l`o sse rvator e romano - Paróquia Nossa Senhora da Conceição

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l`o sse rvator e romano - Paróquia Nossa Senhora da Conceição
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L’OSSERVATORE ROMANO
EDIÇÃO SEMANAL
Unicuique suum
EM PORTUGUÊS
Non praevalebunt
Cidade do Vaticano
Ano XLVII, número 32-33 (2.426)
quinta-feira 11-18 de agosto de 2016
Na Porciúncula o Papa indicou o caminho para renovar a Igreja e a sociedade
O mundo tem necessidade de perdão
Nunca renunciemos a «ser sinais humildes de perdão e instrumentos de
misericórdia», porque «demasiadas
pessoas vivem fechadas no rancor e
conservam ódio, arruinando a própria vida e a dos outros em vez de
encontrar a alegria da serenidade e
da paz». Repetindo que o mundo
de hoje «precisa de perdão», o Papa
confiou à intercessão de são Francisco esta invocação durante a visita à
Porciúncula em Assis realizada na
tarde de 4 de agosto.
Na comemoração do oitavo centenário do Perdão de Assis, o Pontífice foi à basílica de Santa Maria dos
Anjos ali permanecendo três horas
durante as quais, em longa oração
silenciosa na Porciúncula, lugar do
qual a indulgência invocada por são
Francisco ainda hoje continua a «gerar paraíso». Depois de ter proposto
uma meditação aos fiéis presentes na
basílica, ouviu a confissão de 19 pessoas, saudou os bispos, os superiores-gerais das ordens franciscanas e
— evento particularmente significativo à luz de quanto acontece nestes
dias — Abdel Qader Mohd, imã de
Perúsia. Por fim, Francisco encontrou-se com dez religiosos doentes,
com os assistentes, na enfermaria do
adjacente convento dos frades menores.
Acrescentando como de costume
considerações improvisadas ao texto
escrito da meditação sobre o trecho
evangélico de Mateus (18, 21-35), a
conhecida parábola do servo sem
piedade, Francisco libertou o campo
de equívocos dizendo-se consciente
de que «é difícil» perdoar. «Quanto
nos custa perdoar os outros! Pensemos um pouco nisto», exortou. De
resto a Porciúncula, onde «tudo fala
de perdão» — observou o Pontífice
— oferece infinitos pontos de reflexão sobre «o grande dom» oferecido
pelo Senhor aos homens, ensinando-lhes «a perdoar ou, pelo menos,
a ter a vontade de perdoar». A tal
propósito Francisco não tem dúvidas: «Não há ninguém entre nós,
aqui, que não tenha sido perdoado».
Consequentemente «como Deus nos
perdoa, assim também devemos perdoar a quem nos faz mal. É a carícia
do perdão. O coração perdoa. O coração que perdoa, acaricia».
Outro elemento de reflexão contido na parábola e evidenciado pelo
Pontífice foi a «paciência de Deus»,
que se manifesta sobretudo no confessionário. «Somos cheios de defeitos — reconheceu Francisco — e cometemos com frequência os mesmos
pecados. No entanto, Deus nunca se
cansa de oferecer o seu perdão cada
vez que o pedimos». Trata-se de
«um perdão pleno, total, com o qual
nos oferece a certeza de que, não
obstante possamos cometer de novo
os mesmos pecados, Ele tem piedade de nós e nunca deixa de nos
amar». O seu perdão «não conhece
limites; vai além de toda a nossa
imaginação e alcança quantos, no íntimo do coração, reconhecem que erraram e agora desejam voltar para
Ele».
Dado que «oferecer o testemunho
da misericórdia é uma tarefa à qual
Durante o Angelus a denúncia à falta de vontade de paz
«É inaceitável que tantas pessoas inermes — inclusive muitas crianças
— paguem o preço do conflito» na Síria. O Papa Francisco escolheu
palavras fortes no Angelus de domingo 7 de agosto para voltar a denunciar o drama das populações sírias e «a falta de vontade de paz
dos poderosos».
Da janela do Palácio pontifício, no final da prece mariana o Papa
recordou que do país médio-oriental «continuam a chegar notícias de
vítimas civis da guerra, em particular de Alepo». Por isso, quis reiterar
a sua proximidade «com a oração e a solidariedade aos irmãos e irmãs
sírios», confiando-os «à proteção maternal da Virgem». E fê-lo convidando todos os fiéis presentes na praça de São Pedro a rezar «um
pouco em silêncio e depois uma Ave-Maria».
PÁGINA 3
Caminho de Igreja
D OMENICO SORRENTINO
NA PÁGINA
7
Uma mulher com o seu filho em Manbij, perto de Alepo (Afp)
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O Pontífice apresentou um dicionário
Manual
para confessores e fiéis
Preço do conflito na Síria
Aniversário do Perdão de Assis
ninguém pode renunciar», Francisco
convidou os frades e os bispos presentes «a ir aos confessionários e ficar à disposição do perdão», assim
como ele mesmo fez, permanecendo
ali cerca de uma hora a confessar.
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Audiência geral
Do coração
às mãos
A misericórdia «é um caminho que
tem início no coração para chegar às
mãos», recordou o Papa Francisco
na audiência geral de quarta-feira, 10
de agosto, evocando a necessidade
de viver o jubileu extraordinário como ocasião para receber o perdão de
Deus e para o levar aos outros através das obras de caridade.
Ao comentar com os fiéis reunidos
na Sala Paulo VI o trecho evangélico
que narra a ressurreição do filho da
viúva de Naim, o Pontífice evidenciou que o núcleo da descrição de
Lucas (7, 11-17) «não é o milagre mas
a ternura de Jesus para com a mãe
deste jovem». Sim, Ele «sente grande compaixão» por aquela mulher, a
ponto de parar o cortejo fúnebre e
de «enfrentar a morte», restituindo
o jovem à vida.
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L’OSSERVATORE ROMANO
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«A coragem e a força que tendes
dentro de vós possam transmitir,
através dos jogos olímpicos, um grito de fraternidade e de paz». Foi
com estes bons votos que o Papa
Francisco se dirigiu ontem, mediante
uma carta, aos membros da seleção
olímpica de refugiados que participa
nas olimpíadas do Rio, inauguradas
oficialmente no dia 5 de agosto. O
Pontífice comunicou a sua saudação
a fim de que «através de vós a humanidade inteira compreenda que a
paz é possível, que com a paz tudo
se pode ganhar e, ao contrário, com
a guerra tudo se pode perder. Desejo que o vosso testemunho faça bem
a todos nós. Rezo por vós e, por favor, peço-vos que oreis por mim». E
também aos jogos foi dedicado o
tweet do dia, no qual o Santo Padre
formula bons votos a todos os atletas comprometidos nas várias competições dos jogos: «Sede sempre
mensageiros de fraternidade e de genuíno espírito desportivo».
Da seleção de refugiados presente
no Rio de Janeiro fazem parte dez
atletas (seis homens e quatro mulheres), que ontem desfilaram no Maracanã sob uma única bandeira, nomeadamente a das Olimpíadas. No
grupo contam-se dois nadadores da
Síria, dois judocas da República Democrática do Congo e seis corredores provenientes da Etiópia e do Sudão do Sul. Todos eles fugiram de
violências e de perseguições, procurando refúgio noutros países. A jo-
quinta-feira 11-18 de agosto de 2016, número 32-33
Bons votos do Pontífice
Olimpíadas
de todos
vem síria de 18 anos Yusra Mardini,
refugiada em Lesbos, salvou dezenas
de pessoas, impelindo a nado com a
irmã uma embarcação até à praia.
Estes atletas falam várias línguas,
mas representam um único povo de
mais de sessenta milhões de pessoas
em fuga, que têm em comum a dor
e a esperança, além da busca de um
futuro melhor. «Não dispõem de
uma casa, nem de uma sua seleção,
e nem sequer de uma bandeira ou
de um hino», disse o presidente do
Comité olímpico internacional, Thomas Bach. «Nós ofereceremos a estes atletas uma casa na aldeia olímpica, juntamente com todos os demais participantes do mundo inteiro.
E para eles será tocado o hino olímpico, enquanto a bandeira agitada
nos estádios para os representar será
a das Olimpíadas», acrescentou o
presidente do Comité olímpico internacional.
A grandiosa festa brasileira foi
aberta ontem com a cerimónia de
inauguração, um espetáculo ao qual
assistiram pelo menos três biliões de
pessoas. O estádio do Maracanã, em
festa e renovado, estava lotado por
60.000 espetadores que aplaudiram
um espetáculo inesquecível. O cineasta brasileiro Fernando Meirelles,
um dos três diretores artísticos em
ação, quis organizar o show em volta de dois temas-chave: o respeito
pelo meio ambiente e a multiculturalidade. E o espetáculo não desiludiu
as expetativas, contando com a participação de milhares de artistas —
das doze escolas de samba que se
apresentaram — e uma homenagem
significativa à riquíssima tradição
musical brasileira. Além disso, participaram nos trabalhos de preparação
do evento mundial mais de cinco
mil voluntários e aproximadamente
trezentos produtores artísticos. Para
iluminar o céu do Rio de Janeiro foram utilizadas não menos do que
três toneladas de fogos de artifício.
E durante o espetáculo a segurança
foi garantida por cerca de oitenta
mil agentes das forças policiais e militares, que pouco antes do início da
extraordinária manifestação tiveram
que intervir para dispersar alguns
manifestantes reunidos nos arredores
do estádio.
Diante de numerosas autoridades
e representantes do mundo inteiro,
quem inaugurou oficialmente os jogos olímpicos foi Michel Temer, presidente ad interim do Brasil.
Iniciativa das religiosas brasileiras por ocasião dos jogos olímpicos do Rio
Uma medalha de ouro contra o tráfico
Há dois anos, por ocasião da copa do mundo de
futebol contribuiu de modo determinante (+ 42
por cento de denúncias) para fazer emergir os casos de exploração sexual de crianças e adolescentes e de situações de tráfico de pessoas. Hoje, enquanto têm início as Olimpíadas e sobre o mais
vasto país sul-americano se acendem os holofotes
do cenário internacional, a rede brasileira de religiosas contra o tráfico de pessoas «Um grito pela
vida» põe novamente em campo a campanha «Jogue a favor da vida». O mesmo slogan de 2014 e
a consciência de que ainda desempenha um papel
decisivo no contraste a um fenómeno acompanha
cada vez mais as grandes manifestações que
atraem massas de turistas e visitantes de todas as
partes do mundo.
De facto, também as olimpíadas brasileiras correm o risco de se transformar em ocasião propícia
para a criminalidade, para os traficantes de seres
humanos destinados à exploração sexual ou empregatícia. «Se a sociedade e as instituições não
estiverem atentas, as situações de degradação como a violência sexual e o trabalho de menores,
tenderão a aumentar», adverte a religiosa Eurides
Alves de Oliveira, coordenadora de «Um grito
pela vida».
A campanha apoiada por Talitha Kum, rede internacional dos organismos religiosos contra o tráfico de pessoas, e pela União internacional das
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superioras-gerais, visa informar e responsabilizar
os cidadãos, a imprensa e as agências de viagem
sobre um fenómeno que pode ser prevenido e
contrastado. O objetivo, explicou a religiosa, é fazer de Rio 2016 «um espaço propositivo, que promova a cidadania, o cuidado pela vida e a denúncia do tráfico de pessoas e de todas as formas de
exploração e violação dos direitos humanos, dando à população instrumentos a fim de que possa
reagir e denunciar qualquer forma de comercialização e banalização da vida». Trata-se, acrescentou, de «tomar posição contra as forças de morte» e de «afirmar o nosso compromisso a favor da
vida» em particular de quantos «têm os seus direitos violados e vivem submetidos pelo jugo da
escravidão contemporânea: o tráfico de pessoas,
definido pelo Papa Francisco “uma chaga no corpo da humanidade”».
A campanha antitráfico, realizada por vinte e
seis grupos de networks presentes em vinte e dois
Estados brasileiros, pede que as pessoas denunciem — foi ativado um telefone gratuito através do
qual podem ser apresentadas denúncias inclusive
de forma anónima — e que as autoridades sejam
mais velozes na atividade de investigação e nos
processos aos responsáveis por estes crimes. Uma
campanha realizada através dos meios de comunicação e das redes sociais, nas ruas do Rio de Janeiro e de Manaus. Mas também com atividades
GIOVANNI MARIA VIAN
diretor
Giuseppe Fiorentino
vice-diretor
Cidade do Vaticano
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Redação
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TIPO GRAFIA VATICANA EDITRICE
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don Sergio Pellini S.D.B.
diretor-geral
de tipo educativo sobretudo aos jovens e adolescentes, que são os principais grupos que correm o
risco do tráfico. «Contestam-nos — disse a irmã
Gabriella Bottani, coordenadora de Talitha Kum
— que não deveríamos associar o desporto à exploração e ao tráfico. Sabemos que muitos projetos desportivos até em regiões remotas ajudam a
recuperar adolescentes em situações de vulnerabilidade, mas também que grandes eventos trazem
consigo riscos: atos de vandalismo ou realidades
de aumento da exploração, antes para a realização
das infraestruturas e dos serviços necessários e depois para a exploração sexual». Eis a importância
de um compromisso que seja capaz de catalisar as
energias. «É um trabalho realizado juntamente
com diversas Igrejas, não só a Igreja católica: é
uma obra ecuménica mas também de colaboração
com as organizações governamentais prepostas ao
trabalho contra o tráfico».
Para o padre Mario Geremia, missionário scalabriniano responsável pelo núcleo da rede antitráfico da vida consagrada no Rio de Janeiro, a campanha é «um gesto profético» porque «com ela se
denunciam não só as consequências do tráfico
mas as suas causas, um sistema injusto que concentra as riquezas e exclui as pessoas, promove
sonhos de consumo» mas «não oferece as condições para os realizar».
Assinaturas: Itália - Vaticano: € 58.00; Europa: € 100.00 - U.S. $ 148.00; América Latina, África,
Ásia: € 110.00 - U.S. $ 160.00; América do Norte, Oceânia: 162.00 - U.S. $ 240.00.
Administração: telefone +390669899480; fax +390669885164; e-mail: [email protected]
Serviço fotográfico
Para o Brasil: Impressão, Distribuição e Administração: Editora santuário, televendas: 0800160004, fax: 00551231042036, e-mail: [email protected]
telefone +390669884797
fax +390669884998
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Publicidade Il Sole 24 Ore S.p.A, System Comunicazione Pubblicitaria, Via Monte Rosa, 91,
20149 Milano, [email protected]
número 32-33, quinta-feira 11-18 de agosto de 2016
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Bernardette Lopez, «Vigiai»
No Angelus o Papa convidou a usar os bens para ajudar o próximo
Elogio da vigilância
É inaceitável que crianças paguem pela guerra na Síria
«Hoje Jesus recorda-nos que a
expetativa da bem-aventurança eterna
não nos dispensa do compromisso de
tornar o mundo mais justo e mais
habitável», afirmou o Papa Francisco
durante o Angelus de domingo 7 de
agosto, comentando aos numerosos fiéis
e peregrinos presentes na praça de São
Pedro a página do Evangelho de
Lucas (cf. 12, 32-48), onde «Jesus
fala aos seus discípulos sobre a atitude
que devem assumir em vista do
encontro final com Ele». Eis as
expressões do Pontífice.
Bom dia, estimados irmãos e irmãs!
Na página do Evangelho de hoje
(cf. Lc 12, 32-48), Jesus fala aos seus
discípulos sobre a atitude que devem
assumir em vista do encontro final com
Ele, explicando que a expetativa de
o Senhor com fé, permanecendo
pronto, em atitude de serviço. Ele
faz-se presente cada dia, bate à porta do nosso coração. E bem-aventurado será aquele que lhe abrir a porta, porque receberá uma grande recompensa: com efeito, o próprio Senhor será o Servo dos seus servos —
é uma bonita recompensa! — e no
grandioso banquete do seu Reino
Ele mesmo passará a servi-los. Mediante esta parábola, ambientada de
noite, Jesus apresenta a vida como
uma vigília de espera ativa, um prelúdio ao dia resplandecente da eternidade. Para podermos aceder a ela
é preciso que estejamos prontos,
acordados e comprometidos no serviço ao próximo, na consoladora
perspetiva de que no «além” já não
seremos nós que serviremos a Deus,
maldades quotidianas brotam da
ideia de nos comportarmos como senhores da vida dos outros. Nós temos um único Senhor, que não gosta de ser chamado «patrão», mas
sim «Pai». Todos nós somos servos,
pecadores e filhos: Ele é o único
Pai.
Hoje Jesus recorda-nos que a expetativa da bem-aventurança eterna
não nos dispensa do compromisso
de tornar o mundo mais justo e mais
habitável. Aliás, é exatamente esta
nossa esperança de possuir o Reino
na eternidade que nos impele a agir
para melhorar as condições da vida
terrena, de maneira especial dos irmãos mais frágeis. A Virgem Maria
nos ajude a ser pessoas e comunidades não niveladas no presente ou,
pior, nostálgicas do passado, mas
orientadas para o futuro de Deus,
para o encontro com Ele, nossa vida
e nossa esperança.
No final da oração mariana dominical,
o Sumo Pontífice voltou a falar acerca
do drama que continuam a viver as
populações civis, vítimas do conflito na
Síria, e em seguida saudou os grupos
presentes.
tal encontro deve impelir a uma vida
rica de obras boas. Entre outras coisas, diz: «Vendei o que possuís e
dai-o de esmola; fazei para vós bolsas que não se gastam, um tesouro
inesgotável nos céus, onde o ladrão
não chega e a traça não o destrói»
(v. 33). Trata-se de um convite a dar
valor à esmola como obra de misericórdia, a não colocar a confiança
nos bens efémeros e a utilizar as coisas sem apego nem egoísmo, mas segundo a lógica de Deus, a lógica da
atenção ao próximo, a lógica do
amor. Nós podemos viver muito
apegados ao dinheiro e possuir
grandes bens, mas no final não os
poderemos levar connosco. Recordai-vos que «o sudário não tem bolsos».
O ensinamento de Jesus continua
com três breves parábolas sobre o tema da vigilância. Isto é importante:
a vigilância, estar atento, ser vigilante na vida. A primeira é a parábola
dos servos que de noite aguardam a
volta do seu senhor. «Bem-aventurados os servos aos quais o senhor encontrar vigiando, quando vier!» (v.
37): é a bem-aventurança de esperar
mas será Ele mesmo que nos acolherá à sua mesa. Pensando bem, isto já
acontece hoje, cada vez que encontramos o Senhor na oração, ou então
quando servimos os pobres, mas sobretudo na Eucaristia, onde Ele prepara um banquete para nos alimentar com a sua Palavra e com o seu
Corpo.
A segunda parábola tem como
imagem a vinda imprevisível do ladrão. Isto exige a vigilância; com
efeito, Jesus exorta: «Estai, pois,
preparados, porque na hora em que
não pensais virá o Filho do Homem» (v. 40). O discípulo é aquele
que espera o Senhor e o seu Reino.
O Evangelho esclarece esta perspetiva com a terceira parábola: o administrador de uma casa, depois da partida do patrão. No primeiro caso, o
administrador cumpre fielmente os
seus deveres e recebe a recompensa.
No segundo caso, o administrador
abusa da sua autoridade e bate nos
seus servos; por isso, quando o patrão voltar repentinamente, será punido. Esta cena descreve uma situação frequente inclusive nos dias de
hoje: muitas injustiças, violências e
Caros irmãos e irmãs!
Infelizmente, da Síria continuam a
chegar notícias de vítimas civis da
guerra, de modo particular em Ale-
po. É inaceitável que tantas pessoas
inermes — inclusive numerosas crianças — devam pagar o preço do conflito, o preço do fechamento de coração e da falta de vontade de paz
dos poderosos. Mediante a oração e
a solidariedade estamos próximos
dos irmãos e irmãs sírios, enquanto
os confiamos à proteção maternal da
Virgem Maria. Oremos todos juntos,
um pouco em silêncio e depois uma
Ave-Maria.
Saúdo todos vós, romanos e peregrinos de vários países! Veem-se diversas bandeiras!
Hoje estão presentes vários grupos de adolescentes e de jovens.
Saúdo-vos com grande afeto! Em
particular, o grupo da pastoral juvenil de Verona; os jovens de Pádua,
Sandrigo e Brembilla; e o grupo dos
jovens de Fasta, provenientes da Argentina. Mas estes argentinos fazem
barulho em toda a parte!
Saúdo também os adolescentes de
Campogalliano e de San Matteo
della Decima, que vieram a Roma
para desempenhar um serviço de voluntariado nalguns centros de acolhimento. Enfim, saúdo os fiéis de
Sforzatica, na diocese de Bergamo.
Desejo feliz domingo a todos. E,
por favor, não vos esqueçais de rezar
por mim. Bom almoço e até à próxima!
Novo site da ordem equestre do Santo Sepulcro
Ao serviço do encontro
O cardeal Edwin Frederick O’Brien, grão-mestre da ordem equestre do
santo sepulcro de Jerusalém, inaugurou o site da internet do Grão-Magistério (www.oessh.va). Tal site, disponível em cinco línguas — italiano, inglês, francês, espanhol e alemão — foi realizado pelo Serviço de comunicação da ordem, em colaboração com a Secretaria para a comunicação da
Santa Sé. Trata-se de um novo instrumento, destinado a alcançar os cerca
de 30.000 membros da ordem, cavaleiros e damas, presentes nos cinco
continentes, assim como os seus amigos e todos aqueles que amam a Terra Santa.
Na página web precedente, em duas línguas, que se encontra dentro do
site da Santa Sé, permanecerão disponíveis as informações históricas. O
novo site, ao contrário — informa um comunicado — dará mais espaço à
informação relativa às atividades da ordem e aos projetos atualmente promovidos na Terra Santa, ao serviço da «cultura do encontro». Em cada
versão linguística, alguns vídeos mostrarão a vida das lugar-tenências que
são as estruturas periféricas da ordem nas Igrejas locais, da Austrália à
Argentina, da Noruega à África do Sul, passando claramente pelos países
europeus onde a ordem está radicada há muitos séculos.
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quinta-feira 11-18 de agosto de 2016, número 32-33
Francisco apresentou um dicionário teológico e pastoral
Prodígios da misericórdia
publicação do Dicionário Teológico-Pastoral Peccato — Misericordia — Riconciliazione, sabiamente preparado pela Penitenciaria Apostólica, é um contributo importante para este Jubileu da Misericórdia. Esta obra permite que o leitor realize um itinerário de aprofundamento acerca do caminho do homem, o qual experimenta o conforto
da benevolência divina, que o regenera depois da experiência do erro e
do arrependimento.
A vida do crente, de cada homem,
é permeada por uma certeza: o amor
de Deus está sempre pronto para ser
derramado sobre cada um, inclusive
sobre quantos caíram nas vias do pecado, do afastamento deste foco de
caridade e da vida da graça. Embora
numa condição de debilidade e fragilidade, todas as pessoas são chamadas a realizar o próprio percurso,
e não permanecer sozinhas no momento do erro porque podem contar
com o perdão e a compreensão de
um Pai, que acolhe e cura sempre. A
paciência divina derrama-se sobre
todos, até sobre quantos cometeram
erros graves. Com efeito, o amor de
Deus é deveras imenso e até surpreendente dado que espera, prevê e
acolhe. Não obstante o pecado, o
homem não foi abandonado por
Deus, que continua a bater à porta
do seu coração. Para explicitar este
conceito Jesus oferece a parábola da
ovelha tresmalhada (cf. Mt 18, 1214). É muito significativa também a
expressão tirada do livro do Apocalipse: «Eis que estou à porta e bato:
se alguém ouvir a minha voz e me
A
abrir a porta, entrarei em sua casa e
cearemos, eu com ele e ele comigo»
(3, 20). O Senhor está sempre à porta do nosso coração para acolher cada movimento de conversão. Mesmo
nas trevas do pecado, um mínimo de
abertura à graça divina pode revelarse deveras importante para a nossa
transformação interior. No Evangelho Jesus mostra-nos os traços da
misericórdia divina. Cristo reabilita e
doa uma vida nova a quantos se encontram na escuridão das próprias
contradições: quem O encontra, faz
a experiência de uma renovação profunda e duradoura que começa pela
cura do coração. A fidelidade de
Deus é imutável, infinita e continua
a existir e produzir frutos apesar da
infidelidade das criaturas. E é o Espírito Santo que guia o homem neste caminho.
A Igreja é portadora da misericórdia de Deus mediante o dom dos sacramentos. Cada um dos seus elementos desempenha a tarefa de
apresentar ao mundo a beleza e a
profundidade do amor misericordioso do Senhor. No fundo, todo o seu
apostolado exprime a chamada a
anunciar e a testemunhar aos povos
a infinita caridade de Deus, Pai que
perdoa e acolhe além de todas as expectativas. A própria família eclesial
caracteriza-se pelo «desejo inexaurível de oferecer misericórdia, fruto de
ter experimentado a misericórdia infinita do Pai e a sua força difusiva»
(Evangelii gaudium, 24).
O homem, que se tornou interiormente novo pela benevolência divina, ficou ainda mais forte e determi-
nado na capacidade de se doar.
Quantos santos «comovidos» e
«surpreendidos» pela caridade do
Senhor se tornaram protagonistas de
um caminho de santificação emocionante e entusiasmante, caracterizado
por uma grande capacidade de perdão e compreensão! Este prodígio
de amor verifica-se diariamente inclusive hoje. Neste sentido, são significativas a chamada de Levi e
Manual para confessores e fiéis
Publicamos a apresentação do Papa Francisco ao volume Peccato,
Misericórdia, Riconciliazione. Dizionario Teologico-Pastorale editado pela
Penitenciaria apostólica (Cidade do Vaticano, Libreria Editrice Vaticana,
2016, 428 páginas). O texto papal é datado de 24 de junho de 2016,
solenidade de são João Batista. Redigido por Malio Sodi, Krzysztof
Nykiel e Nicola Reali, o dicionário — escreve no prefácio o cardeal
Mauro Piacenza, penitenciário-mor — pode «tornar-se um “bom manual”
quer para os confessores que pretendem administrar adequadamente o
sacramento da reconciliação como fonte da santificação própria e a dos
irmãos; quer para os fiéis que desejarem experimentar o perdão de Deus
no confessionário e empreender um caminho de conversão sincera e de
volta a Deus».
quando Jesus se dirige aos publicanos e aos pecadores (cf. Mc 2, 13-17).
A vida de Levi, precedentemente
imersa no pecado, muda de maneira
radical graças à força regeneradora
do amor misericordioso transmitido
pelo Senhor. A ação arrebatadora do
seu olhar e da sua chamada mudam
o homem no seu íntimo.
Em Braga o encontro dos bispos amigos dos Focolares
Comunhão fraterna
Depois da participação na Jornada mundial da juventude em Cracóvia, sessenta e sete bispos e cardeais
amigos do movimento dos Focolares, provenientes de
vinte e sete países de quatro continentes, reuniram-se
de 2 a 10 de agosto em Braga (Portugal), no santuário
de Nossa Senhora do Sameiro. O encontro, promovido
pelo arcebispo dessa Sede, D. Jorge Ferreira da Costa
Ortiga, e moderado pelo cardeal arcebispo de Bangkok, D. Francis Xavier Kriengsak Kovithavanij, teve
como finalidade aprofundar a comunhão fraterna entre
prelados, à luz da espiritualidade da unidade que anima os Focolares.
Contributos específicos foram oferecidos por teólogos, políticos e outros representantes dos Focolares que
trataram temas como a situação do mundo atual, a reforma da Igreja no seguimento do Papa Francisco, o
ecumenismo. Aprofundaram temas cruciais como a re-
Todas estas dinâmicas são propostas na presente obra. De facto, as
«definições» referidas no volume estabelecem um verdadeiro percurso,
que retrata o encontro entre o amor
misericordioso de Deus e o desejo
de paz interior de cada pessoa. O
sacramento da Penitência desempenha um papel fundamental neste
«abraço» admirável entre regresso e
perdão. Uma atenção particular é reservada ao sacerdócio, o qual é chamado à consciência do seu ser sinal
da caridade divina, não só na celebração do rito, mas também através
de atitudes de acolhimento, compreensão e diálogo que, sem dúvida,
conferem maior riqueza e significado
ao evento sacramental. Trata-se de
uma verdadeira «imersão» na misericórdia de Deus, que tem a força de
transformar e fortalecer o coração:
aqui o homem encontra-se a si mesmo e com a máxima confiança no
lação Igreja-Estado e o islão radical. «As religiões não
se devem substituir à política — observaram — aliás, as
comunidades cristãs devem representar a consciência
crítica da humanidade».
A peregrinação realizada ao santuário de Nossa Senhora de Fátima foi intensa, assim como a missa celebrada na capela das aparições, presidida pelo cardeal
João Braz de Aviz, prefeito da Congregação para os
institutos de vida consagrada e as sociedades de vida
apostólica.
Os congressos dos bispos amigos do movimento dos
Focolares tiveram início no ano de 1977, por iniciativa
de D. Klaus Hemmerle, bispo de Aachen (Alemanha).
E desde o princípio eles foram apoiados pela Santa Sé,
em ordem a favorecer a colegialidade «efetiva e afetiva» entre os bispos, em espírito de comunhão e fraternidade.
Senhor, retoma o caminho com mais
vigor e determinação.
Este volume é um dom no Ano da
Misericórdia; representa um instrumento precioso para os estudiosos e
para os fiéis uma oportunidade de
conhecer a realidade do amor e do
perdão divinos. É um trabalho que
se funda no contributo de estudiosos
habituados com a pastoral prática,
chamados a exprimir uma espécie de
comunhão teológica na oferta da
própria sabedoria ao serviço dos leitores. Aqui encontramos aspetos bíblicos, dogmáticos, pastorais, jurídicos, litúrgicos, sacramentais, eclesiais
e espirituais. Estes aspetos fazem
pensar num «alternar-se» harmonioso das várias disciplinas teológicas.
Gostaria de frisar que se trata de um
Dicionário muito acessível a um amplo número de leitores. Sinto-me feliz por apresentar este texto porque
o considero um ulterior e importante
componente na realização do Ano
da Misericórdia.
Gostaria de expressar o meu apreço à Penitenciaria Apostólica pelo
compromisso no serviço que, pela
sua natureza, realiza no silêncio mais
discreto. No entanto, não passam
inobservadas as inúmeras iniciativas
deste antiquíssimo Dicastério, adequadas para «narrar» ao mundo os
prodígios da misericórdia de Deus.
número 32-33, quinta-feira 11-18 de agosto de 2016
L’OSSERVATORE ROMANO
página 5
Benozzo Gozzoli, «Encontro
de são Domingos com são Francisco» (1452)
Aos dominicanos o Pontífice pediu que sejam contemplativos da Palavra e do povo
O bom pregador
O «bom pregador» deve ser um «contemplativo da Palavra» e «do povo», disse
o Papa Francisco aos participantes no capítulo geral dos padres dominicanos,
recebidos em audiência na manhã de 4 de agosto na sala Clementina.
Publicamos o texto do discurso do Pontífice, proferido em espanhol.
Estimados irmãos e irmãs!
Poderíamos descrever o dia de hoje
como o de «um jesuíta entre os frades»: na parte da manhã convosco, e
à tarde em Assis, com os franciscanos: no meio dos frades.
Dou-vos as boas-vindas e agradeço a saudação que me foi dirigida,
em seu nome e em nome de todos
os presentes, pelo Padre Bruno Cadoré, Mestre-Geral da Ordem, enquanto chega à sua conclusão o Capítulo geral, que teve lugar em Bolonha, onde quisestes renovar as vossas raízes junto do túmulo do santo
Fundador.
lares que asseguram o futuro da Ordem, preservando o vigor do carisma
fundacional.
Deus impeliu são Domingos a
fundar uma «Ordem de Pregadores», dado que a pregação representa
a missão que Jesus tinha confiado
aos apóstolos. É a Palavra de Deus
que arde dentro e estimula a partir
para anunciar Jesus Cristo a todos
os povos (cf. Mt 28, 19-20). O Padre
fundador dizia: «Primeiro contemplar, depois ensinar». Evangelizados
por Deus, para evangelizar. Sem
uma forte união com Ele, a pregação
poderá ser totalmente perfeita, muito argumentada e até mesmo admi-
ardente, quando a Moisés Deus disse: «Tira as sandálias dos teus pés,
porque o lugar em que te encontras
é uma terra santa!» (Êx 3, 5). O
bom pregador está ciente de que se
move numa terra santa, porque a Palavra que ele anuncia é santa, e santos são também os seus destinatários. Os fiéis têm necessidade não só
de receber a Palavra na sua integridade mas devem experimentar também o testemunho de vida de quantos pregam (cf. Evangelii gaudium,
171). Os santos produziram frutos
copiosos porque, mediante a sua vida e a sua missão, falam com a linguagem do coração, que não conhece barreiras e é compreensível a todos.
Enfim, o pregador e a testemunha
devem sê-lo na caridade. Sem ela,
eles serão discutíveis e suspeitos. No
início da sua vida são Domingos te-
mos pregadores de verdade, daquela
verdade anunciada com amor e misericórdia, de que fala santa Catarina
de Sena (cf. Livro da Doutrina Divina, 35). No encontro com a carne viva de Cristo somos evangelizados e
voltamos a encontrar a paixão de ser
pregadores e testemunhas do seu
amor; assim, livramo-nos da perigosa tentação, hoje tão atual, do gnosticismo.
Caros irmãos e irmãs, com o coração agradecido pelos bens recebidos
do Senhor para a vossa Ordem e para a Igreja, encorajo-vos a seguir
com alegria o carisma inspirado em
são Domingos e que foi vivido com
diferentes matizes por tantos santos
e santas da família dominicana. O
seu exemplo é estímulo para enfrentardes o futuro com esperança, conscientes de que Deus renova sempre
tudo... e não tira. Nossa Mãe, a Virgem do Rosário, interceda por vós e
vos ampare, a fim de que sejais corajosos pregadores e testemunhas do
amor de Deus.
Obrigado!
Saudação do mestre-geral
Este ano tem um significado especial para a vossa família religiosa,
porque se completam oito séculos
desde que o Papa Honório III aprovou a Ordem dos Pregadores. Por
ocasião do Jubileu que celebrais por
este motivo, uno-me a vós em ação
de graças pelos copiosos dons recebidos ao longo deste tempo. Além
disso, desejo manifestar a minha gratidão à Ordem, pela significativa
contribuição por ela oferecida à
Igreja e pela colaboração com a Sé
Apostólica que, com espírito de serviço fiel, manteve desde as origens
até hoje.
E este oitavo centenário leva-nos a
fazer memória de homens e mulheres de fé e de letras, contemplativos
e missionários, mártires e apóstolos
da caridade, que levaram a todos os
lugares a carícia e a ternura de
Deus, enriquecendo a Igreja e oferendo novas possibilidades de encarnar o Evangelho através da pregação,
do testemunho e da caridade: três pi-
rável, mas não tocará o coração, e é
o coração que deve mudar. Igualmente imprescindível é o estudo sério e assíduo das matérias teológicas,
assim como tudo aquilo que permite
aproximar-nos da realidade e prestar
ouvidos ao povo de Deus. O pregador é um contemplativo da Palavra e
também um contemplativo do povo,
que espera ser compreendido (cf.
Evangelii gaudium, 154).
Transmitir mais eficazmente a Palavra de Deus exige o testemunho:
mestres fiéis à verdade e intrépidas
testemunhas do Evangelho. A testemunha encarna o ensinamento, tornando-o tangível e atraente, sem deixar ninguém indiferente; une à verdade a alegria do Evangelho, o júbilo de saber que somos amados por
Deus, objeto da sua misericórdia infinita (cf. ibid, 142).
Aos seus seguidores, são Domingos dizia: «Vamos pregar descalços».
Isto recorda-nos a passagem da sarça
ve um dilema, que marcou toda a
sua existência: «Como posso estudar
em peles mortas, enquanto a carne
de Cristo sofre?». É o Corpo de
Cristo vivo e sofredor, que clama ao
pregador e não o deixa em paz. O
grito dos pobres e dos excluídos
desperta e faz compreender a compaixão que Jesus sentia pelo povo
(cf. Mt 15, 32).
Olhando ao nosso redor, verificamos que o homem e a mulher de
hoje vivem sequiosos de Deus. Eles
são a carne viva de Cristo que clama: «Tenho sede» de uma palavra
autêntica e libertadora, de um gesto
fraterno e de ternura. Este brado interpela-nos e deve constituir a espinha dorsal da missão, dando vida às
estruturas e aos programas pastorais.
Pensai nisto, quando meditais sobre
a necessidade de emendar o organograma da Ordem, para discernir a
resposta que se deve dar a este grito
de Deus. Quanto mais saciarmos a
sede do próximo, tanto mais sere-
Diálogo
e encontro
Rever as estruturas da ordem para conjugar mais eficazmente a vida e a missão; inserir o próprio
ministério da pregação numa dinâmica de diálogo, escuta e encontro; intensificar o estudo e a
compreensão da cultura e do pensamento, para saber falar ao homem do nosso tempo: eis o tríplice compromisso apresentado ao
Papa Francisco pelo mestre-geral
dos dominicanos, Bruno Cadoré.
Depois de ter recordado a providencial coincidência entre o oitavo centenário da aprovação da ordem dominicana e o ano da misericórdia, o religioso explicou a articolação e as tarefas do capítulo
geral, reiterando a vontade de renovar o afã evangelizador para
construir «uma Igreja que seja
profeta de unidade e de comunhão entre os homens», acima de
tudo entre os pobres e os marginalizados.
L’OSSERVATORE ROMANO
número 32-33, quinta-feira 11-18 de agosto de 2016
página 6/7
Durante a visita à Porciúncula o Sumo Pontífice indicou o caminho da renovação
O mundo tem necessidade de perdão
Para oferecer misericórdia a quem vive fechado e incuba o ódio
«O mundo tem necessidade de perdão», porque demasiadas pessoas continuam a viver
«fechadas no rancor» e «incubam ódio», disse o Sumo Pontífice durante a visita que
na tarde de 4 de agosto realizou à Porciúncula, na basílica de Santa Maria dos Anjos
em Assis, tendo sido recebido à sua chegada pelo bispo de Assis — Nocera Umbra —
Gualdo Tadino (Itália), D. Domenico Sorrentino, acompanhado por várias autoridades
civis. Faziam parte do séquito papal os arcebispos Becciu, substituto da Secretaria de
Estado, Gänswein, prefeito da Casa pontifícia — com o regente da Prefeitura monsenhor
Sapienza — e Fisichella, presidente do Pontifício conselho para a promoção da nova
evangelização, ao qual foi confiada a organização do jubileu da misericórdia. Estava
presente também Greg Burke, que pela primeira vez participou numa visita pontifícia
como diretor da sala de Imprensa da Santa Sé. Depois, em Santa Maria dos Anjos
deram-lhe as boas-vindas o ministro-geral dos frades menores Michael Anthony Perry,
com o provincial Claudio Durighetto, o guardião e o prefeito da basílica, Rosario
Gugliotta e Massimo Lelli. Publicamos a meditação proferida pelo Papa Francisco
nessa ocasião.
Gostaria hoje de começar, queridos irmãos e irmãs, por lembrar as palavras
que, segundo uma antiga tradição, São
Francisco pronunciou aqui mesmo, perante todo o povo e os bispos: «Quero
mandar-vos todos para o paraíso». Que
poderia o Pobrezinho de Assis pedir de
mais belo do que o dom da salvação,
da vida eterna com Deus e da alegria
sem fim, que Jesus nos conquistou com
a sua morte e ressurreição?
Aliás, que é o paraíso senão o mistério de amor que nos liga para sempre a
Deus numa contemplação sem fim?
Desde sempre a Igreja professa esta fé
ao afirmar que acredita na comunhão
dos santos. Na vivência da fé, nunca estamos sozinhos; fazem-nos companhia
os santos e os beatos — também os nossos entes queridos — que viveram com
simplicidade e alegria a fé e a testemunharam na sua vida. Há um vínculo invisível — mas não por isso menos real —
que, em virtude do único Batismo recebido, faz de nós «um só corpo» animados por «um só Espírito» (cf. Ef 4, 4).
São Francisco, ao pedir ao Papa Honório III o dom da indulgência para
quantos viessem à Porciúncula, talvez
tivesse em mente estas palavras de Jesus aos seus discípulos: «Na casa de
meu Pai há muitas moradas. Se assim
não fosse, como teria dito Eu que vos
vou preparar um lugar? E quando Eu
tiver ido e vos tiver preparado um lugar, virei novamente e hei de levar-vos
para junto de mim, a fim de que, onde
Eu estou, vós estejais também» (Jo 14,
2-3).
A via mestra a seguir para alcançar o
tal lugar no Paraíso é, sem dúvida, a
estrada do perdão. É difícil perdoar…
Quanto nos custa perdoar aos outros!
Pensemos um pouco nisto. E aqui, na
Porciúncula, tudo fala de perdão. Que
grande presente nos deu o Senhor, ao
ensinar-nos a perdoar — ou, pelo menos, a ter o desejo de perdoar — para
tocar quase sensivelmente a misericórdia do Pai! Ouvimos a parábola com
que Jesus nos ensina a perdoar (cf. Mt
18, 21-35). Porque deveremos perdoar a
uma pessoa que nos fez mal? Porque
antes fomos perdoados nós mesmos… e
infinitamente mais. Não há ninguém
aqui, entre nós, que não tenha sido
perdoado. Cada um pense… pensemos
em silêncio quantas coisas más fizemos
e como o Senhor nos perdoou. É isto
mesmo que nos diz a parábola: tal como Deus nos perdoa a nós, assim também devemos perdoar a quem nos faz
mal. É a carícia do perdão, o coração
que perdoa. O coração que perdoa acaricia. Como estamos longe daquele gesto: «Hás de pagar-me!». O perdão é
outra coisa! Precisamente como dizemos na oração que Jesus nos ensinou,
o Pai-Nosso: «Perdoai-nos as nossas
ofensas, assim como nós perdoamos a
quem nos tem ofendido» (Mt 6, 12). As
ofensas são os nossos pecados diante
de Deus, e, àqueles que nos ofenderam,
também nós devemos perdoar.
se cansa de nos oferecer o seu perdão,
sempre que lho pedimos. É um perdão
completo, total, dando-nos a certeza de
que, não obstante possamos voltar a
cair nos mesmos pecados, Ele tem piedade de nós e não cessa jamais de nos
amar. Como o senhor da parábola,
Deus compadece-se, isto é, experimenta
um sentimento de piedade combinada
com ternura: é uma expressão para indicar a sua misericórdia para connosco.
Com efeito, o nosso Pai sempre se
compadece, quando estamos arrependidos e manda-nos voltar para casa de
coração tranquilo e sereno dizendo que
todas as coisas nos foram remidas e nos
perdoou tudo. O perdão de Deus não
tem limites; ultrapassa toda a nossa
imaginação e alcança toda e qualquer
pessoa que, no íntimo do coração, reconheça ter errado e queira voltar para
Ele. Deus vê o coração que pede para
ser perdoado.
O problema surge, infelizmente,
quando nos encontramos com um irmão que nos fez um pequeno agravo.
A reação que ouvimos na parábola é
muito expressiva: «Segurando-o, aper-
aquilo que nos propõe é o amor do Pai,
não a nossa pretensão de justiça. Na
verdade, deter-se nesta, não nos faria
reconhecer como discípulos de Cristo,
que obtiveram misericórdia ao pé da
Cruz apenas em virtude do amor do
Filho de Deus. Não esqueçamos, pois,
as palavras severas com que termina a
parábola: «Assim procederá convosco
meu Pai celeste, se cada um de vós não
perdoar ao seu irmão do íntimo do coração» (v. 35).
Queridos irmãos e irmãs, o perdão,
de que são Francisco se fez «canal»
aqui na Porciúncula, continua ainda a
«gerar paraíso» depois de oito séculos.
Neste Ano Santo da Misericórdia, torna-se ainda mais evidente como a estrada do perdão pode, verdadeiramente,
renovar a Igreja e o mundo. Oferecer o
testemunho da misericórdia, no mundo
atual, é uma tarefa a que nenhum de
nós pode subtrair-se. Repito: oferecer o
testemunho da misericórdia, no mundo
atual, é uma tarefa a que nenhum de
nós pode subtrair-se. O mundo tem necessidade de perdão; demasiadas pessoas vivem fechadas no rancor e incubam ódio, porque incapazes de perdão,
arruinando a própria vida e a dos outros, em vez de encontrar a alegria da
serenidade e da paz. Peçamos a São
Francisco que interceda por nós, para
que nunca renunciemos a ser sinais humildes de perdão e instrumentos de misericórdia.
Podemos rezar por isto. Cada qual
como o sentir. Convido os frades, os
bispos a irem para os confessionários —
eu também vou — para estar à disposição do perdão. Far-nos-á bem recebê-lo
hoje, aqui, todos juntos. Que o Senhor
nos dê a graça de dizer aquela palavra
que o Pai não nos deixa acabar… aquela que disse o filho pródigo «Pai, pequei contra…» e [o Pai] tapou-lhe a
boca, abraçou-o. Nós começamos a falar, e Ele tapar-nos-á a boca e nos revestirá… «Mas, padre, tenho medo de
fazer o mesmo amanhã!». E volta… O
Pai olha sempre a estrada, olha à espera que volte o filho pródigo. E todos
nós o somos. Que o Senhor nos dê esta
graça.
Na conclusão da visita, antes de se
despedir de Assis, o Papa saudou os fiéis
reunidos no adro da basílica de Santa
Maria dos Anjos, pronunciado estas
palavras.
Cada um de nós poderia ser aquele
servo da parábola que tem uma dívida
para pagar, mas tão grande, tão grande
que nunca conseguiria satisfazê-la.
Também nós, quando nos ajoelhamos
aos pés do sacerdote no confessionário,
estamos simplesmente a repetir o mesmo gesto daquele servo. Dizemos: «Senhor, tem paciência comigo!». Já alguma vez pensastes na paciência de
Deus? Tem tanta paciência. Na realidade, sabemos bem que estamos cheios
de defeitos e muitas vezes recaímos nos
mesmos pecados. E todavia Deus não
tou-lhe o pescoço e sufocava-o, dizendo: “Paga o que me deves!”» (Mt 18,
28). Nesta cena, temos todo o drama
das nossas relações humanas: quando
estamos em dívida com os outros, pretendemos misericórdia; mas, quando
são os outros em dívida connosco, invocamos justiça. E todos fazemos assim, todos. Esta não é a reação do discípulo de Cristo, nem pode ser este o
estilo de vida dos cristãos. Jesus ensinanos a perdoar, e a fazê-lo sem limites:
«Não te digo até sete vezes, mas até setenta vezes sete» (v. 22). Em resumo,
Muito obrigado pelas vossas boas-vindas, peço ao Senhor que vos abençoe.
Agradeço-vos este desejo de proximidade. E também não vos esqueçais: perdoai sempre, sempre! Perdoai de coração e, se for possível, aproximai-vos do
outro, mas perdoai. Porque se nós perdoarmos, também o Senhor nos perdoa; e todos nós temos necessidade de
perdão... Se alguém aqui não precisa
de perdão, levante a mão... Todos nós
temos necessidade de perdão.
Agora oremos juntos a Nossa Senhora e, em seguida, conceder-vos-ei a
Bênção.
Ave Maria...
[Bênção].
E por favor, rezai por mim! Até à
vista!
No aniversário do Perdão de Assis concedido pelo Papa
sa, no ministério do sucessor de Pedro,
apresentando ao Pai os méritos infinitos do Redentor, unidos aos que dele
brotam na Virgem Maria e em todos os
santos. Deus chama, o homem responde, sem magia nem automatismo. Eis
então as condições que a Igreja estabelece: arrependimento, confissão dos pecados, Eucaristia, preces e gestos como
a visita à Porciúncula. A condição mais
exigente e importante é o compromisso
a contrastar qualquer apego ao pecado,
mesmo que seja venial.
É bom fazer tal experiência na Porciúncula. É bom ouvir nos seus muros
o eco da santidade e da fraternidade
que gerações de fiéis ouviram, nos passos de Francisco. Na indulgência, a
«comunhão dos santos» exprime-se inclusive como programa de vida. A misericórdia faz-se dom mútuo, abarcando até os defuntos, aos quais a indulHonório III em 1216
gência pode ser aplicada em jeito de
sufrágio, como ajuda para a sua purificação.
Um aspeto que não deve ser decuidado, na imploração da indulgência, é
abertura a Deus tão profunda, a ponto a oração segundo as intenções do Sande dispor o nosso coração ao encontro to Padre. É providencial que, neste ano
da misericórdia, o Papa Francisco tenha
definitivo com Ele.
Cada absolvição sacramental estimu- desejado visitar a Porciúncula, peregrila e exige um ulterior crescimento espi- no entre os peregrinos. Recebamo-lo
ritual, cuja expressão é a própria «peni- com alegria, rezemos por ele. E, em Assis, como deixar de o sentir amado de
tência» que o confessor nos dá. Mas
maneira especial, quase duplamente
quanta dificuldade e incerteza da nossa
«nosso», o primeiro Papa com o nome
parte! Como não sentir a necessidade do nosso santo?
de uma graça especial, que nos permita
Enfim, não podemos esquecer a solirealizar esta cura total do coração?
dariedade. Para Francisco, a indulgênEsta é a graça da indulgência! Não cia era também um presente para as
se trata de um «desconto» sobre os pessoas mais humildes e carentes. Frannossos deveres: nada disso! É sobretu- cisco pediu ao Papa uma indulgência
do uma energia interior com a qual o «sem óbolo». Portanto, à medida dos
Espírito Santo dá nova força ao nosso indigentes! Ele fazia-se defensor e procompromisso, livrando-nos dos resíduos tetor dos pobres também com a Pordas culpas já perdoadas. À dificuldade ciúncula. Esta capela, da qual ele tanto
gostava, traz inscrito o seu
ideal, agora relançado pelo Papa Francisco: «Uma Igreja pobre e para os pobres». Na PorQuando nos arrependemos
ciúncula, quem recebe a indulsinceramente, podemos contar
gência sente o coração dilatarse. Ela impele-nos a arregaçar
sempre com a misericórdia
as mangas para construir um
Mas o pecado não é somente
mundo mais justo, fraterno e
hospitaleiro, um mundo de
uma culpa a perdoar. É inclusive
paz. «Quero mandar-vos todos
uma enfermidade da alma
para o paraíso!». Mas Francisco só pensava no além? Pelo
contrário: a meu ver ele queria
compartilhar com todos o pade eliminar tais resíduos, a Igreja refe- raíso que tinha dentro de si. Quando
re-se falando de «pena temporal», para estamos na graça de Deus, de certo
a distinguir da «pena eterna» — o In- modo já estamos no paraíso. Contudo,
ferno! — que o pecador comina a si experimentá-lo plenamente nesta vida
mesmo quando, livre e definitivamente, implica uma sintonia com o Espírito
à maneira de Satanás, persevera no mal Santo que, quando não se deixa interrejeitando o perdão de Deus. A graça romper pela culpa grave, é pelo menos
da indulgência deve ser implorada com transtornada pelas nossas fragilidades.
oração humilde e confiante.
Considerando o perdão sacramental, a
Desde Honório III, que concedeu es- indulgência visa desenvolver esta sintote dom à Porciúncula, até ao Papa nia. Recebê-la na Porciúncula é um
Francisco, que a visita para receber pes- pouco como deixar-nos curar num sinsoalmente esta dádiva, resplandece aí o gular «ambulatório», onde Jesus tira o
serviço do sucessor de Pedro à unidade nosso «coração de pedra», dando-nos
e à santidade da Igreja. Jesus não cessa um «coração de carne»: o seu próprio
de cumprir a sua promessa. A indul- Coração! «Paraíso, paraíso», exclamagência é graça pura. No diálogo ecu- ram muitos santos! A indulgência é um
ménico devemos manifestar aos irmãos clarão celeste, uma resposta à necessiprotestantes esta nossa convicção. Ne- dade de alegria do nosso coração.
nhuma obra nossa a poderia merecer. É
Jesus, somente Jesus, conhece este
dom gratuito de Deus mediante a Igre- segredo. Neste ano especial, não falteja, corpo e esposa de Cristo que quase mos ao encontro com o júbilo. Por fase concentra, com imploração fervoro- vor, rezai também por mim!
Caminho de Igreja
A seguir, uma sinopse da carta pastoral
escrita pelo bispo de Assis — Nocera Umbra — Gualdo Tadino (Itália) em vista
da visita do Papa.
D OMENICO SORRENTINO
A Providência sempre nos acompanha
e muitas vezes surpreende-nos. Quem
teria podido prever que, no VIII centenário do perdão de Assis, haveria um
Papa chamado Francisco? E como se
poderia ter adivinhado que este aniversário seria celebrado no ano da misericórdia? São circunstâncias que causam
admiração e fazem intuir um desígnio
divino.
Ao meu predecessor Teobaldo, em
1310, coube confirmar, contra vozes críticas, a indulgência da Porciúncula que
Francisco tinha recebido do Papa Honório III. E eu talvez tenha a incumbência de explicar o seu sentido e atualidade. No paço episcopal vivo entre as
ondas da graça geral do Espírito de
Deus no jovem Francisco quando, sob
o olhar do bispo Guido, se despojou
de tudo para se conformar com Cristo.
No lugar onde se comemora este acontecimento, admira-se a pintura que o
recorda e, do lado oposto, precisamente
a Porciúncula, no ato de entrega que os
beneditinos fazem a Francisco. E no
centro da sala sobressai o Perdão de
Assis, com o semblante resplandecente
do santo, enquanto implora a indulgência do Redentor por intercessão da
Bem-Aventurada Virgem.
Tenho a impressão de ver um fio que
une as várias cenas. Francisco, que renunciou às riquezas da terra, distribui
com generosidade os tesouros celestiais.
E enquanto o deus dinheiro deturpou a
sua família carnal, uma capela pobre e
sem adornos recebe e plasma a sua família espiritual. «Não já pai Pedro de
Bernardone, mas Pai nosso que estais
no céu»: o caminho de um homem
transfigurado vai do despojamento à
indulgência.
Transfigurado para transfigurar: dando a notícia do «perdão» a 2 de agosto
de 1216, Francisco exclamou: «Quero
mandar-vos todos para o paraíso!». A
Porciúncula tornava-se uma porta do
céu, aberta sobretudo aos simples e pobres, casa onde a presença de Deus se
sente com uma carícia e as pedras emanam o calor de um ventre maternal.
O que sentiu Francisco neste lugar,
que ele apreciava mais do que qualquer
outro? Podemos supor que aqui ele se
abandonava ao diálogo com a Trindade, embalado no colo da Mãe. Nesta
igrejinha recebeu a consagração de Clara, sua «plantinha», acolhendo os companheiros que se uniam a ele para formar confrarias em missão no mundo.
Portanto, indulgência. Do que se trata? É uma palavra ligada ao perdão:
perdão especial, perdão superabundante. Perdão profundo e pleno. O que a
indulgência acrescenta a tudo isto? Para o compreender é preciso refletir sobre a situação espiritual em que o pecado nos lança.
O pecado deixa «escórias» dolorosas
em nós. A teologia fala delas em termos de «pena».
Quando nos arrependemos sinceramente, podemos contar sempre com a
misericórdia. Mas o pecado não é somente uma culpa a perdoar. É inclusive
uma enfermidade da alma. Quem não
vê que, mesmo depois de ter recebido o
perdão, os pecados deixam em nós inclinações doentias, que nos levam a cometer de novo os mesmos erros? O pecado traz consigo a pena de si mesmo!
O sacramento do perdão resolve um aspeto fundamental desta pena: a separação de Deus (para os pecados graves)
ou o afastamento dele (para os pecados
veniais). Só devemos eliminar os resíduos da enfermidade. Se não os curarmos durante a vida, será necessário fazê-lo depois da morte, no purgatório.
Em função desta «cura», na antiga maneira de celebrar o sacramento da reconciliação, que teve várias fases e formas, previam-se gravosos atos de penitência. Com o tempo afirmou-se uma
pedagogia diversa, uma espécie de cura
«intensiva» da misericórdia que, com
base no perdão sacramental recebido
com o arrependimento sincero e o propósito de uma nova vida, consiste na
imploração eclesial, portanto não só individual, de uma ulterior graça que leve
a uma resposta cada vez mais profunda
ao amor de Deus. Deste modo nasce a
atual praxe da indulgência. Assim concebida, propaga em nós a eficácia do
perdão sacramental, favorecendo uma
L’OSSERVATORE ROMANO
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quinta-feira 11-18 de agosto de 2016, número 32-33
«Christ dans la banlieue», Georges Rouault
(1920-1924)
As palavras com as quais Jesus dá
graças ao Pai por ter revelado a boa
notícia aos mais pequeninos e a não
aos sábios, no texto grego são introduzidas de maneira estranha e obscura: «Naquele tempo, respondendo, Jesus disse...». Dado que não há
interrogação alguma, a nossa tradução eliminou o verbo retorquir, mas
interrogamo-nos do mesmo modo a
quem e como responde Jesus. Responde aos acontecimentos da vida
que interpelam a sua fé, e fá-lo rezando. Assim, a oração torna-se resposta àquela amargura, àquela falência e àquela incompreensão da sua
obra — Ele, Filho do homem, é considerado como se fosse um comilão
e um beberrão, amigo de publicanos
e de pecadores — que são testemunhadas poucos versículos antes, e
que acabam com a repreensão contra
as cidades que tinham visto os seus
milagres e não acreditaram (cf. Mateus 11, 19-24).
A posição de Jesus diante do Pai
proporciona-lhe a possibilidade de
assumir aquilo que aconteceu, por
mais amargo e contraditório que seja, e a capacidade de reconhecer aí
um caminho de amor e obediência
que abate quaisquer recriminações e
lamentações. Somente assim Ele pode voltar a descobrir o sinal do agir
de Deus e dar-lhe graças. A oração
como resposta empenha Jesus numa
relação, num relacionamento de obediência, conotando a sua pessoa como mansa e humilde de coração.
Não se trata de uma sua caraterística
pessoal, mas sobretudo de uma revelação do agir e do ser do próprio
Deus. E Jesus, manso e humilde de
coração, deseja plasmar do mesmo
modo aqueles pequeninos que se
aproximam dele de todas as partes
para o ouvir.
Uma meditação das irmãs de Bose
Manso e humilde
de coração
Jesus transmite com grande força
aquilo que lhe foi concedido pelo
Pai, a fim de que eles sejam seus discípulos. Antes de tudo, chama-os a
uma renúncia à vontade pessoal e a
uma disponibilidade a segui-lo, a estar atrás dele no peso e no cansaço
da vida: «Vinde a mim, vós que estais cansados...». Depois, convida-os
a pôr-se na sua escola: «Aprendei de
mim, que sou manso e humilde de
coração...». O manso não é assim
desde o início: a vida humano-cristã,
a existência comunitária no seu mo-
vimento de olhar para o outro com
consideração, no mistério de uma
vocação, geram-nos dia após dia para a mansidão; ela produz paciência,
e a paciência uma virtude provada, a
perseverança; e a virtude provada, a
esperança (cf. Romanos 5, 3-4). Enfim, com palavras de profunda consolação, Jesus pede-nos que vamos
ter come Ele com confiança, porque
Ele é o mestre que não sobrecarrega
ninguém com pesos insuportáveis:
«Tomai o meu jugo e encontrareis
alívio para as vossas vidas». Onde
estão a alegria e o descanso? Onde
estão a leveza e a suavidade prometidas?
Num escrito de Guilherme de
Saint-Thierry, que serve de comentário para este texto, lemos palavras
postas nos lábios do Senhor: «Tu
gemes e lamentas-te debaixo do meu
jugo, cansas sob o meu fardo, mas é
o amor que confere ao meu jugo a
docilidade, e ao meu fardo a leveza
(...). Queres o amor? Pois bem, tu
empreendeste o caminho que conduz à vida: se não abandonares esta
senda, chegarás à meta almejada. Eu
caminho diante de ti, e tu só deves
pôs os teus passos nos meus. Eu
cansei, resisti: também tu faz o mesmo, é necessário que também tu te
canses. Eu suportei muitos sofrimentos: também tu deves padecer algo.
O caminho que leva a amor é a obediência. Tem firme este ponto e chegarás. O amor é um tesouro imenso,
vale a pena que se pague todo o
preço necessário para o adquirir.
Sim, Deus é amor: quando tiveres
alcançado o amor, então já não te
cansarás. (...) Ajudar-te-ei a suportar
a tua fadiga, fui Eu quem a suportei
até agora e até aqui, sou Eu quem
ainda a suportarei» (Dalla meditazione alla preghiera, Edizioni Qiqajon).
Na obediência, na paciência que
brota da confiança, podemos experimentar o alívio precisamente no
âmago do cansaço, que existe e subsiste; podemos chegar a provar as
inegáveis leveza e docilidade até
quando estamos submetidos a um
peso escolhido livremente e por
amor, o jugo que o próprio Senhor
suportou, e assim podemos saborear
a bem-aventurança que Ele prometeu: «Bem-aventurados os mansos,
porque herdarão a terra».
Iniciativa divulgada pelo núncio apostólico no Lesoto
Caridade do Papa para as vítimas da estiagem
O Papa Francisco doou quatrocentos mil dólares
ao governo do Lesoto para que possa enfrentar a
emergência da seca que atingiu o país e todo o
sul da África provocada por El Niño. Referiu ao
jornal online «African Independent» o núncio
apostólico Peter Bryan Wells, que recentemente
apresentou ao rei Letsie III as cartas credenciais
no início da sua missão diplomática.
Trata-se de um gesto particularmente significativo — explicou o arcebispo, que é também representante pontifício na África do Sul, Botsuana,
Namíbia e Suazilândia — porque é «muito insólito» que o Papa ofereça doações deste tipo diretamente aos governos, pois os procedimentos padrões da Santa Sé em caso de catástrofes preveem
ofertas através de agências como Caritas internationalis ou as Conferências episcopais locais. Segundo o núncio neste caso «o Papa aproveitou a
oportunidade para demonstrar que sustentamos
efetivamente o que dizemos, não oferecemos meros ensinamentos vazios»
De resto no Lesoto os efeitos de El Niño provocaram escassez de água, fome, doenças e consequentemente uma crise económica que pôs de
joelhos a região meridional da África, a qual é
também o epicentro da pandemia do Vih/Sida.
Em particular no Lesoto a seca provocada por El
Niño deu origem a uma diminuição de 62 por
cento na produção agrícola durante a última estação, condenando mais de quinhentas mil pessoas
à fome nos dez distritos do país. A ponto que a
22 de dezembro de 2015 o primeiro-ministro Pakalitha Mosisili declarou o estado de emergência.
Isto chamou a atenção do Pontífice — explicou
o arcebispo de Maseru, D. Gerard Tlali Lerotholi
— e a sua resposta foi imediata. O contributo agora deveria ser passado à Conferência episcopal local, de modo que através de projetos especiais a
Igreja católica no Lesoto possa ajudar a aliviar os
efeitos da seca. «Faremos visitas frequentes a fim
de verificar como o governo e a Igreja local utilizam o dinheiro e para entender o que poderia
servir de ulterior ajuda», disse D. Wells, que recordou os apelos dirigidos pelo Pontífice a toda a
comunidade internacional para uma maior consciência dos danos que foram provocados ao meio
ambiente e em particular das suas consequências
para os pobres e marginalizados.
«O Papa Francisco sente um afeto muito especial pela África, em particular pelos países menores que devem combater contra determinadas dificuldades», comentou o prelado. Por sua vez o soberano do Lesoto expressou gratidão pelo contributo que a Igreja católica ofereceu, sobretudo aos
setores da saúde e da educação.
Segundo D. Wells, o Papa tem conhecimento
da instabilidade política e das polémicas que afligem o país. A tal propósito o núncio expressou a
«African Independent» a esperança da Igreja de
que através da reconciliação, do diálogo e de resoluções pacíficas estas dificuldades possam ser
superadas. Também D. Lerotholi recordou que «a
Igreja católica, em colaboração com os membros
do Conselho cristão do Lesoto», deu «início a
um diálogo para o regresso do exílio do líder da
oposição. E também hoje — concluiu — afirmamos que estamos prontos a assistir o país nesta e
em todas as outras iniciativas de paz».
número 32-33, quinta-feira 11-18 de agosto de 2016
L’OSSERVATORE ROMANO
página 9
O Papa Francisco visitou-o no hospital de Cracóvia
Falecimento do cardeal
Franciszek Macharski
O cardeal Franciszek Macharski, arcebispo emérito de Cracóvia, nasceu a 20 de
maio de 1927 em Cracóvia. Foi ordenado Sacerdote no dia 2 de abril de 1950.
Nomeado arcebispo de Cracóvia a 29 de dezembro de 1978, sucessor direto de
Karol Wojtyła, recebeu a Ordenação episcopal a 6 de janeiro de 1979. Foi criado
e publicado cardeal no consistório de 30 de junho do mesmo ano, com o título de
São João na Porta Latina. No dia 3 de junho de 2005 renunciou ao governo
pastoral da arquidiocese.
«Nunca passou um dia sem que eu
meditasse sobre a Dies irae e a imagem do Cristo pensativo, amado pelo nosso povo, repetindo a mim
mesmo: quaerens me sedisti lassus».
Esta confidência do cardeal Macharski delineia o seu perfil espiritual e pastoral e o seu espírito de
serviço à Igreja e ao povo de Cracóvia. Porque para ele Cracóvia foi deveras o coração de toda a vida e
missão de pastor. Com efeito, ali
nasceu e estudou. Durante os anos
da segunda guerra mundial, sob a
ocupação alemã, trabalhou como
operário, exatamente como Karol
Wojtyła.
Logo após a libertação, em 1945,
entrou no seminário maior de Cracóvia, matriculando-se na faculdade
teológica da universidade jagelónica.
Terminando os estudos filosóficos e
teológicos, foi ordenado Sacerdote a
2 de abril de 1950, pelo cardeal arcebispo de Cracóvia Adam Sapieha.
Por seis anos desempenhou a sua
atividade pastoral como vigário na
paróquia de Kozy, na região de
Bielsko-Biała. Depois, em 1956, estudou na Universidade católica de Friburgo, na Suíça, a fim de completar
os cursos teológicos, formando-se
em teologia pastoral em 1960.
Ao voltar a Cracóvia, recebeu o
encargo de padre espiritual no seminário e professor de teologia pastoral
na Pontifícia faculdade teológica.
Dez anos depois, em 1970, o novo
cardeal arcebispo Wojtyła nomeou-o
reitor do seminário e, em 1977, cónego do cabido metropolitano da catedral de Wawel. Em novembro de
1971 participou como auditor na segunda assembleia geral ordinária do
Sínodo dos bispos dedicada ao tema: «O sacerdócio ministerial e a
justiça no mundo».
Com o seu arcebispo Macharski
sempre manteve uma forte relação
de colaboração e amizade, acompanhando-o inclusive nas várias viagens internacionais ao Canadá, Estados Unidos, França, Alemanha e
Itália.
Precisamente deste estreito vínculo nasceu a decisão de Karol Wojtyła
— eleito Papa em 16 de outubro de
1978 com o nome de João Paulo II —
de o nomear seu sucessor na cátedra
de santo Estanislau, no dia 29 de
dezembro de 1978. O Pontífice polaco conferiu-lhe pessoalmente a orde-
No trigésimo oitavo
aniversário da morte
de Paulo VI
Trinta e oito anos depois do falecimento
do Papa Paulo VI,
na manhã de sábado 6 de agosto,
D. Marcello Semeraro,
bispo de Albano (Itália) e secretário
do Conselho de nove cardeais,
presidiu à santa missa nas grutas
do Vaticano, junto do túmulo
do saudoso Pontífice.
Concelebraram o arcebispo Francesco
Gioia e diversos presbíteros.
Entre os presentes, numerosas religiosas,
pertencentes de maneira especial
à congregação de Maria Menina,
e o regente da Prefeitura da Casa
Pontifícia, monsenhor Leonardo
Sapienza. No final da celebração,
reunidos diante do túmulo do Papa
Montini, todos entoaram
o canto do Magnificat.
Nas orações foram recordados
também o arcebispo Pasquale Macchi,
que tinha exercido a função
de secretário de Paulo VI.
nação episcopal na basílica vaticana,
na presença de muitos peregrinos
provenientes de Cracóvia para a ocasião. «Jesus, confio em ti» foi o lema escolhido pelo purpurado, na
perspetiva da espiritualidade da divina misericórdia da qual foi apóstola
irmã Faustina Kowalska.
Conhecido na Polónia e também
no estrangeiro como homem de cultura, estudioso e escritor, Macharski
dedicou sempre cuidado particular à
promoção das vocações sacerdotais e
religiosas, assim como à formação
teológica e espiritual dos seminaristas. No meio do episcopado polaco,
já antes da nomeação a arcebispo de
Cracóvia, ofereceu a sua contribuição de pensamento e de experiência
participando na atividade de várias
comissões.
Neste contexto, prestou especial
atenção ao laicado: de facto, na assembleia plenária dos bispos polacos, realizada em Varsóvia em fevereiro de 1979, foi-lhe confiada a presidência da comissão do apostolado
dos leigos, da qual já tinha sido secretário quando a guiava o cardeal
Wojtyła de 1966 a 1978.
Sempre foi um ponto de referência para toda a sociedade polaca, capaz de intervenções de perfil elevado
com um estilo simples e direto.
Manteve um vínculo especial com
João Paulo II, recebendo-o oito vezes em visita a Cracóvia entre 1979 e
2002.
Participou em diversas assembleias
do Sínodo dos bispos, desempenhando em particular um papel-chave como presidente delegado na segunda assembleia especial para a
Europa em 1999. Fez parte também
do conselho da segunda secção da
Secretaria de Estado; da Congregação para os bispos, da Congregação
para a evangelização dos povos, da
Congregação para o clero, da Congregação para os institutos de vida
consagrada e as sociedades de vida
apostólica e da Congregação para a
educação católica.
A 3 de junho de 2005, depois de
mais de vinte e seis anos de episcopado, deixou o governo da arquidiocese de Cracóvia a Stanisław
Dziwisz, que durante trinta e nove
anos fora o secretário particular de
Karol Wojtyła.
Telegrama de condolências
do Pontífice
O cardeal polaco Franciszek Macharski, arcebispo emérito
de Cracóvia, faleceu no dia 2 de agosto. Tinha 89 anos.
Durante a viagem à Polónia, o Papa Francisco visitou-o
no hospital universitário no qual estava internado em
gravíssimas condições. Ao receber a notícia, o Pontífice
enviou ao cardeal Stanisław Dziwisz, arcebispo de
Cracóvia, o seguinte telegrama.
Com tristeza, recebi a notícia da morte do Cardeal
Franciszek Macharski, Arcebispo emérito de Cracóvia. Uno-me a ti, estimado irmão, ao presbitério e
aos fiéis da Igreja na Polónia na oração de ação de
graças pela vida e o compromisso pastoral deste benemérito ministro do Evangelho.
Iesu, in te confido! — Jesus, confio em ti! — este lema episcopal guiou a sua vida e o seu ministério.
Hoje, no Ano jubilar da Misericórdia, tornou-se uma
invocação eloquente que proclama o cumprimento da
obra que o Senhor lhe confiou já no momento do
Batismo, introduzindo-o na fila dos selados com o
seu Sangue redentor, e em seguida também com o
dom do sacerdócio, quando o enviou com a tarefa de
santificar o Povo com a palavra e a graça dos sacramentos.
Desempenhava esta missão com zelo como pastor,
professor, reitor do Seminário, até ao dia em que o
Senhor lhe confiou o encargo da herança de santo
Estanislau e do seu imediato predecessor Karol Wojtyła, hoje são João Paulo II, na sede episcopal de
Cracóvia. Com confiança na Misericórdia divina realizou esta obra como pai para os sacerdotes e os fiéis
confiados aos seus cuidados. Guiou a Igreja em Cracóvia no período não fácil das transformações políticas e sociais, com sabedoria e um sábio desapego da
realidade, preocupando-se pelo respeito por cada
pessoa, pelo bem da comunidade da Igreja e, sobretudo, por conservar viva a fé no coração dos homens.
Dou graças à Providência porque pude visitá-lo
durante a recente viagem a Cracóvia. Na última etapa da vida foi muito provado pelo sofrimento, que
aceitava com serenidade de espírito. Também nesta
provação permaneceu testemunha fiel da confiança
na bondade e na misericórdia de Deus. Continuará
assim na minha memória e na oração. O Senhor o receba na sua glória!
A Vossa Excelência, venerado irmão, aos Cardeais
e aos Bispos, à família do falecido, a todos os fiéis
polacos concedo de coração a minha bênção: em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo.
FRANCISCO
L’OSSERVATORE ROMANO
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quinta-feira 11-18 de agosto de 2016, número 32-33
Em diálogo com o arcebispo Fisichella
Uma especial sexta-feira da misericórdia
GIANLUCA BICCINI
Qual foi o papel do seu dicastério na
organização das jornadas na Polónia?
A prece silenciosa em Auschwitz-Birkenau, a visita aos doentes no hospital pediátrico de Cracóvia, a Via-Sacra da jmj com os jovens iraquianos
e com quantos vivem particulares situações de dificuldade. Para o arcebispo Rino Fisichella, presidente do
Pontifício conselho para a promoção
da nova evangelização, existe um
único fio condutor que une estes
três momentos vividos pelo Papa no
dia 29 de julho durante a sua última
viagem, a tal ponto que a do Pontífice pode ser considerada «plenamente» a etapa de julho das chamadas «sextas-feiras da misericórdia»,
como explicou nesta entrevista a
L’Osservatore Romano, na qual falou também das catequeses por ele
dirigidas aos jovens italianos durante
a jmj de Cracóvia.
Estamos no ano santo e portanto
a jornada mundial da juventude insere-se para todos os efeitos neste
momento de graça que o Papa Francisco desejou oferecer a toda a Igreja. A jmj é sempre gerida de maneira
eficaz pelo Pontifício Conselho para
os leigos. Participamos com uma pequena delegação porque era justo
que estivéssemos presentes também
nós, como sinal de que o evento jubilar não era vivido somente em Roma, mas — como o Papa desejou —
também em todas as dioceses do
mundo. De resto, também em Cracóvia o Pontífice atravessou a porta
santa.
Para o dicastério encarregado da animação pastoral e da organização dos
eventos do jubileu, o que representa o
dia vivido pelo Papa a 29 de julho?
Olhando para o que Francisco
fez, sem dúvida podemos definir este dia uma das «sextas-feiras da misericórdia» que ele promove mensalmente ao longo deste ano santo extraordinário. E gostaria de acrescentar que em tal circunstância o Papa
a viveu de modo ainda mais significativo. Sim, acho que o silêncio em
Auschwitz, a sua oração sem palavras, o seu desejo de passar um pouco de tempo com as crianças doentes e com os jovens iraquianos e necessitados presentes na Via-Sacra,
são plenamente obras de misericórdia. Não esqueçamos que rezar pelos
defuntos é uma obra de misericórdia
espiritual, e visitar os doentes é uma
obra de misericórdia corporal. Portanto diria que, não obstante no plano organizacional tivéssemos interrompido durante o verão os encontros jubilares para permitir que o
Pontífice descansasse dos numerosos
esforços envidados nestes meses, ele
voltou a surpreender-nos. Assim,
também em julho presidiu em pleno
sentido à sua «sexta-feira da misericórdia», e talvez de modo ainda
mais admirável.
Ao mesmo tempo, considerou-se a jmj
de Cracóvia como o jubileu dos jovens.
O senhor foi um dos bispos — em Cracóvia estavam presentes 800 — que
animaram as tradicionais catequeses
para os vários grupos linguísticos.
Qual foi a sua experiência a propósito?
Animei duas delas: obviamente o
tema principal foi a misericórdia
porque o lema destas catequeses era:
ser bem-aventurado na medida em
que se é misericordioso. Vivi uma
bonita experiência com dois grandes
grupos de jovens de diversas partes
da Itália e esforcei-me para os fazer
refletir sobre quanto o tema da misericórdia toca diretamente a vida concreta das pessoas e pode mudar a
nossa vida, sobretudo a dos jovens.
Procurei explicar que ser agente de
misericórdia significa acolher a provocação do Papa Francisco: na base
estão as obras de misericórdia espiritual e corporal, mas elas são só o
ponto de partida que nos impele depois a verificar todas as pobrezas
presentes no mundo de hoje, e no
mundo juvenil há muitas. Na vigília
de sábado no Campus misericordiae
de Cracóvia o Pontífice recordou
outras, exortando a não se fazer privar da própria liberdade e a ser ativo. Tudo consiste em reconhecer as
novas formas de pobreza para poder
dar espaço à fantasia criadora da misericórdia e corresponder a elas com
obras sempre novas.
A próxima jmj será no Panamá em
2019. Como devemos ver esta escolha?
Não nos esqueçamos que a África
e a América Latina são continentes
cheios de jovens. Lá ainda existe
uma presença fortíssima de religiosidade popular, portanto desde o nascimento as crianças são iniciadas a
viver na fé. Mas também lá há os
desafios que estão a chegar e sobre
os quais a Igreja deve vigiar sempre,
a fim de poder levar os jovens à verdadeira liberdade, como o Papa
Francisco disse na vigília da jmj.
Além disso devemos considerar que
o Panamá é um Estado moderno,
que pode transmitir aos outros a capacidade de construir o futuro. Por
fim, a sua colocação geográfica favorece as comunicações com as Américas. Mas sobretudo com esta escolha
o Papa quis que as novas gerações
latino-americanas fossem motivadas
por um profundo sentido de pertença à Igreja, artífices e responsáveis
do presente e do futuro dos seus
países e do continente.
Já foram consumidos os recursos anuais da Terra
Chegou a hora de escolher entre colapso e estabilidade
Cada vez antes: para sermos precisos, cinco dias em relação ao ano passado. De facto, no dia 8 de agosto a
humanidade esgotou os recursos que a natureza põe à
disposição para o ano inteiro. Trata-se do dia da sobrecarga da Terra (Earth Overshoot Day): tudo o que começou a ser consumido a partir do dia seguinte supera
os recursos que o planeta pode regenerar. O Global
Footprint Network calcula esta corrida irreprimível,
medindo todos os anos o consumo de recursos disponíveis, frisando que a data limite em 2000 coincidia
com o fim do mês de setembro.
De facto, é a certificação de que emitimos mais dióxido de carbono na atmosfera do que os oceanos e as
florestas são capazes de absorver e depredamos as regiões de pesca e as florestas mais rapidamente do que
se podem reconstituir. As emissões de dióxido de carbono constituem o componente da sobrecarga ecológica que está a aumentar com mais rapidez: a marca devida ao dióxido de carbono (carbon footprint) gera 60
por cento da demanda de recursos naturais por parte
da humanidade (pegada ecológica).
A fim de respeitar os objetivos do acordo de Paris
adotado por quase 200 países em dezembro de 2015, a
pegada das emissões de dióxido de carbono deverá di-
minuir praticamente a zero até 2050. O que requer um
novo modo de viver, comprometido, mas não irrealizável, segundo Mathis Wackernagel, co-fundador e Ceo
de Global Footprint Network. «A boa notícia — observa
— é que tudo isto é atuável com as tecnologias disponíveis e é economicamente vantajoso dado que os benefícios totais são superiores aos custos. O único recurso do
qual temos mais necessidade é a vontade política».
Alguns países enfrentam este desafio. Por exemplo, a
Costa Rica gerou 97 por cento da sua eletricidade através de fontes renováveis durante os primeiros três meses de 2016. Portugal, Alemanha e Grã-Bretanha mostraram níveis muito avançados em relação à capacidade
de produzir energia renovável. A China delineou um
plano para reduzir em 50 por cento o consumo de carne e consequentemente diminuir de um bilião de toneladas as emissões de dióxido de carbono.
Contudo é necessário o comprometimento dos indivíduos. Cada um pode fazer algo. A tal propósito, depois do acordo de Paris, foi lançada uma campanha de
sensibilização com a finalidade de evidenciar a importância de poder contar com a certeza dos recursos dada por um mundo sustentável. De resto, trata-se de escolher entre colapso e estabilidade.
número 32-33, quinta-feira 11-18 de agosto de 2016
Reconhecimento
da Onu
conferido ao Cimi
O Conselho indigenista missionário (Cimi), organismo da
Igreja no Brasil que trabalha
em defesa das populações indígenas, obteve um «estatuto especial». O prestigioso reconhecimento por parte do Conselho económico e social das Nações Unidas (Esosoc) — explicou D. Roque Paloschi, arcebispo de Porto Velho e presidente do Cimi — «qualifica o
trabalho do Conselho indigenista missionário» e intensifica
«a atenção internacional sobre
a defesa dos projetos de vida
das populações indígenas». Na
opinião do prelado brasileiro,
o Ecosoc é um «organismo estratégico para dar espaço às
denúncias e para a construção
de uma consciência coletiva
que reconheça e promova as
comunidades indígenas de todo o mundo».
L’OSSERVATORE ROMANO
página 11
Por ocasião do dia internacional proclamado pelas Nações unidas
Ao congresso eucarístico
Justiça negada aos índios
Cardeal Hummes
enviado papal
O Pontífice pede o respeito pelos direitos dos indígenas
São mais de 370 milhões e vivem em cerca de setenta países. As populações indígenas com frequência são vítimas de abusos, de direitos negados, de desigualdade
social e obrigadas a lutar pela sobrevivência das suas terras ancestrais e do respeito pelas suas tradições. Por ocasião do dia internacional dos povos indígenas,
num tweet, o Papa Francisco lançou um apelo: «Peçamos que os povos indígenas,
ameaçados na sua identidade e na sua existência, sejam respeitados».
Para recordar a importância das populações indígenas e do respeito pelas suas
tradições e história, pronunciou-se também a alta representante da União europeia
para a política estrangeira e de segurança comum, Federica Mogherini, que declarou: «Unamo-nos aos povos indígenas de todo o mundo para celebrar a riqueza
das suas culturas e os seus contributos peculiares para a diversidade cultural mundial». A União «reitera o seu compromisso a promover e tutelar os direitos dos
povos indígenas», acrescentou.
O dia internacional foi proclamado pela Assembleia geral da Onu em dezembro de 1994, para chamar a atenção sobre as exigências dos povos indígenas mais
ameaçados. Hoje, pelo menos em teoria, muitas leis nacionais, políticas e institucionais contêm e respeitam princípios da Declaração da Onu sobre os direitos dos
povos indígenas e da Convenção Ilo sobre os povos indígenas e tribais.
Apesar dos passos já dados, em muitos países diariamente os direitos humanos
dos povos indígenas continuam a ser violados. O último alarme foi lançado pela
organização Survival International, segundo a qual o povo dos Kawahivas, na
Amazônia brasileira, corre o risco de extinção. É preciso que a terra dos Kawahivas seja demarcada e protegida definitivamente.
No dia 12 do passado mês de
junho foi publicada em L’O sservatore Romano a notícia da
nomeação do cardeal franciscano Cláudio Hummes como enviado especial do Papa Francisco ao décimo sétimo congresso eucarístico nacional do
Brasil, que será celebrado na
cidade de Belém de 15 a 21 de
agosto.
O prefeito emérito da Congregação para o clero será
acompanhado de uma missão
composta por dois eclesiásticos
incardinados na arquidiocese
de Belém:
— padre Vladian Silva Alves,
membro do cabido da catedral
e reitor do seminário maior de
São Pio x; e
— padre Ronaldo de Souza
Menezes, pároco da paróquia
de São Geraldo Magela e diretor do museu local de arte
sacra.
INFORMAÇÕES
Audiências
Prelados falecidos
O Papa Francisco recebeu em audiências particulares:
Adormeceram no Senhor:
No dia 4 de agosto
No dia 30 de julho
Os Senhores Cardeais Stanisław Ryłko, Presidente do Pontifício Conselho para os Leigos; e Peter
Kodwo Appiah Turkson, Presidente do Pontifício
Conselho «Justiça e Paz»; e D. Guillermo Rodríguez-Melgarejo, Bispo de San Martin (Argentina).
D. Vicente Huang Shoucheng, Bispo diocesano
de Xiapu (China Continental).
do Sacerdote a 29 de julho de 1974. Recebeu a Ordenação episcopal em 3 de maio de 1974.
No dia 5 de agosto
O venerando Prelado nasceu a 23 de julho de
1923, em Kangcuo (China Continental). Foi ordenado Sacerdote no dia 26 de junho de 1949. Recebeu a
Ordenação episcopal em 9 de janeiro de 1985.
D. Salvador Quizon Quizon, ex-Auxiliar de Lipa
(Filipinas).
O ilustre Prelado nasceu em Manila a 6 de dezembro de 1924. Recebeu a Ordenação sacerdotal no
dia 12 de março de 1949. Foi ordenado Bispo em 22
de agosto de 1979.
No dia 6 de agosto
Nomeações
O Sumo Pontífice nomeou:
A 6 de agosto
Núncio Apostólico na Polónia, D. Salvatore Pennacchio, Arcebispo Titular de Montemarano, até
à presente data Núncio Apostólico na Índia e no
Nepal.
Membro Ordinário da Pontifícia Academia das
Ciências Sociais, o Professor Paolo Carozza, Docente de Direito e Ciências Políticas na University
of Notre Dame, Indiana (Estados Unidos da
América).
No dia 2 de agosto
D. James Martin Hayes, Arcebispo Emérito de
Halifax (Canadá).
O venerando Prelado nasceu a 27 de maio de
1924, em Halifax (Canadá). Recebeu a Ordenação
sacerdotal no dia 15 de junho de 1947. Foi ordenado
Bispo em 20 de abril de 1965.
D. Ercole Lupinacci, Bispo Emérito de Lungro
dos ítalo-albaneses da Itália continental.
O saudoso Prelado nasceu no dia 23 de novembro
de 1933 em San Giorgio Albanese (Itália). Foi ordenado Sacerdote a 22 de novembro de 1959. Recebeu
a Ordenação episcopal em 6 de agosto de 1981.
No dia 8 de agosto
No dia 3 de agosto
D. Mansueto Bianchi, Bispo Emérito de Pistoia e
Assistente eclesiástico geral da Ação católica italiana.
O ilustre Prelado nasceu em Santa Maria a Colle
(Itália), no dia 4 de novembro de 1949. Foi ordena-
D. Edward Kevin Daly, Bispo Emérito de Derry
(Irlanda).
O saudoso Prelado nasceu em Belleek (Irlanda),
no dia 5 de dezembro de 1933. Recebeu a Ordenação
sacerdotal a 16 de março de 1957. Foi ordenado Bispo em 31 de março de 1974.
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L’OSSERVATORE ROMANO
quinta-feira 11-18 de agosto de 2016, número 32-33
A misericórdia «é um caminho que vai do coração às
mãos», recordou o Papa Francisco na audiência
geral de quarta-feira 10 de agosto, comentando com
os fiéis na Sala Paulo VI o trecho evangélico de
Lucas (7, 11-17) que narra a ressurreição do filho da
viúva de Naim.
Queridos irmãos e irmãs, bom dia!
O trecho do Evangelho de Lucas que acabámos
de ouvir (7, 11-17) apresenta-nos um milagre de Jesus deveras grandioso: a ressurreição de um jovem. No entanto, o núcleo desta narração não é o
milagre mas a ternura de Jesus para com a mãe
deste jovem. Aqui a misericórdia assume o nome
de grande compaixão por uma mulher que tinha
perdido o marido e que agora leva ao cemitério o
seu único filho. Esta grande dor da mãe comove
Jesus e provoca o milagre da ressurreição.
Ao introduzir este episódio, o Evangelista hesita sobre muitos pormenores. Na porta da cidade
de Naim — uma aldeia — encontram-se dois grupos numerosos que provêm de direções opostas e
que nada têm em comum. Jesus, seguido pelos
discípulos e por uma multidão prepara-se para
entrar no povoado, enquanto sai o triste cortejo
que acompanha o defunto, com a mãe viúva e
muitas pessoas. Junto da porta os dois grupos
cruzam-se cada um indo pela própria estrada, mas
é então que são Lucas comenta o sentimento de
Jesus: «Vendo-a, o Senhor, movido de compaixão
para com ela, disse-lhe: Não chores! E aproximando-se, tocou no esquife, e os que o levavam
pararam» (vv. 13-14). Grande compaixão guia as
ações de Jesus: é Ele que para o cortejo ao tocar
o esquife e, movido por profunda misericórdia
por esta mãe, decide enfrentar a morte, por assim
dizer, cara a cara. E enfrentá-la-á definitivamente,
face a face, na Cruz.
Durante este Jubileu, seria bom que, ao atravessar a Porta Santa, a Porta da Misericórdia, os
peregrinos se recordassem deste episódio do
Evangelho, ocorrido na porta de Naim. Quando
Jesus vê esta mãe em lágrimas, ela entrou no seu
coração! Cada um chega à Porta Santa trazendo a
própria vida, com as suas alegrias e sofrimentos,
os projetos e as falências, as dúvidas e os temores,
para a apresentar à misericórdia do Senhor. Estamos certos de que, junto da Porta Santa, o Senhor se faz próximo para encontrar cada um de
nós, para trazer e oferecer a sua poderosa palavra
consoladora: «Não chores!» (v. 13). Esta é a Porta
do encontro entre a dor da humanidade e a compaixão de Deus. Atravessando o limiar realizamos
a nossa peregrinação dentro da misericórdia de
Deus que, como ao jovem morto, repete a todos:
«Ordeno-te, levanta-te!» (v. 14). A cada um de
nós diz: «Levanta-te». Deus quer-nos em pé.
Criou-nos para estar em pé: por isso, a compaixão de Jesus leva àquele gesto da cura, a sararnos, do qual a palavra-chave é: «Levanta-te! Põete em pé, como Deus te criou!». Em pé. «Mas,
padre, caímos tantas vezes» — «Em frente, levanta-te!». Esta é a palavra de Jesus, sempre. Ao
atravessar a Porta Santa, procuremos ouvir no
nosso coração esta palavra: «Levanta-te!». A palavra poderosa de Jesus pode fazer com que nos levantemos e provocar também em nós a passagem
da morte para a vida. A sua palavra faz-nos reviver, doa esperança, encoraja os corações cansados,
abre para uma visão de mundo e de vida que vai
além do sofrimento e da morte. Na Porta Santa
está gravado para cada um o inesgotável tesouro
da misericórdia de Deus!
Ao ouvir a palavra de Jesus, «sentou-se o que
estivera morto e começou a falar, e Jesus entregou-o à sua mãe» (v. 15). Esta frase é muito bonita: indica a ternura de Jesus: «Entregou-o à sua
mãe». A mãe reencontra o filho. Recebendo-o das
mãos de Jesus ela torna-se mãe pela segunda vez,
mas o filho que agora lhe foi restituído não recebeu a vida dela. Mãe e filho recebem assim a respetiva identidade graças à palavra poderosa de
Jesus e ao seu gesto amoroso. Deste modo, espe-
Na audiência geral o Papa explicou qual é o caminho da misericórdia
Do coração às mãos
cialmente no Jubileu, a mãe Igreja recebe os seus
filhos reconhecendo neles a vida doada pela graça
de Deus. É em virtude desta graça, a graça do
Batismo, que a Igreja se torna mãe e que cada um
de nós se tornar seu filho.
Diante do jovem ressuscitado e restituído à
mãe, «apoderou-se de todos o temor, e glorificavam a Deus, dizendo: um grande profeta surgiu
entre nós: Deus dirigiu o olhar para o seu povo».
Por conseguinte, quanto Jesus fez não é uma ação
de salvação destinada à viúva e ao seu filho, nem
um gesto de bondade limitado àquela cidadezinha. No socorro misericordioso de Jesus, Deus
vai ao encontro do seu povo, n’Ele aparece e continuará a aparecer à humanidade toda a graça de
Deus. Celebrando este Jubileu, que desejei que
fosse vivido em todas as Igrejas particulares, isto
é em todas as Igrejas do mundo, e não só em Roma, é como se toda a Igreja espalhada pelo mundo se unisse no único canto de louvor ao Senhor.
Também hoje a Igreja reconhece que recebe a visita de Deus. Por isso, encaminhando-se rumo à
Porta da Misericórdia, cada um sabe que se encaminha para a porta do coração misericordioso de
Jesus: de facto é Ele a verdadeira Porta que leva à
salvação e nos restitui a uma vida nova. A misericórdia, quer em Jesus quer em nós, é um caminho
que começa do coração para chegar às mãos. O
que isto significa? Jesus olha para ti, cura-te com
a sua misericórdia, dizendo-te: «Levanta-te!» e o
Visita a Carsoli e Borgo San Pietro
Nos passos
de são Francisco
No dia 9 de agosto, o Papa Francisco visitou, de forma particular, o convento de São
Francisco em Carsoli, na província de Áquila, e depois o santuário de Santa Filipa Mareri no Borgo San Pietro, em Petrella Salto,
na região de Rieti (Itália). Neste itinerário
espiritual nos passos de são Francisco, o
Santo Padre foi recebido e acompanhado
pelo bispo de Rieti, D. Domenico Pompili.
A primeira etapa da sua peregrinação, na
parte da manhã, foi o convento de Carsoli,
que remonta à época de são Francisco, onde
o Papa se encontrou com as irmãs reparadoras da Sagrada Face de Nosso Senhor Jesus
Cristo e celebrou a santa missa. Sucessivamente, à tarde, o Pontífice deteve-se em oração no santuário do Borgo San Pietro, onde
repousa o corpo de santa Filipa Mareri,
fundadora daquele mosteiro, também graças
ao encorajamento direto recebido de são
Francisco. Ali o Santo Padre encontrou-se
com a comunidade de religiosas franciscanas, compartilhando com elas uma reflexão
sobre a beleza e a grande importância da
missão das mulheres consagradas na Igreja.
teu coração renova-se. O que significa realizar um
caminho a partir do coração até às mãos? Quer
dizer que com o coração novo, sarado por Jesus,
posso realizar as obras de misericórdia através das
mãos, procurando ajudar, curar muitos necessitados. A misericórdia é um caminho que tem início
no coração e chega às mãos, isto é, às obras de
misericórdia.
Disse que a misericórdia é um caminho que vai
do coração às mãos. No coração recebemos a misericórdia de Jesus que nos doa o perdão de tudo,
porque Deus perdoa tudo e levanta-nos, dá-nos a
vida nova e contagia-nos com a sua compaixão.
Do coração perdoado e com a compaixão de Jesus, começa o caminho rumo às mãos, isto é, para
as obras de misericórdia. Dizia-me um bispo outro dia que na sua catedral e noutras igrejas fez
portas de misericórdia de entrada e de saída. Perguntei o porquê e a resposta foi: «Porque uma
porta é para entrar, pedir perdão e obter a misericórdia de Jesus; a outra é a porta da misericórdia
em saída, para levar a misericórdia aos outros,
com as nossas obras de misericórdia». Como é inteligente este bispo! Também nós façamos o mesmo com o caminho que vai do coração às mãos:
entremos na igreja pela porta da misericórdia, a
fim de receber o perdão de Jesus, que nos diz
«Levanta-te! Vai, vai!»; e com este «vai!» — em
pé — saiamos pela porta de saída. É a Igreja em
saída: o caminho da misericórdia que vai do coração às mãos. Percorrei este caminho!
No final da catequese o Papa saudou os diversos
grupos linguísticos presentes, dirigindo aos lusófonos,
aos árabes e aos italianos as seguintes expressões.
Dirijo uma saudação cordial aos peregrinos de
língua portuguesa, em particular aos fiéis de Portugal e do Brasil. Queridos amigos, a experiência
da compaixão misericordiosa de Deus nos deve
impelir a levar os outros ao encontro com Jesus
que espera a cada homem e mulher nas Portas da
Misericórdia espalhadas por todas as Igrejas particulares do mundo. Que Deus vos abençoe!
Dirijo uma cordial saudação de boas-vindas aos
peregrinos de língua árabe, em particular aos que
provêm do Médio Oriente! Queridos irmãos e irmãs, a Porta Santa é a Porta do encontro entre a
dor da humanidade e a compaixão de Deus; ao
atravessar o limiar realizamos a nossa peregrinação dentro da misericórdia de Deus que a todos
repete: «Ordeno-te, levanta-te!». O Senhor vos
abençoe!
Por fim, dirijo uma saudação aos jovens, aos
doentes e aos recém-casados. Na segunda-feira
passada recordamos a figura de são Domingos de
Gusmão, cuja Ordem dos Pregadores celebra o
oitavo centenário de fundação. A palavra iluminada deste grande santo vos estimule, queridos jovens, a ouvir e a viver os ensinamentos de Jesus; a
sua fortaleza interior vos apoie, estimados doentes, nos momentos de dificuldade; e a sua dedicação apostólica, recorde, caros jovens casais, a importância da educação cristã na vossa família.