DO VOLANTE àS PANELAS

Transcrição

DO VOLANTE àS PANELAS
Perfil de Chef Luis Felipe Calmon
Do volante
às panelas
Ex-piloto profissional de automóveis,
o chef Luis Felipe Calmon comanda uma criativa
escola de gastronomia em São Paulo
P o r
W a l t e r s o n
S a r d e n b e r g
uem vê o chef Luis Felipe Calmon, 43 anos,
em sua escola de gastronomia no bairro do
Sumarezinho, em São Paulo — uma das
mais inovadoras, por sinal — não diria
estar diante de um ex-piloto internacional
de automobilismo. Não mesmo. Eis um
daqueles sujeitos que cabem por inteiro na
palavra bonachão. Luis é tranquilíssimo e afável.
Caminha, age e fala sem pressa. Como imaginar
seus gestos tímidos e bem medidos em uma profissão
norteada pela rapidez ? Pois não se engane. Luis foi piloto dos bons.
Venceu a mais tradicional prova no país, as Mil
Milhas de Interlagos, entre os carros de sua categoria.
Na Fórmula-Ford, disputou freadas com Rubens
Barricchello e Christian Fittipaldi. Andou pelo
Canadá, onde participou das fórmulas Atlantic e
2000 e ganhou provas deixando na poeira o falecido
ídolo local Greg Moore. Correu até na Fórmula-3 da
Espanha. “Parei com o automobilismo no governo
Collor, quando foram criadas dificuldades imensas
para o piloto conseguir patrocínio”, conta. Se sobrou
mágoa, o chef bonachão não deixa transparecer.
Tanto quanto amava acelerar, Luis se diverte ao
reduzir molhos. Assim como gostava de se concentrar
no cockpit, regala-se nas descontraídas aulas na
Orbacco (palavra tirada de orbacca, a baga do loureiro
em italiano). Eis o nome da escola de gastronomia que
montou com Adriana Ferreira Santos, sua mulher
há 23 anos. Tal como se dedicava a subir sozinho
Q
8 6
G o s t o
d e z e m b r o / j a n e i r o
S
o
F o t o s
a n t ó n i o
r o d r i g u e s
ao pódio, trabalha, agora, com afinco para a vitória
dos outros, prestando consultoria, entre outros,
para o restaurante Ávila Steak House e o Café Raiz,
em São Paulo, e criando os cardápios dos bufês Casa
Tupiniquim e Fairbanks, também paulistanos. Nada
a estranhar. Vocações não são excludentes. Além do
mais, sua extremada afeição pela culinária, sejamos
claros, é muito anterior à sua devoção às pistas.
“Desde que consegui alcançar a mesa, a pia e o
fogão, sou doido por cozinha”, diz, admitindo como
um fator decisivo desta inclinação a ascendência
italiana. A mãe, Marta, e a avó, Maria, vieram da
região do Abruzzo logo após a Segunda Guerra
Mundial. Com elas, o filho único aprendeu a língua
italiana — só foi falar português no curso primário —
e múltiplas técnicas e receitas culinárias. Dia desses,
foi jantar no restaurante Parigi, na capital paulista, e
encantou-se ao descobrir no cardápio um dos sabores
da infância. Era o vitelo tonato, um vitelo cortado em
fartias bem finas, com molho à base de atum. “Parece
uma combinação estranha, mas é ótima”, anima-se.
Os intermináveis almoços em família na infância são
sempre uma doce nostalgia. Eles renderam até mesmo
o slogan da Orbacco : “a tavola non s’invecchia”. Este
antigo adágio, recorrente no repertório da nonna,
sustenta que, ao longo do tempo passado em torno da
mesa de refeição, o ser humano não envelhece.
Se a cozinha italiana permanece como principal
referência de Luis, suas voltas pelo mundo na época de
piloto lhe abriram o apetite para outras gastronomias.
d e z e m b r o / j a n e i r o
G o s t o
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Perfil de Chef Luis Felipe Calmon
Curioso, começou a comprar livros sobre o assunto,
formando uma biblioteca agora próxima de mil
volumes. Mas os rumos deste chef autodidata ainda
teriam muitas voltas antes da bandeirada na escola
de gastronomia. Terminada a carreira de piloto, Luis,
de volta a São Paulo, trabalhou como importador de
pâtisserie, trazendo ao país produtos como croisant
e chausson aux pommes. Começavam os anos de
contato direto com chefs de alto nível. Vários se
tornaram amigos. Entre eles, Pascal e Daniel Valero,
Laurent Suaudeau e Luciano Boseggia, para ficar nos
europeus. “Foram anos de intenso aprendizado e troca
de ideias”, resume. Eram tantas as informações que,
há seis anos, Luis, ex-instrutor na Escola de Pilotagem
Marazzi, resolveu compartilhá-las, abrindo a Orbacco.
Escolheu para isso a casa onde passou a infância.
Nada mais significativo.
Ali, o chef tranquilo ensina técnicas — “e não
receitas”, como gosta de frisar. “Se você aprende a
fazer risotto, faz risotto de qualquer coisa”, diz. “O
Pernil de porco com
farofa de festa e couve
cubos miúdos
líquido em fogo brando, até obter um
 3 dentes de alho picados
leve caramelo no fundo da frigideira.
Por Luis Felipe Calmon
 40 ml de óleo de oliva
Deglace com o vinho branco e junte
 500 g de couve manteiga
o restante do líquido que estava
Serve 8 porções
em finas fatias
reservado.
Pernil
 Sal a gosto
6.5Incorpore o louro e o alecrim.
1 pernil de porco com cerca
Reduza em fogo baixo, para
de 5,6 kg (com a pele )
Pernil
conseguir um molho bastante
 Sal a gosto
1.5Tempere o pernil com sal e
untuoso e brilhante.
coloque-o em um envelope feito com
Molho
papel-alumínio, bem lacrado.
Farofa de festa
 O líquido do cozimento
2.5Passe o pernil para uma assadeira
7.5Em uma frigideira, doure a farinha
do pernil
e leve-o ao forno muito baixo (em
panko em metade da manteiga e
 5 folhas de louro
torno de 80°C). Se não conseguir
reserve.
 2 ramos de alecrim
uma temperatura tão baixa, asse
8.5Em uma panela, aqueça os
o pernil com a porta do forno
demais ingredientes com a manteiga
Farofa de festa
(doméstico) ligeiramente aberta.
que sobrou e junte tudo à farinha já
 400 g de farinha crocante
3.5Deixe o pernil nessa temperatura
dourada.
Panko (adquira em lojas
por aproximadamente 16 horas.
orientais)
Retire cuidadosamente o
Couve
120 g de manteiga
papel-alumínio, reservando
9.5Doure o bacon. Quando estiver
 80 g de tâmaras sem caroço
em um recipiente todo o liquido
dourado, junte o alho e refogue
picadas
do cozimento.
levemente. Incorpore o óleo de
 80 g de damascos turcos
4.5Retorne com o pernil ao forno,
oliva e, em seguida, com o fogo no
picados
desta vez na potência máxima, com
máximo, junte a couve e misture-a
 80 g de cramberries secas
a pele voltada para cima, apenas
rapidamente ao bacon, para evitar a
(opcional)
para (a pele) pururucar.
formação de água. Só então ajuste o
 80 g de nozes quebradas
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G o s t o
sal.
grosseiramente com as mãos
Molho
5.5Em uma frigideira, coloque 1/4
Finalização
Couve
do líquido do cozimento do porco,
10. Sirva o pernil em fatias, com o
 80 g de bacon defumado em
reservando o restante. Reduza esse
molho, a farofa e a couve.
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Perfil de Chef Luis Felipe Calmon
LUIS FELIPE
CALMON é
proprietário do
Orbacco-Espaço
Gastronômico,
Rua Cuxiponés, 125,
Sumarezinho,
tel. (11) 3873-0098,
São Paulo,SP
mesmo vale para as massas. Por que haveria uma
aula de spaghetti e outra de tagliatelli ?”. Luis ministra
os cursos de pratos salgados, delegando à mulher,
Adriana, a doçaria. Outros professores da Orbacco são
Álvaro Cézar Galvão (bebidas), Laura Reinas (azeites),
Cario Ferrari (café), Francisco Júnior (culinária
japonesa), André Mauro Ceneviva (etiqueta à mesa)
e Jonny Tremarin (cerveja). A criatividade costuma
ser vista como o maior diferencial em relação a outras
escolas do gênero. Prova disso, um dos cursos ensina
a harmonizar vinhos e culinária da Argentina e, não
bastasse, também as diversas variações do tango. “Um
dos objetivos é mostrar o contexto histórico e cultural
de cada alimentação”, explica. “Outra, revelar como
a gastronomia pode ser divertida e gregária. Ela une
as pessoas. Em uma época como a nossa, quando os
relacionamentos são cada vez mais mediados pela frieza
do e-mail e das redes sociais, isso é importantíssimo.”
Mais de mil alunos já passaram pelos cursos da
Orbacco. Nos últimos meses de 2012, porém, a escola
esteve fechada. Voltará a abrir as portas em janeiro,
depois de uma ampla reforma na cozinha. O motivo
real da parada nos boxes foi a chegada de Nicole,
a primeira filha de Luis e Adriana. Depois de mais
de duas décadas de convívio, eles decidiram ter um
herdeiro. Faz lembrar outro provérbio, segundo o qual,
planejamento é tudo. Seja nas pistas, seja na cozinha,
seja no dia a dia.
Torta de nozes pecan
Serve 8 porções
1.5Em uma tigela, misture o ovo,
Por Luis Felipe Calmon
Massa
a manteiga, o açúcar e o fermento.
1 ovo
Vá juntando, aos poucos, a
 4 colheres (sopa) de
farinha de trigo.
manteiga
2.5Trabalhe a massa até que
 2 colheres (sopa) de açúcar
desgrude da mão. Embale-a
1 colher (chá) de fermento
em papel filme e deixe-a
em pó
descansar na geladeira por
 2 xícaras (chá) de farinha
20 minutos.
de trigo
3.5Depois, em uma superfície
 Farinha de trigo para
enfarinhada, abra a massa na
polvilhar
espessura de 3 a 4 mm e estenda-a
em uma forma de 24 cm. Reserve.
Recheio
 3 ovos
Recheio
1 xícara (chá) de glucose de
4.5Em uma tigela, coloque os ovos,
milho (Karo)
misture a glucose, o açúcar e a
 3/4 de xícara (chá) de
baunilha.
açúcar
1 colher (chá) de baunilha
Finalização
em pasta
5.5Espalhe as nozes pecan na forma,
 2 colheres (sopa) de
sobre a massa, e despeje o recheio
manteiga derretida
por cima, delicadamente, reservando
1 1/2 xícara (chá) de nozes
um pouco para decorar o sorvete.
pecan inteiras (finalização)
6.5Leve a torta ao forno médio,
preaquecido a 180°C, por cerca
Acompanhamento
de 1 hora. Ou até que, ao enfiar a
 Sorvete de baunilha
ponta de uma faca, ela saia limpa.
7.5Sirva com o sorvete de baunilha,
Massa
9 0
G o s t o
d e z e m b r o / j a n e i r o
decorado com um pouco de recheio.