Originais – Originals janeiro | março • 2013 - IPUB

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Originais – Originals janeiro | março • 2013 - IPUB
ISSN 0047-2085
CODEN JBPSAX
1
janeiro | março • 2013
Volume 62, Número 1, 2013
Originais – Originals
Associação entre depressão, níveis de dor e falta de apoio social
em pacientes internados em enfermarias de clínica médica
The impact of depression on survival of Parkinson’s disease
patients: a five-year study
Componentes atencionais e de funções executivas em meninos
com TDAH: dados de uma bateria neuropsicológica flexível
Uso de álcool e tabaco entre estudantes de Psicologia da
Universidade Federal do Espírito Santo
Hospitalização integral para tratamento dos transtornos
alimentares: a experiência de um serviço especializado
Prevalência e fatores associados aos transtornos mentais comuns
em residentes médicos e da área multiprofissional
Termos psicopatológicos em bandas e músicas de rock and roll
Órgão Oficial do Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro
Official Journal of the Institute of Psychiatry - Federal University of Rio de Janeiro
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sumário
Artigos originais – Original articles
Associação entre depressão, níveis de dor e falta de apoio social
em pacientes internados em enfermarias de clínica médica
Association of depression, levels of pain and lack of social support
in patients admitted to general medical wards
Camila Andrade Marques, Betina Stefanello, Camila Nemoto de Mendonça, Letícia Maria Furlanetto..........................................1
The impact of depression on survival of Parkinson’s
disease patients: a five-year study
O impacto da depressão na sobrevida de pacientes com doença de Parkinson: cinco anos de estudo
Cláudia Débora Silberman, Cláudia Soares Rodrigues, Eliasz Engelhardt, Jerson Laks .................................................................8
Componentes atencionais e de funções executivas em meninos
com TDAH: dados de uma bateria neuropsicológica flexível
Attentional components and executive functions in children with
ADHD: data of a flexible neuropsychological battery
Hosana Alves Gonçalves, Rafael Mattevi Mohr, André Luiz Moraes, Larissa de Souza Siqueira, Mirella Liberatore Prando,
Rochele Paz Fonseca.....................................................................................................................................................................13
Uso de álcool e tabaco entre estudantes de Psicologia
da Universidade Federal do Espírito Santo
Alcohol and tobacco use among Psychology students at the Federal University of Espírito Santo
Marcos Vinícius Ferreira dos Santos, Denis Soprani Pereira, Marluce Miguel de Siqueira ...........................................................22
Hospitalização integral para tratamento dos transtornos
alimentares: a experiência de um serviço especializado
Inpatient treatment for eating disorders: the experience of a specialized service
Raphaela Fernanda Muniz Palma, José Ernesto dos Santos, Rosane Pilot Pessa Ribeiro.............................................................31
Prevalência e fatores associados aos transtornos mentais
comuns em residentes médicos e da área multiprofissional
Prevalence and factors associated with commom mental disorders
in medical and multiprofessional health residents
Carla Novaes Carvalho, Djalma Agripino de Melo-Filho, João Alberto Gomes de Carvalho, Ana Carla Guedes de Amorim.......38
Termos psicopatológicos em bandas e músicas de rock and roll
Psychopathological terms in bands and songs of rock and roll
Thaísa Silva Gios, Francisco Lotufo Neto.......................................................................................................................................46
sumário
Revisões de literatura – Literature reviews
Programas metacognitivos com enfoque em cognição social
na reabilitação da esquizofrenia: uma revisão sistemática
Metacognitive programs focusing social cognition for the rehabilitation of schizophrenia: a systematic review
Hélio Anderson Tonelli, Fernanda Liboni, Diego Augusto Nesi Cavicchioli...................................................................................51
O que é comportamento de risco para transtornos
alimentares em adolescentes?
What is adolescents’ eating disorder risk behavior?
Greisse Viero da Silva Leal, Sonia Tucunduva Philippi, Viviane Ozores Polacow, Táki Athanássios Cordás,
Marle dos Santos Alvarenga..........................................................................................................................................................62
Comunicação breve – Brief communication
Notas sobre a versão em língua portuguesa
da Escala de Bem-Estar Espiritual
Notes on the Portuguese-language version of the Spiritual Well-Being Scale
Edson Zangiacomi Martinez, Rodrigo Guimarães dos Santos Almeida, Fabiana Rodrigues Garcia,
Antonio Carlos Duarte de Carvalho...............................................................................................................................................76
Relatos de caso – Case reports
Cerebral calcifications and schizophreniform disorder
Calcificações cerebrais e transtorno esquizofreniforme
Leonardo Fernandez Meyer, Flávio Jozef, José Geraldo Vernet Taborda, Marco Antonio Alves Brasil,
Alexandre Martins Valença...........................................................................................................................................................81
Cessação tabágica em paciente com tremor essencial
Smoking cessation in a patient with essential tremor
Carolina Ferreira da Costa, Ervin Cotrik, Alberto Araújo, Marco Antônio Brasil ...........................................................................85
Cartas ao editor – Letters to the editor
Early-onset of psychiatric features in mild frontotemporal
dementia with impaired memory test: a case
report and neuropsychological evaluation
Sintomas psiquiátricos prematuros em demência frontotemporal leve com desempenho
deficitário em teste de memória: relato de caso e avaliação neuropsicológica
Gabriel Coutinho, Dídia Fortes, Flavia Miele, Paulo Mattos..........................................................................................................89
Consumo prejudicial de álcool entre usuários
da Estratégia Saúde da Família
Harmful alcohol consumption between users of Family Health Strategy
Ângela Maria Mendes Abreu, Rafael Tavares Jomar, Maria Helena do Nascimento Souza, Raphael Mendonça Guimarães.......91
artigo original
Associação entre depressão, níveis de dor e
falta de apoio social em pacientes internados
em enfermarias de clínica médica
Association of depression, levels of pain and lack of social
support in patients admitted to general medical wards
Camila Andrade Marques1, Betina Stefanello1, Camila Nemoto de Mendonça1, Letícia Maria Furlanetto1
RESUMO
Palavras-chave
Depressão, dor, apoio
social, pacientes internados,
hospital geral.
Objetivo: Verificar a associação entre depressão, níveis de dor e falta de apoio social em
pacientes clínicos internados. Métodos: Em um estudo transversal, 1.147 adultos admitidos
nas enfermarias de clínica médica de um hospital universitário foram selecionados por randomização e avaliados durante a primeira semana de internação. Foram utilizados: Subescala
Cognitivo-afetiva do Inventário Beck de Depressão (BDI-13), Índice Charlson de Comorbidade
Física e escalas numéricas para avaliar dor e percepção de gravidade física. Foram considerados deprimidos os pacientes que pontuaram acima de 10 no BDI-13. Investigou-se apoio
social por meio da pergunta direta: “Com quantos parentes ou amigos você se sente à vontade e pode falar sobre tudo ou quase tudo?”. Foram considerados como tendo falta de apoio
social os pacientes que relataram ter menos que quatro parentes ou amigos confidentes.
Foram utilizados os testes T de Student, Qui-quadrado e Regressão Logística. Resultados:
Dos 1.147 pacientes, 25,3% apresentavam depressão. Escolaridade [odds ratio (OR): 0,96; intervalo de confiança (IC): 0,89-0,96; p < 0,001], renda familiar (OR: 0,92; IC: 0,86-0,99; p = 0,018),
maior intensidade de dor (OR: 1,04; IC: 1,00-1,08; p = 0,036), falta de apoio social (OR: 2,02; IC:
1,49-2,72; p < 0,001) e percepção de maior gravidade física (OR: 1,07; IC: 1,02-1,13; p = 0,008)
se associaram independentemente à depressão. Conclusão: Pacientes clínicos deprimidos
relatam mais falta de apoio social e dor, mesmo após controlar para variáveis confundidoras
sociodemográficas e clínicas.
ABSTRACT
Objective: To evaluate the association of depression, levels of pain and lack of social support in medical inpatients. Methods: In a cross sectional observational study, 1,147 adults
admitted to the general medical wards of a university hospital were randomized and evaluated during the first week of admission. The following instruments were used: cognitive-affective subscale of the Beck Depression Inventory (BDI-13), Charlson Comorbidity Index
and numerical scales to evaluate pain and perception of medical burden. Patients who scored > 10 in the BDI-13 were considered depressed. Social support was investigated asking the
1 Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Centro de Ciências da Saúde, Departamento de Clínica Médica, Florianópolis, SC, Brasil.
Recebido em
20/9/2012
Aprovado em
3/2/2013
Endereço para correspondência: Letícia Maria Furlanetto
Av. Rio Branco, 333/804, Centro – 88015-200 – Florianópolis, SC, Brasil
Telefax: (+55 48) 3234-9756
E-mail: [email protected]
2
artigo original
Marques CA et al.
Keywords
Depression, pain, social
support, medical inpatients,
general hospital.
following question: “How many relatives or friends do you feel at easy and can talk about
almost everything?”. Those who had less than four relatives or close friends were considered
as having lack of social support. The Student T test, Chi-square test and Logistic Regression
analysis were used. Results: Of the 1,147 patients that comprised the sample, 25.3% had depression. Educational level [odds ratio (OR): 0.96; confidence interval (CI): 0.89-0.96; p < 0.001],
household income (OR: 0.92; CI: 0.86-0.99; p = 0.018), pain levels (OR: 1.04; CI: 1.00-1.08; p =
0.036), lack of social support (OR: 2.02; CI: 1.49-2.72; p < 0.001) and perception worse physical
illness severity (OR: 1.07; CI: 1.02-1.13; p = 0.008) were independently associated with depression. Conclusion: Depressive medical inpatients report more lack of social support and pain
even after controlling for social, demographic and clinical variables.
INTRODUÇÃO
Pacientes com transtornos do humor relatam maiores níveis de
dor1. A prevalência de episódios depressivos entre pacientes
clínicos com dor é alta (42%)2. Pacientes com comorbidade de
doenças físicas e depressão apresentam mais dor crônica e têm
pior evolução apesar do tratamento adequado3. Observou-se
que pacientes com artrite, portanto com dor crônica, têm maior
predisposição de desenvolver transtornos do humor4. Estudos
recentes vêm demonstrando mecanismos inflamatórios que
exercem papel na fisiopatologia tanto da depressão como da
dor e de diversas outras doenças sistêmicas5. Em pacientes com
artrite reumatoide, a depressão e a inflamação (medida por
meio da dosagem da proteína C reativa) têm correlação entre si,
mas influenciam a dor de forma independente6. De maneira semelhante, em pacientes com câncer de mama, o tratamento da
depressão foi efetivo para reduzir os indicadores de inflamação7.
Contudo, ainda existem poucos estudos no Brasil sobre a interface da depressão com a dor e outros aspectos psicossociais.
Uma pesquisa realizada na comunidade revelou que os
indivíduos que relatavam ter dor apresentavam mais transtornos depressivos e ansiosos, além de terem pior qualidade
de vida, maior incapacidade, maior utilização dos cuidados
de saúde e uso de substâncias8.
Por ser um achado subjetivo do exame clínico, a percepção da dor depende não só das vias biológicas (como
o que ocorre na inflamação), mas também das características psicológicas do paciente. Um ensaio clínico mostrou
que pacientes com dor crônica e com padrões negativos de
pensamento (como o catastrófico) perceberam maiores níveis de dor em relação àqueles que tinham como padrão de
pensamento a aceitação da dor9. Outra pesquisa evidenciou
a associação entre a gravidade da depressão e a intensidade do pensamento catastrófico em pacientes com anemia
falciforme10. Entre pacientes com dor coronariana aguda a
depressão persistente vem sendo associada com aumento
na mortalidade e na morbidade cardíaca11. Ou seja, apesar
de repetidos estudos sobre o assunto, os mecanismos psicológicos e fisiológicos da dor e sua associação com depressão
não estão esclarecidos e ainda são objeto de controvérsia.
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):1-7.
Discute-se, também, o papel do apoio social no aparecimento, manutenção ou melhora da depressão. Ambos
– apoio social e depressão – podem influenciar, direta ou
indiretamente, na evolução e bem-estar de pacientes clínicos, como observado entre pacientes com infarto agudo do
miocárdio (IAM)12. A depressão mostrou-se um fator preditor
de mortalidade após um ano de IAM, porém o apoio social
não se relacionou diretamente com a sobrevivência. Contudo, altos níveis de apoio social se relacionaram com melhora
nos sintomas depressivos, podendo ser, assim, um fator protetor indireto para pessoas com IAM12. Além disso, pacientes
com insuficiência cardíaca deprimidos apresentaram mais
pessimismo, baixa percepção de apoio social e um padrão
de comportamento de evitação13. Ou seja, além de se isolarem, ainda não perceberam o apoio que tinham. Provavelmente esse mesmo fenômeno aconteceu com um grupo de
pacientes em uso de terapia antirretroviral que, em um ano
de seguimento, apresentou concomitantemente aumento
na sintomatologia depressiva e diminuição nos níveis de
apoio social14. Entre idosos com quadros dolorosos, a rede
social e o estado funcional parecem estar mais relacionados
com a depressão do que com a dor objetiva propriamente
dita15. A associação entre apoio social e depressão também
foi evidenciada em pacientes submetidos ao transplante de
medula óssea16. Nesses pacientes, após seguimento de um
ano, observou-se que o aumento no suporte social percebido esteve relacionado à redução nos níveis de depressão16.
A depressão, a dor e a falta de apoio social são realidades recorrentes na prática clínica e interferem diretamente
no diagnóstico e tratamento de diversas patologias. Vale salientar a importância do tratamento e do acompanhamento
desses pacientes no contexto intra-hospitalar e após alta,
pois já se evidenciou que os transtornos psiquiátricos em
pacientes clínicos hospitalizados não remitem espontanea­
mente17. Ter história familiar psiquiátrica positiva e menor
escolaridade já se mostrou relacionado com a persistência
dos transtornos ansiosos, da depressão e dos transtornos somatoformes após a alta17. Identificar precocemente a combinação de diferentes riscos e instituir o tratamento adequado
previne novos episódios de depressão18.
artigo original
Apesar da vasta literatura sobre o assunto, ainda não é
possível definir exatamente o quanto essas variáveis interagem gerando sofrimento psíquico ou bem-estar, nem como
isso acontece, nos pacientes clínicos. O objetivo deste estudo é verificar se existe associação entre depressão, níveis
de dor e falta de apoio social em pacientes internados em
enfermarias de clínica médica de um hospital universitário.
MÉTODOS
Desenho e local
Trata-se de um estudo transversal, desenvolvido nas Enfermarias de Clínica Médica do Hospital Universitário Professor
Polydoro Ernani de São Thiago de Florianópolis, da Universidade Federal de Santa Catarina (HU-UFSC). A cidade de Florianópolis, localizada no estado de Santa Catarina, tem aproximadamente 450 mil habitantes, com 97% localizados na área urbana.
O Hospital Universitário é referência, atendendo à Grande Florianópolis e aos casos provenientes do interior do estado.
Amostra
Foram anotados os nomes de todos os pacientes consecutivamente internados nas Enfermarias de Clínica Médica do
HU-UFSC desde 15 de abril de 2006 até 30 de junho de 2011,
excluindo os meses não letivos (janeiro, fevereiro e julho),
que no total somaram 7.093 pacientes. Embora o cálculo da
amostra necessária para avaliar a prevalência de sintomatologia depressiva moderada a grave em pacientes clínicos, com
estimativa de 30% e nível de significância de 0,05, tenha sido
de 323 pacientes, com a finalidade de atingir os objetivos do
estudo (associação entre variáveis), foi necessária uma amostra
maior (superior a 1.000 indivíduos) até que os resultados ficassem constantes por causa das múltiplas análises realizadas. Por
meio de uma lista de números randômicos, foram selecionados 1.630 pacientes, que foram abordados, esclarecidos sobre
a natureza do estudo e convidados a participar. Esse número foi
escolhido considerando que 29,6% (N = 483) foram excluídos,
sendo 259 por incapacidade física que impossibilitasse a realização de forma adequada da entrevista (por afasia, dispneia,
prejuízo cognitivo etc.), 117 por causas administrativas (por
exemplo, estar fora do leito realizando exames complementares, cirurgias etc.), 13 por estarem sendo reinternados e 94 por
recusarem. Portanto, compuseram a amostra 1.147 pacientes
que consentiram e que não preenchiam critérios de exclusão.
Procedimentos Os pacientes foram avaliados antes de completar uma semana de internação. Os dados foram colhidos por alunos da
graduação em Medicina já com formação em psicopatologia
e sob supervisão direta da professora (LMF), com experiência
em interconsulta há mais de 20 anos. Foram coletados dados
Depressão, dor e apoio social
3
sociodemográficos como idade, sexo, estado civil, escolaridade em anos, renda familiar em salários-mínimos e dados da
história clínica, bem como preenchidos os questionários descritos a seguir, por meio de entrevista e dados do prontuário.
O Miniexame do Estado Mental (MMSE) foi utilizado com
a finalidade de rastrear pacientes com prejuízo cognitivo,
principalmente delirium e/ou demência19. É composto de 11
perguntas e requer somente de 5 a 10 minutos para ser administrado. O ponto de corte sugerido pelos autores da escala
é de 23/24 para a suspeita de prejuízo cognitivo19. Contudo,
pelo fato de pacientes com baixa escolaridade poderem ter
pontuação inferior nessa escala, sem que apresentem prejuízo cognitivo20, quando apropriado, foram utilizados os pontos
de corte de acordo com o proposto por Bertolucci et al. (13
para analfabetos; 18 para aqueles com 1 a 8 anos incompletos
e 26 para pacientes com 8 ou mais anos de escolaridade)21.
O Inventário Beck de Depressão (BDI) foi elaborado para
medir a gravidade de depressão em adolescentes e adultos22. Entretanto, vem sendo usado como instrumento de
rastreamento de depressão. A subescala cognitivo-afetiva
(primeiros 13 itens – BDI-13) mostrou-se válida em pacientes
atendidos por causa de doenças físicas no nosso hospital23.
Foram considerados como tendo depressão aqueles pacientes que pontuaram acima de 10 no BDI-13. As percepções de gravidade física e de dor foram avaliadas usando-se escalas do tipo NRS (Numerical Rating Scales)24
de 11 pontos (0 a 10), sendo perguntado, respectivamente: “De zero a dez, qual número melhor descreve a gravidade
de sua doença no momento? Zero (0) seria sem doença e
dez (10) seria doença mais grave possível”. E, “De zero a dez,
qual número melhor descreve sua dor agora? Zero (0) seria
‘sem dor’ e dez (10) seria a dor mais forte possível”.
Foi avaliado apoio social com a seguinte pergunta: “Com
quantos parentes ou amigos você se sente à vontade e pode
falar sobre quase tudo?” Essa pergunta foi validada em uma
amostra brasileira por Chor et al.25. Foram considerados como
tendo falta de apoio social aqueles pacientes que relataram
ter menos que quatro parentes ou amigos confidentes. Esse
ponto de corte foi escolhido porque um estudo anterior
mostrou que indivíduos com menos de quatro confidentes
têm maior chance de evoluir com depressão26.
A gravidade física objetiva foi medida pelo Índice Charlson de Comorbidade Física. Esse instrumento foi elaborado
para ser utilizado em estudos de avaliação de prognóstico,
uma vez que é capaz de prever mortalidade. No cômputo
desse item são avaliados não só o número de doenças, mas
também a gravidade delas27.
Análise estatística
A análise estatística foi feita utilizando o programa SPSS (Statistical Package for Social Sciences), versão 17.0 para Windows.
Foram considerados estatisticamente significativos os valores de p ≤ 0,05. Quando foram feitas múltiplas comparações,
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):1-7.
4
artigo original
Marques CA et al.
foi utilizada a correção de Bonferroni. Para a análise descritiva
dos dados, foram empregadas frequências, porcentagens,
médias, medianas e desvios-padrão. Foi utilizado o teste T
de Student para amostras independentes e o teste do Qui-quadrado, conforme apropriado, com o objetivo de comparar os pacientes deprimidos (BDI-13 > 10) e não deprimidos.
Aqueles fatores que foram significativamente diferentes (p ≤
0,05) na análise univariada foram analisados na multivariada,
por meio da Regressão Logística (com o modo “stepwise likelihood-ratio”) conjuntamente com a gravidade física objetiva,
para verificar sua associação independente com a depressão.
Aspectos éticos
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética para Pesquisas
com Seres Humanos da UFSC. Os pacientes foram orientados sobre o estudo e informados que em nada seria alterado seu tratamento caso a decisão fosse a de não participar.
Aqueles que concordaram em participar assinaram o termo
de consentimento livre e esclarecido. Caso fosse detectada
qualquer alteração mental sugestiva de ter benefício de alguma intervenção, os pacientes e médicos-assistentes foram
informados para que a interconsulta psiquiátrica pudesse ser
solicitada, se julgassem necessário.
RESULTADOS
Como já dito, a amostra foi composta por 1.147 pacientes.
Desses, a maioria era do sexo masculino (55,7%), com média de idade ± desvio-padrão (DP) de 49,72 ± 16,18 anos, era
casada ou mantinha união estável (63,6%). A renda familiar
média ± DP foi de 3,27 ± 2,90 salários-mínimos e a escolaridade média ± DP foi de 6,48 ± 4,29 anos. A tabela 1 detalha
as características sociodemográficas da amostra. As doenças digestivas (19,6%) e as doenças respiratórias
(14,4%) foram as principais responsáveis pelas internações
dos pacientes que compuseram a amostra deste estudo (Tabela 2).
A porcentagem de pacientes que relatou falta de apoio
social (com menos de quatro parentes e amigos íntimos) foi
de 33,8% (N = 383). A média do número de parentes e amigos
confidentes ± DP foi de 12,08 ± 16,8. Dos pacientes incluídos
na pesquisa, 25,3% foram considerados como tendo depressão. A tabela 3 descreve a comparação entre deprimidos e
não deprimidos em relação às variáveis sociodemográficas e
clínicas.
Na Regressão Logística foram incluídas as variáveis: escolaridade, renda familiar, dor, apoio social e gravidade física
percebida, que mostraram diferenças estatisticamente significativas entre deprimidos e não deprimidos, mostradas na
tabela 3. A comorbidade física objetiva (Índice Charlson de
Comorbidade Física) foi incluída nessa análise, mesmo não
tendo sido significativa na análise univariada por causa da
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):1-7.
sua importância do ponto de vista clínico nesse grupo. Na
análise multivariada observou-se que a baixa escolaridade
[odds ratio (OR): 0,96; intervalo de confiança (IC): 0,89-0,96;
p < 0,001], a baixa renda familiar (OR: 0,92; IC: 0,86-0,99; p =
0,018), a maior intensidade de dor (OR: 1,04; IC: 1,00-1,08; p
= 0,036), a percepção de falta de apoio social (OR: 2,02; IC:
1,49-2,72; p < 0,001) e a percepção de maior gravidade física
(OR: 1,07; IC: 1,02-1,13; p = 0,008) se associaram independentemente à depressão.
Tabela 1. Características sociodemográficas da amostra (N = 1.147)
Características
N (1.147)*
%
Sexo
Masculino
Feminino
639
508
55,7
44,3
Idade (anos)
18 a 64
Maior ou igual a 65
920
227
80,2
19,8
Estado civil
Casado(a)/união estável
Solteiro(a)
Separado(a)
Viúvo(a)
729
168
147
103
63,6
14,6
12,8
9
Renda familiar salários-mínimos*
Menor que 2
2a4
5a6
Maior que 6
216
537
109
102
22,4
55,7
11,3
10,6
Escolaridade (anos)*
0
1a4
5a8
8 ou mais anos
80
415
313
326
7
36,2
27,3
28,4
*Os valores que, somados, não atingirem o N total da amostra são decorrentes do não preenchimento completo
pelo entrevistado, por desconhecimento ou recusa. Tabela 2. Doenças que motivaram a internação, de acordo com a
CID-10 (Classificação Internacional de Doenças, 10ª revisão) Motivo da internação
N (1.147)
%
Digestivas
225
19,6
Respiratórias
165
14,4
Cardíacas/circulatórias
157
13,7
Hematológicas/imunitárias
146
12,7
Endócrinas/nutricionais/metabólicas
101
8,8
Neurológicas
87
7,6
Neoplasias
60
5,2
Osteomusculares/tecido conjuntivo
43
3,7
Mal-definidas
42
3,7
Geniturinárias
37
3,2
Infecciosas/parasitárias
35
3,1
Pele/subcutâneo
11
1
Causas externas
9
0,8
Lesões/envenenamentos
8
0,7
artigo original
Depressão, dor e apoio social
5
Tabela 3. Análise univariada comparando deprimidos e não deprimidos internados em enfermarias de clínica médica em relação às variáveis
sociodemográficas, clínicas e fatores psicossociais (N = 1.147) Variável*
Depressão? †
Não
Sim
Homens
76,1
23,9
Mulheres
72,4
27,6
P
Sexo (%)
Idade
0,17
49,84 ± 16,29
49,22 ± 15,53
0,56
Escolaridade (anos)
6,83 ± 4,46
5,53 ± 3,66
< 0,001
Renda familiar ‡
3,49 ± 2,95
2,69 ± 2,74
< 0,001
70,9
54,1
< 0,001
Rede de apoio social§ (%)
Variáveis clínicas
Gravidade física objetiva
1,13 ± 1,46
1,01 ± 1,4
0,23
Gravidade física percebida
6 ± 2,95
6,83 ± 3,02
< 0,001
4,12 ± 3,79
5,20 ± 3,92
< 0,001
║
¶
Dor **
* Os dados estão expressos em média ± desvio-padrão, exceto quando especificados de outra forma.
† Foram considerados como tendo depressão aqueles pacientes que pontuaram acima de 10 na Subescala Cognitivo-afetiva (primeiros 13 itens – BDI-13) do Inventário Beck de Depressão.
‡ Renda familiar em salários-mínimos.
§ Responderam um número maior que 3 à pergunta: “Com quantos parentes e amigos você se sente à vontade e pode falar sobre tudo ou quase tudo?”.
║
Índice Charlson de Comorbidade Física.
¶
Respondendo: “De zero a dez, qual número melhor descreve a gravidade de sua doença no momento? Zero seria sem doença e dez seria a doença mais grave possível”.
** Respondendo: “De zero a dez qual número melhor descreve sua dor agora? Zero seria sem dor e dez seria a dor mais forte possível”.
DISCUSSÃO
Este é um dos primeiros estudos realizados em nossa comunidade que avalia tanto a comorbidade psiquiátrica como fatores psicossociais, dor e outros aspectos clínicos em pacientes internados por doenças físicas. Cerca de um quarto dos
pacientes internados por doenças físicas nas Enfermarias de
Clínica Médica do HU-UFSC que compuseram a nossa amostra tinham depressão (25,3%). Verificando-se a correlação entre as variáveis, observou-se que os deprimidos tinham menor escolaridade e menor renda familiar, menor apoio social,
maior gravidade física percebida, assim como maiores níveis
de dor. Não houve diferença estatisticamente significativa em
relação a sexo, idade e comorbidade física objetiva. Na análise multivariada, menor escolaridade, menor renda familiar,
falta de apoio social, maior intensidade da dor e percepção
de maior gravidade física associaram-se significativamente
à depressão, mesmo após ajustar para fatores de confusão.
Esses achados estão condizentes com outros estudos2,16,28,29.
Diferentemente de nossos achados, Iliffe et al.15 verificaram que a intensidade da dor não estava estatisticamente
relacionada com a depressão, mesmo encontrando prevalência semelhante de depressão na amostra analisada (19%).
Esse mesmo estudo revelou uma associação entre depressão e risco de isolamento social. Talvez a diferença encontrada seja devida à diferença de amostras, sendo a amostra
de Iliffe exclusivamente de pessoas acima de 65 anos, não
hospitalizadas e independentes para autocuidado15.
Existem limitações para este estudo, que são as seguintes: 1) O diagnóstico da depressão foi feito por meio de uma
escala, e não por um psiquiatra. Contudo, os estudos que
associam depressão com maior mortalidade utilizaram essa
mesma escala, o BDI11,12; 2) Nossa amostra foi composta por
pacientes internados em um hospital universitário, com nível de atenção terciário. É possível que pacientes na atenção
primária ou secundária tenham padrões diferentes; 3) Por ser
um estudo transversal, não é possível estabelecer relação de
causa e efeito; 4) Pacientes muito graves e incapacitados (por
exemplo, com dispneia intensa) foram excluídos por não
conseguirem responder à entrevista, portanto não estão representados na nossa amostra. Seria importante que estudos
futuros desenvolvessem métodos para detectar depressão,
dor e apoio social nesse grupo; 5) O apoio social foi avaliado
por meio de pergunta direta, o que pode gerar questionamentos quanto à sua validade. Cabe ressaltar que essa pergunta na realidade é um instrumento já validado, inclusive
em uma amostra brasileira25. Apesar de existirem questionários mais completos para essa avaliação, a simplicidade e a
rapidez dos instrumentos são fundamentais em pesquisas
realizadas nas enfermarias de clínica médica, uma vez que
os pacientes estão muito debilitados e necessitam de tempo
para fazer exames e o tratamento da doença de base.
Como significado clínico para esses achados, observa-se
a importância de questionar sobre rede de apoio social e sintomas sugestivos de depressão em indivíduos com doenças
físicas, sobretudo naqueles com maiores níveis de dor, pois
esses fatores são frequentes e podem estar influindo em seu
quadro clínico. Simples perguntas, como “Com quantos parentes e amigos você se sente à vontade e pode falar sobre
tudo ou quase tudo?” Ou “De zero a dez, qual o número que
descreve sua dor agora?”, podem ajudar a detectar fatores
relacionados e a suspeitar da presença de depressão, perJ Bras Psiquiatr. 2013;62(1):1-7.
6
artigo original
Marques CA et al.
mitindo, assim, o diagnóstico e o tratamento precoce dessa
doença.
Uma pesquisa revelou que em idosos o tratamento da
depressão e orientações para lidar com a doença física e
aprimorar a capacidade de realizar atividades diárias levaram
à percepção de maior apoio social, melhoria das condições
gerais do paciente e sua qualidade de vida relacionada à saúde30. Além disso, vem sendo demonstrado que o tratamento
da depressão pode, além de reduzir os sintomas depressivos,
levar a uma redução de marcadores inflamatórios.7 É possível
que, por meio do estudo das vias de ativação de imunidade
mediada por células e outros mecanismos que estimulam a
manutenção de processos inflamatórios possam ser gerados
dados que ajudem a elucidar a alta associação entre dor, depressão e diversas doenças sistêmicas5. Contudo, apesar das
novas vias que vêm sendo propostas, não se pode esquecer
da importância de um bom manejo clínico desses pacientes,
que envolve aspectos do correto tratamento da dor, da relação
médico-paciente e da rede de apoio social.
CONCLUSÃO
Os pacientes internados nas Enfermarias de Clínica Médica
do HU-UFSC que apresentavam depressão (BDI-13 > 10) relataram maiores níveis de dor e mais falta de apoio social,
mesmo após controlar para variáveis confundidoras sociodemográficas e clínicas. Estudos longitudinais podem ajudar
a elucidar a natureza dessa associação. CONTRIBUIÇÕES INDIVIDUAIS
Camila Andrade Marques – Coleta, análise dos dados e
redação do manuscrito.
Betina Stefanello e Camila Nemoto de Mendonça – Coleta, análise dos dados e revisão do manuscrito.
Letícia Maria Furlanetto – Elaboração do projeto, supervisão da coleta, análise dos dados e redação do manuscrito.
CONFLITOS DE INTERESSE E SUPORTE
FINANCEIRO
Nenhum autor tem conflitos de interesse.
Este trabalho teve apoio financeiro do CNPq, por meio
de Bolsa de Iniciação Científica (PIBIC) concedida às três primeiras autoras (Camila Andrade Marques, Betina Stefanello,
Camila Nemoto de Mendonça).
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):1-7.
AGRADECIMENTOS
Agradecemos aos outros integrantes do grupo de pesquisa
do LETH (Laboratório de Estudos em Transtornos de Humor)
que participaram da coleta de dados.
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J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):1-7.
Original article
The impact of depression on survival of
Parkinson’s disease patients: a five-year study
O impacto da depressão na sobrevida de pacientes com
doença de Parkinson: cinco anos de estudo
Cláudia Débora Silberman1, Cláudia Soares Rodrigues2, Eliasz Engelhardt1, Jerson Laks1
ABSTRACT
Keywords
Parkinson’s disease,
depression, mortality.
Objective: The aim of this study is to evaluate the survival rate in a cohort of Parkinson’s
disease patients with and without depression. Methods: A total of 53 Parkinson’s disease
subjects were followed up from 2003-2008 and 21 were diagnosed as depressed. Mean time
of follow up was 3.8 (SD 95% = 1.5) years for all the sample and there was no significant difference in mean time of follow up between depressed and nondepressed Parkinson’s disease
patients. Survival curves rates were fitted using the Kaplan-Meier method. In order to compare survival probabilities according to the selected covariables the Log-Rank test was used.
Multivariate analysis with Cox regression was performed aiming at estimating the effect of
predictive covariables on the survival. Results: The cumulative global survival of this sample
was 83% with nine deaths at the end of the study – five in the depressed and four in the nondepressed group, and 55.6% died in the first year of observation, and none died at the fourth
and fifth year of follow up. Conclusion: Our finding point toward incremental death risk in
depressed Parkinson’s disease patients.
RESUMO
Palavras-chave
Doença de Parkinson,
depressão, mortalidade.
Objetivo: O objetivo deste estudo é avaliar a taxa de mortalidade em uma coorte de parkinsonianos com e sem depressão. Métodos: O total de 53 pacientes com doença de Parkinson foi acompanhado de 2003 a 2008, e 21 deles foram avaliados com depressão. O tempo
médio de doença foi de 3,8 (DP 95% = 1,5) anos para toda a amostra e não houve diferença
significativa entre os parkinsonianos, com e sem depressão, acompanhados durante esse
período. Curvas de sobrevida foram obtidas utilizando-se o método de Kaplan-Meier. A fim
de comparar as probabilidades de sobrevivência de acordo com as covariáveis ​​selecionadas,
o teste Log-Rank foi usado. A análise multivariada com regressão de Cox foi realizada com o
objetivo de estimar o efeito de covariáveis ​​preditivas sobre a sobrevivência. Resultados: A
sobrevivência global acumulada dessa amostra foi de 83%, com nove mortes no final do estudo – cinco no grupo com depressão e quatro no grupo sem depressão. Além disso, 55,6%
morreram durante o primeiro ano de observação, e nenhum morreu no quarto e quinto
ano de acompanhamento. Conclusão: Nossos achados indicam um incremento no risco de
morte em pacientes com doença de Parkinson e depressão.
1 Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, RJ, Brazil.
2 Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Rio de Janeiro, RJ, Brazil.
Received in
10/19/2013
Approved in
2/4/2013
Address for correspondence: Cláudia Débora Silberman
Rua Barata Ribeiro, 774/407, Copacabana – 22051-000 – Rio de Janeiro, RJ, Brazil
Telephone: (21) 2236-7989
E-mail: [email protected]
Original article
INTRODUCTION
Parkinson’s disease (PD) is a chronic subcortical neurodegenerative disease which is best diagnosed by motor symptoms and sings. The non motor signs, however, are quite
important as they progress contributing to the incapacities
that ensue over the course of the disease1. Among the nonmotor symptoms in PD, depression is highly prevalent with
rates around 35%2.
Several studies have shown that PD exerts a negative impact on the patient’s survival, with a risk ranging from 1.5 to 2.9
as compared to the general population3-8. Likewise, depression
has been reported as an independent variable contributing to
increase mortality risk9. Indeed, a six-year follow up study with
chronic depressed elderly pointed to an incremental mortality
risk of 41%10. The severity of the depressive symptoms seems
to hold a direct relationship with mortality in the elderly10,11.
Based on these data it would be reasonable to present
the hypothesis that PD patients with depression would have
a lower survival rate than the PD patients without depression. Conversely a previous review yielded only two studies
with conflicting results. The early one did not find an association between depression and survival in PD12, whereas
Hughes et al.13, reported that depressed PD patients presen­
ted a 1.64 (CI 1.26-2.99) risk of death as compared to controls.
In order to provide more information on this issue, the aim
of this study is to evaluate the survival rate in a cohort of PD
patients with and without depression.
Mortality of depressed parkinsonian patients
9
stages (HY)18. This scale is used when patients were on the on
period. All the patients had a normal CT scan. A psychiatrist
evaluated the patients to determine a diagnosis of depression according to the DSM-IV criteria19 and its severity as measured by the Montgomery Asberg Depression Rating Scale
(MADRS)20 and the Beck Depression Inventory (BECK)21,22.
With the use of standard clinical criteria, such as the UK
Parkinson’s disease brain bank criteria, accuracy of a clinical
diagnosis of the disease can be improved significantly; however, up to 10% of the patients diagnosed with the disease in
life will still have to be reclassified at post-mortem examination23. Diagnostic sensitivity and specificity of these criteria
have been estimated as 98.6% and 91.1% respectively24.
Study design
METHOD
The study started as a cross-sectional study aiming to compare frontal functions in depressed and nondepressed PD.
The methodology of this study is described elsewhere25.
In 2008, the whole population was reassessed. Data on
death and respective causes were collected in two complementary ways: an active search via telephone contact plus
information search in the Mortality Information System, a database held by the Coordination of Vital Data of the Health
Department of the State of Rio de Janeiro, Brazil. The data
were captured by certificates reports from 2003 to 2007. To
prevent mistakes regarding the presence of homonyms the
data were compared with the information recorded in our
own databank of the cohort.
In most cases, the cause of death was not specified. Some
causes identified were from cardiovascular causes (like Acute
Myocardial Infarction), infectious (pneumonia and septicemia) and pulmonary (obstructive pulmonary disease).
Patients
Ethics
A consecutive series of PD patients (n = 100) were screened
in three neurologic outpatient facilities from January 2003 to
April 2006. Patients with dementia or with any other neurological or clinical disorders other than PD were not included
in the study, as well as subjects with psychiatric disorders other than depression. Smokers and drug addicts were excluded.
Patients using antidepressant medications at baseline or who
were taking such medications until three months prior to the
inclusion interview were also excluded from the study. In order to evaluate the cognitive status and to exclude dementia
the Mini-Mental State Examination (MMSE)14 and CAMDEX/
CAMCOG (Cambridge Examination for Mental Disor­ders of
the Elderly15 (required score above 80) were used. We employed a validated Brazilian version of the CAMCOG16.
The study was approved by the local Ethics Committee and
all the patients signed the informed consent prior to any procedure. A written permission was issued by the Health State
Department to access the mortality database.
Neurological examination
All the patients were examined by a neurologist for a detailed
diagnosis of PD according to the United Kingdom Parkinson’s
Disease Society Brain Bank (UK-PDS-BB) criteria17. PD staging and severity was ascertained using the Hoehn and Yahr
Statistical analysis
Descriptive analysis of patient characteristics and initial cognitive tests were carried out to obtain frequency distributions, and the means and standard deviations. The date of
inclusion into the cohort was considered as the baseline for
the survival analysis of each patient. The primary endpoint
was all causes mortality during the follow-up period and survival time was calculated since the cohort inclusion until the
death date. All individuals who did not have death registry or
who could not be contacted by telephone were censored at
the end of data collection period. Follow-up losses were not
considered in this study as analyses were based on secondary data, phone contact, and on clinical visits.
The annual mortality rates and survival rates were estima­
ted using the Kaplan Meier method26. In order to compare
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):8-12.
Original article
Silberman CD et al.
10
survival probabilities according to the selected covariables
the Log-rank test was used. Next, a multivariate analysis with
Cox regression was performed aiming at estimating the effect
of predictive covariables on the survival. Statistical analysis was
performed using SPSS17.0 statistic software (SPSS Inc., USA).
RESULTS
A total of 53 PD subjects met the inclusion criteria for the
study and 21 were diagnosed as depressed at the psychiatric
examination. Baseline characteristics of the patients with and
without depression are shown in table 1. The severity of PD
by Hohen an Yahr stages and the presence of depression are
shown in table 2.
Mean (standard deviation) time of follow up was 3.8 (1.5)
years for all the sample and there was no significant difference in mean time of follow up between depressed and
nondepressed PD patients. The cumulative global survival
of this sample was 83% with nine deaths at the end of the
study – five in the depressed and four in the nondepressed
group (Table 3). Of note, 55.6% died in the first year of observation, and none died at the fourth and fifth year of follow
up (Table 4).
The depressed group shows a higher rate of mortality
than the nondepressed one as shown in figure 1.
Table 5 shows that the Hazard Ratio (HR) for deaths of
PD patients with depression is 2.17 higher than for the nondepressed group, although not statistically significant (p =
0.15). Additionally, the better the cognitive status, the lower
the death risk is (HR = 0.98), again not statistically significant
(p = 0.495).
As age and cognitive status are considered confounding
variables for examining mortality risk in patients with PD and
depression, an analysis was run controlling for these covariables. In this analysis, the mortality HR reached 2.42 in depressed patients (p = 0.103).
Table 2. Severity by Hohen and Yahr stages in patients with or
without depression
Depression
Yes
1
9
19.6%
1
2.2%
10
21.7%
2
6
13.0%
3
6.5%
9
19.6%
2.5
9
19.6%
6
13%
15
32.6%
3
4
8.7%
5
10.9%
9
19.6%
3
6.5%
3
6.5%
18
39.1%
46
100.0%
4
Total
28
60.9%
Table 3. Distribution of deaths in the sample with and without
depression
Deaths
No
No
Depression
Yes
Total
28
4
32
87.5%
12.5%
100%
N
16
5
21
%
76.2%
23.8%
100%
N
44
9
53
%
83.0%
17.0%
100%
%
Cummulative
%
Population
at risk
Mortality
rate
Death- 1st year
5
55.6
55.6
53
0.09434
Death- year
2
22.2
77.8
47
0.042553
100
45
0.044444
2nd
Death- year
2
22.2
Total
9
100.0
3rd
Depression = 0
Nondepressed (n = 32)
Mean (standarddeviation)
p-value*
68.38 (10.39)
68.55 (8.40)
0.716
Education (years)
2.24 (1.57)
2.38 (1.69)
0.860
Duration of disease
(years)
7.76 (5.00)
5.41 (2.81)
0.113
0.50
MMSE**
22.15 (6.73)
22.66 (7.48)
0.534
0.25
CAMCOG***
58.05 (36.40)
70.97 (27.56)
0.217
MADRS****
11.57 (9.46)
3.21 (3.79)
0.001
BDI*****
18.95 (11.69)
7.38 (5.24)
p < 0.001
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):8-12.
N
%
Frequency
Depressed
(n = 21) Mean
(standard deviation)
* Mann-Whitney U test; ** MMSE: Mini-Mental State Examination; *** CAMCOG: Cambridge Cognitive
Examination; **** MADRS: Montgomery Asberg Depression Scale; ***** BDI: Beck Depression Inventory.
Total
Yes
Table 4. Annual frequency and mortality rates
Table 1. Sociodemographic and clinical profile of PD patients
with and without depression
Age
Total
No
1.00
Depression = 1
Kaplan-Meier survival estimates
0.75
0.00
0
500
1,000
Analysis time
Figure 1. Kaplan-Meier survival estimates.
1,500
2,000
Original article
Mortality of depressed parkinsonian patients
Table 5. Cox regression adjusted only by depression or by
depression + age + MEEM
Depression only
Variable
HR
SD
Z
p value
CI 95%
Depression
2.17
1.17
1.43
0.152
0.751- 6.255
Variable
HR
SD
Z
P value
CI 95%
Depression
2.42
1.31
1.63
0.103
0.837- 7.003
MMSE
0.98
0.03
-0.68
0.495
0.917-1.043
Age
1.04
0.03
1.15
0.249
0.976-1.100
Depression + MEEM + age
MMSE: Mini-Mental State Examination; HR: Hazard Ratio; SD: standard deviation; CI: confidence interval;
Z: Z statistical test.
DISCUSSION
The influence of depression on mortality of PD patients is still
a matter of debate. PD alone was associated to a threefold
increase of the mortality risk compared to non PD in elderly
populations3-8. On the other hand, another study which observed a chronically depressed elderly population for 6 years
found a 41% increase in the mortality rate compared to nondepressed subjects10. To the best of our knowledge, this is
the first Brazilian study and the third study in the world over
the last 18 years to address mortality rates in PD comparing
depressed and nondepressed patients. Albeit not statistically
significant, the HR for mortality in depressed PD patients was
2.45 times higher than in nondepressed ones when we controlled for cognitive status. Another study found that the HR
for mortality in depressed PD patients was 2.66 (95% CI: 1.594.44) over 11 years of observation13. Despite the differences
in the two studies, such as the presence of a control group,
the sample size, and time of follow up, all these results are
pointing to the same direction.
Of note in our study, half of the deaths occurred in the
first year of observation (55.6%), a high rate which might
be also associated with the higher age of patients, duration
of disease, and worse economic and cultural status of the
population27,28. A recent study in a large elderly male population29 has presented convincing data with regards to the
direct relationship between mortality and severity of depressive symptoms (dose-response relationship) even when
controlled by factors as health status and age. Depression
may increase mortality risk by a number of reasons. Firstly,
comorbidity with clinical disorders is higher and depression
also complicates the course of these disorders30. Secondly,
a series of pathophysiological cascades with cytokines (e.g.,
IL6, alpha TNF) and lower levels of protective factors (e.g.,
BDNF, IGF1)31 are triggered by depressive states. Inflammatory states are then a possible cause of higher mortality and
neurodegeneration. All these factors also are present in PD.
11
So, it remains to be studied the impact of having depression
when a neurodegenerative disorder is already diagnosed.
There are some limitations in our study which warrant
some comments. The first one is the small sample size which
possibly impacted in the lack of statistical significance. The
absence of a group without PD and depression precluded
a better study of the interaction of the two disease and its
association with mortality. Moreover, as patients were not
actively followed, the presence of follow-up and information
biases could not be excluded.
In most cases, the cause of death was not specified
(there is a serious problem with the completion of death certificates in Brazil). Some causes identified were from cardiovascular causes (like Acute Myocardial Infarction), infectious
(pneumonia and septicemia) and pulmonary (obstructive
pulmonary disease).
CONCLUSION
In summary, our finding points towards an incremental
death risk in depressed PD patients. Further studies with
larger samples are warranted to dissect whether this risk is
present and irrespective of other variables, such as depression symptom severity and staging of PD, as well as whether
treatment of depression is able to lower this risk.
INDIVIDUAL CONTRIBUTIONS
Cláudia Débora Silberman – Principal investigator. Contributed to conception, design analysis and interpretation of
the data. Also contributed to drafting the article, revising it
critically and approval of the final version to be published.
Cláudia Soares Rodrigues – Responsible for all statistical
calculations. She also contributed to: analysis and interpretation of data, revising the article critically; and had given the
final approval of the version to be published.
Eliasz Engelhardt – Contributed to conception, analysis
and interpretation of the data; revising it critically for important intellectual content; and had given the final approval of
the version to be published.
Jerson Laks – Contributed to conception, design analysis
and interpretation of the data. He also contributed to drafting the article, revising it critically and approval of the final
version to be published.
ACKNOWLEDGMENTS
To the Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq) for supporting
Jerson Laks, who is a Researcher 2 of CNPq.
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):8-12.
12
Silberman CD et al.
CONFLICTS OF INTEREST
The authors declare no conflict of interest concerning the
work presented here.
Original article
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J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):8-12.
artigo original
Componentes atencionais e de funções
executivas em meninos com TDAH: dados de
uma bateria neuropsicológica flexível
Attentional components and executive functions in children
with ADHD: data of a flexible neuropsychological battery
Hosana Alves Gonçalves1, Rafael Mattevi Mohr1, André Luiz Moraes1, Larissa de Souza Siqueira1,
Mirella Liberatore Prando1, Rochele Paz Fonseca1
RESUMO
Palavras-chave
Atenção, funções
executivas,
neuropsicologia, TDAH.
Objetivo: Comparar o desempenho de sete meninos com diagnóstico comprovado de TDAH
(G1) e 14 controles saudáveis (G2) em tarefas neuropsicológicas. Método: G1 e G2 foram pareados por sexo, idade e escolaridade em tarefas atencionais e executivas (Fluência Verbal e Discurso Narrativo da Bateria MAC, Teste de Cancelamento dos Sinos – versão infantil, Geração Aleatória de Números, Go-no Go do NEUPSILIN-Inf e N-Back auditivo). Resultados: Destacaram-se
diferenças entre os grupos quanto à atenção concentrada seletiva, à memória de trabalho, ao
automonitoramento, à iniciação e à inibição. Conclusão: Foi possível verificar contribuições
incipientes para um raciocínio de relações intercomponentes das FE e atencionais em pacientes
com TDAH.
ABSTRACT
Keywords
Attention,
executive functions,
neuropsychology, ADHD.
Objective: To compare the performance of seven boys with a confirmed diagnosis of
ADHD (G1) and 14 healthy controls (G2) in neuropsychological tasks. Method: G1 and G2
were matched by gender, age and educational level. They were assessed through attentional
and executive tasks (verbal fluency and narrative discourse from MAC Battery, Bells Test –
children’s version, Number Random Generation, Go-no Go and auditory N-Back). Results:
There were remarkable differences between groups for sustained focused attention, working
memory, self-monitoring, initiation and inhibition. Conclusion: Contributions for incipient
comprehension of relationships among cognitive components in ADHD patients could be
identified.
1 Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Grupo de Neuropsicologia
Clínica e Experimental.
Recebido em
2/4/2012
Aprovado em
18/2/2013
Endereço para correspondência: Hosana Alves Gonçalves
Rua Professor Cristiano Fischer, 2320/204, Petrópolis – 91410-000 – Porto Alegre, RS, Brasil
E-mail: [email protected]
14
artigo original
Gonçalves HA et al.
INTRODUÇÃO
O transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH)
é um dos quadros psiquiátricos de maior interesse dos pesquisadores em avaliação neuropsicológica infantil. É um dos
transtornos mais comuns encontrados entre crianças e adolescentes, e estima-se sua prevalência na população entre
3% e 7%1,2. O portador de TDAH demonstra um padrão de
desatenção e/ou hiperatividade mais frequente e grave do
que o observado em crianças saudáveis com mesmo nível
desenvolvimental. Esse comprometimento, por sua vez, dificulta a realização de processos que envolvam esforço mental por determinado período de tempo1,3,4.
Atualmente, estudos neuropsicológicos sugerem que as
limitações em quadros de TDAH podem ser verificadas em
mais de um domínio cognitivo. As funções mais associadas ao possível prejuízo cognitivo relacionado ao TDAH são
atenção5, memória de trabalho6 e componentes de funções
executivas7.
Mesmo sendo um quadro psiquiátrico bastante estudado na atualidade, alguns sintomas comportamentais do
TDAH são verificados na população em geral e ainda existem mitos acerca dos aspectos clínicos do transtorno mesmo entre profissionais que atendem esse público, fatores
que podem contribuir para um excesso de falso-positivos
desse quadro8. Além disso, parece haver discrepância entre
o índice de portadores do transtorno observado quando se
utilizam entrevistas baseadas nos critérios do DSM-IV-TR e a
avaliação neuropsicológica9.
Sabe-se que o TDAH é um transtorno que pode acarretar diversos prejuízos cognitivos que acarretam dificuldades
escolares, interpessoais e outros, afetando a qualidade de
vida do portador. Contudo, a avaliação neuropsicológica
ainda não é plenamente incluída nos protocolos de avaliação clínica desses pacientes e nos estudos científicos. Com
essa avaliação, busca-se identificar e descrever os padrões de
funcionamento cognitivo típico, esperado de acordo com o
nível sociocultural, desenvolvimental e outras diferenças individuais da população9. Além disso, permite caracterizar as
funções cognitivas cujo desempenho permanece intacto e
aquelas com desempenho prejudicado, possibilitando, assim, compreender as dissociações neurocognitivas presentes no TDAH.
De acordo com alguns estudos, componentes das funções executivas (FE) podem estar alterados no TDAH10.
Porém, parece não haver um posicionamento claro na literatura sobre quais das habilidades executivas e dos subcomponentes atencionais encontram-se mais prejudicados.
Não há clareza, ainda, se as principais defasagens estão mais
associadas às tarefas neuropsicológicas que exigem input
auditivo-verbal ou visual. Assim, nota-se a necessidade de
reconhecer a existência de possíveis dissociações entre esses
domínios cognitivos relacionados ao TDAH.
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):13-21.
Um dos maiores fatores que contribui para essa falta de
consenso na literatura sobre um perfil cognitivo específico
de crianças com TDAH é a heterogeneidade dos critérios de
inclusão das amostras, assim como os diferentes instrumentos selecionados para distintos componentes cognitivos.
Sabe-se que o TDAH se destaca por ser um quadro acompanhado de comorbidades que podem dificultar o diagnóstico preciso11. Portadores desse transtorno podem ter déficits
específicos de aprendizagem como dislexia12, transtornos de
humor e de ansiedade11, transtornos de conduta11, entre outros quadros, tornando mais difícil manter o rigor metodológico de estudos feitos com esses grupos. Ademais, relata-se
a existência de outros fatores confundidores do diagnóstico
do TDAH, como dificuldades de acuidade auditiva e/ou visual12, desvios específicos de linguagem13 e déficits intelectuais14, embora este último não seja um dado consensual na
literatura.
Na tentativa de procurar compreender quais habilidades
executivas e atencionais diferenciam crianças com TDAH de
seus pares saudáveis, no presente estudo buscou-se verificar se há diferenças entre meninos com esse quadro (sem
comorbidade identificada) e controles saudáveis em tarefas
que mensuram planejamento, organização, busca e manutenção de estratégias bem-sucedidas, executivo central da
memória de trabalho, inibição e iniciação e atenção concentrada seletiva. Esse estudo sustenta a hipótese inicial de que
o grupo clínico terá desempenho inferior aos controles em
todas essas funções.
MÉTODO
Amostra
Participaram deste estudo sete meninos portadores de
TDAH recrutados de ambulatórios e clínicas médicas de
Porto Alegre/RS, que preencheram os critérios de inclusão,
sendo selecionados de uma amostra total de 30 participantes indicados e triados. No grupo clínico (G1) foram incluídos
pacientes com TDAH dos tipos combinado (n = 6) ou predominantemente desatento (n = 1) e no grupo controle, 14
meninos saudáveis (G2), em um delineamento 2:1.
Os critérios de inclusão do G1 foram pertencer ao sexo
masculino, ter entre 7 e 12 anos de idade, ter cursado ou estar
cursando pelo menos o primeiro ano do ensino fundamental, ter diagnóstico médico e psicológico recente de TDAH
dos tipos predominantemente desatento ou combinado, de
acordo com os critérios do DSM-IV-TR2, não ter histórico de
repetência escolar e não ter recebido até o momento nenhum tratamento específico para o transtorno. Eles foram
selecionados por conveniência no serviço de neuropsicologia do Serviço de Atendimento e Pesquisa em Psicologia
(SAPP) da Faculdade de Psicologia da PUCRS.
artigo original
Os participantes do G1 receberam diagnóstico de TDAH
pela avaliação psiquiátrica, e esse diagnóstico foi confirmado pela K-SADS-PL (Kaufman, Birmaher, Brent, Rao, Flynn,
Moreci, Williamson e Ryan, 1997), pelo questionário abreviado de Conners (Barbosa e Gouveia, 1993) e pela SNAP-IV
(Mattos, Serra-Pinheiro, Rohde e Pinto, 2006). Foram excluídos 23 participantes do G1 por diferentes fatores: QI inferior
a 70 (n = 5), perda auditiva condutiva e/ou neurossensorial
(n = 1), diagnóstico de TDAH do tipo predominantemente
hiperativo (n = 1), sexo feminino (n = 7), idade superior a 12
anos (n = 1), e tratamento farmacológico atual para o TDAH
(n = 8).
Para o G2, foram selecionadas crianças sem repetência
escolar, sem queixas de aprendizagem, sem déficits sensoriais não corrigidos, ausência de transtornos psiquiátricos e/
ou neurológicos e que pudessem ser emparelhadas às crianças do G1 quanto à idade, ao tipo de escola (pública ou privada), ao nível cognitivo e ao sexo. Os critérios de inclusão
foram investigados a partir de entrevistas e administração de
instrumentos específicos descritos a seguir. As informações
de desempenho cognitivo dos participantes do grupo controle (G2) foram oriundas de um banco de dados de estudos
de normatização de instrumentos neuropsicológicos para
crianças. Esses participantes foram selecionados por conveniência de escolas da região metropolitana de Porto Alegre
e assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
para pesquisa de normatização aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da PUCRS.
Procedimentos e instrumentos
Os pais e/ou responsáveis dos participantes assinaram um
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e um questionário de dados sociodemográficos e de saúde. Logo após,
os professores de ambos os grupos preencheram o Questionário Abreviado de Conners traduzido para o português
brasileiro por Barbosa e Gouveia15, com o intuito de assinalar
possíveis déficits atencionais e sintomas de hiperatividade
referentes à criança. Com o objetivo de descartar prejuízos
intelectuais, o G1 respondeu à Escala de Inteligência Wechsler Abreviada (WASI)16 e o G2, ao Teste Matrizes Progressivas
Coloridas de Raven17.
Verificados esses critérios, as crianças do G1 foram submetidas a uma avaliação audiológica completa (audiometria tonal, imitanciometria, para exclusão de déficits sensoriais auditivos). Os participantes foram, então, avaliados
individual­mente em quatro sessões de aproximadamente
50 minutos de duração. A coleta de dados foi feita conforme aprovação do projeto na Comissão Científica (protocolo
06009) e no CEP-PUCRS (09-04864) em salas de atendimento
apropriadas para avaliação neuropsicológica (iluminadas e
ventiladas, livres de estímulos visuais e auditivos competitivos). Os instrumentos neuropsicológicos utilizados neste
estudo são apresentados a seguir.
Atenção e funções executivas no TDAH
15
Tarefas de caracterização da amostra
Questionário Abreviado de Conners15: este instrumento investiga a presença de sintomas atencionais e de hiperatividade associados ao TDAH. Cada item pode ter pontuação de
0 a 3 (0 = nenhum, 1 = pouco, 2 = razoável, 3 = muito).
Escala de Inteligência Wechsler Abreviada (WASI)16: composta por quatro subtestes (Vocabulário, Cubos, Semelhanças e Raciocínio Matricial), busca fazer uma avaliação do nível
intelectual do participante. Neste estudo, utilizou-se a versão
breve de aplicação desse instrumento e apenas os subtestes
Vocabulário e Raciocínio Matricial foram aplicados. Para fazer
parte da amostra deste estudo, os participantes deveriam ter
QI igual ou superior a 70.
Teste Matrizes Progressivas Coloridas de Raven17: esta tarefa consiste num conjunto de figuras que são mostradas à
criança. Ela é uma medida de inteligência geral em que o participante precisa completar a figura-alvo com uma das opções
que lhe são apresentadas. Foram incluídas no grupo controle
aquelas crianças com percentil igual ou superior a 26.
Tarefas neuropsicológicas para exame das funções
executivas
a) Subtestes de Fluência Verbal da Bateria Montreal
de Avaliação da Comunicação – Bateria MAC18. Esta
bateria é um instrumento de avaliação de quatro
componentes do processamento comunicativo: discursivo, pragmático-inferencial, léxico-semântico e
prosódico. Neste estudo, foram utilizadas as tarefas
de fluência verbal livre (FVL), fluência verbal fonêmico-ortográfica (FVO) e fluência verbal semântica
(FVS), adaptadas para uma versão infantil por Prando19. Na modalidade livre da tarefa de fluência verbal,
avaliam-se iniciativa, memória semântica e planejamento de clusters semântico na busca por palavras
que se enquadrem nos critérios da tarefa; a criança
deve evocar todas as palavras que lembrar, exceto
nomes próprios e números, por 2,5 minutos. Na ortográfica, aspectos relacionados à linguagem e uso
de estratégias de evocação podem ser analisados, e
a criança deve evocar palavras que começam com
a letra “p”, em 2 minutos; e na semântica, palavras
que sejam roupas/vestimentas, em 2 minutos. Todas
as modalidades são subdivididas em blocos de 30
segundos. Calculou-se o escore total de acertos para
cada modalidade, além do número de perseverações (repetição da mesma palavra durante a tarefa).
As perseverações foram classificadas em graus variando de perseveração de grau 1 até grau 6; quanto
menor for o grau da perseveração, mais próxima a
palavra foi repetida, logo o erro é mais severo.
b) Geração Aleatória de Números (GAN)20. Esta tarefa
avalia componentes executivos de inibição, flexibilidade cognitiva e automonitoramento. Consiste na
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):13-21.
16
artigo original
Gonçalves HA et al.
produção de números ao acaso, dentro de determinado intervalo de tempo. A criança é solicitada a
verbalizar números entre 1 e 10 cada vez que ouvir
um estímulo sonoro pré-registrado em equipamento de áudio com menômetro. É enfatizado que ela
não deve dizer sequências conhecidas de números
(por exemplo, 1-2-3 ou 9-8-7) e não deve repetir os
números um perto do outro, sendo considerados
erros perseverativos os números repetidos até quatro intervalos de estímulos. Primeiramente a tarefa é
realizada em velocidade de 2 segundos e posteriormente, de 1 segundo, tendo cada etapa duração de
90 segundos. Calculou-se o número total de acertos
por etapa (escores máximos de 45 para 2 segundos
e 90 para 1 segundo), bem como escore de perseverações, omissões, intrusões (números que não estivessem entre 1 e 10) e número de sequências diretas
e indiretas.
c) Subteste Go-no Go do Instrumento de Avaliação
Neuropsicológica Breve Infantil NEUPSILIN-INF21 para
crianças de 6 a 12 anos: avalia subcomponentes das
funções executivas como automonitoramento, inibição, iniciação e flexibilidade cognitiva, além de atenção concentrada e seletiva auditiva. Uma gravação
de áudio com 60 números aleatórios é apresentada
à criança. Ela é orientada a falar “sim” cada vez que
ouvir o número 8, mantendo-se em silêncio quando qualquer outro número for apresentado. O Go-no Go é um paradigma que permite observar erros
de omissão (quando o participante não responde
quando se espera que o faça) e comissão (quando
o paciente responde quando se espera que ele não
responda).
d) Teste de Cancelamento dos Sinos, versão infantil,
adaptado da versão canadense para adultos22. Esse
instrumento se propõe a avaliar atenção concentrada e seletiva, percepção visual, velocidade de processamento, organização, seleção e manutenção
de estratégias bem-sucedidas, além de mostrar-se
sensível para a detecção de negligência visual leve e
moderada. É apresentada ao participante uma folha
com estímulos-alvo (sinos com alça e badalo), distratores relacionados (sinos com apenas alça e sinos
com apenas badalo) e distratores não relacionados
ao alvo e, em seguida, solicita-se que a criança risque somente os sinos-alvo. Pontuam-se o tempo de
realização da tarefa e os escores de erros e acertos.
e)N-Back 23. É um dos paradigmas reconhecidos internacionalmente por avaliar o componente executivo
central da memória de trabalho por meio de estímulos auditivos e visuais. O teste é composto de quatro
etapas: na primeira, a criança precisa repetir o alvo
em questão; na segunda, evocar o alvo anterior; na
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):13-21.
f)
1.
2.
3.
terceira, o alvo apresentado duas vezes antes; e na
quarta, evocar o alvo apresentado três vezes antes.
Analisam-se, então, o número de acertos até o primeiro erro (span), o número de erros que a criança
cometeu para então voltar a acertar e o número total de acertos da tarefa.
Tarefa de Discurso Narrativo (DN) da Bateria Mon­treal
de Avaliação da Comunicação – Bateria MAC18,19. A
tarefa é composta de três etapas, nesta ordem:
Reconto parcial da história: busca-se avaliar a memória episódica, a memória de trabalho e o processamento de inferências discursivo-pragmático nesta
tarefa. A criança ouve um texto com informações
implícitas e é instruída a ouvir cada parágrafo, recontando-o logo após com suas palavras. Há um escore
total de 18 pontos para as informações essenciais
lembradas (mais relevantes para o entendimento da
narrativa) e de 29 pontos, para as informações presentes lembradas (principais e detalhes);
Reconto integral da história: é dada a instrução de
que a história será lida novamente, mas sem pausas
e, ao final, a criança deverá recontá-la. Um total de 13
pontos é esperado;
Avaliação da compreensão do texto: a criança é solicitada a fornecer um título para a história (escore
de 0 = título sem relação direta com a história ou
inapropriado; 1 = de acordo com a história, mas sem
a inferência representada; ou 2 = com representação da inferência); logo após, deve responder a 11
perguntas de compreensão do texto (pontuação
máxima = 11). Por fim, a criança decide se quer manter o título fornecido ou se deseja trocá-lo. Ao longo
dessas cinco etapas, o examinador deve observar se
o participante desencadeou a inferência dos processos implícitos à história. Apenas a variável ocorrência
de inferência foi considerada nesse estudo por ser a
única relacionada ao funcionamento executivo.
Análise de dados
Para comparar escores médios do desempenho executivo e
atencional entre grupos, utilizou-se o teste Mann-Whitney.
O teste Qui-Quadrado foi utilizado para comparar a distribuição entre grupos quanto a variáveis dependentes categóricas (processamento de inferências e estratégia de cancelamento). As análises foram feitas com a versão 17.0 do
software estatístico SPSS, considerando-se p ≤ 0,05.
RESULTADOS
O QI médio dos participantes de G1 foi correspondente a
95,42 (DP = 12,29) e, de acordo com a WASI, esse valor classificaria o QI dos participantes como médio. Já a média do
artigo original
Atenção e funções executivas no TDAH
percentil dos participantes do G2, de acordo com o Raven,
foi o equivalente a 85 (DP = 16,15), que corresponde a um
desempenho médio superior. As características sociodemográficas e clínicas dos grupos G1 e G2 podem ser observadas
na tabela 1. Houve diferença entre grupos apenas no escore
do Questionário Abreviado de Conners.
Na tabela 2, podem ser observados média e desvio-padrão da quantidade de palavras evocadas em cada bloco de
30 segundos e o total de palavras em cada modalidade das
tarefas de fluência verbal, bem como o número de perseverações dos participantes de G1 e G2.
Os resultados da tabela 2 indicam que o G1 teve desempenho significativamente inferior ao G2 no número de palavras evocadas no primeiro minuto da modalidade livre da
tarefa de fluência verbal. Essas diferenças foram mais eviden-
17
tes nos primeiros 30 segundos da modalidade fonêmico-ortográfica, no segundo bloco da tarefa semântica e no total
de palavras evocadas nos três critérios da tarefa. O número
de perseverações de grau 5 (palavras repetidas após terem
sido primeiramente evocadas três blocos antes) também foi
maior no G1. Na tabela 3 estão apresentados os valores médios da discrepância entre cada modalidade da tarefa.
De acordo com os resultados da tabela acima, o G1 teve
desempenho inferior ao G2 na busca por estratégias bem-sucedidas e na exploração de campos semânticos. Esse
resultado sugere que os participantes clínicos desse estudo
apresentam menor desempenho na habilidade de iniciação
verbal. Na tabela 4, são apresentados os valores de média e
desvio-padrão dos grupos nas tarefas GAN, Go-no Go, Teste
de Cancelamento dos Sinos e N-Back Auditivo.
Tabela 1. Dados de caracterização da amostra
G1
G2
P
Idade (M/DP)
8,29 (1,38)
8,29 (1,32)
1,000
Ano escolar (M/DP)
2,43 (0,97)
2,64 (1,22)
0,930
Tipo de escola (pública/privada) %
28,6-71,4
28,6-71,4
1,000
Escore total Conners (M/DP)
19,86 (4,70)
2,29 (5,49)
0,001
Escore socioeconômico ABEP* (M/DP)
27,33 (9,93)
27,54 (7,92)
0,840
* Associação Brasileira das Empresas de Pesquisa.
Tabela 2. Resultados qualitativos e quantitativos dos grupos nas tarefas de Fluência Verbal
Fluência Verbal Livre
Fluência Verbal fonêmico-ortográfica
Fluência Verbal Semântica
G1
M DP
G2
M DP
p
G1
M DP
G2
M DP
p
G1
M DP
G2
M DP
p
Total Bloco 1
4,71 1,60
9,43 4,73
0, 039
2,57 1,51
5,79 3,40
0,020
Total Bloco 2
3,71 1,89
7,50 3,03
0, 016
1 1,15
2,21 1,92
0,168
5,71 3,09
8,50 2,76
0,060
0,71 0,75
2,79 2,25
0,025
Total Bloco 3
3,00 1,63
5,43 3,39
0, 066
1 1,00
2,14 1,87
0,221
1 1,15
1,07 1,20
0,937
Total Bloco 4
3,43 1,39
5,14 4,43
0, 227
0,86 1,06
1,50 1,22
0,261
0,57 0,78
1,00 1,30
0,569
Total Bloco 5
3,43 3,78
8,21 4,50
0,066
-
-
-
-
-
-
Total Blocos
18,29 8,88
35,7 15,51
0, 023
4,00 2,16
11,50 7,23
0, 006
8,00 2,82
13,36 3,43
0, 004
Pers.* 1
0
0
1,000
0
0
1,000
0
0
1,000
Pers. 2
0,14 0,37
0
0,157
0
0,07 0,26
0,480
0,29 0,75
0,07 0,26
0,558
Pers. 3
0,29 0,48
0,29 0,61
0,802
0
0,07 0,26
0,480
0,14 0,37
0,14 0,36
1,000
Pers. 4
0,14 0,37
0,07 0,26
0,608
0
0
1,000
0,57 1, 13
0,07 0,26
0,177
Pers. 5
0,43 0,53
0
0,010
0,14 0,37
0,07 0,26
0,608
0,084 1,86
0
0, 040
Pers. 6
0
0,07 0,26
0,480
-
0
-
-
0
-
* Perseveração.
Tabela 3. Discrepâncias entre as três modalidades da tarefa de Fluência Verbal
G1
G2
M
DP
M
p
DP
FVL-FVS*
10,28
8,01
21,71
13,95
0,040
FVL-FVO**
14,28
7,84
23,57
15,23
0,232
FVS-FVO***
4,00
2,51
1,85
5,39
0,214
* Fluência Verbal Livre – Fluência Verbal Semântica ; ** Fluência Verbal Livre – Fluência Verbal Fonêmico-ortográfica ; *** Fluência Verbal Semântica – Fluência Verbal Fonêmico-ortográfica.
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):13-21.
artigo original
Gonçalves HA et al.
18
Tabela 4. Desempenho dos grupos no GAN, no Go-no Go, no Teste dos Sinos e no N-Back
G1
GAN
Go-no Go
Teste de Cancelamento dos Sinos
DP
M
DP
Total de acertos/45 (M DP)
23,29
11,499
34
3,34
0,027
Total de pers.*/45
4,43
4,117
4,29
2,92
0,880
Total de omissões/45
9,29
10,420
3,14
2,38
0,070
Total de acertos/90
28,86
18,151
47,14
15,22
0,052
Total de pers./90
6,57
5,533
9,29
5,26
0,330
Total de omissões/90
34,71
18,13
18
13,71
0,031
Total de acertos/60
42,57
12,89
54,71
6,01
0,013
Total de erros de omissão/60
10,43
10,01
3,07
4,48
0, 052
Total de erros de comissão/60
5,57
3,64
2,21
1,96
0, 008
Escore total de omissões
10,57
5,44
5,43
4,10
0, 051
0
1, 000
Escore de erros Sinos sem Badalo
1,29
1,79
0
0, 002
Escore de erros Sinos sem Alça
0,14
0,37
0
0, 157
N-Back 1A (span)
5,86
3,53
8,57
2,73
0, 063
N-Back 1A (total de acertos)
7,00
3,46
9,36
1,08
0, 031
N-Back 1B (span)
3,71
3,49
9,29
0,91
0,011
N-Back 1B (total de acertos)
5,86
3,07
8,14
2,68
0, 004
N-Back 2A (span)
0,71
1,25
4,00
3,23
0, 009
N-Back 2A (total de acertos)
1,71
3,40
4,64
3,43
0, 040
N-Back 2B (span)
0,71
1,25
3,36
3,24
0, 028
N-Back 2B (total de acertos)
1,00
1,91
3,93
3,47
0, 038
N-Back 3A (span)
0,14
0,37
1,21
2,42
0, 586
0
0
1,21
2,42
0, 586
N-Back 3B (span)
0,43
1,13
0,71
1,43
0, 663
N-Back 3B (total de acertos)
0,57
1,51
0,71
1,43
0, 785
N-Back 3A (total de acertos)
O G2 tem um desempenho significativamente superior
ao G1 no total de acertos nos dois tempos da tarefa GAN,
conforme apresentado na tabela 3. Da mesma forma, esses participantes apresentaram maior número de erros tipo
omissões/90. No Go-no Go o desempenho do G1 foi inferior em todas as variáveis analisadas. Diferenças significativas
apareceram apenas nas partes 1 e 2 do N-Back.
Os resultados da avaliação de variáveis qualitativas das
tarefas Discurso narrativo e Teste dos Sinos indicaram que não
houve diferença significativa entre G1 e G2. Na figura 1, pode-se visualizar o percentual de crianças de ambos os grupos
que processaram a inferência do texto (p = 1,00) e o percentual de crianças que utilizaram estratégias organizadas no
cancelamento de sinos-alvo.
Embora a média de meninos com TDAH tenha sido inferior à dos controles na escolha por estratégias organizadas,
essa diferença não foi significativa (p = 0,270).
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):13-21.
p
M
Escore de erros Distratores não relacionados
N-Back
G2
0
100
90
80
70
60
% 50
40
30
20
10
0
57,10% 57,10%
42,90%
28,60%
Processamento de inferências
no discurso narrativo
Grupo TDAH (G1)
Estratégia organizada no
teste dos sinos
Grupo controle (G2)
Figura 1. Desempenho dos grupos no Discurso Narrativo e
nas estratégias de cancelamento do Teste dos Sinos.
artigo original
DISCUSSÃO
O presente estudo, com caráter preliminar, buscou verificar
se há diferenças no desempenho de meninos com TDAH
e controles saudáveis em tarefas que mensuram atenção e
componentes das funções executivas. Ressalta-se que foram
utilizados instrumentos, até onde se sabe, inéditos na clínica
neuropsicológica do TDAH.
A partir dos resultados comparativos de grupos, observou-se que as crianças com TDAH do tipo desatento ou
combinado apresentaram, em geral, desempenho inferior
em todas as medidas neuropsicológicas. Quanto às habilidades atencionais, destacaram-se diferenças quanto à atenção
concentrada seletiva. Em relação aos componentes executivos, observa-se que meninos com TDAH podem ter mais
dificuldades que seus pares sem o transtorno em atividades
que exijam iniciação e inibição, automonitoramento e executivo central da memória de trabalho (MT).
Essas evidências corroboram achados anteriores de autores que defendem que o déficit inibitório pode ser uma das
causas das dificuldades atencionais e executivas de crianças
com TDAH1,7. Ambas dificuldades podem influenciar negativamente em situações novas que exigem automonitoramento e envolvimento do componente executivo central da
MT24. Isso pode justificar, ao menos parcialmente, o grande
número de queixas escolares e cotidianas de manutenção
do foco atencional dessas crianças, além de falhas na execução de tarefas escolares que exigem revisão constante.
Nas tarefas de fluência verbal, nota-se menor desempenho do grupo clínico nas três modalidades, indicando
possíveis dificuldades nas habilidades verbais, mnemônicas
e executivas (iniciação, automonitoramento, organização e
planejamento verbal). Essa hipótese pode ainda ser confirmada pelo cálculo de discrepância entre FVL e FVS, em que
os participantes tiveram média significativamente menor,
sugerindo um possível déficit na capacidade de iniciação e
de busca lexical em campos semânticos.
Tarefas de fluência verbal vêm sendo cada vez mais associadas ao funcionamento executivo na literatura, especialmente no que diz respeito às estratégias de busca para
a evocação das palavras. Os resultados deste estudo divergem dos de outros que também usaram a comparação entre
TDAH e controles saudáveis25. Tal discordância pode se justificar pelo tempo de execução da tarefa de fluência verbal,
que no presente estudo foi de 2 a 2,5 minutos, enquanto
tradicionalmente a versão mais aplicada tem duração de 1
minuto. O tempo maior de aplicação desse tipo de tarefa
pode ser mais sensível para distinguir a performance de grupos clínicos da de controles26.
Os achados deste estudo, embora preliminares, também
sugerem que meninos com TDAH têm um número significativamente maior do que seus pares saudáveis em erros
de perseveração nas tarefas de FVL e FVS. Nesse contexto,
Atenção e funções executivas no TDAH
19
a análise desse tipo de erro é considerada uma importante
interpretação na clínica neuropsicológica para avaliar possível comprometimento inibitório e de automonitoramento27.
Um estudo de Shuai et al.28 também encontrou maior número de palavras repetidas em tarefas de fluência verbal de
meninos com TDAH do que de controles saudáveis. Diversos
processos cognitivos parecem estar envolvidos nesse tipo
de erro, e o próprio déficit atencional pode acarretar erros de
perseveração em tarefas neuropsicológicas. A distância entre
a evocação de uma palavra e sua repetição em nosso estudo
sugere que, além de processos atencionais e inibitórios, os
processos mnemônicos de trabalho podem ter influenciado
na quantidade de erros perseverativos significativamente
maior no grupo clínico do que no de controles saudáveis.
A MT é uma atividade cognitiva complexa que envolve
o armazenamento de uma informação por tempo curto e
limitado enquanto ela é manipulada29, destacando-se a atua­
ção do componente executivo central, um dos quatro subsistemas da MT gerenciador atencional que atua sobre dois
subsistemas auxiliares: a alça fonológica e o esboço visuoespacial. O desempenho do grupo clínico na tarefa N-Back
tende a fortalecer a hipótese de dificuldade executiva e de
memória de trabalho, pois o G1 teve desempenho inferior
ao do G2 em ambos, N-Back 1 e 2. Como já citado, esse é um
déficit esperado para populações com TDAH, e nossos achados corroboram outros estudos que utilizaram esse instrumento em amostras maiores de portadores do transtorno29.
Mais especificamente com relação ao executivo central
da MT, o N-Back 3 é o nível de maior complexidade de exame desse componente executivo. Assim, não houve diferenças entre os grupos provavelmente pelo fato de esse nível
da tarefa ser muito complexo para ambos os grupos, considerando a fase de desenvolvimento dos participantes, o que
contribuiu para um possível efeito de chão.
Quanto ao controle inibitório, o G1 parece apresentar
mais dificuldades em relação ao G2 quando se considera seu
desempenho na tarefa Go-no Go. Os resultados nessa tarefa
corroboram os encontrados no Teste dos Sinos em relação
ao número de omissões e ao cancelamento de distratores
relacionados. Outros estudos que usaram o Go-no Go para
avaliar crianças com TDAH encontraram diferenças significativas entre pacientes e grupo controle quanto aos erros de
comissão, dado que sugere falta de inibição e alta impulsividade29, corroborando nossos achados.
Tanto o GAN quando o Go-no Go são ferramentas utilizadas para investigar habilidades de inibição, de atenção
concentrada, de flexibilidade cognitiva, de velocidade de
processamento e de automonitoramento, pois enquanto
recebe o input a criança precisa de autocontrole e revisão
constante do seu desempenho para não errar. Percebe-se
que em ambas as tarefas o desempenho do G1 foi inferior
ao dos controles, principalmente quando a tarefa de GAN
exigiu maior velocidade de processamento da criança. Esse
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):13-21.
20
artigo original
Gonçalves HA et al.
achado reforça os resultados de Bayliss e Roodenrys30, que
encontraram diferenças importantes entre crianças com
TDAH e controles nessa tarefa, entre outras.
Uma tarefa de input externo em que se observou maior
quantidade de erros nos meninos com TDAH é o Teste de
Cancelamento dos Sinos. Tanto erros de omissão quanto
erros do tipo cancelamento de não alvos tiveram escores
significativamente maiores no G1, sugerindo rebaixamento
atencional e de automonitoramento, em comparação ao
grupo controle. Além disso, o fato de diferenças significativas terem ocorrido apenas em relação ao cancelamento de
sinos sem badalo pode indicar que esse estímulo seja mais
sensível para detectar possíveis déficits atencionais entre
crianças com TDAH e controles. No entanto, quanto à escolha por estratégias de cancelamento, não parece haver diferenças entre os dois grupos, sugerindo que crianças com
TDAH podem não ter dificuldades de organização e planejamento com estímulos visuais quando há demanda de maior
foco atencional. Podem-se relacionar os resultados quantitativos do Teste dos Sinos com os resultados do Go-no Go e
do GAN, uma vez que todos exigem automonitoramento e
outras funções cognitivas importantes, que, estando prejudicadas, podem gerar déficits funcionais, como nas atividades
acadêmicas, observados na maioria dos casos de TDAH31.
No que tange às tarefas que mensuraram componentes
executivos e mnemônicos associados à linguagem oral, existem na literatura neuropsicológica estudos que defendem
que crianças com TDAH têm prejuízos na compreensão da
linguagem e em habilidades pragmáticas32. No entanto, na
tarefa de DN não foram observadas diferenças entre o G1 e
o G2 quanto ao processamento inferencial. A hipótese é que
essa diferença não deve ter sido evidenciada por causa do
número reduzido de participantes ou pelo fato de a amostra
selecionada neste estudo não ter queixas de linguagem.
O tamanho da amostra, reduzida por seu caráter preliminar relacionado aos critérios de inclusão eleitos para este
estudo, pode ser considerado uma limitação dele, no entanto foi possível verificar contribuições incipientes para um raciocínio de relações intercomponentes das FE em pacientes
com TDAH. Apesar de haver desempenho inferior em tarefas
que examinam componentes executivos como iniciação,
inibição, automonitoramento e executivo central da MT e
em processos atencionais seletivos, parece não haver diferenças entre crianças com TDAH e pares saudáveis em habilidades de organização visual e linguístico-pragmáticas. Isso
pode ter ocorrido também em virtude do tamanho reduzido da amostra. Esses dados precisam ser confirmados por
estudos de ocorrência de déficits com base em normas de
instrumentos neuropsicológicos, ainda não encontrados na
literatura.
Outra limitação deste estudo pode ter sido a amostragem
por conveniência de ambos os grupos. No entanto, procurou-se privilegiar a existência de queixas e conse­quências do
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):13-21.
quadro clínico, bem como a motivação familiar e individual
para maior adesão à pesquisa, na medida em que cada participante passou por diversas sessões de avaliação.
É necessário, ainda, um grande investimento para que
se obtenha um panorama específico de quais componentes
das FE estão prejudicados em cada tipo de TDAH e nas manifestações desse quadro em diferentes fases do ciclo vital. O
aprimoramento teórico e metodológico da neuropsicologia
das FE em constante crescimento deve colaborar para que
tais desafios sejam alcançados no contexto da avaliação de
crianças, adolescentes e adultos com TDAH.
Em suma, os resultados deste manuscrito podem contribuir para a literatura nacional sobre aspectos neuropsicológicos do TDAH com base no uso de novos instrumentos,
especialmente no uso de testes de fluência livre, uma vez
que esse construto é raramente (ou nunca) estudado com
portadores de TDAH em nosso meio. Neste estudo foram
unidos instrumentos de avaliação ainda não disponíveis para
a população científica e clínica brasileiras que estão em fase
final de normatização, sendo a princípio sua utilização pioneira nessa população clínica. Além disso, esses dados podem contribuir para a obtenção de evidências preliminares
de validade de critério desse conjunto de tarefas, até onde se
sabe inéditas na aplicabilidade para o TDAH.
Contribuições individuais
Hosana Alves Gonçalves – Trabalhou na idealização do estudo, na revisão da literatura, na coleta de dados, na análise e
discussão dos resultados e na redação geral do artigo.
Rafael Mattevi Mohr – Contribuiu na busca e tabulação dos
artigos utilizados como suporte teórico deste estudo, na interpretação dos resultados e na versão final a ser publicada.
André Luiz Moraes – Contribuiu nas análises estatísticas e
interpretação dos resultados e na revisão geral do artigo.
Larissa de Souza Siqueira – Contribuiu na interpretação
dos resultados e na redação do artigo.
Mirella Liberatore Prando – Contribuiu na idealização do
estudo, na análise dos resultados e na revisão geral do artigo.
Rochele Paz Fonseca – Contribuiu na concepção e no desenho geral do estudo, revisou todo seu conteúdo intelectual e aprovou a versão final a ser publicada.
AGRADECIMENTOS
Agradecemos ao Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq) pela bolsa de produtividade da orientadora Rochele Paz Fonseca, à Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) pela
bolsa de mestrado de Hosana Alves Goncalves; ao Programa
de Bolsas de Mestrado e Doutorado (Probolsas) da Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), pelas
artigo original
bolsas de doutorado de Larissa de Souza Siqueira e Mirella
Liberatore Prando; aos autores do Instrumento de Avaliação
Neuropsicológica Breve Infantil NEUPSILIN – INF, que contribuíram cedendo o uso para fins de pesquisa de uma das
26 tarefas desse instrumento em fase de publicação; e aos
autores da tarefa N-Back, que fez parte da bateria de instrumentos deste estudo.
Atenção e funções executivas no TDAH
21
14. Di Trani M, Casini MP, Capuzzo F, Gentile S, Bianco G, Menghini D, et al. Executive and intellectual functions in attention-deficit/hyperactivity disorder with and without comorbi­
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J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):13-21.
artigo original
Uso de álcool e tabaco entre estudantes de Psicologia
da Universidade Federal do Espírito Santo
Alcohol and tobacco use among Psychology students
at the Federal University of Espírito Santo
Marcos Vinícius Ferreira dos Santos1, Denis Soprani Pereira1, Marluce Miguel de Siqueira2
RESUMO
Descritores
Estudantes universitários,
detecção do abuso de
substâncias, substâncias
psicoativas.
Objetivo: Traçar o perfil do uso de álcool e tabaco entre universitários do curso de gradua­
ção em Psicologia do Centro de Ciências Humanas e Naturais da Universidade Federal do
Espírito Santo. Métodos: Trata-se de um estudo de corte transversal, com abordagem quantitativa. A população estudada foi de alunos matriculados no referido curso no segundo semestre do ano de 2010, constituindo uma amostra de 221 estudantes. O questionário utilizado foi o mesmo utilizado no I Levantamento Nacional entre Universitários, proposto pela
Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas. Resultados: A maioria dos estudantes era
solteira (90,1%), do sexo feminino (81%), estava na faixa etária de 18 a 24 anos (81%), era da
raça/cor caucasoide/branca (57,5%) e 55% referiram pertencer às classes econômicas B1 e B2.
Encontrou-se maior prevalência de álcool (85,07%) e tabaco (33,07%) na frequência uso na
vida, sendo o uso de álcool maior que na população geral. As substâncias associadas ao uso
de álcool na vida foram a maconha (p-valor = 0,007), os tranquilizantes (p = 0,011) e os anfetamínicos (p = 0,045). Já para o uso de tabaco na vida, as substâncias mais associadas foram
a maconha (p = 0,0001), os inalantes (p = 0,0001), os alucinógenos (p = 0,0001) e os anfetamínicos (p = 0,001). Conclusão: É necessária maior abordagem nos currículos de graduação,
especialmente da Psicologia, sobre o consumo de substâncias psicoativas e seus impactos
para o indivíduo, a família e a sociedade, bem como a criação de programas preventivos
específicos para estudantes universitários.
ABSTRACT
Objective: Profiling the use of alcohol and tobacco among the undergraduate students
of Psychology at the Center for Human and Natural Sciences of Federal University of Espírito Santo. Methods: The study population were students enrolled in the second semester of 2010 in the psychology undergraduate, comprising a sample of 221 students. The
questionnaire used was the same used in the National Survey of College I, proposed by
the National Drug Policy Secretariat. Results: Most students were single (90.1%), female
(81%) were in 18-24 years (81%), were the white/Caucasian race (57.5%) and 55% reported
belonging to social classes B1 and B2. We found a higher prevalence of alcohol (85.07%)
and tobacco (33.07%) in the frequency lifetime use, with alcohol consumption greater
Recebido em
9/6/2012
Aprovado em
20/2/2013
1 Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva (PPGSC); Centro de Estudos e Pesquisas
sobre Álcool e outras Drogas (CEPAD), UFES, Vitória, ES, Brasil.
2 UFES, PPGSC-UFES, Departamento de Enfermagem; CEPAD-UFES, Vitória, ES, Brasil.
Endereço para correspondência: Marcos Vinícius Ferreira dos Santos
Rua dos Navegantes, 73, São Pedro – 29030-270 – Vitória, ES, Brasil
Email: [email protected]
artigo original
Keywords
Undergraduate students,
substance abuse detection,
psychoactive substance.
Uso de álcool e tabaco por estudantes de psicologia
23
than in the general population. The substances associated with the use of alcohol in his
life were marijuana (p-value = 0.007), tranquilizers (p = 0.011) and amphetamines (p =
0,045). As for tobacco use in life, the more substances were marijuana related (p = 0.0001),
inhalants (p = 0.0001), hallucinogens (p = 0.0001) and amphetamines (p = 0.001). Conclusion: We need a better approach in undergraduate curricula, especially in psychology course, on the consumption of psychoactive substances and their impacts on the
individual, family and society as well as the creation of specific prevention programs for
college students.
INTRODUÇÃO
Substâncias psicoativas (SPA) são substâncias que alteram
o comportamento, a consciência, o humor e a cognição,
atuan­do no sistema nervoso central1. Seus efeitos negativos
são responsáveis por afetar a estabilidade das estruturas dos
Estados e sociedades. As SPA afetam homens e mulheres,
inde­pendentemente de grupos étnicos, sociais, faixa etária e
instrução2.
O consumo de álcool, produtos de tabaco e outras drogas é um fenômeno mundial que tem transcendido a categoria de problema de saúde3. O uso de produtos de tabaco
afeta 25% da população mundial adulta. Quando comparado às drogas ilícitas, as estimativas apontam que 200 mil
mortes por ano são decorrentes do consumo de substâncias
ilícitas, enquanto 5 milhões são atribuídas ao uso de tabaco.
Em relação ao consumo de álcool, quase 2 bilhões de pessoas no mundo fazem uso dele4. O álcool é responsável por
4% de todas as mortes no mundo; cerca de 2,5 milhões de
pessoas morrem anualmente em decorrência do consumo
de álcool, número maior que as mortes causadas pela AIDS/
HIV, tuberculose ou violência física5.
Conforme o II Levantamento Domiciliar sobre o uso de
Drogas Psicotrópicas no Brasil – estudo envolvendo as 108
maiores cidades do país2 –, o álcool e os produtos de tabaco,
em comparação às demais substâncias psicoativas, foram as
de maior prevalência de uso. E a prevalência de uso na vida
de tabaco e álcool foi relatada por 44% e 74,6% das pessoas
entrevistadas, respectivamente.
Existe na atualidade uma atenção especial a esse uso
entre os universitários. O maior uso de álcool e tabaco por
essa população específica está relacionado a determinados
fatores já identificados, como não possuir religião ou não frequentar celebrações religiosas, morar longe dos pais e apresentar mais horas livres nos dias úteis e alta renda familiar6,7. O
ingresso na universidade pode se tornar um período crítico,
pois a autonomia que se insere na vida de muitos estudantes
é fator gerador de insegurança e de maior vulnerabilidade
para o início e a manutenção do uso SPA8.
Portanto, conhecer o padrão do uso de SPA dessa população é primordial e deve anteceder à implementação de
estratégias de prevenção ao consumo de drogas, pois possibilita o desenvolvimento de políticas públicas, incluindo prevenção e tratamento, com resultados potencialmente mais
proveitosos9.
O uso de SPA por universitários já foi objeto de diversos
estudos envolvendo várias universidades do país. Em uma
pesquisa de revisão acerca do uso de SPA entre estudantes
do ensino superior entre 1997 e 200710, encontram-se os estudos de prevalência realizados na Universidade de São Paulo
(USP), na Universidade do Estado de São Paulo (Unesp), na
Universidade Federal do Amazonas (UFAM), na Universidade de Alfenas (Unifenas), na Universidade Federal de Alfenas
(Unifal), na Universidade Federal do Ceará (UFC) e nas Faculdades de Medicina da Bahia (FM-UFBA). A Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) também foi cenário de pesquisas
semelhantes com universitários dos cursos de Odontologia11,
Enfermagem12 e Farmácia13 e Medicina14, onde o álcool foi a
substância com maior prevalência de uso seguida pelo tabaco, um resultado relevante e comum a todos os estudos
mencionados.
No I Levantamento Nacional sobre o Uso de Álcool, Tabaco e Outras Drogas entre Universitários das 27 Capitais
Brasileiras3, observou-se que, em relação ao uso na vida, as
drogas relatadas com maior frequência foram: álcool (86,2%)
e tabaco (46,7%); enquanto nos últimos 12 meses antecedendo a aplicação do questionário as substâncias mais frequentemente usadas foram: álcool (72,0%) e tabaco (27,8%). Nos
últimos 30 dias, as drogas mais frequentemente consumidas
foram: álcool (60,5%), tabaco (21,6%), maconha (9,1%), anfetamínicos (8,7%), tranquilizantes (5,8%), inalantes (2,9%) e alucinógenos (2,8%).
Os universitários da área da saúde constituem alvo de
especial atenção no que se refere ao consumo de SPA. Isso
pelo fato de que estarão envolvidos na promoção da saúde e
prevenção de diversas morbidades, entre elas a dependência
por substâncias psicoativas. Nesse contexto, os universitários
do curso de Psicologia, que se insere entre as áreas da saúde
e das ciências humanas, devem ter atenção privilegiada, pois,
ao exercerem sua profissão, estarão diretamente envolvidos
na identificação, prevenção e tratamento de indivíduos com
problemas relacionados ao uso de substâncias psicoativas.
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):22-30.
24
artigo original
Santos MVF et al.
De acordo com o exposto, objetiva-se com este estudo
traçar o perfil do uso de álcool e tabaco entre os estudantes
universitários do curso de Psicologia da UFES.
Métodos
Trata-se de um estudo quantitativo, de corte transversal, rea­
lizado no Centro de Ciências Humanas e Naturais (CCHN)
da UFES, no segundo semestre do ano de 2010 (2010/2). A
população estudada foi constituída dos 300 alunos que estavam devidamente matriculados no curso de Psicologia, no
período de 2010/2. A amostra foi calculada no software Epi-Info 6.04, com intervalo de confiança de 95%, erro de 5% e
prevalência esperada de 30% relativa ao fenômeno que ocorre com menor frequência nesse estudo, que seria o consumo
na vida de tabaco, resultando numa amostra de 156 universitários. Como a pesquisa foi realizada com os que estavam
presentes em sala de aula no momento da aplicação do instrumento, a amostra foi constituída por 221 estudantes.
Inicialmente, enviou-se uma carta à chefia do colegiado
de Psicologia solicitando a colaboração dos professores na
concessão de 40 minutos de suas respectivas aulas para a
aplicação dos questionários. Realizou-se um estudo piloto,
a fim de calibrar os aplicadores e identificar possíveis adaptações necessárias ao questionário. A aplicação do questionário foi realizada em sala de aula, por bolsistas de iniciação
científica devidamente treinados, com anuência prévia dos
professores, após breve explicação dos objetivos do trabalho
pelos pesquisadores. Todos que aceitaram participar da pesquisa assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido, de acordo com a Resolução nº 196/1996, do Conselho
Nacional de Saúde (CNS).
O instrumento utilizado foi o proposto pela Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (SENAD) para o I Levantamento Nacional sobre o Uso de Álcool e Outras Drogas entre Universitários das 27 Capitais Brasileiras3. Esse instrumento é um
questionário constituído por 98 questões fechadas, contendo
breve explicação sobre a pesquisa. Por meio dele é possível
identificar o perfil e o estilo de vida do universitário brasileiro,
com ênfase sobre o uso de drogas e seus transtornos, comportamentos de risco e existência de comorbidades psiquiátricas,
como sintomas depressivos, persecutórios e de sofrimento psicológico, como também informações acadêmicas, atividades
gerais, satisfação e desempenho acadêmico, comportamentos
gerais e políticas institucionais. Por meio desse instrumento, o
consumo de substâncias psicoativas é identificado de acordo
com a classificação da Organização Mundial de Saúde15:
• Uso na vida: quando a pessoa fez uso de qualquer
droga psicotrópica pelo menos uma vez na vida;
• Uso no ano: quando a pessoa utilizou droga psicotrópica pelo menos uma vez nos 12 meses que antecederam a pesquisa;
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):22-30.
• Uso no mês: quando a pessoa utilizou droga psicotrópica pelo menos uma vez nos 30 dias que antecederam a pesquisa.
Objetivando alcançar a finalidade desta pesquisa, utilizaram-se apenas os dados relativos ao perfil socioeconômico,
consumo de substâncias psicoativas e os dados referentes ao
Alcohol, Smoking and Substance Involving Screening Test (ASSIST).
O ASSIST é um questionário estruturado que contém questões
sobre o uso de substâncias psicoativas. As questões abordam:
frequência de uso das substâncias (na vida e nos últimos três
meses); problemas relacionados ao uso; preocupação a respeito do uso por parte de pessoas próximas ao usuário; prejuízo
na execução de tarefas esperadas; tentativas malsucedidas de
cessar ou reduzir o uso; sentimento de compulsão e uso por
via injetável. A pontuação varia de 0 a 39, sendo para o álcool
considerada a faixa de pontuação de 0 a 10 como indicadora
do uso sem risco; de 11 a 26 como indicadora do uso de risco
moderado; e quando superior a 27 pontos, indicadora de uso
de alto risco para o desenvolvimento de dependência, com necessidade de encaminhamento para tratamento intensivo. Para
outras substâncias psicoativas, as pontuações respectivamente
necessárias para uso sem risco, uso de risco moderado e uso de
alto risco são: 0-3 pontos; 4-26 pontos e superior a 27 pontos16.
Os dados foram analisados com o auxílio do programa
Statistical Package for the Social Science (SPSS 17). Foram utilizadas a análise univariada para a descrição das variáveis
quantitativas relacionadas ao perfil socioeconômico e a análise bivariada para verificar a associação entre o uso de SPA
lícitas (álcool e tabaco) e as variáveis independentes (sexo,
idade, religião e nível socioeconômico) por meio do teste
Qui-quadrado com nível de significância de 5%.
Este estudo integra o projeto de pesquisa intitulado “Uso
de Substâncias Psicoativas entre Universitários do Curso de
Psicologia”, que foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do Centro de Ciências da Saúde (CCS) da UFES,
de acordo com os dispositivos da Resolução nº 196/96, do
Conselho Nacional de Saúde sobre Pesquisa com Seres Humanos.
RESULTADOS
Participaram deste estudo 221 estudantes, o que corresponde a
73,66% de todos os alunos matriculados no período. Conforme
a tabela 1, a maioria dos estudantes era solteira (90,1%), do sexo
feminino (81%), estava na faixa etária de 18 a 24 anos (81%), era
da raça/cor caucasoide/branca (57,5%). Acerca do nível socioeconômico, 55% referiram pertencer às classes econômicas B1 e
B2. Quanto à religião, houve predomínio de católicos (41,18%)
e evangélicos/protestantes (24,9%), e os que não possuem
religião (21,27%). Quando se tratou de atividade remunerada,
53,15% referiram exercer atividade remunerada, no mínimo 20
horas semanais, no período de aplicação da pesquisa.
artigo original
Uso de álcool e tabaco por estudantes de psicologia
Tabela 1. Perfil socioeconômico dos estudantes de Psicologia da
Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, ES, 2011
Variável socioeconômica
N
%
Masculino
38
17,2
Feminino
179
81
4
1,8
221
100
Sexo
Não informado
Total
Faixa etária
Até 17 anos
12
5,42
De 18 a 24 anos
179
81
De 25 a 34 anos
18
8,14
Acima de 35 anos
9
4,07
Não informado
3
1,37
221
100
2
0,9
Total
Nível socioeconômico
A1
A2
12
5
B1
56
25
B2
66
30
C1
52
24
C2
25
11,3
D
7
3,2
E
1
0,5
221
100
Total
Estado civil
25
Na tabela 2 podem ser observados os dados de prevalência de uso de diversas substâncias psicoativas, nos quais
se nota que as mais consumidas foram as substâncias lícitas. Na vida, as substâncias mais usadas foram, respectivamente, álcool (85,07%), tabaco (33,03%), tranquilizantes
(20,81%), maconha (17,19%) e os inalantes (10,41%); no
ano, álcool (63,80%), tabaco (19,91%), maconha (12,22%),
tranquilizantes (8,6%), inalantes (1,81%) e anfetamínicos
(1,81%); no mês, álcool (52,49%), tabaco (13,12%), maconha
(9,05%), tranquilizantes (3,62%) e posteriormente anfetamínicos, alucinógenos e analgésicos opiáceos, com 1,36% de
prevalência cada.
Quanto ao uso de SPA lícitas segundo a idade de experimentação, a faixa etária de maior prevalência para o
álcool foi a de 15 a 17 anos (48,6%), seguida pela de 12 a
14 anos (32,6%), com idade média de experimentação de
14,84 anos, com idade mínima de 5 e máxima de 21 anos.
Para o tabaco, a faixa etária de maior prevalência foi a de
18 anos ou mais (37,9%) seguida pela faixa de 15 a 17 anos
(33,3%), e a média foi de 16,55 anos, com mínima de 9 e
máxima de 24 anos.
Tabela 2. Uso de substâncias psicoativas entre estudantes de
Psicologia da Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, ES,
2011
Substância psicoativa
Uso na vida
Uso no ano
Uso no mês
N
%
N
%
N
%
Casado
18
8,1
Solteiro
199
90,1
Álcool
188
85,07
141
63,8
116
52,49
Separado
2
0,9
Tabaco
73
33,03
44
19,91
29
13,12
Não informado
2
0,9
221
100
Tranquilizantes
46
20,81
19
8,6
8
3,62
Total
Religião
Maconha
38
17,19
27
12,22
20
9,05
Inalantes
23
10,41
4
1,81
2
0,9
Anfetamínicos
13
5,88
4
1,81
3
1,36
Não tenho
47
21,27
Católica
91
41,18
Espírita
19
8,6
Alucinógenos
12
5,43
8
3,62
3
1,36
Analgésicos opiáceos
8
3,62
6
2,71
3
1,36
Umbanda/candomblé
1
0,45
Evangélica/protestante
55
24,9
Codeína
8
3,62
3
1,36
2
0,9
0,45
Cocaína
6
2,71
2
0,9
2
0,9
0,45
0
0,00
Judaica
1
Outras
4
1,8
Ecstasy
4
1,81
1
Não informado
3
1,35
Drogas sintéticas
3
1,36
0
0
0
0,00
221
100
Chá de ayahuasca
3
1,36
1
0,45
0
0,00
Branco
127
57,5
Sedativos
3
1,36
1
0,45
0
0,0
Negro
16
7,2
Esteroides anabolizantes
2
0,9
2
0,9
1
0,45
Mulato/Pardo
71
32,1
Anticolinérgicos
0
0,00
0
0,00
0
0,00
Asiático/amarelo
2
0,9
Total
Raça/Cor
Cetamina
0
0,00
0
0,00
0
0,00
Crack
0
0,00
0
0,00
0
0,00
Heroína
0
0,00
0
0,00
0
0,00
Índio
2
0,9
Outras
1
0,5
Não informado
2
0,9
Merla
0
0,00
0
0,00
0
0,00
100
Relevin
0
0,00
0
0,00
0
0,00
Total
221
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):22-30.
artigo original
Santos MVF et al.
26
A tabela 3 mostra o padrão do uso de risco (de moderado
a alto) de álcool e tabaco, conforme a classificação obtida
pela pontuação do ASSIST. O valor percentual apresentado
na tabela é relativo ao total de indivíduos pertinentes a cada
categoria analisada. Foi detectado que 16,3% dos estudantes
usaram álcool com esse padrão e que 4,07% usaram tabaco
dessa forma. Quanto ao uso com risco, moderado ou alto,
para álcool pode-se observar que 16,2% das mulheres, 15,8%
dos homens, 23,4% dos que não têm religião, 21% dos esTabela 3. Perfil do uso de risco de álcool e tabaco entre estudantes
de Psicologia da Universidade Federal do Espírito Santo, conforme
ASSIST. Vitória. ES, 2011
Álcool
Variável
Tabaco
N
(%)
N
(%)
36
16,3
9
4,07
Feminino
29
16,2
7
3,9
Masculino
6
15,8
2
5,3
Não respondeu
1
-
0
0,0
Não tenho religião
11
23,4
4
8,5
Espírita
4
21
1
5,3
Católica
17
18,6
3
3,3
Evangélico/protestante
3
5,4
0
0,0
Umbanda/candomblé
1
100
1
100
De 18 a 24 anos
35
19,5
8
4,5
De 25 a 34 anos
1
5,5
1
5,5
Outras faixas etárias
0
0,00
0
0,00
Sim
19
16
7
5,88
Não
16
15,7
2
1,96
Uso de risco
Sexo
Religião
Faixa etária
píritas e 19,5% dos incluídos na faixa etária de 18 a 24 anos
fizeram esse tipo de uso; já para o tabaco, 3,9% das mulheres,
5,3% dos homens, 8,5% dos que não têm religião, 5,3% dos
espíritas. Dos que exerciam algum tipo de atividade remunerada, 5,88% usaram tabaco com padrão de risco e 1,96 dos
que não exerciam usaram tabaco dessa forma.
A tabela 4 apresenta a associação entre o uso na vida
de SPA lícitas e uso na vida de SPA ilícitas. Observou-se que
as substâncias associadas ao uso de álcool na vida foram a
maconha (p = 0,007), os tranquilizantes (p = 0,011) e os anfetamínicos (p = 0,045). Já para o uso de tabaco na vida, as
substâncias mais associadas foram a maconha (p = 0,0001),
os inalantes (p = 0,0001), os alucinógenos (p = 0,0001) e os
anfetamínicos (p = 0,001). As SPA ilícitas associadas ao uso
na vida de tabaco (maconha, inalantes, alucinógenos e anfetamínicos) foram também associadas ao uso na vida de
álcool e tabaco, possuindo o mesmo resultado do teste Qui-Quadrado.
Na tabela 5, é possível verificar o uso na vida de álcool
e tabaco relacionado às variáveis: sexo, idade, religião e nível socioeconômico. O percentual discriminado na tabela
refere-se ao total de indivíduos pertinentes a cada categoria
analisada. O uso de álcool não apresentou relação com as
variá­veis sexo (p = 0,119), religião (p = 0,561) e nível socioeconômico (p = 0,189), mas apresentou relação a variável idade (p = 0,001). Já para uso na vida de tabaco, assim como o
uso de álcool e de tabaco associado, observou-se associação
com religião (p = 0,022) e idade (p = 0,001).
DISCUSSÃO
Atividade remunerada
Notou-se a prevalência de universitários do sexo feminino
(81%), corroborando outros estudos12,23-25, que também encontraram prevalência de estudantes do sexo feminino.
Tabela 4. Uso na vida de SPA lícitas em relação ao uso de SPA Ilícitas entre estudantes de Psicologia da Universidade Federal do Espírito
Santo, Vitória, ES, 2011
Uso na vida de SPA ilícita
Uso na vida
Maconha
n (%)
Inalantes
p-valor
n (%)
p-valor
Cocaína
n (%)
Alucinógenos
p-valor
n (%)
p-valor
Tranquilizantes
n (%)
p-valor
Anfetamínicos
n (%)
p-valor
Álcool
Sim
38 (100%)
Não
0 (0%)
0,007
22 (96%)
1 (4%)
0,283
6 (100%)
0 (0%)
0,693
12 (100%)
0 (0%)
0,055
44 (98%)
1 (2%)
0,011
13 (100%)
0 (0%)
0,045
Tabaco
Sim
35 (92%)
Não
3 (8%)
0,0001
18 (78%)
3 (22)
0,0001
5 (83,3%)
1 (16,7%)
0,011
12 (100%)
0 (0%)
0,0001
18 (40%)
27 (60%)
0,298
10 (77%)
3 (23%)
0,001
Álcool e tabaco
Sim
35 (92%)
Não
3 (8%)
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):22-30.
0,0001
18 (78%)
3 (22)
0,0001
5 (83,3%)
1 (16,7%)
0,011
12 (100%)
0 (0%)
0,0001
18 (40%)
27 (60%)
0,298
10 (77%)
3 (23%)
0,001
artigo original
Uso de álcool e tabaco por estudantes de psicologia
27
Tabela 5. Uso na vida de álcool e tabaco entre estudantes de Psicologia da Universidade Federal do Espírito Santo, segundo sexo, idade,
religião e nível socioeconômico – Vitória-ES, 2011
Variável
Álcool (n = 188)
n (%)
Tabaco (n = 73)
n (%)
Álcool e tabaco
(n = 73)
n (%)
Sexo
p-valor = 0,119
p-valor = 0,593
p-valor = 0,593
Masculino
34 (89,5%)
18 (47,3%)
18 (47,3%)
Feminino
150 (83,8%)
51 (28,5%)
51 (28,5%)
n=4
n=4
n=4
p-valor = 0,561
p-valor = 0,022
p-valor = 0,022
45 (95,75%)
25 (53,2%)
25 (53,2%)
Católica
81 (89%)
27 (26,7%)
27 (26,7%)
Evangélica/protestante
38 (69%)
9 (16,4%)
9 (16,4%)
Outras
21 (84%)
10 (40%)
10 (40%)
Não informado
Religião
Não tenho religião
Não informada
Idade
Até 18 anos
n=3
n=2
n=2
p-valor = 0,001
p-valor = 0,001
p-valor = 0,001
30 (73,2%)
10 (24,4%)
10 (24,4%)
19 a 24 anos
132 (88%)
51 (34%)
51 (34%)
25 a 34 anos
16 (88,9%)
6 (33,3%)
6 (33,3%)
35 ou mais anos
7 (77,8%)
4 (44,4%)
4 (44,4%)
Não informado
Nível socioeconômico
A1
n=3
n=2
n=2
p-valor = 0,109
p-valor = 0,189
p-valor = 0,189
2 (100%)
1 (50%)
1 (50%)
A2
12 (100%)
7 (58,3%)
7 (58,3%)
B1
45 (80,4%)
13 (23,2%)
13 (23,2%)
B2
59 (89,4%)
26 (39,4%)
26 (39,4%)
C1
46 (88,5%)
15 (28,8%)
15 (28,8%)
C2
18 (72%)
7 (28%)
7 (28%)
D
5 (71,4%)
3 (72,8%)
3 (72,8%)
E
1 (100%)
1 (50%)
1 (50%)
Encontrou-se também predomínio da faixa etária de 18 a
24 anos (81%), da raça/cor caucasoide/branca (57,5%) e pertencentes às classes socioeconômicas B1 e B2 (55%). Acerca
da religião, houve predomínio de católicos (41,18%) e evangélicos/protestantes (24,9%) e os que não possuem religião
(21,27%). Resultados semelhantes foram encontrados no I
Levantamento Nacional sobre o Uso de Álcool e Outras Drogas entre Universitários das 27 Capitais Brasileiras3, no qual
foi encontrado predomínio da faixa etária de 18 a 24 anos
(58%), da raça/cor caucasoide/branca (61,6%) e pertencentes às classes econômicas B1 e B2 (49,1%), da religião católica (50,0%), seguida da evangélica (17,4%) e espírita (8,9%), e
14,9% dos universitários respondentes relataram não seguir
nenhuma religião. Quanto à faixa etária, os dados concordam com Kerr-Correa et al.17, que encontraram em seu trabalho predomínio de faixas etárias jovens. Alguns estudos
realizados na UFES11-14 também se aproximam dos resultados
desta pesquisa, já que a maioria dos estudantes pertencia à
faixa etária de 18 a 24 anos e à classe socioeconômica B.
Em relação ao uso de SPA, as lícitas foram as mais prevalentes. Dessa forma, esta pesquisa corrobora estudos
realizados entre a população geral2, entre universitários
brasileiros3,17-19 e com universitários da UFES11-14. Na vida,
as substâncias mais usadas foram, respectivamente, álcool
(85,07%), tabaco (33,03%), tranquilizantes (20,81%) e maconha (17,19%); no ano, álcool (63,80%), tabaco (19,91%),
maconha (12,22%) e tranquilizantes (8,6%); no mês, álcool
(52,49%), tabaco (13,12%), maconha (9,05%) e tranquilizantes (3,62%). Observou-se a prevalência de uso na vida de
álcool de 85,07%, dado semelhante ao encontrado por Kerr-Côrrea et al.17, que detectaram prevalência de 84% para o
uso na vida dessa substância entre estudantes de Medicina
da Unesp, como também por Mardegan et al.12, que constataram prevalência de 82,1% para o uso na vida de álcool
entre estudantes de enfermagem da UFES.
As prevalências de uso de álcool obtidas em nossa pesquisa são superiores às da população geral. Carlini et al. encontraram no II Levantamento Domiciliar sobre o Uso de
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):22-30.
28
Santos MVF et al.
Drogas Psicotrópicas no Brasil2 as prevalências de 74,6%
(vida), 49,8% (ano) e 38,3% (mês). Laranjeira et al., em um levantamento sobre uso de álcool na população geral, constataram que 52% dos brasileiros acima de 18 anos beberam
pelo menos uma vez ao ano, sendo essa prevalência menor
do que a constatada pelo presente estudo (63,80%), em que
a maioria possui 18 anos ou mais (93,2%). Contudo, o uso
de álcool foi inferior ao constatado em universitários brasileiros3. Já em outra pesquisa19 realizada com 538 estudantes, em que 48,9% da amostra era de universitários do curso
de Psicologia, as prevalências de uso do álcool foi de 96,7%
(vida), 67,6% (ano) e 76,6% (mês) e para o tabaco foi de 65,1%
(vida), 37,9% (ano) e 45,5% (mês), dados superiores aos que
encontramos nos universitários de psicologia da UFES.
A prevalência do uso do tabaco obtida se diferencia das
prevalências detectadas por outras pesquisas. Em estudos
realizados entre a população geral2 e entre universitários
brasileiros3,13,17-19,23,25, as prevalências de uso (vida, ano e mês)
são superiores, como exemplificado pelo trabalho de Chiapetti e Serbena19 com universitários do curso de Psicologia,
que detectou altas prevalências de uso de tabaco de 65,1%
(vida), 37,9% (ano) e 45,5% (mês). Pesquisas realizadas com
estudantes de Odontologia11, Medicina14 e Enfermagem12 da
UFES detectaram que o uso na vida para o tabaco foi inferior
a 33,03%, valor encontrado no presente estudo.
Em relação ao uso de SPA ilícitas no ano e no mês, corroboramos os dados obtidos pelo II Levantamento Domiciliar sobre o Uso de Drogas Psicotrópicas no Brasil2, pelo I
Levantamento Nacional entre Universitários das 27 Capitais
Brasileiras3, como também por Chiapetti e Serbena19, que
detectaram a maconha como SPA ilícita mais prevalente. Todavia, quanto ao uso na vida, nosso estudo se diferencia dos
anteriormente citados por encontrar maior uso de tranquilizantes (20,81%), explicado por ser a maioria dos universitários pesquisados do sexo feminino, pois, conforme Wagner
et al.26, as mulheres usam mais medicações com potencial de
abuso que os homens.
Em estudos com estudantes de enfermagem, assim
como este de maioria feminina, obtiveram-se achados discordantes no que diz respeito às SPA mais usadas (exceto
álcool e tabaco). Como exemplo, há a pesquisa realizada na
Universidade Federal de Passo Fundo23, na qual as substâncias mais prevalentes na vida, no ano e no mês (exceto álcool
e tabaco) foram os estimulantes e os benzodiazepínicos, e o
estudo conduzido na Universidade Federal do Espírito Santo12, que encontrou os ansiolíticos e anfetamínicos como as
substâncias mais consumidas na vida, no ano e no mês após
as SPA lícitas. A Universidade Católica de Minas Gerais24 também foi cenário de estudo semelhante, sendo os ansiolíticos
e inalantes após álcool e tabaco as substâncias mais usadas
na vida.
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):22-30.
artigo original
Sobre o uso de SPA lícitas segundo a idade de experimentação, observou-se que houve predomínio de experimentação antes dos 18 anos, tendo 81% dos universitários experimentado álcool e 62% experimentado tabaco com idade
inferior a 18 anos. Os achados deste estudo se relacionam à
posição de autores como Baus et al.20, Kerr-Corrêa et al.17 e Tavares et al.21, pois afirmam que a introdução no consumo de
substâncias tem ocorrido cada vez mais precocemente. Mesmo que legalmente a idade mínima para compra de bebidas
alcoólicas no Brasil seja de 18 anos, 80,8% dos respondentes
já haviam experimentado alguma bebida alcoólica antes dos
18 anos de idade (48,6% entre 15 e 17 anos e 32,6% entre 12
e 14 anos), semelhante ao que se notou no I Levantamento
Nacional entre Universitários3, em que 54% dos entrevistados já haviam experimentado alguma bebida alcoólica antes
dos 16 anos de idade. Corroborando esses dados, Laranjeira
et al.9 encontraram que a população brasileira entre 18 e 25
anos teve média de 15,3 anos para idade de experimentação
e de 17,3 anos para início de consumo regular de álcool. Enquanto isso, os menores de 18 anos tiveram idade média de
13,9 anos para idade de experimentação e de 14,6 anos para
início de uso regular.
Detectou-se que 16,2% das mulheres, 15,8% dos homens
e 19,5% dos incluídos na faixa etária de 18 a 24 anos têm
risco, de moderado a alto, de desenvolver dependência do
álcool. Então, em nossa pesquisa, o sexo feminino teve maior
uso com padrão de risco (no mínimo moderado) e o sexo
masculino e os pertencentes à faixa etária de 18 a 24 anos
tiverem um uso menor, em relação ao que se observou no I
Levantamento Nacional entre Universitários3, em que 13,62%
das mulheres, 26,9% dos homens e 25,3% incluídos na faixa
etária de 18 a 24 anos obtiveram pontuação indicativa de
risco moderado a alto.
Evidenciou-se a relação do uso na vida de álcool, tabaco
e ambas as drogas ao uso na vida de SPA ilícitas (maconha,
inalantes, cocaína, alucinógenos, anfetamínicos e tranquilizantes) com significância estatística. O uso de álcool na vida
associou-se estatisticamente com o uso na vida de maconha, tranquilizantes e anfetamínicos. Nota-se que o uso de
tabaco, em relação ao do álcool, manteve maior associação
com o uso na vida de SPA ilícitas. Maconha, inalantes, cocaína, alucinógenos e anfetamínicos estiveram associados ao
uso na vida de tabaco e mantiveram a associação com experimentação de álcool e tabaco. As frequências de uso na vida
(de tabaco e outra SPA ilícita) são iguais às de uso na vida (de
álcool e tabaco e outra SPA ilícita), evidenciando que todos
os que usaram tabaco na vida também fizeram uso de álcool
na vida. A maconha esteve mais associada ao uso na vida de
álcool (p = 0,007), tabaco (p = 0,0001) e álcool e tabaco (p =
0,0001); esse resultado pode estar relacionado ao fato de a
maconha ser uma das SPA ilícitas mais prevalentes2-4,11-14,17-20
e também aos achados de Ortega-Perez et al.22, que encon-
artigo original
traram a maconha como terceira droga com maior uso e a
primeira ilícita a ser usada na vida, quando questionaram estudantes universitários sobre a ordem do uso e experimentação de SPA.
Verificou-se a associação da variável experimentação do
álcool com a variável idade (p = 0,001). Contudo, não esteve
associada a religião (p = 0,119) e sexo (p = 0,561), dessa forma, em relação à variável sexo, concorda-se com Silva et al.6.
O tabaco esteve associado às variáveis religião (p = 0,022)
e idade (p = 0,001). Mais da metade (53,2%) dos que não
possuíam religião usou pelo menos uma vez na vida essa
substância, seguida pelos católicos, dos quais 26,7% usaram
tabaco ao menos uma vez na vida, e por último os protestantes, com 16,4%. Esses dados divergem do estudo de Silva et
al.6, no qual o uso de álcool apresentou relação com o tipo
de religião praticada (p < 0,001), mas não com o uso de tabaco. Pesquisas apontam a religião como fator de proteção em
relação ao uso de substâncias psicoativas27-30. Funai e Pillon30
afirmam que o consumo de álcool entre estudantes universitários e o comportamento religioso são temas complexos,
importantes, ainda pouco explorados e de difícil mensuração. Segundo Dalgalarrondo et al.27, os protestantes históricos e os pentecostais apresentam relativamente menor uso
das SPA do que os católicos e os espíritas.
As pesquisas que envolvem religião e saúde, em sua
maioria, não têm a religião como foco do estudo31. Contudo,
ao longo dos últimos anos, dados quantitativos vêm apontando íntima relação da religião com a prevenção do consumo de drogas, evidenciando a existência de uma associação
positiva entre o não consumo de drogas e a prática de alguma religião27. Mais de 80% dos estudos publicados antes de
2000 que investigaram a relação entre religiosidade e uso de
SPA encontraram correlação inversa entre essas variáveis32.
Uso de álcool e tabaco por estudantes de psicologia
29
sobre a criação de programas preventivos específicos para
estudantes universitários.
Contribuições individuais
Marcos Vinícius Ferreira dos Santos – Contribuiu na análise e interpretação dos dados, na elaboração do artigo e na
aprovação da versão final a ser publicada.
Denis Soprani Pereira – Contribuiu na concepção e no desenho do estudo, na elaboração do artigo, na análise dos
dados e na aprovação da versão final a ser publicada.
Marluce Miguel de Siqueira – Contribuiu na concepção e
no desenho do estudo, na revisão crítica do conteúdo intelectual e na aprovação da versão final a ser publicada.
CONFLITOS DE INTERESSE
Declaramos que não existem conflitos de interesses pes­
soais, comerciais, acadêmicos, políticos e/ou financeiros neste manuscrito.
AGRADECIMENTOS
Agradecemos à Profa. Ms. Kellen Dettmann Wandekoken e
a Profa. Dra. Luziane Zacché Avellar, que contribuíram de
forma significativa para a melhoria da versão final deste
trabalho, e também aos membros da equipe CEPAD-UFES,
que forneceram apoio técnico-administrativo para execução dele.
REFERÊNCIAS
CONCLUSÃO
Atualmente, o consumo de substâncias psicoativas (SPA)
entre universitários recebe atenção de vários pesquisadores,
principalmente porque as consequências negativas decorrentes do uso de SPA no percurso acadêmico poderão influenciar o exercício profissional desses estudantes.
Os resultados obtidos subsidiarão a elaboração de medidas de prevenção do uso de substâncias psicoativas nessa população, sendo essas mais eficazes quando paralelas à
identificação dos estudantes mais expostos, vulneráveis ou
em potencial risco para abuso ou dependência de substâncias psicoativas. Dessa forma, espera-se uma maior abordagem nos currículos de graduação sobre o consumo (uso,
abuso e dependência) de substâncias psicoativas e seus impactos para o indivíduo, a família e a sociedade, bem como
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artigo original
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artigo original
Hospitalização integral para tratamento
dos transtornos alimentares: a experiência
de um serviço especializado
Inpatient treatment for eating disorders: the
experience of a specialized service
Raphaela Fernanda Muniz Palma1, José Ernesto dos Santos2, Rosane Pilot Pessa Ribeiro3
RESUMO
Palavras-chave
Transtornos alimentares,
hospitalização, anorexia
nervosa, bulimia nervosa.
Objetivo: Descrever as características da hospitalização integral para o tratamento de transtornos alimentares em um serviço especializado de Ribeirão Preto, SP. Métodos: Foram revisados todos os prontuários dos pacientes em seguimento pelo serviço, de 1982 até 2011,
especialmente aqueles que tiveram indicação de internação integral. Foram coletados dados
sociodemográficos e referentes ao diagnóstico. Resultados: No período referido, 186 pacientes receberam atendimento pelo serviço e, desses, 44,6% (n = 83) foram internados para
tratamento. Ao longo do tempo, houve redução na relação atendimento/internação, passando de 77,7% para 36,2% dos casos. A média de internações foi de 1,9 ± 3,9 vezes, e 73,5% (n
= 61) dos pacientes foram hospitalizados apenas uma vez. A duração média da internação,
independentemente do número de hospitalizações, foi de 70,6 ± 115,9 dias (variação de 3 a
804 dias). A predominância foi do sexo feminino, raça branca, solteira, sem filhos e com idade média de 23,3 ± 10,8 anos. O diagnóstico predominante foi de anorexia nervosa (85,5%),
sobretudo em seu tipo restritivo (54,2%). As indicações mais frequentes para internação foram para realização de terapia nutricional (50,9%), seguida da investigação do quadro clínico
(30,1%) e por causa de depressão e/ou ideação suicida (10,9%). Conclusão: A hospitalização
integral é uma modalidade terapêutica necessária para o tratamento desses quadros, e sua
frequência foi considerada significativa, porém diminuiu ao longo do tempo. Esse resultado
pode ser explicado pela tendência de desospitalização a partir da reforma psiquiátrica, do
diagnóstico e tratamento mais precoces e da experiência adquirida pelos profissionais do
serviço ao longo dos anos.
ABSTRACT
Objective: To describe the characteristics of inpatient treatment for eating disorders in a
specialized service in Ribeirao Preto, SP. Methods: We reviewed all the medical records of
patients followed up for the service between 1982 and 2011, particularly those who received inpatient treatment. Sociodemographic data and related to diagnosis were collected.
Results: In the said period, 186 patients were treated by the service and 44.6% (n = 83)
Recebido em
18/9/2012
Aprovado em
20/2/2013
1 Universidade de São Paulo (USP), Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP), Programa de Pós-Graduação em Enfermagem em
Saúde Pública.
2 USP, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP).
3 USP-EERP, Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Saúde Pública.
Endereço para correspondência: Raphaela Fernanda Muniz Palma
Rua Malachias José dos Santos, 42, Jardim Independência
14076-210 – Ribeirão Preto, SP, Brasil
E-mail: [email protected]
32
artigo original
Palma RFM et al.
Keywords
Eating disorders, inpatient
treatment, anorexia
nervosa, bulimia nervosa.
were hospitalized for treatment. A reduction was observed in hospitalization rates of 77,7%
to 36,2% over time. The average hospitalization was 1.9 ± 3.9 times of which 73.5% (n =
61) patients were hospitalized only once. The mean duration of hospitalization, regardless
of the number of hospitalizations was 70.6 ± 115.9 days (range 3-804 days). Most patients
were female, Caucasian, unmarried, childless and with a mean age of 23.3 ± 10.8 years old.
The predominant diagnosis was anorexia nervosa (85.5%), especially in its restrictive type
(54.2%). The most common indications for hospitalization were for nutritional support therapy (50.9%), followed by the clinical research (30.1%) and due to depression or suicidal ideation
(10.9%). Conclusion: Inpatient treatment was a therapeutic modality required for treatment
of these patients and their frequency was significant, but decreased over time. This result
can be explained by the trend of deinstitutionalization from the psychiatric reform, earlier
diagnosis and treatment and the experience gained by service professionals over the years.
INTRODUÇÃO
Os transtornos alimentares (TA) são doenças graves e complexas cuja etiologia é multifatorial, envolvendo fatores genéticos, fisiológicos, psicológicos e ambientais. Dessa forma,
torna-se imprescindível o olhar atento e multifacetado para
o manejo terapêutico que se apresenta, quase sempre, bastante desafiador, requerendo abordagem de uma equipe
multidisciplinar bem treinada em serviços especializados1.
Os TA mais conhecidos e discutidos são a anorexia nervosa
(AN) e a bulimia nervosa (BN).
O nível de cuidado apropriado para o paciente é determinado no momento do seu diagnóstico inicial e, posteriormente, sempre que uma mudança relevante em
sua condição exija transição para um nível diferente. As
configurações incluem o seguimento ambulatorial, tratamento domiciliar, hospitalização parcial em hospitais-dia
e hospitalização integral para pacientes graves que apresentam complicações agudas da doença. Ao determinar o
nível inicial de atendimento ou a mudança para um nível
diferente de cuidados, é essencial analisar em conjunto a
condição física geral, complicações médicas, deficiências,
comorbidade psiquiátrica, comportamento, interação familiar, recursos sociais, meio ambiente e serviços disponíveis2-4.
A hospitalização integral é a modalidade terapêutica
utilizada pelas equipes quando outras tentativas de tratamento falharam ou não conseguem obter resultados satisfatórios. Ocorre em serviços especializados sob regime
de internação em hospitais de nível terciário ou hospitais
universitários. As indicações para hospitalização integral de
pacientes com TA, em geral, englobam o estado nutricional insatisfatório, na maioria das vezes com peso abaixo de
75% de adequação segundo o índice de massa corporal ou
perda de 15% do peso corporal em três meses; episódios de
descompensação clínica com distúrbios hidroeletrolíticos;
níveis de pressão arterial sistólica/diastólica baixos, inferior
a 90/60 mmHg em adultos e 80/50 mmHg em crianças e
adolescentes, frequência cardíaca menor que 50 bpm; preJ Bras Psiquiatr. 2013;62(1):31-7.
sença de comorbidades psiquiátricas ou risco de suicídio
iminente; pouca continência familiar e situações de tensão
ambiental; e também abuso de substâncias e exacerbação
de sintomas purgativos5,6.
No início dos anos 1980, foi criado pela Divisão de Nutrologia do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de
Medicina de Ribeirão o Grupo de Assistência em Transtornos
Alimentares (GRATA) para prestar assistência a portadores
de TA no Hospital das Clínicas (HCFMRP-USP). Ao longo dos
anos, à sua equipe agregaram-se vários profissionais e, atual­
mente, o serviço conta com uma equipe multidisciplinar
composta por médicos (nutrólogo e psiquiatra), psicólogos
e nutricionistas, além de estagiários nas áreas de psicologia
e nutrição7.
O serviço oferece atendimento semanal na esfera ambulatorial, com frequência de retorno variada, dependendo da
necessidade do caso. São oferecidos atendimentos clínicos
individuais com médicos nutrólogos e psiquiatras, consultas
com nutricionistas, apoio psicológico, além da psicoterapia
individual para pacientes e familiares. Atividades educativas/
informativas e de apoio em grupo de natureza psicológica
e nutricional também são realizadas antes dos atendimentos para pacientes e familiares separadamente. Os pacientes
que necessitam de intervenção hospitalar para tratamento
e/ou estabilização do quadro clínico são encaminhados para
internação nas enfermarias de Clínica Médica (Unidade Metabólica) ou Psiquiatria no HCFMRP-USP. A admissão hospitalar é mediada pelos médicos que compõem a equipe do
GRATA, geralmente residentes ou médicos contratados do
HCFMRP-USP; o seguimento dos pacientes nessa situação é
realizado pela equipe fixa de profissionais do hospital, com
possibilidade de assistência de outras especialidades como
terapeutas ocupacionais e assistentes sociais por pedido de
interconsulta8.
O objetivo do presente estudo foi descrever as indicações e as características da hospitalização integral para tratamento de pacientes com transtornos alimentares seguidos
por um serviço especializado desde o início do seu funcionamento.
artigo original
MÉTODOS
Trata-se de um estudo transversal de caráter descritivo e exploratório com delineamento quantitativo.
Inicialmente, foi realizado levantamento no sistema informatizado do hospital junto ao Departamento de Seção de
Dados Médicos dos registros de pacientes que foram internados entre 1982 e 2011 com diagnóstico de AN ou BN.
Foram incluídos no estudo pacientes com diagnóstico
de AN ou BN seguidos pelo GRATA, que foram internados
no período referido, independentemente do sexo e idade,
com duração de internação igual ou superior a três dias. Foram excluídos do estudo aqueles pacientes que, apesar do
diagnóstico do TA, não receberam atendimento pelo GRATA
ou cujos prontuários não foram encontrados nos arquivos
médicos.
Os dados foram coletados a partir da revisão dos prontuários dos pacientes, seguindo o instrumento de coleta
desenvolvido para a pesquisa. Foram colhidos dados sociodemográficos, da doença (tempo de sintomas e idade no
diagnóstico e internação, tempo de tratamento da doença
antes da internação) e informações relacionadas às internações (número, duração e indicação das internações). A definição das faixas etárias de crianças e adolescentes seguiu
a classificação da Organização Mundial da Saúde9: crianças
até 10 anos de idade e adolescentes entre 10 e 19 anos. Os
pacientes adultos compreenderam aqueles com idade superior a 19 anos.
As informações foram transportadas para um banco de
dados com técnica de dupla-digitação e validação no programa Excel do software Microsoft Office, versão 2007. Os
resultados descritivos foram obtidos por meio do cálculo das
médias (desvio-padrão), valores mínimos e máximos para as
variáveis contínuas, além das frequências para as variáveis
categóricas. Foi empregado o teste para análise de variância (ANOVA) e utilizou-se o método Bonferroni para verificar
diferenças estatísticas entre as múltiplas comparações nesse
teste. O valor de p < 0,05 foi adotado como significante e todos os cálculos das análises estatísticas foram realizados com
auxílio do software SPSS versão 17.0 (SPSS Inc. Chicago, USA).
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do HCFMRP-USP (nº 976/2010).
RESULTADOS
No período de abrangência do estudo, o GRATA prestou
atendimento para 186 pacientes com TA; 83 (44,6%) deles
necessitaram de, no mínimo, uma internação durante o tratamento.
Ao longo dos anos, constatou-se que a escolha da hospitalização como modalidade terapêutica foi diminuindo (Figura 1). No início do funcionamento do serviço, na década
Hospitalização integral e transtornos alimentares
33
de 1980, 77,7% dos pacientes (n = 14) em tratamento foram
internados. Já na década seguinte, a relação entre pacientes
atendidos e internados caiu para a metade (n = 28), e, a partir
de 2000, a internação ocorreu em apenas 36,2% dos casos (n
= 41) em seguimento.
113
Pacientes atendidos pelo GRATA
Pacientes internados
55
18
14
28
41
Década de 1980
Década de 1990
A partir do ano de 2000
Figura 1. Número de pacientes atendidos pelo GRATA (Grupo
de Assistência em Transtornos Alimentares, n = 186) no
período do estudo que necessitaram de internação (n = 83)
durante o tratamento, segundo década. Ribeirão Preto, 2011.
Com relação ao número de internações, a média foi de
1,9 ± 3,9 vezes (com variação de 1 a 26 vezes). Constatou-se
que a maioria dos pacientes que necessitaram de intervenção hospitalar para tratamento (n = 61; 73,5%) foi internada
apenas uma vez; 18 pacientes (21,7%) tiveram de duas a cinco internações; e apenas quatro pacientes (4,8%) necessitaram de mais de cinco internações.
A média de idade na admissão hospitalar foi de 23,3 ±
10,8 anos (variação de 8 a 58 anos), aumentando naturalmente com o decorrer do tempo para 30,9 ± 16,6 anos (variação de 9 a 68 anos) na última internação daqueles que
foram internados mais de uma vez.
Na primeira (n = 83) havia duas crianças (2,4%), 37 adolescentes (44,6%) e 44 adultos (53%); para aqueles que tiveram
mais de uma internação (n = 22), a proporção na última internação foi de duas crianças (9%), nove adolescentes (41%)
e 11 adultos (50%).
O tempo médio total de hospitalização, independentemente do número de internações, foi de 70,6 ± 115,9 dias,
com extensa variação (3 a 804 dias). A duração da internação daqueles hospitalizados apenas uma vez (n = 61) foi de
41 ± 37,6 dias (mínimo 3; máximo 159 dias) e para aqueles
hospitalizados mais vezes (n = 22), somando-se todas as internações, a duração média foi de 152 ± 199 dias (mínimo 15,
máximo 804 dias).
As indicações para internação mais frequentes foram
para realização de terapia nutricional (suporte nutricional ou
reposição hidroeletrolítica), seguida da investigação do quadro clínico e por causa de depressão e/ou ideação suicida
(Figura 2).
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):31-7.
34
artigo original
Palma RFM et al.
Tabela 1. Caracterização sociodemográfica dos pacientes
hospitalizados com transtornos alimentares (n = 83), Ribeirão
Preto, 2011
72,7%
59%
Variáveis
30,1%
9,1%
Terapia nutricional
Investigação do
quadro
Primeira internação
10,9%
18,2%
Depressão/ideação
suicida
Última internação
Figura 2. Número de pacientes hospitalizados com transtornos alimentares no HCFMRP-USP (Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – Universidade de
São Paulo), segundo indicação na primeira (n = 83) e última
internação (n = 22), Ribeirão Preto, 2011.
Aproximadamente um terço dos pacientes (30,1%) em
sua primeira hospitalização foi internado para investigação
do quadro, número que naturalmente caiu na última internação. A necessidade de internação de pacientes por causa
de depressão/ideação suicida ocorreu em poucos casos, e
em análise mais detalhada observou-se que foi proporcionalmente maior entre pacientes com BN internados apenas
uma vez.
A tabela 1 apresenta a distribuição da amostra segundo
as características sociodemográficas. Evidencia-se predominância de pacientes do sexo feminino e da raça branca, com
média de idade na época do diagnóstico de 22,6 ± 10,7 anos,
variando de 8 a 58 anos, sendo 53% adultos (n = 44) e 47%
crianças e adolescentes (n = 39). A maioria era solteira, sem
filhos, e cerca da metade dos pacientes era estudante cursando o ensino médio. Observa-se que a maior parte deles
reside em cidades do estado de São Paulo, com cerca de um
terço na cidade de Ribeirão Preto, SP.
A distribuição dos pacientes segundo diagnóstico do
TA (Tabela 2) demonstrou preponderância de AN (n = 71;
85,5%). Quando observados os seus subtipos, aproximadamente metade deles apresentava anorexia nervosa do tipo
restritivo (AN-R), em menor escala apresentaram anorexia
nervosa do tipo compulsão periódica/purgativo (AN-CP). Pacientes portadores de BN abarcaram a minoria dos casos. Em
relação à idade na época do diagnóstico, essa foi semelhante
entre os portadores de AN-R e AN-CP e maior naqueles com
BN, sem diferença estatística.
O tempo dos sintomas da doença antes do diagnóstico
foi de 32,4 ± 45,8 meses, com extensa variação de 1 a 240
meses. Quando separados diagnósticos e subtipos, observou-se que o tempo de sintomas dos pacientes com AN-R
foi menor, e para os portadores de AN-CP ou BN o período
sintomatológico foi, pelo menos, três vezes maior. O tempo
de sintomas apresentados pelos pacientes com AN-R diferiu
significativamente daqueles com AN-CP e BN (p < 0,05).
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):31-7.
[n (%)]
Sexo
Feminino
Masculino
79 (95,2)
4 (4,8)
Estado civil
Solteiro
Casado/amasiado
Divorciado/viúvo
63 (76)
16 (19,3)
4 (4,7)
Filhos
Sim
Não
18 (21,7)
65 (78,3)
Raça
Branca
Mulata
Negra
78 (94)
4 (4,8)
1 (1,2)
Escolaridade
Ensino fundamental
Ensino médio
Ensino superior
21 (25,3)
42 (50,6)
20 (24,1)
Procedência
Ribeirão Preto
Outras cidades do Estado de São Paulo
Outros Estados
30 (36,1)
43 (51,8)
10 (12,1)
Ocupação
Estudante
Do lar
Exerce atividades profissionais
46 (55,4)
18 (21,7)
19 (22,9)
Tabela 2. Caracterização dos pacientes hospitalizados com TA
(n = 83), segundo o diagnóstico e subtipos, Ribeirão Preto, 2011
n (%)
AN-R
Idade (anos)
Tempo de sintomas (meses)
Tempo de tratamento antes
da internação (meses)
45 (54,2)
AN-CP
Idade (anos)
Tempo de sintomas (meses)
Tempo de tratamento antes
da internação (meses)
26 (31,3)
BN
Idade (anos)
Tempo de sintomas (meses)
Tempo de tratamento antes
da internação (meses)
12 (14,5)
± DP
Mín
Máx
21,7
15,4*
3,4
12,6
18,7
17,1
8
1
1
58
108
30
23,4
45,1*
8,3
9,4
56,8
19,9
12
2
1
52
240
96
24
68,2*
1,6
3,9
62,9
3,6
19
1
1
32
180
12
* AN-R < AN-CP e BN (p < 0,05).
TA: transtornos alimentates; : valor médio; DP: desvio-padrão; Mín: valor mínimo; Máx: valor máximo; AN-R:
anorexia nervosa tipo restritivo; AN-CP: anorexia nervosa tipo compulsão periódica/purgativo; BN: bulimia nervosa.
O tempo de tratamento para o TA entre o diagnóstico e
a primeira internação teve média de 4,8 ± 12,5 meses e variação de 1 a 96 meses. O maior tempo de tratamento antes da
internação ocorreu entre pacientes com AN-CP, evidenciado
tanto na média como no tempo máximo apresentado, seguidos de pacientes com AN-R. Os portadores de BN apre-
artigo original
sentaram os intervalos mais curtos de tratamento antes da
internação. Não foram identificadas diferenças significativas
entre as médias de tempo de tratamento antes da internação nos diferentes diagnósticos.
DISCUSSÃO
Os quadros mais graves de TA podem levar à necessidade
de internação para tratamento durante o curso da doença,
na tentativa de reverter ou minimizar as complicações clínicas e comorbidades associadas. Entretanto, pouco se sabe
sobre a relação de pacientes atendidos e internados nos serviços especializados. Os resultados na literatura referem-se
às descrições específicas dos pacientes internados. Casper e
Jabine10 publicaram que 88% dos pacientes necessitaram de
pelo menos uma internação no período de oito anos após
diagnóstico do TA. A frequência de internação entre os pacientes seguidos pelo GRATA nos seus 30 anos de serviço
foi de 44,6%, índice considerado representativo, pois quase
metade dos pacientes foi internada no mínimo uma vez para
tratamento da doença. Na literatura, há escassez de dados
sobre as características dos pacientes com TA internados e o
tipo de tratamento prestado11.
Wiseman et al.12, em estudo sobre a hospitalização de
pacientes com TA em Nova Iorque, observaram mudança
nos padrões entre 1980 e 1998, com aumento no número
de hospitalizações, passando de 20 para 182. A experiência
de um centro de tratamento especializado em TA em Denver, também nos Estados Unidos, demonstrou que, apenas
entre os anos de 2008 e 2010, 76 pacientes foram admitidos
para tratamento hospitalar13. No GRATA, apesar de evidenciado aumento no número de hospitalizações com o passar
dos anos, observou-se que a escolha de hospitalização como
modalidade terapêutica diminuiu nos últimos 30 anos. Houve redução na relação atendimento/internação, passando
de 77,7% para 36,2% dos casos.
Nas últimas décadas, o declínio na frequência de internações por TA tem sido observado em vários países. Na Polônia, entre 2003 e 2007, os hospitais psiquiátricos apresentaram redução de 5% nesse índice, e nos hospitais gerais a
queda foi de 14%14. Nos Estados Unidos, o mesmo cenário
foi notado, visto que o tratamento hospitalar para TA ocorre
apenas em casos crônicos, abrangendo principalmente a estabilização (suporte nutricional e hidratação) dos episódios
agudos. Ao longo do tempo, com o aumento nos custos das
internações, somado ao fato de que pacientes crônicos são
frequentemente passíveis de readmissão e/ou necessitam
de longos períodos de hospitalização, muitas companhias
de planos de saúde passaram a não cobrir os custos da internação, tratando os pacientes em ambulatório12.
A redução dessa modalidade de tratamento para TA também pode ser vista como reflexo das novas políticas de saú-
Hospitalização integral e transtornos alimentares
35
de, fruto do movimento da reforma psiquiátrica. Esse movimento tomou força na segunda metade da década de 1970,
com objetivo de modificar o sistema de tratamento clínico
da doença mental15.
No Brasil, o tratamento hospitalar para essas doenças
sempre foi, em sua grande maioria, disponibilizado por grupos assistenciais em centros universitários vinculados a hospitais públicos com profissionais prestando serviços de forma voluntária16. A diminuição dessas internações pode estar
associada ao fato de que, anteriormente, o tratamento hospitalar era imediatamente indicado, dado o acometimento
físico e clínico dos pacientes que se encontravam quase
sempre, muito debilitados. Com o passar dos anos, o melhor
reconhecimento desses quadros pelos profissionais de saúde e sociedade como um todo favoreceu o diagnóstico e o
tratamento precoces, evitando a exacerbação dos sintomas.
Dessa forma, a abordagem terapêutica utilizando seguimento ambulatorial ou hospital-dia foi possível para a recuperação dos pacientes. Outro aspecto a ser considerado é a
experiência adquirida pelos profissionais dos serviços para
o manejo dos casos mais graves, o que também contribuiu
para diminuição da hospitalização integral em primeira instância17-19. As indicações para hospitalização, desde o início
do funcionamento do serviço até os dias atuais, seguem critérios clínicos claramente estabelecidos, por exemplo: peso
corporal abaixo de 75% do esperado, bradicardia, hipotensão, distúrbios hidroeletrolíticos graves, comprometimento
orgânico, falta de suporte ambiental e/ou risco de suicídio2,20.
As características sociodemográficas dos pacientes hospitalizados pelo GRATA foram semelhantes em relação a outros estudos11-14,21.
A AN, por causa de suas graves consequências nos sistemas orgânicos decorrentes da desnutrição, é o diagnóstico
de TA mais prevalente nas intervenções hospitalares22-24. A
distribuição dos pacientes internados pelo GRATA de acordo
com o diagnóstico também demonstrou preponderância de
AN, sobretudo em seu subtipo restritivo.
Os estudos da literatura científica apontam que pacientes com AN são mais jovens. No presente estudo, a média
de idade mais baixa foi encontrada entre pacientes com AN
(21,7 anos). Entretanto, esse valor é superior às médias demonstradas em outros estudos, que variaram de 10 a 20,7
anos11,21,22,23,25,26.
O tempo de sintomas apresentado pelos pacientes até
que eles sejam diagnosticados é bastante variável. As perturbações psicológicas que comumente se apresentam,
próprias do quadro, passam comumente despercebidas em
primeira instância pela família, por serem associadas às características típicas da adolescência, tais como: irritabilidade,
alteração no caráter, humor depressivo, isolamento, ou em
alguns casos, hiperatividade27. A instalação do quadro de TA
pode ser inicialmente dissimulada com justificativas que não
despertam intensa preocupação, visto que atualmente um
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):31-7.
36
artigo original
Palma RFM et al.
regime alimentar com limitações quantitativas e qualitativas
dos alimentos é encarado como atitude normal28. Diante de
qualquer alegação referente à perda de peso, é comum os
pacientes explicarem sua atitude pelo desejo de emagrecer,
pois encaram-se demasiadamente gordos, mesmo apresentando-se aos olhos alheios uma magreza impressionante. A
negação da doença, parte integrante do quadro dos TA, bem
como a inadmissível recuperação do peso principalmente
entre os anoréxicos, faz com que a procura pelo tratamento
assuma uma tendência tardia28.
A despeito dos esforços para mascarar a doença, os TA
acabam sendo reconhecidos com grande variação no tempo de sintomas até o diagnóstico: são detectados mais rapidamente em portadores de AN, dado o progressivo e rápido
emagrecimento, e tardiamente entre pacientes com BN, que
comumente mantêm o peso dentro da faixa de normalidade. A pesquisa de Hudson et al.25 revelou que o tempo médio
de sintomas apresentados por pacientes com AN foi de 1,7
ano e na BN, de 8,3 anos. Os achados do presente estudo,
quando comparados aos desse autor, indicam tempo médio de sintomas menores, sendo 15,4 meses (1,3 ano) para
pacientes com AN-R; 45,1 meses (3,7 anos) na AN-CP e 68,2
meses (5,7 anos) nos casos de BN.
Apesar de as hospitalizações ocorrerem mais frequentemente e em menor tempo nos pacientes com AN12,13,21,29, os
achados do presente estudo demonstram que aqueles com
BN apresentaram os intervalos mais curtos de tratamento
antes da internação (1,6 ± 3,6 meses). A inversão observada
nessa amostra pode ser explicada pelo fato de que alguns
desses pacientes foram internados para avaliação do quadro
clínico e definição do diagnóstico. A maior parte deles foi internada em menor espaço de tempo, em virtude de distúrbios hidroeletrolíticos e complicações clínicas associadas aos
mecanismos compensatórios recorrentes para evitar o ganho de peso, como indução de vômitos e abuso de laxantes.
A maioria dos pacientes deste estudo foi internada para
receber terapia nutricional, objetivando a recuperação do
peso e compensação dos distúrbios hidroeletrolíticos. As
taxas de internação do presente estudo foram semelhantes
àquelas descritas por Chu et al.13, em que 71% dos pacientes
foram internados para estabilização médica no ACUTE.
Indicações para internação objetivando a investigação do
quadro e diagnóstico estiveram presentes em aproximadamente um terço dos casos na admissão hospitalar, número
que naturalmente caiu na última internação. Parte deles tinha diagnóstico de BN, o que pode explicar o fato de esses
pacientes terem sidos submetidos a internações mais curtas
(média 1,6 mês) do que os portadores de AN. As internações
devidas à depressão/ideação suicida aumentaram na última
internação entre aqueles mais graves que necessitaram de
mais de uma internação. A depressão é uma comorbidade
psiquiátrica que deve ser considerada e tratada por causa de
sua associação direta com o suicídio. Estudos mostram que
sua prevalência pode ser alta entre pacientes com TA11,22.
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):31-7.
Pesquisas que adotam como metodologia a coleta de
dados por meio de revisão de prontuários apresentam, inevitavelmente, viés importante relacionado à perda ou omissão
de informações registradas pelos profissionais de saúde. Essa
foi a principal dificuldade encontrada no desenvolvimento
deste estudo, cuja perda amostral variou de 1,2% a 9% nas
diferentes variáveis estudadas.
Dados sobre a hospitalização integral de pacientes portadores de AN ou BN são pouco conhecidos. No Brasil, isso se
deve ao fato de existirem poucos serviços especializados que
oferecem tratamento, sobretudo hospitalar, com predomínio
de atividades de natureza assistencial. Consequentemente,
investigações científicas nessa área apresentam limitações relacionadas às dificuldades na formação e treinamento de pesquisadores, além da falta de investimentos em recursos humanos, pois a maioria dos serviços conta com profissionais que
atuam de forma voluntária. Esses fatores certamente contribuem para o pequeno conhecimento científico sobre o tema.
CONCLUSÃO
Conclui-se que a hospitalização integral é uma modalidade
terapêutica necessária para o tratamento de anorexia ou
bulimia nervosa, e a frequência de internação do serviço
foi considerada significativa, porém diminuiu ao longo do
tempo. A maioria dos pacientes foi internada apenas uma
vez e era composta de mulheres brancas, adultas jovens,
solteiras e portadoras de anorexia nervosa, sobretudo em
seu tipo restritivo. A indicação mais frequente de internação
dos pacientes foi para realização de terapia nutricional. Os
resultados encontrados são compatíveis com outros dados
da literatura. A diminuição da frequência de internação pode
ser resultado da tendência de desospitalização para as doenças mentais como um todo a partir da reforma psiquiátrica,
da divulgação pela mídia e do maior reconhecimento desses quadros pela sociedade em geral e pelos profissionais de
saúde, favorecendo o diagnóstico e o tratamento mais precoces. Além disso, a experiência adquirida pelos profissionais
do serviço no manejo dos casos mais graves possibilitou que
o seguimento fosse dado em nível ambulatorial e hospital-dia. Porém, futuros estudos são necessários para comprovar
essa hipótese.
CONTRIBUIÇÕES INDIVIDUAIS
Raphaela Fernanda Muniz Palma – Participou da concepção e desenho do estudo e foi responsável pela elaboração
do artigo, além da coleta, análise e interpretação dos dados,
aprovando sua versão final para publicação.
Rosane Pilot Pessa Ribeiro – Contribuiu significativamente
na concepção e no desenho do estudo e orientou a análise,
artigo original
a interpretação dos dados e a elaboração do artigo, aprovando sua versão final para publicação.
José Ernesto dos Santos – Contribuiu significativamente
na concepção e no desenho do estudo, revisou criticamente seu conteúdo intelectual e aprovou sua versão final para
publicação.
Hospitalização integral e transtornos alimentares
37
10. Casper RC, Jabine LN. An eight-year follow-up: outcome from adolescent compared to
adult onset anorexia nervosa. J Youth Adolesc. 1996; 25:499-517.
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13. Chu ES, Gaudiani JL, Mascolo M, Statland B, Sabel A, Carroll K, et al. ACUTE center for eating
disorders. J Hosp Med. 2012;7(4):340-4.
AGRADECIMENTOS
À Profa. Dra. Cláudia Benedita dos Santos pela assessoria nas
análises estatísticas e à Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado de São Paulo (Fapesp) pelo auxílio financeiro para
execução do projeto (processo nº 2010/02417-8).
CONFLITOS DE INTERESSE
Os autores do manuscrito – Raphaela Fernanda Muniz Palma, Prof. Dr. José Ernesto dos Santos e Profa. Dra. Rosane
Pilot Pessa Ribeiro – não possuem conflitos de interesse a
serem declarados.
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the hospitalized eating disordered patient. Crit Care Nurs Clin North Am. 2004;16:515-30.
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J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):31-7.
artigo original
Prevalência e fatores associados aos
transtornos mentais comuns em residentes
médicos e da área multiprofissional
Prevalence and factors associated with commom mental
disorders in medical and multiprofessional health residents
Carla Novaes Carvalho1, Djalma Agripino de Melo-Filho2, João Alberto Gomes de Carvalho1,
Ana Carla Guedes de Amorim3
RESUMO
Palavras-chave
Transtornos mentais, saúde
mental, residência médica,
educação médica.
Objetivo: Determinar a prevalência de transtornos mentais comuns (TMC) e sua associação a fatores sociodemográficos e profissionais em residentes de medicina, enfermagem,
nutrição e saúde coletiva da cidade do Recife (PE). Métodos: Estudo transversal foi conduzido, em 2007, envolvendo uma amostra aleatória de 178 residentes que responderam a
questões sociodemográficas e sobre a formação profissional e ao Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20). Calcularam-se as prevalências de TMC e estimaram-se as razões de prevalência (RP) e os intervalos de confiança. Resultados: A prevalência total dos TMC foi de 51,1%
e não se observou associação aos fatores sociodemográficos. A prevalência do evento foi
39% maior nos médicos que nos não médicos (p = 0,049) e 46% maior em residentes médicos das especialidades cirúrgicas que entre os de enfermagem, nutrição e saúde coletiva
(p = 0,048). Cinco das queixas do SRQ-20 foram mais frequentes no sexo feminino (p <
0,05). Conclusão: Os dados demonstram a elevada magnitude dos TMC nessa população,
principalmente nos residentes médicos, e servem para educadores e gestores de serviços
de saúde no sentido de viabilizar estratégias para prevenir e recuperar a qualidade de vida
dos residentes.
ABSTRACT
Objective: To determine the prevalence of common mental disorders (CMD) and its association with sociodemographics and professionals resident in medicine, nursing, nutrition
and public health from the city of Recife (PE). Methods: A survey was conducted in 2007,
involving a random sample of 178 residents, who responded to question about sociodemographics and professional training and the Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20). The
prevalence of CMD were calculated, also prevalence ratios (PR) and confidence intervals were
estimated. Results: The overall prevalence of CMD was 51.1%, and there was no association
with sociodemographics factors. The prevalence of the event was 39% higher among the
Recebido em
5/10/2012
Aprovado em
3/2/2013
1 Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Centro de Ciências da Saúde, Programa de Pós-graduação em Neuropsiquiatria e Ciências
do Comportamento.
2 UFPE, Núcleo de Saúde Pública e Desenvolvimento Social.
3 Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco.
Endereço para correspondência: Carla Novaes Carvalho
Programa de Pós-graduação em Neuropsiquiatria e Ciências do Comportamento,
Universidade Federal de Pernambuco
Av. Professor Moraes Rego, s/n, bloco A, térreo, Cidade Universitária
50670-420 – Recife, PE, Brasil
Telefone: (81) 2126-8539
E-mail: [email protected]
artigo original
Keywords
Mental disorders, mental
health, internship and
residency, medical
education.
Transtornos mentais comuns em residentes
39
physicians than in the non-medical (p = 0,049) and 46% greater in the surgical specialties
medical residents than among nursing, nutrition and public health (p = 0,048). Five of the
SRQ-20 items were more frequent in female (p < 0,05). Conclusion: These findings indicate
the high magnitude of CMD in this population, especially medical residents and serve to
educators and managers of health services in order to define strategies to prevent and recover the mental health and the quality of life of the residents.
INTRODUÇÃO
O conceito de transtornos mentais comuns (TMC) desenvolveu-se, na década de 1970, por meio de pesquisas sobre
adoe­cimento mental no âmbito da atenção primária em saúde, contexto em que se verifica maior prevalência de transtornos não psicóticos em contraste com o perfil de casos psiquiátricos mais graves do ambiente hospitalar1. A expressão TMC
foi criada por Goldberg e Huxley1 e se refere a sintomas como
insônia, fadiga, irritabilidade, esquecimento, dificuldade de
concentração e queixas somáticas. Esses autores destacam
que os transtornos, apesar de inicialmente não serem graves,
causam enorme sofrimento e, posteriormente, podem estar
associados à incapacidade e ao absenteísmo no trabalho.
Os TMC, embora não configurem uma entidade clínica
específica, descrita em manuais nosológicos, estão relacionados, segundo Mari e Jorge2, aos transtornos de ansiedade,
somatização e depressão sem sintomas psicóticos, constituindo, portanto, uma dimensão desses fenômenos psicopatológicos, expressa no nível coletivo, cuja abordagem é
realizada principalmente pelos estudos epidemiológicos.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS)3, os
transtornos depressivos ocupam o quarto lugar entre as dez
primeiras causas de incapacidade no mundo. Eles representam, como categoria diagnóstica única, a principal causa de
inaptidão quando se consideram os anos vividos com esse
problema.
Os estudos iniciais sobre TMC em países industrializados
referiam uma variação na prevalência entre 7% e 30%1. No
Nordeste do Brasil, investigação realizada, em 1993, em Olinda (PE), encontrou prevalência de 35% e associação desses
transtornos às condições de vida e estrutura ocupacional4. Inquérito desenvolvido, em 1994, em Pelotas (RS), revelou que
22,7% da população adulta da zona urbana sofria de TMC5.
Os transtornos mentais são resultado de múltiplos determinantes, destacando-se os de origem genética, comportamentais e ambientais, e se associam a alguns fatores como sexo,
faixa etária, situação conjugal, condições de vida e trabalho1,4.
O interesse em perscrutar o construto TMC tem crescido para além de sua detecção na população geral. Estudos
foram desenvolvidos para mensurar sua magnitude em várias profissões6-8, incluindo os profissionais de saúde9-12. Pitta9
observou prevalência elevada em trabalhadores do setor
de hemodiálise (45,5%) e da UTI pediátrica (32,1%) em um
hospital geral de São Paulo. Constata-se uma concordância
entre os estudos quando revelam que médicos, enfermeiros,
auxiliares de enfermagem e agentes comunitários de saúde
constituem grupos expostos à insalubridade mental9-12.
Segundo Smith et al.13, a magnitude dos transtornos
mentais em residentes médicos parece estar aumentando,
caracterizando o grupo como de maior risco de adoecimento14,15. A residência constitui uma das fases mais estressantes
na formação do médico, principalmente durante o primeiro
ano de treinamento, quando expõe o jovem treinando a sofrimentos que podem provocar alterações comportamentais
indesejáveis15-17. Small18 descreveu, em residentes médicos,
um quadro sindrômico, denominado de house officer stress
syndrome, caracterizado por distúrbios cognitivos episódicos, raiva crônica, ceticismo, discórdia familiar, depressão,
ideação suicida e suicídio e abuso de drogas.
A residência se caracteriza pelo treinamento em serviço
sob supervisão, cuja finalidade é a criação de competência
profissional para desenvolver conhecimentos, atitudes e habilidades. O residente exercita a prática médica amparando-se nos saberes científico e tecnológico, ao mesmo tempo
em que está em contato permanente com a dor, o sofrimento, a doença e a morte16. Nesse processo, configurado
pela dualidade trabalhador-aprendiz, o residente enfrenta
uma tensão interna constante que tanto pode ajudar no seu
aperfeiçoamento quanto atuar como fator desencadeante
de transtornos mentais. Antes restrita aos médicos, a modalidade de treinamento se expandiu para enfermeiros, nutricionistas e outras categorias profissionais da área de saúde.
As investigações sobre saúde mental em grupos de
profissionais sob treinamento em regime de residência são
escassas, ao contrário daquelas desenvolvidas em graduandos19-21 ou em grupos profissionalizados12,22.
Nesse sentido, esta investigação teve como objetivo
determinar a prevalência de transtornos mentais comuns e
sua associação com variáveis sociodemográficas e relativas
à formação profissional em pós-graduandos dos programas
de residência de medicina, enfermagem, nutrição e saúde
coletiva da cidade do Recife.
MÉTODO
Universo e amostra
O universo do estudo foi formado pelo total de pósgraduan­dos, do primeiro e segundo anos, matriculados,
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):38-45.
40
artigo original
Carvalho CN et al.
em 2007, nos programas de residência da cidade do Recife
(PE), com acesso direto para as áreas de medicina, enfermagem, nutrição e saúde coletiva, gerenciados pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Universidade de
Pernambuco (UPE), Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães
(Fiocruz-PE) e Secretaria Estadual de Saúde (SES-PE). Na
época de investigação, havia 617 pessoas nessa condição.
Para o cálculo amostral, utilizaram-se os seguintes parâmetros: intervalo de confiança de 95%, erro de amostragem de
10% e uma prevalência estimada do evento de 50%, com a
finalidade de maximizar o tamanho amostral. O cálculo foi
desenvolvido no programa Epi-Info, versão 6,0, obtendo-se
um n = 167. Considerando possíveis perdas, o tamanho da
amostra foi aumentado em 20%, obtendo-se um total de
200 participantes. A composição da amostra foi estratificada segundo a proporção de residentes em cada programa,
considerando as diferentes especialidades, medicina, enfermagem, nutrição, saúde coletiva, e ano de treinamento.
O procedimento de seleção dos participantes foi aleatório
e realizado de modo sistemático a partir dos intervalos de
amostragem. Nos casos em que o residente escolhido encontrava-se em férias, em viagem, em algum treinamento
fora da cidade ou, ainda, em gozo de licença-maternidade,
selecionava-se, na listagem, o nome localizado logo abaixo
do seu. Não houve reposição amostral, e quando, após três
tentativas, o residente não era encontrado, considerava-se
perda.
Desenho de estudo e coleta de dados
Conduzido entre outubro e dezembro de 2007, o estudo
transversal avaliou 178 residentes para detecção de TMC
por meio da versão brasileira do Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20). Além disso, foram respondidas questões sobre
dados sociodemográficos e formação profissional, incluindo
idade, sexo, estado conjugal, profissão, ano de conclusão do
curso de graduação, nome do programa de residência, ano
de treinamento, cidade em que residia antes do treinamento,
número de filhos e situação de moradia, que fizeram parte
do questionário original procedente da dissertação de mestrado da autora23. O instrumento de coleta foi testado em
estudo piloto. A coleta dos dados ocorreu no próprio local
de trabalho dos participantes, em geral após as reuniões das
equipes da residência ou, por meio de agendamento, quando os residentes sorteados não estivessem presentes. Após
serem prestadas as orientações sobre a pesquisa e assinado
o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, todos os residentes sorteados preenchiam o questionário, em uma sala
isolada, sob supervisão direta da autora ou de um dos auxiliares da pesquisa, que permaneciam no local para prestar esclarecimentos. Os questionários foram distribuídos dentro de
envelopes padronizados e, após devolução, cada residente
os depositava em uma urna, de modo a garantir a confidencialidade do processo.
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):38-45.
O SRQ-20 foi desenvolvido por Harding et al.24 . Quando
um instrumento é aplicado, dois aspectos devem ser considerados em sua avaliação: a validade e a confiabilidade.
O primeiro, também chamado de acurácia, se refere à sua
capacidade de medir o que se propõe medir, e o segundo,
também chamado de precisão ou fidedignidade, revela o
grau de concordância entre as múltiplas medidas de um
mesmo fenômeno. Embora a confiabilidade seja uma condição necessária, ela não é suficiente para avaliar a validade.
Do ponto de vista operacional, a validade do SRQ-20 é
aferida tomando-se como padrão-ouro a entrevista psiquiátrica. Nesse sentido, percebe-se variação entre 62,9% e 90%
de sua sensibilidade e entre 44% e 95,2% de sua especificidade25. Em relação à confiabilidade desse instrumento, Santos
et al.26, usando a fórmula de Kuder-Richardson (KD-20) para
avaliar a consistência interna do instrumento, encontraram
um coeficiente geral e padronizado de 0,80, semelhante ao
do estudo de Iacoponi e Mari27.
O SRQ-20 é composto por 20 questões do tipo “sim/não”,
das quais quatro se referem a queixas somáticas e 16, a sintomas psíquicos. Cada um dos 20 itens pode apresentar como
escore 0 ou 1, indicando, respectivamente, ausência ou presença do sintoma nos últimos 30 dias. O ponto de corte utilizado em muitas investigações tem sido de 7 ou 86,11,25, no
entanto muitos autores defendem o uso de ponto de corte
diferenciado entre os sexos, 7 ou 8 para o feminino e 5 ou
6 para o masculino, a fim aumentar a validade, diminuindo
os bias de classificação19,21,24,25,28. Neste estudo, considerou-se caso de TMC o participante do sexo masculino que respondeu de modo afirmativo a, no mínimo, seis questões do
SRQ-20 ou do sexo feminino que respondeu, dessa maneira,
a pelo menos oito questões.
Numa primeira abordagem, os programas de residência
foram categorizados segundo áreas: medicina, enfermagem, nutrição e saúde coletiva. Em relação aos programas
médicos, buscou-se, ainda, agregá-los segundo a natureza predominante da prática: clínica ou cirúrgica. Assim, as
especialidades cujos profissionais desenvolviam rotineiramente a prática cirúrgica, incluindo o ato anestésico, foram
classificadas como “cirúrgicas” e as outras foram consideradas “clínicas”. Nesse sentido, procurou-se vincular os profissionais a seus ambientes de trabalho e a inserção no bloco
cirúrgico foi um critério demarcador de “exposição”. Desse
modo, elaborou-se a seguinte classificação: “especialidades
cirúrgicas”: cirurgia geral, obstetrícia-ginecologia, anestesiologia, oftalmologia, traumatologia-ortopedia e otorrinolaringologia; e “especialidades clínicas”: clínica médica,
pediatria, radiologia, infectologia, neurologia, psiquiatria e
dermatologia.
Plano de descrição e análise
Os dados foram processados e analisados no programa Epi-Info, versão 6,0 (2001), determinando-se as prevalências de
artigo original
Transtornos mentais comuns em residentes
TMC, global e específicas, e sua associação com as variá­veis
sociodemográficas e relativas à formação profissional pela
razão de prevalência (RP), cuja significância estatística foi
avaliada pelo teste X2 ou, quando necessário, pelo teste exato de Fisher, considerando os intervalos de confiança a 95%
e valores do p. A probabilidade máxima de erro para rejeição
da hipótese nula foi de 5%.
Todo o processo da pesquisa obedeceu aos princípios
éticos dispostos na Resolução nº 196/96, do Conselho Nacional de Saúde, do Ministério da Saúde, garantindo aos participantes, entre outros direitos, o seu consentimento livre e
esclarecido, sigilo das informações e privacidade. O projeto
foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de
Ciências da Saúde da Universidade Federal de Pernambuco,
registro no 287/07, em 16 de outubro de 2007.
RESULTADOS
Registrou-se uma perda de 11% (22/200), sete recusaram-se
a participar e 15 não foram localizados. O grau de preenchimento médio das questões foi de 99,1%. A idade média dos
participantes foi de 27 ± 2,43 anos e 68,5% eram do sexo
feminino. Cerca de 67% residiam no Recife antes do treina-
41
mento e 88% moravam com outra(s) pessoa(s). Aproximadamente 74% eram solteiros e 90% não tinham filhos. A
prevalência global de TMC foi de 51,1% e não se observou
associação estatisticamente significante (p > 0,05) com sexo,
idade, cidade onde residia antes do treinamento, situação
de moradia, estado conjugal e número de filhos (Tabela 1).
A maioria dos residentes era formada de médicos (68%).
Aproximadamente 67% dos participantes concluíram a graduação em/ou depois de 2005 e quase 95% realizavam seu
primeiro treinamento, 55,1% cursavam o primeiro ano (R1)
e 44,9%, o segundo (R2). Cerca de 31% se concentravam
nas especialidades “cirúrgicas” da medicina, 36% nas especialidades “clínicas” da medicina e 32% nas áreas de enfermagem, nutrição e saúde coletiva. A prevalência de TMC foi
39% maior nos residentes médicos do que nos não médicos (p = 0,049). Os treinandos vinculados a especialidades
“cirúrgicas” apresentaram prevalência de TMC 46% maior
do que a dos residentes de enfermagem, nutrição ou saúde
coletiva (p = 0,048), mas não se observou diferença quando se comparou com os residentes das áreas “clínicas” (p >
0,05). Não se mostraram como fatores associados aos TMC
o tempo de conclusão do curso de graduação, a existência
de treinamento anterior e o ano de treinamento (p > 0,05)
(Tabela 2).
Tabela 1. Prevalência de TMC segundo variáveis sociodemográficas
Prevalência
Totala
RPb (IC 95%)
p
51,6
1,03 (0,76-1,41)
> 0,05
28
50,0
1,00
62,4
58
52,3
1,06 (0,79-1,43)
67
37,6
33
49,3
1,00
Recife
120
67,4
62
51,7
1,03 (0,76-1,41)
Outra cidade
58
32,6
29
50,0
1,00
Não
157
88,2
81
51,6
1,08 (0,67-1,74)
> 0,05
Sim
21
11,8
10
47,6
1,00
> 0,05
Solteiro
131
73,6
67
51,1
1,00 (0,72-1,39)
> 0,05
Casado ou unido
47
26,4
24
51,1
1,00
Nenhum
161
90,4
86
53,4
1,82 (0,86-3,85)
1 ou mais
17
9,6
5
29,4
1,00
Variáveis
no
%
no
%
178
100
91
51,1
Feminino
122
68,5
63
Masculino
56
31,5
≤ 27
111
> 27
Total
Sexo
Idade
> 0,05
Cidade onde residia anteriormente
> 0,05
Mora sozinho
Estado conjugal
Número de filhos
a
b
> 0,05
A soma do total em cada categoria varia em virtude da exclusão de indivíduos para os quais não havia informação.
RP: razão de prevalência.
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):38-45.
artigo original
Carvalho CN et al.
42
Tabela 2. Prevalência de TMC segundo formação profissional
Variáveis
Prevalência
Totala
RPb (IC95%)
p
56,2
1,39 (0,98-1,98)
0,049
40,4
1,00
65
55,1
1,30 (0,93-1,83)
25
42,4
1,00
88
52,1
1,56 (0,61-3,98)
3
33,3
1,00
no
%
no
Sim
121
68,0
68
Não
57
32,0
23
2005 e depois
118
66,7
antes de 2005
59
33,3
Sim
169
94,9
Não
9
5,1
%
Médico
Ano de conclusão da graduação
> 0,05
1a residência
> 0,05
Ano do treinamento
Primeiro (R1)
98
55,1
53
54,1
1,14 (0,85-1,53)
Segundo (R2)
80
44,9
38
47,5
1,00
> 0,05
Programa de residência
Medicina “Esp. Cirúrgicas”
56
31,5
33
58,9
1,46 (0,99-2,14)
0,048
Medicina “Esp. Clínicas”
65
36,5
35
53,8
1,33 (0,91-1,97)
> 0,05
Enfermagem ou Nutrição ou Saúde Coletiva
57
32,0
23
40,4
1,00
A soma do total em cada categoria varia em virtude da exclusão de indivíduos para os quais não havia informação.
b
RP: razão de prevalência.
a
As três queixas, incluídas no SRQ-20, mais relatadas pelo
conjunto dos residentes foram: “sentir-se nervoso, tenso ou
preocupado” (73%), “dormir mal” (69,1%) e “cansar-se com facilidade” (61,2%). Entre as mulheres, a queixa mais prevalente
foi “sentir-se nervosa, tensa ou preocupada” (73,8%) e entre
os homens, “dormir mal” (76,8%). De um total de 20 queixas,
somente cinco delas apresentaram diferença estatisticamente
significante entre os sexos, e em todos os casos a magnitude foi
maior no sexo feminino. “Cansar-se com facilidade” e “ter sensações desagradáveis no estômago” foram, respectivamente,
62% (p < 0,001) e 66% (p = 0,02) mais relatadas pelas mulheres
do que pelos homens (p < 0,02). No mesmo sentido, as prevalências das queixas “sentir dores de cabeça”, “assustar-se com
facilidade” e “chorar mais do que de costume” foram, respectivamente, duas (< 0,01), mais de três (< 0,001) e mais de seis (< 0,001)
vezes maior nas mulheres do que nos homens (Tabela 3).
No grupo dos médicos, as três queixas mais frequentes foram: “sentir-se nervoso, tenso ou preocupado” (73,6%), “dormir
mal” (68,6%) e “sentir-se cansado o tempo todo” (61,2%). Já
entre os profissionais não médicos, foram: “sentir-se nervoso,
tenso ou preocupado” (71,9%), “dormir mal” (70,2%) e “cansar-se com facilidade” (68,4%). Quando se compararam os dois
grupos, a única queixa cuja prevalência mostrou diferença
estatisticamente significante foi “dificuldade no serviço (seu
trabalho lhe causa sofrimento)”, cerca de 2,7 vezes maior entre
os médicos do que entre os não médicos (p = 0,001) (Tabela 4).
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):38-45.
DISCUSSÃO
A prevalência global dos TMC entre os residentes foi de
51,1%, magnitude considerada elevada quando comparada
à encontrada em investigações envolvendo a população em
geral (7%-35%)1,3,4,29 ou grupos específicos, como estudantes
da área de saúde (29,6%-44,7%)19-21 ou médicos, enfermeiros,
auxiliares de enfermagem, agentes comunitários de saúde
(26%-43,3%)9,11,12,22,30,31.
Nenhuma variável sociodemográfica se associou aos
TMC, e isso já era esperado em relação à idade, uma vez que
a amostra foi bastante homogênea. O diferencial por sexo é
sempre observado em outros estudos que mostram maior
prevalência no sexo feminino32-35. A explicação dada nesses
casos é que a mulher se expõe à sobrecarga de papéis sociofamiliares, como a dupla jornada de trabalho, no lar e fora
dele32-35. Quando as perguntas do Self-Reporting Question­
naire (SRQ-20) foram avaliadas isoladamente, diferenças nas
prevalências entre os sexos foram verificadas e em todas as
situações a magnitude foi maior no sexo feminino. Coutinho
et al.33 alegam que a explicação para se detectar uma maior
frequência de TMC no sexo feminino vincula-se a um possível viés de informação, gerado no momento da classificação.
A adoção de pontos de corte diferenciados entre os sexos
possivelmente minimizou a ocorrência desse bias neste estudo.
artigo original
Transtornos mentais comuns em residentes
43
Tabela 3. Prevalência das “queixas” do SRQ-20 segundo sexo
Queixas
Total
Masculino
Feminino
p
n
%
n
%
n
%
Sente-se nervoso, tenso ou preocupado
130
73,0
40
71,4
90
73,8
> 0,05
Dorme mal
123
69,1
43
76,8
80
65,6
> 0,05
Cansa-se com facilidade
109
61,2
24
42,9
85
69,7
< 0,001
Sente-se cansado o tempo todo
108
60,7
31
55,4
77
63,1
> 0,05
Sente-se triste ultimamente
102
57,3
27
48,2
75
61,5
> 0,05
Dificuldade para realizar atividades diárias
99
55,6
26
46,4
73
59,8
> 0,05
Má digestão
75
42,1
21
37,5
54
44,3
>0,05
Tem sensações desagradáveis no estômago
74
41,6
16
28,6
58
47,5
0,02
Dores de cabeça
70
39,3
13
23,2
57
46,7
< 0,01
Dificuldade para tomar decisões
66
37,1
18
32,1
48
39,3
> 0,05
Dificuldade de pensar com clareza
62
34,8
19
33,9
43
35,2
> 0,05
Assusta-se com facilidade
56
31,5
7
12,5
49
40,2
< 0,001
Dificuldade no serviço (seu trabalho lhe causa sofrimento)
54
30,3
18
32,1
36
29,5
> 0,05
Chora mais do que de costume
46
25,8
3
5,4
43
35,2
< 0,001
Perda do interesse pelas coisas
42
23,6
11
19,6
31
25,4
> 0,05
Falta de apetite
25
14,0
11
19,6
14
11,5
> 0,05
Tremores nas mãos
23
12,9
7
12,5
16
13,1
> 0,05
Incapacidade de desempenhar um papel útil na vida
16
9,0
5
8,9
11
9,0
> 0,05
Sente-se uma pessoa inútil, sem préstimo
12
6,7
4
7,1
8
6,6
> 0,05
Tem tido ideia de acabar com a vida
5
2,8
2
3,6
3
2,5
> 0,05
Tabela 4. Prevalência das “queixas” do SRQ-20 segundo profissão
Queixas
Médico
n
Não médico
%
n
%
p
Sente-se nervoso, tenso ou preocupado
89
73,6
41
71,9
> 0,05
Dorme mal
83
68,6
40
70,2
> 0,05
Sente-se cansado o tempo todo
74
61,2
34
59,6
> 0,05
Dificuldade para realizar atividades diárias
71
58,7
28
49,1
> 0,05
Sente-se triste ultimamente
70
57,9
32
56,1
> 0,05
Cansa-se com facilidade
70
57,9
36
68,4
> 0,05
Má digestão
54
44,6
21
36,8
> 0,05
Tem sensações desagradáveis no estômago
50
41,3
24
42,1
> 0,05
Dificuldade de pensar com clareza
47
38,8
15
26,3
> 0,05
Dores de cabeça
46
38,0
24
42,1
> 0,05
Dificuldade para tomar decisões
46
38,0
20
35,1
> 0,05
Dificuldade no serviço (seu trabalho lhe causa sofrimento)
46
38,0
8
14,0
0,001
Assusta-se com facilidade
34
28,1
22
38,6
> 0,05
Perda do interesse pelas coisas
28
23,1
14
24,6
> 0,05
Chora mais do que de costume
26
21,5
20
35,1
= 0,05
Falta de apetite
18
14,9
7
12,3
> 0,05
Tremores nas mãos
18
14,9
5
8,8
> 0,05
Incapacidade de desempenhar um papel útil na vida
11
9,1
5
8,8
> 0,05
Sente-se uma pessoa inútil, sem préstimo
9
7,4
3
5,3
> 0,05
Tem tido ideia de acabar com a vida
4
3,3
1
1,8
> 0,05
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):38-45.
44
artigo original
Carvalho CN et al.
A migração entre cidades não esteve associada aos TMC
no estudo de Almeida-Filho et al.36, e a condição de morar sozinho foi considerada fator de risco por Coutinho et al.33 e Lima37.
Em relação à vida conjugal, a ausência na amostra de
situações que aumentam o risco de TMC, como divórcio,
separação e filhos com idade até 1433,35, possivelmente explicaria a igualdade estatística nas prevalências observadas.
A prevalência de TMC em residentes médicos foi 39%
maior do que em residentes não médicos (p = 0,049). Caso o
tamanho da amostra fosse maior, possivelmente a precisão
dessa associação aumentaria. Hipóteses vinculadas à organização do processo do trabalho médico podem explicar essa
diferença23. O perfil sobre o relato das “queixas” foi muito
semelhante nos dois grupos. Somente uma “queixa” apresentou diferença estatisticamente significante: os médicos
vincularam seu trabalho com sofrimento.
Ao comparar a saúde mental de médicos com a de outros
profissionais, alguns autores verificaram naqueles maior incidência de suicídio e de reações depressivas38-40. A prevalência
de TMC observada nos residentes médicos (56,2%) foi mais
elevada do que a encontrada em professores (entre 44% e
50,3%)6,41 e em médicos-residentes americanos (50%)42.
O treinamento vinculado ao trabalho em ambiente cirúrgico, por ser mais estressante do que aquele realizado nas
áreas de enfermagem, nutrição e saúde coletiva, constitui
uma possibilidade de explicação para o fato de se observar
uma prevalência de TMC maior nos residentes médicos das
especialidades cirúrgicas que requerem habilidade técnica,
controle emocional, autoconfiança, maior pragmatismo, capacidade para direcionar ações para resolução de problemas
num curto espaço de tempo14.
As diferenças de prevalência de TMC encontradas entre os
profissionais médicos e das outras áreas de saúde pesquisadas
pode ser em parte explicada pelas particularidades entre elas.
Muito embora todas as profissões investigadas lidem com
questões de saúde, o residente médico enfrenta situações de
maior responsabilidade diante do paciente. Na literatura são
relatados fatores estressantes como a relação médico-paciente, o comunicar doenças graves, o lidar com a morte, o medo
de adquirir doenças contagiosas, rodízios em ambientes diferentes, isolamento familiar e social, fadiga, privação de sono,
sobrecarga de trabalho, pavor de cometer erros, entre outras
demandas que envolvem a formação médica13-18,43,44.
O tempo de conclusão do curso e o fato de o residente
estar no primeiro treinamento não se mostraram associados
aos TMC. Alguns estudos14,15 mostram que a prevalência de
depressão e ansiedade é maior no primeiro ano de treinamento, com tendência à queda até sua conclusão.
Algumas limitações vinculadas ao desenho de estudo poderiam relativizar essas conclusões. Trata-se de um corte transversal que avalia em um só momento a “exposição” e o “efeito”, limitando ou impedindo o estabelecimento da sequência
temporal correta entre eles. Não se pode afastar a possibilidade
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):38-45.
de que uma parcela dos residentes já sofresse de TMC antes de
entrar nos programas de residência, o que diminuiria a força de
associação entre a vinculação ao treinamento e a ocorrência
do efeito. Uma investigação do tipo coorte ajudaria a esclarecer as dúvidas quanto à magnitude e aos fatores de risco.
A estratégia montada para prevenir perdas se mostrou
eficaz, reduzindo o viés de seleção. O uso de questionário autoaplicável e o anonimato das respostas minimizaram o viés
de informação concernente a perguntas sobre a intimidade
dos pesquisados. O elevado grau de preenchimento médio
das questões não comprometeu a análise dos dados.
O ponto de corte diferenciado entre os sexos para o SRQ20 procurou evitar bias de classificação6,19,21,24,25. Quanto ao
risco de subestimação do evento não parece ter ocorrido,
uma vez que foi observada uma elevada prevalência de TMC
na amostra. Deve-se ressaltar, ainda, que o instrumento do
SRQ-20 permite apenas a suspeição de um caso de transtorno mental, sendo a entrevista psiquiátrica o padrão-ouro
para o diagnóstico.
CONCLUSÃO
O estudo revelou elevada magnitude de TMC na população
de treinandos em programas de residência no estado de Pernambuco, além de mostrar diferenciais nas prevalências do
problema entre médicos e não médicos e no perfil de “queixas” do SRQ-20 entre os sexos.
Esses resultados servem de reflexão para educadores,
preceptores, gestores e coordenadores dos programas e
serviços de saúde no sentido de elaborar estratégias para
o enfrentamento da questão que afeta a qualidade de vida
desses profissionais em formação.
CONTRIBUIÇÕES INDIVIDUAIS
Carla Novaes Carvalho – Participou da concepção do projeto, revisão da literatura, coleta e análise dos dados, interpretação dos resultados, redação do artigo, aprovação da
versão final a ser publicada.
Djalma Agripino de Melo-Filho – Contribuiu com a concepção do projeto, orientação sobre a literatura, análise e
interpretação dos dados, redação do artigo e revisão crítica relevante do conteúdo e aprovação final da versão a ser
publicada.
João Alberto Gomes de Carvalho – Colaborou na concepção do projeto, revisão do artigo e aprovação da versão
final.
Ana Carla Guedes de Amorim – Participou na concepção
e coleta de dados do projeto, da redação do artigo e da
aprovação da versão a ser publicada.
artigo original
Transtornos mentais comuns em residentes
45
FONTES DE FINANCIAMENTO
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Nenhuma.
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AGRADECIMENTOS
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2003;37(4):424-33.
Agradecimento especial a Igor Henrique Figueira da Silva,
pelo grande auxílio prestado na laboriosa coleta de dados.
23. Carvalho CN. Transtornos mentais comuns associados ao processo de trabalho e qualidade
de vida em pós-graduandos dos programas de residência na área de saúde no Recife [dissertação]. [Recife (PE)]: Universidade Federal de Pernambuco; 2008. 118p.
CONFLITO DE INTERESSES
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J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):38-45.
artigo original
Termos psicopatológicos em bandas
e músicas de rock and roll
Psychopathological terms in bands and songs of rock and roll
Thaísa Silva Gios1, Francisco Lotufo Neto2
RESUMO
Palavras-chave
Psicopatologia, psiquiatria,
neurologia, música, rock
and roll.
Objetivo: Investigar o uso de termos psicopatológicos nos nomes de bandas de rock and roll
e em suas músicas. Método: Termos psicopatológicos do glossário do DSM-IV foram digitados em português e inglês na página do YouTube. Bandas e músicas de rock and roll foram
identificadas. O mesmo procedimento foi realizado, a título de comparação, com o glossário
de termos neurológicos da CID-10. Resultados: Foram encontrados nomes de bandas ou
músicas referentes a 62 termos psiquiátricos e a 24 termos neurológicos. Os termos psiquiá­
tricos foram mais frequentes, apresentando diferença estatisticamente significativa. Foram
encontradas 60 bandas de rock com nomes inspirados na psiquiatria e na neurologia. Dessas,
44 bandas usavam nomes psiquiátricos e 16 bandas usavam termos neurológicos. Bandas e
músicas de rock usam mais nomes psiquiátricos que neurológicos. Predominaram nas músicas nomes relacionados ao uso de substâncias. Ao se compararem nomes de bandas e
canções brasileiras e estrangeiras, não se encontrou diferença estatisticamente significativa.
Conclusão: Bandas de rock and roll usam com maior frequência termos psicopatológicos
em seus nomes e em suas músicas. Bandas brasileiras apresentam resultados semelhantes.
ABSTRACT
Keywords
Psychopathology,
psychiatry, neurology,
music, rock and roll.
Objective: To investigate the use of psychopathology terms in the names of rock and roll
bands and in their songs or musics. Method: Psychopathological terms from the DSM-IV
glossary were typed in Portuguese and English on the YouTube page. Bands and music of
rock and roll were identified. The same procedure was performed, for comparison, with the
glossary of neurological terms of ICD-10. Results: Sixty-two psychiatry and 24 neurology
related words were used by rock and roll bands and songs. A frequent use of psychiatric and
neurological terms in band names and songs of rock was found. The psychiatric terms were
more frequent. Sixty bands used psychiatric and neurology related names (44 bands used
psychiatry names and 16 neurology). The names predominant in music were related to substance use. When comparing names and songs of Brazilian and other countries bands no difference was found. Conclusion: Rock and Roll bands use with greater frequency psychopathology and psychiatric terms in their names and musics. Brazilian bands held similar results.
1 Universidade Regional de Blumenau (Furb), Blumenau, SC, Brasil.
2 Universidade de São Paulo (FMUSP), Faculdade de Medicina, Departamento de Psiquiatria.
Recebido em
12/11/2012
Aprovado em
3/2/2013
Endereço para correspondência: Francisco Lotufo Neto
Departamento de Psiquiatria, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo
Rua Dr. Ovídio Pires de Campos 785
05403-903 – São Paulo, SP, Brasil
E-mail: [email protected]
artigo original
INTRODUÇÃO
Durante o século XX a arte foi analisada pela maioria das
teorias psicológicas da época. A psiquiatria e a psicoterapia
influenciaram o modernismo, o surrealismo, o expressionismo e o pós-modernismo. A arte daquele que sofre de um
transtorno mental, denominada por Dubuffet de arte bruta,
foi valorizada com a criação de museus especializados e exposições1-3.
Cinema e histórias em quadrinhos frequentemente têm
como tema a psicopatologia4,5. Principalmente no cinema, o
doente é visto de forma estereotipada, ora como homicida
cruel, ora como muito inteligente, sedutor e iluminado, ora
como narcisista, parasita, egoísta e autocentrado. Por vezes
é visto como alguém de espírito livre e rebelde, de certa forma destacado da sociedade por sua tendência crítica e desafiadora6. Em geral, é mais bem retratado que o psiquiatra
e o psicoterapeuta, comumente vistos como portadores de
traços psicopáticos ou pouco inteligentes, necessitados da
ajuda do paciente.
A interface da música popular brasileira com a psicopatologia foi estudada por Marques Filho et al.7. Essa relação de
formas artísticas com a psicopatologia levou à interrogação
se isso também ocorre no rock and roll, estilo musical da
preferência de muitos jovens. Estudos recentes demonstram associação entre a preferência musical por jazz e rock
e tentativas de suicídio, depressão, delinquência, drogas e
disfunção familiar. O rock parece proporcionar maior hostilidade, tristeza, fadiga e tensão nos indivíduos em relação aos
demais estilos musicais8-10. Por esses motivos, o tema merece
ser estudado.
OBJETIVO
Realizar um estudo transversal investigando o uso de termos
neurológicos e psicopatológicos em nomes de grupos musicais e músicas de rock and roll e comparar os achados em
bandas brasileiras e estrangeiras.
MATERIAIS E MÉTODOS
Os instrumentos utilizados foram o site YouTube, o DSM-IV
e a Classificação Internacional de Doenças 10ª edição (CID10). Todos os 144 termos psiquiátricos do glossário do DSM-IV foram utilizados na pesquisa (páginas 45-57). A título de
comparação, todos os 241 termos neurológicos do capítulo
VI da CID-10 (G00-G99) foram utilizados também (páginas
382-416).
Os termos psicopatológicos presentes no glossário do
DSM-IV foram digitados em português e inglês na página
inicial do YouTube. A pesquisa na internet foi realizada entre
Psicopatologia e rock and roll
47
os dias 23/12/2011 e 4/1/2012. As três primeiras páginas de
busca foram então analisadas, buscando a presença de nomes de bandas de rock and roll ou músicas. Foram excluídos
epônimos que não tiveram inspiração psiquiátrica ou neurológica. Após encontrar as bandas e músicas, buscou-se a
nacionalidade delas no próprio site YouTube.
Para comparação dos dados, foi utilizada a mesma metodologia em relação aos termos neurológicos presentes na
CID-10.
Os resultados foram organizados em tabelas e analisados
pelo teste t de Fisher. Valor de p menor ou igual a 0,05 foi
considerado estatisticamente significante.
RESULTADOS
Foram encontrados nomes de bandas ou músicas referentes a 62 termos psiquiátricos e a 24 termos neurológicos. Os
termos psiquiátricos foram mais frequentes, apresentando
diferença estatisticamente significativa (p = 0,000002).
Bandas de rock and roll inspiradas na
psicopatologia
Foram encontradas 60 bandas de rock com nomes inspirados na psiquiatria e na neurologia. Dessas, 44 bandas usavam nomes psiquiátricos e 16 bandas usavam termos neurológicos. Bandas de rock usam mais nomes psiquiátricos que
neurológicos (p = 0,00009). Onze outras bandas foram excluídas por remeterem a nomes próprios ou não terem significado relacionado às áreas em estudo: Rett Kurs, Nina Becker,
Zé Paulo Becker, Thane Thomsen, Ove Thomsen, Isaacs, Gregory
Isaacs, The Isaacs, Síndrome de Bar, Kanye West, Aura Dione.
Esses nomes são epônimos de algumas síndromes psiquiátricas e neurológicas, mas não tiveram inspiração no rock.
Exemplos de bandas nacionais brasileiras que utilizaram
nomes psiquiátricos são: Delirium tremens, Hienas Distímicas,
Narcolepsia, Carrossel Delirante, Conduta Destrutiva, Esputo
Catatônico, Dirty Alcool, Alcool Club, Grupo Substância, Palhaço Paranoide, Banda Paranoide, Parafilia Horrenda, Mc Insônia,
Parassônia, Hipersônica, Dissonia, Cleptomania, Distonia, Sem
Abuso.
As bandas internacionais encontradas que usam termos psiquiátricos, com as respectivas nacionalidades, são:
Delirium Tremens (Alemanha), Delerium (Canadá), Anorexia
Nervosa (França), Dispareunia (Peru), Mal de Parkinson (Argentina), Bipolar (Espanha), Distimic Suicide (Chile), Ciclotímico
(México), Gallinero Ciclotimico (Argentina), Hardcore Ciclotimico (México), Ciclo Timia (Irlanda), Borderline Insane (Portugal), Santa Demencia (México), Demencia Mortalis (República
Tcheca), Demencia (Argentina), Quartet Doloroso (Estados
Unidos), Sex Pistols (Inglaterra) e Parafilia (França). Em relação
às bandas Borderline, Facticio, Delirium, Sono e Esquizoide, não
foram encontradas pela busca no site YouTube a nacionaliJ Bras Psiquiatr. 2013;62(1):46-50.
48
artigo original
Gios TS, Lotufo Neto F
dade específica e a descrição da banda, e as músicas eram
em idioma estrangeiro.
Foram comparadas as bandas brasileiras e estrangeiras
(Tabela 1) e seu uso de nomes psiquiátricos e neurológicos.
Não foi encontrada diferença estatisticamente significativa
(p = 0,77).
Tabela 1. Nomes psiquiátricos e neurológicos em bandas
brasileiras e estrangeiras
nas, 5 alemãs, 6 mexicanas, 2 equatorianas, 4 espanholas e 3
panamenhas. As demais 8 bandas encontradas não exibiam
nacionalidade específica no site YouTube.
Foram comparados os termos neurológicos e psiquiátricos entre as músicas brasileiras e estrangeiras, conforme a
tabela 3. Não foi encontrada diferença estatisticamente significativa, com valor de p de 0,44.
Bandas brasileiras (N/%)
Bandas estrangeiras (N/%)
Tabela 3. Nomes psiquiátricos e neurológicos em músicas
brasileiras e estrangeiras
Psiquiatria
20 (45,4%)
24 (54,5%)
Músicas brasileiras (N/%)
Músicas estrangeiras (N/%)
Neurologia
8 (50%)
8 (50%)
Psiquiatria
84 (52%)
75 (47,1%)
Neurologia
11 (64,7%)
6 (35,2%)
p = 0,77.
p = 0,44.
Músicas de rock and roll inspiradas na
psicopatologia
DISCUSSÃO
Foram encontrados 176 nomes de canções utilizando termos neurológicos e psiquiátricos. Desses, 159 músicas utilizaram termos psiquiátricos e 17, neurológicos (p = 0,00009).
Foram excluídos sete outros nomes de músicas por não estarem relacionados às áreas em estudo.
Em relação aos termos psiquiátricos, predominaram nas
músicas nomes relacionados ao uso de substâncias como:
“Esbórnia e álcool”, “Anfetamina mil grau”, “Cocaína”, “Nicotina”, “Que corra la nicotina”.
Na tabela 2, observam-se os temas psicopatológicos
mais frequentes encontrados. Os nomes das bandas e músicas sugestivos de psicopatologia foram classificados em
temas pelos autores segundo seu valor de face.
Tabela 2. Temas psicopatológicos usados nos nomes de grupos
de rock e em suas canções
Bandas
Músicas
Uso de substâncias
4
38
Psicoses
3
12
Sexualidade
3
9
Transtornos de personalidade
4
12
Transtornos do humor
7
13
Transtornos de ansiedade
0
5
Transtornos somatoformes
0
3
Sono
6
26
Cognição
8
12
Transtornos na infância/adolescência
2
7
Transtornos alimentares
1
1
Outros
7
21
Foram encontradas 75 músicas estrangeiras com termos
psiquiátricos: 6 norte-americanas, 3 chilenas, 6 italianas, 4
colombianas, 3 neozelandesas, 5 inglesas, 3 canadenses, 3
finlandesas, 3 australianas, 2 francesas, 2 peruanas, 7 argentiJ Bras Psiquiatr. 2013;62(1):46-50.
O rock and roll, desde a década de 1950, possui fama de ser
a música da juventude, da rebeldia, da liberdade e do idealismo. A música popular é vista como uma reflexão e uma
inspiração para os movimentos de jovens, modas e estilos
de vida11.
A banda é um projeto comum que une e combina a
expressão da personalidade de seus membros. O nome da
banda está relacionado aos subgêneros com que dialoga, remetendo às suas características musicais e à visão de mundo.
Simboliza as aspirações e ideologias dos músicos. Notam-se
atualmente muitos nomes de bandas que remetem a temáticas comuns como: destruição, pessimismo, sarcasmo, zombaria e psicopatologia. Nos videoclipes, nas capas de CD e
discos, metáforas e grafias tornam as palavras extraordinárias
e ampliam o seu significado.
A prevalência de comorbidades psiquiátricas é marcante
entre os músicos do rock, como transtornos de ansiedade,
transtornos psicóticos e transtornos relacionados ao uso de
substâncias12-14.
O uso frequente de termos psiquiátricos por bandas e
compositores de rock and roll pode ter diversos significados:
assinalar a prevalência elevada desses transtornos na população ou o receio e desconforto que esses sintomas provocam; enfatizar a associação do transtorno mental com protesto ou com liberdade individual, ser diferente ou fora dos
padrões ou a busca por uma identidade própria que não se
conforma com a tradição.
Segundo Bob Gruen15, o punk é uma atitude. Uma atitude
agressiva que questiona autoridade e tudo o mais. Tem a ver
com querer um mundo melhor e ficar furioso por não consegui-lo rapidamente. Punk é fazer as coisas do seu próprio
jeito, sem orientação ou preocupação com possíveis críticas.
O Punk começou a partir dos excluídos e daqueles que não
concordavam com a sociedade convencional, com um culto
que se formou nos pequenos bares de Nova York e Londres.
O bar inicial de muitas bandas, bar CBGB, era um lugar muito
artigo original
liberal, em que a única regra imposta pelo proprietário era
que as bandas que lá tocavam tinham que escrever suas próprias canções15.
Foram encontradas algumas bandas e músicas usando
termos neurológicos. Mesmo essa especialidade tão próxima da psiquiatria não despertou o mesmo interesse. No
mundo da cultura e das ciências humanas, a preocupação
com a psiquiatria é muito maior, é carregada de ideologia e
desperta maior polarização e paixão. É incomum encontrar
nomes ligados a outras especialidades médicas como gastroenterologia ou cardiologia, por exemplo.
O fenômeno é também internacional. Em diferentes culturas o uso da psicopatologia está relacionado ao nome de
bandas e músicas de rock. Países como México, Peru, Argentina, República Tcheca, Inglaterra, Estados Unidos, Portugal,
Irlanda, Canadá, entre outros, apresentam nomes de bandas
e músicas com termos psiquiátricos em inglês, conforme resultados do presente estudo. O número absoluto de bandas
e músicas brasileiras que usam termos psicopatológicos é
semelhante ao do resto do mundo. Isso pode ser explicado
pela força e atração da cultura anglo-saxã (língua, produtos,
roupas, festas, filmes, televisão) e pelos nossos problemas sociais e grande prevalência de transtornos mentais.
O rock and roll parece manter a visão romântica dos transtornos mentais que foi trazida pela contracultura na década
1970, quando a influência da antipsiquiatria estava no auge.
O show de rock é um espetáculo muitas vezes fantasioso em
que os artistas expõem sob máscaras e músicas seus ideais e
comportam-se como a se libertar das convenções-padrão. A
iluminação dramática e os efeitos de fumaça deixam a performance parecer surreal; parecem pertencer à outra dimensão,
sem regras ou restrições, somente liberdade. Os membros
da banda Kiss, por exemplo, tornaram-se únicos, maquiando-se como monstros, cuspindo fogo e sangue15.
Expressar comportamentos e usar nomes de sintomas
e transtornos mentais permitiria atos impulsivos e inconsequentes, às vezes amorais, mas também uma catarse coletiva, estados alterados de consciência que aliviam ansiedades,
tristeza e angústias. Até mesmo perante a justiça a conduta
diante de alguém com transtorno mental é diferente: a incapacidade de entender o caráter ilícito de seus atos permite
que o doente mental seja considerado inimputável e tenha
julgamento e pena diferenciados. Na visão romântica do
rock and roll, suspender a ordem e as regras seria sinônimo
de liberdade ou agressão à ordem estabelecida. Tal observação lembra a famosa frase de Raul Seixas, famoso cantor
roqueiro, na época da contracultura dos anos 1970: “Faz o
que tu queres há de ser tudo da lei”.
No presente estudo predominou nas músicas pesquisadas termos relacionados ao uso de substâncias como: álcool,
anfetamina, cocaína e nicotina. Foram encontradas 38 músicas relacionadas a esse tema. Dessas, apenas uma defendia
o abandono das drogas, enfatizando seus efeitos deletérios.
Psicopatologia e rock and roll
49
As demais 37 incentivavam o uso. O impacto que isso pode
ter merece ser analisado. As drogas ilícitas por si só remetem
à ideia de anarquia, geralmente presente nas músicas de
rock. Em 2008, um estudo analisou o conteúdo de 279 músicas populares norte-americanas, constatando que 33,3%
referenciaram o uso de substâncias. Dessas músicas, 66 eram
rock e 62 rap e, respectivamente, 14% e 77% delas incentivavam o uso. Do total de músicas, 2,9% referenciaram o tabaco,
23,7% o álcool, 13,6% a maconha e 11,5% drogas inespecíficas. O uso da droga foi associado com festas, sexo, violência
e humor. Somente 4% das músicas expuseram mensagens
antiuso de drogas13. O mesmo fenômeno é encontrado na
música popular brasileira. Segundo resultado de estudo
brasileiro de 2004, ao estudar a relação entre substâncias e
músicas populares, há predominância de músicas discursando a favor da discriminação da cannabis por seu caráter dito
inofensivo e pretensas vantagens de seu uso; uma minoria
de músicas enfatiza os riscos de dependência da cannabis,
do álcool e da heroína7.
Conhecer rock and roll pode facilitar o estabelecimento
de vínculo com adolescentes e jovens aficionados e pode
facilitar atividades terapêuticas discutindo letras de músicas.
Porém, a apropriação de termos médicos pelo vocabulário
popular, como “esquizofrênico”, “imbecil” e “cretino”, e sua
atribuição em casos cotidianos sem nenhum rigor científico,
assim como o uso metafórico desses termos com significados depreciativos e insanos, pode contribuir para o estigma
que alguns transtornos mentais possuem, dificultando a
procura de tratamento para as comorbidades psiquiátricas
e segregando parte da sociedade16. A visão antipsiquiátrica
ou o reducionismo psicológico pode ser prejudicial, pois as
pessoas podem ter dificuldade de separar o normal do patológico e buscar ajuda. O incentivo de muitas músicas ao uso
de substâncias é outro ponto negativo que separa a Psiquiatria do rock and roll.
Contribuições individuais
Os dois autores trabalharam ativamente em todas as fases
do projeto.
Conflitos de interesse
Não há.
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artigo original
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REVISÃO DE LITERATURA
Programas metacognitivos com enfoque
em cognição social na reabilitação da
esquizofrenia: uma revisão sistemática
Metacognitive programs focusing social cognition for the
rehabilitation of schizophrenia: a systematic review
Hélio Anderson Tonelli1, Fernanda Liboni1, Diego Augusto Nesi Cavicchioli2
RESUMO
Palavras-chave
Esquizofrenia, cognição
social, psicoterapia,
sociobiologia.
Objetivo: Revisar sistematicamente a literatura sobre programas psicoterapêuticos para a
esquizofrenia com enfoque em CS, cujos métodos envolvam estratégias metacognitivas. Métodos: Foi realizada uma busca na base MedLine, por trabalhos publicados em inglês ou
português utilizando a frase “Social cognition” AND “Schizophrenia” [Mesh] AND “Psychotherapy” [Mesh] e os limitadores “Humans”, “Clinical Trial”, “Meta-Analysis” e “Randomized Controlled
Trial”. Adicionalmente, foram elaborados critérios de inclusão para selecionar os trabalhos
com abordagem metacognitiva. Resultados: Dezessete estudos foram selecionados, abrangendo essencialmente programas de reconhecimento do afeto facial e de emoções, Teoria
da Mente (ToM), imitação e tomada de perspectiva em situações sociais. Conclusão: A maior
parte dos estudos mostrou que seus programas são eficazes para melhorar medidas de psicopatologia, CS e funcionamento social. Futuras pesquisas deverão esclarecer sobre segurança, especificidade e durabilidade dessas intervenções.
ABSTRACT
Keywords
Schizophrenia, social
cognition, psychotherapy,
sociobiology.
Objective: To review systematically the literature on psychotherapeutic programs focusing
on SC, designed to schizophrenia, which methods include metacognitive strategies. Me­
thods: A search on MedLine base for papers published in English or Portuguese has been
performed, using the phrase “Social cognition” AND “Schizophrenia” [Mesh] AND “Psychotherapy” [Mesh] and the limits “Humans”, “Clinical Trial”, “Meta-Analysis” and “Randomized Controlled Trial”. Additionally, inclusion criteria have been formulated in order to select papers with
metacognitive approach. Results: Seventeen articles have been selected, which comprised
essentially facial emotion recognition, emotion recognition, Theory of Mind (ToM), imitation
and perspective taking in social situations. Conclusion: The great majority of papers have
shown that their programs are effective in improving measures of psychopathology, SC and
social functioning. Future research might clarify about safety, specificity and durability of
such interventions.
1 Instituto de Psiquiatria do Paraná.
2 Universidade Estadual de Londrina (UEL).
Recebido em
12/11/2012
Aprovado em
3/2/2013
Endereço para correspondência: Hélio Anderson Tonelli
Av. Cândido de Abreu, 526, cj. 311, Torre B
80530-000 – Curitiba, PR, Brasil
Email: [email protected]
52
REVISÃO DE LITERATURA
Tonelli HA et al.
INTRODUÇÃO
Por se tratar de uma doença crônica e potencialmente incapacitante, a esquizofrenia é considerada um sério problema
de saúde pública, para o qual estratégias terapêuticas multidimensionais devem, idealmente, ser desenvolvidas.
Abordagens psicoterapêuticas individuais ou grupais são
coadjuvantes do tratamento farmacológico e podem ser
empregadas de forma fácil, tanto em pacientes ambulatoriais quanto em internados.
Os principais alvos terapêuticos dessas abordagens costumam ser as dificuldades interpessoais e sintomas resistentes à medicação.
Circuitos cerebrais especificamente relacionados ao processamento da informação do ambiente social – ou cognição social (CS) – estão disfuncionais na esquizofrenia, gerando sintomas que poderiam ser entendidos como reações
“para mais” ou “para menos” a esse ambiente (respectivamente, sintomas paranoides e afastamento social)1.
Por auxiliar na compreensão da origem dos sintomas da
esquizofrenia, o estudo da CS pode ser útil para o desenvolvimento de estratégias psicoterapêuticas a serem empregadas com a farmacoterapia, melhorando a evolução do transtorno em médio e longo prazo.
A maior parte das técnicas de psicoterapia e reabilitação
desenhadas para a esquizofrenia dirige-se tanto à melhora
cognitiva geral quanto da interação social, e as mais estudadas são as psicoterapias de remediação cognitiva e o treino
de habilidades sociais. Embora úteis, esses programas não
levam em conta as características qualitativas dos estímulos cognitivos sociais2, tendendo a considerar as distorções
apresentadas pelos pacientes em suas interpretações do
ambiente social mais como uma consequência de prejuízos
cognitivos gerais, como déficits atencionais e de função executiva. Dessa forma, essas intervenções têm uma abordagem
baseada nos sintomas, ou, segundo Aghotor et al.3, do tipo
“porta da frente”, por não considerarem a origem cognitiva
social dos sintomas. Assim, o foco das psicoterapias cognitivas para a esquizofrenia seria a modificação de crenças e esquemas mal-adaptativos decorrentes de déficits cognitivos4,
e não da cognição propriamente dita. Programas com foco
na cognição baseiam-se na melhora de parâmetros cognitivos gerais (memória, aprendizado, atenção e função executiva) ou sociais (reconhecimento de emoções, capacidade de
inferência de estados mentais em outros indivíduos e estilos
atribucionais) e seriam mais adequadamente designados
como “treino cognitivo” e considerados estratégias do tipo
“porta dos fundos”3.
Abordagens metacognitivas, por sua vez, são desenvolvidas para focar vieses cognitivos subjacentes aos sintomas
esquizofrênicos e promover alguma reflexão sobre os próprios processos cognitivos. O termo “metacognição” foi utilizado pela primeira vez em 1976 por Flavell5, que o definiu
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):51-61.
como “aquilo que se refere ao conhecimento que alguém
tenha a respeito de seus próprios processos cognitivos, ou a
qualquer coisa que a estes processos se relacionem (...)”. Metacognição, portanto, define a cognição acerca de cognição,
isto é, aquilo que sabemos sobre e reconhecemos em nossa
própria cognição.
Programas metacognitivos com enfoque em CS empregam diversas tarefas que têm em comum a avaliação supervisionada, o estímulo à reflexão e o aprendizado baseados
na observação de como a mente interpreta e reage aos mais
diversos estímulos sociais. Tais técnicas podem auxiliar na
correção de erros na interpretação desses estímulos, levando
a comportamentos mais adaptativos e à melhora nos relacionamentos interpessoais.
Este manuscrito tem como objetivo revisar sistemática e
criticamente a literatura sobre programas psicoterapêuticos
para a esquizofrenia que se baseiem em CS (ou incluam em
algum de seus subprogramas), cujo método envolva estratégias metacognitivas, procurando por ensaios clínicos que
comparem esses programas a outros métodos terapêuticos
não farmacológicos já tradicionalmente utilizados em set­
tings ambulatoriais ou hospitalares.
MÉTODOS
Em uma primeira etapa da preparação deste manuscrito, foi
realizada uma busca na base de dados MedLine, por trabalhos publicados em português ou inglês, no período compreendido entre 1/1/1990 e 1/8/2011, utilizando a frase de
busca “Social cognition” AND “Schizophrenia” [Mesh]) AND
“Psychotherapy” [Mesh] e os limitadores “Humans”, “Clinical
Trial”, “Meta-Analysis” e “Randomized Controlled Trial”. Essa
busca tinha por finalidade encontrar estudos sobre intervenções psicoterápicas utilizando conceitos sociocognitivos e
resultou em 11 artigos2,6-15, dos quais um foi excluído por não
se tratar de um ensaio clínico7. Outros 10 manuscritos3,16-24
foram selecionados a partir da leitura dos artigos acima, pois
pareciam preencher os critérios de inclusão do tema a ser
discutido. Após a leitura deles, dois foram descartados por
não se tratarem de ensaios clínicos22,24 e outro23, por não envolver diretamente CS.
Em uma segunda etapa, foram selecionados os artigos
que estudaram estratégias psicoterapêuticas metacognitivas. Uma vez que nem todos os trabalhos selecionados
explicitavam isso, procurou-se estabelecer um critério objetivo com o qual fosse possível afirmar que estratégias metacognitivas de tratamento haviam sido utilizadas. Assim, a
alusão à abordagem do tipo “porta de trás” foi escolhida na
elaboração desses critérios: segundo ela, o principal objetivo
deve ser a mudança da “infraestrutura cognitiva” por meio
do aumento da atenção dos pacientes à própria cognição.
De acordo com essa perspectiva, optou-se por definir, se não
REVISÃO DE LITERATURA
Cognição social e reabilitação da esquizofrenia
mencionado no manuscrito, que uma estratégia metacognitiva fora adotada quando o método incluía o favorecimento
da conscientização dos pacientes acerca de seus déficits por
meio do estímulo à observação, avaliação e/ou simulação e
correção dos próprios processos cognitivos sociais3. Segundo esses critérios, todos os 17 artigos inicialmente selecionados puderam ser incluídos.
RESULTADOS
Dos 17 artigos incluídos, 14 são estudos controlados3,6,8-21 e três,
não controlados2,12,17. As principais características desses estudos e seus principais achados estão sumarizados na tabela 1.
De forma geral, os estudos incluídos compararam programas realizados em grupo ou individualmente (os programas
metacognitivos avaliados estão resumidos na tabela 2) com
outros tipos de intervenção-controle, como grupo de discussão de jornais3, terapia de solução de problemas6; “estratégias
53
terapêuticas usuais”, incluindo manejo de medicação, psicoterapia suportiva, psicoeducação e terapia ocupacional2,14,18;
psicoterapia suportiva9,13,15; seguimento medicamentoso isolado8; treino de habilidades sociais19 e psicoterapia de remediação cognitiva18. Um estudo examinou os efeitos de sua intervenção sobre a psicopatologia ou cognição em portadores
de esquizofrenia e comparou-os com controles históricos17.
Três programas foram estudados em mais de uma publicação: Cognitive Enhancement Therapy (CET)9,12,13,15, Social
Cognition Interaction Training (SCIT)2,11,19 e Training of Affect
Recognition (TAR)17,18.
Os programas estudados abrangeram várias abordagens,
baseadas nas principais linhas de estudo de CS (Tabela 2),
incluindo tarefas de reconhecimento e percepção de emoções, processamento cognitivo “teoria da mente” (ou “ToM”,
associado à habilidade de inferência de estados mentais em
terceiros), atribuição e julgamento de situações sociais, tomada de perspectiva, apreciação, avaliação e imitação de
ações em contextos sociais.
Tabela 1. Principais características e achados dos trabalhos selecionados
Estudos controlados
Número de participantes
Principais características do estudo
Principais achados
16
Penn e Combs, 2000
40 pacientes internados (23 homens e 17 mulheres)
com diagnósticos de esquizofrenia ou transtorno
esquizoafetivo, de acordo com a Entrevista
Clínica Estruturada para DSM-IV, foram alocados
aleatoriamente para um dos quatro grupos da
pesquisa
Compararam o impacto da imitação de expressões
faciais sobre o reconhecimento de emoções com o
obtido via reforço monetário. Os autores compararam
quatro grupos em relação ao seu desempenho na
identificação do afeto facial e na generalização do
reconhecimento de afeto. Os grupos receberam
abordagens distintas quanto à execução das tarefas:
treino simples, treino com reforço financeiro (a cada
acerto o indivíduo recebia imediatamente $ 0,10),
treino de imitação das emoções mostradas (ou
feedback facial) e treino combinado; feedback facial e
reforço financeiro (grupo “combinação”)
Os grupos “reforço”, “feedback facial” e
“combinação” melhoraram significativamente seu
desempenho no teste de identificação do afeto
facial em relação ao treino simples, isto é, houve
ampliação da capacidade de identificar vários tipos
distintos de afetos observados em fotos de faces.
Todavia, houve limitadas evidências de que os
efeitos das intervenções se generalizavam para a
discriminação do afeto facial, isto é, a habilidade
de perceber se duas faces distintas mostradas
sequencialmente exibem a mesma emoção
Hogarty et al., 200415
120 pacientes ambulatoriais satisfazendo critérios
diagnósticos do DSM-II-R ou do DSM-IV para
esquizofrenia ou transtorno esquizoafetivo (59%
homens e 41% mulheres) foram randomizados para
Cognitive Enhancement Therapy (CET) ou controle
Estudaram o efeito do CET sobre a cognição
de portadores de esquizofrenia ou transtorno
esquizoafetivo. O CET foi comparado a técnicas
psicoterápicas suportivas ao longo de dois
anos. Foram realizadas avaliações cognitivas e
psicopatológicas na baseline e aos 12 e 24 meses
Aos 12 meses foi observado um efeito robusto
do CET em domínios neurocognitivos, com
efeitos marginais sobre a cognição social. No
entanto, a partir dos 24 meses houve melhoras
significativas no grupo CET em todas as medidas
comportamentais e de cognição, exceto em
sintomas residuais
Roncone et al., 200421
20 portadores de esquizofrenia residual, de acordo
com critérios do DSM-IV (13 homens e 7 mulheres),
aleatoriamente alocados para Instrumental
Enrichment Programme (IEP) ou controle (tratamento
medicamentoso e psicoterapia de apoio)
Estudaram a eficácia do IEP em uma população
de esquizofrênicos com déficits ToM, comparando
este programa com um grupo controle, durante
seis meses
Houve melhora estatisticamente significativa do
grupo IEP em diversos domínios cognitivos sociais,
como habilidades ToM e de reconhecimento de
emoções, principalmente tristeza e medo
Wölwer et al., 200518
77 pacientes ambulatoriais com diagnóstico de
esquizofrenia de acordo com a CID-10 (60 homens
e 17 mulheres), alocados aleatoriamente para os
grupos Training of Affect Recognition (TAR); Cognitive
Remediation Training (CRT) e tratamento usual
Compararam o TAR com duas outras estratégias,
CRT e tratamento usual (que não incluía treino
cognitivo algum), a fim de observar seus efeitos
sobre o reconhecimento do afeto facial
Os pacientes recebendo TAR apresentaram melhora
significativa no reconhecimento do afeto facial
em relação aos outros grupos. O grupo CRT, de
tratamento ativo, não modificou o desempenho
sobre o reconhecimento de emoções, mas
apresentou melhora na memória verbal
Choi e Kwon, 200614
34 pacientes ambulatoriais diagnosticados com
esquizofrenia ou transtorno esquizoafetivo de
acordo com DSM-IV (19 homens e 15 mulheres)
foram randomicamente alocados para receberem
Social Cognitive Enhancement Training (SCET) ou
tratamento convencional
Avaliaram o impacto do SCET sobre a avaliação
de contexto social em esquizofrênicos. O SCET
foi comparado a tratamento convencional,
caracterizado por atividades de otimização da
aderência à medicação e do funcionamento social
e ocupacional. Os autores utilizaram instrumentos
para aferição de CS antes e após o tratamento, que
foi realizado por seis meses
Neste trabalho, o SCET melhorou déficits
atencionais, de memória e de função executiva
em esquizofrênicos em relação ao tratamento
convencional, mas não houve generalização desses
efeitos no funcionamento social. Além disso, houve
fracas evidências de que o SCET tenha efeito sobre o
reconhecimento de emoções
continuação
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):51-61.
54
REVISÃO DE LITERATURA
Tonelli HA et al.
Estudos controlados
Número de participantes
Principais características do estudo
Principais achados
28 pacientes ambulatoriais de um serviço de
psiquiatria forense (21 homens e 7 mulheres),
com diagnóstico de transtorno do espectro da
esquizofrenia de acordo com a Entrevista Clínica
Estruturada para DSM-IV
Compararam o Social Cognition and Interaction
Training (SCIT) a uma estratégia de treino de
habilidades sociais em indivíduos com transtornos
do espectro da esquizofrenia ao longo de 18
semanas
Além de demonstrar melhora em todos
os parâmetros CS, os autores reportaram
diminuição de incidentes agressivos no grupo
SCIT, argumentando que um bom rendimento
cognitivo social permite a configuração de relações
interpessoais mais saudáveis, diminuindo o risco
de agressão em indivíduos com transtornos do
espectro da esquizofrenia. As alterações favoráveis
observadas na cognição dos indivíduos recebendo
SCIT mantiveram-se mesmo após terem sido
estatisticamente controladas com os dados sobre
alterações sintomáticas ao longo do tempo
Eack et al., 200713
38 pacientes ambulatoriais com diagnóstico de
esquizofrenia ou transtorno esquizoafetivo de
acordo com a Entrevista Clínica Estruturada para
DSM-IV (26 homens e 12 mulheres), alocados
aleatoriamente para CET ou EST [Terapia Suportiva
Enriquecida (Enriched Supportive Therapy)]
Examinaram os efeitos do CET sobre a CS em
esquizofrênicos com doença recente. O CET foi
comparado a o EST, caracterizado por estratégias
de redução do estresse e psicoeducação, ao longo
de um ano
Os indivíduos recebendo CET apresentaram
melhora significativa na compreensão e no manejo
de emoções, tanto em si mesmos quanto em
terceiros; e na habilidade de utilizar emoções para
facilitar o pensamento e a tomada de decisões,
desenvolvendo a habilidade de compreender o
significado das emoções em um contexto social.
Não houve, contudo, diferenças significativas na
competência de perceber acuradamente emoções
Combs et al., 200911
18 pacientes do estudo de Combs et al., 200719 (12
homens e 6 mulheres)
Publicaram dados acerca da estabilidade dos
efeitos no grupo SCIT na população anteriormente
estudada por Combs et al. (2007)19. Além de
submeterem essa população a medidas de
percepção de emoções e funcionamento social após
seis meses, os autores compararam essa população
com um grupo de indivíduos de uma comunidade
não psiquiátrica
Os resultados foram favoráveis ao SCIT, já que seis
meses após o primeiro estudo os escores do grupo
SCIT mantiveram-se significantemente maiores do
que na baseline, além de não ter havido diferenças
entre o desempenho desse grupo e do grupo não
clínico
Eack et al., 20099
58 pacientes ambulatoriais preenchendo critérios
para esquizofrenia ou transtorno esquizoafetivo
de acordo com a Entrevista Estruturada para
DSM-IV (40 homens e 18 mulheres) aleatoriamente
alocados para CET ou EST
Examinaram os efeitos do CET sobre a CS em
esquizofrênicos e portadores de transtorno
esquizoafetivo com doença recente, reforçando que
podem existir diferenças na capacidade de resposta
a métodos psicoterapêuticos em sujeitos com
doença recente e tardia graças à preservação da
neuroplasticidade naqueles. O estudo foi realizado
ao longo de dois anos. O CET foi comparado à
terapia suportiva enriquecida (EST), e os sujeitos
experimentais foram avaliados no primeiro e no
segundo ano
No primeiro ano os indivíduos recebendo CET
tiveram melhoras importantes em estilos cognitivos
disfuncionais, CS e sintomatologia, em relação ao
grupo EST. Após dois anos as diferenças se tornaram
altamente significativas favorecendo o CET
Gil Sanz et al., 200910
14 pacientes ambulatoriais diagnosticados de
acordo com os critérios da CID-10 (7 homens e 7
mulheres), aleatoriamente alocados para os grupos
experimental e controle
Examinaram os efeitos da aplicação do Social
Cognition Training Program (SCTP), sobre o
reconhecimento de emoções e percepção social em
esquizofrênicos ao longo de 10 semanas
O grupo SCTP mostrou desempenho
significativamente superior nas medidas de
percepção e interpretação de situações sociais, mas
não de reconhecimento de emoções em relação
ao grupo controle, que não recebeu treino em
percepção social
Matsui et al., 20098
20 pacientes ambulatoriais preenchendo
critérios do DSM-IV para esquizofrenia, alocados
aleatoriamente para reabilitação cognitiva com
ênfase em informação social ou controle
Os autores compararam um programa de
reabilitação cognitiva com ênfase em informação
social com tratamento convencional (definido
como seguimento medicamentoso), ao longo de
três meses. Apesar de o programa avaliado não
ter um módulo desenhado especificamente para
o tratamento cognitivo social, os autores tinham
como alvo principal proporcionar um aumento
na competência da avaliação de situações sociais,
por meio de uma estreita interação pacienteterapeuta, o que, em última análise, favoreceria
a criação de novas macroestruturas cognitivas ou
representações mentais sobre o ambiente social
Os indivíduos recebendo reabilitação cognitiva
demonstraram desempenho significativamente
maior em medidas de CS em relação ao controle.
Tais melhoras foram mantidas por pelo menos três
meses após o final da intervenção
Aghotor et al., 20103
30 portadores de transtorno do espectro da
esquizofrenia (20 homens e 10 mulheres), de
acordo com critérios da CID-10, foram alocados para
Metacognitive Training (MCT) ou grupo controle
Compararam a eficácia e a segurança do MCT
com um grupo controle ativo sem características
psicoterápicas em portadores de transtornos do
espectro da esquizofrenia
Os sujeitos recebendo MCT apresentaram melhoras
tanto em parâmetros psicopatológicos quanto
cognitivos, contudo nenhum resultado teve
significação estatística
Combs et al., 2007
19
continuação
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):51-61.
REVISÃO DE LITERATURA
Estudos controlados
Cognição social e reabilitação da esquizofrenia
Número de participantes
Principais características do estudo
Principais achados
32 pacientes ambulatoriais diagnosticados
com esquizofrenia de acordo com a Entrevista
Estruturada do DSM-IV-TR (13 mulheres e 19
homens), aleatoriamente alocados para receberem
Emotion and ToM Imitation Training (ETIT) ou
Treinamento em Solução de Problemas (TSP)
Compararam o ETIT, baseado na observação de
emoções e na imitação de ações como fontes de
melhora cognitiva social na esquizofrenia, com TSP
O grupo ETIT apresentou melhor desempenho
em medidas de processamento ToM, no
reconhecimento de determinadas emoções, como
raiva, tristeza e nojo; no desempenho social e em
escores da dimensão positiva medidas pela escala
BPRS em relação ao grupo TSP
Veltro et al., 201120
24 pacientes ambulatoriais diagnosticados de
acordo com os critérios do DSM-IV-TR foram
alocados aleatoriamente para Problem Solving
Treatment (PST) ou Cognitive Emotional
Rehabilitation (REC)
Compararam duas estratégias semelhantes em sua
forma, mas distintas em seu foco terapêutico para o
tratamento da esquizofrenia: o PST e a REC. Ambos
utilizam técnicas metacognitivas baseadas em
um trabalho supervisionado; contudo, a REC tem
como principal alvo o reconhecimento de emoções
e o PST, o treino no planejamento de solução de
problemas
Embora os treinos tenham sido diferencialmente
eficientes em seus domínios específicos de ação,
ambos associaram-se a melhoras na psicopatologia
e no funcionamento social
Fromann et al., 200317
16 pacientes portadores de esquizofrenia (13
homens e 3 mulheres) de acordo com o International
Diagnostic Checklist of ICD-10
Os autores aplicaram o TAR em uma pequena
amostra de esquizofrênicos. Em seguida,
compararam os resultados com dois grupos controle
históricos, compostos de indivíduos saudáveis e de
portadores de esquizofrenia
A maior parte dos pacientes da amostra atual
apresentou melhora significativa na capacidade de
reconhecer afeto facial não atribuível a eventuais
diferenças no estado psicopatológico observadas
antes e após o treino
Hogarty et al., 200612
106 pacientes do estudo de Hogarty et al., 200415
Examinaram se os efeitos observados nos
indivíduos recebendo CET do estudo de Hogarty et
al. (2004)15 eram mantidos após um ano. Os autores
reavaliaram os pacientes daquele estudo um ano
mais tarde, do ponto de vista neuropsicológico e
comportamental
Houve manutenção das melhoras tanto na CS
quanto em outros domínios cognitivos gerais
Roberts e Penn, 20092
31 pacientes ambulatoriais com diagnóstico de
transtornos do espectro da esquizofrenia de
acordo com a Entrevista Estruturada para DSM-IV
(13 mulheres e 18 homens) receberam SCIT ou
“tratamento usual”
Compararam o SCIT com tratamento usual (manejo
de medicação, técnicas de psicoterapia individual
ou grupal, manejo de caso, psicoeducação e terapia
ocupacional) em portadores de transtornos do
espectro da esquizofrenia, ao longo de 20 semanas
Os indivíduos recebendo SCIT também receberam
o tratamento usual. O grupo SCIT melhorou
significativamente a performance na percepção
de emoções, não havendo efeito significativo
nas medidas ToM nem em vieses atribucionais
agressivos
Mazza et al., 2010
6
55
Tabela 2. Principais características dos programas estudados
Programa
Principais características
Linhas de abordagem CS
Metacognitive Training3
Programa de intervenção em grupo consistindo de oito sessões de
duração entre 45 e 60 minutos, cujo objetivo é conscientizar os pacientes
de distorções cognitivas sociais
Estilos atribucionais disfuncionais e “jumping to conclusions” focando
situações sociais, processamento cognitivo “Teoria da Mente” (ToM)
Emotion and ToM Imitation Training6
Programa de intervenção em grupo com duração de 12 semanas e
desenhado para esquizofrênicos
ToM e imitação de expressões faciais
Reabilitação cognitiva com ênfase
em informação social8
Programa de intervenção individual consistindo de 12 sessões semanais
de 40 minutos
“Social knowledge” (esquemas ou macroestruturas cognitivas a respeito
de como compreender comportamentos humanos)
Cognitive Enhancement Therapy
(CET)9,12,13,15
Programa de intervenção em grupo para remediação de déficits
cognitivos e sociocognitivos para pacientes esquizofrênicos e
esquizoafetivos, cujo subprograma CS caracteriza-se por 45 sessões de
grupo de treino sociocognitivo
Além de um subprograma neurocognitivo, disponibiliza um
subprograma CS cuja finalidade é estimular o aprendizado de
informações a respeito do ambiente social e estimular interações sociais
Social Cognitive Training
Program(SCTP)10
O programa estudado neste trabalho consiste de intervenção em grupo,
realizado duas vezes por semana, em 20 sessões
Reconhecimento de emoções (módulo do programa desenhado pelos
autores) e percepção social (módulo extraído do programa Terapia
Integrada da Esquizofrenia)
Social Cognition and Interaction
Training (SCIT)2,11,19
Programa de intervenção em grupo com duração de 18 a 24
semanas, com ênfase em processos sociocognitivos disfuncionais em
esquizofrênicos
Percepção e discriminação de emoções faciais e ToM
Social Cognitive Enhancement Training
(SCET)14
Programa de intervenção em grupo, consistindo de duas sessões
semanais e duração de seis meses
Percepção de pistas sociais em cartoons e organização deles na ordem da
informação contextual, além de discussão dos resultados
Training of Affect Recognition (TAR)17,18
Programa de intervenção em grupo, consistindo de 12 sessões a ser
desenvolvido em duas sessões de 45 minutos por semana
Reconhecimento do afeto facial
Cognitive Emotional Rehabilitation20
Programa de intervenção em grupo, com sessões semanais durando de
75 a 90 minutos e duração de seis meses
Percepção de emoções, ToM
Instrumental Enrichment Programme21
Programa de intervenção em grupo, com sessões semanais com duração
de até 1 hora, aplicado pelos autores durante 22 semanas
Aquisição de consciência de déficits, de conceitos a respeito da
dificuldade de reconhecer emoções; estímulo a novos processos de
aprendizado social, compreensão da utilidade dos processos cognitivos
envolvidos nas interações sociais, modificação das percepções de si
mesmo e de terceiros
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):51-61.
REVISÃO DE LITERATURA
Tonelli HA et al.
56
Quatro estudos descreveram seus programas de tratamento explicitamente como metacognitivos3,6,20,21.
Os tipos de desfecho avaliados abrangeram melhoras em
medidas de psicopatologia, cognição geral, processamento
ToM, reconhecimento de emoções ou do afeto facial, desempenho social, interpretação e percepção de situações
sociais e número de incidentes agressivos. A tabela 3 resume
os principais parâmetros psicopatológicos, cognitivos e sociocognitivos avaliados em cada estudo.
A maior parte dos estudos documentou melhora significativa de parâmetros CS e até mesmo de parâmetros cognitivos gerais e de sintomatologia nos grupos recebendo
programas metacognitivos baseados em CS, exceto Aghotor
et al.3 (que não demonstraram diferenças significativas entre grupos em medidas de psicopatologia ou de cognição),
Choi e Kwon14 (que, embora com seu programa tenham en-
contrado melhora em déficits neurocognitivos, não conseguiram demonstrar algum impacto dessas melhoras sobre
o funcionamento social, bem como efeito sobre reconhecimento de emoções) e Penn e Combs16 (os quais registraram
melhora da capacidade de identificação, mas não da de discriminação do afeto facial).
Alguns estudos comparando programas com foco em
CS com programas não CS demonstraram especificidade
dos tratamentos2,6,9,13,15,18-21.
Poucos estudos preocuparam-se em estudar a manutenção dos resultados favoráveis de seus programas ao longo do
tempo8,11 ou em avaliar a resposta diferencial à exposição de
pacientes com doença recente ou tardia aos programas9,13.
Os trabalhos aqui revisados fazem pouca ou nenhuma
menção ao papel dos psicofármacos utilizados por suas populações nos resultados obtidos.
Tabela 3. Avaliação de psicopatologia, cognição geral e CS nos estudos incluídos
Estudo
Avaliação da psicopatologia e/ou da cognição geral
Avaliação da cognição social
Penn e Combs, 200016
BPRS37
Hogarty et al., 200415
Velocidade de processamento, habilidades visuoespaciais, memória verbal,
memória de trabalho, linguagem, flexibilidade cognitiva, velocidade
psicomotora; checagem de sintomas positivos e negativos, ansiedade,
depressão, autoestima, temores cotidianos e energia
Fluência verbal e função executiva; Accertamento Disabilità (versão italiana da
Disability Assessment Schedule)40
Atenção, memória de trabalho, compreensão situacional, funções executivas,
fluência verbal; PANSS 42
Organização e sequenciamento perceptual, distinção entre detalhes
essenciais e não essenciais aferidos pela versão coreana da Escala de
Inteligência de Wechsler para Crianças Revisada45
PANSS 42; WRAT-III reading48; Zigler-Glick Pre-morbid Social Competence Scale49;
medidas de flexibilidade cognitiva
Face Emotion Identification Task (FEIT)38; Face Emotion Discrimination Task
(FEDT)38
Social Cognition Profile39
Roncone et al., 200421
Wölwer et al., 200518
Choi e Kwon, 200614
Combs et al., 200719
Eack et al., 200713
Combs et al., 200911
QI na baseline
Social Functioning Scale55
Eack et al., 20099
Velocidade de processamento, memória verbal, memória de trabalho,
habilidades linguísticas, velocidade psicomotora, estilo cognitivo; medidas
de ajustamento em domínios social e vocacional e ajustamento em papéis
sociais maiores e de sintomas positivos e negativos, ansiedade, depressão e
autoestima
PANSS 42; subteste Direct Digits do Integrative Program of Neuropsychological
Exploration of the Test Barcelona60; Disability Scale of the World Health
Organization61
Funcionamento executivo, memória verbal, flexibilidade cognitiva,
planejamento, capacidade estratégica e memória de trabalho
PANSS 42
Gil Sanz et al., 200910
Matsui et al., 20098
Aghotor et al., 20103
Mazza et al., 2010 6
Veltro et al., 201120
Fromann et al., 200317
Hogarty et al., 200612
Roberts e Penn, 20092
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):51-61.
Versão italiana da BPRS37,65; Personal and Social Performance Scale66; medidas
de QI, memória de trabalho, velocidade psicomotora, memória verbal, função
executiva e fluência verbal
QI, memória de trabalho, velocidade psicomotora, memória verbal, função
executiva e fluência verbal
PANSS 42
Major Role Adjustment Inventory70; Global Assessment Scale71; medidas de
velocidade de processamento, inteligência e fluência verbal
PANSS 42; The Social Skills Performance Assessment (SSPA)58
Histórias ToM lidas aos sujeitos experimentais; reconhecimento de emoções por
meio de cartoons; Mach IV Scale41
Performance of Facial Affect (PFA Test)43; Benton Face Recognition Test (BFRT)44
Social Behavior Sequencing Task46; Emotion Recognition Task47
Face Emotion Identification Test50; Face Emotion Discrimination Test50; Social
Perception Scale51; Hinting Task52; Ambiguous Intentions Attributional
Questionnaire53; Need for Closure Scale54; Social Functioning Scale55
The Mayer-Salovey-Caruso Emotional Intelligence Test (MSCEIT)56
Face Emotion Identification Test50; The Bell-Lysaker Emotion Recognition Task
(BLERT)57; The Social Skill Performance Assessment (SSPA)58
Cognitive Style and Social Cognition Elegibility Interview and the Cognitive Styles
Inventory59; The Mayer-Salovey-Caruso Emotional Intelligence Test (MSCEIT)56
Teste computadorizado de reconhecimento de emoções composto de 30 fotos
coloridas selecionadas do NimStim Face Stimulus Set; Escala de Percepción
Social62
Script Test63
Trecho do BADE procedure64, apropriado para avaliação do jumping to
conclusions.
Advanced Theory of Mind Scale67; histórias contendo falsas crenças;
questionários de Empatia68; Emotion Attribution Task Colleagues69
Advanced Theory of Mind Scale67; histórias contendo falsas crenças; Emotion
Attribution Task Colleagues69
Performance of Facial Affect (PFA)43
Cognitive Style and Social Cognition Elegibility Interview and the Cognitive Styles
Inventory59; medidas de autoconfiança, percepção social, capacidade suportiva
e tolerância do Social Cognition Profile59
The Face Emotion Identification Task (FEIT)38; The Bell-Lysaker Emotion Recognition
Task (BLERT)57; Hinting Task52; The Awareness of Social Inference Test (TASIT)72; The
Ambiguous Intentions Hostility Questionnaire – Ambiguous Items (AIHQ-A)53
REVISÃO DE LITERATURA
DISCUSSÃO
A já consolidada ideia de que o tratamento psiquiátrico deve
incluir tanto a recuperação sintomática quanto a funcional tem
estimulado a pesquisa por estratégias terapêuticas não farmacológicas que visem à minimização dos efeitos dos transtornos mentais sobre as relações sociais dos pacientes. Prejuízos
no funcionamento social provocam diminuição na qualidade
de vida e aumento do risco de recaídas na esquizofrenia25.
Baseado nisso, muitos programas psicoterápicos cujo objetivo principal é a reabilitação social foram desenvolvidos, alguns deles tendo como foco principal as alterações cognitivas
gerais presentes e já bem documentadas na esquizofrenia.
Apesar disso, a relação entre cognição, sintomas esquizofrênicos e desempenho social ainda não está bem esclarecida4.
O estudo da CS, além de ser um importante auxiliar na
compreensão da origem dos sintomas esquizofrênicos, tem
gerado novas estratégias de treinamento dirigido aos portadores desse transtorno, o que se reflete em um número
crescente de publicações sobre o tema.
CS é um termo abrangente, referindo-se aos processos
cognitivos relacionados à convivência com outras pessoas
e englobando uma ampla gama de linhas de pesquisa em
que as principais são o reconhecimento de emoções, a compreensão de situações sociais e as habilidades ToM. Grosso
modo, todas essas linhas estudam os processos mentais a
partir dos quais compreendemos os outros seres humanos,
seja porque os concebemos como indivíduos que têm desejos, crenças e intenções, seja porque somos capazes de identificar estados emocionais nas outras pessoas, com as quais
também estamos aptos a sincronizar emocionalmente.
Tais informações sobre os outros são fundamentais para
se entender como formamos nossas representações mentais
acerca de outras mentes.
Na medida em que incorporam tanto a observação dos
processos emocionais a que os outros estão sujeitos (os
quais são, inclusive, passíveis de serem simulados por quem
os observa) quanto as atitudes proposicionais de terceiros
(desejos, crenças e intenções), as representações mentais a
respeito das mentes dos outros são a chave para a previsão
de seu comportamento e, portanto, para relacionamentos
interpessoais saudáveis.
Esse tipo de representação mental está comprometido
na esquizofrenia26 e os trabalhos aqui revisados mostram
que incluir pacientes esquizofrênicos em atividades que estimulem diversas formas de análise, reflexão e exposição a
domínios cognitivos sociais pode auxiliá-los a melhorar seu
rendimento na interpretação adequada de estímulos sociais,
na medida em que podem contribuir para a remediação de
suas representações deficitárias. Essas melhoras refletir-se-iam na diminuição da gravidade de sintomas positivos e negativos (principalmente afastamento social) e, possivelmen-
Cognição social e reabilitação da esquizofrenia
57
te, as intercorrências com agressividade, além da facilitação
à ressocialização.
Os principais domínios CS explorados pelos programas
estudados são o reconhecimento e percepção de emoções,
inferência de estados mentais (ToM), tomada de perspectiva
em situações sociais e imitação de ações sociais (Tabela 3).
A maior parte dos programas associa diferentes tarefas envolvendo esses domínios, o que auxilia nos resultados favoráveis em termos de melhora clínica e CS. De fato, a atomização da CS em domínios distintos facilita o estudo de
cada um deles, contudo a CS caracteriza-se essencialmente
pelo funcionamento sinérgico de todos os domínios que a
caracterizam.
Reconhecimento e percepção de emoções
O ser humano é altamente visual e emprega um tempo
considerável de seu cotidiano olhando e analisando faces
humanas. De fato, rostos são fontes valiosas de informações
indispensáveis no convívio social. O processamento da informação oriunda de faces humanas parece ser separável em
níveis neurais distintos27: enquanto uma análise visual básica
seria realizada no córtex visual, a percepção de faces seria
processada no giro occipital inferior, a percepção da identidade facial no giro fusiforme lateral e a percepção de variáveis sociais da face, como olhar e formato da boca – diferentes nas diversas emoções –, seria realizada no sulco temporal
superior. Amígdala e córtex pré-frontal decodificariam adicionalmente as informações de todas essas regiões.
A interpretação errônea do afeto facial por esquizofrênicos é um possível mecanismo de produção de sintomas
como delírios persecutórios ou afastamento social. Felizmente, o reconhecimento do afeto facial parece ser passível
de melhora por meio de treino27.
A maioria dos programas envolvendo treino em reconhecimento de afeto em esquizofrênicos mostrou melhora significativa no reconhecimento de emoções em relação aos controles, sendo a única exceção o SCTP10, que, contudo, foi estudado
em uma amostra pequena de sujeitos experimentais.
Mesmo levando em conta as diferenças qualitativas e
quantitativas dos programas – e elas são importantes, na
medida em que eles variam muito em conteúdo, tempo e
rotinas de aplicação (Tabela 2) –, todos parecem ser úteis na
melhora do reconhecimento de emoções e, talvez por isso,
possam promover melhoras clínicas em sintomas positivos ou
negativos, conforme mostraram alguns dos trabalhos revisados6,17,18,20,21.
Todavia, duas situações devem ser levadas em conta
ao se interpretarem esses resultados: a primeira, e mais geral, é que a natureza da relação melhora clínica-funcional e
melhora cognitivo-social ainda é um assunto em aberto e
merece mais estudos antes de uma conclusão definitiva. A
segunda, mais especificamente relacionada aos programas
discutidos nesta seção, é que nenhum deles concentrouJ Bras Psiquiatr. 2013;62(1):51-61.
58
REVISÃO DE LITERATURA
Tonelli HA et al.
-se especificamente no treinamento de reconhecimento
de emoções; pelo contrário, boa parte combinou tarefas de
reconhecimento de emoções, de inferência de estados mentais e de imitação, o que pode ter aumentado o poder de
identificação de afetos nos sujeitos experimentais.
A motivação para determinada tarefa parece também ter
um impacto sobre o desempenho, e isso é bem ilustrado no
trabalho de Penn e Combs16, que mostraram que o simples
reforço monetário para o acerto pode melhorar a performance dos sujeitos experimentais em tarefas de identificação
(mas não de discriminação) de afetos faciais.
Inferência de estados mentais (ou habilidades ToM)
A habilidade mental humana automática de se atribuírem
estados mentais a terceiros tem a finalidade principal de
compreensão e predição comportamental, facilitando o
convívio social.
É importante destacar o papel da automaticidade e da
espontaneidade dessa habilidade em humanos saudáveis.
Elas recheiam nossas descrições do ambiente social com expressões relativas a estados mentais, como “querer”, “ter a
intenção de”, “acreditar”, “pensar” etc.
As habilidades ToM parecem ser dissociáveis em dois domínios distintos: o domínio ToM implícita (ou ToMi), que é a
capacidade automática propriamente dita e que permite um
processamento rápido das informações do ambiente social;
e o domínio ToM explícita (ou ToMe), que é a capacidade
de aprender as regras do jogo social, de forma a otimizar o
convívio com outros seres humanos28 por meio da reflexão.
ToMi e ToMe parecem recrutar circuitos neurais distintos
e, do ponto de vista da eficiência, a ToMe é mais lenta, não
permitindo um processamento on-line da informação social.
Indivíduos que nascem com prejuízos na capacidade
automática de inferir estados mentais de terceiros (ToMi),
como alguns autistas e esquizofrênicos, estão sujeitos ao
desenvolvimento de dificuldades na interação social ou isolamento social e de sintomas psicóticos29. Felizmente, eles
podem compensar essa dificuldade por meio do aprendizado de regras sociais (desenvolvimento do domínio ToMe),
embora isso envolva maiores empregos de esforço e tempo.
É possível que os resultados favoráveis apresentados por
muitos dos programas revisados em relação aos parâmetros
ToM devam-se, pelo menos em parte, à possibilidade de que
o julgamento supervisionado de emoções e sua descrição,
a imitação de emoções avaliadas e o estímulo da mudança de perspectiva em relação à avaliação de uma situação
social, além do simples suporte psicoterapêutico oferecido
pelos programas estudados, fomentem o desenvolvimento de circuitos ToMe, podendo resultar, entre outros fatores
diretamente associados à melhora do contato interpessoal,
em diminuição de incidentes agressivos, conforme mostrado em sujeitos expostos ao SCIT19.
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):51-61.
Tomada de perspectiva em situações sociais
A avaliação do ambiente social pode estar comprometida na
esquizofrenia graças a vieses cognitivos afetando tomadas
de decisão. Por exemplo, esses pacientes tendem a coletar
quantidade insuficiente de informação oriunda do ambiente
social para chegar a uma conclusão (jumping to conclusions),
além de frequentemente acusarem pessoas por eventos negativos – em vez de avaliarem a possibilidade de eles serem
multicausais (apresentam um estilo atribucional peculiar) – e
de apresentarem diminuição da clareza de memórias autobiográficas, nas quais confiam excessivamente (déficits em
processos metamnêmicos)30.
Esses prejuízos afetam o que Matsui et al.8 chamam de
“social knowledge”, um repertório de esquemas cognitivos
sobre como as pessoas deveriam se comportar em determinadas situações sociais. Esses autores demonstraram que a
reabilitação cognitiva melhora domínios constituintes desses esquemas, como o julgamento e o sequenciamento de
eventos sociais. Todavia, o grupo controle de Matsui et al. era
constituído apenas de indivíduos em seguimento medicamentoso, assim recebendo quantidade proporcionalmente
menor de atenção que aqueles expostos ao programa. De
qualquer forma, a maioria dos estudos que continham em
seus programas tarefas relacionadas à avaliação de situações
sociais comparou seus programas com intervenções ativas
de estruturação variável e demonstrou resultados favoráveis2,3,8,9,11-15,19-21.
Imitação
O principal modo de representação mental do ser humano
moderno baseia-se em sua capacidade de simbolização. Todavia, a representação simbólica parece ter sido precedida
por um modo ancestral de representações baseado na imitação31. De fato, existem evidências de uma cultura mimética
(mas não simbólica) no Homo erectus, que já desenvolvia ferramentas e utensílios de complexidade variável. Uma cultura
baseada na elaboração de objetos manufaturados precisa
envolver mecanismos de rememoração motora de etapas
complexas de sua confecção, além de métodos eficientes de
propagação desse conhecimento entre os mais jovens, a fim
de que a cultura seja preservada. Tais métodos basearam-se
na imitação.
No entanto, no Homo sapiens o mimetismo ultrapassa os
limites da manufatura de utensílios e adquire uma dimensão representacional sociocognitiva, na medida em que atos
motores aprendidos por imitação passam a ter um significado semântico, por exemplo, quando levamos a mão ao
rosto para expressar vergonha. Outros aspectos vestigiais da
cultura mimética em humanos modernos envolvem o papel
da imitação no aprendizado e na compreensão de outras
mentes em crianças32 e a função central da representação
mimética na arte, principalmente pantomima e dança31.
REVISÃO DE LITERATURA
Os circuitos cerebrais relacionados à imitação envolvem
o sulco temporal superior (STS), responsável pelo processamento visual de ações de terceiros, a parte rostral do lóbulo
parietal inferior e a parte posterior do giro frontal anterior
e córtex pré-motor ventral adjacente33, que criam uma representação motora da ação observada, a ser reenviada ao
STS. O STS fará um pareamento entre a descrição visual da
ação e de sua representação motora, criando um significado
adicional para a ação observada. Esse significado adicional
relaciona-se diretamente à capacidade de representar internamente as ações observadas e executadas por terceiros (e
não exclusivamente sua decodificação visual) e parece ser
importante tanto no desenvolvimento de representações
mentais sobre os outros quanto em mecanismos de empatia, ambos comprometidos na esquizofrenia e em outros
transtornos mentais34,35.
Mazza et al.6 e Penn e Combs16 demonstraram que o treino imitativo pode melhorar parâmetros cognitivos sociais em
esquizofrênicos e, em consequência, não apenas melhorar o
desempenho interpessoal desses indivíduos, mas aliviar sintomas positivos e negativos do transtorno. O treino imitativo
pareceu apurar a compreensão que os sujeitos experimentais tinham das outras pessoas, principalmente por meio do
desenvolvimento da habilidade de reconhecer emoções em
terceiros. É sabido que a imitação se manifesta precocemente em seres humanos: bebês com 1 a 3 semanas de idade
já são capazes de imitar a protrusão da língua e a abertura
de boca encenados por adultos com quem interagem. Meltzoff36 propõe que, ao imitarem gestos, bebês começam a
modular comparativamente sua produção comportamental
com a de outros humanos, detectando coincidências entre
elas, em um processo denominado pareamento intermodal
ativo (PIA). No PIA, movimentos percebidos e movimentos
executados seriam registrados em um único sistema representacional, um passo inicial para a posterior compreensão
de estados mentais de terceiros, propiciada pela possibilidade de conexão cognitiva entre o mundo visível dos outros
e os estados internos do bebê. Assim se configuraria inicialmente a capacidade humana de compreender outras mentes e também de sincronizar emocionalmente com elas.
CONCLUSÃO
É possível concluir, a partir do estudo dos programas aqui revisados, que intervenções metacognitivas dirigidas a domínios cognitivos sociais podem auxiliar na recuperação clínica
e funcional de esquizofrênicos. Contudo, algumas considerações merecem ser feitas sobre os achados dos trabalhos
revisados.
Um questionamento importante diz respeito à correlação entre melhora clínica e melhora de parâmetros cogni-
Cognição social e reabilitação da esquizofrenia
59
tivos sociais, isto é, qual seria o sentido dessa correlação: a
melhora clínica acarretaria melhoras cognitivas ou a recuperação cognitiva é que estaria por trás da recuperação clínica?
Evidentemente, melhoras clínicas podem suscitar melhoras
cognitivas (neste caso, as alterações cognitivas de um dado
transtorno deveriam ser consideradas estado-dependentes);
no entanto, a observação de que déficits cognitivos sociais
podem ocorrer em indivíduos vulneráveis à esquizofrenia e
em parentes de portadores de esquizofrenia34, bem como
em períodos intercríticos da doença, sugere que esses déficits podem ser traço-dependentes e, portanto, passíveis
inclusive de intervenções preventivas. Pesquisas envolvendo
a aplicação desses programas em indivíduos vulneráveis poderiam auxiliar a responder essas questões.
Outro ponto a ser discutido que diz respeito a um fator considerado importante em relação aos estudos de eficiência de
programas psicoterapêuticos em geral se refere ao argumento
de que a maior atenção dispensada por terapeutas e pesquisadores a pacientes expostos a esses programas pode estar diretamente vinculada às suas melhoras clínicas e cognitivas. Esse
efeito pode ter sido mais evidente nos trabalhos que não comparam seus programas com outras intervenções ativas.
A comparação de programas com foco em CS com outros
não orientados para CS pode ser útil para demonstrar a especificidade das intervenções. A possibilidade de que CS seja um
domínio cognitivo especializado e distinto de outros domínios
cognitivos gerais permanece em aberto, principalmente porque, apesar de processar um tipo particular de informação, o
domínio CS recruta diversos circuitos cognitivos não sociais28.
Muitos programas aqui revisados utilizaram métodos
de reabilitação baseados em capacidades humanas como a
imitação e o reconhecimento e identificação de emoções. A
maior compreensão a respeito da neurofisiologia e da neuropsicologia dessas habilidades e de sua relação com a construção da mente humana moderna poderá ser valiosa para a
elaboração de programas de tratamento e de prevenção de
transtornos mentais como a esquizofrenia.
Futuros estudos deverão se concentrar em responder
alguns questionamentos ainda em aberto a respeito de programas metacognitivos com enfoque em CS para o tratamento da esquizofrenia, incluindo a sua segurança, a durabilidade em médio e longo prazo dos efeitos sobre cognição,
funcionamento social e psicopatologia e as populações de
pacientes que podem obter mais benefícios com a exposição a esses programas.
Contribuições individuais
Hélio Tonelli – Elaboração da revisão, leitura dos manuscritos selecionados e redação do artigo.
Fernanda Liboni – Elaboração da revisão, leitura dos manuscritos selecionados e redação do artigo.
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):51-61.
60
Tonelli HA et al.
REVISÃO DE LITERATURA
Diego Augusto Nesi Cavicchioli – Revisão crítica do manuscrito final.
17. Frommann N, Streit M, Wölwer W. Remediation of facial affect impairments in patients
with schizophrenia: a new training program. Psychiatry Res. 2003;117:281-4.
CONFLITOS DE INTERESSE
19. Combs DR, Adams SD, Penn DL, Roberts D, Tiegreen J, Stem P. Social Cognition and Interaction Training (SCIT) for inpatients with schizophrenia spectrum disorders: preliminary
findings. Schizophr Res. 2007;91:112-6.
Drs. Tonelli, Liboni e Cavicchioli declaram não ter conflitos de
interesses financeiros que possam ter enviesado o presente estudo, pois não receberam nenhum suporte financeiro
governamental ou comercial para sua realização. O financiamento do trabalho envolveu recursos próprios dos autores.
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REVISÃO DE LITERATURA
Cognição social e reabilitação da esquizofrenia
61
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J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):51-61.
REVISÃO DE LITERATURA
O que é comportamento de risco para
transtornos alimentares em adolescentes?
What is adolescents’ eating disorder risk behavior?
Greisse Viero da Silva Leal1, Sonia Tucunduva Philippi2, Viviane Ozores Polacow3, Táki Athanássios Cordás4,
Marle dos Santos Alvarenga1
RESUMO
Palavras-chave
Transtornos da alimentação,
adolescente, risco.
Objetivo: Caracterizar comportamento de risco para transtornos alimentares (TA) e sua frequência entre adolescentes em uma revisão da literatura nacional e internacional. Métodos: Foi realizada uma busca bibliográfica por meio de uma revisão integrativa nas bases
de dados PubMed (US National Library of Medicine) e Lilacs e no portal SciELO, utilizando-se
os descritores relacionados à “eating disorder risk behavior”. Foram selecionados artigos publicados nos últimos 10 anos, nos idiomas português, espanhol e inglês, e especificamente
com adolescentes. Foram avaliados 76 artigos e analisados a nomenclatura e os instrumentos utilizados para avaliar comportamento de risco para TA e sua prevalência. Resultados:
Encontrou-se uma série de termos para avaliar risco para TA. A metodologia mais utilizada foi
a de questionários e escalas, destacando-se o EAT-26 ou 40 e o BITE, dentre os mais frequentes; a prevalência de risco variou de 0,24% a 58,4%. Conclusão: Diferentes nomenclaturas e
instrumentos são utilizados para avaliar comportamento de risco para TA entre adolescentes,
com grande amplitude nos resultados de prevalência. Maior padronização de termos e metodologia de avaliação permitiriam melhor comparação entre estudos epidemiológicos em
diferentes localidades.
ABSTRACT
Keywords
Eating disorders,
adolescent, risk.
Recebido em
28/8/2012
Aprovado em
20/10/2012
Objective: To characterize eating disorder (ED) risk behavior and its prevalence among adolescents in a review of national and international literature. Methods: We carried out an
integrative review on PubMed (U.S. National Library of Medicine), Lilacs and SciELO, using
descriptors related to “eating disorder risk behavior”. Articles published in the last 10 years,
in Portuguese, Spanish and English, and specifically with adolescents were selected. The nomenclature and instruments used to assess eating disorder risk behaviors and its frequency
were evaluated and analyzed in 76 articles. Results: Several terms to assess ED risk behavior
were found; questionnaires and scales were used, mainly EAT-26 or 40 and BITE. The prevalence of risk ranged from 0.24% to 58.4%. Conclusion: Different names and instruments
are used to assess ED risk behavior among adolescents, and there is a wide variation in the
prevalence. Standardization of terms and evaluation methodology might enhance a better
comparison of epidemiological studies in different locations.
1 Universidade de São Paulo (USP), Faculdade de Saúde Pública (FSP); Instituto de Psiquiatria, Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina
da USP (IPq-HC-FMUSP), Ambulatório de Bulimia e Transtornos Alimentares (Ambulim), Programa de Transtornos Alimentares.
2 FSP/USP, Departamento de Nutrição.
3 USP, Escola de Educação Física e Esporte (EEFE); IPq-HC-FMUSP, Ambulatório de Bulimia e Transtornos Alimentares (Ambulim), Programa
de Transtornos Alimentares.
4 FMUSP, Departamento de Psiquiatria; IPq-HC-FMUSP, Ambulim, Programa de Transtornos Alimentares.
Endereço para correspondência: Greisse Viero da Silva Leal
Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo, Departamento de Nutrição
Av. Doutor Arnaldo, 715
01246-904 – São Paulo, SP, Brasil
Email: [email protected]
REVISÃO DE LITERATURA
INTRODUÇÃO
Os transtornos alimentares (TA) têm critérios diagnósticos
baseados em características psicológicas, comportamentais
e fisiológicas1. Caracterizam-se por severas perturbações no
comportamento alimentar e imagem corporal, e seus critérios diagnósticos são estabelecidos pela Organização Mundial de Saúde, no Código Internacional de Doenças (CID-10),
e pela Associação de Psiquiatria Americana, no Manual de
Estatísticas de Doenças Mentais (DSM-IV)2.
Os quadros mais conhecidos são a anorexia nervosa (AN)
e a bulimia nervosa (BN). Quando todos os critérios diagnósticos não são preenchidos para uma dessas síndromes,
utiliza-se o diagnóstico de Transtorno Alimentar Sem Outra
Especificação (TASOE)3 e, dentre eles, destaca-se o transtorno da compulsão alimentar periódica (TCAP).
Transtornos alimentares são mais frequentes entre mulheres adolescentes ou adultas jovens, afetando 3,2% das
mulheres com idade entre 18 e 30 anos, e com uma relação homem:mulher variando de 1:6 a 1:101,4. Estudos sobre
a prevalência de AN entre mulheres na adolescência tardia e
início da idade adulta verificam taxas de 0,5% a 1%, segundo
o DSM-IV. Com relação à BN, pelo menos 90% dos indivíduos
são mulheres, e a sua prevalência entre adolescentes e adultas jovens é de aproximadamente 1% a 3%3,5.
Os TA têm uma etiologia multifatorial (diferentes fatores interagindo para o desenvolvimento e perpetuação da
doen­ça)4. Há, portanto, dificuldade na realização de estudos
de incidência e prevalência, pois são necessárias avaliações e
abordagens que contemplem os vários aspectos envolvidos
em sua gênese e manutenção. Assim, pesquisas sobre comportamento de risco podem dar um indício do problema em
determinado local e população2,6.
Embora os TA tenham definição e critérios diagnósticos
padronizados internacionalmente, não há a mesma preocupação em relação àquilo que se denomina “comportamentos de risco para TA”. Esses são avaliados considerando-se
basicamente a presença dos sintomas clássicos dos quadros:
restrição alimentar (hábito de fazer dietas restritivas ou jejum), compulsão alimentar e práticas purgativas (uso de laxantes, diuréticos e vômitos autoinduzidos)7-10.
Diferentes nomenclaturas podem ser adotadas para avaliar esses mesmos aspectos, por exemplo, comportamento
alimentar anormal11, suspeita de transtornos alimentares12,
risco de transtornos alimentares13, comportamentos de risco
para transtornos alimentares7, sintomas de transtornos alimentares14, atitudes alimentares anormais15, padrões alimentares anormais16. Outra terminologia utilizada é o “comer
transtornado”, definido pela Associação de Psiquiatria Americana e pela Associação Dietética Americana como todo espectro dos problemas alimentares, da “simples dieta” aos TA
clássicos1,4. Nesse conceito podem estar incluídas também
práticas não saudáveis para controle do peso, tais como fazer
Risco para transtornos alimentares
63
jejum ou comer muito pouca comida, pular refeições, usar
de substitutos de alimentos como suplementos ou shakes,
tomar remédios para emagrecer ou fumar mais cigarros17.
Dessa forma, para conhecer o “estado da arte” da presença de TA ou comportamentos de risco numa determinada
população e local, os pesquisadores necessitam usar uma
gama de nomenclaturas possíveis. Considerando-se que os
comportamentos de risco para TA ocorrem anteriormente
aos distúrbios clássicos e que podem levar a prejuízos físicos
e emocionais, isolamento social, insatisfação corporal – além
do risco de evoluir para quadros completos –, justifica-se a
sua identificação precoce9,18,19.
Comportamentos de risco para TA são avaliados habitual­
mente por meio de questionários padronizados, tais como o
Eating Attitudes Test (EAT), Eating Disorder Inventory (EDI), Eating Disorder Examination versão questionário (EDE-Q), Binge
Eating Scale (BES), Bulimia Test (BULIT), Bulimic Investigatory
Test, Edinburgh (BITE), entre outros, que surgiram pela necessidade de sistematizar os métodos de estudos de TA após o
estabelecimento de seus critérios diagnósticos. Alguns desses instrumentos abrangem todos os tipos de TA, enquanto
outros são mais específicos para um ou outro transtorno isoladamente6.
No Brasil, os estudos sobre TA e/ou comportamentos de
risco são ainda, em sua maioria, locais e pontuais2,7,10,14,20-25,
sem uma padronização de nomenclatura e metodologia de
avaliação. Nesse contexto, o objetivo deste estudo foi caracterizar o comportamento de risco para transtornos alimentares, incluindo os instrumentos utilizados para identificação,
a nomenclatura adotada e sua prevalência ou frequência
entre adolescentes em uma revisão integrativa da literatura
nacional e internacional.
MÉTODOS
Foi realizada uma busca bibliográfica por meio de revisão integrativa26 nas bases de dados PubMed (US National Library
of Medicine) e Lilacs (Literatura Latino-Americana e do Caribe
em Ciências da Saúde) e no portal SciELO (The Scientific Electronic Library Online), utilizando-se os descritores agrupados
de diferentes formas, conforme sentenças descritas no quadro 1. Como as expressões “comportamento de risco para
transtornos alimentares” ou “eating disorder risk behavior” não
se caracterizavam como descritores em Ciências da Saúde e,
portanto, se mostraram insuficientes para localização de trabalhos, uma série de descritores possivelmente relacionados
ao tema foi utilizada, incluindo o nome de alguns instrumentos padronizados e de alguns autores de referência.
Quadro 1
Os critérios adotados para inclusão dos artigos no estudo
foram: a amostra deveria incluir apenas adolescentes (10J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):62-75.
REVISÃO DE LITERATURA
Leal GVS et al.
64
19 anos); os estudos deveriam ser originais – transversais e/
ou longitudinais; deveriam avaliar a presença de comportamentos de risco para transtornos alimentares, tais como
compulsão alimentar, uso de laxantes e/ou diuréticos, vômito autoinduzido, prática de dieta restritiva, além de práticas
não saudáveis para controle do peso (independentemente
da nomenclatura utilizada); e apresentar a frequência ou a
prevalência desses comportamentos.
Quadro 1 – Estratégias de busca utilizadas em cada base de dados
a partir das palavras-chave
Conjuntos
PubMed
Número
de artigos
encontrados
Número
de artigos
selecionados
1
Eating disorders AND adolescent
AND risk
142
27
2
Disordered eating AND adolescent
AND risk
58
6
3
EAT-26 AND adolescent AND risk
17
2
4
BITE AND adolescent AND risk
2
2
5
EDI AND adolescent AND risk
12
0
6
EDE AND adolescent AND risk
4
0
7
Hay, Phillipa J (author) AND adolescent
(title/abstract) AND eating disorders
(title/abstract) OR disordered eating
(title/abstract)
462
19
8
Hay P AND prevalence of eating
behaviors
7
0
9
Hay P (author)
54
0
SciELO
Número
de artigos
encontrados
Número
de artigos
selecionados
1
Transtornos alimentares AND
adolescentes
8
4
2
EAT AND adolescente
7
1
3
BITE AND adolescente
5
1
Lilacs
Número
de artigos
encontrados
Número
de artigos
selecionados
1
Transtornos da alimentação AND
adolescente AND risco
34
9
2
EAT-26 AND adolescente AND risco
23
2
3
BITE AND transtornos alimentares
8
2
4
EDI AND transtornos alimentares
11
0
5
EDE AND transtornos alimentares
1
1
Google acadêmico
Número
de artigos
encontrados
Número
de artigos
selecionados
141
0
Conjuntos
Conjuntos
Conjuntos
1
“Phillipa Hay” eating disorders
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):62-75.
Como critérios de exclusão de artigos foram utilizados:
artigos de revisão; pesquisas focadas em grupos específicos
(como portadores de diabetes mellitus, atletas e bailarinos);
artigos com indivíduos com AN e BN já diagnosticados; pesquisas focalizadas na associação de fatores de risco para TA
(influência da mídia, família, amigos etc.), ou comportamento
alimentar, ou prevenção e tratamento de TA; e artigos com
foco em outras psicopatologias, fatores genéticos, compulsão por bebidas, orientação sexual, insatisfação corporal, síndrome do comer noturno, uso de substâncias, abuso sexual,
body checking, complicações clínicas, saúde oral, refeições
em família e teasing – e que não apresentavam a frequência
ou a prevalência de comportamento de risco para TA.
RESULTADOS
Foram identificadas 996 publicações de acordo com as estratégias de busca definidas. No caso da base de dados PubMed, pela extensão dos resultados, foram adotados limites:
artigos publicados nos últimos 10 anos; idiomas português,
espanhol e inglês; faixa etária da adolescência; e palavras-chave no título ou resumo.
Após avaliação dos títulos e resumos, utilizando-se os critérios de inclusão e exclusão, 190 artigos foram considerados
potencialmente elegíveis para inclusão nesta revisão. Após a
leitura dos artigos, 74 foram excluídos por terem sido realizados com grupos específicos ou com indivíduos adultos e por
se tratar de revisões, 36 eram repetidos e 2 não estavam disponíveis, sendo incluídos na presente revisão 76 artigos (Figura 1).
Dos artigos selecionados, que avaliaram especificamente
comportamento de risco para TA em adolescentes, foram
destacados a autoria, o ano de publicação, a população de
estudo, o país de origem, a nomenclatura utilizada e o instrumento utilizado para avaliar comportamento de risco para
TA e sua frequência ou prevalência. Podem ser observados
nas tabelas 1, 2, 3 e 4 os trabalhos encontrados no Brasil;
América Latina; Estados Unidos e Canadá; Europa, Ásia, África
e Austrália, respectivamente.
Artigos encontrados
(n = 996)
Excluídos
(n = 806)
Títulos e resumos retidos (n = 190)
PubMed (151); Lilacs (32); SciELO (7)
Segundo exame
(excluídos) (n = 74)
Repetidos
(n = 36)
Artigos não
disponíveis (n = 2)
Artigos incluídos na
revisão (n = 76)
Figura 1. Etapas de seleção dos artigos incluídos na revisão
integrativa.
REVISÃO DE LITERATURA
Risco para transtornos alimentares
65
Tabela 1 – Estudos brasileiros realizados sobre comportamentos de risco para transtornos alimentares entre adolescentes
Autor/Ano
População de estudo
Idade (anos)
Estado/País
Questionário
Nomenclatura utilizada
Prevalência/Frequência*
1.148 meninas
10-19
Florianópolis, Brasil
Eating Attitudes Test (EAT-26)
Sintomas de anorexia
nervosa
15,6%
Dunker et al., 200921
183 meninas
15-18
São Paulo, Brasil
Eating Attitudes Test (EAT-26)
Comportamento de
risco para TA
Escola particular
34,3%*
Escola pública 28,4%*
Ferreira e Veiga, 20087
561
12-19
Rio de Janeiro, Brasil
Questionário adaptado de Hay (1998)40:
questões sobre compulsão, dieta
restritiva, uso de laxante, diurético ou
vômito autoinduzido
Comportamento de
risco para TA (eating
disorder risk behavior)
Compulsão: 37,3%
Dieta restritiva: 24,7%
Laxante: 2,1%
Diurético: 1,6%
Vômito autoinduzido:
1,4%
Gomes et al., 201014
300 meninas
10-15
Paraná, Brasil
Bulimic Investigatory Test Edinburgh
(BITE)
Eating Attitudes Test (EAT-26)
Sintomas de TA
BITE: 4,2%*
Sampei et al., 200923
544 meninas
10-17
São Paulo, Brasil
Eating Attitudes Test (EAT-26)
Atitudes alimentares
(eating attitudes)
Japonesas
Pré-menarca: 4,9%*
Pós-menarca: 12,7%*
Caucasianas
Pré-menarca: 26,7%*
Pós-menarca: 19,4%*
Souza-Kaneshima,
200824
187
15-19
Paraná, Brasil
Bulimic Investigatory Test Edinburgh
(BITE)
Comportamentos
favoráveis ao
desenvolvimento da
bulimia nervosa
Comportamento
alimentar compulsivo:
3,74%*
Comportamento
alimentar não usual:
39,04%*
Vale et al., 201125
652 meninas
14-20
Fortaleza, Brasil
Bulimic Investigatory Test Edinburgh
(BITE)
Comportamentos
de risco para TA (risk
behaviors for eating
disorders)
25,2%
Vilela et al., 200410
1.807
7-19
Minas Gerais, Brasil
Bulimic Investigatory Test Edinburgh
(BITE)
Eating Attitudes Test (EAT-26)
Possíveis TA e
comportamento
alimentar inapropriados
(possible eating
disorders and
inappropriate eating
behaviors)
BITE: 1,1%*
Alves et al., 2008
20
EAT-26: 3,6%*
EAT-26: 13,3%*
Tabela 2 – Descrição de estudos realizados na América Latina sobre comportamentos de risco para transtornos alimentares em
adolescentes
Autor/Ano
População de estudo
Idade (anos)
Estado/País
Metodologia
Nomenclatura utilizada
Prevalência/Frequência*
Barriguete-Meléndez et
al., 200911
25.166
10-19
México
Perguntas próprias: The
Brief Questionnaire for
Risky Eating Behaviors
(10 itens que avaliam
comportamento
alimentar e medo
de ganhar peso nos
últimos 3 meses)
Comportamento
alimentar anormal
(abnormal eating
behaviors)
0,8%
Bay et al., 200512
1.971
10-19
Argentina
Eating Disorder
Examination
Questionnaire (EDE-Q)
Suspeita de TA
19,2%
Behar et al., 200727
296
Alunos do ensino médio
Vina del Mar, Chile
Eating Attitudes Test
(EAT-40)
Risco de TA
12%*
Correa et al., 200628
1.050
11-19
Santiago, Chile
Eating Disorder
Inventory (EDI-2)
Risco de TA
8,3%*
González e Viveros,
200929
298
13-14
Veracruz, México
Eating Attitudes Test
(EAT-40)
Risco de TA
8%*
continuação
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):62-75.
66
REVISÃO DE LITERATURA
Leal GVS et al.
Autor/Ano
Granillo et al., 2005
30
Mancilla-Díaz et al.,
200931
População de estudo
Idade (anos)
Estado/País
Metodologia
Nomenclatura utilizada
Prevalência/Frequência*
1.866 meninas
11-20
México, Cuba e Porto
Rico
IMC < 17 kg/m ,
amenorreia (há mais
de 2 meses), restrição
dietética e sintomas
bulímicos (compulsão,
exercício excessivo,
vômito auto- induzido,
uso de remédios para
emagrecer e uso de
laxantes)
Risco para TA (risk for
eating disorders)
IMC < 17 kg/m2: 2,5%
Amenorreia: 5,5%
Restrição alimentar:
53,3%
Sintomas bulímicos:
1,9%
615
13-16
México
Eating Attitudes Test
(EAT-40)
Bulimia Test (BULIT)
Comportamentos
alimentares
transtornados
(disordered eating
behaviours)
EAT-40: 12,7%
2
BULIT: 9,7%
Palma-Coca et al.,
201132
25.056
10-19
México
The Brief Questionnaire
for Disordered Eating
Behaviors
(CBCAR)
Comportamento
alimentar transtornado
(disordered eating
behaviour)
4%
Power et al., 200833
723 meninas
12-19
Quito, Equador
Eating Attitudes Test
(EAT-26)
Eating Attitudes Test
(EAT-40)
Atitudes alimentares
anormais (abnormal
eating attitudes)
EAT-40: 13%*
EAT-26: 14,4%*
Toro et al., 200634
467 meninas
espanholas
329 meninas
mexicanas
11-18
Espanha e
México
Eating Attitudes Test
(EAT-26)
The Eating Disorders
Assessment
Questionnaire (CETCA)
Risco para TA (risk of
eating disorders)
24,6% espanholas*
22,5% mexicanas*
Tabela 3 – Descrição de estudos realizados nos Estados Unidos e no Canadá sobre comportamentos de risco para transtornos alimentares
em adolescentes
Autor/Ano
População de
estudo
Idade (anos)
Estado/País
Metodologia
Nomenclatura utilizada
Prevalência/frequência*
Austin et al.,
200835
5.567
15,9 (média)
EUA
Eating Attitude Test (EAT-26)
Comer transtornado
(disordered eating)
14,5% meninas
3,6% meninos
Cook et al.,
200736
1.133
15-19
Canadá
Centers for
Disease Control and Prevention’s Youth Risk
Factor
Surveillance Instrument
Comportamento
alimentar transtornado
(disordered eating
behaviour)
Geral: 16%*
Grupo que se achava maior:
Jejum: 15%*
Remédios para emagrecer: 5,6%*
Vômito autoinduzido: 7,5%*
D’Souza et al.,
200537
1.027
14-19
EUA
Eating Attitude Test (EAT-26)
Sintomas de TA
(eating disorder
symptoms)
22% meninas*
2% meninos*
Doyle et al.,
200738
81
12-17
San Diego e
St. Louis, EUA
Eating Disorder Examination –
Questionnaire
(EDE-Q)
Risco para TA
(risk for eatings
disorders)
Purgação: 1,2%*
Uso de remédios para emagrecer: 3,7%*
Exercício físico excessivo: 33,3%*
Compulsão: 29,6%*
Haines et al.,
201039
6.022
meninas
e 4.518
meninos
11-17
EUA
Perguntas próprias sobre métodos
purgativos, compulsão alimentar e prática
de dietas restritivas
Comer transtornado
(disordered eating)
1998
Purgação
Meninas: 3,7%
Meninos: 0,7%
Compulsão
Meninas: 7,1%
Meninos: 2,0%
Follow-up (1999-2001)
Purgação
Meninas: 7,8%
Compulsão
Meninas: 11,8%
Meninos: 4,5%
Haines et al.,
201113
5.740
16 (média)
EUA
Eating Attitudes Test (EAT-26)
Risco de TA (risk of
eating disorders)
Meninas: 14,4%
Meninos: 3,8%
continuação
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):62-75.
REVISÃO DE LITERATURA
Risco para transtornos alimentares
Autor/Ano
População de
estudo
Idade (anos)
Estado/País
Metodologia
Nomenclatura utilizada
Prevalência/frequência*
Haley et al.,
2010 40
16.289
Série escolar:
8ª e 11ª
Oregon
Counties,
EUA
Questões próprias: comportamento não
saudável para perda de peso, para manter
ou evitar ganho de peso: jejum, vomitar,
usar laxantes, tomar remédios para
emagrecer sem consentimento médico
Práticas não saudáveis
para perda de peso
(unhealthy weight loss
practices –UWLP)
11,6%
Jonat e
Birmingham,
2004 41
396
12-19
Canadá
Eating Attitudes Test (EAT-26)
Comer transtornado
(disordered eating)
Meninas: 17,3%*
Meninos: 8,3%*
McVey et al.,
2004 42
2.279
meninas
10-14
Ontario,
Canadá
Children’s Eating Attitudes Test (ChEAT)
Atitudes alimentares
negativas (negative
eating attitudes)
10,5%
NeumarkSztainer et al.,
2006 43
2.516
12-20
Minneapolis/
St. Paul, EUA
Questões próprias sobre frequência de
dieta no último ano e outros métodos
para perder ou manter peso no último ano
(dieta, jejum, remédios para emagrecer,
vômito autoinduzido, uso de laxantes)
Comer transtornado
(disordered eating)
Dieta restritiva:
Meninas: 57%
Meninos: 25,3%
Práticas não saudáveis para controle do
peso:
Meninas: 57,8%
Meninos: 31,3%
NeumarkSztainer et al.,
200944
412
adolescentes
com
sobrepeso
(follow-up)
12-20
Minneapolis/
St. Paul, EUA
Questões próprias sobre compulsão
alimentar, métodos extremos para controle
do peso (remédios para emagrecer, vômito
autoinduzido, uso de laxantes e diuréticos)
e práticas não saudáveis para controle do
peso (jejum, comer muito pouca comida,
usar substitutos de alimentos e pular
refeições)
Comer transtornado
(disordered eating)
(1998-1999): 30,8%
(2003-2004): 40,1%
Pinhas et al.,
2008 45
868
13-20
Toronto,
Canadá
Eating Attitudes Test (EAT-26)
Comer transtornado
(disordered eating)
Judias: 25%
Não judias: 18%
Pisetsky et al.,
2008 46
13.917
Série escolar:
9ª-12ª
EUA
Questão própria: resposta positiva para
comportamentos para controlar o peso
(jejuar, tomar remédio para emagrecer,
vomitar e usar laxante)
Comer transtornado
(disordered eating)
Meninas: 21,8%
Meninos: 11,2%
The McKnight
Investigators,
200347
1.103
meninas
Série escolar:
6ª-9ª
Califórnia,
EUA
McKnight Eating Disorder Examination for
adolescents (com base no DSM-IV para
classificar TA clínicos ou subclínicos)
Fatores de risco para TA
(risk factors for eating
disorder)
Transtorno alimentar parcial ou completo:
2,9%*
Waasdorp et
al., 200748
340
12-21
EUA
Eating attitude test (EAT-26)
Comer transtornado
(disordered eating)
8%*
67
Tabela 4 – Descrição de estudos realizados em países da Europa, Ásia, África e Austrália sobre comportamentos de risco para transtornos
alimentares em adolescentes
Autor/Ano
População de
estudo
Idade (anos)
País
Metodologia
Nomenclatura utilizada
Prevalência/Frequência*
Alonso et al.,
200549
2.483
12-18
Espanha
Eating Attitudes Test (EAT-40)
Risco de desenvolver TA (risk of developing eating
disorders)
Meninas: 12,3%
Meninos: 3,2%
Ballester et al.,
200250
1.025
14-19
Girona,
Espanha
Eating attitude test (EAT-40)
Risco potencial de transtornos do comportamento
alimentar
(potential risk of TCA)
Meninas: 16,3%
Meninos: 0,4%
Beato-Fernández
et al., 200451
1.076
13-15
Espanha
Eating Attitudes Test (EAT-40)
Bulimic Investigatory Test
Edinburgh (BITE)
Comportamento alimentar anormal (abnormal
eating behavior)
3,7%*
Díaz-Benavente
et al., 200352
789
12 a 15
Sevília,
Espanha
Eating Attitude Test (EAT-40)
Risco de TA
(risk of eating disorders)
8,8%*
Boschi et al.,
200353
156 meninas
14-18
Itália
Eating Disorder Inventory 2 (EDI-2)
Transtorno alimentar não especificado – TANE
(eating disorders with particular attention to the
partial syndromes – EDNOS)
BN: 1,28%*
TCAP: 1,28%*
TANE: 10,25%*
Calado et al.,
201054
1.115
14-16
Espanha
Eating Attitude Test (EAT-26)
Padrões alimentares transtornados (disordered
eating patterns)
10,2%
Costarelli et al.,
201155
202
15-18
Grécia
Eating Attitude Test (EAT-26)
Atitudes alimentares transtornadas (disordered
eating attitudes)
18,3%*
continuação
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):62-75.
68
REVISÃO DE LITERATURA
Leal GVS et al.
Autor/Ano
População de
estudo
Idade (anos)
País
Metodologia
Nomenclatura utilizada
Prevalência/Frequência*
Cotrufo et al.,
200756
2.925
11-13
Itália
Eating Disorder Inventory-2 (EDI-2)
Atitude alimentar transtornada e comportamento
alimentar anormal (eating disorder attitude and
abnormal eating behaviours)
14%*
Domine et al.,
200957
3.890 meninos
16-20
Suíça
Questões próprias indicadoras
de DEB – disordered eating
behaviors: medo de ganhar peso,
insatisfação corporal após comer
muito, pensar sobre comida,
gostar da sensação de estômago
vazio, comer muito com perda de
controle e vômito autoinduzido
Comportamento alimentar transtornado (disordered
eating behaviors)
Preocupação com o peso
ou comportamento
alimentar não saudável:
50%
Eapen et al.,
200658
495 meninas
13-18
Emirados
Árabes
Unidos
Eating Attitudes Test (EAT-40)
Atitudes alimentares transtornadas (disordered
eating attitudes)
23,4%*
Fichter et al.,
200559
N = 2631
(1.980)
N = 2920
(1.998)
13-19
Grécia e
Alemanha
Anorexia Nervosa Inventory for
Self-Rating (ANIS)
Distúrbios alimentares (eating disturbances)
Anorexia nervosa
Meninas
Munique: 0%*
Veria: 0,59%*
Bulimia nervosa
Munique: 1,89%*
Veria: 1,18%*
Gandarillas et al.,
2004 60
4.334
15-18
Espanha
Critérios do DSM-IV e Eating
Disorder Inventory (EDI)
Risco para TA (risk for eating disorders)
Meninas: 15,3%
Meninos: 2,2%
Goñi
Grandmontagne
e Rodríguez
Fernández,
2004 61
740
12-16
Burgos,
Espanha
Eating Disorders Inventory (EDI)
Transtornos do comportamento alimentar
(eating behavior disorders)
21,2%*
González-Juárez
et al., 200762
2.195
12-18
Espanha
Eating Attitudes Test (EAT-26)
Em risco de apresentar TA (en riesgo de presentar
trastornos de la alimentación)
8,8%
Grange et al.,
2004 63
813
16,8
(média)
África do Sul
Eating Attitudes Test (EAT-26)
Comer transtornado (disordered eating)
38,3%*
Hautala et al.,
200864
372
15-17
Finlândia
Sick, Control,
One, Fat, Food (SCOFF)
questionnaire
Sintomas de TA
(eating disorders symptoms)
12%*
Hautala et al.,
200865
1.036
14-15
Finlândia
Sick, Control,
One, Fat, Food (SCOFF)
questionnaire
Comer transtornado (disordered eating)
Meninas: 24% *
Meninos: 16% *
HerpertzDahlmann et al.,
200866
1.895
11-17
Alemanha
Sick, Control,
One, Fat, Food (SCOFF)
questionnaire
Comportamentos e atitudes alimentares
transtornados (disordered eating behaviour and
attitudes)
Meninas: 29,4%
Meninos: 14,4%
Isomaa et al.,
201067
128
15
Finlândia
Rating of Anorexia and BulimiaTeenager version (RAB-T)
Risco de TA
(risk of eating disorders)
Meninas: 14,4%*
Meninos: 0,6% *
Kaluski et al.,
200868
2.978 meninas
11-19
Israel
Questionário adaptado do Sick,
Control,
One, Fat, Food (SCOFF)
questionnaire
Comer transtornado (disordered eating)
30%
Knez et al.,
2006 69
480
10-16
Croácia
Children’s Eating Attitude Test
(ChEAT-26)
Comportamentos e atitudes alimentares
transtornados (disturbed eating attitudes and
behaviors)
Comportamento
alimentar
moderadamente
transtornado: 31%*
Comportamento
alimentar severamente
transtornado: 7,5%*
Lal e Abraham,
201170
461 meninas
12-17
Delhi, India
Quality of Life for Eating Disorders
questionnaire (QOLED)
Comportamento alimentar – Eating behavior (EB)
Transtorno Alimentar – Eating disorder (ED)
EB: 1,2%*
Latzer e
Tzischinsky,
200371
1.316 meninas
12-18
Israel
Eating Disorder Inventory-2 (EDI-2)
com 11 subescalas
Comportamentos e atitudes alimentares
transtornados (disordered eating behaviors and
attitudes)
Adolescentes mais
velhas obtiveram escores
maiores no EDI-2
ED: 1,1%*
continuação
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):62-75.
REVISÃO DE LITERATURA
Risco para transtornos alimentares
Autor/Ano
População de
estudo
Idade (anos)
País
Metodologia
Nomenclatura utilizada
Prevalência/Frequência*
Latzer e
Tzischinsky, 200572
1.270 meninas
12-18
Israel
Eating Attitude Test (EAT-26)
Atitudes alimentares anormais
(abnormal eating attitudes)
19,5%
Latzer et al.,
200773
1.131 meninas
12-18
Israel
Eating Disorder Inventory-2 (EDI-2)
Comer transtornado (disordered eating)
13%
Lobera et al.,
200974
841
12-19
Espanha
Eating Attitudes Test (EAT-40)
Comportamento alimentar de risco (conductas
alimentarias de riesgo)
Pontuação de risco:
SCOFF: 21,29%*
EAT-40: 7,13%*
Sick Control On Fat Food (SCOFF)
López-Guimera
et al., 200875
323 meninas
13,11
(média)
Catalonia,
Espanha
Eating Attitude Test (EAT-26)
Atitudes alimentares transtornadas (disordered
eating attitudes)
14%* faziam dieta
e destas, 70%*
apresentavam
atitudes alimentares
desordenadas
Maor et al.,
200615
283
Série
escolar:
7ª-12ª
Israel
Eating Attitudes Test (EAT-26)
Atitudes alimentares anormais
(abnormal eating attitudes)
20,8%*
Marlowe, 200576
836
10-15
Bermuda,
Reino Unido
Bulimic Investigatory Test
Edinburgh (BITE)
Eating Attitudes Test (EAT-40)
Atitudes alimentares anormais
(abnormal eating atitudes)
BITE: 0,24%*
69
EAT: 7,3%*
Mateos-Padorno
et al., 201077
1.364
12-17
Island of
Gran Canaria
Eating attitude test (EAT-40)
Risco de TA
(risk of eating disorders)
13,4%*
Miotto et al.,
200278
847
15-19
Itália
Eating Attitudes Test (EAT-40)
Bulimic Investigatory Test
Edinburgh (BITE)
Risco de TA
(risk of eating disorders)
Padrões alimentares anormais
(abnormal eating patterns)
BITE:
Meninas: 4,1%
Meninos: 0,3%
EAT:
Meninas: 15,8%
Meninos: 2,8%
Miotto et al.,
200316
930
15-19
Itália
Eating Attitudes Test (EAT-40)
Bulimic Investigatory Test
Edinburgh (BITE)
Padrões alimentares anormais
(abnormal eating patterns)
EAT
Meninas: 15%
Meninos: 2,7%
BITE
Meninas: 4,2%
Meninos: 0,3%
Miotto et al.,
200379
847
15-19
Itália
Eating Attitudes Test (EAT-40)
Bulimic Investigatory Test
Edinburgh (BITE)
Risco de TA
(risk of eating disorders)
Padrões alimentares anormais
(abnormal eating patterns)
EAT
Meninas: 15,8%
Meninos: 2,8%
BITE
Meninas: 4,1%
Meninos: 0,3%
Muro-Sans e
Amador-Campos,
200780
1.155
10-17
Espanha
Eating Disorder Inventory-2
(EDI-2) e uma entrevista clínica
estruturada (EDE-12)
Transtornos alimentares (eating disorders)
EDI-2: 8%
EDI-2 + EDE-12: 1,28%
(2,31% das meninas e
0,17% dos meninos)
Murrin et al.,
200781
2.469
10-17
Irlanda
IMC e percepção do tamanho
corporal .
Risco para TA: adolescentes com
baixo peso (IMC < 18,5 kg/m2)
e que pensavam estar muito
gordos.
Risco para TA
(risk of eating disorders)
10,7%
O’Dea, 200982
470
11-14
Australia
Eating Disorders Inventory (EDI)
Risco de TA
(eating disorders risk)
15,1%* em alto risco
Pamies-Aubalat
et al., 201183
2.142
12-16
Alicante,
Espanha
Eating Attitude Test (EAT-40)
Comportamento de risco para desenvolver TA (risk
behaviours of developing an ED)
11,2%
Preti et al.,
2006 84
828
15-19
Itália
Eating Attitudes Test (EAT-40)
Bulimic Investigatory Test
Edinburgh (BITE)
Comer transtornado (disordered eating)
Meninas: 12,7%
Meninos: 2,8%
Soo et al., 2008 85
489 meninas
15-17
Malásia
Restrained Eating scale of the
Dutch Eating Behaoiour
Questionnaire (RESDEBQ)
Binge Scale Questionnaire (BSQ)
Comportamento alimentar
(eating behaviour)
Dieta restritiva: 36%
Compulsão alimentar:
35,4%
continuação
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):62-75.
70
REVISÃO DE LITERATURA
Leal GVS et al.
Autor/Ano
População de
estudo
Idade (anos)
País
Metodologia
Nomenclatura utilizada
Prevalência/Frequência*
Tam et al., 200786
2.382
10-21
Hong Kong
Eating attitude test (EAT-26)
Comer transtornado (disordered eating)
Meninas: 6,5%
Meninos: 3,9%
Toselli et al.,
200587
2.146
14-19
Itália
Inventory for the Screening of
Eating Disorders (ISED)
Comportamento alimentar transtornado (disordered
eating behaviours)
Dieta restritiva
Meninas: 58,4%
Meninos: 27,6%
Atividade física
Meninas: 44,9%
Meninos: 27,8%
Vômito autoinduzido
Meninas: 6,3%
Meninos: 2,3%
Laxantes
Meninas: 2,7%
Meninos: 2%
Veses et al.,
201188
195
13-18
Espanha
SCOFF questionnaire
Risco de TA
(risk of eating disorders)
Meninas: 24,7% *
Meninos: 17,3% *
Yanez et al.,
200789
969 meninas
12-16
Barcelona,
Espanha
Eating Attitude Test (EAT-26)
Atitudes alimentares anormais
(abnormal eating attitudes)
10,1%
Foram encontrados nos artigos localizados 27 diferentes
termos ou conjunto de termos para caracterizar “comportamentos de risco para TA”, variando entre comportamentos,
atitudes, padrões, práticas, sintomas e risco de transtornos
alimentares.
A nomenclatura mais frequente foi “risco de transtornos
alimentares” (“risk of eating disorders”), utilizado em 16 estudos (21,0%), seguido de “comer transtornado” (“disordered
eating”), utilizado em 14 estudos (18,4%). No contexto do
Brasil, “comportamento de risco para transtorno alimentar”
(“eating disorder risk behavior”) foi utilizado em 3 (37,5%) dos
8 estudos nacionais, sendo as outras maneiras de nomear
comportamento de risco para TA utilizadas muito variadas.
Outros nomes também foram frequentes – “comportamento alimentar transtornado” (“disordered eating behaviors”) e “atitudes alimentares transtornadas” (“disoredered
eating attitudes”) foram utilizados em 7 (9,2%) estudos cada.
Os termos “atitudes alimentares anormais” (“abnormal eating
attitudes”) e “comportamentos alimentares anormais” (“abnormal eating behaviors”) foram utilizados em 5 (6,6%) e 3
(3,9%) estudos, respectivamente, além dos termos “padrões
alimentares anormais” (“abnormal eating patterns”) e “sintomas de transtornos alimentares” (“eating disorders symptoms”), que foram utilizados em 3 (3,9%) estudos cada.
Observa-se, em todas as tabelas, que os pesquisadores
utilizaram basicamente questionários validados ou desenvolvidos especificamente para a pesquisa como instrumentos para avaliar comportamento de risco para TA. Verificou-se que 65 (85,5%) trabalhos avaliaram comportamento de
risco para TA utilizando questionários padronizados e, em
alguns casos, mais de um tipo de questionário foi utilizado
no mesmo trabalho.
Dentre os que usaram questionários, 39 (51,3%) utilizaram EAT (versão 26 ou 40), 10 (13,1%) utilizaram o BITE, 9
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):62-75.
(11,8%) utilizaram EDI, 6 (7,9%) utilizaram o Sick, Control, One,
Fat, Food (SCOFF) questionnaire, 3 (3,9%) utilizaram EDE-Q e 2
(2,6%) utilizaram o Children’s Eating Attitudes Test (ChEAT). Os
outros questionários foram utilizados em apenas um estudo cada (1,3%), sendo eles: BULIT, Anorexia Nervosa Inventory
for Self-Rating (ANIS), Rating of Anorexia and Bulimia-Teenager
version (RAB-T), The Eating Disorders Assessment Questionnaire
(CETCA), Inventory for the Screening of Eating Disorders (ISED),
The Brief Questionnaire for Disordered Eating Behaviors (CBCAR), Quality of Life for Eating Disorders questionnaire (QOLED),
Restrained Eating scale of the Dutch Eating Behavior Questionnaire (RESDEBQ) e Binge Scale Questionnaire (BSQ).
Além disso, 12 (15,8%) trabalhos fizeram uso de questões
desenvolvidas pelos autores do estudo, que envolviam perguntas diretas sobre medo de ganhar peso e métodos para
perder peso como vômito autoinduzido, uso de laxantes,
diuréticos ou remédios para emagrecer; fazer jejum, comer
pouca comida, usar substitutos alimentares, pular refeições,
fumar mais cigarros e fazer dieta restritiva.
Entre os estudos nacionais, observou-se o predomínio
dos questionários padronizados EAT-26 e BITE, e o primeiro
foi utilizado por 5 estudos (62,5%) e o segundo, por 4 (50%),
ambos tendo sido utilizados em conjunto em 2 trabalhos.
Apenas um estudo nacional não utilizou questionário padronizado, optando por questões desenvolvidas e adaptadas
por Hay (1998)8 sobre compulsão, dieta restritiva, uso de laxante, diurético ou vômito autoinduzido.
A prevalência/frequência de comportamentos de risco
para TA variou de 1,1%10 a 39,04%24 nos estudos nacionais
(Tabela 1); de 0,8%11 a 53,3%30 na América Latina (Tabela 2);
de 2%37 a 57,8%43 nos estudos realizados nos Estados Unidos e no Canadá (Tabela 3); e nos estudos realizados na Europa, Ásia, África e Austrália (Tabela 4) a prevalência variou
de 0,24%76 a 58,4%87.
REVISÃO DE LITERATURA
Observando-se a prevalência/frequência de comportamentos de risco segundo o tipo de questionário utilizado,
verifica-se variação de 2%37 a 38,3%63 segundo o EAT-26; de
0,4%50 a 23,4%58 segundo o EAT-40; de 1,9%30 a 57%43 utilizando-se perguntas próprias para avaliar comportamentos
de risco para TA; de 0,24%76 a 39,04%24 segundo o BITE; de
2,2%60 a 21,2%61 segundo o EDI; e de 12%64 a 30%68 segundo
o SCOFF.
DISCUSSÃO
A presente revisão objetivou caracterizar o que é denominado “comportamento de risco” para TA entre adolescentes
por diferentes autores e encontrou que uma variedade de
nomes e instrumentos são utilizados nos estudos originais
sobre o tema.
Os principais termos usados para caracterizar a presença
de comportamentos de risco para TA foram “risco de transtornos alimentares”13,27-30,34,38,52,60,67,77-79,81,82,88 e “comer transtornado”35,39,41,43-46,48,63,65,68,73,84,86. Mesmo assim, mais de 60% dos
estudos utilizaram outras diversas nomenclaturas e, no contexto do Brasil, observa-se que também não há padronização dos termos. Dessa forma, um pesquisador que objetiva
conhecer e comparar dados sobre essa temática encontra
dificuldade na seleção dos trabalhos e na compreensão daquilo que os autores se propuseram a avaliar.
Destaca-se, ainda, que os instrumentos utilizados para
avaliar a frequência ou prevalência de “risco de TA” e de “comer transtornado” variaram entre diferentes questionários,
de padronizados a questões desenvolvidas especificamente
para o estudo, havendo, portanto, distinção nos instrumentos de avaliação.
O EAT (tanto na versão 26 ou 40 questões) foi o principal
instrumento utilizado para avaliar comportamento de risco
para TA entre os estudos selecionados. Esse é possivelmente
o instrumento de autopreenchimento mais utilizado na área
dos TA para estudos de rastreamento e avaliações em populações clínicas, em várias línguas e culturas, dada a sua facilidade de aplicação, eficiência, economia e não necessidade
de treinamento para administração6,90.
No entanto, esse instrumento foi desenvolvido inicialmente como um teste para diagnóstico de anorexia nervosa
e, como não se adequou para o diagnóstico do distúrbio,
passou a ser utilizado para detectar casos clínicos em população de alto risco e identificar indivíduos com preocupações anormais com alimentação e peso. Ele avalia sintomas
de restrição alimentar e identifica comportamentos de dieta,
os quais podem ou não estar associados a sintomas mais específicos de TA.
Como o EAT é uma escala que foi desenvolvida há
muito tempo, alguns cuidados com a interpretação dos
resultados tornam-se necessários. Deve-se questionar, por
Risco para transtornos alimentares
71
exemplo, se a resposta positiva à questão “eu como alimentos dietéticos” é, nos dias atuais, uma medida de comer
transtornado; da mesma forma, para se responder que se
conhece o valor calórico dos alimentos, em uma época
de obrigatoriedade de rótulos alimentares91. Além dessas
considerações, podem existir questões de tradução e diferenças de interpretações culturais2. No Brasil, uma primeira
tradução do teste foi disponibilizada em 199492 e uma validação com adolescentes do sexo feminino foi publicada
em 200493. A versão de Bighetti et al.93 encontrou alpha de
Cronbach de 0,82 e a de Nunes et al.22 foi reavaliada em
2005 e teve consistência interna (alpha de Cronbach) de
0,75; essa reavaliação também mostrou baixos coeficientes
de validade para o instrumento aplicado em um contexto
do Brasil, concluindo que existem dúvidas sobre a capacidade do teste de identificar comportamentos alimentares
anormais na população jovem feminina22.
Ainda sobre tradução, nenhuma das versões em português parece trazer corretamente o significado da afirmativa “I worry about the amount of calories in the food I eat”. Foi
traduzida por Nunes et al.92 como “sei quantas calorias têm
os alimentos que como” e, por Bighetti et al.93, como “presto
atenção à quantidade de calorias dos alimentos que eu como”,
considerando que um comportamento mais transtornado
seria contar as calorias de tudo que se consome91.
Ademais, segundo Garfinkel e Newman94, o EAT tem boas
propriedades psicométricas de confiabilidade e validade, razoável sensibilidade e especificidade para TA, mas valor preditivo positivo muito baixo, em virtude de os TA serem relativamente incomuns. Por isso, os autores afirmam que o EAT
é válido para rastreamento de distúrbios da alimentação em
geral, em população de risco e subgrupos específicos, e para
comparações entre grupos e diferentes culturas. Observa-se,
no entanto, pelos resultados encontrados nesta revisão, que
a variabilidade nos resultados de frequência ou prevalência
foi muito grande e, dadas as considerações anteriores, pode
ser temerário fazer comparações entre grupos, apenas com
o resultado do EAT, assim como pensar em maior ou menor frequência de risco de TA em determinado grupo, sem
avaliações concomitantes e considerações amplas sobre o
contexto socioeconômico e cultural, além de considerar-se a
cultura alimentar e a cultura de “dieta” e de imagem corporal
do grupo avaliado.
O segundo questionário mais utilizado para rastrear sintomas de TA foi o BITE, desenvolvido para o rastreamento e
avaliação da gravidade da BN, e apresentando propriedades
psicométricas adequadas no estudo original6. Esse instrumento fornece os resultados em duas escalas, uma de gravidade e outra de sintomas específicos de BN, o que pode
explicar menores frequências na comparação dos resultados
de estudos que utilizaram o BITE e trabalhos que utilizaram
outros questionários – mesmo assim, a amplitude dos resultados é grande.
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):62-75.
72
Leal GVS et al.
O EDI, terceiro instrumento mais utilizado, foi desenvolvido para avaliar características comportamentais e psicológicas da AN e BN. É composto por 64 itens em oito subescalas
que avaliam a busca da magreza, bulimia, insatisfação corporal, perfeccionismo, falta de confiança, consciência corporal e medo da maturidade6. Vários estudos constataram sua
validade e confiabilidade, e existem normas publicadas para
aplicação em adolescentes, mas não há estudo de adaptação do EDI para o português95. No caso dos resultados de
fre­quência ou prevalência com EDI, a amplitude foi menor
do que com EAT e BITE. Observa-se, portanto, que é difícil
comparar os resultados encontrados por meio desses questionários, uma vez que uma gama de características é avaliada, e não apenas ou especificamente os comportamentos
específicos de TA, como restrição, compulsão e purgação.
Alguns fatores podem auxiliar na análise da grande variabilidade na prevalência e frequência de comportamentos de
risco encontrada nos estudos: 1) diferentes comportamentos são avaliados por meio de cada instrumento; quando o
estudo avaliou sintomas mais severos, encontrou prevalências menores, tal fato foi verificado em estudos que utilizaram o BITE, por exemplo, cujo resultado pode ser variado em
diferentes graus de problema alimentar, de acordo com o
escore do instrumento10,24; 2) outro exemplo é a avaliação de
práticas não saudáveis para controle do peso, que são comportamentos menos severos (comer pouca comida, pular
refeição, usar substitutos de alimentos, tomar remédios para
emagrecer e fumar mais cigarros) e apresentam maior prevalência43; 3) alguns estudos apresentaram seus resultados em
relação à amostra completa e outros dicotomizaram segundo sexo37,50,60, aparentando prevalências menores; 4) outros
estudos apresentam apenas resultados de comportamentos
específicos como restrição alimentar30,87 ou sintomas bulímicos30, o que pode levar à apresentação de menores prevalências; 5) pode haver também superestimação dos comportamentos de risco devido a dificuldade de entendimento
do questionário por parte do entrevistado, como no estudo
com adolescentes sul-africanos63 que tiveram dificuldade
de compreender o questionário em inglês e responderam
positivamente a alguns itens do EAT, não por apresentarem
preocupação com o peso, mas sim por práticas culturais
(vomitar o alimento como ritual de limpeza para proteger o
corpo de doenças) e circunstâncias socioeconômicas (após
ficar com muita fome, comiam demais quando havia comida disponível e “tinham” que vomitar), caracterizando falsos-positivos.
Como exemplo do fator 2 listado acima, além dos sintomas clássicos de TA, outros comportamentos de risco menos graves para TA são avaliados por alguns autores que têm
utilizado o termo “práticas não saudáveis para controle do
peso”43,44 para agrupar: fazer jejum ou comer muito pouca
comida, pular refeições, usar substitutos de alimentos como
suplementos ou shakes, tomar remédios para emagrecer
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):62-75.
REVISÃO DE LITERATURA
ou fumar mais cigarros. Esses comportamentos contribuem
para aumentar o risco de desenvolver transtornos alimentares clinicamente significantes e, portanto, também devem
ser avaliados, mas não é adequado comparar sua prevalência com a de sintomas mais graves, específicos para TA, pois
tais práticas tendem a ser mais prevalentes que os sintomas
clássicos de TA43.
Um fator relevante das avaliações realizadas com questões focadas nos comportamentos específicos é que estas
deveriam gerar resultados mais facilmente comparáveis. No
entanto, a variabilidade ainda é razoável nos resultados obtidos de questões específicas elaboradas pelos autores sobre restrição alimentar: 24,7% em estudo nacional7, 53,3% na
América Latina30 e 57%43 em meninas, nos Estados Unidos;
uso de laxantes, vômitos autoinduzidos e diuréticos: 5,1%
no Brasil7 e 7,8% nos Estados Unidos39; e de compulsão alimentar: 37,3% no Brasil7 e 11,8% em meninas, nos Estados
Unidos39. Isso se deve, pelo menos em parte, ao fato de que
esses questionários não geram escores, e, portanto, seus
resultados são apresentados detalhando-se cada comportamento. Dessa forma, verifica-se maior prevalência de restrição alimentar, seguida de compulsão alimentar e menores
prevalências de comportamentos compensatórios (uso de
laxantes, vômitos autoinduzidos e diuréticos).
A vantagem de perguntas específicas relativas aos questionários longos seria a possibilidade de facilitar o entendimento por parte dos adolescentes. Questionários simplificados são, portanto, uma alternativa eficaz para rastrear o risco
de desenvolver TA entre adolescentes7.
Dentre eles, destaca-se o SCOFF questionnaire, que consiste em cinco questões relativas às características fundamentais da AN e BN, desenvolvido para rastrear mulheres
adultas em risco de TA, podendo também ser utilizado com
adolescentes36,64,66. Questões próprias foram desenvolvidas
para alguns estudos: McKnight et al.47 elaboraram quatro
questões, concluindo que foram eficazes para identificar
80% das adolescentes que poderiam desenvolver TA. No
Brasil, Ferreira e Veiga7 adaptaram um questionário elaborado por Hay8, que foi baseado no Eating Disorder Examination
(EDE)96 e considerado o “padrão-ouro” para o rastreamento
dos TA2. Esse questionário é composto por duas perguntas:
a primeira investiga a frequência de compulsão alimentar
e a segunda, subdividida em quatro questões, investiga a
frequência de métodos para controlar o ganho de peso ou
possíveis mecanismos compensatórios à ingestão alimentar
excessiva, tais como o comportamento purgativo (uso de laxantes, diuréticos ou vômitos autoinduzidos) e dieta muito
restritiva ou jejum97.
Ferreira e Veiga97 avaliaram esse questionário para identificar comportamentos de risco para TA em adolescentes do
Rio de Janeiro e encontraram boa confiabilidade para rastrear a frequência da realização de dietas restritivas e para
investigar o uso de diuréticos, laxantes e vômitos autoinduzi-
REVISÃO DE LITERATURA
dos e confiabilidade moderada para avaliar a frequência dos
episódios de compulsão alimentar. Os autores concluíram
também que, pelo fato de ser bem mais curto e simples do
que os demais, e mesmo assim abranger questões acerca
dos principais comportamentos indicadores da presença de
risco para o desenvolvimento de TA, esse questionário pode
ser útil em estudos epidemiológicos para rastreamento do
problema em jovens.
Além dos aspectos discutidos, sabe-se que vários fatores
podem dificultar a caracterização do que é comportamento
de risco para TA4; esses distúrbios podem se apresentar de
maneira distinta em diferentes culturas. Por exemplo, critérios diagnósticos baseados em normas ocidentais podem
não ser apropriados para países não ocidentais98; diferenças raciais e étnicas também são observadas ao se estudar
a prevalência de psicopatologias em adolescentes99. E, de
qualquer forma, deve-se atentar para a atual “globalização”
de costumes alimentares e ideais de beleza100, que se disseminam pela mídia e que afetam até culturas distintas101.
Os presentes resultados chamam a atenção para a necessidade de padronização dos termos utilizados em pesquisas
sobre risco de TA, assim como de padronização do método
de avaliação do fenômeno, o que possibilitaria a comparação de dados dentro do mesmo país ou em diferentes locais
e realidades. Reconhece-se também a necessidade de se definir melhor o que é comportamento disfuncional e o que é
risco para o desenvolvimento do quadro.
Sugere-se que comportamentos de risco para transtornos alimentares poderiam ser caracterizados pela presença
dos sintomas clássicos de TA, ou seja, restrição alimentar,
compulsão ou purgação, e que as práticas menos graves
para controle do peso poderiam ser denominadas “comer
transtornado”.
A padronização dos termos e metodologias de avaliação
dos TA para identificação precoce desses comportamentos é
essencial para o desenvolvimento de métodos de intervenção mais efetivos e para subsidiar ações de prevenção.
CONCLUSÃO
Foi encontrada ampla variação na maneira de caracterizar o
comportamento de risco para TA, assim como nos tipos de
instrumentos e nomenclaturas utilizados.
Os comportamentos de risco para TA foram caracterizados principalmente pela presença dos sintomas clássicos
(restrição alimentar, purgação e compulsão), mas também
foram associados a diferentes características alimentares, de
peso e de imagem corporal.
O principal instrumento utilizado nos estudos foi o EAT
e os termos mais frequentes foram “risco para transtornos
alimentares” e “comer transtornado”. A frequência de com-
Risco para transtornos alimentares
73
portamentos de risco para TA variou de acordo com o tipo
de instrumento utilizado e com a região ou país de origem.
CONTRIBUIÇÕES INDIVIDUAIS
Greisse Viero da Silva Leal – Realizou a busca bibliográfica
para concepção do artigo, assim como a análise dos resultados, discussão e conclusão.
Marle dos Santos Alvarenga – Contribuiu para o desenho
metodológico do estudo, discussão e conclusão e revisou
criticamente seu conteúdo intelectual.
Sonia Tucunduva Philippi – Revisou criticamente seu conteúdo intelectual.
Viviane Ozores Polacow e Táki Athanássios Cordás – Revisaram a versão final.
Todos os autores aprovaram a versão final a ser publicada.
CONFLITOS DE INTERESSE
Nenhum autor possui conflitos de interesse a serem declarados.
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J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):62-75.
comunicação breve
Notas sobre a versão em língua portuguesa
da Escala de Bem-Estar Espiritual
Notes on the Portuguese-language version of the Spiritual Well-Being Scale
Edson Zangiacomi Martinez1, Rodrigo Guimarães dos Santos Almeida2, Fabiana Rodrigues Garcia1, Antonio
Carlos Duarte de Carvalho1
RESUMO
Palavras-chave
Espiritualidade, escalas,
psicometria, religião.
Objetivo: Testar a Escala de Bem-Estar Espiritual (EBE), a versão em português da Spiritual
Well-Being Scale (SWB), em uma amostra de universitários matriculados em cursos de pós-graduação da área da saúde, avaliando suas qualidades psicométricas. Entre os diferentes
instrumentos que objetivam mensurar a espiritualidade, encontra-se a SWB, adaptada recentemente para a língua portuguesa. Os 20 itens desse instrumento originalmente dividem-se em duas dimensões: bem-estar religioso (BER) e bem-estar existencial (BEE). Métodos:
A consistência interna dessas dimensões foi avaliada pelo coeficiente alfa de Cronbach. Foi
utilizada análise fatorial com rotação oblíqua para avaliar a estrutura fatorial latente. Quatrocentos e quarenta e um indivíduos responderam ao instrumento. Resultados: O instrumento apresenta satisfatória consistência interna, mas a análise fatorial sugere que os itens da
dimensão BEE distribuem-se em dois fatores distintos, o que chama a atenção para a complexidade da estrutura fatorial do instrumento. Conclusão: A estrutura fatorial da escala EBE
não é clara, e a presença de um efeito teto em grupos religiosos específicos pode prejudicar
os estudos que buscam associações entre espiritualidade e aspectos relacionados à saúde.
O uso do instrumento exige cautela, e posteriores estudos de revisão da escala são necessários.
ABSTRACT
Objective: This study aims to test the factor structure of the Portuguese-language version
of the Spiritual Well-being Scale (SWB) in a sample of postgraduate students of courses in
the health area, assessing its psychometric qualities. Among the different instruments used
to measure the spirituality, the SWB was recently adapted into Portuguese language. The
20 items of this instrument are originally divided into two dimensions: Religious Well-Being
(RWB) and Existential Well-Being (EWB) subscales. Methods: The internal consistency of the
subscales was assessed by the Cronbach’s alpha coefficient. A factor analysis with oblique
rotation was used to assess the latent factor structure. Four hundred and forty-one indivi­
duals answered the SWB scale. Results: The instrument has satisfactory internal consistency,
but the factor analysis suggests that the items of the EWB subscale are distributed in two
distinct factors, which draws attention to the complexity of the factor structure of the instrument. Conclusion: The factorial structure of the instrument is unclear, and the presence of
1 Universidade de São Paulo, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (USP-FMRP), Departamento de Medicina Social, Ribeirão Preto, SP, Brasil.
2 USP-FMRP, Fundação Hemocentro, Ribeirão Preto, SP, Brasil.
Recebido em
21/9/2012
Aprovado em
25/1/2013
Instituição onde o trabalho foi elaborado: Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo (FMRP-USP), Ribeirão Preto,
SP, Brasil.
Endereço para correspondência: Edson Zangiacomi Martinez
Departamento de Medicina Social, Faculdade de Medicina
de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo
Av. Bandeirantes, 3900
14049-900 – Ribeirão Preto, SP, Brasil
E-mail: [email protected]
comunicação breve
Keywords
Spirituality, scales,
psychometrics, religion.
Notas sobre a escala EBE
77
a ceiling effect for religious groups may hinder the studies about the associations between
spirituality and health-related characteristics. The use of the SWB scale requires caution and
a subsequent revision of the scale is needed.
INTRODUÇÃO
As crenças, práticas e experiências espirituais têm sido desde
tempos remotos um dos componentes mais prevalentes e
influentes da maioria das sociedades1, o que torna a dimensão religiosa/espiritual importante para os estudos em saúde. Como exemplo, Koenig2 destaca que resultados desses
estudos podem trazer informações úteis para o cuidado clínico de pacientes psiquiátricos, considerando a possibilidade de crenças religiosas ou espirituais serem utilizadas para
lidar melhor com a doença ou exacerbá-la. Em adição, espiritualidade e religiosidade mostram-se associadas a pontos
importantes na própria relação médico-paciente, qualidade
de vida e enfrentamento da doença3.
A espiritualidade é definida por Koenig et al.4 como uma
“busca pessoal para entender questões finais sobre a vida e seu
sentido, sobre as relações com o sagrado ou transcendente, que
pode ou não levar ao desenvolvimento de práticas religiosas ou
formações de comunidades religiosas”. É um conceito que se
difere de religiosidade, entendida como “extensão na qual
um indivíduo acredita, segue e pratica uma religião, podendo
ser esta organizacional ou não”. Em uma análise conceitual,
Tanyi5 revisou 76 artigos e 19 livros buscando um significado para o termo “espiritualidade”. Esse estudo mostrou que
espiritualidade e religião são conceitos distintos, sendo a
espiritualidade, então, definida como a busca do indivíduo
pelo significado da vida, enquanto a religião envolve uma
entidade organizada com rituais e práticas orientadas a uma
força maior ou Deus. E, ainda, a espiritualidade pode estar
associada à religião para alguns indivíduos, mas para outros,
como os ateus, pode não estar.
Uma revisão sobre diferentes instrumentos que objetivam mensurar a espiritualidade foi conduzida por Meezenbroek et al.6. Entre esses instrumentos, encontra-se a Spiritual
Well-Being Scale (SWB), introduzida e testada por Paloutzian
e Ellison7. A escala SWB possui 20 itens divididos em duas
dimensões: o bem-estar existencial (BEE, composta por 10
itens, uma dimensão “horizontal”, associada a um propósito na vida e satisfação com a própria existência) e o bem-estar religioso (BER, também composta por 10 itens, uma
dimensão “vertical”, referente a um senso de bem-estar em
relação a Deus). Os itens são apresentados em uma escala
de Likert de seis pontos; para o cálculo dos escores, os itens
que expressam sensações negativas têm suas pontuações
“invertidas”. Assim, os escores da dimensão BER são obtidos
da soma das pontuações dos itens ímpares da escala, e os escores da dimensão BEE são obtidos da soma dos itens pares
(a amplitude é de 6 a 60 pontos). A escala SWB foi adaptada
para a língua portuguesa (recebendo o nome de Escala de
Bem-Estar Espiritual – EBE) e validada por Marques et al.8, que
encontraram satisfatórias qualidades psicométricas e indicaram sua aplicabilidade em estudos em contexto local.
Entretanto, segundo Meezenbroek et al.6, o uso da escala
SWB para predizer propriamente um bem-estar não é recomendado. O argumento é que os itens do domínio de bem-estar existencial (BEE) podem trazer respostas socialmente
desejáveis, enquanto o domínio de bem-estar religioso (BER) é
sujeito a um efeito teto em grupos religiosos específicos, dado
que o indivíduo pode ser influenciado a responder em concordância com os postulados de sua organização religiosa.
O objetivo do presente trabalho é testar a Escala de Bem-Estar Espiritual (EBE), a versão em português da escala SWB
introduzida por Marques et al.8, em uma amostra de estudantes universitários matriculados em cursos de pós-graduação
da área da saúde, avaliando suas qualidades psicométricas.
MÉTODOS
Participaram do estudo 441 estudantes de pós-graduação
de cursos da área da saúde. Os dados foram coletados nos
anos de 2011 e 2012 em salas de aula da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, campus
de Ribeirão Preto. Após um breve rapport, quando elucidado que a palavra “Deus” utilizada no instrumento pode ser
entendida como uma “força superior” ou “inteligência suprema” na qual o indivíduo acredita (recomendação esta
sugerida por Marques et al.8), os sujeitos foram informados
sobre os propósitos da pesquisa e convidados a responder
à escala. A coleta de dados foi conduzida durante aulas de
disciplinas de bioestatística, que são de interesse de alunos
de vários cursos de pós-graduação e oferecidas no campus,
com ênfase em saúde.
No estudo das capacidades psicométricas do instrumento, utilizou-se o coeficiente alfa de Cronbach para exame da
consistência interna. Foi estimado o coeficiente de correlação entre cada item da escala e o indicador total, depurado
de sua própria contribuição. Essa correlação mede a associação do item com as outras medidas tomadas em conjunto.
O coeficiente alfa calculado quando o respectivo item é desprezado mostra o impacto que teria a retirada desse item do
questionário. A análise fatorial com rotação oblíqua (oblimin)
foi utilizada para avaliar a estrutura fatorial latente.
A pesquisa e a elaboração do Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido foram realizadas dentro de padrões éticos, sendo aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa do
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):76-80.
comunicação breve
Martinez EZ et al.
78
Hospital das Clínicas e Faculdade de Medicina de Ribeirão
Preto, Universidade de São Paulo.
RESULTADOS
Responderam ao instrumento 323 mulheres, com idade
entre 21 e 52 anos (média 28,3, desvio-padrão 5,39) e 118
homens, com idade entre 22 e 55 anos (média 29,6, desvio-padrão 5,53). A religião mais frequente é a católica, seguida
da espírita (Tabela 1). A tabela 1 descreve que 23,6% dos participantes atingiram a pontuação máxima da dimensão BER,
sendo esse percentual igual a 43,8% para os evangélicos, o
que sugere a presença de um efeito teto condicionado à religião declarada. O efeito teto não é importante para a dimensão BEE (Tabela 1).
A consistência interna (representada pelo coeficiente
alfa de Cronbach) dos fatores foi de 0,922 para o domínio
de bem-estar religioso, 0,790 para o domínio de bem-estar
existencial e 0,906 para a escala total. A tabela 2 mostra, além
do conteúdo dos itens, a correlação entre cada item dos
domínios BER e BEE e o respectivo coeficiente alfa que seria
encontrado caso aquele item seja desprezado no respectivo
domínio. Os itens 5, 9 e 13 são aqueles com menor correlação com o total do respectivo domínio, mas indicando um
desprezível aumento no coeficiente alfa quando desprezados em seu cálculo. Para os itens constantes do domínio BEE,
Tabela 1. Religião dos participantes segundo sexo e percentual
que atingiu a pontuação máxima dos domínios de bem-estar
religioso (BER) e existencial (BEE)
Religião
Total
n (%)
Percentual que atingiu a
pontuação máxima dos
domínios
Sexo
Tabela 2. Itens constantes do domínio de bem-estar religioso
(BER) e existencial (BEE) da escala EBE e resultados do exame de
consistência interna
Item
Conteúdo
Correlação
entre o item
e o total
Alfa de
Cronbach
se o item é
desprezado
Bem-estar religioso (alfa de Cronbach 0,922)
1
Não encontro satisfação na oração pessoal com
Deus
0,7285
0,9129
3
Creio que Deus me ama e se preocupa comigo
0,7853
0,9102
5
Acredito que Deus é impessoal e não se interessa
por minhas situações cotidianas
0,4247
0,9292
7
Tenho uma relação pessoal significativa com Deus
0,8111
0,9083
9
Não recebo muita força pessoal e apoio de meu
Deus
0,5219
0,9233
11
Acredito que Deus se preocupa com meus
problemas
0,8244
0,9074
13
Não tenho uma relação pessoal satisfatória com
Deus
0,4667
0,9269
15
Meu relacionamento com Deus ajuda-me e não
me sentir sozinho
0,8057
0,9082
Feminino
n (%)
Masculino
n (%)
BER
(%)
BEE
(%)
17
Sinto-me plenamente realizado quando estou em
íntima comunhão com Deus
0,8228
0,9074
19
Minha relação com Deus contribui para minha
sensação de bem-estar
0,8775
0,9044
0,7868
Católica
246 (55,8%)
189 (58,5%)
57 (48,3%)
26,0%
2,5%
Espírita
82 (18,6%)
65 (20,1%)
17 (14,4%)
29,8%
10,3%
Crê em
Deus, mas
não possui
religião
58 (13,2%)
35 (10,8%)
23 (19,5%)
5,9%
0
Evangélica
16 (3,6%)
13 (4,0%)
3 (2,5%)
43,8%
6,3%
Ateu
16 (3,6%)
3 (0,9%)
13 (11,0%)
0
0
Protestante
9 (2,0%)
8 (2,5%)
1 (0,9%)
11,1%
11,1%
Agnóstico
8 (1,8%)
4 (1,2%)
4 (3,4%)
0
0
Testemunha
de Jeová
2 (0,4%)
2 (0,6%)
0
100,0%
50,0%
Igreja
Messiânica
2 (0,4%)
2 (0,6%)
0
50,0%
0
Budista
1 (0,2%)
1 (0,3%)
0
0
0
Bahá’í
1 (0,2%)
1 (0,3%)
0
0
0
Total
441 (100%)
323 (100%)
118 (100%)
23,6%
4,0%
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):76-80.
destaca-se a relativamente baixa correlação dos itens com o
total, embora o impacto da retirada “um a um” desses itens
do domínio tenha baixo impacto sobre o coeficiente alfa.
A tabela 3 apresenta os resultados da análise fatorial, considerando ou não os ateus e agnósticos. Optou-se pela rotação oblíqua para que os resultados fossem comparáveis aos
da literatura, mas observou-se que a estrutura obtida de uma
análise fatorial com rotação varimax é semelhante (resultados não mostrados). Foram retidos três fatores, pelo critério
de preservar aqueles com autovalores maiores que 1. Na
tabela, são indicados em negrito os pesos fatoriais maiores
que 0,4. A estrutura fatorial é semelhante quando os ateus
Bem-estar existencial (alfa de Cronbach 0,790)
2
Não sei quem sou, de onde vim ou para onde vou
0,3750
4
Sinto que a vida é uma experiência positiva
0,4460
0,7765
6
Sinto-me inquieto quanto ao meu futuro
0,3489
0,7962
8
Sinto-me bastante realizado e satisfeito com
a vida
0,7083
0,7477
10
Tenho uma sensação de bem-estar a respeito do
rumo que minha vida está tomando
0,6099
0,7558
12
Não aprecio muito a vida
0,4045
0,7804
14
Sinto-me bem acerca do meu futuro
0,6324
0,7515
16
Sinto que a vida está cheia de conflito e
infelicidade
0,3967
0,7853
18
A vida não tem muito sentido
0,5958
0,7592
20
Acredito que existe algum verdadeiro propósito
para minha vida
0,3798
0,7812
comunicação breve
Notas sobre a escala EBE
79
Tabela 3. Estrutura fatorial dos itens da escala EBE, com rotação oblíqua
Pesos fatoriais
Item
1
a
Todos os respondentes (n = 441)
Excluindo os ateus e agnósticos (n = 425)
Fator 1
Fator 2
Fator 3
Fator 1
Fator 2
Fator 3
0,7589
0,0981
-0,0723
0,6876
0,1113
-0,0708
2
0,4161
-0,0335
0,3966
0,4799
-0,0340
0,2984
3
0,8710
-0,0573
-0,0684
0,8239
-0,1038
-0,0507
4
0,0317
0,6501
0,0569
0,0051
0,6266
0,0572
5
0,6262
-0,2725
0,1454
0,6502
-0,2399
0,0852
6
-0,0381
-0,1006
0,7922
0,0711
-0,1337
0,7627
7
0,8660
-0,0029
-0,0003
0,8267
-0,0080
0,0044
8
0,0780
0,5825
0,4434
0,0642
0,5416
0,4823
9
0,6530
0,0225
-0,0259
0,6437
0,0372
0,0028
10
0,0084
0,4568
0,5192
0,0081
0,3862
0,5752
11
0,8772
0,0040
-0,0270
0,8385
0,0018
-0,0279
12
0,0402
0,7443
-0,0912
0,0247
0,7692
-0,0415
13
0,5315
0,1385
-0,1306
0,5278
0,1669
-0,1420
14
-0,0712
0,4752
0,5648
-0,0447
0,4085
0,6093
15
0,7922
0,0910
0,1318
0,7522
0,1059
0,1499
16
0,0126
0,0964
0,5862
-0,0074
0,0400
0,6160
17
0,8512
-0,0039
0,0620
0,8131
-0,0001
0,0687
18
0,2131
0,5866
0,1819
0,1510
0,6169
0,1813
19
0,8927
0,0247
0,0103
0,8619
0,0254
0,0201
20
0,5919
0,3602
-0,1037
0,5351
0,3851
-0,1569
Autovalores
7,8
2,9
2,1
7,3
2,8
1,1
Proporçãoa
39,2%
14,5%
5,2%
36,6%
14,0%
5,4%
Proporção em que o fator contribui para a variação total.
e agnósticos são excluídos ou não. Todos os itens do domínio religioso (identificados por números ímpares) possuem
maior peso no fator 1, mas observa-se que os itens 2 e 20
(originalmente da dimensão BEE) também possuem expressivo peso nesse fator. A estrutura fatorial apresentada sugere
que os itens da dimensão BEE distribuem-se em dois fatores
distintos (fatores 2 e 3). No fator 3, destacam-se os pesos dos
itens 6, 10, 14 e 16.
DISCUSSÃO
Os valores encontrados para os coeficientes alfa nesta pesquisa são próximos aos encontrados por Marques et al.8 em
uma amostra de 506 adultos residentes em Porto Alegre, ao
propor a adaptação e validação da escala. Isso sugere alta
consistência interna, ou seja, os 10 itens de cada domínio
parecem formar conjuntos consistentes no sentido de mensurar um mesmo objeto. Entretanto, algumas notas sobre o
efeito teto e a estrutura fatorial do instrumento sugerem cautela em seu uso. Bufford et al.9 também destacaram o efeito
teto encontrado em amostras de evangélicos, e Ledbetter et
al.10 argumentaram que, como consequência, a associação
entre a escala EBE e outras variáveis de interesse em saúde
pode ser subestimada em grupos religiosos específicos.
Embora alguns autores tenham encontrado uma solução
com dois fatores ao aplicar a análise fatorial aos itens da escala EBE7,8,11, o presente estudo encontrou uma estrutura de
três fatores. O fator 1 sugere que os itens ímpares da escala
EBE podem ser úteis na mensuração de bem-estar religioso.
O fato de o item 20 possuir peso maior sobre o fator 1 que
sobre o fator 2 é compatível com os resultados de Genia11 e
de Scott et al.12, o que, juntamente com uma baixa correlação entre esse item e o total da dimensão original (0,3798
– ver tabela 2), indica a necessidade de uma revisão. O fator
2 destaca os itens 4, 8, 12 e 18, que expressam uma realização pessoal, um significado, uma satisfação com a vida pes­
soal, enquanto o fator 3 destaca os itens 6, 10, 14 e 16, que
expressam uma visão acerca da vida futura, expectativas e
anseios. Esse resultado sugere que os itens da dimensão de
bem-estar existencial da escala EBE podem estar explicando
dois constructos distintos.
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):76-80.
80
comunicação breve
Martinez EZ et al.
Dessa forma, o presente estudo chama a atenção para
a complexidade da estrutura fatorial do instrumento, o que
traz a necessidade de novos estudos sobre a escala e uma
natural revisão de sua interpretação. Essa complexidade é
também discutida por Ledbetter et al.13, sugerindo ambiguidades na interpretação dos domínios. Scott et al. também
encontraram uma solução de três fatores, mas essa não possui estrutura semelhante à encontrada no presente estudo.
Miller et al.14 encontraram uma solução de três fatores para
indivíduos caucasianos e de cinco fatores para afro-americanos, o que sugere que a estrutura fatorial da escala pode
ter relações com composições étnicas. Utsey et al.15 testaram,
por uma análise fatorial confirmatória, a estrutura original de
dois fatores do instrumento e as estruturas de três e cinco
fatores sugeridas por Miller et al.14 em uma amostra de afro-americanos, mas nenhuma dessas soluções mostrou-se adequada aos dados.
Um aspecto que distingue o presente estudo dos outros
citados é que se utilizou aqui a versão do instrumento traduzida para a língua portuguesa. Entretanto, acredita-se que
as considerações aqui apresentadas independam da linguagem do instrumento.
Edson Zangiacomi Martinez e Rodrigo Guimarães dos
Santos Almeida – Colaboraram na coleta dos dados.
Edson Zangiacomi Martinez – Participou da análise estatística e elaboração dos resultados.
Rodrigo Guimarães dos Santos Almeida, Fabiana Rodrigues Garcia e Antonio Carlos Duarte de Carvalho – Contribuíram na revisão bibliográfica e interpretação dos resultados.
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CONCLUSÃO
8. Marques LF, Sarriera JC, Dell’Aglio DD. Adaptação e validação da Escala de Bem-Estar Espiritual (EBE). Aval Psicol. 2009;8:179-86.
Os resultados apresentados reforçam as afirmações de outros autores de que a estrutura fatorial da escala EBE não é
clara, e a presença de um efeito teto em grupos religiosos
específicos pode prejudicar os estudos que buscam associações entre a espiritualidade e aspectos relacionados à saúde.
Assim, o uso do instrumento exige cautela, e posteriores estudos de revisão da escala são necessários.
9. Bufford RK, Paloutzian RF, Ellison CW. Norms for the Spiritual Well-Being Scale. J Psychol
Theology. 1991;19:56-70.
Contribuições individuais
Todos os autores contribuíram na concepção e no desenho
do estudo, na redação do artigo e revisaram seu conteúdo
intelectual.
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):76-80.
10. Ledbetter MF, Smith LA, Vosler-Hunter WL, Fischer JD. An evaluation of the research and
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Case report
Cerebral calcifications and schizophreniform disorder
Calcificações cerebrais e transtorno esquizofreniforme
Leonardo Fernandez Meyer1,2,3, Flávio Jozef2, José Geraldo Vernet Taborda4, Marco Antonio Alves Brasil1,
Alexandre Martins Valença2,5
ABSTRACT
Keywords
Basal ganglia calcification,
organic psychosis, Fahr’s
disease, dementia,
schizophreniform disorder,
calcium and phosphorus
metabolism disturbances,
hypoparathyroidism.
Objectives: Discuss pathophysiological aspects of cerebral calcifications (CC) and highlight
its importance related to the occurrence of neuropsychiatric syndromes. Method: Single
case report. Result: Man 52 years old, 20 years after going through a total thyroidectomy,
starts showing behavioral disturbance (psychotic syndrome). He was diagnosed as schizophrenic (paranoid subtype) and submitted to outpatient psychiatric treatment. During a
psychiatric admission to evaluate his progressive cognitive and motor deterioration, we identified a dementia syndrome and extensive cerebral calcifications, derived from iatrogenic
hypoparathyroidism. Conclusion: The calcium and phosphorus disturbances, including hypoparathyroidism, are common causes of CC. Its symptoms can imitate psychiatric disorders
and produce serious and permanent cognitive sequelae. The exclusion of organicity is mandatory in any psychiatric investigative diagnosis in order to avoid unfavorable outcomes, such
as in the present case report.
RESUMO
Palavras-chave
Calcificação dos gânglios
da base, psicose
orgânica, doença de Fahr,
demência, transtorno
esquizofreniforme,
distúrbios do metabolismo
do cálcio e fósforo,
hipoparatireoidismo.
Received in
10/10/2012
Approved in
2/20/2013
Objetivos: Discutir aspectos fisiopatológicos das calcificações cerebrais (CC) e ressaltar sua
importância na ocorrência de síndromes neuropsiquiátricas. Método: Relato de caso individual. Resultado: Homem 52 anos de idade, 20 anos após tireoidectomia total, iniciou
com alteração comportamental (síndrome psicótica), foi diagnosticado como portador de
esquizofrenia paranoide e encaminhado para ambulatório de psiquiatria. Durante internação psiquiátrica, para avaliação de importante deterioração cognitivo e motora, foi verificada a vigência de síndrome demencial e extensas CC, secundários a hipoparatiroidismo
iatrogênico. Conclusão: Os distúrbios do metabolismo do cálcio e do fósforo, incluindo o
hipoparatiroidismo, são causas frequentes de CC. Seus sintomas podem mimetizar transtornos psiquiátricos e provocar sequelas cognitivas permanentes. A exclusão de organicidade
é mandatória durante toda investigação diagnóstica na psiquiatria, a fim de evitar desfechos
desfavoráveis, como no presente relato de caso.
1 Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF), Rio de Janeiro, RJ, Brazil.
2 UFRJ, Instituto de Psiquiatria (IPUB), Rio de Janeiro, RJ, Brazil.
3 Centro Psiquiátrico Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brazil.
4 Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), Porto Alegre, RS, Brazil.
5 Universidade Federal Fluminense (UFF), Niterói, RJ, Brazil.
Address for correspondence: Leonardo Fernandez Meyer
Rua Professor Alfredo Gomes 1, ap. 202
22251-080 – Rio de Janeiro, RJ, Brazil
E-mail: [email protected]
Case report
Meyer LF et al.
82
INTRODUCTION
Cerebral calcifications (CC) are not uncommon and can
occur in several clinical conditions. Historically recognized
as Fahr’s syndrome, they can vary in presentation from accidental findings to severe neuropsychiatric syndromes1-4.
Researchers have found that lesions are usually located at
the basal ganglia and cerebellum and may reach the internal capsule and the thalamus, regardless the etiology1,3.
The reason for this tropism is unknown, but recent findings
suggest that cellular and histochemical specificities, such as
vascular permeability and the presence of other electrolytes
(iron, zinc and magnesium), may contribute to the process3-5.
CC development is slow and may remain asymptomatic for
long periods of time3,4.
The principal causes of CC are shown in table 1. Pathologies most statistically associated to CC are calcium
and phosphorus metabolic disturbances (endocrinopathies
and genetic syndromes)3,4. Even though uncommon, hypoparathyroidism is a possible cause of severe psychiatric
disturbances, whether these be related or not to CC5. Parathormone (PTH) deficiency results in a reduction in serum
calcium levels and an increase in serum phosphate levels,
thus producing mineral deposits in the skin, retina and cerebrum1. Clinical symptoms of calcium imbalance previously
demonstrated include: tetany, Chvostek sing (facial muscle
cramps), laryngeal stridor, muscle stiffness, movement disturbances (freezing), and seizures1-5. The last of which may
be the only manifestation of this condition1.
Table 1. Causes associated to cerebral calcification
Parathormone metabolism, calcium and phosphorus
Injured
Without sistemic involvement
Preserved
Hypoparathireoidism
Down syndrome
Idiopathic
Primary
Neuromyophaties
mitochondrial
Fahr’s disease
Systemic lupus
erythematosus
Diffuse neurofibrillary
Tangles with calcification
Acute lymphocytics
leukemia
Aging/physiological
Post-surgical
External radiation
Hypomagnesemia
Pseudohypoparathyroidism
Hyperparathyroidism
Revesz syndrome
Infections: CMV, HIV,
neurotoxoplasmosis, EBV
Toxicosis: Lead e CO
EBV: Epstein-Barr vírus; CO: carbon monoxid; CMV: citomegalovirus; HIV: human immunodeficiency virus.
Neuropsychiatric syndromes are commonly seen when
CC are secondary to hypoparathyroidism and tend to be se­
rious problems1-4. Acute conditions, such as delirium, may derive from electrolytic disturbances, especially in post surgical
and toxic forms1. Cognitive deterioration is the most common psychiatric symptom resulting from hypoparathyroi­
dism1. Mood disorders (anxiety, panic attacks, depression and
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):81-4.
neurasthenia) are frequent and may be the first clinical manifestations of this condition. Symptoms are intermittent, with
periods of spontaneous remission1,3. The onset of psychotic
symptoms tends to occur later and seem to be associated
with the calcification of the basal ganglia3. Hypothyroidism
is commonly part of greater global cognitive impairment, in
post surgical hypoparathyroidism.
The objective of this case report is to present some
neuropsychiatric aspects related to CC in patients with calcium and phosphorus disturbances. In this case report, the
patient was admitted to a psychiatric hospital, with a prior
diagnosis of schizophrenia. After clinical investigation, the
case revealed to be post surgical hypoparathyroidism with
extensive CC. The psychiatric Institution authorized the publication of data gathered for this study.
CASE REPORT
A few weeks after his divorce in 2005, a 52-year-old man
began to show signs of behavioral disorder, specifically social withdrawal, functional impairment and aggressiveness,
associated to psychotic symptoms (persecutory delusions
and hallucinations involving imperative voices). He was diagnosed as schizophrenic (paranoid subtype) and achieved
satisfactory symptomatic control during outpatient psychiatric treatment, at that time. However, from 2006 onwards,
he developed cognitive impairment and movement disorders. These symptoms weakened his adherence to treatment and resulted in several psychiatric hospitalizations,
always triggered by psychotic relapse symptoms (delusions,
hallucinations and psychomotor agitation). Yet his response
conventional antipsychotic therapy was positive.
In June 2009, the patient was admitted to a psychiatric
hospital to better evaluate the general deterioration of his
condition. He was dehydrated, malnourished, showed psychomotor retardation, choreoathetotic appendicular and
orolingual movements, myoclonias, pancerebellar ataxia, pyramidal signs, paratonia and Chvostek sing. A clinical exam of
other organic systems came up normal, except for hypotension (100/70 mmHg). The laboratory investigation came up
normal, except for: PTH < 3 pg/ml; TSH = 64,5 µUI/ml; T4-L =
0,15 ng/dl; Ca++ = 0,65 mmol/L and phosphorus = 47 mg/dl.
The cranial CT scan revealed extensive CC (Figure 1).
While taking the psychiatric examination, the patient remained awake, with hypoprosexia, temporal and spatial disorientation, hypokinesia and upper stereotyped movements.
He showed no response to external stimulation nor to simple verbal commands and sometimes became restless when
hearing his name. He was unable to speak complete words,
babbled unspecific sounds and did not seem to understand
the examiner’s questions. A decrease in displays of affectivity
and inaccessible memory were also verified. No hallucinato-
Case report
Cerebral calcifications and schizophreniform disorder
ry attitude was observed. The application of neurocognitive
tests such as MMSE (Mini Mental State Exam), were unsuccessful because of his global cognitive deterioration.
A
B
C
D
Figure 1. Brain CT revealing extensive calcification of: A)
Cerebellar anterior lobe; midbrain; temporal periventricular
white matter. B) Cerebellar white matter, including inferior
cerebellar peduncles; cerebellar amygdale. C) White matter of
frontal, parietal and occipital gyri, including U-fibers; internal
capsule; caudate, lentiform and thalamus nuclei; choroid
plexus and pineal. D) centrum semiovale.
An investigation of his prior medical history revealed a
Papilliferous Carcinoma of the Thyroid, treated with total resection in 1986. His post-surgical control and treatment in
an outpatient endocrinological clinic was irregular and the
patient abandoned the treatment altogether, at the onset of
psychiatric symptoms. It has been verified family history of
schizophrenia on his maternal grandparents.
During his psychiatric admission (17 days), the patient received adequate nutritional support, the correction of electrolytic disturbances and calcium and phosphorus reposition
(1 g/day and 10 µg/day, respectively). He also started T4-L
reposition (12,5-25 mg/day) and his insomnia was successfully treated with clonazepam. Despite the treatment adopted, cognitive deficits reminded, such as severe dementia
syndrome (aphasia, alogia, temporal and spatial disorientation and movement disorders). In light of the complexity of
the case, he was transferred to a general hospital. His final
diagnosis, after clinical investigation, was Dementia in hypercalcemia (Dementia in other specified diseases classified
elsewhere, F – 02.8, by ICD-10).
83
DISCUSSION
Our case report seeks to highlight the importance of excluding general medical and/or substance related conditions
whenever a psychiatric condition appears. We also look into
an extreme case of extensive CC, derived from iatrogenic hypoparathyroidism. The “exclusion of substance/general medical condition”, proposed by DSM-IV and ICD-10, is mandatory
for all psychiatric diagnoses, even though clinical components and family history are standard of primary mental disorders.
The patient’s initial clinical manifestations consisted in
a delusional-hallucinatory syndrome, with characteristics of
paranoid schizophrenia, and he also had a positive family
history of mental disorder. The atypical characteristics of his
syndrome were the absence of a premorbid personality and
the late onset, in his fifties. The post surgical hypoparathyroidism and the period of time that elapsed until the onset
of psychiatric symptoms are compatible with the patient’s
clinical condition, as well as the laboratory and imaging findings1,3-5. However, it’s likely that hypothyroidism contributed
to the patient’s cognitive-motor neurological condition. Seizures and signs of tetany could be seen in most of the cases
described3,4,6,7, yet our patient only manifested the latter.
Despite the protective effect of the blood-brain barrier,
the sub cortical nuclei are vulnerable to impregnation by
minerals such as copper (Wilson’s disease), iron (neurodegeneration associated with pantothenate kinase) and calcium3,4,8. CC occurs in several clinical conditions (Table 1) and
may commonly be classified as part of three main groups:
Idiopathic, Familial and especially calcium and phosphorus
metabolic disorders1. Among the latter, the more prominent
metabolic disorder are the results of endocrine etiologies,
such as hypoparathyroidism, including the most regularly
occurring post-surgical/iatrogenic type3,5. Calcifications are
usually located at the basal ganglia, dentate, thalamus and
semioval center1. Extensive CC and/or CC located in other
cerebral locations are rare, such as in the case report presented here3,6,7,9,10. In cases of primary hypoparathyroidism,
calcifications tend to be diffuse, while in secondary hypoparathyroidism they tend to be more localized3.
Recent histochemical studies have revealed the presence
of other chemical elements in these lesions such as copper,
zinc, magnesium, aluminum, potassium, iron and calcium.
These elements surround the organic matrix and lead to
mineralization3. Special attention should be given to iron,
which is found in higher concentrations in these CC regions
and apparently increases local dopaminergic neurotransmission3.
Clinical manifestation seems to vary according to the
patient’s age at the onset of the calcification process: from
20 and 40 years of age symptoms are predominantly manifested as schizophreniform psychosis, with no neurologiJ Bras Psiquiatr. 2013;62(1):81-4.
84
Case report
Meyer LF et al.
cal signs3. When the onset occurs after 49 years of age, the
psychosis is often accompanied by disorders of movement
and dementia3. Psychotic symptoms characterized by paranoid delusions, auditory hallucinations (sometimes musical),
complex visual hallucinations, hiker behavior and catatonic
states, were reported within this age range3,5. The extension
of the calcification and the severity of the neuropsychiatric
symptoms are directly correlated, even though they bear no
relationship to any specific kind of symptomatology3. Our
patient developed belated psychiatric symptoms and had
already been diagnosed with dementia, close to the kind of
outcomes found in literature on the subject6,11. In most patients the prognosis is negative, with permanent cognitive
and behavioral damage6,7,11,12. Similar case reports have been
found for patients with Fahr’s disease6.
Treatment of the underlying cause, when possible, can
improve neuropsychiatric symptoms, yet rarely stops the
progression of CC3-5. Clinical intervention in electrolytic disturbances and intoxications is mandatory. The theoretical benefit of using chelating agents (deferoxamine, penicillamine) has
not been proven by clinical studies up to this date2,4. In cases of
hypoparathyroidism, calcium reposition (1-2 g/day), together
with vitamin D (calcitriol, cholecalciferol) is recommended, in
order to maintain serum calcium levels at 8-8.5 mg/day and
urinary calcium under 200 mg/day2,4. The psychotic symptoms may not respond to antipsychotic medication. Lithium
carbonate is recommended for refractory patients1.
CONCLUSION
Mental disorders derived from organic causes are generally reversible, if the appropriate treatment is started early on in the
process. Metabolic disturbances linked to calcium and phosphorus are potential causes of severe neuropsychiatric syndromes and permanent cognitive damage. Excluding organicity is mandatory in any psychiatric diagnosis investigation.
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):81-4.
Individual contributions
Leonardo Fernandez Meyer – Responsible for the data collection, analysis, revision, bibliography and copy-editing the
article.
The other authors helped with the bibliography, discussions
on the theme and final copy-editing.
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relato de caso
Cessação tabágica em paciente com tremor essencial
Smoking cessation in a patient with essential tremor
Carolina Ferreira da Costa1, Ervin Cotrik1, Alberto Araújo2, Marco Antônio Brasil1
RESUMO
Palavras-chave
Cessação tabágica, tremor
essencial, depressão,
ansiedade.
Existem pacientes que, apesar dos esforços da equipe do programa de cessação tabágica,
mostram-se refratários à redução do tabagismo. Entre os motivos mais citados para isso,
estão abuso de álcool, ansiedade e depressão. Além desses, o tremor essencial, frequentemente negligenciado pelos pacientes e médicos, tem implicações clínicas diretas e indiretas
para aqueles que desejam parar de fumar. Antes entendida como uma doença benigna, o
tremor essencial tem fortes associações com transtornos psiquiátricos, além de piorar com a
abstinência de nicotina e com o uso de determinados medicamentos para a cessação. Descrevemos um caso de tremor essencial e comorbidades psiquiátricas no seu percurso para a
abstinência tabágica. Com relação à associação entre nicotina e o curso do tremor essencial,
maiores estudos são necessários. Mas diagnosticar sua presença apresenta relevância clínica,
podendo ser um marcador de pior prognóstico para a cessação.
ABSTRACT
Keywords
Smoking cessation,
essential tremor,
depression, anxiety
Recebido em
18/10/2012
Aprovado em
18/2/2013
There are patients that are resistant to reducing tobacco use, despite the effort of the professionals helping them to quit. Among the most cited motives, there are alcohol abuse, anxiety
and depression. Furthermore, frequently neglected by patients and doctors, essential tremor
has direct and indirect clinical implications for those who want to stop smoking. Once known as
a benign condition, essential tremor has strong association with psychiatric disorders and can
get worse because of nicotine abstinence and certain medications used in smoking cessation. We report a case of essential tremor and psychiatric comorbidities on the path towards
tobacco abstinence. Regarding the link between nicotine and the course of essential tremor, further studies are necessary. However, diagnosing its presence is clinically relevant and
should be considered a marker of worse prognosis in smoking cessation.
1 Universidade Federal do Rio de Janeiro, Hospital Clementino Fraga Filho (UFRJ-HCFF), Serviço de Psiquiatria e Psicologia Médica, Rio de
Janeiro, RJ, Brazil.
2 UFRJ-HCFF, Instituto de Doenças do Tórax (IDT), Núcleo de Estudos e Tratamento em Tabagismo (NETT), Rio de Janeiro, RJ, Brazil.
Endereço de correspondência: Carolina Ferreira da Costa
Av. das Américas, 4801, sala 304, Barra da Tijuca
22631-000 – Rio de Janeiro, RJ, Brasil
E-mail: [email protected]
86
relato de caso
Costa CF et al.
INTRODUÇÃO
O tabagismo é a maior causa de morte evitável no mundo
e mobiliza grandes gastos em saúde pública em virtude de
suas consequências clínicas1. Além disso, por muitas vezes,
mascara e atrasa o diagnóstico e o tratamento adequados de
quadros psíquicos, que prejudicam por vários anos a capacidade funcional e a qualidade de vida do paciente2.
Existem pacientes que, apesar dos esforços da equipe
do programa de cessação tabágica, mostram-se refratários
à redução do tabagismo. Alguns dos motivos que aumentam a chance de insucesso são abuso de álcool, ansiedade
e depressão3. Outro motivo pouco difundido é o paciente
tabagista com tremor essencial, cujo tratamento pode gerar
aumento do tremor de várias maneiras, desde a escolha da
terapia (por exemplo, bupropiona) até a síndrome de abstinência4. O prejuízo da rotina diária, às vezes, é o suficiente
para o paciente desistir de seu objetivo.
Além desses obstáculos, o tratamento pode ser dificultado por comorbidades psiquiátricas associadas ao tremor
essencial. Atualmente, sua dimensão clínica inclui também
componentes não motores e sua clássica característica de
benignidade é questionada5,6.
O caso descrito a seguir relata o percurso de um paciente
para alcançar a abstinência tabágica na vigência de tremor
essencial, depressão maior e transtorno de ansiedade generalizada.
RELATO DO CASO
DSP, masculino, 50 anos, separado, bibliotecário, em sua
quarta tentativa de cessação. Iniciou o uso aos 12 anos ocasionalmente e, aos 20 anos, passou a usar uma média de dois
maços por dia. Obteve escore 9 no Teste de Fagerström7.
Apresentava hipertensão arterial, dislipidemia e nefrolitía­
se como comorbidades clínicas. Tomava losartana 50 mg/d,
sinvastatina 10 mg/d, citrato de potássio 540 mg/d e cloxazolam 1 mg sob demanda, prescritos por seu clínico.
Há três anos, terminou um relacionamento amoroso
de longa data. A partir daí, passou a se isolar socialmente,
mantendo-se mais em seu quarto, apresentando humor deprimido, anedonia e agorafobia e aumentou o consumo de
cerveja (cerca de 4 a 10 latas/dia). É ansioso desde a infância,
cumprindo critérios para transtorno de ansiedade generalizada. Antes de procurar atendimento, já havia parado de
usar álcool há um mês por recomendação médica. Na avaliação inicial, apresentava AUDIT8 = 12 e HADS9 12/12.
Na primeira sessão, foi iniciada terapia de reposição
com adesivo de nicotina 14 mg e bupropiona 150 mg/d
com aumento em uma semana para 300 mg/d, para ajudar
na redução em 25% do número de cigarros até o próximo
encontro.
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):85-8.
Na segunda sessão, havia conseguido diminuir o uso
para 15 cigarros/dia. Parou totalmente cerca de quatro dias
depois, por iniciativa própria, sendo necessário aumento da
dose do adesivo de nicotina para 21 mg.
No primeiro dia de abstinência, passou a apresentar tremor de repouso postural e de ação grosseiros, que o impediam de realizar movimentos finos no dia a dia. Nesse momento, apresentou piora da autoestima, pensamentos de
desesperança, insônia e aumento da fissura tabágica.
Apresentava o tremor desde 12 anos de idade, inicialmente de pequena intensidade, passando a ficar mais visível
e a incomodá-lo a partir de 20 anos de idade, quando começou também a fumar mais. Não possuía história familiar
e não sabia informar se, ao começar a fumar aos 12 anos,
sentia alívio ou piora do tremor.
Na sua última tentativa de parar de fumar há cinco anos,
não usou medicação e não apresentou sintomas de abstinência ou tremor tão perceptíveis como atualmente. A última recordação de o tremor tê-lo incomodado foi após a
parada do uso de tramadol em sua última crise renal há dois
anos. Mesmo assim, lembra-se do tremor ter ficado menos
intenso que atualmente.
Foi introduzido clonazepam 0,5 mg/manhã e 1,0 mg/
noite para redução do tremor e melhora dos sintomas de
ansiedade. Obteve alguma melhora, mas ainda tinha episódios de intenso tremor cinético (por exemplo, ao levantar
uma chaleira).
O paciente foi referido para avaliação de um neurologista, que confirmou o diagnóstico de tremor essencial e manteve a conduta.
Optamos por reduzir gradualmente a bupropiona,
manter o clonazepam e iniciar sertralina 50 mg/d. Houve
melhora progressiva dos sintomas motores de volta ao
nível basal e melhora parcial dos sintomas do humor ao
longo de um mês. O paciente mantém-se em abstinência
do tabaco e álcool há dois meses e três meses, respectivamente.
DISCUSSÃO
O caso descreve um paciente com as seguintes características: elevado grau de dependência tabágica, alta pontuação
no HADS9 para ansiedade e depressão e AUDIT8 compatível
com uso problemático de álcool. Ou seja, um quadro com
múltiplas comorbidades (depressão, ansiedade e abuso de
álcool) que já apresentariam, sozinhas, um prognóstico reservado para cessação.
Além disso, possuía comorbidade com tremor essencial
que piorou dramaticamente após a abstinência. A piora do
tremor pode ter sido influenciada por vários fatores: abstinência de nicotina, piora dos sintomas depressivos e ansiosos, e introdução do inibidor de recaptação de noradrenalina
relato de caso
e dopamina (bupropiona). Em sua última tentativa de parar,
não notou tamanha piora clínica, o que nos levou a entender
o uso da bupropiona como fator principal.
O quadro de tremor essencial pode iniciar em qualquer
idade, apesar de a incidência aumentar acentuadamente
ao longo dos anos. Em mais de 90% dos casos, não exige
cuidados médicos10. Tal fato pode explicar o motivo de não
ter sido dada a devida importância pelo próprio durante as
perguntas de rotina, já que os pacientes costumam aprender
a conviver com o quadro.
Na segunda semana de tratamento, ao pedir atendimento fora de seu horário, com tremor grosseiro em membros superiores, o paciente possuía a firme crença de que
apenas a abstinência do cigarro havia produzido aquele
sintoma. Porém, o tremor não era algo novo e sim um tremor pior do que já existia e que não havia sido informado.
Não havia feito também uso de álcool ou drogas ilícitas. A
partir de então, passamos a acompanhá-lo semanalmente
no ambulatório, além da terapia de grupo, para observar
a evolução do sintoma que poderia gerar interrupção do
tratamento.
Na literatura, sobre a relação existente entre uso de nicotina e tremores em geral, existem estudos11,12 que apontam
para melhora imediata do tremor parkinsoniano, enquanto a
nicotina pioraria outros tipos de tremores como o fisiológico, o induzido ou o tremor essencial. Porém, em um estudo
de coorte prospectivo11, no qual foi observada a incidência
de novos casos de tremor essencial entre fumantes e não
fumantes, houve associação entre os casos de fumantes “pesados” na linha de base e baixo risco de desenvolvimento
da doença. Tal característica é semelhante à vista na doença
de Parkinson, que apresenta algumas ligações clínicas com o
tremor essencial, já que alguns casos evoluem para sintomas
parkinsonianos em longo prazo. Já em um estudo caso-controle, os fumantes que desenvolviam tremor essencial tinham idade mais jovem de início do tremor13. Portanto, mais
estudos precisam ser feitos para elucidar a relação biológica
entre tabagismo e desenvolvimento de tremor essencial, já
que não está claro se o cigarro seria um fator protetor ou
agravante. Em relação ao álcool, o uso crônico está associado
a aumento do risco de desenvolver o quadro pela hipótese
de neurotoxicidade cerebelar14, o que poderia se aplicar ao
caso do paciente.
Reforçando a importância clínica do tremor essencial,
estudos atuais expandiram sua dimensão, incluindo manifestações não motoras como: alterações neuropsiquiátricas
(depressão, ansiedade, traços de personalidade, parkinsonismo, sinais cerebelares, distúrbios do sono, fadiga, evolução para demência) e déficits sensoriais (olfatório e auditivo). Além disso, enquanto alguns estudos de neuroimagem
e neuropatológicos alegam que o tremor essencial é uma
doença progressiva neurodegenerativa, outros afirmam ser
apenas um distúrbio não degenerativo funcional dos cir-
Cessação tabágica e tremor essencial
87
cuitos e receptores5. Assim, tal condição deixa de ser vista
como uma doença puramente motora e passa a ser uma
família heterogênea de doenças, unidas pelo fato de apresentarem tremor cinético, podendo ter caráter progressivo
e degenerativo5,6.
Pacientes que apresentam tremor essencial possuem
duas vezes mais associação com sintomas depressivos e três
vezes mais associação com uso de antidepressivos, que não
são utilizados apenas para o tratamento de depressão maior,
mas para fadiga crônica e ansiedade, por exemplo4. Além
disso, a comorbidade entre depressão e tremor essencial
piora de forma significativa a qualidade de vida6, merecendo
atenção do profissional de saúde e aumentando o desafio
para o paciente que quer parar de fumar.
CONCLUSÃO
O relato de caso levanta duas questões importantes relacionadas ao tremor essencial: sua relação com o uso de nicotina
e sua importância clínica na cessação tabágica.
A respeito da primeira questão, mais estudos precisam
ser feitos para elucidar a natureza da associação.
Já clinicamente, existem nuances sutis que surgem por
causa da presença do tremor essencial e que precisam ser
consideradas para a cessação tabágica. Elas determinam a
escolha da terapia medicamentosa e a orientação dada ao
paciente sobre o que esperar dos sintomas de abstinência.
Além disso, é um alerta para a presença de comorbidades
psiquiátricas que dificultam a cessação, necessitando de tratamento mais intensivo e individualizado.
Assim, esse transtorno motor não deve mais ser visto
como uma entidade meramente benigna e monossintomática. Sua presença pode ser um marcador de pior prognóstico e propomos que sua busca seja ativa pelos médicos que
almejam a cessação tabágica de seus pacientes.
CONTRIBUIÇÕES INDIVIDUAIS
Todos os autores participaram ativa e criticamente em todas as fases da elaboração do manuscrito e aprovaram sua
versão final. A autora Carolina Ferreira da Costa foi responsável pela revisão bibliográfica, descrição do caso clínico,
discussão e revisão do manuscrito; o autor Ervin Cotrik foi
responsável pela revisão bibliográfica, elaboração da introdução, elaboração do resumo e revisão do manuscrito; o
autor Alberto Araújo contribuiu com a descrição do caso
clínico, elaboração da discussão e conclusão, além da revisão do artigo e referências bibliográficas segundo modelo
Vancouver; o autor Marco Antônio Brasil contribuiu com a
elaboração da introdução, discussão e conclusão, além da
revisão do manuscrito.
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):85-8.
88
Costa CF et al.
relato de caso
CONFLITOS DE INTERESSE
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Drs. Carolina Ferreira da Costa, Ervin Cotrik, Alberto Araújo e
Marco Antônio Brasil não possuem conflitos de interesse a
serem declarados.
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letter
Early-onset of psychiatric features in mild
frontotemporal dementia with impaired memory test:
a case report and neuropsychological evaluation
Sintomas psiquiátricos prematuros em demência frontotemporal
leve com desempenho deficitário em teste de memória:
relato de caso e avaliação neuropsicológica
Gabriel Coutinho1, Dídia Fortes2, Flavia Miele3, Paulo Mattos4
Dear editor,
Frontotemporal dementia (FTD) is characterized by behavioral changes which may precede
cognitive decline, being mainly a presenile disturbance with an insidious onset and high fa­
milial incidence1. Degeneration affects mainly prefrontal and temporal anterior brain areas; executive functions (EFs) and language deficits are commonly found. Changes in eating habits
and psychosis have being recently studied as earliest symptoms. We present a FTD case starting with mood symptoms, psychosis and compulsions to discuss differential diagnosis.
CASE
A., male, 61 years-old, right-handed, graduated, recently retired after working as a manager of
a company. Relatives reported first mood changes when he was 56, presenting depressive and
hippomaniac episodes of brief duration. A change of eating habits followed and the patient
lost almost 10 kg in 3 months. A. believes his neighbors will sue him, despite the lack of reasons.
He is spending hours a day organizing documents he believes will be necessary for the legal
process; he started presenting fixed idea for cleaning, washing his hands many times a day. A.’s
wife reported difficulties to return home after going to the church because he needs to ensure
that people will not gather to speak at his back. There is a current though of bankruptcy, despite his high income; he sold his car because of this fear – even after checking his bank balance.
He had no history of psychiatric disorders. He was afraid of taking his medicines because of the
risk of being “poisoned”.
Neuropsychological evaluation: A. presented difficulties to initiate behavior, such as telling
the examiner when he finished the task. Performance in memory was below expected for age,
both for visual and verbal material. Verbal memory was evaluated through a prose memory
test, with weak performance in immediate recall, but a very similar performance in delayed recall – corresponding to normal ranges. The performance in Complex Figure was impaired after
a 5 minute delay. Results revealed cognitive inflexibility, planning difficulties, impaired verbal
fluency and formulation hypothesis ability and also perseveration. Language was normal. Results are in tables 1 and 2.
Received in
10/18/2012
Approved in
11/12/2012
1 Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Instituto D’OR de Pesquisa e Ensino (ID’or), Centro de Neuropsicologia Aplicada (CNA),
Programa de Ciências Morfológicas (PCM), Rio de Janeiro, RJ, Brazil.
2 UFRJ, Grupo de Estudos do Déficit de Atenção (GEDA), Rio de Janeiro, RJ, Brazil.
3 UFRJ, CNA, ID’or, Rio de Janeiro, RJ, Brazil.
4 UFRJ, Faculdade de Medicina, CNA, ID’Or, Rio de Janeiro, RJ, Brazil.
Address for correspondence: Gabriel Coutinho
Centro de Neuropsicologia Aplicada
Rua Diniz Cordeiro, 30, 2º andar
22281-100 – Rio de Janeiro, RJ, Brasil
E-mail: [email protected]
letter
Coutinho G et al.
90
Table 1. Executive functions – cognitive flexibility
WCST scores
Raw scores
% Iles
Total errors
35
4%
Perseverative responses
14
27%
Perseverative errors
12
30%
Nonperseverative errors
23
1%
Categories completed
1
6%-10%
Table 2. Complementary cognitive functions
Raw score
Percentile
Classification
Rey Complex Figure – copy
34
-
Normal
Rey Complex Figure – retrieval
21
-
Impaired
Vocabulary
36
37
Normal
Matrix
12
50
Normal
Digit Span
11
16
Low-avarage
Blocks
33
50
Normal
Log. Memory immediate recall
22
5
Borderline
Log.Memory late recall
14
25
Normal
15
63
Normal
Trail A
Visualspatial span
41 (T score)
-
Normal
Trail B
41 (T score)
-
Normal
40
-
Normal
Token Test
DISCUSSION
Psychiatric features, such as psychosis2, bipolar disorder3
and obsessive-compulsive disorder (OCD)4 should be examined because those symptoms might be due to strokes or
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):89-90.
dege­nerative processes. In the present case, profile showing prominent EFs deficits, with constructional abilities unimpaired and a peculiar memory impairment, may be important to avoid the misdiagnose of FDT with psychiatric
symptoms. Examinee’s memory performance might be different from AD individuals mainly because immediate recall
of prose memory does not exclusively demand long-term
memory structures. This task overloads episodic buffer and
central executive (working memory), and the influence of
retention is more important in delayed recall. Baddeley and
Wilson5 demonstrated that amnesic patients could perform
normally in prose memory immediate recall, despite having
a zero score in delayed recall. The current performance was
the opposite, with weak performance in immediate recall,
but good performance in delayed recall, showing no retention deficit. Complex figures demand planning abilities (EFs),
which might explain impaired performance. This finding is
extremely important to differentiate FTD and AD individuals.
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carta
Consumo prejudicial de álcool entre usuários
da Estratégia Saúde da Família
Harmful alcohol consumption between users of Family Health Strategy
Ângela Maria Mendes Abreu1, Rafael Tavares Jomar2, Maria Helena do Nascimento Souza1,
Raphael Mendonça Guimarães3
Prezado Editor,
O consumo de álcool tem sido apontado como responsável por grande número de acidentes
de trânsito, violência doméstica, aumento da morbimortalidade por doenças cardiovasculares,
cirrose hepática e distúrbios psiquiátricos. Seu consumo abusivo está também relacionado a
cerca de 2,5 milhões de mortes anuais em todo o mundo, sendo considerado o primeiro fator
de risco para a carga global de doenças em países das Américas1.
Mais da metade da população brasileira consome álcool, 25% dela já experimentou pelo
menos um tipo de problema relacionado ao seu consumo, 3% preenchem critérios para abuso
e 9% para dependência dessa substância2. Portanto, estudos que identifiquem características
sociais, demográficas e individuais associadas ao consumo prejudicial de álcool são necessários para o desenvolvimento de estratégias de redução desse padrão de consumo no Brasil3.
Apresentam-se aqui resultados preliminares de um inquérito domiciliar em andamento
que objetiva identificar o consumo prejudicial de álcool entre residentes de áreas adscritas à
Estratégia Saúde da Família (ESF) da cidade do Rio de Janeiro, Brasil. Para tanto, o Alcohol Use
Disorders Identification Test (AUDIT), um dos instrumentos mais empregados no mundo para a
identificação de grupos de risco e rastreamento do uso prejudicial de álcool que apresenta boa
qualidade psicométrica no contexto brasileiro4, foi aplicado em amostra intencional de 196
usuários da ESF (144 mulheres e 52 homens), com idades entre 19 e 57 anos e idade média de
36,5 anos (+/-13,05).
A maioria dos entrevistados era casada (63,8%), possuía ensino fundamental incompleto (30,1%) e renda familiar mensal entre 1-2 salários-mínimos (55,6%). No tocante ao consumo prejudicial de álcool, 19,4% dos entrevistados enquadraram-se nessa classificação. Nesse
padrão de consumo, houve maior proporção estatisticamente significante (a um nível de 0,05
pelo teste x2) entre indivíduos do sexo masculino (p < 0,001) e entre aqueles com renda familiar
mensal superior a 3 salários-mínimos (p < 0,03).
Apesar de o presente estudo apresentar frequência maior, uma metanálise aponta que entre 6% e 15% das pessoas que demandam cuidados em serviços de atenção primária à saúde
fazem consumo prejudicial ou são dependentes de álcool, entretanto apenas um terço delas
tem tal problema detectado pelos profissionais que as atendem5.
Avaliar sistematicamente o consumo de álcool, portanto, é importante para prevenir consequências sociais e de saúde nas populações, especialmente naquelas atendidas pela ESF
Recebido em
31/10/2012
Aprovado em
12/11/2012
1 Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Escola de Enfermagem Anna Nery (EEAN), Núcleo de Pesquisa de Enfermagem e
Saúde Coletiva (NUPENSC), Rio de Janeiro, RJ, Brasil
2 Instituto Nacional de Câncer, Hospital do Câncer I (HCI-INCA), Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
3 UFRJ, Instituto de Estudos de Saúde Coletiva (IESC), Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
Endereço para correspondência: Ângela Maria Mendes Abreu
Rua Afonso Cavalcanti, 275, Cidade Nova
20211-110 – Rio de Janeiro, RJ, Brasil
E-mail: [email protected]
92
carta
Abreu AMM et al.
que têm a promoção da saúde e a prevenção de agravos
como práticas sanitárias prioritárias. Para tanto, acreditamos
não somente na atuação dos profissionais da ESF na promoção de hábitos saudáveis diante do consumo de álcool, mas
também na prática de intervenções eficazes de controle do
consumo prejudicial dessa substância.
Apontam-se como limitações deste estudo a possibilidade de causalidade reversa, o fato de a amostra ser intencional e o elevado número de indivíduos do sexo feminino
entrevistados (73,4%), o que ocorreu pelo fato de a coleta de
dados ter sido realizada somente no período diurno de dias
úteis, fazendo com que o número de donas de casa entrevistadas fosse elevado, o que pode ter implicado ainda a elevada proporção de consumidores de baixo risco encontrada
(80,6%).
J Bras Psiquiatr. 2013;62(1):91-2.
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instruções aos autores
Foco e políticas gerais:
O Jornal Brasileiro de Psiquiatria (JBP) é o periódico oficial do Instituto de Psiquiatria
da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IPUB/UFRJ). Ele é o jornal psiquiátrico com maior
tradição no Brasil, sendo regularmente publicado há mais de 70 anos.
O Jornal Brasileiro de Psiquiatria esforça-se para publicar estudos de alta qualidade que
tenham como objetivo o avanço do conhecimento sobre os transtornos mentais e a melhoria da
assistência e cuidado dos pacientes que sofrem dessas condições. O Jornal visa educar e atualizar
clínicos, acadêmicos e pesquisadores em psiquiatria, psicologia, sociologia e em outros campos
científicos relacionados à saúde mental.
O Jornal Brasileiro de Psiquiatria publica artigos originais, relatos breves, revisões, relatos
de casos, cartas ao editor e resenhas de livros que sirvam aos objetivos acima mencionados,
como também aqueles com características eurísticas, que possam auxiliar os pesquisadores
a vislumbrar novas linhas de estudo e investigação. Todos os manuscritos são revisados por
pareceristas anônimos o mais rápido possível.
Preparação dos manuscritos
Tipos de artigos aceitos:
O Jornal Brasileiro de Psiquiatria publica os seguintes tipos de manuscritos:
1. Artigos originais – Relatos de estudos originais baseados na excelência científica
em psiquiatria e que proporcionem um avanço na pesquisa clínica e experimental.
Artigos originais devem conter novos dados, oriundos de um número representativo
de pacientes, utilizando métodos adequados e confiáveis. Os artigos não devem
ultrapassar 4.000 palavras.
2. Relatos breves – Pequenos relatos de estudos originais, avaliações ou estudos-piloto,
contendo no máximo 2.000 palavras e 15 referências.
3. Revisões – Revisões sistemáticas objetivas e concisas desenhadas para reunir
informações relevantes e atualizadas sobre um tópico específico de particular interesse
e importância em psiquiatria e saúde mental. Os autores devem analisar e discutir
criticamente a literatura disponível. Revisões devem conter no máximo 6.000 palavras.
4. Relatos e séries de casos – Devem fornecer uma curta descrição original de casos
clínicos e estratégias de tratamento particularmente interessantes para pesquisadores
e clínicos. Podemos citar como exemplos a apresentação incomum de um transtorno
conhecido, um tratamento inovador ou um efeito adverso claramente relacionado
a uma medicação específica, que nunca havia sido relatado. Apesar de concisos, os
relatos devem trazer uma descrição cronológica detalhada dos casos, destacando
sua relevância e originalidade. Os autores devem fornecer uma extensiva revisão da
literatura sobre os aspectos clínicos e terapêuticos do tópico relatado, comparando-o
com casos similares descritos na literatura científica internacional. Relatos e séries de
casos não devem ultrapassar o limite de 1.500 palavras e 15 referências.
5. Cartas ao editor – São comunicações discutindo artigos recentemente publicados neste
jornal, descrevendo pesquisas originais ou descobertas científica relevantes. As cartas
não devem ter mais de 500 palavras e cinco referências.
6. Editoriais – Comentários críticos e baseados em evidências feitos por pesquisadores
com grande experiência em uma área específica do conhecimento, a pedido dos
editores deste jornal. Devem conter no máximo 900 palavras e cinco referências.
7. Resenhas de livros – Curtas revisões (no máximo 500 palavras) sobre livros recém-publicados dentro do foco do Jornal Brasileiro de Psiquiatria que poderiam interessar
psiquiatras e profissionais de saúde mental.
Originalidade e autoria
O Jornal Brasileiro de Psiquiatria somente considera para publicação manuscritos
compostos de material original, que não estão submetidos para avaliação em nenhum outro
periódico, ou que não tenham sido publicados em outros meios. As únicas exceções são resumos
com menos de 400 palavras. Os autores devem identificar tabelas, figura e/ou qualquer outro
material que tenham sido publicados em outros locais e obter a autorização dos proprietários dos
direitos autorais antes de reproduzir ou modificar esses materiais. Ao submeter um manuscrito,
os editores entendem que os autores estão de acordo e seguem essas exigências, que todos os
autores participaram substancialmente do trabalho e que cada um deles reviu e aprovou a versão
submetida. Assim, cada autor precisa declarar sua contribuição individual ao artigo na carta de
apresentação (veja a seguir).
Declaração de conflitos de interesse e suporte financeiro
O Jornal Brasileiro de Psiquiatria exije que todos os autores declarem individualmente
qualquer potencial conflito de interesse e/ou qualquer tipo de suporte financeiro para o estudo
obtido nos últimos três anos ou em um futuro previsível. Esta declaração inclui, mas não está
limitada, à compra e à venda de ações, bolsas, fomentos, empregos, afiliações, royalties, invenções,
relações com organizações financiadoras (governamentais, comerciais, não profissionais, etc.),
aulas, palestras para indústrias farmacêuticas, patentes (solicitadas, registradas, em análise ou
fase de preparação) ou viagens; independente do valor envolvido. Se um ou mais autores não
possuírem conflitos de interesse a serem declarados, isso precisa ser explicitamente informado
(por exemplo, Drs. Leme Lopes e Nobre de Mello não possuem conflitos de interesse a serem
declarados). Os autores interessados em obter mais informações sobre esse tópico podem ler um
editorial publicado no British Medical Journal, intitulado “Beyond conflict of interest”, que está
disponível em: http://www.bmj.com/cgi/content/full/317/7154/281.
Os conflitos de interesse e declarações de suporte financeiro devem ser escritos em uma
sessão separada, intitulada “Conflitos de Interesse”, após a sessão “Conclusões”.
Questões éticas
O Jornal Brasileiro de Psiquiatria considera a integridade ética a pedra fundamental da
pesquisa científica e da assistência a seres humanos. Assim, na sessão intitulada “Material e
Métodos”, os autores devem identificar a aprovação e o comitê de ética da instituição que revisou
o estudo. Ainda, em caso de estudos envolvendo seres humanos, os autores devem declarar
explicitamente que todos os participantes concordaram em participar da pesquisa e que
assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. Além disso, os autores devem descrever
os métodos empregados para avaliar a capacidade dos voluntários em entender e dar seu
consentimento informado para participar do estudo, além de descrever também as estratégias
utilizadas no estudo para garantir a proteção dos participantes. Finalmente, em caso de estudos
envolvendo animais, os autores devem declarar que as normas institucionais e nacionais para o
cuidado e emprego de animais de laboratório foram estritamente seguidas.
Registro de experimentos clínicos
Antes de submeter um manuscrito para avaliação pelo Jornal Brasileiro de Psiquiatria,
os ensaios clínico precisam ser registrados em uma base pública de registros de experimentos
clínicos. Um ensaio clínico é aqui definido como qualquer pesquisa que recruta prospectivamente
seres ou grupos de humanos para receber uma ou mais intervenções (farmacológica ou não),
a fim de se avaliar seu impacto na saúde. Esses ensaios podem ser registrados antes ou
durante o recrutamento dos voluntários. Para ser considerada válida, uma base de registros
de ensaios clínicos precisa ser acessível gratuitamente ao público, deve possuir mecanismos
que possibilitem ser pesquisáveis eletronicamente, deve ser aberta para o registro de todos os
ensaios prospectivos e gerenciada por uma agência sem fins lucrativos. Alguns exemplos são
a National Institutes of Health Clinical Trials (http://www.clinicaltrials.gov), a Netherlands Trial
Register (http://www.trialregister.nl), a UMIN Clinical Trials Registry (http://www.umin.ac.jp/
ctr) e o Registro Brasileiro de Ensaios Clínicos (http://www.ensaiosclinicos.gov.br), entre outras.
O nome do estudo e sua URL, o nome da base de registro de ensaios clínicos e sua URL, assim
bem como o número de registro do estudo devem ser descritos imediatamente após a seção
“Declaração de Conflito de Interesses”.
Estrutura geral do manuscrito
Abreviações devem ser evitadas. Porém, abreviações oficiais podem ser usadas, desde de
que a primeira menção do termo no texto seja feita de forma completa e por extenso, seguida
de sua abreviação entre parênteses. Os autores devem usar o nome genérico dos medicamentos,
em vez de seus nomes comerciais.
Todas as páginas devem ser numeradas, com a contagem total de palavras indicada na
primeira página (não devem ser contadas as palavras do resumo em português e inglês, das
referências e das figuras e ilustrações).
A primeira página deve conter o título, o título curto (ambos em português e em inglês),
a contagem total de palavras do manuscrito, o nome dos autores e suas afiliações. O título do
artigo não deve conter siglas ou acrônimos. O título curto deve conter até 50 caracteres (incluindo
espaços) e um máximo de cinco palavras. Diferente do título, o título curto deve aparecer no topo
de cada página do manuscrito (no mesmo idioma que o manuscrito foi escrito).
A segunda página deve conter o resumo em português e o número de registro do
experimento (quando aplicável, ver acima). O resumo deve ser informativo, claro e sucinto,
descrevendo o conteúdo do manuscrito em até 250 palavras. Para artigos originais, relatos
breves e revisões, o resumo deve ser estruturado em 4 tópicos: objetivo(s), métodos, resultados
e conclusões. Após o resumo, devem ser incluídas até cinco palavras-chave. Essas palavras,
se possível, devem ser retiradas da lista de termos MeSH do Index Medicus e ser escolhidas
considerando sua utilidade para a localização do artigo. Para artigos escritos em português, esses
termos podem ser encontrados nos Descritores de Ciências da Saúde, publicados pela BIREME.
A terceira página deve conter o resumos e as palavras-chave em inglês. Ambos devem ser
equivalentes às suas versões em português.
A quarta página deve conter o início ou toda a Introdução. Em artigos originais, relatos
breves e revisões, a Introdução deve ser seguida pelas seções Métodos, Resultados, Discussão,
instruções aos autores
Conclusões, Contribuições Individuais, Conflitos de Interesses, Agradecimentos e referências;
nesta ordem. Apesar do Jornal Brasileiro de Psiquiatria não estipular um número máximo
de páginas, os autores devem sempre respeitar o número máximo de palavras e referências
permitido para cada tipo de artigo. Tabelas e figuras devem vir após as referências, devem ser
citadas no texto, e o local desejado para sua inserção deve ser indicado no manuscrito.
Introdução – Deve incluir uma revisão sucinta de toda a literatura diretamente relacionada
ao assunto em questão, além disso, deve descrever os objetivos do estudo.
Métodos – Deve relatar o desenho do estudo e descrever detalhadamente os métodos
empregados, de forma a permitir que outros autores sejam capazes de replicá-lo.
Resultados – Devem ser descritos de forma lógica, sequencial e sucinta, usando-se,
ocasionalmente, o auxílio de tabelas e figuras.
Discussão – A discussão deve limitar-se a destacar as conclusões do estudo, considerando
as similaridades e diferenças dos seus resultados e daqueles de outros autores, as implicações
dos seus resultados, as limitações do seu estudo e as perspectivas futuras.
Conclusões – Os autores devem especificar, de preferência em um único parágrafo curto,
somente as conclusões que podem ser respaldadas pelos dados do estudo, assim como sua
importância clínica (sem generalizações excessivas).
Contribuições individuais – Nesta seção, o manuscrito deve descrever as contribuições
específicas feitas por cada um dos autores. Para ser considerado um autor, cada colaborador deve
preencher, no mínimo, todas as seguintes condições: (1) ter contribuído significativamente na
concepção e desenho dos estudo, ou na análise e interpretação dos dados; (2) ter contribuído
substancialmente na elaboração do artigo, ou revisado criticamente o seu conteúdo intelectual e
(3) ter aprovado sua versão final a ser publicada.
Conflitos de interesse – Cada autor deve revelar qualquer potencial conflito de interesse
(financeiro ou não) que possa ter potencial de ter enviesado o estudo. Caso um ou mais dos
autores não possuam conflitos de interesse a serem declarados, isso deve ser afirmado
explicitamente (ver seção Declaração de Conflitos de Interesse e Suporte Financeiro).
Agradecimentos – Nesta seção, os autores devem reconhecer as assistências pessoais e
técnicas recebidas, assim como fornecer informação detalhada a respeito de todas as fontes de
financiamento ou outras formas de auxílio econômico.
Referências – Devem seguir o estilo Vancouver (“Uniform Requirements for Manuscripts
Submitted to Biomedical Journals: Writing and Editing for Medical Publication” [http://www.
nlm.nih.gov/bsd/uniform_requirements.html]), ordenadas numericamente de acordo com sua
citação no texto. Exemplos:
Artigos:
• Versiani M. A review of 19 double-blind placebo-controlled studies in social anxiety
disorder (social phobia). World J Biol Psychiatry. 2000;1(1):27-33.
• Appolinario JC, McElroy SL. Pharmacological approaches in the treatment of binge
eating disorder. Curr Drug Targets. 2004;5(3):301-7.
• Dekker J, Wijdenes W, Koning YA, Gardien R, Hermandes-Willenborg L, Nusselder
H, et al. Assertive community treatment in Amsterdam. Community Ment Health J.
2002;38:425-34.
Livros:
• Goodwin FFK, Jamison KR. Manic-depressive illness. New York: Oxford University Press;
1990.
Capítulos de livros:
• Heimberg RG, Juster HR. Cognitive-behavioral treatments: literature review. In:
Heimberg RG, Liebowitz MR, Hope DA, Schneier FR, editors. Social Phobia – Diagnosis
Assessment and Treatment. New York: The Guilford Press, 1995.
Referências a páginas da internet:
• Associação Brasileira de Psiquiatria – Diretrizes para a Indústria da moda.
Recomendações da Comissão Técnica Brasileira de Grupos Especializados no Estudo
e Tratamento de Transtornos Alimentares. Disponível em: http://www.abpbrasil.org.
br/newsletter/comissao_ta/diretrizes_moda.pdf. Acessado em: 12 de Abril de 2007.
Tabelas e figuras:
Todas as tabelas e figuras devem seguir a formatação do estilo da APA (Publication
Manual of the American Psychological Association, Sixth Edition). Além disso, todas devem ser
numeradas com algarismos arábicos e ter suas respectivas legendas. Devem ainda estar em
formato digital próprio para a sua reprodução. Cada tabela deve ser autoexplicativa e, não deve
repetir informações apresentadas no texto. Os lugares para a inserção das tabelas devem ser
claramente assinalados no texto.
Ilustrações e fotografias devem ser enviadas em arquivos de alta resolução, nos formatos
.tif ou .jpg.
Submissão dos manuscritos
Visando reduzir o tempo entre a submissão do manuscrito, a decisão final dos editores, e
sua eventual publicação, o Jornal Brasileiro de Psiquiatria implementou o sistema de submissão
e acompanhamento online por meio do Editorial Manager (www.editorialmanager.com/jbp).
Dessa forma, o Jornal Brasileiro de Psiquiatria não aceita mais manuscritos enviados por e-mail.
Todos os manuscritos, sem exceções, devem ser submetidos por meio do sistema do Editorial
Manager. Durante o processo de submissão, os autores precisarão fornecer um título e um título
curto (máximo de cinco palavras), indicar o autor de correspondência, incluir um resumo conciso
e uma carta de apresentação e sugerir quatro pareceristas em potencial (atenção: os pareceristas
sugeridos não podem trabalhar na mesma instituição/departamento, ter relações próximas ou
ter publicado como coautor de qualquer um dos autores). Não seguir este último requerimento
pode levar à recusa do manuscrito.
Carta de apresentação
Na carta de apresentação os autores devem fornecer o nome completo e as afiliações de
todos os autores e o endereço de contato do autor para correspondência (endereço, endereço
de e-mail, telefones, fax, etc.). Além disso, os autores devem explicar por que eles acreditam
que o manuscrito submetido é adequado para publicação no Jornal Brasileiro de Psiquiatria,
destacando sua relevância e seus aspectos inovadores. Os autores são ainda solicitados a declarar
claramente que o manuscrito submetido representa um material original, que não foi publicado
anteriormente e que não está sendo avaliado para publicação em nenhum outro lugar.
Se os autores receberam ajuda de escritores técnicos ou revisores de idiomas quando
prepararam o manuscrito, isso deve ser explicitado na carta de apresentação, junto com
a declaração de que os autores são totalmente responsáveis pelo conteúdo científico do
manuscrito.
Para ser considerado um autor, cada colaborador deve, no mínimo, preencher todas as
seguintes condições: (1) ter contribuído significativamente na concepção e desenho dos estudo,
ou na análise e interpretação dos dados; (2) ter contribuído substancialmente na elaboração do
artigo, ou revisado criticamente o seu conteúdo intelectual e (3) ter aprovado sua versão final
a ser publicada. A supervisão/coordenação geral do grupo de pesquisa por si só não justifica a
autoria. Participação somente na aquisição de verbas provenientes de fontes financiadoras ou
na coleta de dados também não são suficientes para justificar autoria. A fim de garantir que
todas essas condições sejam satisfeitas, os autores são solicitados a incluir uma declaração a
respeito da autoria, descrevendo separadamente o papel de cada um dos autores no estudo e na
preparação do manuscrito. Caso essa declaração sobre autoria não tenha sido incluída na carta
de apresentação, o manuscrito não será revisto.
Após a submissão
Revisão por pares
Após receber o manuscrito por meio do Editorial Manager, os editores julgarão se ele
será revisto pelos pareceristas anônimos. Sua decisão será baseada no foco de publicação do
jornal e na estrutura, originalidade e relevância do manuscrito para o campo. Em seguida, caso
os revisores decidam assim, o manuscrito será enviado a pelo menos dois revisores anônimos
e independentes (que não são necessariamente aqueles sugeridos pelos autores). Os editores
do Jornal Brasileiro de Psiquiatria esforçam-se para manter rápido o processo de publicação.
Geralmente o período entre a submissão e o aceite do manuscrito é de cerca de três meses. Os
autores receberão um e-mail dos editores com sua decisão final e uma cópia dos comentários dos
revisores. No caso de ter sido indicada a revisão do manuscrito, os autores devem enviar um texto
final com as alterações necessárias (respondendo cada item levantado pelos revisores), seguindo
as instruções dadas pelos editores. Os autores devem reproduzir o item levantado pelo revisor
imediatamente antes de cada uma das suas respostas. Enviar apenas as respostas separadas dos
itens levantados pelos revisores poderá lentificar o processo de avaliação do manuscrito. Todo
esse processo pode ser acompanhado pelos autores por intermédio do Editorial Manager.
Carta de autorização
Os autores devem submeter a seguinte carta de autorização juntamente ao manuscrito:
“Os autores abaixo-assinados aprovam, por meio desta, a submissão deste trabalho
e da subsequente transferência de todos os seus direitos autorais para o Jornal Brasileiro de
Psiquiatria, a fim de permitir a sua publicação. Os autores atestam ainda que seu trabalho
representa um material original, que não infringe nenhum direito autoral de terceiros, e que
nenhuma parte deste trabalho foi publicada ou será submetida para publicação em outro
lugar, até que tenha sido rejeitado pelo Jornal Brasileiro de Psiquiatria. Finalmente, os autores
concordam em indenizar os editores por qualquer dano ou prejuízo secundário a quebra desse
acordo. No caso de o manuscrito não ser publicado, seu direito autoral retorna a seus autores.”
Todos os autores devem assinar este documento e incluir seus nomes completos,
endereços, telefones e e-mails. Essa carta deve ser escaneada e submetida aos editores por meio
do Editorial Manager.
Instructions for authors
Focus and general policies:
The Brazilian Journal of Psychiatry (JBP) is the official journal of the Institute of Psychiatry
of the Universidade Federal do Rio de Janeiro (IPUB/UFRJ). It is the most traditional psychiatric
journal in Brazil, being regularly published for more than 70 years.
The Brazilian Journal of Psychiatry endeavors to publish high quality studies aiming to
advance the knowledge about mental disorders and to improve the care of patients suffering
from such conditions. The journal strives to educate and update clinicians, scholars, and
researchers in psychiatry, psychology, sociology, and in others scientific fields related to mental
health.
The Brazilian Journal of Psychiatry publishes original articles, brief reports, reviews, case
reports, letters to the editor, and book reviews that serve the above mentioned goals, as well
as those with heuristic features that could help researchers envisage new avenues of study and
investigation. All manuscripts are peer-reviewed by anonymous referees as fast as possible.
Manuscript preparation
Types of articles accepted:
The Brazilian Journal of Psychiatry publishes the following types of manuscripts:
1. Original articles – Reports of original studies based on scientific excellence in psychiatry
and providing advances in clinical and experimental research. Original articles must
contain new data derived from a representative number of participants and employ
sound and adequate methods. Articles must not exceed 4,000 words.
2. Brief Communications – Short reports of original studies, evaluations, or pilot data,
containing no more than 2,000 words and 15 references.
3. Reviews – Concise and objective systematic articles designed to bring together
updated and relevant information about a specific topic of particular importance and
interest in psychiatry and mental health. Authors are required analyze and discuss the
available literature. It should contain a maximum of 6,000 words.
4. Case reports – They should provide a short original description of clinical cases and
treatment strategies of particular interest for researchers or clinicians. One could cite as
examples uncommon presentations of a known disorder, an innovative treatment, and
a not previously reported side effect unequivocally related to a specific medication. They
must contain a detailed, yet concise and chronologically-ordered description of the
cases, highlighting its relevance and originality. Authors must provide a comprehensive
literature review about the clinical and therapeutics aspects of the reported topic,
comparing their reports with similar cases described in the international scientific
literature. Case and series reports should not exceed 1,500 words and 15 references.
5. Letters to the Editor– Communications discussing articles recently published in the
journal or describing original researches or meaningful scientific discoveries. Letters
should have no more than 500 words and five references.
6. Editorials – Critical comments and made by researchers with expertise in a specific area
of knowledge at the editors’ invitation. They must contain a maximum of 900 words
and five references.
7. Book reviews – Brief reviews (maximum of 500 words) about recently published books
within the scope of the Brazilian Journal of Psychiatry that may interest the psychiatry
and mental health professionals.
Originality and authorship
The Brazilian Journal of Psychiatry only considers for publication manuscripts consisting
of original material that are not currently under consideration for publication or have not been
published elsewhere. The only exceptions are abstracts with less than 400 words. Authors
must identify tables, figures, and/or any other material that have been published elsewhere,
and permission from the copyright owners must be obtained before reproducing or modifying
the materials. In submitting a manuscript, the editors understand that the authors comply with
this requirement, and that all of them have substantially participated in the work and have
personally reviewed and given final approval of the version submitted. Therefore, each author is
required to declare his or her individual contribution to the article in the cover letter (see below)
and in the manuscript, in a section after the “Conclusions” entitled “Individual contributions”.
Conflicts of interest and financial disclosures
The Brazilian Journal of Psychiatry demands that all authors individually report any
potential conflicts of interest and/or any kind of financial support for the study obtained within
the last 3 years and for the foreseeable future. This disclosure includes, but is not limited to,
stock options/ownership, grants, stipends, employments, affiliations, royalties, inventions,
relationship with sponsoring organizations (governmental, nonprofit, and/or commercial
sources), lectures and speakers bureau for any pharmaceutical company, patents (filed, received,
pending, or in preparation), travel funds; regardless of value or amount. If one or more authors
have no conflicts of interest to disclose, this must be explicitly stated (for example, Drs. Leme
Lopes and Nobre de Mello have no conflicts of interest to report). Interested authors can read an
editorial about this subject, entitled “Beyond conflict of interest”, in the British Medical Journal
available at: http://www.bmj.com/cgi/content/full/317/7154/281.
The conflicts of interest and financial disclosures must be written as a discrete section
entitled “Conflicts of Interest”, after the “Individual contributions” section.
Ethical issues
The Brazilian Journal of Psychiatry considers ethical integrity a cornerstone for scientific
research and care of human beings. Therefore, in the section entitled “Methods”, authors are
required to identify the licensing and the institutional review board or committee that reviewed
and approved the research. Also, in cases of studies involving human subjects, authors must
clearly state that all participants agreed and signed the informed consent form, and must
describe the methods used to evaluate the capacity of subject to understand and give informed
consent, and strategies used in the study to ensure the protection of human subjects. Finally,
in cases of studies involving animals, authors must declare that institutional and national
guidelines for the care and use of laboratory animals were strictly followed.
Clinical trial registration
Before submitting a manuscript to be considered for publication in the Brazilian Journal
of Psychiatry, clinical trials must be registered in a public trials registry. A clinical trial is herein
defined as any research that prospectively enrolls human subjects or groups to one or more
interventions (pharmacological or not) to estimate its impacts on health outcomes. These trials
can be registered before or at the onset of subjects’ enrollment. To be considered valid, a public
trial registry must be freely accessible to the public, must be electronically searchable, opened
to all prospective registrants and managed by a non-profit organization. Some examples are
the National Institutes of Health Clinical Trials (http://www.clinicaltrials.gov), the Netherlands
Trial Register (http://www.trialregister.nl), the UMIN Clinical Trials Registry (http://www.umin.
ac.jp/ctr), and the Brazilian Registry of Clinical Trials (http://www.ensaiosclinicos.gov.br),
among others. The trial name and its URL, the public trial registry name and its URL, as well as
the registration number, must be included immediately after the conflicts of interest disclosure.
Overall structure of the manuscript
Abbreviations should be avoided; official abbreviations, however, may be used, keeping in mind
that the first mention of a term in the text must be complete, followed by its abbreviation between
brackets. Authors must use generic names of medications, as opposed to its trade names.
All pages must be numbered, with total words count indicated at the first page (except for
abstracts, both in Portuguese and in English, references, pictures and illustrations).
The first page should contain the Title and the Running Head (both in English and
in Portuguese), as well as the manuscript’s total word count, and the authors’ names and
affiliations. Article titles should not contain acronyms. The Running Head should contain a total
of up to 50 characters (with spaces) and no more than five words. Different from the Title, the
Running Head must also appear at the top of each page of the manuscript (in the same language
that the manuscript was written).
The second page must contain an abstract in Portuguese and the trial registration
information (when applicable, see above). The abstract must be informative, clearly and
concisely describing the manuscripts’ content in no more than 250 words. In original articles,
brief communications and reviews, abstracts have to be structured in four topics: objective(s),
methods, results and conclusions. A maximum of five key words in Portuguese should follow the
abstract. They should, if possible, be drawn from the MeSH list of Index Medicus and be chosen
with a view to useful cross-indexing of the article. For articles written in Portuguese, these terms
are available at Descritores de Ciências da Saúde, published by BIREME.
The third page must contain the abstract and key words in English both of which must be
identical to their versions in Portuguese.
The fourth page should contain the entire or the beginning of the Introduction section.
In original articles, brief reports, and reviews, the Introduction section must be followed by
the sections Methods, Results, Discussion, Conclusions, Individual Contributions, Conflicts of
Interest, Acknowledgments, and References in this order. Although the Journal of Brazilian
Psychiatry does not stipulate a maximum number of pages, authors must always respect the
maximum number of words and references allowed to each kind of article accepted. Tables and
figures should come after the references, be cited in the text, and their desired position in the
manuscript should be indicated.
Instructions for authors
Introduction – Must contain a concise review of any literature directly related to the topic,
as well as the aim of the study.
Methods – Must depict the model of study and a detailed description of the methods
employed, in order to permit its replication by other authors.
Results – Must be described logically, sequentially and concisely, with the occasional help
of tables and illustrations.
Discussion – The discussion must be limited to highlighting the conclusions of the study,
consider any similarities or differences with the results of other authors, implications of the
findings, limitations and future perspectives.
Conclusions – Authors must specify, preferentially in a short paragraph, solely the
conclusions the study data allow to support, together with their clinical significance (avoiding
excessive generalizations).
Individual contributions – Manuscript must include the specific contributions made by
each author in this section. For being considered an author, each collaborator must meet at
least all the following conditions: (1) had substantially contributed to conception and design
or analysis and interpretation of data; (2) had substantially contributed to drafting the article or
revising it critically for important intellectual content; and (3) had given the final approval of the
version to be published.
Conflicts of interest – Each author must disclose any potential conflict of interest that
might have the potential to have biased the study (whether financial or not). If one or more
author has no conflict of interest to declare, this must be explicitly stated (see Section Conflicts
of Interest and Financial Disclosures).
Acknowledgments – In this section, authors must recognize personal and technical
assistance, as well as provide detailed information regarding all sources of grants and other
modalities of material or financial support.
References – Must be presented in Vancouver stile (“Uniform Requirements for
Manuscripts Submitted to Biomedical Journals: Writing and Editing for Medical Publication”
[http://www.nlm.nih.gov/bsd/uniform_requirements.html]) in the same numerical order they
were quoted in the text, as shown in the following examples.
Articles:
• Versiani M. A review of 19 double-blind placebo-controlled studies in social anxiety
disorder (social phobia). World J Biol Psychiatry. 2000;1(1):27-33.
• Appolinario JC, McElroy SL. Pharmacological approaches in the treatment of binge
eating disorder. Curr Drug Targets. 2004;5(3):301-7.
• Dekker J, Wijdenes W, Koning YA, Gardien R, Hermandes-Willenborg L, Nusselder
H, et al. Assertive community treatment in Amsterdam. Community Ment Health J.
2002;38:425-34.
Books:
• Goodwin FFK, Jamison KR. Manic-depressive illness. New York: Oxford University Press;
1990.
Book chapter:
• Heimberg RG, Juster HR. Cognitive-behavioral treatments: literature review. In:
Heimberg RG, Liebowitz MR, Hope DA, Scneier FR, editors. Social Phobia – Diagnosis
Assessment and Treatment. New York: The Guilford Press, 1995.
References to web pages:
• Associação Brasileira de Psiquiatria – Diretrizes para a Indústria da moda.
Recomendações da Comissão Técnica Brasileira de Grupos Especializados no Estudo
e Tratamento de Transtornos Alimentares. Available at: http://www.abpbrasil.org.br/
newsletter/comissao_ta/diretrizes_moda.pdf. Accessed on: April 12, 2007.
Tables and illustrations
All tables and figures should be formatted in APA style (Publication Manual of the American
Psychological Association, Sixth Edition). All of them must be numbered in Arabic numerals,
with the respective legends. They should be in a digital format proper for reproduction.
Each table must be self-explanatory, and must not repeat the information already present
in the text. Places for table’s insertion must be clearly indicated in the text.
Illustrations and photographs must be sent in high resolution files, format.tif or.jpg.
Printing will be charged on the authors.
Manuscript submission
In order to reduce the time between manuscript submission and the editors’ final decision
and eventual publication, the Brazilian Journal of Psychiatry has implemented an Editorial
Manager internet-based submission and tracking system (www.editorialmanager.com/jbp).
Therefore, the Journal no longer accepts submissions through e-mails. All manuscripts, with
no exceptions, must be submitted through the Editorial Manager system. During the submission
process the authors must provide a Title and a Running Head (no more than five words), indicate
a corresponding author, include a concise abstract, add a cover letter and suggest four potential
reviewers (attention: the suggested reviewers can not work at the same institution/department,
have close relationships, or have published as a co-author with any of the authors). Lack of
attention to this latter requirement can lead to rejection.
Cover letter
In the cover letter, authors must provide the complete name and affiliations of all authors
and the contact information for the corresponding author (postal and e-mail addresses,
telephone and fax numbers, etc.). Also, authors should explain why they consider the submitted
article suitable for publication in the Brazilian Journal of Psychiatry, highlighting its relevance
and innovative aspects. In addition, authors are required to clearly state that the manuscript
represents original material, that has not been published previously, and that is not being
considered for publication elsewhere.
If authors received any assistance from technical writers and language editors while
preparing the manuscript, such assistance must be noted in the cover letter along with the
declaration that the author(s) is (are) entirely responsible for the scientific content of the paper.
For being considered an author, each collaborator must meet all the following conditions:
(1) had substantially contributed to conception and design or analysis and interpretation of
data; (2) had substantially contributed to drafting the article or revising it critically for important
intellectual content; and (3) had given the final approval of the version to be published. General
supervision of the research group alone does not justify authorship. Participation solely in the
acquisition of funding or the collection of data is also not sufficient. In order to assure that all
these conditions are met, authors are required to include a statement regarding authorship,
separately describing the role of each author in the study and manuscript preparation. If there is
no statement regarding authorship in the cover letter, the paper will not be reviewed.
After submission
Peer review
After receiving a manuscript through the Editorial Manager, editors will judge if it will be
reviewed by the anonymous reviewers. Their decision will be based on the publishing scope
of the journal, and on the structure, originality, and relevance of the manuscript to the field,
and structure. Then, if the editors decide so, the manuscript will be submitted to at least two
anonymous and independent reviewers (not necessarily those suggested by the authors). The
Editors of the Brazilian Journal of Psychiatry strive to keep a rapid publication timeline. Generally,
the process from manuscript submission to acceptance takes about three months. Authors will
receive by e-mail the editors’ final decision, along with copies of the reviewer’s comments. In
case of reviews, authors must return the final text with necessary changes (responding each
item raised by the reviewers), according to the editors’ instructions. Authors must reproduce
the reviewer’s comments before their answers. Including just the answers to the reviewer’s
comments is not enough and can lead to delays in processing. All this process can be tracked by
authors through Editorial Manager.
Permission letter
Authors are required to fill a permission letter and submit it along with the manuscript:
“The undersigned authors hereby approves submission of this work and all subsequent
for publication and transfer, assign, or otherwise convey all copyright ownership to the Brazilian
Journal of Psychiatry. Also, the undersigned authors warrant that this work represents original
material and does not infringe upon the copyright of any third party; that no part of the work
has been published or will be submitted for publication elsewhere unless and until it is rejected
by Brazilian Journal of Psychiatry. Finally, the authors agree to indemnify the Publisher against
any loss or damages arising out of a breach of this agreement. In the event that our submission
is not published, copyright ownership shall revert to the Author(s).”
All authors need to sign this document, and include their complete name, addresses for
postage, phone, and e-mail. This letter must be scanned and submitted for the Editors through
the Editorial Manager System.