O DESENVOLVIMENTO EM VARGAS E KUBITSCHEK

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O DESENVOLVIMENTO EM VARGAS E KUBITSCHEK
O DESENVOLVIMENTO EM VARGAS E KUBITSCHEK
Aline Carinhas da Silva
Este texto levanta alguns pontos discutidos na disciplina de Economia Brasileira, a partir do exame dos governos de
Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek (JK), na década de 1950, ambos envolvidos com compromissos e alianças
políticas voltadas à formulação e implantação de um projeto de País. Chamam a atenção as diferenças e semelhanças
entre os projetos de desenvolvimento concebidos e executados por Vargas e JK, que governaram em épocas distintas,
enfrentando problemas macro e microeconômicos bastante complexos.
O retorno de Vargas ao poder, pela via democrática, aconteceu no período de 1951 a 1954. Os alicerces de sua
administração foram a Comissão Mista Brasil/Estados Unidos (CMBEU), instalada em julho de 1951, que elaborou um
diagnóstico da economia brasileira e propôs um conjunto de projetos a ser financiado pelo Banco Internacional para
Reconstrução e Desenvolvimento e pelo Export-Import Bank of the United States e o Grupo Misto CEPAL/BNDE, que
propunha a identificação de problemas e potencialidades do País e a formulação de programas de desenvolvimento.
Especial atenção foi dispensada às necessidades de investimentos identificadas como prioritárias
pela Comissão Mista Brasil – Estados Unidos e pelo Grupo Misto BNDE/Cepal, bases do Plano de
Metas da gestão de Juscelino Kubitschek, ou da edificação dos cinquenta anos em cinto, no intervalo
de 1956-1960 (LOURENÇO, 2005).
Porém, é necessário lembrar que como os interesses dos americanos estavam voltados para as reconstruções da
Europa e do Japão, poucos projetos foram executados na Era Vergas. Nas palavras de Fiori, “houve com Vargas um
prussianismo desfigurado, em que o estado nacional não conseguia se articular com a burguesia industrial em prol da
construção de uma sociedade avançada” (REGO, 2006).
JK foi um democrata-populista que deixou como legado uma base econômica mais ampla e diversificada, apesar das
distorções macroeconômicas decorrentes. JK utilizou, em seu plano de metas, os projetos da CMBEU. O plano
procurou, ao mesmo tempo, atacar os pontos de estrangulamento ao crescimento econômico e criar os pontos de
germinação e de demanda derivada, tarefa que exigiu novos e vultosos investimentos.
Os dois governos perseguiram o desenvolvimento. Vargas apoiou-se nas relações exteriores, especialmente com o
governo dos Estados Unidos, assim como JK, entretanto seu discurso e prática eram nacionalistas. Em momentos
conflituosos da macroeconomia, tanto Vargas quanto JK conseguiram tirar proveito da diplomacia de benefícios.
Conforme Endlich (2013), “Vargas, após a 2° Guerra mundial, conferiu ao Brasil as indústrias de base e uma posição de
credor, JK, ao final de seu governo, estabeleceu uma rapidez de desenvolvimento até então inexistente na história
brasileira, possibilitando uma ampliação do mercado consumidor e consequentemente dos bens de consumo”.
Convém destacar que ambos assumiram características de desenvolvimentistas populistas. “O populismo é uma forma
de governar em que o governante utiliza de vários recursos para obter apoio popular” (FERREIRA, 2001). Vargas
apoiou-se na insatisfação que vigorava nas camadas de trabalhadores urbanos para conquistar o poder político do
país através da Revolução de 1930, instituindo o Estado Novo, em 1937, sendo afastado depois da II Guerra Mundial,
retornando pela via democrática em 1951 e cometendo suicídio em 1954. Foi apelidado de “pai dos pobres” pelo
empenho na aprovação de reformas trabalhistas que favorecessem o operariado, por meio da Consolidação das Leis
do Trabalho (CLT).
Segundo Beluzzo (2007), Beluzzo, Vargas e Juscelino foram tudo aquilo e mais alguma coisa, pois “souberam
responder aos desafios lançados pelas circunstâncias históricas que os produziram como grandes homens públicos”. O
“mais alguma coisa” representaria feitos desprezados ou mesmo omitidos pela história.
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Na Era Vargas, houve diminuição da importância relativa do setor primário na economia, o uso do estado para a
criação de indústrias básicas que, até os dias de hoje, operam com vigor e a realização de mudanças institucionais,
com a instituição e ampliação dos direitos sociais. JK conseguiu colocar o Brasil em um elevado patamar de
industrialização, implementando o departamento 2, com a atração de fabricantes de bens de consumo duráveis, e
promovendo a internacionalização do crescimento do investimento.
Mais que isso, JK ganhou as batalhas concebidas por Vargas, conseguindo, com o Plano de Metas, integrar a economia
do Brasil ao movimento de internacionalização produtiva e multiplicar os investimentos em infraestrutura e nos
segmentos de bens de capital. Operacionalmente, as 31 metas foram gerenciadas por grupos executivos, formados
por representantes da iniciativa privada e da elite do governo, extraídos dos quadros do BNDE e Banco do Brasil,
denominados de “administração pública paralela”.
Outro aspecto importante das administrações de Vargas e JK refere-se à associação direta que se estabelecia entre
industrialização e desenvolvimento. É interessante esclarecer que, mesmo sendo essas expressões usadas como
sinônimo no Brasil, entre os anos 1930 e 1980, a industrialização, por si só, não constitui a principal arma contra os
problemas sociais, pois representa, na maior parte dos casos, o progresso que só resultará em desenvolvimento se,
em paralelo, ocorrer substancial melhoria das condições de vida da população.
Beluzzo questiona, ao resgatar os períodos Vargas e JK, se o Brasil sabe de onde veio e para onde vai. De acordo com
Faoro (2001), é possível estabelecer a relação entre passado e presente. Quando são retiradas apenas as datas, temse um vislumbre do Brasil de hoje.
Rigorosamente, as mudanças institucionais mais relevantes feitas no Brasil ocorreram há pelo menos 60 anos, tendo
como exemplos a CLT que veio atender a necessidade de regulamentação do mercado de trabalho. Houve ainda o
Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG), instituído pelo primeiro governo militar, em 1964, que possuía
como principais objetivos a estabilidade de preços, as reformas estruturais, a diminuição dos desequilíbrios regionais
e a correção do déficit da balança de pagamentos.
O II Plano de Desenvolvimento Nacional (PND), lançado no governo militar de Ernesto Geisel, entre 1974 e 1979,
assumiu o objetivo de fazer do país uma potência mundial emergente, estimulando grandes obras nos setores de
mineração (exploração dos minérios de ferro na Serra dos Carajás e extração de bauxita) e energético (construção de
usinas e o ingresso do país na energia nuclear). O II PND acabou sofrendo várias críticas dos meios de comunicação
conservadores, provocando ampla campanha contra a estatização da economia. Apenas na gestão Geisel foram
criadas mais de uma centena de empresas estatais.
O Brasil pode ter se esquecido de onde veio, porque passou a ignorar a necessidade de planejamento do seu futuro,
que representou a grande marca das gestões de Vargas, JK e Geisel, mas fica uma esperança na observação do trecho
da nota oficial disponibilizada pela Presidente do Brasil, Dilma Rousseff.
“[...] Recebi um país mais justo e menos desigual, com 40 milhões de pessoas ascendendo à classe média, pleno
emprego e oportunidade de acesso à universidade a centenas de milhares de estudantes.[...] .”
No entanto, o Brasil ainda carece de um programa de desenvolvimento. O governo continua envolvido quase que
exclusivamente com o curto prazo, imaginando que o investimento viria na esteira do aumento dos níveis de
emprego, salário e consumo. Como isso não aconteceu, o Brasil passou a conviver, novamente, com um crescimento
econômico baixo e uma inflação em alta.
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REFERÊNCIAS
BELUZZO, Luiz Gonzaga de Mello. Opinião – Getúlio Vargas, Juscelino e a História. Disponível na Internet:
<www.fazenda.gov.br/resenhaeletronica/mostramateria.aspWpag=&cod=365853>. Acesso em: 01 mar. 2013.
ENDLICH, Toni. História Comparada: Política Internacional no Governo Vargas e Juscelino Kubitschek. Disponível na
Internet: <http://pt.scribd.com/doc/38345949/Getulio-Vargas-e-Juscelino-Kubitschek-Politica-Internacional>. Acesso
em: 02 e 20 mar. 2013.
FAORO, Raimundo. Os Donos do Poder. 3. ed. Rio de Janeiro: Editora Globo, 2001.
FERREIRA, Jorge (Org). O Populismo e sua História. Rio de Janeiro, RJ. Editora Civilização Brasileira, 2001. p. 380.
GOMES, Ângela de Castro. A Invenção do trabalhismo. 3. ed. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2005. p. 320.
LAPLANE, Mariano Francisco. Simpósio: Desenvolvimento Industrial, Política Monetária e Spread Bancário no Brasil.
Indústria e Desenvolvimento no Brasil do Século XXI – Economia & Tecnologia, ano 2, v. 06. Curitiba: UFPR, 2006.
LOURENÇO, Gilmar Mendes. O BNDES e a Matriz do Crescimento. Análise Conjuntural, v.29, n. 05-06, p-18.
Maio/junho. 2007. Disponível na Internet: <http://www.ipardes.gov.br/webisis.docs/bol_29_3e.pdf> Acesso em:
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NOTA Oficial da Presidente do Brasil, Disponível na Internet: <http://www2.planalto.gov.br/imprensa/notasoficiais/nota-oficial> do dia 03 de Setembro de 2012 às 17h15. Acesso em: 01 mar. 2013.
REGO, José Marcio; MARQUES, Rosa Maria (organizadores). Economia Brasileira. 3. ed. – São Paulo: Saraiva, 2006.
p. 69-106.
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