O ROSE-BUD
Transcrição
O ROSE-BUD
O ROSE-BUD A tempo, alcançamos águas repletas de cachalotes e a esperança de Acab achar Moby Dick cresceu. Ele estava tão obcecado que não quis parar em terra para reabastecer de água doce. Vimos uma enorme carreira de baleias esguichando água no ar. A tripulação entrou nos botes e nos pusemos a persegui-las, mantendo-as à nossa frente. Quando há muitas baleias, a ordem é matar o máximo possível, ou ao menos feri-las para poder matá-las mais tarde. Para isso, usamos blocos de madeira presos aos arpões. O peso extra dificulta a fuga da baleia ferida. São criaturas impressionantes! As fêmeas e os filhotes pareciam não ter medo e se aproximaram dos barcos como cães. Era maravilhoso observar de perto criaturas tão poderosas e tão calmas. Estávamos enfeitiçados pelo berçário de baleias, perturbado apenas pelas baleias feridas. Apenas uma baleia foi capturada naquele dia. O resto escapou. Uma outra perda foi o chapéu de Quiqueg, que escapou de sua cabeça e nunca mais foi visto. 24 AF•Miolo_Mobydick_03.indd 24 3/5/08 3:19:20 PM O que há com o seu nariz? Quebrou? Ela pode carregar algo bem mais valioso do que óleo. Eu queria era não ter nariz! Aproximamo-nos de um navio francês, o Rose-Bud, com duas baleias amarradas nas laterais. O cheiro era insuportável, e Stubb se perguntou se uma das baleias conteria âmbar-gris7. Stubb decidiu tentar enganar a tripulação francesa, fazendo-a abandonar suas baleias. Apertando o nariz, chamou um tripulante francês. O homem não estava gostando nada daquele cheiro, então Stubb o usou para trapacear o capitão. Como prezamos nossas vidas, livre-se desses peixes. Se chamar o capitão, tiro você dessa enrascada. A tripulação subia para o alto dos mastros em busca de ar mais puro. Usando aquele tripulante como intérprete, Stubb disse ao capitão que aquelas baleias transmitiam uma febre que iria matar a tripulação. Aterrorizado, o inexperiente capitão ordenou que os animais fossem abandonados. Elas agora são minhas! O generoso Stubb se ofereceu para ajudar e ele mesmo soltou um dos animais. Estava feliz por ter garantido uma possível fonte do valioso âmbar-gris para o Pequod. Enfiando as mãos dentro da baleia, retirou uma coisa parecida com queijo podre, mas que valia uma fortuna! Como Acab passava com freqüência pelo convés, contemplou seu dobrão. Então anunciou que queria a baleia-branca arrancada do mar em, no máximo, um mês e um dia. 7. Âmbar-gris: substância sólida de cor cinza, odor almiscarado e consistência de cera, produzida pelos cachalotes. Era valiosa e usada na fabricação de perfumes. AF•Miolo_Mobydick_03.indd 25 25 3/5/08 3:19:35 PM NOTÍCIAS SOBRE A BALEIA-BRANCA Você viu a baleia-branca? Eu não conhecia a fama da baleia-branca naquela ocasião... Agora, em uma conhecida região de baleias, vimos um baleeiro inglês, o Samuel Enderby. Acab o abordou, atrás de notícias de Moby Dick. O capitão Boomer disse que, de fato, tinha visto a baleia-branca na última temporada, e que isso tinha lhe custado o braço. Enquanto tentava pegar uma baleia arpoada, surgiu uma enorme baleia com uma cabeça branca enrugada. Ela tentou morder o cabo do arpão, mas se enroscou nele. Então, o barco de Boomer atacou Moby Dick. Mas ela se debateu, trazendo o cabo do arpão para baixo do bote, partindo-o em dois. A tripulação foi jogada ao mar. Boomer tentou agarrar-se em um arpão antigo preso na lateral da baleia. Com certeza era um dos arpões de Acab. Então, tragédia! Um arpão foi arremessado e acertou o braço de Boomer. Ele ficou preso à baleia e pensou que iria se afogar. Mas, por sorte, conseguiu se soltar. O sangue desse homem está fervendo! Sua pulsação faz suas têmporas saltarem! Nesse ponto, o médico do navio continuou a história. Boomer piorava dia após dia, até que o médico foi forçado a amputar o braço dele. Acab não se comoveu. Ele só queria saber de Moby Dick. Boomer confessou que viram a baleia mais duas vezes desde então, mas, achando que a perda de um braço era suficiente, não a perseguiu. O doutor Bunger alertou Acab que era melhor deixar Moby Dick em paz, mas percebeu que Acab estava obcecado pela baleia. Acab não se importou com o alerta e, com a informação de que a baleia-branca havia ido para o leste, chamou a tripulação de volta para o bote. Retornamos ao Pequod. 26 AF•Miolo_Mobydick_03.indd 26 3/6/08 12:23:09 PM Deixe vazar! Eu mesmo estou todo perfurado! Que vaze! Há um Deus que governa a Terra, e um capitão que governa o Pequod. Na manhã seguinte… Starbuck relatou que o casco estava furado e que, assim, perderíamos mais óleo de baleia em uma hora do que conseguiríamos juntar em um ano. Starbuck argumentou, mas Acab ordenou que ele saísse de sua cabine, apontando-lhe um mosquete carregado. Starbuck disse a Acab que seu maior inimigo era ele mesmo. Quiqueg disse que gostaria de ser enterrado numa canoa, como era costume em sua ilha. O marceneiro foi chamado para fazer o caixão de Quiqueg — o mais parecido possível com uma canoa. Quiqueg deitou-se no caixão com seu arpão e o pequeno ídolo de madeira, mas aos poucos foi melhorando e recuperou a saúde. No meio disso tudo, meu amigo Quiqueg estava de cama, com febre, e a cada dia parecia mais próximo da morte. Ele definhava, cada vez mais magro. Mais tarde, ele disse que, se um homem decide viver, não é uma mera doença que vai matá-lo. E o caixão não foi desperdiçado: Quiqueg o usou como baú. Para o diabo branco! Ego non baptizo te in nomine patris, sed in nomine diaboli!8 Acab perguntou a Perth, o ferreiro, se ele poderia fazer um arpão especial para matar Moby Dick. Perth fez várias lâminas diferentes, até que, finalmente, o velho ficou satisfeito. Acab disse que o arpão deveria ser temperado com o sangue dos arpoadores: Quiqueg, Tashtego e Daggoo. Todos eles deram um talho no braço e deixaram o sangue escorrer até a ponta do arpão. 8. Em latim: “Eu te batizo não em nome do pai, mas em nome do diabo!”. AF•Miolo_Mobydick_03.indd 27 A essa altura, Acab parecia louco e, assim que o sangue tocou o ferro, bradou um misto de oração e maldição, em um estranho batismo. 27 3/5/08 3:20:01 PM
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