TRISTE FIM DE POLICARPO QUARESMA

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TRISTE FIM DE POLICARPO QUARESMA
TRISTE FIM DE POLICARPO QUARESMA: ENTRE O IDEAL E O REAL
RESUMO
Contextualizado no fim do século XIX, no Rio de Janeiro, TRISTE FIM DE POLICARPO
QUARESMA, o principal romance de Lima Barreto, narra os ideais e frustração do funcionário
público Policarpo Quaresma, homem metódico e nacionalista fanático.
Sonhador e ingênuo, Policarpo dedica a vida a estudar as riquezas do país: a cultura
popular, a fauna a flora, os rios. Sua primeira decepção se dá quando sugere a substituição
do português, como língua oficial, pelo tupi. O resultado é a sua internação em um hospício.
Aposentado, confiante na fertilidade do solo brasileiro, dedica-se à agricultura no sítio
Sossego. Contudo, depara-se com uma triste realidade: a esterilidade do solo, o ataque das
saúvas, a falta de apoio ao pequeno agricultor.
Por fim, com a eclosão da Revolta da Armada, no Rio de Janeiro, Quaresma apoia o então
presidente, o marechal Floriano Peixoto, e participa do conflito como voluntário. No cargo
de carcereiro, critica as injustiças que vê serem praticadas contra os prisioneiros. Em razão
dessas críticas, é preso e condenado ao fuzilamento por ordem de Floriano Peixoto, seu
ídolo.
Além da descrição política do país no início da República, a obra traça um rico painel
social e humano dos subúrbio cariocas na virada do século. Aposentados, profissionais
liberais, carreiristas, músicos, donas de casa. O mulato – esse é o universo retratado por
Lima Barreto em sua obra TRISTE FIM DE POLICARPO QUARESMA. Destacam-se, nesse
conjunto, as personagens Ismênia, que, tendo sido educada para o casamento, enlouquece
quando abandonada pelo noivo; Olga, sobrinha de Policarpo, que difere da maioria das
mulheres por ser mais independente; e o violonista e cantor de modinhas Ricardo Coraçãodos Outros, amigo de Policarpo.
FOCO NARRATIVO:
Foco narrativo em 3ª pessoa e dotado de onisciência, isto é, aquele que sabe de tudo,
inclusive do que se passa na cabeça de seus personagens, por isso o narrador de vale do
discurso indireto livre, como se pode perceber no fragmento abaixo, Lima Barreto constrói
um narrador que nutre franca antipatia pelo marechal Floriano Peixoto e por todos aqueles
que o rodeiam, com exceção do próprio Quaresma, por quem ele tem uma simpatia
declarada.
Desde os dezoito anos, que o tal patriotismo lhe absorvia e por ele fizera a tolice de
estudar inutilidades. Que lhe importavam os rios? Eram grandes? Pois que fossem… O
importante é que ele tivesse sido feliz. Foi? Não. Lembrou-se das suas cousas de tupi, do
folclore, das suas tentativas agrícolas… Restava disso tudo em sua alma uma satisfação?
Nenhuma! Nenhuma!
TEMPO
A história transcorre durante o governo de Marechal Floriano Peixoto e a Batalha a
Armada ( ocorrida em 1893), época da chamada República Velha, entre o final do século XIX
e o XX. É durante esse período que o autor procura retratar, detalhadamente, e com
profunda visão crítica, os costumes tanto sociais quanto políticos o Rio de Janeiro.
LINGUAGEM
Utilizou uma linguagem coloquial, adquirida com a experiência de jornalista, com vícios
linguísticos, entretanto carregada de humor, ironia e autenticidade.
TEMAS:
Explorou a xenofobia – aversão a aspectos de culturas estrangeiras – como ardil para
tecer dura crítica ao comportamento de uma sociedade hipócrita.
Destacam-se, também, os seguintes temas:

crítica ao academicismo típicos dos escritores parnasianos;

crítica à tradicional burocracia dos órgãos públicos;

preconceito não só racial, mas social e às pessoas sem formação acadêmica;

crítica a falta de apoio do governo ao homem do campo.
DIVISÃO DA OBRA
Divide-se em três partes: a primeira retrata questões nacionalistas do major Policarpo
Quaresma e da sua vida de funcionário exemplar. A segunda, tematiza a vida de Quaresma
em seu sítio Sossego e a tentativa de sobreviver cultivando a terra, além de seu alistamento
para, ao lado de marechal Floriano Peixoto, participar da Batalha da Armada. A terceira trata
da batalha, com a vitória do Exército sobre os marinheiros que se rebelaram, tentando
assumir o governo e do final trágico do major Quaresma, fuzilado por ser considerado um
traidor da Pátria.
PERSONAGENS
POLICARPO QUARESMA: personagem quixotesco, decorrente de sua xenofobia. Profundo
conhecedor da Literatura Brasileira, história, geografia, fauna, flora do Brasil. Cidadão pacato
que residia no subúrbio carioca, subsecretário do arsenal de guerra, respeitado por aqueles
que o conheciam. No entanto, ao propor a mudança da língua oficial, o português para o
tupi-guarani, cai no descrédito popular, tornando-se alvo de pilhérias. Após sua permanência
internado em um hospício, tenta viver da terra, no sítio Sossego, mas não consegue. Alistase com a finalidade de lutar ao lado do marechal Floriano Peixoto na famosa Batalha da
Armada. Após vitória, encarrega-se de tomar conta dos prisioneiros. Entretanto, ao saber
que vários desses marinheiros estavam sendo fuzilados, escreve ao marechal criticando tal
atitude. é preso e fuzilado.
RICARDO CORAÇÃO DOS OUTROS: seu nome faz alusão a uma paródia de Ricardo Coração
de Leão, rei da Inglaterra que se envolveu em batalhas e conquistas durante o século XII. Há
críticos literários que acreditam ser o personagem uma homenagem ao poeta e compositor
popular, Catulo da Paixão Cearense (1863-1946), autor da modinha Luar do Sertão. É o
professor de violão de major Quaresma. Alvo de forte preconceito, o violão era tido como
um instrumento de vadios e vagabundos, porém o instrumento ocupa um lugar de destaque
na obra, visto que o autor apresenta-o como o instrumento nacional.
OLGA: afilhada do major Quaresma, Olga, apesar de submeter-se a um casamento por
conveniência, é diferente da moças de seu tempo. Também considera idealista, por isso
pertence ao pequeno grupo do major.
VICENTE COLEONI: imigrante italiano, foi por muito tempo quitandeiro ambulante, época
em que conheceu o major, freguês assíduo. Passou por dificuldades financeiras e recebeu
ajuda de Quaresma. Com sua quitanda prosperou, tornou-se empreiteiro e enriqueceu.
Casou-se, teve uma filha, Olga, e como forma de gratidão, fez de Quaresma o padrinho da
criança.
DONA ADELAIDE: irmã mais velha de Policarpo Quaresma. Por não entender as ideias de seu
irmão, não as aceita.
GENERAL ALBERNAZ: militar incompetente e interesseiro. Pai de cinco filhas: Ismênia,
Quinota, Zizi, Lalá e Vivi e de um filho, Lulu, não media esforços para asar suas filhas e
conseguir um alguém que o ajudasse a admitir o filhona Escola Militar.
ISMÊNIA: é o símbolo da moça casadoira. Noiva de Cavalcanti, porém não o amava o
suficiente para se casar, mas não podia pensar na ideia de ficar para tia. No entanto, é
abandonada pelo noivo após a sua formatura. Em seu leito de morte, depois de um longo
período de demência e definhamento, pede para se enterrada vestida de noiva.
CAVALCÂNTI: noivo de Ismênia, estudante de odontologia, estudo custeado pelo pai da
noiva. Cavalcânti prolongou o curso por quatro anos. Não tendo como prolongar mais essa
exploração, formou-se. Após a festa, deveria marcar o casamento, foge para o interior,
deixando Ismênia inconsolável.
GENELÍCIO: futuro marido de Quinota, filha do general Albernaz. Empregado do Tesouro,
Genelício é bajulador, oportunista, sempre visava a conseguir um cargo melhor.
CALDAS: contra-almirante na Marinha, fez pela Marinha o que o general Albernaz fez pelo
Exército, quase nada.
ARMANDO BORGES: esposo de Olga. Formado em medicina, é ambicioso, interesseiro e
preconceituoso.
INOCÊNCIO BUSTAMANTE: apesar de interesseiro era servil e humilde.
DR. CAMPOS: médico, fazendeiro e chefe político do município de Curuzu, onde o major
Quaresma comprara o sítio Sossego. Interesseiro e ardiloso.
MARECHAL FLORIANO PEIXOTO: Presidente da República (presidiu o Brasil de 23 de
novembro de 1891 a 15 de novembro de 1894), conhecido como “marechal de ferro”. O
marechal é alvo de crítica por parte do narrador.
O mais lido e conhecido romance de Lima Barreto é Triste fim de Policarpo Quaresma.
Através dele o autor tematiza o embate entre o real e o ideal. Em Policarpo, o patriotismo é
o ideal. Ele assume ares de visionário, louco por não pensar em si, por não se interessar por
sua carreira ou tentar obter qualquer tipo de vantagem pessoal. Seu único objetivo é o
engrandecimento do Brasil. Por isso, “o triste fim” do protagonista é a perda de todos os
ideais, quando percebe que dedicou sua vida a uma causa inútil.
A desilusão final de Policarpo é a desilusão de Lima Barreto, que morreu acreditando ser o
dever dos escritores “ deixar de lado todas as velhas regras, toda a disciplina exterior dos
gêneros e aproveitar de cada um deles o que puder e procurar, conforme a inspiração
própria, para tentar reformar certas usanças”. Por esse motivo, o novo Brasil que surgiu nos
textos pré-modernistas, marcado por grandes desigualdades sociais, não era um país que
motivasse o orgulho dos leitores. Mas era um país real.
FONTE:
ABAURRE, Maria Luiza M. – Português: contexto, interlocução e sentido. São Paulo: Moderna,
2008