caleidoscópio policiário janeiro

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caleidoscópio policiário janeiro
 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO JANEIRO M. Constantino [email protected] CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO EM JEITO DE INTRODUÇÃO Para todos o que é de todos. Durante anos, como gota de azeite à tona de água, a ideia andava‐nos no pensamento. Publicar na Internet uma espécie de Almanaque Policiário, marcando cada dia do ano com acontecimentos produzidos nesse dia. Passou de Almanaque para Caleidoscópio Policiário, pois tal instrumento apresenta mil imagens, cores e formas, do mesmo modo como desejaríamos que no caleidoscópio coubessem efemérides literárias de autores e policiaristas, personagens reais e de literatura de ficção, convívio, tertúlias existentes e já extintas. Material acumulado ao longo de muitos anos não nos faltava, mas falta o essencial: a colaboração ‐ através do blogue ou de policiariodebolso de todos os policiaristas interessados em partilhar dados sobre actividades policiárias passadas, transformando um trabalho que inicialmente se previa individual num trabalho colectivo. Um trabalho de todos para todos! Amigos, confiamos em vós M. Constantino 2 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 1 DE JANEIRO ANO NOVO – VIDA NOVA Correr o risco de sonhar que, para além das ideias, das crenças e dos sentimentos díspares, há algo que vai unir‐nos, é em si um sonho… mas realizável. Há sempre um ponto mais alto a atingir. Saibamos ultrapassar os efeitos das correntes e das marés. ANO NOVO Estamos presentes! EFEMÉRIDES 1918 – Uma pequena editora de Londres publica em 3 volumes a 1ª edição do romance Frankenstein ‐ de autor anónimo. O nome da autora, Mary Sheelley, só surgirá na 2ª edição em 1923. 1952 – Publica‐se o primeiro número da revista policiária mensal O Gato Preto – Antologia de mistério e fantasia, organizada por Francisco A. Branco e Manuel do Carmo e colaboração de Victor Palla. Foram publicados seis números, uma promessa de árvore 3 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO de bons frutos que não perdurou. Ernest Tidyman (1928‐1984) – nasce em Cleveland (EUA). Escritor policiário publica em 1971 Shaft. Jonh Shaft é um detective negro, o personagem principal de uma série de sete livros que foram adaptados ao cinema e à televisão. Ernest Tidyman recebe vários prémios pela adaptação ao cinema da obra The French Connection ‐ Os Incorruptíveis Contra a Droga. O PRIMEIRO CRIME Apresentado como o filho de Adão e Eva, segundo a tradição ulterior, Caim matou por inveja o seu irmão Abel, apesar de advertido por Deus. O episódio da primeira geração humana mostra que o ódio e o crime remontam às origens e são fontes de pecado. Tem servido de tema a várias narrações literárias, conto e romance, já que respeita a motivação frequente do crime entre irmãos. Em Adão e Eva revela‐se, desde logo, o pecado de desobediência, capacidade impulsionadora de disposição de praticar crimes que no homem se assinala através do filho, o fratricida Caim. O primeiro crime da história hebraica repete‐se com insistência: Absalão matou Ámon, Salomão matou Adonias, sem esquecer os intermináveis anónimos. Mas, dos tempos sem história, da história ao presente, o crime é uma realidade, um contributo de vidas humanas brutalmente extintas sem justificação ao limite. Ontem como hoje, neste aspecto a Humanidade não evoluiu. O crime é uma constante. Em muitos milhares de anos o homem permanece igual a si próprio, imutável. Modificam‐se as condições de vida, beneficia‐se o bem‐estar, mas mantém‐se a permanente agressividade. Porquê? Pergunta sem resposta satisfatória. Existem teorias igualmente insatisfatórias. A explicação estará na explicação do próprio homem, sobretudo na compreensão da parte mais difícil do seu todo: a alma. Aí deve o homem debater e entrechocar as teorias e os conceitos da vida e da morte. Mas não é fácil. As razões que levam ao crime e à delinquência são inexplicáveis e de motivação quase infinita, o que constitui um mistério para o próprio homem. 4 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 2 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Anthony Armstrong (1897‐ 1976) – George Anthony Armstrong Willis, escritor anglo‐
canadiano, filho de pais ingleses, nasce em Esquimalt, British Columbia, Canadá. Escritor de textos humorísticos, é autor de uma série de 5 romances policiários, protagonizados pelo detective privado Jimmie Rezaire e parceiros: Viviane, a sua mulher, e Harry, um escroque simpático seu amigo; o primeiro livro da série The Trail of Fear (ou Jimmie Rezaire), é publicado em 1927; a acção decorre em Londres nos anos vinte. Várias histórias deste autor foram adaptadas ao cinema e à televisão, incluídas na série Alfred Hitchcock Apresenta. Anthony Armstrong é particularmente conhecido pelo Ten‐Minute Alibi (1933), uma peça de teatro adaptada ao cinema em 1950. Isaac Asimov (1920‐1992) – Nasce em Petrovichi na Rússia. Emigra para os EUA e naturaliza‐se em 1928. Doutorado em Bioquímica, serve nas Forças Armadas e posteriormente foi professor universitário até se dedicar em exclusivo à escrita. Escreveu centenas de artigos e livros sobre ciência e ficção científica da qual era um dos mais famosos especialistas. Ligou a ficção científica ao policiário. Em 1966 surge Asimov Mysteries, um livro notável de 14 contos curtos de crime e detecção. Mais tarde, em 1974, escreve uma série de contos sob o título genérico de 5 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO Tales of the Black Widowers, editados entre nós pela Editora Ulisseia com o título Os Crimes dos Viúvos Negros. Jean‐Bernard Pouy – Nasce em Paris em 1946. Editor e escritor de policial negro tem a sua estreia no policiário em 1984 com Nous Avons Brulé Une Sainte, que recebe no ano seguinte o Prix Polar & Co no festival de Bruxelas. Desde 2006 é editor de uma colecção de policial negro: Suite Noire da editora La Branche. O QUE É UM CRIME Na imagem popular, crime identifica‐se com homicídio. Todavia no âmbito jurídico, sem que se encontre uma definição textual (salvo doutrinal), o termo é mais amplo: abrange todos os delitos que atentem contra a integridade física e moral, contra a segurança e os direitos dos cidadãos, ou se afastem das condutas que legalmente são essenciais à garantia do seu bem‐estar. Sem noção específica, a lei penal (não há pena sem lei) anterior que a determine, não só induz o tipo legal de ilícito do facto humano, por acção ou omissão da acção adequada a evitá‐lo, sanções aplicáveis, bem assim os princípios gerais da sua aplicação no tempo e no espaço. Tais regras variam com o tempo, o espaço e as consciências: o conceito de crime diferencia‐se sempre em função do meio, da cultura, da integração do homem da sociedade em que vive. O que ontem não passou de tradição, hoje poderá ser crime, o que em dado espaço territorial independente é tido como crime, num outro espaço territorial será um facto banal do quotidiano. A variação de conceitos morais entre civilizações identificam‐se com os respectivos regimes penais, não há pois unanimidade. As disposições legais mais antigas reportam‐se ao código de Hamurabi, rei da Babilónia no séc. XVIII a.C., baseia‐se nas leis de talião (vida por vida, olho por olho, dente por dente), depois o direito romano… seguindo a marca imparável do progresso, mas nem sempre e de todo eficaz no combate ao crime. 6 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 3 DE JANEIRO EFEMÉRIDES 1934 – Data da fundação da associação americana dos amigos de Sherlock Holmes (S.H.), a The Baker Street Irregulars, uma organização fundada por Christopher Morley. É uma sociedade restrita em que os membros, com provas dadas sobre o conhecimento de S.H., são admitidos apenas por convite. Dedica‐se a estudos, conferências e à divulgação de S.H., também publicando livros e uma revista The Baker Street Journal. Anualmente reúne num jantar, excepcionalmente aberto a Sherlockianos de todo o mundo, que celebram o aniversário de S.H. É a sociedade literária mais antiga dedicada a Sherlock Holmes. Rufus King (1893‐1966) – Nasce em Nova Iorque o escritor americano criador do detective mais rico do mundo, Reginald De Puyster e de Lieutenant Valcour. Do primeiro romance Mystery de Luxe (1927) a The Faces of Danger (1964) publica 3 dezenas de narrativas, entre as quais Murder by Latitude (1931), um famoso caso de crime impossível em quarto fechado. Existem várias adaptações ao cinema de livros e de contos deste autor. Em Portugal, a Costa do Castelo Filmes disponibiliza em DVD O Segredo da Porta Fechada, filme realizado e produzido por Fritz Lang, em 1948, baseado na obra de Rufus King Secret Beyond the Door. 7 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO Em português, um verdadeiro manancial de contos apresenta uma diversidade de interessantes personagens: Stuff Driscold, um criminologista de um gabinete de xerife, Ben Coll, Elye, uma mexeriqueira e o famoso Dr. Collin. A notável versatilidade de King é evidenciada por este personagem que aparece apenas nos contos curtos. O jovem Collin Starr herda o consultório do pai numa pequena cidade imaginária, Laurel Falls – Ohio. A sua simpatia, aliada a sólidos conhecimentos médicos e a uma capacidade de raciocínio dedutivo aguçada, tornam‐no num médico bem sucedido e num notável detective/investigador a quem as mortes naturais não passam despercebidas. PORTUGAL E O CRIME Conhecido e divulgado como país de brandos costumes, vai‐se ultrapassando o fosso entre a imagem e a realidade… basta a leitura diária dos jornais, ainda que estes vivam de anormalidades. No 1º quarto do passado séc. XX, segundo os estudos (1931) de Mendes Correia, eram as pequenas disputas pessoais, os ressentimentos e a embriaguez que degeneravam em agressões e crime. Arraiais, romarias e feiras eram o palco preferencial para lavar as afrontas reais ou presumíveis. Todavia, ao lado dos crimes desta natureza, praticava‐se a delinquência fortuita num impulso de vingança, ciúme, avidez e mais raramente por causas políticas, pura malvadez ou instigação de outrem. Tradicionalmente eram caceteiros, jogadores de pau – crimes fruto da impulsividade portuguesa – que preocupavam (?) as autoridades. De qualquer modo, para aquele período, as estatísticas registam 180 homicídios – o mais censurável para a mentalidade nacional, porquanto representavam uma extinção de vida. Para igual período, que representa o remanescente da 1ª metade do século (1926‐
50), o registo é de 132 homicídios dentro da mesma realidade. Confirmado por Silva Maldonado, no 3º período (25 anos seguintes), por influência da distribuição de águas de rega, limites de propriedade, que se juntam às causas já referidas, o crime aumentou consideravelmente e os seus instrumentos também: enxada, foice, forquilha e outros utensílios agrícolas emparelham com o varapau. No último período do século a situação agravou‐se com a transformação dos valores tradicionais. O modo de exercer e representar a violência modificou‐se, a criminalidade deixa de ser um facto ocasional e impulsivo e passa a ser programado. Não deixa de ser pessoal, mas surgem os gangues de bairro e grupos organizados nacionais e estrangeiros. A arma de fogo marca presença, ameaça, fere e mata… vive‐se um clima de insegurança. Sem analisar de modo exclusivo este surto de violência, os factos parecem demonstrar que há um virtual desregramento na intervenção da segurança/justiça. 8 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 4 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Maria Archer (1899‐1982) – nasce em Lisboa Maria Emília Archer Eyrolles Baltasar Moreira. De 1910 a 1934 vive entre Portugal e Angola, Moçambique e Guiné o que viria a determinar o realce da temática colonial na sua produção literária. Em 1935 publica o primeiro livro Três Mulheres, em Luanda e regressa de seguida a Portugal, onde luta para se afirmar como escritora e jornalista. Em 1955 parte para o Brasil de onde só regressa em 1979. Maria Archer marcou a literatura feminina do séc. XX. Escreveu cerca de meia centena de obras, muitas com várias edições: romances, novelas, contos, peças de teatro e ensaios. Tem uma obra marcante na colaboração regular com diversos jornais e revistas relevantes à época – Diário de Lisboa, Eva, O Atlântico, O Mundo Português, Portugal Democrático, Seara Nova, O Estado de S. Paulo e Gazeta de São Paulo. Publica em 1947 um romance policiário de boa urdidura A Morte Veio de Madrugada, da qual são protagonistas Agente Félix e Crispim. 9 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO NARRATIVA POLICIÁRIA Elemento básico da narrativa policiária, o crime (em regra misterioso), a investigação policial, as pistas, as armadilhas, o interesse dramático e o jogo de raciocínio e mental são as condições que definem este tipo de literatura. Este é o modelo concebido pelo norte‐americano Edgar Allan Poe em1941 ao publicar Os Crimes da Rua da Morgue. Nele cria o primeiro investigador da era moderna, Auguste Dupin e mais tarde, em 1887, o inglês Arthur Conan Doyle apresenta o inigualável e inesquecível Sherlock Holmes. Talvez por ser uma formação anglo‐saxónica, a narrativa policiária (ou policial) foi sempre mais apreciada nos países de língua inglesa, quer na leitura, quer no numeroso grupo de autores. Ao longo dos anos atinge novas regras, sofre mutações até ao presente, ora dominado pelo thriller, misto de aventura criminal e de suspense. Em França, país desde sempre considerado de elite intelectual, o pioneiro é Émilie Gabaroriau, com O Caso Larouge (1866). A narrativa policiária em Portugal, como noutros países, não teve grande aceitação pelo menos nos anos iniciais. É pioneira a dupla Eça de Queirós – Ramalho Ortigão, com O Mistério da Estrada de Sintra (1870), primeiro publicado em folhetins no Diário de Notícias e depois em livro. Durante décadas foi considerada um género menor, popular, havia de vencer o estigma, sobreviver e impor‐se. Há presentemente um número substancial de autores, colecções e obras policiárias best‐sellers no mercado. 10 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 5 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Arthur Bernède (1871‐1937) – Nasce em Redon, Bretanha, França. Dramaturgo de sucesso publica o livro Cœur de Française, onde apresenta as modernas estruturas de espionagem apesar de escrito em 1912. Escreve duas centenas de livros: romances históricos, aventuras, policiais e de espionagem. No tema policiário cria o detective Chantecoq, ex‐agente da Sureté, que trabalha em colaboração com o filho. A. Bernède escreve também com os pseudónimos Roland d'Albret et Jean de la Perigne. Roy Peter Martin – Nasce em Londres em 1931. Exerce cargos políticos antes de se dedicar à literatura policiária. Usa dois pseudónimos: James Melville e Hampton Charles. Como James Melville inicia em 1979 a série superintendente Tetsuo Otani com The Wages of Zen. Passada no Japão a série Otani (13 livros) combina excelentes tramas de crime com uma visão fascinante sobre a vida japonesa contemporânea. Como Hampton Charles escreve 3 histórias da série Miss Seeton, uma personagem de ficção que surge em 1968 e desaparece em 1999. São 3 os autores que escrevem 22 títulos diferentes de um género policiário conhecido como cozies (abreviatura de cozy mystery) nos quais a acção decorre em pequenas comunidades e onde as situações dramáticas são encaradas com o humor. 11 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO Umberto Eco – Nasce em Alessandria, Piemonte, Itália. Professor de semiótica é ensaísta, filósofo, critico literário e escritor. Inicia a sua actividade como ficcionista em 1980 com o livro Il Nome della Rosa – O Nome da Rosa, um bestseller de contornos policiais, adaptado ao cinema em 1986 por Jean‐Jacques Annaud. O segundo romance, Il Pendolo Di Foucault – O Pêndulo de Foucault (1988), integra o esoterismo e a magia em temas actuais – futuro da informática e crime organizado. Arthur Lyons (1946‐1980) – Nasce na Califórnia (EUA). A sua estreia no romance policiário é em 1974 com The Dead Are Discreet, início de uma série protagonizada por Jacob Asch, de descendência judia, repórter do L. A. Chronicle, que depois ser preso por se recusar a revelar uma fonte, abandona o jornalismo para se tornar detective privado em Los Angeles. Jacob Asch é personagem principal de perto de duas dezenas de romances e contos curtos e desaparece prematuramente em The Tongan Nude, um conto curto de 1997. Uma das obras de Arthur Lyons, Castles Burning (1979), é argumento de um telefilme Slow Burn (1986, MCA‐TV). Em Portugal A Universal edita um DVD Slow Burn – Mais Ardente Que o Desejo. VOLTAR AO PASSADO NO POLICIÁRIO – 1 O Nome da Rosa de Umberto Eco é um dos muitos romances policiários que apostam no cenário do passado. Na verdade, a Antiguidade Clássica, a Idade Média, a mais recente Época Vitoriana, têm sido palco de acção dos detectives de todos os tempos. Steven Saylor, criador de Gordiano – o Descobridor, com a série Roma Sub‐rosa, que se inicia com Sangue Romano, (Roman Blood – 1991) e em doze livros (dois dos quais contos) nos arrasta até ao final do Império Romano. Linsey Davis leva‐nos a Roma dos anos 70 a.C., apresenta‐nos Marcus Didius Falco, o 12 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO homem de mão do Vespasiano. Paul Doherty escreve A Máscara de Ré (The Mask of Ra – 1998), Mortes no Templo de Horus (The Horus Killings – 1999), O Roubo do Colar de Anúbis (The Anubis Slayings – 2000), Os Assassinos de Set (The Slayers of Set – 2001), livros de crime e mistério no Antigo Egipto já publicados em Portugal. Nesta série foram ainda lançados pelo autor os seguintes livros: The Assassins of Ísis (2004), The Poisoner of Path (2007) e The Spies of Sobek (2008). Margaret Doody coloca Aristóteles como investigador policiário, ou equivalente, em Aristóteles Detective (Aristotles Detective – 1978), O Enigma de Aristóteles (Aristotle and the Fatal Javelin – 1980), A Justiça de Aristóteles (Aristotle and the Poetic Justice – 2000) e Aristóteles e os Segredos da Vida (Aristotle and the Secrets of Life – 2002), publicados em Portugal. Margaret Doody escreveu ainda Aristotle and the Ring of Bronze (2003), Poison in Athens (2004), Mysteries of Eleusis (2005) e Aristotle and the Egyptian Murders (2010). Jose Carlos Somoza, premiado com o Gold Dagger Award – 2002 com A Caverna das Ideias (La Caverna de las Ideas – 2000), que decorre na Grécia Clássica, onde o decifrador de enigmas é o detective Heracles Póntor. Elizabeth Peters com a série Amelia Peabody, uma egiptóloga, também faz uma viagem ao passado. A série reúne duas dezenas de livro e em Portugal estão publicados: Um Crocodilo na Duna (Crocodile on the Sandbank – 1975), A Maldição dos Faraós (The Curse of the Pharaohs – 1981), O Caso da Múmia (The Mummy Case – 1985), Um Leão no Vale (Lion in the Valley – 1986), Um Crime do Museu Britânico Deeds of the Disturber – 1988), O Último Camelo Caiu ao Meio‐Dia (The Last Camel Died at Noon – 1991) e A Cobra, o Crocodilo e o Cão (The Snake, the Crocodile, and the Dog – 1992). Brad Gexagley situa O Ano das Hienas (Year of the Hyenas – 2005) no cenário do Egipto e Ramsés III onde actua Semerket, um escriba do Departamento de Investigação e Segredos, que é também um detective beberão e de péssima reputação, mas que não se deixa enganar com facilidade. Com acção na Idade Média O Nome da Rosa desenvolve uma intriga de ambiente medieval, protagonizado pelo frade franciscano William de Baskerville, senhor de um saber enciclopédico, e pelo jovem discípulo Adso de Melk. A grande biblioteca de uma abadia italiana é o centro do enredo labiríntico onde há homicídio, pistas, suspense e revelações de William. Também com acção no início do séc. XII a série do Irmão Cadfael, monge‐botânico‐
detective do Mosteiro de Shrewsbury situado a oeste da Inglaterra junto ao País de Gales desvenda intrigantes mistérios. A autora, Ellis Peters tem sido galardoada com vários prémios. Entre nós, as Publicações Europa‐América editaram 21 títulos desta série. De Michael Jecks, reportado a Devon e ao séc. XIV, saiu O Último Templário (The Last Templar – 1995), cujo personagem principal é Sir Baldwin, almoxarife do Castelo Lydford. 13 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO Em Lápides Mortais (Death Comes as Epiphany – 1993), de Sharan Newman, a detective é uma jovem noviça Catherine Levendeur do Convento do Páriclo. Este livro recebeu o Macavity Awads – Best Frist Mystery de 1994. A autora escreveu já uma dezena de livros para esta série que se passa em França no séc. XII. Em Portugal foi também editado A Porta do Demónio (Devil’s Door – 1994), ambos pela Bertrand Editora. 14 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 6 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Victor Werner – Nasce em Bruxelas em 1913. Director do Centro de Polemologia em Bruxelas serve na Sureté em França durante a 2ª Grande Guerra. Escreve obras de Direito Público, estudos de Polemologia e livros policiais e de espionagem com o pseudónimo de Henry Favel: Trop Tard Pour Pleurer (1975) e Les Assassins Sont Morts (1982). Com o pseudónimo de John Bartok colabora com Jean Gabriel (ps. Gabriel Verniers) em Mort Provisoire (1959) e L’Inconnu de Festival (1961). Paul Kruger (1917‐1979) – Nasce no estado de Wisconsin (EUA). É o pseudónimo de Roberta Elizabeth Sebenthal, criadora dos detectives privados Phil Kramer e Vince Latimer. Bullet for a Blond (1958), Weep for Willow Green (1966), Weave a Wicked Web (1967), If The Shroud Fits (1968), The Bronze Claws (1972) e The Cold Ones (1972). Noel Behn (1928‐1998) – Nasce em Chicago (EUA). Produz romances policiais e de espionagem. O primeiro, The Kremlin Letter (1966), é adaptado ao cinema num filme dirigido por Jonh Huston. Segue‐se The Shadowboxer (1969), The Brink’s Job (1976), Big Stick‐Up at Brink’s (1978), Seven Silent Men (1984) e Lindbergh the Crime (1994). Entre 1993 e 1997 escreve sete episódios para a série televisiva Homicide: Life on the Street 15 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO (NBC). Francis M. Nevins – Nasce em 1945 em Bayonne, New Jersey (EUA). Escreve vários ensaios sobre a ligação entre a ficção e a lei. Publica mais de meia centena de contos para revistas de especialidade policiária. Ganha dois Edgar Awards MWA (Mystery Writers of America) pela tese académica sobre Cornell Woolrich e Ellery Queen. Lançou ainda os seguintes livros: Publish and Perish (1975), Corrupt and Ensnare (1978), The 120 Hour Clock (1986), The Ninety Million Dollar Mouse (1987), Into the Same River Twice (1996), Beneficiaries' Requiem (2000), Leap Day and Other Stories (2003) e Into the Same River Twice (2000). Muitos dos contos curtos de Nevins estão reunidos em Night Forms (2010). 16 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 7 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Ritchie Perry (John Allen) – Nasce em 1942 em King’s Lnn, Norfork, Inglaterra. Escreve obras de temas diversos incluindo policiárias. Inicia em 1972, com o livro The Fall Guy, a série Super Secret Agent que se prolonga até 1985 com Kolwesi, o 14º volume. Para a série Frank MacAllister publica 2 livros: Mac Allister (1984) e Presume Dead (1987). Hayford Peirce – Nasce em 1942 na localidade de Bongor, Maine (EUA). É um contista policial, um dos melhores neste género. Entre 1964 e 1987 vive no Taiti, local onde situa os protagonistas da sua obra policiária: Joe Caneili é um detective privado, único elemento da agência de investigação Caneili na cidade de Papeete; outro personagem criado por Peirce é Tama, Comissário da Polícia da ilha. Na série Trouble in Tahiti publica Blood on the Hibiscus (2000), P.I. Joe Caneili, Discrétion Assurée (2000), Commissaire Tama, Chief of Police (2000), The Gauguin Murders (2001) e The Bel Air Blitz (2002). Joe Caneili marca presença nos seguintes contos curtos: The Stolen Grandfather (1985), Fire in the Islands (1995), The Missing House (July 1995), A Matter of Face (1998), The Girl in the Picture (1999). Publica vários 17 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO contos no Alfred Hitchcock's Mystery Magazine e no Ellery Queen's Mystery Magazine. VOLTAR AO PASSADO NO POLICIÁRIO – 2 Sobre a Época Vitoriana, há uma série imensa de pastiches de Sherlock Holmes, para além de muitos outros autores contemporâneos. Elizabeth Peters, já referida na 1ª parte de Voltar ao Passado. A série Amelia Peabody desenrola‐se num período entre 1984 e 1923 e, como a protagonista é arqueóloga, a autora explora na sua obra cenários do Antigo Egipto e da Época Vitoriana. Esta escritora utiliza 2 pseudónimos Barbara Michaels e Barbara Mertz. Anne Perry é também uma escritora policiária muito conhecida por retratar esta época. Cria três séries: Charlotte e Thomas Pitt, William Monk e The Christmas Stories; a primeira com 26 títulos publicados, a segunda com 17 e a terceira com 9. Está anunciada a edição para o corrente ano de pelo menos 3 obras destas séries. Muitos outros escritores escolheram esta época como palco, quer construindo personagens cuja acção se desenrola em vários livros, quer produzindo uma única obra policiária victoriana. Emily Brightwell: série The Inspector and Mrs. Jeffries (29 títulos/próximo Mai.2012). Ray Harrison: mistérios de The Sergeant Bragg and Constable Morton (16 títulos). Alanna Knight: série The Inspector Faro Mysteries (16 títulos/próximo Mar. 2012). Amy Myers: séries August Didier (11 títulos) e Tom Wasp (2 títulos). Robin Paige: série Sir Charles Sheridan protagonizada por Kathryn Ardleigh (12 títulos). Peter Lovesey: séries The Sergeant Cribb (8 títulos) e The Prince of Wales (3 títulos). Carole Nelson Douglas: The Irene Adler Adventures (8 títulos). William J. Palmer: série Mr Dickens (4 títulos). Jean Stubbs: série John Joseph (3 títulos). John Dickson Carr: The Hungry Goblin (1972). Evelyn Hervey: A Remarkable Case of Burglary (1975) e Man of Gold (1985). Anna Clarke: The Lady in Black (1977). Mark Frost: The List of Seven (1993) e The Six Messiahs (1995). Bernard Bastable: To Die Like a Gentleman (1993) e Mansion and its Murder (1998). A Editora Livros do Brasil, na colecção Vampiro e a Editorial Caminho na Caminho Policial têm publicado alguns títulos de Peter Lovesey: A Figura de Cera; nº 567 Vampiro – 1994 (Waxwork, Sergeant Cribb Series; 1978). Abracadáver; nº 576 Vampiro – 1995 (Abracadaver, Sergeant Cribb Series; 1972). Um Crime Passional; nº 587 Vampiro – 1994 (Bertie and the Crime of Passion, The 18 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO Prince of Wales Series; 1993). O Suicídio do Jóquei; nº 616 Vampiro – 1998. Um Caso de Espíritos; nº 58 Caminho Policial – 1994 (A Case of Spirits, Sergeant Cribb Series; 1972). Bertie e os Sete Corpos; nº 128 Caminho Policial – 1994 (Bertie and Seven Bodies, The Prince of Wales Series; 1990). Alguns livros de Anne Perry foram editados pela Gótica na colecção Nocturnos. Estão disponíveis os seguintes títulos da série Thomas Pitt: O Mistério de Callander Square, O Crime de Paragon Walk, Um Morto a Mais em Resurrection Row, Os Segredos de Rutland Place, O Cadáver de Bluegate Fields. Da série William Monk: O Rosto de um Estranho, Luto Perigoso, Defesa e Traição, Uma Morte Súbita e Terrível, Os Pecados do Lobo e Caim seu Irmão. 19 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 8 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Wilkie Collins (1824‐1889) – Nasce em Londres aquele que é considerado o autor do primeiro romance detectivesco inglês com The Moonstone (1868), depois de escrever o popular The Woman in White (1860), que sendo de um trama complicado, é de carácter sentimental. The Moonstone, publicado inicialmente em folhetim, constitui uma genuína e bem estruturada narrativa policiária que conserva, ainda hoje, uma frescura de modernidade digna de especial referência. O recurso narrativo através de cartas e de declarações de diversos personagens proporciona um estilo mais vivo e directo que acaba por captar a atenção. Robert Ashley, na biografia sobre Wilkie Collins, defende que o escritor pode também ser considerado como da primeira vez que intervém um oficial de polícia em A Terribly Strange Bed (1852), a primeira história de detectives com A Stolen Letter (1854), a primeira história de uma mulher detective em The Diary of Anne Rodway (1856), a primeira história detectivesca de humor com The Bitter Bit (1858) e o primeiro cão detective com My Lady’s Money (1877). W. Collins, no campo da ficção policiária/detectives escreve ainda The Dead Secret (1857) e The Evil Genius (1886). O detective criado por Collins, o Sargento Cuff da Scotland Yard, é um homem alto, delgado de rosto afilado; pele amarelada e seca, olhos azul‐claros de aço, dedos compridos como garras; vestido de negro e gravata branca, um modo de andar suave e voz melancólica. Podia passar por padre ou por empresário funerário… também podia passar por qualquer espécie de pessoa. A aparência cinzenta de polícia oficial, que no séc. XIX era sinónimo de inaptidão, esconde um cérebro privilegiado capaz de transformar em êxito o trabalho iminentemente intelectual da sua profissão: a descoberta de delinquentes. Assim no caso que enfrenta, sem grandes aparatos e sem esforço aparente, logra ultrapassar com sucesso o enigma da pedra da lua. Em Portugal, a reimpressão mais recente de Pedra da Lua (2009) é da Colecção Crimes Imperfeitos da Editora Relógio D’Água. 20 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO Denis Heatley (1897‐1977) – Nasce em Londres. Editor e escritor, escreve mais de seis dezenas de livros, publicados ao longo de quase 40 anos: policiários de detecção, aventuras, oculto, espionagem e fantasia. Criou Duke de Richleau, que iniciou a série com The Forbidden Territory (1933), mais tarde adaptado ao cinema. Outros personagens: Gregory Sallust, surge em Black August (1934), Julian Day em The Quest of Julian Day (1939), Roger Brook em The Launching of Roger Brook (1947) e ainda Molly Fountain com To the Devil – a Daughter (1953), adaptado ao cinema em 1976. O DETECTIVE: FICÇÃO E REALIDADE Pesquisas minuciosas e longas levam à conclusão que o aparecimento da palavra detective, com o significado actual, se deve a Charles Dickens, data de 1852 e surge no romance Beak House. Sou o Bucket dos detectives. Sou um agente detective, assim se anuncia o personagem. Porém, seria necessário o decurso de mais de cinquenta anos para que os londrinos aceitassem e começassem a confiar nos detectives à paisana. Eram encarados com a maior suspeita pela maioria dos ingleses. Os célebres bobbies, os agentes fardados da Scotland Yard, outrora suspeitos de se colocarem acima da lei e de serem inimigos naturais do homem comum passaram a ganhar dos londrinos. Mas os detectives sem farda, confundidos com o povo da rua, eram alvo de suspeitas e preconceitos, possivelmente razoáveis, por parte de todos, desde pedintes a banqueiros. Dickens faz do Inspector Bucket um personagem simpático, porque conhecia os verdadeiros detectives da Yard, homens dedicados e decentes, tentando fazer o melhor para tornar a investigação criminal uma ciência. No entanto na mente dos concidadãos de Dickens todos os detectives eram enquadrados em duas categorias: corruptos e incompetentes, ou espiões e agentes da opressão política. Não é de admirar que Conan Doyle em 1880, através de Sherlock Holmes, retrate os detectives da Yard como amáveis, 21 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO mas broncos. Após o fracasso do caso de Jack o Estripador iniciou‐se um período de real esforço para dotar a Yard, à semelhança da Sureté francesa, de condições que levassem a investigação judicial a resultados firmes. O Departamento de Investigação Criminal (CID) da Scotland Yard levou o seu tempo a criar e o seu desenvolvimento tem sido contínuo e bem sucedido. As novas ciências forenses de localização e de identificação de criminosos, mau grado o aspecto negativo de muitos anos de opinião pública adversa e de desconfiança dos júris britânicos, acabam por compreender e aceitar as descobertas científicas como elemento de prova. O CID é presentemente uma das principais divisões da Polícia Inglesa. 22 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 9 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Gil Brewer (1921‐1983) – Gil(bert John) Brewer morre em 1983. Este escritor nova‐
iorquino começa por escrever contos com vários pseudónimos (Eric Fitzgerald, Bailey Morgan, Elaine Evans, Al Conroy), publica o primeiro romance em 1951: 13 French Street. Segue‐se Flight to Darkness (1952) e em 1953 Hell's Our Destination que foi adaptado ao cinema. No total, Brewer escreve cerca de 30 livros até 1967. As suas obras incluem habitualmente um homem comum que se deixa corromper e destruir por se envolver com uma mulher diabólica. Nos seus romances concede especial importância ao papel da mulher no aspecto do sexo e da fatalidade, com um estilo simples e directo, diálogos intensos. SHORT STORY – CRIME DE MORTE A voz da mulher ao telefone era trémula: – Ela… matou‐o. – Como? 23 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO – Cortou‐lhe a cabeça. Que pavor! – Não!... – Sim. Esta manhã. Por instantes as linhas emudeceram. Houve um momento de forte tensão. – Não posso conceber… – É horroroso! – E finalmente apanhámo‐la! – Oh! É terrível! Assististe? – Claro… Claro que vi… Uma interferência exasperante a voz do homem. – Telefonista, telefonista! Não corte a ligação. Está? Está lá? – Vou chamar imediatamente a Polícia – Custa‐me a acreditar. Tens a certeza que viste? – Absoluta. Foi horrível. – Não te metas mais nisso. Eu aviso a Polícia. Desligaram. – Está lá? É da Judiciária? – Sim. – Tenho uma participação a fazer… – Diga. – Pretendo que detenham imediatamente a criada de uma vizinha. A minha mulher testemunhou tudo. É odioso! Assaltou‐me a capoeira e matou o meu melhor galo da índia! 24 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 10 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Frances Lockridge (1896‐1963) – Nasce em Kansas City, Missouri (EUA). Forma com o marido (Richard Orson Lockridge) uma dupla de escritores dos mais produtivos da história da literatura policiária. Em conjunto criam quatro séries de diferentes personagens que por vezes se cruzam. Frances Lockridge colabora em duas das séries: Mr. and Mrs. North, uma famosa dupla de detectives amadores, que se inicia com The Norths Meet Murder em 1940 e termina com Murder by the Book (1963), num total de 26 obras publicadas com várias adaptações à rádio, à televisão, ao teatro e ao cinema; a outra série, Inspector Merton Heimrich, começa com Think of Death (1947) e nesta série Frances Lockridge colabora em 16 de um total de 24 livros. Ainda em parceria com Richard Lockridge são publicados The Faceless Adversary (1956), The Tangled Cord (1957), Catch As Catch Can (1958), The Innocent House (1959), Murder and Blueberry Pie (1959), The Golden Man (1960), The Drill Is Death (1961), And Left for Dead (1961), Night of Shadows (1962), The Ticking Clock (1962), The Devious Ones (1964), Quest for the Bogeyman (1964) e The Quest off the Bogeyman (1965). James Norman (1912‐1983) – James Norman Schmidt nasce em Chicago, Illinois; especialista em história do México trabalha como jornalista do Chicago Tribune. Estreia‐
25 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO se na escrita policiária em 1942 com a publicação de contos. Com Murder Chop Chop (1943) inicia uma série de romances protagonizados por Gimiendo Hernandez Quinto, um mexicano que relembra a passagem do autor pelo México no qual obteve La Pluma de Plata, segue‐se An inch of time (1944) e The Nightwalkers (1947). Guy Cullingford (1907‐2000) – Pseudónimo de Constance Lindsay Taylor. Nasce em Dovercourt, Essex – Inglaterra. Inicia a actividade de escritora policial em 1948 com Murder With Relish, sob o nome próprio, optando pelo pseudónimo nos livros seguintes: If Wishes Were Hearses (1952), Post Mortem (1953), Conjurer's Coffin (1954), Framed for Hanging (1958), A Touch of Drama (1962), Brink of Disaster (1964), The Stylist (1968), The Bread and Butter Miss (1979) e Bother at the Barbican (1991). Tem uma série de contos publicados em revista da especialidade, no Alfred Hitchcock's Mystery Magazine e no Ellery Queen's Mystery Magazine. 26 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 11 DE JANEIRO EFEMÉRIDES R.A.J. Waling (1869‐1949) – Nasce em Devon, Inglaterra. É jornalista e começa a carreira de escritor em 1908 com várias biografias; vinte anos mais tarde publica o primeiro romance policiário, That Dinner at Bardolph's (1928), prelúdio de uma carreira que atinge 28 livros, abordando todos os géneros policiários. Nos romances de enigma classico figura o detective privado Philip Tolefree e o seu parceiro James Farrar que surgem pela primeira vez em The Fatal Five Minutes (1932). Manfred Bennington Lee (1905‐1971) – Nasce em Brooklyn, New York. Forma com o primo Frederic Dannay uma dupla sob o pseudónimo Ellery Queen. Em 1928 concorrem e ganham o concurso organizado pela revista Mc Curie Magazine com o romance The Roman Hat Mystery (1929). Em 1933 fundam e dirigem a Mystery League que cessou no quarto número. Porém, em 1941 já famosos face ao seu historial literário lançam Ellery Queen's Mystery Magazine com êxito absoluto e expansão mundial. Deve ser actualmente a mais antiga colecção de contos de várias tendências e géneros policiais, jamais publicada. Esta revista, para além dos romances publicados, é uma manifestação do interesse dos 27 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO autores pelo género policiário, as várias antologias são hoje quase impossíveis de encontrar. A partir de 1935 expandem‐se, mantêm um programa de rádio, passando mais tarde a Hollywood com uma série de filmes. O protagonista, na quase totalidade dos seus escritos é Ellery Queen. Ellery é alto, tem ombros largos e cintura estreita e flexível. Veste fato completo, elegante, habitualmente cinzento‐escuro. Usa lunetas, as lentes sobre o nariz, nota imprevisível na silhueta atlética, mas visto de frente, os olhos revelam ser um homem de acção. Reside com o pai, o Inspector da Polícia Richard Queen num apartamento da rua 87, no West Side de Manhattan. Ellery é escritor mas, sobretudo, é um incorrigível detective privado que quase nunca recebe remuneração pelos serviços prestados. Desenvolve a própria inteligência e o seu poder dedutivo quase sempre auxiliado pelo pai que recolhe os indícios. Ellery raciocina e encaixa as peças até chegar à solução final. Em princípio as histórias correspondem a uma linha de enigma, a perfeição de jogo é tal que se atreve frequentemente a fazer um desafio ao leitor convidando‐o a identificar o assassino, uma vez que foram lançados todos os elementos de informação para o efeito. Ellery Queen, personagem de ficção, surge em 70 contos curtos e em 30 novelas com destaque para The French Powder Mystery (1930), The Dutch Shoe Mystery (1931), The Greek Coffin Mystery (1932), The Chinese Orange Mystery (1934) e, em especial, os que se desenrolam na imaginária cidade de Wrightville que aparece pela primeira vez em 1942 em Calamity Town, a predilecta de Ellery. Os autores usando o pseudónimo de Barnaby Ross escrevem quatro romances: The Tragedy of X (1932), The Tragedy of Y (1932), The Tragedy of Z (1933) e Drury Lane's Last Case (1933). Nesta série o protagonista é Drury Lane, um actor shakespeariano, retirado no seu castelo isabelino construído sobre o Hudson, e que funciona como detective auxiliar do Inspector Trumm. Os livros de Ellery Queen venderam mais de 150 milhões de cópias em todo o mundo. 28 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 12 DE JANEIRO EFEMÉRIDES 1947 – Sete de Espadas, então já conhecido como produtor e decifrador policiarista, estreia‐se como orientador no Jornal de Sintra, com a secção denominada Mistério e Aventura. O texto de apresentação de Sete de Espadas e primeiro problema da secção são hoje publicados, aqui no Caleidoscópio Policiário. Arthur Wise (1923‐1982) – Nasce em York, Inglaterra. Publica o primeiro romance policiário The Little Fishes em 1961; seguem‐se The Death's‐Head (1962), Leatherjacket (1970), Who Killed Enoch Powell? (1970), The Naughty Girls (1972) e Blood‐Red Rose (1981). Trevanian (1925/1931?‐2005) – É o pseudónimo utilizado por Rodney Whitaker. Existe alguma controvérsia quanto à data de nascimento deste escritor. Segundo o famoso Who's Who, Trevanian nasce em Tóquio a 12 de Janeiro de 1925, de acordo com outras fontes o escritor nasce a 12 de Junho de 1931 em Granville, New York. Nas entrevistas Trevanian nunca esclareceu este ponto. Utilizou ainda os pseudónimos Nicholas Seare, Beñat Le Cagot and Edoard Moran. Escreve romances policiais, na sua maioria thillers, que são bestsellers, traduzidos pelo menos em 14 línguas e vendem mais 29 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO de 5 milhões de cópias. Cria o personagem Jonathan Hemlock, que protagoniza The Eiger Sanction (1972) e The Loo Sanction (1973). Escreve ainda The Main (1976), Shibumi (1979), The Summer of Katya (1983), Incident at Twenty‐Mile (1998) e The Crazyladies of Pearl Street (2005). Entre nós foram editados pelo Círculo de Leitores em 1983: A Missão Eiger e O Jogo da Morte, ambos da série Jonathan Hemlock. JORNAL DE SINTRA – MISTÉRIO E AVENTURA MISTÉRIO E AVENTURA – Secção Policial Orientada pelo SETE DE ESPADAS Leitores e caros colegas: O nosso meio é pequeno e refractário a empreendimentos desta natureza. Estou certo que não faltará quem se erga da sua cátedra para nos atirar com a já tão conhecida e velha frase: Literatura de cordel… Estes catedráticos esquecem‐se, todavia, que a literatura de emoção e resolução de problemas policiais são dois dos grandes recreios do espírito. Estadistas de todo o Mundo, afadigados pelo vertiginoso atropelo dos acontecimentos internacionais, buscam um pouco de tranquilidade no exercício cerebral que lhes oferece a leitura dos grandes romances policiais e a resolução dos grandes problemas. Médicos, advogados, engenheiros, senhoras da melhor sociedade, estudantes, cientistas e muitas outras personagens de categoria social, não se envergonham de confessar a sua simpatia e o seu entusiasmo pela boa literatura de mistério e aventura. Quando fui até ao nosso director para lhe levar a ideia desta secção, confesso que fui a medo, mas encontrei nele um Amigo, que desde logo aceitou e acarinhou esta resolução, dizendo‐nos: – De vez enquanto, sair fora do sistema rotineiro, também sabe bem… O facto de nos apresentarem como orientadores desta secção não significa um maior merecimento, simplesmente – era preciso alguém a fazê‐lo!... Confiamos, pois, na benevolência dos nossos leitores e na amizade dos meus camaradas. Tentaremos agradar e cá os esperamos neste cantinho – que é de todos. Sete de Espadas 30 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO PROBLEMA 1 ‐ CRIME OU SUICÍDIO? O Inspector Charles Hardy foi chamado com urgência a casa do escritor Luiz King, porque este tinha sido encontrado morto no seu escritório. Introduzido no palácio e depois no gabinete de trabalho do escritor, Charles Hardy verificou que o corpo se encontrava caído sobre a secretária, o braço esquerdo em cima do tampo e o direito caído ao longo da cadeira. No chão, uma pistola sem impressões digitais e em cujo carregador faltavam algumas balas. Um orifício perto da orelha e ligeiramente chamuscado mostrava que a morte tinha sido causada por uma bala disparada a pouca distância. Depois de em silêncio ter analisado todos estes pormenores, pediu ao criado que fizesse as suas declarações. Este disse: Como o fazia todas as noites, cerca das 10 horas dirigiu se para a porta do escritório e bateu 3 pancadas, avisando desta maneira que o jantar estava na mesa. O tempo passou e como não era hábito do escritor fazer‐se esperar mais do que um quarto de hora, cerca das 10 e meia voltou, batendo e chamando em voz alta. Como não obtivesse resposta, espreitou pela fechadura e viu o escritor na posição em que ainda está. Como não tinha chave, visto que a única Yale que existia estava sempre em poder do escritor, chamou o cozinheiro preto, Jacob, que o ajudou a forçar a porta, verificando depois nada haver a fazer, porquanto do orifício junto à orelha do escritor saía um fio de sangue… Mesmo do escritório telefonou para a polícia e nem ele nem Jacob saíram de lá. Tudo isto poderá ser confirmado por… – Muito obrigado, já sei como as coisas se passaram! – Caros colegas, como resolveu Charles Hardy mais este problema? CHAMADA PARTICULAR MISS DETECTIVE – Sintra REPÓRTER SELECT – Amadora JOSÉ CARLOS SOARES – Sintra J. A. OLIVEIRA – Galamares REPÓRTER ENIGMÁTICO – Amadora ANTÓNIO GODEFROY – Queluz MIGUEL PESSANHA – Sintra REPÓRTER X – Amadora NICK CÁRTER – Sintra INSPECTOR FEIO – Amadora CAMELIANO – Sintra INSPECTOR KING – Amadora 31 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO O FEITICEIRO – Sintra SATANAZ – Amadora MARIA HELENA D. FERREIRA – Meleças SALOIO – Caneças Como dissemos, este cantinho é de todos vós. Até breve. Sete de Espadas 32 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 13 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Ted Willis (1918‐1992) – Nasce Edward Henry Willis em Tottenham, Middlesex, Inglaterra. Escritor/argumentista de teatro, televisão e cinema inicia‐se no policiário em 1950 com The Blue Lamponde é protagonista George Dixon; segue‐se a série para televisão Dixon of Dock Green, que entre 1955 e 1976 apresenta duas centenas de episódios. Cria e escreve várias séries, também para televisão, como Flower of Evil (1961), Outbreak of Murder (1962) ou Sergeant Cork (1963‐1968). Amanda Cross (1926‐2003) – Nasce Carolyn Gold Heilbrun em East Orange, New Jersey‐EUA, professora de literatura e escritora femininista, que se inicia no romance policiário em 1964 com o pseudónimo Amanda Cross. Escreve 14 livros em que a protagonista é Kate Fansler, também uma professora de literatura inglesa que resolve mistérios habitualmente passados num ambiente académico. Escreve: In the Last Analysis (1964), The James Joyce Murder (1967), Poetic Justice (1970), The Theban Mysteries (1971), The Question of Max (1976), Death in a Tenured Position (1981), Sweet Death, Kind Death (1983), No Word From Winifred (1986), The Players Come Again (1990), An Imperfect Spy (1995), A Trap for Fool (1989), The Puzzled Heart (1997), Honest Doubt (2000) e The Edge of Doom (2002). 33 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO Em Portugal foram editados os seguintes livros: O Manuscrito de James Joyce (2001), Editora Pergaminho, Colecção As Damas do Crime. Título Original: The James Joyce Murder (1967); Uma Espia Imperfeita (2003), Editora Pergaminho, Colecção As Damas do Crime. Título Original: An Imperfect Spy (1995). Ron Goulart – Ronald Joseph Berkeley nasce em 1933, em Berkeley, Califórnia‐EUA. Escritor com uma vasta obra, em particular no campo da ficção científica e mistério, utiliza nove pseudónimos diferentes, sendo os mais conhecidos Kenneth Robeson, Frank S. Shawn, Joseph Silva, Con Steffanson. Escreve duas dezenas de livros de mistério, com destaque para as séries John Easy e Groucho Marx. John Easy é um convencional detective privado de Hollywood que protagoniza alguns contos e 4 livros: If Dying Was All (1971), Too Sweet to Die (1972), The Same Lie Twice (1973) e One Grave Too Many (1974). Na série Groucho Marx, Goulart entrega o papel de detective a um herói da comédia; uma narrativa recheada de clichés e de referências a escritores clássicos da literatura policiária: Groucho Marx, Master Detective (1998), Groucho Marx, Private Eye (1999), Elementary, My Dear Groucho (1999), Groucho Marx and the Broadway Murders (2001), Groucho Marx, Secret Agent (2002) e Groucho Marx, King of the Jungle (2005). O LOCAL IMAGINÁRIO DOS ESCRITORES Todos os escritores têm uma tendência para criar um cenário para os seus romances e contos. Deliberadamente e por razões várias. Nuns casos para dar ênfase à narrativa, caso de Dashiell Hammett, com a cidade de São Francisco. Igualmente Raymond Chandler, Raoul Whitfiel, William Campbell Gault, Arthur Lyons e muitos outros em relação a Los Angeles. Outros pelo ambiente, como Conan Doyle, que quase sempre leva a actuação de 34 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO Sherlock Holmes à sombria e vitoriana Londres, frequentemente envolvida em nevoeiro e chuva e tendo ao fundo o som das patas dos cavalos dos coches nas calçadas escorregadias; Faulkner escolheu um local imaginário Yoknapatawpha County no Estado do Mississipi; Arkham no Estado de Massachusetts ou R'lyeh são cidades na ficção de H. P. Lovecraft; Jack Vance imaginou San Rodrigo; John Crowe (pseud. de Dennis Lynds) encontrou um local imaginário em Buena Costa; Ellery Queen fixou‐se na cidade Wrightville; Agatha Christie cria a aldeia de St. Mary Mead para a perspicaz Miss Marple e a ilha Soldier Island (ou Nigger Island); Evan Hunter (pseud. de Ed McBain) na série 87th Precinctcria Isola; e mais recentemente Stieg Larsson em The Girl with the Dragon Tattoo imagina a ilha de Hedeby palco de um desaparecimento. Outro procedimento clássico consiste em reduzir os espaços a círculos fechados: um comboio, uma biblioteca, herdade ou palácio. Em qualquer dos casos, os autores concebem os locais que lhes proporcionem ambiente e material para desenvolver crimes ou mistérios interessantes e indecifráveis. 35 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 14 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Thomas Tryon (1926‐1991) – Nasce em Hartford, Connecticut‐EUA. Em 1969 abandona a carreira de actor de cinema e televisão para se dedicar à escrita de livros de mistério e ficção científica. Publica vários contos curtos e os seguintes livros: The Other (1971), Harvest Home (1973), Lady (1974), The Night of the Moonbow (1989), The Wings of the Morning (1990), In the Fire of Spring (1991), The Adventures of Opal and Cupid (1992) e Night Magic (1995). John Lescroart – Nasce em 1948 em Houston, Texas. Escreve o primeiro livro Son of Holmes em 1986, seguido de Rasputin's Revenge (1987), ambos da série Auguste Lupa. Cria ainda mais três séries: Dismas Hardy, com 13 títulos publicados, Abe Glitsky com 4 e Wyatt Hunt, com 3 títulos. Os seus livros estão traduzidos em 16 línguas e são editados em 75 países. Em Portugal: O primeiro livro da série Abe Glitsky A Certain Justice (1995) é editado em 2000, com título Justiça Até Certo Ponto pela Temas e Debates, o nº 6 da colecção Top Ten e novamente pelo Círculo de Leitores em 2002. O terceiro livro da série Dismas Hardy, Hard Evidence (1993) é editado pela Temas e Debates, 2003, com o título Prova Material. 36 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO ARQUITECTURA E CONTEXTO DA NARRATIVA POLICIÁRIA – 1 Em Os Elementos Fundamentais da Narrativa Policiária (in Pesquisa Nov.1990) consideramos que o hibridismo de que se reveste tal narrativa impede uma definição generalizada. Conclusão válida. É bem óbvio que nas diversidades de concepção e constante mutação da sua arquitectura, é inútil procurar um ponto comum. Por outro lado há sempre possibilidade de assinalar em concreto as bases de cada padrão narrativo. No todo da narrativa policiária há que distinguir o conteúdo imaginário do verdadeiro. No último caso é necessário determinar se tal assunto é puramente real ou se se está em presença de uma crónica novelada, por exemplo A Sangue Frio de Truman Capote. Não é indiferente pôr no mesmo saco as Memórias de Vidocq, descrição de vida e aventuras do célebre polícia francês, antes ladrão procurado por aquela, da história dos crimes da máfia ou recompilação de crónicas forenses, fichas criminais que correspondem a factos verídicos, e a novelação literária que aproveita a realidade, rodeada de fantasia bastante para criar tensão de mistério e intriga indispensáveis ao interesse e apreensão do leitor. Há quem distinga este tipo de literatura, que os puristas classificam de narrativa criminal, da literatura ficcionada, a policiária. Bem parece teoria de emaranhar ou complicar: a literatura policial é só uma, há sim diversos ramos, géneros ou subgéneros. Segundo o tema que aborda e visão do analista. O romance, a novela, o conto, o enigma ou problema policiário (jogo de lógica de raciocínio proposto como passatempo intelectual) são ficção pura. Neles se distinguem os géneros maiores: a narrativa de enigma ou novela de problema clássico, a narrativa negra ou de máscara negra, ou de suspense. Destas sim, ao longo do tempo, com acentuado clima no espaço norte‐americano, são férteis os sub‐géneros (crook, hardboiled, thoug procedural, private eye, penitentiary story, psychology) a desenvolver em futuros TEMAS. No que concerne a narrativa de enigma, a clássica narração que origina o género policiário, estruturada na existência de um delito, em regra um homicídio misterioso, face ao qual o detective, investigador privado ou simples curioso, recorrendo a indícios encontrados, a procedimentos técnico‐científicos e a interrogatórios, desmascara o culpado. Para captar a atenção do leitor, que em muitos casos inconscientemente, em nervosa expectativa, entra em competição com o investigador, é imprescindível utilizar pistas falsas, armadilhas habilmente urdidas para atrapalhar a acção da polícia ou investigador, até ao encaixar das peças dispersas do puzzle criado pela inteligência do autor. Resumindo, na narrativa clássica, mais do que simples entretenimento, propõe‐se um jogo de inteligência – investigador/contraventor – que desafio o raciocínio do leitor. 37 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO Uma derivação do género, mas nele incluída é a chamada narração invertida. Nesta sabe‐se quem cometeu o crime e como foi cometido, residindo a expectativa em seguir o trabalho do investigador e seguir os escassos indícios que o delinquente deixou ao cometer o crime até à sua identificação. O enigma é uma interrogação constante em busca da resposta, elucidação ou explicação que o autor montou, exige um princípio ético, convincente e a denúncia do mal face à ordem e à justiça. Obviamente que o autor com frequência inclui aspectos individuais, sociológicos, políticos, fantasiosos e outros para dar um fundo de impacto à escrita e confundir o leitor, mas qualquer que seja essa derivação, determina sempre a resolução do enigma fulcral. 38 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 15 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Dennis Lynds (1924‐2005) – Nasce em St. Louis, Missouri‐EUA. Escreve diferentes géneros, especialmente de índole policiária com vários pseudónimos. Com o pseudónimo Michael Collins inicia em 1967 uma série com o protagonista Dan Fortune, em Act Of Fear. Esta série tem 19 livros publicados, os dois últimos Crime, Punishment And Resurrection (1992) e Fortune's World (2000), reúnem todos os contos curtos deste personagem. Escreve ainda Lukan War (1969), The Planets of Death (1970), livros de ficção científica. Utiliza o pseudónimo de Willian Arden para os romances de espionagem industrial protagonizados por Kane Jackson: A Dark Power (1968), The Goliath Scheme (1970), Deal in Violence (1971), Deadly Legacy (1973) e Murder Underground (1974) e também o romance Mystery of the Blue Condor (1973). Com o pseudónimo de Mark Sadler escreve as aventuras do jovem, Paul Shaw, proprietário de uma agência de detectives: The Falling Man (1970), Here To Die (1971), Mirror Image (1972), Circle Of Fire (1973), Touch Of Death (1981) e Deadly Innocents (1986). Com outros escritores (Walter Gibson, Theodore Tinsley e Bruce Elliott adopta o pseudónimo Maxwell Grant na escrita das obras sobre o personagem Shadow – O Sombra. Conhece‐se ainda os pseudónimos, John Crowe, Carl Dekker, Sheila McErlean. É um escritor galardoado com uma longa lista de prémios. 39 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO Michael Collins / Dennis Lynds não deve ser confundido com o escritor irlandês Michael Collins (1964), também autor de policiário com livros publicados em Portugal. O CONTO COMO EXPRESSÃO LITERÁRIA De tal modo tem sido controverso o conceito de conto o que é, o que não é, que amovemos da definição. Qualquer tentativa será mais uma entre tantas. Grave Day classifica‐o como uma obra em que a prosa se pode ler de uma assentada. Mário Albuquerque, mais lato ao resumir conto: é tudo aquilo a que o autor chama de conto. Temo ter de discordar desta última definição: faz‐me lembrar o quadro branco com um ponto negro… um chapéu mexicano na neve… Na verdade, o conto como expressão literária faz parte daquela trilogia, romance, novela, conto, consoante a sua dimensão ou extensão literária. Se para os dois primeiros não existem dúvidas, a classificação de conto pela sua dimensão peculiar tem de encerrar a sua unidade de efeito, isto é, tem de produzir um efeito narrativo, ênfase, com economia de palavras. Cada palavra deve contribuir para o feito final, enquanto o romance e a novela – mais curta que o romance – têm espaço para desenvolver incidentes, analisar e multiplicar acções. O conto é por natureza breve, rápido, preciso, em duas palavras: sintético e monocrónico. Duas razões fundamentais parecem estar no espírito dos autores para evitar o conto: o romance e a novela podem eventualmente ser lucrativos, as palavras valem dinheiro – Rex Stout dizia: se tenho uma boa ideia não a desperdiço num conto; a segunda razão prende‐se com a dificuldade em expressar uma ideia ou intriga em breves palavras. Há bons autores, muito bons até, incapazes de sintetizar as ideias. H.G. Wells, ele próprio um contista hábil e famoso, escreveu: um conto pode ser muito brilhante e comovente, horrível, patético ou divertido, belo, profundamente sugestivo, mas não deve abranger mais do que meia hora de leitura. No aspecto temático, o conto policiário é de apurado encanto, pela vivacidade de palavras e imagens ou pelo assunto que entra no sentimento colectivo. Porém, o seu encanto iguala a dificuldade de concepção, maior ainda do que aquela já referida para o conto em geral. A construção da intriga, a unicidade do tema e o reduzido número de personagens a oferecer em cem palavras a representação de mil, não é tarefa fácil. E, por tal facto, muito se tem discutido a preferência do conto policiário ou do romance. Do ponto de vista do valor da obra os críticos são unânimes em considerar que a mais genuína expressão do género (policiário) só se encontra no conto. No entanto, o predomínio do romance nos escritores profissionais está à vista, Para o leitor reconhece‐
se geralmente como verdadeira a aceitação do conto pela necessidade vital do tempo disponível para ler. Mais curto ainda do que o conto tradicional, há uma segunda modalidade que se 40 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO espalhou rapidamente a short story – raiz americana ao que se crê e facilmente confundida com o próprio conto — o ideal adequado à pressa dos nossos dias e ao tema policiário. Na short story atribui‐se importância particular a um efeito principal desenquadrante, o suspense como força motora até final… em regra a emoção latente mantém‐se angustiante até à última e decisiva frase. 41 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 16 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Magdalen Nabb (1947‐2007) – Nasce em Blackburn, Lancashire, Inglaterra. Em 1975 muda‐se para Itália, fixa residência em Florença e inicia a carreira de escritora de livros infantis e policiais. Cria Marshall (Sargento) Guarnaccia, personagem central da sua obra policiária. O Sargento Salvatore Guarnaccia dos Carabinieri investiga e procura respostas para crimes. Magdalen Nabb inspira‐se em casos reais e situa os acontecimentos dos seus livros sempre em Florença, ou arredores, o que lhes confere um ambiente especial. Na série Guarnaccia: Death of an Englishman (1981), Death of a Dutchman (1982), Death in Springtime (1983), Death in Autumn (1985), The Marshal and the Murderer (1987), The Marshal and the Madwoman (1988), The Marshal's Own Case (1990), The Marshal Makes His Report (1991), The Marshal at the Villa Torrini (1993), The Monster of Florence (1996), Property of Blood (1999), Some Bitter Taste (2002), The Innocent (2005) e Vita Nuova (2008). Em 1986 publica The Prosecutor, escrito em parceria com Paolo Vagheggi. Um enredo onde se cruzam as Brigadas Vermelhas e os Serviços Secretos Militares. Em Portugal a Editorial Caminho, na Colecção de Bolso/Policial, editou: Morte de Um Inglês nº 2 (1984), Death of an Englishman (1981) Morte na Primavera nº 10 (1985), Death in Autumn (1985) Morte de Um Holandês nº 26 (1986), Death of a Dutchman (1982) Morte no Outono nº 48 (1987), Death in Springtime (1983) O Sargento e o Assassino nº 72 (1988), The Marshal and the Murderer (1987) O Sargento e a Louca nº 82 (1988), The Marshal and the Madwoman (1988) O Sargento e o Seu Caso nº 134 (1991), The Marshal's Own Case (1990) A Editora Livros do Brasil, na Colecção Vampiro, editou: Rapto de Uma Condensa nº 631 (2000), Property of Blood (1999) O Fantasma do Crepúsculo nº 649 (2001) Um Gosto Amargo nº 671 (2003), Some Bitter Taste (2002) Site oficial da escritora: http://magdalennabb.com/ 42 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO ARQUITECTURA E CONTEXTO DA NARRATIVA POLICIÁRIA – 2 BLACK MASK No período entre as duas Grandes Guerras Mundiais, mais na primeira metade, viveram‐se uma série de momentos cruciais para a história e mudaram‐se bruscamente as estruturas sociais: o crime, a corrupção a todos os níveis, a violência da vida quotidiana foram o cenário para a nova narrativa. O pulp que levou preferentemente o estilo responsável da narrativa negra, ou máscara negra, foi o Black Mask fundado em 1920. Aí, conscientes das mudanças sociais e da nova imagem do crime, aparecem as primeiras novelas em que a dureza moral e física supera a narrativa de enigmas. Assim, Race William, criação de Carroll John Daly, troca as lucubrações dedutivas pelo comportamento justiceiro e violento – físico e de linguagem. Mas foi Dashiell Hammett que abriu o caminho da projecção do Black Mask. Por um lado, a importância sociológica, o realismo crítico, a violência e a linguagem inusitada (a célebre adaptação realista da narrativa policiária) e, pelo outro lado, um detective que aplica a tarefa de investigação à sua maneira – nem sempre ortodoxa, utiliza métodos e resultados que ultrapassam a ética pessoal, transcende a moral social e as convenções colectivas. Os fins justificam os meios, objectivo puramente profissional: e se há violência física e moral, tem de se ser violento para sobreviver na selva em que vive submerso. A narrativa negra ultrapassa os limites geográficos do nascimento e estende‐se a França, Inglaterra… cresce, adquire cultura e prestígio. Chega a Hollywood, ao grande e pequeno ecrã. Excede‐se. Não obstante não perder a raiz violenta, os autores, além das origens de sempre, associam‐lhe bebida, bebedores e mulheres… 43 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 17 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Al Capone (1899‐1947) – Nasce Alphonsus Gabriel Capone em Brooklyn, New York‐
EUA, considerado o maior gangster norte‐americano de sempre. Descendente de emigrantes italianos, inicia‐se cedo nos gangs de rua. Chefia uma rede de contrabando durante a Lei Seca e acaba por dominar o crime organizado na cidade de Chicago. Conhecido por Scarface, por causa de uma cicatriz na cara, é tido como um homem destemido e implacável. A sua vida e o processo atribulado da sua detenção são inspiração para escritores policiários e também para a indústria cinematográfica. Grahams S. Moliner (1919‐????) – É o pseudónimo adoptado por Graziela Saviotti Molinari. Nasce em Livorno, Itália. Frequenta a Academia de Belas Artes de Brera em Milão. Fixa‐se em Portugal em 1939 e exerce a actividade de tradutora, publicista e cenógrafa – trabalha para o Teatro Nacional D. Maria II. Publica para a Editorial Gleba (1942‐1972), na Colecção Novelas Policiais, o romance policiário A Morte Paira Sobre o Castelo (1948) cujo enredo se desenvolve em Itália. Roy Lewis (1933) – John Royston Lewis nasce em Rhondda, Glamorganshire, País de Gales‐Reino Unido. Desde 1969 escreve romances policiários: o primeiro, A Lover Too Many, pertence à série John Crow – um inspector da polícia britânica – tem um total de 8 títulos. Segue‐se a série Eric Ward – um polícia que se tornou solicitador –, iniciada com A Certain Blindness (1980) e que atinge o 16º livro Guardians of the Dead, publicado em 2008. A terceira série, Arnold Landonum – um perito em arquitectura medieval e investigador em Northumberland – inicia‐se com A Gathering of Ghosts (1982) e tem o 22º livro, Goddess of Death, agendado para o final de Janeiro de 2012. Roy Lewis, que usa também o pseudónimo de David Springfield, tem mais treze romances policiários editados. 44 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO John Bellairs (1938‐1991) – John Anthony Bellairs nasce em Calhoun County, Michigan‐EUA. É conhecido pelos mistérios góticos destinados a um público jovem. Os seus livros são protagonizados por Lewis Barnavelt (6 títulos), Anthony Monday (4 títulos) e Johnny Dixon (9 títulos). Escreve ainda os romances The Pedant and the Shuffly (1968) e The Face in the Frost (1969). O primeiro livro da série Lewis Barnavelt The House with a Clock in Its Walls (1972) foi editado em Portugal, em 2006, pela Editorial Presença, nº 87 da Colecção Estrela do Mar, com o título A Maldição do Relógio. ARQUITECTURA E CONTEXTO DA NARRATIVA POLICIÁRIA – 3 SUSPENSE Na revitalização da corrente dedutiva, a enigmática, por vezes paredes meias com ela, inclusivamente nela, aparecem as narrativas de suspense: – a arte de transportar a angústia do universo imaginário à consciência do leitor. O elemento policiário, particularmente o detective, desaparece ou é secundário, para dar lugar à ansiedade psicológica. O interesse do leitor deixa de se centrar na pergunta ritual. Quem matou? Conseguirá o assassino escapar? Pergunta que só o autor habilmente incute com crescente efervescência. Francis Iles (Anthony Berkeley) dá um primeiro passo em Malice Aforethought (1931) / Malícia Premeditada e em Before the Fact (1932) / Suspeita, sem que se falasse de suspense, mas sim de psicologia. É com William Irish, cujo verdadeiro nome é Cornell Woolrich, que vamos encontrar o real mestre da arte do suspense. Em Irish encontramos a presença da fatalidade; em lugar do detective a vítima ergue‐se como personagem central; a vida é vista do lado do acaso; os inocentes são inexoravelmente coagidos a integrar a engrenagem do enredo. 45 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO Neste tipo de narrativa, o óptimo mede‐se pela dose de angústia real experimentado pelo leitor, pela tensão psicológica e impacto dramático que inocula. 46 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 18 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Milne (1882‐1956) – Alan Alexander Milne nasce em Kilburn, Londres. Jornalista e editor da revista humorística Punch é famoso pelos livros infantis, em particular pela figura de Winnie‐the‐Pooh. Em 1922 publica o romance The Red House Mystery, onde apresenta o investigador Anthony Gillingman, e o seu colaborador Bill Beverley, que deparam com um crime estranho e aparentemente impossível. É uma parelha excêntrica, divertida, cuja narração mantém uma visão humanística pouco comum. O livro é um sucesso de popularidade, mas os críticos não estão de acordo: se por um lado A. Woollcott considera The Red House Mystery como uma das três melhores histórias de mistério de sempre, Raymond Chandler, no ensaio The Simple Art of Murder critica o modelo de Milne, contrapondo: se um problema não contém elementos de verdade e plausibilidade, não é um problema e se a lógica é uma ilusão, não existe nada para deduzir. Este é o único romance policiário atribuído a A.A.Milne, no entanto este autor publica também o conto, The Rape of the Sherlock (1903), que mais não é do que uma paródia holmesiana e escreve ainda dois livros de mistério. The Fourth Wall (1928), uma peça de teatro, representada pela primeira vez em 1928 no Haymarket Theatre e mais tarde adaptada ao cinema no filme The Perfect Alibi, e Four Days' Wonder (1933) uma narrativa também adaptada ao cinema. Em Portugal The Red House Mystery é editado pela Minerva, o nº 50 da Colecção Xis em 1955: O Mistério da Casa Vermelha. 47 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO CRIMINALÍSTICA – JUSTIÇA E PROVA A tradição representa a Justiça como uma figura de mulher de olhos vendados! Significaria a simbólica venda a integridade da justiça, mantém‐se actualmente o símbolo – tornando‐a inacessível a subornos, presentes, ignorando as coroas dos reis ou a sedução da carne, no estreito caminho da VERDADE. Significa, em resumo, fechar os olhos e abrir os ouvidos, se bem que o tempo tenha puído a venda, que se afigura já pouco tapar. O mesmo se poderá dizer da balança, deve ter perdido o equilíbrio… Na prática judicial, não se diz à mulher da venda: Faz justiça! É necessário a prova. Durante séculos, para punir com justiça os que violavam a lei, os métodos eram bárbaros. O Juízo de Deus pela prova da caldeira, que consistia em mergulhar o braço do suspeito em água fervente para retirar uma pedra do fundo da caldeira. A odiosa superstição de que o inocente não se queimava era revelado pelo Juízo de Deus, segundo o grau das queimaduras. De igual modo, a defesa em combate singular do próprio acusado, ou quem ele escolhesse para o representar, defendia a sua inocência na prova do pão – se este não atravessasse a garganta era culpado; o julgamento pela cruz, quando o acusado, que deveria ficar de braços em cruz perante um crucifixo, baixasse os braços ou no caso de dois acusados, o primeiro a baixar os braços era culpado. Por último a tortura, a mais durável é recente, usada pela Inquisição de tão má memória. Qualquer suspeito que lhes caísse nas mãos estava destinado (não podia furtar‐se) às mais atrozes torturas e eram utilizados todos os métodos até à confissão do crime. Confessavam preferindo a morte à tortura. Decorridos tempos, sem tortura visível, a confissão ainda é um elemento de alta importância e relevo, quando não obtida por coacção, portanto espontânea, ainda que não prevaleça desacompanhada de outros factos probatórios. Constituem objecto de prova todos os factos juridicamente relevantes para a 48 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO existência ou inexistência do crime e possibilidade ou impossibilidade do sujeito. Como se vê tem um conceito bastante lato, distinguem‐se, porém, dois aspectos: o da forma e o de fundo. O primeiro constata‐se por um facto material (documento, perícia) ou experimental através da reconstituição a partir dos elementos conhecidos; o segundo, a prova circunstancial, na maior parte das vezes complexa, em que intervêm procedimentos discursivos – deduções ou induções – ou intuitivos, com base em circunstâncias. Nesta última caberá porventura a prova testemunhal. A prova final resulta do valor dos meios elementares que entram como componentes do raciocínio, e cada um desses modos de prova desempenha o seu papel na livre apreciação, segundo as regras de experiência e a livre convicção da entidade julgadora. 49 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 19 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Edgar Allan Poe (1809‐1849) – Esta data e o ano de 1809 é memorável para a literatura policiária. Nasce em Boston Edgar Poe, por adopção Edgar Allan Põe, que é considerado incontestavelmente o criador da narrativa do género. Pode dizer‐se que nasceu sob o signo do infortúnio, para o quel em parte ele viria a contribuir, levado pelo génio que havia em si, um génio poeta sensível, onde abunda a fantasia, o sobrenatural, a magia e o terror levados até ao paroxismo da arte. Todavia, soube aproveitar‐se, com excepcional brilho imaginativo e lógica matemática, para construir uma narrativa, de um novo tipo, publicada em Abril de 1841 no Graham's Lady's and Gentleman's Magazine, de Filadélfia, intitulada The Murders in the Rue Morgue. Com ela cria um novo género, a narrativa de dedução, cronologicamente o primeiro mito da investigação policiária, no protagonista C. (Charles) Auguste Dupin, que é o herói de mais dois relatos, The Mystery of Marie Roget (1842) e The Purloined Letter (1844). Enquadrados no tema policiário são de referir ainda Thou Art the Man (1844) em que o assassino é a pessoa menos suspeita, norma posteriormente seguida por muitos outros autores, e The Gold Bug (1843), um notável conto de criptografia em que o autor foi mestre e especialista. De resto, para além do 50 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO policiário, toda a obra, poesia incluída, é de transbordante qualidade. Aconselhamos vivamente uma leitura detalhada de Edgar Allan Poe. Alexander Woollcott (1887‐1943) – Alexander Humphreys Woollcott nasce em Colts Neck, New Jersey‐EUA. Escritor, jornalista, crítico teatral e literário escreve vários artigos sobre literatura policiária. Em 1934 reúne os seus melhores trabalhos em While Rome Burns, um bestseller, onde se destaca o texto Hands Across the Sea, sobre a justiça em tempo de guerra e The Mystery of the Hansom Cab onde Woollcott explica a sua perspectiva sobre um acontecimento verídico (O caso Nan Patterson). The Mystery of the Hansom Cab é seleccionado em 2008 pela Library of América para ser incluído na retrospectiva de 200 anos de crimes verídicos americanos e está publicado em True Crime: An American Anthology. O conto de Woollcott Moonlight Sonata está incluído no The Vicious Circle (2007), uma antologia de Otto Penzler com escritores dos anos 20. Patricia Highsmith (1921‐1995) – Nasce Mary Patricia Plangman em Fort Worth, Texas‐EUA. Cedo decide ser escritora, apenas com 16 anos. O romance Strangers on a Train (1949) foi um êxito cujos direitos foram adquiridos e levado à tela por Hitchcock em 1951. Em The Blunderer (1954) repete o estilo, entre o suspense e o interesse em fazer sobressair os delinquentes sob os aspectos mais 1955 publica The Talented Mr. Ripley onde põe em evidência as andanças de um estranho personagem, Tom Ripley. Este é culto, educado, sedutor, não é um detective nem um gangster, escroque ou justiceiro, mas um homem totalmente desprovido de consciência, frio ou indiferente, que mata sem escrúpulos, por dinheiro ou por prazer, sem outra razão, talvez para manter o elevado nível de vida. É um homem que vive com a excitação da crueldade. A autora repete em vários romances as aventuras patológicas de Ripley, que parece seduzir os leitores. Highsmith usa também o pseudónimo Clare Morgan no romance The Price of Salt (1952). O último livro Small G – A Summer Idyll (1995) é publicado um mês depois da morte da escritora. 51 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO Patricia Highsmith é um dos grandes vultos do policiário, com mais de uma trintena de títulos publicados e duas dezenas de contos curtos. Patricia Moyes (1923‐2000) – Patricia Pakenham‐Walsh nasce em Dublin, Irlanda. No final da guerra colabora com Peter Ustinov em filmes de ficção. Num período de férias resolve escrever romances policiários. Em 1958 publica Dead Men Don't Ski, o primeiro de uma série de 20 títulos protagonizada por Henry Tibbett e a sua mulher Emmy. A crítica apresenta‐a como uma das mais talentosas escritoras do policiário neo‐clássico. Don Kavanagh (1946) – Nasce em Leicester, Inglaterra, Julian Patrick Barnes. Jornalista, crítico de televisão, inicia a carreira de escritor policiário, sob o pseudónimo Don Kavanagh, em 1980 com Duffy em que o protagonista é um ex‐polícia bissexual, Nick Duffy. Nesta série escreve: Fiddle City (1981), Putting the Boot In (1985) e Going to the Dogs (1987). Thierry Jonquet (1954‐2009) – Nasce em Paris. Lança‐se na escrita em 1984, considerado um modelo do estilo negro francês, é hoje um dos mais conhecidos escritores franceses de crime/policiário. Thierry Jonquet utiliza quarto pseudónimos: Phil Athur e Vince C. Aymin Pluzin para dois ateliers de escrita que dirige; Martin Eden para dois livros relacionados com a série televisiva; David Lansky e Ramon Mercader para três romances de ficção política. Depois do primeiro romance policiário, Mémoire en Cage (1982), segue‐se Du Passé Faisons Table Rase (1982), Le Bal des Débris (1984) e, sob o pseudónimo Ramon Mercander, Cours Moins Vite Camarade, Le Vieux Monde Est Devant Toi (1984). Thierry Jonquet é um escritor galardoado com vários prémios, com destaque para as seguintes obras: La Bête et la Belle (1985), Moloch (1998) e Les Orpailleurs (1993). Pedro Almodovar adapta ao cinema o romance Mygale, com o título A Pele Onde Eu Vivo. Em Portugal estão publicados: 52 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO A Morte Pode Esperar (2006); Editora Ulisseia; Título Original: Ad vitam aeternam (2004) Tarântula (2011); Editora Objectiva; Título Original: Mygale (2002). 53 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 20 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Irving Le Roy (1909‐1972) – Data do falecimento de Robert Georges Debeurre, escritor de aventuras policiárias populares. É conhecido em Portugal pelo supra citado pseudónimo, no entanto tem escritos sob uma extensa lista de pseudónimos como Georges Méra, Ergé Hemm, Rudy Georg Maïer, Irving Heller, Henry Haines, Susan Vialad, Howard Trévor, Andy Knight e provavelmente Jaime Barbara, Gérald Rose, Georges de Guérigny, Robert J. Dolney e outros. Reg Gadney (1941) – Nasce em Cross Hills, Yorkshire‐Inglaterra. Trabalha na área da arqueologia e do teatro. Inicia‐se na escrita em 1971, mas só em 1984 se torna escritor a tempo inteiro. Escreve para televisão e cinema, adapta duas obras policiárias para o pequeno ecrã: The Bell (1958) e The Sculptress (1993) de Minette Walters. Escreve os seguintes romances de ficção: Drawn Blank (1970), Somewhere in England (1971), Seduction of a Tall Man (1972), The Last Hours Before Dawn também conhecido como Victoria (1974), Something Worth Fighting For (1974), The Champagne Marxist também conhecido como The Cage (1977), Nightshade (1987), The Achilles Heel (1996), The Scholar of Extortion (2003), The Woman in Silk (2011). Na série Alan Rosslyn, um detective privado, publica os seguintes títulos: Just When We Are Safest (1995), Mother, Son and Holy Ghost (1998), Strange Police (2000), Immaculate Deception (2006). Em Portugal o primeiro livro da série Alan Rosslyn é editado em 1996 pela Difel, na colecção Literatura Estrangeira, Rivalidades e Corrupção, um livro que se encontra 54 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO esgotado. ESPIÕES E TRUQUES DE ESPIONAGEM Ora admirado, ora odiado, simplesmente ignorado, mais frequentemente perseguido, o espião é um alvo a abater. Registemos alguns comentários breves de escritores sobejamente conhecidos. “Ao lavar as mãos recebi um arranhão no pulso esquerdo de um alfinete que a lavadeira (calculei) deixara na toalha. Correu um pouco de sangue, mas envolvi o ferimento num lenço e, fatigado, deitei‐me adormecendo depois. Meia hora mais tarde fui despertado por uma dor em todo o lado esquerdo – um estranho entorpecer nos músculos da cara, das mãos e na garganta que me impedia de respirar ou de gritar. Tentei erguer‐me e premir o botão da campainha e pedir auxílio, mas não o pude fazer. Aquele alfinete tinha sido ali colocado de propósito. Fora sem dúvida envenenado…” William Le Queux (1864‐1927) “Fechou por completo os olhos. Os circunstantes fitaram‐no. Razunov fez esforço para se recordar de algumas palavras francesas. – Je suis sourd – disse, voltando a desfalecer. – É surdo – exclamaram eles. Eis porque não ouviu o carro. Horas antes, enquanto a trovoada ainda não feria a noite, verificou‐se na sala de Julius Lispara uma sensação. O terrível Nikita, vindo do patamar, erguera a sua voz rouca e sombria diante de todos os presentes: – Razunov! Mr. Razunov! O maravilhoso Razunov! Nunca mais será utilizado como espião por ninguém. Não falará, pois jamais ouvirá seja o que for na sua vida. Absolutamente nada. Rebentei‐lhe os tímpanos. Oh! Podem confiar em mim. Sei como fazer as coisas. Sim, sei como fazer as coisas!” Joseph Conrad (1857‐1924) “De qualquer modo o espião pode ser um ser admirável passível de consideração, no aspecto de carácter e honestidade, não restam dúvidas que no plano profissional o espião é ipso facto, um mentiroso e ladrão! Mais ainda. Ele entra na função de corromper e subornar, aproveita‐se deliberadamente das fraquezas dos outros de forma a levá‐los à traição. Para obter os seus resultados poderá utilizar a extorsão e a chantagem. O facto de o seu móbil ser diferente de um vulgar ladrão, não entra em linha de conta…” Eric Ambler (1909‐1998) 55 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 21 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Israel Zangwill (1864‐1926) – Nasce em Londres. No campo policiário é famoso por um único romance The Big Bow Mystery, publicado em 1891. É um romance histórico pelo tema, o primeiro crime impossível ou de quarto fechado. A narrativa é de estilo livre, vivo, com certa dose de humor e sobretudo engenhosa. Israel Zangwill abre caminho temático para mais de um milhar de escritores, alguns em repetição do tema, que testaram os seus métodos. Desde a primeira edição este livro nunca deixou de ser publicado, e em diversas línguas. The Big Bow Mystery é também adaptado ao cinema com diferentes títulos: The Perfect Crime (1928), um filme com som parcial, The Crime Doctor (1934) e The Verdict, uma versão film noir de 1946 dirigido por Don Siegel. Em Portugal The Big Bow Mystery foi editado pela primeira vez em 1979 por duas editoras Amigos do Livro e Círculo de Leitores com o título Crime Impossível. Mais recentemente, em 1991, pela Livros do Brasil O Grande Mistério de Bow, o nº 522 da Colecção Vampiro. 56 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO FICÇÃO – REALIDADE APARENTE A primeira narrativa em que o crime é cometido em quarto fechado é precisamente a primeira narrativa policiária (1841), com a devida ressalva, por não estar em causa um assassínio humano. Depois de Poe houve um desenvolvimento notável nos métodos usados nos enredos de quarto fechado: Le Fanu com Ghost Stories and Tales of Mystery (1851), Aldrich com Out of His Head (1861), Zangwill com o já referido The Big Bow Mystery, Leroux com Le Mystère de la Chambre Jaune (1907) … até ao rei de todos eles John Dickson Carr/Carter Dickson. Seria de pensar que os limites da engenhosidade metal e criativa estivessem esgotados, contudo verificamos que é infinita. Há sempre novos argumentos, novos truques e variações sobre o tema garantidamente inesgotável. A imaginação fecunda dos escritores não deixa de nos surpreender. O crime em quarto fechado – mais tarde estender‐se‐ia a praias desertas e áreas geladas sem pegadas – é sempre uma impossibilidade coberta por um subterfúgio, porquanto é inaceitável admitir a consumação de um crime no cenário de um quarto, ou qualquer outro recinto, inteiramente fechado e sem meios de comunicação com o exterior. Ainda que se saiba à partida que o crime em quarto fechado é fisicamente impossível, face à habilidade do escritor revela‐se uma realidade praticável. Afastam‐se os alçapões, os esconderijos ou saídas secretas tão do agrado dos escritores do gótico, e também os mecanismos ou engenhos ocultos que disparam por acção inadvertida da vítima, ficamos pelos métodos inteligentes, verdadeiros passos de magia entre o possível e o impossível. Algumas hipóteses das várias encontradas: a) A vítima é atingida mortalmente antes de se entrar no quarto (para se proteger), o agressor tem tempo de atirar com a arma para dentro do quarto antes de este se fechar ocasionalmente passa por um suicídio, tudo depende do ferimento e da arma utilizada; b) É mesmo um suicídio. A vítima, por razões pessoais simula um crime ou trata‐se de um acidente que as circunstâncias apontam para crime; c) A morte é executada no momento em que o quarto é aberto – princípio de Zangwill, depende da oportunidade e preparação do criminoso; d) O crime foi executado no quarto e o assassino sai e tranca a porta. Há diversos métodos para o efeito, desde a manipulação de um simples fio, até outros mais complicados; e) Gás, telefone electrificado, etc. Não nos alonguemos na resenha, o sabor da leitura sobrepõe‐se a qualquer esquema. E não se fica pelo assassínio em quarto fechado, também o roubo é referido e com que mestria. Estes casos exemplificam o recurso ao subterfúgio nas possíveis narrativas de quarto fechado, mas também a vida real caprichosa nos dá exemplos a 57 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO referenciar… MISTÉRIO QUARTO FECHADO REALIDADE FECHADA 19 de Novembro de 1799, numa manhã como as outras, Emma Chavesse — na intimidade Mannette – desceu para a cozinha, preparou o pequeno almoço e dirigiu‐se para o quarto da patroa, Louise Dauvinier. Bateu à porta do quarto e sem esperar resposta como de costume prepara‐se para entrar. A porta não se abriu. Insistiu virando a maçaneta e encontrou a mesma resistência. Estaria trancada? Sentiu a maçaneta húmida e pegajosa. Maquinalmente limpou a mão no avental e aproximou o candeeiro de luz pálida. Viu que estava suja de sangue, também no avental, onde se limpara notavam‐se vestígios de sangue. Apavorada, deixou a bandeja e correu para a entrada gritando que haviam assassinado a patroa. Um homem sexagenário, antigo polícia, agora jardineiro, pegou num pequeno machado e seguiu a criada tentando abrir a porta sem sucesso. Viu as manchas de sangue, acenou com a cabeça com entendimento e passou diante de uma chorosa Mannette, dirigiu‐se para o jardim tentando abrir as janelas hermeticamente fechadas. Voltou para dentro e tentou entrar pela porta do toucador ligado ao quarto, mas foi avisado pela criada que a patroa tinha a porta sempre bloqueada pela mesa de um pesado penteador. Estranho, pensou o homem, um crime em quarto fechado. Era necessário forçar a porta. Dois vizinhos que entretanto acudiram, com a ajuda de uma viga que foram buscar fora, arrombaram a porta, não sem dano. No escuro tactearam até abrir a janela. Deparou‐se‐lhes um quadro horrendo: a Senhora Dauvinier estava pendurada com um lenço em volta do pescoço, estrangulada. Cortado o laço e deitada sobre a cama, viam‐se longos fios de sangue por toda a parte e duas feridas terríveis de faca ou punhal. Marcas de sangue bordejavam o leito, como se Dauvinier tivesse ficado sentada. Os golpes de punhal tinham sido dados com violência, excluído a possibilidade de a própria se apunhalar, dada a localização. Demais não se encontrou a arma. A vítima tinha saúde robusta, mostrava‐se alegre e nada propícia ao suicídio. Crime! Porém como poderia ter fugido o criminoso de um quarto completamente fechado? As averiguações levadas a cabo descobriram que a vítima era uma antiga prostituta de luxo, pela qual uma condessa se apaixonara. Todavia, a prostituta abandonara bruscamente, retirando‐se para alguns quilómetros de Paris, fazendo uma vida recatada. Vivia com Mannette, há muito tempo aposentada, que lhe servia de empregada e parecia ser‐lhe devotada. Esta dormia no primeiro andar de um quarto que dava para os campos, não se apercebera da ocorrência, para mais era um pouco surda. Os vizinhos também 58 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO nada viram nem ouviram. Os investigadores não encontraram motivos para o crime. Havia dinheiro sobre o toucador, algumas jóias e, estranhamente, um punhal de cabo artisticamente trabalhado, com um motivo audacioso que a criada afirmou nunca ter visto. Aliás verificou‐se que era a arma do crime e através dela chegou‐se ao criminoso. De dado em dado levou a um jovem soldado da 17ª Brigada do Exército do Reno, Felicien Jeannet, por quem a vítima se apaixonara e era a razão do seu afastamento, não só da condessa como da vida de prostituta. Jeannet acabou por confessar: por ciúme apunhalara a amante e fugira. Restava saber como tinham sido trancadas as portas e janelas… A pobre mulher tinha pelo amante mais amor do que supunha. Apunhalada, sentindo a morte aproximar‐se, não quisera mais do que salvar aquele que a havia matado. Com auxílio de Mannette conseguiu ir até à porta do quarto, despedir‐se da criada e trancar a porta. Limpou a arma e enforcou‐se com o lenço. Esperava que diante da impossibilidade do crime, se concluísse tratar‐se de um suicídio. Em vão, não há crimes impossíveis! 59 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 22 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Anthony Abbot (1893‐1952) – Nasce Charles Fulton Oursler em Baltimor, Maryland‐
EUA. É jornalista, repórter, editor e escritor. Usa o pseudónimo Anthony Abbot para a escrita de temas policiários. Com o seu primeiro livro About the Murder of Geraldine Foster (1930) cria o Inspector Thatcher Colt, o mais trabalhador e tenaz caçador de criminosos; Thatcher é um felizardo, solteiro que habita uma casa de cinco pisos em Manhatan West, com ginásio próprio e uma biblioteca de 5000 volumes sobre criminologia. Os primeiros livros de Anthony Abbot começam sempre pela palavra ABOUT, no entanto nas edições seguintes o título é diferente, o que baralha os seus leitores. Publica vários romances e contos. Abbot é um clássico entre os clássicos. Joseph Wambaugh (1937) – Joseph Aloysius Wambaugh, Jr. nasce em East Pittsburgh, Pennsylvania‐EUA. Faz parte do United States Marine Corps e da Los Angeles Police Departement o que acaba por influenciar a sua obra literária. Escreve histórias de polícia para a televisão. No domínio da ficção publica o primeiro romance policial em 1971, The New Centurions, mais tarde adaptado ao cinema. Seguem‐se: The Blue Knight (1972), The Choirboys (1975), The Black Marble (1978), The Glitter Dome (1981), The Delta Star (1983), The Secrets of Harry Bright (1985), The Golden Orange (1990), Fugitive 60 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO Nights (1992), Finnegan's Week (1993) e Floaters (1996). Na série Hollywood estão publicados: Hollywood Station (2006), Hollywood Crows (2008), Hollywood Moon (2009) e Hollywood Hills (2010). Joseph Wambaugh tem um novo livro Harbor Nocturne a editar em Abril de 2012. Site oficial do autor: http://www.josephwambaugh.net/ BIBLIOGRAFIA DE ANTHONY ABBOT – ADENDA 1 – About the Murder of Geraldine Foster (1930) também conhecido como The Murder of Geraldine Foster (1930). 2 – About the Murder of the Clergyman's Mistress (1931) também conhecido como The Crime of the Century (1931) ou The Mysterious Murder of the Blonde Play‐Girl (193?) ou ainda The Murder of the Clergyman's Mistress (1950). 3 – About the Murder of the Night Club Lady (1931) também conhecido como The Murder of the Night Club Lady (1931) ou The Night Club Lady (1932). 4 – About the Murder of the Circus Queen (1932) também conhecido como The Murder of a Circus Queen (1933). 5 – About the Murder of A Startled Lady (1935) também conhecido como The Murder of a Startled Lady (1936). 6 – About the Murder of A Man Afraid of Women (1937) também conhecido como The Murder of a Man Afraid of Women (1937). 7 – The Creeps (1939) também conhecido como Murder at Buzzards Bay (1940). 8 – The Shudders (1943) também conhecido como Deadly Secret (1943). Anthony Abbot escreve um romance publicado como autor anónimo Dark Masquerade (1936). E quatro contos curtos: 61 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 1 – About the Disappearance of Agatha King (1939) 2 – About the Perfect Crime of Mr. Digberry (1940) 3 – The Face From Beyond (1946) 4 – The Ship of Sleepless Men (1958) Em Portugal é possível encontrar: 1 – A Misteriosa Morte da Cantora, publicado em 1946 pela Tipografia Ibérica, nº 2 da Colecção Os Melhores Contos Policiais. 2 – O Assassínio da Rainha do Circo, publicado pela Editorial Século em 1951. 3 – A Mão que Abriu o Ferrolho, conto publicado em 1964, em 50 Gigantes do Conto Policial, nº 6 da Antologia Policial de Ross Pynn. 4 – Um Rosto do Além, conto publicado em 1967, em 34 Obras Primas do Conto Policial, nº 8 da Antologia Policial de Ross Pynn. 62 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 23 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Walter M. Miller Jr (1923‐1996) – Walter Michael Miller Jr nasce em New Smyrna Beach, Florida‐USA. É um escritor de ficção científica, publica apenas dois livros, um deles postumamente: A Canticle for Leibowitz (1959) e Saint Leibowitz and the Wild Horse Woman (1997). Em contrapartida, tem uma ampla produção de contos curtos. É detentor de vários prémios e está representado nas grandes antologias de ficção científica. Em Portugal, em 1971, a Livros do Brasil na colecção Argonauta, edita Um Cântico para Leibowitz em 3 volumes (nº 169, 170 e 171), que inclui o primeiro livro de Miller e os contos Fiat Homo, Fiat Lux e Fiat Voluntas Tua. Este conjunto é reeditado em 2000 pela Europa América – nº 81 da Colecção Nébula; e é também esta Editora que publica com o nº 82 da referida colecção o outro livro São Leibowitz e a Mulher do Cavalo Selvagem. Stanislas‐André Steeman (1908‐1970) – Nasce em Liège, Bélgica. Precoce contador de histórias publica o seu primeiro conto aos 14 anos na revista Sincere, um conto de Natal intitulado Les Crottes en Chocolat. Colabora com várias revistas e torna‐se jornalista da La Nation Belge onde trabalha com o famoso Sintair (Hermann Sartini). Em 1928 publica o primeiro livro policiário Le Mystère du Zoo d’Anvers. É laureado em 1931 com o 63 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO Grand Prix du Roman d'Aventure com Six Hommes Morts onde aparece o Monsieur Wens, ou seja Wenceslas Vorobeïtchik, antigo polícia, agora investigador por conta própria. Na série de Wens estão: Six Hommes Morts (1931), Les Atouts de M. Wens (1932), M. Wens et l'Automate (1934), La Morte Survit au 13 (1958). Os livros mais relevantes são: L'Assassin Habite au 21 (1939), Légitime Defense (1949), que mais tarde é editado com o título Quai des Orfèvres e Autopsie d'un Viol (1964). Muito bom o livro de contos L'Infaillible Silas Lord (1939), em que este mostra ser um Sherlock Holmes, fora do habitual. Stanislas‐André Steeman tem várias obras adaptadas a Banda Desenhada e ao cinema. Em Portugal os livros deste autor foram editados com sucesso, entre 1931 e 1951, pela Livraria Clássica Editora, na Colecção Os Melhores Romances Policiais: 1 – Seis Homens Mortos 2 – O Mistério de Lovernal 3 – O Iô‐iô de Vidro 4 – Duas Vezes Assassinado 5 – O Inimigo Sem Rosto E de outras editoras: 6 – Três Igual a Um (1950), Édipo 7 – Crimes, Vendem‐se! (1953), Dois Continentes, nº 4 da Colecção Máscara / Crimes à Vendre 8 – Sua Excelência a Morte (1955), Livros do Brasil, nº 94 da Col. Vampiro / Madame la Mort 9 – Autópsia dum Crime (1967), Empresa Nacional de Publicidade, nº 16 da Colecção Policial Esfinge 64 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 24 DE JANEIRO EFEMÉRIDES René Guillot (1900‐1969) – Nasce em Courcoury, na região de Poitou‐Charentes em França. É um escritor famoso pelos livros de aventuras para jovens, muito popular entre nós nas décadas de 60 e 70. No policiário é considerado um escritor de nível secundário pela escassez de produção neste campo. O livro mais conhecido é Les Équipages de Peter Hill (1946), distinguido com Le Prix du Roman d'Aventures, um prémio literário que distingue anualmente um romance policial francês ou estrangeiro. Les Équipages de Peter Hill foi editado em Portugal em 1948 pela Livraria Clássica Editora, na Colecção Os Melhores Romances Policiais com o nº 72, A Tripulação de Peter Hill. 65 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO CRIMINOLOGIA: O INDÍVIDUO, O FUGITIVO E O DESAPARECIDO A identificação correcta de um indivíduo é de capital importância, quer por simples actos civis, quer no domínio da criminologia – muito particularmente nesta. No passado marcavam‐se os criminosos até à mutilação, de forma brutal com um ferro ardente em várias partes do corpo e em diferentes países: na Rússia, França e Alemanha (1800), na China até 1905… Muito antes, na época de Ptolomeos no Egipto e no Império Romano, o sistema de identificação dos delinquentes usado era surpreendentemente semelhante ao futuro retrato falado. Na Época Medieval e até ao meio do séc. XIX as descrições não abonavam garantia e frequentemente davam lugar a confusões. Cerca de 1840, o belga Quetelet (1796‐1874) afirmou que não há no mundo dois seres humanos exactamente do mesmo tamanho. Baseado nesta tese e nos conhecimentos de antropologia, Alphonse Bertillon (1853‐1914) idealizou um método de identificação a que chamou antropometria, fundando o Service de l'Identité Judiciaire datado de 15 de Fevereiro de 1889. Acrescentou‐se a fotografia em duas posições e depois em três, frente e perfis. A introdução da fotografia e posteriormente a descoberta da dactiloscopia, foram os avanços mais espectaculares nos processos de identificação. Já se sabia que os babilónicos para se protegerem das falsificações marcavam uma impressão digital quando escreviam documentos importantes. O anatomista Malpighi (1628‐1694) tinha descoberto as linhas papilares e Jan Evangelista Purkinje (1787‐1869) identificou diferentes padrões, no entanto sem pensar na identificação. O assunto passou por Georg Meissner (1829‐1905), William Herschel (1833‐1917), Henry Faulds (1843‐1930) até Bertillon que, entusiasmado com o seu sistema antropológico, não aceitou de imediato a dactiloscopia, até que Galton (1822‐1911) e Juan Vucetich (1858‐1925) apuraram o sistema que chegou a todas as polícias. A dactiloscopia dá‐nos aspectos surpreendentes. O mais importante é que não há duas impressões digitais idênticas. A Natureza nunca as reproduz exactamente; se encontramos duas que parecem iguais à vista, o exame microscópio revela logo a diferença; entre pais, filhos e irmãos, mesmo gémeos, conserva‐se a diferença. Não se podem alterar, mesmo as cicatrizes não são obstáculo à sua leitura. Mesmo a cirurgia plástica é inútil, as linhas papilares só desaparecem após a morte com a decomposição do corpo. São fáceis de obter através dos arquivos de identificação. Na recolha basta papel e tinta, ou o uso de equipamento mais sofisticado, incluindo máquinas fotográficas digitais ou utilização de raios ultravioletas para a pesquisa in loco. A comparação faz‐se hoje em tempo verdadeiramente curto. Esta tarefa incube aos laboratórios da Polícia Científica que, com meio século de atraso em relação às polícias europeias, acabou por ser estabelecido pelo Decreto Lei nº 41036, de 2 de Outubro de 1957. Actualmente o 66 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO Gabinete de Identificação e Pesquisa da Polícia Judiciária mantém uma actividade constante neste campo. Não interessa apenas a impressão digital ou a palmar, mas tão somente uma particularidade destas. A lofoscopia interessa‐se pelos desenhos e relevo epidérmico que permitem distinguir. Identificações por vezes morosas mas indispensáveis. DESAPARECIMENTO A identificação é o primeiro passo, antes da transmissão de um aviso de alarme às polícias externas ao local do facto. Após a identificação há que estabelecer, se possível, a motivação para o desaparecimento. Os casos de desaparecimento voluntário (fugitivos) ou involuntários são ambos para trabalho policial. Tratando‐se de um delinquente profissional, cuja fuga oculta, na maior parte dos casos, um novo delito em perspectiva ou já produzido, o arquivo de factos delituosos antecedentes contém numerosas anotações sobre hábitos, lugares, etc. Deve visitar‐se a última residência e as anteriores, parentes, amigos antigos e recentes, associados. Se for um indivíduo de hábitos nocturnos, vigiar as casas e salões de jogos, discotecas, restaurantes, hotéis de má reputação. É importante ter em conta o modus operandi anterior. A cooperação entre polícias é essencial. Estas devem actuar com habilidade e naturalidade. Ter em atenção aos disfarces, no limite, a cirurgia faz maravilhas; altera o rosto, o ângulo dos olhos, o tipo de nariz, cobre e abre cicatrizes impedindo o reconhecimento à vista desarmada. Um bom polícia, porém deve estudar a personalidade de um indivíduo, único facto difícil de disfarçar. Ainda no campo dos fugitivos, mas não delinquentes, a motivação é o suporte principal. Cherchez la femme é um axioma a ter em conta: fugir de uma mulher ou com uma mulher é frequente. Outras causas são as querelas familiares ou laborais; emigração clandestina, frustração ou cansaço social, motivos que levam os indivíduos a afastarem‐
se sem rumo. No caso de ausência involuntária o desaparecimento pode ser consequência de um acidente, doença, morte acidental ou homicídio, sequestro… O processo de desaparecimento involuntário é quase sempre mais difícil por falta de antecedentes e particularidades individuais. Existe um sem número de elementos ligados à pesquisa, desde a utilização de fotos actuais, investigação de movimentos bancários até às buscas com a ajuda do faro de um cão especializado no ramo. 67 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 25 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Somerset Maugham (1874‐1965) – William Somerset Maugham nasce em Paris, na embaixada do Reino Unido. Novelista e dramaturgo britânico, protótipo do escritor prolífero e popular, escreve o primeiro romance em 1897, Liza of Lambeth, inspirado nas suas experiências como médico nos bairros humildes de Londres. No mesmo género ganhou fama internacional com Of Human Bondage (1915) e The Painted Veil (1925). Escreveu muitos e excelentes contos e peças de teatro, alguns dos quais de tema criminal. Neste campo destacam‐se: Ashenden: Or the British Agent (1928), um conjunto de histórias incluído pela Mystery Writers of America no Top 100 Mysteries of All Time e que se julga ter influenciado Ian Fleming na criação de James Bond. Somerset Maugham colabora regularmente com jornais e revistas, em especial The Criminal com cerca de duas centenas de artigos e contos curtos. 68 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO As obras deste autor estão amplamente divulgadas em Portugal, em livros de bolso, em edições populares e por várias editoras, no início publicadas pela Livros do Brasil e mais recentemente pela Asa Editores. A título de exemplo, eis as obras aqui referenciadas na sua edição mais recente: 1 – Liza, a Pecadora (Círculo de Leitores, 1991) 2 – Servidão Humana (Asa, Colecção Vintage, 2011) 3 – O Véu Pintado (Asa, Colecção Pequenos Prazeres, 2004) 4 – O Agente Britânico (Livros do Brasil, Colecção Autores de Sempre, 1986) FICHA CRIMINAL: AL CAPONE No cemitério de Mount Carmel jaz aquele que foi considerado o mais famoso gangster de todos os tempos: Al Capone, o Scarface. Nascido em Brooklyn, descendente de pais napolitanos que haviam adquirido a nacionalidade americana em 1906, o jovem Capone cresceu no bairro povoado por emigrantes italianos que disputavam entre si os mercados, clubes de dança e prédios de apartamentos. Aos 14 anos bateu num professor, foi expulso da escola mas quase de imediato caiu, por sorte ou por destino, sob a influência do gangster napolitano John Torrio. Este pertencia à quadrilha Five Pointers e Alphonse Capone era o moço de recados. Aos 18 anos passou a trabalhar para Frankie Yale, com uso dos punhos e das armas para limpar o clube do patrão de indesejáveis. Um companheiro que usava uma faca deixou‐o marcado para sempre numa face, daí a alcunha de Scarface, no entanto o desfiguramento não o afectou. Cedo encontrou uma rapariga irlandesa, Mae Josephine Coughlin, com quem casou. Torrio foi o padrinho. Quando Torrio decide mudar‐se para Chicago, onde James Colosimo, Big Jim, possuía um clube onde se misturam homens de negócios, políticos, prostitutas e estrelas de cinema. Capone juntou‐se‐lhe em 1919 e exerceu a profissão de segurança, motorista e guarda‐costas. Em 17 de Janeiro de 1920 saiu a lei que proibia a produção e distribuição de álcool, o que conduziu a uma orgia de actividades ilegais e lutas ente os gangs pelo fornecimento, por vezes com a cumplicidade de polícias. Colosimo foi alvejado, dizia‐se pelo sobrinho Torrio e de facto este acaba por expandir o seu negócio. Em 1923 Torrio fez umas longas férias pela Europa, Capone aproveitou para zelar pelos seus interesses. Em 1924 o irmão de Capone, Frank, teve uma morte violenta. Capone matou Joe Howard, mas a polícia não conseguiu provar nada e Capone toma o lugar de Torrio, envolve‐se em outros assassínios, sempre sem provas acusativas válidas. O ataque em 1926 com um grupo de pistoleiros junto a um bar de Capone é um banho de sangue, do qual é vítima o procurador William McSwiggin, foi atribuído a Al Capone, mas mais uma vez este não foi incriminado. A polícia por vingança destrói‐lhe vários estabelecimentos, mas são reconstruídos por Capone. Durante alguns anos o tráfico de bebidas alcoólicas mantém‐se o negócio mais 69 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO produtivo, sempre semeado de mortes à mistura. Depois Capone entra no negócio da extorsão, controlando trinta por cento do mercado. O massacre do Dia de S. Valentim é uma carnificina horrenda mas, de novo, Al Capone não é pronunciado por se encontrar em Miami. Em 1931 é acusado de dois crimes de evasão fiscal por ter violado a Lei da Proibição. Declara‐se culpado para reduzir a pena, mas ao ouvir o juiz declarar que não havia negociações retira a culpa. Em 24 de Outubro desse ano é condenado a 11 anos de prisão, onde consegue manter alguns privilégios até que alguém denuncia essa situação e é transferido para Alcatraz onde cumpre o resto da pena. Sai em Novembro de 1939. Em 19 de Janeiro de 1947 sofre uma hemorragia cerebral e morre em 25 de Janeiro. Do seu tempo ficam as inúmeras mortes, os escritos e os filmes a que deu origem. 70 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 26 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Brian Garfield (1939) – Brian Francis Wynne Garfield nasce em Nova Iorque. É escritor/argumentista de mistérios convencionais e espionagem, com mais de 20 milhões de cópias vendidas em todo o mundo. Tem a particularidade de utilizar diversos pseudónimos Alex Hawk, Bennett Garland, Brian Wynne, Brian Wynne Garfield, Drew Mallory, Frank O'Brian, Frank Wynne, John Ives e Jonas Ward. Começa a escrever policiários em 1962 com The Rimfire Murders como Frank O'Brian. Em 1966 publica The Last Bridge, a que se segue The Villiers Touch (1970) e posteriormente cerca de quarenta romances e contos. Em 1976 recebe o Edgar Award for Best Mystery pelo romance Hopscotch (1975). Brian Garfield cria dois personagens: Paul Benjamin, um vigilante do Arizona protagonista em Death Wish (1972) e Death Sentence (1975) e Sam Watchman, polícia Navajo protagonista em Relentless (1972) e The Threepersons Hunt (1974). John Wyllie (1914) – Piloto da RAF e prisioneiro dos japoneses trabalha para a Cruz Vermelha em África. Vive em Portugal e na Holanda. Escreve os romances policiários: Skull Still Boné (1975), The Butterfly Flood (1975), To Catch a Viper (1977), Death is a Drum… Beating 71 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO Forever (1977), Pocket Full of Dead (1978), The Killer Breath: A Doctor Quarshie Mystery (1979), Tiger in Red Weather (1980) e Long Dark Night of Baron Samedi (1981). ESPIONAGEM ESPIÕES NA GUERRA DA SUCESSÃO O primeiro conflito bélico moderno, ou assim considerado, é a guerra da Sucessão Norte‐Americana (1861‐1865). Nesta época a espionagem ainda seguia a tradição romântica, mais espectacular do que eficiente. Não havia um serviço de informação militar ou os que existiam eram péssimos. Assim concluiu o exército do Norte que mostrou a necessidade urgente de um serviço de informação que facilitasse dados sobre as forças confederadas. Houve que improvisar. O Presidente Lincoln encarregou a organização de detectives de Allan Pinkerton do assunto. Logo, os primeiros Serviços Secretos americanos foram de índole privada. Pinkerton somou alguns sucessos na contra‐espionagem, todavia foi um desastre no território confederado, o que viria a contribuir para a sua dispensa. O maior erro foi a captura da espia sulista Rose Greehow. Esta agente facilitara informações ao general sulista Beauregard, o que lhe permitiu ganhar a batalha de Manassas. Apesar de presa, Rose continua com a sua actividade de espionagem e quando foi posta em liberdade morre afogada ao atravessar um rio. Outra famosa espia sulista foi Belle Boyd, cuja destreza profissional lhe valeu a alcunha de Cleópatra do Sul. Conseguiu salvar‐se ao longo do conflito e acaba por dedicar‐se ao teatro e escrever as suas memórias. Do lado Norte, Elizabeth Van Lew, com residência em Richmond, foi a espia mais famosa. Informadora do General Grant, chegou a colocar uma colaboradora fiel como criada em casa do Presidente da Confederação Jefferson Davis, sem nunca ser descoberta. Lafayette Baker, um antigo espião, foi encarregado da National Detective Police, o primeiro serviço oficial de segurança dos EUA. Lafayette era responsável pela segurança do Presidente Lincoln e designou para guarda‐costas um só agente. Quando Lincoln foi assassinado esse agente estava distraidamente a tomar uns copos fora do teatro. O assassino John Wilkes Booth fugiu, mas foi apanhado e morto antes que pudesse falar. O presidente assassinado foi substituído pelo vice‐presidente Johnson, facto que foi repetido um século mais tarde em Dallas, como que seguindo um imaginário guião de destino. A conjuração contra Lincoln dá início a uma turva situação política dos serviços secretos, não chegando a perceber‐se se correspondem aos interesses do governo ou à regra do seu próprio jogo. 72 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 27 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Lewis Carroll (1832‐1898) – Charles Lutwidge Dodgson nasce em Daresbury, Halton, Cheshire, Inglaterra. Lewis Carroll é pseudónimo literário deste matemático, fotógrafo e escritor. É educado na Universidade de Oxford, onde mais tarde é professor de matemática; é ordenado diácono pela Igreja Anglicana em 1832. De carácter tímido e bondoso vê o seu grande valor matemático ultrapassado pelo mérito da palavra escrita. Como escritor é um marco da literatura de fantasia e uma referência entre os grandes da Literatura Universal. Alice no País das Maravilhas (1865) e Alice do Outro Lado do Espelho (1871) são obras‐mestras entre os clássicos. Todavia, se o matemático é ultrapassado pelo escritor, é justo não esquecer os Jogos de Lógica (1886) e Lógica Simbólica (1896) como adestrações intelectuais. Lewis Carroll tem uma paixão por enigmas, e por isso a sua obra literária contém jogos de palavras ou enigmas e é frequente a inclusão de acrósticos na sua poesia. Outra área em que é perito liga‐se ao desenvolvimento de códigos e cifras. Entre 1858 e 1875 cria cinco cifras que utiliza na sua correspondência pessoal; todas são baseadas no sistema de substituição, onde cada letra é substituída por outra e a palavra‐chave é a base da cifra. O interesse de Lewis Carroll pelos desafios lógicos está bem manifestado em A Tangled Tale (1885), um conjunto de contos curtos e enigmas, publicados pela primeira vez em revistas e posteriormente reunidos em livro. 73 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO LITERATURA: O QUE É LITERATURA DE FANTASIA? Tal como entendemos, não é possível conceber um conceito de literatura de fantasia, já que em boa verdade toda a literatura é invariavelmente fantasia, em razão dos elementos imaginários que comunica. Só na representação ou intenção se poderá distinguir a realidade empírica que se mostra aos seus sentidos, ainda que copie o que existe, ao contrário da fantasia. Esta, proveniente do latim phantasia significa irreal, quimérico, imaginário. Fantasia aplica‐se de forma indiscriminada a qualquer tipo de literatura que não dê prioridade à representação realista, designadamente os contos de fadas, folclore dos mitos, lendas, alegorias utópicas, abrange a ficção científica e o terror. Fantasia representa a violação daquilo que se aceita como possível, implica o exagero ou distorção da natureza, sempre em ruptura da ordem da realidade. CONTO O presente conto, com mais de duas décadas, da autoria de Luis Britto Goraz (Brasil?) contém uma tripla vertente: É um conto de ficção científica; É uma alegoria; É uma lição de sabedoria destinada àqueles que na vida procuram dispensar o trabalho. UM MUNDO MELHOR E conseguiu‐se a sociedade perfeita, atenuou‐se a loucura da espécie humana e os homens ficaram dispostos a dedicar os seus esforços à consecução de um objectivo. Então reconheceram que não havia objectivo algum ao qual se pudessem dedicar… Entretanto, foi idealizado como objectivo a falta de todo o objectivo. Em primeiro lugar, a humanidade quis libertar‐se do trabalho, e assim se iniciou uma louca correria ao trabalho conjunto destinada ao objectivo – não trabalhar. Finalmente, todo o trabalho humano foi feito por máquinas, e as máquinas foram construídos por outras máquinas, que por sua vez eram dirigidas por máquinas, assim se libertou a humanidade do trabalho. Porque todas as faculdades mecânicas do homem, a sua musculatura, os seus membros e as possibilidades de mover‐se e de mover objectos, deixaram de se úteis, atrofiaram‐se – acabaram por desaparecer. Em segundo lugar, havia que libertar‐se a humanidade da escravatura do alimento. Todas as potencialidades químicas se implementaram na síntese das proteínas e dos hidratos de carbono a partir de matéria inanimada e do calor, e, finalmente, mediante a 74 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO energia atómica, força e matéria, foram transmutadas nos laboratórios até que formaram a mais apurada – quinta‐essência – alimentícia, susceptível de passar directamente ao canal sanguíneo sem prévia digestão. Como a boca, o estômago, o intestino, o fígado e, em geral, as vísceras deixaram de ter a pesada tarefa de extrair energia dos alimentos, atrofiaram‐se e acabaram por desaparecer. Em terceiro lugar, quis libertar‐se a humanidade da morte. E os laboratórios eliminaram as toxinas que produziam a degeneração, antes conhecida por velhice, corrigiram os genes do suicídio a partir da matéria orgânica resultante da síntese do protoplasma, e desta a síntese da imortalidade. Com a desnecessidade de reprodução os órgãos de geração atrofiaram‐se e acabaram por desaparecer. Nesta alvorada do espírito o intelecto, já dono e senhor do Universo, estava capaz de lançar‐se à mais audaz das aventuras. Libertado do trabalho, da fome, do sexo, libertado da morte, o cérebro humano dispunha‐se a criar o seu mais potente fruto: aquele que não nascia das vísceras nem do apetite da carne. Um acontecimento enorme, porém estava por surgir: com efeito, o cérebro humano também deixou de ser necessário, também se atrofiou e também havia acabado por desaparecer. 75 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 28 DE JANEIRO EFEMÉRIDES S. H. Courtier (1904‐1974) – Sidney Hobson Courtier nasce em Kangaroo Flat, Victoria‐Austrália. Começa a escrever policiários em 1950 com The Glass Spear, protagonizado pelo Inspector Ambrose Mahon, uma série que tem um total de sete livros. Em 1957 apresenta o Inspector Digger Haig em Now Seek My Bones, uma série também com um total de sete títulos publicados. Escreve ainda os seguintes romances policiários: Softly Dust the Corpse (1960), Who Dies for Me? (1962), Murder's Burning (1967), Ligny's Lake (1971), Some Village Borgia (1971), Dead If I Remember (1972), Into the Silence (1973), Listen to the Mocking Bird (1974), Window in Chungking (1975), The Smiling Trip (1975). Tim Heald (1944) – Timothy Villiers Heald nasce em Dorchester, Dorset, Inglaterra. É escritor, biógrafo e jornalista, também utiliza o pseudónimo David Lancaster. Inicia a actividade de escritor em 1973 com um romance finalista do New Blood Dagger Award. Este livro é o primeiro de uma série protagonizada por Simon Bognor, um investigador especial que é um anti‐herói. A série Simon Bognor tem 12 títulos publicados: Unbecoming Habits (1973), Blue Blood Will Out (1974), Deadline (1975), Let Sleeping 76 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO Dogs Die (1976), Just Desserts (1977), Murder at Moose Jaw (1981), Masterstroke também editado com o título Small Masterpiece (1982), Red Herrings (1986), Brought to Book (1988), Business Unusual (1989), Death in the Opening Chapter (2011) e Poison at the Pueblo (2011). Tim Heald cria ainda uma outra série com o Doctor Tudor Cornwall, um professor universitário de Estudos Criminais, na Universidade de Wessex. Estão editados numa trilogia: Death and the Visiting Fellow (2004), Death and the D'urbervilles (2005) e A Death on the Ocean Wave (2007). LITERATURA: DO CONTO DE FADAS AO POLICIÁRIO Durante séculos a narrativa de aventuras conservou um estilo de uma lenda ou de um conto de fadas, o maravilhoso e o fantástico. A imaginação dos nossos antepassados não estava controlada por uma razão obcecada pela ideia probatória e confundia o impossível com o proibido. Pouco a pouco a experiência fez retroceder o âmbito da efabulação. Os deuses desertaram da Terra. Ficou menos terreno para conquistar. O paladino, a donzela e o malvado, figuras eternas do relato de aventuras, acercaram‐se dos mortais. Havia chegado o momento de pôr em questão as raízes da fábula, o estranho e a suspeita. A imaginação teve de alterar as suas próprias criações. Assim acaba o maravilhoso fantástico, por triunfo da razão, outro aspecto do maravilhoso moderno, mais consciente, mais refinado: o maravilhoso lógico. A inteligência começa a ser usada de forma arrojada, a narrativa de aventuras transforma‐se em narrativa policiária. Com efeito é a lógica a encarregar‐se de criar o maravilhoso moderno, porque é ela que resolve os problemas. Se a imaginação não se apoia no raciocínio, não disporá de um grão íntimo da faculdade de surpreender. A surpresa é um dado certo dos enigmas subtis. A lógica é uma espécie de talismã: prevê ameaças, descobre complôs e detesta intenções escondidas. Observa os personagens, e o conflito que opõe o bem ao mal, suscita angústia que ela mesmo colmatará mais tarde. Este dogma é o suporte necessário da narrativa policiária, há que destacá‐lo. Entre o polícia e o leitor, entre o detective e as potências do mal, o raciocínio integrou‐se na ficção na mesma medida em que se cria e dissimula o mistério. O âmbito insólito da narrativa policiária dá mais magia, impõe‐se; só há um meio de escapar ao feitiço, convertermo‐nos em artesão maravilhado da nossa 77 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO própria ansiedade. A presença perversa de um hábil assassino consegue o que não é provável na proliferante e obscura mitologia dos deuses. O momento em que a bala assassina ou uma faca vibra, fixa‐se como uma realidade. Assim consegue uma ansiedade instintiva, sabendo que é um medo construído mas surpreendente, também um desafio à reflexão, à vontade de compreender… faz poesia pura, a descoberta, o aspecto inocente e o quotidiano das coisas. Diga‐se: a imaginação não renunciou à sua função fabuladora, instruída pela razão viaja até os limites do plausível e do verosímil. Entretanto, as leis da narrativa policiária pressupõem: 1º Deve haver, entre o mal e o raciocínio, um equilíbrio de tal forma doseado que a um máximo de perturbação corresponde sempre um máximo de perturbação lógica; 2º É preciso que os enigmas propostos ao detective sejam ao mesmo tempo difíceis provas da sua capacidade; 3º O estilo deverá valorizar situações dramáticas, delicadamente organizado graças à sua progressão lógica. Assim foi concebido pelo inovador Edgar Allan Poe. (texto concebido a partir de uma tradução livre de um escrito de Thomas Narcejac. Representa uma introdução à Cronologia da Narrativa Policiária, pelo que continuará num próximo dia…) 78 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 29 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Harold Q. Masur (1909‐2005) – Nasce em Nova Iorque. Advogado de formação, serve na US Air Force, que abandona nos anos 40; começa a escrever muito cedo para os pupls policiários. Publica o primeiro romance em 1947: Bury Me Deep; escreve um total de 15 livros policiários e numerosos contos, recolhidos em várias colecções. O seu personagem principal é o advogado nova‐iorquino Scott Jordan, que chegará a magistrado público em 1984 com o romance The Morning After. Harold Q. Masur é Presidente de The Mystery Writers of America em 1973/74. Bibliografia – Série Scott Jordan: 1 – Bury Me Deep (1947) 2 – Suddenly a Corpse (1949) 3 – You Can’t Live Forever (1951) 79 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 4 – So Rich, So Lovely, and So Dead (1952) 5 – The Big Money (1954) 6 – Tall, Dark and Deadly (1956) 7 – The Last Gamble também publicado como The Last Breath e Murder on Broadway (1958) 8 – Send Another Hearse (1960) 9 – The Name Is Jordan (1962), short stories 10 – Make a Killing (1964) 11 – The Legacy Lenders (1967) 12 – The Mourning After (1981) Outros livros: 13 – The Last Breath (1958) 14 – The Attorney (1973) 15 – The Broker (1981) Em Portugal, o conto Papazinho fez parte da antologia 43 Autores Violentos do Conto Policial, o nº 7 da Colecção Antologia Policial, publicada pela Ibis em 1965 (2ª Edição). Também foram editados vários livros, por diferentes editoras, por vezes com um título diferente para a mesma obra original. A Mulher dos Olhos Cinzentos (1958), Minerva, Colecção Xis nº 74 (Bury Me Deep) Ninguém é Eterno (1959), Minerva, Colecção Xis nº 87 (You Can’t Live Forever) Alta, Morena e Fatal (1959), Minerva, Colecção Xis nº 92 (Tall, Dark and Deadly) Tão Rica, Tão Bela e…. Morta (1960), Minerva, Colecção Xis nº 98 (So Rich, So Lovely, and So Dead) A Última Cartada (1961), Minerva, Colecção Xis nº 112 (The Last Gamble) Uma Visita Macabra (1962), Século, Colecção: As Grandes Obras de Mistério e Acção (Suddenly a Corpse) Dinheiro Fatal (1964), Minerva, Colecção Xis nº 143 (The Big Money) Sepultem‐me Bem Fundo (1964), Ibis, Colecção Rififi nº 7 (Bury Me Deep) 80 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO Cadáver Inesperado (1965), Ibis, Colecção Rififi nº 20 (Suddenly a Corpse) Choque de Ambições (1967), Minerva, Colecção Xis nº168 Mercadores de Heranças (1970), Minerva, Colecção Xis nº192 (The Legacy Lenders?) LITERATURA: NARRATIVA DE TERROR – BREVE REFLEXÃO No princípio era o verbo… frase notável. Nos remotos tempos só a palavra existia: para transmitir sensações. As histórias eram cantadas, narradas, representadas pela dança, pela pintura nas paredes das grutas, nos riscos da areia húmida… Eram transcrições utilizadas para exorcizar, basicamente o medo. Os traços das estrelas no céu, o medo da escuridão, da seca, da doença, do desastre, da fome, da morte… apontavam e evocavam demónios reais e imaginários. Os demónios inspiram o horror, sentimentos de medo interior entram no espírito e gelam o sangue… Transporta‐se de século para século de forma verbal, até que chega a palavra escrita, passados milénios: na pedra rija, no tijolo preparado, no papiro, no papel. É uma nova dimensão para a narrativa. Uma existência independente do narrador, sobrevive e espalha‐se pelo mundo. Mudam‐se os métodos narrativos, mas as histórias de terror são imutáveis; o medo é do incognoscível é o artista que domina o palco, o público e a mente. Em tempos idos, com as tétricas lendas medievais eram o lúgubre ambiente das noites tenebrosas dos castelos fantasmagóricos, o cheiro do enxofre do senhor dos infernos, os mortos‐vivos vampiros atravessando a terra das tumbas sedentos de sangue, monstros atemorizadores sem conta, peso e medida. Hoje o narrador moderno modera a descrição e apresenta‐o em múltiplas formas, como uma ciência material, onde se distinguem três correntes essenciais: A alegoria moral, a metáfora psicológica e o fantástico. No primeiro grupo destaca‐se o sobrenatural, ou melhor o encaixe do mal sobrenatural no quotidiano geral, o segundo recai sobre a psicologia humana em forma de metáforas ou efeitos científicos e a terceira corrente citada explora o anormal. Nenhuma delas enjeita a aproximação às correntes congéneres, já que não se pode pôr limites ao fantástico, que a par do maravilhoso, continua nos modelos modernos. O medo a que chamamos terror, estranho e inconcebível tem a sua própria estética e só aguarda uma tensão ideal para se manifestar, Lembramos os góticos Lewis, Radcliffe, Walpole, os românticos Byron, Keats, Shelley, os imaginosos Poe, Le Fanu, Dickens e progressivamente, Doyle, Jacobs, M. R. James, Wills, Lovecraft… até aos modernos Clive Barker, Koontz e Stephen King. 81 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO CONTO O autor do presente conto, Marcel Bealu, é um cultor da área fantástico – terror. VÍCIO SOLITÁRIO No hotel onde me hospedara, o meu maior prazer consistia em espiar o que sucedia nos quartos da frente. Oculto pela sombra, todas as noites experimentava inúmeras satisfações com tais vigílias: um rosto em oferenda, que duas persianas recobriam como pedra de um túmulo, um braço nu mergulhando pelas águas negras de um cortinado, uma cabeleira arrancada aos remoinhos da noite. Não me entregaria a um divertimento tão só visual se, em determinada noite, os reflexos fugidios do mistério de que me rodeava, não acabasse por despertar em mim a mais enlouquecida das paixões. Solitária como eu, vivia ali uma mulher. Por vezes cantava, e eu, do meu observatório, escutava, febril, os sons que me chegavam. Outras, vi‐a sentada no toucador… acontecia trincar os lábios para não gritar o meu deseje de vê‐la mais perto. Sucedeu, porém, que certa noite, esquecendo a minha cela de sombra, aproximei‐me; interpretei como um apelo alguns gestos desacostumados. Ainda que tivesse fixado a localização exacta do quarto, com alguma hesitação bati à porta daquele onde tantas vezes sonhara entrar. Não houve eco de resposta. Movido pela audácia do desejo, receando atrair a atenção dos vizinhos, deixei cair a mão e empurrei a porta. Estava nua e parecia adormecida. A aberração do meu espírito fez‐me acreditar num estratagema ingénuo do amor, ao qual liguei desde logo o meu consentimento. Foi preciso que tivesse perdido o domínio de mim mesmo para não reflectir na estranheza de um tal excesso. A face voltada, inundada de sombra parecia animar‐se nas convulsões do prazer. Olhei com maior atenção e apercebi‐me de que só eu imprimira movimento ao rosto inerte, como de resto a todo o corpo e sacabara de fazer amor com uma morta. Repentinamente morta também a minha paixão. Fiquei apavorado. Em que terrível aventura me afundara. Tinha de fugir depressa. Mas já soavam passos pelo corredor, a porta abria‐se e eu gritava no auge da minha angústia: Não fui eu, não fui eu! Não fui eu! 82 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 30 DE JANEIRO EFEMÉRIDES Jorge Reis (1926‐2005) – Pseudónimo de Atilano dos Reis Ambrósio. Nasce em Vila Franca de Xira. Vive em França durante muitos anos, onde estuda. Exerce várias profissões, desde tipógrafo, empregado fabril, jornalista e bibliotecário. É igualmente redactor de uma revista francesa. Inicia a actividade literária na Gazeta de Coimbra e revista Vértice. A sua estreia no policiário, Matai‐vos Uns aos Outros, com prefácio de Aquilino Ribeiro recebe o prémio Camilo Castelo Branco 1967. Este livro é publicado pela primeira vez em 1961, pela Prelo, nº 3 da Colecção Autores Portugueses; tem várias edições. O Círculo de Leitores e a Editorial Caminho também publicam este livro. A edição mais recente é de 1988 da Vega Editora. Clara Pinto Correia (1960) – Nasce em Lisboa. Bióloga, historiadora das ciências, professora e investigadora tem larga experiência de escrita na área da sua especialidade. Escreve em 1985 um livro policiário Adeus Princesa, cuja acção se passa no Alentejo com a morte de um mecânico alemão na Base Aérea da Nato, em Beja. Criando ficção dentro da realidade, o romance deve ser considerado como um marco na moderna literatura policiária portuguesa. Adeus Princesa é editado pela Relógio D'Água na colecção Crime Imperfeito. 83 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO Margaret York (1924) – Margaret Beda Nicholson nasce Compton, Surrey, Inglaterra. Durante a 2ª Guerra serve na Woman's Royal Naval Service. Assistente na biblioteca de duas universidades de Oxford, é a primeira mulher a trabalhar na Christ Church Library. Em 1979 e 1980 é a presidente da Crime Writers' Association. Publica em 1957 Summer Flightum romance de mistério e até 2000 escreve mais de 40 livros; como contista tem uma boa série de narrativas, reunidas em colecções. Em 1970, cria o personagem Patrick Grant, herói de uma série de romances: 1 – Dead in the Morning (1970) 2 – Silent Witness (1972) 3 – Grave Matters (1973) 4 – Mortal Remains (1974) 5 – Cast for Death (1976) No Medals for the Major (1974) é considerado o seu melhor romance e foi editado em Portugal em 1991 pela Ulisseia, nº 20 da Colecção S.A., com o título A Provação do Major Johnson. Estão também publicados cerca de duas dezenas de outros livros da autora por diferentes editoras com destaque para as Publicações Europa‐America na Colecção Livros de Bolso, série Clube do Crime e na Colecção Obras de Margaret Yorke. 84 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO ESPIONAGEM: ESPIA POR AMOR À PÁTRIA Quando se alude a espias famosas, desde logo, entre centenas, um nome surge: Mata Hari. Todavia, não será assim. Mata Hari conquistou realmente a celebridade nos anais da espionagem e literatura biográfica, crítica e de ficção, contudo o seu desempenho como espia é medíocre, quando comparado com a acção de Louise de Bettignies (Adolfo Coelho in Espionagem – Segredos da Grande Guerra). Enquanto o interesse ou a escravidão de um passado pouco limpo são determinantes que impelem a maioria das espias na 1ª Grande Guerra Mundial (1914‐1918), Louise moveu‐se pelo amor à pátria, dedicação irreprimível da aristocrata que se não fosse a guerra, teria sido freira. Louise Marie Jeanne Henriette de Bettignies nasceu a 15 de Julho de 1880, pertencia a uma velha família de Hainaut e podia orgulhar‐se de uma sólida ascendência fidalga. Diplomada pela Universidade de Oxford, falando com perfeição inglês, italiano e alemão, além da sua própria língua, o francês. Estava em Lille, em casa da mãe, quando em Outubro de 1914 o exército alemão se apoderou da cidade. No desejo imperioso de aspirar o ar da França livre, parte para a Holanda e daí para Inglaterra. Num apertado interrogatório dirigido pelas autoridades inglesas, que procuram informações acerca do inimigo, mostra‐se de tal modo observadora, que lhe propõem a entrada para o serviço de espionagem britânico. Pede para reflectir e aceita a missão desde que trabalhe junto do serviço francês de espionagem. Volta a França e, após consultar o seu director espiritual, decide aceitar a missão. Antes, patrioticamente, oferece‐se para os serviços secretos franceses, mas é olhada com desconfiança pelos compatriotas, pelo que cumpre os serviços à ordem dos britânicos. A aristocrata, educada Bettignies, passa a ser a anónima cidadã Alice Dubois. Vezes sem conta atravessa a fronteira da Holanda, frequentemente vigiada dirige‐se a Lille munida de elementos para organizar os serviços de informação na região, o que consegue. Com energia incomum percorre a região, conquista dedicações e colhe resultados eficientes. Disfarçada de camponesa atravessa fronteiras para levar valiosas notícias e documentação precisa, transpõe barreiras de arame farpado, iludindo a luz dos 85 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO fortes projectores, detectando na escuridão os fios dissimulados de alta tensão. Memorizando um mapa numerado consegue através de um pequeno hieróglifo riscado numa carruagem do caminho‐de‐ferro belga, indicar a localização de baterias inimigas que no dia seguinte serão atacadas e irão pelos ares. Junto de Alice, uma outra mulher, Marie‐Léonie Vanhoutte (ou Charlotte Lameron) desnorteia os serviços secretos alemães. Mas a roda da fortuna desanda. Marie é presa em Bruxelas e Alice arrisca tentar salvá‐la. Astuciosamente com um único salvo‐conduto, que depois de lhe servir para atravessar um posto de guerra é enviado à companheira, por um garoto, para que esta passe também. Riem‐se da partida, intempestivamente, pois estão a ser observadas por dois agentes que lhes pedem a identificação. Agora juntas eram impossível repetir o truque, foram presas. Condenadas à morte em 1916, Louise escreve ao general Von Bissing pedindo o perdão para Marie, assumindo toda a culpa. O general não acede mas comuta‐lhe a pena em prisão. Pior do que a morte, Louise teme a clausura, contrai febre tifóide e morre em 27 de Setembro de 1918. É posteriormente agraciada pelos serviços franceses e ingleses com várias distinções honoríficas. Marie sobrevive e é libertada com o Armistício e também ela é feita Cavaleiro da Legião de Honra. 86 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO 31 DE JANEIRO EFEMÉRIDES C.W. Grafton (1909‐1982) – Data do falecimento de Cornelius Warren ("Chip") Grafton. Nasce na China, filho de pais missionários americanos. Estuda jornalismo e estudos jurídicos. Em 1943 publica o primeiro livro The Rat Began to Gnaw the Rope, com o qual obtém o Mary Roberts Rinehart Award, para o melhor romance do ano. Em 1944 publica The Rope Began to Hang the Butcher e em 1950 Beyond A Reasonable Doubt. Os dois primeiros livros têm como narrador/protagonista o detective/jurista Gilmore Henry. Grafton deixou um manuscrito para um terceiro romance da série Gil Henry, The Butcher Began to Kill the Ox, que nunca chegou a ser editado. Os títulos desta série correspondem a uma lengalenga infantil. A NARRATIVA DE ESPIONAGEM Lado a lado ou constituindo apenas um dos ramos da grande árvore do género policiário (tanto se confundem), a narrativa de espionagem tem um decurso paralelo e inter‐relacionado com o uso do espião. Curiosamente, ou não, talvez na fatalidade do livro mais distinguido no mundo, onde nada parece faltar, é na Bíblia que vamos 87 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO encontrar a primeira referência à espionagem. Moisés, conduzindo os hebreus após o êxodo do Egipto, não encontra mais do que inóspitos desertos para acolher o seu povo. Envia espiões às Terras de Canaã em reconhecimento local. Os fins justificam os meios… aliás, não será a espionagem um acto tão antigo como a existência humana? Eva espiava Adão para encontrar o ponto vulnerável, o homem primitivo espiava para atacar o lado mais débil da caça ou de outros homens. Cipião (236‐183 a.C.) mandou espiar Aníbal para forjar a estratégia de vitória. Ramsés II (séc. XIII a.C.) usou da inteligência e arte da espionagem para vencer os hititas. Alexandre Magno, Ciro, Júlio César Augusto seguiram o exemplo. Mitrídates, Teodorico, os cruzados da Idade Média, reis e vassalos dos estados modernos e contemporâneos mantiveram e mantêm hordas de espiões, a pouco e pouco preparados, criaram serviços organizados de espionagem e contra‐espionagem. Hoje, utilizando a experiência adquirida e os meios adequados. Grandes e prósperas organizações: CIA, Deuxième Bureau, KGB ou NKWD, Intelligence Service, OSS, Sûreté, FBI, NSA, M‐16, etc., etc. A verdadeira expressão para definir a espionagem actual, é que se trata de um verdadeiro iceberg, uma enorme montanha de gelo cuja parte visível sobre a água parece inocentemente inútil, mas a grande massa dura e perigosa permanece invisível. É deste fenómeno que a narrativa de espionagem se alimenta. O primeiro romance deste ramo cabe a James Fenimore Cooper, nascido em 1789 (EUA), que publica em 1821 O Espião, uma abordagem patriótica às andanças de um mensageiro do general Washington. Rudyard Kipling leva a espionagem à Índia com Kimba (1901), Doyle põe Sherlock Holmes a resolver O Caso Naval (1889), mas descritivamente, com maior acerto, só Joseph Conrad com O Agente Secreto (1906) nos dá uma verdadeira dimensão narrativa do tema. Em termos latos – este texto é uma abertura ao tema – passando por dezenas de autores que mereceriam citação, até ao maior êxito comercial, que representa o incrível James Bond, até ao frio Mr. Smiley de John Le Carré, vai um mundo extraordinário de literatura de espionagem. CONTO O conto apresentado, de um autor desconhecido, Tex Ritter, foi publicado em 1946 ou 1947. Serve para divulgação do tema, que também têm cultores portugueses que serão futuramente referenciados O PLANO SECRETO Um ponto luminoso surgiu subitamente na tela do radar, momentos depois o uivo das sirenes cortou o ar da Base Digger. A incursão dos bombardeiros japoneses 88 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO intensificara‐se nos últimos dias, mas a floresta camuflava inteiramente a acumulação de munições que durava há meses, tendo em vista a projectada ofensiva geral. Mesmo assim os japoneses sobrevoavam o acampamento, demonstrando que se mantinham alerta. Pouco depois o uivo das sirenes morreu e deu lugar ao sinal de tudo bem. O avião foi identificado como americano e regressava à base após um voo de reconhecimento. No radar o ponto luminoso aumentou sobre o mar azul do Pacífico e o avião aterrou. O piloto permaneceu a bordo enquanto o técnico entregava um envelope endereçado ao Departamento de Observações e continha filmes tirados ao longo da frente, situada 65 quilómetros a norte. O avião manobrou para entrar no hangar, enquanto o filme revelado era examinado… O tenente‐coronel Wertenbaker olhou a tela onde se projectava uma imagem ampliada e franziu a testa intrigado. Sabia que o inimigo era feroz e dele tudo havia a esperar. Apanhou uma vara e apontou um ponto da projecção. – O que é isto? – Perguntou. O major Herb, que olhava para o outro ponto da projecção, voltou a atenção para o ponto assinalado. – Sim esse ponto não se encontrava aí a semana passada. Herb retirou um filme do arquivo e colocou‐o no projector, procurando o reflexo da água agora detectado; não existia. – Eu já sabia. – Grunhiu Wertenbaker. – Uma vez que é um génio, diga‐me o que significa esse reflexo na água – disse Herb Berkker. O coronel estudou o filme, substituiu‐o pelo outro e respondeu: – Isto pode ser obra da chuva, tem chovido bastante… – É engraçado, recebi um relatório de manhã que comunica que as nossas provisões de água têm diminuído bastante, apesar da chuva. – Atalhou Herb. Wertenbaker sacudiu a cabeça: – Pode ser um detalhe sem importância, aliás temos assuntos mais importantes a tratar, mais tarde voltaremos ao filme. – Quem sabe se Joe Fannel do Serviço de Inteligência, não poderia tratar do assunto – considerou Herb. – Está certo, remeta‐lhe tudo para que o estude. Uma pequena aeronave voltou ao local e três horas mais tarde o tenente Joe Fannel recebia novos filmes que estudou em detalhe e conferenciou com o seu capitão. Segundo ele, o ponto do manancial de água coincidia com o local em que seria desencadeada a ofensiva geral. Para Fannel era um achado importante, vital mesmo para a ofensiva já marcada. Pediu um avião para o levar até ao local assinalado no mapa e algum material. Tencionava esconder‐se na floresta e iria ao encontro das tropas leais, na ofensiva, acrescentando: – Os japoneses encaram esta guerra seriamente e eu também. Eles sabem que 89 CALEIDOSCÓPIO POLICIÁRIO preparamos uma ofensiva e também onde vai começar! Quando anoiteceu um avião conduziu Fannel próximo das linhas inimigas e a cerca de 1200 metros de altura, lançou‐se em pára‐quedas, com uma pesada mochila sobre os ombros. A ofensiva teve lugar dez dias decorridos, a cerca de 6,5 quilómetros da represa de água. Vindos da costa, os bombardeiros americanos atacavam a retaguarda das posições inimigas. Ao sul da cadeia de montanhas defendidas pelos japoneses encontrava‐se o vale, o único ponto de acesso a estas defesas, e foi por ali que a infantaria atacou. Enquanto os soldados avançavam, aviões, tanques pesados, e morteiros estabeleciam uma barragem de fogo. Surgiu então da floresta um homem roto e barbado que alegou ser o tenente do Serviço de Inteligência das forças armadas americanas. Levado ao quartel‐general, Joe Fannel prestou continência e sentou‐se cansado. Sorriu e disse: – Há dez dias que estou aqui, major, para me desincumbir da missão que o senhor e o coronel Wertenbaker me deram. A pequena represa encontra‐se na foto, major. O senhor e o coronel achavam que era uma lagoa formada pela água da chuva, mas eu relacionei‐a com a diminuição das correntes no sul, e estava certo. Os japoneses construíram um dique de cimento armado. O seu plano era acumular água na represa e quando as nossas tropas avançassem e alcançassem o vale, dinamitavam a represa. – Quer dizer se… – Isso. Seria, se o plano fosse bem sucedido, mas há dois dias abri um buraco no dique e a água escoou antes de os nossos homens chegarem. 90 

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