ANAIS PIBIC-2011-2012
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ANAIS PIBIC-2011-2012
Revista Pesquisa & Criação Publicação Científica da Fundação Universidade Federal de Rondônia Produzida pela PROPesq Ano: 2012, Volume 11, Número Especial: Anais do XXI PIBIC/UNIR/CNPq ISSN: 1677-3993 NÚMERO ESPECIAL ANAIS DO XXI SEMINÁRIO FINAL DO PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSAS E TRABALHO VOLUNTÁRIO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA PIBIC/UNIR/CNPq REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO MINISTÉRIO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA - PROPesq DIRETORIA DE PESQUISA E DESENVOLVIMENTO PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSAS E TRABALHO VOLUNTÁRIO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA - PIBIC/UNIR/CNPq ANAIS XXI SEMINÁRIO FINAL DO PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSAS E TRABALHO VOLUNTÁRIO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA ISSN 1677-3993 Realização: Parceiros: 1 FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa Programa Institucional de Bolsas e Trabalho Voluntário de Iniciação Científica (PIBIC) XXI Seminário Final do Programa Institucional de Bolsas e Trabalho Voluntário de Iniciação Científica (PIBIC) COMISSÃO ORGANIZADORA Prof. Dr. Ari Miguel Teixeira Ott - Presidente Profa. Dra. Marli Lúcia Tonatto Zibetti - UNIR TAE Ms. Ilma Erse Campos - UNIR TAE Esp. Alex Santana Costa - UNIR COMISSÃO DE APOIO À INFRAESTRUTURA E LOGÍSTICA TAE Esp. Alex Santana Costa - PROPesq/PIBIC TAE Ms. Ilma Erse Campos - PROPesq/PIBIC Acadêmica Adriele Gonçalves Cardoso - PROPesq/PIBIC Acadêmico João Vitor Demétrio Nogueira - PROPesq/PIBIC TAE Esp. Laércio do Carmo Rodrigues - NCH/UNIR ADM Maênia Araújo Mendes Vaz de Souto - PROPesq TAE Esp. Angélica Maria da Cunha Barbosa - PROPesq Acadêmica Elis Aparecida Lacerda Gonçalves - PROPesq Acadêmica Adriana Correia de Oliveira - PROPesq Acadêmica Sônia Maria Silveira da Costa - UNIR Prof. Dr. Dorisvalder Dias Nunes - Coordenador do Laboratório de Geografia e Planejamento Ambiental - LABOGEOPA/UNIR Prof. Dr. Wanderley Rodrigues Bastos - Coordenador do Laboratório de Geoquímica Ambiental/UNIR Prof. Dr. Carlos Mergulhão Júnior - Campus de Ji-Paraná Prof. Dr. Orestes Zivieri Neto - Diretor do Campus de Rolim de Moura Profa. Dra. Marilsa Miranda de Souza - Campus de Rolim de Moura COMISSÃO DE ORGANIZAÇÃO DOS ANAIS Prof. Dr. Ari Miguel Teixeira Ott - Pró-Reitor/PROPesq TAE Esp. Alex Santana Costa - PROPesq/PIBIC/UNIR Prof. Dr. José Lucas Pedreira Bueno - UNIR Profa. Dra. Juracy Machado Pacífico 2 FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA Profª. Drª. Maria Berenice Alho da Costa Tourinho Reitora Prof.ª Dr.ª Maria Cristina Victorino de França Vice-Reitora Prof. Ms. Adilson Siqueira de Andrade Chefe de Gabinete Prof. Dr. Ari Miguel Teixeira Ott Pró-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa Prof. Dr. Jorge Luiz Coimbra de Oliveira Pró-Reitor de Graduação Prof. Dr. Osmar Siena Pró-Reitor de Planejamento Ms. Ivanda Soares da Silva Pró-Reitora de Administração Prof. Ms. Rubens Vaz Cavalcante Pró-Reitor de Cultura, Extensão e Assuntos Estudantis Prof.ª Ms. Andréa Aparecida Cattaneo de Melo Assessora de Comunicação Prof. Dr. Valdir Aparecido de Souza Diretor de Pesquisa e Pós-Graduação – PROPesq 3 COMITÊ TÉCNICO CIENTÍFICO INSTITUCIONAL Prof. Dr. Ari Miguel Teixeira Ott Presidente CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS I Prof. Dr. Júlio César Barreto Rocha Profa. Dra. Juracy Machado Pacífico Prof. Dr. José Lucas Pedreira Bueno Profa. Dra. Josélia Gomes Neves Profa. Dra. Marilsa Miranda de Souza Profa. Dra. Milena Cláudia Magalhães Santos Guidio Prof. Dr. Orestes Zivieri Neto CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS II Profa. Dra. Lilian Reichert Coêlho Profa. Dra. Maria Lúcia Cereda Gomide CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA Prof. Dr. Carlos Mergulhão Júnior Prof. Dr. Dorisvalder Dias Nunes Prof. Dr. Emanuel Fernando Maia de Souza Profa. Dra. Maria Luiza Lopes de Oliveira Santos Prof. Dr. Rosalvo Stachiw Prof. Dr. Sandro de Vargas Schons Profa. Dra. Silvia das Dores Rissino CIÊNCIAS DA VIDA E SAÚDE Profa. Dra. Kátia Fernanda Alves Moreira Prof. Dr. Paulo Renato Vitória Calheiros 4 COMITÊ TÉCNICO CIENTÍFICO - EXTERNO/CNPq Profa. Dra. Rosa Ester Rossini USP/Ciências Humanas e Sociais II Prof. Dr. Silvio Simione da Silva UFAC/ Ciências Humanas e Sociais II Profa. Dra. Suely Aparecida do Nascimento Mascarenhas UFAM- Ciências Humanas e Sociais I Prof. Dr. Mark Clark Assen de Carvalho UFAC - Ciências Humanas e Sociais I Prof. Dr. Olaf Malm UFRJ - Ciências Exatas e da Terra Dr. Márcio Rodrigues Miranda UFRJ - Ciências Exatas e da Terra Dr. Fernando Luíz de Oliveira Corrêa CEPLAC - Ciências Exatas e da Terra Dr. Alexandre Martins Abdão dos Passos EMBRAPA - Ciências Exatas e da Terra Dra. Ana Karina Dias Salman EMBRAPA - Ciências Exatas e da Terra Dr. Cléberson de Freitas Fernandes EMBRAPA - Ciências Exatas e da Terra Dr. Eduardo Schmitt EMBRAPA - Ciências Exatas e da Terra Dr. Andreimar Martins Soares FIOCRUZ - Ciências da Vida e Saúde Dra. Carla Freire Celedonio Fernandes IPEPATRO - Ciências da Vida e Saúde 5 FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA FICHA TÉCNICA FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA Diretoria de Pesquisa e Desenvolvimento Programa Institucional de Bolsas e Trabalho Voluntário de Iniciação Científica BR-364, Km 9,5 - CEP: 76. 801-974 - TEL/FAX/ (69) 2182-2214; 2182-2172 E-mail: [email protected]; [email protected]; [email protected] REVISTA PESQUISA & CRIAÇÃO DE NÚMERO ESPECIAL PARA OS RESUMOS EXPANDIDOS DO XXI SEMINÁRIO FINAL DO PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSAS E TRABALHO VOLUNTÁRIO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA ISSN: 1677-3993 XXI SEMINÁRIO FINAL DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA - PIBIC/UNIR/CNPq 2011/2012 EQUIPE DA COORDENAÇÃO DO PIBIC/PROPesq/UNIR Alex Santana Costa Ilma Erse Campos 6 Coração de Estudante Quero falar de uma coisa Adivinha onde ela anda Deve estar dentro do peito Ou caminha pelo ar Pode estar aqui do lado Bem mais perto que pensamos A folha da juventude É o nome certo desse amor Já podaram seus momentos Desviaram seu destino Seu sorriso de menino Quantas vezes se escondeu Mas renova-se a esperança Nova aurora, cada dia E há que se cuidar do broto Pra que a vida nos dê Flor e fruto Coração de estudante Há que se cuidar da vida Há que se cuidar do mundo Tomar conta da amizade Alegria e muito sonho Espalhados no caminho Verdes, planta e sentimento Folhas, coração, Juventude e fé. (Milton Nascimento) 7 O conteúdo dos resumos expandidos destes anais é de exclusiva responsabilidade de seus autores (orientadores e orientandos). A comissão organizadora interfere apenas na formatação e exclusão de co-orientadores e colaboradores, haja vista que os projetos e subprojetos de pesquisa registrados no PIBIC não os admitem. 8 SUMÁRIO HISTÓRIA E MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO DE RONDÔNIA: O MUNICÍPIO PIONEIRO DE GUAJARÁ-MIRIM ........................................................................................................... 21 O ENSINO E A APRENDIZAGEM DE FRAÇÕES E NÚMEROS DECIMAIS NA ESCOLA. CAMINHOS A SEREM SUPERADOS ................................................................. 22 PROGRAMAS DE MELHORIA DA QUALIDADE DE ENSINO NA REDE PÚBLICA MUNICIPAL URBANA EM PORTO VELHO..................................... ................................. 35 PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO: QUANTO SOBRE ADAPTAÇÕES CURRICULARES PODE SER VISTO NESTE DOCUMENTO?..................................... .... 46 ALFABETIZAÇÃO DE RIBEIRINHOS NA AMAZÔNIA ................................................... 60 EXPERIÊNCIAS COMPARTILHADAS NO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO DE ALUNOS COM SÍNDROME DE DOWN (SD) NAS ESCOLAS REGULARES NO MUNICÍPIO DE JI-PARANÁ/RO .......................................................................................... 68 A INVENCIONICE DA TRADIÇÃO EM RONALDO CORREIA DE BRITO .................... 77 A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO EDUCATIVO E A FORMAÇÃO DOCENTE COMO ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DE SUSTENTAÇÃO DAS RELAÇÕES DE PODER NO AMBIENTE ESCOLAR .......................................................................................................... 82 O CURSO DE PEDAGOGIA NA MODALIDADE A DISTÂNCIA: DESAFIOS PARA A GESTÃO DO TRABALHO PEDAGÓGICO: ESTADO DA ARTE DA PESQUISA EM EDUCAÇÃO SUPERIOR EM RONDÔNIA .......................................................................... 96 AVALIAR, MEDIR, TESTAR... CRUZES! UM ESTUDO SOBRE A PRÁTICA DA AVALIAÇÃO EDUCACIONAL NAS ESCOLAS DA REDE PÚBLICA DE ROLIM DE MOURA/RO........................................................................................................................... 109 AS CURVAS DA MEMÓRIA DE JOCA REINERS TERRON” ......................................... 120 ASPECTOS DO CAPITALISMO BUROCRÁTICO NA EDUCAÇÃO: CORPORATIVISMO SINDICAL E A LUTA PELA GESTÃO DEMOCRÁTICA DA ESCOLA PÚBLICA ............................................................................................................. 125 O LIVRO SHENIPABU MIYUI: EXISTÊNCIA E ESPECIFICIDADES DA LITERATURA INDÍGENA POR MEIO DO ESTUDO DE EDIÇÕES DE MITOS KAXINAWÁ.............. 138 PROGRAMAS DE MELHORIA DA QUALIDADE DE ENSINO NA REDE PÚBLICA ESTADUAL DE PORTO VELHO (RO) ............................................................................... 144 PRÁTICAS PSICOLÓGICAS: CONSIDERAÇÕES A CERCA DA ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO NO CONTEXTO ESCOLAR/EDUCACIONAL EM PORTO VELHO-RO 155 O (NÃO) TEMPO NAS DOBRAS DO (IR) REAL .............................................................. 165 9 MATEMÁTICA: ESTRATÉGIAS PARA ENSINAR E APRENDER NA EDUCAÇÃO INFANTIL .............................................................................................................................. 178 AVALIAÇÃO PSICOEDUCACIONAL DO ALUNO COM SUSPEITA DE DEFICIÊNCIA INTELECTUAL: CONCEPÇÕES E PRÁTICAS ................................................................. 188 SUB-PROJETO: EDUCAÇAO LINGUISTICA: FORMAÇÃO DOCENTE E ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DA FRONTEIRA BRASIL - BOLÍVIA ........ 193 LITERATURA INDÍGENA CONTEMPORÂNEA POR MEIO DA EDIÇÃO DE DUAS VERSÕES DE MITOS DESANA ......................................................................................... 195 AVALIAÇÃO EDUCACIONAL, PROGRAMAS NACIONAIS DE AVALIAÇÃO E A AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM: UM ESTUDO NAS ESCOLAS ESTADUAIS DE ROLIM DE MOURA/RO ...................................................................................................... 205 A ORDEM SINTÁTICA DA L1 (TUPI-KAWAHIB): NA ESCRITA EM L2 (LÍNGUA PORTUGUESA)..................................................................................... ............................... 217 O ESTUDO DA LITERATURA INDÍGENA CONTEMPORÂNEA SAKURABIAT E SURUÍ PAITER E A CULTURA DO IMPRESSO............................................................... 223 O PROFESSOR ALFABETIZADOR DA REDE MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE PORTO VELHO/RO E O SEU PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO PROFISSIONAL....... 229 O FANTÁSTICO: INTERSECÇÕES CRÍTICAS RELAÇÕES ENTRE EDIFICAÇÕES FANTÁSTICAS E MODO NARRATIVO NA OBRA DE JORGE LUIS BORGES .......... 237 INFLUÊNCIA DOS FATORES EXTRALINGUÍSTICOS NO DIALETO DE VILHENA .... .. ................................................................................................................................................ 242 ONOMÁSTICA RONDONIANA: A APLICAÇÃO CONCRETA DE NORMAS SOBRE NOMES DE LUGARES EM PORTO VELHO .............................................................................................................................................. ..255 A EXPRESSÃO DE GÊNERO E NÚMERO DA L1 (TUPI-KAWAHIB) NA ESCRITA EM L2 (LÍNGUA PORTUGUESA). ............................................................................................ 260 INFORMATIZANDO A LITERATURA DE RONDÔNIA ................................................. 267 AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS EM CURSO NAS ESCOLAS DA REDE ESTADUAL DE ENSINO NA ZONA DA MATA RONDONIENSE: DE ONDE VEM, PARA ONDE VÃO? ...................................................................................................................................... 271 AVALIAÇÃO EDUCACIONAL: UM ESTUDO DA PRÁTICA AVALIATIVA DOS PROFESSORES DAS ESCOLAS ESTADUAIS DO MUNICÍPIO DE ROLIM DE MOURA/RO........................................................................................................................... 283 10 OS DESAFIOS DA TECNOLOGIA DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO NA EDUCAÇÃO: O CASO DO PROJETO DE EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA NO CAMPUS JOSÉ RIBEIRO FILHO ......................................................................................................... 294 O ENSINO E A APRENDIZAGEM DE NÚMEROS E CÁLCULO ARITMÉTICO NA ESCOLA: POSSIBILIDADES E LIMITES .......................................................................... 303 GRUPO DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO DA AMAZÔNIA - GPEA PURUBORÁ UM POVO INDÍGENA RESGATANDO SUA IDENTIDADE E CULTURA ........................... 316 RENDIMENTO ESCOLAR E PROGRAMAS DE MELHORIA DA QUALIDADE DE ENSINO EM ESCOLAS PÚBLICAS ESTADUAIS DE PORTO VELHO.. ....................... 323 FEIÇÕES DA VIOLÊNCIA INSTITUCIONAL EM CRIANÇAS INDÍGENAS NAS ESCOLAS PÚBLICAS URBANAS DO ESTADO DE RONDÔNIA NA PERSPECTIVA DE SEUS FAMILIARES ............................................................................................................. 338 LITERATURA INDÍGENA E OS MITOS YANOMAMI: UM ESTUDO COMPARATIVO DAS OBRAS MITOPOEMAS YANOMAMI E NARO, O GAMBÁ - MITOS DOS ÍNDIOS YANOMAMI ......................................................................................................................... 345 AS RELAÇÕES SEMIFEUDAIS NO AMBIENTE ESCOLAR: SE VOCÊ MANDA, EU OBEDEÇO! ............................................................................................................................ 354 A TEORIA NA PRÁTICA: O CASO DO PROGRAMA DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA NA UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA. CAMPUS UNIVERSITÁRIO JOSÉ RIBEIRO FILHO EM PORTO VELHO ................................................................................ 367 RELACIONAMENTOS INTERORGANIZACIONAIS NO AGRONEGÓCIO LEITE NO MUNICÍPIO DE ARIQUEMES EM RONDÔNIA - CONSTRUÇÃO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: IMPORTÂNCIA DO RELACIONAMENTO INTERORGANIZACIONAL ENTRE OS AGENTES DO AGRONEGÓCIO LEITE NO MUNICÍPIO DE JI-PARANÁ E AS ORGANIZAÇÕES PÚBLICAS E PRIVADAS......... 376 HISTÓRIA E REPRESENTAÇÕES SOCIAIS: A UNIR AO LONGO DOS 30 ANOS DE ATUAÇÃO EM RONDÔNIA (1982 A 2011)*...................................... ............................... 383 MAL-ESTAR SUBJETIVO DE JOVENS MULHERES E SUAS DEMANDAS RELIGIOSAS ......................................................................................................................... 390 ASSENTAMENTO RURAL SOB ENFOQUE DE GÊNERO: UMA ANÁLISE DO PDSA NAZARÉ E BOA VITÓRIA.................................................................................................. 397 PAITER SURUI ..................................................................................................................... 406 A OCUPAÇÃO PRÉ-COLONIAL NA CACHOEIRA DO TEOTÔNIO: ABORDAGEM TECNOLÓGICA DA CULTURA MATERIAL CERÂMICA DOS SÍTIOS SANTA PAULA E TEOTÔNIO ........................................................................................................................ 415 ESTADO PENAL MÍNIMO E DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA ............................. 427 11 MAL-ESTAR SUBJETIVO DO SUJEITO PÓS-MODERNO E SUA RELAÇÃO COM O CAPITALISMO ..................................................................................................................... 435 HISTÓRIA E REPRESENTAÇÕES SOCIAIS: A UNIR AO LONGO DOS 30 ANOS DE ATUAÇÃO EM RONDÔNIA (1982 A 2011)* ..................................................................... 451 ANÁLISE DA CULTURA MATERIAL CERÂMICA DO SÍTIO DO BREJO, PORTO VELHO-RO ............................................................................................................................ 470 O DIREITO A TER DIREITOS NA ERA DA HORIZONTALIDADE DEMOCRÁTICA ESTADO PENAL: O ENCARCERAMENTO SOCIAL....................................................... 480 SISTEMA DE INFORMAÇÕES GERENCIAIS NA GESTÃO DA AGRICULTURA FAMILIAR ............................................................................................................................. 490 AS COMUNIDADES REMANESCENTES DE QUILOMBOLS DO MÉDIO GUAPORÉ: OS QUILOMBOLAS DE SANTA FÉ E FORTE PRÍNCIPE DA BEIRA, UM ESTUDO DE CASOS ................................................................................................................................... 500 ASSOCIAÇÕES E COOPERATIVAS QUE COMPÕEM A CADEIA-REDE DO ALGODÃO AGROECOLÓGICO - JUSTA TRAMA .......................................................... 505 AVALIAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO NO MUNICÍPIO DE PORTO VELHO ATRAVÉS DE INDICADORES ECONOMICOS, SOCIAIS E AMBIENTAIS: ELABORAÇÃO DO IDH (SOCIAL) E IDH (AMBIENTAL) ............................................. 508 EQUIDADE DE GÊNERO NO ASSENTAMENTO RURAL JOANA D’ARC III ............. 513 DIREITOS HUMANOS: UMA ABORDAGEM TRANSVERSAL DOS AGENTES EDUCACIONAIS .................................................................................................................. 527 A EVOLUÇÃO DO DIREITO FEMININO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO......................................................................................................................... 544 JUDEU CABOCLO ............................................................................................................... 557 MAL-ESTAR SUBJETIVO NA VELHICE E A BUSCA PELA FUNÇÃO PATERNA NAS RELIGIÕES CRISTÃS .......................................................................................................... 564 CADEIA-REDE DE COOPERAÇÃO SUSTENTÁVEL. ATIVIDADES ECONÔMICAS E SOCIAIS DA COOPERATIVA AÇAÍ, NO MUNICÍPIO DE PORTO VELHO ................. 572 AS ESTRATEGIAS E RELACIONALIDADE NA TOMADA DE DECISÃO DE EXTRATIVISTAS NA COMERCIALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO DE CASTANHA NA CADEIA-REDE CASTANHA-DA-AMAZONIA ................................................................ 577 MAL- ESTAR SUBJETIVO NAS FAMÍLIAS MONOPARENTAIS SEM A PRESENÇA DO PAI ................................................................................................................................... 585 12 AVALIAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO NO MUNICÍPIO DE PORTO VELHO ATRAVÉS DE INDICADORES ECONÔMICOS, SOCIAIS E AMBIENTAIS PARA A ELABORAÇÃO DO IDH MUNICIPAL AMPLIADO: ELABORAÇÃO DO IDH DAS DIMENSÕES ECONOMIA E INSTITUCIONAL................................................................ 592 A INTELIGÊNCIA ENQUANTO PROCESSO BIOLÓGICO DE ADAPTAÇÃO ............. 597 MOVIMENTOS SOCIAIS E EQUIDADE DE GÊNERO NA ÁREA RIBEIRINHA ......... 610 GÊNERO E CAMPESINATO: UM ESTUDO DAS RELAÇÕES DE GÊNERO NO ASSENTAMENTO RURAL JOANA D’ARC III ................................................................. 621 HISTÓRIA E MEMÓRIA DE PESSOAS LIGADAS DIRETAMENTE OU INDIRETAMENTE A UNIR ................................................................................................. 631 EVOLUÇÃO DA MORTALIDADE EM CRIANÇAS DE 1 A 4 ANOS EM PORTO VELHO-RO NO PERÍODO DE 2006 A 2010: MORBIMORTALIDADE EM PORTO VELHO-RO: POPULAÇÃO DO ENTORNO DAS USINAS HIDRELÉTRICAS DE SANTO ANTÔNIO E JIRAU .............................................................................................................. 638 ANÁLISE CLÍNICO-EPIDEMIOLÓGICO DOS CASOS DE ENVENENAMENTO POR SERPENTES DE PACIENTES DO CENTRO DE MEDICINA TROPICAL DE RONDÔNIA (CEMETRON): ANÁLISE LABORATORIAL DE HEPATOTOXICIDADE, NEFROTOXICIDADE E MIOTOXICIDADE...................................................................... 645 AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DE VIDA E SUA INFLUENCIA SOBRE O PERFIL HEMATOLÓGICO DE ADULTOS EM TRATAMENTO QUIMIOTERÁPICO ............... 647 AVALIAÇÃO DE DOR PÉLVICA CRÔNICA EM PACIENTES ONCOLÓGICAS SUBMETIDAS À RADIOTERAPIA PÉLVICA: CARACTERÍSTICAS DA DOR PÉLVICA CRÔNICA E ANÁLISE DOS SINTOMAS QUE ATINGEM PACIENTES APÓS RADIOTERAPIA PÉLVICA E NÃO PÉLVICA. ................................................................. 654 VERIFICAÇÃO DE ATIVIDADE ANTIMICROBIANA DA OCELLATIN-K1 DE Leptodactylus knudseni em Plasmodium falciparum e Leishmania amazonenses ................ 660 INVESTIGAÇÃO DO USO DE DROGAS LÍCITAS E ILÍCITAS POR ESTUDANTES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA DO CAMPUS DE PORTO VELHO: UMA ANÁLISE SOCIAL E EPIDEMIOLÓGICA ......................................................................... 669 POLIMORFISMOS DO GENE CYP2E1 DO CITOCROMO P450 EM POPULAÇÕES DE RONDÔNIA, AMAZÔNIA OCIDENTAL BRASILEIRA, REGIÃO ENDÊMICA DE MALÁRIA CARACTERIZAÇÃO DE POPULAÇÕES HUMANAS DE RONDÔNIA ATRAVÉS DA ANÁLISE DE POLIMORFISMOS DE DNA ............................................. 675 PURIFICAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DE PEPTÍDEOS DE INTERESSE BIOTECNOLÓGICO DO VENENO DE BOTHROPS ATROX .......................................... 682 GENOTIPAGEM DO POLIMORFISMO DO GENE IL28B E PROGNÓSTICO TERAPÊUTICO EM INDIVÍDUOS PORTADORES DE HEPATOPATIA CRÔNICA PELO 13 VÍRUS C ACOMPANHADOS NO AMBULATÓRIO ESPECIALIZADO DE HEPATITE...... ....................................................................................................................... 690 AVALIAÇÃO DO PERFIL SOCIO-DEMOGRÁFICO, SINTOMAS DE ANSIEDADE E DEPRESSÃO ENTRE PACIENTES USUÁRIOS DE CRACK EM TRATAMENTO NAS PRINCIPAIS CIDADES DO ESTADO DE RONDÔNIA .................................................... 695 AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DE VIDA E SUA INFLUENCIA SOBRE O SISTEMA IMUNOLÓGICO DE CRIANÇAS EM TRATAMENTO QUIMIOTERÁPICO ................. 700 AYAHUASCA INVESTIGAÇÃO TERAPÊUTICA DO USO RITUALÍSTICO ................ 706 PURIFICAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO BIOQUÍMICA DE FOSFOLIPASE A2 MIOTÓXICA DO VENENO DA SERPENTE Bothrops atrox ........................................... 715 CARACTERIZAÇÃO GENOTÍPICA DOS POLIMORFISMOS DO GENE IL28B ENTRE PORTADORES DE HEPATOPATIA CRÔNICA PELO VÍRUS C EM PORTO VELHO, RONDÔNIA ........................................................................................................................... 722 ADOLESCENTES ESCOLARES EM USO DE ÁLCOOL E DROGAS NO MUNICIPIO DE PORTO VELHO: USO DE DROGAS NA ADOLESCÊNCIA E SEUS IMPACTOS NO ÂMBITO FAMILIAR NO MUNICIPIO .............................................................................. 727 CONSTRUÇÃO DO PERFIL EPIDEMIOLÓGICO DE CÂNCER NA CLÍNICA SÃO PELLEGRINO EM PORTO VELHO - RO .......................................................................... 736 FATORES ESTRESSORES E A RELAÇÃO SAÚDE X TRABALHO DO ESTUDANTE DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA................................. 746 O IDOSO ACAMADO E A DINÂMICA FAMILIAR: AS VANTAGENS DO USO DA MACADEIRA ...................................................................................................................... 755 MORTE ENCEFÁLICA E DOAÇÃO DE ÓRGÃOS: OPINIÃO DE FAMILIARES DE PACIENTES INTERNADOS NAS ENFERMARIAS DO HOSPITAL DE BASE DR. ARY PINHEIRO ............................................................................................................................ 763 CUIDANDO DO CUIDADOR: A MUDANÇA DA RELAÇÃO SISTÊMICA FAMILIAR DO DOENTE NA MACADEIRA ......................................................................................... 771 FATORES ESTRESSORES E A RELAÇÃO SAÚDE X TRABALHO DO ESTUDANTE DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA................................. 776 POLIMORFISMOS DO GENE GSTT1 DE GLUTATIÃO S-TRANSFERASE EM AMOSTRA DE POPULAÇÃO DE RONDÔNIA, AMAZÔNIA OCIDENTAL BRASILEIRA, REGIÃO ENDÊMICA DE MALÁRIA ...................................................... 784 USO DE DROGAS PSICODÉLICAS EM CONTEXTOS NÃO RELIGIOSOS ................ 794 14 INTERVENÇÃO BREVE AO TRATAMENTO DO TABAGISMO SUBPROJETO: INTERVENÇÃO BREVE AO TRATAMENTO DO TABAGISMO: ANÁLISE DE SUA EFETIVIDADE ...................................................................................................................... 803 IMPLICAÇÕES DAS MANIFESTAÇÕES DE VIOLÊNCIA/BULLYING NAS RELAÇÕES SOCIAIS E CLIMA ESCOLAR, SEGUNDO OS PROFESSORES E COLABORADORES .... ............................................................................................................................................ 804 MORTALIDADE INFANTIL POR CAUSAS EVITÁVEIS NO MUNICÍPIO DE PORTO VELHO-RO, NO PERÍODO DE 2006 A 2010 ..................................................................... 809 IDENTIFICAÇÃO DO CONTEÚDO ENZIMÁTICO DO VENENO DE ANUROS BUFONÍDEOS (Rhaebo guttatus e Rhinella ......................................................................... 816 PERFIL DOS AFASTAMENTOS POR TRANSTORNOS MENTAIS RELACIONADOS AO TRABALHO ENTRE SERVIDORES PÚBLICOS FEDERAIS DE RONDÔNIA ...... 827 INTERVENÇÃO BREVE AO TRATAMENTO DO TABAGISMO: CONTRIBUIÇÕES DO TESTE MINI ......................................................................................................................... 836 DETERMINAÇÃO DO HORÁRIO EFETIVO DE POLINIZAÇÃO MANUAL EM MARACUJAZEIRO AMARELO NA ZONA DA MATA RONDONIENSE ..................... 854 INSTALAÇÃO DE DOIS ENSAIOS DE CAMPO DE APODRECIMENTO DA MADEIRA E ACOMPANHAMENTO DA SUA DEGRADAÇÃO BIOLÓGICA ............................... 860 EFEITO DE FONTES DE SUBSTRATO PROTÉICO-ENERGÉTICO-MINERAL SOBRE A QUALIDADE DA FARINHA DE MINHOCAS DA ESPÉCIE EUDRILUS EUGENIAE E INDICADORES ECONÔMICOS DE PRODUÇÃO ........................................................... 866 ANÁLISE DA INVERSÃO SEXUAL EM Satanoperca jurupari (HECKEL, 1840) (Perciformes, Cichlidae) NA BACIA DO RIO MADEIRA .................................................. 874 ESTRATÉGIAS DE LEITURA NA FORMAÇÃO INICIAL EM QUÍMICA: UMA ANÁLISE DE DOIS CASOS A PARTIR DO USO DE LITERATURA CIENTÍFICA ...... 878 DISPOSIÇÃO E QUANTIFICAÇÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO CIVIL GERADOS NOS CANTEIROS DE OBRAS DO MUNICÍPIO DE PORTO VELHO/RO........ ................................................................................................................................................ 888 ANÁLISE DA DEPURAÇÃO NATURAL DO RIO JI-PARANÁ, EM DIFERENTESPERÍODOS DO CICLO HIDROLÓGICO .................................................... 897 LEVANTAMENTO DAS NECESSIDADES DE ALTITUDE E PRECIPITAÇÃO DAS ESPÉCIES MADEIREIRAS PROMISSORAS E CARACTERIZAÇÃO DE ALTITUDE E PRECIPITAÇÃO DA ZONA DA MATA RONDONIENSE................................................ 899 AVALIAÇÃO DA QUALIDADE SANITÁRIA DE SEMENTES DE ARROZ (Oryza sativa L.), FEIJÃO (Phaseolus vulgaris L.) E MILHO (Zea mays L.), PRODUZIADAS NA ZONA DA MATA RONDONIENSE ................................................................................................ 904 15 QUALIDADE DO HÚMUS DE MINHOCAS DA ESPÉCIE GIGANTE AFRICANA (E. EUGENIAE) PRODUZIDO EM DIFERENTES SUBSTRATOS......................................... 916 DESEMPENHO PRODUTIVO DE MINHOCAS DA ESPÉCIE GIGANTE AFRICANA EM SUBSTRATOS PROTÉICO, ENERGÉTICO E MINERAL ................................................ 924 CURVA DE NEUTRALIZAÇÃO DA ACIDEZ EM SOLOS DE RONDÔNIA UTILIZANDO CARBONATO DE CÁLCIO COMERCIAL ............................................... 930 PRODUÇÃO DE GRAOS E MATERIA SECA DE CULTURAS SOB DIFERENTES SISTEMAS DE PREPARO DE SOLO E PLANTIO ............................................................ 934 LEVANTAMENTO DO NÚMERO DE POPULAÇÕES TRADICIONAIS ENCONTRADOS NA ZONA DA MATA DE RONDÔNIA ............................................... 941 DIVERSIDADE GENÉTICA EM SATANOPERCA SP. NA BACIA DO RIO MADEIRA (RO) ........................................................................................................................................ 948 ESTUDO DA EXTRAÇÃO DOS PIGMENTOS DO FRUTO DE TUCUMÃ (Astrocaryum aculeatum) .............................................................................................................................. 954 ATIVIDADE ANTIOXIDANTE DE Protium apiculatum Swart ......................................... 958 PRODUÇÃO DE MATÉRIA SECA DE BRACHIARIA SPP EM FUNÇÃO DE DIFERENTES DOSES DE NITROGÊNIO E POTÁSSIORECUPERAÇÃO DE PASTAGEM NA AMAZÔNIA LEGAL ............................................................................... 964 LEVANTAMENTO FITOSSOCIOLÓGICO DAS ESPÉCIES NATIVAS COM POTENCIAL PARA PRODUÇÃO DE REMÉDIOS TRADICIONAIS NA REGIÃO DA ZONA DA MATA, ESTADO DE RONDÔNIA ................................................................... 969 ANÁLISE DO CUSTO DE OPORTUNIDADE PARA CONSERVAÇÃO DA FLORESTA AMAZÔNICA NA REGIÃO DA ZONA DA MATA DO ESTADO DE RONDÔNIA ...... 982 INSTALAÇÃO DE DOIS ENSAIOS DE CAMPO DE APODRECIMENTO DA MADEIRA E ACOMPANHAMENTO DA SUA DEGRADAÇÃO BIOLÓGICA ................................ 989 CRESCIMENTO DO FEIJOEIRO INFLUENCIADO POR DOSES DE NITROGÊNIO ....... .. ................................................................................................................................................ 995 ANÁLISE DA ACIDEZ E CONDUTIVIDADE ELÉTRICA PARA A DEPOSIÇÃO TOTAL NA CIDADE DE JI-PARANÁ RO ...................................................................................... 1001 MODELO TEÓRICO PARA DETERMINAÇÃO DA DIFUSIVIDADE TÉRMICA EMFILMES COM CAMADAS ........................................................................................... 1011 ESPOROS DE FUNGOS MICORRÍZICOS ARBUSCULARES EM ECOSSISTEMAS DE CERRADO O (NÃO) ........................................................................................................... 1018 16 MONITORAMENTO DE TOCAS DE CINGULATA EM ÁREA DE EXPLORAÇÃO FLORESTAL MANEJADA NA FLORESTA NACIONAL DO JAMARI, ITAPUÃ DO OESTE/RO ........................................................................................................................... 1031 PRODUÇÃO DE MATÉRIA SECA DE BRACHIARIA SPP EM FUNÇÃO DE DIFERENTES NÍVEIS DE CALAGEM ............................................................................. 1034 PRODUÇÃO DE MUDAS DE CAFEEIRO (Coffea arabica L.) SOB APLICAÇÃO VIA SOLO E FOLIAR DE DIFERENTES DOSES DE EXTRATO ETANÓLICO DE PRÓPOLIS (EEP) .................................................................................................................................... 1038 ATIVIDADE ANTIOXIDANTE DE Piper krukoffi Yunker cf .......................................... 1047 INTOXICAÇÃO EXPERIMENTAL POR Amorimia sepium EM COELHOS .................. 1056 DIVERSIDADE DE ICHNEUMONOIDEA (INSECTA, HYMENOPTERA) DA ESTAÇÃO ECOLÓGICA DO CUNIÃ, PORTO VELHO, RONDÔNIA .............................................. 1062 ANÁLISE DA CONCENTRAÇÃO DE MERCÚRIO EM AMOSTRAS DE SOLO COLETADAS NA LIXEIRA CONTROLADA INATIVA DO MUNICÍPIO DE JI-PARANÁ - RO: RESULTADOS PRELIMINARES ............................................................................ 1073 MAPEAMENTO DAS ÁREAS VERDES E DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE NA ÁREA URBANA DE PORTO VELHO-RO UTILIZANDO IMAGENS DE SATÉLITE DE ALTA RESOLUÇÃO .......................................................................................................... 1080 ESTUDO DAS INSTABILIDADES INDUZIDAS EM UMA AMOSTRA DE CRISTAL LÍQUIDO NEMÁTICO L .................................................................................................... 1093 TRANSMISSION-LINE MATRIX - DIAKÓPTICAS: FERRAMENTA DE SIMULAÇÃO DE CAMPOS BIDIMENSIONAIS EM ELETROMAGNETISMO E PROPAGAÇÃO TÉRMICA EM TECIDOS BIOLÓGICOS PARA APLICAÇÕES DE BEM/EMC ........... 1098 QUALIDADE FÍSICO-QUÍMICA DE FRUTOS DE MARACUJAZEIRO-AMARELO EM DIFERENTES LÂMINAS DE IRRIGAÇÃO NAS CONDIÇÕES EDAFOCLIMÁTICAS DA ZONA DA MATA RONDONIENSE ........................................................................... 1120 DISPOSIÇÃO E QUANTIFICAÇÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO CIVIL GERADOS NOS CANTEIROS DE OBRAS DO MUNICÍPIO DE PORTO VELHO/RO .............................................................................................................................................. 1126 BIOLOGIA REPRODUTIVA DE PIMELODUS BLOCHII (VALENCIENNES, 1840) DO TRECHO DE CORREDEIRAS DO RIO MADEIRA ......................................................... 1133 CURVA DE NEUTRALIZAÇÃO DA ACIDEZ EM SOLOS DE RONDÔNIA UTILIZANDO CALCÁRIO COMERCIAL) ...................................................................... 1139 DESENVOLVIMENTO DE METODOLOGIAS PARA MEDIÇÃO DOS NÍVEIS DE CAMPOS MAGNÉTICOS GERADOS POR EQUIPAMENTOS ELÉTRICOS PARA ANÁLISE DOS EFEITOS SOBRE A SAÚDE HUMANA ................................................ 1143 17 PRODUÇÃO E QUALIDADE COMERCIAL DE FRUTOS DO MARACUJAZEIROAMARELO SUBMETIDO A DIFERENTES LÂMINAS DE IRRIGAÇÃO NAS CONDIÇÕES EDAFOCLIMÁTICAS DA ZONA DA MATA RONDONIENSE............. 1155 COMPREENSÃO DO PROCESSO CHUVA-VAZÃO DO IGARAPÉ DA PENAL ........ 1161 ESTUDO E ANÁLISE DE EQUIPAMENTOS DE ALTA TECNOLOGIA E BAIXO CUSTO PARA O ENSINO DE FÍSICA NAS ENGENHARIAS ....................................... 1170 IDENTIFICAÇÃO, CLASSIFICAÇÃO E TRATAMENTO DAS INCOMPLETUDES EM BANCO DE DADOS RELACIONAL UTILIZANDO LÓGICA NÃO-CLÁSSICA PARACONSISTENTE......................................................................................................... 1175 O USO DE SIG COMO FERRAMENTA PARA O ESTUDO DE APTIDÃO DE ALGUMAS ESPÉCIES MADEIREIRAS DA ZONA DA MATA RONDONIENSE ............................ 1180 PRODUÇÃO E QUALIDADE COMERCIAL DE FRUTOS DO MARACUJAZEIROAMARELO SUBMETIDO A DIFERENTES LÂMINAS DE IRRIGAÇÃO NAS CONDIÇÕES EDAFOCLIMÁTICAS DA ZONA DA MATA RONDONIENSE............. 1185 ANÁLISE DO CUSTO DE OPORTUNIDADE PARA CONSERVAÇÃO DA FLORESTA AMAZÔNICA NA REGIÃO DA ZONA DA MATA DO ESTADO DE RONDÔNIA ............ .............................................................................................................................................. 1195 ESTUDO MORFO-ANATÔMICO DE MELASTOMATACEAE DA ESTAÇÃO ECOLÓGICA DE CUNIÃ (ESECC) ................................................................................... 1207 AVALIAÇÕES DAS ALTERAÇÕES HEMATOLÓGICAS DE OVINOS EM REBANHOS COM PRESENÇA DE RESISTÊNCIA ANTI- HELMÍNTICA DA REGIÃO DA ZONA DA MATA RONDONIENSE ..................................................................................................... 1219 LEVANTAMENTO DE VARIEDADES DE MANDIOCA PLANTADAS NO MUNICÍPIO DE ROLIM DE MOURA - RO ............................................................................................ 1225 FENOLOGIA DA MANIHOT ESCULENTA SUBSP. FLABELLIFOLIA: A FORMA SILVESTRE DA MANDIOCA ...................................................................................... .....1231 IDADE E CRESCIMENTO DE PIRAMUTABA (BRACHYPLATYSTOMA VAILLANTII), NA BACIA DO RIO MADEIRA, RONDÔNIA ................................................................. 1238 DETERMINAÇÃO DOS PADRÕES QUÍMICOS E FÍSICO-QUÍMICOS DAS ÁGUAS DE POÇOS RASOS E SUPERFICIAIS DA CIDADE DE ROLIM DE MOURA-RO ............ 1240 INFLUÊNCIA DE MACRONUTRIENTES NO CRESCIMENTO DE MICROCYSTIS PANNIFOMIS (CYANOBACTERIA) E NA PRODUÇÃO DE MICROCISTINA POR UMA CEPA ISOLADA DO RESERVATÓRIO DA USINA HIDRELÉTRICA DE SAMUEL (RONDÔNIA). ..................................................................................................................... 1253 CONSERVAÇÃO PÓS-COLHEITA DE FRUTOS DO MARACUJAZEIRO-AMARELO NA ZONA DA MATA RONDONIENSE ........................................................................... 1255 18 GEOPROCESSAMENTO E SENSORIAMENTO REMOTO NA ELABORAÇÃO DO ZONEAMENTO GEOAMBIENTAL DA BACIA DO RIO DAS GARÇAS_RO: MAPEAMENTO DAS CARACTERÍSTCAS GEOAMBIENTAIS DA BACIA DO RIO DAS GARÇAS,COMO SUBSÍDIO AO ZONEAMENTO GEOAMBIENTAL ......................... 1260 MAPEAMENTO, DIAGNÓSTICO, AVALIAÇÃO E MONITORAMENTO DAS ÁREAS DE RISCO NAS CABECEIRAS DO IGARAPÉ GRANDE LOCALIZADA NO SETOR TUCUMANZAL .................................................................................................................. 1271 CARBONO DA BIOMASSA MICROBIANA E NO SOLO SOB DIFERENTES SISTEMAS DE PREPARO DO SOLO E ROTAÇÃO DE CULTURAS NEMÁTICO L ...................... 1283 VARIABILIDADE GENÉTICA DE HEMIODUS UNIMACULATUS A JUSANTE E A MONTANTE DA CACHOEIRA DE SANTO ANTÔNIO (RIO MADEIRA). ................. 1290 AVALIAÇÃO PARASITOLÓGICA DE PEIXES DE INTERESSE ECONÔMICO DO ESTADO DE RONDÔNIA-BRASIL .................................................................................. 1292 ATIVIDADE ANTIOXIDANTE DA PIPER HUMILLIMUM PELO MÉTODO DPPH ... 1300 FLORÍSTICA E FITOSSOCIOLOGIA DE ESPÉCIES ARBÓREAS EM UM FRAGMENTO DE FLORESTA OMBRÓFILA ABERTA SUBMONTANA ............................................. 1306 ESTUDO E ANÁLISE DE EQUIPAMENTOS DE ALTA TECNOLOGIA E BAIXO CUSTO PARA O ENSINO DE FÍSICA NAS ENGENHARIAS ....................................... 1314 NPK NA FORMAÇÃO DE Coffea canéfora .......................................................................... 1319 AVALIAÇÃO DA RESISTÊNCIA ANTI-HELMÍNTICA A QUATRO DIFERENTES PRINCÍPIOS ATIVOS ANTI-HELMÍNTICOS EM REBANHOS OVINOS DA REGIÃO DA ZONA DA MATA RONDONIENSE ........................................................................... 1325 MONITORAMENTO DA MASTOFAUNA TERRESTRE DE MÉDIO E GRANDE PORTE ATRAVÉS DO MÉTODO DE ARMADILHAMENTO FOTOGRÁFICO EM ÁREA DE CONCESSÃO PARA EXPLORAÇÃO FLORESTAL NA FLONA DO JAMARI - ITAPOÃ DO OESTE/RO.....................................................................................................................1330 MAPEAMENTO, DIAGNÓSTICO, AVALIAÇÃO E MONITORAMENTO DAS ÁREAS DE RISCO NAS CABECEIRAS DO IGARAPÉ GRANDE LOCALIZADA NO SETOR ROQUE E MATO GROSSO ............................................................................................... 1335 DIAGNÓSTICO, MAPEAMENTO E MONITORAMENTO DAS ÁREAS DE RISCO NA BACIA DO IGARAPÉ GRANDE - SETOR BAIRRO FLORESTA E MATO GROSSO......... .............................................................................................................................................. 1349 LEVANTAMENTO QUANTITATIVO SAZONAL DE ÁGUA SUPERFICIAL EM SUBBACIA TOTALMENTE URBANIZADA .......................................................................... 1365 COLONIZAÇÃO MICORRÍZICA NO SISTEMA RADICULAR DAS GRAMÍNEAS EM PASTAGENS E SILVIPASTAGENS EM CERRADO NO ESTADO DE RONDÔNIA .......... 19 .............................................................................................................................................. 1370 MODELAGEM POR EQUAÇÕES DIFERENCIAIS À AÇÃO DAS RESPOSTAS HUMORAL E CELULAR A INFECÇÃO MALÁRICA (PLASMODIUM FALCIPARUM)..... .............................................................................................................................................. 1376 FENOLOGIA E PRODUÇÃO DO MARACUJAZEIRO-AMARELO SUBMETIDO A DIFERENTES LÂMINAS DE IRRIGAÇÃO NAS CONDIÇÕES EDAFOCLIMÁTICAS DA ZONA DA MATA RONDONIENSE ........................................................................... 1381 ALGUNS ASPECTOS DA INTERAÇÃO ENTRE FORMIGAS (INSECTA, FORMICIDAE) MAIETA GUIANENSIS AUBLET. (MELASTOMATACEAE) .......................................... 1386 DETERMINAÇÃO DOS PADRÕES MICROBIOLÓGICOS DA ÁGUA DE POÇOS RASOS E SUPERFICIAIS DA CIDADE DE ROLIM DE MOURA-RO1 ......................... 1391 IDENTIFICAÇÃO DE ESPÉCIES ARBÓREAS AMOSTRADAS EM FRAGMENTO DE FLORESTA OMBRÓFILA ABERTA SUBMONTANA ................................................... 1398 O DESENVOLVIMENTO DA ARGUMENTAÇÃO E DA LINGUAGEM CIENTÍFICA POR GRADUANDOS EM QUÍMICA MEDIANTE A PRODUÇÃO TEXTUAL............ 1402 QUANTIFICAÇÃO DE COCAÍNA E IDENTIFICAÇÃO DE DILUENTES E ADULTERANTES EM AMOSTRAS DE ENTORPECENTES APREENDIDAS EM PORTO VELHO - RO: IMPLEMENTAÇÃO DE MÉTODO DE QUANTIFICAÇÃO POR CG-EM ................................................................................................................................. 1410 LEVANTAMENTO DAS CONDIÇÕES NATURAIS DO TIPO DE SOLO E TEMPERATURA MÉDIA ANUAL DAS ESPÉCIES MADEIREIRAS PROMISSORAS E CARACTERIZAÇÃO DO TIPO DE SOLO E DA TEMPERATURA MÉDIA ANUAL DA ZONA DA MATA NEMÁTICO L ...................................................................................... 1415 20 RESUMOS EXPANDIDOS CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS I 21 HISTÓRIA E MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO DE RONDÔNIA: O MUNICÍPIO PIONEIRO DE GUAJARÁ-MIRIM Aleksandra Morge Rabelo1 Dorosnil Alves Moreira2 RESUMO O estudo objetiva investigar os processos de formação dos professores pioneiros e implantação das primeiras escolas públicas no município de Guajará-Mirim/RO, com a finalidade de proceder a um estudo sobre a história da Educação no referido município. Este objetivo está orientado pelo seguinte problema de pesquisa: “Como foi construída a prática pedagógica dos professores pioneiros na rede publica, considerando a História e a memória da Educação no município de Guajará-Mirim/RO?” A pesquisa teve como objetivos específicos: reconstituir, a partir da História Oral e análise documental, a história do processo de implantação das primeiras escolas públicas no município de GuajaráMirim/RO; investigar o modelo de gestão educacional praticado nas primeiras escolas rede pública do município de Guajará-Mirim; realizar entrevistas com professores pioneiros no município de GuajaráMirim/RO; constituir um banco de dados biográficos dos referidos professores; identificar as práticas didáticos pedagógicas utilizadas pelos professores pioneiros; socializar os resultados dos estudos e das pesquisas em encontros, seminários e fóruns locais, nacionais e internacionais; manter um programa regular de publicações e produção científica do grupo. A pesquisa teve abordagem qualitativa, do tipo Estudo de Caso, tendo como participantes os professores pioneiros das escolas públicas do município de Guajará-Mirim/RO. O estudo foi desenvolvido em quatro etapas: a primeira etapa tratou do estudo bibliográfico com ênfase na formação de professores pioneiros do município de GuajaráMirim, considerando suas histórias e memórias. A segunda etapa consistiu no registro das histórias e memórias da formação de professores pioneiros. A terceira etapa dirigiu-se para a análise dos dados e informações coletadas referentes à formação de professores pioneiros do município de GuajaráMirim, considerando suas histórias e memórias. A quarta etapa consistiu na elaboração e socialização dos resultados da pesquisa em eventos acadêmicos e científicos. Os sujeitos da pesquisa foram seis professores: Alexandrina do Nascimento Gomes, Cecília Policarpo Pimenta, Firmino Barbosa de Brito, Izabel de Oliveira Assunção, Lilian da Silva Ferreira e Marisa de Oliveira Carvalho. Os nomes acima relacionados foram obtidos através de conversas informais com educadores da rede pública de ensino, bem como nos arquivos da universidade referentes aos encontros de educação e linguagem. As entrevistas aplicadas aos professores foram gravadas, transcritas, editadas e, previamente, analisadas e os resultados foram socializados através de relatório. Os resultados preliminares demonstraram que no exercício da profissão docente sempre haverá dificuldades. Nas entrevistas, os professores deixaram bem claro que lecionar na época deles, não era mais fácil, porém, atualmente, existe uma série de problemas na educação que interferem nas escolas, na organização curricular e no trabalho dos professores, e alguns desses problemas relatados por eles são a multiplicidade de papeis, a burocratização, as inumeras leis que de certa forma tira a autoridade dos professores fazendo com que eles percam o respeito dos alunos e o que eles mais acham grave que é a indisciplina ea violência que vem se agravando nos ultimos tempos. Todos concordam em um ponto: a profissão docente é muito importante para o desenvolvimento de uma sociedade e, apesar de ser muito importante, o professor não tem o devido reconhecimento. Palavras-chave: Educação. História. Formação de Professores. 1 Orientanda – Acadêmica do curso de pedagogia da Fundação Universidade Federal de Rondônia, Campus de Guajará-Mirim. 2 Orientador. 22 O ENSINO E A APRENDIZAGEM DE FRAÇÕES E NÚMEROS DECIMAIS NA ESCOLA. CAMINHOS A SEREM SUPERADOS. Aline Silva de Oliveira¹ Orestes Zivieri Neto² RESUMO O artigo integra os resultados finais do subprojeto “Como se ensina e como se aprende frações e números decimais em matemática nas séries iniciais do ensino fundamental” 3, com objetivo de mostrar as dificuldades que professores e alunos enfrentam, quando ensinam e aprendem frações e números decimais. O projeto foi desenvolvido em duas escolas públicas estaduais do município de Rolim de Moura - Rondônia, em salas de 4º e 5º Ano do Ensino Fundamental e, traz uma abordagem qualitativa, utilizando, os seguintes instrumentos de coleta de dados: levantamento bibliográfico, análise dos cadernos e dos livros didáticos, observação participante e entrevistas com professores e alunos. Em suas preocupações procura compreender as razões que levam a redução dos conceitos de frações e o tratamento dicotomizado entre os conteúdos de frações e números decimais. Palavras chaves: Frações e números decimais. Subconstructos. Ensino-aprendizagem. INTRODUÇÃO O presente artigo busca apresentar os resultados finais alcançados pela investigação realizada através do subprojeto “Como se ensina e como se aprende frações e números decimais em matemática nas séries iniciais do ensino fundamental”, realizado em duas escolas pública estaduais do município de Rolim de Moura - Rondônia, que integra o projeto “Mas eu ensino! As dificuldades inerentes ao processo de ensinar e de aprender matemática nas séries iniciais”. O objetivo da nossa pesquisa está focado em investigar como se dá a prática pedagógica no ensino da matemática e como está é planejada e desenvolvida, analisando se as escolhas procedimentais atendem as necessidades dos alunos e se essas escolhas favorecem a formação do conceito e sua consequente generalização. Nossa investigação parte da seguinte problemática: Ensinam-se frações e números decimais na escola? Como e de que modo, conceitualmente e procedimentalmente o problema 3 ¹Acadêmica da Universidade Federal de Rondônia – UNIR / Campus de Rolim de Moura ²Prof. Dr. da Universidade Federal de Rondônia – UNIR / Campus de Rolim de Moura Pesquisa financiada pelo Edital MCT/CNPq N º 14/2010 - Universal / Edital MCT/CNPq 14/2010, sobre o registro nº 472664/2010-7, intitulada “Mas eu ensino! A dificuldades inerentes ao processo de ensinar e de aprender matemática nas séries iniciais do ensino fundamental”. 23 previamente enfrentado nas operações de multiplicação e divisão interfere no processo de aprendizagem com frações e decimais na escola? Um elemento inquietante tem nos chamado atenção, é o fato dos professores apresentarem o conteúdo de fração sem nenhuma conexão com o subconstructo quociente,que o levaria a escrita decimal, atribuindo essa dificuldade ao fato de não encontrarem contextos cotidianos de aplicações que vão além de situações de parte e todo. Por essa razão, frações e números decimais não integrariam a mesma natureza de conhecimento, a dos números racionais. Dessa forma teremos a separação, um tratamento para fração reduzida ao vetor a/b numa representação que cuida do todo divido em partes, porém em um processo de dupla contagem para numerador e denominador, reduzindo, assim, seu sentido e significado. Já o tratamento de números decimais contará com as relações com os sistemas de medidas e monetário para lhe conferir mais sentido e significados. Assim, inicialmente faremos uma incursão nos estudos já realizados na área temática, seguido pelos materiais e métodos utilizados pela investigação. Por fim, apresentamos os resultados e discussões com quatro categorias levantadas e, finalizaremos com as considerações finais que relatam as reflexões obtidas ao longo do nosso período de pesquisa nesses dois anos de investigação. UM OLHAR MAIS PENETRANTE SOBRE O ENSINO DE FRAÇÕES E NÚMEROS DECIMAIS Ao se ensinar frações e números decimais nas salas de aula, percebe-se uma redução ao subconstructo parte-todo, em parte isso se deve ao fato dos próprios professores acreditarem que fazer associações com barra de chocolate, pizza, etc, torna mais fácil à aprendizagem de seus alunos. Segundo Valera (2003), os números racionais são conteúdos que os alunos, tanto do ensino fundamental quanto do ensino médio, sentem dificuldades em aprender. Isso se deve ao fato de que os números fracionários geralmente são encontrados na sociedade em sua forma decimal, e as crianças ao chegarem à escola encontram dificuldades em reconhecê-los pela ausência de uma memória de referência em seu dia-a-dia. Os Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs (1998), por sua vez, já alertavam sobre a aprendizagem desse conteúdo indicando que: “Embora as representações fracionárias e decimais dos números racionais sejam conteúdos desenvolvidos nos ciclos iniciais, o que se 24 constata é que os estudantes chegam ao terceiro ciclo sem compreender os diferentes significados associado a esse tipo de número e tampouco os procedimentos de cálculo” (BRASIL, 1998, p.100). Adicionava, ainda, que no ensino de frações fica evidente que o contato dos alunos com essa representação é pouco frequente em seu cotidiano, pois, fica limitado apenas em metades, terços, quartos, e em sua maioria mais por meio de linguagem oral do que representações propriamente ditas. O documento sugere que a prática mais comum para explorar o conceito de frações é a que recorre a situações em que está implícita a relação parte-todo. Os PCN’s (1998) sugerem que o segundo ciclo do Ensino Fundamental sejam trabalhados três significados: parte-todo, razão e quociente, e somente no terceiro ciclo do Ensino Fundamental sejam introduzidos o significado do operador multiplicativo. Os estudos de Kieren (1993, p.57) destacam a necessidade de que o conceito de número racional pode ser construído a partir da categorização de quatro seguintes subconstructos: quociente, operador multiplicativo, medidas e razões. Para Kieren (1993), os quatros subconstructos citados já englobariam o subconstructo parte-todo, pois entende que as idéias que o constituem já estariam implícitas aos mesmos. No entanto, Kieren (apud Silva; Lima, 2004) mostra a fragilidade de adotar exclusivamente o modelo parte/todo quando afirma que essa metodologia leva ao processo de dupla contagem e não introduz a criança no campo dos quocientes. Essa forma de ensino faz com que a criança desenvolva no modelo geométrico um processo de dupla contagem para aprender a linguagem de frações. Os alunos aprendem que devem contar o número total de partes em que foi dividido o inteiro e usar esse número como o denominador e que devem contar o número de partes pintadas na figura e usá-lo para o numerador da fração. Isso então leva os alunos, provavelmente, não compreenderem porque esse novo número não pertence aos conjuntos dos inteiros, visto que estão sempre contando a quantidade de partes. Eles não relacionam esses dois inteiros, pois a interpretação de quociente não lhes é apresentada e com isso a relação entre numerador e denominador fica perdida, não se desenvolvendo a ideia de número fracionário representando também uma quantidade. Outro aspecto observável está ligado à maneira e ao modo em que se é ensinado fração, a metodologia que cada professor utiliza, pois, muitas vezes as dificuldades de aprendizagem do conceito de fração podem estar relacionadas ao fato dos professores desconhecerem o uso social e as possíveis relações e associações com números fracionários, tornando a aprendizagem de frações e números decimais mais complexas e desprovida de sentido e significado. 25 É comum ouvir de alguns professores “para que ensinar frações se é um conteúdo pouco utilizado na vida” Esse tipo de fala demonstra que os próprios professores não conseguem estabelecer relações com números racionais e o seu uso social tem dificuldades de lidar com esse assunto em sala porque também não conseguem compreende-los. (NASCIMENTO, 2010, p.197-198). Desse modo, o estudo de frações não deve recorrer à memorização mecânica do todo e de suas partes, numa lógica aparente que tenta aproximar as pequenas divisões cotidianas de barras de chocolates e pizzas, como se esse fosse o único conceito e função social. A implicação dessa concepção pode erroneamente levar os alunos a não relacionarem o conteúdo a suas aplicações diárias e não legitimar os seus usos cotidianos e, ainda levar a uma falsa impressão de que conhecem profundamente frações. À exemplo do que nos diz Malaspina (2007): A prática mais comum para explorar o conceito de fração é a que recorre a situação em que está implícita a relação parte-todo, como é o caso das tradicionais divisões de um chocolate ou de uma pizza em partes iguais. As crianças são informadas que o numero total de partes é o denominador, e que o numero de partes pintadas, o numerador. Desta forma, introduzir fração pode fazer com que as crianças tenham a impressão que sabem muito sobre frações, mas isso pode ser um engano, uma vez que as situações são limitadas [...] (MALASPINA, 2007, p.16). Reforçando está ideia de Malaspina (2007), Nunes e Bryant (1997) destacam: Com as frações as aparências enganam. Às vezes as crianças parecem ter uma compreensão completa das frações e ainda não a têm. Elas usam os termos fracionários certos; falam sobre frações coerentemente, resolvem alguns problemas fracionais; mas diversos aspectos cruciais das frações ainda lhes escapam. De fato, as aparências podem ser tão enganosas que é possível que alguns alunos passem pela escola sem dominar as dificuldades das frações, e sem que ninguém perceba. (NUNES & BRYANT, 1997, p.191). Os professores devem trazer consigo a preocupação de sempre contextualizar o conceito que se propõe ensinar e, de preferência discutir a sua funcionalidade social, para que assim valide os tipos de conhecimentos fora da escola, dando a ele um pouco mais de sentido e significado. 26 No que diz respeito ao livro didático, Bezerra (2001) chama atenção, para a necessidade de que os subconstructos garantam a formação dos conceitos, uma vez que em alguns casos, os manuais, não se apresentam de maneira clara levando, consequentemente, o aluno a não compreender o seu significado. Isso tudo acaba por recair a culpa sobre o professor quando não analisa criticamente o conceito apresentado pelo livro. Percebemos que o livro didático acaba enfocando uma ou outra concepção para o conteúdo de frações... Porém se o professor tivesse uma melhor formação para desenvolver as habilidades e competência dos alunos, permitiria a estes a construção de seu próprio conhecimento. Assim, se as frações pudessem ser exploradas sob os vários modelos, consequentemente as crianças ampliariam seu campo conceitual. (BEZERRA, 2001, p.13). Em alguns casos e, especificamente em alguns conteúdos os livros didáticos é um dos principais instrumentos para o aprendizado em sala de aula, pois nele é possível encontrar ilustrações, tabelas, analogias e diagramas, além de conter atividades, cujo único objetivo inicial é auxiliar a produção de significados para o aluno. É preciso observar, no entanto, que aquilo que está no livro, não é tudo que existe em relação a determinado conteúdo, por isso é importante que o professor busque novas informações, inove seu processo de ensino com atividades e materiais diferenciados. Por isso, concorda-se com Miorim (1995) que a abordagem de números racionais, traz a perspectiva de compreender frações e números decimais de forma agregadas constituindo, inclusive, a base para outros conteúdos de cunho fortemente social como é o estudo das medidas e sistema monetário, proporcionalidade, aproximando-se ao estudo da matemática comercial e financeira, e, certamente possibilitando uma maior significação e sentido. Enquanto tudo isso não acontece, os professores das escolas públicas continuam sua triste sina de ensinar e não compreenderem porque as crianças não aprendem. MATERIAIS E MÉTODOS A pesquisa esteve em desenvolvimento em duas escolas estaduais da rede pública do município de Rolim de Moura - RO, suas escolhas se deram com base no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) de 2009, a escola “A”4 com aproximadamente, 1520 alunos matriculados, sendo 420 alunos de 1º ao 5º ano, 633 alunos do 6º ao 9º ano e 467 alunos cursando o ensino médio. O número de professores é de 53 no total, sendo 19 docentes 4 Para garantir o anonimato da escola chamaremos de “A” e “B”. 27 de 1º ao 5º ano e os demais dos outros anos. A escola ficou dentro da meta projetada e acima da média alcançada pelo município no IDEB (2009), com uma pontuação de 4.8. A escola “B” atende um número aproximadamente de 240 alunos de 1º ao 5º ano, o número de professores efetivos é de 15, que atuam respectivamente nas séries iniciais oferecidas pela escola. A escola teve sua pontuação no IDEB (2009) acima da meta projetada e abaixo da média alcançada pelo município com 4,4. A investigação é de caráter qualitativo, utilizando como instrumentos de coleta de dados, levantamento bibliográfico, as análises dos cadernos dos alunos e dos livros didáticos adotados para o 4º e 5º ano do ensino fundamental, observação em salas de aula e entrevistas realizadas juntamente com alunos e professores. As análises realizadas nos livros5 didáticos e cadernos, a observação realizada em salas de aula e as entrevistas com alunos e professores, trouxeram de certa forma uma contribuição expressiva para nossa investigação de ter inicialmente uma percepção mínima sobre como se ensina e como se aprende frações e números decimais, assim como os fundamentos implícitos no ato de ensino e, consequentemente, o aprendizado do conceito privilegiado. Finalmente, com as entrevista pudemos encontrar de forma bastante consistente, possíveis soluções para o problema de nossa investigação ou, mesmo evidências que apontem novas indagações para futuras investigações. RESULTADOS E DISCUSSÕES À medida que se adicionava cada instrumento de coleta de dados relacionados a cada período da pesquisa, as informações geraram a perspectiva de serem tratadas e analisadas levando em conta as frequências com que cada dado aparece e levando em conta o acúmulo das informações levantadas, passaremos a adotar quatro categorias com a finalidade de melhor apresentarmos os resultados evidenciados durante o período de investigação, a) A perspectiva do ensino a partir dos livros didáticos adotados pelas escolas Em relação à análise dos livros didáticos adotados pelas escolas “A” e “B”, nota-se que seus conteúdos são tratados em separados e o grande destaque são as inúmeras ilustrações com a função de reforçar o subconstructo parte-todo, sendo este proposto pelos próprios autores. Sendo que nos livros aparecem os subconstructos quociente e operador 5 Os livros analisados são da editora Scipione, da coleção “A escola é nossa” dos autores Fábio Vieira, Jackson Ribeiro e Karina Pessôa, em sua 2ª edição de 2010. 28 multiplicativo. As ilustrações procuram relacionar os conteúdos com o cotidiano das crianças e, em relação a sua dosagem é dada com mais ênfase no 5º ano, quando se conclui as quatro operações - multiplicação e divisão, no 4º ano é apenas uma introdução aos conteúdos, para familiarizar as crianças a estes números. Os estudos de Magina et. al. (2008), mostram realmente o que ocorrem quando os professores escolhem os livros didáticos, pois optam por aqueles que apresentam um maior número de figuras e ilustrações, por considerarem um recurso para suas explicações e, ao mesmo tempo, de mais fácil compreensão para os alunos construírem os seus conceitos de frações e números decimais. Por fim, fica evidente que o livro didático é e sempre será um instrumento auxiliador no processo de ensino e aprendizagem, ao docente cabe torná-lo o mais significativo possível para os alunos, pois não adianta ter bons livros didáticos se nas mãos de professores despreparados seriam facilmente transformadas em muleta, já um mau livro na mão de um bom professor, certamente o obrigará a complementá-lo. E nessa perspectiva, como podemos escolher bons livros didáticos sem cair nas armadilhas de uma boa ilustração e péssimas escolhas teóricas metodológicas? b) Quanto o assunto é frações e números decimais o cadernos dos alunos se transforma em um apêndice do livro didático? Ao apresentarmos a análise realizada nos cadernos dos alunos, pode-se comprovar a intensidade em que os constructos de frações e números decimais são trabalhados pelos professores com seus alunos em sala de aula, não há nenhuma outra atividade proposta que não seja ou não esteja apresentada pelo livro didático. Nos cadernos é encontrado um grande número de atividades que se associam com situações cotidianas, situações-problemas, as frações sempre enfatizando conceito parte-todo representado por meio de figuras, mas, também, são apresentados os subconstructos operador multiplicativo e quociente, estes por sua vez em menor quantidade. Na análise realizada nos cadernos dos alunos, fica comprovada a intensidade em que os subconstructos de frações e números decimais são trabalhados pelos professores com seus alunos em sala de aula. É evidente o acompanhamento da lógica proposta pelos livros didáticos, tratando frações e números decimais como conteúdos isolados e não adotando a abordagem de números racionais, sempre enfatizando o subconstructo parte-todo. 29 Finalmente, o que tudo isso nos revela? Há pelo menos três possibilidades de entendimento. Numa primeira, levando em conta a separação dos dois conteúdos e a eleição de um único subconstructo, de que ausência de formação continuada aos professores colocaos sempre em situação de arcaicos e em posição de desvantagem em relação ao domínio conceitual e científico que constituí na atualidade a ideia de fração e de números decimais; A segunda, seria a de que os professores considerando seus alunos incapazes de apreenderem tais conceitos decidem diminuir a carga intelectual de compreensão sobre os dois conteúdos. Os alunos, por sua vez, começam a acreditar em suas incapacidades e iniciam um processo de anulação do conhecimento em matemática; E a terceira, e última possibilidade seria a de que o uso do livro didático não estaria auxiliando o professor no momento de transmitir o conceito de números racionais aos seus alunos, exatamente pelo fato, dos livros abordarem esse conteúdo de modo separado condicionando-os as vezes a adotarem as mesmas preferências metodológicas por falta de uma autonomia intelectual que lhe permitiria contestá-la. c) A insistência da escola pelo tratamento dicotomizado entre frações e números decimais. A separação que se dá entre a fração e os números decimais pelos professores, ainda que inconscientemente, não acompanha a lógica dos números racionais, primeiro pela ausência do subconstructo quociente, que traria a ideia de toda fração como um número decimal e, segundo porque a insistência na dupla contagem na fração de numerador e denominador pelo número de partes divididas e de partes pintadas não os desvinculam da ideia da fração como outro número não mais natural. Outro dado preocupante foi a observação de que muitos professores não tinham a preocupação em ensinar o conteúdo de fração e decimal, e quando estes eram trabalhados o único subconstructo utilizado era o parte-todo, mesmo que algumas atividades viessem contrárias ao uso do parte-todo, e a consequência disso tudo era que grande parte dos alunos não conseguiam concluir as atividades propostas Ainda em relação aos livros didáticos e a sua redução no momento de ensinar, fica evidente como alguns professores assumem ser o único material disponível para auxiliá-los: Pesquisadora: Quando você tem que dar aula desse conteúdo como você prepara essa aula? Professor “G”: Eu uso o livro e explico no quadro, porque 30 não dá muito tempo de usar outro material [...] (Entrevista realizada dia 22/05/2012, professor “G”, 5º ano escola “B”). Com isso, fica certo que a diminuição do ensino esta voltada apenas para o subconstructo parte-todo, que por sua vez é dado como ideia básica pelo manual do professor, assim coloca-se uma “barreira” entre o aluno e a aquisição dos demais significados de subconstructo, talvez devido a essa redução que o número de acerto do significado parte-todo da fração prevalece sobre os demais significados. Comparando o índice de acerto em relação aos problemas que contemplam os significados parte-todo e operador multiplicativo, constamos que há uma diferença significativa em favor do parte-todo. Entretanto, esse resultado sobre o significado parte-todo, por sua vez ainda não é satisfatório. Diante das respostas dadas pelos professores quando questionados sobre o que eles destacam dentro dos tópicos de frações, fica evidente o uso do subsconstructo parte-todo no momento de ensinar seus alunos, e podemos comprovar esse trabalho quando um dos alunos nas entrevistas responde, quando perguntado: Pesquisadora: Você lembra alguma coisa que aprendeu com frações e números decimais? O aluno “X” respondeu: Eu lembro que também, fração tem que pintar escrever e dividir. Com essa resposta novamente ela é questionada: E como se divide? A resposta da criança é a seguinte: Dividi em partes, pode dividir em quantas partes quiser. (Entrevista realizada dia 30/05/2012, com alunos do 5° ano da escola “B”) Com isso Nunes (2003), em seus estudos indica os perigos das crianças utilizarem da linguagem fracionária sem compreender completamente sua natureza, trazendo em sua pesquisa consignações sobre as ameaças que envolvem a complexidade e a variedade dos conceitos envolvendo frações. Finalmente, quando materializamos a experiência de observação participante em sala de aula e entrevista com os alunos e professores, todo o ciclo de frações e números decimais torna passiveis de serem compreendidos tanto pela ótica reducionista do subconstructo, quanto pela necessidade dos professores em investirem em formações continuadas para superarem fobias e aversões de conteúdos, que antes de serem classificados previamente como complexos seriam superadas pela ausência de autonomia intelectual e falta de flexibilização de práticas pedagógicas alternativas para o ensino e aprendizagem de números racionais. 31 d) A ótica reducionista do subconstructo parte-todo no processo de ensino e aprendizagem de frações e números decimais. A redução do ensino de frações ao subconstructo parte-todo, fazendo com que o aluno restrinja seu conhecimento apenas a divisão de partes pintadas, juntamente com as dificuldades de ensino dos demais subconstructos podem estar ligadas, também, ao fato de os próprios professores não terem uma noção de como trabalhar estes conteúdos. Nascimento (2010), por exemplo, realça em seus estudos a importância do próprio professor gestar o conteúdo e a sala de aula para que isso resulte numa aprendizagem significativa por parte dos alunos. É necessário que as atividades propostas pelo professor em sala de aula tenham a finalidade de promover uma real obtenção do conteúdo privilegiando um ensino no qual seja dada oportunidade ao aluno de compartilhar suas experiências. O que se observou em sala de aula e nas entrevistas é que mesmo com todo o esforço, por parte dos professores em selecionar atividades diferenciadas, ainda assim há um predomínio e uma redução a um mesmo subconstructo. Isso tudo, como o próprio Bertoni (1998) enfatiza pode estar ligado ao fato de os números racionais serem pouco utilizados em nossa civilização, provocando uma grande dificuldade em seu processo de ensino e de aprendizagem, pois certamente o aluno trará para escola pouca ou nenhuma vivência com frações, embora sabendo tratar-se de números de grande valia para a matemática. E sem querer culpabilizar alguém pelo fracasso no ensino e aprendizagem de frações, é necessário destacar que ao recorrer ao livro didático os professores o usam como peça chave para o trabalho em sala de aula, no entanto, sem o domínio necessário para trabalhar outros subconstructos além do parte-todo, mesmo que, ainda, nos livros apareçam esses subconstructos como o operador multiplicativo e o quociente, vistos nas categorias anteriores. Sua formação lhe permite que apresente apenas o subconstructo parte-todo, por compreendêlo e por ser igualmente fácil para seus alunos também compreenderem. Com isso, mais uma vez, afirmamos a necessidade da formação contínua de professores trabalharem com alguns conteúdos que previamente podem ser complexos, para que os docentes possam mais autonomamente oferecer atividades que venham de encontro com as necessidades de seus alunos e lhe dê uma maior mobilidade cognitiva e de escolha e seleção das atividades. Devemos voltar nossos olhos para a qualificação do professor, e levar em conta as preocupações que estes têm em garantir ao aluno um ensino de qualidade, como nos revela um dos professores entrevistados: 32 Pesquisadora: Você tem domínio do que se deve ensinar em frações e números decimais ou necessita do auxilio de um bom livro didático? Professor “M”: Sempre eu procuro ajuda, sempre, porque quando eu estava nessa fase de aprender frações foi uma situação muito complicada que eu vivi na época, a professora queria de todo jeito “enfiar” frações de “guela abaixo”, daí de lá para cá, assim, eu arrasto porque como eu tenho filha que já passou por essa fase de frações e eu estou na segunda filha que passa por isso, sempre tento buscar por isso, que eu trago pizza eu vou variando, para mim também estar entendendo e interagindo. Eu vou buscando outras formas. (Entrevista realizada dia 17/04/2012, professor “M”, 4º ano, escola “B”). Talvez, assim, possamos pressupor o motivo que leva a escola e os professores optarem pelo subconstructo parte-todo, pois tudo colabora para tentar amenizar ou invisibilizar o problema com multiplicação e divisão que grande maioria dos alunos apresentam ao chegar no 4º e 5º anos. No entanto, essa escolha reducionista do conteúdo de frações e números decimais pode estar associada a falta de habilidades multiplicativas e divisoras de seus alunos, pois aqueles que apresentariam essas dificuldades estariam previamente excluídos do processo de aprendizagem, caso todos os subconstructos fossem levados adiante. O subconstructo parte-todo não é, portanto, uma escolha e sim o que se é possível de se realizar. Sobra boa vontade por parte dos professores, mas, no entanto falta-lhe conhecimento e habilidades mais aprofundando sobre o assunto. CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao longo de nosso estudo buscou-se destacar as dificuldades em ensinar e aprender frações e números decimais e é a partir das investigações já realizada que se observa o grande número de trabalhos, que além de confirmarem tal preocupação também mostra o vasto campo de possibilidades que se abrem para que de fato tenha-se uma maior lucidez sobre como se ensina e como se aprende frações. Nos últimos anos, as pesquisas sobre o ensino e a aprendizagem desse tema têm detectado inúmeros problemas e levantado hipóteses que, entretanto, não abrangem a totalidade da problemática, nem são conclusivas. Talvez devido a isso, propostas de ensino incorporando esses resultados são apenas incipientes. O mais comum de se encontrar são as mesmas propostas de sempre, que começam informando as crianças sobre nomes e símbolos de frações, apresentando quadrados, retângulos ou círculos divididos e parcialmente pintados. (BERTONI, 1998, p.02) Buscou-se com parte dos fundamentos teóricos fazer as aproximações entre o que se foi levantado e o que os estudos nos revelam, podendo assim, fazer associações, como, 33 inclusive o conselho apresentado por Malaspina (2007) em suas conclusões finais de estudo, de forma incisiva por nós apresentado, quando considera razoável supor que introduzir frações a partir do significado operador multiplicativo e quociente mostra ser o melhor caminho para aprendizagem da fração, mesmo com crianças pequenas (8 anos). (MALASPINA, 2007, p.167) Nas análises dos livros didáticos e dos cadernos dos alunos encontra-se parte nossa preocupação, pois apesar de alguns livros didáticos trazerem três e até quatro subconstructos para a construção do conceito de frações e números decimais, os cadernos dos alunos indicam uma redução ao conceito “parte-todo”, antes e idealmente eleito como o de mais fácil compreensão pelos alunos, mas certamente redutor em sua possibilidade conceitual. Quanto a associação com os conteúdos de sistemas de medidas, monetários, proporcionalidade estes parece ser um consenso para o livro e o caderno dos alunos. Evidenciamos com a observação em sala e as entrevistas, que a ausência de formação permanente para o professor expõe suas poucas habilidades em suas gestões com o conteúdo de frações e números decimais, resultando em uma abordagem dicotômica entre os mesmos e reduzindo-os a um único subconstructo, mesmo os livros trazendo os demais subconstructos, ainda sim, por desconhecimento, os mesmos optam por trabalhar com o parte-todo, reduzindo o seu processo de aquisição de sentido e significado. Finalmente, nota-se que a não utilização do subconstructos quociente e operador multiplicativo deve-se a um problema prévio que possivelmente os alunos enfrentam com a multiplicação e a divisão, e que no caso conceitual irá reduzir o aprendizado do novo conteúdo. O novo conteúdo, não será inviabilizado de ser apresentado, nem tampouco as quatro operações com frações e números decimais, o seu sentido e significado é que perderá sua potencialidade, tendo apenas o subconstructo parte-todo como referência. REFERÊNCIAS BERTONI, N. E. Frações e números fracionários. Disponível em: <http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/roteiropedagogico/recursometod/3504_FRAA 135A149ES_BERTONI.pdf>. Acesso em: 28 ag. 2010. (Fascículo IV de Educação Matemática). BEZERRA, F. J. Introdução do conceito de número fracionário e de suas representações: uma abordagem criativa para a sala de aula. 220f. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2001. 34 BRASIL, Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação de Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Matemática. Brasília, DF:MEC/SEF, 1998. DANTE, L.R. Uma proposta para mudanças nas ênfases ora dominantes no ensino de matemática. 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Disponível em: < www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/.../MATEMATICA/Tese_Miorin.pdf>. Acesso em: 27 jun. 2011. NASCIMENTO, do Juliane. O ensino e a aprendizagem das frações no contexto das novas propostas curriculares. Disponível em: < <http://www2.marilia.unesp.br/revistas/index.php/ric/article/view/212.>. Acesso em: 28 ago. 2010. NUNES, T. Criança pode aprender frações. E gosta! In: GROSSI, E. P. (Org.). Por que ainda há quem não aprende?A teoria. Rio de Janeiro: Vozes, 2003, p. 119-148. NUNES, T.; BRYANT, P. Crianças fazendo matemática, Porto Alegre, 1997. SILVA, M. F. F. da; LIMA, P. F. Frações e grandezas geométricas: um estudo exploratório da abordagem dada pelos livros didáticos. VIII Encontro Nacional de Educação Matemática, 2004. Disponível em: < www.sbem.com.br/files/viii/pdf/01/PO03800969432.pdfSimilares>. Acesso em: 27 jun. 2011. VALERA, A. R. Uso social e escolar dos números racionais: representação fracionária e decimal. 164f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Filosofia e Ciências, Marília/SP, 2003. 35 PROGRAMAS DE MELHORIA DA QUALIDADE DE ENSINO NA REDE PÚBLICA MUNICIPAL URBANA EM PORTO VELHO Ana Paula da Silva Oliveira6 Juracy Machado Pacífico7 RESUMO O estudo apresenta os resultados da pesquisa que trata dos programas de melhoria da qualidade de ensino na rede pública municipal urbana em Porto Velho. Investiga as políticas públicas educacionais implementadas no período de 2001 a 2011, pela Secretaria Municipal de Educação (SEMED), direcionadas à melhoria da qualidade do ensino nos anos iniciais do ensino fundamental nas escolas públicas urbanas em Porto Velho. A partir dos estudos de Azevedo (2003), Höfling (2001), Klein (2006), Souza (2011), Moraes (2009) dentre outros, discute os temas política pública, políticas públicas educacionais, qualidade de ensino e fluxo escolar. Com uma abordagem qualitativa, fundamentada em Bogdan e Biklen (1994), desenvolveu um levantamento junto à SEMED sobre os programas de melhoria da qualidade de ensino na rede pública e realizou entrevistas com gestores da SEMED. Os resultados demonstram que vários programas foram desenvolvidos, mas que a maioria foi elaborada pelo governo federal e implementada em parceria com o município. Verifica-se ainda que em todos os programas a justificava principal é a melhoria da qualidade do ensino e da aprendizagem. A partir dos resultados deduz-se que, para a SEMED, o fracasso escolar é, principalmente, conseqüência da má formação docente. Palavra-chave: Escolarização. Políticas Públicas. Qualidade de Ensino. 1 INTRODUÇÃO O estudo apresenta os resultados da pesquisa desenvolvida a partir do plano de trabalho “Programas de melhoria da qualidade de ensino na rede pública municipal urbana em Porto Velho”, que tem como objetivo investigar as políticas implementadas no período de 2001 a 2011, pela Secretaria Municipal de Educação (SEMED), direcionadas à melhoria da qualidade dos anos iniciais do ensino fundamental nas escolas públicas urbanas em Porto Velho. Procuramos identificar e analisar apenas os programas e ações que tenham em seus objetivos a intenção de incidir diretamente sobre a melhoria da qualidade do ensino oferecido às crianças e adolescentes dos anos iniciais do ensino fundamental. 6 Bolsista do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação Científica – PIBIC/CNPq. Acadêmica do 5° Período do Curso de Matemática – UNIR - Campus de Porto Velho. Integrante do Grupo Amazônico de Estudos e Pesquisas em Psicologia e Educação - GAEPPE. E-mail: [email protected]. 7 Orientadora. Departamento de Ciências da Educação – UNIR/Campus de Porto Velho. Integrante do Grupo Amazônico de Estudos e Pesquisas em Psicologia e Educação - GAEPPE. E-mail: [email protected]. 36 A partir dos anos de 1990, e principalmente, como conseqüência dos ideais garantidos legalmente por ocasião da promulgação da Constituição Federal de 1988, no que tange ao ensino fundamental foram sendo implementadas políticas de distribuição de recursos (FUNDEF e FUNDEB), políticas de planejamento (Planos Nacionais de Educação), Políticas de ampliação da jornada (Ensino Fundamental de Nove anos, ampliação do tempo de permanência na escola) entre outras. Neste mesmo período vários programas federais se estenderam para os estados e municípios voltados para a democratização da gestão, melhorias do transporte escolar e também da alimentação, além de programas de formação de professores. No entanto, alguns dos investimentos, mesmo tendo como objetivo a melhoria da qualidade da educação, não tiveram grandes impactos, se considerarmos os resultados das avaliações nacionais. Para se ter uma idéia, em 2011, os anos iniciais do ensino fundamental das escolas públicas municipais de Porto Velho apresentaram um resultado ainda muito alto de índices de reprovação: 17.30, 14.50, 13.30 e 7.60, para o 2°, 3°, 4° e 5° ano respectivamente. Tais dados demonstram a existência de problemas no processo já que os resultados não são nada animadores, demonstrando que as políticas públicas precisam de ajustes. Segundo Höfling (2001, p. 31), política pública significa “[...] o Estado implantando um projeto de governo, através de programas, de ações voltadas para setores específicos da sociedade.” A educação se apresenta como uma “[...] política pública social, uma política pública de corte social, de responsabilidade do Estado - mas não pensada somente por seus organismos.” Klein (2006, p. 140) deixa claro que as políticas implementadas “[...] precisam ser avaliadas para verificar sua eficácia e se há necessidade de mudanças.” Para Souza (2008, p. 6), “[...], entender as políticas públicas é compreender como os educadores, alunos e gestores vivenciam sua implantação e participam de sua concepção.” Portanto, é de suma importância entender como esses agentes vivenciam as políticas implementadas, pois só assim podemos verificar sua eficácia. Em termos gerais a política educacional tem dois grandes desafios: acelerar o acúmulo de escolarização da população, o que implica a ampliação do acesso e da permanência da população nas escolas, em todos os níveis e modalidades da educação brasileira, e melhorar a qualidade do ensino, prestando atenção redobrada às novas necessidades de conhecimentos e habilidades requeridos no processo de desenvolvimento econômico e social atual. (CASTRO, 2009). Podemos perceber, portanto, que a melhoria da qualidade de ensino é um desafio que 37 não poderá ser enfrentado de forma isolada, mas está diretamente relacionada ao desenvolvimento econômico e social atual do país. Assim, o plano de trabalho vinculado ao subprojeto da orientadora intitulado Políticas públicas de educação para o enfrentamento das dificuldades escolares na rede municipal na cidade de Porto Velho/RO, buscou responder à seguinte pergunta: quais foram as políticas públicas (planos, programas, projetos) implementadas no período de 2001 a 2011 pela Secretaria Municipal de Educação (SEMED) direcionadas à melhoria da qualidade dos anos iniciais do fundamental nas escolas públicas urbanas em Porto Velho? 2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Esta pesquisa fundamenta-se numa abordagem qualitativa e quanto a seus objetivos, caracteriza-se como descritiva. Foi desenvolvida no município de Porto Velho, com dados da rede pública municipal de educação envolvendo somente o perímetro urbano. Teve como sujeitos os profissionais da SEMED que coordenam programas voltados a melhoria da qualidade do ensino. Para obtermos os dados necessários para realização desta pesquisa fizemos uso de pesquisa bibliográfica, documental e entrevistas. Na pesquisa bibliográfica realizamos o levantamento de bibliografias voltadas ao tema com as quais realizamos leituras com elaboração de fichamentos. Na pesquisa documental fizemos o levantamento dos programas de melhoria da qualidade do ensino junto à SEMED e também levantamos informações no site oficial da Prefeitura Municipal de Porto Velho e do MEC. Para realizamos as entrevistas, contamos com a participação de duas profissionais da educação que respondem por vários programas na SEMED. 3 RESULTADOS E DISCUSSÕES Apresentamos neste tópico os resultados finais desta pesquisa, incluindo os dados levantados em sites oficiais do MEC e dados levantados junto à SEMED. 3.1 PROGRAMAS DE MELHORIA DA QUALIDADE DO ENSINO IMPLEMENTADOS NA REDE MUNICIPAL DE PORTO VELHO Conforme objetivos deste estudo, que é investigar as políticas implementadas pela Secretaria Municipal de Educação (SEMED), direcionadas à melhoria da qualidade do ensino 38 dos anos iniciais do ensino fundamental nas escolas públicas em Porto Velho, no período de 2001 a 2011, realizamos um levantamento dos programas educacionais implementados pela SEMED voltados para os anos iniciais das escolas públicas municipais de ensino fundamental urbano em Porto Velho. Tais programas foram organizados em três grandes grupos, sendo eles: a) Programas de formação docente. Neste grande grupo levantamos junto à SEMED dez programas voltados à melhoria da qualidade do ensino desenvolvidos no período proposto de 2001 a 2011. Considerando que a soma total dos programas dos três grupos é igual a 18 programas, observa-se que os programas de formação docente representam a grande maioria; b) Programas de formação de outros profissionais da educação. Neste grupo coletamos dados de cinco programas que estiveram ou estão em vigor no município de Porto Velho. Percebe-se que neste grupo de formação de outros profissionais da educação a atenção volta-se para a formação dos gestores, de onde se pode inferir que, para a SEMED, é preciso uma gestão competente para que haja um melhor andamento das questões escolares e até mesmo para um melhor relacionamento entre os profissionais da educação e envolvidos; c) Programas de reorganização dos tempos escolares e funcionamento da escola (práticas pedagógicas e avaliação), que, segundo a SEMED, são desenvolvidos em parceria com pais, alunos, professores e comunidade em geral. Quadro 1 - Programas voltados para a melhoria da qualidade do ensino implementados pela SEMED no período de 2001 a 2011 - rede municipal urbana. 1 - PROGRAMAS DE FORMAÇÃO DOCENTE Programa Programa de Desenvolvimento Profissional Continuado PCN em Ação Universidade Aberta do Brasil (UAB) - Pedagogia Programa de Formação de Professores Alfabetizadores (PROFA) Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica Vinculação (Federal, Estadual Municipal) Governo Federal meio do Ministério Educação (MEC) Governo Federal meio do Ministério Educação (MEC) Governo Federal meio do Ministério Educação (MEC) Governo Federal meio do Ministério Educação Período de ou Desenvolvime Público Alvo nto por Entre 2001 a Professores da 2003 Coordenadores pedagógicos. por da Profissionais Educação. por 2010 a 2012 da Professores Coordenadores pedagógicos. por Iniciado da 2011 e da e em Professores da rede pública de ensino. 39 (PARFOR), via Plataforma Freire Programa Gestão da Aprendizagem Escolar (GESTAR I - Urbano e rural). Programa de Formação Continuada de Professore das séries iniciais do Ensino Fundamental (PróLetramento) Mobilização pela Qualidade da Educação Programa Nacional de Formação Continuada em Tecnologia Educacional (ProInfo Integrado) Programa de Habilitação e Capacitação de Professores Leigos (PROHACAP). Programa de Formação de Professores em exercício (PROFORMAÇÃO). (MEC) Governo meio do Educação (MEC) Governo meio do Educação (MEC) Governo meio do Educação (MEC) Governo meio do Educação (MEC) Governo meio do Educação (MEC) Programa de Educação na Muncipal Amazônia: Ensinar a Ensinar. Federal por Turmas desde Professores do 2º Ministério da 2007 ao 5º ano do ensino fundamental. Federal por Turmas desde Professores das Ministério da 2009 séries iniciais do Ensino Fundamental. Federal por Ministério da Desde 2008 Professores Gestores. e Federal por Ministério da Professores gestores e Federal por 2000-RO Ministério da Professores no exercício da docência e sem ensino médio. 2000 a 2004 Docentes que atuam nas áreas rurais e em escolas urbanas. DE OUTROS PROFISSIONAIS DA 2 - PROGRAMAS DE FORMAÇÃO EDUCAÇÃO Programa de Formação Governo Federal por Inicial em Serviço dos meio do Ministério da Profissionais da Educação Educação Básica dos Sistemas de (MEC) Ensino Público (Profuncionário) Programa Formação pela Governo Federal por Escola meio do Ministério da Educação (MEC) Pós-Graduação em Governo Federal por Coordenação Pedagógica - meio do Ministério da Programa Escola de Educação Gestores (MEC) Pós-Graduação em Governo Federal por Tecnologia Educacional meio do Ministério da Educação (MEC) Pós Graduação em Gestão Governo Federal por - Funcionários Escola da 2010 e 2011 Profissionais Educação comunidade. da e 2010 a 2012 Coordenadores Pedagógicos Orientadores educacionais Profissionais educação - 2008 a 2010 e da Gestores (Diretor e 40 Escolar meio do Ministério da Educação (MEC) 3 - PROGRAMAS DE REORGANIZAÇÃO FUNCIONAMENTO DA ESCOLA Mais Educação Governo Federal por meio do Ministério da Educação (MEC) Correção de Fluxo - Se Governo Federal por liga e Acelera Brasil meio do Ministério da Educação (MEC) Programa de incentivo a Governo Federal por leitura e produção textual meio do Ministério da “livro-carta-mural” Educação (MEC) e Municipal vice-Diretor). DOS TEMPOS ESCOLARES E Iniciado 2008. em Alunos do Ensino Fundamental de 1º a 9º ano Iniciado 2009. em Alunos de até 15 anos Iniciado 2009. em Alunos do 3º ao 5º ano, professores e demais servidores. Fonte: Elaborado pelos/as autores/as a partir de informações coletadas junto às Divisãoões da SEMED e site do MEC, em fevereiro e junho de 2012. Através dos programas acima citados e descritos podemos verificar que a maioria tem vinculação com o governo federal em parceria com a prefeitura, recebendo, portanto repasses financeiros federais, mas sempre com colaboração da própria SEMED para a realização dos programas. É necessário compreender as relações entre as políticas implementadas pelo governo federal e os programas desenvolvidos pelo município de Porto Velho no período de abrangência da pesquisa e fazer análise dos programas desenvolvidos, se são do governo federal ou do município e quem eram os prefeitos, governadores e governo federal. Observa-se que no período de 2001 a 2004 há uma constante troca de secretários municipais de educação, chegando ao absurdo de, a cada ano, um novo secretário ou secretária assumir a função. Porém, o prefeito permanecia o mesmo, o que é preocupante, pois nos parece que a educação foi colocada como espaço de “qualquer um/uma”, ou, quem sabe, e não passa de inferências, isso teria relação com quem possibilitava, ou não, a manobra dos recursos que deveriam ser investidos em educação. Observa-se também que houve troca de governadores e presidentes nesses primeiros quatro anos de nosso recorte, com siglas partidárias também diferentes. No entanto, o período de 2005 a 2011 é marcado por administrações petistas, tanto em âmbito municipal quanto federal. É comum os programas passarem por alterações conforme a mudança de autoridade, e é isso que Durham (2010, p. 176) afirma: “parte deles foi reformulada [...], parte foi 41 abandonada, alguns foram ampliados e outros foram criados”. Este fato se repete nos departamentos e divisões da SEMED, nos quais ela se organiza. Conforme fomos coletando dados junto a SEMED, fomos também percebendo a dificuldade de colher informações de períodos anteriores ao dos responsáveis atuais pelos departamentos. Isso nos pareceu que não há uma organização sistematizada dos programas que foram implementados em períodos anteriores. Esse fato veio dificultar o aprofundamento das características de alguns programas. Ao realizarmos o levantamento dos programas de melhoria da qualidade do ensino percebemos que a maioria dos programas tem vinculação com o governo federal. Isso ocorre porque segundo uma das entrevistadas “quando esses programas são oferecidos a rede prontamente adere, já entende que isso vai beneficiar nossos alunos, nossos professores”. (Entrevista 2 - Representante da Divisão de Ensino Fundamental/SEMED - Porto Velho, 2012). Consideramos a afirmativa de Durham (2010, p. 153), para quem “[...] as políticas estaduais e municipais são tão ou mais importantes do que as intervenções federais para assegurar a frequência à escola e melhorar o desempenho dos alunos.” O autor fala justamente sobre essa especificidade que é necessária ao se pensar uma política pública educacional. 3.2 PLANEJAMENTO E AVALIAÇÃO DOS PROGRAMAS PELA SEMED Conforme já informamos anteriormente, grande parte dos programas, no município de Porto Velho, destinados a melhoria da qualidade do ensino tem vinculação com o governo federal e são pensados em nível nacional. Ou seja, a maioria dos programas é planejada em nível federal e, conforme entrevistas, implementada imediatamente ou com base no Planejamento Estratégico, nas audiências públicas, nos dados do IDEB e nos diagnósticos junto à rede municipal de ensino. Portanto, resta entender ainda a forma como a SEMED vem acompanhando e avaliando estes programas. A SEMED informou que na implementação e execução, “os procedimentos são utilizados em consonância com as características de cada programa” (Entrevista 1 Representante da Divisão Formação/SEMED - Porto Velho, 2012), e que “o primeiro passo é conhecer o programa [...] são feitos cursos, são feitos encontros para conhecer esse programa.” (Entrevista 2 - Representante da Divisão de Ensino Fundamental/SEMED - Porto Velho, 2012). Ou seja, é preciso conhecer para implementar. Com relação ao acompanhamento, uma das entrevistadas diz: 42 Dependendo do programa o acompanhamento é feito de maneira direta na escola ou através das atividades realizadas junto aos alunos e apresentadas pelos professores cursistas. O governo federal mantém o acompanhamento dos programas através de relatórios e/ou atividades durante a realização dos cursos. (Entrevista 1 - Representante da Divisão Formação/SEMED - Porto Velho, 2012). O conteúdo dessa entrevista nos informa que além do acompanhamento pela Secretaria Municipal de Educação e pela própria escola, existe também o acompanhamento do governo federal considerando que a maioria tem vinculação com a esfera federal. A entrevistada 2 diz ainda que o “acompanhamento é extremamente rigoroso”, que a SEMED acompanha as escolas e que se o programa recebe apoio financeiro esse acompanhamento é ainda mais rigoroso, através de plataformas e acompanhamento direto. (Entrevista 2 Representante da Divisão de Ensino Fundamental/SEMED - Porto Velho, 2012). Conforme entrevistada 1 “a avaliação tem sido realizada por meio de instrumentais específicos dos programas, das produções dos cursistas, dos relatórios, do SIMAFOR (Sistema de Monitoramento e Avaliação das Formações/SEMED, em fase de experimentação)” e que “como a avaliação acontece sobre as ações de cada programa, possui um caráter mais focado em contribuir para melhoria direta das ações de formação” (Entrevista 1 - Representante da Divisão Formação/SEMED - Porto Velho, 2012). Essa contribuição mais específica no campo da formação docente nos possibilita inferir que se deve ao fato de que a SEMED entende que é aí que se encontra o maior problema da educação no município. Segundo a entrevistada 2, não adianta só investir na formação dos professores se esse professor não tem tempo de participar de um curso, um programa de formação fornecido pela SEMED, então é preciso que se invista neste professor, flexibilizando uma carga horária para ele, possibilitando-o a participar de algo que será bom para a sua capacitação profissional e para a melhoria da qualidade do ensino. Segundo a entrevistada 1, “É preciso avançar mais, tendo por base avaliações mais detalhadas de todas essas ações possibilitando os ajustes necessários”. (Entrevista 1 Representante da Divisão Formação/SEMED - Porto Velho, 2012). Ela vem ressaltando a necessidade de avaliações mais detalhadas sobre as ações que envolvem os programas, pois é preciso saber até onde o programa está apresentando melhoria e ao que se limita. Não é demais, porém, retomar o que nos disseram Ribeiro, Ribeiro e Gusmão (2005, p. 239), onde, tomando como foco a qualidade da escola, estabeleceram sete diferentes dimensões para traduzir a ampla concepção de qualidade educativa. Isso porque a qualidade 43 da educação não se limita a alguns aspectos, mas a vários: “1. Ambiente educativo 2. Prática pedagógica 3. Avaliação 4. Gestão escolar democrática 5. Formação e condições de trabalho dos profissionais da escola 6. Ambiente físico escolar 7. Acesso, permanência e sucesso na escola.” Logo acreditamos que para que haja essa avaliação sistematizada dos programas de melhoria da qualidade do ensino é preciso que sejam consideradas todas essas dimensões apontadas acima como possibilidades de se aproximar da qualidade do ensino. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Tendo como base a fundamentação teórica estudada, podemos concluir que as políticas públicas educacionais, materializadas em programas e ações, têm por objetivo incidirem diretamente sobre a melhoria da qualidade de ensino e/ou enfrentamento das dificuldades escolares. Nesse sentido, a partir das concepções dos vários autores e autoras estudados, concluímos que um sistema educacional é de qualidade quando seus alunos e alunas aprendem e avançam na escolarização, ou seja, são bem sucedidos na escola. Mas garantir a aprendizagem e o avanço ainda não é suficiente, pois a qualidade também implica em atender a todas as crianças e jovens em idade escolar. Observamos que vários programas foram desenvolvidos pela SEMED e que, de modo geral, a preocupação que os fundamentou e os fundamenta a é a qualidade de ensino. O levantamento quantitativo dos programas de melhoria da qualidade de ensino em Porto Velho nos possibilitou verificar que a preocupação quanto ao fracasso escolar tem incidido mais sobre a formação. Tais concepções recaem, portanto, no estudo de Angelucci et al (2004) no que se refere à tendência das políticas públicas em diagnosticar o fracasso escolar como problema técnico, ou seja, por inadequação de metodologias e que a formação docente iria resolver tal problemática. Outro dado que nos chamou atenção foi o fato de a grande maioria dos programas serem pensados pelo governo federal e adotado pela Secretaria Municipal de Educação, não considerando as características únicas do município, mas que conforme as entrevistas realizadas tem surtido resultados positivos mesmo que de forma gradativa e pouco perceptiva. Mas fica-nos a certeza de que é necessário que haja uma política de educação igualitária para que assim os estudantes tenham os mesmos direitos, sem discriminação de sexo, raça, etnia, religião e capacidade, tendo acesso, permanência e sucesso nas etapas da educação. (CURY, 2005). “[...] a educação básica deve ser objeto de uma política educacional 44 de igualdade concreta e que faça jus à educação como o primeiro dos direitos sociais inscrito em nossa Constituição” (p. 29). Podemos inferir, ao término desta pesquisa, que há ainda muito a se estudar com relação às políticas públicas educacionais no município de Porto Velho, já que muitas perguntas precisam ser respondidas. Conhecer os programas voltados à melhoria da qualidade do ensino é um estudo constante que precisa considerar cada vez mais as especificidades de cada etapa da educação, bem como considerar o olhar dos diretamente envolvidos: os sujeitos da escola, o que pretendemos em nosso próximo plano de trabalho. REFERÊNCIAS ANGELUCCI, C. B. et al. O estado da arte da pesquisa sobre o fracasso escolar (1991-2002): um estudo introdutório. Educação e Pesquisa. [online]. jan./abr. 2004, vol.30, no.1 [citado 26 Julho 2005], p.51-72. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517 97022004000100004&lng=pt&nrm=iso> Acesso em: 17 abr. 2012. AZEVEDO, Sérgio de. Políticas públicas: discutindo modelos e alguns problemas de implementação. In: SANTOS JÚNIOR, Orlando A. Dos (et. al.). Políticas públicas e gestão local: programa interdisciplinar de capacitação de conselheiros municipais. Rio de Janeiro: FASE, 2003. BOGDAN, C. R.; BIKLEN, S. K. Investigação qualitativa em educação: uma introdução à teoria e aos métodos. Portugal: Porto Editora, LTD, 1994. BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Disponível em: <http://www.amperj.org.br/store/legislacao/codigos/eca_L8069.pdf>. Acesso em: 29 jan. 2012. BRASIL. INEP. 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(Doutorado em Educação Escolar) - Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. 46 PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO: QUANTO SOBRE ADAPTAÇÕES CURRICULARES PODE SER VISTO NESTE DOCUMENTO? Angélica Aparecida Máximo8 Flávia Pansini9 RESUMO O artigo tem por objetivo divulgar os resultados de uma pesquisa que investiga como as adaptações curriculares para o atendimento aos estudantes com Necessidades Educacionais Especiais instituídas pelo Ministério da Educação em 1998, estão sendo inseridas nos Projetos Político-Pedagógicos de 10 escolas públicas estaduais do município de Rolim de Moura Rondônia. A partir de uma abordagem qualitativa, utilizou-se como instrumentos de coleta de dados análises documentais e entrevista individual. Os resultados apontam que os PPP’s abordam as questões sobre adaptações curriculares de modo superficial, dificultando o estabelecimento de práticas capazes de promover uma inclusão sem prejuízo para a aprendizagem escolar desses alunos. Palavras-chave: Inclusão escolar. Adaptação curricular. Pessoa com deficiência INTRODUÇÃO A preocupação com a inclusão de crianças com necessidades especiais na educação brasileira tem se intensificado desde a década de 1980, com a iniciativa de movimentos sociais engajados na luta em defesa dos direitos das pessoas com deficiência. No entanto, essa preocupação se torna ainda mais intensa a partir de 1990 com a realização da “Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais: acesso e qualidade” promovida pela Organização das Nações Unidas para a educação, a ciência e a cultura (UNESCO) em 1994 na Espanha. Esta conferência resultou na elaboração da “Declaração de Salamanca”, documento contendo 17 páginas nas quais se preconiza o acesso a escola preferencialmente no convívio com outras pessoas sem deficiência, “reconhecendo a necessidade e urgência do providenciamento de educação para as crianças, jovens e adultos com necessidades educacionais especiais dentro do sistema regular de ensino” (UNESCO, 1996, p. 01). A Declaração, portanto, parte do princípio de que as “escolas devem acomodar todas as crianças independentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais, linguísticas ou outras” (idem, p. 03). Para tanto, necessitam se adaptar às necessidades 8 9 Bolsista PIBIC/UNIR Orientadora 47 desses estudantes, estabelecendo mudanças em vários aspectos da escolarização, como no “[...] currículo, prédios, organização escolar, pedagogia, avaliação, pessoal, filosofia da escola e atividades extra-curriculares” (UNESCO, 1996, p. 08). Para que este desafio pudesse ser superado de forma gradual pelas escolas, nos últimos anos o Ministério da Educação (MEC) e as Secretarias de Educação têm lançado mão de um conjunto de leis, diretrizes e documentos orientadores a fim de subsidiar as instituições educativas. Dentre estes, é possível citar no âmbito nacional: Lei nº 9394/96 que institui as Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 2010); Resolução CNE/CEB Nº 2/2001 que institui as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica (BRASIL, 2001); Parâmetros Curriculares Nacionais: Adaptações Curriculares (BRASIL, 1998); Decreto nº 7.611/2011 que dispõe sobre a educação especial, o atendimento educacional especializado e dá outras providências (BRASIL, 2011), entre outros. No âmbito Estadual a educação especial é regida principalmente pelas Resoluções nº 138/1999 - CEE/RO e n°552/2009 - CEE/RO - que regulamenta os dispositivos da Lei 9394/96 a serem observados pelos sistemas de Ensino no Estado (RONDÔNIA, 1999) e institui as Diretrizes e Normas Para a Educação Especial (RONDÔNIA, 2009). Procurando entender os impactos e mudanças produzidas por estes documentos no cotidiano das escolas públicas a pesquisa intitulada “Adaptações curriculares na rede estadual de Rolim de Moura - RO: o que revelam os Projetos Político-Pedagógicos e as práticas desenvolvidas pelas escolas”, tem por objetivo principal conhecer como têm sido realizadas as adaptações curriculares no interior das escolas estaduais de Rolim de Moura - Rondônia, bem como as contribuições que estas têm trazido para a inclusão de crianças com necessidades educacionais matriculadas na rede regular de ensino. Este artigo, portanto, apresenta alguns resultados obtidos nesta investigação. Organizamos o texto em três partes. Na primeira destacamos o conceito de adaptações curriculares e o modo como vêm sendo contempladas nos Projetos Político-Pedagógicos escolares na opinião de diferentes autores. Na segunda explicitamos os procedimentos metodológicos utilizados, seguindo-se dos resultados e discussões, a partir de fragmentos selecionados dos projetos das escolas, bem como da entrevista realizada com a coordenadora da Educação Especial da Representação de ensino (REN) de Rolim de Moura - RO. 48 ADAPTAÇÕES CURRICULARES E PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO: A VISÃO DO PCN E OUTROS AUTORES De acordo com estudos de Reali e Nóbrega (2011, p.04), as discussões sobre adaptações curriculares no cenário brasileiro se intensificaram após a promulgação da Lei 9394/96, “[...] quando o paradigma da inclusão escolar é inserido em textos oficiais especificamente referentes à educação de modo a buscar apoiar a prática pedagógica desenvolvida em escolas regulares”. Consequentemente, dois anos após a promulgação da LDB o MEC publica o documento “Adaptações curriculares: Estratégias para a educação de alunos com necessidades educacionais especiais”, contendo orientações que definem o que são as adaptações e como devem acontecer na escola. A partir de então, surgem diversos trabalhos que baseados neste documento, discutem e problematizam o conceito de adaptações curriculares (FRANCO, 2000; OLIVEIRA; MACHADO, 2007; FERNANDES; ANTUNES; GLAT, 2007; HEREDERO, 2010). Para Oliveira e Machado (2007), as adaptações são na realidade uma forma de se repensar as condições da escola para acolher bem a diversidade dos alunos. Estas partem do princípio de que um currículo único poderia “acentuar as práticas excludentes, agora sob a forma do descaso e do abandono destes alunos ao ‘fundo da sala de aula’ e aos perigosos rótulos das ‘dificuldades de aprendizagem’” (p. 40 - grifos das autoras). As autoras também estabelecem uma diferenciação entre adaptações de acesso ao currículo e adaptações curriculares propriamente ditas; enquanto a primeira compreende a adequação do ambiente escolar por meio da criação de condições físicas, ambientais e materiais, as adaptações curriculares “permitem a eliminação ou a introdução de objetivos específicos, complementares e/ou alternativos e de conteúdos, como forma de favorecer o desenvolvimento e a aprendizagem dos alunos com necessidades educacionais específicas” (OLIVEIRA; MACHADO, 2007, p. 45). Com relação ao que é proposto pelo PCN (BRASIL, 1998), este enfatiza que as adaptações devem ser realizadas em condições de transversalidade, envolvendo todos os níveis de ensino, podendo ser significativas e não significativas, além de realizarem-se em três níveis: no Projeto Político-Pedagógico, no currículo desenvolvido em sala de aula e no âmbito individualizado. No que diz respeito ao Projeto Político-Pedagógico, este deve orientar a operacionalização do currículo, como um recurso para promover o desenvolvimento e a aprendizagem dos alunos, considerando-se os seguintes aspectos: 49 • • • • • atitude favorável da escola para diversificar e flexibilizar o processo de ensino-aprendizagem, de modo a atender às diferenças individuais dos alunos; identificação das necessidades educacionais especiais para justificar a priorização de recursos e meios favoráveis à sua educação; adoção de currículos abertos e propostas curriculares diversificadas, em lugar de uma concepção uniforme e homogeneizadora de currículo; flexibilidade quanto à organização e ao funcionamento da escola, para atender à demanda diversificada dos alunos; possibilidade de incluir professores especializados, serviços de apoio e outros, não convencionais, para favorecer o processo educacional (BRASIL, 1998, p. 32). Mas, se por um lado, o PCN orienta que as escolas façam uma previsão desses elementos no Projeto Político-Pedagógico, por outro, autores têm se preocupado com a forma como as adaptações têm sido inseridas nesse documento. De acordo com Moreira e Baumel (2001, p. 133). [...] devemos lembrar, de um lado, que o projeto pedagógico da escola não pode se traduzir simplesmente em princípios e normas de ações úteis e eficazes, denotando um caráter eminentemente prescritivo para definir a prática. E de outro, a forma como vem sendo incluído o “aluno especial” no ensino regular, com escolas que, em sua grande maioria, não atendem suas necessidades básicas e com professores que não receberam ao longo de sua formação, inicial ou continuada, subsídios concretos acerca desses alunos. Indagamos, então, em que condições serão realizadas as adaptações curriculares? No mesmo sentido, Glat, Pletsch e Fontes (2007), alertam que é necessário refletir sobre o próprio conceito de inclusão uma vez que para tornarem-se inclusivas as escolas precisam “avaliar e re-desenhar sua estrutura, organização, projeto político-pedagógico, recursos didáticos, práticas avaliativas, metodologias e estratégias de ensino” (p. 344). Opinião esta, também defendida por Heredero (2010) ao enfatizar que para propor um planejamento que dê atenção às crianças e jovens que possuem algum tipo de deficiência, a primeira atuação da escola deverá ser no sentido de descrever no Projeto Político Pedagógico, “[...] o desejo de fazer da atenção à diversidade uma forma de trabalho da escola que responda às suas necessidades educativas especiais” (2010, p. 194). Do mesmo modo, Oliveira e Leite (2007) acreditam que o Projeto Político-Pedagógico deve ser o foco das adaptações curriculares, uma vez que, a implementação de um sistema 50 inclusivo implica um “[...] trabalho unificado de toda equipe escolar, como também de suporte e assessoria de profissionais de outros setores municipais, como saúde, transporte, assistência social entre outros (p. 519). Tendo em vista as preocupações manifestadas por estes autores, a seguir descrevemos o aporte metodológico utilizado para em seguida discutir, como as escolas tem inserido tais discussões sobre adaptações curriculares nos seus Projetos Político-Pedagógicos. A PESQUISA A investigação objeto deste estudo realizou-se nos anos de 2011 e 2012 a partir de uma abordagem qualitativa da pesquisa em educação, tendo como foco dez escolas públicas estaduais da área urbana de Rolim de Moura que atendem os anos iniciais do ensino fundamental. Nela foram utilizados como fonte de dados análise documental e entrevista individual. Das dez escolas participantes, nove recebiam as crianças com deficiência nas salas de aula regular e uma somente por meio da sala de recurso, pois não possuía turmas dos anos iniciais do Ensino Fundamental, tendo sido incluída por atuar como serviço de apoio especializado. Uma delas atendia somente os anos iniciais do ensino fundamental, duas os anos iniciais e finais e as demais até o Ensino Médio. O número de alunos com necessidades educacionais especiais matriculados variava de 02 a 15. Havia entre os PPPs destas escolas uma diferença significativa no ano de sua elaboração, sendo os mais antigos de 2007 a 2009 e os mais recentes de 2010 e 2011. No que diz respeito à coordenadora de educação especial entrevistada, esta tinha idade de 36 anos e possuía graduação em educação física e pós-graduação (especialização) em educação inclusiva; atuava na educação há 12 anos, sendo que os três últimos foram dedicados a educação inclusiva na Secretaria de Educação de Rondônia com 40 horas de trabalho semanal. Com relação à coleta do material, os Projetos Político-Pedagógicos foram recolhidos entre os meses de outubro e novembro de 2011 e a entrevista foi realizada no início de 2012. Com os dados em mãos, realizamos uma leitura flutuante dos projetos onde, segundo Bardin apud Franco (2005, p.48), devem acontecer os primeiros “contatos com os documentos a serem analisados e conhecer os textos e mensagens neles contidas”. Em seguida, os dados foram confrontados e postos em relação com as informações da entrevista. A partir de então, formulamos questões indicadoras que serviram de índices para a elaboração 51 das categorias que foram analisadas “à luz das teorias explicativas” (FRANCO, 2005) utilizadas na fundamentação teórica. AS ÊNFASES E AS OMISSÕES NOS PROJETOS DAS ESCOLAS Visando garantir a organização dos dados, para a análise as escolas foram dispostas em ordem alfabética e caracterizadas utilizando-se as letras do alfabeto. Sendo assim, sempre que forem citadas serão utilizadas as respectivas letras A, B, C, D, E, F, G, H, I e J. Ao nos debruçarmos sobre a ocorrência de questões relativas às adaptações curriculares presentes nos Projetos, a primeira questão observada nos remete ao fato de que a discussão em torno da legislação que garante o acesso com qualidade das crianças com deficiência na escola fica restrita a simples menção de leis sem qualquer tipo de explicação ou detalhe do que se aborda em cada uma delas, tampouco suas implicações para a permanência das crianças na escola. Ao ser indagada sobre isso, a coordenadora de Educação Especial relata que as escolas tomam por base para a aplicação de adaptações curriculares ou outros assuntos referentes à educação especial as Resoluções nº 138/1999 e 552/2009, ambas do Conselho Estadual de Educação. Ao analisarmos os dois documentos, percebe-se que em vários pontos eles tomam rumos diferentes, tornando-se por vezes contraditórios em relação às recomendações apontadas por documentos nacionais. Um exemplo disso se dá em relação ao número de alunos a serem atendidos nas salas de aulas. Enquanto a resolução 552/2009 regulamenta no artigo 7º que “para o ingresso e o atendimento aos alunos com necessidades educacionais especiais, os mantenedores e/ou as instituições de ensino devem prever e prover: [...] organização de turmas com número reduzido de alunos, evitando-se a inserção de alunos com diferentes deficiências” (RONDONIA, 2009, p. 03), a Resolução 138/1999 regulamenta em seu artigo Art. 39 que para o atendimento aos educandos portadores de necessidades educativas especiais nas classes comuns das escolas regulares serão observados os seguintes critérios gerais, para as necessidades especificadas: § 1º Deficiência Mental: no máximo 04 alunos em turmas de 30 alunos; [...] § 2º Deficiência Visual: a) cegos - máximo de 02 alunos por turma de 25 alunos; b) visão subnormal - máximo de 04 alunos por turmas de 25 alunos. [...] § 3º Deficiência Auditiva: máximo 02 alunos por turma de 25 alunos; (RONDONIA, 1999, p. 16). 52 Cabe perguntar então, qual será o entendimento dos responsáveis pela Educação Especial sobre o que seria um “número reduzido de alunos”? É interessante mencionar que os números citados na resolução 138, são bem menores quando se trata de classes e escolas especiais o que pode ser entendido como um posicionamento político que visa “facilitar” a permanência de crianças em escolas especiais quando a lei alega preferência pela matrícula em salas regulares. Ainda que de forma implícita, o pensamento presente nestas resoluções corrobora as afirmações de Silva (2003, p. 90) para quem uma das conseqüências dessas prioridades “foi o reforço do atendimento em instituições especializadas e a subvenção quantitativamente maior de verbas públicas para esses trabalhos e atendimentos, tornando-se ‘políticas oficiais’” (grifo da autora). Em outras palavras, quais pais ou mães desejarão retirar seu filho de uma escola especial em que há um pequeno número de crianças sobre os cuidados de vários profissionais para colocá-los em uma escola pública regular que pelas condições estruturais e humanas não lhes dão garantia de sucesso para seus filhos? A esse respeito, no Projeto da Escola A, percebe-se um descontentamento dos atores em relação ao número de alunos ao mencionar que: [...] os alunos matriculados na escola portadores de NEE serão distribuídos de acordo com o número de salas disponíveis de forma que não sobrecarregue a nenhuma, sendo que nas salas que tenham alunos especiais matriculados o número de alunos deve ser menor que nas outras. [...] Em relação a Resolução nº 138/99 - CEE/RO, na verdade, a Inclusão está acontecendo, mas a equipe está preocupada com a forma metodológica aplicada, tendo em vista que o trabalho realizado não está de encontro suficiente com as necessidades que os alunos apresentam [...] podemos dizer que os suportes e recursos também não são adequados e nem suficientes para atender as necessidades apresentadas pelos alunos. [...] Assim sendo, acaba gerando insegurança e insatisfação da parte dos profissionais bem como da escola num todo. [...] na verdade a Inclusão está acontecendo, mas não dentro do desejado (Escola A, 2010, pp. 56-57). Tal descontentamento nos lembra as palavras de Arelaro (2003, p. 30) ao dizer que na formulação de leis e na elaboração do próprio Pcn não se “ouviram os professores das redes públicas, de qualquer região do país, sobre como trabalhavam, nem quais eram suas dificuldades e como pensavam enfrentá-las ou superá-las”. Para a autora, o fracasso na aplicação das propostas do Pcn sobre adaptações curriculares nas escolas pode ser explicado pelo fato de que: 53 Ao lado do discurso falsamente autônomo e descentralizador, de que as comunidades e os professores deveriam construir e propor seu projeto pedagógico inovador [...] são elaborados ‘Parâmetros Curriculares’, a partir de propostas ‘modernas’ de bem-sucedidas escolas privadas, da região sudeste, de clientela de alto poder aquisitivo (Idem, p. 29 - grifos da autora). Essa dissonância também é sentida pela coordenadora de Educação Especial ao afirmar que o alto número de alunos em sala era a principal dificuldade encontrada no momento de auxiliar as escolas. Nas suas palavras: “a dificuldade da inclusão é o número de alunos em sala, o professor questiona que é difícil trabalhar em uma sala com 30 alunos e um com NEE e não tem cuidador. É só o professor mesmo! Então é muito difícil, mas a escola não pode dizer não!” Da mesma forma como ocorre com a legislação, observamos que são mais recorrentes nos projetos as discussões em torno de adaptações de acesso ao currículo, ao passo em que aspectos relativos às adaptações pedagógicas propriamente ditas são abordados de modo superficial ou mesmo não mencionados. Em relação às adaptações de acesso ao currículo, as referências se restringem à especificação das condições físicas e suas possíveis readequações, como apresentado nos trechos a seguir. As dependências estão adaptadas para os alunos com necessidades educacionais especiais (rampas, sanitários adaptados, portas alargadas, sinalização) (Escola D, 2010, p. 10). Instalação de barras de apoio para os espaços necessários, placas de borrachas nas rampas existentes. [...] Alargamento das portas para atender os portadores de necessidades especiais (Escola J, 2009, p. 68). Todavia, embora as questões físicas apareçam com maior frequência, a necessidade de materiais e equipamentos é pouco abordada. Há ainda, pouca menção sobre as barreiras comunicacionais, não apresentando informações sobre como será estabelecida a comunicação entre os alunos com NEE e seus professores, os demais funcionários e alunos. Assim, o acesso ao currículo ocorre de modo limitado, pois não contempla as “condições de acesso à locomoção, comunicação, informação e conhecimento para todas as pessoas” (FERNANDES, ANTUNES E GLAT, 2007, p.54) de modo satisfatório. Para Fernandes, Antunes e Glat (2007, p.55) as barreiras de comunicação têm uma grande importância “[...], pois afetam não só o acesso à informação de modo geral, mas também prejudica diretamente a aprendizagem escolar”. Entre os projetos que mencionam adaptações na comunicação e nos materiais temos: 54 São distribuídas obras didáticas em Braille de língua portuguesa, matemática, ciência, historia geografia e dicionários. (Escola C, 2010, p. 44) Buscar junto às autoridades competentes e responsáveis a criação de um espaço inclusivo [...] materiais didáticos: livros de acordo com a necessidade ou deficiência - tecnológico: TV, vídeo, DVD, fitas, computador com programa apropriado para cada situação inclusiva e outras adaptações que julgar necessário. (Escola E, 2007, p. 35) Confecção de materiais concretos para manuseio dos alunos; (Escola J, 2009, p. 72). Percebe-se que não há maiores detalhes sobre a forma como acontecerá a operacionalização para que as ações se tornem realidade, como por exemplo, a importância de ouvir a família e outros profissionais para buscar a melhor alternativa de material e comunicação, tal como previsto nas diretrizes Nacionais da Educação Especial. Outro elemento problemático diz respeito à dificuldade financeira das escolas, que muitas vezes são as únicas responsáveis pelas adequações. Nesse sentido, a coordenadora relata que em relação às adaptações físicas, as mudanças foram sentidas mais por aquelas escolas contempladas com o Programa Acessibilidade do governo federal e com as salas de recursos que no município são apenas duas. As demais precisam utilizar recursos do Plano de Desenvolvimento da Escola (PDE) para a aquisição de equipamentos, livros e outros materiais adequados para o atendimento as crianças com deficiência. A dificuldade, segundo ela, está justamente no fato das escolas terem inúmeras questões consideradas prioritárias, de modo que, a educação especial, área ainda segregada tanto na educação quanto na sociedade, acaba ficando sempre para um segundo plano. Para Arelaro (2003, p. 33) Nesta lógica, entramos num “beco sem saída” para a cidadania da maioria (pobre) da população, pois se não contamos mais com nenhuma “folga” ou “disponibilidade” orçamentária, e ainda faltam tantos “milhões” sem atendimento educacional, a única alternativa do Governo é o rebaixamento do padrão de qualidade de ensino, para que ele “caiba” na disponibilidade financeira atual (grifos da autora). Neste sentido, questionamos o próprio modo como as escolas têm se utilizado dos seus PPP’s, uma vez que estes não apontam para ações concretas a serem realizadas a curto, médio e longo prazo. Essa ausência se agrava ainda mais em relação às adaptações pedagógicas que, segundo Oliveira e Machado (2007, p. 45), dizem respeito as: [...] modificações no número máximo de alunos que uma sala de aula pode comportar, a definição da sistemática de trabalho cooperativo entre os professores do ensino Regular e do Ensino Especial, bem como em ajustes no tempo de permanência de um aluno em uma determinada série. [...] 55 modificações realizadas no planejamento, nos objetivos da escola, nas estratégias de aplicação desse conteúdo e de avaliação, no currículo como um todo ou em aspectos dele. Em relação aos aspectos mencionados pelas autoras, a maioria dos projetos expressa preocupação em garantir o respeito à diversidade, porém de modo genérico como é possível perceber nos projetos das escolas E e D ao mencionarem que “[...] para a ação pedagógica os professores deverão adaptar os currículos, os conteúdos e as avaliações” (Escola E, 2007 p. 35) e “Adaptar o currículo às necessidades dos alunos é fundamental para a criação de melhores oportunidades educativas, dando espaço à otimização das ações educacionais. (Escola D, 2010, p. 05). Ainda de acordo com a escola D, a adequação curricular aplica-se “[...] tanto a condições gerais da escola, como da sala de aula, das metodologias e das atividades de ensino, desdobrando-se a nível individual se necessário”. (Escola D, 2010, p. 05). Entretanto, esta preocupação não se materializa em discussões mais específicas sobre objetivos, conteúdos, avaliação, temporalidade, entre outros, necessários para que a escola possa garantir as adequações citadas. Em relação à avaliação, por exemplo, os Projetos das Escolas D, B e J, se limitam a mencionar que: A avaliação deverá referir-se aos objetivos propostos nos planos de ensino, de modo a subsidiar o professor a avaliar as condições em que os mesmos foram atingidos para, a partir desses dados, redirecionar os seus planos e refletir sobre sua prática educativa. A Avaliação da aprendizagem é contínua, cumulativa, processual e coletiva. Tem por objetivo a verificação do aproveitamento e desenvolvimento do educando, aferindo mudanças de comportamento do (a) aluno (a), bem como a apuração do rendimento escolar para fins de promoção. [...] A verificação do rendimento escolar compreende a avaliação do aproveitamento e a apuração da assiduidade. Os critérios a serem avaliados são: I testes escritos ou teóricos; II pesquisas; III trabalhos escritos; IV participação nas atividades; V comportamento (Escola D, 2010, p. 47). A escola segue as orientações da portaria nº 398/GAB/SEDUC que trata do sistema de avaliação para as escolas. No regimento escolar também contém as orientações necessárias às adaptações que regem o sistema de avaliação de nossa escola. Ocorre de forma sistemática, contínua, cumulativa, processual e coletiva, baseadas em objetivos claramente definidos realizando-se em função do aluno, respeitando os aspectos sócio-emocional, psicomotor e cognitivo. (Escola B, 2007, p. 46 - grifo nosso). Pretendemos oferecer uma educação que possibilite aos nossos alunos a construção do conhecimento a partir do seu contexto social, considerando os seus aspectos cognitivos, emocional e social, não dissocie o saber do fazer e a teoria da prática e a avaliação seja formativa, somativa e especializada (esta última em caso de alunos “especiais”). (Escola J, 2009, p. 58 - grifo nosso). 56 Ou seja, não há nenhuma referência sobre adaptações a serem realizadas nos procedimentos avaliativos para alunos com deficiência, muito menos quando, como e com quais materiais isso irá acontecer. Tampouco se leva em consideração as orientações do PCN segundo o qual é necessário adequar os critérios de avaliação mediante eliminação ou introdução de novos critérios, mudanças na temporalidade das disciplinas e dos objetivos, entre outros (BRASIL, 1998). Quanto a isso, salientamos que o PCN é bastante específico ao tratar sobre “avaliação e promoção” (BRASIL, 1998, p. 57) trazendo aspectos a serem focalizados em relação ao aluno, ao contexto educacional e familiar, bem como aos aspectos a serem “considerados para orientar a promoção ou a retenção do aluno na série, etapa, ciclo (ou outros níveis)” (p. 58), aspectos estes pouco elucidados nestes projetos, principalmente em relação à temporalidade que, segundo orientações do MEC, precisa estar presente em todos os projetos. De acordo com Pletsch (2009), a ausência de definições sobre temporalidade e as relações entre o que pode ser aprendido por estas crianças ao longo de sua escolarização faz com que as escolas adotem posturas nas quais estes alunos sejam promovidos de uma série para outra, sem que haja uma preocupação com a efetivação da aprendizagem. Todavia, percebe-se que se por um lado, há “falhas” nos documentos no que diz respeito à delimitação dos procedimentos avaliativos, por outro isso não significa que não haja uma preocupação por parte dos docentes. Tal afirmação se justifica pelo fato de que ao questionarmos a Coordenadora de Educação Especial durante a entrevista sobre quais eram as principais solicitações por parte das escolas e professores esta relata que: “a principal solicitação é como avaliar esses alunos; querem um modelo de avaliação pronto mais fica difícil, pois cada um necessita de um tipo de avaliação então não se pode formular um tipo de avaliação cabível a todos os alunos com NEE, isso é impossível. Outra é como trabalhar com esses alunos, uma questão voltada mais a área pedagógica” (Coordenadora de Educação Especial). A pergunta que se faz é, como auxiliar as escolas nestas solicitações, quando a coordenação de Educação Especial conta com apenas uma pessoa para atender vários municípios? Além disso, como atender as diferentes demandas das escolas quando se tem um grande número de atribuições? Vale ressaltar que, ao falar sobre o trabalho que desenvolve, a coordenadora de Educação Especial destaca que: às famílias dos alunos. (Coordenadora de Educação Especial Sou responsável pela formação de professores das salas de aula inclusivas, de dar 57 apoio para eles quando pedem. Eu também coordeno o trabalho das professoras das salas de recursos que são nove no nosso regional e aqui em Rolim são duas; organizo avaliações para alunos com NEE dessas salas; Trabalho com os professores as políticas públicas voltadas para a discussão que contemple a educação inclusiva; participo de algumas reuniões nas escolas quando elas me pedem para falar de Educação Especial. Eu também faço atendimento). Assim, ao analisarmos os apontamentos trazidos pela coordenadora, a primeira impressão que fica é a de que a ausência de discussões sobre adaptações curriculares nos PPPs das dez escolas nada mais é do que um reflexo das ações desencadeadas por seus dirigentes, neste caso a SEDUC, em relação ao tema. Esta situação nos faz acreditar que ao se deparar com alunos com NEE em sala regular, os professores terão dificuldades para responderem aos seguintes questionamentos: adaptar como? Realizar avaliação de que forma? Com que critérios? Será realmente difícil para ele definir todas estas questões, tendo como norteador das práticas educativas, um documento que trate destes aspectos de forma tão fragilizada. CONSIDERAÇÕES Baseando-se no que é apresentado nos projetos das escolas, acreditamos que para estas escolas a inclusão de crianças com necessidades educacionais especiais nesta realidade enfrenta muitas dificuldades no que diz respeito a sua operacionalização uma vez que seus profissionais não dispõem de um documento que lhes possibilitem pensar em um conjunto de ações administrativas, estruturais e pedagógicas para atender estes alunos na forma como destacado nas inúmeras leis, orientações e dispositivos que regem a educação especial em nosso país. Percebemos ainda, que se por um lado o Ministério da Educação lança mão de diferentes documentos para subsidiar as escolas na tarefa de promover adaptações, por outro isso não basta uma vez que ao tentarem colocar em prática essas orientações as escolas esbarram em diversas barreiras impostas pelo próprio sistema como a ausência de uma política de formação profissional, ausência de recursos financeiros, etc. Isso evidencia que as instituições escolares não devem ser simplesmente culpabilizadas pelo fato de não possuírem em seus projetos proposições mais claras e abrangentes em relação à educação especial e as adaptações curriculares. 58 REFERÊNCIAS ARELARO, L. R. G. Direitos sociais e política educacional: alguns ainda são mais iguais que outros. In: SILVA, S; VIZIM, M. Políticas públicas: educação, tecnologias e pessoas com deficiência. (orgs.) Campinas, SP: Mercado de Letras: Associação de Leitura do Brasil (ALB), 2003. pp. 13-36. BRASIL. Decreto nº 7611, de 17 de novembro de 2011. Dispõe sobre a educação especial, o atendimento educacional especializado e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Decreto/D7611.htm. Acesso em 12 de janeiro de 2012. ______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. - 5. ed. - Brasília: Câmara dos Deputados, Coordenação Edições Câmara, 2010. ______. Parâmetros Curriculares Nacionais. Adaptações Curriculares. Brasília: Ministério da Educação, 1998. ______. Ministério da Educação. Resolução n.2, de 11 de setembro de 2001. Institui Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 11 set. 2001. Seção 1, p.3941. FERNANDES, E. M; ANTUNES, K. C. V; GLAT, R. Acessibilidade ao currículo: prérequisito para o processo ensino-aprendizagem de alunos com necessidades educacionais especiais no ensino regular. In: GLAT, R. (org.). Educação Inclusiva: Cultura e Cotidiano Escolar. Rio de Janeiro: 7 LETRAS, 2007. FRANCO, M. L. P. B. Análise de conteúdo. 2º ed. Brasília: Líder Livro, 2005. FRANCO, M. Os PCN e as adaptações curriculares para alunos com necessidades educacionais especiais: um debate. 23ª Reunião anual da ANPEd - GT de Educação Especial - Caxambú - SET/2000 GLAT, R; PLETSCH, M. D; FONTES, R. de S. Educação inclusiva & educação especial: propostas que se complementam no contexto da escola aberta à diversidade. Educação. Santa Maria, v. 32, n. 2, p. 343-356, 2007. HEREDERO, E. S. A escola inclusiva e estratégias para fazer frente a ela: as adaptações curriculares. Acta Scientiarum Education. Maringá, v. 32, n. 2, 2010. p. 193-208. MOREIRA, L. C; BAUMEL, R C. R. de C. Currículo em educação especial: tendências e debates. Educar, Curitiba, n. 17, p. 125-137. 2001. Editora da UFPR. OLIVEIRA, E. de; MACHADO, K. da S. Adaptações curriculares: caminho para uma Educação Inclusiva. In: GLAT, R. (org.). Educação Inclusiva: Cultura e Cotidiano Escolar. Rio de Janeiro: 7 LETRAS, 2007. 59 OLIVEIRA, A. A. S. de; LEITE, L. P. Construção de um sistema educacional inclusivo: um desafio político-pedagógico. Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v. 15, n. 57, p. 511-524, out./dez. 2007. PLETSCH, M. D. Repensando a inclusão escolar de pessoas com deficiência mental: diretrizes políticas, currículo e práticas pedagógicas. Tese (Doutorado) - Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Faculdade de Educação, 2009. REALI, A; NÓBREGA, H. Adaptações curriculares: reflexões sobre a prática que vimos construindo. Disponível em: <http/www.escoladavila.com.br>. Acesso em: 19/12/2011. RONDÔNIA. Resolução n°138/1999 - CEE/RO - Regulamenta dispositivos da Lei 9.394/96, que fixa diretrizes e bases para a educação nacional, a serem observados pelos sistemas de ensino no Estado de Rondônia. Conselho Estadual de Educação, 1999. _____Resolução n°552/2009 - CEE/RO - institui as Diretrizes e Normas Para a Educação Especial. Conselho Estadual de Educação, 2009. SILVA, S. A política educacional brasileira e as pessoas com deficiências. Como difundir o discurso de uma política pública de direitos e praticar a privatização. In: ______; VIZIM, M. Políticas públicas: educação, tecnologias e pessoas com deficiência. (orgs.) Campinas, SP: Mercado de Letras: Associação de Leitura do Brasil (ALB), 2003. pp. 73-100. UNESCO. Declaração de Salamanca: sobre princípios, política e prática na área das necessidades educativas especiais. Procedimentos-Padrões das Nações Unidas para Equalização de Oportunidades para Pessoas Portadoras de Deficiências, A/RES/48/96, Resolução das Nações Unidas adotada em Assembléia Geral. 60 RESUMO EXPANDIDO DO RELATÓRIO PIBIC 2012 UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA - UNIR PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA - PIBIC PROJETO-MÃE: Alfabetização de Ribeirinhos na Amazônia PROJETO DA ORIENTADORA: Linguagem de Ribeirinhos na Amazônia: Atitudes e comportamentos sociais SUB-PROJETO DO ALUNO: Leitura na Sala de Aula: “Prazer momentâneo e lucro duradouro!” PESQUISADORA: Antonia Pereira da Silva Lima ORIENTADORA: Profª Drª Iracema Gabler RESUMO Esta pesquisa pretendeu estudar os efeitos das atividades de leitura em sala de aula e foi desenvolvida com alunos do 5º ano do ensino fundamental da Escola Estadual Franklin Roosevelt, comunidade ribeirinha localizada à margem direita do Rio Madeira, no Bairro Triângulo, Porto Velho/RO. O objetivo maior foi contribuir com o processo de ensinoaprendizagem, e assim, proporcionar aos alunos momentos de reflexão, contato e valorização à leitura e à linguagem oral e escrita. Para tanto, foram realizadas atividades como: leitura compartilhada, debate, dramatização, contação, recontação, ilustração, escrita e reescrita de histórias e outras, pontuando e destacando a importância da literatura infanto-juvenil (contos de fada). Tomou-se como referência teórica BALDI, E. 2009; BAMBERGER, R. 2000; SOUZA, L.V. 1992 entre outros. Durante a pesquisa foram desenvolvidas atividades que possibilitaram aos integrantes da pesquisa conhecer os materiais linguísticos impressos circulantes na escola; identificar as preferências de leituras dos alunos, os meios encontrados e as barreiras ao acesso à leitura; investigar as práticas sociais e pedagógicas das professoras diante das barreiras de acesso aos livros de literatura infanto-juvenil. Estas observações e ações contribuíram no processo de ensino-aprendizagem da comunidade escolar e redirecionaram as práticas acadêmicas, despertando nos pesquisadores e em outros estudantes do Curso de Letras da UNIR a vocação científica. Palavras-chave: Leitura. Literatura Infanto-Juvenil. Aquisição da Escrita. Alfabetização. 1 INTRODUÇÃO 61 Vivemos em uma sociedade multicultural. Linguagens e vivências se entrecruzam em todos os aspectos. Este percurso, rico em interação, experiências e aprendizado também gera desconfortos como, por exemplo, os preconceitos, rivalidades e desfavorecimentos e como almejamos uma melhor convivência entre os povos, entendemos ser de suma importância vivenciar e experienciar o cotidiano e a realidade linguística de uma comunidade ribeirinha periférica da região norte. Optamos, nesta pesquisa, por enfocar os vários usos da linguagem através da leitura por entendermos que ler o mundo e as palavras é determinante para a aprendizagem do ser humano, enriquece o vocabulário, amplia conhecimentos variados, potencializa o raciocínio e a capacidade de interpretação, além de propiciar espaços e prazeres momentâneos e/ou duradouros. O sub-projeto “Linguagem de ribeirinhos na Amazônia: atitudes e comportamentos sociais” pretende refletir, entender e conhecer a linguagem efetivamente usada pela comunidade do bairro Triângulo, zona periférica ribeirinha, localizada à margem direita do Rio Madeira, na cidade de Porto Velho-RO. Para tanto, estabelecemos o nosso Plano de Trabalho com o sub-projeto “Leitura na sala de aula: prazer momentâneo e lucro duradouro”, com o objetivo de verificar a inclusão da leitura e seus efeitos na escola Estadual Franklin Roosevelt, observando, registrando e analisando o comportamento dos alunos de dois quintos anos (2011 e 2012). Uma escola que ofereça condições de leituras prazerosas é o espaço onde o aluno aprende a gostar de ler, a se interessar pela leitura e pelo livro, ou por qualquer atividade que permita uma interpretação, uma conexão com o imaginário, uma história. Partindo da reflexão sobre o papel que a leitura exerce sobre o leitor, fica fácil afirmar que a leitura torna-se o mais importante elemento do imaginário. Portanto a ato de ler significa refletir, sonhar, pensar, emitir opiniões a favor ou contra, mudar de opiniões, posicionar-se, enfim, exercer desde cedo à cidadania. O objetivo geral da pesquisa foi contribuir com o processo de ensino-aprendizagem, e assim, proporcionar aos alunos a reflexão e a valorização da leitura como suporte para a aquisição da linguagem escrita e oral. Para isso, realizamos atividades de leitura compartilhada, debate, contação, recontação, ilustração, dramatização, entre outras, sempre pontuando a importância da literatura infanto-juvenil. 2 MÉTODO E MATERIAL 62 A pesquisa pode ser definida como bibliográfico-descritiva, e, considerando os procedimentos teórico-metodológicos, como uma pesquisa-ação. A população pesquisada foi os alunos da turma de 5º ano/2011 e 5º ano/2012 do ensino fundamental da Escola Estadual Franklin Roosevelt. O corpus foi composto de informações não registradas de conversas informais com alunos, professores, pais e pesquisadores, textos orais produzidos a partir das propostas de atividades de leitura em sala de aula e textos escritos produzidos pelos alunos das referidas turma. O material lúdico/pedagógico, assim como todo material de leitura, foi disponibilizado pela bibliotecária voluntária Glória Valadares Grangeiro e pelos bolsista/pesquisadores. Elegemos os contos de fada como gênero literário principal em nossas atividades por entendermos que ele carrega a magia do extraordinário, ele metamorfoseia os fatos, ele vem com o encantamento que seduz o leitor. As principais atividades de leitura, realizadas duas vezes por semana, em horários estabelecidos em um cronograma elaborado em conjunto com a professora das turmas, foram as seguintes: a)pesquisa bibliográfica - despertar nos “futuros leitores” o prazer da curiosidade e descoberta de suas inquietações; b)debate - gerar uma resposta coletiva e consensual, satisfatória para todos; c)rodas de leitura - gerar momentos prazerosos; d)adivinhações - sociabilizar os mais tímidos ou menos interessados. No final de cada semestre, todos os alunos organizaram individualmente um livro com suas produções, feito manualmente, escrito e ilustrado por eles próprios. Ao final, houve apresentação coletiva dos trabalhos. 3 DA BASE TEÓRICA E CONCEITUAL Para embasar a questão das formas de ler e da variedade de atividades de leitura nos embasamos em BALDI, 2009; BAMBERGER, 2000; SOUZA, 1992 entre outros. Ler é uma das aptidões mais importantes a serem desenvolvidas com o aluno, principalmente após recentes pesquisas que registram ser esta uma das mais consideráveis deficiências do aluno brasileiro. O meio escolhido para observar esta deficiência foi o ambiente escolar que nos permitiu sentir as influências diretas da leitura em um espaço social. Não basta identificar as palavras, faz-se necessário dar-lhes sentido, entender, interpretar, 63 estabelecer relação entre elas, além de conservar na memória o que for mais relevante. Na escolha de determinado livro, revista ou jornal, sempre existe um propósito para justificar a escolha. Para abordagem da leitura na sala de aula usamos o olhar de BALDI (2009, p.8) concordando com ela quando afirma que “É preciso alimentar a imaginação de nossos alunos, compartilhar leituras com eles e oferecer-lhes experiências de fruição para que descubram os encantos da literatura como uma forma de arte que possibilita conhecerem melhor a si mesmos, ao mundo e aos que os cercam, para que se tornem mais sensíveis, mais críticas, mais criativas.” O processo de construção e reconstrução dos saberes formais ocorre em espaços como a escola e a sala de aula. Neste contexto, o professor tem a responsabilidade de selecionar criteriosamente as obras que utilizará para desenvolver as atividades pedagógicas. A leitura é considerada, por BAMBERGER (2000 p.10), como: “[...] A leitura é um dos meios mais eficazes de desenvolvimento sistemático da linguagem e da personalidade”. Falar da importância da leitura na educação é atribuir-lhe o valor de instrumento de ação reflexiva, que proporciona melhoria da condição social e humana. A escola tem o papel fundamental no processo de aquisição do hábito da leitura e formação do leitor, apesar de suas limitações, a escola é o espaço reservado ao aprendizado da leitura. Cabe ao professor ser estimulador de leituras, não podendo ficar omisso diante dos acontecimentos internos e externos à vida do aluno. As leituras, guiadas pelo professor, podem ter diferentes objetivos, produzir efeitos diferentes e alterar a ação e visão do leitor diante do texto. Na abordagem do tema leitura, podemos partir do ponto que a leitura é uma prática sociocultural. Para melhor definição, SOUZA (1992) afirma: “Leitura é, basicamente, o ato de perceber e atribuir significados através de uma conjunção de fatores pessoais com o momento e o lugar, com as circunstâncias. Ler é interpretar uma percepção sob as influências de um determinado contexto. Esse processo leva o indivíduo a uma compreensão particular da realidade”, ou seja, é necessário que haja essa relação e essa percepção entre o leitor e o texto. Entende-se que a leitura é um dos caminhos de integração do ser humano no mundo e lhe permite satisfação e prazer. Atividades de leitura coletiva (alunos lendo para alunos, alunos lendo para professores e pesquisadores, pesquisadores lendo para alunos, professores lendo para alunos) são práticas educativas e prazerosas que promovem a formação continuada dos leitores envolvidos e propiciam reflexões sobre a condição dos sujeitos leitores. 4 RESULTADOS 64 No decorrer do desenvolvimento do projeto, notou-se que houve mudanças significativas no comportamento e na conscientização dos alunos e da professora, pois a leitura passou a ser tratada como uma atividade agradável e integrada ao dia-a-dia, reforçando, assim, seu papel no processo de ensino-aprendizagem, buscando sempre o incentivo à construção do hábito de ler, ao prazer da leitura e à realização de pesquisas. Observamos que a leitura compartilhada é uma das atividades que mais auxilia os alunos a entenderem a história, pois lhes dá oportunidade de expor sua compreensão ou suas dúvidas ao mesmo tempo em que ouvem e refletem sobre os questionamentos dos colegas; a dramatização mostrou-se uma atividade envolvente, prazerosa e afetiva, pois os alunos tem nela a oportunidade de se sentirem parte integrante dela, agindo como personagens e relacionando os enredos às suas próprias experiências. Histórias contadas na hora da leitura tiveram repercussão satisfatória na sala de aula, foram momentos de interação e compartilhamento de identidades, vivências e conhecimento de mundo. Para iniciar as atividades de contação de histórias para as turmas, foi necessário, primeiramente, fazermos uma exposição teórica sobre gêneros textuais e uma reflexão conjunta sobre o que são os contos de fada, a que gênero literário/textual pertencem, qual sua estrutura e o que os difere de outros gêneros. Tivemos a oportunidade de comparar duas produções (escrita e reescrita) de um mesmo aluno. Na escrita o aluno não havia sido orientado a escrever observando a estrutura do gênero narrativo (conto de fadas). Na reescrita, o aluno já havia recebido estas informações, já havíamos contado novos contos, eles já haviam dramatizado, ilustrado, recontado oralmente. O texto reescrito traz exitosamente a estrutura da narrativa, atendendo satisfatoriamente os objetivos da aula. São as atividades de leitura interferindo positivamente nas ações do cotidiano pedagógico. Para ilustrar, trouxemos uma análise breve, clara e objetiva desta reescrita. Categorizamos os aspectos textuais e discursivos presentes no texto reescrito e ilustramos com fragmentos do referido texto narrativo reescrito pelo aluno: 1)Elementos estruturais da narrativa: a)Fato - o que se vai narrar (O quê?) O drama do “menino pobre que vendia frutas em um sinal de trânsito”. b)Tempo - quando o fato ocorreu (Quando?) “Era uma vez um alinda cidade distante...” 65 c)Lugar - onde o fato se deu (Onde?) “em um sinal de trânsito”, “O anjo levou Joãozinho para morar em um lindo abrigo...” d)Personagens - quem participou ou observou o ocorrido (Com quem?) “Um menino pobre que vendia frutas em um sinal de trânsito”, “o homem que estava dirigindo o carro”, “um velho feio muito estranho...”, “uma nave cheia de luz bem colorida”, “um belo anjo azul brilhante”. e)Causa - motivo que determinou a ocorrência (Por quê?) “...o menino se aproximou de um carro e perguntou se o homem queria comprar frutas.” f)Modo - como se deu o fato (Como?) “...o menino se aproximou de um carro e perguntou se o homem que estava dirigindo o carro queria comprar frutas, o motorista olhou para o menino se recusando a comprar.” g)Consequências (Geralmente provoca determinado desfecho) -Tumulto: “Os carros buzinavam, as pessoas começavam a chamar o menino de ladrão, mendigo...” -Surgimento do novo personagem: “um velho feio muito estranho...” que propõe: “... você so precisa rouba as bouças que estão nos carros...” -Magia: “Então aconteceu veio uma nave cheia de luz bem colorida e saiu uma voz la de dentro...”, “... sou seu anjo protetor vou tirar você desse lugar...” -desfecho: “Ele viveram felizes para sempre!” 2) A magia dos contos de fada: -“Então aconteceu veio uma nave cheia de luz bem colorida e saiu uma voz la de dentro. Joãozinho ficou paralizado...”, “...é quando sai de dentro da luz um belo anjo azul brilhante..”, “... sou seu anjo protetor vou tirar você desse lugar...” 3) Os recursos linguísticos comumente encontrados nos contos de fada: - “Era uma vez uma linda cidade...”, - “... quando o sinal fechou...”, - “foi quando apareceu um carro...”, -“ ...meu bom menino qual é seu nome?”, - “Ele foram felizes para sempre!”; 4) Discurso direto/indireto livre característico das narrativas: - Meu bom menino qual é seu nome? - Meu nome é Joãozinho. - O que você faz nessa esquina? - Eu vendo bombom aqui. 66 Além desses aspectos, não podíamos deixar de mencionar a intimidade e a identidade do autor com o texto por ele produzido, principalmente, na reprodução. Se esta história não é a do autor, ele a conhece muito bem. Ela faz parte do seu cotidiano, da sua cultura, do seu mundo. Um indício dessa afirmação é o lapso de memória que ele comete quanto ao produto que o Joãozinho vende no sinal: frutas (início do texto) e bombom (final do texto). É muito comum encontrarmos adultos e crianças vendendo frutas ou bombons nas esquinas/sinais das ruas de Porto Velho. É o cotidiano se fazendo presente nas produções através da experiência e contato com os contos de fada! 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS O envolvimento institucional PIBIC/UNIR no desenvolvimento desta pesquisa/extensão na escola “Franklin Roosevelt possibilitou observação, reflexão, percepção e interação entre pesquisadores, alunos e professores. Vivenciamos o dia-dia em sala de aula e como são planejadas, organizadas e executadas as atividades pedagógicas. Esta experiência foi de suma importância para todos os envolvidos, principalmente para nós, pesquisadores. Na formação acadêmica, projetos como este, mostram que é possível a aplicação da teoria adquirida nas aulas aliadas às atividades práticas e esta dupla função faz do acadêmico, futuro professor, um ser humano, um cidadão mais completo, mais pronto a encarar a profissão que está abraçando. Em sala de aula, cabe ao profissional de educação exercer real influência sobre a qualidade dos saberes, alimentar a imaginação e despertar nos alunos a importância da leitura para tornarem-se mais criativos e mais críticos. Nossa presença impôs, de certa forma, mudanças no perfil das atividades, no programa, no plano de aula que já tem um formato pronto e semi-acabado e as propostas de variadas atividades de leitura, de produção oral e escrita e reescrita, de dramatização, de ilustração de histórias, entre outras, não estavam nos planos. Com o decorrer do tempo, a frequência com que nos fazíamos presentes na sala de aula, as muitas conversas informais, as muitas histórias contadas e as diversas atividades apresentadas e desenvolvidas ganhamos a confiança da turma e da professora e percebemos maior interesse, maior envolvimento e até empolgação de muitos, em participar com alegria e prazer das atividades que propúnhamos. Tornaram-se participantes ativos, críticos e dotados de falas consistentes, de palpites pertinentes, de narração de algumas histórias ouvidas e/ou vividas. 67 Exploramos materiais que primaram pelo desenvolvimento da oralidade, das ideias, da linguagem, dos valores, dos sentimentos, bem como a formação crítica dos nossos leitores através do lúdico e do prazer. A maioria dos alunos já expõem (ainda que com algumas dificuldades) suas ideais por escrito, estão desenvolvendo a arte de interpretar criativamente, de relacionar suas experiências pessoais àquelas presentes nos contos lidos. Os próprios alunos tiveram oportunidade de avaliar e expor suas opiniões sobre o desenvolvimento do projeto e o que ouvimos foi que aprenderam a ler por prazer, a expor suas ideias, além de ler o que gostam e da maneira como gostam. Uma das provas dessa mudança de comportamento é que muitos passaram a frequentar e participar do Projeto “Leitura no Sítio” pelo desejo de conhecer novos livros, novas experiências, novos horizontes, novos mundos... a biblioteca da escola já ficou pequena, o prazer é (ou não) instantâneo, mas o lucro já se mostra duradouro! REFERÊNCIAS BALDI, Elizabeth - Leituras nas séries iniciais: uma proposta para formação de leitores de literatura. Porto Alegre: Ed. Projeto, 2009. BAMBERGER, Richard. Como Incentivar o Hábito da Leitura. São Paulo: Ática, 2000. SOUZA, L. V. As proezas das crianças em textos de opinião. Campinas, SP: Mercado de Letras, 1992. 68 EXPERIÊNCIAS COMPARTILHADAS NO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO DE ALUNOS COM SÍNDROME DE DOWN (SD) NAS ESCOLAS REGULARES NO MUNICÍPIO DE JI-PARANÁ/RO Camila Camargo Senhorinho Santos10 Anamaria Silveira11 RESUMO O presente texto resulta da pesquisa “Experiências compartilhadas na alfabetização de alunos com Síndrome de Down (SD)” em seis escolas regulares inclusivas onde nove professoras lecionam. Objetivou-se comprovar as mudanças, especificamente à alfabetização de alunos sindrômicos no que tange ao currículo e à proposta pedagógica das escolas em questão. Para isso, utilizou-se como metodologia a Pesquisa Qualitativa, entrevistas com o uso de gravadores e a aplicação de um questionário aberto semi-estruturado. Palavras-chave: Alfabetização. Síndrome de Down. Professor INTRODUÇÃO Quando um aluno com Síndrome de Down (SD) é matriculado em uma escola comum regular (conhecida hoje como escola inclusiva), seus pais ou responsáveis desejam que esse aluno não seja apenas alfabetizado, mas esperam que esse aluno seja acolhido com carinho pelos seus colegas de classe e professores, que possa interagir com a turma. Sabemos que a educação se sustenta com uma legislação forte que protege todo o seu alunado, inclusive os deficientes. Atualmente a Educação Especial é um direito garantido pela Constituição de 1988, reforçado pela Declaração Mundial sobre Educação para Todos (1990); Declaração de Salamanca (1994); Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996) e a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2007). Não basta apenas aceitar o aluno deficiente, é preciso incluí-lo nas atividades diárias da escola, há que se fazer adaptações para recepciona-lo, não apenas arquitetônicas, como rampas de acesso, bebedouros adaptados, sinalização de LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais) para alunos surdos, etc., é necessário mudar o currículo escolar, a proposta pedagógica da escola e principalmente o pensamento anacrônico de que o aluno deficiênte é considerado incapaz. REFERENCIAL TEÓRICO 10 11 Bolsista PIBIC/CNPq. Acadêmica do 6º Período de Pedagogia – UNIR – Campus de Ji-Paraná Profª Drª do Departamento de Ciências Humanas e Sociais – DCHS – Campus de Ji-Paraná 69 A formação do professor que vai atuar na educação básica regular precisa passar por uma reestruturação em seu currículo profissional, pois para alfabetizar alunos deficientes o desafio é grande, exige o comprometimento da família do aluno e da equipe pedagógica escolar, implicando assim mudanças de posturas, quebrando os protótipos e levando o educador a transformar sua prática educativa. A escola inclusiva é aquela que foca no desenvolvimento, interação, aprendizagem e conhecimento do aluno deficiênte, não é aquela escola que vê apenas a deficiência. Após a revisão da legislação atual, e a leitura de autores como: Leite (1985); Faria (1993); Costa (1997); Stainback (1999); Schwartzman (2003); Saad (2003); Alves (2007); Soares (2007); Voivodic (2008); Martins (2008); Tada (2009); Silveira (2010); Figueiredo (2010); Mendes (2010); Bibas (2012) e Milanesi (2012) perceberam-se as discussões e preocupações com a alfabetização de alunos deficientes e especificamente aqueles com Síndromes de Down. Conforme a leitura destes autores, compreendemos que a inclusão escolar (em escolas regulares), é um grande desafio, havendo também a necessidade da alfabetização deste educando. As escolas regulares estão hoje, mais receptivas para trabalhar com esses alunos, o que faz diferença na vida não apenas dos alunos deficientes que se sentem aceitos por todos, mas é importante para as outras crianças em sala de aula como aquelas que não possuem deficiência, pois serão adultos mais sensíveis e respeitarão o ser humano com todas a suas diferenças. Através dos estudos de Jannuzzi (2004); Mendes (2006); Milanesi (2012) e outros pesquisadores, percebemos que a Educação Especial no Brasil é foco de preocupações desde 1700, antes do Império, cuja as primeiras experiências com as pessoas deficientes surgiram nos asilos (onde eram consideradas ‘doentes mentais’) e das rodas dos expostos, já em 1717 com a criação da Santa Casa de Misericórdia em São Paulo, as crianças permaneciam até aos sete anos e logo depois iam para os Seminários e estudavam até a idade que pudessem sair para trabalhar (Jannuzzi, 2004). Esta mesma autora alerta “É importante notar o intuito dessas medidas administrativas pela Santa Casa em garantir o trabalho futuro, atitudes nem sempre comum na época” (p. 9). Ao longo destes anos, muito se tem feito para incluir as pessoas deficientes em nossa sociedade e nas escolas, conforme as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica (2001), em seu artigo 2º é determinado: 70 Os sistemas de ensino devem matricular todos os alunos, cabendo às escolas organizarem-se para o atendimento aos educandos com necessidades educacionais especiais, assegurando as condições necessárias de qualidade para todos (MEC/SEESP12, 2001). Porém o trabalho com a criança deficiênte deve começar antes da escola regular, a Resolução CNE/CEB nº 02 de 2011 estabelece as Diretrizes Nacionais para Educação Especial na Educação Básica, seu parágrafo único, art. 1º, menciona o atendimento dos alunos deficientes da seguinte forma: O atendimento escolar desses alunos terá início na educação infantil, nas creches e pré-escolas, assegurando-lhes os serviços de educação especial sempre que se evidencie, mediante avaliação e interação com a família e a comunidade, a necessidade de atendimento educacional especializado (MEC/SEEP, 2001). Tal parágrafo avigora o que autores como Schwartzman (2003) e Mendes (2010), alegam que o estímulo da criança deficiênte deve começar logo nos primeiros dias de vida, através da família e depois partir para as escolas começando nas creches e/ou pré-escolas. No ensino fundamental o atendimento não pode parar, ele tem que ser ministrado por um professor específico no Atendimento Educacional Especializado (AEE) das Salas de Recurso Multifuncional (SRM). O Decreto 7.612 de 2011 em seu Art. 2º considera as pessoas com deficiências “[...] aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras [...]” e o Decreto 7.611 de 2011 complementa “[...] considera-se público-alvo da educação especial as pessoas com deficiência, com transtorno globais do desenvolvimento e com altas habilidades/superdotação”. Assim, ficou claro que a Educação Especial através das escolas inclusivas regulares é de grande relevância não apenas para a família da criança deficiênte, mas seus futuros colegas de classe, para o corpo pedagógico, a sociedade e principalmente os alunos deficientes, sendo este um grande beneficiado da inclusão, pois será aceito e incluído. 12 Em 16 de Maio de 2011, com o Decreto nº 7.480, extinguiu a Secretaria de Educação Especial (SEESP), passando assim suas atribuições à Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI) 71 METODOLOGIA A pesquisa em questão refere-se a um estudo do tipo qualitativo onde foi inicialmente aplicado um questionário aberto semi-estruturado, seguido de entrevistas gravadas. Conforme a leitura de autores como: Duarte (2004); Martins (2004); Minayo (2004); Franco (2006); Terene (2006) e Belei et al (2008). Minayo (2004) afirma “[...] o objetivo das Ciências Sociais é essencialmente qualitativo.” (p. 21). Desta forma, André (1995) esclarece-nos sobre o uso desta metodologia nas pesquisas: Qualitativa, porque se contrapõe ao esquema quantitativo de pesquisa (que divide a realidade em unidades possíveis de mensuração, estudando-as isoladamente), defendendo uma visão holística dos fenômenos isto é, que leva em conta todos os componentes de uma situação em suas interações e influências recíprocas (p. 17) A escolha nesta pesquisa, pela abordagem qualitativa, é a interação que o pesquisador tem com o objeto pesquisado, Firestone (1987) citado por Santos Filho (1995) discute a diferença do pesquisador em pesquisas quantitativas e qualitativas: “O pesquisador quantitativo ideal distancia-se do fato pesquisado a fim de evitar vieses. O pesquisador qualitativo imerge-se no fenômeno de interesse”. (grifo do autor) (SANTOS FILHO, 1995, p. 45). Em pesquisa qualitativa o pesquisador estuda o ‘como’ e não os ‘por quês’ das questões. Em nosso estudo ‘Como’ se processa a alfabetização desses alunos, ‘como’ as professoras chegaram a tal conclusão, ‘como’ elas avaliam seus alunos... Aplicou-se um questionário semi-estruturado, conforme sugere Minayo (2004); Balei et al (2008); Milanesi (2012) entre outros. Manzini (2004) citado por Belei et al (2008) alertanos e explica: Entende-se por entrevista estruturada aquela que contém perguntas fechadas, semelhantes a formulários, sem apresentar flexibilidade; semi-estuturada a direcionada por um roteiro previamente elaborado, composto geralmente por questões abertas; não estruturada aquela que oferece ampla liberdade na formulação de perguntas e na intervenção da fala do entrevistado (BELEI et al 2008, p. 189). Para que as entrevistas pudessem ser registradas utilizamos o gravador de áudio, pois segundo Belei et al (2008) “[...] o gravador preserva o conteúdo original sem aumentar a acurácia dos dados coletados. Registram palavras, silêncios, vacilações e mudanças no tom de 72 voz, além de permitir maior atenção ao entrevistado” (p. 189). Há autores que sugere o uso da vídeo-gravação para que os dados sejam confiáveis ao mostrar para terceiros, porém optamos apenas pela gravação da voz das professoras pesquisadas. Assim, Belei sobre a transcrição das entrevistas sugere-nos que esta seja feita “de preferência em ambiente silencioso e distante da circulação de outras pessoas. É aconselhável que a transcrição seja realizada pelo próprio pesquisador [...] Após a transcrição das informações, inicia-se a análise dos dados” (p.190). RESULTADOS E DISCUSSÕES Após o estudo bibliográfico e escolha da metodologia ideal, partiu-se para a pesquisa de campo. Como dito anteriormente foram pesquisadas seis escolas inclusivas, sendo duas escolas estaduais e quatro municipais. Após os primeiros contatos com a gestão escolar, entramos em contato com as professoras que lecionam para alunos com SD. Houve uma conversa informal onde a bolsista falou sobre o projeto de pesquisa, e sanou as dúvidas sobre a pesquisa, marcou-se uma data para que a bolsista fizesse a entrevista. A entrevista tem onze perguntas, sendo as cinco primeiras para conhecer a professora no que tange ao trabalho com alunos deficientes, e as seis seguintes sobre suas experiências com o seu atual aluno sindrômico, as perguntas foram: 01. Gênero; 02. Idade; 03. Possui Graduação? Especialização?; 04. Há quanto tempo trabalha como professor?; 05. Exceto o aluno com SD você já lecionou para outro aluno deficiênte? Qual era a deficiência?; 06.Quais são as mudanças necessárias para você alfabetizar um aluno SD?; 07. Qual a diferença do aluno SD para os demais alunos com e sem deficiência? 08. Qual experiência você pode compartilhar? 09. Qual a sua dificuldade em alfabetizar o aluno SD?; 10. Você sabe o que currículo funcional? Trabalha assim com seu aluno?; 11. Como avalia o seu aluno SD? Utiliza o portfólio? Você acredita que esse método tem resultado positivo? Por quê? Assim, percebeu-se que 100% das professoras pesquisadas são do gênero feminino; a idade varia de 32 à 51anos; o tempo de serviço como professora regular varia de 2 meses há 21anos; uma professora não é formada, tendo o registro do Magistério e as outras sete professoras são formadas em Pedagogia, três professoras não possuem Pós-Graduação ou Especialização, cinco professoras tem Pós-Graduação as mesmas disseram sentir dificuldade ao trabalhar com alunos deficientes; 100% das professoras já lecionaram para alunos deficientes onde três alunos eram SD, um aluno era Surdo, dois tinham Paralisia Cerebral e dois alunos Autista. 73 As seis questões seguintes ouviu-se várias respostas: a falta de capacitação específica e contínua foi a dificuldade mais citada de trabalho destas professoras, seguido de sala lotadas com mais de dois alunos deficientes por turma, falta de horário para planejamento haja vista que seis professoras trabalham 40hs semanais e têm 4 horas para o planejamento, falta de professor na Sala de Recurso Multifuncional (SRM), das escolas pesquisadas, seis possuem SRM porém um escola não possui, e outra escola tem a SRM mas não tem professor para atuar na mesma; todas professoras falaram não haver diferença do SD para os outros alunos, porém uma professora disse haver um cuidado diferenciado e não diferença do aluno com outros; sobre a experiência, todas as professoras relataram que o seu primeiro contato com o aluno foi uma grande experiência pessoal para as mesmas; sobre a dificuldade em alfabetizar o aluno, obteve-se respostas parecidas, à pergunta sobre as mudanças necessárias para alfabetizar o aluno, no entanto duas professoras relatam que suas dificuldades em trabalhar com o aluno, é relacionada a linguagem dos mesmos, pois estes não frequentam um fonoaudiólogo; sobre o currículo funcional, três professora disseram não saber o significado do mesmo, e as outras cinco sabem e trabalham desta forma com seus alunos; e, por ultimo, na forma de avaliação, as duas professoras das escolas estaduais falaram que não utilizam portfólio para avaliar suas alunas, pois o município utiliza este método para avaliação, as outras seis professoras, quatro não fizeram portfólio ainda, e as duas que já avaliaram desta maneira disseram que veem resultado positivo. Assim, a bolsista viu que muito há para se fazer no que se refere à alfabetização de alunos deficientes, até o sistema escolar que muitas vezes ignora a presença do aluno deficiente nos gráficos de aprovação escolar nacional como a Prova Brasil, o IDEB entre outras, no entanto muito já foi realizado. Porém foi notório a alegria e o entusiasmo das professoras pesquisadas ao falar dos avanços de seus alunos, que progrediu desde que entrou na escola, reforçando a idéia de uma escola inclusiva. A acadêmica compreendeu que os alunos estão progredindo em suas vidas pessoais e acadêmicas, e no futuro quem sabe chegar à Universidade, pois este e outros estudos mostraram que alunos deficientes são capazes, muito capazes, basta apenas o professor crer em seu trabalho e acreditar no potencial de seu aluno. REFERÊNCIAS ALVES, Fátima. Para entender Síndrome de Down - Rio de Janeiro: Wak. Ed., 2007. 74 ANDRÉ, Marli Eliza Dalmázio de. Etnografia da prática escolar. Campinas: Papirus, 1995. 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Dois objetivos são norteadores: 1) problematizar, por intermédio de estudos da sua gênese, o conceito de regionalismo mediante a identificação de traços de regionalidade na produção literária brasileira contemporânea; 2) estudar a obra do escritor Ronaldo Correia de Brito. Em outras palavras, este trabalho conjuga uma investigação teórico-crítica. Mais especificamente, analisa-se Livro dos homens, reunião de contos que, a 78 exemplo de outros livros do autor, permite pensar as relações da tradição ante as mudanças do presente. É uma invenção que se estrutura no sertão cearense, com seus espaços de terra, rios, chuvas esparsas, gente entranhada de superstições e crenças e que esquecem, ao mesmo tempo, essas crenças e superstições. A investigação da tensa relação entre passado e presente se dá, desse modo, mediante a problematização do conceito de regionalismo literário, numa tentativa de destituir oposições binárias que, muitas vezes, se mostram inconsistentes: regional/universal; nacional/estrangeiro; identidade/alteridade. Diversas reconfigurações nos estudos literários ora apresentam o conceito com uma visão positiva ora visão negativa. A gênese do conceito formulada por escritores como Antônio Cândido, Alfredo Bosi e Afrânio Coutinho, em geral, é reafirmada pela crítica brasileira, que, entretanto, lhe dá modulações diversas ao tratar do contemporâneo. A recorrência do tema pôde ser percebida nos escritos de vários autores, dentre eles Ligia Chiappini, Maria Luiza Berwanger da Silva, José Clemente Pozenato, Tânia Pellegrini, Flora Süssekind, Tânia Pellegrini, Humberto Hermenegildo de Araújo, André Tessaro Pelinser, Denise Mallmann Vallerius, Geraldo Nogueira de Amorim, Lourdes Kaminski Alves, Walnice Nogueira Galvão, Rogério Haesbaert, Maria Adélia Menegazzo, Laurindo Mékie Pereira e Maria Zilda Cury. Pode-se observar como exemplo o texto intitulado “Do beco ao belo: dez teses sobre o regionalismo na literatura”, de Ligia Chiappini, que discute as “teses” que causam desconforto ao estudioso que pretende estudar o regionalismo literário. Nas teses apresentadas, ela não se contenta com o rótulo de literatura inferior, ultrapassada e retrógrada dado pela crítica, pois o regionalismo indaga e afronta questões da crítica e da histórica literárias desde o seu surgimento. Por outro lado, em vários momentos, parece concordar com algumas das proposições colocadas. Essa “indecisão” se apresenta em vários outros textos. Assim, a abordagem do conceito de regional orientada pela pesquisa coloca em dúvida essa visão da crítica que comumente associa o regionalismo literário a ficções que enfatizam o pitoresco, o exótico, os costumes locais. Para nós, seriam visões que se negam a colocar em movimento a própria história da literatura, no sentido de que apenas num período demarcado historicamente aconteceram manifestações literárias com as características aludidas anteriormente. A ficção contemporânea que trata de espaços marcados simbolicamente, como o Nordeste de Ronaldo Correia de Brito, não o faz para exaltar uma identidade “perdida” que deva ser resgatada. Pelo contrário, assinala uma identidade cambiante, não fixa. Desse modo, é muito mais do que um elemento que ajuda a estruturar as narrativas. Muitas vezes, como se constatou na literatura do autor estudado, constitui aquilo 79 que diferencia um projeto literário, pois é o tratamento do espaço que legitima sua obra e, por fim, a sua condição de escritor. A reinvenção da tradição, marcada pelo tom poético, está presente em todos os livros de Brito: Faca (2003), Livro dos homens (2005), Galiléia (2008), Retratos imorais (2010), O baile do menino Deus (2011), Arlequim de carnaval (2011). Estamos diante de um escritor que, mais do que a descrição do espaço, remete-o a um tempo/espaço mítico que é e não é ao mesmo tempo passível de presentificação. As influências de Brito são muitas, e isso se reproduz na constituição da sua literatura, fazendo com que, de imediato, a tipicidade da região, no caso a nordestina, seja descartada. A imersão que suas narrativas faz no imaginário nordestino, evocando a sua rica tradição oral em textos com alta densidade lírica, toca a questão do humano em suas múltiplas identidades que ora transita pelo modo mais visível de vida do sertanejo ora pelo impacto do tempo presente sobre essas vidas. Em Livro dos homens, os arranjos narrativos constituídos por Brito amparam-se no misticismo, nas crenças populares, nas violências cotidianas e, sobretudo, na tradição nordestina. E também mostram que a demarcação do espaço físico ajusta-se somente para posicionar as personagens e descrever a transição entre a vida do sertanejo e o impacto do tempo presente sobre essas vidas. O autor evidencia a influência da tradição em seus livros, mas sem desconsiderar a transitividade própria das questões contemporâneas que modificam a visão mesma do que seja tradição, do que seja tocar em costumes de um povo num momento em que os espaços de confluência são cada vez maiores. 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Acesso em: 04/11/2011. 82 A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO EDUCATIVO E A FORMAÇÃO DOCENTE COMO ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DE SUSTENTAÇÃO DAS RELAÇÕES DE PODER NO AMBIENTE ESCOLAR.13 Caroline de Carvalho Mazzo14 Profª Drª Marilsa Miranda de Souza15 RESUMO O presente trabalho tem por finalidade O objetivo desse subprojeto é conhecer como se operacionalizam as políticas educacionais em termos de infraestrutura escolar e a forma de oferta dos diferentes níveis de ensino, organização do trabalho educativo e a formação de professores. A análise parte do conceito de capitalismo burocrático que é o tipo de capitalismo engendrado nos países semicoloniais e semifeudais. As políticas educacionais de formação de professores e gestores das escolas estaduais da Zona da Mata rondoniense são hegemonicamente formuladas, dirigidas e financiadas pelo Banco Mundial. A análise dos dados coletados aponta que as relações de poder na escola são determinadas pelo coronelismo que age indiretamente por meio de coação ou da persuasão dos professores para se submeterem às políticas educacionais ditadas pelo Banco Mundial/MEC e que os professores se submetem por medo de perseguições. Palavras-chave: Formação docente. Capitalismo Burocrático. Coronelismo INTRODUÇÃO O presente trabalho é um resumo do relatório final que tem origem no desenvolvimento da pesquisa intitulada: Capitalismo Burocrático, políticas educacionais e relações de poder na educação escolar em Rondônia financiada pelo PIBIC/UNIR (02 bolsistas) através do desdobramento de seu subprojeto: A organização do trabalho educativo e a formação docente como elementos fundamentais de sustentação das relações de poder no ambiente escolar. O objetivo desse subprojeto é conhecer como se operacionalizam as políticas educacionais em termos de organização do trabalho educativo e a formação de professores. A problemática dessa pesquisa centra-se no descompasso entre os conhecimentos e prática social dos sujeitos da escola pública rondoniense e os conhecimentos impostos pelo conjunto das políticas educacionais. Os educadores ficam alheios à reflexão sobre as políticas 13 Subprojeto da pesquisa Capitalismo Burocrático, políticas educacionais e relações de poder na educação escolar em Rondônia coordenada pela Profª Drª Marilsa Miranda de Souza. 14 Graduanda em pedagogia da UNIR, Campus de Rolim de Moura, Voluntária PIBIC/UNIR. 15 Professora do Departamento de Educação da UNIR, campus de Rolim de Moura e orientadora da Pesquisa. 83 educacionais em curso devido à má formação, às condições precárias em que desenvolvem seu trabalho educativo, além da alienação inculcada pelos aparelhos ideológicos da sociedade que obscurecem a realidade. Escolhemos 01 (uma) escola de cada um dos cinco municípios que compõe essa região do Estado de Rondônia totalizando 05 (cinco) escolas que são: Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Candido Portinari em Rolim de Moura, Escola Estadual de Ensino Médio Aurélio Buarque de Holanda Ferreira em Nova Brasilândia D’Oeste, Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Pe. Ezequiel Ramim em Alta Floresta D’Oeste, Escola estadual de ensino fundamental e médio Juscelino Kubitschek em Santa Luzia D’Oeste e a Escola de Ensino Fundamental e Médio Marechal Rondon em Novo Horizonte D’Oeste. O critério para a escolha dessas escolas foi o número de alunos. Escolhemos a maior escola de cada um dos municípios em termos de número de alunos. O método que utilizamos nesse trabalho é o método do materialismo históricodialético, entendido como um instrumento de captação dos fatos sociais e interpretação que possibilite a intervenção transformadora da realidade. Nossa maior preocupação foi com a constante integração empírico-teórica num vai e vem do todo às partes, das partes ao todo para dar coerência e significados aos elementos de nosso estudo. A parte é o grupo pesquisado. O sujeito é o grupo, não o indivíduo, portanto, procuramos calçar nossa análise na dialética das classes sociais onde encontramos a categoria de professores. A análise dos dados tem como eixo central a aplicação do método dialético, mediante o qual buscamos interpretar a realidade objetiva e subjetiva em termos de categorias básicas: totalidade, contradição, ideologia e práxis e ainda duas categorias históricas que são: imperialismo e capitalismo burocrático. A coleta de dados iniciou-se no segundo semestre de 2011. Num primeiro momento realizamos visitas juntamente com a orientadora em todas as escolas com a finalidade apresentar o projeto e conhecer os gestores, os supervisores/ coordenadores pedagógicos e os professores e discutir com eles os objetivos desse trabalho. Ao apresentar o trabalho, enfatizamos o caráter da pesquisa e esclarecemos que nenhum dos entrevistados seria identificado. Nem mesmo as escolas, que foram renomeadas como Escola A, B, C, D e E quando citadas na análise. Observamos que há um medo expresso em falar da problemática que os envolvem no âmbito da escola e das relações de poder nela estabelecidas. A fundamentação teórica centrou-se nos conceitos e nas categorias de análise que utilizaremos para compreender as políticas educacionais recentes nos aspectos ideológicos, sociais, políticos, econômicos e culturais que se inserem numa realidade mais ampla que é 84 capitalismo burocrático brasileiro. A revisão da literatura privilegiou nesse primeiro momento as principais obras que tratam do assunto numa perspectiva materialista e histórico-dialética. As entrevistas com os professores, com os supervisores e diretores, coordenadores de programas e/ou projetos educacionais em curso foram organizadas a partir de duas modalidades de entrevistas: Entrevistas semiestruturadas individuais como instrumento básico para conhecer a opinião dos professores e da equipe gestora as relações de poder estabelecidas dentro e fora da escola e por meio de Entrevistas coletivas. Nessa primeira fase da pesquisa realizamos apenas as entrevistas individuais. As entrevistas coletivas deverão ser feitas no segundo semestre de 2012 quando da continuidade do projeto. Realizamos entrevista individual com diretores, supervisores/coordenadores pedagógicos e professores do Ensino Fundamental e Médio das escolas pesquisadas. O objetivo era entrevistar 06 professores de Ensino Fundamental e Médio de cada escola pesquisada. Na Escola Estadual de Ensino Médio Aurélio Buarque de Holanda Ferreira onde só há Ensino Médio, foi necessário escolher os 06 professores desse mesmo nível de ensino. Na Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Juscelino Kubitschek superamos o previsto e entrevistamos 7 professores. As perguntas foram as mesmas a todos os entrevistados, para possibilitar uma comparação entre as escolas. AS AÇÕES DO IMPERIALISMO E AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS NO CAPITALISMO BUROCRÁTICO: CORONELISMO E SEMIFEUDALIDADE Os estudos bibliográficos nessa primeira fase da pesquisa priorizaram a compreensão das categorias históricas de análise buscando na teoria marxista o conceito de Estado e sua função na sociedade. O Estado, na visão Marxista, surgiu em consequência da apropriação privada de riqueza e da luta de classes. Para Lênin, “o Estado é o produto e a manifestação do antagonismo inconciliável das classes. O Estado aparece onde e na medida em que os antagonismos de classes não podem objetivamente ser conciliados. E reciprocamente, a existência do Estado prova que as contradições de classe são inconciliáveis” (LÊNIN, 1978, p. 9). O governo moderno não é senão um comitê para gerir os negócios comuns de toda a classe burguesa (MARX E ENGELS, 2008, p.25). O conceito de Estado remete à categoria histórica que empregaremos em nossa análise que é o imperialismo. Para Lênin o imperialismo é a fase superior do capitalismo referenciado nos Estados Unidos da América do Norte. É no seio do Imperialismo norte-americano que os monopólios adquirem a máxima solidez ao reunirem nas mãos a maior parte das fontes de matéria-prima e 85 a vigorosa interferência das associações internacionais que se esforçam por retirar do adversário toda possibilidade de concorrência, por adquirir as terras que contém minérios, jazidas de petróleo, etc. (LÊNIN, 1979). Segundo Lênin, (1979), o imperialismo é o aprofundamento das relações de dominação do capital monopolista sobre a vida econômica e consiste, na divisão do mundo entre países opressores e oprimidos, sustentada no domínio do capital financeiro, na exportação de capitais e na política colonial. O imperialismo ao dividir o mundo define suas colônias e semicolônias mantendo-as dependentes. Essa dependência dos países dominados pelo imperialismo se desenvolve por meio da ação de empresas multinacionais para explorar a matéria-prima e a mão-de-obra barata desses locais, por meio de empréstimos ao Estado e investimentos em fontes de recursos naturais, etc. mantendo uma relação de dominação e controle de suas economias. O conceito de Capitalismo Burocrático é definido por Guzmán como “o capitalismo que o imperialismo impulsiona num país atrasado; o tipo de capitalismo, a forma especial de capitalismo, que impõe um país imperialista a um país atrasado, seja semifeudal, semicolonial” (GUZMÁN, 1974, p. 1). O capitalismo burocrático tem duas colunas: semicolonialismo e semifeudalidade (grande propriedade, semisservidão, gamonalismo ou coronelismo) que são interdependentes e interligadas. O Brasil é um país de capitalismo burocrático, porque permanece semifeudal e semicolonial, dominado por uma potência estrangeira. Por nunca ter realizado a revolução burguesa, manteve dois grandes problemas: o problema nacional (nunca teve soberania e em cada época é dominado por uma potência imperialista) e o problema da terra, ostentando uma das maiores concentrações de terra do mundo. Essa condição fez com que o Brasil permanecesse como um país semifeudal e semicolonial e, portanto, um país de capitalismo burocrático (SOUZA, 2010). Conforme a análise de Souza (2010) nas ultimas décadas o imperialismo ao instaurar uma nova ordem política, chamada de neoliberalismo, instituiu também uma nova ordem cultural por meio de seus organismos multilaterais como o Fundo Monetário Internacional (FMI), a Organização Mundial do Comércio (OMC), o Banco Mundial, etc. Santomé (2003, p. 19) diz que esses organismos são “o cérebro das políticas neoliberais”. Esses organismos, em especial o Banco Mundial impõe suas ideologias com o objetivo de produzir seres humanos com “habilidades e competências” para o trabalho semisservil e precário por meio das políticas educacionais dirigidas e financiadas pelo imperialismo, especialmente o estadunidense. A principal agência responsável pela difusão das ideologias imperialistas na 86 atualidade é, sem dúvida, o Banco Mundial. Souza (2010, p.171) explica sobre os objetivos do Banco: Na verdade, o objetivo educacional do banco é controlar as populações pobres por meio dos principais aparelhos ideológicos. Pretende-se formar seres dóceis e passivos diante das imposições do capital e da miséria que se intensifica com as novas formas de organização econômica forjada da crise capitalista. É o mercado que regula tudo. As relações educacionais passam a ser também relações mercantis. A escola deve funcionar como uma empresa capitalista e servir ao mercado na produção de mão-de-obra barata, qualificada e semisservil que garanta maior produtividade ao capital monopolista. Na verdade, a educação passou a ser entendida como investimento, pois ela prepara recursos humanos para atender ao mercado capitalista. Se a força de trabalho dos trabalhadores possui maior qualificação técnica, maior possibilidade de apropriação de capital, maior extração de mais-valia, de produtividade. Atualmente sob está em pleno vigor em Rondônia o projeto Fundescola, que se subdividiu em Fundescola I, Fundescola II e Fundescola III. Nos municípios de Rondônia foram implantados vários programas do Fundescola: PDE, Escola Ativa, Gestar, Pró-Gestão, Proler e outros programas também com financiamento e orientações do Banco Mundial como o Pró-Letramento, Pró-Infantil, Pró-Jovem Pró-Info, Além das Letras e Brasil Alfabetizado, etc. (SOUZA, 2010 e SILVA, 2011). Conforme análise de Souza (2010), Esses programas fundamentam-se na concepção de que o professor deve ser munido de muitas atividades práticas, separadas por conteúdos e módulos. O professor deve aplicar essas atividades na sala de aula e depois avaliar seus resultados com os tutores. “A preocupação está centrada no fazer e não no conhecimento teórico. É o conhecimento técnico de como fazer, como executar as atividades que já vêm elaboradas nos módulos” (SOUZA, 2010, p.226). AS POLÍTICAS DE FORMAÇÃO DOCENTE COMO ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DE SUSTENTAÇÃO DAS RELAÇÕES DE PODER NO AMBIENTE ESCOLAR Nas entrevistas realizadas nas escolas estaduais da Zona da Mata Rondoniense captamos as diversas maneiras como o capitalismo burocrático se impõe nas políticas pedagógicas. Nossa análise vai desde a formação continuada de docentes, ditos como programas que aprimoram a atuação em sala de aula, até os fatores externos à escola. Nas 87 escolas pesquisadas encontramos o PDE, o Gestar, o Pro-Letramento, o Proinfo, Escola de Gestores, entre outros programas de formação. A institucionalização da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n° 9.394/96 no Brasil se forjou em meio a essas pressões realizadas pelo Banco Mundial e conflitos entre fomentadores de políticas, prevalecendo às imposições do Banco Mundial, de uma formação técnica do professorado. Os cursos de formação de professores no Brasil, que têm sido realizados em sua maioria à distância e em serviço, uma vez, que muitos são concomitantes com períodos de aula enquanto os professores exercem a docência (SILVA, 2002). A pesquisa identificou que os programas são impostos e os professores são pressionados a participarem. Quando indagados sobre o funcionamento dos programas de formação que foram implantados nas escolas, como o GESTAR, PRÓ-LETRAMENTO, PROINFO, etc., muitos professores afirmaram que são pressionados de alguma forma a aderirem aos programas e permanecerem nos cursos oferecidos. Ao serem perguntados “Se vocês decidirem não participar dos programas de formação, não seguirem as normas instituídas, não aceitarem as relações autoritárias na escola o que ocorre?” obtivemos o seguinte resultado: PRINCIPAIS RESPOSTAS DOS PROFESSORES SOBRE A Qua “DESOBEDIÊNCIA” nt. Há uma pressão velada; “facilidades e bonificações” para quem 13 participa; a direção/supervisão força a participação por convencimento; Pressão excessiva para que participem; há punição; ameaça de envio de 07 relatório à SEDUC. Não tem pressão; não há punição; acredita que não acontece nada 07 Nunca descumprimos por receio de punição; por medo 01 Não sabe o que acontece se não participar e seguir as normas; 03 TOTAL 31 % 41,9 22,6 22,6 3,2 9,7 100 % Conforme o quadro acima 64,5% dos professores afirmou que há pressão para que participem dos programas de formação. A situação mais grave identificadas nas Escola B e E foi o fato de que participam “porque conta como dia letivo, registramos horas. A escola faz acordos com os professores (...) A REN cobra dos diretores e estes negociam com professores para que participem”. Para levantar as contradições existentes nas relações estabelecidas entre professores e gestores perguntamos aos supervisores e diretores sobre esses mecanismos de pressão: “Como são as relações entre gestores e professores na escola? O que ocorre quando um professor não 88 cumpre com as regras estabelecidas, não participa dos programas e das atividades propostas?” As respostas contradizem às informações prestadas pelos professores. O posicionamento é de negação ou de “pressão leve” que ocorre pelo “convencimento” como podemos ver no quadro abaixo: PRINCIPAIS RESPOSTAS DOS SUPERVISORES E DIRETORES Qua SOBRE A “DESOBEDIÊNCIA”DO PROFESSOR nt. Tem boa relação; há conversas de forma amigável sem punição; não há 4 pressão Há pressão leve, se estabelece “acordos”; alguns participam e outros não; 5 há convencimento Tem que pressionar mesmo, pois não pode deixar as coisas “soltas” 1 (Supervisora) Não cabe à supervisão esse papel, seu papel é pedagógico; relatamos à 1 direção; (Supervisora) TOTAL 11 % 36,3 6 45,4 5 9,09 9,09 100 % Ao implantar esses programas de formação a pesquisa identificou que se busca a adesão dos professores de três formas: Primeiro busca-se o “convencimento” de que o programa oferece materiais pedagógicos que resolverão os problemas do fracasso escolar. Quando essa forma não funciona, se oferece vantagens, como redução da carga horária. Muitos entrevistados ingressaram nesses programas devido a essa redução. Se nenhuma das duas primeiras formas de inserção dos professores nos programas funcionarem, então se apela para a pressão, logicamente tácita, isolando-os. Os professores que se recusam a participar são chamados de desinteressados, individualistas por não se integrarem ao grupo. Assim, mesmo que seja apenas para agir como a maioria, os professores acabam se inserindo nos cursos de formação do Gestar ou do Pró-Letramento. No caso dos diretores das escolas a obrigação de matricularem-se nos cursos de formação do Programa Escolas de Gestores está prescrito no próprio Decreto nº 16.202, de 20 de setembro de 2011 que institui eleições para diretores e vice-diretores das escolas do Estado de Rondônia. Muitos professores são “convencidos” ou pressionados a aderirem aos programas de formação, mas quando são questionados a respeito destes, 67,6% os consideram bons, 15,74% os consideram ruins, 10% se mostraram indiferentes e 6,66% não participam dos mesmos. Já a direção e a supervisão, 80% afirmaram ser bons, 10% ruins e 10% não souberam como opinar. Nas entrevistas, os professores, mesmo os que disseram que os programas de formação são “bons”, reclamaram e desqualificaram alguns programas, argumentando que deles pouco 89 se aproveita: “Não consegui engolir o Pró-Letramento, pois veio um curso fraco. Não deu para engolir um curso de matemática também do Pró-Letramento, não dá... é como se eu estivesse indo para atrás."(Professora da Escola A). Os professores da Escola D afirmaram que os cursos são muito repetitivos, aligeirados; que no PROINFO os equipamentos não funcionam; que o único que se aplicou foi o PROFA por ter bons formadores e que nos demais programas os formadores são ruins; que os conteúdos estão longe da realidade e finalmente, que concretamente pouco se aproveita dos programas de formação. Segundo uma das professoras, “é inaplicável o que se aprende nos cursos, não tem como operacionalizar”. Muitos dos que não participam tem consciência do que eles significam como expressou um professor da Escola D: “São programas que servem para colocar professores numa "forminha", como o governo e os organismos internacionais querem. São cursos tecnicistas”. Uma professora da Escola A, em sua entrevista, deixou claro que, por mais que sua graduação proporcionasse criticidade, o ambiente escolar não oferece suporte para o aprofundamento da crítica numa visão que integre aspectos sociais, econômicos, políticos e ideológicos. Essa professora afirmou sentir-se um “tanto engessada pelos programas repetitivos que em nada contribuem para uma educação problematizadora” e que, em consequência disso, não percebe “nenhum movimento transformador da realidade”. Os professores não conhecem as origens das políticas educacionais implantadas na escola e não percebem as formas de dominação e controle delas decorrentes. Não sabem quem formula nem quem financia esses programas existentes na escola, se são condizentes com a realidade ou não. Perguntamos nas entrevistas se sabiam quem formula, orienta e financia os programas de formação que participam e obtivemos as seguintes respostas:86,66% declararam abertamente não saberem, 3,34% não opinaram e os 10% que disseram saber não tinham propriedade sobre a origem dos mesmos. Professores, diretores e supervisores/coordenação pedagógicas afirmaram que desconhecem a real origem desses programas, em suas respostas declararam que pensam que estes são elaborados e financiados pelo MEC, Governo do Estado, FNDE e até mesmo os que concordam e participam dos programas desconhecem quem os formula. Não conhecem, nem discutem as políticas educacionais, vivendo na mais completa obscuridade. Esses programas já são formulados para inibir a reflexão, a criticidade, tornando sempre maçantes e repetitivos, desmotivando os professores que fazem esses cursos, às vezes além de sua carga horária e não garante nenhum incentivo financeiro. A formação do professor, neste contexto, passa por perdas incalculáveis. Esta formação vem sendo feita, prioritariamente, de forma aligeirada, pragmática, onde estão sendo criados os “práticos da educação”. Há que se compreender que seus encaminhamentos 90 inserem-se no processo de ajuste da educação às novas exigências dos organismos internacionais, em particular do Banco Mundial e do FMI e visa adequar a formação de profissionais ao atendimento das demandas de um mercado globalizado. Nessa direção, a atual LDB negou à educação o estatuto epistemológico da ciência, descaracterizando o profissional de educação como intelectual, atribuindo-lhe uma dimensão tarefeira, para a qual não precisa se apropriar dos conteúdos da ciência e da pesquisa. Assim, entende-se que à grande maioria compete a função de divulgação do conhecimento produzido em níveis diferenciados, para o que se propõe uma qualificação também diferenciada e tão mais aligeirada e menos especializada quanto mais se destine às classes subalternas, objeto “natural” de exclusão, para o que não se justifica longos e caros investimentos, principalmente no que diz respeito à sua formação na universidade. Vê-se, pois, que o arcabouço teórico está sendo diminuído em face da conotação prática que a formação está tomando. Os órgãos oficiais divulgam, contraditoriamente, que a escola tem autonomia para elaborar seu projeto político pedagógico e os diversos encaminhamentos dele decorrente, porém, na prática, deve seguir determinações de instâncias superiores a exemplo dos Parâmetros Curriculares Nacionais. Compreende-se, assim, que as postulações advindas do Ministério da Educação apresentadas como forma de atender às necessidades da nação, na verdade estão de acordo com os interesses do Estado, e este, por sua vez, é um Estado burguês; logo as orientações do MEC atendem, não aos interesses dos alunos e dos professores, mas aos interesses da classe burguesa, que é defender a manutenção do modo de produção capitalista. Decorrente dessas determinações, a formação do educador, de forma fragmentada, baseada no modelo taylorista/fordista em que cada “especialista” - diretor, orientador, supervisor, coordenador - desenvolve seu trabalho de forma isolada, cada um cumprindo sua função. Por outro lado, na perspectiva toyotista, são formados os educadores para atenderem aos mais variados ramos da educação, porém, sem compreenderem a educação como um todo e sem, portanto, ver na formação do educador uma possibilidade de unitariedade. Forja-se, assim, a formação de professores multitarefeiros, polivalentes, que atuam em várias funções no interior da escola, que formam o trabalhador/consumidor e não um membro da sociedade capaz de compreender as contradições da sociedade de classes em que vive. Neste processo, grande parte dos professores não se identifica como classe trabalhadora, os quais acabam aderindo ao projeto político da burguesia, passando os conceitos de empreendedorismo, competitividade, inteligência emocional, polivalência, com 91 uma formação conduzida à articulação entre competência e compromisso, precarizando assim a formação dos professores. A fragmentação é usada também para que o professor não se veja como pertencente a uma categoria. Com a divisão das especialidades - administrador, supervisor, orientador, coordenador - ele não se identifica mais como professor, e trabalhando em várias escolas, não se identifica nem com a escola em que trabalha, nem com os problemas da mesma. Todavia esta divisão do trabalho escolar tem origem na separação entre propriedade dos meios de produção e força de trabalho, e não na divisão técnica do trabalho. Porém, percebe-se a compreensão e o interesse que a classe dominante tem em relação à escola, quando considera que compete a ela dar uma formação que possibilite o manuseio das máquinas que serão utilizadas nos mercados de trabalho e de consumo. Esta é a função da escola no novo modo de vida: preparar as pessoas com um certo grau de conhecimento conhecimentos úteis para que possam realizar suas tarefas, mas não com o conhecimento do processo produtivo como um todo, pois caso o trabalhador tenha acesso a uma educação mais complexa, poderá perceber sua condição de explorado. A implantação dessas políticas educacionais é possível devido às relações coronelícias, hierarquizadas dentro da escola. As relações semifeudais existentes na esfera educacional garantem o repasse de vários “pacotes” que ela deve utilizar. São "inovações compartilhadas", impostas e alheias aos professores, supervisores e diretores. O autoritarismo é rigoroso. A maioria dos professores entrevistados afirmaram que a relação com a supervisão e direção da escola é uma relação “relação indiferente, distante, autoritária, burocrática e hierarquizada, apenas há informes e repasses”, como podemos ver no quadro abaixo: RELACIONAMENTO DOS PROFESSORES COM A SUPERVISÃO Situações Quantidade % Boa relação. Há um diálogo sobre as questões pedagógicas; 08 25,8 Tranqüila e harmoniosa 04 12,9 Relação conflituosa, supervisão burocrata; autoritária; dominadora 13 41,9 Relação razoável; supervisão não impõe, mas não contribui no 02 trabalho pedagógico. 6,5 Há muita transferência de supervisores. Há número insuficiente de 01 supervisores 3,2 Relação indiferente e distante, apenas há informes e repasses. 03 9,7 TOTAL 31 100,0 (Continuação) RELACIONAMENTO DOS PROFESSORES COM A DIREÇÃO Tipo de relação Quantidade Conflituosa; autoritária; burocrática, hierarquizada e distante do 10 % 32,26 92 trabalho coletivo. Relação harmoniosa, democrática; contribui com o trabalho coletivo Relação hierarquizada, distante; sem autoritarismo; não estimula nem interfere no trabalho coletivo; Não respondeu; TOTAL 10 32,26 10 32,26 01 3,23 O coronelismo é um fenômeno que ocorre em várias dimensões de forma hierárquica, como demonstram as relações dos supervisores e diretores com a Representação de EnsinoREN, o órgão de chefia imediata da Secretaria de Educação do estado de Rondônia. Perguntados “Como é seu relacionamento com a representação de ensino? Você cumpre tudo o que a SEDUC determina? O que ocorre se você discordar?” obtivemos as seguintes respostas: PRINCIPAIS RESPOSTAS DOS SUPERVISORES E DIRETORES Relacionamento distante e burocrático. Em alguns casos rejeitamos algumas propostas. Em outros casos não tem força para rejeitar. A maioria das ações é determinação; cumprem as determinações mesmo questionando. Nada é imposto. A escola é autônoma. Só não podemos desrespeitar a Lei. Cumpre todas as determinações da SEDUC; não há questionamento; não há autonomia; falta suporte para solucionar problemas. Sem informação; Não Respondeu. TOTAL Qua nt. % 08 72,73 01 9,09 01 9,09 01 11 9,09 100% Os sujeitos da prática educativa não participam de nenhuma formulação pedagógica, apenas repetem e planejam o que já vem pronto. 39,52% dos professores alegaram que não participam das decisões pedagógicas em ambiente escolar, 50,94% responderam que “não somos consultados; nossa participação é formal, pois apenas nos comunicam das decisões; não respeitam a vontade do coletivo; a escola não tem autonomia; a SEDUC impõe as coisas e a direção/supervisão só reproduz; reuniões burocratizadas; não há discussão pedagógica”. Afirmaram que “há participação apenas em alguns espaços, mas em caráter de ajustes e sugestões; no geral as reuniões servem para legitimar o que vem pronto; as reuniões são apenas informativas; a SEDUC restringe muito o tempo para discussão”. Os outros 9,54% decidiram por não responder a questão para evitar qualquer situação conflituosa ou constrangedora. 93 Se a maioria afirma que há relações autoritárias, que os programas de formação são impostos, que discordam do processo de avaliação de desempenho realizado pelo Ministério da Educação, que não participam das decisões gerais nem da própria escola, então perguntamos aos professores, “porque aceitam as imposições do governo?” Eis as respostas: PRINCIPAIS RESPOSTAS DOS PROFESSORES Por medo de perseguição e punição; por não conhecer seus direitos (jovens); serem alienados; medo de perder o salário. Por acomodação; maioria já em fim de carreira; cansados de lutar; consideram que não tem força Há muita luta contra as imposições; mesmo impondo não aceitamos tudo; há resistência Atualmente o governo não impõe; há diálogo com os professores; não são punidas, mas há pequenos benefícios; Não sabe; não respondeu TOTAL Qua nt. % 22 71,0 05 16,1 02 6,5 01 3,2 01 31 3,2 100 % Embora de forma parcial e preliminar, a partir de nossos estudos, já podemos afirmar que há relações semisservís e autoritárias entre gestores e professores e entre estes e os gestores da SEDUC e que todos eles se submetem a diversas formas de opressão do sistema educacional. Os programas são impostos sem nenhuma participação da comunidade escolar. A escola não possui autonomia alguma para a tomada de decisões. Essas relações autoritárias ocorrem através da ação dos governantes ou até mesmo dos próprios colegas de trabalho, estabelecidas pelo coronelismo vigente nas mais amplas relações sociais do capitalismo burocrático. Presente em ambientes escolares, as imposições autoritárias partem inicialmente de governantes, que encaminham suas ordens aos agentes indiretos, aos órgãos educacionais responsáveis pelas escolas de cada município até chegarem aos gestores e professores; formando degraus, em que as ordens são implantadas de cima para baixo e impreterivelmente cumpridas. Quando a educação é imposta, configura-se o que se convencionou chamar, na América Latina, de gamonalismo ou caciquismo, e que no Brasil denominamos coronelismo. Retomando nossa categoria histórica de análise o capitalismo burocrático tem duas colunas: semicolonialismo e semifeudalidade (grande propriedade, semisservidão, gamonalismo) conforme Guzmán (1974). O semicolonialismo é externo e a semifeudalidade é interna (SOUZA, 2010). A semifeudalidade caracteriza-se pela existência da grande propriedade, da semisservidão e do gamonalismo (coronelismo). O gamonalismo não está 94 representado somente pelos gamoneles (latifundiários) propriamente ditos. Compreende uma grande hierarquia de funcionários, intermediários, agentes, parasitas, etc. (MARIÁTEGUI, 2008, p. 54). Coronelismo é, portanto, a estrutura hierárquica que vai gerar a organização do Estado que sustenta as relações de semisservidão. Segundo Mariátegui, o coronelismo ou gamonalismo não designa apenas uma categoria social e econômica dos latifundiários, mas agentes públicos: O termo gamonalismo não designa apenas uma categoria social e econômica dos latifundiários ou grandes proprietários agrícolas. Designa todo um fenômeno. O gamonalismo não está representado somente pelos gamonales propriamente ditos. Compreende uma grande hierarquia de funcionários, intermediários, agentes, parasitas, etc. (MARIÁTEGUI, 2008, p. 54). O coronelismo caracteriza-se por uma estrutura política e administrativa das instituições do Estado. Os cargos técnicos e políticos concentram-se nas mãos de pessoas escolhidas e nomeadas pelos detentores do poder local para executar seus projetos que raramente são escolhidas por critérios profissionais. Os agentes indiretos do imperialismo e tem seus subordinados nos setores da administração pública. Professores ocupando cargos técnicos nas instituições dirigentes da educação se transformam em opressores de sua própria classe porque se colocam a serviço dos interesses do grupo detentor do poder. CONSIDERAÇÕES FINAIS O resultado da parcial da pesquisa definiu as questões principais desenvolvidas neste estudo que são: a) O Brasil é um país de capitalismo burocrático, que é o tipo de capitalismo engendrado pelo imperialismo nos países atrasados, ou seja, semifeudal e semicolonial, mediante o domínio do imperialismo sobre toda a sua estrutura econômica e social (GUZMÁN, 1974, p. 2); b) As políticas educacionais de formação de professores e gestores das escolas estaduais da Zona da Mata são hegemonicamente formuladas, dirigidas e financiadas pelo imperialismo, por meio de uma de suas principais agências, o Banco Mundial, e se efetivam nos programas implantados na educação por meio do coronelismo existente no âmbito do poder local; A análise dos dados coletados apresentaram resultados preliminares apontando que as relações de poder na escola são determinadas pelo coronelismo que age indiretamente por meio de coação ou da persuasão dos professores para se submeterem às políticas 95 educacionais ditadas pelo Banco Mundial/MEC, sob risco de perseguições por parte do poder local. REFERÊNCIA BRASIL. Ministério de Educação. Fundescola. Manual de operacionalização e monitoramento do Programa Gestão da Aprendizagem Escolar - GESTAR. Brasília: MEC, 2000. GUZMÁN, A. La problemática nacional: discurso pronunciado no Sindicato de Docentes de Huamanga, Lima, Peru, 1974. Disponível em: <http://www.blythe.org/perupcp/docs_sp/nacional.htm>. Acesso em: jan. 2009. LÊNIN, V. I. O imperialismo: fase superior do capitalismo. Tradução de Olinto Beckerman. 1. ed. São Paulo: Global, 1979. MARIÁTEGUI, J. C. Sete ensaios de interpretação da realidade peruana. São Paulo: Expressão Popular, 2008. MARX, K; ENGELS, F. Manifesto do Partido Comunista. Rio de Janeiro: Frente Revolucionária de Defesa dos Direitos do Povo, 2008. SANTOMÉ, J. T. A educação em tempos de neoliberalismo. Porto Alegre: Artmed, 2003. SILVA, P. A. D. Repercussões das concepções pedagógicas nas políticas educacionais em Rondônia entre 1995 e 2010. Dissertação de Mestrado, UNIR, 2011. SOUZA, M. M. Imperialismo e Educação do Campo: Uma análise das políticas educacionais a partir de 1990. Tese de doutorado, Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista- UNESP, Araraquara, 2010. SILVA, M. A. Intervenção e Consentimento: a política educacional do Banco Mundial. Campinas - SP: Autores Associados - Fapesp, 2002. 96 O CURSO DE PEDAGOGIA NA MODALIDADE A DISTÂNCIA: DESAFIOS PARA A GESTÃO DO TRABALHO PEDAGÓGICO ESTADO DA ARTE DA PESQUISA EM EDUCAÇÃO SUPERIOR EM RONDÔNIA Cáthlen Lemos Silva16 [email protected] Carmen Tereza Velanga17 [email protected] RESUMO A fundação Universidade Federal de Rondônia - UNIR tem, como umas de suas principais e históricas missões institucionais o continuam desenvolvimento de ações voltadas para a melhoria da Educação no Estado, desafio que vem sendo enfrentado ao longo de sua trajetória por aqueles que reconhecem a relevância social e o papel das licenciaturas na construção deste objetivo. As facilidades oferecidas pelas ferramentas tecnológicas permitem a comunicação e orientação a distância, e o acesso a grandes volumes de informações, de forma diferenciada em termos de espaço e tempo de aprendizado. Altera-se o conceito do “presencial” e também o conceito de “aula”, sendo que o espaço e o tempo de aula passam a ser cada vez mais flexíveis. As atuais tecnologias, principalmente a INTERNET, nos impulsionam a modificações na forma de ensinar e aprender tanto nos cursos presenciais. como nos de educação continuada e à distância. Cada vez mais a aquisição da informação depende menos da presença do professor e, portanto, o estar junto fisicamente passa a ter significado quando algo importante acontece; o papel do professor passa a ser o de organizador e motivador da aprendizagem, auxiliando o aluno a interpretar as informações, relacioná-las e contextualizá-las. Esta pesquisa buscou conhecer as principais características desta modalidade de ensino, bem como ressaltar os principais pontos positivos e negativos e as dificuldades dos participantes deste processo (Gestores, Professores, Tutores e Alunos), na Educação a Distancia especificamente o curso de Pedagogia ofertado pela UNIR em parceria com a Universidade Aberta do Brasil-UAB. Palavras-chave: Gestão. Educação a Distancia. Formação de Professores. ABSTRACT The foundation of the Federal University of Rondônia - UNIR, has, as one of its main historical and institutional missions, the continued development of actions aimed at improving education in the State, a challenge that is being faced throughout his career by those who recognize the social relevance and the role of graduates in the construction of this goal. The facilities offered by the technological tools allow you to communicate the distance and orientation, and access to large volumes of information in different ways in terms of space and time for learning. Changes to the concept of "face" and also the concept of "class", and 16 17 Acadêmica do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Rondônia Profª. do departamento de Educação 97 that space and time class become increasingly flexible. The current technologies, especially Internet, in driving the changes in the way of teaching and learning in both courses. as in continuing education and distance learning. Increasingly, information acquisition depends less on the teacher's presence and, therefore, being together physically is to have meaning when something important happens, the role of the teacher becomes an organizer and motivator of learning, helping students to interpret information, and relate them to contextualize them. This research sought to identify the principal characteristics of this type of education, as well as highlight the main strengths and weaknesses and difficulties of the participants in this process (Managers, Teachers, Tutors and Students) in Distance Education Faculty of Education specifically offered by UNITE in partnership with the Open University of Brazil-UAB. Keywords: Management. Distance Education. Teacher Training. INTRODUÇÃO O Plano de Trabalho ora proposto decorre de uma pesquisa financiada pelo CNPq/PIBIC, iniciado em 2009, intitulado “A Construção do curso de Pedagogia a Distância da Universidade Federal de Rondônia: Desafios e Utopias”, que cumpriu na primeira etapa com o objetivo de historicizar o referido curso levantando a historia e a memória, que surgiu a partir da demanda por professores formados em toda a região e a oferta do Ministério da Educação na educação a distancia. Na UNIR, o Curso foi proposto em 2005, mas somente teria sua primeira turma de ingressantes em 2008. Mesmo em meio a promulgação das novas Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação do pedagogo (2006), o Projeto Político Pedagógico do curso ainda não atendia as reais demandas e peculiaridades regionais amazônicas, e passou por uma reformulação curricular ainda em 2009. Este novo PPP foi implantado em 2010. Que foi objeto de estudo no plano de trabalho de 2010 a 2011, buscando-se a partir da implantação da reformulação curricular, estudar o currículo do Curso de Pedagogia da UNIR na modalidade a distância mediante a reformulação provocada pelas novas Diretrizes Curriculares Nacionais (2006) e a sua implementação bem como as implicações da docência universitária para a efetivação deste currículo e para a formação do pedagogo no estado de Rondônia e continuou contemplando os estudos da historia e a memória desse curso, bem como os documentos legais que o constituem. E se propôs a identificar o perfil sócio-cultural dos principais atores envolvidos no processo pedagógico da EAD - Curso de Pedagogia da UNIR - no que se refere ás representações de suas funções e papéis, dificuldades e necessidades diante da estrutura e 98 organização da educação a distância na tarefa de formar o pedagogo no estado de Rondônia delineando a construção de um curso de Pedagogia que se propõe à formação a distancia. METODOLOGIA Como metodologia, utilizou-se a abordagem qualitativa e pesquisa do tipo estudo de caso, uma vez é uma pesquisa descritiva em suas diversas formas, onde focaliza a gestão do trabalho pedagógico e suas consequências para a formação do pedagogo na Universidade Federal de Rondônia bem como a problematização que se faz inserida em um Estado multicultural, amazônico, de dimensões geopolíticas e sociais, determinando aspectos relevantes a serem considerados nesta modalidade de formação de professores. O estudo de caso, conta com uma variedade de fontes de informação, onde o pesquisador recorre. Considerando que o Estado ainda necessita desses quadros formados para atender a demanda crescente no ensino fundamental, cabe-nos estudar os limites, os desafios e as utopias necessárias à construção desse Curso, e suas consequentes mudanças paradigmáticas. Estudar a gestão educacional em uma perspectiva democrática implica em reconhecer neste paradigma, o sentido para obter a qualidade de ensino necessária a formação de docentes para uma sociedade cidadã e para a formação do sujeito de direitos e deveres. GESTÃO NOS SISTEMAS DE EDUCAÇÃO A DISTANCIA A expansão e desenvolvimento da educação a distancia em todos os países do mundo estão associados à popularização e democratização do acesso às tecnologias de informação e de comunicação. O documento do ministério da educação Referenciais de Qualidade para a educação a distância destaca a importância do processo de gestão para o desenvolvimento de um bom sistema de educação a distância ( Brasil, 2007). Considera-se a gestão educacional um campo de suma importância para que se compreenda o conjunto do processo de ensinoaprendizagem na educação básica e superior, assim como na educação presencial ou a distância. Para Luck 2006, boas escolas emergem mais facilmente de sistemas de ensino bem organizados e orientados, a partir de uma concepção clara sobre educação e sobre o seu papel de gestão para promove-la. O termo Gestão Escolar começou a ser utilizado recentemente e está relacionado à ação que objetiva promover a organização, a mobilização e a articulação de todas as condições materiais e humanas necessárias para garantir o avanço dos processos 99 sócio-educacionais nos locais de ensino, onde a gestão visa a promoção efetiva da aprendizagem pelos alunos. O conceito de gestão escolar nasceu para superar um possível enfoque limitado do termo administração escolar. Foi construído a partir dos movimentos de abertura politica do pais, que começaram a promover novos conceitos e valores, associados, sobretudo a ideia de autonomia escolar, à participação da sociedade e da comunidade .A pratica da gestão escolar é de extrema importância, na medida em que se almeja uma escola que atenda exigências da vida social, ou seja, uma escola que: forme cidadãos, desenvolvendo suas competências e habilidades necessárias à inserção social. A gestão escolar está classificada em três áreas, de modo integrado ou sistêmico: Gestão Pedagógica, Gestão de Recursos Humanos e Gestão Administrativa. Neste momento prioriza-se a gestão pedagógica. A gestão pedagógica é considerada como a mais importante e significativa no sistema escolar, visto que cuida do gerenciamento da área educativa da escola e da educação escolar. Além de Estabelecer e traçar objetivos: gerais e específicos, para o ensino. Define as linhas de atuação, em função dos objetivos e do perfil da comunidade e dos alunos. Elabora os conteúdos curriculares, acompanha e avalia o rendimento das propostas pedagógicas, dos objetivos e o cumprimento de metas. Avalia o desempenho dos alunos, do corpo docente e da equipe escolar como um todo. Luck (2000) percebe a gestão escolar como sendo uma dimensão, um enfoque de atuação, um meio e não um fim em si mesmo, uma vez que o objetivo final da gestão é a aprendizagem efetiva e significativa dos alunos, de modo que, no cotidiano que vivenciam na escola, desenvolvam as competências que a sociedade demanda, dentre as quais se evidenciam: pensar criativamente Logo se entende que: Gestão é a atividade que procura garantir o sucesso de um empreendimento novo coletivo, que conhece e compreende a organização detalhadamente. A gestão fornece ferramentas para que os gestores possam ao mesmo tempo compreender, analisar e tentar melhorar ainda mais o seu desempenho operacional, e para se alcançar esses objetivos a gestão deve utilizar uma metodologia voltada para o auto-conhecimento, compreensão e determinação do ambiente, definições de estratégias, controle avaliativo, entre outros procedimentos. (BURIN; VARVOKIS; MORINI, 2006). A implantação de um sistema de gestão de Educação a Distancia requer de todos os envolvidos conhecimento amplo da organização, uma qualificação adequada e um desempenho grupal para que o projeto seja colocado em prática e os objetivos alcançados, gerando assim resultados pedagógicos e educacionais eficientes. O gestor deve contribuir na 100 qualificação dos tutores, apoiá-los em todo processo de ensino, planejamento o programa e disponibilizar a estrutura necessária para que eles produzam o material aos alunos o acesso às informações necessárias para que eles possam desenvolver as atividades. Costa (2001) aponta três modelos institucionais de Educação a Distância: autônomo, misto e em rede. No Brasil, a grande maioria de sistemas de educação a distância desenvolvese no âmbito das universidades já consolidadas no ramo de educação presencial (Costa, 2001; Mille,2002). Os recursos tecnológicos e físicos, os modelos de ensino adotados, a gestão dos recursos financeiros, a gestão de pessoal, a formação de professores e tutores, a elaboração e distribuição de material, a tecnologia adotada, os procedimentos acadêmicos e os sistemas de monitoramento e avaliação são princípios fundamentais para que a gestão do programa seja implantada com eficácia. É importante que a gestão respeite os requisitos referentes às diretrizes e critérios de qualidades exigidas por Leis, das instituições que oferecem essa modalidade de ensino. (AMARAL; CASTRO, 2005). Portanto, cabe ao gestor a reponsabilidade pela direção, organização planejamento e controle dos processos de formação pela modalidade. Há muitas condições decorrentes do processo que merecem atenção dos gestores, condições de disponibilidade dos recursos do processo administrativo: instalações, espaço, tempo, dinheiro, informações e pessoas. Os procedimentos de administração ou gestão como conhecemos hoje são extremamente complexos e organizados: planejar, sistematizar, coordenar e supervisionar são objetos de pensadores até hoje. Os sistemas de gestão atualmente implementados todos possuem uma história rica e antiga. Eles têm suas raízes em princípios científicos há tempos socializados - alguns anteriores a Revolução Industrial. LEGISLAÇÃO EM EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (nº 9.394, de 20 de Dezembro de 1996) estabeleceu-se o estatuto de maioridade para a Educação a Distancia. Garantindo o incentivo do poder publico, espaço amplo de atuação e tratamento privilegiado no que se refere a utilização de canais de radiodifusão. Os requisitos para a realização de exames e registros de diplomas seriam dados pela união e a demais dimensões (produção, controle, avaliação e autorização). Em seu art. 80º, a LDB estabelece: 101 Art. 80ª O Poder Publico incentivará o desenvolvimento veiculação de programas de ensino a distancia, em todos os níveis e modalidade de ensino, educação continuada. §1º A educação à distancia, organizada com abertura e regime especiais, será oferecida por instituições especificamente credenciadas pela união. § 2º a união regulamentará os requisitos para a realização de exames e registros de diplomas relativos a cursos de educação à distancia. § 3º. As normas para a produção, controle e avaliação de programas de educação à distancia e a autorização para sua implementação, caberá aos respectivos sistemas de ensino, podendo haver cooperação e integração entre os diferentes sistemas. §4º. A educação à distancia gozar de tratamento diferenciado, que incluirá: I-custos de transmissão reduzida em canais comerciais de radiodifusão sonora e de sons e imagens. II-concessão de canais com finalidades exclusivamente educativas; III-reserva de tempo mínimo, sem ônus para o Poder Publico, pelos concessionários de canais comerciais. Em 10 de Fevereiro de 1998, o decreto nº 2.494 foi criado e destinado a regulamentar o Art. 80, onde conceitua a educação a distancia, estipula diretrizes para a regulamentação, autorização e credenciamentos das instituições, estabelecendo tempo de validade para esses atos regulatórios, distribui competências, aborda assuntos referentes a matriculas, transferências, aproveitamento de estudos, certificados, diplomas de avaliação de rendimento, estabelece penalidades para o não atendimento dos padrões de qualidade e outras regularidades e determina a divulgação periódica, pelo Ministério da Educação, da listagem das instituições credenciadas e cursos autorizados. Fica estabelecido no Decreto nº 2.494: (a) Os cursos à distancia serão organizados em regime especial, com flexibilidade, requisitos para admissão, horários e duração, obedecendo, quanto for o caso, as diretrizes curriculares nacionais. (b) As instituições para oferecerem cursos de EAD que conduzam a certificação de conclusão ou diploma de EJA, Educação Profissional, ensino médio e graduação necessitam de credenciamento especial do MEC. (c) Os credenciamentos e autorizações terão prazo limitado de cinco anos. (d) É facultado a transferência e o aproveitamento de créditos dos alunos de cursos presenciais para cursos de EAD e vice-versa. 102 (e) Os diplomas e certificados de EAD terão validade nacional. (f) As avaliações com fins de promoção, certificação ou diplomação serão realizadas por meio de exames presenciais, sob responsabilidade da instituição credenciada. O Decreto nº 2.561, publicado em 27 de abril de 1998, corrigindo o disposto nos art. 11º e 12º do decreto acima citado. Refere-se a competência dos sistemas estaduais e municipais. No decreto nº 2.494, esses sistemas podiam regular a oferta de EaD destinada ao ensino fundamental de jovens e Adultos e ao Ensino Médio. Enquanto o decreto de abril expandiu essa proposta acrescentando o ensino profissional de nível técnico. Em 19 de dezembro de 2005, foi publicado o Decreto nº 5.622, que mais viria a ser complementado, pelo Decreto nº 6.303, de 12 de dezembro de 2007. Esses decretos regulamentam o Art. 80 presente na Lei de Diretrizes e Bases da Educação, de forma mais sucinta e concreta. Os documentos estabelecem normas para a educação a distancia, credenciamento das instituições, autorização e reconhecimento de cursos destinados para a educação a distancia. Nestes decretos estão presentes de forma detalhada, as normas e exigências para os procedimentos de autorização, reconhecimento de cursos, credenciamento de polos, identificação de irregularidades e suas devidas ações corretivas, formação de parceria entre as instituições, acordos convênios, dentre outras possibilidades. CURSO DE PEDAGOGIA A DISTÂNCIA UNIR/UAB O curso de pedagogia a distancia na UNIR foi projetado em 2005, projeto este que sofreu várias transformações até a sua efetiva implantação em 2008. A oferta dos cursos a distância em Rondônia UNIR/UAB, estão nas seguintes localidades: Ariquemes, Ji-paraná, Chupinguaia, Rolim de Moura, Porto Velho, Nova Mamoré e Buritis. A modalidade a distância no curso de formação de professores na Unir atendem a divisão de carga horária conforme RESOLUÇÃO CNE/CP 2, 19 de Fevereiro de 2002, em seu Art.º 1º que estabelece que a carga horária de duração em 2.800 nos cursos de formação de professores, dividindo-as em atividades de pesquisa, estágio supervisionado e atividades de aprofundamento teórico-práticas para aprofundamento em áreas especificas. A implantação do curso resultado da parceria UNIR/UAB, que visa formação de professores no estado de Rondônia se justifica pela necessidade de um público de professores que já atuavam nas séries iniciais e que em consequência da lei nº 9.394/96, que tornou 103 obrigatório a graduação dos professores da Educação Básica, aumenta a procura pelos cursos de ensino superior, além do mais levar o ensino superior a localidades distantes da capital e de difícil acesso. O objetivo do curso é formar profissionais voltados para atuação na Educação Básica e gestores dos espaços escolares. Como consta no Projeto Pedagógico do Curso de Pedagogia, o objetivo geral é: Formar professores que compreendam o processo educativo escolar com suas múltiplas inter-relações: pedagógicas, historias, sociais, econômicas, politicas e culturais, com domínio de fundamentos teóricos básicos das ciências que integram o currículo dos anos iniciais e, concomitantemente, seu tratamento didático-metodológico, exigido em nível destes anos (PPP do curso, 2007,p. 12). AMBIENTE VIRTUAL DO CURSO DE PEDAGOGIA UNIR/UAB Modular Object-Oriented Dyanamic Learnig Environment - MOODLE é o ambiente virtual utilizado no curso de pedagogia a distancia ofertado pela UNIR. A capacitação para o uso do Moodle para os tutores, professores e coordenadores de polo é oferecida pela coordenadoria de educação a distancia da UNIR, para os discentes, a capacitação é proporcionada nos primeiros dias de aula, onde se constitui uma aula inaugural presencial em cada cidade onde o curso é ofertado. APRESENTAÇÃO DOS DADOS E ANALISE Atualmente o curso de Pedagogia na modalidade a Distância UNIR/UAB é coordenado pela Professora Drª. Carmen Tereza Velanga graduada em Pedagogia na UNESP, com especialidade em Administração Escolar e Educação especial (UNESP), mestrado em Educação e Politicas Públicas (UFRJ) e Doutorado em Educação (PUC-SP), assumindo o posto de coordenadora pedagógica em 2008. O curso em sua trajetória teve seu currículo reformulado para atender as exigências das novas Diretrizes Curriculares Nacionais 2006 - DCNs. O Modelo do Curso está proposto no seu Projeto Politico Pedagógico, cuja matriz curricular prevê disciplinas e atividades curriculares de pesquisa, eixos temáticos propondo a interdisciplinaridade, estágio curricular. A proposta baseia-se na linha de pensamento sócio interacionista. 104 O Curso de Pedagogia EAD da UNIR tem dois Projetos Politico Pedagógico, o primeiro foi elaborado com alguns professores do DED antes de 2008, e ainda antes das DCN de 2006 serem implantadas. Foi necessário refazer o Projeto Politico Pedagógico dessas primeiras turmas em atendimento às DCN. Participaram dessa construção alguns professores do DED, que já estavam trabalhando para desenvolver o curso. Foi construído por um grupo de professores do DED, que também passaram a participar como professores do curso a distancia. As principais características do curso, em seu modelo curricular são: Interdisciplinaridade, ambos os PPPs promovem eixos temáticos ao final de um período, contribuindo para o encontro dos alunos, dos conhecimentos adquiridos nas disciplinas daquele período ou semestre, com apresentação de trabalhos temáticos propostos por um Coordenador do Eixo Temático, que deve ser escolhido entre os professores do semestre. Este professor acompanha a apresentação dos seminários temáticos, juntamente com tutores do Curso, e, quando o orçamento do curso possibilita, outros professores também são convidados a participar. Caso não haja possibilidade orçamentária de reunir este grupo presencialmente, a proposta é manter um encontro virtual, manter um fórum também, onde se registram os trabalhos. O Curso hoje trabalha com dois PPP: O primeiro para as turmas antigas, que já estão no 6 semestre ( e já teriam terminado não fossem os problemas enfrentados na UNR e na gestão da DIRED). O segundo PPP está iniciando, pois abrange as novas turmas, que vão cursar o 2º período assim que o curso for retomado. O Curso prevê estágios, totalizando 300 horas, em espaços escolares e não escolares, com acompanhamento supervisionado para os alunos. Prevê oficinas culturais, que são atividades práticas e também propõe seminários e eventos oferecidos pelo próprio polo a fim de que os alunos possam ter suas atividades complementares (principalmente nos municípios onde tais eventos educacionais são mais raros). PRODUÇÃO DO MATERIAL DIDÁTICO O material didático para o curso de Pedagogia foi e está sendo construído por professores convidados da UNIR, que trabalham na área específica do componente curricular. Este material segue a proposta geral para o ensino a distância, ou seja, necessita incluir uma dinâmica para esta modalidade, como: uma linguagem interativa com o aluno, remete-lo a 105 ambientes virtuais de pesquisas, apontando links para pesquisar, sites, indicando leituras complementares, livros, filmes e vídeos. A Coordenação do Curso faz o convite ao professor, que ao aceitar, assina um termo de compromisso indicando sua responsabilidade juntamente aquele material, que inclui ceder os direitos autorais para a UAB, deve ter o cuidado para não cometer plágios (pois isso é um problema muito sério neste tipo de produção), também são enviados alguns modelos de outros materiais que são considerados bons, com a linguagem para EAD adequada, bem como manuais que temos de outras universidades, além das orientações da equipe da DIRED, que cuida exatamente da diagramação e da edição desses materiais. O professor tem um tempo para produzir, encaminha o material em cd-room, a equipe da DIRED trabalha com esse material, se for o caso, se reúne com o professor propondo algumas modificações ou sugestões para sua melhoria, até que vi editá-lo. A Coordenação disponibiliza a apostila ou material no ambiente virtual para os alunos terem acesso. Ou seja, é de responsabilidade da Coordenação do Curso encaminhar e acompanhar esse processo até que o material esteja disponível para o aluno no AVA (Ambiente Virtual de Avaliação), para que ele possa cumprir adequadamente a disciplina. A equipe da tutoria tem um papel fundamental e muito relevante no curso de pedagogia a distancia, os professores são formados em Pedagogia e especialistas em alguma área pedagógica com experiência na modalidade a distancia. Para a coordenadora pedagógica, as especializações dos tutores contribuem significativamente, “surpreende o professor da disciplina positivamente, e assim eles passam a agir como parceiros para diminuir as dificuldades do curso junto ao aluno”. A equipe de tutoria está formada por: 01 Coordenador de Tutoria, uma equipe de tutores presenciais e outra equipe de tutores a distância. Os tutores presenciais trabalham diretamente nos polos do curso, eles tem uma agenda de trabalho que é publicada no polo, atendendo aos alunos presencialmente. Ajudam os alunos nas suas dificuldades de compreensão das atividades e às vezes até do conteúdo do material fornecido. Buscam esse aluno quando percebem que está desistindo por algum motivo, telefonam e mesmo vão até suas casas (pois residem no mesmo município), tentando traze-los de volta ao curso. Os tutores apresentam as dificuldades dos alunos e mantem um contato via internet com a coordenação e com os professores. Os tutores a distancia tem o papel de mediar a ação pedagógica do professor ministrante com o aluno. Eles são divididos por polo, conforme o numero de alunos, e trabalham diretamente com a coordenação de tutoria e do Curso, na UNIR em Porto Velho. 106 Mantem uma agenda semanal de encontros para discutir como estão indo as turmas naquela determinada disciplina, quais são os problemas detectados - desde problemas de acesso ao ambiente, tecnológicos até os pedagógicos. São estes tutores que mantem quase que um trabalho de monitoria junto ao professor ministrante e ao mesmo tempo coletam os dados do tutor presencial para discuti-los e resolve-los nas reuniões semanais. Os professores ministrantes precisam ter vinculo com a UNIR e geralmente são apontados pelos departamentos. A Coordenação do Curso envia a demanda para os departamentos, que, em suas reuniões, coloca as necessidades e envia a Coordenação do Curso os nomes e contatos dos professores que desejam ministrar as disciplinas que serão ofertadas naquele semestre. A Coordenação tem um documento intitulado “Orientações Metodológicas”, o qual é orientador desde o ambiente virtual (na abertura das salas ambientes) , até o registro das aulas e entrega das notas. Além desse documento, quando se faz necessário ou seja, quando o professor não tem nenhuma experiência com EaD, por exemplo), a Coordenação propõe uma capacitação breve para o professor se ambientalizar com a plataforma Moodle, que é utilizada no curso, e também conhecer as ferramentas pedagógicas, como: postagem de material nos lugares adequados, fóruns, chats, diário de bordo, enfim, saber operar na modalidade. com a disciplina, propor-se a acompanhar o aluno, etc). As reuniões pedagógicas envolviam a todos, que se conheciam, conheciam os papeis de cada um, percebiam que uns complementariam as funções dos outros, perceberiam o caráter interdisciplinar do curso e se esforçariam para agir dessa maneira, desde o planejamento da disciplina. Este modelo adotado inicialmente, foi enfraquecendo devido ao alto custo de deslocar professores e também das responsabilidades que eles passariam a assumir dentro do curso pelo menos naquele semestre. Houve resistências para adesão deste modelo de gestão no trabalho pedagógico, quando o curso entrou em crise, como todos os demais junto a DIRED e UAB. Os professores ministrantes tem uma disciplina que fica 28 dias on-line. Os alunos cumprem uma disciplina por vez. Cada uma delas fica no AVA por 28 dias e neste período o professor recolhe as atividades, as devolve e fecha suas notas. É acompanhado pelo tutor a distancia até fechar notas. Quando há necessidade de recuperação, se ela não foi feita concomitantemente (paralela a disciplina), então há um prazo para isso, para que o aluno tenha a chance de refazer atividades ou outras atividades e recuperar seu desempenho. Após esse período vem a avaliação, que encerra a disciplina. 107 Os professores são constantemente monitorados pela tutoria a distancia, recebem as informações dos tutores presenciais (sobre desempenho e dificuldade dos alunos) e tem completa liberdade junto a Coordenação do Curso, pois todos devem estar empenhados no desenvolvimento da aprendizagem do aluno. Os polos eram visitados constantemente em equipe, no início da implantação do curso, todos os meses, ou bimestralmente. Foram realizadas reuniões mensais com os coordenadores dos polos na DIRED onde se tratavam dos assuntos pedagógicos e administrativos do Curso. Depois essas reuniões foram sendo diminuída por conta da escassez de recursos, isso diminui a qualidade do curso. O acompanhamento se dá de duas formas: por e-mail e telefone e em reuniões presenciais. Isso tudo repercute na qualidade do curso, na crise que foi se instaurando e finalmente na paralização do curso. CONSIDERAÇÕES FINAIS A presente pesquisa desenvolveu estudos sobre gestão pedagógica na modalidade de ensino a distancia, especificamente no Curso de Pedagogia ofertado pela Universidade Federal de Rondônia e a Universidade aberta do Brasil. Além de fazer um breve relato sobre o a construção do curso. Diante dos resultados, a pesquisa constatou que a Unir sempre esteve preocupada em todo com a formação de profissionais para que possam atender as demandas do mercado de trabalho do estado de Rondônia. Hoje o curso de Pedagogia na modalidade a distancia encontra mais um desafio à retomada de suas atividades. Fica nítido a gestão integrada nos sistemas de ensino em EaD, onde cada participante do processo (COORDENADOR, PROFESSOR, TUTOR e ALUNOS) fazem contribuições significativas no processo de construção do curso a luz de uma gestão democrática, é evidente que esta modalidade de ensino, desperta nos alunos outra dimensão no que se diz respeito a aprendizagem, o aluno se torna mais autônomo e procura novas formas de buscar o conhecimento, fazendo seus próprios horários, explorando novas ferramentas. Este curso possui uma concepção de ensino e estrutura curricular diferenciada. REFERÊNCIAS PARO,Vitor Henrique. Administração Escolar: introdução crítica. São Paulo: Cortez, 1986. LUCK, Heloísa. Gestão Educacional: Uma Questão Paradigmática. Editora: Vozes, 2006. 108 LUCK, Heloísa. Ação Integrada: administração, supervisão e orientação educacional. Editora: Vozes, 2002. SOUZA, José Vieira. Teorias Administrativas. Brasília: Universidade de Brasília, 2006. (Pró Funcionário - Curso Técnico de Formação para funcionários da educação). VELANGA, C.T; BRASILEIRO, T.S.A.; COLARES, M.L. I. S.; COLARES, A. A. (Orgs.). Gestão educacional e escolar: desafios e possibilidades na contemporaneidade. São Carlos: Pedro & João Editores; Porto velho: EDUFRO, 2009. COSTA, M. G. P. Ecologia da escola: capacitação de professores por meio da educação a distância. Educação em Foco, Belo Horizonte: FAE/CBH/UEMG, 2001. BRASIL. Ministério da Educação, Secretaria de Educação a Distância. Referenciais de qualidade para educação superior a distância. Brasília: MEC-SEED, 2007. ______ Leis, Decretos, etc. Decreto n. 3.276, de 6 de dezembro de 1999. Dispõe sobre a formação em nível superior de professores para atuar na Educação Básica e dá outras providências. ______ Leis, Decretos, etc. Lei n. 9394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. ______ MEC/Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CP 1 de 18 de fevereiro de 2002. Institui diretrizes nacionais para a formação de professores da educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena. ______ MEC/Conselho Nacional de Educação. Versão Preliminar: Proposta de Diretrizes para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica, em Cursos de Nível Superior. Fevereiro de 2001. AGRADECIMENTOS: Ao CNPQ; Ao PIBIC; A minha orientadora Carmen Tereza Velanga; A todos que contribuíram de forma direta e indireta. 109 AVALIAR, MEDIR, TESTAR... CRUZES! UM ESTUDO SOBRE A PRÁTICA DA AVALIAÇÃO EDUCACIONAL NAS ESCOLAS DA REDE PÚBLICA DE ROLIM DE MOURA/RO Cleonice Nunes Fernandes Fraga18 Flavine Assis de Miranda19 RESUMO Este estudo tem como objetivo confrontar o discurso do professor e sua atuação prática quanto à avaliação educacional e sua relação com o planejamento de ensino. Foram utilizados como procedimentos metodológicos: pesquisa bibliográfica, observações diretas em campo e entrevista. Tomamos como base as concepções de Luckesi (2006), Haydt (1994), Hoffman (1992) e Turra (1982). Resultados da pesquisa evidenciaram o uso da pedagogia do exame onde as provas foram utilizadas para punição de alunos e não como instrumento auxiliar da aprendizagem. Palavras-chave: Avaliação da Aprendizagem. Planejamento Educacional. Prática docente. INTRODUÇÃO Avaliar, medir, testar... Cruzes! Exclamações como essa são frequentes no ambiente escolar quando o assunto é avaliação educacional. Dentre as indagações e constatações que permeiam este universo, um fato que tem sido recorrente é o medo de avaliar, testar e medir. Os objetivos da pesquisa são: identificar por meio de observação a prática avaliativa dos professores referente à verificação da aprendizagem e do desempenho escolar do aluno, e os instrumentos de avaliação utilizados; Identificar a concepção pedagógica do professor, seu planejamento de ensino e proposta de avaliação; e relacionar o discurso do professor e sua atuação prática quanto à avaliação educacional e sua relação com o planejamento de ensino. A metodologia que dá suporte ao estudo se pauta na pesquisa educacional qualitativa por meio de procedimentos como observação direta em campo, pesquisa bibliográfica e entrevista estruturada. Foram investigadas turmas do ensino fundamental em diferentes escolas municipais de Rolim de Moura/RO. 18 Aluna do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Rondônia – UNIR/Campus de Rolim de Moura, bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC/UNIR/CNPQ. 19 Professora da Universidade Federal de Rondônia – UNIR/Campus de Rolim de Moura. Doutora em Educação pela UNESP/FCLAR e Líder do Grupo de Pesquisa em Política, Gestão e Avaliação da Educação – GPPGAE/UNIR. 110 A fundamentação teórica que está subdividida em quatro tópicos, sendo que o primeiro vem discutindo os conceitos de avaliar, testar e medir segundo as abordagens de Haydt (1994), Hoffman (1992), Lea Depresbiteris (1991), Luckesi (2006) e Moreto (2002). O segundo discute conceitos como os de avaliação diagnóstica, formativa e somativa que passaram a fazer parte do repertório teórico de avaliação. O terceiro tópico da fundamentação trata da importância do planejamento para a avaliação educacional. E o quarto tópico discute as tendências pedagógicas. Os resultados apresentados foram divididos em duas partes: uma para apresentar os dados das observações de campo e outra para os dados obtidos com as entrevistas; por fim, apresentam-se as considerações finais, apontando as evidencias que se destacaram no desenvolvimento da pesquisa. O QUE É AVALIAR, MEDIR E TESTAR? A avaliação é muito importante e não se aplica somente na escola, mas em qualquer outra prática. Refletir é avaliar, e avaliar é planejar, estabelecer objetivos. Haydt (1994, p.10) afirma que “Avaliar é julgar ou fazer a apreciação de alguém ou alguma coisa, tendo como base uma escala de valores [...] consiste na coleta de dados quantitativos e qualitativos e na interpretação desses resultados com base em critérios previamente definidos”. Na opinião de Luckesi (2006, p. 180) o ato de avaliar “[...] por sua constituição mesma não se destina a um julgamento ‘definitivo sobre alguma coisa, pessoa ou situação, pois que não é um ato seletivo’. A avaliação se destina ao diagnóstico e, por isso mesmo, a inclusão;” Durante muito tempo, principalmente depois do aperfeiçoamento dos instrumentos de medida em educação, o termo avaliar foi usado como sinônimo de medir. Mas medir é apenas um procedimento da avaliação. Haydt (1994, p.9) afirma que “Medir significa determinar a quantidade, a extensão ou o grau de alguma coisa, tendo por base um sistema de unidades convencionais”. Segundo os estudos de Hoffman (1992) Scriven afirma que a medida é cortar ou numerar de tal forma que se possa descrever mais exatamente o quanto alguma coisa é grande, pequena, longa, etc. Portanto a medida não pode ser confundida com a avaliação, pois medir é cortar, determinar quantidade e avaliação é muito mais que os números. Testar é um procedimento da avaliação que consiste basicamente em examinar, experimentar e provar uma situação de forma padronizada. Haydt (1994, p. 9) afirma que: 111 “Testar significa submeter a um teste ou experiência, isto é, consiste em verificar o desempenho de alguém ou alguma coisa (um material, uma máquina etc.)”. Luckesi (2006) aponta que uma das características mais evidentes da nossa prática avaliativa educacional é o que ele denomina de “pedagogia do exame”, segundo ele “o ensino centra-se no exercício de resolver provas a partir de determinados conteúdos [...]” (2006, p.17). Os estudos de Moreto (1991) apontam que os alunos ao longo dos anos passam a estudar só: se tiver prova, se vai cair na prova e para a prova. Luckesi (2006, p.19) aponta ainda que: Os professores utilizam as provas como instrumentos de ameaça e tortura prévia dos alunos, protestando ser um elemento motivador da aprendizagem. Quando o professor sente que seu trabalho não esta surtindo o efeito esperado, anuncia aos seus alunos: “Estudem! Caso contrário, vocês poderão se dar mal no dia da prova”. Mas como um objeto de tortura e ameaça pode ser motivador para aprendizagem? Como estudar de forma significativa se o medo da prova está presente a todo o momento na sala de aula? FUNÇÕES DA AVALIAÇÃO Expressões e conceitos como os de avaliação diagnóstica, formativa e somativa passaram a fazer parte do repertório teórico de avaliação. Mas o que significa estas expressões? A avaliação diagnóstica é aquela realizada no início de um curso, período letivo ou unidade de ensino, com a intenção de constatar se os alunos apresentam ou não o domínio dos pré-requisitos necessários, isto é, se possuem os conhecimentos e habilidades imprescindíveis para as novas aprendizagens. A avaliação formativa, com função de controle, é realizada durante todo o decorrer do período letivo com o intuito de verificar se os alunos estão atingindo os objetivos previstos, isto é, quais os resultados alcançados durante o desenvolvimento das atividades. A avaliação somativa, com função classificatória, realiza-se ao final de um curso, período letivo ou unidade de ensino, e consiste em classificar os alunos de acordo com níveis de aproveitamento previamente estabelecidos, geralmente tendo em vista sua promoção de uma série para outra, ou de um grau para outro. 112 Na perspectiva teórica de Haydt (1994) para garantir a eficiência do sistema de avaliação do processo ensino-aprendizagem o professor deve fazer uso das três modalidades da avaliação. Enquanto que na perspectiva de Luckesi (2006) a avaliação tem que ser diagnóstica e não classificatória como vem sendo praticada nas escolas. AVALIAÇÃO EDUCACIONAL E O PLANEJAMENTO Para Freire (2008, p.170) “O planejamento nasce da avaliação”, pois o ato de planejar envolve olhar o passado projetando o futuro para se construir o presente. Desse modo, as ações a serem planejadas partem de uma avaliação que possibilite esse diálogo com o que temos e o que desejamos conquistar em termos de conhecimento e formação do sujeito. E o planejamento permite direcionar a prática pedagógica para a busca dos objetivos propostos a fim de concretizá-los. O ato de planejar é a atividade intencional pela qual se projetam fins e se estabelecem meios para atingi-los. Por isso, não é neutro, mas ideologicamente comprometido. Segundo Luckesi (2006, p. 118) “a avaliação atravessa o ato de planejar e de executar. Por isso, contribui em todo o percurso da ação planificada.” O planejamento deve ser uma base para a avaliação, pois é através dele que o professor pode orientar o seu trabalho, estabelecer objetivos, critérios para a análise. Para Luckesi (2006, p. 165) [...] planejamento e avaliação são atos que estão a serviço da construção de resultados satisfatórios. Enquanto o planejamento traça previamente os caminhos, a avaliação subsidia os redirecionamentos que venham a se fazer necessários no percurso da ação. A avaliação é um ato de investigar a qualidade dos resultados intermediários ou finais de uma ação, subsidiando sempre sua melhora. O professor deve avaliar seus alunos através de seus objetivos planejados no início do ano letivo. Pois avaliar é verificar se os resultados desejados foram alcançados, e quanto mais técnicas e instrumentos de avaliação usar melhores resultados poderão obter. E todos os instrumentos de avaliação terão um bom resultado se forem usados de acordo com os objetivos previstos. 113 TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS A tendência tradicional parte do pressuposto de que o aluno deveria ser protegido de estímulos externos para concentrar sua atenção nas explicações do professor, considerava-se que os conhecimentos científicos transmitidos prontos às crianças. Como afirma Saviani (2005, p. 06) “A escola organiza-se como uma agência centrada no professor, o qual transmite segundo uma graduação lógica, o acervo cultural aos alunos. A estes cabe assimilar os conhecimentos que lhes foram transmitidos.” Saviani (2005) aponta também que as tendências progressistas partem de uma análise crítica das realidades sociais, sustentam implicitamente as finalidades sociopolíticas da educação. A tendência progressista, que se ramifica em três correntes: libertadora, libertária e histórico-crítica. A tendência libertadora vincula a educação à luta e organização de classe do oprimido, busca a transformação social, a condição de se libertar através da elaboração da consciência crítica passo a passo com sua organização de classe. A tendência libertária parte do pressuposto de que apenas o vivenciado pelo aluno é incorporado e empregado em situações novas, por isso o saber sistematizado só terá relevância se for possível seu uso prático. A tendência histórico-crítica prioriza os conteúdos no seu confronto com as realidades sociais, instrui o aluno para o mundo adulto, com participação organizada e ativa na democratização da sociedade; por meio da aquisição de conteúdos e da socialização. O professor é o mediador entre conteúdos e alunos, o ensino/aprendizagem tem como centro o aluno. Segundo os estudos de Silva (2012) aponta que para Libâneo a pedagogia liberal defende a ideia de que a escola tem a função de preparar os alunos para a atuação de papéis sociais, de acordo com as aptidões individuais. Isso pressupõe que o aluno precisa adaptar-se aos valores e normas vigentes na sociedade de classe, através do desenvolvimento da cultura individual. RESULTADOS E DISCUSSÕES DAS OBSERVAÇÕES DE CAMPO Os dados apresentados aqui são referentes à observação de campo realizado em 2011 nas turmas do ensino fundamental das escolas municipais. As categorias de analise foram às 114 seguintes: prática pedagógica e as concepções pedagógicas; planejamento pedagógico e avaliativo; funções da avaliação: somativa, formativa e diagnóstica; prática avaliativa. Podemos constatar que 83,33% dos professores observados nas escolas municipais apresentaram apenas a pauta do dia. Relata-se que nesta pauta, de maneira geral, são relatados apenas aspectos como: Oração, leitura, problema matemático, português leitura e interpretação do texto: “o gato e a barata” (professora X, 3º ano EF, escola Y). Apesar da precariedade dos planejamentos 40% deles foram desenvolvidos completamente durante a aula. Apesar da importância do planejamento para prática pedagógica podemos identificar que os professores utilizam esse instrumento apenas para cumprir com uma exigência da escola e não como uma ferramenta necessária para sua prática em sala de aula. Podemos perceber, ainda, que os professores observados segue a tendência da escola tradicional, onde as tarefas são passadas no quadro para os alunos copiarem e logo depois corrige, em geral, deixa pouco tempo para os alunos encontrarem as respostas. Os professores também estão muito presos ao livro didático. As provas foram aplicadas de forma rígida, tradicional, onde os alunos deviam ficar organizados em filas, sem nenhum tipo de conversa, e a orientação do professor para não olharem para as provas dos colegas, pois ele estaria olhando. O professor também deixou claro que não iria ajudar nenhum aluno, pois era prova. Hoje é dia de prova não vou explicar nada no quadro, se você não sabe deixa sem fazer. (professora R, 3º ano EF, escola W). Podemos perceber que a prova foi utilizada para punir os alunos, pois durante todo o ensino do conteúdo o professor dizia que: Fiquem quietos isso vai cair na prova! Prestem atenção, vai ter prova desse conteúdo em! (professora R, 3º ano EF, escola W). Entretanto essa não deveria ser uma das funções da avaliação, conforme aponta Haydt (1994, p. 26) “a avaliação deve ser um instrumento para estimular o interesse e motivar o aluno para o maior esforço e aproveitamento e não uma arma de tortura ou punição.” A prova 115 como punição não ajuda em nada, a não ser deixar os alunos traumatizados em relação às provas. Podemos perceber que só a função somativa foi encontrada nas escolas. Onde os alunos são classificados pelas notas obtidas nas provas, entretanto o professor deve fazer uso conjugado das três modalidades de avaliação: formativa, somativa e diagnóstica. RESULTADOS E DISCUSSÕES DAS ENTREVISTAS Os resultados apontados pelas entrevistas são referentes às escolas do ensino fundamental do município, dados obtidos em 2012, foram entrevistados 5 dos 6 professores observados durante a pesquisa de campo com a finalidade de relacionar o discurso do professor e sua atuação prática quanto à avaliação educacional e sua relação com o planejamento de ensino. Todos os sujeitos entrevistados tem formação superior e possuem pós-graduação na área de formação. O tempo de atuação como docente pode ser expresso da seguinte forma: 3 sujeitos entre 6 a 15 anos de efetivo exercício e 2 sujeitos entre 16 a 30 anos de exercício. No que se refere à questão sobre aos conteúdos estudados na formação inicial e ou continuada sobre a avaliação educacional, dois professores afirmam terem estudado sobre a avaliação, mas não se lembram de quais conteúdos específicos. Sobre as considerações de como o sujeito aprende verifica-se três respostas que se adéquam a tendência progressista da educação e uma se situa na tendência liberal. Como exemplo da tendência progressista pode ser observado no fragmento abaixo: [...] o aluno é o construtor principal da sua própria aprendizagem, é influenciado pela inteligência, motivação com estímulos e impulsos [...] (professora X, 4º ano EF, escola Y) Conforme os estudos de Saviani (2005) as tendências progressistas partem de uma análise crítica das realidades sociais, sustentam implicitamente as finalidades sociopolíticas da educação. O conteúdo a ser estudado deve ser extraído da realidade dos alunos e deve levá-lo a conscientização de sua história. Exemplo da tendência liberal pode ser observado no fragmento a seguir: Para mim, o aluno aprende a aprender com a convivência e atitudes do cotidiano que desenvolve e que estimula ou não aptidões cognitivas... Quem deve promover, e levar o aluno a aprender é o professor... Se os alunos não 116 aprender a aprender, se ele não foi ensinado a aprender, ele nunca vai aprender de verdade. (professora Z, 2º ano EF, escola W) Segundo os estudos de SILVA (2012) aponta que Libâneo afirma que na pedagogia liberal o aluno aprende a aprender, a escola deve proporcionar meios para que permitam o aluno educar-se. Quando questionados sobre a avaliação realizada na e pela escola pode ser considerado adequado? Verifica-se pelas respostas obtidas que mesmo não considerando adequada a avaliação feita na e pela escola os sujeitos da pesquisa não identificam quais os principais desafios a serem enfrentados, ou mesmo não apresentam propostas desafiadoras para mudar a forma de avaliar a aprendizagem dos alunos. [...] acredito que não, porque ela é muito tradicional usada ainda hoje né... Consiste em atribuir nota ou conceito aos aluno... então ela acaba sendo uma forma de discriminação. (professora R, 3º ano EF, escola W) Quanto às competências para o desenvolvimento do trabalho de avaliação da aprendizagem dos alunos, as respostas apresentam aspectos como: “ter um bom planejamento”; “a pensar, aprender a aprender”; “respeitar as diferenças de cada aluno”; “um profissional criativo, observador, mediador, inovador”. Ao responderem sobre como realizam a avaliação de seus alunos em sala de aula, verifica-se a necessidade de seguir um sistema de provas e geração de notas determinados pela escola, bem como se verifica a existência de respostas que afirma a utilização da função formativa da avaliação por meios qualitativos como observação e registro do cotidiano do aluno em sala de aula. [...] eu tenho que acatar o que a escola me passa, mas eu tenho a minha forma diferenciada para avaliar meu aluno... Não levo em consideração só a avaliação que o aluno fez, observo o aluno... Eu coloco a avaliação como uma forma de buscar aquilo que esta faltando... (professor K, 2º ano EF, escola S) Verifica-se que mesmo tendo uma “norma” para ser seguida os professores afirmam que tem sua forma diferenciada de avaliar utilizando a observação e o registro, Haydt (1994) aponta que uma das melhores técnicas que o professor dispõe para conhecer o comportamento de seus alunos é a observação, pois é através dela que ele identifica suas dificuldades e avalia seu desempenho nas várias atividades realizadas e seu progresso na aprendizagem. Mas essa observação tem que ser registrada! 117 No que se refere ao uso dos instrumentos de avaliação verifica-se que os sujeitos entrevistados afirmam a necessidade de um uso variado destes, o que pode ser observado pela fala a seguir: Eu acredito que não... o professor... deve usar... diversos instrumentos não tem que priorizar um ou outro [...]. (professora R, 3º ano EF, escola W) Podemos compreender que mesmo havendo a predominância da utilização de provas como instrumento avaliativo os professores entrevistados demonstram que tal predominância ou priorização não é adequada ao processo de avaliação da aprendizagem. Esta orientação quanto ao uso de instrumentos de avaliação diversificados pode ser encontrada em autores como Luckesi (2006), Hoffman (1992), Silva (1992), Haydt (1994) entre outros. Quanto à prática da avaliação que predomina neste contexto infere-se pelas respostas dos sujeitos uma concepção de que esta deva ser continua e não punitiva, que deva respeitar as individualidade dos alunos e que responda a objetivos e conteúdos previamente elaborados e estruturados segundo os aspectos do planejamento, além de utilizar instrumentos de avaliação que sejam adequados ao aluno no que se refere ao grau de dificuldade. Vejam as falas a seguir: Trabalhando com clareza e os objetivos de acordo com as dificuldades do aluno, usando instrumentos de avaliação diversificada [...] (professora Z, 2º ano EF, escola W) [...] sem que o aluno perceba você pode estar fazendo essa avaliação ou sem estar usando aquela avaliação como uma arma [...] (professor K, 2º ano EF, escola S) A fala do professor K corrobora com as perspectivas de Haydt (1994), Luckesi (2006) onde a avaliação não deve ser usada como uma arma de tortura ou punição e sim como um instrumento para estimular o interesse e motivar o aluno. Com base nas respostas analisadas verifica-se que a contribuição da avaliação se da quando esta acontece de forma contínua e formativa, quando seus resultados são utilizados pelo professor e equipe pedagógica para a verificação dos avanços educacionais dos alunos, podemos observar pelos fragmentos abaixo: [...] quando usamos as avaliações para fazer intervenções e reflexões necessárias redimensionando o planejamento adequado às necessidades do aluno [...] (professora Z, 2º ano EF, escola W) 118 [...] acompanhando dentro do processo de avaliação o mais importante que é seguir de perto o desenvolvimento do aluno e detectar as suas atitudes e suas habilidades. (professora X, 4º ano EF, escola Y) Tais respostas nos levam a compreender que o planejamento e avaliação são atos que estão a serviço da construção de resultados satisfatórios, como afirma Luckesi (p. 165, 2006) “enquanto o planejamento traça previamente os caminhos, a avaliação subsidia os redirecionamentos que venham a se fazer necessários no percurso da ação... é um ato de investigar a qualidade dos resultados intermediários ou finais de uma ação”. Esta orientação quanto ao uso do planejamento como prática reflexiva para a melhoria da ação avaliativa também pode ser encontrada em autores como Moreto (2002), Silva (1992), Freire (2008). CONSIDERAÇÕES FINAIS Após concluirmos o nosso trabalho compreendemos que avaliar é uma atividade complexa e que deveria ser usada em prol do educando para auxiliá-lo em sua aprendizagem e não para puni-lo ou ameaçá-lo. Os dados da pesquisa apontam a utilização da prova como um instrumento de avaliação disciplinador e punitivo, exercendo função classificatória e excludente, para fins de aprovação e reprovação. Esse fato corrobora com a perspectiva de Luckesi (2006) quanto à pedagogia do exame se manter presente nas escolas de educação básica orientando o processo de ensinoaprendizagem à preparação do aluno para responder a testes, provas e exames. Os dados da pesquisa apontam, ainda, que a falta de um planejamento consistente das ações pedagógicas do professor, aliada aos equívocos deste quanto ao entendimento de que as ações de avaliar, medir e testar são distintas e não análogas, corroboram para a manutenção do que Luckesi aponta ser uma pedagogia do exame. As observações e as entrevistas realizadas nas escolas da rede municipal do ensino fundamental nos revelam que a prática pedagógica destes professores ainda está pautada em um ensino tradicional. Em relação ao planejamento podemos constatar que apesar dos professores terem conhecimento de sua estrutura e sua importância para prática pedagógica poucos utilizam deste instrumento no seu dia a dia, apenas utilizam a pauta, que muitas vezes não garante para os professores indicadores para avaliação das atividades realizadas, desta forma, o professor fica sem informações para repensar suas ações e reencaminhar a sua prática. 119 Os professores participantes deste estudo, apesar de terem representações sobre as concepções pedagógicas, liberais e progressistas revelados nas entrevistas, na observação constataram uma concepção tradicional e algumas uma posturas em que o professor se coloca como único detentor do saber. Dito isto, podemos analisar que apesar dos professores conhecer (teoricamente) concepções pedagógicas, ainda não consegue de forma efetiva fazer a transposição didática para que de fato essas ações estejam reveladas em sua prática. REFERÊNCIAS DEPRESBITERIS, Lea. Avaliação da Aprendizagem: revendo conceitos e posições. In: Sousa, Clarilza Prado de (org.). Avaliação do Rendimento Escolar. Campinas, SP: Papirus, 1991. FREIRE, Madalena. Educador, educa a dor. São Paulo: Paz e Terra, 2008. HAYDT, Regina Célia Cazaux. Avaliação do processo ensino aprendizagem. 4ª ed. São Paulo, Ática, 1994. HOFFMAM, Jussara. Avaliação Mito e Desafio: uma perspectiva construtivista. 7ª. Ed. Porto Alegre: Educação e Realidade, 1992. LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem escolar - 18ª ed. - São Paulo: Cortez, 2006. MORETO, Vasco Pedro. Prova: um momento privilegiado de estudo não um acerto de contas. Rio de Janeiro: DP&A, 2002. SAVIANI, Demerval. Escola e Democracia. 37ª ed. Campinas, São Paulo: autores associados, 2005. SILVA, Delcio Barros. As principais tendências pedagógicas na prática escolar brasileira e seus pressupostos de aprendizagem. Disponível em < http://www.ufsm.br/lec/01_00/DelcioL&C3.htm>, acesso em 05/07/2012. TURRA, C.M. G. et. al. Planejamento de ensino e avaliação. Porto alegre: PUC/EMMA, 1975. 120 FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA/CAMPUS VILHENA DELL - DEPARTAMENTO DE ESTUDOS LINGUÍSTICOS E LITERÁRIOS GEPŒC - GRUPO DE PESQUISA EM POÉTICA BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA RESUMO EXPANDIDO DO SUBPROJETO “AS CURVAS DA MEMÓRIA DE JOCA REINERS TERRON” IDENTIFICAÇÃO: Projeto de Pesquisa “O regional como questão na Literatura brasileira contemporânea. GEPŒC - Grupo de Pesquisa em Poética Brasileira Contemporânea” SUBPROJETO: As curvas da memória de Joca Reiners Terron PESQUISADORA/PIBIC/CNPq: Prof.ª Dr.ª Milena Cláudia Magalhães Santos Guidio BOLSISTA: Cristiane Kelly Schmitka LOCAL DE EXECUÇÃO: UNIR/Campus de Vilhena-RO VIGÊNCIA: agosto/2011 a julho/2012 Neste trabalho, analisa-se a obra de Joca Reiners Terron. Mais especificamente, Curva de rio sujo, livro lançado em 2003, que serviu para que a crítica identificasse em Terron um possível representante da “renovação” da literatura dita regional. Há uma evocação da memória do local que não passa despercebida em razão da atmosfera de “casos” próprios da região. Concomitantemente, a problematização das noções de regionalismo literário possibilita que se entreveja, na obra desse autor, o esgarçamento da noção tradicional de regional. A pesquisa deteve-se, inicialmente, no levantamento bibliográfico de textos cujo tema é o regional/regionalismo/regionalidade na literatura brasileira contemporânea. Por isso, houve necessidade de ler textos de autores que tratam do regionalismo literário tanto sob perspectiva negativa como positiva. Fizeram parte do nosso rol de nossas leituras os seguintes autores: José Clemente Pozenato, Afrânio Coutinho, Antonio Candido, Flora Süssekind, Tânia 121 Pellegrini, Humberto Hermenegildo de Araújo, André Tessaro Pelinser, Denise Mallmann Vallerius, Geraldo Nogueira de Amorim, Lourdes Kaminski Alve, Walnice Nogueira Galvão, Ligia Chiapinni Maria Luiza Berwanger da Silva, Karl Eric Schollhammer, Leyla PerroneMoisés, Stuart Hall, Rogério Haesbaert, Maria Adélia Menegazzo, Milena Magalhães, Laurindo Mékie Pereira e Maria Zilda Cury. Percebemos a partir da leitura desses autores que o regionalismo é uma questão bastante incômoda na literatura, diríamos que é uma questão mal resolvida. Se por um lado, temos críticos que o colocam num posição de marginalidade, como é o caso de Afrânio Coutinho, há quem o procura tirar desse beco, como a estudiosa Maria Adélia Menegazzo. Historicamente, o que se vê é a permanência dessa tendência ora com a finalidade de construir uma identidade local, uma espécie de autoafirmação na relação campo x cidade - como aconteceu no Romantismo brasileiro, ora como forma de tensionar essa mesma identidade, como pode ser visto no livro Curva de rio sujo, de Joca Reiners Terron. Terron estreou na literatura em 1998 com Eletroencefalodrama, livro de poemas que também marcou a criação de sua editora, Ciência do acidente. Publicou os romances Não há nada lá (2001) e Hotel Hell (2003), além dos poemas de Animal anônimo (2002) e as narrativas de Curva de rio sujo (2003), editado no Brasil e em Portugal, e de Sonho interrompido por guilhotina (2006). Seus textos também já foram publicados na Itália, nos Estados Unidos, na Argentina e no México. Em Curva de rio sujo, há o indicativo do espaço mato-grossense contado a partir de um discurso fragmentado, por pequenas narrativas que transitam, através de rastros, as linhas da reminiscência de uma região de rios (Mato Grosso), além das referências culturais do universo pop associadas à literatura, característica dos romances policiais. Terron procura emergir o Estado do Mato Grosso como um cenário mítico, atravessado por rios, pelas lembranças da juventude e pela violência. A narrativa de Terron encontra-se em meio ao peculiar transposto por um lirismo que nasce do bloqueio aparentemente invencível do atípico e do não comum. Pensando, assim, Curva de rio sujo, pode ser visto como uma narrativa, ou melhor, como micronarrativas, que rompem com a hegemonia espaço-temporal e o caminho encontrado para isso é o traço memorialista. Segundo Bauman, no livro Modernidade líquida (2001), vivemos o tempo do imediatismo e do dinamismo. Isso suplanta as formas tradicionais de vida, processo pelo qual passou e passa a sociedade, ou seja, as ideias passam por uma fluidez, como os líquidos, e adaptam-se ao recipiente no qual são postas. 122 A narrativa memorialista reitera o tempo passado mais distante através da história do lugar, ao passo que são representadas a partir de descrições imagéticas do espaço para facilitar a compreensão da história narrada. O conflito existencial, típico do homem pós-moderno, cria uma realidade inquietante que acarreta uma desconstrução interna do ser e de sua relação direta com o espaço, desta maneira ocorre uma não uniformidade, ou seja, uma espécie de recolocação ou reterritorialização do ser. É na configuração desse memorialismo que o “caso” Terron é, de certo modo, exemplar para negar as visões da crítica que comumente associam o regionalismo literário a ficções que descrevem o ambiente de forma pitoresca. Em Terron, mais propriamente Em curva de rio sujo, a evocação da memória do local se mistura a um grande número de referências literárias e artísticas. Os sentidos do espaço como um lugar de fronteira, distanciado dos grandes centros, adquirem novas conotações. Essas conotações não apontam para a ideia fácil de “universalidade”, mas, sim, para a inserção de elementos diferenciados em um espaço que, em geral, é visto a partir de estereotipias. Algo da ordem de afirmar que, no Mato Grosso, há rios, bichos, matas, motocicletas, televisão; tudo misturado. O que neste livro soou como lirismo - prontamente renegado pelo escritor - é, em grande parte, evocação a lendas, mitos, da região, mediante um processo de “sujeira” que apaga qualquer visão idílica do lugar. O espaço “civilizado” é marcado fortemente por uma natureza de denúncia, sua narrativa adota o feitio de forte busca às reminiscências da memória. Assim como uma região de união de rios sinuosos, faz- se construir a narrativa fragmentada que permite a relocação dos costumes, espaços e culturas. A literatura de Terron contribui para suspender a relação atraso = campo/ avanço = cidade, que cria outra: literatura regional = retardo/ literatura urbana = cosmopolitismo. Aqui, as noções de região contaminam-se de outros sentidos. O espaço mato-grossense é posto em “mini-histórias” mediante traços da memória que revisitam rios, paisagens, mitos, sem lançar mão de qualquer elemento “exótico”. Terron incide por vezes invasões pela prosa experimental, propositalmente abarrotada de alusões citadinas, com escracho, deixando, desta maneira, transpor os diferentes feitios da conduta humana: “Curva de rio sujo só junta tranqueira”. Palavras-chave: Literatura contemporânea. Regionalismo. Joca Reiners Terron. 123 REFERÊNCIAS BAUMAN, Zygmunt, Identidade: entrevista a Benedetto Vecchi. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2005. BOURDIEU, Pierre. 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Companhia das Letras, 2011. 125 ASPECTOS DO CAPITALISMO BUROCRÁTICO NA EDUCAÇÃO: CORPORATIVISMO SINDICAL E A LUTA PELA GESTÃO DEMOCRÁTICA DA ESCOLA PÚBLICA20 Eliane de Jesus Paula21 Profª Drª Marilsa Miranda de Souza22 RESUMO O presente trabalho tem por finalidade analisar as propostas e lutas do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado de Rondônia pela Gestão Democrática, bem como identificar as contradições no processo de luta e organização sindical na atualidade. Observase um elevado nível de corporativismo que procuramos identificar por meio desta pesquisa, que utilizou o método do materialismo histórico-dialético, onde buscamos interpretar a realidade objetiva e subjetiva através das categorias de análise totalidade, contradição, ideologia e práxis. Palavras-chave: SINTERO. Capitalismo Burocrático. Corporativismo sindical INTRODUÇÃO O presente trabalho tem por finalidade apresentar o atual desenvolvimento da pesquisa “Capitalismo Burocrático, Políticas Educacionais e Relações de Poder na Educação Escolar em Rondônia”, tendo como referência as primeiras investigações do subprojeto “Aspectos do Capitalismo Burocrático na Educação: Corporativismo Sindical e a Luta pela Gestão Democrática da Escola Pública” que tem como objetivo Identificar e analisar as propostas e lutas do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado de Rondônia pela Gestão Democrática. Após o prévio conhecimento dos objetivos da pesquisa e seu referencial teórico, iniciamos o trabalho de coleta de dados realizado por meio de entrevistas semi-estruturadas que envolveram profissionais da Educação da rede pública estadual nos municípios da Zona da Mata rondoniense. Como nossa análise do subprojeto envolve a discussão em torno da Gestão democrática e do corporativismo sindical, nosso trabalho em específico, buscou 20 Subprojeto da pesquisa Capitalismo Burocrático, Políticas Educacionais e Relações de Poder na Educação Escolar em Rondônia, coordenada pela Profª Drª Marilsa Miranda de Souza. 21 Graduanda em História da UNIR, Campus de Rolim de Moura, Bolsista PIBIC/UNIR. 22 Professora do Departamento de Educação da UNIR, campus de Rolim de Moura e orientadora da Pesquisa. 126 entrevistar dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado de Rondônia SINTERO, que depois de transcritas serão analisadas. Faz-se necessário ainda, uma análise mais aprofundada sobre a história do Movimento Sindical brasileiro, sobretudo, a organização dos trabalhadores em Educação. Iniciamos nossa pesquisa bibliográfica levando em conta o processo de organização do movimento operário no Brasil e a intervenção estatal através do corporativismo sindical instituído pela Era Vargas, conforme a análise Oliveira (1994), Fausto (2000), Antunes (1982), Boito Júnior (1991 e 1994) e Carone (1970 e 1979). No que se refere ao processo histórico de organização sindical dos trabalhadores em Educação, temos como principal fonte bibliográfica o trabalho de Fontoura, Gindin e Gentili (2009), que identificam de forma sucinta a história e o processo de luta dos trabalhadores da Educação, sobretudo no período da década de 1990 em que se intensificam os choques com o Estado no processo de expansão neoliberal que culminou com cortes de direitos, fim da estabilidade, reforma previdenciária, etc. Além da análise historiográfica temos buscado analisar a partir da pesquisa bibliográfica e das entrevistas com dirigentes sindicais o nível de consciência política enquanto classe social e quais críticas se constroem em torno das políticas educacionais (pedagógicas e de gestão) que chegam à escola. Utilizamos como ferramenta de análise o método do materialismo histórico-dialético, entendido como um instrumento de compreensão da realidade enquanto práxis e de interpretação que possibilite uma intervenção transformadora. Na análise e interpretação dos dados buscamos interpretar a realidade objetiva e subjetiva em termos das categorias totalidade, contradição, ideologia e práxis, estudando as relações sociais e econômicas que determinam a educação e a produção das ações concretas dos sujeitos históricos que dela fazem parte. Também aplicamos duas categorias históricas fundamentais que nos ajudam a elucidar as relações de dominação existentes na esfera socioeconômica, política e cultural e que incidem sobre as políticas educacionais e as relações de poder estabelecidas no ambiente escolar e nas relações sociais de produção da sociedade. São elas: imperialismo e capitalismo burocrático. A aplicação destas categorias nos permitirá compreender o sindicato como aparelho ideológico do Estado a serviço da grande burguesia e do imperialismo na atualidade. Além da análise em andamento de documentos disponibilizados pela Regional da Zona da Mata23 do SINTERO realizamos entrevistas com dirigentes sindicais, professores, 23 Dentro da estrutura sindical do SINTERO, a base territorial é dividida em 11 regionais. A regional da Zona da Mata, que tem como sede o município de Rolim de Moura, abrange um total de 05 municípios. 127 supervisores e diretores das escolas. Este tipo de entrevista nos permitiu ao mesmo tempo, conhecer o que pensam os professores/as sobre a ação do SINTERO nessa importante bandeira de luta dos trabalhadores em Educação que é a gestão democrática e a própria prática sindical dos dirigentes observada pela base. Nossa análise parte do método dialético considerando que este possibilita ir do fato empírico (fenômeno) identificando as determinações fundamentais e secundárias do problema, conforme a análise de Marx de que “o curso do pensamento abstrato que se eleva do mais simples ao complexo” enquanto constante movimento de contradição (MARX, 1982, p. 15). A análise dialética busca identificar as contradições no seio do espaço escolar. Contudo, precisamos identificar que as contradições expressas no micro espaço escolar são reflexos de contradições existentes na totalidade das relações sociais e econômicas dominantes. Neste sentido, partimos da análise de Lênin (1979) de que vivemos atualmente a etapa de desenvolvimento do capitalismo onde se dá a concentração da produção por meio do monopólio, o fortalecimento do capital financeiro associados à partilha territorial do globo entre as grandes potências capitalistas. Nesta fase imperialista, vivemos uma contradição principal entre imperialismo e país dominado semicolonial. Nos países semicoloniais impera relações de caráter semifeudal e desenvolve-se um tipo de capitalismo atrasado, dependente, um capitalismo burocrático24, já que nestes países não se concretizaram revoluções burguesas, havendo uma persistência do problema agrário, como é o caso do Brasil (MARTÍN MARTÍN, 2007). O estudo dos documentos nessa primeira fase centrou-se nas normas para escolha de diretores escolares dispostas no Decreto n. 16.202, de 20 de setembro de 2011 e em documentos do SINTERO que tratam da temática, mas que requerem uma análise mais aprofundada e confrontada com a realidade objetiva. SINDICATO, CORPORATIVISMO E ATRELAMENTO AO ESTADO As primeiras experiências de organização dos trabalhadores surgem ao longo do século XIX e são dirigidas principalmente por Europeus que se instalam no Brasil. A Confederação Operária Brasileira fundada em 1908, uma das primeiras organizações sindicais, foi uma das associações mais representativas no Brasil, cujos ideais eram guiados 24 Conforme a conceituação de Guzmán, “o capitalismo que o imperialismo impulsiona num país atrasado; o tipo de capitalismo, a forma especial de capitalismo, que impõe um país imperialista a um país atrasado, seja semifeudal, semi-colonial” (GUZMÁN, 1974, p. 1) 128 pelo anarcosindicalismo. O sindicalismo brasileiro nasceu, pelas mãos dos imigrantes espanhóis, italianos, portugueses, etc., ligados ao anarcosindicalismo, no princípio do século XX. Fora dos sindicatos, mas exercendo intensa atividade política, o anarquismo foi a principal corrente política também no meio operário, ao lado dos esforços de socialistas e da Igreja Católica (OLIVEIRA, 2004). O Brasil inseriu-se num forte período de “corporativismo inclusivo” entre os anos de 1930 a 1945. Este modelo sindical corporativo nos anos de 1930, no governo de Getúlio Vargas, foi resultado de uma profunda intervenção do Estado na organização sindical. O Estado passou a assumir-se como mediador dos conflitos entre o capital e trabalho, como resultado disso, as ações sindicais ficaram voltadas para o assistencialismo, com o apoio de recursos públicos: uma extensão ou apêndice do Estado. Então, o Sindicato no Brasil se estrutura, a partir da década de 1930, como um órgão articulado diretamente ao Estado. Conforme o artigo 513 da CLT, o principio fundamental da estrutura sindical é a colaboração de classes, o corporativismo. O poder dos sindicatos para representar os trabalhadores é dado pelo Estado. Esta intervenção, atribuída a Getúlio Vargas, visava por rédeas aos Sindicatos que durante as primeiras décadas do século XX protagonizaram inúmeras greves massivas dirigidas por anarquistas, socialistas e comunistas. Uma das estratégias adotadas por Vargas para garantir o controle dos sindicatos e estimular a criação de sindicatos oficiais foi vincular a concessão de benefícios trabalhistas à representação por sindicato reconhecido (MATTOS, 2003, p. 14). O surgimento do novo sindicalismo através das oposições sindicais (1964-1978) levaria a uma crítica desta estrutura sindical. O sindicalismo classista toma por base a luta de classes. Há muitas contradições no processo de luta e organização sindical na atualidade. O Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado de Rondônia - SINTERO há alguns anos aparentemente não vem atuando em defesa da gestão democrática das escolas rondonienses e observa-se um elevado nível de corporativismo que procuraremos identificar por meio desta pesquisa. Se o chamado Novo Sindicalismo se apresentava como um sindicalismo de massa e de confronto no final da década de 1970, a partir dos anos de 1990 apresenta-se como um sindicalismo neocorporativo de participação, a exemplo da CUT, como explica Boito Júnior: Desde o seu surgimento como movimento de massa em 1978, transitou de um sindicalismo que ‘tendia’ à ação unificada de amplos setores das classes trabalhadoras contra a política de desenvolvimento pró-monopolista e próimperialista do Estado burguês brasileiro - ou, pelo menos, contra a política salarial que era um aspecto fundamental da política de desenvolvimento - para uma ação sindical na qual os diferentes setores das 129 classes trabalhadoras isolam-se em suas reivindicações específicas, desenvolvem uma nova segmentação corporativa, e procuram reduzir as perdas de seu setor particular numa conjuntura de crise, mesmo quando a redução das perdas implica a aceitação ativa da política de desenvolvimento pró-monopolista e pró-imperialista (BOITO JR., 1994, p. 23). O Corporativismo sindical a partir do governo Collor, se intensifica com as tendências ‘neocorporativas’ de participação e/ou negociação que passaram a se tornar hegemônicas no sindicalismo brasileiro. Alves (2000) considera que, a partir da era neoliberal, consolidaram-se no interior da CUT posturas moderadas que caminham para um processo de conciliação de classes, num claro movimento de defensiva frente ao processo de avanço neoliberal de reorganização do trabalho. Como resposta à sua própria crise, iniciou-se um processo de reorganização do capital e de seu sistema ideológico e político de dominação, cujos contornos mais evidentes foram o advento do neoliberalismo, com a privatização do Estado, a desregulamentação dos direitos do trabalho e a desmontagem do setor produtivo estatal (ANTUNES, 1999, p. 31). Com isso, paulatinamente se tem uma mudança significativa de discurso que não mais representam proposições de mudanças profundas, mas de algo que, no máximo, chega a defender “políticas públicas” voltadas para superar as “desigualdades” e a “exclusão social”, expressas, principalmente, a partir do momento em que o projeto eleitoral do PT chega ao objetivo que era o de conquistar a presidência da república em 2002. Há um processo de acomodação e de colaboração direta entre o movimento sindical e social que será engessado e cooptado com papel de colaboradores nas políticas neoliberais (ROCHA, 2011, p. 43). Um exemplo concreto deste processo de cooptação é o ato do Governo em sancionar no ano 2008 a Lei 11.648 que instituiu as centrais sindicais, um dos atos mais explícitos de corporativismo escancarado que atrela ainda mais ao Estado o movimento sindical brasileiro, já que através da referida lei as Centrais sindicais passaram a ganhar 10% da contribuição sindical, tributo pago obrigatoriamente pelos trabalhadores, recolhidos pelo Estado e repassado às centrais e sindicatos como se esses fossem autarquias do Governo Federal. SINTERO: CONTRADIÇÕES ENTRE O DISCURSO E A PRÁTICA 130 O Sindicato dos Trabalhadores em Educação no Estado de Rondônia - SINTERO foi fundado 25 nos dias 25 e 26 de fevereiro de 1989 em um Congresso realizado na cidade de Ouro Preto do Oeste. Em seu breve histórico na página do Sindicato consta um apanhado geral das diversas lutas que os trabalhadores em educação travaram, mas que se resumem à sua maioria em lutas salariais. Diferente das disputas que ocorriam em outras regiões do país, a fundação do SINTERO foi fruto de um trabalho político do Partido dos Trabalhadores - PT que inicialmente polarizou com PC do B, mas que se tornou a direção hegemônica da fundação até a atualidade. Como boa parte de sua direção pertence ao quadro do Partido dos Trabalhadores, esse sindicato também compõe a base da CUT - Central Única dos Trabalhadores, que também é dirigida pelo PT e da CNTE - Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação. Estas organizações sindicais não têm aprofundado qualquer análise sobre as políticas educacionais impostas pelo MEC com a exceção da discussão acerca do Piso Nacional de Educação e do Plano Nacional de Educação, ou seja, as discussões variam de forma superficial no que se refere à reajustes salariais da categoria e luta em torno do financiamento da Educação. O discurso produzido de que o Sindicato tem o papel de lutar por uma educação de qualidade não tem gerado qualquer espaço de discussão para debater, por exemplo, o conjunto de políticas educacionais de caráter neoliberal e conservador que chegam à escola pública através de diversos programas do MEC e Governo do Estado. Não há qualquer análise ou manifestação sobre as “formações” existentes que são ofertadas aos trabalhadores em educação de Rondônia ou qualquer discussão que possibilite contrapor o que está posto. Os atuais dirigentes regionais do SINTERO encontram-se no segundo mandato e as principais abordagens com base nas perguntas referem-se a um conjunto de lutas que tem respectivamente, esta ordem de prioridade: valorização salarial, ambiente de trabalho e redução da jornada semanal. Há uma crítica ao autoritarismo do governo, mas expresso num certo conformismo ao realizarem uma comparação com o governo anterior. Em relação à Gestão democrática, a afirmação é a de que esta é uma bandeira histórica dos trabalhadores em educação, mas que ao longo do tempo foi se perdendo o foco. Reconhecem que há um descrédito da categoria, mas identificam como um problema da “base”, ou seja, “muitas vezes culpa do trabalhador, em não buscar informação”. Em dado momento, transferem a responsabilidade para a categoria frente à desmobilização: “Eu diria que os trabalhadores estão cansados, são poucos que ainda tem fôlegos para irem para luta e cobrar de todos”. As 25 Informações extraídas do site do SINTERO. Disponível em: www.sintero.org.br. Acesso em: 18/01/2012. 131 falas de dirigentes, contrastadas com as dos entrevistados, professores, supervisores e orientadores, são divergentes. Em sua maioria há uma crítica à direção do Sindicato, como observamos em uma das entrevistas: Já foi o tempo em que os sindicatos representavam a categoria. Antes era muito mais fácil mobilizar, quando falavam algo lá em cima, você acreditava. Hoje, pra mobilizar a categoria é muito mais difícil porque você sabe que existe um monte de politiqueiro lá em cima. Nosso sindicato hoje é do PT e não da categoria. Se mudar fica de outro partido então temos um sindicato partidário. Eu faço parte da oposição, nós somos os que não prestam e eles são os que querem preservar o sindicato, mas preservar do jeito deles?! [...] O sindicato quanto a gente criou era diferente, hoje virou politiqueiro faz politicagem pra ir subindo pra ver se vira um deputado, um prefeito, vê o Sobrinho, prefeito de Porto Velho, foi o nosso primeiro presidente do SINTERO. Foi virou vereador, até virar prefeito, assim tantos outros, às vezes dá errado, o Nereu nós elegemos e depois não conseguiu a reeleição. Quem apronta muito acaba sendo marcado pela categoria. Infelizmente o SINTERO de hoje não é mais o mesmo de quando criamos há 20 anos e participei da fundação do SINTERO [...]. (PROFESSOR DA ESCOLA A) Entre dirigentes regionais do Sindicato e demais entrevistados o que identificamos preliminarmente em comum é que há uma crítica ao autoritarismo existente na rede pública estadual, considerando que o atual modelo de Gestão democrática foi instituído por decreto e os critérios não atendiam aos interesses da comunidade escolar que sequer participou efetivamente da elaboração de critérios. Contudo, as críticas apresentam-se de forma superficial observando-se que há certo desconhecimento das políticas educacionais tanto na esfera estadual, como federal. A educação em Rondônia apresenta traços de semifeudalidade através de uma prática coronelícia onde toda estrutura administrativa das instituições do Estado, seus cargos técnicos e políticos concentram-se nas mãos de pessoal nomeado pelos detentores do poder local e para estar a seu serviço, mesmo aqueles professores que ocupam cargos e passam a ser opressores de sua própria classe (SOUZA, 2010, p. 270). Esta relação de subordinação por que passa os trabalhadores em Educação da rede pública estadual é conhecida. Mesmo no processo de construção da “Gestão democrática” do governo do Estado os dirigentes sindicais dizem que não há autonomia e através de um conformismo identificam que os trabalhadores têm que se adequar à estrutura e que antes era muito pior: Não garante autonomia, tem algumas coisinhas que ainda tem que ser discutidas. Querendo ou não querendo, os trabalhadores têm que se adequar. Tem que mudar tem que ser rediscutido. E era pior, porque no regime 132 passado era ditatorial, opressão mesmo. Foi uma coisa que veio de cima para baixo. Falta muita coisa pra garantir, tudo é muito complexo. Questão de formação, isso engloba a questão democrática (DIRIGENTE SINDICAL 1). Segundo Souza (2010), por se tratarem de políticas gestadas no escritório do Banco Mundial e distribuído como modelo até a mais humilde secretaria de educação municipal que recebe ordens de efetivação dessas políticas, “o processo de implantação é doloroso, cheio de contradições, mas que aos poucos vai envolvendo os professores, que acabam se encantando” pelo discurso de que estes são os “novos” modelos de educação, incentivados e até coagidos a ingressarem nesses programas “educacionais” que privilegiam publicações vazias. Uma parte considerável desses trabalhadores sofre um processo de precarização do trabalho docente, “não possuem autonomia didático-científica, não possuem autonomia de gestão e se submetem aos processos mais rudes de obrigação e servidão às políticas implantadas nas escolas”, onde acabam por se “adaptar” às imposições externas (SOUZA, 2010, p. 270 e 271). É preciso analisar de forma mais concreta como o capital identifica os trabalhadores em Educação, considerando que estes têm um papel fundamental na formação da “única mercadoria sobre a qual depende o sistema capitalista: a força de trabalho” e são “perigosos porque estão intimamente ligados à produção social da força de trabalho”, (HILL, 2003, p. 4) razão pela qual precisam ser tutelados pelos Programas governamentais e terem a ilusão de que uma democracia tutelada seria uma democracia ampla. Nos deparamos com realidades adversas no que se refere à Educação Pública, com escolas sem oferecer estrutura de qualidade e profissionais desmotivados em relação à desvalorização salarial. Ao serem entrevistados os dirigentes sindicais e professores há uma enorme contradição na prática sindicalista desenvolvida no Estado. Ou seja, para os dirigentes há uma grande satisfação com a atuação enquanto aparelho de extensão do poder do estado. Entre os profissionais da educação há uma indignação com as praticas maquiavélicas dos agentes sindicais. Fica evidente uma enorme distância entre o discurso e a prática dos dirigentes sindicais. Isto é demonstrado nas afirmações dos professores entrevistados, coletadas em nossa pesquisa de campo. Questionados sobre a atuação do SINTERO e se este tem lutado pela gestão democrática e contra as políticas do governo para a educação, as respostas apresentadas foram, em sua maioria, apontando críticas severas e negativas. Dos 31 entrevistados, 21 apresentou críticas contundentes à atuação da direção do Sindicato, representando 67,7%. Outros 22,6% consideram o sindicato atuante, mas ponderaram os problemas na Educação. É um número que consideramos alto, ocasionado, entre outros 133 fatores, pela atuação da direção do SINTERO frente às negociações com o governo, nas últimas greves da educação. Vejamos: QUADRO I - PRINCIPAIS RESPOSTAS DOS PROFESSORES* Qua nt. % 21 67,7 07 22,6 01 02 31 3,2 6,5 100 % Sindicato pelego; não tem trabalho de base; faz negociata com governo; direção oportunista; não informa a base; não se preocupa com os problemas da educação; Sindicato é trampolim político Sindicato atuante nos problemas da educação embora com problemas na direção; O problema do sindicato é a base que não é atuante; sindicato somos nós e a luta deve ser de todos. Sindicato inoperante; pouca ação; falta experiência para conduzir a luta Não respondeu; não quis opinar; não participa TOTAL *Quadro elaborado pela equipe de pesquisadores a partir da sistematização das entrevistas Entre os diretores e supervisores, as críticas permaneceram. Entre estes, a crítica mais direta e dura, de denúncia à direção do Sindicato, representa 54,55%. QUADRO II - PRINCIPAIS RESPOSTAS SUPERVISORES E DIRETORES* Sindicato pelego; não tem trabalho de base; faz negociata com governo; direção oportunista; não informa a base; não se preocupa com os problemas da educação; Sindicato é trampolim político Sindicato atuante embora com problemas na direção; O problema do sindicato é reflexo da base; a luta só é salarial sem se envolver em outras questões. Sindicato inoperante; pouca ação; distante; Qua nt. Não respondeu; não quis opinar; não participa TOTAL % 6 54,5 5 2 18,1 8 2 1 11 18,1 8 9,09 100 % *Quadro elaborado pela equipe de pesquisadores a partir da sistematização das entrevistas Observamos que a base do SINTERO enfatiza que os avanços registrados pela categoria até o presente momento são de pouca validez, visto que o sindicato simplesmente não pensa em sua base como um todo. Alguns trabalhadores acreditam, e puderam testemunhar na prática, que os representantes sindicais estão na direção pelo simples fato de fazer nome político, e não atendem aos verdadeiros interesses que a classe trabalhadora da educação precisa. Nossa compreensão em relação ao SINTERO é a de que existem múltiplas falhas que são apresentadas na pratica de sua organização social. Para os trabalhadores em educação fica 134 o questionamento de diversos assuntos que a direção do SINTERO esqueceu-se durante o tempo. E um dos mais questionáveis é a luta pela gestão democrática, que no início da formação do sindicato se falava na gestão democrática e se lutava por ela também. Porém nos dias atuais o que era uma das principais pautas de luta sindical, a gestão democrática nas escolas, tornou-se algo distante e sem discussão. Os dirigentes culpam a base em não buscar informações ou de se mobilizar, mas é importante destacar que a base espera no mínimo uma ação concreta de quem está à frente da direção. A direção sindical fica em débito até mesmo quando é preciso discutir as políticas educacionais, que são impostas tanto do governo Estadual e quem dirá do governo Federal. A classe trabalhadora necessita de condições adequadas para trabalhar, inclusive um salário digno. No entanto, para o sindicato a sua principal bandeira de luta é a questão salarial, mas apesar de falar tanto em melhorias salariais o próprio SINTERO não consegue organizar uma pauta de reivindicação salarial, que atendesse sua base como um todo. Neste contexto, assim nos diz Mattos (2009): (...) É a classe trabalhadora quem continua a depender desses serviços públicos cada vez mais sucateados, de educação e saúde etc. Unir nas lutas os trabalhadores do serviço público e seus usuários, também trabalhadores, deveria ser pauta prioritária do movimento sindical. (MATTOS, 2009, p.151). Entendemos que os agentes sindicais não trabalham para atender os trabalhadores em educação. Os dirigentes, segundo a maioria dos entrevistados, são guiados e manipulados pelo PT, que são à base do governo estadual. O SINTERO não se preocupa com os problemas dos trabalhadores, devido à passividade dos dirigentes pelegos. CONCLUSÃO Com base nas informações colhidas, percebe-se o quanto ainda está presente a questão do SINTERO não funcionar de acordo com as necessidades que os servidores da educação necessitam em seu meio social, inclusive a participação ativa deste sindicato nas escolas, expondo aos educadores os verdadeiros problemas em que a categoria passa. No entanto, é preciso que o sindicato envolva a comunidade escolar, a verdadeira essência dos problemas recorrentes na qual, os servidores da educação enfrentam. E com isso, buscar soluções, ouvindo a comunidade escolar e não simplesmente passar a funcionar apenas num 135 escritório sem um contato direto com verdadeiros problemas da educação. Na pesquisa realizada, concluímos que: a) O Brasil é um país de capitalismo burocrático, que é o tipo de capitalismo engendrado pelo imperialismo nos países atrasados, ou seja, semifeudal e semicolonial, dominado pelo imperialismo em sua estrutura econômica e social (LENIN, 1979, GUZMÁN, 1974); b) As políticas educacionais de formação de professores e gestores das escolas estaduais da Zona da Mata são hegemonicamente formuladas, dirigidas e financiadas pelo imperialismo, e suas origens são desconhecidas tanto do conjunto dos professores, quanto pelos dirigentes sindicais. A análise final dos dados coletados apresentou resultados apontando que: a) O trabalho dos professores é compreendido como semifeudal, uma vez que se submetem às mais precárias condições de trabalho e emprego, não possuem autonomia didáticocientífica, não possuem autonomia de gestão e se sujeitam às políticas implantadas nas escolas e aos processos falseadores de gestão democrática. b) O sindicato como parte de uma estrutura corporativa, age como apêndice do Estado mesmo se apresentando como espaço questionador das práticas estatais, aqui identificadas apenas para justificar a sua existência. Há um crescente descontentamento da categoria diante das práticas oportunistas da direção sindical, c) Há um nível de alienação de dirigentes sindicais quanto às causas do sucateamento da educação pública e da natureza das políticas educacionais orientadas pelo imperialismo e suas agências multilaterais. Este nível de incompreensão política é reproduzido para o conjunto dos trabalhadores em Educação. Nossa perspectiva era a de encerrar essa primeira fase da pesquisa no mês de julho de 2012, mas dado a dimensão do problema evidenciado durante a investigação haverá que aprofundar os estudos acerca da História do movimento sindical dos trabalhadores em Educação em Rondônia, aprofundamento bibliográfico sobre a história do movimento sindical docente no Brasil e sobre as políticas neoliberais orquestradas pelos Organismos Internacionais e postas em prática pelo Estado como forma de manter o controle ideológico sobre a escola através da submissão dos trabalhadores em Educação e o conseqüente processo de perda de identidade enquanto agentes de transformação. Tais análises são fundamentais para compreendermos mais a fundo como se processam as contradições: capital X trabalho; Práticas coronelícias X Práticas libertadoras; Sindicato corporativo burocrata X Sindicato classista com trabalho de base; para que possamos ao final a compreensão do fenômeno no seio da Educação pública da Zona da Mata. 136 Neste sentido, nossa pesquisa ainda carece de mais tempo para resultados mais objetivos frente à complexidade de variantes apresentadas até o momento. REFERÊNCIAS ALVES, G. O novo (e precário) mundo do trabalho: reestruturação produtiva e crise do sindicalismo. São Paulo: Boitempo, 2000. ANTUNES, R. Classe operária, sindicatos e partido no Brasil: um estudo sobre a consciência de classe: da Revolução de 30 até a Aliança Nacional Libertadora. São Paulo: Cortez, 1982. _____. Os sentidos do trabalho: ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. São Paulo: Boitempo, 1999. BOITO JÚNIOR, A. O sindicalismo de Estado no Brasil. 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Imperialismo e Educação do Campo: Uma análise das políticas educacionais a partir de 1990. Tese de doutorado, Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista - UNESP, Araraquara, 2010. 138 O LIVRO SHENIPABU MIYUI: EXISTÊNCIA E ESPECIFICIDADES DA LITERATURA INDÍGENA POR MEIO DO ESTUDO DE EDIÇÕES DE MITOS KAXINAWÁ Acadêmica Érica dos Santos Lima Voluntária PIBIC/ UNIR/2011-2012 Profª Drª Cynthia de Cássia Santos Barra Orientadora RESUMO A presente pesquisa pretende discutir um movimento editorial recente no Brasil que alguns autores afirmam (ALMEIDA, 2004; GOLDEMBERG, 2009) se tratar de um movimento de natureza literária. Em suas pesquisas (1999), Maria Inês de Almeida afirma ter encontrado entre os anos de 1996 e 1998 mais de 100 títulos de autoria indígena. A atitude de publicar livros é uma prática que vem sendo adotada por vários povos indígenas do Brasil nas últimas décadas. Estes livros estão ganhando espaço gradativamente na cultura do impresso tanto no nosso circuito literário nacional quanto dentro das próprias comunidades indígenas. Pretendese, por meio deste trabalho, entender as condições de elaboração, edição e difusão destas obras publicadas por povos indígenas no Brasil nas últimas três décadas, visando a melhor compreensão da autoria e do movimento editorial indígena. Também se pretende analisar características destas obras que melhor representam as especificidades do movimento literário emergente. Serão destacadas, especificamente, a produção literária do povo Kaxinawá que habita terras indígenas no Acre. Esta etnia se sobressai por suas inúmeras produções, sendo uma delas, o livro ShenipabuMiyui: história dos antigos (1995; 2000), indicado como leitura obrigatória para vestibular de duas universidades federais brasileiras (UFMG, 2001; UFVJM, 2011). Palavras-chave: Literatura. Povos Indígenas. Autoria Indígena. Kaxinawá ABSTRACT This research discusses a recent editorial movement in Brazil that some authors claim (Almeida, 2004; GOLDMBERG, 2009) it is a movement of literary nature. In her research, Maria Ines de Almeida claims to have found between the years 1996 and 1998 more than 100 titles of indigenous authorship. This attitude of publishing books is a practice that has been adopted by various indigenous peoples of Brazil. These books are gradually gaining ground in the culture of the printed circuit both in our national literary and within indigenous communities themselves. We intend through this article, understand the conditions of preparation, editing and dissemination of these works published by indigenous peoples in Brazil in the last three decades aimed at better understanding of indigenous publishing movement. We also intend to analyze the characteristics of these works that best represent the characteristics of this emerging literary movement. Highlight specifically the literary production of the people inhabiting Kaxinawá indigenous lands in Acre. This ethnic group 139 stands out for his numerous productions, one of them, the book Shenipabu Miyui: ancient history, indicated as required reading for vestibular two Brazilian federal universities. Keywords: Literature. Indigenous Peoples. Indigenous Authorship. Kaxinawá 1 INTRODUÇÃO Nas últimas décadas do século XX, observamos a mudança de postura dos povos indígenas. Eles decidiram que não mais esperariam que alguém ou alguma organização intercedesse por seus interesses de terem seus direitos reconhecidos pelo Estado brasileiro (OLIVEIRA, 2006). Os índios passaram a realizar suas manifestações políticas por conta própria, construindo representações, fazendo alianças e levando seus pleitos à opinião pública. A organização política dos índios também colaborou para o surgimento de uma literatura produzida por escritores indígenas de forma sistemática e com características próprias. Desse modo, assistimos ao surgimento do que podemos sem dúvida caracterizar como um novo movimento literário26: aproximadamente quarenta povos indígenas do Brasil estão publicando textos em livros. Se fizermos uma comparação desses livros, os chamados “livros da floresta” (ALMEIDA, 2004), com o material produzido pelos europeus que descreviam as belezas e as novidades da terra recém descoberta no século XVI, temos a impressão de que se trata de uma nova apresentação da terra descoberta, só que dessa vez pelo olhar dos índios. Essa literatura que surge é resultado de esforços em conjunto entre os professores e pensadores indígenas e assessores não-indígenas. Os livros de autoria indígena são, na maioria das vezes, custeados por órgãos oficiais (MEC) ou por ONGs, como, por exemplo, o livro Arte Indígena Umutina, da etnia Umutina (MT), financiado pelo Ministério da Educação. Raramente esses livros são publicados por editoras privadas. Podemos atribuir o surgimento dessa literatura nova, principalmente, aos professores das mais de 1.500 escolas indígenas que estão construindo a literatura de suas comunidades. Entretanto, esta literatura ainda é pouco estudada em seus aspectos contemporâneos. 26 Conferir (ALMEIDA, 2004) e (GOLDEMBERG, 2009); encontramos, nessas obras, pesquisas e dados que afirmam a existência de um novo movimento literário com características próprias: a literatura de autoria indígena. 140 2 O MOVIMENTO EDITORIAL INDÍGENA Baseando-se nas pesquisas de Maria Inês de Almeida, que mostram a existência de mais de 100 títulos de autoria indígena entre os anos de 1996 e 1998 e também levando em consideração a pesquisa bibliográfica realizada no programa de iniciação científica (PIBIC/UNIR/CNPq 2011-201227), podemos observar a existência de um movimento editorial de autoria indígena. No passado, tudo que era produzido sobre as culturas indígenas ou que discutiam questões relacionadas à temática indígena tinha um cunho antropológico ou linguístico. Nas três últimas décadas do século XX e primeiras décadas do século XXI, vimos essa realidade ser mudada com a publicação de dois títulos: Mitopoemas Yanoman (1978) e Antes o mundo não existia (1980). Tais obras representam os primórdios da co-autoria e da autoria indígena, respectivamente, e já não podemos classificá-las como obras antropológicas ou linguísticas, pois não são mais relatos de viajantes que se infiltraram na rotina das etnias, agora são os próprios indígenas é quem falam, ainda que com assessoria de não indígenas. E percebemos a preocupação dessas obras com a questão da linguagem esteticamente eficaz. São obras muito bem ilustradas e pensadas de forma que melhor representem a beleza e a força cognitiva do pensamento e da cultura de cada etnia. A partir desses dois títulos surgiu a necessidade de se pensar uma nova categoria no âmbito das letras nacionais: a literatura de autoria indígena. Podemos classificar essas duas obras como o inicio de um movimento editorial que se expandiu por várias etnias no Brasil. Ao revisitarmos alguns conceitos da teoria literária ocidental, nós podemos perceber que estamos, de fato, diante de um movimento literário emergente. Porém, é preciso ter cautela ao utilizar os conceitos da literatura ocidental para ler a literatura de autoria indígena, pois é preciso atentar para o fato de que as condições de produção, de difusão e a cultura em questão se diferem bastante da cultura ocidental e, portanto, devem ser analisadas em seus aspectos particulares. Estes textos publicados refletem as marcas do momento em que foram escritos. Momento em que a necessidade de preservação da cultura é forte, por causa do contato com outras culturas que afetaram bastante os hábitos dos índios. 27 Pesquisa bibliográfica realizada durante o período de vigência do projeto (2011-2012), que visava encontrar o número de 120 referências bibliográficas concernentes à etnia Kaxinawá com o objetivo de montar um banco de dados on line. 141 2.1 PESQUISA BIBLIOGRÁFICA CONCERNENTE A ETNIA KAXINAWÁ Um dos objetivos de nossa pesquisa foi montar um banco de dados virtual contendo referências bibliográficas concernentes às etnias que foram estudadas pela equipe de trabalho. Para isso, realizamos pesquisas nas bibliotecas de universidades federais brasileiras: UnB, USP, UNIR, Unicamp, UFRJ, UFSC, UFMG e UFPA. Também foram consultados os acervos da Biblioteca da Floresta (AC), esta in loco, da Comissão Pró-índio do Acre (anexo I) e o site do Instituto Ambiental Brasileiro. A pesquisa consistiu em buscar nestas bibliotecas, através de catálogos disponíveis na internet, todos os tipos de obras que abordassem a temática indígena, respeitando a etnia estudada por cada componente. Dentro desta pesquisa, priorizamos materiais de autoria indígena, seja individual ou coletiva. Também demos preferência para materiais que estivessem disponíveis na internet em formato PDF, que fossem de procedência legal (publicação autorizada na web). Em cada site visitado, registramos a referida referência bibliográfica disponível e registramos também resumo da obra (se disponível), comentário a respeito da obra (caso tenha sido lida), áreas de conhecimento abrangidas pela obra (dados catalográficos de cada biblioteca), gênero de referência (livro, tese, dissertação, etc.) e tipo de autoria (se indígena ou não-indígena, coletiva, individual, co-autoria), também registramos o número de chamada da obra na biblioteca (caso esteja disponível apenas na biblioteca física) e o respectivo link, caso a obra esteja disponível na rede de forma legal. Através deste método, foram colhidas até a elaboração do relatório parcial 70 referências. E na parte final da pesquisa alcançamos a meta estipulada no plano de trabalho que visava atingir, até o final da pesquisa, o número de 120 referências bibliográficas por etnia. Todas as referencias bibliográficas encontradas, foram analisadas e separadas e categorias conforme o tipo de autoria (figura 1), quanto ao tipo de referencia bibliográfica (livro, tese, dissertação, artigo científico) e quanto a área de conhecimento abrangida pela obra conforme a ficha catalográfica da biblioteca em que cada obra se encontra. 142 Figura 1 3 SHENIPABU MIYUI: 1ª E 2ª EDIÇÕES O livro escrito pelo povo Kaxinawá que alcançou maior reconhecimento foi Shenipabu Miyui, cuja primeira edição foi publicada em 1995; a segunda edição foi publicada em 2000. A segunda edição saiu pela Editora UFMG e apresenta algumas mudanças em relação à primeira. A primeira edição foi publicada pela Comissão Pró-Índio do Acre e é uma versão que aparenta ter mais a “cara” dos índios. De início, o livro apresenta um texto escrito por uma das coordenadoras do projeto editorial, Nietta Monte. É um livro que contém doze mitos do povo Kaxinawá, apresentados em língua materna indígena e, logo em seguida, em língua portuguesa. Cada mito também possui ilustrações feitas pelos indígenas que representam momentos da história contada. Uma dessas ilustrações está presente na capa da obra. Os mitos apresentados possuem uma escrita marcada pela oralidade e é em relação a isso que se pode atribuir diferenças significativas entre as duas edições. A segunda edição é mais trabalhada, o livro é maior em dimensão física e apresenta uma capa diferente da primeira edição. A capa da segunda edição, projetada por Marcelo Belico, utiliza ilustração de Raimundo Nonato Mana e usa elementos das pinturas Kaxinawá. Nesta edição foi adicionado um sumário e também mais informações na nota introdutória escrita por Nietta Monte sobre os Kaxinawá. Na parte dos mitos não há mudanças no conteúdo das histórias, o texto é apenas revisado e algumas palavras são acrescentadas e outras excluídas. Nessa revisão, nota-se a perda de parte das marcas de oralidade presentes na primeira edição, pois as estórias estão mais próximas da norma padrão de escrita em português. 143 A impressão de leitura é que a segunda edição tem uma interferência maior de não indígenas, e isso teria influenciado no resultado final da edição. Isto é, a segunda edição parece mais próxima à cultura ocidentalizada, o que não prejudica, contudo, a beleza do conteúdo das estórias apresentadas, uma vez que essas possuem um traço indígena forte. 4 CONCLUSÃO Observando o caminho percorrido pelo povo Kaxinawá, desde o contato com os ‘brancos’ até a atualidade, percebemos um longo percurso trilhado em busca de uma voz própria e que seja audível para a sociedade ocidental. Os frutos do movimento editorial iniciado pelos indígenas estão chegando até nós em forma de livros em prosa e em poesia e já demandam uma nova categoria dentro da literatura brasileira contemporânea: a literatura de autoria indígena. Este status é merecido pela beleza e subjetividade das obras já publicadas pela etnia Kaxinawá. Colocar este movimento em destaque é prioridade, pois deverá ser apropriadamente reconhecido como parte da literatura brasileira. Para isso, é necessário olhar com novos olhos para os livros da floresta, observando as características da cultura indígena que, sendo diferente da cultura ocidental, apresenta elementos singulares, mas constituintes da comunidade estética que vigora no Brasil. REFERÊNCIAS ALMEIDA, Maria Inês de & QUEIROZ, Sônia. “Livros da floresta”. In: _________. Na captura da voz - as edições da narrativa oral no Brasil. Belo Horizonte: Autêntica; FALE/UFMG. 2004. p.195-277. GOLDEMBERG, Deborah. A concepção do I Sarau de Poéticas Indígenas por uma antropóloga escritora. Espaço Ameríndio, Porto Alegre, v. 3, n. 1, p.42-60, jan./jun. 2009. OLIVEIRA, João Pacheco; FREIRE, Carlos Augusto da Rocha. A presença indígena na formação do Brasil. Ed. MEC/UNESCO: Brasília, 2006. 144 PROGRAMAS DE MELHORIA DA QUALIDADE DE ENSINO NA REDE PÚBLICA ESTADUAL DE PORTO VELHO (RO) Fabrício Ricardo Lopes28 Marli Lúcia Tonatto Zibetti29 RESUMO Os estudos realizados sobre o processo educacional a partir de uma perspectiva crítica de Psicologia Escolar têm trazido contribuições muito significativas para a compreensão das dificuldades escolares sob um olhar menos individualizante e mais político-social. Neste sentido, os estudos sobre as políticas educacionais tornam-se relevantes por permitirem evidenciar as formas como a materialização das propostas estatais imprimem marcas nos processos de escolarização, tanto no âmbito individual quanto institucional. Esta investigação teve como objetivo investigar as políticas implementados pela Secretaria de Estado da Educação de Rondônia, de 2002 a 2010, voltadas à melhoria da qualidade do ensino, buscando compreender a forma como os programas foram formulados, implementados, acompanhados e avaliados. Para isso foram utilizados dados qualitativos obtidos por meio de análise de documentos e entrevistas semi-estruturadas. Os resultados indicam a centralização da concepção e definição das formas de desenvolvimento dos programas e uma descentralização da execução. Questiona-se a adequação de projetos pensados em nível federal para a realidade de estados periféricos como Rondônia e a contribuição destas políticas para a manutenção das desigualdades regionais. Palavras-chave: Políticas Públicas. Ensino Fundamental. Programas Educacionais. INTRODUÇÃO O presente trabalho está inserido em uma pesquisa mais ampla denominada Políticas públicas de educação para o enfrentamento das dificuldades escolares na rede urbana estadual em Porto Velho-RO a qual, por sua vez, vincula-se ao Programa de Cooperação Acadêmica - PROCAD - Novas Fronteiras firmado entre a Universidade Federal de Rondônia, Universidade de São Paulo e Universidade Estadual de Maringá, que conta com financiamento da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES. A investigação, desenvolvida a partir de uma abordagem qualitativa teve como objetivo geral investigar as políticas implementadas pela Secretaria de Estado da Educação 28 científica Acadêmico do 5º período de Psicologia da Universidade Federal de Rondônia, bolsista de iniciação pelo Programa Institucional de Iniciação Científica PIBIC/CNPq. [email protected] 29 Professora do Departamento [email protected] de Psicologia – Universidade Federal de Rondônia – 145 (SEDUC) direcionadas à melhoria da qualidade nos anos iniciais do ensino fundamental nas escolas públicas em Porto Velho no período de 2002 a 2012. Os objetivos específicos que orientaram o estudo foram: a)Levantar os programas educacionais implementados nos anos iniciais do ensino fundamental nas escolas públicas estaduais em Porto Velho; b)Identificar as formas de planejamento, implementação, acompanhamento e avaliação dos programas desenvolvidos no âmbito da SEDUC; c)Compreender as relações entre as políticas implementadas pelo governo federal e os programas desenvolvidos no estado de Rondônia, no período de abrangência da pesquisa. Desta forma, nos debruçamos sobre políticas públicas educacionais desenvolvidas em um período de oito anos os quais compreenderam os mandatos de Ivo Narciso Cassol como governador do estado e Luiz Inácio Lula da Silva como presidente da República. Após a aprovação da Constituição Federal de 1988, o Brasil passou por várias transformações, principalmente no campo da saúde e da educação. O estudo de políticas educacionais merece investimentos, pois seus reflexos afetaram diretamente a dinâmica da educação brasileira, desde questões macro, institucionais, financiamento da educação, políticas de avaliação até as políticas com seus objetivos apontados para a melhoria da qualidade do ensino, vislumbrando a mudança direta dos serviços prestados à população brasileira. As políticas públicas são entendidas conforme Augusto (1989, p. 1) como: [...] um conjunto articulado de decisões de governo, visando fins previamente estabelecidos a serem atingidos através de práticas globalmente programadas e encadeadas de forma coerente. Clareza de propósitos, hierarquia quanto aos fins, e programas definidos no sentido de atingi-los, qualificariam as políticas governamentais em geral. (AUGUSTO, 1989, p. 1destaques da autora) Nesse sentido a Psicologia Escolar se faz presente e necessária neste campo de estudos, buscando entender em uma perspectiva crítica as implicações dessas políticas para os sujeitos envolvidos. Assim, analisar os processos educacionais de uma perspectiva crítica consiste em compreender as relações entre os determinantes mais amplos, tais como o contexto político e econômico que os condiciona, bem como a materialização destas influências na normatização da legislação que conforma e institucionaliza as práticas educacionais nos sistemas educativos. Desta forma, ganham relevância, no campo da psicologia os estudos sobre as políticas educacionais, pois conforme Viégas, Asbahr e Angelucci (2011, p. 15): 146 [...] sabemos que as políticas públicas educacionais implementadas nas redes de ensino imprimem marcas profundas na constituição do processo de escolarização. Assim, mais do que atual, é imprescindível conhecermos o que propõe o discurso oficial em relação à educação, ao nos depararmos com a realidade absolutamente contraditória da escola pública. E é por meio dos programas, muitas vezes apresentados em forma de leis, que o poder público se faz presente nas escolas. Portanto, a análise dos conteúdos de tais programas é fundamental para a compreensão das condições de escolarização oferecidas nas escolas públicas, por isso este é o foco de nossa investigação. A LEGISLAÇÃO E AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS A “Carta Magna” da educação brasileira teve suas raízes lançadas a absolutamente todos os setores da educação. Seu caráter regulatório alcançou também a administração referente a políticas educacionais. Entende-se por política educacional como “uma modalidade de política social.” (SAVIANI, 2008, 223). As políticas educacionais delimitam os caminhos a serem percorridos pela educação; são medidas tomadas pelo Estado a fim de que se tornem efetivas, atingindo seus ideais de melhorar significativamente a educação. No Brasil, tais políticas se encontram - uma vez analisado o esquema divisório de nossa administração pública - na área social, porém, questionamentos realizados por autores como Saviani (2008), ressaltam que é correto afirmar o caráter social de todas as políticas, já que o sentido da palavra corresponde à administração do bem comum. De acordo com este mesmo autor, as políticas sociais existem para contradizer o caráter, justamente, anti-social da política econômica em curso no Brasil. Esta política, por sua vez, segue a lógica do capitalismo, favorecendo interesses privados em detrimento dos interesses da coletividade. “[...] a necessidade de formulação de uma política social decorre do caráter anti-social da economia e, portanto, das políticas econômicas nas sociedades capitalistas.” (SAVIANI, 2008, p. 224). O momento pós-nova LDB e até mesmo um pequeno espaço de tempo pré-lei, constituiu, uma perspectiva visivelmente atrelada à economia, evidenciando os fins públicos e interesses privados30. Segundo Peroni: 30 Ver PLANK. D. Política Educacional no Brasil: caminhos para salvação pública. Porto Alegre, Artmed, 1991. 147 [...] a democracia, mesmo a meramente representativa, impede o livre andamento do mercado, porque os políticos têm de atender pelo menos em parte a demanda dos eleitores para se reelegerem. Portanto, a solução seria acabar com o voto, mas, se isso não fosse possível, esvaziar seu poder, esvaziando, também, as instituições representativas estatais deslocando as responsabilidades do Estado para a sociedade civil. Neste período particular do capitalismo, mais do que nunca, os empresários e o setor ligado ao capital tem o controle hegemônico da sociedade civil. (PERONI, 2003, p 115-116). Segundo Oliveira (2005) a sociedade brasileira passa a debater-se entre a expansão do direito à educação de qualidade para a maioria da população ou a negação desse benefício, quando se passa a colocá-la na esfera do mercado. Essa perspectiva, notadamente neoliberal, estimulou o investimento público na iniciativa privada e é a partir dessa orientação política dominante na década de 1990, que se encontram as formulações de algumas políticas educacionais que apontam para uma democratização do acesso, mas a negação do direito ao conhecimento. Essas modificações ocorrem em um contexto no qual, tendencialmente, regulariza-se o fluxo no Ensino Fundamental, impulsionado de forma ambígua tanto por uma perspectiva democratizante quanto por uma de economia de recursos. Isto fará com que, em breve, todos tenham oito anos de escolarização, mas não o acesso aos mesmos níveis de conhecimento. Muitos, nem a patamares mínimos. Elimina-se, assim, a exclusão do Ensino Fundamental, não a exclusão do acesso ao conhecimento. Modifica-se apenas a forma de manifestação da exclusão. (OLIVEIRA, 2005, p. 19). De acordo com Oliveira (2005) a expansão do acesso e permanência no sistema escolar para as camadas que sempre estiveram excluídas da escola, garantiu que ao final do século XX o ensino obrigatório no Brasil estivesse praticamente universalizado, pelo menos em relação ao acesso. Entretanto, essa democratização entra em choque com as bases políticas do programa neoliberal que tem como pilar a redução dos investimentos públicos em educação. Outro aspecto contraditório que caracterizou o processo educacional brasileiro com as reformas implementadas nos anos 1990, foi o redimensionamento da polaridade centralização/descentralização. Segundo Oliveira (2005, p. 18) “[...] ao mesmo tempo em que, tendencialmente, descentralizou-se a gestão e o financiamento, centralizou-se o processo de avaliação e controle do sistema.” O melhor exemplo do processo de descentralização da gestão da educação brasileira foi a criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), que permitiu à união transferir a responsabilidade de 148 gerir a educação para estados e municípios, por meio da redistribuição de recursos orçamentários arrecadados dos próprios entes municipais e estaduais. De acordo com Oliveira (2005, p. 21) na perspectiva da descentralização constrói-se um discurso no qual se valorizam “[...] expressões e termos como ‘autonomia’, ‘participação’, ’controle da comunidade’, ‘novo padrão de gestão’, ‘racionalização administrativa’, ‘repasse direto de recursos para a escola’, ‘indução ao estabelecimento de parcerias’ e ‘municipalização’.” (Destaques do autor). Por outro lado, a centralização se deu pelo estabelecimento de avaliações nacionais do sistema com exames padronizados para todos os níveis de ensino e neste âmbito os termos utilizados remetem a “[...] ‘difusão de uma cultura de avaliação’, ‘padrão de qualidade’, ‘avaliação de sistema’ e ‘competição’”. (OLIVEIRA, 2005, p. 21 - Destaques do autor). Assim, o sentido atribuído à descentralização decorrente da política implementada nos anos de 1990 e incorporado pela legislação brasileira é a transferência para Estados, Municípios e o Distrito Federal a responsabilidade de administrar diretamente suas redes de escolas. O funcionamento das escolas e das respectivas redes, por sua vez, passa a ser controlado de forma indireta pelos resultados alcançados pelos alunos nos testes que compõem os sistemas de avaliação. “Passa-se a controlar o ‘produto’ do sistema e não o ‘processo’ que o originou. Nesta lógica, a ‘autonomia’ da escola passa a ter outro sentido, pois a instituição passa a ser ‘monitorada’ de outra maneira, não mais pelo controle burocrático-hierárquico direto.” (OLIVEIRA, 2005, p. 24 - Destaques do autor). Nestes termos, a política educacional brasileira orienta-se por uma racionalidade instrumental e utilitarista da educação. De um lado entendida como ferramenta para a competitividade e, de outro, como condição para o desenvolvimento econômico do país. Cabe, portanto à educação, a reprodução da força de trabalho, integração social, prevenção de conflitos, formação para o consumo e para re-adequar-se frente ao desemprego, preparando-se para as transformações da sociedade moderna. Assim, a pressão social e política sobre a educação leva à ‘reordenação’ da gestão educacional que se vai conformando na direção estabelecida pela política federal. Segundo Freitas (1998, p. 09) “Essa se dá mediante condicionamento da função supletiva da União à adesão, pelo município, a projetos federais. Esta adesão tem implicado um crescente controle central dos resultados que, em alguns casos, alcança o interior da própria instituição escolar.” Esta parece ser a situação observada na rede estadual de ensino em Rondônia, conforme indicam os dados obtidos em nossa pesquisa. 149 A PESQUISA A abordagem qualitativa está sendo utilizada frequentemente no campo educacional, apesar de ainda ser alvo de críticas quanto ao seu rigor científico. Lüdke e André (1986) afirmam ser essa abordagem bastante efetiva, na medida em que supõe o contato direto do pesquisador/a com o campo, sendo ele (o/a pesquisador/a) o principal instrumento de mediação entre o ambiente pesquisado, os conhecimentos adquiridos por ele através da teoria e de suas experiências pessoais. Essa abordagem enfatiza um interesse maior pelo processo do que pelo produto e preocupa-se, também, com o registro detalhado dos dados e relações estabelecidas com os participantes da pesquisa. Segundo as autoras [...] são utilizadas mais frequentemente nesse novo tipo de estudo a observação participante, que cola o pesquisador à realidade estudada; a entrevista, que permite um maior aprofundamento das informações obtidas; e a análise documental, que complementa os dados obtidos através da observação e da entrevista que aponta novos aspectos da realidade estudada. (LUDKE; ANDRÉ. 1986. p.9) Com base nesses pressupostos a pesquisa foi desenvolvida junto à Secretaria Estadual de Educação em Porto Velho, por meio de contato com os técnicos da Gerência de Educação e da Gerência de Projetos Especiais, campo no qual foram coletados documentos e informações sobre os programas desenvolvidos no período analisado. Aos documentos fornecidos pelas Gerências foram somadas as informações obtidas no site do Ministério da Educação e também do Governo de Rondônia. Após a análise documental foram realizadas entrevistas com duas profissionais que atuaram em vários setores da secretaria por períodos que variam entre 07 e 15 anos. A análise dos dados respeitou as recomendações metodológicas de Lüdke e André (1986), buscando sempre manter a relação entre a Psicologia, a políticas públicas educacionais, e a base teórica do trabalho de forma a atender os objetivos que orientaram a pesquisa. RESULTADOS E DISCUSSÕES De acordo com dados do INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, Rondônia possuía no ano de 2010 cerca de 210 escolas na rede estadual que atendiam os anos iniciais. Em 2011 esse número caiu para 198 escolas. Dessas, 150 64 estavam localizadas em Porto Velho. Para evidenciar como têm se comportado os dados referentes à reprovação, aprovação e abandono na rede pública estadual durante o período estudado, organizamos a Tabela 1, com dados divulgados pelo INEP, procurando evidenciar como está situado o estado de Rondônia no quadro regional e nacional. Os referidos dados demonstram que os índices de evasão têm diminuído ao longo dos últimos anos, situando-se em 2010, abaixo da média regional (5.3%) e pouco acima da média nacional (3.1%). Entretanto, como se pode observar pela comparação ao longo do período, esses números têm oscilado de 4.3 em 2003, para 7.1 em 2005 e 3.3 em 2011. Tabela 1: Dados de rendimento escolar nos anos iniciais - Brasil, Região Norte e Rondônia Ano/ Região Brasil Norte Rondôni a 2003 Aprov . 84.3 77.1 85.0 Reprov . 10.3 15.5 10.7 Aband . 5.4 7.4 4.3 2005 Aprov . 79.5 73.1 78.5 Reprov . 13.0 15.8 14.4 Aband . 7.5 11.1 7.1 2010 Aprov . 86.6 82.9 82.2 Reprov . 10.3 11.8 14.5 Aband . 3.1 5.3 3.3 Fonte: MEC/INEP Em relação à reprovação, entretanto, o quadro é menos animador, pois o estado apresentava em 2003 e 2005 uma taxa inferior à média nacional, porém superior à da região norte. Entretanto, em 2010 esta situação se inverteu e o estado apresentou um índice de reprovação de 14.5%, superior à média da região norte (11.8%) e à média nacional (10.3%). Quando observamos os dados divulgados pelo IDEB - Índice de Desenvolvimento da Educação Básica - percebemos que o crescimento no período superou as metas estabelecidas, entretanto está ainda aquém do desejável, pois avançou de 3,9 em 2007, para 4,2 em 2009. Avanço que se deve, possivelmente, à diminuição dos índices de abandono. Quanto aos programas desenvolvidos para a melhoria da qualidade do ensino, a análise dos dados indicou um número de 16 programas que foram desenvolvidos no período de 2002 a 2010. Alguns deles, ainda em execução. Os programas foram agrupados de acordo com seus objetivos e o público alvo em cinco grandes grupos: 1)Programas de Formação de professores: Programa Especial de Habilitação e Capacitação para professores (PROHACAP), Programa de Formação Continuada PCN em Ação, Programa de Formação de Professores Alfabetizadores (PROFA); Programa de apoio a 151 Leitura e Escrita (PRALER) e Gestão da Aprendizagem Escolar (GESTAR I). 2)Programas de formação de outros profissionais da educação escolar: Escola de Gestores da educação Básica e Fortalecimento dos Conselhos Escolares. 3)Programas de reorganização (escolar) - mudança dos tempos e funcionamento da escola: Ciclo Básico de Alfabetização (Projeto Caminhar - CBA); Programa de Aceleração da Aprendizagem (Classe de Aceleração) e Programa Mais educação. 4)Programas de Tecnologia educacional: TV escola; Mídias na educação e Um computador por Aluno (UCA) 5)Programas voltados à melhoria da Gestão escolar: Programa de Fortalecimento da Escola (Fundescola), Programa de Apoio Financeiro (PROAFI) e Programa de Financiamento de Projetos Escolares (PROFIPES) Pode-se afirmar que a maior parte dos programas desenvolvidos ou em desenvolvimento na rede estadual em Rondônia são decorrentes de iniciativa federal e isso permite que seja questionada a sua adequação à realidade do estado, uma vez que muitos deles são desenvolvidos com base em material impresso e vídeográfico produzido em outros centros do país. Ou seja, são pensados e desenvolvidos ignorando-se as especificidades locais. [...] essa questão da formação continuada, o MEC deve continuar fomentando sim; mas eu penso que a gente podia pensar e deve já pensar, formação continuada regionalizada, material já regionalizado, não que a gente deixe o que é nacional para fazer o que é local, mas que a gente tenha um núcleo que é nacional, mas as questões regionais. A gente do estado pensar também na nossa proposta de formação continuada, com a nossa cara. O que a gente quer aqui em Rondônia. (Entrevista 1 - 27/06/2012). Outra questão a ser destacada é a multiplicidade de programas em desenvolvimento, muitas vezes destinados ao mesmo público e abordando os mesmos componentes curriculares, como os programas de formação PROFA, PRALER, GESTAR I. Todos têm como preocupação principal a formação de professores para o ensino da leitura, da escrita e no caso do GESTAR também o ensino da matemática. Em algumas situações, vários programas estavam em desenvolvimento ao mesmo tempo, como ocorreu com o PCN em ação, o PROFA e o PROHACAP. 152 SOBRE A ADESÃO, IMPLANTAÇÃO E ACOMPANHAMENTO DOS PROGRAMAS Desde o início da coleta de dados chamou-nos atenção a forma como ocorre a distribuição de responsabilidades sobre os programas em desenvolvimento na Secretaria de Estado da Educação. Cada programa possui uma coordenação específica e, na ausência da pessoa responsável, há dificuldades de acesso às informações. É importante ressaltar que a maioria desses programas parte da iniciativa federal e são assumidos pela SEDUC. Os dados obtidos mostram que existe a ilusão de descentralização da administração pública. Os programas, em sua maioria são, como dito acima, pensados em nível federal e a execução é responsabilidade dos estados, mas a forma como esses programas são implantados, acompanhados e avaliados também é definida no pacote que é adquirido pela Secretaria de educação. De acordo com as entrevistas realizadas e com os diálogos travados durante a coleta de dados, muitos programas são apresentados aos estados pelos próprios técnicos do Ministério da Educação que realizam visitas às secretarias para apresentação dos projetos. Ou então, os técnicos dos estados são convidados para a apresentação nacional do programa realizada em Brasília. “Na verdade, [...] sempre chega através do MEC mesmo. Vem um consultor, traz a proposta nova, [...] dos que eu já acompanhei sempre é através do MEC. Um ou outro de repente o Estado manifesta interesse [...]”. (Entrevista 01 - 27/06/2012). A partir dessa apresentação, o estado firma convênio com o Governo Federal e por meio dessa parceria os programas passam a ser desenvolvidos, pois como destaca a profissional da SEDUC “Geralmente os estados aderem aos programas, porque quando o governo federal sugere, ele capacita e ele também investe.” (Entrevista 2 - 27/06/2012). Nesse sentido, os dados evidenciam uma política de Gerencialismo, caracterizada segundo Lima e Gandin (2011), pela dispersão do poder, defendida sob o argumento de transparência governamental, objetivos claros, que dão a ideia de eficácia, trazendo o indivíduo como central e levando em conta mais o resultado através da avaliação de desempenho. Conforme indicam os dados, a SEDUC exerce o papel de intermediária e executora dos programas federais em nível de estado: “Aqui sempre é regionalizado. Passa pelas GE e depois vai para a Representação de Ensino. Não vão direto pra escola. Não tem nenhum, até o Mais Educação que era pra ser assim, direto na escola, não é.” (Entrevista 1, 27/06/2012). 153 CONSIDERAÇÕES FINAIS Inicialmente, percebemos que no período pesquisado estavam em curso administrações que se orientam por programas políticos sustentados em correntes filosóficas diferentes. No âmbito nacional tínhamos o governo do Presidente Luis Inácio Lula da Silva e no âmbito estadual Ivo Narciso Cassol. Esse é um dado relevante, na medida em que, mesmo havendo esse distanciamento entre posições políticas distintas, os programas propostos em nível central eram assumidos e desenvolvidos na esfera estadual, sem nenhuma restrição ou adaptação. Isso mostra que a educação não era prioridade no governo Estadual, pois existia um número muito restrito de programas educacionais regionalizados. Em contrapartida existiam e existem muitos programas da iniciativa federal que foram ou estão sendo executados pelo Estado. O governo do estado pode-se dizer que não deu sua identidade à educação local evidenciando sua fraqueza no que diz respeito à formulação das políticas educacionais. Por outro lado o governo federal mostra sua força alcançando os municípios mais periféricos. Nesse sentido, é possível afirmar que a Secretaria de Estado da Educação se tornou um ponto de passagem desses programas e as escolas suas executoras. Os métodos de implantação, acompanhamento e avaliação são determinados pelo governo federal. Outro aspecto que pode ser destacado dos programas identificados é a ênfase dada à formação de professores e àqueles voltados para a questão da tecnologia educacional, estes últimos inclusive, quase sempre acompanhados de propostas de formação. Isto indica que os governos continuam acreditando que a qualidade da educação pode ser alterada por meio deste caminho. Além disso, a adoção e execução de programas planejados em outras esferas contribuem para manter as relações de desigualdade entre as regiões centrais do país e os estados periféricos, uma vez que impede o desenvolvimento de quadros técnicos capazes de propor alternativas adequadas aos problemas regionais. Talvez este seja um aspecto a ser mais investigado e discutido, uma vez que, conforme os dados de rendimento escolar apresentados neste texto, os programas desenvolvidos no período não foram suficientes para melhorar os índices de aproveitamento escolar nos anos iniciais do Ensino Fundamental. 154 REFERÊNCIAS AUGUSTO, M. H. O. Políticas públicas, políticas sociais e políticas de saúde: Algumas questões para reflexão e debate. Tempo Social. S. Paulo, v. 1, n.1, 1989. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/legislacao/const/con1988/CON1988_04.02.2010/CON1988.pdf>.Acesso em: 08 mar. 2012. ______. Lei 9394, de 20 de dezembro de 1996. Dispõem sobre as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 dez. 1996. LIMA, I. G. de; GANDIN, L. A. Estado, gerencialismo e políticas educacionais: construindo um referencial teórico de análise. 34ª Reunião Anual da ANPED. Natal, 2011. Disponível em: <http://www.anped.org.br/app/webroot/34reuniao/.../GT05-667%20int.pdf>. Acesso em: 10 jul. 2012. LUDKE, M; ANDRÉ, M.E.D.A. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU. 1986. OLIVEIRA, R. P de. Política Educacional no Brasil: A expansão do Ensino Fundamental e suas conseqüências In. BOCK, A. M. B. (Org.) Relatório Final: Programa Banco Social de Serviços em Psicologia. Disponível em: <http://www.pol.org.br/pol/export/sites/default/pol/publicacoes/publicacoesDocumentos/MSE_Relato rio_Final.pdf>. Acesso em: 12 jul. 2012. PERONI, V. Política Educacional e papel do estado: no Brasil dos anos 1990. São Paulo: Xamã. 2003 PLANK, D.N. Política educacional no Brasil: caminhos para a salvação pública. Porto Alegre: Artmed, 2001. SANTOS, Pablo. Guia Prático da Política Educacional no Brasil: ações, planos, programas e impactos. São Paulo: Cengage Learning, 2012. VIÉGAS, L de S.; ASBAHR, F. da S. F.; ANGELUCCI, C. B. Apresentação. In. VIÉGAS, L de S.; ANGELUCCI, C. B. (Orgs.) Políticas públicas em Educação: Uma Análise Crítica a partir da Psicologia Escolar. São Paulo: Casa do Psicólogo. 2006. p. 9-23. 155 PRÁTICAS PSICOLÓGICAS: CONSIDERAÇÕES A CERCA DA ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO NO CONTEXTO ESCOLAR/EDUCACIONAL EM PORTO VELHO RO Fernanda Angrewski Coutinho1 Iracema Tada2 INTRODUÇÃO O atual modelo teórico da Psicologia Escolar (histórico-crítica) surgiu na década de 1980 a partir de uma autocrítica, uma análise oriunda da própria Psicologia aos modelos de atuação do psicólogo na Educação - cujo trabalho contribuiu para explicar o mau desempenho escolar, centrando grande parte dos motivos nas dificuldades apresentadas pelo aluno. A autocrítica da Psicologia em relação à atuação do psicólogo (SOUZA, 2010), levou-a a analisar e discutir o processo de escolarização das crianças, buscando compreender o problema além de uma perspectiva individual considerando todo o contexto institucional e social. Segundo Souza (2010) “os aspectos psicológicos são parte do complexo universo da escola, encontrando-se imbricados nas múltiplas relações que se estabelecem no processo pedagógico e institucional presentes na escola.” (p.60). As pesquisas, a partir de então, têm verificado que o fenômeno da queixa escolar se instauram e se perpetuam não por culpa do aluno ou de sua família, mas em virtude de que as crianças têm ingressado em “cotidianos escolares adoecidos e adoecedores” (SOUZA, 2007), e apontam que uma atuação do psicólogo escolar com ênfase na clínica, por meio de atendimentos individuais e aplicação de testes psicológicos, que tendem a culpabilizar o aluno ou sua família pelo insucesso escolar não são mais cabíveis nem aceitáveis (ANGELUCI et. al., 2004; COLLARES; MOYSÉS, 1996; FACCI, 1991; MACHADO, 2003; MACHADO; PROENÇA, 2008; MEIRA; ANTUNES, 2003; PATTO, 1990; 1997 e 2005; SOUZA, 1996). No entanto, mais de 30 anos de estudos sobre o adoecimento do cotidiano escolar bem como de pesquisas para uma nova prática do psicólogo escolar, não alteraram sua atuação clínica e individualista. Pelo contrário, temos visto um retorno às explicações para a não aprendizagem centradas no aluno e poucos avanços na implantação de políticas públicas de fato inclusivas na educação (GUARIDO, 2010; SOUZA, 2010; COLLARES; MOYSÉS, 2010). 1 Bolsista PIBIC/UNIR/CNPq - [email protected]; 156 2 Professora do departamento de Psicologia da Universidade Federal de Rondônia e orientadora da pesquisa Dois aspectos desta discussão precisam ser mais debatidos para compreendermos o atual quadro em que se inserem os processos institucionais escolares e os fatores que tem interferem na produção do fracasso escolar, são eles: as políticas públicas e a medicalização da educação. POLÍTICAS PÚBLICAS EM EDUCAÇÃO Paralelamente aos estudos sobre o fracasso escolar, surgem pesquisas focadas na análise das políticas públicas na educação. Tais pesquisas têm sido fundamentais para se traçar o perfil de atuação do psicólogo na escola. As pesquisas até agora realizadas, atentam para o fato de que a escola é um espaço cultural que constitui diversas relações sociais. Porém é perpassada por uma hierarquia, que “dá ordens” 31 a serem executadas, mas não dá voz aos verdadeiros atores escolares. Essa hierarquia silencia pais, alunos e professores e os responsabilizam pelo fracasso escolar (SOUZA, 2010), predominando a “ausência de discussão por parte daqueles que as concretizarão e a desconsideração de seus saberes.” (SOUZA, 2007, p.247) Viégas (2006) ao analisar o regime da progressão continuada - política de promoção automática que proíbe a reprovação no ensino básico - no estado de São Paulo, afirma que por trás dessa política (e de todas as outras) existe uma ideologia. Segundo ela, a ideologia é caracterizada por conferir prestígio ao discurso competente32, pela forma autoritária e pelo pensamento mágico - crença de que as ideias podem transformar a realidade. As formas como as políticas são impostas, evidenciam contradições, pois ao mesmo tempo em que o discurso oficial as coloca como uma mudança efetiva da realidade coloca também requisitos necessários para educadores cumprir, de forma que se a iniciativa fracassar, este não recaia sobre os seus idealizadores. Trata-se, pois, de uma política que não transforma a essência 33 do fracasso escolar, mas apenas o que dele aparece [...], ou seja, que não visa a garantir o sucesso, mas apenas eliminar o fracasso. (VIÉGAS, 2006, p.161). Como explicitado acima, tais políticas acabam sendo mais “engolidas” do que implantadas, pois na maioria das vezes, a escola é informada com pouco prazo das novas 31 Destaque nosso. Grifo da autora. O discurso competente é definido como o discurso do especialista, inspirado na suposta eficácia dos meios de ação (p.159). 33 Grifos da autora 32 157 diretrizes e ainda é cobrada a aderir até a data estipulada. Medidas adotadas dessa maneira são apropriadas pelos educadores de forma superficial e distorcida (SOUZA, 2007). Tornam-se mais uma iniciativa que está no projeto, que traz números para escola, mas que não funcionam e que não ajudam a melhorar o processo de escolarização. Os preconceitos que as instâncias superiores têm em relação às famílias pobres e seus filhos também atravessam a implantação das políticas públicas. A escola passa a ter o papel de família, pois a família biológica é “incapaz” de educar seus filhos porque não possuem cultura suficiente ou são “criminosos”. Preconceitos, que segundo Viégas (2006) “são travestidos de olhar científico” (p.162), ou seja, são corroborados pela ciência. Os educadores, atores diários da instituição não são convidados a discutir as necessidades da escola, e quando alguma política é estabelecida, surge como norma e obrigação. Ao mesmo tempo em que o professor é trazido como elemento fundamental no sucesso de uma política pública, as pesquisas demonstram que esse profissional pouco tem participado da discussão ou de instâncias de discussão do planejamento e da implantação de quaisquer das políticas estudadas. (SOUZA, 2010, p.138-139) Essas instâncias superiores determinam de forma arbitrária as iniciativas que devem ser implantadas nas escolas, sem dar ouvidos aos verdadeiros interessados no desenvolvimento educacional. É nesse sentido que são criados setores próprios para a avaliação das dificuldades de aprendizagem, que trabalham com encaminhamentos a especialistas médicos (JOHNSON, 2011). Em relação à Psicologia, as Políticas Públicas que deliberam o trabalho do psicólogo no campo educacional são todos voltados para uma atuação psicométrica e medicalizante. Conforme estudo realizado por Souza e Cunha (2010) em São Paulo/SP, os projetos de lei em trâmite no estado definem o trabalho do psicólogo como: aplicação de testes de orientação vocacional; realização de exames psicodiagnóstico infantis e acompanhamento de alunos com TDAH e Dislexia. Tais situações revelam como o processo de medicalização, ou seja, a redução de conflitos sociais a doenças individuais, tem se tornado natural. A MEDICALIZAÇÃO DOS ESCOLARES A medicina e a tecnociência evoluíram muito nas últimas décadas. Seus resultados são divulgados cada vez mais pela mídia e outros meios de comunicação. A ênfase no 158 organicismo tem gerado a ideia de que o sofrimento psíquico é mera expressão do organismo “Neste sentido o campo das perturbações psíquicas é um dos mais eloquentes: o sofrimento transformado em transtorno, o medo em excitação da amígdala [...]” (TERZAGGHI, citado por GUARRIDO, 2010, p. 28). Na década de 1990 e no início do século XXI, ressalta-se uma apropriação do discurso médico-psicológico no cotidiano escolar. “No lugar de uma autoridade familiar, um conjunto de especialidades se consolidou como capaz de orientar a educação das crianças.” (GUARRIDO, 2010, p.36). A aprendizagem é fruto do bom funcionamento do organismo e caso não ocorra é porque existe um déficit neurológico. (GUARRIDO, 2010.) A educação passa a ser atingida por este processo denominado medicalização, ou seja, a concepção de que as crianças não obtêm sucesso escolar em função de possuírem distúrbios de aprendizagem, como a dislexia e transtornos de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH). A medicalização é um processo que diz respeito à redução de questões de natureza social a um problema de saúde. “Medicalizar significa definir, em termos médicos, problemas sociais e buscar sua origem na biologia.” (ILLICH, 1975 citado por MOYSÉS; GUARRIDO, 2010, p. 150). Segundo Souza (2010) a patologização de crianças e adolescentes em idade escolar como explicação da não aprendizagem tem movimentado a indústria farmacêutica que vende milhares de medicamentos para crianças diagnosticadas com vários transtornos todos os anos. Este artifício tem sido aceito e defendido por várias instâncias públicas como um direito da criança de ser diagnosticada e medicada, Esse argumento vem ganhando os espaços legislativos de grande parte de cidades e estados brasileiros por meio de inúmeros projetos de lei que visam criar serviços sejam nas secretarias de Educação, seja na secretaria de Saúde, para atender as crianças com problemas escolares. (p.64) A naturalização da medicalização coopera para a precarização cada vez maior da educação. Para Souza (2010), Há um retrocesso visível no campo educacional ao transformarmos em patologia algo que é produto das dificuldades vividas por um sistema escolar que não consegue dar conta de suas finalidades. Sistema este fruto de políticas que durante décadas depauperaram a escola pública e dificultaram que desempenhasse seus papeis sociais e políticos. (p.65) 159 O processo de medicalização implica em continuar afirmando que a culpa do fracasso escolar está na criança, porém de forma mais moderna com o alvará da ciência, o que torna mais difícil desmistificá-lo. A medicalização está totalmente imbricada no cotidiano escolar. Na contramão do que têm acontecido, os atuais pesquisadores na área da psicologia escolar acreditam que o trabalho do psicólogo deve trabalhar a nível institucional, ou seja, “o psicólogo ao atuar no campo educacional e escolar envolverá os diversos protagonistas da escola [...]” (SOUZA; CUNHA, 2010, p. 226). Dar voz e espaço para os demais atores escolares, para que também possam refletir sobre suas práticas. A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO COM ÊNFASE NA PSICOLOGIA ESCOLAR CRÍTICA Envolver os protagonistas da escola, os atores escolares na atuação com a queixa escolar, é um trabalho árduo, pois implica em colocar luz sobre os problemas institucionais. Machado (2003) coloca que a presença do psicólogo na escola gera nos educadores expectativas de que terão respostas para o não aprender. Para a autora, este é o primeiro ponto a ser trabalhado: “reforça-se a necessidade de estabelecermos estratégias que possam dar visibilidade às tensões do cotidiano” (p.65). Beatriz de Paula Souza (2007) aponta como estratégia colher e problematizar as versões de cada participante da queixa (pois o aluno não é o único envolvido). Machado (2003) também cita a necessidade de se conversar com os professores apontando as contradições dos encaminhamentos produzidos. É preciso, segundo a autora “intervir nas produções cotidianas, criando práticas, acontecimentos que permitissem movimentar aquilo que estava cristalizado, produzindo diferenciações” (p.71). Olhar para o potencial e não para a falta. (SARAIVA, 2007). Diante do que foi exposto, Propusemo-nos a conhecer em que nível de atuação o psicólogo escolar em Porto Velo/RO está trabalhando. OBJETIVOS O objetivo principal da pesquisa foi compreender as estratégias de enfrentamento do fracasso escolar utilizadas pelo psicólogo escolar, bem como suas crenças e valores acerca da queixa escolar e dos problemas de aprendizagem. Além disso, Investigar como acontecem os 160 processos de encaminhamentos de alunos com queixa escolar, analisando a presença ou não do processo de medicalização na atuação do psicólogo. MÉTODO Foram realizadas entrevistas semi-estruturadas, gravadas em áudio (LÜDKE; ANDRÉ, 1986) com dez psicólogos escolares, dois lotados na Secretaria Municipal de Educação (SEMED) e oito lotados na Secretaria Estadual de Educação (SEDUC). A pesquisa é de caráter qualitativo e trata-se de um estudo de caso, pois se dedica a compreender um fenômeno em especial, neste caso, a atuação do psicólogo frente à queixa escolar e os processos de medicalização na educação (CHIZZOTTI, 2006; YIN, 2005). Para análise dos dados foram construídas categorias descritivas por meio da impregnação de conteúdo, buscando o material manifesto e o latente, presentes nas mensagens implícitas ou contraditórias, ou nos temas silenciados (LÜDKE; ANDRÉ, 1986). RESULTADOS E DISCUSSÃO Como citado anteriormente, para a realização dessa pesquisa foram entrevistados dez psicólogos que atuam nas secretarias de educação: duas lotadas na SEMED e oito lotados na SEDUC, identificados como Psi 01; Psi 02; Psi 03; Psi 04; Psi 05; Psi 06; Psi 07; Psi 08; Psi 09 e Psi 10. Para compreender os dados, dividimos as respostas das entrevistadas em categorias: a) Concepções sobre problemas de aprendizagem e queixa escolar; b) procedimentos de atendimento e encaminhamento; c) instrumento de avaliação e compreensão da queixa escolar e d) a medicalização no cotidiano do psicólogo escolar. Em relação às concepções que os entrevistados têm sobre o motivo que leva a dificuldade de aprendizagem, Psi 01, Psi 02, Psi 04, Psi 06 e Psi 10 concordam que existem vários fatores para explicar os problemas de aprendizagem, porém Psi 01 e Psi 02 colocam maior ênfase na família ou em problemas físicos. Psi 06 dá maior ênfase na falta de reforço escolar e da condição social em que a criança se insere e a falta de acompanhamento dos pais. Psi 05 e Psi 07 acreditam que não exista dificuldade de aprendizagem e sim varáveis que 161 interferem no processo de escolarização. Psi 10 e Psi 04 colocam que o motivo principal é a metodologia da escola, e a dificuldade da formação básica. Quanto às formas de atendimento aos casos de queixa escolar recebidos pelos colaboradores, Psi 01; Psi 02 e Psi 09 basicamente atuam realizando encaminhamentos de aluno aos especialistas que consideram competentes para resolver o problema, ou aos pais. Psi 06 realiza um atendimento individualizado com o aluno. Psi 04, Psi 10 e Psi 05 trabalham a queixa escolar com os demais atores escolares. A forma de atendimento de Psi 04 e Psi 10 são realizadas diretamente com os professores da escola, através da socialização dos problemas. Sobre a avaliação dos encaminhamentos recebidos, Psi 01, Psi 06 e Psi 08 afirmam não utilizar nenhum instrumento psicológico na avaliação diagnóstica do aluno, porém utilizam a anamnese, que consiste numa entrevista que investiga temas como: o nascimento da criança (como foi o parto); doenças que teve ou problemas de saúde na família; o tempo que levou para se desenvolver, etc. Psi 04 e Psi 07 utilizam para avaliação alguns testes psicológicos de caráter projetivo, porém, Psi 07 também realiza a avaliação através de observação do aluno no cotidiano escolar, assim como Psi 10. A cerca do processo de medicalização dentro da escola, apenas Psi 05 e Psi 07 apresentaram um discurso crítico em relação a esse fenômeno. Os demais ou não se posicionaram, ou não concebem a medicalização como um fenômeno social que busca justificar o fracasso escolar como algo de ordem orgânica e individual. O que implica dizer que o fenômeno da medicalização está impregnado no contexto escolar, embora apenas uma das entrevistadas tenha relatado conhecer casos de alunos sendo medicados em decorrência da dificuldade de aprendizagem. Ao fazer um balanço, é verificável que Psi 01, Psi 02, Psi 06, Psi 08 e Psi 09 ainda possuem uma atuação que ainda trabalha a dificuldade de aprendizagem como responsabilidade apenas do aluno, o que as leva a atuar apenas por meio de encaminhamentos desse aluno para outros especialistas, ou dando orientações aos pais, ou ainda, atendê-los sob uma perspectiva clínica, individualizada. Ao contrário, vemos que Psi 04, Psi 05, Psi 07 e Psi 10 têm uma atuação diferente. Os mesmos realizam grupos com professores e orientadores. Ao dar voz aos demais atores escolares, esses psicólogos propiciam um espaço de reflexão da prática, de forma que se vejam como ativos no processo de escolarização, até mesmo na produção do fracasso escolar. 162 CONSIDERAÇÕES FINAIS O berço da Psicologia no Brasil são as escolas. A Psicologia foi inserida dentro da educação, a princípio, com o objetivo de avaliar, medir, encaminhar e diagnosticar os motivos do não aprender. Essa atuação retrógada já vem sendo criticada há muito tempo, ao passo que vão se construindo novas formas de atuação, que fuja aos padrões clínicos e individualizantes. Uma atuação crítica, que considere o contexto escolar como importante no processo ensinoaprendizagem; que trabalhe também os demais atores escolares que estão envolvidos direta e indiretamente na educação. Podemos apontar que dos dez psicólogos entrevistados para a realização dessa pesquisa quatro se aproximaram daquilo que chamamos de atuação crítica no período que trabalhavam nas escolas. Atualmente os psicólogos estão passando por uma redefinição da sua atuação como psicólogo educacional, como determina a lei 420/2008 vivenciando uma crise de identidade profissional até mesmo aqueles que tinham uma atuação diferenciada anteriormente, uma vez que não foi respeitado o desejo deles de permanecerem na escola. Tal situação nos leva a pensar a necessidade de estar em constante reflexão e atualização a cerca da atividade profissional, independente da área. Talvez, o Curso de atualização em Psicologia Escolar - mais uma parceria da universidade com a SEDUC - esteja contribuindo para modificar, aos poucos essa realidade. Esse curso tem sido importante para proporcionar a reflexão sobre o sistema educacional. Segundo Souza (2009): O conhecimento psicológico no campo da educação precisa ser constantemente construído, revisitado, criticado, superado, visando dar respostas e interferir, o mais que pudermos nos rumos das dimensões de formação do sujeito humano. (p.182) Dessa forma, acreditamos que ainda há muito a ser discutido para que o psicólogo educacional de Porto Velho tenha uma atuação crítica comprometida com a educação e a sociedade. AGRADECIMENTOS Aos colaboradores da pesquisa, que gentilmente cederam seu tempo que tornou possível a realização da pesquisa. Ao CNPq, a UNIR e ao PIBIC pelo apoio através da bolsa de iniciação científica e pela oportunidade de fazer ciência. 163 Às Professoras Dra. Iracema Neno Cecilio Tada e Dra. Vanessa Aparecida Alves de Lima pela orientação, apoio e suporte no desenvolvimento da pesquisa e no esclarecimento das dúvidas bem como por serem profundamente comprometidas com a formação acadêmica e ética de seus alunos. REFERÊNCIAS ANACHE, Alexandra Ayach. Psicologia Escolar e educação especial: versões, inserções e mediações. Em Aberto, Brasília, v. 23, n. 83, p. 73-93, mar. 2010 CHIZZOTTI, A. Pesquisa em ciências humanas e sociais. São Paulo: Cortez. 2006. FERNANDES, Ângela Maria Dias et al. 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O que fazem as escolas quando as crianças não aprendem a ler e a escrever? Uma investigação sobre fracasso escolar no Ciclo Básico em Rolim de Moura - RO. 2010. 176f. Relatório de Pesquisa (Edital Universal/2006/CNPq) - Fundação Universidade Federal de Rondônia, Rolim de Moura, Rondônia. 165 O (NÃO) TEMPO NAS DOBRAS DO (IR) REAL Gabriel Pereira de Melo34 Heloísa Helena Siqueira Correia35 RESUMO O presente texto é um resumo do relatório de pesquisa que foi desenvolvida pelo aluno. O texto perpassa pela teoria platônica do conhecimento, tendo esta, servido de base para a análise do conto “O Imortal” do escritor Argentino Jorge Luis Borges. Além, de ter sido feita a análise com a influência da literatura neofantástica, para concretizar o estudo sobre a negação do tempo presente no conto. Palavras-chave: Borges. Filosofia Platônica. Neofantástico. INTRODUÇÃO A filosofia tem colaborado com diversas áreas do conhecimento e possibilita diversos estudos comparativos no âmbito da literatura. Na obra de Jorge Luís Borges - escritor, contista e ensaísta argentino -, percebemos grande influência da filosofia, especialmente a platônica. O projeto “Fantástico: Intersecções Críticas” possibilita, entre outros, o estudo comparativo entre a literatura fantástica borgeana e determinados textos clássicos da filosofia. Com o sub-projeto “O (não) tempo nas dobras do (ir) real” se pode investigar mais precisamente como se dá essa relação entre o fantástico e a filosofia de Platão. Nesse sentido, os objetivos gerais da pesquisa são os seguintes: - Realizar leitura dos contos de Jorge Luis Borges identificando as concepções de tempo, inclusive a noção de negação do tempo, com as quais o escritor argentino tece suas ficções desconstrutoras de nosso mundo histórico e cotidiano; - Estudar a mescla de ensaio e ficção levada a cabo por Jorge Luis Borges em textos diversos. Mais especificamente nos propomos a: - Promover diálogo entre as reflexões metalingüísticas presentes na obra borgeana e as concepções de fantástico trabalhadas pela teoria e pela crítica; 34 Aluno do 6° período do curso de Filosofia na Fundação Universidade Federal de Rondônia. Pesquisador voluntário do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação Científica – PIBIC, e integrante do Grupo de Pesquisa “Fantástico: Intersecções Críticas”. 35 Profa. Dra e Orientadora da pesquisa. 166 - Elencar e ensaiar hipóteses interpretativas, levantando questões para discussão e futuras pesquisas. O trabalho comparativo nos permitiu analisar como a narrativa borgeana está entrelaçada com a filosofia de Platão. O mundo sensível descrito por Platão se encontra presente no conto analisado - “O imortal” -, e a saída desse mundo em direção ao mundo inteligível, que traria o conhecimento pleno e verdadeiro, não acontece. No conto borgeano que estamos estudando o mundo sensível é sentido em sua forma mais latente. A TEORIA DO CONHECIMENTO PLATÔNICA A PARTIR DA ALEGORIA DA CAVERNA A teoria das ideias de Platão explica o modo pelo qual o indivíduo adquire o conhecimento verdadeiro das ideias Verdadeiras, Eternas, Perfeitas, Imóveis e Imutáveis, origem e modelo de todas as coisas existentes no mundo sensível. Platão em sua obra A República tenta organizar a polis para receber o representante mais indicado para governá-la: o Filósofo. A república é um dos textos mais importantes da filosofia platônica, pois além de trazer ao leitor a concepção platônica de pólis, demonstra seu pensamento por meio de diálogos e alegorias, o que torna a compreensão uma experiência também estética. Um dos mitos mais importantes (ou senão o mais conhecido) é a Alegoria da Caverna, exposto no Livro VII de A República. Essa alegoria narra a história de um grupo de homens aprisionados em uma caverna desde o nascimento, eles estão de tal forma amarrados, que não podem olhar uns para os outros e nem se moverem. O grupo, apenas, podia ver imagens, como sombras, que se projetavam na parede do fundo da caverna, com a ajuda da luz de uma fogueira. De acordo com o mito, um homem consegue se libertar da caverna. O prisioneiro que se liberta caminha cambaleante para fora da caverna e vê a luz do sol, nesse momento começa a olhar pela primeira vez a realidade de fora da caverna, e o faz com dificuldade, uma vez que sua visão estava acostumada à escuridão da caverna. O texto do mito explica como deve ser a transição: Precisava de se habituar, julgo eu, se quisesse ver o mundo superior. Em primeiro lugar, olharia mais facilmente para as sombras, depois disso, para as imagens dos homens e dos outros objectos, reflectidas na água, e, por último, para os próprios objectos. A partir de então, seria capaz de contemplar a o que há no céu, e o próprio céu, durante a noite, olhando para a luz das estrelas e da Lua, mais facilmente do que se fosse o Sol e o seu 167 brilho de dia. [...] Finalmente, julgo eu, seria capaz de olhar para o Sol e de o contemplar, não já a sua imagem na água ou em qualquer sítio, mas a ele mesmo, no seu lugar. [...] Depois já compreenderia, acerca do Sol, que é ele que causa as estações e os anos e que tudo dirige no mundo visível, e que é o responsável por tudo aquilo de que eles viam arremedo. A Caverna simboliza o mundo sensível, este mundo em que vivemos, e a saída do prisioneiro simboliza a saída do mundo da ignorância para o mundo do conhecimento, inteligível. Ao sair, não conseguirá ver, pois o Sol (Idéia de Bem) ofuscará seus olhos até que eles se acostumem à luz. Quando cessar o momento de ofuscamento, começará a contemplar o que é real (do qual antes só via as sombras), chegando assim ao conhecimento “verdadeiro”. “Finalmente, julgo eu, seria capaz de olha para o Sol e de o contemplar, não já a sua imagem na água ou em qualquer sítio, mas ele mesmo, no seu lugar” (PLATÃO, 2010, p. 317, §516b). Ou seja, só o Sol mostrará a realidade como ela é, libertando os olhos das aparências imperfeitas. O ato de sair da caverna se dá de forma ascendente. O prisioneiro ao caminhar para a saída da caverna, concomitantemente, caminha para a superação do mundo das sombras, das ilusões, das opiniões. “Em primeiro lugar, olharia mais facilmente para as sombras, depois disso, para as imagens dos homens e dos outros objectos, reflectidas na água, e, por último, para os próprios objectos (PLATÃO, 2010, p. 315-319, 514a - 517a)”. Esse tempo que passa a contemplar as sombras das coisas ao sair da caverna é o momento em que está em processo de elevação de grau de conhecimento. Após esse estágio de eikasía atinge o grau da pístis e dóxa, ou seja, começa a produzir especulações sobre esse “novo” mundo que está a ver, e parte para a crença de que esse mundo, de fato, existe. O grau da diánoia que necessita dos métodos do raciocínio, do pensamento intelectual e da dialética para alcançar o grau da nóesis ou espistéme, precisa do auxílio da educação, o que, na alegoria está condensado na visão direta do Sol (entendido como Bem). Para Chauí “[...] a dialética como movimento ascendente de libertação, [...] nos libera da cegueira para vermos a luz das idéias” (PLATÃO, 2010, p.196), e foi o que aconteceu com o liberto, a cegueira caiu ao chão provocando o olhar para a realidade. Esse movimento é irreversível, pois ao contemplar “a luz das idéias” não poderá virar as costas e “de repente” esquecer o que apreendeu dessa realidade. Mesmo que consiga voltar à caverna (mundo sensível), não será a mesma pessoa de antes, pois essa tentativa já é parte da dialética descendente. Na relação entre o mundo sensível e o inteligível encontra-se a importância fundamental da dialética platônica (CHAUÍ, 1994, p. 187). Para sintetizar o significado da alegoria da caverna, lembramos Chauí (1994, p. 195) quando afirma que: 168 A réstia de luz que projeta as sombras na parede é um reflexo da luz verdadeira (as idéias) sobre o mundo sensível. Somos os prisioneiros. As sombras são as coisas sensíveis que tomamos pelas verdadeiras. Os grilhões são nossos preconceitos, nossa confiança em nossos sentidos e opiniões. O instrumento que quebra os grilhões e faz a escalada do muro é a dialética. O prisioneiro curioso que escapa é o filósofo. A luz que ele vê é a luz plena do Ser, isto é, o Bem, que ilumina o mundo inteligível como o Sol ilumina o mundo sensível. O retorno à caverna para convidar os outros a sair dela é o diálogo filosófico (CHAUÍ, 1994, p. 195). A alegoria da Caverna platônica, rica em significados, explica a maior parte da teoria platônica sobre o processo educativo que o homem deve fazer para alcançar o conhecimento. Gradativamente o homem passa de um nível de conhecimento para o outro, até que, se for capaz, poder ver a luz do Sol, ou o resplandecer do verdadeiro conhecimento. A INFLUÊNCIA DA NARRATIVA NEOFANTÁSTICA NA OBRA DE BORGES Para fundamentar a discussão acerca da literatura fantástica, o estudioso argentino Jayme Alazraki (2001), em seu texto ¿Qué es lo neofantástico?, propõe uma espécie de derivação do fantástico como gênero, a saber, o neo-fantástico, para explicar as novas relações do sobrenatural com a realidade. Segundo o crítico, a denominação proposta atende ás exigências de tratamento do fantástico moderno e contemporâneo, e de modo especial ao fantástico que se pode encontrar nas obras de Jorge Luis Borges e Júlio Cortázar. Aquela concepção de fantástico pensado como gênero existente nos séculos XVIII e XIX, e sistematicamente trabalhado pelo estudioso húngaro Tzvetan Todorov (2003), não era suficiente para pensar o modo como esses autores, em especial Borges, lançava mão da filosofia e das escolas da metafísica em suas obras de ficção, daí a nova terminologia. É preciso ter em mente que ao cunhar essa nova terminologia, Alazraki tinha como contexto o pós-guerra, assim afirma: “(...) el ralato neofantástico está apuntalado por los efectos de la primera guerra mundial, por los movimientos de vanguardia, por Freud y el psicoanálisis, por el surrealismo y el existencialismo, entre otros factores” (ALAZRAKI, 2001, p. 280). Nesse sentido, era preciso inovar, criar novos modos fantásticos para poder surpreender o leitor afetado pelos movimentos surrealista, existencialista e psicanalítico. Eis que aparece a possibilidade do discurso fantástico como forma de insinuação do sobrenatural na realidade. A realidade humana passa a poder ser vista como uma ponte para o território desconhecido do sobrenatural. A fissura que persiste em existir na realidade humana é o lugar das angústias do ser que se vê diante de muitas respostas científicas e não sabe como 169 fazer uso delas. É nessa fissura que Borges irá trabalhar para escrever suas narrativas fantásticas. Entre as fendas do real surgirá a narrativa que se aproveitará de perguntas filosóficas, entre elas a que pergunta como o tempo age na fissura. Ao lançar mão desses aparatos temporais em sua narrativa, Borges inaugura seu modo particular de fazer literatura. A partir da filosofia, cria metáforas temporais que se entrelaçam com seu fazer literário, transformando a sua escrita em um emaranhado filosófico que rompe/racha os muros das explicações científicas. Ao fazer isso, pretende não só sugerir a literatura como uma forma de conhecimento, mas pretende estabelecer um conhecimento inteligível de outras realidades não alcançadas pelo intelecto humano. Não é por menos que muitos dos textos críticos sobre a sua obra operam uma revisão filosófica dos conceitos de tempo, causalidade e realidade. O fantástico, então, provém do momento de espanto diante de algo desconhecido e, por isso, questionável ou inexplicável? Borges cria uma literatura vinculada à filosofia, isso torna ainda mais difícil a compreensão do mundo em meio a um labirinto temporal? Assim afirma Alazraki: Era necessario definir el relieve fantástico de toda doctrina filosófica para poder entrever las posibilidades filosóficas del género fantástico. Borges puede no ser original en la primera de estas tareas, pero ningún escritor ha capitalizado como él las implicaciones y posibilidades que emergen de la primera de las dos propociones respecto a la segunda (ALAZRAKI, 1987, p. 190). Borges afimou no conto “Tlön, Uqbar, Orbis Tertius” que os metafísicos de Tlön “julgam que a metafísica é um ramo da literatura fantástica” (2000, p. 481). Isso nos permite interpretar que a metafísica, por ser uma área da filosofia que não se limita às investigações do mundo físico, é a matéria mais subjetiva e mais sobrenatural que se encontra nas escolas filosóficas, o que permite que o ser humano possa se aventurar em experiências fantásticas por meio das especulações metafísicas. “Ahí está la fuerza de Borges. En saber proporcionárselos: los temas filosóficos más esquemáticos y yertos se transforman en animados relatos de sucesos, en vívidas descripciones de mundo fantásticos” (NUÑO, 1986, p. 16). O conto “O Imortal”, presente no livro O Aleph de 1949, é exemplo de narrativa que explora fantasticamente argumentos e problemas metafísicos. 170 “O IMORTAL: O MUNDO SENSÍVEL VENCE A DIALÉTICA” O conto narra a história de um tribuno romano que em uma noite de insônia caminha pelos jardins de Tebas. Ele se depara com um homem vindo a cavalo, já muito debilitado pelo tempo de viagem, que lhe fala sobre a existência de um rio que concede a imortalidade para quem bebe de suas águas e sobre a Cidade dos Imortais. Antes que a noite termine o viajante morre, deixando apenas a direção em que, possivelmente, se encontram o rio e a cidade. O tribuno, com desejo de conhecer tal rio, determina a si mesmo a tarefa de encontrálo. Para essa busca consegue o apoio, cedido por superiores, de soldados e de mercenários. Começa a viagem, e após várias mortes e deserções dos soldados o tribuno se vê sozinho e sedento. Finalmente, ao chegar a uma montanha consegue ver a suposta Cidade dos Imortais. Apressado, desce a montanha e bebe das águas escuras que encontra, tornando-se imortal. Vale retomar as palavras do narrador: “A urgência da sede me fez temerário. Considerei que estava a uns trinta pés das areia: de olhos fechados, com as mãos atadas às costas, atirei-me montanha abaixo. Afundei o rosto ensangüentado na água escura” (BORGES, 2000, p. 596). De modo semelhante e paralelamente pergunta-se: é possível encontrar e beber as águas do rio que concedem a imortalidade? Segundo a narrativa borgeana, o tribuno, personagem protagonista de “O Imortal”, realiza tal encontro, e também consegue alcançar a Cidade dos Imortais. Ao chegar às montanhas que circundam a cidade que, aparentemente, é a Cidade dos Imortais, a personagem se depara com uma água escura que bebe “(...) como a beberam os animais” (BORGES, 2000, p. 596). Fatigado se entrega aos delírios do sono. Quando acorda sente que não é mais o mesmo de quando ali chegara: Não sei quantos dias e noites rodopiaram sobre mim. Dolorido, incapaz de recuperar o abrigo das cavernas, despido na ignorada areia, deixei que a lua e o sol brincassem com meu aziago destino. Os trogloditas, infantis na barbárie, não me ajudaram a sobreviver ou a morrer. Em vão, roguei-lhes que me dessem a morte. Um dia, com o fio de um pedernal, parti minhas ligaduras. Em outro, levantei-me e pude mendigar ou roubar - eu, Marco Flamínio Rufo, tribuno militar de uma das legiões de Roma - minha primeira detestada ração de carne de serpente (BORGES, 2000, p. 596). Depois de comer e conseguir pôr-se em pé, caminha para conhecer a cidade, no que é seguido pelos trogloditas. Engana-se ao supor que a Cidade é próxima: “(...) ofuscado pela pedreiras; ofuscado pela grandeza da Cidade, eu a supusera próxima” (BORGES, 2000, p. 596-97), no entanto a personagem chega aos muros da Cidade apenas à meia-noite, o que lhe 171 faz fechar os olhos para esperar o amanhecer. O dia não lhe traz mais êxito, apesar de sua busca intensa não encontra sequer uma porta nos muros. A passagem será identificada de outro modo: “A força do dia fez com que me refugiasse numa caverna; no fundo havia um poço, no poço uma escada que se abismava até a treva inferior” (BORGES, 2000, p. 597). Dando continuidade à relação com o Mito da Caverna, percebe-se que a crescente possibilidade de olhar diretamente para o sol - Idéia de Bem - presente na narrativa platônica, não possui paralelo no conto borgeano. A adaptação necessária ao homem, tal como expõe Platão, é seqüencial; obriga o homem liberto dos grilhões que o mantinham na caverna a acostumar sua visão primeiramente dirigindo seu olhar para as sombras dos objetos - dóxa -, e seus reflexos na água - eikasía-, para em seguida, olhar diretamente para os próprios objetos e relacioná-los - dianóia, e então, e só então, vislumbrar diretamente a luz do sol - nóesis. Qual é, diferentemente, o caminho da personagem borgeana? Nosso tribuno militar romano, que se apresenta como Marco Flamínio Rufo, às avessas do homem que se liberta da caverna no texto platônico, continua seu caminho e descobertas no subterrâneo da caverna, no mundo com pouca luminosidade: Desci; por um caos de sórdidas galerias cheguei a uma vasta câmara circular, a muito custo visível. Havia nove portas naquele porão; oito davam para um labirinto que falazmente desembocava na mesma câmara circular, igual à primeira. Ignoro o número total de câmaras; minha desventura e minha ansiedade as multiplicaram. O silêncio era hostil e quase perfeito; outro rumor não havia nessas profundas redes de pedra além de um vento subterrâneo,cuja causa não descobri; sem ruído, perdiam-se entre as gretas fios de água enferrujada (BORGES, 2000, p. 597). O mundo sensível aprofundado e maximizado é um mundo de caos, é o lugar onde reina a completa ignorância sobre as coisas idealizadas (verdadeiras). A câmara circular representa a capacidade de conhecimento do tribuno, entretanto, as portas que deveriam leválo para outros caminhos do conhecimento apenas o levam a labirintos que desembocam na mesma sala circular. O tribuno parece incapaz de superar os graus de conhecimento para alcançar a luz do Bem. Por medo da luz, refugiara-se no mundo ao qual sempre esteve habituado. Sua vida se resumiria a contentar-se com essa realidade? “Habituei-me com horror a esse duvidoso mundo; considerei inacreditável que pudesse existir outra coisa além de porões providos de nove portas e além de longos porões que se bifurcavam” (BORGES, 2000, p. 597). Após se resignar à nova realidade do mundo de sombras, de trevas do conhecimento, de labirintos sensíveis e escuros, lhe é concedido ascender à realidade que o libertará desse 172 mundo sombrio em que entrou. A possibilidade de ascensão surge na narrativa do seguinte modo: No fundo de um corredor, um não previsto muro me barrou os passos, uma remota luz caiu sobre mim. Ergui os ofuscados olhos: no vertiginoso, no mais alto, vi um círculo de céu tão azul que chegou a parecer-me de púrpura. Alguns degraus de metal escalavam o muro. O cansaço me relaxava, mas subi, só me detendo às vezes para pesadamente soluçar de felicidade. Fui divisando capitéis e astrágalos, frontões triangulares e abóbadas, confusas pompas do granito e de mármore. Foi-me assim concedido ascender da cega região de negros labirintos entretecidos à resplandecente Cidade (BORGES, 2000, p. 597). A narrativa acima parece demonstrar que o tribuno está preparado para ver a Luz do verdadeiro conhecimento - na narrativa borgeana a expressão usada é “Foi me concedido ascender (...) à resplandecente cidade”. Agora, ao que tudo indica, o tribuno será capaz de admirar toda a beleza do Bem (origem de tudo que existe no mundo sensível). Após viver por tantos séculos e escrever obras que passaram de geração para geração, procurar ser mortal novamente talvez tenha sido a única solução, por ele encontrada, racionalizada e vivida. Após muito andar encontra, finalmente, a superação de sua condição de imortal: Nos arredores, vi um caudal de água clara; provei-a, levado pelo costume. Ao subir à margem, uma árvore espinhosa me lacerou o dorso da mão. A inusitada dor me pareceu muito viva. Incrédulo, silencioso e feliz, contemplei a preciosa formação de uma lenta gota de sangue. De novo sou mortal, repeti a mim mesmo, de novo me pareço com todos os homens. Nessa noite, dormi até o amanhecer (BORGES, 2000, p. 604). A experiência de imortalidade para o tribuno não era a esperada por ele. E o que deveria esperar da imortalidade? A sua vida antes da eternidade, possuía sentido e anseios de viver; o contrário da vida na cidade dos imortais, em que a maior parte do tempo se dedicava ao ócio. O autor do conto inverte o sentido do mito platônico para explicar que o sentido da realidade humana está no meio da dóxa e da eikasía. O homem também é um ser material que participa da realidade sensível. Utilizar os meios de conhecimentos metafísicos como a nóesis está além da condição humana, por isso o desejo e a busca por apagar sua imortalidade. 173 O RETORNO À MORTALIDADE A imortalidade adquirida pelo tribuno não passa de uma imortalidade corporal, física, que amplia a sua visão sobre o que já conhece e não sobre os mistérios do mundo ou das suas perguntas mais remotas. Seu corpo deixa de envelhecer, mas seus pensamentos continuam envelhecendo conforme o passa tempo. É por meio dessa imortalidade que a negação do tempo é feita. E nisso até o nome do conto já propõe essa negação do tempo: O Imortal. Com o tempo ignorado, o tribuno não pode mais sentir a emoções de uma pessoa normal, assim com o era antes. O impulso de beber da água imortalizante e de procurá-la foi feita sem planejamento. As conseqüências desse ato estão vinculadas mais com o plano físico do que com o plano espiritual, ou inteligível como proporia Platão. A adaptação é necessária para que o tribuno possa viver como e com os imortais da cidade dos Imortais: Ao propor a extinção do tempo, Borges anula a morte, eternizando o homem. Sem a noção de tempo, todas as nossas concepções sobre a realidade, sobre a personalidade individual, sobre a literatura e a própria morte alteram-se, abalam-se. A repetição dos gestos do homem cria a eternidade (NOBREGA, 1992, p. 70). Mesmo quando Borges tenta eternizar o homem por meio da sua negação temporal, não o consegue sem ocorrer alguns danos à identidade humana, isto é, o homem não é mais aquele que possuí sentimentos, originalidade e excitação perante o novo. A noção de tempo que o tribuno possuía antes de se tornar imortal agora é ignorada: Não sei quantos dias e noites rodopiaram sobre mim. [...] A ânsia de ver os Imortais, de tocar a sobre-humana Cidade, quase me impedia de dormir. Como se penetrassem em meu propósito, não dormiam também os trogloditas: a princípio, inferi que me vigiavam; depois, que se haviam contagiado por minha inquietude, como poderiam contagiar-se os cães (BORGES, 2000, p. 596). Como se pode notar no fragmento acima, os trogloditas estavam agitados devido à presença estrangeira do tribuno. O tribuno, de certo modo, é a novidade da vida imortal, pois traz consigo o espectro do que foi um mundo onde o tempo é contínuo e cheio de significados. Agora ele estava nessa aldeia estranha, nesse paraíso da eternidade dos bárbaros: “Ignoro o tempo que tive de caminhar sob a terra; sei que certa vez confundi, na mesma nostalgia, a atroz aldeia dos bárbaros e minha cidade natal, entre videiras” (BORGES, 2000, p. 597). 174 Após caminhar pela cidade procurando conhecê-la, chega à conclusão de que a cidade é perigosa apenas por existir: ‘Esta Cidade’, pensei, ‘é tão horrível que sua mera existência e perduração, embora no centro de um deserto secreto, contamina o passado e o futuro e, de algum modo, compromete os astros. Enquanto perdurar, ninguém no mundo poderá ser valoroso ou feliz’ (BORGES, 2000, p. 598). Os trogloditas, por sua vez, nada desconfiavam e a conclusão do tribuno não é partilhada por eles: “Absortos, quase não percebiam o mundo físico” (BORGES, 2000, p. 601). Mundo físico de que a personagem ainda se lembrava muito bem, pois era o lugar onde sua existência fazia sentido, em que era considerado uma pessoa comum, participante de uma vida regida por uma sociedade favorável aos costumes físicos finitos. Depois de o tribuno ter alcançado a imortalidade e tê-la experimentado da maneira mais visível possível, e observando que não era o que esperava, entra em um outro processo, que se pode chamar de angústia do descobrimento da verdade. Em decorrência disso, utiliza o recurso psicológico de autodefesa para se livrar desse mundo que conquistou. Impõe a si esquecer a sua condição: Nada mais posso lembrar. Esse esquecimento, agora insuperável, foi talvez voluntário; talvez as circunstâncias de minha evasão tenham sido tão ingratas que, em algum dia não menos esquecido também, jurei esquecê-las (BORGES, 2000, p. 599). Assim o tempo foi passando e os anseios de retorno àquela realidade que há muito vivera se torna mais latente: Pensei em um mundo sem memória, sem tempo; considerei a possibilidade de uma linguagem que ignorasse os substantivos, uma linguagem de verbos impessoais ou de indeclináveis epítetos. Assim foram morrendo os dias e com os dias os anos, mas algo parecido com a felicidade ocorreu uma manhã. Choveu, com lentidão poderosa (BORGES, 2000, p. 600). Após uma discussão com um dos trogloditas, a personagem parte à procura de todos os rios do mundo para que possa libertar-se da tão famigerada imortalidade física: “‘Existe um rio cujas águas dão a imortalidade; em alguma região haverá outro rio cujas águas a apaguem’. O número de rios não é infinito; um viajante imortal que percorra o mundo acabará, algum dia, tendo bebido de todos” (BORGES, 2000, p. 603). 175 Os destinos dos seres imortais não se parecem com a ideia que se tem sobre esses seres, que poderiam possuir uma clarividência maior sobre as questões do mundo sensível e da inteligibilidade do universo. Essa visão distorcida sobre o papel dos imortais era encarnada pelo próprio tribuno, pois após ter-se tornado imortal não partilha da mesma ideia que fazia de tal condição. Mas que condição é essa que o faz percorrer o mundo à procura de uma possível “cura” para o seu “mal”? O que se pode afirmar é que cada ser humano possui suas próprias angústias e seus próprios temores sobre a vida, e cabe a cada pessoa escolher a maneira mais adequada de encarar esses dilemas existenciais. A morte, para quem está vivo, é algo importante, pois é ela quem dará sentido para a existência da vida. Sem essas potências antagônicas a realidade humana não faria o menor sentido, seríamos apenas mais um grupo de seres vivendo por instinto: A morte (ou sua alusão) torna preciosos e patéticos os homens. Estes comovem por sua condição de fantasmas; cada ato que executam pode ser o último; não há rosto que não esteja por dissolver-se como o rosto de um sonho. Tudo, entre os mortais, tem valor do irrecuperável e do inditoso. Entre os Imortais, ao contrário, cada ato (e cada pensamento) é o eco de outros que no passado o antecederam, sem princípio visível, ou fiel presságio de outros que no futuro o repetirão até a vertigem (BORGES, 2000, p. 603). Após percorrer o mundo todo à procura desse rio des-imortalizante, encontra-o e, assim, se dá o fim da procura descendente em direção à realidade humana: Ao subir à margem, uma árvore espinhosa me lacerou o dorso da mão. A inusitada dor me pareceu muito viva. Incrédulo, silencioso e feliz contemplei a preciosa formação de uma lenta gota de sangue. De novo sou mortal, repeti a mim mesmo, de novo me pareço com todos os homens” (BORGES, 2000, 604). A literatura fantástica é importante nesse contexto porque proporciona o suporte teórico-literário para a compreensão do modo como Borges faz uso da filosofia. Isso se percebe no momento em que o tribuno sai à procura da mortalidade por todos os rios do mundo, fato que se relaciona com o neofantástico. Para ele, a literatura fantástica se vale de ficções não para escapar da realidade cotidiana, mas para expressar o que a literatura realista não consegue mostrar. É justamente por seu valor de metáfora da realidade, ou de alegoria da realidade, que a literatura fantástica expressa uma visão mais complexa do real (MONEGAL, 1987, p. 65). 176 Esse é o estilo de Borges, utiliza a filosofia para alcançar níveis mais altos de literariedade e suspense, ou mesmo para alcançar uma dimensão mais complexa de entendimento acerca da realidade: Para Borges, a literatura fantástica se vale da ficção não para se evadir da realidade, como acreditam (ou fingem acreditar) seus detratores mais superficiais, mas para expressar uma visão mais complexa da realidade: uma visão que não pode se alcançar por meio do realismo crasso que se praticava na América Latina nos anos 30 e 40. Por isso mesmo, não é difícil encontrar nas suas ficções esse tema “humano”, subjacente, que segundo seus tratores estaria ausente por completo (MONEGAL, 1987, p. 74). Daí o papel da literatura neofantástica: declarar existentes coisas que seriam impossíveis na realidade. A literatura neofantástica seria o suporte desse acontecimento, não como um fim, mas como um meio de toda a transrealidade acontecer. CONSIDERAÇÕES FINAIS A filosofia de Platão nos possibilitou uma análise mais consistente do conto “O Imortal” de Jorge Luis Borges. De acordo com a filosofia platônica podemos entender que o mundo idealizado guarda as Formas reais de tudo o que se vê no mundo físico, sensível. Mas, temos que ter em mente que Platão elabora a teoria presente na obra A República para estruturar o plano de sua pólis ideal. De certa forma, ao sistematizar a pólis também estrutura a vida dos homens que nela vivem, por isso, o uso de todo o processo educativo trazido pelos graus de conhecimento: eikasía, pístis e dóxa, diánoia, e nóesis ou epistéme. O conto borgeano nos mostra a incapacidade do ser humano em atingir as Formas, Essências ou Ideias perfeitas, eternas e verdadeiras. O homem, em sua dimensão material e sensível, não pode sair desse mundo ao qual está habituado e partir de uma vez por todas para o mundo desconhecido da Verdade. Ao conseguir a imortalidade do corpo, não consegue a sabedoria que equilibraria suas vontades humanas. A personagem, após se tornar imortal e partilhar dessa condição com os outros imortais, parte em uma jornada a procura do rio que dissolverá a imortalidade do seu corpo; quer tornar-se humano novamente, envelhecer e, como os outros homens, participar do processo de conhecimento que só a dimensão histórica do vivido pode proporcionar. De maneira fantástica, a sua jornada é o caminho de um arrependido, de mais um humano que não conseguiu deixar a sua antiga vida de lado. 177 Essa análise ainda deixa possibilidades de leitura. A obra de Jorge Luis Borges nos deixa ver a dimensão do que é a literatura, e sua vinculação à filosofia. REFERÊNCIAS ALAZRAKI, Jaime. ¿Qué es lo neofantástico? In: ROAS, David (Org.). Teorías de lo fantástico. Madrid: Arco/Libros, 2001. p. 265-282. BORGES, Jorge Luis. Obras Completas de Jorge Luis Borges. São Paulo: Globo, 2000. CHAUÍ, Marilena de Souza. Introdução à História da Filosofia: dos pré-socráticos a Aristóteles. São Paulo: Brasiliense, 1994. (Volume I) PITTRE, Bernard. A República: Platão. 2. ed. [Tradução do Livro: Elza Moreira Marcelina] Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1996. PLATÃO. A República. 12. ed. [Tradução Maria Helena da Rocha Pereira]. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2010. MONEGAL, Emir Rodríguez. Borges por Borges. Tradução: Ernani Ssó. Porto Alegre: L&PM, 1987. NÓBREGA, M.H. da. O percurso filosófico de Jorge Luis Borges para a negação do tempo. Dissertação (Mestrado em Comunicação e Semiótica), 164p. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 1992. TODOROV, Tzvetan. Definição do Fantástico. In: _____. Introdução à literatura fantástica. Tradução de Maria Clara Correa Castello. São Paulo: Perspectiva, 2003. p. 29- 46. 178 MATEMÁTICA: ESTRATÉGIAS PARA ENSINAR E APRENDER NA EDUCAÇÃO INFANTIL Gilcirlene Sacchi Roque36 Profa. Me. Bianca Santos Chisté37 RESUMO Este texto tem como objetivo apresentar o projeto de pesquisa Matemática: estratégias para aprender e ensinar na educação infantil, vinculado ao PIBIC, assim como algumas concepções a respeito do ensino e aprendizagem dessa área de conhecimento. Bem como as concepções sobre a construção dos conhecimentos matemáticos pela criança e as estratégias e recursos utilizados pelas professoras no ensino com essa ciência. A matemática esta presente no dia-a-dia de todos os indivíduos e começa a ser trabalhada de uma forma sistematizada com as crianças na educação infantil, devendo ser abordada de uma maneira significativa e prazerosa para que as crianças realmente se envolvam com ela. Assim, as professoras precisam se apropriar de recursos e estratégias, como o lúdico, que as auxiliem no ensino dessa ciência e que possibilitem uma aprendizagem significativa e envolvimento da criança com a matemática. A partir disso, a referida pesquisa busca identificar como se dá a construção do conhecimento matemático pelas crianças, na concepção de professoras que atuam na educação infantil, quais são as estratégias e recursos mais utilizados por elas para ensinar essa ciência e compreender qual a importância do lúdico no ensino e aprendizagem da matemática. Sendo que, as questões que norteiam essa pesquisa foram respondidas, por meio, de estudos bibliográficos e também a partir da conversa com as docentes e da observação do espaço escolar infantil, precisamente a sala de aula. Palavras-chave: Matemática. Educação Infantil. Ensino e Aprendizagem. DIALOGANDO SOBRE A MATEMÁTICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL A matemática é uma ciência que faz parte do cotidiano de todo individuo e está presente em tudo que se aprende, tanto na escola como fora dela, uma criança mesmo antes de iniciar sua escolarização já tem contato com os saberes matemáticos, por meio da convivência com o adulto e com outras crianças. Ela desenvolve seus saberes matemáticos de uma forma espontânea, conforme vai realizando variedades de relações entre diferentes objetos em diferentes situações em seu dia-a-dia. No entanto, quando inicia sua escolarização os saberes matemáticos lhes são apresentados de uma forma sistematizada, por meio de conteúdos específicos e selecionados. 36 37 Vilhena Acadêmica de Pedagogia - Universidade Federal de Rondônia – UNIR/Campus de Vilhena Professora e pesquisadora do Departamento Acadêmico de Ciências da Educação – UNIR/Campus de 179 A educação infantil torna-se então o momento em que as crianças começam a ter contato com esses conhecimentos matemáticos de forma sistematizada Sendo que a aprendizagem das crianças nessa fase se dá paulatinamente e principalmente por meio do concreto, do palpável, da experiência e da manipulação, havendo uma necessidade da criança vivenciar situações em que possa manipular os objetos e descobrir o meio e o mundo que a cerca. Pois, assim como na vida cotidiana em que a criança aprende matemática de uma forma significativa e contextualizada, na educação infantil essa ciência também deve ser trabalhada com as crianças, de uma maneira significativa, prazerosa e dentro de um contexto presenciado por elas. Neste sentido, o lúdico é um recurso fundamental que dever ser utilizado pelas professoras para trabalhar os conteúdos matemáticos com as crianças, por proporcionar as crianças momentos em que possam desenvolver sua imaginação e agir sobre o objeto de aprendizagem de uma forma mais significante. Alguns conteúdos acabam assumindo certa importância de ser trabalhados para que as crianças se apropriem de conceitos matemáticos que contribuem com o seu raciocínio lógico, no entanto, a exploração de todos os campos matemáticos deve ser proporcionada. É muito comum na educação infantil, e até nos demais anos de escolarização, encontrar professoras utilizando-se de joguinhos, brincadeiras, números móveis, coleções e outros materiais concretos (muitas vezes fabricados pelas próprias professoras), para ensinar matemática e outros saberes as crianças. Entretanto, algumas delas não percebem que a presença da matemática é cotidiana em suas aulas e, mesmo tendo recursos e materiais para trabalhar com as crianças, acabam perdendo muitos momentos do dia-a-dia da sala de aula propícios para aplicá-los de uma maneira que potencialize a aprendizagem das crianças. Os saberes matemáticos que devem ser trabalhados na educação infantil são muitos. Assim, como que existem vários recursos, estratégias e materiais que podem ser utilizados pelas professoras para ensinar esses saberes às crianças. Porém, as professoras só conseguirão desenvolver uma prática pedagógica eficaz no ensino dessa ciência quando se atentarem para a necessidade de se trabalhar os saberes matemáticos escolares de uma forma significativa e prazerosa. Assim, como quando procurarem compreender como as crianças se apropriam desses saberes, para poderem realizar um planejamento do seu ensino. O projeto de pesquisa, Matemática: estratégias para aprender e ensinar na educação infantil, vinculado ao PIBIC, volta-se assim, para as instituições de educação infantil de Vilhena/Rondônia procurando investigar como se dá a construção do conhecimento matemático pelas crianças, na concepção das professoras, e como elas se relacionam com essa 180 área do conhecimento. Além disso, investiga quais as estratégias e recursos mais utilizados pelas professoras, que atuam na educação infantil, para ensinar matemática e compreender a importância do lúdico no ensino dessa ciência e na aprendizagem das crianças. Como se trata de uma pesquisa qualitativa, utilizamos nos procedimentos metodológicos, o desenvolvimento de estudos bibliográficos, bem como, a realização de entrevistas com as professoras da educação infantil, a partir de perguntas semiestruturadas, e a realização de observações da prática de ensino de matemática dessas professoras com as crianças do pré-escolar e a análise dos dados coletados à luz dos referenciais teóricos abordados. Para o cumprimento dos objetivos propostos, os procedimentos metodológicos do projeto foram divididos em duas partes fundamentais. A primeira se constitui em estudos bibliográficos para o entendimento e aprimoramento sobre como se dá o ensino e aprendizagem dos saberes matemáticos pelas crianças de 4 a 5 anos, em que as leituras realizadas foram analisadas e fichadas para eventuais consultas. A segunda em entrevistas e observação de aulas que permitiram uma análise entre a teoria e pratica das professoras. As entrevistas, com caráter de conversa, ocorreram de março a maio de 2012 em quatro instituições públicas da rede municipal do município de Vilhena, escolhidas a partir do interesse demonstrado por parte das professoras em participar, sendo entrevistadas duas professoras de cada uma das instituições participantes que atuam no período vespertino. Essas professoras foram de grande importância para a realização da pesquisa, pois puderam nos fornecer as informações necessárias sobre nosso problema de pesquisa. Concluindo-se as entrevistas com 03 professoras do pré-escolar I e 05 professoras do pré-escolar II sendo entrevistadas Pelo fato desta pesquisa ser de cunho qualitativo, nos preocupamos e nos dedicamos bastante ao trabalho de campo, buscamos de uma forma participante, conhecer como a matemática se faz presente na educação infantil. Investigando e observando, como as professoras ensinam os saberes relacionados a essa ciência e como as crianças aprendem esses saberes. Procuramos uma aproximação com as pessoas e com as situações no ambiente da educação infantil, por meio das observações do cotidiano das salas de aula de algumas das professoras entrevistadas. O nosso olhar durante as observações foi direcionado para os saberes e fazeres matemáticos pelas docentes e pelas crianças da educação infantil, considerando que não há fragmentação no trabalho com as diferentes áreas do conhecimento nessa etapa da educação básica e que o conhecimento matemático está presente em todas as ciências. Buscamos 181 averiguar durante as observações como as professoras ensinam os conhecimentos matemáticos para as crianças, quais conteúdos são abordados em sala de aula, quais as estratégias de ensino são utilizadas por elas, bem como, identificar algumas dificuldades encontradas pelas professoras no trabalho com a matemática e o interesse demonstrado pelas crianças por essa ciência e como as professoras buscam fazê-las quererem aprender. Os estudos bibliográficos partiram de leituras de produções acadêmico-científicas de autores que abordam a matemática na educação infantil e a construção dos saberes matemáticos pela criança, bem como, a utilização do lúdico no ensino dessa ciência, para que se pudesse ter uma compreensão de como se dá a construção do conhecimento matemático pelas crianças e de como o lúdico, no ensino e aprendizado da matemática, possibilita um ensino de qualidade com significado e contextualização ao mesmo tempo. Dessa forma, do ponto de vista teórico, a pesquisa fundamenta-se em autores nacionais e estrangeiros que discutem sobre a construção do conhecimento lógico-matemático pela criança. Entre eles destaca-se Kamii (1990) afirmando que, se a criança “construir a estrutura lógico-matemática de maneira sólida tornar-se-á capaz de raciocinar logicamente numa ampla variedade de tarefas mais difíceis” (1990 p. 30). Sendo que o conhecimento lógico-matemático é aquele que leva a criança a fazer relações mentais sobre os objetos, percebendo assim as diferenças entre um e outro. Segundo Kamii (1990, p.15) “o conhecimento lógico matemático consiste na coordenação de relações”. Precisando a criança assim fazer todos os tipos relações com todos os tipos de objetos, para poder construir os conhecimentos matemáticos fazendo relações entre eles. Pois, sendo as relações mentais importantes na construção numérica e lógico-matemática, as crianças precisam se acostumar a fazer relações desde cedo. As crianças constroem o conhecimento lógico matemático, assim, à medida que estabelecem relações cada vez mais elaboradas e complexas com o meio e instrumentos nos quais interagem, experimentam e manipulam. Segundo as pesquisas piagetianas as estruturas do pensamento inteligente são de natureza lógico-matemática. De acordo com Fávero: Desde que nascemos, ao agirmos sobre as coisas ao nosso redor, classificamos essas coisas, relacionando-as, combinando-as segundo um critério dado pelas suas características físicas (coisas quadradas, duras, lisas, vermelhas, etc.), como depois, dentro de um critério abstrato (atitudes democráticas, comportamento ético etc.). Em resumo nós operamos. (FAVERO, 2005, p. 108) 182 Da mesma forma que o homem construiu no decorrer da história da humanidade, o conhecimento matemático, a criança também o faz durante o seu desenvolvimento, visto que, reconstruímos ao longo do nosso desenvolvimento as conquistas históricas. As crianças, desde bem pequenas, pensam e agem sobre o mundo em que estão inseridas procurando compreendê-lo. Por meio da ação e da experimentação ela constrói suas bases matemáticas procurando resolver os problemas de seu tempo conferidos pela complexidade de situações sociais. Dessa forma, um trabalho intencional com a matemática contribui com que elas elaborem, construam e sistematizem conhecimentos. Nessa perspectiva o Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil (BRASIL, 2001, p. 207), argumenta que, “o trabalho com a matemática na educação infantil atende, [...] às necessidades das próprias crianças de construírem conhecimentos que incidam nos mais domínios do pensamento [...].” Lorenzato (2008) que aborda os conteúdos a serem ensinados na educação infantil, argumentando que a geometria, a medida e o número são o tripé básico dos conhecimentos matemáticos, propondo o ensino dos sete processos mentais básicos, que são: correspondência, comparação, classificação, sequenciação, seriação, inclusão e conservação. Pois, segundo o autor “esses processos são abrangentes e constituem um alicerce que será utilizado para sempre pelo raciocínio humano (2008, p.27)”. A matemática está presente em todos os contextos da vida diária, tudo o que fazemos envolve conhecimento matemático, desde os mais elementares até os mais complexos, ou seja, é impossível viver sem o conhecimento matemático. Em diversos momentos realizamos várias relações entre os objetos, embora não seja consciente. Desde o momento do nascimento a matemática está presente por meio da linguagem na categorização dos instrumentos pertencentes e não pertencentes ao mundo que estamos inseridos. O que torna a sua aprendizagem tão importante e necessária quanto às demais áreas de conhecimento. Porém, quando as pessoas falam em conhecimentos matemáticos, se prendem muito a idéia de número. Esquecem que matemática também envolve medidas e geometria, possuindo um amplo campo de saberes e conceitos que precisam ser aprendidos, conforme destaca Smole, Diniz e Cândido (2000, p. 09): Uma proposta de trabalho de matemática para a Educação Infantil deve encorajar a exploração de uma grande variedade de ideias matemáticas, não apenas numéricas, mas também aquelas relativas á geometria, às medidas e às noções de estatística, de forma que as crianças desenvolvam e conservem com prazer uma curiosidade acerca da matemática, adquirindo diferentes formas de perceber a realidade. 183 Tendo em vista, que o ensino dessa ciência torna-se menos complexo na medida em que as professoras procuram compreender como as crianças se apropriam dos conhecimentos matemáticos, que essa apropriação acontece a partir de situações em que os conceitos matemáticos são explicitados e colocados em jogo, é preciso haver uma contextualização e concretização desses conceitos desde a educação infantil. Para tanto, o lúdico, compreendido nesse trabalho, como as brincadeiras e jogos, é visto como possibilidades para a aprendizagem matemática. As brincadeiras e jogos estão presentes em muitas situações da vida infantil e contribui com que as crianças ampliem a capacidade corporal, a consciência do outro, a percepção de si mesma como ser social e cultural, a percepção e exploração do espaço que a cerca. Além disso, a utilização do lúdico nas atividades matemática na educação infantil contribui com que as crianças apropriem-se de noções como: proximidade, separação, vizinhança e continuidade, bem como, a compreensão dos conceitos perto/longe, parte/todo, dentro/fora, pequeno/grande. Na brincadeira ainda, de acordo com Smole, Diniz e Cândido (2000, p. 16) a criança pode ser incentivada a “realizar contagens, comparação de quantidades, identificar algarismo, adicionar pontos que fez durante a brincadeira, perceber intervalos numéricos [...] noções de posição no espaço, de direção e sentido, discriminação visual e memória visual e formas geométricas.”. Diante do exposto, acreditamos, que a utilização das brincadeiras e jogos como proposta pedagógica para o trabalho com a matemática, bem como a manipulação de materiais concretos oportuniza as crianças experiências, vivências e aprendizagem com mais sentido, de maneira prazerosa e significativa. Assim, os estudos realizados na pesquisa foram também fundamentais para uma compreensão de como as professoras que atuam na educação infantil utilizam os recursos didáticos durante a abordagem matemática, dentro e fora do espaço da sala de aula. A conclusão dos estudos bibliográficos e o cumprimento da segunda etapa da pesquisa, que se baseia na em entrevistas e observação de aulas, permitiram um reconhecimento e entendimento de como ocorre à construção dos conhecimentos matemáticos nas crianças, dos processos e estratégias que envolvem o ensino e aprendizagem dessa ciência tão presente em nosso cotidiano e uma percepção da importância dada ao lúdico no ensino dos saberes matemáticos, relacionando os dados obtidos com a entrevista com os dados da observação. 184 Durante as entrevistas pode-se perceber, através das falas das professoras, que algumas delas possuem uma dificuldade em olhar para os saberes matemáticos e para os conhecimentos que as crianças expressam sobre essa ciência, sem relacioná-los a um conteúdo ou atividade específica. Com a análise dos dados concluímos que há uma contradição entre as falas das professoras entrevistadas e a suas práticas de ensino. No que diz respeito ao lúdico, por exemplo, as professoras afirmaram que as atividades lúdicas, como os jogos e brincadeiras, e materiais concretos como: peças de encaixe, pecinhas pedagógicas, palitinhos, sementes, tampinhas, brinquedos, entre outros devem ser utilizados para trabalhar a matemática com as crianças. No entanto, nas observações verificamos que as professoras trabalham o lúdico de uma forma não direcionada e planejada, quando distribuem as pecinhas pedagógicas para as crianças brincarem as professoras nem se que se atentam ao uso que as crianças fazem delas. Da mesma forma, presenciamos essa falta de intervenção e de importância no que diz respeito aos jogos, como os de quebra-cabeça, que são utilizados como uma forma de distrair as crianças e fazer com que permaneçam sentados em suas cadeiras, e nas brincadeiras que são utilizadas para como um momento de descontração. No que se refere aos conteúdos matemáticos abordados em sala de, elas afirmaram nas entrevistadas que trabalham: os números, quantidades, pequenas adições, situações problemas, sequencias, formas geométricas, seriação, classificação, identificação de números, conjuntos, pesos, símbolos numéricos, medidas, entre outros. Mas o que vimos durante as observações é uma valorização do campo numérico, as professoras se prendem muito aos números, a identificação numérica é mais trabalhada do que qualquer outro saber matemático. De acordo com os argumentos das professoras é possível perceber os conhecimentos que as crianças já possuem sobre essa ciência através das suas falas. Das conversas que acontecem durante as atividades, durante as brincadeiras, em outros momentos e até mesmo quando elas conversam com as professoras. No entanto muitas dessas conversas das crianças acontecem longe dos olhos e ouvidos das professoras. Ocorrem realmente durante as brincadeiras e nos momentos em que as crianças estão realizando uma atividade proposta pela professora, porém a professora após passar um exercício para a criança fazer, senta em sua cadeira e fica preparando a próxima atividade que passará a criança ou fica cuidando para que elas não conversem, para não “fazer bagunça”. Perdem esse momento que é tão propicio para observar as falas das crianças. 185 Diante de todas essas análises e comparações entre as falas das professoras e sua prática em sala de aula, pode-se considerar que as professoras precisam buscar sempre uma renovação de sua prática e métodos de ensino. Possibilitando que sempre saibam como utilizar os materiais e recursos disponíveis de uma forma que potencialize a aprendizagem dos conteúdos ensinados pelas crianças. Antes de optar por um material as professores devem refletir sobre os conhecimentos que esperam que as crianças desenvolvam por meio de sua manipulação, a escolha não deve se dar apenas pelo foto desse material ser atraente ou lúdico, mas sim, pelo foto de sua introdução nas atividades de ensino da matemática garantir uma reflexão e aprendizagem dos saberes que estão sendo construídos pelas crianças. A professora deve planejar os conhecimentos que deseja que seus alunos aprendam para podem conduzir os jogos e brincadeiras de uma forma que as crianças cheguem a eles. As brincadeiras devem fazer parte da proposta pedagógica da professora, deve estar no planejamento de suas aulas, de uma forma pensada e planejada. A matemática deve ser mais explorada pelas professoras, pois, o que se vê hoje nas salas de aula da educação infantil, mais especificamente as observadas, é a matemática sendo pouco abordadas e sendo reduzida a simples identificação da representação numérica. As professoras se prendem muito nas atividades que possibilitem as crianças identificar os números que acabam esquecendo que existem outros saberes matemáticos e que eles devem ser trabalhados com as crianças. Tanto durante as entrevistas quanto durante as observações realizadas pode-se perceber como as professoras da educação infantil estão presas aos números nos poucos momentos em que trabalham com a “matemática”. Um olhar para matemática na educação infantil que vai além das falas das professoras, possibilita-nos identificar a presença da matemática em sua prática pedagógica, comparando o que elas dizem trabalhar no campo matemático com o que elas realmente trabalham. Pode-se concluir que os momentos mais ricos em saberes matemático, que mostram o que as crianças já sabem sobre essa ciência e o que estão aprendendo, acontecem longe dos olhos das professoras. Os momentos em que as crianças estão conversando, interagindo com os demais e com o objeto de conhecimento, não têm designado a importância que merecem pela professora, que deixa de presenciar os momentos de descobertas das crianças, o desenvolvimento de suas abstrações, as suas curiosidades e dúvidas e as demonstrações dos conhecimentos que as crianças já dominam. 186 Ensinando desde o início para criança que essa ciência não é tão difícil e complexa, como a maioria a considera, as professoras despertarão nas crianças a vontade de aprendê-la, assim como o estímulo a curiosidade das crianças é muito importante para que a aprendizagem dessa ciência seja prazerosa e significativa. No entanto, antes de tudo é necessário que a professora compreenda e assuma uma postura diferente em relação à matemática, não permitindo que ela se constitua apenas na memorização de conteúdos e na identificação simbólica, atribuindo-a a mesma importância dada às outras áreas de conhecimento. REFERÊNCIAS BORGES, T. M. M. A criança em idade pré-escolar. São Paulo; Ática, 1994. BRASIL. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI). Ministério da Educação e do Desporto (MEC), Secretaria de Ensino Fundamental (SEF), Brasília: 1998. V. 1. FÁVERO, M H. Psicologia e Conhecimento. Subsídios da psicologia do desenvolvimento para a análise do ensinar e do aprender. Brasília; Editora da Universidade de Brasília, 2005. KAMI, Constance. A criança e o número: implicações educacionais da teoria de Piaget para a atuação junta a escolares de 4 a 6 anos. 11ª ed. Campinas, SP: Papirus, 1990. LORENZATO, Sergio. Educação infantil e percepção matemática. 2 ed. Campinas, SP: autores Associados, 2008. LÜDKE, M. e ANDRÉ, M. D. A. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo, EPU, 1986. PARRA, C.; SAIZ, I. (org.). Didática da matemática - reflexões Psicopedagógicas. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996. SMOLE, Katia Stocco; DINIZ, Maria Ignez e CÂNDIDO, Patrícia. 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Bianca Santos Chisté E-mail: [email protected] 188 AVALIAÇÃO PSICOEDUCACIONAL DO ALUNO COM SUSPEITA DE DEFICIÊNCIA INTELECTUAL: CONCEPÇÕES E PRÁTICAS Dra. Iracema Neno Cecilio Tada38 Iagê Lage Donato39 RESUMO O presente estudo investigou e analisou com o olhar da Psicologia Histórico-Crítica os procedimentos legais, concepções e encaminhamentos dados aos estudantes com suspeita ou diagnóstico de deficiência intelectual na Secretaria Estadual de Educação do Estado de Rondônia e na Secretaria Municipal de Educação do Município de Porto Velho. A pesquisa foi desenvolvida nos setores de educação especial e saúde escolar da secretaria municipal e na secretaria estadual no setor de educação especial e em uma escola de ensino fundamental. Como método de investigação foram utilizados a analise documental das legislações concernentes ao tema da inclusão do estudante com deficiência na rede de ensino regular e entrevistas semi-estruturadas gravadas em áudio com responsáveis pelos setores de Educação Especial em ambas as secretarias. Constatamos que há um grande número de estudantes com deficiência intelectual ambas as secretarias e nelas são realizadas apenas a avaliação progressiva das habilidades pedagógicas, que é feita na própria escola. Acreditamos que a avaliação de deficiência intelectual merece maior atenção para evitar a culpabilização do estudante que não se encaixa na estrutura escolar e acaba injustamente estigmatizado. Palavras-chave: Educação Especial. Inclusão Escolar. Deficiência Intelectual. Avaliação Psicoeducacional INTRODUÇÃO: Historicamente, até a década de 1990 o processo de escolarização dos alunos com deficiência intelectual era de responsabilidade de instituições especializadas em Educação Especial. O foco era a deficiência do aluno, desenvolvendo basicamente a autonomia deste aluno nas atividades da vida diária e o desenvolvimento das funções psicológicas básicas, por meio de atividades repetitivas e descontextualizadas (BUENO, 1997; D’Antino, 1988; Ferreira, 1989; Jannuzzi, 1997; 2004; Mazzotta, 1999; VIGOTSKI, 1997). Para identificar o aluno que possuía deficiência intelectual e encaminhá-lo para o Ensino Especial o psicólogo escolar aplicava testes psicométricos como WISC, Raven, entre outros, acreditando assim, que poderia quantificar o quoeficiente de inteligência - QI - da 38 39 Doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano pela Universidade de São Paulo, professora do curso de Mestrado em Psicologia da Universidade Federal de Rondônia. Graduando de Psicologia da Universidade Federal de Rondônia 189 criança, diagnosticando se tinha inteligência normal ou não. Esta prática de avaliação psicológica tem sido duramente criticada por pesquisadores como Machado (1994); Patto (1997); Moysés (2001) e Tada (2009), por não contribuir para que as potencialidades de aprendizagem e de desenvolvimento deste aluno sejam analisadas. A partir de 1990, documentos internacionais - Conferência Mundial sobre Educação para Todos; Declaração de Salamanca, Declaração de Guatemala - e nacionais - Estatuto da Criança e do Adolescente; Plano Nacional de Educação; Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva - foram elaborados buscando respeitar a diversidade humana e o compromisso com a construção de sistemas educacionais inclusivos, assegurando ao aluno com deficiência o seu acesso e permanência no Ensino Regular (FREITAS, 2009). Os dados coletados nas secretarias mostram que a porcentagem de estudantes com deficiência intelectual é bastante significativa frente às outras deficiências. Representam 47,08% na rede municipal e 43,40% na rede estadual. Segundo Rizzini e Menezes (2010) o número de indivíduos entre 0 (zero) e 17 (dezessete) anos de idade com deficiência intelectual na população brasileira é de 1%, considerando deficiência intelectual somente e associada a outra deficiência. Segundo dados do sítio eletrônico do governo do estado de Rondônia existiam 251 mil estudantes matriculados na rede de ensino estadual em 2011 e de acordo com os dados do censo 1291 estudantes da rede estadual possuem o diagnóstico de deficiência intelectual. Isso representa que os estudantes com deficiência intelectual matriculados na rede estadual de ensino são alarmantes 19,44% do total, ou seja, um número quase 2000% maior que o apresentado por Rizzine e Menezes. Acreditamos que a educação escolar é parte de um sistema maior e está imbricada dentro das estruturas sócio-político-culturais. As políticas públicas e a forma como são aplicadas, muitas vezes mostrando contradições, são um espelho da estrutura social, sua organização e funcionamento. Dessa forma, analisar as legislações a nível federal, estadual e municipal nos permite visualizar o papel destinado à educação especial e seus beneficiários na estrutura social, e na investigação da sua aplicação levantar as incongruências e preconceitos latentes reveladores do funcionamento das interações sociais. Para tanto, buscamos na legislação vigente identificar as políticas de inclusão do aluno com Deficiência Intelectual e a concepção teórica e parâmetros de avaliação para esse tipo de deficiência. 190 MÉTODO Fomos à Secretaria Municipal de Educação de Porto Velho (SEMED) e à Secretaria Estadual de Educação de Rondônia (SEDUC), ambas localizadas no município de Porto Velho/RO, para identificar os setores responsáveis pela inclusão escolar: Na SEMED, visitamos duas divisões, a Divisão de Educação Especial (DIEES) e a Divisão de Saúde Escolar (DISE); e na SEDUC, o Núcleo de Apoio à Educação Inclusiva (NAEDI) e a Representação de Ensino (REN). Nesses setores entrevistamos duas pedagogas e duas psicólogas atuantes na educação especial. E para a coleta de dados utilizamos a análise documental e entrevistas semiestruturadas gravadas em áudio que permitem a interação com o participante, buscando retratar sua percepção sobre o tema pesquisado, facilitando o surgimento de informações ocorrendo, constantemente, análises e avaliação dos dados. (Chizzotti, 1998; Lüdke; André, 1986; Martins, 1999). Para analisar os dados qualitativos construímos categorias descritivas por meio da impregnação do conteúdo, buscando o material manifesto e o latente, presentes nas mensagens implícitas ou contraditórias, ou nos temas silenciados que pudemos observar nas falas das participantes (LÜDKE; ANDRÉ, 1986). As categorias descritivas elencadas são as seguintes: a) A inclusão escolar em termos numéricos; b) Políticas públicas e inclusão escolar; c) Concepções teóricas sobre deficiência intelectual; d) Avaliação psicopedagógica do estudante com deficiência intelectual RESULTADOS E DISCUSSÃO: Por trás dessa profusão de diagnósticos pode estar o preconceito, o não reconhecimento do potencial deste estudante que, historicamente foi excluído do sistema escolar regular e encaminhado para instituições especiais, tendo negando o seu direito de acesso aos conteúdos científicos produzidos pelo ser humano ao longo do seu desenvolvimento, apesar da discussão em termos internacionais e nacionais sobre as políticas públicas de inclusão escolar. Diversos autores () tem apontado para o fato que problemas relacionados a organização escolar e estigmas sociais são constantemente mascarados sob a culpabilização do indivíduo. 191 Assim, o estudante que não se adapta prontamente à escola e vai "ficando para trás", acumulando dificuldades em conseguir absorver os conteúdos científicos culturalmente construídos pela humanidade, pode estar recebendo o rótulo de deficiente intelectual. Dessa forma, problemas estruturais do ensino escolar são postos debaixo do tapete e o estudante fica estigmatizado com uma marca que pode não estar de fato correta. Não obstante, a inclusão dos educandos com deficiência intelectual na rede regular de ensino não é garantia de que eles terão acesso aos conteúdos científicos, pois, os currículos são flexibilizados e muitas vezes não há rigor nas avaliações. Dessa forma, os estudantes vão sendo passados de ano sem apreender os conteúdos, o que prejudica sua autonomia e independência na vida adulta. Com a análise da legislação foi possível notar que a atual conjectura da educação especial permite práticas de exclusão do estudante com deficiência intelectual que, apesar de na maioria das vezes incluído no ensino regular, eles tem o currículo flexibilizado e não tem garantido o seu direito de apropriação dos conteúdos científicos da mesma forma que os demais estudantes. Uma política que visa às estatísticas de aprovação, aliado à falta de investimentos relatada pelos próprios atores escolares que traz dificuldades estruturais e de formação profissional, formam uma barreira entre o estudante com deficiência e o seu direito à educação. Ademais, de acordo com o que pudemos constatar a avaliação do estudante com suspeita de deficiência intelectual é feita pelos professores e consiste na avaliação continua das habilidades pedagógicas. Acreditamos que pode haver uma falha na avaliação desses estudantes o que resulta num número alarmante, corroborado pelos dados censitários, de ocorrência de deficiência intelectual entre os estudantes da rede pública no estado de Rondônia e no município de Porto Velho. É temeroso afirmar que há estudantes sendo encaminhados ao AEE por deficiência intelectual que em verdade não possuem a deficiência. Contudo, a avaliação e o processo pedagógico desses estudantes é tema que merece maior atenção e ser mais pesquisado. AGRADECIMENTOS: Agradeço primeiramente à minha orientadora Drª Iracema Neno Cecilio Tada por oportunizar a mim a experiência de ter vivenciado essa pesquisa, pela paciência, consideração e apoio prestados. À equipe do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Cientifica (PIBIC/UNIR), pelo sempre prestíssimo atendimento. Às secretarias de educação do município de Porto Velho e do estado de Rondônia pela colaboração e participação 192 fundamentais para a execução da pesquisa. Ao Conselho de Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico (CNPq) e o Centro de Pesquisa em Formação da Pessoa (CEPEFOP) pelo amparo estrutural oferecido. E a todos familiares, amigos e transeuntes que de alguma forma colaboraram com esse trabalho. Deixo o meu sincero obrigado. ¹Doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano pela Universidade de São Paulo, professora do curso de Mestrado em Psicologia da Universidade Federal de Rondônia. ²Graduando de Psicologia da Universidade Federal de Rondônia 193 SUB-PROJETO: EDUCAÇAO LINGUISTICA: FORMAÇÃO DOCENTE E ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DA FRONTEIRA BRASIL - BOLÍVIA. Janice Mendoza Aranda40 Prof. Dr. Dorosnil Alves Moreira41 RESUMO O estudo objetiva investigar, registrar, analisar e compreender a Educação Linguística, no contexto da formação docente e das práticas pedagógicas nas escolas da fronteira BrasilBolívia. O tema é relevante porque o ensino de Língua Portuguesa nas escolas públicas do município de Guajará-Mirim/RO constitui-se em uma prática desafiadora, pois devido à complexidade do ecossistema linguístico é necessário adotar metodologias de ensino que favoreçam o processo de ensino-aprendizagem e o respeito às singularidades linguísticas, culturais e sociais dos alunos. A Sociolinguística Educacional e a Semântica de Contextos e Cenários foram a base teórico-metodológica dessa pesquisa, pois as mesmas são capazes de explicar os fenômenos linguísticos que permeiam e constituem nosso objeto de estudo. Este objetivo foi orientado pelos seguintes questionamentos: a) Como é constituído o ecossistema linguístico do município de Guajará-Mirim/RO, no contexto da fronteira Brasil -Bolívia? b) Como é constituída a formação docente e a prática pedagógica dos professores de Língua Portuguesa, considerando as variedades dialetais existentes na fronteira Brasil - Bolívia? c) Quais as concepções didático-pedagógicas que orientam a educação linguística no contexto multicultural e plurilíngue da fronteira Brasil - Bolívia? A pesquisa teve como objetivos específicos: a) Compreender o processo de constituição do ecossistema lingüístico de Guajará-Mirim/RO; b) Realizar entrevistas com professores de Língua Portuguesa para identificar as concepções dos mesmos sobre o ensino de língua materna em um contexto multicultural e plurilíngue; c) Realizar entrevistas com alunos do ensino fundamental para registrar as marcas identitárias, através da transcrição de textos orais e escritos; d) econhecer e valorizar as marcas identitárias, sociolinguísticas e culturais dos alunos e professores; e) Constituir um banco de dados que permita a construção de um currículo multicultural; f) Socializar os resultados dos estudos e das pesquisas em encontros, seminários e fóruns locais, nacionais e internacionais; g) Manter um programa regular de publicações e produção científica do grupo.A coleta de dados da pesquisa foi realizada nos meses de outubro a dezembro/2011 e janeiro a junho de 2012. Os procedimentos metodológicos foram constituídos de momentos interligados: Leituras dos Referenciais Curriculares Nacionais como os Parâmetros Curriculares Nacionais de 5ª a 8ª série e obras relativas a temáticas de bilinguísmo, multiculturalismo, Pluralidade Cultural; Elaboração de um questionário para as devidas entrevistas com os docentes e discentes da escola “Durvalina Estilbem de Oliveira”; Caracterização do lócus e dos sujeitos da pesquisa; Coleta e análise de dados. Na coleta de dados utilizaram-se os seguintes procedimentos técnicos: observações, análise linguística dos textos (orais e escritos) produzidos pelos alunos, conversas informais e entrevistas com professora e Supervisora Escolar. De acordo com Bortoni-Ricardo (2005), a variação linguística como um processo identitário e explica as implicações das complexas relações dos indivíduos na construção dos discursos e das práticas sociais, destacando que os falantes das comunidades tradicionais do campo apresentam linguagens próprias, específicas e singulares, 40 Orientanda - Acadêmica de pedagogia da Fundação Univesidade Federal de Rondônia, Campus de GuajaráMirim. Guajará-Mirim/RO. 41 Orientador. 194 que nem sempre é valorizada, reconhecida e legitimada pela escola. Nesse sentido, a partir das observações e conversas informais com os alunos, constatamos que o ecossistema da escola é constituído por uma diversidade linguística e sociocultural. Nela, circulam: o português, o espanhol e o portunhol, além das variedades linguísticas do português brasileiro. A linguagem dos alunos também apresenta variações em todos os níveis: fonético-fonológico, morfológico, sintático, semântico e lexical. Verificamos que no contexto escolar há alunos bilíngues e que o hibridismo linguístico e cultural influencia na constituição das identidades individuais e coletivas. Em decorrência disso, além dos conflitos durante as interações sociais em sala de aula e do preconceito linguístico, muitos alunos, principalmente os indígenas e os bolivianos, apresentam dificuldades na construção da leitura e na escrita e na aprendizagem de outros conteúdos da disciplina de Língua Portuguesa. Os resultados das entrevistas com a Professora e a Supervisora escolar evidenciaram que a prática pedagógica é orientada pela concepção da educação crítica. Durante a observação do contexto educacional, verificamos que a escola desenvolve inúmeras atividades voltadas à valorização do multiculturalismo, incluindo não apenas as questões linguísticas e culturais, mas, principalmente, a inclusão social. A investigação, o registro, a análise e a compreensão da Educação Linguística, no contexto da formação docente e das práticas pedagógicas nas escolas da fronteira BrasilBolívia, contribuirá para a incorporação, a contextualização e a recontextualização das práticas e dos saberes culturais, sociais e linguísticas no currículo oficial de Língua Portuguesa e na prática docente, de maneira crítica, reflexiva e dialógica. Além disso, a realização desse estudo contribuirá para a desconstrução dos preconceitos linguísticos, sociais e culturais existentes no interior da língua padrão, que impede a valorização, o respeito e o reconhecimento das singularidades das vivências linguísticas dos alunos pertencentes à fronteira Brasil-Bolívia. Palavras-chave: Formação Docente. Prática Pedagógica. Multiculturalismo. Educação Linguística. 195 LITERATURA INDÍGENA CONTEMPORÂNEA POR MEIO DA EDIÇÃO DE DUAS VERSÕES DE MITOS DESANA Jazilane Pessoa Oliveira Araújo42 Profª Drª Cynthia de Cássia Santos Barra43 RESUMO Em 1980 foi publicada pela Cultura Editora a primeira edição de Antes o mundo não existia, de Luiz e Firmiano Lana, escritores indígenas da etnia Desana, habitante do noroeste amazônico. Constituindo o primeiro livro de autoria indígena no Brasil, marca o início de um fenômeno literário denominado por Almeida (2004) de Livros da Floresta, caracterizado por publicações de autores indígenas de diversas etnias. Esse fenômeno é o macro-objeto desta pesquisa, que vai discuti-lo a partir dos textos criativos de indígenas Desana. Assim, refletir e compreender os alcances da apoderação da escrita e da inserção na cultura do impresso por parte dos indígenas desta etnia é o principal objetivo deste trabalho, que também pretende efetuar uma análise comparativa de narrativas Desana: a versão de Luiz e Firmiano Lana para as histórias da origem da noite e do roubo das flautas sagradas pelas mulheres, ambas contidos em Antes o mundo não existia (1980); as mesmas histórias registradas, em 1995, na segunda edição desta obra; e a versão do escritor e artista plástico Feliciano Lana, contida em A origem da noite e como as mulheres roubaram as flautas sagradas (2009). Diversos pesquisadores, como Finnegan (2006), defendem a existência de uma literatura no campo da oralidade em comunidades tradicionais. Neste trabalho será analisada a passagem para o escrito/impresso de textos criativos de indígenas Desana com a finalidade de apontar caracteres que os sustentem como criações literárias e instauradoras de uma nova discursividade. Para isso, será considerado que a autoria e a literariedade são construções socioculturais de cada povo. E, ainda, que as textualidades indígenas passam por uma tradução intersemiótica e intercultural e esta deve procurar manter recursos verbais e visuais equiparáveis aos do texto de partida (oral) no texto de chegada (escrito/impresso). Palvras chaves: Literatura de autoria indígena. Livros da Floresta. Antes o mundo não existia. Narrativas Desana. ABSTRACT In 1980 was published by Editora Cultura the first edition of Antes o mundo não existia by Luiz and Firmiano Lana, indigenous writers from Desana ethnic, residents in Northwest of Amazon. Being the first book by indigenous people in Brazil, marking the beginning of a literary phenomenon called by Almeida (2004) Book of the Forest, characterized by publications of authors from various indigenous ethnic groups. This phenomenon is the macro-object of this research, which will discuss it from the creative writing of indigenous Desana. Through this research, we intend to reflect and understand the reach of the asset of writing and the insertion on the printed culture of the indigenous from this ethnic group, is 42 43 Bolsista PIBIC/UNIR/CNPq. Contato: [email protected]. Orientadora. Contato: [email protected]. 196 the main objective of this work, which also intends to make a comparative analysis of Desana narratives: a version of Luis and Firmiano Lana to the stories of the origin of the night and the stealing of the sacred flutes by women, both contained in Antes o mundo não existia (1980), the same stories recorded in 1995, the second edition of this work, and the version of the writer and artist Feliciano Lana contained in A origem da noite e como as mulheres roubaram as flautas sagradas (2009). Several researchers, as Finnegan (2006), argue the existence of a literature in the field of orality in traditional communities. This paper analyzes the transition to the written / printed creative texts of indigenous Desana in order to point out that the supporting characters as literary creations, a new foundational discourse. For this, it is assumed that the authorship and literariness are sociocultural constructions of each people. And yet, that the indigenous textualities go through a intersemiotic and intercultural translation and this should seek to maintain verbal and visual features comparable to the source text (oral) into the target text (written/printed). KEYWORDS: Literature of indigenous authorship. Books of the Forest. Antes o mundo não existia. Desana Narratives. 1 INTRODUÇÃO A cultura indígena sempre foi marcada pela oralidade. A origem, a história do povo e seus ensinamentos sempre foram transmitidos pela boca dos mais velhos. Entretanto, nas décadas finais do século XX, aproximadamente 100 títulos com a autoria de cerca de 40 nações indígenas já haviam sido publicados (ALMEIDA, 2004); em 2012, já são 538 livros publicados (LIMA, 2012), a maioria escrita por professores indígenas, no âmbito da educação escolar indígena específica, diferenciada, intercultural e bilíngue, e subsidiada por ONG’s e pelo Governo Federal (ALMEIDA, 2004; LIMA, 2012). Apesar de já se constituir como uma produção expressiva na área de Letras e outros Saberes, tanto no meio acadêmico quanto no senso comum, ainda há desconfiança e questionamentos inflamados quando se afirma a existência e a legitimidade de uma literatura de autoria indígena no Brasil contemporâneo. Em relação à sociedade nacional, aos leitores não indígenas, pode-se atribuir a falta de interesse - o desconhecimento - em relação aos livros e à literatura de autoria indígena aos resquícios deixados pela colonização. O índio continua a ser visto de maneira inferior e depreciativa: não tem língua, tem dialeto; não produz arte, mas artesanato; não é escritor, não produz livros, apenas conta oralmente suas histórias para que outros a escrevam. Outro fator a considerar em relação à recepção dos livros de autoria indígena pela sociedade nacional é a multiplicidade dessas novas práticas de escrita que abrangem diversos povos indígenas, línguas e crenças e para a qual ainda não há sistematização ou classificação definitiva, visto que os padrões atuais, provenientes da tradição literária ocidental, não a comportam satisfatoriamente. Contudo, mesmo com esses impasses, é inútil ignorar a 197 emergência da literatura de autoria indígena: “(...) a sensação que se tem é que independentemente do reconhecimento da sua poesia e prosa pela sociedade nacional, os índios continuarão nessa trajetória” (GOLDEMBERG & CUNHA, 2010, p.144). Dentre as etnias indígenas que possuem publicações, encontram-se os Desana, que vivem na bacia do Rio Negro, no Amazonas. Em Antes o mundo não existia, de Luiz Gomes Lana e Firmiano Arantes Lana (Tõrãmu Kehíri e Umusi Pãrõkumu), foram narrados os 13 principais mitos do clã Kehiríporã, da etnia Desana. O livro, organizado com a ajuda da antropóloga Berta Ribeiro, foi publicado em 1980 pela Livraria Cultura Editora, com tiragem de 5000 exemplares e foi “um dos fatos mais importantes para o surgimento da literatura indígena no Brasil” (ALMEIDA, 2004, p. 273), com segunda edição em 1995 e traduções para o francês, italiano e castelhano (MENENDEZ, 2006, p. 3). A análise comparativa das duas versões para os mitos da origem da noite e do roubo das flautas mágicas pelas mulheres é um dos objetivos desta pesquisa, que pretende ainda verificar a inserção dos Desana na cultura do impresso, além de efetuar um levantamento a respeito de outros textos literários e/ou etnográficos a respeito dessa etnia. 2 METODOLOGIA Esta pesquisa não incluiu visitas a campo para coletas de dados. Por outro lado, esta investigação apresenta um caráter duplamente bibliográfico, à medida que se baseou em: a) inventariar referências bibliográficas de qualquer natureza, disponíveis em bibliotecas físicas e virtuais de Universidades Federais e Organizações Indigenistas para a montagem de um banco de dados virtual a cerca do povo Desana; b) efetuar leitura analítica e comparativa de duas obras de autores Desana, a saber: a versão de Luiz e Firmiano Lana para as histórias de origem da noite e do roubo das flautas sagradas pelas mulheres, ambos contidos em Antes o mundo não existia (1980 e 1995); e essas mesmas narrativas segundo o escritor e artista plástico Feliciano Lana, contidas em A origem da noite e como as mulheres roubaram as flautas sagradas (2009). O material literário de autoria indígena selecionado como corpus desta pesquisa foi analisado quanto à forma discursiva, o conteúdo e sua estética, buscando possíveis conexões entre o saber tradicional Desana e autores da Teoria Literária contemporânea. Quanto ao acervo consultado a fim de montar o banco de dados previsto no subprojeto, optou-se por 198 privilegiar as bibliotecas virtuais universitárias, os periódicos científicos open access e os bancos de dados virtuais de Organizações Não Governamentais Indígenas. 3 RESULTADOS 3.1 Levantamento bibliográfico Conforme meta traçada pela orientadora, o levantamento bibliográfico atingiu o número de 120 referências coletadas. A partir desse material foram elaborados alguns gráficos. O primeiro relaciona a quantidade de referências coletadas em relação ao tipo de autoria. Fontes: UFAM, UFAC, UFRR, UFG, UFPB, UFBA, UFMG, UFES, Unb, UFRJ, UFSC, UFMT, UNICAMP, UFF, UFPA, IPHAN, Portal de Periódicos Capes, Base de Dados Scirus, Scientific Eletronic Library Online (SciELO), Institut de recherche pour le développement (IRD), Société Suisse des Américanistes (SSA), Repositorio Institucional de la Universidad Nacional de Colombia, Nazan Universty Library Percebe-se que a maioria esmagadora das produções encontradas até o momento é de autoria não indígena, contando até mesmo com textos em língua estrangeira. Note-se que há mais produções em autoria indígena (individual e coletiva) que em co-autoria, reafirmando o princípio já destacado por Almeida (2004) de que os indígenas desejam apresentarem-se por si mesmos, através da escrita alfabética. Percebe-se também que além de textos de autoria Desana, também foram levantados alguns textos de autores indígenas de outras etnias (Tukano, Tuyuka e Baniwa). Apesar de este trabalho priorizar as publicações de escritores Desana, foram selecionados alguns textos de outros autores indígenas para compor o banco de dados acerca da etnia Desana. Os povos indígenas que habitam a região do Rio Negro estão intimamente conectados por relações de 199 trocas matrimoniais, comerciais e rituais. De fato, a maior parte dos estudos sobre os grupos étnicos dessa região não aborda uma etnia específica, mas sim características gerais, comuns a todos esses povos. Uma vez que as etnias do Rio Negro possuem muitas semelhanças em determinados aspectos, coube preservar na lista de bibliografias coletadas alguns escritos de indígenas de outras etnias da região por se entender que as informações contidas nessas obras são relevantes para adquirir conhecimentos a respeito dos Desana. O gráfico seguinte trata dos tipos de referências bibliográficas coletadas. A primeira vista, o número de livros (considerando-se também o número de capítulos de livros) e capítulos de livros identificados que abordam a temática Desana consiste na maioria das referências coletadas (46 obras - 39% aproximadamente), o que é importante ao se pensar que esses títulos encontram-se disponíveis nas estantes das livrarias a qualquer interessado. Entretanto, somando-se a produção científica encontrada (artigos apresentados em eventos, artigos publicados em livros, artigos publicados em periódicos, dissertações, eventos acadêmicos e teses), tem-se mais da metade do total (62 obras - 53% aproximadamente), demonstrando que o interesse pela temática ainda concentra-se na comunidade acadêmica. Esse fato ressalta a importância desta pesquisa, particularmente a do futuro banco de dados que, sendo acessível a acadêmicos, pesquisadores e professores, tanto da educação básica, quanto do ensino superior, contribuirá para a aplicação efetiva da Lei 11.645/2008, que alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (Lei 9.394/1996), incluindo no currículo escolar oficial a abordagem do tema História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena, principalmente nas áreas de educação artística, história e literatura. Fontes: UFAM, UFAC, UFRR, UFG, UFPB, UFBA, UFMG, UFES, Unb, UFRJ, UFSC, UFMT, UNICAMP, UFF, UFPA, IPHAN, Portal de Periódicos Capes, Base de Dados Scirus, Scientific Eletronic Library Online (SciELO), Institut de recherche pour le développement (IRD), Société Suisse des Américanistes (SSA), Repositorio Institucional de la Universidad Nacional de Colombia, Nazan Universty Library. 200 3.2 ELABORAÇÕES TEÓRICAS A CERCA DO CONCEITO DE LITERATURA DE AUTORIA INDÍGENA É necessário compreender que os textos indígenas, agora ilustrados, encadernados e disponíveis para compra em livrarias urbanas e sites de livros usados, eram inicialmente narrativas orais. Daí surge esta questão: “Pode-se falar em literatura no caso de tradição oral? Pesquisadores africanos, como Pius Zirimu, da Uganda, introduziram o conceito de oratura em oposição a literatura. [sic] O primeiro referir-se-ia então a “textos” orais e o último, a escritos.” (SCHIPPER, 2006, p.10). Segundo Antônio Risério, “(...) Sousândrade afirmava a existência de um texto criativo ameríndio” (1992, p. 26, grifo meu), apesar de não haver ainda textos impressos de autoria indígena, no qual teria baseado seus escritos literários, hoje consagrados. Assim, sustenta Risério: “Não há povo que não ostente, no elenco dos seus signos mais expressivos, objetos de linguagem, correspondentes ao que, em nosso mundo, chamamos poesia” (RISÉRIO, 1993, p. 25). Essa oratura apresenta características específicas por envolver, além da palavra falada, a performance que a acompanha. Para que a transposição do oral para o escrito faça da oratura nascer uma literatura, no sentido de “uso estético da linguagem” (COMPAGNON, 2006, p. 39), é imprescindível que o tratamento dado ao texto escrito leve em consideração os recursos presentes na performance do texto original: as vestimentas e a entonação de voz do narrador, seus gestos, os objetos manipulados por ele, a luminosidade do local, os sons, cheiros, texturas, em fim, todo o aparato presente no momento da apresentação. Nota-se que essa não é uma tarefa simples, uma vez que os elementos da performance não cabem no papel, sendo preciso encontrar equivalentes gráficos/linguísticos que sustentem a literariedade do texto sem perder de vista a cultura de origem. Ou seja, a oratura deve passar por uma “transcriação”44 para que daí surja uma literatura. Os textos indígenas são aqui entendidos como textos criativos oriundos de uma literatura bem sucedida no plano da oralidade. Mas, como já assinalado, a passagem para o impresso pode acarretar na perda da literariedade. Assim, faz-se necessário buscar diversos recursos para manter a literariedade do texto. Segundo os estudos de Amanda Lima (2012), os 44 Ao definir a transcriação, Haroldo de Campos aponta: “Numa tradução dessa natureza, não se traduz apenas o significado, traduz-se o próprio signo, ou seja, sua fisicalidade, sua materialidade mesma (propriedades sonoras, da imagética visual, enfim tudo aquilo que forma, segundo Charles Morris, a iconicidade do signo estético, entendido por signo icônico aquele ‘que é de certa maneira similar àquilo que ele denota’). O significado, o parâmetro semântico, será apenas e tão-somente a baliza demarcatória do lugar da empresa recriadora. Está-se pois no avesso da chamada tradução literal.” (CAMPOS, 1970, p. 24 apud BICALHO, 2007, p.122). 201 livros de autoria indígena na contemporaneidade, além de fazer uso da palavra, muitas vezes lançam mão do que ela chama de “múltiplas grafias”, ou seja, outros recursos como o desenho, grafismos, fotografias ou suportes de arquivo audiovisual acompanhando a obra. Ancorada nessa e em outras referências, a presente pesquisa buscou elementos verbais e visuais que sustentassem o corpus de análise como criações literárias. 3.3 ANÁLISE DE NARRATIVAS Visto que a preservação das características da fala é um recurso desejável nas publicações indígenas, pois mantém a literariedade original presente na oratura, a “revisão” textual pode acabar minando a potência estética. A leitura das obras demonstrou que Antes o mundo não existia (1980), mais que revisada, foi remoldada para se adequar aos padrões cultos da língua portuguesa, o que reduziu consideravelmente a expressão estética da obra. Vale ressaltar que o processo de revisão textual realizado por Berta Ribeiro foi importante, mesmo imprescindível, para que a publicação pudesse ser concretizada, contudo as perdas são inegáveis. Aliando-se aos recursos linguísticos, a estratégia editorial adotada também contribui para um declínio estético. Fica evidente a preocupação em registrar as narrativas, em protegêlas do desaparecimento salvaguardando-as no papel; procedimento feito sem intenções estéticas. A disposição do título, do texto, a opção por utilizar uma família tipográfica com serifas e em tamanho pequeno no corpo do texto (dificultando a leitura), as muitas notas de rodapé traduzindo para o Tukano os termos em Desana, por fim, a divisão da obra, privilegiando a palavra, em momento texto, momento imagem, com o uso de indicativos, às margens das páginas, da figura que corresponde ao trecho; são recursos que tornam o livro mais voltado para acadêmicos que para a sociedade em geral: uma etnografia. Sendo um livro de autoria indígena: uma autoetnografia. Quanto a Antes o mundo não existia (1995) observa-se alguns avanços, tanto no tratamento dado à linguagem verbal, quanto em questão do projeto gráfico adotado. Quanto a manutenção de características da oralidade no texto, vê-se que houve essa preocupação seja em maior ou menor grau. Ainda assim, as marcas de oralidade ainda são pouco preservadas. A composição da capa, a configuração das páginas, usando tipos em tamanho maior, a disposição do título e a (tímida) aproximação da palavra ao desenho contribuíram para uma melhoria estética em relação à primeira edição. Mas a divisão hierarquizante momento texto, momento imagem ainda se faz presente, ainda que desta vez de maneira alternada, Assim, essa 202 obra parece estar no meio caminho de uma publicação que valorize os dispositivos criativos indígenas. A origem da noite e como as mulheres roubaram as flautas sagradas (2009) apresenta, em relação às obras anteriores, um projeto gráfico melhor elaborado e seriamente engajado na transmissão dos saberes indígenas e de suas potencialidades estéticas. Desde a capa o livro convida o leitor à leitura e ao deleite. As páginas foram organizadas de forma a apresentar muitos detalhes, porém sem sufocar o leitor. A escolha pelo uso de tipos com serifa e sem serifas para diferenciar os textos em Desana e em Português, respectivamente, torna o livro ainda mais potente visualmente. Ao trabalhar com a letra enfeitada para a língua Desana, e a letra puramente informativa para o texto em Português o livro prioriza a língua materna do autor além de destacar para os leitores da sociedade envolvente a existência do outro e de sua língua. Em relação aos recursos linguísticos usados no texto em Português, esta como nas outras obras apresentam um afastamento da oralidade em alguns momentos. Contudo, vestígios de oralidade ainda podem ser notados em algumas passagens. Sobre a manutenção de características do oral, todas as três obras apresentam ressalvas. Mas no livro de Feliciano Lana, a linguagem verbal é secundária, é assessório; o enfoque maior está nas gravuras. Mesmo que peque em alguns momentos por não manter marcas de oralidade, a obra de Feliciano é muito bem sucedida ao contar as histórias através do desenho, linguagem universal. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Conforme já afirmado neste trabalho, entende-se que a tessitura oral e criativa de autoria indígena que passa por uma transcrição/tradução intersemiótica e intercultural precisa, para originar um objeto literário bem sucedido, levar em consideração que o berço da oratura é a performance e buscar elementos a ela equivalentes na passagem para o escrito/impresso, na tentativa de transcriar o texto. Nesse sentido, o texto verbal não é visto como único meio para transportar ao papel os saberes indígenas. Ao contrário, muitas vezes a palavra revela-se um recurso insuficiente para transmitir as potencialidades estéticas da oratura indígena. Assim, uma alternativa viável e muito utilizada entre as publicações de autoria indígena no Brasil contemporâneo é o uso do que pode ser chamado de “multimodalidades de escrita” (THIAGO, 2007) ou “múltiplas grafias” (LIMA, 2012). No caso dos textos criativos Desana, a análise comparativa de seis narrativas, contidas em três livros distintos, abordando 203 linguagem verbal e visual, demonstrou um percurso que primeiramente privilegia a palavra, mas vai gradativamente indo em direção à imagem: do registro (auto)etnográfico à criação literária. REFERÊNCIAS ALMEIDA, Maria Inês de. “Livros da Floresta”. In: ALMEIDA, Maria Inês de & QUEIRÓS, Sônia. Na captura da voz - as edições da narrativa oral no Brasil. Belo Horizonte: Autêntica Editora. 2004. p. 193-277. CAMPOS, Haroldo de. Metalinguagem - ensaios de Teoria e Crítica Literária. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 1970. p. 24 apud BICALHO, Charles. Yãmîy Maxacali - um gênero narrativo de poesia. Aletria. v.16, jul./dez. 2007. p.119-132. COMPAGNON, Antoine. “A Literatura”. In:_______. O demônio da teoria: literatura e senso comum. Tradução de Cleonice Paes Barreto Mourão e Consuelo Fortes Santiago. 3ª reimpressão. Belo Horizonte: UFMG. 2006. p. 29-45. (Humanitas, 41) FINNEGAN, Ruth. O significado da literatura em culturas orais. In: QUEIROZ, Sônia (Org.). A tradição oral. Belo Horizonte: FALE/UFMG. 2006. p. 64-104. GOLDEMBERG, Deborah & CUNHA, Rubelise da. Literatura Indígena Contemporânea: O encontro das formas e dos conteúdos na poesia e prosa do I Sarau das Poéticas Indígenas. Espaço Ameríndio, Porto Alegre, v. 4, n. 1, p. 117-148, jan./jun. 2010. LIMA, Amanda Machado Alves de. O livro indígena e suas múltiplas grafias. 154f. 2012. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Letras: Estudos Literários, Universidade de Minas Gerais, 2012. MENENDEZ, Larissa Lacerda. Dois artistas, um mito. In: ENCONTRO DE HISTÓRIA DA ARTE, 2, 2006, Anais..., Campinas: IFC-Unicamp, 2006. Disponível em: <http://www.ifch.unicamp.br/pos/hs/anais/2006/posgrad/(45).pdf>. Acesso em: 4 jun. 2011. RISÉRIO, Antônio. Palavras canibais. Revista USP, São Paulo, n.13, p. 26-43, mar./abr./mai. 1992. RISÉRIO, Antônio. Textos e tribos: poéticas extraocidentais nos trópicos. Rio de Janeiro: Imago. 1993. SCHIPPER, Mineke. Literatura oral e oralidade escrita. In: QUEIROZ, Sônia (Org.). A literatura oral. Belo Horizonte: FALE/UFMG. 2006. p. 10-24. THIAGO, Elisa Maria Costa Pereira de S. O texto multimodal de autoria indígena: narrativa, lugar e interculturalidade. 268f. 2007. Tese (Doutorado) - Programa de Estudo Linguísticos e Literários em Inglês, Universidade de São Paulo. 2007. AGRADECIMENTOS: Ao PIBIC/UNIR/CNPq; 204 À Orientadora, Profª Drª Cynthia de Cássia Santos Barra; Às minhas companheiras de pesquisa; À minha família e amigos. 205 AVALIAÇÃO EDUCACIONAL, PROGRAMAS NACIONAIS DE AVALIAÇÃO E A AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM: UM ESTUDO NAS ESCOLAS ESTADUAIS DE ROLIM DE MOURA/RO Jefferson Pereira da Silva Mendonça45 Flavine Assis de Miranda46 RESUMO Este artigo é resultado de uma pesquisa desenvolvida para o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica - PIBIC/CNPq. As questões-chave que nortearam a realização do estudo foram: como se desenvolve a prática da avaliação educacional nas escolas estaduais do ensino fundamental de Rolim de Moura/RO entre os professores de 1º ao 4º ano? Como os resultados dos sistemas oficiais de avaliação da educação básica, o SAEB (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica) e o Prova Brasil, estão sendo apropriados e utilizados pelos professores para orientar a sua prática docente? Com objetivo de identificar, por meio de entrevistas como os professores pesquisados utilizam as informações fornecidas pelos sistemas oficiais de avaliação da educação, a exemplo do programa Prova Brasil e SAEB, para orientar seu planejamento pedagógico, sua prática docente e avaliativa. Assim, a pesquisa baseou-se inicialmente em levantamentos e estudos bibliográficos a fim de compreender a complexidade dos conceitos relacionados à avaliação educacional e para o embasamento das análises dos dados coletados pelas observações de campo e entrevistas estruturadas. Os resultados das observações de campo e as análises das entrevistas foram discutidos com base em diferentes autores que abordam o tema da avaliação educacional. Palavras - chave: Avaliação Educacional. Avaliação da Aprendizagem. Prova Brasil; SAEB. Programas de Avaliação. INTRODUÇÃO A temática da avaliação educacional, cada vez mais, tem conquistado um espaço privilegiado na produção teórica na área das ciências humanas, principalmente no Brasil, revelando uma crescente e diversificada preocupação com o tema. Com o esforço do governo brasileiro em quantificar a educação básica, os sistemas de avaliação oficiais se tornam uma realidade na educação brasileira a partir da década de 1980, mais especificamente com a institucionalização do SAEB (Sistema de Avaliação da Educação Básica) chamado primeiramente de avaliação do ensino de primeiro grau - SAEP. As avaliações externas da educação básica a partir da década de 1990 ganham contornos específicos de um instrumento de regulação do Estado por meio de políticas 45 Acadêmico do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Rondônia – Campus de Rolim de Moura. Bolsista Voluntário do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC/CNPq. 46 Profª. Drª. na Universidade Federal de Rondônia – Campus de Rolim de Moura/Departamento de Educação. Orientadora do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC/CNPq. 206 educacionais que visam à melhoria da qualidade do ensino básico. A importância que a educação básica vem tendo nas políticas educacionais justifica-se por ser esse o nível de ensino em que a busca de melhoria da qualidade melhor responde às solicitações do mercado, dentro de padrões pré-estabelecidos e encorajados pelas agências de fomento e órgãos internacionais (Barreiros, 2003). Um fator preocupante e de destaque nesse nível de ensino é que nele se encontram os maiores problemas enfrentados pela educação brasileira, a saber, a reprovação e a evasão escolar (Gama 2002). Neste sentido, a avaliação educacional, relacionada ao sistema educativo, objetiva diagnosticar e subsidiar a implementação ou manutenção de políticas educacionais, devendo também monitorar continuamente o sistema educacional para apontar os efeitos das políticas adotadas. Um sistema de avaliação deve obter e organizar informações periódicas e comparáveis sobre os diferentes aspectos do sistema educacional. Assim, a avaliação educacional passa a ser usada como tentativa de encontrar possíveis soluções para os problemas enfrentados pela educação. Isso porque há um entendimento de que o desempenho dos alunos nestas avaliações determina a elevação nos padrões educacionais do país. De acordo com Viana (2003) a avaliação tem finalidades distintas, e uma de suas finalidades é a identificação de problemas na aprendizagem. Para ele as avaliações apenas apontam problemas, mas não os solucionam. Sendo o ato de avaliar parte da atuação do professor, a avaliação passa, então, a ter relação direta com os processos educativos escolares e o trabalho do professor. Ela permite verificar, diretamente, o nível de aprendizagem dos alunos, e também, indiretamente, permite determinar a qualidade do processo de ensino, isto é, o êxito do trabalho do professor. A avaliação deve fazer parte da rotina escolar e trazer benefícios para os envolvidos, o momento de avaliar tem que trazer questionamentos que estimulem o desenvolvimento do aluno. Ser a facilitadora da aprendizagem. Faria (1989) destaca a função da avaliação relacionada ao ensino, ou seja, a de oferecer informações ao professor a respeito da eficácia dos materiais e métodos que ele costuma utilizar. Para este autor os exames auxiliariam a localizar aspectos do ensino ministrado que mereceriam ser corrigidos. A tarefa de avaliar não é exclusiva do professor, mas estende-se a outros elementos participantes do processo educacional, como alunos, pais e administradores. Neste sentido a avaliação implica em julgamento do desempenho educacional, tendo como parâmetro os objetivos previamente fixados. Essa compreensão evidencia uma avaliação centrada em objetivos que dimensionam o desempenho esperado e em razão dos quais serão apreciados os resultados obtidos. 207 OS PROGRAMAS NACIONAIS DE AVALIAÇÃO DA EDUCAÇÃO BÁSICA Com a intensificação de pesquisas no âmbito da educação nas décadas de 1960, 1970, 1980 e 1990 e com a finalidade de avaliar o ensino oferecido pelas instituições de ensino, deu-se início a uma ampla política de avaliação do rendimento de alunos de escolas públicas em todo o país, por iniciativa do Ministério de Educação e desenvolvida pelo INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) no que se refere à implantação e desenvolvimento de programas nacionais de avaliação da educação básica. Estes visavam, no final da década de 1980, identificar, na diversidade do quadro educacional brasileiro, pontos curriculares críticos; verificar o desempenho em aspectos cognitivos básicos dos alunos e subsidiar os professores para uma recuperação de seus alunos. Dois programas são marcantes nesse contexto, o SAEB e o Prova Brasil. O programa Prova Brasil tem caráter censitário e o SAEB é uma amostra das escolas participantes da Prova Brasil, ambos sendo realizados em biênios. Seus resultados abrangem todo o território nacional e são adequados para avaliarem redes ou sistemas de ensino, e não alunos individualmente. Esse fato possibilita a discussão dos resultados dentro da escola, permitindo a auto-avaliação e consequente adoção de medidas para melhorar o desempenho. Possibilita, ainda, o desenvolvimento de projetos de intervenção pedagógica, vinculados aos resultados das avaliações cotidianas realizadas pelo professor. Segundo Carvalho (2010) o foco no processo da aprendizagem, conferido pela avaliação interna, e os resultados dados pelas avaliações oficiais se complementam em suas diferentes funções materializando-se através dos projetos de intervenção pedagógicas. O Prova Brasil foi criado em 2005, como um desmembramento do SAEB a fim de oferecer dados mais específicos sobre os municípios e as escolas. É destinado aos alunos do 5° e 9° ano do ensino fundamental de todas as escolas da rede pública urbana e rural. Sua abrangência é universal, contando com a participação de todos os alunos das respectivas séries, e os resultados de uma parcela das escolas participantes compõe os resultados do SAEB. O SAEB (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica) é composto de uma amostra das mesmas séries avaliadas pelo Prova Brasil acrescentando ainda o 3º ano do Ensino Médio. Pretendendo contribuir para a universalização do acesso à escola e a ampliação da equidade e da eficiência do sistema educacional brasileiro fornecendo subsídios à formulação de políticas e diretrizes adequadas à diversidade de situações. 208 As notas dessas avaliações são usadas para compor o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), instrumento que o governo federal tem utilizado para definir políticas públicas destinadas à melhoria da educação em nosso país. A partir de 2007, os dois exames passaram a ser realizados em conjunto. A AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM NA PERSPECTIVA DA SALA DE AULA Muitos são os alertas para os riscos do uso da avaliação punitiva, seletiva e classificatória como forma de dominação (Gama, 2002). Uma das conseqüências dessa prática leva o aluno a sentir-se incapaz de aprender. Outro grande problema da avaliação classificatória é o alto índice de reprovação e evasão escolar, logo nos primeiros anos, refletidos nas séries subsequentes. A forma como a avaliação educacional é praticada pela escola, reflete no desempenho dos alunos, estando representada pelos altos índices de evasão e repetência escolar. Estando a escola simplesmente interessada em classificar seus alunos, forçando professores e instituições utilizarem métodos que desqualifica e não ajuda no rendimento escolar. Uma prática excludente, punitiva e classificatória. A avaliação classificatória não proporciona espaços significativos para um diálogo profundo, em que o processo e seus resultados possam ser compartilhados pelos sujeitos envolvidos. (Esteban, 2005) Gama (2002) observa um número significativo de professores que utilizam à avaliação como um método de mera averiguação da aprendizagem. Esse fato faz com que as aulas se resumam apenas a momentos de preparação para os testes e provas. Assim, para o autor, a aula torna-se uma revisão de conteúdos pré-determinados pelo currículo escolar, muitas vezes constituindo-se num exercício autoritário de julgamento de capacidades. Porém, o autor ressalta que, esta pode ser usada de forma a proporcionar uma mudança qualitativa na atuação do avaliador, num processo que tem como propósito, o acompanhamento contínuo dos processos de ensino e aprendizagem, numa prática dialética e não apenas instrumental. Logo, a avaliação da aprendizagem deve ser um processo contínuo, sistemático e integral, que não pode ser improvisado, deve ser planejada, e realizada em função de objetivos. Que não visa punir alunos, mas orientá-los nos processos de ensino/aprendizagem, pois analisa e julga todas as dimensões do comportamento, considerando o aluno como um todo. (Haydt, 1994) Nesse sentido, a avaliação assume nova função, pois se torna um meio de diagnosticar e de verificar se os alunos estão alcançando os objetivos proposto pelo 209 planejamento escolar. Por meio dela, o professor observa se suas aulas estão sendo produtivas. Segundo Hoffmann (1993) ao propor uma avaliação mediadora que liberte o aluno do paradigma reprovação/aprovação alguns professores se vêem assustados com a possibilidade de abolir práticas herdadas da escola behaviorista. Práticas estas enraizada no tradicionalismo. A ação mediadora tem uma postura construtivista na educação, onde a relação dialógica possibilita inúmeros momentos em que é possível a troca de experiências progressivas entre professor e aluno. A avaliação educacional encarada como uma questão dialética serve de mediadora entre as práticas de ensino-aprendizagem partindo do princípio de que todos os envolvidos no processo estão sujeitos a ela. Por fim, a avaliação da aprendizagem, também conhecida como avaliação do processo ensino-aprendizagem ou avaliação do rendimento escolar, julga o desempenho do aluno, professores e de toda a situação de ensino. Seu principal objetivo é o aperfeiçoamento do ensino. Torna-se um instrumento eficaz e valioso quando utilizado com o propósito de analisar e compreender o processo de aprendizagem. Para Cury (apud Gama, 2002) a educação dá sustentação para uma mudança social e a avaliação pode ser usada para que ocorra uma mudança de personalidade já que ela é um critério de dominação usado na escola, podendo ser utilizada como método transformador. MATERIAIS E METODOS A pesquisa iniciou com a reunião do grupo de pesquisa, onde foram apresentados os participantes e entregue a cada um seu respectivo plano de trabalho. Os participantes foram divididos em dois grupos, ficando o primeiro grupo responsável por realizar o levantamento dos dados nas escolas municipais e o segundo grupo responsável pela mesma tarefa nas escolas estaduais. O levantamento de dados sobre as escolas ocorreu com a finalidade de obtermos informações quanto à quantidade de turmas do primeiro ao quinto ano, e quantidade de alunos por turma. Em uma segunda reunião os participantes da pesquisa foram divididos para que fossem feitos os levantamentos bibliográficos nas instituições de ensino superior e repartições públicas de ensino com o objetivo de mapear os exemplares que tratam sobre a temática da avaliação. 210 Com os acervos bibliográficos mapeados a orientadora, selecionou as obras que foram lidas pelos bolsistas, voluntários e colaboradores os quais fizeram um estudo bibliográfico por meio de fichamentos e resenhas, a fim de fundamentação teórica sobre a temática. A seleção das escolas para que a pesquisa fosse desenvolvida foi feita através da técnica de amostragem aleatória simples. Com a definição das amostras iniciaram-se os procedimentos da coleta de dados em campo por meio das observações diretas. Os dados obtidos nas observações foram registrados em um caderno de campo, com descrição minuciosa da aula. A coleta de dados se deu no final do ano letivo de 2011, sendo possível observarmos a prática docente no que diz respeito à avaliação e seus procedimentos. Após as observações de campo foram elaboradas as questões para que fossem feitas as entrevistas direcionadas aos professores das escolas e classes observadas. O período de realização das mesmas foi entre março e abril de 2012. Após a realização das entrevistas fizemos a análise das mesmas, com base no referencial teórico construído, no que diz respeito à utilização dos resultados das avaliações oficiais realizadas na escola. RESULTADOS E DISCUSSÕES A coleta de dados da pesquisa ocorreu em dois momentos diferentes. No primeiro deles, referente às observações de campo, foram obtidos dados quanto à metodologia de trabalho do professor e sua prática avaliativa. No segundo momento foram realizadas as entrevistas estruturadas para a coleta de informações a respeito dos conhecimentos dos professores pesquisados sobre o tema da avaliação e como os resultados das avaliações oficiais se materializam na escola. De acordo com as observações realizadas o modo como à avaliação aconteceu nas escolas está pautado em práticas que punem os alunos. Isso se observou pala fala de alguns professores quando tentavam justificar a retenção dos alunos que não haviam alcançado boas notas para serem aprovados para o 5° ano do ensino fundamental. Observe a fala dos professores H1 e F2: 211 “Ano que vem vou estar aqui de novo, não quero nem saber, vai ter que estudar comigo de novo, a não ser que me mudem de ano, só não quero 1° ano!” (caderno de campo, escola X, professor H1. 07/11/2011). “Sabe eu tenho alunos muito bons, mas são poucos. Aqui tem aluno que já está reprovado, mas não pode ficar sem vim na [sic.] aula, então, estão aqui [...].” (caderno de campo, escola B, professor F2. 16/11/2011). “[...] aquele aluno que senta ali no fundo, veja bem, quando ele veiopara cá no segundo bimestre não sabia nem ler, tive que fazer um caderno específico para ele. Agora, já está bem adiantado, mas não me preocupa mais, pois sei que vai reprovar”. (caderno de campo, escola A, professor F1, 04/11/2011) Na perspectiva dos sujeitos estudados, quando o aluno não alcança média ao final do ano letivo, ainda que em apenas uma disciplina, isso o deixa inapto para o próximo nível. Não alcançando a média anual de 60 pontos estipulados pela Portaria 1001/2008/GAB/SEDUC, o aluno é desqualificado para o acesso ao próximo ano/série gerando um quadro de defasagem e fracasso escolar. Pelos fragmentos das falas dos professores citados a cima, observou-se a freqüência de uma prática de avaliação seletiva e classificatória, apenas para fins de promoção do aluno. O planejamento da aula como pôde ser observado sumariza-se em uma pauta escrita no quadro pelo professor. A falta do planejamento reflete diretamente na aula sendo que nos registros de campo foram presenciados alguns momentos em que o professor perdeu o controle da classe e tomou medidas enérgicas para retomar o controle, a forma utilizada foi claramente punitiva. Como demonstramos no fragmento de fala a baixo: “Agora vou usar a mesma estratégia dos colonizadores. Rafael [nome fictício] vem pra frente! Henrique [nome fictício] vai para o fundo! Celestino [nome fictício] na outra fileira. Agora vocês estão separados, quero ver conversar. Cadê o caderno pra mim [sic.] vistar? Não fez! Vai reprovar! Não faz nada na aula!” (Escola X, professor H1, 14/11/2011). Assim, vimos nas observações de campo o uso da avaliação punitiva e classificatória, utilizada como forma ameaçadora e disciplinadora em sala de aula. Essa experiência demonstrou que nos casos estudados, há uma relação desconexa entre a prática docente avaliativa, entre a prática da avaliação em sala de aula e o planejamento de ensino, e ainda, um distanciamento entre a ação pedagógica nas escolas e os resultados das avaliações oficiais do Estado. Duas questões das entrevistas estruturadas abordaram a relação direta entre os programas oficiais de avaliação e a utilização dos seus resultados por parte da escola e dos professores. São elas: Com relação aos programas de avaliação da educação desenvolvidos pelo governo, sabemos que são muitos. Tem o SAEB, o Prova e Provinha Brasil, ENEM e 212 Enade. Qual o seu ponto de vista sobre a avaliação dos sistemas educacionais e a forma como ela se materializa através destes programas? O SAEB e o Prova Brasil são programas oficias e nacionais de avaliação da educação básica para o ensino fundamental. Nível de ensino o qual você desenvolve sua atuação profissional. Os resultados desses programas retornam à escola de formas variadas, podendo ser informados via secretaria de educação e ainda, informada e discutida pela direção e coordenação pedagógica da escola, ou mesmo consultados pela internet. Como você tem acesso a esses resultados? O que a escola, e você, particularmente faz com estes resultados? Estas foram aplicadas a oito professores das escolas estaduais observados na primeira etapa de coleta de dados. Quanto à primeira questão, o que se buscou foi conhecer o grau de informação e conhecimento dos professores com relação aos programas de avaliação citados e qual juízo estes professores fazem sobre os mesmo. Algumas das respostas obtidas são aqui apresentadas. “No meu ponto de vista, essas provinhas são para medir os níveis de conhecimento dos alunos, mas não é isso que acontece. Por serem totalmente objetivas, às vezes, os alunos de níveis inferiores acertam mais dos que aqueles que já lêem, ou seja, pode ser respondida ao acaso, ou de memória. Portanto, não pode constatar o que o aluno adquiriu de conhecimento”. (escola A, professor F1) “Então, essas avaliações são elaboradas a nível de Brasil, perguntas objetivas geralmente de marcar X, não se levam em consideração a diversidade. A avaliação é feita para todos de uma forma igual. Aquela criança especial, se por acaso, ela tiver uma pontuação menor, vai interferir no índice de toda a turma”. (escola D, professor F4) “Eu ainda não passei por isso. Eu não tive essa experiência, ainda, de explicar a Provinha Brasil. Então fica difícil para eu falar como que é, apesar, de já estarmos trabalhando, porque na hora, quando eu faço o meu planejamento com os demais professores, elas estão-me orientando na questão de como trabalhar para que essas crianças consigam fazer a provinha. Então, a gente já trabalha em cima do conteúdo para as crianças não ficarem tão perdidas na hora da provinha. (escola E, professor F5) “Eu conheço muito pouco. Eu nunca estive em uma série que estivesse sendo avaliada. (...) a gente fica sabendo dessa nota e através dessa nota, que reflete a situação do aluno, é que a gente estabelece as metas, os métodos, os projetos... tudo que a gente vai tentar para resolver a baixa nota. Ou também rever a prática, às vezes quando melhorou a gente analisa tudo e vê o que funcionou, o que teve um efeito positivo, e a partir disso, a gente trabalha, tenta aplicar onde está precisando melhorar. É assim”. (escola F, professor F6) “Eu já trabalhei com algumas dessas questões. Você deve levar em consideração o aspecto cultural do aluno, região essas coisas todas, quando 213 você vê essas avaliação que tem uma abrangência tão grande algumas teorias você vê elas sendo dizimadas deixa de ter valor, porque quando você passa algumas dessas questões aqui de ENEM e SAEB muitas vezes o aluno não tem o conhecimento, porque não faz parte do seu dia a dia, acho que ela deveria ser trabalhada em cada região. (escola X, professor H1) O que se verificou, pelas respostas obtidas, foi um baixo conhecimento, por parte dos professores entrevistados, sobre os programas oficiais de avaliação da educação. E, a formas de tentar justificar tal desconhecimento vem em afirmações do tipo “Eu ainda não passei por isso. Eu não tive essa experiência” ou ainda “Eu conheço muito pouco. Eu nunca estive em uma série que estivesse sendo avaliada”. Verificou-se ainda, equívocos de compreensão sobre a metodologia de aplicação destas avaliações sistêmicas no que se refere ao acerto ao acaso e a generalização dos instrumentos para todas as regiões do país. Outro ponto de destaque nas respostas apresentadas a cima foi como esses resultados chegam até a escola e aos professores e como são discutidos por eles. As respostas demonstraram que tais resultados não são amplamente divulgados na escola e são discutidos superficialmente pela equipe pedagógica e gestora. Esse fato reflete que tais avaliações não alcançam seu principal objetivo de fornecer dados e informações á escola, para que esta analise e reveja suas ações na busca de aprimoramento e melhorias no sistema. A segunda questão que se apresentou aos professores buscou conhecer o que a escola e eles, particularmente, fazem ao tomarem conhecimento dos resultados das avaliações oficiais, ou seja, como professores e escola se apropriam desses resultados e os transformam em ação pedagógica. Seguem algumas das respostas obtidas. “Então, os resultados a gente tem visto pela internet, vêm uns materiais para a escola enviados pelo MEC. Também, esses tempos, estava no mural da escola. A nossa coordenadora expôs lá, no mural, p’ra gente [sic] estar vendo a classificação da nossa escola. Com relação aos resultados, não tem sido muito discutidos não. A gente tem aí, também, o PDE levando a aprovação do aluno. Não adianta só elevar as medidas, mas as aprendizagens do aluno”. (escola C, professor F3) “Eu tenho acesso à informação pela direção da escola, e a partir dessas informações é feito um trabalho para que aumente o índice, a nota da escola. Só que é feita da seguinte forma, é passado pela direção da escola o resultado e aí cada profissional vai trabalhar, utilizando formas diferenciadas para que haja um maior desempenho da turma”. (escola D, professor F4) “Eu não tenho essa experiência, ano passado as professoras do 2° Ano aplicaram as provinhas e eu não vi como foi o processo, daí elas receberam essas notas dói colocadas no edital na sala dos professores, aconteceu uma reunião na escola e participou que aplicou a prova e os demais também e é discutida o porquê destas notas” (escola E, professor F5) 214 “A coordenação pedagógica da escola sempre nos informa, eu e o grupo da escola sempre procuramos discutir os resultados e procuramos estabelecer metas, projetos uma metodologia diferenciada se inscreverem em programas do governo para tentar melhorar aquele resultado que não foi tão bom”. (escola F, professor F6) “Na verdade agente nem tem esse resultado. Às vezes você fica sabendo, assim, por alto, mas nem sabe qual a realidade. Não passa a ser mais discutida em sala de aula. Só chega p’ra gente [sic.] aplicar (...) e quando vem o resultado ninguém busca trabalhar em cima daquilo p’ra [sic.] buscar algo melhor. Eu acho que o objetivo seria esse, avaliar seu aluno e trabalhar em cima daquilo que ele não alcançou, mas não se faz nada, não se pensa”. (escola X, professor H1) Neste sentido foram encontrados diversos problemas relacionados à eficiência dos métodos avaliativos utilizados nas avaliações oficiais. Uma vez que a utilização dos seus resultados, por parte da escola e dos professores, ainda, é muito pequena devido à amplitude de divulgação, discussão e materializam destes em ações pedagógicas efetivas de aprimoramento e melhoria da qualidade do ensino. Nota-se que a preocupação do professor é com a elevação do desempenho da escola e o preparo da aula para questões que poderão cair nos testes. Esta prática é prejudicial para o aluno visto que este se torna refém das avaliações com foco em seus rendimentos. CONSIDERAÇÕES FINAIS Tendo por base as evidências obtidas pelos procedimentos da pesquisa, ficou claro que a prática da avaliação nas escolas da rede pública estadual de Rondônia vem acontecendo de forma a desqualificar o aluno para o acesso ao próximo ano/série, pautando-se em práticas punitivas e classificatórias e gerando um quadro de defasagem e fracasso escolar prejudiciais ao sistema de ensino como um todo, e não apenas ao aluno no âmbito de sua individualidade. Ficou patente, nas práticas observadas que o planejamento de ensino e das aulas, de uma maneira geral, sumariza-se em uma pauta reduzida. Essa falta de planejamento vem refletindo diretamente qualidade da aula uma vez que o professor perde o controle disciplinar da classe e passa a tomar medidas enérgicas para retomá-lo. Nesse momento a avaliação ganha contornos disciplinadores e ameaçadores. No que se refere aos conhecimentos dos professores estudados sobre os programas oficiais do governo federal para a avaliação da educação básica, identificou-se um baixo grau de conhecimento dos mesmos, muitas vezes justificado por explicações que revelam a não experiência em ano/séries avaliados pelo SAEB e Prova Brasil. Ou seja, se o professor não 215 leciona em uma turma, cujo ano/série fazem parte do universo a ser avaliado pelos programas mencionados, ele não precisa conhecê-lo aprofundadamente. E ainda, se sua turma não passa por essa avaliação, ele se sente desobrigado, ou mesmo, sem uma responsabilidade direta com os resultados alcançados pela escola. Verificou-se ainda, equívocos de compreensão sobre a metodologia de aplicação destas avaliações sistêmicas no que se refere ao acerto ao acaso e a generalização dos instrumentos para todas as regiões do país. Destaque foi dado aos dados que revelam como esses resultados chegam até a escola e aos professores e como são discutidos por eles. As respostas demonstraram que estes não são amplamente divulgados na escola e são discutidos superficialmente pela equipe pedagógica e gestora. Isso reflete que tais avaliações não alcançam seu principal objetivo de fornecer dados e informações à escola, a fim de que esta analise e reveja suas ações na busca de aprimoramento e melhorias no sistema. Uma vez que a utilização dos resultados dos programas oficiais de avaliação da educação básica do governo federal não são devidamente apropriados e utilizados pela escola seus professores, devido a sua baixa amplitude de divulgação e discussão, a materialização destes em ações pedagógicas efetivas de aprimoramento e melhoria da qualidade do ensino fica quase inexistente. Nos casos estudados, fica clara a relação desconexa entre a prática da avaliação em sala de aula e o planejamento de ensino, e ainda, um distanciamento entre a ação pedagógica das e nas escolas e os resultados das avaliações oficiais do Estado. Sendo assim, entendemos que a escola, seus sujeitos e os agentes formuladores de políticas educacionais, ao proporem a educação como método de transformação social, devem garantir que todas as práticas que a segue devam ter seus objetivos voltados à melhoria e conscientização de seus participantes. Devido à complexidade da avaliação educacional, e sua vertente de avaliação da aprendizagem, muitos professores têm uma visão simplória do ato avaliativo, tornando-o uma prática classificatória, punitiva, com a utilização de métodos tradicionais para a sua efetivação. No que diz respeito às avaliações oficiais do governo federal para a educação básica e sua efetivação no seio das escolas, e sua influência na criação de políticas educacionais, ficou evidente que estas não vêm servindo bem nem à função de controle mantida pelo Estado, tão pouco à finalidade de aprimoramento do sistema e melhoria da qualidade da educação pública. O que tais programas vêm cumprindo são as exigências internacionais postas por organismos como o Banco Mundial. 216 REFERÊNCIAS BARREIROS, Débora Raquel Alves. O sistema nacional de avaliação da educação básica: vínculos entre avaliação e currículo. Dissertação de mestrado apresentada ao Curso de PósGraduação em Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2003. BOAS, Benigna Maria de Freitas Villas (Org.), Avaliação: políticas e práticas. São Paulo: Papirus, 2003. CARVALHO, Gisele Francisca da Silva. Avaliação oficial: subsídios para a compreensão do impacto na prática docente. Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de PósGraduação: Processos Socioeducativos e Práticas Escolares da Universidade Federal de São João Del-Rei. São João Del-Rei/MG, Março de 2010. ESTEBAN Maria Tereza/org. Escola, currículo e avaliação 2ª ed. São Paulo: Cortez, 2005. GAMA, Zacarias Jaegger. Avaliação na escola de 2° grau. 3ª ed. Campinas: Papirus, 2002. HAYDT, Regina Cazaux. Avaliação do Processo Ensino-Aprendizagem. São Paulo, Ática, 2001. HOFFMANN, Jussara. Avaliação mediadora: uma prática em construção da pré-escola à universidade. 20ª ed. Porto Alegre: Mediação, 1993. MIRANDA, Flavine Assis de. Avaliação educacional no interior amazônico: entre a regulação e a emancipação. Tese de doutorado. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho/UNESP/FCLAR, 2010. MACHADO Ednéia Maria Azevedo. OLIVEIRA Maria de Fátima de. O estágio supervisionado no curso de pedagogia e suas contribuições na formação docente. Disponível em: <http://[email protected]>. PERRENOUD, Phillipe. Avaliação: da excelência à regulação das aprendizagens. Porto Alegre: Artes Médicas, 1999. SANTOS. Claudino Bispo dos. Avaliação nas séries iniciais do ensino fundamental. Trabalho de conclusão de curso, para título de graduação pela Universidade Norte do Paraná, UNOPAR. SOUSA, Clarilza Prado de (org.). Avaliação do Rendimento Escolar. Campinas, SP: Papirus, 1991. VIANA, Heraldo Marelim. Avaliações em Debate: SAEB, ENEM, PROVÃO. Brasília: Plano, 2003. A ORDEM SINTÁTICA DA L1 (TUPI-KAWAHIB) 217 NA ESCRITA EM L2 (LÍNGUA PORTUGUESA) 47 Julie Dorrico48 [email protected] Wany Bernardete de Araujo Sampaio49 [email protected] RESUMO Este trabalho busca examinar possíveis manifestações da Gramática da L1 (Língua Materna) na escrita em L2 (Língua Portuguesa) de professores indígenas em formação, enfocando especialmente questões referentes à ordem sintática, considerando o valor do reconhecimento da multietnicidade, pluralidade e diversidade dos povos nativos brasileiros e suas culturas e línguas que são frutos da herança de gerações anteriores, mas que estão sempre em eterna construção, reelaboração, criação e desenvolvimento. Palavras - chaves: Ordem Sintática. Manifestações Gramaticais da L1 na Escrita em L2. Formação de professores. Pluralidade e Multietnicidade. ABSTRACT This paper seeks to examine possible manifestations of the L1 grammar (Mother Tongue) in writing in L2 (Portuguese) of indigenous teachers in training, focusing mainly on issues related to syntactical order, recognizing the value of multiethnicity, plurality and diversity of native brazilian peoples, their cultures and languages that are the fruit of the heritage of previous generations, but always in eternal construction, rework, design and development. Key-words: Syntactic Order. Manifestations of Grammar in Writing L1 in L2. Teacher Training. Plurality and Multiethnicity. INTRODUÇÃO A presente pesquisa procurou analisar manifestações gramaticais da L1(Língua Materna) na escrita em L2 (Língua Portuguesa) de professores indígenas em formação, a fim de discutir a ordem sintática. 47 Texto produzido a partir de resultados finais do projeto de pesquisa Manifestação da ordem sintática da L1(Língua Materna) na escrita em L2(Língua Portuguesa) de professores indígenas em formação, desenvolvido pelo Grupo de Estudos em Culturas, Educação e Linguagens, Centro de Estudos da Linguagem, Departamento de Línguas Vernáculas/NED/UNIR, com o apoio do PIBIC/UNIR/CNPq. Orientadora: Wany Bernardete de Araujo Sampaio. 48 Acadêmica do sétimo período do Curso de Letras-Português/UNIR. Orientanda PIBIC/ UNIR/ CNPq. 49 Dra. em Línguística; Dra. em Educação Escolar. Departamento de Línguas Vernáculas. UNIR 218 A discussão acerca da ordem pautou-se na suposição de que, ao tornar-se consciente das diferenças entre a L1 e a L2, os falantes (indígenas) estariam mais aptos a controlar a transferência inadvertida de padrões sintáticos de sua língua materna para o português (MAIA, 2005). A explicitação dos padrões de ordem vocabular dominante (MAIA, 2005) poderia facilitar a aquisição de uma L2, considerando que os processos de aquisição não são atingidos de forma plena em ambiente artificial; por outro lado, é importante que os professores formadores de professores indígenas estejam inteirados do que ocorre no processo de ensino-aprendizagem de uma L1 para uma L2, reconhecendo os processos próprios de aprendizagem dos povos indígenas. No que se refere à formação de professores indígenas, a pesquisa tomou por base os documentos - Referencial Curricular Nacional para as Escolas Indígenas/ Referenciais para a Formação de Professores Indígenas - e a sua tarefa de apresentar-se como veículo para subsidiar e apoiar professores na tarefa de invenção e reinvenção contínua de suas práticas escolares. PROCEDIMENTOS A pesquisa constituiu-se de análise estrutural de textos escritos em português por indígenas usuários de línguas Tupi-Kawahib (Uru-eu-uau-uau e Amondawa); os indígenas são professores em formação através do Projeto AÇAI II. Analisando as sentenças escolhidas, buscamos ver como a ordem da sentença escrita em português mostra manifestações da língua materna na estrutura escrita do falante em processo de aprendizado. RESULTADOS Os exemplos a seguir são de professores Uru-eu-uau-uau e Amondawa em formação, através do Projeto AÇAI II, que se insere no Programa de Educação Indígena desenvolvido pelo Governo do Estado de Rondônia, e tem a formulação de uma política pública de educação para as comunidades indígenas, sob olhar dos conceitos de multiculturalismo, interculturalidade e alteridade, encontrados nos documentos oficiais que fundamentam o Referencial Curricular Nacional de Educação Indígena (RCNEI) e as Políticas Públicas de Educação Indígena. (VENERE, 2011). 219 Tais exemplos são utilizados com a finalidade de discutir manifestações que indicam a diferenciação da L1 (Língua Materna) na escrita em L2 (Língua portuguesa): EXEMPLO 1 Sentença escrita em português por falante tupi-kawahib (análise morfológica): Como aldeia meia dois um Pron. Subs. surgiu Numeral VI Ordem da sentença em português (análise sintática): Como (a) aldeia meia dois um Pron. surgiu S VI c) Ordem da sentença escrita por falante da língua Tupi-Kawahib (análise sintática): Como Pron. aldeia meia dois um S surgiu VI Nesta sentença, escrita pelo falante Tupi-Kawahib, a ordenação da categoria sintagmática lexical da sentença em língua portuguesa é: SV. Na língua amondawa é incomum o verbo em uma sentença aparecer no final da frase, pois a constituição do sintagma verbal (SV) ocorre com um prefixo pronominal + verbo (Tupi-Kawahib). O pronome (COMO) é relativo na sentença, o Sujeito (ALDEIA MEIA DOIS UM) nominativo, e o Verbo (SURGIU) intrasitivo, portanto não pede complemento. A colocação do verbo no final da frase, considerando que o mesmo se apresenta na língua materna constituído de prefixo pronominal+verbo, revela que os parâmetros da estrutura da gramática da L2 indicam que há internalizações inadvertidas (MAIA, 2005) no falante que se apresentam na escrita na língua portuguesa. Verifica-se também que no tupi-kawahib quando o VI não é acompanhado de S-nãohumano, têm-se duas diferentes ordens: SV e VS. Exemplo: i) se houver, na sentença, um morfema circunstancial, a ordem será SV; ii) se a construção tiver apenas o sujeito mais o verbo, a ordem será VS (SAMPAIO, 2000). 220 Como se vê, a ordenação do sintagma com verbo intransitivo em amondawa pode ser: SV ou VS. Considerando que a constituição do sintagma verbal em amondawa é V=Pess.Ag+R, e no início da frase, a manifestação do verbo intransitivo com ordenação no final da frase (SV - que é mais comum na gramática da L2), na escrita em língua portuguesa pode sugerir que o falante tupi-kawahib já tenha iniciado um processo de internalização das estruturas gramaticais da L2. EXEMPLO 2 a) Análise morfológica da sentença escrita por falante amondawa Bom nós não Adj. Pron. Adv. damos a o V Art. valor para Subs. Prep. coisa própria nossa S Adj. Pron. Poss. Posp. b) Análise sintática da sentença escrita por falante Amondawa Bom nós não Suj. Adv V damos (a) o O valor para coisa própria nossa O Na sentença (a) produzida pelo falante Amondawa/Tupi-Kawahib, a ordem da sentença na oração é: Sujeito + Verbo + Objeto. Neste exemplo podemos ver que os determinantes (A) e o (O) são utilizados ao mesmo tempo, entretanto tal utilização é posta na 221 estrutura da oração para atuar como um elemento de hipercorreção do indivíduo, pois tal colocação não ocorre em uma construçãoamondawa, nem em língua portuguesa. O sujeito está representado por um pronome pessoal (NÓS) anteposto ao verbo; o verbo (DAMOS) é solícito de complemento, também comumente usado no português; porém, o determinante (que marca o objeto, em língua portuguesa, definindo-o ou caracterizando-o) que comumente é suprimido dado a não existência de tal marca no tronco tupi-kawahib é utilizado no sintagma duplamente (A e O), demonstrando uma oscilação no uso do componente (DET) na relação com o núcleo do sintagma (VALOR). Em tupi-kawahib a forma pronominal genitiva é posposta ao nome possuído. O deslocamento do possessivo nossa (COISA PRÓPRIA NOSSA) que surge na sentença escrita em português pelo falante amondawa é utilizado, talvez, em uma tentativa de hipercorrigir; é possível que o deslocamento da forma pronominal em português se explique por analogia com o possessivo de 3° pessoa da língua portuguesa (cf. meu livro, teu livro, livro dele (a)), que é posposto ao nome possuído e a ele vinculado por meio de preposição (dele = de + ele); o processo analógico pode ocasionar o conhecido fenômeno da hipercorreção, que decorre de uma hipótese que o falante realiza, em um esforço para aprender a língua-alvo. CONSIDERAÇÕES FINAIS Através deste estudo, buscamos analisar possíveis manifestações da ordem sintática da L1 (Língua Materna) na escrita da L2 (Língua Portuguesa) na escrita da língua portuguesa (L2) professores indígenas em formação. Na etapa final, obtivemos importantes resultados: (i) A constituição do sintagma verbal em amondawa é V=Pess.Ag+R em posição inicial; a manifestação do verbo intransitivo com ordenação no final da frase (SV - que é mais comum na gramática da L2), na escrita em língua portuguesa sugere que o falante tupi-kawahib iniciou um processo de internalização das estruturas da L2. (ii) O deslocamento da forma pronominal da 1ª pessoa do plural (nossa) para depois do SN; possivelmente esse fato decorre da analogia com o possessivo de 3ª pessoa da língua portuguesa (cf. meu livro, teu livro, livro dele (a)), que é posposto ao nome possuído e a ele vinculado por meio de preposição (dele = de + ele); o processo analógico pode ocasionar o conhecido fenômeno da hipercorreção, que decorre de uma hipótese que o falante realiza, em um esforço para aprender a língua-alvo. Portanto, consideramos que esta pesquisa seja muito relevante, não somente para o conhecimento de línguas indígenas, mas também para incentivar modelos educativos e 222 metodológicos no processo de formação de professores indígenas na compreensão e assimilação das estruturas e funcionamento da língua portuguesa escrita e também para que os professores formadores de professores indígenas possam auxiliar tais professores indígenas em formação no processo educativo, respeitando a pluralidade étnica e linguística desses povos nativos. REFERÊNCIAS BRASIL. Referencial curricular nacional para as escolas indígenas/Ministério da Educação e do Desporto, Secretaria de Educação Fundamental. - Brasília: MEC/SEF, 1998. BRASIL. Ministério da Educação Referenciais para a formação de professores indígenas/Secretaria de Educação Fundamental — Brasília : MEC ;SEF, 2002. FARIA CARDOSO, V. Um estudo de categorias sintagmáticas da língua Kaiowá/Guarani, 2001. Disponível em: http://www.academicoo.com/artigo/um-estudo-dascategorias-sintagmaticas-da-lingua-kaiowaguarani> Acesso em 15/04/2011. 12:32. MAIA, Marcus. Uma mente, duas línguas: reflexões sobre a transferência de padrões de ordem vocabular em textos de falantes indígenas bilingues, 2005. Disponível em: <http://indigena.unemat.br/publicacoes/cadernos4/006_marcusmaia_umamenteduaslinguas.pdf> Acesso em: 15/03/2001. 18:21. SAMPAIO, W. B.A. A referência remissiva número-pessoal nos prefixos verbais da língua Uru-eu-uau-uau, 2006. (Não-publicado) ____. As línguas Tupi-Kawahib: Um estudo Sistemático-Filogenético. Tese de doutorado. Programa de Pós-Graduação em Linguística. UNIR, 2001. Orientador: Mario Alberto Cozzuol. SAUSSURE, F. Curso de linguística geral. São Paulo: Cultrix, 2006. VENERE, Mario Roberto. Projeto Açaí: uma contribuição à formação dos professores indígenas no Estado de Rondônia / Mario Roberto Venere. São Paulo, 2011. 223 RESUMO EXPANDIDO SUBPROJETO: O Estudo da Literatura Indígena Contemporânea Sakurabiat e Suruí Paiter e a Cultura do Impresso PROJETO: Livros da floresta - do registro etnográfico à criação literária Orientandos: Rafael Rodrigues da Cunha, Regyvânya Alves Araújo e Lucélia Miranda de Souza. Orientadora: Profª. Drª Cynthia de Cássia Santos Barra. RESUMO Esta comunicação tem por finalidade fazer uma reflexão sobre os caminhos da educação escolar indígena no Brasil, neste início do séc. XXI, enfocando suas relações com a transmissão da escrita alfabética nas aldeias e a produção de literatura de autoria indígena (ALMEIDA, 2004). Para percebermos as mudanças que tem ocorrido no cenário da educação escolar indígena, vamos lançar um olhar para a implantação das escolas jesuítas que tinham por finalidade “civilizar” os indígenas e, nos dias atuais, verificaremos como os movimentos indígenas, órgãos governamentais, antropólogos, educadores, diversos artistas e cientistas apoiam os indígenas, que exigem seus direitos assegurados por lei, como, por exemplo, o respeito às suas formas tradicionais de produção de conhecimento e também o direito a uma escola diferenciada, específica. Nesse contexto, a antropóloga e editora de narrativas indígenas Betty Mindlin levanta importante questão: “que utilidade teria aos indígenas escrever e ler em suas línguas?” (MINDLIN, 2004). Pedagogicamente falando, a alfabetização em língua materna é mais fácil de ser assimilada pelos indígenas; no entanto, isso implica a introdução de estruturas de produção de conhecimento não indígenas nas escolas das aldeias. Nesse sentido, talvez o maior desafio envolva a escolha de métodos e procedimentos interculturais tanto para a alfabetização quanto para a pesquisa e o registro das produções orais tradicionais. Sabemos que a introdução da escrita alfabética nas comunidades indígenas possui um amplo alcance político, estético e cultural; gostaríamos, portanto, de propor uma discussão em torno da prática da escrita alfabética e dos desafios, caminhos abertos e problemas, trazidos pela Educação Escolar Indígena no Brasil em sua relação com a 224 publicação dos Livros da Floresta (ALMEIDA, 2004). Orientaremos nossa discussão enfocando algumas das produções escritas produzidas em co-autoria por Betty Mindlin e as comunidades Suruí Paiter, de Rondônia, nas últimas décadas. Palavras-Chave: Educação Escolar Indígena. Livros da Floresta. Suruí Paiter. ABSTRACT This Communication aims to reflect on the ways of indigenous education in Brazil, in the beginning of XXI century. Focusing on its relations between the transmission of alphabetic writing in the villages and the production of indigenous authorship of literature (ALMEIDA, 2004). To understand the changes that have occurred in the setting of indigenous education, we cast an eye toward the deployment of Jesuit schools which aimed to "civilize" the Indians, and today, we will see how the indigenous movements, government agencies, anthropologists, educators, artists and many scientists support the indigenous people, who demand their rights guaranteed by law, for example, respect for traditional forms of knowledge production and also the right to a different school, specifically. In this context, the anthropologist and editor of indigenous narratives Betty Mindlin raises important question: "what use would the natives to read and write in their language?" (Mindlin, 2004). Pedagogically speaking, literacy in mother tongue is more easily assimilated by the natives, however, this implies the introduction of structures of knowledge production in non-indigenous village schools. In this sense, perhaps the greatest challenge involves the choice of methods and procedures for both cultural literacy and to research and record of oral traditional productions. We know that the introduction of alphabetic writing in indigenous communities has a far-reaching political, cultural and aesthetic; would like therefore to propose a discussion on the practice of alphabetic writing and the challenges, problems and open paths, brought by the Indigenous Education Brazil in its relationship with the publication of Books of the Forest (ALMEIDA, 2004). Will advise our discussion focusing on some of the written productions produced in co-authored by Betty Mindlin and communities Suruí Paiter, Rondônia, in recent decades. Keywords: Indigenous Education. Forest Books. Suruí Paiter. INTRODUÇÃO A questão literária em torno da temática indígena esteve por muito tempo restrita ao campo da literatura oral. As histórias das etnias eram passadas oralmente de geração a geração e apenas publicadas por meio das ações de antropólogos, linguistas, pesquisadores folcloristas e mesmo autores de literatura infanto-juvenil. Cabe-nos aqui, diante das produções contemporâneas dos escritores indígenas, ressaltar que a literatura de autoria indígena nos traz um conteúdo histórico e social de formação do povo brasileiro ainda praticamente inédito, pouco conhecido. 225 Ressaltamos ainda a importância de se realizar trabalhos nesse sentido, considerando a Lei 11.645/08 (LDB), que pretende preencher lacunas no currículo da área de Língua Portuguesa e Literaturas, já que a introdução do ensino da Cultura e da Literatura Indígena e Afro-brasileira nas escolas passa a ser obrigatório e responsabilidade dos professores das disciplinas que tratam de Literatura, História e Artes, no ensino médio e fundamental. Sendo assim, fazem-se necessários o desenvolvimento de pesquisas e a produção de conhecimentos novos sobre a temática indígena e, consequentemente, cursos de formação continuada para os profissionais da educação básica. 2.0 OBJETIVOS 2.1 Geral Refletir teoricamente sobre a introdução da escrita alfabética e da cultura do impresso nas comunidades indígenas Sakurabiat e Surui Paiter, povos habitantes de reservas no estado de Rondônia, contribuindo para a compreensão das condições de produção, de difusão e de recepção da literatura de autoria indígena na contemporaneidade. 2.2 Específicos Identificar, classificar e inventariar os diversos processos de coleta e de registro de narrativas orais e de produção escrita, relativos a mitos, lendas, contos históricos e cantos indígenas - sob a forma de práticas etnográficas e/ou literárias - , concernentes às etnias indígenas Sakurabiat e Surui Paiter. Criar um banco de dados com informações bibliográficas relativas às etnias Sakurabiat e Surui Paiter, recobrindo sua relação com a cultura do impresso, constituindo acervo temático com inventário de escritas etnográficas e/ou literárias encontradas durante a pesquisa bibliográfica. Revisitar os conceitos de escrita, oralidade, textualidade, literatura, tradição oral, tradução literária, autoria, gênero literário, poética e performance, conceitos considerados necessários à produção de ensaios críticos sobre obras de autores indígenas contemporâneos. Produzir um artigo científico acerca das produções literárias dos povos Sakurabiat e Suruí Paiter. 3 OBJETIVOS 226 Refletir teoricamente sobre a introdução da escrita alfabética e da cultura do impresso nas comunidades indígenas Sakurabiat e Surui Paiter, povos habitantes de reservas no estado de Rondônia, contribuindo para a compreensão das condições de produção, de difusão e de recepção da literatura de autoria indígena na contemporaneidade bem como os andamentos que tem sido tomados acerca da Educação Escolar Indígena no Brasil na atualidade. 4 RESULTADOS FINAIS E DISCUSSÃO Pesquisa teórica • Revisitamos os conceitos de escrita, oralidade, textualidade, literatura, tradição oral, tradução literária, autoria, gênero literário, poética e performance, conceitos considerados necessários à produção de ensaios críticos sobre obras de autores indígenas contemporâneos. • Produzimos um artigo científico acerca das produções literárias do povo Suruí Paiter, tomando como situação de produção o processo histórico da Educação Escolar Indígena no Brasil. Pesquisa bibliográfica: construção de banco de dados • Identificamos, classificamos e inventariamos diversos processos de coleta e de registro de narrativas orais e de produção escrita, relativos a mitos, lendas, contos históricos e cantos indígenas - sob a forma de práticas etnográficas e/ou literárias - , concernentes às etnias indígenas Sakurabiat e Surui Paiter, totalizando 120 referências bibliográficas. AGRADECIMENTOS: À nossa orientadora Cynthia de Cássia Santos Barra; Ao CNPQ; Ao PIBIC; A UNIR; __________________________ CONTATOS 227 Orientandos: Lucélia Miranda de Souza E-mail: [email protected] Rafael Rodrigues da Cunha E-mail: [email protected] Regyvânya Alves Araújo E-mail: [email protected] Orientador: Profª. Drª Cynthia de Cássia Santos Barra. E-mail: [email protected] REFERÊNCIAS ALMEIDA, Maria Inês de. Desocidentada: experiência literária em terra indígena. Belo Horizonte: UFMG. 2009. ALMEIDA, Maria Inês de. Ensaios sobre a literatura indígena contemporânea no Brasil. São Paulo, Programa de Comunicação e Semiótica - PUC, 1999. Tese de doutorado inédita. ALMEIDA, Maria Inês de & QUEIROZ, Sônia. “Livros da floresta”. In: Na captura da voz as edições da narrativa oral no Brasil. Belo Horizonte: Autêntica; FALE/UFMG. 2004. p.195277. FERREIRA, Mariana Kawal Leal. “As teorias Antropológicas do Contato Interétnico no Brasil”. In: _________. Da origem dos homens à conquista da escrita: um estudo sobre povos indígenas e educação escolar no Brasil. 1992. Dissertação (Mestrado), Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social, Departamento de Antropologia, Universidade de São Paulo. 1992. LÉVI-STRAUSS, Claude. O pensamento selvagem. 5. ed. Campinas: Papirus, 2005. MINDLIN, B. e NARRADORES SURUÍ. Vozes da origem: estórias sem escrita. Narrativas dos índios Suruí de Rondônia. São Paulo, Ática/Iamá, 1996. MINDLIN, B. Nós Paiter: os Suruí de Rondônia. Petrópolis: Vozes, 1985. MINDLIN, B.Os diários da floresta. Belo Horizonte: Autêntica, 2006. ROCHA, Everardo. O que é mito. Editora Brasiliense. Versão digital. SOUZA, Lynn Mario T. Menezes de. Uma outra história: a escrita indígena no Brasil.Versão digital. 228 LIMA, Amanda Machado Alves de. O livro indígena e suas múltiplas grafias. 2012.156 f. Dissertação (Mestrado em Letras) - Faculdade de Letras da UFMG. Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte. 229 O PROFESSOR ALFABETIZADOR DA REDE MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE PORTO VELHO/RO E O SEU PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO PROFISSIONAL Luciene de Sousa Marques Rosângela de Fátima Cavalcante França RESUMO Este estudo teve como objetivo conhecer e analisar aspectos de uma realidade particular - o processo de socialização profissional do professor iniciante na profissão docente como alfabetizador, na Rede Municipal de Educação de Porto Velho-RO.Este foi desenvolvido em 7 escolas pertencentes à Rede de Ensino no município de Porto Velho-RO e teve como sujeitos 14 professoras alfabetizadoras. A questão norteadora desse estudo foi: como se dá o processo de socialização profissional dos professores iniciantes na profissão docente, como alfabetizadores, na Rede Municipal de Educação de Porto velho/RO. Os dados finais apresentados denotam a necessidade de estudos sobre a temática em pauta, visando apresentar indicadores que possam subsidiar uma política de supervisão e apoio ao trabalho dos professores alfabetizadores, durante os primeiros anos de sua atividade profissional. Palavras-chave: Socialização Profissional. Profissão Docente. Professor Iniciante. Professor Alfabetizador. ABSTRACT This study aimed to identify and analyze aspects of a particular reality - the process of professional socialization of beginning teachers in the teaching profession as literacy, the Municipal Education of Porto Velho-RO. This was developed in seven schools belonging to the Network for Education in the city of Porto Velho, RO and had as subjects 14 literacy teachers. The guiding question of this study was: how is the process of professional socialization of beginning teachers in the teaching profession, such as literacy, the Municipal Education of Porto Velho / RO. The final data presented denote the need for studies on the issue in question in order to provide indicators that can support a policy of surveillance and support the work of literacy teachers during the first years of his professional activity. ∗ Aluna do Curso de Pedagogia da Universidade Federal de Rondônia – UNIR. Pesquisadora do PIBIC/UNIR. Membro do Grupo de Pesquisa PRÁXIS. E-mail: [email protected] ∗ ∗ Doutora em Educação. Professora do Departamento de Ciências da Educação e do PPGE - Mestrado em Educação da Universidade Federal de Rondônia. Pesquisadora do Grupo de Pesquisa PRÁXIS. E-mail: [email protected] 230 1 INTRODUÇÃO Ao ingressar na profissão docente, o professor vivenciará vários desafios. Estes estão relacionados à adaptação a um ambiente com uma cultura escolar que ele desconhece, à convivência com os seus pares e à aprendizagem do seu ofício. Essa realidade que implica na transição de aluno que aprende para ser mestre, para professor principiante, se insere num quadro de estudos que tratam da socialização profissional, cujo processo investigamos no âmbito dos professores alfabetizadores. Partindo dessa contextualização,trabalhamos nessa investigação com a seguinte questão norteadora: como se dá o processo de socialização profissional dos professores iniciantes na profissão docente, como alfabetizadores, na Rede Municipal de Educação de Porto velho/RO? Para a realização desse estudo, iniciamos pela fase bibliográfica na qual tomamos conhecimento da literatura que trata da profissão docente e da socialização profissional dos professores. Posteriormente, elaboramos o perfil dos participantes desse estudo.Em seguida, iniciamos a etapa de investigação sobre o processo de socialização profissional dos professores alfabetizadores da Rede Municipal de Educação de Porto Velho/RO. 2 SOCIALIZAÇÃO PROFISSIONAL: UM OLHAR SOBRE O PROFESSOR PRINCIPIANTE Historicamente verifica-se que a profissão docente passa por um processo de degradação. Os parcos salários, as precárias condições de trabalho, a perda de prestigio e as exigências cada vez maiores quanto à atuação do professor, têm concorrido para que esta profissão se torne cada vez menos atrativa. O conjunto desses fatores se insere num quadro de mudanças sociais que perpassam a educação e consequentemente afetam a profissão docente. A respeito dessas mudanças Esteve (1999, p.95) enfatiza: [...] a sociedade parece que deixou de acreditar na educação como promessa de futuro melhor: os professores enfrentam a sua profissão com uma atitude de desilusão e de renúncia, que se foi desenvolvendo em paralelo com a degradação da sua imagem social. A constatação dessas mudanças corrobora a ideia da perda do status social que o professor detinha quando da sua profissionalização e mostra que esse caminha rumo a um 231 processo de proletarização, que segundo Contreras (2002, p. 33), pode ser definido como “[...] a paulatina perda por parte dos professores daquelas qualidades que faziam deles profissionais, ou, ainda, a deterioração daquelas condições de trabalho nas quais depositavam suas esperanças de alcançar tal status”. O resultado dessa situação tem desencadeado um malestar-docente ressaltado por Esteve (1999, p.98) que afirma: Um elemento importante no desencadear do mal-estar-docente é a falta de apoio, as críticas e a demissão da sociedade em relação às tarefas educativas, tentando fazer do professor o único responsável pelos problemas sociais que requerem soluções sociais. Diante desse contexto, no bojo das políticas públicas de valorização da profissão docente, urge que além do investimento na formação do professor e das melhorias de salário e condições de trabalho, também se dispense um tratamento especial aos professores nos primeiros anos de sua função profissional, ou seja, uma política de apoio ao processo de socialização profissional dos professores. Para tratarmos da socialização profissional, partimos de uma definição de Dubar que ressalta: A socialização é, enfim, um processo de identificação, de construção de identidade, ou seja, de pertença e de relação. Socializar-se é assumir o sentimento de pertença a grupos (de pertença ou de referência), ou seja, “assumir pessoalmente as atitudes do grupo que, sem nos apercebermos, guiam as nossas condutas” (DUBAR, 1997, p. 31). É possível relacionar o comentário do autor com o processo de socialização pelo qual o professor iniciante tem que passar quando ingressa na carreira docente, ou seja, o meio no qual está sendo inserido irá influenciar na sua conduta como profissional e nas atitudes que sempre serão tomadas com o objetivo de manter o equilíbrio e o bem estar no ambiente. Falar dos primeiros anos do exercício da profissão docente, é voltar o olhar ao professor principiante. Veenman, citado por Pacheco e Flores (1999, p. 55) define o professor principiante como ‘aquele que ainda não completou três anos de ensino depois de se ter graduado’. Neste contexto, esse professor apresenta especificidades que são inerentes a sua condição profissional, uma vez que: O professor principiante diferencia-se, significamente, do professor estagiário porque se “libertou” das influências dos orientadores, não tendo que se submeter a ninguém, pois é o único actor, além dos alunos, na sala de aula. Contudo, esta libertação não significa uma total autonomia profissional, já que 232 o professor entra numa fase de crescente e tácita socialização profissional. (PACHECO E FLORES 1999, p. 55). Ao destacar que o professor procura de forma tácita a sua socialização profissional é que entendemos o quanto é relevante o apoio ao professor iniciante para que ele não sofra desemparo neste momento tão singular do seu desenvolvimento profissional. Pacheco e Flores (1999, p. 19) ainda tratando do professor principiante assim se posicionam: Como qualquer profissional, o professor, para ensinar, dispõe de saberes ou conhecimentos organizados em diversas dimensões e delimitados por critérios de profissionalidade. A sua função dimensiona-se num contexto de interação social e a sua atuação consubstancia-se num contexto sociocultural, institucional e didático. Em todos os contextos, o professor estabelece relações com a sociedade, o saber, a prática profissional e o saber pedagógico. Neste contexto, a necessidade da convivência em grupo influencia o homem a criar regras (e consequentemente mecanismos que assegurem seu cumprimento), às normas de convivência, formas de enxergar o mundo, de refletir sobre ele, que se modifica em cada agrupamento. A especificidade do professor iniciante requer , portanto, a criação de mecanismos que possibilitem apoio e assessoramento ao seu exercício profissional 3 METODOLOGIA A metodologia utilizada foi do tipo estudo de caso de abordagem qualitativa (BOGDAN e BIKLEN, 1994). Esta teve uma fase bibliográfica e a outra empírica. Para o levantamento dos dados da pesquisa de campo foram utilizados instrumentos como questionário e entrevista. Para o caso específico da elaboração do perfil dos professores, utilizamos o questionário e para o conhecimento do processo de socialização dos professores utilizamos a entrevista .Foram sujeitos desse estudo professores alfabetizadores da Rede Municipal de Educação, com até três anos de atuação nesta área. Os dados obtidos nas entrevistas foram categorizados à luz da Análise de Conteúdo (BARDIN, 1977). 233 4 RESULTADOS DO ESTUDO 4.1 O que dizem as professoras sobre o seu processo de socialização profissional Após analisarmos os dados obtidos por meio da entrevista junto aos professores alfabetizadores, foi possível, a partir dos fragmentos de suas falas, criarmos com fundamentação em Bardin (1977) as seguintes categorias de análise. Quadro 1 - Dados do processo de socialização dos professores alfabetizadores ASPECTOS INVESTIGADOS CATEGORIAS 1: Desconhecem os critérios. Critérios para atuar na alfabetização 2: Conhecem os critérios. 1: Relacionado à prática pedagógica Tipo de Acolhimento (desenvolvimento profissional). 2: Socialização junto à comunidade escolar. 1: Receberam preparação oferecida por Preparação que receberam instituições formadoras. 2: Buscaram sua própria preparação. 1: Orientações direcionadas ao Desenvolvimento da prática alfabetizadora. Orientações que receberam 2: Orientações direcionadas à Gestão da sala de aula. 3: Orientações direcionadas à Relação professor-aluno. 1: Apenas no início da carreira. Acompanhamento da prática pedagógica 2: Durante o desenvolvimento da prática alfabetizadora. 234 1: Professoras que acreditam que a formação inicial contribuiu. Formação inicial 2: Professoras que acharam insuficiente os saberes obtidos com a formação inicial e só com a prática foi possível construir esse saber. ASPECTOS INVESTIGADOS CATEGORIAS 1: Avaliação voltada ao desempenho do aluno. 2: Avaliação voltada ao trabalho do Professor. Avaliação da prática pedagógica 3: Auto-avaliação. 4: Percepção diferenciada da avaliação. 1: Dificuldade pela falta de colaboração dos alunos e dos pais. Dificuldades encontradas no início da profissão 2: Dificuldade devido à ausência de materiais pedagógicos. 3: Falta de experiência profissional. 1: Diálogo com os pais dos alunos. Mecanismos utilizados para tentar superar as dificuldades 2: Aquisição do próprio material pedagógico. 3: Busca de ajuda junto aos seus pares. 1: Apoio institucional por parte dos gestores escolares. Apoio recebido 2: Apoio ao desenvolvimento do processo de ensino e de aprendizagem. 3: Apoio relacionado à formação. Fonte: Entrevista utilizada na pesquisa (2011). 235 Ao observarmos os resultados obtidos, percebemos que algumas professoras conhecem os critérios adotados para atuar na área de alfabetização; todas receberam algum tipo de acolhimento, parte das professoras recebeu alguma preparação no início da profissão docente e todas receberam algum tipo de orientação. Parte das professoras recebeu acompanhamento apenas no início da profissão enquanto outras afirmam ter sido acompanhadas durante o processo de ensino. Parte das professoras acredita que a formação inicial foi insuficiente e somente com a prática foi possível construir os saberes necessários ao desenvolvimento da prática alfabetizadora.Todas tiveram o desempenho avaliado de alguma forma .Todas as professoras afirmam ter encontrado dificuldades para desenvolver a prática.Todas relatam ter utilizado algum mecanismo para tentar superar as dificuldades encontradas e todas afirmam ter recebido algum tipo de apoio. Considerando que esse momento requer uma atenção especial,entendemos que esses mecanismos adotados se caracterizam como ações pontuais e estanques e não como um programa sistemático de apoio voltado às necessidades dos professores iniciantes. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS O caráter pontual e estanque das ações desenvolvidas junto aos professores principiantes denotam que não há uma política efetiva que vise subsidiar as ações dos professores nos anos iniciais de sua profissão, o que corrobora a importância desse estudo que tem como finalidade apresentar indicadores para uma política de supervisão e apoio ao trabalho do professor alfabetizador durante os primeiros anos de sua atividade profissional. REFERÊNCIAS BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Rio de Janeiro, Edições 70, 1977. BOGDAN, Robert e BIKLEN, Sari.Investigação Qualitativa em Educação: uma Introdução à Teoria e aos Métodos. Porto: Porto Editora, 1994. CONTRERAS, José. A Autonomia de Professores. São Paulo: Cortez, 2002. DUBAR, Claude. A Socialização. Porto Editora, 2ª edição, 1997. 236 ESTEVE, José M. Mudanças Sociais e Função Docente. In: NÓVOA, António. (Org.). Profissão Professor. Porto-Portugal, Editora Porto, 1999. PACHECO, José Augusto; FLORES, Maria Assunção.Formação e Avaliação de Professores. Porto Editora, 1ª edição, 1999. 237 O FANTÁSTICO: INTERSECÇÕES CRÍTICAS RELAÇÕES ENTRE EDIFICAÇÕES FANTÁSTICAS E MODO NARRATIVO NA OBRA DE JORGE LUIS BORGES Luis Antonio Mopi Lafuente Heloisa Helena Correia Siqueira RESUMO Este trabalho teve como meta analisar a construção fantástica presente num conto de Jorge Luis Borges, "La Biblioteca de Babel", para assim tentar desvendar o modo como tal edificação fantástica se conjuga com o modo narrativo. Ao longo da pesquisa, se tentou verificar os principais pressupostos que fazem da Biblioteca de Babel uma metáfora mestra da Humanidade, analisando os diversos elementos da narrativa e comparando-os com o espaço fantástico em questão. Também se fez uma interpretação no sentido de relacionar a estrutura física da Biblioteca de Babel com a simbologia da Cabala, já que se detectaram rastros que apontavam para tal correlação. Palavras-chave: Análise literária. Gênero fantástico. Espaço fantastico. Jorge L. Borges. ABSTRACT This work had in its intention to analyse the fantastic construction presents in a Jorge Luis Borges' short story, "La Biblioteca de Babel", in order to try to uncover the manner how this fantastic construction coordinates whit the narrative manner. Along of the research I tried to verify the fundamental principles that stablishs this short story a master metaphor of the Humanity, analysing the differents elements of the narrative and compare them whit the fantastic space at issue. I also did a interpretation connecting the Biblioteca de Babel`s physical structure whit the Kabala`s symbology, since I detected marks that indicated for this connexion. Words-key: Literary analyse. Fantastic genre. Fantastic space. Jorge L. Borges. INTRODUÇÃO A obra literária de Jorge Luis Borges se caracteriza pelo seu constante questionamento do conhecimento Humano, em especial no que se refere à maneira como o ser humano vem construindo suas certezas epistemológicas; daí que ele seja conhecido como um grande cético. Por outro lado ele também é reconhecido por ser o grande artífice de espaços fantásticos memoráveis, nos quais, além de indagar sobre a veracidade do conhecimento científico 238 construído ao longo de séculos e sacrifícios, inscreve as suas próprias interpretações sobre os mais antigos problemas filosóficos que sempre estiveram presentes na cogitação do ser humano. É por demais conhecida a sua declaração de que as diversas doutrinas filosóficas e religiosas são um excelente material para tramar narrativas fantásticas, e a partir dessa visão esteticista Jorge Luis Borges soube apropriar-se do farto material presente nessas atividades para transportá-lo ao mundo ficcional, construindo uma obra rica em significados e metáforas. A Biblioteca de Babel é um exemplo de tudo o anterior. Esta narrativa é uma metáfora mestra sobre o modo como o homem vem fundamentando o seu conhecimento de tudo o que o rodeia, transformando o conto numa espécie de crônica que relata as diversas atitudes do homem diante das descobertas feitas por ele. Além do mais, o transfundo simbólico deste texto é notável, já que na estrutura física da Biblioteca de Babel e nos livros que ela resguarda pode-se notar a influência do pensamento cabalístico, fazendo jus ao método borgeano de tomar doutrinas filosófico-religiosas e transferi-las ao mundo da ficção. OBJETIVOS Mediante o estudo dos diferentes elementos da narrativa, se tentou evidenciar o modo como a edificação fantástica da Biblioteca de Babel se relaciona com o modo narrativo, e a maneira como dita construção incide nas ideias filosóficas nele enunciadas. Numa segunda etapa do trabalho, seguiu-se o rastro de certas evidências que indicavam a influência da Cabala na construção da Biblioteca de Babel, expondo as metáforas nele inseridas pelo narrador implícito. METODOLOGIA O método utilizado nesta pesquisa foi simples: analisou-se por separado os diferentes elementos narrativos, personagens, narrador, tempo, enredo e espaço, para depois verificar como a construção fantástica exerce a sua influência em cada um deles, para posteriormente fazer uma interpretação do que poderia significar a metáfora do Universo como Biblioteca. Com os resultados parciais em mãos, junto com as questões não resolvidas, se fez o prosseguimento da pesquisa no sentido de relacionar a doutrina da Cabala incluída na estrutura da Biblioteca de Babel, expondo os possíveis significados que tal inclusão poderia trazer à interpretação. 239 RESULTADOS Se a Biblioteca de Babel é uma metáfora do universo, o Bibliotecário simboliza o homem desde um posto de vista universal. A análise das personagens corrobora esta afirmação: os fatos nos quais estão envolvidos, e que têm todos como ponto de partida a interpretação dos livros, parece ser a narração da História Universal da Humanidade ocidental, tal qual a conhecemos por intermédio das ciências da História e Antropologia. Por outro lado, a Biblioteca de Babel formula, a partir da sua estrutura, oposições que sempre preocuparam os humanos (ao igual que aos bibliotecários): Divino-Humano, Universal-Concreto, Perfeição-Imperfeição, Eterno-Temporal, Cognoscibilidade- Incognoscibilidade do que existe. Tais binômios contraditórios podem ser representados na simbologia cabalística incluída no interior da estrutura hexagonal da Biblioteca de Babel. De fato, o hexágono estrelado representa o seis, e este número simboliza, entre outras coisas, a oposição entre a criatura e o criador (CHEVALIER, GHEERBRANT, 1989, p 809). É a mesma oposição apontado pelo narrador do conto, quando faz a apologia da Biblioteca de Babel (ou do Universo) contra o Homem: "El hombre, el imperfecto bibliotecario, puede ser obra del azar o de los demiurgos malévolos; el universo [...] sólo puede ser obra de um dios" (BORGES, 2004, pp 88-89). Estes binômios opostos também se manifestam no interior do Biliobtecário/Homem, já que "A estrela de seis braços é também o macrocosmo, ou o homem universal, sendo a de cinco braços o microcosmo ou o homem comum" (CHEVALIER, GHEERBRANT, 1989, p 810). Isto poderia ser aplicado de forma bidirecional à estrutura hexagonal da Biblioteca de Babel, ou seja, se ela é uma metáfora do universo é também o macrocosmo (ou o homem universal). Esta interpretação poderia explicar a presença da latrina e do cubículo para dormir de pé na interconexão dos hexágonos: se de fato o Universo (ou a Biblioteca) é a obra de "um deus", e por isso é perfeita e eterna e imóvel, tais atributos não deixam de acolher a imperfeição e temporalidade do Homem, obra do "azar ou dos demiurgos malévolos". CONSIDERAÇÕES FINAIS Ficam muitos pontos por estudar neste conto. Creio vislumbrar que as possibilidades se abrem num leque amplo e profundo, possibilidades que só podem ser reais se se toma em 240 conta a simbologia cabalística. Como exemplo, me limito a mencionar a enumeração meticulosa dos estantes de livros: por cada hexágono temos cinco prateleiras, para cada prateleira temos trinta e dois livros, para cada livro temos quatrocentas e dez páginas, para cada página temos quarenta linhas, e por ai vai... É também interessante notar que entre os vinte e cinco símbolos que compõem os livros não se encontra um só número. Por que os algarismos foram "banidos" dessa Biblioteca que tem tantas coisas em comum com a Cabala, doutrina na qual os números são de vital importância? Por outro lado, a análise deste conto demonstrou que existem nele coisas escondidas ao comum dos leitores. Para "saboreá-lo" plenamente é necessário possuir uma cultura ampla, verdadeira erudição que exige anos e anos de leitura e estudo das mais diversas disciplinas: filosofia, história das religiões e seitas, filosofia da linguagem, linguística, matemática etc. Daí a pobreza desta interpretação do conto, pois eu me encontro longe de possuir tantos conhecimentos que me permitam velejar com liberdade nesse verdadeiro "Universo" feito de palavras. Qual o impacto desta imposição no leitor implícito? Como se vê, as dúvidas não diminuíram com o estudo deste conto: na verdade, elas aumentaram, tornando ainda mais instigante e desafiador a leitura de qualquer conto de Jorge Luis Borges, grande "fazedor" de metáforas epistemológicas. REFERÊNCIAS ALAZRAKI, Jaime (org.) Jorge Luis Borges. Madrid: Taurus, 1987. BORGES, Jorge L. Ficciones. Madrid: Alianza Editorial, 2004. BORGES, Jorge L. Obras completas. São Paulo: Emecé Editores, 1993. Volúmenes I y II. CHEVALIER, Jean. GHEERBRANT, Alain. Dicionário de símbolos. Rio de Janeiro: José Olympio, 1989. FURTADO, Filipe. A construção do fantástico na narrativa. Lisboa: Livros Horizonte, 1980. GRAU, Cristina. Borges y la arquitectura. Madrid: Cátedra, 1989. MANGUEL, Alberto. GUADALUPI, Gianni. Dicionário de lugares imaginários. São Paulo: Companhia das Letras, 2003. Os pré-socráticos: fragmentos, doxografia e comentários. São Paulo: Abril Cultural, 1978. Seleção de textos e supervisão: Prof. José Cavalcante de Souza. 241 REALE, Giovanni. História da Filosofia Antiga Vol. I. São Paulo: Edições Loyola, 1994. (Tradução: Henrique Cláudio de Lima Vaz, Marcelo Perine). SOSNOWSKI, Saúl. Borges e a Cabala. São Paulo: Editora Pespectiva S.A., 1991. TODOROV, Tzvetan. Introdução à literatura fantástica. São Paulo: Perspectiva, 2007. AGRADECIMENTOS Ao CNPQ; ao PIBIC; a UNIR; à professora Heloisa Helena e aos livros que li durante toda a minha vida. CONTATOS Orientando: Luis Antonio Mopi Lafuente Email: [email protected] Orientadora: Profa. Dra. Heloisa Helena Correia Siqueira Email: [email protected] 242 INFLUÊNCIA DOS FATORES EXTRALINGUÍSTICOS NO DIALETO DE VILHENA Maiara Arruda da Silva50 [email protected] Maria do Socorro Pessoa51 [email protected] RESUMO Este trabalho apresenta os resultados finais do Sub-Projeto intitulado: “Influência dos Fatores Extralinguísticos no Dialeto de Vilhena”. A pesquisa teve por objetivo investigar a possível influência dos fatores extralingüísticos na formação do Dialeto Vilhenense. Ainda, verificar como os Professores de Língua Por5tuguesa lidam com a Diversidade Linguístico-Cultural existente em sala de aula, e, deste modo, contribuir com a identificação dos falares Amazônicos / Amazônidas. Palavras-chave: Fatores Extralinguísticos. Dialeto Vilhenense. Diversidade LinguísticoCultural. 1 INTRODUÇÃO Este texto apresenta os resultados finais obtidos por meio do plano de trabalho desenvolvido no período de Agosto de 2011 a Julho de 2012, com Bolsa PIBIC/UNIR/CNPq, sob a orientação da Profa. Dra. Maria do Socorro Pessoa. Durante este período, nos dedicamos à preparação dos instrumentos de coleta de dados e à aplicação dos mesmos em pesquisa de campo para: alunos migrantes e imigrantes, alunos nativos de Vilhena e para professores de Língua Portuguesa da Rede Pública de Ensino. Portanto, o corpus da pesquisa foi constituído por uma amostragem total de 50 (cinquenta) pessoas, sendo que: a amostragem que corresponde aos alunos migrantes e imigrantes é constituída por 20 (vinte) pessoas, das quais, 10 (dez) alunos cursam o Ensino Fundamental, e os outros 10 (dez) alunos cursam o Ensino Médio; Já, a amostragem que corresponde aos alunos nativos é constituída por 20 (vinte) pessoas que cursam o Ensino Médio. Para completar o corpus da nossa pesquisa temos 50 Acadêmica do Curso de Letras, 4º período, da Universidade Federal de Rondônia, Campus de Vilhena, Bolsista PIBIC/UNIR/CNPq 2011-2012. 51 Professora Adjunta da Universidade Federal de Rondônia, Campus de Vilhena, lotada no Departamento Acadêmico de Estudos Linguísticos e Literários. Av. Major Amarante n. 4085, Prédio do Boticário, apto. 01, Centro, Vilhena/RO, CEP. 76.980-000. 243 uma amostragem aleatória que corresponde aos professores de Língua Portuguesa da Rede Pública de Ensino, constituída por 10 (dez) pessoas. O principal objetivo desta pesquisa foi identificar quais são os Fatores Extralingüísticos que influenciam a fala do Vilhenense, contribuindo para uma possível formação do Dialeto da região de Vilhena. Com os dados obtidos, por meio da aplicação dos questionários direcionados ao corpus da pesquisa, espera-se que as aulas de Língua Portuguesa sejam auxiliares para a valorização da Diversidade Linguística e Cultural, e ainda, sejam auxiliares na identificação dos Fatores Extralinguísticos que influenciam os Dialetos da Língua Portuguesa. 2 VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: FORMAÇÃO DOS DIALETOS SOCIAIS A língua é um patrimônio social, que está sempre em processo de mudança, ao longo do tempo, como cita Bagno (2007:36): “a língua é um processo, um fazer-se permanente e nunca concluído”. A língua é uma atividade social, e, assim como a sociedade, no decorrer de qualquer época, será diversificada e estará sujeita a conflitos e transformações. Vivemos em uma sociedade heterogênea. É comum encontrarmos, no cotidiano, pessoas de diferentes faixas etárias, origens, classes sociais, de todos os graus de escolaridade, com diferentes profissões, e, também, com diferentes modos de falar. Biderman (2001) afirma esta heterogeneidade Lingüística e Social: Sendo a língua um patrimônio social, preexistente aos indivíduos, classifica-se como uma realidade heterogênea, sujeita aos outros fatores que compõem a herança social, como a cultura e a estrutura da sociedade, por exemplo. Assim sendo, a língua se situa num eixo temporal que evolui e se altera através dos séculos, sofrendo continuamente a injunção de variadíssimos fatores extralingüísticos. (BIDERMAN, 2001, p. 13) Na citação acima, Biderman (2001) fala sobre o fenômeno da Variação Lingüística, atribuindo a causa aos Fatores Extralinguísticos, ou seja, fatores externos ao sujeito, que influenciam o seu modo de falar. Portanto, os Fatores Extralingüísticos exercem grande influência no comportamento lingüístico do individuo, proporcionando-lhe marcas lingüísticas específicas que são manifestadas pelo Dialeto de uso. Segundo Bagno (2007), os principais Fatores Extralingüísticos que exercem influência no modo de falar do indivíduo são: a Origem Geográfica, o Status Socioeconômico, o Grau de Escolarização, a Idade, o Sexo, o Mercado de Trabalho e as Redes Sociais. Portanto, estes são os principais fatores, externos ao sujeito, que podem influenciar a fala, proporcionando-lhe 244 uma identidade, por meio de marcas lingüísticas próprias, que são conhecidas ou rotuladas como dialetos com várias classificações: de estilo, sociais, geográficos, históricos, entre outros. 3 METODOLOGIA Neste trabalho concretizamos uma pesquisa qualitativa, do tipo pesquisa-ação para envolver o “corpus” da pesquisa com as teorias que tratam da Sociolinguística Aplicada ao Ensino de Língua Portuguesa. Nosso método de trabalho seguiu rigorosamente o Cronograma citado no nosso Plano de trabalho, a saber: a) No mês de Agosto/2011, participamos do evento denominado 22º FALE - Fórum Acadêmico de Letras, em Vilhena/RO; b) No mês de Setembro/2011, participamos do evento denominado IV SED Seminário de Educação, em Vilhena/RO; c) Nos meses de Agosto e Setembro/2011, concluímos a preparação dos instrumentos de coleta de dados; d) A pesquisa de campo teve a duração de três meses, sendo realizada no período de Outubro à Dezembro/2011. A aplicação dos questionários foi direcionada para: alunos Migrantes e Imigrantes, alunos Nativos de Vilhena, e professores de Língua Portuguesa. e) No período de Janeiro à Março/2011, iniciamos a compilação e análise dos dados coletados, enquanto, simultaneamente, elaboramos o Relatório Parcial correspondente ao período de Agosto/2011 a Março/2012. A metodologia utilizada, de pesquisa de Campo com aplicação de questionários, teve como meta identificar, do modo mais imparcial possível, que fatores extra-linguísticos estão presentes, influenciando a construção desse Dialeto, no Cone Sul de Rondônia, como é o caso de Vilhena. As Teorias Sociolinguísticas que serviram de base para os resultados finais são aquelas que estudam a Língua, a Cultura e a Sociedade. 4 RESULTADOS Para entender o fenômeno lingüístico que acontece em Vilhena, foram controladas as Variáveis Lingüísticas de natureza Extralingüística, que podem ser consideradas como “Variáveis Linguísticas” por se tratarem de fatores como: Idade, Sexo, Origem, Redes Sociais, Status Sócio-econômico, Grau de Escolaridade e, também, o que é inerente à Língua, 245 como o seu léxico, aqui denominado “Vocabulário”. Após essas considerações iniciou-se a descrição lingüística das variáveis e as ocorrências delas, por meio da análise dos dados coletados pelos questionários que foram direcionados aos alunos nativos de Vilhena, aos alunos migrantes e imigrantes, e aos professores de Língua Portuguesa de Escolas Públicas de Vilhena. Os dados coletados juntol ao corpus da pesquisa, permitem-nos afirmar que os informantes não percebem, ainda, a presença de marcas lingüísticas capazes de já identificarem um falar que possa ser chamado de “Falar Vilhenense”. Porém, estes informantes mostraram, por meio das respostas dadas, que possuem consciência de que os contatos com distintas origens, culturas e linguagens podem ter grande influência na formação do “Falar Vilhenense”. Os alunos nativos de Vilhena afirmaram que algumas expressões utilizadas por pessoas que vieram de outros lugares, foram incorporadas em sua fala, ou seja, temos a confirmação de que o contato com distintas origens influenciam o modo de falar. Portanto, podemos verificar a forte influencia do Fator Extralingüístico “Origem Geográfica”, na fala do Vilhenense. Os mesmos alunos informaram cinco expressões que adquiriram por meio do contato com pessoas que possuíam uma origem diferente da sua e, com estes dados, fizemos um estudo, com intuito de saber de que origens vieram estas expressões e qual era o seu significado. Após este estudo, foi possível verificar que a maioria das expressões incorporadas pelos Vilhenenses é de origem: Nordestina, Gaúcha, Mineira e Paranaense. Em seguida, os informantes responderam quais eram as origens com as quais mantinham contato no cotidiano. Com estes dados observamos que a maioria dos Vilhenenses possui contato com pessoas de origem “Nordestina”, o segundo contato de maior predominância no dia-a-dia destes nativos vilhenenses é a origem “Gaúcha”; o terceiro contato de maior predominância é a origem “Mineira”. Os Vilhenenses afirmaram que pessoas com idades distintas, consequentemente, possuem um modo de falar também diferenciado, pois, terão uma fala adequada à sua faixa etária. Outro fator apontado por estes informantes como causa dos diferentes falares é o ambiente em que a pessoa convive, pois, diferentes ambientes pedem também, uma atitude linguística diferenciada, adequada ao ambiente em que estamos. Sendo assim, estes dados nos levam a evidenciar dois Fatores Extralingüísticos presentes nos diferentes modos de falar, que são: “Faixa Etária” e “Redes Sociais”. Os informantes afirmaram que pessoas que possuem rendas distintas entre si, possuem também um modo de falar diferenciado, assim como, pessoas com diferentes graus de 246 escolaridade entre si, possuem, também, um comportamento linguístico diferenciado. Portanto, temos a confirmação de mais dois Fatores Extralinguísticos que influenciam o modo de falar: “Status Sócio-econômico” e “Escolaridade”. Os dados obtidos por meio dos questionários direcionados aos alunos migrantes e imigrantes do município de Vilhena serviram de confirmação para os resultados obtidos e citados anteriormente. Aplicamos-lhes um questionário que possui as mesmas questões que foram direcionadas aos alunos nativos, mas que possui, também, algumas outras questões diferenciadas, com o intuito de confirmar e entender este processo de formação do Dialeto Vilhenense. Os Alunos Migrantes e Imigrantes afirmaram a existência da Diversidade Linguística no município de Vilhena e, ainda, apontaram o “Vocabulário” como a principal diferença entre a sua fala e a do Vilhenense Nativo. Ou seja, estes informantes, que vieram de outras regiões do Brasil para Vilhena, são de locais/regiões que já possuem uma fala característica, com marcas lingüísticas específicas, enquanto que o Vilhenense ainda constrói uma linguagem que futuramente marcará o seu modo de falar. Portanto, este contato entre os Vilhenenses e pessoas de outras origens podem influenciar a fala dos nativos, pois, como já foi mencionado. Ocorreram algumas incorporações de expressões que são utilizadas por pessoas que possuem marcas lingüísticas próprias e características. Ou seja, temos então, a presença e influência do Fator Extralinguístico: “Origem Geográfica”. Os dados obtidos por meio dos questionários direcionados aos Professores de Língua Portuguesa nos mostraram que estes professores, em suas próprias palavras, possuem conhecimento sobre a Diversidade Linguístico-Cultural e que os principais meios de obtenção de informações sobre este assunto foram as ações de formação de professores, os livros, e os PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais). Os Professores afirmaram, ainda, que têm consciência da Diversidade Linguística e Cultural existente no município de Vilhena que se fazem presentes na sala de aula, portanto, procuram utilizar os conhecimentos que possuem a respeito deste assunto para estudos em suas aulas, por meio de debates e outras atividades que proporcionem a valorização das distintas culturas e linguagens. Porém, percebemos a dificuldade que estes professores tiveram em distinguir que fatores linguísticos causam maior diferença entre os alunos, apesar de terem afirmado, anteriormente, o seu conhecimento a respeito das diversidades lingüísticas e culturais dos seus aprendizes. A pesquisa de campo mostrou que os professores percebem as dificuldades linguísticas que os alunos migrantes e imigrantes possuem para se integrar no ambiente escolar e que, esta 247 dificuldade de integração escolar, na opinião dos Professores de Língua Portuguesa, são reflexos de “Choques Culturais” entre “as diferenças entre a fala dos Alunos Migrantes, Imigrante e dos Vilhenenses Nativos”. O gráfico a seguir torna visível a análise realizada: 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS SOBRE A ANÁLISE DA VARIAÇÃO LINGUISTICA EM VILHENA, OBTIDA POR MEIO DA APLICAÇÃO DE QUESTIONARIOS A ALUNOS NATIVOS, MIGRANTES E IMIGRANTES E, INCLUSIVE, PARA PROFESSORES DE LINGUA PORTUGUESA Além da busca pelos Fatores Extra-Linguísticos que influenciam o Dialeto de Vilhena, procuramos saber se há alguma marca lingüística já definida na fala do Vilhenense, indagando como os professores lidam com as diversidades lingüísticas e culturais em sala de aula, questionando sobre o que este professor sabe a respeito da variação linguística e da sua contribuição para as aulas de Língua Portuguesa. Para compreender o Fenômeno Linguístico que se encontra em processo de construção linguística do município de Vilhena, faz-se necessário nos atentarmos aos estudos da Teoria Sociolingüística, que estuda a relação entre a Língua, a Cultura e a Sociedade. Viver em sociedade é participar ativamente como membro da mesma, e, para que ocorra essa participação ativa, necessitamos de nos comunicar e nos expressarmos por meio da 248 linguagem. Além disso, é por meio da linguagem que manifestamos a nossa cultura, ou seja, é impossível pensar nas manifestações lingüísticas sem levar em consideração a sociedade que a utiliza, e, deste modo, constrói a sua identidade e manifesta a sua cultura. Nesse sentido, Alkmim (2001) afirma que: Linguagem e sociedade estão ligadas entre si de modo inquestionável. Mais do que isso, podemos afirmar que essa relação é a base da constituição do ser humano. A história da humanidade é a história de seres organizados em sociedade e detentores de um sistema de comunicação oral, ou seja, de uma língua. (ALKMIM, 2001, p. 21) A Sociolinguística investiga e correlaciona os aspectos linguísticos e sociais, com a finalidade de identificar o processo de mudança de uma Língua viva e heterogênea, que muda ao longo do tempo, juntamente, com a sociedade que a utiliza. A Sociolinguística é uma das subáreas da Linguística e estuda a língua em uso no seio das comunidades de fala, voltando a atenção para um tipo de investigação que correlaciona aspectos lingüísticos e sociais. Esta ciência se faz presente num espaço interdisciplinar, na fronteira entre língua e sociedade, focalizando precipuamente os empregos linguísticos concretos, em especial os de caráter heterogêneo. (MOLLICA, 2004, p. 9) A Língua é um patrimônio social. Sendo assim, para compreender os Fenômenos Linguísticos, é necessário estudar as variações lingüísticas em relação a determinadas variáveis sociais e, deste modo, descobrir como ocorre a formação dos diferentes falares. Segundo Mollica (2004), o fenômeno da variação linguística ocorre por meio da influência de fatores de natureza social; trata-se de fatores externos ao sujeito e que podem influir no modo de falar. Uma variável é concebida como dependente no sentido que o emprego das variantes não é aleatório, mas influenciado por grupos de fatores (ou variáveis independentes) (...) que podem exercer pressão sobre os usos (...). (MOLLICA & BRAGA, 2004, p. 11) Willian Labov, precursor dos estudos sociolingüísticos, afirma que a língua é heterogênea, e, que esta heterogeneidade é constituída por fatores sociais, que exercem mudanças lingüísticas. Labov relacionou os fatores extralingüísticos ao comportamento linguístico dos falantes. De acordo com Labov (1968, apud MONTEIRO, 2000, p.13): Os procedimentos da Linguística descritiva se baseiam no entendimento de que a língua é um conjunto estruturado de normas sociais. No passado, foi útil considerar que tais normas eram invariantes e compartilhadas por todos os membros da comunidade linguística. Todavia, as análises do contexto social em que a língua é utilizada vieram demonstrar que muitos elementos da estrutura linguística estão implicados na variação sistemática que reflete tanto a 249 mudança no tempo quanto os processos sociais extralingüísticos. (LABOV apud MONTEIRO, 2000, p.13). Bright (1963, apud MONTEIRO, 2000, p.28) afirma que as variações lingüísticas não são aleatórias, pois, estão condicionadas aos fatores sociais com os quais a diversidade linguística se relaciona. Ou seja, os fatores externos ao sujeito condicionam as diferentes maneiras de falar. De acordo com Pretti (1997:40), os Fatores Extralinguísticos que influi a fala do indivíduo são de três espécies: geográficas ou diatópicas; sócio-cultural ou diastráticas, influenciadas por fatores ligados ao falante como, por exemplo, a “idade”, o “sexo”, a “profissão”, a “posição social”, o “grau de escolaridade” e a “classe econômica”; e por fim, contextuais ou diafásicas, que se refere aos níveis de linguagem, por exemplo, a fala formal e a fala coloquial. Paredes da Silva (2003) afirma que: Ao estudar a língua em uso numa comunidade, defrontamo-nos com a realidade da variação. Os membros da comunidade são falantes homens e mulheres de idades diferentes, pertencentes a estratos socioeconômicos distintos, desenvolvendo atividades variadas, e é natural que essas diferenças, identificadas como sociais ou externas, atuem na forma de cada um expressar-se. (PAREDES DA SILVA, 2003, p.67) A Língua é parte da sociedade, a qual influencia e é influenciada. Trata-se de um processo contínuo, gerador do fenômeno da Variação Linguística. Por meio desta relação entre os fatores externos ao sujeito e os aspectos linguísticos, a linguagem dos indivíduos sofre mudanças, ao longo do tempo, proporcionando aos seus falantes marcas lingüísticas específicas, que passam a ser manifestadas por meio do Dialeto. Na pesquisa realizada, verificamos que a fala do Vilhenense é influenciada, entre outros, pelos seguintes Fatores Extralinguísticos: Origem, Idade, Redes Sociais, Status Socioeconômicos e Escolaridade. Estes Fatores, de natureza externa, foram apontados por Bagno (2007) como fatores que exercem influência nas diferentes maneiras de falar e, além disso, auxiliam na identificação dos fenômenos de Variação Lingüística. O Fator Extralinguístico “Origem Geográfica” influi na fala do Vilhenense, pois, a população do município de Vilhena é constituída por pessoas de diferentes origens, que vieram de outras regiões do Brasil. Estes migrantes e imigrantes trouxeram os seus costumes, a sua cultura e, também, as suas marcas linguísticas. O contato entre os Vilhenenses e pessoas que já possuem um dialeto característico, proporcionou como já foi mencionado, anteriormente, a incorporação pelos Vilhenenses de algumas palavras que são utilizadas por indivíduos de distintas origens. 250 A “Idade” é um Fator Extralinguístico que mantêm influência na maneira dos Vilhenenses falar, pois, em faixas etárias distintas temos, também, falas diferenciadas. Cada faixa etária pede uma atitude linguística adequada; por exemplo, entre dois ou três anos de idade, a criança vai aprender a falar o que os seus pais dizem; já, entre quatro a treze anos, começa a falar como as pessoas que tem a mesma idade e fazem parte do seu grupo de amigos. Portanto, a faixa etária influencia a fala, porém, ao analisar os dados obtidos por meio da pesquisa, verificamos que o fator “idade” não age isolado. Os dados coletados e analisados mostraram que estes alunos falam igual a outros jovens da mesma idade, entretanto, ao estar em um ambiente social mais formal, procuram adequar a sua fala às pessoas que se encontram nesse ambiente independente da idade que estes possuem. Langacker (1980) explica que em diferentes circunstâncias ou ambientes teremos uma fala diferenciada: (...) Cada falante tem não apenas seu sistema linguístico único, mas também diferentes estilos de fala que emprega em circunstâncias diversas. O estilo usado quando se é entrevistado para um emprego é consideravelmente diferente do usado numa conversa com os amigos, por exemplo. (LANGACKER, 1980, p.59) Ao analisar os dados obtidos, foi possível verificar que o Fator Extralinguístico que mantêm maior influência na fala do Vilhenense denomina-se “Redes Sociais”. Em diferentes ambientes, temos também uma atitude linguística diferenciada, adequada a esta circunstância, independente da idade, o grau de escolaridade ou do status socioeconômico das pessoas que estiverem neste lugar. O Fator Extralinguístico “Redes Sociais” possui uma relevância maior, pois, sua influência é predominante na fala. Rossi-Landi (1968 apud CALVET, 2002, p. 108) explica que a comunidade linguística é como “uma espécie de imenso mercado, no qual as palavras, as expressões e as mensagens circulam como mercadorias”. Portanto, cada ambiente nos oferece dentro desta comunidade linguística uma linguagem a ser adquirida por meio do contato entre o sujeito e a rede social. Bakhtin (2002:113) cita que: “a situação social mais imediata e o meio social mais amplo determinam completamente, por assim dizer, a partir do seu próprio interior, a estrutura da enunciação.” Ou seja, é o meio social que nos determina como devemos falar em diferentes circunstâncias. O “Status Socioeconômico” é um fator que, também, influi no modo de falar do Vilhenense. Pessoas de diferentes classes sociais, consequentemente, fazem uso de falas diferenciadas; isto se explica por não possuírem os mesmos acessos à educação, a cultura e, além disso, não freqüentarem os mesmos ambientes e, não fazer parte das mesmas comunidades lingüísticas. Segundo Bakhtin (2002), os sujeitos de classe sócio-econômica 251 média podem ser considerados como os maiores produtores de mudanças lingüísticas, assim como os primeiros a percebê-la, pois, geralmente, procuram se afastar da classe sócioeconômica que julgam ser inferior e buscam aproximar-se da classe sócio-econômica alta. Portanto, os distintos “Status Socioeconômico” se refletem nas falas dos indivíduos, marcando quem é este sujeito na sociedade. Votre (2004 apud MOLLICA & BRAGA, 2004, p. 51) afirma que pessoas de escalas socioeconômicas distintas apresentam um falar diferenciado: A primeira distinção focaliza o status econômico e o prestígio social dos usuários das formas da língua. As formas de expressão socialmente prestigiadas das pessoas consideradas superiores na escala socioeconômica opõem-se aos falares das pessoas que não desfrutam de prestígio social e econômico. (VOTRE, 2004, apud MOLLICA & BRAGA, 2004) Por fim, temos o último Fator Extralinguístico que influi no modo de falar do Vilhenense: a “Escolaridade”. Quando as pessoas falam é possível identificar se este sujeito teve oportunidade de estudar ou qual o seu grau de escolaridade, por exemplo. Portanto, as pessoas que possuem acesso à escola, consequentemente, possuem uma fala distinta de quem não teve a oportunidade de estudar, ou então, uma pessoa que já concluiu um Curso de Nível Superior, também, terá uma atitude linguística diferenciada de quem ainda não concluiu o Ensino Médio. Ou seja, os indivíduos que tem acesso à escola possuem um domínio maior na estrutura da enunciação, enquanto quem não usufrui dos mesmos acessos à escolaridade tende a não dominar essa linguagem mais elaborada. De acordo com Votre (2004 apud MOLLICA & BRAGA, 2004, p. 51): A observação do dia-a-dia confirma que a escola gera mudanças na fala e na escrita das pessoas que as freqüentam e das comunidades discursivas. Constata-se, por outro lado, que ela atua como preservadora de formas de prestígio, face a tendências de mudança em curso nessas comunidades. Veículo de familiarização com a literatura nacional, a escola incute gostos, normas, padrões estéticos e morais em face da conformidade de dizer e de escrever. Compreende-se, nesse contexto, a influência da variável nível de escolarização, ou escolaridade, como correlata aos mecanismos de promoção ou resistência à mudança. Os dados analisados nos permitem afirmar quais são os Fatores Extralinguísticos que influem a fala do Vilhenense e, deste modo, contribuem para formação do Dialeto Vilhenense. Porém, é necessário refletir como os Professores de Língua Portuguesa lidam com esta Diversidade Linguística e Cultural em sala de aula. Será que temos uma conscientização e valorização das distintas culturas e linguagens no ambiente escolar? 252 Segundo Bagno (2002:39) é preciso promover a valorização da Diversidade Linguístico-Cultural, pois, a língua é o reflexo da sociedade. Portanto, se vivemos em uma sociedade estratificada e desigual, é natural que os fenômenos linguísticos manifestem, por meio da linguagem, a Diversidade Sócio-Cultural e econômica de seus falantes. Faraco (1991:13) cita que “a língua é uma realidade heterogênea, multifacetada e que as mudanças emergem dessa heterogeneidade.” Os Professores de Língua Portuguesa entrevistados têm consciência da Diversidade Linguística e Cultural presente na sala de aula, porém, não sabem como lidar com esta situação. Segundo Luft (1985:108), é natural que os professores possuam dificuldades quanto ao ensino da Língua, pois, trata-se de “um terreno de areias movediças, ainda em expansão, como é o das teorias sobre a linguagem”. Ou seja, temos uma língua viva e heterogênea em processo contínuo de mudanças, pois, assim como a sociedade muda ao longo do tempo, a linguagem, consequentemente, acompanha esse processo de transformação. Portanto, se o Professor não consegue lidar com esta diversidade em sala de aula, é porque ele não possui conhecimento suficiente sobre as teorias aplicáveis ao ensino da língua. Luft (1985:108) afirma que é necessário que o professor encare esta realidade e traga-a para a sala de aula. Segundo Cagliari (2002) para o professor saber o que é ensinar a Língua Portuguesa, é necessário, conhecer o seu grupo de alunos, falantes desta língua rica e heterogênea. Este conhecer “o grupo de alunos” como falantes da Língua Portuguesa é reconhecer as Variações “Geográficas”, “Sociais” e “Estilísticas”. Cagliari (2002:47) afirma que a escola deveria conhecer os falares regionais do Brasil “para poder entender a realidade linguística de uma classe, da qual fazem parte alunos procedentes de várias regiões do país.” O Ensino da Língua Portuguesa ainda não desenvolve práticas que auxiliem na valorização da Diversidade Linguístico-Cultural, pois, os alunos não têm consciência de que sua linguagem é o reflexo da sociedade em que vivemos. (...) Portanto, a escola tem que fazer o ensino de português uma forma de o aluno compreender melhor a sociedade em que vivemos, o que ela espera de cada um lingüisticamente e o que podemos fazer usando essa ou aquela variedade do Português. (CAGLIARI, 2002, p. 48) Cagliari (2002) mostra-nos que o Ensino de Língua Portuguesa é muito problemático pelo que se ensina e, também, torna-se falho porque deixa de ensinar muita coisa em relação às Variações Lingüísticas. Este é um assunto que os Professores de Língua Portuguesa 253 deveriam discutir em sala de aula, mostrando assim, o porquê dos diferentes modos de falar e qual a sua relação com a sociedade. Observamos, portanto, que os Professores que lecionam a disciplina de Língua Portuguesa não discute sobre a heterogeneidade linguística em suas aulas, porque não possuem conhecimento a respeito deste assunto. Se os professores não ensinam é porque não sabem, portanto, é nesse sentido que vemos a relevância de um curso de Formação de Professores que se comprometa com as questões relacionadas à Diversidade Linguística e Cultural, contribuindo, assim, para a identificação dos Falares Amazônicos. REFERÊNCIAS ALKIMIM, Tânia Maria. Sociolingüística. Parte I. In: Mussalin, F. e Bentes, A. C. (orgs.), Introdução à Lingüística: Domínios e fronteiras. São Paulo: Cortez, 2001. AMARAL, Nair Ferreira Gurgel do; PESSOA, Maria do Socorro, AZEVEDO, Tânia Suely Azevedo (Org.). Educação, cultura e linguagem. 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São Paulo: Edusp, 1997. 255 UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA COORDENAÇÃO DE PESQUISA PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA DEPARTAMENTO DE LÍNGUAS VERNÁCULAS GRUPO DE PESQUISA FILOLOGIA E MODERNIDADES RESUMO EXPANDIDO PROJETO: ONOMÁSTICA RONDONIANA A APLICAÇÃO SUBPROJETO: CONCRETA DE NORMAS SOBRE NOMES DE LUGARES EM PORTO VELHO LINHA DE PESQUISA: Interculturalidade e Análise Crítica do Discurso ORIENTADORA: Dra. Maria do Socorro Beltrão Macieira PESQUISADOR: Marcus Vinicius da Rocha Gouveia Cardoso LOCAL DE EXECUÇÃO: Universidade Federal de Rondônia Campus de Porto Velho. RESUMO O Projeto teve como objetivo geral recolher normas que tratem de fixação de antropônimos e topônimos no Brasil, verificando a sua pertinácia na aplicação a pessoas e lugares concretos na Amazônia, no propósito de estabelecer parâmetros de redignificação social. Especificamente, procurou identificar a realidade normativa, cultural, antroponímica e toponímica, da região amazônica, a partir de Porto Velho e de Rondônia, buscando apoio ao reconhecimento de parcelas socioculturais diferenciadas (indígenas, quilombolas, ribeirinhos) para o emprego de denominações antroponímicas e toponímicas próprias; fundamentalmente efetuando uma pesquisa de legislação, sistematizando os dados recolhidos. 1 INTRODUÇÃO: Da realidade das normas levantadas e da realidade encontrada nas ruas surge um diferencial que leva a uma paulatina discriminação social de componentes brasílicos discriminados em razão do nome. Verifica-se uma resultante inicial imediata: identificamos 256 parcelas de realidade ligada à Onomasiologia. Preparou-se o espaço da discussão no propósito de municiar políticas públicas responsáveis por ampliar a dignificação das pessoas que vivenciam a experiência de sobreviver ou como comunidades diferenciadas (indígenas, não indígenas e com os indígenas) ou como comunidades envolvidas no viver comum. Especialmente em áreas da periferia de Porto Velho, pode-se avaliar quais são os nomes existentes em uso, e assim dispor de elementos para uma análise mais ampla, compreendendo o processo de utilização de nomes forâneos, quando estes elementos “sobem” a uma naturalização fora do espaço rural ou ribeirinho. Pode-se, por meio deste Trabalho, empreender uma pesquisa-ação detectando o uso concreto das normas de uso de nomes, as suas contextualizações significativas na sociedade, evidenciando assim configurar elementos para o seu emprego em políticas públicas de inclusão social. Este Projeto, como os seus congêneres e antecedentes, desvendam de algum modo a realidade do entrechoque de parcelas humanas. Os seus referenciais onomásticos são um vetor decisivo para este mapeamento. Assim, pode-se detectar a melhor maneira de encaminhar respostas às carências de populações alijadas do reconhecimento da normalidade dos seus referenciais, seja dos nomes próprios que empregam (ou deixam de empregar, em função de preconceitos dirigidos), seja de outras denominações que lhes sejam cotidianas. 2 MATERIAIS E MÉTODOS Os dados foram recolhidos por pesquisa em meio eletrônico, submetidos a sistematização e análise detida. A análise dos dados estará fundada nos estudos da Onomástica, segundo teóricos estudados previamente, inclusive doutrinadores da área (Walter Ceneviva). A recolha exemplar final dos antropônimos e topônimos levará em conta a contextualização ao local e a deriva cultural. A Onomástica é ciência responsável por estudar referenciais fundamentais ao sistema comunicativo, com condições de fixar ou retratar, de modo direto, os elementos indiciais prioritários da comunidade que analisa, devido à sua característica intrínseca de valorizar dados da indexação social. O estudo dos nomes próprios de lugares fornece uma larga fonte de pesquisa na área da linguística, da cultura e da lexicologia, indiciando com isso a origem de pessoas e de coletividades. Como ramo de pesquisa, a Onomástica ainda é pouco explorada no espaço das escolas. Ciência encarregada de verificar, através de topônimos e antropônimos, quais os termos 257 empregados para nomear pessoas e lugares. Até porque é espaço cultural naturalizado (não se admite a existência de seres inominados), ao longo do tempo as comunidades procuram se integrar à sociedade envolvente adotando as denominações mais correntes do seu entorno cultural. 3 RESULTADOS A Onomástica é ciência responsável por estudar referenciais fundamentais ao sistema comunicativo, com condições de fixar ou retratar, de modo direto, os elementos indiciais prioritários da comunidade que analisa, devido à sua característica intrínseca de valorizar dados da indexação social. O estudo dos nomes próprios de lugares fornece uma larga fonte de pesquisa na área da linguística, da cultura e da lexicologia, indiciando com isso a origem de pessoas e de coletividades. Segundo Oliveira e Isquerdo (2001), “o léxico de uma língua conserva estreita relação com a história cultural da comunidade”, seguindo os fatores relevantes que influenciam na denominação de toponímica e antroponímica, gerando uma relação entre a pessoa ou lugar com os nomes atribuídos, representando a cultura que o nomeou. 4 CONCLUSÃO Descobriram-se antropônimos e topônimos havidos em cartórios da cidade, localizando vestígios onomásticos indígenas, ribeirinhos, quilombolas e outros, foram localizadas algumas problemáticas de conhecimento e de reconhecimento de nomes próprios de pessoa e de lugar, por isso resolvemos concentrar os nossos esforços em busca de viabilizar uma informação mais acabada de dados técnicos para que as comunidades possam vir a se situar culturalmente. Para a aplicação concreta de normas sobre nomes de lugares em Porto Velho, as suas bases legais, as normas positivas fornecem dados que podem ser utilizados às políticas públicas referenciais capacitados se servem de uma Lei (de Registros Públicos) e do Código civil. Diversos foram os debates, seja sobre a readaptação do projeto, sobre os impactos que o nome possa dignificar e dar posses e direitos a uma pessoa, sobre a problemática indígena: nomes e posse de terras, entre outras que trataram do aprofundamento desses temas principais. 258 Houve troca de informações com discente veterano do sexto período de Informática, sobre noções avançadas de criação de website, para um próximo momento, além de repassar espaços de divulgação ao Projeto co-irmão Informatizando a Literatura de Rondônia. Com o DTI/UNIR buscamos informações sobre o espaço eletrônico onde virá a ser publicado o material dos Projetos. Através do constante levantamento bibliográfico realizado pelos pesquisadores do atual projeto, foi possível perceber que os resultados dessa pesquisa poderão contribuir consideravelmente para a humanidade. Ao analisar palavras, origens de nomes e lugares, estamos, na verdade, detectando a cultura destes povos, podendo, com certeza, resgatar muita coisa de um passado, que na maioria das vezes é esquecido. REFERÊNCIAS CARVALHO, Manuel. “Toponímia: gente & lugares: de Portucale a Portugal.” Disponível em: http://deaveiroeportugal.blogspot.com. Acesso em 28 de janeiro de 2009. CASSEB-GALVÃO, V. C. e RIBEIRO, R. R. Relações entre nome e lugar: uma análise da toponímia oficial de Piracanjuba. Disponível em. <http://www.nee.ueg.br/seer/index.php/ temporisacao/article/view/15/19=>. Acesso em: 10/09/2009. DICK, M. 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A relevância do trabalho em questão procura mostrar que teremos um conhecimento mais profundo sobre as línguas indígenas e das interferências gramaticais da L1 na escrita de L2 e poderão no futuro, contribuir com a formação dos professores formadores de professores indígenas no que se refere à compreensão das estruturas gramaticais reveladas na produção escrita de seus alunos; e isto poderá apontar para a produção de novas e mais adequadas técnicas diferenciadas de ensino da escrita de língua portuguesa para falantes de línguas indígenas. Palavras - chaves: Línguas Indígenas. Concordância de gênero e número. Interferências da L1 na escrita em L2. Formação de professores. ABSTRACT This article presents a study of the grammatical manifestations of L1 (mother tongue) in writing in L2 (Portuguese), referring specifically to gender and number agreement on texts written in Portuguese language (L2) for teachers in training indigenous ethnic Tupi-Kawahib. The relevance of the work in question seeks to show that we have a deeper understanding of indigenous languages and grammatical interference of L1 in L2 writing and may in future contribute to the training of indigenous teachers teacher educators with regard to understanding the grammatical structures revealed in the written production of students, and this may point to the production of new and more appropriate teaching techniques different from the writing of the Portuguese language to speakers of indigenous languages. Key-words: Indigenous Language. Reliability of gender and number. Interference of L1 in L2 writing. Teacher Training 52 Texto produzido a partir de resultados do projeto de pesquisa Manifestações da Concordância de Gênero e Número da L1 na escrita em L2 de professores indígenas em formação, desenvolvido pelo Grupo de Estudos em Culturas, Educação e Linguagens, Centro de Estudos da Linguagem, Departamento de Línguas Vernáculas/NED/UNIR, com o apoio do PIBIC/UNIR/CNPq. 53 Discente do 7º período do curso de Letras Português/Literaturas e bolsista do PIBIC/UNIR/CNPq. 54 Doutora em Linguística. Doutora em Educação Escolar. Departamento de Línguas Vernáculas. Orientadora da pesquisa. 261 INTRODUÇÃO Através das observações dos professores que ensinam a língua portuguesa nas aldeias indígenas, percebe-se que ocorreu um crescimento de falantes bilíngues, pois a necessidade do aprendizado da Língua Portuguesa - oral e escrita - é dada pelas relações majoritárias com a população não índia do Brasil. Nas aldeias indígenas, é predominante a tradição oral, sendo ínfimo ou até nenhum material escrito em língua materna. Na maioria das aldeias alfabetizase primeiro na língua materna e, posteriormente, introduze-se a língua portuguesa. Considerando este fato, surge a proposta de investigar as possíveis manifestações da Gramática da L1, no que se refere à concordância de gênero e número, em textos escritos em língua portuguesa (L2) por professores indígenas em formação - pertencentes a etnias Tupi-Kawahib. A pesquisa pretendia inicialmente trabalhar a partir de um projeto de formação de professores em nível superior na Universidade Federal de Rondônia, porém o curso recebeu apenas alunos não indígenas. Diante deste fato, houve necessidade de mudar a clientela alvo; assim, foram coletados dados adquiridos de estudantes indígenas do Ensino Médio Magistério Indígena, através do Projeto Açaí (Projeto de Formação de Professores Indígenas da Secretaria de Estado da Educação). As produções escritas dos estudantes em L2 (Língua Portuguesa) podem mostrar manifestações gramaticais da L1 e podem revelar sistemas que ocorrem internamente no processo de aquisição e aprendizagem. O conhecimento de tais sistemas e mecanismos poderá contribuir para uma melhor compreensão linguística na formação de professores indígenas e também de professores de Língua Portuguesa. BASE TEÓRICA As manifestações da gramática da L1 na escrita em L2 propõem várias discussões das interferências que ocorrem internamente nos sistemas dos falantes. No que se refere à concepção de gênero, os estudos de alguns teóricos remetem-nos aos conceitos etimológicos dessa repartição sexual e de como influenciará a aquisiçãoaprendizagem de uma L2. 262 É comum em diversas línguas como, por exemplo, nas línguas portuguesa, espanhola, francesa e italiana, utilizar-se os termos masculino e feminino para classificar a flexão do gênero. Ao utilizarmos um artigo que se encontre no gênero feminino, o substantivo também deve estar em tal classificação, através da concordância. Contudo, algumas línguas, embora sigam essa classificação binária, possuem também o gênero neutro. O alemão, o polonês e o árabe acrescentam o gênero neutro. Outras línguas baseiam a classificação do gênero em conceitos inteiramente diferentes, tais como animado-inanimado, ou de acordo com a forma e o tamanho. A arbitrariedade nas classificações de gênero, no que diz respeito aos referentes do “mundo real”, varia de língua para língua. A palavra “lua” pertence ao gênero feminino em espanhol e ao masculino em alemão. Em chinanteca55 “lua” é considerada como um ser animado, o que reflete a crença do povo de que ela foi anteriormente um animal que saiu de um ovo. (ELSON, 1973 e PICKETT, 1973) Nota-se, então, que a concepção de gênero é muito relativa e essas abordagens refletem em muitas línguas cujas palavras provêm dessa etimologia. Com os estudos de Elson e Pickett (1978) percebemos que, para entender a língua de um povo, deve-se conhecer sua cultura, crença ou mitologia. METODOLOGIA A pesquisa em questão investiga manifestações gramaticais da L1 na escrita em L2 (Língua Portuguesa) através de textos produzidos por professores indígenas em formação. O trabalho para a seleção e organização de dados se pautou em arquivos já dispostos no Grupo de Estudos em Culturas, Educação e linguagens - GECEL, com intuito de (re)aproveitar textos escritos por professores amondawa, tanto em língua portuguesa como em língua materna. O trabalho compreende a pesquisa bibliográfica (com leitura e estudo dos textos teóricos) e a pesquisa documental (nos arquivos do GECEL) quando desenvolveu-se o levantamento e análise de aspectos gramaticais, especificamente da concordância de gênero e número, segundo o seguinte roteiro de trabalho: i) Seleção de textos dos estudantes indígenas amondawa; ii) levantamento da manifestação morfológica e sintática; iii) identificação e descrição da relação da língua amondawa com a língua portuguesa; iv) análise das sentenças, 55 Língua indígena do México. 263 e posteriormente das manifestações da L1 (articulação entre os aspectos estruturais e o histórico-social) evidenciada nas sentenças coletadas, como resultado de uma pesquisa inicial. A perspectiva teórico-metodológica que fundamenta as reflexões e as análises da pesquisa articula conceitos da Linguística Estrutural; enfocamos, portanto, sintagmaticamente, manifestações gramaticais na (re)escrita da língua portuguesa realizada por estudantes da etnia Tupi-Kawahib. RESULTADOS A investigação ocorreu em duas etapas: a primeira foi com sintagmas extraídos dos arquivos do grupo de pesquisa - GECEL. Coletamos frases escritas em L1 (amondawa) para a escrita de L2 (língua portuguesa) e a segunda com textos dos alunos do ensino médio da etnia Tupi-Kawahib - projeto Açaí. Buscamos analisar as manifestações que ocorrem internamente na língua portuguesa e a influência da língua materna. A seguir apresentaremos trechos de um texto produzindo por um falante indígena: a) E Anta estava paciado pela mata e cabou encontrando jabuti comendo Inga e falou para eles tirarem Inga para ele tambem. Jabuti brincaram com Anta. b) Acabaram achando ele (Anta). c) E jaboti foram atrás da Anta. d) Jabuti não sabia o que fase com Anta perssaran ir perga fogo da onça. e) Ir perga fogo da onça/ aonça estava dormido/ undos jabuti fez baralho e aonça acordou. Nos trechos do texto “a historia do jabuti’, a discussão proposta é que o falante apresenta ocorrências que demonstram que ao mesmo tempo internalizou as regras da L2 e ao mesmo tempo foge do padrão normativo solicitado. Ou seja, no começo e no desenrolar do texto o falante omite diversas vezes o artigo que designa a concordância de gênero e número: E anta estava paciando/acabou encontrando jabuti. Embora não apresente os determinantes do gênero masculino para o substantivo ‘Jabuti’ e o substantivo “Anta”, percebemos, no texto, que o falante tem uma pequena noção quanto ao gênero, mas ainda está em processo de internalização. Em boa parte do texto fica bem marcado que o substantivo “Anta” é usado no masculino, pois na língua materna a palavra é neutra. No decorrer do texto, utiliza o adjetivo e nas outras vezes o pronome pessoal do caso reto ‘ele’ para determinar o gênero (masculino): falou para eles (os jabutis) tirarem Inga para ele (anta) também/ Anta ficou bravo/Acabaram achando ele (a anta). 264 No segundo momento do texto, depois da morte da anta, o indígena trabalha com um terceiro personagem, a onça (outro substantivo epiceno). Percebe-se que utiliza a concordância exata: ir perga fogo da onça/ aonça estava dormido/ undos jabuti fez baralho e aonça acordou. Porém num dado momento ele manifesta que a onça é macho, através do pronome pessoal ‘ele’: tinha que miti para onça para ele da fogo (Tinha que mentir para a onça, para ele dar o fogo). Este fato acontece porque para o falante TupiKawahib não há essa necessidade de se reportar ao sexo do animal; por ser uma palavra neutra em sua língua, o indígena irá optar por um dos pronomes pessoais ele/ela ou artigos, na língua portuguesa, por ter, provavelmente, dúvidas quanto ao sistema de concordância, e não por estar preocupado em diferenciar se o animal é macho ou fêmea. Em muitos casos ocorre também uma confusão na língua portuguesa, assim como afirmam Cipro Neto e Infante (1998): O uso das palavras masculino e feminino costuma provocar confusão entre a categoria gramatical de gênero e a característica biológica dos sexos. Para evitar essa confusão, observe que definimos gênero como um fato ligado à concordância das palavras em seu relacionamento linguístico: por exemplo, o pó é um substantivo masculino pela concordância que estabelece com o artigo o, e não porque se possa pensar num possível comportamento sexual das partículas de poeira. Só faz sentido relacionar o gênero ao sexo quando se trata de palavras que designam pessoas e animais, como, por exemplo, os pares professor/professora ou gato/gata. Ainda assim, essa relação não é obrigatória, pois há palavras que, mesmo pertencendo exclusivamente a um único gênero, podem indicar seres do sexo masculino ou feminino. E o caso de criança, palavra do gênero feminino que pode designar seres dos dois sexos. (CIPRO NETO & INFANTE, 1998 p. 203). De acordo com os estudos referentes à interferência da L1 sobre a L2, os “erros” cometidos por aprendizes de uma segunda língua ocorrem por duas maneiras: pela transferência dos padrões da língua materna ou pelo esforço para descobrir a estrutura da segunda língua. É exatamente como acontece no texto em análise. Pesquisas revelam que as línguas tupi-kawahib não possuem determinantes, explicando assim as ausências dos determinantes ou as oscilações dos artigos (a) e (o): “E Ø jaboti foram atrás da Anta”; no que concerne ao gênero, possuem três formas: masculino, feminino e neutro. Este último é utilizado somente para não humanos. Assim as manifestações da L1 ocorrem devido não necessitar de explicações quanto à concordância; de acordo com Hirt (1927) - o neutro é simplesmente uma reminiscência daquela época que ainda não havia distinção de gênero. CONSIDERAÇÕES FINAIS O projeto Manifestação da L1 (língua materna) na escrita da L2 (língua portuguesa), através do subprojeto: Manifestações da concordância de gênero e número da L1 (língua materna) na escrita da L2 (língua portuguesa) buscou mostrar possíveis manifestações 265 gramaticais da língua materna (L1) na escrita da língua portuguesa (L2) por professores indígenas em formação. Nesta pesquisa, buscamos enfatizar que existem muitos conceitos no que se refere ao gênero e que sua concepção é muito relativa. E em resultado, interferências da língua materna serão manifestadas na escrita de uma segunda língua, visto que os falantes tupi-kawahib, assim como os ingleses e alemães possuem um terceiro gênero, o neutro. Diante dos casos estudados, aprendemos, através de teóricos como Krashen, que a aquisição e a aprendizagem dependerão do ambiente onde se encontra o falante e é um critério individual que necessita de interação social para ser bem sucedido. Compreendemos, também, que o processo de aprendizado e aquisição de uma segunda língua não se desenvolve da mesma forma que a L1, pois este último é um processo mais natural. Reconhecemos, ainda, que a língua materna poderá manifestar influências da sua gramática original na aquisição/aprendizagem de uma segunda língua, pois tal gramática está internalizada e influencia no aprendizado de outros idiomas, podendo ser de forma positiva ou negativa. Através deste estudo, percebemos algumas importantes manifestações do falante tupi-kawahib na escrita em língua portuguesa: 1) A substituição do determinante (artigo) O (masculino) por A (feminino); 2) A supressão de determinantes em sintagmas nominais em português. 3) A utilização de dois determinantes quando o substantivo necessitar de marcadores que indiquem gênero e número. 4) O gênero está inteiramente ligado à concordância e não ao sexo; as manifestações acontecem porque na língua materna não há determinantes.. É possível supor que, na escrita em português (L2), o falante tupi-kawahib fez tais substituições e/ou supressões porque na sua língua (L1) não há determinantes, não há marcadores flexionais. Na aquisição oral de uma segunda língua, principalmente na escrita, fatalmente os estudantes demonstram sua Gramática 1; muitas vezes essas manifestações são consideradas ERROS, em vez de se tornarem objeto de estudo para uma reflexão maior. Percebemos que, com o aumento do nível de escolarização, os alunos do Projeto Açaí progrediram muito na gramática de L2 deixando isto bem visível nos textos, diminuindo assim as ocorrências de manifestações no que se refere à ausência de determinantes. O Referencial de Formação de Professores e o Referencial Curricular Nacional para Escolas Indígenas busca auxiliar os professores indígenas a melhor compreenderem esse universo que os permeia e assimilarem as estruturas e funcionamento da língua portuguesa escrita. 266 Assim, consideramos que este conhecimento seja muito relevante, não somente para o conhecimento de línguas indígenas, mas também para os professores formadores de professores indígenas, que buscam uma inserção no magistério intercultural. REFERÊNCIAS BORBA, Francisco da Silva. Introdução aos Estudos Linguísticos. Campinas, SP: Pontes, 14ª edição, 2005. DOBSON, R. Aspectos da língua kayabí. Série Linguística, 12. Brasília: Summer Institute of Linguistics, 1988. ELSON, B. F. e PICKETT V. B. Introdução à morfologia e à sintaxe. Petrópolis: Vozes, 1973. FIGUEIREDO, F. J. Q. Aquisição e Aprendizagem de Segunda Língua, 1995. JUNIOR, M. C. Princípios de Linguística Geral: Como Introdução aos Estudos Superiores da Língua Portuguesa. Padrão- Livraria Editora. Rio de Janeiro, 1989. NETO, Pasquale e INFANTE, Ulisses. Gramática da Língua Portuguesa. São Paulo: Editora Scipione, 1998. SAUSSURE, F. Curso de linguística geral. São Paulo: Cultrix, 2006. SAMPAIO, W. B. A. A referência remissiva número-pessoal nos prefixos verbais da língua Uru-eu-uau-uau, 2006. (Não-publicado) TAGMÊMICA. Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/Tagm%C3%AAmica>. Acesso em 20 de janeiro de 2011. ZUCARELLO, Maria Franca. Domínios e interferências da língua estrangeira sobre a língua materna. Cadernos da CNFL, Vol XIII, nº 4, 2010. 267 UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO, PESQUISA E EXTENSÃO COORDENAÇÃO DE PESQUISA PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA - PIBIC DEPARTAMENTO DE LÍNGUAS VERNÁCULAS GRUPO DE PESQUISA FILOLOGIA E MODERNIDADES RESUMO EXPANDIDO PROJETO: Informatizando a Literatura de Rondônia SUBPROJETO: “Disponibilização on line de textos de escritores de Rondônia” PESQUISADORA: Mariana Priscila Mendonça Lopes ORIENTADOR: Dr. Júlio César Barreto Rocha LOCAL DE EXECUÇÃO: Universidade Federal de Rondônia Campus de Porto Velho. RESUMO O Projeto teve como objetivo geral proceder à disponibilização on line de textos de escritores difundidos em Rondônia, após obter licença de difusão. Especificamente, pretende favorecer a caracterização dos textos, identificando gêneros, autores e obras; e afinal compreender qualidades estéticas como um princípio fundamental e potencializador do processo de literariedade sem desprezar a função social da Arte. 1 INTRODUÇÃO Em agosto de 2011, foram iniciadas as atividades referentes ao Subprojeto da Pesquisa Disponibilização on line de textos de escritores de Rondônia, sob a orientação do professor Dr. Júlio César Barreto Rocha. Foram realizadas leituras de alguns livros de teóricos de Literatura e de literatura local, tais como Marcas do Tempo (CÂNDIDO DA SILVA, A. Poesias. Ed. do Autor, s/d.); A Literatura no Brasil (COUTINHO, A. Rio de Janeiro: EdUnicamp, 1955.); Sobre Literatura 268 (ECO, U. Barcelona: RqueR, 2002.); e ainda o texto Filologia Política, de autoria do nosso orientador. Superar o caráter esteticizante dos estudos de Literatura, em termos de consideração da obra como tal e de apresentação ao público, é um passo. A maioria das obras que não chega ao grande público ou aos estandes de feiras e vitrines de livraria, nem à mesa de um resenhista de nomeada, que lhe faculte abrir as portas de uma leitura menos espontânea e mais respeitosa. Assim, estas obras, muitas das quais “redescoberta” anos ou mesmo séculos depois de redigidas (alguma vez nem publicadas), findam não merecendo um lugar, mesmo que à sombra, ao lado da chamada grande literatura. 2 MATERIAIS E MÉTODOS Pesquisas de campo e bibliográficas, conversas pessoais e entrevistas com autores foram os modos de abordar primeiramente a obra. A sua leitura (parcial) e a sua análise de gênero, com debate (breve) sobre qualidade estético-literária, foram prévios ao tratamento de digitalização de parte do texto. Debates sobre o direito autoral e sobre a difusão da obra literária local nos espaços públicos de Porto Velho seguiram-se às leituras, teóricas e das obras. Depois discutimos técnicas de digitalização e de disponibilização de livros na internet. 3 RESULTADOS Acompanhamos ativamente o recolhimento de diversos livros, efetuamos pesquisa sobre como efetuar o melhor tratamento digital de uma obra ou de algumas de suas partes, e efetuamos a digitalização, em casa ou na sala da pesquisa, levando o resultado ao evento de Biblioteconomia. Foi concluído, na fase final, o texto do Termo de Cessão e da Carta de Encaminhamento do Termo de Cessão, para a disponibilização legal das obras (ou de partes das obras) na internet. 4 CONCLUSÃO O Projeto mostrou-se interessante, devido às descobertas de tantas obras de Rondônia (ou sobre Rondônia) que catrecfem de maior divulgação. Também pelos debates sobre 269 propriedade privada de obras literárias, umas estando liberadas para divulgação gratuitas (as de 70 anos ou mais da morte do autor) e outras que precisam de Termo de Cessão de Direitos. Conhecer autores também foi importante, para vermos como eles são pessoas “normais”, querendo a divulgação da sua obra e da Literatura de Rondônia, nenhum fazendo muita questão de ganhar dinheiro com os seus escritos. REFERÊNCIAS Antônio Cândido da Silva. Madeira-Mamoré. O Vagão dos Esquecidos: O autor conta a história da construção da ferrovia através de poesias. 2º ed. Porto Velho, 2000, 224 p. Antônio Cândido da Silva. Marcas do Tempo: Poesias. Porto Velho: Gráfica Quarenta, 78 p. Bahia, José Ailton Ferreira. Se o mundo não acabou - conserte-o! São Paulo: Scortecci, 2005, 142 p. Carvalho, Julio. Juru, Jurupá, Jurupari. 1. Lendas indígenas. 2. Mitos. 3. Rondônia. Brasil. I. EDUFRO: Porto Velho. Brasil. 2001, 88p. Cátia Cernov. Amazônia em Chamas: Seleção de contos, literatura fantástica. 1º ed. São Paulo: Selo do Povo, 2010, 98 p. Cláudio B. Feitosa et alii. Antologia da Prosa e do Verso Rondoniense: Crônicas e poesia. Porto Velho, 1994, 184 p. Dias, Carlos Macedo (Poeta Mado). Das Tripas ao Marcapasso. Porto Velho: Edufro, 2003, 122 p. Fundação Cultural de Rondônia. Antologia da Prosa e do Verso Rondoniense. Porto Velho: FUNCER, 1995, 125 pp. José Ailton Ferreira (Bahia). Versômetro: Poesias. 1.º ed. São Paulo: João Scortecci Editora, 1996, 82 pp. Jotatê, João Teixeira. Coletânea JOTATÊ - Poesias, Crônicas e Contos. Porto Velho: s/editora, s/data, 173 p. Martins, Eduardo. O lado aberto. Poesias. Porto Velho: EDUFRO, 2004, 129 p. Martins, William Haverly. O Tempo da Vida. Porto Velho: Ed Sem Nome, 1997, 148 p. Nilza Menezes. Sina: troco ou vendo em bom estado: Poesias. Rio de Janeiro: Blocos, 1999, 84 p. Ribeiro, Darcy. O indigenista Rondon. Homenagem da Turma de 1958 da Escola Superior de Guerra ao seu patrono. Rio de Janeiro: Departamento de Imprensa Nacional, 1969, 75p. 270 ROCHA, J.C.B. (2001). “A ilha-Brasil: identidade pela diversidade”. In (obra coletiva): Maria Teresa Toribio Brittes Lemos Luiz Henrique Nunez Bahia, Andrzej Dembicz. Brasil: Espaço, Memória e Identidade. Estudos i Materiais. Número 21. Warszawa: CESLA-Centro de Estudos Latino-Americanos / UERJ; pp. 54-72. ISBN: 83-85620-94-X ROCHA, J.C.B. (2003). Análise Intercultural de Argumentos. Santiago de Compostela: Servizo de Publicacións da Universidade de Santiago de Compostela, 2005. Roquette-Pinto, Edgar. Rondônia (Brasiliana, v.39). Brasília: INL / São Paulo: Ed. Nacional, 1975, 285p. Vitor Hugo. Desbravadores: história da colonização da região amazônica. Humaitá: Edição Da Missão Salesiana, 1959, 495 pp. 271 AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS EM CURSO NAS ESCOLAS DA REDE ESTADUAL DE ENSINO NA ZONA DA MATA RONDONIENSE: DE ONDE VEM, PARA ONDE VÃO? Mauricéia Ferreira Teixeira56 Marilsa Miranda de Souza57 RESUMO Este artigo trata das políticas educacionais implantadas nas escolas da Zona da Mata rondoniense. Utilizou-se o método dialético por meio das categorias básicas contradição e totalidade e imperialismo e capitalismo burocrático como categorias históricas. O estudo identificou as principais políticas educacionais implantadas nas escolas em Rondônia e discute suas origens, seus pressupostos e reais objetivos. Constatou-se que os sujeitos diretamente envolvidos no processo educativo, em sua maioria, desconhecem o processo de formulação das políticas implementadas. Parte-se do pressuposto de que o Banco Mundial como agência multilateral a serviço do imperialismo, sobretudo o estadunidense, tem formulado e imposto aos países dominados políticas educacionais que promovem o esvaziamento do processo educativo e implementam mecanismos de gestão a partir de uma lógica gerencial e burocrática com vistas a inviabilizar propostas efetivamente democráticas. Palavras-chave: Políticas educacionais; Imperialismo; Banco Mundial. INTRODUÇÃO Este trabalho tem origem no desenvolvimento da pesquisa intitulada “Capitalismo burocrático, políticas educacionais e relações de poder na educação escolar em Rondônia” financiada pelo Programa Institucional de Bolsas, Trabalho Voluntário de Iniciação Científica e Apoio Técnico (PIBIC) e pela Universidade Federal de Rondônia (UNIR) e seu subprojeto: “As políticas educacionais em curso nas escolas da rede estadual de ensino na zona da mata rondoniense: de onde vem, para onde vão?”. O objetivo da pesquisa foi identificar as principais políticas educacionais implantadas nas escolas da rede estadual de ensino na Zona da Mata rondoniense, suas origens, seus objetivos, o contexto em que foram implantadas e seus principais agentes em nível local, regional, nacional e internacional. A educação escolar atual foi delineada numa sociedade marcada por um período de reformas político-econômicas, do aprofundamento das relações de dependência, da imposição 56 Acadêmica do curso de Pedagogia do Campus de Rolim de Moura e Bolsista Voluntária do Programa Institucional de Bolsas, Trabalho Voluntário de Iniciação Científica e Apoio Técnico (PIBIC). 57 Doutora em Educação e professora do Departamento de Educação da Universidade Federal de Rondônia (UNIR), Campus de Rolim de Moura. 272 e controle cada vez mais intenso dos organismos multilaterais imperialistas sobre as políticas educacionais (CORAGGIO, 2007). As políticas públicas educacionais são hegemonicamente formuladas, dirigidas e financiadas pelo Banco Mundial. Fundamentam-se nas teorias do capital humano e nas concepções da educação neoprodutivista tornando a educação cada vez mais vazia de conteúdo e intensificando os processos de exploração e precarização do trabalho docente (SOUZA, 2010). Em Rondônia, as políticas educacionais têm reforçado as relações de semisservidão dos professores no contexto escolar, enfraquecido a gestão democrática e a construção de uma educação histórico-crítica. Os estudos teóricos, assim como a pesquisa de cunho bibliográfico foram realizados ainda no segundo semestre de 2011. Iniciamos, ainda neste período, a pesquisa de campo, que teve continuidade no primeiro semestre de 2012, momento em que levantamos parte dos documentos a serem analisados, bem como a maior parte das entrevistas. Segue abaixo a relação das escolas pesquisadas: Município Nova Brasilândia D’Oeste Alta Floresta D’Oeste Santa Luzia D’Oeste Rolim de Moura Novo Horizonte D’Oeste Escola Escola Estadual de Ensino Médio Aurélio Buarque de Holanda Ferreira Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Pe. Ezequiel Ramin Escola estadual de ensino fundamental e médio Juscelino Kubitschek Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Candido Portinari Escola de Ensino Fundamental e Médio Marechal Rondon MATERIAIS E MÉTODOS A apresentação do projeto foi realizada por meio de visitas em todas as escolas selecionadas para a investigação. As visitas iniciais também possibilitaram o contato com os gestores, supervisores, coordenadores pedagógicos e professores. Nestas ocasiões apresentamos e discutimos os objetivos deste trabalho, a forma como desenvolveríamos a pesquisa. Destacamos o fato de que não haveria identificação das escolas e tampouco dos sujeitos entrevistados. Para tanto, os sujeitos foram identificados apenas como “professor da escola A, B, C, D ou E. Utilizamos a modalidade de entrevistas semi-estruturadas individuais por meio das quais conhecemos a opinião dos professores e da equipe gestora acerca das políticas 273 educacionais em curso no Estado e, particularmente, nas escolas pesquisadas. Foram entrevistados 03 professores do Ensino Fundamental e 03 de Ensino Médio de cada escola pesquisada aplicando-se um único questionário. Buscamos analisar a parte sem perder de vista sua relação com a totalidade. Desta forma, nos fundamentamos em Marx (2008). Este autor faz uma crítica àqueles que buscam realizar seus estudos sem considerar as relações concretas que são estabelecidas no âmbito da produção e afirma que o concreto é síntese de múltiplas determinações e constitui unidade no diverso (MARX, 2008, p.258). Sendo assim, a análise dos dados teve como eixo central a aplicação do método dialético, mediante o qual buscamos interpretar a realidade objetiva e subjetiva em termos de categorias básicas: totalidade, contradição. Utilizamos ainda as categorias históricas imperialismo e capitalismo burocrático que nos possibilitaram entender como ocorrem os processos de dominação que determinam a elaboração e implantação das políticas educacionais analisadas. A região estudada está composta por cinco municípios sendo eles: Rolim de Moura, Nova Brasilândia, Alta Floresta D’Oeste, Santa Luzia D’Oeste, Novo Horizonte D’Oeste. A pesquisa foi realizada em cinco escolas, portanto, uma em cada município da Zona da Mata do Estado de Rondônia. Utilizamos como critério para definição da escola a ser pesquisada aquela que possui o quantitativo maior de alunos matriculados. RESULTADOS E DISCUSSÕES Para compreendermos o fenômeno objeto da pesquisa há que se considerar os processos mais amplos que, em última instância, determinam o conteúdo e a forma como são executadas no âmbito local as políticas educacionais. Para tanto, recorremos ao conceito de imperialismo. O capitalismo, de acordo com Lênin (1987), se transformou num sistema de caráter universal, submetendo a grande maioria da população do globo à opressão de alguns países ditos mais avançados. O saque realizado nas nações dominadas é partilhado entre os poucos países. Desta forma, as nações hegemônicas passam a deter o controle de grandes parcelas do globo. Entretanto, Lênin (1987, p. 84), chama a atenção para outras formas intermediárias de dominação além da colonização propriamente dita: “as semi-colônias”. Recorremos, também, ao conceito de capitalismo burocrático. O capitalismo burocrático desenvolve-se nos países atrasados que não realizaram a revolução burguesa e, 274 portanto, mantém a estrutura agrária concentrada impedindo reformas de cunho democrático. As relações estabelecidas no âmbito destes países constituem-se como semifeudais tendo em vista o grau de servidão a que são submetidos os trabalhadores em geral. Considerando que o Brasil possui estas características, o conceito de capitalismo burocrático pode ser aplicado para explicar a realidade brasileira (MARTÍN MARTÍN, 2007). Na condição de um país semicolonial, conforme Lênin (1987), e de capitalismo burocrático, o Brasil submete-se às imposições dos organismos controlados pelo imperialismo estadunidense. O Banco Mundial tem pautado suas políticas educativas tendo como marco referencial a teoria econômica neoclássica. Neste enfoque, de acordo com Coraggio (2007, p. 97), busca-se “assemelhar a escola à empresa, a ver os fatores dos processos produtivos como insumos, e a eficiência e as taxas de retorno como critérios fundamentais de decisão”. Para o autor citado, esse modelo é preocupante tendo em vista os vícios intrínsecos que comprometem a validade científica das propostas apresentadas pelo Banco. O Banco Mundial assim se expressa acerca da educação (BANCO MUNDIAL, apud CORAGGIO, 2007, p. 95): “a análise econômica da educação em geral, e a análise das taxas de retorno em particular, é um instrumento de diagnóstico para começar o processo de estabelecer prioridades e para considerar formas alternativas de atingir objetivos num enfoque setorial”. A sistematização da teoria do capital humano, que resulta desse enfoque, foi construída, ainda na década de 1950, por um grupo de estudos coordenado por Theodoro Schultz nos EUA. De acordo com Frigotto (2003, p. 41), a equipe de Schultz pretendia descobrir “o fator que pudesse explicar, para além dos usuais fatores A (nível de tecnologia), K (insumos de capital) e L (insumos de mão de obra), dentro da fórmula geral de Cobb Douglas, as variações do desenvolvimento e subdesenvolvimento entre os países”. Ao propor o fator H (capital humano) como resposta ao problema proposto, Schultz ganha notabilidade sendo premiado com o Nobel de economia em 1968. Para Frigotto (2003, p. 41), a idéia chave da teoria do capital humano é de que: [...] “a um acréscimo marginal de instrução, treinamento e educação, corresponde um acréscimo marginal de capacidade de produção”. No Brasil a teoria do capital humano adquiriu força na medida em que foi incorporada à legislação “na forma dos princípios da racionalidade, eficiência e produtividade, com os corolários do ‘máximo resultado com o mínimo de dispêndio’ e ‘não duplicação de meios para fins idênticos’” (SAVIANI, 2007, p. 363). A aprovação da lei 5.540 em 28 de novembro de 1968, que promoveu a reforma universitária, em vigor a partir de 11 de fevereiro de 1969 por meio do decreto n. 464, representa o marco oficial de implementação 275 de uma concepção produtivista na educação brasileira. Em seguida, com a lei 5.692 de 11 de agosto de 1971, que reformou a educação de primeiro e segundo graus, a concepção produtivista foi estendida a todas as escolas do país através da pedagogia tecnicista. Ainda de acordo com Saviani (2007, p. 363), a visão produtivista na educação não desapareceu com o fim da ditadura militar, ao contrário, permaneceu, embora refuncionalizada. Esta refuncionalização do produtivismo é denominada por Saviani (2007, p. 427) de neoprodutivismo. Essa mudança ocorreu em função da reestruturação produtiva ocorrida a partir da década de 1970 em meio à crise estrutural do modo de produção capitalista. Para tanto, revolucionou-se a base técnica da produção “conduzindo à substituição do fordismo pelo toyotismo”. O fordismo operava com tecnologia pesada de base fixa e organização do trabalho com base nos métodos tayloristas. Estes, por sua vez, preconizavam a rígida divisão do trabalho no que diz respeito ao planejamento e a execução, assim como impunham o parcelamento das atividades produtivas como forma de ditar o ritmo de trabalho e impedir o conhecimento, por parte dos trabalhadores, de todo o processo de produção. Por outro lado, o toyotismo “apóia-se em tecnologia leve, de base microeletrônica flexível, e opera com trabalhadores polivalentes visando à produção de objetos diversificados, em pequena escala, para atender a demanda de nichos de mercado”. Imbuído desta perspectiva, o Banco Mundial estabeleceu como ações prioritárias no Brasil as seguintes medidas: a) providenciar livros didáticos e outros materiais de ensino a exemplo de brinquedos pedagógicos e livros de leitura; b) melhorar as habilidades dos professores em técnicas de sala de aula. Essa melhoria se daria por meio da implementação de programas de formação continuada nas modalidades à distância e presencial. Para alcançar o objetivo proposto estas atividades são avaliadas com o intuito de constatar “sua eficácia em mudar o comportamento dos professores em sala de aula” (TOMMASI, 2007, p. 198). Roberto Leher (1999, p. 1), afirma que o Banco é na verdade “o ministério mundial da educação dos países periféricos”. Ainda de acordo com este autor, “o caráter determinante das ideologias que informam a reforma educacional fica melhor evidenciado quando a investigação apresenta concretamente como as concepções ideológicas se materializam nas instituições”. A materialização destas ideologias ocorre precisamente por meio da implementação de programas e projetos que tem como principal objetivo submeter aos interesses imperialistas os processos educativos nos países de capitalismo burocrático. Nas entrevistas realizadas foram identificados os seguintes programas e projetos: PME, PDE, GESTAR, Programa de Financiamento de Projetos Escolares (PROFIPES), Pró- 276 letramento, Empreendedorismo, Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), Transporte Escolar, PROINFO, Mais Educação, Ensino Médio Inovador, Mídias na Educação. No gráfico a seguir estão sintetizadas as opiniões dos professores acerca dos programas implementados nas escolas. Gráfico 01- Opinião dos professores sobre os programas de formação Fonte: Silmara Ferreira Lopes Nas entrevistas realizadas 67,6% dos professores avaliam como “bom” os programas implantados, 15,74% como “ruim”, 10% são indiferentes e 6,66% não souberam ou não responderam a questão. A princípio, esses resultados poderiam expressar uma aparente aceitação consciente por parte dos professores em relação aos programas. Os professores que avaliam como “bom” argumentam que participaram dos cursos, no entanto, são poucas as “coisas” que se aproveitam. “Fiz GESTAR, PROFA e Pró-letramento. O Pró-Letramento não tem muita coisa que se aproveite. São programas bons, no geral, depende da maneira que se aplica e usa” (PROFESSOR DA ESCOLA A). Outros ainda entendem que no geral são muito bons, porém, apresentam restrições a programas específicos a exemplo da fala a seguir: “os programas são muito bons, mas o PDE tá um pouco falho, não consegue atingir as metas definidas, não consegue cumprir o calendário. PDE existe no papel” (PROFESSOR DA ESCOLA B). Há aqueles que entendem ser importante aproveitar todas as oportunidades de formação relacionadas à sua formação a exemplo do professor da escola C: “Eu acho que cada profissional deve aproveitar cada oportunidade para adquirir mais conhecimento na sua área”. Há ainda aqueles que aderem sem restrições e cumprem rigorosamente a proposta do 277 programa: “São bons, necessários. O GESTAR achei muito bom, apliquei todos os conteúdos, as atividades.” (PROFESSOR DA ESCOLA C). Constata-se, portanto, que as restrições às políticas impostas estão presentes mesmo entre aqueles que as avaliam positivamente. Por outro lado os 15,74% que consideram os programas ruins estão muito seguros em sua avaliação. A seguir falas que evidenciam este posicionamento: “Não participo de nenhum e nem quero participar. São programas que servem para colocar professores numa "forminha", como o governo e os organismos internacionais querem. São cursos tecnicistas” (PROFESSOR DA ESCOLA E); “Muito repetitivo, os cursos são aligeirados. O PROINFO, os equipamentos não funcionam; o aproveitamento é muito pouco. Participei do GESTAR, Pró-Letramento, PROINFO por ser coagida” (PROFESSOR DA ESCOLA D). A imposição dos programas fica mais clara na medida em que se evidencia o processo de alienação no que diz respeito às origens dos mesmos. Gráfico 02- Se os professores sabem quem formula os programas de formação Fonte: Silmara Ferreira Lopes Os resultados expressam o completo desconhecimento acerca dos objetivos reais destas políticas. Dos 30 professores entrevistados, 26 (86,66%) afirmam desconhecer quem formula, 01 (3,34%) não soube responder e apenas 03 (10%) afirmam conhecer a origem dos programas implantados. No entanto, ao analisarmos as falas destes últimos, constatamos equívocos. Para estes professores “Os programas são elaborados pelo governo federal” (PROFESSOR DA ESCOLA D). Apesar do governo federal aparentemente ser o formulador e gestor destas políticas, entendemos que é o Banco Mundial o responsável pela concepção e 278 imposição nos países dominados, entre os quais está o Brasil. Em sua maioria, as políticas implementadas são diretamente financiadas e dirigidas pelo Banco Mundial. As demais seguem a mesma orientação tanto no que diz respeito aos aspectos pedagógicos, quanto nos fundamentos teóricos que as embasam. Os diretores e supervisores demonstram o mesmo desconhecimento. Dos 11 entrevistados, todos afirmam desconhecer a origem dos programas. Apesar de considerarem a maioria dos programas bons, realizam críticas pontuais em relação a alguns programas: formadores despreparados, conteúdo repetitivo e não atendem a realidade da escola. Questionam também o fato de algumas formações ocorrerem na cidade de Porto Velho, o que acarreta inúmeros transtornos. Afirmam que há muita desistência dos inscritos nos programas e que em alguns casos os professores aplicam os módulos em suas atividades pedagógicas. Todos realizaram críticas contundentes aos programas Mais Educação e Ensino Médio Inovador por conta da carga horária, ausência de infraestrutura e insuficiência de profissionais capacitados para atender a demanda de atividades a serem implementadas nas escolas. Entre as políticas identificadas está o PDE. Este é o carro chefe dos programas do Banco Mundial para a educação brasileira. Constitui-se em uma das ações do Fundo de Fortalecimento da Escola (FUNDESCOLA) que é financiado pelo Banco Mundial e foi gradativamente sendo implantado priorizando as chamadas “Zonas de Atendimento Prioritárias (ZAP’s)”. O PDE tem como principal objetivo promover um conjunto de ações com o intuito de melhorar a qualidade das escolas do ensino fundamental, ampliando a permanência das crianças nas escolas públicas, bem como a ampliação da escolaridade nas regiões onde se faz presente. Entretanto, apesar do objetivo proclamado, e não obstante o fato de defender a eliminação da burocracia enfatizando a eficiência e a eficácia, suas ações têm se constituído numa estratégia de controle burocrático das atividades desenvolvidas na escola. Esse processo é evidenciado quando são apresentadas as etapas a serem seguidas durante a elaboração do PDE (BRASIL, 2006, p. 20): [...] a) preparação, b) análise situacional, c) definição da visão estratégica e do plano de suporte estratégico, d) execução e e) monitoramento e avaliação. Além das etapas, o anexo do manual de elaboração do programa “reúne o conjunto de formulários que compõem o documento PDE e que deverão ser apresentados após todo o processo de analisar e repensar a escola”. Para Silva (2011, p. 72), os mecanismos de controle estão presentes nas exigências feitas à escola no processo de elaboração do PDE e PME. “Ao elaborá-los, a escola realiza um 279 diagnóstico de sua situação concreta, explicita o que pretende atingir a curto, médio e em longo prazo, traçando para isso, objetivos, estratégias, metas e planos de ação a serem alcançados”. Já pelo PME o repasse dos recursos diretamente para a escola é viabilizado. Fica condicionada, desta forma, “a disponibilização de recursos mediante a perda da autonomia da escola. Os gestores e professores transformam-se em meros executores de ações que somente na aparência são formuladas para atender aos interesses da escola”. Ao vislumbrar a qualidade da educação apenas por meio da melhoria de aspectos gerenciais, desconsiderando, portanto, as relações mais amplas que determinam o fracasso da educação escolar, está “implícita nas ações aprovadas e financiadas uma concepção que enxerga a organização da escola e do ensino por uma ótica gerencial e autoritária. De acordo com Souza (2010, p. 211), o PDE corresponde ao “objetivo de ajuste estrutural imposto pelo imperialismo nas últimas décadas, que é reduzir gastos públicos dos países semicoloniais nas áreas sociais”. De acordo com autora, os recursos que deveriam ser gastos com as escolas são reduzidos, “uma vez que a melhoria da qualidade e a expansão do acesso são feitas por meio do financiamento que o governo brasileiro pagará com juros altos, alimentando ainda mais o nível de sua dependência em relação ao imperialismo”. Outra ação do FUNDESCOLA implementada no Estado de Rondônia foi o GESTAR. O objetivo geral deste programa é provocar transformações nas práticas de aprendizagem dos alunos, na qualidade do ensino tornando os professores competentes e autônomos, na ação pedagógica da direção e do corpo docente e na reflexão sobre as representações da profissão do magistério, do seu papel social e das competências que lhe são exigidas (BRASIL, 2005, apud SILVA, 2011, p. 73). O GESTAR, ao abordar a concepção de qualidade, o faz através dos aspectos a seguir: “do indivíduo para o mundo produtivo reclamado pelo sistema econômico”, desenvolvimento de “capacidades básicas para: a) compreender e transformar o mundo produtivo; b) comunicar-se adequadamente nas formas oral e escrita; c) trabalhar em equipe; e d) exercer a função produtiva de maneira criativa e crítica” (BRASIL, 2005, p. 9). A ideia de que é mais importante desenvolver a capacidade do aluno de aprender de forma permanente também se faz presente na proposta do GESTAR. Ou seja, a escola não deve necessariamente estar comprometida com a apropriação, por parte do aluno, dos conhecimentos universais produzidos historicamente, mas, tão somente, com os conhecimentos exigidos pela realidade no sentido de possibilitar a adaptação às exigências do mundo da produção, assim como aqueles conhecimentos exigidos para um abstrato “exercício da cidadania”. 280 Outro programa em vigor no Estado é o PROFIPES. Este programa foi instituído pela lei 1517 de 29 de agosto de 2005 e tem como objetivo propiciar às unidades de ensino o fortalecimento de sua autonomia pedagógica por meio do suporte financeiro a projetos com o intuito de propiciar melhorias no processo de ensino e de aprendizagem (RONDÔNIA, S/D, p.9). Silva (2011, p. 71), ao analisar a segunda edição do manual de orientações pedagógicas e aplicação financeira do PROFIPES, destaca expressões como “[...] o PROFIPES demonstra uma contínua preocupação em reduzir problemas de ensino e aprendizagem e oferecer subsídios para a prática docente na busca por índices de excelência”, “O grande êxito do PROFIPES se fundamenta com sua presença na escola através de um recurso financeiro capaz de promover ações pedagógicas que são essenciais para um funcionamento eficaz da própria instituição de ensino”, “[...] se fundamenta em seu princípio primordial: a sala de aula vista a partir do olhar da comunidade escolar”, “nesse sentido, o docente é uma figura importante, pois é o profissional mais capacitado para colaborar com o Governo na busca por soluções das falhas educacionais ainda existentes” (RONDÔNIA, apud SILVA, 2011, p. 71). Ainda de acordo com Silva, programas como o PROFIPES estão fortemente imbuídos de uma concepção que privilegia aspectos técnicos e gerenciais “na medida em que avaliam os baixos índices de aprendizagem desconsiderando os determinantes sociais e econômicos que estão na base do fracasso escolar”. Para o autor citado, a concepção presente no referido programa está moldada (SILVA, 2011, p. 71): [...] pelo discurso neoliberal presente nas afirmações de que se pretende atingir ‘índices de excelência’ e possibilitar um ‘funcionamento eficaz’ das instituições de ensino por meio de ações pedagógicas fragmentadas e descontínuas cuja implementação está condicionada ao atendimento das exigências dos órgãos que compõem a hierarquia da estrutura educacional que, no caso do PROFIPES, está representado pela secretaria estadual de educação (SEDUC) de Rondônia. O PROFIPES configura-se, portanto, como mais um programa oficial destinado a maquiar o lugar destinado à educação em uma sociedade de classes, assim como evidencia a ausência de um projeto educacional que possibilite o acesso à educação pública, gratuita e de qualidade a todos sem a necessidade de políticas focalizadas e destinadas, sobretudo, ao controle gerencial por meio da lógica capitalista. 281 CONCLUSÃO Procuramos neste trabalho identificar as principais políticas educacionais implantadas na rede estadual de ensino, precisamente nos municípios que compreendem a Zona da Mata do Estado de Rondônia. Buscamos interpretar a realidade aplicando o método dialético por meio das categorias totalidade e contradição. Utilizamos também imperialismo e capitalismo burocrático como categorias históricas para compreender como se processa a dominação que se materializa no âmbito da educação através da imposição das políticas educacionais analisadas. Constatamos que mesmo aqueles que avaliam positivamente estas políticas, apresentam restrições a programas específicos e a maneira como ocorre o processo de implantação que objetiva, em última análise, atender os interesses imediatistas do capitalismo em sua fase imperialista. Ainda foi possível constatar que, em sua maioria, os sujeitos entrevistados desconhecem a origem e os reais objetivos dos programas impostos. Os poucos que afirmaram conhecer quem formula e controla supõem que o MEC seja o responsável. As políticas de formação analisadas, a exemplo do GESTAR, supervalorizam os conhecimentos cotidianos e desprezam os conhecimentos universais acumulados historicamente pela humanidade. Demonstram explicitamente que seus objetivos buscam atender as constantes mudanças que ocorrem no mundo produtivo fornecendo os rudimentos de conhecimento necessários à permanente adaptação dos sujeitos às exigências do mercado. As políticas voltadas supostamente para melhoria da qualidade da educação por meio da implementação de técnicas de gestão, a exemplo do PDE, na prática funcionam como uma ferramenta gerencial de natureza burocrática que busca manter sob controle os processos educativos. Conclui-se, portanto, a partir do referencial teórico utilizado, da análise documental realizada e dos dados empíricos coletados e sistematizados, que as políticas educacionais implantadas nas escolas da Zona da Mata rondoniense são gestadas e dirigidas pelas instituições multilaterais a serviço das nações imperialistas, sobretudo, dos Estados Unidos. A instituição que mais tem se destacado nesse processo é o Banco Mundial. 282 REFERÊNCIAS BRASIL. Guia geral do GESTAR. Brasília: MEC/SEF, 2005. ______. Como elaborar o Plano de Desenvolvimento da Escola: aumentando o desempenho da escola por meio do planejamento eficaz. 3. ed. Brasília: FUNDESCOLA/DIPRO/FNDE/MEC, 2006. ______.MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Disponível em:<http://www.fnde.gov.br/index.php/fundescola-apresentacao>. Acesso em: 03 mar. 2012. CORAGGIO, J. L. Propostas do Banco Mundial para a educação: sentido oculto ou problemas de concepção? In: TOMMASI L; WARDE, M.; HADAD, S. (Orgs). O Banco Mundial e as políticas Educacionais. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2007. FRIGOTTO, G. Educação e a crise do capitalismo real. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2003. LÊNIN, V. I. O imperialismo: fase superior do capitalismo. Tradução de Olinto Beckerman. 4. ed. São Paulo: Global, 1987. MARX, K. Contribuição à crítica da economia política. 2. ed. São Paulo: Expressão Popular, 2008. MARTÍN MARTÍN, V. O. El papel del campesinato en la transformación del mundo actual. Valencia: Baladre, 2007. RONDÔNIA. PROFIPES: manual de orientações pedagógicas e de aplicação financeira. Porto Velho: Secretaria de Estado da Educação, S/D. SAVIANI, D. História das idéias pedagógicas no Brasil. Campinas: Autores Associados, 2007. SILVA, P. A. D. da. Repercussões das concepções pedagógicas nas políticas educacionais em Rondônia entre 1995 e 2010. 125 f. Dissertação (Mestrado Acadêmico em Educação) Fundação Universidade Federal de Rondônia, Porto Velho, 2011. SOUZA, M.M. Imperialismo e Educação do Campo: Uma análise das políticas educacionais a partir de 1990. 405 f. Tese (Doutorado em Educação Escolar) - Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2010. TOMMASI, L. Financiamentos do Banco Mundial no setor educacional brasileiro: os projetos em fase de implementação. In: TOMMASI, L.; WARDE, M.; HADAD, S. (Orgs). O Banco Mundial e as políticas Educacionais. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2007. LEHER. R. Um novo senhor da educação? A política educacional do Banco Mundial para a periferia do capitalismo. Revista Outubro, nº 3, 1999. 283 AVALIAÇÃO EDUCACIONAL: UM ESTUDO DA PRÁTICA AVALIATIVA DOS PROFESSORES DAS ESCOLAS ESTADUAIS DO MUNICÍPIO DE ROLIM DE MOURA/RO Melina Saraiva da Costa58 Flavine Assis de Miranda59 RESUMO O presente trabalho é resultado de um projeto de pesquisa, e traz considerações a respeito da avaliação educacional nas séries iniciais do ensino fundamental. A pesquisa que o orientou pretendeu analisar a prática da avaliação escolar adotada pelos professores com base em observações e entrevista estruturada. Buscou-se, pela análise dos dados, compreender o que tem ocorrido nas escolas estaduais do ensino fundamental no município de Rolim de Moura. Os dados apresentados fazem parte de um projeto de pesquisa PIBIC (Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica), financiado pelo CNPq. A pesquisa teve início em agosto de 2011 e término em agosto de 2012. Na análise dos dados percebeu-se que os professores entrevistados utilizam diversos instrumentos avaliativos sendo estes amparados pela portaria 1001/2008/GAB/. SEDUC. Palavras- chave: Avaliação Educacional, Prática Avaliativa, Funções da Avaliação, Matrizes Epistemológicas, Tendências Pedagógicas. INTRODUÇÃO Apesar da avaliação ser uma prática social ampla, pela capacidade que o ser humano tem de observar, refletir e julgar, na escola, sua dimensão educacional não está evidente o suficiente para seus sujeitos. Segundo Hoffmann (1992) são muitos os equívocos quanto à terminologia e seu uso. Ao longo de décadas ela vem sendo utilizada como atribuição de notas, visando à promoção ou reprovação do aluno. O presente trabalho vem mostrar a relação entre a avaliação educacional em decorrência da utilização tradicional, como forma de mensuração dos conhecimentos 58 Acadêmica do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Rondônia – Campus de Rolim de Moura. Bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC/CNPq. 59 Profª. Drª. na Universidade Federal de Rondônia – Campus de Rolim de Moura/Departamento de Educação. Orientadora do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC/CNPq. 284 adquiridos, como também, possibilitar a busca de alternativas, para que o processo de avaliação, transcorra numa perspectiva de avaliação transformadora, mediante uma abordagem reflexiva, formadora, onde a mesma seja desenvolvida de forma processual, contínua e diagnóstica. Com o objetivo de identificar a prática avaliativa dos professores das escolas públicas estaduais de Rolim de Moura/RO, este trabalho surgiu das discussões referentes à pesquisa de iniciação científica no âmbito da graduação. Com isso, o texto em questão busca trazer reflexões sobre a prática da avaliação enquanto verificação da aprendizagem e do desempenho escolar do aluno e dos instrumentos utilizados para a sua efetivação. Será discutido o conceito de avaliação educacional, no contexto das principais matrizes geradoras e explicativas do pensamento e do comportamento humano. Quais as funções da avaliação, sendo basicamente, três: diagnosticar, controlar e classificar. Relacionadas a essas funções, existem três modalidades de avaliação diagnóstica, formativa, e somativa. Neste sentido, pretendemos iniciar reflexões sobre o papel da avaliação educacional, e também para que os professores reflitam sobre como tem sido sua prática. AVALIAÇÃO EDUCACIONAL E SUAS VERTENTES Para que possamos compreender melhor o conceito de avaliação educacional, precisamos inseri-la no contexto das principais matrizes geradoras e explicativas do pensamento e do comportamento humano. Sendo elas a matriz objetivista, matriz subjetivista e a matriz histórico-dialética. Na matriz objetivista, a avaliação da aprendizagem consiste em constatar se o aluno aprendeu e se foram atingidos os objetivos educacionais proposto pelo currículo escolar. Essa abordagem está ligada ao Positivismo,60 centrando-se na objetividade e neutralidade dos fatos e fenômenos estudados. No que tange à avaliação da aprendizagem, na matriz objetivista, ganha destaque a Teoria Clássica dos Testes valorizando as questões de múltipla escolha e provas objetivas como instrumentos avaliativos. Na prática avaliativa, o objetivismo implica na valorização dos instrumentos de mensuração, na importância de testes e medidas, de escalas de observação de atitudes, no uso de questões essencialmente objetivas, no 60 O positivismo é uma corrente filosófica que surgiu na França no começo do século XIX, defende a idéia de que o conhecimento científico é a única forma de conhecimento verdadeiro. Somente pode-se afirmar que uma teoria é correta se ela foi comprovada através de métodos científicos válidos. 285 planejamento sistêmico e numa pedagogia claramente tecnicista. Nesta matriz a avaliação se volta para a verificação dos objetivos previamente estabelecidos importando mais o produto do que o processo, logo, o objeto ganha destaque sobre o sujeito. Quanto à matriz subjetivista, nela o sujeito ganha maior relevância e o processo se sobrepõe aos resultados ou produto. A avaliação ganha um cunho qualitativo e ênfase nos instrumentos como opinários, questionários, entrevistas e auto-avaliação. Nessa perspectiva temos a contribuição de Scriven (1967) e Stufflebean (1981). A abordagem do vínculo indivíduo sociedade tem ênfase na realidade social, parte da premissa de que a educação ocorre na relação do sujeito com a sociedade. Com isso, a avaliação passa a demandar procedimentos e instrumentos que explicitem habilidades de pensamento, de elaboração pessoal e de criatividade, envolvendo conteúdos e situações que remetam para os problemas e desafios sociais. Essa matriz tem a contribuição dos estudos de Stake (1969). Então, vejamos como estudiosos do assunto definem o processo de avaliação da aprendizagem. Ressaltamos que cada uma das definições abordadas por seus autores é o reflexo de uma postura adotada. Isto é, a forma de conceber a avaliação está marcada pela abordagem teórica adotada. Haydt (1994) cita que segundo Ralph Tyler “o processo de avaliação consiste essencialmente em determinar em que medida os objetivos educacionais estão sendo realmente alcançado pelo programa do currículo e do ensino” (Haydt, 1994, p.11). O autor ainda acrescenta que “como os objetivos visados consistem em produzir certas modificações desejáveis nos padrões de comportamento do estudante, a avaliação é o processo mediante o qual se determina o grau em que essas mudanças de comportamento estão realmente ocorrendo”. Com essa definição de Tyler, Haydt (1994) aponta a ênfase dada ao caráter funcional da avaliação. Haydt (1994) aborda que Michael Scriven define a avaliação como uma atividade metodológica que consiste na coleta e na combinação de dados correlatos ao desempenho, usando um conjunto ponderado de escalas de critérios que levam à classificações comparativas ou numéricas, e na justificação: a) dos instrumentos e coletas de dados; b) das ponderações; c) da seleção de critérios. De acordo com Scriven (apud Haydt, 1994), é preciso avaliar não apenas o grau de consecução dos objetivos estabelecidos, mas também os próprios objetivos e as outras conseqüências não previstas. Daniel Stufflebeam (apud Haydt, 1994) diz que a avaliação é o processo de delinear, obter e fornecer informações úteis para o julgamento de decisões alternativas. As informações 286 obtidas devem ter como critério básico a utilidade, visando orientar a tomada de decisões. Para esse autor, a avaliação tem duas finalidades básicas: auxiliar o processo de tomada de decisão e verificar a produtividade. Segundo Haydt (1994), Bloom, Hastings e Madaus, apresentam as várias dimensões do conceito de avaliação, por considerá-las didáticas e elucidativas no sentido de esclarecer a natureza do processo de avaliação e seu papel na educação. Para esse grupo de autores a avaliação é um método de coleta e de processamento dos dados necessários à melhoria da aprendizagem e do ensino. Assim, a avaliação inclui uma grande variedade de dados, superior ao rotineiro exame final escrito. Ela auxilia no esclarecimento das metas e dos objetivos educacionais importantes, e consiste num processo de determinação da medida em que o desenvolvimento do aluno está se processando da maneira desejada. Nesse entendimento, a avaliação é um sistema de controle de qualidade pelo qual se pode determinar, a cada passo do processo ensino-aprendizagem, se este está sendo eficaz ou não e indica que mudanças devem ser feitas a fim de assegurar sua eficácia. A autora Haydt (1994) cita que para Blomm e colaboradores a avaliação é um instrumento na prática educacional que permite verificar se os procedimentos alternativos são igualmente eficazes na consecução de uma série de objetivos educacionais. A partir daí podemos observar que estes autores apresentam uma concepção extensiva de avaliação, entendendo que ela não tem fim em si mesmo, mas, é sempre um meio, um recurso, e como tal deve ser usada. FUNÇÕES DA AVALIAÇÃO Segundo Casaux (1994), a avaliação apresenta basicamente três funções: diagnosticar, controlar e classificar. Relacionadas a essas funções, existem três modalidades de avaliação: diagnóstica, formativa, e somativa. A avaliação diagnóstica é aquela realizada no início de um período letivo ou unidade de ensino, com a intenção de constatar se os alunos apresentam ou não o domínio dos prérequisitos necessários, isto é, se possuem os conhecimentos e habilidades para as novas aprendizagens. A avaliação formativa, com função de controle, é realizada durante todo o decorrer do período letivo com o intuito de verificar se os alunos estão atingindo os objetivos previstos, isto é, quais os resultados alcançados durante o desenvolvimento das atividades. A avaliação somativa, tem função classificatória, realiza-se ao final de um curso, período letivo ou unidade de ensino, e consiste em classificar os alunos de acordo com níveis 287 de aproveitamento previamente estabelecidos, geralmente tendo em vista sua promoção de uma série para outra, ou de um grau para outro. Essas três formas de avaliação estão intimamente vinculadas, para garantir a eficiência do sistema de avaliação e a eficácia do processo ensino-aprendizagem, o professor deve fazer uso conjugado das três modalidades (Haydt, 1994). Para Depresbiteris (1989) a avaliação da aprendizagem utiliza geralmente dois critérios: absoluto e relativo, sendo que a avaliação baseada em padrões absolutos é chamada de avaliação referente a critério, e a baseada em padrões relativos é chamada de avaliação baseada em normas. A avaliação baseada em critério verifica o desempenho do aluno com relação a domínios esperados do conhecimento, e por isso é mais apropriada ao processo de ensino aprendizagem. Já a avaliação que se baseia em normas verifica a posição do aluno referente ao grupo, sendo assim, mais apropriada a um sistema de seleção, de classificação. A PROVA COMO INSTRUMENTO DE AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM Os instrumentos de avaliação devem ser utilizados ao longo do período letivo e permite ao professor colher informações sobre a capacidade de aprendizado dos alunos. Cabe ao professor definir os instrumentos que serão utilizados e com isso acompanhar o processo de ensino aprendizagem dos alunos. Não existem instrumentos específicos de avaliação capazes de detectar o desenvolvimento e aprendizagem dos alunos. É diante da limitação que cada instrumento de avaliação comporta que se faz necessário pensar em instrumentos diversos e mais adequados com suas finalidades. Os instrumentos utilizados pelos professores nas escolas no período de observação basicamente eram composto por provas, trabalhos, e observação de comportamento. Essa evidência nos leva a uma reflexão mais profunda sobre a prova. E para discutir esse conceito destacamos as idéias de Moreto (2002) e sua defesa sobre a prova como instrumento privilegiado de estudo e não como um acerto de contas entre professor e aluno. Para ele a prova é um momento privilegiado por julgar que diante de tudo o que a tradição vem associando a prova, o aluno coloca suas energias em busca do sucesso normalmente associado a uma boa nota. Segundo Moreto (2002) o real sucesso educacional é quando o professor atinge os objetivos de ensinar oportunizando a aprendizagem significativa de conteúdos relevantes. Neste sentido a pesquisa pode constatar que a aplicação de provas por alguns professores visa 288 apenas à verificação de aprendizagem dos alunos e classificá-los em aptos ou inaptos para o ano seguinte. Para considerar o sucesso do ensino, é preciso que o professor estabeleça claramente seus objetivos ao preparar suas aulas, verificar se os conteúdos são relevantes para o contexto dos alunos. Além disso, o professor não deve avaliar seu aluno apenas por uma prova, deve utilizar outros instrumentos de avaliação de aprendizagem para poder julgar possíveis competências dos alunos numa situação específica. METODOLOGIA A pesquisa teve seu inicio com a reunião do grupo de pesquisa, onde foram apresentados os participantes e definidas as estratégias de levantamentos de dados. Primeiramente foi realizado o levantamento das escolas e levantamento bibliográfico de obras referentes ao tema da avaliação. O resultado do levantamento mostrou um número exíguo de obras à disposição dos professores, o que nos leva a inferir que estes não conseguem ter acesso a materiais e discussões de ponta sobre a temática da avaliação. Durante o período de estudos e fichamentos das obras referentes à temática e depois de levantados dos dados sobre as escolas, foi constituída a amostra da população por meio da técnica de amostragem aleatória simples. Após a definição das amostras a equipe iniciou os procedimentos da coleta de dados em observações diretas, realizadas com base em um roteiro prévio, apresentado ao professor regente, pelo qual ele tomava conhecimento sobre o que seria observado e quais seriam as categorias analíticas. O processo de coleta de dados teve início no período de encerramento do quarto bimestre letivo, no período de novembro e dezembro de 2011. Concluída a etapa de observação de campo, foram realizadas as análises das mesmas com o objetivo de verificar a concepção pedagógica adotada pelos professores. Em um segundo momento foi realizado as entrevistas com os professores no período de março e abril de 2012. Após a realização das entrevistas fizemos a análise das mesmas, com base em diferentes autores que corroboram para identificação e discussão acerca das concepções e práticas adotadas por cada professor. 289 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS DAS OBSERVAÇÕE DE CAMPO Inicialmente apresentaremos uma análise dos resultados coletados nas observações. Os dados encontrados serão descritos e discutidos seguindo os eixos de análise: instrumento de avaliação e funções da avaliação Os instrumentos de avaliação devem ser utilizados ao longo do período letivo. Esses instrumentos permitem ao professor colher informações sobre a capacidade de aprendizado dos alunos, em especial, pela competência dos mesmos para resolver problemas e instrumentalizar o conhecimento. Cabe ao professor definir os instrumentos que serão utilizados para melhor acompanhar o processo de ensino aprendizado de seus alunos. Não existem instrumentos específicos de avaliação capazes de detectar o desenvolvimento da aprendizagem. É diante da limitação que cada instrumento de avaliação comporta que se faz necessário pensar em instrumentos diversos e mais adequados com suas finalidades. No que diz respeito aos instrumentos de avaliação encontrados, 28,5% dos casos observados utilizam as provas. Este mesmo percentual 28,5% foi observado na frequência de uso dos trabalhos em aula e em casa, na avaliação por observação sem registro formal, e na pontuação de tarefas, comportamento e participação em aula. Sendo estes os instrumentos utilizados e observados nas escolas e práticas observadas. Durante as observações foram constatados que durante a aplicação das provas, os alunos pedem o auxílio do professor, houve um relato de um professor que disse: “Aqui esta certo, apaga esta e faz novamente”. (Professora 2º ano EF, escola B) Houve outro relato no qual um aluno disse: Aluno: Professora! Eu não sei fazer esta questão! Professora: Coloca na que você acha que é certa. (Professora, 2º ano EF, escola B) Para Moreto (2002) o professor deve pensar no momento da elaboração das provas em uma avaliação eficaz (que traz resultados satisfatórios) e ao mesmo tempo eficiente. Neste último tanto o objetivo quanto o processo são levados em conta e o aluno faz uso do seu raciocínio para responder as atividades dando significado ao que lê e produz. Para ele, ao formular perguntas é preciso adotar um parâmetro, um ponto de partida deixando a pergunta clara, objetiva e contextualizada. Segundo Moreto (2002) Não é acabando com a prova escrita ou oral que se melhora o processo de avaliação da aprendizagem, mas resignificando o instrumento e elaborando-o dentro de uma nova perspectiva pedagógica (2001 p.25). 290 Gama (2002) observa um número significativo de professores que utilizam à prova como um método de mera averiguação da aprendizagem. Esse fato faz com que as aulas se resumam apenas a momentos de preparação para os testes e provas. A aula torna uma revisão de conteúdos pré-determinados pelo currículo escolar centralizador das práticas pedagógicas. Com relação às funções da avaliação foram observados que em 71,4% das avaliações feitas nas escolas estaduais observadas se enquadram na modalidade somativa, com função classificatória, realizada ao final do bimestre, período letivo ou unidade de ensino, consistindo em classificar os alunos de acordo com níveis de aproveitamento previamente estabelecidos, geralmente tendo em vista sua promoção de uma série para outra, ou de um grau para outro. APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS DAS ENTREVISTAS ESTRUTURADAS As entrevistas foram realizadas com cinco professores, sendo todos pedagogos e pósgraduados. No que se refere à prática docente uma das respostas obtidas confirma as ações pedagógicas que foram observadas com maior frequência em sala de aula durante o período de observação em campo. “A gente procura desenvolver os conteúdos propostos no planejamento, também o planejamento diário que a gente faz a nossa rotina de trabalho, a gente confecciona cartazes, atividades em duplas, sala de vídeo, sala do computador. Tudo isso contribui para que a gente tenha um trabalho melhor.” (Professora, 3º ano EF, escola D) “Importante o professor fazer um levantamento prévio do conhecimento do aluno e a partir desse levantamento ele trabalhar utilizando material concreto. Importante o professor fazer uma sondagem para identificar até que ponto o aluno tem conhecimento do assunto”. (Professora, 2º ano EF, escola I) Ressalta-se que nas respostas obtidas fica evidente a prática da sondagem como elemento auxiliador do planejamento de ensino e desenvolvimento das intervenções práticas. Ao serem perguntados sobre o sistema de avaliação adotado na e pela escola fica patente a menção a Portaria 1001/2008/GAB/SEDUC, que normatiza a matéria. Com isso o que se observa é uma adequação ao sistema, resguardando as particularidades de cada caso à medida que tal normativa abre espaço para tais especificidades. Dentro do que estabelece a resolução o sujeito (Professora 3°ano EF escola D) adéqua a sua forma de avaliar, aplicando uma prova bimestral no valor de 05 pontos, acreditando ser esta uma forma de responder aos pais e sociedade sobre o que o aluno faz no dia-a-dia da escola. 291 “Eu faço sempre um diagnóstico inicial quando ele chega pra mim, e os avanços que ele vai tendo no mês a mês, bimestralmente. Eu atribuo uma nota porque é necessário, em função do sistema que nós vivemos, tudo tem uma nota final. Olha, que nem eu digo, eu me adéquo a ele, eu não tenho assim... uma opinião formada se ele é adequado ou não, mas, eu procuro me adequar a ele. Então aquela provinha bimestral para dar uma resposta para a sociedade que os pais cobram. A gente não tem como tá [sic] explicando todo como é o processo do dia-a-dia p’ra [sic] eles. Então eu faço essa provinha que é pra dar uma resposta p’ros [sic] pais, e o que conta p’ra [sic] mim mesmo é o que o aluno me mostra no dia-a-dia, e não aquela notinha final.Porque a nota final só vai chegar p’ra [sic] ela após todo esse processo que eu acompanho na sala de aula”. (Professora, 3º ano EF, escola D) Outro relato pode ser observado no que se refere à Portaria 1001/2008/GAB/SEDUC, que trata sobre as normas da avaliação. “Depois que foi instituída a normativa 1001 eu acredito que se evoluiu muito porque dá p’ra [sic] se dizer que 50% dela avalia de forma qualitativa e 50% de forma quantitativa”. (Professora, 4º ano EF, escola M) Segundo Haydt (1994) o termo avaliar tem sido constantemente associado a expressões como fazer provas, fazer exames, atribuir nota, repetir ou passar de ano. Essa associação tão frequente em nossas escolas, e mesmo no sistema estadual de ensino, é resultado de uma concepção pedagógica arcaica, mas tradicionalmente predominante. Em análise das respostas obtidas, infere-se que para estes sujeitos, a avaliação no processo ensino-aprendizagem tem o papel de mera constatação de resultados, pelos quais se determina a progressão ou retenção do aluno. As respostas são aparentemente contraditórias, onde se observa uma defesa na avaliação como coleta de informações úteis para o desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem. Entretanto, as tônicas das respostas giram sempre em torno da nota e da reprovação. “A gente tem tentado considerar tudo o que o aluno faz, mesmo aquele com mais dificuldade a gente se amparar pelo histórico que ele já tem, assim, a gente tenta fazer um relatório do desenvolvimento das atividades dele, no final de tudo tem que atribuir uma nota. Dependendo da situação do aluno ele é retido na mesma série”. (Professora, 3º ano EF, escola D) “A prova tem que servir p’ro [sic] aluno como uma devolutiva, é uma devolutiva. (...) enfim, o resultado do bimestre é a soma de tudo aquilo que tá [sic] na 1001”. (Professora, 4º ano EF, escola M) Como sabemos os instrumentos avaliativos são diversos, cabe ao professor, conhecer sua turma e avaliar, tendo objetivos claros e definidos, visando à qualidade da aprendizagem e 292 não a quantidade. O importante é que o professor conheça bem seus alunos, sendo mediador no processo de construção do conhecimento escolar. Geralmente o instrumento avaliativo mais utilizado pelos professores de todos os níveis de ensino são as provas escritas. CONSIDERAÇÕES FINAIS Podemos, a partir de então, observar que entre os professores pesquisados, os instrumentos de avaliação utilizados têm um enfoque quantitativo com a supervalorização de provas, nas quais o foco principal está nos resultados geradores da nota do aluno. Nesses casos, a medida se sobrepõe à avaliação, que pela função somativa ganha contornos classificatórios e excludentes. A supervalorização da nota, como principal resultado gerado pela avaliação, pode ser verificada em comportamentos como: em 9% dos casos, o professor induz o aluno ao “chute”, para que ele não deixe questões sem resposta. Em todos os casos, a nota atribuída à prova do aluno é a principal definidora de seu desempenho quanto à sua “média bimestral” ou mesmo sua aprovação ou reprovação ao final do ano letivo. Este estudo considera que a avaliação educacional deva servir de instrumento pedagógico que auxilie o professor durante todo o processo de ensino-aprendizagem de forma articulada aos princípios pedagógicos adotados. Neste sentido, entendemos que a avaliação não deve ser concebida de forma arbitrária e sim como processo educativo sistemático e significativo que valoriza o aluno e seu contexto em articulação com os conhecimentos básicos e fundamentais do currículo formal escolar. A forma como a avaliação educacional é praticada pela escola simplesmente interessada em classificar seus alunos, força professores a utilizarem métodos que desqualifica e não ajuda no rendimento escolar, tornando-a uma prática excludente e punitiva. REFERÊNCIAS FARIA Wilson de. Aprendizagem e planejamento de ensino. São Paulo: Ática, 1989. GAMA, Zacarias Jaegger. Avaliação na escola de 2° grau, 3ª ed. Campinas: Papirus, 2002. 293 HAYDT, Regina Cazaux. Avaliação do Processo Ensino-Aprendizagem. São Paulo: Ática, 2001. DEPRESBITERIS, L. O desafio da Avaliação da Aprendizagem; dos Fundamentos a uma Proposta Inovadora. São Paulo: EPU, 1989. LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem escolar. 18ª ed. São Paulo: Cortez, 2006. MIRANDA, Flavine Assis de. Avaliação educacional no interior amazônico: entre a regulação e emancipação. Tese de doutorado. Universidade Estadual paulista Júlio de Mesquita Filho/UNESP/FCLAR, 2010. MORETO, Vasco Pedro. Prova: um momento privilegiado de estudo não um acerto de contas. Rio de Janeiro: DP&A, 2002. SILVA, Ceres Santos. Medidas e Avaliação em Educação. Petrópolis: Vozes, 1992. 294 OS DESAFIOS DA TECNOLOGIA DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO NA EDUCAÇÃO: O CASO DO PROJETO DE EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA NO CAMPUS JOSÉ RIBEIRO FILHO A relação entre os principais modelos nacionais e internacionais de educação a distância e a pertinência e aderência desses modelos com o contexto amazônico de Rondônia Natalí Maria Silva Brito61 José Lucas Pedreira Bueno62 RESUMO Este estudo tem como objetivos realizar levantamento dos desafios enfrentados no uso de tecnologia de informação e comunicação dentro do processo de Educação a Distância do Campus José Ribeiro Filho, mais especificamente, identificar quais os desafios enfrentados para a implantação e funcionamento da educação a distância na Universidade Federal de Rondônia. Na primeira etapa do estudo, foram selecionados e analisados os documentos oficiais e institucionais referentes à modalidade de educação a distância, bem como a leitura da literatura produzida na área em questão. Na etapa empírica realizamos entrevistas com as docentes da Universidade Federal de Rondônia, que estiveram diretamente envolvidas com a implantação e oferta dos cursos de graduação a distância nessa IFES. Os resultados obtidos foram submetidos à análise de conteúdo, que revelou que os principais desafios para a educação a distância na UNIR são, respectivamente: a falta de recursos humanos, a resistência à modalidade de ensino a distância, a quantidade insuficiente de recursos financeiros e a evasão de alunos por não adaptação ao modelo de EAD institucional da Unir, superando os próprios desafios do uso de tecnologias de informação e comunicação na educação. Palavras-chave: Educação a Distância; Tecnologia de Informação e Comunicação; Desafios organizacionais; Universidade Federal de Rondônia. ABSTRACT This study aims to carry out a survey of the challenges faced in the use of technology information and communication within the process of Distance Education in Campus José Ribeiro Filho, more specifically, identify the challenges faced in the implementation and operation of distance education at the University of Rondônia. In the first stage of the study, were selected and analyzed official documents and institutional related to distance education mode, as well as reading the literature produced in the area in question. In step empirical interviews conducted with teachers at the Federal University of Rondônia, which were directly involved with the implementation and delivery of undergraduate distance that IFES. The results obtained were subjected to content analysis, which revealed that the main challenges for distance education in UNIR are, respectively: the lack of human resources, resistance to distance learning mode, the insufficient 61 Acadêmica do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Rondônia e bolsista PIBIC/UNIR/CNPQ vinculada ao grupo de pesquisa PRAXIS. (e-mal:i [email protected]). 62 Professor do Departamento de Ciências da Educação e do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação da UNIR. (e-mail:[email protected]). 295 amount of financial resources and avoidance of students, exceeding the propers challenges of use of information and communication technologies in education. Keywords: Distance Education; Technoloty Information and Communication; Organizational challenges; Federal University of Rondônia. 1 INTRODUÇÃO As mudanças sociais, educacionais e econômicas após a Revolução Industrial fizeram a reorganização da sociedade em torno das relações estabelecidas para a produção material, que, consequentemente, influenciaram as ações de produção subjetiva e material da educação. Esse fenômeno, segundo Rosar (1999) não aconteceu com exclusividade no sistema educacional do Brasil. Hoje, essas influências podem ser vistas a partir das mudanças educacionais que muitos países adotaram, frente às políticas econômicas provenientes do Banco Mundial (BIRD). Para Behar (2009, p. 20) o modelo educativo na Sociedade industrial, modelo aqui com sentido de “um pressuposto filosófico matricial, ou seja, uma teoria, um conhecimento que origina o estudo de um campo científico; uma realização científica com métodos e valores que são concebidos como modelo” dá ênfase ao ensino tecnicista, pois sua função é preparar o indivíduo para as divisões do trabalho de acordo com as aptidões, sendo que nesse modelo não é levado em conta a vivencia do aluno, não desperta a curiosidade e privilegia o acúmulo de conhecimento e normas da sociedade. Observa-se, contudo, que as abordagens do ensino presencial foram se modificando e avançando para um ensino à Distância, face às exigências principalmente da formação de licenciados e bacharéis para o mercado de trabalho. Assim, nesse contexto a Educação a Distância (EAD) tornou-se uma necessidade para o desenvolvimento da educação, visando ampliar o quadro de profissionais formados. Tal necessidade, implica, de outra forma, em considerar as distâncias geográficas e de áreas que não são atendidas nos cursos presenciais, no ensino superior do Brasil ou que a procura é maior que o número de oferta de vagas, como as oferecidas nas universidades públicas, municipais, estaduais, ou federais. A EAD a partir da sua legalização, por meio da Lei de Diretrizes e Bases da Educação em 1996, tem crescido vertiginosamente nos últimos anos no Brasil, caracterizada pela substituição do contato professor/aluno, pela ação sistematizada e conjunta de novos recursos didáticos e pelo apoio de uma organização técnica tutorial, que auxiliam o ensino- 296 aprendizagem independente e flexível do aluno no Ambiente Virtual de Aprendizagem (BEHAR, 2009). Juntamente com o crescimento da oferta de cursos de graduação a distância, urge os questionamentos sobre como vem se desenvolvendo a implantação e funcionamento de um projeto de educação a distância, considerando ser este um processo recente e que tem enfrentado muitos desafios de caráter subjetivo, como a resistência a este modelo de educação, até questões objetivas, como infraestrutura e capacidade tecnológica. Buscamos com isso, realizar um estudo de caráter exploratório, que visa identificar os principais desafios para a implantação e funcionamento de um projeto de educação a distância. 2 O CASO DA EAD DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA A modalidade de Educação a Distância na Unir teve início em 1999, com a participação da instituição na primeira edição do curso Mídias na Educação, capacitação e formação continuada (PPP, 2010). Atualmente, encontram-se registrados sobre Rondônia, no Catálogo do Sistema Universidade Aberta do Brasil, os seguintes cursos: Bacharelado em Administração Pública, ofertado pela UnB, Licenciatura em Ciências Biológicas, Licenciatura em Letras Português e Licenciatura em Pedagogia, ofertados pela Universidade Federal de Rondônia. Os polos credenciados pela Capes para a oferta dos cursos são Chupinguaia, Rolim de Moura, Ariquemes, Ji-paraná, Buritis, Nova Mamoré e Porto Velho. Figura 1: Mapa dos polos de Educação a Distância em Rondônia - UAB Fonte: Site da Capes/Uab, 2012. 297 Quadro 1: Perfil da Educação a Distância em Rondônia Fonte: Site da UAB, 2012. O Sistema Universidade Aberta do Brasil - UAB foi criado pelo Ministério da Educação - MEC, pelo decreto nº 5.800, de 08 de Junho de 2006 visando a articulação para Educação a Distância (PPP, 2010). A Unir utiliza a plataforma Moodle: esse sistema, em código livre, adotado pela Unir, começou a ser idealizado, no início da década de 90, por Martin Dougiamas, então Webmaster na Curtin University of Technology, na Austrália e responsável pela administração do sistema de gerenciamento de aprendizagem (LMS - Learning Management System) ou Ambiente Virtual de Aprendizagem - AVA dessa instituição, naquela época (Borges, 2008). Hoje este AVA exerce uma hegemonia sobre a escolha dos softwares de mediação de educação distância em universidades de todo o mundo. 298 3 METODOLOGIA A metodologia adotada pela pesquisa é de abordagem qualitativa, do tipo estudo de caso e caracteriza-se, com relação ao seu objetivo, como exploratória. O estudo é composto por duas etapas: na primeira parte é realizada a análise documental e o levantamento da literatura da área. Na etapa empírica, a coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas com os coordenadores e professores dos cursos de graduação ofertados na modalidade a distância, pela UNIR, por meio do sistema UAB, que tiveram e/ou têm participação relevante no processo de implantação deste modelo de ensino nessa IFES. Para tanto, elaboramos um roteiro de entrevista semiestruturada que procurou investigar os desafios enfrentados no uso da tecnologia de informação dentro do processo de educação a distância. Os dados obtidos foram submetidos a análise de conteúdo. 4 RESULTADOS DO ESTUDO 4.1 Os desafios da Educação a Distância na Universidade Federal de Rondônia: o caso dos cursos de Letras e Pedagogia UNIR/UAB Com vistas a descobrir quais são os principais desafios para a implantação e funcionamento do Programa de Educação a Distância da Universidade Federal de Rondônia, escolhemos como objeto de estudo os cursos de Letras e Pedagogia ofertadas na modalidade a distância. Tal escolha justifica-se na medida em que essas graduações foram as pioneiras na oferta dessa modalidade de ensino dentro da instituição e são ofertadas diretamente pela IFES, com materiais, professores e Projeto Político Pedagógico próprios, em parceria com o sistema Universidade Aberta do Brasil. Para a obtenção dos dados, realizamos entrevistas com três professoras que estiveram diretamente envolvidas com o projeto dos cursos e que tiveram relevada importância no desenvolvimento dos mesmos. Para preservar a identidade das participantes dos estudos, identificamos seus discursos por meio das nomenclaturas: Prof.ª A, Prof.ª B e Prof.ª C. Sendo a ordem das entrevistas o critério escolhido para a definição das nomenclaturas. 299 Figura 2: Desafios da EAD na Universidade Federal de Rondônia . Fonte: Entrevista aplicada na pesquisa de campo, 2012. A análise dos conteúdos revela que os principais desafios da Educação a Distância na Universidade Federal de Rondônia estão relacionados às seguintes categorias, respectivamente: recursos humanos, recursos financeiros e alunos, quais sejam: a falta de técnicos na universidade, a quantidade insuficiente de recursos financeiros para a execução do programa de EAD e a evasão de alunos (Figura 2). 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS A conclusão deste trabalho nos permite inferir algumas proposições acerca do objetivo do trabalho e as questões que foram investigadas. Com relação ao objetivo geral: realizar levantamento dos desafios enfrentados nos uso de tecnologia de informação e comunicação dentro do processo de Educação a Distância do Campus José Ribeiro Filho, concluímos que os desafios vão além do uso das tecnologias de informação, envolvendo processos complexos que abrangem desde a infraestrutura dos polos de educação a distância até a gestão dos recursos financeiros, passando por critérios subjetivos como a capacitação e qualificação dos recursos humanos e a resistência institucional perante a modalidade de educação a distância. Tais fatores emergiram a criação de um objetivo específico que englobasse todos os aspectos referentes aos desafios para a implantação e funcionamento de um projeto de educação a 300 distância, qual seja, identificar quais os desafios enfrentados para a implantação e funcionamento da educação a distância na Universidade Federal de Rondônia. Para responder a este objetivo específico, realizamos entrevistas semiestruturadas com três professoras dos cursos de Letras e Pedagogia que estiveram diretamente envolvidas com a implantação da modalidade de ensino a distância na Universidade Federal de Rondônia e submetemos os dados obtidos pelas entrevistas à análise de conteúdo. A análise do conteúdo revelou que, dentre os desafios do processo de educação a distância na UNIR, a falta de recursos humanos foi o obstáculo mais enfatizado pelas professoras. Os discursos das docentes revelam que a falta de técnicos dentro da instituição afeta sobremaneira o andamento do projeto, na medida em que aumenta a sobrecarga de trabalho dos envolvidos e impede o funcionamento e/ou aperfeiçoamento das ferramentas tecnológicas. O segundo desafio mais enfatizado durante as entrevistas foi a resistência institucional ao modelo de educação a distância. Segundo as docentes, houve muito preconceito e rejeição por parte dos próprios colegas, o que dificultou à priori a adesão de novos professores. Também, destacam-se como desafios para o processo de educação a distância da UNIR a quantidade de recursos financeiros insuficientes, a evasão de alunos por não se adaptarem ao “modelo pedagógico em ação” e a falta de políticas e ações para capacitação dos recursos humanos. Podemos, então, inferir que a modalidade de ensino a distância, principalmente, a realizada por meio dos ambientes virtuais de aprendizagem, é um processo recente no país, se comparada com o processo de aprendizagem presencial, e requer muitos esforços por parte dos estudiosos da área para investigar a complexidade de fatores englobados neste processo, a fim de aprimorá-lo para superar as barreiras advindas de sua implantação a partir de planejamento e recursos insuficientes. Podemos compreender que os problemas nos cursos a distância, muitas vezes, podem estar para além do uso das tecnologias de informação e comunicação, na área de planejamento e gestão e no momento da implantação e manutenção da infraestrutura física, na expansão da capacidade de infraestrutura de rede, na contratação, gestão e capacitação de recursos humanos, na adequação do material didático ao perfil do aluno e ao modelo pedagógico e, principalmente, no desenvolvimento do projeto pedagógico previsto e aprovado para execução. Sendo assim, nosso objetivo ao identificar os principais desafios no processo de educação a distância na Universidade Federal de Rondônia foi o de suscitar reflexões e práticas que pudessem servir para aperfeiçoar essa modalidade de ensino, 301 para que essa possa ser usada como uma ferramenta de democratização e, sobretudo, de qualificação do saber. REFERÊNCIAS BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Ed. 70. 1977. BEHAR, Patrícia Alejandra. Modelos Pedagógicos em Educação a Distância. Porto Alegre: Artmed, 2009. BRASIL. Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996. Brasília: MEC: 1996. ______. Portaria Ministerial nº 4.059. Brasília. MEC: 2004. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/sesu/arquivos/pdf/nova/acs_portaria4059.pdf>. Acesso em: 20 de fevereiro de 2012. ______. Decreto nº 5.622. Diário Oficial da União - D.O.U. 2005. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2005/decreto/D5622.htm>. Acesso em: 20 set. 2011. ______. Decreto nº 5.800, Brasília. MEC: 2006. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/decreto/d5800.htm>. Acesso em: 20 set. 2011. ______. Portaria Normativa nº 2. Brasília. MEC: 2007. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seed/arquivos/pdf/legislacao/portaria2.pdf>. Acesso em: 20 set. 2011. ______. Portaria Ministerial nº 4.361. Brasília. MEC: 2004. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seed/arquivos/pdf/port_4361.pdf>. Acesso em: 20 set. 2011. EDITAL, N.º 007/2011/DIRED/Reitoria. Universidade Federal de Rondônia. Diretoria de Educação a Distância - Universidade Aberta do Brasil - UAB. 2011. LÉVY, P. A inteligência coletiva - Para uma antropologia do ciberespaço. Lisboa: Ed. Instituto Piaget, 1994. LUDKE, M e ANDRÉ, M. E. D. A. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986. BORGES, M. R. C.. Escola Superior Aberta do Brasil. LTDA -ESAB, Vila Velha, ES, 2008. BORGES, M. R. C.. Introdução a Educação a Distância. Escola Superior Aberta do Brasil. LTDA - ESAB <http://www.esab.edu.br>. Vila Velha, ES, 2008. 302 MORAN, José Manuel. Especialista em mudanças na educação presencial e a distância.Texto publicado em RICARDO, Eleonora Jorge (org.). Educação Corporativa e Educação a Distância. Rio de Janeiro: Editora Qualitymark, 2005. _______. Modelos e avaliação do ensino superior a distância no Brasil. Revista digital. Revista ETD, Educação Temática Digital da Unicamp, Vol. 10, Nº 2 Disponível em: <http://www.eca.usp.br/prof/moran/avaliacao.htm> Acesso em: 20 set. 2011. PILETTI, C. Didática Geral. 21. ed. São Paulo: Ática, 1997. SANTOS, J. F. S. Avaliação no Ensino a Distância. In: Revista Iberoamericana de Educación (ISSN: 1681-5653), 2006, s/v, s/p. Disponível em: <http://www.rieoei.org/deloslectores/1372Severo.pdf > Acesso: em: 20 de fevereiro de 2012. Universidade Federal de Rondônia. Diretoria de Educação a Distância - DIRED Universidade Aberta do Brasil - UAB. Projeto Pedagógico do Curso Bacharelado em Administração Pública Modalidade a Distância. Porto Velho, 2010. _______. Projeto pedagógico do curso de Letras/ UAB-UNIR. Porto Velho, 2007. _______. Projeto Pedagógico Curricular do Curso de Pedagogia na modalidade a distância UNIR/UAB. Porto Velho, 2010. 303 O ENSINO E A APRENDIZAGEM DE NÚMEROS E CÁLCULO ARITMÉTICO NA ESCOLA: POSSIBILIDADES E LIMITES Patrícia da Silva Manhães Ferreira63 Orestes Zivieri Neto64 RESUMO O presente trabalho apresenta os resultados referentes a dois anos da pesquisa desenvolvida por meio do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação Científica - PIBIC/2010-2012, através do subprojeto “Os (des) caminhos das quatros operações básicas e do valor posicional em matemática nas séries iniciais do ensino fundamental”65. Seu objetivo é analisar as dificuldades enfrentadas pelos professores e alunos de série iniciais respectivamente no ato de ensinar e aprender números e quatro operações. O estudo foi desenvolvido em duas escolas públicas estaduais do município de Rolim de Moura - RO, em turmas de 1º e 2º Ano do Ensino Fundamental e, traz como abordagem o enfoque qualitativo, utilizando, para isso, os seguintes instrumentos de coleta de dados: análise dos cadernos e dos livros didáticos, observação e entrevistas com professores e alunos. Assim, espera-se que os desafios do processo ensino aprendizagem de números e cálculo aritmético, sejam superados com o auxílio de seu sentido e sua significação, normalmente obtidos, como nos aponta Berton e Itacarambi (2009), ao utilizar situações problemas que suscitam o emprego de estratégias que acabam por revelar os conhecimentos prévios alcançados pelas crianças em ações informais do cotidiano. Palavras chaves: Números e quatro operações. Ensino aprendizagem. Valor posicional. INTRODUÇÃO O presente artigo busca apresentar os resultados parciais da pesquisa intitulada “Mas eu ensino! As dificuldades inerentes ao processo de ensinar e de aprender matemática nas séries iniciais do ensino fundamental”3, através do desdobramento de seu subprojeto - Os (des) caminhos das quatros operações básicas e do valor posicional em matemática nas séries iniciais do ensino fundamental. A investigação encontra-se em desenvolvimento em duas escolas estatuais do município de Rolim de Moura - RO, em salas de 1º e 2º anos do ensino 63 Acadêmica do VI Período de Pedagogia da Universidade Federal de Rondônia – Campus de Rolim de Moura. Membro do Grupo de Estudos e Pesquisa em Psicologia e Educação da Amazônia – GEPPEA. Bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC/UNIR. 64 Professor Pesquisador e Vice-Líder do Grupo de Estudos e Pesquisa em Psicologia e Educação da Amazônia da Universidade Federal de Rondônia – Campus de Rolim de Moura 65 Pesquisa financiada pelo Edital MCT/CNPq N º 14/2010 - Universal / Edital MCT/CNPq 14/2010, sobre o registro nº 472664/2010-7, intitulada “Mas eu ensino! A dificuldades inerentes ao processo de ensinar e de aprender matemática nas séries iniciais do ensino fundamental”. 304 fundamental. Seu objetivo é o de levantar as dificuldades inerentes ao processo de ensino e aprendizagem de números e quatro operações. Dentre as indagações e constatações, um fato recorrente é que alguns conteúdos ensinados, quando necessitam de serem amalgamados para facilitar o processo de compreensão de um novo conceito são impossibilitado pela ausência de uma memória por parte dos alunos, que forneça a possibilidade de uma conexão lógica entre as partes. Em muitos casos, alguns conteúdos como as quatro operações, por exemplo, em especial a multiplicação e divisão são problemas que normalmente se estendem ao longo de todos dos anos do ensino fundamental. Com isso surge um de nossos problemas: A ausência de uma consolidação lógico compreensiva da base dez em nosso sistema numérico decimal prejudicaria os demais conteúdos a serem dados nos anos subsequentes? Por exemplo, as quatro operações, especialmente a multiplicação e divisão seriam o princípio desencadeador de algumas fobias? Desse modo, o artigo apresenta, inicialmente, os fundamentos teóricos obtidos através do embasamento dos estudos sobre o assunto, logo após as discussões de “Materiais e Métodos”. Em seguida, optou-se em agrupar os “Resultados e Discussões” com a indicação de quatro categorias. Por fim, apresentam-se as considerações finais, levando em conta os elementos que se destacam pelos levantamentos realizados por nossa investigação. NÚMEROS, VALOR POSICIONAL E QUATRO OPERAÇÕES: UM DESAFIO VIVIDO PELOS PROFESSORES DOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL. A matemática deve ser vista por todos como algo essencial, inserida na cultura ela esta sempre presente na vida cotidiana das pessoas. A exemplo das indicações oferecidas pela literatura científica é preciso superar as aversões no ensino de matemática, apresentando metodologias que aproximam os conteúdos a sua funcionalidade social, para que os alunos possam além de validarem seus conhecimentos erigidos no cotidiano, o utilizarem para conferirem maior significado e sentido a tudo àquilo que se esta ensinando. Os estudos elaborados por Kamii (2005), colaboradora de Piaget, por exemplo, buscam relacionar o conhecimento que as crianças possuem na perspectiva de compreender como elas constroem seus conceitos matemáticos. A construção do conceito de número pelas crianças se desenvolve através de três tipos de conhecimentos: conhecimento físico, social e lógico. Com a combinação dos dois primeiros conhecimentos surgiria à capacidade da 305 abstração física e, com a construção do conhecimento lógico obteríamos a abstração reflexiva ou construtiva. De acordo com Berton e Itacarambi (2009) para facilitar a compreensão das crianças em processo de aquisição dos conceitos numéricos, o educador deve trabalhar com atividades desenvolvidas através de jogos e situações problemas que envolvem seu cotidiano a fim de proporcionar sentido, o que facilita seu aprendizado e compreensão. As crianças chegam à escola com algum conhecimento dos números, Nunes e Bryant (1997) afirmam que as crianças mais novas são capazes de contar números na ordem correta, mas isso não significa que compreende o significado e o significante desses números e, para que isso aconteça é preciso que elas compreendam o processo de conservação numérico quantitativo. O sistema de ensino ao invés de explorar a sequência numérica como atividades nas quais as crianças possam adquirir a compreensão das regras do sistema decimal inviabilizam, ou retardam essa aprendizagem com exercícios que envolvem leitura e escrita de números, o que reforça as crianças a memorizarem mecanicamente a ordem numérica sem entender sua lógica de base dez. Segundo Pavanello (2004) a compreensão do significado dos números com dois algarismos gera muitos conflitos para as crianças, por isso é essencial que se trabalhe já no início da escolaridade o valor posicional dos números para favorecer a compreensão de que nosso sistema numérico é organizado pela base 10. Esses conflitos também são gerados na escrita dos números, quando pensam que os números são escritos da mesma forma com que é falado ou, quando atribui que um número é maior que o outro por ter mais algarismo, a partir de sua ordem na classe numérica. De acordo com Moreno (2006), as crianças quando ainda não conhecem a escrita convencional dos números se baseiam em ideias que relacionam a fala e a escrita, como se os números fossem escritos da mesma forma como se fala, mas o valor posicional dos números não pode ser atribuído à fala. O que as crianças não compreendem é que os números escritos possuem posições, que permite atribuir a eles valores que ficam claros quando se entende em que consiste a potência decimal dos números. Em relação aos conceitos aditivos, Nunes e Bryant (1997) explicam que quando as crianças compreendem o processo das composições aditivas, isto permite que elas entendam como é estruturado o sistema decimal. Ao decompor os números com mais de dois algarismos, separando as dezenas das unidades, esse entendimento se dá numa estratégia mais avançada de contar “na sequência”, que as crianças podem descobrir para resolver operações 306 de adição. Outra estratégia na qual as crianças mais novas se sentem confiantes para realizar adições é a estratégia de “contar todos”, ou seja, resolver os problemas de adição fazendo a contagem de todas as quantidades. Quando se utiliza atividades desenvolvidas através de situação-problema para trabalhar com operações de adição e subtração, os conceitos presentes nos enunciados, segundo Berton e Itacarambi (2009) são: problemas de composição que correspondem à ideia de juntar relacionando as partes para compor o todo. O de transformação que envolve situação de modificação do estado inicial em uma situação final, ou vice-versa. O de comparação que se relaciona com o tipo a mais, a menos, equiparar, completar e quantos faltam. E, como introdução da estrutura multiplicativa os problemas que envolvem combinação entre objetos que permite o uso de recursos representativos, diagramas e desenhos, trazendo as ideias iniciais do “vezes” da multiplicação. Nas composições de situações problemas com as estruturas multiplicativas e de divisão, além das ideias de combinação, os alunos também apresentam certas habilidades para compreenderem a configuração retangular em atividades que envolvam a questão de filas/colunas por linhas, desde que utilizem para isso problemas relacionados ao dia a dia de mais fácil compreensão pelas crianças. Na estrutura multiplicativa e de divisão, ainda, é possível às situações problemas que envolvem a comparação referentes a dobros, triplos, metades e terços. Para a estrutura de divisão, em especial, é preciso investir em atividades em que o tamanho de cada agrupamento a ser formado seja conhecido, e é preciso determinar quanto agrupamentos serão necessários. Exemplo: Como posso dividir 96 figurinhas em pacotes com 3 figurinhas cada um? Quantos pacotinhos podem ser feitos? Moreno e Sastre apud Moreno (2006, p.63), explica que: “Na escola, são o professor e o livro que abstraem e isolam propriedades quantitativas e qualitativas; na vida é a criança quem deve abstrair, analisar e organizar toda a informação para poder decidir como vai proceder”. Por essa razão o professor deve sempre realizar uma reflexão de sua prática, avaliando se a forma de ensinar oferecidas as crianças oferecem oportunidades reais de assimilação e generalização do conhecimento matemático e, consequentemente, o desenvolvimento de sua autonomia intelectual. Assim, pode se dizer que o ensino dos números e das quatro operações, portal de ingresso curricular ao ensino e aprendizagem da matemática escolar, deve sempre estar interligado com o valor e sentido que eles representam nos repertórios de conhecimentos 307 sociais dos sujeitos, para que funcione como peças fundamentais à conferência de sentido e atribuição de significado para cada atividade a ser realizada na escola e na vida. MATERIAIS E MÉTODOS A presente pesquisa é de abordagem qualitativa e seu estudo do tipo analítico descritivo, tem como propósito investigar como é planejada e desenvolvida a prática pedagógica ao ensinar números e quatro operações, se os métodos utilizados favorecem ou não a aprendizagem do aluno. Averiguar se os conceitos numéricos ensinados auxiliam a compreensão dos mesmos contribuindo assim para o desenvolvimento do raciocínio lógicomental em entender aritmética. O universo desta investigação consiste em duas escolas públicas da rede estadual do município de Rolim de Moura, que foram selecionadas através da classificação dos índices obtidos na Provinha Brasil, sendo uma com melhor índice e a outra com o índice abaixo da média. Os colaboradores da pesquisa são, portanto, professores e alunos. A investigação utilizou como instrumentos de coleta de dados o levantamento bibliográfico, contextualização do universo de investigação, as análises dos cadernos dos alunos e dos livros didáticos adotados para o 1º e 2º ano do ensino fundamental, observação em salas de aula e, por fim as entrevistas com professores e alunos. As análises dos livros didáticos66 e cadernos dos alunos foram realizadas tomando todas as atividades que exclusivamente traziam como objetivo, o ensino de números e das quatro operações. A observação participante, foi desenvolvida com 4 turmas da instituição “A” sendo duas turmas de 1º ano e duas turmas de 2º ano, e na escola e “B”, com duas turmas, uma de 1º ano e outra de 2º ano. Em ambas escolas houve autonomia para negociar com as professoras os horários e dias que melhor atendessem o professor participante sem prejudicar o andamento da rotina de cada turma. O último instrumento da pesquisa utilizado foi a entrevista semiestruturada, com os professores e alunos, que contou com a participação de 6 professores, sendo 3 docentes da 66 Os livros adotados e analisados são: “A escola é nossa” de 1º ano, de autoria: Fábio Vieira, Jackson Ribeiro e Karina Pessôa, Editora Scipione, e o “Livro Fazendo e Compreendendo Matemática” de 2º ano, de autoria: Lucília Bechara Sanchez; Manhúcia Perelberg Liberman; Regina Lúcia da Motta Wey da Editora Saraiva. 308 escola “A”, sendo duas que ministram aulas para o 1º ano e a outra de 2º ano e, na escola “B” duas docentes que ministram aulas para o 2º ano e uma para o 1º ano. Com os alunos tivemos a participação alunos 12 na escola “A”, sendo 6 alunos de 1º ano e 6 alunos de 2º ano e, na escola “B” contamos com a participação de 6 alunos, sendo 3 de 1º ano e 3 de 2º ano, esses números representam probabilisticamente a porcentagem 10% de alunos de cada turma investigada. Dessa forma, com os instrumentos de coleta de dados utilizados, espera-se que possamos aventurar a indicar as causas que levam cada vez mais os alunos a não compreenderem o significado e sentido de nosso sistema numérico decimal e do cálculo aritmético. RESULTADOS E DISCUSSÕES Nesse momento da pesquisa, na medida em que se adiciona cada instrumento de coleta de dados relacionados respectivamente em cada período, as informações geram a perspectiva de serem tratadas e analisadas levando em conta a frequência com que cada dado aparece, possibilitando que os resultados e as discussões pertinentes se fundem na tentativa de elucidar a melhor forma de tratamento. Desse modo, levando em conta o acúmulo das informações levantadas, passaremos adotar quatro categorias com a finalidade de melhor apresentarmos os resultados já evidenciados. α) O ensino de números e quatro operações nas perspectivas dos livros didáticos adotados. A análise dos livros didáticos de 1º e 2º ano, das respectivas escolas participantes da pesquisa, tem a finalidade de mostrar os objetivos propostos por seus autores, no ensino de números e quatro operações. Os livros adotados pelas escolas “A” e “B” apresentam nas atividades propostas para a construção do conceito de número o uso de ilustrações presentes em nosso dia a dia, com a finalidade de revelarem suas funções socioculturais. Sobre esse aspecto, considera-se que a construção cognitiva do número é muito mais complexa do que a mera repetição de palavras e suas escritas. Para que seja desenvolvido um trabalho construtivo e que estimule os alunos, são propostas atividades planejadas usando o lúdico (jogos e material concreto) para despertar o interesse das crianças. 309 Em relação à aprendizagem das quatro operações, os livros adotados propõem trabalhar conceitos importantes para facilitar a compreensão das crianças. Nos conceitos aditivos propõem atividades de juntar e acrescentar; já para se trabalhar a subtração utilizamse situações de retirar com questionamento de “Quantos sobram?”. Para os conceitos multiplicativos propõem situações de comparação: Quantos a mais / quantos a menos? E para a divisão utiliza situações de cálculo de possibilidades e a configuração retangular; repartição e distribuição. O livro propõe atividades com jogos, situações problemas, tabelas e cálculos com decomposição dos números. Finalmente, quando se trata do livro didático há dois aspectos que integram nossas análises: a) a escolha final do livro didático nunca virá de encontro a real necessidade de cada professor em sala de aula, por isso o seu entendimento como um instrumento de auxílio no processo de ensino aprendizagem; b) em razão da grande insistência do uso do livro didático como um instrumento de auxílio e não uma muleta, convencionou-se como politicamente correto o uso de vários livros, simultaneamente, o que acarreta um método de trabalho não uníssono. β) Os cadernos dos alunos revelam uma possibilidade real de ensino e de aprendizagem ou eles se transformam em um mero apêndice do livro didático? A análise dos cadernos dos alunos de 1º e 2º ano, das duas escolas participantes da pesquisa, tem a finalidade de verificar as atividades desenvolvidas para trabalhar o conceito de números e quatro operações, como também tentar descobrir os objetivos que os educadores pretendem alcançar no seu desenvolvimento, se possível, perceber o desempenho da criança e, consequentemente, o aprendizado resultante de cada situação de trabalho apresentada. Em todas as amostras analisadas percebe-se que a quantidades de atividades relacionadas à escrita de números, é exorbitante. Este tipo de exercícios tem sua origem em uma prática tradicional, que não favorece o desenvolvimento do raciocínio lógico do aluno. Portanto, os estudos teóricos revelam que ensinar números utilizando a mera repetição, não favorece a atribuição de sentido ou ligações com os conhecimentos sociais que as crianças possam ter, resultando quase sempre em uma aprendizagem passiva de memorização mecânica. Um outro tipo de atividade bastante utilizada, também de matriz tradicional, são as conhecidas “continhas” na estrutura de arme e efetue que busca trabalhar o conceito das quatro operações e, ao mesmo tempo desenvolver as habilidades em cálculo aritmético. 310 Não foram encontrados nos cadernos atividades que utilizam situações problemas para reforçarem, ou mesmo levantarem os conhecimentos prévios dos alunos em números e quatro operações, a respeito do que dizem Berton & Itacarambi (2009). Comumente, quando se encontra problemas matemáticos são do tipo padrão ou convencional e, suas intenções revelam muito mais uma fixação por uma ou outra operação, sem ao menos preocupar com o conceito subjacente a estrutura operativa presente e o possível trabalho que poderia ser realizado a partir da socialização de seu processo de resolução. Os cadernos dos alunos nos possibilitam ter uma visão simplificada dos conteúdos e os métodos revelados para se trabalhar números e quatro operações, não deixando de serem puros arremedos apontados pelo livro didático. Finalmente, em relação aos cadernos dos alunos, é importante destacar que a função dos conteúdos de números e quatro operações em sua maioria se resumem em exercícios repetitivos, que se recorre exclusivamente ao recurso da automatização. Embora essas atividades no presente trabalho tenham sido analisadas e questionadas através dos estudos bibliográficos, cabe ainda uma reflexão adicional: Qual objetivo pretende alcançar os educadores, ao aplicar esses tipos de atividades aos seus alunos? Será que este equívoco está relacionado à falta de conhecimento, ou enxergam nesse método apenas uma praticidade e controle da sala no ensino de números e quatro operações? χ) O que se esconde por detrás do ensino de números e quatro operações? Quando paramos para pensar o que acontece com os professores e alunos no ato de ensinar e aprender números e quatro operações, o que realmente se esconde por detrás, é que ambas as partes parecem se cansar e desistirem de compreender a origem de suas dificuldades. Os alunos em compreender o que se ensina e os professores em entender porque ensinam e os alunos não conseguem compreender. Na busca de se concretizar uma aprendizagem significativa e satisfatória observa que muitos professores se empenham em realizar um trabalho desenvolvido em princípios construtivistas, que vão além do simples lápis e papel. Através da observação em sala é possível analisar momentos proporcionados às crianças no ensino de números, como também adição e subtração, de forma produtiva, nos quais a professora inicia a aula através da contagem dos alunos e a soma dos que faltaram no dia, tornando-se um universo cheio de questionamentos que proporcionam aos alunos aquisição de conhecimentos e levam a criar hipóteses tornando a aprendizagem significativa. 311 O ensino da multiplicação pôde ser observado apenas em duas aulas, no período da observação. Percebe-se um certo receio dos professores em trabalhar o conteúdo de multiplicação e divisão, isso talvez em razão das dificuldades das crianças que poderiam ser inicialmente consideradas incapazes de aprenderem tais conteúdos, já que se propaga na escola a ideia das duas operações supracitadas como mais complexas em relação às demais operações. O trabalho no 2º ano, normalmente, inicia-se com o conceito de dobro e triplo, permitindo que aos poucos se desenvolva a estrutura da multiplicação. Os registros nos possibilitam perceber, também, que os professores ficam preocupados em introduzir os alunos em conteúdos de multiplicação e divisão, principalmente a divisão, não trabalhada durante o período da observação em sala. Esses conteúdos quando ministrados são sempre os últimos as serem vistos, pois na concepção dos professores é preciso aprender vários outros conteúdos primeiro para depois partir para multiplicação e divisão. Esses conceitos presente nas práticas do professor também pode ser evidenciado nas falas das professoras no momento da entrevista em que a maioria revela quando diz: “Não tem como você já entrar com a divisão e uma multiplicação assim lá na 1ª série na operação abstrata há não ser no concreto (...)” (Entrevista realizada com a profª. Maria -1º ano E. F. no dia 22/05/2012). “Eu sinto mais que os alunos têm mais dificuldade de aprender é a divisão, a divisão por conta de que ela é a operação mais complexa, ele tem que tá com a adição, a subtração e a multiplicação já bem estruturada, ter um bom conhecimento, né”. (Entrevista realizada com a profª. Claudia - 1ª ano, E.F. no dia 17/04/2012). Finalmente, quando se utiliza a observação em sala de aula e se junta aos dados levantados pelos cadernos dos alunos, torna-se evidente que o método utilizado para o ensino de números e quatro operações esconde a falta de alternativas flexíveis para consolidar esse conhecimento. No caso dos números os conhecimentos implícitos de sistema de numeração de base dez, valor posicional, antecessor e sucessor e valor absoluto e relativo. Já no caso do cálculo aritmético a possível combinação entre o sentido e significado de cada operação irá marcar significativamente essa ausência de ligação entre a matemática escolar e a da vida. Isso, então, fica patente ao observar em sala que algumas dificuldades dos alunos vão se acumulando, talvez em razão do pouco tempo de investimento para sistematizá-los, acabando por tornar uma bola de neve. 312 δ) Mitos, crenças e velhos vícios: o retrato real do ensino e da aprendizagem de números e quatro operações. A observação possibilitou perceber que o método tradicional predomina em muitas práticas pedagógicas. Observou-se o esforço em superar velhos vícios e crenças, mas também a insistência em continuar acreditando que apenas o exercício repetitivo, o uso abusivo da memorização, a escrita de números e as famosas continhas levam os alunos à aprendizagem de números. Essas situações são, também, reveladas nos cadernos dos alunos e, na observação em sala, os esforços na tentativa em realizar uma didática construtivista, mas que o cotidiano acaba por não sustentar. Na observação, então, vez ou outra, a crença arraigada da quantidade exagerada de continhas desenvolvidas no formato de arme e efetue, para se ensinar operações de adição e subtração. Muitas vezes o professor acredita que essa forma levará o aluno à aprendizagem, mas o que se percebe é que na realidade rouba-lhe a compreensão e a consciência do que esta fazendo. Muitas contas ou escrita de números nos permitem questionar para que? Qual objetivo de tudo disso? Dentro dessa concepção fica evidente que os alunos não compreendem o número e suas quantidades, quando na entrevista os alunos demonstram seus conhecimentos: Pesquisadora: Qual que é o número que vem antes de 100? Aluna: Mil. Pesquisadora: Depois de 79? Aluna: Mil. (Entrevista realizada no dia 30/05/2012, Julia67 do 1º ano, E.F.) Pesquisadora: Qual que é o número que vem antes de 100? Aluno: 99 Pesquisadora: Depois de 79? Aluno: 69...60. (Entrevista realizada no dia 30/05/2012 Pedro do 2º ano, E.F.) 67 ∗ ∗∗ Nomes codificados para preservar seus anonimatos. 313 Suas falas nos revelam, ainda, a falta de consolidação da ordem e, possivelmente, da inclusão hierárquica dos números, obstruindo por sua vez o conhecimento simples da sucessão, com a ideia de + 1 e a antecessão com a ideia de - 1. Nem mesmo em situações problemas em que se podia abrir um canal para o uso de aplicações ao cotidiano, que funcionariam como levantamento prévio de conhecimentos de números, cálculos aritméticos e de estratégias mentais utilizados no dia-a-dia a escola e os professores conseguem articular. O que impera é o velho vicio do problema padrão ou convencional, com o fim exclusivo de fixar a operação aritmética que esta em jogo. No tocante, ainda, ao uso livro didático ser visto pelo professor com um auxílio em sua prática pedagógica, algumas vezes utilizados como única fonte, em outras ocasiões os professores se valem de vários livros em busca de atividades alternativas; observa-se que o resultado de tudo isso é que não se realiza completamente nem os objetivos propostos pelos conteúdos do livro didático adotado, tampouco a soma de todas as partes se configura como um método adotado pelo professor. Um mito que se justifica a partir de nossa observação é que mesmo em situações cotidianas da sala de aula que poderiam ser utilizadas para o estímulo e o desenvolvimento de conceitos iniciais voltadas ao ensino de multiplicação e divisão não aproveitadas, se deve, muito provavelmente, pela simples crença de ser impossível de trabalhar com essas duas operações com crianças que não teriam uma prontidão para tal. Dessa forma, não estaríamos decretando ou colaborando com a ideia de que a matemática escolar não tem nada haver com a matemática que certamente muitos alunos teriam em suas vidas cotidianas? Assim, o que podemos afirmar é que muitos vícios e crenças antigas, ainda, predominam no ensino de números e quatro operações de 1º e 2º ano do ensino fundamental, quase todas pautadas em ausência de prontidão que sequer se filiam em lógicas que obedecem à vida cotidiana, por exemplo. E talvez resida ai, o adiamento desnecessário e alongados a que são submetidos alguns conteúdos em matemática, especificamente número e quatro operação, que normalmente retardam e não interagem com conteúdos dos anos subsequentes. CONSIDERAÇÕES FINAIS No decorrer dos nossos estudos se destacou as dificuldades enfrentadas por professores e alunos, em ensinar e aprender números e quatro operações e através dessa investigação pôde se perceber um amplo campo de estudo envolvendo a mesma preocupação na busca de encontrar meios de resolver essa situação vivida nas escolas. Muitas vezes, as 314 crianças encontram no ambiente escolar regras e métodos que impedem de expor e descobrir novos conhecimentos, a partir de situações que envolva o seu dia-a-dia, em que comumente resolver adições, subtrações, multiplicações e divisões estão envoltos por um campo conceitual muito mais amplo e diversificado do que o oferecido pela escola. Mergulhamos em cada instrumento de coleta de dados na tentativa de cercear melhor os nossos problemas de estudos e apresentar resultados consistentes que elucidam as dificuldades enfrentadas por professores e alunos quando ensinam e aprendem números e quatro operações, respectivamente. Buscou-se, realizar isso a partir da quadriangulação de dados obtidos através da análise do livro didático, dos cadernos de alunos, da observação em sala de aula e da entrevista com professores e alunos, enquadrando os resultados em quatro categorias que pudessem retratar a complexidade da realidade escolar e, em particular do ensino e aprendizagem de matemática na escola. Para efeito, adotaremos nessas considerações finais, apenas os três grandes desafios que se colocaram de forma evidente quando agregávamos todos os instrumentos de coleta de dados utilizados, que assim se impunham: a) A vasta produção cientifica a respeito da temática do nosso estudo não tem chegado e não tem sido absorvida pelas escolas, retardando algumas mudanças nas práticas que continuam fundamentadas em matrizes tradicionais. b) As formações iniciais e os enfretamentos dos professores com a realidade do oficio docente diário muitas vezes o colocam numa situação injusta e delicada com uma ciência que em muitos casos não tem muita intimidade; c) As políticas de formação continuadas em massa oferecidas pelo governo nem sempre atendem as reais necessidades do professor, suas condições efetivas de assimilação, aplicação e generalização do conhecimento oferecido, ou até mesmo leva em conta seus contextos reais e não ideais de trabalho. Finalmente, esperamos que os resultados apontados por nossos estudos possam refinar mais o nosso olhar e mais claramente tenha conseguido indicar as razões que levam algumas crianças a se excluírem da significação e sentido de nosso sistema numérico decimal e, consequentemente, retardarem o processo de compreensão das estruturas operativas, em especial multiplicação e divisão. 315 REFERÊNCIA BERTON, I., ITACARAMBI, R. Números : Brincadeiras e Jogos. São Paulo: Livraria da Física, 2009. BIGODE, A. J. L. O cálculo e a vida moderna. In: MATEMÁTICA. Brasília: Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação a Distância. 1998.p. 32-5, 2 v. (Cadernos da TV Escola. PCN na Escola). BIGODE, A. J. L. A calculadora e o raciocínio da criança. In: MATEMÁTICA. Brasília: Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação a Distância. 1998, p.43-8, 2 v. (Cadernos da TV Escola. PCN na Escola). KAMII, Constance. A Criança e o Número: Implicações educacionais da teoria de Piaget para a atuação com escolares de 4 a 6 anos. 33º ed. Campinas - SP: Papirus. 2005. MORENO, B. R. O ensino do numero e do sistema de numeração na educação infantil e na 1ª série. In: PANIZZA, M. et al Ensinar Matemática na educação infantil e nas séries iniciais: Análise e Propostas. Porto Alegre: Artmed, 2006. NUNES, T., BRYANT, P. Crianças Fazendo Matemática. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. PAVANELLO, Regina Maria (org.) Nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental: A pesquisa e a sala de aula. V. 2. São Paulo-SP: Biblioteca do educador matemático. 2004.(. Coleção SBEM). 316 GRUPO DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO DA AMAZÔNIA - GPEA PURUBORÁ UM POVO INDÍGENA RESGATANDO SUA IDENTIDADE E CULTURA Poliana Alves Cassimiro68 José Joaci Barboza69 RESUMO O presente trabalho se propõe a apresentar os resultados parciais da pesquisa desenvolvida com o povo Puruborá, grupo indígena que teve contato com a cultura não índia no início do século passado, no rio Manoel Correia, um dos afluentes do rio Guaporé, onde o então coronel Rondon teria delimitado um território para eles. Após o contato esse povo passou por diversos processos de fricção interétnica e foram diversas vezes expulsos de suas terras. O projeto pretende contribuir com o resgate das memórias e das histórias do povo, para tal valeu-se da metodologia da História Oral. Palavras-chave: Puruborá. Ressurgido. História Oral ABSTRACT This paper aims to present the partial results of research carried out with the people Puruborá, indigenous group who had contact with non-Indian culture at the beginning of last century, the river Manoel Correia, a tributary of the River Guaporé, where the then Colonel Rondon had a defined territory for them. After contact these people went through various processes of interethnic friction and were repeatedly driven off their land. The project aims to contribute to the recovery of memories and stories of the people, for that drew on the methodology of oral history. KEYWORDS: Puruborá. Risen. Oral History INTRODUÇÃO O povo puruborá é um grupo de índios ressurgidos na década de dois mil no estado de Rondônia, sendo que o mesmo foi considerado extinto pela FUNAI. Segundo registros históricos, o Povo Puruborá foi contatado no ano de 1909, pelo Marechal Rondon, que os deixou na região do rio Manoel Correia, afluente do rio São Miguel. Os Puruborá ficaram 68 Acadêmica do curso de Pedagogia da Fundação Universidade Federal de Rondônia, campos de JiParaná, e-mail: [email protected] 69 Prof. Ms. do Departamento de Educação Intercultural – DEINTER, e pesquisador do Grupo de Pesquisa em Educação na Amazônia – GPEA, da Fundação Universidade Federal de Rondônia – UNIR, Campus de Ji-Paraná, e-mail: [email protected] 317 num lugar denominado Colônia ou Posto Dois de Maio sob responsabilidade de José Felix do Nascimento, encarregado local do Serviço de Proteção ao Índio-SPI. Daí em diante o povo Puruborá sofreu vários processos de expulsão das terras definidas para eles por Rondon, sofrendo com várias doenças como sarampo, catapora, gripe entres outras doenças que quase acabaram com o seu povo. Após o contato, esse grupo, como de resto todos os grupos étnicos que habitavam os vales do Guaporé/Mamoré foram recrutados para trabalharem como mão de obra barata e, em precária situação de moradia e saúde. Várias mulheres foram transformadas em prêmio para aqueles extratores que produzissem mais que a cota anual estabelecida previamente. Ainda na gestão de José Felix do Nascimento, á área dos Puruborá passou pela primeira ocupação, já que o administrador do posto estimulou a presença de não-índios nas áreas que deveriam ser exclusivamente para o povo. Após o falecimento de José Felix os Puruborá solicitaram ao SPI um novo encarregado, pedido que fora negado por achar a FUNAI que os mesmos não eram mais índios puros e sim mestiços. Como consequência, muitos deixaram as suas terras e foram trabalhar para seringalistas com mão de obra barata, afinal como diz Roberto Cardoso de Oliveira (1972; p. 107), parafraseando Curt Nimuendaju, o SPI e a FUNAI já havia realizado seu trabalho, qual seja, o de “engordar sapo para a cobra comer”, ou seja, já haviam pacificado os indígenas para servirem como força de trabalho barato nos seringais amazônicos. Segundo relatos dos colaboradores e literatura produzida por Mauro Leonel (1995), os puruborá ainda resistiram e permaneceram nas terras indígenas até que foram expulsos quando da criação da Rebio do Guaporé (1982), e posteriormente quando da demarcação das terras indígenas dos Uru-Eu-wau-wau (1985). Em 1995 uma família Puruborá volta as suas terras n Rio Manuel Correia, sendo encontrados aí pelo Conselho Indígena Missionário CIMI. Desde então, o povo Puruborá se espalhou por toda parte do estado de Rondônia, chegando mesmo a perder parte significativa de sua cultura e de sua identidade. Diante deste fato o intuito do projeto de pesquisa foi buscar resgatar as histórias e preservar a memória do povo, conhecer suas experiências de vida, sua tradição sua luta, seus sofrimentos, bem como contribuir com a sua luta principalmente a de fortalecimento da identidade e a da demarcação de suas terras. É dentro desse contexto que, segundo Siloé Soares de Amorim (2003; p. 32): 318 Além da luta pela recuperação de suas terras, introduzem novas formas de representações políticas tendo em vista o cenário legislativo e jurídico que lhes atribuem estigmas e obstáculos nesse reconhecimento, reformulando, para superá-los, suas manifestações culturais e religiosas, para garantir espaços no contexto regional local e nacional. É, então, dentro desta perspectiva que podemos enquadrar as lutas dos Puruborá, luta que é de todos os grupos ressurgidos no Brasil, que enfrentam várias dificuldades em virtude do estigma ao qual são submetidos todos os povos indígenas e de modo especial os povos “misturados”, ou seja, aqueles que foram vítimas dos processos de inclusão forçada no cenário nacional e que agora lutam para ter seus direitos assegurados. Por último, mais não menos importante, o projeto de pesquisa que não se restringe ao PIBIC, pretende contribuir com a construção de um acervo documental que possa servir como fonte primária para outros pesquisadores da questão indígena e regional, processo esse que se encontra em estágio bastante avançado e, com o qual o PIBIC contribuiu sobremaneira. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Para a realização da pesquisa nos aproximamos da literatura e da metodologia da moderna História Oral. Essa metodologia foi desenvolvida no início da segunda metade do século passado, quando nos estados unidos se percebeu que os soldados que voltavam dos campos de batalha retornavam envoltos num profundo silêncio. Ela, a entrevista, foi utilizada como um recurso para que esses sobreviventes pudessem resgatar sua dignidade e sua autoconfiança, enquanto sujeitos que buscam superar os traumas inerentes a guerra e, pudessem se reintegrar efetivamente no convívio social e por conseqüência no familiar. Daí em diante a História Oral se desenvolveu fora do meio acadêmico, só algum tempo depois de insere nos meios acadêmicos. No Brasil a História Oral tem seus primórdios na década de 1970 quando a fundação FORD em parceria com a FGV oferecem um curso de formação e apropriação da metodologia. Outro elemento importante para a divulgação da História Oral nas universidades foi o lançamento do livro da Ecléa Bosi: Lembranças de Velhos. Posteriormente, temos uma geração de professores universitários que irão efetuar pesquisas se utilizando da metodologia da História Oral, sendo que alguns publicaram manuais ou livros de referência, tais como: José Carlos Sebe Bom Meyhi, e o seu clássico 319 Manual de História Oral (2000), Antônio Torres Montenegro (2001), Marieta de Moraes Ferreira (1996). A História Oral que estamos utilizando nessa pesquisa é a desenvolvida por Meihy (2000), ela pressupõe a utilização da pré-entrevistas, entrevistas e pós-entrevistas, bem como os de transcrição e transcriação das entrevistas. A pré-entrevista é o momento em que os pesquisadores se apresentam a comunidade e ao mesmo tempo falam sobre o projeto de pesquisa, feita essa apresentação os futuros colaboradores são inquiridos se gostariam de participar das entrevistas. Em seguida marca-se a data e o local da entrevista, sendo que o local, a data e o horário quem tem o direito de escolher será o entrevistado. A entrevista propriamente dita é o momento em que o pesquisador munido dos equipamentos tais como: gravador, caderno de campo, máquina fotográfica ou filmadora vai ao local, no dia e horário marcado pelos entrevistados, e inicia um diálogo com os colaboradores. Como já falamos sobre os objetivos da pesquisa, ou seja, sobre o que o pesquisador está pesquisando, então não realizamos no primeiro momento nenhuma pergunta, simplesmente franqueamos a palavra aos colaboradores. Posteriormente, quando o colaborador encerra a narrativa de duas experiências de vida e, quando o pesquisador entende que alguns tópicos da narrativa precisam ser mais bem detalhados, então retomamos os pontos da narrativa que fazem alusão aquele aspecto a ser desenvolvido e solicitamos ao colaborador que fale mais sobre a temática. Daí, passamos para a fase da transcrição das entrevistas, ou seja, é o momento onde buscamos transcrever o mais próximo quilo que nos foi falado, as falas dos colaboradores e dos entrevistadores, bem como, quando ocorre, das intervenções de outras pessoas que eventualmente participaram, mesmo sem ser “objeto” da entrevista. O outro momento que antecede a conferência é a transcriação. Queremos deixar bem claro que a transcriação não se inicia após a transcrição, ela se inicia quando aquela é iniciada, em outras palavras, só utilizamos essa nomenclatura para efeitos gnosiológicos e para caracterizar um momento intencional e, portanto, consciente de trabalhar no texto para melhorá-lo do ponto de vista do código escrito. A fase posterior, e penúltima etapa do trabalho, será a conferência dos textos pelos colaboradores, onde acontecerá o retorno dos entrevistadores aos colaboradores, com o intuito de que os mesmos leiam ou ouçam a leitura dos textos, para que apontem o que deve permanecer ou ser excluído, o que pode ser melhorado e por fim autorizar ou não a utilização dos textos. 320 A última fase é o arquivamento ou a publicação, quando for o caso, das entrevistas trabalhadas e autorizada o uso para os demais entrevistadores. No caso do atual projeto de pesquisa pretende-se ao fim, publicar um livro com as entrevistas, além da construção de um acervo documental. RESULTADOS E DISCUSSÕES Ao todo foram realizadas quatro entrevistas com colaboradores residentes nos município de Seringueiras e São Francisco, essas entrevistas foram realizadas com Hosana Castro de Oliveira Montanha, Dona Emília de Oliveira, Mário de Oliveira e Marines Castro de Oliveira. Pode parecer pouco a realização de quatro entrevistas, e de fato o é, mas se levarmos em conta que estudo no campus de Ji-Paraná localizado na mesma cidade e, para a realização das entrevistas temos de efetuar o deslocamento intermunicipal e para tal não dispomos de apoio, senão a de ligação com outro projeto financiado pelo PROEXT que possibilitou o deslocamento, e ainda assim com algumas dificuldades tais como atraso de pagamentos das bolsas e liberação de passagens etc. Ainda assim, realizei conjuntamente com o professor coordenador do projeto as quatro entrevistas e transcrevi todas, porém, o projeto por parte do PROEXT ainda continua até dezembro de 2012, com reais possibilidades de continuação no ano de 2013, quando efetivamente poderemos falar de conclusão do trabalho. Nesse momento só posso falar das atividades desenvolvidas até o presente, ou seja, só posso falar em resultados parciais. Realizamos a revisão da bibliografia, principalmente no sentido de nos apropriarmos da metodologia da História Oral, concomitantemente efetuamos leituras n o sentido de compreender esse fenômeno ainda recente do ponto de vista histórico que é o ressurgimento étnico, dito de outra forma, procuramos entender como um grupo num momento se identifica de uma forma e posteriormente passa a se identificar de outra forma. Ainda como resultado provisório da pesquisa, produzimos quatro banners que foram apresentados em eventos nacionais e estadual, e produzimos um artigo: PURUBORÁ: NARRATIVAS DE UM POVO RESSURGIDO NA AMAZÔNIA, que foi apresentado no XI Encontro Nacional de História Oral. Uma das colaboradoras do projeto apresentou um projeto de Trabalho de Conclusão de Curso, tendo como objeto de pesquisa os mitos do povo Puruborá. Do ponto de vista do povo Puruborá, no tocante a impactos em decorrência do projeto, ainda não podemos falar muito, contudo, observamos que as pessoas contatadas para 321 participarem do projeto, concedendo entrevistas, têm nos recebido de braços abertos e criam uma expectativa muito grande em relação aos resultados finais. De nossa parte, supomos que ao término do trabalho o povo terá um acervo que será de muita valia para a manutenção e preservação tanto da história do povo como da memória, já que os mais velhos, a geração nascida após o contato tem sido os principais colaboradores desse projeto e, eles são os portadores das histórias, dos mitos, da língua e das memórias desse povo. CONSIDERAÇÕES FINAIS Como já fiz referencia anteriormente, a pesquisa objeto do projeto apresentado ao PIBIC/2011/2012, se encerra parcialmente com a entrega do relatório e desse resumo expandido, contudo, no período de um ano a realização das entrevistas com o povo Puruborá nos levou a melhor compreender o sentido da luta do povo pelo resgate de sua história e, consequentemente pela demarcação do seu território ancestral. Levou-nos ainda a se solidarizar com o sofrimento dos colaboradores principalmente, por aqueles decorrentes da negação de sua identidade e do direito básico que qualquer ser humano, o de possuir suas terras. Quando iniciei o processo de pré-entrevista e da entrevista, pude compreender o papel da pesquisa com a utilização da História Oral de Vida enquanto instrumento de fortalecimento da luta e da organização dos excluídos da história. REFERÊNCIAS AMORIM, Siloé Soares de. ÍNDIOS RESSURGIDOS: A construção da auto-imagem - os Tumbalalá, os Kalankó, os Karuazu, os Catókinn e os Koiupanká. Campinas, SP, 2003 (dissertação de Mestrado) BARBOZA. José Joaci. PURUBORÁ: NARRATIVAS DE UM POVO RESSURGIDO NA AMAZÔNIA. Artigo apresentado na XI Encontro Nacional de História oral, realizado no Rio de Janeiro de 10 a 13 de junho de 2012. FERREIRA, Marieta de Mores & AMADO, Janaína. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getulio Vargas, 1996. LEONEL, Mauro. ETNODICÉIA URUÉU-AU-AU: o Endocolonialismo e os índios no Centro de Rondônia, O Direito à Diferença e à Preservação Ambiental. São Paulo: Editora da USP/Instituto de Antropologia e Meio Ambiente/ FAPESP, 1995. 322 MEIHY, J. C. S. B. Manual de História Oral. São Paulo: Edições Loyola, 2000. MONTENEGRO, Antonio Torres. HISTÓRIA ORAL E MEMÓRIA: a cultura popular revisitada. 3 ed., São Paulo: Contexto, 2001. OLIVEIRA, Roberto Cardoso de, O ÍNDIO E O MUNDO DOS BRANCOS. 2 ed., São Paulo: Livraria Pioneira Editora, 1972. OLIVEIRA, João Pacheco de. ENSAIOS DE ANTROPOLOGIA HISTÓRICA. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, 1999. __________. (org.). A VIAGEM DE VOLTA: etnicidade, política e reelaboração cultural no Nordeste indígena. 2 ed., São Paulo: Contra Capa/LACED, 2004. 323 RENDIMENTO ESCOLAR E PROGRAMAS DE MELHORIA DA QUALIDADE DE ENSINO EM ESCOLAS PÚBLICAS ESTADUAIS DE PORTO VELHO Rômulo Gomes Zanon70 Marli Lúcia Tonatto Zibetti71 RESUMO Este trabalho tem por objetivo investigar a relação entre as políticas de avaliação do rendimento escolar e a implantação de programas de melhoria da qualidade do ensino em escolas públicas estaduais em Porto Velho. A pesquisa foi desenvolvida em duas escolas com diferentes Índices de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) e os dados foram produzidos por meio de observações dos espaços escolares e entrevistas com os gestores das referidas escolas e técnicos da Gerência de Acompanhamento, Controle e Avaliação da Secretaria de Estado da Educação. Os resultados indicam que a implantação dos programas de melhoria da qualidade do ensino ocorre a partir do número de alunos e do número de salas de aula existentes nas escolas. O IDEB foi considerado para premiar a escola que obteve avanços significativos no seu rendimento, evidenciando que ao invés de servir de indicador das necessidades das escolas esse índice é utilizado para estimular a competição entre as instituições contribuindo para tornar ainda melhores aquelas que já apresentam bons resultados. INTRODUÇÃO Desde a Constituição de 1988, o Brasil estabelece, além da obrigatoriedade no ensino fundamental, a necessidade de assegurar a “garantia de padrão de qualidade” (BRASIL, 1988). Para atestar esse padrão de qualidade, foram criados sistemas de avaliação externos estabelecendo níveis de desempenho a serem alcançados. O texto da LDBEN normatiza as formas como o sistema educacional assegurará o padrão de qualidade estabelecido pela Constituição. No artigo 9º, destacam-se os seguintes incisos: V - coletar, analisar e disseminar informações sobre a educação; VI - assegurar processo nacional de avaliação do rendimento escolar no ensino fundamental, médio e superior, em colaboração com os sistemas de ensino, objetivando a definição de prioridades e a melhoria da qualidade do ensino; Em tramitação no Congresso Nacional, o Projeto de Lei que Aprova o Plano Nacional de Educação para o decênio 2011-2020, anuncia em seu Artigo 11: 70 71 Estudante do 5º Período de Psicologia – Universidade Federal de Rondônia – UNIR Orientadora: Professora do Curso de Psicologia - Universidade Federal de Rondônia – UNIR 324 O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica - IDEB será utilizado para avaliar a qualidade do ensino a partir dos dados de rendimento escolar apurados pelo censo escolar da educação básica, combinados com os dados relativos ao desempenho dos estudantes apurados na avaliação nacional do rendimento escolar. §1º O IDEB é calculado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira - INEP, vinculado ao Ministério da Educação, §2º O INEP empreenderá estudos para desenvolver outros indicadores de qualidade relativos ao corpo docente e à infraestrutura das escolas de educação básica. Neste estudo, interessa-nos analisar de que maneira este índice tem sido utilizado pelo sistema estadual de ensino em Rondônia na definição de políticas de enfrentamento das dificuldades escolares, uma vez que na base dos sistemas de avaliação encontra-se a justificativa de que eles permitirão a identificação dos problemas enfrentados pelas redes educativas com vistas à implantação de melhorias para sua superação. Assim, este texto apresenta inicialmente uma breve discussão a respeito do sistema de avaliação educacional e da implantação do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB). Em seguida, descrevemos os objetivos e as características da pesquisa desenvolvida. Por fim apresentamos os resultados e discussões com base nos dados obtidos por meio de observação e entrevistas com os gestores escolares. ASPECTOS TEÓRICOS Segundo Peroni (2003, p.19), na década de 1990 houve um processo de descentralização da educação pública. Esse foi um terreno fértil para a intensificação das políticas de avaliação, pois a partir da descentralização, cada esfera tem responsabilidade de atingir suas próprias metas de acordo com as pontuações das diferentes avaliações. Isso acaba gerando competitividade entre as escolas e nem sempre mostra resultados como afirma Sousa (2003, p. 176), Ao que parece, a questão central nesta proposta não é a de buscar subsídios para intervenções mais precisas e consistentes do poder público, ou seja, uma análise das informações coletadas para definição e implementação de políticas para a educação básica, mas difundir nos sistemas escolares uma dada concepção de avaliação, que tem como finalidade a instalação de mecanismos que estimulem a competição entre as escolas, responsabilizando-as, em última instância, pelo sucesso ou fracasso escolar. 325 No Brasil, registra-se desde a década de 1960 o uso de testes educacionais. No entanto, situa-se nos anos finais da década de 1980 a primeira iniciativa de uma sistemática de avaliação do ensino fundamental e médio em âmbito nacional - Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SOUSA, 2003). De acordo com Castro (2009, p. 5) uma das políticas que mais avançou no Brasil nos últimos 15 anos, foi a implantação dos sistemas de avaliação educacional. Considerada hoje uma das mais abrangentes e eficientes do mundo, a política de avaliação engloba diferentes programas, tais como o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica - Saeb, o Exame Nacional do Ensino Médio - Enem, o Exame Nacional de Cursos - ENC, conhecido como Provão e, posteriormente, substituído pelo Exame Nacional de Desempenho do Ensino Superior - Enade, o Exame Nacional de Certificação de Jovens e Adultos - Enceja, o Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior Sinaes, a Prova Brasil e o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica Ideb. Em conjunto, estes sistemas, ao lado da Avaliação da Pós-Graduação da Capes - o mais antigo sistema de avaliação do país no setor educação -, configuram um macrossistema de avaliação da qualidade da educação brasileira. Segundo Lima e Gandin (2011) essas avaliações constituem-se como ferramentas imprescindíveis ao sistema de gestão das políticas públicas implementadas no modelo neoliberal cuja característica básica é a centralidade nos resultados. Focar a atenção nos resultados justifica-se pela necessidade de verificar a eficiência, qualidade e eficácia dos serviços. Para isso defende-se a gestão descentralizada argumentando-se que a decisão sobre a prestação de serviços ocorreria perto do local onde seria realizada podendo contar com a avaliação dos clientes. Portanto, a criação de um ambiente competitivo dentro das instituições públicas é considerada condição básica para a elevação da qualidade dos serviços e otimização da produtividade. Conforme destacam os autores, nesse cenário ocorre uma reconfiguração do Estado que passa a gerenciar a oferta de serviços, passando de executor a fiscalizador. Como síntese das políticas avaliativas o governo brasileiro cria em 2007 o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) que representa a iniciativa de reunir num só indicador, dois conceitos de grande importância para a qualidade da educação, fluxo escolar (promoção, evasão e repetência) e desempenho nas avaliações. Segundo Fernandes (2007) o IDEB é calculado a partir de dois componentes: taxa de rendimento escolar (aprovação) e média de desempenho nos exames padronizados aplicados pelo Instituto Nacional de Estudos 326 e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) por meio das Prova Brasil e Sistema de Avaliação da Educação Básica SAEB. Conforme destaca Freitas (2007) ao implementar um índice de desenvolvimento da educação básica, o Ministério da Educação institui os meios para o fortalecimento de uma administração gerencial, na qual a relação do governo central com estados e municípios é direta, gerenciando à distância a liberação de recursos a partir de resultados, conforme explicitado pelo ex-presidente do INEP: Todo o PDE [Plano de Desenvolvimento da Educação] está ancorado justamente na criação do Índice de Desenvolvimento da Educação Brasileira - IDEB, que pondera os resultados do SAEB, da Prova Brasil e dos indicadores de desempenho captados pelo censo escolar (evasão, aprovação e reprovação). Cria um indicador que varia de zero a dez, desdobrável por estado e por município e por redes de ensino [e agora por escola]. A partir da construção do IDEB, o MEC vinculará o repasse de recursos oriundos do FNDE à assinatura de compromisso dos gestores municipais com determinadas metas de melhoria dos seus indicadores ao longo de determinado período. (ARAÚJO, 2007, apud FREITAS, 2007, p 967. Comentários entre colchetes do autor) Com a descentralização da educação pública, municípios e estados têm suas obrigações bem definidas e com essas avaliações o peso de conseguir alcançar as metas desejadas. A avaliação, para Sousa (2003), neste contexto é assumida como uma estratégia capaz de propiciar o alcance dos objetivos de melhoria da eficiência e da qualidade da educação. Freitas (2007), entretanto, alerta para o fato de que a divulgação dos resultados dos desempenhos das escolas, seja por meio das provas do SAEB ou do IDEB, pode acabar criando uma perversa competição entre as escolas, levando os pais a procurarem as escolas melhor avaliadas, reforçando ainda mais os investimentos nessas escolas. Enquanto os pobres continuariam a ter acesso a escolas cada vez menos valorizadas. Os usos que são feitos dos resultados das avaliações podem contribuir para a melhoria do ensino oferecido nas escolas com maiores dificuldades? Este trabalho busca uma aproximação inicial com esta questão, analisando a implantação de programas de melhoria da qualidade do ensino em duas escolas públicas estaduais com IDEB distinto. 327 A PESQUISA O objetivo que orientou nossa pesquisa foi investigar a relação entre rendimento escolar e a implementação de programas de melhoria da qualidade do ensino nos anos iniciais do Ensino Fundamental em duas escolas da rede estadual em Porto Velho. Para isso foram selecionadas escolas cujos Índices de Desenvolvimento da Educação Básica eram diferentes e a partir do levantamento dos programas educacionais implementados nas referidas escolas foi realizada uma análise com vistas a verificar sua contribuição para a superação das dificuldades evidenciadas nos dados de rendimento escolar. A Escola A72 apresenta um dos maiores índices entre as escolas que oferecem as séries iniciais na rede estadual. Ao observar a série do IDEB da referida escola, constatou-se que ela possuía um índice de 3.6 em 2005, subindo para 3.8 em 2007 e em 2009 chegou a 4.8, estando 17% acima da projeção feita para o período. Por isso, considerou-se relevante escolher a escola para identificar aspectos que contribuíram para elevação do IDEB. Em relação à escola B, que está entre as que possuem o menor IDEB nos anos iniciais do ensino fundamental da rede estadual, a situação é inversa. A escola tinha um índice de 3.5 em 2005, quando o IDEB foi implantado. Na segunda avaliação em 2007 passou para 4.0, entretanto em 2009, retornou aos 3.5. Por isso, julgou-se relevante investigar uma escola cujo índice oscilou durante o período e se encontra em queda. Foram realizadas observações nas escolas pesquisadas, as quais foram anotadas em fichas próprias para levantamento de dados sobre espaços físicos, mobiliário, materiais pedagógicos e profissionais que atuam nas referidas escolas. Também foram realizadas entrevistas com diretores das escolas A e B, vice-diretora e coordenadora Pedagógica da Escola B, além de duas técnicas da Gerência de Acompanhamento, Controle e Avaliação GACA. A análise de dados considerou os objetivos e o referencial teórico adotado para a compreensão das informações fornecidas pelos participantes. RESULTADOS E DISCUSSÕES Nos discursos governamentais, bem como nos diferentes segmentos da mídia, o sistema de avaliação da educação básica é um instrumento fundamental para que a gestão 72 Utilizamos as letras A e B para nomear as escolas, preservando o sigilo sobre os dados. 328 pública tenha elementos para monitorar o sistema educacional de forma a investir nos locais em que há maiores dificuldades. Tal como acontece com os testes do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb), os da Prova Brasil avaliam competências construídas e habilidades desenvolvidas e detectam dificuldades de aprendizagem. No caso da Prova Brasil, o resultado, quase censitário, amplia a gama de informações que subsidiarão a adoção de medidas que superem as deficiências detectadas em cada escola avaliada. (BRASIL, 2008, p. 45 - Grifos nossos) Na medida em que ouvíamos os gestores percebemos que vários programas desenvolvidos nas escolas estavam relacionados ao sistema de manutenção da Educação Básica o qual tem se caracterizado pela descentralização dos recursos que são enviados para as escolas. As unidades escolares passaram a receber as verbas para manutenção das atividades em contas específicas para cada um dos programas em desenvolvimento e os diretores, juntamente com os vice-diretores e os tesoureiros dos Conselhos Escolares designados como Unidades Executoras em substituição às antigas Associações de Pais e Professores - APPs, são responsáveis pelo planejamento de metas, recebimento dos recursos, licitação ou cotação dos produtos e serviços, compra, acompanhamento da entrega e/ou execução e prestação de contas. Cada programa que libera verbas para as Unidades Escolares exige a abertura de conta específica para gerenciamento dos recursos. Alguns deles recebem recursos tanto do governo federal quanto do estadual e nesses casos são administrados em contas separadas e com prestação de contas também diferenciadas. De acordo com informações dos gestores das escolas pesquisadas eles administravam, no momento da pesquisa, de seis (Escola A) a oito contas (Escola B). Configura-se assim o sentido de “descentralização” incorporado nessa legislação. [LBD 9394] Este termo é entendido como a transferência para Estados, Distrito Federal e Municípios da responsabilidade de gerir diretamente as diferentes redes de escolas. Ao mesmo tempo, introduz-se nova concepção de controle, agora realizado indiretamente pelos resultados obtidos pelos alunos nos testes sistêmicos. Passa-se a controlar o "produto" do sistema e não o "processo" que o originou. Nesta lógica, a "autonomia" da escola passa a ter outro sentido, pois a instituição passa a ser "monitorada" de outra maneira, não mais pelo controle burocráticohierárquico direto. (OLIVEIRA, 2005, p. 24). 329 A maior parte dos programas toma como indicador para liberação dos recursos o número de alunos matriculados na escola, de acordo com o Censo do ano anterior. Para o Diretor da Escola B, este cálculo, quando não leva em consideração outros aspectos da escola cria distorções que prejudicam sua manutenção. Pelo fato de nossa escola ser uma escola inclusiva, aí nós temos limitações no número de atendimento de alunos, porque nós não podemos colocar nas salas de aula mais que 25 alunos porque em todas as salas nós temos alunos com necessidades especiais; então a legislação limita e limitando, reduz o número de alunos e todo recurso que vem para cá é baseado no número de alunos matriculados que são atendidos pela escola né? Mas mesmo assim pela grandiosidade da estrutura física, olha a escola vai de uma rua a outra, a escola tem várias árvores, e as folhas caem e precisam ser rasteladas; você não pode mais queimar, é crime fazer fogo, produzir queimadas, então o que você tem que fazer, colocar em um saco apropriado e dar a destinação certa e isso é custo operacional. Vai saco de lixo, 5 ou 10 por dia, vai mais rastelo, mais vassoura, mais pano de chão, para a manutenção da estrutura. [...] a escola de uma dimensão dessa aqui vai receber para a manutenção 4.441 reais e 30 centavos para o ano todo. (Entrevista Diretor Escola B). O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) também destina recursos considerando o número de alunos a serem atendidos. As informações sobre o PNAE disponíveis no site do MEC (BRASIL, 2012) indicam que os recursos financeiros da União são transferidos em dez parcelas mensais, correspondentes à manutenção de 20 dias letivos em cada parcela (considerando a duração do ano em 200 dias letivos) e o número de alunos a serem atendidos. De acordo com os gestores, a aplicação do recurso é acompanhada por uma comissão, mas a prestação de contas fica sob responsabilidade dos diretores e vices que, no dia a dia verificam as necessidades e analisam como positiva a gestão dos recursos da merenda pelas unidades escolares por lhes permitir adequar sua oferta às demandas da clientela. Entretanto, o cálculo do valor a ser enviado a cada escola deveria considerar outros aspectos e não só o número de alunos matriculados. Conforme o diretor da Escola B, para atender à realidade dos alunos daquela escola foi necessário inserir, além do lanche servido durante o intervalo, o café da manhã que é servido antes do início da aula. É uma das grandes preocupações que eu tenho como gestor e toda vez que eu chego na escola eu não venho para cá [sala da direção]. Eu não venho para outro lugar não, eu vou para o refeitório, cedo. Eu chego aqui 7h. Cardápio está sob controle? -Tá. Então beleza! [...] Nós temos um café da manhã que nós introduzimos aqui na escola por conta própria. A gente usa o recurso da cantina escolar e alguns gêneros também da alimentação escolar de aluno, então quer dizer assim... O que havia de alunos aqui, anos 330 anteriores, que chegava aqui com dor de barriga, passando mal. Ai a gente sentava: “Você jantou ontem?” “Não!” “O que você comeu hoje?” “Nada.” Doze horas só tomando água. Água hidrata, mas não alimenta, não tem nutrientes suficientes. Aí quer saber de uma coisa, vamos fazer o projeto café com leite, que é um café com leite básico, [...] um biscoito salgado com margarina e quando tem uma fruta, uma banana, uma fatia de melancia, enfim. Nunca mais aconteceu esse problema. (Entrevista Diretor Escola B). O Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) visa à melhoria da infraestrutura física e pedagógica das unidades escolares. Os recursos liberados para as escolas podem ser investidos em: manutenção, conservação e pequenos reparos na escola; aquisição de material permanente; aquisição de material de consumo, necessário ao funcionamento da escola; material didático-pedagógico; desenvolvimento de atividades educacionais, etc. Como um desdobramento do PDDE o Programa de Melhoria da Escola (PME) é um instrumento que viabiliza o repasse de verbas diretamente para as escolas para o financiamento e execução das metas contidas no Plano de Desenvolvimento da Escola (PDE). De acordo com a Gestora da Escola A “[...] o PDE/PME é um projeto que visa sanar as deficiências do ano que tá dando problema. Por exemplo, no caso nosso aqui, existe um ano que a gente fala que é o mais trabalhoso que é o 2º ano e que era o antigo 1º aninho.” (Entrevista Diretora da Escola A). Os recursos recebidos pelo Programa de Melhoria da Escola estão vinculados ao Projeto de Desenvolvimento da Escola - PDE e podem ser investidos, conforme planejamento, tanto em recursos materiais, quanto em formação do quadro docente, visando melhores resultados na série em que os índices são mais problemáticos. O que vai nos ajudar a solucionar o problema do 2º ano? Aí a gente fala: no pedagógico o que a gente vai fazer? O que a supervisora vai trabalhar com elas [as professoras] pra poder não reter muitas crianças no 2º aninho? E o lado financeiro que é o PME, que é lado a lado: o que vai ser preciso a escola comprar pra ajudar. A gente colocou kits pedagógicos, cadernos, lápis. Para recebimento dos recursos a escola precisa elaborar projeto ano a ano e enviá-lo para aprovação. A verba é liberada mediante acompanhamento do alcance das metas projetadas e da prestação de contas da escola dos valores recebidos no ano anterior. Outro programa que repassa recursos às escolas é o Programa de Apoio Financeiro às Unidades Escolares (PROAFI). Por meio deste programa o governo estadual disponibilizava R$3,00 por aluno matriculado, tomando como referência o total de alunos matriculados no 331 ano anterior. Em 2012 o Governo do estado aumentou este valor para R$ 8,00 por aluno. Os repasses que eram feitos semestralmente passaram a ser feitos por trimestre e o dinheiro também é administrado pelo diretor da escola e o tesoureiro do Conselho Escolar. Os recursos do PROAFI destinam-se à manutenção e conservação dos prédios escolares, mobiliário e equipamentos, podendo também ser utilizado para a aquisição de materiais necessários ao funcionamento da escola, à capacitação de profissionais da educação, compra de materiais didático-pedagógicos para implementação de projetos e ainda para pagamento de taxas de água, luz telefone e provedor de internet. Os profissionais das escolas são unânimes em afirmar que as condições melhoraram a partir do repasse direto de dinheiro uma vez que as escolas têm mais materiais disponíveis para as atividades pedagógicas e também para a realização de pequenos reparos e manutenção dos serviços no dia a dia das escolas. Entretanto os recursos têm sido insuficientes para realizar as reformas que os espaços físicos das escolas estão necessitando. Eu cheguei aqui em 2003 e nós não tínhamos nada de equipamento de informática, de tecnologia, nada. Nós tínhamos apenas um computadorzinho na secretaria, só um aqui. De lá pra cá, nós tivemos avanços significativos na melhoria do processo de infra-estrutura da escola para que o professor pudesse otimizar o processo de ensino aprendizagem. [...] Hoje a nossa grande dificuldade é a infraestrutura porque nós temos uma escola inclusiva e atendemos alunos com necessidades especiais, a nossa infraestrutura é inadequada, é imprópria, para o convívio. (Entrevista Diretor Escola B) Agora se as escolas fossem reformadas, por exemplo, ah, vamos receber os ar-condicionado, ah, então as escolas vão passar por uma reforma de fiação... o dinheiro dava, tranquilo! Mas o problema é que a gente tem com o dinheiro: comprar o fio, fazer a gambiarra, pagar mão-de-obra. Aí é complicado, por isso que não dá! (Entrevista - Diretora Escola A). A própria Secretaria de Educação reconhecendo que o repasse regular de recursos do PROAFI às escolas é insuficiente para a manutenção de prédios escolares com sérios problemas na estrutura física, decidiu enviar parcela adicional para que as unidades escolares executassem outros serviços, como a pintura dos prédios e reforma de banheiros. A Escola B recebeu, segundo seu diretor, 64 mil reais para realizar pintura e reforma das instalações no ano de 2011 como parcela adicional do PROAFI. Entretanto, na análise do entrevistado os recursos foram insuficientes: Por exemplo, houve no ano passado o repasse de recursos que a escola nossa aqui foi prejudicada, porque eles mandaram mediante tipologia de cada 332 escola. Aí a escola recebeu, foi passado pra cá 64.000,00 reais e a outra escola que é desse tamaínho recebeu o mesmo valor. Significa dizer que o serviço que tinha que fazer lá foi feito e presumo que deve ter sobrado dinheiro. Aqui não deu pra a gente fazer a metade que seria a pintura de toda a estrutura física da escola desde o muro externo, passando pela área externa e interna da escola e quadra de esporte; não deu para a gente concluir a parte administrativa, nem pintar a quadra de esporte, nem restaurar as instalações do banheiro porque o recurso foi insuficiente. Nós precisaríamos do dobro para dar conta, de acordo com o levantamento metro quadrado. A questão da manutenção na minha visão, não é preciso ser engenheiro, você tem que trabalhar o metro quadrado da área construída...(Entrevista Diretor Escola B). O repasse de recursos às unidades escolares deveria ser destinado a pequenos reparos e à compra de itens de primeira necessidade como gás, por exemplo. Deste ponto de partida, ampliou-se a proposta a ponto de incumbir as escolas de licitar, contratar, acompanhar a execução, pagar e prestar contas de serviços de reforma muito mais amplos e que deveriam estar ao encargo de profissionais com formação técnica para isso, como engenheiros e mestres de obra. Além do mais, não houve ampliação no quadro de funcionários das escolas em decorrência do aumento das atribuições com a gestão desses recursos, intensificando a carga de trabalho e responsabilidade dos gestores das escolas que enfrentam dificuldades de toda a ordem para administrar em condições de trabalho desfavoráveis: Existe uma insatisfação, a senhora sabe disso, existe uma insatisfação muito grande. Hoje pela primeira vez eu vi uma coisa que eu não tinha presenciado ainda, porque quando eu ia para as reuniões junto com os professores, eu via os professores falando né, mas quando era reunião só de supervisor, coordenador pedagógico ninguém falava nada, todo mundo era calado. Hoje, eu levei um susto, eu levei um susto! Porque a coisa assim, bombou né, popularmente falando na reunião e a SEDUC não conseguiu nem terminar a pauta. (Entrevista Coord. Pedagógica Escola B). Outro programa apontado pelas duas Escolas como voltado à melhoria da qualidade do ensino é o Mais Educação. Este é um programa interministerial de ação conjunta do MEC, Ministério dos Esportes, Ciência e Tecnologia, Cultura, entre outros. De acordo com o documento orientador divulgado pela Secretaria de educação Continuada, Alfabetização e Diversidade - SECAD, o Mais Educação é uma estratégia que [...] promove a ampliação de tempos, espaços, oportunidades educativas e o compartilhamento da tarefa de educar entre os profissionais da educação e de outras áreas, as famílias e diferentes atores sociais, sob a coordenação da escola e dos professores. Isso porque a Educação Integral, associada ao 333 processo de escolarização, pressupõe a aprendizagem conectada à vida e ao universo de interesse e de possibilidades das crianças, adolescentes e jovens. (BRASIL, s.d, p. 07) Neste programa os recursos também são depositados em contas específicas e administrados pelo diretor e pelo Conselho Escolar. Dentre todos os programas mencionados pelos entrevistados, o Mais Educação foi apontado como o mais promissor no que se refere à sua contribuição para a melhoria da qualidade do ensino, conforme indicam as afirmações de nossos entrevistados: O Mais Educação é um programa de muita relevância para corroborar o processo de ensino aprendizagem, principalmente porque o foco do programa é detectar aqueles alunos que na nossa concepção, escola, estão em vulnerabilidade social, ou seja, eles vivem em um ambiente onde houve a ruptura familiar, ou seja, o pai separou da mãe, a mãe separou do pai, ou vivem com a avó, ou vivem com o tio, ou seja, com alguém que não sejam os pais verdadeiramente dessas pessoas. E aí obviamente que essas pessoas não tem essa preocupação como se fossem o pai e a mãe efetivamente. Porque nós já fizemos um levantamento estatístico e isso é fato aqui na nossa escola, que todos os alunos que causam problema no ambiente escolar, a gente vai fazer uma pesquisa, um levantamento e detecta que esse aluno, ele vive em uma família rompida, desestruturada. Já os outros que têm os pais que vivem no mesmo domicílio são alunos tranquilos, estudiosos. [...] Então, o programa ele veio para combater esse tipo de situação. (Entrevista Diretor Escola B). É um programa belíssimo, só que as escolas no Brasil elas não tão em condições de ter esse programa. Pode ser que as novas escolas que vão ser construídas consigam. Mas as que já são têm que passar por reformas. O nosso Mais educação aqui, onde que funciona? Deveria ter uma sala pra trabalhar a questão do xadrez, aí na outra sala trabalhava outra oficina. A gente trabalha nos pátios. (Entrevista diretora da Escola A). A escola não tem estrutura, não tem espaço físico para os alunos passarem o dia todo, não tem onde esses alunos tomarem um banho, onde trocarem de roupa, material mesmo. (Entrevista Vice-Diretora da Escola B) Inicialmente é preciso considerar a importância dada pelos gestores a um programa que se propõem a atender aos estudantes em outro horário, como a grande esperança de melhoria da aprendizagem e do comportamento dos alunos. Isso indica o quanto as escolas ainda acreditam que o baixo rendimento é decorrência de fatores externos à sala de aula. Outro aspecto a destacar são as limitações apontadas pelos profissionais nas condições estruturais das escolas para que o programa Mais Educação possa ser desenvolvido com a qualidade que se propõe. Faltam espaços físicos, condições materiais e também recursos 334 humanos capacitados, conforme indica outro trecho da entrevista realizada na escola B com a coordenadora Pedagógica, pois a proposta do programa é trabalhar oficinas pedagógicas ministradas por estagiários das instituições de Ensino Superior ou com profissionais da própria comunidade. Eu acho o seguinte: as coisas na educação acontecem assim de repente, vem o pacote e joga dentro da escola, então você não é orientada como trabalhar, os objetivos do programa não ficam claros pra gente, os recursos que vem não são aplicados como deveriam ser porque falta recurso humano capacitado e você fica correndo não sabe onde encontrar. A escola não oferece espaço adequado para determinadas atividades, então acaba que o programa que tinha o objetivo de ajudar a melhorar não consegue, vem mais trabalho. (Entrevista Coordenadora Pedagógica da Escola B). O que os dados indicam é que os mesmos programas estão em desenvolvimento em ambas as escolas e que os critérios utilizados para sua implementação não são os dados obtidos nas avaliações externas e nem os índices do IDEB. Ou seja, os recursos são repassados tomando-se em conta o número de alunos atendidos pela escola, o número de salas de aula disponíveis e a apresentação ou não de projetos que justifiquem a liberação do recurso. Entretanto, a diretora da Escola A esclarece que, na última aferição do IDEB, sua escola alcançou um avanço significativo no índice de desenvolvimento, muito acima das metas projetadas para o período. Isso levou a escola a receber uma bonificação em dinheiro. Era pra tirar 3,4 nós fomos pra 4,8. Então o que aconteceu? Nós ganhamos um certificado do MEC dizendo que houve empenho, que a escola alcançou uma média superior à prevista por eles, e nós recebemos uma bonificação em dinheiro, através do PDDE de R$ 1.369,00. Pra nós gastarmos na escola. Isso foi uma bonificação que nós tivemos. Um dinheiro a mais. Uma verba federal pra gente comprar, material pedagógico ou capital, permanente. A premiação da escola que obteve aumento significativo do IDEB evidencia a política de competição entre as escolas da rede, inspirada na lógica de mercado. As iniciativas de repassar recursos diretamente para a escola, deixando a esta a tarefa de definir prioridades e, eventualmente, buscar fontes alternativas de financiamento, têm sido implementadas há algum tempo. Em contrapartida, isso aumenta sua responsabilização pelos resultados alcançados pelos alunos, “isentando-se” os níveis hierárquicos superiores pelo eventual fracasso destes nos testes sistêmicos. A educação passa a ser responsabilidade da escola, cabendo à administração pública garantir um mínimo de recursos e 335 divulgar os resultados alcançados em cada uma delas. (OLIVEIRA, 2005, p. 30). Quando a avaliação da qualidade do ensino se dá à distância apenas pela aferição dos números do rendimento escolar perdem-se de vista os fatores que condicionam esses resultados, ignorando-se que cada escola possui características culturais e organizacionais muito distintas e que as soluções para a superação das dificuldades escolares serão diferentes para cada uma dessas instituições. Como ocorreu com a Escola A. As razões apresentadas pela diretora para o salto dado pela escola na elevação do IDEB passaram pelo trabalho pedagógico diferenciado desenvolvido por uma única professora. Na época, nós tivemos uma professora aqui e ela trabalhou com um projeto dela mesma, que depois ela vendeu, por que a SEDUC não deixou que ela continuasse desenvolvendo o projeto aqui, que era um projeto de leitura. [...] Ela desenvolveu um projeto, e esse projeto era bem amplo. Ela trabalhava raciocínio lógico, sabe?... Com a criança. E ela conseguiu durante esse ano desenvolver um bom trabalho, foi isso que aconteceu aqui. [...] Ela não trabalhava só num quarto ano, que agora é o quinto ano, ela trabalhava nos dois, ela trabalhava português e a outra professora só trabalhava matemática. Aí elas revezavam. [...] Foi um projeto muito bom. Isso desenvolveu muito os alunos Aí, o que aconteceu: quando foi final do ano, a SEDUC não aceitou que ela ficasse [...]. Mandamos pra representação, falamos da importância, do que tinha ocorrido na escola, o benefício que isso tinha trazido... Mas não deixaram, não! (Entrevista Diretora da Escola A). A situação descrita pela diretora indica que um esforço centrado no trabalho pedagógico foi o elemento mais importante para que a escola conseguisse melhorar o aproveitamento dos alunos que se submeteram às avaliações no ano em que a escola melhorou seu índice de desenvolvimento. Entretanto, os resultados obtidos pela professora não foram suficientes para que ela fosse mantida na função, apesar das solicitações da escola. 5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS Quando consideramos os objetivos estabelecidos pelos diferentes programas de avaliação e mais especificamente do ranking construído pelos diferentes indicadores que resultam no IDEB, todos eles apontam que os dados devem contribuir para o direcionamento de investimentos para a melhoria das condições de funcionamento das escolas, com vistas à elevação dos índices e consequentemente da qualidade do ensino. 336 Entretanto, os dados obtidos indicam que as avaliações externas têm sido instrumento de gerenciamento dos resultados obtidos pelas escolas a partir dos investimentos dos recursos financeiros encaminhados para as unidades escolares por meio de programas de descentralização dos recursos e da gestão. Assim, os governos estadual e federal têm repassado para as escolas a responsabilidade pela manutenção da educação por meio da transferência de recursos financeiros, claramente insuficientes para a manutenção de uma educação de qualidade. Além disso, outros elementos do processo educacional não têm sido considerados na oferta de uma educação de qualidade, tais como a inadequação dos espaços físicos, a remuneração dos profissionais e a falta de funcionários para atuar nas diferentes funções no interior das escolas. A política educacional brasileira precisa fazer valer o que estabelece a Constituição e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional quando afirmam que o acesso a uma educação de qualidade é um direito de todos os cidadãos. Com disputas entre instituições, não será garantido este direito, uma vez que a lei de mercado é atender aos que têm mais recursos e não a todos os que necessitam. REFERÊNCIAS BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 1988. 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Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB). Brasília, 2007. 337 FREITAS, Luiz Carlos de. Eliminação adiada: O ocaso das classes populares no interior da escola e a ocultação da (má) qualidade do ensino. Educ. Soc., Campinas, vol. 28, n. 100 Especial, p. 965-987, out. 2007. Disponível em: <http://www.cedes.unicamp.br>. LIMA, I. G. de; GANDIN, L. A. Estado, gerencialismo e políticas educacionais: construindo um referencial teórico de análise. 34ª Reunião Anual da ANPED. Natal, 2011. Disponível em: www.anped.org.br/app/webroot/34reuniao/.../GT05-667%20int.pdf Acesso em: 10 jun. 2012. OLIVEIRA, R. P de. Política Educacional no Brasil: A expansão do Ensino Fundamental e suas conseqüências In. BOCK, A. M. B. (Org.) Relatório Final: Programa Banco Social de Serviços em Psicologia. Disponível em: <http://www.pol.org.br/pol/export/sites/default/pol/publicacoes/publicacoesDocumentos/MSE_Relato rio_Final.pdf>. Acesso em: 12 jul. 2012. PERONI, Vera. 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O objetivo central foi “Levantar e analisar por meio de entrevistas com as famílias indígenas dos estudantes participantes da pesquisa, ocorrências por elas interpretadas como violência da e na escola”. Vale ressaltar que trata-se de apenas um dos objetivos do Projeto Matriz, visto que além das famílias indígenas, os próprios estudantes indígenas, docentes, coordenadores e coordenadoras pedagógicas, além da direção das escolas, atuaram como colaboradores da pesquisa. As atividades principais foram: leituras sobre a temática, seminários locais, pesquisa de campo e sistematização do estudo. Palavras-Chave: Violência Institucional Escolar. Crianças Indígenas. Perspectiva Familiar. ABSTRACT This research deals with the results of the study developed under the project: Pencil, notebook, arrow and prejudice: features of institutional violence in indigenous children in urban public schools of Rondônia, which unfolded in subproject Features of institutional violence in indigenous children in urban public schools in the state of Rondonia in the prospect of their families. The central objective was to "lift and look through interviews with the families of Indigenous students participating in the research, which they interpreted as instances of violence and at school." Note that this is just one of the goals of Project Matrix, as well as indigenous families, their own indigenous students, teachers, coordinators and pedagogical coordinators, and the direction of schools, acted as collaborators in the research. The main activities were: reading on the subject, local seminars, field research and systematic study. Keywords: Institutional Violence School. Indigenous children. Family Perspective. 73 Bolsista do PIBIC/UNIR/CNPQ, acadêmica do curso de Pedagogia, email: [email protected] Profª. Dra. Do curso de Pedagogia, Departamento de Ciências Humanas e Sociais da Fundação Universidade Federal de Rondônia, Campus de Ji-Paraná. Email: [email protected] 74 339 VIOLÊNCIA INSTITUCIONAL ESCOLAR E O PAPEL DA ESCOLA Conceituar a violência escolar e delimitar sua compreensão nos termos “da e na” escola, significa ao mesmo tempo identificar os meios ao qual se constroem os espaços como o seio familiar, institucional e social, de interação entre os sujeitos envolvidos neste ambiente. Não é sempre que estes meios estão e são identificados por aqueles considerados capazes de intervir e interagir com as diversas situações vivenciadas no cotidiano destes ambientes. As identificações ressaltadas nestes escritos estão relacionadas relações sociais produzidas pelos sujeitos participantes nestes ambientes. Organizar um espaço que seja destinado a produzir reflexões sérias e sistematizadas quando o assunto se refere ao respeito do outro na construção deste outro como sendo também o sujeito que participa do meio ao qual está inserido, nem sempre são possíveis. Poder-se-ia dizer que a escola é o ambiente destinado a esta produção. No entanto, a instituição de ensino, atualmente sente dificuldade em direcionar o processo de ensino e aprendizagem para ação voltada a criticidade, construtivo, interativo, e a autonomia na construção dos sujeitos inseridos neste processo. Não é fracasso escolar, mas a própria negação por parte da gestão, docência, políticas públicas e demais profissionais da educação na significação que as crianças inseridas no ambiente escolar terão em relação a criticidade e ao respeito de si e do outro, bem como reconhecer as alteridades culturais existentes neste meio. A Violência institucional escolar nasce também da hostilização da existência destes sujeitos no espaço escolar. É possível perceber esta hostilização nos escritos de Abramovay (2002) que segundo a autora vários estudos vem sendo desenvolvidos com o intuito de compreender como a violência institucional escolar, uma vez que esta violência não está vinculada somente a questão da criminalidade, mas também sua relação com que questão da exclusão social, miséria, ao desamparo político, tendo em vista sua desagregação social relacionadas com a exclusão social e institucional. Desta forma, o que determina a violência, sobretudo a institucional é o desrespeito, a coisificação, a negação do outro, a violação dos direitos humanos, fatos estes que se somam a uma realidade social de miséria, exclusão, corrupção, desemprego, concentração de renda, poder e autoritarismo. No que se refere à violência institucional escolar, observamos suas 340 evidências no cotidiano da escola uma vez que reflete em seu interior as próprias contradições da sociedade, respaldando-se na desigualdade social, nas diferenças culturais75. Autores como Bourdieu e Passeron (1975) já desenvolviam estudos relacionados a problemática em questão, e ressaltam que toda ação pedagógica exercida pelo sistema de ensino se constitui em uma violência simbólica. Para os autores esta violência se condiciona por meio de duas subdivisões: “inculca um conteúdo cultural arbitrário e exerce a ação pedagógica por um poder autoritário que reproduz interesses dos grupos dominantes. A educação escolar, assim, além de reproduzir a cultura dominante, contribui para a perpetuação da desigualdade social, pois não propicia às classes populares um acesso igualitário à educação”. Os autores evidenciam que o processo educacional não deve reproduzir ações centradas em uma única característica cultural, mas levar em consideração todas as alteridades existentes no espaço escolar. Diante do que foi exposto, fica evidente que a violência institucional segundo os escritos de Chauí (1999) são compreendidas como a violência exercida no âmbito dos serviços públicos, seja por ação ou omissão, uma vez que a mesma possa envolver a falta de acesso a estes serviços e sua má qualidade para os seus usuários, tendo em vista que sua distribuição ocorre de formas assimétricas, tais como abusos de poder nas relações existentes entre os atores que a constitui. Caracterizando a transgressão da integridade física e psíquica, da dignidade humana das pessoas. Trata-se de um evento realizado pelas instituições que ocasionam dano a outrem, sobretudo em função da desigualdade social. Relacionando a conceitualização do termo violência institucional escolar na perspectiva dos e das estudantes indígenas - como é o caso deste estudo, observa-se que: A constante busca de refinamento metodológico e conceitual que se nota nos estudos de contato interétnico, ainda que possa ser considerada como o processo natural de desenvolvimento de qualquer ciência, pode ser considerada também e sobretudo como o resultado da perene frustração dos etnólogos em bem compreender a estrutura e a dinâmica das relações entre povos de etnia distinta, inseridos numa situação determinada: a situação de contato. (OLIVEIRA, 1996, p.33) Estas situações de contato dentro do espaço escolar, ocorrem diariamente e em sua maioria de forma agressiva - fisicamente e simbolicamente falando, tendo em vista o 75 Texto retirado do Projeto intitulado Lápis, caderno, flecha e preconceito: feições da violência institucional com crianças indígenas em escolas públicas urbanas de Rondônia, desenvolvido pelo GPEA na UNIR, Campus de Ji-Paraná no período de 2011-2012. 341 não conhecimento da cultura e dos costumes dos e das estudantes indígenas inseridas nas escolas públicas urbanas. Em outras palavras, A intervenção, no aspecto que poderia ser considerado como educação escolar, esteve pautada nesta perspectiva sobre o outro, seja no sentido de, com a instrução, tirá-lo da condição de selvagem, seja negando a ele o acesso a instrumentos que o permitissem conquistar a liberdade [...] é preciso ter presente o histórico de desprezo dos brasileiros pelo índio, para se ter respeitadas algumas especificidades socioculturais, refletidas nas conquistas políticas, particularmente a educação escolar, fundamentada no respeito à cultura do povo a quem se destina. (DALMOLIN, 2004, p. 81, 82, 84) Estas situações dentro dos espaços escolares são consideradas, e como também já foi contextualizada, como violência institucional escolar, onde há a negação do outro, mesmo havendo sua existência confirmada. A aceitação destas situações estabelecem o domínio de poder, entre a sociedade ocidental - considerada a organização correta dos sujeitos, e as comunidades indígenas - sendo esta, a formação primitiva de atores primitivos. Diante todos os fatores supracitados, é preciso ter em mente que a violência institucional cometida dentro do processo escolar são reedições e estratégias históricas vivenciadas na catequização do índios pelos padres jesuítas e na própria colonização existente na formação do Brasil, para manter sujeitos em questão em condição social inferior, minoritária e consequentemente subalternizado. METODOLOGIA DE ESTUDO Para suscitar os resultados desta pesquisa, optou-se pela abordagem qualitativa que segundo Minayo (2010, p. 16) se “[...] inicia por uma questão, por um problema, por uma pergunta, por uma dúvida. A resposta a esse movimento do pensamento geralmente se vincula a conhecimentos anteriores ou demanda a criação de novos referenciais”. Neste sentido, questionou-se: na perspectiva das famílias indígenas dos estudantes participantes da pesquisa, há ocorrências por elas interpretadas como violência da e na escola? Deste modo, foi elaborado um plano esquemático, subdivido em três níveis. No primeiro nível, foram desenvolvidas revisões de livros e artigos relacionados à problemática em questão - violência institucional escolar. O segundo nível destaca a pesquisa de campo, tendo como base as visitas e entrevistas recorrentes segundo os escritos de Zanelli (2002), com as famílias dos estudantes inseridos neste processo. O terceiro nível deste estudo 342 implicará a análise dos dados, tendo em vista compreender como a violência institucional das escolas públicas urbanas vem se manifestando no município pesquisado no que se refere a visão de indígenas urbanos. ANÁLISE DOS DADOS OBTIDOS Durante a coleta de dados, o que mais chamou a atenção foram os relatos dos participantes em relação ao comportamento da escola, entendida neste estudo como docentes, gestores, secretários e todo corpo que compõe os profissionais da educação. As entrevistas demonstram que as escolas, em sua maioria, ignoram a participação de estudantes indígenas no processo de ensino e aprendizagem, tendo em vista que a aceitação da matrícula é apenas a inclusão destas crianças na instituição de ensino e não sua inserção com o processo democrático de ensino, uma vez que “a escola nem acha que eu sou índia, eles falam que eu pareço mais japonesa. Mas quando eles falam eu digo que sou indígena”(E2/ C.I). Estas ações segundo Dalmolin (2004, p.138) “teve e tem como finalidade interferir na identidade cultural destes povos, dada a concepção etnocêntrica em que se sustentam seus objetivos.” Outro fator é a não problematização das novas identidades culturais dentro do espaço escolar e o desconhecimento da gestão institucional em reconhecer e desenvolver, nas questões pedagógicas, ações que possibilite, bem como proporcione tanto aos estudantes indígenas e não indígenas como os profissionais da educação, compreender, orientar e relacionar as alteridades existentes e os fatores sociopolíticos e culturais que envolvem a temática em questão. Percebe-se, a princípio, que a escola não trabalha com a construção das alteridades culturais, tendo em vista que: Observamos neste estudo é a negação da criança indígena dentro do espaço escolar por meio de estereótipos físicos - em relação a instituição dizer que a estudante indígena é asiática, e a afirmação de políticas inexistentes por parte da escola. O que se observa nestas primeiras entrevistas é desconexo entre a função da escola em orientar o reconhecimento de si e do outro como sujeito resultante e participante do mesmo meio social, bem como a construção deste auto reconhecimento. Diante do que foi exposto, verificamos junto as análises das entrevistas obtidas por meio do trabalho de campo desenvolvido com os familiares das crianças indígenas das escolas públicas urbanas do município de Ji-Paraná - RO que há um distanciamento entre as realidades destas crianças e o espaço escolar. Outro fator que pode ser verificado é como os 343 responsáveis lidam as situações de violência institucional escolar apresentada até o presente momento, tendo em vista que as falas dos e das participantes da pesquisa. CONSIDERAÇÕES FINAIS As análises das pesquisas obtidas no estudo bibliográfico e no trabalho de campo desenvolvido com os familiares das crianças indígenas das escolas públicas urbanas do município de Ji-Paraná - RO estão nos fazendo compreender que há um distanciamento entre as realidades destas crianças e o espaço escolar. Outro fator que pode ser verificado é como os responsáveis lidam as situações de violência institucional escolar apresentada até o presente momento, tendo em vista que as falas dos e das participantes da pesquisa. Outro fator ressaltado nestes resultados preliminares é a negação da criança indígena dentro do espaço escolar por meio de estereótipos físicos - em relação a instituição dizer que a estudante indígena é asiática, e a afirmação de políticas inexistentes por parte da escola. O que se observa nestas primeiras entrevistas é desconexo entre a função da escola em orientar o reconhecimento de si e do outro como sujeito resultante e participante do mesmo meio social, bem como a construção deste auto reconhecimento. O estudo sugere a necessidade de continuidade e aprofundamento da temática tendo em vista a necessidade de esclarecer alguns dados coletados. Vale ressaltar que este estudo busca compreender como os estudantes indígenas se desenvolvem ao passo em que o mesmo apropria sua identidade dentro do processo de coletividade. REFERÊNCIAS ABRAMOVAY, M. (Org). Violências no cotidiano das escolas. Brasília: UNESCO, 2002. BOURDIEU, P; PASSERON, J. C. A reprodução. 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Acessado em Fevereiro de 2011. 345 LITERATURA INDÍGENA E OS MITOS YANOMAMI: UM ESTUDO COMPARATIVO DAS OBRAS MITOPOEMAS YANOMAMI E NARO, O GAMBÁ MITOS DOS ÍNDIOS YANOMAMI Sebastiana Pereira dos Santos Programa Institucional de Iniciação Científica - PIBIC/UNIR/CNPq Orientadora Profa Dra Cynthia de Cássia Santos Barra Universidade Federal de Rondônia - UNIR RESUMO Os índios brasileiros foram introduzidos de diversas formas na literatura brasileira, mas, nos últimos trintas anos, temos tido a oportunidade de apreciar essa temática por meio da voz e do olhar dos próprios indígenas. Obras de autoria indígena e obras produzidas em coautoria com indígenas entraram no circuito literário brasileiro e estão constituindo o seu próprio público. O estudo comparativo das obras Mitopoemas Yanomami (1978), produzido a partir de um projeto editorial coletivo, e Nar-o gambá: mitos dos índios yanomami (1986), uma adaptação de Ciça Fittipaldi para a chamada literatura infantil brasileira, permite-nos entender um momento importante dessa passagem dos temas indígenas tratados como objetos de estudo folclóricos ou científicos ao aparecimento da figura do autor indígena na contemporaneidade. A experiência de autoria indígena, certamente, aponta para significativas transformações nas formas de inscrição e de representação literária de temática indígena. Nas páginas do livro Mitopoemas Yanomami, por exemplo, foram preservados os aspectos da oralidade e isso não deve ser tomado somente como registros espontâneos das falas coletadas: há ali uma produção intelectual, realizada em coautoria (povo indígena e artistas não indígenas), sob a perspectiva da transcrição/transcriação literária. Diante do exposto, esta comunicação pretende propor uma reflexão teórica acerca da introdução da escrita e da cultura do impresso na etnia Yanomami, propiciando uma melhor compreensão das condições de produção, difusão e recepção da literatura indígena na contemporaneidade. Palavra-Chaves: Literatura de autoria indígena. Mitopoemas Yanomami. Estilo Yanomami. ABSTRACT Brazilian Indians were introduced in various forms in Brazilian literature, but in last thirty years, we have had the opportunity to enjoy this theme through the voice and the look of the Indians themselves, as works of indigenous authorship and works produced in co-authoring with indigenous entered Brazilian literary circuit and are forming their own audience. The comparative study of the works Mitopoemas Yanomam (1978) in co-authorship and Nar-o Gambá: myths of the Yanomami Indians - an adaptation to the called Brazilian children's literature, allows us to understand an important moments: the passage of indigenous issues treated as scientific objects of study as folklore and the appearance of the figure of the Indian 346 author. The experience of indigenous authorship, certainly points to changes in the forms of literary representation and inclusion of indigenous issues. In the pages of the book Mitopoemas Yanomam, for example, were preserved aspects of orality and this should not be taken only as records of spontaneous speech collected. Is there an intellectual production, held in co-authoring (indigenous people and non-indigenous artists), from the perspective of transcription / transcreation literary. This article proposes a theoretical reflection about the introduction of writing and culture of the Yanomami ethnic printed on, allowing a better understanding of the conditions of production, dissemination and reception of literature in contemporary Indian. Key word: Literature of indigenous authorship. Mitopoemas Yãnomam. Yanomami Indians. Style. Speaking. Transcription / transcreation. INTRODUÇÃO Entre muitas conquistas sociais e políticas asseguradas na Constituição Federal do Brasil de 1988, os indígenas, através da garantia de programas de educação diferenciada e específica, têm aprendido a lidar com a prática da escrita alfabética. Dessa forma, os índios saíram da posição de figurantes nas produções textuais e, passo a passo, vêm se configurando como autores de suas próprias histórias. Hoje é possível dizer que os escritos indígenas participam da cultura do impresso, constituindo não só acervos documentais, mas também acervos de teor estético com a publicação de textos criativos ou literários. As produções estéticas estão sendo consumidas não só no contexto do processo educacional, como também pela sociedade brasileira, inclusive já fazem parte de acervos de Universidade Federais (MATOS, 2011, p 04). Com as novas condições, os povos indígenas assumem um novo posicionamento, já que, agora, o próprio índio fala sobre si, desmitificando muitas concepções estereotipadas e folclóricas a que estiveram submetidos por não terem voz perante a sociedade ocidental. A partir da experiência de autoria indígena é possível considerar que esse perfil está sendo remodelado, visto que “através da escrita e publicação de suas narrativas, de seus cantos e de suas poesias, os índios agora ensaiam uma nova forma de figurar na história” (ALMEIDA & QUEIROZ, 2004 p. 233). A literatura de autoria indígena no Brasil pode ser tomada com uma das novas formas do discurso indígena. Se como fenômeno cultural ainda é recente, por outro lado, a produção literária de autoria indígena já se tornou significativa para os estudos literários, pois “não seria impertinente incluir a produção literária dos índios brasileiros na retomada da discussão sobre sujeito, representação e estilo, no âmbito da literatura brasileira, em função da crítica literária” (ALMEIDA & QUEIROZ, 2004 p. 233). 347 Ao longo da pesquisa, tivemos por objetivo pensar qual o lugar ocupado pela obra Mitopoemas Yãnomam (1978) em relação ao movimento literário de autoria indígena emergente no Brasil; bem como trilhar um caminho que visasse mapear como vem se materializando historicamente e esteticamente a literatura de autoria yanomami. Para realizar o percurso crítico almejado por nós, estruturamos nosso trabalho em três momentos: 1º) breve panorama dos dados encontrados em pesquisa bibliográfica relativa à relação dos Yanomami com a cultura do impresso; 2º) uma revisão bibliográfica sobre o movimento literário indígena; 3º) por fim, análise comparativa das obras Mitopoemas Yãnomam (1978), escrito em co-autoria, e Naro, o Gambá: mitos dos índios yanomami (1986), de Ciça Fittipaldi METODOLOGIA Em conformidade com o Plano de Trabalho da coordenadora do Projeto gerador, as fontes de pesquisa abrangidas aqui são estritamente de cunho bibliográfico. Não estão previstas pesquisas de campo, coletas de narrativas em comunidades indígenas ou realização de entrevistas com escritores indígenas. Todo o material dessa espécie que porventura nos sirva de fonte e objeto de estudo virá de pesquisas bibliográficas em bibliotecas físicas e virtuais, de consulta a acervos públicos e/ou privados, e à rede web.Em relação ao tratamento crítico a ser conferido aos livros escolhidos como objetos das análises literárias propostas no presente Plano de Trabalho, será realizado um levantamento das características gerais dos livros selecionados para análise, ou seja, será feita reflexão teórica sobre a prática discursiva, os conteúdos específicos, os gêneros utilizados e a proposta estética neles existentes, articulando e problematizando essas características tanto em relação ao saber indígena tradicional quanto ao saber científico concernente à Teoria Literária contemporânea, sobretudo aquela que se faz em diálogo com a corrente crítica francesa pós-estruturalista. Em relação ao corpus constituinte das bibliotecas físicas e virtuais a serem consultadas a fim de montar o banco de dados previsto neste projeto, optou-se, neste momento, por privilegiar as bibliotecas virtuais universitárias, os periódicos científicos open access e os bancos de dados virtuais de Organizações Não-Governamentais Indígenas (ONGs), em razão da dificuldade financeira para deslocamentos físicos da pesquisadora-coordenadora e de sua equipe de trabalho 348 Principais resultados da pesquisa bibliográfica Os resultados aqui apresentados terão por base a classificação dos dados coletados nas bibliotecas virtuais de Universidades Federais: do Amazonas (UFAM), Roraima (UFRR), Minas Gerais (UFMG), Brasília (UNB), Rondônia (UNIR), Acre (UFAC), São Paulo (USP) e Organizações de apoio a etnia Yanomami, como o site da Comissão Pro-Yanomami. Neste resumo, apresentaremos apenas os Gráficos 1 e 2, os demais constam do Relatório Final. Gráfico 1 - Apresenta a classificação por grupos de autoria de todos os dados coletados Através da pesquisa nas bibliotecas, contatamos que os Yanomami não produziram muito desde 1978, quando foi elaborada a obra em co-autoria Mitopoemas Yanomami. Desde a elaboração desta obra, não foi possível constatar registros de produções em co-autorias. Conforme o gráfico 1, as produções em co-autoria e autoria indígena juntas correspondem a menos de 6% (seis por cento) das referências coletadas, totalizando cerca de 7 (sete) produções. As produções de autoria yanomami chegam a mais de 4% (quatro por cento) dos dados coletados, o que representa dados animadores. Não houve registros desse tipo de manifestação até a década 1990, mas, a partir daí, é possível pensar que tais produções escritas tenham se tornado uma prática da etnia. As produções de autoria não indígena sobre os Yanomami correspondem a pouco mais de 94% (noventa por cento) dos dados coletados. Além da obra de literatura infantil sobre a mitologia indígena: Naro-o Gambá: mitos dos índios yanomami e a obra literária: A criação do mundo segundo os índios ianomâmi, tais produções, em sua maioria, são resultados de 349 pesquisas antropológicas e sociais, históricas, geográficas, medicinais etc., já que essa etnia oferece dados para estudos nessas áreas, devido ao conturbado processo de contato. Em relação às particularidades das produções de autoria indígena, vejamos o gráfico seguinte. Gráfico 2 - Apresenta a distribuição da autoria Yanomami por diferentes categorias autorais O gráfico 2 demonstra a forma de produção textual dos Yanomami. As produções de autoria individual e coletiva somam 6 (seis) produções, e apenas 1 (uma) delas é de autoria coletiva. Os resultados de autoria indígena coletiva não são muito estimuladores, pois encontramos apenas 1 (uma) produção. A produção de autoria coletiva não é literária, e sim uma carta de caráter político-governamental, encaminhada ao Governo Federal, na qual a comunidade requer medidas urgentes no sentido da demarcação definitiva de suas terras. O objetivo desse tipo de produção é chamar atenção para os direitos indígenas, fazendo parte, portanto, de um movimento político. As produções de autoria individual representam a maioria das produções de autoria yanomami, cerca de 83% (oitenta e três por cento). Estes textos são todos de autoria do líder da etnia Yanomami, Davi Kopenawa Yanomami. Os textos escritos de Davi Kopenawa requerem uma problematização específica, pois contam com o apoio do antropólogo Bruce Albert, que atua como escriba numa parceria intelectual que dura mais de trinta anos. Davi Kopenawa não possui domínio da escrita alfabética. Assim, foi muito interessante observar, nas fichas catalográficas consultadas, que todas essas produções individuais apresentam Davi Kopenawa como autor e o antropólogo, responsável pela transcrição do texto oral, apenas 350 como tradutor. Casos como esses nos quais há um trabalho conjunto de indígenas e não indígenas, por vezes, produzem impasses e/ou equívocos no momento da atribuição de autoria. Como afirma Franca e Chagas: Para serem reconhecidos como criadores de suas obras, os índios não devem apenas transcrever uma narrativa contada oralmente e tampouco os organizadores não indígenas devem receber créditos de autoria principal, ignorando os casos de autoria coletiva indígena. (Franca e Chagas, 2010, p.09) Na maioria das vezes, os textos de autoria individual Yanomami encontrados apresentam narrativas míticas ou históricas com aspectos comuns aos membros da comunidade, caracterizando-se como uma memória coletiva (cultura, costumes, mitos, organização social e política, história Yanomami). Tal como afirmado por Almeida: “A escritura é coletiva porque é expressão do que é comum, ou de um consenso em torno do ‘quem somos’” (ALMEIDA, 2004, p. 197). Principais resultados da pesquisa bibliográfica A inter-relação de Mitopoemas Yãnomam e Naro - o gambá: mitos dos índios yanomami na construção de um estilo yanomami As obras Mitopoemas Yãnomam e Naro - o gambá: mitos dos índios yanomami reproduzem uma mesma temática dentro de um mesmo campo do saber, mas provocam efeitos diferentes. O potencial da obra Mitopoemas Yãnomam se ancora no projeto editorial. O desejo de mostrar um produto criativo dos índios yanomami foi levado às últimas consequências nesta obra para não só disseminar a cultura yanomami, mas também para aproximar o leitor ocidental de uma escrita que tivesse uma lógica específica. Isto é, não bastava somente conhecer a cultura yanomami através dos mitos, era preciso lançar um novo olhar para a alteridade cognitiva e estética dos indígenas. Assim, cada detalhe da construção da obra, como o tamanho, a forma de ilustração, a falta de paginação e etc., são importantes para se alcançar tal objetivo: A construção da página, desde a definição do tipo, seu desenho, tamanho e espaçamento entre as letras, palavras e linhas, bem como a delimitação da mancha, influencia enormemente a leitura de um livro, podendo muitas vezes desanimar o leitor ou encorajá-lo a continuar. (MACHADO, 2012, p. 57) 351 Já a obra Naro - o gambá: mitos dos índios yanomami não busca, especificamente, promover o potencial criativo yanomami. Ancora sua maior força no papel político desempenhado pela publicação dos mitos em relação à defesa da causa indígena. Contudo, o fato de mitos indígenas estarem numa literatura direcionadas ao público infantil contribui também para fortalecer as concepções que tratam a representação indígena como produtos inferiorizados e/ou infantis, principalmente pelo constante imposição de desenhos e grafismos: Esses especialistas, bem preparados e bem intencionados, não têm, no entanto, considerando com seriedade, as representações culturais nãoverbais criadas pelos professores indígenas e seus alunos, classificando essas representações como mera ilustração e expressão da alegria e atitude infantil dos povos indígenas. (THYAGO, 2007, p. 21). Dessa forma, Naro - o gambá: mito dos índios yanomami produz efeitos de leitura já esperados em uma literatura infantil tradicional. Possui características clássicas de uma narrativa em prosa, com a presença da personificação e maior atenção para as ilustrações gráficas. Mitopoemas Yãnomam, também lançando mão da mitologia indígena, de desenhos e textos escritos, elimina qualquer possibilidade de ser consumida apenas por um público infantil. Diante das contribuições das duas obras para pensarmos em um estilo indígena yanomami, relembremos que a obra Mitopoemas Yãnomam é fundamental para a construção da literatura de autoria indígena na contemporaneidade. Então, diz Almeida, “através da criação e da articulação de novas formas, eles [os povos indígenas] entram no circuito literário” (ALMEIDA, 2004, p. 198), dando início a um movimento de literatura indígena. Assim, na tentativa de reconhecer o estilo indígena, pensemos que, embora haja especificidades nas obras que cada etnia produz, é possível definir um estilo indígena geral. Almeida (2004) afirma: A proposta de um estilo indígena na literatura brasileira se fundamenta no princípio da dessubjetivação: o sujeito se perde no estilo e se reencontra por algum traço, quando a cultura se torna realmente importante. (ALMEIDA, 2004, p. 201). A dessubjetivação, sem dúvida, é um ponto de reflexão do estilo literário nas obras de literatura de autoria indígena. Pensando na proposta da autora, também aposto no texto 352 multimodal, sobretudo em Mitopoemas Yãnomam, como configuração do estilo da autoria indígena na literatura. Amanda Machado (2012) defende, em sua dissertação de mestrado, a presença do texto gráfico-textual como recurso estilístico próprio da literatura de autoria indígena produzida hoje no Brasil (MACHADO, 2012, p. 55). CONSIDERAÇÕES FINAIS O estudo da escrita indígena como um olhar estético, sem dúvida, é um trabalho delicado. Há nesse tipo de produção todas as complexidades possíveis de um objeto em sua primeira fase de conhecimento. O estudo de uma obra que é diferente de tudo que já é de nosso conhecimento leva a questionamentos comuns: Como ler uma literatura que não se enquadra nos padrões conhecidos? Como sistematizar essa leitura? Se a proposta é levar essa literatura para a faculdade de letras, como torná-la objeto de reflexões acadêmicas? Como ver o que ainda não se sabe? Como deixar existir o que ainda não se nomeou? (ALMEIDA, 2004, p. 236). Estamos acostumados a lidar com estudos comparativos entre estéticas provenientes de um mesmo meio social, político e cosmológico. Diante da literatura de autoria indígena, temos a percepção que estamos diante de algo fantástico e misterioso aos leitores. Contudo, como críticos, nós temos a sensação de não possuirmos conhecimentos suficientes para finalizar esse estudo. As armas dos estudos literários que temos parecem não ser capazes de satisfazer as necessidades da escrita criativa dos indígenas. Com esta pesquisa pudemos constatar que as visões etnocêntricas não podem ser completamente afastadas e é em diálogo com diferentes visões que a literatura de autoria indígena mostra-se expressiva, específica e desafiadora. REFERÊNCIAS ALMEIDA, Maria Inês e QUEIROZ, Sonia. Na captura da voz: as edições da narrativa oral no Brasil. Belo Horizonte, Autêntica e FALE/UFMG, 2004. ANDUJAR, Claúdia (Org.). Mitopoemas Yanomami. São Paulo: Olivetti do Brasil, 1978. BICALHO, Charles. Yãmîy maxakali: um gênero nativo de poesia. Belo-horizonte: Aletria, 2007. 353 FITTIPALDI, Ciça. Naro-O gambá: Mitos dos índios Yanomami. São Paulo: Melhoramentos, 2005. GÓMEZ, Gale Goodwin. Empréstimos do português e neologismos em Yanomae. Goania UFG, 2001. GRAÚNA, Graça. Literatura Indígena: desconstruindo estereótipos, repensando preconceitos. Recife - UPE, 2011. GUESSE, Érika Bergamasco. Da oralidade à escrita: os mitos e a literatura indígena no Brasil. Anais do SILEL. Volume 2. Número 2. Uberlândia: EDUFE, 2011. GUIMARÃES, Sílvia. O drama ritual da morte nos Sanumá. Campo Grande: Tellus, 2010. LIMA, Amanda Machado Alves de. O livro indígena e suas múltiplas grafias. 2012.156 f. Dissertação (Mestrado em Letras) - Faculdade de Letras da UFMG. Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte. RISÉRIO, Antônio. Palavras canibais. Revista USP, São Paulo, n.13, p.26-43, mar./abr./mai. 1992. SOUZA, Lynn Mario T. Menezes de. As visões da anaconda: a narrativa escrita indígena no Brasil. São Paulo -USP. Revista SEMEAR 7, 2011. THIÉL, Janice Cristine, QUIRINO, Vanessa Ferreira dos Santos. A literatura indígena na escola: um caminho para a Reflexão sobre a pluralidade cultural. Coritiba: PCPR, 2011. In ISIRSSE - EDUCERE. VIDILLE, Wagner. Xamãs e os espíritos ancestrais. São Pulo; PEPSIC, 2006. YANOMAMI. Davi Kopenawa. Sonhos das Origens. Revista povos indígenas do Brasil ISA, São Paulo. 1998. AGRADECIMENTOS: Ao PIBIC / CNPQ; À Unir / Departamento de Línguas Vernáculas; À Orientadora, Dra. Cynthia de Cássia dos Santos Barra Aos meus companheiros de pesquisa; À minha Família e Amigos. CONTATOS Orientando: Sebastiana Pereira dos Santos E-mail: [email protected] Orientador: Profª Dra Cynthia de Cássia dos Santos Barra E-mail: [email protected] 354 AS RELAÇÕES SEMIFEUDAIS NO AMBIENTE ESCOLAR: SE VOCÊ MANDA, EU OBEDEÇO!76 Silmara Ferreira Lopes77 Prof.ª Drª Marilsa Miranda de Souza78 Universidade Federal de Rondônia - UNIR RESUMO A pesquisa foi realizada nas escolas da Zona da Mata rondoniense e buscou analisar as relações de poder no ambiente escolar. O método utilizado foi o materialismo históricodialético. A pesquisa apontou que as relações são determinadas pelo coronelismo que age indiretamente por meio de coação ou da persuasão dos professores para se submeterem às políticas educacionais ditadas pelo Banco Mundial/MEC, sob pena de perseguições por parte do poder local. O trabalho dos professores é compreendido como semifeudal, uma vez que se submetem às mais precárias condições de trabalho e emprego, não possuem autonomia didático-científica, não possuem autonomia de gestão e se sujeitam aos processos mais rudes de obrigação e servidão às políticas implantadas nas escolas e aos processos falseadores de gestão democrática. Palavras-chave: Semifeudalidade. Coronelismo. Políticas educacionais. 1 INTRODUÇÃO O presente relatório final tem origem no desenvolvimento da pesquisa intitulada: CAPITALISMO BUROCRÁTICO, POLÍTICAS EDUCACIONAIS E RELAÇÕES DE PODER NA EDUCAÇÃO ESCOLAR EM RONDÔNIA financiada pelo PIBIC/UNIR (02 bolsistas) através do desdobramento de seu subprojeto: AS RELAÇÕES SEMIFEUDAIS NO AMBIENTE ESCOLAR: SE VOCÊ MANDA, EU OBEDEÇO! A pesquisa realizada por Souza (2010) sobre as políticas educacionais em educação do campo levantou uma problemática que deu origem a essa pesquisa. Um dos aspectos desta problemática é a relação de poder estabelecida no âmbito da escola nos últimos anos. As políticas educacionais têm reforçado as relações de semisservidão dos professores no contexto escolar, enfraquecido a gestão democrática e a construção de uma educação histórico-crítica e 76 Subprojeto da pesquisa Capitalismo Burocrático, políticas educacionais e relações de poder na educação escolar em Rondônia, coordenada pela Prof.ª Drª Marilsa Miranda de Souza. 77 Graduanda em Pedagogia, Universidade Federal de Rondônia, Campus de Rolim de Moura, bolsista PIBIC/UNIR. 78 Professora do Departamento de Educação, Universidade Federal de Rondônia, Campus de Rolim de Moura. 355 as lutas em defesa da gestão democrática da escola pública? O objetivo desse subprojeto é identificar os mecanismos de opressão a que são submetidos os profissionais da educação, as relações autoritárias e semiservís existentes entre professores e gestores nos ambientes escolares e suas consequências no processo de organização da produção na sociedade. Para analisar o processo de implantação e a efetivação das políticas educacionais aplicaremos o conceito de semifeudalidade. Uma das características da semifeudalidade é o gamonalismo, que no Brasil chamamos de coronelismo. Segundo Souza (2010) é nas relações coronelícias que se encontram as forças capazes de fazer uma determinação do Banco Mundial ser cumprida por milhares de secretarias de educação do País, obrigando os professores a aderirem aos programas e projetos formulados pelas agências multilaterais do imperialismo. Nosso trabalho está sendo realizado a partir de uma abordagem metodológica que possibilita integrar a parte ao todo: o método do materialismo histórico dialético. Essa metodologia possibilita encontrar as determinações fundamentais e secundárias do problema. O método do materialismo histórico-dialético possibilita ir do fato empírico (fenômeno) para o conceito e num movimento lógico o desvelamento das contradições essenciais do fenômeno, se fixa na essência, no mundo real, no conceito, na consciência real, na teoria e ciência (KOSIK, 1976, p.16). A totalidade desta investigação consiste em 05 escolas públicas da rede estadual dos municípios da Zona da Mata rondoniense supracitadas. Escolhemos 01 (uma) escola de cada um dos cinco municípios que compõe essa região do Estado de Rondônia: Rolim de Moura, Nova Brasilândia, Alta Floresta D’Oeste, Santa Luzia D’Oeste, Novo Horizonte D’Oeste. O critério para a escolha dessas escolas foi o número de alunos. Escolhemos a maior escola de cada um dos municípios em termos de número de alunos. O presente trabalho apresenta os resultados referentes a três dos instrumentos de coleta de dados que são: Análise documental, pesquisa bibliográfica e entrevistas individuais. A pesquisa bibliográfica e os estudos teóricos ocorreram no segundo semestre de 2011 e o início da pesquisa de campo, que prosseguiu no primeiro semestre de 2012, quando levantamos parte dos dados documentais e fizemos a maior parte das entrevistas com os sujeitos da pesquisa. 356 2 ASPECTOS TEÓRICOS QUE DEFINEM AS RELAÇÕES SEMIFEUDAIS E CORONELICIAS. O Estado originou-se da apropriação privada de riqueza e da luta de classes. É um produto da sociedade para legitimar e perpetuar a divisão de classes e a exploração de uma classe sobre outra (ENGELS, 1995), funcionando como um instrumento de dominação e de coação, formado especialmente para manter a opressão sobre as classes dominadas (MARX e ENGELS, 2008, p. 25), além de proteger a propriedade privada concentrada nas mãos da classe dominante (MARX e ENGELS, 1989, p. 70). O Estado capitalista ostenta várias contradições que se agudizam ainda mais em sua fase atual, o imperialismo. Os estudos de Lênin (1979), afirmam que o imperialismo é uma etapa superior do capitalismo, ou seja, a fase em que o desenvolvimento do capitalismo ocorre com o domínio dos monopólios e do capital financeiro, adquirindo grande importância a exportação de capital, a divisão internacional do trabalho e, sobretudo, a partilha dos territórios entre as grandes potências capitalistas, tornando-os dominados e dependentes. O imperialismo é o aprofundamento das relações de dominação do capital monopolista sobre a vida econômica e consiste, em sua essência, na divisão do mundo entre países opressores e oprimidos, sustentada no domínio do capital financeiro, na exportação de capitais e na política colonial (LÊNIN, 1979). Guzmán que define o capitalismo burocrático como “o capitalismo que o imperialismo impulsiona num país atrasado; o tipo de capitalismo, a forma especial de capitalismo, que impõe um país imperialista a um país atrasado, seja semifeudal, semicolonial” (GUZMÁN, 1974, p. 1). O conceito de capitalismo burocrático se aplica à análise de todos os países que não fizeram a revolução burguesa e mantêm o problema agrário, por isto se aplica ao Brasil (MARTÍN MARTÍN, 2007). O capitalismo burocrático tem duas colunas: semicolonialismo e semifeudalidade (grande propriedade, semisservidão, gamonalismo ou coronelismo), que são interligadas e indissolúveis. Compreende-se, assim, que a definição de capitalismo burocrático, de semifeudalidade, não significa falar de feudalismo, nem de modo de produção feudal, e sim de capitalismo burocrático, que é uma parte nova dentro do processo histórico (SOUZA, 2010, p. 367). Historicamente a educação tem servido aos interesses dos coronéis latifundiários e ao imperialismo. O financiamento da educação do campo pelos organismos do imperialismo norte-americano se iniciou com Vargas, intensificou-se no regime militar e chegou ao seu 357 auge na atualidade, com a mais completa hegemonia sobre as políticas educacionais do campo e da cidade. Conforme a análise de Souza (2010) nas ultimas décadas o imperialismo norteamericano por meio dessa nova ordem política chamada de neoliberalismo instituiu uma nova ordem cultural por meio de seus organismos multilaterais como o Fundo Monetário Internacional, a Organização Mundial do Comércio, o Banco Mundial, etc. Para Santomé (2003) esses organismos são “o cérebro das políticas neoliberais” e na atualidade a principal agência responsável pela difusão das ideologias imperialistas é sem dúvida, o Banco Mundial. O imperialismo norte-americano por meio do Banco Mundial controla a educação das semicolônias financiando as políticas educacionais que se materializam em projetos e programas. Souza (2010) explica que o real objetivo do banco é controlar a população carente através de suas politicas educacionais implantadas; onde a escola se torna uma empresa capaz de atender aos interesses do mercado, formando de mão de obra barata e seres conformados com a organização econômica imposta pelo mercado capitalista. O Banco Mundial intervém na educação brasileira por meio da imposição de políticas educacionais e de empréstimos a programas e projetos educativos que fazem parte da reforma estrutural do capitalismo. Quando a educação é imposta, configura-se o que se convencionou chamar, na América Latina, de gamonalismo ou caciquismo, e que no Brasil denominamos coronelismo. O termo gamonalismo não designa apenas uma categoria social e econômica: a dos latifundiários ou grandes proprietários agrícolas. Designa todo um fenômeno. O gamonalismo não está representado somente pelos gamoneles propriamente ditos. Compreende uma grande hierarquia de funcionários, intermediários, agentes, parasitas, etc. (MARIÁTEGUI, 2008, p. 54). Coronelismo é, portanto, a estrutura hierárquica que vai gerar a organização do Estado que sustenta as relações de semisservidão. E não pertence ao passado. Está vigorosamente presente nas relações que se estabelecem em nossas escolas sob novas formas. Para Mariátegui, “o fator central do fenômeno é a hegemonia da grande propriedade semifeudal na política e no mecanismo de Estado” (MARIÁTEGUI, 2008, p. 54 e 55). Para Souza (2010) “é nas relações coronelícias que se encontram as forças capazes de fazer uma determinação de o Banco Mundial ser cumprida por milhares de secretarias de educação do País, obrigando os professores a aderirem aos programas” (SOUZA, 2010, p. 378). 358 Especialmente nas pequenas cidades, os coronéis comandam a política e a economia pela submissão de agentes indiretos que atuam na administração pública. O predomínio do autoritarismo e o não cumprimento da lei escrita são as maiores evidências do coronelismo que vigora na educação (MARIÁTEGUI, 2008, p. 55). 3 GESTÃO DEMOCRÁTICA: DECRETO N. 16.202 Conforme o decreto n. 16.202, de 20 de setembro de 2011assinado pelo governador Confúcio Moura, sobre os critérios e condições para a realização das eleições para diretores e vice-diretores de escolas estaduais; as eleições foram realizadas, concomitantemente, em todas as escolas estaduais e assim será feito a cada três anos, sempre no último bimestre letivo. Os votantes são os servidores efetivos, alunos do 6º ano do ensino fundamental regular em diante, com idade de 16 anos ou acima; alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA) com 16 anos de idade ou mais; mãe, pai ou responsável por aluno menor de 16 anos (artigo 6º). De acordo com o referido decreto podem candidatar-se: professores com formação em pedagogia ou licenciaturas pertencentes ao quadro efetivo de pessoal civil do Estado de Rondônia ou ao quadro do Governo Federal à disposição do Estado, com vínculo de 40 horas semanais de trabalho. De acordo com o artigo 3º do referido Decreto só podem candidatar-se professores que já tenham cumprido o estágio probatório e estejam trabalhando na escola na qual pretenda concorrer há pelo menos dois anos consecutivos, se pedagogo ou licenciados não habilitado em Administração Escolar, 05 anos de exercício profissional no Estado de Rondônia. O artigo 5º dispõe que os profissionais que tiverem suas candidaturas homologadas ainda precisarão participar de curso de formação de gestores de educação pública, elaborar e apresentar um plano de gestão para a escola na qual se candidatou e assinar termo de compromisso de adesão e participação no curso de especialização para gestores de educação pública, caso venha a ser eleito. A SEDUC promoveu um curso de formação continuada para gestores, com duração de 20 horas, entre os dias 24 de outubro a 11 de novembro a todos os candidatos, a fim de habilitá-los ao bom exercício da gestão escolar. A formação dos gestores faz parte do processo de reprodução das formas da gestão empresarial impostas nos pacotes da Escola de Gestores. O Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica Pública, que faz parte das ações do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), reproduz os “processos de gestão escolar compatíveis com a proposta e a concepção da qualidade social 359 da educação, baseada nos princípios da moderna administração pública e de modelos avançados de gerenciamento de instituições públicas de ensino, buscando assim, qualificar os gestores das escolas da educação básica” conforme descrito no Portal do MEC (http://portal.mec.gov.br). Há profundas contradições nesse processo de gestão democrática. A gestão democrática almejada historicamente pelos trabalhadores em educação está anos luz desta imposta pelo governo do Estado de Rondônia. Na verdade, o que se pretende é manter o controle absoluto sobre a gestão escolar a partir dos princípios e ações formuladas pelas agências multilaterais do imperialismo. A gestão democrática obriga os novos diretores a seguir a linha de gestão já definida. Esses cursos têm por objetivo exercer o controle das escolas e enquadrar a gestão dos eleitos nos princípios e normas do PDE e outros programas orientados pelo Banco Mundial. Há normas estabelecidas no Decreto que são ilegais; como o fato de professores em período probatório não poderem candidatar-se. A Constituição Brasileira prevê isonomia para todos os servidores e os direitos devem ser exercidos por todos. Nas entrevistas foi unânime a informação de que não houve nenhuma discussão com a comunidade escolar sobre essa “gestão democrática de Confúcio”. Cerca de 42% dos entrevistados não concordam com o referido decreto e a forma como foi instituído, 51,8% concordam, 6,2% concordam em parte, e alegam que nem ao menos o conhecem, pois nem mesmo o Sindicato dos Trabalhadores em Educação- SINTERO discutiu ou contestou o Decreto n. 16.202/11 com a categoria. Segundo professor da escola D: “Em nossa escola não houve discussão antecipada, foi passada apenas a documentação de como seria a procedência para esta escolha [...] colegas foram barrados em participar devido algumas clausulas... a gente não concorda com a maneira como o decreto foi imposto, pois já veio lá de cima! Pronto!” Mostrando-se desta forma um documento antidemocrático, capaz de limitar a participação dos próprios “interessados”, os profissionais de educação; e mesmo sendo imposto e sem qualquer tipo discussão prévia às suas clausulas, não foi questionado pelos professores, que em grande número revelaram não saber que a regulamentação das eleições deveria ser feita por lei e não por um decreto, que pode ser revogado a qualquer instante, inclusive pelo próprio governador. Diversos mecanismos de opressão são utilizados pelo Estado e seus governantes, como nos anos anteriores, com a determinação e nomeação de diretores para as escolas, chamadas pelo governante de escolha democrática. Já houve outros processos de escolha de diretores impostos pelo governo do Estado, mas que não fora normatizado. Nas entrevistas os 360 professores explicaram como funcionava; Professor da escola A: “Ele (o governador) chamou de eleição democrática porque podia indicar três nomes para a direção da escola, então ele escolhia um dos três. Lembro-me de uma escola que indicou esses três nomes e nenhum deles foram aceitos.” Determinação que acabou por excluir a prática de eleição dos profissionais de educação da escola A que mesmo não respaldados legalmente, há muitos anos já realizavam uma eleição democrática. A gestão democrática da educação foi negada na lei maior da educação brasileira, quando permitiu que os sistemas de ensino a regulamentassem, o que não correu na maior parte do país. Não há norma geral que regulamente o processo de escolha de gestores, o que resulta em imposições de normas via decreto, como foi o caso de Rondônia. Isto é socialmente pernicioso, sobretudo se reconhecermos que, na área educacional, tem vigorado a tradição de um suposto “consenso” de que a gestão dos sistemas de ensino e das escolas é prerrogativa, direta ou indireta, daqueles que detêm a hegemonia do Estado. Tem prevalecido a definição de critérios de escolha de pressupostos para as funções de gestão que, em geral, privilegiam o saber que advém apenas da competência técnica, com doses variadas de burocracia. Esta LDB não faz mais do que retroceder no que tange à gestão democrática dos sistemas de educação e das instituições escolares, oficializando e ratificando prerrogativas centralizadoras e impositivas das chamadas “autoridades educacionais” (MINTO e MURANAKA, 1997, p. 5). No contexto do capitalismo burocrático as relações são extremamente autoritárias, pois não há consideração sequer com as instâncias deliberativas. A totalidade dos professores entrevistados até o momento não conhecem o regulamento e o papel dos Conselhos Escolares instituídos na escola no ano de 2011, no mesmo pacote da gestão democrática. 4. PDE E PROGRAMAS DE FORMAÇÃO: DE ONDE VEM? As escolas pesquisadas participam de vários programas do FUNDESCOLA e orientados pelo Banco Mundial: PDE, Gestar, Pró-Letramento, PROINFO, PROFIPES e Mais Educação. Os estudos Haddad (1998), Tommasi (1996), Rosar (1999), sobre o Banco Mundial afirmam que quase todas as políticas públicas de educação no Brasil são formuladas, dirigidas e financiadas pelo Banco mundial. E as escolas se encontram sem autonomia sequer para recusar esses programas; são formulados e implantados dentro dos ambientes educacionais mesmo que estes não tenham uma estruturação, espaço físico, ou profissionais 361 adequados para recebê-los. Sofrem com o autoritarismo por não poderem ao menos “decidir” ou “escolher”. Em relação ao PDE unanimemente os entrevistados de todas as escolas pesquisadas disseram ser existente em suas respectivas escolas; quanto a participação apenas 35,24% são ativos e 64,76% não participam do programa, de acordo com o professor da escola A: “[...] a escola tem PDE sim, e de vez enquanto a direção passa para nós alguma coisa sobre o que está acontecendo, mas normalmente quem cuida disso é a direção e a supervisão, os professores participam às vezes, quando são convidados ou obrigados [...]” . E segundo professor da escola E: “Os professores são chamados para discutir alguns pontos do PDE, entre uma aula e outra, é um tempo mínimo de forma acelerada, de forma clínica. O professor não vai estar totalmente inteirado para o que acontece, ou quais os resultados”. Em algumas escolas são realizadas reuniões a respeito do PDE, onde professores são informados sobre a verba destinada à escola, em outras os professores alegam que não participam do programa devido ser uma função da direção e dos conselhos escolares eleitos recentemente, tendo uma participação figurativa no processo, uma vez que não contribuem nas decisões tomadas, não havendo discussões são apenas comunicados sobre estas e seus fins; sendo que seu destino se encontra distante das reais necessidades da instituição de ensino. Quanto a opinião sobre PDE 63,80% disseram ser bom, 16,20% ruim e 10% não opinaram. Revelaram em suas respostas não conhecer quem realmente o financia ou como se aplica de fato, alguns chegaram a mencionar que o programa é financiado pela União, a SEDUC. De acordo com Neto (2009, p. 44): “O PDE é um instrumento, um fio condutor dessa política educacional, responsável pela agudização da crise estrutural da Educação Nacional educacional. Está baseado em uma pedagogia subjacente a uma lógica do mercado capitalista, tendo como objetivo a “qualidade total” na educação”. Desconhecem que o PDE é um plano organizado em parceria com empresários, instituições privadas, ONGS e demais órgãos, e que está distante de resolver a crise educacional como define. A respeito dos programas de formação 67,6% dizem considera-los bons, 15,74% ruins, 10% se mostraram indiferentes e 6,66% não participam dos mesmos. Já a direção e a supervisão, 80% afirmaram ser bons, 10% ruins e 10% não souberam como opinar. Os professores assim como diretores e coordenadores pedagógicos/supervisão que até mesmo participam dos programas, revelam que os mesmos são repetitivos em relação aos conteúdos. Segundo professor da escola C; “É inaplicável o que se aprende nesses cursos”. Pois não contribuem com sua formação profissional, ou com a elevação do nível de ensino de suas 362 escolas. Os professores e demais profissionais da educação são vítimas do plano neoliberal, que em seus ajustes tem uma politica de formação continuada, que se retrata em um treinamento, com o objetivo de reduzir gastos, fazem com que esses cursos sejam totalmente contrários a realidade (NETO, 2009). Sobre a origem e formulação desses programas de formação desenvolvidos foi unânime tanto entre professores quanto diretores e supervisores/coordenação pedagógicos afirmar que desconhecem a real origem desses programas, em suas respostas declararam que pensam ser elaborados e financiados pelo MEC, Estado, FNDE e até mesmo os que concordam e participam dos programas desconhecem quem os formula. Professor da escola A: “Vem do MEC, vem o “pacotão” a gente não escolhe”. Os entrevistados revelam que nem ao menos tem o direito de decidirem se querem ou não participar dos cursos que já chegam prontos e destinados a todos os profissionais da educação; é perceptível que há uma profunda alienação dos entrevistados. Nenhum deles conhecia as origens das políticas educacionais implantadas na escola e não percebem as formas de dominação e controle delas decorrentes. 5 A AÇÃO DO CORONELISMO E AS RELAÇÕES AUTORITÁRIAS E SEMISERVÍS. As relações coronelícias se fazem presentes de várias formas no meio educacional, fazendo com que sejam cumpridas as determinações autoritárias do Banco Mundial e suas politicas públicas educacionais sem qualquer questionamento por parte dos profissionais de educação (SOUZA, 2010). Quando perguntamos aos professores sobre o que acontece se eles não decidirem participar dos programas de formação, ou não seguirem as normas instituídas e as relações autoritárias estabelecidas dentro das escolas 41,9% alegam que há algum tipo de pressão, ameaças de punições e de envio de relatórios sobre o procedimento dos mesmos para o MEC; os professores são coagidos, não abertamente, a participarem dos programas de formação. Não descumprem as normas e aceitam participar dos programas, pois tem receio de que as punições sejam aplicadas, como por meio de isolamento. O professor que não participa é acusado de ser preguiçoso, de não querer “buscar novos conhecimentos” e passa ser mal visto pelos colegas. Assim, por uma ou mais dessas formas de coação, os professores se sujeitam. De acordo com o professor da escola E: “A REN cobra dos diretores que negociam com os professores para fazer os cursos”. A cerca disso, a direção e supervisão/coordenação pedagógica 36,36% relataram que há conversas de forma amigável e sem punições; 9,9% 363 disseram acreditar que deve realmente ser feito pressão sobre os professores pra que as coisas não fiquem muito “à vontade” e 45,45% admitiram ser estabelecida alguma forma de persuasão para a participação nos cursos aconteçam. Nas entrevistas foram relatadas algumas formas pelas quais os professores e gestores são incluídos nos programas de formação do Banco Mundial/MEC. Primeiro há o processo de persuasão, de convencimento. Quando esse método não funciona parte-se pelo oferecimento de vantagens pessoais, como redução da Carga Horária. Na Escola B os professores relataram que foi lhes subtraídos 06 horas aulas de trabalho para que se matriculassem no GESTAR. É notável que o Estado convoca a todo o momento os profissionais da educação a atuar de acordo com suas ideologias, o representando e ainda o obrigando a desenvolver seu trabalho em condições mínimas, seja através de normas diretas, como por decreto, ou por meio de seus próprios colegas de trabalho, e ambos perdem o direito a voz, a decisão. A existência de hierarquia entre professores e direção também foi apontada por 55,6% entrevistados, 41% disseram não existir e 3,4% decidiram não responder a questão. Os entrevistados apontaram que nos anos anteriores, no antigo governo quando a direção era por indicação havia muitos problemas ao se relacionar, pois as ordens eram passadas e deveriam ser cumpridas sem qualquer tipo de questionamento. Porém revelam que atualmente ainda existem impasses na relação. “A relação é bastante complicada, por ser uma “gestão democrática, eleita pela comunidade escolar”, pois há pressão e reprodução das ordens do Governo para a REN, da REN para a direção, e diretores para professores; que vem de cima para baixo e comprime!” (Professor da escola D). As ordens continuam sendo impostas e cumpridas, oprimindo professores e diretores que não são ouvidos, e fazendo com que a gestão atual torne-se cada vez mais distante da tão aclamada gestão democrática. Além disso, 39,52% dos professores alegaram que não participam das decisões pedagógicas em ambiente escolar, 50,94% responderam que participam, porém possuem uma participação apenas formal, sendo comunicados das decisões já tomadas; que são impostas pela SEDUC e apenas reproduzidas pela direção e supervisão; as reuniões possuem um caráter informativo sem uma real discussão pedagógica, passando a ter um caráter opressor, capaz de fazer cumprir a risca as determinações que vem de cima. Os outros 9,54% decidiram por não responder a questão para evitar qualquer situação conflituosa ou constrangedora. Diversas formas de opressão foram identificadas através das entrevistas, entre os docentes 64,5% apontam o baixo salário, o não reconhecimento pela sociedade como profissional da educação, a falta de infraestrutura, falta de autonomia, como forma de desvalorização profissional; além da pressão e burocracia impostas pelo governo e até pelos 364 próprios colegas de trabalho. De forma que 81,82% dos diretores e supervisores/coordenação pedagógica expressam a mesma opinião que os professores, além da carga horária excessiva e do fracasso escolar que recai sobre estes. Porém 3,2% confessam não sentir nenhum tipo de opressão ou desvalorização profissional; mostrando mais uma vez o estágio de alienação em que se encontram os docentes. Para Costa (2009, p. 74): A forma privilegiada de se efetivar a alienação de um professor é oferecer uma formação esvaziada do conteúdo de seu trabalho - o saber - desde a sua formação inicial pois, dessa maneira, se interdita o desenvolvimento de um processo de objetivação e apropriação não alienada. A alienação no processo de formação do professor se destaca pelo esvaziamento dos conteúdos em sala de aula, reduzindo o conhecimento sobre o seu processo de trabalho, e os conhecimentos pedagógicos, que permanecerá durante toda a sua vida. Portanto, às políticas públicas voltadas para formação do professor, se subordinam às agencias internacionais que priorizam a redução de custos e um treinamento disfarçado de formação que atenda a demanda do mercado, com profissionais que memorize informações, mas que não as relacione. CONSIDERAÇÕES FINAIS As políticas educacionais de formação de professores e gestores das escolas estaduais da Zona da Mata são hegemonicamente formuladas, dirigidas e financiadas pelo imperialismo, por meio de uma de suas principais agências, o Banco Mundial, e se efetivam nos programas implantados na educação por meio do coronelismo existente no âmbito do poder local; se fundamentam nas teorias do capital humano e nas concepções da educação neoprodutivista pautada no neoescolanovismo, no neoconstrutivismo e no neotecnicismo que caracterizam a educação imperialista pós-moderna (FRIGOTTO, 2005 e 2000; DUARTE, 2001 e SAVIANI, 2007b). A análise dos dados coletados apresentaram resultados apontando que as relações são determinadas pelo coronelismo que age indiretamente por meio de coação ou da persuasão dos professores para se submeterem às políticas educacionais ditadas pelo Banco Mundial/MEC, sob pena de perseguições por parte do poder local. As ordens de implantação 365 e todos os processos organizativos das políticas são definidos hierarquicamente, do escritório do Banco Mundial até as secretarias municipais de educação, onde elas se efetivam de fato. O trabalho dos professores é compreendido como semifeudal, uma vez que se submetem às mais precárias condições de trabalho e emprego, não possuem autonomia didático-científica, não possuem autonomia de gestão e se sujeitam aos processos mais rudes de obrigação e servidão às políticas implantadas nas escolas e aos processos falseadores de gestão democrática. REFERÊNCIAS COSTA, A. Entre a dilapidação moral e a missão redentorista: o processo de alienação no trabalho dos professores do ensino básico brasileiro. In: COSTA, A. et al. A proletarização do professor. Neoliberalismo na educação. São Paulo, Editora Instituto José Luiz e Rosa Sundermann, 2009. DUARTE, N. Conhecimento tácito e conhecimento escolar na formação do professor (por que Donald Schön não entendeu Luria). Educação e sociedade, Campinas, v. 24, n. 83, p. 601625, ago. 2003. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/%0D/es/v24n83/a15v2483.pdf.>. Acesso em: 3 dez. 2009. ENGELS, F. A origem da família, da propriedade privada e do Estado. 13. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1995. FRIGOTTO, G. Delírios da razão: crise do capital e metamorfose conceitual no campo educacional. In: GENTILI, P. (Org.). Pedagogia da exclusão: crítica ao neoliberalismo em educação. 12. ed. Petrópolis: Vozes, 2005. _____. As três frentes de luta de classes no campo brasileiro. In: Raimundo Santos (Org.). 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CAMPUS UNIVERSITÁRIO JOSÉ RIBEIRO FILHO EM PORTO VELHO A relação entre os principais modelos nacionais e internacionais de educação a distância e a pertinência e aderência desses modelos com o contexto amazônico de Rondônia Tuane Carolinda Miranda da Silva79 José Lucas Pedreira Bueno80 Silva, Tuane Carolinda Miranda da. Relatório de Pesquisa (Relatório Final, referente ao período de Agosto/2011 e Julho/2012). Fundação Universidade Federal de Rondônia (UNIR), PIBIC/CNPq, 2011/2012. RESUMO Este trabalho tem como objetivo confrontar a teoria adotada pelo Programa de Educação a Distância na Universidade Federal de Rondônia, Campus José Ribeiro Filho, EAD/PVH/RO com a prática por ele implementada, por meio de um levantamento descritivo sobre a atual situação da mesma em relação à EAD. A UNIR, como outras instituições públicas, iniciou sua experiência de implantação de cursos de graduação à distância a partir de 2006, com a adesão a programas governamentais para essa modalidade. Desta formas, o presente estudo pretende contribuir com um dos desafios considerados cruciais quando se trata de implementação e consolidação de programas de EAD: a questão metodológica. Sendo assim, será utilizado como procedimento à pesquisa bibliográfica e documental com uma abordagem qualitativa descritiva, com a realização de entrevistas semiestruturadas aplicadas à coordenação dos cursos estudados, com o objetivo de obter informações sobre como funciona a teoria adotada na prática. Analisamos os dados coletados e verificarmos quais as características e formas de mediação e tecnologias utilizadas, bem como as características desta metodologia na EAD da Universidade Federal de Rondônia. Palavras-chave: Educação a Distância. Teoria e Prática de EAD. Universidade Federal de Rondônia. 1 INTRODUÇÃO O ensino à distância é uma modalidade que oportuniza o acesso ao ensino superior a estudantes que não têm condições de frequentar as salas de aula por diversos motivos, tais como necessidade de trabalhar e não conseguir destinar horários fixos para frequentar às aulas. O processo educacional a distancia é mediado, principalmente, por plataformas de 79 Acadêmica do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Rondônia e bolsista PIBIC/UNIR/CNPQ vinculada ao grupo de pesquisa PRAXIS. (e-mail: [email protected]). 80 Professor do Departamento de Ciências da Educação e do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação da UNIR. (e-mail: [email protected]). 368 ambientes virtuais de aprendizagem com base na internet, devido à agilidade proporcionada às interações, comunicações e informações combinadas e organizadas por essas tecnologias. Segundo Valente e Mattar (2007, p.19), o distanciamento físico entre os participantes de um curso “não implica em distanciamento humano”. Assim, alunos e professores podem estar em locais diferentes, participando sincronicamente de uma mesma atividade com fim pedagógico, como, por exemplo, um chat. O grande impulso para o crescimento do modelo EAD e semipresencial foi dado pelo próprio governo, com a criação da Universidade Aberta do Brasil, em 2005. O sistema oferece 180 mil vagas em cursos superiores oferecidos em parceria com universidades públicas. O presente estudo pretende contribuir com um dos desafios considerados cruciais quando se trata de implementação e consolidação de programas de EAD: a questão metodológica. Ao contribuir com este importante elemento de análise para o diagnóstico dos desafios que a EAD enfrenta e, tomando a experiência de Porto Velho como elemento de análise, pretende-se responder as seguintes questões: tendo em consideração a teoria adotada para nortear a prática de EAD na Universidade Federal de Rondônia (UNIR), como tem sido implementada na prática tal teoria? Isto tem redundado em prejuízo ou benefício para a sobrevivência e/ou mesmo ampliação da EAD na UNIR? 2 METODOLOGIA A metodologia adotada para a pesquisa é de abordagem qualitativa e caracteriza-se, com relação ao seu objetivo, como descritiva. Segundo Gil (2010), “As pesquisas descritivas têm como objetivo a descrição das características de determinada população. Podem ser elaboradas também com a finalidade de identificar possíveis relações entre variáveis. Entre as pesquisas descritivas, salientam-se aquelas que têm por objetivo estudar as características de um grupo: sua distribuição por idade, sexo, procedência, nível de escolaridade, estado de saúde física e mental, etc. Também são pesquisas descritivas aquelas que visam descobrir a existência de associações entre variáveis, como, por exemplo, as pesquisas eleitorais que indicam a relação entre a preferência político-partidária e nível de rendimentos ou de escolaridade”. Neste caso, buscamos confrontar a teoria adotada pelo Programa de Educação a Distância da Universidade Federal de Rondônia, Campus José Ribeiro Filho, com a prática por ele implementada. 369 Quanto ao método utilizado, a pesquisa se classifica como estudo de caso, com coleta de dados secundários e primários, realizados a partir das análises de documentos oficiais (MEC, Governo Federal e UNIR referentes à implantação da EAD nas Universidades Federais) e entrevistas em profundidade (com coordenadores e professores dos cursos de graduação EAD da UNIR). Segundo Ludke; André (1986, p. 18-20), o estudo de caso apresenta as seguintes características: visa à descoberta; enfatiza a interpretação no seu contexto; busca revelar a multiplicidade de dimensões presentes numa determinada situação ou problema; recorre a variados dados coletados em diferentes momentos; permite generalizações naturalísticas; procura representar os diferentes pontos de vista presentes numa situação social. Escolhemos como unidade de análise o Projeto de Educação a Distância da Universidade Federal de Rondônia, mais especificamente os cursos de Letras e Pedagogia ofertados pela IFES na modalidade a distancia, no sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB). A coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas com as ex-coordenadoras e exprofessora dos cursos de Letras e Pedagogia ofertados na modalidade a distância, que estiveram presentes no momento da implantação deste modelo de ensino na IFES. Para tanto, elaboramos um roteiro de entrevista semiestruturada que procurou investigar como as metodologias de ensino-aprendizagem propostas pelo Projeto Político Pedagógico destes cursos se efetivavaram na prática, e os desafios inerentes à implantação de cursos na modalidade a distância. As questões foram analisadas quanto aos seguintes aspectos: polos, aulas presenciais, aulas virtuais e Ambientes Virtuais de Aprendizagem (A.V.A), recursos humanos, capacitação, infraestrutura, currículo e material didático, alunos e gestão. Foram realizadas 03 entrevistas, sendo uma entrevista com a atual coordenadora do curso de pedagogia UAB/UNIR, uma entrevista semiestrututrada com a ex-coordenadora do curso de Letras UAB/UNIR, outra com a ex-professora do curso de Letras UAB/UNIR, que participou na implantação do projeto de reconfiguração da Educação a Distância na Universidade Federal de Rondônia e com o atual diretor da Diretoria de Educação a Distância da UNIR, às quais foram submetidas à análise de conteúdo. Segundo Bardin (1977, p.9), a análise do conteúdo compreende “um conjunto de instrumentos metodológicos [...] que se aplicam a discursos (conteúdos e continentes) extremamente diversificados”. De acordo com a autora, os métodos de análise de conteúdo proporcionam a ultrapassagem da incerteza e o enriquecimento da leitura. 370 Para Gil (2010. p.122) a análise e interpretação dos dados pode seguir as seguintes etapas: codificação dos dados, estabelecimento de categorias analíticas, exibição dos dados e busca de significados. Na primeira etapa, busca-se atribuir uma designação aos conceitos relevantes encontrados na transcrição da entrevista, a partir desta codificação são criadas as categorias analíticas que, de acordo com Bardin (1977, p. 37) “pretende tomar em consideração a totalidade de um texto passando pelo crivo da classificação e recenseamento, segundo a frequência de presença ou de ausência de itens de sentidos”. Após a categorização, realizam-se a análise de dados por meio de tópicos-chave e consequente elaboração de um texto discursivo, que podem ser exibidos por meios de matrizes e/ou diagramas. E, por fim, a busca de significados que pode ser realizada por meio da verificação dos temas que se repetem com vistas ao estabelecimento de relações entre os fatos e as possíveis explicações. 3 A EAD NA UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDONIA Entre os cursos oferecidos pela UNIR/UAB esta Licenciatura em Pedagogia para as Séries Iniciais do Ensino Fundamental; Licenciatura em Letras com Habilitação em Língua Portuguesa e suas Literaturas, com polos de apoio presencial no Campus de Ariquemes, JiParaná, Porto Velho, Rolim de Moura, Chupinguaia e os novos polos que são Porto Velho, Nova Mamoré e Buritis. O Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB) tem como principal objetivo a formação de professores para a Educação Básica. A implantação do desenvolvimento dos cursos está sendo feita por meio da política pública educacional, do incentivo ao desenvolvimento ensino superior pelo Sistema Universidade Aberta do Brasil. Tais iniciativas aproveitam a competência do ensino superior presencial para institucionalizar a oferta de cursos de licenciatura e iniciar um projeto de ensino a distância, que dinamize o processo de formação de profissionais qualificados, de modo ainda a atender às questões que afligem a educação básica. Em seu início a estrutura de gestão da EAD na UNIR era centralizada em um único coordenador, responsável pela realização de todas as tarefas como planejamento, controle financeiro, supervisão, entre outras atividades, enquanto os departamentos se preocupavam com o conteúdo dos cursos. A coordenadora trabalhava diretamente com os departamentos que se interessavam em oferecer seus cursos na modalidade a distância, formando as parcerias necessárias. A estrutura atual de gestão possui característica descentralizadora, a coordenação do programa está dividida em quatro categorias: Diretoria de Educação a Distância, Coordenação 371 da UAB, Coordenação de curso (Pedagogia, Ciências Naturais e Biologia, Letras Português, Administração Pública). 3.1 CATEGORIAS DE ANALISE DA PESQUISA De acordo com as categorias resultantes da análise de conteúdo podemos inferir as seguintes conclusões acerca do funcionamento da EAD na Universidade Federal de Rondônia: • Que a infraestrutura dos polos, mesmo cumprindo as exigências do MEC, ainda falta incorporar novos ambientes de aprendizagem. • Quanto ao AVA, se tem uma grande dificuldade, pois a internet é ruim e às vezes não se consegue ter acesso, isso tem redundado em problemas. • Quanto à tutoria afirmaram que o tutor é responsável por fazer um acompanhamento com os alunos, o qual é realizado constantemente da forma presencial e a distância. • Que as aulas presenciais acontecem no início de cada disciplina e é, muitas vezes, a única ou principal forma de interação entre aluno-professor. • Os materiais didáticos são todos produzidos pelos professores da UNIR. Onde afirmaram que tais professores fazem curso para fazer um material a distancia, que precisa ser claro, planejado e organizado. • A capacitação dos professores e tutores da unir é feita pelo pessoal da DTI, os tutores a distância são responsáveis por fazer tanto a capacitação dos professores, quanto do corpo de tutores. • As aulas virtuais acontecem na plataforma Moodle, onde os professores utilizam texto, apostilas e filmes. Tendo um problema, pois a internet, muitas vezes, não dispõe capacidade de banda para transferência desses materiais. • Os estágios têm a presença de um professor/tutor de estágio, tudo presencialmente. São realizados em quatro módulos. Na UNIR há um grande desafio, pois os estágios começaram logo no período das greves de acordo com a fala das professoras. • As defesas de TCC ocorrerão da mesma forma do presencial por força de legislação. As defesas de TCC ainda não ocorreram para os cursos analisados. • A matriz curricular dos cursos é dividida em núcleos, seguindo orientações do MEC, estão sendo reformulado de acordo com a legislação. 372 • As idas dos professores aos polos ocorrem como previsto no Projeto, recebendo diárias, alimentação, hospedagem e transporte. O professor vai para iniciar cada disciplina e, se tiver necessidade e recurso disponível, vai outra vez para tirar dúvidas. • O modelo pedagógico utilizado é o interacionista, que dá as condições necessárias para utilizá-lo na sua prática docente e, de acordo com as falas das professoras, pode se perceber que elas desconheciam o modelo utilizado, mas depois de refletir sobre a questão, destacam tal modelo. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Esta pesquisa foi iniciada, a partir das nossas inquietações e dúvidas em relação à teoria adotada pelo Programa de Educação a Distância na Universidade Federal de Rondônia e os caminhos que estavam sendo construídos para a EAD, em diferentes contextos. Chegamos ao fim do percurso com muitas questões esclarecidas. Para compreender o caminho mais fácil para responder a nossa questão inicial sobre as circunstâncias que levaram a instituição a adotar a EAD e verificar as razões que a levaram a adotar a metodologia existente no todo ou em parte para nortear a prática de seu programa, foi preciso compreender as relações da EAD da UNIR com o seu entorno institucional, tanto na sua concepção, geração, quanto na sua manutenção, considerando que muito teve que resistir em termos de dificuldades internas para se manter como tal. A partir disso, foi realizada uma comparação entre a teoria e a pratica implementada dentro da universidade. E a partir das dificuldades enfrentas pela EAD na UNIR, é possível infeir que a instituição ainda mantém um processo em fase de implementação, sem consolidação, com falta de estrutura, de experiência na modalidade de ensino e de profissionais capacitados como principais dificuldades enfrentadas pela gestão. Considerando que a implantação desse tipo de processo em uma IES de ensino presencial requer um tipo de gestão inovadora capaz de lidar com várias barreiras, como: falta de estrutura de recursos humanos, falta de infraestrutura física, falta de capacitação dos recursos humanos, falta de compreensão da modalidade, resultando em desconhecimento e preconceito com a EAD e até mesmo discriminação. Percebemos que se faz mister desenvolver um modelo que seja adequado à clientela de sujeitos (professores, tutores e alunos) envolvidos no processo de ensino aprendizagem à distância, capacitando-os para ensinar e aprender a distância e para utilizar os recursos de interação, comunicação e 373 compartilhamento de conteúdos, bem como, desenvolver uma metodologia de ensinar e aprender a distância e formar esses sujeitos para praticá-las. Acreditamos que esta pesquisa venha contribuir para a reflexão acerca da educação a distancia em Rondônia e na atuação dos docentes acerca da dimensão educativa, à medida que expõe os desafios na sua formação e apontam caminhos a serem percorridos. Vimos que o modelo atual sobre várias barreiras para desenvolver o processo de ensino-aprendizagem a distância para formar cidadãos críticos e capazes de desenvolver profissionalmente o conhecimento formado com os cursos, porque mesmo com o objetivo de formar pessoas críticas e conscientes, o modelo atual é limitado e fica reduzido a leituras com poucas interações profeessor-aluno, devido a falta de vários recursos para guarnecer a execução dos cursos. Dessa forma, reencontramos com nossas pretensões iniciais de investigar a importância da formação em EAD de Rondônia, uma vez que essa se desenvolve e precisa ser planejada e executada com as condições necessárias para alcançar os resultados esperados para o ensino superior. REFERÊNCIAS COSTA, I. E. T., FAGUNDES, L. C., NEVADA, R. A . "Projeto TEC-LEC": modelo de nova metodologia em EAD incorporando os recursos da telemática. Informática na educação: teoria & prática, Porto Alegre, v. 1, n. 1, p. 83-100, out. 1998. FAZENDA, I. Didática e interdisciplinaridade. São Paulo: Papirus, 1993. FREIRE, P. Política e Educação: ensaios. São Paulo: Cortez, 1993. GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 5. Ed. - São Paulo: Atlas, 2010. LEMOS P. Ambientes Virtuais de Aprendizagem: combinando iniciativas presenciais e a distância. Disponivel em: <http://www.rc.unesp.br/pef/hemeroteca/ead/moran.pdf>. Acessado em 19 de jul. 2012 LUDKE, M e ANDRÉ, M. E. D. A. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986. MEC/SEED. Referenciais de qualidade para educação superior à distância. Brasília: MEC/SEED, 2003. Disponível em < http://portal.mec.gov.br/seed> Acesso em: 17 de Janeiro de 2011. 374 MEC. PROGRAMA UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL (UAB). Disponível em: http://uab.capes.gov.br/. Acesso em: Setembro de 2011 MORAM, J. M. Desafios da internet para o professor. Disponível <http://www.eca.usp.br/prof/moran/desafio.htm>. Acesso em: 20 dezembro. 2011. em: MORAN, J. M. Ensino e Aprendizagem Inovadores com Tecnologia. Informática na Educação: Teoria & Prática / Programa de Pós-Graduação em Informática na Educação. vol 3, (set 2000) -.- Porto Alegre : UFRGS. Programa de Pós-Graduação em Informática na Educação, 2000-v. pg 137/144. UNIR. PROJETO DO CURSO DE LETRAS E SUAS LITERATURAS - 2007 / UAB/UNIR. Acesso em: Dezembro de 2011. 375 RESUMOS EXPANDIDOS CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS II 376 RELACIONAMENTOS INTERORGANIZACIONAIS NO AGRONEGÓCIO LEITE NO MUNICÍPIO DE ARIQUEMES EM RONDÔNIA - CONSTRUÇÃO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: IMPORTÂNCIA DO RELACIONAMENTO INTERORGANIZACIONAL ENTRE OS AGENTES DO AGRONEGÓCIO LEITE NO MUNICÍPIO DE JI-PARANÁ E AS ORGANIZAÇÕES PÚBLICAS E PRIVADAS Alexandre Cruz de Mello Franco81 Mariluce Paes de Souza82 RESUMO Esta pesquisa tem como objetivo identificar como ocorre os relacionamentos interoganizacionais no Agronegócio do leite em entre os agentes do setor agropecuário e as organizações públicas em Ji-Paraná no estado de Rondônia e, a partir disso, relacionar de que modo esses relacionamentos contribuem ou podem contribuir para o desenvolvimento da região. Desenvolveu-se a pesquisa procedendo-se a revisão teórica e análise de formulários da base de dados do CEDSA nos quais procurou-se entender melhor a relação existente entre a prefeitura de Ji-Paraná com as associações e as organizações, bem como da prefeitura e das associações com os produtores de leite. Em vista disso, fez-se um levantamento de dados e verificou-se que as associações poderiam estar contribuindo com a criação de eventos e a capacitação de seus produtores e ainda que a prefeitura poderia passar a desempenhar o papel de agente que lidera externamente como fonte de inovação tecnológica influenciando diretamente nas estratégias dos agentes e as organizações privadas. Palavras-chave: Relacionamento Interorganizacional. Agronegócio do Leite. Organizações Públicas e Privadas ABSTRACT This research aimed to identify how general labor occurs in inter-organizational relationships on the agribusiness of the milk on the city Ji-Paraná in Rondonia state, and from this, to relate how these relationships contribute or can contribute to the development of the region. Developed through the research and theoretical forms in which it sought to better understand the relationship between the City of Ji-Parana associations and organizations, and municipal and associations with milk farmers. As a result, surveyed the data and found that associations could be contributing to the creation of events and training for their producers and the city hall could move into the role of agent that leads externally as a source of technological innovation directly influencing strategies of the agents and private organizations. Keywords: Sustainable Development. Interorganizational Relationships. Agribusiness of Milk. Public and Private Organizations 81 82 Acadêmico do curso de Administração da universidade Federal de Rondônia (UNIR) Orientadora. 377 INTRODUÇÃO Após a Segunda Guerra Mundial, com a intensificação da globalização e a facilitação da disseminação das informações aumentaram a concorrência a um nível global, afetando empresas de grande, médio e pequeno porte como um todo. Em meio a um mundo cada vez mais competitivo e exigente, vários empresas se viram obrigadas a procurar novas estratégias e oportunidades. Segundo Powell; Koput; Smith-Doerr (1996), as organizações precisam colaborar para adquirir recursos e competências que elas não possuem internamente. Com base nisso, muitas empresas investiram na idéia de unir esforços e recursos com outras organizações e órgãos como estratégia competitiva. Portanto, o relacionamento interorganizacional contribui para que as organizações, que dificilmente conseguiriam competir sozinhas, possam conquistar mercado e adquirir vantagens em prol de um objetivo em comum. Assim como explica Das; Teng, 2002; Dyer; Sing,1998 P 142: “Nos últimos anos, diversas correntes científicas como a economia industrial, marketing, [...] vêm empregando seus esforços para o entendimento das complexas relações entre as organizações. O preceito básico dessas correntes científicas indica que as organizações que combinam seus recursos podem realizar uma superior vantagem sobre os seus competidores”. Mediante isto, o cenário agropecuário rondoniense gira entorno da produção de 746.873 milhares de litros de leite e que Ji-paraná, por sua vez, contribuem com 35.182 milhares litros de leite(Dados do IBGE, 2009). Tendo esses dados como base, pode se perceber a importância do município de Ji-Paraná e, ainda, o potencial agropecuário dado pelo clima e pela disponibilidade das terras. A partir disto, têm o relacionamento organizacional como forma de não somente beneficiar as organizações, mas também, melhorar as condições e a qualidade do leite de seus produtores, assim como também, pode melhorar a competitividade do estado de Rondônia. Diante do exposto, pretende-se avaliar como o agronegócio do leite em Ji-Paraná pode explorar os relacionamentos interoganizacionais como forma desenvolvimento aliado ao seu enorme potencial, cabendo a presente pesquisa identificar e descrever a importância desses relacionamentos interorganizacionais entre agentes e organizações do Agronegócio Leite no município de Ji-Paraná e as organizações públicas e privadas, respondendo a seguinte pergunta: 378 Qual é a importância dos relacionamentos interorganizacionais entre os diversos agentes do agronegócio do leite no município de Ji-Paraná em Rondônia e organizações públicas e privadas e qual sua contribuição para o desenvolvimento do Estado? METODOLOGIA Esta pesquisa é de abordagem qualitativa, pois permite a flexibilidade na interpretação do problema de pesquisa que consiste em compreender de que forma os relacionamentos interorganizacionais podem contribuir para o desenvolvimento sustentável no agronegócio do leite. Trata-se de uma pesquisa de cunho exploratório-descritivo em que foi feito, inicialmente, coleta de dados secundários para melhor compreensão do problema de pesquisa. Foi feito o levantamento de dados em periódicos especializados, livros, sites da internet e formulários aplicados aos produtores e associações de leite no município de Ji-Paraná os quais compõem a base de dados do banco do Centro de Estudos Interdisciplinar em Desenvolvimento Sustentável da Amazônia CEDSA. REFERENCIAL TEÓRICO O potencial agropecuário de Rondônia é favorecido com a vasta extensão de terras e clima quente, o que leva os detentores de propriedades rurais a investir mais na pecuária, e isso leva a maior produção de leite, o que se constitui na principal fonte de renda para o pequeno produtor, representando sua subsistência. Sendo assim, Ji-Paraná com mais de 495 mil cabeças de gado bovino, o município possui a terceira maior criação de gado do estado, de acordo com o Censo Agropecuário do IBGE (2006). Além da criação de bovinos, Ji-Paraná é um dos maiores produtores de leite do estado com uma produção de 41 mil litros de leite em 2006, que são distribuídos por laticínios localizados na região (Censo agropecuário do IBGE, 2006). Apesar da produção significativa apresentada pelo Estado, e consequentemente no município de Ji-Paraná, parece que a não sistematização ou a falta de assistência técnica e implementação de políticas públicas e ainda, a velocidade do crescimento dessa atividade, não favoreceram a organização e desenvolvimento da atividade leiteira em Rondônia. Fato este, agravado pelas transformações pelo qual passou este setor, principalmente a partir de 1990 379 com a desregulamentação do mercado leiteiro nacional e a abertura da economia ao comércio exterior. Sendo assim, é necessário o apoio não só dos governos, como também é necessário que o apoio das grandes empresas e até mesmo das próprias pessoas. Já que não existe mais uma visão isolada das regiões, e sim, uma visão global e de que cada componente, interno ou externo, deve ser integrado ao todo. Buscando promover e fortalecer o setor, as instituições governamentais buscam estabelecer regras de incentivos para possibilitar o desenvolvimento da pecuária leiteira no Estado. Entretanto, nos últimos anos houve um avanço significativo no agronegócio do leite no Estado, que vem se estruturando desde a década de 1970, porém somente no final da década de 1990 é que foi criado o Programa de Desenvolvimento da Pecuária Leiteira do Estado de Rondônia (Pró-Leite), desenvolvido pelo governo estadual e administrado pela EMATER-RO (PAES-DESOUZA, 2007). Esta iniciativa busca oferecer capacitação e condições técnicas de melhoria de qualidade e que vem permitindo o acesso de milhares de agricultores familiares à tecnologias de ponta, no que se refere a produção e manejo de bovinos de leite. Pode se notar que essas relacionamentos interoganizacionais, compõem um conjunto de organizações que sozinhas não estariam aptas a concorrer no mercado, o que gera benefícios e vantagens para ambas empresas e fortalece a competitividade. Segundo POWELL; KOPUT; SMITH-DOERR (1996), as organizações precisam colaborar para adquirir recursos e competências que elas não possuem internamente. Produtores em várias regiões do país estão se organizando em associações, visando a uma melhor negociação para o leite produzido em suas comunidades e comunidades vizinhas. As iniciativas nascem com o objetivo central de negociar a venda do leite a melhores preços recebidos até então por um produtor fornecendo o leite sozinho. É a busca de criar um poder de mercado. Esse tipo de associação de produtores de leite são de pequeno porte, com pequena ou nenhuma estrutura inicial e com uma limitada abrangência geográfica. Contudo esta iniciativa nasce mais fortalecida se contar com o apoio de lideranças dos produtores, sindicatos rurais, prefeituras municipais e agentes da assistência técnica. Esta é uma conjugação de esforços com representação política, buscando a defesa da união e dos interesses dos produtores. As atenções dadas no controle dos processos adéquam à viabilidade técnica e comercial desses produtos. O pequeno produtor precisa incorporar essas alternativas para a 380 agregação de valor dos seus produtos, não esquecendo que esses investimentos se fazem necessários para a comercialização, já que existem exigências a serem atendidas CONSIDERAÇÕES FINAIS Mediante o estudado, foi possível perceber que muitos destes produtores necessitam das associações para se manterem competitivos no mercado do leite. E essas, que, por sua vez, contribuem para a melhora na qualidade de leite e no desenvolvimento da região, onde se torna imprescindível a participação da prefeitura e de outras organizações, por exemplo, a SUFRAMA, demonstrando que nestes relacionamentos todos podem ganhar. Como demonstra na figura 1 a Superintendência da Zona Franca de Manaus (SUFRAMA) estabelece um relacionamento com a prefeitura, onde ela investe e financia tanques. A prefeitura, por sua vez, repassa os tanques os tanques às associações e, com isso, gerando desenvolvimento na região. Essas associações que adquiriram tanques e investimentos trazem aos seus produtores uma melhora na qualidade, de renda, de vida e de poder de negociação, esses produtores, em troca, fortalecem a associação e aumentam seu poder de expressividade. Figura 1 - Demonstrativo dos relacionamentos entre organizações Fonte: Composição do autor (2012) as 381 Sabe-se que as associações e cooperativas podem oferecer benefícios, no entanto, esta assertiva somente é verdadeira se os princípios cooperativistas forem praticados. Porém, muitas dessas associações ainda carecem na disponibilização de tecnologias e informações, e que a prefeitura poderia exercer um papel muito mais representativo mediante esses produtores. Observa-se também que existe muita dificuldade entre os produtores em agregarem-se em busca do benefício comum. Sendo assim, as parcerias entre as instituições públicas e privadas e as associações, apesar de serem indispensáveis aos produtores de leite, poderiam ainda estar beneficiar melhor estes produtores. Tendo se em vista disto, dá-se como sugestão para as associações, a criação de eventos e a capacitação dos representantes e participantes dos produtores para que a gestão da mesma possa ser feita em torno do seu objetivo que deve ser auxiliar o pequeno produtor e tornar rentável a atividade em que ele está inserido. Já com relação à prefeitura e organizações privadas, o Governo através de sua influência no ambiente institucional poderia passar a desempenhar o papel de agente que lidera externamente, sendo fonte de inovação tecnológica influenciando diretamente nas estratégias dos agentes e das organizações privadas. Diante disso, o processo de interação e cooperação, através da união de produtores em arranjos e/ou em organizações coletivos sustentáveis com as organizações privadas, facilitaria o processo produtivo, potencializando assistência técnica e otimizando os recursos obtidos de instituições governamentais ou não governamentais. Isto também pode propiciar maior poder de negociação junto a fornecedores, na busca de minimizar os custos dos insumos, o que levará a uma melhor relação com o mercado. Concluindo, a pesquisa demonstrou que a maior carência dos produtores de leite é a disponibilização da informação e tecnologia. Em vista disso, verificou-se que as associações poderiam estar contribuindo com a criação de eventos e a capacitação de seus produtores e a prefeitura poderia passar a desempenhar o papel de agente que lidera externamente como fonte de inovação tecnológica influenciando diretamente nas estratégias de seus colaboradores e associados. REFERÊNCIAS 382 REIS, Lineu Bélico dos. Energia, recursos naturais e a prática do desenvolvimento sustentável / REIS, Lineu Belico dos, FADIGAS, Eliane A. Amaral; CARVALHO, Claúdio Elias. - Barueri, SP: Manole, 2005. POWELL, Walter W.; KOPUT, Kenneth W.; SMITH-DOER, Laurel. Interorganisational collaboration and the locus of innovation: Networks of Learning. Administrative Science Quartery (1996, P 116-145) CÂNDIDO, Gesinaldo Ataíde. A formação de redes interorganizacionais como mecanismo para a formação de vantagem competitiva e para promoção do desenvolvimento regional: O papel do Estado e das políticas públicas neste cenário. HAWKEN, Paul. The Ecology of Commerce: A declaration of sustainability, HarperCollins (1993, p. 223-240). http://www.cnpgl.embrapa.br/nova/informacoes/estatisticas/producao/tabela0240.php Acessado em 25 de Abril de 2011. CHIAVENATO, Idalberto, Introdução à teoria geral da administração: uma visão abrangente da moderna administração das organizações, edição compacta/ Idalberto Chiavenato. 3.ed.rev.e atualizada. -Rio de Janeiro: Elsevier, 2004- 3ª Reimpressão. Banco de dados do Centro Interdisciplinar em Desenvolvimento Sustentável - CEDSA http://www.ji-parana.ro.gov.br/. Acessado em 8 de Fevereiro de 2012. http://www.ibge.gov.br. Acessado em 10 de Fevereiro de 2012. AGRADECIMENTOS: Ao CNPQ; Ao PIBIC; A UNIR; Ao CEDSA; Ao NUCSA; Aos Professores Dra. Mariluce Paes de Souza, Dr. Theophilo Alves de Souza Filho e ao professor Dércio CONTATOS Orientando: Alexandre Cruz de Mello Franco E-mail: [email protected] Orientadora: Dra. Mariluce Paes de Souza E-mail: [email protected] 383 HISTÓRIA E REPRESENTAÇÕES SOCIAIS: A UNIR AO LONGO DOS 30 ANOS DE ATUAÇÃO EM RONDÔNIA (1982 A 2011) * HISTÓRIA E MEMÓRIA DE EX-ALUNOS SOBRE A CRIAÇÃO DA UNIR. Aline Cristina de Almeida Lopes ** Lilian Maria Moser RESUMO O presente resumo trata acerca de História e Representações Sociais na UNIR do período de sua instalação no Estado de Rondônia. Este trabalho objetiva a reconstrução da Memória e das Representações sociais na UNIR através da História Oral, ou seja, a partir de entrevistas com ex-alunos e ex-professores a fim de que estabeleçam uma relação indivíduo-sociedade do período da criação da Universidade Federal de Rondônia, e a partir disto, que se estabeleça uma melhor compreensão da sociedade. Palavras-Chave: Unir. História Oral. Representação Social. INTRODUÇÃO A presente pesquisa alude sobre o cumprimento do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica - PIBIC/UNIR, e tem por objetivo o estudo da História e das Representações Sociais na Unir ao longo dos 30 anos de atuação em Rondônia (1982 a 2011). A pesquisa inicia-se com um breve estudo acerca da história da Universidade no Brasil. Conforme FÁVEA (2006 p. 20), as primeiras universidades surgem em virtude de diversos fatores, dentre eles, a influência positivista na política educacional, marcada pela atuação de Benjamin Constant. Outro fator emblemático para a criação destas instituições de ensino, seria o chamada "desoficialização" do ensino brasileiro. Nesse contexto (Minchelotto apud Fávea, 2006 p. 23) surge em 1909, a Universidade de Manaus; em 1911 é instituída a Universidade de São Paulo, e em 1912, surge a Universidade do Paraná como instituições livres. * Trabalho elaborado a partir de pesquisa científica desenvolvida através do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC, no período de Agosto de 2011 a Julho de 2012, que tem a finalidade de mostrar os resultados alcançados diante da problemática acolhida. * * Graduanda em História pela Universidade Federal de Rondônia – UNIR. Bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC e membro do Centro de Documentação e Estudos Avançados sobre Memória e Patrimônio de Rondônia – CDEAMPRO. ∗ ∗∗ Orientadora. 384 Através da Lei N.º 7.011 de 8 de julho de 1982, a Universidade Federal de Rondônia fora criada, em decorrência da instalação do Estado. No momento da instalação da Universidade, a região passava por uma série de modificações. Até 1981, de acordo com FONSECA & TEIXEIRA (2003 p.177), Rondônia pertencia a categoria de Território Federal. O grande fluxo migratório provenientes de várias regiões do Brasil teve forte influência para que em 22 de Dezembro de 1981 fosse aprovada a Lei Complementar N.º 41, que criou o Estado de Rondônia - tendo sua instalação ocorrido apenas no ano seguinte. De acordo com levantamentos no Acervo Documental do Estado de Rondônia - Jornal Alto Madeira de 04 de julho de 1982 - verificou-se que em tal período o Estado possuía um número de matriculados na graduação que girava na em torno de 1.253 (Hum mil, duzentos e cinquenta e três) alunos, com 10 cursos (UFPA), sendo três deles administrado pelo Centro de Ensino Superior de Rondônia. Em reportagem encontrada no Jornal Alto Madeira, pouco tempo antes da inauguração da Universidade, pôde-se observar que além do objetivo de formar Professores para educação básica, tinha-se o intuito de criar uma Instituição de Ensino Superior, que tivesse por intuito uma nova missão cultural da Universidade (ensino e pesquisa), uma nova dimensão, a missão social que supõe e completa a primeira. O mesmo Jornal abordava sobre as principais funções de um Universidade, quais seriam, tornar-se uma distribuidora social do saber e participante ativa e dinâmica dos problemas fundamentais da sociedade, estimulará o desenvolvimento na sua indispensável categoria de globalidade; a crítica da estrutura incompatíveis com uma sociedade que se transforma; a busca de novas formas de organização social, mais nacionais e mais humanas; o desenvolvimento do homem amazônida em toda sua dimensão a preparação de quadros profissionais para nossa realidade. Os principais objetivos desta pesquisa era entrevistar ex-alunos e ex-professores da UNIR e verificar os significados dos aspectos históricos relacionados a esta instituição, a fim de se colher relatos sobre histórias de vida em torno destes 30 anos da criação da Universidade Federal de Rondônia, e a partir disto, através da História Oral reconstruir a representação exercida por esta instituição na sociedade local. Para a realização desta pesquisa contamos com a colaboração do ex-aluno Sandoval Rodrigues Lopes Assim sendo, diante das problemáticas propostas pela pesquisa, priorizamos por conhecer a História e Memória da UNIR através de seus ex-alunos. Para tanto foram estabelecidos sistemas de visitas, consultas e pesquisas, que viabilizassem nossa aproximação empírica e o conhecimento de quais foram as Representações Sociais e Memórias advindas da época. 385 METODOLOGIA Neste trabalho realizamos uma pesquisa bibliográfica referente à História, Memória, e Representação. Tal pesquisa foi de caráter fundamental para que pudéssemos analisar as fontes documentais, quais sejam, a entrevista coletada em Julho de 2012 e jornais do Centro de Documentação do Estado de Rondônia. De acordo com A Pesquisa em História o documento durante muito tempo foi visto como a única garantia do acontecido.Vieira (1989, p. 13) afirmou: Quando a História recebeu o estatuto de ciência, o que se deu com a escola positivista em fins do século XIX, o registro privilegiado pelo Historiador era o documento escrito, sobretudo o oficial. Esse documento assumia o peso de prova histórica e a objetividade garantida pelo mesmo. Em relação a isso Le Goff (2008) comenta que os fundadores da Revista dos Annales, pioneiros de uma Nova História, insistiram sobre a necessidade de ampliar a noção de documentos. A História faz-se com documentos escritos, sem dúvida. Quando estes existem. Mas pode fazer-se, deve fazer-se sem documentos escritos, quando não existem. Com tudo o que a habilidade do historiador lhe permite utilizar para fabricar seu mel, na falta de flores habituais. Signos, paisagens e telhas. Numa palavra com tudo o que pertencendo ao homem, depende do homem, serve o homem, exprime o homem, demonstra a presença a atividade, os gostos e as maneiras de ser do homem. Há que se tornar a palavra documento no sentido mais amplo, a partir de documento escrito, ilustrado transmitido pelo som, a imagem ou de qualquer outra maneira. ( LE GOFF, 2008, p. 530) Através de entrevistas pudemos trabalhar a História Oral com pessoas que fizeram parte desses 30 anos da UNIR, buscando entender entre outros os que esta instituição representa para a sociedade. Cabe destacar que utilizaremos a História Oral como fonte de pesquisa. Segundo Alberti (2010, p. 157) é comum que as pessoas se confundam e considerem a entrevista de História Oral como a própria "história", levando à ilusão de se chegar à "verdade do povo". Pesavento (2003, p. 42) explica que através destas fontes é possível elaborar as representações construídas em determinado período. Nesta pesquisa trabalhamos com a interdisciplinaridade comentada por BURKE (1992) em A Escrita da História. Na obra A Escola dos Annales (1929-1989) é destacada alguns pontos que cabem em nossa pesquisa, quais sejam: a substituição da tradicional narrativa de acontecimentos por uma história problema e a história de todas as atividades 386 humanas e não apenas uma história política. Utilizamos um roteiro de perguntas semiestruturadas, com base na História Oral de Vida defendida por Antonio Torres Montenegro, que oferece ao pesquisador um manual de como conduzir uma entrevista: Um estímulo que pode ajudar muitas vezes o entrevistado a acrescentar novos detalhes ou mesmo a resgatar outras memórias de algum tema sobre o qual esteja dissertando é a repetição pelo entrevistador da última palavra dita pelo entrevistado. Ou ainda de expressões como:" mas foi assim mesmo?" "ah, foi?". Esta técnica, que é utilizada de maneira informal em qualquer conversa para demonstrar interesse, poderá servir como nova motivação para o entrevistado acrescentar novos detalhes ao que está sendo narrado ou evocar outras memórias referentes ao assunto em tela. As perguntas devem sempre ter um caráter descritivo e evitar qualquer indução ou juízo de valor. É importante não fazer perguntas extensas e analíticas. .(MONTENEGRO, 1994 p.150-151) De acordo com o autor, a História Oral tem como matéria prima a memória que pode vir à tona através de estímulos diretos que comumente se denomina de memória voluntária, mas também a partir da memória involuntária que ocorre por meio da própria entrevista. "O entrevistador deverá colocar-se na postura de parteira de lembranças, facilitador do processo que se cria de resgatar as marcas deixadas pelo passado na memória" (MONTENEGRO, 1994 p. 150). E foi, através deste conhecimento que buscamos resgatar as representações acerca da UNIR, quando de sua criação. Conforme metodologia apresentada no projeto ora proposto, cumprimos, até o presente momento, algumas das tarefas contidas em nosso cronograma de trabalho, quais sejam: consultas bibliográficas, a fim de encontrar referencial teórico e metodológico, pesquisa documental, bem como entrevistas. Buscamos, em caráter essencial, compreender através do recurso da entrevistas, utilizando o método da História Oral e ainda, através das bibliografias que relação a Universidade Federal de Rondônia estabeleceu com os atores sociais da época de sua inauguração e sua importância para a sociedade da época, como um todo. RESULTADOS Neste trabalho buscamos a construção da História da Universidade Federal de Rondônia, através da História Oral. Por meio da entrevista com o ex-aluno Sandoval Rodrigues Lopes, pudemos observar a representatividade exercida pela Universidade Federal 387 quando de sua criação e inicial estruturação. Nascido em Guajará-Mirim, o ex-aluno Sandoval passou a estudar na Universidade Federal de Rondônia, antes da mesma receber esta titulação. Bolsista do extinto CESUR Centro de Ensino Superior de Rondônia, fez parte da turma inicial de Administração de Empresas, que fora a primeira turma a se formar da Universidade Federal de Rondônia. Viveu o período de transição e criação da UNIR. A partir da entrevista coletada extraímos alguns em destaque. Primeiramente, a questão da implementação de uma Universidade Federal em Rondônia a partir da instalação do recente Estado. Sandoval também relata que a primeira turma de alunos da Universidade era formada, em sua maior parte, por alunos com condições financeiras favoráveis e já a algum tempo distante da escola. Parte significativa da entrevista é retratando sobre como o nível superior era visto na época, como fazer parte de uma universidade era grandioso, conforme trecho: “O curso superior na época, aqui em Rondônia, no início da década de 80, era um sonho pra qualquer pessoa. Até mesmo para as pessoas com poder aquisitivo melhor, porque normalmente eles mandavam os filhos para outros estados, pra estudar em Manaus, Belém, Rio, São Paulo. Então, quer dizer, pra os moradores de Rondônia e também para os nascidos em Rondônia era um sonho, inclusive a própria família, os vizinhos, os parentes, os amigos, vibraram muitos quando nós conseguimos entrar na faculdade, no caso, porque, digamos de cada mil pessoas em Porto Velho, uma conseguia - porque a população ainda era pequena - entrar na Universidade pra fazer o curso superior. E assim, graças a Deus, eu me senti na época como um precursor. No bairro em que eu morava, fui o primeiro a entrar na faculdade(...) Então, eu, meio que servi de exemplo tanto para os meus irmãos - sou o mais velho de nove irmãos, como para os vizinhos, os amigos, os parentes. “ Conforme análise da entrevista, a representação exercida pela criação da Universidade tinha na sociedade da época um forte apelo emocional, demonstrando-se como um degrau para uma nova vida. O nosso narrador aborda acerca do inicial desconforto quanto as diferenciações socioeconômicas encontradas, e posteriormente, a existência de uma integração entre os desiguais, de acordo com trecho a seguir: “Olha, sinceramente, inicialmente eu sentia até um pouco de vergonha, porque a grande maioria dos meus colegas, digamos que dos 40 estudantes, uns 30, possuía um carro. E eu lembro bem que eu morava mais ou menos uns três kms da universidade, eu ia de bicicleta e tinha uma colega que morava próximo a minha casa que ia na garupa da minha 388 bicicleta e no início eu me sentia um pouco envergonhado(...) mas depois eu fui me acostumando. Só que aí foi muito bom, porque eu sempre fui muito tímido, a convivência me abriu muito os horizontes, a cabeça, principalmente com gente mais idosa que eu.. além dos professores, é claro. Sandoval aludiu sobre a formação do corpo docente, que em sua maioria, fazia parte anteriormente da SEPLAN (Secretária Estadual de Planejamento) e da competência dos mesmos. Do orgulho de ter aulas com determinados professores, de estar na Universidade. Em outro trecho da entrevista o ex-aluno tratou sobre a popularidade da Universidade Federal de Rondônia quando da sua criação - encontrando-se entre um dos três temas mais comentados no início da década de 80. Por fim, demonstrou em seus relatos que a representação construída no periodo da instalação da UNIR, mantém-se de certo modo, ainda presente, de acordo com o seguinte trecho: Eu sempre vou lembrar com muito carinho da UNIR, por mais problemas que ela tenha... Problemas acontecem conosco também, seres humanos. A UNIR é uma entidade que está caminhando com suas próprias pernas, é maior de idade. Os problemas acontecem, mas eles estão aí pra serem resolvidos. Construindo através destes apanhados de trechos uma espécie de representação social da UNIR na década de 80. Cabe destacar ainda que não pretendemos trazer a "verdade" sobre a UNIR, trazemos apenas uma interpretação, dentre muitas outras que podem ser realizadas pelos Historiadores. Acerca disto Jenkins em A História Repensada comenta: A História é um discurso em constante transformação construído pelos historiadores e que da existência do passado não se deduz uma interpretação única: mude o olhar, desloque a perspectiva, e surgirão novas interpretações[...] a verdade deve ser entendida como um conjunto de procedimentos regulados para a produção, a lei , a repartição, a circulação e o funcionamento dos enunciados. A verdade está ligada a sistemas de poder que a produzem e sustentam. (JENKINS, 2009 p. 35-59) CONSIDERAÇÕES FINAIS Conforme já aludida neste relatório, pretendemos construir um conhecimento no que diz respeito à trajetória da Universidade Federal de Rondônia, refletindo objetivamente como fator primordial, as representações sociais criadas nos primeiros anos de atuação no Estado de Rondônia. 389 Para tal empreitada realizamos primeiramente leituras a cerca do assunto na tentativa de apreender base teórica para sustentar nossa investigação. Posteriormente nos debruçamos à História Oral, através das entrevistas, buscando criar um esboço da Representação Social que a UNIR exercia quando de sua criação. Ressaltamos que conforme apresenta nosso cronograma de trabalho faltam ainda algumas etapas da pesquisa documental e entrevistas das historias orais de vida de técnicos, professores e alunos, bem como pretendemos ainda nos aprofundar, sobretudo em todo e qualquer escrito sobre a Universidade investigando a legitimidade de cada documento visando tentear com fidedignidade que representações sociais foram geradas quando houve a criação da Unir e a posteriori, ao longo de sua trajetória nesses trinta anos. REFERÊNCIAS Ofício do Historiador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. BOSI, Ecléa. Memória e Sociedade. Lembrança de Velhos. 3ªed. São Paulo. Cia das Letras, 1994. BURKE, Peter (Org). A Escrita da História: novas perspectivas. São Paulo: Editora da Unesp, 1992. BURKE, Peter. A Escola dos Annales. São Paulo: Brasiliense, 1992. CHARTIER, Roger. À Beira da Falésia: a História entre certezas e inquietude. Porto Alegre: Editora da Universidade/UFRGS, 2002. HALBWACHS, Maurice. 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Assim, vê-se que o ser humano está diante do perigo iminente da perda, e o anseio pelos deuses acompanha o caminho da humanidade, evidenciando uma tentativa de diminuir os males da natureza, aliviando o homem da verdade de seu padecimento. A pesquisa foi um estudo qualitativo, realizado com 08 mulheres usando como instrumento uma entrevista semi dirigida. O objetivo desse estudo é promover um estudo do mal-estar subjetivo e suas expressões em jovens mulheres e suas demandas religiosas como forma de apaziguar esse mal-estar subjetivo. Palavras-chave: Religião. Feminino. Mal-estar subjetivo. ABSTRACT This paper discusses the relationship between young women and the search for religion as a way to appease a malaise subjective. The theoretical basis is psychoanalysis, which Freud tries to understand the tendency of man to approach and believe in the promises of eternal life. Thus, we see that human beings are facing the imminent danger of loss, and longing for the gods follows the path of humanity, showing an attempt to diminish the evils of nature, relieving the man of the truth of their suffering. The study was a qualitative study, conducted with 08 women using an instrument a semi driven. The aim of this study is to promote a study of this ill-r subjective and its expressions in young women and their religious demands as a way to appease this malaise subjective. Keywords: Religion. Women. Malaise subjective. INTRODUÇÃO Este trabalho apresenta uma parte do referencial teórico usado na pesquisa realizada em 2011-2012 sobre feminino e religião. Apresenta também sua metodologia e considerações finais. Tem como objetivo apresentar de forma resumida a pesquisa realizada. No primeiro 83 84 Orientanda, matriculada no 7º período do curso de Psicologia. Orientadora, professora do departamento do curso de Psicologia. 391 momento será apresentado o referencial teórico sobre jovem adulto, feminino, religião e malestar subjetivo, em seguida o método de realização da pesquisa e instrumentos utilizados e por fim as considerações finais da pesquisa, mostrando seus resultados. DESENVOLVIMENTO A religião é um tema que está muito presente nas referências psicanalíticas evidenciando a curiosidade de Freud pela mesma. Ela atravessou várias épocas e culturas e desde sempre se mostra como uma instituição reguladora da moral e dos costumes, o que não se faz de maneira diferente na contemporaneidade. Quando Freud trata de religião não se atém apenas a sua função de coerção da vontade, mas discute sobre como se dá a natureza desse vínculo, tentado entender a tendência do homem a se aproximar e acreditar nas ilusões de plenitude e promessas de vida eterna. Freud expõe que o desejo humano quando contraposto as restrições impostas pela cultura, reafirmados pela religião, pode acarretar em doenças de ordem nervosa, pois a repressão dos desejos tem importância primordial no adoecimento psíquico. Assim, o papel da religião na comunicação e controle da civilização é grande e persiste em várias obras freudianas. Sua crítica se potencializa quando fala sobre a inadequação do que prega a cultura à condição humana: A severidade das normas repercute diretamente sobre a vida social, pois os sacrifícios impostos ao sujeito têm como decorrência o incremento das doenças nervosas no último século. A ordem social, em nome de uma convivência harmônica, exige do sujeito algo que o ultrapassa, ou seja, na leitura psicanalítica, o limite que define o humano situa-se muito aquém das exigências da cultura. (OLIVEIRA, 2002.) Em “O futuro de uma ilusão” (1927), Freud registra sua crítica mais aguda sobre a religião quando trata de sua função na civilização, mostrando que a religião tem como papel oferecer uma satisfação substitutiva às renuncias impostas ao humano pela sua própria estrutura psíquica e pela vida comunitária, ou seja, pretende conciliá-lo com os valores culturais. Nesse sentido, vê-se que o ser humano está diante do perigo iminente da perda; a cada instante se depara com a fragilidade de seu corpo, com as limitações de sua existência e a 392 aproximação da morte; por isso, o anseio pelos deuses e ídolos encontrados, principalmente nas religiões, acompanha o caminho da humanidade, evidenciando uma tentativa de diminuir os males da natureza, aliviando o homem da verdade de seu padecimento. Há os elementos, que parecem escarnecer de qualquer controle humano: a terra, que treme se escancara e sepulta toda a vida humana e suas obras; a água, que inunda e afoga tudo num torvelinho; as tempestades, que arrastam tudo o que lhes antepõe; as doenças, que só recentemente identificamos como sendo ataques oriundos de outros organismos e, finalmente, o penoso enigma da morte, contra o qual remédio algum foi encontrado e provavelmente nunca será. É com essas forças que a natureza se ergue contra nós, majestosa, cruel e inexorável; uma vez mais nos traz à mente nossa fraqueza e desamparo de que pensávamos ter fugido através do trabalho da civilização (FREUD, 1927, p.27). Esse fragmento traz consigo o desamparo do ser humano diante as forças da natureza, pois há um limite na criação humana. E se a religião é uma das maneiras inventadas pelo homem para lhe dar maior proteção devido sua fragilidade, então sobra algo que revela seu temor diante da vida, sua condição de ser finito evidenciado por um corpo que perece e pela certeza de uma morte que não tarda em alcançá-lo. É a isso que Freud chama a atenção: aos exageros dessa tentativa da civilização de suprimir o mal-estar inerente ao ser humano, deixando clara a impossibilidade de a cultura proteger o sujeito dos perigos reais e imaginários por completo. Desse modo, segundo Freud, é a religião que deve dar conta desse desamparo e responder aos mistérios da existência. O homem tem necessidade de construir algo para se espelhar e seguir, dando um significado a sua existência. É na religião, onde há a crença em deuses e ídolos e em uma verdade celestial, que essa necessidade pode ser satisfeita. Essas crenças regem o regulamento social e fazem o homem sentir-se mais protegido diante de seu desconhecimento. Assim, a religião pode ajudar a apaziguar o mal-estar subjetivo do homem e até mesmo psicossomático de suas enfermidades fazendo uso de seu poder de explicação do universo e promessa de vida eterna. MÉTODO A pesquisa realizada foi de cunho qualitativo e buscou uma análise subjetiva de jovens mulheres e seu perfil religioso em duas instituições religiosas distintas de Porto Velho. O 393 presente estudo teve como objetivo geral fazer um estudo do mal-estar subjetivo atual e suas expressões em jovens mulheres em busca da religião como forma de apaziguar esse mal-estar. A escolha por essa abordagem se deveu ao fato de que A abordagem qualitativa parte do fundamento de que há uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma interdependência viva entre o sujeito e o objeto, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito. (CHIZZOTTI, 2010, p.79). Vale salientar que a escolha pela pesquisa qualitativa, utilizando entrevista não diretiva, se deu para permitir uma maior liberdade aos entrevistados para falar sobre seu cotidiano, sem preocupações com o produto final, ou seja, o conhecimento produzido através das falas não busca igualar todos os conteúdos a um produto definitivo. Como nos esclarece Chizzotti (2010, p. 92) “a entrevista não-diretiva, ou abordagem clínica, é uma forma de colher informações baseadas no discurso livre do entrevistado”. Por tais características devemos ressaltar a importância do papel do pesquisador. O pesquisador é parte fundamental da pesquisa qualitativa. Ele deve, preliminarmente, despojar-se de preconceitos, predisposições para assumir uma atitude aberta a todas as manifestações que observa, sem adiantar explicações nem conduzir-se pelas aparências imediatas, a fim de alcançar uma compreensão global dos fenômenos. (CHIZZOTTI, 2010, p. 82). Outro aspecto que deve ser característico dos entrevistadores é quanto à escuta. O entrevistador deve manter-se na escuta ativa e com atenção receptiva a todas as informações prestadas, quaisquer que sejam elas, intervindo com discretas interrogações de conteúdo ou com sugestões que estimulem a expressão mais circunstanciada de questões que interessam à pesquisa. (CHIZZOTTI, 2010, p.93). Assim, não foi preocupação dessa pesquisa criar generalizações, mas apenas produzir uma discussão epistemológica, em face às problemáticas levantadas. A Epistemologia Qualitativa defende o caráter construtivo interpretativo do conhecimento, o que de fato implica compreender o conhecimento como produção e não como apropriação linear de uma realidade que se nos apresenta. (GONZÁLES REY, 2005, p.5). Para analisar os dados dessa pesquisa, fizemos uso de uma técnica denominada inferência do texto, onde se procuram conteúdos latentes tanto no dito quanto no não dito do 394 sujeito, o que vai ao encontro do método utilizado pela psicanálise. “Por detrás do discurso aparente geralmente simbólico e polissêmico esconde-se um sentido que convém desvendar”. (BARDIN, 1977, p.14). Ressaltando esse aspecto utilizamos Chizzotti (2010, p. 98) “o objetivo da análise do conteúdo é compreender criticamente o sentido das comunicações, seu conteúdo manifesto ou latente, as significações explícitas ou ocultas”. Vale destacar ainda, que a análise dos dados é a Análise de Conteúdo de Bardin (1977), na categoria temática, onde os temas serão destacados a partir das falas dos colaboradores. CONSIDERAÇÕES FINAIS O grande objetivo deste estudo foi investigar jovens mulheres em busca da religião como apaziguadora de seu mal-estar subjetivo. Querer entender como se dá essa relação entre religião e jovens mulheres foi o que motivou a realização desta pesquisa. Assim, no decorrer da pesquisa foi possível compreender a relação que existe entre essas jovens mulheres e a busca pela religião como um alívio, um consolo para suas aflições, o que é evidenciado em cada fala das colaboradoras desta pesquisa. Embora o mal-estar subjetivo em jovens mulheres não deva ser investigado apenas pelo olhar da religião, a partir das falas analisadas nesta pesquisa, pode- se perceber a importância da religião na vida dessas mulheres, no sentido de subtrair mal-estares de suas vidas. Segundo Freud (1930) a religião é um [...] sistema de doutrinas e promessas que, por um lado, lhe explicam os enigmas deste mundo com perfeição invejável, e que, por outro, lhe garantem que uma Providência cuidadosa velará por sua vida e o compensará, numa existência futura, de quaisquer frustrações que tenha experimentado aqui. (p. 26). A partir disso, Freud (1927) mostra que o homem continua desamparado e buscando deuses, junto a esse desamparo. O desamparo do homem, porém, permanece e, junto com ele, seu anseio pelo pai e pelos deuses. Estes mantêm sua tríplice missão: exorcizar os terrores da natureza, reconciliar os homens com a crueldade do Destino, particularmente a que é demonstrada na morte, 395 e compensá-los pelos sofrimentos e privações que uma vida civilizada em comum lhes impôs. (p. 82). Desse modo, a partir da análise desta amostra proposta, pode-se perceber que há um mal-estar nessas jovens mulheres e a busca pela religião como apaziguadora desses malestares. Tudo isso pode ser percebido nas falas das colaboradoras. No entanto, destacamos também a visão que elas próprias têm da mulher atual. O ser mulher ainda é definido por traços essenciais como sensibilidade, capacidade de cuidar, maternidade. Ou seja, o conceito de feminilidade permeia a definição de mulher em suas falas. Uma delas ainda afirma que a mulher é mais aceita pela sociedade se ela seguir os princípios da “verdadeira mulher”, ou seja, sendo o negativo do homem, o ser subordinado, “O outro”. “[...] a “verdadeira mulher” é a que se aceita como Outro.” (BEAUVOIR, 1980, p. 307). Em meio a isso, mesmo que de acordo com essas falas a religião tenha grande importância como apaziguadora de mal-estar subjetivo, não podemos afirmar que isso se aplique a todas as mulheres. Salientamos que este estudo se tratou de uma iniciação científica, portanto, estas conclusões não podem ser tomadas como absolutas ou definitivas. Compreendemos que há uma grandeza de possibilidades de interpretação do tema em estudo. Porém, considero os dados obtidos de grande relevância, pois houve um grande esforço para responder a todos os objetivos propostos a esta pesquisa. REFERÊNCIAS BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977. BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo. Trad. Sérgio Milliet. 6.ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980. 1 e 2.v. CHIZZOTTI, Antonio. Pesquisa em ciências humanas e sociais. 11. ed. São Paulo: Cortez, 2010. FREUD, S. (1927). O futuro de uma ilusão. In: Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1969. ______ (1930) O mal-estar da civilização. In: Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1969. 396 GONZÁLES REY, F. Pesquisa qualitativa e subjetividade: os processos de construção da informação. São Paulo: Thomson, 2005. OLIVEIRA, Daniella Coelho de. O texto freudiano como analisador da cultura: uma resposta aos discursos totalizantes da ciência e da religião. Revista Mal-Estar e Subjetividade. v.2 n.2. Fortaleza set. 2002. CONTATOS Orientanda: Ana Lígia Oliveira de Freitas. E-mail: [email protected] Orientadora: Melissa Andréa Vieira de Medeiros E-mail: [email protected] 397 ASSENTAMENTO RURAL SOB ENFOQUE DE GÊNERO: UMA ANÁLISE DO PDSA NAZARÉ E BOA VITÓRIA Ana Carla Taborga da Silva85 Profa. Dra. Maria Das Graças Silva Nascimento Silva86 RESUMO A pesquisa se insere dentro do campo rural ribeirinho, foi desenvolvida no Assentamento PDSA Nazaré e Boa Vitória, e tem como principais objetivos levantar as propriedades pertencentes às mulheres titulares deste lote, e identificar a participação de homens e mulheres na organização social e espacial em meio aos movimentos sociais, desse assentamento, onde buscou também verificar de que forma que se organizam e utilizam as técnicas aplicas ao lote. Essas mudanças estão associadas aos Movimentos que veem cada vez, mas adentrando no meio rural campo e rural ribeirinho, que trazem mudanças para as questões de gênero neste espaço. O que intitula a presença feminina mesmo que invisibilizada na transformação desse território. Palavras-chave: Gênero. Ribeirinho. Movimentos Sociais. ABSTRACT The research falls within the coastal rural countryside, being developed in the Settlement and Good PDSA Nazareth Victoria, and has as main objectives to raise the properties belonging to women owners of this lot, and identify the participation of men and women in social and spatial structure in the middle social movements, this settlement, which also sought to determine how to organize and use the techniques aplicas the lot. These changes are associated with movements that see time, but entering in the rural countryside and coastal countryside, bringing changes to gender issues in this space. What entitles the presence feminine even though invisibly in the transformation of this territory. Keywords: Gender, Riverside, Social Movements. INTRODUÇÃO O presente artigo tem a finalidade de demonstrar os resultados obtidos com a pesquisa realizada no assentamento, rural sob o enfoque de gênero: Uma análise do PSDA Nazaré e 85 Bolsista PIBIC/CNPQ. Acadêmica de Geografia da Fundação Universidade Federal de Rondônia – UNIR. ([email protected]). 86 Orientadora. Professora do departamento de Geografia ([email protected]). 398 Boa Vitória, tendo como objetivo colaborar para uma melhor compreensão acerca do tema, que se caracteriza em um grande desafio, o alcance da igualdade entre homens e mulheres na discussão de gênero. Onde foi desenvolvido, no ano 2011 e 2012, um plano de trabalho realizado com os titulares dos lotes do assentamento Nazaré e Boa Vitória. A pesquisa abordou uma observação simples onde nos possibilitou descrever e compreender mais detalhadamente o PDSA, no que se refere às relações sociais sob um olhar no enfoque de gênero, onde a comunidade está passando por um processo produtivo de isolamento para o mercado consumidor assim ganhando seu espaço na produção e desenvolvimento. Diante desse novo contexto de desenvolvimento com o plano do PDSA, está havendo uma nova construção no espaço ribeirinho em relação ao meio de produção e nos movimentos sociais, o assentamento foi criado com o intuito de que essa população tradicional permaneça no seu local de origem e que não venha interromper seu modo de vida nem todo seu contexto histórico, já que a implantação de uma organização social configura todo o espaço que é ocupado por certa comunidade, a partir das suas conquistas que permitem um melhor modo de viver para a sociedade presente e grande possibilidades das melhorias para gerações futuras. O desenvolvimento em um contexto geral remete ao processo de produção, crescimento econômico e mudança no padrão de vida das pessoas em diversas comunidades. Mesmo diante de tantas dificuldades, que não são poucas, o ribeirinho cultiva no seu tempo e sabedoria que tem em relação com a natureza e ao ambiente de onde extrai seu meio de subsistência, as comunidades tradicionais diante de muitos entraves os/as agricultores/as têm consenso que suas estruturas sociais e econômicas são extraídas da fonte onde a riqueza de poder está baseada na terra, assim, se desmatarem ou poluírem as margens do rio correm o risco de não terem sucesso em suas produções e por diante sofrerem com a falta da lavoura. Além disso, temem em ficar sem algumas espécies de peixes no local onde desenvolvem as atividades pesqueiras tanto para subsistência ou para o mercado em pequena escala, muita das vezes local. Embora com tantos empreendimentos que há na comunidade, alguns agricultores/as ficam sem acesso as informações pelo fato de morarem em locais de difícil acesso, e assim perdem a oportunidade que são as melhorias para a produção e desenvolvimento da sua mão de obra. Para a demarcação dos lotes que é de uso coletivo, a participação dos órgãos governamentais INCRA, IBAMA tem um trabalho importante, pois o assentamento tem ao seu redor duas reservas extrativistas e devido todo o processo que utilizam para demarcação 399 dessas terras os titulares não se sentem contemplados com os mesmos, pois a proximidade com as reservas dificulta e limita as demarcações. O INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), juntamente com o IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis), são os órgãos que demarcam as áreas dos lotes. Através dessa peculiaridade que adentra a esse assentamento dificultando a necessidade do desenvolvimento social, crescimento econômico interno na própria comunidade, faz necessário eleger representantes para que possa estabelecer e direcionar a toda comunidade especificamente aqueles que são membros da associação AMPAN (Associação de Moradores Produtores e Amigos de Nazaré), e os assentados titulares dos lotes, que integram o PDSA, onde toda instrumentalização de desenvolvimento local venha ocorrer através do esforço coletivo em aproveitar as potencialidades que o local oferece. Dessa forma, as entidades representativas como associações venha de maneira participativa contribuir tanto nas atividades em grupos como nas reuniões de decisões que são destinadas para homens e mulheres agricultores/as que ali buscam melhorias no seu modo de produção e nas políticas voltadas para a discussão das relações sociais que vem se fortalecendo cada vez, mas nesse espaço de comunidade tradicionais. Para a pesquisa utilizou-se questionário e experiência de vivenciar o cotidiano dessas pessoas, onde buscou verificar como que se organizam tanto para a produção como em participação nos movimentos sociais, sempre analisando a discussão de gênero partindo do principio da nossa pesquisa, sempre priorizando de como a cultura determina a organização espacial da área ocupada, as pessoas a serem pesquisadas são os que possuem titulo do lote em seu nome. Segundo dados do INCRA (Instituto Nacional colonização Reforma Agrária) o PDSA- Nazaré e Boa Vitória e constituído por 99 titulares do lote, distribuído com 66 assentados em Nazaré e 33 em Boa Vitória, desse universo 14 são do sexo feminino e 85 são do sexo masculino dados que nos foram cedido no ano 2011. METODOLOGIA Gênero agrega a dimensão social e cultural da diferença sexual, adotando a perspectiva da construção social dos papéis sociais que devem ser desempenhados por homens e mulheres, e nega a construção universal das diferenças, implicando a compreensão dos papéis em determinada estrutura temporal e espacial. (Silva, 2011, p 26). 400 A pesquisa implica em um estudo de caso de abordagem qualitativa e quantitativa. De acordo com Gil (2002), o estudo de caso refere-se ao estudo de um caso considerado, um grupo social do Assentamento Rural PDS Nazaré e Boa Vitória. Em conformidade com Siena (2007) a pesquisa qualitativa tem um processo de reflexão e análise da realidade através da utilização de métodos e técnicas para a compreensão detalhada do objeto de estudo em seu contexto histórico e segundo sua estruturação. Já a quantitativa é caracterizada pela quantificação na coleta e tratamento de dados, busca classificar e compreender os fatos ocorrentes de uma forma objetiva e precisa. RESULTADOS E DISCUSSÔES Os resultados a seguir são em relação ao quantitativo dos/as titulares dos lotes PDSANazaré e Boa Vitória mais especificamente as mulheres. E qual tipo de técnica que os mesmos utilizam em meio à produção, analisando se há produções diversificadas por homens e mulheres, mediante qual produto que comercializam e que se destina à sua subsistência familiar, verificou-se, também, se à participação nos movimentos sociais tanto das mulheres como os homens ocorre da mesma maneira. Estudos da Ciência Geográfica que discute a equidade e construção social de gênero conceitua a igualdade de oportunidade entre homens e mulheres, seja no espaço público ou privado. Um dos entraves que limitam as mulheres terem acesso do titulo do lote é não ter participação expressiva enquanto a titularidade é a forma como o INCRA exige em beneficiar as famílias, um dos principais fatores são os documentos necessários para que possa fazer parte da seleção em ser proprietário/a do lote. O quantitativo entre sexo masculino e o feminino donos/as dos títulos do assentamento Nazaré e Boa Vitória. A representação feminina chega a um total de 21%, constatando-se que são minoria as mulheres titulares dos lotes. O sexo masculino está representado em 79% do total dos assentados que possuem os títulos de posse dos lotes, do instrumento aplicado o valor equivale a um quantitativo de 42 dos entrevistados que são homens e o restante no total de 11 são as mulheres donos/as de lotes, totalizando 53 entrevistados (as). Outro resultado que foi obtido é em relação ao uso das técnicas utilizadas, aplicadas e direcionadas na produção da agricultura entre homens e mulheres e como manuseiam para melhorias a sua mão de obra, fica explícito com 40%, que muitas utilizam a capina como 401 melhor forma de preparo da terra para produção, e em segundo plano fica com total de 30% o roçado pelo fato de muitas terem que desempenhar muitas funções relacionadas ao seu cotidiano, e em terceiro lugar 20%, opta pela utilização da queima, mas com uma ressalva a utilização do fogo só ocorre quando as mesmas vão mudar a lavoura, e outras, mulheres não nos informaram de que forma utilizavam ou aderiam algum tipo de técnica para a produção e melhoria no lote. Constatou-se no que se refere aos homens que possuem o título do lote, alguns afirmaram que a utilização da capina é de 31% na manutenção da terra, agora 41% constatou o manuseio do roçado, e da mesma forma que as mulheres a utilização da queima com 19% é para troca do plantio, e 9% não informaram qual técnica utilizar para o preparo da terra. Em relação à técnica da queima os produtores usam com receio devido o lote ser coletivo e o fogo atingir a produção de outro titular. Para poder entender a forma que homens e mulheres se organizam para comercializarem sua produção, serão equiparados os dois gráficos que demonstrará qual e o produto e o quantitativo que os mesmo produzem. Sobre a discussão entre os gêneros há uma diversificação expressiva no que modula essa comunidade ribeirinha na produção para o comercio, onde a atividade que esses/as agricultores/as desenvolvem, entre homens como as próprias mulheres são para atender em pequena escala alguns comércios do município de Porto Velho dependendo do tipo da produção. E por eles produzirem com menor intensidade esses moradores das áreas ribeirinhas muitas das vezes são chamados de preguiçosos, pode compreender que essa argumentação em um método mal aplicado que não considera vivência de cada grupo. O modo de produção o ribeirinho não é preguiçoso, o processo produtivo depende de vários fatores: o principal fator é a quantidade da mão de obra que atuam na produção (agricultura familiar), como se trata de produção pequena, qualquer alteração trará consequência quanto ao produto sendo uma única fonte de renda. O produto que essa comunidade cultiva é a melancia, sendo dessa forma a maior produtora de melancia do baixo madeira para a venda tanto no comércio do município de Porto Velho como para cidade de Manaus, logo em seguida encontra-se a farinha como sendo os produtos que mais dão retorno financeiro para esses produtores, sendo uma comunidade tradicional nos surpreende a atividade pesqueira, a plantação da mandioca e extração do açaí não serem um dos principais produtos destinados à comercialização tanto quanto para subsistência. A mulher passa ter acesso à participação no espaço público a partir da década de setenta, quando o governo começa a implantar políticas públicas depois de muitas lutas, assim, elas passam a iniciar um novo caminhar mesmo a pequenos passos, é um dos ganhos 402 lentos que as mulheres se beneficiaram foi autonomia em seu próprio corpo, havendo o controle da taxa de fecundidade o governo teve uma importante participação nesse processo, como a implantação nos postos de saúde os anticonceptivos para o controle da fecundidade. A presença da mulher na discussão sobre movimentos sociais ainda nessa comunidade ribeirinha é muito recente e pouco discutida, das mulheres que participam muitas delas tem algum benefício que adquiriu fazendo parte da Associação de Moradores Produtores e Amigos de Nazaré (AMPAN), como a carteira de pescadora profissional que assegura essas moradoras no tempo da defesa pesqueira, recebendo um quantitativo em dinheiro para que não fique desamparada e outros benefícios que as mesmas expuseram. Mesmo que essas mulheres, trabalhadoras, mães, esposas tenham um modo de viver prazeroso e diferenciado, ainda há muito que lutar e assegurar o que for pertinente para sua sobrevivência, pois, sua dupla jornada de trabalhar no campo e ter que se dedica a família o trabalho acaba lhe privando de ter acesso ao espaço público e se limitando ao espaço privado. A mulher da qual estamos nos reportando ocupa o espaço anacumênicos: espaços onde a vida é excessivamente difícil, lugares habitados de transitória, nesse caso a metáfora simboliza lugares onde a presença das mulheres é especialmente difícil e onde sua sobrevivência não depende da natureza, mas de seu empenho em transformar relações de gênero historicamente construídas. Mesmo com as novas transformações no cotidiano dessas famílias, e no esforço de adquirir possibilidade na autonomia social, econômica a mulher ainda exerce o papel fundamental no contexto familiar. O homem por ocupar o espaço direcionado ao público tem mais acesso a transformação que ocorre em meio à sociedade e se privilegia com mais benefícios do que as mulheres, já que as mulheres estão direcionadas a atividade doméstica não remunerada, relacionada à reprodução, material ou simbólica, das pessoas (alimentação, saúde, educação...). Na pesquisa há também aqueles titulares que não participam ou já participaram e saíram devido a motivos que não lhes agradaram. Alguns disseram ter saído devido não ver resultado advindo da mensalidade que era paga para a associação, o custo era de 3,00 reais passando para 5,00 reais, outros questionamentos dos ex-associados seriam quando precisava utilizar qualquer que seja o equipamento conseguido pela associação tinha uma resistência do responsável, mediante, ter que pagar uma taxa de três reais para o uso, e assim, desagradando os que precisavam do apoio da associação. 403 CONSIDERAÇÕES FINAIS A pesquisa apontou para resultados voltados à discussão das relações sociais, especificamente sob o enfoque de gênero que discute como homens e mulheres, moldam esse espaço nessa comunidade tradicional. O modo de vida dessa comunidade ribeirinha tem o mesmo modo de vida do agricultor rural campo, pois ambos dependem da terra e de seu cultivo, onde o meio em que se produz não ultrapassa sua necessidade cotidiana, como para subsistência e pequenas comercializações. Considerando os resultados finais possibilitaram uma compreensão a cerca das relações de gênero no cotidiano dos/as titulares, nos esclarecendo quais as formas relacionais quanto ao gênero no espaço referido, assim, muitas vezes notam diferenciação como ocupam mesmo espaço de formas diferente, desses e dessas titulares. A mesma possibilitou, como resultado de analise, um levantamento das propriedades pertencentes às mulheres nos assentamentos, constatando que entre o gênero masculino representado com 79% e feminino 21%, desse universo a mulher ainda ocupa um espaço muito pequeno mesmo com políticas publicas voltadas a beneficiar as mesmas junto ao desenvolvimento do assentamento. Na pesquisa analisou a diferença relacionada ao uso das técnicas aplicadas ao manejo da terra, bem como as produções realizadas por homens e mulheres, mediante as novas transformações que vem ocorrendo nesse espaço, à mulher ainda desenvolve uma dupla jornada como casa + roçado, mesmo praticando toda tarefa na produção ela utiliza as técnicas manuais, como roçados, queima, capina, tanto quanto os homens, em meio à técnica que esses agricultores utilizam esta ocorrendo uma transformação no campo para que a produção seja destinada com qualidade aos compradores, e diante dessa discussão brevemente está se instalando na comunidade uma cooperativa resultado das conquistas. As transformações ocorridas nesse espaço, só foram compreendidas a partir de estudos que contextualizou e analisou todo processo histórico dessa comunidade ribeirinha. Obtendo fatos relevantes de cada ação social que movimenta e dinamiza um todo. Onde cada ação nos movimentos sociais parte primordialmente do lugar particular de cada individuo, podendo assim, se relacionar com o grupo familiar ou coletivo. A participação desses titulares em meio a movimentos sociais e políticas publicam, pode ter uma participação dos homens mais expressiva do que das mulheres, devido elas terem que conciliar seu espaço privado com público, no que se refere aos homens à participação e mais significativa e por isso é quem toma as principais decisões quando o assunto está vinculado aos benefícios aos titulares, e ao Distrito de Nazaré, onde atende todo 404 baixo madeira. E foi através da participação desses titulares nesses movimentos sociais, em associações, que será criada uma cooperativa para instalarem uma agroindústria, dando desenvolvimento econômico e social. Ocorreu também nessa comunidade políticas públicas voltadas em beneficiar as mulheres dando a titularidade dos lotes. Esse modelo de desenvolvimento rural que acompanha a modernização pode ser chamado capitalista, mesmo que as mulheres utilizem sua força produtiva não há reconhecimento de formas diretas a sua participação nas atividades voltadas para produção de alimentos, preparação da terra, como nos trabalhos de plantio e colheita, é em pequenas hortas e criações de animais, tendo algumas que utilizam da matéria prima para produção de artesanatos. Com esse empreendimento que irá norteia esse novo espaço, cabe ter um olhar mais delicado, pois se trata de um estudo voltado para comunidade que passando por processo de desenvolvimento, as expectativas são muitas por parte daqueles que pretendem trabalhar e expor seus produtos. A pesquisa qualitativa nesse espaço ribeirinha nos faz ter um outro olhar, voltado não só para a estrutura espacial, mas para a forma que essa comunidade valoriza o rio, e possuem uma relação diferenciada com a natureza. A natureza e o rio são visto de propriedade deles, onde, se encontra a essência da vida e liberdade dos mesmos. Os dados obtidos e a vivência no cotidiano dessa comunidade possibilitou atingir todos os objetivos da etapa da pesquisa e assim dando uma continuidade para a construção da ciência geográfica em estudos voltados a discussão sob enfoque de gênero na área rural ribeirinha e as transformações que esse espaço tem se modificado, as suas conquistas que veem anos de lutas e dessa maneira obter melhorias sócio espacial e sócio econômica para a comunidade e ampliar seu desenvolvimento. REFERÊNCIAS Gil, Antonio Carlos. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. 4ª Edição, São Paulo Editora Atlas S.A-1995. SIENA, Osmar. Metodologia da pesquisa científica: elementos para elaboração e apresentação de trabalhos acadêmicos. Porto Velho: [s.n.], 2007,200 p. SILVA, Joseli Maria; ORTON, Marcio Jose; JUNIOR, Baptista Chimin. Espaço, Gênero e Feminilidades Iberio- americanas. Ponta Grossa, PR: TODAPALAVRA, 2011. - (Coleção Geografias Feministas). SILVA, Josué Costa. O Mito e as Crenças como Contribuintes do Espaço Ribeirinho na Formação do Modo de Vida Amazônico. IN: Kozel, Salete; Silva Josué da Costa; GIL. 405 YANNOULAS, Silvia Cristina; VALLEJOS, Adriana Lucila; LENARDUZZI, Zulma Viviana. Feminismo e Academia. V. 81, n 199, p. 425 - 451, Brasília: R. Brás. Est. Pedag., set/dez 2000. 406 PAITER SURUI Carlandio Alves da Silva¹ Adnilson de Almeida silva² RESUMO Este trabalho sintetiza uma tentativa de explicação da complexidade socioespacial da comunidade indígena Paiter Surui. Que para as sociedades indígenas, a terra é muito mais do que um simples meio de subsistência, ela representa o suporte da vida social e esta diretamente ligada ao sistema de crenças e conhecimento. É de grande importância para a geografia, abordar, discutir e entender a complexidade de seus modos de vida, compreender suas territorialidades, e suas implicações ambientais, socioeconômicas e culturais. Ressaltamos que apesar de grande parte da identidade indígena terem sido extinta ao longo do processo de colonização de Rondônia, as sobrevivente representam uma enorme riqueza cultural no estado e no país. Palavras Chaves: Território. Territorialidades. Cultura. O povo indígena Suruí que se autodenominam Paiter, que significa “gente de verdade”, pertence ao grupo lingüístico Tupi Mondé e possui uma população aproximadamente de 1.350 indivíduos, que habitam uma área de 248.147 hectares inseridas nos estados de Rondônia e Mato Grosso e foram contatados pela FUNAI, fundação nacional do índio no dia 07 de setembro de 1969. De acordo com a história oficial do contato, que relata que em dois anos sua população foi reduzida de 600 para 250 pessoas, enquanto que os paiter Surui relatam que eram 5.000, a FUNAI teria deixado de registrar a quantidade de malocas existentes, e só constando em seus registros duas, daí o numero reduzido da população segundo informações de Almir Suruí, um dos principais lideres do povo Paiter. Segundo relatos dos Paiter Surui que as doenças oriundas do contato, em que os indígenas não teriam imunidades suficientes frente a vírus e bactérias então desconhecidas, dentre as principais que se destacam-se, epidemias de sarampo, tuberculose, gripe e pneumonia, teriam sido a responsável pela redução drástica da população. Essa semelhança é ¹Discente do Curso de Geografia UNIR bolsista do CNPq/ Membro do Grupo de Pesquisa Gepcultura - [email protected] ²Doutor em Geografia; Docente do Departamento de Geografia e do PPGG-UNIR - [email protected] 407 possível de verificação na historia de diversos outros povos indígenas. Não era possível registrar o numero de mortos, pois os doentes fugiam para as outras aldeias contaminando os demais que não tinham defesa imunológicas, a tal ponto que não dava tempo para sepultar todos os mortos. A população dos Paiter Surui teve um forte declínio na décadas de 1970, e 1980 devido as doenças, a presença de invasores e aos danos dos recursos naturais, que interferiram diretamente em sua forma de vida. Na década de 1990 a população dos Paiter Surui começa a ter uma rápida recuperação. A população Paiter Surui se distribui em 25 aldeias, que se localizam no limite da Terra Indígena e atendem o objetivo de proteger o território. Também contam como parte da população, os Paiter que vivem fora da Terra idigena, que por algum motivo foram morar fora, para estudar ou por terem se casado com membros de outras etnias ou não indígenas. Os Paiter Surui tem sua organização social baseada em clãs, que são Gameb (maribondos pretos), Gamir (maribondos amarelos), Makor (uma espécie de bambo amazônico), Kaban (uma fruta regional). Os clãs são as bases do sistema de governança, organização política e do sistema de parentesco, sua organização social é patrilinear e preconiza a exogomia clanica, em que os casamentos são permitidos apenas com clãs diferentes. O homem casa-se com a filha de sua irmã, pois segundo sua concepção cosmogonica, esta não são parentes próximas, pois são de outros clãs, assim o casamento com primos cruzados, e dessa forma se mantém a exogomia clãnica. A Terra Indígena Sete de Setembro que foi demarcada e homologada pelo Decreto 88.867 de 17 de outubro de 1983 está localizada nos municípios de Cacoal e Espigão do Oeste, em Rondônia e rondolândia no Mato Grosso, com a seguinte delimitação: NORTE - O perímetro demarcado desenvolve-se a partir do marco 09 de coordenadas geográficas 10º45’03’,9” S e 61º25’47,7” Wgr. Daí, segue por uma linha reta de azimute 88º27’45,2” com uma distancia de 54.908,82m, até o Marco 14 de coordenadas geográficas 10º44’16,0” S e 60º55’41,4” Wgr, LESTE - Do marco 14 segue por uma linha reta de azimute 178º44’50,4” com distancia de 24.007,68m, ate o marco 16 de coordenadas geográficas 10º57’16,9” S, e 60º55’23,4” Wgr. Daí segue por uma linha reta de azimute 217º16’33,0” e uma distancia de 40.711,33m, até o Marco 20 de coordenadas geográficas, 11º14’51,6” S e 61º08’55,1” Wgr. SUL - Do marco 20 segue por uma linha reta de azimute 269º32’55,5”, com uma distancia de 18.017,15m, até o marco 01 de coordenadas geográficas 11º14’56,2” S e 61º18’49,0” Wgr, daí segue por uma linha reta de azimute 359º51”11,8”, com 408 uma distancia de 15.005,61m, ate o Marco 02 de coordenadas geográficas 11º06’47’9” S e 61º18’50,2”, Wgr, daí segue por uma linha reta de azimute 269º47”12,1” com uma distancia de 12.060,15m, até o Marco 5 de coordenadas geográficas 11º14’51,6” S e 61º08’55,1” Wgr, SUL - Do marco 20 segue por uma linha 11º06’49,2” S e 61’25’27,6” Wgr OESTE - Do marco 5 segue por uma linha reta de azimute 359º04’59,0” com uma distancia de 40.110,29m, até o marco 09 ponto inicial da presente descrição perimétrica. Localização da TI Paiterey Garah Fonte: Metareilá, 2009 Para chegar-se a área a parti de Cacoal através das linhas, 5,6,7,8,9,10,11,12,14,15, e linha Pacarana, pelo fato das aldeias, que ao todo são 25 - estarem distribuídas ao longo dos seus limites, tanto por questões de segurança quanto de aproveitamento de antigas sedes de fazendas deixadas por invasores que se estabeleceram dentro da área nas décadas de 1970 e 1980. Esses acessos se dão pela BR 364, até Cacoal ou Rondolândia e depois segue pela rodovia do café seguindo para cada aldeia pelas estradas vicinais. 409 O MAPIMAÍ é uma festa da qual se comemora a criação do mundo, na qual acontece como reconciliação e a busca por equilíbrio entre o homem natureza e cultura, trazendo também a valorização da cultura desse povo. Nesse ritual os Paiter Suruí, que são organizados socialmente em quatro clãs ou grupos chamados, Gãmeb, Kaban, Makor, Gãmir, onde um dos clãs tem que ficar separado dos outros três grupos, pois esse é o anfitrião da festa onde é oferecido a bebida conhecida por chicha, os participantes tem que beber até vomitar, pois assim não podem deixar que seu líder se embriaguem, pois não seria bom que seu líder fosse visto de tal maneira, pois ele como líder não pode demonstrar desequilíbrio, e assim todos dos clãs tentam beber o máximo possível na tentativa de poupar o líder fazendo com que ele venha a beber menos, e dessa forma a bebida servindo como elemento de purificação do espírito. Os Paiter Suruí de Rondônia, conhecido como os indígenas cantores, fabricam artesanatos e instrumentos musicais para ser ofertados durante festa, como troca simbólica, sendo que cada música deve ser única não podendo ser copiada por outros. São fabricados colares, cocares e outros, e em um lugar afastado do clã que ficou responsável para oferecer a chicha. Em ordem cosmogônica, todos os indivíduos Paiter Surui compartilham a mesma regra social, obrigações e deveres, suas comunidades são divididas em metades, em que uma representa a mata e a outra o roça. Desta forma, organizam a agricultura, assim como obrigações e deveres, sendo que o parentesco é uma das formas mais importantes de organização social. Assim, organizavam em épocas tradicionais uma agricultura sistematizada, de modo que todos se ajudavam. A metade da mata ficava durante o verão em uma abertura da floresta, afastada aproximadamente 1KM da aldeia, onde a metade da roça não podia ir naquele período. As metades iam se alternando durante o ano, de modo que todos ajudavam no cultivo e na colheita da plantação. A metade da roça era responsável pela produção dos alimentos, da fabricação da chicha e como anfitriões da metade da mata, de modo que todos cooperavam entre si. Todas estavam inseridas num ritual - o MAPIMAÍ. Com o contato este ritual foi deixando de ser realizado, pois os Paiter Suruí passaram a viver em virtude da defesa do território e a FUNAI introduziu a a pratica das roças individuais. Em 2000, foi realizado o MAPIMAÍ com o apoio da Associação Metareilá, Kanindé e MMA - ministério do meio ambiente, já numa retomada de suas praticas ancestrais. 410 Esse fortalecimento, via retomada dos costumes tradicionais, é de extrema importância para a manutenção do território, pois permite aos jovens entender e estreitar os laços com a historia e a luta pela terra, assim como compreender os laços com a natureza. O MAPIMAÍ, que se da por suas metades, em que a metade ligada a comida, precisa de roças maiores para serem compartilhadas, e devem dedicar-se mais tempo para colher e cozinhar. A chegada no acampamento se da por meio de gritos e barulhos feitos pelos homens em clima de festa, fazem arcos, flechas, enfeites de plumas e cocares. As mulheres fazem vasos de cerâmica, os colares os cestos, e tecem tipóias para carregar seus filhos. É na floresta que encontram seus produtos, em que a busca é feita acompanhados ou sozinhos. É de lá que vem a palha dos cestos e das casas, as taquaras e tintas de jenipapo, corda e madeira para os arcos. Trata-se de dias seguidos de cerimônias, quando se enfeitam com colares e cintos e pinturas, a mulher do chefe cerimonial leva uma tocha que não deve ser apagada, pois indicaria que morrerão cedo e que o ser criador da humanidade (Palop) se recusaria a visitar e proteger a aldeia. No ritual do MAPIMAÍ, também acontecem os casamentos, onde a poligamia é explicita, e com o contato com a cultura da sociedade envolvente, e com o envolvimento de igrejas pode-se dizer que tenha diminuído a poligamia, mas ainda nos dias atuais encontramse indígenas casados com duas ou três esposas, sendo que antigamente encontrava-se de cinco até seis esposas. Estas costumam conviver em harmonia e paz, e negam não ter ciúmes e as mulheres não se sentem menosprezadas. Os Paiter Suruí são descritos como patrilinear, e seu sistema baseado em clãs é o que define a organicidade e os aspectos políticos desse povo, e os fortalece nas lutas por seus direitos. Na assembléia realizada no período de 10 a 12 de novembro de 2010, os Paiter suruí retomaram sua forma de organização ancestral e aprovaram durante o evento sua forma de governança. Almir Narayamoga Suruí foi escolhido o labiway e saga, líder geral do povo Paiter Suruí, (kanindé - Associação de Defesa Etnoambiental, 2011, p.6). Esse ritual que nos aparece como um dos principais marcadores territoriais, em que nele apresenta vários outros marcadores, faz com que compreendamos melhor essa comunidade. Que de acordo com Almeida Silva (2010), para o entendimento de “marcadores territoriais” que pode ser compreendida a parti dos símbolos que ocorrem enquanto espaço de ação, definem territorialidades vinculadas à cosmogonia e experiências sócio-espaciais e possibilitam a formação das identidades culturais e do pertencimento identitário. 411 Anterior ao território, a espacialidade e territorialidade que são consideradas como a ação humana sobre o espaço, mostram a aproximação física e, sobretudo de sentimentos e valores do construir, entender e olhar o mundo. Onde pode se constatar permeado de símbolos, signos, significados e representações que fazem o individuo frente ao mundo. Através de tais questões para entender que a territorialidade e a espacialidade, muito embora possuam interpretações distintas entre tais correntes epistemológicas geográficas, se constituem de um caráter identitário com seu grau de importância a parti das variáveis que estão presentes na representação e na materialidade espacial através do social, do econômico,do cultural, do ambiental e do político, pois essas categorias são igualmente portadoras de formas e representações. Os marcadores territoriais estão permeados de relações que estruturam a vida de forma que se apóiam em mitos e formas simbólicas. As experiências vividas através de espiritualidades e percepções, que aparecem juntos com sentimentos e sentidos, em que as formas dão significados como representações simbólicas que qualificam o espaço e o território, dando a dimensão das relações do espaço de ação. Esses espaços vividos, são preenchidos de conteúdos geográficos, pois são experiências pessoais ou espaço de ação. O sentido de compreender a espacialidade como representação simbólica e que atuem com importante elemento que faz entendermos as relações com o seu semelhante. Para o indígena a imagem da maloca, é como a casa é para nos urbanizados que faz a junção entre imagem e lembrança, memória e imaginação. Dessa maneira ela é ideação e pregnância, assim como a casa é para nós a memória da primeira moradia como um referencial, que não nos abandona durante a vida, a maloca tem a representação para os Paiter. E sempre voltamos a ela através de memórias ou lembranças. Nesta viajem pude presenciar um pouco do cotidiano desses moradores que lá habitam, vivenciando parte de seus problemas e conhecendo mais sobre sua história. Tive a oportunidade de conhecer o atual cacique dos Paiter Surí, Almir Narayamoga Suruí, o qual pude gravar entrevista em que fala sobre sua cultura sua organização política e sobre a luta de seu povo na busca da conservação da sua cultura e o entendimento da cultura do não indígena. Almir nos fala o que está acontecendo com sua cultura. “O que esta acontecendo com nossa cultura, é que a cada ano a cada dia, a cultura avança, porque a cultura não é uma coisa que fica parada, é uma coisa que anda, anda de forma positiva ou de forma negativa , e assim estamos trabalhando firmemente na 412 manutenção de nossa cultura e na utilização da cultura do não indígena,(Almir Narayamoga Suruí)”. Os trabalhos realizados no desenvolvimento da sua cultura, mostra a realidade da tentativa de reconstruir o que foi perdido desde a historia do contato, na busca de adaptação com uma cultura que é muito diferente da sua. As festa realizadas nos dias de hoje pode-se dizer que celebram a unidade dos Paiter Suruí, através da formação de governança, que o chamam de parlamento do Povo Paiter Suruí, fazendo com que exista envolvimento de todos os clãs, na busca de proteção, conservação e na defesa dos direitos do povo. Há quarenta e dois anos ocorreu oficialmente a história do contato com a FUNAI, os indígenas não conhecia os não indígenas, a partir do contato a sua história passa a ter sérias influências na sua cultura e no seu meio social, passando a se perder muitos dos seus costumes e deixando de praticar muitos dos seus rituais. Não sendo só a parte da cultura que foi comprometida, mas trazendo também novas doenças em que o indígena não sabia como lidar com ela, seus pajés também desapareceram passando a deixar os indígenas desacreditados em suas pajelanças e nos espíritos da floresta. Antes da história do contato os Paiter Suruí não conhecia comida temperada, comida salgada e bebidas alcoólicas, e que em outros tempos sua bebida era somente a chicha, bebida fermentada de milho ou cará. Logo após o contato muitas mudanças ocorreram no seu meio e seus hábitos alimentares já não são os mesmos, passando a substituição da alimentação tradicional por alimentos industrializados, o que produz um desequilíbrio nutricional e que causa insuficiência de vitaminas, vindo a ser a causa de muitas doenças. Com a localização de difícil acesso, os Paiter Suruí sofrem com a falta de assistência medica na aldeia, fazendo com que qualquer problema de saúde seja tratado na cidade, expondo o doente a grandes deslocamentos e ao contato com outros doentes. A alimentação tradicional é a que vem da floresta, de onde tiram os frutos, caçam e pesca, sendo que nem todos os animais fazem parte de seus hábitos alimentares, pois não fazem parte de sua cultura, e plantam algumas raízes para sua subsistência. Na aldeia Apoena Meireles, encontra-se algumas cabeças de gado que alguns Paiter Suruí criam para sua alimentação; os trabalhos feitos na manutenção da terra para o plantio é feito em grupo sendo que cada um tem sua parte. A evangelização existe desde a época que os brancos começaram a fazer contato com indígenas, mas que tem aumentado muito nos últimos anos. O cacique informa que recentemente teve que permitir a construção de uma igreja na aldeia para evitar 413 desentendimento entre seu povo, visto que grande parte deles estão sendo evangelizados fazendo com que haja uma grande mudança em sua cultura, porque com esse processo muitos de seus costumes passam a ser considerados pecado. Dessa forma deixaram de ser realizadas varias manifestações culturais como danças, festas e casamentos tradicionais. As crianças de hoje estão expostas como nunca esteve nenhuma geração anterior, a aprendizagem não é mais como as anteriores, realizar faz parte de aprender. A habilidade para fazer merecer tanto credito quanto a capacidade de armazenar a informação recebida. Em se tratando da educação os Paiter Suruí dão muita importância a esse assunto, no entanto, alguns iniciaram o ensino superior, sendo os primeiros indígenas do estado de Rondônia aprovados no vestibular em Porto Velho. A aldeia dispõe de uma pequena escola, onde as aulas são ministradas pelo corpo docente paiter Suruí em que crianças tem acesso, alguns professores dão cursos de alfabetização e matemática para os adultos. A construção de uma escola chegou a ser iniciada com uma estrutura um pouco maior, a obra encontra-se em fase terminal e atualmente a obra esta parada. 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Este trabalho busca apresentar dados que contribua para os estudos sobre a variabilidade cerâmica do Alto rio Madeira, através dos estudos das cerâmicas dos sítios Santa Paula e Teotônio encontrados recentemente no Alto rio Madeira no âmbito do Projeto de Arqueologia Preventiva da UHE Santo Antônio, RO. Palavras Chaves: Cerâmica. Teotônio. Santa Paula. INTRODUÇÃO As pesquisas no campo da arqueologia ocorrem no estado de Rondônia desde os estudos pioneiros que Eurico Theofilo Miller desenvolveu na região entre 1970 e 1980, percorrendo grande parte do estado, evidenciando diversos sítios arqueológicos no âmbito do Programa Nacional de Pesquisas Arqueológicas da Bacia Amazônica (PRONAPABA) (Miller, 1987; Miller et alli,1992; Miller e Meggers 2003). Atualmente a demanda de pesquisas arqueológicas no estado cresceu principalmente em decorrência da construção de duas grandes usinas no rio Madeira (UHE Santo Antônio e UHE Jirau), além das diversas Linhas de Transmissão de Energia (Scientia, 2008). Nesse sentido, o projeto de “Arqueologia preventiva nas áreas de intervenção da UHE Santo Antônio” vem sendo desenvolvida pela Scientia Consultoria Cientifica desde 2008. Além dos 32 sítios já cadastrados pelo pesquisador Eurico Theofilo Miller, foram evidenciados outros sítios pré-cerâmicos, cerâmicos e históricos nas margens do rio Madeira, dentre os quais está o sítio Santa Paula que se encontra na margem esquerda e o sítio Teotônio na margem direita do rio Madeira, ambos localizados em frente à cachoeira Teotônio em área de terraço. 87 88 Aluno do Curso de Arqueologia da Fundação Universidade Federal de Rondônia/UNIR. Professor do Departamento de Arqueologia- DARC/UNIR. 416 Figura 1: Croqui de delimitação do sítio arqueológico Santa Paula, e em frente o sítio Teotônio (Michelle Mayumi Tizuka 2012). . Ambos os sítios arqueológicos foram evidenciados e cadastrados no IPHAN em 1979 pelo arqueólogo Eurico Theofilo Miller , sendo o sitio Santa Paula com o nome de Porto Seguro e Teotônio RO-JP-01, definidos como sítio habitação, com forma elipsoidal e sua cultura material pertencente à subtradição Jatuarana, da tradição com Policroma da Amazônia, datada na região entre 2.730 a 2.340 a. P. No dia 25 de novembro de 2011, na I Semana de Arqueologia da Fundação Universidade Federal de Rondônia, em uma conversa com o pesquisador Eurico Miller, ele relatou que o sítio Santa Paula já havia sido cadastrado por ele com o nome de Porto Seguro, o qual ele classificou como subtradição Jatuarana atribuída à tradição Policroma da Amazônia perante o IPHAN. O sitio Santa Paula está localizado em uma área de terraço fluvial, sua vegetação composta por arbustos espinhosos, árvores de pequeno e médio porte assim como algumas palmeiras e áreas destinadas a prática de plantio e campo de futebol. No ano de 2009 foi realizada a delimitação do sítio e escavadas duas unidades amostrais de 1x1m no âmbito do projeto Arqueologia preventiva nas áreas de intervenção do AHE Santo Antônio, RO. A delimitação consistiu na realização de furos testes obedecendo a uma malha de 20 x 20m, totalizando 220 furos testes (176 positivos e 47 negativos). A unidade de escavação 3826319021469 localiza-se na área mais central do sitio e a 382670 - 9021310 na porção sul do sitio, ambas abertas nos locais com maior concentração de material arqueológico, escavadas em níveis artificiais de 10 cm O sítio apresentou um extenso pacote de terra preta antropogênica com profundidade de 2,1 m e alta densidade de material cerâmico, lítico e alguns fragmentos ósseos (SCIENTIA, 2009). 417 Neste trabalho abordamos o material cerâmico da unidade 382631- 9021469 desse sítio, escavada até 2,50 m, onde foram identificadas sete camadas sedimentares no perfil oeste, denominadas de I a VII, da base para o Topo, caracterizadas da seguinte forma (Scientia, 2009), visualizadas no croqui abaixo. Figura 2: Croqui digitalizado do Perfil oeste da sondagem 382631 - 9021469 (Arte Final: Crisvaldo Cássio de Souza, 2009) A camada arqueológica esta concentrada nas camadas II, III, IV, V, VI, VII, com alta densidade de material arqueológico. Com os carvões coletados nesta unidade, foram realizadas datações absolutas em rádiocarbono (C 14). Estes são provenientes das camadas II, III e IV do perfil Norte. As datas variam de 1.520 a 1550 AP, com margem de erro de 30 a 40 anos para mais ou para menos. 418 Tabela 1: datações absolutas para o sítio Santa Paula Amostra PN Unidade Nível Obs. Datação SAPA 1124.4 382631/ 9021469 X = 18 Z = 103 Perfil norte 15030 + ou - 30 SAPA 1124.2 382631/ 9021469 X=40 Perfil norte 15030 + ou - 30 Perfil norte 1520 + ou - 40 SAPA 1124.3 382631/ 9021469 Z = 181 X = 40 Z = 203 Fonte: Scientia 2011 Estes dados não corroboram com alguns estudos anteriores relacionados aos sítios arqueológicos pré-coloniais da Amazônia, especificamente no estado de Rondônia, em que autores retrataram a região como inadequada para assentamentos permanentes, pois segundo eles não possuíam subsídios alimentares ricos em proteínas para estas populações sedentárias sobreviverem (Meggers, 1990; MILLER, 1992). Estes estudos relatam à rápida perca dos nutrientes do solo devido ao uso continuo e com poucas áreas de solo cultivável, dentre outros fatores, os quais são responsáveis pelas pequenas concentrações populacionais, e desta forma, os sítios de terra preta seriam produtos de reocupações. Nesta perspectiva, as populações amazônicas não seriam sedentárias devido à manutenção de um sistema de permanência que seria incapaz de manter adensamentos sedentários, devido à limitação ambiental. Pesquisas recentes na Amazônia têm demonstrado o contrário, que a Amazônia foi densamente ocupada por grupos por longos períodos de tempo. Nessa perspectiva, Neves afirma que: Na Amazônia, a natureza não oferece necessariamente um limite contra o crescimento demográfico ou a emergência da complexidade social, já que a natureza é parcialmente um produto da ação humana e não uma variável externa totalmente independente. Tal constatação é sugestiva o suficiente para lançar dúvidas ao determinismo ambiental extremo que caracteriza as pesquisas arqueológicas realizadas na Amazônia sob a influência de Meggers (NEVES 1999 - 2000, p. 95). O sítio arqueológico Teotônio RO-JP-01 possui uma data de 2730+ou-75 BP (Miller 1992), atribuído a subtradição Jatuarana atribuída à tradição Policroma da Amazônia (Miller, 419 1999). A vegetação é formada por uma mata de porte pequeno (“capoeira”) recente, que ainda preserva alguns pés de tucumãs e piquiá. Entretanto, a área bem impactada pela ação do plantio de alguns produtos agrícolas como a mandioca, a instalação de áreas de moradias, e a extração de terra preta para fins comerciais e de adubação. (Scientia, 2011). No ano de 2009, foi realizada a delimitação deste sítio. Na sua área onde está a maior concentração de terra preta e de material arqueológico foi escavada uma área de 2 m x 2,6 m denominado “Setor Estrada”, abordado neste trabalho. A escavação desta área foi realizada em 2010 quando, após os trabalhos de aperfeiçoamento da estrada ficaram visíveis duas circunferências, e moradores ao passarem pelo local avistaram as mesmas e rapidamente entraram em contato com a Scientia consultoria responsável pelas pesquisas arqueológicas nas áreas de impacto direto e indireto da UHE Santo Antônio. Ao chegar ao local foi constatado que se tratava de três vasilhas e não duas. A escavação (Coordenada UTM 20L 0383270 / 9019954) foi realizada em níveis artificiais de 20 x 20 cm, aprofundando até 60 cm evidenciando todo o perfil das vasilhas. A escavação revelou duas camadas: camada A que corresponde ao nível de 0 a 40 cm escavado, a coloração do sedimento foi classificado como 10YR 5/6 (yellowish brown), sua textura e argilo-siltoso, muito compacto, com uma alta concentração de raízes e presença de material arqueológico. A camada B, que corresponde ao nível 40 a 60 cm escavado, coloração 10YR 5/8 (yellowish brown), textura e argilo-siltosa com compactação alta, presença de grânulos, seixos e blocos lateríticos, e material arqueológico. A escavação foi interrompida ao chegar no embasamento laterítico. Após o termino da escavação com o perfil das vasilhas evidenciadas, estas foram retiradas. A vasilha 2 apresenta-se semi-inteira, com presença de fragmentos da parede, base e borda. Parte da boca da vasilha estava orientada para o oeste, e como estava fragmentada, foram coletados os seus fragmentos. Já as vasilhas 1 e 3 foram retiradas com o sedimento, transportadas até o laboratório, onde foram escavadas. Onde foram encontrados fragmentos ósseos (não identificados), cerâmicos como fragmentos de assador (bijuzeiro) e líticos (não analisados ainda) ambas contendo furo na base possivelmente relacionado a contexto funerario. 420 Figura 3 - Vasilhas 1, 2 e 3 evidenciadas Vasilha 3 Vasilha 2 Vasilha 1 Nesse projeto analisamos uma amostra do material cerâmico do sítio Teotônio mais precisamente o Setor Estrada, bem como da unidade 382631 9021469 do sítio Santa Paula, buscando semelhanças /diferenças nos conjuntos de artefatos cerâmicos de ambos, bem como as relações entre ambos os sítios, tendo em vista que estão localizados em área de terraço relativamente alta e extensa nas duas margens do rio, um em frente ao outro. Levantamos algumas questões tais como: será um único grupo ocupando as duas margens? São ocupações contemporâneas? Seriam vários grupos ocupando o mesmo espaço em ambas as áreas? MATERIAL E MÉTODOS Foram triados e analisados materiais provenientes da unidade 20L 9021469 E 382631, localizada na área mais central do sítio Santa Paula, totalizando 1.997 fragmentos cerâmicos, dentre os quais 667 são diagnósticos e foram analisados. E do sitio Teotônio foram analisados 490 fragmentos incluindo todos os fragmentos encontardos no interior das vasilhas 1 e 3 e a analise das três vasilhas proveniente da unidade 20L 383270/ 9019954, localizada no Setor Estrada. A triagem consiste na separação do material cerâmico em diagnósticos e não diagnósticos. Os fragmentos diagnósticos são todos aqueles que fornecem informações sobre as formas (bordas, bases, ombros, carenas, bojo, além de peças modeladas e apêndices), 421 acabamentos de superfície (plásticos e pintados) e marcas de uso. Na análise tecnológica realizada com os fragmentos diagnósticos, são analisados 46 atributos que caracterizam as escolhas das ceramistas em relação à pasta, técnicas de confecção, acabamentos de superfície, queima, formas e usos, visando compreender a variabilidade do material cerâmico do sítio Santa Paula. Os atributos constam em uma ficha de analise desenvolvida no projeto “Variabilidade cerâmica nos sítios arqueológicos pré-coloniais do Alto rio Madeira, RO” (Zuse, 2011), A construção da ficha foi baseada na seguinte bibliografia: Shepard (1995), Rye (1981), Rice (1997), Orton (1997), Chymz (1976), La Salvia e Brochado (1989), Brochado, Monticelli e Neumann (1990) e Brochado e Monticelli (1994). Além destas obras, são considerados também trabalhos mais recentes etnoarqueológicos como o de Silva (2000) e de experimentação cerâmica (Cerezer, 2009) que fornecem subsídios para a escolha dos atributos (Zuse, 2011). RESULTADOS A análise do material cerâmico do sítio Santa Paula não mostrou nenhuma mudança brusca quanto à manufatura dos vasilhames, técnica de produção, escolha do antiplástico, acabamento de superfície, tratamento plásticos e motivos ao longo do período de ocupação, desde os níveis mais profundos até os mais superficiais. Em relação a cultura material cerâmico foram identificados no sítio vasilhas utilizadas para cozinhar com bordas extrovertidas e diretas inclinadas externamente com diâmetro variando entre 14 a 38 cm. Ocorre vasilha extrovertida com diâmetro 12 cm com pintura vermelha e branca para fermentar bebida e vasilhas com formas abertas e rasas com bordas diretas inclinada externamente com formas semelhantes a pratos com diâmetro variando entre 10 a 20 cm, utilizadas possivelmente para servir. As decorações com tratamentos plásticos são inciso, inciso e ponteado, apliques, inciso e aplique, bem como flanges. E em relação à pintura, ocorre as cores vermelha e branca e vermelha associada a inciso. Assim como o sítio Santa Paula, os dados da analise do material cerâmico do sítio Teotônio provenientes da unida 20L 383270/ 9019954 localizada no Setor Estrada, não apresentam mudanças nas escolhas tecnológicas de manufatura dos artefatos, ocorrendo em sua maioria à adição do cariapé e carvão, em menor quantidade o cauixi na composição da pasta, sendo este antiplástico ligado a uma determinada forma de vasilha. O mineral encontrado é o quartzo muitas das vezes acompanhado de hematita (oxido de ferro) grãos 422 finos/baixa inclusão, a queima em sua maioria reduzida, em menor quantidade as oxidantes assim como as com duas faixas oxidantes e núcleo reduzido; o acabamento de superfície sendo predominante o alisamento fino em ambas as faces assim como polimento em ambas as faces e em menor densidade o alisamento médio e grosseiro; também foi possível observar que diferente do sítio Santa Paula a ocorrência de barbotina e bem menor; já em relação ao tratamento plástico os dados corroboram com que (Miller, 1992) diz a respeito da subtradição Jatuarana já citado anteriormente. As bordas analisadas estão muito fragmentadas, não sendo possivels eparar conjuntos hipotéticos de vasilhas; ocorrem duas bordas extrovertidas com diâmetro de 18 a 22 cm; e destaca-se um fragmento de assador para processar alimentos que não foi possível identificar o diâmetro (todas estas possuem antiplástico de cariapé). Em relação aos tratamentos plásticos, incidem incisos e aplique zoomorfo (parece ser um peixe). Figura 4: a esquerda zoomorfo e a direita fragmento de assador. Nas vasilhas grandes (1 e 3) utilizadas possivelmente para enterramento, não foi possível identificar a forma completa porque estavam sem a borda (removida pelo maquinário que fez a estrada), mas ambas possuem pasta composta por cauixi e um furo na base, possivelmente ligado ao campo simbólico do grupo. A Vasilha 2 possui pasta de mineral com forma aberta e base plano-côncava, diferente morfologicamente das outras duas. Nas primeiras pesquisas realizadas na região do Alto rio Madeira, o arqueólogo Eurico Miller (1987) estabeleceu a subtradição Jatuarana. As vasilhas que compõem esta Subtradição variam de tigelas com e sem tratamento de superfície, bijuzeiros, vasos, globulares, carenados e urnas funerárias antropomórficas. A “decoração” plástica é composta por exciso, inciso, ponteado, ponteado-arrastado, ungulado, serrungulado, acanalado, estampado, carimbado, isolados ou combinados entre si e com policromia associados a apliques zoomórficos, antropomórficos, flanges, alças, azas e outros artifícios. A decoração policroma nesse caso consiste de um prévio engobo branco, sobre o qual são aplicadas as 423 cores preta, marrom, amarelo, laranja, vermelho e magenta, em desenhos geométricos-zooantropomórficos (Miller, 1987). Como já foi dito acima, Miller (1987) definiu as camadas de terras pretas encontradas ao longo do rio Madeira e vinculadas a subtradição Jatuarana como processos de reocupações, ou seja, seriam sítios habitações de povos semi-sedentários. No entanto, os contextos evidenciados recentemente e as datas obtidas para uma das unidades escavadas no sítio Santa Paula (382631/9021469) demonstra uma intensa ocupação contínua associada a cerâmicas e terra preta. A análise da cultura material corrobora com que o (Miller 1992) diz a respeito da subtradição Jatuarana e suas semelhanças à tradição Guarita da Amazônia Central, ocorrendo fragmentos pintados e associados a tratamentos plásticos, principalmente incisos e ponteado, com antiplástico predominante sendo o cariapé, e cauixi em menor quantidade; o acabamento de superfície predomina o alisamento fino, acompanhado do polimento, e em menor proporção alisamento médio e o alisamento grosseiro. REFERÊNCIAS BROCHADO, J.P. MONTICELLI, G. Regras praticas na reconstrução gráfica da cerâmica Guarani por comparação com vasilhas inteiras. Estudos Ibero-Americanos, Porto Alegre, 20(2). p. 107-118, 1994. BROCHADO, J.P; MONTICELLI, G. & NEUMANN, E. Analogia etnográfica na reconstrução gráfica das vasilhas Guarani arqueológicas, Veritas, Porto Alegre, 35 (140). p. 727-743. 1990. CARNEIRO, Robert L. A base ecológica dos cacicados amazônicos. Tradução: Denise P. Schaan. 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São Paulo, 2011. 426 AGRADECIMENTOS À Scientia Consultoria Científica; Ao Dr. Renato Kipnis, coordenador do Projeto de Arqueologia Preventiva na UHE Santo Antônio, RO; aos colegas de campo e laboratório pelos relatórios, desenhos, fotos e croquis. 427 ESTADO PENAL MÍNIMO E DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA Eletícia Aline e S. de Rezende¹ Vinício Carrilho Martinez² RESUMO A presente pesquisa visa uma abordagem inicial acerca do Estado, sua evolução e transformações na sociedade, principalmente no que compreende à formação do Estado moderno e instituição do Estado Democrático de Direito, fato que culminou na gênese do princípio da dignidade da pessoa humana, um dos objetos da temática a ser desenvolvida. Analisa-se também a questão metamórfica das penas no decorrer da história, o que serviu de base para a breve explanação do Direito Penal no contexto atual, mais precisamente na figura do Estado Penal. Feito isso, insere-se o assunto sobre o Minimalismo Penal, alternativa em detrimento do sistema penal, com suas principais características e princípios, destacando-se e aprofundando-se o mais importante deles: o princípio da dignidade da pessoa humana. Palavras-chave: Minimalismo Penal. Dignidade Humana. Estado Penal. INTRODUÇÃO Aos passos do desenvolvimento e evolução da sociedade no transcorrer da história, acompanha-se também o nascimento e metamorfose de uma das mais importantes instituições já originadas: o Estado. Firmado à base de lutas e aprimorado por revoluções, tem como uma de suas principais funções organizar e disciplinar a vida social através do uso de seu respectivo ordenamento jurídico. Apesar de lhe ser conferido poder político (soberania), o Estado não pode agir arbitrariamente, de modo que se encontra limitado por uma das maiores conquistas da humanidade: a Constituição, conjunto de normas e princípios que possui, dentre outras finalidades, assegurar e efetivar o cumprimento dos direitos e garantias fundamentais. O mesmo Estado provedor e garantidor, também é o Estado que fornece proteção à sociedade por meio da aplicação de sanções àqueles que transgridam o ordenamento jurídico vigente, colocando em risco o bem comum. Para que isto ocorra, entra em cena o Direito Penal na figura do Estado Penal, aparelho repressor estatal que utiliza de seu aparato coercitivo com a finalidade de combater a criminalidade e conter o avanço da violência. Para que este fim seja alcançado, o Estado Penal muitas vezes atropela os próprios princípios que o amoldaram e limitaram, fazendo isso por meio da política repressiva estatal, seja através do endurecimento de penas, investimento no aparato policial, construção de novos estabelecimentos prisionais, etc. ¹ Acadêmica de Direito na Universidade Federal de Rondônia/ Bolsista PIBIC/ CNPq ²Professor do Departamento de Ciências Jurídicas da UNIR e coordenador do grupo de pesquisa Estado Penal 428 Em meio a essa situação questiona-se a existência de alternativas mais brandas e realmente eficazes, pois apesar da sólida estrutura penal, o próprio Direito Penal acaba que por não cumprir de maneira definitiva uma de suas principais funções, que seria a ressocialização do indivíduo transgressor da ordem social. Uma das possíveis soluções começou a ser discutida por volta da década de 60, funcionando como uma verdadeira crítica à problemática penal. Constitui-se, desse modo, o movimento do Minimalismo Penal, tendo como pilares os princípios da intervenção mínima e da dignidade da pessoa humana. Justifica-se, portanto, o presente estudo em analisar teoricamente de que forma as diretrizes constitucionais e sócio-políticas são capazes de uma recepção convincente e eficaz dos princípios ditados pelo denominado Estado Penal Mínimo, notadamente o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Trata-se de efetuar pesquisa teórica e empírica que vislumbre a formação de massa crítica participativa e produtiva socialmente, sendo capaz de analisar e correlacionar criticamente, os entremeios entre normas sociais e normas jurídicas. Analisar teoricamente de que forma as diretrizes constitucionais e sócio-políticas são capazes de uma recepção convincente e eficaz dos princípios ditados pelo denominado Estado Penal Mínimo, notadamente o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Sob este prisma, trata-se ainda de antepor esta concepção humanista à incursão repressora do chamado Estado Penal. ANTECEDENTES HISTÓRICOS DO ESTADO Várias são as teorias e suposições que abordam sobre uma das instituições considerada mais importante na história da humanidade: o Estado. A doutrina de Dalmo de Abreu Dallari (1998) aponta para três possíveis hipóteses: a de que o Estado sempre existiu, a de que a sociedade existiu durante algum tempo sem o Estado, tendo este surgido bem depois por diversos motivos e, uma terceira posição que afirma que o Estado seria a sociedade política dotada de características e peculiaridades próprias. Quanto à sua composição, é formado, basicamente, por três elementos: a população ou povo, compreendido como o conjunto dos homens pertencentes a um Estado, o território, espaço onde o poder estatal há de se manifestar na forma específica de poder público e, a soberania, poder de associação que ordena e dirige as ordens do Estado destinadas à população que habita em seu território (SOARES, 2004). No tocante à sua evolução, um de seus períodos mais notáveis talvez se resuma ao compreendido pelo Estado Moderno. Durante essa fase, o Estado passou por várias 429 transformações, passando de uma figura absoluta no período do Estado Absoluto, considerado o princípio do Estado Moderno e, que estava alicerçado em uma base dotada de poder centralizado e militarizada. Com a decadência do feudalismo, seguida pela ascensão da classe burguesa, sentia-se a necessidade de poder intervir nos caminhos do Estado e para tanto, precisava-se possuir direitos políticos. A partir daí, o Estado absoluto passa a ter seus poderes limitados na carta constitucional, ocorrendo também a separação de poderes e a garantia dos direitos individuais. Surge o denominado Estado de Direito ou Estado Liberal de Direito. Sucedendo o Estado de Direito e deixando para trás a capa do neutralismo, efetivando a justiça social, surge o Estado Social de Direito, defendendo a afirmação dos direitos sociais e prezando pela efetivação da justiça social (SILVA, 2010). Logo após, deu-se o advento de uma das formas mais relevantes do Estado Moderno: o Estado Democrático de Direito. Este, que teve como objetivo principal realizar a democracia como garantia geral dos direitos fundamentais da pessoa humana. O principal legado do Estado Moderno foi a transição do Estado absoluto para o Estado constitucional, este composto tanto pelo Estado de Direito quanto pelo Estado Democrático. A positivação do Estado ocorreu por meio do fenômeno do Constitucionalismo, cuja origem formal se remete à Carta Magna dos Estados Unidos (1787), após a Independência das 13 Colônias, e ao texto constitucional da França (1791), a partir da Revolução Francesa, possibilitando aos cidadãos exercerem livremente, sem a capa opressora do Estado, seus direitos e garantias fundamentais tendo por base as constituições escritas. Para Bulos (2011), a Constituição significa, dentre suas outras conceituações, o “complexo normativo que disciplina a organização do Estado, a origem e o exercício de poder, a discriminação das competências estatais e a proclamação das liberdades públicas”. Resumidamente, é a norma mestra que conduz a sociedade. MINIMALISMO PENAL Em sua origem mais primitiva, a pena significava um tipo de vingança, funcionava como um revide à agressão sofrida, sendo totalmente desproporcional à ofensa e aplicada sem preocupação de justiça. Em uma ótica mais contemporânea, contempla-se a definição de Direito Penal, ramo do Direito Público que corresponde ao sistema de princípios e regras pelos quais o Estado tipifica as condutas de cunho criminal, ou seja, quando determinada conduta fere os valores considerados primordiais à ordem social, o Poder Público pode e deve 430 intervir por meio de sanções penais aplicadas aos transgressores, sejam elas penas ou medidas de segurança (REALE, 2010). Mesmo que a matéria penal atue com o direito de punir (uma das finalidades da própria pena), busca-se a proteção dos direitos do homem e a humanização da justiça, concordando o Direito Penal com os Direitos Humanos e preservando a figura do apenado contra os possíveis tratamentos abusivos sofridos durante sua permanência no sistema prisional. Embora o Direito Penal se preocupe com a proteção dos direitos do homem e a humanização da justiça, o que ocorre na prática, em uma considerável parte dos casos, acaba sendo algo totalmente oposto à essa proposta. O que há, então, é uma deslegitimação do sistema penal, que coloca à mostra suas inúmeras falhas. O sistema penal vigente está baseado na doutrina “bem x mal” do maquineísmo medievo, polarizando, dessa forma, a sociedade e seu pensamento. É também estruturalmente incapaz de cumprir determinadas funções que o legitimam, como proteger bens jurídicos tutelados por ele e, combater e prevenir a criminalidade, por exemplo. Além de atuar seletivamente, uma de suas outras finalidades nada mais é que “fabricar os criminosos” (ANDRADE, 2006). O que pode ser constatado é que há um gasto e preocupação maior por parte do Estado no investimento em políticas criminais, seja por meio do aumento do efetivo policial, ou da construção de novas unidades prisionais, da instituição de políticas de lei e ordem, do endurecimento de penas, da criminalização de condutas que poderiam ser tratadas pelos outros ramos do Direito, etc. Como uma crítica e também uma possível solução à toda problemática produzida pelo punitivismo, surge durante a década de 60 do século XX, um movimento que defendia o cumprimento e efetivação das garantias formais e principalmente materiais do indivíduo, com fundamento no Estado Democrático de Direito: o Minimalismo Penal (CIT, 2010). O objeto do minimalismo não é, portanto o Direito Penal, ou muito menos ocasionar a extinção da punição no formato da pena, como no caso do pensamento abolicionista. Mas, é aniquilar o sistema penal, síntese do poder punitivo do Estado e sua engenharia punitiva (ANDRADE, 2006). Tem por base tanto o princípio da intervenção mínima, com seu caráter fragmentário e subsidiário, quanto o princípio da dignidade da pessoa humana. 431 DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA Princípio que teve por inspiração diversos documentos com espírito reformista, como a Magna Carta (1215), Petição de Direitos (1629), Habeas Corpus Act (1679), Bill of Rights (1689), Constituição americana (1787) e Constituição francesa (1791), consagrou-se no plano internacional com a edição da Declaração dos Direitos Humanos no ano de 1948 (GUERRA, 2010). No ordenamento jurídico brasileiro está prevista no inciso III do art. 1º da Constituição Federal de 1988. Se expressa em alguns outros artigos da CF/88, como os incisos do art. 5º que abordam sobre: a prática do racismo (XLII); crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes, terrorismo e crimes hediondos (XLIII); cumprimento da pena (XLVIII); seguridade dos direitos do preso quanto à sua integridade física e moral (XLIX) e, assegurar condições necessárias para que as presidiárias permaneçam com seus filhos durante o período de amamentação (L). Apesar da criação de tratados internacionais e outros documentos que exaltam os princípios basilares do Estado Democrático de Direito, valorizando e promovendo a dignidade da pessoa humana frente às possíveis ameaças a serem sofridas, ainda assim, são constatadas inúmeras violações ao mesmo ordenamento jurídico, ocasionando um retrocesso, uma negação dos próprios direitos anteriormente previstos e considerados tão essenciais. Um dos casos mais relevantes, que marcou o sistema penitenciário brasileiro, foi o ocorrido na casa de detenção José Mário Alves Filho, popularmente conhecida como “Urso Branco” e construíra na capital do estado de Rondônia no ano de 1990. Sempre foi considerada uma unidade marcada pela instabilidade e violência, fato comprovado nas rebeliões e mortes (cerca de 100) durante o período de 2000 a 2007. Frente a todo esse contexto de revolta e violência, o Brasil foi denunciado à Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), pela Justiça Global e Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de Porto Velho, no qual o país sofreu uma série de sanções em virtude dos acontecimentos. Os relatórios compostos nos período de 2007 e 2011 pelos membros dessas instituições que visitaram a unidade, retratarem a presença de inúmeras irregularidades, como: - superlotação; - precariedade ou até mesmo a falta de atendimento médico e odontológico; - abastecimento de água precário, visto que a água para o consumo não é filtrada e ao que tudo indica está contaminada; 432 - kit de higiene fornecido de forma irregular, obrigando os presos a compartilharem materiais de uso pessoal, ficando expostos a qualquer tipo de contaminação; - precariedade no serviço de limpeza, ocasionando acúmulo de lixo ao redor das celas; - insalubridade na estrutura do presídio, ocasionada pela umidade excessiva, infiltrações, entre outros problemas, o que torna a habitabilidade nas celas quase que impossível; - falta de colchões; - denúncias de abusos sofridos pelos presos da parte dos agentes; - ausência de atividade laboral ou educativa, ficando os presos completamente ociosos. Toda essa situação contraria o disposto tanto na Constituição Federal de 1988, mais especificamente nos incisos III e XLIX, onde estão previstos, respectivamente, que “ninguém será submetido a tortura nem tratamento desumano ou degradante” e “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”. Também se mostra oposta ao previsto na Lei de Execução Penal (LEP), cujo um dos pilares é o princípio da dignidade da pessoa humana. Essa lei tem por essência cumprir uma das mais importantes funções do Direito Penal, que é a reinserção do apenado na sociedade. Observa-se também a atuação do Estado Penal, que se preocupa mais na questão da repressão por meio da punição, do que com o cumprimento de princípios fundamentais e das próprias normas por ele criadas, salvaguardando os direitos dos presos, tratando-os de forma digna e não como a escória da sociedade. Não é porque uma pessoa comete um crime, que o Estado deixará de assegurar os direitos e garantias que foram conquistados à sangue e suor ao longo da história da humanidade. Após as denúncias e exigências de mudanças, atualmente, segundo informações colhidas no site do Tribunal de Justiça de Rondônia, a situação do Urso Branco é um pouco menos caótica se comparada ao estado anterior. Pode-se inferir que é um presídio que está sob controle e que procurar atender, dentro das possibilidades, as normas referentes ao tratamento de reclusos e aos padrões da Lei de Execução Penal (LEP). CONSIDERAÇÕES FINAIS Apesar das conquistas advindas do Estado Democrático de Direito, como a seguridade e efetivação dos direitos e garantias fundamentais, juntamente com um dos princípios basilares do ordenamento jurídico estatal, o princípio da dignidade humana, observa-se a negação do mesmo em diversas proporções. Este fato pode ser verificado na 433 abordagem sobre o caso Urso Branco e, não somente a este, como também essa realidade pode ser ampliada à outras instituições Brasil e mundo afora. Nega-se a dignidade quando não só é oferecido um tratamento precário aos apenados, mas principalmente, quando é aniquilada grande parte de seus direitos, além dos previstos pela legislação penal. Isso ocorre quando é negado o acesso a serviços básicos como saúde, boa alimentação, educação e trabalho, por exemplo, tão essenciais e inerentes a qualquer pessoa seja ela em qual condição estiver. Uma das consequências dessa realidade é a própria deslegitimação do cárcere, que funciona apenas como um mero depósito de indivíduos considerados nocivos para a sociedade. Constata-se também que ao invés de aproximar e reinserir o apenado na sociedade, o Estado Penal faz justamente o contrário, estigmatizando e degenerando ainda mais quem está do lado de dentro do cárcere e alimentando a instabilidade e segurança de quem está do lado de fora. Partindo do exposto, conclui-se que a solução para essa problemática não se encontra no crescimento do Estado Penal e suas formas repressivas, mas justamente em outras possíveis alternativas, como por exemplo o minimalismo e, acima de tudo, respeitando e cumprindo de forma plena e não em partes, o próprio ordenamento jurídico instituído no território. REFERÊNCIAS ANDRADE, Vera Regina Pereira. Minimalismos e Abolicionismos: a crise do sistema penal entre a deslegitimação e a expansão. Revista da ESMEC, Vol. 13, Nº 19, 2006. BARATTA, Alessandro. Princípios do Direito Penal Mínimo. DOCTRINA PENAL. TEORIA E PRÁTICA EM LÃS CIÊNCIAS PENAIS. ANO 10,N. 87, P. 623-650 (Traduzido por Francisco Bissoli Filho). 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Ressalta-se que não só buscou-se descrever a manifestação destes mal-estares e sintomas, mas compreender as estratégias de enfrentamento do sofrimento, bem como realizar uma cartografia deste mal-estar subjetivo, circunscrevendo suas expressões e considerando a realidade singular de Porto Velho/RO. Palavras-chave: SPA/UNIR. Mal-estar subjetivo. Capitalismo. Pós-modernidade. Pacientes do INTRODUÇÃO Este estudo foi construído a partir de um diálogo entre referenciais psicanalíticos e sociológicos, na busca da compreensão da dinâmica do mundo pós-moderno e suas implicações subjetivas. Pretendeu-se evidenciar as consequências que a ávida vida para o consumo, para a estetização, para o modismo e para tantas demandas capitalistas acarretam para o sujeito, apontando a estreita ligação que existe entre as mudanças culturais, sociais e psíquicas. Trata-se de pensar nos destinos do desejo na atualidade já que os destinos nos permitem captar o que se passa nas subjetividades. Com isso podemos nos aproximar do que há de sofrente nas novas formas de subjetivação, circunscrevendo então o campo do mal-estar contemporâneo. (BIRMAN, 2000, p.17) 89 Acadêmica do 5º período do curso de Psicologia da Fundação Universidade Federal de Rondônia – UNIR. [email protected] 90 Profª Drª do curso de Psicologia da Fundação Universidade Federal de Rondônia - UNIR - e orientadora desta pesquisa. [email protected] 436 Esta pesquisa qualitativa visou analisar a estreita relação dialética entre o sujeito e o mundo objetivo, buscando compreender o mal-estar subjetivo de sujeitos que apresentaram algum tipo de sofrimento vinculado às questões de desamparo, consumismo, descontentamento afetivo e estético, e que buscaram suavizar seus sofrimentos por meio de atendimento psicológico oferecido pelo Serviço de Psicologia Aplicada (SPA) da Universidade Federal de Rondônia (UNIR) na cidade de Porto Velho/RO. A escolha dos cinco colaboradores foi feita através da seleção das fichas de triagem dos pacientes que aguardavam por atendimento psicoterápico no SPA, na qual foram analisados apenas quatro, sem distinção de sexo e acima de 18 anos de idade. Para a obtenção de informações utilizou-se a técnica de entrevista, pois esta se caracteriza como um encontro interpessoal estabelecido para a obtenção de informações verbais e não verbais, como expõe Bleger (1993, p.16-17) “aquilo que não nos pode dar como conhecimento explícito, nos é oferecido ou emerge através do seu comportamento não-verbal [...].” Já no tratamento dos dados seguiram-se os pressupostos teórico-metodológicos de Turato (2003) em diálogo com as acepções de Bardin (1977) no que tange a questão da análise de conteúdo com ênfase na temática, seguindo os três pólos cronológicos: pré-análise, exploração do material, a inferência e interpretação dos resultados, que proporcionou realizar uma cartografia do malestar subjetivo, no sentido delimitar as coordenadas dos mal-estares subjetivos, desenhando o campo sofrente do sujeito portovelhense. MODERNO PÓS MODERNO A palavra ‘moderno’ origina-se do baixo latim modernus, que significa recente. Por volta do século XIX com o processo de mercantilização exacerbado a originalidade assume um valor significativo para o comércio. Surge então, a necessidade de objetos diferentes que valeriam mais. Necessidade criada por um mercado ávido por lucros. Esse modernismo que antecede a Primeira Guerra Mundial foi uma reação às novas condições de produção, circulação e consumo. A manutenção da lucratividade impulsiona o mercado, que apressa os capitalistas a se aproveitarem de todos os novos tipos de possibilidades de ganho. Diante deste evidente avanço do capitalismo, que interfere diretamente no cotidiano do sujeito, surge à necessidade de analisar os efeitos e as possíveis transformações na subjetividade. É nesta conjuntura que se instala a pós-modernidade, para Jamerson “o pósmodernismo não é senão a lógica cultural do capitalismo avançado” (JAMERSON apud HARVEY, 2009, p. 65). Harvey (2009, p. 306) concorda com o pressuposto ao afirmar que o 437 capital não é algo estático, mas “um processo de reprodução da vida social por meio da produção de mercadorias em que todas as pessoas do mundo capitalista avançado estão profundamente implicadas.” Netto (2005, p. 33) relata que em segundo momento definiu-se uma estética da publicidade, utilizando-se de conceitos como: “mobilidade, descontinuidade, cientificismo. E em um terceiro momento, a arte, ou algo semelhante a isso, começou a seguir as propostas dessa outra arte, a publicidade [...]. Nesse momento entra em cena a pósmodernidade.” A publicidade adquire maior visibilidade a ponto de ser indispensável para todo “bom” produto. Foi nela que os capitalistas apoiaram-se fielmente, como uma atraente e eficaz estratégia de venda, tornando-se, então, a arte oficial do capitalismo. Há uma redefinição da função da publicidade que não mais consiste em informar ou promover no sentido comum, mas “volta-se cada vez mais para a manipulação dos desejos e gostos mediante imagens que podem ou não ter relação com o produto a ser vendido.” (HARVEY, 2009, p. 259). LIBERDADE OU SEGURANÇA? AS IMPLICAÇÕES DA CIVILIZAÇÃO Essa modificação sistemática do capitalismo traz consigo efeitos que implicam diretamente nas subjetividades. Freud (1930, p.116) já alertava que “a liberdade do indivíduo não constitui um dom da civilização,” sendo assim, um excesso de ordem significa para o sujeito a escassez de sua liberdade. Bauman (1998) compartilha da idéia de Freud ao relatar que os prazeres da vida civilizada estão atrelados ao sofrimento, bem como a satisfação com o mal-estar e a submissão com a rebelião. A questão do sofrimento e suas implicações na vida psíquica é um tema bastante discutido por Freud (1930), ele aponta três tópicos geradores de sofrimento: 1) decrepitude do nosso próprio corpo; 2) força esmagadora da natureza e 3) relações sociais. Evidencia-se que o sofrimento advindo do convívio com o outro é o mais árduo deles, todavia a busca mais difundido para evitar o sofrimento é a aproximação, tornar-se membro da comunidade humana. Neste contexto se instaura a civilização, a tentativa de ordenar as relações sociais. Assim: “A civilização - a ordem imposta a uma humanidade naturalmente desordenada - é um compromisso, uma troca continuamente reclamada e para sempre investigada a se renegociar” (BAUMAN, 1998, p.08). A civilização se torna responsável pelo sofrimento que aplaca o sujeito, pois exige que ele renuncie a seus instintos. Desta forma seria necessário abandoná-la e retornar ao estado primitivo, garantindo assim maior felicidade. 438 Assim, entendemos que o sujeito civilizado renunciou aos instintos, à sexualidade e à agressividade na busca de maior segurança. Evidencia-se, então, que o indivíduo usufrui de pouca felicidade (satisfação de necessidades represadas em alto grau), portanto de uma liberdade restrita, em busca de uma segurança, que no contexto pós-moderno tem se mostrado etérea e frágil demais. Há um conflito entre a força pulsional/instintual e a civilização. Birman (2000, p.38) descreve que “aquilo que Freud denominou civilização corresponde ao processo de modernização do social”. Invertem-se as condições nas quais o sujeito se sente livre em suas escolhas, mas aprisionado em um mundo instável e de incertezas, pois o mundo contemporâneo apresenta-se fragmentado em partes que precisam ser juntadas para formarem o todo. Assim, os mal-estares, aflições, angústias, ansiedades, sentimentos de insegurança e desamparo típicos do mundo pós-moderno resultam do gênero da sociedade que oferece cada vez mais liberdade individual ao preço de cada vez menos segurança e estabilidade. Como relata Bauman (1998, p.156) “Os mal-estares pós-modernos nascem da liberdade, em vez da opressão”. O MAL-ESTAR DA PÓS-MODERNIDADE Na pós-modernidade “os projetos de vida individuais não encontram nenhum terreno estável em que acomodem uma âncora, e os esforços de constituição da identidade individual não podem retificar as conseqüências do “desencaixe”, deter o eu flutuante e a deriva.” (BAUMAN, 1998, p.32). Os laços afetivos passam a ser dissimulados encontros sucessivos, é a Era do ‘ficar’, dos free lances amorosos e é exatamente neste contexto que o sujeito pósmoderno depara-se com um turbilhão de sensações adversas: estranheza, aversão, admiração, entusiasmo, tristeza, desdém, esperança, solidão etc. O consumo abundante se apresenta como marca do sucesso. Compreende-se que o consumo de determinados objetos e a postura coerente com certo estilo de vida é a condição necessária para a felicidade, talvez até para a dignidade humana, como expõe Bauman (1998). Se o consumo é a medida de uma vida bem-sucedida, da felicidade e mesmo da decência humana, então foi retirada a tampa dos desejos humanos: nenhuma quantidade de aquisições e sensações emocionantes tem qualquer probabilidade de trazer satisfação da maneira como o “manter-se ao nível dos padrões” [...] (BAUMAN, 1998, p.56). E a aptidão em participar deste jogo consumista que constitui o critério decisivo para consolidar o sonho da pureza na pós-modernidade, pois “os deixados de fora como um 439 “problema”, como a “sujeira” que precisa ser removida, são consumidores falhos - pessoas incapazes de responder aos atrativos do mercado porque lhes faltam os recursos requeridos [...]”. (BAUMAN, 1998, p.24). Tais sujeitos se julgam e são julgados como indivíduos nãolivres, pois dentro do processo do capital, liberdade significa poder de escolha do consumidor. Entende-se que: No mundo pós-moderno de estilos e padrões de vida livremente concorrentes, há ainda um severo teste de pureza que se requer seja transposto por todo aquele que solicite ser ali admitido: tem de mostrar-se capaz de ser seduzido pela infinita possibilidade e constante remoção promovida pelo mercado consumidor, de se regozijar com a sorte de vestir e despir identidades, de passar a vida na caça interminável de cada vez mais intensas sensações e cada vez mais inebriante experiência. (BAUMAN, 1998, p.23). Assim, o sentimento de desamparo aumentou significativamente na pós-modernidade, surgindo formas inéditas de desamparo, oriundas deste processo do capital atrelado a uma crescente condição de desesperança, instabilidade, insegurança, desencantamento do mundo, esvaziamento dos deuses e a predominância da racionalização. Esse desencantamento do mundo pode ser comparado ao que Bauman (2001) considera como modernidade líquida, pois esta é marcada pela invasão do racionalismo, avanço na área tecnológica, desenfreado avanço capitalista, a dita globalização, racionalização e cientificismo. Bauman (2001) afirma que a modernidade líquida - ou seja, a pósmodernidade -, se insere em um momento de "derretimento dos sólidos", sejam eles valores e concepções, teorias científicas, tecnologias, modelo econômico e até mesmo padrões de comportamento. Antigos valores de solidez e durabilidade, tradição, família e religiosidade abrem espaço para a fluidez, mudança, velocidade, adaptabilidade, produtividade e racionalidade. Até mesmo as concepções de tempo e espaço se reconfiguram nesse momento. (SARAIVA, 2010. S/P) O que se conclui é que essa racionalização e cientificismo enaltecidos culminaram em uma cultura da exaltação do eu, como um tipo de narcisismo, no qual atributos como a beleza e a estética são extremamente valorizados, moldando os modos, gostos, desejos dos sujeitos pós-modernos. “Assim a existência do sujeito se constitui pelo eixo de sua estetização. É a estetização que toma volume como estilo existencial do sujeito.” (BIRMAN, 2000, p.246). Isso implicará diretamente na condição de felicidade dos sujeitos pós-modernos. Sobre essa 440 afirmativa Freud (1930, p.101) relata que “a felicidade da vida é predominante buscada na fruição da beleza”. Apesar destas mudanças nos eixos cultural, psíquico e coletivo, a religião, em seus altos e baixos, sempre se fez presente na vida do ser humano, seja na busca incessante por ela ou na sua negação. Assim, não demorou muito para se perceber que a ciência dissolve crenças que dão sentido à vida dos homens. Pode-se afirmar, então, que esse mundo no qual o progresso tecnológico, a racionalização e a ciência não trouxeram toda a felicidade que um dia se ansiou, é inquestionável que nesse "mundo desencantado [...] os homens são completamente incapazes de passar sem a consolação de ilusão religiosa, que sem ela, não poderiam suportar as dificuldades da vida e as crueldades da realidade.” (FREUD, 1927, p.63). Não se pode negar, também, que o desamparo humano aumentou expressivamente na pós-modernidade e, “junto com ele, seu anseio pelo pai e pelos deuses.” (FREUD, 1927, p. 29). Assim, “não poucas pessoas encontraram sua única consolação nas doutrinas religiosas, e só conseguem suportar a vida com o auxílio delas” (FREUD, 1927, p.48). RESULTADOS E DISCUSSÕES Individualização: da identidade coletiva as identidades individuais O conceito de identidade é bastante analisado quando se trata dos efeitos da pósmodernidade, o que ficou evidente, em teoria e prática foi que a identidade não é mais entendida como algo coletivo, mas assume um caráter individual. Em trechos das falas do colaborador pode-se evidenciar essa questão, por exemplo: “Hoje em dia é muito difícil a gente pensar em algo que faça bem para todos, sempre vai ter um descontente ou não querendo a mesma coisa que você quer. Cada um tem suas vontades, desejos e sonhos. É por isso que cada um segue um caminho, ou prefere ficar sozinho mesmo.” (colaborador 1; masculino, 21 anos.) Hall (2006, p.69) apresenta três conseqüências da globalização nas identidades: 1) a desintegração das identidades nacionais em resultado da homogeneização cultural e do pósmoderno global; 2) identidades “locais” estão sendo reforçadas pela resistência à globalização e 3) identidades nacionais estão em declínio, formando identidades híbridas. Assim, os indivíduos na pós-modernidade perderam (ou estão perdendo), suas identidades coletivas, como a identificação por sua Nação ou mesmo o apreço pela cidade natal. Os defensores da 441 pátria, atualmente, são poucos, quase não existem, salvo os homens, com maior idade, que são obrigados pelo Estado a cumprirem seus deveres de cidadãos, se ‘disponibilizando’ à junta militar. Existe, ainda, um movimento antagônico na tentativa de reforçar as identidades, entretanto o que se evidencia, neste contexto que Hall (2006) chamou de pós-moderno global, é o surgimento de novas identidades, essas de maneira mais híbrida. As falas do colaborador compartilham desta ideia e pode ficar evidente quando lhe perguntado qual a importância da religião na sua vida. Sua resposta ofereceu indícios sobre o que ele pensava a respeito da religiosidade como solucionadora dos sofrimentos dos indivíduos, mas também apresentaram de maneira subentendida, suas idéias a respeito de identidades. Eu sou muçulmano né, mais só no papel. Para mim, eu acho que... Eu leio muito sabe, estudo muito e para mim tudo isso é uma construção. Então eu sou todas as religiões. Para mim, as minhas soluções são diferentes. Não é Deus. Mas ai eu tenho medo de morrer e ir para o nada. [...] (colaborador 1, masculino, 21 anos). O que se pretende expor é que da passagem da identidade coletiva para uma identificação mais singular ou hibrida o funcionamento e a vivência social foi modificada ou está sendo modificada paulatinamente. Tomados por um contexto de muita insegurança e desconfiança plena, os sujeitos pós-modernos tem diminuído as expectativas em relação á vida em sociedade, sendo necessária a seleção das pessoas com quem quer manter algum vínculo, e os critérios desta seleção se tornam mais rigorosos ao passo que o medo e a desconfiança sobre o outro aumentam. [...] hoje em dia não dá para confiar em ninguém, porque eu vou ficar vinculado a alguém quem eu mal sei o que está fazendo em relação à vida dele. Ou seja, as pessoas tomaram posicionamento mais individualista com relação a isso. Parou de ter a preocupação em pensar conjuntamente e as pessoas tomaram um aspecto mais individual com relação a relacionamentos futuros. Ou seja, as pessoas se tornaram mais egoístas com relação ao que elas sentem e pararam de pensar um pouco no que o outro que ela está envolvida, pensa, sente ou deixou de sentir. (colaborador 2 , masculino, 24 anos). Essas modificações nas identidades podem ser verificadas em vários campos subjetivos como no amor, quando o colaborador afirmou estar buscando uma independência emocional; na percepção do mundo, quando ele relata que as pessoas não estão “nem aí” para 442 você ou estão felizes por você estar mal, e na percepção de si mesmo, evidente em sua fala ao se descrever como narcisista, individualista, exibicionista e consumista. O amor: sobre a fragilidade dos laços humanos Sobre o amor ou amores contemporâneos Bauman (2004, p.08) afirma que “no líquido cenário da vida moderna, os relacionamentos talvez sejam os representantes mais comuns, agudos, perturbadores e profundamente sentidos da ambivalência.” E, ainda, afirma que: [...] a definição romântica de amor como “até que a morte nos separe” está decididamente fora de moda, tendo deixado para trás seu tempo de vida útil em função da radical alteração das estruturas de parentesco as quais costumava servir e de onde extraída seu vigor e sua valorização. (BAUMAN, 2004, p. 19). Ficou evidente nas falas do colaborador que o “até que a morte nos separe” é algo distante dos seus propósitos, quando ele afirmar que “os pólos se alternaram completamente”, alegando que antigamente era quase obrigação manter um relacionamento fixo, mas que atualmente a maneira de se relacionar afetivamente mudou e alega, ainda, que não acha isso ruim. Outro aspecto que reforça a idéia de que os relacionamentos estão mais superficiais e que há uma desconfiança sobre o outro, fez-se presente nesta fala: Eu namorei poucas vezes, mas todas elas foram, digamos, duradouras. Mas confesso que ‘fiquei’ mais do que namorei. Eu não vou me envolver com alguém que eu não tenha o mínimo de segurança ou de afeto para isso, é uma questão de escolha [...] (colaborador 2 , masculino, 24 anos). Este trecho da fala do colaborador remete a ideia, muito comum atualmente, do ‘ficar’, que prega a ‘liberdade de escolha’, a aquisição de novas e surpreendentes experiências e o não apego a ninguém. O colaborador finaliza sua fala ressaltando que “hoje em dia há múltiplas variedades.” Bauman (2004) faz um questionamento extremamente pertinente sobre esta descartabilidade de parceiros: Consideradas defeituosas ou não “plenamente satisfatórias” as mercadorias podem ser trocadas por outras, as quais se espera que agradem mais [...] automóveis, computadores ou telefones celulares perfeitamente usáveis, em bom estado e em condições satisfatórias são consideradas, sem remorso, como um monte de lixo no instante em que “novas e aperfeiçoadas versões” aparecem nas lojas e se tornam o assunto do momento. Alguma razão para que as parcerias sejam consideradas exceção? (BAUMAN, 2004. p. 28). 443 Se, em tempos esquecidos, buscavam-se relacionamentos na expectativa de mitigar a insegurança contida nas noites de solidão e no dia -a- dia dos indivíduos, atualmente, “o tratamento só fez expandir os sintomas, e talvez agora você se sinta mais inseguro do que antes, ainda que essa “nova e agravada” insegurança provenha de outras paragens.” (BAUMAN, 2004, 30). É sobre relações ditas mais abertas que os sujeitos contemporâneos vivenciam suas experiências, nas quais a traição já não é algo inaceitável como já foi considerada um dia. Reich (1988) ressalta que: [...] na ausência do parceiro adequado, o que, sob condições reinantes da vida sexual, parece ser a regra, a capacidade para a monogamia se transforma no seu oposto. [...] As Velhas relações, entretanto, desmoronam pela veemente quando se deterioram e quando outro novo parceiro promete mais prazer. (REICH, 1988, p. 40). Essa possibilidade de ‘escolhas’ e de romances free lances, na qual prevalece a ideia de que ninguém é de ninguém, faz o indivíduo refletir e ser invadido por uma sensação de mal-estar atrelado a solidão, desamparo, baixa auto-estima e depreciação de sua própria imagem. Quando perguntado ao colaborador sobre seu campo afetivo, ele respondeu: Eu to namorando agora, mas estou muito iceberg. É ele que corre atrás. Gosto dele, mas ainda estou muito iceberg, porque eu sei que uma hora vai derreter. Tem um ditado [frase] muito popular agora, que eu vi no facebook, que é assim: gruda que pisa, cospe que cola. Essa frase define os relacionamentos hoje em dia. (colaborador 1, masculino, 21 anos). Conclui-se que nesta atmosfera de relacionamentos instáveis, proporcionados pelas transformações pós-modernas, vinculadas a lógica de consumo, na qual tudo se encontra em obsolescência programada que o lema “gruda que pisa, cospe que cola” é seguido, principalmente, pelos jovens pós-modernos. Individualização: mudanças na percepção sobre mundo pós-moderno Buscou-se entender o que motivou o sujeito a procurar o SPA, assim, durante a explicação do colaborador foi possível notar uma resistência em buscar soluções no coletivo, certa necessidade de auto-suficiência e, por fim, uma preocupação consigo mesmo que denotou nas entre linhas resultado de uma desilusão amorosa. Assim ele respondeu: É difícil, agora, encontrar uma pessoa que te ouve, que te dá tanta atenção. Porque quando você está feliz as pessoas te escutam, mas quando você ta triste por um motivo tão fútil, como por exemplo, sofrer por alguém, 444 ninguém tem saco pra te ouvir. As pessoas fingem que estão te ouvindo, mas no fundo não te ouvem. (colaborador 1, masculino, 21 anos). Nesta fala o colaborador expressa seu anseio em ter alguém em que possa compartilhar suas inquietações e se mostra revoltado por estar tomado por uma sensação de desamparo e solidão. Assim, ele menciona estratégias para superar seu desamparo investindo em si mesmo, como uma forma compensatória e individualizada. Esse processo de individualização moldado pelo capitalismo pode ser observado em demais instâncias na vida do colaborador, pois ao expor sua percepção sobre o mundo contemporâneo ele relata que “80% das pessoas não estão nem aí para os seus sofrimentos, e outras 20% estão felizes por você estar assim [sofrendo]. Por isso as pessoas preferem ir para uma terapia, pagar para alguém te escutar,” (colaborador 1, masculino, 21 anos). Nesse sentido este esse processo faz com que o sujeito pós-moderno se afaste das soluções coletivas, criando um campo de rivalidade e disputa. A mulher e a busca pela beleza que relação é essa? Logo na etapa de seleção das fichas de triagem dos pacientes do SPA percebeu-se a prevalência de pessoas do sexo feminino que buscam atendimento psicoterápico e que relataram descontentamento estético e afetivo. Assim recorreu-se a literatura mítica para apresentar, de maneira singela, alguns aspectos da psique feminina, utilizando os pressupostos teóricos de Robert Johnson (1993), no qual o autor faz uma análise da psique feminina através do mito Eros e Psiquê, descrevendo a jornada da mulher em busca da sua individuação. O mito relata sobre a história de Psiquê - uma jovem princesa adorada por sua beleza, que despertou inveja e ira em Afrodite, que se sentiu menosprezada por todos. Sua inveja era tanta que enviou seu filho Eros - o deus do amor -, para vingar-se de Psiquê, ordenando que ele fizesse à bela Psiquê se apaixonar por um terrível monstro. Entretanto, Eros ao ver Psiquê ficou deslumbrado e acidentalmente se feriu com uma de suas flechas, se apaixonando por Psiquê. Impedido, por Afrodite, de se entregar a ela, Eros é preso em uma torre e Psiquê, apaixonada, se entrega como serva à Afrodite, tudo em nome do amor que sentia por Eros. Na condição de serva Psiquê é ordenada por Afrodite a realizar quatro tarefas irrealizáveis. Evidencia-se aqui, a quarta tarefa, que consiste em uma viagem ao mundo infernal em busca do segredo da beleza de Perséfone - ungüento de beleza. Após um tenebroso caminho até o mundo dos mortos e o retorno, também bastante árduo, ao mundo dos vivos, Psiquê consegue cumprir com a quarta tarefa imposta por Afrodite, trazendo em mãos um cofrinho com ungüento de beleza. Já avistando o mundo dos vivos Psiquê cai em tentação e resolve abrir o cofrinho e utilizar um pouco da beleza que nele continha, e é neste momento que a jovem bela 445 Psiquê é invadida pelo nada. “O nada sai e recai sobre ela sob a forma de um sono mortal vindo do inferno e Psiquê jaz no chão totalmente inconsciente.” (JOHNSON, 1993, p.90). Um primeiro ponto que pode ser ponderado consiste na questão: porque Psiquê mesmo sendo uma jovem e bela mulher, se rendeu a vontade de usar ungüento de beleza? Será que as mulheres pós-modernas também não fariam (ou fazem) o mesmo que Psiquê? Ousa-se dizer que muito provavelmente sim! Pois a beleza se configura como um pilar da civilização, que somada à ordem e a limpeza constituem o tripé de exigências da mesma. Pode-se observar tal questão neste trecho em uma das entrevistas: Isso tem muito a ver, também, porque eu comecei a fazer análise aqui no SPA. Porque antes eu era muito insegura com meu corpo, com tudo assim. Eu ainda sou muito insegura, mas eu acho que com a análise eu consegui adquirir mais segurança. Inclusive com meu corpo. Acho que assim, eu não to 100% satisfeita com meu corpo, mas pelo menos não é totalmente baixo alta-estima [...] (colaborador 5, feminino, 20 anos). Desta forma pode-se dizer que na contemporaneidade há uma incansável busca pela beleza, para atingir ou se adequar aos ‘padrões’ estéticos. Pois se entende que ser jovem e belo é sinônimo de produtividade, de capacidade, mascarado pelas mídias que funcionam sobre a lógica do sistema capitalista. Assim, Freud (1930, p.102) salienta que “a fruição da beleza dispõe de uma quantidade peculiar de sentimento tenuamente intoxicante.” Pode-se notar a importância dada à beleza na fala de uma das colaboradoras: Eu fui muito alimentada com isso... Do tipo: não corre que você vai ralar o joelho e vai ficar marcado pra o resto da vida. Já pensei em colocar silicone nos seios por causa dessa descendência japonesa, mas já desisti. Já pensei e ainda penso em fazer, mas por conta do tempo ainda não fiz a cirurgia do nariz. Não só pela estética, mas porque tenho problemas pra respirar, a estética também [...]. Já me incomodou muito, agora não to nem ai... Mas ainda vou fazer por que... Não sei se não é que me incomoda, porque eu já ignorei o fato de me incomodar, mas é me incomoda ainda. Então vou fazer. (colaborador 3, feminino, 20 anos). Os sujeitos pós-modernos encontram-se sob esse princípio, no qual a beleza é um elemento enaltecido, sendo que “a civilização não pode dispensá-la” (Idem), pois se caracteriza como uma das exigências da civilização, podendo ser vista como definidora de personalidade e caráter. Contudo, Freud (1930, p 102) alerta que “a atitude estética em relação ao objetivo da vida oferece muita pouca proteção contra a ameaça do sofrimento, embora possa compensá-lo bastante”. 446 Outro colaborador também salienta essa preocupação com a estética, na qual ela destaca que a mídia estabelece uma íntima ligação com a exaltação da beleza, criando e ditando padrões a serem seguidos. Quando eu era mais nova eu era cheinha e tal. A única coisa que eu fiz, é... Eu procurei uma nutricionista, ai eu fiz reeducação alimentar. Eu acho assim, tudo isso tem muito a ver com essas coisas que a gente vive, com esse padrão de beleza. A televisão também ajuda muito a impor esse padrão na gente. Então acho que elas procuram muito isso, seguir esse padrão. Mas eu particularmente não, ah foi um pouquinho por isso, mas não totalmente. (colaborador 5, feminino, 20 anos). Um segundo ponto de análise pode ser voltado para o ‘nada’ que invadiu a consciência de Psiquê, este pode ser lido como a mudança de valores, o vazio e a fragilidade que se fazem presentes no mundo pós-moderno e se tornam partes constitutivas das personalidades. Na qual os indivíduos respaldaram suas vidas sob a fragilidade dos laços afetivos e a efemeridade de valores, ideologias, crenças e hábitos. Há uma busca pela beleza que atinge de modo bastante singular as mulheres. Os produtos, a mídia e a modernização entendem, de modo geral, que as mulheres são o público-alvo. E existe, ainda, subentendida uma busca em sanar certo mal-estar oriundo de uma insegurança e um desamparo no ato de consumir, como se pode notar nesta fala: Minha época consumista foi com meu primeiro cartão de crédito, com o meu primeiro salário também... Gastei tudo com sapatos, vários. Já teve épocas de eu bater na Marisa todo o final de semana pra comprar nem que seja uma blusa se não começava a me desesperar. Era muito ruim... Tipo ficar em casa, me sentia sozinha e com auto-estima baixa, então ia lá na loja andava, comprava [...]. Saia me sentindo bem mais bonita, com outro astral (colaborador 3, feminino, 20 anos). Por detrás do mito de Eros e Psiquê pode-se ver o preço e o valor atribuído a beleza. Psiquê, então, morrera (para atingir outro estágio de desenvolvimento, pois será lhe devolvido a vida através da intercessão de Zeus), com sua beleza e ingenuidade, algo narcisista e pueril. Nesse sentido pode-se refletir sobre a relação entre traços narcísicos e a vigência do modo de produção capitalista. Pois a lógica capitalista é pautada no processo de individualização, no qual é primordial preocupação consigo mesmo, um voltar-se para si, principalmente no que tange a questão da beleza e da estética valorizadas no mundo pós-moderno. Haja visto que tais aspectos movimenta e cria novos mercados de consumo, que, cada vez mais, pregam o individualismo gerando rivalidade e mal-estar. 447 [...] está bem claro que um aspecto característico do consumo moderno é extensão em que produtos e serviços são comprados pelos indivíduos para uso próprio. [...] Ainda mais característico do consumo moderno é a ideologia associada ao individualismo. Esse é o valor extraordinário anexado a esse modo de consumo, juntamente com a ênfase colocada no direito dos indivíduos de decidirem, por si mesmos, que produtos e serviços consumir. (CAMPBELL, 2006, P.48-49) Conclui-se, assim, que “o homem civilizado reverencie a beleza, sempre que a perceba na natureza ou sempre que crie nos objetos de seu trabalho manual, na medida em que é capaz disso.” (FREUD, 1930, P. 112). A busca de si na era do consumo Campbell (2006, p.47) ao questionar por que o ato de comprar tem crescido nos dias atuais, salienta que existe uma série de respostas que “vão da satisfação de necessidades até a emulação dos outros, a busca por prazer, a defesa ou afirmação de um status etc.”, o que foi possível analisar nesta fala: Eu sinto mais prazer quando vou na loja e compro por comprar. Tipo ah esse mês meu cartão não veio alto então posso me dar ao luxo de comprar alguma coisa, ai eu vou lá e compro. Agora quando eu tenho que ir comprar, tipo preciso mesmo... preciso de ir pra um casamento e não tenho um vestido pára ir, ai tenho que comprar mesmo ai eu já compro, já olho preço, já... ai não me dá tanto prazer quando tenho que comprar por obrigação. Já gosto de ir mesmo comprar quando vou comprar por comprar sem precisar. (colaborador 3, feminino, 20 anos.) Todavia, o autor ainda ressalta que o consumo possa estar suprindo uma função bem mais importante do que apenas satisfazer motivos ou intenções específicas, recaindo sobre questões relacionadas com a natureza da realidade e com o que seria o verdadeiro propósito da existência. O que Campbell (2006) sugere é que reside no modo de viver dos sujeitos pósmodernos a idéia do compro, logo existo, “pois a atividade de comprar não só é um meio pelo qual as pessoas descobrem quem elas são, como fornece a elas a comprovação básica de sua existência. Quando eu não tenho dinheiro pra comprar nada eu até evito olhar para as vitrines. Porque eu tenho a necessidade de gastar pelo menos 10,00 por dia, seja com um suco e um misto, sei lá qualquer coisa. Porque eu penso assim... Eu trabalho, faço minhas coisas, estudo sabe... Se eu não tiver dinheiro não dá nem vontade de sair de casa, me desmotiva muito sabe, o dia fica improdutivo, vazio, sei lá [...] (colaborador 1, masculino, 21 anos). 448 Essa fala remete a idéia exposta por Campbell (2006, p.56.) quando ele relata que o consumo “pode ser visto como uma atividade que envolve a exploração do self e também pode ser visto como uma resposta à insegurança ontológica ou à angústia existencial.” Nesse sentido, o consumo pode trazer uma sensação de conforto por passar a certeza de que “somos seres humanos autênticos - isto é, que realmente existimos.” (Idem) O que se sobressalta nas entre linhas das falas dos colaboradores é o anseio em consumir com uma forma de afirmação, amparo e identificação, no sentido de que por de trás do ato de consumir existe uma busca por si mesmo. Ou seja, ”a verdadeira atividade de consumo no mundo - a seleção, a compra e o uso de produtos - deve ser entendida como um processo que resulta da manifestação ou da “conversão em realidade” de algo que antes era meramente latente.” (CAMPBELL, 2006, P. 58). Nesse sentido os objetos que nos cercam é resultado direto do estado emocional do sujeito, em específico do seu desejo, onde eles se tornam parte de sua realidade cotidiana. Durante a entrevista com o colaborador 3 ela relatou não saber o que a motivava comprar naquela maneira, se era porque em outra época ela não tinha condições para tanto e agora alcançou tal condição ou se gostava mesmo de fazer compras, até em supermercados. O que resultou na interpretação que logo quando sua situação econômica ascendeu, ela externalizou seus desejos e sua nova posição social através dos sapatos e demais artigos adquiridos . Essa idéia vai ao encontro das concepções sobre o desejo latente e a busca por realizações através do ato de consumir, como apresenta Campbell (2006). [...] fazer compras é um contexto ideal para continuar a busca por significado. Ideal porque há uma pureza de auto-expressão ligada à atividade que não é comumente experimentada nessas outras atividades (contanto o que não se esteja pensando em compras de rotina ou de presentes, mas em uma atividade que vise satisfazer vontades do self.). Essa pureza deriva da não-consideração de qualquer necessidade, seja de sentimentos ou demandas de outras pessoas, seja da intensidade e variedade dos estímulos do que é ofertado. (CAMPBELL. 2006, P. 57) CONSIDERAÇÕES FINAIS Buscou-se apresentar que estamos em uma sociedade em que a satisfação das vontades tomou o lugar do atendimento das necessidades, sendo estas vontades moldadas pelas nuances do sistema capitalista e suas exigências individualistas, narcísicas, com ideologias e valores descartáveis já que estão inclusos em uma obsolescência programada. 449 A partir desta conjuntura, na qual o eu pós-moderno é excepcionalmente aberto e flexível, buscou-se compreender as variadas formas de mal-estares oriundos desta nova maneira de viver, ver e se relacionar no mundo contemporâneo. Evidenciando que os sujeitos pós-modernos estão engajados em um processo de recriar a si mesmo com base, sobretudo, na satisfação das vontades regidas conforme as exigências do modo de produção capitalista, principalmente no ato de consumir, pois “o consumismo é fundamental para o processo pelo qual os indivíduos confirmam ou até criam sua identidade.” (CAMPBELL, 2006, P. 51). Como Salienta Birmam (2000) trata-se de pensar nos destinos dos desejos na atualidade, captando o que há de sofrente nas novas formas de subjetivação. REFERÊNCIAS BAPTISTA, Makilim Nunes; CAMPOS, Dinael Corrêa de. Metodologia de pesquisa em ciência: análises quantitativas e qualitativas. Rio de janeiro: LTC, 2007. BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977. BAUMAN, Zygmunt. O mal-estar da pós-modernidade. Rio de Janeiro: Zahar, 1998. _________. Ser leve e líquido. In.: Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001. P. 7-22. _________. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar. 2004. BIRMAN, Joel. Mal-estar na atualidade: a psicanálise e as novas formas de subjetivação. 2ª Ed. RJ: Civilização Brasileira, 2000. BLEGER, José. Temas de psicologia: entrevista e grupo. São Paulo: Martins Fontes, 1993. FREUD, Sigmund (1930) O mal-estar da civilização. 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Acesso em Se. 2011. 451 HISTÓRIA E REPRESENTAÇÕES SOCIAIS: A UNIR AO LONGO DOS 30 ANOS DE ATUAÇÃO EM RONDÔNIA (1982 A 2011)* Representações Sociais no período da Criação da UNIR Elizângela Mendes de Araújo** Lilian Maria Moser "A Universidade de Rondônia, que agora surge tardiamente, é o coroamento de uma luta de nosso povo que durante amargos 38 anos de Território Federal teve esse direito negado", (...). (...), "trata-se de uma conquista de nossa gente, criada como imperativo de desenvolvimento econômico, social, cultural e político do Estado" 91 (grifo meu). RESUMO O presente escrito é resultado de pesquisas bibliográficas e documentais, realizadas com intuito de conhecer a Universidade Federal de Rondônia quando no momento de sua criação e no decorrer dos trinta anos (1982-2012), entendendo a partir desses levantamentos que representações sociais foram geradas na/para população do Estado de Rondônia. Para tanto realizamos no primeiro passo a identificação, através de pesquisas e leituras, dos jornais que teriam notícias consideradas relevantes à construção desse estudo, a fase inicial se deu no Centro de documentação histórica de Rondônia, em seguida no Centro de documentação do Poder Judiciário. Assim dois jornais foram identificados: O Estadão e O Guaporé, que em várias edições abordavam assuntos importantes sobre a Unir, posteriormente nos detemos a estudar cada matéria... O trabalho buscou também conhecer pessoas que fizeram parte da Unir e ainda vivas poderiam colaborar com a pesquisa, porém várias que foram sugeridas afirmaram não conhecer a fundo a história da Universidade, por isso não poderiam dar entrevista. Sobretudo, como já realizada pesquisa bibliográfica em fontes que adotamos como referencial teórico bem como em processo de finalização a pesquisa documental em acervos do Estado, pretendemos no próximo passo aprofundar nossa busca no que tange as fontes orais, que de alguma forma fizeram ou fazem parte da história desta Universidade, falamos assim da memória de professores, técnicos, alunos bem como reitores desta. No geral, as investigações projetadas nessa pesquisa, tiveram como foco principal abrir caminhos que desvendassem o pensamento social quando se estabeleceu em Rondônia a Universidade Federal. Diante desse objetivo, fomos levados a analisar principalmente os discursos dos políticos que ludibriavam o fator: "bem público", estes tentavam, sobretudo, transparecer a população que a criação da Universidade era uma conquista do "povo", era uma vitória para todos. No entanto implícito nesses discursos que tinham por objetivo ganhar popularidade e se autopromover diante da sociedade, estavam impregnados os interesses políticos particulares, pois as justificativas e as atividades utilizadas para criação da Universidade em momento * * Graduanda em História pela Universidade Federal de Rondônia – UNIR. Bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC e membro do Centro de Documentação e Estudos Avançados sobre Memória e Patrimônio de Rondônia – CDEAMPRO. ∗ ∗∗ Orientadora. 91 Jerônimo Santana em declaração de voto na Câmara Federal, no dia 22 de junho, quando da criação da Universidade. Fonte: Jornal O Guaporé, 01 de julho de 1982, p. 2. (Arquivos do Centro de documentação histórica de Rondônia). 452 algum coincidiram com os discursos, nesse sentido a criação da universidade estava sendo projetada como veiculo de status político e era tão somente um desenvolvimento do Estado para o próprio "Estado político". Palavras-chave: Unir. Criação e história. Representações sociais. ABSTRACT This writing is the result of bibliographical and documentary research, conducted with the aim of meeting the Federal University of Rondônia when the moment of its creation and in the course of thirty years (1982-2012), understanding from these surveys that were generated in the social representations / to the population of the state of Rondônia. For this purpose we used the first step to identify, through research and reading, the news papers that have considered relevant to the construction of this study, the initial phase took place in the center of historical documentation of Rondônia, then the Documentation Center of the Judiciary. Just two newspapers were identified: The Guaporé and O Estado, which addressed several issues important issues about the Uniting later we pause to examine each matter ... The study also sought to meet people who were part of the Uniting and still alive could collaborate with the research, but several said they were suggested not know the background history of the University, so it could not be interviewed. Especially, as bibliographical research on sources which we adopt as a theoretical as well as in the process of finalizing the documentary research collections in the state, the next step we intend to deepen our search regarding the oral sources, which somehow did or part the history of this University, spoke well of the memory of teachers, technicians, students and rectors of this. In general, investigations designed in this research had as main focus of open paths desvendassem social thought when it established the Federal University in Rondônia. Given this goal, we were led to examine particularly the speeches of politicians who ludibriavam factor: "public good", they attempted especially surface the population that the creation of the University was an achievement of "the people" was a victory for all. However implicit in these discourses that aimed to gain popularity and promote yourself to society, were impregnated with the political interests of individuals, as the justifications and the activities used to create the University at any time coincided with the speeches in this sense the creation of the university was being designed as a vehicle for political status and was merely a development of the state for their own "political state". INTRODUÇÃO A presente pesquisa nasceu no sentido de investigar a história da Universidade Federal de Rondônia, levantando inicialmente as problemáticas: quando foi criada, o porquê de sua criação e que representações sociais esta gerou no Estado. O primeiro passo se deu no sentido de buscar referencial teórico que nos auxiliasse na pesquisa documental. Assim por sugestão da orientadora Dr.ª Lilian Moser, estudamos as teorias de LE GOFF em História e Memória (1990) e Halbwachs, Memória Coletiva (1994); através dessas leituras, compreendemos o processo de aproximação com o documento histórico, sua importância e o olhar do historiador 453 para estes, sejam escritos ou orais, os documentos trazem à memória do presente “a linguagem de uma voz agora reduzida ao silêncio: seu rastro frágil, mas por sorte, decifrável” (FOUCAULT, 2004, p. 7). A posteriori objetivando encontrar vestígios sobre a história da Universidade, foram consultados os jornais O Estadão e O Guaporé, ambos os arquivos do Centro de documentação histórica de Rondônia. Este trabalho reflete os resultados já alcançados, porem prosseguirá, pois o objetivo fundamental é debruçar-se sob as varias fontes que trazem um pouco sobre a história da Universidade e dessa forma reuni-las na forma de um livro, em decorrência dos trinta anos de sua existência. A seguir um breve comentário do embasamento teórico, para então descrever densamente a respeito da Universidade Federal de Rondônia e sua história. l MEMÓRIA, HISTÓRIA E DOCUMENTO I. I O significado do documento: História Tradicional versus a Nova História. Segundo Samara e Tupy (2010) na contemporaneidade, podemos considerar a História uma disciplina de caráter científico, levando em consideração que esta possui um método de trabalho onde a aprendizagem do historiador face ao referencial teórico, metodologia e fontes documentais, requerem impreterivelmente critérios técnico-científicos para sua realização. Para os historiadores do século XIX a História se designaria como "a reconstrução do passado" e o documento escrito como uma fonte fidedigna que traz à memória do presente os acontecimentos vivenciados, portanto o historiador na construção do presente no passado projetado para o futuro deve refletir fielmente cada informação contida no documento, dessa forma sem, sobretudo, reproduzi-los com as interpretações pessoais. A tarefa do fazer história no presente se tornou para muitos o produto de uma só época, sendo esta evidenciada sempre por mudanças metodológicas que surgem para desenvolvimento ou aprimoramento da disciplina em cada época da sociedade e de sua história. É em cada tempo da História, que o uso do documento como comprovação autêntica da verdade vivida num passado memorável, se torna necessário ou inútil na busca pela fidedignidade dos fatos. A respeito do método dos historiadores do século XIX ao olhar para as fontes documentais, Michel Foucault (2004) reitera que neste período sempre se serviu de documentos, sempre os interrogou, não apenas sobre o que queriam dizer, mas principalmente sobre a veracidade, legitimidade e genuinidade (FOUCAULT, 2004, p. 7). O objetivo 454 primordial era reconstituir a partir do que supostamente diziam os documentos, o passado de onde estes se originaram. Por isso, era vitalício para o fazer histórico saber da autenticidade dos documentos, pois representavam “a linguagem de uma voz agora reduzida ao silêncio: seu rastro frágil, mas, por sorte, decifrável” (FOUCAULT, 2004, p. 7). É nesse sentido que ao nos aproximar dos jornais arquivados no Centro de documentação histórica de Rondônia, buscamos primeiramente interrogá-los sobre a autenticidade e entender o que queriam dizer em essência, considerando que cada acontecimento é decorrente de acordo com sua época e os valores sociais. Ao contrário das práticas da História Tradicional, surge opostamente à Nova História, esta influenciada por pesquisadores que embora não utilizassem os documentos como fontes, passaram a fazer uso de documentos através de métodos e técnicas que se serviam desse tipo de fonte. (SAMARA & TUPI, 2010). Segundo Peter Burke (1997, p. 21) a historiografia francesa neste momento passou a buscar outros elementos, problemas e objetos, se aproximando de uma abordagem interdisciplinar, havendo também uma mudança na relação com as diferentes linguagens, em função das diversas manifestações nas relações humanas, as quais propunham estudar. Tais mudanças trouxeram também uma ampliação no conceito de documento histórico, que de mero texto escrito passou a significar de acordo com Vieira (2003) "tudo que o homem produziu". Essa ação interdisciplinar amplia o campo de trabalho do historiador, não apenas pelas novas fontes, mas também os enfoques teóricos vindos de novas abordagens que os historiadores assumem. De posse desses conhecimentos podemos entender que, o avanço da história como ciência se fez acompanhado de uma renovação de métodos e técnicas em que todos os meios possíveis são utilizados para tentar vencer as lacunas do silêncio, o que é evidente na obra Historia & Documento e metodologia de pesquisa, eis a seguir trecho extraído: Na nova historiografia o documento busca elementos no viver cotidiano nas elações de uso e troca criadas pela humanidade. Os artefatos devem ser estudados enquanto criação dos grupos sociais nos quais a produção humana está inserida. (SAMARA & TUPI, 2010). Diante de tais reflexões fomos indagados a respeito do uso e do significado do documento na contemporaneidade, tendo em vista que as mudanças ao longo dos anos trouxeram à história uma nova metodologia e um novo olhar para o historiador quanto às fontes documentais, sejam escritas, digitais, sejam as oralidades ou as mais diversas memórias 455 gravadas nos documentos que servem a construção da história, ou seja, à reconstrução do passado. Uma definição interessante de documento está em Samara & Tupi (2010, p. 118), segundo estas o documento pode ser entendido como a “organização de uma forma de linguagem”. Para Vieira (2003) o documento é “toda produção Humana” evidenciando também nossos elementos materiais e imateriais. Ambas as definições estão muito próximas, pois evidencia a utilização de diversas formas de linguagens incorporadas no avanço da ciência histórica, ao dizer de Pominique apud Samara e Tupi (2010, p. 118), mais precisamente a interdisciplinaridade, ou seja, a incorporação de métodos e técnicas de outras ciências afins. É dentro desse contexto que passamos a analisar não só o documento em si (os jornais do Centro de documentação do Estado), mas a escrita e a mensagem que cada matéria abordava. Por fim passamos a assumir o papel de decodificadores das mensagens, logo também os receptores (após anos de publicados esses noticiários), sobretudo tendo cuidado para não cometer erros de anacronismos. Pensando na composição do documento histórico e visando a compreensão do leitor, desenvolvemos a seguir uma breve análise do referencial teórico utilizado nas abordagens: o que é escrita, como se identifica a mensagem e como se dá o processo de decodificação? No mais, sobre o receptor, também integrante do documento, pois realiza a leitura e interpretação da mensagem. A escrita, não se trata apenas da elaboração de um texto, mas é a transmissão de uma mensagem, entre quem lê e quem interpreta a leitura. No dizer de Roger Chartier (1990), escrita é antes de tudo a representação física da linguagem, a linguagem escrita traduz um universo simbólico, uma dimensão selecionada que atrai signos, símbolos, é uma construção argumentativa. Há também na escrita (além de sua leitura e interpretação), a decodificação da mensagem, que requer, sobretudo, o conhecimento do contexto que foi produzido, pois decodificar é além de todo e qualquer procedimento, tentar conhecer os atores sociais envolvidos em sua criação. No documento há além da escrita e decodificação aquele que receberá a mensagem. O receptor se caracteriza como aquele que tentará decodificar a mensagem de forma mais próxima do pensamento original, evitando sempre anacronismos, ou seja, julgar os elementos que são frutos de determinada época, de acordo com os preceitos estabelecidos na sociedade 456 contemporânea; afinal a tarefa do historiador consiste analisar com fidelidade as informações, sem atribuir valores próprios de uma época ou uma sociedade distinta. A análise do texto em pesquisa histórica é o de que um documento é sempre, portanto de um discurso que, assim considerado, não pode ser considerado algo transparente. (SAMARA & TUPI, 2010, p. 123). A História é uma construção que não cessa, é a perpétua gestação do presente para o passado. Logo o documento não pode ser entendido como a realidade em si. Além disto, as fontes são sempre exploradas com filtros do presente, de acordo com seus valores e preocupações. A partir da leitura inicial das bibliografias que nos serviram como referencial teórico; seguimos a estruturação da pesquisa documental desempenhada nos acervos do Centro de documentação histórica de Rondônia e Centro de documentação histórica do Poder Judiciário. Tendo conhecimento que as fontes escritas (os documentos), que no caso se identificam como jornais, são de máxima importância em nossa busca, nos detemos primordialmente a ler, estudar e entender cada matéria que trazia a respeito da Unir. II A CRIAÇÃO DA UNIVERSIDADE FEDERAL EM RONDÔNIA II. I Dos projetos à criação da Unir: 08 de julho de 1982. De acordo com os jornais, a criação da Universidade está inserida como marco histórico para Rondônia. Desde 08 de julho de 1982 quando houve sua inauguração passou desde o projeto de criação nº 7.011 - a ser fator de desenvolvimento para o então Território Federal elevado à categoria de Estado de Rondônia. Sobre o início da Universidade no prédio do antigo Porto Velho Hotel, segue um breve fascículo a respeito da doação do patrimônio que teve seu tombamento histórico em 1988, eis: O antigo prédio do Porto Velho Hotel foi doado à FUNDACENTRO que se transformou na Fundação Universidade Federal de Rondônia, implantada por Euro Tourinho Filho e Raymundo Nonato Castro, respectivamente, 1º Reitor e 1º Vice-Reitor. Por um longo período esse prédio ficou sem manutenção e as restaurações essenciais a um bem histórico e arquitetônico, ficando nossa cidade privada de um dos seus componentes mais significativos que conferem sua identidade e seu caráter. Não adiantou seu tombamento histórico - Decreto nº 3.995 de 29 de novembro de 1988, porque na época o prédio não estava vocacionado para um uso específico. Passaram-se os anos e a UNIR despertou. Realizou a 457 restauração do prédio, dando-lhe perenidade. Só que a perenidade não implica em situação estática, imobilista, e isso, no caso de arquitetura, só poderá ser explicitado na dinamização, no uso vocacionado do prédio. Atualmente a UNIR mudou o necessário e conservou o imprescindível, instalando a Reitoria, sendo possível assim, preservar esse bem que é uma testemunha de decisões significativas para o desenvolvimento sociocultural e político de Rondônia. 92 Mediante as fontes de pesquisa observamos que a Unir passou a funcionar em 1982, no mesmo local da FUNDACENTRO, conforme os noticiários esta assumia um caráter pouco diferente da antiga, pois somente mudava o fator de faculdade privada para Universidade pública, porém os objetivos implícitos nas decisões políticas de aprovar a criação de uma Universidade Federal não diferiam daqueles impregnados no ensino superior da antiga Fundação. Diante da pesquisa nos jornais O Guaporé de 1982, exploramos ao máximo notícias sobre a criação da Unir. Encontramos uma primeira matéria que tratava a respeito dos estudantes do Centro de Estudos Superior de Rondônia (CESUR) que reivindicavam o pagamento de 23 mil cruzeiros das matrículas para o segundo período letivo. Em entrevista os funcionários da Cesur informaram que o pagamento era legítimo, tendo em vista que a Universidade Federal de Rondônia ainda não havia sido criada, havia apenas uma autorização para sua criação, o que ocorreria num prazo de aproximadamente um ou dois meses. Alguns alunos chegaram a afirmar que a cobrança da taxa era uma maneira de atacar seus bolsos antes que a Unir fosse criada, pois quando isso ocorresse não mais poderiam ser cobrados por qualquer taxa. Euro Tourinho Filho como primeiro reitor da Universidade, concorda com algumas colocações dos alunos, mas desmente "os boatos existentes de que a Unir não tivesse sido ainda criada, afirmando que isto aconteceu no dia 08 de julho". Como demonstra a seguinte icnografia: Figura 1 92 BORZACOV, Yêdda Pinheiro. PORTO VELHO: 100 ANOS DE HISTÓRIA. 1907-2007. P. 146-147. (Arquivos da Biblioteca Municipal de Porto: Francisco Meireles). 458 Fonte: Jornal O Guaporé, 16 de Julho de 1982. (Arquivos do Centro de documentação histórica de Rondônia). Mediante os fatos podemos concluir que a criação da Unir não ocorreu de imediato, mas tendo sido assinado o Projeto de criação em 08 de julho através da Lei 7.011 passou a vigorar tempos depois (após dois meses aproximadamente), o que ocasionou para a população estudantil um desconforto, principalmente de cunho econômico. Ainda sobre a criação da Universidade, encontramos uma matéria a respeito do primeiro projeto que sugeria uma universidade para o Estado. Conforme notícia do Jornal O Guaporé de 01 de julho de 1982, o projeto para a criação da Universidade havia sido proposto em 1976, quando o então deputado Jerônimo Santana ofereceu à consideração da Câmara Federal o projeto de lei nº 2.747, no entanto essa proposta terá sido rejeitada. Em 1977 Jerônimo reapresentou o projeto, sendo aprovado por todos na Câmara naquela ocasião. No entanto o governo resolveu desprestigiar a iniciativa parlamentar e engavetou o projeto não permitindo que nem fosse colocado na ordem do dia. Na foto a seguir encontra-se o deputado Jerônimo falando à Câmara quando houve a criação da UNIR (em 1982), para ele uma vitória de todos, vejamos. Figura 2: Primeiras fustigações a respeito da criação da Unir 459 Fonte: O Guaporé, 01 de Julho de 1982. (Arquivos do Centro de documentação histórica de Rondônia). Como retrata a imagem, no discurso de Jerônimo Santana encontramos palavras que demonstram uma luta à priori e nesse momento "uma conquista do povo" a esperança de novos momentos, a 22 de junho de 1982 no jornal O Guaporé - quando na criação da universidade - ressaltamos a seguinte frase que demonstra seu pensamento diante do aflorar da Universidade. "Trata-se de uma conquista de nossa gente, criada como imperativo de desenvolvimento econômico, social, cultural e político do Estado". (...) "Muito lutei para chegarmos a essa conquista, em favor da juventude de Rondônia e com ela hoje regozijamo-nos por mais essa vitória." 93 Entendemos assim que nesse momento a representação da universidade para a esfera parlamentar era projetada como um elemento parte da criação do Estado, no entanto analisando as páginas posteriores observamos que há também na criação da universidade a representação de um status político, que desejava pela barganha social um novo olhar... 93 Palavras do deputado Jerônimo Santana em declaração de voto na Câmara Federal, no dia 22 de Junho de 1982, quando da criação da Universidade Federal de Rondônia. Fonte: Jornal O Guaporé. 01 de Julho de 1982, p. 3. (Arquivos do Centro de documentação histórica de Rondônia). 460 Se atentarmos para as várias notícias a respeito da criação da universidade, veremos um ponto que é comum a todas: o desenvolvimento ocasionado para o estado em virtude da criação da universidade. Compreendemos mediante as palavras dos atores sociais da época (encontrados nos jornais de 1982 e nos anos posteriores) que a Universidade Federal de Rondônia era sim do interesse de "todos", pois além de proporcionar conhecimento para toda a população (tendo em vista que era pública), ela habilitaria vários profissionais, tanto para a saúde como para a educação; sem a atuação de uma universidade no estado todos continuariam a esperar profissionais que migravam de outras regiões para atender a demanda local, então ter uma universidade própria no estado era uma conquista para o povo rondoniense e isso significava desenvolvimento. III. A UNIR AO LONGO DE SUA PRIMEIRA DÉCADA III. I O que somos e para onde vamos? Castoriadis (1987) analisa um conceito teórico que chama de autoinstituição. Para este autor autoinstituição é a forma como determinado grupo cria seu mundo, sua forma de entender a uma dada realidade, por normas, valores, formas de analisar a vida e a morte. Segundo ele são estes fatores que criam diferentes formas de entender o real, “criações específicas aparecem em seu interior”. A partir desse elemento teórico nos propomos a analisar a seguinte problemática: "O que somos e para onde vamos?" Percebemos que essa é a questão mais presente, nos textos produzidos logo nos primeiros anos de funcionamento da Universidade. A discussão de qual seria a proposta e objetivos da Universidade Federal de Rondônia, foi um elemento a ser discutido pelo primeiro reitor, Euro Tourinho Filho. É claro que também foi motivo de debate por outros reitores, mais a necessidade de se autoinstituir parecia gritante e real nos primeiros anos de funcionamento desta instituição. Euro Tourinho filho, agrônomo e conhecedor da literatura regional, descreve de forma simples e coerente quais seriam as bases da Universidade Amazônica. Ele destaca em seu discurso a posição que Rondônia encontra-se e toma-o como elemento de projeção para entender de que forma a universidade poderia atuar. Euro Tourinho de posse dos conhecimentos das bases de uma universidade começa a pensar além do Ensino e da Pesquisa. Eis a seguir um trecho extraído de um jornal - sem referência. 461 A ideia de transformar a Unir numa Universidade Amazônica para todo o continente irá exigir profissionais do mais alto nível atuando em Rondônia. Isso, de acordo com o reitor Euro Tourinho Filho, será possível graças a um convenio entre a instituição, o centro de desenvolvimento e apoio Técnico à Educação - CEDATE - e o Ministério da Educação e Cultura - MEC. (Jornal sem Referência - Centro de Documentação do Estado de Rondônia). Nossa UNIR - e este é nosso maior compromisso com Rondônia - deverá ser uma Universidade diferente. Diferente pelas suas diretrizes, diferente pela sua ideologia, diferente pelos seus objetivos, diferente pelas suas funções comunitárias, diferente pelo seu quadro de professores, competentes, dedicados e conscientes do papel de “agentes de mudanças comportamentais”, diferente pela sua vocação Amazônica, diferente pela sua preocupação com as gerações futuras, diferente pelo seu compromisso com a qualidade de ensino, diferente pelo seu reitor, que na verdade, é mais empresário do que professor, é mais pesquisador do que acadêmico. Talvez, ao me indicar reitor, nosso governador Jorge Teixeira de Oliveira tenha querido dar resposta a um dos problemas terríveis da universidade brasileira, rica de doutores e pobre de competência gerencial. (Discurso de Posse de Euro Tourinho, setembro de 1982. Centro de documentação histórica de Rondônia). Sem dúvida este processo de escolha do modelo da Universidade, ou melhor, de um projeto político pedagógico, não é inocente. É nítida a escolha de um modelo voltado para atender as necessidades da elite do recém-criado Estado de Rondônia. Temos como exemplo a criação dos cursos de licenciaturas que visavam atender a demanda de profissionais na área da educação, elemento este cobrado pelo Poder Executivo Federal com a ação da sociedade política local. Também podemos observar na escolha de cursos técnicos, que o são praticamente todos na área de agropecuária, elemento assim caracterizado pela ligação direta com a principal vocação econômica do estado na década de oitenta. Como foi mencionada, a escolha do modelo político e pedagógico da universidade não é inocente, tanto do ponto de vista a quem quer atender, como também reflete as problemáticas de uma jovem Universidade, que por determinação de instâncias superiores tem uma cobrança de um status: Ensino e Pesquisa. É interessante resaltar que é latente nesse mesmo período a grande falta de estrutura na Universidade bem como a ausência de professores e de produção científica, etc. Destacamos também o forte envolvimento da reitoria nas edições de jornais, existem várias notícias que são caracterizadas como textos de autoria do reitor Euro Tourinho. Ora na falta do que se projetar no sentido da falta de elementos consolidados de uma Universidade aponta: 462 É de se indagar: que capacidade de influência dispõe o professor sobre os educandos, se ele, o AGENTE DE MUDANÇAS, tem péssima aparência pessoal (cabelo, barba, unhas, dentes, indumentárias e sapatos descuidados), se ele, o LIDER, é um descomprometido com o horário, com a preparação das aulas e dos recursos instrucionais. (TOURINHO, Euro Filho. Perfil Ideológico da Universidade Federal de Rondônia. - 1983. Panfleto. Disponível no Centro de documentação histórica do Estado). Em virtude do que relatei a pouco, a fala acima é muito presente na narrativa do primeiro reitor desta Universidade, em seus escritos feitos com ótima coerência textual tenta mostrar que a Unir é uma Universidade, e ao falar de suas atividades naquele período enfatiza sobre os elementos teóricos sobre ensino e aprendizagem ou, se projetar sobre o futuro, problemática não apenas da Unir, mas de um Jovem de qualquer Centro de ensino Superior. Além disso, podemos através dos jornais O Guaporé de 1982 identificar matérias que retratavam claramente os esforços políticos por criar uma universidade e justificar essa atitude como favorável ao desenvolvimento econômico, social e cultural para a população do Estado. IV. ENSINO & PESQUISA NOS PRIMEIROS ANOS Sem dúvida não foi fácil para UNIR se tornar de fato uma universidade no que se refere a sua atuação no ensino e na pesquisa. Principalmente nos primeiros anos, visto que o MEC através de acordos de repasse de dinheiro exigia uma produção científica. A grande dificuldade encontrada naquele período era a universidade não contar (em sua maioria) com profissionais conhecedores de um nível teórico metodológico que desenvolvessem um objeto de pesquisa, bem como a ausência de laboratórios científicos no campo das Ciências exatas e da Terra o que dificultava o salto qualitativo da Universidade. Um ano após a criação da Universidade, seu primeiro - Reitor Euro Tourinho indagado sobre a situação da Pesquisa na Universidade responde ao jornal Alto Madeira: A Unir aplicará também no seu ritmo de trabalho, as linhas de ação do governo Jorge Teixeira, sobretudo no que diz respeito a dois aspectos: Treinamento de mão de obra e montagem de uma Infraestrutura de pesquisa pura. Tourinho Filho detalha essas metas: - Parece um pesadelo, mas queremos sair do baixo rendimento para um desempenho com maior eficiência. Isso exigirá um acompanhamento e avaliação permanente do trabalho de cada departamento. Apesar de tudo, Tourinho Filho concorda com a tese de que a função da pesquisa se torna cada vez mais difícil da Universidade: Hoje em dia a pesquisa cientifica são cada vez mais caras exigem equipamentos complicados, pessoal especializado etc. e a Universidade não tem estes recursos. Quase não existem também mecanismos adequados para premiar e 463 fortalecer o pesquisador mais talentoso, e afastar o medíocre e o incompetente. (Jornal Alto Madeira, 18 agosto de 1983). As palavras acima são passíveis de diversas análises. Na fala de Tourinho percebemos a fraqueza da pesquisa naquele momento, pois na realidade a Unir se dedicava unicamente ao ensino, atendendo as necessidades das escolas públicas do Ensino Fundamental e Médio, que consistia na formação de professores. A pesquisa não era a tônica da UNIR. Pelo contexto histórico e político em que se encontrava o próprio estado de Rondônia, a pesquisa era uma área ainda a ser conquistada, de forma que não atendia os critérios básicos de uma Universidade. Observa-se que o referido reitor deixa clara a ligação dos interesses do governo do estado num sentido de atuação da Universidade, como dito anteriormente: "formar profissionais para o quadro técnico do jovem estado", bem como profissionais voltados ao agronegócio, principal fator econômico de Rondônia naquele período. O t