena, pois é
preciso atentar para o fato de que as condições de produção, de difusão e a cultura em questão
se diferem bastante da cultura ocidental e, portanto, devem ser analisadas em seus aspectos
particulares.
Estes textos publicados refletem as marcas do momento em que foram escritos.
Momento em que a necessidade de preservação da cultura é forte, por causa do contato com
outras culturas que afetaram bastante os hábitos dos índios.
27
Pesquisa bibliográfica realizada durante o período de vigência do projeto (2011-2012), que visava
encontrar o número de 120 referências bibliográficas concernentes à etnia Kaxinawá com o objetivo de montar
um banco de dados on line.
141
2.1 PESQUISA BIBLIOGRÁFICA CONCERNENTE A ETNIA KAXINAWÁ
Um dos objetivos de nossa pesquisa foi montar um banco de dados virtual contendo
referências bibliográficas concernentes às etnias que foram estudadas pela equipe de trabalho.
Para isso, realizamos pesquisas nas bibliotecas de universidades federais brasileiras: UnB,
USP, UNIR, Unicamp, UFRJ, UFSC, UFMG e UFPA. Também foram consultados os acervos
da Biblioteca da Floresta (AC), esta in loco, da Comissão Pró-índio do Acre (anexo I) e o site
do Instituto Ambiental Brasileiro.
A pesquisa consistiu em buscar nestas bibliotecas, através de catálogos disponíveis na
internet, todos os tipos de obras que abordassem a temática indígena, respeitando a etnia
estudada por cada componente. Dentro desta pesquisa, priorizamos materiais de autoria
indígena, seja individual ou coletiva. Também demos preferência para materiais que
estivessem disponíveis na internet em formato PDF, que fossem de procedência legal
(publicação autorizada na web).
Em cada site visitado, registramos a referida referência bibliográfica disponível e
registramos também resumo da obra (se disponível), comentário a respeito da obra (caso
tenha sido lida), áreas de conhecimento abrangidas pela obra (dados catalográficos de cada
biblioteca), gênero de referência (livro, tese, dissertação, etc.) e tipo de autoria (se indígena ou
não-indígena, coletiva, individual, co-autoria), também registramos o número de chamada da
obra na biblioteca (caso esteja disponível apenas na biblioteca física) e o respectivo link, caso
a obra esteja disponível na rede de forma legal. Através deste método, foram colhidas até a
elaboração do relatório parcial 70 referências. E na parte final da pesquisa alcançamos a meta
estipulada no plano de trabalho que visava atingir, até o final da pesquisa, o número de 120
referências bibliográficas por etnia. Todas as referencias bibliográficas encontradas, foram
analisadas e separadas e categorias conforme o tipo de autoria (figura 1), quanto ao tipo de
referencia bibliográfica (livro, tese, dissertação, artigo científico) e quanto a área de
conhecimento abrangida pela obra conforme a ficha catalográfica da biblioteca em que cada
obra se encontra.
142
Figura 1
3 SHENIPABU MIYUI: 1ª E 2ª EDIÇÕES
O livro escrito pelo povo Kaxinawá que alcançou maior reconhecimento foi
Shenipabu Miyui, cuja primeira edição foi publicada em 1995; a segunda edição foi publicada
em 2000. A segunda edição saiu pela Editora UFMG e apresenta algumas mudanças em
relação à primeira.
A primeira edição foi publicada pela Comissão Pró-Índio do Acre e é uma versão que
aparenta ter mais a “cara” dos índios. De início, o livro apresenta um texto escrito por uma
das coordenadoras do projeto editorial, Nietta Monte. É um livro que contém doze mitos do
povo Kaxinawá, apresentados em língua materna indígena e, logo em seguida, em língua
portuguesa. Cada mito também possui ilustrações feitas pelos indígenas que representam
momentos da história contada. Uma dessas ilustrações está presente na capa da obra. Os mitos
apresentados possuem uma escrita marcada pela oralidade e é em relação a isso que se pode
atribuir diferenças significativas entre as duas edições.
A segunda edição é mais trabalhada, o livro é maior em dimensão física e apresenta
uma capa diferente da primeira edição. A capa da segunda edição, projetada por Marcelo
Belico, utiliza ilustração de Raimundo Nonato Mana e usa elementos das pinturas Kaxinawá.
Nesta edição foi adicionado um sumário e também mais informações na nota introdutória
escrita por Nietta Monte sobre os Kaxinawá. Na parte dos mitos não há mudanças no
conteúdo das histórias, o texto é apenas revisado e algumas palavras são acrescentadas e
outras excluídas. Nessa revisão, nota-se a perda de parte das marcas de oralidade presentes na
primeira edição, pois as estórias estão mais próximas da norma padrão de escrita em
português.
143
A impressão de leitura é que a segunda edição tem uma interferência maior de não
indígenas, e isso teria influenciado no resultado final da edição. Isto é, a segunda edição
parece mais próxima à cultura ocidentalizada, o que não prejudica, contudo, a beleza do
conteúdo das estórias apresentadas, uma vez que essas possuem um traço indígena forte.
4 CONCLUSÃO
Observando o caminho percorrido pelo povo Kaxinawá, desde o contato com os
‘brancos’ até a atualidade, percebemos um longo percurso trilhado em busca de uma voz
própria e que seja audível para a sociedade ocidental. Os frutos do movimento editorial
iniciado pelos indígenas estão chegando até nós em forma de livros em prosa e em poesia e já
demandam uma nova categoria dentro da literatura brasileira contemporânea: a literatura de
autoria indígena. Este status é merecido pela beleza e subjetividade das obras já publicadas
pela etnia Kaxinawá.
Colocar este movimento em destaque é prioridade, pois deverá ser apropriadamente
reconhecido como parte da literatura brasileira. Para isso, é necessário olhar com novos olhos
para os livros da floresta, observando as características da cultura indígena que, sendo
diferente da cultura ocidental, apresenta elementos singulares, mas constituintes da
comunidade estética que vigora no Brasil.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Maria Inês de & QUEIROZ, Sônia. “Livros da floresta”. In: _________. Na
captura da voz - as edições da narrativa oral no Brasil. Belo Horizonte: Autêntica;
FALE/UFMG. 2004. p.195-277.
GOLDEMBERG, Deborah. A concepção do I Sarau de Poéticas Indígenas por uma
antropóloga escritora. Espaço Ameríndio, Porto Alegre, v. 3, n. 1, p.42-60, jan./jun. 2009.
OLIVEIRA, João Pacheco; FREIRE, Carlos Augusto da Rocha. A presença indígena na
formação do Brasil. Ed. MEC/UNESCO: Brasília, 2006.
144
PROGRAMAS DE MELHORIA DA QUALIDADE DE ENSINO NA REDE PÚBLICA
ESTADUAL DE PORTO VELHO (RO)
Fabrício Ricardo Lopes28
Marli Lúcia Tonatto Zibetti29
RESUMO
Os estudos realizados sobre o processo educacional a partir de uma perspectiva crítica de
Psicologia Escolar têm trazido contribuições muito significativas para a compreensão das
dificuldades escolares sob um olhar menos individualizante e mais político-social. Neste
sentido, os estudos sobre as políticas educacionais tornam-se relevantes por permitirem
evidenciar as formas como a materialização das propostas estatais imprimem marcas nos
processos de escolarização, tanto no âmbito individual quanto institucional. Esta investigação
teve como objetivo investigar as políticas implementados pela Secretaria de Estado da
Educação de Rondônia, de 2002 a 2010, voltadas à melhoria da qualidade do ensino,
buscando compreender a forma como os programas foram formulados, implementados,
acompanhados e avaliados. Para isso foram utilizados dados qualitativos obtidos por meio de
análise de documentos e entrevistas semi-estruturadas. Os resultados indicam a centralização
da concepção e definição das formas de desenvolvimento dos programas e uma
descentralização da execução. Questiona-se a adequação de projetos pensados em nível
federal para a realidade de estados periféricos como Rondônia e a contribuição destas
políticas para a manutenção das desigualdades regionais.
Palavras-chave: Políticas Públicas. Ensino Fundamental. Programas Educacionais.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho está inserido em uma pesquisa mais ampla denominada Políticas
públicas de educação para o enfrentamento das dificuldades escolares na rede urbana
estadual em Porto Velho-RO a qual, por sua vez, vincula-se ao Programa de Cooperação
Acadêmica - PROCAD - Novas Fronteiras firmado entre a Universidade Federal de
Rondônia, Universidade de São Paulo e Universidade Estadual de Maringá, que conta com
financiamento da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES.
A investigação, desenvolvida a partir de uma abordagem qualitativa teve como
objetivo geral investigar as políticas implementadas pela Secretaria de Estado da Educação
28
científica
Acadêmico do 5º período de Psicologia da Universidade Federal de Rondônia, bolsista de iniciação
pelo
Programa
Institucional
de
Iniciação
Científica
PIBIC/CNPq.
[email protected]
29
Professora do Departamento
[email protected]
de
Psicologia
–
Universidade
Federal
de
Rondônia
–
145
(SEDUC) direcionadas à melhoria da qualidade nos anos iniciais do ensino fundamental nas
escolas públicas em Porto Velho no período de 2002 a 2012. Os objetivos específicos que
orientaram o estudo foram: a)Levantar os programas educacionais implementados nos anos
iniciais do ensino fundamental nas escolas públicas estaduais em Porto Velho; b)Identificar as
formas de planejamento, implementação, acompanhamento e avaliação dos programas
desenvolvidos no âmbito da SEDUC; c)Compreender as relações entre as políticas
implementadas pelo governo federal e os programas desenvolvidos no estado de Rondônia, no
período de abrangência da pesquisa.
Desta forma, nos debruçamos sobre políticas públicas educacionais desenvolvidas em
um período de oito anos os quais compreenderam os mandatos de Ivo Narciso Cassol como
governador do estado e Luiz Inácio Lula da Silva como presidente da República.
Após a aprovação da Constituição Federal de 1988, o Brasil passou por várias
transformações, principalmente no campo da saúde e da educação. O estudo de políticas
educacionais merece investimentos, pois seus reflexos afetaram diretamente a dinâmica da
educação brasileira, desde questões macro, institucionais, financiamento da educação,
políticas de avaliação até as políticas com seus objetivos apontados para a melhoria da
qualidade do ensino, vislumbrando a mudança direta dos serviços prestados à população
brasileira.
As políticas públicas são entendidas conforme Augusto (1989, p. 1) como:
[...] um conjunto articulado de decisões de governo, visando fins
previamente estabelecidos a serem atingidos através de práticas globalmente
programadas e encadeadas de forma coerente. Clareza de propósitos,
hierarquia quanto aos fins, e programas definidos no sentido de atingi-los,
qualificariam as políticas governamentais em geral. (AUGUSTO, 1989, p. 1destaques da autora)
Nesse sentido a Psicologia Escolar se faz presente e necessária neste campo de
estudos, buscando entender em uma perspectiva crítica as implicações dessas políticas para os
sujeitos envolvidos. Assim, analisar os processos educacionais de uma perspectiva crítica
consiste em compreender as relações entre os determinantes mais amplos, tais como o
contexto político e econômico que os condiciona, bem como a materialização destas
influências na normatização da legislação que conforma e institucionaliza as práticas
educacionais nos sistemas educativos. Desta forma, ganham relevância, no campo da
psicologia os estudos sobre as políticas educacionais, pois conforme Viégas, Asbahr e
Angelucci (2011, p. 15):
146
[...] sabemos que as políticas públicas educacionais implementadas nas redes
de ensino imprimem marcas profundas na constituição do processo de
escolarização. Assim, mais do que atual, é imprescindível conhecermos o
que propõe o discurso oficial em relação à educação, ao nos depararmos com
a realidade absolutamente contraditória da escola pública.
E é por meio dos programas, muitas vezes apresentados em forma de leis, que o poder
público se faz presente nas escolas. Portanto, a análise dos conteúdos de tais programas é
fundamental para a compreensão das condições de escolarização oferecidas nas escolas
públicas, por isso este é o foco de nossa investigação.
A LEGISLAÇÃO E AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS
A “Carta Magna” da educação brasileira teve suas raízes lançadas a absolutamente
todos os setores da educação. Seu caráter regulatório alcançou também a administração
referente a políticas educacionais. Entende-se por política educacional como “uma
modalidade de política social.” (SAVIANI, 2008, 223).
As políticas educacionais delimitam os caminhos a serem percorridos pela educação;
são medidas tomadas pelo Estado a fim de que se tornem efetivas, atingindo seus ideais de
melhorar significativamente a educação. No Brasil, tais políticas se encontram - uma vez
analisado o esquema divisório de nossa administração pública - na área social, porém,
questionamentos realizados por autores como Saviani (2008), ressaltam que é correto afirmar
o caráter social de todas as políticas, já que o sentido da palavra corresponde à administração
do bem comum.
De acordo com este mesmo autor, as políticas sociais existem para contradizer o
caráter, justamente, anti-social da política econômica em curso no Brasil. Esta política, por
sua vez, segue a lógica do capitalismo, favorecendo interesses privados em detrimento dos
interesses da coletividade. “[...] a necessidade de formulação de uma política social decorre do
caráter anti-social da economia e, portanto, das políticas econômicas nas sociedades
capitalistas.” (SAVIANI, 2008, p. 224).
O momento pós-nova LDB e até mesmo um pequeno espaço de tempo pré-lei,
constituiu, uma perspectiva visivelmente atrelada à economia, evidenciando os fins públicos e
interesses privados30. Segundo Peroni:
30
Ver PLANK. D. Política Educacional no Brasil: caminhos para salvação pública. Porto Alegre,
Artmed, 1991.
147
[...] a democracia, mesmo a meramente representativa, impede o livre
andamento do mercado, porque os políticos têm de atender pelo menos em
parte a demanda dos eleitores para se reelegerem. Portanto, a solução seria
acabar com o voto, mas, se isso não fosse possível, esvaziar seu poder,
esvaziando, também, as instituições representativas estatais deslocando as
responsabilidades do Estado para a sociedade civil. Neste período particular
do capitalismo, mais do que nunca, os empresários e o setor ligado ao capital
tem o controle hegemônico da sociedade civil. (PERONI, 2003, p 115-116).
Segundo Oliveira (2005) a sociedade brasileira passa a debater-se entre a expansão do
direito à educação de qualidade para a maioria da população ou a negação desse benefício,
quando se passa a colocá-la na esfera do mercado. Essa perspectiva, notadamente neoliberal,
estimulou o investimento público na iniciativa privada e é a partir dessa orientação política
dominante na década de 1990, que se encontram as formulações de algumas políticas
educacionais que apontam para uma democratização do acesso, mas a negação do direito ao
conhecimento.
Essas modificações ocorrem em um contexto no qual, tendencialmente,
regulariza-se o fluxo no Ensino Fundamental, impulsionado de forma
ambígua tanto por uma perspectiva democratizante quanto por uma de
economia de recursos. Isto fará com que, em breve, todos tenham oito anos
de escolarização, mas não o acesso aos mesmos níveis de conhecimento.
Muitos, nem a patamares mínimos. Elimina-se, assim, a exclusão do Ensino
Fundamental, não a exclusão do acesso ao conhecimento. Modifica-se
apenas a forma de manifestação da exclusão. (OLIVEIRA, 2005, p. 19).
De acordo com Oliveira (2005) a expansão do acesso e permanência no sistema
escolar para as camadas que sempre estiveram excluídas da escola, garantiu que ao final do
século XX o ensino obrigatório no Brasil estivesse praticamente universalizado, pelo menos
em relação ao acesso. Entretanto, essa democratização entra em choque com as bases políticas
do programa neoliberal que tem como pilar a redução dos investimentos públicos em
educação.
Outro aspecto contraditório que caracterizou o processo educacional brasileiro com as
reformas implementadas nos anos 1990, foi o redimensionamento da polaridade
centralização/descentralização. Segundo Oliveira (2005, p. 18) “[...] ao mesmo tempo em que,
tendencialmente, descentralizou-se a gestão e o financiamento, centralizou-se o processo de
avaliação e controle do sistema.”
O melhor exemplo do processo de descentralização da gestão da educação brasileira
foi a criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de
Valorização do Magistério (Fundef), que permitiu à união transferir a responsabilidade de
148
gerir a educação para estados e municípios, por meio da redistribuição de recursos
orçamentários arrecadados dos próprios entes municipais e estaduais.
De acordo com Oliveira (2005, p. 21) na perspectiva da descentralização constrói-se
um discurso no qual se valorizam “[...] expressões e termos como ‘autonomia’, ‘participação’,
’controle da comunidade’, ‘novo padrão de gestão’, ‘racionalização administrativa’, ‘repasse
direto de recursos para a escola’, ‘indução ao estabelecimento de parcerias’ e
‘municipalização’.” (Destaques do autor).
Por outro lado, a centralização se deu pelo estabelecimento de avaliações nacionais do
sistema com exames padronizados para todos os níveis de ensino e neste âmbito os termos
utilizados remetem a “[...] ‘difusão de uma cultura de avaliação’, ‘padrão de qualidade’,
‘avaliação de sistema’ e ‘competição’”. (OLIVEIRA, 2005, p. 21 - Destaques do autor).
Assim, o sentido atribuído à descentralização decorrente da política implementada nos
anos de 1990 e incorporado pela legislação brasileira é a transferência para Estados,
Municípios e o Distrito Federal a responsabilidade de administrar diretamente suas redes de
escolas. O funcionamento das escolas e das respectivas redes, por sua vez, passa a ser
controlado de forma indireta pelos resultados alcançados pelos alunos nos testes que
compõem os sistemas de avaliação. “Passa-se a controlar o ‘produto’ do sistema e não o
‘processo’ que o originou. Nesta lógica, a ‘autonomia’ da escola passa a ter outro sentido,
pois a instituição passa a ser ‘monitorada’ de outra maneira, não mais pelo controle
burocrático-hierárquico direto.” (OLIVEIRA, 2005, p. 24 - Destaques do autor).
Nestes termos, a política educacional brasileira orienta-se por uma racionalidade
instrumental e utilitarista da educação. De um lado entendida como ferramenta para a
competitividade e, de outro, como condição para o desenvolvimento econômico do país.
Cabe, portanto à educação, a reprodução da força de trabalho, integração social, prevenção de
conflitos, formação para o consumo e para re-adequar-se frente ao desemprego, preparando-se
para as transformações da sociedade moderna.
Assim, a pressão social e política sobre a educação leva à ‘reordenação’ da gestão
educacional que se vai conformando na direção estabelecida pela política federal. Segundo
Freitas (1998, p. 09) “Essa se dá mediante condicionamento da função supletiva da União à
adesão, pelo município, a projetos federais. Esta adesão tem implicado um crescente controle
central dos resultados que, em alguns casos, alcança o interior da própria instituição escolar.”
Esta parece ser a situação observada na rede estadual de ensino em Rondônia,
conforme indicam os dados obtidos em nossa pesquisa.
149
A PESQUISA
A abordagem qualitativa está sendo utilizada frequentemente no campo educacional,
apesar de ainda ser alvo de críticas quanto ao seu rigor científico. Lüdke e André (1986)
afirmam ser essa abordagem bastante efetiva, na medida em que supõe o contato direto do
pesquisador/a com o campo, sendo ele (o/a pesquisador/a) o principal instrumento de
mediação entre o ambiente pesquisado, os conhecimentos adquiridos por ele através da teoria
e de suas experiências pessoais. Essa abordagem enfatiza um interesse maior pelo processo do
que pelo produto e preocupa-se, também, com o registro detalhado dos dados e relações
estabelecidas com os participantes da pesquisa. Segundo as autoras
[...] são utilizadas mais frequentemente nesse novo tipo de estudo a
observação participante, que cola o pesquisador à realidade estudada; a
entrevista, que permite um maior aprofundamento das informações obtidas;
e a análise documental, que complementa os dados obtidos através da
observação e da entrevista que aponta novos aspectos da realidade estudada.
(LUDKE; ANDRÉ. 1986. p.9)
Com base nesses pressupostos a pesquisa foi desenvolvida junto à Secretaria Estadual
de Educação em Porto Velho, por meio de contato com os técnicos da Gerência de Educação
e da Gerência de Projetos Especiais, campo no qual foram coletados documentos e
informações sobre os programas desenvolvidos no período analisado. Aos documentos
fornecidos pelas Gerências foram somadas as informações obtidas no site do Ministério da
Educação e também do Governo de Rondônia.
Após a análise documental foram realizadas entrevistas com duas profissionais que
atuaram em vários setores da secretaria por períodos que variam entre 07 e 15 anos.
A análise dos dados respeitou as recomendações metodológicas de Lüdke e André
(1986), buscando sempre manter a relação entre a Psicologia, a políticas públicas
educacionais, e a base teórica do trabalho de forma a atender os objetivos que orientaram a
pesquisa.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
De acordo com dados do INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira, Rondônia possuía no ano de 2010 cerca de 210 escolas na rede
estadual que atendiam os anos iniciais. Em 2011 esse número caiu para 198 escolas. Dessas,
150
64 estavam localizadas em Porto Velho.
Para evidenciar como têm se comportado os dados referentes à reprovação, aprovação
e abandono na rede pública estadual durante o período estudado, organizamos a Tabela 1,
com dados divulgados pelo INEP, procurando evidenciar como está situado o estado de
Rondônia no quadro regional e nacional. Os referidos dados demonstram que os índices de
evasão têm diminuído ao longo dos últimos anos, situando-se em 2010, abaixo da média
regional (5.3%) e pouco acima da média nacional (3.1%). Entretanto, como se pode observar
pela comparação ao longo do período, esses números têm oscilado de 4.3 em 2003, para 7.1
em 2005 e 3.3 em 2011.
Tabela 1: Dados de rendimento escolar nos anos iniciais - Brasil, Região Norte e Rondônia
Ano/
Região
Brasil
Norte
Rondôni
a
2003
Aprov
.
84.3
77.1
85.0
Reprov
.
10.3
15.5
10.7
Aband
.
5.4
7.4
4.3
2005
Aprov
.
79.5
73.1
78.5
Reprov
.
13.0
15.8
14.4
Aband
.
7.5
11.1
7.1
2010
Aprov
.
86.6
82.9
82.2
Reprov
.
10.3
11.8
14.5
Aband
.
3.1
5.3
3.3
Fonte: MEC/INEP
Em relação à reprovação, entretanto, o quadro é menos animador, pois o estado
apresentava em 2003 e 2005 uma taxa inferior à média nacional, porém superior à da região
norte. Entretanto, em 2010 esta situação se inverteu e o estado apresentou um índice de
reprovação de 14.5%, superior à média da região norte (11.8%) e à média nacional (10.3%).
Quando observamos os dados divulgados pelo IDEB - Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica - percebemos que o crescimento no período superou as metas estabelecidas,
entretanto está ainda aquém do desejável, pois avançou de 3,9 em 2007, para 4,2 em 2009.
Avanço que se deve, possivelmente, à diminuição dos índices de abandono.
Quanto aos programas desenvolvidos para a melhoria da qualidade do ensino, a
análise dos dados indicou um número de 16 programas que foram desenvolvidos no período
de 2002 a 2010. Alguns deles, ainda em execução.
Os programas foram agrupados de acordo com seus objetivos e o público alvo em
cinco grandes grupos:
1)Programas de Formação de professores: Programa Especial de Habilitação e Capacitação
para professores (PROHACAP), Programa de Formação Continuada PCN em Ação,
Programa de Formação de Professores Alfabetizadores (PROFA); Programa de apoio a
151
Leitura e Escrita (PRALER) e Gestão da Aprendizagem Escolar (GESTAR I).
2)Programas de formação de outros profissionais da educação escolar: Escola de Gestores da
educação Básica e Fortalecimento dos Conselhos Escolares.
3)Programas de reorganização (escolar) - mudança dos tempos e funcionamento da escola:
Ciclo Básico de Alfabetização (Projeto Caminhar - CBA); Programa de Aceleração da
Aprendizagem (Classe de Aceleração) e Programa Mais educação.
4)Programas de Tecnologia educacional: TV escola; Mídias na educação e Um computador
por Aluno (UCA)
5)Programas voltados à melhoria da Gestão escolar: Programa de Fortalecimento da Escola
(Fundescola), Programa de Apoio Financeiro (PROAFI) e Programa de Financiamento de
Projetos Escolares (PROFIPES)
Pode-se afirmar que a maior parte dos programas desenvolvidos ou em
desenvolvimento na rede estadual em Rondônia são decorrentes de iniciativa federal e isso
permite que seja questionada a sua adequação à realidade do estado, uma vez que muitos
deles são desenvolvidos com base em material impresso e vídeográfico produzido em outros
centros do país. Ou seja, são pensados e desenvolvidos ignorando-se as especificidades locais.
[...] essa questão da formação continuada, o MEC deve continuar
fomentando sim; mas eu penso que a gente podia pensar e deve já pensar,
formação continuada regionalizada, material já regionalizado, não que a
gente deixe o que é nacional para fazer o que é local, mas que a gente tenha
um núcleo que é nacional, mas as questões regionais. A gente do estado
pensar também na nossa proposta de formação continuada, com a nossa cara.
O que a gente quer aqui em Rondônia. (Entrevista 1 - 27/06/2012).
Outra questão a ser destacada é a multiplicidade de programas em desenvolvimento,
muitas vezes destinados ao mesmo público e abordando os mesmos componentes curriculares,
como os programas de formação PROFA, PRALER, GESTAR I. Todos têm como
preocupação principal a formação de professores para o ensino da leitura, da escrita e no caso
do GESTAR também o ensino da matemática. Em algumas situações, vários programas
estavam em desenvolvimento ao mesmo tempo, como ocorreu com o PCN em ação, o
PROFA e o PROHACAP.
152
SOBRE A ADESÃO, IMPLANTAÇÃO E ACOMPANHAMENTO DOS PROGRAMAS
Desde o início da coleta de dados chamou-nos atenção a forma como ocorre a
distribuição de responsabilidades sobre os programas em desenvolvimento na Secretaria de
Estado da Educação. Cada programa possui uma coordenação específica e, na ausência da
pessoa responsável, há dificuldades de acesso às informações. É importante ressaltar que a
maioria desses programas parte da iniciativa federal e são assumidos pela SEDUC.
Os dados obtidos mostram que existe a ilusão de descentralização da administração
pública. Os programas, em sua maioria são, como dito acima, pensados em nível federal e a
execução é responsabilidade dos estados, mas a forma como esses programas são
implantados, acompanhados e avaliados também é definida no pacote que é adquirido pela
Secretaria de educação.
De acordo com as entrevistas realizadas e com os diálogos travados durante a coleta de
dados, muitos programas são apresentados aos estados pelos próprios técnicos do Ministério
da Educação que realizam visitas às secretarias para apresentação dos projetos. Ou então, os
técnicos dos estados são convidados para a apresentação nacional do programa realizada em
Brasília. “Na verdade, [...] sempre chega através do MEC mesmo. Vem um consultor, traz a
proposta nova, [...] dos que eu já acompanhei sempre é através do MEC. Um ou outro de
repente o Estado manifesta interesse [...]”. (Entrevista 01 - 27/06/2012).
A partir dessa apresentação, o estado firma convênio com o Governo Federal e por
meio dessa parceria os programas passam a ser desenvolvidos, pois como destaca a
profissional da SEDUC “Geralmente os estados aderem aos programas, porque quando o
governo federal sugere, ele capacita e ele também investe.” (Entrevista 2 - 27/06/2012).
Nesse sentido, os dados evidenciam uma política de Gerencialismo, caracterizada
segundo Lima e Gandin (2011), pela dispersão do poder, defendida sob o argumento de
transparência governamental, objetivos claros, que dão a ideia de eficácia, trazendo o
indivíduo como central e levando em conta mais o resultado através da avaliação de
desempenho.
Conforme indicam os dados, a SEDUC exerce o papel de intermediária e executora
dos programas federais em nível de estado: “Aqui sempre é regionalizado. Passa pelas GE e
depois vai para a Representação de Ensino. Não vão direto pra escola. Não tem nenhum, até o
Mais Educação que era pra ser assim, direto na escola, não é.” (Entrevista 1, 27/06/2012).
153
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Inicialmente,
percebemos
que
no
período
pesquisado
estavam
em
curso
administrações que se orientam por programas políticos sustentados em correntes filosóficas
diferentes. No âmbito nacional tínhamos o governo do Presidente Luis Inácio Lula da Silva e
no âmbito estadual Ivo Narciso Cassol. Esse é um dado relevante, na medida em que, mesmo
havendo esse distanciamento entre posições políticas distintas, os programas propostos em
nível central eram assumidos e desenvolvidos na esfera estadual, sem nenhuma restrição ou
adaptação.
Isso mostra que a educação não era prioridade no governo Estadual, pois existia um
número muito restrito de programas educacionais regionalizados. Em contrapartida existiam e
existem muitos programas da iniciativa federal que foram ou estão sendo executados pelo
Estado. O governo do estado pode-se dizer que não deu sua identidade à educação local
evidenciando sua fraqueza no que diz respeito à formulação das políticas educacionais. Por
outro lado o governo federal mostra sua força alcançando os municípios mais periféricos.
Nesse sentido, é possível afirmar que a Secretaria de Estado da Educação se tornou um ponto
de passagem desses programas e as escolas suas executoras. Os métodos de implantação,
acompanhamento e avaliação são determinados pelo governo federal.
Outro aspecto que pode ser destacado dos programas identificados é a ênfase dada à
formação de professores e àqueles voltados para a questão da tecnologia educacional, estes
últimos inclusive, quase sempre acompanhados de propostas de formação. Isto indica que os
governos continuam acreditando que a qualidade da educação pode ser alterada por meio
deste caminho.
Além disso, a adoção e execução de programas planejados em outras esferas
contribuem para manter as relações de desigualdade entre as regiões centrais do país e os
estados periféricos, uma vez que impede o desenvolvimento de quadros técnicos capazes de
propor alternativas adequadas aos problemas regionais. Talvez este seja um aspecto a ser mais
investigado e discutido, uma vez que, conforme os dados de rendimento escolar apresentados
neste texto, os programas desenvolvidos no período não foram suficientes para melhorar os
índices de aproveitamento escolar nos anos iniciais do Ensino Fundamental.
154
REFERÊNCIAS
AUGUSTO, M. H. O. Políticas públicas, políticas sociais e políticas de saúde: Algumas
questões para reflexão e debate. Tempo Social. S. Paulo, v. 1, n.1, 1989.
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<http://www.senado.gov.br/legislacao/const/con1988/CON1988_04.02.2010/CON1988.pdf>.Acesso
em: 08 mar. 2012.
______. Lei 9394, de 20 de dezembro de 1996. Dispõem sobre as Diretrizes e Bases da
Educação Nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 dez. 1996.
LIMA, I. G. de; GANDIN, L. A. Estado, gerencialismo e políticas educacionais: construindo
um referencial teórico de análise. 34ª Reunião Anual da ANPED. Natal, 2011. Disponível
em: <http://www.anped.org.br/app/webroot/34reuniao/.../GT05-667%20int.pdf>. Acesso em: 10
jul. 2012.
LUDKE, M; ANDRÉ, M.E.D.A. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas. São
Paulo: EPU. 1986.
OLIVEIRA, R. P de. Política Educacional no Brasil: A expansão do Ensino Fundamental e
suas conseqüências In. BOCK, A. M. B. (Org.) Relatório Final: Programa Banco Social de
Serviços
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Psicologia.
Disponível
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PLANK, D.N. Política educacional no Brasil: caminhos para a salvação pública. Porto
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SANTOS, Pablo. Guia Prático da Política Educacional no Brasil: ações, planos, programas
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VIÉGAS, L de S.; ASBAHR, F. da S. F.; ANGELUCCI, C. B. Apresentação. In. VIÉGAS, L
de S.; ANGELUCCI, C. B. (Orgs.) Políticas públicas em Educação: Uma Análise Crítica a
partir da Psicologia Escolar. São Paulo: Casa do Psicólogo. 2006. p. 9-23.
155
PRÁTICAS PSICOLÓGICAS: CONSIDERAÇÕES A CERCA DA ATUAÇÃO DO
PSICÓLOGO NO CONTEXTO ESCOLAR/EDUCACIONAL EM PORTO VELHO RO
Fernanda Angrewski Coutinho1
Iracema Tada2
INTRODUÇÃO
O atual modelo teórico da Psicologia Escolar (histórico-crítica) surgiu na década de
1980 a partir de uma autocrítica, uma análise oriunda da própria Psicologia aos modelos de
atuação do psicólogo na Educação - cujo trabalho contribuiu para explicar o mau desempenho
escolar, centrando grande parte dos motivos nas dificuldades apresentadas pelo aluno.
A autocrítica da Psicologia em relação à atuação do psicólogo (SOUZA, 2010), levou-a
a analisar e discutir o processo de escolarização das crianças, buscando compreender o
problema além de uma perspectiva individual considerando todo o contexto institucional e
social. Segundo Souza (2010) “os aspectos psicológicos são parte do complexo universo da
escola, encontrando-se imbricados nas múltiplas relações que se estabelecem no processo
pedagógico e institucional presentes na escola.” (p.60).
As pesquisas, a partir de então, têm verificado que o fenômeno da queixa escolar se
instauram e se perpetuam não por culpa do aluno ou de sua família, mas em virtude de que as
crianças têm ingressado em “cotidianos escolares adoecidos e adoecedores” (SOUZA, 2007),
e apontam que uma atuação do psicólogo escolar com ênfase na clínica, por meio de
atendimentos individuais e aplicação de testes psicológicos, que tendem a culpabilizar o aluno
ou sua família pelo insucesso escolar não são mais cabíveis nem aceitáveis (ANGELUCI et.
al., 2004; COLLARES; MOYSÉS, 1996; FACCI, 1991; MACHADO, 2003; MACHADO;
PROENÇA, 2008; MEIRA; ANTUNES, 2003; PATTO, 1990; 1997 e 2005; SOUZA, 1996).
No entanto, mais de 30 anos de estudos sobre o adoecimento do cotidiano escolar bem
como de pesquisas para uma nova prática do psicólogo escolar, não alteraram sua atuação
clínica e individualista. Pelo contrário, temos visto um retorno às explicações para a não
aprendizagem centradas no aluno e poucos avanços na implantação de políticas públicas de
fato inclusivas na educação (GUARIDO, 2010; SOUZA, 2010; COLLARES; MOYSÉS,
2010).
1
Bolsista PIBIC/UNIR/CNPq - [email protected];
156
2
Professora do departamento de Psicologia da Universidade Federal de Rondônia e orientadora da pesquisa
Dois aspectos desta discussão precisam ser mais debatidos para compreendermos o
atual quadro em que se inserem os processos institucionais escolares e os fatores que tem
interferem na produção do fracasso escolar, são eles: as políticas públicas e a medicalização
da educação.
POLÍTICAS PÚBLICAS EM EDUCAÇÃO
Paralelamente aos estudos sobre o fracasso escolar, surgem pesquisas focadas na análise
das políticas públicas na educação. Tais pesquisas têm sido fundamentais para se traçar o
perfil de atuação do psicólogo na escola.
As pesquisas até agora realizadas, atentam para o fato de que a escola é um espaço
cultural que constitui diversas relações sociais. Porém é perpassada por uma hierarquia, que
“dá ordens”
31
a serem executadas, mas não dá voz aos verdadeiros atores escolares. Essa
hierarquia silencia pais, alunos e professores e os responsabilizam pelo fracasso escolar
(SOUZA, 2010), predominando a “ausência de discussão por parte daqueles que as
concretizarão e a desconsideração de seus saberes.” (SOUZA, 2007, p.247)
Viégas (2006) ao analisar o regime da progressão continuada - política de promoção
automática que proíbe a reprovação no ensino básico - no estado de São Paulo, afirma que por
trás dessa política (e de todas as outras) existe uma ideologia. Segundo ela, a ideologia é
caracterizada por conferir prestígio ao discurso competente32, pela forma autoritária e pelo
pensamento mágico - crença de que as ideias podem transformar a realidade. As formas
como as políticas são impostas, evidenciam contradições, pois ao mesmo tempo em que o
discurso oficial as coloca como uma mudança efetiva da realidade coloca também requisitos
necessários para educadores cumprir, de forma que se a iniciativa fracassar, este não recaia
sobre os seus idealizadores.
Trata-se, pois, de uma política que não transforma a essência 33 do fracasso
escolar, mas apenas o que dele aparece [...], ou seja, que não visa a garantir o
sucesso, mas apenas eliminar o fracasso. (VIÉGAS, 2006, p.161).
Como explicitado acima, tais políticas acabam sendo mais “engolidas” do que
implantadas, pois na maioria das vezes, a escola é informada com pouco prazo das novas
31
Destaque nosso.
Grifo da autora. O discurso competente é definido como o discurso do especialista, inspirado na
suposta eficácia dos meios de ação (p.159).
33
Grifos da autora
32
157
diretrizes e ainda é cobrada a aderir até a data estipulada. Medidas adotadas dessa maneira são
apropriadas pelos educadores de forma superficial e distorcida (SOUZA, 2007). Tornam-se
mais uma iniciativa que está no projeto, que traz números para escola, mas que não funcionam
e que não ajudam a melhorar o processo de escolarização.
Os preconceitos que as instâncias superiores têm em relação às famílias pobres e seus
filhos também atravessam a implantação das políticas públicas. A escola passa a ter o papel
de família, pois a família biológica é “incapaz” de educar seus filhos porque não possuem
cultura suficiente ou são “criminosos”. Preconceitos, que segundo Viégas (2006) “são
travestidos de olhar científico” (p.162), ou seja, são corroborados pela ciência. Os educadores,
atores diários da instituição não são convidados a discutir as necessidades da escola, e quando
alguma política é estabelecida, surge como norma e obrigação.
Ao mesmo tempo em que o professor é trazido como elemento
fundamental no sucesso de uma política pública, as pesquisas
demonstram que esse profissional pouco tem participado da discussão
ou de instâncias de discussão do planejamento e da implantação de
quaisquer das políticas estudadas. (SOUZA, 2010, p.138-139)
Essas instâncias superiores determinam de forma arbitrária as iniciativas que devem ser
implantadas nas escolas, sem dar ouvidos aos verdadeiros interessados no desenvolvimento
educacional. É nesse sentido que são criados setores próprios para a avaliação das
dificuldades de aprendizagem, que trabalham com encaminhamentos a especialistas médicos
(JOHNSON, 2011).
Em relação à Psicologia, as Políticas Públicas que deliberam o trabalho do psicólogo no
campo educacional são todos voltados para uma atuação psicométrica e medicalizante.
Conforme estudo realizado por Souza e Cunha (2010) em São Paulo/SP, os projetos de lei em
trâmite no estado definem o trabalho do psicólogo como: aplicação de testes de orientação
vocacional; realização de exames psicodiagnóstico infantis e acompanhamento de alunos com
TDAH e Dislexia. Tais situações revelam como o processo de medicalização, ou seja, a
redução de conflitos sociais a doenças individuais, tem se tornado natural.
A MEDICALIZAÇÃO DOS ESCOLARES
A medicina e a tecnociência evoluíram muito nas últimas décadas. Seus resultados são
divulgados cada vez mais pela mídia e outros meios de comunicação. A ênfase no
158
organicismo tem gerado a ideia de que o sofrimento psíquico é mera expressão do organismo
“Neste sentido o campo das perturbações psíquicas é um dos mais eloquentes: o sofrimento
transformado em transtorno, o medo em excitação da amígdala [...]” (TERZAGGHI, citado
por GUARRIDO, 2010, p. 28).
Na década de 1990 e no início do século XXI, ressalta-se uma apropriação do discurso
médico-psicológico no cotidiano escolar. “No lugar de uma autoridade familiar, um conjunto
de especialidades se consolidou como capaz de orientar a educação das crianças.”
(GUARRIDO, 2010, p.36). A aprendizagem é fruto do bom funcionamento do organismo e
caso não ocorra é porque existe um déficit neurológico. (GUARRIDO, 2010.)
A educação passa a ser atingida por este processo denominado medicalização, ou seja, a
concepção de que as crianças não obtêm sucesso escolar em função de possuírem distúrbios
de aprendizagem, como a dislexia e transtornos de déficit de atenção e hiperatividade
(TDAH). A medicalização é um processo que diz respeito à redução de questões de natureza
social a um problema de saúde. “Medicalizar significa definir, em termos médicos, problemas
sociais e buscar sua origem na biologia.” (ILLICH, 1975 citado por MOYSÉS; GUARRIDO,
2010, p. 150).
Segundo Souza (2010) a patologização de crianças e adolescentes em idade escolar
como explicação da não aprendizagem tem movimentado a indústria farmacêutica que vende
milhares de medicamentos para crianças diagnosticadas com vários transtornos todos os anos.
Este artifício tem sido aceito e defendido por várias instâncias públicas como um direito da
criança de ser diagnosticada e medicada,
Esse argumento vem ganhando os espaços legislativos de grande parte
de cidades e estados brasileiros por meio de inúmeros projetos de lei
que visam criar serviços sejam nas secretarias de Educação, seja na
secretaria de Saúde, para atender as crianças com problemas escolares.
(p.64)
A naturalização da medicalização coopera para a precarização cada vez maior da
educação. Para Souza (2010),
Há um retrocesso visível no campo educacional ao transformarmos
em patologia algo que é produto das dificuldades vividas por um
sistema escolar que não consegue dar conta de suas finalidades.
Sistema este fruto de políticas que durante décadas depauperaram a
escola pública e dificultaram que desempenhasse seus papeis sociais e
políticos. (p.65)
159
O processo de medicalização implica em continuar afirmando que a culpa do fracasso
escolar está na criança, porém de forma mais moderna com o alvará da ciência, o que torna
mais difícil desmistificá-lo. A medicalização está totalmente imbricada no cotidiano escolar.
Na contramão do que têm acontecido, os atuais pesquisadores na área da psicologia
escolar acreditam que o trabalho do psicólogo deve trabalhar a nível institucional, ou seja, “o
psicólogo ao atuar no campo educacional e escolar envolverá os diversos protagonistas da
escola [...]” (SOUZA; CUNHA, 2010, p. 226). Dar voz e espaço para os demais atores
escolares, para que também possam refletir sobre suas práticas.
A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO COM ÊNFASE NA PSICOLOGIA ESCOLAR
CRÍTICA
Envolver os protagonistas da escola, os atores escolares na atuação com a queixa
escolar, é um trabalho árduo, pois implica em colocar luz sobre os problemas institucionais.
Machado (2003) coloca que a presença do psicólogo na escola gera nos educadores
expectativas de que terão respostas para o não aprender. Para a autora, este é o primeiro ponto
a ser trabalhado: “reforça-se a necessidade de estabelecermos estratégias que possam dar
visibilidade às tensões do cotidiano” (p.65).
Beatriz de Paula Souza (2007) aponta como estratégia colher e problematizar as versões
de cada participante da queixa (pois o aluno não é o único envolvido). Machado (2003)
também cita a necessidade de se conversar com os professores apontando as contradições dos
encaminhamentos produzidos. É preciso, segundo a autora “intervir nas produções cotidianas,
criando práticas, acontecimentos que permitissem movimentar aquilo que estava cristalizado,
produzindo diferenciações” (p.71). Olhar para o potencial e não para a falta. (SARAIVA,
2007).
Diante do que foi exposto, Propusemo-nos a conhecer em que nível de atuação o
psicólogo escolar em Porto Velo/RO está trabalhando.
OBJETIVOS
O objetivo principal da pesquisa foi compreender as estratégias de enfrentamento do
fracasso escolar utilizadas pelo psicólogo escolar, bem como suas crenças e valores acerca da
queixa escolar e dos problemas de aprendizagem. Além disso, Investigar como acontecem os
160
processos de encaminhamentos de alunos com queixa escolar, analisando a presença ou não
do processo de medicalização na atuação do psicólogo.
MÉTODO
Foram realizadas entrevistas semi-estruturadas, gravadas em áudio (LÜDKE; ANDRÉ,
1986) com dez psicólogos escolares, dois lotados na Secretaria Municipal de Educação
(SEMED) e oito lotados na Secretaria Estadual de Educação (SEDUC). A pesquisa é de
caráter qualitativo e trata-se de um estudo de caso, pois se dedica a compreender um
fenômeno em especial, neste caso, a atuação do psicólogo frente à queixa escolar e os
processos de medicalização na educação (CHIZZOTTI, 2006; YIN, 2005).
Para análise dos dados foram construídas categorias descritivas por meio da
impregnação de conteúdo, buscando o material manifesto e o latente, presentes nas
mensagens implícitas ou contraditórias, ou nos temas silenciados (LÜDKE; ANDRÉ, 1986).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Como citado anteriormente, para a realização dessa pesquisa foram entrevistados dez
psicólogos que atuam nas secretarias de educação: duas lotadas na SEMED e oito lotados na
SEDUC, identificados como Psi 01; Psi 02; Psi 03; Psi 04; Psi 05; Psi 06; Psi 07; Psi 08; Psi
09 e Psi 10.
Para compreender os dados, dividimos as respostas das entrevistadas em categorias: a)
Concepções sobre problemas de aprendizagem e queixa escolar; b) procedimentos de
atendimento e encaminhamento; c) instrumento de avaliação e compreensão da queixa escolar
e d) a medicalização no cotidiano do psicólogo escolar.
Em relação às concepções que os entrevistados têm sobre o motivo que leva a
dificuldade de aprendizagem, Psi 01, Psi 02, Psi 04, Psi 06 e Psi 10 concordam que existem
vários fatores para explicar os problemas de aprendizagem, porém Psi 01 e Psi 02 colocam
maior ênfase na família ou em problemas físicos. Psi 06 dá maior ênfase na falta de reforço
escolar e da condição social em que a criança se insere e a falta de acompanhamento dos pais.
Psi 05 e Psi 07 acreditam que não exista dificuldade de aprendizagem e sim varáveis que
161
interferem no processo de escolarização. Psi 10 e Psi 04 colocam que o motivo principal é a
metodologia da escola, e a dificuldade da formação básica.
Quanto às formas de atendimento aos casos de queixa escolar recebidos pelos
colaboradores, Psi 01; Psi 02 e Psi 09 basicamente atuam realizando encaminhamentos de
aluno aos especialistas que consideram competentes para resolver o problema, ou aos pais. Psi
06 realiza um atendimento individualizado com o aluno. Psi 04, Psi 10 e Psi 05 trabalham a
queixa escolar com os demais atores escolares. A forma de atendimento de Psi 04 e Psi 10 são
realizadas diretamente com os professores da escola, através da socialização dos problemas.
Sobre a avaliação dos encaminhamentos recebidos, Psi 01, Psi 06 e Psi 08 afirmam não
utilizar nenhum instrumento psicológico na avaliação diagnóstica do aluno, porém utilizam a
anamnese, que consiste numa entrevista que investiga temas como: o nascimento da criança
(como foi o parto); doenças que teve ou problemas de saúde na família; o tempo que levou
para se desenvolver, etc. Psi 04 e Psi 07 utilizam para avaliação alguns testes psicológicos de
caráter projetivo, porém, Psi 07 também realiza a avaliação através de observação do aluno no
cotidiano escolar, assim como Psi 10.
A cerca do processo de medicalização dentro da escola, apenas Psi 05 e Psi 07
apresentaram um discurso crítico em relação a esse fenômeno. Os demais ou não se
posicionaram, ou não concebem a medicalização como um fenômeno social que busca
justificar o fracasso escolar como algo de ordem orgânica e individual. O que implica dizer
que o fenômeno da medicalização está impregnado no contexto escolar, embora apenas uma
das entrevistadas tenha relatado conhecer casos de alunos sendo medicados em decorrência da
dificuldade de aprendizagem.
Ao fazer um balanço, é verificável que Psi 01, Psi 02, Psi 06, Psi 08 e Psi 09 ainda
possuem uma atuação que ainda trabalha a dificuldade de aprendizagem como
responsabilidade apenas do aluno, o que as leva a atuar apenas por meio de encaminhamentos
desse aluno para outros especialistas, ou dando orientações aos pais, ou ainda, atendê-los sob
uma perspectiva clínica, individualizada.
Ao contrário, vemos que Psi 04, Psi 05, Psi 07 e Psi 10 têm uma atuação diferente. Os
mesmos realizam grupos com professores e orientadores. Ao dar voz aos demais atores
escolares, esses psicólogos propiciam um espaço de reflexão da prática, de forma que se
vejam como ativos no processo de escolarização, até mesmo na produção do fracasso escolar.
162
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O berço da Psicologia no Brasil são as escolas. A Psicologia foi inserida dentro da
educação, a princípio, com o objetivo de avaliar, medir, encaminhar e diagnosticar os motivos
do não aprender. Essa atuação retrógada já vem sendo criticada há muito tempo, ao passo que
vão se construindo novas formas de atuação, que fuja aos padrões clínicos e individualizantes.
Uma atuação crítica, que considere o contexto escolar como importante no processo ensinoaprendizagem; que trabalhe também os demais atores escolares que estão envolvidos direta e
indiretamente na educação.
Podemos apontar que dos dez psicólogos entrevistados para a realização dessa pesquisa
quatro se aproximaram daquilo que chamamos de atuação crítica no período que trabalhavam
nas escolas. Atualmente os psicólogos estão passando por uma redefinição da sua atuação
como psicólogo educacional, como determina a lei 420/2008 vivenciando uma crise de
identidade profissional até mesmo aqueles que tinham uma atuação diferenciada
anteriormente, uma vez que não foi respeitado o desejo deles de permanecerem na escola.
Tal situação nos leva a pensar a necessidade de estar em constante reflexão e
atualização a cerca da atividade profissional, independente da área. Talvez, o Curso de
atualização em Psicologia Escolar - mais uma parceria da universidade com a SEDUC - esteja
contribuindo para modificar, aos poucos essa realidade. Esse curso tem sido importante para
proporcionar a reflexão sobre o sistema educacional. Segundo Souza (2009):
O conhecimento psicológico no campo da educação precisa ser
constantemente construído, revisitado, criticado, superado, visando dar
respostas e interferir, o mais que pudermos nos rumos das dimensões de
formação do sujeito humano. (p.182)
Dessa forma, acreditamos que ainda há muito a ser discutido para que o psicólogo
educacional de Porto Velho tenha uma atuação crítica comprometida com a educação e a
sociedade.
AGRADECIMENTOS
Aos colaboradores da pesquisa, que gentilmente cederam seu tempo que tornou
possível a realização da pesquisa.
Ao CNPq, a UNIR e ao PIBIC pelo apoio através da bolsa de iniciação científica e
pela oportunidade de fazer ciência.
163
Às Professoras Dra. Iracema Neno Cecilio Tada e Dra. Vanessa Aparecida Alves de
Lima pela orientação, apoio e suporte no desenvolvimento da pesquisa e no esclarecimento
das dúvidas bem como por serem profundamente comprometidas com a formação acadêmica
e ética de seus alunos.
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- Fundação Universidade Federal de Rondônia, Rolim de Moura, Rondônia.
165
O (NÃO) TEMPO NAS DOBRAS DO (IR) REAL
Gabriel Pereira de Melo34
Heloísa Helena Siqueira Correia35
RESUMO
O presente texto é um resumo do relatório de pesquisa que foi desenvolvida pelo aluno. O
texto perpassa pela teoria platônica do conhecimento, tendo esta, servido de base para a
análise do conto “O Imortal” do escritor Argentino Jorge Luis Borges. Além, de ter sido feita
a análise com a influência da literatura neofantástica, para concretizar o estudo sobre a
negação do tempo presente no conto.
Palavras-chave: Borges. Filosofia Platônica. Neofantástico.
INTRODUÇÃO
A filosofia tem colaborado com diversas áreas do conhecimento e possibilita diversos
estudos comparativos no âmbito da literatura. Na obra de Jorge Luís Borges - escritor,
contista e ensaísta argentino -, percebemos grande influência da filosofia, especialmente a
platônica. O projeto “Fantástico: Intersecções Críticas” possibilita, entre outros, o estudo
comparativo entre a literatura fantástica borgeana e determinados textos clássicos da filosofia.
Com o sub-projeto “O (não) tempo nas dobras do (ir) real” se pode investigar mais
precisamente como se dá essa relação entre o fantástico e a filosofia de Platão. Nesse sentido,
os objetivos gerais da pesquisa são os seguintes:
- Realizar leitura dos contos de Jorge Luis Borges identificando as concepções de
tempo, inclusive a noção de negação do tempo, com as quais o escritor argentino tece suas
ficções desconstrutoras de nosso mundo histórico e cotidiano;
- Estudar a mescla de ensaio e ficção levada a cabo por Jorge Luis Borges em textos
diversos.
Mais especificamente nos propomos a:
- Promover diálogo entre as reflexões metalingüísticas presentes na obra borgeana e as
concepções de fantástico trabalhadas pela teoria e pela crítica;
34
Aluno do 6° período do curso de Filosofia na Fundação Universidade Federal de Rondônia. Pesquisador
voluntário do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação Científica – PIBIC, e integrante do Grupo de
Pesquisa “Fantástico: Intersecções Críticas”.
35
Profa. Dra e Orientadora da pesquisa.
166
- Elencar e ensaiar hipóteses interpretativas, levantando questões para discussão e
futuras pesquisas.
O trabalho comparativo nos permitiu analisar como a narrativa borgeana está
entrelaçada com a filosofia de Platão. O mundo sensível descrito por Platão se encontra
presente no conto analisado - “O imortal” -, e a saída desse mundo em direção ao mundo
inteligível, que traria o conhecimento pleno e verdadeiro, não acontece. No conto borgeano
que estamos estudando o mundo sensível é sentido em sua forma mais latente.
A TEORIA DO CONHECIMENTO PLATÔNICA A PARTIR DA ALEGORIA DA
CAVERNA
A teoria das ideias de Platão explica o modo pelo qual o indivíduo adquire o
conhecimento verdadeiro das ideias Verdadeiras, Eternas, Perfeitas, Imóveis e Imutáveis,
origem e modelo de todas as coisas existentes no mundo sensível. Platão em sua obra A
República tenta organizar a polis para receber o representante mais indicado para governá-la:
o Filósofo. A república é um dos textos mais importantes da filosofia platônica, pois além de
trazer ao leitor a concepção platônica de pólis, demonstra seu pensamento por meio de
diálogos e alegorias, o que torna a compreensão uma experiência também estética.
Um dos mitos mais importantes (ou senão o mais conhecido) é a Alegoria da Caverna,
exposto no Livro VII de A República. Essa alegoria narra a história de um grupo de homens
aprisionados em uma caverna desde o nascimento, eles estão de tal forma amarrados, que não
podem olhar uns para os outros e nem se moverem. O grupo, apenas, podia ver imagens,
como sombras, que se projetavam na parede do fundo da caverna, com a ajuda da luz de uma
fogueira.
De acordo com o mito, um homem consegue se libertar da caverna. O prisioneiro que
se liberta caminha cambaleante para fora da caverna e vê a luz do sol, nesse momento começa
a olhar pela primeira vez a realidade de fora da caverna, e o faz com dificuldade, uma vez que
sua visão estava acostumada à escuridão da caverna. O texto do mito explica como deve ser a
transição:
Precisava de se habituar, julgo eu, se quisesse ver o mundo superior. Em
primeiro lugar, olharia mais facilmente para as sombras, depois disso, para
as imagens dos homens e dos outros objectos, reflectidas na água, e, por
último, para os próprios objectos. A partir de então, seria capaz de
contemplar a o que há no céu, e o próprio céu, durante a noite, olhando para
a luz das estrelas e da Lua, mais facilmente do que se fosse o Sol e o seu
167
brilho de dia. [...] Finalmente, julgo eu, seria capaz de olhar para o Sol e de o
contemplar, não já a sua imagem na água ou em qualquer sítio, mas a ele
mesmo, no seu lugar. [...] Depois já compreenderia, acerca do Sol, que é ele
que causa as estações e os anos e que tudo dirige no mundo visível, e que é o
responsável por tudo aquilo de que eles viam arremedo.
A Caverna simboliza o mundo sensível, este mundo em que vivemos, e a saída do
prisioneiro simboliza a saída do mundo da ignorância para o mundo do conhecimento,
inteligível. Ao sair, não conseguirá ver, pois o Sol (Idéia de Bem) ofuscará seus olhos até que
eles se acostumem à luz. Quando cessar o momento de ofuscamento, começará a contemplar
o que é real (do qual antes só via as sombras), chegando assim ao conhecimento “verdadeiro”.
“Finalmente, julgo eu, seria capaz de olha para o Sol e de o contemplar, não já a sua imagem
na água ou em qualquer sítio, mas ele mesmo, no seu lugar” (PLATÃO, 2010, p. 317, §516b).
Ou seja, só o Sol mostrará a realidade como ela é, libertando os olhos das aparências
imperfeitas.
O ato de sair da caverna se dá de forma ascendente. O prisioneiro ao caminhar para a
saída da caverna, concomitantemente, caminha para a superação do mundo das sombras, das
ilusões, das opiniões. “Em primeiro lugar, olharia mais facilmente para as sombras, depois
disso, para as imagens dos homens e dos outros objectos, reflectidas na água, e, por último,
para os próprios objectos (PLATÃO, 2010, p. 315-319, 514a - 517a)”. Esse tempo que passa a
contemplar as sombras das coisas ao sair da caverna é o momento em que está em processo de
elevação de grau de conhecimento. Após esse estágio de eikasía atinge o grau da pístis e
dóxa, ou seja, começa a produzir especulações sobre esse “novo” mundo que está a ver, e
parte para a crença de que esse mundo, de fato, existe.
O grau da diánoia que necessita dos métodos do raciocínio, do pensamento intelectual
e da dialética para alcançar o grau da nóesis ou espistéme, precisa do auxílio da educação, o
que, na alegoria está condensado na visão direta do Sol (entendido como Bem). Para Chauí
“[...] a dialética como movimento ascendente de libertação, [...] nos libera da cegueira para
vermos a luz das idéias” (PLATÃO, 2010, p.196), e foi o que aconteceu com o liberto, a
cegueira caiu ao chão provocando o olhar para a realidade. Esse movimento é irreversível,
pois ao contemplar “a luz das idéias” não poderá virar as costas e “de repente” esquecer o que
apreendeu dessa realidade. Mesmo que consiga voltar à caverna (mundo sensível), não será a
mesma pessoa de antes, pois essa tentativa já é parte da dialética descendente.
Na relação entre o mundo sensível e o inteligível encontra-se a importância
fundamental da dialética platônica (CHAUÍ, 1994, p. 187). Para sintetizar o significado da
alegoria da caverna, lembramos Chauí (1994, p. 195) quando afirma que:
168
A réstia de luz que projeta as sombras na parede é um reflexo da luz
verdadeira (as idéias) sobre o mundo sensível. Somos os prisioneiros. As
sombras são as coisas sensíveis que tomamos pelas verdadeiras. Os grilhões
são nossos preconceitos, nossa confiança em nossos sentidos e opiniões. O
instrumento que quebra os grilhões e faz a escalada do muro é a dialética. O
prisioneiro curioso que escapa é o filósofo. A luz que ele vê é a luz plena do
Ser, isto é, o Bem, que ilumina o mundo inteligível como o Sol ilumina o
mundo sensível. O retorno à caverna para convidar os outros a sair dela é o
diálogo filosófico (CHAUÍ, 1994, p. 195).
A alegoria da Caverna platônica, rica em significados, explica a maior parte da teoria
platônica sobre o processo educativo que o homem deve fazer para alcançar o conhecimento.
Gradativamente o homem passa de um nível de conhecimento para o outro, até que, se for
capaz, poder ver a luz do Sol, ou o resplandecer do verdadeiro conhecimento.
A INFLUÊNCIA DA NARRATIVA NEOFANTÁSTICA NA OBRA DE BORGES
Para fundamentar a discussão acerca da literatura fantástica, o estudioso argentino
Jayme Alazraki (2001), em seu texto ¿Qué es lo neofantástico?, propõe uma espécie de
derivação do fantástico como gênero, a saber, o neo-fantástico, para explicar as novas
relações do sobrenatural com a realidade. Segundo o crítico, a denominação proposta atende
ás exigências de tratamento do fantástico moderno e contemporâneo, e de modo especial ao
fantástico que se pode encontrar nas obras de Jorge Luis Borges e Júlio Cortázar. Aquela
concepção de fantástico pensado como gênero existente nos séculos XVIII e XIX, e
sistematicamente trabalhado pelo estudioso húngaro Tzvetan Todorov (2003), não era
suficiente para pensar o modo como esses autores, em especial Borges, lançava mão da
filosofia e das escolas da metafísica em suas obras de ficção, daí a nova terminologia.
É preciso ter em mente que ao cunhar essa nova terminologia, Alazraki tinha como
contexto o pós-guerra, assim afirma: “(...) el ralato neofantástico está apuntalado por los
efectos de la primera guerra mundial, por los movimientos de vanguardia, por Freud y el
psicoanálisis, por el surrealismo y el existencialismo, entre otros factores” (ALAZRAKI,
2001, p. 280). Nesse sentido, era preciso inovar, criar novos modos fantásticos para poder
surpreender o leitor afetado pelos movimentos surrealista, existencialista e psicanalítico.
Eis que aparece a possibilidade do discurso fantástico como forma de insinuação do
sobrenatural na realidade. A realidade humana passa a poder ser vista como uma ponte para o
território desconhecido do sobrenatural. A fissura que persiste em existir na realidade humana
é o lugar das angústias do ser que se vê diante de muitas respostas científicas e não sabe como
169
fazer uso delas. É nessa fissura que Borges irá trabalhar para escrever suas narrativas
fantásticas. Entre as fendas do real surgirá a narrativa que se aproveitará de perguntas
filosóficas, entre elas a que pergunta como o tempo age na fissura.
Ao lançar mão desses aparatos temporais em sua narrativa, Borges inaugura seu modo
particular de fazer literatura. A partir da filosofia, cria metáforas temporais que se entrelaçam
com seu fazer literário, transformando a sua escrita em um emaranhado filosófico que
rompe/racha os muros das explicações científicas. Ao fazer isso, pretende não só sugerir a
literatura como uma forma de conhecimento, mas pretende estabelecer um conhecimento
inteligível de outras realidades não alcançadas pelo intelecto humano. Não é por menos que
muitos dos textos críticos sobre a sua obra operam uma revisão filosófica dos conceitos de
tempo, causalidade e realidade.
O fantástico, então, provém do momento de espanto diante de algo desconhecido e,
por isso, questionável ou inexplicável? Borges cria uma literatura vinculada à filosofia, isso
torna ainda mais difícil a compreensão do mundo em meio a um labirinto temporal? Assim
afirma Alazraki:
Era necessario definir el relieve fantástico de toda doctrina filosófica para
poder entrever las posibilidades filosóficas del género fantástico. Borges
puede no ser original en la primera de estas tareas, pero ningún escritor ha
capitalizado como él las implicaciones y posibilidades que emergen de la
primera de las dos propociones respecto a la segunda (ALAZRAKI, 1987, p.
190).
Borges afimou no conto “Tlön, Uqbar, Orbis Tertius” que os metafísicos de Tlön “julgam
que a metafísica é um ramo da literatura fantástica” (2000, p. 481). Isso nos permite
interpretar que a metafísica, por ser uma área da filosofia que não se limita às investigações
do mundo físico, é a matéria mais subjetiva e mais sobrenatural que se encontra nas escolas
filosóficas, o que permite que o ser humano possa se aventurar em experiências fantásticas
por meio das especulações metafísicas. “Ahí está la fuerza de Borges. En saber
proporcionárselos: los temas filosóficos más esquemáticos y yertos se transforman en
animados relatos de sucesos, en vívidas descripciones de mundo fantásticos” (NUÑO, 1986,
p. 16). O conto “O Imortal”, presente no livro O Aleph de 1949, é exemplo de narrativa que
explora fantasticamente argumentos e problemas metafísicos.
170
“O IMORTAL: O MUNDO SENSÍVEL VENCE A DIALÉTICA”
O conto narra a história de um tribuno romano que em uma noite de insônia caminha
pelos jardins de Tebas. Ele se depara com um homem vindo a cavalo, já muito debilitado pelo
tempo de viagem, que lhe fala sobre a existência de um rio que concede a imortalidade para
quem bebe de suas águas e sobre a Cidade dos Imortais. Antes que a noite termine o viajante
morre, deixando apenas a direção em que, possivelmente, se encontram o rio e a cidade.
O tribuno, com desejo de conhecer tal rio, determina a si mesmo a tarefa de encontrálo. Para essa busca consegue o apoio, cedido por superiores, de soldados e de mercenários.
Começa a viagem, e após várias mortes e deserções dos soldados o tribuno se vê sozinho e
sedento. Finalmente, ao chegar a uma montanha consegue ver a suposta Cidade dos Imortais.
Apressado, desce a montanha e bebe das águas escuras que encontra, tornando-se imortal.
Vale retomar as palavras do narrador: “A urgência da sede me fez temerário. Considerei que
estava a uns trinta pés das areia: de olhos fechados, com as mãos atadas às costas, atirei-me
montanha abaixo. Afundei o rosto ensangüentado na água escura” (BORGES, 2000, p. 596).
De modo semelhante e paralelamente pergunta-se: é possível encontrar e beber as
águas do rio que concedem a imortalidade? Segundo a narrativa borgeana, o tribuno,
personagem protagonista de “O Imortal”, realiza tal encontro, e também consegue alcançar a
Cidade dos Imortais.
Ao chegar às montanhas que circundam a cidade que, aparentemente, é a Cidade dos
Imortais, a personagem se depara com uma água escura que bebe “(...) como a beberam os
animais” (BORGES, 2000, p. 596). Fatigado se entrega aos delírios do sono. Quando acorda
sente que não é mais o mesmo de quando ali chegara:
Não sei quantos dias e noites rodopiaram sobre mim. Dolorido, incapaz de
recuperar o abrigo das cavernas, despido na ignorada areia, deixei que a lua e
o sol brincassem com meu aziago destino. Os trogloditas, infantis na
barbárie, não me ajudaram a sobreviver ou a morrer. Em vão, roguei-lhes
que me dessem a morte. Um dia, com o fio de um pedernal, parti minhas
ligaduras. Em outro, levantei-me e pude mendigar ou roubar - eu, Marco
Flamínio Rufo, tribuno militar de uma das legiões de Roma - minha primeira
detestada ração de carne de serpente (BORGES, 2000, p. 596).
Depois de comer e conseguir pôr-se em pé, caminha para conhecer a cidade, no que é
seguido pelos trogloditas. Engana-se ao supor que a Cidade é próxima: “(...) ofuscado pela
pedreiras; ofuscado pela grandeza da Cidade, eu a supusera próxima” (BORGES, 2000, p.
596-97), no entanto a personagem chega aos muros da Cidade apenas à meia-noite, o que lhe
171
faz fechar os olhos para esperar o amanhecer. O dia não lhe traz mais êxito, apesar de sua
busca intensa não encontra sequer uma porta nos muros. A passagem será identificada de
outro modo: “A força do dia fez com que me refugiasse numa caverna; no fundo havia um
poço, no poço uma escada que se abismava até a treva inferior” (BORGES, 2000, p. 597).
Dando continuidade à relação com o Mito da Caverna, percebe-se que a crescente
possibilidade de olhar diretamente para o sol - Idéia de Bem - presente na narrativa platônica,
não possui paralelo no conto borgeano. A adaptação necessária ao homem, tal como expõe
Platão, é seqüencial; obriga o homem liberto dos grilhões que o mantinham na caverna a
acostumar sua visão primeiramente dirigindo seu olhar para as sombras dos objetos - dóxa -, e
seus reflexos na água - eikasía-, para em seguida, olhar diretamente para os próprios objetos e
relacioná-los - dianóia, e então, e só então, vislumbrar diretamente a luz do sol - nóesis. Qual
é, diferentemente, o caminho da personagem borgeana?
Nosso tribuno militar romano, que se apresenta como Marco Flamínio Rufo, às
avessas do homem que se liberta da caverna no texto platônico, continua seu caminho e
descobertas no subterrâneo da caverna, no mundo com pouca luminosidade:
Desci; por um caos de sórdidas galerias cheguei a uma vasta câmara circular,
a muito custo visível. Havia nove portas naquele porão; oito davam para um
labirinto que falazmente desembocava na mesma câmara circular, igual à
primeira. Ignoro o número total de câmaras; minha desventura e minha
ansiedade as multiplicaram. O silêncio era hostil e quase perfeito; outro
rumor não havia nessas profundas redes de pedra além de um vento
subterrâneo,cuja causa não descobri; sem ruído, perdiam-se entre as gretas
fios de água enferrujada (BORGES, 2000, p. 597).
O mundo sensível aprofundado e maximizado é um mundo de caos, é o lugar onde
reina a completa ignorância sobre as coisas idealizadas (verdadeiras). A câmara circular
representa a capacidade de conhecimento do tribuno, entretanto, as portas que deveriam leválo para outros caminhos do conhecimento apenas o levam a labirintos que desembocam na
mesma sala circular.
O tribuno parece incapaz de superar os graus de conhecimento para alcançar a luz do
Bem. Por medo da luz, refugiara-se no mundo ao qual sempre esteve habituado. Sua vida se
resumiria a contentar-se com essa realidade? “Habituei-me com horror a esse duvidoso
mundo; considerei inacreditável que pudesse existir outra coisa além de porões providos de
nove portas e além de longos porões que se bifurcavam” (BORGES, 2000, p. 597).
Após se resignar à nova realidade do mundo de sombras, de trevas do conhecimento,
de labirintos sensíveis e escuros, lhe é concedido ascender à realidade que o libertará desse
172
mundo sombrio em que entrou. A possibilidade de ascensão surge na narrativa do seguinte
modo:
No fundo de um corredor, um não previsto muro me barrou os passos, uma
remota luz caiu sobre mim. Ergui os ofuscados olhos: no vertiginoso, no
mais alto, vi um círculo de céu tão azul que chegou a parecer-me de púrpura.
Alguns degraus de metal escalavam o muro. O cansaço me relaxava, mas
subi, só me detendo às vezes para pesadamente soluçar de felicidade. Fui
divisando capitéis e astrágalos, frontões triangulares e abóbadas, confusas
pompas do granito e de mármore. Foi-me assim concedido ascender da cega
região de negros labirintos entretecidos à resplandecente Cidade (BORGES,
2000, p. 597).
A narrativa acima parece demonstrar que o tribuno está preparado para ver a Luz do
verdadeiro conhecimento - na narrativa borgeana a expressão usada é “Foi me concedido
ascender (...) à resplandecente cidade”. Agora, ao que tudo indica, o tribuno será capaz de
admirar toda a beleza do Bem (origem de tudo que existe no mundo sensível).
Após viver por tantos séculos e escrever obras que passaram de geração para geração,
procurar ser mortal novamente talvez tenha sido a única solução, por ele encontrada,
racionalizada e vivida. Após muito andar encontra, finalmente, a superação de sua condição
de imortal:
Nos arredores, vi um caudal de água clara; provei-a, levado pelo costume.
Ao subir à margem, uma árvore espinhosa me lacerou o dorso da mão. A
inusitada dor me pareceu muito viva. Incrédulo, silencioso e feliz,
contemplei a preciosa formação de uma lenta gota de sangue. De novo sou
mortal, repeti a mim mesmo, de novo me pareço com todos os homens.
Nessa noite, dormi até o amanhecer (BORGES, 2000, p. 604).
A experiência de imortalidade para o tribuno não era a esperada por ele. E o que deveria
esperar da imortalidade? A sua vida antes da eternidade, possuía sentido e anseios de viver; o
contrário da vida na cidade dos imortais, em que a maior parte do tempo se dedicava ao ócio.
O autor do conto inverte o sentido do mito platônico para explicar que o sentido da realidade
humana está no meio da dóxa e da eikasía. O homem também é um ser material que participa
da realidade sensível. Utilizar os meios de conhecimentos metafísicos como a nóesis está
além da condição humana, por isso o desejo e a busca por apagar sua imortalidade.
173
O RETORNO À MORTALIDADE
A imortalidade adquirida pelo tribuno não passa de uma imortalidade corporal, física,
que amplia a sua visão sobre o que já conhece e não sobre os mistérios do mundo ou das suas
perguntas mais remotas. Seu corpo deixa de envelhecer, mas seus pensamentos continuam
envelhecendo conforme o passa tempo. É por meio dessa imortalidade que a negação do
tempo é feita. E nisso até o nome do conto já propõe essa negação do tempo: O Imortal.
Com o tempo ignorado, o tribuno não pode mais sentir a emoções de uma pessoa
normal, assim com o era antes. O impulso de beber da água imortalizante e de procurá-la foi
feita sem planejamento. As conseqüências desse ato estão vinculadas mais com o plano físico
do que com o plano espiritual, ou inteligível como proporia Platão. A adaptação é necessária
para que o tribuno possa viver como e com os imortais da cidade dos Imortais:
Ao propor a extinção do tempo, Borges anula a morte, eternizando o homem.
Sem a noção de tempo, todas as nossas concepções sobre a realidade, sobre a
personalidade individual, sobre a literatura e a própria morte alteram-se,
abalam-se. A repetição dos gestos do homem cria a eternidade (NOBREGA,
1992, p. 70).
Mesmo quando Borges tenta eternizar o homem por meio da sua negação temporal,
não o consegue sem ocorrer alguns danos à identidade humana, isto é, o homem não é mais
aquele que possuí sentimentos, originalidade e excitação perante o novo. A noção de tempo
que o tribuno possuía antes de se tornar imortal agora é ignorada:
Não sei quantos dias e noites rodopiaram sobre mim. [...] A ânsia de ver os
Imortais, de tocar a sobre-humana Cidade, quase me impedia de dormir.
Como se penetrassem em meu propósito, não dormiam também os
trogloditas: a princípio, inferi que me vigiavam; depois, que se haviam
contagiado por minha inquietude, como poderiam contagiar-se os cães
(BORGES, 2000, p. 596).
Como se pode notar no fragmento acima, os trogloditas estavam agitados devido à
presença estrangeira do tribuno. O tribuno, de certo modo, é a novidade da vida imortal, pois
traz consigo o espectro do que foi um mundo onde o tempo é contínuo e cheio de
significados. Agora ele estava nessa aldeia estranha, nesse paraíso da eternidade dos bárbaros:
“Ignoro o tempo que tive de caminhar sob a terra; sei que certa vez confundi, na mesma
nostalgia, a atroz aldeia dos bárbaros e minha cidade natal, entre videiras” (BORGES, 2000,
p. 597).
174
Após caminhar pela cidade procurando conhecê-la, chega à conclusão de que a cidade
é perigosa apenas por existir:
‘Esta Cidade’, pensei, ‘é tão horrível que sua mera existência e perduração,
embora no centro de um deserto secreto, contamina o passado e o futuro e,
de algum modo, compromete os astros. Enquanto perdurar, ninguém no
mundo poderá ser valoroso ou feliz’ (BORGES, 2000, p. 598).
Os trogloditas, por sua vez, nada desconfiavam e a conclusão do tribuno não é
partilhada por eles: “Absortos, quase não percebiam o mundo físico” (BORGES, 2000, p.
601). Mundo físico de que a personagem ainda se lembrava muito bem, pois era o lugar onde
sua existência fazia sentido, em que era considerado uma pessoa comum, participante de uma
vida regida por uma sociedade favorável aos costumes físicos finitos.
Depois de o tribuno ter alcançado a imortalidade e tê-la experimentado da maneira
mais visível possível, e observando que não era o que esperava, entra em um outro processo,
que se pode chamar de angústia do descobrimento da verdade. Em decorrência disso, utiliza o
recurso psicológico de autodefesa para se livrar desse mundo que conquistou. Impõe a si
esquecer a sua condição:
Nada mais posso lembrar. Esse esquecimento, agora insuperável, foi talvez
voluntário; talvez as circunstâncias de minha evasão tenham sido tão
ingratas que, em algum dia não menos esquecido também, jurei esquecê-las
(BORGES, 2000, p. 599).
Assim o tempo foi passando e os anseios de retorno àquela realidade que há
muito vivera se torna mais latente:
Pensei em um mundo sem memória, sem tempo; considerei a possibilidade
de uma linguagem que ignorasse os substantivos, uma linguagem de verbos
impessoais ou de indeclináveis epítetos. Assim foram morrendo os dias e
com os dias os anos, mas algo parecido com a felicidade ocorreu uma
manhã. Choveu, com lentidão poderosa (BORGES, 2000, p. 600).
Após uma discussão com um dos trogloditas, a personagem parte à procura de todos
os rios do mundo para que possa libertar-se da tão famigerada imortalidade física: “‘Existe
um rio cujas águas dão a imortalidade; em alguma região haverá outro rio cujas águas a
apaguem’. O número de rios não é infinito; um viajante imortal que percorra o mundo
acabará, algum dia, tendo bebido de todos” (BORGES, 2000, p. 603).
175
Os destinos dos seres imortais não se parecem com a ideia que se tem sobre esses
seres, que poderiam possuir uma clarividência maior sobre as questões do mundo sensível e
da inteligibilidade do universo. Essa visão distorcida sobre o papel dos imortais era encarnada
pelo próprio tribuno, pois após ter-se tornado imortal não partilha da mesma ideia que fazia de
tal condição. Mas que condição é essa que o faz percorrer o mundo à procura de uma possível
“cura” para o seu “mal”? O que se pode afirmar é que cada ser humano possui suas próprias
angústias e seus próprios temores sobre a vida, e cabe a cada pessoa escolher a maneira mais
adequada de encarar esses dilemas existenciais. A morte, para quem está vivo, é algo
importante, pois é ela quem dará sentido para a existência da vida. Sem essas potências
antagônicas a realidade humana não faria o menor sentido, seríamos apenas mais um grupo de
seres vivendo por instinto:
A morte (ou sua alusão) torna preciosos e patéticos os homens. Estes
comovem por sua condição de fantasmas; cada ato que executam pode ser o
último; não há rosto que não esteja por dissolver-se como o rosto de um
sonho. Tudo, entre os mortais, tem valor do irrecuperável e do inditoso.
Entre os Imortais, ao contrário, cada ato (e cada pensamento) é o eco de
outros que no passado o antecederam, sem princípio visível, ou fiel presságio
de outros que no futuro o repetirão até a vertigem (BORGES, 2000, p. 603).
Após percorrer o mundo todo à procura desse rio des-imortalizante, encontra-o e,
assim, se dá o fim da procura descendente em direção à realidade humana:
Ao subir à margem, uma árvore espinhosa me lacerou o dorso da mão. A
inusitada dor me pareceu muito viva. Incrédulo, silencioso e feliz contemplei
a preciosa formação de uma lenta gota de sangue. De novo sou mortal, repeti
a mim mesmo, de novo me pareço com todos os homens” (BORGES, 2000,
604).
A literatura fantástica é importante nesse contexto porque proporciona o suporte
teórico-literário para a compreensão do modo como Borges faz uso da filosofia. Isso se
percebe no momento em que o tribuno sai à procura da mortalidade por todos os rios do
mundo, fato que se relaciona com o neofantástico.
Para ele, a literatura fantástica se vale de ficções não para escapar da
realidade cotidiana, mas para expressar o que a literatura realista não
consegue mostrar. É justamente por seu valor de metáfora da realidade, ou
de alegoria da realidade, que a literatura fantástica expressa uma visão mais
complexa do real (MONEGAL, 1987, p. 65).
176
Esse é o estilo de Borges, utiliza a filosofia para alcançar níveis mais altos de
literariedade e suspense, ou mesmo para alcançar uma dimensão mais complexa de
entendimento acerca da realidade:
Para Borges, a literatura fantástica se vale da ficção não para se evadir da
realidade, como acreditam (ou fingem acreditar) seus detratores mais
superficiais, mas para expressar uma visão mais complexa da realidade: uma
visão que não pode se alcançar por meio do realismo crasso que se praticava
na América Latina nos anos 30 e 40. Por isso mesmo, não é difícil encontrar
nas suas ficções esse tema “humano”, subjacente, que segundo seus tratores
estaria ausente por completo (MONEGAL, 1987, p. 74).
Daí o papel da literatura neofantástica: declarar existentes coisas que seriam
impossíveis na realidade. A literatura neofantástica seria o suporte desse acontecimento, não
como um fim, mas como um meio de toda a transrealidade acontecer.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A filosofia de Platão nos possibilitou uma análise mais consistente do conto “O
Imortal” de Jorge Luis Borges. De acordo com a filosofia platônica podemos entender que o
mundo idealizado guarda as Formas reais de tudo o que se vê no mundo físico, sensível. Mas,
temos que ter em mente que Platão elabora a teoria presente na obra A República para
estruturar o plano de sua pólis ideal. De certa forma, ao sistematizar a pólis também estrutura
a vida dos homens que nela vivem, por isso, o uso de todo o processo educativo trazido pelos
graus de conhecimento: eikasía, pístis e dóxa, diánoia, e nóesis ou epistéme.
O conto borgeano nos mostra a incapacidade do ser humano em atingir as Formas,
Essências ou Ideias perfeitas, eternas e verdadeiras. O homem, em sua dimensão material e
sensível, não pode sair desse mundo ao qual está habituado e partir de uma vez por todas para
o mundo desconhecido da Verdade. Ao conseguir a imortalidade do corpo, não consegue a
sabedoria que equilibraria suas vontades humanas.
A personagem, após se tornar imortal e partilhar dessa condição com os outros
imortais, parte em uma jornada a procura do rio que dissolverá a imortalidade do seu corpo;
quer tornar-se humano novamente, envelhecer e, como os outros homens, participar do
processo de conhecimento que só a dimensão histórica do vivido pode proporcionar. De
maneira fantástica, a sua jornada é o caminho de um arrependido, de mais um humano que
não conseguiu deixar a sua antiga vida de lado.
177
Essa análise ainda deixa possibilidades de leitura. A obra de Jorge Luis Borges
nos deixa ver a dimensão do que é a literatura, e sua vinculação à filosofia.
REFERÊNCIAS
ALAZRAKI, Jaime. ¿Qué es lo neofantástico? In: ROAS, David (Org.). Teorías de lo
fantástico. Madrid: Arco/Libros, 2001. p. 265-282.
BORGES, Jorge Luis. Obras Completas de Jorge Luis Borges. São Paulo: Globo, 2000.
CHAUÍ, Marilena de Souza. Introdução à História da Filosofia: dos pré-socráticos a
Aristóteles. São Paulo: Brasiliense, 1994. (Volume I)
PITTRE, Bernard. A República: Platão. 2. ed. [Tradução do Livro: Elza Moreira Marcelina]
Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1996.
PLATÃO. A República. 12. ed. [Tradução Maria Helena da Rocha Pereira]. Lisboa:
Fundação Calouste Gulbenkian, 2010.
MONEGAL, Emir Rodríguez. Borges por Borges. Tradução: Ernani Ssó. Porto Alegre:
L&PM, 1987.
NÓBREGA, M.H. da. O percurso filosófico de Jorge Luis Borges para a negação do
tempo. Dissertação (Mestrado em Comunicação e Semiótica), 164p. Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo. São Paulo, 1992.
TODOROV, Tzvetan. Definição do Fantástico. In: _____. Introdução à literatura
fantástica. Tradução de Maria Clara Correa Castello. São Paulo: Perspectiva, 2003. p. 29- 46.
178
MATEMÁTICA: ESTRATÉGIAS PARA ENSINAR E APRENDER NA EDUCAÇÃO
INFANTIL
Gilcirlene Sacchi Roque36
Profa. Me. Bianca Santos Chisté37
RESUMO
Este texto tem como objetivo apresentar o projeto de pesquisa Matemática: estratégias para
aprender e ensinar na educação infantil, vinculado ao PIBIC, assim como algumas
concepções a respeito do ensino e aprendizagem dessa área de conhecimento. Bem como as
concepções sobre a construção dos conhecimentos matemáticos pela criança e as estratégias e
recursos utilizados pelas professoras no ensino com essa ciência. A matemática esta presente
no dia-a-dia de todos os indivíduos e começa a ser trabalhada de uma forma sistematizada
com as crianças na educação infantil, devendo ser abordada de uma maneira significativa e
prazerosa para que as crianças realmente se envolvam com ela. Assim, as professoras
precisam se apropriar de recursos e estratégias, como o lúdico, que as auxiliem no ensino
dessa ciência e que possibilitem uma aprendizagem significativa e envolvimento da criança
com a matemática. A partir disso, a referida pesquisa busca identificar como se dá a
construção do conhecimento matemático pelas crianças, na concepção de professoras que
atuam na educação infantil, quais são as estratégias e recursos mais utilizados por elas para
ensinar essa ciência e compreender qual a importância do lúdico no ensino e aprendizagem da
matemática. Sendo que, as questões que norteiam essa pesquisa foram respondidas, por meio,
de estudos bibliográficos e também a partir da conversa com as docentes e da observação do
espaço escolar infantil, precisamente a sala de aula.
Palavras-chave: Matemática. Educação Infantil. Ensino e Aprendizagem.
DIALOGANDO SOBRE A MATEMÁTICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL
A matemática é uma ciência que faz parte do cotidiano de todo individuo e está
presente em tudo que se aprende, tanto na escola como fora dela, uma criança mesmo antes de
iniciar sua escolarização já tem contato com os saberes matemáticos, por meio da convivência
com o adulto e com outras crianças. Ela desenvolve seus saberes matemáticos de uma forma
espontânea, conforme vai realizando variedades de relações entre diferentes objetos em
diferentes situações em seu dia-a-dia. No entanto, quando inicia sua escolarização os saberes
matemáticos lhes são apresentados de uma forma sistematizada, por meio de conteúdos
específicos e selecionados.
36
37
Vilhena
Acadêmica de Pedagogia - Universidade Federal de Rondônia – UNIR/Campus de Vilhena
Professora e pesquisadora do Departamento Acadêmico de Ciências da Educação – UNIR/Campus de
179
A educação infantil torna-se então o momento em que as crianças começam a ter
contato com esses conhecimentos matemáticos de forma sistematizada Sendo que a
aprendizagem das crianças nessa fase se dá paulatinamente e principalmente por meio do
concreto, do palpável, da experiência e da manipulação, havendo uma necessidade da criança
vivenciar situações em que possa manipular os objetos e descobrir o meio e o mundo que a
cerca. Pois, assim como na vida cotidiana em que a criança aprende matemática de uma forma
significativa e contextualizada, na educação infantil essa ciência também deve ser trabalhada
com as crianças, de uma maneira significativa, prazerosa e dentro de um contexto presenciado
por elas.
Neste sentido, o lúdico é um recurso fundamental que dever ser utilizado pelas
professoras para trabalhar os conteúdos matemáticos com as crianças, por proporcionar as
crianças momentos em que possam desenvolver sua imaginação e agir sobre o objeto de
aprendizagem de uma forma mais significante. Alguns conteúdos acabam assumindo certa
importância de ser trabalhados para que as crianças se apropriem de conceitos matemáticos
que contribuem com o seu raciocínio lógico, no entanto, a exploração de todos os campos
matemáticos deve ser proporcionada.
É muito comum na educação infantil, e até nos demais anos de escolarização,
encontrar professoras utilizando-se de joguinhos, brincadeiras, números móveis, coleções e
outros materiais concretos (muitas vezes fabricados pelas próprias professoras), para ensinar
matemática e outros saberes as crianças. Entretanto, algumas delas não percebem que a
presença da matemática é cotidiana em suas aulas e, mesmo tendo recursos e materiais para
trabalhar com as crianças, acabam perdendo muitos momentos do dia-a-dia da sala de aula
propícios para aplicá-los de uma maneira que potencialize a aprendizagem das crianças.
Os saberes matemáticos que devem ser trabalhados na educação infantil são muitos.
Assim, como que existem vários recursos, estratégias e materiais que podem ser utilizados
pelas professoras para ensinar esses saberes às crianças. Porém, as professoras só conseguirão
desenvolver uma prática pedagógica eficaz no ensino dessa ciência quando se atentarem para
a necessidade de se trabalhar os saberes matemáticos escolares de uma forma significativa e
prazerosa. Assim, como quando procurarem compreender como as crianças se apropriam
desses saberes, para poderem realizar um planejamento do seu ensino.
O projeto de pesquisa, Matemática: estratégias para aprender e ensinar na educação
infantil, vinculado ao PIBIC, volta-se assim, para as instituições de educação infantil de
Vilhena/Rondônia procurando investigar como se dá a construção do conhecimento
matemático pelas crianças, na concepção das professoras, e como elas se relacionam com essa
180
área do conhecimento. Além disso, investiga quais as estratégias e recursos mais utilizados
pelas professoras, que atuam na educação infantil, para ensinar matemática e compreender a
importância do lúdico no ensino dessa ciência e na aprendizagem das crianças.
Como se trata de uma pesquisa qualitativa, utilizamos nos procedimentos
metodológicos, o desenvolvimento de estudos bibliográficos, bem como, a realização de
entrevistas com as professoras da educação infantil, a partir de perguntas semiestruturadas, e a
realização de observações da prática de ensino de matemática dessas professoras com as
crianças do pré-escolar e a análise dos dados coletados à luz dos referenciais teóricos
abordados.
Para o cumprimento dos objetivos propostos, os procedimentos metodológicos do
projeto foram divididos em duas partes fundamentais. A primeira se constitui em estudos
bibliográficos para o entendimento e aprimoramento sobre como se dá o ensino e
aprendizagem dos saberes matemáticos pelas crianças de 4 a 5 anos, em que as leituras
realizadas foram analisadas e fichadas para eventuais consultas. A segunda em entrevistas e
observação de aulas que permitiram uma análise entre a teoria e pratica das professoras.
As entrevistas, com caráter de conversa, ocorreram de março a maio de 2012 em
quatro instituições públicas da rede municipal do município de Vilhena, escolhidas a partir do
interesse demonstrado por parte das professoras em participar, sendo entrevistadas duas
professoras de cada uma das instituições participantes que atuam no período vespertino. Essas
professoras foram de grande importância para a realização da pesquisa, pois puderam nos
fornecer as informações necessárias sobre nosso problema de pesquisa. Concluindo-se as
entrevistas com 03 professoras do pré-escolar I e 05 professoras do pré-escolar II sendo
entrevistadas
Pelo fato desta pesquisa ser de cunho qualitativo, nos preocupamos e nos dedicamos
bastante ao trabalho de campo, buscamos de uma forma participante, conhecer como a
matemática se faz presente na educação infantil. Investigando e observando, como as
professoras ensinam os saberes relacionados a essa ciência e como as crianças aprendem esses
saberes. Procuramos uma aproximação com as pessoas e com as situações no ambiente da
educação infantil, por meio das observações do cotidiano das salas de aula de algumas das
professoras entrevistadas.
O nosso olhar durante as observações foi direcionado para os saberes e fazeres
matemáticos pelas docentes e pelas crianças da educação infantil, considerando que não há
fragmentação no trabalho com as diferentes áreas do conhecimento nessa etapa da educação
básica e que o conhecimento matemático está presente em todas as ciências. Buscamos
181
averiguar durante as observações como as professoras ensinam os conhecimentos
matemáticos para as crianças, quais conteúdos são abordados em sala de aula, quais as
estratégias de ensino são utilizadas por elas, bem como, identificar algumas dificuldades
encontradas pelas professoras no trabalho com a matemática e o interesse demonstrado pelas
crianças por essa ciência e como as professoras buscam fazê-las quererem aprender.
Os estudos bibliográficos partiram de leituras de produções acadêmico-científicas de
autores que abordam a matemática na educação infantil e a construção dos saberes
matemáticos pela criança, bem como, a utilização do lúdico no ensino dessa ciência, para que
se pudesse ter uma compreensão de como se dá a construção do conhecimento matemático
pelas crianças e de como o lúdico, no ensino e aprendizado da matemática, possibilita um
ensino de qualidade com significado e contextualização ao mesmo tempo.
Dessa forma, do ponto de vista teórico, a pesquisa fundamenta-se em autores nacionais
e estrangeiros que discutem sobre a construção do conhecimento lógico-matemático pela
criança. Entre eles destaca-se Kamii (1990) afirmando que, se a criança “construir a estrutura
lógico-matemática de maneira sólida tornar-se-á capaz de raciocinar logicamente numa ampla
variedade de tarefas mais difíceis” (1990 p. 30).
Sendo que o conhecimento lógico-matemático é aquele que leva a criança a fazer
relações mentais sobre os objetos, percebendo assim as diferenças entre um e outro. Segundo
Kamii (1990, p.15) “o conhecimento lógico matemático consiste na coordenação de relações”.
Precisando a criança assim fazer todos os tipos relações com todos os tipos de objetos, para
poder construir os conhecimentos matemáticos fazendo relações entre eles. Pois, sendo as
relações mentais importantes na construção numérica e lógico-matemática, as crianças
precisam se acostumar a fazer relações desde cedo.
As crianças constroem o conhecimento lógico matemático, assim, à medida que
estabelecem relações cada vez mais elaboradas e complexas com o meio e instrumentos nos
quais interagem, experimentam e manipulam. Segundo as pesquisas piagetianas as estruturas
do pensamento inteligente são de natureza lógico-matemática. De acordo com Fávero:
Desde que nascemos, ao agirmos sobre as coisas ao nosso redor,
classificamos essas coisas, relacionando-as, combinando-as segundo um
critério dado pelas suas características físicas (coisas quadradas, duras, lisas,
vermelhas, etc.), como depois, dentro de um critério abstrato (atitudes
democráticas, comportamento ético etc.). Em resumo nós operamos.
(FAVERO, 2005, p. 108)
182
Da mesma forma que o homem construiu no decorrer da história da humanidade, o
conhecimento matemático, a criança também o faz durante o seu desenvolvimento, visto que,
reconstruímos ao longo do nosso desenvolvimento as conquistas históricas.
As crianças, desde bem pequenas, pensam e agem sobre o mundo em que estão
inseridas procurando compreendê-lo. Por meio da ação e da experimentação ela constrói suas
bases matemáticas procurando resolver os problemas de seu tempo conferidos pela
complexidade de situações sociais. Dessa forma, um trabalho intencional com a matemática
contribui com que elas elaborem, construam e sistematizem conhecimentos. Nessa
perspectiva o Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil (BRASIL, 2001, p.
207), argumenta que, “o trabalho com a matemática na educação infantil atende, [...] às
necessidades das próprias crianças de construírem conhecimentos que incidam nos mais
domínios do pensamento [...].”
Lorenzato (2008) que aborda os conteúdos a serem ensinados na educação infantil,
argumentando que a geometria, a medida e o número são o tripé básico dos conhecimentos
matemáticos, propondo o ensino dos sete processos mentais básicos, que são:
correspondência, comparação, classificação, sequenciação, seriação, inclusão e conservação.
Pois, segundo o autor “esses processos são abrangentes e constituem um alicerce que será
utilizado para sempre pelo raciocínio humano (2008, p.27)”.
A matemática está presente em todos os contextos da vida diária, tudo o que fazemos
envolve conhecimento matemático, desde os mais elementares até os mais complexos, ou
seja, é impossível viver sem o conhecimento matemático. Em diversos momentos realizamos
várias relações entre os objetos, embora não seja consciente. Desde o momento do nascimento
a matemática está presente por meio da linguagem na categorização dos instrumentos
pertencentes e não pertencentes ao mundo que estamos inseridos. O que torna a sua
aprendizagem tão importante e necessária quanto às demais áreas de conhecimento.
Porém, quando as pessoas falam em conhecimentos matemáticos, se prendem muito
a idéia de número. Esquecem que matemática também envolve medidas e geometria,
possuindo um amplo campo de saberes e conceitos que precisam ser aprendidos, conforme
destaca Smole, Diniz e Cândido (2000, p. 09):
Uma proposta de trabalho de matemática para a Educação Infantil deve
encorajar a exploração de uma grande variedade de ideias matemáticas, não
apenas numéricas, mas também aquelas relativas á geometria, às medidas e
às noções de estatística, de forma que as crianças desenvolvam e conservem
com prazer uma curiosidade acerca da matemática, adquirindo diferentes
formas de perceber a realidade.
183
Tendo em vista, que o ensino dessa ciência torna-se menos complexo na medida em
que as professoras procuram compreender como as crianças se apropriam dos conhecimentos
matemáticos, que essa apropriação acontece a partir de situações em que os conceitos
matemáticos são explicitados e colocados em jogo, é preciso haver uma contextualização e
concretização desses conceitos desde a educação infantil.
Para tanto, o lúdico, compreendido nesse trabalho, como as brincadeiras e jogos, é
visto como possibilidades para a aprendizagem matemática. As brincadeiras e jogos estão
presentes em muitas situações da vida infantil e contribui com que as crianças ampliem a
capacidade corporal, a consciência do outro, a percepção de si mesma como ser social e
cultural, a percepção e exploração do espaço que a cerca.
Além disso, a utilização do lúdico nas atividades matemática na educação infantil
contribui com que as crianças apropriem-se de noções como: proximidade, separação,
vizinhança e continuidade, bem como, a compreensão dos conceitos perto/longe, parte/todo,
dentro/fora, pequeno/grande. Na brincadeira ainda, de acordo com Smole, Diniz e Cândido
(2000, p. 16) a criança pode ser incentivada a “realizar contagens, comparação de
quantidades, identificar algarismo, adicionar pontos que fez durante a brincadeira, perceber
intervalos numéricos [...] noções de posição no espaço, de direção e sentido, discriminação
visual e memória visual e formas geométricas.”.
Diante do exposto, acreditamos, que a utilização das brincadeiras e jogos como
proposta pedagógica para o trabalho com a matemática, bem como a manipulação de
materiais concretos oportuniza as crianças experiências, vivências e aprendizagem com mais
sentido, de maneira prazerosa e significativa. Assim, os estudos realizados na pesquisa foram
também fundamentais para uma compreensão de como as professoras que atuam na educação
infantil utilizam os recursos didáticos durante a abordagem matemática, dentro e fora do
espaço da sala de aula.
A conclusão dos estudos bibliográficos e o cumprimento da segunda etapa da
pesquisa, que se baseia na em entrevistas e observação de aulas, permitiram um
reconhecimento e entendimento de como ocorre à construção dos conhecimentos matemáticos
nas crianças, dos processos e estratégias que envolvem o ensino e aprendizagem dessa ciência
tão presente em nosso cotidiano e uma percepção da importância dada ao lúdico no ensino dos
saberes matemáticos, relacionando os dados obtidos com a entrevista com os dados da
observação.
184
Durante as entrevistas pode-se perceber, através das falas das professoras, que
algumas delas possuem uma dificuldade em olhar para os saberes matemáticos e para os
conhecimentos que as crianças expressam sobre essa ciência, sem relacioná-los a um
conteúdo ou atividade específica.
Com a análise dos dados concluímos que há uma contradição entre as falas das
professoras entrevistadas e a suas práticas de ensino. No que diz respeito ao lúdico, por
exemplo, as professoras afirmaram que as atividades lúdicas, como os jogos e brincadeiras, e
materiais concretos como: peças de encaixe, pecinhas pedagógicas, palitinhos, sementes,
tampinhas, brinquedos, entre outros devem ser utilizados para trabalhar a matemática com as
crianças.
No entanto, nas observações verificamos que as professoras trabalham o lúdico de
uma forma não direcionada e planejada, quando distribuem as pecinhas pedagógicas para as
crianças brincarem as professoras nem se que se atentam ao uso que as crianças fazem delas.
Da mesma forma, presenciamos essa falta de intervenção e de importância no que diz respeito
aos jogos, como os de quebra-cabeça, que são utilizados como uma forma de distrair as
crianças e fazer com que permaneçam sentados em suas cadeiras, e nas brincadeiras que são
utilizadas para como um momento de descontração.
No que se refere aos conteúdos matemáticos abordados em sala de, elas afirmaram nas
entrevistadas que trabalham: os números, quantidades, pequenas adições, situações
problemas, sequencias, formas geométricas, seriação, classificação, identificação de números,
conjuntos, pesos, símbolos numéricos, medidas, entre outros. Mas o que vimos durante as
observações é uma valorização do campo numérico, as professoras se prendem muito aos
números, a identificação numérica é mais trabalhada do que qualquer outro saber matemático.
De acordo com os argumentos das professoras é possível perceber os conhecimentos
que as crianças já possuem sobre essa ciência através das suas falas. Das conversas que
acontecem durante as atividades, durante as brincadeiras, em outros momentos e até mesmo
quando elas conversam com as professoras.
No entanto muitas dessas conversas das crianças acontecem longe dos olhos e ouvidos
das professoras. Ocorrem realmente durante as brincadeiras e nos momentos em que as
crianças estão realizando uma atividade proposta pela professora, porém a professora após
passar um exercício para a criança fazer, senta em sua cadeira e fica preparando a próxima
atividade que passará a criança ou fica cuidando para que elas não conversem, para não “fazer
bagunça”. Perdem esse momento que é tão propicio para observar as falas das crianças.
185
Diante de todas essas análises e comparações entre as falas das professoras e sua
prática em sala de aula, pode-se considerar que as professoras precisam buscar sempre uma
renovação de sua prática e métodos de ensino. Possibilitando que sempre saibam como
utilizar os materiais e recursos disponíveis de uma forma que potencialize a aprendizagem dos
conteúdos ensinados pelas crianças.
Antes de optar por um material as professores devem refletir sobre os conhecimentos
que esperam que as crianças desenvolvam por meio de sua manipulação, a escolha não deve
se dar apenas pelo foto desse material ser atraente ou lúdico, mas sim, pelo foto de sua
introdução nas atividades de ensino da matemática garantir uma reflexão e aprendizagem dos
saberes que estão sendo construídos pelas crianças. A professora deve planejar os
conhecimentos que deseja que seus alunos aprendam para podem conduzir os jogos e
brincadeiras de uma forma que as crianças cheguem a eles. As brincadeiras devem fazer parte
da proposta pedagógica da professora, deve estar no planejamento de suas aulas, de uma
forma pensada e planejada.
A matemática deve ser mais explorada pelas professoras, pois, o que se vê hoje nas
salas de aula da educação infantil, mais especificamente as observadas, é a matemática sendo
pouco abordadas e sendo reduzida a simples identificação da representação numérica. As
professoras se prendem muito nas atividades que possibilitem as crianças identificar os
números que acabam esquecendo que existem outros saberes matemáticos e que eles devem
ser trabalhados com as crianças. Tanto durante as entrevistas quanto durante as observações
realizadas pode-se perceber como as professoras da educação infantil estão presas aos
números nos poucos momentos em que trabalham com a “matemática”.
Um olhar para matemática na educação infantil que vai além das falas das professoras,
possibilita-nos identificar a presença da matemática em sua prática pedagógica, comparando o
que elas dizem trabalhar no campo matemático com o que elas realmente trabalham. Pode-se
concluir que os momentos mais ricos em saberes matemático, que mostram o que as crianças
já sabem sobre essa ciência e o que estão aprendendo, acontecem longe dos olhos das
professoras.
Os momentos em que as crianças estão conversando, interagindo com os demais e com
o objeto de conhecimento, não têm designado a importância que merecem pela professora,
que deixa de presenciar os momentos de descobertas das crianças, o desenvolvimento de suas
abstrações, as suas curiosidades e dúvidas e as demonstrações dos conhecimentos que as
crianças já dominam.
186
Ensinando desde o início para criança que essa ciência não é tão difícil e complexa,
como a maioria a considera, as professoras despertarão nas crianças a vontade de aprendê-la,
assim como o estímulo a curiosidade das crianças é muito importante para que a
aprendizagem dessa ciência seja prazerosa e significativa. No entanto, antes de tudo é
necessário que a professora compreenda e assuma uma postura diferente em relação à
matemática, não permitindo que ela se constitua apenas na memorização de conteúdos e na
identificação simbólica, atribuindo-a a mesma importância dada às outras áreas de
conhecimento.
REFERÊNCIAS
BORGES, T. M. M. A criança em idade pré-escolar. São Paulo; Ática, 1994.
BRASIL. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI). Ministério
da Educação e do Desporto (MEC), Secretaria de Ensino Fundamental (SEF), Brasília: 1998.
V. 1.
FÁVERO, M H. Psicologia e Conhecimento. Subsídios da psicologia do desenvolvimento
para a análise do ensinar e do aprender. Brasília; Editora da Universidade de Brasília, 2005.
KAMI, Constance. A criança e o número: implicações educacionais da teoria de Piaget
para a atuação junta a escolares de 4 a 6 anos. 11ª ed. Campinas, SP: Papirus, 1990.
LORENZATO, Sergio. Educação infantil e percepção matemática. 2 ed. Campinas, SP:
autores Associados, 2008.
LÜDKE, M. e ANDRÉ, M. D. A. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São
Paulo, EPU, 1986.
PARRA, C.; SAIZ, I. (org.). Didática da matemática - reflexões Psicopedagógicas. Porto
Alegre: Artes Médicas, 1996.
SMOLE, Katia Stocco; DINIZ, Maria Ignez e CÂNDIDO, Patrícia. Brincadeiras infantis
nas aulas de matemática. Porto Alegre: Artmed, 2000.
SMOLE, K. Novos óculos para o ensino de matemática. In. Jean Piaget: aprendizado do
mundo. Viver Mente e Cérebro. Coleção Memória da Pedagogia. Especial. N.1, p.34-41.
Rio de Janeiro: Ediouro; São Paulo: Segmento-duetto, 2005.
WEISZ, Telma. O diálogo entre o ensino e a aprendizagem. São Paulo: Ática, 2000
187
AGRADECIMENTOS:
Ao CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico pelo
financiamento da pesquisa e bolsa de iniciação científica;
Ao PIBIC e à UNIR - Universidade Federal de Rondônia pela oportunidade e espaço que dá
aos acadêmicos de desenvolver projetos de pesquisa;
À minha orientadora Profa. Me. Bianca Santos Chisté pela orientação eficiente, significativa e
apoio.
_________________________
CONTATOS
Orientanda: Gilcirlene Sacchi Roque
E-mail: [email protected]
Orientadora: Profa. Me. Bianca Santos Chisté
E-mail: [email protected]
188
AVALIAÇÃO PSICOEDUCACIONAL DO ALUNO COM SUSPEITA DE
DEFICIÊNCIA INTELECTUAL: CONCEPÇÕES E PRÁTICAS
Dra. Iracema Neno Cecilio Tada38
Iagê Lage Donato39
RESUMO
O presente estudo investigou e analisou com o olhar da Psicologia Histórico-Crítica os
procedimentos legais, concepções e encaminhamentos dados aos estudantes com suspeita ou
diagnóstico de deficiência intelectual na Secretaria Estadual de Educação do Estado de
Rondônia e na Secretaria Municipal de Educação do Município de Porto Velho. A pesquisa
foi desenvolvida nos setores de educação especial e saúde escolar da secretaria municipal e na
secretaria estadual no setor de educação especial e em uma escola de ensino fundamental.
Como método de investigação foram utilizados a analise documental das legislações
concernentes ao tema da inclusão do estudante com deficiência na rede de ensino regular e
entrevistas semi-estruturadas gravadas em áudio com responsáveis pelos setores de Educação
Especial em ambas as secretarias. Constatamos que há um grande número de estudantes com
deficiência intelectual ambas as secretarias e nelas são realizadas apenas a avaliação
progressiva das habilidades pedagógicas, que é feita na própria escola. Acreditamos que a
avaliação de deficiência intelectual merece maior atenção para evitar a culpabilização do
estudante que não se encaixa na estrutura escolar e acaba injustamente estigmatizado.
Palavras-chave: Educação Especial. Inclusão Escolar. Deficiência Intelectual. Avaliação
Psicoeducacional
INTRODUÇÃO:
Historicamente, até a década de 1990 o processo de escolarização dos alunos com
deficiência intelectual era de responsabilidade de instituições especializadas em Educação
Especial. O foco era a deficiência do aluno, desenvolvendo basicamente a autonomia deste
aluno nas atividades da vida diária e o desenvolvimento das funções psicológicas básicas, por
meio de atividades repetitivas e descontextualizadas (BUENO, 1997; D’Antino, 1988;
Ferreira, 1989; Jannuzzi, 1997; 2004; Mazzotta, 1999; VIGOTSKI, 1997).
Para identificar o aluno que possuía deficiência intelectual e encaminhá-lo para o
Ensino Especial o psicólogo escolar aplicava testes psicométricos como WISC, Raven, entre
outros, acreditando assim, que poderia quantificar o quoeficiente de inteligência - QI - da
38
39
Doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano pela Universidade de São Paulo, professora
do curso de Mestrado em Psicologia da Universidade Federal de Rondônia.
Graduando de Psicologia da Universidade Federal de Rondônia
189
criança, diagnosticando se tinha inteligência normal ou não. Esta prática de avaliação
psicológica tem sido duramente criticada por pesquisadores como Machado (1994); Patto
(1997); Moysés (2001) e Tada (2009), por não contribuir para que as potencialidades de
aprendizagem e de desenvolvimento deste aluno sejam analisadas.
A partir de 1990, documentos internacionais - Conferência Mundial sobre Educação
para Todos; Declaração de Salamanca, Declaração de Guatemala - e nacionais - Estatuto da
Criança e do Adolescente; Plano Nacional de Educação; Política Nacional de Educação
Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva - foram elaborados buscando respeitar a
diversidade humana e o compromisso com a construção de sistemas educacionais inclusivos,
assegurando ao aluno com deficiência o seu acesso e permanência no Ensino Regular
(FREITAS, 2009).
Os dados coletados nas secretarias mostram que a porcentagem de estudantes com
deficiência intelectual é bastante significativa frente às outras deficiências. Representam
47,08% na rede municipal e 43,40% na rede estadual. Segundo Rizzini e Menezes (2010) o
número de indivíduos entre 0 (zero) e 17 (dezessete) anos de idade com deficiência intelectual
na população brasileira é de 1%, considerando deficiência intelectual somente e associada a
outra deficiência. Segundo dados do sítio eletrônico do governo do estado de Rondônia
existiam 251 mil estudantes matriculados na rede de ensino estadual em 2011 e de acordo
com os dados do censo 1291 estudantes da rede estadual possuem o diagnóstico de deficiência
intelectual. Isso representa que os estudantes com deficiência intelectual matriculados na rede
estadual de ensino são alarmantes 19,44% do total, ou seja, um número quase 2000% maior
que o apresentado por Rizzine e Menezes.
Acreditamos que a educação escolar é parte de um sistema maior e está imbricada
dentro das estruturas sócio-político-culturais. As políticas públicas e a forma como são
aplicadas, muitas vezes mostrando contradições, são um espelho da estrutura social, sua
organização e funcionamento.
Dessa forma, analisar as legislações a nível federal, estadual e municipal nos permite
visualizar o papel destinado à educação especial e seus beneficiários na estrutura social, e na
investigação da sua aplicação levantar as incongruências e preconceitos latentes reveladores
do funcionamento das interações sociais. Para tanto, buscamos na legislação vigente
identificar as políticas de inclusão do aluno com Deficiência Intelectual e a concepção teórica
e parâmetros de avaliação para esse tipo de deficiência.
190
MÉTODO
Fomos à Secretaria Municipal de Educação de Porto Velho (SEMED) e à Secretaria
Estadual de Educação de Rondônia (SEDUC), ambas localizadas no município de Porto
Velho/RO, para identificar os setores responsáveis pela inclusão escolar: Na SEMED,
visitamos duas divisões, a Divisão de Educação Especial (DIEES) e a Divisão de Saúde
Escolar (DISE); e na SEDUC, o Núcleo de Apoio à Educação Inclusiva (NAEDI) e a
Representação de Ensino (REN). Nesses setores entrevistamos duas pedagogas e duas
psicólogas atuantes na educação especial.
E para a coleta de dados utilizamos a análise documental e entrevistas semiestruturadas gravadas em áudio que permitem a interação com o participante, buscando
retratar sua percepção sobre o tema pesquisado, facilitando o surgimento de informações
ocorrendo, constantemente, análises e avaliação dos dados. (Chizzotti, 1998; Lüdke; André,
1986; Martins, 1999).
Para analisar os dados qualitativos construímos categorias descritivas por meio da
impregnação do conteúdo, buscando o material manifesto e o latente, presentes nas
mensagens implícitas ou contraditórias, ou nos temas silenciados que pudemos observar nas
falas das participantes (LÜDKE; ANDRÉ, 1986).
As categorias descritivas elencadas são as seguintes:
a) A inclusão escolar em termos numéricos;
b) Políticas públicas e inclusão escolar;
c) Concepções teóricas sobre deficiência intelectual;
d) Avaliação psicopedagógica do estudante com deficiência intelectual
RESULTADOS E DISCUSSÃO:
Por trás dessa profusão de diagnósticos pode estar o preconceito, o não
reconhecimento do potencial deste estudante que, historicamente foi excluído do sistema
escolar regular e encaminhado para instituições especiais, tendo negando o seu direito de
acesso aos conteúdos científicos produzidos pelo ser humano ao longo do seu
desenvolvimento, apesar da discussão em termos internacionais e nacionais sobre as políticas
públicas de inclusão escolar. Diversos autores () tem apontado para o fato que problemas
relacionados a organização escolar e estigmas sociais são constantemente mascarados sob a
culpabilização do indivíduo.
191
Assim, o estudante que não se adapta prontamente à escola e vai "ficando para trás",
acumulando dificuldades em conseguir absorver os conteúdos científicos culturalmente
construídos pela humanidade, pode estar recebendo o rótulo de deficiente intelectual. Dessa
forma, problemas estruturais do ensino escolar são postos debaixo do tapete e o estudante fica
estigmatizado com uma marca que pode não estar de fato correta.
Não obstante, a inclusão dos educandos com deficiência intelectual na rede regular de
ensino não é garantia de que eles terão acesso aos conteúdos científicos, pois, os currículos
são flexibilizados e muitas vezes não há rigor nas avaliações. Dessa forma, os estudantes vão
sendo passados de ano sem apreender os conteúdos, o que prejudica sua autonomia e
independência na vida adulta. Com a análise da legislação foi possível notar que a atual
conjectura da educação especial permite práticas de exclusão do estudante com deficiência
intelectual que, apesar de na maioria das vezes incluído no ensino regular, eles tem o currículo
flexibilizado e não tem garantido o seu direito de apropriação dos conteúdos científicos da
mesma forma que os demais estudantes. Uma política que visa às estatísticas de aprovação,
aliado à falta de investimentos relatada pelos próprios atores escolares que traz dificuldades
estruturais e de formação profissional, formam uma barreira entre o estudante com deficiência
e o seu direito à educação.
Ademais, de acordo com o que pudemos constatar a avaliação do estudante com
suspeita de deficiência intelectual é feita pelos professores e consiste na avaliação continua
das habilidades pedagógicas. Acreditamos que pode haver uma falha na avaliação desses
estudantes o que resulta num número alarmante, corroborado pelos dados censitários, de
ocorrência de deficiência intelectual entre os estudantes da rede pública no estado de
Rondônia e no município de Porto Velho. É temeroso afirmar que há estudantes sendo
encaminhados ao AEE por deficiência intelectual que em verdade não possuem a deficiência.
Contudo, a avaliação e o processo pedagógico desses estudantes é tema que merece maior
atenção e ser mais pesquisado.
AGRADECIMENTOS:
Agradeço primeiramente à minha orientadora Drª Iracema Neno Cecilio Tada por
oportunizar a mim a experiência de ter vivenciado essa pesquisa, pela paciência, consideração
e apoio prestados. À equipe do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Cientifica
(PIBIC/UNIR), pelo sempre prestíssimo atendimento. Às secretarias de educação do
município de Porto Velho e do estado de Rondônia pela colaboração e participação
192
fundamentais para a execução da pesquisa. Ao Conselho de Desenvolvimento Cientifico e
Tecnológico (CNPq) e o Centro de Pesquisa em Formação da Pessoa (CEPEFOP) pelo
amparo estrutural oferecido.
E a todos familiares, amigos e transeuntes que de alguma forma colaboraram com esse
trabalho. Deixo o meu sincero obrigado.
¹Doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano pela Universidade de São
Paulo, professora do curso de Mestrado em Psicologia da Universidade Federal de Rondônia.
²Graduando de Psicologia da Universidade Federal de Rondônia
193
SUB-PROJETO: EDUCAÇAO LINGUISTICA: FORMAÇÃO DOCENTE E ENSINO
DE LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DA FRONTEIRA BRASIL - BOLÍVIA.
Janice Mendoza Aranda40
Prof. Dr. Dorosnil Alves Moreira41
RESUMO
O estudo objetiva investigar, registrar, analisar e compreender a Educação Linguística, no
contexto da formação docente e das práticas pedagógicas nas escolas da fronteira BrasilBolívia. O tema é relevante porque o ensino de Língua Portuguesa nas escolas públicas do
município de Guajará-Mirim/RO constitui-se em uma prática desafiadora, pois devido à
complexidade do ecossistema linguístico é necessário adotar metodologias de ensino que
favoreçam o processo de ensino-aprendizagem e o respeito às singularidades linguísticas,
culturais e sociais dos alunos. A Sociolinguística Educacional e a Semântica de Contextos e
Cenários foram a base teórico-metodológica dessa pesquisa, pois as mesmas são capazes de
explicar os fenômenos linguísticos que permeiam e constituem nosso objeto de estudo. Este
objetivo foi orientado pelos seguintes questionamentos: a) Como é constituído o ecossistema
linguístico do município de Guajará-Mirim/RO, no contexto da fronteira Brasil -Bolívia? b)
Como é constituída a formação docente e a prática pedagógica dos professores de Língua
Portuguesa, considerando as variedades dialetais existentes na fronteira Brasil - Bolívia? c)
Quais as concepções didático-pedagógicas que orientam a educação linguística no contexto
multicultural e plurilíngue da fronteira Brasil - Bolívia? A pesquisa teve como objetivos
específicos: a) Compreender o processo de constituição do ecossistema lingüístico de
Guajará-Mirim/RO; b) Realizar entrevistas com professores de Língua Portuguesa para
identificar as concepções dos mesmos sobre o ensino de língua materna em um contexto
multicultural e plurilíngue; c) Realizar entrevistas com alunos do ensino fundamental para
registrar as marcas identitárias, através da transcrição de textos orais e escritos; d) econhecer
e valorizar as marcas identitárias, sociolinguísticas e culturais dos alunos e professores;
e) Constituir um banco de dados que permita a construção de um currículo multicultural;
f) Socializar os resultados dos estudos e das pesquisas em encontros, seminários e fóruns
locais, nacionais e internacionais; g) Manter um programa regular de publicações e produção
científica do grupo.A coleta de dados da pesquisa foi realizada nos meses de outubro a
dezembro/2011 e janeiro a junho de 2012. Os procedimentos metodológicos foram
constituídos de momentos interligados: Leituras dos Referenciais Curriculares Nacionais
como os Parâmetros Curriculares Nacionais de 5ª a 8ª série e obras relativas a temáticas de
bilinguísmo, multiculturalismo, Pluralidade Cultural; Elaboração de um questionário para as
devidas entrevistas com os docentes e discentes da escola “Durvalina Estilbem de Oliveira”;
Caracterização do lócus e dos sujeitos da pesquisa; Coleta e análise de dados. Na coleta de
dados utilizaram-se os seguintes procedimentos técnicos: observações, análise linguística dos
textos (orais e escritos) produzidos pelos alunos, conversas informais e entrevistas com
professora e Supervisora Escolar. De acordo com Bortoni-Ricardo (2005), a variação
linguística como um processo identitário e explica as implicações das complexas relações dos
indivíduos na construção dos discursos e das práticas sociais, destacando que os falantes das
comunidades tradicionais do campo apresentam linguagens próprias, específicas e singulares,
40
Orientanda - Acadêmica de pedagogia da Fundação Univesidade Federal de Rondônia, Campus de GuajaráMirim. Guajará-Mirim/RO.
41
Orientador.
194
que nem sempre é valorizada, reconhecida e legitimada pela escola. Nesse sentido, a partir
das observações e conversas informais com os alunos, constatamos que o ecossistema da
escola é constituído por uma diversidade linguística e sociocultural. Nela, circulam: o
português, o espanhol e o portunhol, além das variedades linguísticas do português brasileiro.
A linguagem dos alunos também apresenta variações em todos os níveis: fonético-fonológico,
morfológico, sintático, semântico e lexical. Verificamos que no contexto escolar há alunos
bilíngues e que o hibridismo linguístico e cultural influencia na constituição das identidades
individuais e coletivas. Em decorrência disso, além dos conflitos durante as interações sociais
em sala de aula e do preconceito linguístico, muitos alunos, principalmente os indígenas e os
bolivianos, apresentam dificuldades na construção da leitura e na escrita e na aprendizagem
de outros conteúdos da disciplina de Língua Portuguesa. Os resultados das entrevistas com a
Professora e a Supervisora escolar evidenciaram que a prática pedagógica é orientada pela
concepção da educação crítica. Durante a observação do contexto educacional, verificamos
que a escola desenvolve inúmeras atividades voltadas à valorização do multiculturalismo,
incluindo não apenas as questões linguísticas e culturais, mas, principalmente, a inclusão
social. A investigação, o registro, a análise e a compreensão da Educação Linguística, no
contexto da formação docente e das práticas pedagógicas nas escolas da fronteira BrasilBolívia, contribuirá para a incorporação, a contextualização e a recontextualização das
práticas e dos saberes culturais, sociais e linguísticas no currículo oficial de Língua
Portuguesa e na prática docente, de maneira crítica, reflexiva e dialógica. Além disso, a
realização desse estudo contribuirá para a desconstrução dos preconceitos linguísticos, sociais
e culturais existentes no interior da língua padrão, que impede a valorização, o respeito e o
reconhecimento das singularidades das vivências linguísticas dos alunos pertencentes à
fronteira Brasil-Bolívia.
Palavras-chave: Formação Docente. Prática Pedagógica. Multiculturalismo. Educação
Linguística.
195
LITERATURA INDÍGENA CONTEMPORÂNEA POR MEIO DA EDIÇÃO DE DUAS
VERSÕES DE MITOS DESANA
Jazilane Pessoa Oliveira Araújo42
Profª Drª Cynthia de Cássia Santos Barra43
RESUMO
Em 1980 foi publicada pela Cultura Editora a primeira edição de Antes o mundo não existia,
de Luiz e Firmiano Lana, escritores indígenas da etnia Desana, habitante do noroeste
amazônico. Constituindo o primeiro livro de autoria indígena no Brasil, marca o início de um
fenômeno literário denominado por Almeida (2004) de Livros da Floresta, caracterizado por
publicações de autores indígenas de diversas etnias. Esse fenômeno é o macro-objeto desta
pesquisa, que vai discuti-lo a partir dos textos criativos de indígenas Desana. Assim, refletir e
compreender os alcances da apoderação da escrita e da inserção na cultura do impresso por
parte dos indígenas desta etnia é o principal objetivo deste trabalho, que também pretende
efetuar uma análise comparativa de narrativas Desana: a versão de Luiz e Firmiano Lana para
as histórias da origem da noite e do roubo das flautas sagradas pelas mulheres, ambas
contidos em Antes o mundo não existia (1980); as mesmas histórias registradas, em 1995, na
segunda edição desta obra; e a versão do escritor e artista plástico Feliciano Lana, contida em
A origem da noite e como as mulheres roubaram as flautas sagradas (2009). Diversos
pesquisadores, como Finnegan (2006), defendem a existência de uma literatura no campo da
oralidade em comunidades tradicionais. Neste trabalho será analisada a passagem para o
escrito/impresso de textos criativos de indígenas Desana com a finalidade de apontar
caracteres que os sustentem como criações literárias e instauradoras de uma nova
discursividade. Para isso, será considerado que a autoria e a literariedade são construções
socioculturais de cada povo. E, ainda, que as textualidades indígenas passam por uma
tradução intersemiótica e intercultural e esta deve procurar manter recursos verbais e visuais
equiparáveis aos do texto de partida (oral) no texto de chegada (escrito/impresso).
Palvras chaves: Literatura de autoria indígena. Livros da Floresta. Antes o mundo não
existia. Narrativas Desana.
ABSTRACT
In 1980 was published by Editora Cultura the first edition of Antes o mundo não existia by
Luiz and Firmiano Lana, indigenous writers from Desana ethnic, residents in Northwest of
Amazon. Being the first book by indigenous people in Brazil, marking the beginning of a
literary phenomenon called by Almeida (2004) Book of the Forest, characterized by
publications of authors from various indigenous ethnic groups. This phenomenon is the
macro-object of this research, which will discuss it from the creative writing of indigenous
Desana. Through this research, we intend to reflect and understand the reach of the asset of
writing and the insertion on the printed culture of the indigenous from this ethnic group, is
42
43
Bolsista PIBIC/UNIR/CNPq. Contato: [email protected].
Orientadora. Contato: [email protected].
196
the main objective of this work, which also intends to make a comparative analysis of Desana
narratives: a version of Luis and Firmiano Lana to the stories of the origin of the night and the
stealing of the sacred flutes by women, both contained in Antes o mundo não existia (1980),
the same stories recorded in 1995, the second edition of this work, and the version of the
writer and artist Feliciano Lana contained in A origem da noite e como as mulheres roubaram
as flautas sagradas (2009). Several researchers, as Finnegan (2006), argue the existence of a
literature in the field of orality in traditional communities. This paper analyzes the transition
to the written / printed creative texts of indigenous Desana in order to point out that the
supporting characters as literary creations, a new foundational discourse. For this, it is
assumed that the authorship and literariness are sociocultural constructions of each people.
And yet, that the indigenous textualities go through a intersemiotic and intercultural
translation and this should seek to maintain verbal and visual features comparable to the
source text (oral) into the target text (written/printed).
KEYWORDS: Literature of indigenous authorship. Books of the Forest. Antes o mundo não
existia. Desana Narratives.
1 INTRODUÇÃO
A cultura indígena sempre foi marcada pela oralidade. A origem, a história do povo e
seus ensinamentos sempre foram transmitidos pela boca dos mais velhos. Entretanto, nas
décadas finais do século XX, aproximadamente 100 títulos com a autoria de cerca de 40
nações indígenas já haviam sido publicados (ALMEIDA, 2004); em 2012, já são 538 livros
publicados (LIMA, 2012), a maioria escrita por professores indígenas, no âmbito da educação
escolar indígena específica, diferenciada, intercultural e bilíngue, e subsidiada por ONG’s e
pelo Governo Federal (ALMEIDA, 2004; LIMA, 2012). Apesar de já se constituir como uma
produção expressiva na área de Letras e outros Saberes, tanto no meio acadêmico quanto no
senso comum, ainda há desconfiança e questionamentos inflamados quando se afirma a
existência e a legitimidade de uma literatura de autoria indígena no Brasil contemporâneo.
Em relação à sociedade nacional, aos leitores não indígenas, pode-se atribuir a falta de
interesse - o desconhecimento - em relação aos livros e à literatura de autoria indígena aos
resquícios deixados pela colonização. O índio continua a ser visto de maneira inferior e
depreciativa: não tem língua, tem dialeto; não produz arte, mas artesanato; não é escritor,
não produz livros, apenas conta oralmente suas histórias para que outros a escrevam. Outro
fator a considerar em relação à recepção dos livros de autoria indígena pela sociedade
nacional é a multiplicidade dessas novas práticas de escrita que abrangem diversos povos
indígenas, línguas e crenças e para a qual ainda não há sistematização ou classificação
definitiva, visto que os padrões atuais, provenientes da tradição literária ocidental, não a
comportam satisfatoriamente. Contudo, mesmo com esses impasses, é inútil ignorar a
197
emergência da literatura de autoria indígena: “(...) a sensação que se tem é que
independentemente do reconhecimento da sua poesia e prosa pela sociedade nacional, os
índios continuarão nessa trajetória” (GOLDEMBERG & CUNHA, 2010, p.144).
Dentre as etnias indígenas que possuem publicações, encontram-se os Desana, que
vivem na bacia do Rio Negro, no Amazonas. Em Antes o mundo não existia, de Luiz Gomes
Lana e Firmiano Arantes Lana (Tõrãmu Kehíri e Umusi Pãrõkumu), foram narrados os 13
principais mitos do clã Kehiríporã, da etnia Desana. O livro, organizado com a ajuda da
antropóloga Berta Ribeiro, foi publicado em 1980 pela Livraria Cultura Editora, com tiragem
de 5000 exemplares e foi “um dos fatos mais importantes para o surgimento da literatura
indígena no Brasil” (ALMEIDA, 2004, p. 273), com segunda edição em 1995 e traduções
para o francês, italiano e castelhano (MENENDEZ, 2006, p. 3). A análise comparativa das
duas versões para os mitos da origem da noite e do roubo das flautas mágicas pelas mulheres
é um dos objetivos desta pesquisa, que pretende ainda verificar a inserção dos Desana na
cultura do impresso, além de efetuar um levantamento a respeito de outros textos literários
e/ou etnográficos a respeito dessa etnia.
2 METODOLOGIA
Esta pesquisa não incluiu visitas a campo para coletas de dados. Por outro lado, esta
investigação apresenta um caráter duplamente bibliográfico, à medida que se baseou em:
a) inventariar referências bibliográficas de qualquer natureza, disponíveis em
bibliotecas físicas e virtuais de Universidades Federais e Organizações Indigenistas
para a montagem de um banco de dados virtual a cerca do povo Desana;
b) efetuar leitura analítica e comparativa de duas obras de autores Desana, a saber: a
versão de Luiz e Firmiano Lana para as histórias de origem da noite e do roubo das
flautas sagradas pelas mulheres, ambos contidos em Antes o mundo não existia (1980
e 1995); e essas mesmas narrativas segundo o escritor e artista plástico Feliciano Lana,
contidas em A origem da noite e como as mulheres roubaram as flautas sagradas
(2009).
O material literário de autoria indígena selecionado como corpus desta pesquisa foi
analisado quanto à forma discursiva, o conteúdo e sua estética, buscando possíveis conexões
entre o saber tradicional Desana e autores da Teoria Literária contemporânea. Quanto ao
acervo consultado a fim de montar o banco de dados previsto no subprojeto, optou-se por
198
privilegiar as bibliotecas virtuais universitárias, os periódicos científicos open access e os
bancos de dados virtuais de Organizações Não Governamentais Indígenas.
3 RESULTADOS
3.1 Levantamento bibliográfico
Conforme meta traçada pela orientadora, o levantamento bibliográfico atingiu o
número de 120 referências coletadas. A partir desse material foram elaborados alguns
gráficos. O primeiro relaciona a quantidade de referências coletadas em relação ao tipo de
autoria.
Fontes: UFAM, UFAC, UFRR, UFG, UFPB, UFBA, UFMG, UFES, Unb, UFRJ, UFSC, UFMT, UNICAMP,
UFF, UFPA, IPHAN, Portal de Periódicos Capes, Base de Dados Scirus, Scientific Eletronic Library Online
(SciELO), Institut de recherche pour le développement (IRD), Société Suisse des Américanistes (SSA),
Repositorio Institucional de la Universidad Nacional de Colombia, Nazan Universty Library
Percebe-se que a maioria esmagadora das produções encontradas até o momento é de
autoria não indígena, contando até mesmo com textos em língua estrangeira. Note-se que há
mais produções em autoria indígena (individual e coletiva) que em co-autoria, reafirmando o
princípio já destacado por Almeida (2004) de que os indígenas desejam apresentarem-se por
si mesmos, através da escrita alfabética.
Percebe-se também que além de textos de autoria Desana, também foram levantados
alguns textos de autores indígenas de outras etnias (Tukano, Tuyuka e Baniwa). Apesar de
este trabalho priorizar as publicações de escritores Desana, foram selecionados alguns textos
de outros autores indígenas para compor o banco de dados acerca da etnia Desana. Os povos
indígenas que habitam a região do Rio Negro estão intimamente conectados por relações de
199
trocas matrimoniais, comerciais e rituais. De fato, a maior parte dos estudos sobre os grupos
étnicos dessa região não aborda uma etnia específica, mas sim características gerais, comuns a
todos esses povos. Uma vez que as etnias do Rio Negro possuem muitas semelhanças em
determinados aspectos, coube preservar na lista de bibliografias coletadas alguns escritos de
indígenas de outras etnias da região por se entender que as informações contidas nessas obras
são relevantes para adquirir conhecimentos a respeito dos Desana.
O gráfico seguinte trata dos tipos de referências bibliográficas coletadas. A primeira
vista, o número de livros (considerando-se também o número de capítulos de livros) e
capítulos de livros identificados que abordam a temática Desana consiste na maioria das
referências coletadas (46 obras - 39% aproximadamente), o que é importante ao se pensar que
esses títulos encontram-se disponíveis nas estantes das livrarias a qualquer interessado.
Entretanto, somando-se a produção científica encontrada (artigos apresentados em eventos,
artigos publicados em livros, artigos publicados em periódicos, dissertações, eventos
acadêmicos e teses), tem-se mais da metade do total (62 obras - 53% aproximadamente),
demonstrando que o interesse pela temática ainda concentra-se na comunidade acadêmica.
Esse fato ressalta a importância desta pesquisa, particularmente a do futuro banco de
dados que, sendo acessível a acadêmicos, pesquisadores e professores, tanto da educação
básica, quanto do ensino superior, contribuirá para a aplicação efetiva da Lei 11.645/2008,
que alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (Lei 9.394/1996), incluindo no
currículo escolar oficial a abordagem do tema História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena,
principalmente nas áreas de educação artística, história e literatura.
Fontes: UFAM, UFAC, UFRR, UFG, UFPB, UFBA, UFMG, UFES, Unb, UFRJ, UFSC, UFMT, UNICAMP,
UFF, UFPA, IPHAN, Portal de Periódicos Capes, Base de Dados Scirus, Scientific Eletronic Library Online
(SciELO), Institut de recherche pour le développement (IRD), Société Suisse des Américanistes (SSA),
Repositorio Institucional de la Universidad Nacional de Colombia, Nazan Universty Library.
200
3.2 ELABORAÇÕES TEÓRICAS A CERCA DO CONCEITO DE LITERATURA DE
AUTORIA INDÍGENA
É necessário compreender que os textos indígenas, agora ilustrados, encadernados e
disponíveis para compra em livrarias urbanas e sites de livros usados, eram inicialmente
narrativas orais. Daí surge esta questão: “Pode-se falar em literatura no caso de tradição oral?
Pesquisadores africanos, como Pius Zirimu, da Uganda, introduziram o conceito de oratura
em oposição a literatura. [sic] O primeiro referir-se-ia então a “textos” orais e o último, a
escritos.” (SCHIPPER, 2006, p.10). Segundo Antônio Risério, “(...) Sousândrade afirmava a
existência de um texto criativo ameríndio” (1992, p. 26, grifo meu), apesar de não haver ainda
textos impressos de autoria indígena, no qual teria baseado seus escritos literários, hoje
consagrados. Assim, sustenta Risério: “Não há povo que não ostente, no elenco dos seus
signos mais expressivos, objetos de linguagem, correspondentes ao que, em nosso mundo,
chamamos poesia” (RISÉRIO, 1993, p. 25).
Essa oratura apresenta características específicas por envolver, além da palavra falada,
a performance que a acompanha. Para que a transposição do oral para o escrito faça da
oratura nascer uma literatura, no sentido de “uso estético da linguagem” (COMPAGNON,
2006, p. 39), é imprescindível que o tratamento dado ao texto escrito leve em consideração os
recursos presentes na performance do texto original: as vestimentas e a entonação de voz do
narrador, seus gestos, os objetos manipulados por ele, a luminosidade do local, os sons,
cheiros, texturas, em fim, todo o aparato presente no momento da apresentação. Nota-se que
essa não é uma tarefa simples, uma vez que os elementos da performance não cabem no
papel, sendo preciso encontrar equivalentes gráficos/linguísticos que sustentem a literariedade
do texto sem perder de vista a cultura de origem. Ou seja, a oratura deve passar por uma
“transcriação”44 para que daí surja uma literatura.
Os textos indígenas são aqui entendidos como textos criativos oriundos de uma
literatura bem sucedida no plano da oralidade. Mas, como já assinalado, a passagem para o
impresso pode acarretar na perda da literariedade. Assim, faz-se necessário buscar diversos
recursos para manter a literariedade do texto. Segundo os estudos de Amanda Lima (2012), os
44
Ao definir a transcriação, Haroldo de Campos aponta: “Numa tradução dessa natureza, não se traduz
apenas o significado, traduz-se o próprio signo, ou seja, sua fisicalidade, sua materialidade mesma (propriedades
sonoras, da imagética visual, enfim tudo aquilo que forma, segundo Charles Morris, a iconicidade do signo
estético, entendido por signo icônico aquele ‘que é de certa maneira similar àquilo que ele denota’). O
significado, o parâmetro semântico, será apenas e tão-somente a baliza demarcatória do lugar da empresa
recriadora. Está-se pois no avesso da chamada tradução literal.” (CAMPOS, 1970, p. 24 apud BICALHO, 2007,
p.122).
201
livros de autoria indígena na contemporaneidade, além de fazer uso da palavra, muitas vezes
lançam mão do que ela chama de “múltiplas grafias”, ou seja, outros recursos como o
desenho, grafismos, fotografias ou suportes de arquivo audiovisual acompanhando a obra.
Ancorada nessa e em outras referências, a presente pesquisa buscou elementos verbais e
visuais que sustentassem o corpus de análise como criações literárias.
3.3 ANÁLISE DE NARRATIVAS
Visto que a preservação das características da fala é um recurso desejável nas
publicações indígenas, pois mantém a literariedade original presente na oratura, a “revisão”
textual pode acabar minando a potência estética. A leitura das obras demonstrou que Antes o
mundo não existia (1980), mais que revisada, foi remoldada para se adequar aos padrões
cultos da língua portuguesa, o que reduziu consideravelmente a expressão estética da obra.
Vale ressaltar que o processo de revisão textual realizado por Berta Ribeiro foi importante,
mesmo imprescindível, para que a publicação pudesse ser concretizada, contudo as perdas são
inegáveis.
Aliando-se aos recursos linguísticos, a estratégia editorial adotada também contribui
para um declínio estético. Fica evidente a preocupação em registrar as narrativas, em protegêlas do desaparecimento salvaguardando-as no papel; procedimento feito sem intenções
estéticas. A disposição do título, do texto, a opção por utilizar uma família tipográfica com
serifas e em tamanho pequeno no corpo do texto (dificultando a leitura), as muitas notas de
rodapé traduzindo para o Tukano os termos em Desana, por fim, a divisão da obra,
privilegiando a palavra, em momento texto, momento imagem, com o uso de indicativos, às
margens das páginas, da figura que corresponde ao trecho; são recursos que tornam o livro
mais voltado para acadêmicos que para a sociedade em geral: uma etnografia. Sendo um livro
de autoria indígena: uma autoetnografia.
Quanto a Antes o mundo não existia (1995) observa-se alguns avanços, tanto no
tratamento dado à linguagem verbal, quanto em questão do projeto gráfico adotado. Quanto a
manutenção de características da oralidade no texto, vê-se que houve essa preocupação seja
em maior ou menor grau. Ainda assim, as marcas de oralidade ainda são pouco preservadas.
A composição da capa, a configuração das páginas, usando tipos em tamanho maior, a
disposição do título e a (tímida) aproximação da palavra ao desenho contribuíram para uma
melhoria estética em relação à primeira edição. Mas a divisão hierarquizante momento texto,
momento imagem ainda se faz presente, ainda que desta vez de maneira alternada, Assim, essa
202
obra parece estar no meio caminho de uma publicação que valorize os dispositivos criativos
indígenas.
A origem da noite e como as mulheres roubaram as flautas sagradas (2009) apresenta,
em relação às obras anteriores, um projeto gráfico melhor elaborado e seriamente engajado na
transmissão dos saberes indígenas e de suas potencialidades estéticas. Desde a capa o livro
convida o leitor à leitura e ao deleite. As páginas foram organizadas de forma a apresentar
muitos detalhes, porém sem sufocar o leitor. A escolha pelo uso de tipos com serifa e sem
serifas para diferenciar os textos em Desana e em Português, respectivamente, torna o livro
ainda mais potente visualmente. Ao trabalhar com a letra enfeitada para a língua Desana, e a
letra puramente informativa para o texto em Português o livro prioriza a língua materna do
autor além de destacar para os leitores da sociedade envolvente a existência do outro e de sua
língua.
Em relação aos recursos linguísticos usados no texto em Português, esta como nas
outras obras apresentam um afastamento da oralidade em alguns momentos. Contudo,
vestígios de oralidade ainda podem ser notados em algumas passagens. Sobre a manutenção
de características do oral, todas as três obras apresentam ressalvas. Mas no livro de Feliciano
Lana, a linguagem verbal é secundária, é assessório; o enfoque maior está nas gravuras.
Mesmo que peque em alguns momentos por não manter marcas de oralidade, a obra de
Feliciano é muito bem sucedida ao contar as histórias através do desenho, linguagem
universal.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme já afirmado neste trabalho, entende-se que a tessitura oral e criativa de
autoria indígena que passa por uma transcrição/tradução intersemiótica e intercultural precisa,
para originar um objeto literário bem sucedido, levar em consideração que o berço da oratura
é a performance e buscar elementos a ela equivalentes na passagem para o escrito/impresso,
na tentativa de transcriar o texto. Nesse sentido, o texto verbal não é visto como único meio
para transportar ao papel os saberes indígenas. Ao contrário, muitas vezes a palavra revela-se
um recurso insuficiente para transmitir as potencialidades estéticas da oratura indígena.
Assim, uma alternativa viável e muito utilizada entre as publicações de autoria indígena no
Brasil contemporâneo é o uso do que pode ser chamado de “multimodalidades de escrita”
(THIAGO, 2007) ou “múltiplas grafias” (LIMA, 2012). No caso dos textos criativos Desana,
a análise comparativa de seis narrativas, contidas em três livros distintos, abordando
203
linguagem verbal e visual, demonstrou um percurso que primeiramente privilegia a palavra,
mas vai gradativamente indo em direção à imagem: do registro (auto)etnográfico à criação
literária.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Maria Inês de. “Livros da Floresta”. In: ALMEIDA, Maria Inês de & QUEIRÓS,
Sônia. Na captura da voz - as edições da narrativa oral no Brasil. Belo Horizonte: Autêntica
Editora. 2004. p. 193-277.
CAMPOS, Haroldo de. Metalinguagem - ensaios de Teoria e Crítica Literária. 2. ed.
Petrópolis: Vozes, 1970. p. 24 apud BICALHO, Charles. Yãmîy Maxacali - um gênero
narrativo de poesia. Aletria. v.16, jul./dez. 2007. p.119-132.
COMPAGNON, Antoine. “A Literatura”. In:_______. O demônio da teoria: literatura e senso
comum. Tradução de Cleonice Paes Barreto Mourão e Consuelo Fortes Santiago. 3ª
reimpressão. Belo Horizonte: UFMG. 2006. p. 29-45. (Humanitas, 41)
FINNEGAN, Ruth. O significado da literatura em culturas orais. In: QUEIROZ, Sônia (Org.).
A tradição oral. Belo Horizonte: FALE/UFMG. 2006. p. 64-104.
GOLDEMBERG, Deborah & CUNHA, Rubelise da. Literatura Indígena Contemporânea: O
encontro das formas e dos conteúdos na poesia e prosa do I Sarau das Poéticas Indígenas.
Espaço Ameríndio, Porto Alegre, v. 4, n. 1, p. 117-148, jan./jun. 2010.
LIMA, Amanda Machado Alves de. O livro indígena e suas múltiplas grafias. 154f. 2012.
Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Letras: Estudos Literários,
Universidade de Minas Gerais, 2012.
MENENDEZ, Larissa Lacerda. Dois artistas, um mito. In: ENCONTRO DE HISTÓRIA DA
ARTE, 2, 2006, Anais..., Campinas: IFC-Unicamp, 2006. Disponível em:
<http://www.ifch.unicamp.br/pos/hs/anais/2006/posgrad/(45).pdf>. Acesso em: 4 jun. 2011.
RISÉRIO, Antônio. Palavras canibais. Revista USP, São Paulo, n.13, p. 26-43, mar./abr./mai.
1992.
RISÉRIO, Antônio. Textos e tribos: poéticas extraocidentais nos trópicos. Rio de Janeiro:
Imago. 1993.
SCHIPPER, Mineke. Literatura oral e oralidade escrita. In: QUEIROZ, Sônia (Org.). A
literatura oral. Belo Horizonte: FALE/UFMG. 2006. p. 10-24.
THIAGO, Elisa Maria Costa Pereira de S. O texto multimodal de autoria indígena:
narrativa, lugar e interculturalidade. 268f. 2007. Tese (Doutorado) - Programa de Estudo
Linguísticos e Literários em Inglês, Universidade de São Paulo. 2007.
AGRADECIMENTOS:
Ao PIBIC/UNIR/CNPq;
204
À Orientadora, Profª Drª Cynthia de Cássia Santos Barra;
Às minhas companheiras de pesquisa;
À minha família e amigos.
205
AVALIAÇÃO EDUCACIONAL, PROGRAMAS NACIONAIS DE AVALIAÇÃO E A
AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM: UM ESTUDO NAS ESCOLAS ESTADUAIS
DE ROLIM DE MOURA/RO
Jefferson Pereira da Silva Mendonça45
Flavine Assis de Miranda46
RESUMO
Este artigo é resultado de uma pesquisa desenvolvida para o Programa Institucional de Bolsas
de Iniciação Científica - PIBIC/CNPq. As questões-chave que nortearam a realização do
estudo foram: como se desenvolve a prática da avaliação educacional nas escolas estaduais do
ensino fundamental de Rolim de Moura/RO entre os professores de 1º ao 4º ano? Como os
resultados dos sistemas oficiais de avaliação da educação básica, o SAEB (Sistema Nacional
de Avaliação da Educação Básica) e o Prova Brasil, estão sendo apropriados e utilizados pelos
professores para orientar a sua prática docente? Com objetivo de identificar, por meio de
entrevistas como os professores pesquisados utilizam as informações fornecidas pelos
sistemas oficiais de avaliação da educação, a exemplo do programa Prova Brasil e SAEB,
para orientar seu planejamento pedagógico, sua prática docente e avaliativa. Assim, a
pesquisa baseou-se inicialmente em levantamentos e estudos bibliográficos a fim de
compreender a complexidade dos conceitos relacionados à avaliação educacional e para o
embasamento das análises dos dados coletados pelas observações de campo e entrevistas
estruturadas. Os resultados das observações de campo e as análises das entrevistas foram
discutidos com base em diferentes autores que abordam o tema da avaliação educacional.
Palavras - chave: Avaliação Educacional. Avaliação da Aprendizagem. Prova Brasil; SAEB.
Programas de Avaliação.
INTRODUÇÃO
A temática da avaliação educacional, cada vez mais, tem conquistado um espaço
privilegiado na produção teórica na área das ciências humanas, principalmente no Brasil,
revelando uma crescente e diversificada preocupação com o tema.
Com o esforço do governo brasileiro em quantificar a educação básica, os sistemas
de avaliação oficiais se tornam uma realidade na educação brasileira a partir da década de
1980, mais especificamente com a institucionalização do SAEB (Sistema de Avaliação da
Educação Básica) chamado primeiramente de avaliação do ensino de primeiro grau - SAEP.
As avaliações externas da educação básica a partir da década de 1990 ganham
contornos específicos de um instrumento de regulação do Estado por meio de políticas
45
Acadêmico do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Rondônia – Campus de Rolim de
Moura. Bolsista Voluntário do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC/CNPq.
46
Profª. Drª. na Universidade Federal de Rondônia – Campus de Rolim de Moura/Departamento de
Educação. Orientadora do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC/CNPq.
206
educacionais que visam à melhoria da qualidade do ensino básico. A importância que a
educação básica vem tendo nas políticas educacionais justifica-se por ser esse o nível de
ensino em que a busca de melhoria da qualidade melhor responde às solicitações do mercado,
dentro de padrões pré-estabelecidos e encorajados pelas agências de fomento e órgãos
internacionais (Barreiros, 2003). Um fator preocupante e de destaque nesse nível de ensino é
que nele se encontram os maiores problemas enfrentados pela educação brasileira, a saber, a
reprovação e a evasão escolar (Gama 2002).
Neste sentido, a avaliação educacional, relacionada ao sistema educativo, objetiva
diagnosticar e subsidiar a implementação ou manutenção de políticas educacionais, devendo
também monitorar continuamente o sistema educacional para apontar os efeitos das políticas
adotadas. Um sistema de avaliação deve obter e organizar informações periódicas e
comparáveis sobre os diferentes aspectos do sistema educacional. Assim, a avaliação
educacional passa a ser usada como tentativa de encontrar possíveis soluções para os
problemas enfrentados pela educação. Isso porque há um entendimento de que o desempenho
dos alunos nestas avaliações determina a elevação nos padrões educacionais do país.
De acordo com Viana (2003) a avaliação tem finalidades distintas, e uma de suas
finalidades é a identificação de problemas na aprendizagem. Para ele as avaliações apenas
apontam problemas, mas não os solucionam. Sendo o ato de avaliar parte da atuação do
professor, a avaliação passa, então, a ter relação direta com os processos educativos escolares
e o trabalho do professor. Ela permite verificar, diretamente, o nível de aprendizagem dos
alunos, e também, indiretamente, permite determinar a qualidade do processo de ensino, isto
é, o êxito do trabalho do professor.
A avaliação deve fazer parte da rotina escolar e trazer benefícios para os envolvidos,
o momento de avaliar tem que trazer questionamentos que estimulem o desenvolvimento do
aluno. Ser a facilitadora da aprendizagem. Faria (1989) destaca a função da avaliação
relacionada ao ensino, ou seja, a de oferecer informações ao professor a respeito da eficácia
dos materiais e métodos que ele costuma utilizar. Para este autor os exames auxiliariam a
localizar aspectos do ensino ministrado que mereceriam ser corrigidos.
A tarefa de avaliar não é exclusiva do professor, mas estende-se a outros elementos
participantes do processo educacional, como alunos, pais e administradores. Neste sentido a
avaliação implica em julgamento do desempenho educacional, tendo como parâmetro os
objetivos previamente fixados. Essa compreensão evidencia uma avaliação centrada em
objetivos que dimensionam o desempenho esperado e em razão dos quais serão apreciados os
resultados obtidos.
207
OS PROGRAMAS NACIONAIS DE AVALIAÇÃO DA EDUCAÇÃO BÁSICA
Com a intensificação de pesquisas no âmbito da educação nas décadas de 1960,
1970, 1980 e 1990 e com a finalidade de avaliar o ensino oferecido pelas instituições de
ensino, deu-se início a uma ampla política de avaliação do rendimento de alunos de escolas
públicas em todo o país, por iniciativa do Ministério de Educação e desenvolvida pelo INEP
(Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) no que se refere à implantação e
desenvolvimento de programas nacionais de avaliação da educação básica. Estes visavam, no
final da década de 1980, identificar, na diversidade do quadro educacional brasileiro, pontos
curriculares críticos; verificar o desempenho em aspectos cognitivos básicos dos alunos e
subsidiar os professores para uma recuperação de seus alunos.
Dois programas são marcantes nesse contexto, o SAEB e o Prova Brasil. O programa
Prova Brasil tem caráter censitário e o SAEB é uma amostra das escolas participantes da
Prova Brasil, ambos sendo realizados em biênios. Seus resultados abrangem todo o território
nacional e são adequados para avaliarem redes ou sistemas de ensino, e não alunos
individualmente. Esse fato possibilita a discussão dos resultados dentro da escola, permitindo
a auto-avaliação e consequente adoção de medidas para melhorar o desempenho. Possibilita,
ainda, o desenvolvimento de projetos de intervenção pedagógica, vinculados aos resultados
das avaliações cotidianas realizadas pelo professor. Segundo Carvalho (2010) o foco no
processo da aprendizagem, conferido pela avaliação interna, e os resultados dados pelas
avaliações oficiais se complementam em suas diferentes funções materializando-se através
dos projetos de intervenção pedagógicas.
O Prova Brasil foi criado em 2005, como um desmembramento do SAEB a fim de
oferecer dados mais específicos sobre os municípios e as escolas. É destinado aos alunos do
5° e 9° ano do ensino fundamental de todas as escolas da rede pública urbana e rural. Sua
abrangência é universal, contando com a participação de todos os alunos das respectivas
séries, e os resultados de uma parcela das escolas participantes compõe os resultados do
SAEB.
O SAEB (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica) é composto de uma
amostra das mesmas séries avaliadas pelo Prova Brasil acrescentando ainda o 3º ano do
Ensino Médio. Pretendendo contribuir para a universalização do acesso à escola e a ampliação
da equidade e da eficiência do sistema educacional brasileiro fornecendo subsídios à
formulação de políticas e diretrizes adequadas à diversidade de situações.
208
As notas dessas avaliações são usadas para compor o Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica (IDEB), instrumento que o governo federal tem utilizado para definir
políticas públicas destinadas à melhoria da educação em nosso país. A partir de 2007, os dois
exames passaram a ser realizados em conjunto.
A AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM NA PERSPECTIVA DA SALA DE AULA
Muitos são os alertas para os riscos do uso da avaliação punitiva, seletiva e
classificatória como forma de dominação (Gama, 2002). Uma das conseqüências dessa prática
leva o aluno a sentir-se incapaz de aprender. Outro grande problema da avaliação
classificatória é o alto índice de reprovação e evasão escolar, logo nos primeiros anos,
refletidos nas séries subsequentes.
A forma como a avaliação educacional é praticada pela escola, reflete no
desempenho dos alunos, estando representada pelos altos índices de evasão e repetência
escolar. Estando a escola simplesmente interessada em classificar seus alunos, forçando
professores e instituições utilizarem métodos que desqualifica e não ajuda no rendimento
escolar. Uma prática excludente, punitiva e classificatória. A avaliação classificatória não
proporciona espaços significativos para um diálogo profundo, em que o processo e seus
resultados possam ser compartilhados pelos sujeitos envolvidos. (Esteban, 2005)
Gama (2002) observa um número significativo de professores que utilizam à
avaliação como um método de mera averiguação da aprendizagem. Esse fato faz com que as
aulas se resumam apenas a momentos de preparação para os testes e provas. Assim, para o
autor, a aula torna-se uma revisão de conteúdos pré-determinados pelo currículo escolar,
muitas vezes constituindo-se num exercício autoritário de julgamento de capacidades. Porém,
o autor ressalta que, esta pode ser usada de forma a proporcionar uma mudança qualitativa na
atuação do avaliador, num processo que tem como propósito, o acompanhamento contínuo
dos processos de ensino e aprendizagem, numa prática dialética e não apenas instrumental.
Logo, a avaliação da aprendizagem deve ser um processo contínuo, sistemático e integral, que
não pode ser improvisado, deve ser planejada, e realizada em função de objetivos. Que não
visa punir alunos, mas orientá-los nos processos de ensino/aprendizagem, pois analisa e julga
todas as dimensões do comportamento, considerando o aluno como um todo. (Haydt, 1994)
Nesse sentido, a avaliação assume nova função, pois se torna um meio de
diagnosticar e de verificar se os alunos estão alcançando os objetivos proposto pelo
209
planejamento escolar. Por meio dela, o professor observa se suas aulas estão sendo
produtivas. Segundo Hoffmann (1993) ao propor uma avaliação mediadora que liberte o aluno
do paradigma reprovação/aprovação alguns professores se vêem assustados com a
possibilidade de abolir práticas herdadas da escola behaviorista. Práticas estas enraizada no
tradicionalismo.
A ação mediadora tem uma postura construtivista na educação, onde a relação
dialógica possibilita inúmeros momentos em que é possível a troca de experiências
progressivas entre professor e aluno. A avaliação educacional encarada como uma questão
dialética serve de mediadora entre as práticas de ensino-aprendizagem partindo do princípio
de que todos os envolvidos no processo estão sujeitos a ela.
Por fim, a avaliação da aprendizagem, também conhecida como avaliação do
processo ensino-aprendizagem ou avaliação do rendimento escolar, julga o desempenho do
aluno, professores e de toda a situação de ensino. Seu principal objetivo é o aperfeiçoamento
do ensino. Torna-se um instrumento eficaz e valioso quando utilizado com o propósito de
analisar e compreender o processo de aprendizagem. Para Cury (apud Gama, 2002) a
educação dá sustentação para uma mudança social e a avaliação pode ser usada para que
ocorra uma mudança de personalidade já que ela é um critério de dominação usado na escola,
podendo ser utilizada como método transformador.
MATERIAIS E METODOS
A pesquisa iniciou com a reunião do grupo de pesquisa, onde foram apresentados os
participantes e entregue a cada um seu respectivo plano de trabalho. Os participantes foram
divididos em dois grupos, ficando o primeiro grupo responsável por realizar o levantamento
dos dados nas escolas municipais e o segundo grupo responsável pela mesma tarefa nas
escolas estaduais.
O levantamento de dados sobre as escolas ocorreu com a finalidade de obtermos
informações quanto à quantidade de turmas do primeiro ao quinto ano, e quantidade de alunos
por turma.
Em uma segunda reunião os participantes da pesquisa foram divididos para que
fossem feitos os levantamentos bibliográficos nas instituições de ensino superior e repartições
públicas de ensino com o objetivo de mapear os exemplares que tratam sobre a temática da
avaliação.
210
Com os acervos bibliográficos mapeados a orientadora, selecionou as obras que
foram lidas pelos bolsistas, voluntários e colaboradores os quais fizeram um estudo
bibliográfico por meio de fichamentos e resenhas, a fim de fundamentação teórica sobre a
temática.
A seleção das escolas para que a pesquisa fosse desenvolvida foi feita através da
técnica de amostragem aleatória simples. Com a definição das amostras iniciaram-se os
procedimentos da coleta de dados em campo por meio das observações diretas. Os dados
obtidos nas observações foram registrados em um caderno de campo, com descrição
minuciosa da aula.
A coleta de dados se deu no final do ano letivo de 2011, sendo possível observarmos
a prática docente no que diz respeito à avaliação e seus procedimentos.
Após as observações de campo foram elaboradas as questões para que fossem feitas
as entrevistas direcionadas aos professores das escolas e classes observadas. O período de
realização das mesmas foi entre março e abril de 2012.
Após a realização das entrevistas fizemos a análise das mesmas, com base no
referencial teórico construído, no que diz respeito à utilização dos resultados das avaliações
oficiais realizadas na escola.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
A coleta de dados da pesquisa ocorreu em dois momentos diferentes. No primeiro
deles, referente às observações de campo, foram obtidos dados quanto à metodologia de
trabalho do professor e sua prática avaliativa. No segundo momento foram realizadas as
entrevistas estruturadas para a coleta de informações a respeito dos conhecimentos dos
professores pesquisados sobre o tema da avaliação e como os resultados das avaliações
oficiais se materializam na escola.
De acordo com as observações realizadas o modo como à avaliação aconteceu nas
escolas está pautado em práticas que punem os alunos. Isso se observou pala fala de alguns
professores quando tentavam justificar a retenção dos alunos que não haviam alcançado boas
notas para serem aprovados para o 5° ano do ensino fundamental. Observe a fala dos
professores H1 e F2:
211
“Ano que vem vou estar aqui de novo, não quero nem saber, vai ter que
estudar comigo de novo, a não ser que me mudem de ano, só não quero 1°
ano!” (caderno de campo, escola X, professor H1. 07/11/2011).
“Sabe eu tenho alunos muito bons, mas são poucos. Aqui tem aluno que já
está reprovado, mas não pode ficar sem vim na [sic.] aula, então, estão aqui
[...].” (caderno de campo, escola B, professor F2. 16/11/2011).
“[...] aquele aluno que senta ali no fundo, veja bem, quando ele veiopara cá
no segundo bimestre não sabia nem ler, tive que fazer um caderno específico
para ele. Agora, já está bem adiantado, mas não me preocupa mais, pois sei
que vai reprovar”. (caderno de campo, escola A, professor F1, 04/11/2011)
Na perspectiva dos sujeitos estudados, quando o aluno não alcança média ao final do
ano letivo, ainda que em apenas uma disciplina, isso o deixa inapto para o próximo nível. Não
alcançando a média anual de 60 pontos estipulados pela Portaria 1001/2008/GAB/SEDUC, o
aluno é desqualificado para o acesso ao próximo ano/série gerando um quadro de defasagem e
fracasso escolar. Pelos fragmentos das falas dos professores citados a cima, observou-se a
freqüência de uma prática de avaliação seletiva e classificatória, apenas para fins de promoção
do aluno.
O planejamento da aula como pôde ser observado sumariza-se em uma pauta escrita
no quadro pelo professor. A falta do planejamento reflete diretamente na aula sendo que nos
registros de campo foram presenciados alguns momentos em que o professor perdeu o
controle da classe e tomou medidas enérgicas para retomar o controle, a forma utilizada foi
claramente punitiva. Como demonstramos no fragmento de fala a baixo:
“Agora vou usar a mesma estratégia dos colonizadores. Rafael [nome
fictício] vem pra frente! Henrique [nome fictício] vai para o fundo! Celestino
[nome fictício] na outra fileira. Agora vocês estão separados, quero ver
conversar. Cadê o caderno pra mim [sic.] vistar? Não fez! Vai reprovar! Não
faz nada na aula!” (Escola X, professor H1, 14/11/2011).
Assim, vimos nas observações de campo o uso da avaliação punitiva e classificatória,
utilizada como forma ameaçadora e disciplinadora em sala de aula. Essa experiência
demonstrou que nos casos estudados, há uma relação desconexa entre a prática docente
avaliativa, entre a prática da avaliação em sala de aula e o planejamento de ensino, e ainda,
um distanciamento entre a ação pedagógica nas escolas e os resultados das avaliações oficiais
do Estado.
Duas questões das entrevistas estruturadas abordaram a relação direta entre os
programas oficiais de avaliação e a utilização dos seus resultados por parte da escola e dos
professores. São elas: Com relação aos programas de avaliação da educação desenvolvidos
pelo governo, sabemos que são muitos. Tem o SAEB, o Prova e Provinha Brasil, ENEM e
212
Enade. Qual o seu ponto de vista sobre a avaliação dos sistemas educacionais e a forma como
ela se materializa através destes programas? O SAEB e o Prova Brasil são programas oficias e
nacionais de avaliação da educação básica para o ensino fundamental. Nível de ensino o qual
você desenvolve sua atuação profissional. Os resultados desses programas retornam à escola
de formas variadas, podendo ser informados via secretaria de educação e ainda, informada e
discutida pela direção e coordenação pedagógica da escola, ou mesmo consultados pela
internet. Como você tem acesso a esses resultados? O que a escola, e você, particularmente
faz com estes resultados? Estas foram aplicadas a oito professores das escolas estaduais
observados na primeira etapa de coleta de dados.
Quanto à primeira questão, o que se buscou foi conhecer o grau de informação e
conhecimento dos professores com relação aos programas de avaliação citados e qual juízo
estes professores fazem sobre os mesmo. Algumas das respostas obtidas são aqui
apresentadas.
“No meu ponto de vista, essas provinhas são para medir os níveis de
conhecimento dos alunos, mas não é isso que acontece. Por serem totalmente
objetivas, às vezes, os alunos de níveis inferiores acertam mais dos que
aqueles que já lêem, ou seja, pode ser respondida ao acaso, ou de memória.
Portanto, não pode constatar o que o aluno adquiriu de conhecimento”.
(escola A, professor F1)
“Então, essas avaliações são elaboradas a nível de Brasil, perguntas objetivas
geralmente de marcar X, não se levam em consideração a diversidade. A
avaliação é feita para todos de uma forma igual. Aquela criança especial, se
por acaso, ela tiver uma pontuação menor, vai interferir no índice de toda a
turma”. (escola D, professor F4)
“Eu ainda não passei por isso. Eu não tive essa experiência, ainda, de
explicar a Provinha Brasil. Então fica difícil para eu falar como que é,
apesar, de já estarmos trabalhando, porque na hora, quando eu faço o meu
planejamento com os demais professores, elas estão-me orientando na
questão de como trabalhar para que essas crianças consigam fazer a
provinha. Então, a gente já trabalha em cima do conteúdo para as crianças
não ficarem tão perdidas na hora da provinha. (escola E, professor F5)
“Eu conheço muito pouco. Eu nunca estive em uma série que estivesse sendo
avaliada. (...) a gente fica sabendo dessa nota e através dessa nota, que
reflete a situação do aluno, é que a gente estabelece as metas, os métodos, os
projetos... tudo que a gente vai tentar para resolver a baixa nota. Ou também
rever a prática, às vezes quando melhorou a gente analisa tudo e vê o que
funcionou, o que teve um efeito positivo, e a partir disso, a gente trabalha,
tenta aplicar onde está precisando melhorar. É assim”. (escola F, professor
F6)
“Eu já trabalhei com algumas dessas questões. Você deve levar em
consideração o aspecto cultural do aluno, região essas coisas todas, quando
213
você vê essas avaliação que tem uma abrangência tão grande algumas teorias
você vê elas sendo dizimadas deixa de ter valor, porque quando você passa
algumas dessas questões aqui de ENEM e SAEB muitas vezes o aluno não
tem o conhecimento, porque não faz parte do seu dia a dia, acho que ela
deveria ser trabalhada em cada região. (escola X, professor H1)
O que se verificou, pelas respostas obtidas, foi um baixo conhecimento, por parte dos
professores entrevistados, sobre os programas oficiais de avaliação da educação. E, a formas
de tentar justificar tal desconhecimento vem em afirmações do tipo “Eu ainda não passei por
isso. Eu não tive essa experiência” ou ainda “Eu conheço muito pouco. Eu nunca estive em
uma série que estivesse sendo avaliada”. Verificou-se ainda, equívocos de compreensão sobre
a metodologia de aplicação destas avaliações sistêmicas no que se refere ao acerto ao acaso e
a generalização dos instrumentos para todas as regiões do país.
Outro ponto de destaque nas respostas apresentadas a cima foi como esses resultados
chegam até a escola e aos professores e como são discutidos por eles. As respostas
demonstraram que tais resultados não são amplamente divulgados na escola e são discutidos
superficialmente pela equipe pedagógica e gestora. Esse fato reflete que tais avaliações não
alcançam seu principal objetivo de fornecer dados e informações á escola, para que esta
analise e reveja suas ações na busca de aprimoramento e melhorias no sistema.
A segunda questão que se apresentou aos professores buscou conhecer o que a escola
e eles, particularmente, fazem ao tomarem conhecimento dos resultados das avaliações
oficiais, ou seja, como professores e escola se apropriam desses resultados e os transformam
em ação pedagógica. Seguem algumas das respostas obtidas.
“Então, os resultados a gente tem visto pela internet, vêm uns materiais para
a escola enviados pelo MEC. Também, esses tempos, estava no mural da
escola. A nossa coordenadora expôs lá, no mural, p’ra gente [sic] estar
vendo a classificação da nossa escola. Com relação aos resultados, não tem
sido muito discutidos não. A gente tem aí, também, o PDE levando a
aprovação do aluno. Não adianta só elevar as medidas, mas as aprendizagens
do aluno”. (escola C, professor F3)
“Eu tenho acesso à informação pela direção da escola, e a partir dessas
informações é feito um trabalho para que aumente o índice, a nota da escola.
Só que é feita da seguinte forma, é passado pela direção da escola o
resultado e aí cada profissional vai trabalhar, utilizando formas diferenciadas
para que haja um maior desempenho da turma”. (escola D, professor F4)
“Eu não tenho essa experiência, ano passado as professoras do 2° Ano
aplicaram as provinhas e eu não vi como foi o processo, daí elas receberam
essas notas dói colocadas no edital na sala dos professores, aconteceu uma
reunião na escola e participou que aplicou a prova e os demais também e é
discutida o porquê destas notas” (escola E, professor F5)
214
“A coordenação pedagógica da escola sempre nos informa, eu e o grupo da
escola sempre procuramos discutir os resultados e procuramos estabelecer
metas, projetos uma metodologia diferenciada se inscreverem em programas
do governo para tentar melhorar aquele resultado que não foi tão bom”.
(escola F, professor F6)
“Na verdade agente nem tem esse resultado. Às vezes você fica sabendo,
assim, por alto, mas nem sabe qual a realidade. Não passa a ser mais
discutida em sala de aula. Só chega p’ra gente [sic.] aplicar (...) e quando
vem o resultado ninguém busca trabalhar em cima daquilo p’ra [sic.] buscar
algo melhor. Eu acho que o objetivo seria esse, avaliar seu aluno e trabalhar
em cima daquilo que ele não alcançou, mas não se faz nada, não se pensa”.
(escola X, professor H1)
Neste sentido foram encontrados diversos problemas relacionados à eficiência dos
métodos avaliativos utilizados nas avaliações oficiais. Uma vez que a utilização dos seus
resultados, por parte da escola e dos professores, ainda, é muito pequena devido à amplitude
de divulgação, discussão e materializam destes em ações pedagógicas efetivas de
aprimoramento e melhoria da qualidade do ensino.
Nota-se que a preocupação do professor é com a elevação do desempenho da escola
e o preparo da aula para questões que poderão cair nos testes. Esta prática é prejudicial para o
aluno visto que este se torna refém das avaliações com foco em seus rendimentos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tendo por base as evidências obtidas pelos procedimentos da pesquisa, ficou claro
que a prática da avaliação nas escolas da rede pública estadual de Rondônia vem acontecendo
de forma a desqualificar o aluno para o acesso ao próximo ano/série, pautando-se em práticas
punitivas e classificatórias e gerando um quadro de defasagem e fracasso escolar prejudiciais
ao sistema de ensino como um todo, e não apenas ao aluno no âmbito de sua individualidade.
Ficou patente, nas práticas observadas que o planejamento de ensino e das aulas, de
uma maneira geral, sumariza-se em uma pauta reduzida. Essa falta de planejamento vem
refletindo diretamente qualidade da aula uma vez que o professor perde o controle disciplinar
da classe e passa a tomar medidas enérgicas para retomá-lo. Nesse momento a avaliação
ganha contornos disciplinadores e ameaçadores.
No que se refere aos conhecimentos dos professores estudados sobre os programas
oficiais do governo federal para a avaliação da educação básica, identificou-se um baixo grau
de conhecimento dos mesmos, muitas vezes justificado por explicações que revelam a não
experiência em ano/séries avaliados pelo SAEB e Prova Brasil. Ou seja, se o professor não
215
leciona em uma turma, cujo ano/série fazem parte do universo a ser avaliado pelos programas
mencionados, ele não precisa conhecê-lo aprofundadamente. E ainda, se sua turma não passa
por essa avaliação, ele se sente desobrigado, ou mesmo, sem uma responsabilidade direta com
os resultados alcançados pela escola. Verificou-se ainda, equívocos de compreensão sobre a
metodologia de aplicação destas avaliações sistêmicas no que se refere ao acerto ao acaso e a
generalização dos instrumentos para todas as regiões do país.
Destaque foi dado aos dados que revelam como esses resultados chegam até a escola
e aos professores e como são discutidos por eles. As respostas demonstraram que estes não
são amplamente divulgados na escola e são discutidos superficialmente pela equipe
pedagógica e gestora. Isso reflete que tais avaliações não alcançam seu principal objetivo de
fornecer dados e informações à escola, a fim de que esta analise e reveja suas ações na busca
de aprimoramento e melhorias no sistema.
Uma vez que a utilização dos resultados dos programas oficiais de avaliação da
educação básica do governo federal não são devidamente apropriados e utilizados pela escola
seus professores, devido a sua baixa amplitude de divulgação e discussão, a materialização
destes em ações pedagógicas efetivas de aprimoramento e melhoria da qualidade do ensino
fica quase inexistente. Nos casos estudados, fica clara a relação desconexa entre a prática da
avaliação em sala de aula e o planejamento de ensino, e ainda, um distanciamento entre a ação
pedagógica das e nas escolas e os resultados das avaliações oficiais do Estado.
Sendo assim, entendemos que a escola, seus sujeitos e os agentes formuladores de
políticas educacionais, ao proporem a educação como método de transformação social, devem
garantir que todas as práticas que a segue devam ter seus objetivos voltados à melhoria e
conscientização de seus participantes.
Devido à complexidade da avaliação educacional, e sua vertente de avaliação da
aprendizagem, muitos professores têm uma visão simplória do ato avaliativo, tornando-o uma
prática classificatória, punitiva, com a utilização de métodos tradicionais para a sua
efetivação.
No que diz respeito às avaliações oficiais do governo federal para a educação básica
e sua efetivação no seio das escolas, e sua influência na criação de políticas educacionais,
ficou evidente que estas não vêm servindo bem nem à função de controle mantida pelo
Estado, tão pouco à finalidade de aprimoramento do sistema e melhoria da qualidade da
educação pública. O que tais programas vêm cumprindo são as exigências internacionais
postas por organismos como o Banco Mundial.
216
REFERÊNCIAS
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vínculos entre avaliação e currículo. Dissertação de mestrado apresentada ao Curso de PósGraduação em Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2003.
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Papirus, 2003.
CARVALHO, Gisele Francisca da Silva. Avaliação oficial: subsídios para a compreensão
do impacto na prática docente. Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de PósGraduação: Processos Socioeducativos e Práticas Escolares da Universidade Federal de São
João Del-Rei. São João Del-Rei/MG, Março de 2010.
ESTEBAN Maria Tereza/org. Escola, currículo e avaliação 2ª ed. São Paulo: Cortez, 2005.
GAMA, Zacarias Jaegger. Avaliação na escola de 2° grau. 3ª ed. Campinas: Papirus, 2002.
HAYDT, Regina Cazaux. Avaliação do Processo Ensino-Aprendizagem. São Paulo, Ática,
2001.
HOFFMANN, Jussara. Avaliação mediadora: uma prática em construção da pré-escola à
universidade. 20ª ed. Porto Alegre: Mediação, 1993.
MIRANDA, Flavine Assis de. Avaliação educacional no interior amazônico: entre a
regulação e a emancipação. Tese de doutorado. Universidade Estadual Paulista Júlio de
Mesquita Filho/UNESP/FCLAR, 2010.
MACHADO Ednéia Maria Azevedo. OLIVEIRA Maria de Fátima de. O estágio
supervisionado no curso de pedagogia e suas contribuições na formação docente.
Disponível em: <http://[email protected]>.
PERRENOUD, Phillipe. Avaliação: da excelência à regulação das aprendizagens. Porto
Alegre: Artes Médicas, 1999.
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Trabalho de conclusão de curso, para título de graduação pela Universidade Norte do Paraná,
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Papirus, 1991.
VIANA, Heraldo Marelim. Avaliações em Debate: SAEB, ENEM, PROVÃO. Brasília:
Plano, 2003.
A ORDEM SINTÁTICA DA L1 (TUPI-KAWAHIB)
217
NA ESCRITA EM L2 (LÍNGUA PORTUGUESA) 47
Julie Dorrico48
[email protected]
Wany Bernardete de Araujo Sampaio49
[email protected]
RESUMO
Este trabalho busca examinar possíveis manifestações da Gramática da L1 (Língua Materna) na
escrita em L2 (Língua Portuguesa) de professores indígenas em formação, enfocando
especialmente questões referentes à ordem sintática, considerando o valor do reconhecimento da
multietnicidade, pluralidade e diversidade dos povos nativos brasileiros e suas culturas e línguas
que são frutos da herança de gerações anteriores, mas que estão sempre em eterna construção,
reelaboração, criação e desenvolvimento.
Palavras - chaves: Ordem Sintática. Manifestações Gramaticais da L1 na Escrita em L2.
Formação de professores. Pluralidade e Multietnicidade.
ABSTRACT
This paper seeks to examine possible manifestations of the L1 grammar (Mother Tongue) in
writing in L2 (Portuguese) of indigenous teachers in training, focusing mainly on issues related to
syntactical order, recognizing the value of multiethnicity, plurality and diversity of native
brazilian peoples, their cultures and languages that are the fruit of the heritage of previous
generations, but always in eternal construction, rework, design and development.
Key-words: Syntactic Order. Manifestations of Grammar in Writing L1 in L2. Teacher Training.
Plurality and Multiethnicity.
INTRODUÇÃO
A presente pesquisa procurou analisar manifestações gramaticais da L1(Língua
Materna) na escrita em L2 (Língua Portuguesa) de professores indígenas em formação, a fim
de discutir a ordem sintática.
47
Texto produzido a partir de resultados finais do projeto de pesquisa Manifestação da ordem sintática da
L1(Língua Materna) na escrita em L2(Língua Portuguesa) de professores indígenas em formação, desenvolvido
pelo Grupo de Estudos em Culturas, Educação e Linguagens, Centro de Estudos da Linguagem, Departamento
de Línguas Vernáculas/NED/UNIR, com o apoio do PIBIC/UNIR/CNPq. Orientadora: Wany Bernardete de Araujo
Sampaio.
48
Acadêmica do sétimo período do Curso de Letras-Português/UNIR. Orientanda PIBIC/ UNIR/ CNPq.
49
Dra. em Línguística; Dra. em Educação Escolar. Departamento de Línguas Vernáculas. UNIR
218
A discussão acerca da ordem pautou-se na suposição de que, ao tornar-se consciente
das diferenças entre a L1 e a L2, os falantes (indígenas) estariam mais aptos a controlar a
transferência inadvertida de padrões sintáticos de sua língua materna para o português
(MAIA, 2005). A explicitação dos padrões de ordem vocabular dominante (MAIA, 2005)
poderia facilitar a aquisição de uma L2, considerando que os processos de aquisição não são
atingidos de forma plena em ambiente artificial; por outro lado, é importante que os
professores formadores de professores indígenas estejam inteirados do que ocorre no processo
de ensino-aprendizagem de uma L1 para uma L2, reconhecendo os processos próprios de
aprendizagem dos povos indígenas.
No que se refere à formação de professores indígenas, a pesquisa tomou por base os
documentos - Referencial Curricular Nacional para as Escolas Indígenas/ Referenciais para a
Formação de Professores Indígenas - e a sua tarefa de apresentar-se como veículo para
subsidiar e apoiar professores na tarefa de invenção e reinvenção contínua de suas práticas
escolares.
PROCEDIMENTOS
A pesquisa constituiu-se de análise estrutural de textos escritos em português por
indígenas usuários de línguas Tupi-Kawahib (Uru-eu-uau-uau e Amondawa); os indígenas são
professores em formação através do Projeto AÇAI II. Analisando as sentenças escolhidas,
buscamos ver como a ordem da sentença escrita em português mostra manifestações da língua
materna na estrutura escrita do falante em processo de aprendizado.
RESULTADOS
Os exemplos a seguir são de professores Uru-eu-uau-uau e Amondawa em formação,
através do Projeto AÇAI II, que se insere no Programa de Educação Indígena desenvolvido
pelo Governo do Estado de Rondônia, e tem a formulação de uma política pública de
educação para as comunidades indígenas, sob olhar dos conceitos de multiculturalismo,
interculturalidade e alteridade, encontrados nos documentos oficiais que fundamentam o
Referencial Curricular Nacional de Educação Indígena (RCNEI) e as Políticas Públicas de
Educação Indígena. (VENERE, 2011).
219
Tais exemplos são utilizados com a finalidade de discutir manifestações que indicam
a diferenciação da L1 (Língua Materna) na escrita em L2 (Língua portuguesa):
EXEMPLO 1
Sentença escrita em português por falante tupi-kawahib (análise morfológica):
Como
aldeia meia dois um
Pron.
Subs.
surgiu
Numeral
VI
Ordem da sentença em português (análise sintática):
Como
(a) aldeia meia dois um
Pron.
surgiu
S
VI
c) Ordem da sentença escrita por falante da língua Tupi-Kawahib (análise sintática):
Como
Pron.
aldeia meia dois um
S
surgiu
VI
Nesta sentença, escrita pelo falante Tupi-Kawahib, a ordenação da categoria
sintagmática lexical da sentença em língua portuguesa é: SV.
Na língua amondawa é incomum o verbo em uma sentença aparecer no final da frase,
pois a constituição do sintagma verbal (SV) ocorre com um prefixo pronominal + verbo
(Tupi-Kawahib). O pronome (COMO) é relativo na sentença, o Sujeito (ALDEIA MEIA
DOIS UM) nominativo, e o Verbo (SURGIU) intrasitivo, portanto não pede complemento.
A colocação do verbo no final da frase, considerando que o mesmo se apresenta na
língua materna constituído de prefixo pronominal+verbo, revela que os parâmetros da
estrutura da gramática da L2 indicam que há internalizações inadvertidas (MAIA, 2005) no
falante que se apresentam na escrita na língua portuguesa.
Verifica-se também que no tupi-kawahib quando o VI não é acompanhado de S-nãohumano, têm-se duas diferentes ordens: SV e VS. Exemplo: i) se houver, na sentença, um
morfema circunstancial, a ordem será SV; ii) se a construção tiver apenas o sujeito mais o
verbo, a ordem será VS (SAMPAIO, 2000).
220
Como se vê, a ordenação do sintagma com verbo intransitivo em amondawa pode ser:
SV ou VS. Considerando que a constituição do sintagma verbal em amondawa é
V=Pess.Ag+R, e no início da frase, a manifestação do verbo intransitivo com ordenação no
final da frase (SV - que é mais comum na gramática da L2), na escrita em língua
portuguesa pode sugerir que o falante tupi-kawahib já tenha iniciado um processo de
internalização das estruturas gramaticais da L2.
EXEMPLO 2
a) Análise morfológica da sentença escrita por falante amondawa
Bom
nós
não
Adj.
Pron. Adv.
damos a o
V
Art.
valor para
Subs. Prep.
coisa própria nossa
S
Adj. Pron. Poss. Posp.
b) Análise sintática da sentença escrita por falante Amondawa
Bom
nós
não
Suj.
Adv
V
damos (a) o
O
valor para
coisa própria nossa
O
Na sentença (a) produzida pelo falante Amondawa/Tupi-Kawahib, a ordem da
sentença na oração é: Sujeito + Verbo + Objeto. Neste exemplo podemos ver que os
determinantes (A) e o (O) são utilizados ao mesmo tempo, entretanto tal utilização é posta na
221
estrutura da oração para atuar como um elemento de hipercorreção do indivíduo, pois tal
colocação não ocorre em uma construçãoamondawa, nem em língua portuguesa. O sujeito
está representado por um pronome pessoal (NÓS) anteposto ao verbo; o verbo (DAMOS) é
solícito de complemento, também comumente usado no português; porém, o determinante
(que marca o objeto, em língua portuguesa, definindo-o ou caracterizando-o) que comumente
é suprimido dado a não existência de tal marca no tronco tupi-kawahib é utilizado no
sintagma duplamente (A e O), demonstrando uma oscilação no uso do componente (DET) na
relação com o núcleo do sintagma (VALOR).
Em tupi-kawahib a forma pronominal genitiva é posposta ao nome possuído. O
deslocamento do possessivo nossa (COISA PRÓPRIA NOSSA) que surge na sentença escrita
em português pelo falante amondawa é utilizado, talvez, em uma tentativa de hipercorrigir; é
possível que o deslocamento da forma pronominal em português se explique por analogia
com o possessivo de 3° pessoa da língua portuguesa (cf. meu livro, teu livro, livro dele (a)),
que é posposto ao nome possuído e a ele vinculado por meio de preposição (dele = de + ele);
o processo analógico pode ocasionar o conhecido fenômeno da hipercorreção, que decorre
de uma hipótese que o falante realiza, em um esforço para aprender a língua-alvo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Através deste estudo, buscamos analisar possíveis manifestações da ordem sintática da
L1 (Língua Materna) na escrita da L2 (Língua Portuguesa) na escrita da língua portuguesa
(L2) professores indígenas em formação. Na etapa final, obtivemos importantes resultados:
(i) A constituição do sintagma verbal em amondawa é V=Pess.Ag+R em posição
inicial; a manifestação do verbo intransitivo com ordenação no final da frase (SV - que é
mais comum na gramática da L2), na escrita em língua portuguesa sugere que o falante
tupi-kawahib iniciou um processo de internalização das estruturas da L2.
(ii) O deslocamento da forma pronominal da 1ª pessoa do plural (nossa) para depois
do SN; possivelmente esse fato decorre da analogia com o possessivo de 3ª pessoa da língua
portuguesa (cf. meu livro, teu livro, livro dele (a)), que é posposto ao nome possuído e a ele
vinculado por meio de preposição (dele = de + ele); o processo analógico pode ocasionar o
conhecido fenômeno da hipercorreção, que decorre de uma hipótese que o falante realiza, em
um esforço para aprender a língua-alvo.
Portanto, consideramos que esta pesquisa seja muito relevante, não somente para o
conhecimento de línguas indígenas, mas também para incentivar modelos educativos e
222
metodológicos no processo de formação de professores indígenas na compreensão e
assimilação das estruturas e funcionamento da língua portuguesa escrita e também para que os
professores formadores de professores indígenas possam auxiliar tais professores indígenas
em formação no processo educativo, respeitando a pluralidade étnica e linguística desses
povos nativos.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Referencial curricular nacional para as escolas indígenas/Ministério da
Educação e do Desporto, Secretaria de Educação Fundamental. - Brasília: MEC/SEF,
1998.
BRASIL. Ministério da Educação Referenciais para a formação de professores
indígenas/Secretaria de Educação Fundamental — Brasília : MEC ;SEF, 2002.
FARIA CARDOSO, V. Um estudo de categorias sintagmáticas da língua
Kaiowá/Guarani, 2001. Disponível em: http://www.academicoo.com/artigo/um-estudo-dascategorias-sintagmaticas-da-lingua-kaiowaguarani> Acesso em 15/04/2011. 12:32.
MAIA, Marcus. Uma mente, duas línguas: reflexões sobre a transferência de padrões de
ordem vocabular em textos de falantes indígenas bilingues, 2005. Disponível em:
<http://indigena.unemat.br/publicacoes/cadernos4/006_marcusmaia_umamenteduaslinguas.pdf>
Acesso em: 15/03/2001. 18:21.
SAMPAIO, W. B.A. A referência remissiva número-pessoal nos prefixos verbais da
língua Uru-eu-uau-uau, 2006. (Não-publicado)
____. As línguas Tupi-Kawahib: Um estudo Sistemático-Filogenético. Tese de doutorado.
Programa de Pós-Graduação em Linguística. UNIR, 2001. Orientador: Mario Alberto
Cozzuol.
SAUSSURE, F. Curso de linguística geral. São Paulo: Cultrix, 2006.
VENERE, Mario Roberto. Projeto Açaí: uma contribuição à formação dos professores
indígenas no Estado de Rondônia / Mario Roberto Venere. São Paulo, 2011.
223
RESUMO EXPANDIDO
SUBPROJETO:
O Estudo da Literatura Indígena Contemporânea Sakurabiat e Suruí Paiter e a Cultura
do Impresso
PROJETO:
Livros da floresta - do registro etnográfico à criação literária
Orientandos: Rafael Rodrigues da Cunha, Regyvânya Alves Araújo
e Lucélia Miranda de Souza.
Orientadora: Profª. Drª Cynthia de Cássia Santos Barra.
RESUMO
Esta comunicação tem por finalidade fazer uma reflexão sobre os caminhos da educação
escolar indígena no Brasil, neste início do séc. XXI, enfocando suas relações com a
transmissão da escrita alfabética nas aldeias e a produção de literatura de autoria indígena
(ALMEIDA, 2004). Para percebermos as mudanças que tem ocorrido no cenário da educação
escolar indígena, vamos lançar um olhar para a implantação das escolas jesuítas que tinham
por finalidade “civilizar” os indígenas e, nos dias atuais, verificaremos como os movimentos
indígenas, órgãos governamentais, antropólogos, educadores, diversos artistas e cientistas
apoiam os indígenas, que exigem seus direitos assegurados por lei, como, por exemplo, o
respeito às suas formas tradicionais de produção de conhecimento e também o direito a uma
escola diferenciada, específica. Nesse contexto, a antropóloga e editora de narrativas
indígenas Betty Mindlin levanta importante questão: “que utilidade teria aos indígenas
escrever e ler em suas línguas?” (MINDLIN, 2004). Pedagogicamente falando, a
alfabetização em língua materna é mais fácil de ser assimilada pelos indígenas; no entanto,
isso implica a introdução de estruturas de produção de conhecimento não indígenas nas
escolas das aldeias. Nesse sentido, talvez o maior desafio envolva a escolha de métodos e
procedimentos interculturais tanto para a alfabetização quanto para a pesquisa e o registro das
produções orais tradicionais. Sabemos que a introdução da escrita alfabética nas comunidades
indígenas possui um amplo alcance político, estético e cultural; gostaríamos, portanto, de
propor uma discussão em torno da prática da escrita alfabética e dos desafios, caminhos
abertos e problemas, trazidos pela Educação Escolar Indígena no Brasil em sua relação com a
224
publicação dos Livros da Floresta (ALMEIDA, 2004). Orientaremos nossa discussão
enfocando algumas das produções escritas produzidas em co-autoria por Betty Mindlin e as
comunidades Suruí Paiter, de Rondônia, nas últimas décadas.
Palavras-Chave: Educação Escolar Indígena. Livros da Floresta. Suruí Paiter.
ABSTRACT
This Communication aims to reflect on the ways of indigenous education in Brazil, in the
beginning of XXI century. Focusing on its relations between the transmission of alphabetic
writing in the villages and the production of indigenous authorship of literature (ALMEIDA,
2004). To understand the changes that have occurred in the setting of indigenous education,
we cast an eye toward the deployment of Jesuit schools which aimed to "civilize" the Indians,
and today, we will see how the indigenous movements, government agencies, anthropologists,
educators, artists and many scientists support the indigenous people, who demand their rights
guaranteed by law, for example, respect for traditional forms of knowledge production and
also the right to a different school, specifically. In this context, the anthropologist and editor
of indigenous narratives Betty Mindlin raises important question: "what use would the natives
to read and write in their language?" (Mindlin, 2004). Pedagogically speaking, literacy in
mother tongue is more easily assimilated by the natives, however, this implies the
introduction of structures of knowledge production in non-indigenous village schools. In this
sense, perhaps the greatest challenge involves the choice of methods and procedures for both
cultural literacy and to research and record of oral traditional productions. We know that the
introduction of alphabetic writing in indigenous communities has a far-reaching political,
cultural and aesthetic; would like therefore to propose a discussion on the practice of
alphabetic writing and the challenges, problems and open paths, brought by the Indigenous
Education Brazil in its relationship with the publication of Books of the Forest (ALMEIDA,
2004). Will advise our discussion focusing on some of the written productions produced in
co-authored by Betty Mindlin and communities Suruí Paiter, Rondônia, in recent decades.
Keywords: Indigenous Education. Forest Books. Suruí Paiter.
INTRODUÇÃO
A questão literária em torno da temática indígena esteve por muito tempo restrita ao
campo da literatura oral. As histórias das etnias eram passadas oralmente de geração a geração
e apenas publicadas por meio das ações de antropólogos, linguistas, pesquisadores folcloristas
e mesmo autores de literatura infanto-juvenil.
Cabe-nos aqui, diante das produções contemporâneas dos escritores indígenas,
ressaltar que a literatura de autoria indígena nos traz um conteúdo histórico e social de
formação do povo brasileiro ainda praticamente inédito, pouco conhecido.
225
Ressaltamos ainda a importância de se realizar trabalhos nesse sentido, considerando a
Lei 11.645/08 (LDB), que pretende preencher lacunas no currículo da área de Língua
Portuguesa e Literaturas, já que a introdução do ensino da Cultura e da Literatura Indígena e
Afro-brasileira nas escolas passa a ser obrigatório e responsabilidade dos professores das
disciplinas que tratam de Literatura, História e Artes, no ensino médio e fundamental. Sendo
assim, fazem-se necessários o desenvolvimento de pesquisas e a produção de conhecimentos
novos sobre a temática indígena e, consequentemente, cursos de formação continuada para os
profissionais da educação básica.
2.0 OBJETIVOS
2.1 Geral
Refletir teoricamente sobre a introdução da escrita alfabética e da cultura do impresso
nas comunidades indígenas Sakurabiat e Surui Paiter, povos habitantes de reservas no estado
de Rondônia, contribuindo para a compreensão das condições de produção, de difusão e de
recepção da literatura de autoria indígena na contemporaneidade.
2.2 Específicos
Identificar, classificar e inventariar os diversos processos de coleta e de registro de
narrativas orais e de produção escrita, relativos a mitos, lendas, contos históricos e cantos
indígenas - sob a forma de práticas etnográficas e/ou literárias - , concernentes às etnias
indígenas Sakurabiat e Surui Paiter.
Criar um banco de dados com informações bibliográficas relativas às etnias Sakurabiat
e Surui Paiter, recobrindo sua relação com a cultura do impresso, constituindo acervo
temático com inventário de escritas etnográficas e/ou literárias encontradas durante a pesquisa
bibliográfica.
Revisitar os conceitos de escrita, oralidade, textualidade, literatura, tradição oral,
tradução literária, autoria, gênero literário, poética e performance, conceitos considerados
necessários à produção de ensaios críticos sobre obras de autores indígenas contemporâneos.
Produzir um artigo científico acerca das produções literárias dos povos Sakurabiat e
Suruí Paiter.
3 OBJETIVOS
226
Refletir teoricamente sobre a introdução da escrita alfabética e da cultura do impresso
nas comunidades indígenas Sakurabiat e Surui Paiter, povos habitantes de reservas no estado
de Rondônia, contribuindo para a compreensão das condições de produção, de difusão e de
recepção da literatura de autoria indígena na contemporaneidade bem como os andamentos
que tem sido tomados acerca da Educação Escolar Indígena no Brasil na atualidade.
4 RESULTADOS FINAIS E DISCUSSÃO
Pesquisa teórica
•
Revisitamos os conceitos de escrita, oralidade, textualidade, literatura, tradição oral,
tradução literária, autoria, gênero literário, poética e performance, conceitos
considerados necessários à produção de ensaios críticos sobre obras de autores
indígenas contemporâneos.
•
Produzimos um artigo científico acerca das produções literárias do povo Suruí Paiter,
tomando como situação de produção o processo histórico da Educação Escolar
Indígena no Brasil.
Pesquisa bibliográfica: construção de banco de dados
•
Identificamos, classificamos e inventariamos diversos processos de coleta e de registro
de narrativas orais e de produção escrita, relativos a mitos, lendas, contos históricos e
cantos indígenas - sob a forma de práticas etnográficas e/ou literárias - , concernentes
às etnias indígenas Sakurabiat e Surui Paiter, totalizando 120 referências
bibliográficas.
AGRADECIMENTOS:
À nossa orientadora Cynthia de Cássia Santos Barra;
Ao CNPQ;
Ao PIBIC;
A UNIR;
__________________________
CONTATOS
227
Orientandos:
Lucélia Miranda de Souza
E-mail: [email protected]
Rafael Rodrigues da Cunha
E-mail: [email protected]
Regyvânya Alves Araújo
E-mail: [email protected]
Orientador:
Profª. Drª Cynthia de Cássia Santos Barra.
E-mail: [email protected]
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Maria Inês de. Desocidentada: experiência literária em terra indígena. Belo
Horizonte: UFMG. 2009.
ALMEIDA, Maria Inês de. Ensaios sobre a literatura indígena contemporânea no Brasil.
São Paulo, Programa de Comunicação e Semiótica - PUC, 1999. Tese de doutorado inédita.
ALMEIDA, Maria Inês de & QUEIROZ, Sônia. “Livros da floresta”. In: Na captura da voz as edições da narrativa oral no Brasil. Belo Horizonte: Autêntica; FALE/UFMG. 2004. p.195277.
FERREIRA, Mariana Kawal Leal. “As teorias Antropológicas do Contato Interétnico no
Brasil”. In: _________. Da origem dos homens à conquista da escrita: um estudo sobre
povos indígenas e educação escolar no Brasil. 1992. Dissertação (Mestrado), Programa de
Pós-Graduação em Antropologia Social, Departamento de Antropologia, Universidade de São
Paulo. 1992.
LÉVI-STRAUSS, Claude. O pensamento selvagem. 5. ed. Campinas: Papirus, 2005.
MINDLIN, B. e NARRADORES SURUÍ. Vozes da origem: estórias sem escrita. Narrativas
dos índios Suruí de Rondônia. São Paulo, Ática/Iamá, 1996.
MINDLIN, B. Nós Paiter: os Suruí de Rondônia. Petrópolis: Vozes, 1985.
MINDLIN, B.Os diários da floresta. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.
ROCHA, Everardo. O que é mito. Editora Brasiliense. Versão digital.
SOUZA, Lynn Mario T. Menezes de. Uma outra história: a escrita indígena no
Brasil.Versão digital.
228
LIMA, Amanda Machado Alves de. O livro indígena e suas múltiplas grafias. 2012.156 f.
Dissertação (Mestrado em Letras) - Faculdade de Letras da UFMG. Universidade Federal de
Minas Gerais, Belo Horizonte.
229
O PROFESSOR ALFABETIZADOR DA REDE MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE
PORTO VELHO/RO E O SEU PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO PROFISSIONAL
Luciene de Sousa Marques
Rosângela de Fátima Cavalcante França
RESUMO
Este estudo teve como objetivo conhecer e analisar aspectos de uma realidade particular - o
processo de socialização profissional do professor iniciante na profissão docente como
alfabetizador, na Rede Municipal de Educação de Porto Velho-RO.Este foi desenvolvido em
7 escolas pertencentes à Rede de Ensino no município de Porto Velho-RO e teve como
sujeitos 14 professoras alfabetizadoras. A questão norteadora desse estudo foi: como se dá o
processo de socialização profissional dos professores iniciantes na profissão docente, como
alfabetizadores, na Rede Municipal de Educação de Porto velho/RO. Os dados finais
apresentados denotam a necessidade de estudos sobre a temática em pauta, visando apresentar
indicadores que possam subsidiar uma política de supervisão e apoio ao trabalho dos
professores alfabetizadores, durante os primeiros anos de sua atividade profissional.
Palavras-chave: Socialização Profissional. Profissão Docente. Professor Iniciante. Professor
Alfabetizador.
ABSTRACT
This study aimed to identify and analyze aspects of a particular reality - the process of
professional socialization of beginning teachers in the teaching profession as literacy, the
Municipal Education of Porto Velho-RO. This was developed in seven schools belonging to
the Network for Education in the city of Porto Velho, RO and had as subjects 14 literacy
teachers. The guiding question of this study was: how is the process of professional
socialization of beginning teachers in the teaching profession, such as literacy, the Municipal
Education of Porto Velho / RO. The final data presented denote the need for studies on the
issue in question in order to provide indicators that can support a policy of surveillance and
support the work of literacy teachers during the first years of his professional activity.
∗
Aluna do Curso de Pedagogia da Universidade Federal de Rondônia – UNIR. Pesquisadora do
PIBIC/UNIR. Membro do Grupo de Pesquisa PRÁXIS. E-mail: [email protected]
∗
∗
Doutora em Educação. Professora do Departamento de Ciências da Educação e do PPGE - Mestrado
em Educação da Universidade Federal de Rondônia. Pesquisadora do Grupo de Pesquisa PRÁXIS. E-mail:
[email protected]
230
1 INTRODUÇÃO
Ao ingressar na profissão docente, o professor vivenciará vários desafios. Estes estão
relacionados à adaptação a um ambiente com uma cultura escolar que ele desconhece, à
convivência com os seus pares e à aprendizagem do seu ofício. Essa realidade que implica na
transição de aluno que aprende para ser mestre, para professor principiante, se insere num
quadro de estudos que tratam da socialização profissional, cujo processo investigamos no
âmbito dos professores alfabetizadores.
Partindo dessa contextualização,trabalhamos nessa investigação com a seguinte
questão norteadora: como se dá o processo de socialização profissional dos professores
iniciantes na profissão docente, como alfabetizadores, na Rede Municipal de Educação de
Porto velho/RO?
Para a realização desse estudo, iniciamos pela fase bibliográfica na qual tomamos
conhecimento da literatura que trata da profissão docente e da socialização profissional dos
professores. Posteriormente, elaboramos o perfil dos participantes desse estudo.Em seguida,
iniciamos a etapa de investigação sobre o processo de socialização profissional dos
professores alfabetizadores da Rede Municipal de Educação de Porto Velho/RO.
2 SOCIALIZAÇÃO PROFISSIONAL: UM OLHAR SOBRE O PROFESSOR
PRINCIPIANTE
Historicamente verifica-se que a profissão docente passa por um processo de
degradação. Os parcos salários, as precárias condições de trabalho, a perda de prestigio e as
exigências cada vez maiores quanto à atuação do professor, têm concorrido para que esta
profissão se torne cada vez menos atrativa. O conjunto desses fatores se insere num quadro de
mudanças sociais que perpassam a educação e consequentemente afetam a profissão docente.
A respeito dessas mudanças Esteve (1999, p.95) enfatiza:
[...] a sociedade parece que deixou de acreditar na educação como
promessa de futuro melhor: os professores enfrentam a sua profissão
com uma atitude de desilusão e de renúncia, que se foi desenvolvendo
em paralelo com a degradação da sua imagem social.
A constatação dessas mudanças corrobora a ideia da perda do status social que o
professor detinha quando da sua profissionalização e mostra que esse caminha rumo a um
231
processo de proletarização, que segundo Contreras (2002, p. 33), pode ser definido como “[...]
a paulatina perda por parte dos professores daquelas qualidades que faziam deles
profissionais, ou, ainda, a deterioração daquelas condições de trabalho nas quais depositavam
suas esperanças de alcançar tal status”. O resultado dessa situação tem desencadeado um malestar-docente ressaltado por Esteve (1999, p.98) que afirma:
Um elemento importante no desencadear do mal-estar-docente é a falta de apoio, as
críticas e a demissão da sociedade em relação às tarefas educativas, tentando fazer do
professor o único responsável pelos problemas sociais que requerem soluções sociais.
Diante desse contexto, no bojo das políticas públicas de valorização da profissão
docente, urge que além do investimento na formação do professor e das melhorias de salário e
condições de trabalho, também se dispense um tratamento especial aos professores nos
primeiros anos de sua função profissional, ou seja, uma política de apoio ao processo de
socialização profissional dos professores.
Para tratarmos da socialização profissional, partimos de uma definição de Dubar que
ressalta:
A socialização é, enfim, um processo de identificação, de construção
de identidade, ou seja, de pertença e de relação. Socializar-se é
assumir o sentimento de pertença a grupos (de pertença ou de
referência), ou seja, “assumir pessoalmente as atitudes do grupo que,
sem nos apercebermos, guiam as nossas condutas” (DUBAR, 1997, p.
31).
É possível relacionar o comentário do autor com o processo de socialização pelo qual
o professor iniciante tem que passar quando ingressa na carreira docente, ou seja, o meio no
qual está sendo inserido irá influenciar na sua conduta como profissional e nas atitudes que
sempre serão tomadas com o objetivo de manter o equilíbrio e o bem estar no ambiente.
Falar dos primeiros anos do exercício da profissão docente, é voltar o olhar ao
professor principiante. Veenman, citado por Pacheco e Flores (1999, p. 55) define o professor
principiante como ‘aquele que ainda não completou três anos de ensino depois de se ter
graduado’. Neste contexto, esse professor apresenta especificidades que são inerentes a sua
condição profissional, uma vez que:
O professor principiante diferencia-se, significamente, do
professor estagiário porque se “libertou” das influências dos
orientadores, não tendo que se submeter a ninguém, pois é o
único actor, além dos alunos, na sala de aula. Contudo, esta
libertação não significa uma total autonomia profissional, já que
232
o professor entra numa fase de crescente e tácita socialização
profissional. (PACHECO E FLORES 1999, p. 55).
Ao destacar que o professor procura de forma tácita a sua socialização profissional é
que entendemos o quanto é relevante o apoio ao professor iniciante para que ele não sofra
desemparo neste momento tão singular do seu desenvolvimento profissional.
Pacheco e Flores (1999, p. 19) ainda tratando do professor principiante assim se
posicionam:
Como qualquer profissional, o professor, para ensinar, dispõe de saberes ou conhecimentos
organizados em diversas dimensões e delimitados por critérios de profissionalidade. A sua
função dimensiona-se num contexto de interação social e a sua atuação consubstancia-se num
contexto sociocultural, institucional e didático. Em todos os contextos, o professor estabelece
relações com a sociedade, o saber, a prática profissional e o saber pedagógico.
Neste contexto, a necessidade da convivência em grupo influencia o homem a criar
regras (e consequentemente mecanismos que assegurem seu cumprimento), às normas de
convivência, formas de enxergar o mundo, de refletir sobre ele, que se modifica em cada
agrupamento.
A especificidade do professor iniciante requer , portanto, a criação de mecanismos que
possibilitem apoio e assessoramento ao seu exercício profissional
3 METODOLOGIA
A metodologia utilizada foi do tipo estudo de caso de abordagem qualitativa
(BOGDAN e BIKLEN, 1994). Esta teve uma fase bibliográfica e a outra empírica. Para o
levantamento dos dados da pesquisa de campo foram utilizados instrumentos como
questionário e entrevista. Para o caso específico da elaboração do perfil dos professores,
utilizamos o questionário e para o conhecimento do processo de socialização dos professores
utilizamos a entrevista .Foram sujeitos desse estudo professores alfabetizadores da Rede
Municipal de Educação, com até três anos de atuação nesta área. Os dados obtidos nas
entrevistas foram categorizados à luz da Análise de Conteúdo (BARDIN, 1977).
233
4 RESULTADOS DO ESTUDO
4.1 O que dizem as professoras sobre o seu processo de socialização profissional
Após analisarmos os dados obtidos por meio da entrevista junto aos professores
alfabetizadores, foi possível, a partir dos fragmentos de suas falas, criarmos com
fundamentação em Bardin (1977) as seguintes categorias de análise.
Quadro 1 - Dados do processo de socialização dos professores alfabetizadores
ASPECTOS INVESTIGADOS
CATEGORIAS
1: Desconhecem os critérios.
Critérios para atuar na alfabetização
2: Conhecem os critérios.
1: Relacionado à prática pedagógica
Tipo de Acolhimento
(desenvolvimento profissional).
2: Socialização junto à comunidade escolar.
1: Receberam preparação oferecida por
Preparação que receberam
instituições formadoras.
2: Buscaram sua própria preparação.
1:
Orientações
direcionadas
ao
Desenvolvimento da prática alfabetizadora.
Orientações que receberam
2: Orientações direcionadas à Gestão da sala de
aula.
3:
Orientações
direcionadas
à
Relação
professor-aluno.
1: Apenas no início da carreira.
Acompanhamento da prática pedagógica
2: Durante o desenvolvimento da prática
alfabetizadora.
234
1: Professoras que acreditam que a formação inicial
contribuiu.
Formação inicial
2: Professoras que acharam insuficiente os saberes
obtidos com a formação inicial e só com a prática foi
possível construir esse saber.
ASPECTOS INVESTIGADOS
CATEGORIAS
1: Avaliação voltada ao desempenho do aluno.
2: Avaliação voltada ao trabalho do Professor.
Avaliação da prática pedagógica
3: Auto-avaliação.
4: Percepção diferenciada da avaliação.
1: Dificuldade pela falta de colaboração dos alunos e
dos pais.
Dificuldades encontradas no início da profissão
2: Dificuldade devido à ausência de materiais
pedagógicos.
3: Falta de experiência profissional.
1: Diálogo com os pais dos alunos.
Mecanismos utilizados para tentar superar as
dificuldades
2: Aquisição do próprio material pedagógico.
3: Busca de ajuda junto aos seus pares.
1: Apoio institucional por parte dos gestores
escolares.
Apoio recebido
2: Apoio ao desenvolvimento do processo de ensino
e de aprendizagem.
3: Apoio relacionado à formação.
Fonte: Entrevista utilizada na pesquisa (2011).
235
Ao observarmos os resultados obtidos, percebemos que algumas professoras
conhecem os critérios adotados para atuar na área de alfabetização; todas receberam algum
tipo de acolhimento, parte das professoras recebeu alguma preparação no início da profissão
docente e todas receberam algum tipo de orientação. Parte das professoras recebeu
acompanhamento apenas no início da profissão enquanto outras afirmam ter sido
acompanhadas durante o processo de ensino. Parte das professoras acredita que a formação
inicial foi insuficiente e somente com a prática foi possível construir os saberes necessários ao
desenvolvimento da prática alfabetizadora.Todas tiveram o desempenho avaliado de alguma
forma .Todas as professoras afirmam ter encontrado dificuldades para desenvolver a
prática.Todas relatam ter utilizado algum mecanismo para tentar superar as dificuldades
encontradas e todas afirmam ter recebido algum tipo de apoio.
Considerando que esse momento requer uma atenção especial,entendemos que esses
mecanismos adotados se caracterizam como ações pontuais e estanques e não como um
programa sistemático de apoio voltado às necessidades dos professores iniciantes.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O caráter pontual e estanque das ações desenvolvidas junto aos professores
principiantes denotam que não há uma política efetiva que vise subsidiar as ações dos
professores nos anos iniciais de sua profissão, o que corrobora a importância desse estudo que
tem como finalidade apresentar indicadores para uma política de supervisão e apoio ao
trabalho do professor alfabetizador durante os primeiros anos de sua atividade profissional.
REFERÊNCIAS
BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Rio de Janeiro, Edições 70, 1977.
BOGDAN, Robert e BIKLEN, Sari.Investigação Qualitativa em Educação: uma
Introdução à Teoria e aos Métodos. Porto: Porto Editora, 1994.
CONTRERAS, José. A Autonomia de Professores. São Paulo: Cortez, 2002.
DUBAR, Claude. A Socialização. Porto Editora, 2ª edição, 1997.
236
ESTEVE, José M. Mudanças Sociais e Função Docente. In: NÓVOA, António. (Org.).
Profissão Professor. Porto-Portugal, Editora Porto, 1999.
PACHECO, José Augusto; FLORES, Maria Assunção.Formação e Avaliação de
Professores. Porto Editora, 1ª edição, 1999.
237
O FANTÁSTICO: INTERSECÇÕES CRÍTICAS
RELAÇÕES ENTRE EDIFICAÇÕES FANTÁSTICAS E MODO NARRATIVO NA
OBRA DE JORGE LUIS BORGES
Luis Antonio Mopi Lafuente
Heloisa Helena Correia Siqueira
RESUMO
Este trabalho teve como meta analisar a construção fantástica presente num conto de Jorge
Luis Borges, "La Biblioteca de Babel", para assim tentar desvendar o modo como tal
edificação fantástica se conjuga com o modo narrativo. Ao longo da pesquisa, se tentou
verificar os principais pressupostos que fazem da Biblioteca de Babel uma metáfora mestra da
Humanidade, analisando os diversos elementos da narrativa e comparando-os com o espaço
fantástico em questão. Também se fez uma interpretação no sentido de relacionar a estrutura
física da Biblioteca de Babel com a simbologia da Cabala, já que se detectaram rastros que
apontavam para tal correlação.
Palavras-chave: Análise literária. Gênero fantástico. Espaço fantastico. Jorge L. Borges.
ABSTRACT
This work had in its intention to analyse the fantastic construction presents in a Jorge Luis
Borges' short story, "La Biblioteca de Babel", in order to try to uncover the manner how this
fantastic construction coordinates whit the narrative manner. Along of the research I tried to
verify the fundamental principles that stablishs this short story a master metaphor of the
Humanity, analysing the differents elements of the narrative and compare them whit the
fantastic space at issue. I also did a interpretation connecting the Biblioteca de Babel`s
physical structure whit the Kabala`s symbology, since I detected marks that indicated for this
connexion.
Words-key: Literary analyse. Fantastic genre. Fantastic space. Jorge L. Borges.
INTRODUÇÃO
A obra literária de Jorge Luis Borges se caracteriza pelo seu constante questionamento
do conhecimento Humano, em especial no que se refere à maneira como o ser humano vem
construindo suas certezas epistemológicas; daí que ele seja conhecido como um grande cético.
Por outro lado ele também é reconhecido por ser o grande artífice de espaços fantásticos
memoráveis, nos quais, além de indagar sobre a veracidade do conhecimento científico
238
construído ao longo de séculos e sacrifícios, inscreve as suas próprias interpretações sobre os
mais antigos problemas filosóficos que sempre estiveram presentes na cogitação do ser
humano. É por demais conhecida a sua declaração de que as diversas doutrinas filosóficas e
religiosas são um excelente material para tramar narrativas fantásticas, e a partir dessa visão
esteticista Jorge Luis Borges soube apropriar-se do farto material presente nessas atividades
para transportá-lo ao mundo ficcional, construindo uma obra rica em significados e metáforas.
A Biblioteca de Babel é um exemplo de tudo o anterior. Esta narrativa é uma metáfora
mestra sobre o modo como o homem vem fundamentando o seu conhecimento de tudo o que
o rodeia, transformando o conto numa espécie de crônica que relata as diversas atitudes do
homem diante das descobertas feitas por ele. Além do mais, o transfundo simbólico deste
texto é notável, já que na estrutura física da Biblioteca de Babel e nos livros que ela resguarda
pode-se notar a influência do pensamento cabalístico, fazendo jus ao método borgeano de
tomar doutrinas filosófico-religiosas e transferi-las ao mundo da ficção.
OBJETIVOS
Mediante o estudo dos diferentes elementos da narrativa, se tentou evidenciar o modo
como a edificação fantástica da Biblioteca de Babel se relaciona com o modo narrativo, e a
maneira como dita construção incide nas ideias filosóficas nele enunciadas.
Numa segunda etapa do trabalho, seguiu-se o rastro de certas evidências que
indicavam a influência da Cabala na construção da Biblioteca de Babel, expondo as metáforas
nele inseridas pelo narrador implícito.
METODOLOGIA
O método utilizado nesta pesquisa foi simples: analisou-se por separado os diferentes
elementos narrativos, personagens, narrador, tempo, enredo e espaço, para depois verificar
como a construção fantástica exerce a sua influência em cada um deles, para posteriormente
fazer uma interpretação do que poderia significar a metáfora do Universo como Biblioteca.
Com os resultados parciais em mãos, junto com as questões não resolvidas, se fez o
prosseguimento da pesquisa no sentido de relacionar a doutrina da Cabala incluída na
estrutura da Biblioteca de Babel, expondo os possíveis significados que tal inclusão poderia
trazer à interpretação.
239
RESULTADOS
Se a Biblioteca de Babel é uma metáfora do universo, o Bibliotecário simboliza o
homem desde um posto de vista universal. A análise das personagens corrobora esta
afirmação: os fatos nos quais estão envolvidos, e que têm todos como ponto de partida a
interpretação dos livros, parece ser a narração da História Universal da Humanidade
ocidental, tal qual a conhecemos por intermédio das ciências da História e Antropologia.
Por outro lado, a Biblioteca de Babel formula, a partir da sua estrutura, oposições que
sempre preocuparam os humanos (ao igual que aos bibliotecários): Divino-Humano,
Universal-Concreto,
Perfeição-Imperfeição,
Eterno-Temporal,
Cognoscibilidade-
Incognoscibilidade do que existe.
Tais binômios contraditórios podem ser representados na simbologia cabalística
incluída no interior da estrutura hexagonal da Biblioteca de Babel. De fato, o hexágono
estrelado representa o seis, e este número simboliza, entre outras coisas, a oposição entre a
criatura e o criador (CHEVALIER, GHEERBRANT, 1989, p 809). É a mesma oposição
apontado pelo narrador do conto, quando faz a apologia da Biblioteca de Babel (ou do
Universo) contra o Homem: "El hombre, el imperfecto bibliotecario, puede ser obra del azar o
de los demiurgos malévolos; el universo [...] sólo puede ser obra de um dios" (BORGES,
2004, pp 88-89).
Estes binômios opostos também se manifestam no interior do Biliobtecário/Homem, já
que "A estrela de seis braços é também o macrocosmo, ou o homem universal, sendo a de
cinco braços o microcosmo ou o homem comum" (CHEVALIER, GHEERBRANT, 1989, p
810). Isto poderia ser aplicado de forma bidirecional à estrutura hexagonal da Biblioteca de
Babel, ou seja, se ela é uma metáfora do universo é também o macrocosmo (ou o homem
universal). Esta interpretação poderia explicar a presença da latrina e do cubículo para dormir
de pé na interconexão dos hexágonos: se de fato o Universo (ou a Biblioteca) é a obra de "um
deus", e por isso é perfeita e eterna e imóvel, tais atributos não deixam de acolher a
imperfeição e temporalidade do Homem, obra do "azar ou dos demiurgos malévolos".
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ficam muitos pontos por estudar neste conto. Creio vislumbrar que as possibilidades
se abrem num leque amplo e profundo, possibilidades que só podem ser reais se se toma em
240
conta a simbologia cabalística. Como exemplo, me limito a mencionar a enumeração
meticulosa dos estantes de livros: por cada hexágono temos cinco prateleiras, para cada
prateleira temos trinta e dois livros, para cada livro temos quatrocentas e dez páginas, para
cada página temos quarenta linhas, e por ai vai... É também interessante notar que entre os
vinte e cinco símbolos que compõem os livros não se encontra um só número. Por que os
algarismos foram "banidos" dessa Biblioteca que tem tantas coisas em comum com a Cabala,
doutrina na qual os números são de vital importância?
Por outro lado, a análise deste conto demonstrou que existem nele coisas escondidas
ao comum dos leitores. Para "saboreá-lo" plenamente é necessário possuir uma cultura ampla,
verdadeira erudição que exige anos e anos de leitura e estudo das mais diversas disciplinas:
filosofia, história das religiões e seitas, filosofia da linguagem, linguística, matemática etc.
Daí a pobreza desta interpretação do conto, pois eu me encontro longe de possuir tantos
conhecimentos que me permitam velejar com liberdade nesse verdadeiro "Universo" feito de
palavras. Qual o impacto desta imposição no leitor implícito? Como se vê, as dúvidas não
diminuíram com o estudo deste conto: na verdade, elas aumentaram, tornando ainda mais
instigante e desafiador a leitura de qualquer conto de Jorge Luis Borges, grande "fazedor" de
metáforas epistemológicas.
REFERÊNCIAS
ALAZRAKI, Jaime (org.) Jorge Luis Borges. Madrid: Taurus, 1987.
BORGES, Jorge L. Ficciones. Madrid: Alianza Editorial, 2004.
BORGES, Jorge L. Obras completas. São Paulo: Emecé Editores, 1993. Volúmenes I y II.
CHEVALIER, Jean. GHEERBRANT, Alain. Dicionário de símbolos. Rio de Janeiro: José
Olympio, 1989.
FURTADO, Filipe. A construção do fantástico na narrativa. Lisboa: Livros Horizonte,
1980.
GRAU, Cristina. Borges y la arquitectura. Madrid: Cátedra, 1989.
MANGUEL, Alberto. GUADALUPI, Gianni. Dicionário de lugares imaginários. São
Paulo: Companhia das Letras, 2003.
Os pré-socráticos: fragmentos, doxografia e comentários. São Paulo: Abril Cultural, 1978.
Seleção de textos e supervisão: Prof. José Cavalcante de Souza.
241
REALE, Giovanni. História da Filosofia Antiga Vol. I. São Paulo: Edições Loyola, 1994.
(Tradução: Henrique Cláudio de Lima Vaz, Marcelo Perine).
SOSNOWSKI, Saúl. Borges e a Cabala. São Paulo: Editora Pespectiva S.A., 1991.
TODOROV, Tzvetan. Introdução à literatura fantástica. São Paulo: Perspectiva, 2007.
AGRADECIMENTOS
Ao CNPQ; ao PIBIC; a UNIR; à professora Heloisa Helena e aos livros que li durante
toda a minha vida.
CONTATOS
Orientando: Luis Antonio Mopi Lafuente
Email: [email protected]
Orientadora: Profa. Dra. Heloisa Helena Correia Siqueira
Email: [email protected]
242
INFLUÊNCIA DOS FATORES EXTRALINGUÍSTICOS NO DIALETO DE
VILHENA
Maiara Arruda da Silva50
[email protected]
Maria do Socorro Pessoa51
[email protected]
RESUMO
Este trabalho apresenta os resultados finais do Sub-Projeto intitulado: “Influência dos Fatores
Extralinguísticos no Dialeto de Vilhena”. A pesquisa teve por objetivo investigar a possível
influência dos fatores extralingüísticos na formação do Dialeto Vilhenense. Ainda, verificar
como os Professores de Língua Por5tuguesa lidam com a Diversidade Linguístico-Cultural
existente em sala de aula, e, deste modo, contribuir com a identificação dos falares
Amazônicos / Amazônidas.
Palavras-chave: Fatores Extralinguísticos. Dialeto Vilhenense. Diversidade LinguísticoCultural.
1 INTRODUÇÃO
Este texto apresenta os resultados finais obtidos por meio do plano de trabalho
desenvolvido no período de Agosto de 2011 a Julho de 2012, com Bolsa PIBIC/UNIR/CNPq,
sob a orientação da Profa. Dra. Maria do Socorro Pessoa. Durante este período, nos
dedicamos à preparação dos instrumentos de coleta de dados e à aplicação dos mesmos em
pesquisa de campo para: alunos migrantes e imigrantes, alunos nativos de Vilhena e para
professores de Língua Portuguesa da Rede Pública de Ensino. Portanto, o corpus da pesquisa
foi constituído por uma amostragem total de 50 (cinquenta) pessoas, sendo que: a amostragem
que corresponde aos alunos migrantes e imigrantes é constituída por 20 (vinte) pessoas, das
quais, 10 (dez) alunos cursam o Ensino Fundamental, e os outros 10 (dez) alunos cursam o
Ensino Médio; Já, a amostragem que corresponde aos alunos nativos é constituída por 20
(vinte) pessoas que cursam o Ensino Médio. Para completar o corpus da nossa pesquisa temos
50
Acadêmica do Curso de Letras, 4º período, da Universidade Federal de Rondônia, Campus de Vilhena,
Bolsista PIBIC/UNIR/CNPq 2011-2012.
51
Professora Adjunta da Universidade Federal de Rondônia, Campus de Vilhena, lotada no Departamento
Acadêmico de Estudos Linguísticos e Literários. Av. Major Amarante n. 4085, Prédio do Boticário, apto. 01,
Centro, Vilhena/RO, CEP. 76.980-000.
243
uma amostragem aleatória que corresponde aos professores de Língua Portuguesa da Rede
Pública de Ensino, constituída por 10 (dez) pessoas.
O principal objetivo desta pesquisa foi identificar quais são os Fatores Extralingüísticos
que influenciam a fala do Vilhenense, contribuindo para uma possível formação do Dialeto da
região de Vilhena. Com os dados obtidos, por meio da aplicação dos questionários
direcionados ao corpus da pesquisa, espera-se que as aulas de Língua Portuguesa sejam
auxiliares para a valorização da Diversidade Linguística e Cultural, e ainda, sejam auxiliares
na identificação dos Fatores Extralinguísticos que influenciam os Dialetos da Língua
Portuguesa.
2 VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: FORMAÇÃO DOS DIALETOS SOCIAIS
A língua é um patrimônio social, que está sempre em processo de mudança, ao longo do
tempo, como cita Bagno (2007:36): “a língua é um processo, um fazer-se permanente e nunca
concluído”. A língua é uma atividade social, e, assim como a sociedade, no decorrer de
qualquer época, será diversificada e estará sujeita a conflitos e transformações.
Vivemos em uma sociedade heterogênea. É comum encontrarmos, no cotidiano, pessoas
de diferentes faixas etárias, origens, classes sociais, de todos os graus de escolaridade, com
diferentes profissões, e, também, com diferentes modos de falar. Biderman (2001) afirma esta
heterogeneidade Lingüística e Social:
Sendo a língua um patrimônio social, preexistente aos indivíduos, classifica-se como uma
realidade heterogênea, sujeita aos outros fatores que compõem a herança social, como a
cultura e a estrutura da sociedade, por exemplo. Assim sendo, a língua se situa num eixo
temporal que evolui e se altera através dos séculos, sofrendo continuamente a injunção de
variadíssimos fatores extralingüísticos. (BIDERMAN, 2001, p. 13)
Na citação acima, Biderman (2001) fala sobre o fenômeno da Variação Lingüística,
atribuindo a causa aos Fatores Extralinguísticos, ou seja, fatores externos ao sujeito, que
influenciam o seu modo de falar. Portanto, os Fatores Extralingüísticos exercem grande
influência no comportamento lingüístico do individuo, proporcionando-lhe marcas
lingüísticas específicas que são manifestadas pelo Dialeto de uso.
Segundo Bagno (2007), os principais Fatores Extralingüísticos que exercem influência
no modo de falar do indivíduo são: a Origem Geográfica, o Status Socioeconômico, o Grau de
Escolarização, a Idade, o Sexo, o Mercado de Trabalho e as Redes Sociais. Portanto, estes são
os principais fatores, externos ao sujeito, que podem influenciar a fala, proporcionando-lhe
244
uma identidade, por meio de marcas lingüísticas próprias, que são conhecidas ou rotuladas
como dialetos com várias classificações: de estilo, sociais, geográficos, históricos, entre
outros.
3 METODOLOGIA
Neste trabalho concretizamos uma pesquisa qualitativa, do tipo pesquisa-ação para
envolver o “corpus” da pesquisa com as teorias que tratam da Sociolinguística Aplicada ao
Ensino de Língua Portuguesa. Nosso método de trabalho seguiu rigorosamente o Cronograma
citado no nosso Plano de trabalho, a saber:
a) No mês de Agosto/2011, participamos do evento denominado 22º FALE - Fórum
Acadêmico de Letras, em Vilhena/RO;
b) No mês de Setembro/2011, participamos do evento denominado IV SED Seminário de Educação, em Vilhena/RO;
c) Nos meses de Agosto e Setembro/2011, concluímos a preparação dos instrumentos
de coleta de dados;
d) A pesquisa de campo teve a duração de três meses, sendo realizada no período de
Outubro à Dezembro/2011. A aplicação dos questionários foi direcionada para: alunos
Migrantes e Imigrantes, alunos Nativos de Vilhena, e professores de Língua Portuguesa.
e) No período de Janeiro à Março/2011, iniciamos a compilação e análise dos dados
coletados, enquanto, simultaneamente, elaboramos o Relatório Parcial correspondente ao
período de Agosto/2011 a Março/2012.
A metodologia utilizada, de pesquisa de Campo com aplicação de questionários,
teve como meta identificar, do modo mais imparcial possível, que fatores extra-linguísticos
estão presentes, influenciando a construção desse Dialeto, no Cone Sul de Rondônia, como é
o caso de Vilhena. As Teorias Sociolinguísticas que serviram de base para os resultados finais
são aquelas que estudam a Língua, a Cultura e a Sociedade.
4 RESULTADOS
Para entender o fenômeno lingüístico que acontece em Vilhena, foram controladas as
Variáveis Lingüísticas de natureza Extralingüística, que podem ser consideradas como
“Variáveis Linguísticas” por se tratarem de fatores como: Idade, Sexo, Origem, Redes
Sociais, Status Sócio-econômico, Grau de Escolaridade e, também, o que é inerente à Língua,
245
como o seu léxico, aqui denominado “Vocabulário”. Após essas considerações iniciou-se a
descrição lingüística das variáveis e as ocorrências delas, por meio da análise dos dados
coletados pelos questionários que foram direcionados aos alunos nativos de Vilhena, aos
alunos migrantes e imigrantes, e aos professores de Língua Portuguesa de Escolas Públicas de
Vilhena.
Os dados coletados juntol ao corpus da pesquisa, permitem-nos afirmar que os
informantes não percebem, ainda, a presença de marcas lingüísticas capazes de já
identificarem um falar que possa ser chamado de “Falar Vilhenense”. Porém, estes
informantes mostraram, por meio das respostas dadas, que possuem consciência de que os
contatos com distintas origens, culturas e linguagens podem ter grande influência na formação
do “Falar Vilhenense”.
Os alunos nativos de Vilhena afirmaram que algumas expressões utilizadas por pessoas
que vieram de outros lugares, foram incorporadas em sua fala, ou seja, temos a confirmação
de que o contato com distintas origens influenciam o modo de falar. Portanto, podemos
verificar a forte influencia do Fator Extralingüístico “Origem Geográfica”, na fala do
Vilhenense. Os mesmos alunos informaram cinco expressões que adquiriram por meio do
contato com pessoas que possuíam uma origem diferente da sua e, com estes dados, fizemos
um estudo, com intuito de saber de que origens vieram estas expressões e qual era o seu
significado. Após este estudo, foi possível verificar que a maioria das expressões incorporadas
pelos Vilhenenses é de origem: Nordestina, Gaúcha, Mineira e Paranaense. Em seguida, os
informantes responderam quais eram as origens com as quais mantinham contato no
cotidiano. Com estes dados observamos que a maioria dos Vilhenenses possui contato com
pessoas de origem “Nordestina”, o segundo contato de maior predominância no dia-a-dia
destes nativos vilhenenses é a origem “Gaúcha”; o terceiro contato de maior predominância é
a origem “Mineira”.
Os Vilhenenses afirmaram que pessoas com idades distintas, consequentemente,
possuem um modo de falar também diferenciado, pois, terão uma fala adequada à sua faixa
etária. Outro fator apontado por estes informantes como causa dos diferentes falares é o
ambiente em que a pessoa convive, pois, diferentes ambientes pedem também, uma atitude
linguística diferenciada, adequada ao ambiente em que estamos. Sendo assim, estes dados nos
levam a evidenciar dois Fatores Extralingüísticos presentes nos diferentes modos de falar, que
são: “Faixa Etária” e “Redes Sociais”.
Os informantes afirmaram que pessoas que possuem rendas distintas entre si, possuem
também um modo de falar diferenciado, assim como, pessoas com diferentes graus de
246
escolaridade entre si, possuem, também, um comportamento linguístico diferenciado.
Portanto, temos a confirmação de mais dois Fatores Extralinguísticos que influenciam o modo
de falar: “Status Sócio-econômico” e “Escolaridade”.
Os dados obtidos por meio dos questionários direcionados aos alunos migrantes e
imigrantes do município de Vilhena serviram de confirmação para os resultados obtidos e
citados anteriormente. Aplicamos-lhes um questionário que possui as mesmas questões que
foram direcionadas aos alunos nativos, mas que possui, também, algumas outras questões
diferenciadas, com o intuito de confirmar e entender este processo de formação do Dialeto
Vilhenense.
Os Alunos Migrantes e Imigrantes afirmaram a existência da Diversidade Linguística no
município de Vilhena e, ainda, apontaram o “Vocabulário” como a principal diferença entre a
sua fala e a do Vilhenense Nativo. Ou seja, estes informantes, que vieram de outras regiões do
Brasil para Vilhena, são de locais/regiões que já possuem uma fala característica, com marcas
lingüísticas específicas, enquanto que o Vilhenense ainda constrói uma linguagem que
futuramente marcará o seu modo de falar. Portanto, este contato entre os Vilhenenses e
pessoas de outras origens podem influenciar a fala dos nativos, pois, como já foi mencionado.
Ocorreram algumas incorporações de expressões que são utilizadas por pessoas que possuem
marcas lingüísticas próprias e características. Ou seja, temos então, a presença e influência do
Fator Extralinguístico: “Origem Geográfica”.
Os dados obtidos por meio dos questionários direcionados aos Professores de Língua
Portuguesa nos mostraram que estes professores, em suas próprias palavras, possuem
conhecimento sobre a Diversidade Linguístico-Cultural e que os principais meios de obtenção
de informações sobre este assunto foram as ações de formação de professores, os livros, e os
PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais).
Os Professores afirmaram, ainda, que têm consciência da Diversidade Linguística e
Cultural existente no município de Vilhena que se fazem presentes na sala de aula, portanto,
procuram utilizar os conhecimentos que possuem a respeito deste assunto para estudos em
suas aulas, por meio de debates e outras atividades que proporcionem a valorização das
distintas culturas e linguagens. Porém, percebemos a dificuldade que estes professores
tiveram em distinguir que fatores linguísticos causam maior diferença entre os alunos, apesar
de terem afirmado, anteriormente, o seu conhecimento a respeito das diversidades lingüísticas
e culturais dos seus aprendizes.
A pesquisa de campo mostrou que os professores percebem as dificuldades linguísticas
que os alunos migrantes e imigrantes possuem para se integrar no ambiente escolar e que, esta
247
dificuldade de integração escolar, na opinião dos Professores de Língua Portuguesa, são
reflexos de “Choques Culturais” entre “as diferenças entre a fala dos Alunos Migrantes,
Imigrante e dos Vilhenenses Nativos”.
O gráfico a seguir torna visível a análise realizada:
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS SOBRE A ANÁLISE DA VARIAÇÃO LINGUISTICA
EM VILHENA, OBTIDA POR MEIO DA APLICAÇÃO DE QUESTIONARIOS A
ALUNOS NATIVOS, MIGRANTES E IMIGRANTES E, INCLUSIVE, PARA
PROFESSORES DE LINGUA PORTUGUESA
Além da busca pelos Fatores Extra-Linguísticos que influenciam o Dialeto de Vilhena,
procuramos saber se há alguma marca lingüística já definida na fala do Vilhenense, indagando
como os professores lidam com as diversidades lingüísticas e culturais em sala de aula,
questionando sobre o que este professor sabe a respeito da variação linguística e da sua
contribuição para as aulas de Língua Portuguesa.
Para compreender o Fenômeno Linguístico que se encontra em processo de construção
linguística do município de Vilhena, faz-se necessário nos atentarmos aos estudos da Teoria
Sociolingüística, que estuda a relação entre a Língua, a Cultura e a Sociedade. Viver em
sociedade é participar ativamente como membro da mesma, e, para que ocorra essa
participação ativa, necessitamos de nos comunicar e nos expressarmos por meio da
248
linguagem. Além disso, é por meio da linguagem que manifestamos a nossa cultura, ou seja, é
impossível pensar nas manifestações lingüísticas sem levar em consideração a sociedade que
a utiliza, e, deste modo, constrói a sua identidade e manifesta a sua cultura. Nesse sentido,
Alkmim (2001) afirma que:
Linguagem e sociedade estão ligadas entre si de modo inquestionável. Mais do que isso,
podemos afirmar que essa relação é a base da constituição do ser humano. A história da
humanidade é a história de seres organizados em sociedade e detentores de um sistema de
comunicação oral, ou seja, de uma língua. (ALKMIM, 2001, p. 21)
A Sociolinguística investiga e correlaciona os aspectos linguísticos e sociais, com a
finalidade de identificar o processo de mudança de uma Língua viva e heterogênea, que muda
ao longo do tempo, juntamente, com a sociedade que a utiliza.
A Sociolinguística é uma das subáreas da Linguística e estuda a língua em uso no seio das
comunidades de fala, voltando a atenção para um tipo de investigação que correlaciona
aspectos lingüísticos e sociais. Esta ciência se faz presente num espaço interdisciplinar, na
fronteira entre língua e sociedade, focalizando precipuamente os empregos linguísticos
concretos, em especial os de caráter heterogêneo. (MOLLICA, 2004, p. 9)
A Língua é um patrimônio social. Sendo assim, para compreender os Fenômenos
Linguísticos, é necessário estudar as variações lingüísticas em relação a determinadas
variáveis sociais e, deste modo, descobrir como ocorre a formação dos diferentes falares.
Segundo Mollica (2004), o fenômeno da variação linguística ocorre por meio da influência de
fatores de natureza social; trata-se de fatores externos ao sujeito e que podem influir no modo
de falar.
Uma variável é concebida como dependente no sentido que o emprego das variantes não
é aleatório, mas influenciado por grupos de fatores (ou variáveis independentes) (...) que
podem exercer pressão sobre os usos (...). (MOLLICA & BRAGA, 2004, p. 11)
Willian Labov, precursor dos estudos sociolingüísticos, afirma que a língua é
heterogênea, e, que esta heterogeneidade é constituída por fatores sociais, que exercem
mudanças lingüísticas. Labov relacionou os fatores extralingüísticos ao comportamento
linguístico dos falantes. De acordo com Labov (1968, apud MONTEIRO, 2000, p.13):
Os procedimentos da Linguística descritiva se baseiam no entendimento de que a língua
é um conjunto estruturado de normas sociais. No passado, foi útil considerar que tais normas
eram invariantes e compartilhadas por todos os membros da comunidade linguística. Todavia,
as análises do contexto social em que a língua é utilizada vieram demonstrar que muitos
elementos da estrutura linguística estão implicados na variação sistemática que reflete tanto a
249
mudança no tempo quanto os processos sociais extralingüísticos. (LABOV apud
MONTEIRO, 2000, p.13).
Bright (1963, apud MONTEIRO, 2000, p.28) afirma que as variações lingüísticas não
são aleatórias, pois, estão condicionadas aos fatores sociais com os quais a diversidade
linguística se relaciona. Ou seja, os fatores externos ao sujeito condicionam as diferentes
maneiras de falar. De acordo com Pretti (1997:40), os Fatores Extralinguísticos que influi a
fala do indivíduo são de três espécies: geográficas ou diatópicas; sócio-cultural ou
diastráticas, influenciadas por fatores ligados ao falante como, por exemplo, a “idade”, o
“sexo”, a “profissão”, a “posição social”, o “grau de escolaridade” e a “classe econômica”; e
por fim, contextuais ou diafásicas, que se refere aos níveis de linguagem, por exemplo, a fala
formal e a fala coloquial. Paredes da Silva (2003) afirma que:
Ao estudar a língua em uso numa comunidade, defrontamo-nos com a realidade da
variação. Os membros da comunidade são falantes homens e mulheres de idades diferentes,
pertencentes a estratos socioeconômicos distintos, desenvolvendo atividades variadas, e é
natural que essas diferenças, identificadas como sociais ou externas, atuem na forma de cada
um expressar-se. (PAREDES DA SILVA, 2003, p.67)
A Língua é parte da sociedade, a qual influencia e é influenciada. Trata-se de um
processo contínuo, gerador do fenômeno da Variação Linguística. Por meio desta relação
entre os fatores externos ao sujeito e os aspectos linguísticos, a linguagem dos indivíduos
sofre mudanças, ao longo do tempo, proporcionando aos seus falantes marcas lingüísticas
específicas, que passam a ser manifestadas por meio do Dialeto.
Na pesquisa realizada, verificamos que a fala do Vilhenense é influenciada, entre
outros, pelos seguintes Fatores Extralinguísticos: Origem, Idade, Redes Sociais, Status
Socioeconômicos e Escolaridade. Estes Fatores, de natureza externa, foram apontados por
Bagno (2007) como fatores que exercem influência nas diferentes maneiras de falar e, além
disso, auxiliam na identificação dos fenômenos de Variação Lingüística.
O Fator Extralinguístico “Origem Geográfica” influi na fala do Vilhenense, pois, a
população do município de Vilhena é constituída por pessoas de diferentes origens, que
vieram de outras regiões do Brasil. Estes migrantes e imigrantes trouxeram os seus costumes,
a sua cultura e, também, as suas marcas linguísticas. O contato entre os Vilhenenses e pessoas
que já possuem um dialeto característico, proporcionou como já foi mencionado,
anteriormente, a incorporação pelos Vilhenenses de algumas palavras que são utilizadas por
indivíduos de distintas origens.
250
A “Idade” é um Fator Extralinguístico que mantêm influência na maneira dos
Vilhenenses falar, pois, em faixas etárias distintas temos, também, falas diferenciadas. Cada
faixa etária pede uma atitude linguística adequada; por exemplo, entre dois ou três anos de
idade, a criança vai aprender a falar o que os seus pais dizem; já, entre quatro a treze anos,
começa a falar como as pessoas que tem a mesma idade e fazem parte do seu grupo de
amigos. Portanto, a faixa etária influencia a fala, porém, ao analisar os dados obtidos por meio
da pesquisa, verificamos que o fator “idade” não age isolado. Os dados coletados e analisados
mostraram que estes alunos falam igual a outros jovens da mesma idade, entretanto, ao estar
em um ambiente social mais formal, procuram adequar a sua fala às pessoas que se encontram
nesse ambiente independente da idade que estes possuem. Langacker (1980) explica que em
diferentes circunstâncias ou ambientes teremos uma fala diferenciada:
(...) Cada falante tem não apenas seu sistema linguístico único, mas
também diferentes estilos de fala que emprega em circunstâncias
diversas. O estilo usado quando se é entrevistado para um emprego é
consideravelmente diferente do usado numa conversa com os amigos,
por exemplo. (LANGACKER, 1980, p.59)
Ao analisar os dados obtidos, foi possível verificar que o Fator Extralinguístico que
mantêm maior influência na fala do Vilhenense denomina-se “Redes Sociais”. Em diferentes
ambientes, temos também uma atitude linguística diferenciada, adequada a esta circunstância,
independente da idade, o grau de escolaridade ou do status socioeconômico das pessoas que
estiverem neste lugar. O Fator Extralinguístico “Redes Sociais” possui uma relevância maior,
pois, sua influência é predominante na fala. Rossi-Landi (1968 apud CALVET, 2002, p. 108)
explica que a comunidade linguística é como “uma espécie de imenso mercado, no qual as
palavras, as expressões e as mensagens circulam como mercadorias”. Portanto, cada ambiente
nos oferece dentro desta comunidade linguística uma linguagem a ser adquirida por meio do
contato entre o sujeito e a rede social. Bakhtin (2002:113) cita que: “a situação social mais
imediata e o meio social mais amplo determinam completamente, por assim dizer, a partir do
seu próprio interior, a estrutura da enunciação.” Ou seja, é o meio social que nos determina
como devemos falar em diferentes circunstâncias.
O “Status Socioeconômico” é um fator que, também, influi no modo de falar do
Vilhenense. Pessoas de diferentes classes sociais, consequentemente, fazem uso de falas
diferenciadas; isto se explica por não possuírem os mesmos acessos à educação, a cultura e,
além disso, não freqüentarem os mesmos ambientes e, não fazer parte das mesmas
comunidades lingüísticas. Segundo Bakhtin (2002), os sujeitos de classe sócio-econômica
251
média podem ser considerados como os maiores produtores de mudanças lingüísticas, assim
como os primeiros a percebê-la, pois, geralmente, procuram se afastar da classe sócioeconômica que julgam ser inferior e buscam aproximar-se da classe sócio-econômica alta.
Portanto, os distintos “Status Socioeconômico” se refletem nas falas dos indivíduos,
marcando quem é este sujeito na sociedade. Votre (2004 apud MOLLICA & BRAGA, 2004,
p. 51) afirma que pessoas de escalas socioeconômicas distintas apresentam um falar
diferenciado:
A primeira distinção focaliza o status econômico e o prestígio social dos usuários das
formas da língua. As formas de expressão socialmente prestigiadas das pessoas consideradas
superiores na escala socioeconômica opõem-se aos falares das pessoas que não desfrutam de
prestígio social e econômico. (VOTRE, 2004, apud MOLLICA & BRAGA, 2004)
Por fim, temos o último Fator Extralinguístico que influi no modo de falar do
Vilhenense: a “Escolaridade”. Quando as pessoas falam é possível identificar se este sujeito
teve oportunidade de estudar ou qual o seu grau de escolaridade, por exemplo. Portanto, as
pessoas que possuem acesso à escola, consequentemente, possuem uma fala distinta de quem
não teve a oportunidade de estudar, ou então, uma pessoa que já concluiu um Curso de Nível
Superior, também, terá uma atitude linguística diferenciada de quem ainda não concluiu o
Ensino Médio. Ou seja, os indivíduos que tem acesso à escola possuem um domínio maior na
estrutura da enunciação, enquanto quem não usufrui dos mesmos acessos à escolaridade tende
a não dominar essa linguagem mais elaborada. De acordo com Votre (2004 apud MOLLICA
& BRAGA, 2004, p. 51):
A observação do dia-a-dia confirma que a escola gera mudanças na fala e na escrita das
pessoas que as freqüentam e das comunidades discursivas. Constata-se, por outro lado, que
ela atua como preservadora de formas de prestígio, face a tendências de mudança em curso
nessas comunidades. Veículo de familiarização com a literatura nacional, a escola incute
gostos, normas, padrões estéticos e morais em face da conformidade de dizer e de escrever.
Compreende-se, nesse contexto, a influência da variável nível de escolarização, ou
escolaridade, como correlata aos mecanismos de promoção ou resistência à mudança.
Os dados analisados nos permitem afirmar quais são os Fatores Extralinguísticos que
influem a fala do Vilhenense e, deste modo, contribuem para formação do Dialeto
Vilhenense. Porém, é necessário refletir como os Professores de Língua Portuguesa lidam
com esta Diversidade Linguística e Cultural em sala de aula. Será que temos uma
conscientização e valorização das distintas culturas e linguagens no ambiente escolar?
252
Segundo Bagno (2002:39) é preciso promover a valorização da Diversidade
Linguístico-Cultural, pois, a língua é o reflexo da sociedade. Portanto, se vivemos em uma
sociedade estratificada e desigual, é natural que os fenômenos linguísticos manifestem, por
meio da linguagem, a Diversidade Sócio-Cultural e econômica de seus falantes. Faraco
(1991:13) cita que “a língua é uma realidade heterogênea, multifacetada e que as mudanças
emergem dessa heterogeneidade.”
Os Professores de Língua Portuguesa entrevistados têm consciência da Diversidade
Linguística e Cultural presente na sala de aula, porém, não sabem como lidar com esta
situação. Segundo Luft (1985:108), é natural que os professores possuam dificuldades quanto
ao ensino da Língua, pois, trata-se de “um terreno de areias movediças, ainda em expansão,
como é o das teorias sobre a linguagem”. Ou seja, temos uma língua viva e heterogênea em
processo contínuo de mudanças, pois, assim como a sociedade muda ao longo do tempo, a
linguagem, consequentemente, acompanha esse processo de transformação. Portanto, se o
Professor não consegue lidar com esta diversidade em sala de aula, é porque ele não possui
conhecimento suficiente sobre as teorias aplicáveis ao ensino da língua. Luft (1985:108)
afirma que é necessário que o professor encare esta realidade e traga-a para a sala de aula.
Segundo Cagliari (2002) para o professor saber o que é ensinar a Língua Portuguesa, é
necessário, conhecer o seu grupo de alunos, falantes desta língua rica e heterogênea. Este
conhecer “o grupo de alunos” como falantes da Língua Portuguesa é reconhecer as Variações
“Geográficas”, “Sociais” e “Estilísticas”. Cagliari (2002:47) afirma que a escola deveria
conhecer os falares regionais do Brasil “para poder entender a realidade linguística de uma
classe, da qual fazem parte alunos procedentes de várias regiões do país.” O Ensino da Língua
Portuguesa ainda não desenvolve práticas que auxiliem na valorização da Diversidade
Linguístico-Cultural, pois, os alunos não têm consciência de que sua linguagem é o reflexo da
sociedade em que vivemos.
(...) Portanto, a escola tem que fazer o ensino de português uma forma
de o aluno compreender melhor a sociedade em que vivemos, o que
ela espera de cada um lingüisticamente e o que podemos fazer usando
essa ou aquela variedade do Português. (CAGLIARI, 2002, p. 48)
Cagliari (2002) mostra-nos que o Ensino de Língua Portuguesa é muito problemático
pelo que se ensina e, também, torna-se falho porque deixa de ensinar muita coisa em relação
às Variações Lingüísticas. Este é um assunto que os Professores de Língua Portuguesa
253
deveriam discutir em sala de aula, mostrando assim, o porquê dos diferentes modos de falar e
qual a sua relação com a sociedade.
Observamos, portanto, que os Professores que lecionam a disciplina de Língua
Portuguesa não discute sobre a heterogeneidade linguística em suas aulas, porque não
possuem conhecimento a respeito deste assunto. Se os professores não ensinam é porque não
sabem, portanto, é nesse sentido que vemos a relevância de um curso de Formação de
Professores que se comprometa com as questões relacionadas à Diversidade Linguística e
Cultural, contribuindo, assim, para a identificação dos Falares Amazônicos.
REFERÊNCIAS
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255
UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
COORDENAÇÃO DE PESQUISA
PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA
DEPARTAMENTO DE LÍNGUAS VERNÁCULAS
GRUPO DE PESQUISA FILOLOGIA E MODERNIDADES
RESUMO EXPANDIDO
PROJETO: ONOMÁSTICA RONDONIANA
A
APLICAÇÃO
SUBPROJETO:
CONCRETA
DE
NORMAS
SOBRE
NOMES
DE
LUGARES EM PORTO VELHO
LINHA DE PESQUISA: Interculturalidade e Análise Crítica do Discurso
ORIENTADORA: Dra. Maria do Socorro Beltrão Macieira
PESQUISADOR: Marcus Vinicius da Rocha Gouveia Cardoso
LOCAL DE EXECUÇÃO: Universidade Federal de Rondônia Campus de Porto Velho.
RESUMO
O Projeto teve como objetivo geral recolher normas que tratem de fixação de antropônimos e
topônimos no Brasil, verificando a sua pertinácia na aplicação a pessoas e lugares concretos
na Amazônia, no propósito de estabelecer parâmetros de redignificação social.
Especificamente, procurou identificar a realidade normativa, cultural, antroponímica e
toponímica, da região amazônica, a partir de Porto Velho e de Rondônia, buscando apoio ao
reconhecimento de parcelas socioculturais diferenciadas (indígenas, quilombolas, ribeirinhos)
para o emprego de denominações antroponímicas e toponímicas próprias; fundamentalmente
efetuando uma pesquisa de legislação, sistematizando os dados recolhidos.
1 INTRODUÇÃO:
Da realidade das normas levantadas e da realidade encontrada nas ruas surge um
diferencial que leva a uma paulatina discriminação social de componentes brasílicos
discriminados em razão do nome. Verifica-se uma resultante inicial imediata: identificamos
256
parcelas de realidade ligada à Onomasiologia. Preparou-se o espaço da discussão no propósito
de municiar políticas públicas responsáveis por ampliar a dignificação das pessoas que
vivenciam a experiência de sobreviver ou como comunidades diferenciadas (indígenas, não
indígenas e com os indígenas) ou como comunidades envolvidas no viver comum.
Especialmente em áreas da periferia de Porto Velho, pode-se avaliar quais são os
nomes existentes em uso, e assim dispor de elementos para uma análise mais ampla,
compreendendo o processo de utilização de nomes forâneos, quando estes elementos “sobem”
a uma naturalização fora do espaço rural ou ribeirinho.
Pode-se, por meio deste Trabalho, empreender uma pesquisa-ação detectando o uso
concreto das normas de uso de nomes, as suas contextualizações significativas na sociedade,
evidenciando assim configurar elementos para o seu emprego em políticas públicas de
inclusão social.
Este Projeto, como os seus congêneres e antecedentes, desvendam de algum modo a
realidade do entrechoque de parcelas humanas. Os seus referenciais onomásticos são um vetor
decisivo para este mapeamento. Assim, pode-se detectar a melhor maneira de encaminhar
respostas às carências de populações alijadas do reconhecimento da normalidade dos seus
referenciais, seja dos nomes próprios que empregam (ou deixam de empregar, em função de
preconceitos dirigidos), seja de outras denominações que lhes sejam cotidianas.
2 MATERIAIS E MÉTODOS
Os dados foram recolhidos por pesquisa em meio eletrônico, submetidos a
sistematização e análise detida. A análise dos dados estará fundada nos estudos da
Onomástica, segundo teóricos estudados previamente, inclusive doutrinadores da área (Walter
Ceneviva). A recolha exemplar final dos antropônimos e topônimos levará em conta a
contextualização ao local e a deriva cultural.
A Onomástica é ciência responsável por estudar referenciais fundamentais ao sistema
comunicativo, com condições de fixar ou retratar, de modo direto, os elementos indiciais
prioritários da comunidade que analisa, devido à sua característica intrínseca de valorizar
dados da indexação social. O estudo dos nomes próprios de lugares fornece uma larga fonte
de pesquisa na área da linguística, da cultura e da lexicologia, indiciando com isso a origem
de pessoas e de coletividades.
Como ramo de pesquisa, a Onomástica ainda é pouco explorada no espaço das escolas.
Ciência encarregada de verificar, através de topônimos e antropônimos, quais os termos
257
empregados para nomear pessoas e lugares. Até porque é espaço cultural naturalizado (não se
admite a existência de seres inominados), ao longo do tempo as comunidades procuram se
integrar à sociedade envolvente adotando as denominações mais correntes do seu entorno
cultural.
3 RESULTADOS
A Onomástica é ciência responsável por estudar referenciais fundamentais ao sistema
comunicativo, com condições de fixar ou retratar, de modo direto, os elementos indiciais
prioritários da comunidade que analisa, devido à sua característica intrínseca de valorizar
dados da indexação social. O estudo dos nomes próprios de lugares fornece uma larga fonte
de pesquisa na área da linguística, da cultura e da lexicologia, indiciando com isso a origem
de pessoas e de coletividades.
Segundo Oliveira e Isquerdo (2001), “o léxico de uma língua conserva estreita relação
com a história cultural da comunidade”, seguindo os fatores relevantes que influenciam na
denominação de toponímica e antroponímica, gerando uma relação entre a pessoa ou lugar
com os nomes atribuídos, representando a cultura que o nomeou.
4 CONCLUSÃO
Descobriram-se antropônimos e topônimos havidos em cartórios da cidade,
localizando vestígios onomásticos indígenas, ribeirinhos, quilombolas e outros, foram
localizadas algumas problemáticas de conhecimento e de reconhecimento de nomes próprios
de pessoa e de lugar, por isso resolvemos concentrar os nossos esforços em busca de
viabilizar uma informação mais acabada de dados técnicos para que as comunidades possam
vir a se situar culturalmente.
Para a aplicação concreta de normas sobre nomes de lugares em Porto Velho, as suas
bases legais, as normas positivas fornecem dados que podem ser utilizados às políticas
públicas referenciais capacitados se servem de uma Lei (de Registros Públicos) e do Código
civil.
Diversos foram os debates, seja sobre a readaptação do projeto, sobre os impactos que
o nome possa dignificar e dar posses e direitos a uma pessoa, sobre a problemática indígena:
nomes e posse de terras, entre outras que trataram do aprofundamento desses temas principais.
258
Houve troca de informações com discente veterano do sexto período de Informática, sobre
noções avançadas de criação de website, para um próximo momento, além de repassar
espaços de divulgação ao Projeto co-irmão Informatizando a Literatura de Rondônia. Com o
DTI/UNIR buscamos informações sobre o espaço eletrônico onde virá a ser publicado o
material dos Projetos.
Através do constante levantamento bibliográfico realizado pelos pesquisadores do
atual projeto, foi possível perceber que os resultados dessa pesquisa poderão contribuir
consideravelmente para a humanidade.
Ao analisar palavras, origens de nomes e lugares, estamos, na verdade, detectando a cultura
destes povos, podendo, com certeza, resgatar muita coisa de um passado, que na maioria das
vezes é esquecido.
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260
A EXPRESSÃO DE GÊNERO E NÚMERO DA L1 (TUPI-KAWAHIB)
NA ESCRITA EM L2 (LÍNGUA PORTUGUESA)52
Maria de Fátima Marques da Cunha53
[email protected]
Wany Bernardete de Araujo Sampaio54
[email protected]
RESUMO
Este artigo apresenta um estudo acerca das manifestações gramaticais da L1 (língua materna) na
escrita em L2 (língua portuguesa), referindo-se especificamente à concordância de gênero e
número em textos escritos em língua portuguesa (L2) por professores indígenas em formação da
etnia Tupi-Kawahib. A relevância do trabalho em questão procura mostrar que teremos um
conhecimento mais profundo sobre as línguas indígenas e das interferências gramaticais da L1 na
escrita de L2 e poderão no futuro, contribuir com a formação dos professores formadores de
professores indígenas no que se refere à compreensão das estruturas gramaticais reveladas na
produção escrita de seus alunos; e isto poderá apontar para a produção de novas e mais adequadas
técnicas diferenciadas de ensino da escrita de língua portuguesa para falantes de línguas
indígenas.
Palavras - chaves: Línguas Indígenas. Concordância de gênero e número. Interferências da L1 na
escrita em L2. Formação de professores.
ABSTRACT
This article presents a study of the grammatical manifestations of L1 (mother tongue) in writing in
L2 (Portuguese), referring specifically to gender and number agreement on texts written in
Portuguese language (L2) for teachers in training indigenous ethnic Tupi-Kawahib. The relevance
of the work in question seeks to show that we have a deeper understanding of indigenous
languages and grammatical interference of L1 in L2 writing and may in future contribute to the
training of indigenous teachers teacher educators with regard to understanding the grammatical
structures revealed in the written production of students, and this may point to the production of
new and more appropriate teaching techniques different from the writing of the Portuguese
language to speakers of indigenous languages.
Key-words: Indigenous Language. Reliability of gender and number. Interference of L1 in L2
writing. Teacher Training
52
Texto produzido a partir de resultados do projeto de pesquisa Manifestações da Concordância de Gênero e
Número da L1 na escrita em L2 de professores indígenas em formação, desenvolvido pelo Grupo de Estudos em
Culturas, Educação e Linguagens, Centro de Estudos da Linguagem, Departamento de Línguas
Vernáculas/NED/UNIR, com o apoio do PIBIC/UNIR/CNPq.
53
Discente do 7º período do curso de Letras Português/Literaturas e bolsista do PIBIC/UNIR/CNPq.
54
Doutora em Linguística. Doutora em Educação Escolar. Departamento de Línguas Vernáculas.
Orientadora da pesquisa.
261
INTRODUÇÃO
Através das observações dos professores que ensinam a língua portuguesa nas aldeias
indígenas, percebe-se que ocorreu um crescimento de falantes bilíngues, pois a necessidade
do aprendizado da Língua Portuguesa - oral e escrita - é dada pelas relações majoritárias com
a população não índia do Brasil. Nas aldeias indígenas, é predominante a tradição oral, sendo
ínfimo ou até nenhum material escrito em língua materna. Na maioria das aldeias alfabetizase primeiro na língua materna e, posteriormente, introduze-se a língua portuguesa.
Considerando este fato, surge a proposta de investigar as possíveis manifestações da
Gramática da L1, no que se refere à concordância de gênero e número, em textos escritos
em língua portuguesa (L2) por professores indígenas em formação - pertencentes a etnias
Tupi-Kawahib.
A pesquisa pretendia inicialmente trabalhar a partir de um projeto de formação de
professores em nível superior na Universidade Federal de Rondônia, porém o curso recebeu
apenas alunos não indígenas. Diante deste fato, houve necessidade de mudar a clientela alvo;
assim, foram coletados dados adquiridos de estudantes indígenas do Ensino Médio Magistério Indígena, através do Projeto Açaí (Projeto de Formação de Professores Indígenas
da Secretaria de Estado da Educação).
As produções escritas dos estudantes em L2 (Língua Portuguesa) podem mostrar
manifestações gramaticais da L1 e podem revelar sistemas que ocorrem internamente no
processo de aquisição e aprendizagem. O conhecimento de tais sistemas e mecanismos poderá
contribuir para uma melhor compreensão linguística na formação de professores indígenas e
também de professores de Língua Portuguesa.
BASE TEÓRICA
As manifestações da gramática da L1 na escrita em L2 propõem várias discussões das
interferências que ocorrem internamente nos sistemas dos falantes.
No que se refere à concepção de gênero, os estudos de alguns teóricos remetem-nos
aos conceitos etimológicos dessa repartição sexual e de como influenciará a aquisiçãoaprendizagem de uma L2.
262
É comum em diversas línguas como, por exemplo, nas línguas portuguesa, espanhola,
francesa e italiana, utilizar-se os termos masculino e feminino para classificar a flexão do
gênero. Ao utilizarmos um artigo que se encontre no gênero feminino, o substantivo também
deve estar em tal classificação, através da concordância. Contudo, algumas línguas, embora
sigam essa classificação binária, possuem também o gênero neutro.
O alemão, o polonês e o árabe acrescentam o gênero neutro. Outras línguas baseiam a
classificação do gênero em conceitos inteiramente diferentes, tais como animado-inanimado,
ou de acordo com a forma e o tamanho. A arbitrariedade nas classificações de gênero, no que
diz respeito aos referentes do “mundo real”, varia de língua para língua. A palavra “lua”
pertence ao gênero feminino em espanhol e ao masculino em alemão. Em chinanteca55 “lua” é
considerada como um ser animado, o que reflete a crença do povo de que ela foi
anteriormente um animal que saiu de um ovo. (ELSON, 1973 e PICKETT, 1973)
Nota-se, então, que a concepção de gênero é muito relativa e essas abordagens
refletem em muitas línguas cujas palavras provêm dessa etimologia. Com os estudos de Elson
e Pickett (1978) percebemos que, para entender a língua de um povo, deve-se conhecer sua
cultura, crença ou mitologia.
METODOLOGIA
A pesquisa em questão investiga manifestações gramaticais da L1 na escrita em L2
(Língua Portuguesa) através de textos produzidos por professores indígenas em formação. O
trabalho para a seleção e organização de dados se pautou em arquivos já dispostos no Grupo
de Estudos em Culturas, Educação e linguagens - GECEL, com intuito de (re)aproveitar
textos escritos por professores amondawa, tanto em língua portuguesa como em língua
materna.
O trabalho compreende a pesquisa bibliográfica (com leitura e estudo dos textos
teóricos) e a pesquisa documental (nos arquivos do GECEL) quando desenvolveu-se o
levantamento e análise de aspectos gramaticais, especificamente da concordância de gênero e
número, segundo o seguinte roteiro de trabalho: i) Seleção de textos dos estudantes indígenas
amondawa; ii) levantamento da manifestação morfológica e sintática; iii) identificação e
descrição da relação da língua amondawa com a língua portuguesa; iv) análise das sentenças,
55
Língua indígena do México.
263
e posteriormente das manifestações da L1 (articulação entre os aspectos estruturais e o
histórico-social) evidenciada nas sentenças coletadas, como resultado de uma pesquisa inicial.
A perspectiva teórico-metodológica que fundamenta as reflexões e as análises da
pesquisa articula conceitos da Linguística Estrutural; enfocamos, portanto, sintagmaticamente,
manifestações gramaticais na (re)escrita da língua portuguesa realizada por estudantes da
etnia Tupi-Kawahib.
RESULTADOS
A investigação ocorreu em duas etapas: a primeira foi com sintagmas extraídos dos
arquivos do grupo de pesquisa - GECEL. Coletamos frases escritas em L1 (amondawa) para a
escrita de L2 (língua portuguesa) e a segunda com textos dos alunos do ensino médio da etnia
Tupi-Kawahib - projeto Açaí. Buscamos analisar as manifestações que ocorrem internamente
na língua portuguesa e a influência da língua materna.
A seguir apresentaremos trechos de um texto produzindo por um falante indígena:
a) E Anta estava paciado pela mata e cabou encontrando jabuti comendo Inga e falou
para eles tirarem Inga para ele tambem. Jabuti brincaram com Anta.
b) Acabaram achando ele (Anta).
c) E jaboti foram atrás da Anta.
d) Jabuti não sabia o que fase com Anta perssaran ir perga fogo da onça.
e) Ir perga fogo da onça/ aonça estava dormido/ undos jabuti fez baralho e aonça
acordou.
Nos trechos do texto “a historia do jabuti’, a discussão proposta é que o falante apresenta
ocorrências que demonstram que ao mesmo tempo internalizou as regras da L2 e ao mesmo
tempo foge do padrão normativo solicitado. Ou seja, no começo e no desenrolar do texto o
falante omite diversas vezes o artigo que designa a concordância de gênero e número: E anta
estava paciando/acabou encontrando jabuti. Embora não apresente os determinantes do
gênero masculino para o substantivo ‘Jabuti’ e o substantivo “Anta”, percebemos, no texto,
que o falante tem uma pequena noção quanto ao gênero, mas ainda está em processo de
internalização. Em boa parte do texto fica bem marcado que o substantivo “Anta” é usado no
masculino, pois na língua materna a palavra é neutra. No decorrer do texto, utiliza o adjetivo e
nas outras vezes o pronome pessoal do caso reto ‘ele’ para determinar o gênero (masculino):
falou para eles (os jabutis) tirarem Inga para ele (anta) também/ Anta ficou bravo/Acabaram
achando ele (a anta).
264
No segundo momento do texto, depois da morte da anta, o indígena trabalha com um
terceiro personagem, a onça (outro substantivo epiceno). Percebe-se que utiliza a
concordância exata: ir perga fogo da onça/ aonça estava dormido/ undos jabuti fez
baralho e aonça acordou. Porém num dado momento ele manifesta que a onça é macho,
através do pronome pessoal ‘ele’: tinha que miti para onça para ele da fogo (Tinha que
mentir para a onça, para ele dar o fogo). Este fato acontece porque para o falante TupiKawahib não há essa necessidade de se reportar ao sexo do animal; por ser uma palavra
neutra em sua língua, o indígena irá optar por um dos pronomes pessoais ele/ela ou artigos, na
língua portuguesa, por ter, provavelmente, dúvidas quanto ao sistema de concordância, e não
por estar preocupado em diferenciar se o animal é macho ou fêmea. Em muitos casos ocorre
também uma confusão na língua portuguesa, assim como afirmam Cipro Neto e Infante
(1998):
O uso das palavras masculino e feminino costuma provocar confusão entre a
categoria gramatical de gênero e a característica biológica dos sexos. Para
evitar essa confusão, observe que definimos gênero como um fato ligado à
concordância das palavras em seu relacionamento linguístico: por exemplo,
o pó é um substantivo masculino pela concordância que estabelece com o
artigo o, e não porque se possa pensar num possível comportamento sexual
das partículas de poeira. Só faz sentido relacionar o gênero ao sexo quando
se trata de palavras que designam pessoas e animais, como, por exemplo, os
pares professor/professora ou gato/gata. Ainda assim, essa relação não é
obrigatória, pois há palavras que, mesmo pertencendo exclusivamente a um
único gênero, podem indicar seres do sexo masculino ou feminino. E o caso
de criança, palavra do gênero feminino que pode designar seres dos dois
sexos. (CIPRO NETO & INFANTE, 1998 p. 203).
De acordo com os estudos referentes à interferência da L1 sobre a L2, os “erros”
cometidos por aprendizes de uma segunda língua ocorrem por duas maneiras: pela
transferência dos padrões da língua materna ou pelo esforço para descobrir a estrutura da
segunda língua. É exatamente como acontece no texto em análise. Pesquisas revelam que as
línguas tupi-kawahib não possuem determinantes, explicando assim as ausências dos
determinantes ou as oscilações dos artigos (a) e (o): “E Ø jaboti foram atrás da Anta”; no que
concerne ao gênero, possuem três formas: masculino, feminino e neutro. Este último é
utilizado somente para não humanos. Assim as manifestações da L1 ocorrem devido não
necessitar de explicações quanto à concordância; de acordo com Hirt (1927) - o neutro é
simplesmente uma reminiscência daquela época que ainda não havia distinção de gênero.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O projeto Manifestação da L1 (língua materna) na escrita da L2 (língua portuguesa),
através do subprojeto: Manifestações da concordância de gênero e número da L1 (língua
materna) na escrita da L2 (língua portuguesa) buscou mostrar possíveis manifestações
265
gramaticais da língua materna (L1) na escrita da língua portuguesa (L2) por professores
indígenas em formação.
Nesta pesquisa, buscamos enfatizar que existem muitos conceitos no que se refere ao
gênero e que sua concepção é muito relativa. E em resultado, interferências da língua materna
serão manifestadas na escrita de uma segunda língua, visto que os falantes tupi-kawahib,
assim como os ingleses e alemães possuem um terceiro gênero, o neutro.
Diante dos casos estudados, aprendemos, através de teóricos como Krashen, que a
aquisição e a aprendizagem dependerão do ambiente onde se encontra o falante e é um critério
individual que necessita de interação social para ser bem sucedido. Compreendemos, também,
que o processo de aprendizado e aquisição de uma segunda língua não se desenvolve da
mesma forma que a L1, pois este último é um processo mais natural. Reconhecemos, ainda,
que a língua materna poderá manifestar influências da sua gramática original na
aquisição/aprendizagem de uma segunda língua, pois tal gramática está internalizada e
influencia no aprendizado de outros idiomas, podendo ser de forma positiva ou negativa.
Através deste estudo, percebemos algumas importantes manifestações do falante
tupi-kawahib na escrita em língua portuguesa:
1) A substituição do determinante (artigo) O (masculino) por A (feminino);
2) A supressão de determinantes em sintagmas nominais em português.
3) A utilização de dois determinantes quando o substantivo necessitar de
marcadores que indiquem gênero e número.
4) O gênero está inteiramente ligado à concordância e não ao sexo; as
manifestações acontecem porque na língua materna não há determinantes..
É possível supor que, na escrita em português (L2), o falante tupi-kawahib fez tais
substituições e/ou supressões porque na sua língua (L1) não há determinantes, não há
marcadores flexionais. Na aquisição oral de uma segunda língua, principalmente na escrita,
fatalmente os estudantes demonstram sua Gramática 1; muitas vezes essas manifestações são
consideradas ERROS, em vez de se tornarem objeto de estudo para uma reflexão maior.
Percebemos que, com o aumento do nível de escolarização, os alunos do Projeto Açaí
progrediram muito na gramática de L2 deixando isto bem visível nos textos, diminuindo
assim as ocorrências de manifestações no que se refere à ausência de determinantes. O
Referencial de Formação de Professores e o Referencial Curricular Nacional para Escolas
Indígenas busca auxiliar os professores indígenas a melhor compreenderem esse universo que
os permeia e assimilarem as estruturas e funcionamento da língua portuguesa escrita.
266
Assim, consideramos que este conhecimento seja muito relevante, não somente para o
conhecimento de línguas indígenas, mas também para os professores formadores de
professores indígenas, que buscam uma inserção no magistério intercultural.
REFERÊNCIAS
BORBA, Francisco da Silva. Introdução aos Estudos Linguísticos. Campinas, SP: Pontes,
14ª edição, 2005.
DOBSON, R. Aspectos da língua kayabí. Série Linguística, 12. Brasília: Summer Institute
of Linguistics, 1988.
ELSON, B. F. e PICKETT V. B. Introdução à morfologia e à sintaxe. Petrópolis: Vozes,
1973.
FIGUEIREDO, F. J. Q. Aquisição e Aprendizagem de Segunda Língua, 1995.
JUNIOR, M. C. Princípios de Linguística Geral: Como Introdução aos Estudos
Superiores da Língua Portuguesa. Padrão- Livraria Editora. Rio de Janeiro, 1989.
NETO, Pasquale e INFANTE, Ulisses. Gramática da Língua Portuguesa. São Paulo:
Editora Scipione, 1998.
SAUSSURE, F. Curso de linguística geral. São Paulo: Cultrix, 2006.
SAMPAIO, W. B. A. A referência remissiva número-pessoal nos prefixos verbais da
língua Uru-eu-uau-uau, 2006. (Não-publicado)
TAGMÊMICA. Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/Tagm%C3%AAmica>. Acesso
em 20 de janeiro de 2011.
ZUCARELLO, Maria Franca. Domínios e interferências da língua estrangeira sobre a
língua materna. Cadernos da CNFL, Vol XIII, nº 4, 2010.
267
UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO, PESQUISA E EXTENSÃO
COORDENAÇÃO DE PESQUISA
PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA - PIBIC
DEPARTAMENTO DE LÍNGUAS VERNÁCULAS
GRUPO DE PESQUISA FILOLOGIA E MODERNIDADES
RESUMO EXPANDIDO
PROJETO: Informatizando a Literatura de Rondônia
SUBPROJETO: “Disponibilização on line de textos de escritores de Rondônia”
PESQUISADORA: Mariana Priscila Mendonça Lopes
ORIENTADOR: Dr. Júlio César Barreto Rocha
LOCAL DE EXECUÇÃO: Universidade Federal de Rondônia Campus de Porto Velho.
RESUMO
O Projeto teve como objetivo geral proceder à disponibilização on line de textos de escritores
difundidos em Rondônia, após obter licença de difusão. Especificamente, pretende favorecer a
caracterização dos textos, identificando gêneros, autores e obras; e afinal compreender
qualidades estéticas como um princípio fundamental e potencializador do processo de
literariedade sem desprezar a função social da Arte.
1 INTRODUÇÃO
Em agosto de 2011, foram iniciadas as atividades referentes ao Subprojeto da Pesquisa
Disponibilização on line de textos de escritores de Rondônia, sob a orientação do professor
Dr. Júlio César Barreto Rocha.
Foram realizadas leituras de alguns livros de teóricos de Literatura e de literatura local,
tais como Marcas do Tempo (CÂNDIDO DA SILVA, A. Poesias. Ed. do Autor, s/d.); A
Literatura no Brasil (COUTINHO, A. Rio de Janeiro: EdUnicamp, 1955.); Sobre Literatura
268
(ECO, U. Barcelona: RqueR, 2002.); e ainda o texto Filologia Política, de autoria do nosso
orientador.
Superar o caráter esteticizante dos estudos de Literatura, em termos de consideração
da obra como tal e de apresentação ao público, é um passo. A maioria das obras que não
chega ao grande público ou aos estandes de feiras e vitrines de livraria, nem à mesa de um
resenhista de nomeada, que lhe faculte abrir as portas de uma leitura menos espontânea e mais
respeitosa. Assim, estas obras, muitas das quais “redescoberta” anos ou mesmo séculos depois
de redigidas (alguma vez nem publicadas), findam não merecendo um lugar, mesmo que à
sombra, ao lado da chamada grande literatura.
2 MATERIAIS E MÉTODOS
Pesquisas de campo e bibliográficas, conversas pessoais e entrevistas com autores
foram os modos de abordar primeiramente a obra. A sua leitura (parcial) e a sua análise de
gênero, com debate (breve) sobre qualidade estético-literária, foram prévios ao tratamento de
digitalização de parte do texto.
Debates sobre o direito autoral e sobre a difusão da obra literária local nos espaços
públicos de Porto Velho seguiram-se às leituras, teóricas e das obras. Depois discutimos
técnicas de digitalização e de disponibilização de livros na internet.
3 RESULTADOS
Acompanhamos ativamente o recolhimento de diversos livros, efetuamos pesquisa
sobre como efetuar o melhor tratamento digital de uma obra ou de algumas de suas partes, e
efetuamos a digitalização, em casa ou na sala da pesquisa, levando o resultado ao evento de
Biblioteconomia.
Foi concluído, na fase final, o texto do Termo de Cessão e da Carta de
Encaminhamento do Termo de Cessão, para a disponibilização legal das obras (ou de partes
das obras) na internet.
4 CONCLUSÃO
O Projeto mostrou-se interessante, devido às descobertas de tantas obras de Rondônia
(ou sobre Rondônia) que catrecfem de maior divulgação. Também pelos debates sobre
269
propriedade privada de obras literárias, umas estando liberadas para divulgação gratuitas (as
de 70 anos ou mais da morte do autor) e outras que precisam de Termo de Cessão de Direitos.
Conhecer autores também foi importante, para vermos como eles são pessoas “normais”,
querendo a divulgação da sua obra e da Literatura de Rondônia, nenhum fazendo muita
questão de ganhar dinheiro com os seus escritos.
REFERÊNCIAS
Antônio Cândido da Silva. Madeira-Mamoré. O Vagão dos Esquecidos: O autor conta a
história da construção da ferrovia através de poesias. 2º ed. Porto Velho, 2000, 224 p.
Antônio Cândido da Silva. Marcas do Tempo: Poesias. Porto Velho: Gráfica Quarenta, 78 p.
Bahia, José Ailton Ferreira. Se o mundo não acabou - conserte-o! São Paulo: Scortecci,
2005, 142 p.
Carvalho, Julio. Juru, Jurupá, Jurupari. 1. Lendas indígenas. 2. Mitos. 3. Rondônia. Brasil.
I. EDUFRO: Porto Velho. Brasil. 2001, 88p.
Cátia Cernov. Amazônia em Chamas: Seleção de contos, literatura fantástica. 1º ed. São
Paulo: Selo do Povo, 2010, 98 p.
Cláudio B. Feitosa et alii. Antologia da Prosa e do Verso Rondoniense: Crônicas e poesia.
Porto Velho, 1994, 184 p.
Dias, Carlos Macedo (Poeta Mado). Das Tripas ao Marcapasso. Porto Velho: Edufro, 2003,
122 p.
Fundação Cultural de Rondônia. Antologia da Prosa e do Verso Rondoniense. Porto Velho:
FUNCER, 1995, 125 pp.
José Ailton Ferreira (Bahia). Versômetro: Poesias. 1.º ed. São Paulo: João Scortecci Editora,
1996, 82 pp.
Jotatê, João Teixeira. Coletânea JOTATÊ - Poesias, Crônicas e Contos. Porto Velho:
s/editora, s/data, 173 p.
Martins, Eduardo. O lado aberto. Poesias. Porto Velho: EDUFRO, 2004, 129 p.
Martins, William Haverly. O Tempo da Vida. Porto Velho: Ed Sem Nome, 1997, 148 p.
Nilza Menezes. Sina: troco ou vendo em bom estado: Poesias. Rio de Janeiro: Blocos, 1999,
84 p.
Ribeiro, Darcy. O indigenista Rondon. Homenagem da Turma de 1958 da Escola Superior
de Guerra ao seu patrono. Rio de Janeiro: Departamento de Imprensa Nacional, 1969, 75p.
270
ROCHA, J.C.B. (2001). “A ilha-Brasil: identidade pela diversidade”. In (obra coletiva): Maria
Teresa Toribio Brittes Lemos Luiz Henrique Nunez Bahia, Andrzej Dembicz. Brasil:
Espaço, Memória e Identidade. Estudos i Materiais. Número 21. Warszawa: CESLA-Centro
de Estudos Latino-Americanos / UERJ; pp. 54-72. ISBN: 83-85620-94-X
ROCHA, J.C.B. (2003). Análise Intercultural de Argumentos. Santiago de Compostela:
Servizo de Publicacións da Universidade de Santiago de Compostela, 2005.
Roquette-Pinto, Edgar. Rondônia (Brasiliana, v.39). Brasília: INL / São Paulo: Ed. Nacional,
1975, 285p.
Vitor Hugo. Desbravadores: história da colonização da região amazônica. Humaitá: Edição
Da Missão Salesiana, 1959, 495 pp.
271
AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS EM CURSO NAS ESCOLAS DA REDE
ESTADUAL DE ENSINO NA ZONA DA MATA RONDONIENSE: DE ONDE VEM,
PARA ONDE VÃO?
Mauricéia Ferreira Teixeira56
Marilsa Miranda de Souza57
RESUMO
Este artigo trata das políticas educacionais implantadas nas escolas da Zona da Mata
rondoniense. Utilizou-se o método dialético por meio das categorias básicas contradição e
totalidade e imperialismo e capitalismo burocrático como categorias históricas. O estudo
identificou as principais políticas educacionais implantadas nas escolas em Rondônia e
discute suas origens, seus pressupostos e reais objetivos. Constatou-se que os sujeitos
diretamente envolvidos no processo educativo, em sua maioria, desconhecem o processo de
formulação das políticas implementadas. Parte-se do pressuposto de que o Banco Mundial
como agência multilateral a serviço do imperialismo, sobretudo o estadunidense, tem
formulado e imposto aos países dominados políticas educacionais que promovem o
esvaziamento do processo educativo e implementam mecanismos de gestão a partir de uma
lógica gerencial e burocrática com vistas a inviabilizar propostas efetivamente democráticas.
Palavras-chave: Políticas educacionais; Imperialismo; Banco Mundial.
INTRODUÇÃO
Este trabalho tem origem no desenvolvimento da pesquisa intitulada “Capitalismo
burocrático, políticas educacionais e relações de poder na educação escolar em Rondônia”
financiada pelo Programa Institucional de Bolsas, Trabalho Voluntário de Iniciação Científica
e Apoio Técnico (PIBIC) e pela Universidade Federal de Rondônia (UNIR) e seu subprojeto:
“As políticas educacionais em curso nas escolas da rede estadual de ensino na zona da mata
rondoniense: de onde vem, para onde vão?”.
O objetivo da pesquisa foi identificar as
principais políticas educacionais implantadas nas escolas da rede estadual de ensino na Zona
da Mata rondoniense, suas origens, seus objetivos, o contexto em que foram implantadas e
seus principais agentes em nível local, regional, nacional e internacional.
A educação escolar atual foi delineada numa sociedade marcada por um período de
reformas político-econômicas, do aprofundamento das relações de dependência, da imposição
56
Acadêmica do curso de Pedagogia do Campus de Rolim de Moura e Bolsista Voluntária do Programa
Institucional de Bolsas, Trabalho Voluntário de Iniciação Científica e Apoio Técnico (PIBIC).
57
Doutora em Educação e professora do Departamento de Educação da Universidade Federal de
Rondônia (UNIR), Campus de Rolim de Moura.
272
e controle cada vez mais intenso dos organismos multilaterais imperialistas sobre as políticas
educacionais (CORAGGIO, 2007). As políticas públicas educacionais são hegemonicamente
formuladas, dirigidas e financiadas pelo Banco Mundial. Fundamentam-se nas teorias do
capital humano e nas concepções da educação neoprodutivista tornando a educação cada vez
mais vazia de conteúdo e intensificando os processos de exploração e precarização do
trabalho docente (SOUZA, 2010).
Em Rondônia, as políticas educacionais têm reforçado as relações de semisservidão
dos professores no contexto escolar, enfraquecido a gestão democrática e a construção de uma
educação histórico-crítica.
Os estudos teóricos, assim como a pesquisa de cunho bibliográfico foram realizados
ainda no segundo semestre de 2011. Iniciamos, ainda neste período, a pesquisa de campo, que
teve continuidade no primeiro semestre de 2012, momento em que levantamos parte dos
documentos a serem analisados, bem como a maior parte das entrevistas. Segue abaixo a
relação das escolas pesquisadas:
Município
Nova Brasilândia D’Oeste
Alta Floresta D’Oeste
Santa Luzia D’Oeste
Rolim de Moura
Novo Horizonte D’Oeste
Escola
Escola Estadual de Ensino Médio Aurélio Buarque de
Holanda Ferreira
Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Pe. Ezequiel
Ramin
Escola estadual de ensino fundamental e médio Juscelino
Kubitschek
Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Candido
Portinari
Escola de Ensino Fundamental e Médio Marechal Rondon
MATERIAIS E MÉTODOS
A apresentação do projeto foi realizada por meio de visitas em todas as escolas
selecionadas para a investigação. As visitas iniciais também possibilitaram o contato com os
gestores, supervisores, coordenadores pedagógicos e professores. Nestas ocasiões
apresentamos e discutimos os objetivos deste trabalho, a forma como desenvolveríamos a
pesquisa. Destacamos o fato de que não haveria identificação das escolas e tampouco dos
sujeitos entrevistados. Para tanto, os sujeitos foram identificados apenas como “professor da
escola A, B, C, D ou E.
Utilizamos a modalidade de entrevistas semi-estruturadas individuais por meio das
quais conhecemos a opinião dos professores e da equipe gestora acerca das políticas
273
educacionais em curso no Estado e, particularmente, nas escolas pesquisadas. Foram
entrevistados 03 professores do Ensino Fundamental e 03 de Ensino Médio de cada escola
pesquisada aplicando-se um único questionário.
Buscamos analisar a parte sem perder de vista sua relação com a totalidade. Desta
forma, nos fundamentamos em Marx (2008). Este autor faz uma crítica àqueles que buscam
realizar seus estudos sem considerar as relações concretas que são estabelecidas no âmbito da
produção e afirma que o concreto é síntese de múltiplas determinações e constitui unidade no
diverso (MARX, 2008, p.258).
Sendo assim, a análise dos dados teve como eixo central a aplicação do método
dialético, mediante o qual buscamos interpretar a realidade objetiva e subjetiva em termos de
categorias básicas: totalidade, contradição. Utilizamos ainda as categorias históricas
imperialismo e capitalismo burocrático que nos possibilitaram entender como ocorrem os
processos de dominação que determinam a elaboração e implantação das políticas
educacionais analisadas.
A região estudada está composta por cinco municípios sendo eles: Rolim de Moura,
Nova Brasilândia, Alta Floresta D’Oeste, Santa Luzia D’Oeste, Novo Horizonte D’Oeste. A
pesquisa foi realizada em cinco escolas, portanto, uma em cada município da Zona da Mata
do Estado de Rondônia. Utilizamos como critério para definição da escola a ser pesquisada
aquela que possui o quantitativo maior de alunos matriculados.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Para compreendermos o fenômeno objeto da pesquisa há que se considerar os
processos mais amplos que, em última instância, determinam o conteúdo e a forma como são
executadas no âmbito local as políticas educacionais.
Para tanto, recorremos ao conceito de imperialismo. O capitalismo, de acordo com
Lênin (1987), se transformou num sistema de caráter universal, submetendo a grande maioria
da população do globo à opressão de alguns países ditos mais avançados. O saque realizado
nas nações dominadas é partilhado entre os poucos países.
Desta forma, as nações hegemônicas passam a deter o controle de grandes parcelas
do globo. Entretanto, Lênin (1987, p. 84), chama a atenção para outras formas intermediárias
de dominação além da colonização propriamente dita: “as semi-colônias”.
Recorremos, também, ao conceito de capitalismo burocrático. O capitalismo
burocrático desenvolve-se nos países atrasados que não realizaram a revolução burguesa e,
274
portanto, mantém a estrutura agrária concentrada impedindo reformas de cunho democrático.
As relações estabelecidas no âmbito destes países constituem-se como semifeudais tendo em
vista o grau de servidão a que são submetidos os trabalhadores em geral. Considerando que o
Brasil possui estas características, o conceito de capitalismo burocrático pode ser aplicado
para explicar a realidade brasileira (MARTÍN MARTÍN, 2007).
Na condição de um país semicolonial, conforme Lênin (1987), e de capitalismo
burocrático, o Brasil submete-se às imposições dos organismos controlados pelo imperialismo
estadunidense.
O Banco Mundial tem pautado suas políticas educativas tendo como marco
referencial a teoria econômica neoclássica. Neste enfoque, de acordo com Coraggio (2007, p.
97), busca-se “assemelhar a escola à empresa, a ver os fatores dos processos produtivos como
insumos, e a eficiência e as taxas de retorno como critérios fundamentais de decisão”. Para o
autor citado, esse modelo é preocupante tendo em vista os vícios intrínsecos que
comprometem a validade científica das propostas apresentadas pelo Banco. O Banco Mundial
assim se expressa acerca da educação (BANCO MUNDIAL, apud CORAGGIO, 2007, p. 95):
“a análise econômica da educação em geral, e a análise das taxas de retorno em particular, é
um instrumento de diagnóstico para começar o processo de estabelecer prioridades e para
considerar formas alternativas de atingir objetivos num enfoque setorial”.
A sistematização da teoria do capital humano, que resulta desse enfoque, foi
construída, ainda na década de 1950, por um grupo de estudos coordenado por Theodoro
Schultz nos EUA. De acordo com Frigotto (2003, p. 41), a equipe de Schultz pretendia
descobrir “o fator que pudesse explicar, para além dos usuais fatores A (nível de tecnologia),
K (insumos de capital) e L (insumos de mão de obra), dentro da fórmula geral de Cobb
Douglas, as variações do desenvolvimento e subdesenvolvimento entre os países”. Ao propor
o fator H (capital humano) como resposta ao problema proposto, Schultz ganha notabilidade
sendo premiado com o Nobel de economia em 1968. Para Frigotto (2003, p. 41), a idéia chave
da teoria do capital humano é de que: [...] “a um acréscimo marginal de instrução, treinamento
e educação, corresponde um acréscimo marginal de capacidade de produção”.
No Brasil a teoria do capital humano adquiriu força na medida em que foi
incorporada à legislação “na forma dos princípios da racionalidade, eficiência e
produtividade, com os corolários do ‘máximo resultado com o mínimo de dispêndio’ e ‘não
duplicação de meios para fins idênticos’” (SAVIANI, 2007, p. 363). A aprovação da lei 5.540
em 28 de novembro de 1968, que promoveu a reforma universitária, em vigor a partir de 11
de fevereiro de 1969 por meio do decreto n. 464, representa o marco oficial de implementação
275
de uma concepção produtivista na educação brasileira. Em seguida, com a lei 5.692 de 11 de
agosto de 1971, que reformou a educação de primeiro e segundo graus, a concepção
produtivista foi estendida a todas as escolas do país através da pedagogia tecnicista. Ainda de
acordo com Saviani (2007, p. 363), a visão produtivista na educação não desapareceu com o
fim da ditadura militar, ao contrário, permaneceu, embora refuncionalizada.
Esta refuncionalização do produtivismo é denominada por Saviani (2007, p. 427) de
neoprodutivismo. Essa mudança ocorreu em função da reestruturação produtiva ocorrida a
partir da década de 1970 em meio à crise estrutural do modo de produção capitalista. Para
tanto, revolucionou-se a base técnica da produção “conduzindo à substituição do fordismo
pelo toyotismo”. O fordismo operava com tecnologia pesada de base fixa e organização do
trabalho com base nos métodos tayloristas. Estes, por sua vez, preconizavam a rígida divisão
do trabalho no que diz respeito ao planejamento e a execução, assim como impunham o
parcelamento das atividades produtivas como forma de ditar o ritmo de trabalho e impedir o
conhecimento, por parte dos trabalhadores, de todo o processo de produção. Por outro lado, o
toyotismo “apóia-se em tecnologia leve, de base microeletrônica flexível, e opera com
trabalhadores polivalentes visando à produção de objetos diversificados, em pequena escala,
para atender a demanda de nichos de mercado”.
Imbuído desta perspectiva, o Banco Mundial estabeleceu como ações prioritárias no
Brasil as seguintes medidas: a) providenciar livros didáticos e outros materiais de ensino a
exemplo de brinquedos pedagógicos e livros de leitura; b) melhorar as habilidades dos
professores em técnicas de sala de aula. Essa melhoria se daria por meio da implementação de
programas de formação continuada nas modalidades à distância e presencial. Para alcançar o
objetivo proposto estas atividades são avaliadas com o intuito de constatar “sua eficácia em
mudar o comportamento dos professores em sala de aula” (TOMMASI, 2007, p. 198).
Roberto Leher (1999, p. 1), afirma que o Banco é na verdade “o ministério mundial
da educação dos países periféricos”. Ainda de acordo com este autor, “o caráter determinante
das ideologias que informam a reforma educacional fica melhor evidenciado quando a
investigação apresenta concretamente como as concepções ideológicas se materializam nas
instituições”.
A materialização destas ideologias ocorre precisamente por meio da implementação
de programas e projetos que tem como principal objetivo submeter aos interesses
imperialistas os processos educativos nos países de capitalismo burocrático.
Nas entrevistas realizadas foram identificados os seguintes programas e projetos:
PME, PDE, GESTAR, Programa de Financiamento de Projetos Escolares (PROFIPES), Pró-
276
letramento, Empreendedorismo, Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE),
Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), Programa Nacional do Livro Didático (PNLD),
Transporte Escolar, PROINFO, Mais Educação, Ensino Médio Inovador, Mídias na
Educação.
No gráfico a seguir estão sintetizadas as opiniões dos professores acerca dos
programas implementados nas escolas.
Gráfico 01- Opinião dos professores sobre os programas de formação
Fonte: Silmara Ferreira Lopes
Nas entrevistas realizadas 67,6% dos professores avaliam como “bom” os programas
implantados, 15,74% como “ruim”, 10% são indiferentes e 6,66% não souberam ou não
responderam a questão. A princípio, esses resultados poderiam expressar uma aparente
aceitação consciente por parte dos professores em relação aos programas. Os professores que
avaliam como “bom” argumentam que participaram dos cursos, no entanto, são poucas as
“coisas” que se aproveitam. “Fiz GESTAR, PROFA e Pró-letramento. O Pró-Letramento não
tem muita coisa que se aproveite. São programas bons, no geral, depende da maneira que se
aplica e usa” (PROFESSOR DA ESCOLA A). Outros ainda entendem que no geral são muito
bons, porém, apresentam restrições a programas específicos a exemplo da fala a seguir: “os
programas são muito bons, mas o PDE tá um pouco falho, não consegue atingir as metas
definidas, não consegue cumprir o calendário. PDE existe no papel” (PROFESSOR DA
ESCOLA B). Há aqueles que entendem ser importante aproveitar todas as oportunidades de
formação relacionadas à sua formação a exemplo do professor da escola C: “Eu acho que cada
profissional deve aproveitar cada oportunidade para adquirir mais conhecimento na sua área”.
Há ainda aqueles que aderem sem restrições e cumprem rigorosamente a proposta do
277
programa: “São bons, necessários. O GESTAR achei muito bom, apliquei todos os conteúdos,
as atividades.” (PROFESSOR DA ESCOLA C). Constata-se, portanto, que as restrições às
políticas impostas estão presentes mesmo entre aqueles que as avaliam positivamente.
Por outro lado os 15,74% que consideram os programas ruins estão muito seguros em
sua avaliação. A seguir falas que evidenciam este posicionamento: “Não participo de nenhum
e nem quero participar. São programas que servem para colocar professores numa "forminha",
como o governo e os organismos internacionais querem. São cursos tecnicistas”
(PROFESSOR DA ESCOLA E); “Muito repetitivo, os cursos são aligeirados. O PROINFO,
os equipamentos não funcionam; o aproveitamento é muito pouco. Participei do GESTAR,
Pró-Letramento, PROINFO por ser coagida” (PROFESSOR DA ESCOLA D).
A imposição dos programas fica mais clara na medida em que se evidencia o processo
de alienação no que diz respeito às origens dos mesmos.
Gráfico 02- Se os professores sabem quem formula os programas de formação
Fonte: Silmara Ferreira Lopes
Os resultados expressam o completo desconhecimento acerca dos objetivos reais
destas políticas. Dos 30 professores entrevistados, 26 (86,66%) afirmam desconhecer quem
formula, 01 (3,34%) não soube responder e apenas 03 (10%) afirmam conhecer a origem dos
programas implantados. No entanto, ao analisarmos as falas destes últimos, constatamos
equívocos. Para estes professores “Os programas são elaborados pelo governo federal”
(PROFESSOR DA ESCOLA D). Apesar do governo federal aparentemente ser o formulador
e gestor destas políticas, entendemos que é o Banco Mundial o responsável pela concepção e
278
imposição nos países dominados, entre os quais está o Brasil. Em sua maioria, as políticas
implementadas são diretamente financiadas e dirigidas pelo Banco Mundial. As demais
seguem a mesma orientação tanto no que diz respeito aos aspectos pedagógicos, quanto nos
fundamentos teóricos que as embasam.
Os diretores e supervisores demonstram o mesmo desconhecimento. Dos 11
entrevistados, todos afirmam desconhecer a origem dos programas. Apesar de considerarem a
maioria dos programas bons, realizam críticas pontuais em relação a alguns programas:
formadores despreparados, conteúdo repetitivo e não atendem a realidade da escola.
Questionam também o fato de algumas formações ocorrerem na cidade de Porto Velho, o que
acarreta inúmeros transtornos. Afirmam que há muita desistência dos inscritos nos programas
e que em alguns casos os professores aplicam os módulos em suas atividades pedagógicas.
Todos realizaram críticas contundentes aos programas Mais Educação e Ensino Médio
Inovador por conta da carga horária, ausência de infraestrutura e insuficiência de profissionais
capacitados para atender a demanda de atividades a serem implementadas nas escolas.
Entre as políticas identificadas está o PDE. Este é o carro chefe dos programas do
Banco Mundial para a educação brasileira. Constitui-se em uma das ações do Fundo de
Fortalecimento da Escola (FUNDESCOLA) que é financiado pelo Banco Mundial e foi
gradativamente sendo implantado priorizando as chamadas “Zonas de Atendimento
Prioritárias (ZAP’s)”.
O PDE tem como principal objetivo promover um conjunto de ações com o intuito
de melhorar a qualidade das escolas do ensino fundamental, ampliando a permanência das
crianças nas escolas públicas, bem como a ampliação da escolaridade nas regiões onde se faz
presente.
Entretanto, apesar do objetivo proclamado, e não obstante o fato de defender a
eliminação da burocracia enfatizando a eficiência e a eficácia, suas ações têm se constituído
numa estratégia de controle burocrático das atividades desenvolvidas na escola. Esse processo
é evidenciado quando são apresentadas as etapas a serem seguidas durante a elaboração do
PDE (BRASIL, 2006, p. 20): [...] a) preparação, b) análise situacional, c) definição da visão
estratégica e do plano de suporte estratégico, d) execução e e) monitoramento e avaliação.
Além das etapas, o anexo do manual de elaboração do programa “reúne o conjunto de
formulários que compõem o documento PDE e que deverão ser apresentados após todo o
processo de analisar e repensar a escola”.
Para Silva (2011, p. 72), os mecanismos de controle estão presentes nas exigências
feitas à escola no processo de elaboração do PDE e PME. “Ao elaborá-los, a escola realiza um
279
diagnóstico de sua situação concreta, explicita o que pretende atingir a curto, médio e em
longo prazo, traçando para isso, objetivos, estratégias, metas e planos de ação a serem
alcançados”. Já pelo PME o repasse dos recursos diretamente para a escola é viabilizado. Fica
condicionada, desta forma, “a disponibilização de recursos mediante a perda da autonomia da
escola. Os gestores e professores transformam-se em meros executores de ações que somente
na aparência são formuladas para atender aos interesses da escola”. Ao vislumbrar a qualidade
da educação apenas por meio da melhoria de aspectos gerenciais, desconsiderando, portanto,
as relações mais amplas que determinam o fracasso da educação escolar, está “implícita nas
ações aprovadas e financiadas uma concepção que enxerga a organização da escola e do
ensino por uma ótica gerencial e autoritária.
De acordo com Souza (2010, p. 211), o PDE corresponde ao “objetivo de ajuste
estrutural imposto pelo imperialismo nas últimas décadas, que é reduzir gastos públicos dos
países semicoloniais nas áreas sociais”. De acordo com autora, os recursos que deveriam ser
gastos com as escolas são reduzidos, “uma vez que a melhoria da qualidade e a expansão do
acesso são feitas por meio do financiamento que o governo brasileiro pagará com juros altos,
alimentando ainda mais o nível de sua dependência em relação ao imperialismo”.
Outra ação do FUNDESCOLA implementada no Estado de Rondônia foi o
GESTAR. O objetivo geral deste programa é provocar transformações nas práticas de
aprendizagem dos alunos, na qualidade do ensino tornando os professores competentes e
autônomos, na ação pedagógica da direção e do corpo docente e na reflexão sobre as
representações da profissão do magistério, do seu papel social e das competências que lhe são
exigidas (BRASIL, 2005, apud SILVA, 2011, p. 73).
O GESTAR, ao abordar a concepção de qualidade, o faz através dos aspectos a
seguir: “do indivíduo para o mundo produtivo reclamado pelo sistema econômico”,
desenvolvimento de “capacidades básicas para: a) compreender e transformar o mundo
produtivo; b) comunicar-se adequadamente nas formas oral e escrita; c) trabalhar em equipe; e
d) exercer a função produtiva de maneira criativa e crítica” (BRASIL, 2005, p. 9).
A ideia de que é mais importante desenvolver a capacidade do aluno de aprender de
forma permanente também se faz presente na proposta do GESTAR. Ou seja, a escola não
deve necessariamente estar comprometida com a apropriação, por parte do aluno, dos
conhecimentos universais produzidos historicamente, mas, tão somente, com os
conhecimentos exigidos pela realidade no sentido de possibilitar a adaptação às exigências do
mundo da produção, assim como aqueles conhecimentos exigidos para um abstrato “exercício
da cidadania”.
280
Outro programa em vigor no Estado é o PROFIPES. Este programa foi instituído
pela lei 1517 de 29 de agosto de 2005 e tem como objetivo propiciar às unidades de ensino o
fortalecimento de sua autonomia pedagógica por meio do suporte financeiro a projetos com o
intuito de propiciar melhorias no processo de ensino e de aprendizagem (RONDÔNIA, S/D,
p.9).
Silva (2011, p. 71), ao analisar a segunda edição do manual de orientações
pedagógicas e aplicação financeira do PROFIPES, destaca expressões como “[...] o
PROFIPES demonstra uma contínua preocupação em reduzir problemas de ensino e
aprendizagem e oferecer subsídios para a prática docente na busca por índices de excelência”,
“O grande êxito do PROFIPES se fundamenta com sua presença na escola através de um
recurso financeiro capaz de promover ações pedagógicas que são essenciais para um
funcionamento eficaz da própria instituição de ensino”, “[...] se fundamenta em seu princípio
primordial: a sala de aula vista a partir do olhar da comunidade escolar”, “nesse sentido, o
docente é uma figura importante, pois é o profissional mais capacitado para colaborar com o
Governo na busca por soluções das falhas educacionais ainda existentes” (RONDÔNIA, apud
SILVA, 2011, p. 71).
Ainda de acordo com Silva, programas como o PROFIPES estão fortemente
imbuídos de uma concepção que privilegia aspectos técnicos e gerenciais “na medida em que
avaliam os baixos índices de aprendizagem desconsiderando os determinantes sociais e
econômicos que estão na base do fracasso escolar”. Para o autor citado, a concepção presente
no referido programa está moldada (SILVA, 2011, p. 71):
[...] pelo discurso neoliberal presente nas afirmações de que se pretende atingir ‘índices de
excelência’ e possibilitar um ‘funcionamento eficaz’ das instituições de ensino por meio de
ações pedagógicas fragmentadas e descontínuas cuja implementação está condicionada ao
atendimento das exigências dos órgãos que compõem a hierarquia da estrutura educacional
que, no caso do PROFIPES, está representado pela secretaria estadual de educação (SEDUC)
de Rondônia.
O PROFIPES configura-se, portanto, como mais um programa oficial destinado a
maquiar o lugar destinado à educação em uma sociedade de classes, assim como evidencia a
ausência de um projeto educacional que possibilite o acesso à educação pública, gratuita e de
qualidade a todos sem a necessidade de políticas focalizadas e destinadas, sobretudo, ao
controle gerencial por meio da lógica capitalista.
281
CONCLUSÃO
Procuramos neste trabalho identificar as principais políticas educacionais implantadas
na rede estadual de ensino, precisamente nos municípios que compreendem a Zona da Mata
do Estado de Rondônia. Buscamos interpretar a realidade aplicando o método dialético por
meio das categorias totalidade e contradição. Utilizamos também imperialismo e capitalismo
burocrático como categorias históricas para compreender como se processa a dominação que
se materializa no âmbito da educação através da imposição das políticas educacionais
analisadas.
Constatamos que mesmo aqueles que avaliam positivamente estas políticas,
apresentam restrições a programas específicos e a maneira como ocorre o processo de
implantação que objetiva, em última análise, atender os interesses imediatistas do capitalismo
em sua fase imperialista. Ainda foi possível constatar que, em sua maioria, os sujeitos
entrevistados desconhecem a origem e os reais objetivos dos programas impostos. Os poucos
que afirmaram conhecer quem formula e controla supõem que o MEC seja o responsável.
As políticas de formação analisadas, a exemplo do GESTAR, supervalorizam os
conhecimentos
cotidianos
e
desprezam
os
conhecimentos
universais
acumulados
historicamente pela humanidade. Demonstram explicitamente que seus objetivos buscam
atender as constantes mudanças que ocorrem no mundo produtivo fornecendo os rudimentos
de conhecimento necessários à permanente adaptação dos sujeitos às exigências do mercado.
As políticas voltadas supostamente para melhoria da qualidade da educação por meio
da implementação de técnicas de gestão, a exemplo do PDE, na prática funcionam como uma
ferramenta gerencial de natureza burocrática que busca manter sob controle os processos
educativos.
Conclui-se, portanto, a partir do referencial teórico utilizado, da análise documental
realizada e dos dados empíricos coletados e sistematizados, que as políticas educacionais
implantadas nas escolas da Zona da Mata rondoniense são gestadas e dirigidas pelas
instituições multilaterais a serviço das nações imperialistas, sobretudo, dos Estados Unidos. A
instituição que mais tem se destacado nesse processo é o Banco Mundial.
282
REFERÊNCIAS
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da
escola
por
meio
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LEHER. R. Um novo senhor da educação? A política educacional do Banco Mundial para a
periferia do capitalismo. Revista Outubro, nº 3, 1999.
283
AVALIAÇÃO EDUCACIONAL: UM ESTUDO DA PRÁTICA AVALIATIVA DOS
PROFESSORES DAS ESCOLAS ESTADUAIS DO MUNICÍPIO DE ROLIM DE
MOURA/RO
Melina Saraiva da Costa58
Flavine Assis de Miranda59
RESUMO
O presente trabalho é resultado de um projeto de pesquisa, e traz considerações a respeito da
avaliação educacional nas séries iniciais do ensino fundamental. A pesquisa que o orientou
pretendeu analisar a prática da avaliação escolar adotada pelos professores com base em
observações e entrevista estruturada. Buscou-se, pela análise dos dados, compreender o que
tem ocorrido nas escolas estaduais do ensino fundamental no município de Rolim de Moura.
Os dados apresentados fazem parte de um projeto de pesquisa PIBIC (Programa Institucional
de Bolsas de Iniciação Científica), financiado pelo CNPq. A pesquisa teve início em agosto de
2011 e término em agosto de 2012. Na análise dos dados percebeu-se que os professores
entrevistados utilizam diversos instrumentos avaliativos sendo estes amparados pela portaria
1001/2008/GAB/. SEDUC.
Palavras- chave: Avaliação Educacional, Prática Avaliativa, Funções da Avaliação, Matrizes
Epistemológicas, Tendências Pedagógicas.
INTRODUÇÃO
Apesar da avaliação ser uma prática social ampla, pela capacidade que o ser humano
tem de observar, refletir e julgar, na escola, sua dimensão educacional não está evidente o
suficiente para seus sujeitos. Segundo Hoffmann (1992) são muitos os equívocos quanto à
terminologia e seu uso. Ao longo de décadas ela vem sendo utilizada como atribuição de
notas, visando à promoção ou reprovação do aluno.
O presente trabalho vem mostrar a relação entre a avaliação
educacional em
decorrência da utilização tradicional, como forma de mensuração dos conhecimentos
58
Acadêmica do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Rondônia – Campus de Rolim de
Moura. Bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC/CNPq.
59
Profª. Drª. na Universidade Federal de Rondônia – Campus de Rolim de Moura/Departamento de
Educação. Orientadora do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC/CNPq.
284
adquiridos, como também, possibilitar a busca de alternativas, para que o processo de
avaliação,
transcorra numa perspectiva de avaliação transformadora, mediante uma
abordagem reflexiva, formadora, onde a mesma seja desenvolvida de forma processual,
contínua e diagnóstica.
Com o objetivo de identificar a prática avaliativa dos professores das escolas
públicas estaduais de Rolim de Moura/RO, este trabalho surgiu das discussões referentes à
pesquisa de iniciação científica no âmbito da graduação. Com isso, o texto em questão busca
trazer reflexões sobre a prática da avaliação enquanto verificação da aprendizagem e do
desempenho escolar do aluno e dos instrumentos utilizados para a sua efetivação.
Será discutido o conceito de avaliação educacional, no contexto das principais
matrizes geradoras e explicativas do pensamento e do comportamento humano. Quais as
funções da avaliação, sendo basicamente, três: diagnosticar, controlar e classificar.
Relacionadas a essas funções, existem três modalidades de avaliação diagnóstica, formativa, e
somativa.
Neste sentido, pretendemos iniciar reflexões sobre o papel da avaliação educacional,
e também para que os professores reflitam sobre como tem sido sua prática.
AVALIAÇÃO EDUCACIONAL E SUAS VERTENTES
Para que possamos compreender melhor o conceito de avaliação educacional,
precisamos inseri-la no contexto das principais matrizes geradoras e explicativas do
pensamento e do comportamento humano. Sendo elas a matriz objetivista, matriz subjetivista
e a matriz histórico-dialética.
Na matriz objetivista, a avaliação da aprendizagem consiste em constatar se o aluno
aprendeu e se foram atingidos os objetivos educacionais proposto pelo currículo escolar. Essa
abordagem está ligada ao Positivismo,60 centrando-se na objetividade e neutralidade dos fatos
e fenômenos estudados. No que tange à avaliação da aprendizagem, na matriz objetivista,
ganha destaque a Teoria Clássica dos Testes valorizando as questões de múltipla escolha e
provas objetivas como instrumentos avaliativos. Na prática avaliativa, o objetivismo implica
na valorização dos instrumentos de mensuração, na importância de testes e medidas, de
escalas de observação de atitudes, no uso de questões essencialmente objetivas, no
60
O positivismo é uma corrente filosófica que surgiu na França no começo do século XIX, defende a
idéia de que o conhecimento científico é a única forma de conhecimento verdadeiro. Somente pode-se afirmar
que uma teoria é correta se ela foi comprovada através de métodos científicos válidos.
285
planejamento sistêmico e numa pedagogia claramente tecnicista. Nesta matriz a avaliação se
volta para a verificação dos objetivos previamente estabelecidos importando mais o produto
do que o processo, logo, o objeto ganha destaque sobre o sujeito.
Quanto à matriz subjetivista, nela o sujeito ganha maior relevância e o processo se
sobrepõe aos resultados ou produto. A avaliação ganha um cunho qualitativo e ênfase nos
instrumentos como opinários, questionários, entrevistas e auto-avaliação. Nessa perspectiva
temos a contribuição de Scriven (1967) e Stufflebean (1981).
A abordagem do vínculo indivíduo sociedade tem ênfase na realidade social, parte da
premissa de que a educação ocorre na relação do sujeito com a sociedade. Com isso, a
avaliação passa a demandar procedimentos e instrumentos que explicitem habilidades de
pensamento, de elaboração pessoal e de criatividade, envolvendo conteúdos e situações que
remetam para os problemas e desafios sociais. Essa matriz tem a contribuição dos estudos de
Stake (1969).
Então, vejamos como estudiosos do assunto definem o processo de avaliação da
aprendizagem. Ressaltamos que cada uma das definições abordadas por seus autores é o
reflexo de uma postura adotada. Isto é, a forma de conceber a avaliação está marcada pela
abordagem teórica adotada.
Haydt (1994) cita que segundo Ralph Tyler “o processo de avaliação consiste
essencialmente em determinar em que medida os objetivos educacionais estão sendo
realmente alcançado pelo programa do currículo e do ensino” (Haydt, 1994, p.11). O autor
ainda acrescenta que “como os objetivos visados consistem em produzir certas modificações
desejáveis nos padrões de comportamento do estudante, a avaliação é o processo mediante o
qual se determina o grau em que essas mudanças de comportamento estão realmente
ocorrendo”. Com essa definição de Tyler, Haydt (1994) aponta a ênfase dada ao caráter
funcional da avaliação.
Haydt (1994) aborda que Michael Scriven define a avaliação como uma atividade
metodológica que consiste na coleta e na combinação de dados correlatos ao desempenho,
usando um conjunto ponderado de escalas de critérios que levam à classificações
comparativas ou numéricas, e na justificação: a) dos instrumentos e coletas de dados; b) das
ponderações; c) da seleção de critérios. De acordo com Scriven (apud Haydt, 1994), é preciso
avaliar não apenas o grau de consecução dos objetivos estabelecidos, mas também os próprios
objetivos e as outras conseqüências não previstas.
Daniel Stufflebeam (apud Haydt, 1994) diz que a avaliação é o processo de delinear,
obter e fornecer informações úteis para o julgamento de decisões alternativas. As informações
286
obtidas devem ter como critério básico a utilidade, visando orientar a tomada de decisões.
Para esse autor, a avaliação tem duas finalidades básicas: auxiliar o processo de tomada de
decisão e verificar a produtividade.
Segundo Haydt (1994), Bloom, Hastings e Madaus, apresentam as várias dimensões
do conceito de avaliação, por considerá-las didáticas e elucidativas no sentido de esclarecer a
natureza do processo de avaliação e seu papel na educação. Para esse grupo de autores a
avaliação é um método de coleta e de processamento dos dados necessários à melhoria da
aprendizagem e do ensino. Assim, a avaliação inclui uma grande variedade de dados, superior
ao rotineiro exame final escrito. Ela auxilia no esclarecimento das metas e dos objetivos
educacionais importantes, e consiste num processo de determinação da medida em que o
desenvolvimento do aluno está se processando da maneira desejada. Nesse entendimento, a
avaliação é um sistema de controle de qualidade pelo qual se pode determinar, a cada passo
do processo ensino-aprendizagem, se este está sendo eficaz ou não e indica que mudanças
devem ser feitas a fim de assegurar sua eficácia. A autora Haydt (1994) cita que para Blomm
e colaboradores a avaliação é um instrumento na prática educacional que permite verificar se
os procedimentos alternativos são igualmente eficazes na consecução de uma série de
objetivos educacionais. A partir daí podemos observar que estes autores apresentam uma
concepção extensiva de avaliação, entendendo que ela não tem fim em si mesmo, mas, é
sempre um meio, um recurso, e como tal deve ser usada.
FUNÇÕES DA AVALIAÇÃO
Segundo Casaux (1994), a avaliação apresenta basicamente três funções:
diagnosticar, controlar e classificar. Relacionadas a essas funções, existem três modalidades
de avaliação: diagnóstica, formativa, e somativa.
A avaliação diagnóstica é aquela realizada no início de um período letivo ou unidade
de ensino, com a intenção de constatar se os alunos apresentam ou não o domínio dos prérequisitos necessários, isto é, se possuem os conhecimentos e habilidades para as novas
aprendizagens.
A avaliação formativa, com função de controle, é realizada durante todo o decorrer
do período letivo com o intuito de verificar se os alunos estão atingindo os objetivos
previstos, isto é, quais os resultados alcançados durante o desenvolvimento das atividades.
A avaliação somativa, tem função classificatória, realiza-se ao final de um curso,
período letivo ou unidade de ensino, e consiste em classificar os alunos de acordo com níveis
287
de aproveitamento previamente estabelecidos, geralmente tendo em vista sua promoção de
uma série para outra, ou de um grau para outro.
Essas três formas de avaliação estão intimamente vinculadas, para garantir a
eficiência do sistema de avaliação e a eficácia do processo ensino-aprendizagem, o professor
deve fazer uso conjugado das três modalidades (Haydt, 1994).
Para Depresbiteris (1989) a avaliação da aprendizagem utiliza geralmente dois
critérios: absoluto e relativo, sendo que a avaliação baseada em padrões absolutos é chamada
de avaliação referente a critério, e a baseada em padrões relativos é chamada de avaliação
baseada em normas. A avaliação baseada em critério verifica o desempenho do aluno com
relação a domínios esperados do conhecimento, e por isso é mais apropriada ao processo de
ensino aprendizagem. Já a avaliação que se baseia em normas verifica a posição do aluno
referente ao grupo, sendo assim, mais apropriada a um sistema de seleção, de classificação.
A PROVA COMO INSTRUMENTO DE AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM
Os instrumentos de avaliação devem ser utilizados ao longo do período letivo e
permite ao professor colher informações sobre a capacidade de aprendizado dos alunos. Cabe
ao professor definir os instrumentos que serão utilizados e com isso acompanhar o processo
de ensino aprendizagem dos alunos.
Não existem instrumentos específicos de avaliação capazes de detectar o
desenvolvimento e aprendizagem dos alunos. É diante da limitação que cada instrumento de
avaliação comporta que se faz necessário pensar em instrumentos diversos e mais adequados
com suas finalidades.
Os instrumentos utilizados pelos professores nas escolas no período de observação
basicamente eram composto por provas, trabalhos, e observação de comportamento. Essa
evidência nos leva a uma reflexão mais profunda sobre a prova. E para discutir esse conceito
destacamos as idéias de Moreto (2002) e sua defesa sobre a prova como instrumento
privilegiado de estudo e não como um acerto de contas entre professor e aluno. Para ele a
prova é um momento privilegiado por julgar que diante de tudo o que a tradição vem
associando a prova, o aluno coloca suas energias em busca do sucesso normalmente associado
a uma boa nota.
Segundo Moreto (2002) o real sucesso educacional é quando o professor atinge os
objetivos de ensinar oportunizando a aprendizagem significativa de conteúdos relevantes.
Neste sentido a pesquisa pode constatar que a aplicação de provas por alguns professores visa
288
apenas à verificação de aprendizagem dos alunos e classificá-los em aptos ou inaptos para o
ano seguinte. Para considerar o sucesso do ensino, é preciso que o professor estabeleça
claramente seus objetivos ao preparar suas aulas, verificar se os conteúdos são relevantes para
o contexto dos alunos. Além disso, o professor não deve avaliar seu aluno apenas por uma
prova, deve utilizar outros instrumentos de avaliação de aprendizagem para poder julgar
possíveis competências dos alunos numa situação específica.
METODOLOGIA
A pesquisa teve seu inicio com a reunião do grupo de pesquisa, onde foram
apresentados os participantes e definidas as estratégias de levantamentos de dados.
Primeiramente foi realizado o levantamento das escolas e levantamento bibliográfico de obras
referentes ao tema da avaliação.
O resultado do levantamento mostrou um número exíguo de obras à disposição dos
professores, o que nos leva a inferir que estes não conseguem ter acesso a materiais e
discussões de ponta sobre a temática da avaliação.
Durante o período de estudos e fichamentos das obras referentes à temática e depois
de levantados dos dados sobre as escolas, foi constituída a amostra da população por meio da
técnica de amostragem aleatória simples.
Após a definição das amostras a equipe iniciou os procedimentos da coleta de dados
em observações diretas, realizadas com base em um roteiro prévio, apresentado ao professor
regente, pelo qual ele tomava conhecimento sobre o que seria observado e quais seriam as
categorias analíticas. O processo de coleta de dados teve início no período de encerramento do
quarto bimestre letivo, no período de novembro e dezembro de 2011. Concluída a etapa de
observação de campo, foram realizadas as análises das mesmas com o objetivo de verificar a
concepção pedagógica adotada pelos professores.
Em um segundo momento foi realizado as entrevistas com os professores no período
de março e abril de 2012. Após a realização das entrevistas fizemos a análise das mesmas,
com base em diferentes autores que corroboram para identificação e discussão acerca das
concepções e práticas adotadas por cada professor.
289
APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS DAS OBSERVAÇÕE DE CAMPO
Inicialmente apresentaremos uma análise dos resultados coletados nas observações.
Os dados encontrados serão descritos e discutidos seguindo os eixos de análise: instrumento
de avaliação e funções da avaliação
Os instrumentos de avaliação devem ser utilizados ao longo do período letivo. Esses
instrumentos permitem ao professor colher informações sobre a capacidade de aprendizado
dos alunos, em especial, pela competência dos mesmos para resolver problemas e
instrumentalizar o conhecimento.
Cabe ao professor definir os instrumentos que serão utilizados para melhor
acompanhar
o
processo
de
ensino
aprendizado
de
seus
alunos.
Não existem instrumentos específicos de avaliação capazes de detectar o desenvolvimento da
aprendizagem. É diante da limitação que cada instrumento de avaliação comporta que se faz
necessário pensar em instrumentos diversos e mais adequados com suas finalidades.
No que diz respeito aos instrumentos de avaliação encontrados, 28,5% dos casos
observados utilizam as provas. Este mesmo percentual 28,5% foi observado na frequência de
uso dos trabalhos em aula e em casa, na avaliação por observação sem registro formal, e na
pontuação de tarefas, comportamento e participação em aula. Sendo estes os instrumentos
utilizados e observados nas escolas e práticas observadas.
Durante as observações foram constatados que durante a aplicação das provas, os
alunos pedem o auxílio do professor, houve um relato de um professor que disse:
“Aqui esta certo, apaga esta e faz novamente”. (Professora 2º ano EF, escola B)
Houve outro relato no qual um aluno disse:
Aluno: Professora! Eu não sei fazer esta questão!
Professora: Coloca na que você acha que é certa. (Professora, 2º ano EF, escola B)
Para Moreto (2002) o professor deve pensar no momento da elaboração das provas
em uma avaliação eficaz (que traz resultados satisfatórios) e ao mesmo tempo eficiente. Neste
último tanto o objetivo quanto o processo são levados em conta e o aluno faz uso do seu
raciocínio para responder as atividades dando significado ao que lê e produz. Para ele, ao
formular perguntas é preciso adotar um parâmetro, um ponto de partida deixando a pergunta
clara, objetiva e contextualizada. Segundo Moreto (2002)
Não é acabando com a prova escrita ou oral que se melhora o processo de avaliação da
aprendizagem, mas resignificando o instrumento e elaborando-o dentro de uma nova
perspectiva pedagógica (2001 p.25).
290
Gama (2002) observa um número significativo de professores que utilizam à prova
como um método de mera averiguação da aprendizagem. Esse fato faz com que as aulas se
resumam apenas a momentos de preparação para os testes e provas. A aula torna uma revisão
de conteúdos pré-determinados pelo currículo escolar centralizador das práticas pedagógicas.
Com relação às funções da avaliação foram observados que em 71,4% das avaliações
feitas nas escolas estaduais observadas se enquadram na modalidade somativa, com função
classificatória, realizada ao final do bimestre, período letivo ou unidade de ensino, consistindo
em classificar os alunos de acordo com níveis de aproveitamento previamente estabelecidos,
geralmente tendo em vista sua promoção de uma série para outra, ou de um grau para outro.
APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS DAS ENTREVISTAS ESTRUTURADAS
As entrevistas foram realizadas com cinco professores, sendo todos pedagogos e pósgraduados.
No que se refere à prática docente uma das respostas obtidas confirma as ações
pedagógicas que foram observadas com maior frequência em sala de aula durante o período
de observação em campo.
“A gente procura desenvolver os conteúdos propostos no planejamento, também o
planejamento diário que a gente faz a nossa rotina de trabalho, a gente confecciona cartazes,
atividades em duplas, sala de vídeo, sala do computador. Tudo isso contribui para que a gente
tenha um trabalho melhor.” (Professora, 3º ano EF, escola D)
“Importante o professor fazer um levantamento prévio do conhecimento do aluno e a
partir desse levantamento ele trabalhar utilizando material concreto. Importante o professor
fazer uma sondagem para identificar até que ponto o aluno tem conhecimento do assunto”.
(Professora, 2º ano EF, escola I)
Ressalta-se que nas respostas obtidas fica evidente a prática da sondagem como
elemento auxiliador do planejamento de ensino e desenvolvimento das intervenções práticas.
Ao serem perguntados sobre o sistema de avaliação adotado na e pela escola fica
patente a menção a Portaria 1001/2008/GAB/SEDUC, que normatiza a matéria. Com isso o
que se observa é uma adequação ao sistema, resguardando as particularidades de cada caso à
medida que tal normativa abre espaço para tais especificidades. Dentro do que estabelece a
resolução o sujeito (Professora 3°ano EF escola D) adéqua a sua forma de avaliar, aplicando
uma prova bimestral no valor de 05 pontos, acreditando ser esta uma forma de responder aos
pais e sociedade sobre o que o aluno faz no dia-a-dia da escola.
291
“Eu faço sempre um diagnóstico inicial quando ele chega pra mim, e os avanços que ele vai
tendo no mês a mês, bimestralmente. Eu atribuo uma nota porque é necessário, em função do
sistema que nós vivemos, tudo tem uma nota final. Olha, que nem eu digo, eu me adéquo a
ele, eu não tenho assim... uma opinião formada se ele é adequado ou não, mas, eu procuro me
adequar a ele. Então aquela provinha bimestral para dar uma resposta para a sociedade que os
pais cobram. A gente não tem como tá [sic] explicando todo como é o processo do dia-a-dia
p’ra [sic] eles. Então eu faço essa provinha que é pra dar uma resposta p’ros [sic] pais, e o
que conta p’ra [sic] mim mesmo é o que o aluno me mostra no dia-a-dia, e não aquela notinha
final.Porque a nota final só vai chegar p’ra [sic] ela após todo esse processo que eu
acompanho na sala de aula”. (Professora, 3º ano EF, escola D)
Outro
relato
pode
ser
observado
no
que
se
refere
à
Portaria
1001/2008/GAB/SEDUC, que trata sobre as normas da avaliação.
“Depois que foi instituída a normativa 1001 eu acredito que se evoluiu muito porque dá p’ra
[sic] se dizer que 50% dela avalia de forma qualitativa e 50% de forma quantitativa”.
(Professora, 4º ano EF, escola M)
Segundo Haydt (1994) o termo avaliar tem sido constantemente associado a
expressões como fazer provas, fazer exames, atribuir nota, repetir ou passar de ano. Essa
associação tão frequente em nossas escolas, e mesmo no sistema estadual de ensino, é
resultado de uma concepção pedagógica arcaica, mas tradicionalmente predominante.
Em análise das respostas obtidas, infere-se que para estes sujeitos, a avaliação no
processo ensino-aprendizagem tem o papel de mera constatação de resultados, pelos quais se
determina a progressão ou retenção do aluno. As respostas são aparentemente contraditórias,
onde se observa uma defesa na avaliação como coleta de informações úteis para o
desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem. Entretanto, as tônicas das respostas giram
sempre em torno da nota e da reprovação.
“A gente tem tentado considerar tudo o que o aluno faz, mesmo aquele com mais dificuldade
a gente se amparar pelo histórico que ele já tem, assim, a gente tenta fazer um relatório do
desenvolvimento das atividades dele, no final de tudo tem que atribuir uma nota. Dependendo
da situação do aluno ele é retido na mesma série”. (Professora, 3º ano EF, escola D)
“A prova tem que servir p’ro [sic] aluno como uma devolutiva, é uma devolutiva. (...) enfim,
o resultado do bimestre é a soma de tudo aquilo que tá [sic] na 1001”. (Professora, 4º ano EF,
escola M)
Como sabemos os instrumentos avaliativos são diversos, cabe ao professor, conhecer
sua turma e avaliar, tendo objetivos claros e definidos, visando à qualidade da aprendizagem e
292
não a quantidade. O importante é que o professor conheça bem seus alunos, sendo mediador
no processo de construção do conhecimento escolar. Geralmente o instrumento avaliativo
mais utilizado pelos professores de todos os níveis de ensino são as provas escritas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Podemos, a partir de então, observar que entre os professores pesquisados, os
instrumentos de avaliação utilizados têm um enfoque quantitativo com a supervalorização de
provas, nas quais o foco principal está nos resultados geradores da nota do aluno. Nesses
casos, a medida se sobrepõe à avaliação, que pela função somativa ganha contornos
classificatórios e excludentes.
A supervalorização da nota, como principal resultado gerado pela avaliação, pode ser
verificada em comportamentos como: em 9% dos casos, o professor induz o aluno ao “chute”,
para que ele não deixe questões sem resposta. Em todos os casos, a nota atribuída à prova do
aluno é a principal definidora de seu desempenho quanto à sua “média bimestral” ou mesmo
sua aprovação ou reprovação ao final do ano letivo.
Este estudo considera que a avaliação educacional deva servir de instrumento
pedagógico que auxilie o professor durante todo o processo de ensino-aprendizagem de forma
articulada aos princípios pedagógicos adotados.
Neste sentido, entendemos que a avaliação não deve ser concebida de forma
arbitrária e sim como processo educativo sistemático e significativo que valoriza o aluno e seu
contexto em articulação com os conhecimentos básicos e fundamentais do currículo formal
escolar.
A forma como a avaliação educacional é praticada pela escola simplesmente
interessada em classificar seus alunos, força professores a utilizarem métodos que
desqualifica e não ajuda no rendimento escolar, tornando-a uma prática excludente e punitiva.
REFERÊNCIAS
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GAMA, Zacarias Jaegger. Avaliação na escola de 2° grau, 3ª ed. Campinas: Papirus,
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294
OS DESAFIOS DA TECNOLOGIA DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO NA
EDUCAÇÃO: O CASO DO PROJETO DE EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA NO CAMPUS
JOSÉ RIBEIRO FILHO
A relação entre os principais modelos nacionais e internacionais de educação a distância
e a pertinência e aderência desses modelos com o contexto amazônico de Rondônia
Natalí Maria Silva Brito61
José Lucas Pedreira Bueno62
RESUMO
Este estudo tem como objetivos realizar levantamento dos desafios enfrentados no uso de
tecnologia de informação e comunicação dentro do processo de Educação a Distância do Campus
José Ribeiro Filho, mais especificamente, identificar quais os desafios enfrentados para a
implantação e funcionamento da educação a distância na Universidade Federal de Rondônia. Na
primeira etapa do estudo, foram selecionados e analisados os documentos oficiais e institucionais
referentes à modalidade de educação a distância, bem como a leitura da literatura produzida na
área em questão. Na etapa empírica realizamos entrevistas com as docentes da Universidade
Federal de Rondônia, que estiveram diretamente envolvidas com a implantação e oferta dos
cursos de graduação a distância nessa IFES. Os resultados obtidos foram submetidos à análise de
conteúdo, que revelou que os principais desafios para a educação a distância na UNIR são,
respectivamente: a falta de recursos humanos, a resistência à modalidade de ensino a distância, a
quantidade insuficiente de recursos financeiros e a evasão de alunos por não adaptação ao modelo
de EAD institucional da Unir, superando os próprios desafios do uso de tecnologias de
informação e comunicação na educação.
Palavras-chave: Educação a Distância; Tecnologia de Informação e Comunicação; Desafios
organizacionais; Universidade Federal de Rondônia.
ABSTRACT
This study aims to carry out a survey of the challenges faced in the use of technology information
and communication within the process of Distance Education in Campus José Ribeiro Filho, more
specifically, identify the challenges faced in the implementation and operation of distance
education at the University of Rondônia. In the first stage of the study, were selected and analyzed
official documents and institutional related to distance education mode, as well as reading the
literature produced in the area in question. In step empirical interviews conducted with teachers at
the Federal University of Rondônia, which were directly involved with the implementation and
delivery of undergraduate distance that IFES. The results obtained were subjected to content
analysis, which revealed that the main challenges for distance education in UNIR are,
respectively: the lack of human resources, resistance to distance learning mode, the insufficient
61
Acadêmica do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Rondônia e bolsista
PIBIC/UNIR/CNPQ vinculada ao grupo de pesquisa PRAXIS. (e-mal:i [email protected]).
62
Professor do Departamento de Ciências da Educação e do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu
em Educação da UNIR. (e-mail:[email protected]).
295
amount of financial resources and avoidance of students, exceeding the propers challenges of use
of information and communication technologies in education.
Keywords: Distance Education; Technoloty Information and Communication; Organizational
challenges; Federal University of Rondônia.
1 INTRODUÇÃO
As mudanças sociais, educacionais e econômicas após a Revolução Industrial fizeram
a reorganização da sociedade em torno das relações estabelecidas para a produção material,
que, consequentemente, influenciaram as ações de produção subjetiva e material da educação.
Esse fenômeno, segundo Rosar (1999) não aconteceu com exclusividade no sistema
educacional do Brasil. Hoje, essas influências podem ser vistas a partir das mudanças
educacionais que muitos países adotaram, frente às políticas econômicas provenientes do
Banco Mundial (BIRD).
Para Behar (2009, p. 20) o modelo educativo na Sociedade industrial, modelo aqui
com sentido de “um pressuposto filosófico matricial, ou seja, uma teoria, um conhecimento
que origina o estudo de um campo científico; uma realização científica com métodos e valores
que são concebidos como modelo” dá ênfase ao ensino tecnicista, pois sua função é preparar o
indivíduo para as divisões do trabalho de acordo com as aptidões, sendo que nesse modelo
não é levado em conta a vivencia do aluno, não desperta a curiosidade e privilegia o acúmulo
de conhecimento e normas da sociedade.
Observa-se, contudo, que as abordagens do ensino presencial foram se modificando e
avançando para um ensino à Distância, face às exigências principalmente da formação de
licenciados e bacharéis para o mercado de trabalho. Assim, nesse contexto a Educação a
Distância (EAD) tornou-se uma necessidade para o desenvolvimento da educação, visando
ampliar o quadro de profissionais formados. Tal necessidade, implica, de outra forma, em
considerar as distâncias geográficas e de áreas que não são atendidas nos cursos presenciais,
no ensino superior do Brasil ou que a procura é maior que o número de oferta de vagas, como
as oferecidas nas universidades públicas, municipais, estaduais, ou federais.
A EAD a partir da sua legalização, por meio da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
em 1996, tem crescido vertiginosamente nos últimos anos no Brasil, caracterizada pela
substituição do contato professor/aluno, pela ação sistematizada e conjunta de novos recursos
didáticos e pelo apoio de uma organização técnica tutorial, que auxiliam o ensino-
296
aprendizagem independente e flexível do aluno no Ambiente Virtual de Aprendizagem
(BEHAR, 2009).
Juntamente com o crescimento da oferta de cursos de graduação a distância, urge os
questionamentos sobre como vem se desenvolvendo a implantação e funcionamento de um
projeto de educação a distância, considerando ser este um processo recente e que tem
enfrentado muitos desafios de caráter subjetivo, como a resistência a este modelo de
educação, até questões objetivas, como infraestrutura e capacidade tecnológica. Buscamos
com isso, realizar um estudo de caráter exploratório, que visa identificar os principais desafios
para a implantação e funcionamento de um projeto de educação a distância.
2 O CASO DA EAD DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA
A modalidade de Educação a Distância na Unir teve início em 1999, com a
participação da instituição na primeira edição do curso Mídias na Educação, capacitação e
formação continuada (PPP, 2010).
Atualmente, encontram-se registrados sobre Rondônia, no Catálogo do Sistema
Universidade Aberta do Brasil, os seguintes cursos: Bacharelado em Administração Pública,
ofertado pela UnB, Licenciatura em Ciências Biológicas, Licenciatura em Letras Português e
Licenciatura em Pedagogia, ofertados pela Universidade Federal de Rondônia. Os polos
credenciados pela Capes para a oferta dos cursos são Chupinguaia, Rolim de Moura,
Ariquemes, Ji-paraná, Buritis, Nova Mamoré e Porto Velho.
Figura 1: Mapa dos polos de Educação a Distância em Rondônia - UAB
Fonte: Site da Capes/Uab, 2012.
297
Quadro 1: Perfil da Educação a Distância em Rondônia
Fonte: Site da UAB, 2012.
O Sistema Universidade Aberta do Brasil - UAB foi criado pelo Ministério da
Educação - MEC, pelo decreto nº 5.800, de 08 de Junho de 2006 visando a articulação para
Educação a Distância (PPP, 2010).
A Unir utiliza a plataforma Moodle: esse sistema, em código livre, adotado pela
Unir, começou a ser idealizado, no início da década de 90, por Martin Dougiamas, então
Webmaster na Curtin University of Technology, na Austrália e responsável pela
administração do sistema de gerenciamento de aprendizagem (LMS - Learning Management
System) ou Ambiente Virtual de Aprendizagem - AVA dessa instituição, naquela época
(Borges, 2008). Hoje este AVA exerce uma hegemonia sobre a escolha dos softwares de
mediação de educação distância em universidades de todo o mundo.
298
3 METODOLOGIA
A metodologia adotada pela pesquisa é de abordagem qualitativa, do tipo estudo de
caso e caracteriza-se, com relação ao seu objetivo, como exploratória. O estudo é composto
por duas etapas: na primeira parte é realizada a análise documental e o levantamento da
literatura da área. Na etapa empírica, a coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas
com os coordenadores e professores dos cursos de graduação ofertados na modalidade a
distância, pela UNIR, por meio do sistema UAB, que tiveram e/ou têm participação relevante
no processo de implantação deste modelo de ensino nessa IFES. Para tanto, elaboramos um
roteiro de entrevista semiestruturada que procurou investigar os desafios enfrentados no uso
da tecnologia de informação dentro do processo de educação a distância. Os dados obtidos
foram submetidos a análise de conteúdo.
4 RESULTADOS DO ESTUDO
4.1 Os desafios da Educação a Distância na Universidade Federal de Rondônia: o caso
dos cursos de Letras e Pedagogia UNIR/UAB
Com vistas a descobrir quais são os principais desafios para a implantação e
funcionamento do Programa de Educação a Distância da Universidade Federal de Rondônia,
escolhemos como objeto de estudo os cursos de Letras e Pedagogia ofertadas na modalidade a
distância. Tal escolha justifica-se na medida em que essas graduações foram as pioneiras na
oferta dessa modalidade de ensino dentro da instituição e são ofertadas diretamente pela IFES,
com materiais, professores e Projeto Político Pedagógico próprios, em parceria com o sistema
Universidade Aberta do Brasil.
Para a obtenção dos dados, realizamos entrevistas com três professoras que estiveram
diretamente envolvidas com o projeto dos cursos e que tiveram relevada importância no
desenvolvimento dos mesmos. Para preservar a identidade das participantes dos estudos,
identificamos seus discursos por meio das nomenclaturas: Prof.ª A, Prof.ª B e Prof.ª C. Sendo
a ordem das entrevistas o critério escolhido para a definição das nomenclaturas.
299
Figura 2: Desafios da EAD na Universidade Federal de Rondônia
.
Fonte: Entrevista aplicada na pesquisa de campo, 2012.
A análise dos conteúdos revela que os principais desafios da Educação a Distância na
Universidade
Federal
de
Rondônia
estão
relacionados
às
seguintes
categorias,
respectivamente: recursos humanos, recursos financeiros e alunos, quais sejam: a falta de
técnicos na universidade, a quantidade insuficiente de recursos financeiros para a execução do
programa de EAD e a evasão de alunos (Figura 2).
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A conclusão deste trabalho nos permite inferir algumas proposições acerca do objetivo
do trabalho e as questões que foram investigadas. Com relação ao objetivo geral: realizar
levantamento dos desafios enfrentados nos uso de tecnologia de informação e comunicação
dentro do processo de Educação a Distância do Campus José Ribeiro Filho, concluímos que
os desafios vão além do uso das tecnologias de informação, envolvendo processos complexos
que abrangem desde a infraestrutura dos polos de educação a distância até a gestão dos
recursos financeiros, passando por critérios subjetivos como a capacitação e qualificação dos
recursos humanos e a resistência institucional perante a modalidade de educação a distância.
Tais fatores emergiram a criação de um objetivo específico que englobasse todos os aspectos
referentes aos desafios para a implantação e funcionamento de um projeto de educação a
300
distância, qual seja, identificar quais os desafios enfrentados para a implantação e
funcionamento da educação a distância na Universidade Federal de Rondônia.
Para responder a este objetivo específico, realizamos entrevistas semiestruturadas com
três professoras dos cursos de Letras e Pedagogia que estiveram diretamente envolvidas com a
implantação da modalidade de ensino a distância na Universidade Federal de Rondônia e
submetemos os dados obtidos pelas entrevistas à análise de conteúdo.
A análise do conteúdo revelou que, dentre os desafios do processo de educação a
distância na UNIR, a falta de recursos humanos foi o obstáculo mais enfatizado pelas
professoras. Os discursos das docentes revelam que a falta de técnicos dentro da instituição
afeta sobremaneira o andamento do projeto, na medida em que aumenta a sobrecarga de
trabalho dos envolvidos e impede o funcionamento e/ou aperfeiçoamento das ferramentas
tecnológicas.
O segundo desafio mais enfatizado durante as entrevistas foi a resistência institucional
ao modelo de educação a distância. Segundo as docentes, houve muito preconceito e rejeição
por parte dos próprios colegas, o que dificultou à priori a adesão de novos professores.
Também, destacam-se como desafios para o processo de educação a distância da UNIR a
quantidade de recursos financeiros insuficientes, a evasão de alunos por não se adaptarem ao
“modelo pedagógico em ação” e a falta de políticas e ações para capacitação dos recursos
humanos.
Podemos, então, inferir que a modalidade de ensino a distância, principalmente, a
realizada por meio dos ambientes virtuais de aprendizagem, é um processo recente no país, se
comparada com o processo de aprendizagem presencial, e requer muitos esforços por parte
dos estudiosos da área para investigar a complexidade de fatores englobados neste processo, a
fim de aprimorá-lo para superar as barreiras advindas de sua implantação a partir de
planejamento e recursos insuficientes. Podemos compreender que os problemas nos cursos a
distância, muitas vezes, podem estar para além do uso das tecnologias de informação e
comunicação, na área de planejamento e gestão e no momento da implantação e manutenção
da infraestrutura física, na expansão da capacidade de infraestrutura de rede, na contratação,
gestão e capacitação de recursos humanos, na adequação do material didático ao perfil do
aluno e ao modelo pedagógico e, principalmente, no desenvolvimento do projeto pedagógico
previsto e aprovado para execução. Sendo assim, nosso objetivo ao identificar os principais
desafios no processo de educação a distância na Universidade Federal de Rondônia foi o de
suscitar reflexões e práticas que pudessem servir para aperfeiçoar essa modalidade de ensino,
301
para que essa possa ser usada como uma ferramenta de democratização e, sobretudo, de
qualificação do saber.
REFERÊNCIAS
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BEHAR, Patrícia Alejandra. Modelos Pedagógicos em Educação a Distância. Porto Alegre:
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distância UNIR/UAB. Porto Velho, 2010.
303
O ENSINO E A APRENDIZAGEM DE NÚMEROS E CÁLCULO ARITMÉTICO NA
ESCOLA: POSSIBILIDADES E LIMITES
Patrícia da Silva Manhães Ferreira63
Orestes Zivieri Neto64
RESUMO
O presente trabalho apresenta os resultados referentes a dois anos da pesquisa desenvolvida
por meio do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação Científica - PIBIC/2010-2012,
através do subprojeto “Os (des) caminhos das quatros operações básicas e do valor posicional
em matemática nas séries iniciais do ensino fundamental”65. Seu objetivo é analisar as
dificuldades enfrentadas pelos professores e alunos de série iniciais respectivamente no ato de
ensinar e aprender números e quatro operações. O estudo foi desenvolvido em duas escolas
públicas estaduais do município de Rolim de Moura - RO, em turmas de 1º e 2º Ano do
Ensino Fundamental e, traz como abordagem o enfoque qualitativo, utilizando, para isso, os
seguintes instrumentos de coleta de dados: análise dos cadernos e dos livros didáticos,
observação e entrevistas com professores e alunos. Assim, espera-se que os desafios do
processo ensino aprendizagem de números e cálculo aritmético, sejam superados com o
auxílio de seu sentido e sua significação, normalmente obtidos, como nos aponta Berton e
Itacarambi (2009), ao utilizar situações problemas que suscitam o emprego de estratégias que
acabam por revelar os conhecimentos prévios alcançados pelas crianças em ações informais
do cotidiano.
Palavras chaves: Números e quatro operações. Ensino aprendizagem. Valor posicional.
INTRODUÇÃO
O presente artigo busca apresentar os resultados parciais da pesquisa intitulada “Mas
eu ensino! As dificuldades inerentes ao processo de ensinar e de aprender matemática nas
séries iniciais do ensino fundamental”3, através do desdobramento de seu subprojeto - Os
(des) caminhos das quatros operações básicas e do valor posicional em matemática nas séries
iniciais do ensino fundamental. A investigação encontra-se em desenvolvimento em duas
escolas estatuais do município de Rolim de Moura - RO, em salas de 1º e 2º anos do ensino
63
Acadêmica do VI Período de Pedagogia da Universidade Federal de Rondônia – Campus de Rolim de
Moura. Membro do Grupo de Estudos e Pesquisa em Psicologia e Educação da Amazônia – GEPPEA. Bolsista
do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC/UNIR.
64
Professor Pesquisador e Vice-Líder do Grupo de Estudos e Pesquisa em Psicologia e Educação da
Amazônia da Universidade Federal de Rondônia – Campus de Rolim de Moura
65
Pesquisa financiada pelo Edital MCT/CNPq N º 14/2010 - Universal / Edital MCT/CNPq 14/2010,
sobre o registro nº 472664/2010-7, intitulada “Mas eu ensino! A dificuldades inerentes ao processo de ensinar e
de aprender matemática nas séries iniciais do ensino fundamental”.
304
fundamental. Seu objetivo é o de levantar as dificuldades inerentes ao processo de ensino e
aprendizagem de números e quatro operações.
Dentre as indagações e constatações, um fato recorrente é que alguns conteúdos
ensinados, quando necessitam de serem amalgamados para facilitar o processo de
compreensão de um novo conceito são impossibilitado pela ausência de uma memória por
parte dos alunos, que forneça a possibilidade de uma conexão lógica entre as partes. Em
muitos casos, alguns conteúdos como as quatro operações, por exemplo, em especial a
multiplicação e divisão são problemas que normalmente se estendem ao longo de todos dos
anos do ensino fundamental.
Com isso surge um de nossos problemas: A ausência de uma consolidação lógico
compreensiva da base dez em nosso sistema numérico decimal prejudicaria os demais
conteúdos a serem dados nos anos subsequentes? Por exemplo, as quatro operações,
especialmente a multiplicação e divisão seriam o princípio desencadeador de algumas fobias?
Desse modo, o artigo apresenta, inicialmente, os fundamentos teóricos obtidos através
do embasamento dos estudos sobre o assunto, logo após as discussões de “Materiais e
Métodos”. Em seguida, optou-se em agrupar os “Resultados e Discussões” com a indicação
de quatro categorias. Por fim, apresentam-se as considerações finais, levando em conta os
elementos que se destacam pelos levantamentos realizados por nossa investigação.
NÚMEROS, VALOR POSICIONAL E QUATRO OPERAÇÕES: UM DESAFIO
VIVIDO PELOS PROFESSORES DOS ANOS INICIAIS DO ENSINO
FUNDAMENTAL.
A matemática deve ser vista por todos como algo essencial, inserida na cultura ela
esta sempre presente na vida cotidiana das pessoas. A exemplo das indicações oferecidas pela
literatura científica é preciso superar as aversões no ensino de matemática, apresentando
metodologias que aproximam os conteúdos a sua funcionalidade social, para que os alunos
possam além de validarem seus conhecimentos erigidos no cotidiano, o utilizarem para
conferirem maior significado e sentido a tudo àquilo que se esta ensinando.
Os estudos elaborados por Kamii (2005), colaboradora de Piaget, por exemplo,
buscam relacionar o conhecimento que as crianças possuem na perspectiva de compreender
como elas constroem seus conceitos matemáticos. A construção do conceito de número pelas
crianças se desenvolve através de três tipos de conhecimentos: conhecimento físico, social e
lógico. Com a combinação dos dois primeiros conhecimentos surgiria à capacidade da
305
abstração física e, com a construção do conhecimento lógico obteríamos a abstração reflexiva
ou construtiva.
De acordo com Berton e Itacarambi (2009) para facilitar a compreensão das crianças
em processo de aquisição dos conceitos numéricos, o educador deve trabalhar com atividades
desenvolvidas através de jogos e situações problemas que envolvem seu cotidiano a fim de
proporcionar sentido, o que facilita seu aprendizado e compreensão.
As crianças chegam à escola com algum conhecimento dos números, Nunes e Bryant
(1997) afirmam que as crianças mais novas são capazes de contar números na ordem correta,
mas isso não significa que compreende o significado e o significante desses números e, para
que isso aconteça é preciso que elas compreendam o processo de conservação numérico
quantitativo.
O sistema de ensino ao invés de explorar a sequência numérica como atividades nas
quais as crianças possam adquirir a compreensão das regras do sistema decimal inviabilizam,
ou retardam essa aprendizagem com exercícios que envolvem leitura e escrita de números, o
que reforça as crianças a memorizarem mecanicamente a ordem numérica sem entender sua
lógica de base dez.
Segundo Pavanello (2004) a compreensão do significado dos números com dois
algarismos gera muitos conflitos para as crianças, por isso é essencial que se trabalhe já no
início da escolaridade o valor posicional dos números para favorecer a compreensão de que
nosso sistema numérico é organizado pela base 10. Esses conflitos também são gerados na
escrita dos números, quando pensam que os números são escritos da mesma forma com que é
falado ou, quando atribui que um número é maior que o outro por ter mais algarismo, a partir
de sua ordem na classe numérica.
De acordo com Moreno (2006), as crianças quando ainda não conhecem a escrita
convencional dos números se baseiam em ideias que relacionam a fala e a escrita, como se os
números fossem escritos da mesma forma como se fala, mas o valor posicional dos números
não pode ser atribuído à fala. O que as crianças não compreendem é que os números escritos
possuem posições, que permite atribuir a eles valores que ficam claros quando se entende em
que consiste a potência decimal dos números.
Em relação aos conceitos aditivos, Nunes e Bryant (1997) explicam que quando as
crianças compreendem o processo das composições aditivas, isto permite que elas entendam
como é estruturado o sistema decimal. Ao decompor os números com mais de dois
algarismos, separando as dezenas das unidades, esse entendimento se dá numa estratégia mais
avançada de contar “na sequência”, que as crianças podem descobrir para resolver operações
306
de adição. Outra estratégia na qual as crianças mais novas se sentem confiantes para realizar
adições é a estratégia de “contar todos”, ou seja, resolver os problemas de adição fazendo a
contagem de todas as quantidades.
Quando se utiliza atividades desenvolvidas através de situação-problema para
trabalhar com operações de adição e subtração, os conceitos presentes nos enunciados,
segundo Berton e Itacarambi (2009) são: problemas de composição que correspondem à ideia
de juntar relacionando as partes para compor o todo. O de transformação que envolve situação
de modificação do estado inicial em uma situação final, ou vice-versa. O de comparação que
se relaciona com o tipo a mais, a menos, equiparar, completar e quantos faltam. E, como
introdução da estrutura multiplicativa os problemas que envolvem combinação entre objetos
que permite o uso de recursos representativos, diagramas e desenhos, trazendo as ideias
iniciais do “vezes” da multiplicação.
Nas composições de situações problemas com as estruturas multiplicativas e de
divisão, além das ideias de combinação, os alunos também apresentam certas habilidades para
compreenderem a configuração retangular em atividades que envolvam a questão de
filas/colunas por linhas, desde que utilizem para isso problemas relacionados ao dia a dia de
mais fácil compreensão pelas crianças.
Na estrutura multiplicativa e de divisão, ainda, é possível às situações problemas que
envolvem a comparação referentes a dobros, triplos, metades e terços. Para a estrutura de
divisão, em especial, é preciso investir em atividades em que o tamanho de cada agrupamento
a ser formado seja conhecido, e é preciso determinar quanto agrupamentos serão necessários.
Exemplo: Como posso dividir 96 figurinhas em pacotes com 3 figurinhas cada um? Quantos
pacotinhos podem ser feitos?
Moreno e Sastre apud Moreno (2006, p.63), explica que: “Na escola, são o professor e
o livro que abstraem e isolam propriedades quantitativas e qualitativas; na vida é a criança
quem deve abstrair, analisar e organizar toda a informação para poder decidir como vai
proceder”.
Por essa razão o professor deve sempre realizar uma reflexão de sua prática, avaliando
se a forma de ensinar oferecidas as crianças oferecem oportunidades reais de assimilação e
generalização do conhecimento matemático e, consequentemente, o desenvolvimento de sua
autonomia intelectual.
Assim, pode se dizer que o ensino dos números e das quatro operações, portal de
ingresso curricular ao ensino e aprendizagem da matemática escolar, deve sempre estar
interligado com o valor e sentido que eles representam nos repertórios de conhecimentos
307
sociais dos sujeitos, para que funcione como peças fundamentais à conferência de sentido e
atribuição de significado para cada atividade a ser realizada na escola e na vida.
MATERIAIS E MÉTODOS
A presente pesquisa é de abordagem qualitativa e seu estudo do tipo analítico
descritivo, tem como propósito investigar como é planejada e desenvolvida a prática
pedagógica ao ensinar números e quatro operações, se os métodos utilizados favorecem ou
não a aprendizagem do aluno. Averiguar se os conceitos numéricos ensinados auxiliam a
compreensão dos mesmos contribuindo assim para o desenvolvimento do raciocínio lógicomental em entender aritmética.
O universo desta investigação consiste em duas escolas públicas da rede estadual do
município de Rolim de Moura, que foram selecionadas através da classificação dos índices
obtidos na Provinha Brasil, sendo uma com melhor índice e a outra com o índice abaixo da
média. Os colaboradores da pesquisa são, portanto, professores e alunos.
A investigação utilizou como instrumentos de coleta de dados o levantamento
bibliográfico, contextualização do universo de investigação, as análises dos cadernos dos
alunos e dos livros didáticos adotados para o 1º e 2º ano do ensino fundamental, observação
em salas de aula e, por fim as entrevistas com professores e alunos.
As análises dos livros didáticos66 e cadernos dos alunos foram realizadas tomando todas
as atividades que exclusivamente traziam como objetivo, o ensino de números e das quatro
operações.
A observação participante, foi desenvolvida com 4 turmas da instituição “A” sendo duas
turmas de 1º ano e duas turmas de 2º ano, e na escola e “B”, com duas turmas, uma de 1º ano
e outra de 2º ano. Em ambas escolas houve autonomia para negociar com as professoras os
horários e dias que melhor atendessem o professor participante sem prejudicar o andamento
da rotina de cada turma.
O último instrumento da pesquisa utilizado foi a entrevista semiestruturada, com os
professores e alunos, que contou com a participação de 6 professores, sendo 3 docentes da
66
Os livros adotados e analisados são: “A escola é nossa” de 1º ano, de autoria: Fábio Vieira, Jackson
Ribeiro e Karina Pessôa, Editora Scipione, e o “Livro Fazendo e Compreendendo Matemática” de 2º ano, de
autoria: Lucília Bechara Sanchez; Manhúcia Perelberg Liberman; Regina Lúcia da Motta Wey da Editora
Saraiva.
308
escola “A”, sendo duas que ministram aulas para o 1º ano e a outra de 2º ano e, na escola “B”
duas docentes que ministram aulas para o 2º ano e uma para o 1º ano.
Com os alunos tivemos a participação alunos 12 na escola “A”, sendo 6 alunos de 1º
ano e 6 alunos de 2º ano e, na escola “B” contamos com a participação de 6 alunos, sendo 3
de 1º ano e 3 de 2º ano, esses números representam probabilisticamente a porcentagem 10%
de alunos de cada turma investigada.
Dessa forma, com os instrumentos de coleta de dados utilizados, espera-se que
possamos aventurar a indicar as causas que levam cada vez mais os alunos a não
compreenderem o significado e sentido de nosso sistema numérico decimal e do cálculo
aritmético.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Nesse momento da pesquisa, na medida em que se adiciona cada instrumento de coleta
de dados relacionados respectivamente em cada período, as informações geram a perspectiva
de serem tratadas e analisadas levando em conta a frequência com que cada dado aparece,
possibilitando que os resultados e as discussões pertinentes se fundem na tentativa de elucidar
a melhor forma de tratamento. Desse modo, levando em conta o acúmulo das informações
levantadas, passaremos adotar quatro categorias com a finalidade de melhor apresentarmos os
resultados já evidenciados.
α) O ensino de números e quatro operações nas perspectivas dos livros didáticos adotados.
A análise dos livros didáticos de 1º e 2º ano, das respectivas escolas participantes da
pesquisa, tem a finalidade de mostrar os objetivos propostos por seus autores, no ensino de
números e quatro operações.
Os livros adotados pelas escolas “A” e “B” apresentam nas atividades propostas para a
construção do conceito de número o uso de ilustrações presentes em nosso dia a dia, com a
finalidade de revelarem suas funções socioculturais.
Sobre esse aspecto, considera-se que a construção cognitiva do número é muito mais
complexa do que a mera repetição de palavras e suas escritas. Para que seja desenvolvido um
trabalho construtivo e que estimule os alunos, são propostas atividades planejadas usando o
lúdico (jogos e material concreto) para despertar o interesse das crianças.
309
Em relação à aprendizagem das quatro operações, os livros adotados propõem
trabalhar conceitos importantes para facilitar a compreensão das crianças. Nos conceitos
aditivos propõem atividades de juntar e acrescentar; já para se trabalhar a subtração utilizamse situações de retirar com questionamento de “Quantos sobram?”. Para os conceitos
multiplicativos propõem situações de comparação: Quantos a mais / quantos a menos? E para
a divisão utiliza situações de cálculo de possibilidades e a configuração retangular; repartição
e distribuição. O livro propõe atividades com jogos, situações problemas, tabelas e cálculos
com decomposição dos números.
Finalmente, quando se trata do livro didático há dois aspectos que integram nossas
análises: a) a escolha final do livro didático nunca virá de encontro a real necessidade de cada
professor em sala de aula, por isso o seu entendimento como um instrumento de auxílio no
processo de ensino aprendizagem; b) em razão da grande insistência do uso do livro didático
como um instrumento de auxílio e não uma muleta, convencionou-se como politicamente
correto o uso de vários livros, simultaneamente, o que acarreta um método de trabalho não
uníssono.
β) Os cadernos dos alunos revelam uma possibilidade real de ensino e de aprendizagem ou
eles se transformam em um mero apêndice do livro didático?
A análise dos cadernos dos alunos de 1º e 2º ano, das duas escolas participantes da
pesquisa, tem a finalidade de verificar as atividades desenvolvidas para trabalhar o conceito
de números e quatro operações, como também tentar descobrir os objetivos que os educadores
pretendem alcançar no seu desenvolvimento, se possível, perceber o desempenho da criança e,
consequentemente, o aprendizado resultante de cada situação de trabalho apresentada.
Em todas as amostras analisadas percebe-se que a quantidades de atividades
relacionadas à escrita de números, é exorbitante. Este tipo de exercícios tem sua origem em
uma prática tradicional, que não favorece o desenvolvimento do raciocínio lógico do aluno.
Portanto, os estudos teóricos revelam que ensinar números utilizando a mera repetição, não
favorece a atribuição de sentido ou ligações com os conhecimentos sociais que as crianças
possam ter, resultando quase sempre em uma aprendizagem passiva de memorização
mecânica.
Um outro tipo de atividade bastante utilizada, também de matriz tradicional, são as
conhecidas “continhas” na estrutura de arme e efetue que busca trabalhar o conceito das
quatro operações e, ao mesmo tempo desenvolver as habilidades em cálculo aritmético.
310
Não foram encontrados nos cadernos atividades que utilizam situações problemas para
reforçarem, ou mesmo levantarem os conhecimentos prévios dos alunos em números e quatro
operações, a respeito do que dizem Berton & Itacarambi (2009). Comumente, quando se
encontra problemas matemáticos são do tipo padrão ou convencional e, suas intenções
revelam muito mais uma fixação por uma ou outra operação, sem ao menos preocupar com o
conceito subjacente a estrutura operativa presente e o possível trabalho que poderia ser
realizado a partir da socialização de seu processo de resolução.
Os cadernos dos alunos nos possibilitam ter uma visão simplificada dos conteúdos e os
métodos revelados para se trabalhar números e quatro operações, não deixando de serem
puros arremedos apontados pelo livro didático.
Finalmente, em relação aos cadernos dos alunos, é importante destacar que a função
dos conteúdos de números e quatro operações em sua maioria se resumem em exercícios
repetitivos, que se recorre exclusivamente ao recurso da automatização. Embora essas
atividades no presente trabalho tenham sido analisadas e questionadas através dos estudos
bibliográficos, cabe ainda uma reflexão adicional: Qual objetivo pretende alcançar os
educadores, ao aplicar esses tipos de atividades aos seus alunos? Será que este equívoco está
relacionado à falta de conhecimento, ou enxergam nesse método apenas uma praticidade e
controle da sala no ensino de números e quatro operações?
χ) O que se esconde por detrás do ensino de números e quatro operações?
Quando paramos para pensar o que acontece com os professores e alunos no ato de
ensinar e aprender números e quatro operações, o que realmente se esconde por detrás, é que
ambas as partes parecem se cansar e desistirem de compreender a origem de suas
dificuldades. Os alunos em compreender o que se ensina e os professores em entender porque
ensinam e os alunos não conseguem compreender.
Na busca de se concretizar uma aprendizagem significativa e satisfatória observa que
muitos professores se empenham em realizar um trabalho desenvolvido em princípios
construtivistas, que vão além do simples lápis e papel.
Através da observação em sala é possível analisar momentos proporcionados às
crianças no ensino de números, como também adição e subtração, de forma produtiva, nos
quais a professora inicia a aula através da contagem dos alunos e a soma dos que faltaram no
dia, tornando-se um universo cheio de questionamentos que proporcionam aos alunos
aquisição de conhecimentos e levam a criar hipóteses tornando a aprendizagem significativa.
311
O ensino da multiplicação pôde ser observado apenas em duas aulas, no período da
observação. Percebe-se um certo receio dos professores em trabalhar o conteúdo de
multiplicação e divisão, isso talvez em razão das dificuldades das crianças que poderiam ser
inicialmente consideradas incapazes de aprenderem tais conteúdos, já que se propaga na
escola a ideia das duas operações supracitadas como mais complexas em relação às demais
operações. O trabalho no 2º ano, normalmente, inicia-se com o conceito de dobro e triplo,
permitindo que aos poucos se desenvolva a estrutura da multiplicação.
Os registros nos possibilitam perceber, também, que os professores ficam preocupados
em introduzir os alunos em conteúdos de multiplicação e divisão, principalmente a divisão,
não trabalhada durante o período da observação em sala. Esses conteúdos quando ministrados
são sempre os últimos as serem vistos, pois na concepção dos professores é preciso aprender
vários outros conteúdos primeiro para depois partir para multiplicação e divisão.
Esses conceitos presente nas práticas do professor também pode ser evidenciado nas
falas das professoras no momento da entrevista em que a maioria revela quando diz: “Não tem
como você já entrar com a divisão e uma multiplicação assim lá na 1ª série na operação
abstrata há não ser no concreto (...)” (Entrevista realizada com a profª. Maria -1º ano E. F. no
dia 22/05/2012). “Eu sinto mais que os alunos têm mais dificuldade de aprender é a divisão, a
divisão por conta de que ela é a operação mais complexa, ele tem que tá com a adição, a
subtração e a multiplicação já bem estruturada, ter um bom conhecimento, né”. (Entrevista
realizada com a profª. Claudia - 1ª ano, E.F. no dia 17/04/2012).
Finalmente, quando se utiliza a observação em sala de aula e se junta aos dados
levantados pelos cadernos dos alunos, torna-se evidente que o método utilizado para o ensino
de números e quatro operações esconde a falta de alternativas flexíveis para consolidar esse
conhecimento. No caso dos números os conhecimentos implícitos de sistema de numeração de
base dez, valor posicional, antecessor e sucessor e valor absoluto e relativo. Já no caso do
cálculo aritmético a possível combinação entre o sentido e significado de cada operação irá
marcar significativamente essa ausência de ligação entre a matemática escolar e a da vida.
Isso, então, fica patente ao observar em sala que algumas dificuldades dos alunos vão se
acumulando, talvez em razão do pouco tempo de investimento para sistematizá-los, acabando
por tornar uma bola de neve.
312
δ) Mitos, crenças e velhos vícios: o retrato real do ensino e da aprendizagem de números e
quatro operações.
A observação possibilitou perceber que o método tradicional predomina em muitas
práticas pedagógicas. Observou-se o esforço em superar velhos vícios e crenças, mas também
a insistência em continuar acreditando que apenas o exercício repetitivo, o uso abusivo da
memorização, a escrita de números e as famosas continhas levam os alunos à aprendizagem
de números. Essas situações são, também, reveladas nos cadernos dos alunos e, na observação
em sala, os esforços na tentativa em realizar uma didática construtivista, mas que o cotidiano
acaba por não sustentar.
Na observação, então, vez ou outra, a crença arraigada da quantidade exagerada de
continhas desenvolvidas no formato de arme e efetue, para se ensinar operações de adição e
subtração. Muitas vezes o professor acredita que essa forma levará o aluno à aprendizagem,
mas o que se percebe é que na realidade rouba-lhe a compreensão e a consciência do que esta
fazendo. Muitas contas ou escrita de números nos permitem questionar para que? Qual
objetivo de tudo disso?
Dentro dessa concepção fica evidente que os alunos não compreendem o número e
suas quantidades, quando na entrevista os alunos demonstram seus conhecimentos:
Pesquisadora: Qual que é o número que vem antes de 100? Aluna: Mil.
Pesquisadora: Depois de 79? Aluna: Mil. (Entrevista realizada no dia 30/05/2012, Julia67 do
1º ano, E.F.)
Pesquisadora: Qual que é o número que vem antes de 100?
Aluno: 99
Pesquisadora: Depois de 79?
Aluno: 69...60.
(Entrevista realizada no dia 30/05/2012 Pedro do 2º ano, E.F.)
67
∗
∗∗
Nomes codificados para preservar seus anonimatos.
313
Suas falas nos revelam, ainda, a falta de consolidação da ordem e, possivelmente, da
inclusão hierárquica dos números, obstruindo por sua vez o conhecimento simples da
sucessão, com a ideia de + 1 e a antecessão com a ideia de - 1.
Nem mesmo em situações problemas em que se podia abrir um canal para o uso de
aplicações ao cotidiano, que funcionariam como levantamento prévio de conhecimentos de
números, cálculos aritméticos e de estratégias mentais utilizados no dia-a-dia a escola e os
professores conseguem articular. O que impera é o velho vicio do problema padrão ou
convencional, com o fim exclusivo de fixar a operação aritmética que esta em jogo.
No tocante, ainda, ao uso livro didático ser visto pelo professor com um auxílio em
sua prática pedagógica, algumas vezes utilizados como única fonte, em outras ocasiões os
professores se valem de vários livros em busca de atividades alternativas; observa-se que o
resultado de tudo isso é que não se realiza completamente nem os objetivos propostos pelos
conteúdos do livro didático adotado, tampouco a soma de todas as partes se configura como
um método adotado pelo professor.
Um mito que se justifica a partir de nossa observação é que mesmo em situações
cotidianas da sala de aula que poderiam ser utilizadas para o estímulo e o desenvolvimento de
conceitos iniciais voltadas ao ensino de multiplicação e divisão não aproveitadas, se deve,
muito provavelmente, pela simples crença de ser impossível de trabalhar com essas duas
operações com crianças que não teriam uma prontidão para tal. Dessa forma, não estaríamos
decretando ou colaborando com a ideia de que a matemática escolar não tem nada haver com
a matemática que certamente muitos alunos teriam em suas vidas cotidianas?
Assim, o que podemos afirmar é que muitos vícios e crenças antigas, ainda,
predominam no ensino de números e quatro operações de 1º e 2º ano do ensino fundamental,
quase todas pautadas em ausência de prontidão que sequer se filiam em lógicas que obedecem
à vida cotidiana, por exemplo. E talvez resida ai, o adiamento desnecessário e alongados a que
são submetidos alguns conteúdos em matemática, especificamente número e quatro operação,
que normalmente retardam e não interagem com conteúdos dos anos subsequentes.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No decorrer dos nossos estudos se destacou as dificuldades enfrentadas por
professores e alunos, em ensinar e aprender números e quatro operações e através dessa
investigação pôde se perceber um amplo campo de estudo envolvendo a mesma preocupação
na busca de encontrar meios de resolver essa situação vivida nas escolas. Muitas vezes, as
314
crianças encontram no ambiente escolar regras e métodos que impedem de expor e descobrir
novos conhecimentos, a partir de situações que envolva o seu dia-a-dia, em que comumente
resolver adições, subtrações, multiplicações e divisões estão envoltos por um campo
conceitual muito mais amplo e diversificado do que o oferecido pela escola.
Mergulhamos em cada instrumento de coleta de dados na tentativa de cercear melhor
os nossos problemas de estudos e apresentar resultados consistentes que elucidam as
dificuldades enfrentadas por professores e alunos quando ensinam e aprendem números e
quatro operações, respectivamente. Buscou-se, realizar isso a partir da quadriangulação de
dados obtidos através da análise do livro didático, dos cadernos de alunos, da observação em
sala de aula e da entrevista com professores e alunos, enquadrando os resultados em quatro
categorias que pudessem retratar a complexidade da realidade escolar e, em particular do
ensino e aprendizagem de matemática na escola.
Para efeito, adotaremos nessas considerações finais, apenas os três grandes desafios
que se colocaram de forma evidente quando agregávamos todos os instrumentos de coleta de
dados utilizados, que assim se impunham:
a) A vasta produção cientifica a respeito da temática do nosso estudo não tem chegado
e não tem sido absorvida pelas escolas, retardando algumas mudanças nas práticas que
continuam fundamentadas em matrizes tradicionais.
b) As formações iniciais e os enfretamentos dos professores com a realidade do oficio
docente diário muitas vezes o colocam numa situação injusta e delicada com uma ciência que
em muitos casos não tem muita intimidade;
c) As políticas de formação continuadas em massa oferecidas pelo governo nem
sempre atendem as reais necessidades do professor, suas condições efetivas de assimilação,
aplicação e generalização do conhecimento oferecido, ou até mesmo leva em conta seus
contextos reais e não ideais de trabalho.
Finalmente, esperamos que os resultados apontados por nossos estudos possam refinar
mais o nosso olhar e mais claramente tenha conseguido indicar as razões que levam algumas
crianças a se excluírem da significação e sentido de nosso sistema numérico decimal e,
consequentemente, retardarem o processo de compreensão das estruturas operativas, em
especial multiplicação e divisão.
315
REFERÊNCIA
BERTON, I., ITACARAMBI, R. Números : Brincadeiras e Jogos. São Paulo: Livraria da
Física, 2009.
BIGODE, A. J. L. O cálculo e a vida moderna. In: MATEMÁTICA. Brasília: Ministério da
Educação e do Desporto. Secretaria de Educação a Distância. 1998.p. 32-5, 2 v. (Cadernos da
TV Escola. PCN na Escola).
BIGODE, A. J. L. A calculadora e o raciocínio da criança. In: MATEMÁTICA. Brasília:
Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação a Distância. 1998, p.43-8, 2 v.
(Cadernos da TV Escola. PCN na Escola).
KAMII, Constance. A Criança e o Número: Implicações educacionais da teoria de Piaget
para a atuação com escolares de 4 a 6 anos. 33º ed. Campinas - SP: Papirus. 2005.
MORENO, B. R. O ensino do numero e do sistema de numeração na educação infantil e na 1ª
série. In: PANIZZA, M. et al Ensinar Matemática na educação infantil e nas séries
iniciais: Análise e Propostas. Porto Alegre: Artmed, 2006.
NUNES, T., BRYANT, P. Crianças Fazendo Matemática. Porto Alegre: Artes Médicas,
1997.
PAVANELLO, Regina Maria (org.) Nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental: A
pesquisa e a sala de aula. V. 2. São Paulo-SP: Biblioteca do educador matemático. 2004.(.
Coleção SBEM).
316
GRUPO DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO DA AMAZÔNIA - GPEA
PURUBORÁ UM POVO INDÍGENA RESGATANDO SUA IDENTIDADE E
CULTURA
Poliana Alves Cassimiro68
José Joaci Barboza69
RESUMO
O presente trabalho se propõe a apresentar os resultados parciais da pesquisa desenvolvida
com o povo Puruborá, grupo indígena que teve contato com a cultura não índia no início do
século passado, no rio Manoel Correia, um dos afluentes do rio Guaporé, onde o então
coronel Rondon teria delimitado um território para eles. Após o contato esse povo passou por
diversos processos de fricção interétnica e foram diversas vezes expulsos de suas terras. O
projeto pretende contribuir com o resgate das memórias e das histórias do povo, para tal
valeu-se da metodologia da História Oral.
Palavras-chave: Puruborá. Ressurgido. História Oral
ABSTRACT
This paper aims to present the partial results of research carried out with the people Puruborá,
indigenous group who had contact with non-Indian culture at the beginning of last century,
the river Manoel Correia, a tributary of the River Guaporé, where the then Colonel Rondon
had a defined territory for them. After contact these people went through various processes of
interethnic friction and were repeatedly driven off their land. The project aims to contribute to
the recovery of memories and stories of the people, for that drew on the methodology of oral
history.
KEYWORDS: Puruborá. Risen. Oral History
INTRODUÇÃO
O povo puruborá é um grupo de índios ressurgidos na década de dois mil no estado de
Rondônia, sendo que o mesmo foi considerado extinto pela FUNAI. Segundo registros
históricos, o Povo Puruborá foi contatado no ano de 1909, pelo Marechal Rondon, que os
deixou na região do rio Manoel Correia, afluente do rio São Miguel. Os Puruborá ficaram
68
Acadêmica do curso de Pedagogia da Fundação Universidade Federal de Rondônia, campos de JiParaná, e-mail: [email protected]
69
Prof. Ms. do Departamento de Educação Intercultural – DEINTER, e pesquisador do Grupo de
Pesquisa em Educação na Amazônia – GPEA, da Fundação Universidade Federal de Rondônia – UNIR, Campus
de Ji-Paraná, e-mail: [email protected]
317
num lugar denominado Colônia ou Posto Dois de Maio sob responsabilidade de José Felix do
Nascimento, encarregado local do Serviço de Proteção ao Índio-SPI. Daí em diante o povo
Puruborá sofreu vários processos de expulsão das terras definidas para eles por Rondon,
sofrendo com várias doenças como sarampo, catapora, gripe entres outras doenças que quase
acabaram com o seu povo.
Após o contato, esse grupo, como de resto todos os grupos étnicos que habitavam os
vales do Guaporé/Mamoré foram recrutados para trabalharem como mão de obra barata e, em
precária situação de moradia e saúde. Várias mulheres foram transformadas em prêmio para
aqueles extratores que produzissem mais que a cota anual estabelecida previamente.
Ainda na gestão de José Felix do Nascimento, á área dos Puruborá passou pela
primeira ocupação, já que o administrador do posto estimulou a presença de não-índios nas
áreas que deveriam ser exclusivamente para o povo. Após o falecimento de José Felix os
Puruborá solicitaram ao SPI um novo encarregado, pedido que fora negado por achar a
FUNAI que os mesmos não eram mais índios puros e sim mestiços.
Como consequência, muitos deixaram as suas terras e foram trabalhar para
seringalistas com mão de obra barata, afinal como diz Roberto Cardoso de Oliveira (1972; p.
107), parafraseando Curt Nimuendaju, o SPI e a FUNAI já havia realizado seu trabalho, qual
seja, o de “engordar sapo para a cobra comer”, ou seja, já haviam pacificado os indígenas para
servirem como força de trabalho barato nos seringais amazônicos.
Segundo relatos dos colaboradores e literatura produzida por Mauro Leonel (1995), os
puruborá ainda resistiram e permaneceram nas terras indígenas até que foram expulsos
quando da criação da Rebio do Guaporé (1982), e posteriormente quando da demarcação das
terras indígenas dos Uru-Eu-wau-wau (1985). Em 1995 uma família Puruborá volta as suas
terras n Rio Manuel Correia, sendo encontrados aí pelo Conselho Indígena Missionário CIMI.
Desde então, o povo Puruborá se espalhou por toda parte do estado de Rondônia,
chegando mesmo a perder parte significativa de sua cultura e de sua identidade. Diante deste
fato o intuito do projeto de pesquisa foi buscar resgatar as histórias e preservar a memória do
povo, conhecer suas experiências de vida, sua tradição sua luta, seus sofrimentos, bem como
contribuir com a sua luta principalmente a de fortalecimento da identidade e a da demarcação
de suas terras.
É dentro desse contexto que, segundo Siloé Soares de Amorim (2003; p. 32):
318
Além da luta pela recuperação de suas terras, introduzem novas formas de representações
políticas tendo em vista o cenário legislativo e jurídico que lhes atribuem estigmas e
obstáculos nesse reconhecimento, reformulando, para superá-los, suas manifestações culturais
e religiosas, para garantir espaços no contexto regional local e nacional.
É, então, dentro desta perspectiva que podemos enquadrar as lutas dos Puruborá, luta
que é de todos os grupos ressurgidos no Brasil, que enfrentam várias dificuldades em virtude
do estigma ao qual são submetidos todos os povos indígenas e de modo especial os povos
“misturados”, ou seja, aqueles que foram vítimas dos processos de inclusão forçada no
cenário nacional e que agora lutam para ter seus direitos assegurados.
Por último, mais não menos importante, o projeto de pesquisa que não se restringe ao
PIBIC, pretende contribuir com a construção de um acervo documental que possa servir como
fonte primária para outros pesquisadores da questão indígena e regional, processo esse que se
encontra em estágio bastante avançado e, com o qual o PIBIC contribuiu sobremaneira.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Para a realização da pesquisa nos aproximamos da literatura e da metodologia da
moderna História Oral. Essa metodologia foi desenvolvida no início da segunda metade do
século passado, quando nos estados unidos se percebeu que os soldados que voltavam dos
campos de batalha retornavam envoltos num profundo silêncio.
Ela, a entrevista, foi utilizada como um recurso para que esses sobreviventes pudessem
resgatar sua dignidade e sua autoconfiança, enquanto sujeitos que buscam superar os traumas
inerentes a guerra e, pudessem se reintegrar efetivamente no convívio social e por
conseqüência no familiar.
Daí em diante a História Oral se desenvolveu fora do meio acadêmico, só algum
tempo depois de insere nos meios acadêmicos. No Brasil a História Oral tem seus primórdios
na década de 1970 quando a fundação FORD em parceria com a FGV oferecem um curso de
formação e apropriação da metodologia. Outro elemento importante para a divulgação da
História Oral nas universidades foi o lançamento do livro da Ecléa Bosi: Lembranças de
Velhos.
Posteriormente, temos uma geração de professores universitários que irão efetuar
pesquisas se utilizando da metodologia da História Oral, sendo que alguns publicaram
manuais ou livros de referência, tais como: José Carlos Sebe Bom Meyhi, e o seu clássico
319
Manual de História Oral (2000), Antônio Torres Montenegro (2001), Marieta de Moraes
Ferreira (1996).
A História Oral que estamos utilizando nessa pesquisa é a desenvolvida por Meihy
(2000), ela pressupõe a utilização da pré-entrevistas, entrevistas e pós-entrevistas, bem como
os de transcrição e transcriação das entrevistas.
A pré-entrevista é o momento em que os pesquisadores se apresentam a comunidade e
ao mesmo tempo falam sobre o projeto de pesquisa, feita essa apresentação os futuros
colaboradores são inquiridos se gostariam de participar das entrevistas. Em seguida marca-se
a data e o local da entrevista, sendo que o local, a data e o horário quem tem o direito de
escolher será o entrevistado.
A entrevista propriamente dita é o momento em que o pesquisador munido dos
equipamentos tais como: gravador, caderno de campo, máquina fotográfica ou filmadora vai
ao local, no dia e horário marcado pelos entrevistados, e inicia um diálogo com os
colaboradores. Como já falamos sobre os objetivos da pesquisa, ou seja, sobre o que o
pesquisador está pesquisando, então não realizamos no primeiro momento nenhuma pergunta,
simplesmente franqueamos a palavra aos colaboradores.
Posteriormente, quando o colaborador encerra a narrativa de duas experiências de vida
e, quando o pesquisador entende que alguns tópicos da narrativa precisam ser mais bem
detalhados, então retomamos os pontos da narrativa que fazem alusão aquele aspecto a ser
desenvolvido e solicitamos ao colaborador que fale mais sobre a temática.
Daí, passamos para a fase da transcrição das entrevistas, ou seja, é o momento onde
buscamos transcrever o mais próximo quilo que nos foi falado, as falas dos colaboradores e
dos entrevistadores, bem como, quando ocorre, das intervenções de outras pessoas que
eventualmente participaram, mesmo sem ser “objeto” da entrevista.
O outro momento que antecede a conferência é a transcriação. Queremos deixar bem
claro que a transcriação não se inicia após a transcrição, ela se inicia quando aquela é iniciada,
em outras palavras, só utilizamos essa nomenclatura para efeitos gnosiológicos e para
caracterizar um momento intencional e, portanto, consciente de trabalhar no texto para
melhorá-lo do ponto de vista do código escrito.
A fase posterior, e penúltima etapa do trabalho, será a conferência dos textos pelos
colaboradores, onde acontecerá o retorno dos entrevistadores aos colaboradores, com o intuito
de que os mesmos leiam ou ouçam a leitura dos textos, para que apontem o que deve
permanecer ou ser excluído, o que pode ser melhorado e por fim autorizar ou não a utilização
dos textos.
320
A última fase é o arquivamento ou a publicação, quando for o caso, das entrevistas
trabalhadas e autorizada o uso para os demais entrevistadores. No caso do atual projeto de
pesquisa pretende-se ao fim, publicar um livro com as entrevistas, além da construção de um
acervo documental.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Ao todo foram realizadas quatro entrevistas com colaboradores residentes nos
município de Seringueiras e São Francisco, essas entrevistas foram realizadas com Hosana
Castro de Oliveira Montanha, Dona Emília de Oliveira, Mário de Oliveira e Marines Castro
de Oliveira. Pode parecer pouco a realização de quatro entrevistas, e de fato o é, mas se
levarmos em conta que estudo no campus de Ji-Paraná localizado na mesma cidade e, para a
realização das entrevistas temos de efetuar o deslocamento intermunicipal e para tal não
dispomos de apoio, senão a de ligação com outro projeto financiado pelo PROEXT que
possibilitou o deslocamento, e ainda assim com algumas dificuldades tais como atraso de
pagamentos das bolsas e liberação de passagens etc.
Ainda assim, realizei conjuntamente com o professor coordenador do projeto as quatro
entrevistas e transcrevi todas, porém, o projeto por parte do PROEXT ainda continua até
dezembro de 2012, com reais possibilidades de continuação no ano de 2013, quando
efetivamente poderemos falar de conclusão do trabalho. Nesse momento só posso falar das
atividades desenvolvidas até o presente, ou seja, só posso falar em resultados parciais.
Realizamos a revisão da bibliografia, principalmente no sentido de nos apropriarmos
da metodologia da História Oral, concomitantemente efetuamos leituras n o sentido de
compreender esse fenômeno ainda recente do ponto de vista histórico que é o ressurgimento
étnico, dito de outra forma, procuramos entender como um grupo num momento se identifica
de uma forma e posteriormente passa a se identificar de outra forma.
Ainda como resultado provisório da pesquisa, produzimos quatro banners que foram
apresentados em eventos nacionais e estadual, e produzimos um artigo: PURUBORÁ:
NARRATIVAS DE UM POVO RESSURGIDO NA AMAZÔNIA, que foi apresentado no XI
Encontro Nacional de História Oral. Uma das colaboradoras do projeto apresentou um projeto
de Trabalho de Conclusão de Curso, tendo como objeto de pesquisa os mitos do povo
Puruborá.
Do ponto de vista do povo Puruborá, no tocante a impactos em decorrência do projeto,
ainda não podemos falar muito, contudo, observamos que as pessoas contatadas para
321
participarem do projeto, concedendo entrevistas, têm nos recebido de braços abertos e criam
uma expectativa muito grande em relação aos resultados finais.
De nossa parte, supomos que ao término do trabalho o povo terá um acervo que será
de muita valia para a manutenção e preservação tanto da história do povo como da memória,
já que os mais velhos, a geração nascida após o contato tem sido os principais colaboradores
desse projeto e, eles são os portadores das histórias, dos mitos, da língua e das memórias
desse povo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como já fiz referencia anteriormente, a pesquisa objeto do projeto apresentado ao
PIBIC/2011/2012, se encerra parcialmente com a entrega do relatório e desse resumo
expandido, contudo, no período de um ano a realização das entrevistas com o povo Puruborá
nos levou a melhor compreender o sentido da luta do povo pelo resgate de sua história e,
consequentemente pela demarcação do seu território ancestral.
Levou-nos ainda a se solidarizar com o sofrimento dos colaboradores principalmente,
por aqueles decorrentes da negação de sua identidade e do direito básico que qualquer ser
humano, o de possuir suas terras. Quando iniciei o processo de pré-entrevista e da entrevista,
pude compreender o papel da pesquisa com a utilização da História Oral de Vida enquanto
instrumento de fortalecimento da luta e da organização dos excluídos da história.
REFERÊNCIAS
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323
RENDIMENTO ESCOLAR E PROGRAMAS DE MELHORIA DA QUALIDADE DE
ENSINO EM ESCOLAS PÚBLICAS ESTADUAIS DE PORTO VELHO
Rômulo Gomes Zanon70
Marli Lúcia Tonatto Zibetti71
RESUMO
Este trabalho tem por objetivo investigar a relação entre as políticas de avaliação do
rendimento escolar e a implantação de programas de melhoria da qualidade do ensino em
escolas públicas estaduais em Porto Velho. A pesquisa foi desenvolvida em duas escolas com
diferentes Índices de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) e os dados foram
produzidos por meio de observações dos espaços escolares e entrevistas com os gestores das
referidas escolas e técnicos da Gerência de Acompanhamento, Controle e Avaliação da
Secretaria de Estado da Educação. Os resultados indicam que a implantação dos programas de
melhoria da qualidade do ensino ocorre a partir do número de alunos e do número de salas de
aula existentes nas escolas. O IDEB foi considerado para premiar a escola que obteve avanços
significativos no seu rendimento, evidenciando que ao invés de servir de indicador das
necessidades das escolas esse índice é utilizado para estimular a competição entre as
instituições contribuindo para tornar ainda melhores aquelas que já apresentam bons
resultados.
INTRODUÇÃO
Desde a Constituição de 1988, o Brasil estabelece, além da obrigatoriedade no ensino
fundamental, a necessidade de assegurar a “garantia de padrão de qualidade” (BRASIL,
1988). Para atestar esse padrão de qualidade, foram criados sistemas de avaliação externos
estabelecendo níveis de desempenho a serem alcançados.
O texto da LDBEN normatiza as formas como o sistema educacional assegurará o
padrão de qualidade estabelecido pela Constituição. No artigo 9º, destacam-se os seguintes
incisos:
V - coletar, analisar e disseminar informações sobre a educação;
VI - assegurar processo nacional de avaliação do rendimento escolar no
ensino fundamental, médio e superior, em colaboração com os sistemas de
ensino, objetivando a definição de prioridades e a melhoria da qualidade do
ensino;
Em tramitação no Congresso Nacional, o Projeto de Lei que Aprova o Plano Nacional
de Educação para o decênio 2011-2020, anuncia em seu Artigo 11:
70
71
Estudante do 5º Período de Psicologia – Universidade Federal de Rondônia – UNIR
Orientadora: Professora do Curso de Psicologia - Universidade Federal de Rondônia – UNIR
324
O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica - IDEB será utilizado
para avaliar a qualidade do ensino a partir dos dados de rendimento escolar
apurados pelo censo escolar da educação básica, combinados com os dados
relativos ao desempenho dos estudantes apurados na avaliação nacional do
rendimento escolar.
§1º O IDEB é calculado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira - INEP, vinculado ao Ministério da Educação,
§2º O INEP empreenderá estudos para desenvolver outros indicadores de
qualidade relativos ao corpo docente e à infraestrutura das escolas de
educação básica.
Neste estudo, interessa-nos analisar de que maneira este índice tem sido utilizado pelo
sistema estadual de ensino em Rondônia na definição de políticas de enfrentamento das
dificuldades escolares, uma vez que na base dos sistemas de avaliação encontra-se a
justificativa de que eles permitirão a identificação dos problemas enfrentados pelas redes
educativas com vistas à implantação de melhorias para sua superação.
Assim, este texto apresenta inicialmente uma breve discussão a respeito do sistema de
avaliação educacional e da implantação do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
(IDEB). Em seguida, descrevemos os objetivos e as características da pesquisa desenvolvida.
Por fim apresentamos os resultados e discussões com base nos dados obtidos por meio de
observação e entrevistas com os gestores escolares.
ASPECTOS TEÓRICOS
Segundo Peroni (2003, p.19), na década de 1990 houve um processo de
descentralização da educação pública. Esse foi um terreno fértil para a intensificação das
políticas de avaliação, pois a partir da descentralização, cada esfera tem responsabilidade de
atingir suas próprias metas de acordo com as pontuações das diferentes avaliações. Isso acaba
gerando competitividade entre as escolas e nem sempre mostra resultados como afirma Sousa
(2003, p. 176),
Ao que parece, a questão central nesta proposta não é a de buscar subsídios
para intervenções mais precisas e consistentes do poder público, ou seja,
uma análise das informações coletadas para definição e implementação de
políticas para a educação básica, mas difundir nos sistemas escolares uma
dada concepção de avaliação, que tem como finalidade a instalação de
mecanismos que estimulem a competição entre as escolas,
responsabilizando-as, em última instância, pelo sucesso ou fracasso escolar.
325
No Brasil, registra-se desde a década de 1960 o uso de testes educacionais. No
entanto, situa-se nos anos finais da década de 1980 a primeira iniciativa de uma sistemática de
avaliação do ensino fundamental e médio em âmbito nacional - Sistema Nacional de
Avaliação da Educação Básica (SOUSA, 2003).
De acordo com Castro (2009, p. 5) uma das políticas que mais avançou no Brasil nos
últimos 15 anos, foi a implantação dos sistemas de avaliação educacional.
Considerada hoje uma das mais abrangentes e eficientes do mundo, a
política de avaliação engloba diferentes programas, tais como o Sistema
Nacional de Avaliação da Educação Básica - Saeb, o Exame Nacional do
Ensino Médio - Enem, o Exame Nacional de Cursos - ENC, conhecido como
Provão e, posteriormente, substituído pelo Exame Nacional de Desempenho
do Ensino Superior - Enade, o Exame Nacional de Certificação de Jovens e
Adultos - Enceja, o Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior Sinaes, a Prova Brasil e o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica Ideb. Em conjunto, estes sistemas, ao lado da Avaliação da Pós-Graduação
da Capes - o mais antigo sistema de avaliação do país no setor educação -,
configuram um macrossistema de avaliação da qualidade da educação
brasileira.
Segundo Lima e Gandin (2011) essas avaliações constituem-se como ferramentas
imprescindíveis ao sistema de gestão das políticas públicas implementadas no modelo
neoliberal cuja característica básica é a centralidade nos resultados. Focar a atenção nos
resultados justifica-se pela necessidade de verificar a eficiência, qualidade e eficácia dos
serviços. Para isso defende-se a gestão descentralizada argumentando-se que a decisão sobre a
prestação de serviços ocorreria perto do local onde seria realizada podendo contar com a
avaliação dos clientes. Portanto, a criação de um ambiente competitivo dentro das instituições
públicas é considerada condição básica para a elevação da qualidade dos serviços e
otimização da produtividade. Conforme destacam os autores, nesse cenário ocorre uma
reconfiguração do Estado que passa a gerenciar a oferta de serviços, passando de executor a
fiscalizador.
Como síntese das políticas avaliativas o governo brasileiro cria em 2007 o Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) que representa a iniciativa de reunir num só
indicador, dois conceitos de grande importância para a qualidade da educação, fluxo escolar
(promoção, evasão e repetência) e desempenho nas avaliações. Segundo Fernandes (2007) o
IDEB é calculado a partir de dois componentes: taxa de rendimento escolar (aprovação) e
média de desempenho nos exames padronizados aplicados pelo Instituto Nacional de Estudos
326
e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) por meio das Prova Brasil e Sistema de
Avaliação da Educação Básica SAEB.
Conforme destaca Freitas (2007) ao implementar um índice de desenvolvimento da
educação básica, o Ministério da Educação institui os meios para o fortalecimento de uma
administração gerencial, na qual a relação do governo central com estados e municípios é
direta, gerenciando à distância a liberação de recursos a partir de resultados, conforme
explicitado pelo ex-presidente do INEP:
Todo o PDE [Plano de Desenvolvimento da Educação] está ancorado
justamente na criação do Índice de Desenvolvimento da Educação Brasileira
- IDEB, que pondera os resultados do SAEB, da Prova Brasil e dos
indicadores de desempenho captados pelo censo escolar (evasão, aprovação
e reprovação). Cria um indicador que varia de zero a dez, desdobrável por
estado e por município e por redes de ensino [e agora por escola]. A partir da
construção do IDEB, o MEC vinculará o repasse de recursos oriundos do
FNDE à assinatura de compromisso dos gestores municipais com
determinadas metas de melhoria dos seus indicadores ao longo de
determinado período. (ARAÚJO, 2007, apud FREITAS, 2007, p 967.
Comentários entre colchetes do autor)
Com a descentralização da educação pública, municípios e estados têm suas
obrigações bem definidas e com essas avaliações o peso de conseguir alcançar as metas
desejadas. A avaliação, para Sousa (2003), neste contexto é assumida como uma estratégia
capaz de propiciar o alcance dos objetivos de melhoria da eficiência e da qualidade da
educação.
Freitas (2007), entretanto, alerta para o fato de que a divulgação dos resultados dos
desempenhos das escolas, seja por meio das provas do SAEB ou do IDEB, pode acabar
criando uma perversa competição entre as escolas, levando os pais a procurarem as escolas
melhor avaliadas, reforçando ainda mais os investimentos nessas escolas. Enquanto os pobres
continuariam a ter acesso a escolas cada vez menos valorizadas.
Os usos que são feitos dos resultados das avaliações podem contribuir para a melhoria
do ensino oferecido nas escolas com maiores dificuldades? Este trabalho busca uma
aproximação inicial com esta questão, analisando a implantação de programas de melhoria da
qualidade do ensino em duas escolas públicas estaduais com IDEB distinto.
327
A PESQUISA
O objetivo que orientou nossa pesquisa foi investigar a relação entre rendimento
escolar e a implementação de programas de melhoria da qualidade do ensino nos anos iniciais
do Ensino Fundamental em duas escolas da rede estadual em Porto Velho. Para isso foram
selecionadas escolas cujos Índices de Desenvolvimento da Educação Básica eram diferentes e
a partir do levantamento dos programas educacionais implementados nas referidas escolas foi
realizada uma análise com vistas a verificar sua contribuição para a superação das
dificuldades evidenciadas nos dados de rendimento escolar.
A Escola A72 apresenta um dos maiores índices entre as escolas que oferecem as séries
iniciais na rede estadual. Ao observar a série do IDEB da referida escola, constatou-se que ela
possuía um índice de 3.6 em 2005, subindo para 3.8 em 2007 e em 2009 chegou a 4.8,
estando 17% acima da projeção feita para o período. Por isso, considerou-se relevante
escolher a escola para identificar aspectos que contribuíram para elevação do IDEB.
Em relação à escola B, que está entre as que possuem o menor IDEB nos anos iniciais
do ensino fundamental da rede estadual, a situação é inversa. A escola tinha um índice de 3.5
em 2005, quando o IDEB foi implantado. Na segunda avaliação em 2007 passou para 4.0,
entretanto em 2009, retornou aos 3.5. Por isso, julgou-se relevante investigar uma escola cujo
índice oscilou durante o período e se encontra em queda.
Foram realizadas observações nas escolas pesquisadas, as quais foram anotadas em
fichas próprias para levantamento de dados sobre espaços físicos, mobiliário, materiais
pedagógicos e profissionais que atuam nas referidas escolas. Também foram realizadas
entrevistas com diretores das escolas A e B, vice-diretora e coordenadora Pedagógica da
Escola B, além de duas técnicas da Gerência de Acompanhamento, Controle e Avaliação GACA.
A análise de dados considerou os objetivos e o referencial teórico adotado para a
compreensão das informações fornecidas pelos participantes.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Nos discursos governamentais, bem como nos diferentes segmentos da mídia, o
sistema de avaliação da educação básica é um instrumento fundamental para que a gestão
72
Utilizamos as letras A e B para nomear as escolas, preservando o sigilo sobre os dados.
328
pública tenha elementos para monitorar o sistema educacional de forma a investir nos locais
em que há maiores dificuldades.
Tal como acontece com os testes do Sistema Nacional de Avaliação da
Educação Básica (Saeb), os da Prova Brasil avaliam competências
construídas e habilidades desenvolvidas e detectam dificuldades de
aprendizagem. No caso da Prova Brasil, o resultado, quase censitário, amplia
a gama de informações que subsidiarão a adoção de medidas que superem
as deficiências detectadas em cada escola avaliada. (BRASIL, 2008, p. 45 - Grifos nossos)
Na medida em que ouvíamos os gestores percebemos que vários programas
desenvolvidos nas escolas estavam relacionados ao sistema de manutenção da Educação
Básica o qual tem se caracterizado pela descentralização dos recursos que são enviados para
as escolas. As unidades escolares passaram a receber as verbas para manutenção das
atividades em contas específicas para cada um dos programas em desenvolvimento e os
diretores, juntamente com os vice-diretores e os tesoureiros dos Conselhos Escolares designados como Unidades Executoras em substituição às antigas Associações de Pais e
Professores - APPs, são responsáveis pelo planejamento de metas, recebimento dos recursos,
licitação ou cotação dos produtos e serviços, compra, acompanhamento da entrega e/ou
execução e prestação de contas.
Cada programa que libera verbas para as Unidades Escolares exige a abertura de conta
específica para gerenciamento dos recursos. Alguns deles recebem recursos tanto do governo
federal quanto do estadual e nesses casos são administrados em contas separadas e com
prestação de contas também diferenciadas. De acordo com informações dos gestores das
escolas pesquisadas eles administravam, no momento da pesquisa, de seis (Escola A) a oito
contas (Escola B).
Configura-se assim o sentido de “descentralização” incorporado nessa
legislação. [LBD 9394] Este termo é entendido como a transferência para
Estados, Distrito Federal e Municípios da responsabilidade de gerir
diretamente as diferentes redes de escolas. Ao mesmo tempo, introduz-se
nova concepção de controle, agora realizado indiretamente pelos resultados
obtidos pelos alunos nos testes sistêmicos. Passa-se a controlar o "produto"
do sistema e não o "processo" que o originou. Nesta lógica, a "autonomia"
da escola passa a ter outro sentido, pois a instituição passa a ser
"monitorada" de outra maneira, não mais pelo controle burocráticohierárquico direto. (OLIVEIRA, 2005, p. 24).
329
A maior parte dos programas toma como indicador para liberação dos recursos o
número de alunos matriculados na escola, de acordo com o Censo do ano anterior. Para o
Diretor da Escola B, este cálculo, quando não leva em consideração outros aspectos da escola
cria distorções que prejudicam sua manutenção.
Pelo fato de nossa escola ser uma escola inclusiva, aí nós temos limitações
no número de atendimento de alunos, porque nós não podemos colocar nas
salas de aula mais que 25 alunos porque em todas as salas nós temos alunos
com necessidades especiais; então a legislação limita e limitando, reduz o
número de alunos e todo recurso que vem para cá é baseado no número de
alunos matriculados que são atendidos pela escola né? Mas mesmo assim
pela grandiosidade da estrutura física, olha a escola vai de uma rua a outra, a
escola tem várias árvores, e as folhas caem e precisam ser rasteladas; você
não pode mais queimar, é crime fazer fogo, produzir queimadas, então o que
você tem que fazer, colocar em um saco apropriado e dar a destinação certa e
isso é custo operacional. Vai saco de lixo, 5 ou 10 por dia, vai mais rastelo,
mais vassoura, mais pano de chão, para a manutenção da estrutura. [...] a
escola de uma dimensão dessa aqui vai receber para a manutenção 4.441
reais e 30 centavos para o ano todo. (Entrevista Diretor Escola B).
O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) também destina recursos
considerando o número de alunos a serem atendidos. As informações sobre o PNAE
disponíveis no site do MEC (BRASIL, 2012) indicam que os recursos financeiros da União
são transferidos em dez parcelas mensais, correspondentes à manutenção de 20 dias letivos
em cada parcela (considerando a duração do ano em 200 dias letivos) e o número de alunos a
serem atendidos.
De acordo com os gestores, a aplicação do recurso é acompanhada por uma comissão,
mas a prestação de contas fica sob responsabilidade dos diretores e vices que, no dia a dia
verificam as necessidades e analisam como positiva a gestão dos recursos da merenda pelas
unidades escolares por lhes permitir adequar sua oferta às demandas da clientela. Entretanto, o
cálculo do valor a ser enviado a cada escola deveria considerar outros aspectos e não só o
número de alunos matriculados. Conforme o diretor da Escola B, para atender à realidade dos
alunos daquela escola foi necessário inserir, além do lanche servido durante o intervalo, o café
da manhã que é servido antes do início da aula.
É uma das grandes preocupações que eu tenho como gestor e toda vez que
eu chego na escola eu não venho para cá [sala da direção]. Eu não venho
para outro lugar não, eu vou para o refeitório, cedo. Eu chego aqui 7h.
Cardápio está sob controle? -Tá. Então beleza! [...] Nós temos um café da
manhã que nós introduzimos aqui na escola por conta própria. A gente usa o
recurso da cantina escolar e alguns gêneros também da alimentação escolar
de aluno, então quer dizer assim... O que havia de alunos aqui, anos
330
anteriores, que chegava aqui com dor de barriga, passando mal. Ai a gente
sentava: “Você jantou ontem?” “Não!” “O que você comeu hoje?” “Nada.”
Doze horas só tomando água. Água hidrata, mas não alimenta, não tem
nutrientes suficientes. Aí quer saber de uma coisa, vamos fazer o projeto
café com leite, que é um café com leite básico, [...] um biscoito salgado com
margarina e quando tem uma fruta, uma banana, uma fatia de melancia,
enfim. Nunca mais aconteceu esse problema. (Entrevista Diretor Escola B).
O Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) visa à melhoria da infraestrutura física
e pedagógica das unidades escolares. Os recursos liberados para as escolas podem ser
investidos em: manutenção, conservação e pequenos reparos na escola; aquisição de material
permanente; aquisição de material de consumo, necessário ao funcionamento da escola;
material didático-pedagógico; desenvolvimento de atividades educacionais, etc.
Como um desdobramento do PDDE o Programa de Melhoria da Escola (PME) é um
instrumento que viabiliza o repasse de verbas diretamente para as escolas para o
financiamento e execução das metas contidas no Plano de Desenvolvimento da Escola (PDE).
De acordo com a Gestora da Escola A “[...] o PDE/PME é um projeto que visa sanar as
deficiências do ano que tá dando problema. Por exemplo, no caso nosso aqui, existe um ano
que a gente fala que é o mais trabalhoso que é o 2º ano e que era o antigo 1º aninho.”
(Entrevista Diretora da Escola A).
Os recursos recebidos pelo Programa de Melhoria da Escola estão vinculados ao
Projeto de Desenvolvimento da Escola - PDE e podem ser investidos, conforme
planejamento, tanto em recursos materiais, quanto em formação do quadro docente, visando
melhores resultados na série em que os índices são mais problemáticos.
O que vai nos ajudar a solucionar o problema do 2º ano? Aí a gente fala: no
pedagógico o que a gente vai fazer? O que a supervisora vai trabalhar com
elas [as professoras] pra poder não reter muitas crianças no 2º aninho? E o
lado financeiro que é o PME, que é lado a lado: o que vai ser preciso a
escola comprar pra ajudar. A gente colocou kits pedagógicos, cadernos,
lápis.
Para recebimento dos recursos a escola precisa elaborar projeto ano a ano e enviá-lo
para aprovação. A verba é liberada mediante acompanhamento do alcance das metas
projetadas e da prestação de contas da escola dos valores recebidos no ano anterior.
Outro programa que repassa recursos às escolas é o Programa de Apoio Financeiro às
Unidades Escolares (PROAFI). Por meio deste programa o governo estadual disponibilizava
R$3,00 por aluno matriculado, tomando como referência o total de alunos matriculados no
331
ano anterior. Em 2012 o Governo do estado aumentou este valor para R$ 8,00 por aluno. Os
repasses que eram feitos semestralmente passaram a ser feitos por trimestre e o dinheiro
também é administrado pelo diretor da escola e o tesoureiro do Conselho Escolar.
Os recursos do PROAFI destinam-se à manutenção e conservação dos prédios
escolares, mobiliário e equipamentos, podendo também ser utilizado para a aquisição de
materiais necessários ao funcionamento da escola, à capacitação de profissionais da educação,
compra de materiais didático-pedagógicos para implementação de projetos e ainda para
pagamento de taxas de água, luz telefone e provedor de internet.
Os profissionais das escolas são unânimes em afirmar que as condições melhoraram a
partir do repasse direto de dinheiro uma vez que as escolas têm mais materiais disponíveis
para as atividades pedagógicas e também para a realização de pequenos reparos e manutenção
dos serviços no dia a dia das escolas. Entretanto os recursos têm sido insuficientes para
realizar as reformas que os espaços físicos das escolas estão necessitando.
Eu cheguei aqui em 2003 e nós não tínhamos nada de equipamento de
informática, de tecnologia, nada. Nós tínhamos apenas um computadorzinho
na secretaria, só um aqui. De lá pra cá, nós tivemos avanços significativos na
melhoria do processo de infra-estrutura da escola para que o professor
pudesse otimizar o processo de ensino aprendizagem. [...] Hoje a nossa
grande dificuldade é a infraestrutura porque nós temos uma escola inclusiva
e atendemos alunos com necessidades especiais, a nossa infraestrutura é
inadequada, é imprópria, para o convívio. (Entrevista Diretor Escola B)
Agora se as escolas fossem reformadas, por exemplo, ah, vamos receber os
ar-condicionado, ah, então as escolas vão passar por uma reforma de fiação...
o dinheiro dava, tranquilo! Mas o problema é que a gente tem com o
dinheiro: comprar o fio, fazer a gambiarra, pagar mão-de-obra. Aí é
complicado, por isso que não dá! (Entrevista - Diretora Escola A).
A própria Secretaria de Educação reconhecendo que o repasse regular de recursos do
PROAFI às escolas é insuficiente para a manutenção de prédios escolares com sérios
problemas na estrutura física, decidiu enviar parcela adicional para que as unidades escolares
executassem outros serviços, como a pintura dos prédios e reforma de banheiros. A Escola B
recebeu, segundo seu diretor, 64 mil reais para realizar pintura e reforma das instalações no
ano de 2011 como parcela adicional do PROAFI. Entretanto, na análise do entrevistado os
recursos foram insuficientes:
Por exemplo, houve no ano passado o repasse de recursos que a escola nossa
aqui foi prejudicada, porque eles mandaram mediante tipologia de cada
332
escola. Aí a escola recebeu, foi passado pra cá 64.000,00 reais e a outra
escola que é desse tamaínho recebeu o mesmo valor. Significa dizer que o
serviço que tinha que fazer lá foi feito e presumo que deve ter sobrado
dinheiro. Aqui não deu pra a gente fazer a metade que seria a pintura de toda
a estrutura física da escola desde o muro externo, passando pela área externa
e interna da escola e quadra de esporte; não deu para a gente concluir a parte
administrativa, nem pintar a quadra de esporte, nem restaurar as instalações
do banheiro porque o recurso foi insuficiente. Nós precisaríamos do dobro
para dar conta, de acordo com o levantamento metro quadrado. A questão da
manutenção na minha visão, não é preciso ser engenheiro, você tem que
trabalhar o metro quadrado da área construída...(Entrevista Diretor Escola
B).
O repasse de recursos às unidades escolares deveria ser destinado a pequenos reparos e
à compra de itens de primeira necessidade como gás, por exemplo. Deste ponto de partida,
ampliou-se a proposta a ponto de incumbir as escolas de licitar, contratar, acompanhar a
execução, pagar e prestar contas de serviços de reforma muito mais amplos e que deveriam
estar ao encargo de profissionais com formação técnica para isso, como engenheiros e mestres
de obra. Além do mais, não houve ampliação no quadro de funcionários das escolas em
decorrência do aumento das atribuições com a gestão desses recursos, intensificando a carga
de trabalho e responsabilidade dos gestores das escolas que enfrentam dificuldades de toda a
ordem para administrar em condições de trabalho desfavoráveis:
Existe uma insatisfação, a senhora sabe disso, existe uma insatisfação muito
grande. Hoje pela primeira vez eu vi uma coisa que eu não tinha presenciado
ainda, porque quando eu ia para as reuniões junto com os professores, eu via
os professores falando né, mas quando era reunião só de supervisor,
coordenador pedagógico ninguém falava nada, todo mundo era calado. Hoje,
eu levei um susto, eu levei um susto! Porque a coisa assim, bombou né,
popularmente falando na reunião e a SEDUC não conseguiu nem terminar a
pauta. (Entrevista Coord. Pedagógica Escola B).
Outro programa apontado pelas duas Escolas como voltado à melhoria da qualidade do
ensino é o Mais Educação. Este é um programa interministerial de ação conjunta do MEC,
Ministério dos Esportes, Ciência e Tecnologia, Cultura, entre outros. De acordo com o
documento orientador divulgado pela Secretaria de educação Continuada, Alfabetização e
Diversidade - SECAD, o Mais Educação é uma estratégia que
[...] promove a ampliação de tempos, espaços, oportunidades educativas e o
compartilhamento da tarefa de educar entre os profissionais da educação e de
outras áreas, as famílias e diferentes atores sociais, sob a coordenação da
escola e dos professores. Isso porque a Educação Integral, associada ao
333
processo de escolarização, pressupõe a aprendizagem conectada à vida e ao
universo de interesse e de possibilidades das crianças, adolescentes e jovens.
(BRASIL, s.d, p. 07)
Neste programa os recursos também são depositados em contas específicas e
administrados pelo diretor e pelo Conselho Escolar. Dentre todos os programas mencionados
pelos entrevistados, o Mais Educação foi apontado como o mais promissor no que se refere à
sua contribuição para a melhoria da qualidade do ensino, conforme indicam as afirmações de
nossos entrevistados:
O Mais Educação é um programa de muita relevância para corroborar o
processo de ensino aprendizagem, principalmente porque o foco do
programa é detectar aqueles alunos que na nossa concepção, escola, estão em
vulnerabilidade social, ou seja, eles vivem em um ambiente onde houve a
ruptura familiar, ou seja, o pai separou da mãe, a mãe separou do pai, ou
vivem com a avó, ou vivem com o tio, ou seja, com alguém que não sejam
os pais verdadeiramente dessas pessoas. E aí obviamente que essas pessoas
não tem essa preocupação como se fossem o pai e a mãe efetivamente.
Porque nós já fizemos um levantamento estatístico e isso é fato aqui na nossa
escola, que todos os alunos que causam problema no ambiente escolar, a
gente vai fazer uma pesquisa, um levantamento e detecta que esse aluno, ele
vive em uma família rompida, desestruturada. Já os outros que têm os pais
que vivem no mesmo domicílio são alunos tranquilos, estudiosos. [...] Então,
o programa ele veio para combater esse tipo de situação. (Entrevista Diretor
Escola B).
É um programa belíssimo, só que as escolas no Brasil elas não tão em
condições de ter esse programa. Pode ser que as novas escolas que vão ser
construídas consigam. Mas as que já são têm que passar por reformas. O
nosso Mais educação aqui, onde que funciona? Deveria ter uma sala pra
trabalhar a questão do xadrez, aí na outra sala trabalhava outra oficina. A
gente trabalha nos pátios. (Entrevista diretora da Escola A).
A escola não tem estrutura, não tem espaço físico para os alunos
passarem o dia todo, não tem onde esses alunos tomarem um banho,
onde trocarem de roupa, material mesmo. (Entrevista Vice-Diretora da
Escola B)
Inicialmente é preciso considerar a importância dada pelos gestores a um programa
que se propõem a atender aos estudantes em outro horário, como a grande esperança de
melhoria da aprendizagem e do comportamento dos alunos. Isso indica o quanto as escolas
ainda acreditam que o baixo rendimento é decorrência de fatores externos à sala de aula.
Outro aspecto a destacar são as limitações apontadas pelos profissionais nas condições
estruturais das escolas para que o programa Mais Educação possa ser desenvolvido com a
qualidade que se propõe. Faltam espaços físicos, condições materiais e também recursos
334
humanos capacitados, conforme indica outro trecho da entrevista realizada na escola B com a
coordenadora Pedagógica, pois a proposta do programa é trabalhar oficinas pedagógicas
ministradas por estagiários das instituições de Ensino Superior ou com profissionais da
própria comunidade.
Eu acho o seguinte: as coisas na educação acontecem assim de repente, vem
o pacote e joga dentro da escola, então você não é orientada como trabalhar,
os objetivos do programa não ficam claros pra gente, os recursos que vem
não são aplicados como deveriam ser porque falta recurso humano
capacitado e você fica correndo não sabe onde encontrar. A escola não
oferece espaço adequado para determinadas atividades, então acaba que o
programa que tinha o objetivo de ajudar a melhorar não consegue, vem mais
trabalho. (Entrevista Coordenadora Pedagógica da Escola B).
O que os dados indicam é que os mesmos programas estão em desenvolvimento em
ambas as escolas e que os critérios utilizados para sua implementação não são os dados
obtidos nas avaliações externas e nem os índices do IDEB. Ou seja, os recursos são
repassados tomando-se em conta o número de alunos atendidos pela escola, o número de salas
de aula disponíveis e a apresentação ou não de projetos que justifiquem a liberação do
recurso.
Entretanto, a diretora da Escola A esclarece que, na última aferição do IDEB, sua
escola alcançou um avanço significativo no índice de desenvolvimento, muito acima das
metas projetadas para o período. Isso levou a escola a receber uma bonificação em dinheiro.
Era pra tirar 3,4 nós fomos pra 4,8. Então o que aconteceu? Nós ganhamos
um certificado do MEC dizendo que houve empenho, que a escola alcançou
uma média superior à prevista por eles, e nós recebemos uma bonificação em
dinheiro, através do PDDE de R$ 1.369,00. Pra nós gastarmos na escola.
Isso foi uma bonificação que nós tivemos. Um dinheiro a mais. Uma verba
federal pra gente comprar, material pedagógico ou capital, permanente.
A premiação da escola que obteve aumento significativo do IDEB evidencia a política
de competição entre as escolas da rede, inspirada na lógica de mercado.
As iniciativas de repassar recursos diretamente para a escola, deixando a esta
a tarefa de definir prioridades e, eventualmente, buscar fontes alternativas de
financiamento, têm sido implementadas há algum tempo. Em contrapartida,
isso aumenta sua responsabilização pelos resultados alcançados pelos alunos,
“isentando-se” os níveis hierárquicos superiores pelo eventual fracasso
destes nos testes sistêmicos. A educação passa a ser responsabilidade da
escola, cabendo à administração pública garantir um mínimo de recursos e
335
divulgar os resultados alcançados em cada uma delas. (OLIVEIRA, 2005, p.
30).
Quando a avaliação da qualidade do ensino se dá à distância apenas pela aferição dos
números do rendimento escolar perdem-se de vista os fatores que condicionam esses
resultados, ignorando-se que cada escola possui características culturais e organizacionais
muito distintas e que as soluções para a superação das dificuldades escolares serão diferentes
para cada uma dessas instituições. Como ocorreu com a Escola A. As razões apresentadas
pela diretora para o salto dado pela escola na elevação do IDEB passaram pelo trabalho
pedagógico diferenciado desenvolvido por uma única professora.
Na época, nós tivemos uma professora aqui e ela trabalhou com um projeto
dela mesma, que depois ela vendeu, por que a SEDUC não deixou que ela
continuasse desenvolvendo o projeto aqui, que era um projeto de leitura. [...]
Ela desenvolveu um projeto, e esse projeto era bem amplo. Ela trabalhava
raciocínio lógico, sabe?... Com a criança. E ela conseguiu durante esse ano
desenvolver um bom trabalho, foi isso que aconteceu aqui. [...] Ela não
trabalhava só num quarto ano, que agora é o quinto ano, ela trabalhava nos
dois, ela trabalhava português e a outra professora só trabalhava matemática.
Aí elas revezavam. [...] Foi um projeto muito bom. Isso desenvolveu muito
os alunos Aí, o que aconteceu: quando foi final do ano, a SEDUC não
aceitou que ela ficasse [...]. Mandamos pra representação, falamos da
importância, do que tinha ocorrido na escola, o benefício que isso tinha
trazido... Mas não deixaram, não! (Entrevista Diretora da Escola A).
A situação descrita pela diretora indica que um esforço centrado no trabalho
pedagógico foi o elemento mais importante para que a escola conseguisse melhorar o
aproveitamento dos alunos que se submeteram às avaliações no ano em que a escola melhorou
seu índice de desenvolvimento. Entretanto, os resultados obtidos pela professora não foram
suficientes para que ela fosse mantida na função, apesar das solicitações da escola.
5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS
Quando consideramos os objetivos estabelecidos pelos diferentes programas de
avaliação e mais especificamente do ranking construído pelos diferentes indicadores que
resultam no IDEB, todos eles apontam que os dados devem contribuir para o direcionamento
de investimentos para a melhoria das condições de funcionamento das escolas, com vistas à
elevação dos índices e consequentemente da qualidade do ensino.
336
Entretanto, os dados obtidos indicam que as avaliações externas têm sido instrumento
de gerenciamento dos resultados obtidos pelas escolas a partir dos investimentos dos recursos
financeiros encaminhados para as unidades escolares por meio de programas de
descentralização dos recursos e da gestão.
Assim, os governos estadual e federal têm repassado para as escolas a
responsabilidade pela manutenção da educação por meio da transferência de recursos
financeiros, claramente insuficientes para a manutenção de uma educação de qualidade. Além
disso, outros elementos do processo educacional não têm sido considerados na oferta de uma
educação de qualidade, tais como a inadequação dos espaços físicos, a remuneração dos
profissionais e a falta de funcionários para atuar nas diferentes funções no interior das escolas.
A política educacional brasileira precisa fazer valer o que estabelece a Constituição e a
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional quando afirmam que o acesso a uma
educação de qualidade é um direito de todos os cidadãos. Com disputas entre instituições, não
será garantido este direito, uma vez que a lei de mercado é atender aos que têm mais recursos
e não a todos os que necessitam.
REFERÊNCIAS
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<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituição/constituição.htm>. Acesso em 20 dez.
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337
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338
FEIÇÕES DA VIOLÊNCIA INSTITUCIONAL EM CRIANÇAS INDÍGENAS NAS
ESCOLAS PÚBLICAS URBANAS DO ESTADO DE RONDÔNIA NA PERSPECTIVA
DE SEUS FAMILIARES
Rozane Alonso Alves73
Josélia Gomes Neves74
RESUMO
Esta pesquisa trata dos resultados do estudo desenvolvido no âmbito do projeto: Lápis,
caderno, flecha e preconceito: feições da violência institucional com crianças indígenas em
escolas públicas urbanas de Rondônia, que se desdobrou no subprojeto Feições da violência
institucional em crianças indígenas nas escolas públicas urbanas do estado de Rondônia na
perspectiva de seus familiares. O objetivo central foi “Levantar e analisar por meio de
entrevistas com as famílias indígenas dos estudantes participantes da pesquisa, ocorrências
por elas interpretadas como violência da e na escola”. Vale ressaltar que trata-se de apenas um
dos objetivos do Projeto Matriz, visto que além das famílias indígenas, os próprios estudantes
indígenas, docentes, coordenadores e coordenadoras pedagógicas, além da direção das
escolas, atuaram como colaboradores da pesquisa. As atividades principais foram: leituras
sobre a temática, seminários locais, pesquisa de campo e sistematização do estudo.
Palavras-Chave: Violência Institucional Escolar. Crianças Indígenas. Perspectiva Familiar.
ABSTRACT
This research deals with the results of the study developed under the project: Pencil,
notebook, arrow and prejudice: features of institutional violence in indigenous children in
urban public schools of Rondônia, which unfolded in subproject Features of institutional
violence in indigenous children in urban public schools in the state of Rondonia in the
prospect of their families. The central objective was to "lift and look through interviews with
the families of Indigenous students participating in the research, which they interpreted as
instances of violence and at school." Note that this is just one of the goals of Project Matrix,
as well as indigenous families, their own indigenous students, teachers, coordinators and
pedagogical coordinators, and the direction of schools, acted as collaborators in the research.
The main activities were: reading on the subject, local seminars, field research and systematic
study.
Keywords: Institutional Violence School. Indigenous children. Family Perspective.
73
Bolsista do PIBIC/UNIR/CNPQ, acadêmica do curso de Pedagogia, email: [email protected]
Profª. Dra. Do curso de Pedagogia, Departamento de Ciências Humanas e Sociais da Fundação
Universidade Federal de Rondônia, Campus de Ji-Paraná. Email: [email protected]
74
339
VIOLÊNCIA INSTITUCIONAL ESCOLAR E O PAPEL DA ESCOLA
Conceituar a violência escolar e delimitar sua compreensão nos termos “da e na”
escola, significa ao mesmo tempo identificar os meios ao qual se constroem os espaços como o seio familiar, institucional e social, de interação entre os sujeitos envolvidos neste
ambiente. Não é sempre que estes meios estão e são identificados por aqueles considerados
capazes de intervir e interagir com as diversas situações vivenciadas no cotidiano destes
ambientes. As identificações ressaltadas nestes escritos estão relacionadas relações sociais
produzidas pelos sujeitos participantes nestes ambientes.
Organizar um espaço que seja destinado a produzir reflexões sérias e sistematizadas
quando o assunto se refere ao respeito do outro na construção deste outro como sendo também
o sujeito que participa do meio ao qual está inserido, nem sempre são possíveis. Poder-se-ia
dizer que a escola é o ambiente destinado a esta produção. No entanto, a instituição de ensino,
atualmente sente dificuldade em direcionar o processo de ensino e aprendizagem para ação
voltada a criticidade, construtivo, interativo, e a autonomia na construção dos sujeitos
inseridos neste processo.
Não é fracasso escolar, mas a própria negação por parte da gestão, docência, políticas
públicas e demais profissionais da educação na significação que as crianças inseridas no
ambiente escolar terão em relação a criticidade e ao respeito de si e do outro, bem como
reconhecer as alteridades culturais existentes neste meio. A Violência institucional escolar
nasce também da hostilização da existência destes sujeitos no espaço escolar.
É possível perceber esta hostilização nos escritos de Abramovay (2002) que segundo a
autora vários estudos vem sendo desenvolvidos com o intuito de compreender como a
violência institucional escolar, uma vez que esta violência não está vinculada somente a
questão da criminalidade, mas também sua relação com que questão da exclusão social,
miséria, ao desamparo político, tendo em vista sua desagregação social relacionadas com a
exclusão social e institucional.
Desta forma, o que determina a violência, sobretudo a institucional é o desrespeito, a
coisificação, a negação do outro, a violação dos direitos humanos, fatos estes que se somam a
uma realidade social de miséria, exclusão, corrupção, desemprego, concentração de renda,
poder e autoritarismo. No que se refere à violência institucional escolar, observamos suas
340
evidências no cotidiano da escola uma vez que reflete em seu interior as próprias contradições
da sociedade, respaldando-se na desigualdade social, nas diferenças culturais75.
Autores como Bourdieu e Passeron (1975) já desenvolviam estudos relacionados a
problemática em questão, e ressaltam que toda ação pedagógica exercida pelo sistema de
ensino se constitui em uma violência simbólica. Para os autores esta violência se condiciona
por meio de duas subdivisões: “inculca um conteúdo cultural arbitrário e exerce a ação
pedagógica por um poder autoritário que reproduz interesses dos grupos dominantes. A
educação escolar, assim, além de reproduzir a cultura dominante, contribui para a perpetuação
da desigualdade social, pois não propicia às classes populares um acesso igualitário à
educação”. Os autores evidenciam que o processo educacional não deve reproduzir ações
centradas em uma única característica cultural, mas levar em consideração todas as alteridades
existentes no espaço escolar.
Diante do que foi exposto, fica evidente que a violência institucional segundo os
escritos de Chauí (1999) são compreendidas como a violência exercida no âmbito dos
serviços públicos, seja por ação ou omissão, uma vez que a mesma possa envolver a falta de
acesso a estes serviços e sua má qualidade para os seus usuários, tendo em vista que sua
distribuição ocorre de formas assimétricas, tais como abusos de poder nas relações existentes
entre os atores que a constitui. Caracterizando a transgressão da integridade física e psíquica,
da dignidade humana das pessoas. Trata-se de um evento realizado pelas instituições que
ocasionam dano a outrem, sobretudo em função da desigualdade social.
Relacionando a conceitualização do termo violência institucional escolar na
perspectiva dos e das estudantes indígenas - como é o caso deste estudo, observa-se que:
A constante busca de refinamento metodológico e conceitual que se nota nos
estudos de contato interétnico, ainda que possa ser considerada como o
processo natural de desenvolvimento de qualquer ciência, pode ser
considerada também e sobretudo como o resultado da perene frustração dos
etnólogos em bem compreender a estrutura e a dinâmica das relações entre
povos de etnia distinta, inseridos numa situação determinada: a situação de
contato. (OLIVEIRA, 1996, p.33)
Estas situações de contato dentro do espaço escolar, ocorrem diariamente e em sua
maioria de forma agressiva - fisicamente e simbolicamente falando, tendo em vista o
75
Texto retirado do Projeto intitulado Lápis, caderno, flecha e preconceito: feições da violência
institucional com crianças indígenas em escolas públicas urbanas de Rondônia, desenvolvido pelo GPEA na
UNIR, Campus de Ji-Paraná no período de 2011-2012.
341
não conhecimento da cultura e dos costumes dos e das estudantes indígenas inseridas
nas escolas públicas urbanas. Em outras palavras,
A intervenção, no aspecto que poderia ser considerado como educação
escolar, esteve pautada nesta perspectiva sobre o outro, seja no sentido de,
com a instrução, tirá-lo da condição de selvagem, seja negando a ele o
acesso a instrumentos que o permitissem conquistar a liberdade [...] é
preciso ter presente o histórico de desprezo dos brasileiros pelo índio, para se
ter respeitadas algumas especificidades socioculturais, refletidas nas
conquistas políticas, particularmente a educação escolar, fundamentada no
respeito à cultura do povo a quem se destina. (DALMOLIN, 2004, p. 81, 82,
84)
Estas situações dentro dos espaços escolares são consideradas, e como também já foi
contextualizada, como violência institucional escolar, onde há a negação do outro, mesmo
havendo sua existência confirmada. A aceitação destas situações estabelecem o domínio de
poder, entre a sociedade ocidental - considerada a organização correta dos sujeitos, e as
comunidades indígenas - sendo esta, a formação primitiva de atores primitivos.
Diante todos os fatores supracitados, é preciso ter em mente que a violência
institucional cometida dentro do processo escolar são reedições e estratégias históricas vivenciadas na catequização do índios pelos padres jesuítas e na própria colonização existente
na formação do Brasil, para manter sujeitos em questão em condição social inferior,
minoritária e consequentemente subalternizado.
METODOLOGIA DE ESTUDO
Para suscitar os resultados desta pesquisa, optou-se pela abordagem qualitativa que
segundo Minayo (2010, p. 16) se “[...] inicia por uma questão, por um problema, por uma
pergunta, por uma dúvida. A resposta a esse movimento do pensamento geralmente se vincula
a conhecimentos anteriores ou demanda a criação de novos referenciais”. Neste sentido,
questionou-se: na perspectiva das famílias indígenas dos estudantes participantes da pesquisa,
há ocorrências por elas interpretadas como violência da e na escola?
Deste modo, foi elaborado um plano esquemático, subdivido em três níveis. No
primeiro nível, foram desenvolvidas revisões de livros e artigos relacionados à problemática
em questão - violência institucional escolar. O segundo nível destaca a pesquisa de campo,
tendo como base as visitas e entrevistas recorrentes segundo os escritos de Zanelli (2002),
com as famílias dos estudantes inseridos neste processo. O terceiro nível deste estudo
342
implicará a análise dos dados, tendo em vista compreender como a violência institucional das
escolas públicas urbanas vem se manifestando no município pesquisado no que se refere a
visão de indígenas urbanos.
ANÁLISE DOS DADOS OBTIDOS
Durante a coleta de dados, o que mais chamou a atenção foram os relatos dos
participantes em relação ao comportamento da escola, entendida neste estudo como docentes,
gestores, secretários e todo corpo que compõe os profissionais da educação. As entrevistas
demonstram que as escolas, em sua maioria, ignoram a participação de estudantes indígenas
no processo de ensino e aprendizagem, tendo em vista que a aceitação da matrícula é apenas a
inclusão destas crianças na instituição de ensino e não sua inserção com o processo
democrático de ensino, uma vez que “a escola nem acha que eu sou índia, eles falam que eu
pareço mais japonesa. Mas quando eles falam eu digo que sou indígena”(E2/ C.I). Estas ações
segundo Dalmolin (2004, p.138) “teve e tem como finalidade interferir na identidade cultural
destes povos, dada a concepção etnocêntrica em que se sustentam seus objetivos.”
Outro fator é a não problematização das novas identidades culturais dentro do espaço
escolar e o desconhecimento da gestão institucional em reconhecer e desenvolver, nas
questões pedagógicas, ações que possibilite, bem como proporcione tanto aos estudantes
indígenas e não indígenas como os profissionais da educação, compreender, orientar e
relacionar as alteridades existentes e os fatores sociopolíticos e culturais que envolvem a
temática em questão. Percebe-se, a princípio, que a escola não trabalha com a construção das
alteridades culturais, tendo em vista que:
Observamos neste estudo é a negação da criança indígena dentro do espaço escolar por
meio de estereótipos físicos - em relação a instituição dizer que a estudante indígena é
asiática, e a afirmação de políticas inexistentes por parte da escola. O que se observa nestas
primeiras entrevistas é desconexo entre a função da escola em orientar o reconhecimento de si
e do outro como sujeito resultante e participante do mesmo meio social, bem como a
construção deste auto reconhecimento.
Diante do que foi exposto, verificamos junto as análises das entrevistas obtidas por
meio do trabalho de campo desenvolvido com os familiares das crianças indígenas das escolas
públicas urbanas do município de Ji-Paraná - RO que há um distanciamento entre as
realidades destas crianças e o espaço escolar. Outro fator que pode ser verificado é como os
343
responsáveis lidam as situações de violência institucional escolar apresentada até o presente
momento, tendo em vista que as falas dos e das participantes da pesquisa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As análises das pesquisas obtidas no estudo bibliográfico e no trabalho de campo
desenvolvido com os familiares das crianças indígenas das escolas públicas urbanas do
município de Ji-Paraná - RO estão nos fazendo compreender que há um distanciamento entre
as realidades destas crianças e o espaço escolar. Outro fator que pode ser verificado é como os
responsáveis lidam as situações de violência institucional escolar apresentada até o presente
momento, tendo em vista que as falas dos e das participantes da pesquisa.
Outro fator ressaltado nestes resultados preliminares é a negação da criança indígena
dentro do espaço escolar por meio de estereótipos físicos - em relação a instituição dizer que a
estudante indígena é asiática, e a afirmação de políticas inexistentes por parte da escola. O que
se observa nestas primeiras entrevistas é desconexo entre a função da escola em orientar o
reconhecimento de si e do outro como sujeito resultante e participante do mesmo meio social,
bem como a construção deste auto reconhecimento.
O estudo sugere a necessidade de continuidade e aprofundamento da temática tendo
em vista a necessidade de esclarecer alguns dados coletados. Vale ressaltar que este estudo
busca compreender como os estudantes indígenas se desenvolvem ao passo em que o mesmo
apropria sua identidade dentro do processo de coletividade.
REFERÊNCIAS
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BOURDIEU, P; PASSERON, J. C. A reprodução. Elementos para uma teoria do sistema
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OLIVEIRA, Roberto Cardoso de. O índio e o mundo dos brancos. Campinas, SP: Editora
UNICAMP, 1996.
DALMOLIN, Gilberto Francisco. O papel da escola entre os povos indígenas. Rio Branco:
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344
MINAYO, Maria C. S(org). Pesquisa Social: teoria, método e criatividade. Petrópolis:
Vozes, 2010.
ZANELLI, J. C.. Pesquisa Qualitativa em estudo da gestão de pessoas. Estudos de
Psicologia. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script =sci_arttext&pid=S1413294X2002000300009&lng=pt&nrm=isso. Acessado em Fevereiro de 2011.
345
LITERATURA INDÍGENA E OS MITOS YANOMAMI: UM ESTUDO
COMPARATIVO DAS OBRAS MITOPOEMAS YANOMAMI E NARO, O GAMBÁ MITOS DOS ÍNDIOS YANOMAMI
Sebastiana Pereira dos Santos
Programa Institucional de Iniciação Científica - PIBIC/UNIR/CNPq
Orientadora Profa Dra Cynthia de Cássia Santos Barra
Universidade Federal de Rondônia - UNIR
RESUMO
Os índios brasileiros foram introduzidos de diversas formas na literatura brasileira, mas, nos
últimos trintas anos, temos tido a oportunidade de apreciar essa temática por meio da voz e do
olhar dos próprios indígenas. Obras de autoria indígena e obras produzidas em coautoria com
indígenas entraram no circuito literário brasileiro e estão constituindo o seu próprio público.
O estudo comparativo das obras Mitopoemas Yanomami (1978), produzido a partir de um
projeto editorial coletivo, e Nar-o gambá: mitos dos índios yanomami (1986), uma adaptação
de Ciça Fittipaldi para a chamada literatura infantil brasileira, permite-nos entender um
momento importante dessa passagem dos temas indígenas tratados como objetos de estudo
folclóricos ou científicos ao aparecimento da figura do autor indígena na contemporaneidade.
A experiência de autoria indígena, certamente, aponta para significativas transformações nas
formas de inscrição e de representação literária de temática indígena. Nas páginas do livro
Mitopoemas Yanomami, por exemplo, foram preservados os aspectos da oralidade e isso não
deve ser tomado somente como registros espontâneos das falas coletadas: há ali uma produção
intelectual, realizada em coautoria (povo indígena e artistas não indígenas), sob a perspectiva
da transcrição/transcriação literária. Diante do exposto, esta comunicação pretende propor
uma reflexão teórica acerca da introdução da escrita e da cultura do impresso na etnia
Yanomami, propiciando uma melhor compreensão das condições de produção, difusão e
recepção da literatura indígena na contemporaneidade.
Palavra-Chaves: Literatura de autoria indígena. Mitopoemas Yanomami. Estilo Yanomami.
ABSTRACT
Brazilian Indians were introduced in various forms in Brazilian literature, but in last thirty
years, we have had the opportunity to enjoy this theme through the voice and the look of the
Indians themselves, as works of indigenous authorship and works produced in co-authoring
with indigenous entered Brazilian literary circuit and are forming their own audience. The
comparative study of the works Mitopoemas Yanomam (1978) in co-authorship and Nar-o
Gambá: myths of the Yanomami Indians - an adaptation to the called Brazilian children's
literature, allows us to understand an important moments: the passage of indigenous issues
treated as scientific objects of study as folklore and the appearance of the figure of the Indian
346
author. The experience of indigenous authorship, certainly points to changes in the forms of
literary representation and inclusion of indigenous issues. In the pages of the book
Mitopoemas Yanomam, for example, were preserved aspects of orality and this should not be
taken only as records of spontaneous speech collected. Is there an intellectual production, held
in co-authoring (indigenous people and non-indigenous artists), from the perspective of
transcription / transcreation literary. This article proposes a theoretical reflection about the
introduction of writing and culture of the Yanomami ethnic printed on, allowing a better
understanding of the conditions of production, dissemination and reception of literature in
contemporary Indian.
Key word: Literature of indigenous authorship. Mitopoemas Yãnomam. Yanomami Indians.
Style. Speaking. Transcription / transcreation.
INTRODUÇÃO
Entre muitas conquistas sociais e políticas asseguradas na Constituição Federal do
Brasil de 1988, os indígenas, através da garantia de programas de educação diferenciada e
específica, têm aprendido a lidar com a prática da escrita alfabética. Dessa forma, os índios
saíram da posição de figurantes nas produções textuais e, passo a passo, vêm se configurando
como autores de suas próprias histórias. Hoje é possível dizer que os escritos indígenas
participam da cultura do impresso, constituindo não só acervos documentais, mas também
acervos de teor estético com a publicação de textos criativos ou literários. As produções
estéticas estão sendo consumidas não só no contexto do processo educacional, como também
pela sociedade brasileira, inclusive já fazem parte de acervos de Universidade Federais
(MATOS, 2011, p 04). Com as novas condições, os povos indígenas assumem um novo
posicionamento, já que, agora, o próprio índio fala sobre si, desmitificando muitas concepções
estereotipadas e folclóricas a que estiveram submetidos por não terem voz perante a sociedade
ocidental. A partir da experiência de autoria indígena é possível considerar que esse perfil está
sendo remodelado, visto que “através da escrita e publicação de suas narrativas, de seus
cantos e de suas poesias, os índios agora ensaiam uma nova forma de figurar na história”
(ALMEIDA & QUEIROZ, 2004 p. 233).
A literatura de autoria indígena no Brasil pode ser tomada com uma das novas formas
do discurso indígena. Se como fenômeno cultural ainda é recente, por outro lado, a produção
literária de autoria indígena já se tornou significativa para os estudos literários, pois “não seria
impertinente incluir a produção literária dos índios brasileiros na retomada da discussão sobre
sujeito, representação e estilo, no âmbito da literatura brasileira, em função da crítica literária”
(ALMEIDA & QUEIROZ, 2004 p. 233).
347
Ao longo da pesquisa, tivemos por objetivo pensar qual o lugar ocupado pela obra
Mitopoemas Yãnomam (1978) em relação ao movimento literário de autoria indígena
emergente no Brasil; bem como trilhar um caminho que visasse mapear como vem se
materializando historicamente e esteticamente a literatura de autoria yanomami. Para realizar
o percurso crítico almejado por nós, estruturamos nosso trabalho em três momentos: 1º) breve
panorama dos dados encontrados em pesquisa bibliográfica relativa à relação dos Yanomami
com a cultura do impresso; 2º) uma revisão bibliográfica sobre o movimento literário
indígena; 3º) por fim, análise comparativa das obras Mitopoemas Yãnomam (1978), escrito
em co-autoria, e Naro, o Gambá: mitos dos índios yanomami (1986), de Ciça Fittipaldi
METODOLOGIA
Em conformidade com o Plano de Trabalho da coordenadora do Projeto gerador, as
fontes de pesquisa abrangidas aqui são estritamente de cunho bibliográfico. Não estão
previstas pesquisas de campo, coletas de narrativas em comunidades indígenas ou realização
de entrevistas com escritores indígenas. Todo o material dessa espécie que porventura nos
sirva de fonte e objeto de estudo virá de pesquisas bibliográficas em bibliotecas físicas e
virtuais, de consulta a acervos públicos e/ou privados, e à rede web.Em relação ao tratamento
crítico a ser conferido aos livros escolhidos como objetos das análises literárias propostas no
presente Plano de Trabalho, será realizado um levantamento das características gerais dos
livros selecionados para análise, ou seja, será feita reflexão teórica sobre a prática discursiva,
os conteúdos específicos, os gêneros utilizados e a proposta estética neles existentes,
articulando e problematizando essas características tanto em relação ao saber indígena
tradicional quanto ao saber científico concernente à Teoria Literária contemporânea,
sobretudo aquela que se faz em diálogo com a corrente crítica francesa pós-estruturalista. Em
relação ao corpus constituinte das bibliotecas físicas e virtuais a serem consultadas a fim de
montar o banco de dados previsto neste projeto, optou-se, neste momento, por privilegiar as
bibliotecas virtuais universitárias, os periódicos científicos open access e os bancos de dados
virtuais de Organizações Não-Governamentais Indígenas (ONGs), em razão da dificuldade
financeira para deslocamentos físicos da pesquisadora-coordenadora e de sua equipe de
trabalho
348
Principais resultados da pesquisa bibliográfica
Os resultados aqui apresentados terão por base a classificação dos dados coletados nas
bibliotecas virtuais de Universidades Federais: do Amazonas (UFAM), Roraima (UFRR),
Minas Gerais (UFMG), Brasília (UNB), Rondônia (UNIR), Acre (UFAC), São Paulo (USP) e
Organizações de apoio a etnia Yanomami, como o site da Comissão Pro-Yanomami. Neste
resumo, apresentaremos apenas os Gráficos 1 e 2, os demais constam do Relatório Final.
Gráfico 1 - Apresenta a classificação por grupos de autoria de todos os dados coletados
Através da pesquisa nas bibliotecas, contatamos que os Yanomami não produziram
muito desde 1978, quando foi elaborada a obra em co-autoria Mitopoemas Yanomami. Desde
a elaboração desta obra, não foi possível constatar registros de produções em co-autorias.
Conforme o gráfico 1, as produções em co-autoria e autoria indígena juntas
correspondem a menos de 6% (seis por cento) das referências coletadas, totalizando cerca de
7 (sete) produções. As produções de autoria yanomami chegam a mais de 4% (quatro por
cento) dos dados coletados, o que representa dados animadores. Não houve registros desse
tipo de manifestação até a década 1990, mas, a partir daí, é possível pensar que tais produções
escritas tenham se tornado uma prática da etnia.
As produções de autoria não indígena sobre os Yanomami correspondem a pouco mais
de 94% (noventa por cento) dos dados coletados. Além da obra de literatura infantil sobre a
mitologia indígena: Naro-o Gambá: mitos dos índios yanomami e a obra literária: A criação
do mundo segundo os índios ianomâmi, tais produções, em sua maioria, são resultados de
349
pesquisas antropológicas e sociais, históricas, geográficas, medicinais etc., já que essa etnia
oferece dados para estudos nessas áreas, devido ao conturbado processo de contato.
Em relação às particularidades das produções de autoria indígena, vejamos o gráfico
seguinte.
Gráfico 2 - Apresenta a distribuição da autoria Yanomami por diferentes categorias autorais
O gráfico 2 demonstra a forma de produção textual dos Yanomami. As produções de
autoria individual e coletiva somam 6 (seis) produções, e apenas 1 (uma) delas é de autoria
coletiva.
Os resultados de autoria indígena coletiva não são muito estimuladores, pois
encontramos apenas 1 (uma) produção. A produção de autoria coletiva não é literária, e sim
uma carta de caráter político-governamental, encaminhada ao Governo Federal, na qual a
comunidade requer medidas urgentes no sentido da demarcação definitiva de suas terras. O
objetivo desse tipo de produção é chamar atenção para os direitos indígenas, fazendo parte,
portanto, de um movimento político.
As produções de autoria individual representam a maioria das produções de autoria
yanomami, cerca de 83% (oitenta e três por cento). Estes textos são todos de autoria do líder
da etnia Yanomami, Davi Kopenawa Yanomami. Os textos escritos de Davi Kopenawa
requerem uma problematização específica, pois contam com o apoio do antropólogo Bruce
Albert, que atua como escriba numa parceria intelectual que dura mais de trinta anos. Davi
Kopenawa não possui domínio da escrita alfabética. Assim, foi muito interessante observar,
nas fichas catalográficas consultadas, que todas essas produções individuais apresentam Davi
Kopenawa como autor e o antropólogo, responsável pela transcrição do texto oral, apenas
350
como tradutor. Casos como esses nos quais há um trabalho conjunto de indígenas e não
indígenas, por vezes, produzem impasses e/ou equívocos no momento da atribuição de
autoria. Como afirma Franca e Chagas:
Para serem reconhecidos como criadores de suas obras, os índios não
devem apenas transcrever uma narrativa contada oralmente e
tampouco os organizadores não indígenas devem receber créditos de
autoria principal, ignorando os casos de autoria coletiva indígena.
(Franca e Chagas, 2010, p.09)
Na maioria das vezes, os textos de autoria individual Yanomami
encontrados apresentam narrativas míticas ou históricas com aspectos
comuns aos membros da comunidade, caracterizando-se como uma
memória coletiva (cultura, costumes, mitos, organização social e
política, história Yanomami). Tal como afirmado por Almeida: “A
escritura é coletiva porque é expressão do que é comum, ou de um
consenso em torno do ‘quem somos’” (ALMEIDA, 2004, p. 197).
Principais resultados da pesquisa bibliográfica
A inter-relação de Mitopoemas Yãnomam e Naro - o gambá: mitos dos índios yanomami
na construção de um estilo yanomami
As obras Mitopoemas Yãnomam e Naro - o gambá: mitos dos índios yanomami
reproduzem uma mesma temática dentro de um mesmo campo do saber, mas provocam
efeitos diferentes.
O potencial da obra Mitopoemas Yãnomam se ancora no projeto editorial. O desejo de
mostrar um produto criativo dos índios yanomami foi levado às últimas consequências nesta
obra para não só disseminar a cultura yanomami, mas também para aproximar o leitor
ocidental de uma escrita que tivesse uma lógica específica. Isto é, não bastava somente
conhecer a cultura yanomami através dos mitos, era preciso lançar um novo olhar para a
alteridade cognitiva e estética dos indígenas. Assim, cada detalhe da construção da obra,
como o tamanho, a forma de ilustração, a falta de paginação e etc., são importantes para se
alcançar tal objetivo:
A construção da página, desde a definição do tipo, seu desenho, tamanho e
espaçamento entre as letras, palavras e linhas, bem como a delimitação da
mancha, influencia enormemente a leitura de um livro, podendo muitas
vezes desanimar o leitor ou encorajá-lo a continuar. (MACHADO, 2012, p.
57)
351
Já a obra Naro - o gambá: mitos dos índios yanomami não busca, especificamente,
promover o potencial criativo yanomami. Ancora sua maior força no papel político
desempenhado pela publicação dos mitos em relação à defesa da causa indígena. Contudo, o
fato de mitos indígenas estarem numa literatura direcionadas ao público infantil contribui
também para fortalecer as concepções que tratam a representação indígena como produtos
inferiorizados e/ou infantis, principalmente pelo constante imposição de desenhos e
grafismos:
Esses especialistas, bem preparados e bem intencionados, não têm, no
entanto, considerando com seriedade, as representações culturais nãoverbais criadas pelos professores indígenas e seus alunos,
classificando essas representações como mera ilustração e expressão
da alegria e atitude infantil dos povos indígenas. (THYAGO, 2007, p.
21).
Dessa forma, Naro - o gambá: mito dos índios yanomami produz efeitos de leitura já
esperados em uma literatura infantil tradicional. Possui características clássicas de uma
narrativa em prosa, com a presença da personificação e maior atenção para as ilustrações
gráficas. Mitopoemas Yãnomam, também lançando mão da mitologia indígena, de desenhos e
textos escritos, elimina qualquer possibilidade de ser consumida apenas por um público
infantil.
Diante das contribuições das duas obras para pensarmos em um estilo indígena
yanomami, relembremos que a obra Mitopoemas Yãnomam é fundamental para a construção
da literatura de autoria indígena na contemporaneidade. Então, diz Almeida, “através da
criação e da articulação de novas formas, eles [os povos indígenas] entram no circuito
literário” (ALMEIDA, 2004, p. 198), dando início a um movimento de literatura indígena.
Assim, na tentativa de reconhecer o estilo indígena, pensemos que, embora haja
especificidades nas obras que cada etnia produz, é possível definir um estilo indígena geral.
Almeida (2004) afirma:
A proposta de um estilo indígena na literatura brasileira se fundamenta
no princípio da dessubjetivação: o sujeito se perde no estilo e se
reencontra por algum traço, quando a cultura se torna realmente
importante. (ALMEIDA, 2004, p. 201).
A dessubjetivação, sem dúvida, é um ponto de reflexão do estilo literário nas obras de
literatura de autoria indígena. Pensando na proposta da autora, também aposto no texto
352
multimodal, sobretudo em Mitopoemas Yãnomam, como configuração do estilo da autoria
indígena na literatura. Amanda Machado (2012) defende, em sua dissertação de mestrado, a
presença do texto gráfico-textual como recurso estilístico próprio da literatura de autoria
indígena produzida hoje no Brasil (MACHADO, 2012, p. 55).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo da escrita indígena como um olhar estético, sem dúvida, é um trabalho
delicado. Há nesse tipo de produção todas as complexidades possíveis de um objeto em sua
primeira fase de conhecimento. O estudo de uma obra que é diferente de tudo que já é de
nosso conhecimento leva a questionamentos comuns:
Como ler uma literatura que não se enquadra nos padrões conhecidos? Como
sistematizar essa leitura? Se a proposta é levar essa literatura para a
faculdade de letras, como torná-la objeto de reflexões acadêmicas? Como
ver o que ainda não se sabe? Como deixar existir o que ainda não se
nomeou? (ALMEIDA, 2004, p. 236).
Estamos acostumados a lidar com estudos comparativos entre estéticas provenientes
de um mesmo meio social, político e cosmológico. Diante da literatura de autoria indígena,
temos a percepção que estamos diante de algo fantástico e misterioso aos leitores. Contudo,
como críticos, nós temos a sensação de não possuirmos conhecimentos suficientes para
finalizar esse estudo. As armas dos estudos literários que temos parecem não ser capazes de
satisfazer as necessidades da escrita criativa dos indígenas.
Com esta pesquisa pudemos constatar que as visões etnocêntricas não podem ser
completamente afastadas e é em diálogo com diferentes visões que a literatura de autoria
indígena mostra-se expressiva, específica e desafiadora.
REFERÊNCIAS
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oral no Brasil. Belo Horizonte, Autêntica e FALE/UFMG, 2004.
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BICALHO, Charles. Yãmîy maxakali: um gênero nativo de poesia. Belo-horizonte: Aletria,
2007.
353
FITTIPALDI, Ciça. Naro-O gambá: Mitos dos índios Yanomami. São Paulo:
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GRAÚNA, Graça. Literatura Indígena: desconstruindo estereótipos, repensando preconceitos.
Recife - UPE, 2011.
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GUIMARÃES, Sílvia. O drama ritual da morte nos Sanumá. Campo Grande: Tellus, 2010.
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Dissertação (Mestrado em Letras) - Faculdade de Letras da UFMG. Universidade Federal de
Minas Gerais, Belo Horizonte.
RISÉRIO, Antônio. Palavras canibais. Revista USP, São Paulo, n.13, p.26-43, mar./abr./mai.
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SOUZA, Lynn Mario T. Menezes de. As visões da anaconda: a narrativa escrita indígena
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THIÉL, Janice Cristine, QUIRINO, Vanessa Ferreira dos Santos. A literatura indígena na
escola: um caminho para a Reflexão sobre a pluralidade cultural. Coritiba: PCPR, 2011. In
ISIRSSE - EDUCERE.
VIDILLE, Wagner. Xamãs e os espíritos ancestrais. São Pulo; PEPSIC, 2006.
YANOMAMI. Davi Kopenawa. Sonhos das Origens. Revista povos indígenas do Brasil ISA, São Paulo. 1998.
AGRADECIMENTOS:
Ao PIBIC / CNPQ;
À Unir / Departamento de Línguas Vernáculas;
À Orientadora, Dra. Cynthia de Cássia dos Santos Barra
Aos meus companheiros de pesquisa;
À minha Família e Amigos.
CONTATOS
Orientando: Sebastiana Pereira dos Santos
E-mail: [email protected]
Orientador: Profª Dra Cynthia de Cássia dos Santos Barra
E-mail: [email protected]
354
AS RELAÇÕES SEMIFEUDAIS NO AMBIENTE ESCOLAR:
SE VOCÊ MANDA, EU OBEDEÇO!76
Silmara Ferreira Lopes77
Prof.ª Drª Marilsa Miranda de Souza78
Universidade Federal de Rondônia - UNIR
RESUMO
A pesquisa foi realizada nas escolas da Zona da Mata rondoniense e buscou analisar as
relações de poder no ambiente escolar. O método utilizado foi o materialismo históricodialético. A pesquisa apontou que as relações são determinadas pelo coronelismo que age
indiretamente por meio de coação ou da persuasão dos professores para se submeterem às
políticas educacionais ditadas pelo Banco Mundial/MEC, sob pena de perseguições por parte
do poder local. O trabalho dos professores é compreendido como semifeudal, uma vez que se
submetem às mais precárias condições de trabalho e emprego, não possuem autonomia
didático-científica, não possuem autonomia de gestão e se sujeitam aos processos mais rudes
de obrigação e servidão às políticas implantadas nas escolas e aos processos falseadores de
gestão democrática.
Palavras-chave: Semifeudalidade. Coronelismo. Políticas educacionais.
1 INTRODUÇÃO
O presente relatório final tem origem no desenvolvimento da pesquisa intitulada:
CAPITALISMO BUROCRÁTICO, POLÍTICAS EDUCACIONAIS E RELAÇÕES DE
PODER NA EDUCAÇÃO ESCOLAR EM RONDÔNIA financiada pelo PIBIC/UNIR (02
bolsistas) através do desdobramento de seu subprojeto: AS RELAÇÕES SEMIFEUDAIS NO
AMBIENTE ESCOLAR: SE VOCÊ MANDA, EU OBEDEÇO!
A pesquisa realizada por Souza (2010) sobre as políticas educacionais em educação
do campo levantou uma problemática que deu origem a essa pesquisa. Um dos aspectos desta
problemática é a relação de poder estabelecida no âmbito da escola nos últimos anos. As
políticas educacionais têm reforçado as relações de semisservidão dos professores no contexto
escolar, enfraquecido a gestão democrática e a construção de uma educação histórico-crítica e
76
Subprojeto da pesquisa Capitalismo Burocrático, políticas educacionais e relações de poder na
educação escolar em Rondônia, coordenada pela Prof.ª Drª Marilsa Miranda de Souza.
77
Graduanda em Pedagogia, Universidade Federal de Rondônia, Campus de Rolim de Moura, bolsista
PIBIC/UNIR.
78
Professora do Departamento de Educação, Universidade Federal de Rondônia, Campus de Rolim de
Moura.
355
as lutas em defesa da gestão democrática da escola pública? O objetivo desse subprojeto é
identificar os mecanismos de opressão a que são submetidos os profissionais da educação, as
relações autoritárias e semiservís existentes entre professores e gestores nos ambientes
escolares e suas consequências no processo de organização da produção na sociedade.
Para analisar o processo de implantação e a efetivação das políticas educacionais
aplicaremos o conceito de semifeudalidade. Uma das características da semifeudalidade é o
gamonalismo, que no Brasil chamamos de coronelismo. Segundo Souza (2010) é nas relações
coronelícias que se encontram as forças capazes de fazer uma determinação do Banco
Mundial ser cumprida por milhares de secretarias de educação do País, obrigando os
professores a aderirem aos programas e projetos formulados pelas agências multilaterais do
imperialismo.
Nosso trabalho está sendo realizado a partir de uma abordagem metodológica que
possibilita integrar a parte ao todo: o método do materialismo histórico dialético.
Essa metodologia possibilita encontrar as determinações fundamentais e secundárias
do problema. O método do materialismo histórico-dialético possibilita ir do fato empírico
(fenômeno) para o conceito e num movimento lógico o desvelamento das contradições
essenciais do fenômeno, se fixa na essência, no mundo real, no conceito, na consciência real,
na teoria e ciência (KOSIK, 1976, p.16).
A totalidade desta investigação consiste em 05 escolas públicas da rede estadual dos
municípios da Zona da Mata rondoniense supracitadas. Escolhemos 01 (uma) escola de cada
um dos cinco municípios que compõe essa região do Estado de Rondônia: Rolim de Moura,
Nova Brasilândia, Alta Floresta D’Oeste, Santa Luzia D’Oeste, Novo Horizonte D’Oeste. O
critério para a escolha dessas escolas foi o número de alunos. Escolhemos a maior escola de
cada um dos municípios em termos de número de alunos.
O presente trabalho apresenta os resultados referentes a três dos instrumentos de
coleta de dados que são: Análise documental, pesquisa bibliográfica e entrevistas individuais.
A pesquisa bibliográfica e os estudos teóricos ocorreram no segundo semestre de 2011 e o
início da pesquisa de campo, que prosseguiu no primeiro semestre de 2012, quando
levantamos parte dos dados documentais e fizemos a maior parte das entrevistas com os
sujeitos da pesquisa.
356
2 ASPECTOS TEÓRICOS QUE DEFINEM AS RELAÇÕES SEMIFEUDAIS E
CORONELICIAS.
O Estado originou-se da apropriação privada de riqueza e da luta de classes. É um
produto da sociedade para legitimar e perpetuar a divisão de classes e a exploração de uma
classe sobre outra (ENGELS, 1995), funcionando como um instrumento de dominação e de
coação, formado especialmente para manter a opressão sobre as classes dominadas (MARX e
ENGELS, 2008, p. 25), além de proteger a propriedade privada concentrada nas mãos da
classe dominante (MARX e ENGELS, 1989, p. 70). O Estado capitalista ostenta várias
contradições que se agudizam ainda mais em sua fase atual, o imperialismo.
Os estudos de Lênin (1979), afirmam que o imperialismo é uma etapa superior do
capitalismo, ou seja, a fase em que o desenvolvimento do capitalismo ocorre com o domínio
dos monopólios e do capital financeiro, adquirindo grande importância a exportação de
capital, a divisão internacional do trabalho e, sobretudo, a partilha dos territórios entre as
grandes potências capitalistas, tornando-os dominados e dependentes. O imperialismo é o
aprofundamento das relações de dominação do capital monopolista sobre a vida econômica e
consiste, em sua essência, na divisão do mundo entre países opressores e oprimidos,
sustentada no domínio do capital financeiro, na exportação de capitais e na política colonial
(LÊNIN, 1979).
Guzmán que define o capitalismo burocrático como “o capitalismo que o
imperialismo impulsiona num país atrasado; o tipo de capitalismo, a forma especial de
capitalismo, que impõe um país imperialista a um país atrasado, seja semifeudal, semicolonial” (GUZMÁN, 1974, p. 1). O conceito de capitalismo burocrático se aplica à análise
de todos os países que não fizeram a revolução burguesa e mantêm o problema agrário, por
isto se aplica ao Brasil (MARTÍN MARTÍN, 2007).
O capitalismo burocrático tem duas colunas: semicolonialismo e semifeudalidade
(grande propriedade, semisservidão, gamonalismo ou coronelismo), que são interligadas e
indissolúveis. Compreende-se, assim, que a definição de capitalismo burocrático, de
semifeudalidade, não significa falar de feudalismo, nem de modo de produção feudal, e sim
de capitalismo burocrático, que é uma parte nova dentro do processo histórico (SOUZA,
2010, p. 367).
Historicamente a educação tem servido aos interesses dos coronéis latifundiários e ao
imperialismo. O financiamento da educação do campo pelos organismos do imperialismo
norte-americano se iniciou com Vargas, intensificou-se no regime militar e chegou ao seu
357
auge na atualidade, com a mais completa hegemonia sobre as políticas educacionais do campo
e da cidade.
Conforme a análise de Souza (2010) nas ultimas décadas o imperialismo norteamericano por meio dessa nova ordem política chamada de neoliberalismo instituiu uma nova
ordem cultural por meio de seus organismos multilaterais como o Fundo Monetário
Internacional, a Organização Mundial do Comércio, o Banco Mundial, etc. Para Santomé
(2003) esses organismos são “o cérebro das políticas neoliberais” e na atualidade a principal
agência responsável pela difusão das ideologias imperialistas é sem dúvida, o Banco
Mundial.
O imperialismo norte-americano por meio do Banco Mundial controla a educação
das semicolônias financiando as políticas educacionais que se materializam em projetos e
programas. Souza (2010) explica que o real objetivo do banco é controlar a população carente
através de suas politicas educacionais implantadas; onde a escola se torna uma empresa capaz
de atender aos interesses do mercado, formando de mão de obra barata e seres conformados
com a organização econômica imposta pelo mercado capitalista.
O Banco Mundial intervém na educação brasileira por meio da imposição de
políticas educacionais e de empréstimos a programas e projetos educativos que fazem parte da
reforma estrutural do capitalismo. Quando a educação é imposta, configura-se o que se
convencionou chamar, na América Latina, de gamonalismo ou caciquismo, e que no Brasil
denominamos coronelismo.
O termo gamonalismo não designa apenas uma categoria social e
econômica: a dos latifundiários ou grandes proprietários agrícolas. Designa
todo um fenômeno. O gamonalismo não está representado somente pelos
gamoneles propriamente ditos. Compreende uma grande hierarquia de
funcionários, intermediários, agentes, parasitas, etc. (MARIÁTEGUI, 2008,
p. 54).
Coronelismo é, portanto, a estrutura hierárquica que vai gerar a organização do
Estado que sustenta as relações de semisservidão. E não pertence ao passado. Está
vigorosamente presente nas relações que se estabelecem em nossas escolas sob novas formas.
Para Mariátegui, “o fator central do fenômeno é a hegemonia da grande propriedade
semifeudal na política e no mecanismo de Estado” (MARIÁTEGUI, 2008, p. 54 e 55). Para
Souza (2010) “é nas relações coronelícias que se encontram as forças capazes de fazer uma
determinação de o Banco Mundial ser cumprida por milhares de secretarias de educação do
País, obrigando os professores a aderirem aos programas” (SOUZA, 2010, p. 378).
358
Especialmente nas pequenas cidades, os coronéis comandam a política e a economia pela
submissão de agentes indiretos que atuam na administração pública. O predomínio do
autoritarismo e o não cumprimento da lei escrita são as maiores evidências do coronelismo
que vigora na educação (MARIÁTEGUI, 2008, p. 55).
3 GESTÃO DEMOCRÁTICA: DECRETO N. 16.202
Conforme o decreto n. 16.202, de 20 de setembro de 2011assinado pelo governador
Confúcio Moura, sobre os critérios e condições para a realização das eleições para diretores e
vice-diretores de escolas estaduais; as eleições foram realizadas, concomitantemente, em
todas as escolas estaduais e assim será feito a cada três anos, sempre no último bimestre
letivo. Os votantes são os servidores efetivos, alunos do 6º ano do ensino fundamental regular
em diante, com idade de 16 anos ou acima; alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA)
com 16 anos de idade ou mais; mãe, pai ou responsável por aluno menor de 16 anos (artigo
6º).
De acordo com o referido decreto podem candidatar-se: professores com formação
em pedagogia ou licenciaturas pertencentes ao quadro efetivo de pessoal civil do Estado de
Rondônia ou ao quadro do Governo Federal à disposição do Estado, com vínculo de 40 horas
semanais de trabalho. De acordo com o artigo 3º do referido Decreto só podem candidatar-se
professores que já tenham cumprido o estágio probatório e estejam trabalhando na escola na
qual pretenda concorrer há pelo menos dois anos consecutivos, se pedagogo ou licenciados
não habilitado em Administração Escolar, 05 anos de exercício profissional no Estado de
Rondônia.
O artigo 5º dispõe que os profissionais que tiverem suas candidaturas homologadas
ainda precisarão participar de curso de formação de gestores de educação pública, elaborar e
apresentar um plano de gestão para a escola na qual se candidatou e assinar termo de
compromisso de adesão e participação no curso de especialização para gestores de educação
pública, caso venha a ser eleito. A SEDUC promoveu um curso de formação continuada para
gestores, com duração de 20 horas, entre os dias 24 de outubro a 11 de novembro a todos os
candidatos, a fim de habilitá-los ao bom exercício da gestão escolar. A formação dos gestores
faz parte do processo de reprodução das formas da gestão empresarial impostas nos pacotes
da Escola de Gestores. O Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica Pública,
que faz parte das ações do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), reproduz os
“processos de gestão escolar compatíveis com a proposta e a concepção da qualidade social
359
da educação, baseada nos princípios da moderna administração pública e de modelos
avançados de gerenciamento de instituições públicas de ensino, buscando assim, qualificar os
gestores das escolas da educação básica” conforme descrito no Portal do MEC
(http://portal.mec.gov.br). Há profundas contradições nesse processo de gestão democrática.
A gestão democrática almejada historicamente pelos trabalhadores em educação está anos luz
desta imposta pelo governo do Estado de Rondônia. Na verdade, o que se pretende é manter o
controle absoluto sobre a gestão escolar a partir dos princípios e ações formuladas pelas
agências multilaterais do imperialismo. A gestão democrática obriga os novos diretores a
seguir a linha de gestão já definida. Esses cursos têm por objetivo exercer o controle das
escolas e enquadrar a gestão dos eleitos nos princípios e normas do PDE e outros programas
orientados pelo Banco Mundial.
Há normas estabelecidas no Decreto que são ilegais; como o fato de professores em
período probatório não poderem candidatar-se. A Constituição Brasileira prevê isonomia para
todos os servidores e os direitos devem ser exercidos por todos.
Nas entrevistas foi unânime a informação de que não houve nenhuma discussão com
a comunidade escolar sobre essa “gestão democrática de Confúcio”.
Cerca de 42% dos entrevistados não concordam com o referido decreto e a forma
como foi instituído, 51,8% concordam, 6,2% concordam em parte, e alegam que nem ao
menos o conhecem, pois nem mesmo o Sindicato dos Trabalhadores em Educação- SINTERO
discutiu ou contestou o Decreto n. 16.202/11 com a categoria. Segundo professor da escola D:
“Em nossa escola não houve discussão antecipada, foi passada apenas a documentação de
como seria a procedência para esta escolha [...] colegas foram barrados em participar devido
algumas clausulas... a gente não concorda com a maneira como o decreto foi imposto, pois já
veio lá de cima! Pronto!”
Mostrando-se desta forma um documento antidemocrático, capaz de limitar a
participação dos próprios “interessados”, os profissionais de educação; e mesmo sendo
imposto e sem qualquer tipo discussão prévia às suas clausulas, não foi questionado pelos
professores, que em grande número revelaram não saber que a regulamentação das eleições
deveria ser feita por lei e não por um decreto, que pode ser revogado a qualquer instante,
inclusive pelo próprio governador.
Diversos mecanismos de opressão são utilizados pelo Estado e seus governantes,
como nos anos anteriores, com a determinação e nomeação de diretores para as escolas,
chamadas pelo governante de escolha democrática. Já houve outros processos de escolha de
diretores impostos pelo governo do Estado, mas que não fora normatizado. Nas entrevistas os
360
professores explicaram como funcionava; Professor da escola A: “Ele (o governador) chamou
de eleição democrática porque podia indicar três nomes para a direção da escola, então ele
escolhia um dos três. Lembro-me de uma escola que indicou esses três nomes e nenhum deles
foram aceitos.” Determinação que acabou por excluir a prática de eleição dos profissionais de
educação da escola A que mesmo não respaldados legalmente, há muitos anos já realizavam
uma eleição democrática.
A gestão democrática da educação foi negada na lei maior da educação brasileira,
quando permitiu que os sistemas de ensino a regulamentassem, o que não correu na maior
parte do país. Não há norma geral que regulamente o processo de escolha de gestores, o que
resulta em imposições de normas via decreto, como foi o caso de Rondônia.
Isto é socialmente pernicioso, sobretudo se reconhecermos que, na área
educacional, tem vigorado a tradição de um suposto “consenso” de que a
gestão dos sistemas de ensino e das escolas é prerrogativa, direta ou indireta,
daqueles que detêm a hegemonia do Estado. Tem prevalecido a definição de
critérios de escolha de pressupostos para as funções de gestão que, em geral,
privilegiam o saber que advém apenas da competência técnica, com doses
variadas de burocracia. Esta LDB não faz mais do que retroceder no que
tange à gestão democrática dos sistemas de educação e das instituições
escolares, oficializando e ratificando prerrogativas centralizadoras e
impositivas das chamadas “autoridades educacionais” (MINTO e
MURANAKA, 1997, p. 5).
No contexto do capitalismo burocrático as relações são extremamente autoritárias,
pois não há consideração sequer com as instâncias deliberativas. A totalidade dos professores
entrevistados até o momento não conhecem o regulamento e o papel dos Conselhos Escolares
instituídos na escola no ano de 2011, no mesmo pacote da gestão democrática.
4. PDE E PROGRAMAS DE FORMAÇÃO: DE ONDE VEM?
As escolas pesquisadas participam de vários programas do FUNDESCOLA e
orientados pelo Banco Mundial: PDE, Gestar, Pró-Letramento, PROINFO, PROFIPES e Mais
Educação. Os estudos Haddad (1998), Tommasi (1996), Rosar (1999), sobre o Banco
Mundial afirmam que quase todas as políticas públicas de educação no Brasil são formuladas,
dirigidas e financiadas pelo Banco mundial. E as escolas se encontram sem autonomia sequer
para recusar esses programas; são formulados e implantados dentro dos ambientes
educacionais mesmo que estes não tenham uma estruturação, espaço físico, ou profissionais
361
adequados para recebê-los. Sofrem com o autoritarismo por não poderem ao menos “decidir”
ou “escolher”.
Em relação ao PDE unanimemente os entrevistados de todas as escolas pesquisadas
disseram ser existente em suas respectivas escolas; quanto a participação apenas 35,24% são
ativos e 64,76% não participam do programa, de acordo com o professor da escola A: “[...] a
escola tem PDE sim, e de vez enquanto a direção passa para nós alguma coisa sobre o que
está acontecendo, mas
normalmente quem cuida disso é a direção e a supervisão, os
professores participam às vezes, quando são convidados ou obrigados [...]” .
E segundo professor da escola E: “Os professores são chamados para discutir alguns
pontos do PDE, entre uma aula e outra, é um tempo mínimo de forma acelerada, de forma
clínica. O professor não vai estar totalmente inteirado para o que acontece, ou quais os
resultados”. Em algumas escolas são realizadas reuniões a respeito do PDE, onde professores
são informados sobre a verba destinada à escola, em outras os professores alegam que não
participam do programa devido ser uma função da direção e dos conselhos escolares eleitos
recentemente, tendo uma participação figurativa no processo, uma vez que não contribuem
nas decisões tomadas, não havendo discussões são apenas comunicados sobre estas e seus
fins; sendo que seu destino se encontra distante das reais necessidades da instituição de
ensino.
Quanto a opinião sobre PDE 63,80% disseram ser bom, 16,20% ruim e 10% não
opinaram. Revelaram em suas respostas não conhecer quem realmente o financia ou como se
aplica de fato, alguns chegaram a mencionar que o programa é financiado pela União, a
SEDUC. De acordo com Neto (2009, p. 44): “O PDE é um instrumento, um fio condutor
dessa política educacional, responsável pela agudização da crise estrutural da Educação
Nacional educacional. Está baseado em uma pedagogia subjacente a uma lógica do mercado
capitalista, tendo como objetivo a “qualidade total” na educação”. Desconhecem que o PDE é
um plano organizado em parceria com empresários, instituições privadas, ONGS e demais
órgãos, e que está distante de resolver a crise educacional como define.
A respeito dos programas de formação 67,6% dizem considera-los bons, 15,74%
ruins, 10% se mostraram indiferentes e 6,66% não participam dos mesmos. Já a direção e a
supervisão, 80% afirmaram ser bons, 10% ruins e 10% não souberam como opinar. Os
professores assim como diretores e coordenadores pedagógicos/supervisão que até mesmo
participam dos programas, revelam que os mesmos são repetitivos em relação aos conteúdos.
Segundo professor da escola C; “É inaplicável o que se aprende nesses cursos”. Pois não
contribuem com sua formação profissional, ou com a elevação do nível de ensino de suas
362
escolas. Os professores e demais profissionais da educação são vítimas do plano neoliberal,
que em seus ajustes tem uma politica de formação continuada, que se retrata em um
treinamento, com o objetivo de reduzir gastos, fazem com que esses cursos sejam totalmente
contrários a realidade (NETO, 2009).
Sobre a origem e formulação desses programas de formação desenvolvidos foi
unânime tanto entre professores quanto diretores e supervisores/coordenação pedagógicos
afirmar que desconhecem a real origem desses programas, em suas respostas declararam que
pensam ser elaborados e financiados pelo MEC, Estado, FNDE e até mesmo os que
concordam e participam dos programas desconhecem quem os formula. Professor da escola
A: “Vem do MEC, vem o “pacotão” a gente não escolhe”. Os entrevistados revelam que nem
ao menos tem o direito de decidirem se querem ou não participar dos cursos que já chegam
prontos e destinados a todos os profissionais da educação; é perceptível que há uma profunda
alienação dos entrevistados. Nenhum deles conhecia as origens das políticas educacionais
implantadas na escola e não percebem as formas de dominação e controle delas decorrentes.
5 A AÇÃO DO CORONELISMO E AS RELAÇÕES AUTORITÁRIAS E
SEMISERVÍS.
As relações coronelícias se fazem presentes de várias formas no meio educacional,
fazendo com que sejam cumpridas as determinações autoritárias do Banco Mundial e suas
politicas públicas educacionais sem qualquer questionamento por parte dos profissionais de
educação (SOUZA, 2010).
Quando perguntamos aos professores sobre o que acontece se eles não decidirem
participar dos programas de formação, ou não seguirem as normas instituídas e as relações
autoritárias estabelecidas dentro das escolas 41,9% alegam que há algum tipo de pressão,
ameaças de punições e de envio de relatórios sobre o procedimento dos mesmos para o MEC;
os professores são coagidos, não abertamente, a participarem dos programas de formação.
Não descumprem as normas e aceitam participar dos programas, pois tem receio de que as
punições sejam aplicadas, como por meio de isolamento. O professor que não participa é
acusado de ser preguiçoso, de não querer “buscar novos conhecimentos” e passa ser mal visto
pelos colegas. Assim, por uma ou mais dessas formas de coação, os professores se sujeitam.
De acordo com o professor da escola E: “A REN cobra dos diretores que negociam
com os professores para fazer os cursos”. A cerca disso, a direção e supervisão/coordenação
pedagógica 36,36% relataram que há conversas de forma amigável e sem punições; 9,9%
363
disseram acreditar que deve realmente ser feito pressão sobre os professores pra que as coisas
não fiquem muito “à vontade” e 45,45% admitiram ser estabelecida alguma forma de
persuasão para a participação nos cursos aconteçam.
Nas entrevistas foram relatadas algumas formas pelas quais os professores e gestores
são incluídos nos programas de formação do Banco Mundial/MEC. Primeiro há o processo de
persuasão, de convencimento. Quando esse método não funciona parte-se pelo oferecimento
de vantagens pessoais, como redução da Carga Horária. Na Escola B os professores relataram
que foi lhes subtraídos 06 horas aulas de trabalho para que se matriculassem no GESTAR.
É notável que o Estado convoca a todo o momento os profissionais da educação a
atuar de acordo com suas ideologias, o representando e ainda o obrigando a desenvolver seu
trabalho em condições mínimas, seja através de normas diretas, como por decreto, ou por
meio de seus próprios colegas de trabalho, e ambos perdem o direito a voz, a decisão.
A existência de hierarquia entre professores e direção também foi apontada por
55,6% entrevistados, 41% disseram não existir e 3,4% decidiram não responder a questão. Os
entrevistados apontaram que nos anos anteriores, no antigo governo quando a direção era por
indicação havia muitos problemas ao se relacionar, pois as ordens eram passadas e deveriam
ser cumpridas sem qualquer tipo de questionamento. Porém revelam que atualmente ainda
existem impasses na relação. “A relação é bastante complicada, por ser uma “gestão
democrática, eleita pela comunidade escolar”, pois há pressão e reprodução das ordens do
Governo para a REN, da REN para a direção, e diretores para professores; que vem de cima
para baixo e comprime!” (Professor da escola D). As ordens continuam sendo impostas e
cumpridas, oprimindo professores e diretores que não são ouvidos, e fazendo com que a
gestão atual torne-se cada vez mais distante da tão aclamada gestão democrática.
Além disso, 39,52% dos professores alegaram que não participam das decisões
pedagógicas em ambiente escolar, 50,94% responderam que participam, porém possuem uma
participação apenas formal, sendo comunicados das decisões já tomadas; que são impostas
pela SEDUC e apenas reproduzidas pela direção e supervisão; as reuniões possuem um
caráter informativo sem uma real discussão pedagógica, passando a ter um caráter opressor,
capaz de fazer cumprir a risca as determinações que vem de cima. Os outros 9,54% decidiram
por não responder a questão para evitar qualquer situação conflituosa ou constrangedora.
Diversas formas de opressão foram identificadas através das entrevistas, entre os
docentes 64,5% apontam o baixo salário, o não reconhecimento pela sociedade como
profissional da educação, a falta de infraestrutura, falta de autonomia, como forma de
desvalorização profissional; além da pressão e burocracia impostas pelo governo e até pelos
364
próprios colegas de trabalho. De forma que 81,82% dos diretores e supervisores/coordenação
pedagógica expressam a mesma opinião que os professores, além da carga horária excessiva e
do fracasso escolar que recai sobre estes.
Porém 3,2% confessam não sentir nenhum tipo de opressão ou desvalorização
profissional; mostrando mais uma vez o estágio de alienação em que se encontram os
docentes. Para Costa (2009, p. 74):
A forma privilegiada de se efetivar a alienação de um professor é oferecer
uma formação esvaziada do conteúdo de seu trabalho - o saber - desde a sua
formação inicial pois, dessa maneira, se interdita o desenvolvimento de um
processo de objetivação e apropriação não alienada.
A alienação no processo de formação do professor se destaca pelo esvaziamento dos
conteúdos em sala de aula, reduzindo o conhecimento sobre o seu processo de trabalho, e os
conhecimentos pedagógicos, que permanecerá durante toda a sua vida. Portanto, às políticas
públicas voltadas para formação do professor, se subordinam às agencias internacionais que
priorizam a redução de custos e um treinamento disfarçado de formação que atenda a
demanda do mercado, com profissionais que memorize informações, mas que não as
relacione.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As políticas educacionais de formação de professores e gestores das escolas estaduais
da Zona da Mata são hegemonicamente formuladas, dirigidas e financiadas pelo
imperialismo, por meio de uma de suas principais agências, o Banco Mundial, e se efetivam
nos programas implantados na educação por meio do coronelismo existente no âmbito do
poder local; se fundamentam nas teorias do capital humano e nas concepções da educação
neoprodutivista pautada no neoescolanovismo, no neoconstrutivismo e no neotecnicismo que
caracterizam a educação imperialista pós-moderna (FRIGOTTO, 2005 e 2000; DUARTE,
2001 e SAVIANI, 2007b).
A análise dos dados coletados apresentaram resultados apontando que as relações são
determinadas pelo coronelismo que age indiretamente por meio de coação ou da persuasão
dos professores para se submeterem às políticas educacionais ditadas pelo Banco
Mundial/MEC, sob pena de perseguições por parte do poder local. As ordens de implantação
365
e todos os processos organizativos das políticas são definidos hierarquicamente, do escritório
do Banco Mundial até as secretarias municipais de educação, onde elas se efetivam de fato.
O trabalho dos professores é compreendido como semifeudal, uma vez que se
submetem às mais precárias condições de trabalho e emprego, não possuem autonomia
didático-científica, não possuem autonomia de gestão e se sujeitam aos processos mais rudes
de obrigação e servidão às políticas implantadas nas escolas e aos processos falseadores de
gestão democrática.
REFERÊNCIAS
COSTA, A. Entre a dilapidação moral e a missão redentorista: o processo de alienação no
trabalho dos professores do ensino básico brasileiro. In: COSTA, A. et al. A proletarização
do professor. Neoliberalismo na educação. São Paulo, Editora Instituto José Luiz e Rosa
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Donald Schön não entendeu Luria). Educação e sociedade, Campinas, v. 24, n. 83, p. 601625, ago. 2003. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/%0D/es/v24n83/a15v2483.pdf.>.
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366
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Educacionais. São Paulo, Cortez, 1996.
367
A TEORIA NA PRÁTICA: O CASO DO PROGRAMA DE EDUCAÇÃO A
DISTÂNCIA NA UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA. CAMPUS
UNIVERSITÁRIO JOSÉ RIBEIRO FILHO EM PORTO VELHO
A relação entre os principais modelos nacionais e internacionais de educação a distância
e a pertinência e aderência desses modelos com o contexto amazônico de Rondônia
Tuane Carolinda Miranda da Silva79
José Lucas Pedreira Bueno80
Silva, Tuane Carolinda Miranda da. Relatório de Pesquisa (Relatório Final, referente ao
período de Agosto/2011 e Julho/2012). Fundação Universidade Federal de Rondônia (UNIR),
PIBIC/CNPq, 2011/2012.
RESUMO
Este trabalho tem como objetivo confrontar a teoria adotada pelo Programa de Educação a
Distância na Universidade Federal de Rondônia, Campus José Ribeiro Filho, EAD/PVH/RO
com a prática por ele implementada, por meio de um levantamento descritivo sobre a atual
situação da mesma em relação à EAD. A UNIR, como outras instituições públicas, iniciou sua
experiência de implantação de cursos de graduação à distância a partir de 2006, com a adesão
a programas governamentais para essa modalidade. Desta formas, o presente estudo pretende
contribuir com um dos desafios considerados cruciais quando se trata de implementação e
consolidação de programas de EAD: a questão metodológica. Sendo assim, será utilizado
como procedimento à pesquisa bibliográfica e documental com uma abordagem qualitativa
descritiva, com a realização de entrevistas semiestruturadas aplicadas à coordenação dos
cursos estudados, com o objetivo de obter informações sobre como funciona a teoria adotada
na prática. Analisamos os dados coletados e verificarmos quais as características e formas de
mediação e tecnologias utilizadas, bem como as características desta metodologia na EAD da
Universidade Federal de Rondônia.
Palavras-chave: Educação a Distância. Teoria e Prática de EAD. Universidade Federal de
Rondônia.
1 INTRODUÇÃO
O ensino à distância é uma modalidade que oportuniza o acesso ao ensino superior a
estudantes que não têm condições de frequentar as salas de aula por diversos motivos, tais
como necessidade de trabalhar e não conseguir destinar horários fixos para frequentar às
aulas. O processo educacional a distancia é mediado, principalmente, por plataformas de
79
Acadêmica do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Rondônia e bolsista
PIBIC/UNIR/CNPQ vinculada ao grupo de pesquisa PRAXIS. (e-mail: [email protected]).
80
Professor do Departamento de Ciências da Educação e do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu
em Educação da UNIR. (e-mail: [email protected]).
368
ambientes virtuais de aprendizagem com base na internet, devido à agilidade proporcionada às
interações, comunicações e informações combinadas e organizadas por essas tecnologias.
Segundo Valente e Mattar (2007, p.19), o distanciamento físico entre os participantes
de um curso “não implica em distanciamento humano”. Assim, alunos e professores podem
estar em locais diferentes, participando sincronicamente de uma mesma atividade com fim
pedagógico, como, por exemplo, um chat.
O grande impulso para o crescimento do modelo EAD e semipresencial foi dado pelo
próprio governo, com a criação da Universidade Aberta do Brasil, em 2005. O sistema oferece
180 mil vagas em cursos superiores oferecidos em parceria com universidades públicas.
O presente estudo pretende contribuir com um dos desafios considerados cruciais
quando se trata de implementação e consolidação de programas de EAD: a questão
metodológica.
Ao contribuir com este importante elemento de análise para o diagnóstico dos desafios
que a EAD enfrenta e, tomando a experiência de Porto Velho como elemento de análise,
pretende-se responder as seguintes questões: tendo em consideração a teoria adotada para
nortear a prática de EAD na Universidade Federal de Rondônia (UNIR), como tem sido
implementada na prática tal teoria? Isto tem redundado em prejuízo ou benefício para a
sobrevivência e/ou mesmo ampliação da EAD na UNIR?
2 METODOLOGIA
A metodologia adotada para a pesquisa é de abordagem qualitativa e caracteriza-se,
com relação ao seu objetivo, como descritiva. Segundo Gil (2010),
“As pesquisas descritivas têm como objetivo a descrição das características
de determinada população. Podem ser elaboradas também com a finalidade
de identificar possíveis relações entre variáveis. Entre as pesquisas
descritivas, salientam-se aquelas que têm por objetivo estudar as
características de um grupo: sua distribuição por idade, sexo, procedência,
nível de escolaridade, estado de saúde física e mental, etc. Também são
pesquisas descritivas aquelas que visam descobrir a existência de
associações entre variáveis, como, por exemplo, as pesquisas eleitorais que
indicam a relação entre a preferência político-partidária e nível de
rendimentos ou de escolaridade”.
Neste caso, buscamos confrontar a teoria adotada pelo Programa de Educação a
Distância da Universidade Federal de Rondônia, Campus José Ribeiro Filho, com a prática
por ele implementada.
369
Quanto ao método utilizado, a pesquisa se classifica como estudo de caso, com coleta
de dados secundários e primários, realizados a partir das análises de documentos oficiais
(MEC, Governo Federal e UNIR referentes à implantação da EAD nas Universidades
Federais) e entrevistas em profundidade (com coordenadores e professores dos cursos de
graduação EAD da UNIR). Segundo Ludke; André (1986, p. 18-20), o estudo de caso
apresenta as seguintes características: visa à descoberta; enfatiza a interpretação no seu
contexto; busca revelar a multiplicidade de dimensões presentes numa determinada situação
ou problema; recorre a variados dados coletados em diferentes momentos; permite
generalizações naturalísticas; procura representar os diferentes pontos de vista presentes numa
situação social.
Escolhemos como unidade de análise o Projeto de Educação a Distância da
Universidade Federal de Rondônia, mais especificamente os cursos de Letras e Pedagogia
ofertados pela IFES na modalidade a distancia, no sistema Universidade Aberta do Brasil
(UAB).
A coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas com as ex-coordenadoras e exprofessora dos cursos de Letras e Pedagogia ofertados na modalidade a distância, que
estiveram presentes no momento da implantação deste modelo de ensino na IFES. Para tanto,
elaboramos um roteiro de entrevista semiestruturada que procurou investigar como as
metodologias de ensino-aprendizagem propostas pelo Projeto Político Pedagógico destes
cursos se efetivavaram na prática, e os desafios inerentes à implantação de cursos na
modalidade a distância. As questões foram analisadas quanto aos seguintes aspectos: polos,
aulas presenciais, aulas virtuais e Ambientes Virtuais de Aprendizagem (A.V.A), recursos
humanos, capacitação, infraestrutura, currículo e material didático, alunos e gestão.
Foram realizadas 03 entrevistas, sendo uma entrevista com a atual coordenadora do
curso de pedagogia UAB/UNIR, uma entrevista semiestrututrada com a ex-coordenadora do
curso de Letras UAB/UNIR, outra com a ex-professora do curso de Letras UAB/UNIR, que
participou na implantação do projeto de reconfiguração da Educação a Distância na
Universidade Federal de Rondônia e com o atual diretor da Diretoria de Educação a Distância
da UNIR, às quais foram submetidas à análise de conteúdo.
Segundo Bardin (1977, p.9), a análise do conteúdo compreende “um conjunto de
instrumentos metodológicos [...] que se aplicam a discursos (conteúdos e continentes)
extremamente diversificados”. De acordo com a autora, os métodos de análise de conteúdo
proporcionam a ultrapassagem da incerteza e o enriquecimento da leitura.
370
Para Gil (2010. p.122) a análise e interpretação dos dados pode seguir as seguintes
etapas: codificação dos dados, estabelecimento de categorias analíticas, exibição dos dados e
busca de significados. Na primeira etapa, busca-se atribuir uma designação aos conceitos
relevantes encontrados na transcrição da entrevista, a partir desta codificação são criadas as
categorias analíticas que, de acordo com Bardin (1977, p. 37) “pretende tomar em
consideração a totalidade de um texto passando pelo crivo da classificação e recenseamento,
segundo a frequência de presença ou de ausência de itens de sentidos”. Após a categorização,
realizam-se a análise de dados por meio de tópicos-chave e consequente elaboração de um
texto discursivo, que podem ser exibidos por meios de matrizes e/ou diagramas. E, por fim, a
busca de significados que pode ser realizada por meio da verificação dos temas que se
repetem com vistas ao estabelecimento de relações entre os fatos e as possíveis explicações.
3 A EAD NA UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDONIA
Entre os cursos oferecidos pela UNIR/UAB esta Licenciatura em Pedagogia para as
Séries Iniciais do Ensino Fundamental; Licenciatura em Letras com Habilitação em Língua
Portuguesa e suas Literaturas, com polos de apoio presencial no Campus de Ariquemes, JiParaná, Porto Velho, Rolim de Moura, Chupinguaia e os novos polos que são Porto Velho,
Nova Mamoré e Buritis. O Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB) tem como principal
objetivo a formação de professores para a Educação Básica.
A implantação do desenvolvimento dos cursos está sendo feita por meio da política
pública educacional, do incentivo ao desenvolvimento ensino superior pelo Sistema
Universidade Aberta do Brasil. Tais iniciativas aproveitam a competência do ensino superior
presencial para institucionalizar a oferta de cursos de licenciatura e iniciar um projeto de
ensino a distância, que dinamize o processo de formação de profissionais qualificados, de
modo ainda a atender às questões que afligem a educação básica.
Em seu início a estrutura de gestão da EAD na UNIR era centralizada em um único
coordenador, responsável pela realização de todas as tarefas como planejamento, controle
financeiro, supervisão, entre outras atividades, enquanto os departamentos se preocupavam
com o conteúdo dos cursos. A coordenadora trabalhava diretamente com os departamentos
que se interessavam em oferecer seus cursos na modalidade a distância, formando as parcerias
necessárias.
A estrutura atual de gestão possui característica descentralizadora, a coordenação do
programa está dividida em quatro categorias: Diretoria de Educação a Distância, Coordenação
371
da UAB, Coordenação de curso (Pedagogia, Ciências Naturais e Biologia, Letras Português,
Administração Pública).
3.1 CATEGORIAS DE ANALISE DA PESQUISA
De acordo com as categorias resultantes da análise de conteúdo podemos inferir as
seguintes conclusões acerca do funcionamento da EAD na Universidade Federal de Rondônia:
• Que a infraestrutura dos polos, mesmo cumprindo as exigências do MEC, ainda falta
incorporar novos ambientes de aprendizagem.
• Quanto ao AVA, se tem uma grande dificuldade, pois a internet é ruim e às vezes
não se consegue ter acesso, isso tem redundado em problemas.
• Quanto à tutoria afirmaram que o tutor é responsável por fazer um acompanhamento
com os alunos, o qual é realizado constantemente da forma presencial e a distância.
• Que as aulas presenciais acontecem no início de cada disciplina e é, muitas vezes, a
única ou principal forma de interação entre aluno-professor.
• Os materiais didáticos são todos produzidos pelos professores da UNIR. Onde
afirmaram que tais professores fazem curso para fazer um material a distancia, que
precisa ser claro, planejado e organizado.
• A capacitação dos professores e tutores da unir é feita pelo pessoal da DTI, os tutores
a distância são responsáveis por fazer tanto a capacitação dos professores, quanto do
corpo de tutores.
• As aulas virtuais acontecem na plataforma Moodle, onde os professores utilizam
texto, apostilas e filmes. Tendo um problema, pois a internet, muitas vezes, não dispõe
capacidade de banda para transferência desses materiais.
• Os estágios têm a presença de um professor/tutor de estágio, tudo presencialmente.
São realizados em quatro módulos. Na UNIR há um grande desafio, pois os estágios
começaram logo no período das greves de acordo com a fala das professoras.
• As defesas de TCC ocorrerão da mesma forma do presencial por força de legislação.
As defesas de TCC ainda não ocorreram para os cursos analisados.
• A matriz curricular dos cursos é dividida em núcleos, seguindo orientações do MEC,
estão sendo reformulado de acordo com a legislação.
372
• As idas dos professores aos polos ocorrem como previsto no Projeto, recebendo
diárias, alimentação, hospedagem e transporte. O professor vai para iniciar cada
disciplina e, se tiver necessidade e recurso disponível, vai outra vez para tirar dúvidas.
• O modelo pedagógico utilizado é o interacionista, que dá as condições necessárias
para utilizá-lo na sua prática docente e, de acordo com as falas das professoras, pode se
perceber que elas desconheciam o modelo utilizado, mas depois de refletir sobre a
questão, destacam tal modelo.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa foi iniciada, a partir das nossas inquietações e dúvidas em relação à
teoria adotada pelo Programa de Educação a Distância na Universidade Federal de Rondônia
e os caminhos que estavam sendo construídos para a EAD, em diferentes contextos.
Chegamos ao fim do percurso com muitas questões esclarecidas.
Para compreender o caminho mais fácil para responder a nossa questão inicial sobre as
circunstâncias que levaram a instituição a adotar a EAD e verificar as razões que a levaram a
adotar a metodologia existente no todo ou em parte para nortear a prática de seu programa, foi
preciso compreender as relações da EAD da UNIR com o seu entorno institucional, tanto na
sua concepção, geração, quanto na sua manutenção, considerando que muito teve que resistir
em termos de dificuldades internas para se manter como tal. A partir disso, foi realizada uma
comparação entre a teoria e a pratica implementada dentro da universidade.
E a partir das dificuldades enfrentas pela EAD na UNIR, é possível infeir que a
instituição ainda mantém um processo em fase de implementação, sem consolidação, com
falta de estrutura, de experiência na modalidade de ensino e de profissionais capacitados
como principais dificuldades enfrentadas pela gestão.
Considerando que a implantação desse tipo de processo em uma IES de ensino
presencial requer um tipo de gestão inovadora capaz de lidar com várias barreiras, como: falta
de estrutura de recursos humanos, falta de infraestrutura física, falta de capacitação dos
recursos humanos, falta de compreensão da modalidade, resultando em desconhecimento e
preconceito com a EAD e até mesmo discriminação. Percebemos que se faz mister
desenvolver um modelo que seja adequado à clientela de sujeitos (professores, tutores e
alunos) envolvidos no processo de ensino aprendizagem à distância, capacitando-os para
ensinar e aprender a distância e para utilizar os recursos de interação, comunicação e
373
compartilhamento de conteúdos, bem como, desenvolver uma metodologia de ensinar e
aprender a distância e formar esses sujeitos para praticá-las.
Acreditamos que esta pesquisa venha contribuir para a reflexão acerca da educação a
distancia em Rondônia e na atuação dos docentes acerca da dimensão educativa, à medida que
expõe os desafios na sua formação e apontam caminhos a serem percorridos. Vimos que o
modelo atual sobre várias barreiras para desenvolver o processo de ensino-aprendizagem a
distância para formar cidadãos críticos e capazes de desenvolver profissionalmente o
conhecimento formado com os cursos, porque mesmo com o objetivo de formar pessoas
críticas e conscientes, o modelo atual é limitado e fica reduzido a leituras com poucas
interações profeessor-aluno, devido a falta de vários recursos para guarnecer a execução dos
cursos.
Dessa forma, reencontramos com nossas pretensões iniciais de investigar a
importância da formação em EAD de Rondônia, uma vez que essa se desenvolve e precisa ser
planejada e executada com as condições necessárias para alcançar os resultados esperados
para o ensino superior.
REFERÊNCIAS
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nova metodologia em EAD incorporando os recursos da telemática. Informática na
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FREIRE, P. Política e Educação: ensaios. São Paulo: Cortez, 1993.
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19 de jul. 2012
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MEC/SEED, 2003. Disponível em < http://portal.mec.gov.br/seed> Acesso em: 17 de Janeiro de
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http://uab.capes.gov.br/. Acesso em: Setembro de 2011
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<http://www.eca.usp.br/prof/moran/desafio.htm>. Acesso em: 20 dezembro. 2011.
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MORAN, J. M. Ensino e Aprendizagem Inovadores com Tecnologia. Informática na
Educação: Teoria & Prática / Programa de Pós-Graduação em Informática na Educação. vol 3, (set 2000) -.- Porto Alegre : UFRGS. Programa de Pós-Graduação em Informática na
Educação, 2000-v. pg 137/144.
UNIR. PROJETO DO CURSO DE LETRAS E SUAS LITERATURAS - 2007 /
UAB/UNIR. Acesso em: Dezembro de 2011.
375
RESUMOS EXPANDIDOS
CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS II
376
RELACIONAMENTOS INTERORGANIZACIONAIS NO AGRONEGÓCIO LEITE
NO MUNICÍPIO DE ARIQUEMES EM RONDÔNIA - CONSTRUÇÃO DO
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: IMPORTÂNCIA DO RELACIONAMENTO
INTERORGANIZACIONAL ENTRE OS AGENTES DO AGRONEGÓCIO LEITE NO
MUNICÍPIO DE JI-PARANÁ E AS ORGANIZAÇÕES PÚBLICAS E PRIVADAS
Alexandre Cruz de Mello Franco81
Mariluce Paes de Souza82
RESUMO
Esta pesquisa tem como objetivo identificar como ocorre os relacionamentos
interoganizacionais no Agronegócio do leite em entre os agentes do setor agropecuário e as
organizações públicas em Ji-Paraná no estado de Rondônia e, a partir disso, relacionar de que
modo esses relacionamentos contribuem ou podem contribuir para o desenvolvimento da
região. Desenvolveu-se a pesquisa procedendo-se a revisão teórica e análise de formulários da
base de dados do CEDSA nos quais procurou-se entender melhor a relação existente entre a
prefeitura de Ji-Paraná com as associações e as organizações, bem como da prefeitura e das
associações com os produtores de leite. Em vista disso, fez-se um levantamento de dados e
verificou-se que as associações poderiam estar contribuindo com a criação de eventos e a
capacitação de seus produtores e ainda que a prefeitura poderia passar a desempenhar o papel
de agente que lidera externamente como fonte de inovação tecnológica influenciando
diretamente nas estratégias dos agentes e as organizações privadas.
Palavras-chave: Relacionamento Interorganizacional. Agronegócio do Leite. Organizações
Públicas e Privadas
ABSTRACT
This research aimed to identify how general labor occurs in inter-organizational relationships
on the agribusiness of the milk on the city Ji-Paraná in Rondonia state, and from this, to relate
how these relationships contribute or can contribute to the development of the region.
Developed through the research and theoretical forms in which it sought to better understand
the relationship between the City of Ji-Parana associations and organizations, and municipal
and associations with milk farmers. As a result, surveyed the data and found that associations
could be contributing to the creation of events and training for their producers and the city
hall could move into the role of agent that leads externally as a source of technological
innovation directly influencing strategies of the agents and private organizations.
Keywords: Sustainable Development. Interorganizational Relationships. Agribusiness of
Milk. Public and Private Organizations
81
82
Acadêmico do curso de Administração da universidade Federal de Rondônia (UNIR)
Orientadora.
377
INTRODUÇÃO
Após a Segunda Guerra Mundial, com a intensificação da globalização e a facilitação
da disseminação das informações aumentaram a concorrência a um nível global, afetando
empresas de grande, médio e pequeno porte como um todo. Em meio a um mundo cada vez
mais competitivo e exigente, vários empresas se viram obrigadas a procurar novas estratégias
e oportunidades. Segundo Powell; Koput; Smith-Doerr (1996), as organizações precisam
colaborar para adquirir recursos e competências que elas não possuem internamente.
Com base nisso, muitas empresas investiram na idéia de unir esforços e recursos com
outras organizações e órgãos como estratégia competitiva. Portanto, o relacionamento
interorganizacional contribui para que as organizações, que dificilmente conseguiriam
competir sozinhas, possam conquistar mercado e adquirir vantagens em prol de um objetivo
em comum.
Assim como explica Das; Teng, 2002; Dyer; Sing,1998 P 142: “Nos últimos anos,
diversas correntes científicas como a economia industrial, marketing, [...] vêm empregando
seus esforços para o entendimento das complexas relações entre as organizações. O preceito
básico dessas correntes científicas indica que as organizações que combinam seus recursos
podem realizar uma superior vantagem sobre os seus competidores”.
Mediante isto, o cenário agropecuário rondoniense gira entorno da produção de
746.873 milhares de litros de leite e que Ji-paraná, por sua vez, contribuem com 35.182
milhares litros de leite(Dados do IBGE, 2009). Tendo esses dados como base, pode se
perceber a importância do município de Ji-Paraná e, ainda, o potencial agropecuário dado pelo
clima e pela disponibilidade das terras.
A partir disto, têm o relacionamento organizacional como forma de não somente
beneficiar as organizações, mas também, melhorar as condições e a qualidade do leite de seus
produtores, assim como também, pode melhorar a competitividade do estado de Rondônia.
Diante do exposto, pretende-se avaliar como o agronegócio do leite em Ji-Paraná
pode explorar os relacionamentos interoganizacionais como forma desenvolvimento aliado ao
seu enorme potencial, cabendo a presente pesquisa identificar e descrever a importância
desses relacionamentos interorganizacionais entre agentes e organizações do Agronegócio
Leite no município de Ji-Paraná e as organizações públicas e privadas, respondendo a
seguinte pergunta:
378
Qual é a importância dos relacionamentos interorganizacionais entre os diversos
agentes do agronegócio do leite no município de Ji-Paraná em Rondônia e organizações
públicas e privadas e qual sua contribuição para o desenvolvimento do Estado?
METODOLOGIA
Esta pesquisa é de abordagem qualitativa, pois permite a flexibilidade na
interpretação do problema de pesquisa que consiste em compreender de que forma os
relacionamentos interorganizacionais podem contribuir para o desenvolvimento sustentável
no agronegócio do leite.
Trata-se de uma pesquisa de cunho exploratório-descritivo em que foi feito,
inicialmente, coleta de dados secundários para melhor compreensão do problema de pesquisa.
Foi feito o levantamento de dados em periódicos especializados, livros, sites da internet e
formulários aplicados aos produtores e associações de leite no município de Ji-Paraná os quais
compõem a base de dados do banco do Centro de Estudos Interdisciplinar em
Desenvolvimento Sustentável da Amazônia CEDSA.
REFERENCIAL TEÓRICO
O potencial agropecuário de Rondônia é favorecido com a vasta extensão de terras e
clima quente, o que leva os detentores de propriedades rurais a investir mais na pecuária, e
isso leva a maior produção de leite, o que se constitui na principal fonte de renda para o
pequeno produtor, representando sua subsistência.
Sendo assim, Ji-Paraná com mais de 495 mil cabeças de gado bovino, o município
possui a terceira maior criação de gado do estado, de acordo com o Censo Agropecuário do
IBGE (2006). Além da criação de bovinos, Ji-Paraná é um dos maiores produtores de leite do
estado com uma produção de 41 mil litros de leite em 2006, que são distribuídos por laticínios
localizados na região (Censo agropecuário do IBGE, 2006).
Apesar da produção significativa apresentada pelo Estado, e consequentemente no
município de Ji-Paraná, parece que a não sistematização ou a falta de assistência técnica e
implementação de políticas públicas e ainda, a velocidade do crescimento dessa atividade, não
favoreceram a organização e desenvolvimento da atividade leiteira em Rondônia. Fato este,
agravado pelas transformações pelo qual passou este setor, principalmente a partir de 1990
379
com a desregulamentação do mercado leiteiro nacional e a abertura da economia ao comércio
exterior.
Sendo assim, é necessário o apoio não só dos governos, como também é necessário
que o apoio das grandes empresas e até mesmo das próprias pessoas. Já que não existe mais
uma visão isolada das regiões, e sim, uma visão global e de que cada componente, interno ou
externo, deve ser integrado ao todo.
Buscando promover e fortalecer o setor, as instituições governamentais buscam
estabelecer regras de incentivos para possibilitar o desenvolvimento da pecuária leiteira no
Estado. Entretanto, nos últimos anos houve um avanço significativo no agronegócio do leite
no Estado, que vem se estruturando desde a década de 1970, porém somente no final da
década de 1990 é que foi criado o Programa de Desenvolvimento da Pecuária Leiteira do
Estado de Rondônia (Pró-Leite), desenvolvido pelo governo estadual e administrado pela
EMATER-RO (PAES-DESOUZA, 2007). Esta iniciativa busca oferecer capacitação e
condições técnicas de melhoria de qualidade e que vem permitindo o acesso de milhares de
agricultores familiares à tecnologias de ponta, no que se refere a produção e manejo de
bovinos de leite.
Pode se notar que essas relacionamentos interoganizacionais, compõem um conjunto
de organizações que sozinhas não estariam aptas a concorrer no mercado, o que gera
benefícios e vantagens para ambas empresas e fortalece a competitividade. Segundo
POWELL; KOPUT; SMITH-DOERR (1996), as organizações precisam colaborar para
adquirir recursos e competências que elas não possuem internamente.
Produtores em várias regiões do país estão se organizando em associações, visando a
uma melhor negociação para o leite produzido em suas comunidades e comunidades vizinhas.
As iniciativas nascem com o objetivo central de negociar a venda do leite a melhores preços
recebidos até então por um produtor fornecendo o leite sozinho. É a busca de criar um poder
de mercado.
Esse tipo de associação de produtores de leite são de pequeno porte, com pequena ou
nenhuma estrutura inicial e com uma limitada abrangência geográfica. Contudo esta iniciativa
nasce mais fortalecida se contar com o apoio de lideranças dos produtores, sindicatos rurais,
prefeituras municipais e agentes da assistência técnica. Esta é uma conjugação de esforços
com representação política, buscando a defesa da união e dos interesses dos produtores.
As atenções dadas no controle dos processos adéquam à viabilidade técnica e
comercial desses produtos. O pequeno produtor precisa incorporar essas alternativas para a
380
agregação de valor dos seus produtos, não esquecendo que esses investimentos se fazem
necessários para a comercialização, já que existem exigências a serem atendidas
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Mediante o estudado, foi possível perceber que muitos destes produtores necessitam
das associações para se manterem competitivos no mercado do leite. E essas, que, por sua
vez, contribuem para a melhora na qualidade de leite e no desenvolvimento da região, onde se
torna imprescindível a participação da prefeitura e de outras organizações, por exemplo, a
SUFRAMA, demonstrando que nestes relacionamentos todos podem ganhar.
Como demonstra na figura 1 a Superintendência da Zona Franca de Manaus
(SUFRAMA) estabelece um relacionamento com a prefeitura, onde ela investe e financia
tanques. A prefeitura, por sua vez, repassa os tanques os tanques às associações e, com isso,
gerando desenvolvimento na região. Essas associações que adquiriram tanques e
investimentos trazem aos seus produtores uma melhora na qualidade, de renda, de vida e de
poder de negociação, esses produtores, em troca, fortalecem a associação e aumentam seu
poder de expressividade.
Figura
1
-
Demonstrativo
dos
relacionamentos
entre
organizações
Fonte: Composição do autor (2012)
as
381
Sabe-se que as associações e cooperativas podem oferecer benefícios, no entanto, esta
assertiva somente é verdadeira se os princípios cooperativistas forem praticados. Porém,
muitas dessas associações ainda carecem na disponibilização de tecnologias e informações, e
que a prefeitura poderia exercer um papel muito mais representativo mediante esses
produtores. Observa-se também que existe muita dificuldade entre os produtores em
agregarem-se em busca do benefício comum.
Sendo assim, as parcerias entre as instituições públicas e privadas e as associações,
apesar de serem indispensáveis aos produtores de leite, poderiam ainda estar beneficiar
melhor estes produtores.
Tendo se em vista disto, dá-se como sugestão para as associações, a criação de eventos
e a capacitação dos representantes e participantes dos produtores para que a gestão da mesma
possa ser feita em torno do seu objetivo que deve ser auxiliar o pequeno produtor e tornar
rentável a atividade em que ele está inserido.
Já com relação à prefeitura e organizações privadas, o Governo através de sua
influência no ambiente institucional poderia passar a desempenhar o papel de agente que
lidera externamente, sendo fonte de inovação tecnológica influenciando diretamente nas
estratégias dos agentes e das organizações privadas. Diante disso, o processo de interação e
cooperação, através da união de produtores em arranjos e/ou em organizações coletivos
sustentáveis com as organizações privadas, facilitaria o processo produtivo, potencializando
assistência técnica e otimizando os recursos obtidos de instituições governamentais ou não
governamentais. Isto também pode propiciar maior poder de negociação junto a fornecedores,
na busca de minimizar os custos dos insumos, o que levará a uma melhor relação com o
mercado.
Concluindo, a pesquisa demonstrou que a maior carência dos produtores de leite é a
disponibilização da informação e tecnologia. Em vista disso, verificou-se que as associações
poderiam estar contribuindo com a criação de eventos e a capacitação de seus produtores e a
prefeitura poderia passar a desempenhar o papel de agente que lidera externamente como
fonte de inovação tecnológica influenciando diretamente nas estratégias de seus colaboradores
e associados.
REFERÊNCIAS
382
REIS, Lineu Bélico dos. Energia, recursos naturais e a prática do desenvolvimento
sustentável / REIS, Lineu Belico dos, FADIGAS, Eliane A. Amaral; CARVALHO, Claúdio
Elias. - Barueri, SP: Manole, 2005.
POWELL, Walter W.; KOPUT, Kenneth W.; SMITH-DOER, Laurel. Interorganisational
collaboration and the locus of innovation: Networks of Learning. Administrative Science
Quartery (1996, P 116-145)
CÂNDIDO, Gesinaldo Ataíde. A formação de redes interorganizacionais como mecanismo
para a formação de vantagem competitiva e para promoção do desenvolvimento regional: O
papel do Estado e das políticas públicas neste cenário.
HAWKEN, Paul. The Ecology of Commerce: A declaration of sustainability, HarperCollins
(1993, p. 223-240).
http://www.cnpgl.embrapa.br/nova/informacoes/estatisticas/producao/tabela0240.php Acessado em
25 de Abril de 2011.
CHIAVENATO, Idalberto, Introdução à teoria geral da administração: uma visão abrangente
da moderna administração das organizações, edição compacta/ Idalberto Chiavenato.
3.ed.rev.e atualizada. -Rio de Janeiro: Elsevier, 2004- 3ª Reimpressão.
Banco de dados do Centro Interdisciplinar em Desenvolvimento Sustentável - CEDSA
http://www.ji-parana.ro.gov.br/. Acessado em 8 de Fevereiro de 2012.
http://www.ibge.gov.br. Acessado em 10 de Fevereiro de 2012.
AGRADECIMENTOS:
Ao CNPQ;
Ao PIBIC;
A UNIR;
Ao CEDSA;
Ao NUCSA;
Aos Professores Dra. Mariluce Paes de Souza, Dr. Theophilo Alves de Souza Filho e ao
professor Dércio
CONTATOS
Orientando: Alexandre Cruz de Mello Franco
E-mail: [email protected]
Orientadora: Dra. Mariluce Paes de Souza
E-mail: [email protected]
383
HISTÓRIA E REPRESENTAÇÕES SOCIAIS: A UNIR AO LONGO DOS 30 ANOS
DE ATUAÇÃO EM RONDÔNIA (1982 A 2011) *
HISTÓRIA E MEMÓRIA DE EX-ALUNOS SOBRE A CRIAÇÃO DA UNIR.
Aline Cristina de Almeida Lopes **
Lilian Maria Moser
RESUMO
O presente resumo trata acerca de História e Representações Sociais na UNIR do período de
sua instalação no Estado de Rondônia. Este trabalho objetiva a reconstrução da Memória e das
Representações sociais na UNIR através da História Oral, ou seja, a partir de entrevistas com
ex-alunos e ex-professores a fim de que estabeleçam uma relação indivíduo-sociedade do
período da criação da Universidade Federal de Rondônia, e a partir disto, que se estabeleça
uma melhor compreensão da sociedade.
Palavras-Chave: Unir. História Oral. Representação Social.
INTRODUÇÃO
A presente pesquisa alude sobre o cumprimento do Programa Institucional de Bolsas
de Iniciação Científica - PIBIC/UNIR, e tem por objetivo o estudo da História e das
Representações Sociais na Unir ao longo dos 30 anos de atuação em Rondônia (1982 a 2011).
A pesquisa inicia-se com um breve estudo acerca da história da Universidade no
Brasil. Conforme FÁVEA (2006 p. 20), as primeiras universidades surgem em virtude de
diversos fatores, dentre eles, a influência positivista na política educacional, marcada pela
atuação de Benjamin Constant. Outro fator emblemático para a criação destas instituições de
ensino, seria o chamada "desoficialização" do ensino brasileiro. Nesse contexto (Minchelotto
apud Fávea, 2006 p. 23) surge em 1909, a Universidade de Manaus; em 1911 é instituída a
Universidade de São Paulo, e em 1912, surge a Universidade do Paraná como instituições
livres.
*
Trabalho elaborado a partir de pesquisa científica desenvolvida através do Programa Institucional de
Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC, no período de Agosto de 2011 a Julho de 2012, que tem a finalidade de
mostrar os resultados alcançados diante da problemática acolhida.
*
*
Graduanda em História pela Universidade Federal de Rondônia – UNIR. Bolsista do Programa
Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC e membro do Centro de Documentação e Estudos
Avançados sobre Memória e Patrimônio de Rondônia – CDEAMPRO.
∗
∗∗
Orientadora.
384
Através da Lei N.º 7.011 de 8 de julho de 1982, a Universidade Federal de Rondônia
fora criada, em decorrência da instalação do Estado. No momento da instalação da
Universidade, a região passava por uma série de modificações. Até 1981, de acordo com
FONSECA & TEIXEIRA (2003 p.177), Rondônia pertencia a categoria de Território Federal.
O grande fluxo migratório provenientes de várias regiões do Brasil teve forte influência para
que em 22 de Dezembro de 1981 fosse aprovada a Lei Complementar N.º 41, que criou o
Estado de Rondônia - tendo sua instalação ocorrido apenas no ano seguinte.
De acordo com levantamentos no Acervo Documental do Estado de Rondônia - Jornal
Alto Madeira de 04 de julho de 1982 - verificou-se que em tal período o Estado possuía um
número de matriculados na graduação que girava na em torno de 1.253 (Hum mil, duzentos e
cinquenta e três) alunos, com 10 cursos (UFPA), sendo três deles administrado pelo Centro de
Ensino Superior de Rondônia. Em reportagem encontrada no Jornal Alto Madeira, pouco
tempo antes da inauguração da Universidade, pôde-se observar que além do objetivo de
formar Professores para educação básica, tinha-se o intuito de criar uma Instituição de Ensino
Superior, que tivesse por intuito uma nova missão cultural da Universidade (ensino e
pesquisa), uma nova dimensão, a missão social que supõe e completa a primeira. O mesmo
Jornal abordava sobre as principais funções de um Universidade, quais seriam, tornar-se uma
distribuidora social do saber e participante ativa e dinâmica dos problemas fundamentais da
sociedade, estimulará o desenvolvimento na sua indispensável categoria de globalidade; a
crítica da estrutura incompatíveis com uma sociedade que se transforma; a busca de novas
formas de organização social, mais nacionais e mais humanas; o desenvolvimento do homem
amazônida em toda sua dimensão a preparação de quadros profissionais para nossa
realidade.
Os principais objetivos desta pesquisa era entrevistar ex-alunos e ex-professores da
UNIR e verificar os significados dos aspectos históricos relacionados a esta instituição, a fim
de se colher relatos sobre histórias de vida em torno destes 30 anos da criação da
Universidade Federal de Rondônia, e a partir disto, através da História Oral reconstruir a
representação exercida por esta instituição na sociedade local. Para a realização desta pesquisa
contamos com a colaboração do ex-aluno Sandoval Rodrigues Lopes
Assim sendo, diante das problemáticas propostas pela pesquisa, priorizamos por
conhecer a História e Memória da UNIR através de seus ex-alunos. Para tanto foram
estabelecidos sistemas de visitas, consultas e pesquisas, que viabilizassem nossa aproximação
empírica e o conhecimento de quais foram as Representações Sociais e Memórias advindas da
época.
385
METODOLOGIA
Neste trabalho realizamos uma pesquisa bibliográfica referente à História, Memória, e
Representação. Tal pesquisa foi de caráter fundamental para que pudéssemos analisar as
fontes documentais, quais sejam, a entrevista coletada em Julho de 2012 e jornais do Centro
de Documentação do Estado de Rondônia.
De acordo com A Pesquisa em História o documento durante muito tempo foi visto como
a única garantia do acontecido.Vieira (1989, p. 13) afirmou:
Quando a História recebeu o estatuto de ciência, o que se deu com a
escola positivista em fins do século XIX, o registro privilegiado pelo
Historiador era o documento escrito, sobretudo o oficial. Esse documento
assumia o peso de prova histórica e a objetividade garantida pelo mesmo.
Em relação a isso Le Goff (2008) comenta que os fundadores da Revista dos Annales,
pioneiros de uma Nova História, insistiram sobre a necessidade de ampliar a noção de
documentos.
A História faz-se com documentos escritos, sem dúvida. Quando estes
existem. Mas pode fazer-se, deve fazer-se sem documentos escritos,
quando não existem. Com tudo o que a habilidade do historiador lhe
permite utilizar para fabricar seu mel, na falta de flores habituais. Signos,
paisagens e telhas. Numa palavra com tudo o que pertencendo ao homem,
depende do homem, serve o homem, exprime o homem, demonstra a
presença a atividade, os gostos e as maneiras de ser do homem. Há que se
tornar a palavra documento no sentido mais amplo, a partir de documento
escrito, ilustrado transmitido pelo som, a imagem ou de qualquer outra
maneira. ( LE GOFF, 2008, p. 530)
Através de entrevistas pudemos trabalhar a História Oral com pessoas que fizeram
parte desses 30 anos da UNIR, buscando entender entre outros os que esta instituição
representa para a sociedade. Cabe destacar que utilizaremos a História Oral como fonte de
pesquisa. Segundo Alberti (2010, p. 157) é comum que as pessoas se confundam e
considerem a entrevista de História Oral como a própria "história", levando à ilusão de se
chegar à "verdade do povo". Pesavento (2003, p. 42) explica que através destas fontes é
possível elaborar as representações construídas em determinado período.
Nesta pesquisa trabalhamos com a interdisciplinaridade comentada por BURKE
(1992) em A Escrita da História. Na obra A Escola dos Annales (1929-1989) é destacada
alguns pontos que cabem em nossa pesquisa, quais sejam: a substituição da tradicional
narrativa de acontecimentos por uma história problema e a história de todas as atividades
386
humanas e não apenas uma história política.
Utilizamos um roteiro de perguntas semiestruturadas, com base na História Oral de
Vida defendida por Antonio Torres Montenegro, que oferece ao pesquisador um manual de
como conduzir uma entrevista:
Um estímulo que pode ajudar muitas vezes o entrevistado a acrescentar
novos detalhes ou mesmo a resgatar outras memórias de algum tema
sobre o qual esteja dissertando é a repetição pelo entrevistador da última
palavra dita pelo entrevistado. Ou ainda de expressões como:" mas foi
assim mesmo?" "ah, foi?". Esta técnica, que é utilizada de maneira
informal em qualquer conversa para demonstrar interesse, poderá servir
como nova motivação para o entrevistado acrescentar novos detalhes ao
que está sendo narrado ou evocar outras memórias referentes ao assunto
em tela. As perguntas devem sempre ter um caráter descritivo e evitar
qualquer indução ou juízo de valor. É importante não fazer perguntas
extensas e analíticas. .(MONTENEGRO, 1994 p.150-151)
De acordo com o autor, a História Oral tem como matéria prima a memória que pode
vir à tona através de estímulos diretos que comumente se denomina de memória voluntária,
mas também a partir da memória involuntária que ocorre por meio da própria entrevista. "O
entrevistador deverá colocar-se na postura de parteira de lembranças, facilitador do processo
que se cria de resgatar as marcas deixadas pelo passado na memória" (MONTENEGRO, 1994
p. 150). E foi, através deste conhecimento que buscamos resgatar as representações acerca da
UNIR, quando de sua criação.
Conforme metodologia apresentada no projeto ora proposto, cumprimos, até o
presente momento, algumas das tarefas contidas em nosso cronograma de trabalho, quais
sejam: consultas bibliográficas, a fim de encontrar referencial teórico e metodológico,
pesquisa documental, bem como entrevistas. Buscamos, em caráter essencial, compreender
através do recurso da entrevistas, utilizando o método da História Oral e ainda, através das
bibliografias que relação a Universidade Federal de Rondônia estabeleceu com os atores
sociais da época de sua inauguração e sua importância para a sociedade da época, como um
todo.
RESULTADOS
Neste trabalho buscamos a construção da História da Universidade Federal de
Rondônia, através da História Oral. Por meio da entrevista com o ex-aluno Sandoval
Rodrigues Lopes, pudemos observar a representatividade exercida pela Universidade Federal
387
quando de sua criação e inicial estruturação.
Nascido em Guajará-Mirim, o ex-aluno Sandoval passou a estudar na Universidade
Federal de Rondônia, antes da mesma receber esta titulação. Bolsista do extinto CESUR Centro de Ensino Superior de Rondônia, fez parte da turma inicial de Administração de
Empresas, que fora a primeira turma a se formar da Universidade Federal de Rondônia. Viveu
o período de transição e criação da UNIR.
A partir da entrevista coletada extraímos alguns em destaque. Primeiramente, a
questão da implementação de uma Universidade Federal em Rondônia a partir da instalação
do recente Estado. Sandoval também relata que a primeira turma de alunos da Universidade
era formada, em sua maior parte, por alunos com condições financeiras favoráveis e já a
algum tempo distante da escola.
Parte significativa da entrevista é retratando sobre como o nível superior era visto na
época, como fazer parte de uma universidade era grandioso, conforme trecho:
“O curso superior na época, aqui em Rondônia, no início da década de 80,
era um sonho pra qualquer pessoa. Até mesmo para as pessoas com poder
aquisitivo melhor, porque normalmente eles mandavam os filhos para
outros estados, pra estudar em Manaus, Belém, Rio, São Paulo. Então,
quer dizer, pra os moradores de Rondônia e também para os nascidos em
Rondônia era um sonho, inclusive a própria família, os vizinhos, os
parentes, os amigos, vibraram muitos quando nós conseguimos entrar na
faculdade, no caso, porque, digamos de cada mil pessoas em Porto Velho,
uma conseguia - porque a população ainda era pequena - entrar na
Universidade pra fazer o curso superior. E assim, graças a Deus, eu me
senti na época como um precursor. No bairro em que eu morava, fui o
primeiro a entrar na faculdade(...) Então, eu, meio que servi de exemplo
tanto para os meus irmãos - sou o mais velho de nove irmãos, como para
os vizinhos, os amigos, os parentes. “
Conforme análise da entrevista, a representação exercida pela criação da Universidade
tinha na sociedade da época um forte apelo emocional, demonstrando-se como um degrau
para uma nova vida.
O nosso narrador aborda acerca do inicial desconforto quanto as diferenciações
socioeconômicas encontradas, e posteriormente, a existência de uma integração entre os
desiguais, de acordo com trecho a seguir:
“Olha, sinceramente, inicialmente eu sentia até um pouco de vergonha,
porque a grande maioria dos meus colegas, digamos que dos 40
estudantes, uns 30, possuía um carro. E eu lembro bem que eu morava
mais ou menos uns três kms da universidade, eu ia de bicicleta e tinha uma
colega que morava próximo a minha casa que ia na garupa da minha
388
bicicleta e no início eu me sentia um pouco envergonhado(...) mas depois
eu fui me acostumando. Só que aí foi muito bom, porque eu sempre fui
muito tímido, a convivência me abriu muito os horizontes, a cabeça,
principalmente com gente mais idosa que eu.. além dos professores, é
claro.
Sandoval aludiu sobre a formação do corpo docente, que em sua maioria, fazia parte
anteriormente da SEPLAN (Secretária Estadual de Planejamento) e da competência dos
mesmos. Do orgulho de ter aulas com determinados professores, de estar na Universidade.
Em outro trecho da entrevista o ex-aluno tratou sobre a popularidade da Universidade
Federal de Rondônia quando da sua criação - encontrando-se entre um dos três temas mais
comentados no início da década de 80.
Por fim, demonstrou em seus relatos que a representação construída no periodo da
instalação da UNIR, mantém-se de certo modo, ainda presente, de acordo com o seguinte
trecho:
Eu sempre vou lembrar com muito carinho da UNIR, por mais problemas
que ela tenha... Problemas acontecem conosco também, seres humanos. A
UNIR é uma entidade que está caminhando com suas próprias pernas, é
maior de idade. Os problemas acontecem, mas eles estão aí pra serem
resolvidos.
Construindo através destes apanhados de trechos uma espécie de representação social
da UNIR na década de 80. Cabe destacar ainda que não pretendemos trazer a "verdade" sobre
a UNIR, trazemos apenas uma interpretação, dentre muitas outras que podem ser realizadas
pelos Historiadores. Acerca disto Jenkins em A História Repensada comenta:
A História é um discurso em constante transformação construído
pelos historiadores e que da existência do passado não se deduz
uma interpretação única: mude o olhar, desloque a perspectiva, e
surgirão novas interpretações[...] a verdade deve ser entendida
como um conjunto de procedimentos regulados para a produção,
a lei , a repartição, a circulação e o funcionamento dos
enunciados. A verdade está ligada a sistemas de poder que a
produzem e sustentam. (JENKINS, 2009 p. 35-59)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme já aludida neste relatório, pretendemos construir um conhecimento no que
diz respeito à trajetória da Universidade Federal de Rondônia, refletindo objetivamente como
fator primordial, as representações sociais criadas nos primeiros anos de atuação no Estado de
Rondônia.
389
Para tal empreitada realizamos primeiramente leituras a cerca do assunto na tentativa
de apreender base teórica para sustentar nossa investigação. Posteriormente nos debruçamos à
História Oral, através das entrevistas, buscando criar um esboço da Representação Social que
a UNIR exercia quando de sua criação.
Ressaltamos que conforme apresenta nosso cronograma de trabalho faltam ainda
algumas etapas da pesquisa documental e entrevistas das historias orais de vida de técnicos,
professores e alunos, bem como pretendemos ainda nos aprofundar, sobretudo em todo e
qualquer escrito sobre a Universidade investigando a legitimidade de cada documento visando
tentear com fidedignidade que representações sociais foram geradas quando houve a criação
da Unir e a posteriori, ao longo de sua trajetória nesses trinta anos.
REFERÊNCIAS
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BOSI, Ecléa. Memória e Sociedade. Lembrança de Velhos. 3ªed. São Paulo. Cia das Letras,
1994.
BURKE, Peter (Org). A Escrita da História: novas perspectivas. São Paulo: Editora da
Unesp, 1992.
BURKE, Peter. A Escola dos Annales. São Paulo: Brasiliense, 1992.
CHARTIER, Roger. À Beira da Falésia: a História entre certezas e inquietude. Porto
Alegre: Editora da Universidade/UFRGS, 2002.
HALBWACHS, Maurice. A Memória Coletiva. São Paulo: Centauro, 2009.
JENKINS, Keith. A História Repensada. São Paulo: Contexto, 2009.
MONTENEGRO, Antônio Torres. História Oral e Memória: a Cultura Popular
Revisitada. São Paulo: Contexto, 1994.
SILVEIRA, Eder da Silva. História Oral e Memória: a construção de um perfil de
Historiador-Etnográfico. Ciência e Conhecimento - Revista Eletrônica da ULBRA São
Jerônimo - Vol. 01, 2007, HISTORIA, A.2
390
MAL-ESTAR SUBJETIVO DE JOVENS MULHERES E SUAS DEMANDAS
RELIGIOSAS
83
84
Ana Lígia Oliveira de Freitas
Melissa Andréa Vieira de Medeiros
RESUMO
Este trabalho trata da relação entre mal-estar subjetivo de jovens mulheres e suas demandas
religiosas, como forma de apaziguar um mal-estar subjetivo. O referencial teórico utilizado é
a Psicanálise, onde Freud tenta entender a tendência do homem a se aproximar da religião e
acreditar em suas promessas de vida eterna. Assim, vê-se que o ser humano está diante do
perigo iminente da perda, e o anseio pelos deuses acompanha o caminho da humanidade,
evidenciando uma tentativa de diminuir os males da natureza, aliviando o homem da verdade
de seu padecimento. A pesquisa foi um estudo qualitativo, realizado com 08 mulheres usando
como instrumento uma entrevista semi dirigida. O objetivo desse estudo é promover um
estudo do mal-estar subjetivo e suas expressões em jovens mulheres e suas demandas
religiosas como forma de apaziguar esse mal-estar subjetivo.
Palavras-chave: Religião. Feminino. Mal-estar subjetivo.
ABSTRACT
This paper discusses the relationship between young women and the search for religion as a
way to appease a malaise subjective. The theoretical basis is psychoanalysis, which Freud
tries to understand the tendency of man to approach and believe in the promises of eternal life.
Thus, we see that human beings are facing the imminent danger of loss, and longing for the
gods follows the path of humanity, showing an attempt to diminish the evils of nature,
relieving the man of the truth of their suffering. The study was a qualitative study, conducted
with 08 women using an instrument a semi driven. The aim of this study is to promote a study
of this ill-r subjective and its expressions in young women and their religious demands as a
way to appease this malaise subjective.
Keywords: Religion. Women. Malaise subjective.
INTRODUÇÃO
Este trabalho apresenta uma parte do referencial teórico usado na pesquisa realizada
em 2011-2012 sobre feminino e religião. Apresenta também sua metodologia e considerações
finais. Tem como objetivo apresentar de forma resumida a pesquisa realizada. No primeiro
83
84
Orientanda, matriculada no 7º período do curso de Psicologia.
Orientadora, professora do departamento do curso de Psicologia.
391
momento será apresentado o referencial teórico sobre jovem adulto, feminino, religião e malestar subjetivo, em seguida o método de realização da pesquisa e instrumentos utilizados e por
fim as considerações finais da pesquisa, mostrando seus resultados.
DESENVOLVIMENTO
A religião é um tema que está muito presente nas referências psicanalíticas
evidenciando a curiosidade de Freud pela mesma. Ela atravessou várias épocas e culturas e
desde sempre se mostra como uma instituição reguladora da moral e dos costumes, o que não
se faz de maneira diferente na contemporaneidade.
Quando Freud trata de religião não se atém apenas a sua função de coerção da
vontade, mas discute sobre como se dá a natureza desse vínculo, tentado entender a tendência
do homem a se aproximar e acreditar nas ilusões de plenitude e promessas de vida eterna.
Freud expõe que o desejo humano quando contraposto as restrições impostas pela
cultura, reafirmados pela religião, pode acarretar em doenças de ordem nervosa, pois a
repressão dos desejos tem importância primordial no adoecimento psíquico. Assim, o papel da
religião na comunicação e controle da civilização é grande e persiste em várias obras
freudianas.
Sua crítica se potencializa quando fala sobre a inadequação do que prega a cultura à
condição humana:
A severidade das normas repercute diretamente sobre a vida social,
pois os sacrifícios impostos ao sujeito têm como decorrência o
incremento das doenças nervosas no último século. A ordem social,
em nome de uma convivência harmônica, exige do sujeito algo que o
ultrapassa, ou seja, na leitura psicanalítica, o limite que define o
humano situa-se muito aquém das exigências da cultura. (OLIVEIRA,
2002.)
Em “O futuro de uma ilusão” (1927), Freud registra sua crítica mais aguda sobre a
religião quando trata de sua função na civilização, mostrando que a religião tem como papel
oferecer uma satisfação substitutiva às renuncias impostas ao humano pela sua própria
estrutura psíquica e pela vida comunitária, ou seja, pretende conciliá-lo com os valores
culturais.
Nesse sentido, vê-se que o ser humano está diante do perigo iminente da perda; a cada
instante se depara com a fragilidade de seu corpo, com as limitações de sua existência e a
392
aproximação da morte; por isso, o anseio pelos deuses e ídolos encontrados, principalmente
nas religiões, acompanha o caminho da humanidade, evidenciando uma tentativa de diminuir
os males da natureza, aliviando o homem da verdade de seu padecimento.
Há os elementos, que parecem escarnecer de qualquer controle
humano: a terra, que treme se escancara e sepulta toda a vida humana
e suas obras; a água, que inunda e afoga tudo num torvelinho; as
tempestades, que arrastam tudo o que lhes antepõe; as doenças, que só
recentemente identificamos como sendo ataques oriundos de outros
organismos e, finalmente, o penoso enigma da morte, contra o qual
remédio algum foi encontrado e provavelmente nunca será. É com
essas forças que a natureza se ergue contra nós, majestosa, cruel e
inexorável; uma vez mais nos traz à mente nossa fraqueza e
desamparo de que pensávamos ter fugido através do trabalho da
civilização (FREUD, 1927, p.27).
Esse fragmento traz consigo o desamparo do ser humano diante as forças da natureza,
pois há um limite na criação humana. E se a religião é uma das maneiras inventadas pelo
homem para lhe dar maior proteção devido sua fragilidade, então sobra algo que revela seu
temor diante da vida, sua condição de ser finito evidenciado por um corpo que perece e pela
certeza de uma morte que não tarda em alcançá-lo.
É a isso que Freud chama a atenção: aos exageros dessa tentativa da civilização de
suprimir o mal-estar inerente ao ser humano, deixando clara a impossibilidade de a cultura
proteger o sujeito dos perigos reais e imaginários por completo. Desse modo, segundo Freud,
é a religião que deve dar conta desse desamparo e responder aos mistérios da existência.
O homem tem necessidade de construir algo para se espelhar e seguir, dando um
significado a sua existência. É na religião, onde há a crença em deuses e ídolos e em uma
verdade celestial, que essa necessidade pode ser satisfeita. Essas crenças regem o regulamento
social e fazem o homem sentir-se mais protegido diante de seu desconhecimento. Assim, a
religião pode ajudar a apaziguar o mal-estar subjetivo do homem e até mesmo psicossomático
de suas enfermidades fazendo uso de seu poder de explicação do universo e promessa de vida
eterna.
MÉTODO
A pesquisa realizada foi de cunho qualitativo e buscou uma análise subjetiva de jovens
mulheres e seu perfil religioso em duas instituições religiosas distintas de Porto Velho. O
393
presente estudo teve como objetivo geral fazer um estudo do mal-estar subjetivo atual e suas
expressões em jovens mulheres em busca da religião como forma de apaziguar esse mal-estar.
A escolha por essa abordagem se deveu ao fato de que
A abordagem qualitativa parte do fundamento de que há uma relação
dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma interdependência viva entre o
sujeito e o objeto, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a
subjetividade do sujeito. (CHIZZOTTI, 2010, p.79).
Vale salientar que a escolha pela pesquisa qualitativa, utilizando entrevista não
diretiva, se deu para permitir uma maior liberdade aos entrevistados para falar sobre seu
cotidiano, sem preocupações com o produto final, ou seja, o conhecimento produzido através
das falas não busca igualar todos os conteúdos a um produto definitivo.
Como nos esclarece Chizzotti (2010, p. 92) “a entrevista não-diretiva, ou abordagem
clínica, é uma forma de colher informações baseadas no discurso livre do entrevistado”.
Por tais características devemos ressaltar a importância do papel do pesquisador.
O pesquisador é parte fundamental da pesquisa qualitativa. Ele deve,
preliminarmente, despojar-se de preconceitos, predisposições para assumir
uma atitude aberta a todas as manifestações que observa, sem adiantar
explicações nem conduzir-se pelas aparências imediatas, a fim de alcançar
uma compreensão global dos fenômenos. (CHIZZOTTI, 2010, p. 82).
Outro aspecto que deve ser característico dos entrevistadores é quanto à escuta.
O entrevistador deve manter-se na escuta ativa e com atenção receptiva a
todas as informações prestadas, quaisquer que sejam elas, intervindo com
discretas interrogações de conteúdo ou com sugestões que estimulem a
expressão mais circunstanciada de questões que interessam à pesquisa.
(CHIZZOTTI, 2010, p.93).
Assim, não foi preocupação dessa pesquisa criar generalizações, mas apenas produzir
uma discussão epistemológica, em face às problemáticas levantadas.
A Epistemologia Qualitativa defende o caráter construtivo interpretativo do
conhecimento, o que de fato implica compreender o conhecimento como
produção e não como apropriação linear de uma realidade que se nos
apresenta. (GONZÁLES REY, 2005, p.5).
Para analisar os dados dessa pesquisa, fizemos uso de uma técnica denominada
inferência do texto, onde se procuram conteúdos latentes tanto no dito quanto no não dito do
394
sujeito, o que vai ao encontro do método utilizado pela psicanálise. “Por detrás do discurso
aparente geralmente simbólico e polissêmico esconde-se um sentido que convém desvendar”.
(BARDIN, 1977, p.14).
Ressaltando esse aspecto utilizamos Chizzotti (2010, p. 98) “o objetivo da análise do
conteúdo é compreender criticamente o sentido das comunicações, seu conteúdo manifesto ou
latente, as significações explícitas ou ocultas”.
Vale destacar ainda, que a análise dos dados é a Análise de Conteúdo de Bardin
(1977), na categoria temática, onde os temas serão destacados a partir das falas dos
colaboradores.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O grande objetivo deste estudo foi investigar jovens mulheres em busca da religião
como apaziguadora de seu mal-estar subjetivo. Querer entender como se dá essa relação entre
religião e jovens mulheres foi o que motivou a realização desta pesquisa.
Assim, no decorrer da pesquisa foi possível compreender a relação que existe entre
essas jovens mulheres e a busca pela religião como um alívio, um consolo para suas aflições,
o que é evidenciado em cada fala das colaboradoras desta pesquisa.
Embora o mal-estar subjetivo em jovens mulheres não deva ser investigado apenas
pelo olhar da religião, a partir das falas analisadas nesta pesquisa, pode- se perceber a
importância da religião na vida dessas mulheres, no sentido de subtrair mal-estares de suas
vidas.
Segundo Freud (1930) a religião é um
[...] sistema de doutrinas e promessas que, por um lado, lhe explicam
os enigmas deste mundo com perfeição invejável, e que, por outro,
lhe garantem que uma Providência cuidadosa velará por sua vida e o
compensará, numa existência futura, de quaisquer frustrações que
tenha experimentado aqui. (p. 26).
A partir disso, Freud (1927) mostra que o homem continua desamparado e buscando
deuses, junto a esse desamparo.
O desamparo do homem, porém, permanece e, junto com ele, seu
anseio pelo pai e pelos deuses. Estes mantêm sua tríplice missão:
exorcizar os terrores da natureza, reconciliar os homens com a
crueldade do Destino, particularmente a que é demonstrada na morte,
395
e compensá-los pelos sofrimentos e privações que uma vida civilizada
em comum lhes impôs. (p. 82).
Desse modo, a partir da análise desta amostra proposta, pode-se perceber que há um
mal-estar nessas jovens mulheres e a busca pela religião como apaziguadora desses malestares. Tudo isso pode ser percebido nas falas das colaboradoras.
No entanto, destacamos também a visão que elas próprias têm da mulher atual. O ser
mulher ainda é definido por traços essenciais como sensibilidade, capacidade de cuidar,
maternidade. Ou seja, o conceito de feminilidade permeia a definição de mulher em suas
falas. Uma delas ainda afirma que a mulher é mais aceita pela sociedade se ela seguir os
princípios da “verdadeira mulher”, ou seja, sendo o negativo do homem, o ser subordinado,
“O outro”. “[...] a “verdadeira mulher” é a que se aceita como Outro.” (BEAUVOIR, 1980, p.
307).
Em meio a isso, mesmo que de acordo com essas falas a religião tenha grande
importância como apaziguadora de mal-estar subjetivo, não podemos afirmar que isso se
aplique a todas as mulheres.
Salientamos que este estudo se tratou de uma iniciação científica, portanto, estas
conclusões não podem ser tomadas como absolutas ou definitivas. Compreendemos que há
uma grandeza de possibilidades de interpretação do tema em estudo. Porém, considero os
dados obtidos de grande relevância, pois houve um grande esforço para responder a todos os
objetivos propostos a esta pesquisa.
REFERÊNCIAS
BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977.
BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo. Trad. Sérgio Milliet. 6.ed. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1980. 1 e 2.v.
CHIZZOTTI, Antonio. Pesquisa em ciências humanas e sociais. 11. ed. São Paulo: Cortez,
2010.
FREUD, S. (1927). O futuro de uma ilusão. In: Edição Standard Brasileira das Obras
Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1969.
______ (1930) O mal-estar da civilização. In: Edição Standard Brasileira das Obras
Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1969.
396
GONZÁLES REY, F. Pesquisa qualitativa e subjetividade: os processos de construção da
informação. São Paulo: Thomson, 2005.
OLIVEIRA, Daniella Coelho de. O texto freudiano como analisador da cultura: uma
resposta aos discursos totalizantes da ciência e da religião. Revista Mal-Estar e
Subjetividade. v.2 n.2. Fortaleza set. 2002.
CONTATOS
Orientanda: Ana Lígia Oliveira de Freitas.
E-mail: [email protected]
Orientadora: Melissa Andréa Vieira de Medeiros
E-mail: [email protected]
397
ASSENTAMENTO RURAL SOB ENFOQUE DE GÊNERO: UMA ANÁLISE DO
PDSA NAZARÉ E BOA VITÓRIA
Ana Carla Taborga da Silva85
Profa. Dra. Maria Das Graças Silva Nascimento Silva86
RESUMO
A pesquisa se insere dentro do campo rural ribeirinho, foi desenvolvida no Assentamento
PDSA Nazaré e Boa Vitória, e tem como principais objetivos levantar as propriedades
pertencentes às mulheres titulares deste lote, e identificar a participação de homens e
mulheres na organização social e espacial em meio aos movimentos sociais, desse
assentamento, onde buscou também verificar de que forma que se organizam e utilizam as
técnicas aplicas ao lote. Essas mudanças estão associadas aos Movimentos que veem cada
vez, mas adentrando no meio rural campo e rural ribeirinho, que trazem mudanças para as
questões de gênero neste espaço. O que intitula a presença feminina mesmo que invisibilizada
na transformação desse território.
Palavras-chave: Gênero. Ribeirinho. Movimentos Sociais.
ABSTRACT
The research falls within the coastal rural countryside, being developed in the Settlement and
Good PDSA Nazareth Victoria, and has as main objectives to raise the properties belonging to
women owners of this lot, and identify the participation of men and women in social and
spatial structure in the middle social movements, this settlement, which also sought to
determine how to organize and use the techniques aplicas the lot. These changes are
associated with movements that see time, but entering in the rural countryside and coastal
countryside, bringing changes to gender issues in this space. What entitles the presence
feminine even though invisibly in the transformation of this territory.
Keywords: Gender, Riverside, Social Movements.
INTRODUÇÃO
O presente artigo tem a finalidade de demonstrar os resultados obtidos com a pesquisa
realizada no assentamento, rural sob o enfoque de gênero: Uma análise do PSDA Nazaré e
85
Bolsista PIBIC/CNPQ. Acadêmica de Geografia da Fundação Universidade Federal de Rondônia – UNIR.
([email protected]).
86
Orientadora. Professora do departamento de Geografia ([email protected]).
398
Boa Vitória, tendo como objetivo colaborar para uma melhor compreensão acerca do tema,
que se caracteriza em um grande desafio, o alcance da igualdade entre homens e mulheres na
discussão de gênero. Onde foi desenvolvido, no ano 2011 e 2012, um plano de trabalho
realizado com os titulares dos lotes do assentamento Nazaré e Boa Vitória.
A pesquisa abordou uma observação simples onde nos possibilitou descrever e
compreender mais detalhadamente o PDSA, no que se refere às relações sociais sob um olhar
no enfoque de gênero, onde a comunidade está passando por um processo produtivo de
isolamento para o mercado consumidor assim ganhando seu espaço na produção e
desenvolvimento. Diante desse novo contexto de desenvolvimento com o plano do PDSA,
está havendo uma nova construção no espaço ribeirinho em relação ao meio de produção e
nos movimentos sociais, o assentamento foi criado com o intuito de que essa população
tradicional permaneça no seu local de origem e que não venha interromper seu modo de vida
nem todo seu contexto histórico, já que a implantação de uma organização social configura
todo o espaço que é ocupado por certa comunidade, a partir das suas conquistas que permitem
um melhor modo de viver para a sociedade presente e grande possibilidades das melhorias
para gerações futuras. O desenvolvimento em um contexto geral remete ao processo de
produção, crescimento econômico e mudança no padrão de vida das pessoas em diversas
comunidades.
Mesmo diante de tantas dificuldades, que não são poucas, o ribeirinho cultiva no seu
tempo e sabedoria que tem em relação com a natureza e ao ambiente de onde extrai seu meio
de subsistência, as comunidades tradicionais diante de muitos entraves os/as agricultores/as
têm consenso que suas estruturas sociais e econômicas são extraídas da fonte onde a riqueza
de poder está baseada na terra, assim, se desmatarem ou poluírem as margens do rio correm o
risco de não terem sucesso em suas produções e por diante sofrerem com a falta da lavoura.
Além disso, temem em ficar sem algumas espécies de peixes no local onde desenvolvem as
atividades pesqueiras tanto para subsistência ou para o mercado em pequena escala, muita das
vezes local.
Embora com tantos empreendimentos que há na comunidade, alguns agricultores/as
ficam sem acesso as informações pelo fato de morarem em locais de difícil acesso, e assim
perdem a oportunidade que são as melhorias para a produção e desenvolvimento da sua mão
de obra.
Para a demarcação dos lotes que é de uso coletivo, a participação dos órgãos
governamentais INCRA, IBAMA tem um trabalho importante, pois o assentamento tem ao
seu redor duas reservas extrativistas e devido todo o processo que utilizam para demarcação
399
dessas terras os titulares não se sentem contemplados com os mesmos, pois a proximidade
com as reservas dificulta e limita as demarcações. O INCRA (Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária), juntamente com o IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Renováveis), são os órgãos que demarcam as áreas dos lotes.
Através dessa peculiaridade que adentra a esse assentamento dificultando a
necessidade do desenvolvimento social, crescimento econômico interno na própria
comunidade, faz necessário eleger representantes para que possa estabelecer e direcionar a
toda comunidade especificamente aqueles que são membros da associação AMPAN
(Associação de Moradores Produtores e Amigos de Nazaré), e os assentados titulares dos
lotes, que integram o PDSA, onde toda instrumentalização de desenvolvimento local venha
ocorrer através do esforço coletivo em aproveitar as potencialidades que o local oferece.
Dessa forma, as entidades representativas como associações venha de maneira participativa
contribuir tanto nas atividades em grupos como nas reuniões de decisões que são destinadas
para homens e mulheres agricultores/as que ali buscam melhorias no seu modo de produção e
nas políticas voltadas para a discussão das relações sociais que vem se fortalecendo cada vez,
mas nesse espaço de comunidade tradicionais.
Para a pesquisa utilizou-se questionário e experiência de vivenciar o cotidiano dessas
pessoas, onde buscou verificar como que se organizam tanto para a produção como em
participação nos movimentos sociais, sempre analisando a discussão de gênero partindo do
principio da nossa pesquisa, sempre priorizando de como a cultura determina a organização
espacial da área ocupada, as pessoas a serem pesquisadas são os que possuem titulo do lote
em seu nome. Segundo dados do INCRA (Instituto Nacional colonização Reforma Agrária) o
PDSA- Nazaré e Boa Vitória e constituído por 99 titulares do lote, distribuído com 66
assentados em Nazaré e 33 em Boa Vitória, desse universo 14 são do sexo feminino e 85 são
do sexo masculino dados que nos foram cedido no ano 2011.
METODOLOGIA
Gênero agrega a dimensão social e cultural da diferença sexual, adotando a perspectiva
da construção social dos papéis sociais que devem ser desempenhados por homens e
mulheres, e nega a construção universal das diferenças, implicando a compreensão dos papéis
em determinada estrutura temporal e espacial. (Silva, 2011, p 26).
400
A pesquisa implica em um estudo de caso de abordagem qualitativa e quantitativa. De
acordo com Gil (2002), o estudo de caso refere-se ao estudo de um caso considerado, um
grupo social do Assentamento Rural PDS Nazaré e Boa Vitória.
Em conformidade com Siena (2007) a pesquisa qualitativa tem um processo de
reflexão e análise da realidade através da utilização de métodos e técnicas para a compreensão
detalhada do objeto de estudo em seu contexto histórico e segundo sua estruturação. Já a
quantitativa é caracterizada pela quantificação na coleta e tratamento de dados, busca
classificar e compreender os fatos ocorrentes de uma forma objetiva e precisa.
RESULTADOS E DISCUSSÔES
Os resultados a seguir são em relação ao quantitativo dos/as titulares dos lotes PDSANazaré e Boa Vitória mais especificamente as mulheres. E qual tipo de técnica que os
mesmos utilizam em meio à produção, analisando se há produções diversificadas por homens
e mulheres, mediante qual produto que comercializam e que se destina à sua subsistência
familiar, verificou-se, também, se à participação nos movimentos sociais tanto das mulheres
como os homens ocorre da mesma maneira.
Estudos da Ciência Geográfica que discute a equidade e construção social de gênero
conceitua a igualdade de oportunidade entre homens e mulheres, seja no espaço público ou
privado.
Um dos entraves que limitam as mulheres terem acesso do titulo do lote é não ter
participação expressiva enquanto a titularidade é a forma como o INCRA exige em beneficiar
as famílias, um dos principais fatores são os documentos necessários para que possa fazer
parte da seleção em ser proprietário/a do lote.
O quantitativo entre sexo masculino e o feminino donos/as dos títulos do
assentamento Nazaré e Boa Vitória. A representação feminina chega a um total de 21%,
constatando-se que são minoria as mulheres titulares dos lotes.
O sexo masculino está representado em 79% do total dos assentados que possuem os
títulos de posse dos lotes, do instrumento aplicado o valor equivale a um quantitativo de 42
dos entrevistados que são homens e o restante no total de 11 são as mulheres donos/as de
lotes, totalizando 53 entrevistados (as).
Outro resultado que foi obtido é em relação ao uso das técnicas utilizadas, aplicadas
e direcionadas na produção da agricultura entre homens e mulheres e como manuseiam para
melhorias a sua mão de obra, fica explícito com 40%, que muitas utilizam a capina como
401
melhor forma de preparo da terra para produção, e em segundo plano fica com total de 30% o
roçado pelo fato de muitas terem que desempenhar muitas funções relacionadas ao seu
cotidiano, e em terceiro lugar 20%, opta pela utilização da queima, mas com uma ressalva a
utilização do fogo só ocorre quando as mesmas vão mudar a lavoura, e outras, mulheres não
nos informaram de que forma utilizavam ou aderiam algum tipo de técnica para a produção e
melhoria no lote.
Constatou-se no que se refere aos homens que possuem o título do lote, alguns
afirmaram que a utilização da capina é de 31% na manutenção da terra, agora 41% constatou
o manuseio do roçado, e da mesma forma que as mulheres a utilização da queima com 19% é
para troca do plantio, e 9% não informaram qual técnica utilizar para o preparo da terra. Em
relação à técnica da queima os produtores usam com receio devido o lote ser coletivo e o fogo
atingir a produção de outro titular.
Para poder entender a forma que homens e mulheres se organizam para
comercializarem sua produção, serão equiparados os dois gráficos que demonstrará qual e o
produto e o quantitativo que os mesmo produzem. Sobre a discussão entre os gêneros há uma
diversificação expressiva no que modula essa comunidade ribeirinha na produção para o
comercio, onde a atividade que esses/as agricultores/as desenvolvem, entre homens como as
próprias mulheres são para atender em pequena escala alguns comércios do município de
Porto Velho dependendo do tipo da produção. E por eles produzirem com menor intensidade
esses moradores das áreas ribeirinhas muitas das vezes são chamados de preguiçosos, pode
compreender que essa argumentação em um método mal aplicado que não considera vivência
de cada grupo. O modo de produção o ribeirinho não é preguiçoso, o processo produtivo
depende de vários fatores: o principal fator é a quantidade da mão de obra que atuam na
produção (agricultura familiar), como se trata de produção pequena, qualquer alteração trará
consequência quanto ao produto sendo uma única fonte de renda. O produto que essa
comunidade cultiva é a melancia, sendo dessa forma a maior produtora de melancia do baixo
madeira para a venda tanto no comércio do município de Porto Velho como para cidade de
Manaus, logo em seguida encontra-se a farinha como sendo os produtos que mais dão retorno
financeiro para esses produtores, sendo uma comunidade tradicional nos surpreende a
atividade pesqueira, a plantação da mandioca e extração do açaí não serem um dos principais
produtos destinados à comercialização tanto quanto para subsistência.
A mulher passa ter acesso à participação no espaço público a partir da década de
setenta, quando o governo começa a implantar políticas públicas depois de muitas lutas,
assim, elas passam a iniciar um novo caminhar mesmo a pequenos passos, é um dos ganhos
402
lentos que as mulheres se beneficiaram foi autonomia em seu próprio corpo, havendo o
controle da taxa de fecundidade o governo teve uma importante participação nesse processo,
como a implantação nos postos de saúde os anticonceptivos para o controle da fecundidade.
A presença da mulher na discussão sobre movimentos sociais ainda nessa comunidade
ribeirinha é muito recente e pouco discutida, das mulheres que participam muitas delas tem
algum benefício que adquiriu fazendo parte da Associação de Moradores Produtores e
Amigos de Nazaré (AMPAN), como a carteira de pescadora profissional que assegura essas
moradoras no tempo da defesa pesqueira, recebendo um quantitativo em dinheiro para que
não fique desamparada e outros benefícios que as mesmas expuseram.
Mesmo que essas mulheres, trabalhadoras, mães, esposas tenham um modo de viver
prazeroso e diferenciado, ainda há muito que lutar e assegurar o que for pertinente para sua
sobrevivência, pois, sua dupla jornada de trabalhar no campo e ter que se dedica a família o
trabalho acaba lhe privando de ter acesso ao espaço público e se limitando ao espaço privado.
A mulher da qual estamos nos reportando ocupa o espaço anacumênicos: espaços onde a vida
é excessivamente difícil, lugares habitados de transitória, nesse caso a metáfora simboliza
lugares onde a presença das mulheres é especialmente difícil e onde sua sobrevivência não
depende da natureza, mas de seu empenho em transformar relações de gênero historicamente
construídas.
Mesmo com as novas transformações no cotidiano dessas famílias, e no esforço de
adquirir possibilidade na autonomia social, econômica a mulher ainda exerce o papel
fundamental no contexto familiar.
O homem por ocupar o espaço direcionado ao público tem mais acesso a
transformação que ocorre em meio à sociedade e se privilegia com mais benefícios do que as
mulheres, já que as mulheres estão direcionadas a atividade doméstica não remunerada,
relacionada à reprodução, material ou simbólica, das pessoas (alimentação, saúde,
educação...). Na pesquisa há também aqueles titulares que não participam ou já participaram e
saíram devido a motivos que não lhes agradaram. Alguns disseram ter saído devido não ver
resultado advindo da mensalidade que era paga para a associação, o custo era de 3,00 reais
passando para 5,00 reais, outros questionamentos dos ex-associados seriam quando precisava
utilizar qualquer que seja o equipamento conseguido pela associação tinha uma resistência do
responsável, mediante, ter que pagar uma taxa de três reais para o uso, e assim, desagradando
os que precisavam do apoio da associação.
403
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa apontou para resultados voltados à discussão das relações sociais,
especificamente sob o enfoque de gênero que discute como homens e mulheres, moldam esse
espaço nessa comunidade tradicional. O modo de vida dessa comunidade ribeirinha tem o
mesmo modo de vida do agricultor rural campo, pois ambos dependem da terra e de seu
cultivo, onde o meio em que se produz não ultrapassa sua necessidade cotidiana, como para
subsistência e pequenas comercializações.
Considerando os resultados finais possibilitaram uma compreensão a cerca das
relações de gênero no cotidiano dos/as titulares, nos esclarecendo quais as formas relacionais
quanto ao gênero no espaço referido, assim, muitas vezes notam diferenciação como ocupam
mesmo espaço de formas diferente, desses e dessas titulares. A mesma possibilitou, como
resultado de analise, um levantamento das propriedades pertencentes às mulheres nos
assentamentos, constatando que entre o gênero masculino representado com 79% e feminino
21%, desse universo a mulher ainda ocupa um espaço muito pequeno mesmo com políticas
publicas voltadas a beneficiar as mesmas junto ao desenvolvimento do assentamento.
Na pesquisa analisou a diferença relacionada ao uso das técnicas aplicadas ao manejo
da terra, bem como as produções realizadas por homens e mulheres, mediante as novas
transformações que vem ocorrendo nesse espaço, à mulher ainda desenvolve uma dupla
jornada como casa + roçado, mesmo praticando toda tarefa na produção ela utiliza as técnicas
manuais, como roçados, queima, capina, tanto quanto os homens, em meio à técnica que esses
agricultores utilizam esta ocorrendo uma transformação no campo para que a produção seja
destinada com qualidade aos compradores, e diante dessa discussão brevemente está se
instalando na comunidade uma cooperativa resultado das conquistas.
As transformações ocorridas nesse espaço, só foram compreendidas a partir de estudos
que contextualizou e analisou todo processo histórico dessa comunidade ribeirinha. Obtendo
fatos relevantes de cada ação social que movimenta e dinamiza um todo. Onde cada ação nos
movimentos sociais parte primordialmente do lugar particular de cada individuo, podendo
assim, se relacionar com o grupo familiar ou coletivo.
A participação desses titulares em meio a movimentos sociais e políticas publicam,
pode ter uma participação dos homens mais expressiva do que das mulheres, devido elas
terem que conciliar seu espaço privado com público, no que se refere aos homens à
participação e mais significativa e por isso é quem toma as principais decisões quando o
assunto está vinculado aos benefícios aos titulares, e ao Distrito de Nazaré, onde atende todo
404
baixo madeira. E foi através da participação desses titulares nesses movimentos sociais, em
associações, que será criada uma cooperativa para instalarem uma agroindústria, dando
desenvolvimento econômico e social. Ocorreu também nessa comunidade políticas públicas
voltadas em beneficiar as mulheres dando a titularidade dos lotes. Esse modelo de
desenvolvimento rural que acompanha a modernização pode ser chamado capitalista, mesmo
que as mulheres utilizem sua força produtiva não há reconhecimento de formas diretas a sua
participação nas atividades voltadas para produção de alimentos, preparação da terra, como
nos trabalhos de plantio e colheita, é em pequenas hortas e criações de animais, tendo algumas
que utilizam da matéria prima para produção de artesanatos.
Com esse empreendimento que irá norteia esse novo espaço, cabe ter um olhar mais
delicado, pois se trata de um estudo voltado para comunidade que passando por processo de
desenvolvimento, as expectativas são muitas por parte daqueles que pretendem trabalhar e
expor seus produtos. A pesquisa qualitativa nesse espaço ribeirinha nos faz ter um outro olhar,
voltado não só para a estrutura espacial, mas para a forma que essa comunidade valoriza o rio,
e possuem uma relação diferenciada com a natureza. A natureza e o rio são visto de
propriedade deles, onde, se encontra a essência da vida e liberdade dos mesmos.
Os dados obtidos e a vivência no cotidiano dessa comunidade possibilitou atingir
todos os objetivos da etapa da pesquisa e assim dando uma continuidade para a construção da
ciência geográfica em estudos voltados a discussão sob enfoque de gênero na área rural
ribeirinha e as transformações que esse espaço tem se modificado, as suas conquistas que
veem anos de lutas e dessa maneira obter melhorias sócio espacial e sócio econômica para a
comunidade e ampliar seu desenvolvimento.
REFERÊNCIAS
Gil, Antonio Carlos. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. 4ª Edição, São Paulo Editora
Atlas S.A-1995.
SIENA, Osmar. Metodologia da pesquisa científica: elementos para elaboração e
apresentação de trabalhos acadêmicos. Porto Velho: [s.n.], 2007,200 p.
SILVA, Joseli Maria; ORTON, Marcio Jose; JUNIOR, Baptista Chimin. Espaço, Gênero e
Feminilidades Iberio- americanas. Ponta Grossa, PR: TODAPALAVRA, 2011. - (Coleção
Geografias Feministas).
SILVA, Josué Costa. O Mito e as Crenças como Contribuintes do Espaço Ribeirinho na
Formação do Modo de Vida Amazônico. IN: Kozel, Salete; Silva Josué da Costa; GIL.
405
YANNOULAS, Silvia Cristina; VALLEJOS, Adriana Lucila; LENARDUZZI, Zulma
Viviana. Feminismo e Academia. V. 81, n 199, p. 425 - 451, Brasília: R. Brás. Est. Pedag.,
set/dez 2000.
406
PAITER SURUI
Carlandio Alves da Silva¹
Adnilson de Almeida silva²
RESUMO
Este trabalho sintetiza uma tentativa de explicação da complexidade socioespacial da
comunidade indígena Paiter Surui. Que para as sociedades indígenas, a terra é muito mais do
que um simples meio de subsistência, ela representa o suporte da vida social e esta
diretamente ligada ao sistema de crenças e conhecimento. É de grande importância para a
geografia, abordar, discutir e entender a complexidade de seus modos de vida, compreender
suas territorialidades, e suas implicações ambientais, socioeconômicas e culturais.
Ressaltamos que apesar de grande parte da identidade indígena terem sido extinta ao longo do
processo de colonização de Rondônia, as sobrevivente representam uma enorme riqueza
cultural no estado e no país.
Palavras Chaves: Território. Territorialidades. Cultura.
O povo indígena Suruí que se autodenominam Paiter, que significa “gente de
verdade”, pertence ao grupo lingüístico Tupi Mondé e possui uma população
aproximadamente de 1.350 indivíduos, que habitam uma área de 248.147 hectares inseridas
nos estados de Rondônia e Mato Grosso e foram contatados pela FUNAI, fundação nacional
do índio no dia 07 de setembro de 1969.
De acordo com a história oficial do contato, que relata que em dois anos sua
população foi reduzida de 600 para 250 pessoas, enquanto que os paiter Surui relatam que
eram 5.000, a FUNAI teria deixado de registrar a quantidade de malocas existentes, e só
constando em seus registros duas, daí o numero reduzido da população segundo informações
de Almir Suruí, um dos principais lideres do povo Paiter.
Segundo relatos dos Paiter Surui que as doenças oriundas do contato, em que os
indígenas não teriam imunidades suficientes frente a vírus e bactérias então desconhecidas,
dentre as principais que se destacam-se, epidemias de sarampo, tuberculose, gripe e
pneumonia, teriam sido a responsável pela redução drástica da população. Essa semelhança é
¹Discente do Curso de Geografia UNIR bolsista do CNPq/ Membro do Grupo de Pesquisa Gepcultura -
[email protected]
²Doutor em Geografia; Docente do Departamento de Geografia e do PPGG-UNIR - [email protected]
407
possível de verificação na historia de diversos outros povos indígenas. Não era possível
registrar o numero de mortos, pois os doentes fugiam para as outras aldeias contaminando os
demais que não tinham defesa imunológicas, a tal ponto que não dava tempo para sepultar
todos os mortos.
A população dos Paiter Surui teve um forte declínio na décadas de 1970, e 1980
devido as doenças, a presença de invasores e aos danos dos recursos naturais, que interferiram
diretamente em sua forma de vida. Na década de 1990 a população dos Paiter Surui começa a
ter uma rápida recuperação.
A população Paiter Surui se distribui em 25 aldeias, que se localizam no limite da
Terra Indígena e atendem o objetivo de proteger o território. Também contam como parte da
população, os Paiter que vivem fora da Terra idigena, que por algum motivo foram morar
fora, para estudar ou por terem se casado com membros de outras etnias ou não indígenas.
Os Paiter Surui tem sua organização social baseada em clãs, que são Gameb
(maribondos pretos), Gamir (maribondos amarelos), Makor (uma espécie de bambo
amazônico), Kaban (uma fruta regional).
Os clãs são as bases do sistema de governança, organização política e do sistema de
parentesco, sua organização social é patrilinear e preconiza a exogomia clanica, em que os
casamentos são permitidos apenas com clãs diferentes.
O homem casa-se com a filha de sua irmã, pois segundo sua concepção
cosmogonica, esta não são parentes próximas, pois são de outros clãs, assim o casamento com
primos cruzados, e dessa forma se mantém a exogomia clãnica.
A Terra Indígena Sete de Setembro que foi demarcada e homologada pelo Decreto
88.867 de 17 de outubro de 1983 está localizada nos municípios de Cacoal e Espigão do
Oeste, em Rondônia e rondolândia no Mato Grosso, com a seguinte delimitação:
NORTE - O perímetro demarcado desenvolve-se a partir do marco 09 de
coordenadas geográficas 10º45’03’,9” S e 61º25’47,7” Wgr. Daí, segue por uma linha reta de
azimute 88º27’45,2” com uma distancia de 54.908,82m, até o Marco 14 de coordenadas
geográficas 10º44’16,0” S e 60º55’41,4” Wgr, LESTE - Do marco 14 segue por uma linha
reta de azimute 178º44’50,4” com distancia de 24.007,68m, ate o marco 16 de coordenadas
geográficas 10º57’16,9” S, e 60º55’23,4” Wgr. Daí segue por uma linha reta de azimute
217º16’33,0” e uma distancia de 40.711,33m, até o Marco 20 de coordenadas geográficas,
11º14’51,6” S e 61º08’55,1” Wgr. SUL - Do marco 20 segue por uma linha reta de azimute
269º32’55,5”, com uma distancia de 18.017,15m, até o marco 01 de coordenadas geográficas
11º14’56,2” S e 61º18’49,0” Wgr, daí segue por uma linha reta de azimute 359º51”11,8”, com
408
uma distancia de 15.005,61m, ate o Marco 02 de coordenadas geográficas 11º06’47’9” S e
61º18’50,2”, Wgr, daí segue por uma linha reta de azimute 269º47”12,1” com uma distancia
de 12.060,15m, até o Marco 5 de coordenadas geográficas 11º14’51,6” S e 61º08’55,1” Wgr,
SUL - Do marco 20 segue por uma linha 11º06’49,2” S e 61’25’27,6” Wgr OESTE - Do
marco 5 segue por uma linha reta de azimute 359º04’59,0” com uma distancia de 40.110,29m,
até o marco 09 ponto inicial da presente descrição perimétrica.
Localização da TI Paiterey Garah
Fonte: Metareilá, 2009
Para chegar-se a área a parti de Cacoal através das linhas, 5,6,7,8,9,10,11,12,14,15, e
linha Pacarana, pelo fato das aldeias, que ao todo são 25 - estarem distribuídas ao longo dos
seus limites, tanto por questões de segurança quanto de aproveitamento de antigas sedes de
fazendas deixadas por invasores que se estabeleceram dentro da área nas décadas de 1970 e
1980.
Esses acessos se dão pela BR 364, até Cacoal ou Rondolândia e depois segue pela
rodovia do café seguindo para cada aldeia pelas estradas vicinais.
409
O MAPIMAÍ é uma festa da qual se comemora a criação do mundo, na qual
acontece como reconciliação e a busca por equilíbrio entre o homem natureza e cultura,
trazendo também a valorização da cultura desse povo. Nesse ritual os Paiter Suruí, que são
organizados socialmente em quatro clãs ou grupos chamados, Gãmeb, Kaban, Makor, Gãmir,
onde um dos clãs tem que ficar separado dos outros três grupos, pois esse é o anfitrião da
festa onde é oferecido a bebida conhecida por chicha, os participantes tem que beber até
vomitar, pois assim não podem deixar que seu líder se embriaguem, pois não seria bom que
seu líder fosse visto de tal maneira, pois ele como líder não pode demonstrar desequilíbrio, e
assim todos dos clãs tentam beber o máximo possível na tentativa de poupar o líder fazendo
com que ele venha a beber menos, e dessa forma a bebida servindo como elemento de
purificação do espírito.
Os Paiter Suruí de Rondônia, conhecido como os indígenas cantores, fabricam
artesanatos e instrumentos musicais para ser ofertados durante festa, como troca simbólica,
sendo que cada música deve ser única não podendo ser copiada por outros. São fabricados
colares, cocares e outros, e em um lugar afastado do clã que ficou responsável para oferecer a
chicha.
Em ordem cosmogônica, todos os indivíduos Paiter Surui compartilham a mesma
regra social, obrigações e deveres, suas comunidades são divididas em metades, em que uma
representa a mata e a outra o roça. Desta forma, organizam a agricultura, assim como
obrigações e deveres, sendo que o parentesco é uma das formas mais importantes de
organização social.
Assim, organizavam em épocas tradicionais uma agricultura sistematizada, de modo
que todos se ajudavam. A metade da mata ficava durante o verão em uma abertura da floresta,
afastada aproximadamente 1KM da aldeia, onde a metade da roça não podia ir naquele
período. As metades iam se alternando durante o ano, de modo que todos ajudavam no cultivo
e na colheita da plantação.
A metade da roça era responsável pela produção dos alimentos, da fabricação da
chicha e como anfitriões da metade da mata, de modo que todos cooperavam entre si. Todas
estavam inseridas num ritual - o MAPIMAÍ.
Com o contato este ritual foi deixando de ser realizado, pois os Paiter Suruí
passaram a viver em virtude da defesa do território e a FUNAI introduziu a a pratica das roças
individuais. Em 2000, foi realizado o MAPIMAÍ com o apoio da Associação Metareilá,
Kanindé e MMA - ministério do meio ambiente, já numa retomada de suas praticas ancestrais.
410
Esse fortalecimento, via retomada dos costumes tradicionais, é de extrema
importância para a manutenção do território, pois permite aos jovens entender e estreitar os
laços com a historia e a luta pela terra, assim como compreender os laços com a natureza.
O MAPIMAÍ, que se da por suas metades, em que a metade ligada a comida, precisa
de roças maiores para serem compartilhadas, e devem dedicar-se mais tempo para colher e
cozinhar. A chegada no acampamento se da por meio de gritos e barulhos feitos pelos homens
em clima de festa, fazem arcos, flechas, enfeites de plumas e cocares. As mulheres fazem
vasos de cerâmica, os colares os cestos, e tecem tipóias para carregar seus filhos.
É na floresta que encontram seus produtos, em que a busca é feita acompanhados ou
sozinhos. É de lá que vem a palha dos cestos e das casas, as taquaras e tintas de jenipapo,
corda e madeira para os arcos. Trata-se de dias seguidos de cerimônias, quando se enfeitam
com colares e cintos e pinturas, a mulher do chefe cerimonial leva uma tocha que não deve ser
apagada, pois indicaria que morrerão cedo e que o ser criador da humanidade (Palop) se
recusaria a visitar e proteger a aldeia.
No ritual do MAPIMAÍ, também acontecem os casamentos, onde a poligamia é
explicita, e com o contato com a cultura da sociedade envolvente, e com o envolvimento de
igrejas pode-se dizer que tenha diminuído a poligamia, mas ainda nos dias atuais encontramse indígenas casados com duas ou três esposas, sendo que antigamente encontrava-se de cinco
até seis esposas. Estas costumam conviver em harmonia e paz, e negam não ter ciúmes e as
mulheres não se sentem menosprezadas.
Os Paiter Suruí são descritos como patrilinear, e seu sistema baseado em clãs é o
que define a organicidade e os aspectos políticos desse povo, e os fortalece nas lutas por seus
direitos.
Na assembléia realizada no período de 10 a 12 de novembro de 2010, os Paiter suruí
retomaram sua forma de organização ancestral e aprovaram durante o evento sua forma de
governança. Almir Narayamoga Suruí foi escolhido o labiway e saga, líder geral do povo
Paiter Suruí, (kanindé - Associação de Defesa Etnoambiental, 2011, p.6).
Esse ritual que nos aparece como um dos principais marcadores territoriais, em que
nele apresenta vários outros marcadores, faz com que compreendamos melhor essa
comunidade. Que de acordo com Almeida Silva (2010), para o entendimento de “marcadores
territoriais” que pode ser compreendida a parti dos símbolos que ocorrem enquanto espaço de
ação, definem territorialidades vinculadas à cosmogonia e experiências sócio-espaciais e
possibilitam a formação das identidades culturais e do pertencimento identitário.
411
Anterior ao território, a espacialidade e territorialidade que são consideradas como a
ação humana sobre o espaço, mostram a aproximação física e, sobretudo de sentimentos e
valores do construir, entender e olhar o mundo. Onde pode se constatar permeado de
símbolos, signos, significados e representações que fazem o individuo frente ao mundo.
Através de tais questões para entender que a territorialidade e a espacialidade, muito
embora possuam interpretações distintas entre tais correntes epistemológicas geográficas, se
constituem de um caráter identitário com seu grau de importância a parti das variáveis que
estão presentes na representação e na materialidade espacial através do social, do
econômico,do cultural, do ambiental e do político, pois essas categorias são igualmente
portadoras de formas e representações.
Os marcadores territoriais estão permeados de relações que estruturam a vida de
forma que se apóiam em mitos e formas simbólicas. As experiências vividas através de
espiritualidades e percepções, que aparecem juntos com sentimentos e sentidos, em que as
formas dão significados como representações simbólicas que qualificam o espaço e o
território, dando a dimensão das relações do espaço de ação.
Esses espaços vividos, são preenchidos de conteúdos geográficos, pois são
experiências pessoais ou espaço de ação. O sentido de compreender a espacialidade como
representação simbólica e que atuem com importante elemento que faz entendermos as
relações com o seu semelhante.
Para o indígena a imagem da maloca, é como a casa é para nos urbanizados que faz a
junção entre imagem e lembrança, memória e imaginação. Dessa maneira ela é ideação e
pregnância, assim como a casa é para nós a memória da primeira moradia como um
referencial, que não nos abandona durante a vida, a maloca tem a representação para os Paiter.
E sempre voltamos a ela através de memórias ou lembranças.
Nesta viajem pude presenciar um pouco do cotidiano desses moradores que lá
habitam, vivenciando parte de seus problemas e conhecendo mais sobre sua história.
Tive a oportunidade de conhecer o atual cacique dos Paiter Surí, Almir Narayamoga
Suruí, o qual pude gravar entrevista em que fala sobre sua cultura sua organização política e
sobre a luta de seu povo na busca da conservação da sua cultura e o entendimento da cultura
do não indígena. Almir nos fala o que está acontecendo com sua cultura.
“O que esta acontecendo com nossa cultura, é que a cada ano a cada dia, a cultura
avança, porque a cultura não é uma coisa que fica parada, é uma coisa que anda, anda de
forma positiva ou de forma negativa , e assim estamos trabalhando firmemente na
412
manutenção de nossa cultura e na utilização da cultura do não indígena,(Almir Narayamoga
Suruí)”.
Os trabalhos realizados no desenvolvimento da sua cultura, mostra a realidade da
tentativa de reconstruir o que foi perdido desde a historia do contato, na busca de adaptação
com uma cultura que é muito diferente da sua. As festa realizadas nos dias de hoje pode-se
dizer que celebram a unidade dos Paiter Suruí, através da formação de governança, que o
chamam de parlamento do Povo Paiter Suruí, fazendo com que exista envolvimento de todos
os clãs, na busca de proteção, conservação e na defesa dos direitos do povo. Há quarenta e
dois anos ocorreu oficialmente a história do contato com a FUNAI, os indígenas não conhecia
os não indígenas, a partir do contato a sua história passa a ter sérias influências na sua cultura
e no seu meio social, passando a se perder muitos dos seus costumes e deixando de praticar
muitos dos seus rituais.
Não sendo só a parte da cultura que foi comprometida, mas trazendo também novas
doenças em que o indígena não sabia como lidar com ela, seus pajés também desapareceram
passando a deixar os indígenas desacreditados em suas pajelanças e nos espíritos da floresta.
Antes da história do contato os Paiter Suruí não conhecia comida temperada, comida
salgada e bebidas alcoólicas, e que em outros tempos sua bebida era somente a chicha, bebida
fermentada de milho ou cará.
Logo após o contato muitas mudanças ocorreram no seu meio e seus hábitos
alimentares já não são os mesmos, passando a substituição da alimentação tradicional por
alimentos industrializados, o que produz um desequilíbrio nutricional e que causa
insuficiência de vitaminas, vindo a ser a causa de muitas doenças. Com a localização de difícil
acesso, os Paiter Suruí sofrem com a falta de assistência medica na aldeia, fazendo com que
qualquer problema de saúde seja tratado na cidade, expondo o doente a grandes
deslocamentos e ao contato com outros doentes.
A alimentação tradicional é a que vem da floresta, de onde tiram os frutos, caçam e
pesca, sendo que nem todos os animais fazem parte de seus hábitos alimentares, pois não
fazem parte de sua cultura, e plantam algumas raízes para sua subsistência. Na aldeia Apoena
Meireles, encontra-se algumas cabeças de gado que alguns Paiter Suruí criam para sua
alimentação; os trabalhos feitos na manutenção da terra para o plantio é feito em grupo sendo
que cada um tem sua parte.
A evangelização existe desde a época que os brancos começaram a fazer contato
com indígenas, mas que tem aumentado muito nos últimos anos. O cacique informa que
recentemente teve que permitir a construção de uma igreja na aldeia para evitar
413
desentendimento entre seu povo, visto que grande parte deles estão sendo evangelizados
fazendo com que haja uma grande mudança em sua cultura, porque com esse processo muitos
de seus costumes passam a ser considerados pecado. Dessa forma deixaram de ser realizadas
varias manifestações culturais como danças, festas e casamentos tradicionais.
As crianças de hoje estão expostas como nunca esteve nenhuma geração anterior, a
aprendizagem não é mais como as anteriores, realizar faz parte de aprender. A habilidade
para fazer merecer tanto credito quanto a capacidade de armazenar a informação recebida. Em
se tratando da educação os Paiter Suruí dão muita importância a esse assunto, no entanto,
alguns iniciaram o ensino superior, sendo os primeiros indígenas do estado de Rondônia
aprovados no vestibular em Porto Velho. A aldeia dispõe de uma pequena escola, onde as
aulas são ministradas pelo corpo docente paiter Suruí em que crianças tem acesso, alguns
professores dão cursos de alfabetização e matemática para os adultos. A construção de uma
escola chegou a ser iniciada com uma estrutura um pouco maior, a obra encontra-se em fase
terminal e atualmente a obra esta parada.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA SILVA, Adnilson de: Territorialidades e Identidade do Coletivo Kawahib da
Terra Indígena Uru-eu-wau-wau em Rondônia. Curitiba: UFPR, 2010.
AVILA, Camilo Alejandro Bustos: O componente social do plano Colômbia e a
territorialidade da comunidade camponesa-indígena awá do departamento do
Putumayo (Colômbia), universidade de São Paulo, faculdade de filosofia, letras e ciências
humanas, departamento de geografia 2008.
BRANDÃO, Carlos Rodrigues: Pesquisa Participante, Editora Brasiliense, 1982.
CASSIRER, Ernst: Linguagem e Mito, Editora Perspectiva S.A. 1992.
CLAVAL, Paul: A geografia Cultural, tradução de Luiz Fugazzola Pimenta e Margareth de
Castro Afeche Pimenta, Editora Florianópolis: Editora da UFSC,2007.
GIL, Antonio Carlos: Métodos e Técnicas de Pesquisa Social, São Paulo, Editora
Atlas,2007.
KANINDÉ, Associação de Defesa Etnoambiental, 2011.
QUAINI, Massimo: A Construção da Geografia Humana, tradução Liliana Laganá
Fernandes, Editora Paz e Terra, 1983.
414
SOUZA, Álvaro Jose de: Geografia Lingüística: dominação e liberdade, São Paulo, Editora
Contexto, 2001.
LEANDRO,L.E. ECOTURISMO INDÍGENA E GESTÃO TERRITORIAL,
CONTRIBUIÇÕES PARTICIPATIVAS DA TERRA INDÍGENA PAITEREY KARAH
(SETE DE SETEMBRO).
415
A OCUPAÇÃO PRÉ-COLONIAL NA CACHOEIRA DO TEOTÔNIO: ABORDAGEM
TECNOLÓGICA DA CULTURA MATERIAL CERÂMICA DOS SÍTIOS SANTA
PAULA E TEOTÔNIO
Edileno Duram da Silva87
Carlos Augusto Zimpel88
RESUMO
Atualmente a Amazônia vem sendo palco das diversas discussões em relação às cerâmicas
policromas bem como sua distribuição geográfica na região. Este trabalho busca apresentar
dados que contribua para os estudos sobre a variabilidade cerâmica do Alto rio Madeira,
através dos estudos das cerâmicas dos sítios Santa Paula e Teotônio encontrados recentemente
no Alto rio Madeira no âmbito do Projeto de Arqueologia Preventiva da UHE Santo Antônio,
RO.
Palavras Chaves: Cerâmica. Teotônio. Santa Paula.
INTRODUÇÃO
As pesquisas no campo da arqueologia ocorrem no estado de Rondônia desde os
estudos pioneiros que Eurico Theofilo Miller desenvolveu na região entre 1970 e 1980,
percorrendo grande parte do estado, evidenciando diversos sítios arqueológicos no âmbito do
Programa Nacional de Pesquisas Arqueológicas da Bacia Amazônica (PRONAPABA)
(Miller, 1987; Miller et alli,1992; Miller e Meggers 2003).
Atualmente a demanda de pesquisas arqueológicas no estado cresceu principalmente
em decorrência da construção de duas grandes usinas no rio Madeira (UHE Santo Antônio e
UHE Jirau), além das diversas Linhas de Transmissão de Energia (Scientia, 2008). Nesse
sentido, o projeto de “Arqueologia preventiva nas áreas de intervenção da UHE Santo
Antônio” vem sendo desenvolvida pela Scientia Consultoria Cientifica desde 2008. Além dos
32 sítios já cadastrados pelo pesquisador Eurico Theofilo Miller, foram evidenciados outros
sítios pré-cerâmicos, cerâmicos e históricos nas margens do rio Madeira, dentre os quais está
o sítio Santa Paula que se encontra na margem esquerda e o sítio Teotônio na margem direita
do rio Madeira, ambos localizados em frente à cachoeira Teotônio em área de terraço.
87
88
Aluno do Curso de Arqueologia da Fundação Universidade Federal de Rondônia/UNIR.
Professor do Departamento de Arqueologia- DARC/UNIR.
416
Figura 1: Croqui de delimitação do sítio arqueológico Santa Paula, e em frente o sítio
Teotônio (Michelle Mayumi Tizuka 2012).
.
Ambos os sítios arqueológicos foram evidenciados e cadastrados no IPHAN em 1979
pelo arqueólogo Eurico Theofilo Miller , sendo o sitio Santa Paula com o nome de Porto
Seguro e Teotônio RO-JP-01, definidos como sítio habitação, com forma elipsoidal e sua
cultura material pertencente à subtradição Jatuarana, da tradição
com Policroma da
Amazônia, datada na região entre 2.730 a 2.340 a. P. No dia 25 de novembro de 2011, na I
Semana de Arqueologia da Fundação Universidade Federal de Rondônia, em uma conversa
com o pesquisador Eurico Miller, ele relatou que o sítio Santa Paula já havia sido cadastrado
por ele com o nome de Porto Seguro, o qual ele classificou como subtradição Jatuarana
atribuída à tradição Policroma da Amazônia perante o IPHAN.
O sitio Santa Paula está localizado em uma área de terraço fluvial, sua vegetação
composta por arbustos espinhosos, árvores de pequeno e médio porte assim como algumas
palmeiras e áreas destinadas a prática de plantio e campo de futebol. No ano de 2009 foi
realizada a delimitação do sítio e escavadas duas unidades amostrais de 1x1m no âmbito do
projeto Arqueologia preventiva nas áreas de intervenção do AHE Santo Antônio, RO. A
delimitação consistiu na realização de furos testes obedecendo a uma malha de 20 x 20m,
totalizando 220 furos testes (176 positivos e 47 negativos). A unidade de escavação 3826319021469 localiza-se na área mais central do sitio e a 382670 - 9021310 na porção sul do sitio,
ambas abertas nos locais com maior concentração de material arqueológico, escavadas em
níveis artificiais de 10 cm O sítio apresentou um extenso pacote de terra preta antropogênica
com profundidade de 2,1 m e alta densidade de material cerâmico, lítico e alguns fragmentos
ósseos (SCIENTIA, 2009).
417
Neste trabalho abordamos o material cerâmico da unidade 382631- 9021469 desse
sítio, escavada até 2,50 m, onde foram identificadas sete camadas sedimentares no perfil
oeste, denominadas de I a VII, da base para o Topo, caracterizadas da seguinte forma
(Scientia, 2009), visualizadas no croqui abaixo.
Figura 2: Croqui digitalizado do Perfil oeste da sondagem 382631 - 9021469 (Arte Final:
Crisvaldo Cássio de Souza, 2009)
A camada arqueológica esta concentrada nas camadas II, III, IV, V, VI, VII, com alta
densidade de material arqueológico. Com os carvões coletados nesta unidade, foram
realizadas datações absolutas em rádiocarbono (C 14). Estes são provenientes das camadas II,
III e IV do perfil Norte. As datas variam de 1.520 a 1550 AP, com margem de erro de 30 a 40
anos para mais ou para menos.
418
Tabela 1: datações absolutas para o sítio Santa Paula
Amostra
PN
Unidade
Nível
Obs.
Datação
SAPA
1124.4
382631/
9021469
X = 18
Z = 103
Perfil
norte
15030 + ou - 30
SAPA
1124.2
382631/
9021469
X=40
Perfil
norte
15030 + ou - 30
Perfil
norte
1520 + ou - 40
SAPA
1124.3
382631/
9021469
Z = 181
X = 40
Z = 203
Fonte: Scientia 2011
Estes dados não corroboram com alguns estudos anteriores relacionados aos sítios
arqueológicos pré-coloniais da Amazônia, especificamente no estado de Rondônia, em que
autores retrataram a região como inadequada para assentamentos permanentes, pois segundo
eles não possuíam subsídios alimentares ricos em proteínas para estas populações sedentárias
sobreviverem (Meggers, 1990; MILLER, 1992). Estes estudos relatam à rápida perca dos
nutrientes do solo devido ao uso continuo e com poucas áreas de solo cultivável, dentre outros
fatores, os quais são responsáveis pelas pequenas concentrações populacionais, e desta forma,
os sítios de terra preta seriam produtos de reocupações. Nesta perspectiva, as populações
amazônicas não seriam sedentárias devido à manutenção de um sistema de permanência que
seria incapaz de manter adensamentos sedentários, devido à limitação ambiental.
Pesquisas recentes na Amazônia têm demonstrado o contrário, que a Amazônia foi
densamente ocupada por grupos por longos períodos de tempo. Nessa perspectiva, Neves
afirma que:
Na Amazônia, a natureza não oferece necessariamente um limite contra o
crescimento demográfico ou a emergência da complexidade social, já que a
natureza é parcialmente um produto da ação humana e não uma variável
externa totalmente independente. Tal constatação é sugestiva o suficiente
para lançar dúvidas ao determinismo ambiental extremo que caracteriza as
pesquisas arqueológicas realizadas na Amazônia sob a influência de
Meggers (NEVES 1999 - 2000, p. 95).
O sítio arqueológico Teotônio RO-JP-01 possui uma data de 2730+ou-75 BP (Miller
1992), atribuído a subtradição Jatuarana atribuída à tradição Policroma da Amazônia (Miller,
419
1999). A vegetação é formada por uma mata de porte pequeno (“capoeira”) recente, que ainda
preserva alguns pés de tucumãs e piquiá. Entretanto, a área bem impactada pela ação do
plantio de alguns produtos agrícolas como a mandioca, a instalação de áreas de moradias, e a
extração de terra preta para fins comerciais e de adubação. (Scientia, 2011).
No ano de 2009, foi realizada a delimitação deste sítio. Na sua área onde está a maior
concentração de terra preta e de material arqueológico foi escavada uma área de 2 m x 2,6 m
denominado “Setor Estrada”, abordado neste trabalho. A escavação desta área foi realizada
em 2010 quando, após os trabalhos de aperfeiçoamento da estrada ficaram visíveis duas
circunferências, e moradores ao passarem pelo local avistaram as mesmas e rapidamente
entraram em contato com a Scientia consultoria responsável pelas pesquisas arqueológicas nas
áreas de impacto direto e indireto da UHE Santo Antônio. Ao chegar ao local foi constatado
que se tratava de três vasilhas e não duas. A escavação (Coordenada UTM 20L 0383270 /
9019954) foi realizada em níveis artificiais de 20 x 20 cm, aprofundando até 60 cm
evidenciando todo o perfil das vasilhas.
A escavação revelou duas camadas: camada A que corresponde ao nível de 0 a 40 cm
escavado, a coloração do sedimento foi classificado como 10YR 5/6 (yellowish brown), sua
textura e argilo-siltoso, muito compacto, com uma alta concentração de raízes e presença de
material arqueológico. A camada B, que corresponde ao nível 40 a 60 cm escavado, coloração
10YR 5/8 (yellowish brown), textura e argilo-siltosa com compactação alta, presença de
grânulos, seixos e blocos lateríticos, e material arqueológico. A escavação foi interrompida ao
chegar no embasamento laterítico.
Após o termino da escavação com o perfil das vasilhas evidenciadas, estas foram
retiradas. A vasilha 2 apresenta-se semi-inteira, com presença de fragmentos da parede, base e
borda. Parte da boca da vasilha estava orientada para o oeste, e como estava fragmentada,
foram coletados os seus fragmentos.
Já as vasilhas 1 e 3 foram retiradas com o
sedimento, transportadas até o laboratório, onde foram escavadas. Onde foram encontrados
fragmentos ósseos (não identificados), cerâmicos como fragmentos de assador (bijuzeiro) e
líticos (não analisados ainda) ambas contendo furo na base possivelmente relacionado a
contexto funerario.
420
Figura 3 - Vasilhas 1, 2 e 3 evidenciadas
Vasilha 3
Vasilha 2
Vasilha 1
Nesse projeto analisamos uma amostra do material cerâmico do sítio Teotônio mais
precisamente o Setor Estrada, bem como da unidade 382631 9021469 do sítio Santa Paula,
buscando semelhanças /diferenças nos conjuntos de artefatos cerâmicos de ambos, bem como
as relações entre ambos os sítios, tendo em vista que estão localizados em área de terraço
relativamente alta e extensa nas duas margens do rio, um em frente ao outro. Levantamos
algumas questões tais como: será um único grupo ocupando as duas margens? São ocupações
contemporâneas? Seriam vários grupos ocupando o mesmo espaço em ambas as áreas?
MATERIAL E MÉTODOS
Foram triados e analisados materiais provenientes da unidade 20L 9021469 E 382631,
localizada na área mais central do sítio Santa Paula, totalizando 1.997 fragmentos cerâmicos,
dentre os quais 667 são diagnósticos e foram analisados. E do sitio Teotônio foram analisados
490 fragmentos incluindo todos os fragmentos encontardos no interior das vasilhas 1 e 3 e a
analise das três vasilhas proveniente da unidade 20L 383270/ 9019954, localizada no Setor
Estrada.
A triagem consiste na separação do material cerâmico em diagnósticos e não
diagnósticos. Os fragmentos diagnósticos são todos aqueles que fornecem informações sobre
as formas (bordas, bases, ombros, carenas, bojo, além de peças modeladas e apêndices),
421
acabamentos de superfície (plásticos e pintados) e marcas de uso. Na análise tecnológica
realizada com os fragmentos diagnósticos, são analisados 46 atributos que caracterizam as
escolhas das ceramistas em relação à pasta, técnicas de confecção, acabamentos de superfície,
queima, formas e usos, visando compreender a variabilidade do material cerâmico do sítio
Santa Paula. Os atributos constam em uma ficha de analise desenvolvida no projeto
“Variabilidade cerâmica nos sítios arqueológicos pré-coloniais do Alto rio Madeira, RO”
(Zuse, 2011), A construção da ficha foi baseada na seguinte bibliografia: Shepard (1995), Rye
(1981), Rice (1997), Orton (1997), Chymz (1976), La Salvia e Brochado (1989), Brochado,
Monticelli e Neumann (1990) e Brochado e Monticelli (1994). Além destas obras, são
considerados também trabalhos mais recentes etnoarqueológicos como o de Silva (2000) e de
experimentação cerâmica (Cerezer, 2009) que fornecem subsídios para a escolha dos atributos
(Zuse, 2011).
RESULTADOS
A análise do material cerâmico do sítio Santa Paula não mostrou nenhuma mudança
brusca quanto à manufatura dos vasilhames, técnica de produção, escolha do antiplástico,
acabamento de superfície, tratamento plásticos e motivos ao longo do período de ocupação,
desde os níveis mais profundos até os mais superficiais.
Em relação a cultura material cerâmico foram identificados no sítio vasilhas
utilizadas para cozinhar com bordas extrovertidas e diretas inclinadas externamente com
diâmetro variando entre 14 a 38 cm. Ocorre vasilha extrovertida com diâmetro 12 cm com
pintura vermelha e branca para fermentar bebida e vasilhas com formas abertas e rasas com
bordas diretas inclinada externamente com formas semelhantes a pratos com diâmetro
variando entre 10 a 20 cm, utilizadas possivelmente para servir. As decorações com
tratamentos plásticos são inciso, inciso e ponteado, apliques, inciso e aplique, bem como
flanges. E em relação à pintura, ocorre as cores vermelha e branca e vermelha associada a
inciso.
Assim como o sítio Santa Paula, os dados da analise do material cerâmico do sítio
Teotônio provenientes da unida 20L 383270/ 9019954 localizada no Setor Estrada, não
apresentam mudanças nas escolhas tecnológicas de manufatura dos artefatos, ocorrendo em
sua maioria à adição do cariapé e carvão, em menor quantidade o cauixi na composição da
pasta, sendo este antiplástico ligado a uma determinada forma de vasilha. O mineral
encontrado é o quartzo muitas das vezes acompanhado de hematita (oxido de ferro) grãos
422
finos/baixa inclusão, a queima em sua maioria reduzida, em menor quantidade as oxidantes
assim como as com duas faixas oxidantes e núcleo reduzido; o acabamento de superfície
sendo predominante o alisamento fino em ambas as faces assim como polimento em ambas as
faces e em menor densidade o alisamento médio e grosseiro; também foi possível observar
que diferente do sítio Santa Paula a ocorrência de barbotina e bem menor; já em relação ao
tratamento plástico os dados corroboram com que (Miller, 1992) diz a respeito da subtradição
Jatuarana já citado anteriormente. As bordas analisadas estão muito fragmentadas, não sendo
possivels eparar conjuntos hipotéticos de vasilhas; ocorrem duas bordas extrovertidas com
diâmetro de 18 a 22 cm; e destaca-se um fragmento de assador para processar alimentos que
não foi possível identificar o diâmetro (todas estas possuem antiplástico de cariapé). Em
relação aos tratamentos plásticos, incidem incisos e aplique zoomorfo (parece ser um peixe).
Figura 4: a esquerda zoomorfo e a direita fragmento de assador.
Nas vasilhas grandes (1 e 3) utilizadas possivelmente para enterramento, não foi
possível identificar a forma completa porque estavam sem a borda (removida pelo maquinário
que fez a estrada), mas ambas possuem pasta composta por cauixi e um furo na base,
possivelmente ligado ao campo simbólico do grupo. A Vasilha 2 possui pasta de mineral com
forma aberta e base plano-côncava, diferente morfologicamente das outras duas.
Nas primeiras pesquisas realizadas na região do Alto rio Madeira, o arqueólogo Eurico
Miller (1987) estabeleceu a subtradição Jatuarana. As vasilhas que compõem esta
Subtradição variam de tigelas com e sem tratamento de superfície, bijuzeiros, vasos,
globulares, carenados e urnas funerárias antropomórficas. A “decoração” plástica é composta
por exciso, inciso, ponteado, ponteado-arrastado, ungulado, serrungulado, acanalado,
estampado, carimbado, isolados ou combinados entre si e com policromia associados a
apliques zoomórficos, antropomórficos, flanges, alças, azas e outros artifícios. A decoração
policroma nesse caso consiste de um prévio engobo branco, sobre o qual são aplicadas as
423
cores preta, marrom, amarelo, laranja, vermelho e magenta, em desenhos geométricos-zooantropomórficos (Miller, 1987).
Como já foi dito acima, Miller (1987) definiu as camadas de terras pretas encontradas
ao longo do rio Madeira e vinculadas a subtradição Jatuarana como processos de reocupações,
ou seja, seriam sítios habitações de povos semi-sedentários. No entanto, os contextos
evidenciados recentemente e as datas obtidas para uma das unidades escavadas no sítio Santa
Paula (382631/9021469) demonstra uma intensa ocupação contínua associada a cerâmicas e
terra preta.
A análise da cultura material corrobora com que o (Miller 1992) diz a respeito da
subtradição Jatuarana e suas semelhanças à tradição Guarita da Amazônia Central, ocorrendo
fragmentos pintados e associados a tratamentos plásticos, principalmente incisos e ponteado,
com antiplástico predominante sendo o cariapé, e cauixi em menor quantidade; o acabamento
de superfície predomina o alisamento fino, acompanhado do polimento, e em menor
proporção alisamento médio e o alisamento grosseiro.
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Programa de Pós-graduação do Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São
Paulo. São Paulo, 2011.
426
AGRADECIMENTOS
À Scientia Consultoria Científica; Ao Dr. Renato Kipnis, coordenador do Projeto de
Arqueologia Preventiva na UHE Santo Antônio, RO; aos colegas de campo e laboratório
pelos relatórios, desenhos, fotos e croquis.
427
ESTADO PENAL MÍNIMO E DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
Eletícia Aline e S. de Rezende¹
Vinício Carrilho Martinez²
RESUMO
A presente pesquisa visa uma abordagem inicial acerca do Estado, sua evolução e
transformações na sociedade, principalmente no que compreende à formação do Estado
moderno e instituição do Estado Democrático de Direito, fato que culminou na gênese do
princípio da dignidade da pessoa humana, um dos objetos da temática a ser desenvolvida.
Analisa-se também a questão metamórfica das penas no decorrer da história, o que serviu de
base para a breve explanação do Direito Penal no contexto atual, mais precisamente na figura
do Estado Penal. Feito isso, insere-se o assunto sobre o Minimalismo Penal, alternativa em
detrimento do sistema penal, com suas principais características e princípios, destacando-se e
aprofundando-se o mais importante deles: o princípio da dignidade da pessoa humana.
Palavras-chave: Minimalismo Penal. Dignidade Humana. Estado Penal.
INTRODUÇÃO
Aos passos do desenvolvimento e evolução da sociedade no transcorrer da história,
acompanha-se também o nascimento e metamorfose de uma das mais importantes instituições
já originadas: o Estado. Firmado à base de lutas e aprimorado por revoluções, tem como uma
de suas principais funções organizar e disciplinar a vida social através do uso de seu
respectivo ordenamento jurídico. Apesar de lhe ser conferido poder político (soberania), o
Estado não pode agir arbitrariamente, de modo que se encontra limitado por uma das maiores
conquistas da humanidade: a Constituição, conjunto de normas e princípios que possui, dentre
outras finalidades, assegurar e efetivar o cumprimento dos direitos e garantias fundamentais.
O mesmo Estado provedor e garantidor, também é o Estado que fornece proteção à
sociedade por meio da aplicação de sanções àqueles que transgridam o ordenamento jurídico
vigente, colocando em risco o bem comum. Para que isto ocorra, entra em cena o Direito
Penal na figura do Estado Penal, aparelho repressor estatal que utiliza de seu aparato
coercitivo com a finalidade de combater a criminalidade e conter o avanço da violência. Para
que este fim seja alcançado, o Estado Penal muitas vezes atropela os próprios princípios que o
amoldaram e limitaram, fazendo isso por meio da política repressiva estatal, seja através do
endurecimento de penas, investimento no aparato policial, construção de novos
estabelecimentos prisionais, etc.
¹ Acadêmica de Direito na Universidade Federal de Rondônia/ Bolsista PIBIC/ CNPq
²Professor do Departamento de Ciências Jurídicas da UNIR e coordenador do grupo de pesquisa Estado Penal
428
Em meio a essa situação questiona-se a existência de alternativas mais brandas e
realmente eficazes, pois apesar da sólida estrutura penal, o próprio Direito Penal acaba que
por não cumprir de maneira definitiva uma de suas principais funções, que seria a
ressocialização do indivíduo transgressor da ordem social. Uma das possíveis soluções
começou a ser discutida por volta da década de 60, funcionando como uma verdadeira crítica
à problemática penal. Constitui-se, desse modo, o movimento do Minimalismo Penal, tendo
como pilares os princípios da intervenção mínima e da dignidade da pessoa humana.
Justifica-se, portanto, o presente estudo em analisar teoricamente de que forma as
diretrizes constitucionais e sócio-políticas são capazes de uma recepção convincente e eficaz
dos princípios ditados pelo denominado Estado Penal Mínimo, notadamente o Princípio da
Dignidade da Pessoa Humana.
Trata-se de efetuar pesquisa teórica e empírica que vislumbre a formação de massa
crítica participativa e produtiva socialmente, sendo capaz de analisar e correlacionar
criticamente, os entremeios entre normas sociais e normas jurídicas. Analisar teoricamente de
que forma as diretrizes constitucionais e sócio-políticas são capazes de uma recepção
convincente e eficaz dos princípios ditados pelo denominado Estado Penal Mínimo,
notadamente o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Sob este prisma, trata-se ainda de
antepor esta concepção humanista à incursão repressora do chamado Estado Penal.
ANTECEDENTES HISTÓRICOS DO ESTADO
Várias são as teorias e suposições que abordam sobre uma das instituições
considerada mais importante na história da humanidade: o Estado. A doutrina de Dalmo de
Abreu Dallari (1998) aponta para três possíveis hipóteses: a de que o Estado sempre existiu, a
de que a sociedade existiu durante algum tempo sem o Estado, tendo este surgido bem depois
por diversos motivos e, uma terceira posição que afirma que o Estado seria a sociedade
política dotada de características e peculiaridades próprias.
Quanto à sua composição, é formado, basicamente, por três elementos: a população
ou povo, compreendido como o conjunto dos homens pertencentes a um Estado, o território,
espaço onde o poder estatal há de se manifestar na forma específica de poder público e, a
soberania, poder de associação que ordena e dirige as ordens do Estado destinadas à
população que habita em seu território (SOARES, 2004).
No tocante à sua evolução, um de seus períodos mais notáveis talvez se resuma ao
compreendido pelo Estado Moderno. Durante essa fase, o Estado passou por várias
429
transformações, passando de uma figura absoluta no período do Estado Absoluto, considerado
o princípio do Estado Moderno e, que estava alicerçado em uma base dotada de poder
centralizado e militarizada. Com a decadência do feudalismo, seguida pela ascensão da classe
burguesa, sentia-se a necessidade de poder intervir nos caminhos do Estado e para tanto,
precisava-se possuir direitos políticos. A partir daí, o Estado absoluto passa a ter seus poderes
limitados na carta constitucional, ocorrendo também a separação de poderes e a garantia dos
direitos individuais. Surge o denominado Estado de Direito ou Estado Liberal de Direito.
Sucedendo o Estado de Direito e deixando para trás a capa do neutralismo,
efetivando a justiça social, surge o Estado Social de Direito, defendendo a afirmação dos
direitos sociais e prezando pela efetivação da justiça social (SILVA, 2010). Logo após, deu-se
o advento de uma das formas mais relevantes do Estado Moderno: o Estado Democrático de
Direito. Este, que teve como objetivo principal realizar a democracia como garantia geral dos
direitos fundamentais da pessoa humana.
O principal legado do Estado Moderno foi a transição do Estado absoluto para o
Estado constitucional, este composto tanto pelo Estado de Direito quanto pelo Estado
Democrático. A positivação do Estado ocorreu por meio do fenômeno do Constitucionalismo,
cuja origem formal se remete à Carta Magna dos Estados Unidos (1787), após a
Independência das 13 Colônias, e ao texto constitucional da França (1791), a partir da
Revolução Francesa, possibilitando aos cidadãos exercerem livremente, sem a capa opressora
do Estado, seus direitos e garantias fundamentais tendo por base as constituições escritas.
Para Bulos (2011), a Constituição significa, dentre suas outras conceituações, o
“complexo normativo que disciplina a organização do Estado, a origem e o exercício de
poder, a discriminação das competências estatais e a proclamação das liberdades públicas”.
Resumidamente, é a norma mestra que conduz a sociedade.
MINIMALISMO PENAL
Em sua origem mais primitiva, a pena significava um tipo de vingança, funcionava
como um revide à agressão sofrida, sendo totalmente desproporcional à ofensa e aplicada sem
preocupação de justiça. Em uma ótica mais contemporânea, contempla-se a definição de
Direito Penal, ramo do Direito Público que corresponde ao sistema de princípios e regras
pelos quais o Estado tipifica as condutas de cunho criminal, ou seja, quando determinada
conduta fere os valores considerados primordiais à ordem social, o Poder Público pode e deve
430
intervir por meio de sanções penais aplicadas aos transgressores, sejam elas penas ou medidas
de segurança (REALE, 2010).
Mesmo que a matéria penal atue com o direito de punir (uma das finalidades da
própria pena), busca-se a proteção dos direitos do homem e a humanização da justiça,
concordando o Direito Penal com os Direitos Humanos e preservando a figura do apenado
contra os possíveis tratamentos abusivos sofridos durante sua permanência no sistema
prisional. Embora o Direito Penal se preocupe com a proteção dos direitos do homem e a
humanização da justiça, o que ocorre na prática, em uma considerável parte dos casos, acaba
sendo algo totalmente oposto à essa proposta.
O que há, então, é uma deslegitimação do sistema penal, que coloca à mostra suas
inúmeras falhas. O sistema penal vigente está baseado na doutrina “bem x mal” do
maquineísmo medievo, polarizando, dessa forma, a sociedade e seu pensamento. É também
estruturalmente incapaz de cumprir determinadas funções que o legitimam, como proteger
bens jurídicos tutelados por ele e, combater e prevenir a criminalidade, por exemplo. Além de
atuar seletivamente, uma de suas outras finalidades nada mais é que “fabricar os criminosos”
(ANDRADE, 2006).
O que pode ser constatado é que há um gasto e preocupação maior por parte do
Estado no investimento em políticas criminais, seja por meio do aumento do efetivo policial,
ou da construção de novas unidades prisionais, da instituição de políticas de lei e ordem, do
endurecimento de penas, da criminalização de condutas que poderiam ser tratadas pelos
outros ramos do Direito, etc.
Como uma crítica e também uma possível solução à toda problemática produzida
pelo punitivismo, surge durante a década de 60 do século XX, um movimento que defendia o
cumprimento e efetivação das garantias formais e principalmente materiais do indivíduo, com
fundamento no Estado Democrático de Direito: o Minimalismo Penal (CIT, 2010).
O objeto do minimalismo não é, portanto o Direito Penal, ou muito menos ocasionar
a extinção da punição no formato da pena, como no caso do pensamento abolicionista. Mas, é
aniquilar o sistema penal, síntese do poder punitivo do Estado e sua engenharia punitiva
(ANDRADE, 2006). Tem por base tanto o princípio da intervenção mínima, com seu caráter
fragmentário e subsidiário, quanto o princípio da dignidade da pessoa humana.
431
DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
Princípio que teve por inspiração diversos documentos com espírito reformista, como
a Magna Carta (1215), Petição de Direitos (1629), Habeas Corpus Act (1679), Bill of Rights
(1689), Constituição americana (1787) e Constituição francesa (1791), consagrou-se no plano
internacional com a edição da Declaração dos Direitos Humanos no ano de 1948 (GUERRA,
2010).
No ordenamento jurídico brasileiro está prevista no inciso III do art. 1º da
Constituição Federal de 1988. Se expressa em alguns outros artigos da CF/88, como os
incisos do art. 5º que abordam sobre: a prática do racismo (XLII); crimes de tortura, tráfico
ilícito de entorpecentes, terrorismo e crimes hediondos (XLIII); cumprimento da pena
(XLVIII); seguridade dos direitos do preso quanto à sua integridade física e moral (XLIX) e,
assegurar condições necessárias para que as presidiárias permaneçam com seus filhos durante
o período de amamentação (L).
Apesar da criação de tratados internacionais e outros documentos que exaltam os
princípios basilares do Estado Democrático de Direito, valorizando e promovendo a dignidade
da pessoa humana frente às possíveis ameaças a serem sofridas, ainda assim, são constatadas
inúmeras violações ao mesmo ordenamento jurídico, ocasionando um retrocesso, uma
negação dos próprios direitos anteriormente previstos e considerados tão essenciais.
Um dos casos mais relevantes, que marcou o sistema penitenciário brasileiro, foi o
ocorrido na casa de detenção José Mário Alves Filho, popularmente conhecida como “Urso
Branco” e construíra na capital do estado de Rondônia no ano de 1990. Sempre foi
considerada uma unidade marcada pela instabilidade e violência, fato comprovado nas
rebeliões e mortes (cerca de 100) durante o período de 2000 a 2007.
Frente a todo esse contexto de revolta e violência, o Brasil foi denunciado à Corte
Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), pela Justiça Global e Comissão de Justiça e Paz
da Arquidiocese de Porto Velho, no qual o país sofreu uma série de sanções em virtude dos
acontecimentos. Os relatórios compostos nos período de 2007 e 2011 pelos membros dessas
instituições que visitaram a unidade, retratarem a presença de inúmeras irregularidades, como:
- superlotação;
- precariedade ou até mesmo a falta de atendimento médico e odontológico;
- abastecimento de água precário, visto que a água para o consumo não é filtrada e ao que
tudo indica está contaminada;
432
- kit de higiene fornecido de forma irregular, obrigando os presos a compartilharem
materiais de uso pessoal, ficando expostos a qualquer tipo de contaminação;
- precariedade no serviço de limpeza, ocasionando acúmulo de lixo ao redor das celas;
- insalubridade na estrutura do presídio, ocasionada pela umidade excessiva, infiltrações,
entre outros problemas, o que torna a habitabilidade nas celas quase que impossível;
- falta de colchões;
- denúncias de abusos sofridos pelos presos da parte dos agentes;
- ausência de atividade laboral ou educativa, ficando os presos completamente ociosos.
Toda essa situação contraria o disposto tanto na Constituição Federal de 1988, mais
especificamente nos incisos III e XLIX, onde estão previstos, respectivamente, que “ninguém
será submetido a tortura nem tratamento desumano ou degradante” e “é assegurado aos presos
o respeito à integridade física e moral”. Também se mostra oposta ao previsto na Lei de
Execução Penal (LEP), cujo um dos pilares é o princípio da dignidade da pessoa humana.
Essa lei tem por essência cumprir uma das mais importantes funções do Direito Penal, que é a
reinserção do apenado na sociedade.
Observa-se também a atuação do Estado Penal, que se preocupa mais na questão da
repressão por meio da punição, do que com o cumprimento de princípios fundamentais e das
próprias normas por ele criadas, salvaguardando os direitos dos presos, tratando-os de forma
digna e não como a escória da sociedade. Não é porque uma pessoa comete um crime, que o
Estado deixará de assegurar os direitos e garantias que foram conquistados à sangue e suor ao
longo da história da humanidade.
Após as denúncias e exigências de mudanças, atualmente, segundo informações
colhidas no site do Tribunal de Justiça de Rondônia, a situação do Urso Branco é um pouco
menos caótica se comparada ao estado anterior. Pode-se inferir que é um presídio que está sob
controle e que procurar atender, dentro das possibilidades, as normas referentes ao tratamento
de reclusos e aos padrões da Lei de Execução Penal (LEP).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar das conquistas advindas do Estado Democrático de Direito, como a
seguridade e efetivação dos direitos e garantias fundamentais, juntamente com um dos
princípios basilares do ordenamento jurídico estatal, o princípio da dignidade humana,
observa-se a negação do mesmo em diversas proporções. Este fato pode ser verificado na
433
abordagem sobre o caso Urso Branco e, não somente a este, como também essa realidade
pode ser ampliada à outras instituições Brasil e mundo afora.
Nega-se a dignidade quando não só é oferecido um tratamento precário aos
apenados, mas principalmente, quando é aniquilada grande parte de seus direitos, além dos
previstos pela legislação penal. Isso ocorre quando é negado o acesso a serviços básicos como
saúde, boa alimentação, educação e trabalho, por exemplo, tão essenciais e inerentes a
qualquer pessoa seja ela em qual condição estiver. Uma das consequências dessa realidade é a
própria deslegitimação do cárcere, que funciona apenas como um mero depósito de indivíduos
considerados nocivos para a sociedade.
Constata-se também que ao invés de aproximar e reinserir o apenado na sociedade, o
Estado Penal faz justamente o contrário, estigmatizando e degenerando ainda mais quem está
do lado de dentro do cárcere e alimentando a instabilidade e segurança de quem está do lado
de fora. Partindo do exposto, conclui-se que a solução para essa problemática não se encontra
no crescimento do Estado Penal e suas formas repressivas, mas justamente em outras
possíveis alternativas, como por exemplo o minimalismo e, acima de tudo, respeitando e
cumprindo de forma plena e não em partes, o próprio ordenamento jurídico instituído no
território.
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435
MAL-ESTAR SUBJETIVO DO SUJEITO PÓS-MODERNO
E SUA RELAÇÃO COM O CAPITALISMO
Eliane Gamas Fernandes89
Melissa Andrea Viera de Medeiros Carvalho90
RESUMO
Este trabalho é um relato da pesquisa intitulada Mal-estar subjetivo do sujeito pós-moderno,
que tem como objetivo central analisar a condição de mal-estar subjetivo do sujeito
portovelhense, acometido pelas nuances do sistema capitalista. Tendo como público alvo os
pacientes do Serviço de Psicologia Aplicada (SPA/UNIR), que buscam por atendimento
psicoterápico. Ressalta-se que não só buscou-se descrever a manifestação destes mal-estares e
sintomas, mas compreender as estratégias de enfrentamento do sofrimento, bem como realizar
uma cartografia deste mal-estar subjetivo, circunscrevendo suas expressões e considerando a
realidade singular de Porto Velho/RO.
Palavras-chave:
SPA/UNIR.
Mal-estar
subjetivo.
Capitalismo.
Pós-modernidade.
Pacientes
do
INTRODUÇÃO
Este estudo foi construído a partir de um diálogo entre referenciais psicanalíticos e
sociológicos, na busca da compreensão da dinâmica do mundo pós-moderno e suas
implicações subjetivas. Pretendeu-se evidenciar as consequências que a ávida vida para o
consumo, para a estetização, para o modismo e para tantas demandas capitalistas acarretam
para o sujeito, apontando a estreita ligação que existe entre as mudanças culturais, sociais e
psíquicas.
Trata-se de pensar nos destinos do desejo na atualidade já que os destinos
nos permitem captar o que se passa nas subjetividades. Com isso podemos
nos aproximar do que há de sofrente nas novas formas de subjetivação,
circunscrevendo então o campo do mal-estar contemporâneo. (BIRMAN,
2000, p.17)
89
Acadêmica do 5º período do curso de Psicologia da Fundação Universidade Federal de Rondônia –
UNIR. [email protected]
90
Profª Drª do curso de Psicologia da Fundação Universidade Federal de Rondônia - UNIR - e
orientadora desta pesquisa. [email protected]
436
Esta pesquisa qualitativa visou analisar a estreita relação dialética entre o sujeito e o
mundo objetivo, buscando compreender o mal-estar subjetivo de sujeitos que apresentaram
algum
tipo
de
sofrimento
vinculado
às
questões
de
desamparo,
consumismo,
descontentamento afetivo e estético, e que buscaram suavizar seus sofrimentos por meio de
atendimento psicológico oferecido pelo Serviço de Psicologia Aplicada (SPA) da
Universidade Federal de Rondônia (UNIR) na cidade de Porto Velho/RO.
A escolha dos cinco colaboradores foi feita através da seleção das fichas de triagem
dos pacientes que aguardavam por atendimento psicoterápico no SPA, na qual foram
analisados apenas quatro, sem distinção de sexo e acima de 18 anos de idade. Para a obtenção
de informações utilizou-se a técnica de entrevista, pois esta se caracteriza como um encontro
interpessoal estabelecido para a obtenção de informações verbais e não verbais, como expõe
Bleger (1993, p.16-17) “aquilo que não nos pode dar como conhecimento explícito, nos é
oferecido ou emerge através do seu comportamento não-verbal [...].” Já no tratamento dos
dados seguiram-se os pressupostos teórico-metodológicos de Turato (2003) em diálogo com
as acepções de Bardin (1977) no que tange a questão da análise de conteúdo com ênfase na
temática, seguindo os três pólos cronológicos: pré-análise, exploração do material, a
inferência e interpretação dos resultados, que proporcionou realizar uma cartografia do malestar subjetivo, no sentido delimitar as coordenadas dos mal-estares subjetivos, desenhando o
campo sofrente do sujeito portovelhense.
MODERNO PÓS MODERNO
A palavra ‘moderno’ origina-se do baixo latim modernus, que significa recente. Por
volta do século XIX com o processo de mercantilização exacerbado a originalidade assume
um valor significativo para o comércio. Surge então, a necessidade de objetos diferentes que
valeriam mais. Necessidade criada por um mercado ávido por lucros. Esse modernismo que
antecede a Primeira Guerra Mundial foi uma reação às novas condições de produção,
circulação e consumo. A manutenção da lucratividade impulsiona o mercado, que apressa os
capitalistas a se aproveitarem de todos os novos tipos de possibilidades de ganho. Diante
deste evidente avanço do capitalismo, que interfere diretamente no cotidiano do sujeito, surge
à necessidade de analisar os efeitos e as possíveis transformações na subjetividade.
É nesta conjuntura que se instala a pós-modernidade, para Jamerson “o pósmodernismo não é senão a lógica cultural do capitalismo avançado” (JAMERSON apud
HARVEY, 2009, p. 65). Harvey (2009, p. 306) concorda com o pressuposto ao afirmar que o
437
capital não é algo estático, mas “um processo de reprodução da vida social por meio da
produção de mercadorias em que todas as pessoas do mundo capitalista avançado estão
profundamente implicadas.” Netto (2005, p. 33) relata que em segundo momento definiu-se
uma estética da publicidade, utilizando-se de conceitos como: “mobilidade, descontinuidade,
cientificismo. E em um terceiro momento, a arte, ou algo semelhante a isso, começou a seguir
as propostas dessa outra arte, a publicidade [...]. Nesse momento entra em cena a pósmodernidade.” A publicidade adquire maior visibilidade a ponto de ser indispensável para
todo “bom” produto. Foi nela que os capitalistas apoiaram-se fielmente, como uma atraente e
eficaz estratégia de venda, tornando-se, então, a arte oficial do capitalismo. Há uma
redefinição da função da publicidade que não mais consiste em informar ou promover no
sentido comum, mas “volta-se cada vez mais para a manipulação dos desejos e gostos
mediante imagens que podem ou não ter relação com o produto a ser vendido.” (HARVEY,
2009, p. 259).
LIBERDADE OU SEGURANÇA? AS IMPLICAÇÕES DA CIVILIZAÇÃO
Essa modificação sistemática do capitalismo traz consigo efeitos que implicam
diretamente nas subjetividades. Freud (1930, p.116) já alertava que “a liberdade do indivíduo
não constitui um dom da civilização,” sendo assim, um excesso de ordem significa para o
sujeito a escassez de sua liberdade. Bauman (1998) compartilha da idéia de Freud ao relatar
que os prazeres da vida civilizada estão atrelados ao sofrimento, bem como a satisfação com o
mal-estar e a submissão com a rebelião.
A questão do sofrimento e suas implicações na vida psíquica é um tema bastante
discutido por Freud (1930), ele aponta três tópicos geradores de sofrimento: 1) decrepitude do
nosso próprio corpo; 2) força esmagadora da natureza e 3) relações sociais. Evidencia-se que
o sofrimento advindo do convívio com o outro é o mais árduo deles, todavia a busca mais
difundido para evitar o sofrimento é a aproximação, tornar-se membro da comunidade
humana. Neste contexto se instaura a civilização, a tentativa de ordenar as relações sociais.
Assim: “A civilização - a ordem imposta a uma humanidade naturalmente desordenada - é um
compromisso, uma troca continuamente reclamada e para sempre investigada a se renegociar”
(BAUMAN, 1998, p.08). A civilização se torna responsável pelo sofrimento que aplaca o
sujeito, pois exige que ele renuncie a seus instintos. Desta forma seria necessário abandoná-la
e retornar ao estado primitivo, garantindo assim maior felicidade.
438
Assim, entendemos que o sujeito civilizado renunciou aos instintos, à sexualidade e à
agressividade na busca de maior segurança. Evidencia-se, então, que o indivíduo usufrui de
pouca felicidade (satisfação de necessidades represadas em alto grau), portanto de uma
liberdade restrita, em busca de uma segurança, que no contexto pós-moderno tem se mostrado
etérea e frágil demais. Há um conflito entre a força pulsional/instintual e a civilização. Birman
(2000, p.38) descreve que “aquilo que Freud denominou civilização corresponde ao processo
de modernização do social”. Invertem-se as condições nas quais o sujeito se sente livre em
suas escolhas, mas aprisionado em um mundo instável e de incertezas, pois o mundo
contemporâneo apresenta-se fragmentado em partes que precisam ser juntadas para formarem
o todo. Assim, os mal-estares, aflições, angústias, ansiedades, sentimentos de insegurança e
desamparo típicos do mundo pós-moderno resultam do gênero da sociedade que oferece cada
vez mais liberdade individual ao preço de cada vez menos segurança e estabilidade. Como
relata Bauman (1998, p.156) “Os mal-estares pós-modernos nascem da liberdade, em vez da
opressão”.
O MAL-ESTAR DA PÓS-MODERNIDADE
Na pós-modernidade “os projetos de vida individuais não encontram nenhum terreno
estável em que acomodem uma âncora, e os esforços de constituição da identidade individual
não podem retificar as conseqüências do “desencaixe”, deter o eu flutuante e a deriva.”
(BAUMAN, 1998, p.32). Os laços afetivos passam a ser dissimulados encontros sucessivos, é
a Era do ‘ficar’, dos free lances amorosos e é exatamente neste contexto que o sujeito pósmoderno depara-se com um turbilhão de sensações adversas: estranheza, aversão, admiração,
entusiasmo, tristeza, desdém, esperança, solidão etc.
O consumo abundante se apresenta como marca do sucesso. Compreende-se que o
consumo de determinados objetos e a postura coerente com certo estilo de vida é a condição
necessária para a felicidade, talvez até para a dignidade humana, como expõe Bauman (1998).
Se o consumo é a medida de uma vida bem-sucedida, da felicidade e mesmo
da decência humana, então foi retirada a tampa dos desejos humanos:
nenhuma quantidade de aquisições e sensações emocionantes tem qualquer
probabilidade de trazer satisfação da maneira como o “manter-se ao nível
dos padrões” [...] (BAUMAN, 1998, p.56).
E a aptidão em participar deste jogo consumista que constitui o critério decisivo para
consolidar o sonho da pureza na pós-modernidade, pois “os deixados de fora como um
439
“problema”, como a “sujeira” que precisa ser removida, são consumidores falhos - pessoas
incapazes de responder aos atrativos do mercado porque lhes faltam os recursos requeridos
[...]”. (BAUMAN, 1998, p.24). Tais sujeitos se julgam e são julgados como indivíduos nãolivres, pois dentro do processo do capital, liberdade significa poder de escolha do consumidor.
Entende-se que:
No mundo pós-moderno de estilos e padrões de vida livremente
concorrentes, há ainda um severo teste de pureza que se requer seja
transposto por todo aquele que solicite ser ali admitido: tem de mostrar-se
capaz de ser seduzido pela infinita possibilidade e constante remoção
promovida pelo mercado consumidor, de se regozijar com a sorte de vestir e
despir identidades, de passar a vida na caça interminável de cada vez mais
intensas sensações e cada vez mais inebriante experiência. (BAUMAN,
1998, p.23).
Assim, o sentimento de desamparo aumentou significativamente na pós-modernidade,
surgindo formas inéditas de desamparo, oriundas deste processo do capital atrelado a uma
crescente condição de desesperança, instabilidade, insegurança, desencantamento do mundo,
esvaziamento dos deuses e a predominância da racionalização.
Esse desencantamento do mundo pode ser comparado ao que Bauman (2001)
considera como modernidade líquida, pois esta é marcada pela invasão do racionalismo,
avanço na área tecnológica, desenfreado avanço capitalista, a dita globalização, racionalização
e cientificismo. Bauman (2001) afirma que a modernidade líquida - ou seja, a pósmodernidade -, se insere em um momento de "derretimento dos sólidos", sejam eles valores e
concepções, teorias científicas, tecnologias, modelo econômico e até mesmo padrões de
comportamento.
Antigos valores de solidez e durabilidade, tradição, família e religiosidade
abrem espaço para a fluidez, mudança, velocidade, adaptabilidade,
produtividade e racionalidade. Até mesmo as concepções de tempo e espaço
se reconfiguram nesse momento. (SARAIVA, 2010. S/P)
O que se conclui é que essa racionalização e cientificismo enaltecidos culminaram em
uma cultura da exaltação do eu, como um tipo de narcisismo, no qual atributos como a beleza
e a estética são extremamente valorizados, moldando os modos, gostos, desejos dos sujeitos
pós-modernos. “Assim a existência do sujeito se constitui pelo eixo de sua estetização. É a
estetização que toma volume como estilo existencial do sujeito.” (BIRMAN, 2000, p.246).
Isso implicará diretamente na condição de felicidade dos sujeitos pós-modernos. Sobre essa
440
afirmativa Freud (1930, p.101) relata que “a felicidade da vida é predominante buscada na
fruição da beleza”.
Apesar destas mudanças nos eixos cultural, psíquico e coletivo, a religião, em seus
altos e baixos, sempre se fez presente na vida do ser humano, seja na busca incessante por ela
ou na sua negação. Assim, não demorou muito para se perceber que a ciência dissolve crenças
que dão sentido à vida dos homens. Pode-se afirmar, então, que esse mundo no qual o
progresso tecnológico, a racionalização e a ciência não trouxeram toda a felicidade que um
dia se ansiou, é inquestionável que nesse "mundo desencantado [...] os homens são
completamente incapazes de passar sem a consolação de ilusão religiosa, que sem ela, não
poderiam suportar as dificuldades da vida e as crueldades da realidade.” (FREUD, 1927,
p.63). Não se pode negar, também, que o desamparo humano aumentou expressivamente na
pós-modernidade e, “junto com ele, seu anseio pelo pai e pelos deuses.” (FREUD, 1927, p.
29). Assim, “não poucas pessoas encontraram sua única consolação nas doutrinas religiosas, e
só conseguem suportar a vida com o auxílio delas” (FREUD, 1927, p.48).
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Individualização: da identidade coletiva as identidades individuais
O conceito de identidade é bastante analisado quando se trata dos efeitos da pósmodernidade, o que ficou evidente, em teoria e prática foi que a identidade não é mais
entendida como algo coletivo, mas assume um caráter individual. Em trechos das falas do
colaborador pode-se evidenciar essa questão, por exemplo:
“Hoje em dia é muito difícil a gente pensar em algo que faça bem para todos,
sempre vai ter um descontente ou não querendo a mesma coisa que você
quer. Cada um tem suas vontades, desejos e sonhos. É por isso que cada um
segue um caminho, ou prefere ficar sozinho mesmo.” (colaborador 1;
masculino, 21 anos.)
Hall (2006, p.69) apresenta três conseqüências da globalização nas identidades: 1) a
desintegração das identidades nacionais em resultado da homogeneização cultural e do pósmoderno global; 2) identidades “locais” estão sendo reforçadas pela resistência à globalização
e 3) identidades nacionais estão em declínio, formando identidades híbridas. Assim, os
indivíduos na pós-modernidade perderam (ou estão perdendo), suas identidades coletivas,
como a identificação por sua Nação ou mesmo o apreço pela cidade natal. Os defensores da
441
pátria, atualmente, são poucos, quase não existem, salvo os homens, com maior idade, que são
obrigados pelo Estado a cumprirem seus deveres de cidadãos, se ‘disponibilizando’ à junta
militar. Existe, ainda, um movimento antagônico na tentativa de reforçar as identidades,
entretanto o que se evidencia, neste contexto que Hall (2006) chamou de pós-moderno global,
é o surgimento de novas identidades, essas de maneira mais híbrida.
As falas do colaborador compartilham desta ideia e pode ficar evidente quando lhe
perguntado qual a importância da religião na sua vida. Sua resposta ofereceu indícios sobre o
que ele pensava a respeito da religiosidade como solucionadora dos sofrimentos dos
indivíduos, mas também apresentaram de maneira subentendida, suas idéias a respeito de
identidades.
Eu sou muçulmano né, mais só no papel. Para mim, eu acho que... Eu leio
muito sabe, estudo muito e para mim tudo isso é uma construção. Então eu
sou todas as religiões. Para mim, as minhas soluções são diferentes. Não é
Deus. Mas ai eu tenho medo de morrer e ir para o nada. [...] (colaborador 1,
masculino, 21 anos).
O que se pretende expor é que da passagem da identidade coletiva para uma
identificação mais singular ou hibrida o funcionamento e a vivência social foi modificada ou
está sendo modificada paulatinamente. Tomados por um contexto de muita insegurança e
desconfiança plena, os sujeitos pós-modernos tem diminuído as expectativas em relação á
vida em sociedade, sendo necessária a seleção das pessoas com quem quer manter algum
vínculo, e os critérios desta seleção se tornam mais rigorosos ao passo que o medo e a
desconfiança sobre o outro aumentam.
[...] hoje em dia não dá para confiar em ninguém, porque eu vou ficar
vinculado a alguém quem eu mal sei o que está fazendo em relação à vida
dele. Ou seja, as pessoas tomaram posicionamento mais individualista com
relação a isso. Parou de ter a preocupação em pensar conjuntamente e as
pessoas tomaram um aspecto mais individual com relação a relacionamentos
futuros. Ou seja, as pessoas se tornaram mais egoístas com relação ao que
elas sentem e pararam de pensar um pouco no que o outro que ela está
envolvida, pensa, sente ou deixou de sentir. (colaborador 2 , masculino, 24
anos).
Essas modificações nas identidades podem ser verificadas em vários campos
subjetivos como no amor, quando o colaborador afirmou estar buscando uma independência
emocional; na percepção do mundo, quando ele relata que as pessoas não estão “nem aí” para
442
você ou estão felizes por você estar mal, e na percepção de si mesmo, evidente em sua fala ao
se descrever como narcisista, individualista, exibicionista e consumista.
O amor: sobre a fragilidade dos laços humanos
Sobre o amor ou amores contemporâneos Bauman (2004, p.08) afirma que “no líquido
cenário da vida moderna, os relacionamentos talvez sejam os representantes mais comuns,
agudos, perturbadores e profundamente sentidos da ambivalência.” E, ainda, afirma que:
[...] a definição romântica de amor como “até que a morte nos separe” está
decididamente fora de moda, tendo deixado para trás seu tempo de vida útil
em função da radical alteração das estruturas de parentesco as quais
costumava servir e de onde extraída seu vigor e sua valorização.
(BAUMAN, 2004, p. 19).
Ficou evidente nas falas do colaborador que o “até que a morte nos separe” é algo
distante dos seus propósitos, quando ele afirmar que “os pólos se alternaram completamente”,
alegando que antigamente era quase obrigação manter um relacionamento fixo, mas que
atualmente a maneira de se relacionar afetivamente mudou e alega, ainda, que não acha isso
ruim. Outro aspecto que reforça a idéia de que os relacionamentos estão mais superficiais e
que há uma desconfiança sobre o outro, fez-se presente nesta fala:
Eu namorei poucas vezes, mas todas elas foram, digamos, duradouras. Mas
confesso que ‘fiquei’ mais do que namorei. Eu não vou me envolver com
alguém que eu não tenha o mínimo de segurança ou de afeto para isso, é uma
questão de escolha [...] (colaborador 2 , masculino, 24 anos).
Este trecho da fala do colaborador remete a ideia, muito comum atualmente, do ‘ficar’,
que prega a ‘liberdade de escolha’, a aquisição de novas e surpreendentes experiências e o não
apego a ninguém. O colaborador finaliza sua fala ressaltando que “hoje em dia há múltiplas
variedades.” Bauman (2004) faz um questionamento extremamente pertinente sobre esta
descartabilidade de parceiros:
Consideradas defeituosas ou não “plenamente satisfatórias” as mercadorias
podem ser trocadas por outras, as quais se espera que agradem mais [...]
automóveis, computadores ou telefones celulares perfeitamente usáveis, em
bom estado e em condições satisfatórias são consideradas, sem remorso,
como um monte de lixo no instante em que “novas e aperfeiçoadas versões”
aparecem nas lojas e se tornam o assunto do momento. Alguma razão para
que as parcerias sejam consideradas exceção? (BAUMAN, 2004. p. 28).
443
Se, em tempos esquecidos, buscavam-se relacionamentos na expectativa de mitigar a
insegurança contida nas noites de solidão e no dia -a- dia dos indivíduos, atualmente, “o
tratamento só fez expandir os sintomas, e talvez agora você se sinta mais inseguro do que
antes, ainda que essa “nova e agravada” insegurança provenha de outras paragens.”
(BAUMAN, 2004, 30). É sobre relações ditas mais abertas que os sujeitos contemporâneos
vivenciam suas experiências, nas quais a traição já não é algo inaceitável como já foi
considerada um dia. Reich (1988) ressalta que:
[...] na ausência do parceiro adequado, o que, sob condições reinantes da
vida sexual, parece ser a regra, a capacidade para a monogamia se
transforma no seu oposto. [...] As Velhas relações, entretanto, desmoronam
pela veemente quando se deterioram e quando outro novo parceiro promete
mais prazer. (REICH, 1988, p. 40).
Essa possibilidade de ‘escolhas’ e de romances free lances, na qual prevalece a ideia
de que ninguém é de ninguém, faz o indivíduo refletir e ser invadido por uma sensação de
mal-estar atrelado a solidão, desamparo, baixa auto-estima e depreciação de sua própria
imagem. Quando perguntado ao colaborador sobre seu campo afetivo, ele respondeu:
Eu to namorando agora, mas estou muito iceberg. É ele que corre atrás.
Gosto dele, mas ainda estou muito iceberg, porque eu sei que uma hora vai
derreter. Tem um ditado [frase] muito popular agora, que eu vi no facebook,
que é assim: gruda que pisa, cospe que cola. Essa frase define os
relacionamentos hoje em dia. (colaborador 1, masculino, 21 anos).
Conclui-se que nesta atmosfera de relacionamentos instáveis, proporcionados pelas
transformações pós-modernas, vinculadas a lógica de consumo, na qual tudo se encontra em
obsolescência programada que o lema “gruda que pisa, cospe que cola” é seguido,
principalmente, pelos jovens pós-modernos.
Individualização: mudanças na percepção sobre mundo pós-moderno
Buscou-se entender o que motivou o sujeito a procurar o SPA, assim, durante a
explicação do colaborador foi possível notar uma resistência em buscar soluções no coletivo,
certa necessidade de auto-suficiência e, por fim, uma preocupação consigo mesmo que
denotou nas entre linhas resultado de uma desilusão amorosa. Assim ele respondeu:
É difícil, agora, encontrar uma pessoa que te ouve, que te dá tanta atenção.
Porque quando você está feliz as pessoas te escutam, mas quando você ta
triste por um motivo tão fútil, como por exemplo, sofrer por alguém,
444
ninguém tem saco pra te ouvir. As pessoas fingem que estão te ouvindo, mas
no fundo não te ouvem. (colaborador 1, masculino, 21 anos).
Nesta fala o colaborador expressa seu anseio em ter alguém em que possa
compartilhar suas inquietações e se mostra revoltado por estar tomado por uma sensação de
desamparo e solidão. Assim, ele menciona estratégias para superar seu desamparo investindo
em si mesmo, como uma forma compensatória e individualizada.
Esse processo de individualização moldado pelo capitalismo pode ser observado em
demais instâncias na vida do colaborador, pois ao expor sua percepção sobre o mundo
contemporâneo ele relata que “80% das pessoas não estão nem aí para os seus sofrimentos, e
outras 20% estão felizes por você estar assim [sofrendo]. Por isso as pessoas preferem ir para
uma terapia, pagar para alguém te escutar,” (colaborador 1, masculino, 21 anos). Nesse
sentido este esse processo faz com que o sujeito pós-moderno se afaste das soluções coletivas,
criando um campo de rivalidade e disputa.
A mulher e a busca pela beleza que relação é essa?
Logo na etapa de seleção das fichas de triagem dos pacientes do SPA percebeu-se a
prevalência de pessoas do sexo feminino que buscam atendimento psicoterápico e que
relataram descontentamento estético e afetivo. Assim recorreu-se a literatura mítica para
apresentar, de maneira singela, alguns aspectos da psique feminina, utilizando os pressupostos
teóricos de Robert Johnson (1993), no qual o autor faz uma análise da psique feminina através
do mito Eros e Psiquê, descrevendo a jornada da mulher em busca da sua individuação. O
mito relata sobre a história de Psiquê - uma jovem princesa adorada por sua beleza, que
despertou inveja e ira em Afrodite, que se sentiu menosprezada por todos. Sua inveja era tanta
que enviou seu filho Eros - o deus do amor -, para vingar-se de Psiquê, ordenando que ele
fizesse à bela Psiquê se apaixonar por um terrível monstro. Entretanto, Eros ao ver Psiquê
ficou deslumbrado e acidentalmente se feriu com uma de suas flechas, se apaixonando por
Psiquê. Impedido, por Afrodite, de se entregar a ela, Eros é preso em uma torre e Psiquê,
apaixonada, se entrega como serva à Afrodite, tudo em nome do amor que sentia por Eros. Na
condição de serva Psiquê é ordenada por Afrodite a realizar quatro tarefas irrealizáveis.
Evidencia-se aqui, a quarta tarefa, que consiste em uma viagem ao mundo infernal em busca
do segredo da beleza de Perséfone - ungüento de beleza. Após um tenebroso caminho até o
mundo dos mortos e o retorno, também bastante árduo, ao mundo dos vivos, Psiquê consegue
cumprir com a quarta tarefa imposta por Afrodite, trazendo em mãos um cofrinho com
ungüento de beleza. Já avistando o mundo dos vivos Psiquê cai em tentação e resolve abrir o
cofrinho e utilizar um pouco da beleza que nele continha, e é neste momento que a jovem bela
445
Psiquê é invadida pelo nada. “O nada sai e recai sobre ela sob a forma de um sono mortal
vindo do inferno e Psiquê jaz no chão totalmente inconsciente.” (JOHNSON, 1993, p.90).
Um primeiro ponto que pode ser ponderado consiste na questão: porque Psiquê mesmo
sendo uma jovem e bela mulher, se rendeu a vontade de usar ungüento de beleza? Será que as
mulheres pós-modernas também não fariam (ou fazem) o mesmo que Psiquê? Ousa-se dizer
que muito provavelmente sim! Pois a beleza se configura como um pilar da civilização, que
somada à ordem e a limpeza constituem o tripé de exigências da mesma. Pode-se observar tal
questão neste trecho em uma das entrevistas:
Isso tem muito a ver, também, porque eu comecei a fazer análise aqui no
SPA. Porque antes eu era muito insegura com meu corpo, com tudo assim.
Eu ainda sou muito insegura, mas eu acho que com a análise eu consegui
adquirir mais segurança. Inclusive com meu corpo. Acho que assim, eu não
to 100% satisfeita com meu corpo, mas pelo menos não é totalmente baixo
alta-estima [...] (colaborador 5, feminino, 20 anos).
Desta forma pode-se dizer que na contemporaneidade há uma incansável busca pela
beleza, para atingir ou se adequar aos ‘padrões’ estéticos. Pois se entende que ser jovem e
belo é sinônimo de produtividade, de capacidade, mascarado pelas mídias que funcionam
sobre a lógica do sistema capitalista. Assim, Freud (1930, p.102) salienta que “a fruição da
beleza dispõe de uma quantidade peculiar de sentimento tenuamente intoxicante.” Pode-se
notar a importância dada à beleza na fala de uma das colaboradoras:
Eu fui muito alimentada com isso... Do tipo: não corre que você vai ralar o
joelho e vai ficar marcado pra o resto da vida. Já pensei em colocar silicone
nos seios por causa dessa descendência japonesa, mas já desisti. Já pensei e
ainda penso em fazer, mas por conta do tempo ainda não fiz a cirurgia do
nariz. Não só pela estética, mas porque tenho problemas pra respirar, a
estética também [...]. Já me incomodou muito, agora não to nem ai... Mas
ainda vou fazer por que... Não sei se não é que me incomoda, porque eu já
ignorei o fato de me incomodar, mas é me incomoda ainda. Então vou fazer.
(colaborador 3, feminino, 20 anos).
Os sujeitos pós-modernos encontram-se sob esse princípio, no qual a beleza é um
elemento enaltecido, sendo que “a civilização não pode dispensá-la” (Idem), pois se
caracteriza como uma das exigências da civilização, podendo ser vista como definidora de
personalidade e caráter. Contudo, Freud (1930, p 102) alerta que “a atitude estética em relação
ao objetivo da vida oferece muita pouca proteção contra a ameaça do sofrimento, embora
possa compensá-lo bastante”.
446
Outro colaborador também salienta essa preocupação com a estética, na qual ela
destaca que a mídia estabelece uma íntima ligação com a exaltação da beleza, criando e
ditando padrões a serem seguidos.
Quando eu era mais nova eu era cheinha e tal. A única coisa que eu fiz, é...
Eu procurei uma nutricionista, ai eu fiz reeducação alimentar. Eu acho
assim, tudo isso tem muito a ver com essas coisas que a gente vive, com esse
padrão de beleza. A televisão também ajuda muito a impor esse padrão na
gente. Então acho que elas procuram muito isso, seguir esse padrão. Mas eu
particularmente não, ah foi um pouquinho por isso, mas não totalmente.
(colaborador 5, feminino, 20 anos).
Um segundo ponto de análise pode ser voltado para o ‘nada’ que invadiu a consciência
de Psiquê, este pode ser lido como a mudança de valores, o vazio e a fragilidade que se fazem
presentes no mundo pós-moderno e se tornam partes constitutivas das personalidades. Na
qual os indivíduos respaldaram suas vidas sob a fragilidade dos laços afetivos e a efemeridade
de valores, ideologias, crenças e hábitos. Há uma busca pela beleza que atinge de modo
bastante singular as mulheres. Os produtos, a mídia e a modernização entendem, de modo
geral, que as mulheres são o público-alvo. E existe, ainda, subentendida uma busca em sanar
certo mal-estar oriundo de uma insegurança e um desamparo no ato de consumir, como se
pode notar nesta fala:
Minha época consumista foi com meu primeiro cartão de crédito, com o meu
primeiro salário também... Gastei tudo com sapatos, vários. Já teve épocas
de eu bater na Marisa todo o final de semana pra comprar nem que seja uma
blusa se não começava a me desesperar. Era muito ruim... Tipo ficar em
casa, me sentia sozinha e com auto-estima baixa, então ia lá na loja andava,
comprava [...]. Saia me sentindo bem mais bonita, com outro astral
(colaborador 3, feminino, 20 anos).
Por detrás do mito de Eros e Psiquê pode-se ver o preço e o valor atribuído a beleza.
Psiquê, então, morrera (para atingir outro estágio de desenvolvimento, pois será lhe devolvido
a vida através da intercessão de Zeus), com sua beleza e ingenuidade, algo narcisista e pueril.
Nesse sentido pode-se refletir sobre a relação entre traços narcísicos e a vigência do modo de
produção capitalista. Pois a lógica capitalista é pautada no processo de individualização, no
qual é primordial preocupação consigo mesmo, um voltar-se para si, principalmente no que
tange a questão da beleza e da estética valorizadas no mundo pós-moderno. Haja visto que
tais aspectos movimenta e cria novos mercados de consumo, que, cada vez mais, pregam o
individualismo gerando rivalidade e mal-estar.
447
[...] está bem claro que um aspecto característico do consumo moderno é
extensão em que produtos e serviços são comprados pelos indivíduos para
uso próprio. [...] Ainda mais característico do consumo moderno é a
ideologia associada ao individualismo. Esse é o valor extraordinário anexado
a esse modo de consumo, juntamente com a ênfase colocada no direito dos
indivíduos de decidirem, por si mesmos, que produtos e serviços consumir.
(CAMPBELL, 2006, P.48-49)
Conclui-se, assim, que “o homem civilizado reverencie a beleza, sempre que a perceba
na natureza ou sempre que crie nos objetos de seu trabalho manual, na medida em que é capaz
disso.” (FREUD, 1930, P. 112).
A busca de si na era do consumo
Campbell (2006, p.47) ao questionar por que o ato de comprar tem crescido nos dias
atuais, salienta que existe uma série de respostas que “vão da satisfação de necessidades até a
emulação dos outros, a busca por prazer, a defesa ou afirmação de um status etc.”, o que foi
possível analisar nesta fala:
Eu sinto mais prazer quando vou na loja e compro por comprar. Tipo ah esse
mês meu cartão não veio alto então posso me dar ao luxo de comprar alguma
coisa, ai eu vou lá e compro. Agora quando eu tenho que ir comprar, tipo
preciso mesmo... preciso de ir pra um casamento e não tenho um vestido
pára ir, ai tenho que comprar mesmo ai eu já compro, já olho preço, já... ai
não me dá tanto prazer quando tenho que comprar por obrigação. Já gosto de
ir mesmo comprar quando vou comprar por comprar sem precisar.
(colaborador 3, feminino, 20 anos.)
Todavia, o autor ainda ressalta que o consumo possa estar suprindo uma função bem
mais importante do que apenas satisfazer motivos ou intenções específicas, recaindo sobre
questões relacionadas com a natureza da realidade e com o que seria o verdadeiro propósito
da existência. O que Campbell (2006) sugere é que reside no modo de viver dos sujeitos pósmodernos a idéia do compro, logo existo, “pois a atividade de comprar não só é um meio pelo
qual as pessoas descobrem quem elas são, como fornece a elas a comprovação básica de sua
existência.
Quando eu não tenho dinheiro pra comprar nada eu até evito olhar para as
vitrines. Porque eu tenho a necessidade de gastar pelo menos 10,00 por dia,
seja com um suco e um misto, sei lá qualquer coisa. Porque eu penso assim...
Eu trabalho, faço minhas coisas, estudo sabe... Se eu não tiver dinheiro não
dá nem vontade de sair de casa, me desmotiva muito sabe, o dia fica
improdutivo, vazio, sei lá [...] (colaborador 1, masculino, 21 anos).
448
Essa fala remete a idéia exposta por Campbell (2006, p.56.) quando ele relata que o
consumo “pode ser visto como uma atividade que envolve a exploração do self e também
pode ser visto como uma resposta à insegurança ontológica ou à angústia existencial.” Nesse
sentido, o consumo pode trazer uma sensação de conforto por passar a certeza de que “somos
seres humanos autênticos - isto é, que realmente existimos.” (Idem)
O que se sobressalta nas entre linhas das falas dos colaboradores é o anseio em
consumir com uma forma de afirmação, amparo e identificação, no sentido de que por de trás
do ato de consumir existe uma busca por si mesmo. Ou seja, ”a verdadeira atividade de
consumo no mundo - a seleção, a compra e o uso de produtos - deve ser entendida como um
processo que resulta da manifestação ou da “conversão em realidade” de algo que antes era
meramente latente.” (CAMPBELL, 2006, P. 58). Nesse sentido os objetos que nos cercam é
resultado direto do estado emocional do sujeito, em específico do seu desejo, onde eles se
tornam parte de sua realidade cotidiana.
Durante a entrevista com o colaborador 3 ela relatou não saber o que a motivava
comprar naquela maneira, se era porque em outra época ela não tinha condições para tanto e
agora alcançou tal condição ou se gostava mesmo de fazer compras, até em supermercados. O
que resultou na interpretação que logo quando sua situação econômica ascendeu, ela
externalizou seus desejos e sua nova posição social através dos sapatos e demais artigos
adquiridos . Essa idéia vai ao encontro das concepções sobre o desejo latente e a busca por
realizações através do ato de consumir, como apresenta Campbell (2006).
[...] fazer compras é um contexto ideal para continuar a busca por
significado. Ideal porque há uma pureza de auto-expressão ligada à atividade
que não é comumente experimentada nessas outras atividades (contanto o
que não se esteja pensando em compras de rotina ou de presentes, mas em
uma atividade que vise satisfazer vontades do self.). Essa pureza deriva da
não-consideração de qualquer necessidade, seja de sentimentos ou demandas
de outras pessoas, seja da intensidade e variedade dos estímulos do que é
ofertado. (CAMPBELL. 2006, P. 57)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Buscou-se apresentar que estamos em uma sociedade em que a satisfação das vontades
tomou o lugar do atendimento das necessidades, sendo estas vontades moldadas pelas nuances
do sistema capitalista e suas exigências individualistas, narcísicas, com ideologias e valores
descartáveis já que estão inclusos em uma obsolescência programada.
449
A partir desta conjuntura, na qual o eu pós-moderno é excepcionalmente aberto e
flexível, buscou-se compreender as variadas formas de mal-estares oriundos desta nova
maneira de viver, ver e se relacionar no mundo contemporâneo. Evidenciando que os sujeitos
pós-modernos estão engajados em um processo de recriar a si mesmo com base, sobretudo, na
satisfação das vontades regidas conforme as exigências do modo de produção capitalista,
principalmente no ato de consumir, pois “o consumismo é fundamental para o processo pelo
qual os indivíduos confirmam ou até criam sua identidade.” (CAMPBELL, 2006, P. 51).
Como Salienta Birmam (2000) trata-se de pensar nos destinos dos desejos na atualidade,
captando o que há de sofrente nas novas formas de subjetivação.
REFERÊNCIAS
BAPTISTA, Makilim Nunes; CAMPOS, Dinael Corrêa de. Metodologia de pesquisa em
ciência: análises quantitativas e qualitativas. Rio de janeiro: LTC, 2007.
BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977.
BAUMAN, Zygmunt. O mal-estar da pós-modernidade. Rio de Janeiro: Zahar, 1998.
_________. Ser leve e líquido. In.: Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001. P.
7-22.
_________. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar. 2004.
BIRMAN, Joel. Mal-estar na atualidade: a psicanálise e as novas formas de subjetivação. 2ª
Ed. RJ: Civilização Brasileira, 2000.
BLEGER, José. Temas de psicologia: entrevista e grupo. São Paulo: Martins Fontes, 1993.
FREUD, Sigmund (1930) O mal-estar da civilização. In: Edição Standard Brasileira das
Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1969.
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 4ª. Rio de Janeiro: DP&A, 2000.
HARVEY, David. Condição Pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança
cultural. 18ª Ed. São Paulo: Edições Loyola. 2009.
NETTO, J. Teixeira Coelho. Moderno pós moderno: modos e versões. 5ª Ed. São Paulo:
Iluminuras, 2005.
REICH, Wilhelm. A revolução sexual. 8ª Ed. Rio de janeiro: Guanabara, 1988.
450
SARAIVA, Mariana Ferreira. Modernidade, Desencantamento do mundo, Mídia e Poder.
Filosofia. Agos. 2010. Disponível em: <http://www.webartigos.com/artigos/modernidadedesencantamento-do-mundo-midia-e-poder/44897/>. Acesso em Se. 2011.
451
HISTÓRIA E REPRESENTAÇÕES SOCIAIS: A UNIR AO LONGO DOS 30 ANOS
DE ATUAÇÃO EM RONDÔNIA (1982 A 2011)*
Representações Sociais no período da Criação da UNIR
Elizângela Mendes de Araújo**
Lilian Maria Moser
"A Universidade de Rondônia, que agora surge tardiamente, é o coroamento
de uma luta de nosso povo que durante amargos 38 anos de Território
Federal teve esse direito negado", (...). (...), "trata-se de uma conquista de
nossa gente, criada como imperativo de desenvolvimento econômico,
social, cultural e político do Estado" 91 (grifo meu).
RESUMO
O presente escrito é resultado de pesquisas bibliográficas e documentais, realizadas com
intuito de conhecer a Universidade Federal de Rondônia quando no momento de sua criação e
no decorrer dos trinta anos (1982-2012), entendendo a partir desses levantamentos que
representações sociais foram geradas na/para população do Estado de Rondônia. Para tanto
realizamos no primeiro passo a identificação, através de pesquisas e leituras, dos jornais que
teriam notícias consideradas relevantes à construção desse estudo, a fase inicial se deu no
Centro de documentação histórica de Rondônia, em seguida no Centro de documentação do
Poder Judiciário. Assim dois jornais foram identificados: O Estadão e O Guaporé, que em
várias edições abordavam assuntos importantes sobre a Unir, posteriormente nos detemos a
estudar cada matéria... O trabalho buscou também conhecer pessoas que fizeram parte da Unir
e ainda vivas poderiam colaborar com a pesquisa, porém várias que foram sugeridas
afirmaram não conhecer a fundo a história da Universidade, por isso não poderiam dar
entrevista. Sobretudo, como já realizada pesquisa bibliográfica em fontes que adotamos como
referencial teórico bem como em processo de finalização a pesquisa documental em acervos
do Estado, pretendemos no próximo passo aprofundar nossa busca no que tange as fontes
orais, que de alguma forma fizeram ou fazem parte da história desta Universidade, falamos
assim da memória de professores, técnicos, alunos bem como reitores desta. No geral, as
investigações projetadas nessa pesquisa, tiveram como foco principal abrir caminhos que
desvendassem o pensamento social quando se estabeleceu em Rondônia a Universidade
Federal. Diante desse objetivo, fomos levados a analisar principalmente os discursos dos
políticos que ludibriavam o fator: "bem público", estes tentavam, sobretudo, transparecer a
população que a criação da Universidade era uma conquista do "povo", era uma vitória para
todos. No entanto implícito nesses discursos que tinham por objetivo ganhar popularidade e se
autopromover diante da sociedade, estavam impregnados os interesses políticos particulares,
pois as justificativas e as atividades utilizadas para criação da Universidade em momento
*
*
Graduanda em História pela Universidade Federal de Rondônia – UNIR. Bolsista do Programa
Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC e membro do Centro de Documentação e Estudos
Avançados sobre Memória e Patrimônio de Rondônia – CDEAMPRO.
∗
∗∗
Orientadora.
91
Jerônimo Santana em declaração de voto na Câmara Federal, no dia 22 de junho, quando da criação da
Universidade. Fonte: Jornal O Guaporé, 01 de julho de 1982, p. 2. (Arquivos do Centro de documentação
histórica de Rondônia).
452
algum coincidiram com os discursos, nesse sentido a criação da universidade estava sendo
projetada como veiculo de status político e era tão somente um desenvolvimento do Estado
para o próprio "Estado político".
Palavras-chave: Unir. Criação e história. Representações sociais.
ABSTRACT
This writing is the result of bibliographical and documentary research, conducted with the aim
of meeting the Federal University of Rondônia when the moment of its creation and in the
course of thirty years (1982-2012), understanding from these surveys that were generated in
the social representations / to the population of the state of Rondônia. For this purpose we
used the first step to identify, through research and reading, the news papers that have
considered relevant to the construction of this study, the initial phase took place in the center
of historical documentation of Rondônia, then the Documentation Center of the Judiciary. Just
two newspapers were identified: The Guaporé and O Estado, which addressed several issues
important issues about the Uniting later we pause to examine each matter ... The study also
sought to meet people who were part of the Uniting and still alive could collaborate with the
research, but several said they were suggested not know the background history of the
University, so it could not be interviewed. Especially, as bibliographical research on sources
which we adopt as a theoretical as well as in the process of finalizing the documentary
research collections in the state, the next step we intend to deepen our search regarding the
oral sources, which somehow did or part the history of this University, spoke well of the
memory of teachers, technicians, students and rectors of this. In general, investigations
designed in this research had as main focus of open paths desvendassem social thought when
it established the Federal University in Rondônia. Given this goal, we were led to examine
particularly the speeches of politicians who ludibriavam factor: "public good", they attempted
especially surface the population that the creation of the University was an achievement of
"the people" was a victory for all. However implicit in these discourses that aimed to gain
popularity and promote yourself to society, were impregnated with the political interests of
individuals, as the justifications and the activities used to create the University at any time
coincided with the speeches in this sense the creation of the university was being designed as
a vehicle for political status and was merely a development of the state for their own "political
state".
INTRODUÇÃO
A presente pesquisa nasceu no sentido de investigar a história da Universidade Federal
de Rondônia, levantando inicialmente as problemáticas: quando foi criada, o porquê de sua
criação e que representações sociais esta gerou no Estado. O primeiro passo se deu no sentido
de buscar referencial teórico que nos auxiliasse na pesquisa documental. Assim por sugestão
da orientadora Dr.ª Lilian Moser, estudamos as teorias de LE GOFF em História e Memória
(1990) e Halbwachs, Memória Coletiva (1994); através dessas leituras, compreendemos o
processo de aproximação com o documento histórico, sua importância e o olhar do historiador
453
para estes, sejam escritos ou orais, os documentos trazem à memória do presente “a
linguagem de uma voz agora reduzida ao silêncio: seu rastro frágil, mas por sorte, decifrável”
(FOUCAULT, 2004, p. 7). A posteriori objetivando encontrar vestígios sobre a história da
Universidade, foram consultados os jornais O Estadão e O Guaporé, ambos os arquivos do
Centro de documentação histórica de Rondônia. Este trabalho reflete os resultados já
alcançados, porem prosseguirá, pois o objetivo fundamental é debruçar-se sob as varias fontes
que trazem um pouco sobre a história da Universidade e dessa forma reuni-las na forma de
um livro, em decorrência dos trinta anos de sua existência. A seguir um breve comentário do
embasamento teórico, para então descrever densamente a respeito da Universidade Federal de
Rondônia e sua história.
l MEMÓRIA, HISTÓRIA E DOCUMENTO
I. I O significado do documento: História Tradicional versus a Nova História.
Segundo Samara e Tupy (2010) na contemporaneidade, podemos considerar a História
uma disciplina de caráter científico, levando em consideração que esta possui um método de
trabalho onde a aprendizagem do historiador face ao referencial teórico, metodologia e fontes
documentais, requerem impreterivelmente critérios técnico-científicos para sua realização.
Para os historiadores do século XIX a História se designaria como "a reconstrução do
passado" e o documento escrito como uma fonte fidedigna que traz à memória do presente os
acontecimentos vivenciados, portanto o historiador na construção do presente no passado
projetado para o futuro deve refletir fielmente cada informação contida no documento, dessa
forma sem, sobretudo, reproduzi-los com as interpretações pessoais.
A tarefa do fazer história no presente se tornou para muitos o produto de uma só
época, sendo esta evidenciada sempre por mudanças metodológicas que surgem para
desenvolvimento ou aprimoramento da disciplina em cada época da sociedade e de sua
história. É em cada tempo da História, que o uso do documento como comprovação autêntica
da verdade vivida num passado memorável, se torna necessário ou inútil na busca pela
fidedignidade dos fatos.
A respeito do método dos historiadores do século XIX ao olhar para as fontes
documentais, Michel Foucault (2004) reitera que neste período sempre se serviu de
documentos, sempre os interrogou, não apenas sobre o que queriam dizer, mas principalmente
sobre a veracidade, legitimidade e genuinidade (FOUCAULT, 2004, p. 7). O objetivo
454
primordial era reconstituir a partir do que supostamente diziam os documentos, o passado de
onde estes se originaram. Por isso, era vitalício para o fazer histórico saber da autenticidade
dos documentos, pois representavam “a linguagem de uma voz agora reduzida ao silêncio: seu
rastro frágil, mas, por sorte, decifrável” (FOUCAULT, 2004, p. 7).
É nesse sentido que ao nos aproximar dos jornais arquivados no Centro de
documentação histórica de Rondônia, buscamos primeiramente interrogá-los sobre a
autenticidade e entender o que queriam dizer em essência, considerando que cada
acontecimento é decorrente de acordo com sua época e os valores sociais.
Ao contrário das práticas da História Tradicional, surge opostamente à Nova História,
esta influenciada por pesquisadores que embora não utilizassem os documentos como fontes,
passaram a fazer uso de documentos através de métodos e técnicas que se serviam desse tipo
de fonte. (SAMARA & TUPI, 2010).
Segundo Peter Burke (1997, p. 21) a historiografia francesa neste momento passou a
buscar outros elementos, problemas e objetos, se aproximando de uma abordagem
interdisciplinar, havendo também uma mudança na relação com as diferentes linguagens, em
função das diversas manifestações nas relações humanas, as quais propunham estudar.
Tais mudanças trouxeram também uma ampliação no conceito de documento
histórico, que de mero texto escrito passou a significar de acordo com Vieira (2003) "tudo que
o homem produziu". Essa ação interdisciplinar amplia o campo de trabalho do historiador,
não apenas pelas novas fontes, mas também os enfoques teóricos vindos de novas abordagens
que os historiadores assumem.
De posse desses conhecimentos podemos entender que, o avanço da história como
ciência se fez acompanhado de uma renovação de métodos e técnicas em que todos os meios
possíveis são utilizados para tentar vencer as lacunas do silêncio, o que é evidente na obra
Historia & Documento e metodologia de pesquisa, eis a seguir trecho extraído:
Na nova historiografia o documento busca elementos no viver cotidiano nas
elações de uso e troca criadas pela humanidade. Os artefatos devem ser
estudados enquanto criação dos grupos sociais nos quais a produção humana
está inserida. (SAMARA & TUPI, 2010).
Diante de tais reflexões fomos indagados a respeito do uso e do significado do
documento na contemporaneidade, tendo em vista que as mudanças ao longo dos anos
trouxeram à história uma nova metodologia e um novo olhar para o historiador quanto às
fontes documentais, sejam escritas, digitais, sejam as oralidades ou as mais diversas memórias
455
gravadas nos documentos que servem a construção da história, ou seja, à reconstrução do
passado.
Uma definição interessante de documento está em Samara & Tupi (2010, p. 118),
segundo estas o documento pode ser entendido como a “organização de uma forma de
linguagem”. Para Vieira (2003) o documento é “toda produção Humana” evidenciando
também nossos elementos materiais e imateriais. Ambas as definições estão muito próximas,
pois evidencia a utilização de diversas formas de linguagens incorporadas no avanço da
ciência histórica, ao dizer de Pominique apud Samara e Tupi (2010, p. 118), mais
precisamente a interdisciplinaridade, ou seja, a incorporação de métodos e técnicas de outras
ciências afins.
É dentro desse contexto que passamos a analisar não só o documento em si (os jornais
do Centro de documentação do Estado), mas a escrita e a mensagem que cada matéria
abordava. Por fim passamos a assumir o papel de decodificadores das mensagens, logo
também os receptores (após anos de publicados esses noticiários), sobretudo tendo cuidado
para não cometer erros de anacronismos.
Pensando na composição do documento histórico e visando a compreensão do leitor,
desenvolvemos a seguir uma breve análise do referencial teórico utilizado nas abordagens: o
que é escrita, como se identifica a mensagem e como se dá o processo de decodificação? No
mais, sobre o receptor, também integrante do documento, pois realiza a leitura e interpretação
da mensagem.
A escrita, não se trata apenas da elaboração de um texto, mas é a transmissão de uma
mensagem, entre quem lê e quem interpreta a leitura. No dizer de Roger Chartier (1990),
escrita é antes de tudo a representação física da linguagem, a linguagem escrita traduz um
universo simbólico, uma dimensão selecionada que atrai signos, símbolos, é uma construção
argumentativa.
Há também na escrita (além de sua leitura e interpretação), a decodificação da
mensagem, que requer, sobretudo, o conhecimento do contexto que foi produzido, pois
decodificar é além de todo e qualquer procedimento, tentar conhecer os atores sociais
envolvidos em sua criação.
No documento há além da escrita e decodificação aquele que receberá a mensagem. O
receptor se caracteriza como aquele que tentará decodificar a mensagem de forma mais
próxima do pensamento original, evitando sempre anacronismos, ou seja, julgar os elementos
que são frutos de determinada época, de acordo com os preceitos estabelecidos na sociedade
456
contemporânea; afinal a tarefa do historiador consiste analisar com fidelidade as informações,
sem atribuir valores próprios de uma época ou uma sociedade distinta.
A análise do texto em pesquisa histórica é o de que um documento é sempre,
portanto de um discurso que, assim considerado, não pode ser considerado
algo transparente. (SAMARA & TUPI, 2010, p. 123).
A História é uma construção que não cessa, é a perpétua gestação do presente para o
passado. Logo o documento não pode ser entendido como a realidade em si. Além disto, as
fontes são sempre exploradas com filtros do presente, de acordo com seus valores e
preocupações.
A partir da leitura inicial das bibliografias que nos serviram como referencial teórico;
seguimos a estruturação da pesquisa documental desempenhada nos acervos do Centro de
documentação histórica de Rondônia e Centro de documentação histórica do Poder Judiciário.
Tendo conhecimento que as fontes escritas (os documentos), que no caso se identificam como
jornais, são de máxima importância em nossa busca, nos detemos primordialmente a ler,
estudar e entender cada matéria que trazia a respeito da Unir.
II A CRIAÇÃO DA UNIVERSIDADE FEDERAL EM RONDÔNIA
II. I Dos projetos à criação da Unir: 08 de julho de 1982.
De acordo com os jornais, a criação da Universidade está inserida como marco
histórico para Rondônia. Desde 08 de julho de 1982 quando houve sua inauguração passou desde o projeto de criação nº 7.011 - a ser fator de desenvolvimento para o então Território
Federal elevado à categoria de Estado de Rondônia.
Sobre o início da Universidade no prédio do antigo Porto Velho Hotel, segue um breve
fascículo a respeito da doação do patrimônio que teve seu tombamento histórico em 1988, eis:
O antigo prédio do Porto Velho Hotel foi doado à FUNDACENTRO que se
transformou na Fundação Universidade Federal de Rondônia, implantada por
Euro Tourinho Filho e Raymundo Nonato Castro, respectivamente, 1º Reitor
e 1º Vice-Reitor.
Por um longo período esse prédio ficou sem manutenção e as restaurações
essenciais a um bem histórico e arquitetônico, ficando nossa cidade privada
de um dos seus componentes mais significativos que conferem sua
identidade e seu caráter.
Não adiantou seu tombamento histórico - Decreto nº 3.995 de 29 de
novembro de 1988, porque na época o prédio não estava vocacionado para
um uso específico. Passaram-se os anos e a UNIR despertou. Realizou a
457
restauração do prédio, dando-lhe perenidade. Só que a perenidade não
implica em situação estática, imobilista, e isso, no caso de arquitetura, só
poderá ser explicitado na dinamização, no uso vocacionado do prédio.
Atualmente a UNIR mudou o necessário e conservou o imprescindível,
instalando a Reitoria, sendo possível assim, preservar esse bem que é uma
testemunha de decisões significativas para o desenvolvimento sociocultural e
político de Rondônia. 92
Mediante as fontes de pesquisa observamos que a Unir passou a funcionar em 1982,
no mesmo local da FUNDACENTRO, conforme os noticiários esta assumia um caráter pouco
diferente da antiga, pois somente mudava o fator de faculdade privada para Universidade
pública, porém os objetivos implícitos nas decisões políticas de aprovar a criação de uma
Universidade Federal não diferiam daqueles impregnados no ensino superior da antiga
Fundação.
Diante da pesquisa nos jornais O Guaporé de 1982, exploramos ao máximo notícias
sobre a criação da Unir. Encontramos uma primeira matéria que tratava a respeito dos
estudantes do Centro de Estudos Superior de Rondônia (CESUR) que reivindicavam o
pagamento de 23 mil cruzeiros das matrículas para o segundo período letivo. Em entrevista os
funcionários da Cesur informaram que o pagamento era legítimo, tendo em vista que a
Universidade Federal de Rondônia ainda não havia sido criada, havia apenas uma autorização
para sua criação, o que ocorreria num prazo de aproximadamente um ou dois meses. Alguns
alunos chegaram a afirmar que a cobrança da taxa era uma maneira de atacar seus bolsos
antes que a Unir fosse criada, pois quando isso ocorresse não mais poderiam ser cobrados por
qualquer taxa.
Euro Tourinho Filho como primeiro reitor da Universidade, concorda com algumas
colocações dos alunos, mas desmente "os boatos existentes de que a Unir não tivesse sido
ainda criada, afirmando que isto aconteceu no dia 08 de julho". Como demonstra a seguinte
icnografia:
Figura 1
92
BORZACOV, Yêdda Pinheiro. PORTO VELHO: 100 ANOS DE HISTÓRIA. 1907-2007. P. 146-147.
(Arquivos da Biblioteca Municipal de Porto: Francisco Meireles).
458
Fonte: Jornal O Guaporé, 16 de Julho de 1982. (Arquivos do Centro de documentação histórica de Rondônia).
Mediante os fatos podemos concluir que a criação da Unir não ocorreu de imediato,
mas tendo sido assinado o Projeto de criação em 08 de julho através da Lei 7.011 passou a
vigorar tempos depois (após dois meses aproximadamente), o que ocasionou para a população
estudantil um desconforto, principalmente de cunho econômico.
Ainda sobre a criação da Universidade, encontramos uma matéria a respeito do
primeiro projeto que sugeria uma universidade para o Estado.
Conforme notícia do Jornal O Guaporé de 01 de julho de 1982, o projeto para a
criação da Universidade havia sido proposto em 1976, quando o então deputado Jerônimo
Santana ofereceu à consideração da Câmara Federal o projeto de lei nº 2.747, no entanto essa
proposta terá sido rejeitada. Em 1977 Jerônimo reapresentou o projeto, sendo aprovado por
todos na Câmara naquela ocasião. No entanto o governo resolveu desprestigiar a iniciativa
parlamentar e engavetou o projeto não permitindo que nem fosse colocado na ordem do dia.
Na foto a seguir encontra-se o deputado Jerônimo falando à Câmara quando houve a
criação da UNIR (em 1982), para ele uma vitória de todos, vejamos.
Figura 2: Primeiras fustigações a respeito da criação da Unir
459
Fonte: O Guaporé, 01 de Julho de 1982. (Arquivos do Centro de documentação histórica de Rondônia).
Como retrata a imagem, no discurso de Jerônimo Santana encontramos palavras que
demonstram uma luta à priori e nesse momento "uma conquista do povo" a esperança de
novos momentos, a 22 de junho de 1982 no jornal O Guaporé - quando na criação da
universidade - ressaltamos a seguinte frase que demonstra seu pensamento diante do aflorar
da Universidade.
"Trata-se de uma conquista de nossa gente, criada como imperativo de
desenvolvimento econômico, social, cultural e político do Estado". (...)
"Muito lutei para chegarmos a essa conquista, em favor da juventude de
Rondônia e com ela hoje regozijamo-nos por mais essa vitória." 93
Entendemos assim que nesse momento a representação da universidade para a esfera
parlamentar era projetada como um elemento parte da criação do Estado, no entanto
analisando as páginas posteriores observamos que há também na criação da universidade a
representação de um status político, que desejava pela barganha social um novo olhar...
93
Palavras do deputado Jerônimo Santana em declaração de voto na Câmara Federal, no dia 22 de Junho
de 1982, quando da criação da Universidade Federal de Rondônia. Fonte: Jornal O Guaporé. 01 de Julho de
1982, p. 3. (Arquivos do Centro de documentação histórica de Rondônia).
460
Se atentarmos para as várias notícias a respeito da criação da universidade, veremos
um ponto que é comum a todas: o desenvolvimento ocasionado para o estado em virtude
da criação da universidade.
Compreendemos mediante as palavras dos atores sociais da época (encontrados nos
jornais de 1982 e nos anos posteriores) que a Universidade Federal de Rondônia era sim do
interesse de "todos", pois além de proporcionar conhecimento para toda a população (tendo
em vista que era pública), ela habilitaria vários profissionais, tanto para a saúde como para a
educação; sem a atuação de uma universidade no estado todos continuariam a esperar
profissionais que migravam de outras regiões para atender a demanda local, então ter uma
universidade própria no estado era uma conquista para o povo rondoniense e isso significava
desenvolvimento.
III. A UNIR AO LONGO DE SUA PRIMEIRA DÉCADA
III. I O que somos e para onde vamos?
Castoriadis (1987) analisa um conceito teórico que chama de autoinstituição. Para este
autor autoinstituição é a forma como determinado grupo cria seu mundo, sua forma de
entender a uma dada realidade, por normas, valores, formas de analisar a vida e a morte.
Segundo ele são estes fatores que criam diferentes formas de entender o real, “criações
específicas aparecem em seu interior”.
A partir desse elemento teórico nos propomos a analisar a seguinte problemática: "O
que somos e para onde vamos?" Percebemos que essa é a questão mais presente, nos textos
produzidos logo nos primeiros anos de funcionamento da Universidade.
A discussão de qual seria a proposta e objetivos da Universidade Federal de Rondônia,
foi um elemento a ser discutido pelo primeiro reitor, Euro Tourinho Filho. É claro que
também foi motivo de debate por outros reitores, mais a necessidade de se autoinstituir
parecia gritante e real nos primeiros anos de funcionamento desta instituição.
Euro Tourinho filho, agrônomo e conhecedor da literatura regional, descreve de forma
simples e coerente quais seriam as bases da Universidade Amazônica. Ele destaca em seu
discurso a posição que Rondônia encontra-se e toma-o como elemento de projeção para
entender de que forma a universidade poderia atuar. Euro Tourinho de posse dos
conhecimentos das bases de uma universidade começa a pensar além do Ensino e da Pesquisa.
Eis a seguir um trecho extraído de um jornal - sem referência.
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A ideia de transformar a Unir numa Universidade Amazônica para todo o
continente irá exigir profissionais do mais alto nível atuando em Rondônia.
Isso, de acordo com o reitor Euro Tourinho Filho, será possível graças a um
convenio entre a instituição, o centro de desenvolvimento e apoio Técnico à
Educação - CEDATE - e o Ministério da Educação e Cultura - MEC. (Jornal
sem Referência - Centro de Documentação do Estado de Rondônia).
Nossa UNIR - e este é nosso maior compromisso com Rondônia - deverá ser
uma Universidade diferente. Diferente pelas suas diretrizes, diferente pela
sua ideologia, diferente pelos seus objetivos, diferente pelas suas funções
comunitárias, diferente pelo seu quadro de professores, competentes,
dedicados e conscientes do papel de “agentes de mudanças
comportamentais”, diferente pela sua vocação Amazônica, diferente pela sua
preocupação com as gerações futuras, diferente pelo seu compromisso com a
qualidade de ensino, diferente pelo seu reitor, que na verdade, é mais
empresário do que professor, é mais pesquisador do que acadêmico. Talvez,
ao me indicar reitor, nosso governador Jorge Teixeira de Oliveira tenha
querido dar resposta a um dos problemas terríveis da universidade brasileira,
rica de doutores e pobre de competência gerencial. (Discurso de Posse de
Euro Tourinho, setembro de 1982. Centro de documentação histórica de
Rondônia).
Sem dúvida este processo de escolha do modelo da Universidade, ou melhor, de um
projeto político pedagógico, não é inocente. É nítida a escolha de um modelo voltado para
atender as necessidades da elite do recém-criado Estado de Rondônia. Temos como exemplo a
criação dos cursos de licenciaturas que visavam atender a demanda de profissionais na área da
educação, elemento este cobrado pelo Poder Executivo Federal com a ação da sociedade
política local. Também podemos observar na escolha de cursos técnicos, que o são
praticamente todos na área de agropecuária, elemento assim caracterizado pela ligação direta
com a principal vocação econômica do estado na década de oitenta.
Como foi mencionada, a escolha do modelo político e pedagógico da universidade não
é inocente, tanto do ponto de vista a quem quer atender, como também reflete as
problemáticas de uma jovem Universidade, que por determinação de instâncias superiores tem
uma cobrança de um status: Ensino e Pesquisa. É interessante resaltar que é latente nesse
mesmo período a grande falta de estrutura na Universidade bem como a ausência de
professores e de produção científica, etc.
Destacamos também o forte envolvimento da reitoria nas edições de jornais, existem
várias notícias que são caracterizadas como textos de autoria do reitor Euro Tourinho. Ora na
falta do que se projetar no sentido da falta de elementos consolidados de uma Universidade
aponta:
462
É de se indagar: que capacidade de influência dispõe o professor sobre os
educandos, se ele, o AGENTE DE MUDANÇAS, tem péssima aparência
pessoal (cabelo, barba, unhas, dentes, indumentárias e sapatos descuidados),
se ele, o LIDER, é um descomprometido com o horário, com a preparação
das aulas e dos recursos instrucionais. (TOURINHO, Euro Filho. Perfil
Ideológico da Universidade Federal de Rondônia. - 1983. Panfleto.
Disponível no Centro de documentação histórica do Estado).
Em virtude do que relatei a pouco, a fala acima é muito presente na narrativa do
primeiro reitor desta Universidade, em seus escritos feitos com ótima coerência textual tenta
mostrar que a Unir é uma Universidade, e ao falar de suas atividades naquele período enfatiza
sobre os elementos teóricos sobre ensino e aprendizagem ou, se projetar sobre o futuro,
problemática não apenas da Unir, mas de um Jovem de qualquer Centro de ensino Superior.
Além disso, podemos através dos jornais O Guaporé de 1982 identificar matérias que
retratavam claramente os esforços políticos por criar uma universidade e justificar essa atitude
como favorável ao desenvolvimento econômico, social e cultural para a população do Estado.
IV. ENSINO & PESQUISA NOS PRIMEIROS ANOS
Sem dúvida não foi fácil para UNIR se tornar de fato uma universidade no que se
refere a sua atuação no ensino e na pesquisa. Principalmente nos primeiros anos, visto que o
MEC através de acordos de repasse de dinheiro exigia uma produção científica. A grande
dificuldade encontrada naquele período era a universidade não contar (em sua maioria) com
profissionais conhecedores de um nível teórico metodológico que desenvolvessem um objeto
de pesquisa, bem como a ausência de laboratórios científicos no campo das Ciências exatas e
da Terra o que dificultava o salto qualitativo da Universidade.
Um ano após a criação da Universidade, seu primeiro - Reitor Euro Tourinho indagado sobre a situação da Pesquisa na Universidade responde ao jornal Alto Madeira:
A Unir aplicará também no seu ritmo de trabalho, as linhas de ação do
governo Jorge Teixeira, sobretudo no que diz respeito a dois aspectos:
Treinamento de mão de obra e montagem de uma Infraestrutura de pesquisa
pura. Tourinho Filho detalha essas metas: - Parece um pesadelo, mas
queremos sair do baixo rendimento para um desempenho com maior
eficiência. Isso exigirá um acompanhamento e avaliação permanente do
trabalho de cada departamento.
Apesar de tudo, Tourinho Filho concorda com a tese de que a função da
pesquisa se torna cada vez mais difícil da Universidade: Hoje em dia a
pesquisa cientifica são cada vez mais caras exigem equipamentos
complicados, pessoal especializado etc. e a Universidade não tem estes
recursos. Quase não existem também mecanismos adequados para premiar e
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fortalecer o pesquisador mais talentoso, e afastar o medíocre e o
incompetente. (Jornal Alto Madeira, 18 agosto de 1983).
As palavras acima são passíveis de diversas análises. Na fala de Tourinho percebemos
a fraqueza da pesquisa naquele momento, pois na realidade a Unir se dedicava unicamente ao
ensino, atendendo as necessidades das escolas públicas do Ensino Fundamental e Médio, que
consistia na formação de professores.
A pesquisa não era a tônica da UNIR. Pelo contexto histórico e político em que se
encontrava o próprio estado de Rondônia, a pesquisa era uma área ainda a ser conquistada, de
forma que não atendia os critérios básicos de uma Universidade.
Observa-se que o referido reitor deixa clara a ligação dos interesses do governo do
estado num sentido de atuação da Universidade, como dito anteriormente: "formar
profissionais para o quadro técnico do jovem estado", bem como profissionais voltados ao
agronegócio, principal fator econômico de Rondônia naquele período.
O t

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