relatório setorial final - NMEturma012010
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relatório setorial final - NMEturma012010
RELATÓRIO SETORIAL - FINAL SETOR: FARMACÊUTICA - LAB NACIONAIS PESQUISADOR: MARA PINTO DATA: 09/02/2004 ANEXOS: Ver Sumário Executivo: O setor farmacêutico no Brasil é composto por um número muito maior de empresas nacionais que transnacionais, mas o faturamento total das transnacionais é, aproximadamente, três vezes maior do que o faturamento das nacionais. Assim como em outros setores da economia, os agentes geradores desse panorama são históricos e podem ser estudados por diferentes aspectos. Um desses aspectos é o nível de pesquisa e desenvolvimento tecnológico (P&D) das empresas que, por estarem diretamente ligados à capacidade produtiva e ao lançamento de novos produtos, são de alto valor estratégico. Os estudos realizados anteriormente na cadeia produtiva do setor farmacêutico indicam que as transnacionais concentram a maior parte de P&D em seus países de origem, deslocando a parte de produção e comercialização dos produtos para outros países. Essa tendência é constatada até mesmo quando as empresas transnacionais dão a localização de seus centros de pesquisa em seu material de divulgação, como por exemplo, em páginas da internet. Medidas governamentais de implementação e estímulo para atividades de P&D no país podem ser adotadas de maneira mais eficaz a partir de um melhor entendimento da intensidade do esforço tecnológico que as empresas do setor realizam. Por essa razão, dez empresas foram escolhidas para o estudo mais detalhado e a entrevista. Os fatores em comum entre elas são a origem do capital, nacional, e o fato de terem apresentado em seu material de divulgação menção destacada à pesquisa pela empresa. Considerando que uma parte importante da pesquisa em medicamentos é realizada na fase da produção da matéria prima, duas empresas farmoquímicas, três fitoterápicas e uma de origem biotecnológica foram avaliadas, além das quatro farmacêuticas. Para as farmacêuticas, com o intuito de facilitar a interpretação dos resultados, as principais atividades tecnológicas realizadas pelas empresas são citadas em ordem crescente de acordo com o grau de sofisticação exigido. As atividades são: · (A) Produção de similares; · (B) Produção de genéricos; · (C) Síntese química; · (D) Inovações incrementais . Duas empresas farmacêuticas caracterizaram-se por realizar as quatro atividades (A-D). São as empresas de maior faturamento (R$ 300 e 400 milhões) e, aproximadamente, a mesma porcentagem de investimento em P&D (1,5%). As inovações incrementais, o ponto mais forte dessas empresas, coloca-as em destaque com relação às outras empresas. Estas inovações foram basicamente resultantes de combinações inteligentes de medicamentos, mudança em adjuvantes e mudanças estruturais em moléculas já conhecidas que ocasionaram melhorias no desempenho do medicamento. Uma terceira empresa farmacêutica, que embora tenha declarado um investimento de 19% em P&D e o faturamento de R$ 3 milhões, não apresentou inovações incrementais em seus produtos, atendo-se às atividades A e C. Pode-se dizer que apesar do grande empenho investido na capacidade de síntese química desta empresa, os resultados em termos de inovação são modestos, especialmente se a compararmos com as duas empresas citadas anteriormente. A quarta empresa farmacêutica, com faturamento maior que a terceira (R$ 144 milhões) e sem declarar o investimento em P&D, mostrou-se a mais frágil tecnologicamente, realizando apenas a atividade de produção de similares (A). As duas empresas farmoquímicas apresentaram discrepância na dimensão tecnológica. Uma delas possui alto coeficiente de exportação, material humano qualificado (dois mestres e três doutores), sintetiza 100% dos seus produtos e parte para associação com uma empresa americana que pretende desenvolver moléculas novas (que poderíamos classificar na categoria de inovações radicais). A segunda empresa, que embora tenha um faturamento três vezes maior que a primeira exporta apenas 3% dos seus produtos, possui somente um funcionário com mestrado e sintetiza 70% dos produtos. Quanto às três fitoterápicas avaliadas, destacam-se dois fatores comuns: o volume de pesquisas realizadas nas empresas é nulo e muitas pesquisas clínicas são realizadas em convênio com universidades, especialmente para atender às novas normas de legislação da ANVISA. Apenas uma delas possui uma pesquisa em convênio com uma universidade que foge dos estudos clínicos e tem por objetivo a clonagem de plantas para maior padronização da matéria prima. A produção de extratos de plantas é totalmente terceirizada em uma empresa e parcialmente terceirizada nas outras duas empresas. A empresa de biotecnologia avaliada é a única no país que se propõe a montar um banco de extratos de plantas originárias de florestas brasileiras e a extrair princípios ativos que posteriormente, depois de testes (inúmeros), poderão tornar-se moléculas aplicadas na produção de medicamentos. Por apresentar uma proposta diferenciada, onde os riscos envolvidos são muitos, conseguiu avançar financeiramente por meio de um contrato com uma grande multinacional, mas atualmente passa dificuldades em conseguir novos contratos. Posteriormente à realização da entrevista, esta empresa conseguiu uma participação acionária de um grande grupo privado nacional, por uma quantia que diversas fontes classificam como muito inflacionada. 1. Fontes de Informações sobre o Setor: 1.1. Estudos acadêmicos: Nacionais Quatro grupos merecem destaque pela publicação de textos relevantes para o entendimento dos diversos aspectos do setor farmacêutico brasileiro: · Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP), FIOCRUZ-RJ · Universidade Federal do Rio de Janeiro (Grupo Inovação - Instituto de Economia) · Universidade Estadual de Campinas: no Núcleo de Estudos de Políticas Públicas - Instituto de Economia · Universidade Estadual de Campinas: Departamento de Política Científica e Tecnológica - Instituto de Geociências. Os estudos acadêmicos abordam, prioritariamente: · · · · a a a a produzidos por pesquisadores destes grupos estrutura produtiva competitividade do setor, regulação de mercado legislação no setor farmacêutico. Os aspectos da inovação, pesquisa e desenvolvimento são apontados, nestes estudos, sempre como um ponto de fragilidade do setor nacional, mas sem uma abordagem de maior profundidade. Internacionais A página do European Innovation Monitoring System (EIMS) oferece estudos acadêmicos e avaliações sobre novas tecnologias e políticas de inovação em diferentes áreas da economia européia. Na página do European Pharmaceutical Regulation & Innovation Systems (EPRIS), artigos mais específicos e aprofundados referentes às questões de inovação e P&D na indústria farmacêutica são encontrados. Além disso, caminhos de acesso a outros importantes centros de informação técnica estão disponíveis, como por exemplo, o Centre for Research on Innovation and Internationalisation Processes (CESPRI). 1.2. Fontes setoriais - entidades patronais: Estudos setoriais muito elucidativos estão disponíveis na página do Ministério do Desenvolvimento Industria e Comércio - MDIC (). Na Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA (www.anvisa.com.br) encontram-se as informações mais recentes sobre a legislação do setor farmacêutico brasileiro. As leis podem ser consultadas na íntegra, mas em alguns casos, as dúvidas podem ser esclarecidas em textos organizados, didaticamente, por meio de perguntas e respostas. A Federação Brasileira da Indústria Farmacêutica - FEBRAFARMA (www.abifarma.com.br) disponibiliza dados estatísticos sobre o mercado farmacêutico com citação das fontes, informa sobre eventos relativos ao setor, destaca as notícias atuais e traz artigos sobre a indústria farmacêutica. Outras instituições que trazem informações sobre o setor: · · · Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos no Estado de São Paulo -SINDUSFARMA (www.sindusfarma.org.br) Associação Brasileira das Indústrias Químicas ABIQUIM (www.abiquim.org.br) Associação Brasileira da Indústria Farmoquímica ABIQUIF (www.abiquif.org.br) 1.3. Publicações jornalísticas: Especialmente após a Lei de Patentes e o impacto dos genéricos no mercado nacional, muitas publicações sobre a indústria farmacêutica podem ser encontradas em periódicos não científicos. Nestas publicações, encontram-se análises de políticos, pessoas da indústria farmacêutica e da academia sobre o setor. Artigos dessa natureza, em que os pontos de vista podem variar de acordo com o grupo a que o analista pertence, são muito saudáveis para formar o mosaico representativo do setor farmacêutico. Poucas análises de caráter mais técnico sobre P&D são encontradas em periódicos como, por exemplo: Comciencia, B2B e Comtexto. A revista GRUPEMEF, com periodicidade bimestral, aborda temas diretamente ligados à indústria farmacêutica. Em jornais como Gazeta Mercantil e Valor Econômico encontram-se artigos que analisam os aspectos estruturais da indústria farmacêutica. 1.4. Fontes estatísticas: Nacionais Para as estatísticas referentes ao comércio interno, O Grupo dos Profissionais Executivos do Mercado Farmacêutico (GRUPEMEF) é a fonte primária citada por todas as associações e sindicatos do setor (www.grupemef.com.br). O grupo é formado por profissionais de 95 empresas: · · 60 de laboratórios que representam 82% do faturamento do setor 35 de empresas prestadoras de serviços para indústria farmacêutica. Os dados fornecidos não são estimativas, mas compilação das informações enviadas pelas empresas para vendas em farmácias e hospitais. Os dados de comércio exterior citados pelas associações e sindicatos têm como fontes primárias o Ministério do Desenvolvimento Indústria e Comércio Exterior (MDIC) e a Secretaria de Comércio Exterior (SECEX). Internacionais Os dados do IMS Health (ims-global.com) são estimativas a partir dos distribuidores de medicamentos. É uma fonte de dados fortemente reconhecida mundialmente, que apresenta dados e análises comparativas do setor em diferentes países. Representada pelas indústrias líderes do mercado, a Pharmaceutical Research and Manufacturers of America - PhRMA, (phrma.org) analisa os dados estatísticos da indústria farmacêutica internacional sob a ótica empresarial. Os aspectos referentes à legislação de cada país, que causam efeitos no comércio das indústrias farmacêuticas, também são discutidos. 2. Introdução: O setor farmacêutico, desde o seu estabelecimento na Europa, na metade do século XIX, até os dias atuais, é um dos setores industriais que mais se sustenta com base em pesquisa e desenvolvimento (P&D) tecnológico (Achilladelis e Antonakis, 2001). Pelas características inerentes à produção de medicamentos, pode-se identificar quatro estágios da cadeia farmacêutica (Queiroz e González, 2001): o · 1 estágio - P&D de novos princípios ativos, também chamados de fármacos. É o estágio que mais envolve riscos de insucesso e necessita altos investimentos. Divide-se em fase pré-clínica e clínica. Estas fases serão abordadas com maiores detalhes na Seção 3.1. · 2 estágio - Produção em escala de fármacos. · 3 estágio - Produção de medicamentos - fase em que os fármacos são misturados aos adjuvantes e embalados. · 4 o o o estágio - Introdução dos medicamentos no mercado. Acompanhando as fases da cadeia de produção, compreende-se que a indústria farmoquímica, responsável pela matéria-prima necessária à formulação de medicamentos, está ligada à indústria farmacêutica de forma bastante intrínseca. Observa-se, porém, peculiaridades inerentes a cada setor (farmoquímica e farmacêutica). No que se refere à localização de plantas, por exemplo, a produção de fármacos e de medicamentos comporta-se de maneira diversa. A indústria farmacêutica é fortemente internacionalizada, ao passo que a produção de fármacos é mais concentrada em determinados centros como os EUA, países da Europa, Índia e China. Esse dado indica que a importância da proximidade dos mercados é maior para a produção de medicamentos que de fármacos (Hasenclever, 2001). o o Para a execução dos 3 e 4 estágios da cadeia produtiva, há a necessidade de interação da indústria farmacêutica com os segmentos de embalagens, equipamentos especializados, marketing e distribuição dos produtos às clínicas, farmácias e hospitais (Hasenclever, 2001). As grandes multinacionais farmacêuticas realizam os quatro estágios, porém, centralizam os dois primeiros em seus países de origem e os dois últimos em outros países, valendo-se do comércio intra-firmas (Queiroz, 1993). 2.1. Classificações do setor: Critérios utilizados internacionalmente para a classificação dos medicamentos Os medicamentos podem ser classificados segundo: · natureza da matéria prima · necessidade de prescrição médica · caráter de essencialidade · características dos produtos Natureza da matéria prima: a matéria-prima utilizada para a produção de medicamentos pode ser (Hasenclever, 2002): · originária da síntese fina de materiais orgânicos (farmoquímicos); · obtida a partir de processos que utilizem a biologia molecular (biotecnológicos); · obtida a partir do isolamento de substância medicamentosa encontrada em material botânico integral ou em seu extrato (fitoterápicos). Atualmente, os farmoquímicos, esmagadoramente, representam a maior parte da matéria prima utilizada mundialmente. Entretanto, as mudanças na estrutura de P&D do setor apontam para um aumento na matéria prima obtida por processos biotecnológicos (Malerba e Orsenigo, 2001). As Novas Firmas de Biotecnologia (NFBs), que fazem parte desta nova estrutura, serão tratadas adiante com maior detalhamento. Quanto ao terceiro tipo de matéria-prima, os fitoterápicos, também representam um mercado razoavelmente novo, tendo iniciado seu crescimento nos anos sessenta (Queiroz e González, 2001). Os valores de vendas de medicamentos fitoterápicos para o ano de 2000 na Europa e nos EUA foram de US$ 8,5 e US$ 6,3 bilhões, respectivamente (Simões e Schenkel, 2001). Necessidade de receita médica: de acordo com este critério, os medicamentos são diferenciados entre (Hasenclever, 2001): · os que necessitam de prescrição médica (éticos); · os que são de venda livre (não éticos ou também chamados OTC, sigla da nomenclatura inglesa, over the counter). Os produtos éticos participam com 70% do faturamento do setor (Romano e Bernardo, 2001). A análise do mercado dos medicamentos não éticos é semelhante à análise de outros bens de consumo não duráveis, diferentemente dos medicamentos éticos, em que a decisão de consumir não está, em condições normais, nas mãos do consumidor (Frenkel, 2001). Caráter de essencialidade: são os medicamentos classificados pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como de máxima importância e indispensáveis à saúde da população. Esta classificação formal, entretanto, não garante que os remédios essenciais sejam produzidos. Um trabalho realizado pela Organização Internacional Médicos Sem Fronteiras (MSF), denominado Remédios para Doenças Negligenciadas, mostrou o grau da defasagem de medicamentos para doenças tropicais (Galeno e Jansen, 2002): · dos 1.393 novos medicamentos aprovados nos últimos 25 anos, 13 tratam de doenças tropicais e dois de tuberculose; · dos 13 medicamentos para doenças tropicais, seis foram desenvolvidos com o apoio de um programa financiado pela Organização das Nações Unidas, Banco Mundial e OM S. Este programa, chamado Treinamento para Doenças Tropicais (TDR), funcionou com a modesta cifra de US$ 30 milhões anuais. Características do produto: este critério pode ser subdividido em: · forma de apresentação - líquidos, injetáveis, comprimidos, pomadas; · classes terapêuticas (atuação). Os dados do IMS, obtidos nos 13 países com maior faturamento do setor farmacêutico, no período de fevereiro de 2001 a janeiro de 2002, apontaram que as cinco classes terapêuticas mais vendidas foram os medicamentos: ! cardiovasculares; · para o sistema nervoso central; · para o metabolismo alimentar; · os respiratórios; · os antiinflamatórios. Pelas características do setor, as empresas disputam fatias do mercado, de modo que as inovações em uma classe terapêutica não asseguram o sucesso em outra (Malerba e Orsenigo, 2001). Mesmo nos EUA, país mais representativo do setor farmacêutico, observa-se que as diferentes empresas dominam classes terapêuticas distintas. Por exemplo, os cinco produtos mais vendidos, suas respectivas classes terapêuticas e empresas, em 2001 foram (IMS, 2002): · Lipitor (cardiovascular - Pfizer) · Prilosec (metabolismo alimentar- Astra Zeneca) · Zocor (cardiovascular - Merck) · Prevacid (metabolismo alimentar - Tap) · Celebrez (antiinflamatório - Pharmacia) Classificação ANVISA - Brasil No Brasil, o Ministério da Saúde, através da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), regulamenta e fiscaliza a produção da indústria farmacêutica brasileira. A ANVISA adota a seguinte classificação e definições técnicas para delinear as normas do setor (ANVISA, 2002): ! Medicamentos de referência ou marca: são, normalmente, medicamentos inovadores, cuja eficácia, segurança e qualidade foram comprovadas cientificamente, por ocasião do registro junto ao Ministério da Saúde, através da ANVISA. São os medicamentos que, geralmente, se encontram há bastante tempo no mercado e têm uma marca comercial conhecida; ! Medicamentos similares: os similares são medicamentos que possuem o mesmo fármaco, a mesma concentração, forma farmacêutica, via de administração, posologia e indicação terapêutica do medicamento de referência, mas não têm sua bioequivalência com o medicamento de referência comprovada; ! Medicamento genérico: é aquele que contém o mesmo fármaco (princípio ativo), na mesma dose e forma farmacêutica, é administrado pela mesma via e com a mesma indicação terapêutica do medicamento de referência no país, apresentando a mesma segurança que o medicamento de referência no país. Classificação das atividades - IBGE - CNAE Em termos de classificação de atividades, o Cadastro Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) classifica: · a indústria farmoquímica na Classe 24.51 - Fabricação de farmoquímicos · a indústria farmacêutica na Classe 24.52 - Fabricação de medicamentos para uso humano. Ambas estão dentro do Grupo 24.5 (Fabricação de Produtos Farmacêuticos), que por sua vez está na Divisão 24 (Fabricação de produtos químicos). Classificação de produtos A Nomenclatura Comum de Mercadorias (NCM) é comum aos dois setores para o nível de Divisão, diferenciando-se a partir de Grupo e Classe. Classificação patentária As categorias patentárias podem ser divididas, de acordo com a natureza de produção dos medicamentos, em produtos químicos e biotecnológicos. Os biotecnológicos são entendidos como aqueles derivados de processos tecnológicos aplicados a seres vivos ou às suas partes funcionais isoladas. A descoberta e o desenvolvimento do DNA recombinante em 1974 foi o marco para dividir produtos biotecnológicos em tradicionais e modernos (Bermudez et al., 2000). A possibilidade de manipulação do DNA, ou seja, do material genético dos organismos trouxe a base da engenharia genética que, por exemplo, pode produzir microorganismos modificados artificialmente capazes de fornecer produtos como a insulina e o interferon. Considerando a legislação de propriedade industrial, os medicamentos podem ser divididos entre os que apresentam patentes e aqueles com patentes expiradas. Internacionalmente, os medicamentos protegidos por patentes são, mais uma vez, subdivididos em duas categorias. Os que apareceram pela primeira vez no mercado, ou os produtos inovadores, e o medicamento desenvolvido posteriormente com atividade terapêutica semelhante ao primeiro produto, mas com características químicas diferentes do medicamento inovador, denominado me too (Frenkel 2001). 2.2. Importância do setor em termos quantitativos: O faturamento do setor farmacêutico mundial em 2001 foi de US$ 364,2 bilhões, representando um aumento de 12% sobre o ano anterior. Deste montante, a proporção de vendas de medicamentos referentes às principais regiões do mundo foi de (IMS, 2002): · · · · · 50% para a América do Norte 24% para a Europa 13% para o Japão 8% para a Ásia, África e Austrália 5% para a América Latina. É considerado um setor oligopolista, pois embora existam 10.000 empresas fabricantes de produtos farmacêuticos, em apenas 100 estão concentrados 90% dos produtos farmacêuticos para consumo humano (Bermudez, et al. 2000). As dez empresas do setor que apresentaram maiores faturamentos no período de julho de 2001 a julho de 2002 foram (IMS, 2002): · · · · · · · · · · Pfizer (EUA) Glaxo SmithKline (Inglaterra) Merck (EUA) Astra Zeneca (Inglaterra) Novartis (Suécia) Johnson & Johnson (EUA) Bristol Myers Squibb (EUA) Aventis (Alemanha) Pharmacia (EUA) Wyeth (EUA). Em 2001, as duas empresas que apresentaram maiores lucros foram Pfizer (atualmente unida com a Pharmacia) com US$ 7,8 bilhões e Merck com U$ 7,3 bilhões, contando cada uma com quatro blockbusters (medicamentos com mais de US$ 1 bilhão em vendas) no mercado (Citizen, 2002). A representatividade dos blockbusters nas vendas do setor farmacêutico aumentou de 18% em 1997 para 45% em 2001. A indústria farmacêutica brasileira ocupa, atualmente, a décima posição mundial dentre os países com maior faturamento no setor (Frenkel, 2002), sendo os EUA, Japão e Alemanha, os três primeiros. O faturamento brasileiro apontado para o ano de 2000 foi de US$ 6,7 bilhões e para 2001 foi de US$ 5,6 bilhões (Sindusfarma, 2002), uma variação que está relacionada à oscilação cambial do período. Sempre que ocorre uma desvalorização importante da moeda nacional, os fabricantes têm alguma dificuldade de repasse integral imediato, e absorvem uma parcela deste impacto. Na América Latina, México e Brasil se destacam como os países com maiores faturamentos do setor. No período de Julho/2001 até Julho/2002, as vendas aferidas em farmácias apontaram US$ 5,9 bilhões para o México e US$ 4,1 bilhões para o Brasil. Em relação ao ano anterior estes números representam um aumento de 12% no mercado mexicano e, contrariamente, um decréscimo de 12% no mercado brasileiro (IMS, 2002). Comparativamente, o primeiro país da lista, ou seja, os EUA obtiveram em 2001 um faturamento de US$ 172 bilhões (Blankenhorn e Lipson, 2002). Brasil: farmacêutica e farmoquímica Em consequência da interdependência das indústrias farmacêutica e farmoquímica, os dados obtidos por meio da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), foram desagregados com a finalidade de avaliação comparativa entre os setores (Anexos 2.2a e 2.2b ). Dos dados levantados a partir da RAIS, dois itens chamam a atenção por ilustrarem, por um lado, uma grande diferença na magnitude e, por outro, uma semelhança entre os setores farmacêutico e farmoquímico. A grande discrepância está no número de empregados, sete vezes maior na indústria farmacêutica que na farmoquímica. A semelhança aparece na distribuição de empregados em suas funções. Na indústria farmacêutica e farmoquímica, respectivamente, dá-se da seguinte maneira: · químicos ou físicos 0,9% e 1,4%; · engenheiros 0,4% e 0,6%; · · técnicos 3,3% e 4,4%; demais funções 95,4% e 93,8%. Para áreas consideradas de alto nível tecnológico, esse baixo número de funcionários em funções mais especializadas é, no mínimo, intrigante. 2.3. Elementos Institucionais: Historicamente, em âmbito mundial, o desenvolvimento da legislação para novas drogas foi impulsionado pela repercussão dos efeitos teratogênicos (mal formação em fetos), causados pela droga talidomida na década de sessenta. Embora a estrutura da legislação apresente diferenças de país para país, etapas como o desenvolvimento, produção, forma de estocagem, distribuição e vendas de medicamentos sofrem intervenção governamental na maioria dos países. Garantias de boas práticas de fabricação e testes de eficiência e segurança de novos medicamentos fazem parte das normas exigidas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para o setor. Provavelmente, o Food and Drug Administration (FDA), órgão americano de regulamentação do setor, seja o mais conhecido internacionalmente e suas normas consideradas as mais restritivas. Uma análise mais detalhada das normas adotadas pela legislação americana para o setor farmacêutico, em comparação com aquelas adotadas por alguns países da África e América Latina (Colômbia), pode ser encontrada em um estudo realizado pela OMS (Wondemagegnehu, 1999). Como já salientado na Seção 2.1, no Brasil a ANVISA é o órgão responsável pela regulamentação do setor e adota definições específicas para os diversos tipos de medicamentos. A partir da Lei 9787 de 10 de fevereiro de 1999, os medicamentos genéricos passaram, obrigatoriamente, a vigorar no Brasil. A ANVISA avalia os testes de bioequivalência entre o genérico e seu medicamento de referência, apresentados pelos fabricantes, para comprovação da sua qualidade (ANVISA, 2002). A partir de abril/2001, os medicamentos similares tiveram que comprovar equivalência farmacêutica e bioequivalência com o medicamento de referência, transformando-se em genérico ou medicamento de marca. Equivalência farmacêutica e Teste de Bioequivalência Segundo a legislação brasileira (...) o medicamento genérico deve ser equivalente farmacêutico ao seu respectivo medicamento de referência, ou seja, deve conter o mesmo fármaco, na mesma dosagem e forma farmacêutica. O teste de equivalência farmacêutica é realizado in vitro (não envolve seres humanos), por laboratórios de controle de qualidade habilitados pela ANVISA. O teste de bioequivalência consiste na demonstração de que o medicamento genérico e seu respectivo medicamento de referência apresentam a mesma biodisponibilidade no organismo. A biodisponibilidade relaciona-se à quantidade absorvida, à velocidade do processo de absorção do fármaco liberado e à forma farmacêutica administrada. Quando dois medicamentos apresentam a mesma biodisponibilidade no organismo, sua eficácia clínica é considerada comparável (ANVISA, 2002). Os testes clínicos ou pesquisas clínicas são realizados em seres humanos para a avaliação da segurança, toxicidade e eficácia da ação terapêutica de um novo fármaco, ou para validar testes de bioequivalência. O desenvolvimento e as etapas das pesquisas clínicas serão detalhados na Seção 3.2. Para entrar com pedido de autorização para a realização de uma pesquisa clínica, a empresa farmacêutica deverá providenciar 11 documentos exigidos pela ANVISA. Entre eles, um parecer do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da instituição onde será realizada a pesquisa, aprovando o protocolo clínico e seu Consentimento Livre e Esclarecido. Neste documento devem constar o nome do pesquisador responsável, o embasamento científico e a adequação dos estudos da fase pré-clínica, com ênfase na segurança, toxicidade, reações ou efeitos adversos, eficácia e resultados. Além disso, faz-se necessária a comprovação de que este parecer está devidamente registrado e aprovado na Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP), órgão que avalia as condições éticas envolvidas na pesquisa solicitada. Exige-se também um projeto de pesquisa clínica oriundo do pesquisador principal ou patrocinador, quando houver, à Secretaria de Vigilância Sanitária, e uma declaração do patrocinador ao diretor da área de pesquisa nacional ou internacional, dando todas as informações a respeito da pesquisa que pretende viabilizar. Lei de Patentes Através da Lei de Patentes, ou Lei da Propriedade Industrial 9279/96, aprovada em 14 de maio de 1996, a legislação brasileira passou a conceder o direito de patenteamento a produtos e processos farmacêuticos. A patente tem validade de 20 anos, a partir da data de depósito do pedido (Hasenclever, 2002). Comércio de produtos farmacêuticos As taxas de importação para produtos farmacêuticos (NCM 3000 até 3499) variam de 18% a 25%, dependendo do produto (Mendonça, 1999). O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) é de 18% no Estado de São Paulo, mas decresce para 7% a 12% em outros estados brasileiros (Mendonça, 1999). 3. Estrutura de Mercado, Padrão Competitivo e Estratégias: 3.1. O contexto internacional: Desde a década de oitenta, fatores como aumento nos gastos com P&D, políticas públicas destinadas a aumentar o acesso da população a medicamentos e a entrada da biotecnologia mudaram a estrutura do setor farmacêutico mundialmente. As empresas responderam com o estabelecimento de alianças e fusões para manter e ampliar seus mercados (Sharp e Patel, 2003). Países com indústria farmacêutica fortemente estabelecida realizam P&D e centralizam a produção de fármacos e medicamentos dentro do país. Para a expansão do comércio, suas empresas distribuem-se por outros países onde realizam a produção e distribuição dos medicamentos. Raramente desenvolvem P&D fora de seus países de origem e, quando o fazem, são em países que compartilham alto grau de avanço tecnológico. O alto grau de tecnologia já conquistado e o comércio intra-firma são pontos fortes para a manutenção destes países como líderes no setor farmacêutico. Paralelamente, o segmento dos genéricos atraiu grandes indústrias de países da Europa e dos EUA devido ao estímulo dos governos em substituir medicamentos de referência por genéricos, em função do preço (Hasencler, 2002). Um fenômeno que, já há algum tempo, vem ganhando força nos EUA é a terceirização das atividades de P&D das grandes multinacionais (Avila, 2003). Essa tendência ocorre, especialmente, com empresas de biotecnologia, porém aparentemente ainda é mais característico dos EUA do que de países europeus (Arora et al. 2000). 3.1.1. Existem configurações nacionais típicas?: Tradicionalmente, empresas alemãs e suíças se estabeleceram como farmacêuticas manufatureiras com forte base científica. No pós guerra, houve um domínio do mercado farmacêutico por empresas americanas, porém, empresas européias, especialmente as de origem inglesa, permanecem entre as líderes do setor. Tomando como parâmetro de mensuração tecnológica o número de novos medicamentos mais vendidos, as empresas alemãs estão em desvantagem em relação às inglesas, que são as líderes dentre as européias do setor (Sharp e Patel, 2003). Cabe a ressalva que a mensuração adequada da inovação tecnológica na indústria farmacêutica é complexa, porque uma grande parte de P&D é destinada a duplicar o trabalho de concorrentes, como por exemplo, pequenas mudanças estruturais em compostos já conhecidos e uma estratégia de patenteamento defensivo. Estudos acadêmicos mostram uma certa relutância das empresas européias em mudarem o paradigma da pesquisa de novos fármacos, que tem a química como ferramenta básica, por empreendimentos de base biotecnológica (Arora et al. 2000; Sharp e Patel, 2003). Esse processo tende a ser acelerado em consequência do estabelecimento de associações entre empresas européias e empresas de base tecnológicas americanas (Sharp e Patel, 2003). A política européia para aumentar as inovações do setor farmacêutico são centradas em (Sharp e Patel, 2003): · dar suporte para as pesquisas básicas realizadas em instituições públicas; · · · encorajar as grandes empresas européias a acompanhar pesquisas realizadas em instituições públicas; ampliar esforços para um único sistema regulamentar europeu, ao invés de políticas nacionais para o setor com o intuito de facilitar o financiamento entre firmas; promover mecanismos para dar maior suporte às empresas de base tecnológica. A indústria farmacêutica nos países em desenvolvimento A configuração da indústria farmacêutica nos países em desenvolvimento é, de maneira geral, marcada pela presença de empresas e instituições locais e das grandes multinacionais européias e americanas. Estas tendem a dominar parcela significativa do mercado. No Brasil, por exemplo, embora as empresas nacionais representem 80% do número total de empresas instaladas no país, elas detêm menos de 20% do mercado, daí, parte das limitações das empresas nacionais em investir em P&D. Em relação à indústria farmacêutica instalada na Argentina, o núcleo central do setor está formado por, aproximadamente, 75 empresas, dentre empresas nacionais, filiais de grandes empresas multinacionais e laboratórios públicos. Assim como na maioria dos países, a indústria farmacêutica na Argentina é muito concentrada, dado que as quatro maiores empresas respondem por 25% do mercado e as oito maiores empresas possuem 28% de todo o mercado argentino de medicamentos. Outro elemento é que 71% do faturamento dos laboratórios teve origem no mercado interno. A concentração naquele mercado é mais pronunciado quando se avalia as vendas locais de importados. Neste critério, as quatro primeiras empresas são responsáveis por 30% das importações (INDEC, 2002). Já na indústria farmacêutica indiana o que se observa é uma alta fragmentação no setor. São mais de 20.000 empresas produtoras domésticas para fins farmacêuticos, isso porque até recentemente havia baixa exigência de capital. Porém, somente 300 empresas estão organizadas setorialmente. E é exatamente esta estrutura que causa intensa competição, especialmente nas drogas a granel (bulk drugs) (Radaelli, 2003). 3.1.2. Marcos do processo de internacionalização: Ao estudar a dinâmica da inovação tecnológica na indústria farmacêutica, desde o seu surgimento até os dias atuais, Achilladellis e Antonakis (2001) identificam três fases no que se refere ao de fluxo de tecnologia e internacionalização no setor. A primeira fase (1880-1950), em que surgiram todas as indústrias que atualmente desenvolvem esforços intensivos em pesquisa e desenvolvimento, foi marcada por limitada transferência de tecnologia entre os países. O cenário político que se apresentava, com a Primeira Guerra Mundial, o período de recessão nos anos 20 e início dos anos 30, e a preparação para a Segunda Guerra Mundial, levou os governos a aumentar as barreiras protecionistas e a diminuir as importações. Na segunda fase (1950-1980), o intercâmbio entre os países foi intensificado através de legislação nacional e acordos internacionais. A transferência de tecnologia foi acelerada, porém as empresas que investiam fortemente em P&D mantiveram seus departamentos de P&D nos países de origem. A fase seguinte iniciada em 1980, e ainda em andamento, caracteriza-se pela globalização dos mercados e mudança na concepção tecnológica que passa a não ser mais totalmente centrada apenas em química orgânica, farmacologia e rastreamento (screening) de moléculas mas, beneficia-se dos avanços em áreas de fisiologia, biofísica, biologia molecular, bioquímica e enzimologia. As empresas com alto esforço em P&D passaram a investir em outros países e as fusões e aquisições ocorreram entre empresas de diferentes países. As inovações alcançadas na fase anterior em determinadas classes terapêuticas, como anti-hipertensivos, analgésicos, antibactericidas e medicamentos para o sistema nervoso central, tornaram-se, nas décadas de 80 e 90, genéricos ou OTCs. As empresas, visando a demanda do mercado, direcionaram suas pesquisas para doenças cardiovasculares, doenças causadas pelo avanço da idade, câncer e doenças virais. As Novas Firmas Biotecnológicas (NFBs), originárias nessa fase, serão detalhadas na Seção 3.2. A associação entre maturidade tecnológica e comercial fez com que algumas empresas mantivessem seus investimentos em P&D ao mesmo tempo que verticalizassem suas atividades com a produção de genéricos e OTCs. Na prática, essa verticalização ocorreu através de dois processos: · deslocamento de segmentos manufatureiros de baixa rentabilidade, mas alta capacitação tecnológica, para países em desenvolvimento (o que criou um fluxo de capital para os setores de pesquisa); · e as aquisições/fusões de outras empresas de manufatura e distribuidores de medicamentos. Como conseqüência desse processo, houve uma concentração de grandes companhias integradas globalmente e a diminuição do número de firmas competindo entre si. A diversificação horizontal das atividades do setor farmacêutico é calcada nas classes terapêuticas. A grande parte das empresas continua desenvolvendo pesquisas em seus países de origem, entretanto, como anteriormente ressaltado, o sucesso em uma classe terapêutica não é correlacionado com o sucesso em outras classes. Porém, através do processo de fusões ou aquisições de empresas com diferentes competências, uma empresa líder em uma área terapêutica pode também ganhar competência em outra. Um exemplo que abrange a diversificação horizontal e a verticalização em uma mesma empresa é o caso da Merck. A fusão com a Sharp & Dohme trouxe-lhe competência na área de diuréticos (Achilladellis e Antonakis, 2001). Em 1993, a Merck comprou a distribuidora de medicamentos Medco Containment Services (Queiroz e Gozález, 2001). 3.1.2.1. Comércio: A América do Norte é o mercado consumidor mais importante e os Estados Unidos o país com o maior nível de consumo e produção em termos monetários, seguido por Japão e Alemanha. Esses três países concentram mais de 60% das vendas totais do setor. Cabe ressaltar que os níveis de consumo do setor farmacêutico estão ligados à renda da população. Por serem produtos na maioria das vezes essenciais à vida do consumidor, o preço não influencia a decisão de compra nas camadas de renda superior (demanda inelástica). Nas camadas intermediárias, a elasticidade-preço é considerável e estratégias de comprar o medicamento mais barato, ou o mais importante, são utilizadas. Em camadas de renda mais baixa, o consumo é difícil mesmo com preços baixos e, especialmente, nestes casos as políticas de distribuição gratuita pelo Estado são fundamentais (Frenkel, 2001). Em 1990, os sete países da OCDE concentravam 67,3% do mercado mundial de medicamentos. Isso se deve, sobretudo, à alta correlação entre o consumo e poder aquisitivo da população (Radaelli, 2003). As grandes líderes do setor concentram, em seus países de origem, as etapas iniciais do processo produtivo, que demandam maior esforço tecnológico e distribuem em outros países unidades de manufatura e comércio dos medicamentos. Nesse contexto, o comércio intra-firma é de elevado valor para as multinacionais. 3.1.2.2. Produção: Um dos fenômenos mais agressivos do setor está relacionado com o crescente grau de centralização e concentração do capital na indústria, manifestado sobretudo, por uma sistêmica onda de fusões e aquisições. A explicação dada pelas grandes empresas baseia-se na necessidade de ganhar escala para manter-se competitivo, para suprir os altos custos em pesquisa, que correspondem em média a 14% do faturamento das grandes empresas. Segundo especialistas, há três razões principais pelas quais as fusões e aquisições (F&A) ocorrem na indústria farmacêutica: · a primeira diz respeito à redução de custos, dado que as empresas envolvidas em F&A normalmente podem reduzir pessoal e fechar fábricas obsoletas; · segundo motivo é a ampliação da capacidade das equipes de venda das empresas. Isso porque os laboratórios farmacêuticos não querem ser vistos como comerciantes agressivos, mas sim, prefeririam que o público acreditasse que os médicos prescrevem seus remédios simplesmente porque são os melhores. Aqui cabe ressaltar que os laboratórios, através de seus representantes, tentam alcançar o consumidor final (o paciente) através de um cliente intermediário (o médico), pois o primeiro não é capaz de avaliar aspectos da qualidade dos medicamentos, sendo preciso a ajuda de um profissional especializado. · a terceira e maior motivação para fusões e aquisições é o aumento do orçamento para pesquisa e desenvolvimento. Embora as grandes empresas farmacêuticas continuem sendo lucrativas, o tempo e os gastos com a descoberta e testes de novos medicamentos têm aumentado ao longo dos anos. Desse modo, a competitividade do setor está baseado no lançamento cada vez mais rápido de medicamentos (Radaelli, 2003). Seguem alguns exemplos dentre as operações de F&A ocorridos na década de noventa. Em termos de aquisições: · a American Home Products (USA) comprou a American Cyanamid (USA) (1994); · Glaxo (UK) comprou a Wellcome (UK) (1995); · Sanofi (FR) comprou a Sterling na linha OTC (USA) (1994); · Johnson & Johnson (USA) comprou a Centour (USA) (2000). Como exemplos de fusões, temos: · Sandoz e Ciba formando a Novartis (1996); · Astra e Zêneca formando a Astra Zêneca (1999); · em 1995 ocorreu a fusão entre a Pharmacia (Suécia) e a Upjohn (USA) formando a Pharmacia & Upjohn; · no ano de 1998 surge a Aventis, resultado da fusão entre o laboratório alemão Hoechst Marion Roussel e o Grupo francês Rhone Poulenc · em 1999, a Pfizer, empresa norte americana, fundiu-se com a também norte americana Warner Lambert, formando Pfizer Inc. · no ano 2000, outra importante fusão ocorreu entre a Pharmacia & Upjohn (Suécia/USA) e a Monsanto (USA) formando a Pharmacia Corp. 3.1.3. Configuração internacional da cadeia / setor / segmento: Um aspecto de grande relevância no setor farmacêutico é o fato de que as empresas líderes acumulam, em média, um século de experiência com crescimento e diversificação, permitindo que se formassem estruturas controladoras de recursos gigantescos, assegurando assim a possibilidade de criação de novas funções, tais como, as produtivas, tecnológicas, comerciais e financeiras. Isso permite às grandes corporações a vantagem de uma atuação verticalizada, isto é, em todos os estágios da produção de medicamentos. A diferenciação entre as grandes empresas farmacêuticas e as químicas é que as primeiras, embora produzam os princípios ativos para seus medicamentos, realizam a maior parte de suas vendas e P&D na fase farmacêutica. Estas empresas, como por exemplo Merck, GlaxoSmithkline, Pfizer, Eli Lilly, compõem a maior parte do setor. De outro lado, as empresas químicas de grande porte, como Bayer, Hoechst, Ciba-Geigy e Rhône-Poulenc, investem na pesquisa e desenvolvimento de farmoquímicos (Queiroz, 1993). Assim, os principais agentes da indústria farmacêutica são empresas de grande porte. Entretanto, nenhuma delas controla uma porcentagem muito elevada do mercado (em média 4%) como se observa em outras indústrias, o que pode caracterizar um setor altamente concentrado. Como os produtos farmacêuticos não são homogêneos, na medida que cada medicamento pertence a uma classe terapêutica, é dentro de cada classe terapêutica que a concentração pode ser muito elevada. Segundo dados do Intercontinental Medical Statistics (IMS), o número de fabricantes de produtos farmacêuticos está por volta de dez mil empresas. Entretanto, deste número, apenas cem empresas são responsáveis por cerca de 90% de todos os produtos farmacêuticos produzidos e destinados ao consumo humano. 3.2. Fatores relevantes para a competitividade no setor: No contexto do setor farmacêutico, os fatores mais relevantes para a competitividade ligados à estrutura interna da empresa são a capacitação e o desenvolvimento tecnológico e as atividades de marketing. Medicamentos não éticos dependem mais do marketing, os genéricos mais da capacitação tecnológica e os de referência de ambos (Queiroz, 1993). As atividades de propaganda e marketing constituem barreiras à entrada de novos produtos uma vez que a manutenção de antigos produtos e o lançamento de novos produtos, requer uma cara e enorme estrutura de marketing. A lealdade à marca é considerada característica histórica da indústria, o que permite lucros contínuos, mesmo depois de expirado o prazo de exclusividade, concedido pela patente (Radaelli, 2003). Com os genéricos essa relação não é tão direta pois sua atuação é na competição por preços, sendo necessário que a propaganda seja intensiva com relação à marca e sua confiabilidade. Além da mídia, bastante utilizada, especialmente, por grandes empresas, a mais forte estratégia de divulgação é realizada na classe médica. Com relação à parte responsável pelo impulso dessa indústria, ou seja, a capacitação e o desenvolvimento tecnológico, conforme salientado na Seção 2, a produção de um medicamento envolve quatro estágios: P&D de novos princípios ativos; produção em escala de fármacos, produção de medicamentos, introdução dos medicamentos no mercado O primeiro estágio, o de pesquisa e desenvolvimento, é o de maior investimento. A cifra de US$ 500 milhões para a pesquisa e desenvolvimento de um medicamento é uma avaliação da Associação dos Empresários da Indústria Farmacêutica Americana (The Pharmaceutical Research and Manufactures of America), utilizada na maioria das referências sobre o assunto. Entretanto, esse valor é questionado, mesmo nos EUA, pelo Instituto Nacional de Saúde Americano que menciona o contrastante valor de US$ de 16 milhões. Nesse intervalo, um estudo realizado em 1997 estima o valor para US$ 312 milhões (Macedo, 2002). Avaliando apenas o aspecto técnico dessa questão pode-se entender que esta discrepância seja causada pela variabilidade da tecnologia inerente à pesquisa e desenvolvimento de um medicamento. Números mais precisos só podem ser obtidos se os processos utilizados para a mensuração forem melhor definidos. A seqüência dos eventos envolvidos na pesquisa e desenvolvimento de um medicamento será detalhada abaixo para um melhor entendimento do processo e das estratégias utilizadas para a promoção dos produtos. Dividem-se as etapas de desenvolvimento de um medicamento em fases pré-clínica, clínica e galênica (Queiroz, 1993; Asta Médica, 2002). A fase pré-clínica (química e biológica) consiste em descobrir uma nova substância e avaliar suas características em animais. Basicamente, três rotas podem ser utilizadas para a descoberta de um novo produto: · pelo isolamento de moléculas a partir de produtos naturais; · pela modificação química de moléculas já conhecidas; · por processos biotecnológicos. A fase clínica envolve cinco etapas: · fase clínica 1 - a primeira fase envolve um pequeno número de voluntários, de 12 a 50, e dura no máximo um ano. Nesta etapa, comparam-se os resultados obtidos em animais e no ser humano. · fase clínica 2 - esta fase, a de investigação clínica, determina-se a utilidade do novo produto e seu potencial terapêutico, onde alguns poucos investigadores, no máximo dez, aplicam a droga em um número ainda reduzido de pacientes, que varia de 5 a 300. Para entrar nesta fase, os protocolos de pesquisa já precisam estar aprovados pelo Comitê de Ética Hospitalar e devem ser efetuados dentro da legislação vigente em cada país. · fase clínica 3 - nesta etapa determina-se qual a posologia adequada. O fármaco pesquisado é comparado com um placebo ou um produto eficaz já conhecido. · fase clínica 4 - na fase dos ensaios clínico terapêuticos, a intenção é efetuar um estudo clínico mais amplo, no qual se pretende determinar a eficácia clínica comparada e a segurança do novo produto. Nesta etapa, de 500 a 1.000 pacientes participam, geralmente envolvendo mais de um centro de pesquisa. É nesta fase que possíveis efeitos adversos, como toxicidade ou fenômenos alérgicos, podem ser detectados através de um processo conhecido como farmacovigilância. · fase clínica 5 - na fase entre a divulgação e promoção do produto já testado, o novo fármaco será utilizado em hospitais e clínicas como um novo produto, registrado em órgãos governamentais, numa estratégia de promoção. A aceitação da classe médica é fundamental neste ponto do processo. Além disso, é preciso provar as vantagens econômicas do novo produto, com base em um número de pacientes que varia de 2 mil a 10 mil. A fase galênica é realizada simultâneamente à fase clínica objetivando avaliar composição, pureza e estabilidade do produto ao longo do tempo (Queiroz, 1993). Na fase pré-clínica, de natureza químico-farmacêutica, concentra-se a maior parte das dificuldades tecnológicas da produção de um medicamento e nas fases clínicas e galênicas estão as atividades estritamente farmacêuticas, com tecnologia de relativa simplicidade e difusão (Queiroz, 1993). O exemplo do Japão ilustra a relevância de P&D para a competitividade no setor farmacêutico. Na década de 50, o governo japonês adotou medidas para criar uma forte indústria nacional, aumentou os preços dos medicamentos (com 90% do valor subsidiado pelo governo) e dificultou a entrada de companhias estrangeiras que se viram obrigadas a licenciar seus produtos para as empresas japonesas. Os medicamentos estrangeiros chegaram a representar 35 a 40% do total. Além disso, a Lei de Patentes protegia apenas processos de manufatura, mas não produtos, o que encorajou as empresas japonesas a desenvolverem processos para a manufatura de produtos já existentes ou com alguma modesta modificação, ao invés de investirem no desenvolvimento de drogas originais. A maioria das inovações japonesas ficou restrita ao desenvolvimento de drogas imitadas. Com a crise econômica dos anos setenta, essa situação começou a ser alterada quando o governo, por pressão dos EUA relaxou as medidas protecionistas contra empresas estrangeiras. Como as empresas estrangeiras começaram a introduzir drogas originais, a Lei de patentes passou a ser extensiva aos produtos. As companhias japonesas foram forçadas a competir em mercados mundiais, aumentaram seus gastos com P&D focando também o desenvolvimento de produtos biotecnológicos e estabeleceram joint ventures com empresas estrangeiras (Achilladelis e Antonakis, 2001). No ano de 1997, os investimentos com P&D em relação ao faturamento de cinco grandes empresas farmacêuticas foram os seguintes (Hasenclever, 2002): · Eli Lilly 16% · Roche e Pfizer 15% · Glaxo Wellcome 14% · Novartis 11% Até o início dos anos 80, a maioria das novas drogas provinha de investimentos em P&D realizados nos laboratórios das grandes indústrias, porém, algumas mudanças ocorreram com o advento da biotecnologia moderna, especialmente nos EUA, com o surgimento das Novas Firmas Biotecnológicas (Malerba e Orsenigo, 2001). Novas Firmas Biotecnológicas - NFBs As NFBs são especializadas nos estágios iniciais da pesquisa de um medicamento. Muitas vezes originadas a partir de centros universitários, são um entremeio entre as universidades (apresentam características universitárias) e as grandes indústrias farmacêuticas (com finalidade comercial) (Albuquerque e Cassiolato, 2000). Embora as NFBs tenham habilidade para a síntese de novos produtos, não possuem força competitiva para as fases de desenvolvimento, testes e comercialização. As grandes indústrias farmacêuticas, embora mantenham seus laboratórios de pesquisa, têm adotado a estratégia de fazer acordos com as NFBs para a obtenção de novos compostos (Arora et al., 2001). Esta modalidade de cooperação é caracterizada como um fenômeno norteamericano, pois mais da metade dos projetos de pesquisa nos EUA são oriundos das NFBs, ao passo que na Europa quase 90% dos projetos têm origem em empresas farmacêuticas (Arora et al., 2001). Os dados mais recentes sobre NFBs, entretanto, não são tão promissores quanto se acreditava na década de noventa. No início de 2002, o medicamento Erbitux, produzido por uma destas empresas (ImClone Systems) e licenciado pela Bristol-Myers Squibb por US$2 bilhões, recebeu parecer negativo da Food and Drug Administration (FDA) para o registro. Novos testes clínicos estão em andamento, porém a cautela roubou o lugar da confiabilidade de investimentos em tais empresas (IMS, 2003). Acredita-se ainda no potencial das NFBs, mas as estimativas apontam a necessidade de 5 a 10 anos para que resultados mais concretos retomem a confiança dos investidores. No quadro atual, uma série de cortes de despesas, fusões e venda das NFBs para empresas maiores são observados (IMS, 2003). 3.3. O setor / segmento no Brasil: 3.3.1. Características e configurações do setor / segmento no país: Embora o parque industrial brasileiro no que se refere à produção de medicamentos seja bastante desenvolvido, inclusive com capacidade produtiva tanto de produtos finais quanto como para alguns produtos da química fina, o segmento químico-farmacêutico em seu conjunto é ainda pouco desenvolvido (Radaelli, 2003). A Associação Brasileira da Indústria de Química Fina reúne 20 associados com uma produção de US$ de 359 milhões e é uma parte da cadeia produtiva com possibilidades de crescimento no Brasil, embora tenha perdido espaço, nos últimos 10 anos para Índia e China na produção de fármacos (Frenkel, 2002). A estrutura econômica dos setores farmoquímico e farmacêutico é muito contrastante (Seção 2). Aproximadamente, 80% dos medicamentos são produzidos no Brasil, em contraste com os 20% de fármacos que são produzidos nacionalmente (Galembeck, 2001). Um estudo realizado pela ABIQUIM em 2000 mostrou que de 93 produtos importados com valores acima de US$10 milhões, 17 eram fármacos (Hasenclever, 2002). Uma retrospectiva histórica esclarece as razões desta discrepância entre os dois setores, demonstrando que esta relação consolidou-se a partir da década de 90. Durante a década de 80, certas medidas governamentais de fomento ao setor farmoquímico foram adotadas, com destaque para duas delas. A Portaria n. 4 de 1984, que proibia a importação dos fármacos que viessem a ser produzidos no Brasil, e a construção de laboratórios especializados na produção de fármacos. Estas medidas, inseridas em um cenário onde a legislação patentária permitia a cópia de moléculas, propiciaram um aumento na produção nacional de fármacos. A situação promissora do setor farmoquímico foi alterada com as medidas governamentais adotadas já no início da década de 90 e perpetuadas ao longo do período. De forma resumida, ressalta-se (Queiroz e González, 2001): · redução das tarifas de importação; · alteração na legislação patentária (com proibição de cópias de moléculas); · desativação de centros governamentais destinados à produção de fármacos. Os produtos éticos seguem a tendência mundial por predominarem em relação aos não-éticos. A magnitude de sua participação no faturamento do setor varia de 70% (Romano e Bernardo, 2001) a 93% (Hasenclever, 2002). O amplo leque de classes terapêuticas, aproximadamente 264, faz com que o setor seja formado por oligopólios e monopólios (Romano e Bernardo, 2001). Os cinco medicamentos mais vendidos no Brasil, de 2000 a 2001, foram (Hasenclever, 2002): · Cataflan (Novartis) · Hipoglós (Procter & Gamble) · Neosaldina (Knoll) · Novalgina (Aventis) · Tylenol (Janssen Cilag) Nenhuma empresa detém mais que 7% do faturamento do mercado farmacêutico no Brasil. As cinco empresas que apresentaram maiores faturamento no período de 1999 a 2000 foram (Hasenclever, 2002): · Aventis Pharma (6,5%) · Novartis (5,9%) · Aché (5,7%) · Bristol Meyers Squibb (3,9%) · Roche (3,7%) Os laboratórios públicos no Brasil, 15 no total, são responsáveis por 3% da produção nacional em valor e 10% em volume de produção. O grau de importância destes institutos está na função de minimizar o suprimento de medicamentos de menor interesse para o setor privado. Dentre estes laboratórios destaca-se o Instituto Oswaldo Cruz (Far-Manguinhos), que em 1998 entrou com pedido para os dois únicos pipelines solicitados no Brasil, na área de biotecnologia (Bermudez et al., 2000). Em 2000, os gastos com P&D na Fiocruz representaram 26% das despesas totais em programas da instituição (Hasenclever, 2002). A porcentagem de faturamento das empresas nacionais corresponde a 20% do setor (Albuquerque e Cassiolato, 2000). A tradição de produção do setor, de acordo com informações obtidas na ANVISA, é das empresas farmacêuticas estrangeiras instaladas no Brasil fabricarem mais medicamentos de referência e as nacionais, mais os produtos similares ou, atualmente, os genéricos. Dentro dos quatro estágios da cadeia de produção de medicamentos, no Brasil, as empresas transnacionais concentram suas atividades nos dois últimos estágios, ou seja, na formulação de medicamentos e sua introdução no mercado (Romano e Bernardo, 2001). Queiroz e González (2001) consideram que o aumento no número de pesquisas clínicas desenvolvidas no Brasil, por empresas transnacionais na década de 90, embora ainda aquém do desejado, não deve ser menosprezado, por representarem uma parte significativa da pesquisa e desenvolvimento de um medicamento. Dados da Associação Nacional de Pesquisa, Desenvolvimento e Engenharia das Empresas Inovadoras (ANPEI) de 1996, retirados de 15 empresas do setor farmacêutico, registram uma aplicação de 0,78% em P&D em relação ao faturamento bruto. Comparativamente, os investimentos dessa ordem nos EUA são de aproximadamente 17%. Tais valores denotam como, no Brasil, a imagem da indústria farmacêutica não corresponde à caracterização mundial do setor como intensivo em P&D (Albuquerque e Cassiolato, 2000). Com referência aos pedidos de patentes no Brasil, é interessante observar a sua distribuição ao longo do tempo e a sua classificação de acordo com a natureza do produto final. Durante o período de 1992 a 1998, observa-se claramente o aumento de patentes a partir de 1996, quando a nova lei de Propriedade Industrial foi aprovada. Os produtos de origem Química são quantitativamente superiores aos obtidos por Biotecnologia tradicional ou moderna (Gráfico 3.3.1a) e os países com maior número de patentes solicitadas naquele período foram: EUA e Alemanha para produtos de origem Química, EUA e Brasil para produtos originados de Biotecnologia tradicional e EUA e França para aqueles originados a partir de Biotecnologia moderna (Bermudez et al, 2000). 3.3.2. Agenda do setor no país e questões ausentes: Algumas sugestões de políticas governamentais, feitas por especialistas do setor, para tornar o país mais competitivo tecnologicamente são destacadas: · Incentivo às fusões de empresas nacionais, que com maior faturamento possuem mais recursos para aplicação em P&D. · Estímulo à produção de genéricos visando mercado doméstico e exportação para países da América Latina. · Aumento de condições técnico-científicas para que as transnacionais, aproveitando a reestruturação de redução de plantas, passem a desenvolver atividades de P&D no Brasil. Centros de excelência como a Fiocruz, por exemplo, podem ser base para que as transnacionais invistam em doenças tropicais. · Fortalecimento do setor farmoquímico, com maior fiscalização da qualidade dos fármacos importados, não penalizando empresas nacionais que muitas vezes não conseguem competir com preços, mas que possuem maior qualidade na produção. · Estratégias de apoio às empresas de base tecnológica. Pesquisas clínicas e P&D Hasenclever (2002) entende que uma alteração na regulamentação dos testes clínicos poderia refletir em benefícios para as atividades de P&D. Este efeito positivo pode ser obtido com a obrigatoriedade de testes clínicos que utilizem como padrão o perfil epidemiológico da população brasileira para toda a importação, produção ou comercialização de medicamentos. O número de centros para a realização de estudos clínicos tem aumentado gradativamente e uma preocupação relevante na condução deste estudos é a sua normatização, i.e., a legislação brasileira não pode ser flexível ao ponto de tornar o país um campo aberto para pesquisas onde a ética e a preocupação com as pessoas envolvidas nos testes não sejam prioridades. Estas questões têm sido cada vez mais debatidas por universidades, instituições públicas e privadas. Um exemplo de avanço nessa área é que, em certos casos, o CONEP não aprova pesquisas clínicas onde o medicamento a ser testado seja comparado com um placebo (substância inerte). O grupo controle deve ser tratado com um outro medicamento já utilizado, impedindo que pessoas fiquem sem o tratamento. A indústria farmacêutica prefere a comparação com o placebo por obter com facilidade e agilidade resultados sobre a atuação do medicamento. O pesquisador e professor Gilberto de Nucci, salienta os pontos positivos da realização de pesquisas clínicas no Brasil como uma fonte geradora de aprendizado (protocolos vêm prontos) e empregos qualificados. Sua visão também é positiva quanto à legislação brasileira referente às pesquisas clínicas, que, segundo sua avaliação, é tão restritiva quanto à americana. A vantagem para as empresas transnacionais realizarem pesquisas clínicas no Brasil é aumentar seu marketing no país (comunicação pessoal). Genéricos e P&D A relação entre a produção de medicamentos genéricos e P&D no setor farmacêutico é um aspecto que causa divergência de opiniões. Alguns especialistas acreditam que pode haver uma relação positiva na associação destes fatores e que a tendência da indústria nacional em copiar moléculas existentes não é desprezível do ponto de vista tecnológico. Os ganhos são destacados em três passos (Frenkel,1990 apud Albuquerque e Cassiolato, 2000): · conhecimentos tecnológicos são gerados com a instalação e a manutenção da produção; · desenvolvimento de conhecimentos necessários para as alterações dos processos e produtos já em operação; · indução da necessidade de atividades rotineiras de P&D, referentes à possibilidade de desenvolvimento de novos processos e produtos. O diretor do Laboratório de Avaliação de Substâncias Bioativas (Lassbio) da UFRJ, professor Eliezer Barreiro, acredita que a política dos genéricos não levará a avanços tecnológicos, embora atenue a exclusão social. Seu posicionamento é de que o governo deveria investir na melhoria das universidades públicas, onde está a maior parte da pesquisa inovadora no Brasil. Seu alerta é que a generalização de que a pesquisa de um novo medicamento é sempre um processo muito oneroso, e por isso desmotivador, não é totalmente correta, pois os custos variam dentro das classes terapêuticas (Comciencia, 2002b). Outro especialista do setor que concorda que o genérico somente age como instrumento indireto para o desenvolvimento tecnológico é professor Sérgio Queiroz do Instituto de Geociências da UNICAMP. Sua avaliação é que a função básica dos genéricos é sobre os preços e que, eventualmente, podem alavancar recursos para desenvolvimento de P&D da empresa. Biodiversidade e P&D A investigação da fauna e da flora brasileiras, aliada à competência científica, é uma tática bastante defendida por diferentes pesquisadores como possível ferramenta para uma alteração no quadro de baixo desenvolvimento tecnológico doméstico. Este otimismo em relação à biodiversidade é explicado por Queiroz e González (2001) por meio de análises do mercado internacional, que demonstram o aumento nas vendas de fitoterápicos e as fusões de empresas, ditas tradicionais com empresas de fitoterápicos. No Brasil, o aumento no número de grupos de pesquisa em química e farmacologia de produtos naturais, aproximadamente 70 de acordo com os autores, é estimulante para o desenvolvimento de medicamentos a partir de plantas. Camargo (2002) analisa que a abordagem genômica, tão difundida mundialmente, e a química combinatória, são processos que possuem seus méritos, mas, em contrapartida, são de elevado custo e baixo sucesso no curto prazo. O pesquisador aposta que o conhecimento acumulado por pesquisadores brasileiros sobre as riquezas da biodiversidade brasileira pode ser o caminho para as inovações terapêuticas da indústria nacional. Para a realização desse objetivo, sua sugestão é a união de esforços entre os setores públicos e privados como, por exemplo, a iniciativa da FAPESP na criação de um consórcio em que participam três indústrias nacionais, o Instituto Uniemp (Universidade-Empresa) e instituições públicas como o Instituto Butantan e o Ipen. Empresas de base tecnológica Como citado acima por Camargo (2002), as iniciativas conjuntas entre universidades/empresas podem levar, no Brasil, a um sistema semelhante ao adotado pelos EUA, com o desenvolvimento de empresas de base tecnológica. Alguns dos mais interessantes exemplos de sucesso de empresas nacionais com desenvolvimento tecnológico de porte respeitável vieram de pequenas empresas de base tecnológica, com forte interação com instituições de pesquisa. Microbiológica, Biobrás e Quiral são resultantes desse tipo de iniciativa. 4. Inserção Internacional: A despeito de ter ocorrido nos anos 80 uma série de iniciativas com o objetivo de desenvolver a produção nacional de fármacos, o que se verifica é que nos anos 90 a pesquisa e o desenvolvimento de novos fármacos no Brasil continuou incipiente. À medida que se permite que essa capacidade inovativa situe-se fora do país, e caso a indústria farmacêutica nacional considere-se satisfeita em atuar em fases menos complexas e rentáveis, irá ocorrer entre os mais diversos elos produtivos, a cristalização de uma inserção tradicional na divisão internacional do trabalho (Radaelli, 2003). Como já mencionado, o volume de produção nacional de medicamentos (formulação) é bastante superior ao de fármacos. Entretanto, dados comparativos apontam uma curva ascendente de importações, iniciada entre 1992 e 1993, para os dois setores. Na década de 90, o aumento de importações de medicamentos acabados foi de 1.304% e o de fármacos e intermediários de 204% (Frenkel, 2002). A maior parte das importações de medicamentos são originárias de países onde estão localizados os laboratórios das grandes transnacionais do setor. Os principais fornecedores de insumos são Itália, Índia e Espanha. Países como China, Coréia do Sul e Israel ganharam importância como países exportadores de fármacos para o Brasil (Frenkel, 2002). No ano de 2002, os valores de importação para medicamentos foram de US$ 1,4 bilhões e de fármacos, US$ 830 milhões (ABIQUIF, 2003). As exportações do setor também sofreram um aumento a partir de 1993, especialmente para os países do Mercosul. No entanto, de acordo com especialistas, esse aumento não foi suficiente para equilibrar a balança comercial (Queiroz e González, 2001). No ano de 2002, os valores de exportação para medicamentos foram de US$ 204 milhões e de fármacos, US$ 187 milhões (ABIQUIF, 2003). 5. Mudanças recentes e estratégias das empresas: Do ponto de vista da produção de medicamentos, existe uma tendência das transnacionais em reduzir o número de suas plantas no Brasil e aumentar a especialização das mesmas (Queiroz e González, 2001). Na América latina, as grandes empresas têm concentrado suas produções em três grandes mercados: Argentina, Brasil e México. As conseqüências dessa reestruturação das empresas transnacionais têm aspectos positivos negativos. Se por um lado, tornam o Brasil mais relevante no processo produtivo destas empresas no plano regional, podendo abastecer o mercado interno, além de outros mercados com produtos tradicionais mais baratos, por outro aumentam as importações e a dependência de produtos, mais caros, não abarcados pela planta mais especializada. · Do ponto de vista tecnológico, como já discutido ao longo do relatório, observa-se somente o aumento das pesquisas clínicas no país e algumas tímidas interações com projetos conjuntos entre empresas e universidades. As variáveis envolvidas no desenvolvimento tecnológico do setor estão relacionadas com questões de ordem econômica e política. Por essa razão, mudanças estruturais que propiciem o desenvolvimento tecnológico no país são bastante complexas. 6. Estudo Proposto: 6.1. Definição da amostra: critérios e justificativas: Do ponto de vista da pesquisa e desenvolvimento, a indústria farmacêutica no Brasil está muito aquém do esperado para um setor que tem características mundiais de intensa atividade tecnológica. As fontes de informações sobre o setor deixam claro que as transnacionais não aplicam em recursos para pesquisa no Brasil e, quando o fazem, estão restritas às pesquisas clínicas. Quanto às nacionais, existe um enorme desconhecimento sobre o que está acontecendo no âmbito dos esforços tecnológicos. Pode-se pinçar exemplos, aqui e ali, de empresas nacionais com projetos de sucesso que, ou partiram da iniciativa de professores universitários, ou desenvolvem projetos em conjunto com essas instituições. Nesse contexto é que esta pesquisa está inserida. O grande objetivo é identificar empresas nacionais com empenho tecnológico e encontrar os parâmetros mais adequados para mensurar os níveis desse empenho. O estágio preliminar para o estudo sobre a indústria farmacêutica e o desenvolvimento tecnológico foi realizado com um levantamento em páginas de empresas industriais nacionais e transnacionais deste setor. O intuito deste levantamento foi averiguar a ênfase que estas empresas dão à pesquisa e ao desenvolvimento tecnológico. Duas observações surgiram em decorrência desta investigação: · termo pesquisa é amplamente utilizado como parte da estratégia das empresas, nacionais ou transnacionais. Seu significado, entretanto, pode ser aplicado tanto para testes clínicos quanto para desenvolvimento tecnológico propriamente dito. Desta forma, uma empresa que cita o item pesquisa como uma de suas estratégias, pode simplesmente estar indicando que realiza testes, já padronizados, para avaliar os efeitos de novas drogas em animais e seres humanos (testes clínicos), não necessariamente contribuindo para o desenvolvimento tecnológico dentro do país. · Grande parte das empresas transnacionais que, em suas páginas em Português, citam o Brasil como país onde se desenvolve pesquisa, não o incluem na lista dos países que fazem parte de seus Centros de Pesquisa, nas páginas de suas matrizes. Este levantamento inicial, embora possa ser considerado pouco profundo, mostrou certa corroboração de que o desenvolvimento tecnológico, no que diz respeito às transnacionais, não está ocorrendo no Brasil. Quanto às empresas nacionais, o sentido dúbio da palavra pesquisa, se aplicada a estudos clínicos ou desenvolvimento tecnológico, deixa margem a alguma interpretação. Considerando estas duas observações, optamos por amostrar empresas nacionais que citam pesquisa como parte de suas estratégias para averiguar o real sentido do emprego do termo, e a contribuição destas empresas ao desenvolvimento tecnológico do país. Numa segunda etapa do trabalho, de posse de um levantamento mais amplo e com uma reflexão mais aprofundada, passaremos à análise de uma amostra com empresas de outras procedências. Com o objetivo principal de entender e tornar mais claro o grau de desenvolvimento tecnológico do setor farmacêutico no país, e considerando a estreita relação entre a matéria prima e o produto final - medicamento - foi considerado pertinente incluir na amostra, além de empresas farmacêuticas, empresas farmoquímicas, fitoterápicas e uma empresa de biotecnologia. As análises abordarão os aspectos comuns a estes subgrupos e, quando necessário, as peculiaridades serão ressaltadas. As empresas selecionadas (e seus respectivos subgrupos) foram (Anexo 6.1a): · Quiral - farmacêutica · Biossintética - farmacêutica · Cristália - farmacêutica · Biolab Sanus - farmacêutica · Microbiológica - farmoquímica · Labogen - farmoquímica · Herbarium - fitoterápica · Laboratório Catarinênse - fitoterápica · Laboratório Simões - fitoterápica · Extracta - biotecnologia 6.2. Empresas-reserva: Nortec; Sintefina; Medley, Aché, Eurofarma. 6.3. Características da amostra: Farmacêuticas Das quatro empresas farmacêuticas analisadas, três são de médio porte e uma de pequeno porte. Uma delas trabalha com a produção de medicamentos similares a produtos licenciados. As outras três fabricam genéricos e sintetizam uma parte da matéria prima utilizada. Duas demonstram grande interesse e potencial para o desenvolvimento de novos produtos, com pesquisas centradas na parte farmoquímica e/ou na fase galênica da produção do medicamento (novas apresentações, formulações, dosagens e interações medicamentosas). Algum interesse, porém sem grande expressão, foi observado com relação às pesquisas com fitoterápicos. Produtos de origem biotecnológica também aparecem com potencial de investimento. Farmoquímicas As duas empresas farmoquímicas amostradas apresentaram capacidade diferenciada para a síntese dos fármacos. Uma com maior e outra com menor poder de desenvolvimento de síntese química. Quanto menor o desenvolvimento tecnológico na atividade de síntese, maior a dependência de produtos importados. Fitoterápicas A característica comum às três empresas de fitoterápicos avaliadas foi o impacto das medidas adotadas pela ANVISA referentes aos medicamentos fitoterápicos. A exigência de testes para avaliar a segurança e a eficácia dos fitoterápicos fez com que alguns produtos fossem retirados do mercado. Concomitantemente, o número de estudos clínicos desenvolvidos em parceria com Universidades aumentou significativamente. O desenvolvimento tecnológico para a produção interna dos extratos variou entre as empresas, mas há a preocupação de ampliação dessa capacidade pelas empresas menos qualificadas para essa atividade. Outro ponto de fragilidade apresentado como preocupação por uma das empresas foi a padronização da matéria-prima, com a parceria de Universidades para a clonagem de plantas. Biotecnologia: A empresa visitada é a única empresa privada no Brasil que tem como objetivo pesquisar plantas em florestas brasileiras para a indústria farmacêutica. 7. Esforços e Mudanças: 7.1. Esforço tecnológico - produto e processo: As fontes de informação e/ou conhecimento tecnológico citadas nos quatro subgrupos foram múltiplas: universidades, artigos científicos, bases de dados, patentes, concorrentes e fornecedores. Destas fontes, as universidades são as citadas com mais ênfase em função das parcerias estabelecidas. As patentes também são valorizadas como fonte de informação, sendo que, em algumas empresas existe a presença de uma pessoa responsável pela leitura de patentes. Os concorrentes e fornecedores aparecem mais como fontes de idéias de produtos que podem ser interessantes do que propriamente fontes de conhecimento tecnológico. No segmento fitoterápico, além das fontes acima citadas, foi ressaltada a importância das associações específicas para o grupo e dos órgãos regulatórios. Com relação às parcerias, todas as empresas pesquisadas têm projetos com universidades brasileiras e institutos de pesquisa. A divisão de tarefas depende do objetivo da pesquisa, mas de modo geral as empresas pagam por determinados serviços ou providenciam a compra de equipamentos para a universidade. As motivações ressaltadas para essas parcerias são a formação de vínculos com universidades, divisão de competências, know how acumulado pelos pesquisadores das instituições públicas e a facilidades para testes em menor escala. As atividades desenvolvidas em parceria com instituições públicas incluem: · desenvolvimento de processos de síntese · desenvolvimento de produtos biotecnológicos · estudos de estabilidade e farmacológicos. Com exceção das empresas farmoquímicas pesquisadas e de base tecnológica, os estudos clínicos foram as atividades em parceria com universidades mais citadas pelas empresas farmacêuticas e, especialmente, pelas fitoterápicas. As motivações citadas foram o alto custo das pesquisas clínicas e a necessidade de adequação às normas da ANVISA. As dificuldades ressaltadas nas parcerias com universidades foram a falta de agilidade dos parceiros e, em muitos casos, a dificuldade de formalização dos vínculos por questões burocráticas. As empresas farmoquímicas citaram parcerias com empresas farmacêuticas para o desenvolvimento de novos produtos. A empresa de biotecnologia associa-se, prioritariamente, às universidades para a identificação das plantas coletadas. Com relação às atividades realizadas internamente, existem variações dentre os segmentos avaliados de acordo com as suas características. As atividades mais citadas pelas empresas farmacêuticas foram: · formulação dos medicamentos · pesquisas centradas na fase galênica · controle de qualidade. Em três, das quatro empresas avaliadas, o desenvolvimento de síntese química, atividade para a produção de princípios ativos utilizados nos medicamentos, é parcialmente realizado internamente. O grau de capacidade de síntese variou entre as empresas em relação à matéria prima comprada e, geralmente importada. A produção interna de princípios ativos nas três empresas foi de 20%, 40% e 50%. A quarta empresa não realiza nenhum processo de síntese química porque trabalha com produtos licenciados ou produz similares com matéria prima importada. Mesmo nas farmoquímicas, a proporção de síntese química variou entre as empresas. Esse dado é confirmado com a estimativa citada por uma das empresas de que aproximadamente, 30% dos princípios ativos são comprados prontos de países asiáticos. Por tratar-se de uma atividade prioritária para o setor, esse valor ganha uma proporção expressiva. As empresas fitoterápicas realizam internamente atividades como: · desenvolvimento analítico · testes de estabilidade · controle de qualidade. A matéria prima é praticamente toda comprada, na forma de plantas secas ou na forma de extrato. Uma das empresas produz 80% dos extratos, outra 15% e a terceira não produz nada internamente. A maior dificuldade alegada para a produção interna dos extratos é que cada planta exige processamento e tecnologia diferenciada para a produção de extratos de boa qualidade. Uma das empresas tem investido na produção de plantas clonadas em parceria com universidades. No futuro, o objetivo dessa empresa é produzir e padronizar sua própria matéria- prima. Pelas características inerentes à empresa de base tecnológica entrevistada, as atividades realizadas internamente são: · produção de extratos das plantas coletadas · fracionamento e isolamento de substâncias químicas presentes nos extratos. As moléculas encontradas são repassadas para a contratante, normalmente uma empresa farmacêutica, que avaliará o potencial de ação terapêutico dessas moléculas. De acordo com as expectativas do presidente da empresa, o intuito para o futuro é torná-la uma empresa capaz de realizar essas avaliações e, consequentemente, transformam-se em uma empresa farmacêutica. A mínima e a máxima porcentagem de investimentos em P&D, nos três segmentos, foram respectivamente de 1,5 a 19% do faturamento, mas valores abaixo de 5% foram os mais freqüentes. De modo geral, a rubrica P&D engloba salários, equipamentos, gastos com banco de dados, estudos clínicos e patentes. A maior parte dos funcionários ligados aos processos tecnológicos é de nível médio. Seis funcionários com Doutorado por empresa foi o número máximo encontrado, tanto nas empresas farmacêuticas como nas farmoquímicas e de base tecnológica. Nas empresas de fitoterápicos pesquisadas não há nenhum funcionário com pós-graduação. As empresas estão satisfeitas com a qualidade técnica da formação dos funcionários. A reclamação mais freqüente foi a da falta de visão de mercado, que as universidades não têm preocupação em desenvolver na formação dos estudantes. Uma observação recorrente das empresas farmacêuticas foi a inexistência na formação de um profissional com perfil para gerenciar atividades de P&D. 7.2. Mudanças nos produtos e processos: 7.2.1. Mudanças nos produtos: As mudanças nos produtos das empresas farmacêuticas pesquisadas foram associadas à diminuição dos efeitos colaterais de produtos antigos. Essas alterações foram alcançadas por duas estratégias básicas: · associação de medicamentos já conhecidos e racionalmente combinados · mudança estrutural de uma molécula já existente. Um exemplo de sucesso do primeiro caso, ou seja, a utilização de associação medicamentosa, ocorreu com duas substâncias utilizadas isoladamente para o controle da pressão arterial. O efeito colateral de um desses medicamentos é o edema de membros inferiores e por essa razão os médicos receitavam um segundo remédio capaz de reduzir esse efeito. Observando isso, uma das empresas decidiu associar os dois medicamentos em um só, o que além de diminuir o efeito colateral propiciou a redução das doses desse medicamentos anteriormente administrados isoladamente. Das farmoquímicas pesquisadas, uma apresentou desenvolvimento sintético de novas moléculas para hepatite B e C, a partir dos conhecimentos previamente acumulados com a síntese de anti virais específicos para AIDS. As inovações nessa empresa foram alcançadas após associação com uma empresa americana que desenvolveu uma tecnologia de detecção viral para avaliar a atividade biológica de novas substâncias desenvolvidas. Os testes são feitos em cultivos celulares in vitro onde pode-se observar o efeito inibidor da substância alvo na reprodução das partículas virais. Nas empresas fitoterápicas, a mudança de produtos baseou-se na melhoria da qualidade de um produto a partir de planta clonada ou na forma de administração de alguns produtos, como por exemplo o desenvolvimento de cápsulas para a administração do produto, anteriormente ingerido somente por via líquida. A clonagem de plantas propicia a padronização dos princípios ativos, aumentando assim a qualidade do produto final. Essa metodologia ainda é bastante incipiente, com apenas uma planta clonada na empresa visitada, mas a intenção manifestada por essa empresa é ampliá-la para o maior número possível de plantas. A fundação da empresa de base tecnológica ainda é recente e, de acordo com o entrevistado, por essa razão ainda não sofreu alteração em seus produtos. 7.2.2. Mudanças nos processos: Para as empresas farmacêuticas analisadas, a principal tecnologia citada como crucial para ser competitivo no processo produtivo é a capacidade de síntese química por diminuir a dependência de importações. Conhecimento científico, visão racional e estratégica, ou seja, capacidade de avaliar as tendências do mercado e encontrar soluções científicas para atendê-las, também foram citados como fatores importantes para a competitividade da empresa. Somente uma das empresas relatou uma alteração nos processos nos últimos três anos. Essa mudança ocorreu em consequência da alteração na substância utilizada para potencializar a ação de determinado princípio ativo (adjuvante). A troca do adjuvante potencializou o produto antigo. Para as farmoquímicas, a capacidade de inovação tecnológica da empresa (conhecimento científico) e a melhoria na rotas dos processos (diminuição de tempo e custos) são as estratégias cruciais para esse segmento. Uma das empresas alcançou melhoria de processo de formulação de um produto a partir da associação com uma empresa farmacêutica. As empresas fitoterápicas, unanimamente, destacaram três práticas fundamentais para o segmento: · capacidade de desenvolvimento analítico · capacidade de produção de extratos · capacidade produção da matéria prima (plantio). Com exceção do desenvolvimento analítico, praticado por todas as empresas pesquisadas, as outras duas práticas citadas como importantes são realizadas com potencial fraco ou médio. 7.2.3. Mudanças nos produtos e processos: O patenteamento foi a forma mais citada para a proteção de conhecimentos ou novas tecnologias das empresas dos três segmentos. Em poucos casos, o segredo industrial também foi citado como estratégia da empresa. As empresas farmacêuticas foram as que apresentaram maior número de patentes (quatro ou cinco). As farmoquímicas e fitoterápicas, quando apresentaram patentes, não ultrapassaram uma por empresa. Com variações individuais, as empresas dos três segmentos efetuam pagamentos referentes às mudanças tecnológicas, como por exemplo, uso de marcas, serviços de pesquisa, serviços de desenvolvimento, máquinas, equipamentos, estudos clínicos. Nenhuma delas recebe pagamento por mudanças tecnológicas nos produtos ou processos produtivos. 7.3. Financiamento dos esforços e mudanças: As fontes próprias de recursos para atividades tecnológicas são as mais utilizadas. FINEP foi o órgão financiador mais citado pelas empresas farmacêuticas e farmoquímicas e CNPq o mais citado pelas fitoterápicas (especialmente pelo estímulo dado pelo órgão para o desenvolvimento de estudos clínicos para produtos de origem vegetal). As manifestações sobre financiamentos públicos foram mais direcionadas à FINEP. As impressões positivas ou de desconhecimento foram manifestadas pelas maiores empresas farmacêuticas e as impressões negativas pelas demais empresas analisadas. As opiniões descritas abaixo foram direcionadas à FINEP. · “Os juros são altos”. · “A contrapartida para as empresas é muito alta”. · “As garantias exigidas são exorbitantes para empresas pequenas”. · “Não há possibilidade de troca de uma garantia por outra”. · “Não há uma parceria no sentido de ajudar o empresário (especialmente um bom técnico, mas inexperiente no mundo dos negócios) a ter uma melhor visão do mercado e do seu produto”. · “Descrédito com a instituição”. · “Falta de critérios para o empréstimo para empresas que importam mais do que investem em desenvolvimento tecnológico”. 9. Considerações finais: O que foi observado no subgrupo das farmacêuticas foram três empresas com capacidade de realizar síntese química, duas das quais com uma estrutura montada de pesquisa e aparentemente um bom potencial para realizarem desenvolvimento tecnológico de excelente qualidade. Pode-se dizer que nesse cenário de atraso tecnológico, essas duas empresas destacam-se de modo expressivo e apresentam uma potencial para desenvolvimento tecnológico bastante muito promissor. Nas farmoquímicas houve um desnível tecnológico muito grande entre as duas empresas avaliadas. Possivelmente, a competência técnica e o desempenho individual do proprietário de uma delas tenha causado essa visão desnivelada. Outras empresas do setor necessitam ser avaliadas para que se possa perceber quantas estão mais de um lado ou de outro das extremidades. Com relação à tão falada biodiversidade brasileira e seu potencial para o desenvolvimento de medicamentos, a empresa de biotecnologia, embora com problemas de investimento, faz o que esperava-se de empresas de fitoterápicos, ou seja, pesquisar novas moléculas a partir de plantas. É verdade que as empresas de fitoterápicos, por conta de medidas normativas deliberadas pela ANVISA, demonstram maior empenho em associar-se a outros centros para a realização de pesquisas. Entretanto, qualquer avaliação sobre até que ponto essa maior necessidade de pesquisas e aprimoramento tecnológico será incorporada pelas empresas de fitoterápicos e poderá alterar a mentalidade de um simples ramo de negócios para uma área de maior exploração científica, ainda é prematura. A defasagem tecnológica do Brasil na área farmacêutica e farmoquímica, em relação a outros países, é de tal proporção que seria ingenuidade procurar inovações incrementais em grande volume. Que se pode dizer, então, das inovações radicais? Possuir capacidade de sintetizar moléculas (fazer cópias), por exemplo, parece muito primário quando comparado à capacidade de criar moléculas novas, mas no cenário nacional essa capacidade não é tão banal assim. Esse exemplo de fragilidade demonstra que os problemas, e os caminhos para as soluções em termos de ganhos do desempenho tecnológico nacional para o setor, são muito peculiares. Colocar o atual estágio de desenvolvimento tecnológico de países desenvolvidos como meta a ser alcançada pelas empresa nacionais é desestimulante se os passos para o longo caminho não forem calculados em função das dificuldades apresentadas pelas diferentes empresas. Cabe ressaltar que as empresas entrevistadas não foram escolhidas aleatoriamente para amostrar o universo brasileiro nesse setor. A escolha foi direcionada para empresas que, ao menos, declaravam realizar pesquisas. Essa observação é fundamental para que as conclusões não sejam tiradas de modo generalizado e, portanto, equivocadas. 10. Referências: ABIQUIF, 2002.www.abiquif.org.br. Acesso em 09/2002. Achilladelis, B e Antonakis, N. 2001. The dynamics of technological innovation: the case of the pharmaceutical industry. 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