DESAFIOS E PERSPECTIVAS DA EDUCAÇÃO
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DESAFIOS E PERSPECTIVAS DA EDUCAÇÃO
DESAFIOS E PERSPECTIVAS DA EDUCAÇÃO ONMILATERAL NA FORMAÇÃO DO TRABALHADOR Aristéia Mariane Kayser* Marco Aurélio da Silva** Raimunda Nonata Fortes Braga*** RESUMO A proposta deste artigo é analisar a importância da educação onmilateral na formação do trabalhador. Justifica-se a escolha da temática pela proposta de uma educação emancipatória no que tange aos desafios e perspectivas ao sistema neoliberal. Para o desenvolvimento teórico da pesquisa, pautou-se em bibliografia conceitual da temática acima descrita, tendo como base conceitual a questão emancipatória, uma educação libertária visando a uma transformação significativa do trabalhador, discutindo assim possíveis alternativas no que se refere a uma reflexão dinâmica visando, desta forma, abrir um canal de diálogo interdisciplinar. Palavras-chave: Educação. Emancipação. Trabalhador. INTRODUÇÃO Diante do mundo do trabalho complexo, a vez é das mudanças do século XXI, as quais se tornaram questões relevantes para os trabalhadores, economia, educação e no próprio lugar de trabalho. Aparecendo neste contexto, novos conceitos, como: globalização, qualidade, tecnologia, terceirização, diversidade de mão-de-obra, entre * Especialização em Gestão da Organização em Saúde Pública - UFSM, Especialização em Educação Ambiental UFSM, Santa Maria - RS/BRASIL, E-mail; [email protected]; Endereço Lattes: http://lattes.cnpq.br/7654244279351973 ** Mestrado em Ciências Sociais - UFSM, Mestrado em Educação - UNISC, Pós Graduação em Educação Ambiental UFSM, Pós Graduação em Mídias na Educação - UFPEL. Santa Maria - RS/BRASIL. Diretor Acadêmico da Faculdade do Baixo Parnaíba - FAP. E-mail: [email protected]; Lattes: http://lattes.cnpq.br/66653838665568 *** Mestrado em Desenvolvimento Humano: Formação, Políticas e Práticas Sociais pela Universidade de Taubaté. Graduação em Pedagogia - UFMA. E-mail: [email protected]. Professora da Faculdade do Baixo Parnaíba FAP. Lattes: http://lattes.cnpq.br/3413997082821016 Diálogos & Saberes, Mandaguari, v. 10, n. 1, p. 77-94, 2014 77 outros. Neste mundo inconstante os trabalhadores tentam se adaptar, porque na verdade as pessoas não gostam de mudanças. Porque as mudanças no mundo do trabalho são drásticas para o trabalhador, com dolorosas demissões e reestruturação da própria mão-de-obra. E estas por sua vez, deixam os trabalhadores frustrados e assustados. Todavia, muito são os calorosos e apaixonados debates, no que tange aos desafios na construção de um projeto político pedagógico de Educação para a formação dos trabalhadores, em uma perspectiva de emancipação humana, a qual surge como alternativa a uma tradicional educação dominante. No atual mundo globalizado em que vivemos novas demandas se colocam para a escola e para todos que participam de sua gestão, estamos na sociedade do conhecimento e da tecnologia no qual precisamos da participação efetiva de todos para a construção coletiva de um projeto de sociedade mais justa e humana (LINHARES, 1986, p.16). O conceito de gestão pressupõe uma esfera macro que visa à dinamização do micro, portanto é correto englobar dentro deste sistema as esferas governamentais sendo “Estado e municípios”. E dentro de um escopo de uma gestão escolar essa predominância administrativa também é verificada. Todavia, existe uma necessidade de articulação visando legitimar a eficácia das políticas públicas as quais são respaldadas n aLei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (LDB 9394/96), em seus respectivos artigos nº 3, 12,13, 15e 39, do Brasil. Neste contexto, observamos a vertente do modelo tayloristafordista, o qual é oriundo do processo industrial, que tem como base a centralização, a produção de massa, mecanização, formalização, e isto influencioua gestão educacional, a administração escolar, o projeto político pedagógico e a gestão democrática1. Exemplo este formado por um sistema gessado e ainda burocratizado da educação, apresentando assim um novo modelo de gestão no Brasil visando responder às perspectivas do Banco Mundial. Entretanto, uma das críticas feitas a esse modelo de gestão está relacionada à falta de um planejamento adequado, pois existe toda uma Diálogos & Saberes, Mandaguari, v. 10, n. 1, p. 77-94, 2014 78 política institucional chamada “Educação para todos” e como exemplo se verifica uma situação ilustrativa, porém real, que é o Programa Universidade para todos - “Prouni” e a Educação a Distância, programas assumidos pelo governo como uma proposta inclusiva e de produção de massa. Há uma política pública de inclusão, mas, não há uma devida preocupação com esta “clientela”, ou seja, no que tange às questões da locomoção, da alimentação, moradia, acesso à internet, a computadores/laboratórios, material didático impresso, infraestrutura de qualidade, insumo físico capacitado, professores com formação própria para atuação nas devidas áreas de ensino, o que nos habilita em dizer que se trata de um processo fragmentado, superficial sem atingir a totalidade dos objetivos, demonstrando, assim, um processo de massa. Logo, observa-se a influência do modelo taylorista-fordista sobre as normatizações de leis, as quais na sua prática ficam inviáveis para a aplicação, portanto na sua essência sem a devida efetivação. É importante compreender o contexto histórico do sistema educacional brasileiro, as dificuldades, as vitórias, a influência de movimentos sociais, interesse das grandes empresas sobre a mão de obra qualificada, a preparação para o mercado do trabalho, lembrando que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (LDB 9394/96) surgiu com a abertura do Brasil para o sistema neoliberal. Globalização e neoliberalismo são duas palavras que ouvimos com frequência no cotidiano, mas será que todos sabem o verdadeiro significado de cada uma delas e sua influência em nossas vidas e na educação? Ambos os conceitos ainda permeiam em ambiguidades, e ainda usam do velho jogo ideológico muito bem conhecido por todos nós. O Brasil, ao abrir-se para o sistema neoliberal e em resposta aos anseios do Banco Mundial no que tange à educação, elaborou na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (LDB 9394/96) os artigos 1 e 35, os quais enfatizam a necessidade de preparação para o mercado do trabalho e para a prática social duas vertentes que se coadunam com os artigos 205 e 206 da Constituição Federal de 1988. Há toda uma política de “mecanização do ensino”, visando alcançar as metas governamentais por meio de um sistema que não valoriza o pensamento e a emancipação do sujeito. Diálogos & Saberes, Mandaguari, v. 10, n. 1, p. 77-94, 2014 79 Nos dias atuais, as fronteiras nacionais são insignificantes para o limite de competição de mão-de-obra, as oportunidades de trabalho destinam-se à educação do conhecimento, à economia, na maior parte do mundo é capitalista, e cada vez mais, o espírito empreendedor conduz as pequenas empresas, sendo que as necessidades dos clientes que conduzem os negócios de uma organização. Carnoy (1994) ressalta que é fundamental percebermos a distinção feita por Marx e Gramsci no que se refere ao entendimento sobre o conceito de (sociedade civil) e cita que, Para Marx e Gramsci, a sociedade civil é o fator chave na compreensão do desenvolvimento capitalista, mas para Marx a sociedade civil é estrutura (relações na produção). Para Gramsci, ao contrário, ela é superestrutura, que representa o fator ativo e positivo no desenvolvimento histórico; é o complexo das relações ideológicas e culturais, a vida espiritual e intelectual, e a expressão política dessas relações torna-se o centro da análise, e não a estrutura (CARNOY, 1994, p. 93). Dessa forma, propomos um trabalho que traga uma relação dos novos conceitos exigidos por este mundo do trabalho com os conceitos marxianos e Gramscinos, os quais nos fazem refletir sobre um mundo de mudanças velozes e as perspectivas do futuro no mundo do trabalho. Assim, visamos a uma melhoria na educação para os trabalhadores e que esses indivíduos possam colocar em prática tais conceitos, que possam ser corajosos, sem ter o temor do erro e que possam construir uma visão de futuro. Porém, é preciso que essas competências sejam desenvolvidas em sala de aula, criando a ideia de que o conhecimento pode ser consolidado com a educação e as exigências do mundo do trabalho. Trata-se de uma proposta de reflexão, na qual há compromisso com o desenvolvimento humano, social e econômico sustentável. Entretanto, não basta o sonho, precisamos de ferramentas que auxiliem essas realizações. Como sabemos, temos que entrelaçar os velhos conceitos e abordar novos paradigmas, em que o essencial é o capital intelectual, ou chamado capital humano, ou seja, ideias e conhecimentos de um ser ou Diálogos & Saberes, Mandaguari, v. 10, n. 1, p. 77-94, 2014 80 um grupo. Este vem a desmistificar a realidade que nos encontramos tais como os valores negativos atribuídos ao mundo de trabalho, estigma do fracasso, sonhos não realizados vinculados ao trabalho, busca da estabilidade, aversão ao risco, cultura da dependência, síndrome da empregabilidade, entre outros. Por exemplo, no que diz respeito à “síndrome da empregabilidade” ocorre que, em muitos casos, há empregados que esperam sempre por alguém que lhe dê direção ou supervisão e busca apenas conhecer um determinado setor, o seu, não olhando a produção ou a organização como um todo. A educação muda a versão desses conceitos e gera novos e preciosos conhecimentos, dando-nos direção e rumo, os quais nos levam ao mundo do trabalho globalizado, identificando a capacidade de nos dar oportunidades, de nos mostrar as redes de relações que existem e, acima de tudo, mostra-nos que os fracassos podem servir de lição e aprendizado. Na escola atual, em função da crise profunda da tradição cultural e da concepção da vida e do homem, verifica-se um processo de progressiva de generescência: as escolas de tipo profissional, isto é, preocupadas em satisfazer interesses práticos imediatos, predominam sobre a escola formativa, imediatamente desinteressada. O aspecto mais paradoxal reside em que este novo tipo de escola aparece e é louvada/o como democrático, quando na realidade, não só é destinado a perpetuar as diferenças sociais, como ainda a cristalizá-las em formas chinesas (GRAMSCI, 2001, p. 49). Gramsci, ao propor uma reflexão de “escola unitária”, está pensando em uma escola humanista, ou seja, um espaço público propício para o afloramento de condições ideais de escola democrática, considerando as contradições sociais. Surgindo, assim, uma perspectiva de uma educação flexiva, descentralizada, horizontal em suas relações e nas suas práticas, desencadeando propostas emancipatórias e ressignificando o contexto social e fomentando uma consciência crítica do modelo tayloristafordista verificado no sistema educacional brasileiro. Diálogos & Saberes, Mandaguari, v. 10, n. 1, p. 77-94, 2014 81 [...] nas reformas dos sistemas de ensino aparecem conceitos e propostas tais como descentralização; autonomia dos centros escolares; flexibilidade dos programas escolares; liberdade de escolha de instituições docentes; necessidade de formação continuada; superação do conhecimento fragmentado [...]. Esses conceitos encontram correspondência nas características da reorganização do mundo produtivo: na descentralização das grandes corporações industriais; na autonomia relativa de cada fábrica em decorrência do processo de desterritorialização das unidades de produção e/ou de montagem; na flexibilidade da organização produtiva para se ajustar à variabilidade de mercados e de consumidores (SANTOMÉ, 1998, p. 21 apud MARTINS, 2000, p. 72). A Unesco formulou, nas décadas de 1990, diretrizes para educação, que são: Aprender a conhecer, Aprender a fazer, Aprender a viver juntos e Aprender a ser. Estas seriam os “pilares da educação do futuro” e esses pilares estão referenciados nos “PNCs” e nas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio “DCNEM”,de 1998 da educação brasileira (FRIGOTTO; CIAVATTA, 2002; FERRETTI; SILVAJUNIOR, 1998; KUENZER, 2001). Segundo Ramos (2004, p. 39), “[...] preparar para a vida significava desenvolver competências genéricas e flexíveis, de modo que as pessoas pudessem se adaptar facilmente às incertezas do mundo contemporâneo”. Observa que, no Plano Nacional da Educação “PNE”, estabelecido em 2001 (Lei n. 10.172), foram planejadas e definidas várias metas para o ensino médio até 2011, sendo uma delas. Oferecer vagas que, no prazo de cinco anos, correspondam a 50% e, em dez anos, a 100% da demanda por ensino médio, em decorrência da universalização e da regularização do fluxo de alunos no ensino fundamental; Melhorar o aproveitamento dos alunos do ensino médio, de forma que atinjam níveis satisfatórios de desempenho definidos e avaliados pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB), Diálogos & Saberes, Mandaguari, v. 10, n. 1, p. 77-94, 2014 82 pelo Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e pelos sistemas de avaliação que venham a ser implantados nos estados; Reduzir, em 5% ao ano, a repetência e a evasão, de forma que se diminua para quatro anos o tempo médio para conclusão desse nível; Assegurar, em cinco anos, que todos os professores do ensino médio possuam diploma de nível superior, oferecendo, inclusive, oportunidades de formação, nesse nível de ensino, àqueles que não a realizaram; Promover, no prazo de um ano, padrões mínimos nacionais de infraestrutura, compatíveis com as realidades regionais (BRASIL, 2001). Entre os vários desafios da educação contemporânea brasileira existe o problema do diagnóstico. A educação é um elemento desencadeador de transformações, e, neste sentido, é fundamental a qualidade da pedagogia técnica para responder às demandas do mundo produtivo. Nesta ótica se apresenta a pedagógica tecnicista, a qual tem como demanda o processo industrial brasileiro, a instrumentalização de mão-deobra, para o processo fabril. Portanto, os modelos taylorista e o fordista, no âmbito educacional, surgem com um projeto pedagógico, estritamente técnico, o qual é direcionado a uma determinada perspectiva de formação e ordem mercadológica, tornando o Estado mínimo em sua responsabilização no que tange à educação, e, desta forma, trazendo para as fronteiras do Brasil a porosidade por meio da implementação de uma língua estrangeira a partir de 6º ano em qualquer das séries. Segundo Saviani (2005), os ditames da educação tecnicista estão baseados no trabalho. Na verdade, o modelo “fordista” enfatiza uma produção crescente, uma qualificação “marginal”, unilateral dos trabalhadores e sob as diretrizes do mercado, e isso não é diferente na educação, pois há o saber-fazer segundo Dellors (1996, p. 4). Este aumento de exigências em matéria de qualificação, em todos os níveis, têm várias origens. No que se diz respeito ao pessoal de execução, a justaposição de trabalhos prescritos e parcelados deu lugar à organização em 'coletivos de trabalho' [...]. Por outro lado a indiferenciação entre trabalhadores Diálogos & Saberes, Mandaguari, v. 10, n. 1, p. 77-94, 2014 83 sucede a personalização das tarefas. Os empregadores substituem, cada vez mais, a exigência de uma qualificação ainda muito ligada, de seu ver, à ideia de competência material, pela exigência de uma competência que se apresenta como uma espécie de coquetel individual, combinando a qualificação, em sentido estrito, adquirida pela formação técnica e profissional, o comportamento social, a aptidão para o trabalho em equipe, a capacidade de iniciativa, o gosto pelo risco. O modelo de produção fordista vem passando por transformações com o processo de “tecnificação”, que esta pautada na redistribuição de atividades. Neste sentido, percebe que no sistema educacional, principalmente proposto pelas Universidades Federais e Institutos Federais, consistem em formação por células, ou seja, centro de educação, centro de saúde, de tecnologia, de engenharia, enfim, vários centros formando pessoas sem uma perspectiva de uma educação transversal e interdisciplinar. O neoliberalismo visa, através da educação, condiciona o cidadão em consumidor passivo, a educação se redefine de acordo com os termos de mercado. E para que isso não ocorra de forma isolada é preciso que aconteça a globalização que ultrapassa as fronteiras de países e continentes. As transformações gerais da sociedade atual apontam a inevitabilidade de compreender o país no contexto da globalização, da revolução tecnológica e da ideologia do livre mercado (neoliberalismo). A globalização é uma tendência internacional do capitalismo que, juntamente com o projeto neoliberal, impõe aos países periféricos a economia de mercado global sem restrições, a competição ilimitada e a minimização do Estado na área econômica e social (OLIVEIRA; LIBÂNEO, 1998, p. 606). Neste contexto globalizado e neoliberal entre países ricos e pobres, dita as regras quem tem maior domínio econômico e influência global, que resulta em poder político. Consequentemente as políticas educacionais implantadas seguem a mesma ordem, e obedecem às Diálogos & Saberes, Mandaguari, v. 10, n. 1, p. 77-94, 2014 84 necessidades e exigências de mercado. Citam-se, por exemplo, as políticas dos órgãos internacionais, como o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial, os quais enfatizam que os investimentos devem ser calculados da mesma forma como,via de regra, um empréstimo empresarial. Essa centralidade se dá porque educação e conhecimento passam a ser do ponto de vista do capitalismo globalizado, força motriz e eixos da transformação produtiva e do desenvolvimento econômico. São, portanto, bens econômicos necessários à transformação da produção, ao aumento do potencial científico e tecnológico e ao aumento do lucro e do poder de competição num mercado concorrencial que se quer livre e globalizado pelos defensores do neoliberalismo. Torna-se clara, portanto, a conexão estabelecida entre educação/conhecimento e desenvolvimento/ desempenho econômico. A educação é, portanto, um problema econômico na visão neoliberal, já que é oelementocentraldessenovopadrãodedesenvolvimento (OLIVEIRA;LIBÂNEO, 1998,p.602). Apesar de ocorrer a exclusão social, e as políticas públicas não conseguirem privilegiar a todos com uma proposta de educação emancipatória, a educação continua sendo uma forma de acumular forças contraditórias a dominação. O neoliberalismo, no que se refere à educação, apresenta a ideia de preparação de mão de obra para o mercado de trabalho. Portanto, é interessante que possamos debater, discutir e investigar as contradições e transformações referentes ao período em que vivemos e o processo produtivo mundial. Período este marcado pela reestruturação produtiva, com propostas de inovações tecnológicas visando a uma melhor competitividade e aumento da produtividade (HARVEY, 1996). Assim, foi necessário repensar, redefinir estratégias referente à dinâmica educação para o trabalho, pois a classe trabalhadora não era valorizada. Uma das significativas mudanças verificadas é a polivalência do trabalhador, gerando um sistema competitivo, o qual o emprego cada vez mais se torna algo escasso, e o trabalhador capacitado e qualificado Diálogos & Saberes, Mandaguari, v. 10, n. 1, p. 77-94, 2014 85 torna-se objeto de cobiça das empresas. Fenômeno este que acabou criando um sistema instável, exigindo um novo do perfil do trabalhador, porém o sistema globalizado responsabiliza-o pelo seu sucesso ou fracasso, enquanto um profissional “trabalhador”. No que tange ao discurso oficial da relação educação e produção, pauta-se na pedagogia da qualidade, da multi-habilitação, da polivalência do trabalhador na busca constante da manutenção da sua empregabilidade (FRIGOTTO, 1996). Processo este nos faz entender o posicionamento de Ramos (2001), e consequentemente concordar com sua teoria, pois a constituição das relações sociais no processo formativo humano se reconfigura pela via relacional da dialética no que tange o subsumir do homem ao capital e a luta contra o próprio sistema. Sendo assim, na agenda do capital, a educação passa a ser algo fundamental, pois pela via dessa é que surge o desenvolvimento e esta é necessária para a manutenção deste fenômeno que tem como uma das bandeiras a diminuição da pobreza, da desigualdade social. Na perspectiva de Rummert (2000, p. 6), a educação deve se comprometer a atender “[...] às exigências do mercado, sendo dotada dos conteúdos exigidos pelo capitalismo para seu desenvolvimento nessa nova fase”. Outro desafio verificado, no que diz respeito à construção de novas propostas de educação do trabalhador, é a dificuldade de rompimento com a educação hegemônica, pois muitas vezes é desconsiderada a experiência do trabalhador. Por mais que tenhamos políticas públicas de inclusão, acesso escolar e garantia de uma educação de qualidade, conforme proposta da “Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (LDB 9394/96)”. O projeto político-pedagógico das escolas ainda é algo centrado na burocracia escolar, dificultando assim debates e implementação de conteúdos no que tange considerar o contexto histórico do trabalhador sem a devida preocupação com a adaptabilidade de mecanismos que considerem a realidade social do mundo do trabalho. Portanto, o caráter sociológico e ideológico muitas vezes é desconsiderado no que se refere à construção de uma educação do trabalho pela via da solidariedade, do cooperativismo, da associação, pois, há uma preocupação do sistema neoliberal em fomentar um individualismo e uma competição constante. O que se verifica na Diálogos & Saberes, Mandaguari, v. 10, n. 1, p. 77-94, 2014 86 realidade é uma classe dominante querendo garantir seu poder ideológico, e Gramsci (1991, p. 10-11) menciona que, Por enquanto, pode-se fixar dois grandes 'planos' superestruturais: o que pode ser chamado de 'sociedade civil' (isto é, o conjunto de organismos chamados comumente de 'privados') e o da 'ociedade política ou Estado', que correspondem à função de 'hegemonia' que o grupo dominante exerce em toda a sociedade e àquela de 'doio direto' ou de comando, que se expressa no Estado e no governo 'jurídico'. Estas funções são precisamente organizativas e conectivas. Os intelectuais são os 'comissários' do grupo dominante para o exercício das funções subalternas da hegemonia social e do governo político, isto é: 1) do consenso 'espontâneo' dado pelas grandes massas da população à orientação impressa pelo grupo fundamental dominante à vida social, consenso que nasce 'historicamente' do prestígio (e, portanto, da confiança) que o grupo dominante obtém, por causa de sua posição e de sua função no mundo da produção; 2) do aparato de coerção estatal que assegura 'legalmente' a disciplina dos grupos que não 'consentem', nem ativa nem passivamente, mas que é constituído para toda a sociedade, na previsão dos momentos de crise no comando e na direção, nos quais fracassa o consenso espontâneo. O trabalhador cada vez mais deve recorrer à apropriação de conhecimentos científicos e tecnológicos e Kuenzer (1988, p. 138) menciona que “[...] a simplificação do trabalho contemporâneo é a expressão concreta da complexificação da tecnologia através da operacionalização da ciência”. AEDUCAÇÃO PROFISSIONALE O DESAFIO DE ROMPIMENTO COM PROPOSTAS HEGEMÔNICAS Abrimos esta seção pautando-nos em uma perspectiva históricocrítica, afirmando que as relações sociais só se sustentam estruturadas Diálogos & Saberes, Mandaguari, v. 10, n. 1, p. 77-94, 2014 87 nas sociedades de classe. Pois bem, o contexto histórico da educação profissional é o exemplo mais explícito desta afirmação, pois se constituiu pela via da dualidade entre trabalho manual e trabalho intelectual, visando à garantia da produção de massa cujos conteúdos voltam-se para a produção. Na perspectiva das classes dominantes, historicamente, a educação dos diferentes grupos sociais de trabalhadores deve dar-se a fim de habilitá-los técnica, social e ideologicamente para o trabalho. Trata-se de subordinar a função social da educação de forma controlada para responder às demandas do capital (FRIGOTTO, 1996, p. 26). Entre as mais diversas perspectivas teóricas de proposta de educação emancipatória é romper ou no mínimo desenvolver a capacidade crítica do sujeito em perceber as nuances contraditórias dos mais diversos modelos de produção capitalista, os quais estão pautados na competição e no acirramento de consumo e de desigualdade social, exigindo do trabalhador um disciplinamento dos seus conhecimentos científicos. Trata-se, portanto, de uma formação tecnicista. Entretanto, observa-se uma fragmentação, pois há um discurso da obsolescência desta proposta educacional, e a nova proposta é uma formação integral e exclusivamente voltada às necessidades da gestão do trabalho, visando, assim, a uma sinergia no que se refere ao aproveitamento máximo da força de trabalho, ou seja, este não é considerado como práxis social. E na perspectiva deAntunes (1999, p. 168), O trabalho é, portanto, um momento efetivo de colocação de finalidades humanas, dotado de intrínseca dimensão teleológica. E, como tal, mostra-se uma experiência elementar da vida cotidiana, nas respostas que oferece aos carecimentos e necessidades sociais. Reconhecer o papel fundante do trabalho na gênese e no fazer-se do ser social nos remete diretamente à dimensão decisiva dada pela esfera da vida cotidiana, como ponto de partida para a genericidade para-si dos homens. É central a recorrência ao universo da vida Diálogos & Saberes, Mandaguari, v. 10, n. 1, p. 77-94, 2014 88 cotidiana, quando se quer transcender do âmbito e das ações próprias da consciência espontânea, contingente, mais próximas da imediatidade, para as formas de consciência mais dotadas de valores emancipados, livres e universais. A intencionalidade da educação parece ser o desafio a ser refletido, discutido, pois conforme Freire (1998) é fundamental uma crítica à educação bancária a uma proposta de educação emancipatória, mas o problema consiste em para quem, para que e que educação queremos? Somos críticos de uma educação mecanicista, contudo nossas práticas e estratégias pedagógicas estão pautadas no modelo de competências assegurando o status do sistema neoliberal, acabamos por transferir para escola e principalmente para os alunos a responsabilização do sucesso, ou não. E esse argumento de que o sujeito éo principal responsável pelo seu sucesso é uma falácia, tal base metodológica de ensino é contraditória. É o sistema (capital) quem regulariza o interesse social condicionando a sociedade a esta cultura filosófica e utiliza-se da metodológica dialética para assim definir um percurso formativo conforme interesse próprio. Este princípio da adaptabilidade – que requer uma personalidade responsável, comprometida e autônoma, ao lado de posturas flexíveis frente às incertezas – recebe o investimento da empresa, mediante o gerenciamento exercido sobre a personalidade do trabalhador. Isto favorece a interiorização dos valores da empresa e a internalização de seus modos de controle. Este tipo de gestão é instrumentalizado pela valorização de características psico-cognitivas e sócio-afetivas do indivíduo, em outras palavras, do saber conjugado ao saber fazer (RAMOS, 2001, p. 11). Desta forma, a construção de novos parâmetros sociais acaba sendo afetada pelo discurso das competências individuais, justificado pelo processo de certificação profissional e reorganizando o sistema educacional colocando-o a serviço do capital. A noção de competência é, então, apropriada ao Diálogos & Saberes, Mandaguari, v. 10, n. 1, p. 77-94, 2014 89 processo de despolitização das relações sociais e de individualização das reivindicações e negociações. As relações coletivas não se esgotam, já posto que o trabalho continua sendo uma relação social e o homem continua vivendo em sociedade, mas elas se pautam cada vez menos por parâmetros corporativos e/ou políticos para se orientarem por parâmetros individuais e técnicos (RAMOS, 2001, p. 159-160). Neste caso, portanto, entendemos que uma proposta de qualificação profissional deve considerar todos os aspectos da realidade social no que tange uma educação integral, pois a viabilidade desta proposta está na formação utópica no que se refere à onmilateralidade. Tudo irá depender de como se quer operar no âmbito social. Entendemos que essa utopia consiste nas reais possibilidades de transformação social da realidade educacional do trabalhador, considerando a história, a ação, os fenômenos sociais e culturais no universo do trabalhador. CONSIDERAÇÕES FINAIS Entendemos ser problemático afirmar que há um consenso na relação trabalho e educação, pois esse fenômeno e suas condições são conflituosos. Não há consenso, o que há é uma relação, mas não de maneira adequada no capitalismo (SAVIANI, 2005). Como exemplo, pode citar a contradição do aumento constante do desemprego de trabalhadores escolarizados. Isto é uma das realidades brasileira, pois a educação ainda não é um direito universalizado, as desigualdades são latentes principalmente nas classes sociais menos favorecidas, ou seja, a educação não é um direito garantido. Há um argumento falacioso disseminado pelo sistema capitalista que é introjetado nos meios de comunicação, na sociedade atual relativizando que o desemprego não trata e apenas uma realidade da sociedade mais excluída. Mas é um fenômeno que ocorre nas sociedades mais modernas, mais escolarizadas, ou seja, a ideia central é que a educação enquanto instrumental é capaz de favorecer, ou melhor, garantir emprego. Através desse discurso é evidenciada a relação complexa entre escolaridade e inserção no mercado de trabalho, o que na essência dessa relação está Diálogos & Saberes, Mandaguari, v. 10, n. 1, p. 77-94, 2014 90 demonstrando o fenômeno da desigualdade social, presente na estrutura do sistema econômico brasileiro, afetando objetivamente os jovens em processo formativo e com idade de inserção no mercado de trabalho. As nuanças contraditórias da relação educação e inserção no mundo do trabalho possibilitando classificar este fenômeno como relação social que influencia principalmente as classes sociais mais vulneráveis, tratando-se de jovens em processo de inserção no mercado de trabalho. Pois, o sistema capitalista requer habilidades, competências, valores culturais, processos produtivos com mais tecnologia. Tudo isso acaba por gerar desigualdade e a manutenção da classe social. Um dos papeis da escola é, então, revelar as contradições sociais, econômicas, culturais. O ato educativo é um fim em si mesmo para o favorecimento da construção de uma cidadania crítica, pois não se pode adotar ou legitimar a ilusão do desenvolvimento social, é necessária a ação consciente da transformação social para possibilitar a alteração da ordem social contraditória da nossa sociedade. ABSTRACT CHALLENGES AND PERSPECTIVES OF THE EDUCATION IN THE ONMILATERALWORKER'S FORMATION The purpose of this paper is to analyze the importance of education in shaping the onmilateral worker. It is justified the choice of the thematic for the emancipatory education of a proposal regarding the challenges and perspectives of the neoliberal system. For the theoretical development of the research was based on the conceptual thematic bibliographies described above having as conceptual basis emancipatory question, a libertarian education aiming at a significant transformation of the worker as well discussing possible alternatives regarding a dynamic thinking to thereby open a channel of an interdisciplinary dialogue. Keywords: Education. Emancipation. Worker. Notas: 1 A Educação na contemporaneidade vem se tornando cada vez mais complexa, a participação de novos atores na educação possibilita estrategicamente o Diálogos & Saberes, Mandaguari, v. 10, n. 1, p. 77-94, 2014 91 discurso de modernização e democratização, que ressignifica alguns conceitos, lembrando que é através do processo histórico que compreendemos como ocorrem os fatos sociais. Ao considerar a perspectiva dos três teóricos clássicos das Ciências Sociais percebe-se que Marx centrou seu debate na proposta educacional de Gotha, já Marx Weber compara a educação alemã àquela dos Literati Chineses. Durkheim traça um histórico da construção do sistema educacional francês, dos três autores foi o que mais se dedicou à educação. Ele nos mostra a educação como uma instituição sociabilizadora das novas gerações nos valores sociais hegemônicos e que continua atualmente, onde as práticas educativas não são fatos isolados. Assim, a educação moral é ao mesmo tempo racional. Muitas foram as consequências do processo de globalização e da política neoliberal, sendo que não são recentes, tendo hoje como acontecimentos normais, a globalização acarretou em uma maior concentração de renda. Com o neoliberalismo ocorrem mudanças em relação ao papel do Estado, colocando que o mercado deveria substituir a política, e quanto à política educacional, a mesma segue a lógica de mercado, restringindo a ação do Estado à garantia da educação básica, e deixando os outros níveis sujeitos às leis de oferta e procura. Essas transformações atingiram profundamente a cultura e a educação. A concorrência no mercado trouxe a algumas escolas uma mudança nas suas relações, transformando quem ensina num prestador de serviço, quem aprende no cliente, e a educação num produto a ser produzido com alta ou baixa qualidade. REFERENCIAS ANTUNES, R. Os sentidos do trabalho: ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. São Paulo: Boitempo, 1999. BRASIL. Lei no 10.172, de 9 de janeiro de 2001. Aprova o Plano Nacional de Educação e dá outras providências. Diário Oficial [da] União, Brasília, DF, 26 jan. 2001. Seção 1, p. 1. BRASIL. Ministério da Educação. 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