Teoria Literária I Prof. Ismael Dantas

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Teoria Literária I Prof. Ismael Dantas
Teoria Literária I
Prof. Ismael Dantas
www.dantas.pro.br
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[11] 8517-1911
Gêneros Literários
Gênero lírico .................................................................................................................. 02
Soneto ............................................................................................................................. 02
Canção .......................................................................................................................... 21
Madrigal........................................................................................................................... 34
Acróstico ......................................................................................................................... 37
Décima ........................................................................................................................... 40
Oitava .............................................................................................................................. 42
Ode .................................................................................................................................. 43
Elegia ............................................................................................................................... 51
Lira ................................................................................................................................... 54
Barcarola .......................................................................................................................... 57
Rondó ............................................................................................................................... 60
Balada ............................................................................................................................. 64
Vilancete ......................................................................................................................... .69
Edílio ............................................................................................................................... 72
Écloga ............................................................................................................................. 73
Triolé .................................................................................................................................74
Haicai ...............................................................................................................................76
Epitalâmio .........................................................................................................................77
Epitáfio ..............................................................................................................................78
Sextina ..............................................................................................................................80
Terça-Rima .......................................................................................................................83
Acalanto ............................................................................................................................87
Pantum...............................................................................................................................90
Vilanela ..............................................................................................................................94
Ditirambo ...........................................................................................................................95
Glosa .................................................................................................................................96
Hino ...................................................................................................................................97
Poema-Piada .....................................................................................................................98
Poema Figurativo.............................................................................................................. 99
Trova .............................................................................................................................. 101
Quadrão ..................................................................................................................... 104
Textos Produzidos pelos Alunos.........................................................................
105
Fonte de Consulta ..................................................................................................
108
1
Gêneros Literários
O estudo clássico dos gêneros literários costumam agrupar-se em três gêneros:
lírico, épico e dramático. Há alguns críticos literários que acrescentam também gêneros
didático e pastoril que são chamados gêneros secundários ou menores pela sua menor
importância no quadro dos gêneros poéticos.
Gênero Lírico
Na antiga Grécia a poesia era declamada ao som da lira, daí
a origem da palavra lírico. Pela tradição literária esse instrumento
passou a simbolizar a própria poesia. No gênero lírico, o poeta
expressa os seus próprios sentimentos ou interpreta os sentimentos
a dos outros. A poesia lírica é pessoal e subjetiva, enquanto a
poesia épica é impessoal e objetiva.
Classificação das fôrmas líricas:
Soneto
Originário da Itália e divulgado em Portugal por Sá de Miranda. Composição
poética de fôrma fixa constituído de dois quartetos, (estrofe de quarto versos) e dois
tercetos (estrofes de três versos). Geralmente, os versos são decassílabos heróicos 10(610) ou raramente, sáficos 10(4-8-10). Os esquemas rimáticos são geralmente: ABBA
/ABBA ou ABAB /ABAB (nas quadras e CDC /DCD ou CDE /CDE (nos tercetos). Há os
alexadradinos (com doze sílabas). E encontramos também sonetos com o menor
número de sílabas métricas, os sonetilhos.
Essa é a fôrma clássica do soneto italiano, enquanto soneto inglês, também
formado de quatorze versos, mas distribuídos em três quadras e um dístico final (dois
versos).
Quanto ao assunto, embora seja lírico-amoroso, o soneto aborda quaisquer temas
como épico, humorístico, satírico, didático ou simplesmente descritivo. Vale lembrar que,
a tradição clássica exige que o último verso do soneto seja uma «chave de ouro», a
síntese do que o poeta desenvolveu.
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NOTA IMPORTANTE:
Há sonetistas modernos que obedecem às regras métricas, mas os versos não rimam. Os chamados
«versos brancos.»
2
Sonetos decassílabos:
Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer;
É um não querer mais que bem querer;
É solitário andar por entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É cuidar que se ganha em se perder;
É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata lealdade.
Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?
[Luís Vaz de Camões - 1525?/1580]
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Nasce o Sol, e não dura mais que um dia,
Depois da Luz se segue a noite escura,
Em tristes sombras morre a formosura,
Em contínuas tristezas a alegria.
Porém se acaba o Sol, por que nascia?
Se formosa a Luz é, por que não dura?
Como a beleza assim se transfigura?
Como o gosto da pena assim se fia?
Mas no Sol, e na Luz, falte a firmeza,
Na formosura não se dê constância,
E na alegria sinta-se tristeza.
Começa o mundo enfim pela ignorância,
E tem qualquer dos bens por natureza
A firmeza somente na inconstância.
[Gregório de Matos 1636-1696]
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3
Olha, Marília, as flautas dos pastores
Que bem que soam, como estão cadentes!
Olha o Tejo a sorrir-se! Olha, não sentes
Os Zéfiros brincar por entre as flores?
Vê como ali, beijando-se, os Amores
Incitam nossos ósculos ardentes!
Ei-las de planta em planta as inocentes,
As vagas borboletas de mil cores!
Naquele arbusto o rouxinol suspira;
Ora nas folhas a abelhinha pára.
Ora nos ares sussurrando gira:
Que alegre campo! Que manhã tão clara!
Mas ah! Tudo o que vês, se eu não te vira,
Mais tristeza que a morte me causara.
[Manuel Maria Bocage du Bocage – 1765/1805]
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Leia a posteridade, ó pátrio Rio,
Em meus versos teu nome celebrado;
Por que vejas uma hora despertado
O sono vil do esquecimento frio:
Não vês nas tuas margens o sombrio,
Fresco assento de um álamo copado;
Não vês ninfa cantar, pastar o gado
Na tarde clara do calmoso estio.
Turvo banhando as pálidas areias
Nas porções do riquíssimo tesouro
O vasto campo da ambição recreias.
Que de seus raios o planeta louro
Enriquecendo o influxo em tuas veias,
Quanto em chamas fecunda, brota em ouro.
[Cláudio Manuel da Costa - 1729/1789]
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4
Pálida, à luz da lâmpada sombria,
Sobre o leito de flores reclinada,
Como a lua por noite embalsamada,
Entre as nuvens do amor ela dormia!
Era a virgem do mar! na escuma fria
Pela maré das águas embalada!
Era um anjo entre nuvens d’ alvorada
Que em sonhos se banhava e se esquecia!
Era mais bela! o seio palpitando...
Negros olhos as pálpebras abrindo...
Formas nuas no leito resvalando...
Gustave Courbet
Não te rias de mim, meu anjo lindo,
Por ti – as noites eu velei chorando,
Por ti – nos sonhos morrerei sorrindo!
[Álvares de Azevedo – 1831/1852]
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As Pombas...
Vai-se a primeira pomba despertada...
Vai-se outra mais... mais outra... enfim dezenas
De pombas vão-se dos pombais, apenas
Raia sanguínea e fresca a madrugada...
E à tarde, quando a rígida nortada
Sopra, aos pombais de novo elas, serenas,
Ruflando as asas, sacudindo as penas,
Voltam todas em bando e em revoada...
Também dos corações onde abotoam,
Os sonhos, um por um, céleres voam,
Como voam as pombas dos pombais;
No azul da adolescência as asas soltam,
Fogem... Mas aos pombais as pombas voltam,
E eles aos corações não voltam mais...
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NOTAS:
raiar – emitir raios luminosos; brilhar; despontar no horizonte.
nortada – vento áspero e frio que sopra do norte.
ruflar – agitar (asas ) para alcançar voo.
abotoar – prender com botões; agarrar.
célere – que anda depressa; veloz; ligeiro.
5
SONHO ORIENTAL
Sonho-me às vezes rei, alguma ilha,
Muito longe, nos mares do Oriente,
Onde a noite é balsâmica e fulgente
E a lua cheia sobre as águas brilha...
O aroma da magnólia e da baunilha
Paira no ar diáfano e dormente...
Lambe a orla dos bosques, vagamente,
O mar com finas ondas de escumilha...
E enquanto eu, na varanda de marfim,
Me encosto, absorto num cismar sem fim,
Tu, meu amor, divagas ao luar,
Porto de Nassau - Barreiros, PE
[ Posted by Dantas]
Do profundo jardim pelas clareiras,
Ou descansas debaixo das palmeiras,
Tendo aos pés um leão familiar.
[Antero de Quental – 1842/1891]
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NOTAS:
balsâmico – aromático; perfumado; [fig.] confortante.
absorto [ô] – pensativo.
fulgente – que fulge; brilhante; luzente.
cismar – pensar muito.
magnólia –flor aromática.
diáfano - transparente; translúcido.
baunilha – planta aromática.
divagar – andar errante; caminhar ao acaso;
escumilha – espuma miúda [De escuma +ilha]
6
CÁRCERE DAS ALMAS
Ah! Toda a alma num cárcere anda presa,
Soluçando nas trevas, entre as grades
Do calabouço olhando imensidades,
Mares, estrelas, tardes, natureza.
Tudo se veste de uma igual grandeza
Quando a alma entre grilhões as liberdades
Sonha e, sonhando, as imortalidades
Rasga no etéreo Espaço da Pureza.
Ó almas presas, mudas e fechadas
Nas prisões colossais e abandonadas,
Da Dor no calabouço, atroz, funéreo!
Posted by Dantas
Nesses silêncios solitários, graves,
Que chaveiro do Céu possui as chaves
Para abrir-vos as portas do Mistério?!
[Cruz e Sousa – 1861/1898]
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NOTAS:
calabouço – prisão subterrânea.
grilhão – corrente com que se prendem os pés dos prisioneiros; grilheta [ê]; [fig.] prisão.
etéreo – relativo ao éter; [poét.] que se situa a grande altura; [fig.] puro; sublime; celeste; diáfano.
colossal – de grande tamanho; imenso; gigantesco.
atroz – cruel; desumano; feroz; doloroso.
funéreo (ou fúnebre) – que se refere à morte ou ao funeral; [fig.] lúgubre; triste.
7
CAMINHO I
Tenho sonhos cruéis: n`alma doente
Sinto um vago receio prematuro.
Vou a medo na aresta do futuro,
Embebido em saudades do presente...
Saudades desta dor que em vão procuro
Do peito afugentar bem rudemente,
Devendo, ao desmaiar sobre o poente,
Cobrir-me o coração dum véu escuro!...
Porque a dor, esta falta d`harmonia,
Toda a luz desgrenhada que alumia
As almas doidamente, o céu d`agora,
PE-076 / Tamandaré-PE
[Posted by Dantas]
Sem ela o coração é quase nada:
Um sol onde expirasse a madrugada,
Porque é só madrugada quando chora.
[Camilo Pessanha – 1867/1926]
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NOITINHA
A noite sobre nós se debruçou...
Minha alma ajoelha, põe as mãos e ora!
O luar, pelas colinas, nesta hora,
É água dum gomil que se entornou...
Não sei quem tanta pérola espalhou!
Murmura alguém pelas quebradas fora...
Flores do campo, humildes, mesmo agora,
A noite os olhos brandos lhes fechou...
Fumo beijando o colmo dos casais...
Serenidade idílica das fontes,
E a voz dos rouxinóis nos salgueirais...
Tranquilidade... calma... anoitecer...
Num êxtase, eu escuto pelos montes
O coração das pedras a bater...
[Florbela Espanca – 1894/1930]
8
A CAMÕES
Quando n’alma pesar de tua raça
A névoa da apagada e vil tristeza,
Busque ela sempre a glória que não passa,
Em teu poema de heroísmo e de beleza.
Gênio purificado na desgraça,
Tu resumiste em ti toda a grandeza:
Poeta e soldado... Em ti brilhou sem jaça
O amor da grande pátria portuguesa.
E enquanto o fero canto ecoar na mente
Da estirpe que em perigos sublimados
Plantou a cruz em cada continente,
Não morrerá, sem poetas nem soldados,
A língua em que cantaste rudemente
As armas e os barões assinalados.
[«Estrela da Vida Inteira», de Manuel Bandeira – 1886/1968]
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SONETO DE FIDELIDADE
DE TUDO, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
Que vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.
E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.
[Vinícius de Morais -1913/1980]
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9
Oficina Irritada
Eu quero compor um soneto duro
como poeta algum ousara escrever.
Eu quero pintar um soneto escuro,
seco, abafado, difícil de ler.
Quero que meu soneto, no futuro,
não desperte em ninguém nenhum prazer.
E que, no seu maligno ar imaturo,
ao mesmo tempo saiba ser, não ser.
Esse meu verbo antipático e impuro
há de pungir, há de fazer sofrer,
tendão de Vênus sob o pedicuro.
Ninguém o lembrará: tiro no muro,
cão mijando no caos, enquanto Arcturo,
claro enigma, se deixa surpreender.
[«Claro Enigma», de Carlos Drummond de Andrade – 1902/1987]
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Nasci na várzea do Capibaribe
De terra escura, de macio turvo,
De luz dourada no horizonte curvo
E onde a água doce, o massapê proíbe.
Sua presença para mim se exibe
No seu ar sereno que inda hoje absorvo,
E nas noites, com negridão de corvo.
Antes que ao porto do seu céu arribe
A lua. Assim só tenho essa planície...
Pois tudo quanto fiz foi superfície
De inúteis coisas vãs, humanamente.
De glórias e de alturas e universos
Não tenho o que dizer nestes meus versos:
– Nessa várzea nasci, nasci somente.
[Joaquim Cardozo – 1897/1978]
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10
MEU DECASSÍLABO
A natureza que seus filhos gera,
e qual Saturno os próprios filhos mata,
deu-te a noção a pouco e pouco exata,
desse final que trágico te espera!
Ser feliz por completo é uma quimera...
Ao lado d'alma boa anda a insensata,
como às vezes no Bom surge uma inata
e atávica tendência de ser fera...
Por mais indefectível que pareças,
Homem, serás duma outra vida a imagem,
pois justo é que tu nasças e pereças,
Rio Mundaú- União dos Palmares AL
[Posted by Dantas / Amorim]
— herdeiro dos pavores do Selvagem
e dos vícios, das dores, das desgraças
originárias de milhões de raças...
[Jorge de Lima – 1893/1953]
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Um Soneto para Marília
À maneira de Dirceu
Eis que um dia na mata se banhava
Cupido... e estava nu, inteiramente,
Pois que deixara à margem da corrente
O arco terrível e a repleta aljava.
Marília que, a ocultas, o espreitava
Só aguarda ocasião... E, de repente,
As armas furta sorrateiramente,
Enquanto o deus as costas lhe voltava.
Surgem então as fauces escarninhas
Dos silvanos e sátiros astutos.
Põem-se a vaiar o Amor, sem mais cautelas.
Ah! Temíeis as frechas quando minhas!
(E o deus sorri) Vereis agora, ó brutos,
O que Marília há de fazer com elas!
[Mário Quintana – 1906/1994]
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NOTAS IMPORTANTES:
aljava- recipiente de se colocar flechas
slvanos, sátiros- seres mitológicos, habitantes dos bosques; divindades campestres.
ZILBERMAN, Regina. Mário Quintana. São Paulo: Nova Cultural, 1988. [Literatura Comentada]
11
Sonetos Alexandrinos:
Este, que um deus cruel arremessou à vida,
Marcando-o com o sinal da sua maldição,
— Este desabrochou como a erva má, nascida
Apenas para aos pés ser calcada no chão.
De motejo em motejo arrasta a alma ferida...
Sem constância no amor, dentro do coração
Sente, crespa, crescer a selva retorcida
Dos pensamentos maus, filhos da solidão.
Longos dias sem sol! noites de eterno luto!
Alma cega, perdida à toa no caminho!
Roto casco de nau, desprezado no mar!
E, árvore, acabará sem nunca dar um fruto;
E, homem há de morrer como viveu: sozinho!
Sem ar! sem luz! sem Deus! sem fé! sem pão! sem lar!
[Olavo Bilac - 1865/1918]
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O ACENDEDOR DE LAMPIÕES
Lá vem o acendedor de lampiões da rua!
Este mesmo que vem infatigavelmente,
Parodiar o sol e associar-se à lua
Quando a sombra da noite enegrece o poente!
Um, dois, três lampiões, acende e continua
Outros mais a acender imperturbavelmente,
À medida que a noite aos poucos se acentua
E a palidez da lua apenas se pressente.
União dos Palmares-AL
[ Posted by Dantas /Amorim]
Triste ironia atroz que o senso humano irrita:
Ele que doira a noite e ilumina a cidade,
Talvez não tenha luz na choupana em que habita.
Tanta gente também nos outros insinua
Crenças, religiões, amor, felicidade,
Como este acendedor de lampiões da rua!
[Jorge de Lima – 1895/1953]
12
Sonetilhos:
A casa daquela gente
é branca como um jasmim!
Tem nas vidraças da frente ,
forros azuis de metim
Quando o sol tinge o poente,
vai de bengala ao jardim
um velhote impertinente
de roupa clara ,de brim.
Enxota os pintos e clama
contra quem pisa na grama ,
xinga as crianças, cruel!
Por encontrá-las adiante
pondo no lago ondulante
Embarcações de papel .
[“Cromos, XXIV,” de B. Lopes - 1859/1916]
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Sonetilho do Falso Fernando Pessoa
Onde nasci, morri.
Onde morri, existo.
E das peles que visto
muitas há que não vi.
Sem mim como sem ti
posso durar. Desisto
de tudo quanto é misto
e que odiei ou senti.l
Nem Fausto nem Mefisto,
à deusa que se ri
deste nosso oaristo,
eis-me a dizer: assisto
além, nenhum, aqui,
mas não sou eu, nem isto.
[«Claro Enigma», de Carlos Drummond de Andrade – 1902/1987]
13
A Charles Baudelaire
Carlos também
embora sem
flores nem aves
vinho nem naves,
eu te remeto
este soneto
para saberes,
se o acaso o leres,
que existe alguém
no mundo, cem
anos após
que não vaiou
e nem magoou
teu albatroz.
[Carlos Pena Filho -1929/1960]
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XENHENHÉM No. 2
Em meio às minhas muitas dores
talvez maiores do que o mundo,
surges, às vezes, um segundo,
cheia de pérfidos langores.
Chegas sutil e sem rumores^
E até sinto o odor profundo
no qual eu sôfrego me inundo
─ pária do amor, sonhando amores.
Depois, tu falas não sei donde^
És como um eco que responde
mas, sempre e sempre, além^ além^
Ascenso Ferreira - Recife PE
[By Dantas /Sara / Rayne]
Súbito, encontro a casa oca.
Não estás! ─ Meu Deus, que coisa louca,
só é na vida um xenhenhém !
[Ascenso Ferreira -1895/1965]
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Sonetos com versos brancos:
O desespero de perder-te um dia
Ou de vir a deixar-te neste mundo,
Habita o coração inquieto e triste
Enquanto a noite rola e o sono tarda.
Olho-te, e o teu mistério me penetra;
Sinto que estás vivendo o breve engano
Deste mundo, e que irás também, um dia,
Para onde foram essas de que vieste.
– Essas morenas e secretas musas,
Tuas avós, ciganas de olhos negros
Que te legaram tua graça triste.
Lembro que esfolharás na eterna noite
A rosa de teu corpo delicado,
E ouço a noite chorar como uma fonte.
[Augusto Frederico Schmidt - 1906/ 1965]
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Essa pavana é para uma defunta
infanta, bem-amada, ungida e santa,
e que foi encerrada num profundo
sepulcro recoberto pelos ramos
de salgueiro silvestres para nunca
ser retirada desse leito estranho
em que repousa ouvindo essa pavana
recomeçada sempre sem descanso,
sem consolo, através dos desenganos,
dor reveses e obstáculos da vida,
das ventanias que se insurgem contra
Casa Jorge de Lima – União dos Palmares-AL
[ Posted by Dantas / Amorim]
a chama inapagada, a eterna chama
que anima esta defunta infanta ungida
e bem-amada e para sempre santa.
[Jorge de Lima – 1895/1953]
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NOTAS IMPORTANTES:
pavana – dança e música antigas, lentas e majestosas.
LIMA, Jorge de. Poesias completas / Jorge de Lima. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980. p.368.
15
Soneto inglês
From fairest creatures we desire increase,
That thereby beauty's rose might never die,
But as the riper should by time decease,
His tender heir might bear his memory:
But thou contracted to thine own bright eyes,
Feed'st thy light's flame with self-substantial fuel,
Making a famine where abundance lies,
Thy self thy foe, to thy sweet self too cruel:
Thou that art now the world's fresh ornament,
And only herald to the gaudy spring,
Within thine own bud buriest thy content,
And tender churl mak'st waste in niggarding:
Pity the world, or else this glutton be,
To eat the world's due, by the grave and thee.
[William Shakespeare- 1564/1616]
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Quer-se prole às mais belas criaturas
pra que não morra a rosa da beleza
e em fenecendo as coisas já maduras
um terno herdeiro as lembre. Mas acesa,
contrai-te a luz do teu olhar, consomes
teu ser no ser das tuas próprias chamas
e onde há abundância crias fomes,
cru inimigo de ti teu ser desamas:
tu que do mundo és fresco ornamento
que a gaia primavera arauto fez,
em teu botão te enterras a contento
e terno avaro esbanjas mesquinhez:
Apieda-te do mundo, ou sê glutão.
Comas tu o devido, a cova não.
[Tradução de Vasco Graça Moura ]
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NOTAS:
terno – meigo; afetuoso.
fenecer – acabar; morrer; murchar.
desamar – deixar de amar; aborrecer; odiar.
gaia – deusa da Terra, Mãe da Terra.
arauto – pessoa, que na Idade Média, era encarregada de anunciar oficialmente e solenemente certas
notícias; porta-voz; [fig.] mensageiro.
avaro [á] – avarento. [Do lat. avãru-, «cobiçoso»]
glutão – que come muito com avidez; comilão.
Vasco Graça Moura – poeta, ensaísta, escritor, dramaturgo, tradutor e político português. Nasceu no Porto
em 1942.
16
SONETO INGLÊS No. 1
Quando a morte cerrar meus olhos duros
- Duros de tantos vãos padecimentos,
Que pensarão teus peitos imaturos
Da minha dor de todos os momentos?
Vejo-te agora alheia, e tão distante:
Mais que distante - isenta. E bem prevejo,
Desde já bem prevejo o exato instante
Em que de outro será não teu desejo,
Que o não terás, porém teu abandono,
Tua nudez! Um dia hei de ir embora
Adormecer no derradeiro sono.
Um dia chorarás... Que importa? Chora.
Então eu sentirei muito mais perto
De mim feliz, teu coração incerto.
1940
[Manuel Bandeira – 1886 /1968]
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17
Soneto Espanhol [Chileno]
MATILDE, nome de planta ou pedra ou vinho,
do que nasce da terra e dura,
palavra em cujo crescimento amanhece,
em cujo estio rebenta a luz dos limões.
Nesse nome correm navios de madeira
rodeados por enxames de fogo azul marinho,
e essas letras são a água de um rio
que em meu coração calcinado desemboca.
Oh meu nome descoberto sob uma trepadeira
como a porta de um túnel desconhecido
que comunica com a fragância do mundo!
Oh invade-me com tua boca abrasadora,
indaga-me, se queres, com teus olhos noturnos,
mas em teu nome deixa-me navegar e dormir.
[Pablo Neruda – 1904/1973]
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NOTAS:
NERUDA, Pablo. Cem sonetos de amor. Porto Alegre : L&PM, 1997.
Tradução de Carlos Nejar.
18
Soneto Francês
VOGAIS
A negro, E branco, I rubro, U verde, O azul, vogais,
Ainda desvendarei seus mistérios latentes:
A, velado voar de moscas reluzentes
Que zumbem ao redor dos acres lodaçais;
E, nívea candidez de tendas e areais,
Lanças de gelo, reis brancos, flores trementes;
I, escarro carmim, rubis a rir nos dentes
Da ira ou da ilusão em tristes bacanais;
U, curvas, vibrações verdes dos oceanos,
Paz de verduras, paz dos pastos, paz dos anos
Que as rugas vão urdinho entre brumas e escolhos;
O, supremo Clamor cheio de estranhos versos,
Silêncios assombrados de anjos e universos;
- Ó! Ômega, o sol violeta dos Seus olhos!
[Arthur Rimbaud -1854/1891]
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NOTA:
CAMPOS, Augusto de. Rimbaud livre. São Paulo: Perspectiva, 1993.
19
Elogio ao soneto:
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Soneto! Mal de ti falem perversos
que eu te amo e te ergo no ar como uma taça.
Canta dentro de ti a ave da graça
na gaiola dos teus quatorze versos.
Quantos sonhos de amor jazem imersos
em ti que és dor, temor, glória e desgraça?
Foste a expressão sentimental da raça
de um povo que viveu fazendo versos.
Teu lirismo é a nostálgica tristeza
dessa saudade atávica e fagueira
que no fundo da raça nos verteu
a primeira guitarra portuguesa
gemendo numa praia brasileira
naquela noite em que o Brasil nasceu...
[Menotti Del Picchia – 1892/1988]
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PICCHIA, Paulo Menotti del. Seleta em prosa e verso. Rio de Janeiro: José Olympio, 1974. p. 55-56.
20
Canção
Criada por Petrarca (1304/13740), na Itália, a canção clássica foi introduzida em
Portugal por Sá de Miranda e cultivada sobretudo por Luís Vaz de Camões (1525?/1580).
Não há somente uma modalidade de canção. Ao longo da história literária lusobrasileira, encontramos, pelo menos, três tipos bem distintos de canções: a trovadoresca,
a clássica e a romântica ou moderna.
a)Trovadorescas: são composições dos trovadores galego-portugueses da fase
medieval. Ex.:
Você me proibiu, senhora,
de que lhe dissesse qualquer coisa
sobre o quanto sofro por sua causa.
Mas então me diga,
por Deus, senhora: a quem falarei
o quanto sofro e já sofri por você
senão a você mesma?
Ou a quem direi o meu amor
se eu não o disser a você?
Calar-me não é o que quero
mas dizê-lo também não adianta.
Sofro tanto de amor por você...
Se eu não lhe falar sobre isso
como saberá o que sinto?
Ou a quem direi o sofrimento
que me faz viver,
se eu não for dizê-lo a você?
Diga-me: o que faço?
E, assim, se Deus lhe perdoa,
coita do meu coracão,
a quem direi o meu amor?
[Cantiga de Amor, de D. Dins]
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b) Clássicas: são criações da época renascentista e do período que vai até o
século XVIII. Estas canções possuem certas características bem definidas. De um modo
geral, compõem-se certas de três partes: a introdução (o poeta se serve para indicar uma
situação circunstancial ou o lugar em que está no momento da composição), o texto
(encerra propriamente o desenvolvimento do poema) e a ata (estrofe menor, semelhante
ao ofertório das baladas).
Quanto à fôrma, na estrutural métrica usa-se o decassílabo, alternado com o
hexassílabo; as estrofes são longas e a disposição rímica obedece a um esquema
simétrico regular e igual.
Quanto à temática, são sempre de conteúdo amoroso, se bem que algumas
canções do século seiscentista apresentam temas de caráter moral ou heróico, porém
esporadicamente. Ex.:
Manda-me Amor que cante docemente
O que já em minha alma tem impresso,
Com pressuposto de desabafar-me;
E, por que com meu mal seja contente,
Diz que o ser de tão lindos olhos preso,
Contá-lo bastaria a contentar-me.
Este excelente modo de enganar-me
Tomara eu só de Amor por interesse,
Se não se arrependesse,
Com a pena o engenho escurecendo.
Porém a mais me atrevo,
Em virtude do gesto de que escrevo;
E se é mais o que canto que o que entendo,
Invoco o lindo aspeito,
Que pode mais que Amor em meu defeito.
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Canção, se quem te ler
Não crer dos olhos lindos o que dizes,
Pelo que em si se esconde,
- Os sentidos humanos - lhe responde Não podem dos divinos ser juízes,
[Senão um pensamento
Que a falta supra a fé do entendimento]. (*)
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(*)CAMÕES, Luís Vaz de. “Canções” In: Lírica. São Paulo: Cultrix, 1996.
22
C) Românticas ou Modernas: a partir do Romantismo a canção se revestiu de mais
ampla liberdade formal e conceitual. Tornou-se um poema simples, expressivo, e
comportando os mais diversos assuntos. Ex.:
Nostálgicas – expressam o sentimento da saudade ou uma situação de repassada
tristeza face a um confronto no tempo ou no espaço:
Meus Oito Anos
Oh! souvenirs! printemps! Aurores
Victor Hugo
Oh ! que saudades que eu tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais !
Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais !
Como são belos os dias
Do despontar da existência !
- Respira a alma inocência
Como perfumes a flor;
O mar é - lago sereno,
O céu - um manto azulado,
O mundo - um sonho dourado,
A vida - um hino d’amor !
Que auroras, que sol, que vida,
Que noites de melodia
Naquela doce alegria,
Naquele ingênuo folgar !
O céu bordado d’estrelas,
A terra de aromas cheia,
As ondas beijando a areia
E a lua beijando o mar !
Oh ! dias de minha infância !
Oh ! meu céu de primavera !
Que doce a vida não era
Nessa risonha manhã !
Em vez de mágoas de agora,
Eu tinha nessas delícias
De minha mãe as carícias
E beijos de minha irmã !
Livre filho das montanhas,
Eu ia bem satisfeito,
23
De camisa aberta ao peito,
- Pés descalços, braços nus Correndo pelas campinas
À roda das cachoeiras,
Atrás das asas ligeiras
Das borboletas azuis !
Naqueles tempos ditosos
Ia colher as pitangas,
Trepava a tirar as mangas,
Brincava à beira do mar;
Rezava às Ave-Marias,
Achava o céu sempre lindo,
Adormecia sorrindo,
E despertava a cantar !
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Oh ! que saudades que eu tenho
Da aurora da minha vida
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais !
- Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais !
(*)
Lisboa - 1857
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NOTAS:
fagueiro – que afaga ou faz meiguices; meigo; suave; agradável.
folgar – dar folga; alargar; desapertar.
ditoso – [ô] que tem sorte; feliz; afortunado.
souvenir - [çuvnir] lembrança.
printemps - [prentan] primavera.
aurore - [ôrór] aurora.
(*) ABREU, Casimiro de. Poesia: Casimiro de Abreu. Rio de Janeiro: Agir, 1974. [Nossos Clássicos, 23]
24
CANÇÃO DO EXÍLIO
Kennst du das Land, wo die Citro
Im dunkeln Laub die Gold-Orange
Kennst du es wohl? – Dahin,
Möcht`ich... ziehen.(*)
[Goethe]
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.
Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Posted by Dantas
Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar – sozinho – à noite Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu’inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
(**)
Coimbra – Julho 1843
[Gonçalves Dias – 1823/1864]
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NOTAS:
cismar – ficar absorto em pensamentos; planejar; meditar.
primor- perfeição; delicadeza; esmero.
gorjear – emitir sons melodiosos; cantar (ger. pássaros).
(*) “Conheces o país onde florescem as laranjeiras? Ardem na escura fronde os frutos de ouro... Conhecêlo? – Para lá quisera eu ir!” (M. Bandeira)
(**) BANDEIRA, Manuel. Poesia e vida de Gonçalves Dias. São Paulo: Editora das Américas, 1962.
SEGRE, Cesare. “A canção do exílio de Gonçalves”. In: Os signos e a crítica. São Paulo: Perspectiva, 1974.
[Coleção Debates, v.83]
25
CANÇÃO DO EXÍLIO
Minha terra tem macieiras da Califórnia
onde cantam gaturamos de Veneza.
Os poetas da minha terra
são pretos que vivem em torres de ametista,
os sargentos do exército são monistas, cubistas,
os filósofos são polacos vendendo a prestações.
A gente não pode dormir
com os oradores e os pernilongos.
Os sururus em família têm por testemunha a Gioconda.
Eu morro sufocado
em terra estrangeira.
Nossas flores são mais bonitas
nossas frutas mais gostosas
mas custam cem mil réis a dúzia.
Ai quem me dera chupar uma carambola de verdade
e ouvir um sabiá con certidão de idade!
[Murilo Mendes -1901/1975]
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NOTAS:
gaturamo –pequeno pássaro canoro. [Canoro - que canta; melodioso.]
ametista – pedra roxa semipreciosa.
monista – pessoa sectária do monismo.
Monismo – doutrina segundo a qual o mundo é constituído por uma única substância, quer a chamamos
matéria, como os materialistas, ou espírito, como os espiritualistas.
cubista – artista adepto ao Cubismo.
Cubismo – movimento artístico surgido por volta 1910 e que se caracteriza pela decomposição e
geometrização das formas naturais.
Giogonda - Mona Lisa ou La Giogonda, nome dado a um quadro de Leonardo da Vinci..
MENDES, Murilo. Poemas e bum-meu-poeta. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988. p. 21.
26
CANTO DO REGRESSO À PÁTRIA
Minha terra tem palmares
Onde gorjeia o mar
Os passarinhos daqui
Não cantam como os de lá
Minha terra tem mais rosas
E quase que mais amores
Minha terra tem mais ouro
Minha terra tem mais terra
Ouro terra amor e rosas
Eu quero tudo de lá
Não permita Deus que eu morra
Sem que volte para lá
Posted by Dantas
Não permita Deus que eu morra
Sem que volte pra São Paulo
Sem que veja a Rua 15
E o progresso de São Paulo
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NOTAS:
ANDRADE, Oswald de. Pau-Brasil. São Paulo: Globo, 1998. p. 139.
27
Amorosa ou Erótica – cantam o amor nas suas manifestações idílicas:
Moreninha, Moreninha,
Tu és do campo a rainha,
Tu és senhora de mim;
Tu matas todos d'amores,
Faceira, vendendo as flores
Que colhes no teu jardim.
Quando tu passas n'aldeia
Diz o povo à boca cheia:
- "Mulher mais linda não há
"Ai! vejam como é bonita
"Co'as tranças presas na fita,
"Co'as flores no samburá! Tu és meiga, és inocente
Como a rola que contente
Voa e folga no rosal;
Envolta nas simples galas,
Na voz, no riso, nas falas,
Morena - não tens rival!
Tu, ontem, vinhas do monte
E paraste ao pé da fonte
À fresca sombra do til;
Regando as flores, sozinha,
Nem tu sabes, Moreninha,
O quanto achei-te gentil!
Depois segui-te calado
Como o pássaro esfaimado
Vai seguindo a juriti;
Mas tão pura ias brincando,
Pelas pedrinhas saltando,
Que eu tive pena de ti!
(*)
[^]
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(*) ABREU, Casimiro de. Poesia: Casimiro de Abreu. Rio de Janeiro: Agir, 1974. [Nossos Clássicos, 23]
28
Guerreiras – exaltam a coragem, o heroísmo:
O Canto do Guerreiro
I
Aqui na floresta
Dos ventos batida,
Façanhas de bravos
Não geram escravos,
Que estimem a vida
Sem guerra e lidar.
- Ouvi-me, Guerreiros.
- Ouvi meu cantar.
II
Valente na guerra
Quem há, como eu sou?
Quem vibra o tacape
Com mais valentia?
Quem golpes daria
Fatais, como eu dou?
- Guerreiros, ouvi-me;
- Quem há, como eu sou?
[^]
[Gonçalves Dias, in «O Canto do Guerreiro»]
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Patrióticas – exaltam a terra natal:
Ao Brasil
[...]
Oh! terra de meu berço, oh pátria amada,
Ergue a fronte gentil ungida em glórias
De uma grande nação!
Quando sofre o Brasil, os brasileiros
Lavam as manchas, ou debaixo morrem
Do santo pavilhão!... (*)
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(*) TÁTI, Miécio e GUERRA, E. Carrera (Org.). Poesias completas de L. N. Fagundes Varela – primeiro
volume. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1957.
29
Religiosas:
Voz do Poeta
Perdão, Senhor meu Deus! Busco-te embalde
Na natureza inteira! O dia, a noite,
O tempo, as estações mudos sucedem-se,
Mas eu sinto-te o sopro dentro d’alma!
Da consciência ao fundo te contemplo!
E movo-me por ti, por ti respiro,
Ouço-te a voz que o cérebro me anima,
E em ti me alegro, e canto, e penso!
Jaboatão dos Guararapes – PE
[Posted by Dantas / Sara / Rayne]
Da natureza inteira que aviventas
Todos os elos a teu ser se prendem,
Tudo parte de ti e a ti se volta;
Presente em toda a parte, e em parte alguma,
Íntima fibra, espírito infinito,
Moves potente a criação inteira!
Dás a vida e a morte, o olvido e a glória!
Se não posso adorar-te face a face,
Oh! basta-me sentir-te sempre, e sempre!
Eu creio em ti! eu sofro, e o sofrimento
Como ligeira nuvem se esvaece
Quando murmuro teu sagrado nome!
Eu creio em ti! e vejo além dos mundos,
Minha essência imortal brilhante e livre,
Longe dos erros, perto da verdade,
Branca dessa brancura imaculada
Que os gênios inspirados nesta vida
Em vão tentaram descobrir no mármore! (*)
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(*) VARELA, Luís Nicolau Fagundes. Poesia. Rio de Janeiro: Agir, 1975 [Nossos Clássicos, 12]
30
Sertaneja: a canção é, em geral, um poema de forma culta. Isto não impediu que,
na evolução incontrolável do tempo, fosse ela atingida nessa espécie de base seletiva.
Hoje já há canções genuinamente populares. A canção sertaneja admite duas
modalidades: 1ª) culta: é aquela que, embora tenha por fundo a vida e os aspectos do
sertão, apresenta-se estilizada numa linguagem correta, se bem que espontânea:
TIRANA
"MINHA MARIA é bonita,
Tão bonita assim não há;
O beija-flor quando passa
Julga ver o manacá.
"Minha Maria é morena,
Como as tardes de verão;
Tem as tranças da palmeira
Quando sopra a viração.
[...]
[Castro Alves]
Rodolfo Amoedo - 1857/1941
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2ª) a inculta: o estilo e a forma denunciam com toda a possível fidelidade o
linguajar do nosso sertanejo:
“Os pezinho da cabocla
Quando dançava o baião,
Parecia dois pombinho
A mariscá pelo chão”.
[Catulo da Paixão Cearense, in “O Marruero”]
Na canção sertaneja inculta podemos incluir as chamadas «cantorias» dos nossos
cantores ou «cantadores» populares, com imensa variedade de suas formas e gêneros.
Dentre as cantorias lembramos: o ABC, o aboio, adivinha, beira-mar, carretilha,
colcheia, décima, desafio, embolada, toada, etc. Esta última – a toada, além de ser uma
espécie de romance lírico brasileiro, com quadras e refrão, tem sido modernamente
aproveitada por poetas cultos, que a estilizam através de uma forma breve e singela,
lembrando a trova:
“Minha infância está presente.
É como se fora alguém.
Tudo o que dói nesta noite,
eu sei, é dela que vem.”
[«Toada I», de Emílio Moura- 1902/1971]
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NOTAS:
manacá – arbusto ornamental, com flores perfumadas.
viração – brisa marítima.
31
Canção Redonda
É a «cansó redonda» dos trovadores provençais; consiste numa variante de “leixapren”(poema estrófico que repete no início de cada estância o último verso da estrofe
anterior), - em que o verso inicial vem a ser o último do poema.
VOU-ME EMBORA PRA PASÁRGADA
Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconsequente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive
Manuel Bandeira / Recife – PE
[Posted by Dantas / Sara / Rayne]
E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d'água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada
Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar
E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.
[Manuel Bandeira -1886/1968]
32
Podemos considerar como variantes da canção redonda:
a) Repetição do verso inicial no final na mesma estrofe:
Ontem à tarde, quando o sol morria,
A natureza era um poema santo,
De cada moita a escuridão saía,
De cada gruta rebentava um canto,
Ontem à tarde, quando o sol morria.
Do céu azul na profundeza escura
Brilhava a estrela, como um fruto louro,
E qual a foice, que no chão fulgura,
Mostrava a lua o semicirc'lo d'ouro,
Do céu azul na profundeza escura.
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[«Murmúrios da Tarde», de Castro Alves]
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b) Repetição, no final do poema, de toda ou parte da estrofe inicial:
Quero um beijo sem fim,
Que dure a vida inteira e aplaque o meu desejo!
Ferve-me o sangue. Acalma-o com teu beijo,
Beija-me assim!
O ouvido fecha ao rumor
Do mundo, e beija-me, querido!
Vive só para mim, só para a minha vida,
Só para o meu amor!
Fora, repouse em paz
Dormida em calmo sono a calma natureza,
Ou se debata, das tormentas presas, Beija inda mais!
E, enquanto o brando calor
Sinto em meu peito de teu seio,
Nossas bocas febris se unam com o mesmo anseio,
Com o mesmo ardente amor!
Quero um beijo sem fim,
Que dure a vida inteira e aplaque o meu desejo!
Ferve-me o sangue: acalma-o com teu beijo!
Beija-me assim!
O ouvido fecha ao rumor
Do mundo, e beija-me, querida!
Vive só para mim, só para a minha vida,
Só para o meu amor!
[Olavo Bilac, in «Beijo Eterno»]
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NOTA IMPORTANT:
Recurso retórico de leixa-pren, in: «Levad’amigo que dormides as manhanas frias», cantiga de amigo, de
Nuno Fernandez Torneol.
33
Madrigal
Madrigal - composição poética curta, do século XIV, que expressa um lirismo
delicado, geralmente uma galante confissão de amor. Até o século XV, o madrigal
ostentava fôrma fixa: dois ou três tercetos seguidos de um ou dois dísticos, em versos
decassílabos rimados.
Já no século XVI, o madrigal adquiriu uma estrutura mais simplificada, resumindose apenas numa estrofe curta, em que alternam o decassílabo e o hexassílabo (verso de
6 sílabas).
VI
Neste áspero rochedo,
A quem imitas, Glaura sempre dura,
Gravo o triste segredo
Dum amor extremoso e sem ventura.
Os Faunos da espessura
Com sentimento agreste
Aqui meu nome cubram de cipreste;
Ornem o teu as Ninfas amorosas
De goivos, de jasmins, lírios e rosas.
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NOTAS:
Os Faunos – deuses campestres dos latinos; presidiam à criação do gado, defendiam-no contra os lobos e
protegiam a agricultura.
cipreste – árvore alta, de galhos curtos e folhas verde-escuras.
Ninfas (greco-romana) – são «jovens mulheres» que povoam o campo, os bosques e as águas. São
consideradas divindades secundárias.
goivo [ô] – planta ornamental com flores aromáticas nativa da Europa.
ALVARENGA, Manuel Inácio da Silva. “Madrigais” In: Glaura: poemas eróticos. São Paulo: Companhia Das
Letras, 1996. p. 263.
34
Modernamente, os poetas contemporâneos têm composto madrigais com grande
liberdade:
MADRIGAL MELANCÓLICO
O que eu adoro em ti
Não é a tua beleza
A beleza, é em nós que ela existe.
A beleza é um conceito.
E a beleza é triste.
Não é triste em si,
Mas pelo que há nela de fragilidade e de incerteza.
O que eu adoro em ti,
Não é a tua inteligência.
Mas é o teu espírito sutil,
Tão ágil, tão luminoso,
- Ave solta no céu matinal da montanha.
Nem a tua ciência
Do coração dos homens e das coisas.
O que eu adoro em ti,
Não é a tua graça musical,
Sucessiva e renovada a cada momento.
Graça aérea como teu próprio momento,
Graça que perturba e que satisfaz.
O que eu adoro em ti,
Não é a mãe que já perdi.
Não é a irmã que já perdi.
E meu pai.
O que eu adoro em tua natureza,
Não é o profundo instinto matinal
Em teu flanco aberto como uma ferida.
Nem a tua pureza. Nem a tua impureza.
O que adoro em ti – lastima-me e consola-me!
O que eu adoro em ti, é a vida.
11 de junho de 1920
[Manuel Bandeira – 1886/1968]
______
NOTAS:
BANDEIRA, Manuel. “Madrigal melancólico” In: Estrela da vida inteira / Manuel Bandeira. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 1993. p. 113-114
35
MADRIGAL PARA AS DEBUTANTES DE 1946
Outro, não eu, ó debutantes!
Cante as galas primaveris.
Que o meu estro de relutantes
Octossílabos já senis
Mais imagina do que diz
O que nos primeiros instantes
Do amor e do sonho sentis.
Meus vinte anos vão tão distantes!
Pensando bem, jamais os fiz.
Enfermo, envelheci muito antes.
Aprendi a ser infeliz,
Deus louvado, e por isso quis
Em vossa festa, ó debutantes!
Meter, perdoai!, o meu nariz.
[Manuel Bandeira – 1886/1968]
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NOTAS:
BANDEIRA, Manuel. “Madrigal para as debutantes de 1946.” In: Estrela da vida inteira / Manuel Bandeira.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993. p. 306.
36
Acróstico
Acróstico – composição poética em que as letras iniciais de cada verso, lidas no
sentido vertical, formam uma palavra ou uma frase, que lhe servem de tema, ou, mais
frequentemente, o nome da pessoa a quem é dedicado:
Amigo leitor, prudente,
Não crítico rigoroso,
Te desejo, mas piedosol,
Os meus defeitos consente:
Nome não busco excelente
Insigne entre os escritores;
Os aplausos inferiores
Julgo a meu pletro bastantes:
Os encômios relevantes
São para engenhos maiores.
Esta cômica harmonia
Passatempo e douto, e grave;
Honesta e alegre e suave,
Divertida a melodia.
Apolo, que ilustra o dia,
Soberano me reparte
Ideias, facúndia e arte,
Leitor, para divertir-te,
Vontade para servir-te,
Afeto para agradar-te.
[Antônio José da Silva, o Judeu – 1705/1739]
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NOTAS:
pletro - ponteiro de marfim com que se feriam as cordas da lira; [fig.] gênio poético; poesia.
douto – muito instruído; sábio; erudito.
facúndia – facilidade de falar em público; eloqüência.
insigne – distinto;notável; famoso; ilustre.
encômio – elogio rasgado; louvor público; aplauso.
37
Oh! Excelso monarca, eu vos saúdo!
Bem como vos saúda o mundo inteiro,
O mundo que conhece as vossas glórias.
Brasileiros, erguei-vos e de um brado.
O monarca saudai, saudai com hinos.
Do dia de dezembro o dois faustoso,
O dia que nos trouxe mil venturas!
Ribomba ao nascer d'alva a artilharia.
E parece dizer em tom festivo:
Império do Brasil, cantai, cantai!
Festival harmonia reine em todos;
As glórias do monarca, as vãs virtudes.
Zelemos decantando-as sem cessar.
A excelsa imperatriz, a mãe dos pobres.
Não olvidemos também de festejar.
Neste dia imortal que é para ela
O dia venturoso em que nascera
Sempre grande e imortal, Pedro II.
[Poeta anônimo]
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Mar que te agitas num eterno anseio,
Alma de flor, da luz que me sorri,
Recebe, acolhe no teu casto seio,
Guarda contigo os versos que escrevi.
A minha vida cheia de tristeza
Riu e sonhou; porém nada mais quis;
Inda conserva dentro da alma acessa
Doce lembrança sem ideias vis...
Ave! que Deus te fez pura e feliz!
[João Ribeiro – 1860/1934]
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Modalidades do acróstico: teléstico (terminal) e mesóstico (medial):
“Há muito que não te via
Dois meses já se foram,
Desde que, naquele dia,
Eu jurei não te esquecer.
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“Uma estrela matutina
Trouxe consigo alvorada.
No alto céu reclinada
Em chama de ouro inflamada
Já se desfez a neblina”
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Décima
Décima - é uma composição monostrófica de 10 versos, em geral com verso
heptassílabo (verso de 7 silabas). Também conhecida também com o nome de
«espinela», pois sua criação é atribuída ao poeta e romancista espanhol Vicente Espinel
(1551/1634).
Para mim, que os versos fiz
de graça, um só doce basta,
mas já sei, que sois de casta
de fazer doces gentis:
e pois a fortuna quis
dar-me em prêmio esta fartura,
pintando uma formosura,
agora por nova empresa
digo da vossa grandeza,
que sois ávida doçura.
[Gregório de Matos – 1636/1696]
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A décima é bastante usada pelos cantadores nordestinos, nos seus repentes.
Servem-se dela para glosar um mote.
Mote
O espinho da saudade
só fere no coração
Glosa
Causa dor, ansiedade
tristeza, melancolia,
uma espécie de agonia,
o espinho da saudade:
nasce da planta – amizade –
no vácuo – separação e, por capricho ou paixão
ou mesmo não sei porque,
essa arma, que ninguém vê,
só fere no coração.
[Cantadores nordestinos]
40
Variantes da Décima:
Martelo agalopado - composição poética de uma estrofe (ou mais estrofes), em
versos decassílabos (abbaaccddc).Utilizada bastante por cordelistas e cantadores
sertanejos:
Quando as tripas da terra mal se agitam,
E os metais derretidos se confundem,
E os escuros diamantes que se fundem,
Da cratera ao ar se precipitam.
As vulcânicas ondas que vomitam
Grossas bagas de ferro incendiado,
Em redor, deixam tudo sepultado
Só com o som da viola que me ajuda,
Treme o sol, treme a terra, o tempo muda,
Eu cantando Martelo agalopado.
[Silvino Pirauá Lima]
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Galope a Beira Mar – composição poética de estofes, em versos
decassílabos(versos de 10 sílabas) ou endecassílabos (versos 11 sílabas), seguindo a
mesma distribuição de rimas da Décima (abbaaccddc). Geralmente o último verso termina
com a palavra «mar». O Galope a Beira Mar é assim chamado em virtude de ser
empregado mais em temas praieiros e ter um ritmo que se assemelha ao galope dum
cavalo. Essa composição é bastante utilizada por poetas populares:
Cantando um Galope ninguém me humilha,
Pois tudo o que existe no mar aproveito,
Na ilha, no cabo, península, estreito,
Estreito, península, em cabo e na ilha,
Navio, lá na proa, em bússola e milha!
Medindo a distância eu vou viajar,
Não quero, da rota, jamais me afastar,
Porque me afastando o destino saí torto;
Confio em Deus pra avistar o meu porto,
Cantando Galope na beira do mar !
[Dimas Batista]
Cabo de Santo Agostinho – PE
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41
Oitava
Oitava – poema monostrófico ou não, caracterizado por uma estância de 8 versos.
Das modalidades de oitavas, temos:
a)Oitava rima, oitava real ou oitava heróica:
São aquelas cujos versos decassílabos apresentam uma disposição rímica
cruzada e paralela, ou seja, abababcc:
As armas e os barões assinalados
Que da Ocidental praia Lusitana,
Por mares nunca dantes navegados
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram;
[...]
[Luís Vaz de Camões, in: «Os Luíadas»]
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b) Oitava italiana ou romântica:
O quarto verso e o último apresentam rimas agudas, não havendo normas quanto à
disposição ou tonicidade dos demais, inclusive podendo mesmo serem soltos:
Um dia em que na terra a sós vagava
Pela estrada sombria da existência,
Sem rosas - nos vergéis da adolescência,
Sem luz d'estrela - pelo céu do amor;
Senti as asas de um arcanjo errante
Roçar-me brandamente pela fronte,
Como o cisne, que adeja sobre a fonte,
Às vezes toca a solitária flor.
[...]
Castro Alves, Iin: «O Voo do Gênio»]
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Ode
Ode [do gr. odés, «canto», pelo lat. ode). Entre os
antigos gregos, composição em verso que se destina a
ser cantada. “Ode: entre antigos gregos e romanos,
ligava-se à música, passando depois a um poema lírico
em que se exprimem os grandes sentimentos da alma
humana. Pode celebrar fatos heróicos, religiosos, o amor
ou os prazeres”, (Norma Goldstein).
Sob o ponto de vista clássico, a ode classifica-se, em
heróica ou pindária, também denominada de epinício
[atingir ao épico]; sacra ou religiosa; filosófica ou
epódica; sáfica ou moral; anacreôntica, amorosa ou
pastoril entre outras.
Quanto à estrutura (ou à fôrma), tradicionalmente,
temos: a ode tripartite ou pindárica, em que a estrofe e a
antístrofe apresentam esquema comum, e a épode,
divergente; a ode homostrófica ou horaciana, composta duma série de estâncias iguais e
a ode irregular ou livre.
Os mais distintos cultores da ode na Grécia foram Alceu, Safo, Anacreonte e
Píndaro. Em Roma foi Horácio que latinizou a ode, sendo também o seu maior cultor. Foi
no Renascimento que a ode nasceu em Portugal, tendo como representantes: António
Ferreira, Luís Vaz de Camões, Bocage, Antero de Quental, José Régio, Fernando Pessoa
entre outros. Na literatura Brasileira, a ode apareceu a partir do Arcadismo (séc. XVIII),
com Cláudio Manuel da Costa, Sousa Caldas entre outros; no século XIX, Castro Alves,
Tobias Barreto, Raimundo Correia entre outros; no século XX; Raul de Leôni, Mário de
Andrade, Carlos Drummond de Andrade, Emílio Moura, Lêdo Ivo entre outros.
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NOTA IMPORTANTE:
Alceu – poeta lírico grego (Lesbos séc. VII. a.C.). Provável criador da estrofe alcaica, cantou seus amores e
ódios políticos.
estrofe alcaica – estrofe de versos alcaicos, sendo dois de onze sílabas, 1 de nove e 1 de dez sílabas. Em
outras palavras: ode de quatro versos, com versos brancos e sem rima.
Safo – poetisa grega contemporânea e rival de Alceu. Nascida na ilha de Lesbos, onde derivam os termos
«safismo» e «lesbianismo». Célebre por suas poesias líricas. Criou ritmos e metros novos (a estrófica
sáfica).
estrofe sáfica – estrofe de quatro versos, sendo os 3 primeiros decassílabos e o 4º quebrado com 4 sílabas.
Os versos podem ser rimados ou não.
Anacreonte – poeta lírico grego (séc. VI. a. C.). As odes a ele atribuídas, que celebram o amor e os prazeres
efêmeros, inspiraram a chamada poesia anacreôntica da Renascença. Ode-anacreôntica, aquela em que se
canta o amor, os prazeres e o vinho.
anacreôntico – verso criado por Anacreonte (séc. a. C.), composto de: pirríquio+troqueu+ troqueu +
pirríquio. (Pirríquio - na versificação grego-latina, o metro ou pé formado por duas sílabas breves; troqueu
– na versificação grego-latina, o pé formado por uma sílaba longa e uma breve).
Píndaro – poeta lírico grego da Antiguidade (552-446). Desenvolveu a ode pindárica, composta de estrofe,
antístrofe e epodo, gênero muito usado pelos poetas ingleses dos séculos XVII e XVIII.
horaciano – referente a Horácio (séc. 68 a. c.), poeta lírico romano. Considerado um dos maiores poetas da
Roma Antiga.
43
Ode clássica:
Ode ao Homem Selvagem
ESTROFE 1ª
Ó homem, que fizeste? tudo brada;
Tua antiga grandeza
De todo se eclipsou: a paz dourada,
A liberdade com ferros se vê presa,
E a pálida tristeza
Em teu rosto esparzida desfigura
Do Deus, que te criou, a imagem pura.
ANTÍSTROFE 1ª
Na Cítara, que empunho, as mãos grosseiras
Não pôs Cantor profano;
Emprestou-me a Verdade, que as primeiras
Canções nela entoara; e o vil Engano,
O erro desumano,
Sua face escondeu espavorido,
Cuidando ser do mundo enfim banido.
EPODE 1ª
Dos céus desce brilhando
A altiva Independência, a cujo lado
Ergue a razão o cetro sublinhado
Eu a oiço ditando
Versos jamais ouvidos: Reis da Terra,
Tremei à vista do que ali se encera.
[...]
[Sousa Caldas -1762/1814]
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NOTAS INPORTANTE:
SÉRGIO BUARQUE, de Holanda. “Sousa Caldas” in: Antologia dos poetas brasileiros. São Paulo:
Perspectiva, 1979. p.396.
44
Odes modernas (onde há grande liberdade e flexibilidade):
AO AOS DOUS DE JULHO
(Recitada no Teatro de S. Paulo)
Era no dous de julho. A pugna imensa
Travara-se nos cerros da Bahia...
O anjo da morte pálido cosia
Uma vasta mortalha em Pirajá.
"Neste lençol tão largo, tão extenso,
"Como um pedaço roto do infinito...
O mundo perguntava erguendo um grito:
"Qual dos gigantes morto rolará?!..."
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Mas quando a branca estrela matutina
Surgiu do espaço... e as brisas forasteiras
No verde leque das gentis palmeiras
Foram cantar os hinos do arrebol,
Lá do campo deserto da batalha
Uma voz se elevou clara e divina:
Eras tu— Liberdade peregrina!
Esposa do porvir - noiva do sol!...
Eras tu que, com os dedos ensopados
No sangue dos avós mortos na guerra,
Livre sagravas a Colúmbia terra,
Sagravas livre a nova geração!
Tu que erguias, subida na pirâmide,
Formada pelos mortos de Cabrito,
Um pedaço de gládio — no infinito...
Um trapo de bandeira — n'amplidão!...
S. Paulo, julho de 1868
[Castro Alves – 1847/1871]
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NOTA IMPORTANTE:
GOMES, Eugênio (Org.) Castro Alves – obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1997.
45
ODE A UM POETA MORTO
À memória de Olavo Bilac
Semeador de harmonia e de beleza
Que num glorioso túmulo repousas,
Tua alma foi um cântico diverso,
Cheio da eterna música das cousas:
Uma voz superior da Natureza
E uma ideia sonora do Universo!
Onde passaste, ao longo das estradas,
Linhas de imagens rútilas e vivas,
Em filigrana,
Foram tecendo, como o olhar das fadas,
Nas mais nobres e belas perspectivas,
O panorama dos ideais da Terra
E a ondulante paisagem da alma humana.
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Dignificaste a Espécie, na nobreza
Das grandes sensações de Harmonia e Beleza;
Disseste a Glória de viver, e, agora,
O teu eco a cantar pelos tempos em fora
Dirá aos homens que o melhor destino,
Que o sentido da Vida e o seu arcano,
É a imensa aspiração de se divino,
No supremo prazer de ser humano!
No supremo prazer de ser humano!
[Raul de Leôni – 1895/1926]
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NOTA IMPORTANTE:
ALCIDES, Sérgio (Org.) Luz mediterrânea e outros poemas / Raul de Leoni. São Paulo: Martins Fontes,
2001.
46
ODE TRIUNFAL
À dolorosa luz das grandes lâmpadas eléctricas da fábrica
Tenho febre e escrevo.
Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto,
Para a beleza disto totalmente desconhecida dos antigos.
Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r-r eterno!
Forte espasmo retido dos maquinismos em fúria!
Em fúria fora e dentro de mim,
Por todos os meus nervos dissecados fora,
Por todas as papilas fora de tudo com que eu sinto!
Tenho os lábios secos, ó grandes ruídos modernos,
De vos ouvir demasiadamente de perto,
E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um excesso
De expressão de todas as minhas sensações,
Com um excesso contemporâneo de vós, ó máquinas!
Em febre e olhando os motores como a uma Natureza tropical Grandes trópicos humanos de ferro e fogo e força Canto, e canto o presente, e também o passado e o futuro,
Porque o presente é todo o passado e todo o futuro
E há Platão e Virgílio dentro das máquinas e das luzes eléctricas
Só porque houve outrora e foram humanos Virgílio e Platão,
E pedaços do Alexandre Magno do século talvez cinquenta,
Átomos que hão-de ir ter febre para o cérebro do Ésquilo do século cem,
Andam por estas correias de transmissão e por estes êmbolos e por estes volantes,
Rugindo, rangendo, ciciando, estrugindo, ferreando,
Fazendo-me um acesso de carícias ao corpo numa só carícia à alma.
Ah, poder exprimir-me todo como um motor se exprime!
Ser completo como uma máquina!
Poder ir na vida triunfante como um automóvel último-modelo!
Poder ao menos penetrar-me fisicamente de tudo isto,
Rasgar-me todo, abrir-me completamente, tornar-me passento
A todos os perfumes de óleos e calores e carvões
Desta flora estupenda, negra, artificial e insaciável!
[...]
[Ávaro de Campos, heterônimo de Fernando Pessoa – 1888/1935]
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NOTA IMPORTANTE:
PESSOA, Fernando. Fernando Pessoa – obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994. p. 306.
47
ODE AO BURQUÊS
Eu insulto o burguês! O burguês-níquel,
O burguês-burguês!
A digestão bem feita de São Paulo!
O homem-curva! o homem-nádegas!
O homem que sendo francês, brasileiro, italiano,
É sempre um cauteloso pouco-a-pouco!
Eu insulto as aristocracias cautelosas!
Os barões lampeões! os condes Joões! os duques zurros!
Que vivem dentro de muros sem pulos;
E gemem sangues de alguns milréis fracos
Para dizerem que as filhas da senhora falam francês
E tocam o Printemps com as unhas!
Eu insulto o burguês funesto!
O indigesto feijão com toucinho, dono das tradições!
Fora os que algarismam os amanhãs!
Olha a vida dos nossos setembros!
Fará Sol? Choverá? Arlequinal!
Mas à chuva dos rosais
O êxtase fará sempre Sol!
Morte à gordura!
Morte às adiposidades cerebrais!
Morte ao burguês- mensal!
Ao burguês cinema! ao burguês tílburi!
Padaria Suiça! Morte viva ao Adriano!
" — Ai, filha, que te darei pelos teus anos?
— Um colar... — Conto e quinhentos!!!
Mas nós morreremos de fome!"
Come! Come-te a ti mesmo, oh! gelatina plasma!
Oh! purée de batatas morais
Oh! cabelos nas ventas! oh! carecas!
Ódio aos temperamentos regulares!
Ódio aos relógios musculares! Morte e infâmia!
Ódio à soma! Ódio aos secos molhados!
Ódio aos sem desfalecimentos nem arrependimentos,
Sempiternamente as mesmices convencionais!
De mãos nas costas! Marco eu o compasso! Eia!
Dois a dois! Primeira posição! Marcha!
Todos para a Central do meu rancor inebriante!
48
Ódio e insulto! Ódio e raiva! Ódio e mais ódio!
Morte ao burguês de giolhos,
Chorando religião e que não crê em Deus!
Ódio vermelho! Ódio fecundo! Ódio cíclico!
Ódio fundamento, sem perdão!
Fora! Fu! Fora o bom burguês!...
[Mário de Andrade - 1893/1945]
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NOTA IMPORTANTE:
Printemps – loja de departamento.
Arlequinal – relativo a, ou próprio de Arlequim.
Arlequim – personagem da antiga comédia italiana que usava trajes de várias cores; palhaço; bobo; [fig.]
pessoa que muda de opinião.
adiposidade – obesidade.
tílburi – carruagem de dois assentos puxada por um só animal.
sempiternamente – perpétuo; eterno [Do lat. sempiternu ].
inebriante – que inebria; embriagador.
giolho – forma antiga de joelho.
MANFIO, Diléa Zanotto. (Org.) Poesias completas /Mário de Andrade. Belo Horizonte, 2005. p.88-89.
49
Ode Equatorial
(1950)
Aonde quer eu vá encontro sempre os rios
e suas águas lavadeiras vão limpando
as paisagens sujas da terra.
Ó rios, sois melhores que os espelhos!
Sem esperança de cristal ou crispação de zodíaco,
as beiras dos rios são como as vizinhanças das mulheres,
ó mistério à flor das águas eternamente profundas,
ó consciência dos meus afundamentos,
gosto de água salobra nos corredores do mar!
Caminho pelos estuários e a sombra do equador
é, das luzes, a maior, num fulgor de fogueira.
Aqui há mais rios do que a geografia pode suportar
mas o horizonte, fora prisão didática dos mapas, é vasto e infronteirável.
Em mil canuas, cheias de cucos, de pupa a prua,
não se pode ir a seus lugares,
aos seus rios que choram como as lontras,
aos seus instantes que cantam como o uirapuru.
Longe de meus pertos destronados, é aqui que me descubro
na foz da floresta absoluta e inviajável,
neste mundo livre de planura verde,
com raízes enfiadas na areia como cordas que amarram terras de aluvião,
folhas de todas as árvores, formigueiros rebentados,
e principalmente os feros bichos amazônicos
que não viajaram na arca de Noé
e não conheceram a grande cabotagem do Dilúvio.
Regresso à terra pelo caminho das águas.
Desço degraus de lodo e maré baixa
e atinjo as primeiras etapas da selva.
Tudo o que eu procurava está aqui
neste mar verde, entre dois oceanos verdadeiros como o silêncio entre palavras.
[...]
[Lêdo Ivo -1924]
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NOTA IMPORTANTE:
fulgor – brilho intenso; clarão.
cuco – ave trepadora da família dos Cuculídeos.
lontra – mamífero carnívoro que vive em rios e lagos e se alimenta de peixes e crustáceos.
pupa – ninfa [ Do lat. puppa-, «menina; ninfa»]
uirapuru – pássaro do Brasil, pequeno mas de belo canto. Segundo a crença popular, dá sorte a que o
possui. [Do tupi wirapu’ru, «id.», de wi’ra, «pássaro» + pu’ru, «magro»].
aluvião. Deposito de materiais provenientes da destruição das rochas e transportados pelas águas
correntes.
IVO, Lêdo. Poesia completa (1940-2004). Rio de Janeiro: Topbooks, 2004. p. 251.
50
Elegia
Elegia - poema lírico em que se lamenta uma morte ou outro acontecimento
causador de tristeza. Na Grécia antiga, a elegia era um canto fúnebre com
acompanhamento de flauta. [Do gr. elegía (odé), «canto lúgubre».]
ELEGIA
Perto de tua sepultura,
trazida pelo humilde sonho
que fez a minha desventura,
mal minhas mãos na terra ponho,
logo estranhamente as retiro.
Neste limiar de indiferença,
não posso abrir a tênue rosa
do mais espiritual suspiro.
Jazes com a estranha, a muda, a imensa
Amada eterna e tenebrosa,
pelas tuas mãos escolhida
para teu convívio absoluto.
Por isso me retraio, certa
de que é pura felicidade
a terra densa que te aperta.
E por entre as pedras serenas
desliza o meu tímido luto,
com uma quieta lágrima, apenas,
- esse humano, doce atributo.
[Cecília Meireles– 1901/1964]
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NOTAS:
MEIRELES, Cecília. Poesia completa - volume único. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1993. p. 239.
51
ELEGIA A UM TUCANO MORTO
Ao Pedro
O sacrifício da asa corta o vôo
no verdor da floresta. Citadino
serás e mutilado,
caricatura de tucano
para a curiosidade de crianças
e a indiferença de adultos.
Sofrerás a agressão de aves vulgares
e morto quedarás
no chão de formigas e de trapos.
Eu te celebro em vão
como à festa colorida mas truncada,
projeto da natureza interrompido
ao azar de peripécias e viagens
do Amazonas ao asfalto
da feira de animais.
Eu te registro, simplesmente,
no caderno de frustrações deste mundo
pois para isto vieste:
para a inutilidade de nascer.
[Carlos Drummond de Andrade – 1902/1987]
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NOTAS:
verdor [ê] – característica do que é verde; estado de planta verde.
quederar – ficar quedo; estacionar; parar.
quedo [ê] – que não se move; quieto.
ANDRADE, Carlos Drummond de. Farewell / Carlos Drummond de Andrade. Rio de Janeiro: Record, 2002.
p.69.
52
ELEGIA DE UMA RUA
— Por onde foi eu a levaram?
— Por aqui, por esta rua.
— A rua está bem mudada.
— A rua é a mesma, não muda.
— Os que a levaram, acaso
Se lembrarão dessa tarde?
— Aqueles que iam com ela
Sumiram-se ao fim da estrada.
— Mil novecentos e treze!
Chovia naquela tarde...
— Vinte anos faz que na rua
Chuva de tempo desaba.
Posted by Dantas
— Dizes que se foram todos
Os que lhe queriam bem?
— Hoje só restam os filhos,
Ora amigos de ninguém.
Mas este é o mesmo sol, e estas
As mesmas cornijas e árvores,
E nestes mesmos telhados
Cantam hoje os mesmos pássaros.
— Sim, tudo é o mesmo, no entanto
Minh´alma estranha o que sente,
A rua vejo que é a mesma,
O ar porém é diferente.
A tarde era um cobre novo
Saturado de laranjas.
Chorava pelas janelas
Aquela dor de quinze anos.
Foi por aqui que a levaram,
Por esta rua passaram.
[Manuel Bandeira – 1886/1968]
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NOTAS:
cornija – remate na parte superior duma parede, que a protege das águas pluviais.
BANDEIRA, Manuel. Estrela da vida inteira Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1993. p. 429-430.
53
Lira
Lira – é uma canção em que se repete de ordinário um estribilho ao fim de cada
estrofe. No Arcadismo brasileiro, sobretudo com Tomás Antônio Gonzaga, cuja obra se
intitula precisamente Liras, essa fôrma poética alcançou o auge, mas a partir do
Romantismo foi por completo abandonada.
LIRA I
Eu, Marília, não sou algum vaqueiro,
Que viva de guardar alheio gado,
De tosco trato, de expressões grosseiro,
Dos frios gelos e dos sóis queimado.
Tenho próprio casal e nele assisto;
Dá-me vinho, legume, fruta, azeite;
Das brancas ovelhinhas tiro o leite,
E mais as finas lãs, de que me visto.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!
Alberto Guignard [1896/1962]
Eu vi o meu semblante numa fonte,
Dos anos inda não está cortado;
Os Pastores, que habitam este monte,
Respeitam o poder do meu cajado.
Com tal destreza toco a sanfoninha,
Que inveja até me tem o próprio Alceste:
Ao som dela concerto a voz celeste
Nem canto letra que não seja minha.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!
Mas tendo tantos dotes da ventura,
Só apreço lhes dou, gentil Pastora,
Depois que o teu afeto me segura
Que queres do que tenho ser Senhora.
É bom, minha Marília, é bom ser dono
De um rebanho, que cubra monte e prado;
Porém, gentil pastora, o teu agrado
Vale mais que um rebanho, e mais que um trono.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela !
54
Os teus olhos espalham luz divina,
A quem a luz do sol em vão se atreve;
Papoila ou rosa delicada e fina
Te cobre as faces, que são cor da neve.
Os teus cabelos são uns fios d'ouro;
Teu lindo corpo bálsamo vapora.
Ah! não, não fez o Céu, gentil Pastora,
Para Glória de amor igual Tesouro!
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!
Leve-me a sementeira muito embora
O rio, sobre os campos levantado;
Acabe, acabe, a peste matadora,
Sem deixar uma rês, o nédio gado.
Já destes bens, Marília, não preciso
Nem me cega a paixão, que o mundo arrasta;
Para viver feliz, Marília basta
Que os olhos movas, e me dês um riso.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!
Irás a divertir-te na floresta,
Sustentada, Marília, no meu braço;
Aqui descansarei a quente sesta,
Dormindo um leve sono em teu regaço;
Enquanto a luta jogam os Pastores,
E emparelhados correm nas campinas,
Toucarei teus cabelos de boninas,
Nos troncos gravarei os teus louvores.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!
55
Depois que nos ferir a mão da Morte,
Ou seja neste monte, ou noutra serra,
Nossos corpos terão, terão a sorte
De consumir os dous a mesma terra.
Na campa, rodeada de ciprestes,
Lerão estas palavras os Pastores:
”Quem quiser ser feliz nos seus amores,
Siga os exemplos, que nos deram estes”.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!
By Dantas
[Tomás Antônio Gonzaga – 1744/1810]
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NOTAS:
alheio – o que não é nosso; (o) que pertence a outrem; impróprio.
tosco [ô] – grosseiro; malfeito; rude.
Estrela – com inicial maiúscula traduz a idéia de «sorte», «fadário» (vida difícil).
destreza [ê] – agilidade, habilidade.
Alceste e Glauceste Satúrnio – eram os nomes poéticos de Cláudio Manuel de Costa.
concerto – faço soar com harmonia.
papoila (ou papoula) – planta de suco leitoso, com pétalas geralmente vermelhas; planta cultivada para
ornamento, ópio ou comida.
tocarei – enfeitarei (sentido em desuso).
bonina – planta da família das compostas, também chamada de margarida dos prados.
bálsamo – resina aromática de certas plantas.
nédio – luzidio; gordo.
sesta [é] – sono ou descanso após o almoço ou esse período de tempo.
regaço [Poét.] – colo.
dous – dois.
campa – pedra ou lousa que cobre a sepultura; sino pequeno.
cipreste – árvore alta, de galhos curtos e folhas verde-escuras. [Fig.] Símbolo da morte, da tristeza, do luto,
da dor.
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NOTAS:
GONZAGA, Tomás Antônio. Marília de Dirceu. Rio de Janeiro: Garnier, 1992.p.29-33.
56
Barcarola
Barcarola - canção de barqueiros, cujo o nome deriva das barcaruoli (canto dos
gondoleiros e barqueiros venezianos). Em outras palavras – cantiga medieval portuguesa
inspirada em assuntos marítimos. Teve grande popularidade no Romantismo.
O GONDOLEIRO DO AMOR
Barcarola
Dama -Negra
Teus olhos são negros, negros,
Como as noites sem luar...
São ardentes, são profundos,
Como o negrume do mar;
Sobre o barco dos amores,
Da vida boiando à flor,
Douram teus olhos a fronte
Do Gondoleiro do amor.
By Dantas / Amorim
Tua voz é cavatina
Dos palácios de Sorrento,
Quando a praia beija a vaga,
Quando a vaga beija o vento.
E como em noites de Itália
Ama um canto o pecador,
Bebe a harmonia em teus cantos
O Gondoleiro do amor.
Teu sorriso é uma aurora
Que o horizonte enrubesceu,
- Rosa aberta com o biquinho
Das aves rubras do céu;
Nas tempestades da vida
Das rajadas no furor,
Foi-se a noite, tem auroras
O Gondoleiro do amor.
Teu seio é vaga dourada
Ao tíbio clarão da lua,
Que, ao murmúrio das volúpias,
Arqueja, palpita nua;
57
Como é doce, em pensamento,
Do teu colo no languor
Vogar, naufragar, perder-se
O Gondoleiro do amor!?
Teu amor na treva é - um astro,
No silêncio uma canção,
É brisa - nas calmarias,
É abrigo - no tufão;
Por isso eu te amo, querida,
Quer no prazer, quer na dor...
Rosa! Canto! Sombra! Estrela!
Do Gondoleiro do amor.
Recife, janeiro de 1867.
[Castro Alves – 1847/1871]
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NOTAS:
Gondoleiro – tripulante de gôndola. (Gôndola – pequena embarcação).
negrume – escuridão; cerração; negridão; [fig.] tristeza.
vaga – onda.
rubro – vermelho-vivo; cor de fogo.
cavatina – pequena ária simples. (Ária – melodia; cantiga).
Sorrento – cidade da Itália.
enrubescer – tornar ou tornar-se rubro; avermelhar; corar.
furor [ô] – agitação violenta de ânimo; fúria; delírio.
tíbio – tépido; frouxo; indolente; escasso.
volúpia – voluptuosidade; prazer sensual; grande prazer moral; deleite.
arquejar – respirar com esforço; ansiar; ofegar.
languor (ou langor) – languidez; fraqueza. (Do lat. languor)
vogar – navegar (barco); [fig.] estar em vigor ou em moda.
tufão – vendaval; furacão.
GOMES, Eugênio (Org.). Castro Alves – obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aquilar, 1997. P. 98-99.
58
Barcarola
A flor d’água transparente,
Do rio na correnteza,
Baila um sol adolescente...
O cristal da água corrente
É o espelho da natureza.
Mas sem se ver, de repente,
Como uma folha caída,
À flor d’água transparente,
Uma cigarra suicida
Vai levada na corrente...
By Dantas
Era tão alegre a vida
Que a água se perde cantando,
Mas a voz que desconforta
É tão triste e comovente,
Que nela percebe a gente
A voz da cigarra morta
Cantando na água correnteza.
[Olegário Mariano – 1889/1953]
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59
Rondó
Rondó – poema lírico de fôrma fixa, originária da França, onde apareceu por volta
de 1250. A princípio, consistia numa canção que acompanhava uma dança, a ronde, de
onde lhe veio o nome.
Quanto à estrutura destacamos dois tipos de rondó: o rondó
francês e o rondó português.
O rondó francês – composto em versos octossílabos (oito sílabas) ou decassílabos
(dez sílabas), em duas rimas, com a seguinte estrutura: uma quintilha (rimas aabba); um
terceto (rimas aab), ao qual se ajusta, à guisa de refrão, a primeira ou primeiras palavras
do poema; uma segunda quintilha (rimas aabba), também seguida do mesmo refrão. Tal
refrão não se consta como versos, nem rima com qualquer dos versos anteriores.
XII
(Rondó)
De amor e ciúmes desatino,
porque te amar é meu destino,
— causa do gozo e do sofrer! —
Se vivo é para te querer,
mulher, fulgor, perfume ou hino!
O meu desejo, astro divino,
cerca-te o vulto airoso e fino,
como atmosfera, a te envolver,
de amor!
Ilha florida, eu te imagino,
e julgo o ciúme, agro e mofino,
que me transtorna todo o ser,
um bravo mar sempre a gemer,
a uivar, num ímpeto tigrino
de amor!..
[Goulart de Andrade – 1881/1936]
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NOTAS:
RAMOS, Péricles Eugênio da Silva. “Goulart de Andrade” In: Poesia parnasiana – antologia. São Paulo:
Melhoramentos, 1967. p. 288.
60
O rondó português – constitui-se duma quadra que se repete ao fim de oitavas ou
duas quadras. Funcionando como uma espécie de ritornello, a quadra recorrente
apresenta rima encadeada, isto é, a rima correspondente ao primeiro verso situa-se no
interior do segundo, a deste, no interior do terceiro, e a deste, no interior do quarto. O
número de estrofes pode variar. Utiliza, de preferência, o verso redondilho maior, ou
heptassílabo (verso de 7 sílabas). Silva Alvarenga, poeta do Arcadismo brasileiro (século
XVIII), destaca-se como cultor desse tipo de rondó.
RONDÓ XXXVII
À Mangueira
Carinhosa e doce, ó Glaura,
Vem esta aura lisonjeira,
E a Mangueira já florida
Nos convida a respirar.
Sobre a relva o sol doirado
Bebe as lágrimas da Aurora,
E suave os dons de Flora
Neste prado vê brotar.
Ri-se a fonte: e bela e pura
Sai dos ásperos rochedos,
Os pendentes arvoredos
Com brandura a namorar
Posted by Dantas
Carinhosa e doce, ó Glaura,
Vem esta aura lisonjeira,
E a Mangueira já florida
Nos convida a respirar.
Com voz terna, harmoniosa
Canta alegre o passarinho,
Que defronte do seu ninho
Vem a esposa consolar.
Em festões os lírios trazem...
Ninfas, vinde... eu dou os braços;
Apertai de amor os laços,
Que me fazem suspirar.
Carinhosa e doce, ó Glaura,
Vem esta aura lisonjeira,
E a Mangueira já florida
Nos convida a respirar.
[Silva Alvarenga – 1749/1814]
[...]
_____________
ALVARENGA, Manuel Inácio da Silva. “À mangueira” In: Glaura: poemas eróticos. São Paulo:
Companhia Das Letras, 1996. p.173-174.
61
Há outras modalidades de rondós:
Rondó simples - composto de 3 estrofes assim distribuídas: 2 quadras e uma
sextilha, acrescentando-se nas 2 últimas estâncias o hemistíquio inicial do poema:
RONDÓ DE COLOMBINA
De Colombina o infantil borzeguim
Pierrot aperta a chorar de saudade.
O sonho passou. Traz magoado o rim,
Magoada a cabeça exposta à umidade.
Lavou o orvalho a alvaiade e o carmim.
A alva desponta. Dói-lhe a claridade
Nos olhos tristes. Que é dela?... Arlequim
Levou-a! e dobra o desejo à maldade
De Colombina.
O seu desencanto não tem um fim.
Pobre Pierrot! Não lhe queiras assim.
Que são teus amores?... - Ingenuidade
E o gosto de buscar a própria dor.
Ela é de dois?... Pois aceita a metade!
Que essa metade é talvez todo o amor
De Colombina...
Arlequim e Colombina
- Edgar Degas
[Manuel Bandeira – 1886/1968]
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NOTAS :
Edgar Degas - pintor francês (1834 / 1917).
Arlequim – personagem da antiga comédia italiana que usava trajes de várias cores; palhaço; bobo; [fig.]
pessoa que muda de opinião.
Colombina – personagem da commedia dell’arte em que figura como participante dum triângulo amoroso:
Colombina, Pierrô e Arlequim.
borzequim – calçado antigo até meio da perna, com atacadores de botões. [Do hol. borseken, «pequena
bota de couro»].
Pierrô – personagem da comédia italiana, cuja feição é ingênua e sentimental, e que foi assimilado pelo
teatro francês.
hemístiquio – metade de verso.
BANDEIRA, Manuel. “Rondó de Colombina” In: A cinza das horas; carnaval; o ritmo dissoluto / Manuel
Bandeira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1994. p. 123.
62
Rondó dobrado – composto de 6 quadras ou 5 com mais 3 versos. E uma estrutura
rímica de 2 rimas:
RONDÓ DOS CAVALINHOS
Os cavalinhos correndo.
E nós, cavalões, comendo...
Tua beleza, Esmeralda,
Acabou me enlouquecendo.
Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
O sol tão claro lá fora
E em minh’alma — anoitecendo!
Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
Alfonso Reys partindo,
E tanta gente ficando...
Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
A Itália falando grosso,
A Europa se avacalhando...
Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
O Brasil politicando,
Nossa! A poesia morrendo...
O sol tão claro lá fora,
O sol tão claro, Esmeralda,
E em minhalma — anoitecendo!
[Manuel Bandeira – 1886/1968]
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NOTAS:
BANDEIRA, Manuel. “Rondó dos cavalinhos” In: Estrela da vida inteira / Manuel Bandeira. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 1993. p. 161-162.
63
Balada
Balada – [Do provençal. ant. ballada, de ballar,dançar]. Na alta Idade Média as
baladas eram composições musicadas para dança de camponeses, durante as vindimas
e colheitas. “Balada – poema narrativo de assunto lendário ou fantástico e de caráter
simples e melancólico, típico dos povos do Norte da Europa na época do pré-romantismo,
e que tem sido livremente adotado em períodos posteriores.” (Aurélio Buarque de
Holanda).
A partir do século XIV, Eustáquio Deschamps criou a balada de fôrma fixa,
composta por três estrofes seguidas duma meia estrofe de encerramento, a chamada
«balada clássica francesa».
Em Portugal, depois de Almeida Garrett, a balada é cultivada por Soares de
Passos, Augusto Gil, José Gomes Ferreira entre outros, numa estrutura livre. Na
Literatura Brasileira é cultivada por Olavo Bilac, Goulart de Andrade, Guilherme de
Almeida entre outros, na fôrma fixa. A partir do movimento modernista de 1922, tem-se
dado o nome de balada a certos poemas que, deste gênero, só possuem a simplicidade e
algo do fundo lírico. Temos como cultivadores os poetas, Jorge de Lima, Oswald de
Andrade, Manuel Bandeira, Vinícius de Morais, Carlos Drummond de Andrade entre
outros.
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NOTA IMPORTANTE:
Eustáquio Deschamps – poeta francês (1346/1407), da Corte de Carlos V e de Carlos VI. Autor de
importante obra lírica e de uma Arte de compor (1392), que constituiu um marco na história da arte poética.
64
Baladas Românticas
I
Branca
Vi-te pequena: ias rezando
Para a primeira comunhão:
Toda de branco, murmurando,
Na fronte o véu, rosas na mão.
Não ias só: grande era o bando...
Mas entre todas te escolhi:
Minh'alma foi te acompanhando,
A vez primeira em que te vi.
Tão branca e moça! o olhar tão brando!
Tão inocente o coração!
Toda de branco, fulgurando,
Mulher em flor! flor em botão!
Inda, ao lembrá-lo, a mágoa abrando,
Esqueço o mal que vem de ti,
E, o meu rancor estrangulando,
Bendigo o dia em que te vi!
Rosas na mão, brancas... E, quando
Te vi passar, branca visão,
Vi, com espanto, palpitando
Dentro de mim, esta paixão...
O coração pus ao teu mando...
E, porque escravo me rendi,
Ando gemendo, aos gritos ando,
- Porque te amei! porque - te vi!
Depois fugiste... E, inda te amando,
Nem te odiei, nem te esqueci:
- Toda de branco... Ias rezando...
Maldito o dia em que te vi!
[Olavo Bilac – 1865/1918]
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NOTA IMPORTANTE:
BUENO, Aleixo (Org.). Olavo Bilac: obra reunida. Rio de Janeiro: Nova Aquilar, 1996.
65
Balada do Solitário
Edifiquei certo castelo
por uma esplêndida manhã:
brincava o sol, quente e amarelo,
numa alegria incauta e sã.
E eu quis fazer, ó louco anelo!
desse palácio encantador
o ninho rico, mas singelo,
do teu, do meu, do nosso amor.
Por isso, em vez do som do duelo
tinindo em luta heroica e vã,
Recife -PE
fiz soluçar um “ritornello”
em cada ameia ou barbacã^
Depois, tomando o camartelo,
alto esculpi, dominador,
esse brasão suntuoso e belo
do teu, do meu, do nosso amor.
De que serviu? se elo por elo
dessa paixão de alma pagã
rompeste a golpes de cutelo,
ó minha loira castelã?
Hoje estou só, sozinho, e velo
por este imenso corredor
que corre, corre paralelo
ao teu, ao meu, ao nosso amor.
Ofertório:
A ti, Princesa, eu te revelo
esta canção, que um trovado
virá cantar pelo castelo
do teu, do meu, do nosso amor!
[Guilherme Almeida- 1890/1969]
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NOTA IMPORTANTE:
MOISÉS, Massaud. “Guilherme de Almeida” In: A literatura brasileira através dos textos. São Paulo: Cultrix,
1997.
66
Balada do Amor através das Idades
Eu te gosto, você me gosta
desde tempos imemoriais.
Eu era grego, você troiana,
troiana mas não Helena.
Saí do cavalo de pau
para matar seu irmão.
Matei, brigamos, morremos.
Virei soldado romano,
perseguidor de cristãos.
Na porta da catacumba
encontrei-te novamente.
Mas quando vi você nua
caída na areia do circo
e o leão que vinha vindo,
dei um pulo desesperado
e o leão comeu nós dois.
Depois fui pirata mouro,
flagelo da Tripolitânia.
Toquei fogo na fragata
onde você se escondia
da fúria de meu bergantim.
Mas quando ia te pegar
e te fazer minha escrava,
você fez o sinal-da-cruz
e rasgou o peito a punhal...
Me suicidei também.
67
Depois (tempos mais amenos)
fui cortesão de Versailles,
espirituoso e devasso.
Você cismou de ser freira...
Pulei muro de convento
mas complicações políticas
nos levaram à guilhotina.
Hoje sou moço moderno,
remo, pulo, danço, boxo,
tenho dinheiro no banco.
Você é uma loura notável,
boxa, dança, pula, rema.
Seu pai é que não faz gosto.
Mas depois de mil peripécias,
eu, herói da Paramount,
te abraço, beijo e casamos.
[Carlos Drummond de Andrade – 1902/1987, in «Alguma Poesia»]
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MOISÉS, Massaud. “Carlos Drummond de Andrade” In: A literatura brasileira através dos textos. São Paulo:
Cultrix, 1997. p.449-450.
68
Vilancete
Vilancete [ê] - antiga composição poética geralmente de caráter campesino,
constituída por um terceto (dito mote) glossado em duas ou maus oitavas (ditas voltas),
cujo o verso final repete integral ou parcialmente. O vilancete é bastante cultivado no
Classicismo (século XVI) por Luís de Camões. Na Literatura Brasileira (século XIX),
Goulart de Andrade (1881/1936), também cultiva o vilancete:
MOTE
Descalça vai pera a fonte
Lianor pela verdura;
Vai fermosa, e não segura.
VOLTAS
Leva na cabeça o pote,
O testo nas mãos de prata,
Cinta de fina escarlata.
Sainho de chamalote;
Traz a vasquinha de cote,
Mais branca que a neve pura.
Vai fermosa, e não segura.
Descobre a touca a garganta,
Cabelos de ouro o trançado,
Fita de cor de encarnado,
Tão linda que o mundo espanta.
Chove nela graça tanta,
Que dá graça à fermosura.
Vai fermosa, e não segura.
[Luís Vaz de Camões- 1524? / 1580]
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NOTAS:
escarlata – tecido de lã ou de sede vermelho vivo.
sainho – diminutivo de saio; gibão redondo e sem abas; espécie de camisa ou colete.
chamalote – tecido de lã misturada com seda.
vasquinha – saia com muitas pregas na cintura.
de cote – de uso cotidiano (etimologia quotidie).
testo [ê] – tampa de pote.
fermosura – formosura.
fermosa – formosa.
o trançado – a fita de atar o cabelo, a «fita de cor de encarnado».
_______________
CAMÕES, Luís de. Camões: lírico. Rio de Janeiro: Agir, 1977. p.37. [Nossos Clássicos, 106].
69
MOTE ALHEIO
Perdigão perdeu a pena,
Não há mal que lhe não venha.
VOLTAS
Perdigão que o pensamento
Subiu a um alto lugar,
Perde a pena do voar,
Ganha a pena do tormento.
Não tem no ar nem no vento
Asas com que se sustenha:
Não há mal que lhe não venha.
Quis voar a uma alta torre,
Mas achou-se desasado;
E, vendo-se depenado,
De puro penado morre.
Se a queixumes se socorre,
Lança no fogo mais lenha:
Não há mal que lhe não venha.
[Luís Vaz de Camões- 1524? / 1580]
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NOTA IMPORTANTE:
O mote (o motivo), em geral, é um terceto no qual os dois últimos versos são rimados. Se o mote for
um dístico, não é obrigatoriamente o uso de rima.
________
CAMÕES, Luís de. Lírica. São Paulo: Cultrix, 1996. p. 87.
70
MOTE
Quando eu para vós tornar,
Descontarão meu penar.
VOLTAS
Nem sei que são alegrias,
Mas sim aborrecimentos.
Para compensar os tormentos
Destes cento e vinte dias,
Dou curso a mil fantasias
Pensando no que fareis ...
Nas férias que me dareis
Praia Riacho Doce – Maceió- AL
Posted by Dantas /Amorim
Se a paixão vos faz vassala
De mim, em tão longa ausência,
Trago uma reminiscência
De tudo o que de vós fala
Se hoje a esta dor nada iguala,
Os beijos quando eu voltar,
Descontarão meu penar.
[Goulart de Andrade – 1881/1936]
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71
Idílio
Idílio – composição poética de caráter
campestre ou pastoril. Do grego eidyllion, «quadrinho,
pelo lat. idylliu-, «poema pastoril; idílio». É um poema
lírico muito ao gosto dos poetas arcádicos.
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Idílio, tela de Tarsila do Amaral
FLÉRIDA
(Pastoril)
Oh monte, monte estéril, e escalvado,
Amiga solidão, tristeza amiga!
Eis um pobre pastor, e um pobre gado,
Eu cheio de saudade, ele de fome:
Permite Amor, que eu diga
Por desafogo o mal, que me consome:
Os clamores sentidos
Da solitária ninfa, que responde
A meus ternos gemidos
Lá da gruta, ou da mata, em que se esconde;
Vão ser noutros outeiros,
Vão ser noutras montanhas pregoeiros
Das ânsias, a que Flérida me obriga,
E tu ouve injustiças do meu fado,
Da minha doce, e bárbara inimiga,
Oh monte, monte estéril, e escalvado,
Amiga solidão, tristeza amiga!
[Bocege – 1765/1805]
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NOTAS:
escalvado – sem cabelo; calvo; [fig.] sem vegetação.
terno – meigo; afetuoso; suave.
outeiro – pequena elevação de terreno; colina.
BOCAGE, Manuel Maria Barbosa. “Idílios” In: Bocage – antologia. Lisboa: Ulisseia, 1991. p. 202.
72
Écloga
Écloga ou égloga – composição lírica que tem como cenário a Natureza. A écloga é
geralmente constituída por uma parte narrativa e um diálogo entre duas personagens
rústicas acerca do conceito do amor. Do grego eklogê, «seleção». A écloga difere do
idílio por ser o poema dialogado.
Autor
Tristes práticas passavam,
Cantavam grandes tristezas
Gotas de sangue suavam,
Ledos com suas firmezas,
Elas mesmas os matavam:
Sentiam mui grande dor.
Cada um com seu martírio,
Que nunca se viu maior:
Começa logo o primeiro
Silvestre, sem amador.
Silvestre:
Triste, de mim que será,
Ou coitado que farei,
Que não sei onde me vá,
Com quem me consolarei
Ou quem me consolará?
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Amador:
Ó enganada ventura,
Que queres deste pastor?
Deixa-me ir com minha dor,
Que minha desventura
Traz consigo outra maior;
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[Bernardim Ribeiro – 1482?/1552?, in «Écloglas»]
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Triolé
Triolé ou trioleto – poema lírico de fôrma fixa em uma ou mais oitavas com duas
rimas entrelaçadas, em que o primeiro e o quarto versos são repetidos, e os dois
primeiros se repetem no fim. Os versos são heptassílabos (7 sílabas métrica) ou
octossílabos ( 8 sílabas métricas). O triolé “presta-se pela repetição, que é como um grifo,
e pela leveza, que é como uma seta, ao gênero epigramático, do qual se torna um auxiliar
terrível” (Manuel de Carmo, Consolidação das Leis do Verso, 1910, p. 229).
Originário de França permaneceu em circulação até o século XVI, quando entrou
em completo desuso. Esquecido por centúrias, despertou novo interesse entre os poetas
parnasianos franceses como Alphonse Daudet, Théodore de Banville e outros, na
segunda metade do século XIX. Na Literatura Brasileira, destacam-se Machado de Assis,
Fontoura Xavier, Adelino Fontoura e outros.
Flor da Mocidade
Eu conheço a mais bela flor;
És tu, rosa da mocidade,
Nascida aberta para o amor.
Eu conheço a mais bela flor.
Tem do céu a serena cor,
E o perfume da virgindade.
Eu conheço a mais bela flor,
És tu, rosa da mocidade.
Vive às vezes na solidão,
Como filha da brisa agreste.
Teme acaso indiscreta mão;
Vive às vezes na solidão.
Poupa a raiva do furacão
Suas folhas de azul celeste.
Vive às vezes na solidão,
Como filha da brisa agreste.
Posted by Dantas
Colhe-se antes que venha o mal,
Colhe-se antes que chegue o inverno;
Que a flor morta já nada val.
Colhe-se antes que venha o mal.
Quando a terra é mais jovial
Todo o bem nos parece eterno.
Colhe-se antes que venha o mal,
Colhe-se antes que chegue o inverno.
[Machado de Assis – 1839/1908]
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ASSIS, Machado de. Poesia. Rio de Janeiro: Agir, 1977. p. 30-31. [Nossos Clássicos, 82]
74
Ai, perfume de lima!
Ai, que perfume silvestre!...
Até me provoca a rima,
Ai, que perfume de lima!...
Dize, Silvestre de Lima,
Donde este cheiro, Silvestre?...
Ai, que perfume de lima!
Ai, que perfume silvestre!
[Fontoura Xavier - 1856/1922]
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Na tela frágil dos Cromos
Quantas mimosas quimeras!
Meu Deus! Que doirado pomos
Na tela frágil dos Cromos,
Os sábios, em muitos tomos,
Não sobem tanto às esferas,
Na tela frágil dos Cromos
Quantas mimosas quimeras!
[Adelino Fontoura – 1855/1884]
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NOTAS:
Cromos - título da obra do poeta de B. Lopes (1859/1916).
Silvestre - poeta Silvestre de Lima (1859/1949).
quimera – monstro lendário; [fig.] fantasia; ilusão.
75
Haicai
Haicai – fôrma poética japonesa, que se caracteriza por sua brevidade. A estrofe
deve conter 17 sílabas métricas, na seguinte ordem: 1º verso: 5 sílabas; 2º verso: 7
sílabas e o último com as 5 sílabas restantes (5-7-5). Em princípio, o haicai deve sugerir
uma das estações do ano.
Uma folha morta
Um galho no céu, grisalho.
Fecho a minha porta.
[Guilherme de Almeida – 1890/1969]
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Quis gravar “Amor”
no tronco de um velho freixo:
“Marília”, escrevi”.
[Manuel Bandeira, In: «Haicai tirado de uma falsa lira de Gonzaga»]
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Hai-kai
Em meio da ossaria
Uma caveira piscava-me...
Havia um vagalume dentro dela.
[Mário Quintana – 1906/1994]
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76
Epitalâmio
Epitalâmio – canto ou poema destinado a celebrar bodas e núpcias, em fim, casamento. Do grego epithlámion, «nupcial», pelo lat. epithalamiu-, «poema nupcial».
EPITALÂMIO
PARA MARIA DA GLÓRIA E RODOLFO
Cantei Maria da Glória
recém-nascida. Hoje canto
a mesma na plena glória
de mulher recém-casada
- adorável e adorada.
Ela, pelo seu encanto,
acabou por alcançar
com quem o mais pelo par
de que no mundo há memória
fazer. Assim Deus os fez
e os uniu. Glória ao marquês
Rodolfo! e as bênçãos não cessem
dos céus aos dois, pois merecem.
J. Waterhouse -1849/1917
[Manuel Bandeira – 1886/1968]
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BANDEIRA, Manuel. Estrela da vida inteira / Manuel Bandeira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993. p.
326.
77
Epitáfio
Epitáfio – composição versejada, em que mencionam e virtudes e atos do falecido.
Geralmente, o epitáfio não excede duma quadra. Do grego, epitáphion, «inscrição
tumular». Figuradamente o epitáfio podem ser dirigidos a outros seres.
[...]
Eu deixo a vida como deixa o tédio
Do deserto, o poento caminheiro,
- Como as horas de um longo pesadelo
Que se desfaz ao dobre de um sineiro;
[...]
Descansem o meu leito solitário
Na floresta dos homens esquecida,
À sombra de uma cruz, e escrevam nela:
- Foi poeta - sonhou - e amou na vida. [...]
[Álvares de Azevedo – 1831/1852, in «Lembrança de Morrer»]
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Um anjo dorme aqui; na aurora apenas,
Disse adeus ao brilhar das açucenas
Sem ter da vida alevantado ao véu.
— Rosa tocada do cruel granizo —
Cedo finou-se e no infantil sorriso
Passou do berço p’ra brincar no céu!
[Casimiro de Abreu – 1839/1860, in «Num túmulo dum Menino»]
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“Aqui... jaz pó; eu não; eu sou quem fui... / Raio animado de uma Lua celeste, / À qual a
morte as almas restitui, / Restituindo à terra o pó que as veste”
[Epitáfio sobre o túmulo de Antero de Quental, escrito por João de Deus.]
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«Passante, não chores minha morte
Se eu vivesse tu estarias morto.»
[Robespierre – 1758/1798]
78
Aqui jaz o Sol
Que criou a aurora
E deu a luz ao dia
E apascentou a tarde
O mágico pastor
De mãos luminosas
Que fecundou as rosas
E as despetalou.
Aqui jaz o Sol
O andrógino meigo
E violento, que
Possui a forma
De todas as mulheres
E morreu no mar.
[Vinícius de Morais – 1913/1980]
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MORAIS, Vinícius de. “Epitáfio” In: Vinicius de Moraes – poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova
Aguilar, 1986. p. 205.
79
SEXTINA
Sextina – poema de fôrma fixa composto de seis sextilhas, geralmente em versos
decassílabos, seguidos dum terceto final, que serve como «remate» ou «fecho de ouro».
Os versos devem terminar com palavras de duas silabas. A terminação do verso anterior
de vê ser repetida no primeiro verso da estrofe seguinte. A criação da sextina é atribuída
ao trovador provençal do século XII, Arnaut Daniel.
Em Portugal, a sextina foi praticada por Luís Vaz de Camões, no século XVI.
Permaneceu em circulação até o século XVIII. Com o fim do Arcadismo, a sextina entrou
paulatinamente a perder a primitiva fixidez, até confundir-se com a sextilha. Na Literatura
Brasileira Modernista, Jorge de Lima também a cultivou.
Foge-me pouco a pouco a curta vida
Se por caso é verdade que inda vivo;
Vai-se-me o breve tempo d'ante os olhos;
Choro pelo passado e, quando falo,
Se me passam os dias passo e passo,
Vai se me, enfim, a idade e fica a pena.
Que maneira tão áspera de pena!
Que nunca üa hora viu tão longa vida
em que possa do mal mover se um passo.
Que mais me monta ser morto que vivo?
Para que choro, enfim? Para que falo,
Se lograr me não pude de meus olhos?
Ó fermosos, gentis e claros olhos,
cuia ausência me move a tanta pena
quanta se não compreende enquanto falo!
Se, no fim de tão longa e curta vida,
De vós m'inda inflamasse o raio vivo,
Por bem teria tudo quanto passo.
Mas bem sei, que primeiro o extremo passo
Me há de vir a cerrar os tristes olhos
Que Amor me mostre aqueles por que vivo.
Testemunhas serão a tinta e pena,
Que escreveram de tão molesta vida
O menos que passei, e o mais que falo.
Oh! que não sei que escrevo, nem que falo!
Que se de um pensamento n'outro passo,
Vejo tão triste gêénero de vida
Que, se lhe não valerem tantos olhos,
Não posso imaginar qual seja a pena
Que traslade esta pena com que vivo.
80
N'alma tenho confino um fogo vivo,
Que, se não respirasse no que falo,
Estaria já feita cinza a pena;
Mas, sobre a maior dor que sofro e passo,
Me temperam as lágrimas dos olhos
Com que, fugindo, não se acaba a vida.
Morrendo estou na vida, e em morte vivo;
Vejo sem olhos, e sem língua falo;
E juntamente passo glória e pena.
[Luís Vaz de Camões- 1524?/1580]
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CAMÕES, Luís de. Lírica de Luís de Camões. São Paulo: Cultrix, 1996. P.161-162
81
XXIV
A sextina começa
de novo uma ária espessa,
(sextina da procura!)
Eurídice nas trevas,
Ó Eurídice obscura.
Eva entre às outras Evas.
Repousai aves, Evas,
que a busca recomeça
cada vez mais obscura
da visão mais espessa
repousada nas trevas
Ah! difícil procura!
Incessante procura
entre noturnas Evas,
entre divinas trevas,
Eurídice começa
a trajetória espessa,
a trajetória obscura.
Casa Jorge de Lima - União dos Palmares - AL
Posted by Dantas / Amorim
Desceu à pátria obscura.
em que não se procura
alguém na sombra espessa
e onde sombras são Evas,
e onde ninguém começa,
mas tudo acaba em trevas.
Infernos, Evas, trevas,
lua submersa e obscura.
Aí a ária começa,
e não finda a procura
entre as celestes Evas
a Eva da terra espessa.
Eurídice, Eva espessa,
musa de doce trevas,
mais que todas as Evas musa obscura, Eva obscura;
sextina que procura
acabar, e começa.
[Jorge de Lima -1893/1953]
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NOTAS:
ária – peça de música para uma voz que geralmente paz parte duma ópera, oratório ou cantata.
espesso [ê] – denso; compacto; grosso; opaco.
Eurídice – esposa de Orfeu.
Orfeu – personagem da mitologia grega, poeta e músico.
LIMA, Jorge de. Antologia poética. Rio de Janeiro: José Olympio, 1974. p. 149-150.
82
Terça-Rima
Terça-Rima ou Terceto - poema estrófico usado por Dante Alighieri (1265/1321) na
«Divina Comédia», no século XIV, e constituído por número variado de tercetos. O poema
tem a seguinte disposição das rimas: aba / bcb/ cdc / ded etc. Ao final do poema (ou ao
derradeiro terceto), acrescenta-se um verso, que rima com o verso intermediário da
estrofe precedente (xyx y) e que pode permanecer isolado ou aglutinar-se ao terceto,
formando um quarteto.
Em Portugal, o poema é utilizado por Luís de Camões, António Ferreira e outros.
Na Literatura Brasileira, é cultivado por Gregório de Matos, Cláudio Manuel da Costa,
Tomás Antônio Gonzaga, Álvares de Azevedo, Machado de Assis, Olavo Bilac, Alberto de
Oliveira e outros.
A DIVINA COMÉDIA
Canto I
"A meio caminhar de nossa vida
fui me encontrar em uma selva escura:
estava a reta minha vida perdida.
/a/
/b/
/a/
Ah! que a tarefa de narrar é dura
essa selva selvagem, rude e forte,
que volve o medo à mente que a figura.
/b/
/c/
/b/
De tão amarga, pois mais lhe é a morte,
mas, pra tratar do bem que enfim lá achei,
direi do mais que me guardava a sorte.
Como lá fui parar dizer não sei;
tão tolhido de sono me encontrava,
que a verdadeira via abandonei."
/c/
/d/
/c/
/d/
/e/
/d/
[...]
que me conduzas lá aonde tu disseste.
A porta de São Pedro então verei
e aqueles que tão mestos desceveste.
Moveu-se então , e eu o acompanhei.
[Dante Alighieri -1265/1321]
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ALIGUIERI, Dante. “Canto I” In: A divina comédia: inferno. São Paulo: Ed 34, 1998. p. 25-29-30..
Terza Rima
83
É belo de entre a cinza ver ardendo
Nas mãos do fumador um bom cigarro,
Sentir o fumo em névoas recendendo,
Do cachimbo alemão no louro barro
Ver a chama vermelha estremecendo
E até... perdoem... respirar-lhe o sarro!
Porém o que há mais doce nesta vida,
O que das mágoas desvanece o luto
E dá som a uma alma empobrecida,
Palavra d'honra, és tu, ó meu charuto!
[Álvares de Azevedo – 1831/1852]
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NOTAS:
recender – exalar cheiro de.
desvanecer – fazer desaparecer ou desaparecer; apagar(-se).
sarro - resíduo de tabaco queimado que se deposita no tubo dos cachimbos e das piteiras.
AZEVEDO, Álvares de. “Terça rima” In: Lira dos vinte anos. Cotia: Ateliê Editorial, 2000. p. 284.
84
Última Jornada
I
E ela se foi nesse clarão primeiro,
Aquela esposa mísera e ditosa;
E ele se foi o pérfido guerreiro.
Ela serena ia subindo e airosa,
Ele à força de incógnitos pesares
Dobra a cerviz rebelde e lutuosa.
Iam assim, iam cortando os ares,
Deixando em baixo as fértiles campinas,
E as florestas, e os rios e os palmares.
Oh! cândidas lembranças infantinas!
Oh! vida alegre da primeira taba;
Que aurora vos tomou, aves divinas?
Como um tronco do mato que desaba,
Tudo caiu; lei bárbara e funesta:
O mesmo instante cria e o mesmo acaba.
De esperanças tamanhas o que resta?
Uma história, uma lágrima chorada
Sobre as últimas ramas da floresta.
A flor do ipê a viu brotar magoada,
E talvez a guardou no seio amigo,
Como lembrança da estação passada.
Agora os dous, deixando o bosque antigo,
E as campinas, e os rios e os palmares,
Para subir ao derradeiro abrigo,
Iam cortando lentamente os ares.
Albert Eckhout -1610/665
[Machado de Assis – 1839/1908]
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NOTAS:
ditoso [ô] – feliz, venturoso.
pérfido – que age com deslealdade; desleal.
airoso [ô] – gentil, delicado.
cerviz - a parte superior do pescoço; nunca.
lutuoso [ô] – coberto de luto; [fig.] triste.
fértil – capaz de produzir com facilidade; produtivo. [Do lat.fertilis ].
taba – aldeia indígena.
palmares – uma das regiões botânicas do Brasil setentrional, a qual abrange vastas zonas onde a
vegetação predominante são palmeiras (babaçu, carnaúba etc). Quilombo dos palmares.
funesto [é] – que traz morte; mortal, fatal.
ipê – árvore nativa do Brasil, de flores brancas, róseas ou amarelas e madeira nobre muito resistente.
[«O ipê é a árvores nacional do Brasil»].
ASSIS, Machado de. “Última jornada” In: Crônicas–crítica-poesia-teatro. São Paulo, Cultrix, 1961. p. 222223.
85
I
Noite ainda, quando ela me pedia
Entre dois beijos que me fosse embora,
Eu, com os olhos em lágrimas, dizia:
"Espera ao menos que desponte a aurora!
Tua alcova é cheirosa como um ninho...
E olha que escuridão há lá por fora!
Como queres que eu vá, triste e sozinho,
Casando a treva e o frio de meu peito
Ao frio e à treva que há pelo caminho?
Ouves? é o vento! é um temporal desfeito!
Não me arrojes à chuva e à tempestade!
Não me exiles do vale do teu leito!
Morrerei de aflição e de saudade...
Espera! até que o dia resplandeça,
Aquece-me com a tua mocidade!
Sobre o teu colo deixa-me a cabeça
Repousar, como há pouco repousava...
Espera um pouco! deixa que amanheça!"
— E ela abria-me os braços. E eu ficava.
[Olavo Bilac – 1865/1918]
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NOTAS:
alcova – pequeno quarto de dormir situado no interior da casa; dormitório de mulher ou de casal.
arrojar – lançar com ímpeto; arremessar.
exilar [z] – condenar(-se) ao exílio; expatriar(-se; [fig.] afastar(-se) do convívio social; isolar(-se); retirar(-se).
resplandecer – brilhar intensamente; rutilar; luzir; resplender
BILAC, Olavo. “Tercetos” In: Olavo Bilac: obra reunida. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1996. p. 177.
86
Acalanto
Acalanto - breve composição em versos, geralmente em redondilhos, cantados em
ritmos lento, com que se adormecem crianças. Corresponde à bercause francesa.
Tutu- marambá,
Não venhas mais cá,
Que o pai do menino
Te manda matar.
[Quadra Popular]
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Dorme, meu filhinho,
Dorme sossegado.
Dorme, que a teu lado
Cantarei baixinho.
O dia não tarda...
Vai amanhecer:
Como é frio o ar!
O anjinho da guarda
Que o Senhor te deu,
Pode adormecer,
Pode descansar.
Que te guardo eu.
8 de agosto de 1942
Bougureau – 1825/1905
[Manuel Bandeira, in «Acalanto de John Talbot»]
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“Xoxô, Papão!
Sai de cima do telhado,
87
Deixa o meu filho dormir
Seu soninho sossegado”.
A mãe balança o berço, balança...
O menino matreiro finge dormir,
De quando em quando, sem se sentir,
Abre os olhinhos cor da esperança...
E a mãe balança o berço, balança...
Tem quinze meses o menino.
É lindo e loiro como uma manhã de sol.
- Meu filho vai ter um belo destino,
Vai ser alegre como um rouxinol.
Vai ser feliz na tranquilidade
Da vida boa que os simples têm.
O que me vier de felicidade
Vai ser dele, de mais ninguém.
Que nunca ele ame. Que nunca a mágoa
Do amor o envolve no seu fulgor.
E a mãe com os olhos boiando nágua,
Pensa no fruto do seu amor.
“Xoxô, Papão!
Sai de cima do telhado,
Deixa o meu filho dormir
Seu soninho sossegado.”
Dorme o menino, Sem que pareça,
Seu sono é um sono de passarinho...
A mãe cansada baixa a cabeça,
Inclina o dorso devagarinho.
E ainda murmura para ele ouvir,
Num tênue fio de voz magoado:
Deixa o meu filho dormir
Seu soninho sossegado:
“Deixa o meu filho dormir
Seu soninho sossegado”
[Olegário Mariano, in «Xoxô, Papão»]
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[...]
88
“Faz de conta que os sabugos
são bois^”
“Faz de conta^”
“Faz de conta^”
E os sabugos de milho
mugem como bois de verdade^
e os tacos que deveriam ser
soldadinhos de chumbo são
cangaceiros de chapéus de couro^
E as pedrinhas balem!
Coitadinhas das ovelhas mansas
longe das mães
presas nos currais de papelão!
É boquinha da noite
no mundo que o menino impossível
povoou sozinho!
A mamãe cochila.
O papai cabeceia.
O relógio badala.
E vem descendo
uma noite encantada
da lâmpada que expira
lentamente
na parede da sala^
O menino poisa a testa
e sonha dentro da noite quieta
da lâmpada apagada
com o mundo maravilhoso
que ele tirou do nada^
Xô! Xô! Pavão!
Sai de cima do telhado
Deixa o menino dormir
Seu soninho sossegado!
[Jorge de Lima, in «O Mundo do Menino Impossível»]
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89
Pantum
Pantum – poema de fôrma fixa, composto por quartetos, em número
indeterminado. O 2º e o 4º versos de cada estrofe repetem-se como 1º e 3º da estrofe
seguinte, e o poema termina com o mesmo verso que o iniciou. O pantum é originário da
Malásia. Na França, foi introduzido por Vítor Hugo. No Brasil, foi cultivado por Olavo Bilac,
Alberto de Oliveira e outros.
Quando passaste, ao declinar do dia,
Soava na altura indefinido arpejo:
Pálido, o sol do céu se despedia,
Enviando à terra o derradeiro beijo.
Soava na altura indefinido arpejo...
Cantava perto um pássaro, em segredo;
E, enviando à terra o derradeiro beijo,
Esbatia-se a luz pelo arvoredo.
Cantava perto um pássaro em segredo;
Cortavam fitas de ouro o firmamento...
Esbatia-se a luz pelo arvoredo:
Caíra a tarde; sossegara o vento.
Postado por Dantas
Cortavam fitas de ouro o firmamento...
Quedava imoto o coqueiral tranquilo...
Caíra a tarde. Sossegara o vento.
Que mágoa derramada em tudo aquilo!
Quedava imoto o coqueiral tranquilo.
Pisando a areia, que a teus pés falava,
(Que mágoa derramada em tudo aquilo!)
Vi lá embaixo o teu vulto que passava.
Pisando a areia, que a teus pés falava,
Entre as ramadas flóridas seguiste.
Vi lá embaixo o teu vulto que passava...
Tão distraída! - nem sequer me viste!
Entre as ramadas flóridas seguiste,
E eu tinha a vista de teu vulto cheia.
Tão distraída! - nem sequer me viste!
E eu contava os teus passos sobre a areia.
Eu tinha a vista de teu vulto cheia.
E, quando te sumiste ao fim da estrada,
Eu contava os teus passos sobre a areia:
Vinha a noite a descer, muda e pausada...
90
E, quando te sumiste ao fim da estrada,
Olhou-me do alto uma pequena estrela.
Vinha a noite, a descer, muda e pausada,
E outras estrelas se acendiam nela.
Olhou-me do alto uma pequena estrela,
Abrindo as áureas pálpebras luzentes:
E outras estrelas se acendiam nela,
Como pequenas lâmpadas trementes.
Abrindo as áureas pálpebras luzentes,
Clarearam a extensão dos largos campos;
Como pequenas lâmpadas trementes
Fosforeavam na relva os pirilampos.
Clarearam a extensão dos largos campos. .
Vinha, entre nuvens, o luar nascendo...
Fosforeavam na relva os pirilampos...
E eu inda estava a tua imagem vendo.
Vinha, entre nuvens, o luar nascendo:
A terra toda em derredor dormia...
E eu inda estava a tua imagem vendo,
Quando passaste ao declinar do dia!
Olavo Bilac – 185/1918]
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NOTAS:
arpejo [ê] - execução rápida e sucessiva de notas dum acorde, geralmente em
instrumento de corda. [Do it. arpeggio, «toque de harpa»].
esbater – apresentar-se com as cores ou tons esbatidos; atenuar-se; enfraquecer-se
imoto – imóvel; fixo; inabalável. [Do lat. immotu].
quedar – ficar quieto; estacionar;parar.
tremente – que treme.
fosforear - brilhar como fósforo.
relva – camada de erva rasteira; grama.
áureo – de ouro ou da cor dele; dourado; brilhante; [fig.] nobre; magnífico.
pálpebra - cada uma das duas membranas móveis que protegem os olhos.
pirilampo - vaga-lume.
flórido – florescente; brilhante.
luzente – que brilha ou luz; luminoso.
derredor [ó] – à volta ; em redor.
BILAC, Olavo. “Pantum” In: Olavo Bilac: obra reunida. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1996. p. 132-133-134.
SERENATA NO RIO
91
Desce a corrente do rio
O barco sem remadores.
Que secreto murmurio
Da ribanceira entre as flores!
O barco sem remadores
Oscilla à toa, flutua,
Da ribanceira entre as flores,
Aos frios raios da lua.
Oscilla à toa, flutua...
Que figura inteiriçada,
Aos frios raios da lua,
Vai nesse caixão deitada!
Claude Monet – 1840/1924
Que figura inteiriçada!
— Vede-lhe os olhos sem vida! Vai nesse caixão deitada,
Toda de branco vestida.
Vede-lhe os olhos sem vida!
Que visão! Que forma estranha!
Toda de branco vestida,
É um mármor que a lua banha.
Que visão! Que forma estranha!
Que neve esmaiada aquela!
É um mármor que a lua banha...
Soluça alguém junto dela:
(Que neve esmaiada aquela!)
— “Minha pálida neblina,
(Soluça alguém junto dela)
Dorme, que a noite é divina!
Minha pálida neblina,
A morte ao seio te estreita;
Dorme, que a noite é divina,
E em breve estarás desfeita.
A morte ao seio te estreita,
Tua essência se evapora
E em breve estarás desfeita.
Como as neblinas da aurora.
Tua essência se evapora...”
Cala-se a voz de repente.
Como as neblinas da aurora,
Roxeia o clarão do Oriente.
Cala-se a voz... De repente
92
Surge o dia esplendoroso;
Roxeia o clarão do Oriente
O barco silencioso.
Surge o dia esplendoroso...
Como um fantasma sombrio,
O barco silencioso
Desce a corrente do rio.
[Alberto de Oliveira -1857/1937]
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NOTAS:
murmurio – alteração da palavra «murmúrio» por hiperbibasmo. [Hiperbibasmo – deslocação do acento
tônico duma palavra, que torna a pronúncia errada. [Do gr. hyperbibasmós, «deslocação do acento»].
Licença poética.
mármor – forma apocopada de mármore. [Apocopada – de apócope; supressão de fonema ou sílaba final
dum vocábulo].
esmaiada – forma reduzida de desmaiada.
roxeiar – tornar-se roxo, purpúreo.
inteiriçado – hirto, retesado.
O começo do poema - «Desce a corrente do rio o barco sem remadores» – lembra o começo do «Le Bateau
Ivre» de Rimbaud - «Como eu já descesse Rios impassíveis».
“DOanjinho da guarda
OLIVEIRA, Alberto de. “Serenata no rio” In: Poesia. Rio de Janeiro: Agir, 1969. p.42-43-44. [Nossos
Clássicos, 32]
Que o Senhor te deu,
93
Vilanela
Vilanela – poema de fôrma fixa que surge na Itália, no século XVI. Formado por
vários tercetos e uma quadra que finaliza a composição. Repetição dos versos: o 1º e 3º
do 1º terceto repetem-se, alternadamente, ao final de cada estrofe; na quadra, os dois
últimos versos são o 1º e o 3º do primeiro terceto. Na Literatura Brasileira, a vilanela é
cultivada por Manuel Bandeira, Homero Prates e outros.
CHAMA E FUMO
Amor – chama, e, depois, fumaça...
Medita no que vais fazer:
O fumo vem, a chama passa...
Gozo cruel, ventura escassa,
Dono do meu e do teu ser,
Amor – chama, e, depois, fumaça...
Tanto ele queima! E, por desgraça,
Queimado o que melhor houver,
O fumo vem, a chama passa...
Paixão puríssima ou devassa,
Triste ou feliz, pena ou prazer,
Amor – chama, e, depois, fumaça...
A cada par que a aurora enlaça,
Como é pungente o entardecer!
O fumo vem, a chama passa...
Antes, todo ele é gosto e graça.
Amor, fogueira linda a arder!
Amor – chama, e, depois, fumaça...
Porquanto, mal se satisfaça,
(Como te poderei dizer?...)
O fumo vem, a chama passa...
A chama queima. O fumo embaça.
Tão triste que é! Mas, tem de ser...
Amor?... – chama, e, depois, fumaça:
O fumo vem, a chama passa...
Teresópolis, 1911
[Manuel Bandeira -1886/1968]
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BANDEIRA, Manuel. “Chama e fumo” In: Estrela da vida inteira / Manuel Bandeira. Rio de Janeiro, Nova
Fronteira, 1993. p. 48.
94
Ditirambo
Ditirambo - poema lírico que exprime entusiasmo ou delírio. “Um poema destinado
a celebrar o vinho, os prazeres da mesa, o prazer em geral, a alegria” (Manuel do Carmo,
Consolidação das Leis do Verso). Primitivamente, o ditirambo consistia num canto em
louvor a Baco, deus do vinho.
Na Literatura Brasileira, no século XIX, cultivaram o ditirambo Medeiros e
Albuquerque, Fagundes Varela e outros.
Conviva, enchamos as finas taças
Dos claros vinhos no louro rio!
Deixem-se as mágoas vãs das desgraças,
Do pensamento negro e sombrio:
Seja a Alegria quem do horizonte
Derrame os gozos na nossa fronte!
Bebe! se sentes no arfar do peito
Nome de virgem casto surgindo,
Verás — do Vinho sublime efeito —
Ela a teus braços chegar, sorrindo...
Então, no afeto dos puros beijos,
Serão cumpridos os teus desejos.
Bebe! se queres a eterna glória
Para teu nome de luz banhar,
Nos olhos baços — febre ilusória —
O mundo inteiro verás clamar...
Vivas, aplausos, gritos ardentes...
As turbas loucas dirão frementes...
Bebe! e se ao cabo da noite escura
— Hora de crimes torpes, medonhos, — ,
O brilho vivo da razão pura
Varrer-te acaso da mente os sonhos,
Cerra os ouvidos à voz do povo!
— Ergue teu cálix, bebe de novo!
[Medeiros e Albuquerque -1867/1934]
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NOTAS:
fronte – testa, rosto.
arfar – estar ofegante; respirar com dificuldade.
casto – que guarde castidade; puro; inocente; sem mescla. [Do lat.castu-, «puro»]
baço – sem brilho; embaciado; embaçado. [«Eu tenho os olhos baços»Telles.]
turba – multidão em desordem; muita pessoas reunidas; multidão.
cerrar – fechar; unir (olhos, lábios etc.); unir fortemente; apertar.
torpe [ô] – contrário à decência; à moral e aos bons costumes; sórdido, infame.
95
Glosa
Glosa – composição poética que desenvolve o sentido de um mote (motivo) dado
ou escolhido, e repetindo-lhe o verso ou os versos, através da composição ou no fim dela.
“Este tipo de forma poética faz parte da chamada poesia obrigada a mote e deve ter
origem palaciana.” (Dicionário da Literatura Medieval Galega e Portuguesa p.298).
A glosa teve um período áureo no século XVII, decaindo durante o Romantismo.
Essa fôrma poética é bastante utilizada pelos poetas do Nordeste do Brasil,
principalmente os cantadores. É uma espécie de variante do vilancete.
AO VIOLISTA F. MONIZ BARRETO FILHO
(Improviso no Teatro Santa Isabel)
MOTE
"No teu arco prendeste à eternidade!"
Tobias Barreto.
ERA NO CÉU, à luz da lua errante,
Moema triste, abandonando os lares,
Cindia as vagas dos cerúleos mares
Te erguendo ao longe, ó peregrino infante!
Lá dos jardins sob o vergel fragrante,
À sombra dos maestros, sobre os ares,
Ouvias das estrelas os cantares
— Aves d'ouro no espaço cintilante.
Mas quando o gênio teu se alteia aflito,
Da alabastrina luz à claridade,
Lançando flores, lá do céu proscrito,
Pasma Bellini; e em meio à imensidade
Diz a lua suspensa no infinito:
"No teu arco prendeste a eternidade!"
Santa Isabel – Recife, PE
Posted by Dantas
Recife, 1865
[Castro Alves - 1847/1871]
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NOTAS:
cindir – separar em duas partes, dividir.
vaga – grande onda narina.
cerúleo – da cor do céu; azul.
vergel – jardim com plantas, árvores frutíferas e flores; pomar.
alabastrino – feito de ou da cor do alabastro. [Alabastro – variedade muito branca e translúcida de gipsita].
proscrito – que se proscreveu ; que se proibiu (livro proscrito); proibido; banido.
GOMES, Eugênio (Org.). Castro Alves – obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar,
96
1997. p. 406.
Hino
Hino – é uma fôrma lírica, geralmente para ser cantada, em que se celebra alguma
personalidade ou algum acontecimento. “Modernamente tem esse nome qualquer
composição poética de exaltação, com música, preferentemente cívica”. (Geir Campos, in
«Pequeno Dicionário de Arte Poética»]. O hino é uma fôrma variante da ode.
Salve, lindo pendão da esperança,
Salve símbolo augusto da paz!
Tua nobre presença à lembrança
A grandeza da Pátria nos traz
Recebe o afeto que se encerra,
Em nosso peito juvenil,
Querido símbolo da terra
Da amada terra do Brasil!
[...]
Pátria Amda – by Diego Dalmaso
[Olavo Bilac, in «Hino à Bandeira»]
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Ela mostrou-se enfim!
Ela mostrou-se enfim, a mais formosa,
A mais bela das luzes!
Por esse azul cetim,
Caminhando tão linda e tão garbosa,
Aonde nos conduzes?
Aonde, branca Aurora?
Filha também do Sol, a Noite escura
Tua estrada marcou.
[...]
[Fagundes Varela, in «Hino à Aurora»]
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97
Poema –Piada
Poema-Piada – gênero poético bastante usado pelos modernistas de 22, como
meio de ridicularizar o pieguismo romântico e formalismo acadêmico em vigor.
POEMA DO BECO
Que importa a paisagem, a Glória, a baía, a linha do horizonte?
— O que eu vejo é o beco.
1933
[Manuel Bandeira, in «Estrela da Vida Inteira»]
Postado por Prof. Dantas
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POLÍTICA LITERÁRIA
A Manuel Bandeira
O poeta municipal
discute com o poeta estadual
qual deles é capaz de bater o poeta federal.
Enquanto isso o poeta federal
tira ouro do nariz.
[Calos Drummond de Andrade, in «Antologia Poética»]
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FILOSOFIA (José Pereira de Araújo – “Doutorzinho
de Escada)
Hora de comer — comer!
Hora de dormir — dormir!
Hora de vadiar — vadiar!
Hora de trabalhar?
— Pernas pro ar que ninguém é de ferro!
[Ascenso Ferreira, in «Poemas de Ascenso Ferreira»]
Posted by Dantas
98
Poema Figurativo
Poema Figurativo – “corresponde ao «carmen figuratum» dos romanos, ao
«technopaignion» dos gregos, ou ao «caligrama» de Guillaume Apollinaire. Seu efeito
reside no aspecto visual, pois a disposição gráfica do poema procura reproduzir a forma
do objeto evocado” (Hênio Tavares, in Teoria de Literatura).
Estrelas
Singelas,
Luzeiros
Fagueiros,
Esplêndidos orbes, que o mundo aclarais!
Desertos e mares, - florestas vivazes!
Montanhas audazes que o céu topetais!
Abismos
Profundos!
Cavernas
E t e r nas!
Extensos,
Imensos
Espaços
A z u i s!
Altares e tronos,
Humildes e sábios, soberbos e grandes!
Dobrai-vos ao
vulto sublime da cruz!
Só ela nos mostra da glória o caminho,
Só ela nos fala das
leis de - Jesus!
Posted by Dantas
[Fagundes Varelas, in «Cantos Religiosos»]
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99
Só
de pó
Deus o fez.
Mas ele, em vez
de se conformar,
quis ser sol, e ser mar,
e ser céu... Ser tudo, enfim.
Mas nada pôde! E foi assim
que se pôs a chorar de furor...
Mas ah! foi sobre sua própria dor
que as lágrimas tristes rolaram. E o pó,
molhado, ficou sendo lodo - e lodo só!
[Guilherme de Almeida- 1890/1969]
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100
Trova
Trova - composição poética monostrófica, formada de 4 versos e 7 sílabas
(redondilha maior) poéticas que condensam todo o pensamento ou emoção. A trova é a
mais popular das fôrmas poéticas, mas também cultivada largamente por poetas de
renome. Há quadras com qualquer número de versos, mas não são trovas. A trova é uma
redondilha maior.
Morena, minha morena,
Corpo de linda torcida,
Queira Deus você seja
Perdição de minha vida.
[Folclore ]
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Saudade palavra doce
que traduz tanto amargor;
saudade é como se fosse
espinho cheirando a flor...
[Bastos Tigre – 1882/1957]
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A criança é a semente,
A linda flor de macela,
O professor é um regente,
Esse ensina a todas elas.
[Prof. Dantas /Miguelito, in «Educação»]
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101
Vai alta a nuvem que passa.
Vai alto o meu pensamento
Que é escravo da tua graça
Como a nuvem o é do vento.
[Fernando Pessoa – 1888/1935]
Posted by Dantas
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Você tem quase tudo dela,
o mesmo perfume, a mesma cor,
a mesma rosa amarela,
só não tem o meu amor.
[Carlos Pena Filho, in «A mesma Rosa Amarela»]
Posted by Dantas
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Teu nome, voz das sereias,
Teu nome, o meu pensamento,
Escrevi-o nas areias,
Na água - escrevi-o no vento.
[Manuel Bandeira, in «Teu»]
102
Quando vejo esta menina,
Logo ao despontar da aurora,
Comparando mal, parece
Que eu vejo Nossa Senhora.
[Quadra Popular]
Manet
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Quisera ser água, um dia,
de chuveiro, rio ou mar,
para teu corpo, morena,
todinho acariciar.
«A Mulher nas Ondas »- Gustave Courbet
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Meu povo, preste atenção!
Pois agora vou cantá...
Vou te dar uma lição...
Sou eu que vou te ensiná...
[Cantadores Nordestinos]
103
Quadrão
Quadrão – espécie de composição poética popular brasileira, correspondente à
OITAVA de REDONDILHAS rimando em aaabccb ou aaabbccb chamada oito pés a
quadrão.
O cantador repentista
em todo ponto de vista
precisa ser um artista
de fina imaginação
para dar capricho à arte
e ter nome em toda parte
honrando seu grande estandarte
dos oito pés a quadrão
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Vejamos versos duma cantoria entre José Gonçalves e Zé Limeira (AAABBCCB):
Gonçalves:
Eu canto com Zé Limeira
Rei dos vates do Teixeira
Nesta noite prazenteira
Da lua sob o clarão
Sentindo no coração
A alegria deste canto
Por isso é que eu canto tanto
NOS OITO PÉS A QUADRÃO
Limeira:
Eu sou Zé Limeira e tanto
Cantando por todo canto
Frei Damião já é santo
Dizendo a santa missão
Espinhaço e gangão
Batata de fim de rama
Remédio de velho é cama
NOS OITO PÉS A QUADRÃO.
104
Textos produzidos pelos alunos do 1º de Letras - FAAT / 2004/5
Quem passou por esta vida,
E não viveu ser errante.
Perdido, alma combalida.
Some como lua minguante.
[Viviane / Ulisses]
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Contemplo o céu com louvor
Misericórdia que vem
Meu coração com amor
As contas nas mãos Amém.
[Cláudia Munhoz]
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Amor sentimento
Amor, este sentimento
Que é doce, suave, sublime.
É loucura e sofrimento,
E tudo nele se exprime.
[Brian / Marli]
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Pra você
Pra você eu quero ser
O sol do seu coração
A busca do seu saber
A letra da sua canção.
[Elisandra Leite]
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Amor é um sol ardente
Amor é sentir prazer
Que levanta nossa mente
Durante o entardecer.
[Camila / Michele]
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Homem de serra na mão
uma árvore a derrubar
da floresta em extinção
o oxigênio a acabar.
[Cinthia Ferreira]
105
Quem dera pudesse um dia
Ir pra onde o amor está
Decerto não sentiria
Saudade que sinto cá.
[Rosângela Siqueira]
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O cego
A flor tu não podes ver
Sentes o perfume no ar
O amor tu não podes ter
Sentes a falta do olhar.
[Jacira Uchoa]
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Luar acende minha alma
E meu coração acalma
Essa paixão desvairada
Que tenho por ti amada
[Cristina R. de S. Pomela]
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Formosa
Entre a rosa e o jasmim,
Prefiro vê-la formosa,
E todas no meu jardim,
Rosas singelas, virtuosas.
[Miguel Messias do Santos]
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Meu amor
Meu amor é espanhol
Esperar já não agüento
Então peço que o sol
Me tire do sofrimento
[Ana Rosa Pereira dos Santos]
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Saudade que trás a dor
Essa dor que o peito sente
Dói, que de tanto amor
Na dor vivo tão somente
[Dulciara C. Silva]
106
Ao fechar os olhos vida!
Lá no céu quero morar
Das lembranças esquecidas
Para sempre vou lembrar
[Ana Thereza/Tatiana/Emerson/Wilson]
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Domingo Bingo
Sagrada manhã, domingo
Soa o sino na lareira
Mas a velha rezadeira
Amanhece já no Bingo
[Marcos Guilherme Raymundo]
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Cantando o amor eu senti
Coisa mais bela adentrar
Na alma mui triste vivi
Um sofrimento pulsas
[Ana Paula Fonseca/Luciana Bittencourt]
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Amor com sinceridade
Mostra-se muito bonito
Tem cheiro de eternidade
Tem sabores de infinito
[Jaqueline Flores]
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Amor, refletir no amor,
Jaz o sentido da vida,
Pela existência lutar,
Sem medo e sem ter medida
[Viviana Aparecida Manoel / Cláudia de Oliveira]
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A montanha cobre a lua
Enche meus olhos de cor
Não cobre a beleza tua
E nem cobre teu amor
[Silvia Alves]
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Amar: maior que viver
Poder estar junto a ti
Nunca vou te esquecer
Meu doce de sapoti
[Patrícia Salvia Ruiz/Laira Ramos]
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FONTE DE CONSULTA
CAMPOS, GEIR. Pequeno dicionário de arte poética. Rio de Janeiro: Ediouro, s/d.
CANDIDO, Antonio. O estudo analítico do poema. São Paulo: Humanitas
Publicações/FFLCH/USP, 1996.
GANCHO, Cândida Vilares. Introdução à poesia – teoria e prática. São Paulo, Atual, 1989.
GOLDSTEIN, Norma. Versos, sons, ritmos. São Paulo: Ática, 2003. [Série Princípios, 6]
MOISÉS, Massaud. A criação literária – poesia. São Paulo; Cultrix, 1993.
______________ . Dicionário de termos literários. São Paulo; Cultrix, 1995.
TAVARES, Hênio. Teoria literária. Belo Horizonte: Vila Rica, 1996.
XAVIER, Raul. Vocabulário de poesia. Rio de Janeiro: Imago; Brasília: INL, 1978.
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