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ISSN 2359-1773
Anais do
Congresso Nacional de Ensino Religioso
7ª Edição
FONAPER
Florianópolis/SC
2014
VII Congresso de Ensino Religioso,
realizado entre os dias 03 a 05 de outubro de 2013,
na Universidade Federal de Juiz de Fora, em Juiz de Fora/MG.
© 2014 FONAPER – Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso
Caixa Postal 90 - Florianópolis/SC - CEP 88.010-970
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Copyright dos textos: dos autores
Proponentes
Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso (FONAPER)
Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF)
Coordenação Geral
Adecir Pozzer (FONAPER)
Rodrigo Portella (UFJF)
Comissão Organizadora
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Frederico Pieper Pires (UFJF); Gracileide Alves da Silva (FONAPER); Henri Luiz Fuchs (FONAPER);
Maria José da Silva Lopes (FONAPER); Maria José Torres Holmes (FONAPER); Simone Riske Koch
(FONAPER); Josiane Cruzaro (ASPERSC).
Comissão Científica
Dr. Alberto da Silva Moreira (PUC-GO); Dr. Antônio Sidekum (UCA/El Salvador); Dr. Artur César Isaia
(UFSC); Dr. Carlos André Cavalcanti (UFPB); Dr. Douglas Rodrigues da Conceição (UEPA); Drando
Élcio Cecchetti (UFSC); Dra. Elisa Rodrigues (UFJF); Dr. Evaldo Luís Pauly (UNILASALLE); Dr. Flávio
Augusto Senra Ribeiro (PUC-MG); Dr. Gilbraz de Souza Aragão (UNICAP); Me. Henri Luiz Fuchs
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Izidoro (CES-JF); Dr. Leomar Brustolin (PUC-RS) ; Dra. Lílian Blanck de Oliveira (FURB/RELER); Dr.
Luiz José Dietrich (PUCPR e GPEAD/FURB); Dr. Luzival Barcellos (UFPB); Dr. Marcos Rodrigues da
Silva (PUC/SP); Dra. Marga Janete Ströher (SDH/PR); Dra. Maria Clara Lucchetti Bingemer (PUC-RJ);
Me. Maria José Holmes Torres (SEMED João Pessoa/PB); Dra Kathlen Luana de Oliveira (FACOS e
IMT/URI); Dr. Wellington Teodoro da Silva (PUC-MG); Me. Obertal Xavier Ribeiro (UNIGRANRIO); Dr.
Oneide Bobsin (Faculdades EST); Dr. Remí Klein (Faculdades EST); Dra. Sílvia Regina Alves
Fernandes (UFRRJ); Ma. Simone Riske-Koch (FURB/FONAPER); Dr. Zwinglio Mota Dias (UFJF).
Organização dos Anais: Janaina Hübner; Iuri Andréas Reblin; Francisco Sales Palheta.
Produção dos Anais do VII Congresso Nacional do Ensino Religioso
Dados Técnicos:
Título: Anais do VII Congresso Nacional do Ensino Religioso
Organização: Janaina Hübner; Iuri Andréas Reblin e Francisco Sales Palheta
Editora/Autor corporativo: FONAPER Cidade: Florianópolis Ano: 2014 Volume: 7
Páginas: 1004
ISSN: 2359-1773
Revisão: Esther do Amaral
Editoração Eletrônica: Iuri Andréas Reblin
Como citar um texto nos Anais do VII CONERE:
SOBRENOME, Nome. Título da Comunicação. In: Congresso Nacional do Ensino Religioso, 7., 2013,
Juiz de Fora/MG. Anais do Congresso Nacional do Ensino Religioso. Organizado por Janaina
Hübner, Iuri Andréas Reblin e Francisco Sales Palheta. Florianópolis: FONAPER, v. 7, 2014. página
inicial - página final.
(Online) ISSN: 2359-1773
A correta menção às fontes, em termos de honestidade intelectual, e a coerência às normas da ABNT
são de de responsabilidade dos autores e das autoras dos textos.
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO ...................................................................................................13
PROGRAMAÇÃO ....................................................................................................17
COMUNICAÇÕES ...................................................................................................19
GT1: FORMAÇÃO DOCENTE PARA O ENSINO RELIGIOSO ..............................21
A PRÁTICA REFLEXIVA NO CONTEXTO DE AÇÃO DO PROFESSOR
PESQUISADOR ...................................................................................... 23
Gleyds Silva Domingues .................................................................................23
FORMAÇÃO DOCENTE E DIVERSIDADE CULTURAL RELIGIOSA:
LICENCIATURA EM ENSINO RELIGIOSO DA FURB ................................. 33
Vanderlei Kulkamp ..........................................................................................33
Gysselly Buzzi Puff ..........................................................................................33
Adecir Pozzer ..................................................................................................33
A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DO ENSINO RELIGIOSO NUMA
PERSPECTIVA INCLUSIVA ..................................................................... 49
Ana Cristina de Almeida Cavalcante Bastos ...................................................49
A MEMÓRIA DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE ENSINO RELIGIOSO CONTRIBUIÇÕES PARA AS PRÁTICAS COM O ENSINO RELIGIOSO
PLURALISTA .......................................................................................... 63
Araceli Sobreira Benevides .............................................................................63
O LUGAR DO ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO INFANTIL NO BRASIL: A
POSTURA DO EDUCADOR ENTRE O CUIDAR E O EDUCAR NA
DIVERSIDADE DE PERTENÇA ................................................................ 81
Celeide Agapito Valadares Nogueira ..............................................................81
FORMAÇÃO ACADÊMICA/PROFISSIONAL PARA A DOCÊNCIA DO ENSINO
RELIGIOSO NAS ESCOLAS PÚBLICAS BRASILEIRAS ............................. 93
Edalza Helena Bosetti Santiago ......................................................................93
FONAPER
OS (DES)PROPÓSITOS DO ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO INFANTIL
........................................................................................................... 109
Renata de Souza Leão ................................................................................. 109
A FORMAÇÃO INICIAL E CONTINUADA DO DOCENTE DE ENSINO
RELIGIOSO .......................................................................................... 125
José Carlos do Nascimento Santos ............................................................. 125
NO JARDIM DAS ERVAS – SUBPROJETO INTERCULTURAL INDÍGENA
FURB/SC ............................................................................................. 137
Eldrita Hausmann de Paula .......................................................................... 137
Sandra Andréia Müller Schroeder ................................................................ 137
O CAMINHO E OS DESAFIOS NA FORMAÇÃO DOCENTE DO ENSINO
RELIGIOSO EM PERNAMBUCO ............................................................ 151
Wellcherline Miranda Lima ........................................................................... 151
Rosalia Soares de Sousa ............................................................................. 151
ENSINO RELIGIOSO ESCOLAR NO CONTEXTO DA DIVERSIDADE
RELIGIOSA: UMA EXPERIÊNCIA NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES ... 163
Iolanda Rodrigues da Costa ......................................................................... 163
Maria de Lourdes Santos Melo ..................................................................... 163
Rosilene Pacheco Quaresma ....................................................................... 163
QUE
PESQUISADORES/EDUCADORES
DE
ENSINO
RELIGIOSO
BUSCAMOS? UM DEBATE A PARTIR DA DISCIPLINA PESQUISA EM
ENSINO RELIGIOSO – PARFOR BLUMENAU E RIO DO SUL/SC ............. 177
Josué de Souza ............................................................................................ 177
O ENSINO RELIGIOSO EM GOIÁS: O PROBLEMA DA FORMAÇÃO DE
PROFESSORES ................................................................................... 189
Raimundo Márcio Mota de Castro ................................................................ 189
José Maria Baldino ....................................................................................... 189
A ABORDAGEM DA FINITUDE NO CURRÍCULO DE FORMAÇÃO DE
PROFESSORES DE ENSINO RELIGIOSO/PA: CONSIDERAÇÕES INICIAIS
........................................................................................................... 203
Rodrigo Oliveira dos Santos ......................................................................... 203
4
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
A IMPORTÂNCIA DO PROFISSIONAL HABILITADO EM CIÊNCIAS DA
RELIGIÃO PARA ATUAR COMO DOCENTE DO ENSINO RELIGIOSO NA
EDUCAÇÃO BÁSICA ............................................................................ 221
Ediana Maria Mascarello Finatto ...................................................................221
Leonel Piovezana ..........................................................................................221
FORMAÇÃO DOS PROFESSORES DO ENSINO RELIGIOSO NO MUNICÍPIO
DE CARIACICA - ES ............................................................................. 235
Eliane Maura Littig Milhomem de Freitas ......................................................235
O ENSINO RELIGIOSO NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL,
EM MINAS GERAIS: A FORMAÇÃO E A PRÁTICA DOCENTE .................. 251
Felippe Nunes Werneck ................................................................................251
GT2: CURRÍCULO DO ENSINO RELIGIOSO ......................................................269
ENSINO RELIGIOSO PARA ALUNOS/AS DO ENSINO FUNDAMENTAL I:
ESTUDO SOBRE PROPOSTA CURRICULAR UNIFICADA ....................... 271
Aldenir Teotonio Claudio ...............................................................................271
Marinilson Barbosa da Silva ..........................................................................271
LIMITES E AVANÇOS DA ESTRUTURA CURRICULAR DO ENSINO
RELIGIOSO NO COLÉGIO MARISTA DE BELÉM .................................... 291
Alex Coimbra Sales .......................................................................................291
O ENSINO RELIGIOSO NAS ESCOLAS PÚBLICAS BRASILEIRAS: UMA
ANÁLISE A PARTIR DAS LEGISLAÇÕES EDUCACIONAIS ...................... 309
Claudia Berdague ..........................................................................................309
O ENSINO RELIGIOSO NO CURRÍCULO ESCOLAR ............................... 319
Elisângela Madeira Coelho............................................................................319
O LUGAR DO ENSINO RELIGIOSO NO CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO
ADVENTISTA ....................................................................................... 331
Francisco Luiz Gomes de Carvalho ..............................................................331
5
FONAPER
O ENSINO RELIGIOSO TRANSVERSALIZANDO OUTRAS ÁREAS DE
CONHECIMENTO ................................................................................. 343
Iêda de Oliveira Caminha ............................................................................. 343
Maria José Torres Holmes............................................................................ 343
DANÇAS CIRCULARES SAGRADAS: UM RELATO DE UMA PROPOSTA
METODOLÓGICA NO CURSO DE LICENCIATURA NO ER- PARFOR/
BLUMENAU.......................................................................................... 357
Laudicéia Lene de Freitas Barbosa .............................................................. 357
O ENSINO RELIGIOSO NA REDE MUNICIPAL DE CURITIBA: ALGUMAS
CONSIDERAÇÕES ............................................................................... 369
Luís Fernando Lopes .................................................................................... 369
Renata Adriana Garbossa ........................................................................... 369
PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NO ENSINO RELIGIOSO: EXPERIÊNCIAS,
DESAFIOS E PERSPECTIVAS ............................................................... 385
Josiane Crusaro ............................................................................................ 385
Lindamir Teresinha Bianchi Crusaro ............................................................ 385
Adecir Pozzer................................................................................................ 385
GT3: CONCEPÇÕES METODOLÓGICAS DO ENSINO RELIGIOSO ................ 397
O FENÔMENO RELIGIOSO NO ENSINO RELIGIOSO: DESAFIOS
EPISTEMOLÓGICOS PARA DOCENTES NO ENSINO FUNDAMENTAL .... 399
Anderson Ferreira Costa ............................................................................. 399
Edile Maria Fracaro Rodrigues ..................................................................... 399
ENSINO DO FATO RELIGIOSO: CONHECIMENTO PARA A ACEITAÇÃO DO
DIFERENTE ......................................................................................... 417
José Antonio Lages ...................................................................................... 417
POR UM ENSINO RELIGIOSO NÃO RELIGIOSO: DESAFIOS NO CONTEXTO
ESCOLAR ............................................................................................ 433
Daniela Crusaro ............................................................................................ 433
Josiane Crusaro ............................................................................................ 433
Lindamir Teresinha Bianchi Crusaro ............................................................ 433
6
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
ALTERIDADE E DIVERSIDADE CULTURAL RELIGIOSA: REFLEXÕES
SOBRE O SER HUMANO ...................................................................... 447
Marcely Carnieletto Gazoni ...........................................................................447
Leonel Piovezana ..........................................................................................447
A QUESTÃO ATUAL DO ENSINO RELIGIOSO COMO CAMPO DISCIPLINAR:
UMA PROPOSTA DE CONSCIENTIZAÇÃO PARA A COMUNIDADE ESCOLAR
........................................................................................................... 465
Terezinha de Souza Pacheco .......................................................................465
Neusa Maria de Souza Trindade ...................................................................465
O ATEÍSMO NAS AULAS DO ENSINO RELIGIOSO ................................. 471
Narjara Lins de Araújo ...................................................................................471
POSSIBILIDADES METODOLÓGICAS PARA O ENSINO RELIGIOSO NO
ENSINO MÉDIO EM SANTA CATARINA ................................................. 489
Eliston Terci Panzenhagen............................................................................489
MORTE E VIDA: DIFERENTES CONCEPÇÕES....................................... 503
Janete Ulrich Bachendorf ..............................................................................503
Marléte Arens ................................................................................................503
O ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO ESCOLAR: UM DESAFIO DIÁRIO
........................................................................................................... 515
Janete Ulrich Bachendorf ..............................................................................515
GT4: IMAGINÁRIO SIMBÓLICO E ENSINO RELIGIOSO ....................................531
A DIALÉTICA DO SAGRADO
NA RESOLUÇÃO DA TENSÃO DE
CONHECIMENTO ................................................................................. 533
Marco Antônio Teles da Costa ......................................................................533
PROJETO CORPO SINCRÉTICO: INSTALAÇÃO PERFORMATIVA COMO
PERCURSO EDUCATIVO EM AMBIENTES NÃO ESCOLARES ................ 549
Wallace Wagner Rodrigues Pantoja .............................................................549
7
FONAPER
SAMHAIN, HERANÇAS DE UM IMAGINÁRIO SIMBÓLICO APLICADO AO
ENSINO RELIGIOSO............................................................................. 565
Silas Roberto Rocha Lima ............................................................................ 565
GT5: DIVERSIDADE RELIGIOSA E DIREITOS HUMANOS ............................... 577
ENSINO RELIGIOSO: DIREITO RECONHECIDO OU DIREITO NEGADO .. 579
Maria Lina Rodrigues de Jesus .................................................................... 579
DISCURSOS E PRÁTICAS: A (IN)TOLERÂNCIA RELIGIOSA NO AMBIENTE
ESCOLAR ............................................................................................ 597
Sueli Martins ................................................................................................. 597
DIVERSIDADE RELIGIOSA E INTERCULTURALIDADE: APORTES PARA
UMA DECOLONIZAÇÃO RELIGIOSA NA EDUCAÇÃO ............................. 615
Georgia Carneiro da Fontoura ...................................................................... 615
Lilian Blanck de Oliveira ............................................................................... 615
MEMÓRIA, TOLERÂNCIA E RESISTÊNCIAS: DISCUSSÕES SOBRE
RELIGIÃO E DIREITOS HUMANOS NO BRASIL ...................................... 635
Kathlen Luana de Oliveira ............................................................................ 635
GT6: EDUCAÇÃO E INTERCULTURALIDADE ................................................... 655
O ENSINO RELIGIOSO E A DIVERSIDADE CULTURAL RELIGIOSA NA
EDUCAÇÃO ......................................................................................... 657
Edina Fialho Machado .................................................................................. 657
Rodrigo Oliveira dos Santos ......................................................................... 657
EDUCAÇÃO INTERCULTURAL: A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE E DA
DIFERENÇA NO AMBIENTE ESCOLAR .................................................. 673
Eliel Ribeiro da Silva .................................................................................... 673
ETNOJOGO UMA PROPOSTA CRIATIVA ............................................... 689
Claudilene Christina de Oliveira ................................................................... 689
Rosana Castro de Luna Rezende ................................................................ 689
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Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
GT7: A RELIGIÃO E O ETHOS CONTEMPORÂNEO NA PERSPECTIVA DA
EDUCAÇÃO E DO ENSINO RELIGIOSO NO BRASIL ........................................709
ORA PRO NOBIS: MEMÓRIA E RELIGIOSIDADE DOS CANTADORES DE
LADAINHA EM MOCAJUBA PARÁ ........................................................ 711
Guilherme Luís Mendes Martins ...................................................................711
DIREITOS SEXUAIS E REPRODUTIVOS E LAICIDADE DO ESTADO ...... 725
Myriam Aldana ...............................................................................................725
Leonel Piovezana ..........................................................................................725
A CONTRIBUIÇÃO DE JOHN LOCKE PARA A TOLERÂNCIA ................... 739
Sérgio Ricardo Gonçalves Dusilek ................................................................739
GT8: ENSINO RELIGIOSO E VALORES DO DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO ...753
RELIGIÃO E ESTADO SECULAR EM DIÁLOGO: UMA NOVA PROPOSTA DE
ENSINO E APRENDIZAGEM PARA O ENSINO RELIGIOSO ..................... 755
Elenilson Delmiro dos Santos .......................................................................755
ENSINO RELIGIOSO E DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO NAS ESCOLAS
PÚBLICAS: UM DESAFIO A SER ENFRENTADO .................................... 767
Elivaldo Serrão Custódio ...............................................................................767
A PLURALIDADE EM DIÁLOGO E O ENSINO RELIGIOSO NO SÉCULO XXI
........................................................................................................... 785
Suely Ribeiro Barra .......................................................................................785
GT9: A ESPIRITUALIDADE E A FORMAÇÃO DO EDUCADOR .........................801
A IMPORTÂNCIA DA ESPIRITUALIDADE DO EDUCADOR
NA
CONSTRUÇÃO DA ESPIRITUALIDADE NO PROCESSO EDUCATIVO .... 803
Ana D‘arc Vieira Cândido ..............................................................................803
Sidney Allessandro da Cunha Damasceno ...................................................803
ESPIRITUALIDADE: UM CAMINHO DE BUSCA E DESCOBERTAS PARA O
EDUCADOR ......................................................................................... 821
Daiane da Silva Barbosa ...............................................................................821
Laugrinei P. B. da Anunciação - UCB ...........................................................821
9
FONAPER
A ESPIRITUALIDADE NA CONSTITUIÇÃO DO DOCENTE ....................... 833
Monica Pinz Alves ........................................................................................ 833
PROFESSOR COMO MEDIADOR DE APRENDIZAGEM
NO ENSINO
RELIGIOSO .......................................................................................... 847
Nancy Pereira da Silva ................................................................................. 847
GT10: CONHECIMENTOS E RELIGIOSIDADES INDÍGENAS E O ENSINO
RELIGIOSO .......................................................................................................... 861
RITUAL DO KIKI: UMA CELEBRAÇÃO DE VIDAS .................................... 863
Avalcir Rita Ferrari ........................................................................................ 863
Rosinei Pedrotti Ferrari ................................................................................. 863
Leonel Piovezana ......................................................................................... 863
INOVAÇÃO PEDAGÓGICA PARA A EDUCAÇÃO SUPERIOR EM CULTURAS
INDÍGENAS: DESAFIOS E POSSIBILIDADES ......................................... 877
Leonel Piovezana ......................................................................................... 877
Luciano Jaeger ............................................................................................. 877
Ediana M. M. Finatto ..................................................................................... 877
RELIGIOSIDADE INDÍGENA: REFLEXÕES SOBRE OS POVOS KAINGANG
........................................................................................................... 893
Gilberto Oliari ................................................................................................ 893
RELIGIOSIDADES MACUXI
E A PERSPECTIVA PARA O ENSINO
RELIGIOSO .......................................................................................... 905
Manoel Gomes Rabelo Filho ........................................................................ 905
GT 11: CONHECIMENTOS E RELIGIOSIDADES AFRICANAS
E AFROBRASILEIRAS E O ENSINO RELIGIOSO ........................................................... 923
ESTÁGIO DE DOCÊNCIA: UMA EXPERIÊNCIA INOVADORA ENVOLVENDO
ELEMENTOS ESSENCIAIS E INDIVIDUAIS DA UMBANDA ...................... 925
Adenize Vieira de Jesus ............................................................................... 925
Daiane Waltrick ............................................................................................. 925
Ediana M. M. Finatto ..................................................................................... 925
10
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
BEBÊS ABAYOMIS: UMA PROPOSTA PEDAGÓGICA PARA O ENSINO
RELIGIOSO NAS SÉRIES INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL ........... 947
Dina Carla da Costa Bandeira .......................................................................947
Elane Queiroz Carneiro Ribeiro ....................................................................947
ENSINO RELIGIOSO E RELIGIÕES DE MATRIZES AFRICANAS: CONFLITOS
E DESAFIOS NA EDUCAÇÃO PÚBLICA NO AMAPÁ ............................... 959
Elivaldo Serrão Custódio ...............................................................................959
Eugenia da Luz Silva Foster .........................................................................959
DESAFIOS DO ENSINO DAS RELIGIÕES AFRO-BRASILEIRAS ............... 977
Fabiano Aparecido Costa Leite .....................................................................977
RELIGIOSIDADE AFROBRASILEIRA E O TRATO PEDAGÓGICO NO ENSINO
RELIGIOSO .......................................................................................... 989
Alysson Brabo Antero ....................................................................................989
11
APRESENTAÇÃO
Em âmbito nacional, a educação básica tem ocupado lugar de
destaque nos últimos anos, principalmente após a promulgação da
Resolução CNE/CEB n° 4/2010, que institui novas Diretrizes Curriculares
Nacionais Gerais para a Educação Básica (DCNGEB)1 e da Resolução
CNE/CEB nº 7/2010, que define as Diretrizes Curriculares Nacionais para
o Ensino Fundamental de 9 (nove) anos2 (DCNEF).
As diretrizes apresentam a organização curricular por áreas de
conhecimento. O art. 13, explica que os conteúdos escolares são
constituídos por componentes curriculares que, por sua vez, se articulam
com as áreas de conhecimento, as quais favorecem a comunicação entre
diferentes conhecimentos sistematizados entre estes e outros
saberes, mas permitem que os referenciais próprios de cada
componente curricular sejam preservados.
No art. 15, os componentes curriculares obrigatórios do ensino
fundamental são assim organizados em relação às áreas de
conhecimento:
I – Linguagens:
a) Língua Portuguesa;
b) Língua Materna, para populações indígenas;
c) Língua Estrangeira moderna;
d) Arte; e
e) Educação Física;
II – Matemática;
III – Ciências da Natureza;
IV – Ciências Humanas:
a) História;
b) Geografia;
V – Ensino Religioso.
Neste contexto de consolidação da educação básica, do processo de
reorganização curricular, de redefinição da base nacional comum e da
1
2
BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CEB nº 4/2010. Define
Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica. Brasília, DF, 2010.
BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CEB nº 7/2010. Fixa as
Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de Nove (9) Anos. Brasília,
DF, 2010.
FONAPER
parte diversificada, da nova relação entre área de conhecimento e
componente curricular, que se insere o Ensino Religioso.
Atentos às mudanças da sociedade brasileira e frente aos desafios
contemporâneos surgidos após a Constituição Federal de 1988, diferentes
sujeitos vêm propondo e construindo novos paradigmas para o ensino
religioso. Legitimado pelo Art. 33 da LDB nº. 9.394/96 (redação alterada
pela Lei nº. 9.475/1997)3, é considerado disciplina escolar, parte integrante
da formação básica do cidadão, assegurado o respeito à diversidade
cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo.
Desde então, o Ensino Religioso objetiva disponibilizar
conhecimentos construídos historicamente pelas culturas e tradições
religiosas, a fim de possibilitar esclarecimentos sobre o direito à diferença,
valorizando a diversidade cultural religiosa presente na sociedade, como
uma das formas de promover e exercitar a liberdade de concepções e a
construção da autonomia e da cidadania, prerrogativas de um Estado laico
e democrático.
Todo conhecimento humano, inclusive o religioso, independente da
forma como foi construído, quando elaborado, torna-se patrimônio da
humanidade. Sendo patrimônio da humanidade, deve estar disponível à
escola a fim de possibilitar ao educando uma compreensão mais acurada
da realidade em que está inserido, possibilitando o desenvolvimento de
ações conscientes e seguras no mundo imediato, além de ampliar o seu
universo cultural. (MOREIRA; CANDAU, 2008)4.
A fim de atender as necessidades e garantir os direitos de
aprendizagem dos educandos, o conhecimento que transita o cotidiano
escolar apresenta certas características próprias para serem tratados na
escola, por isso denominados de conhecimentos escolares.
[...] Concebemos o conhecimento escolar como uma construção
específica da esfera educativa, não como uma mera simplificação de
conhecimentos produzidos fora da escola. Consideramos, ainda, que
o conhecimento escolar tem características próprias que o distinguem
3
4
14
O Art. 33, o primeiro a ser modificado da LDBEN nº. 9.394/1996, procede de uma
grande mobilização da sociedade brasileira, envolvendo educadores, representantes de
entidades civis, religiosas, educacionais, governamentais e não governamentais, de
diferentes setores de atuação, sensibilizados e comprometidos com a causa do Ensino
Religioso na escola pública, em nível da Educação Básica.
MOREIRA, Antônio Flávio Barbosa; CANDAU, Vera Maria. Currículo, conhecimento e
cultura. In: BRASIL, Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica.
Indagações sobre o currículo. Brasília, 2008.
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
de outras formas de conhecimento. (MOREIRA; CANDAU, 2008, p.
22).
Essas características se tornam evidentes em diferentes momentos,
sendo um deles o tratamento dado aos conhecimentos no processo de
ensino-aprendizagem. Quando ensinados na escola, não podem ser
tratados como ―cópias exatas de conhecimentos socialmente construídos‖
(MOREIRA; CANDAU, 2008, p. 23). Significa dizer que não se trata de
uma simples mudança de posição ou de lugar. Se assim fosse, a função
da escola e do professor estariam comprometidas, pois não podem ser
reduzidos a simples receptores de conhecimentos elaborados pelas
instituições produtoras do conhecimento científico e das demais áreas da
atividade humana, como o mundo do trabalho, das tecnologias, dos
movimentos sociais, da produção artística, do campo da saúde, das
atividades desportivas e corporais e outras. A escola também pode ser um
espaço de produção de conhecimentos no processo de ensinoaprendizagem.
Neste sentido, é de fundamental importância compreender que:
Para se tornarem conhecimentos escolares, os conhecimentos de
referência sofrem uma descontextualização e, a seguir, um processo
de recontextualização. A atividade escolar, portanto, supõe uma certa
ruptura com as atividades próprias dos campos de referência.
(MOREIRA; CANDAU, 2008, p. 23).
É nesta perspectiva que a formação específica para cada área do
conhecimento da educação básica tem seu fundamento. É o professor
licenciado para determinado componente curricular que poderá reunir as
condições necessárias para ler, interpretar e realizar o processo de
descontextualização e a posterior recontextualização com seus educandos
em um determinado contexto histórico-cultural, tornando assim os
conhecimentos significativos para aqueles sujeitos.
Isso posto e, diante das DCNGEB, das DCNEF e do art. 33 da LDB,
cabe perguntar: como os conhecimentos são construídos nas culturas e
tradições religiosas? Como esses conhecimentos elaborados e
sistematizados pelas ciências chegam até a escola? Quais são os desafios
e possibilidades inerentes ao processo de descontextualização e
recontextualização dos conhecimentos no Ensino Religioso? Quais são os
15
FONAPER
desafios e perspectivas para a formação de professores na área do ensino
religioso?
Discutir e socializar estudos e pesquisas relacionadas aos processos
de construção de conhecimentos nas culturas e tradições religiosas e suas
interfaces com o Ensino Religioso enquanto área de conhecimento da
educação básica, bem como oportunizar a comunicação de pesquisas e
práticas pedagógicas que dizem respeito a essa temática, foram as
intenções do VII CONERE.
Ao todo, 64 trabalhos foram aprovados pela Comissão Científica
para a publicação, os quais integram o presente volume dos Anais do VII
CONERE.
O FONAPER agradece as instituições copromotoras e apoiadoras do
evento, os membros da Comissão Organizadora e da Comissão Científica,
acadêmicos, pesquisadores e docentes de Educação Básica que
gentilmente submeteram seus trabalhos, bem como a todos os
participantes do VII CONERE, os quais, em conjunto, contribuíram para a
realização de mais um evento científico em prol da consolidação do Ensino
Religioso como área de conhecimento na Educação Básica.
Coordenação FONAPER
(Gestão 2012-2014)
16
PROGRAMAÇÃO
DATA
03/10
5ª feira
04/10
6ª feira
HORA
ATIVIDADE
C-H
16h00
Credenciamento
18h30
Solenidade de Abertura
19h00
às
21h30
Mesa I: A construção dos conhecimentos nas culturas
- tradições religiosas e não-religiosas
4h/a
8h00
às
12h00
Comunicações de trabalhos – GTs
5h/a
14h00
às
16h00
Minicursos
17h00
às
19h30
Mesa II – Os conhecimentos religiosos e nãoreligiosos na produção do conhecimento científico.
6h/a
Plenária
05/10
Sábado
19h30
Assembleia Ordinária do FONAPER
20h30
Noite Cultural
08h30
Mesa III: A (re)construção dos conhecimentos
religiosos e não- religiosos no Ensino Religioso.
Plenária
12h30
Solenidade Encerramento
5h/a
COMUNICAÇÕES
GT1: FORMAÇÃO DOCENTE PARA O ENSINO RELIGIOSO
Coordenação:
Dra. Lílian Blank de Oliveira (RELER/FURB);
Me. Simone Riske-Koch (FURB/FONAPER)
Dra. Elisa Rodrigues (UFJF)
Ementa: Ao longo da história da educação brasileira, diferentes ações foram
implementadas visando garantir a oferta de formação inicial e continuada aos
professores de Ensino Religioso. Entretanto, a partir da promulgação da Lei n.
9.475/97, a formação de docentes para esta área do conhecimento tem sido alvo
de crescente interesse, discussão e pesquisa em âmbito nacional, envolvendo a
comunidade acadêmica, sistemas de ensino e organizações da sociedade civil,
tendo em vista a necessidade de assegurar o respeito à diversidade culturalreligiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. Este GT busca
problematizar, discutir e socializar referenciais, políticas e práticas relativas à
formação inicial e continuada na área de conhecimento de Ensino Religioso na
atualidade brasileira.
Palavras-chave: Formação Docente; Ensino Religioso; Diversidade Cultural
Religiosa; Brasil.
A PRÁTICA REFLEXIVA NO CONTEXTO DE AÇÃO DO
PROFESSOR PESQUISADOR
Gleyds Silva Domingues1 - FACULDADES EST
Resumo:
A prática reflexiva torna-se o ponto chave para que o docente repense a sua ação
pedagógica, a qual não deve estar limitada ao ato de transmissão de um conhecimento
sistematizado. Antes, faz-se necessário revisitar a sua forma de pensar, agir e decidir
diante de uma situação ou processo educativo. Sendo assim, questiona-se: como a prática
reflexiva pode contribuir de forma significativa com a ação do professor-pesquisador? E
ainda, como formar o professor para o exercício de uma prática reflexiva? Diante da
questão levantada, esta pesquisa visa apontar a relevância da prática reflexiva na formação
do professor pesquisador situado no campo do ensino religioso. A intenção volta-se para
tecer uma discussão sobre a formação profissional, uma vez que tanto o processo de
ensino como de aprendizagem são demarcados por diferentes significações. A proposta,
então, apresenta como direção o desenvolvimento da formação profissional reflexiva e
como esta deve ser considerada pelo docente, no que se refere a sua ação educativa. Esse
é o desafio ou a trama a ser construída nesta investigação.
Palavras-chave: prática reflexiva; professor pesquisador; formação profissional.
Introdução
O contexto do trabalho docente torna-se referente de uma prática
profissional, a qual é revestida de códigos e linguagens que lhe dão
sentido e significação, isso porque no seu interior ocorrem representações
que são parte do fazer docente, as quais revelam concepções e saberes
oriundos, quer da experiência, quer da sistematização de conhecimentos
de natureza teórico-prática.
O fazer docente, então, é marcado por saberes que tem sua origem
nos conhecimentos tácitos e científicos, os quais foram e continuam sendo
adquiridos no processo de formação quer seja inicial ou continuada, sendo
alvos diretos da ação reflexiva, e por isso são fundamentais no ato de
repensar e ressignificar a prática educativa.
1
Doutoranda em Teologia (Faculdades EST); Bolsista da CAPES, Mestre em Educação.
Integrante do Grupo de Pesquisa Currículo, identidade religiosa e práxis educativa e
pesquisadora do Núcleo Paranaense de Pesquisas em Religião (NUPER). E-mail:
[email protected]
FONAPER
Esses saberes, ainda, são expressos no trabalho educativo e
possibilitam ao professor tecer diálogos com a realidade em que está
inserido. Isso se torna mais evidente quando os saberes são percebidos no
interior de uma prática reflexiva, a qual se apresenta na tríade relacional
ação-reflexão-tomada de decisão.
A prática reflexiva torna-se, então, o objeto eleito neste trabalho, cujo
objetivo volta-se para compreender o seu sentido no contexto do trabalho
docente, uma vez que a mesma requer do profissional professor(a) o
desenvolvimento de uma escuta atenta capaz de perceber os detalhes
envolvidos na trama relacional, em que este profissional encontra-se
inserido: a práxis educativa.
Diante disto, surge a questão problematizadora a ser investigada:
como a prática reflexiva pode contribuir de forma significativa com a ação
do professor pesquisador? E ainda, como formar o professor para o
exercício de uma prática reflexiva?
A finalidade do trabalho não é apresentar respostas pontuais sobre a
problemática levantada, antes objetiva-se discutir a questão, a fim de
contribuir com o campo de pesquisa sobre formação de professores, no
sentido de pontuar possibilidades a serem consideradas, no que diz
respeito ao fazer docente em relação à prática reflexiva.
Eis um caminho a ser trilhado. A busca começou.
Saberes, formação e identidade docente
Ao falar em formação docente faz-se necessário tecer relações entre
os saberes e a prática profissional a ser exercida, isso porque não há
prática esvaziada de sentidos, antes ela partilha de certos saberes que dão
forma e representatividade à ação educativa. Entende-se que os sentidos
incorporados ao fazer docente são construídos numa trajetória de
formação e profissionalização, visto que envolve um processo marcado por
experiências, significações e conhecimentos que comporão a identidade
profissional docente.
―A identidade não é um dado adquirido, não é uma propriedade, não
é um produto. A identidade é um lugar de lutas e conflitos, é um espaço de
construção de maneiras de ser e estar na profissão‖. (NÓVOA, 1995, p.
34). A identidade, ainda:
24
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
[...] nos permite aprender a ser o que somos, nos distanciando do que
não somos, ajuda a compreender a complexidade do nosso trabalho e
a importância do mesmo, imprime em nós um caráter, uma marca,
uma especificidade que distingue pessoas e produz conhecimento
(CUNHA, 2005, p.167).
A identidade docente, então, constitui-se de digitais que são
atinentes ao exercício de uma profissionalidade, a qual é revestida de
saberes que se tornam próprios de uma profissão. Isso porque, a
profissionalidade é ―caracterizada por um conjunto de competências,
habilidades e valores instituídos pela sociedade‖. (DOMINGUES, 2007, p.
22).
No caso brasileiro da formação profissional de professores, este
conjunto - de competências, habilidades e valores - pode ser encontrado
nas Diretrizes Curriculares de Formação de Professores, as quais são
utilizadas pelas diferentes instituições de ensino superior na organização e
construção de seus projetos pedagógicos voltados à formação docente.
Para Nóvoa (1992, p. 26):
Os professores têm de afirmar a sua profissionalidade em um universo
complexo de poderes e relações sociais, não abdicando de uma
definição ética – e, num certo sentido, militante – da sai profissão, mas
não alimentando utopias excessivas, que se viram contra eles,
obrigando-os a carregar aos ombros o peso das injustiças sociais. A
causa do mal estar dos professores prende-se, sem dúvida, à
defasagem que existe nos dias de hoje entre uma imagem idílica da
profissão docente e as realidades concretas com que os professores
se deparam no seu dia a dia.
Ainda sobre a profissionalidade docente é perceptível que a mesma
expresse de fato uma identidade real, ou seja, aquela que está
consubstanciada na realidade e não distanciada da mesma, o que torna
um grande desafio no processo de formação e profissionalização, pois
parte-se da ideia de uma prática fundamentada numa teoria e de uma
teoria fundamentada numa prática.
Afinal, ―os professores e as professoras também têm teorias que
embasam a sua prática e práticas que embasam suas teorias, e esses
conhecimentos podem ser sistematizados‖. (GERALDI et al., 1998, p. 264)
A relação teoria e prática torna-se o ponto de equilíbrio a ser
buscado no processo de formação docente, visto que é nesta busca que
os saberes serão situados e constituídos. Os saberes, então, podem ser
considerados como a expressão fundante do trabalho docente, pois
25
FONAPER
revelam posicionamentos, concepções e fazeres que foram se
consolidando no decorrer de um tempo histórico. ―A apropriação desses
saberes pelo educador pode contribuir para que sua prática seja reflexiva,
consciente e politizada‖ (BENASSULY, 2002, p. 185).
Não é à toa que os saberes são apresentados pelos estudiosos da
formação docente em categorias. Essas categorias expressam, de fato, as
significações que são representadas no fazer docente e que influenciam,
sobremaneira, a forma como este docente pensa, age e sente sobre o
exercício de sua profissão.
Weisser (1998, p. 95) sinaliza que os saberes da prática ―não são
fruto de uma transmissão, mas de uma apropriação e de uma produção;
eles estão ligados ao ator profissional, mas também à sua pessoa‖.
Os saberes imprimem o jeito de ser do docente, ou seja, eles
refletem a forma com que cada docente se afirma diante do conteúdo do
seu trabalho e também da vida. Ainda sobre os saberes, Tardif (2002)
afirma que são eles plurais, pois compreendem os conhecimentos ligados
à disciplina, ao currículo, à experiência e à formação profissional.
Na visão, ainda, de Tardif o saber tem natureza social e por isso
revela a presença de uma intencionalidade na ação do professor,
requerendo dele uma postura profissional política e ética. Isto porque, ―O
professor é alguém que deve conhecer sua matéria, sua disciplina e seu
programa, além de possuir certos conhecimentos relativos às ciências da
educação e à pedagogia e desenvolver um saber prático baseado em sua
experiência‖ (TARDIF, 2002, p. 39).
Para Gauthier (1998, p.27), a prática educativa é pautada na
―mobilização de vários saberes que formam uma espécie de reservatório
no qual o professor se abastece para responder a exigências de sua
situação concreta de ensino‖.
Assim, na tentativa de encontrar respostas para as questões
enfrentadas no cotidiano de sua ação educativa, surge a necessidade de
os professores autorrefletirem sobre suas práticas. Essa reflexão requer
posicionamento crítico diante da realidade, como também bases teóricas,
epistemológicas e práticas que substanciam seu trabalho docente.
A prática reflexiva
A reflexão é um ato que envolve escuta sensível dos sujeitos quanto
à leitura da realidade presente. Esta realidade é marcada por significações
26
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
que dão vida ao trabalho efetivado, principalmente quando este envolve o
processo de ensinar e aprender.
Afinal, ―o ensino não é um meio para conseguir certos objetivos fixos,
previamente estabelecidos, mas o espaço no qual se realizam os valores
que orientam a intencionalidade educativa (SACRISTÁN e PÉREZ
GÓMEZ, 2007, p.86)‖.
O ato do ensinar e do aprender constitui um processo relacional a ser
mediado, o que retira dele o caráter puramente técnico e transmissivo, pois
à medida que há interação o ato educativo se apresenta como uma
possibilidade aberta para o diálogo e para o enfrentamento da realidade
social, pois a partir das questões levantadas, os sujeitos autorrefletem e se
posicionam criticamente diante das problemáticas advindas de um
contexto, no sentido de buscar sentidos para o seu pensar e agir no
mundo.
A condição basilar do ensino é ―transformar a informação numa
ponte luminosa entre a realidade do aluno e a realidade da cultura, entre o
mundo do aluno e o mundo da gramática, entre a vida do aluno e a vida
das palavras (PERISSÉ, 2012, p. 14)‖.
Frente a esta realidade interacional, entende-se que o agir reflexivo
torna-se uma prática emancipatória que requer do professor uma visão
comprometida com a reconstrução social. Isso porque, ele se torna um
protagonista de sua ação, pois assume o processo de autoria que permite
a construção de novos saberes, os quais se farão presentes no processo
ensino e aprendizagem.
Desta forma, ao transpor a concepção do professor reflexivo para o
Ensino Religioso percebe-se que seu papel requer abertura para o diálogo
e, acima de tudo, a aceitação do outro. Esse outro é percebido e sentido
com toda a gama de discursos construídos, aceitos e representados na
esfera social.
A ação reflexiva do professor frente ao seu trabalho docente, ainda,
remete à prática da autonomia legitimada e consolidada, que busca nos
discursos produzidos a representação dos papeis que entram em jogo no
ato de fazer e acontecer a educação.
A ação reflexiva é um processo que implica mais do que a busca de
soluções lógicas e racionais para os problemas; envolve intuição,
emoção; não é um conjunto de técnicas que possa ser empacotado e
ensinado aos professores. A busca do professor reflexivo é a busca do
27
FONAPER
equilíbrio entre a reflexão e a rotina, entre o ato e o pensamento.
(GERALDI et al, 1998, p.248)
A reflexividade, então, não é um ato simples da prática docente, isso
porque o próprio ato revela o modo como o pensamento é projetado e
concretizado no trabalho educativo. Quando se pensa em ação reflexiva,
deve-se fazer a correlação possível entre os sujeitos em cena, a partir de
suas leituras e percepções sobre a vida e, principalmente, como esses
apreendem os objetos e os sentidos atribuídos no ato de significação e
desvelamento do desconhecido.
A reflexão não é apenas um processo psicológico individual, passível
de ser estudado a partir de esquemas formais, independentes do
conteúdo, do contexto e das interações. A reflexão implica a imersão
consciente do homem no mundo da sua experiência, um mundo
carregado de conotações, valores, intercâmbios simbólicos,
correspondências afetivas, interesses sociais e cenários políticos. O
conhecimento acadêmico, teórico, científico ou técnico só pode ser
considerado instrumento dos processos de reflexão se for integrado
significativamente, não em parcelas isoladas da memória semântica,
mas em esquemas de pensamento mais genéricos ativados pelo
indivíduo quando interpreta a realidade concreta em que vive e
quando organiza a sua própria experiência (PÉREZ GÓMEZ, 1992,
p.103).
Ao se posicionar política e historicamente, o professor reflexivo
confere novos jeitos de trabalhar o Ensino Religioso, à medida que permite
o ato de se descobrir diante do inusitado, do inesperado, do impensável e
do não crido. Nesse gesto de abertura para o diferente há a proposição da
autonomia, que confere voz e vez aos sujeitos que estão diretamente
envolvidos nas práticas cotidianas, pois o que se fala é de vida e não de
outra coisa.
A prática reflexiva no fazer docente torna-se o ponto de partida para
o exercício da alteridade, capaz de posicionamento e enfrentamento, cuja
finalidade não é o distanciamento, mas a busca pelo outro. Mais uma vez
este outro que desequilibra e torna a vida um grande desafio, assim como
o trabalho educativo a ser construído num tempo e num espaço
demarcado na história.
Ao praticar a reflexão no Ensino Religioso o que se tem em mente é
a diversidade de ideias, de ações e leituras sobre a vida. Vida significada,
experimentada e compartilhada, quer seja por um conjunto de crenças,
28
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
tradições e visões de mundo. A prática reflexiva coloca em confronto as
certezas que fundamentam o sentido de ser, estar e viver neste mundo.
A reflexão na e sobre a ação evidencia o momento entre o ato
pensado, concretizado e o que poderá ser reelaborado, que requer
registro do professor e suas ações. Esse registro não se limita a
práticas, mas são formulações e reformulações de possíveis ações,
como respostas às reflexões sobre o problema encontrado na
realidade escolar (DOMINGUES, 2007, p. 29).
Tem-se na prática reflexiva uma visão que projeta para o
desconhecido. É um ato de desvelamento, de descoberta e de aventura,
pois de fato não se busca por respostas prontas, mas por perguntas que
desafiam as certezas, o que torna esta prática um ato do sujeito, envolto
em suas percepções e subjetividades.
À guisa de conclusão
Falar da prática reflexiva na formação e prática docente requer um
olhar atento para o processo educativo em que estão imersos os
professores e as professoras, isso porque este processo não pode ser
limitado apenas ao momento de sistematização do conhecimento, pois sua
amplitude abarca as experiências e os saberes teórico-práticos que são
construídos ao longo de uma trajetória profissional.
Os saberes delineiam a identidade docente e o modo como cada
professor e professora orientam seu trabalho educativo, o que requer do
profissional uma postura comprometida com as questões éticas, políticas e
sociais em que se encontram imersos.
Pensar a reflexividade na prática docente é assumir que a mesma
possibilita tecer leituras sobre o vivido, o experenciado e o construído, quer
seja de forma subjetiva ou em conjunto com seus pares. O desafio a ser
perseguido é que o ato da reflexão se faça presente no contexto do
trabalho docente, a fim de significar o seu trabalho educativo.
Nesta direção, a reflexividade no contexto do Ensino Religioso tornase referente de uma prática que busca tecer linhas de confronto com o
estabelecido na realidade social. Assim, não há que se falar numa prática
religiosa, mas de uma multiplicidade de cosmovisões que significam a vida.
A busca pelo sentido da reflexão começa quando se toma
consciência das possibilidades a serem construídas no âmbito da prática
29
FONAPER
docente, a qual demanda novas leituras e interpretações daquele que
observa, sente, age e vive a educação. Essa é a grande diferença.
Referências
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construídos pelos docentes do ensino superior privado face às exigências
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Graduação (strictosensu) em Educação, Universidade Metodista de
Piracicaba - SP, 2007.
GAUTHIER, C. et al.Por uma teoria da pedagogia: pesquisas
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GERALDI, C. M. G.; FIORENTINI, D. e PEREIRA, E. M. DE. A.
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NÓVOA, A. (org). Os professores e sua formação. Lisboa: Dom Quixote,
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FAZENDA, I. (org.) A Pesquisa em Educação e as transformações do
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PÉREZ GOMÉZ, A. O pensamento prático do professor – a formação do
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PERISSÉ, Gabriel. A arte de ensinar. Brasília: Editora UNB, 2008.
SACRISTÁN, Juan Gimeno; PÈREZ GÓMEZ, A. I. Compreender e
transformar o ensino. Porto Alegre: Artmed, 2007.
30
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
TARDIF, Maurice. Saberes Docentes e Formação Profissional. 2a edição.
Petrópolis: Vozes, 2002.
WEISSER, M.Lesavoir de la pratique: I‟Existence precede I‟Essence.
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et laformation.INRP, n.27, p. 93-102, 1998.
31
FORMAÇÃO DOCENTE E DIVERSIDADE CULTURAL
RELIGIOSA: LICENCIATURA EM ENSINO RELIGIOSO DA FURB
Vanderlei Kulkamp (PARFOR/FURB)1
Gysselly Buzzi Puff (PARFOR/FURB)2
Adecir Pozzer (GPEAD/FURB)3
Resumo:
O presente artigo trata da formação docente do profissional de Ensino Religioso na
Fundação Universidade Regional de Blumenau (FURB) que, com base no artigo 33 da Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), visa assegurar o respeito à
diversidade cultural religiosa brasileira, em uma perspectiva de direitos humanos. Ao se
constatar grande carência de profissionais habilitados em Ensino Religioso para atuarem
nesta área do conhecimento da educação básica que, acaba sendo suprida por
profissionais com formação em pedagogia, filosofia, história e/ou outras áreas, verificamos
a relevância da licenciatura em Ensino Religioso para o estudo das diferentes
manifestações do fenômeno religioso presentes no cotidiano escolar e na sociedade de
modo a contextualizá-lo, a partir de pressupostos científicos e em perspectivas de direitos
humanos. Consideramos o Ensino Religioso, enquanto área de conhecimento e
componente curricular, um espaço privilegiado para o acesso aos conhecimentos
produzidos pelas culturas – tradições religiosas e não-religiosas, contribuindo
significativamente na construção de relações alteritárias na diversidade cultural religiosa.
Palavras-chave: Formação docente; Licenciatura em Ensino Religioso na FURB;
Diversidade Cultural Religiosa; Direitos Humanos.
1
2
3
Acadêmico da 8ª fase do Curso de Ciências da Religião: Licenciatura em Ensino
Religioso (PARFOR – Rio do Sul), da Universidade Regional de Blumenau (FURB).
Licenciado em Filosofia pela Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL).
Professor de Ensino Religioso na Rede Municipal de Agronômica/SC e de Filosofia na
Rede Estadual de Educação de Santa Catarina, Ensino Médio, na cidade de Rio do
Sul/SC. E-mail: [email protected]
Acadêmica da 8ª fase do Curso de Ciências da Religião: Licenciatura em Ensino
Religioso (PARFOR – Rio do Sul), da Universidade Regional de Blumenau (FURB).
Licenciada em Química pela FURB. Professora de Química e Ensino Religioso na Rede
Estadual de Educação de Santa Catarina, Ensino Fundamental e Médio, na cidade de
Lontras/SC. E-mail: [email protected]
Mestrado em Educação pela UFSC; Graduação em Ciências da Religião - Licenciatura
em Ensino Religioso pela FURB (2010); Especialização em Formação de Professores
para o Ensino Religioso pela PUCPR (2006). Bacharel em Ciências Religiosas pela
PUCPR (2002). Membro dos grupos de Pesquisa Ethos, Alteridade e Desenvolvimento
(GPEAD/FURB) e Arte e Educação da linha Filosofia da Educação (GRAFIA/UFSC).
Coordenador do Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso (FONAPER 20122014). Professor de Ensino Religioso Rede Pública do Estado Santa Catarina, da
Associação Franciscana Senhor Bom Jesus e no Curso de Ciências da Religião –
Licenciatura em Ensino Religioso na FURB/PARFOR. Atua na área da Educação, com
ênfase nos seguintes temas: diversidade cultural religiosa, ensino religioso, formação de
professores e direitos humanos. E-mail: [email protected]
FONAPER
Introdução
Pensar a formação docente no Brasil requer uma ampliação de
olhares para além dos momentos formais pelos quais os formandos são
submetidos nos inúmeros processos formativos. Significa dizer que é
necessário compreender o conceito de formação no intuito de identificar os
pressupostos, princípios e valores que orientaram e orientam os processos
de formação presentes na atualidade.
Não nos deteremos na realização de uma análise histórica do
conceito e dos processos de formação de modo geral, apenas nos
propomos puxar um ―fio‖ da grande ―teia‖ que, de certa forma, incide
diretamente com a formação docente para o Ensino Religioso. Este ―fio‖
que nos dispomos refletir se refere à relação entre a diversidade cultural
religiosa e a formação docente para o Ensino Religioso no Brasil, com
especial atenção a licenciatura de Ensino Religioso da FURB.
É sabido, pois, que uma das marcas da sociedade brasileira é a
presença de inúmeras identidades culturais que, cada qual, trouxe crenças
e formas diversificadas de manifestá-las. Esta marca estava/está presente
nos diferentes grupos indígenas, ampliada e ao mesmo tempo negada com
a vinda dos colonizadores, seguida com o tráfico de africanos tornados
escravos, com os processos de imigração e mais recentemente com o
processo de mundianização.
Estes encontros entre culturas e crenças religiosas e não-religiosas
geraram sincretismos e despertaram a consciência de muitos para a
importância do respeito à diferença e a dignidade4 do outro5, porém,
4
5
34
Todo ser humano é portador de dignidade por ser diferente. O outro interpela o eu por
reconhecimento. O eu não poderá anular o outro ou simplesmente reduzi-lo ao mesmo.
Emerge daí a diferença que constitui cada pessoa, sob a qual se constroem as
identidades humanas. ―[...] A dignidade humana não provém do Estado e nem é criada
pela ordem jurídica ou simplesmente atribuída ao ser humano. A dignidade humana
fundamenta-se no ser sujeito e pessoa, do ―ser humano‖ como tal. Ela implica numa
existência anterior ao princípio da ordem jurídica do Estado. Ela interpela eticamente
pelo reconhecimento da alteridade absoluta. Ela é conquista, afirma uma nova
consciência histórica para ser humanamente no mundo social e político. É anterior a
qualquer direito estabelecido pelo Estado‖ (SIDEKUM, 2011, p. 40).
Para Levinas, o ―Outro‖ existe independentemente da intencionalidade do ―eu‖. É
totalmente diferente do ―eu‖. Totalmente livre diante do ―eu‖. ―O Outro metafísico é outro
de uma alteridade que não é formal, de uma alteridade que não é simples inverso da
identidade nem de uma alteridade feita de resistência ao Mesmo, mas de uma
alteridade anterior a toda a iniciativa, a todo imperialismo do mesmo; outro de uma
alteridade que constitui o próprio conteúdo do Outro; outro de uma alteridade que não
limita o mesmo, porque nesse caso o Outro não seria rigorosamente Outro: pela
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
possibilitou também a construção de preconceitos em relação à diferença
cultural e religiosa, gerando discriminação, invisibilização e estigmatização
do outro, sendo colonizado e não reconhecido em sua alteridade.
Na esteira deste contexto marcado pela diversidade cultural religiosa
é que diferentes conceitos e encaminhamentos na área da formação foram
se construindo e, em grande parte da história, reforçando certos
preconceitos referentes às crenças religiosas. No tocante ao Ensino
Religioso, a formação docente para as conhecidas ‗aulas de religião‘, de
‗educação religiosa‘ até na década de 1990 estava centrada nas
instituições religiosas cristãs. Segundo Caron (1997), esses professores
tinham formação em cursos de Teologia, Ciências Religiosas, Catequese,
Educação Cristã ou outras formações similares.
Deste modo, o Ensino Religioso tinha caráter confessional cristão.
Neste período ainda não existiam cursos de graduação com o objetivo de
formar profissionais habilitados para o Ensino Religioso, sendo capazes de
compreender o fenômeno religioso em suas diferentes manifestações
culturais religiosas, bem como as inúmeras linguagens religiosas ou não, a
partir de pressupostos científicos.
De acordo com Figueiredo (1994), as primeiras iniciativas para a
formação docente em Ensino Religioso de caráter não confessional,
surgiram no Sul do Brasil, especificamente no Estado de Santa Catarina.
Essas iniciativas são decorrentes das amplas discussões e estudos
iniciados nos anos 1970, principalmente a partir da Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (LDBEN), nº 5.692/1971, mas, surgem
também para atender ao art. 33, da Lei nº 9.394/1996, cuja redação fora
alterada pela Lei nº 9.475/19976.
Após algumas tentativas sem êxito de criar cursos de licenciatura em
Ensino Religioso no Estado de Santa Catarina7, a FURB, tendo recebido a
coordenação do Conselho Interconfessional para a Educação Religiosa
6
7
comunidade da fronteira, seria, dentro do sistema, ainda o Mesmo‖ (LEVINAS, 1980, p.
26).
―O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do
cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino
fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas
quaisquer formas de proselitismo‖ (BRASIL, 1997).
De acordo com Oliveira (2003), já em 1972 foi elaborado o primeiro projeto de curso de
licenciatura de Ensino Religioso. Outros dois projetos foram elaborados em 1973 e entre
1985 a 1990, de forma articulada com a Secretaria Estadual da Educação. Porém,
nenhum obteve êxito na sua implementação.
35
FONAPER
(CIER) e de representantes da Secretaria da Educação e do Desporto de
Santa Catarina (SED), em outubro de 1995, avaliou e acolheu a proposta
de ofertar licenciatura em Ensino Religioso. Para esta área do
conhecimento da educação básica, criava-se aí a primeira licenciatura do
país, exigindo e desafiando para uma nova perspectiva de formação
docente.
Neste sentido, pretendemos refletir alguns aspectos que, com base
na experiência de estarmos envolvidos com esta formação, reconhecemos
como diferenciais para o exercício da docência na atualidade, no intuito de
afirmar o quanto é relevante uma formação fundamentada em uma
perspectiva interreligiosa e intercultural em vista de uma educação
emancipadora.
Diversidade cultural religiosa brasileira: invisibilizações e reconhecimento
Tratar da diversidade religiosa presente na sociedade brasileira
implica compreender como a pluralidade de culturas está imbricada aos
processos históricos, políticos e sociais que, de uma forma ou de outra,
perpassam os processos formativos, tanto acadêmicos quanto escolares.
Antes de qualquer coisa, é preciso lembrar que a diversidade
religiosa foi (e continua) se constituindo nos encontros e/ou desencontros
entre as culturas, em que a dimensão transcendental foi sendo
representada e tomando forma de crenças fundadas em mitos, vivenciada
e representada em rituais e símbolos específicos.
Por cultura, concordamos que é o arcabouço para a sobrevivência e
o desenvolvimento do ser humano, por possibilitar aprendizagens, sentidos
e significados (SIDEKUM, 2009). O mesmo autor complementa tal
definição afirmando que ela é:
[...] todo o ato de aprender a viver e o processo de humanizar-se.
Cultura passa a ser o processo de humanização. Assim, podemos
definir a cultura como o modo de viver do ser humano. Pela cultura o
homem supera o que lhe é dado pela natureza. Portanto, a cultura é
todo o processo com o qual ele se transforma: a sociedade e o mundo
material. [...] A cultura compreende-se a partir da criatividade humana.
Essa criatividade é sua característica fundamental. O caráter
antropológico é a divisa que se estabelece com um mundo dado. [...] A
cultura expressa o desenvolvimento das habilidades cognitivas e
espirituais do ser humano. Além da ideação do mundo, o ser humano
é impulsionado para a transformação do mundo (SIDEKUM, 2009, p.
58-60).
36
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Todas as culturas produziram crenças religiosas frente aos
processos de compreensão e explicação dos fenômenos naturais e
humanos que incidiam sobre os corpos humanos e influenciavam o
ambiente que viviam. De acordo com Martini (1995), na raiz de toda
criação cultural reside uma possibilidade de transcendência. A capacidade
de transcender é uma dimensão inerente ao ser humano e esta integra
tudo o que está em seu envolto. Por isso, o ser humano foi deixando
marcas ao longo da história que o caracteriza como homo religiosu que, de
acordo com Eliade (2001), é a abertura às manifestações inteiramente
diferentes das realidades consideradas ―naturais‖.
O religioso, expresso em diferentes religiosidades e tradições
religiosas, passa a ser entendido como parte de uma totalidade,
corresponsável pela vida. Para Eliade, buscar conhecer o universo
transcendental e as situações assumidas pelo ser humano religioso é fazer
avançar seu conhecimento como um todo, embora se saiba que,
[...] a maior parte das situações assumidas pelo homem religioso das
sociedades primitivas e das civilizações arcaicas há muito tempo
foram ultrapassadas pela história. Mas não desapareceram sem
deixar vestígios: contribuíram para que nos tornássemos aquilo que
somos hoje; fazem parte, portanto, da nossa própria história (ELIADE,
2001, p. 164).
No Brasil, as crenças religiosas dos povos ancestrais indígenas e
africanos foram relegadas, negadas e invisibilizadas pelos colonizadores,
os quais impuseram outra crença, a cristã. Aos que se negavam à
conversão, à perseguição e ao não reconhecimento social e político. Além
dos povos ancestrais indígenas, passaram pelas mesmas restrições e
perseguições integrantes das religiões afro-brasileiras, judaicas e
protestantes, até a Proclamação da República. A diversidade cultural
religiosa era tida como uma ameaça ao fundamento em que a sociedade
brasileira estava organizada (FONAPER, 2000).
A concepção etnocêntrica, monocultural e colonialista não
permitia/permite ver/aceitar/acolher a diversidade cultural e religiosa que
constitui a sociedade brasileira. Com o processo de imigração iniciado no
século XIX e intensificado no século seguinte, juntamente com as lutas de
movimentos étnicos, sociais e religiosos ocorreu um processo de
ampliação e percepção da diversidade cultural religiosa. Mesmo assim, tal
37
FONAPER
processo se mostrou insuficiente e lento enquanto reconhecimento social e
político de inúmeras identidades culturais/religiosas.
É perceptível que, mesmo após as reformas educacionais, o modelo
etnocêntrico e monocultural permanece em propostas pedagógicas, em
currículos de formação docente, produções de materiais didáticos,
paradidáticos e outros, manifestando que, em certa medida, a própria
educação e demais processos formativos têm se mostrado
corresponsáveis na reprodução do pensamento monocultural. Pode-se
dizer que, ora ela assume oficialmente, ora oficiosamente valores da
cultura religiosa eurocêntrica, judaico-cristã, masculina, branca, negando
e/ou desconsiderando o religioso presente no substrato das diferentes
culturas.
Na Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural, da UNESCO,
publicada em 2002, a diversidade cultural é reconhecida como um
patrimônio da humanidade. Do conjunto de elementos que constituem as
culturas, não é possível excluir a dimensão das crenças religiosas, pois
são parte da cultura e, de uma forma ou de outra, exercem influência na
formação das identidades dos sujeitos.
Mesmo que, aparentemente, as diferenças culturais e religiosas
―convivam bem‖ no Brasil, é preciso afirmar que o contexto é complexo e
(re)produtor de exclusões, desafiando fundamentalmente os processos
formativos para que ampliem suas reflexões, estudos e práticas a fim de
superar processos que invisibilizam, discriminam e colonizam o outro em
sua alteridade.
Neste sentido, cabe destacar que a perspectiva intercultural e
interreligiosa tem despertado o interesse de educadores que,
comprometidos em assegurar o respeito e o (re)conhecimento da
diversidade religiosa no campo educacional, têm procurado refletir e
encaminhar práticas de caráter intercultural.
A formação da identidade do docente em ensino religioso
O reconhecimento do perfil do profissional de Ensino Religioso
possibilita o exercício da cidadania e a construção de uma relação
respeitosa com o diferente. O fato de acolher e aceitar o diferente e suas
diferenças permite conhecer o outro em mim mesmo. A partir desta atitude
38
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
compreendemos que cada pessoa é única e irrepetível, digna de
reconhecimento e respeito.
Deste modo, não é possível tornar o outro igual ao mesmo, pois,
acarretaria anulação total do outro, mas o que pode ocorrer são tentativas
de redução, causadas pela pouca liberdade e responsabilidade em
assumir a própria vida diante daquele/daquilo que a ameaça e,
principalmente diante de processos subalternos e colonizantes que
discretamente se desenvolvem na sociedade.
No decorrer da história, o professor da Educação Básica conviveu
com a desvalorização profissional.
A desvalorização do professor de educação básica (antigo primário e
ginásio e, depois, Ensino Fundamental; ensino secundário e, hoje,
Ensino Médio) é continuação do longo processo histórico da educação
no Brasil desde os tempos dos jesuítas, passando pela era pombalina,
que a República não conseguiu superar (CORDEIRO, 2010, p. 128).
Nas relações que o ser humano desenvolve, o uso das linguagens
tem de favorecer a construção de uma ética da comunicação capaz de
proporcionar transformações no convívio entre educandos e educadores.
Mas, a alteridade do outro não pode ser compreendida na sua totalidade,
pois acessamos o outro por meio da linguagem, e esta tem se
demonstrado limitada e falível, especialmente quando se trata do
entendimento do outro na sua infinitude.
A linguagem é a maneira mais complexa que o ser humano criou para
se relacionar com o mundo; ele faz a humanidade ser. Desde a
fecundação, a fala do grupo familiar já integra o indivíduo no nível
sociocultural da existência, transmitindo expectativas, escolhendo
nomes, relatando a experiência e progressos no seu crescimento. A
linguagem é a possibilidade concreta de os dados brutos da realidade
tornem objeto de conhecimento. A fala permite às gerações transmitir
o processo de interação com a natureza e elaborar a compreensão
sobre elas (ANDRADE,1993, p.22).
O ser humano nunca está pronto e, por ser inacabado, sempre
permanece buscando o conhecimento de si mesmo e do outro que, de
uma forma ou de outra, dá sentido a sua existência. Por isso, o espaço
escolar tem maior relevância quando compreendido como espaço de
construção de identidades individuais e coletivas, sendo a identidade e
alteridade do outro o imperativo ético para continuar pensando e agindo
39
FONAPER
não a partir de uma ―egologia‖, mas sim, a partir do outro, proposta
filosófica de Emmanuel Levinas8.
O reconhecimento da identidade e da alteridade do outro e do outro
em mim nos processos de formação docente encontra-se desafiada pela
globalização, o que tem trazido sérias consequências à educação. Os
elementos norteadores desta ideologia tentam inculturar nos formandos a
prática do consumismo, do individualismo, em que o ‗ter‘ tem muito mais
importância que o ‗ser‘. Assim sendo, pode-se cair no risco de formar
analfabetos funcionais.
Formação docente e a licenciatura em Ensino Religioso na FURB
Na atualidade, a formação do professor de Ensino Religioso
apresenta-se cercada por inúmeros desafios. De um modo geral, no Brasil,
é possível encontrar correntes que defendem a exclusão deste
componente curricular. Outras correntes defendem a permanência do
Ensino Religioso, mas de caráter confessional. Outra corrente defende a
permanência do Ensino Religioso laico, independente de qualquer
confissão religiosa e sem qualquer tipo de proselitismo. Mas, se há uma
legislação (Art. 210 da Constituição Federal; Art. 33 da LDB) e esta indica
uma concepção (assegurar o respeito à diversidade cultural religiosa, sem
proselitismo), por que tantas dificuldades para efetivamente pensar a oferta
de formação docente, bem como sua oferta por parte dos sistemas de
ensino, nesta perspectiva?
Com a promulgação da Lei nº 9.475/1997, que alterou a redação do
art. 339 da Lei nº 9.394/1996, inaugurou-se uma nova identidade deste
componente. O Ensino Religioso perde seu caráter confessional e/ou
interconfessional e adquire status de estudo do fenômeno religioso na
diversidade cultural religiosa do Brasil. A partir disso, surgem novas
demandas, especialmente voltadas à formação docente para esta área do
8
9
40
Para aprofundamentos, ver Tese de Doutoramento de Marcos Alexandre Alves, UFPEL,
2011, intitulada ―Pedagogia da Alteridade: O Ensino como Acolhimento Ético do Outro e
condição crítica do saber em Levinas‖.
O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do
cidadão, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas do ensino
fundamental, assegurando o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas
quaisquer formas de proselitismo (BRASIL, 1997).
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
conhecimento (Cf. Resolução CNE/CEB nº 2 e Resolução CNE/CEB nº
4/2010).
O Ensino Religioso, enquanto área de conhecimento e componente
curricular tem de proporcionar o conhecimento dos elementos básicos que
compõem o fenômeno religioso partindo das experiências religiosas e não
religiosas percebidas e vivenciadas no contexto dos educandos. Os
conteúdos do Ensino Religioso presentes no currículo visam garantir o
direito à diferença, promovendo a construção de relações interpessoais,
interculturais e interreligiosas, efetivando assim os princípios da
Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Para alcançar estes objetivos, faz-se mister formar docentes que
sejam
capazes de desempenhar este papel na educação básica,
confrontando processos que reduzem o ser humano a lógica instrumental e
monocultural. Os docentes precisam ter consciência da complexidade
sociocultural da questão religiosa no ambiente escolar, estando abertos e
sensíveis à diversidade cultural religiosa, mediando diálogos, conflitos a
fim de garantir aprendizagens e o direito à expressão do pensar, crer, ser e
viver.
Como em todas as áreas de conhecimento, exige-se também do
profissional de Ensino Religioso, sensibilidade e responsabilidade frente às
pessoas que são parte dos processos formativos. Justifica-se com isso a
necessidade de profissionais que estejam devidamente preparados para o
exercício da docência no ambiente escolar.
Configuram algumas exigências para o profissional de Ensino
Religioso:
Compreenda o fenômeno religioso, contextualizando-o espacial e
temporalmente; Configure o fenômeno religioso através das ciências
da religião; Conheça a sistematização do fenômeno religioso pelas
tradições religiosas e suas teologias; Analise o papel das Tradições
religiosas na estruturação e manutenção das diferentes culturas e
manifestações sócio-culturais; Faça a exegese dos Textos Sagrados
orais e escritos das diferentes matrizes religiosas (africanas,
indígenas, ocidentais e orientais); Relacione o sentido da atitude
moral, como consequência do fenômeno religioso sistematizado pelas
Tradições Religiosas e como expressão da consciência e da resposta
pessoal e comunitária das pessoas (FONAPER, 1998, p. 11).
A formação acadêmica deste profissional deve auxiliar no estudo e
desenvolvimento de suas habilidades e competências. Uma das
dificuldades encontradas na atualidade é o número de profissionais
41
FONAPER
devidamente preparados e qualificados para a prática docente deste
componente. Por isso, encontramos situações onde professores
habilitados em outras áreas de conhecimento estão assumindo aulas de
Ensino Religioso com o intuito de complementar sua carga horária, sem
formação alguma.
As habilidades e competências que o profissional de Ensino
Religioso precisa adquirir durante a sua formação acadêmica são
múltiplas. Entre elas convém destacar a relação entre teoria e prática
através de uma formação sólida na área das ciências humanas, onde
conhecimentos religiosos de matriz indígena, africana, oriental e semita se
articulam em diferentes áreas como a Antropologia, Sociologia, Filosofia,
História, Geografia, Psicologia, Teologia, Ética e outras.
Com base no histórico de 18 anos - desde a instalação do Fórum
Nacional Permanente do Ensino Religioso – FONAPER, ele propõe que a
formação específica para o professor de Ensino Religioso em nível
superior, deve se dar por meio de licenciatura, precisa estar alicerçada em
dois pressupostos curriculares: o epistemológico, que tem suas bases nas
Ciências Sociais, especificamente nas Ciências da Religião e o
pedagógico, que se fundamenta nas Ciências da Educação. Estes
pressupostos necessitam estar articulados, sem que um se sobreponha ao
outro, mas que se complementem visando à formação docente
(FONAPER, 2008).
Na proposta de Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de
graduação em Ciências da Religião – Licenciatura em Ensino Religioso,
elaborada a partir dos debates realizados no X Seminário Nacional de
Formação de Professores para o Ensino Religioso pelo FONAPER e,
encaminhado à presidente do Conselho Nacional de Educação (CNE),
Professora Clélia Brandão Alvarenga Craveiro, em 4 de dezembro de
2008, assim propôs a contemplação dos dois pressupostos acima citados
no art. 7º:
O curso de Graduação em Ciências da Religião – Licenciatura em
Ensino Religioso terá a carga máxima de 2.800 horas de efetivo
trabalho acadêmico, assim distribuído:
I – 1.800 horas de conteúdos curriculares de natureza científicoculturais específicos no campo das Ciências da Religião e da
Educação, incluindo atividades formativas como assistências às aulas,
realização de seminários e participação na realização de pesquisas;
42
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
II – 400 horas de prática como componente curricular, realizadas
articuladamente às questões metodológicas dos conteúdos
curriculares de natureza científico-cultural;
III – 400 horas dedicadas ao Estágio Supervisionado em todos os
níveis da Educação Básica, caracterizadas por um trabalho práticoreflexivo devidamente acompanhado pelos docentes do curso, no qual
os graduandos desenvolverão atividades pedagógicas rigorosamente
planejadas;
IV – 200 horas de atividades complementares de cunho acadêmicocientífico-cultural em áreas específicas de interesse dos licenciados,
articulados ao campo das Ciências da Religião e da Educação
(FONAPER, 2008).
Outros aspectos fundamentais à formação docente para o Ensino
Religioso devem ser considerados, como: ter consciência crítica com
espírito investigativo, visão ampla da realidade/mundo/cosmo,
conhecimento do ser humano como um ser inacabado em contínuo
desenvolvimento, capacidade de discernimento e maturidade no exercício
de sua profissão, domínio dos conteúdos a serem estudados neste
componente, abertura à diversidade cultural e religiosa, senso de
responsabilidade perante o Outro, estímulo à pesquisa de campo.
Um professor de Ensino Religioso não pode reduzir sua formação ao
domínio dos saberes de diferentes culturas e tradições religiosas, mas,
para além destes conhecimentos necessários, precisa ter sensibilidade e
responsabilidade referente às questões que dizem respeito ao ser humano
em sua dignidade e alteridade, identificando e erradicando práticas
prosélitas na escola e na sociedade que depõem contra os direitos
humanos.
Nesta perspectiva e atendendo os imperativos legais no que se
refere à formação docente e às necessidades regionais, o Curso Ciências
da Religião: Licenciatura em Ensino Religioso da FURB reelaborou sua
proposta curricular no ano de 2011.
O objetivo do curso consiste em:
Auxiliar o acadêmico na construção de um referencial teóricometodológico que viabilize uma leitura e compreensão crítica dos
fenômenos religiosos na diversidade cultural, permitindo a construção
de uma sociedade justa, solidária e livre, capaz de reconhecer na
alteridade a dignidade de todas as formas e expressões de vida
(OLIVEIRA; RISKE-KOCH, 2012, p. 473).
43
FONAPER
De acordo com as mesmas autoras, espera-se que com essa
proposta curricular se atinja os seguintes objetivos enquanto curso de
graduação:
a) Habilitar o acadêmico para o exercício pedagógico em Ensino
Religioso na Educação Básica; b) Investigar e compreender a
dimensão educativa da escola e sua interação com a família,
comunidade e sociedade em suas diversidades; c) Situar o estudo dos
fenômenos religiosos no âmbito das ciências humanas; d)
Sistematizar categorias, conceitos e práticas que expressem
diferentes ideologias e relações com o que transcende as vivências
humanas; e) Estudar os fenômenos religiosos na complexidade das
relações sociais, culturais, políticas e pedagógicas, compreendendoos a partir de perspectivas inter e transdisciplinares; f) Analisar o papel
das tradições religiosas e não religiosas na organização e
estruturação das realidades sociais, históricas, políticas e culturais; g)
Reconhecer e respeitar as diversidades e complexidades das
diferentes manifestações e experiências religiosas nas sociedades e
culturas, combatendo a discriminação e quaisquer formas de
proselitismo no contexto escolar e social; h) Atuar com sensibilidade
ética, responsabilidade e compromisso, na perspectiva da constituição
de uma sociedade justa, solidária e humana, que indaga e busca
intervir nas fontes geradoras do sofrimento, da ignorância e da
injustiça; i) Conhecer as disposições previstas nas legislações do
magistério e específicas para os profissionais de Ensino Religioso
(OLIVEIRA; RISKE KOCH, 2012, p. 473-474).
Atingir estes objetivos significa formar professores para o Ensino
Religioso conscientes do compromisso enquanto gestores do
conhecimento, prática que deve ter como pano de fundo a criticidade.
Princípios éticos devem orientar a construção e/ou contextualização dos
saberes que transitam o cotidiano escolar, a fim de conviver com as
diversidades em uma perspectiva democrática e emancipatória, superando
práticas de invisibilização, discriminação e colonização do Outro.
Nesta perspectiva que o Curso Ciências da Religião com licenciatura
em Ensino Religioso da FURB reorganizou sua proposta curricular,
definindo em sua matriz curricular um total de 3.474 horas. Estas estão
distribuídas em 2.322 horas para componentes de caráter científicoculturais e pedagógicas; 414 horas eixo articulador das licenciaturas; 486
horas destinadas à realização de estágios curriculares supervisionados na
educação básica e 252 horas para atividades acadêmicas científicoculturais de cunho extracurricular (FURB, 2011).
44
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
A organização curricular se distribui em áreas temáticas que, se
desdobram em um Eixo Geral que inclui componentes de outras áreas, e
um Eixo Específico que caracteriza a identidade de cada curso.
No Eixo Geral das licenciaturas, encontram-se os seguintes
componentes: Currículo e Didática; Psicologia da Educação; Humanidade,
Educação e Cidadania; Libras; Pesquisa em Educação; Políticas Públicas
e História e Legislação de Ensino e Produção de Texto I e II; Disciplina
Optativa I (FURB, 2011).
Já no Eixo Específico do Curso Ciências da Religião com licenciatura
em Ensino Religioso, os componentes são: Arte, Cultura e Religião;
Cosmovisão das Religiões e dos Movimentos Religiosos; Culturas e
Fenômenos Religiosos; Desenvolvimento Humano e Religiosidade;
Diálogos Interculturais e Diversidade Religiosa; Direitos Humanos e
Educação; Educação e Interculturalidade; Educação Inclusiva; Ensino
Religioso no Brasil I, II; Epistemologias e Fenômenos Religiosos; Estágio
em Ensino Religioso I, II, II, IV, V; Estética, Ética e Formação Docente;
Éticas; Fenômenos Religiosos e Desafios Contemporâneos; Filosofia e
Humanidade, Gestão, Planejamento e Avaliação Educacional; Histórias
Religiosas da América Latina; Introdução aos Textos e Narrativas
Sagradas; Linguagens e Fenômenos Religiosos; Meio Ambiente,
Sociedades e Tradições Religiosas; Metodologia do Ensino Religioso I, II;
Movimentos Sociais e Espiritualidades; Pesquisa em Ensino Religioso;
Religião, Ciência e Tecnologia; Sociedades, Religiões e Territórios;
Planejamento e Avaliação Educacional; Textos e Narrativas Sagradas
Indígenas; Textos e Narrativas Sagradas Africanas; Textos e Narrativas
Sagradas Orientais e Textos e Narrativas Sagradas Semitas (FURB,
2011).
Enquanto egresso e acadêmicos do Curso, ressaltamos a
significativa contribuição desta licenciatura na formação docente, pois, por
meio de sua proposta inovadora busca articular o ensino, a pesquisa e a
extensão, levando a um comprometimento acadêmico e social do
formando com as realidades que requerem outras práticas educacionais e
sociais, a fim de superar e combater situações desumanas de
desigualdades, invisibilizações e discriminações, que impedem o
(re)conhecimento da alteridade dos diferentes sujeitos históricos que estão
ou não em processos formativos.
45
FONAPER
Considerações finais
Se o Ensino Religioso é uma possibilidade real para o estudo das
diferenças culturais e religiosas na educação básica assegurando o direito
a ter uma ou outra religião, ou inclusive de não ter nenhuma; se, enquanto
área de conhecimento e componente curricular, o Ensino Religioso deve
disponibilizar e proporcionar o acesso ao conjunto de conhecimentos
religiosos produzidos pela humanidade e; se legalmente o Ensino
Religioso deve ser ofertado pela escola, em que medida uma formação
docente nesta perspectiva que tratamos, poderá contribuir para novos e
outros encaminhamentos relativos a oferta do Ensino Religioso nas
escolas, bem como a ampliação da formação para atender as demandas
educacionais e sociais?
A formação docente para o Ensino Religioso é fundamental que se
dê por meio de licenciatura em uma perspectiva interreligiosa e
intercultural, identificando e estudando as diferentes linguagens religiosas
e outras que o ser humano utiliza na construção e manutenção de
respostas e significados para sua existência. Formar para a sensibilidade e
responsabilidade em relação ao Outro, enquanto um sujeito histórico
constituído por subjetividade e singularidades, requer outros olhares,
encaminhamentos e práticas, capazes de subsidiar os docentes para o
desenvolvimento de processos democráticos e emancipatórios.
Neste sentido, ressaltamos a contribuição desta licenciatura à
formação humana e acadêmica para a prática docente do Ensino
Religioso. Não reduz a formação a aplicabilidade de uma dada ciência.
Forma para um olhar crítico do conhecimento seja religioso ou não, tendo
em vista uma docência que de fato garanta o direito à aprendizagem e ao
desenvolvimento dos formandos, necessários para construir mundos
possíveis, sustentáveis e justos.
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48
A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DO ENSINO RELIGIOSO NUMA
PERSPECTIVA INCLUSIVA
Ana Cristina de Almeida Cavalcante Bastos1 – UFPB
Resumo:
O Ensino Religioso, numa visão epistemológica e pedagógica, é o lócus privilegiado para
promoção do reconhecimento e assunção cultural (FREIRE, 1996) das pessoas
pertencentes às minorias, dentre elas, as pessoas com deficiência. Essa pesquisa busca
analisar a formação continuada dos professores de Ensino Religioso nas escolas da Rede
Municipal de João Pessoa em educação especial/inclusiva. Pretende-se perceber como os
conceitos de inclusão/exclusão e diversidade se aplicam no resultado, responder a
indagação sobre a contribuição do Ensino Religioso para a inclusão do aluno com
deficiência no ambiente escolar, de forma a perceber se os professores se sentem
subsidiados com conhecimentos teóricos e práticos nesta área específica, para promover a
formação integral de seus alunos.
Palavras-Chave: Formação continuada; Pessoa com deficiência; Educação inclusiva;
Ensino religioso;
Introdução
O Ensino Religioso (ER), normatizado pela Lei 9.475 de 22/07/97,
caminha na transformação de uma hegemonia monocultural, resquício de
um ensino religioso confessional e interconfessional para uma concepção
focada no reconhecimento das diferenças, no respeito à diversidade
cultural/religiosa e no combate ao preconceito e intolerância.
O ER tem seus Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNERs
alicerçados nos princípios de cidadania, respeito à diversidade, tolerância
no entendimento do outro e na relação do ser humano em sua busca pelo
transcendente.
No texto ―Concepção de ensino religioso no FONAPER: Trajetórias
de um conceito em construção‖, o autor faz uma análise da importância do
Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso – FONAPER em seus 15
anos de existência, para a busca da ―ampliação, aprofundamento e
1
Professora da Rede Estadual à disposição da Fundação Centro Integrado de Apoio ao
Portador de Deficiência – FUNAD/Paraíba, atuando como reabilitadora na Assessoria de
Educação Especial – Professora da Educação de Jovens e Adultos da Rede Municipal
de João Pessoa – PMJP/PB – Graduada em Estudos Sociais – UEPB/PB e Pedagogia –
UVA/CE – Especialista em Psicopedagogia Institucional – CINTEP/PB – Mestranda em
Ciências da Religiões UFPB. E-mail: [email protected]
FONAPER
efetivação de uma concepção de ER enquanto parte integrante da
formação básica do cidadão‖ (POZZER, 2010, p. 84). O mesmo autor
afirma que:
Esse entendimento levou o FONAPER a propor um objeto de estudo,
objetivos, encaminhamentos didáticos e metodológicos, eixos de
conteúdos e pressupostos para avaliação, buscando sustentação
epistemológica e pedagógica para o ER, o qual constantemente é
desafiado a mostrar sua importância na superação de preconceitos,
no tratamento adequado às culturas e grupos religiosos silenciados,
invisibilizados,
negados
e/ou
exotizados,
ao
propor
o
(re)conhecimento do diferente e suas diferenças a partir de, com e em
relações alteritárias.
Dessa forma, o ER torna-se um componente curricular apropriado
para trazer à tona as questões pertinentes à busca da construção de uma
educação inclusiva, voltada para garantir não somente o acesso de todos
os alunos, mas sua permanência com sucesso num ambiente escolar
acolhedor.
Desenvolvimento
A educação inclusiva, entendida como um processo em construção
de cunho mundial2, que implica no acesso e permanência de todos os
alunos na escola, conjuga igualdade e diferença como valores
indissociáveis (Brasil, 2008). Para tanto, requer adoção de práticas
pedagógicas que valorizem as potencialidades e a produção de
conhecimentos, segundo o ritmo e possibilidades de cada aluno,
independente de sua condição social, etnia ou deficiência que possua.
Uma série de documentos filosóficos e normativos de âmbito
internacional e nacional oferece subsídios e diretrizes para cada vez mais
erradicar a exclusão e favorecer o fortalecimento da Política Nacional da
Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva em todo o
território brasileiro. A própria Constituição Brasileira, nossa Carta Magna
em seu Art. 3, diz que se deve ―promover o bem de todos, sem
2
50
O compromisso com a construção de sistemas educacionais inclusivos possui a
orientação de documentos de âmbito internacional, a partir da Declaração Universal dos
Direitos Humanos (1948), seguido da Declaração de Jontiem (1990), Declaração de
Salamanca (1994), Declaração de Guatemala (1998) e Convenção da ONU (2008), que
em seu artigo 24, garante, que nenhuma pessoa com deficiência seja excluída do
sistema educacional geral sob alegação de deficiência‖.
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas
de discriminação‖; Já o Art. 5º diz que ―Todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza‖ e o Art. 206. Diz que um dos princípios
para ministrar o ensino é ―Igualdade de condições para o acesso e
permanência na escola‖
O conjunto de Decretos, Leis, Portarias e Resoluções existentes,
além de Notas técnicas emanadas do Ministério da Educação e Cultura –
MEC através da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização,
Diversidade e Inclusão (SECADI), normatizam a garantia não somente a
oferta, mas a permanência com sucesso dos alunos com deficiência,
transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação,
público-alvo da educação especial em ambiente escolar em iguais
condições que os demais alunos.
Apesar de todo o cabedal de marcos normativos que o Brasil dispõe,
observa-se que ainda existe um distanciamento entre a Lei e sua
aplicabilidade efetiva. Um exemplo disso é a Lei 7.853/89 que em seu
Artigo 8º diz o seguinte:
Constitui crime punível com reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e
multa:
I - recusar, suspender, procrastinar, cancelar ou fazer cessar, sem
justa causa, a inscrição de aluno em estabelecimento de ensino de
qualquer curso ou grau, público ou privado, por motivos derivados da
deficiência que porta.
Porém existe um longo caminho ainda a se percorrer para que essa
lei seja cumprida em sua totalidade e dessa forma, ainda acontecem
situações de preconceito e discriminação sofridas pelas pessoas públicoalvo da educação especial, que são as pessoas com deficiência,
transtornos globais de desenvolvimento e altas habilidades/superdotação.
Muitas destas situações são oriundas do desconhecimento sobre os
direitos dessas pessoas em participar em situação de igualdade de todo e
qualquer espaço social, principalmente o espaço escolar, elemento meio
entre família e sociedade, que tem função vital para o desenvolvimento da
formação básica do cidadão.
A luta pela educação inclusiva vai muito além da garantia da
matrícula, pois o que se almeja é uma escola que não somente matricule,
mas ofereça oportunidades de desenvolvimento das potencialidades das
pessoas com deficiência, numa igualdade de oportunidades. É o que
51
FONAPER
Santos (2002, p.75) afirma em sua pauta transidentitária e transcultural:
―temos o direito de sermos iguais quando a diferença nos inferioriza e a ser
diferentes quando a igualdade nos descaracteriza‖.
A educação inclusiva é um fenômeno muito complexo e de grande
envergadura e como tal, para que realmente se efetive depende de muitos
fatores, sendo a formação de professores, de capital importância para a
implantação/implementação dessa política pública.
O Decreto nº 5626 de 22 de dezembro de 2005, que trata da Língua
Brasileira de Sinais – LIBRAS e que também regulamentou o art. 18 da Lei
nº 10.098 de 19 de dezembro de 2000, determinou em seu artigo 3º:
Art. 3º A Libras deve ser inserida como disciplina curricular obrigatória
nos cursos de formação de professores para o exercício do
magistério, em nível médio e superior, e nos cursos de
Fonoaudiologia, de instituições de ensino, públicas e privadas, do
sistema federal de ensino e dos sistemas de ensino dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios.
§ 1º Todos os cursos de licenciatura, nas diferentes áreas do
conhecimento, o curso normal de nível médio, o curso normal
superior, o curso de Pedagogia e o curso de Educação Especial são
considerados cursos de formação de professores e profissionais da
educação para o exercício do magistério.
§ 2º A Libras constituir-se-á em disciplina curricular optativa nos
demais cursos de educação superior e na educação profissional, a
partir de um ano da publicação deste Decreto.
No corpo do referido Decreto estão estabelecidos os prazos máximos
para a sua execução:
o
Art. 9 A partir da publicação deste Decreto, as instituições de ensino
médio que oferecem cursos de formação para o magistério na
modalidade normal e as instituições de educação superior que
oferecem cursos de Fonoaudiologia ou de formação de professores
devem incluir Libras como disciplina curricular, nos seguintes prazos e
percentuais mínimos:
I - até três anos, em vinte por cento dos cursos da instituição;
II - até cinco anos, em sessenta por cento dos cursos da instituição;
III - até sete anos, em oitenta por cento dos cursos da instituição; e
IV - dez anos, em cem por cento dos cursos da instituição.
Isso significa dizer que até o ano de 2015, todos os cursos de
Licenciatura, inclusive a graduação em Ciências das Religiões, têm de se
moldar à lei e ofertar a Libras como disciplina curricular obrigatória.
Espera-se, portanto, que o Decreto seja cumprido, muito embora que
alguns dos prazos nele existentes já foram exauridos e não se sabe se o
52
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
percentual estipulado para o seu cumprimento foi concretizado. Mas o
importante é que esta é uma grande vitória para a pessoa surda que cada
vez mais conquista o direito de ser entendido em sua língua materna que
já esta é oficializada no Brasil pela Lei 10.436, de 24 de abril de 2002.
Considerando que na Resolução nº 1/2012, do Conselho Nacional de
Educação, que trata da Educação em Direitos Humanos, ao evidenciar a
formação inicial e continuada dos profissionais da educação em seus
Artigos 8º e 9º, e tendo em seu Art. 3º, III, o ―reconhecimento e valorização
das diferenças e das diversidades‖, justifica-se trazer para a escola,
enquanto lócus dessa investigação, os conceitos de inclusão, exclusão e
diversidade, para que esta possa sair de uma cultura heterogênea e
assuma a condição de ser o melhor espaço de formação de valores
voltados à construção de um ser ético, solidário, fraterno e sensível aos
seus pares. Como afirma Freire (1996, p. 17):
A ética de que falo é a que se sabe afrontada na manifestação
discriminatória de raça, de gênero, de classe. É por esta ética
inseparável da prática educativa, não importa se trabalhamos com
crianças, jovens ou com adultos, que devemos lutar. E a melhor
maneira de por ela lutar, é vivê-la em nossa prática, é testemunhá-la,
vivaz, aos educandos em nossas relações com eles.
Para tanto, torna-se importante uma formação voltada à
complexidade e à transdisciplinaridade em educação, que se baseia
segundo Moraes e Navas (2010, p.15) ―no desenvolvimento integral da
pessoa humana e na realização plena de todas as suas capacidades e
possibilidades‖. Segundo Caetano (2007, p. 228) esta é uma visão
holística de perceber o ser humano enquanto ―sujeito epistêmico, éticosocial, afetivo, psicológico e sexual‖ que dá ao Ensino Religioso as
condições necessárias para trazer o foco da Educação Inclusiva para
dentro do contexto da escola.
O estudo do fenômeno religioso e suas manifestações em todos os
tempos, lugares e povos, alicerçados nos princípios de cidadania e na
busca pelo respeito à diversidade, deve favorecer a construção de uma
cultura de paz, com a abolição do preconceito e da discriminação. Daí a
relevância dessa pesquisa, que permitirá uma análise crítica e reflexiva
sobre o que o professor do ensino religioso entende por inclusão, exclusão
e diversidade; e de como esses conceitos são aplicados em sua prática
pedagógica, mais especificamente, na educação inclusiva enquanto
53
FONAPER
construção de um ambiente acolhedor para o recebimento e manutenção
dos alunos público-alvo da educação especial no ambiente escolar.
No decorrer da História, a pessoa com deficiência vem sofrendo um
processo de exclusão em seus aspectos sócio-econômicos, religiosos e
educacionais desde os primórdios das civilizações antigas até agora na
contemporaneidade (SANTIAGO, 2011). De um lado, a exclusão e por
outro, a luta por uma inclusão que vem ao longo do tempo, também
mostrando avanços capazes de fazer com que a história se modifique e
surjam políticas públicas voltadas para esse segmento populacional3.
A inclusão e a exclusão estão ao longo do tempo, lado a lado como
faces de uma mesma moeda, uma vez que só existe uma porque a outra
se evidencia. Tomando como exemplo o período da Antiguidade nas
sociedades Greco-romanas, muitas vezes quando nascia uma criança com
deficiência esta era sacrificada. Entretanto, nestas mesmas civilizações
alguns de seus cidadãos já pensavam de forma diferente, tanto é que
essas situações que já haviam se incorporado à sociedade vigente,
enquanto regra social, foram ao longo do tempo modificadas por um
pensamento de preservação da vida. E isso foi acontecendo em toda uma
cronologia sócio-histórica até chegar a nossa atualidade, na qual, apesar
dos avanços tecnológicos e de todas as conquistas legais, situações de
inclusão e exclusão ainda são vivenciadas.
A sociedade inclusiva passa necessariamente por uma escola
inclusiva que tem no perfil mediador do professor, o diferencial capaz de
suscitar a construção desse processo. (TEBAR, 2011, p. 19) afirma que ―o
papel dos docentes é fundamental no que se refere à qualidade e a
pertinência da educação e ainda diz que:
Mediar também é transmitir valores, é conectar vivências e elementos
culturais, é superar a ignorância e a privação cultural, abrindo ao outro
um mundo novo de significados. Ao mediar vamos além das
necessidades imediatas, transcendemos o presente, buscamos um
mundo de relações que antecipam o futuro ou apresentam outras
situações inesperadas. A mediação é um fenômeno vital; não
acontece somente na escola, é uma realidade em toda a vida
(TEBAR, 2011. p, 115).
3
54
Brasil. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Marcos PolíticoLegais da Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva/Secrearia da
Educação Especial. – Brasília: Secretaria de Educação Especial, - 2010. 72 p. Este guia
contém uma série de Decretos, leis, resoluções e outros marcos normativos que
referendam a educação especial/inclusiva.
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Se o professor do ER busca mediar a formação de uma cultura de
paz, de respeito à diversidade cultural e religiosa, então nada mais viável
do que este profissional trabalhar com seus educandos o respeito à
condição de diferença de ―ser gente‖. Portanto, esta pesquisa busca
analisar o processo de formação continuada dos professores de Ensino
Religioso nas escolas da Rede Municipal de João Pessoa, objetivando
identificar se estes docentes possuem formação continuada em educação
especial/ inclusiva. Pretende também analisar como o conhecimento
teórico sobre educação inclusiva se aplica na prática pedagógica do
professor do ensino religioso.
Segundo Holmes (2010) o Ensino Religioso foi normatizado na
Paraíba através da Resolução 119/94 do Conselho Estadual de Educação
– CEE e ficou sob a responsabilidade da Secretaria Estadual da Educação
e Arquidiocese da Paraíba. Em 1986, foi implantado em todas as escolas
estaduais, da 5ª a 6ª série (atualmente, do 6º ao 9º ano).
Também em 1996, aconteceu a ―I Capacitação de Professores do
ER‖, com carga horária de 80h. Em 2000, houve o Curso à Distância
Capacitação para a Formação Docente Novo Milênio FONAPER, no qual
dos 100 (cem) educadores escritos, cinquenta e seis concluíram o curso
(ibidem, p.93). Em 2005, foi implantada através da Universidade Federal
da Paraíba, a primeira turma de especialização em Ciências das Religiões.
Em 2007, foi implantado o Mestrado e em 2008, o curso de
Licenciatura/Bacharelado nesta mesma área de ensino.
Isso nos leva a crer que os professores do ER do estado da Paraíba
têm possibilidades cada vez mais emergentes de formação inicial e
continuada na área específica em Ciências das Religiões, a exemplo do
Mestrado (ibidem, p.94), que é o primeiro Mestrado em Ciências das
Religiões no Nordeste e o 2º em uma Universidade Federal no Brasil.
Por isso, mais uma vez professamos a importância de contemplar
nestes espaços de formação, conteúdos inerentes ao contexto da inclusão
dos alunos público-alvo da educação especial em ambiente escolar, para
que a partir do momento em que os professores absorvam conhecimentos
teóricos e práticos, possam se sentir subsidiados a fazer com que essa
concepção sobre educação inclusiva, chegue à sua prática pedagógica na
escola, sendo um interlocutor da busca da formação integral de todos os
alunos na escola.
55
FONAPER
Metodologia
Segundo Damasceno e Sales (2005), a pesquisa qualitativa é um
tipo de abordagem que permite a aferição de aspectos qualitativos de
questões relevantes no campo socioeducacional, como por exemplo,
atitudes, expressões culturais, motivações, percepção, representações
sociais e saberes gerados nas práticas socioeducativas. A análise dos
dados ocorre de forma indutiva; sem a preocupação primeira, portanto, de
confirmar hipóteses, as quais não são constituídas previamente, mas vão
constituindo-se na medida em que os dados são descobertos e se interrelacionam.
Tendo em vista a complexidade e abrangência do tema, utilizaremos
a observação direta - nas análises que faremos do ambiente escolar dos
professores que fazem parte do universo pesquisado, e a observação
indireta, na pesquisa bibliográfica tendo como fonte de pesquisa, livros,
artigos de periódicos e materiais disponibilizados na Internet. Na pesquisa
documental, faremos uma análise dos documentos filosóficos e normativos
em âmbito internacional e nacional que ratificam a Educação Inclusiva e o
Ensino Religioso. Utilizaremos também a aplicação de questionários, a
elaboração de quadros e tabelas e a análise de todas as informações para
traçar um perfil do professor do ensino religioso numa perspectiva
inclusiva.
Por fim, além de oferecermos propostas de ressignificação desse
componente curricular, ainda faremos a análise, interpretação e
cruzamento de todos os dados obtidos na pesquisa, junto às fontes
teóricas estudadas, objetivando auferir subsídios que possam comprovar a
importância do Ensino Religioso para uma educação de qualidade,
inclusiva.
Resultados
O Ensino Religioso, enquanto componente curricular que trabalha
para a formação de um ser crítico e pensante no exercício de sua
cidadania precisa fomentar a Educação Inclusiva, como forma de promover
a visibilidade de uma minoria que não é tão minoria assim, já que segundo
56
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
os dados do Censo 2010,4 24% da população brasileira, disse ter algum
tipo de deficiência, o que corresponde a cifra de 45 milhões de pessoas. A
Paraíba é o 3ª Estado5 brasileiro com o maior número de pessoas com
deficiência num total de 1.045.962, totalizando um percentual de 27,7% de
sua população.
Almejamos como resultado dessa pesquisa responder às seguintes
indagações: Em sua formação inicial o professor é preparado com
conhecimentos teóricos para trabalhar com a diversidade dos alunos com
deficiência em suas necessidades? O professor do Ensino Religioso
participa de cursos de formação continuada que contemple esse
conhecimento específico? Nas escolas onde esses professores exercem
sua docência, conseguem trazer à tona as discussões sobre inclusão,
exclusão, preconceito, limites e possibilidades frente às diferenças? Até
que ponto o professor do ER é o interlocutor das minorias na escola?
É o professor um mediador da aprendizagem e da formação de
valores de aceitação e respeito às diferenças? O professor organiza os
conteúdos a serem trabalhados em sala com esse fim? Ao se deparar com
um aluno com deficiência em sua sala de aula, o professor se preocupa
em criar estratégias metodológicas para ensinar a turma toda, incluindo-o
na mesma proporção que os demais?
Existe algum material didático de suporte que possa fazer com que a
aprendizagem aconteça de forma mais significativa? E os recursos de
tecnologia e mídias digitais são utilizados?
Qual o papel concreto que o professor pode desempenhar para
disseminar a educação inclusiva e a inclusão de alunos com deficiência
nas escolas?
Como lidar com situações de preconceito rótulos e estigmas diante
dos alunos com deficiência? Quais as propostas de se minimizar ou
solucionar essa questão?
O professor se sente parte integrante da escola em que trabalha ou
ele próprio se sente vítima de alguma situação de exclusão e preconceito?
4
5
GLOBO.COM. 23,9% DOS BRASILEIROS DECLARAM TER ALGUMA DEFICIÊNCIA, DIZ IBGE.
DISPONÍVEL EM < HTTP://G1.GLOBO.COM/BRASIL/NOTICIA/2012/04/239-DOSBRASILEIROS-DECLARAM-TER-ALGUMA-DEFICIENCIA-DIZ-IBGE.HTML> ACESSO
EM 20/05/2012
REDE SACI. 27,7% da população paraibana tem algum tipo de deficiência, diz IBGE.
Disponível em <http://saci.org.br/index.php?modulo=akemi&parametro=34235 >
Acesso em 20/05/2012
57
FONAPER
Por fim, além de oferecermos propostas de ressignificação desse
componente curricular, ainda faremos a análise, interpretação e
cruzamento de todos os dados obtidos na pesquisa, junto às fontes
teóricas estudadas, objetivando auferir subsídios que possam comprovar a
importância do Ensino Religioso para uma educação de qualidade,
inclusiva.
Concluímos que se faz necessário repensar a formação inicial e
continuada do Ensino Religioso com vistas a contemplar essa temática a
fim de que o exercício da cidadania desse segmento populacional possa
se tornar cada vez mais concreto.
Conclusão
Segundo Machado (2008, p. 77),
A formação do professor supõe a mobilização de práticas pedagógicas
solidárias, democráticas e reflexivas sobre a realidade social, capazes
de gerar inovação completando a diversidade presente no contexto
brasileiro, entre elas, a diversidade religiosa. Criando uma nova
cultura a partir do entendimento de que todo e qualquer indivíduo é
portador de direitos e deveres, e que estes devem tornar-se algo á ser
buscado e conquistado de forma coletiva e não interpretado como
uma mera concessão, pois, o exercício da cidadania é ser cidadão no
gozo seus direitos e deveres, sendo capaz de interferir na ordem
social em que vive, constituindo-se em uma luta pela inclusão.
É importante que o professor conheça seu alunado e tente construir
uma cultura de paz em sala de aula. Assim o respeito á diversidade
humana precede qualquer outra forma de diversidade. A partir do momento
em que as pessoas se aceitam como são, reconhecendo as diferenças e a
diversidade humana, fica mais fácil se aceitar a diversidade social,
econômica e religiosa que o outro possa ter.
O Professor do Ensino Religioso deve possuir saberes que
favoreçam a promoção da autonomia do educando (FREIRE, 1996).
Assim, saindo de uma curiosidade ingênua para uma curiosidade
epistemológica e rejeitando todo o tipo de discriminação, com bom senso,
criatividade, estética e ética, este profissional, pautará sua prática
pedagógica na assunção cultural de cada um de seus alunos,
independente que tenham ou não deficiência, já que o ser humano é
inconcluso, condicionado, mas não determinado.
58
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Por isso, mais uma vez professamos a importância de contemplar
nestes espaços de formação, conteúdos inerentes ao contexto da inclusão
dos alunos com deficiência em ambiente escolar, para que a partir do
momento em que os professores apreendam conhecimentos teóricos e
práticos, possam se sentir subsidiados a fazer com que essa concepção
sobre educação inclusiva, chegue à prática pedagógica na escola, sendo
um interlocutor da busca da formação integral de todos os alunos no
ambiente escolar.
Referências
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Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988. 292 p.
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gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas
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providências. Disponível em <
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BRASIL. Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a Língua
Brasileira de Sinais - Libras e dá outras providências.- Disponível em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10436.htm> Acesso
em 15/07/2013
BRASIL. Lei nº 7.853 de 24 de outubro de 1989. Dispõe sobre o apoio às
pessoas portadoras de deficiência, sua integração social, sobre a
Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de
Deficiência - Corde, institui a tutela jurisdicional de interesses coletivos ou
59
FONAPER
difusos dessas pessoas, disciplina a atuação do Ministério Público, define
crimes, e dá outras providências. Disponível em<
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7853.htm> Acesso em
18/07/2013
BRASIL. Lei nº 9.475, de 22 de julho de 1997 - Dá nova redação ao art.
33 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as
diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9475.htm> Acesso em
13/05/2013
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Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
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TÉBAR, Lorenzo. O perfil do professor mediador: pedagogia da
mediação. Tradução de Prisicla Pereira Mota. São Paulo: Editora Senac
São Paulo, 2011.
61
A MEMÓRIA DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE ENSINO
RELIGIOSO - CONTRIBUIÇÕES PARA AS PRÁTICAS COM O
ENSINO RELIGIOSO PLURALISTA
Araceli Sobreira Benevides - UERN1
Resumo:
Este trabalho discute a constituição das identidades de docentes de Ensino Religioso de
Natal/RN, compreendendo como as trajetórias de professores contribuíram para uma teoria
da formação na área, assim, destacamos as transformações mais significativas que
aconteceram nas práticas com o ER. As análises indicam caminhos que professores/as
percorrem para compreender o significado da memória da docência de professores que
vivenciaram a prática com o ensino de Religião (denominação do passado) e o Ensino
Religioso Pluralista (denominação atual). Consideramos que os resultados apresentam
reflexões para a realidade da formação e da atuação docente, além de estabelecer um
diálogo com as teorias que compreendem as imagens e os processos embutidos ao longo
das experiências pedagógicas modificadas pelas transformações sociais das duas últimas
décadas.
Palavras-chave: Memórias de Docentes de Ensino Religioso; Identidades de Docentes de
Ensino Religioso; Ensino Religioso Pluralista.
Introdução
Ao varrer o sagrado desvão
Denominado Memória,
Escolhe uma vassoura reverente
E faz em silêncio o teu trabalho.
Será um labor de surpresas –
além da própria identidade,
outros interlocutores
são uma possibilidade.
Nesses domínios é nobre a poeira,
Deixa que repouse intocada –
Não tens como removê-la,
Mas ela pode silenciar-te.
Emily Dickinson
No domínio das pesquisas interdisciplinares em Linguística Aplicada,
os estudos da constituição de processos identitários dos/as professores/as
1
Doutora em Educação. Professora do Curso de Ciências da Religião e do Programa de
Pós-Graduação em Educação – POSEDUC/UERN. Pesquisadora da Linha de Pesquisa
Formação e Atuação do Docente das Ciências da Religião e da Educação. Líder do
Grupo de Pesquisa Educação, Cultura e Fenômeno Religioso/UERN. E-mail:
[email protected]
FONAPER
têm sido motivo de permanente investigação nos últimos anos.
Paralelamente, pesquisas sobre os saberes docentes também mostram a
necessidade de se olhar atentamente para a formação de professores/as
na área das Ciências da Educação. Discutindo sobre essas duas questões,
interpretamos o que professores e professoras de Ensino Religioso da
região metropolitana de Natal/RN enunciam sobre seus saberes e
experiências formativas. Com o intuito de observar as vivências e os
saberes dos docentes que atuam desde antes da legislação de 1997
(BRASIL, 9.475/97), em comparação com os daqueles que estão
desempenhando esse papel a partir da nova modalidade de Ensino
Religioso: pluralista, não catequista, não dogmático, não evangelizador.
Esse modelo2 contemporâneo está sendo estabelecido desde as
transformações da última década quando se firmaram que para se
lecionar, em salas de aula dessa disciplina, era necessária a formação
específica, isso ocasionou a criação de cursos de Graduação e PósGraduação, no Brasil, que garantissem os conhecimentos/saberes da
docência de professores de ER. Assim, para quem escolhe essa área para
atuar no Ensino Fundamental, o curso a ser feito é a Licenciatura em
Ciências da Religião, área de conhecimento das Ciências Humanas e
Sociais que tem se expandido (CORTELLA, 2007) e se fortalecido nesses
anos iniciais do novo milênio.
Dessa forma, neste trabalho, trazemos reflexões construídas em
relação à memória das práticas docentes retiradas do corpus discursivo da
pesquisa coordenada por nós – Saberes das práticas docentes no contexto
do Ensino Religioso – diálogo multidisciplinar entre as práticas de leitura,
memórias docentes, experiências e a construção de identidades (FASE II –
UERN- 2013-2014) que revelam quem são e o que sabem os professores
de ER da capital potiguar. Neste estudo, interpretamos o quanto as
imagens construídas pelos professores/as sobre si próprios revelam as
experiências, as relações, as dificuldades com a prática desde o início da
atuação e os saberes mobilizados na prática com a disciplina.
Analisaremos dados de uma entrevista coletiva realizada com dois
professores que vivenciaram momentos diferentes com o ER no RN que
2
64
Esse novo modelo apresenta-se legalizado pelo artigo 33 da Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional nº 9394/96, modificada, posteriormente, pela lei nº 9475/97, que
estabelece o Ensino Religioso como área de conhecimento do Ensino Fundamental. Em
decorrência, a religiosidade deixa de ser o ponto central da docência que passa a ter o
fenômeno religioso como objeto de estudo.
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
discutem exatamente a questão da formação específica para a atuação
docente na disciplina e como esses/as profissionais se inserem no
contexto de atuação ao narrar sobre suas experiências pessoais ou sua
trajetória como professor/a de ER.
Para analisarmos o que os/as professores dizem sobre suas
identidades e sobre seus saberes, tomamos como base o modelo sóciohistórico de linguagem, compreendendo linguagem como uma prática
discursiva, que constitui identidades e subjetividades, relacionada a todas
as esferas da atividade humana (BAKHTIN, 2003).
Quando o/a graduando/a do curso de Ciências da Religião passa
para a fase de estágio e precisa desenvolver as atividades inerentes dessa
fase, percebemos a discrepância entre o conhecimento construído em
relação às práticas passadas e às práticas atuais que indicam um
preconceito muito grande em relação aos modelos de Ensino Religioso
existentes em cada fase. Para traçarmos um caminho historiográfico para
as mudanças acontecidas no plano epistemológico e no plano
metodológico dessa disciplina, iniciamos, no contexto da pesquisa em
formação docente, o resgate de narrativas biográficas de professores de
diferentes épocas e modelos de ensino. Acreditamos que essas
informações pudessem indicar aos estudantes da Licenciatura em Ciências
da Religião que as transformações com o ER não foram aleatórias nem
desconectadas das discussões maiores realizadas no âmbito da formação
de professores. Além disso, também quisemos mostrar que, inclusive, no
âmbito da prática em modelos anteriores à LDB (1996), os próprios
professores iniciaram as alterações de um ensino de/da Religião para um
ensino com base na compreensão do fenômeno religioso e na apropriação
de um método didático apropriado para a mediação pedagógica desse
componente do Ensino Fundamental.
Os caminhos para um labor de surpresas
Em pesquisas anteriores, quando discutimos as identidades e os
saberes de professores de Ensino Religioso (BENEVIDES, 2011),
construímos um olhar para as diferenças de saberes existentes nas
práticas de professores dessa disciplina ainda entendida como ensino
confessional para muitos dos sujeitos participantes pelo fato de, na
construção do percurso profissional, não haver a obrigatoriedade de
65
FONAPER
formação específica em nível de licenciatura. Em nossos estudos iniciais,
indicamos que os docentes, os quais não possuem formação específica na
área, utilizam-se de metodologias variadas (BENEVIDES, 2011), sem um
escopo teórico que fundamente suas práticas, levando em conta o
fenômeno religioso, enquanto objeto de estudo dessa disciplina. No
entanto, o Estado do Rio Grande do Norte registra a presença de docentes
que contribuíram significativamente com a mudança de paradigma que
conduz ao Ensino Religioso atual. Esses docentes elaboraram documentos
importantes, como a Cartilha de Deus (década de 70) e as Propostas
Curriculares do Ensino Religioso (década de 80 e 90), além de
organizarem encontros de planejamento e organização curricular da
disciplina, mesmo em uma época em que o ensino baseava-se na
proposta confessional, entendemos que essa fase pode ser compreendida
como introdutória das ações pedagógicas que criam a Licenciatura em
Ciências da Religião no Estado as quais ainda são desconhecidas pelos
estudantes que ingressam nesse curso na UERN. Com isso, registramos a
necessidade de se ampliar as ações da formação docente, recuperando
uma memória da docência de professores de um passado recente. Assim,
a linha de pesquisa Formação e Atuação do Docente da Educação e das
Ciências da Religião começa a se fortalecer, através dessas investigações,
ao conseguir mapear ações de docentes do Ensino Religioso na região da
Grande Natal (BENEVIDES, 2011) e, ao indicar novas compreensões para
o longo percurso que se instaurou em termos de organização dos saberes
curriculares do Ensino Religioso (ER), conforme as transformações sóciohistóricas que estabelecem um ensino plural, não-proselitista nem
confessional, diferente do que havia, desde o período colonial brasileiro,
até fins do século XX, quando existia a predominância do ensino católico
nas práticas escolares. Essa mudança significativa não foi aleatória nem
ocorreu de repente. Seguiu as transformações ocorridas no espaço escolar
e no campo das discussões sobre modernidade, pós-modernidade,
ideologias, discursos, poder e diversidade cultural, entre outras, postas
pelas Ciências Humanas e Sociais nos últimos anos. Entretanto, pela falta
de conhecimento de docentes e de gestores, pela distância ou ausência de
curso específico, ou pela tradição já estabelecida, o ER ainda necessita de
ampliação dos conceitos (que, na sua nova versão, ainda estão em
processo de construção, segundo os discursos de seus agentes) e da
66
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
inserção de ações pedagógicas sob a orientação do multiculturalismo e do
respeito à diversidade religiosa.
Por essas razões, percebemos a necessidade de ampliação das
questões postas em nossas investigações que têm gerado algumas
produções acadêmicas em congressos, no âmbito dos trabalhos de
conclusão de curso de graduação e interesse por parte daqueles que
ingressam na Especialização em Ciências da Religião, além dos grupos
que estão envolvidos com a formação continuada tanto das Secretarias de
Educação do Estado do RN quanto do município de Natal. Estes têm
buscado alterar essa realidade que demonstra ser também uma posição
política de gestão escolar, já que os discursos dos sujeitos revelam que só
assumem a disciplina, sem a devida formação, porque diretores e outros
gestores assim o permitem.
Tudo isso retira o caráter disciplinar e pedagógico (CORDEIRO,
2004) envolvidos nas práticas educativas e impede um trabalho planejado
na perspectiva pluralista, não-proselitista e multicultural. Dessa forma,
pretendemos nos deter mais precisamente em dois aspectos gerados
pelas inquietações que as pesquisas provocaram: o resgate das
experiências vivenciadas pelos sujeitos que construíram práticas
transformadoras do ER, a partir da análise do discurso das narrativas
pessoais e do registro do cotidiano escolar, relacionando a construção
identitária à construção das novas práticas construídas nas vivências de
professores recém-formados pela Licenciatura em Ciências da
Religião/UERN e que tenham sido aprovados em concursos públicos para
atuar na escola pública.
Ao debruçarmos sobre essas questões, acreditando que merecem
tratamento científico, dada a relevância de pesquisas que acompanham as
transformações/reflexões que ocorrem no espaço escolar, buscamos, a
partir das construções discursivas, uma relação interdisciplinar (MOITA
LOPES, 2006), trazendo as vozes das teorias sobre práticas de ensino,
entre outros encaminhamentos pedagógicos apreendidos naquele curso,
nas/pelas disciplinas, que estarão presentes no campo de atuação dos
sujeitos participantes cuja construção identitária indica a posição de
educadores/as e não de agentes religiosos/as.
67
FONAPER
A identidade pela narrativa biográfica
Justapondo a essa compreensão de construção de identidades ao
trabalho de compor narrativas sobre as trajetórias pessoais de professores,
apoiamo-nos, neste artigo, na perspectiva das pesquisas sobre as
biografias educativas para discutir sobre quem são/foram os/as
professores/as de Ensino Religioso. Nessa perspectiva, o trabalho de autonarrar-se evoca uma dimensão de compreensão do Eu e do Outro. Isso
significa o desenvolvimento de uma atitude reflexiva diante do olhar para
nós mesmos, da compreensão (parcial) de nós mesmos, ao mesmo tempo
em que esse olhar se dirige para o outro, no sentido de compreendê-lo,
―[...] de olhar para fora, contrastar com outros pontos de vista e com outras
sensibilidades, como forma de compreender, de captar nossas dimensões
não-exploradas‖ (CONTRERAS, 2002, p. 211).
Com isso, as subjetividades, as complexidades, as diferenças e as
novas percepções dos sujeitos emergem através das práticas discursivas,
ou seja, de seus enunciados (tanto orais quanto escritos), que, no dizer
bakhtiniano (BAKHTIN, 2003), significam unidades da interação verbal e
que partem daquilo que um sujeito disse (ou escreveu) em um momento
dado e em condições precisas.
Nóvoa (1995) propõe a compreensão da realidade do professor a
partir do que é dito pelo próprio professor. De acordo com esse autor,
os/as professores ―possuem um conhecimento vivido (prático), que cada
um é capaz de transferir de uma situação para outra, mas que é
dificilmente transmissível a outrem‖ (NÓVOA, 1995, p.36). Dessa forma, é
necessário que seja dada a palavra ao professor, no intuito inclusive de se
valorizar os conhecimentos dos quais os professores são portadores, do
ponto de vista social e científico. Além desses autores, Ferrarotti (1988)
aponta para a necessidade de uma renovação metodológica no campo da
formação docente, apostando no método biográfico no âmbito da pesquisa
em educação. Nesse método, tanto a subjetividade dos sujeitos que se
manifestam através de sua historicidade, quanto a compreensão desse
sujeito a respeito do mundo ao seu redor são explicitadas a partir de sua
autobiografia educativa. Mais: olhando-o como o outro, o que está no outro
lugar – o lugar da prática – por parte de quem o vê – do lugar da formação
– elaboramos novos conhecimentos. Conhecimentos estes produzidos
pela reflexão sobre os dois lugares – o da prática e da teoria.
68
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Assim, diante dessas colocações, começamos a debater no curso de
Ciências da Religião qual o papel da memória para a construção das
identidades docentes. A seguir, estabelecemos o percurso metodológico
para a instauração de possibilidades de interlocução com os
conhecimentos da formação e os da prática, pela experiência vivida em
diferentes épocas do Ensino Religioso em Natal e no Brasil.
A abordagem metodológica
Adotamos como direcionamento metodológico de nosso estudo o
enfoque qualitativo, com ênfase na abordagem interpretativista (MOITA
LOPES, 1994) relacionada ao contexto sócio-histórico (FREITAS, 2002)
dos sujeitos participantes. Essa perspectiva permite a (re) interpretação do
mundo, tendo em vista as significações das diferentes vozes do mundo
social pela linguagem, entendida como sistema aberto. A segunda
abordagem corrobora no entendimento das perspectivas sociais e
históricas que se constroem e são construídas pela linguagem e que
permitem uma compreensão dos processos mediante os quais os próprios
sujeitos investigados foram constituindo modos de ser e de fazer
específicos de sua pessoa/profissional.
Desse modo, o corpus discursivo foi construído a partir de uma
entrevista realizada com uma professora que representa as várias
gerações com a prática pedagógica do Ensino Religioso no RN. Optamos
por trabalhar com a entrevista coletiva, porque, conforme Kramer (2004), a
proposta desse instrumento de pesquisa é que os participantes dela
dialoguem e o que é dito, transforme-se em situações dialógicas
(BAKHTIN, 2003).
A entrevista foi realizada em uma seção, no final do ano de 2012, e
procuramos dar voz aos participantes, observando as informações
pessoais e profissionais, com características biográficas. No momento da
entrevista, estavam presentes duas estudantes do curso de Ciências da
Religião e um bolsista de iniciação científica, cada um participou de algum
modo, perguntando ou comentando. Porém, o objetivo maior voltou-se
para a trajetória pessoal da professora, aqui denominada P1. Essa
professora foi convidada a participar como sujeito de pesquisa porque
possui quarenta anos de experiência com o ER no Estado do RN, já foi
Coordenadora Pedagógica do Curso de Ciências da Religião da
69
FONAPER
Universidade de Estado do Rio Grande do Norte (UERN), além de ter
trabalhado como coordenadora da formação continuada em Ensino
Religioso na Secretaria de Educação, Cultura e Desportos do RN de onde
se aposentou como professora de Ensino Religioso. Ainda possui uma
trajetória pessoal bastante envolvida com a evolução do ER no estado do
RN e no Brasil, por ter participado de situações históricas definidoras das
transformações mais recentes com as práticas formativas do ER e a
criação do Fórum Nacional do Ensino Religioso, representando o RN.
A transcrição da entrevista foi feita de modo que os trechos
selecionados também não sofressem qualquer modificação no que é dito.
Existem alguns trechos destacados entre chaves com informações
explicitadas por nós, para melhor compreensão do leitor. Interpretamos
que a professora traz inúmeras contribuições sobre a evolução que
acontece nas práticas pedagógicas do ER.
Dessa maneira, interpretamos as posições assumidas pela
informante do ponto de vista daquilo que é ex-posto (LARROSA, 2002),
enquanto experiências formativas, no contexto da entrevista coletiva.
Em outras palavras, essa escolha oportuniza o pesquisador a
entender os enunciados a partir dos posicionamentos dos entrevistados
que refletem o contexto social e histórico que vivenciaram, mostram as
marcas do seu tempo, trazem as dimensões em que estavam/estão
inseridas, privilegiando os fragmentos de vida trazem diferentes situações,
sentidos e vozes que se articulam como possibilidade de interlocução.
Freitas (2002, p.29) destaca ainda que, ―[...] na entrevista é o sujeito que
se expressa, mas sua voz carrega o tom de outras vozes, refletindo a
realidade de seu grupo, gênero, etnia, classe, momento histórico e social‖.
Assim, as narrativas proporcionam um gama de contextos investigativos,
que, na análise, demonstram como as identidades são produtos históricos
e sociais.
Considerando essas ideias, analisamos as rememorações, com base
na significação das vivências de uma professora de Ensino Religioso que
revela suas experiências com a atuação na área desde o antigo modelo de
Ensino Religioso – o modelo de ensino da Religião – ao modelo mais atual
– o das práticas pluralistas. Inserida no campo da subjetividade, as
entrevistas implicam dimensões do sujeito e o modo como os seres
humanos entendem suas histórias pessoais, sociais, coletivas. Além disso,
observamos e tentamos compreender como a professora participante
70
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
pensa e sente as diferentes situações de seu processo formativo,
principalmente ao destacar essa ou aquela situação em detrimento de
outras.
Seguindo essa lógica, a entrevista torna-se um espaço para o
diálogo e para o destaque dos papeis subjetivos que são produzidos no
momento da rememoração. Desse modo, salientamos que para a
construção dos dados, participamos desse momento juntamente com mais
três alunos do curso de Ciências da Religião que fazem parte do grupo de
estudos organizados pela linha de Pesquisa da qual todos participam. Em
alguns momentos, cada participante teve voz e fez perguntas e/ou
comentários. Neste artigo, porém, destacaremos apenas os enunciados
selecionados da transcrição que indicam a escolha de professores de
Ensino Religioso nas décadas de 70 e 80 e o modelo que orientava a
prática dos professores desse período.
Os dados contidos nas filmagens foram transcritos e estão
organizados da seguinte maneira: [...] Corte pelo analista, ( ) Pausas,
hesitações no fluxo das enunciações, [ Falas sobrepostas, / Interrupção na
fala em curso.
Na análise e construção dos dados, procuramos interpretar os
discursos da participante com o intento de entender os valores tomados
como fundamentais para uma melhor educação da época, ou seja,
priorizamos o conhecimento que essa profissional construiu ao invés de
julgarmos suas atitudes de proselitistas ou não.
A experiência como professora-formadora – além da própria identidade
Formada em Letras e com especialização e Mestrado em Ciências
da Religião, desde a formação inicial leciona ou trabalha diretamente com
a formação de professores de Ensino Religioso. A seguir, transcrevemos
um trecho da entrevista no qual a pesquisadora (identificada na
transcrição3 como E1 – Entrevistadora 1) indaga à participante sobre as
experiências profissionais durante os anos de 1970.
3
Elementos que estão na transcrição: Pq pesquisador; ( ) algo inaudível; ... algo foi
editado; / pausa curta; // pausa longa; [ fala sobreposta; [...] Trecho retirado.
Trabalhamos com modelo existente em Moita Lopes (2002).
71
FONAPER
E1: [...] E a gente quer ver mais ou menos as práticas. / Como eram
as práticas? / então, a gente vai fazer dois blocos. Hoje a gente vai ver
um pouquinho sobre a formação. O que você puder contar pra gente
quem eram, quem é que dava o Ensino Religioso? Como você
começou sua carreira? Como você entrou na carreira docente? E
como era a formação naquele tempo, né?! /
P1: É! / Então! / em 1973, com a LDB 5.692/71, é, / é a exigência
através do artigo / já na reformulação de 1969, através do artigo que
eu num tô lembrada agora, mas vocês pesquisem que acham...
E1: Hum...hum...
P1: O Ensino Religioso começou a fazer parte / porque na LDB, ela
sai, ele, na CNBB, ele sai sem ônus, e sem ônus num funciona, em
canto nenhum, nem com ônus funciona, imagine sem ônus! / Mas
logo, na Emenda Constitucional de 1969, que é fruto do regime militar,
entra o Ensino Religioso, nas escolas de primeiro e segundo grau, /
obrigatório para o aluno. / Obrigatório para a escola oferecer, e
facultativo para o aluno, que isso é História que.. que... tá na história
do Ensino Religioso desde 1931, né?! / então / aí va, vamos, vamos
nos organizar para esse ensino, pra, pra, sistematizar este ensino. / O
Conselho Estadual de Educação do Rio Grande do Norte, através do
parecer 03/76, / [lembrando-se]... isso antes a gente se reúne, a gente
vai a NUREB‘s, nessa época era a NUREB‘s. / Acho que era Núcleo
de Educação e Supletivo, que só havia três no Rio Grande do Norte!
Era um Natal, um Mossoró e outra em Caicó. / E a chefe do, da
4
NUREB‘s na época era XX , chama Monsenhor WW, para trabalhar
com o Ensino Religioso / como eu não sabia / nessa época eu
trabalhava no Manoel Dantas, que era uma experiência da, da / em
1972 / uma experiência inovadora, exitosa que era um colégio, eram
três colégios chamados Complexos Escolar de Natal. Era o Sebastião
Dantas, // o Sebastião Fernandes, o Manoel Dantas e o Jerônimo
Gueiros. Eram escolas de primeiríssima... /
E1: [Jerônimo o que? /
P1: Jerônimos, Jerônimo Gueiros, que hoje praticamente não
funcionam. São escolas... / Sebastião Dantas tá até com problemas
num tem mais aula à noite por causa disso. Mas era uma experiência
inovadora! // E aí começa / a gente vai convidar a chefe do NUREBS
pra trabalhar o Ensino Religioso aqui no Rio Grande do Norte. / Na /
No primeiro NURE, no primeiro NUREB, e no Rio Grande do Norte,
posteriormente o NUREB passa a ser NURE, que é Núcleo Regional
de Ensino, de, ensino... de ensino! /
E1: Hum..hum!
4
72
Alguns nomes foram substituídos por XX, YY, WW, para se preservas as identidades de
pessoas citadas.
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
P1: Então, quando ele chega no NUREB é muito interessante. Elas
entregam três, sete professoras, todas velhas e a gente perguntou: ―e
por que essas professoras?‖. ―Por que elas não prestam mais‖. O
termo usado foi esse! ―elas não prestam mais para a sala de aula. /
Mas elas têm afinidade com o Ensino Religioso‖. E elas faziam
catequese de sobra. Mas essas criaturas foram maravilhosas! / Eram
sete pessoas idosas que começamos um trabalho excelente com
essas criaturas...que... acho que a última morreu há pouco tempo, que
era Irmã WW. Que era uma memória viva, que a gente num registrou
nada. Então, que que elas faziam? / Elas faziam catequeses nas
escolas, e elas estavam liberadas pelo Estado, para isso. Pra fazer
isso! Porque nós fazíamos preparação para a eucaristia, preparação
para crisma, faziam catequese, preparação de missa. / E, chegamos
nós, né?! Também com esta, / esta preocupação, a gente começou
esse trabalho fazendo catequese mesmo. / Que era um / a gente fazia
catequese, mas a gente tinha uma preocupação, já na época, de
respeitar a religiosidade presente na sala de aula. Aí, a gente já tinha
essa preocupação. / Aí a gente começou a perceber que havia
muito boa vontade, mas não havia preparação adequada. Então, a
gente começou a fazer viagem. / Aqui, a gente fazia reunião com os
professores e, e, e fazia viagens pelo interior/ do Rio Grande do Norte,
para trabalhar o Ensino Religioso. / Nessa época existia um método, /
chamado.. é, realizado na igreja, é, chamado Ver, Julgar e Agir. O que
era esse método? / Esse método a gente analisava a realidade
presente na sala de aula, que, na mesma época, que era usada na
catequese, depois essa realidade era iluminada por um texto bíblico,
ou outro texto, que pudesse iluminar, dar respostas a essa realidade.
Depois esses / a gente trabalhava com os alunos, / é, / ações
transformadoras daquela realidade. / E celebrávamos também.
Celebrávamos aquela realidade. / Foi uma experiência riquíssima. E
nessa época 5.692 [referindo à lei], / a gente trabalhava exatamente
isso: a religiosidade. / Respeitando os credos, só que, que, nas
escolas, a lei dizia / posteriormente em 1996, quando o Conselho
Estadual de Educação regulamenta o Ensino Religioso, / que os
professores são indicados pela autoridade religiosa, / então, a gente
tinha o poder de indicar o professor para a sala de aula. /
A narrativa produzida pela professora, mediada por nossas
intervenções, deixa marcas de cada uma de nós, pois revela
historicamente o que acontecia em uma época não tão distante de hoje,
indicando uma prática muito comum em tempos passados: as pessoas que
lidavam com o Ensino Religioso não precisavam de nenhuma formação
especial a não ser possuir uma fé. Esta última informação confere com o
que Passos (2007 p. 32) explica sobre o ensino religioso dessa época: ―[...]
há um vínculo direto entre as confissões religiosas e o ER [...]‖.
Para completar a imagem construída pela participante, se as/os
professoras/es fossem mais velhas/os ou perto de se aposentar,
enquadravam-se na representação mais comum de quem lidava com essa
disciplina, caso não fosse freira ou padre. São elementos constitutivos da
73
FONAPER
identidade de docente do Ensino Religioso e que, por total
desconhecimento das agências de formação, dos gestores da educação
(diretores, coordenadores e professores, além dos próprios estudantes e
familiares) sobre as mudanças legais e epistemológicas do atual modelo
de ER, ainda hoje continuam a se perpetuar.
A professora ainda considera normal o fato de as professoras
indicadas para a prática com o Ensino Religioso da época serem
enquadradas no modelo confessional. Tanto é que percebemos a
naturalidade como ela se expressa durante a filmagem, olhando para cada
interlocutor e achando graça da situação rememorada. No entanto,
notamos uma pequena fissura na avaliação que a professora introduz no
diálogo: ela marca o momento em que o grupo que trabalhava com o ER
no Estado do RN começa a perceber que há algo mais a ser feito no
contexto da prática educativa. A primeira reação que motiva um olhar
diferenciado para as novas práticas a serem introduzidas ao longo dos
próximos vinte anos, começa a ser construída da percepção de que se
necessitava respeitar a religiosidade dos estudantes e professores e, em
seguida, de que não poderia haver qualquer conhecimento no contexto da
sala de aula.
Na condição de formadora, a professora evoca o período em que
começa a viajar pelo estado e o período em que usa a mesma metodologia
da catequese com o material intitulado Ver, Julgar e Agir que orientava as
práticas de ensino na época. Mesmo sem a possibilidade de uma mudança
radical, a professora destaca a importância de se analisar a realidade da
sala de aula, de se ter um tema norteador e de se ler um texto. Essa
prática fica condizente aos momentos históricos pelos quais a educação
brasileira atravessa, quando vislumbramos uma rotina muito parecida com
o ensino em geral: o trabalho com os temas geradores, a leitura que
inspira e ilumina o conhecimento e a compreensão que é feita pela
reflexão e discussão. Esse modelo, muito comum à época, decorre do
sistema didático adotado no país.
O respeito à religiosidade não era desvinculado das práticas
celebrativas, como a realização da primeira eucaristia e da crisma, porém,
o olhar do/a professor/a daquela época é atravessado pelo respeito à
diversidade, ainda que de modo não muito organizado nem sistemático,
em termos pedagógicos, como podemos ver, no trecho selecionado.
74
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Percebemos ainda que P1 ainda revela conhecer profundamente a
legislação que altera o status de disciplina sem ônus, ou seja, de disciplina
que não precisa de agentes externos ou agentes religiosos, vindos de uma
instituição religiosa quem mantinha o ensino de catequese para o status de
disciplina com ônus, significando que os estados e municípios assumiriam
a seleção e manutenção dos docentes de Ensino Religioso, ficando
responsáveis pelos salários desses docentes. Essa alteração aconteceu,
de fato, a partir dos anos finais do século passado, a partir de uma grande
mobilização no Brasil, conforme relembra a própria professora:
P1: [...] e isso foi muito bom, porque na calada da noite, a LDB é
apro... apro...(titubeando) aprovado em 20 de dezembro, onde escola
não funciona mais, onde tinha com ônus para os cofres públicos,
Sarney, tirou com ônus e botou sem ônus! / foi Sarney que fez isso!
[...] é quando // a gente se movimenta! / há um movimento, o Fórum
toma a frente, a CNBB toma a frente, aí a gente foi buscar ajuda de
todas as entidades! / as superiores, as... tudo! / os institutos formados,
as universidades, a AEC, e aí vamos juntar! / vamos juntar! / era, era a
confecção do MEC dos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino
Religioso! / nós não fomos contemplados com os Parâmetros
Curriculares,[...].
Uma transformação radical nesse tipo de prática de ensino foi a
superação do ER catequético para o respeito às práticas religiosas tanto
de alunos/as quanto de professores/as. Ainda há contradições na
construção das transformações no contexto escolar. Nem sempre os
agentes religiosos conseguem interferir na escolha/seleção dos docentes
do Ensino Religioso, porque também, nem sempre, os professores da
disciplina são agentes religiosos, ao contrário, são professores que
trabalham numa linha pedagógica e que assumem a disciplina por vários
fatores. A entrada de professores que não atuavam como agentes
religiosos introduz as pequenas alterações que ainda levarão quase uma
década para alterar o modelo de Ensino Religioso predominantes. Essa
contradição reforça os embates que irão acontecer tanto na área da
atuação quanto na formação docente. Percebemos, em nossos estudos
iniciados em 2007, que esse embate ficará registrado até a criação do
curso de Ciências da Religião da UERN. Nessa linha de pensamento, a
resistência acontece porque
Tal ensino estaria, portanto, fundado na factualidade e na relevância
do preceito religioso para a vida social, fazendo parte de um projeto
mais amplo que não coloca a priori a religiosidade dos sujeitos como
75
FONAPER
algo a ser educado, mas, antes, os próprios sujeitos,
independentemente de suas adesões de fé. (PASSOS, 2007, p.33).
Para que houvesse a percepção indicada nas palavras de Passos,
muito foi realizado em termos de discussões e posicionamentos. As
referências indicam que para na história recente, o Ensino Religioso
passou a ser entendido mais como ―[...] parte integrante da formação do
cidadão‖ (GIUMBELLI; CARNEIRO, 2004a, 2004b). No entanto, a partir
dessa concepção, várias mudanças começam a se destacar na rotina das
práticas com o ER. Quem assume que qualquer professor/a pode lecionar
a disciplina Ensino Religioso, sem o devido preparo inicial, está se
posicionando como alguém que desconhece as leis e parâmetros
orientadores das ações com essa disciplina e, mais ainda, demonstra
desconhecer totalmente que Ensino Religioso não é mais sinônimo de
ensino de uma religião, como podemos registrar ao longo da História da
Educação Brasileira.
P1 revela que durante a sua trajetória pessoal, o Ensino Religioso
funcionava em detrimento da religião católica e mostra que hoje, isso não é
mais concebido. Para ela:
P1: Ele [o professor] não pode fazer proselitismo nem da sua [religião]
nem de nenhuma. Ele tem de trabalhar as Ciências da Religião
oportunizando a esse aluno a se encontrar com ele mesmo, a se
encontrar com os outros, numa atitude de respeito à natureza, de
cuidado com a natureza, de cuidado com as pessoas, como todos,
com velhos, com crianças, com adultos, com todo mundo. (Trecho da
entrevista)
Como professora formadora, P1 mostra o que tem feito em sua
prática. Como podemos ver, a trajetória pessoal da professora-formadora
resgata particularidades de um período marcado por transformações
diversificadas no campo do Ensino Religioso. Essas transformações, para
ela, que estava totalmente envolvida com a prática nessa área de atuação
em diversas áreas, como a de elaboração de materiais didáticos; cursos
que hoje são compreendidos como formação continuada (há poucos anos,
esses cursos eram chamados de treinamentos, cursos de reciclagem,
capacitação profissional); além de participar de ações que traziam para a
realidade do Ensino Religioso a compreensão de área de conhecimento
constituída historicamente e que possui saberes epistemológicos, não
dissociados de um conhecimento sobre didática, filosofia, antropologia,
76
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
sociologia, teologia e outras áreas afins. Assim, quando P1 rememora
diferentes fases de sua experiência profissional, também traz consigo,
através de suas palavras, sua compreensão própria sobre os reflexos das
últimas mudanças sobre as práticas de ensino nessa área de
conhecimento. Para o/a aluno/a de um curso de Formação de Professores,
como o é a Licenciatura em Ciências da Religião, essas palavras se
tornam conhecimentos que reconstroem o percurso pessoal e coletivo do
fazer docente de uma época muito significativa para os que se envolveram
com as Ciências da Religião.
Observações finais
Podemos perceber como o conhecimento da trajetória pessoal de
professores/as que fazem a memória do Ensino Religioso no RN, mais
especificamente na capital potiguar, conforme sublinhamos neste artigo,
serve para que estudantes em formação possam ter conhecimentos sobre
o que acontece e acontecia em períodos variados da história da educação
mais recente. Além disso, podemos entender a percepção do sujeito que
conta os conhecimentos, as mudanças, as ações, as perspectivas da
educação pelo seu ponto de vista, pela sua compreensão, ou seja, pelos
desdobramentos de sua subjetividade. No dizer de Bueno (2002, p.24):
[...] aqueles que visam unicamente favorecer o processo de formação
do professor utilizando- se do recurso às histórias de vida como
instrumento de educação continuada; aqueles que se exprimem por
uma preocupação essencialmente investigativa, quer seja como forma
de obter conhecimento sobre aspectos da formação dos docentes,
quer seja sobre as práticas pedagógicas; e aqueles que visam
simultaneamente favorecer práticas de formação contínua e a
investigação de processos aí envolvidos.
Na interface entre a individualidade que rememora e as questões
relativas às transformações das práticas de professores é necessário
considerar a natureza social das práticas educativas, percebendo que as
transformações ocorrem em contextos situados e se configuram como
complexos e dinâmicos, quando olhamos – do ponto de vista do sujeito
que atua no campo educacional. As reflexões que ora realizamos, neste
trabalho, não são determinantes nem acabadas, pois que ainda estão em
fase de apropriação pelos sujeitos pesquisadores. Entretanto, podemos
afirmar que a memória – como produto social – pode ter um significado
77
FONAPER
formativo para aqueles que buscam construir e reconstruir os caminhos
percorridos para a instalação no novo modelo de Ensino Religioso.
Referências
BAKHTIN, Mikhail. Estética da Criação Verbal. Tradução Paulo Bezerra.
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79
O LUGAR DO ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO INFANTIL
NO BRASIL: A POSTURA DO EDUCADOR ENTRE O CUIDAR E
O EDUCAR NA DIVERSIDADE DE PERTENÇA
Celeide Agapito Valadares Nogueira (UFJF)1
Resumo:
O intuito desta comunicação é discorrer sobre a educação infantil e o lugar do ensino
religioso entre o Educar e o Cuidar na diversidade religiosa de um país laico. A delicada
tarefa no processo de desenvolvimento da criança abrange diversas dimensões e requer
uma postura multilateral de múltiplas perspectivas do que é o ser humano e suas
potencialidades evolutivas de forma global: a antropológica, a fisiológica, a sociológica, a
epistemológica, a lúdica, a artística, a afetiva, a religiosa, a espiritual, etc. Lançar-se-á mão
como aporte teórico-metodológico autores como Jean Piaget (2009); Luiz Antônio Cunha
(2013); Jordanna, Castelo Branco e Patrícia Corsino.
Palavras-chaves: Ensino Religioso; Educação Infantil; Diversidade.
Introdução
A educação infantil requer e necessita de um olhar para o ser a qual
se destina o processo educativo em suas múltiplas dimensões:
antropológica, a fisiológica, a sociológica, a epistemológica, a lúdica, a
artística, a afetiva, a religiosa e a espiritual. Não é tarefa fácil englobar
tantas dimensões necessárias ao desenvolvimento cognitivo e afetivoespiritual do ser que são o arcabouço e sustentáculo da criança para um
equilíbrio deste ser humano em pleno desabrochar das suas
multifacetadas necessidades intrínsecas. No entanto, existem pontos
básicos ao qual o feito educativo não pode negligenciar o cuidado e, por
lado, o cuidado não pode abster da esfera educativa do ser humano em
evolução com suas potencialidades. De maneira que, historicamente,
vemos uma ênfase em determinado aspecto do processo global educativo
em detrimento do outro.
Houve, em princípio, um ideário assistencialista preconizando a
fase da educação infantil como um momento apenas de cuidados que se
1
Mestrado em Ciência da Religião PPCIR-UFJF (2012). Licenciada em Filosofia pela
UFJF (2007) com Especialização em Filosofia Moderna e Contemporânea pela UFJF
(2008) e Especialização em Ciência da Religião PPCIR-UFJF (2010). Atualmente
cursando Especialização em Religiões e Religiosidades Afro-brasileiras NEAB-UFJF e
Licenciatura em Pedagogia pela UFJF.
FONAPER
restringiam aos cuidados elementares e básicos para o desenvolvimento
físico-biológico. Esta visão da educação infantil no percurso da história da
educação brasileira foi se ampliando, de maneira que na realidade da
educação infantil atual é inconcebível não abarcar as duas dimensões, a
do cuidar e do educar.
O educar e o cuidar
É polissêmica a semântica das palavras educar e cuidar, por isto
merece a nossa delicada atenção para compreendermos seus vários
significados, e assim apontarmos sobre o quê se está falando quando nos
referirmos a estas.
Cuidar segundo o Dicionário Analógico da Língua Portuguesa é
―velar; zelar, ter os olhos sobre alguém‖ e cuidado é ―solicitude,
pensamento, desvelo, zelo, atenção, empenho, interesse‖.2
Educação de acordo com o Dicionário de Filosofia: ―Daí o imperativo
a que pode ser reduzida a E. contemporânea: o de ‗aprender a ser‘,
‗aprender a aprender‘: tarefa que dura toda a vida e envolve indivíduos e
instituições.‖ 3 Os indivíduos são objeto a qual se dirige a educação, as
instituições têm que garantir os direitos e a base logística para o
desenvolvimento destes indivíduos para viverem a plena cidadania.
Indivíduo que se torna um cidadão do mundo, comprometido com a casa
comum, que é o planeta. E, ainda, segundo a concepção de Educação de
Abbagnano:
A exigência da universalização do direito à E. traz à luz o nexo entre
E. e democracia que não poucos pensadores do século XX
evidenciaram ( tais como J. Dewey, J. Maritain, S. Hessen, e R.
Dottrens), e que constitui outra peculiaridade do discurso
contemporâneo sobre a E., que se configura, assim, em termos
decididamente pessoais e idiográficos: na base da E. atual existe a
preocupação de respeitar o homem em sua dignidade (universal) e em
sua especificidade (individual), e a E. configura-se essencialmente
como um processo de remoção dos obstáculos que impedem o
2
3
82
AZEVEDO, Francisco Ferreira Dos Santos. Dicionário Analógico da Língua
Portuguesa. 2ª Ed. Atual. E revista. Rio de Janeiro: Lexikon, 2010, p.459.
ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. 5 ed. SãoPaulo, Martins Fontes, 2007,
p. 358.
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
desenvolvimento, bem como de promoção das potencialidades
4
próprias de cada pessoa.
Se a educação é promover o desenvolvimento das potencialidades
de cada ser em si, não se pode excluir da educação infantil o apanágio da
dimensão da religiosidade ou espiritualidade do ser humano. Não
desconsiderando que as crianças trazem de suas famílias socializações
primárias referenciais de religião que irão se imiscuir com uma diversidade
na sala de aula. Desde a infância o ser humano vai desenvolver suas
potencialidades, sobressaltando que o conceito de infância é um construto
social que cada tempo histórico tende a colocar em uma estrutura
específica de cada contexto social.
Num primeiro momento, elencaremos algumas concepções de
Piaget sobre uma proposta educativa que leva em conta as necessidades
do ser humano para se desenvolver intelectualmente e afetivamente. E,
num segundo momento far-se-á a explanação com o arcabouço teórico
escolhido para abordar a temática a educação infantil e o lugar do ensino
religioso entre o Educar o Cuidar na diversidade religiosa de um país laico.
Piaget: O desenvolvimento do pensamento não é indissociável do
afetivo-emocional.
Segundo Piaget (2009) o pensamento da criança não é uma
mentalidade pré-lógica no sentido que não há uma lógica, mas no sentido
que há uma lógica diferente da fase adulta:
Comecemos pelas diferenças entre a criança e o adulto. Sustentei em
meus primeiros livros que a criança começava sendo ‗pré-lógica‘, não
no sentido de uma diferenciação fundamental entre a criança e o
adulto, e, sim, no da necessidade de uma construção progressiva das
5
estruturas lógicas.
Partindo desse pressuposto, inferimos que esta construção
progressiva do pensamento inicia-se antes mesmo das etapas sucessivas:
―concreto‖ entre 7 e 11 anos, e ―formal‖ ou proposicional após os 11-12
anos. O que queremos chamar a atenção aqui sobre a construção
4
5
ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. 5 ed. SãoPaulo, Martins Fontes, 2007,
p. 358.
PIAGET, Jean. Seis Estudos de Psicologia. Tradução: Maria Alice Magalhães
D‘Amorim e Paulo Sérgio Lima Silva. 24ª Ed. Rio de janeiro: Forense, 2009, p.69-70.
83
FONAPER
progressiva do pensamento é a respeito da mentalidade lógica da criança
como preponderante para o desenvolvimento da criança não somente ao
que tange a uma epistemologia genética. Entre e para além está todo o
dimensionamento do que é este ser humano que se quer progredir. Ainda
na etapa da primeira infância como já supracitado, há inúmeras nuances
da criança e do humano como tal que precisam ser consideradas.
Englobando a criança num ser físico, que pensa, mas também num ser
afetivo que sente antes de tudo. Este sentimento se revela no corpo físico
na ação como primeira linguagem, por isto, no jogo e no brincar
ludicamente revela sua face mais genuína. Assim também, a posteriori no
desenho livre, na linguagem escrita vai progressivamente construindo sua
visão de mundo a partir da sua própria descoberta.
De acordo com Piaget esta construção da realidade centrada nos
dois primeiros anos no eu, dá lugar a um eu em relação com o mundo, as
pessoas, os objetos.
A evolução da afetividade durante os dois primeiros anos dá lugar a
um quadro que, no conjunto, corresponde, exatamente, àquele
estabelecido através do estudo das funções motoras e cognitivas.
Existe, com efeito, um paralelo constante entre a vida afetiva e a
intelectual. Temos aí apenas um exemplo, mas veremos que esse
paralelismo se seguirá no curso de todo desenvolvimento da infância e
adolescência. Tal constatação só surpreende quando se reparte, de
acordo com o senso comum, a vida do espírito em dois
compartimentos estanques: o dos sentimentos e dos pensamentos.
6
Mas, nada é mais falso e superficial.
No veio da reflexão de Piaget entrevemos ser indissociável o
sentimento do pensamento e vice-versa. O desenvolvimento do
pensamento não é indissociável do afetivo-emocional. Isto nos leva a
pensar que a criança é um todo complexo, um misto de sentimento e
pensamento dialéticos em eterno devir, pois que nunca pronta e acabada.
Mas, um ser em construção, e isto não é próprio da criança, mas da
existencialidade humana.
Diante de tais conjecturas, como são levados em conta estas
premissas pelas políticas públicas para agraciarem este ser em
construção, tanto na sua necessidade fisiológica, afetiva e intelectual e
6
84
PIAGET, Jean. Seis Estudos de Psicologia. Tradução: Maria Alice Magalhães
D‘Amorim e Paulo Sérgio Lima Silva. 24ª Ed. Rio de janeiro: Forense, 2009, p. 22.
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
religiosa? Será que estas políticas no Brasil consideram esta criança em
construção em suas diversas dimensões em progressão?
A legislação do Ensino Religioso e as politicas públicas para a
educação infantil no Brasil
Em um artigo intitulado O ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO
INFANTIL DE DUAS ESCOLAS PÚBLICAS DO MUNICÍPIO DO RIO DE
JANEIRO: o que as práticas revelam? As autoras Jordanna Castelo
Branco (Licenciada em Pedagogia pela UFRJ) e Patrícia Corsino
(Professora adjunta da Faculdade de Educação da UFRJ) fazem uma
reflexão sobre o Ensino Religioso no Rio de Janeiro no ensino fundamental
e relatam que nas duas escolas pesquisadas encontraram práticas de um
ensino confessional. Em suas palavras:
Colocando o foco no município do Rio de Janeiro, temos cerca de
18% das crianças de zero a três anos de idade atendidas em creches
e 95% 3, das de quatro a seis anos, freqüentando escolas. As
crianças de seis anos, desde 2000, já foram incluídas no Ensino
Fundamental, e as de quatro e cinco anos freqüentam pré-escolas
públicas e privadas. Quanto ao ensino religioso, antes da lei municipal
no 3.228, de 26 de abril de 2001, que estabelece o Ensino Religioso
Confessional nas escolas da rede pública de ensino do Município do
Rio de Janeiro, em algumas escolas municipais, já havia aulas de
religião lecionadas por voluntários, fora da grade curricular, sob a
justificativa de ensinar valores éticos e morais às crianças. O ensino
religioso, como parte integrante do currículo do Ensino Fundamental e
da Educação Infantil das escolas da redemunicipal de ensino, está
contemplado no Núcleo Curricular Básico - Multi-educação, de 1996,
como ―enfoque religioso na pluralidade cultural sob a justificativa de
que a potencialidade transformadora do sagrado se manifesta e
mostra o quanto é importante, hoje, a busca de uma ética para o ser
7
humano‖ (p.188).
Adiante acrescenta:
Cabe a ressalva de que, com a lei no 9.475, de 22 de julho de 1997, o
ensino religioso nas escolas públicas passou a ser ―de matrícula
facultativa, parte integrante da formação básica do cidadão e constitui
disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino
7
CASTELO BRANCO, Jordanna e CORSINO,Patrícia. O ENSINO RELIGIOSO NA
EDUCAÇÃO INFANTIL DE DUAS ESCOLASPÚBLICAS DO MUNICÍPIO DO RIO DE
JANEIRO: o que as práticas revelam?, In:
http://www.revistacontemporanea.fe.ufrj.br/index.php/contemporanea/article/download/2
1/15 Acessado em 18/06/2013.
85
FONAPER
fundamental, assegurando o respeito à diversidade cultural religiosa
8
do Brasil, vedadas de qualquer forma deproselitismo‖ (artigo 33).
Nesse veio sobre o ensino religioso como facultativo (Cordeiro, 2010,
p.133) aponta que a formação básica do cidadão não se completa no
ensino fundamental. Ressalva sobre a formação de professores a
importância da postura de um professor que transmita o Ensino Religioso
de maneira científica, como fazem a Ciência da Religião, e não como
Teologia advogando qualquer causa confessional. Sem proselitismo o
Ensino Religioso há que respeitar a diversidade multicultural, multirracial e
a pluralidade religiosa na qual se configura o cenário da realidade
contextual brasileira.
O cenário no qual estamos inseridos no Brasil desde a Constituição
de 1988 Estatuto da Criança e do Adolescente, em 1990, segundo Barreto
(2003):
Nota-se que grandes avanços no âmbito jurídico-legal vêm ocorrendo,
especialmente após a Constituição de 1988, no que tange aos direitos
da criança. O Estatuto da Criança e do Adolescente, de 1990, a Lei
Orgânica da Assistência Social, de 1993, e a Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional, de 1996, consagram tais avanços. Destacamse, entre estes, o direito à educação da criança de 0 a 6 anos de
idade, em creches e pré-escolas. Essas instituições passam a
9
constituir a educação infantil, primeira etapa da educação básica.
E, Kramer (2006) assinala que:
Do debate sobre a educação de crianças de 0 a 6 anos nasceu à
necessidade de formular políticas de formação de profissionais e de
estabelecer alternativas curriculares para a educação infantil.
Diferentes concepções de infância, currículo e atendimento; diversas
alternativas práticas, diferentes matizes da educação infantil. Direitos
de crianças consideradas cidadãs foram conquistados legalmente sem
que exista, no entanto, dotação orçamentária que viabilize a
consolidação desses direitos na prática; exigências de formação de
8
9
86
CASTELOBRANCO,Jordanna e CORSINO,Patrícia. O ENSINO RELIGIOSO NA
EDUCAÇÃO INFANTIL DE DUAS ESCOLASPÚBLICAS DO MUNICÍPIO DO RIO DE
JANEIRO: o que as práticas revelam?,
In:http://www.revistacontemporanea.fe.ufrj.br/index.php/contemporanea/article/download
/21/15 Acessado em 18/06/2013.
A educação infantil no contexto das políticas públicas Angela Maria Rabelo Ferreira
Barreto, p.58. In: http://www.scielo.br/pdf/%0D/rbedu/n24/n24a05.pdf
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
profissionais da educação infantil e reconhecimento de sua condição
10
de professores.
Os direitos estão garantidos legalmente, no entanto, faltam, na
prática, verbas orçamentárias para efetuarem eficazmente a aplicação da
lei. O reconhecimento não garante efetivamente a contemplação dos
direitos que em debates são levados à tona na realidade de um cenário
multiforme com diferenças que emergem da diversidade do país. Tanto no
que se refere às diferentes concepções de infância, quanto da elaboração
de currículos diferenciados para atenderem a demanda de um país
geograficamente e culturalmente diverso. Para além do pano de fundo que
é circunscrever numa esfera conceitual a qual ser se quer educar, há
novas implicações de cunho social, curricular, orçamentário, etc. Com as
quais o desenvolvimento dos dois aspectos educar e cuidar são uma
problemática.
O lugar das políticas públicas para as crianças menores de sete anos
no Brasil até as pesquisas do ano de 2003 ainda é tímido, como assinala
Barreto (2003):
Observa-se que ainda é tímido o lugar ocupado pela criança menor de
sete anos nas políticas públicas, apesar de ser esse o segmento
populacional mais afetado pelas condições de pobreza e
desigualdade. O percentual de crianças dessa faixa etária em famílias
com renda inferior a 1/2 salário mínimo per capita chega a 42,2%, bem
superior àquele da população em geral. (Dados da PNAD/IBGE de
11
1999).
Percebe-se que são escassas pesquisas da área de pedagogia
recentes que abordem a evolução dos programas e metas traçando um
paralelo a partir de 2006 para cá. Nas buscas e mapeamentos de
levantamento bibliográfico pela Internet não conseguimos dissertações ou
teses recentes sobre esta temática. Ainda que haja muitos referenciais de
análises quantitativas. Há uma sobrepujança de dados numéricos sobre a
Educação infantil em detrimento de pesquisas que retratem com zelo em
termos qualitativos o encaminhamento progressivo das crianças de 0 a 6
anos. O campo das pesquisas também requer uma atenção e um olhar
10
11
KRAMER, Sônia. AS CRIANÇAS DE 0 A 6 ANOS NAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS
NO BRASIL: EDUCAÇÃO INFANTIL E/É FUNDAMENTAL In:
http://www.scielo.br/pdf/%0D/es/v27n96/a09v2796.pdf Acessado em 13/10/2012.
A educação infantil no contexto das políticas públicas - Angela Maria Rabelo Ferreira
Barreto In: http://www.scielo.br/pdf/%0D/rbedu/n24/n24a05.pdf
87
FONAPER
voltado para este público alvo investigando em termos qualitativos o perfil
das crianças de 0 a 6 anos em seu aspecto global. Nas observações de
Rosemberg (2001),
Dentro desta ótica, o design dos projetos de diagnóstico/avaliação são
orientados para avaliar cobertura, custo e impacto, este último
geralmente medidos através de aferição do estado nutricional, da
inteligência, de habilidades cognitivas, mas, raramente, do
desenvolvimento social (Myers, 1992). O indicador chave deste
modelo é a avaliação custo–benefício, incluindo nos benefícios
principalmente as taxas de retorno. Este é o modelo particularmente
presente nos estudos realizados, encomendados ou publicados pelo
12
Banco Mundial (CORAGGIO, 1996; LAUGLO, 1997).
A ótica da política de resultados é o imperativo como nos diz
Rosemberg, em face desta realidade pouco se conhece sobre os efeitos
sociais e os reflexos na individualidade do sujeito a qual se destina os
programas que visam geralmente resultados na ordem da aprendizagem
no âmbito do mérito conceitual e intelectual. Não abordando as outras
possibilidades de evolução como no campo afetivo, social, familiar,
estético, e por que não para avaliar se estas crianças que recebem tais
programas estão felizes. Afinal, os programas são elaborados para quê?
Para desenvolver o país em termos de taxas numa educação que zela por
resultados técnicos, ou para permitir a educação de crianças e adultos
felizes e plenos no desenvolvimento das suas potencialidades globais,
dentre elas a espiritual?
A educação brasileira face ao princípio da laicidade
A laicidade é um dos princípios do Estado Moderno que promove a
igualdade de todos perante a lei e a liberdade de crença de cada indivíduo
como um direito individual desde que não fira a liberdade de outrem.
Sendo o conceito de Laicidade com semânticas diferenciadas: ora designa
a separação dos poderes da Igreja e do Estado, ora designa uma profícua
liberdade individual (privada) com respeito à pluralidade no âmbito do
coletivo (pública). Neste trabalho buscar-se-á, por vezes, nas entrelinhas
nas referências bibliográficas fazer um exercício hermenêutico buscando
12
88
ROSEMBERG, Fúlvia. Avaliação de programas, indicadores e projetos em educação
infantil. Revista Brasileira de Educação. Jan/Fev/Mar/Abr 2001 Nº 16, p.23. In:
http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n16/n16a02.pdf
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
os dois sentidos explicitados, e suas inter-relações na configuração do
processo de laicidade desencadeando políticas públicas em prol de um
feito educativo laico. Pensando o conceito de laicidade entendido
filosoficamente como princípio de abertura ao acolhimento das múltiplas
pertenças religiosas em um mesmo espaço – no caso aqui a ambiência
escolar – é a condição de possibilidade de um convívio pacífico com
respeito às diferentes pertenças religiosas.
Segundo Botto (2010) a secularização foi a propulsora da laicidade
fundamentada nas ideias iluministas contrapondo-se ao modelo absolutista
da supremacia da aristocracia e do clero: ―Fenômeno europeu no século
XVIII, a secularização integra o movimento que separa a moralidade da
religião, que marca os limites entre Estado e Igreja;‖(BOTTO, 2010, p.111112). Adiante BOTTO (2010) faz referência a compreensão sobre o
estatuto do homem secularizado ―[...] que determinará o mundo e o modode-ser-no-mundo moderno. Por isso, uma interpretação do iluminismo é,
por essência, uma leitura da secularização‖ (PEREIRA apud BOTTO,
2010, p.112). Tal constatação traz em seu bojo uma nova cosmovisão
humana, e na diferenciação de status desse homem não mais cavalheiro
(súdito da vontade do Rei) representante de Deus, mas um homem com o
uso da razão que conduz a sua vontade e os ditames de sua liberdade
com seus direitos civis salvaguardados em igualdade de direitos. Uma
liberdade ancorada na subjetividade humana com o direito natural, agora o
detentor das suas escolhas sociais, morais, intelectuais, espirituais, etc. O
livre-arbítrio doravante é o condutor das ações humanas, desde que, em
consonância com o bem geral de toda a sociedade civil. Fundamentado
nos imperativos kantianos a ética humana doravante com uso da liberdade
dá condições de discernir e escolher com o uso da razão uma lei interna, e
não mais uma lei coercitiva externa. A justiça depende da capacidade
humana de discernimento, o homem como projeto humano consciente da
sua liberdade então, passa a ser sujeito da história.
Luiz Antônio Cunha em sua mais recente obra Educação e Religiões:
A descolonização religiosa da Escola Pública faz uma análise da laicidade
no Brasil dividindo o eixo temporal histórico em dois momentos: uma
―primeira onda laica‖ no Período Imperial (1870-1870) seus protagonistas
são homens da elite; na ―segunda onda laica‖ que Cunha refere-se aos
últimos anos, que tem como fundamento mudanças profundas no campo
religioso brasileiro e os protagonistas além da parte intelectual da elite ―tem
89
FONAPER
um componente antes inexistente: os movimentos de massa,
especialmente os que lutam pelos direitos sexuais e reprodutivos, tão
marcados por proibições de caráter religioso‖ (CUNHA, 2013, p. 99). O
ensino religioso na escola pública, na sua compreensão trata-se de
colonização. Aponta que o Ensino Religioso no Brasil deveria ser banido
da Constituição Brasileira:
Deverá ser expurgado da Constituição Brasileira o dispositivo que
inseriu o Ensino Religioso nas escolas públicas, de modo que o
currículo seja efetivamente secularizado, sem prejuízo algum para as
13
crenças dos alunos e suas famílias.
Tal compreensão não leva em conta a perspectiva de Piaget com
relação à educação do ser de forma global, bem como a Constituição
Federal de 1988 em seu art. 205:
A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao
pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da
14
cidadania e sua qualificação para o trabalho.
E mais, segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
nº 9.394/96:
A educação dever do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e
nos ideais da solidariedade humana, tem por finalidade o pleno
desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da
15
cidadania e sua qualificação para o trabalho.
A educação infantil está mais voltada para política de resultados
conforme as exigências do Banco Mundial, ou seja, elevação em termos
de qualificação tecno-científica para o trabalho e rendimentos que
contemplem as avaliações de verificação de aprendizagem conceitual,
13
14
15
90
CUNHA, Luiz Antônio Cunha. Educação e Religiões: A descolonização religiosa
Escola Pública. Belo Horizonte, Mazza, 2013, p.102.
POZZER, Adecir; et al (Organizador). Diversidade religiosa e ensino religioso
Brasil: memórias, propostas e desafios – Obra comemorativa aos 15 anos
FONAPER. São Leopoldo: Nova Harmonia, 2010, p. 70.
POZZER, Adecir; et al (Organizador). Diversidade religiosa e ensino religioso
Brasil: memórias, propostas e desafios – Obra comemorativa aos 15 anos
FONAPER. São Leopoldo: Nova Harmonia, 2010, p.70.
da
no
do
no
do
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
renegando para o segundo plano a felicidade deste sujeito em construção
pelo feito educativo.
Considerações finais
O que revelam os dados aqui analisados? Ainda no momento atual a
Educação Infantil no Brasil e as políticas públicas não conseguem agraciar
de forma satisfatória as necessidades da pessoa em evolução com as
suas potencialidades de forma global. Há uma lacuna entre o ideal e o real
a ser preenchida no que tange a concretização da legislação. A legislação
existe de forma a contemplar o campo da Educação Infantil, no entanto na
práxis não se efetiva ou concretiza-se às projeções das leis. As políticas
públicas ficam mais no âmbito das ideais e utopias, posto que
concretamente não tenham tanta demonstrabilidade de eficácia tal quais
os discursos políticos anunciam.
Há muito que caminhar e avançar para conseguirmos no Brasil uma
efetivação das propostas que vislumbram um Ensino Religioso laico sem
proselitismo e consequentemente que consiga abranger as necessidades
globais do educando de 0 a 6 anos eficazmente, segundo os dados em
análise por este trabalho.
Prenuncia-se uma esperança em andamento pelos meios
pedagógicos, mas os recursos oriundos dos poderes púbicos são
escassos. Apesar da dedicação do magistério em lutar por ensino de
qualidade para a Educação Infantil faltam os recursos numéricos para tal
feito. Além, da falta de qualificação dos professores da Educação Infantil,
as verbas para as escolas públicas também são ínfimas. Em decorrência
de tal realidade ainda deixa a desejar o ensino do Ensino Religioso no
Brasil com professores com uma visão do que seja o feito da educação
religiosa vislumbrando uma perspectiva científica como é feito pela Ciência
da Religião.
Ainda que se perceba conquistas e avanços desde 1990 para cá, há
muito o que se realizar para nos orgulharmos da qualidade da Educação e
do Cuidado com as crianças de 0 a 6 anos no nosso país de forma a
agraciar e de maneira a contemplar as necessidades globais da criança,
dentre elas a espiritualidade da pessoa em evolução nas suas
potencialidades.
91
FONAPER
Referências
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Fontes, 2007.
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Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/%0D/cp/n115/a02n115.pdf
92
FORMAÇÃO ACADÊMICA/PROFISSIONAL PARA A DOCÊNCIA
DO ENSINO RELIGIOSO NAS ESCOLAS PÚBLICAS
BRASILEIRAS
Edalza Helena Bosetti Santiago1
Resumo:
O presente artigo traz uma discussão acerca da formação docente para o profissional da
disciplina Ensino Religioso do Ensino Fundamental das Escolas da rede pública. Conforme
LDB 9394/1996 esta disciplina é parte do núcleo comum da estrutura curricular das escolas
públicas do país. No entanto, a mesma legislação educacional deixa claro que a formação
dos docentes deve ser em curso de licenciatura para as séries finais do ensino
fundamental. Como não ficou definido em lei nacional qual seria a formação docente para
tal disciplina, o Conselho Nacional de Educação – CNE - através do Parecer 97/99 dá
autonomia aos Sistemas de Ensino para deliberarem e definirem sobre o tema. Portanto, o
objetivo desta comunicação é trazer à tona, algumas Resoluções já estabelecidas por
alguns Conselhos Estaduais de Educação do país.
Palavras-chave: Ensino Religioso. Formação Docente.
Introdução
A disciplina Ensino Religioso é componente curricular da Educação
básica, mais especificamente, do Ensino Fundamental, cujo objetivo é
entender a natureza da religiosidade nas culturas presentes no dia a dia
dos discentes, bem como o respeito às diferentes formas de conceber os
credos, evitando quaisquer formas de proselitismo.
Assim, a Lei de Diretrizes e Bases nº 9394 de 20 de dezembro de
1996 (LDB nº 9394/96) ao versar sobre a oferta desta disciplina nas
escolas públicas de ensino fundamental do Brasil, delegou autonomia aos
sistemas de ensino, seja através dos Conselhos Estaduais de Educação
(CEE) ou Conselhos Municipais de Educação (CME), para decidirem
juntamente com a entidade civil, constituída pelas diferentes
1
Especialista em Docência do Ensino Superior, Literatura Brasileira e Gestão Escolar.
Mestranda do Curso de Ciências das Religiões pela Faculdade Unida de Vitória (ES).
Docente da rede pública em Eunápolis e Porto Seguro (BA). E-mail:
[email protected]
FONAPER
denominações religiosas a regulamentação acerca dos conteúdos e
normas para a habilitação e admissão dos professores para a disciplina.
Portanto esta pesquisa cujo objetivo é trazer à tona as deliberações
sobre a formação acadêmica/profissional para a docência da disciplina
Ensino religioso nas escolas públicas do país, se justifica mediante a
importância do legado cultural de crenças que permeiam os espaços
escolares e que deve ser mediados por um profissional capacitado para
tal, com imparcialidade, para tratar dos diversos credos e costumes que
constituem o homem.
Um breve relato sobre como foi introduzido o Ensino Religioso no
Brasil
A condição humana, antropológica2, torna-o acessível às questões
transcendentais e religiosas, com aptidões a reproduzir suas crenças e
valores através do seu convívio em sociedade. Portanto, estas questões
sempre estarão permeadas no convívio escolar, por não ser possível
dissociar o ser humano de suas crenças e valores neste espaço. A escola
por sua vez, através da disciplina Ensino Religioso3, deve estar preparada
para lidar com a diversidade de credos ou religiões4, como explicita
Sérgio Junqueira (2008, p. 133):
[...] o Ensino Religioso deverá ser concebido a partir do contexto
escolar, com o objetivo de conhecimento próprio e com objetivos
específicos, enfatizando a formação cidadã a partir das contribuições
que as tradições religiosas oferecem para o processo de civilização e
humanização do homem.
2
3
4
94
Adj. Relativo à antropologia.De antropo- + -log(o) - + ia. S. f. Ciência que reúne várias
disciplinas cujas finalidades comuns são descrever o homem e analisá-lo com base nas
características biológicas (antropologia física) e culturais (antropologia cultural) dos
grupos em que se distribui, dando ênfase, através das épocas, às diferenças e
variações entre esses grupos. Antropologia cultural. Ramo da antropologia que trata
das características culturais do homem (costumes, crenças, comportamentos,
organização social) e que se relaciona, portanto com várias outras ciências, tais como
etnologia, arqueologia, linguística, sociologia, economia, história, geografia humana (...).
Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, 1986, p. 134.
Art. 33. O ensino religioso, (...) constitui disciplina dos horários normais das escolas
públicas do ensino fundamental, assegurando o respeito à diversidade cultural religiosa
do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. (Redação dada pela Lei nº 9.475,
de 22.7.1997). p. 26
Grifo nosso.
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Para entendermos a inserção desta disciplina como componente
curricular nas escolas públicas de ensino fundamental faz-se necessário
retornarmos ao período colonial. Porque naquele momento da história a
disciplina foi formalizada com a aquiescência do Estado e da Igreja
Católica. Cujo objetivo era catequizar os povos indígenas e colonizar os
africanos, sem considerar suas culturas, com o fim específico de tirar
proveito dos tesouros deste país e ao mesmo tempo impor aos habitantes
aqui encontrados o seu credo, o catolicismo, como também, explorar sua
força para o trabalho.
E, em 1549, os jesuítas, foram os primeiros professores do Brasil,
que tinham função evangelizadora. Em 1550 são criadas as primeiras
escolas jesuítas, e assim se dá o marco inicial da introdução do ensino
religioso na educação brasileira.
Severino (1986, p.71) ressalta que:
[...] os princípios de uma ética individualista e social fundada na
suprema prioridade da pessoa sobre a sociedade. A qualidade moral
dos indivíduos repercutirá necessariamente sobre a qualidade moral
da sociedade. Todo o investimento da evangelização, em sentido
estrito, como da educação, sob inspiração cristã, se deu
historicamente nesta linha. Foi por isso mesmo que o Cristianismo e a
Igreja conviveram pacificamente com situações sociais de extrema
opressão, com a escravidão, a exploração no trabalho etc. É como se
estas situações independessem da vontade do homem, bastando que
as consciências individuais se sentissem em paz, nada se podendo
fazer contra estas situações objetivas.
Neste contexto de passividade e submissão do evangelizado, sua
condição antropológica foi negligenciada por muitos anos. Ou seja, toda a
diversidade de riqueza cultural destes colonizados foram sufocadas. Só
após 488 anos, após a promulgação várias Constituições que tratavam o
ensino religioso com proselitismo, o povo brasileiro, teve promulgada em
1988 a Constituição da República Federativa do Brasil (CF/88). Carta
Magna que garante os direitos e deveres do cidadão desta nação.
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união
indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constituise em estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I – a soberania;
II – a cidadania;
III – a dignidade da pessoa humana;
IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V – o pluralismo político.
95
FONAPER
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio
de representantes eleitos, ou diretamente, nos termos desta
Constituição.
Na CF/88, em seu Capítulo III, nos artigos 205 e 210 versão que a
educação é um direito de todos e dever do Estado e da família e que, o
ensino religioso, constitui disciplina das escolas públicas de Ensino
Fundamental.
Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família,
será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade,
visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o
exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino
fundamental, de maneira a assegurar formação básica comum e
respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais.
§ 1º O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá
disciplina dos horários normais das escolas públicas do ensino
fundamental. BRASIL, 1988, grifo nosso).
Porém na contemporaneidade, o professor de Ensino Religioso,
talvez por falta de habilitação específica para tratar da diversidade religiosa
poderá agir com proselitismo e preconceitos com seus alunos. Fatos que
poderão desencadear controvérsias e desentendimentos não só com seus
alunos, mas também com toda a comunidade escolar, que se sentir ferida
nos direitos adquiridos através da Carta Magna e Lei de Diretrizes e Bases
nº 9394/96 de 20 de dezembro de 1996 (LDB nº 9394/96). Portanto, faz-se
necessário refletir sobre a formação docente desta área.
Qual a formação específica para a docência do Ensino Religioso?
Ao questionarmos qual a formação específica para a docência do
Ensino Religioso, fomos buscar respostas nas Resoluções de alguns
CEE‘s através de suas publicações na internet e solicitações via e-mail aos
Conselhos de Educação. Visto que a LDB (9394/96) devido às várias
vertentes religiosas existentes no Brasil, associada aos direitos do cidadão
que constam na Carta Magna (CF/88) aprovou o seguinte sobre o tema:
96
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Art. 33 O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante
da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários
normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurando o
respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer
formas de proselitismo. (Redação dada pela Lei nº 9.475, de
22.7.1997)
§ 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos
para a definição dos conteúdos do ensino religioso e
estabelecerão normas para a habilitação e admissão dos
professores.
§ 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas
diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos
do ensino religioso. (LDB nº 9394/96, grifo nosso)
Tais decisões acerca de dar autonomia aos sistemas de ensino para
deliberarem e decidirem quanto à habilitação do docente para a tal
disciplina estão discutidas no Parecer do Conselho Pleno (CP) nº CP
97/995. Este Parecer teve como relatora, a conselheira, Sra. Eunice R.
Durham. Ela se refere ao art. 33 da Lei nº 9.475/97 da seguinte forma: ―(...) A
Lei nos parece clara, reafirmando o caráter leigo do Estado e a
necessidade de formação religiosa aos cuidados dos representantes
reconhecidos pelas próprias igrejas (...)‖.
Mais adiante declara que como a lei deixa a cargo dos sistemas
decidirem sobre o § 1º e § 2º do Art. 33, para o CP ―(...) é impossível prever a
diversidade das orientações estaduais e municipais e, assim, estabelecer
uma diretriz curricular uniforme para uma licenciatura em ensino religioso
que cubra as diferentes opções (...)‖. Enfatizando que a Lei nº 9475/97 não
se refere a cursos de licenciatura específica para esta docência, mas, que
os sistemas de ensino estabeleçam normas para habilitação e admissão
de professores.
(...) é preciso evitar que o Estado interfira na vida religiosa da
população e na autonomia dos sistemas de ensino. Devemos
considerar que, se o Governo Federal determinar o tipo de formação
que devem receber os futuros professores responsáveis pelo ensino
religioso, ou estabelecer diretrizes curriculares para curso específico
de licenciatura em ensino religioso, estará determinando, em grande
5
Parecer CP da Câmara de Educação Superior nº CP 97/99, que tem como interessado
o Conselho Nacional de Educação (CNE) sobre o assunto ―Formação de professores
para o Ensino Religioso nas escolas públicas de ensino fundamental‖, através do
processo nº 23001.000110/99-06.
97
FONAPER
parte, o conteúdo do ensino religioso a ser ministrado. (PARECER Nº:
CP 097/99)
Portanto, o CP se coloca da seguinte forma quanto à licenciatura
para ministrar aulas de ensino religioso:
(...) - Não cabendo a União, determinar, direta ou indiretamente,
conteúdos curriculares que orientam a formação religiosa dos
professores, o que interferiria tanto na liberdade de crença como nas
decisões de Estados e municípios referentes à organização dos
cursos em seus sistemas de ensino, não lhe compete autorizar, nem
reconhecer, nem avaliar cursos de licenciatura em ensino religioso,
cujos diplomas tenham validade nacional; (idem, PARECER Nº: CP
097/99)
Então, além do que está posto na Lei nº 9.475/97, o CP com este
pronunciamento deixa clara a autonomia dos Conselhos Estaduais e
Municipais de Educação para deliberarem e resolverem sobre o tema em
questão.
A partir de então, discorremos sobre a questão a ser analisada a luz
dos Sistemas de ensino quanto à formação acadêmica para o ensino
religioso. Ora, se a Constituição da República declara o princípio da
laicidade do Estado (Art. 19, Inciso I) no que concerne ao ensino religioso.
Não cabe a escola pública o ensino confessional ou interconfessional
como foi colocado por Debora Diniz e Tatiana Lionço6 que ressaltam:
Há, entretanto uma ambigüidade conceitual na fronteira entre essas
duas modalidades de ensino religioso, pois todo ensino
interconfessional é também confessional em seus fundamentos. A
diferença entre os dois tipos de ensino estaria na abrangência da
confessionalidade: o ensino confessional estaria circunscrito a uma
6
98
Débora Diniz e Tatiana Lionço. ―Educação e Laicidade‖. In: Debora Diniz, Tatiana Linço
e Vanessa Carrião. Laicidade e ensino religioso no Brasil. Brasília: Unesco/Letras
Livres/Unb, 2010, p. 14/15.
a) Ensino confessional: objetivo do ensino religioso é a promoção de uma ou mais
confissões religiosas. O ensino religioso é clerical e, de preferência, ministrado por um
representante de comunidades religiosas. É o caso do Acre, Bahia, Ceará e Rio de
Janeiro;
b) ensino interconfessional: o objetivo do ensino religioso é a promoção de valores e
práticas religiosas em um consenso sobreposto em torno de algumas religiões
hegemônicas à sociedade brasileira. É passível de ser ministrado por representantes de
comunidades religiosas ou por professores sem filiação religiosa declarada. É o caso de
Alagoas, Amapá, Amazonas, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato
Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio Grande
do Norte, Rio Grande do Sul, Rondônia, Roraima, Santa Catarina, Sergipe e Tocantins.
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
comunidade religiosa específica, ao passo que o interconfessional
partiria de consensos entre as religiões, uma estratégia educacional
mais facilmente posta em prática pelas religiões cristãs por exemplo.
(DINIZ e LIONÇO, 2010, p. 14/15)
Portanto se for usado um modelo confessional nas escolas, estará
descaracterizado o caráter laico. Acredita-se que o modelo não
confessional poderá trabalhar com conteúdos diversos como: fazer um
estudo das doutrinas existentes no Brasil e sua dimensão social,
considerando também as posições ateístas e agnósticas procurando evitar
o preconceito, enfatizando o respeito à diversidade. E, para ministrar tal
disciplina, e evitar quaisquer formas de proselitismo, deve-se considerar o
professor da própria rede pública, visto que existem os critérios para
admissão de professores (através de concurso público) e que estes
profissionais sejam habilitados à prática pedagógica desta ciência com
imparcialidade.
No entanto, é necessária muita habilidade no trato das políticas para
a formação de professores, porque de acordo com Caron:
É urgente repensar políticas para a formação de professores, pois a
transformação da escola frente às exigências impostas pela
globalização, pela reestruturação produtiva, pelas políticas
educacionais a sociedade depende em grande parte da habilitação,
qualificação e competência dos professores. Para que os profissionais
da educação sejam dotados de competência mínima ao exercício da
profissão, o preparo se dá com a formação inicial, continua, com a
7
licenciatura ou cursos de magistério. (CARON, 2007, p. 62)
E alguns Estados da Federação, como o Paraná, por exemplo,
definiu o seguinte sobre a disciplina Ensino Religioso, mesmo sem ter a
graduação específica:
(...) 4. nos anos iniciais será ministrada pelo professor regente
conforme encaminhamentos específicos pedagógicos para esta fase
de escolarização.
(...) 10.1. Para o exercício da docência no ensino religioso, exigir-se-á,
em ordem de prioridade:
7
CARON, Lurdes. Políticas e Práticas Curriculares: Formação de Professores do Ensino
Religioso. Tese (Doutorado em Educação: Currículo). Pontifícia Universidade Católica
de são Paulo – PUC-SP, 2007.
99
FONAPER
10.1.1 nos anos iniciais
. graduação em Curso de Pedagogia, com habilitação para o
magistério dos anos iniciais;
. graduação em Curso Normal superior;
. habilitação em curso de nível médio – modalidade Normal, ou
equivalente.
10.1.2 nos anos finais
. QPM, nomeados em Ensino religioso, para a rede pública estadual
de ensino;
. formação em cursos de licenciatura na área das Ciências Humanas,
preferencialmente em Filosofia, História, Ciências Sociais e
Pedagogia, com especialização em Ensino Religioso;(...) (Instrução nº
8
013/2006 SUED/SEEB)
Já o CEE e Secretaria de Estado da Educação de Alagoas através
da Res. Nº 003/20029 definiram o seguinte no Art. 9º quanto à habilitação
de professores para a docência do ensino religioso:
―(...) Consideram-se habilitados para o exercício do magistério do
Ensino Religioso em quaisquer séries dos anos do Ensino
Fundamental:
Os portadores de diploma de licenciatura plena em História, Filosofia,
Ciências Sociais, Psicologia;
Os portadores de diplomas em cursos de licenciatura plena para
formação de Professores para o Ensino Religioso;
Os docentes licenciados portadores de Curso de Especialização latosensu em Ensino religioso ou pós-graduação stricto-sensu na área.
§ 1º - Os portadores de diploma de bacharel em História, filosofia,
Ciências sociais, Psicologia e Teologia poderão também ser
considerados habilitados ao exercício do magistério do Ensino
religioso desde que venham a concluir curso de preparação
pedagógica em instituição devidamente credenciada, nos termos da
Resolução 02/97, do plenário do CNE.( Res. Nº 003/2002)
E, nas nossas pesquisas foi constatado que existem cursos de
Licenciatura e Pós-graduação (lato e stricto sensu) em várias
Universidades e Faculdades do Brasil. Destacamos algumas e
evidenciamos a proposta dos cursos ofertados:
Na Universidade Regional de Blumenau (FURB), o Curso de
Ciências da Religião – Licenciatura em Ensino (CR-ER):
8
9
Secretaria de Estado da Educação – Superintendência da Educação - Instrução nº
013/2006 SUED/SEED. Assunto: Orienta a oferta do ensino religioso na rede estadual
de ensino do Paraná. Curitiba, 07/11/2006.
Secretaria de Estado da Educação e do Esporte – Conselho de Estadual de Educação
de Alagoas – Resolução nº 003/2002 – CEE/AL. 21/05/2002
100
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Criado há quinze anos, o Curso CR-ER da FURB é pioneiro no Brasil
com Licenciatura em Ensino Religioso, habilita profissionais para o
exercício docente em Ensino Religioso na Educação Básica. No
decorrer destes anos o curso tem integrado de forma significativa a
luta pelos Direitos Humanos em relação à Diversidade Cultural
Religiosa, que transita no cotidiano social, acadêmico e escolar,
buscando contribuir na formação de docentes e pesquisadores e
comunidades comprometidas com a erradicação de discriminações e
violências de caráter religioso.
O curso de Ciências da Religião - Licenciatura em Ensino Religioso
(CR-ER) da FURB tem como foco desenvolver atividades de ensino,
pesquisa e extensão, que possibilite uma leitura e compreensão
críticas dos fenômenos religiosos na diversidade cultural, contribuindo
para a construção de uma sociedade justa, solidária e livre, que
reconheça na alteridade a dignidade de todas as formas e expressões
de vida.
É um curso voltado ao estudo das ciências da religião que são
disciplinas empíricas que investigam sistematicamente a religião em
todas as suas manifestações. Um elemento chave é o compromisso
de seus representantes com o ideal da neutralidade frente aos objetos
de estudo (FURB, 2011. Disponível em: http:/www.furb.
br/web/1771/cursos/.../cursos/ciencias-da-religiao/apresentaca.)
A Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes-MG)
Não se questiona a "verdade" ou a "qualidade" de uma religião. Do
ponto de vista metodológico, religiões são "sistemas de sentido
formalmente idênticos". É especificamente este princípio metateórico
que distingue a Ciência da Religião da Teologia. O licenciado em
Ciências da Religião estará apto a atuar como docente em Ensino
Religioso na Educação básica, Fundamental e Médio. Conforme a
legislação vigente poderá avançar seus estudos em cursos de PósGraduação em Ciências da Religião ou áreas afins e atuar na
Educação
Superior.
(http://www.unimontes.br/index.php/.../4761ciencias-da-religiao-montes-claros)
A Faculdade de Educação Tecnológica do Pará (FACET) – Oferta a
Licenciatura Plena em Ciências da Religião.
(...) é o estudo e a análise das religiões num contexto histórico
específico e sua influência sobre os processos antropológicos e
sociológicos. O curso tem por objetivo formar profissionais com
Habilitação em Licenciatura Plena em Ciências da Religião para
exercerem a docência e a pesquisa em face da realidade do
fenômeno religioso e suas múltiplas relações econômicas, políticas
sociais e culturais. (www.facet.com.br)
101
FONAPER
Na Faculdade Teológica de Ciências Humanas e Sociais Logos –
Unidade Passo Fundo – RS.
O curso de Licenciatura em Ciências da Religião (Formação de
Professores em Educação Religiosa – Parecer 296/99 CNE)
proporciona conhecimento e treinamento às pessoas vocacionadas
para o ensino religioso. No seu conteúdo o curso debruça-se sobre
amplos fundamentos bíblicos, tanto no Antigo quanto no Novo
Testamento sobre a educação religiosa. Ênfases são dadas aos
ensinos de Moisés, dos profetas, de Jesus Cristo e dos apóstolos,
especialmente Paulo. Além dos fundamentos bíblicos, o curso valoriza
ainda os fundamentos teológicos e históricos da educação religiosa,
sempre numa abordagem cristã.
(www.faetelpassofundo.
com/2011/05/licenciatura-plena-em-teologia.html)
A Universidade do Contestado (UnC) oferece no Campus
Universitário Canoinhas – Marcílio Dias e Campus Universitário
Curitibanos em Santa Catarina o curso Licenciatura em Ciências da
Religião através da Plataforma Freire (PARFOR).
O Curso de Licenciatura em Ciência da Religião tem como finalidade
proporcionar aos docentes conhecimentos necessários para trabalhar
com o Ensino Religioso para o ensino fundamental e médio com uma
sólida fundamentação teológica, tradições orais/simbólicas e
pedagógicas, com ênfase para os estudos do fenômeno religioso,
valorizando o pluralismo e a diversidade cultural, proporcionando a
vivência dos valores éticos, morais e espirituais na perspectiva do
exercício pleno da cidadania. No Campus Universitário Canoinhas Marcílio Dias e Campus Universitário Curitibanos em santa Catarina.
(http://www.unc.br/index.php?option=com_content&view=article&id=10
87&Itemid=28)
O Centro Universitário Municipal de São José (USJ) oferece o Curso
de Licenciatura em Ciências da Religião reconhecido pelo CEE de Santa
Catarina através do Parecer 171 e Resolução 050/CEE/SC de 14/09/2010.
O Curso de Licenciatura em Ciências da Religião tem a finalidade de
formar docentes qualificados para atuarem no ensino religioso
entendido como componente curricular, bem como, formar
profissionais qualificados para atuarem na pesquisa e na produção
científica no campo religioso. Visa ainda, propiciar estudos do campo
religioso, numa perspectiva científica, com uma abordagem crítica,
dialógica, criativa e respeitosa. Abordar os estudos das práticas
religiosas dos povos ao longo da história da humanidade por um
conjunto de disciplinas das Ciências Humanas e Sociais, tendo como
foco principal o campo religioso com vistas a habilitar o acadêmico
para
trabalhar
pedagogicamente
as
questões
religiosas.
O egresso do curso de Ciências da Religião está habilitado para atuar
102
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
na educação básica e nos espaços educacionais onde a temática da
religião e/ou Ensino Religioso se faz presente para assessorar grupos
religiosos de caráter inter-religioso; em projetos e movimentos sociais,
visando à leitura e à interação crítica do fenômeno religioso na
pluralidade cultural.(www.usj.edu.br/templates/.../conteudo_visualizar_
dinamico.jsp?...)
A Universidade Metodista de São Paulo oferece através do Programa
de Pós-graduação em Ciências da Religião está autorizada pelo MEC e foi
muito bem avaliada pela CAPES/MEC 2007-2009, a sua ementa
contempla:
O Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião estuda as
religiões em suas formas de expressão e articulação próprias e nas
relações com seus contextos histórico, social e cultural. Desenvolve a
interdisciplinaridade no campo extenso das ciências da religião,
recorrendo ao instrumental teórico fornecido sobretudo pelas ciências
humanas: teorias literárias e da linguagem, da cultura, de gênero,
historiográficas, das ciências sociais, da teologia, da exegese, da
filosofia,
da
psicologia
e
da
pedagogia.
(http://www.metodista.br/posreligiao)
A Pontifícia Universidade Católica (PUC/SP)
A Ciência da Religião é um campo do saber que tem como realidade o
fenômeno religioso investigando-o sistematicamente em todas as suas
manifestações sem que se questione sua validade teológica, ou seja,
nesta área do conhecimento não se questiona a "verdade" ou a
"qualidade" de uma religião, pois todas se apresentam igualmente
como objeto de estudo e investigação. Seu princípio metodológico é o
vislumbramento das religiões como sistemas de sentido formalmente
idênticos apresentando, portanto, pontos comuns que as tornam
passíveis de serem investigadas. Universos culturais, as religiões
representam os sentidos e os significados criados pelo homem nas
relações que estabelece com o mundo, com os outros e com si
mesmo. Sua compreensão, portanto, do universo cultural religioso
torna possível a compreensão do homem nele inserido.
(www.pucsp.br/pos-graduacao/mestrado-e.../ciencias-da-religiao)
A Faculdade de São Bento do Rio de Janeiro (FSBRJ)
O curso de pós-graduação lato sensu em Ciências da Religião busca
dar sustentação ao campo da pesquisa e da docência. A partir de uma
pluralidade metodológica este estudo investiga as distintas áreas do
saber possibilitando uma visão atualizada, diversa e ao mesmo tempo
profunda sobre o tema em questão. O fenômeno religioso não é
abordado a partir de uma tradição em especial. Os fundamentos e as
manifestações do religioso serão analisados em distintas culturas,
numa reflexão sobre a essência do religioso e sua presença na
103
FONAPER
história.(www.faculdadesaobento.org.br/pos-graduacao/cincias-dareligio)
A Universidade Presbiteriana Mackenzie
Criado em 2002, o Programa de Pós Graduação em Ciências da
Religião (PPG/CR) da Universidade Presbiteriana Mackenzie busca
contribuir para: compreender a religião em suas relações com a
sociedade na interface das ciências sociais e humanas; formar
pesquisadores e capacitar lideranças sociais, culturais, educacionais e
políticas em sintonia com as demandas científico-culturais e históricosociais contemporâneas de compreensão do campo religioso;
desenvolver a pesquisa e a produção científica na área das Ciências
da Religião e nas áreas relacionadas ao fenômeno do campo religioso
em geral; formar docentes altamente qualificados para atuar no campo
do estudo do fenômeno religioso em suas relações com a sociedade
brasileira. O público alvo do programa consiste em profissionais de
todas as áreas que pretendam aprofundar seus conhecimentos quanto
à influência da religião na sociedade e trabalhar com o ensino e a
pesquisa. (http://www .mackenzie.br/stricto_ciencias_religiao.html)
Na Faculdade Unida de Vitória-ES é ofertado Mestrado Profissional
em Ciências das religiões.
O Programa do Mestrado Profissional em Ciências das Religiões da
Faculdade Unida de Vitória tem como objetos principais de suas
pesquisas: (a) a compreensão das relações entre religiões e a
sociedade democrática nas suas diversas dimensões, com ênfase no
incremento crítico da participação religiosa na vida social; e (b) a
análise dos discursos religiosos canônicos e não-canônicos, com
vistas à compreensão crítica dos modos de produção, interpretação,
circulação e difusão do discurso religioso no âmbito sócio-cultural.
Nosso Programa é o único de natureza ―profissional‖ na área de
Teologia e Ciências da Religião e desenvolve suas atividades em
sintonia com a história e desafios do campo, sendo membro da
ANPTECRE desde seu credenciamento pela CAPES.
A Área de Concentração do programa é Religião e sociedade e suas
linhas de Pesquisa são:
Religião e Esfera pública: cujo foco recai sobre o lugar da religião na
sociedade em geral e na esfera público-política em particular,
incluindo pesquisa e discussão sobre temas tais como: Ensino
Religioso escolar, crenças religiosas e legislação; a participação
política das religiões; pluralismo e diálogo inter-religioso etc.
Análise do Discurso Religioso: cujo foco recai sobre a análise crítica
dos vários tipos de discurso religioso, tais como: discurso em textos
canônicos das religiões; testemunho pessoal dos adeptos; religião na
mídia; hermenêutica e filosofia da linguagem etc.
104
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
(http://www.faculdadeunida.com.br/site/cursos/mestrado/)
A Universidade Salgado de Oliveira (UNIVERSO) também oferece o
curso de Pós-graduação em Ciências da Religião.
Vimos então, que em diversos Estados brasileiros, podemos
encontrar Universidades ou Faculdades que estão ofertando cursos em
níveis de graduação e/ou pós-graduação em Ciência(s) da(s) Religião(ões)
com vistas ao Ensino Religioso, objetivando habilitar o profissional para a
docência deste componente curricular da Educação Básica. Portanto, fica
evidenciada a importância da formação docente para o exercício da função
nesta área específica.
Considerações
Através deste estudo conclui-se que, existem ainda várias
divergências entre o CNE e os CEE e CME do país quanto à formação
específica para o docente da disciplina Ensino Religioso. Alguns estados
ou municípios já estabeleceram uma licenciatura específica: Licenciatura
ou Bacharelado em Ensino Religioso, em Ciências da Religião,
Especialização na área para esta docência, e no caso de não haver
demanda de professores da área específica, abrem vagas para a docência
da disciplina, para os professores portadores de diplomas de licenciatura
plena em História, Filosofia, Ciências Sociais, Psicologia. Porém, foi
diagnosticado que existem municípios no estado da Bahia que não
deliberaram sobre a questão, e, nem mesmo ofertam a disciplina aos
alunos do ensino fundamental.
Por outro lado, percebemos que os centros de pesquisa e extensão
―As Universidades e Faculdades‖ já estão se preparando para tal demanda
que possivelmente está por vir.
Mas, se faz mister ressaltar que os diálogos continuam acerca do
assunto, e, que eles não se encerram em si mesmo. Porque, já que
estamos em um estado democrático de direitos, o ser humano em sua
condição antropológica deve ser respeitado e respeitar a condição do
outro, e, o ensino religioso, na fase escolar do ensino fundamental poderá
através do estudo das crenças e costumes religiosos observados dentro e
fora do contexto escolar, promover a autonomia do educando, evitando o
105
FONAPER
preconceito e a discriminação, preparando-o para o respeito mútuo,
garantindo a todos os seus direitos fundamentais.
Referências
BRASIL, Constituição Federal de 1998. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br. Acesso em: 17 de ago. 2013.
______. Ministério da Educação e Cultura. Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nº 4024 de 1961. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L4024.htm. Acesso em: 17 de
ago. 2013.
______. Ministério da Educação e Cultura. Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nº 5692 de 1971. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5692.htm. Acesso em: 20 de
mai. 2011.
______. Ministério da Educação e Cultura. Lei de Diretrizes e Bases –
LDB - nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996 – Parecer CNE/CEB nº
17/2001. Brasília, 2007.
______. Ministério da Educação e Cultura. Lei Nº 9475 de 1997.
Disponível em: http://www.pedagogiaemfoco.pro.br/lindice.htm. Acesso
em: 20 de mai. 2011.
______. Conselho Pleno do Conselho Nacional de Educação. Parecer nº
97, de 06 de abril de 1999. Formação de professores para o Ensino
religioso nas escolas públicas de ensino fundamental. Disponível em:
www.pen.uem.br/diretrizes/Parecer_CNE-CP_1999_97.doc Acesso em:
19 ago. 2013.
FERREIRA. Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua
Portuguesa. 2. Ed. Rio de Janeiro: Ed. Nova Fronteira, 1986.
JUNQUEIRA, Sérgio. História, legislação e fundamentos do Ensino
religioso. Curitiba: Ed. IBPEX, 2008.
PARAMETROS CURRICULARES NACIONAIS PARA O ENSINO
RELIGIOSO. Fórum Nacional permanente do Ensino Religioso. São Paulo:
Mundo Mirim, 2009.
106
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
SEVERINO, Antônio Joaquim. Educação, Ideologia e Contra-ideologia.
São Paulo: EPU, 1986.
107
OS (DES)PROPÓSITOS DO ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO
INFANTIL
Renata de Souza Leão1
Resumo:
Este artigo objetiva defender a necessidade de formação para professores de Educação
Infantil nas práticas pedagógicas de ensino religioso nas escolas públicas. As instituições
de ensino provocam induções partidárias de conhecimento de mundo, ou seja,
professores seguidores de uma determinada religião fazem divulgação de suas crenças
religiosas, no entanto, este proselitismo na infância ascende à desigualdade, apontando a
supremacia de catequização de um conceito sobre o outro. Utiliza-se como metodologia o
estudo teórico subsidiado por referência bibliográfica relevantes ao tema. Considerando que
a discussão se faz necessária para a educação, pois conduzirá a práticas pedagógicas de
respeito às diferenças religiosas e culturais, o que caracteriza a constituição de um povo
pertencente a um Estado Laico, e detentores de direitos nas escolas públicas de qualidade
com a possibilidade de saber pensar e produzir intervenções por meio de interações de
conhecimento.
Palavras-Chave: Formação. Educação Infantil. Intervir.
Introdução
A proposta deste artigo é aprofundar a temática da formação do
professor de educação infantil direcionada ao ensino religioso no processo
de desenvolvimento e no acesso a direitos fundamentais como igualdade e
liberdade.
O problema do texto se situa na prática realizada pelo professor de
educação infantil em pregar sua religiosidade promovendo proselitismo
dentro da escola, provocando preconceitos e discriminações sem a
ampliação de direitos humanos e constitucionais.
Este texto provoca um pensar autônomo, numa discussão
eticamente direcionada por uma prática educacional, como fazer valer
direitos sociais básicos num momento de descoberta, de prazer e de
conhecimento na educação infantil. O objetivo é garantir na formação do
professor de educação infantil a essencial prática pedagógica igualitária e
1
Graduada em Filosofia pela UFAL e Especialista em Gestão Escolar pela UNOPAR.
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Educação pela UNASUR.
Professora efetiva da rede pública, Estadual e Municipal, de Maceió/AL.
FONAPER
justa, mediante a aliança do ensino religioso como práxis de
desenvolvimento humano na educação infantil.
O Trabalho provoca uma reflexão baseado em estudos, publicações,
textos acadêmicos e documentação do MEC, relativas à educação infantil,
primeiramente o texto discutirá os pontos do ensino religioso e da
educação infantil e em seguida debatendo sobre práticas pedagógicas e
formação continuada do professor de educação infantil em ensino
religioso.
Ao acompanharmos o histórico da educação no Brasil, podemos
destacar a evolução da Educação Infantil que revigorou suas reais funções
em relação às crianças ganhando um novo horizonte, valorizando-se cada
vez mais a educação das crianças entre 0 e 5 anos de idade. Contudo,
observa-se também que este trajeto foi estabelecido com o incentivo e
empenho de educadores, através de discussões e movimentos sociais em
prol da qualidade na educação infantil.
A visão em relação às crianças também foi valorizada, visto que
estas passaram a ser consideradas como sujeitos de direitos que se
encontram em processo de desenvolvimento, necessitando assim de
investimentos especiais para uma educação de qualidade que atenda as
peculiaridades de sua faixa etária.
Os (des)propósitos do Ensino Religioso
A legislação brasileira, Constituição Federal (1988) garante educação
básica de qualidade para todos, que possibilita ao cidadão o seu
desenvolvimento pleno. A LDB (1996) apresenta uma estrutura curricular
de aprendizagem, organizando a educação por etapas e modalidades,
utilizando como parâmetro a faixa etária, ou seja, períodos determinados
para aprender um conhecimento fixado.
Pois bem, a compreensão da legislação possibilita o entendimento
de uma série de atividades que aparecem como conteúdo social, incluindo
a organização humana como uma conexão histórica, política e social
fortalecido, nos propósitos da constituição educacional.
A divisão do saber como propostas de aprendizagem apresentam
unicamente o ensino religioso como facultativo e laico, na etapa de ensino
fundamental. O conhecimento fatiado abre espaço para aberrações
educacionais que acometem as outras modalidades, no qual o ensino
110
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
religioso passa pelo processo de mutação de conceitos para o proselitismo
escolar visto assim, a discussão em prol do conhecimento, sofre
metamorfose religiosa dilaceradoras do ser humano, promovendo
desigualdade, movida de preconceitos e ignorância, coisa que não pode
ser permitida dentro dos muros de uma escola pública, abrindo o
descredenciamento do Estado em discutir educação de qualidade
(JUNIOR, 2012).
No entanto, quando discorremos sobre determinações curriculares
sabemos que a escola é sujeito de um objeto específico de contexto
personificado socialmente. Mészáros (2008), afirma que a crescente
preocupação de resolver a ―crise de valores‖, mostra que o Estado
caminha a passos largos e definidos para uma sociedade delinqüente,
projetada pelo Ministério da Educação e assegurada pelos professores.
Entretanto, parece radical a discussão de que o poder público é o
maior e único culpado do fracasso social, mas quando estamos falando em
direcionamento educacional, de teorias pedagógicas, de estruturas de
aprendizagem, não existe outro a culpar, ou pelo menos não existem
outros para começar a debater, quais são as intenções sociais proferidas
de uma década até agora? No qual a criança hoje de 10 anos, que se
encontra no ensino fundamental, é a mesma criança que pratica roubos,
mata e passa pela educação infantil, possuidora da bolsa-escola e
numerada no Brasil carinhoso, viés que tenta apaziguar os desníveis
sociais, mas que ainda é o maior detector de negligência do Estado para
com o seu povo.
Entenda melhor, o ensino religioso não é o salvador social, não é isto
que está sendo defendido, o que está sendo questionado é: por qual
motivo o ensino religioso é preso a uma etapa de ensino, transformando
uma área de conhecimento em um contexto limitado e aprisionado, como
se na educação infantil as crianças não conseguissem refletir e no ensino
médio são tão avançados intelectualmente que outras disciplinas supririam
as competências necessárias do conhecimento como a filosofia e/ou a
sociologia? A escola influi e forma pensamentos proferido pelo professor,
desencadeado pelo conhecimento, como proposta de aprendizagem entre
pares pensantes e dispostos a significar ou reinventar os conceitos
propostos.
Isto demonstra que o ensino religioso deve ser contemplado em
todas as áreas e modalidades para discutir a cultura dentro da sociedade,
111
FONAPER
Morin (2000), coloca que a condição humana está ligada com o cosmo,
como ser único no posicionamento do individuo no mundo, não
determinando idade e momento para aprender.
Então, o que se entende por ensino religioso não é um simples
levantamento histórico de culturas religiosas passadas pelo mundo, mas
de uma aprendizagem significativa voltada para o interesse de aprender e
transcender a metafísica, que necessita de ser repensados quais são os
objetivos da exclusividade no Ensino Fundamental como proposta de
aprendizagem e quais são suas competências vinculadas as suas
habilidades. Como apresenta a LDB 9304/96 art.33:
Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.
Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante
da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários
normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o
respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer
formas de proselitismo. (Redação dada pela Lei nº 9.475, de
22.7.1997)
§ 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a
definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as
normas para a habilitação e admissão dos professores.
§ 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas
diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos
do ensino religioso."
Cury (2004) afirma que a multiculturalidade do Brasil é o primeiro
processo polêmico de debate, entretanto o que se compreende são a
limitação e o direcionamento que incorpora a legislação relacionada ao
ensino religioso.
Posto que, a exclusividade do ensino fundamental relacionada ao
ensino religioso tem deixado aberto o que vem sendo feito como prática
pedagógica nas salas de educação infantil e nas salas do ensino médio,
não esquecendo que o ser humano é o mesmo que passa por todas as
etapas escolares, então, quais as discussões e os encaminhamentos
quando temas e atitudes relacionados ao ensino religioso é abordado
nestas salas, qual é o norteador que compreende que a resposta dada
anos depois, não responde a pergunta de hoje, ou que já passou a
pergunta e a resposta não é satisfatória, nisto a angústia do saber
112
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
determinado deve ou não ser apreciado e tratado como proposta de
aprendizagem, ou como elaborar respostas para estes itens se a própria
legislação atribui áreas a serem abordadas no tempo e no espaço
determinado.
O problema não é o período da aprendizagem, o problema é
limitarem o pensamento humano e negligenciarem a astúcia humana que
direciona, influencia e até determina o caminho da salvação da
humanidade.
Nessa situação o ensino religioso necessita de uma elaboração
epistemológica de intenções, e uma proposta de diálogo derivado do
pensar, visto que a credibilidade do aprender é fundamentada no
empirismo da razão.
A educação infantil e o ensino religioso
Desde a LDB de 1996, a educação infantil é uma etapa da educação
básica que profere características próprias e legislação específica. O CNE
através da Resolução das Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Infantil 20/2009 apresenta eixos determinados e teorias
detalhadas de aprendizagem com a publicação das Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação Infantil.
Assim, a Lei define que a criança é um sujeito de direito e de acesso
irrestrito a educação, com progressão contínua através de uma rotina que
possibilita a interação e a brincadeira, pelo menos são estes os eixos
determinados no currículo e que o cuidar e educar são propostas
elementares do ensino na educação infantil. Valendo lembrar inicialmente
que o preâmbulo da constituição afirmam direitos irrevogáveis do cidadão:
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia
Nacional Constituinte para instituir em Estado Democrático, destinado
a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade,
a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça
como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem
preconceito, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem
interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias,
promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte constituição da
república federativa do brasil.(BRASIL, 2004)
Não é necessário agora discutir o proselitismo encontrado no
preâmbulo da Magna Carta, pois é um ponto extenso a ser estudado; o
113
FONAPER
importante é compreender que promover o pleno desenvolvimento do
cidadão depende do ‗exercício dos direitos sociais e individuais, a
liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a
justiça‘ em uma sociedade ‗pluralista e sem preconceito‘ com contexto
social e educacional.
Entendendo que o ensino religioso como área, abrange todo o
contexto, modalidades e etapas da educação básica como acontece com a
matemática, e a linguagem, entre outros, estando presente na educação
infantil, no ensino fundamental e no ensino médio, rompendo a barreira da
etapa e ampliando o desenvolvimento pleno como proposta de
aprendizagem na educação, política e cidadã, lembrando que a educação
infantil erroneamente está vulnerável a teorias eurocêntrica, criacionista e
classista, por entender que a criança não reflete e é um ser propenso a
modelagem, contribuindo para a desigualdade e fomentando e
discriminação.
A problemática sobre as concepções de currículo tem sido discutida
dentro da sociedade, pois os movimentos tecnológicos têm ultrapassado a
estrutura da grade curricular, e credenciado pela humanidade no caráter
atualizador de conhecimento pela mídia, a criança vive neste cenário e é
protagonista desta história de tecnologia, Warschauer (2002). Então, a
criança não espera mais a informação vinda do professor, ela dialoga
mediante o panorama discutido na atualidade dentro do espaço educativo,
Barbosa e Richter (2012) afirmam que os bebês já organizam seus
pensamentos mediantes as propostas de atividades oferecidas pelos
estímulos.
A criança é incentivada o tempo todo e interage entre muitas
linguagens no decorrer do dia. Na educação infantil, o professor é o elo
entre o estímulo e a aprendizagem; visto que, é através desta relação que
a criança participa das atividades propostas, e muitas vezes este professor
é o formador de opinião e possuidor de uma credibilidade inabalável diante
do olhar curioso e perceptivo da criança, Warschauer (2002). Podendo
sujeitá-la ao domínio negligente da educação pública que não discute o
ensino religioso na Educação Infantil e permite a religiosidade,
transmissora da omissão em teorias provocadoras de aberrações sociais.
Então, qual é a conseqüência do não cumprimento de vários direitos
relacionados à educação infantil que prejudica o desenvolvimento da
sociedade? A resposta é simples: o não cumprimento gera um povo
114
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
omisso, ignorante e que não sabem que o Estado é o maior vilão da
história social ou a maior vítima já que a sociedade é composta por
cidadãos criados pelo Estado. A radicalização das ações educacionais é o
suporte de mudanças, talvez pelo menos seja o início de alguma mudança,
visto que a sociedade é reflexo dos seus direitos e deveres cumpridos pelo
Estado.
No entanto, é do Estado que fomenta uma sociedade refletida em um
povo, como relata Marx e Engels (2009, p. 43):
Todas as sociedades anteriores, como vimos repousaram no
antagonismo entre classes opressoras e classes oprimidas. Mas para
oprimir uma classe, é necessário pelo menos lhe garantir condições
de existência que lhe permitam viver na servidão.
Visto que, a educação brasileira é fruto de um Estado opressor e do
não diálogo dentro da educação, na existência de um processo melhor ou
da ideia de um campo conceitual superior provocando e garantindo as
‗condições de existência que lhe permitam viver na servidão‘. Então,
esbarramos num contexto histórico desastroso como a colonização,
escravidão, o capitalismo (usineira, cafezais e outros) e o neoliberalismo
refletido ainda hoje num Estado afogado em desvios, subornos, roubos e
cobranças alarmantes de impostos, qual seria a versão contrária nesta
peça democrática, a consciência de um povo baseado na educação, isto é
fato, mas como se dá esta consciência, já que Marx e Engels (2009, p. 56)
afirmam:
Será necessária uma grande perspicácia para compreender que as
idéias, os conceitos, e as noções dos homens, numa palavra, sua
consciência, se modificam com toda modificação sobrevinda em suas
condições de vida, em suas relações sociais em sua existência social?
Em uma palavra a mudança entrelaça-se na ‗consciência‘, sendo a
porta fundamental da radicalização dita em parágrafos anteriores, mas
como gerar um povo consciente, como retirar da história a inércia de uma
nação, como solicitar a soberania da igualdade e justiça, como mobilizar a
massa? As inquietações são rebatidas mediante o óbvio que proporciona a
outra palavra, talvez salvadora da pátria que é a educação, ou seja, é o
cumprimento legal, é garante a um povo a possibilidade da mudança.
115
FONAPER
O que nos parece indiscutível é que, se pretendemos a libertação dos
homens não podemos começar por aliená-los ou mantê-los alienados.
A libertação autêntica, que é a humanização em processo, não é uma
coisa que se deposita nos homens. Não é uma palavra a mais, oca,
mitificante. É práxis, que implica a ação e a reflexão dos homens
sobre o mundo para transformá-lo (FREIRE, 2005, p. 132).
Separados por etapas e diferenciado por área a educação infantil
não consegue dialogar com o ensino religioso, andam lado a lado
sorrateiramente, permitindo que as crianças sejam sujeitadas a pregações
e catequizações que diabolizam o saber com seus proselitismos causais,
distintos e discriminatórios com contexto étnico, racial e cultural. É
necessário a ‗libertação do homem‘, na práxis de transformação.
Os momentos ingênuos da roda na educação infantil
É dito que dentro da educação infantil os momentos inocentes
podem acontecer, mas estes momentos utilizados pelo adulto nunca são
inocentes, sempre tem intencionalidades, sempre estão cobertos de
interesses, sempre estão sujeitos ao poder burocrático da salvação.
Discutir o ensino religioso como proposta de ciência na educação pública
laica e de qualidade é debater porque a aceitação calada de proselitismo
dentro das rotinas de atividades apresentadas para as crianças.
A organização do trabalho pedagógico é dividida no cuidar e educar
dito como associado, atividades contínuas e inseparáveis, pelo CNE
20/2009. Na palavra educar, estão as atividades cotidianas, sendo
divididas em roda de conversa, lanche, atividade direcionada, brincadeiras,
pinturas, contação de história até a espera do responsável para o regresso
a casa.
O que acontece na roda da conversa ou hora de atividade é o
momento de sucessivo abuso de direitos humanos infringidos; explicando
melhor, e sabendo que este momento pode ter a nomenclatura regional de
diferentes formas, cabe detalhamento do que seja a roda da conversa, é o
instante da primeira atividade proposta, as crianças são colocadas em
roda, ou seja, cadeiras alinhadas em círculo, no qual as crianças fazem a
chamada diária e cantam como forma de iniciar os preparativos da
aprendizagem. Nisto temos músicas repetidas como comandos ditatoriais
diariamente, Fonterrada (2005), é neste momento de abertura do dia, que
116
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
as professoras cometem a arbitrariedade de orarem, rezarem e proferem
sua fé.
É neste instante de tempo na educação infantil que o professor deixa
de ser professor e passa a agir como doutrinador de dogmas, proferidores
de verdades absolutistas, e de singularidades preconceituosas e
discriminatórias.
Junior (2012) aborda que a negligência política educacional provoca
a desigualdade e é sujeito à penalidade judicial ou pelo menos é
necessário estar atento aos conceitos culturais abordados com valores
negativos apreendidos socialmente iniciando com a criança entrando na
creche, violando os direitos do cidadão.
Esta discussão é pertinente e muito necessária mediante a
consequência que provoca dentro da qualidade educacional, levando a
discriminação étnico-racial criando num vínculo cultural de superioridade
em determinadas crenças, subjugando culturas milenares praticadas por
nossas crianças em suas comunidades.
Para garantir igualdade de direito e para efetivar uma sociedade justa
é necessário abrir espaço para discutir o ensino religioso como forma de
assegurar o espaço de aprender dentro da instituição educacional, não
prevalecendo a religiosidade do professor, mas abrindo temas para
aprendizagem na educação infantil sobre o ensino religioso.
Provocando no professor o diálogo no momento que inicia as
atividades com as crianças na roda de conversa e não propondo
proselitismo, e sim, um espaço de diálogo, interação e respeito à
diversidade humana, e isto, estão suas crenças, seus rituais, suas
oferendas e seus deuses e demônios.
É importantíssimo salientar que o conhecimento é fundamental para
mudança, pois, só através dele iremos conseguir uma transformação,
tendo o poder de pensar e agir com consciência. Vigotski (2002) afirma
que a construção do conhecimento é entendida como resultado de
adaptações da criança ao meio, envolvendo dois mecanismos reguladores:
a assimilação, através da qual a criança exercita os esquemas já
construídos e a acomodação pela qual se apropria desses dados. Valorizar
o conhecimento, ouvir atentamente as opiniões, estimular as participações,
possibilitar as escolhas e divertir-se na aprendizagem, são os objetivos de
uma proposta de educação infantil. Trabalhar às diferentes necessidades
educacionais, aos interesses e estilos de aprendizagem da cada criança,
117
FONAPER
exigem uma avaliação contínua do profissional diante suas ações e
deliberações nas estratégias ao ensino e a aprendizagem.
A formação como proposta de ampliação do Ensino Religioso na
educação infantil
O que requer muita atenção é quando acontece proselitismo nas
escolas públicas e este detalhe está passando despercebido por nossos
conceitos, mas vivenciado pelas crianças da educação infantil como
práticas discriminatórias, a religiosidade de matriz africana ou a indígena
demonstrada como crença não cristã e isto provoca a supremacia de uma
colonização determinante de classes.
Goes, Barbosa e Junior (2012) discutem que na matriz africana a
religiosidade concebe ao humano com um ser integrado ao meio, parte
importante da harmonização do humano com seu habitat, com respeito aos
mais velhos, com transmissão de conhecimento pela oralidade e que todos
estão detidos em uma roda de dança, bailando para o engrandecimento
individual e coletivo, as escolas precisam oferecer uma aprendizagem que
produza liberdade, igualdade e conhecimento.
A formação do professor é essencial para discutir que os espaços
educativos não são lugares de pregação ou direcionamentos religiosos,
que a roda de conversa é exclusivamente o espaço voltado para o diálogo
aberto e discursivo.
Promover a formação do profissional de educação infantil é
importantíssimo, pois o intercâmbio intencional de conhecimento através
de diálogos nos encontros promovidos pela formação é estimulador no que
se refere a planejar a rotina, o tempo e o espaço das práticas pedagógicas
da educação infantil.
Kramer (2008) propõe uma ação contínua de formação atendendo ao
aspecto cultural e social das crianças, compreendendo a infância como
conectivos de ações únicas e sujeitas de propriedades singulares de
aprendizagem.
A qualidade é inerente à educação ou deveria ser, pois é financiada
para proporcionar o pleno ‗desenvolvimento do cidadão‘, retomando uma
relação indivíduo e educação na proporção qualitativa, ou seja, a qualidade
da educação é dever do Estado, e passa pela formação do professor, pois
118
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
o povo sendo o fornecedor de subsídios por meio de imposto à devolução
de um serviço de qualidade é o mínimo esperado.
A divulgação de resultados de avaliações (SAEB, IDEB, PISA, ENEM,
ENADE) tem trazido dados preocupantes sobre a qualidade do ensino
no país. Comumente, quando são divulgados estes índices, há
algumas reações, mais ou menos inflamadas, mas são apenas
espasmos: logo depois, tudo parece voltar ao ―normal‖. Aos poucos,
no entanto, parcelas cada vez maiores da sociedade vão tomando
consciência de que não deve ser assim: a preocupação com a
qualidade da educação deve ser uma constante (VASCONCELLOS,
2013, p.02).
Então a gratuidade e a qualidade é exigência inerente da educação,
nisto por ser um investimento que é retirado do povo para o povo, e pelo
povo, num governo democrático, não discutindo aqui o sentido de valor e
de custo, só esboçando uma estrutura da efetivação do direito social.
Visto que, a propriedade da discussão volta ao teor educacional de
propor inicialmente o conhecimento dos fatos como evidência de
proselitismo e ao mesmo tempo como proposta de formação direcionada
para aprendizagem do professor, no qual utiliza o ambiente laico para uma
prática pluralista e democrática.
Considerações finais
A efetivação dos direitos sociais depende de sua capacidade de
autorreconstrução teórica e, ao mesmo tempo, da atividade da educação
como o trabalho crítico do conceito que buscar a elaboração de teorias
com intenções práticas construindo hipóteses plausíveis orientadoras do
sujeito autônomo – de vontade livre, capaz do exercício constante da auto
– reflexão. É essa capacidade de auto-reconstrução o que torna a
educação eficaz, dando-lhe condições de pemanecer fiel à praxis que a
idealiza.
A formação do professor é uma proposta relevante quando aponta
uma discussão entre a teoria e prática, buscando uma educação de
qualidade e aliando a educação infantil com o ensino religioso desde os
primeiros passos linguísticos do ser humano.
A lógica desse exercício de liberdade e de prática é o diálogo. O
diálogo é peculiar ao indivíduo, pois a prática individual é essencialmente
119
FONAPER
dialética e a dialética é a lógica da ação, tanto quanto a ação é processo
inteligível da educação.
Essa conversão só é possível no diálogo entre o ensino religioso e
suas ações na educação infantil como propulsora de equidade equivalente
a proliferação dos direitos sociais num contexto justo de direitos, e para
isso é necessário garantir estes direitos de forma clara e acessível.
Isto é claro quando no decorrer do artigo faz um levante da formação
do professor mediante as atitudes que estão sendo vistas dentro da
educação infantil e ao mesmo tempo propõe um debate esclarecedor que
as práticas sejam ações includentes e possibilitadoras do exercício da
cidadania.
Referências
BARBOSA, Maria Carmen Silveira; RICHTER, Sandra Regina Simonis.
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123
A FORMAÇÃO INICIAL E CONTINUADA DO DOCENTE DE
ENSINO RELIGIOSO
José Carlos do Nascimento Santos1
Resumo:
Este artigo objetiva apresentar a importância da formação inicial e continuada do docente
de Ensino Religioso, uma vez que se faz necessário uma formação de caráter inicial como
também de forma continuada para que o docente possa transmitir de forma eficaz e coesa
o objeto de estudo que é o fenômeno religioso. O artigo objetiva ainda à práxis pedagógica
utilizadas pelos docentes, proporcionando uma ação-reflexão-ação. Pretende-se com esta
reflexão contribuir para com um Ensino Religioso voltado ao respeito à diversidade religiosa
presente nas escolas públicas, como também fazer um resgate do perfil do docente para
atuar nesta área de conhecimento que é o Ensino Religioso. Para a conceituação teórica
utilizarei autores que abordam a temática da formação docente em Ensino Religioso.
Palavras-chave: Formação docente; Ensino Religioso; Práxis pedagógica; Fenômeno
religioso.
Introdução
A formação docente para o Ensino Religioso – ER sempre foi um
grande desafio na realidade brasileira. Esta problemática remete ao
período da colonização e se arrasta até os dias atuais.
O professor tem muito pra contribuir na formação do alunado, no
tocante as questões relacionadas à religiosidade de cada um para que
assim sejam orientados nas expressões religiosas. É fundamental que o
profissional tenha no mínimo uma formação específica nesta área de
conhecimento.
O mediador da construção do conhecimento deve preparar-se para
assim saber dialogar com as múltiplas religiões. O educador deve levar em
consideração a metodologia que melhor possibilite o desenvolvimento da
aprendizagem, sem excluir nenhum dos alunos e seus saberes.
É bom ressaltar o Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso FONAPER como um espaço específico de formação continuada para
todos aqueles que atuam ou buscam informações no tocante o fenômeno
religioso como também as práticas pedagógicas do Ensino Religioso. O
1
Graduado em Licenciatura plena em Letras (UEPB), Pós-graduado em Língua,
linguagem e Ensino (CINTEP), Bacharel em Teologia (FJC), Mestrando em Filosofia da
Docência Teológica (CAEEC), Professor dos municípios: Cuitegi e Pilões. E-mail:
[email protected]
FONAPER
mesmo busca informar, formar e capacitar o docente para atuar de forma
segura sobre o Ensino Religioso na sala de aula.
Para que tenhamos uma formação docente significativa faz-se
necessário uma formação de caráter sequencial aonde venha atender
todos os anseios do profissional de Ensino Religioso. A relação entre
professor e aluno deve haver uma liberdade. É o que afirma Freire (1999),
―No fundo, o essencial nas relações entre educador e educando, entre
autoridade e liberdade, entre pais, mães, filhos e filhas é reinvenção do ser
humano no aprendizado de sua autonomia‖.
Aspectos teóricos
I - Formação do docente de Ensino Religioso
A formação do docente em Ensino Religioso é um grande desafio,
pois a demanda é muito grande para atender aos profissionais desta área
de conhecimento.
Faz-se necessário uma formação inicial de forma sistemática dos
conteúdos que são abordados nas aulas de Ensino Religioso. O
profissional deve estar apto para ministrar os conteúdos, pois os mesmos
requerem conhecimento na área, dentre eles podemos elencar como:
Culturas e Tradições Religiosas; Escrituras Sagradas; Teologias
Comparadas; Ritos e Ethos, garantindo-lhe a formação adequada ao
desempenho de sua ação educativa.
O docente de Ensino Religioso deve estar disponível ao diálogo
como também a compreensão do fenômeno religioso enquanto objeto de
estudo do ensino religioso. É bom salientar a importância de despertar em
sala de aula a alteridade entre o alunado para que assim entendam a
importância da transcendência na sua vida pessoal e social.
Os cursos de Licenciatura em Ensino religioso e Ciências da
Religião têm um papel importante na formação dos profissionais de Ensino
Religioso para que aprofundem o conhecimento sobre o fenômeno
religioso. A partir daí o professor terá a capacidade de analisar e realizar
pesquisas no campo religioso. Já os cursos de teologia, são confessionais,
desencontrando com a religião como afirma Oliveira et al. (2006, p.92):
126
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
É preciso considerar que não há teologia a-confessional ou supra
confessional, isto porque a teologia sistematiza experiências religiosas
e afirma que os adeptos de uma denominação religiosa devem crer e
como devem agir na organização de sua vida para então, serem
considerados membros daquele grupo religioso. A sistematização da
fé normaliza o odo de vida de um grupo religioso.
Para alcançar os objetivos propostos ao Ensino Religioso, os
Parâmetros Curriculares Nacionais de Ensino Religioso (PCNERs)
apresentam cinco (5) eixos organizadores, que indicam os conteúdos
programáticos de cada ciclo ou série do Ensino Fundamental:
1.Culturas e Tradições Religiosas (filosofia da tradição religiosa;
história e tradição religiosa; sociologia e tradição religiosa; psicologia e
tradição religiosa);
2. Escrituras Sagradas e/ou Tradições Orais (revelação; história das
narrativas sagradas; contexto cultural; exegese);
3. Teologias (divindades; verdades de fé; vida além da morte);
4. Ritos (rituais; símbolos; espiritualidades);
5. Ethos (alteridade; valores; limites) (FONAPER, 1997, p. 33-39).
O professor de ER tem os seus lugares e no tempo decorrido desde
a promulgação da LDB 9.394/96 tem sido desafiado a pensar e repensar a
sua práxis como sujeita do conhecimento religioso. Nesse sentido, no que
refere ao professor, Tardif (2002, p.238) alerta que:
Se pare de ver os professores de profissão como objetos de pesquisa
e que eles passem a ser considerados como sujeitos de
conhecimento. Isso significa, noutras palavras, que a produção dos
saberes sobre o ensino não pode ser mais privilégio exclusivo dos
pesquisadores, os quais devem reconhecer que os professores
também possuem saberes esses que são diferentes dos
conhecimentos universitários e obedecem a outras lógicas de ação.
Um órgão que não podemos deixar de enfatizar é o Fórum Nacional
Permanente do Ensino Religioso - FONAPER, pois o mesmo tem
contribuído significativamente na formação continuada do docente de
Ensino Religioso, realizando seminários (anos pares) como também
congressos (anos impares). Nesses espaços o professor tem a
oportunidade de apresentar suas pesquisas como também aprofundar
seus conhecimentos. O fórum é dinâmico, uma vez que o mesmo realiza
sessões, congressos e seminários de forma itinerantes em todo o recanto
do nosso país.
127
FONAPER
Com a presença do FONAPER no meio educacional o
professor/educador do Ensino Religioso passou a ter um lugar ideal e
específico para buscar informações pertinentes sobre a práxis do ER em
sala de aula, como também o acesso ao conhecimento sobre o fenômeno
religioso. O papel do Fórum é muito pertinente e merece todo
reconhecimento
e
valorização
dos
professores,
educadores,
pesquisadores, enfim, de todos que buscam diretamente ou indiretamente
formação.
II - Perfil do docente de ensino religioso
O mediador do conhecimento, no caso o professore, deve se
preparar para melhor dialogar com as diversas culturas e religiões. O
educador deve levar em consideração a metodologia ideal para ser
aplicada, sem que não exclua nenhum dos alunos, pois é importante que
haja uma sintonia entre o transmissor e o receptor.
Freire (1999, p.94) nos afirma no tocante a relação professor e aluno.
―No fundo, o essencial nas relações entre educador e educando, entre
autoridade e liberdade, entre pais, mães, filhos e filhas é reinvenção do ser
humano no aprendizado de sua autonomia.‖
A comunidade escolar deve caminhar sempre em sintonia com a
sociedade, pois duas realidades se completam.
Um desafio é não realizarmos proselitismo, pois vivemos em um
contexto marcado pela diversidade. E, portanto, o respeito às diferenças
deve ser o diferencial do Ensino Religioso no campo educacional.
É importante que todos educadores independente de ser professor
de ER ou não, despertem no alunado a importância da disciplina ER no
currículo escolar e na vida de cada aluno, pois o ser humano é um ser que
sente a necessidade de relacionar com o transcendente.
No ER como diz Roque Zimmermann (1998, p. 09), não se trata de
transmissão de normas de conduta e sim:
Trata-se de proporcionar, na educação escolar, oportunidade para que
o educando descubra o sentido mais profundo da existência; encontre
caminhos e objetos adequados para sua realização e valores que lhe
norteiam o sentido pleno da própria vida.
O professor de Ensino Religioso precisa colocar seu conhecimento e
sua experiência pessoal a serviço da liberdade do educando, subsidiando128
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
o no entendimento do fenômeno religioso. Portanto, a competência deste
profissional exige que:
1. Compreenda o fenômeno religioso, contextualizando-o no
espaço e no tempo;
2. Configure o fenômeno religioso através das ciências da
religião;
3. Conheça a sistematização do fenômeno religioso pelas
Tradições Religiosas e suas teologias;
4. Analise o papel das Tradições Religiosas na estruturação,
manutenção das diferentes culturas e manifestações
socioculturais;
5. Compreenda os fundamentos éticos, políticos e culturais dos
Textos Sagrados orais e escritos das diferentes matrizes
religiosas;
6. Relacione o sentido da atitude moral, como consequência do
fenômeno religioso sistematizado pelas Tradições Religiosas
e como expressão da consciência e da resposta pessoal e
comunitária das pessoas.
O profissional do Ensino Religioso faz sua síntese do fenômeno
religioso a partir da experiência pessoal, mas necessita, continuamente,
apropriar-se da sistematização de outros saberes e experiências que
permeiam a diversidade cultural.
III - Características do professor de Ensino Religioso
Considerando a Escola como lugar de saber (conhecimento), lugar
de saber fazer (habilidade), lugar de ser (ética), o Professor de Ensino
Religioso deverá apresentar as seguintes características.
 Sólida formação no campo das ciências, com ênfase nas
ciências humanas;
 Fundamentação teórica voltada à reflexão e ação no campo
pedagógico;
 Consciência crítica;
 Visão e ação criativa, contextualizada com vistas à totalidade
na perspectiva interdisciplinar;
 Conhecimento do ser humano na sua integralidade e contexto
no qual está situado;
129
FONAPER

Sensibilidade, discernimento e equilíbrio nas relações com o
fato religioso e suas diversas manifestações.
IV - A práxis pedagógica do Ensino Religioso
A prática pedagógica é de suma importância no desenvolvimento
educacional no campo religioso, uma vez que é um tema que merece
muita atenção e valorização, pois é algo de muita importância na formação
integral do cidadão (ã).
O objetivo do componente, hoje, é de levar ao educando como
proposta de cunho interreligioso e intercultural, não fundada no
proselitismo. Vivemos num mundo plural onde cabe a cada um de nós
respeitas as diversidades. Os conteúdos programáticos são conteúdos
voltados à interação entre o homem e o sagrado nas diversas expressões
religiosas. Os conteúdos não são temas transversais e sim temas
vinculados ao sagrado de cada um de forma particular.
A metodologia que os educadores utilizam de formas diversas. O
método por sua vez deve proporcionar: PARTICIPAÇÃO, INTERAÇÃO E
CAPACIDADE DE PENSAR.
Cabe ao educador proporcionar uma aula dinâmica e de participação
ativa nas aulas de ER, deixando assim a flexibilidade para o educando
expor as suas percepções sobre os temas abordados em sala de aula e
não o educador impor o seu pensamento de ver o mundo e o sagrado.
A Lei que dá suporte e respalda ao ER é muito ampla e flexível, uma
vez que, deixa a critérios das Secretarias Estaduais de Educação e os
Conselhos de Educação sua regulamentação. Deixa também a
possibilidade do projeto Político Pedagógico de que cada unidade escolar
adapte tal legislação à sua realidade universal.
Houve um grande avanço quanto ao direcionamento pedagógico no
ER desde as reflexões e lutas garantidas na Constituição Federal, em
1987/1988.
O Ensino Religioso Ocupava-se com a educação integral do ser
humano, com os valores e suas aspirações mais profundas quer
cultivar no ser humano as razões mais íntimas e transcendentes
fortalecendo nele o caráter de cidadão, desenvolvendo seu espírito de
participação, oferecendo critérios para a segurança de seus juízos e
aprofundando as motivações para a autêntica cidadania.
130
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Não se pretende na sala de aula fazer uma comunidade de fé, mas
um espaço de reflexões sobre limites e superações. Diante disto necessitase construir uma pedagogia que atende a estas reflexões. Entretanto, fazse necessário interferir a teoria e a prática pedagógica.
Na escola, diante da diversidade cultural religiosa em que os
educandos estão inseridos, segundo o FONAPER (2000, p. 18), o Ensino
Religioso:
Pelo estudo do fenômeno religioso desencadeia o diálogo e a
reverência. Pode - se dizer que estas são as grandes finalidades
dessa disciplina na escola: diálogo e reverência.
Diálogo a partir do entendimento da palavra: diálogo.
Dia: prefixo grego= diferentes, opostos
Logos: sufixo grego = palavra, discurso articulado.
Portanto, diálogo e a realidade que se estabelece a partir de palavra
de diferentes de opostos. Na homogeneidade não há diálogo, somente
repetição. O diálogo como meta do ER é possível pela diversidade
cultural-religiosa do Brasil, presente no convívio social. Diálogo como
processo de construção do conhecimento, de modo que possa
contribuir para a formação de indenidades afirmativas, persistentes e
capazes de protagonizar ações solidárias e autônomas de constituição
de valores indispensáveis à vida cidadã. (Cf. parecer nº 04/98 da
CEB/Conselho Nacional de Educação).
Reverência - significa acatamento às coisas sagradas, ao que é digno
de respeito veneração, mesura, cortesia, genuflexão.
Quando se usa o termo reverência (ao Transcendente no outro) no
Ensino Religioso quer-se ir mais longe, além do simples entendimento
encontrado no senso comum, vai do respeito à tolerância para com o
diferente.
Tanto o diálogo como a reverência são de uma importância ímpar
para o ER. Como afirma Freire (1998, p. 134) em Pedagogia do Oprimido:
O diálogo com as massas não é concessão, nem presente, nem muito
menos uma tática a ser usada, como a sloganização o é, para
dominar. O diálogo, como encontro dos homens para a ―pronúncia― do
mundo é uma condição fundamental para a sua real humanização.
O fenômeno religioso é algo que está presente muito antes de
vivenciado em sala de aula. Humanamente falando, temos a necessidade
de transcender e ao mesmo tempo esperamos que algo ou alguém
preencha as nossas vidas.
Nós educadores temos uma tarefa de levar ao alunado a importância
do ser na sociedade plural e global que estamos inserindo. Estamos
vivendo uma cultura de contra valores muito fortes, uma vez que o ser
131
FONAPER
enquanto personalidade está adormecido na grande maioria; enquanto que
o ter, poder aquisitivo, está muito em evidência. Em outras palavras
estamos cultivando uma frase muito pronunciada ―só vale quem tem‖.
Devemos como mediadores de conhecimento despertar nos nossos
ambientes educacionais meios através dos quais o aluno se sinta amado e
acolhido pelo ser superior, independente da tradição, movimento religioso
ou não religioso ao qual pertença, ou da terminologia da palavra: Deus,
Jeová, Alorum, Tupã... que utilize.
O ER deve despertar no alunado, por meio do acesso ao
conhecimento, o querer relacionar-se e reconhecer a transcendência. É o
que o afirma Zimmermann (1998): tem como objeto a compreensão da
busca do transcendente e do sentido da vida, que dão critérios e
segurança ao exercício responsável de valores universais base da
cidadania.
Desta forma, o Ensino Religioso assim previsto, se torna possível e
necessário para:
 estrutura a partir da Escola, lugar privilegiado para o exercício
de construção das bases da cidadania.
 desenvolve-se
na
perspectiva
de
construção
do
conhecimento religioso e não mais na do modelo
ultrapassado de repasse de conteúdos.
 alicerça-se na certeza de que as tradições Religiosas
(Religiões) conferem critérios de segurança para o exercício
da cidadania.
Segundo Delors (1999, p. 90-99) a educação durante toda a vida
baseia - se em quatro pilares:
1. Aprender a conhecer
2. Aprender a fazer
3. Aprender a viver junto, conviver.
4. Aprender a ser
É importante desenvolver no ER possíveis relações com as
diferenças espirituais e culturais, como afirma:
Devemos cultivar, com utopia orientadora, o propósito de encaminhar
o mundo para uma maior compreensão mútua, mais sentido de
responsabilidade e mais solidariedade, na aceitação das nossas
diferenças espirituais e culturais. A educação permitindo o acesso de
todos ao conhecimento tem um papel bem concreto a desempenhar o
132
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
mundo e o outro a fim de melhor se compreender. (DELORS, 1999, p.
50).
De acordo com a citação acima se faz necessário um Ensino
Religioso onde deve cativar a todos sem distinção de cor, raça e religião,
pois o objeto de estudo é justamente o fenômeno religioso e não religião.
O difícil está sendo trabalhar com o diferente, o outro. Alteridade é algo
que deveríamos resgatar, pois a partir do momento que há uma aceitação
um respeito para com o meu próximo. Deve-se levar em consideração na
prática de ensino religioso, um ensino que não desenvolva práticas
prosélitas e sim ecumênica que contemple todas as religiões, conforme
rege o artigo 33 da LDB.
Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante
da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários
normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o
respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer
formas de proselitismo.
§ 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a
definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as
normas para a habilitação e admissão dos professores.
§ 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas
diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos
do ensino religioso." (BRASIL,1997).
Considerações finais
Faz-se necessário uma reflexão diante de tudo que foi apresentado
anteriormente sobre a formação específica da profissional de ensino
religioso área de conhecimento que requer um olhar todo especial, uma
vez que se trata da relação do ser humano com o transcendente.
A formação do docente nesta área de conhecimento perpassa por
inúmeras dificuldades, pois o mesmo trabalha com diversos credos na rede
pública de ensino. Mediante a tudo o que foi apresentado como
fundamentação teórica e prática o profissional deve receber uma atenção
diferencial, um olhar com atenção, articulação e respeito à diversidade
religiosa presente nas escolas que lecionam.
O professor de Ensino Religioso deve ser aquele profissional que
na sua comunidade e na sala de aula desempenhe o papel de mediador do
conhecimento das diversas religiosidades e espiritualidades, sem perder a
sua missão de promotor do diálogo inter-religioso e intercultural como
133
FONAPER
também da busca constante da ética e da promoção da paz entre todos os
credos, crenças e religiões presentes no contexto social e escolar.
Nota-se a grande importância que tem o professor de Ensino
Religioso, uma vez que o mesmo torna-se um grande elo entre a realidade
social e a realidade pedagógica da escola e da comunidade na qual está
inserido.
Percebe-se ainda que a formação docente diante de pesquisas e
sistematizações são mais complexas. Diante desta complexidade o
docente de ER deve ter domínio dos conteúdos e conhecimentos que
perpassam os eixos que constam dos PCNER, a saber: ethos, ritos, textos
orais e sagrados e teologias.
Não podemos esquecer-nos da importância do FONAPER na
formação dos docentes de Ensino Religioso, pois o mesmo é um ―espaçopolítico-pedagógico‖. Nesse sentido, continua exercendo o papel de
acompanhar as discussões relevantes sobre o Ensino Religioso de todo o
Brasil, como também estabeleceu como prioridade a formação do docente
para este componente curricular, sempre atualizado para os desafios
decorrentes.
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135
NO JARDIM DAS ERVAS– SUBPROJETO INTERCULTURAL
INDÍGENA FURB/SC
Eldrita Hausmann de Paula – FURB/PIBID1
Sandra Andréia Müller Schroeder – FURB/PIBID2
Resumo:
O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID criado pela CAPES
(2007) objetiva incentivar licenciandos a aproximação da realidade escolar, valorização,
aperfeiçoamento, capacitação e prática formadora via construção de reflexão e qualificação
docente. Desde agosto de 2012 o Curso de Ciências da Religião – Licenciatura em ER
integra o PIBID da FURB/SC com o Subprojeto Intercultural Indígena. Radicado na EEB
Hercílio Deeke (Blumenau/SC) busca contribuir com a prática formadora dos licenciandos
em consonância com a Lei nº 11.645/08. Conhecimentos, práticas pedagógicas e produção
de materiais didáticos pedagógicos envolvendo o saber tradicional sobre ervas e árvores
medicinais relacionados a historia e cultura do Povo Indígena Xokleng Laklanõ (Vale do
Itajaí) são alguns dos resultados se articularam na construção coletiva do Jardim das Ervas.
Palavras-chave: História; Cultura; Povo Xokleng Laklanõ; Ervas; Árvores.
Introdução
O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência é um
Programa –(PIBID) do Ministério da Educação (MEC), gerenciado pela
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES,
que desempenha papel fundamental na expansão e consolidação da pósgraduação stricto sensu (mestrado e doutorado) em todos os estados do
Brasil. Em 2007, passou também a atuar na formação de professores da
educação básica ampliando o alcance de suas ações na formação de
professores qualificados no Brasil e no exterior, como objetivo maior.
1
2
Acadêmica da IV Fase do Curso Ciências da Religião – Licenciatura em Ensino
Religioso, da Fundação Universidade Regional de Blumenau – FURB/SC, Bolsista do
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID, Subprojeto
Intercultural Indígena. E-mail: [email protected]
Acadêmica da IV Fase do Curso Ciências da Religião – Licenciatura em Ensino
Religioso, da Fundação Universidade Regional de Blumenau – FURB/SC, Bolsista do
Programa Institucional de Bolsa a Iniciação à Docência – PIBID, Subprojeto Intercultural
Indígena. E-mail: [email protected]
FONAPER
É um programa de Iniciação à docência, os bolsistas são acadêmicos
dos cursos de Licenciatura que, inseridos no cotidiano de escolas da rede
pública, planejam e participam de experiências metodológicas e práticas
docentes de caráter inovador, disciplinar e interdisciplinar, e que buscam a
superação de problemas identificados no processo de ensino
aprendizagem. O objetivo do programa é incentivar licenciandos a
aproximação da realidade escolar, valorização, aperfeiçoamento,
capacitação e prática formadora via construção de reflexão e qualificação
docente.
O PIBID se organiza com projetos Institucionais inserindo vários
subprojetos nas diferentes áreas de conhecimento da Educação Básica e
são formados por: acadêmicos de graduação (licenciandos), professores
das escolas públicas conveniadas (supervisoras) e coordenadores de área
(professores da IES). A participação no programa garante a cada bolsista
uma bolsa mensal. Atualmente, no Brasil, o PIBID é aplicado em 196
Instituições de Ensino Superior - IES e oferece 49.321 bolsas. Em Santa
Catarina, sexto lugar no ranking brasileiro, é oferecido 2.460 bolsas.
No contexto de SC, a FURB integra o PIBID com dois projetos
institucionais. Em 2012, o Curso de Ciências da Religião – Licenciatura em
Ensino Religioso passou a integrar o PIBID da FURB/SC com o Subprojeto
Intercultural Indígena. O Curso de Ciências da Religião – Licenciatura em
Ensino Religioso (CR-ER), uma das iniciativas de formação pioneira nesta
área do conhecimento no Brasil. Busca habilitar profissionais para o
exercício docente em Ensino Religioso abordando a diversidade cultural
religiosa em sua relação direta com os Direitos Humanos, que contempla
em sua matriz curricular o estudo dos fenômenos religiosos de matriz
oriental, semita, africana e indígena. Nesse sentido, tem contribuído com a
construção de reflexão e ações comprometidas com a erradicação de
discriminações e violências de caráter religioso no cotidiano escolar,
acadêmico e social.
O Curso CR-ER busca constantemente ampliar e subsidiar sua
prática formadora, e um dos espaços/lugares é no Subprojeto Intercultural
Indígena, iniciado em agosto de 2012, na Escola de Educação Básica
Hercílio Deeke, Blumenau, SC. Objetiva desenvolver uma parceria entre a
Universidade e a Educação Básica, colaborar com os estudantes,
professores em exercício e a escola na promoção de uma aprendizagem
significativa nos diferentes processos de reflexão, discussão,
138
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
conhecimento, construção de outros olhares acerca do povo indígena
Laklanõ Xokleng que são correspondentes à História e Cultura Indígena no
Vale do Itajaí, na execução da Lei nº 11.645/08.Vale que historicamente foi
habitado por este povo e hoje se restringe apenas às cidades de Doutor
Pedrinho, José Boiteux, Vitor Meireles e Itaiópolis (SC).
O referencial teórico que sustenta esta iniciação à docência são
pesquisas, estudos e leituras do povo indígena Laklanõ Xokleng sob os
títulos: História e cultura indígena e educação básica no Alto Vale do Itajaí:
desafios e perspectivas a partir da Lei n. 11.645/08; A semana dos povos
indígenas de 2005: um exercício de interlocução e O povo indígena
Laklanõ Xokleng: aproximações sobre cultura e religiosidade, Botocudo:
uma história de contacto,respectivamente, foi possível realizar um trabalho
minucioso sobre o povo indígena Laklanõ Xokleng registrou-se o
conhecimento parcial sobre este povo. Outras leituras feitas e não menos
importante foram realizadas.
O povo Laklanõ Xokleng com seus saberes tradicionais sobre ervas
medicinais e através das experiências, conhecimentos e olhares na Mata
Atlântica, desenvolveu práticas e formas de utilizar essas ervas medicinais,
árvores nativas, frutos e raízes silvestres. O recorte que realizamos no
desenvolvimento das atividades de aprendizagem na EEB Hercílio Deeke,
com estudantes dos anos finais do Ensino Fundamental, foi justamente a
partir dos saberes sobre as ervas.
Na primeira fase do subprojeto desenvolvemos atividades com
estudantes dos sétimos e oitavos anos. Onde realizamos a elaboração e a
confecção de material didático pedagógico acerca dos conhecimentos do
povo indígena e da sociedade atual para tratamento, cura e prevenção de
doenças. Com estes saberes, foram realizadas pesquisas e coletas das
ervas. Além é claro, do Jardim das Ervas, atividade desenvolvida com
estudantes dos sétimos anos realizada no contra turno da escola.
Este texto está organizado em algumas partes, à primeira faz uma
introdução ao subprojeto, à segunda traz um recorte do nosso aporte
teórico, a terceira relata uma prática pedagógica e seus desdobramentos
com o Jardim das Ervas.
Jardim das ervas: relatando as práticas
Pesquisar e sistematizar a história do povo Laklanõ Xokleng é um
desafio, pois esse povo foi violentado em seus direitos e sua cultura sofreu
139
FONAPER
perdas significativas a partir do contato com a sociedade não indígena em
especial, no que tange o aspecto religioso. Desse modo, buscamos na
primeira parte deste capítulo trazer um pouco desta história de contacto
até os dias atuais.
Na segunda parte relatamos a utilização de plantas com fins
medicinais, para tratamento, cura e prevenção de doenças, que são uma
das mais antigas formas de prática medicinal da humanidade e dos povos
indígenas. Por fim, relatamos algumas práticas didáticas pedagógicas
desenvolvidas na escola, e que são resultados de estudos, pesquisas e
confecção de materiais pedagógicos que contemplam e integram a História
e Cultura do povo indígena Laklanõ Xokleng, com seus possíveis
resultados.
Conhecendo um pouco da cultura e história do povo Laklanõ Xokleng
A religiosidade é uma forma de expressar seus específicos
sentimentos pela vida, o ser humano e a natureza (FLORES, 2003).
Segundo Lopes (apud FLORES, 2003, p. 14) ―[...] é sumamente concreta
[...] gosta de contemplar a vida, saboreá-la, banhar-se nos seus
mistérios...‖. Os povos indígenas respeitam, valorizam e acima de tudo
amam a terra que é sagrada e estes povos pretendem conviver em
harmonia. Flores (2003, p. 14) complementa afirmando: ―religiosidade
indígena é portanto a experiência do mergulho sagrado sem estar
sobrecarregado de culpas ou enfrentando o olhar ameaçador de Deus‖. A
ideia de religioso está estritamente vinculada a tudo que dá vida e a
sustenta, constituindo outras maneiras de compreender a própria
transcendência. No povo indígena Laklanõ Xokleng não há divindade
ocupando a centralidade na vida da comunidade.
A dimensão religiosa representa parte constitutiva e está interrelacionada com o todo de sua cultura. Esta visão é perceptível nas
diversas concepções, nos mitos, nos ritos, nos símbolos, nas práticas
cotidianas, na organização do tempo, do espaço e das atividades, nas
relações e interações (MARKUS; OLIVEIRA, 2005, p.376).
O cotidiano, o nascimento, a morte os acontecimentos na vida e a
cosmovisão com o sagrado, a terra, a natureza, os seres vivos e humanos,
estão repletos de sentimentos específicos com a cultura e a religião.
Sendo assim, a religiosidade está presente em todos os momentos da
140
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
história e da vida da comunidade indígena. Os rituais, as práticas e a
crença religiosa na natureza estão nos valores e normas do povo indígena.
O respeito, a cultura, as práticas e modos de conviver com a natureza são
a principal fonte da religiosidade do povo indígena Laklanõ Xokleng.
Portanto, não há uma divindade com nome específico e sim, a veneração e
o respeito à natureza, os animais, os seres humanos, isto é divino. A
língua materna também é um dos elementos da cultura que mantém a
família e o grupo unidos, segundo Markus e Oliveira (2005).
Vocês adoram a lua, o sol? Que Deus vocês adoram: as pedras, os
animais, os rios, a floresta? É verdade que os índios não entendem o
cristianismo? Então eu me dou conta do tamanho da desinformação,
da distorção e das dificuldades de diálogo e compreensão entre índios
e não índios em pleno século XXI. (FLORES, 2003, p.11).
Os indígenas não entendem o cristianismo, mas amam as pedras, os
animais, os rios, as florestas, adoram a lua, o sol e as estrelas. Então, o
que é o cristianismo? Estamos desinformados, somos distorcidos e temos
dificuldade de diálogo. Amor e respeito por todos e tudo é o que o indígena
prega. São com lutas e através da identidade de um grupo, que se forma a
denominação de um povo, com medidas de reviver sua língua, seus
artefatos, os seus mitos, os seus símbolos, enfim, sua cultura. O povo
Laklanõ Xokleng vem conquistando espaço e território político em terras
que lhes foram tomadas, inclusive com o nome de seu povo.
A denominação Laklanõ Xokleng traz significados importantes para o
povo. O termo Xokleng, na língua do grupo designa ―a aranha que vive
nas taipas de pedra‖ e foi popularizado pelo trabalho do antropólogo
Silvio Coelho dos Santos (1987). O nome foi incorporado pelo grupo
enquanto denominador de uma identidade externa e usada em suas
lutas públicas. No entanto, o grupo se autodenomina ―Laklanõ‖, isto é,
―o Povo do Sol‖ (PEREIRA, 1998). Este termo vem ganhando espaço
político através de um forte movimento de afirmação da identidade do
grupo, com estudos e revitalização de sua língua, mitos, artefatos,
medicina e território tradicional. A língua é um dos elementos fortes da
cultura deste povo e tem tido zelo e a persistência em sua
transmissão. (MARKUS; OLIVEIRA, 2005, p.376)
O povo Laklanõ Xokleng habitava boa parte do estado de SC. Mas, o
contato com os colonizadores deflagrou uma verdadeira guerra os
habitantes que aqui viviam e os colonizadores que recém chegaram.
Segundo Namem (1994), visando proteger esse povo da violência dos
141
FONAPER
bugreiros3, foi criado pelo chefe do governo catarinense, Adolfo Konder,
em 1926a Terra Indígena (TI) inicialmente denominada Posto Indígena
Duque de Caxias, para aldear os indígenas. Ao povo Laklanõ Xokleng, que
era nômade, foi destinado uma área de 14.156,58 hectares. Em 1965 foi
oficialmente demarcada e em 1975 recebeu o nome de TI Ibirama, situada
ao longo dos rios Hercílio e Plate, que moldam a bacia do rio Itajaí-açu.
Localizada em quatro municípios cerca de 70% da área está dentro dos
limites dos municípios José Boiteux, Doutor Pedrinho, Vitor Meireles e
Itaiópolis.
Com o plano de colonização do alto Vale do Itajaí em conjunto com
representantes do governo, o povo Laklanõ Xokleng, sofreu ataques com
violência para o seu extermínio e foram impedidos de conviver na estrutura
cultural, territorial e social do grupo e desta forma o Serviço de Proteção ao
Índio (SPI) deveria garantir a não exploração e a integridade física,
transformando indígenas em agricultores sofridos.
Antes de 1914, os Botocudos viram suas terras serem ocupados pelos
brancos, ao tempo em que foram violentamente caçados pelos
bugreiros [...] Segundo RIBEIRO (1979:127-48), contrariando
interesses dos governantes locais e estaduais, a criação do SPI visava
garantir aos índios a posse de suas terras, controlar as relações
desses com a sociedade nacional, não permitindo que fossem
oprimidos e explorados, e promover a punição de crimes cometidos
contra os índios. Entretanto, além desse protecionismo declarado,
conforme LIMA (IN OLIVEIRA FILHO, 1989), os objetivos eram,
também, de sedentarizar índios, transformando-os em reserva de
mão-de-obra. [...] praticassem a agricultura, a fim de manterem a
sobrevivência e o Posto Indígena, e procurava evitar um contacto mais
direto entre esses e os brancos (SANTOS, 1973) [...] (NAMEM, 1994,
p. 28).
Ao serem confinados em uma área restrita e com precárias
condições de desenvolvimento. Esse grupo viu seu povo sendo reduzido,
além de sua cultura e religião. Afinal para o povo indígena cultura e
religião não se separam. A ancestralidade está presente, é para manter
viva a memória dos seus ancestrais através de orações, refeições e
oferendas especiais; os indígenas estão convictos de que os ancestrais
estão incumbidos de cuidar da vida de seus descendentes, crença de que
3
Bugreiros nomenclatura designada aos contratados pelos colonizadores imigrantes e
muitas vezes pelo governo provincial de Santa Catarina, para capturar e exterminar os
indígenas. O termo deriva da palavra bugre, como era conhecido o povo indígena
desta região.
142
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
os mortos, especialmente os espíritos, continuam vivos e influenciam o
destino dos vivos, dando proteção.
Nas décadas de 50 a 70, a atuação de igrejas na TI logrou a adesão
de indígenas à Igreja Católica; quanto à Igreja Evangélica Assembleia de
Deus e a incidência de adesão do grupo ao pentecostalismo estão muito
presente na representação do Botocudo. Na adesão à religião católica e ao
pentecostalismo que o povo indígena se prende a outros grupos sociais.
Quanto à assistência religiosa na área indígena, SANTOS (1973:270:
6) relatou as constantes mudanças de orientação ao longo dos anos
1950, 60 e 70. Entre 1935 e 1968, a orientação foi dada pela Igreja
Assembleia de Deus, de orientação protestante. [...], para preservar a
integridade da sociedade e da cultura dos pioneiros, que veem nos
cultos religiosos um substituto das suas cerimônias tradicionais
(NAMEM, 1994, p.96).
Atualmente, constata-se que a Igreja Assembleia de Deus
consolidada entre grande parte da população da área indígena se identifica
como crentes e cristãos, a igreja Pentecostal tem introduzido novos
valores, servindo para preservar a integridade da sociedade e da cultura.
As plantas e ervas na cultura do Povo Laklanõ Xokleng
A utilização de plantas com fins medicinais, para tratamento, cura e
prevenção de doenças, é uma das mais antigas formas de prática
medicinal da humanidade e dos povos indígenas. A Organização Mundial
de Saúde (OMS) , responsável por desempenhar um papel de liderança
em questões de saúde globais, a definição da agenda de pesquisa em
saúde, estabelecendo padrões, articulando opções políticas baseadas em
evidências, fornecendo apoio técnico aos países e monitorar e avaliar as
tendências da saúde - define planta medicinal como sendo ―todo e
qualquer vegetal que possui, em um ou mais órgãos, substâncias que
podem ser utilizadas com fins terapêuticos ou que sejam precursores de
fármacos semissintéticos‖.
A humanidade utiliza plantas, primeiro numa relação de consumidor
e mais tarde para a cura de suas enfermidades. Iniciada antes da medicina
moderna, a medicina tradicional definida pela OMS como sendo:
A soma de todos os conhecimentos teóricos e práticos, explicáveis ou
não, utilizados para diagnóstico, prevenção e tratamentos físicos,
mentais ou sociais, baseados exclusivamente na experiência e
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FONAPER
observação e transmitidos oralmente ou por escrito de geração em
geração. (MORODIN; BAPTISTA, 2001).
Essa medicina tradicional permanece até os dias de hoje, com base
e práticas mantidas há milhares de anos, vem oferecendo contribuição ao
desenvolvimento da ciência, a partir de conhecimentos e práticas de
saúde. Considerando que a medicina tradicional representa um importante
papel social, por meio de seus elementos compartilhados por toda a
sociedade, é importante avaliar se o uso de plantas medicinais decorre de
um conhecimento tradicional, embasado na experiência direta dos
membros das comunidades ou resulta de contatos com fontes externas à
cultura local, como migrantes ou veículos de comunicação (livros, rádio,
televisão) e caráter empírico, influenciadas pelo contexto sociocultural,
econômico e físico, no qual se encontram inseridos.
Segundo Neves (2001), observa-se a predominância da utilização de
folhas, frequentemente a partir da combinação de plantas bem como a
utilização de outros componentes no preparo, como mel e leite. A maioria
da sociedade atual faz uso das ervas medicinais por indicação dos
parentes e amigos, um número reduzido busca informações em livros ou
através da televisão e rádio. Mais da metade desta sociedade
recomendam o uso de alguma erva medicinal para outras pessoas.
Grande parte da sociedade cultiva espécies de ervas consumidas,
em hortas ou pequenos vasos. Embora seu potencial nem sempre seja
bem explorado. É possível reduzir o consumo de medicamentos fazendo
uso correto das ervas medicinais. O mais importante é que por um custo
muito baixo pode-se manter um bom número de ervas em residências,
mesmo dispondo de pouco espaço para o cultivo. O uso de ervas requer
cuidados, em se tratando de preparações caseiras e tais cuidados
permitem segurança e eficácia na utilização, garantindo que seus efeitos
sejam aqueles desejados, para tanto, devem ser levados em conta a parte
e tipo da erva, o grupo de princípio ativo e a finalidade.
Foram os povos indígenas que descobriram a capacidade medicinal
das ervas. Os europeus, quando chegaram ao Brasil, aprenderam muito
com os indígenas e recorreram às ervas para tratar doenças e amenizar
dores e incômodos e esta mesma erva empregada pelos povos indígenas
continuaram a ser valorizados através dos tempos. Os pajés ou xamãs dos
povos indígenas são os grandes conhecedores das ervas e plantas
medicinais.
144
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
O uso de ervas entre o povo Laklanõ Xokleng era basicamente
restrito a dois vegetais: ―o ―uiôlo-nhãtâi‖ e o ―tutôlo‖, espécies até hoje
nunca identificadas (SENS, 2002)‖, sendo indicadas para os mais variados
distúrbios. No entanto, ―o emprego mais significativo destes vegetais era
profilático e ritualístico uma vez que a etiologia das doenças tinha um
caráter essencialmente espiritual (Henry, 1941; Mussolini, 1946, apud
SENS, 2002)‖. Porém, quando as grandes epidemias se alastraram após o
contato com os brancos, as práticas tradicionais de cura deixaram de ter
efeito e foram abandonados, os Laklanõ Xokleng passaram a fazer uso de
muitas plantas indicadas e ou introduzidas pelos brancos, para tratar
doenças infecciosas. As duas principais plantas originais perderam o seu
valor profilático e ritualístico e passaram a ser utilizadas de acordo com as
regras da medicina popular brasileira.
É provável que o próprio Eduardo de Lima e Silva Hoerhan, o
―pacificador‖, tenha sido um dos importantes agentes na introdução de
tantas espécies vegetais, uma vez que dispunha de pouquíssimos
recursos para o tratamento dos indígenas e a utilização de plantas se
convertia em uma modalidade de terapia de baixo custo e razoável
eficácia (SENS, 2002).
Diante dessa nova realidade os indígenas passaram a fazer uso de
muitas plantas indicadas e ou introduzidas para tratar doenças infecciosas
e outras até então, desconhecidas e para as quais eles não tinham
tratamento.
O jardim das ervas na escola: exercícios de iniciação a docência
De posse dos referenciais teóricos, realizamos observação
participante, acompanhando a professora supervisora em suas aulas de
Ensino Religioso, com os anos finais do Ensino Fundamental. Esse
período nos permitiu conhecer o chão da escola com suas rotinas, suas
dificuldades, necessidades, avanços e desafios. Também realizamos uma
visita à Aldeia Bugio, na terra indígena Laklanõ Xokleng situada em Dr.
Pedrinho, SC - para aproximação com o modo de vida; seus hábitos,
cultura, religiosidade e vida social.
Na Terra Indígena de Ibirama, vivem alguns povos indígenas:
Laklanõ Xokleng, Guarani e Kaingang. Estão organizados em oito aldeias,
a saber - Bugio, Palmeira, Barragem, Figueira, Sede, Coqueiro, Toldo e
145
FONAPER
Pavão. Nossos estudos focam-se no povo Laklanõ Xokleng, por dois
motivos: é o único logo, o último grupo existente no planeta; segundo pelas
atrocidades feitas com sua cultura e religião, ao longo da história do estado
de SC.
Na Aldeia Bugio, participamos de uma Trilha da Sapopema e
identificamos uma quantidade significativa de ervas medicinais como:
tanchagem, erva cidreira, camomila, etc. Na etapa das ervas, nos auxiliou
teoricamente artigo Alternativas para a auto sustentabilidade dos
Kokleng da terra indígena Ibirama - publicado por Sávio Luiz Sens, em
2002.
Elaboramos e aplicamos um instrumento de diagnóstico para
mapeamento de saberes dos educandos e dos professores em exercício
sobre saberes das ervas medicinais, conhecimentos e práticas
pedagógicas. Realizamos o registro, sistematização e análise dos dados
recolhidos após encontro dos/as bolsistas que subsidiaram a elaboração
das práticas pedagógicas.
A escolha pela temática das ervas "Jardim das Ervas" se deu
primeiro pela observação realizada na Aldeia Bugio; segundo porque a
Escola cedeu um canteiro para o plantio das ervas coletadas, que se
articularam na construção coletiva do livro ―Jardim das Ervas". E a partir do
Jardim das Ervas, foram desenvolvidas atividades de aprendizagem
envolvendo a produção de material didático pedagógico relacionado à
História e Cultura dos Povos Indígenas no Vale do Itajaí, em consonância
com a Lei nº 11.645/08.
Dentre as diferentes atividades desenvolvidas no decorrer do
primeiro semestre de 2013 no Subprojeto, socializaremos somente a
experiência do Jardim das Ervas. Esta atividade era realizada com
estudantes dos anos finais do Ensino Fundamental, através de encontros
sistematizadosdas15h50mim até 17h20mim, no contra turno da escola
com os estudantes dos 7º.
Utilizamos aulas dialogadas e vídeos, a partir de uma atividade
diagnóstica e de uma apresentação em Power point que abordou a história
do povo indígena Laklanõ Xokleng, apresentamos a definição de ervas,
conhecendo as ervas Alecrim, Alfavaca, Amargosa, Canela de Sassafrás,
Marcela do Campo, Picão, Quebra Pedras, Tanchagem e Urtiga Miúda,
ensinando e aprendendo como preparar um canteiro para posteriormente
plantá-las.
146
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
No canteiro das ervas, espaço disponibilizado dentro da área escolar,
foi desenvolvida a prática do plantio das ervas, o cultivo e conhecimento
dos métodos de utilização, a conservação e os benefícios das ervas; foram
realizadas visitas periódicas ao jardim das ervas, na sala de informática
desenvolvemos pesquisas; na prática explicativa das ervas medicinais
estudamos os nomes científicos e famílias, a indicação terapêutica, a
conservação, parte utilizada da erva, posologia, contra indicação e modo
de usar, tanto da cultura indígena quanto na cultura não indígena,
conhecendo as diversas formas de manipular as ervas e as plantas
medicinais; preparamos alguns chás com auxílio de água, chaleira e o
modo correto da infusão destas ervas, degustando-os, percebendo os
gostos, os cheiros, fotografando as plantas no jardim das ervas e por
último iniciando a produção de um livro das ervas estudadas, com
imagens, nome científico, indicação terapêutica, modo de preparo e o
modo de uso na cultura indígena e não indígena.Nele é possível encontrar
fotos e ilustrações criadas pelos educandos e informações sobre os usos
de cada erva em particular.Não se trata de uma obra completa.
Aprendizados e desafios: um convite (ainda tímido) a outras leituras e
olhares para as relações e práticas
No Subprojeto Intercultural Indígena do PIBID/FURB, destacamos
sua contribuição na nossa formação como futuros professores, porque é a
oportunidade de experimentar e realizar, na prática, o conhecimento
teórico adquirido no decorrer da formação acadêmica dentro do Curso
Ciências da Religião - Licenciatura em Ensino Religioso, em especial aqui
sobre a História e Cultura Indígena no Vale do Itajaí, em consonância com
a Lei nº 11.645/08.
Muitos foram os aprendizados e os desafios identificados pelo
Subprojeto Intercultural Indígena, somou-se a reflexão, através de debates
e diálogos sobre a temática analisando de forma coletiva e crítica,
desafiando a construção de outros olhares e leituras dos educandos
acerca do povo indígena Laklanõ Xokleng, em pesquisas, estudos,
socialização e discussões com o grupo sobre a importância, a utilização
das ervas e árvores medicinais para tratamento, cura e prevenção de
147
FONAPER
doenças, sendo uma das mais antigas formas de prática medicinal da
humanidade, e deste povo.
Como resultado final a confecção do livro, sistematizado em forma de
produção textual coletiva com os conhecimentos adquiridos sobre as ervas
medicinais do saber tradicional indígena e os conhecimentos da sociedade
atual.
O subprojeto como experiência foi uma oportunidade de aprofundar
os conhecimentos e a capacidade criativa na resolução dos impasses
encontrados durante esse período. Reflexão de que educadores da
sociedade escolar têm a tarefa importante de pesquisar, estudar, conhecer
e principalmente respeitar e valorizar a diversidade cultural dos povos
indígenas. Que toda a sociedade escolar deverá passar pelo exercício do
diálogo, criar lastro e competências para a superação de diferenças
discriminatórias e preconceituosas, conhecer para respeitar e conviver
para a construção de diálogos na busca pela erradicação de violências de
caráter religioso e cultural, é no desarmamento de leituras e olhares que se
tornam possíveis percepções diferenciadas movidas pelo respeito em
alteridade no cotidiano social, cultural e escolar através do ensino e da
docência.
Considerações finais
A Interculturalidade realizada entre o povo indígena Laklanõ Xokleng
e a Escola de Educação Básica Hercílio Deeke mostrou a importância do
reconhecimento da diversidade cultural, onde não se considera uma
cultura superior à outra. Nesse sentido, se incentiva o respeito e o
entendimento entre os seres humanos de diferentes etnias e culturas,
ainda que se saiba que relações de desigualdades existem. Sabemos que
perante a humanidade somos todos iguais pertencentes à espécie humana
e, diferentes quanto à cultura.
Sabemos que geralmente é nas diferentes culturas que os grupos se
dividem, achando a sua própria cultura como predominante e a mais
correta. Mas reconhecer que o outro pode utilizar a sua língua materna e o
seu processo de aprendizagem na educação escolar instituindo-se como
parte de um processo de afirmação étnica e cultural é um desafio e um
caminho árduo a se concretizar.
148
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Neste sentido, um pequeno passo foi dado pelos bolsistas,
coordenadores e supervisores do Projeto PIBID, para uma aproximação
entre o povo indígena Laklanõ Xokleng com um grupo de estudantes de
uma escola, mas que muitas outras possam seguir o mesmo caminho.
Diminuindo assim, a distância entre os povos indígenas e não indígenas. E
quem sabe, com isso o reconhecimento e respeito às diversidades de
culturas e religiosidades ultrapassem os muros das escolas.
Referências
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http://www.jardineiro.net/classe/arvores
http://www.plantamed.com.br/
http://www.plantasquecuram.com.br/
www.proxy.furb/tede/tde_busca/arquivo?...150 - Entre o Sol e a
Sombra. Fundação Universidade Regional de Blumenau - FURB.
150
O CAMINHO E OS DESAFIOS NA FORMAÇÃO DOCENTE DO
ENSINO RELIGIOSO EM PERNAMBUCO
Wellcherline Miranda Lima SEE/PE 1
Rosalia Soares de Sousa SEE/PE 2
Resumo:
Neste artigo mostram-se dados da pesquisa em desenvolvimento sobre a formação
docente de Ensino Religioso da Rede Estadual de Pernambuco cujo objetivo é buscar
reflexão da função social do Ensino Religioso (ER), considerado como elemento de
formação cidadã, na educação brasileira, em especial na sociedade pernambucana; e
também, apresentar dados da investigação sobre a formação docente ER na qual ainda
continua o desafio para os Sistemas de Ensino. A metodologia da pesquisa qualitativa foi
revisão bibliográfica com os estudos de Junqueira (2001; 2007) sobre o Ensino Religioso na
educação brasileira; a formação docente do ER com Sena (2007) e Oliveira; Junqueira;
Alves; Keim (2007). Dessa forma, teremos um olhar mais ampliado sobre o docente do ER
para a promoção ao diálogo interreligioso.
Palavras-chave: Ensino Religioso; Formação de Docente; Pernambuco; Escola Pública.
Os Princípios Básicos do Ensino Religioso para a função social
O Ensino Religioso é componente curricular de oferta obrigatória
para o Ensino Infantil e Fundamental como os demais componentes. A
matrícula só é efetivada se o responsável legal do estudante fizer a opção.
Essa condição é determinada pela Constituição da República Federativa
do Brasil em seu artigo 210. Apesar de não ser obrigatório, esse
componente procura atender à função social da escola de conformidade
com a legislação vigente.
Por outro lado, o Ensino remete à instrução, à educação, enquanto o
religioso deve ser entendido como religiosidade, ou seja, a dimensão
humana de abertura ao transcendente que se almeja educar no ambiente
escolar com base no respeito à diversidade dos sujeitos existentes nesse
espaço educacional.
1
2
Mestre em Ciências da Religião (UNICAP). Secretaria de Educação de Pernambuco
(SEE/PE). Email: [email protected]
Mestranda em Ciências da Religião (UNICAP). Secretaria de Educação de Pernambuco
(SEE/PE). Email: [email protected]
FONAPER
O ordenamento jurídico do Brasil está baseado em princípios que
expressam a conduta e os valores do povo brasileiro. De acordo com
Sundfeld (1995, p. 18) os princípios devem ser entendidos como as "ideias
centrais de um sistema, ao qual dão sentido lógico, harmonioso, racional,
permitindo a compreensão de seu modo de se organizar".
Assim, os
princípios do Ensino Religioso (e demais componentes curriculares)
deverão estar fundamentados nos princípios constitucionais e a partir dele
na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9394/96,
incluindo a Lei 9475/97 que dá nova redação ao art. 33.
São considerados princípios do Ensino Religioso: A igualdade de
condições para o acesso ao conhecimento das tradições culturais
religiosas em todas as escolas da rede pública do ensino fundamental.
Esse princípio não pode ser efetivado para todos os estudantes pelo fato
óbvio de a matrícula para esse componente curricular ser opcional.
Outro princípio constitucional é o pluralismo religioso. Reconhecer a
diversidade religiosa dos sujeitos que fazem parte do universo escolar é
dever de todos. Esse princípio faz jus à condição de país de riquíssima
diversidade cultural como o Brasil, notável em vários povos que deram sua
contribuição no processo de formação desse espaço geográfico.
Os povos indígenas, Tapuias, Jês, Fulni-ô e tantos outros, já
ocupavam esse território quando da chegada dos portugueses. A migração
forçada dos negros africanos, além de outros povos europeus e asiáticos
que vieram para cá contribuindo com o processo de miscigenação fez
surgir essa diversidade cultural que precisa ser considerada na escola,
valorizando a experiência que os estudantes trazem sobre sua
religiosidade, mas abordar também a religiosidade regional e brasileira.
As Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de
09 (nove) anos3 apresentam em seus fundamentos que as escolas devem:
Assegurar a cada um e a todos o acesso ao conhecimento e aos
elementos da cultura imprescindíveis para o seu desenvolvimento
pessoal e para a vida em sociedade, assim como os benefícios de
uma formação comum, independentemente da grande diversidade da
população escolar e das demandas sociais. (BRASIL, 2010, p.01)
Para que o Ensino Religioso Escolar cumpra sua função social é
importante considerar os princípios éticos, políticos e estéticos
3
Em seu artigo 5º afirma que o direito à educação é inalienável, ou seja, aqueles
pertencentes à pessoa pela sua condição humana.
152
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
determinados pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino
Fundamental de 09 (nove) anos.
No primeiro, espera-se que esse componente possa contribuir para a
eliminação dos preconceitos religiosos combatendo a discriminação
expressas nas abordagens orientadas pelo professor, pelas opções dos
estudantes em professar religiões consideradas minorias em relação
àquelas predominantes. Liberdade, autonomia, justiça e solidariedade,
portanto, são expressas nesse princípio ético.
Considerando o segundo princípio (políticos), espera-se que o
Ensino Religioso possa contribuir para o reconhecimento dos direitos dos
estudantes em expressar sua religiosidade e deveres quanto ao respeito
do outro também poder expressar-se livremente a sua opção religiosa, à
preservação dos templos religiosos evitando depredações nos símbolos de
outras religiões. O reconhecimento da igualdade de direitos entre os
sujeitos escolares que apresentam diferentes necessidades também fazem
parte desse segundo princípio.
Quanto ao terceiro princípio (Estéticos), faz-se necessário o estímulo
e desenvolvimento da sensibilidade, da racionalidade, da criatividade e
valorização das diferentes expressões da cultura (local, regional e
nacional) do reconhecimento do pluralismo religioso, característico da
sociedade brasileira.
Portanto, o Ensino Religioso é direito de todos os estudantes, sem
exceções, pois desenvolverá o potencial da transcendência humana, além
de oportunizar o pleno exercício dos mais variados direitos cumprindo,
assim, a função social da escola.
O Estado de Pernambuco através do Conselho Estadual de
Educação publicou no ano de 2006 a Resolução nº 05 cujo dispõe sobre o
Ensino Religioso (ER) nas escolas da rede pública de ensino constando na
formação básica dos estudantes do ensino fundamental. O fenômeno
religioso é o seu objeto de estudo sendo expresso nas manifestações
religiosas.
O proselitismo também está presente nessa resolução e assim como
na Lei nº 9.394/1997 fica expressamente proibido, bem como os conteúdos
direcionados para esse ou aquele credo religioso. Os mesmos deverão
constar no projeto-político-pedagógico de cada unidade de ensino desde
que estejam em consonância com os pressupostos das Diretrizes
Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental.
153
FONAPER
Os
pressupostos
referem-se
à
interdisciplinaridade
e
contextualização como estruturadores da organização do currículo; o
reconhecimento ―do transcendente e do sagrado através de fontes escritas
e orais, ritos, símbolos e outras formas de expressão, identificadas e
organizadas pelas tradições religiosas‖. Reconhece também os valores
(éticos/morais) que cada tradição religiosa traz e a garantia da dignidade
do ser humano; a cultura de paz; justiça e solidariedade entre os diversos
povos; o reconhecimento do pluralismo religioso presente na escolas que
deverá ser respeitado como direito inerente a cada indivíduo; a busca pelo
diálogo entre as diversas religiões.
O objetivo das Orientações Curriculares de Educação em Direitos
Humanos (PERNAMBUCO, 2012, p.16), ―é contribuir para a qualidade da
educação de Pernambuco, proporcionando a todos os pernambucanos
uma formação de qualidade, pautada na Educação em Direitos Humanos
em prol da valorização da diversidade4 e do respeito pelo diferente, que
garanta a sistematização dos conhecimentos desenvolvidos na sociedade
e o desenvolvimento integral do ser humano.‖ Portanto, para a função
social da escola.
Formação dos docentes do Ensino Religioso
A formação dos docentes esteve e continua com desafios inerentes à
história da educação brasileira, visto que a partir da década de 1990,
devido às exigências estabelecidas pelos órgãos internacionais,5 como
também o processo da globalização que envolveu o Brasil, várias ações
políticas e reformas educacionais que se propagaram nas esferas federal,
estadual e municipal, juntaram esforços no sentido de buscar definir e
concretizar políticas públicas para a formação técnica e tecnológica de
docentes (CARON, 2008, p. 62-66).
Caron diz que ―[...] há necessidade de efetivas políticas públicas. E
para que novas políticas públicas sejam implementadas é preciso que o
professor no exercício de sua função política, de sua cidadania, participe
das discussões e atividades de formação [...]‖ (CARON, 2005, p.12).
4
5
Entende-se também sobre a inclusão da cultura religiosa.
FMI - Fundo Monetário Internacional e a UNESCO - Organização das Nações Unidas
para a educação, à ciência e a cultura.
154
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Com isso, percebemos a necessidade de políticas públicas que
envolvam os participantes, incluindo integralmente as suas vivências
culturais e religiosas também. Fazendo uma análise do artigo 62 da
LDBEN, fica clara a necessidade de atenção à política de formação
docente para atendimento na educação básica das áreas de conhecimento
previstas na Lei nº 9.394/1996 que:
A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em
nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em
universidade e institutos superiores de educação, admitida, como
formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e
nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em
nível médio, na modalidade normal (BRASIL, 1996, grifo nosso).
Está previsto na lei federal que a formação inicial e continuada
docente do Ensino Religioso deve ser realizada nos espaços das
Instituições Superiores. Segundo os comentários de Meneghetti (2007),
essa formação deve acontecer em Instituições Superiores, por elas
existirem em função dos saberes universais, ou melhor, no ensino,
pesquisa e extensão sobre as diversas ciências e tradições de sabedoria,
tendo assim o melhor ―domínio da área do conhecimento e das
metodologias de trabalho apropriadas a esse saber‖. (MENEGHETTI,
2007, p. 141)
Em Pernambuco, a Região Metropolitana do Recife dispõe de
faculdades particulares e as três grandes Instituições Superiores com
cursos voltados para a docência, tais como: as públicas - Universidade
Federal de Pernambuco, Universidade Federal Rural de Pernambuco ambas não dispõem de curso de Ciências da Religião e Teologia; e de
natureza comunitária a Universidade Católica de Pernambuco, a qual
dispõe do curso de Teologia e o mestrado em Ciências da Religião.6
Outro ponto levantado sobre a formação docente do Ensino
Religioso, em Pernambuco, é a Resolução nº 05 do Conselho Estadual de
Educação que orienta no artigo 5º que a ―formação dos docentes para o
magistério de ER dar-se-á em curso superior de licenciatura em Ciências
da Religião ou correspondente‖ (CEE/PE, 2006, p.02). A palavra
―corresponde‖ inserida no texto informa mais adiante que é o curso de
6
O panorama apresentado mostra-se a deficiência na formação inicial do docente para o
Ensino Religioso
155
FONAPER
Teologia que melhor atende e, na ausência desses, deve-se ao curso de
Pedagogia ou outro na área de Humanas.
Nota-se que há urgência da formação de maneira adequada dos
docentes do Ensino Religioso, que deve ser inserida no plano de formação
de licenciados e, no caso da Resolução pernambucana, especificando o
curso de Ciências da Religião. Logo, esse curso fornecerá a capacidade
para o docente saber como desenvolver e enfocar, na pluralidade do
fenômeno religioso, o olhar para a diversidade cultural para a formação
cidadã em valores humanizantes (MENEGHETTI, 2007, p.141).
Diante disso, pode-se afirmar que a formação do docente de Ensino
Religioso requer a compreensão do docente como mediador do saber no
conjunto de saberes/ciências de que se compõe o currículo escolar,
lembrando que a disciplina ainda conta com obstáculos de ordem política,
legal e epistemológica, relativos à laicidade do Estado e à presença do
religioso em espaço público no Brasil. Parte-se do princípio de que a
formação docente se articula com o contexto social em que está inserida e
que o Ensino Religioso tem diante de si a perspectiva da diversidade
cultural e religiosa verificada na sociedade brasileira atual.
A esse respeito, cabe citar a obrigatoriedade, dada pela redação do
artigo nº 33 da LDBEN 9.394/1996, de que os sistemas de ensino ouçam
entidades civis com representação religiosa. Pois existem também
dificuldades dos docentes quanto à demora da efetivação das mudanças
do sistema de ensino nessa direção. Verifica-se que muitos docentes ainda
não conseguem estabelecer necessária distância entre sua formação
inicial e familiar de base religiosa-confessional e a elaboração de uma
visão plural e inclusiva do componente curricular de Ensino Religioso.
Caron nos conduz para a reflexão de Perround a esse respeito:
[...] Para o professor adquirir competências profissionais, um conjunto
de conhecimentos é necessário. Essas competências são, ao mesmo
tempo, de ordem cognitiva, afetiva, conotativa e prática. Entende-se
como um conjunto diversificado de conhecimentos da profissão, de
esquemas de ação e de posturas que são mobilizados no exercício do
ofício (PERROUND apud CARON, 1999, p.12)
Nesse estudo, objetiva-se, a partir da apresentação de dados
coletados, por amostragem, através da aplicação de 06 (seis)
questionários e 02 (duas) entrevistas semi-estruturadas com o universo de
156
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
06 (seis) docentes para ilustrar os desafios referentes à formação docente,
discutidos neste tópico.
A pesquisa de campo foi realizada entre maio a junho de 2013 na
capital pernambucana, a partir de vivências de 06 (seis) escolas da Rede
Estadual relativas ao Ensino Religioso, que essas detêm de uma
diversidade cultural e religiosa notável, é que se colocaram as
provocações e o desejo de aprofundamento, que se traduzem no esforço
realizado desta pesquisa.
Observamos nos gráficos 01 e 02 que uma boa parte das
participantes7 ainda continua no patamar da Graduação, sendo
concentrada na área das Ciências Humanas, por razões inerentes ao
contexto docente tradicional.
Gráfico 01- FORMAÇÃO ACADÊMICA
Graduação
17%
Especialização
83%
A maior parte das docentes que responderam ao questionário tem
Especialização, em área normalmente correspondente à da sua graduação
em licenciatura plena, distribuída como mostra o gráfico 02.
7
As pessoas que responderam o questionário estruturado foram do sexo feminino.
157
FONAPER
Gráfico 02 - HABILITAÇÃO EM LICENCIATURA
Ciências da
Religião
0%
Biologia
20%
Filosofia
10%
Geografia
10%
História
10%
Teologia
10%
Letras
20%
Pedagogia
20%
A rede estadual de ensino dispõe, na prática, de critérios de lotação8
dos docentes para assumir a disciplina do Ensino Religioso, dando
prioridade aos cursos de Pedagogia, Letras e Teologia.
A escolha desse primeiro curso vem pelo motivo do Sistema de
Ensino aproveitar os docentes de Pedagogia que perderam carga-horária
ao longo dos anos, desde o fim do Magistério (hoje chamado Normal
Médio), atendendo às exigências da LDBEN Lei nº 9.394/1996; como
também o docente de Letras, que contém uma carga-horária superior às
demais, exceto Matemática, sendo como complemento de carga horária9.
As aparições dos formados em cursos de História e Geografia
ocorrem no caso da vacância na unidade escolar e da disponibilidade de
carga-horária do docente.
Percebemos a ausência nas respostas dos
questionários das docentes da habilitação no curso de Ciências da
Religião: na entrevista semi-estruturada apenas duas professoras
conheciam a existência do curso oferecido na capital em nível de mestrado
conforme a disposição do gráfico 03.
Para a formação específica do Ensino Religioso houve ainda, na
pesquisa, a posição de duas docentes que responderam ter cursado uma
8
9
Informações cedidas pelas Gerências Regionais de Educação.
Essas situações eram muito comuns até o ano de 2010.
158
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Extensão em Ensino Religioso, mas não informaram à instituição que
ofertou.
Gráfico 03 - FORMAÇÃO ESPECÍFICA NA
ÁREA DO
ENSINO RELIGIOSO
Sim
33%
Não
67%
Para Meneghetti, a disponibilidade dos cursos apresentados nos
registros das entrevistas mostra os entraves para a garantia do respeito à
diversidade cultural religiosa presente no contexto sociocultural da
sociedade. Logo, a política pública de formação, no caso, em Pernambuco,
onde não há cursos destinados para essa modalidade e nem à disposição
do Estado, precisa ser incrementada com vistas, inicialmente, à oferta de
curso de especialização e/ou extensão na linha das Ciências da Religião10.
Outro ponto em destaque é a formação continuada sendo promovida
pelo Sistema de Ensino estabelecido pelo 1º parágrafo do artigo 62 da
LDBEN que, em se tratando da rede estadual, ―em regime de colaboração,
deverão promover a formação inicial, a continuada e a capacitação dos
profissionais de magistério‖ (BRASIL, 1996).
10
Nas Instituições do Ensino Superior em Pernambuco não dispõe do curso em
Licenciatura em Ciências da Religião. No campo da pós-graduação existe desde 2005 o
curso em nível de mestrado pela Universidade Católica de Pernambuco que ainda
ofereceu em 2012 o curso de Especialização em Ciências da Religião. Em 2008 foi
aberto o Edital no Diário Oficial de Pernambuco, publicado em 17 jun. 2008 de cursos
de Especialização e Atualização patrocinados pelo Governo do Estado que nesta área
de conhecimento não foi contemplada.
159
FONAPER
A formação continuada promovida na rede estadual de ensino e em
suas respectivas Gerências Regionais de Educação - GRE, localizadas no
Recife (Norte e Sul), aproxima-se do proposto pelas Ciências da Religião.
O primeiro entendimento é a ação vinculada com as Ciências da
Religião, a qual se dá pela formação das técnicas das GRE, que possuem
cursos de Especialização e Mestrado em Ciências da Religião. O segundo
é a interação promovida pela GRE com a sociedade civil, sendo
convidados variados segmentos religiosos em vários momentos das
formações de docentes, para conhecimento das suas cosmovisões11.
Para Caron a formação adequada para o docente ―terá condições
de análise e crescimento, assim como para inovar em seu fazer
pedagógico‖ (CARON, 2008, p.67).
Ao docente de Ensino Religioso, que se insere no espaço escolar
com pluralidade religiosa, espera-se uma constante busca de
conhecimento do fenômeno religioso contextualizado no espaço
sociocultural e de formações permanentes que possibilitem o
aprimoramento de sua interação pedagógica. Portanto, Junqueira (2002,
p. 112) reforça que a formação do docente de ER não se deve:
[...] limitar ao estudo acadêmico dos conteúdos específicos. Após esta
apropriação do ‗discurso religioso‘, é preciso fazer a ‗tradução
pedagógica‘ da linguagem religiosa, adaptando-a ao nível do
desenvolvimento dos alunos, em seus aspectos psicogenéticos e
socioculturais.
Considerações Finais
O contexto histórico do docente do ER nos remente ao longo
percurso de desafios entre elas à formação para o exercício do cargo e na
dinâmica pedagógica para promover o respeito e a valorização das
diversidades cultural e religiosa presentes no espaço social.
O Ensino Religioso apresenta diversos vértices e elementos de
enorme perspectiva de interação social, como também a sua função social
mediante a totalidade de inserir estudos no campo do sagrado.
11
Esses momentos foram registrados em vídeos e fotografias realizadas pelas duas
técnicas das GRE e apresentados durante a entrevista. Nas entrevistas semiestruturadas com as docentes foi levantado esse último ponto, que as formações
promoveram a oportunidade de conhecer outros saberes e a minimização do
preconceito dessas religiões.
160
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
A Secretaria de Educação de Pernambuco publicou em 2012 os
Parâmetros Curriculares do Estado, com cadernos12 específicos para cada
componente curricular (alguns em processo de construção e outros já
publicados). O caderno de Parâmetros Curriculares do Ensino Religioso,
em Pernambuco, não foi elaborado e acreditamos que não deverá ser pelo
menos em curto prazo.
Referências
BRASIL. Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº
9.394/1996. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/seed/arquivos/pdf/tvescola/leis/lein9394.pdf>
Acesso em: 27. abr 2012.
BRASIL. Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental
de 9(nove) anos Disponível em:
<portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Ensfund/noveanorienger.pdf> Acesso
em: 23 jun. 2013.
CARON, Lurdes (Org.). O ensino religioso na nova LDB. 2. ed.
Petrópolis: Vozes,1999.
JUNQUEIRA, Sérgio Rogério Azevedo. O Processo de escolarização do
Ensino Religioso no Brasil. Petrópolis: Vozes, 2002.
_____ ; WAGNER, Raul (org.). O Ensino Religioso no Brasil. Porto
Alegre: Champagnat, 2007.
OLIVEIRA, Lilian Blanck; RISKE-KOCH, Simone; WICKERT, Tarcísio
Alfonso (orgs.). Formação de docentes e Ensino Religioso no Brasil:
tempos, espaços, lugares. Blumenau: Edifurb, 2008.
PERNAMBUCO. Conselho Estadual de Educação. Resolução nº 05, de
09 de maio de 2006.
SENA, Luiza (Org.). Ensino Religioso e a formação docente: Ciências
da Religião em diálogo. São Paulo: Paulinas, 2007.
12
A elaboração desses cadernos teve a participação de professores da rede estadual e de
universidades públicas. As diretrizes e princípios educacionais estão presentes nesses
parâmetros bem como a organização curricular.
161
FONAPER
SUNDFELD, Carlos Ari. Licitação e Contrato Administrativo. 2. ed. São
Paulo: Malheiros, 1995.
162
ENSINO RELIGIOSO ESCOLAR NO CONTEXTO DA
DIVERSIDADE RELIGIOSA: UMA EXPERIÊNCIA NA FORMAÇÃO
DE PROFESSORES
Iolanda Rodrigues da Costa (UEPA)1
Maria de Lourdes Santos Melo (UEPA)2
Rosilene Pacheco Quaresma (UEPA)3
Resumo:
O artigo aborda a experiência desenvolvida no processo de formação de professores no
Curso de Licenciatura em Ciências da Religião da Universidade do Estado do Pará,
objetivando socializar práticas significativas realizadas junto aos alunos do PARFOR (Plano
Nacional de Formação de Professores). O texto apresenta reflexões acerca dos paradigmas
educacionais contemporâneos, onde a questão do multiculturalismo emerge como um
desafio para o currículo escolar e para a formação de professores. Discute ainda a questão
do Ensino Religioso como área de conhecimentos no currículo da Educação Básica e seus
desafios para a formação de professores para essa disciplina. Em seguida, relata a
experiência que vem sendo desenvolvida na disciplina Prática de Ensino, do Curso de
Licenciatura em Ciências da Religião da Universidade Estadual do Pará, onde os alunos
são levados a elaborar propostas de conteúdos programáticos para o Ensino Fundamental,
tendo em vista a diversidade cultural religiosa da sociedade e a importância do cultivo do
diálogo inter-religioso e do respeito às diferenças de crenças, bem como, realizam palestras
sobre a Identidade do Ensino Religioso na Escola, envolvendo os educadores e gestores
escolares dos municípios do interior do Estado.
Palavras-chave: Paradigmas educacionais; Multiculturalismo; Diversidade Religiosa;
Ensino Religioso; Formação de Professores.
1
2
3
Pedagoga, Mestre em Educação (UNIMEP/SP), professora do Curso de Licenciatura em
Ciências da Religião da Universidade do Estado do Pará- UEPA, Membro da Equipe
Técnica de Pesquisa da Secretaria Municipal de Educação de Belém/PA. E-mail:
[email protected]
Pedagoga, Doutora em Educação (UFRJ/RJ), coordenadora do Curso de Licenciatura
em Ciências da Religião da Universidade do Estado do Pará-UEPA, Membro do grupo
de
pesquisa
internacional
sobre
avaliaçãoBrasil/Portugal.
E-mail:
[email protected]
Pedagoga, Especialista em Educação, professora do Curso de Licenciatura em Ciências
da Religião da Universidade do Estado do Pará-UEPA. Sub-Coordenadora de Extensão
da COAD/CCSE/UEPA. E-mail: [email protected]
FONAPER
Introdução
A sociedade contemporânea vivencia um processo de mudanças
paradigmáticas em todos os campos: sociopolítico, cultural, econômico,
epistemológico, científico, tecnológico, enfim, em todos os setores. Tais
mudanças se intensificaram a partir da década de 90, com os avanços
científicos e tecnológicos que marcaram esse período, expandindo as
telecomunicações e os sistemas de informação, favorecendo o intercâmbio
entre os povos do mundo inteiro, onde as distâncias físicas e espaciais não
são mais empecilho para o contato humano e o aprendizado mútuo.
Ao mesmo tempo em que a globalização rompe as fronteiras entre
pessoas e países, traz consigo a intensificação do processo de exclusão
social, acirrada pela competitividade internacional, como alerta Moreira
(2001, p. 66):
Há que se atentar para as desigualdades econômicas e se distribuir os
frutos da globalização com mais justiça. Há também que se
reconhecer a pluralidade cultural que cada vez mais se expressa no
mundo de riscos globais em que vivemos, tanto nos setores
beneficiados pela globalização como nos que ela tem ajudado a
marginalizar.
Nesse contexto, emergem inúmeros desafios para a educação, no
sentido de repensar o currículo escolar e a formação de professores, de
modo a responder às novas exigências da sociedade.
Um desses desafios se refere à educação multicultural, uma vez que
esta é a marca fundamental das sociedades contemporâneas, cujas
diferenças se expressam em várias dimensões da vida social: gênero,
etnia, orientação sexual, cultura e religião. Nesse sentido, o
multiculturalismo representa uma condição inescapável do mundo
ocidental, à qual se pode responder de diferentes formas, mas não se
pode ignorar. (MOREIRA, 2011, p. 66).
A educação multicultural representa uma resposta dada pela escola
às diferenças existentes na sociedade, enquanto um desafio que envolve a
garantia dos direitos humanos, uma vez que as pessoas têm direito a ser
iguais sempre que a diferença as tornar inferiores; contudo, têm também
direito a ser diferentes sempre que a igualdade colocar em risco suas
identidades. (SANTOS, 1997, apud MOREIRA, 2001, p. 67).
Dentre as diferenças a serem trabalhadas pela educação
multicultural, situamos a diversidade religiosa. Sendo o ser humano
164
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
possuidor de uma religiosidade intrínseca, este sente necessidade de
transcender à realidade imanente, em direção ao transcendente, em busca
de respostas para o sentido da vida. A religiosidade se expressa de
diversas formas em diferentes culturas humanas, por meio de símbolos,
gestos, ritos, mitos, festividades, textos sagrados, monumentos,
edificações, ethos, religiões e outras formas de expressão.
A esse respeito, Oliveira et al. (2007, p. 65) assim se reporta:
Quando o ser humano se pôs a perguntar sobre a origem da vida, seu
sentido e finalidade, ativou um movimento extremamente dinâmico,
responsável por seu afastamento dos limites biológicos e pelo início
do processo de humanização, entendido como a busca de algo mais,
que extrapole as necessidades básicas de sobrevivência.
Por se constituírem em saberes e práticas sociais, as expressões
religiosas fazem parte da cultura humana em sua diversidade, sendo,
portanto conhecimentos a serem incorporados pelo currículo escolar, no
contexto de uma educação multicultural. Ao perceber a religião como uma
forma de expressão do fenômeno religioso que ocorre em uma cultura ou
culturas, compreende-se também o ambiente social como um agente que
contribui e interfere na avaliação do mundo e das pessoas na dimensão da
expressão religiosa.
Essa diversidade se faz reconhecer pela Secretaria Nacional de
Direitos Humanos da Presidência da República, por meio da criação e
instalação do Comitê Nacional de Diversidade Religiosa, em cooperação
com a Secretaria de Direitos Humanos no dia 30 de novembro de 2011,
tendo como um de seus objetivos a elaboração de políticas de afirmação
do direito à diversidade religiosa e a implementação das ações
programáticas previstas no PNDH-3.
Mais do que nunca se ampliam os horizontes da Educação Básica,
no sentido de promover uma ampla revisão tanto no currículo quanto nas
práticas pedagógicas dos professores, de forma a incorporar a diversidade
religiosa como área de conhecimentos, como forma de desenvolver uma
formação cidadã, onde os alunos possam aprender a conviver com as
diferenças de credo de forma respeitosa e dialógica.
Nesse sentido, os novos paradigmas da disciplina Ensino Religioso
Escolar, apontam para o respeito à diversidade cultural religiosa, quando a
lei nº 9.475/97 (Art. 33) estabelece:
165
FONAPER
O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da
formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais
das escolas públicas de Educação Básica assegurada o respeito à
diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de
proselitismo.
Como se pode observar, a referida lei integra essa disciplina no
conjunto da formação básica do cidadão e garante o tratamento igualitário
de sua oferta no horário escolar, bem como, a liberta das amarras do
proselitismo, afirmando a sua identidade como área de conhecimentos, tal
como as demais disciplinas que compõem o currículo da educação básica.
Nesta nova abordagem, o Ensino Religioso assume como objeto de
estudos o fenômeno religioso em suas diversas formas de expressão entre
os diferentes povos do planeta, de acordo com a sua história e cultura.
Esta abordagem representa um avanço significativo em relação ao
caráter e à abordagem dessa disciplina no currículo escolar, uma vez que
rompe com o modelo tradicional pautado numa perspectiva catequética,
que se confunde com o papel da igreja.
É nessa perspectiva que a formação de professores para o Ensino
Religioso Escolar se coloca enquanto um importante desafio para os
formadores no âmbito do Ensino Superior, uma vez que exige o
estabelecimento de um referencial teórico-metodológico fundamentado
numa práxis inovadora, aberta à pluralidade de concepções de mundo e de
crenças, apoiada no espírito crítico e investigativo, bem como no senso de
alteridade e respeito às diferenças.
Até a década de 90 a formação de professores nessa área estava
restrita às denominações religiosas cristãs, algumas poucas experiências
eram realizadas em parceria com as Secretarias de Educação.
No caso do Estado do Pará, houve uma experiência na década de 80
de parceria, por meio de um convênio entre a Arquidiocese de Belém e a
Universidade Federal do Pará, quando foi ofertado um curso Livre de
Educação Religiosa, voltado para a formação de professores de Ensino
Religioso Escolar.
O referido curso apresentava um desenho curricular
amplo, contemplando matérias pedagógicas, teológicas, sociológica,
filosóficas, psicológicas e científicas, totalizando 2.700 horas.
A
abordagem curricular estava centrada numa proposta de formação
ecumênica para o Ensino Religioso Escolar. Este curso foi extinto ainda na
década de 80.
Segundo Oliveira (2007, p. 121-122):
166
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
É preciso mencionar que esse tipo de formação, apesar de envolver
empenho e qualidade, não graduava os professores, diferentemente
do que ocorria com os profissionais da educação de outras disciplinas,
o que gerava impasses e dificuldades em sua vida funcional. [...] Os
professores das outras disciplinas tinham as graduações reconhecidas
pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC), fator que lhes dava
direito de prestar concurso público e, consequentemente, seguir plano
de carreira funcional. Os professores de ensino religioso, embora
muitas vezes formados por cursos de caráter teológico, não eram
reconhecidos pelo MEC. Por imperativos da legislação, eram-lhes
negados os acessos funcionais na área do magistério, sendo
permitida a contratação de seus serviços apenas em caráter
temporário.
O cenário apresentado exige o desenvolvimento de iniciativas no
sentido de atender às demandas para a formação inicial de professores
nessa área de conhecimentos. Conforme determina a Lei 9.475/97, os
sistemas de ensino devem regulamentar os procedimentos para a
definição dos conteúdos do Ensino religioso e as normas para a habilitação
e admissão de professores, atendendo à prerrogativa da LDB (Lei nº
9.394/96), que exige habilitação específica do professor em nível de
Licenciatura na área que leciona.
Dessa forma, em 1999 a Universidade do Estado do Pará cria o
Curso de Licenciatura em Ciências da Religião, tendo como referência o
curso da Arquidiocese, porém ofertado em nível de Licenciatura Plena e
com um desenho curricular mais abrangente, focado em 4 eixos básicos:
Dialogo Inter-religioso, Diálogo Inter saberes, Produção de Conhecimentos
e Práxis Pedagógica, totalizando 3.200 horas.
De acordo com o Projeto Político-Pedagógico do Curso de
Licenciatura em Ciências da Religião (UEPA, 2003, p. 25), as diretrizes
filosóficas que permeiam a formação docente no Curso consideram:
a) a compreensão do ser humano como reflexivo, crítico, dialógico,
investigador, problematizador, aberto ao transcendente e sujeito do
conhecimento e da história;
b) a compreensão da práxis educativa como formadora integral do ser
humano, uma produção cultural humana, ética e política;
c) a compreensão do fenômeno religioso como processo de formação
existencial do ser humano.
O curso assume uma perspectiva multiculturalista e científica das
religiões, tomando o fenômeno religioso que se expressa nas diversas
culturas e tradições religiosas como objeto de estudos. É o primeiro curso
167
FONAPER
de graduação, em universidade pública, no Brasil voltado especialmente
para a formação de professores para a disciplina Ensino Religioso Escolar,
dentro de uma concepção pluralista das religiões, de modo a fomentar o
diálogo inter-religioso e o respeito à diversidade religiosa na Educação
Básica.
Pode-se dizer que a proposta curricular do Curso de Licenciatura em
Ciências da Religião da UEPA articula-se com os critérios definidos pelo
Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso - FONAPER (2000) para
a avaliação da formação do professor de Ensino Religioso, quais sejam:
a) Honestidade científica do profissional, que exige a constante busca
do conhecimento religioso, o entendimento da complexidade do
conhecimento do fenômeno religioso, a capacidade de viver a
reverência à alteridade; o reconhecimento da família e da comunidade
religiosa como espaços privilegiados para a vivência religiosa e para a
opção de fé; o propósito de estar a serviço da liberdade do estudante;
o aperfeiçoamento nas cinco áreas temáticas do estudo do fenômeno
religioso (fundamentos epistemológicos do Ensino Religioso, Culturas
e Tradições Religiosas, Textos Sagrados, Teologias e Ethos).
b) Competência profissional, que exige do professor: a compreensão
do fenômeno Religioso, contextualizando- espacial e temporalmente; a
configuração do fenômeno religioso por meio das ciências da tradição
religiosa (religião); o conhecimento da sistematização do fenômeno
religioso pelas tradições religiosas e suas teologias; a análise do papel
das tradições religiosas na estruturação e manutenção das diferentes
culturas e manifestações socioculturais; a exegese dos textos
sagrados orais e escritos das diferentes matrizes religiosas (africanas,
indígenas, ocidental e oriental); a compreensão do sentido da atitude
moral como consequência do fenômeno religioso sistematizado pelas
tradições religiosas e como expressão da consciência e da resposta
pessoal e comunitária das pessoas.
Pelo exposto, percebe-se que são muitos os desafios para a
formação de professores de Ensino Religioso, o que requer o empenho e o
compromisso da Universidade e dos docentes do Curso de Licenciatura
em Ciências da Religião, no sentido de aproximar-se cada vez mais desse
ideário formativo proposto pelo FONAPER, bem como, pelas orientações
emanadas do Conselho Nacional de Educação- CNE, no que se refere ao
parecer sobre a formação de professores para o Ensino Religioso nas
Escolas Públicas de Ensino Fundamental (1999).
Nesse sentido, há que se louvar o esforço empreendido por algumas
universidades, por educadores, pelo FONAPER e por alguns grupos
religiosos e entidades não governamentais, comprometidos com uma
168
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
educação democrática e de qualidade, que têm lutado pela efetivação das
condições necessárias para a garantia da qualidade do ensino em todos os
níveis, e no caso do Ensino Religioso escolar, que este seja oferecido de
forma laica, respeitando a diversidade cultural religiosa e que conte com
professores devidamente capacitados para oferecer um ensino isento de
proselitismo.
O Estágio Supervisionado na Formação de Professores para o Ensino
Religioso
O estágio supervisionado, como componente curricular, constitui-se
disciplina fundamental na formação de professores, na medida em que se
efetiva espaço de reflexão-ação, como possibilidade de campo de
pesquisa onde emerge questões norteadoras que possibilitam a
construção da práxis.
Nesse sentido, a prática docente exige do profissional uma
concepção educacional que determine a compreensão dos papéis de
professor e estudante, da metodologia, da função social da escola e dos
conteúdos a serem trabalhados. A discussão dessas questões é
importante, para que se explicitem os pressupostos pedagógicos
subjacentes à atividade de ensino, na busca de coerência entre o que se
pensa estar fazendo e o que realmente se faz (OLIVEIRA et al., 2007).
Como professoras da disciplina Prática de Ensino (Estágio
Supervisionado) no Curso de Licenciatura em Ciências da Religião, temos
clareza de que o estágio deve proporcionar aos futuros profissionais
experiências significativas, onde possam materializar os conhecimentos
adquiridos ao longo do curso, bem como, produzir novos conhecimentos a
partir do enfrentamento da realidade educacional.
Nesse contexto, nossas preocupações voltaram-se para a
compreensão dessa realidade, bem como, para a elaboração de propostas
curriculares que pudessem contribuir para o avanço das práticas
educativas no âmbito do Ensino Religioso escolar, tanto na rede pública
quanto da rede privada de ensino.
Desta forma, queremos compartilhar com o leitor a experiência que
vem sendo desenvolvida com discentes do Estágio Supervisionado no
Curso de Licenciatura em Ciências da Religião, especificando aqui
atividades junto aos acadêmicos do PARFOR – Plano Nacional de
169
FONAPER
Formação de Professores da Educação Básica, experiência que reúne o
tripé de sustentação das Universidades, ou seja, Ensino, Pesquisa e
Extensão.
Este estágio supervisionado compreende uma carga horária de 400
horas, sendo 200 horas no 3º ano do curso e200 horas no 4º ano do curso,
sendo dividido didaticamente em 3 etapas, a saber: Observação,
Participação e Regência.
Etapa de Observação:
Essa etapa caracteriza-se como um momento fundamental de
investigação acerca da realidade escolar. Nela, o estagiário tem a
oportunidade de compreender os desafios postos para a área, a partir de
um olhar crítico e ao mesmo tempo solidário em relação ao contexto de
trabalho docente, observando as condições de ensino, as práticas
pedagógicas,
a
cultura
organizacional
da
escola,
as
percepções/importância da disciplina, enfim, uma série de aspectos que
envolvem a realidade educacional/escolar do professor. Nessa etapa é
realizada uma observação participante, eles/elas atuam como monitores,
auxiliando professores em suas tarefas em sala de aula.
Foi com base nas observações realizadas, que os estudantes
descobriram que a maioria dos professores que ministram a disciplina
Ensino Religioso não possuem habilitação específica na área, como exige
a LDB (Lei 9394/96), sendo oriundos da área da Pedagogia
(majoritariamente), além de profissionais da Matemática, Letras, História,
alguns possuem somente o Magistério de nível Médio, dentre outras
formações estranhas à licenciatura, como podemos observar no gráfico 1.
170
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Fonte: Secretaria Estadual de Educação do Pará, Setor de Lotação, 2011.
A falta de formação específica desses professores, considerando a
observação dos acadêmicos, resulta em práticas pedagógicas
ultrapassadas, dentro do modelo catequético, acreditando que esse
modelo de Ensino Religioso é o que ainda corresponde aos propósitos da
educação escolar. Em suas observações, os estagiários perceberam que
muitos professores foram lotados sem critérios profissionais, obedecendo
apenas à necessidade de complementação de carga horária ou
preenchimento de horário na jornada escolar.
Apesar de haverem profissionais já habilitados na área, formados
pelo Curso de Licenciatura em Ciências da Religião, a partir de 2009é que
iniciou concursos públicos para a referida disciplina nas escolas públicas
municipais e em quantidade insuficiente, o que exigiu uma ação do
Ministério Público do Estado do Pará, para que o Estado regularizasse
essa situação, efetuando concurso no ano de 2012.
Outra realidade observada pelos estagiários foi a total desvalorização
da disciplina e do profissional de Ensino Religioso no contexto escolar,
sendo colocada sempre nos horários que ninguém quer. Isso sem falar nas
171
FONAPER
―piadinhas‖ às quais professores são submetidos, fruto da imagem
equivocada e que os demais professores possuem em relação a essa
disciplina na escola.
Essas e outras questões são foco de reflexões em sala de aula,
incentivo para criação de atividades e produção de artigos pelos
acadêmicos durante a fase inicial do estágio.
Por outro lado, nessa etapa os estagiários têm ainda oportunidade de
conhecer experiências pedagógicas significativas no âmbito do Ensino
Religioso Escolar, por meio da realização do Painel de Relatos de
Experiências no Ensino Religioso escolar, promovido pela Coordenação de
Estágio e Coordenação do Curso de Licenciatura em Ciências da Religião,
evento em que participam professores com larga experiência de atuação
na disciplina, docentes que possuem práticas pedagógicas inovadoras,
levando-se em consideração a abordagem da diversidade cultural
religiosa. O referido painel permite um intercâmbio entre as escolas de
Educação Básica e a Universidade, viabilizando a relação teoria e prática
na formação de professores. Outro aspecto importante nessa atividade é a
possibilidade de obtermos um feedback dos egressos do curso, no sentido
de avaliarmos o êxito da formação adquirida no curso.
2- Etapa de Participação:
Essa etapa do Estágio Supervisionado caracteriza-se como um
momento em que o estagiário tem a oportunidade de analisar o plano de
ensino elaborado pelo professor de Ensino Religioso, bem como o livro
didático utilizado em sala de aula, tendo como referência os Parâmetros
Curriculares Nacionais para o Ensino Religioso Escolar, elaborado pelo
FONAPER (Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso). Tais
parâmetros situam-se no contexto da pluralidade cultural religiosa da
sociedade, fomentando o respeito à diversidade e o diálogo inter-religioso.
Com base nas observações e nas análises, os estudantes são
desafiados a elaborar uma proposta de planejamento de ensino para as
séries/ciclos finais do Ensino Fundamental, bem como, um projeto didático
para as séries/ciclos iniciais, tendo em vista as observações feitas no
planejamento docente e suas concepções acerca da identidade do Ensino
Religioso na escola.
172
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Tal elaboração constitui-se num exercício crítico-reflexivo
fundamental de produção de conhecimentos pedagógicos, buscando
contribuir para o desenvolvimento do currículo escolar. Essa elaboração
exige dos estagiários a sistematização dos conhecimentos específicos e
pedagógicos adquiridos ao longo do curso.
3 - Etapa de Regência
Esta etapa está dividida em dois momentos importantes. No primeiro
momento os acadêmicos são orientados a realizar palestras nas
Secretarias de Educação tanto da capital quanto do interior do Estado do
Pará, voltadas para os educadores que atuam na Educação Básica, bem
como, para a equipe gestora das escolas e das Secretarias de Educação,
com o tema: ―A identidade do Ensino Religioso na Escola e a Formação de
Professores‖. O objetivo desta atividade é discutir acerca dos novos
paradigmas do Ensino Religioso Escolar, bem como, esclarecer acerca da
legislação concernente à disciplina e os critérios de lotação docente.
Os discentes são organizados em equipes e distribuídos pelos
municípios para a realização das palestras, sendo acompanhados pelas
professoras responsáveis pela disciplina. É uma atividade que tem contado
com a parceria das Prefeituras Municipais, sendo elogiado, pela maioria
dos professores participantes como a primeira formação continuada na
área. Durante a programação os estagiários apresentam a proposta de
planejamento para a disciplina, elaborada na etapa de participação,
constituindo-se como uma contribuição ao trabalho dos professores na
disciplina.
Além dessa atividade, os estagiários ministram aulas, nas turmas de
Ensino Religioso onde realizam o estágio, tendo em vista o respeito à
diversidade cultural religiosa da sociedade, participam de seminários e
atividades na UEPA e elaboram um relatório, ao final do período de
estágio, contendo as reflexões e o registro de todas as etapas aqui
mencionadas.
Considerações Finais
A experiência na formação de professores, no contexto da
diversidade cultural religiosa da sociedade, tem representado um grande
173
FONAPER
desafio para nós educadores, no sentido de empreendermos uma luta pela
construção de um projeto de formação que articule o Ensino, a Pesquisa e
a Extensão, ao mesmo tempo em que possibilita o intercâmbio entre a
universidade e as escolas de educação básica, numa dinâmica de trocas
significativas.
O resultado deste trabalho tem sido bastante gratificante e produtivo,
tanto para nós docentes da Universidade, como para os acadêmicos
estagiários, bem como para os professores da rede municipal e, em
consequência, para o trabalho desenvolvido com os estudantes do Ensino
Fundamental, que têm a chance de ampliar o seu olhar sobre a
diversidade religiosa e experimentar uma verdadeira formação para a
cidadania.
Há que se considerar nesse processo o que afirma Oliveira (2007, p.
128):
Os professores e a disciplina de Ensino Religioso vivem na atualidade,
numa constante encruzilhada entre o velho e o novo, o estabelecido e
o desafiador. A sabedoria talvez resida em retirar tanto do velho
quanto do novo o que permanece válido: princípios que, no encontro
dos tempos, desnudos de suas roupagens contextuais e históricas,
detêm o poder de denunciar, enunciar e desafiar outras perspectivas;
ir ao encontro e promover vivências pedagógico-didáticas inovadoras;
valorizar e respeitar o diferente e as diferenças.
Acreditamos que experiências como esta são cada vez mais
urgentes na formação de professores no âmbito do Ensino Superior, pela
inovação curricular que proporciona tanto para os cursos de Licenciatura,
mas principalmente, pelo retorno positivo que apresenta para o currículo
da educação básica e formação continuada dos educadores.
Referências
BRASIL. CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO. Parecer sobre a
formação de professores para o Ensino religioso nas Escolas
Públicas de Ensino Fundamental. Brasília: CNE, 1999.
_____. Lei nº 9394/96. Brasília/DF, 1996.
______.Lei nº 9.475/97. Brasília/DF, 1997.
174
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
FONAPER, Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso. Parâmetros
Curriculares Nacionais do Ensino Religioso. São Paulo/SP: Ave Maria,
1997.
MOREIRA, AntonioFlávio. A recente produção científica sobre currículo
e multiculturalismo no Brasil (1995-2000): avanços, desafios e tensões.
Revista Brasileira de Educação- Set/Out/Nov/Dez 2001 Nº 18.
OLIVEIRA, Lilian Blank de. etal. O Ensino Religioso no Ensino
Fundamental. São Paulo /SP: Cortez, 2007. (Coleção docência em
Formação. Série Ensino Fundamental).
SOUSA SANTOS, Boaventura, (1997). Toward a multicultural
conception of human rights.ZeitschriftfürRechtssoziologie,nº 18, p.1-14.
UEPA, UNIVERSIDADE DO ESTADO DO PARÁ, Projeto Político
Pedagógico do Curso de licenciatura em Ciências da Religião.
Belém/Pa, 2003.
175
QUE PESQUISADORES/EDUCADORES DE ENSINO RELIGIOSO
BUSCAMOS? UM DEBATE A PARTIR DA DISCIPLINA
PESQUISA EM ENSINO RELIGIOSO – PARFOR BLUMENAU E
RIO DO SUL/SC
Josué de Souza1(PARFOR/FURB)
Resumo:
A presença do Ensino Religioso no currículo escolar é motivo de debate e controvérsia.
Muito desta resistência é por conta da prática de proselitismo religioso. Prática legalmente
superada pela Lei nº 9.475/97. Resta a discussão do perfil de pesquisadores/educadores
da área. Com base em Weber e Bourdieu pretendemos debater particularidades do campo
de pesquisa das Ciências da Religião, bem como o perfil dos pesquisadores/educadores.
Weber defende que a produção científica deve buscar os significados atribuídos pelos
atores sociais para a realidade, que por sua vez, é construída por múltiplas
individualidades, possibilitando diversas leituras. Isso não quer dizer que a produção
científica deva buscar subjetividade, pelo contrário, busca características singulares do
objeto. Já Bourdieu defende que a característica do campo é a presença de pesquisadores
pertencentes ao próprio campo social.
Palavras-chaves: Formação docente; Ciências da Religião; Diversidade Cultural Religiosa;
Brasil
Introdução
A história da disciplina de Ensino Religioso nas escolas de ensino
fundamental está diretamente ligada ao processo de construção nacional,
que tem como base a forte presença da fé católica através do processo de
homogeneização cultural religiosa promovido por ela ao longo da história
do Brasil. O Ensino Religioso, como forma de catequização, foi utilizado
por muitos atores sociais como forma de domínio e construção de
docilidades pelo colonizador europeu. Assim, a presença de uma
disciplina, que tenha como objeto de estudo o saber religioso no currículo
escolar é motivo de debates e controvérsias. Muito desta resistência, dá-se
1
Cientista Social e Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento
Regional – PPGDR da FURB. Docente no Curso de Ciências da Religião – Licenciatura
em Ensino Religioso da FURB – Programa PARFOR. Docente efetivo da disciplina de
Sociologia na Rede Estadual de Educação de SC, atuando na Escola de Educação
Básica Alexandre Guilherme Figueiredo no Município de Picarras/SC; Integra o Grupo
de Pesquisa Ethos, Alteridade e Desenvolvimento (GPEAD) do PPGDR – FURB.
FONAPER
por conta da prática do proselitismo religioso e pelo papel histórico, que
historicamente esta disciplina serviu ao longo do tempo.
Porém, a partir da Constituição Federal de 1988, em seu art. 210, a
disciplina de Ensino Religioso passa a ser garantida em todo o território
nacional. Isto se dá na forma facultativa e na Lei nº 9.475/97, que
reconhece que o Ensino Religioso, enquanto disciplina do currículo
escolar. Traz em seu art. 1º que: ―é parte integrante da formação básica do
cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de
ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa,
vedadas quaisquer formas de proselitismo‖.
O novo ordenamento jurídico coloca novas luzes sobre a disciplina e
segundo Riske-Koch (2007), a partir de agora, busca resolver questões
como a promoção e a integração sociocultural. Dito de outra forma, se
historicamente a disciplina buscava construir homogeneização
cultural/religiosa, agora busca gerar alteridade e valorização de
convivência dos educandos com o outro e com a diferença,
proporcionando o diálogo das diferenças cultural, social e religiosa.
Neste cenário o perfil do educador/pesquisador de Ensino Religioso
deve ser problematizado, para assim, sua postura romper com históricas
práticas de catequização e privilégios à apenas determinadas formas de
expressão de religiosidades. Sobretudo, em um cenário sociorreligioso
como o brasileiro marcado pela diversidade religiosa, étnica e cultural
(MARKUS; OLIVEIRA, 2010).
Neste sentido, pretendemos neste artigo problematizar do campo de
pesquisa da ciência da religião, o perfil para um docente na disciplina em
Ensino Religioso. Defendemos que a prática docente deve unir não só a
transmissão de conhecimento, mas a prática docente com a base em um
conhecimento construído na prática de cultura de pesquisa na educação.
Como base de reflexão vamos utilizar os ensinamentos do sociólogo
alemão Max Weber, especificamente em sua obra: ―Ciência e política:
duas vocações‖ e do sociólogo Francês Pierre Bourdieu no texto:
―Sociólogos da crença e crença de sociólogo‖.
Max Weber, a ciência e a docência
Dos autores clássicos do pensamento social, Max Weber talvez seja
o mais lembrado pelo tratamento do fenômeno religioso em sua obra. A
178
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
mais conhecida delas é ―A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo‖
(2005), onde busca mostrar a relação existente entre as ideias religiosas e
as suas consequências sobre o processo de mudança social. Porém, ele
inicia seus estudos sobre religião em um artigo anterior chamado
―Rejeições religiosas do mundo e suas direções‖ onde apresenta as
tensões existentes entre as religiões e outras esferas sociais. No texto, o
autor mostra como se deu o percurso histórico na construção das
racionalidades religiosas, sejam elas de caráter místico, ascese ou mesmo
as universalistas. Todas estas correntes surgiram segundo Weber, de
pressupostos mágicos que a partir de atuação de um profeta ou salvador,
se legitimaram a partir da construção de um carisma.
Nas palavras do autor:
Em geral, o profeta e salvador legitimaram-se através de um carisma
mágico. Para eles, porém isso foi apenas um meio de garantir o
reconhecimento e conseguir adeptos para a significação exemplar, a
missão, da qualidade de salvador de suas personalidades (WEBER,
1997, p. 161).
Assim, segundo Weber, o objetivo das religiões é garantir ao fiel um
estado sagrado, livre do sofrimento terreno. Para isso prega a ele um
comportamento que garante a salvação. O status de salvo é dado ao fiel
de forma transitória através de rituais, orgias, ascetismo ou contemplação.
Na busca da salvação o religioso age com regularidade, tendo agora sua
conduta controlada pelos sucessores do profeta, ou seja, a hierarquia do
grupo religioso (WEBER, 1997).
Porém será na obra ―Ciência e valores: duas vocações‖, que o autor
irá trabalhar a relação entre ciências sociais e valores do pesquisador,
especificamente a relação existente entre conhecimento e valores.
Debaterá sobre a distinção entre conhecer e valorar. Para
compreendermos o autor alemão é preciso partir da premissa que a
sociologia weberiana ―filia-se‖ na escola neokantiana, defendendo que o
método das ciências sociais deveria ser ―singularizante‖. Portanto, é
necessário compreender o significado cultural do objeto. Weber nasceu e
viveu durante a sua formação intelectual no período em que as primeiras
disputas e discussões sobre metodologia das ciências sociais estava
sendo travado, o que torna os escritos de Max Weber importantes para a
compreensão de como se dá o processo de construção do conhecimento
científico nas Ciências Sociais (TRAGTENBER, 1980).
179
FONAPER
I - A esfera da ciência
Em ―Ciência e Política: Duas vocações‖, o sociólogo alemão aponta
as características da comunidade científica. A primeira afirmativa de Weber
é que o cientista só consegue sucesso na carreira quando se coloca pura e
simplesmente a serviço de sua causa. Assim, ele se põe a desvelar o
interior da esfera da ciência, comparando a organização da ciência nos
Estados Unidos e na Alemanha. Mostra que as relações de poder no
interior desta esfera, em nada se diferem das relações capitalistas
existentes em outras áreas de atuação profissional.
O autor alemão valoriza a intuição dos pesquisadores neófitos e
afirma que a intuição deste pode ter um significado e resultado maior que
de um especialista. Isto não significa afirmar que Weber despreze o
método e a dedicação do pesquisador ao seu objeto de estudo, pelo
contrário, o autor afirma que ―a inspiração não substitui o trabalho, mas
este por seu turno não pode substituir nem forçar o nascimento de uma
intuição‖ (WEBER, 2009, p. 34).
Assim, o autor dês-romantiza o papel social do cientista mostrando
que na ciência a intuição tem a mesma função que qualquer outro campo
da vida sendo a sua importância, tanto quanto a intuição de um
empreendedor ou de um artista. Porém, diferente deste último, em que a
produção artística fixa-se em seu tempo, na ciência a produção é
concebida para ser ultrapassada. O sentido do conhecimento científico não
é outro do que fazer surgir novas indagações. Neste sentido a vocação
científica pressupõe paixão, rigor, e, sobretudo, aceitação da precondição
fundamental de que o conhecimento científico existe para ser superado.
Weber aceita a ideia que a pesquisa científica sempre é parcial e
provisória, pois opera uma seleção da realidade diretamente influenciada
pelo momento histórico e cultural vivido pelo cientista. Assim, na
sociologia weberiana não é possível conhecer toda a realidade e a ciência
não possui a palavra final na compreensão da realidade. Segundo Mattedi
(2006), esta afirmação não se dá apenas às ciências sociais, mas em toda
modalidade de ciência empírica (MATTEDI, 2006 p. 54).
Sobre os cientistas veteranos ou professores, Weber os compara aos
artesões, pois estes são o seu próprio patrão, possuem a liberdade de
produzirem sua própria agenda de pesquisa. São proprietários da sua
biblioteca que é seu meio de trabalho. Reconhece, porém, que as
transformações capitalistas se processavam na sociedade e então, que em
180
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
breve atingiriam também esta esfera social. Assim a atuação na ciência
depende muito mais de dedicação do que vocação profissional.
Weber chama a atenção que o sucesso na carreira passa também
pela inspiração;
Sempre que se objetiva atingir um resultado, não se pode
impunemente fazer com que o trabalho seja executado por meios
mecânicos – ainda que esse resultado seja, muitas vezes, de reduzida
significação. No entanto, se não vier ao espírito uma ‗idéia‘ precisa
que a oriente a formulação de hipótese, e se, no tempo em que nos
entregamos a nossas conjecturas, não nos ocorra uma ―idéia‖ relativa
ao alcance dos resultados parciais obtidos, não lograremos a alcançar
nem mesmo aquele mínimo (WEBER, 2006 p. 33).
Outra característica do pensamento Weberiano é a impossibilidade
de apresentar uma visão da totalidade ou uma ―cosmovisão‖, sobretudo
porque esta linha de pensamento, diferente de Comte, Durkheim e Marx,
não é normativa, pois não possui uma visão finalista do desenvolvimento
da sociedade. Dito de outra forma, a sociologia de Weber não serve de
―caminho para a felicidade‖, pois para ele, os valores supremos que dão
sentido a vida humana não são construídos ou escolhidos de forma
racional, mas movidos por convicções de superioridade (MATTEDI, 2006;
LAZARTE, 1996).
Rolando Lazarte, no livro ―Max Weber: ciência e valores‖, propõe que
interpretamos o sociólogo alemão a partir de uma perspectiva humanista e
que possibilite a interpretação da sociedade contemporânea. Sobretudo
quando em um período que segundo ele, vivenciamos uma crise
civilizacional e por consequência, uma crise na ciência que nasceu
assentada na modernidade.
O autor procura ―domesticar‖ o pensamento de Max Weber,
afirmando que para o sociólogo alemão era impossível fundamentar
qualquer norma moral, ou valor supremo. Qualquer caminho escolhido,
mesmo que seja uma escolha racional, não nos inocentaríamos como
seres de cultura.
O importante aqui é observar que toda ação humana é realizada de
forma ―racional‖, ou seja, com algum sentido, mesmo que para o
observador isso não fique aparente. Um exemplo disto é o principal tema
de estudo de Weber, a Religião. O mecanismo que a religião puritana
opera na economia, é na verdade, instrumentalizar o trabalho a fim de
conhecer a vontade positiva de Deus.
181
FONAPER
No texto ―Religião e Racionalidade Econômica‖ o autor aponta como
funciona o mecanismo operado pela fé calvinista:
Os homens eram por natureza todos igualmente pecaminosos, mas as
chances religiosas eram desiguais no mais alto grau, não só
temporariamente mas de modo definitivo [...] Mas sempre reinava
nessas diferenças a providencia e a graça injustificada e imerecida,
―livre‖ de um Deus supramundano. Por isso a crença na
predestinação, ainda que não a única, era de longe a formulação
dogmática, mas consequente dessa religiosidade de virtuosos [...] tudo
se orientava, portanto, para a livre graça de Deus e para o destino do
além, e a vida terrena era apenas um vale de lagrimas ou então
somente uma passagem. Por isso mesmo uma ênfase extraordinária
era posta sobre o esse diminuto lapso de tempo. Não porque fosse
possível conquistar a salvação eterna pelo puro desempenho próprio.
Isso era impossível. Mas porque a própria vocação para a salvação só
era concedida ao individuo e, sobretudo, só podia ser conhecida
através da consciência de uma ralação nuclear unitária dessa sua
curta vida com Deus ultramundano e sua vontade: na ―santificação‖.
Esta, por sua vez como em toda a ascese ativa, apenas podia ser
comprovada na atividade cara a Deus, portanto numa ação ética sobre
a qual repousava a benção divina, dando assim ao indivíduo a certeza
da salvação na segurança de que era instrumento de Deus. Com isso
ficava reservado o prêmio íntimo mais forte de que pudesse conceber
para uma vida moral metodicamente racional. [...] O empenho ―na obra
daquele que me mandou enquanto é dia‖ tornava-se aqui um dever, e
essa tarefa não eram de natureza ritual mas ético-racional (WEBER
1999, p. 155).
Mesmo aceitando a impossibilidade de que o conhecimento científico
é portador do conhecimento da totalidade dos fatos, Weber defende que
na prática da docência, assim como na pesquisa, a objetividade e
neutralidade devem ser buscadas. Assim, a função do professor reduz-se
a de apresentar os dados científicos a seus estudantes. O autor reprova
que o professor busque reproduzir nos estudantes suas próprias
concepções ideológicas ou políticas, afirmando que ao fazer isto, o
professor perde a compreensão real dos fatos. O papel do professor é
mostrar fatos científicos, que produzam desconforto nas opiniões dos
estudantes, encorajando-os a reflexão.
Nas palavras do autor:
A tarefa primeira de um competente professor é a de levar seus
discípulos a reconhecerem que há fatos que geram desconforto, assim
entendidos aqueles que desagradam a opinião pessoal de um
indivíduo. Positivamente existem fatos extremamente desagradáveis
para cada opinião, inclusive a minha (WEBER, 2009 p. 48).
182
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Weber afirma que o professor que possui o desejo de participar de
lutas políticas e de concepções de mundo, nas palavras do autor,
―conselheiro da juventude‖, deve fazer fora de sala de aula, em lugar
público através da imprensa, em reuniões ou associações.
Por sua vez, a visão de mundo produzida pela ciência, sobretudo na
sociologia, é de desencantamento e de desconstrução de qualquer tipo de
―significação‖. Neste sentido, Weber não crê que o conhecimento científico
em algum momento pode ser ferramenta de construção de verdades ou de
produção de felicidades. Neste ponto, afirma que, na tentativa de
diferenciar o discurso científico do religioso, apontando que as respostas
produzidas pela ciência dizem respeito apenas a questionamentos feitos
por quem o faz, mediante a sua própria especialização.
Assim, o sociólogo alemão prega que a função do professor é o de
ensinar um método de pensamento que possa servir de instrumento para a
compreensão da realidade, capacitando o estudante de compreender
diante de um problema ou valor qual prática ou opção possível e as
consequências de suas ações. Nas palavras do autor:
O professor pode mostrar apenas a necessidade da escolha, mas não
pode ir além, caso se limite a seu papel de professor e não queira
transformar-se em demagogo... os cientistas podem e – devem –
mostrar que tal ou qual posição adotada deriva, logicamente e com
toda certeza, quanto ao ―significado‖ de tal ou qual visão última e
básica do mundo. Uma tomada de posição pode derivar de uma visão
única do mundo ou de varias (WEBER, 2009, p. 52).
Assim, para Weber, o papel da ciência é o de mostrar que
dependendo da posição que adotar, a pessoa estará a serviço de um deus
e ofendendo o outro. Ou seja, a tarefa do pesquisador é compreender o
porquê das ações humanas, seu desenvolvimento e suas consequências.
Neste sentido, o texto científico não é e nem deve pretender ser uma cópia
do real, mas é a reprodução da realidade que deve ser entendida como
parcial, e provisória que irá sucumbir diante de um conhecimento novo.
183
FONAPER
Bourdieu, o sociólogo da crença e os campos
Em uma conferência apresentada no congresso da associação
francesa de sociologia da religião em 19822, o sociólogo francês
apresentou algumas observações sobre o campo da sociologia da crença,
que julgamos ser importante para utilizarmos na análise e debate do tema
em tela.
O autor francês inicia seu texto perguntando se a sociologia da
religião tal como é praticada hoje é de fato científica. A pergunta se dá pelo
fato de que segundo Bourdieu, boa parte dos pesquisadores faz parte do
mesmo campo social que pesquisam. Assim, para compreensão do
tratamento ao fenômeno religioso, neste texto e na obra de Pierre
Bourdieu, partimos da compreensão de um dos principais conceitos da sua
obra que é o conceito de campo social.
O campo social pode ser compreendido como um microcosmo no
espaço social com regras específicas. Sua atuação dá-se como um
―sistema‖ ou um ―espaço‖ estruturado de posições entre os diferentes
agentes que ocupam as diversas posições dentro dos microssomos. Estes
agentes atuam em disputas (lutas) em torno da apropriação de um capital
específico, do que por sua vez, é desigualmente distribuído dentro do
campo. Esta disputa desigual faz coexistir no seu interior duas classes de
indivíduos, os dominantes e os dominados. Será esta distribuição desigual
do capital que irá determinar as estrutura do campo.
As estratégias dos (agentes, instituições) são compreendidas a
partir de suas posições no campo. Cada agente do campo é caracterizado
por sua trajetória social, seu habitus3 e sua posição no campo. Um campo
possui uma autonomia relativa: as lutas que nele ocorrem têm uma lógica
interna, mas o seu resultado nas lutas (econômicas, sociais, políticas...)
externa ao campo, pesa fortemente sobre a questão das relações de força
internas. Por sua vez, este campo encontra-se em disputa com outros
campos constitutivos da sociedade (OLIVEIRA, 2003).
2
3
Texto publicado no Brasil com o título ―Sociólogos da crença e crença de sociólogo‖ no
livro: BOURDIEU, Pierre. Coisas ditas. São Paulo: Brasiliense, 1990. P. 108-113.
Em Bourdieu, Habitus é o produtor de ações e produto do condicionamento histórico e
social, configura um universo de classificações e possibilidades que o agente
internalizou como aprisionamento prático e mental. Embora o autor recuse a aceitar que
seja um determinismo social rígido, uma vez que aceita uma margem de manobra para
a ação do indivíduo. (PINTO, 2000)
184
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
No que se refere ao fenômeno religioso, as disputas se concentram
em um campo próprio, o campo religioso e foi analisado pelo sociólogo
francês em um texto intitulado: ―A gênese e estrutura do campo religioso‖.
Bourdieu (2005) propõe uma teoria do fenômeno religioso que engloba as
contribuições das principais correntes da teoria sociológica e procura
sistematizar a distribuição do poder, ou ocupação dos espaços dentro do
campo religioso, que para ele, divide-se entre especialistas e leigos.
No campo da sociologia da crença4 os pesquisadores se dividem em
dois grupos: os que fazem parte do campo religioso, (religiosos, ou exreligiosos que praticam ciência) e os cientistas que não fazem parte do
campo (chamados pelo autor de pesquisadores não autocnes). A diferença
dos dois grupos, segundo o autor, não será pelo fato de o pesquisador ter
fé ou não, mas pelo grau de comprometimento que este mantém com as
estruturas do campo pesquisado.
E nisto, segundo Bourdieu, reside à dificuldade de transposição, ou
rompimento, de um campo para outro. O autor problematiza se este
rompimento, não pode influenciar na produção da pesquisa:
Ele se preocupa demais, e o leigo não se deixa enganar: a raiva, a
indignação e a revolta são sinais de interesse. Por sua própria luta, ele
testemunha que continua fazendo parte dela. Esse interesse negativo,
critico, pode orientar toda a pesquisa e ser vivido como interesse
científico puro, graças à confusão entre atitude científica e a atitude
critica (de esquerda) afirmada no próprio campo religioso
(BOURDIEU, 1990 p. 109).
Porém o pesquisador, religioso, ou ex-religioso possui a vantagem de
possuir um conhecimento prático sobre o campo, característica e
vantagem que o pesquisador não-autocne possui dificuldade. Por outro
lado, este saber de detalhes, pode confundir o pesquisador religioso sobre
o que é o saber científico em relação à objetividade do seu conhecimento.
Neste sentido, o corte etimológico, consiste no corte social, das
vinculações com as estruturas do campo, que segundo ele, é uma ameaça
aos especialistas das grandes religiões universais, pois, correm o risco de
produzir uma ciência de edificação. Bourdieu chama a atenção para
raridade de pesquisa na área da ciência e da religião que sejam
produzidos cientistas que fazem parte de outra tradição religiosa, ou ate
mesmo, estudos comparativo (BOURDIEU, 1990).
4
Termo utilizado pelo autor.
185
FONAPER
Ensaiando uma (in)conclusão: desafio à prática do
educador/pesquisador em ensino religioso
A dificuldade de produção de pesquisas, que sejam produzidas por
autores de formação pessoal em outras tradições religiosas está
diretamente ligada às dificuldades e desafios da formação do docente em
Ensino Religioso. Segundo Markus e Oliveira (2010), o processo de
formação docente é herdeiro não somente do processo de
homogeneização cultural-religioso, como também, deve enfrentar o desafio
de produzir um educador/pesquisador, que possua capacidade de
compreensão, intervenção e construção de novas realidades.
Neste sentido, cremos que a sociologia weberiana possibilita ao
pesquisador o olhar para si, na tentativa de compreender e explicar os
caminhos da construção do discurso científico. Porém, é da natureza desta
corrente sociológica não pretender ser o discurso final ou a verdade sobre
a matéria, mas apenas ser a compreensão possível a partir de uma
determinada metodologia de uma determinada disciplina científica, a
sociologia.
Outra característica desta corrente é aceitar que a ciência é uma
produção cultural, que por sua vez é fruto de um determinado tempo
histórico, a modernidade e sendo assim, carrega no seu interior, valores,
características culturais e ideológicas deste tempo histórico. Pelo seu
caráter universal, a ciência e o cientista como seu operador, devem buscar
despirem-se destes valores para ser aceito e possuir legitimidade.
Porém a principal característica da contribuição de Weber para a
formação de um educador/pesquisador de Ensino Religioso é conceber
uma teoria que não seja finalista ou que seja detentora de uma
cosmovisão, ou uma ―mensagem escatológica‖, apesar de não abrir mão
de elementos históricos na análise sociológica.
Características que em nosso juízo de valor, estão na gênese da
disciplina de Ensino Religioso, que tem como um dos seus objetivos
compreender que ―o ser humano é multifacetado, e possui capacidade de
intervir, criar e recriar as suas relações e os saberes inerentes a elas‖
(FONAPER, 1997; MARKUS;OLIVEIRA).
Da mesma forma que a construção de uma prática docente esteja
comprometida com uma produção científica esta deve desafiar o
educador/pesquisador a fazer de sua prática docente um constante
exercício de pesquisa/docência. Assim, conforme Bourdieu, buscar
186
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
construir um campo de pesquisa, que rompa com práticas de catequização
e proselitismo, esteja comprometido com práticas de e em alteridades na
construção de um saber que não se reduza a uma ciência edificante, mas
conforme o autor francês, rompa com o jogo duplo.
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188
O ENSINO RELIGIOSO EM GOIÁS: O PROBLEMA DA
FORMAÇÃO DE PROFESSORES
Raimundo Márcio Mota de Castro – UEG1
José Maria Baldino – PUC/Goiás2
Resumo:
Com a promulgação da Lei nº. 9.475/97 que modificou o art. 33 da Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional, a formação (habilitação) para o professor de Ensino Religioso
tornou-se responsabilidade dos sistemas de ensino. O objetivo deste trabalho é analisar os
desdobramentos da ausência de políticas de formação de professores em Goiás. O aporte
teórico-metodológico sustenta-se em Castro (2009); Cury (1993); Dallabrida (2005); Souza
(2006) entre outros. Por meio da pesquisa narrativa, professoras/es de escolas públicas
relatam a ausência de sua formação e os dedobramentos em suas práticas educativas.
Percebe-se a prática do proselitismo religioso na escola pública o que fere o principio
básico da laicidade do estado e tem possibilitado certa aversão a esse componente
curriicular, inclusive por parte dos alunos.
Palavras-chave: Ensino religioso; Narrativas; Formação de professores.
Introdução
Com a redemocratização do Brasil na década de 1980, inicia-se
amplo debate em torno das questões educacionais. Quase 10 anos após a
promulgação da Carta Constitucional de 1988, a educação era reformada
em toda sua estrutura e organização, pela Lei nº 9.394, de 20 de dezembro
de 1996, que definiu as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. No que
se refere à formação de professores, a nova lei determinava que o
professor, para atuar na docência, mesmo da educação básica, deveria ter
formação obtida em instituições de ensino superior. Apesar de Oliveira
(2005, p. 247) atestar que, ―as discussões desenvolvidas assim como a
emissão do dispositivo legal atingiram de modo substancial o processo de
formação de docentes para todas as áreas do conhecimento na educação
1
2
Mestre em Educação. Doutorando em Educação. Professor efetivo da Universidade
Estadual de Goiás. E-mail: [email protected]
Doutor em Educação. Professor Titular de Sociologia da Pontifícia Universidade Católica
de Goiás. E-mail: [email protected]
FONAPER
brasileira‖, nada foi feito em relação à formação de professores para o
ensino religioso.
Não somente a formação dos professores para o ensino religioso,
como também a forma de se pensar essa disciplina na escola (estrutura,
conteúdo, organização etc.), demandou da sociedade civil a exigência da
alteração do art. 33 da LDB, que passou a vigorar com nova redação por
meio da Lei nº 9.475, de 22 de julho de 1997. Apesar de uma nova
configuração legal, o novo dispositivo também não apresentou solução
para inúmeras questões que permeiam essa disciplina e permanecem
abertas, tornado-se ―foco de interesse, discussão e pesquisa em âmbito
nacional; envolvendo lideranças de diferentes denominações religiosas, a
comunidade acadêmica e os sistemas de ensino, todos diretamente
atingidos pelo dispositivo legal‖ (OLIVEIRA, 2005, p. 247).
O texto apresentado é parte dos resultados da pesquisa
―FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE ENSINO RELIGIOSO: textos legais
e contextos vividos‖, desenvolvido na Universidade Estadual de Goiás,
Unidade Universitária de Itaberaí, realizada no biênio 2011-2012, e tem por
objetivo analisar a formação dos professores para o ensino religioso no
Estado de Goiás a partir do dispositivo presente na LDB de 1996, tendo
por referência o relato de professoras que atuam nessa disciplina em
diversos municípios de Estado.
Para o alcance do objetivo, privilegiou-se a pesquisa qualitativa que
possibilitou uma maior aproximação e aprofundamento do tema em
evidência. Por meio da pesquisa narrativa, coletou-se os relatos de
professoras/es que atuam em escolas públicas em municípios da região
noroeste do estado de Goiás (Itaberaí, Goiás, Itapuranga, Itauçu e
Inhumas). A escolha dos sujeitos e locais da pesquisa deu-se por três
motivações: a primeira por ser necessário compreender a complexidade
vivida na docência dessa disciplina visto que não há uma formação
específica para atuar na área; a segunda por se observar, em visitas feitas
a priori, que há uma prática, na maioria das escolas públicas dessas
cidades de uma oração (de cunho cristão) no início das atividades
escolares, situação que fere o princípio da laicidade do estado; e por fim,
por ser nessa região que se localiza a cidade de Itaberaí que sedia uma
unidade universitária da Universidade Estadual de Goiás, possuindo como
um de seus encargos a formação dos professores por meio do curso de
pedagogia.
190
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Assim, busca-se entender a prática desses docentes situando-os no
contexto da legislação educacional vigente, que preconiza o ensino
religioso como parte integrante da formação do cidadão, apresentando-o
como obrigatório na escola, mas de caráter facultativo ao aluno. Neste
sentido, o texto apresenta-se dividido em duas partes: na primeira se traça
todo o aspecto metodológico da pesquisa e em seguida, discute-se a
temática partindo de uma breve trajetória da inclusão do ensino religioso
na escola brasileira; depois, reflete-se sobre as ambiguidades legais
presentes na legislação em vigor; e por fim, analisa a fala das/os
professoras/es numa tentativa de desvelar os problemas causados no
espaço da escola pública pela ausência de formação desses professores.
A construção da pesquisa
A pesquisa nasce da necessidade de se buscar uma resposta a uma
indagação, mas a forma de atingir tal resposta, longe de possuir um
padrão único, está de certa forma condicionada a ―crença‖ do pesquisador,
ou melhor, ao entendimento teórico e metodológico apreendido no
percurso da pesquisa.
Pesquisar tem muito de desafio e aventura. É uma luta por saber e
para demonstrar o que se sabe. É sempre uma decisão árdua
desentranhar o conhecimento para, com a discrição e o equilíbrio
devidos, pô-lo em circulação e torná-lo acessível aos demais. São
esses, pelo menos esses, que devem ser, de um ponto de vista
deontológico, a meta, o destino e a finalidade: contribuir com nosso
esforço e nossa vontade perscrutadora par ampliar os limites do
conhecimento racionalizado (PERUJO SERRANO, 2011, p. 13).
Se durante muitos anos a pesquisa debruçou-se apenas sobre o
modelo positivista, que primava pela exatidão e, em muitos casos, a
dogmatização dos resultados, contempla-se nas últimas décadas inúmeros
debates sobre a permanência de outros modelos como o método histórico
dialético e o método fenomenológico. A utilização desses métodos
produziu alterações substanciais, na forma de se pensar pesquisa em
Ciências Sociais, haja vista a complexidade do homem enquanto Ser
produtor de si e de história.
Enquanto Ser, o homem busca estabelecer-se no mundo mediante a
apreensão do mesmo. Essa apreensão vai acontecendo por meio das
indagações que o ser humano faz de si e do mundo que o cerca. Nem
191
FONAPER
sempre as indagações são respondidas no todo ou no tempo em que se
destinou a buscar soluções para tal problemática. Assim também ocorre
com a pesquisa.
Inicialmente pensava-se que no prazo de um ano daríamos conta de
responder a questão norteadora dessa pesquisa, mas logo percebemos
que o primeiro ano seria apenas para efetuarmos o levantamento
bibliográfico sobre a temática, assim a pesquisa prolongou-se por dois
anos (2011-2012).
Dada a complexidade de nosso objeto, optamos por realizar uma
pesquisa de natureza qualitativa. De acordo com Lüdke; André (1986, p.
11-13), as características básicas de uma pesquisa qualitativa são:
1. A pesquisa qualitativa tem o ambiente natural com sua fonte direta
de dados e o pesquisador com seu principal instrumento. [...]
2. Os dados coletados são descritivos [...].
3. A preocupação com o processo é muito maior do que com o
produto [...].
4. O significado que as pessoas dão as coisas e à sua vida são focos
de atenção especial pelo pesquisador [...]
5. A análise dos dados tende a seguir um processo indutivo. Os
pesquisadores não se preocupam em buscar evidências que
comprovem hipóteses definidas antes do início dos estudos. As
abstrações se formam ou se consolidam basicamente a partir da
inspeção dos dados num processo de baixo para cima.
Bicudo (2011, p. 17) amplia essa caracterização afirmando que a
pesquisa qualitativa, como o nome já indica, trabalha com a qualidade.
Tendo presente a necessidade de ouvir os relatos e deste modo dar
voz aos professores/as, optou-se pela pesquisa narrativa, por entender
que se trata de uma perspectiva que permite não somente a investigação,
mas também a formação. Para esclarecer a dupla dimensão da pesquisa
narrativa, Souza (2006, p. 26) infere que essa perspectiva de trabalho,
[...] configura-se como investigação porque se vincula à produção de
conhecimentos experienciais dos sujeitos adultos em formação. Por
outro lado, é formação porque parte do princípio de que o sujeito toma
consciência de si e de suas aprendizagens experienciais quando vive,
simultaneamente, os papéis de ator e investigador da sua própria
história.
192
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Para Catani et al (1997, p. 20),
[...] o que se convencionou chamar de pesquisa narrativa, no campo
educacional, enfatiza a variedade de práticas de investigação e
formação assim agrupadas, como iniciativas que vêm se firmando no
campo desde a década de 80, principalmente na Europa, e que deve
muito às tentativas de recolocação do sujeito no centro das
interpretações das ciências humanas.
Pela pesquisa narrativa é possível compreender as experiências
vividas, lembradas pelos/as narradores/as, tornado-se forma de
comunicação e troca de experiências, haja vista que não se tem apenas
uma informação repassada do narrador ao ouvinte, mas principalmente
uma troca, onde narrador e ouvinte unem-se em uma simbiose de trocas
mutuas.
A escolha de narrativas como instrumento de coleta de dados deu-se
ao fato de que entender que as mesmas constituem-se de acordo com
Chizzotti (2003, p.17). ―testemunho oral das pessoas presentes em
eventos, suas percepções e análises‖ e isso pode ―esclarecer muitos
aspectos ignorados e indicar fatos inexplorados do problema‖. Ainda sobre
as narrativas, Bosi (1994, p. 88) afirma que ―a narração é uma forma
artesanal de comunicação. Ela não visa a transmitir o ‗em si‘ do
acontecido, ela o tece até atingir uma forma boa. Investe sobre o objeto e o
transforma‖.
As narrativas foram produzidas de próprio punho por professores da
rede municipal e estadual de ensino que ministram aulas de Ensino
Religioso, depois digitalizadas e arquivadas em mídia eletrônica. Para a
produção dos mesmas, os/as sujeitos receberam um roteiro com 4 (quatro)
itens que deveriam se fazer presente em seus relatos. Tais narrativas ao
serem escritas e digitalizadas, passaram a compor como fonte e
documento da pesquisa. A participação dos sujeitos foi voluntária, e a
utilização de suas falas foi possível graças à autorização dos mesmos
sujeitos que, por meio de termo de consentimento livre e esclarecido,
tomaram conhecimento dos objetivos da pesquisa e decidiram contribuir
com a pesquisa. Delineado o percurso da pesquisa, apresenta-se a seguir,
breve apontamentos sobre a trajetória do ensino religioso no Brasil.
193
FONAPER
Ensino religioso no Brasil: apontamentos de uma trajetória
Durante o período colonial, visto que a formação educacional no país
fora majoritariamente feita pelos jesuítas e por outros religiosos, sempre
vigorou na escola o ensino da religião. No entanto, as reformas de cunho
iluminista empreendidas por Sebastião José de Carvalho e Melo – o
Marquês de Pombal, influente ministro do rei de Portugal, Dom José I, que
possibilitou a expulsão dos padres jesuítas do Brasil em 1759 e a posterior
extinção da Companhia de Jesus em 1760, não conseguiu quebrar a ideia
de permanência da religião cristã no ensino ministrado nas escolas.
Durante o período imperial, a religião católica continuou sendo
oficialmente a fé professada pelo imperador Dom Pedro I e pela maioria da
corte, apesar do reconhecimento de que outras denominações religiosas já
tivessem se instalado nas terras brasileiras. Fato evidente ao se ler o art.
5º, do Título I, da Constituição Política do Império do Brasil. O texto
menciona: ―A Religião Catholica Apostólica Romana continuará a ser a
religião do Império. Todas as outras Religiões serão permitidas com seu
culto doméstico ou particular, em casas para isso destinadas, sem forma
alguma exterior de templo‖ (BRASIL, 1824). Mas se por um lado há o
reconhecimento de outras crenças, percebe-se fortemente a ―confirmação
e a legitimidade do poder da Igreja Católica‖ (CASTRO, 2009, p. 39).
Com a proclamação da república, em 15 de novembro de 1889,
religião e estado deixam de ser sinônimos e se inicia um processo
complexo e lento de separação entre o poder religioso e o poder temporal,
ou seja, entre a igreja e o estado. A educação deixa de ser dever apenas
da família e da Igreja, tornando-se uma das prerrogativas do estado.
Comentando esse período Castro (2009, p. 44) afirma:
Com a latente separação, a educação passa a ser de
responsabilidade do Estado, assim, surge a tendência de eliminar o
ensino da religião das escolas públicas, uma vez que este era gerador
de grande polêmica. Em 22 de fevereiro de 1890, o governo provisório
decidiu suprimir o ensino de religião dos estabelecimentos públicos do
Distrito Federal, por proposta de Benjamim Constant, então ministro
da Instrução Pública, Correios e Telégrafos, alegando que ser de
responsabilidade do Estado incentivar qualquer sentimento religioso,
bastando, para isso, no lar, a ação da mãe de família, e nos templos
de cada religião a ação do sacerdote.
Notamos que, mesmo com a decisão de suprimir o ensino de religião
da escola pública, alguns professores fiéis aos princípios da fé e dos bons
194
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
costumes permaneceram com a prática das orações ao início das aulas e
tomando ainda por base um ou outro texto da doutrina cristã para o ensino.
A Igreja não tardou em reagir. Nesse período abriram-se inúmeras escolas
católicas onde o ensino da religião era amplamente divulgado.
[...] A entrada de ordens e congregações religiosas intensificou-se
após a promulgação da Constituição de 1891, que contornou o
anticlericalismo radical dos primeiros meses do regime republicano,
permitindo maior liberdade à Igreja Católica. Os membros destas
ordens e congregações que imigravam para o Brasil vinham imbuídos
de forte ardor missionário e acreditavam que eram enviados com o
dever de ensinar a verdadeira doutrina cristã, contribuindo para
reconstruir o colonialismo cultural europeu. Algumas congregações
imigraram com o intuito de atender espiritualmente colônias de
imigrantes europeus, como os salesianos e lazaristas entre italianos;
outras visavam à catequização dos indígenas e a maioria delas atuou
na reconversão dos brasileiros à fé católica romanizada
(DALLABRIDA, 2005, p. 79).
No entanto, a primeira Constituição Republicana, de 1891, garantiu a
liberdade de culto público e com isso possibilitou que outros credos
gozassem dos mesmos privilégios que os católicos e logo essas novas
denominações também abriram escolas confessionais, possibilitando uma
abertura a novas tendências, a novas formas de pensar o ensino,
diferentemente daquele ministrado unicamente pelos cristãos católicos.
Segundo Cury (1993), a crise sócio-econômico-político ocorrida no
final dos anos de 1920, possibilitou o retorno da Igreja ao cenário nacional.
As reformas empreendidas a partir da década de 1930, entre as quais a
ascensão de Vargas ao poder, a criação do Ministério dos Negócios da
Educação e Saúde Pública, sendo empossado no cargo Francisco
Campos e a elaboração da Constituição de 1934, consolidou no campo
educacional, o retorno da Igreja para dentro da escola.
Aliada e apoiando o Governo Vargas, como guardiã da ordem e dos
bons costumes, a Igreja consegue que o ensino de religião volte para a
escola, agora, porém com um diferencial: a nomenclatura passa a
denominar-se de ensino religioso, apesar da prática continuar proselitista e
catequética. Analisando a conjuntura desse período, Cury (1993, p. 28),
infere:
E apesar da pressão dos deputados defensores da laicidade no
ensino público, a redação final ficou assim: ―Art. 153 – O ensino
religioso será de frequência facultativa e ministrado de acordo com os
195
FONAPER
princípios da confissão religiosa do aluno manifestada pelos pais ou
responsáveis e constituirá matéria dos horários nas escolas públicas
primárias, secundárias, profissionais e normais‖.
Daí em diante o ensino religioso perpassou todos os textos
constitucionais, inclusive estando presente na Constituição Federal de
1988, e posteriormente na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, sendo que esta lei
sofreu, alguns meses depois, sua primeira alteração por meio da Lei nº
9.475, de 22 de julho de 1997, justamente no dispositivo referente ao
ensino religioso.
Ambiguidades na legislação
A polêmica recorrente que envolve o ensino religioso na escola e ao
pequeno interesse pela produção de uma reflexão sistematizada por parte
da academia, tem tornado o espaço desse ensino um lugar de todos e de
qualquer um, se apresentado até mesmo de forma irresponsável quanto à
formação do cidadão. Quando os debates tem se instalado no meio
acadêmico, aparecem duas categorias que ocupam posições antagônicas
em extremos – os defensores e os contrários a esse ensino. Muitos
debates não saem disso e longe de se ter uma solução impossibilitam uma
reflexão amadurecida que proponha formação para os professores, modelo
a ser seguido e base epistemológica dessa disciplina.
A nova redação dada ao Art. 33 da LDB, pela Lei nº 9.475, de 22 de
julho de 1997, em nada contribuiu para dirimir os conflitos presentes em
torno dessa questão. Pelo contrário, tem permitido que a efetivação do que
fora pensado não se concretize devido às ambiguidades presentes na
própria redação legal. Basta uma leitura atenta de tal artigo para que as
indagações pululem a mente e instiguem a busca de respostas.
Uma primeira ambiguidade está no caput do artigo 33, da LDB, ao
mencionar que:
O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da
formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais
das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à
diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de
proselitismo (BRASIL, 1996).
196
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Como se pode observar, ao mesmo tempo em que esse ensino é
entendido como ―parte integrante da formação básica do cidadão‖ o
mesmo é de ―matrícula facultativa‖ cabendo ao aluno optar por participar
do mesmo ou não. Cabe perguntarmos de que maneira um ensino
reconhecidamente fundamental para a promoção da cidadania do sujeito
pode ser facultativo? Outro problema advém em seguida, pois se esse
ensino deve assegurar o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil,
sendo vedada qualquer forma de proselitismo, não se teria aqui um ensino
de doutrinação de um determinado credo, mas sim, um espaço para que o
aluno entendesse as diferenças que culturalmente são construídas e que
constitui os diversos credos. Reconhecer o ensino religioso como
facultativo é reconhecer a dimensão proselitista, catequética e doutrinal de
um ensino que não é capaz de educar para as diferenças, mas reproduz
modelos oriundos de práticas culturais religiosas majoritárias.
Como se já não bastasse à polêmica ambiguidade na redação do
caput do artigo, os parágrafos que o compõem prolongam tal situação.
Vejamos a redação:
§ 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a
definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as
normas para a habilitação e admissão dos professores.
§ 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas
diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos
do ensino religioso (BRASIL, 1996).
Referente ao texto do parágrafo primeiro atribui-se aos sistemas de
ensino (estadual e municipal) a responsabilidade de legislar sobre os
conteúdos e as normas para habilitação e admissão dos professores para
ministrarem tal ensino, devido à ausência de uma sistematização por parte
desses sistemas; e tendo presente que na maioria dos casos há uma
omissão na organização e definição do lugar dessa disciplina no currículo,
verifica-se que este espaço torna-se apropriação de qualquer um, pois
encontramos professores, inclusive de química, matemática e física
ministrando tal aula, simplesmente para complementar carga horária de
suas modulações.
No que diz respeito ao parágrafo segundo, quando da elaboração
dos parâmetros curriculares nacionais e tendo em vista que não havia um
para o ensino religioso, o Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso
(FONAPER) – instituição civil desvinculada de credos religiosos e formada
197
FONAPER
por diversos professores de ensino religioso; articulou-se no sentido de
enviar ao Ministério da Educação e Cultura (MEC) um parâmetro curricular
que contemplasse tal ensino. Tal documento fora rejeitado pela comissão
responsável pela elaboração dos PCNs, pois segundo parecer da relatora,
não cabia ao estado legislar sobre questões religiosas como amplamente
propagado na Constituição Federal. Ao tratar o ensino religioso como
―coisa de religião‖ e não ―tema de responsabilidade do Estado‖ (laico,
como é o Brasil) significa dizer que esse ensino serve para que as
denominações utilizem do espaço público como adendo ou complemento
de suas fronteiras catequéticas e doutrinais.
Ainda no parágrafo segundo da lei, ao dizer que ―os sistemas de
ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações
religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso‖ isso não
significa dizer que será dessas denominações à palavra final sobre o tema.
Para isso, se faz necessário que tenhamos no interior do estado, como
seus representantes, pessoas preparadas e entendidas de que ensino
religioso não é o mesmo que ensino de religião.
Posto os diversos problemas apresentados por conta de uma lei
ambígua e às vezes pela omissão das reflexões acadêmicas sobre o tema,
tem-se o espaço do ensino religioso existe na escola, tomando as mais
diversas conotações e tons que acinzentam o chão da escola, permitindo
que, em vez de formar pessoas para o entendimento do fenômeno
religioso esse ensino sirva para reproduzir modelos dogmáticos que
reforçam o preconceito e a demonização da religião das minorias.
Como o Estado até o presente momento não cumpriu o parágrafo
segundo, inúmeros livros didáticos de ensino religioso circulam no
mercado, servindo de subsídio, inclusive para o MEC, que os adquire e os
coloca no ensino público. Tais livros, no entanto, muitas vezes de autoria
de pessoas vinculadas a alguns seguimentos religiosos (na maioria cristã)
têm reforçado as ideias de preconceito e intolerância como comprovado na
pesquisa realizada, em 2010, pelo Instituto de Bioética, Direitos Humanos
e Gênero da Universidade de Brasília, sob a responsabilidade das
professoras Débora Diniz, Tatiana Lionço e Vanessa Carrião; e, publicado
pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura (UNESCO).
Toda essa problemática, longe de ser resolvida, tem seus reflexos
ampliados no espaço escolar, como veremos a seguir.
198
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
A formação de professores de ensino religioso: relatos
Como relatado anteriormente, as narrativas foram desmembradas
em unidades de significado constituindo recortes que desvelam e
descortinam uma realidade vivida, experienciada pelo narrador. Tal
realidade precisa ser descortinada e trazida à tona. Neste trabalho,
apresentaremos a unidade relativa à problemática da formação do
professor de ensino religioso.
Observando a preservação da identidade das respondentes, tendo
em vista o princípio ético da pesquisa, utilizamos a identificação das letras
do alfabeto de nossa língua, haja vista que o número de participantes é
exatamente proporcional ao número de letras que o compõe.
A primeira unidade de significado diz respeito à formação desses
professores: Vejamos os relatos:
Professora A: Como já disse minha formação é História, na área do
ensino religioso eu não tenho nenhuma formação.
Professora B: Sou licenciada em pedagogia pela Universidade
Estadual de Goiás, pós-graduada em psicopedagogia clinica [...] Com
relação ao ensino religioso eu nunca fiz nenhum curso na área, mas
ministro a disciplina há quatro anos.
Professora C: Fiz pedagogia. Antes de começar a dar aula de
ensino religioso fiz um curso em Goiânia [...] um curso de missões mesmo,
que tem tudo a ver com essa área.
Professora X: Sou geógrafa e advogada, especialista em direito
agrário [...] Na área de ensino religioso não fiz nenhum curso específico,
estudei no curso de direito a disciplina teologia que estuda as questões
pertinentes ao conhecimento da divindade, suas atribuições e relações
com os homens e o mundo que os cerca, ela, porém, toma partido a favor
de revindicações e verdade de determinada religião.
Professora V: Sou formada em matemática. Eu já trabalho ensino
religioso há bastante tempo [...]
Como se pode notar no relato das narradoras, nenhuma possui uma
formação específica para o ensino religioso, em todos os casos no
seguimento da narrativa percebe-se que as mesmas são colocadas em
199
FONAPER
sala de aula com o intuito de complementar carga horária de atividade
docente. A exceção é a professor V que apesar de ter formação em
matemática, hoje só leciona ensino religioso por ter tido um problema de
saúde e ter solicitado que gostaria de trabalhar apenas essa disciplina.
A ausência de uma formação específica influirá direto na prática
desses/as docentes em sala de aula. Em seus relatos fica patente a
utilização de um único seguimento religioso como referencial de tal ensino:
o cristão. Tal prática tem produzido proselitismo cristão uma vez que
todos/as participantes da pesquisa declaram-se cristãos católicos ou
evangélicos e na unidade de significado referente ao como trabalha a
disciplina em sala temos:
Professora V: [...] às vezes os alunos não tem conhecimento do painosso, que tem família [...] tem família que não senta, não abre a bíblia,
não discute uma palavra de Deus [...] o primeiro texto que trabalhei com
eles esse ano foi ―a família, presente de Deus‖.
Professora M: Mas eu gosto muito aprofundar dentro da palavra de
Deus que é muito importante.
Professor J: Eu sou pastor [...] trabalhar o ensino religioso é
aproximar as crianças de Deus.
Como se pode observar nas narrativas o ensino é proselitista uma
vez que o conteúdo volta-se à única possibilidade de entendimento do
sagrado (perspectiva cristã – ainda que entendamos o multifacetamento do
cristianismo). Há como se pode notar a tomada do espaço público como
prolongamento do espaço privado, e podemos atribuir tal situação a dois
motivos que se desvelam no decorrer da pesquisa: o primeiro refere-se à
ausência de formação que forme e habilite o professor a ministrar tal
conteúdo, o segundo diz respeito ao entendimento reinante que ensino
religioso é espaço de ensino de catequese doutrinal e das verdades
relativas à fé.
Considerações finais
Os desafios postos para o entendimento do ensino religioso como
disciplina presente na escola pública são inúmeros e complexos. A
discussão sobre a laicidade do estado tem sentido à medida que não
200
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
houve, dada a omissão do poder público, a formulação que um modelo que
rompesse com a catequese e a doutrina do credo que toma posse desse
espaço, transformando o público numa extensão do privado.
Nas pesquisas mencionadas nesse texto tem-se evidenciado que o
espaço escolar tem sido usurpado pela confissão religiosa de professores
despreparados para lecionarem a disciplina de ensino religioso, isso por
ausência de uma política educacional que garanta o pleno cumprimento do
que se encontra previsto no ordenamento jurídico constitucional e da Lei
de Diretrizes e Bases. No entanto, não podemos culpabilizar os
professores que tem se empenhado em atender e ministrar tal ensino, pois
ao chegarem em sala, não levam consigo nenhum preparo como vimos
nas narrativas analisadas. Fazem o que entendem ser o mais correto. E
como são resultado de um processo educativo, também, confessional
(ainda que no espaço público) replicam e reproduzem o que receberam;
fato que fica evidente, quando a professora menciona na análise anterior
diz que utiliza dos conhecimentos recebidos na disciplina de teologia,
cursada na universidade, durante sua formação.
Para longe de ser um espaço para a propagação da fé, nossos
estudos tem-nos conduzido a pensar o ensino religioso como espaço de
formação cidadã para a diversidade num país de cultura multifacetada
como o nosso. Assim, entende-se que haja lugar para o ensino religioso na
escola desde que por religioso entenda-se o fenômeno social e cultural de
todas e de cada religião, que possui seus ritos próprios, suas crenças,
seus costumes, sua cultura de re-ligação ao seu criador, ou que seja
inclusive capaz de negar tal possibilidade como é o caso dos ateus.
Temos entendido que a única possibilidade de aceitar o ensino
religioso na escola seja na perspectiva entendida por Oliveira et al (2007)
que ao falar dos objetivos desse componente infere que deve ser impresso
nesse ensino o religioso não como religação do sujeito ao transcendente,
mas como releitura do fenômeno religioso.
Diante dessas inúmeras provocações, fica o alerta para que os
programas e os diversos cursos de formação de professores possam
levantar esse debate, também despido de preconceitos, e que busquem
solicitar do poder público uma resolução sobre o tema no intuito de
amenizar o dano que tem sido produzido na vida e na formação social e
cidadã dos principais sujeitos da educação que são os alunos.
201
FONAPER
Referências
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Companhia das Letras, 1994.
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SOUZA, E.C.de (Org.). Autobiografias, História de Vida e Formação:
pesquisa e ensino. Salvador/Bahia: EDUNEB - EDIPUCRS, 2006.
202
A ABORDAGEM DA FINITUDE NO CURRÍCULO DE FORMAÇÃO
DE PROFESSORES DE ENSINO RELIGIOSO/PA:
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Rodrigo Oliveira dos Santos (UFPA)1
Resumo:
Este estudo pretende destacar, por meio da pesquisa qualitativa e do paradigma
hermenêutico-fenomenológico, algumas considerações acerca da abordagem da finitude no
currículo de formação de professores para o Ensino Religioso no Pará, haja vista que, para
esse componente curricular, a temática em torno desta se apresenta como central, a ponto
de nortear toda a sua prática educativa na Educação Básica, conforme orienta os PCNER.
A partir do diálogo metodológico com o currículo do curso de formação desses professores,
percebe-se certo distanciamento e articulação entre a área tomada para essa formação, no
caso, as Ciências da Religião, assim como a sua prática, o Ensino Religioso, implicando, de
certa forma, na formação desses professores.
Palavras-chave: Finitude. Currículo. Hermenêutica. Formação de Professores. Ensino
Religioso.
Introdução
Desde a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, a Lei nº 9.394/1996, busca-se desenvolver uma política para
Formação de Professores de Ensino Religioso (ER) no Brasil nos mesmos
moldes das demais formações para as áreas do conhecimento que
compõem o currículo da Educação Básica (EB).
O cerne da questão é política e aponta para a responsabilidade do
Ministério da Educação (MEC) que até hoje não emitiu Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Formação desses professores, muito menos
Parâmetros Curriculares Nacionais para a disciplina, deixando a critério
dos Sistemas de Ensino Básico (SEB) e Instituições de Ensino Superior
(IES) tal responsabilidade.
Os Conselhos de Educação Municipais, Estaduais e Federais que
autorizam/reconhecem essa formação no país apontam para as Ciências
1
Mestrando em Educação (PPGED/UFPA) na Linha de Pesquisa Educação: Currículo,
Epistemologia e História. Bolsista da CAPES. Líder do Grupo de Pesquisa em Educação
e Religião na Amazônia (GPERA). Bolsista da CAPES. Membro do grupo de pesquisa
em Filosofia, Ética e Educação (GPFEE/UFPA) e Hermenêutica, Antropologia e
Educação (GPHAE/UFPA). Professor de Ensino Religioso da rede estadual do Pará e
municipal de Belém. E-mail: [email protected]
FONAPER
da Religião (CR) como área do conhecimento capaz de assegurar o
caráter epistemológico e pedagógico do ER, também defendida entre
vários pesquisadores que se dedicam a referida área e sua relação com a
educação (PASSOS, 2007; SOARES, 2010, JUNQUEIRA, 2008, 2010,
2011).
Nesse contexto, destaca-se o Fórum Nacional Permanente do
Ensino Religioso (FONAPER), criado em 1995, com a finalidade de
assumir essa pasta, acabando por ficar responsável pela leitura
pedagógico-didática e metodológica do ER, congregando, formando e
apoiando os profissionais que ministram esse componente curricular em
todo território nacional.
Após a sua criação, o FONAPER logo organizou os Parâmetros
Curriculares Nacionais para o Ensino Religioso (PCNER) em 1996 e
publicados em 1997 e, posteriormente as Diretrizes Curriculares Nacionais
do Curso de Licenciatura Plena em Ciências da Religião/Ensino Religioso,
encaminhados ao MEC, por duas vezes, em 1998 e 2009 (JUNQUEIRA,
2010, 2011), mas sem nenhum avanço nessas questões fundamentais
para operacionalização da disciplina, restando a operacionalização e sua
implementação por meio dos SEB e IES, a saber, dos procedimentos para
a definição dos conteúdos, assim como as normas para a habilitação e
admissão dos professores, em conformidade com a Lei 9.475/1997 e o
Parecer CNE/CP 097/1999.
Nesse sentido, várias instituições de ensino organizaram seus cursos
para habilitação de professores de ER, desde 1996, sob as mais diferentes
concepções e aporte teórico-metodológicos, a luz da legislação
educacional, estando presentes em quase todas as regiões do país.
A trajetória de implantação, organização e funcionamento desses
cursos de graduação é um percurso motivador que nos surpreende a cada
parada, seja esta no âmbito das instituições privadas, públicas municipais,
estaduais e federais, são objetos de conhecimentos e análises de vários
pesquisadores da área, com destaque para OLIVEIRA (2003), CARON
(2007), PASSOS (2007), JUNQUEIRA (2010, 2011) e SOARES (2010).
O currículo de formação de professores de ensino religioso no
contexto brasileiro: pós-graduação e graduação
As Ciências da Religião, nomenclatura mais utilizada para nomear a
área de conhecimento adotada para a formação de professores de ER no
204
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
país, localiza-se na Grande Área Ciências Humanas – Área Teologia –
Subárea Filosofia/Teologia, segundo tabela de áreas do conhecimento da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)
e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(CNPq).
Atualmente, existem com recomendação e/ou reconhecimento da
CAPES vários programas de pós-graduação em Ciência da Religião,
Ciências da Religião ou ainda Ciências das Religiões e Teologia, sendo
esses presentes em todas as regiões do país (Ciências da Religião), como
discriminados na tabela abaixo:
Tabela 01: Relação de cursos Recomendados e Reconhecidos de Ciência da Religião,
Ciências da Religião ou Ciências das Religiões e Teologia constante na web página
2
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) .
Ord.
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
Grande Área: Ciências Humanas
Área: Teologia
Nomenclatura/
Programa
IES
Programas
Ciência da Religião
Ciência da Religião: 01
UFJF
Ciências da Religião
PUC/GO
Ciências da Religião
PUC/MG
Ciências da Religião
UEPA
Ciências da Religião
Ciências da Religião: 07
UNICAP
Ciências da Religião
PUC/SP
Ciências da Religião
UMESP
Ciências da Religião
UPM
Ciências das Religiões Ciências das Religiões: 02
FUV
Ciências das Religiões
UFPB
Teologia
FAJE
Teologia
PUC/PR
Teologia
FTBP
Teologia
PUC/RJ
Teologia: 08
Teologia
PUC/RS
Teologia
EST
Teologia
EST
Teologia
PUC/SP
UF
MG
GO
MG
PA
PE
SP
SP
SP
ES
PB
MG
PR
PR
RJ
RS
RS
RS
SP
M
5
4
3
3
3
5
5
3
3
6
3
3
5
4
6
3
NOTA
D
F
5
4
5
5
3
6
5
6
-
4
-
Legenda:
M (mestrado acadêmico);
D (doutorado acadêmico);
F (mestrado profissional).
Considerando os dados tabulados acima, percebemos que, três dos
programas em CR estão presentes em instituições públicas (mestrado:
2
Disponível em:
<http://conteudoweb.capes.gov.br/conteudoweb/ProjetoRelacaoCursosServlet?acao=pe
squisarIes&codigoArea=71000003&descricaoArea=CI%CANCIAS+HUMANAS+&descric
aoAreaConhecimento=TEOLOGIA&descricaoAreaAvaliacao=FILOSOFIA%2FTEOLOGI
A%3ASUBCOMISS%C3O+TEOLOGIA, acesso em 30/05/2013.
205
FONAPER
Universidade do Estado do Pará (UEPA) – Ciências da Religião; mestrado:
Universidade Federal da Paraíba (UFPB) – Ciências das Religiões;
mestrado e doutorado: Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) –
Ciência da Religião) e seis confessionais, sendo quatro católicas
(mestrado: Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC/GO) – Ciências
da Religião; mestrado: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
(PUC/MG) – Ciências da Religião; mestrado: Universidade Católica de
Pernambuco (UNICAP) – Ciências da Religião; mestrado e doutorado:
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) – Ciências da
Religião), uma metodista (mestrado e doutorado: Universidade Metodista
de São Paulo (UMESP) – Ciências da Religião) e duas presbiteriana
(mestrado: Universidade Mackenzie (UPM); mestrado profissional:
Faculdade Unida de Vitória (FUV) – Ciências das Religiões).
Dos dez cursos apresentados e/ou recomendados pela CAPES, a
maioria não apresenta em suas áreas de concentração ocupação com o
ER, muito menos com a formação desses professores a partir das CR, a
não ser no programa da PUC/SP que, na área Fundamentos das Ciências
da Religião, possui a linha de pesquisa Fundamentos do ER, como consta
no site do programa3:
Busca-se recolher diferentes experiências de Ensino Religioso, em
nível de primeiro e segundo grau, em vários estados brasileiros.
Aplicam-se recortes históricos e geográficos para a configuração das
propostas aí contidas, que são confrontadas com teorias consagradas
na ciência da religião, assim como estudos no campo de ensino em
vários países. Objetiva-se prestar uma contribuição a um tema atual
no campo educacional brasileiro, especialmente na escola pública,
oferecendo reflexos de fundo que possam subsidiar práticas
específicas, de profissionais diretamente vinculados a esta atividade.
Outro programa que merece destaque, embora com singularidades,
é o Programa de Pós-Graduação em Teologia, com mestrado e doutorado
acadêmico da Escola Superior de Teologia (EST/RS), das Faculdades
EST, que possui, entre as suas áreas de concentrações, a área Religião e
Educação, sendo nesta uma das linhas de pesquisa Fenômeno Religioso e
Práxis Educativa na América Latina, como consta no site do programa4:
3
4
Disponível em: http://pos.pucsp.br/cienciasreligiao, acesso em 20/06/2012.
Disponível em: http://www.est.edu.br/pos-graduacao/, acesso em 20/06/2012.
206
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Área de Concentração: Religião e Educação
A área desenvolve a pesquisa interdisciplinar sobre a relação entre
religião e educação no contexto latino-americano com ênfase na
formação continuada de educadores e na formação de pesquisadores.
Focaliza a relação entre as diferentes manifestações do fenômeno
religioso e a práxis educativa escolar, eclesial e dos movimentos
sociais.
Linha de Pesquisa
Fenômeno Religioso e Práxis Educativa na América Latina
Nesta linha realizam-se pesquisas sobre a relação entre o fenômeno
religioso e a educação em suas múltiplas formas e interfaces,
compreendendo a análise das políticas, processos e práticas
educativas, num enfoque interdisciplinar, na perspectiva da Teologia e
da Educação com atenção para a práxis educativa das denominações
religiosas, das instituições escolares e dos movimentos sociais na
América Latina.
Esses programas têm contribuído com o ER em diversos aspectos,
principalmente nos últimos citados, com a produção de pesquisas
essências no campo epistemológico e pedagógico da disciplina e na
formação desses professores, mais que ainda são escassos, diante da
necessidade, adequação e defesa como área referencial para esse
componente curricular.
Dos programas em Ciência da Religião, Ciências da Religião ou
Ciências das Religiões listadas, apenas três deles convivem com a
graduação: os da UEPA, UFPB e UFJF, ampliando, dessa forma, a
integração e a área que forma e a sua aplicação na EB.
Nesse sentido, a formação de professores para o ER vai se
constituindo em quase todas as regiões do país, a partir do modelo teóricometodológico e pedagógico das Ciências da Religião, no espaço
acadêmico-científico, em paridade com as demais áreas do conhecimento,
ampliando e conquistando seu espaço, seja na pós-graduação ou na
graduação, como abaixo especificado, listamos os cursos de graduação,
nos graus de licenciados, bacharelados; na modalidade presencial ou à
distância; com os cursos ativos ou extintos, assim como as três
nomenclaturas possíveis, enfatizando a perspectiva da singularidade e
multiplicidade desse campo de estudos que vem se configurando no Brasil
a partir da década de 70, do século passado.
207
FONAPER
Tabela 02: Cursos de graduação em Ciência da Religião ou Ciências da Religião ou
5
Ciências das Religiões que constam no site do MEC em 2013
Ord.
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
Curso
Ciências
da Religião
Instituição
UFS
UEPA
USJ
UERN
UEL
FURB
UNOESC
UNIMONTES
UNISUL
UNOCHAPECÓ
UNEC
UEMA
IESPES
IESMA
FSB/RJ
CEUCLAR
Ciência da
Religião
UFJF
Ciências das
Religiões
UFPB
Grau
Modalidade
Situação
Total
Licenciatura
Presencial
Ativo
11
Licenciatura
Distância
Extinto
Ativo
01
01
Bacharelado
Presencial
Ativo
Distância
Licenciatura
Bacharelado
Licenciatura
Bacharelado
03
01
Presencial
Ativo
02
Presencial
Ativo
02
Fonte: MEC: disponível em: http://emec.mec.gov.br/, acesso em 15/02/2013.
Como podemos observar na tabela acima, dos vinte cursos listados
no site do MEC, dezoito estão ativos e presentes em todas as regiões do
país (dois no norte, seis no nordeste, quatro no sudeste, seis no sul), onde
treze são licenciaturas, sendo um extinto (UNEC), logo onze são
presenciais e um a distância; e seis bacharelados onde, um deles está
com suas atividades encerradas (CEUCLAR), apesar de ter sido o primeiro
curso de bacharelado a ser reconhecido no país.
Entre os dezoito cursos em atividades, onze estão em instituições
públicas (cinco federais, cinco estaduais e uma municipal) e o restante em
instituições privadas.
Esses dados disponíveis no site do MEC demonstram que, em quase
todas as regiões do país a formação docente para o ER já é uma realidade
que vem ocorrendo desde a segunda metade da década de 90, sendo
5
Dados disponíveis no e-MEC que informa as Instituições de Ensino Superior e Cursos
Cadastrados no país. O e-MEC foi criado para fazer a tramitação eletrônica dos
processos de regulamentação. Pela internet, as instituições de educação superior fazem
o credenciamento e o recredenciamento, buscam autorização, reconhecimento e
renovação de reconhecimento de cursos. Em funcionamento desde janeiro de 2007, o
sistema permite a abertura e o acompanhamento dos processos pelas instituições de
forma simplificada e transparente.
208
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
predominante, segundo a tabela, a nomenclatura Ciências da Religião,
defendido como área do conhecimento referencial para formação de
professores de ER, e a sua aplicação didática, os conteúdos ministrados
nesse componente curricular (PASSOS, 2007; SOARES, 2010).
Nesse sentido,
As Ciências da Religião podem oferecer base teórica e metodológica
para a abordagem da dimensão religiosa em seus diversos aspectos e
manifestações, articulando-a de forma integrada com a discussão
sobre a educação. A educação geral, fundada em conhecimentos
científicos e em valores, assume o preceito religioso como um
elemento comum às demais áreas que fazem parte do currículo e
como um dado histórico-cultural fundamental para as finalidades
éticas inerentes à ação educacional. Portanto, nesse modelo não se
afirma o ensino da religião como uma atividade cientificamente neutra,
mas com clara intencionalidade educativa, postula-se a importância do
conhecimento da religião para a vida ética e social do educandos [...].
Nesse sentido, trata-se de uma visão transreligiosa que pode
sintonizar-se com a visão epistemológica atual, sendo que busca
superar a fragmentação do conhecimento posta pelas diversas
ciências com suas especializações e alcançar horizontes de visão
mais amplos sobre o ser humano. (PASSOS, 2007, p. 65-66).
Considerando os pressupostos teórico-metodológicos e legais
apresentados, percebemos o quanto as Ciências da Religião tem muito a
contribuir para leitura e decodificação do fenômeno religioso na sociedade
brasileira e na escola em atendimento aos pressupostos do Estado laico
com a formação educacional e humana do cidadão.
O lugar da finitude no currículo e no ensino religioso
Dando continuidade a discussão e apontando para os aspectos
pertinentes a legislação educacional que se restringe a formação cidadã e
o mundo do trabalho, destaca-se o ER, no currículo da escola da EB como
espaço de diálogo e interseção entre Educação e Tanatologia.
Segundo a legislação educacional, o ER está assegurado no art.
210, § 1°, da Constituição Federal (1988) e na LDB/1996, no art. 33,
alterado pela Lei nº 9.475/1997, como parte integrante da formação básica
do cidadão, constituindo-se disciplina dos horários normais das escolas
públicas de ensino fundamental, sendo assegurado o respeito à
diversidade cultural religiosa do país e vedadas quaisquer formas de
proselitismo.
209
FONAPER
O ER assume a compreensão de área do conhecimento, de acordo
com as Diretrizes Nacionais para o Ensino Fundamental (RESOLUÇÃO
CNE/CEB Nº 02/1998).
De acordo com as Diretrizes Nacionais para Educação Básica, esse
componente curricular integra à base nacional comum, segundo o art. 14
da Resolução CNE/CEB nº 04/2010, assegurando, nesses termos já
citados, o currículo para a formação comum.
Embora exista diversos dispositivos legais que assegurem seu
espaço no currículo e sua natureza pedagógica, esse componente
curricular tem ainda sido alvo de polêmicas:
Estamos diante de um tema polêmico. Não por acaso, esta foi a
primeira emenda à LDB. A república Federativa do Brasil é laica,
significa dizer que, de um lado, inexiste religião oficial face a
separação total entre Estado e Igreja; de outro, não pode haver
relações de dependência, ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a
colaboração de interesse público. É preciso compreender que a
previsão constitucional de algumas vedações dirigidas aos entes
federativos objetiva garantir o equilíbrio federativo, a harmonia e a
coesão sociais e, evidentemente, no caso da opção religiosa, o
respeito à escolha de cada um.
Mas é preciso compreender, também que, ao ser formalmente
constituído como uma federação leiga, o Brasil não é um Estado ateu.
Tanto é assim que, no preâmbulo da Constituição, os representantes
do povo brasileiro proclamam: ―[...] promulgamos, sob a proteção de
Deus, a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil‖
(CARNEIRO, 2011, p. 39).
A não compreensão do ER como área de conhecimento e como
componente curricular é assistida por muitas questões de natureza
pedagógica, epistemológica e política, envolvendo diretamente o Estado e
os SEB e IES na regulamentação dos procedimentos para a definição dos
conteúdos e estabelecimento das normas para habilitação e admissão dos
professores, uma vez que as igrejas saem de cena, como segue abaixo:
De fato, desde a nova LDB, o Ministério da Educação não conseguiu
implantar uma política de ER que superasse a clássica questão da
separação Igreja-Estado, o que significou não conseguir sustentar
uma proposta consistente desse ensino: do ponto de vista
antropológico, como uma dimensão humana a ser educada; do ponto
de vista epistemológico, como uma área de conhecimento com
estatuto próprio, conforme indica a Resolução n. 2/98, da Câmara da
Educação Básica; e, do ponto de vista político, como uma tarefa
210
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
primordial dos sistemas de ensino e não das confissões religiosas
(PASSOS, 2007, p.14).
Essa responsabilidade, até então deixada de lado pelo MEC, mesmo
estando prevista na legislação educacional, implicou na organização do
Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso (FONAPER), em 1995,
congregando pesquisadores desse componente curricular que
posteriormente se debruçaram na elaboração dos Parâmetros Curriculares
Nacionais para o Ensino Religioso (PCNER), em 1996, haja vista que na
elaboração/publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) pelo
MEC, o ER não foi contemplado.
Para o MEC, os PCN publicados por ele representam
O conjunto das proposições aqui expressas responde à necessidade
de referenciais a partir dos quais o sistema educacional do País se
organize, a fim de garantir que, respeitadas as diversidades culturais,
regionais, étnicas, religiosas e políticas que atravessam uma
sociedade múltipla, estratificada e complexa, a educação possa atuar,
decisivamente, no processo de construção da cidadania, tendo como
meta o ideal de uma crescente igualdade de direitos entre os
cidadãos, baseado nos princípios democráticos. Essa igualdade
implica necessariamente o acesso à totalidade dos bens públicos,
entre os quais o conjunto dos conhecimentos socialmente relevantes.
(PCN, 1997, p. 13).
Nesses termos, os PCNER (2009) têm sido até então, o principal
documento na orientação acadêmico-científica do ER e da sua prática
educativa no país, respaldado no modelo das Ciências da Religião, mesmo
que esse modelo não seja o mais praticado, coexistindo com outros, que a
nosso ver, contrariam os pressupostos da legislação educacional.
É por meio da orientação desse documento que fazemos a leitura
pedagógico-didática e metodológica do ER, e que por onde podemos
estabelecer relações diretas com a Tanatologia6, pois,
O Ensino Religioso, valorizando o pluralismo e a diversidade cultural
presente na sociedade brasileira, facilita a compreensão das formas
que exprimem o Transcendente na superação da finitude humana e
6
A Tanatologia poderia ser definida como a ciência que estuda a morte e o processo de
morrer em todos os seus aspectos: forense, antropológico, social, psicológico, biológico,
educacional, filosófico, religioso e estético. Seu nome deriva do no nome do deus grego
Tânatos. Na mitologia grega, Tânatos era irmão de Hipnos, o Sono e filho de Nix, a
Noite e Érebro, as trevas. Era representado como uma nuvem prateada ou um homem
de olhos e cabelos prateados (SANTOS, 2009, p. 292).
211
FONAPER
que determinam, subjacentemente, o processo histórico da
humanidade. Por isso necessita:

proporcionar o conhecimento dos elementos básicos que
compõem o fenômeno religioso, a partir das experiências religiosas
percebidas, o contexto do educando;

subsidiar o educando na formulação do questionamento
existencial, em profundidade, para dar sua resposta devidamente
informado;

analisar o papel das tradições religiosas em estruturação e
manutenção
das
diferentes
culturas
e
manifestações
socioculturais;

facilitar a compreensão do significado das afirmações e verdades
de fé das tradições religiosas;

refletir o sentido da atitude moral, como consequência do
fenômeno religioso e expressão da consciência e da resposta
pessoal e comunitária do ser humano;

possibilitar esclarecimentos sobre o direito à diferença na
construção de estruturas religiosas que tem na liberdade o seu
valor inalienável (PCNER, 2009, p 46-47).
Ao propor a leitura e decodificação do fenômeno religioso como uma
construção sociocultural, apontando para o estudo do sagrado
transcendente/imanente na superação da finitude humana e na busca do
sentido existencial, reconhecemos nossa individualidade e nossa
dificuldade em nos compreender como sujeitos do conhecimento que
estamos sempre a nos perguntar: Quem sou? De onde vim? Para onde
vou?
Essas questões não eliminam e nem colocam determinados
conhecimentos sobre outros, uma vez que todos os conhecimentos são
produções humanas que buscam fundamentar, (re)significar e melhorar
nossas condições, logo todos precisam estar disponíveis e isso não exclui
o conhecimento religioso.
Essa compreensão não consiste mais na codificação desse
conhecimento (conhecimento adquirido como produto por meio de
doutrinas, leis, ensinamentos, ritos, história etc.), algo próprio das tradições
culturais religiosas e já superado na legislação educacional, mas o
educando é desafiado a (re)leitura, ou seja, a decodificação (interpretar,
analisar, entender como, por que, para que em que se deu esta
codificação) do fenômeno religioso na diversidade cultural religiosa da
sociedade, tendo em vista a compreensão da finitude humana, na
formulação do questionamento existencial, em profundidade.
Esse questionamento vem sendo trabalhado de diversas formas nos
diferentes tempos e espaços, unificando-se a vida coletiva e prática, em
212
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
sua orientação frente a essa dimensão do ser, como podemos observar
nos critérios para organização e seleção dos conteúdos e seus
pressupostos didáticos de caracterização geral do ER:
Hoje, o fenômeno religioso é a busca do Ser frente à ameaça do Não
Ser. Basicamente, a humanidade ensaiou quatro respostas possíveis
como norteadoras do sentido da vida além da morte:

a Ressurreição;

a Reencarnação;

o Ancestral;

o Nada.
Cada uma dessas respostas organiza-se num sistema de pensamento
próprio, obedecendo uma estrutura comum. E é desta estrutura
comum que são retirados os critérios para organização e seleção dos
conteúdos e objetivos do Ensino Religioso. Assim, na pluralidade da
Escola brasileira esses critérios para os blocos de conteúdos são:
Culturas e Tradições Religiosas;
Escrituras Sagradas;
Teologias;
Ritos;
Ethos (PCNER, 2009, p. 49-50).
A busca do ser frente à ameaça do não ser evidencia o
conhecimento de que o ser humano tem acerca da sua finitude, ou seja,
que ele é um ser-para-a-morte, tão presente na codificação do
conhecimento racional e inerente ao conhecimento religioso.
Esse conhecimento, inerente ao ser humano, desde sempre, é
marcado pelo mistério, fazendo com que este recorresse, na maioria das
vezes, a Transcendência, não muito diferente dos dias atuais, embora o
tratamento dado a finitude a partir do final do século XIX seja outro.
Nesses termos, a humanidade vem ensaiando diversas respostas,
sendo as mais recorrentes a ressurreição, a reencarnação e a
ancestralidade. Sendo que, essas concepções defendem a continuidade
da vida, dotando-a de sentido e significação variados, na busca da tão
sonhada felicidade.
A concepção do nada, ou seja, da morte física como cessação da
existência que atribuí à vida, na maioria das vezes, a sua dimensão
imanente e material, tem sido objeto de estudo do fazer filosófico e de
certa forma, o científico, há mais de dois milênios, mesmo coexistindo
divergência entre alguns filósofos que se atém a transcendência. Essa
concepção passa a ser bem mais difundida a partir do século XVIII até os
dias atuais.
213
FONAPER
Nesses termos, cada uma dessas respostas, segundo os PCNER,
organiza-se num sistema de pensamento próprio, obedecendo a uma
estrutura comum, de onde são retirados os critérios para organização,
seleção dos conteúdos e objetivos do ER, outrora já citados, na
diversidade cultural religiosa da sociedade e escola, em cinco eixos
temáticos: cultura e tradições religiosas, escrituras sagradas escritas e
orais, teologias, ritos e ethos.
O curso da UEPA/PA e a finitude
Dentre os cursos de formação específica para o ER no Brasil, para
atender os anos finais do ensino fundamental e médio, conforme o art. 33,
§ 1º (Lei 9.475/1997) e o art. 62 da LDBEN/1996, o Projeto Político do
Curso de Licenciatura Plena em Ciências da Religião (PPCLPCR) da
Universidade do Estado do Pará (UEPA) foi o primeiro a ocupar o espaço
de uma (IES) pública.
Esse processo teve sua origem no curso livre de Educação Religiosa
(PALHETA, 2007; NASCIMENTO, 2009), ministrado pela Arquidiocese de
Belém em parceria com a Universidade do Federal do Pará (UFPA) entre
as décadas de 80 e 90 do século passado, sendo o curso reconhecido
pelas Resoluções nº 1.351/1986, 1.954/1991 e 2.127/1993 do Conselho
Superior de Ensino e Pesquisa (CONSEP), da UFPA.
A base metodológica do curso livre de Educação Religiosa
encontrava na proposta da interconfessionalidade os pressupostos para
seu desenvolvimento no espaço escolar, conforme a Lei nº 5.692/1971.
O PPCLPCR/UEPA foi criado pela Resolução nº 361/1999, do
Conselho Universitário (CONSUN/UEPA), tendo seu funcionamento
autorizado pelo Parecer nº 372/2001 e a Resolução nº 403/2001, do
Conselho Estadual de Educação do Pará (CEE/PA), de acordo o
PPCLPCR/UEPA (2003).
As atividades do referido curso iniciaram em 2000, na modalidade
regular anual e atualmente conta com mais seis turmas do Plano Nacional
de Formação de Professores da Educação Básica (PARFOR) em
atividade.
Diante do exposto, e da documentação analisada, pudemos perceber
a evolução na mudança de paradigma e na concepção para a formação
214
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
desses professores que vai se constituindo no país, assim como do próprio
ER, uma vez que isso não exclui o Pará.
Dessa forma, o estudo da religião, bem mais coerente do que seu
ensino nas escolas, nas suas mais diversas manifestações, experiências e
complexidade tem sido algo localizado no PPCLPCR/UEPA, a partir dos
aportes teórico-metodológicos das Ciências da Religião, traduzidos para
sua aplicação na EB.
Esse aspecto, no que consiste a tradução para sua aplicação na
escola, tem sido algo que vem nos chamando atenção e aponta para uma
problemática pertinente a toda e qualquer formação profissional, em nosso
caso, a formação de professores.
O estudo das diversas ciências e as suas aplicações nas escolas,
tem posto em evidência a preocupação de caráter pedagógico-didático e
metodológico na efetivação das aprendizagens, uma espécie de
adaptação/tradução para se tornar acessível aos alunos e aos seus limites
cognitivos.
Com os estudos da religião, traduzidos para o ER, não tem sido
diferente e o que temos percebido, a partir da análise do PPCLPCR/UEPA,
evidencia certo distanciamento e articulação na sua organização curricular
para o ER, refletindo na integração entre as disciplinas específicas e
pedagógicas, assim como uma reflexão mais apurada do seu caráter
nuclear assentado na finitude, de onde se pensa a sua organização e
desenvolvimento no currículo da escola.
Mas essas reflexões, embora sejam iniciais, nos fazem pensar na
maior proximidade que deveria ocorrer entre as IES e a EB, algo também
que deveria ser pensado no momento de organização dos currículos dos
cursos de formação de professores.
A finitude humana, segundo os PCNER (2009), pode ser algo que
aponte para a reflexão da nossa própria morte e morrer, a partir do
momento em que localizamos nas diversas culturas e tradições religiosas
vários elementos que as compõem, como os mitos, ritos, valores, textos
escritos e orais que, às vezes, remetem-nos a continuidade da vida,
apontando limites, maneiras de ser e fazer no cosmo; assim são ensaiadas
as respostas elaboradas pela humanidade: ressurreição, reencarnação e a
ancestralidade.
Também, nos abre espaço para reflexão de que a morte delimita
nossa finitude, como a perspectiva do nada, permitindo outras analíticas
215
FONAPER
existenciais, advindas da perspectiva filosófico-científica, como nesse
caso, na maioria das vezes.
Para encerrar, sabemos que na organização do PPCLPCR/UEPA,
não somente, vários fatores estão envolvidos e que neste texto e em
outros não teremos como encerrar. Por isso, trata-se de considerações
iniciais, apreendidas in loco, assim como da análise do referido
documento.
Considerações finais
A morte, o morrer e a finitude, nesses termos, é algo nuclear e
pertinente para a organização e seleção dos conteúdos e objetivos do ER,
como previsto nos PCNER (2009).
Nessa perspectiva, a partir do estudo da religião, na diversidade
cultural religiosa do país e nas respostas elaboradas pela humanidade, o
ER pode ―[...] subsidiar o educando na formulação do questionamento
existencial, em profundidade, para dar sua resposta, devidamente
informado‖ (PCNER, 2009, p. 47).
Esse compromisso desenvolve-se na sua prática pedagógicodidática, a partir dos pressupostos traduzidos das Ciências da Religião
para o ER, para a formação humana do cidadão, de forma integral e
solidária.
Nesse processo, devem-se abordar todas as respostas possíveis, no
que se refere aos conhecimentos socioculturais e filosófico-científicos,
construídos nos variados tempos e espaços, onde nem sempre a
interdição da reflexão e discussão da nossa mortalidade fosse uma
constante.
Nesse sentido, o ER é um componente curricular que situa numa
perspectiva de uma educação para vida e para a morte, quando se
assenta na perspectiva da finitude humana.
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219
A IMPORTÂNCIA DO PROFISSIONAL HABILITADO EM
CIÊNCIAS DA RELIGIÃO PARA ATUAR COMO DOCENTE DO
ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO BÁSICA
Ediana Maria Mascarello Finatto
Leonel Piovezana**
Resumo
Este trabalho busca caracterizar e questionar a realidade do ensino mediante as novas
discussões que emergem na sociedade. Procura demonstrar a importância do profissional
habilitado em Ciências da Religião para atuar como docente do Ensino Religioso na
Educação Básica. A formação de profissionais em Ciências da Religião, com estudos da
implantação desse curso no estado de Santa Catarina e mais especificamente no oeste
catarinense, tem possibilitado discussões e alternativas metodológicas e pedagógicas que
incluem todas as pessoas no processo ensino-aprendizagem, gerando mais inclusão e
humanização. Contribui-se assim para a introdução de novos paradigmas nos debates
relacionados a essa área do conhecimento e a superação de teorias padronizadas e ou
teologia específica.
Palavras-chave: Ensino; Ciência; Religião.
Introdução
Como habitantes do planeta Terra, acompanhamos nessa primeira e
segunda décadas do século XXI mudanças rápidas, principalmente no
campo econômico, e consequentemente no social. Essas mudanças
implicam transformações, atitudes e posições; acreditamos que seja o
conhecimento o carro-chefe para filtrar o que é bom ou pode ser bom para
as pessoas. Nesse vai e vem de mudanças e discussões, contempla-se

**
Mestranda em Educação pela Universidade Comunitária da Região de Chapecó –
Unochapecó (SC). Graduada em História pela Universidade Comunitária da Região de
Chapecó – Unochapecó (SC). Acadêmica do sétimo período do Curso de Ciências da
Religião da Universidade Comunitária da Região de Chapecó – Unochapecó (SC),
Professora de Teoria e Metodologia de História III na Unochapecó e professora efetiva
da rede estadual de Santa Catarina. E-mail: [email protected]
Doutor em Desenvolvimento Regional – Área Interdisciplinar – pela UNISC.
Coordenador dos cursos de Ciências da Religião e das Licenciaturas Interculturais
Indígena e Professor dos Programas de Mestrado em Educação e Políticas Sociais e
Dinâmicas Regionais da Unochapecó. E-mail: [email protected]
FONAPER
em âmbito escolar e social uma ebulição de ideias, que trazem no seu bojo
o desejo de problematizar e/ou desconstruir visões dominantes. Essa
desconstrução vem atrelada aos desafios que a sociedade impõe:
convivência entre diferentes grupos étnicos em um mesmo espaço,
presença de diversos grupos religiosos em uma mesma localidade e
encontro das diferenças no espaço escolar.
Nesse terreno de desafios, faz-se necessário estarmos receptivos às
reivindicações feitas pelos diversos grupos étnicos; cabe também
buscarmos constantemente conhecimentos que possibilitem ampliar novas
discussões. Essas reivindicações que no iniciar do século XXI ganham
corpo têm o intuito de favorecer novas reflexões, as quais consolidam
discussões que até o findar do século XX não se fizeram tão presentes,
principalmente na comunidade escolar.
Nas representações desses grupos, percebe-se que o interesse está
na reformulação de valores instituídos, que durante muitos anos
naturalizaram-se como verdadeiros. Diante deste cenário, intensifica-se o
desejo de oportunizar aos diversos grupos étnicos reflexões significativas,
as quais propiciem a deslegitimação de paradigmas hegemônicos
enraizados na mente das pessoas.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) é um elemento
de grande visibilidade no amparo às emergências desses movimentos, que
buscam constantemente introduzir nas discussões marcas identitárias
como meio de viabilizar a convivência de diferentes elementos culturais.
No conjunto de artigos que compõem a Declaração Universal dos
Direitos Humanos, encontramos, no artigo I, princípios que garantem uma
convivência pautada no respeito à diversidade, justamente o que os grupos
minoritários reivindicam para assegurar sua identidade e sobrevivência.
―Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São
dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras
com espírito de fraternidade.‖ (UNESCO, 2008, p. 202). Por essa razão, é
imprescindível suscitar nos indivíduos um olhar aguçado para as
especificidades no tratamento aos mais diversos grupos sociais, o que
perpassa os valores culturais. Esses valores, quando incorporados,
fornecem subsídios que possibilitam um reconhecimento da identidade e
da alteridade, elementos presentes em cada grupo étnico, que propiciam a
identificação do outro como contribuinte das relações sociais.
222
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Esses movimentos se mesclam na intencionalidade de ampliar os
espaços de debates e introduzir uma visão que contribua para uma nova
estruturação do conhecimento, que seja capaz de reconhecer o diferente e
permitir a adesão às constantes transformações sociais e culturais, em que
a coexistência se intensifique e garanta novos sentidos ao viver.
O que se propaga na educação, principalmente no ambiente escolar,
na grande maioria das vezes, é a reprodução de conhecimentos já
elaborados. Esta reprodução torna-se evidente quando, nas metodologias
teórico-pedagógicas, contemplamos uma fragmentação de determinados
temas e a imposição de padrões homogeneizantes que ao longo da
história da educação legitimaram-se como meios de atingir os objetivos
traçados para o desenvolvimento social e do ensino.
Envolvendo essa linha de raciocínio, salienta-se como exemplo de
conhecimento instituído por interesses a teoria geocêntrica, segundo a
qual se acreditava que a Terra era o centro do universo. Transmitiu-se e
defendeu-se essa teoria por muitos séculos.
Porém, quando Galileu Galilei, através de estudos realizados
anteriormente e ampliados por ele, contestou essa teoria afirmando que
não era a Terra o centro do universo, mas sim o Sol, muitos se revoltaram
contra o seu discurso e passaram a persegui-lo – isto, porque essa nova
teoria estabelecia um rompimento entre o pensamento dogmático religioso
e o pensamento científico, o que se evidencia nas palavras de Lopes
(2010, p. 49): ―A teologia cristã estava intrinsecamente ligada à concepção
de universo fechado, estático, geocêntrico, ao modelo aristotélicoptolomaico‖.
Devido à formulação de uma nova teoria, a qual viria a desestruturar
um conhecimento instituído pela igreja, Galileu Galilei foi condenado pela
inquisição. Apesar de todo o constrangimento, ele manteve-se firme em
seu discurso, e neste iniciar do século XXI o que vigora como teoria é de
fato aquilo que, com ousadia, ele defendeu.
A implementação de um novo modelo considerava a superação de
uma teoria basicamente religiosa, transmitida como verdadeira durante
muitos séculos, por outra que estabelecia o contrário, baseada em
transformações decorrentes de inúmeras pesquisas e estudos.
Essa nova teoria possibilitou avanços na compreensão da formação
do universo, estabelecendo assim uma dinâmica de substituição de
conhecimentos incutidos na mente e no pensamento humano.
223
FONAPER
Nesta perspectiva, buscamos historicizar como o processo educativo
pode contribuir para desconstruir ideias naturalizadas que dificultam a
entrada de novos olhares compostos por diferentes reflexões. Encontrar no
terreno da educação o favorecimento de novas reflexões tem sido um
processo lento, mas fundamental para lançar novas perguntas e
desconstruir modelos clássicos, estandardizados na educação.
Meio a essa multiplicidade de fatores que podem exercer influências
no processo de introdução de novos objetivos na educação, deparamo-nos
com o que Cortella (2012, p. 11) compreende como limite durante o
desenvolvimento de novos conhecimentos: ―[...] a condição humana perde
substância e energia vital toda vez que se sente plenamente confortável
com a maneira como as coisas já estão, rendendo-se à sedução do
repouso e mobilizando-se na acomodação‖.
Ao nos enquadrarmos numa determinada zona de conforto, ficamos
impossibilitados de estranhar o objeto, o novo, de problematizá-lo e
avançar na compreensão de novos conhecimentos. Agindo assim,
assumimos um entendimento generalizado dos fatos. Nesse sentido,
quando internalizamos um conhecimento difundido há muito tempo,
acabamos propagando-o, dificultando assim o desvencilhamento dele de
nossa estrutura intelectual.
Sob essa ótica, acabamos moldando seres condicionados a aceitar
apenas uma verdade, desconsiderando a existência de outras
possibilidades de construir novos conhecimentos. Diante disso, constatase que há
[...] a necessidade de descobrirmos, respeitarmos e orientarmos nossa
prática pedagógica pela ―diferença‖, ―categoria essencial para
compreender a função da escola‖, e, por fim, a necessidade de se
tratar a questão étnica na sala de aula, retrabalhando nosso
imaginário social [...] (DAYRELL, 1996, p.18).
Esse imaginário é inundado por estereótipos que impossibilitam a
manifestação da sensibilidade em perceber o outro, dificultando a
convivência cultural e religiosa e a atuação profissional no espaço escolar
como meio de introduzir novas maneiras de articular as relações humanas.
Nesse sentido, é de fundamental importância compreender que as
mudanças necessárias não ocorrem sem turbulências no ambiente
escolar. No entanto, emerge um desafio aos educadores, principalmente
aos licenciados em Ciências da Religião, que durante a formação
224
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
continuada têm possibilitada a apropriação de conhecimentos e discussões
que contribuem para a desconstrução e desestruturação de conhecimentos
padronizados e incorporados, os quais ocasionam ocultamento de muitos
outros que o mundo rejeitou por inúmeros motivos.
O conhecimento se faz num processo de vida da humanidade e vai
se somando aos feitos culturais e mesmo às necessidades para a
sobrevivência ou para sanar as dúvidas, as curiosidades, que juntos
resultam nas práticas e ações socioculturais, econômicas, ambientais e
religiosas das pessoas. Ele não se constrói sozinho, depende do outro, de
olhares múltiplos. Smolka (1996, p. 9) refere:
Isto significa dizer que é através de outros que o sujeito estabelece
relações com objetos de conhecimento, ou seja, que a elaboração
cognitiva se funda na relação com o outro. Assim, a constituição do
sujeito, com seus conhecimentos e formas de ação, deve ser
entendida na sua relação com outros, no espaço da intersubjetividade.
Com a interação estabelecida entre sujeitos, as trocas de
conhecimentos vão acontecendo naturalmente. Através disso, há a
possibilidade de construção de novos conhecimentos como também a
efetivação de conhecimentos já elaborados e estigmatizados pela
sociedade, como aponta Smolka (1996, p. 37):
[...] os modos sociais de interação, incluindo a função comunicativa da
fala e a coordenação das relações sociais, são internalizadas pelo
indivíduo que passa a usar esses mesmos modos para organizar e
atuar sobre a sua própria atividade. Nesse processo de interação de
signos e práticas sociais, os seres humanos desenvolvem a fala
interior, o pensamento verbalizado, preservando a função social das
interações na sua atividade individual.
Essa reflexão está pautada no objetivo deste artigo, que consiste em
compreender o seguinte: como, através de uma formação acadêmica,
pode-se apreender novos conhecimentos e reelaborá-los de acordo com a
realidade em que o profissional da educação vai atuar, sem que fique
alienado ao que está dado como conhecimento pronto e acabado?
Nesta perspectiva, referimo-nos especificamente ao Ensino
Religioso, componente curricular que tem permanecido com estruturas
sólidas emergidas de conhecimentos fundamentados e difundidos pela
visão dominante de políticos religiosos. Não é nossa intenção buscar uma
compreensão que justifique tal permanência, mas, diante da
225
FONAPER
reconfiguração dessas estruturas, vale ressaltar que a falta de profissionais
habilitados nesta área do conhecimento impossibilita introduzir novos
olhares nos espaços escolares. Assim, em muitos ambientes escolares,
percebe-se que o Ensino Religioso continua bebendo da fonte dominadora
que se instituiu desde a chegada dos Portugueses ao Brasil.
A diferença proporcionada pelo novo olhar sobre a Religião na
Europa, difundido através da Reforma Protestante, fez com que a Religião
Católica, forte e dominadora até então, aos poucos fosse perdendo fiéis.
No intuito de buscar saídas para tal situação instalada nos reinos,
Católicos Ibéricos (Portugal e Espanha) são motivados pela Igreja para a
busca e conquista de novas terras, novas colônias e, juntamente a essas
conquistas, a efetivação do convencimento de novos adeptos,
catequizando-os nos seus princípios religiosos.
O modelo de pensamento ligado à religião como única e universal
ainda é muito forte e resistente em muitas regiões do Brasil. Uma atenção
mais minuciosa sobre essa dimensão leva-nos a perceber a dificuldade da
atuação dos profissionais do Ensino Religioso nas comunidades escolares,
onde, ao lançar perguntas para descontextualizar dilemas que advêm
dessa situação, encontram grande resistência na discussão e
desconstrução de ideias normatizadas. Essa situação se agrava mais
quando da atuação de docentes proselitista que apregoam a teologia de
suas religiões e de seus interesses, para o que propomos: todo educador
do componente de Ensino Religioso deve ser um profissional habilitado em
Ciências da Religião, contemplando as pessoas sem distinção de credo,
etnia e função social, com respeito à diferença, cultura e posição social,
cujo objetivo seja humanizar o humano e ver nas pessoas ‗alteridade‘ e, na
vida da terra, a vida sendo respeitada, sem exceção.
O conhecimento humaniza o humano à vida
No âmbito escolar, é comum ouvirmos e vermos a prática e o
discurso de teorias alienantes. Para muitos profissionais da educação, elas
continuam vivas pelo fato de não incorporarem, em seu dia a dia, novos
elementos que destituam padrões e normas estabelecidas por interesses
econômicos, políticos e religiosos. Diante dessa realidade, percebe-se
como os elos dessas teorias permanecem resistentes e perpetuam-se
226
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
através da educação, dificultando aos profissionais da educação
perceberem novos conhecimentos, como aborda Adorno (1995, p. 34):
Apagar a memória seria mais um resultado da consciência vigilante do
que resultado da fraqueza da consciência frente à superioridade de
processos inconscientes. Junto ao esquecimento do que mal acabou
de acontecer ressoa a raiva pelo fato de que, como todos sabem,
antes de convencer os outros é preciso convencer a si próprio.
No processo da educação, evidencia-se essa afirmação ao efetivarse a instituição do Ensino Religioso com um novo viés, sem as bases de
uma doutrina religiosa, evidenciado nos PCNER (FONAPER, 2009, p. 5):
―[...] o ano de 1997 foi um marco na história do Ensino Religioso no Brasil,
o ano em que, pela Lei nº 9475/97, foi dada nova redação ao artigo 33 da
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), Lei nº 9394/96
[...]‖, ficando assim contemplada a nova redação: ―[...] assegurando o
respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer
formas de proselitismo.‖ (POZZER, 2010, p. 51).
Mesmo com essa nova abordagem acerca do Ensino Religioso,
percebe-se que a prática de efetivação da aula de Ensino Religioso
continua na mesma linha do século XX, com mudanças quase que
insignificativas, tanto no discurso como na prática. Nesse sentido,
compreende-se que, para ocorrer uma mudança no discurso, é necessário,
como diz Adorno (1995, p. 34), ―convencer-se a si próprio‖ de que a
mudança ocorreu.
Assim como convencer-se de que a mudança ocorreu é importante,
talvez seja mais importante contar com um profissional habilitado para
atuar nessa área de conhecimento. Teixeira (2011, p. 910) discorre:
[...] estudos em ciências da religião hoje no Brasil vem [...] favorecer
uma importante ampliação de visada do fenômeno religioso, de
capacitação de profissionais instrumentados para essa reflexão
específica e de contribuição efetiva para o enriquecimento pedagógico
nesta delicada e fundamental área.
Porém, passadas duas décadas e meia da elaboração da última
Constituição, na qual o Ensino Religioso também é tratado em trâmite
legal, encontramos muitos profissionais da área da educação
despreparados para ministrar as aulas de Ensino Religioso. Percebemos
no dia a dia que nos discursos da maioria de docentes evidenciam-se falas
de um ensino proselitista.
227
FONAPER
Cabe aqui justificar a importância da atuação do profissional
habilitado em Ciências da Religião, que, após frequentar esse curso, tem
como sustentação nas discussões relacionadas ao Ensino Religioso
abordar os conhecimentos específicos para essa área, retirando dos
PCNER (FONAPER, 2009, p. 49) ―[...] os critérios para organização e
seleção dos conteúdos e objetivos do Ensino Religioso. [...] Culturas e
Tradições Religiosas; Escrituras Sagradas; Teologias; Ritos e Ethos [...]‖ e,
ainda, dialogar com pessoas que não têm nenhuma religião ou crença.
De posse desses conhecimentos, o profissional habilitado contará
também com uma multiplicidade de fatores que exercerão influências em
seu discurso, utilizando-se assim de uma linguagem apropriada para
abordar os conteúdos específicos desta área do conhecimento, a qual,
segundo Oleniki e Daldegan (2003, p. 10-11), ―[...] torna-se responsável
em proporcionar o conhecimento do patrimônio cultural de diferentes
tradições religiosas para que o educando compreenda o pluralismo e a
diversidade cultural presentes na dinâmica social‖. Com a atuação desse
profissional, é possível fomentar a mudança que a educação deste novo
milênio aspira principalmente no que tange ao Ensino Religioso Escolar.
A permanência do discurso proselitista é percebida no espaço
escolar nas conversas paralelas do dia a dia dos profissionais. É percebida
também nas reuniões pedagógicas quando gestores e demais profissionais
ainda se referem ao Ensino Religioso como ―aula de Religião‖ ou
direcionam-se a ele utilizando-se da sigla ERE (Educação Religiosa
Escolar), evidenciando que as mudanças no tratamento desse componente
curricular ainda não foram absorvidas, tampouco a mudança nos próprios
conteúdos.
Pudemos constatar em nossos estudos que a manutenção desse
discurso enquadra-se nos moldes de três características perceptíveis.
Porém, em adiantamento a essas três características, é preciso clarificar
que tal situação não é presenciada em todas as escolas das redes de
ensino, não estamos generalizando, mas enfatizando a ocorrência dessa
prática em alguns espaços com os quais temos tido contato, como
estagiária, profissional da educação ou através de cadernos de alunos de
outras instituições escolares.
Primeira característica: a forma de gestão escolar. Tanto no nível
micro como no macro, ministrar as aulas de Ensino Religioso, na maioria
das vezes, é tarefa atribuída a alguém que está na escola e não possui
228
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
carga horária suficiente em sua habilitação; não se abrem vagas,
dificultando a outros profissionais, no caso, os que estão cursando ou que
são licenciados na área, ministrarem essas aulas. Dito de outro modo
possibilita-se a regência das aulas a quem interessa à gestão.
Segunda característica: a formação para essa área. Como
professora da rede estadual há mais de dez anos e, especificamente de
Ensino Religioso há seis anos, durante os cursos de formação continuada
que foram oferecidos pela Secretaria Estadual da Educação, não me
lembro de ter recebido formação específica para esta área. O que ocorre
quando da oferta dos cursos é uma junção de áreas afins. Provavelmente
isso tem ocorrido pela falta de profissionais habilitados e disponíveis para
atender tal demanda, ou talvez pelo descrédito que se tem em relação a
esse componente curricular.
Essas características ficam mais evidentes quando se propaga que
qualquer profissional de outras áreas pode ministrar essas aulas de ensino
religioso, demonstrando que ainda não foram incorporadas as mudanças
garantidas legalmente para o Ensino Religioso. Em razão dessas
tendências, percebe-se no início de cada ano letivo as divergências em
relação à distribuição das aulas. Como graduandos ou habilitados em
Ensino Religioso, precisamos no ato da escolha das aulas nos impor para
conseguirmos a garantia de ministrar as aulas desse componente
curricular, pois em muitas escolas as aulas são distribuídas a profissionais
de outras áreas antes mesmo do momento oficial de escolha.
A terceira característica mais limitante e que traz à tona discursos
arcaicos: a dificuldade encontrada pelo profissional habilitado para
modificar estruturas cimentadas, petrificadas no intelecto de cada
profissional integrante das unidades escolares. Essa característica tem
traços marcantes, pois dificulta a instituição de novos debates e a
construção de novos conhecimentos. A resistência para a desconstrução
desses conhecimentos legitimados evidencia-se na gestão escolar, assim
como em outros segmentos da sociedade.
A maior dificuldade perceptível é justamente a que acontece em
datas comemorativas, quando, nas paredes da escola, encontra-se
nitidamente estampada a preferência pela mesma religião que outrora era
tida como única, ou, muito mais grave, quando são expostos modelos de
―Mães‖ com gravuras de profissionais de passarela ou de ―Mãe Maria‖ em
229
FONAPER
comemoração ao dia das mães, jogando-se por terra os Direitos Humanos,
os quais referem que temos por direito sermos humanos.
Diante dessas práticas comuns em muitas escolas, percebe-se a
tendência pela manutenção dos mesmos discursos. Portanto, através do
Ensino Religioso, faz-se
[...] necessário subsidiar práticas educativas que eduquem para o
acolhimento da diversidade, que modifiquem estereótipos e
preconceitos por meio do conhecimento de todas as culturas, em
mesmo grau e valor, promovendo atitudes e relações sociais que
evitem a discriminação e favoreçam interações positivas,
possibilitando o desenvolvimento das culturas, em especial, a dos
grupos em desvantagem social. (POZZER, 2010, p. 275).
A partir dessa abordagem e possuídos por esses conhecimentos que
afloram socialmente, o que mais tem nos inquietado é a falta de
criatividade de alguns segmentos escolares para substituir essas práticas
por outras. As críticas que sofremos como profissionais habilitados em
Ciências da Religião ao tentar incluir novos olhares no âmbito escolar são
tão frequentes que muitas vezes acabamos compactuando com esses
olhares, contribuindo assim para a permanência da visão dominante.
Novamente, reporto-me a aquilo que Adorno (1995, p. 34) cita:
―Apagar a memória seria mais um resultado da consciência vigilante do
que resultado da fraqueza da consciência frente à superioridade de
processos inconscientes [...]‖. Apesar da urgência em absorvermos essas
novas tendências, ainda paira a dúvida acerca de como podemos nos
desvencilhar desses conhecimentos arcaicos e substituí-los por novos
conhecimentos se a comunidade escolar, assim como a sociedade, ainda
resiste ao que propomos nos moldes desse novo viés?
Cabe, então, formar profissionais capazes de dialogar com as
pessoas, com a vida envolta às questões sociais colocadas por interesses
individuais ou de grupos que desqualificam qualquer ação humanitária,
fraterna, mais igual e de liberdade, que dignificam e fortalecem a
alteridade.
A sobrevivência desses elementos em nosso conhecimento deve-se
à persistência dos pressupostos sociais de alimentar e manter vivas em
nosso dia a dia, mesmo que por meio do ocultamento, ideias e afirmações
instituídas com o objetivo de manutenção do poder.
230
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Possibilitar novos olhares no âmbito escolar através da efetivação de
um profissional habilitado em Ensino Religioso só será possível quando
conseguirmos compreender aquilo que Adorno (1995, p. 45) defende:
Nem nós somos meros espectadores da história do mundo transitando
mais ou menos imunes em seu âmbito, e nem a própria história do
mundo, cujo ritmo frequentemente assemelha-se ao catastrófico,
parece possibilitar aos seus sujeitos o tempo necessário para que tudo
melhore por si mesmo.
Percebemos, nessa abordagem, uma multiplicidade de fatores que
nos levam a refletir sobre a importância de mudarmos e definirmos os
rumos de nossa história. Não é concebível continuarmos difundindo um
ensino estruturado em torno dos conhecimentos selecionados.
Precisamos, como profissionais habilitados em Ciências da Religião,
possibilitar ao Ensino Religioso efetivar as PCNER (FONAPER, 2009, p.
8): ―[...] o conhecimento dos elementos básicos que compõem o fenômeno
religioso‖, isto é, precisamos dar voz a esse componente curricular que,
durante toda a História do Brasil, vem lutando para se efetivar como área
do conhecimento. O conhecimento das coisas e de como elas realmente
acontecem ou aconteceram, principalmente quando nos referirmos às
religiões ou crenças, é a saída e entrada para um novo mundo, que já
iniciamos.
Saberes e Interculturalidade
Nenhum saber, por mais puro e estruturado que seja, está isento de
ser refutado. Numa cadeia de significações, os saberes ao propor
discussões possibilitam a formulação de perguntas que contextualizem as
informações e direcionem para outras áreas de conhecimento. Como
consequência, outros saberes colocam-se no campo das discussões e vão
tomando consistência, contribuindo para a estruturação de novos
elementos, os quais emergem para dar sentido e presença à pluralidade
de saberes.
Nas Ciências da Religião, incontestavelmente, presenciam-se
grandes discussões. Essas discussões surgem relacionadas a uma
infinidade de saberes que por muito tempo estiveram sob o controle de
grupos hegemônicos, dificultando o debate em espaços coletivos. Entre os
saberes que na atualidade passam por uma aguçada observação e
231
FONAPER
estimulam a reflexão sobre a coexistência, encontramos a pluralidade
cultural.
Desfrutando das reflexões proporcionadas por essa temática,
percebe-se que através das questões que dela emergem há a
possibilidade de uma convivência mais harmoniosa entre todos,
superando-se assim o modo linear e causal de entendimento da
constituição da sociedade.
Sem dúvida, se através das aulas de Ensino Religioso conseguirmos
deslocar o ângulo estratificado social e superar conhecimentos arcaicos,
reformulando-os de acordo com uma nova consciência recheada de
olhares destituídos de preconceitos, a partir da qual o ser humano possa
compreender que tudo o que vive tem sua sensibilidade, estaremos
rompendo com os enquadramentos impostos há séculos e possibilitando
novas maneiras de articular relações, refutando assim a ideia de um
homem ideal.
São muitos e complexos os caminhos para a efetivação desse
pensamento. Mas, nesse arcabouço de possibilidades emergentes,
compreendemos o que diz Pozzer et. al. (2010, p. 9) quando salienta que
[...] o Ensino Religioso constitui-se um direito de todo cidadão, uma
vez que o conhecimento religioso é parte dos conhecimentos
historicamente produzidos e elaborados por inúmeros povos/culturas
e, como tal, necessita estar disponível e acessível a educandos e
educandas na escola.
Compreendendo a importância que esse componente representa no
exercício de absorver ideias de pluralidade, afirmamos que o Ensino
Religioso, presente nas escolas públicas e com profissionais licenciados
em Ciências da Religião atuando, conseguirá ressignificar essa realidade
permeada por ideologias que contêm os germes da dominação e projetar
novas interpretações capazes de degenerar a história da individualidade.
O Ensino Religioso foi até recentemente uma área pulverizada por
outros campos de saberes, começando a ser garantidos nos PCNER
(FONAPER, 2009, p. 7) os ―[...] fundamentos históricos, epistemológicos e
didáticos desse componente curricular‖. Esses fundamentos direcionam
para um aprofundamento de novos saberes e uma aplicação daquilo que
está garantido legalmente pelos PCNER (FONAPER, 2009, p. 49): os
―critérios para a organização e seleção de conteúdos e seus pressupostos
didáticos‖. Diante dessa argumentação, constatamos que devemos dar
232
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
novos sentidos e direções para o trabalho escolar, adequando-o aos
princípios que se apresentam neste século XXI como pressuposto de uma
educação que promova a diversidade cultural.
Para isso, devemos, como educadores que somos, especialmente
como habilitados em Ciências da Religião, proporcionar no âmbito escolar
reflexões acerca das mudanças ocorridas na ―concepção da abordagem
pedagógica do Ensino Religioso‖ (FONAPER, 2009, p. 7). Devemos
introduzir nas discussões do dia a dia, mesmo encontrando muitas
resistências, os saberes adquiridos durante a graduação e através das
constantes leituras, os quais contribuirão para uma nova compreensão da
realidade e possibilitarão, também, ampliar os horizontes da humanização
das pessoas, ainda na contemporaneidade.
Referências
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Leo Maar. 3. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995.
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OLENIKI, Marilca Loraine R.; DALDEGAN, Viviane Mayer. Encantar: uma
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POZZER, Adecir et al. (Org.). Diversidade religiosa e ensino religioso
no Brasil: memórias, propostas e desafios. Obra comemorativa aos 15
anos do FONAPER. São Leopoldo: Nova Harmonia, 2010.
233
FONAPER
POZZER, Adecir; CECHETTI, Elcio; RISKE-KOCH, Simone. Ensino
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intercultural. In: OLIVEIRA, Lilian Blank (Org.). Culturas e diversidade
religiosa na América Latina: pesquisa e perspectivas. 2. ed. Blumenau:
Edifurb; São Leopoldo: Nova Harmonia, 2010.
SMOLKA, Ana Luiza; GÓES, Maria Cecília Rafael de. A linguagem e o
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TEIXEIRA, Faustino. O ―ensino religioso‖ e as Ciências da Religião.
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<http://www.scielo.br/pdf/pc/v20n2/a15v20n2.pdf>. Acesso em: 9 abr.
2013.
234
FORMAÇÃO DOS PROFESSORES DO ENSINO RELIGIOSO NO
MUNICÍPIO DE CARIACICA - ES
Eliane Maura Littig Milhomem de Freitas1 – PMC/FSG
Resumo:
A presente comunicação objetiva apresentar o processo de formação continuada dos
professores do Ensino Religioso do município de Cariacica – ES: como esse sistema de
ensino tem pensado e organizado tal formação e como se tem privilegiado a metodologia
das sequências didáticas. O texto esclarece sobre a legislação estadual que ampara e
normatiza a oferta dessa área do conhecimento e também aborda as formações iniciais
oferecidas na grande Vitória – ES. Destaca as tensões que podem ocorrer na prática de
sala de aula por falta do estabelecimento de critérios claros para formação dessa área do
conhecimento. Tem como intenção discutir sobre a importância da formação continuada,
uma vez que os Sistemas de Ensino precisam compreender a dinâmica da disciplina do
ensino religioso escolar, seus pressupostos epistemológicos, objetivos, tratamento didático,
avaliação da disciplina entre outros, que especifica um trabalho didático diferenciado e que
atenda ao prescritivo legal do oferecimento da mesma.
Palavras-chaves: Ensino Religioso; Formação Continuada; Sequências Didáticas.
Introdução
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL,
1996) orienta que sistemas de ensino organizem suas Diretrizes
Curriculares, e estas devem representar no seu documento as
peculiaridades do município.
Este texto tem a pretensão de apresentar como tem se dado o
processo de formação continuada dos professores do Ensino Religioso do
município de Cariacica – ES. Relata sobre a legislação estadual que
ampara e normatiza a oferta dessa área do conhecimento e também
aborda sobre as formações iniciais oferecidas para essa disciplina na
grande Vitória – ES.
Em se tratando da disciplina em questão, é necessário considerar
sobre a fragilidade da formação do professor de Ensino Religioso, uma vez
que paira sobre essa disciplina um entendimento de que ela tenha pouca
contribuição específica para a formação dos alunos, além é claro da
1
Mestre em Educação. Universidade São Marcos/SP. Coordenadora da formação de
professores do Ensino Religioso no município de Cariacica – ES. Professora do Curso
de Pedagogia da FSG. E-mail: [email protected]
FONAPER
argumentação de que em um Estado laico, o Ensino Religioso foge a esse
prescritivo legal. Cabe então a escola, aos professores e a comunidade em
geral compreenderem que, embora o país seja laico a nova legislação, a
partir da Lei nº 9.475/97 garante um direito humano primordial conforme o
artigo 5º inciso VI da Constituição: ―É inviolável a liberdade de consciência
e de crença sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e
garantida, na forma lei, a proteção aos locais de culto e suas liturgias‖. A
liberdade religiosa é um dos direitos fundamentais da humanidade, como
afirma a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), da qual
somos signatários.
Assim, as escolas devem organizar seus currículos considerando os
princípios norteadores da disciplina como prescreve a legislação tomando
como base o diálogo e a tolerância religiosa conforme a cartilha sobre
―Diversidade Religiosa e Direitos Humanos‖ (2004), produzida pela
Secretaria Especial dos Direitos Humanos.
Formação Continuada dos Professores do Município de CariacicaES: Privilegiando as Sequências Didáticas
No ano de 2013, em virtude das eleições, o município de Cariacica –
ES recebeu uma nova gestão política. A Secretaria Municipal de Educação
deixou como herança para a nova administração, um currículo que fora
produzido no final da gestão anterior. Tal currículo fora produzido a muitas
mãos contando com assessores, especialistas e professores dessa rede
de ensino.
Dentre as ações da política educacional vigente dessa nova gestão,
considera-se como relevante a execução das Diretrizes Curriculares
produzidas anteriormente. Assim, para garantir a implantação e
materialização do currículo em âmbito escolar, tem se agregado muitos
esforços; pois além de um movimento político da secretaria municipal de
educação para que o currículo se processe no seio da escola, é importante
considerar que os teóricos praticantes do mesmo, ou seja, os professores,
participem, compreendam e acreditem na importância do currículo para
que este se materialize no dia a dia da escola e para tanto esse movimento
deve contar incondicionalmente com os professores atuantes no sistema
de ensino.
236
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Esse movimento de formação tem ocorrido periodicamente e a cada
encontro a formação vem tomando corpo e aperfeiçoando a metodologia
de trabalho que tem permeado tal formação isto é, As Sequências
Didáticas.
De acordo com as Diretrizes Curriculares do Município de Cariacica
para o Ensino Religioso (2012, p. 158):
[...] enfatiza-se a importância de uma metodologia que busque a
utilização dos eixos apresentados e o desenvolvimento do conteúdo a
partir das sequências didáticas. Essas, por sua vez, se constituem
num conjunto de atividades ligadas entre si e planejadas para
trabalhar um determinado conhecimento, etapa por etapa, numa
perspectiva dinâmica, intencional, contextualizada visando atingir os
aspectos da aprendizagem de conteúdos conceituais, procedimentais
e atitudinais. As sequências devem na sua estrutura metodológica
privilegiar a problematização inicial, que consiste em motivar e
coordenar as discussões, a organização no qual diferentes atividades
poderão ser empregadas para auxiliar no desenvolvimento dos
conceitos em que se articula o conhecimento com as atividades
cotidianas.
Observa-se que o trabalho desenvolvido a partir das Sequências
Didáticas mobiliza o aluno, pois o torna um sujeito mais participativo nas
aulas e os conteúdos tanto mais significativos. Assim a aprendizagem se
torna também significativa. De acordo com Pelizzari (2002) a teoria da
aprendizagem de Ausubel propõe que os conhecimentos prévios dos
alunos sejam valorizados, para que possam construir estruturas mentais
utilizando, como meio, mapas conceituais que permitem descobrir outros
conhecimentos, caracterizando, assim, uma aprendizagem prazerosa e
eficaz.
Delizoivov, Angotti e Pernanbuco apud Mendes (2010) sugerem uma
nova abordagem de conteúdos, visando a superar as concepções, muito
presentes em sala de aula. Essa metodologia tem início com a
problematização inicial, na qual se faz a introdução do conteúdo,
valorizando a participação dos alunos. Nesse momento devem colocar
seus conhecimentos e experiências em relação ao tema. Num segundo
momento segue a organização do conhecimento, sistematizando e
estudando o tema visando à sua compreensão, com a orientação do
professor. A metodologia é finalizada com a aplicação do conhecimento,
na qual o aluno deverá articular o conhecimento com situações cotidianas
e significativas.
237
FONAPER
Ausubel apud Pelizzari (2002, p. 38) assim se expressa:
Para haver aprendizagem significativa são necessárias duas
condições. Em primeiro lugar, o aluno precisa ter uma disposição para
aprender: se o indivíduo quiser memorizar o conteúdo arbitrária e
literalmente, então a aprendizagem será mecânica. Em segundo, o
conteúdo escolar a ser aprendido tem que ser potencialmente
significativo, ou seja, ele tem que ser lógica e psicologicamente
significativo: o significado lógico depende somente da natureza do
conteúdo, e o significado psicológico é uma experiência que cada
indivíduo tem. Cada aprendiz faz uma filtragem dos conteúdos que
têm significado ou não para si próprio.
Se esta metodologia for amplamente trabalhada por nossos
professores, então teremos um aprendizado potente, pois o que a escola
pode oferecer de melhor é um ensino que faça sentido para o alunado;
pois infelizmente muitos deles enxergam o conhecimento como algo muito
fora da sua realidade.
Na docência do Ensino Religioso é necessário considerar que os
conteúdos se tornam interessantes ao conhecimento do/a aluno/a se ele/a
compreender que os temas ali problematizados e discutidos em sala de
aula fazem parte de um contexto que abrange uma complexidade, mas
que essa complexidade precisa ser identificada e reconhecida pelo/a
próprio aluno/a.
Toma-se como referência Figueiredo (1995) quando diz que a busca
da identidade pessoal é fundamental no processo que visa a tal realização.
Assim, no dizer da autora a escola por ser uma instituição qualificada de
educação, abre perspectivas para a evolução diferencial do eu, isto é,
possibilita ao aluno reconhecer-se como ser humano que é, colabora no
sentido de ampliar os horizontes, identificar outras concepções de valores
e de sua determinação subjetiva na relação interativa global do nós,
compreender-se como ser integrante de algo muito maior. ―A pessoa não é
ainda uma plenitude experimentada, é um ―vir-a-ser‖; a única maneira de
alcançá-la é fazê-la ser‖ (RICOUER apud FIGUEIREDO, 1995, p. 34).
A Legislação Estadual e os cursos de Formação de professores do
Ensino Religioso na Grande Vitória – ES
No Estado do Espírito Santo temos como legislação que rege a
disciplina do Ensino Religioso os decretos do governador nº 1735 – R que
238
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
dispõe sobre o reconhecimento e credenciamento do CONERES
(Conselho do Ensino Religioso no Estado do ES), o Decreto nº 1736 – R
que dispõe sobre a oferta da disciplina do Ensino Religioso nas escolas
públicas estaduais do ES e a Resolução nº 1900/2009, que explica e
normatiza sobre a oferta da disciplina Ensino Religioso no Ensino
Fundamental das escolas públicas do Estado do Espírito Santo.
Esses textos apresentam como perfil docente para o Ensino
Religioso preferencialmente professores do quadro efetivo do magistério
com curso de licenciatura e com pós-graduação em Ensino Religioso; ou
com licenciatura, acrescida de curso de formação específica em Ensino
Religioso, com carga horária mínima de 180 (cento e oitenta) horas; para
atuação nas séries iniciais do Ensino Fundamental ou ainda com formação
em Ciências da Religião acrescida de complementação pedagógica. Para
suprir eventual falta de professores do quadro efetivo, a Resolução nº
1900/2009 diz que será permitida uma concessão de autorização
temporária para o exercício do magistério da disciplina Ensino Religioso,
considerando os mesmos prescritivos anteriormente colocados.
O Art. 7º da Resolução citada afirma que nos dois primeiros anos
contados a partir de sua publicação, as secretarias de educação deveriam
promover em caráter emergencial, curso de formação específica em
Ensino Religioso, com carga horária mínima de 180 horas, elaborado por
comissão designada para esse fim, com a participação do CONERES,
destinada a docentes da respectiva rede pública, com licenciatura em
qualquer área do conhecimento ou habilitados em curso de nível médio,
modalidade Normal que tenham interesse em ministrar Ensino Religioso.
O Art. 9º afirma que as secretarias de educação promoveriam para
os professores com formação em nível superiora oferta de cursos de pósgraduação lato sensu em Ensino Religioso, elaborado com a assessoria do
CONERES. Embora já tenhamos por parte das secretarias de educação
um esforço no sentido de garantir pelo menos a oferta do Ensino Religioso
nas escolas e da formação continuada, não temos, por outro lado, atingido
a meta da formação de professores com a participação e envolvimento dos
sistemas de ensino, como prescreve a resolução, salvo raríssimas
exceções. Assim cabe a iniciativa privada ofertar o curso de formação de
professores em Ensino Religioso para sua atuação em escolas públicas
municipais e estaduais.
239
FONAPER
Infelizmente, no Estado do Espírito Santo, não temos ainda um
curso de formação de professores em nível de graduação que possa
atender a todas as demandas colocadas para o desenvolvimento da
disciplina em âmbito escolar.
Na grande Vitória, são oferecidos cursos da iniciativa privada em
nível de pós-graduação e aqueles que têm seus projetos de curso em
concordância com a lei, têm obtido o referendo do CONERES conforme
adverte a Resolução citada anteriormente. No entanto consideram-se tais
cursos incipientes no sentido de oferecer maior aprofundamento para
atender à dinâmica que envolve a disciplina tanto no que diz respeito aos
conhecimentos de aprofundamento teórico como de aprofundamento
prático.
Observa-se que nesses cursos de formação muitos dos formandos
são pessoas que fizeram o bacharelado em Teologia e então buscam uma
complementação pedagógica e um curso de pós em Ensino Religioso para
que possam adquirir a formação requerida para a docência nessa
disciplina.
Resulta daí alguns percalços que contribuem para uma docência
que às vezes se torna problemática, pois, na maioria das vezes, falta a
esse docente uma maior compreensão metodológica e didática para o
desenvolvimento do processo educativo, pois é preciso compreender que
mesmo o/a professor/a de Ensino Religioso deve desenvolver saberes
necessários à prática educativa, segundo Freire (2002).
Tomando por base o autor citado considera-se como marco
fundamental para a formação do professor a máxima de Freire que afirma
que ―ensinar exige reflexão crítica sobre a prática. [...] É pensando
criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a
próxima prática‖ (FREIRE, 2002 p. 44).
Para esse autor, a prática educativa-crítica pauta-se numa ética
pedagógica e numa visão de mundo alicerçadas em rigorosidade,
pesquisa, criticidade, risco, humildade, bom senso, tolerância, alegria,
curiosidade, esperança, competência, generosidade, disponibilidade dentre
outros que transforma um/a professor/anum docente crítico e
comprometido com uma educação que prima pela aprendizagem dos
alunos.
Placco e Silva, citadas por Freitas (2013), alertam que é preciso
considerar que a formação se dá em diferentes dimensões. Assim temos: a
240
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
dimensão técnica científica – esta dimensão consiste na formação de uma
área específica e na busca de um conhecimento técnico-científico inter e
transdisciplinar; a dimensão da formação continuada – a qual motiva,
estimula a busca de outros saberes, possibilitando a dialética como o novo;
a dimensão do trabalho coletivo e da construção coletiva do trabalho
pedagógico – essa dimensão possibilita a construção do grupo,
trabalhando em cooperação com vistas à melhoria da aprendizagem dos
alunos; a dimensão dos saberes para ensinar – essa dimensão abrange os
aspectos afetivo-emocionais, proporciona o conhecimento sobre os
objetivos educacionais e seus compromissos como cidadão e profissional
(visão de educação, objetivos da educação, formação de determinado tipo
de homem que se pretende formar); a dimensão crítico reflexiva – tal
dimensão exige compromisso e disponibilidade para reflexão e avaliação
da própria prática; e finaliza com a dimensão avaliativa – tal dimensão
colabora no sentido de informar sobre as especificidades de uma avaliação
mais justa e destituída de autoritarismo. Tais dimensões podem e devem
ser desenvolvidas simultaneamente a fim de melhorar a prática dos
professores e para que estas sejam assimiladas pelos/as professore/as é
necessário que haja uma boa formação inicial complementada pela
formação continuada.
Apontamos ainda Tardif (2002) que em seu livro ―Saberes Docentes
e Formação Profissional‖ apresenta aos professores dois pontos de
convergência; ele diz que a formação deve considerar o saber dos
professores em seu trabalho e o saber dos professores em sua formação.
No texto o autor procura discutir sobre os saberes que servem de base
para desenvolver um bom trabalho, sobre os fundamentos sociocognitivos
do ensino entre outros que darão suporte teórico para entendimento do
trabalho docente no contexto escolar, colaborando assim com os textos
sobre formação discutidos anteriormente.
Tensões Pedagógicas e os Desafios da Compreensão da Disciplina
do Ensino Religioso para a Formação do Professor
De conformidade com Oliveira (2007) a prática docente pressupõe
uma concepção educacional que determine a compreensão dos papéis do
professor e do estudante, da metodologia, da função social da escola e
dos conteúdos a serem trabalhados.
241
FONAPER
Educar não é tarefa fácil e a cada dia as tensões pedagógicas se
confundem no seio da escola. Para além dessa normativa a disciplina do
Ensino Religioso sempre esteve ―marcada por conflitos políticos e
ideológicos em decorrência da dificuldade de definir com clareza a
identidade pedagógica da disciplina‖ (OLIVEIRA, 2007, p. 120).
A religiosidade se faz presente na modernidade em que vivemos e
nesse contexto Sandrini (2009) nos esclarece que estamos vivendo uma
mudança de época. Novos paradigmas estão surgindo e trazendo consigo
novos valores. Para o autor o grande desafio que se coloca é odo diálogo
com todas as culturas, todas as religiões e etnias. Assim o autor destaca
três realidades que se entrecruzam. São elas: a religiosidade, a educação
e a pós-modernidade. Ele alerta que se a modernidade não soube
dialogar com a religião, por outro lado a religião não soube dialogar com a
modernidade.
No contexto atual em que vivemos não há espaço para exclusões e
muito menos para anátemas. Todos querem ser incluídos e de maneira
geral recebem por parte dos seus constitutivos políticos e jurídicos tais
condições.
O próprio autor reconhece que a cultura ocidental sempre teve
grande dificuldade em incluir o outro e o diferente em sua reflexão e em
sua ação. Infelizmente os conhecimentos que adquirimos em nossa vida
acadêmica foi pensado a partir da cultura eurocêntrica, mesmo que os
povos em que se manifestassem esses sentidos fossem das mais diversas
etnias.
No Brasil em particular vivemos muitas tensões políticas que
perpassam pelo viés religioso. Não são poucas as tentativas de também
por conta disso suprimir o Ensino Religioso da escola, desconhece, no
entanto tais predicativos que quanto maior for o entendimento do
conhecimento religioso tanto mais se abreviará as tensões pelo imperativo
da tolerância e do respeito ao outro.
Sandrini (2009) propõe uma análise que no seu entender se constitui
na revitalização da religiosidade. No dizer do autor, se por um lado houve
um adormecimento da espiritualidade, por outro ele destaca cinco pontos
fundamentais pelas quais apresentam os motivos de tal revitalização. Em
primeiro lugar, destaca a queda do colonialismo, determinando também o
fim do eurocentrismo, ou pelo menos seu enfraquecimento, podemos
constatar que nossa legislação educacional já determina a inserção das
242
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Leis nº 10.639/03 e da Lei 11.645/08 que torna obrigatória o ensino da
história e cultura afro-brasileira e africana, e indígena nas redes públicas e
particulares da educação, pela qual, anteriormente, nem se pensava em
estudar tais conhecimentos e quando apareciam eram destacados como
inferiores, primitivos e folclóricos e tantos outros adjetivos que o livro
didático procurou apresentar; assim como outras culturas que receberam
valor e consideração a partir de um olhar plural; em segundo lugar, o
consequente desenvolvimento de uma sociedade multiétnica, que se
mostra e se empodera como sujeitos de direitos e culturas diferenciadas; e
em terceiro, as culturas que tomaram a palavra nas sociedades ocidentais
e trouxeram consigo suas próprias teologias e crenças religiosas com o
consequente retorno à tradição religiosa local nas sociedades industriais;
como ponto quarto, a gravidade dos novos problemas que advém da
modernidade com o desenvolvimento das ciências da vida e que
simplesmente a razão é incapaz de solucionar; e ainda um quinto ponto
que o autor coloca como a popularidade que um personagem como o papa
romano adquiriu ao contribuir poderosamente para a queda das ditaduras
comunistas.
Diante de todo esse contexto depreende-se que ―mesmo com suas
contradições e acusações de alienação, manipulação, distorções,
regressões, a religião continua sendo potencial de esperança para o
mundo‖ (SANDRINI, 2009, p. 133).
Há que se entender, no entanto que todo esse conhecimento não é
incorporado imediatamente pelo universo escolar ou mesmo pela
sociedade. Fazem-se necessárias políticas públicas que fomentem tal
entendimento criando possibilidades de formação e de compreensão por
parte dos indivíduos.
Continuando com o autor citado ele adverte que a religião são
tesouros éticos e que tem muito a ensinar a modernidade; assim como a
modernidade tem a ensinar a religiosidade.
Boff citado por Sandrini (2009), destaca que as grandes ameaças da
humanidade são o desequilíbrio ecológico e as injustiças sociais. Para o
autor a solução para esses males não se encontra na técnica e nem na
economia isoladas e sozinhas. Para ele o encaminhamento pode ser dado
a partir da confluência de três grandes realidades: a ética, a educação e a
espiritualidade. Fazendo um recorte de todas as questões aqui colocadas,
compreende-se a escola como uma agente também de responsabilidade
243
FONAPER
social e nesse sentido não somente a disciplina do Ensino Religioso deve
imbuir-se desse papel como todas as demais disciplinas.
Para tanto cabe aos sistemas de ensino e as escolas reconhecerem
qual de fato é a roupagem para essa disciplina tão rica para promover
conexões e interações com o vasto e globalizado mundo em que vivemos.
Dinâmica da disciplina do ensino religioso escolar: seus
pressupostos epistemológicos, objetivos, tratamento didático e
avaliação.
A Resolução nº 4 de 13 de julho de 2010 que define as Diretrizes
Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica no capítulo II, artigo
14 relaciona as disciplinas da Educação Básica e dentre elas cita o Ensino
Religioso como parte integrante da base nacional comum e como área do
conhecimento de acordo com o parágrafo 2º.
Assim a mesma enquadra-se no padrão comum das demais
disciplinas, pois apresenta: objeto de estudo – o fenômeno religioso;
conteúdo próprio – conhecimento religioso; tratamento didático – didática
do fenômeno religioso; e ainda, objetivos definidos, metodologia própria,
sistema de avaliação e inserção no sistema de ensino prescrito nos
Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso - PCNER
(FONAPER, 2006).
Para Oliveira et al. (2007) o desafio de discutir a identidade
pedagógica do Ensino Religioso encontra-se no fato de que, no decurso de
sua história, ele não foi concebido como integrante de uma área maior com
a educação. Propor e discutir características pedagógicas para esse
componente curricular significa analisá-lo e compreendê-lo segundo o
conjunto de teorias e doutrinas da educação. A mesma autora relata que
historicamente em grande parte das investigações efetuadas pelos
estudiosos do Ensino Religioso brasileiro, a fonte mais utilizada era a
legislação, e não as linhas educacionais.
A autora adverte sobre dois enfoques significativos na articulação
da formatação dos componentes curriculares; o primeiro é o enfoque social
sobre os processos de ensino e aprendizagem. Entende-se desse sentido
as relações entre desenvolvimento e aprendizagem, a importância da
relação interpessoal e a relação entre a cultura e educação e o papel da
ação educativa ajustada às situações de aprendizagem e às
244
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
características da atividade mental construtiva do aluno em cada momento
da escolaridade; o segundo é a compreensão do processo de
desenvolvimento na construção do conhecimento. Compreender os
mecanismos pelos quais o indivíduo constrói suas representações.
De conformidade com a autora citada, o componente curricular do
Ensino Religioso, articulado com as demais disciplinas, contribui para a
construção de outra visão de mundo, de ser humano e de sociedade.
Depreende-se que o objeto do Ensino Religioso é o fenômeno
religioso, assumindo a conceituação de religião que tem o significado de
―reler‖, ―religar‖ o ser humano a Deus.
Figueiredo (1995) adverte que o termo ―religioso‖ deriva do latim
―religio‖, que designa, de certa forma, a relação da pessoa humana com o
sagrado; e a paIavra ―Religião‖, segundo Lactâncio, vem de ―religare‖, no
sentido de relação com a entidade divina.
No entanto é importante considerar de acordo com a autora citada
que o Ensino Religioso não está a serviço dessa ou daquela religião, mas
sim identificar o substrato religioso presente na formação do povo
brasileiro e ainda o fenômeno religioso, que adentra as nossas vidas,
sejam pelos símbolos, costumes, feriados, movimentos sociais, mídia e
etc.
Segundo os PCNER (FONAPER, 2006), o tratamento didático do
Ensino Religioso deve considerar, como em outras áreas, os
conhecimentos anteriores do educando, interesses e possibilidades, a
garantia de participação dos alunos numa perspectiva de gerar respeito à
diferença, vivência da própria cultura e tradição religiosa, abertura para a
aprendizagem e autonomia, recursos adequados, estabelecimento de
relações, interações, conexões entre os conhecimentos do universo
religioso pessoal e com os conhecimentos religiosos dos colegas e os
apresentados no ambiente escolar.
Oliveira et al. (2007) apresenta alguns aspectos estruturais da
disciplina, já regulamentadas em nível nacional. São elas: é parte
integrante da formação básica do cidadão; é disciplina dos horários
normais, assegurando o respeito à diversidade cultural religiosa sem
proselitismo; é componente curricular; veicula um conjunto de
conhecimentos e conteúdos que subsidiam o entendimento do fenômeno
religioso à luz da relação entre culturas e tradições religiosas; orienta para
a sensibilidade ao mistério; encaminha processos de aprendizagem
245
FONAPER
processual, progressista e permanente; desenvolve práticas pedagógicodidáticas contextualizadas e organizadas, que se concretizam nas relações
de ensino-aprendizagem; percebe a avaliação como um processo não
servindo para fins de promoção e retenção, mas para aferir se os objetivos
foram atingidos e as metas alcançadas.
O Ensino Religioso utiliza-se da avaliação como um elemento
integrador da aprendizagem dos estudantes à atuação dos
professores na construção coletiva dos conhecimentos. Na forma de
avaliação processual, o objetivo maior será sempre desenvolver o
diálogo, oferecendo a uns e outros, oportunidades para que cresçam
mediante percepções diferenciadas sobre um mesmo dado social,
num constante processo de construção e reconstrução dos
conhecimentos (OLIVEIRA et al., 2007, p. 116).
Em relação aos conteúdos e metodologia compreende-se que o
Ensino Religioso constitui um dos elementos para a formação integral do
ser humano. Assim como as outras disciplinas tal componente assume o
compromisso de pensar, discutir, analisar e proporcionar os elementos que
transitam numa ética, alteridade e respeito à diferença. É importante levar
em conta a vivência do alunado, observando os elementos dos contextos,
a singularidade, situações e sentimentos que permeiam suas vidas e como
estas mobilizam seu desenvolvimento humano.
Além desse imperativo, Oliveira et al. (2007) considera proposital a
perspectiva cultural para que estas possam também ser privilegiadas na
elaboração das propostas curriculares. Assim também é importante
apreciar as condições positivas, a cooperação ativa; as relações
interpessoais e outros elementos que no contexto das escolas são
consideradas de fundamental relevância.
Como parte da orientação dos PCNER (FONAPER, 2006), Oliveira et
al. (2007) destaca cinco invariantes propostas para o conhecimento
religioso. São eles: Cultura e Tradições Religiosas, que analisa questões
como função e valores da tradição religiosa, relação entre ética e outros;
Textos Sagrados (orais e escritos) apresentam os textos que transmitem,
conforme a fé dos seguidores, uma mensagem do transcendente,
mediante a qual, pela revelação, cada forma de afirmá-lo faz conhecer aos
seres humanos seus mistérios e sua vontade, dando origem às tradições.
De acordo com a autora, estão presentes neste eixo a pregação, a
exortação e os estudos eruditos; Teologias, esse eixo contempla o
conjunto de afirmações e conhecimentos elaborados pela religião sobre o
246
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
transcendente e repassados aos fiéis de um modo organizado ou
sistematizado; os Ritos identificam uma série de práticas celebrativas das
tradições religiosas, formando um conjunto de rituais, símbolos e
espiritualidades; e o Ethos, que apresenta a forma interior da moral
humana em que se realiza o próprio sentido do ser.
A autora considera a importância de exercícios que favoreçam a
sensibilidade diante de qualquer discriminação religiosa no trato do
cotidiano. Assim professores/as e alunos/as precisam embrenhar-se nos
mistérios da fé. Devem formar o senso crítico, a fim de possibilitar aos
estudantes leitura e interpretação das narrações e dos fatos históricos
religiosos relacionados como fenômeno religioso de caráter plural.
Conclusões
A formação de professores permeada pelas Sequências Didáticas
está em andamento. Embora tenhamos muito que avançar, o município de
Cariacica já deu conta de oferecer aos seus professores um documento
escrito, como também tem mobilizado e possibilitado a formação.
No desenvolvimento dessa formação contamos com atentos novos
olhares, curiosos, mas interessados em oferecer um Ensino Religioso com
qualidade e comprometimento.
A metodologia ora pensada é uma novidade na formação. É preciso
acreditar que tem consistência e que pode mobilizar o educando para a
aprendizagem. Os conteúdos apresentados pelos professores devem
chegar para os alunos com efeitos de sentidos e significados.
A modernidade se expressa de forma a tomar o seu lugar também no
contexto da religiosidade e o diálogo é fundamental para possibilitar a
aproximação dos sujeitos, diferentes em concepções, mas iguais em
direitos. Assim, cabe também ao docente o entendimento da revitalização
do ser humano que tem modos de vida diferentes, porém que precisa ser
respeitado e acolhido pelos agentes educativos. Se tivermos bons
professores de Ensino Religioso teremos em boa medida bons alunos e
bons cidadãos também cientes não só dos seus deveres, como também
dos seus direitos.
Para dar conta da docência do Ensino Religioso é preciso levar em
conta seus pressupostos epistemológicos, objetivos, tratamento didático e
avaliação; pois assim cada vez mais se produzirá novos conceitos. E
247
FONAPER
assim, os/as alunos/as, professores/as e quem sabe os cidadãos/ãs
brasileiros/as poderão conhecer a dinâmica dessa disciplina que envolve o
ser humano naquilo que ele tem de mais precioso que é a sua
espiritualidade.
Cabe então à escola ofertar com responsabilidade e zelo o Ensino
Religioso compreendendo que a educação para a religiosidade fará a
diferença na vida do alunado trazendo-lhes mais segurança, conhecimento
e respeito.
Referências
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Brasil – Brasil, DF: Senado Federal, 1998.
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Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica.
Disponível em http//portal.mec.gov.br. Acesso em 04 de agosto de 2013.
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dos Poderes do Estado, de 26 de novembro de 2009.
DECRETO nº 1735-R de 26 de Setembro de 2006. Dispõe sobre o
reconhecimento e credenciamento do CONERES (Conselho do Ensino
Religioso no Estado do ES).
DECRETO nº 1736-R de 26 de Setembro de 2006. Dispõe sobre a oferta
da disciplina do Ensino Religioso nas escolas públicas Estaduais do ES.
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de 6º ao 9º ano)/ Prefeitura Municipal de Cariacica, ES: Secretaria
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FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: Saberes Necessários a
Prática Educativa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002.
FREITAS, Eliane Maura Littig Milhomem de. O Ensino Religioso no
município de Cariacica – ES: O processo de construção das diretrizes
curriculares e o desafio de sua implementação em âmbito escolar.
Comunicação apresentada no I Simpósio Internacional de Teologia e
Ciências das Religiões no período de 10 a13 de junho de 2013 em
Vitória/ES.
248
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
FIGUEIREDO, Anísia de Paulo. Ensino religioso: perspectivas
pedagógicas. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994. (Colégio Ensino religioso
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MENDES, Francisco Carlos Pierin. Fundamentos e Metodologia de
Ciências. Curitiba: Editora Fael, 2010.
OLIVEIRA, Lilian Blanck (et al). Ensino Religioso: fundamentos e
métodos. São Paulo: Cortez, 2007. (Coleção docência em formação. Série
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Maria: São Paulo, 2006.
PELIZZARE, Adriana (et al). Teoria da aprendizagem significativa
segundo Ausubel. Rev. PEC, Curitiba, v.2, n. 1, p. 37, jul. 2001 – jul. 2002
SANDRINI, Marcos. Religiosidade no contexto da pós-modernidade.
Petrópolis, RJ: Vozes, 2009.
TARDIF, Maurice. Saberes Docentes e Formação Profissional.
Petrópolis. RJ: Vozes, 2002.
249
O ENSINO RELIGIOSO NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO
FUNDAMENTAL, EM MINAS GERAIS: A FORMAÇÃO E A
PRÁTICA DOCENTE
Felippe Nunes Werneck1 (PUC Minas)
Resumo:
Ao se pensar sobre o Ensino Religioso (ER) nas escolas públicas estaduais, em Minas
Gerais, depara-se com o aspecto legal, no que se refere à docência: a Resolução SEE nº
2.253/2013, estabelece, no art. 4º, que as disciplinas ER e Educação Física (EF) devem ser
ministradas pelo professor regente, nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Esta
comunicação, considerando o currículo do curso de Pedagogia de três universidades
mineiras e a proposta, defendida por Cortella (2006), Passos (2006), Caron (2011) e
Junqueira (2011), de formatação dos cursos de Ciências da Religião para a formação de
professores de ER, objetiva discutir o seguinte: É necessário o docente especialista para o
ER, nos anos iniciais do Ensino Fundamental? O curso de Pedagogia prepara o professor
regente para abordar, sistematizada e cientificamente, o conteúdo do ER?
Palavras-chave: Ensino Religioso. Ensino Fundamental. Anos Iniciais. Formação Docente.
Prática Docente.
Introdução
No Estado de Minas Gerais, foi publicada, pela Secretaria de Estado
de Educação, a Resolução nº 2.253, de 09 de janeiro de 2013,
estabelecendo, no artigo 4º, que as disciplinas Educação Religiosa e
Educação Física (EF) devem ser ministradas pelo professor regente da
turma, nos anos iniciais do Ensino Fundamental.
Art.4º Nos anos iniciais do Ensino Fundamental os componentes
curriculares de Educação Física e Educação Religiosa serão
ministrados pelo próprio regente da turma, exceto quando na escola já
houver professor efetivo ou efetivado pela Lei Complementar nº 100,
de 2007, nesses componentes curriculares. (MINAS GERAIS, 2013).
Esse ato normativo causou um desconforto muito grande entre os
professores de Educação Religiosa e EF. No início do ano de 2013,
1
Mestrando em Ciências da Religião, sob orientação do Prof. Dr. Amauri Carlos Ferreira,
no Programa de Pós-graduação em Ciências da Religião – PUC Minas, Bolsista da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e integrante
dos Grupos de Pesquisa (CNPQ): Educação, Ética e Religião e Rede Ibero-Americana
de Estudos sobre Educação Profissional e Evasão Escolar (RIMEPES). E-mail:
[email protected]
FONAPER
seguindo as determinações da Resolução SEE nº 2.253/2013, os
professores designados que tinham assumido uma das duas disciplinas,
nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, foram desligados das escolas
estaduais e, de acordo com relatos de alguns docentes, os profissionais
efetivos ou efetivados, que lecionavam a Educação Religiosa ou a
Educação Física, no referido nível de ensino, foram lotados em outras
séries e, até, em outras disciplinas diferentes daquelas para as quais
fizeram concurso e se formaram.
Diante disso, o Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de
Minas Gerais (Sind-UTE/MG) e o Conselho Regional de Educação Física –
6ª Região, através de seus representantes, organizou-se e solicitou ajuda
aos representantes políticos para intermediar o diálogo entre os
professores, as organizações civis de representação e a Secretaria de
Estado de Educação, para discutirem o conteúdo da Resolução SEE nº
2.253/2013.
No dia 30 de abril de 2013, a partir do requerimento assinado pelos
deputados estaduais Ulysses Gomes de Oliveira Neto, Rogério Correia de
Moura Baptista e Luiz Tadeu Martins Leite, ocorreu uma Audiência Pública,
promovida pelas Comissões de Educação, Ciência e Tecnologia e de
Esporte, Lazer e Juventude, da Assembleia Legislativa de Minas Gerais
(ALMG), com o objetivo de debater o artigo 4º, da Resolução SEE nº
2.253/2013. Em todas as declarações dos trabalhadores em educação,
dos representantes sindicais, dos licenciandos e de alguns deputados,
pronunciadas na Audiência, afirmou-se a reivindicação da revogação do
referido artigo, assegurando, assim, que as disciplinas Ensino Religioso
(ER)2 e Educação Física fossem lecionadas, nos Anos Iniciais do Ensino
Fundamental, por profissionais com habilitação específica.
No que tange ao ER, para demonstrar a especificidade do conteúdo
e, consequentemente, do trabalho da referida disciplina, que acaba
requerendo um professor habilitado nessa área, os docentes e demais
debatedores, ao longo da Audiência Pública, explicitaram, através de
cartazes e de seus pronunciamentos, algumas expressões referentes aos
2
Neste trabalho, a nomenclatura utilizada é Ensino Religioso para se referir à disciplina
que se configura no tema deste texto. Dessa forma, apesar desse trecho se referir ao
artigo 4º, da Resolução SEE nº 2.253/2013, que faz o uso da designação Educação
Religiosa, utiliza-se o termo Ensino Religioso, recorrendo àquela nomenclatura, apenas,
quando se referir ao texto do instrumento normativo, em questão.
252
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
assuntos abordados nas aulas de ER, no intuito de defender a importância
da matéria na formação dos alunos.
A seguir, evidenciam-se as palavras e expressões expostas em
cartazes afixados no auditório, onde ocorreu a Audiência:
1. Relacionamentos Saudáveis, Harmoniosos e Equilibrados;
2. Cultura de Paz, Compreensão, Diálogo, Respeito e
Tolerância;
3. O Ser Humano como Projeto Infinito;
4. Valores em Primeiro Lugar;
5. Propiciando Escolhas Saudáveis.
Com base nas palavras e expressões expostas nos cartazes, como
Relacionamentos, Ser humano, Valores, Escolhas, Cultura de Paz,
Compreensão, Diálogo, Respeito e Tolerância, pode-se demarcar a base
epistemológica do Ensino Religioso, do currículo das escolas estaduais, a
partir da visão e da prática dos professores. No entanto, ressalta-se que,
neste trabalho, não se fará a análise do conteúdo dos cartazes
apresentados acima, assim como, da epistemologia do ER, focando na
discussão sobre o docente, que leciona nos Anos Iniciais do Ensino
Fundamental, a sua formação e a sua habilitação para trabalhar com os
conteúdos do Ensino Religioso, no referido nível de ensino.
Na Audiência Pública, vários expositores puderam manifestar as
suas opiniões acerca da Resolução SEE nº 2.253/2013 ou o
posicionamento dos órgãos que se fizeram presentes, e, a partir de
algumas falas, pôde se chegar à questão sobre a formação e a atuação do
professor de Ensino Religioso, ou seja, do docente especialista da área, e
do profissional generalista que leciona nos Anos Iniciais do Ensino
Fundamental.
A coordenadora-geral do Sind-UTE/MG, prof.ª Beatriz da Silva
Cerqueira, defendendo a presença, nos Anos Iniciais do Ensino
Fundamental, dos professores habilitados ou especialistas para lecionarem
as disciplinas Ensino Religioso e Educação Física, afirmou que ―[...] é um
desrespeito ao direito das crianças de ter um profissional habilitado nas
áreas de Educação Física e Ensino Religioso nos Anos Iniciais.‖
(IMPASSES..., 2013).
No sentido contrário à requisição da prof.ª Beatriz Cerqueira, a
subsecretária de Educação Básica, da Secretaria de Estado de Educação,
prof.ª Raquel Elizabeth de Souza Santos, reiterou que o professor,
253
FONAPER
licenciado em Pedagogia ou em Normal Superior, é o profissional
habilitado, legalmente, para atuar nos Anos Iniciais, devendo, assim,
lecionar todos os conteúdos que compõem a matriz curricular, do referido
nível de ensino.
O profissional, para trabalhar nos Anos Iniciais, não é o especialista de
conteúdo, é o habilitado pelo curso Normal, de nível superior, ou o
habilitado pelo curso de Pedagogia. Em todas as estruturas destes
cursos, lá dá plena autonomia a ele, que esses profissionais vão
lecionar: Português, Matemática, Geografia, História, Ciências,
Educação Física, Artes e Ensino Religioso. (IMPASSES..., 2013).
Ressalta-se que o argumento, apresentado acima, valida a decisão
do Estado mineiro em reafirmar que os componentes curriculares de
Educação Física e de Ensino Religioso devem ser ministrados pelo próprio
regente da turma, ou seja, o professor, cuja formação obrigatória se
consubstancia na posse do título de graduado em Pedagogia ou em
Normal Superior.
Uma aluna do curso de Pedagogia, de uma Instituição de Ensino
Superior (IES) particular, localizada em Belo Horizonte, e que estava
presente na Audiência Pública, realizada na ALMG, manifestou a sua
preocupação em lecionar os conteúdos de Educação Física e de Ensino
Religioso, pois ela não se sentia capacitada, por meio de sua graduação,
para ministrar os componentes citados, nos Anos Iniciais do Ensino
Fundamental (SIND-UTE., 2013). Ainda, ao encontro da fala dessa
expositora, um aluno do curso de Ciências da Religião, de uma IES
pública, situada na cidade de Montes Claros, indagou a prof.ª Raquel
Santos sobre o porquê das escolas estaduais não continuar seguindo a
orientação já praticada quanto à disponibilização dos professores de ER
para os Anos Iniciais, visto que, no próprio Estado, é ofertada, na
modalidade licenciatura, a graduação em Ciências da Religião,
responsável pela formação do docente em ER, o qual poderá atuar na
Educação Básica, ou seja, nos Ensinos Fundamental e Médio.
Diante desses argumentos e opiniões, questiona-se, especificamente
sobre a disciplina Ensino Religioso, o seguinte: o curso de Pedagogia
prepara o professor regente para abordar, sistematizada e cientificamente,
o conteúdo do ER? É necessário o docente especialista para o ER, nos
Anos Iniciais do Ensino Fundamental?
254
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Na tentativa de se encontrar alguma resposta aos questionamentos
acima, recorrer-se-á à legislação que normatiza, atualmente, a formação
dos professores para o Ensino Fundamental, especificamente, para os
seus cinco primeiros anos, às matrizes curriculares de três cursos de
Pedagogia, de diferentes IES, localizadas em Belo Horizonte, e, também,
às proposições de Cortella (2006), Passos (2006), Caron (2011) e
Junqueira (2011), as quais se referem à habilitação dos cursos de
licenciaturas em Ciências da Religião para a formação de professores de
ER.
Formação Docente para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental:
alguns aspectos das legislações nacional e estadual
Na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBen), a de nº
9.394, de 20 de dezembro de 1996, é previsto, após a alteração do artigo
62 através da Lei nº 12.796, de 04 de abril de 2013, que a formação de
professores, para a Educação Básica, deve ser realizada em cursos de
licenciatura, de nível superior, admitindo-se, para o exercício da docência
na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, a
formação mínima oferecida em cursos normais de nível médio.
Art. 62. A formação de docentes para atuar na educação básica farse-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena,
em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como
formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e
nos 5 (cinco) primeiros anos do ensino fundamental, a oferecida em
nível médio na modalidade normal. (BRASIL, 1996).
Ainda sobre isso, tem-se o Parecer CNE/CP nº 5, de 13 de dezembro
de 20053, que, ao tratar sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais para o
curso de Pedagogia, defini o exercício profissional daqueles que se
formarem na referida graduação, enfatizando, como base da formação
ofertada, a docência, cuja atuação professoral se efetiva na Educação
Infantil, nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental e em disciplinas
pedagógicas dos cursos de nível médio, na modalidade Normal, e de
Educação Profissional na área de serviços e apoio escolar.
3
Ressalta-se que este Parecer foi reexaminado pelo o de nº 3, de 21 de fevereiro de
2006, entretanto as mudanças propostas não alteraram os trechos utilizados neste
trabalho.
255
FONAPER
Diante disso, a Resolução CNE/CP nº 1, de 15 de maio de 2006,
estabelece, em seu artigo 5º, inciso VI, que o egresso da graduação em
Pedagogia, na modalidade licenciatura, deve estar apto a: ―VI - ensinar
Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História, Geografia, Artes,
Educação Física, de forma interdisciplinar e adequada às diferentes fases
do desenvolvimento humano;‖ (BRASIL, 2006).
É possível destacar, neste instante, que, de acordo com o
instrumento normativo acima, não é determinado o Ensino Religioso como
um conteúdo obrigatório a ser lecionado pelo professor habilitado no curso
de Pedagogia, demonstrando, assim, o avocamento de uma postura de
indefinição quanto ao componente curricular em questão.
Essa posição já tinha sido adotada, anteriormente, pelo Conselho
Nacional de Educação (CNE), que, ao versar, por exemplo, sobre a
formação de professores para o Ensino Religioso nas escolas públicas de
Ensino Fundamental, reforçou, através de o Parecer CNE/CP nº 97, de 06
de abril de 1999, a postura de que à União não cabe legislar sobre os
conteúdos curriculares dos cursos de ―formação religiosa‖ dos professores,
ficando o assunto sob a competência dos Estados e dos Municípios, os
quais devem respeitar ―as determinações legais para o exercício do
magistério, a saber: diploma de habilitação para o magistério em nível
médio, como condição mínima para a docência nas séries iniciais do
ensino fundamental;‖ (BRASIL, 1999).
Mediante a essa deliberação de definição da situação do ER aos
Estados, em Minas Gerais, foi promulgada a Lei nº 15.434, de 05 de
janeiro de 2005, que dispôs sobre o Ensino Religioso na rede pública
estadual de ensino. Em cinco artigos, a referida legislação determinou o
seguinte: a) o ER, de caráter facultativo, é definido como componente
curricular no Ensino Fundamental e deve respeitar a diversidade cultural e
religiosa; b) o ER deve seguir o modelo fenomenológico, buscando incluir
aspectos da religiosidade, da antropologia cultural e filosófica e da
formação ética; c) o ER deve ser ofertado no horário normal das escolas e,
caso o aluno opte por não cursar a referida disciplina, o estabelecimento
oferecerá outros conteúdos e atividades de formação para a cidadania; d)
seguindo a orientação dada na LDBen, o Estado normatizou, no artigo 5º,
a habilitação e a admissão dos professores de ER:
256
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Art. 5º O exercício da docência do ensino religioso na rede pública
estadual de ensino fica reservado a profissional que atenda a um dos
seguintes requisitos:
I -conclusão de curso superior de licenciatura plena em ensino
religioso, ciências da religião ou educação religiosa;
II -conclusão de curso superior de licenciatura plena ou de licenciatura
curta autorizado e reconhecido pelo órgão competente, em qualquer
área do conhecimento, cuja grade curricular inclua conteúdo relativo a
ciências da religião, metodologia e filosofia do ensino religioso ou
educação religiosa, com carga horária mínima de quinhentas horas;
III -conclusão de curso superior de licenciatura plena ou de
licenciatura curta, em qualquer área de conhecimento, acrescido de
curso de pós-graduação lato sensu em ensino religioso ou ciências da
religião, com carga horária mínima de trezentas e sessenta horas,
oferecido até a data de publicação desta Lei;
IV -conclusão de curso superior de licenciatura plena ou de
licenciatura curta, em qualquer área de conhecimento, acrescido de
curso de metodologia e filosofia do ensino religioso oferecido até a
data de publicação desta Lei por entidade credenciada e reconhecida
pela Secretaria de Estado da Educação.
§ 1ºFica assegurada isonomia de tratamento entre os professores de
ensino religioso e os demais professores da rede pública estadual de
ensino.
§ 2ºÉ garantido ao profissional que satisfizer requisito definido em
inciso do caput deste artigo o direito de participar de concurso público
para docência de ensino religioso na rede pública estadual de ensino.
(MINAS GERAIS, 2005).
Ao analisar a lei estadual, citada anteriormente, é importante
destacar a exigência posta para que um profissional possa lecionar o
Ensino Religioso, em uma escola da rede pública estadual. Para isso, é
necessário que o docente possua um curso superior de licenciatura plena
em Ensino Religioso, Ciências da Religião ou Educação Religiosa, ou
qualquer curso superior de licenciatura plena ou de licenciatura curta, que
tenha, em seu currículo, o conteúdo, com no mínimo 500 horas, relativo às
Ciências da Religião, à metodologia e filosofia do Ensino Religioso ou
Educação Religiosa, ou, ainda, um curso superior de licenciatura plena ou
curta, em qualquer área de conhecimento, acrescido de curso, com no
mínimo 360 horas, de Pós-graduação Lato Sensu em Ensino Religioso ou
em Ciências da Religião, ou de curso de metodologia e filosofia do Ensino
Religioso.
257
FONAPER
Ressalta-se, também, que, na Lei nº 15.434/2005, não há uma
delimitação explícita sobre a partir de qual nível de ensino é necessária a
presença do docente de Ensino Religioso com uma formação específica, o
que pode gerar a interpretação de que as orientações dadas, no artigo 5º,
podem ser adotadas para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental,
indicando, assim, a possibilidade da atuação, no referido nível, do
professor especialista para o conteúdo de ER.
Ensino Religioso e as Ciências da Religião: a formação docente
Ao tratar sobre a questão da formação do professor de Ensino
Religioso, Cortella (2006) reitera, primeiramente, que o ER deve ser visto
como um componente curricular obrigatório, revestido de seriedade, de
valor acadêmico e de rigor científico quanto qualquer outro componente
pedagógico, necessitando, assim, da ordenação intencional do seu
conteúdo no ambiente escolar, em instituições privadas ou públicas, pois
―[...] o estudo científico das religiões é tão laico quanto qualquer outro
inscrito na esfera das ciências que são ensinadas nas escolas, [...].‖
(PASSOS, 2006, p. 23).
Após a identificação dos três modelos que norteiam as tendências
predominantes nas práticas de Ensino Religioso, Passos (2006) afirma que
o modelo das Ciências da Religião, ao conferir à disciplina escolar a
autonomia epistemológica e pedagógica, permite a superação dos outros
dois modelos, a saber: o Catequético e o Teológico, os quais possuem um
caráter confessional que fere o princípio da laicidade dos currículos
escolares.
Dessa forma, para se buscar a afirmação do Ensino Religioso como
área de conhecimento, é importante fundamentar a sua competência em
ser um componente regular, nos currículos do Ensino Fundamental,
objetivando o ensino da religião com o pressuposto pedagógico. E, para
isso, há a requisição de uma formação específica que recorra ―[...] aos
fundamentos das Ciências da Religião, com todo o aporte que nos oferece
ao investigar as manifestações do religioso na história e nas sociedades
(de antes e de agora), seus campos simbólicos, as relações com o poder
político, sempre com a colaboração multidisciplinar de vários ramos do
saber.‖ (CORTELLA, 2006, p. 20).
258
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Essa formação específica fundamentada nas Ciências da Religião,
as quais concedem ao ER a base teórica e metodológica para a
abordagem da dimensão religiosa em seus diversos aspectos e
manifestações, objetivam, mediante as propostas de licenciatura das
Ciências das Religiões, ―[...] capacitar o profissional a exercer a docência
na disciplina atualmente denominada ER na rede pública e privada,
tratando o fenômeno religioso como característica cultural dos povos e
patrimônio da humanidade, passível de ser estudado e pesquisado.‖
(JUNQUEIRA, 2011, p. 185).
No intuito de defender a formação de professores de ER como o
meio fundamental para garantir a continuidade da disciplina escolar que
busca respeitar a liberdade religiosa, favorecer o exercício da cidadania e
contribuir no processo de formação integral dos estudantes, Caron (2011)
apresenta a matriz curricular do curso de Ciências da Religião –
Licenciatura Plena em Ensino Religioso, ofertado em três IES, no Estado
de Santa Catarina.
Para elucidar a estrutura da referida matriz, relacionar-se-ão todas as
disciplinas ofertadas no curso ofertado nas instituições citadas, que são:
Ações Comunitárias; Ações Comunitárias I e II; Atividades AcadêmicoCientíficas; Antropologia Religiosa; Cosmovisão das Religiões e dos
Movimentos Religiosos I e II; Cosmovisão das Religiões e Movimentos
Religiosos; Cultura e Tradições Religiosas; Didática; Didática Geral;
Ecumenismo e Diálogo Interreligioso; Educação Física I e II; Educação
Física – Prática Desportiva; Ensino Religioso no Brasil; Escrituras
Sagradas e Reencarnação; Escrituras Sagradas e Ressurreição I, II e III;
Estágio Curricular Supervisionado (Prática de Ensino); Estrutura e
Funcionamento de Ensino de 1º e 2º Graus; Estrutura e Funcionamento do
Ensino; Exegese I e II; Ética em Ciência da Religião; Ética em Ciências da
Religião I e II; Filosofia I e Filosofia da Educação; Filosofia da Religião;
Filosofia Geral; Filosofia Religiosa; História da Educação; História
Religiosa na América Latina; Informática Básica; Introdução aos Textos
Sagrados; Introdução às Escrituras Sagradas; Língua Portuguesa;
Metodologia de Ensino de 1º e 2º Graus; Metodologia de Pesquisa;
Metodologia do Ensino Religioso; Metodologia do Ensino Religioso I e II;
Metodologia do Trabalho Acadêmico; Mística e Fé; Prática de Ensino em
Ensino Religioso I - II Prática de Ensino – Estágio; Projetos de Pesquisa
em Ciências da Religião; Psicologia Geral; Psicologia da Aprendizagem;
259
FONAPER
Psicologia da Educação; Psicologia do Desenvolvimento; Psicologia do
Desenvolvimento
e
da
Aprendizagem;
Psicologia
Religiosa;
Psicopedagogia Religiosa; Religiosidade Popular na América Latina;
Religiosidade Popular; Seminário de Formação Humanística; Sociologia;
Sociologia da Educação; Sociologia Geral; Sociologia Religiosa; Técnica
de Redação; Teologia nas Tradições Religiosas; Textos Sagrados I e II;
Textos Sagrados I, II e III; Tópicos Especiais em Ensino Religioso;
Trabalhos de Conclusão de Curso – TCC.
O nível da Educação Básica, em que o licenciado em Ciências da
Religião deve atuar, é o Ensino Fundamental. Contudo, apesar da tradição,
em alguns estabelecimentos públicos e em quase todos os particulares, de
se ter, nos Anos Iniciais, a presença do professor especialista para lecionar
o Ensino Religioso, a normatização brasileira não exige a presença do
referido profissional nos cinco primeiros anos, pois, como já dito
anteriormente neste estudo, o professor regente é o responsável por
lecionar todos os componentes curriculares integrantes dos Anos Iniciais
do Ensino Fundamental.
Professor Regente e o Ensino Religioso: a matriz curricular dos
cursos de graduação em Pedagogia
Retornando à LDBen e à Resolução CNE/CP nº 1/2006, reitera-se
que a graduação em Pedagogia é o curso de nível superior responsável
pela formação dos professores que devem lecionar nos Anos Iniciais, do
Ensino Fundamental. E, com o objetivo de verificar se os egressos da
referida graduação estão habilitados para lecionarem o componente
curricular Ensino Religioso, nos primeiros cinco anos do nível em questão,
apresentar-se-á, abaixo, a matriz curricular de três licenciaturas em
Pedagogia, ofertadas em três distintas IES, localizadas em Belo Horizonte,
sem, contudo, entrar no mérito de análise das matrizes, focando, assim, na
identificação de alguma disciplina que, notadamente, busque abordar o
conteúdo do Ensino Religioso.
A matriz curricular da primeira instituição, aqui designada como IES
A, possui a seguinte estrutura:
260
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
TABELA 1 - Matriz Curricular do curso de Pedagogia, da IES A
DISCIPLINA
1º Período
2º Período
3º Período
4º Período
5º Período
6º Período
Alfabetização e Letramento I
Política Educacional
Metodologia de Pesquisa em Educação I
Sociologia da Educação I
Filosofia da Educação I
Alfabetização e Letramento II
Arte no Ensino Fundamental
Psicologia da Educação I
Filosofia da Educação II
Sociologia da Educação II
Atividades Teórico-Práticas I
História da Educação I
Política e Administração dos Sistemas Educacionais
Fundamentos e Metodologia do Ensino da Matemática I
Antropologia e Educação
Psicologia da Educação II
História da Educação II
Estágio Curricular de Introdução ao Campo Educacional
Atividades Teórico-Práticas II
Fundamentos e Metodologia do Ensino da Matemática II
Corpo e Educação
Estudos sobre a Infância
Teorias de Currículo
Processos Educativos nas Ações Coletivas
Escola e Diversidade: Interfaces Políticas e Sociais
Atividades Teórico-Práticas III
(continua)
CARGA
HORÁRIA
60h
60h
60h
60h
60h
60h
60h
60h
30h
30h
30h
30h
30h
60h
60h
60h
60h
60h
60h
60h
60h
60h
60h
30h
30h
120h
Fundamentos e Metodologia do Ensino de Língua
Portuguesa
Fundamentos e Metodologia do Ensino da Geografia
Didática
Fundamentos da Educação Inclusiva
Organização da Educação Infantil
Organização do Ensino Fundamental
Formação Livre
60h
Dificuldades no Ensino-Aprendizagem da Leitura e da
Escrita
Fundamentos e Metodologia do Ensino da História
Fundamentos e Metodologia do Ensino de Ciências
Físicas
Fundamentos e Metodologia do Ensino de Ciências
Biológicas
Estágio Curricular em docência no Ensino Fundamental
60h
60h
60h
60h
30h
30h
60h
60h
60h
60h
60h
261
FONAPER
(conclusão)
7º Período
Sistemas de Avaliação Educacional
Libras
Arte na Educação Infantil
Didática da Educação Infantil
Estágio Curricular em Educação Infantil
Políticas Públicas, Movimentos Sociais e Cidadania
Metodologia de Pesquisa em Educação II
8º Período
Economia e Política de Financiamento da Educação Básica
Observatório de Currículo: Educação Infantil
Observatório de Currículo: Ensino Fundamental
Optativa (3)
Estágio Curricular em Gestão da Escola e Coordenação
Pedagógica
Fundamentos Teórico-Metodológicos da Educação Popular
9º Período
Trabalho Docente e Relações de Trabalho nos Sistemas de
Ensino
Educação Social
Tópicos em Educação Social ou Tópicos Especiais em
Sociologia da Educação
Prática em Educação Social
Organização da Educação de Jovens e Adultos
Metodologia da Alfabetização de Jovens e Adultos
Prática em Educação de Jovens e Adultos
Monografia na área de Ciências da Educação
Optativa (4)
Formação Livre
Fonte: Elaborada pelo autor
60h
Não definido
60h
60h
120h
60h
60h
60h
30h
30h
60h
120h
60h
60h
60h
60h
60h
60h
60h
60h
60h
60h
60h
A matriz curricular da segunda instituição, aqui designada como IES
B, possui a seguinte estrutura:
TABELA 2 - Matriz Curricular do curso de Pedagogia, da IES B
(continua)
DISCIPLINA
1º Período
262
Pedagogia e sua Multidimensionalidade
História da Educação: Educação na Formação Social Moderna
Estudos Filosóficos: Sociedade e Educação
Psicologia da Educação: Teorias Psicológicas e Práticas
Educativas
Sociologia: Sociedade e Educação
Didática: Pensamento Educacional e Processo de EnsinoAprendizagem na Educação
CARGA
HORÁRIA
54h
54h
54h
54h
54h
72h
Língua Portuguesa
36h
Pesquisa em Educação
36h
Prática Pedagógica de Formação: - Atividade de Integração
Pedagógica
36h
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
2º Período
3º Período
4º Período
5º Período
História da Educação: Educação na Formação Social Moderna e
na Sociedade Brasileira
Estudos Filosóficos: Epistemologias da Educação
Sociologia: Sociedade e Educação
Psicologia da Educação para a Educação Infantil
Antropologia: Cultura, Sociedade e Educação
Didática: Processos de Aprendizagem na Educação Infantil e
nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental
Educação e Tecnologia: Sociedade da Informação e do
Conhecimento
Pesquisa em Educação
Práticas Pedagógicas de Formação: Atividade de Integração
Pedagógica, Estágio Supervisionado e Práticas Pedagógicas
História da Educação: Bases Sociais, Políticas do Pensamento
Educacional Brasileiro
Antropologia: Cultura Brasileira
Psicologia da Educação para os Anos Iniciais do Ensino
Fundamental
Estudos
do
Conteúdos
–
Ciências
da
Natureza:
Desenvolvimento da Criança na Educação infantil e Anos Iniciais
do Ensino Fundamental
Didática: Planejamento e Avaliação no Processo Pedagógico
Organização Curricular da Educação Básica
Estudos sobre Estatística Aplicada à Educação
Pesquisa em Educação
Práticas Pedagógicas de Formação: Atividade de Integração
Pedagógica, Estágio Supervisionado e Práticas Pedagógicas
Psicologia da Educação para a Educação de Jovens e Adultos
Língua Portuguesa: Conteúdos e Metodologias na Educação
Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental
Matemática: Conteúdos e Metodologias na Educação Infantil e
nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental
Geografia e História: Conteúdos e Metodologias na Educação
Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental
Ciências da Natureza: Conteúdos e Metodologias na Educação
Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental
Educação Física: Conteúdos e Metodologias na Educação
Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental
Pesquisa em Educação
Práticas Pedagógicas de Formação: Atividade de Integração
Pedagógica, Estágio Supervisionado e Práticas Pedagógicas
Pedagogia e sua Multidimensionalidade
Organização Curricular da Educação Básica
Língua Portuguesa: Conteúdos e Metodologias na Educação
Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental
Matemática: Conteúdos e Metodologias na Educação Infantil e
nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental
Organização e Funcionamento do Sistema Educacional –
Educação Básica
(continua)
72h
72h
54h
72h
54h
54h
36h
36h
81h
54h
54h
54h
54h
72h
72h
54h
36
92h
54h
72h
72h
72h
72h
72h
36h
92h
54h
72h
72h
72h
54h
Gestão da Escola na Educação Básica
72h
Pesquisa em Educação
54h
Práticas Pedagógicas de Formação: Atividade de Integração
Pedagógica, Estágio Supervisionado, Práticas Pedagógicas e
Práticas de Pesquisa
117h
263
FONAPER
6º Período
7º Período
8º Período
Estudos Sobre Necessidades Educacionais Especiais
Arte na Educação: Conteúdos e Metodologias na Educação
Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental
Língua Portuguesa: Conteúdos e Metodologias na Educação
Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental
Matemática: Conteúdos e Metodologias na Educação Infantil e
nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental
Geografia e História: Conteúdos e Metodologias na Educação
Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental
Ciências da Natureza: Conteúdos e Metodologias na Educação
Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental
Educação e Tecnologia: Mediação Tecnológica
Práticas Pedagógicas de Formação: Atividade de Integração
Pedagógica, Estágio Supervisionado, Práticas Pedagógicas,
Práticas de Pesquisa e Trabalho de Conclusão de Curso:
Elaboração de Monografia
Estudos Filosóficos: Ética na Formação do Educador
Organização Social e Técnica do Trabalho Capitalista: Profissão
Docente
Arte: Conteúdos e Metodologias na Educação Infantil e nos
Anos Iniciais do Ensino Fundamental
Matemática: Conteúdos e Metodologias na Educação Infantil e
nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental
Sala de aula: Espaço Social, Cultural e Histórico
Educação Física: Conteúdos e Metodologias na Educação
Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental
Introdução à Língua Brasileira de Sinais
Educação e Tecnologia: Mídias e Educação
Práticas Pedagógicas de Formação: Atividade de Integração
Pedagógica, Estágio Supervisionado, Práticas Pedagógicas,
Práticas de Pesquisa e Trabalho de Conclusão de Curso:
Elaboração de Monografia
Organização e Funcionamento do Sistema Educacional:
Educação Básica
Geografia e História: Conteúdos e Metodologias na Educação
Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
Gestão da escola na Educação Básica
Língua Portuguesa: Conteúdos e Metodologias na Educação
Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental
Avaliação Educacional – Sistemas e Instituições
Políticas Públicas para Educação Básica
Educação e Tecnologia: Informática Educativa
Práticas Pedagógicas de Formação: Atividade de Integração
Pedagógica, Estágio Supervisionado, Práticas Pedagógicas,
Práticas de Pesquisa e Trabalho de Conclusão de Curso:
Elaboração de Monografia
(conclusão)
72h
54h
72h
72h
54h
54h
36h
196h
54h
54h
54h
54h
54h
54h
54h
36h
196h
72h
54h
72h
54h
54h
72h
36h
166h
Fonte: Elaborada pelo autor
Ao comparar as matrizes curriculares da licenciatura em Ciências da
Religião e dos dois cursos de Pedagogia, percebe-se que, nas duas
últimas matrizes não há nenhuma disciplina que faz referência aos
conteúdos e às disciplinas que compõem as bases e os fundamentos das
Ciências da Religião, assim como, nenhuma matriz contempla a
especificidade do trabalho do professor com os conteúdos do Ensino
264
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Religioso, evidenciando, assim, a negligência quanto ao ensino desse
componente curricular, que, por meio do artigo 210, parágrafo 1º, da
Constituição Federal de 1988, e do artigo 33, da Lei nº 9.394/1996, se faz
obrigatória a sua oferta, em todo o Ensino Fundamental.
Segue, abaixo, a matriz curricular da terceira instituição, aqui
designada como IES C. Ela possui a seguinte estrutura:
TABELA 3 - Matriz Curricular do curso de Pedagogia, da IES C
(continua)
DISCIPLINA
1º Período
2º Período
3º Período
4º Período
5º Período
6º Período
Pedagogia: Identidade, Teorias e Práticas
Sociologia
Filosofia I
Laboratório de Pesquisa e Prática Educacionais I
Metodologia do Trabalho Científico
Leitura e Escrita
Sociologia da Educação
Didática I
Filosofia II
Fundamentos e História da Educação
Filosofia da Educação
Seminário de Integração I
Pedagogia da Educação Não Escolar
Metodologia da Alfabetização e Letramento I
Metodologia do Ensino da Matemática I
Pesquisa Pedagógica I
Antropologia Cultural e Educação
Cultura Religiosa I
Psicologia da Educação
Laboratório de Pesquisa e Práticas Educacionais II
Língua Brasileira de Sinais
Psicologia do Desenvolvimento e da Aprendizagem
Cultura Religiosa II
Seminário de Integração II
Didática II
Metodologia do Ensino da Matemática II
Metodologia do Ensino da Geografia
Metodologia do Ensino da História
Políticas Públicas de Educação
Educação de Jovens e Adultos
Metodologia do Ensino das Ciências Naturais
Avaliação Escolar
Laboratório de Pesquisa e Práticas Educacionais III
Teorias do Currículo
Estágio Curricular Supervisionado I
Seminário de Integração III
Princípios Epistemológicos da Educação Infantil
Metodologia da Escrita e Letramento na Educação Infantil
A Criança, a Natureza e a Sociedade: Aspectos Metodológicos
Metodologia do ensino da Matemática na Educação Infantil
Estágio Curricular Supervisionado II: Docência nos Anos Iniciais
do Ensino Fundamental
Pesquisa Pedagógica II
CARGA
HORÁRIA
64h
64h
64h
64h
64h
64h
64h
64h
64h
64h
64h
34h
32h
64h
64h
104h
64h
64h
64h
68h
64h
64h
32h
34h
64h
32h
64h
64h
64h
64h
64h
64h
68h
64h
140h
34h
64h
64h
64h
64h
140h
104h
265
FONAPER
7º Período
8º Período
A Família e a Escola na Educação Infantil
Literatura na Educação Infantil
Gestão e Trabalho Docente
Trabalho de Conclusão de Curso I
Estágio Curricular Supervisionado III: Docência na Educação
Infantil
Arte e Educação
Tecnologias e Práticas Educativas
Seminário de Integração IV
Fundamentos Legais e Organização da Educação Infantil
Corporeidade e Movimento
Estágio Curricular Supervisionado IV: Gestão Pedagógica
Trabalho de Conclusão de Curso II
Informática Aplicada à Educação Infantil
(conclusão)
32h
64h
64h
104h
116h
32h
68h
34h
64h
32h
116h
140h
64h
Fonte: Elaborada pelo autor
Diferentemente das instituições A e B, a IES C, através da oferta das
disciplinas Cultura Religiosa I e Cultura Religiosa II, demarca, em sua
matriz curricular do curso de Pedagogia, a presença de algum conteúdo
que se relaciona com o objeto do Ensino Religioso, ou seja, o fenômeno
religioso. Entretanto, ressalte-se que não há referência quanto às
especificidades do trabalho docente, no ER, especificamente, no que diz
respeito à questão didático-metodológica.
Considerações Finais
Quanto à formação do professor para os Anos Iniciais do Ensino
Fundamental, a legislação brasileira deixa claro que ela se dá por meio dos
cursos de graduação em Pedagogia, na modalidade licenciatura,
admitindo-se, para o exercício da docência na Educação Infantil e nos
Anos Iniciais do citado nível de ensino, a formação mínima oferecida em
cursos Normais de nível médio.
Diante disso, há o respaldo legal para a decisão da Secretaria de
Estado de Educação de Minas Gerais, disposta na Resolução nº 2.253, de
09 de janeiro de 2013, em restringir a docência, nos Anos Iniciais do
Ensino Fundamental, e, especificamente, dos componentes de Ensino
Religioso e de Educação Física, ao regente da turma, considerando o fato
do referido profissional ser habilitado, pelos cursos de graduação em
Pedagogia ou Normal, de nível médio ou superior, para lecionar todos os
conteúdos dos cinco primeiros anos.
Entretanto, através das matrizes curriculares dos cursos de
Pedagogia, de três Instituições de Ensino Superior, localizadas em Belo
266
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Horizonte, pode-se constatar, em duas IES, a ausência de disciplinas que
abordem os conteúdos básicos do Ensino Religioso, e, nas três
instituições, a falta de abordagem das especificidades do trabalho docente,
no ER, especificamente, quanto à questão didático-metodológica,
evidenciando, assim, o despreparo dos licenciados, formados nos referidos
cursos, para lecionar, nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, de forma
científica e sistematizada, os conteúdos da disciplina ER. Dessa forma,
sugere-se a reflexão mais aprofundada sobre a necessidade de inclusão
da discussão sobre os conteúdos e os aspectos didático-metodológicos do
Ensino Religioso, no âmbito da formação dos licenciados em Pedagogia.
Referências
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diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília,
20 dez. 1996. Disponível em: <
http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1996/lei-9394-20-dezembro-1996362578-normaatualizada-pl.html>. Acesso em: 12 ago. 2013.
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Parecer CNE/CP nº 97, de 06 de abril de 1999. Formação de professores
para o Ensino Religioso nas escolas públicas de ensino fundamental.
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Acesso em: 12 maio 2011.
BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação.
Resolução CNE/CP nº 1, de 15 de maio de 2006. Institui Diretrizes
Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia,
licenciatura. Diário Oficial da União, Brasília, 16 maio 2006. Disponível
em: <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/rcp01_06.pdf>. Acesso em:
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In: SENA, Luzia (Org.). Ensino religioso e formação docente: ciências
da religião e ensino religioso em diálogo. São Paulo: Paulinas, 2006. p. 1120.
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formação de professores de ensino religioso. In: OLIVEIRA, Pedro A.
Ribeiro; MORI, Geraldo de (Orgs.). Religião e educação para a
cidadania. São Paulo: Paulinas, 2011. p. 189-228.
267
FONAPER
IMPASSE marca audiência sobre aulas de educação física: professores
pedem revogação de artigo e SEE defende proposição, em reunião
conjunta de comissões da ALMG. 30 abr. 2013. Disponível em:
<http://www.almg.gov.br/acompanhe/noticias/arquivos/2013/04/30_comissa
o_aula_educacao_fisica.html>. Acesso em: 15 maio 2013.
JUNQUEIRA, Sérgio. A construção histórica entre o ensino religioso e as
ciências da religião no cenário brasileiro. In: OLIVEIRA, Pedro A. Ribeiro;
MORI, Geraldo de (Orgs.). Religião e educação para a cidadania. São
Paulo: Paulinas, 2011. p. 169-188.
MINAS GERAIS. Lei nº 15.434, de 05 de janeiro de 2005. Dispõe sobre o
Ensino Religioso na rede pública estadual de ensino. Minas Gerais Diário
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MINAS GERAIS. Secretaria de Estado de Educação. Resolução nº 2.253,
de 09 de janeiro de 2013. Estabelece normas para a organização do
Quadro de Pessoal das Escolas Estaduais e a designação para o exercício
de função pública na rede estadual de educação básica. Imprensa Oficial
do Estado de Minas Gerais, jan. 2013. Disponível em:
<http://crv.educacao.mg.gov.br/SISTEMA_CRV/banco_objetos_crv/8AF44
F7006BE4E7FBB4E35C2F0CAE7402412013165242_RESOLU%C3%87%
C3%83O%20SEE%20N%C2%BA%202253,%20DE%209%20DE%20JAN
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PASSOS, João Décio. Ensino religioso: mediações epistemológicas e
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formação docente: ciências da religião e ensino religioso em diálogo. São
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SIND-UTE/MG cobra revogação do artigo 4º da Resolução 2.553/13.
Disponível em: <
http://www.sindutemg.org.br/novosite/conteudo.php?MENU=1&LISTA=deta
lhe&ID=4743>. Acesso em: 15 maio 2013.
268
GT2: CURRÍCULO DO ENSINO RELIGIOSO
Coordenação:
Drando. Elcio Cecchetti (UFSC)
Me. Maria José Holmes Torres (SEMED João Pessoa/PB)
Ementa: Reconhecendo o Ensino Religioso como área do conhecimento este GT
objetiva aprofundar as discussões relacionadas às concepções, objetivos,
conteúdos, metodologias e procedimentos avaliativos concernentes aos processos
de ensino-aprendizagem em Ensino Religioso na Educação Básica; socializar
atividades de aprendizagem e práticas pedagógicas em Ensino Religioso e;
estabelecer relações entre currículo, conhecimento religioso e diversidade cultural
religiosa.
Palavras-chave: Currículo; Ensino Religioso; Conhecimento Religioso;
Diversidade Cultural Religiosa.
ENSINO RELIGIOSO PARA ALUNOS/AS DO ENSINO
FUNDAMENTAL I: ESTUDO SOBRE PROPOSTA CURRICULAR
UNIFICADA
Aldenir Teotonio Claudio (UFPB)1
Marinilson Barbosa da Silva (UFPB)2
Resumo:
O objetivo central desse estudo consistiu na discussão e aprofundamento sobre a proposta
de currículo unificado para o Ensino Religioso, a partir dos Parâmetros Curriculares
Nacionais para o Ensino Religioso (PCNER). Desenvolveu-se assim uma pesquisa de
cunho bibliográfico, utilizando-se de livros, artigos científicos, revistas e LDB realizando
assim um recorte do currículo trabalhado atualmente. Percebemos que Ensino Religioso é
um marco estruturado de leitura e interpretação da realidade, essencial para garantir a
possibilidade de participação do cidadão na sociedade de forma autônoma, para tal possui
uma linguagem própria, favorecendo a compreensão do fenômeno religioso, valorizando o
pluralismo e a diversidade cultural e religiosa, no cotidiano, e na sociedade, possibilitando a
compreensão do Sagrado no âmbito geral das diferentes culturas e manifestações
socioculturais.
Palavras-chave: Ensino Religioso; Diversidade Religiosa; Sagrado; PCNER.
Introdução
Ao longo dos anos, o Ensino Religioso vem sofrendo várias
modificações de acordo com a forma de conceber dos legisladores no
decorrer da história. Essas mudanças de concepção estão pautadas nas
Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: na Lei 4024/ 61, o
Ensino Religioso era concebido como ―aula de religião‖, em que a
doutrinação, a catequese tinha um lugar privilegiado na sala de aula, cuja
finalidade era "fazer seguidores‖; na Lei 5692/71 era "resgate de valores",
"aula de ética‖, tendo como propósito ―tornar as pessoas mais religiosas".
Com o advento da Lei 9394/96, aconteceu uma grande movimentação
nacional por parte dos profissionais da educação, Igrejas e vários
1
2
Professora de Ensino Religioso na Prefeitura Municipal de João Pessoa-PB. Mestranda
do Programa de Pós-Graduação em Ciências das Religiões - UFPB. E-mail:
[email protected]
Pesquisador do quadro permanente do Programa de Pós-Graduação em Ciências das
Religiões. Professor Adjunto e Vice-chefe do Departamento de Habilitações
Pedagógicas (DHP - CE - UFPB). E-mail: [email protected].
FONAPER
organismos da sociedade no que concerne da mudança na redação do Art.
33, onde constava a expressão: ―sem ônus para os cofres públicos‖. Essa
mobilização possibilitou uma grande manifestação que motivou a
proposição de vários projetos para mudança na referida redação.
Desenvolveremos neste trabalho pesquisa bibliográfica, com uma
abordagem qualitativa que dará respaldo e amparo indispensáveis para
seu desenvolvimento, pois o homem está sempre a procura de respostas
das perguntas ―de onde vim?‖ e ―para onde vou?‖. E a busca para essas
inquietações se dá na busca do transcendente. Essas questões são bem
presentes no universo dos educandos, com isso uma proposta de um
currículo unificado proporcionará a todos os educandos a possibilidade de
ter o mesmo currículo sem quaisquer adaptações ou improvisações
respeitando os que têm alguma confissão de fé ou aqueles que não têm; a
discussão em sala de aula não é acreditar ou não acreditar em um ―Deus
ou em deuses‖, mais sim ter o respeito, pois estamos em um País Laico e
esse respeito deve ser independe de religião.
Como em qualquer área, o Ensino Religioso veicula um
conhecimento específico e um objetivo a ser perseguido. E esse
conhecimento, segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino
Religioso, não é uma mera informação de conteúdos religiosos, um saber
em si. É um conhecimento que, numa nova visão pedagógica, oportuniza o
saber de si: ―o educando conhecerá ao longo do Ensino Fundamental, os
elementos básicos que compõem o fenômeno religioso, para que possa
entender melhor a busca do transcendente‖ (PCNER, 2010, p.47).
Procedimentos Metodológicos
Um dos fundamentos para a realização deste trabalho surgiu a partir
de alguns questionamentos levantados no grupo de pesquisa Formação,
Identidade, Desenvolvimento e Liderança de Professores de Ensino
Religioso (FIDELID) ao qual faço parte, no debate constante com meu
orientador e em minha pratica docente, devido há não existência de uma
grade curricular unificada para o Ensino Religioso, uma vez que, quando
recebo alunos transferidos de escolas do mesmo município, vejo que os
conteúdos ministrados diferem do que estou trabalhando naquele
momento, estes muitas vezes distorcendo totalmente do currículo
trabalhado segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino
272
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Religioso (PCNER), cuja orientação se fundamenta na proposta dos cinco
eixos temáticos: Culturas e Tradições Religiosas; Escrituras sagradas e/ ou
Tradições Orais; Teologias; Ritos e Ethos. Realizaremos uma pesquisa
exploratória, com base na análise bibliográfica e qualitativa. Mesmo os
PCNER não sendo um documento oficial elaborado pelo Ministério da
Educação (MEC), contribuem efetivamente na ação educativa e no
processo de ensino e aprendizagem em sala de aula. O ensino religioso de
matrícula facultativa é parte integrante da formação básica do cidadão e
constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino
fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do
Brasil, vedadas, quaisquer formas de proselitismo (art. 33 da Lei nº 9394
de 20 de dezembro de 1996). Assim o currículo do ensino Religioso deve
ser fundamentado na diversidade cultural e no diálogo e comunicação
entre grupos sociais diversos, inclusive das culturas minoritárias do país,
atuando de forma Multicultural.
Diante disto, pretendemos adentrar na questão curricular com o
intuito de provocar reflexões e inquietações nos educadores para a
estruturação da unificação do currículo de Ensino Religioso,
proporcionando ao educando a possibilidade de estudar o mesmo
conteúdo referente à sua série independente da escola que esteja inserido
no mesmo município.
Esperamos que esse artigo contribua para as discussões sobre o
Ensino Religioso, sua estruturação enquanto disciplina, seu currículo, seus
conteúdos, independente de sua nomenclatura e que os futuros cientistas
das religiões sintam-se provocados a pensar nessa temática.
Educação e Religião
A dimensão teórico-prática da Educação e Religião é um processo
altamente complexo, e, portanto, uma necessidade que se impõe, tendo
em vista que a religiosidade está arraigada na tradição cultural e
profundamente incorporada na experiência pessoal do ser humano,
repercutindo diretamente no espaço escolar. Muitas vezes esta relação é
elaborada de forma conformista, burocrática e confessional pelos docentes
do ensino religioso.
No sentido mais amplo, educação é um processo de atuação de uma
comunidade sobre o desenvolvimento do indivíduo a fim de que ele possa
273
FONAPER
atuar em uma sociedade pronta para a busca da aceitação dos objetivos
coletivos, à medida que o homem se educa não passa somente a aceitarse, mas busca uma transformação dele e do mundo onde está inserido,
pois a função social da educação hoje não é só transmitir conhecimento
formal, mas educar para a vida, para o respeito e para a coletividade. Para
tal educação, devemos considerar o homem no plano sociocultural,
intelectual e espiritual consciente das possibilidades e limitações, capaz de
compreender e refletir sobre a realidade do mundo que o cerca. Segundo
Aurélio (2002), educação é o processo de desenvolvimento da capacidade
física, intelectual e moral da criança e do ser humano em geral, visando a
sua melhor integração individual e social.
Consideramos que a educação tem caráter permanente. Não há
seres educados e não educados, estamos todos nos educando. Existem
graus de educação, mas estes não são absolutos. Esta afirmação tão
coerente nos faz refletir sobre o processo educativo contínuo, como base
de uma constante busca pela melhoria da qualidade da formação docente
e discente. A ação educativa, portanto, implica um conceito de homem e
de mundo concomitantes, é preciso não apenas estar no mundo e sim
estar aberto ao mundo (FREIRE, 1996).
Esta perspectiva nos faz entender a educação enquanto
desenvolvimento integral do indivíduo: corpo mente espírito, saúde,
emoções, pensamentos, conhecimento, expressão, etc. Tudo em benefício
da própria pessoa, e a serviço de seu protagonismo, autonomia, bem
como, sua integração construtiva com toda a sociedade. Neste sentido,
compreendemos que a educação do cidadão é um processo complexo que
inclui múltiplos aspectos, inclusive o religioso enquanto dado antropológico
e sócio cultural presente na história da humanidade. O conhecimento é
assimilação crítica e responsável de conteúdos e métodos acumulados
pelas ciências no decorrer da história, e a universidade apresenta-se como
facilitadora dessa, ao ensinar a aprender, ao oferecer aos educandos
posturas e estratégias cognitivas e éticas (PASSOS, 2007).
Este pensamento nos leva a interpretar que o Curso de Ciências das
Religiões participa desse processo complexo de ensinar a conhecer com
autonomia e responsabilidade que é creditado à universidade, pois, a
Religião compõe o conjunto dos demais conhecimentos, tanto como fonte
de informação sobre o ser humano, a sociedade e a história, quanto como
fonte de valor para a vida dos educandos.
274
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
De acordo com Alves (2003), a religião está mais próxima de nossa
experiência pessoal do que desejamos admitir, é como um espelho no qual
nos vemos, ela não se liquida com a abstinência dos atos lamentais e a
ausência dos lugares sagrados, ela permanece e frequentemente exibe
uma vitalidade que se julgava extinta. Basta depararmos com uma
situação de dor, na qual todos os recursos técnicos tenham se esgotado
para acordarmos um pouco videntes, profetas, benzedores, mágicos,
curadores, etc., aquele que reza e suplica sem saber ao certo a quem deve
pedir ou entregar-se.
É fácil, portanto, identificar, isolar e estudar a religião como
comportamento exótico de grupos sociais restritos e distantes, sendo
necessário reconhecê-la como presença invisível, sutil e disfarçada, pois,
ela se constitui em um dos fios que se tece o acontecer do nosso cotidiano
(ALVES, 2003). Então, por mais que determinados grupos pareçam
exóticos estes devem ser visto, com respeito, como os demais grupos
religiosos. A cada dia cresce fervorosamente o numero de religiões,
comunidades, seitas, ou grupos alternativos que não querem fazer parte
de grupos que tenham ritos, dogmas ou praticas religiosas, então o desafio
de ser professor de ensino religioso cresce, pois esse componente
curricular deve ser estruturado dentro de uma base epistemológica
pautada no fenômeno religioso e não ensinar o que surge rapidamente ou
o que se ouvi falar, levar para sala de aula apresentar como verdade
absoluta, e pronta, é um risco, isso, porque o artigo 33 (PCNER) em sua
redação, mais atual deixa a cargo dos estados e municípios decidirem o
que ensinar com isso enfrenta-se esquemas políticos, tudo vai depender
de quem está ―assinando‖ que esse tenha uma conduta ética e não
tendenciosa.
Sabemos que o Ensino Religioso vem de uma discussão histórica em
nosso país com mais, de 500 anos sem alcançar a legalidade efetiva,
única disciplina inserida na Constituição Federal Brasileira, mais a coisa
não anda, historicamente falando, houve avanços e retrocessos, quando
falamos em uma unificação curricular, não pretendemos, alçar voo tão
altos e dizer agora será assim, até porque, quando se implanta no
currículo, uma disciplina obrigatória para a escola e facultativa para o
aluno, por si só a disciplina fica com viés de ―coisa fácil‖, com isso permite
a não eficácia da sua efetivação, pensando no que temos hoje veremos
que a sociedade civil, o Fonaper, os professores, os leigos trabalham em
275
FONAPER
função desse componente, mais quem de fato e de direito deveria
organizar e estruturar a disciplina como qualquer outro componente.
Acreditamos que com a possibilidade dos municípios ou estados,
estruturarem um currículo de Ensino Religioso Unificado, iniciariam uma só
linguagem, dentro da não confessionalidade, e independente do gestor, do
diretor, do partido politico, da religião, esse ensino não seria da
conveniência de um grupo, mais sim de culturas diversas contidas no
mesmo País.
Ensino Religioso
Não há como falar de Ensino Religioso sem falar do FONAPER, que
é a própria vivência do Ensino Religioso, e é o instrumento responsável por
toda a evolução desse componente nas escolas do Brasil. Então na
assembleia dos 25 anos do CIER - Conselho das Igrejas para o Ensino
Religioso, realizada em Florianópolis nos dias 25 e 26 de setembro de
1995, aconteceu à organização do Fórum Nacional do Ensino Religioso,
onde foi instalado em 26 de setembro de 1995 e depois transformado em
FONAPER - Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso, sendo
formado por educadores, organismos e entidades interessadas e/ou
envolvidas com o Ensino Religioso.
O FONAPER tem como objetivos consultar, refletir, propor, deliberar
e encaminhar assuntos relacionados ao Ensino Religioso cujas finalidades
são: exigir que a escola, de qualquer natureza, ofereça esta disciplina em
todos os níveis de escolaridade, respeitando a diversidade e as diferentes
opções religiosas; contribuir para que o espaço pedagógico atenda o
entendimento a busca do Transcendente; subsidiar o Estado na definição
do conteúdo programático; pessoas jurídicas e físicas podem se filiar ao
Fórum desde que sejam identificadas com o Ensino Religioso
(www.fonaper.com.br).
O Ensino religioso é um componente curricular que visa discutir a
diversidade e a complexidade do ser humano como pessoa aberta às
diversas perspectivas do sagrado presentes nos tempos e espaços
histórico-culturais. Esse ensino deve estar atento para essa questão, pelo
fato de haver, nas escolas, diferentes opções e dimensões de fé. Saber
respeitar o diferente e as diferenças e com eles interagir, para esse
componente é um marco referencial. Em um mundo culturalmente
276
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
diversificado nos aspectos educacionais, culturais, religiosos, sociais,
étnicos, tecnológicos, nos vemos frente a um grande desafio que é
repensar a educação, a prática pedagógica, o processo de ensinoaprendizagem e o currículo, que começou a ser pensado a partir da
industrialização.
Deparamo-nos com um desafio maior ainda, que ocorreu com a
implantação do Ensino Religioso nas Escolas públicas como componente
curricular de matrícula facultativa para os educandos e obrigatória para
escola. A LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) aponta
para o respeito à diversidade religiosa brasileira, daí a importância da
abordagem do fenômeno Religioso, mesmo sabendo que esse ensino não
aborda apenas a dimensão religiosa do ser humano, consideramos que há
uma confusão, com a disciplina ensino religioso por parte de alguns
educadores, mesmo nos reunindo sistematicamente, há não existência de
uma grade curricular que seja comum para professores da disciplina, deixa
os professores autônomos e sem direcionamento, lembrando que o
documento (PCNER- FONAPER) que orienta a disciplina ainda não é
oficial, ele sugere uma gama de conteúdos, mas o que percebemos é que
o conteúdo é aplicado de maneira individual, por mais que o grupo de
professores planeje junto, na prática no dia-dia depende do
comprometimento do profissional.
Esse componente curricular, não está estruturado como as demais
disciplinas do currículo, como os conteúdos definidos e selecionados para
os quatros bimestres, ainda falta formação e capacitação para professores,
uma epistemologia específica respeitando a imparcialidade da disciplina, a
ética na não propagação de um proselitismo para determinado confissão
de fé, a formação acadêmica para os profissionais que atuam na disciplina.
O Ensino Religioso, como as demais disciplinas do currículo escolar,
prevê também a organização social das atividades, a organização do
tempo e do espaço, assim como a seleção e os critérios de uso dos
materiais e recursos, sendo por isso, necessário assumir um referencial
metodológico na perspectiva de totalidade. A disciplina do Ensino Religioso
insere-se na escola como um exercício de ciência a ser feito com os
alunos sobre a religião em suas expressões simbólicas e valorativas.
Participa do processo complexo de ensinar a conhecer com autonomia e
responsabilidade o que é creditada a escola, lembrando que a religião
compõe o conjunto dos demais conhecimentos.
277
FONAPER
De acordo com Gilz (2009), é preciso zelar pelo respeito às
diversidades culturais e religiosas dos alunos ao lidar com o Ensino
Religioso, ou seja, chama a atenção para o tratamento que deve ser dado
na pluralidade e diversidade em sala de aula. Nesta concepção o Ensino
Religioso, valorizando a diversidade cultural-religiosa em sala de aula e
consciente da função social da educação no atual contexto históricocultural busca auxiliar na compreensão das diferentes formas de exprimir o
transcendente, inclusive, contribuir para o respeito àqueles que não
pertencem a nenhuma religião e os que dizem não professar crença
alguma.
O Ensino Religioso na escola propõe analisar o fenômeno religioso
com base na convivência social dos alunos, configurando-o objeto de
estudo e conhecimento na diversidade cultural-religiosa. Favorece na
construção de respostas aos questionamentos existenciais dos estudantes,
no entendimento da identidade religiosa e no convívio com as diferenças
(OLIVEIRA et. al, 2007).
Com relação aos conteúdos curriculares do ER estes são orientados
pelos eixos temáticos das culturas e tradições religiosas; teologias; textos
sagrados e tradições orais; ritos e ethos. O currículo é o instrumento que
aciona as possibilidades de aprendizagem e a educação integral latentes
na sala de aula não só no que se refere aos conteúdos, como também ao
planejamento de atividades.
O FONAPER, ao organizar a primeira Capacitação para o novo
milênio, preparando os professores de Ensino Religioso à distância, na
introdução aos Cadernos de Estudo, fez um verdadeiro manifesto a favor
de um novo Ensino Religioso.
Segundo as orientações de Carniato (2010), é possível de forma
pedagógica, organizar a diversidade de informações e de possíveis
abordagens do conteúdo em cinco eixos temáticos, partindo-se do visível,
isto é, do conhecimento o qual os estudantes têm acesso fora da escola,
por meio da cultura, da comunicação, da observação do meio ambiente ou
da experiência familiar, conforme abaixo:
• Ritos, festas, locais sagrados, símbolos - Centros religiosos,
templos, igrejas, sinagogas, mesquitas, terreiros, casas de reza;
cerimônias, oferendas, cultos, liturgias, rituais etc.;
• Tradições Religiosas – Indígenas, Africanas e Afro-brasileiras,
Judaísmo, Xintoísmo, Hinduísmo, Budismo, Islamismo Fé Bahá‘i,
278
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Protestantismo, Catolicismo, Pentecostalismo, novos movimentos
religiosos ecléticos e sincréticos, religião cigana e outras;
• Teologias das Tradições Religiosas - Diferentes nomes e atributo
do ser transcendente, diferenças e semelhanças doutrinas entre
as tradições religiosas; mitos de origem; crenças na imortalidade:
ancestralidade, reencarnação, ressurreição;
• Textos Sagrados – Orais: mitos e cosmo visões das tradições
indígenas, ciganas, africanas; Escritos: livros sagrados das
antigas civilizações e das tradições religiosas atuais;
• Ethos dos Povos e das Culturas – Costumes e valores dos povos
e de suas religiões.
Considerando os eixos temáticos acima relacionados sob os moldes
do FONAPER, consideramos que o Ensino Religioso é essencialmente
interdisciplinar, com isso, ele requer atividades interativas que
proporcionem não só a pesquisa rigorosa, a reelaboração de dados, mas
também a produção de formas literárias e artísticas do conhecimento
adquirido e reflexão. Juntamente com experiências significativas na
educação integral, pois, nenhuma disciplina como o Ensino Religioso lida
com as questões humanas universais. Assim, torna-se imprescindível o
uso de debate em classe, diálogo em grupo, mutirão de ideias, entre
outros.
Sobre Currículo
Em um mundo culturalmente diversificado nos aspectos
educacionais, culturais, religiosos, sociais, étnicos, tecnológicos, nos
vemos frente a um grande desafio que é repensar a educação: a prática
pedagógica, o processo de ensino- aprendizagem e o currículo.
É importante situarmos que os estudos sobre currículo nasceram a
partir das teorias tradicionais nos Estados Unidos como um campo
profissional especializado, as quais se organizavam em: ensino,
aprendizagem,
avaliação,
metodologia,
didática,
organização,
planejamento, eficiência e objetivos. Já as Teorias Críticas de Currículo
possuem como palavras-chave ideologia, reprodução cultural e social,
poder, classe social, capitalismo, relações sociais de produção,
conscientização, emancipação e libertação, currículo oculto e resistência e,
as Teorias Pós-Críticas: identidade, alteridade, diferença, subjetividade,
279
FONAPER
significação e discurso, saber-poder, representação, cultura, gênero, raça,
etnia, sexualidade e multiculturalismo.
A década de 60 foi marcada por grandes agitações e
transformações, as teorias críticas do currículo efetuam uma completa
inversão nos fundamentos das teorias tradicionais, onde o currículo estava
baseado na cultura dominante. Na perspectiva fenomenológica o currículo
era visto como experiência e como local de interrogação e questionamento
da experiência, não podendo ser compreendido e transformado se não
fizermos questionamentos fundamentais com as relações de poder.
Henry Giroux foi um dos grandes amigos de Paulo Freire, inclusive,
escreveram alguns textos a quatro mãos. O teórico crítico da cultura e da
educação, Henry Giroux, foi um dos fundadores da pedagogia crítica nos
Estados Unidos, além disso, foi pioneiro nos estudos voltados para a
cultura, os jovens, o ensino superior e público, os meios de comunicação e
teoria crítica. Como crítico, propôs reflexões sobre as teorias educacionais,
escola e mais ainda, sobre os professores e seu papel no processo ensinoaprendizagem, bem como a influência dos mesmos nos alunos.
Segundo Giroux (1997) a escola é um local onde a cultura da
sociedade dominante é aprendida e inculcada nos alunos, à mesma
prepara os estudantes, não somente para ingressarem no mercado de
trabalho, mas no meio social.
Contudo a escola para Giroux (1997) pode se tornar um veículo para
ajudar cada estudante a desenvolver todo o seu potencial como pensador
crítico e participante responsável no processo democrático simplesmente
alterando-se a metodologia e o currículo oficial nos estudos sociais.
O currículo oculto é constituído por todos aqueles aspectos do
ambiente escolar que, sem fazer parte do currículo oficial, explícito,
contribuem, de forma implícita para aprendizagens sociais relevantes
(...) o que se aprende no currículo oculto são fundamentalmente
atitudes, comportamentos, valores e orientações... (SILVA, 2001, p.
78).
É notório que todos os profissionais comprometidos com a educação
se angustiam em: ―o que ensinar?‖ e ―como ensinar?‖, em princípio as
teorias do currículo tentaram responder as perspectivas tradicionais como
uma questão simplesmente técnica, ela se tornaria mais complexa na
medida em que as teorias críticas e pós-críticas passavam a conceber o
280
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
currículo como um campo ético e moral, ―teorizar‖ o currículo resumia-se
em discutir as melhores e mais eficientes formas de organizá-lo.
A primeira vez que se utilizou a palavra currículo foi em 1918 (Bobbitt
– The curriculum - Currículo é organização, é mecânica, é economia). A
sua inspiração teórica foi à administração científica de Taylor.
Especificação precisa de objetivos, procedimentos e métodos para a
obtenção de resultados passíveis de serem mensurados.
A necessidade de pensar no currículo surge devido à
industrialização. Nessa altura o modelo institucional da concepção de um
currículo era a fábrica. O currículo seria sempre o resultado de uma
seleção, parar, observar o público, selecionar o que é pertinente para
aquele grupo.
Para elaborar um currículo deve-se selecionar o que pretendemos
com base nas seguintes questões: que tipo de ser humano se quer? (uma
vez que o currículo pretende alterar pessoas). O que queremos que ele
saiba?
O currículo é sempre o resultado de uma seleção, então nos
perguntamos o que queremos que nossos alunos saibam. Para Giroux
(1997), o currículo está ligado diretamente às relações sociais de poder e a
desigualdade, pois ele envolve as construções dos significados e valores
culturais, não estando simplesmente envolvido com a transmissão de
―fatos‖ e conhecimentos ―objetivos‖.
Deparamo-nos com um desafio maior ainda, que ocorreu com a
implantação do Ensino Religioso nas Escolas Públicas como componente
curricular de matrícula facultativa para os alunos e obrigatório para escola,
pois inicialmente o pensamento era que o grande desafio seria quebrar
preconceitos em relação às religiões e trabalhar o respeito, o resgate de
valores, à etnia, gênero e sexualidade, mas à medida que, fomos nos
apropriando do conhecimento vimos que teríamos que focar nosso
trabalho no respeito e conhecimento à diversidade cultural e religiosa e
não na religião A, B, ou C.
O conhecimento não é exterior ao poder, o conhecimento não se opõe
ao poder. O conhecimento não é aquilo que põe em xeque o poder: o
conhecimento é parte inerente do poder (...), o mapa do poder é
ampliado para incluir os processos de dominação centrados na raça,
na etnia, no gênero e na sexualidade (SILVA, 2001, p.148-1149).
281
FONAPER
A LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) aponta para
o respeito à diversidade religiosa brasileira, daí a importância da
abordagem do Fenômeno Religioso, mesmo sabendo que esse ensino não
aborda apenas a dimensão religiosa do ser humano, pois muitas das vezes
é na aula do Ensino Religioso que o educando tem a oportunidade de
expressar-se, não só sobre sua religião, a religião do outro, mais o que a
sociedade apresenta como o fenômeno religioso.
O currículo aparece, assim, como o conjunto de objetivos de
aprendizagem selecionados que devem dar lugar à criação de
experiências apropriadas que tenham efeitos cumulativos avaliáveis,
de modo que se possa manter o sistema numa revisão constante,
para que nele se operem as oportunas reacomodações (SACRISTÁN,
2000, p. 46).
Um currículo escolar é primeiramente, no vocabulário pedagógico,
um percurso educacional, um conjunto contínuo de situações de
aprendizagem às quais um indivíduo vê-se exposto ao longo de um dado
período, no contexto de uma instituição de educação formal.
O currículo está irremediavelmente envolvido nos processos de
formação pelos quais nós nos tornamos o que somos e é uma questão de
identidade e poder. O currículo é lugar, espaço, território, é relação de
poder, é trajetória, viagem, percurso, é autobiografia, nossa vida,
curriculum vitae: no currículo se forja nossa identidade, é texto, discurso,
documento, é documento de identidade (SILVA, 2003).
Contribuições para unificação do Currículo
A mudança do enfoque da disciplina de Ensino Religioso, para as
escolas brasileiras, a partir da Lei 9475/97 e os atuais Parâmetros
Curriculares Nacionais de Ensino Religioso são os eixos norteadores da
nova proposta curricular para o Ensino Religioso. Tal proposta considera a
disciplina como:
• Uma disciplina escolar concebida na diversidade cultural religiosa
do Brasil.
• Uma disciplina centrada na antropologia religiosa e não na
catequese ou exposição de doutrina.
282
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
• Uma disciplina organizada para possibilitar o acesso ao
conhecimento religioso - patrimônio da humanidade, a partir da
pluralidade cultural religiosa da sala de aula.
• Uma disciplina curricular do Ensino Fundamental, que a partir de
sua especificidade, o religioso, contribui de forma significativa,
juntamente com as demais disciplinas escolares, na formação
básica do cidadão, conforme o disposto no artigo 33 da Lei e
Diretrizes Básicas da Educação, n. 9394 de 20 de dezembro de
1996.
Os PCNER ao centrarem a disciplina de Ensino Religioso na
antropologia religiosa pressupõem que o ser humano é um ser dotado de
múltiplas capacidades: que pensa, sente, se relaciona e age. Estas
capacidades possibilitam o homem ―ser humano‖ a viver no seu cotidiano,
em seu mundo impregnado de diferentes nuanças, compostos pela sua
própria essência, e pelo outro, pelo mundo e pela sociedade na qual está
inserido, o homem é produto do meio, porem ele é capaz de fazer suas
próprias escolhas a partir do conhecimento adquirido.
Na tentativa de expressar e nomear o vivenciado o homem e a
mulher utilizam de metáforas, imagens, nomes e títulos inscritos em uma
cultura. Os PCNER, procurando respeitar de forma igual às diversas
tradições religiosas, usam para refletir e dialogar sobre a temática em
questão, a expressão "o Transcendente", que significa "muito elevado,
superior, sublime, excelso; que transcende os limites da experiência
possível, metafísico". (PCNER, p.4)
O Transcendente nos PCNER é estudado através do fenômeno
religioso. Fenômeno este, que surge da relação ou experiência entre o ser
humano e o Transcendente.
Dessa forma, o objeto de estudo, na disciplina de Ensino Religioso,
não é a causa e sim, o efeito ou consequência. O objeto de estudo não é o
Transcendente em si mesmo, centra-se no produto humano que se dá do
encontro da pessoa com essa realidade, o fenômeno religioso. Produto
que ao ser organizado, dá origem aos sistemas religiosos que alimentam
cada cultura e as diversas tradições religiosas.
Não se propõe desinteresse frente ao Transcendente, mas, a busca
por uma maior compreensão, que transparece nas diversas tradições
religiosas e que, na sociedade brasileira, tem suas raízes: africanas,
indígenas, ocidentais e orientais.
283
FONAPER
O objetivo central da disciplina é facilitar a compreensão das formas
que exprimem o Transcendente na superação da finitude humana e que
determinam subjacentemente, o processo histórico da humanidade,
valorizando o pluralismo e a diversidade cultural presentes na sociedade
brasileira.
Dentre todos os objetivos destacamos: proporcionar o conhecimento
dos elementos básicos que compõem o fenômeno religioso, a partir das
experiências religiosas percebidas no contexto do educando. Subsidiar o
educando na formulação do questionamento existencial, em profundidade,
para dar sua resposta, devidamente informado. Analisar o papel das
tradições religiosas na estruturação e manutenção das diferentes culturas
e manifestações socioculturais. Facilitar a compreensão do significado das
afirmações e verdades de fé das tradições religiosas. Refletir o sentido da
atitude moral, como consequência do fenômeno religioso, expressão da
consciência e da resposta pessoal e comunitária do ser humano.
Possibilitar esclarecimentos sobre o direito à diferença na construção de
estruturas religiosas que têm na liberdade o ser valor inalienável. Promover
o diálogo como um dos elementos construtores da cidadania, reverência e
alteridade. Favorecer ao aluno o conhecimento sobre os elementos
básicos que compõem os fenômenos religiosos, a partir do seu contexto
sociocultural. Conceder ao educando a oportunidade de refletir sobre a
história e origem dos textos sagrados, relacionando-os com as práticas
religiosas nos diferentes grupos (PCNER, 1997).
Compreender que a ideia do Transcendente em cada tradição
religiosa se constitui no valor supremo de uma cultura, e que é de suma
importância que o educando exteriorize suas ideias religiosas,
reverenciando as diferenças do outro. Compreender que em quase toda
estrutura religiosa o objeto de estudo é o Transcendente. Analisar a
estrutura religiosa como um todo se colocando como parte integrante dela,
se posicionando de forma lógica diante dos questionamentos, relacionando
o conhecimento religioso adquirido com o seu próprio contexto. Destacar
os valores morais como subsídios importantes para o crescimento pessoal
e social de cada indivíduo. Analisar as mudanças e permanências na
religião, articulando as perspectivas que contemplem a singularidade das
diferentes tradições religiosas. Conhecer as possíveis respostas dadas
perante o fato morte, orientadoras das verdades de fé, da valorização em
284
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
atitudes éticas e expressas em diferentes métodos de relacionar-se com o
Transcendente, consigo mesmo, com o outro e com o mundo.
Considerações Finais
A Transcendência é a companheira da ação humana em todas as
etapas da aventura da pessoa e origem de seus projetos enquanto desejo
e utopia. O senso religioso é o substrato da cultura e, portanto, buscar os
fundamentos para o Ensino Religioso remete à questão do fundamento da
vida humana. Entende-se, dessa forma, a religiosidade como parte
fundamental integrante do conhecimento humano, nessa compreensão de
ser humano como finito se fundamenta o fenômeno religioso, que lhe
possibilita construir-se na liberdade e plenitude humana. No
Transcendente a pessoa procura respostas para as situações-limites: o
nascimento, a morte, a doença, as catástrofes, o amor, o altruísmo e as
grandes opções. A pessoa defronta-se com essas situações, questiona-se
quanto ao por que delas, buscando o real sentido da vida. Ela indaga-se,
procurando respostas às perguntas clássicas: Quem sou? De onde vim? O
que acontece depois da morte? Por que isto acontece comigo? Ao
questionar-se, a pessoa estabelece tensões entre a realidade vivida e a
realidade do inexplicável, que transcende o tempo, a consciência e o
mundo palpável.
Conhecer as tradições religiosas significa entrar em contato com um
mundo pluricultural no qual estamos inseridos. As sociedades e os
indivíduos, apesar dos níveis variados, todos, entram em relação com o
mundo religioso que é inerente ao homem. Assim esse Transcendente, o
sagrado e o luminoso, permanecem atraindo e fascinando o homem no
contexto pós-moderno. Apesar do avanço da ciência, da tecnologia, da
robótica e da informática, desse mundo globalizado continuamos a nos
questionar, e esses questionamentos nos levam a questionar que no ser
humano há algo misterioso, indecifrável e insondável que o faz sentir-se
criatura, limitado, dependente, e, paradoxalmente aberto ao infinito, com
desejo de imortalidade e isso desperta, temor e veneração provoca
alegrias, esperanças e faz nascerem angústias e tristezas.
Com isso o Ensino Religioso como área do conhecimento visa todos
os aspectos do desenvolvimento do ser humano, conduzido pela sua
dimensão de Transcendência, aberto aos outros, sem discriminação a
285
FONAPER
nenhum credo religioso, etnia, cultura, condição social, ou mesmo aqueles
que si dizem não ter nenhum tipo de religião. A essa disciplina se confia,
um ensino leigo e pluralista e com caráter de disciplina curricular.
Concluímos ressaltando a importância de um estudo integrado por
parte de todos que fazem o Ensino Religioso para dá o real significado há
esse fenômeno, assim organizando um currículo que seja único para todas
as escolas, a linguagem será a mesma, os recursos pedagógicos, a
metodologia, o plano de trabalho a dinâmica em sala de aula, fica a critério
do educador, mas ele deve ter um norte do que ensinar? Como ensinar? E
em qual bimestre ensinar?
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289
LIMITES E AVANÇOS DA ESTRUTURA CURRICULAR DO
ENSINO RELIGIOSO NO COLÉGIO MARISTA DE BELÉM
Alex Coimbra Sales1
Resumo:
Esta pesquisa pretende fazer uma reflexão acerca dos limites e avanços da estrutura
curricular do Ensino Religioso no Colégio Marista de Belém a partir do seu Plano Trienal de
Evangelização (2009), seguindo as atribuições da rede de ensino Marista.
Palavras-chave: Educação. Ensino Religioso. Currículo. Colégio Marista de Belém. Rede
de Ensino.
Introdução
Nos últimos anos, o Ensino Religioso no Brasil tem sido alvo de
debates na busca de compreender sua natureza e o seu lugar na escola
como disciplina regular do currículo. Se por muitas décadas o Ensino
Religioso foi considerado um elemento eclesial na escola, hoje o esforço
tem sido envidado no sentido de assegurá-lo como área de conhecimento
visando à produção do conhecimento religioso (CNBB, 2000).
A partir de 1997, com a revisão do artigo 33 da LDB, estabeleceu-se
uma nova concepção para o Ensino Religioso. Seu foco deixou de ser
catequético para assumir um perfil pedagógico e,
Como componente curricular, seu foco é a educação da dimensão
religiosa dos estudantes, incluindo a produção do conhecimento
religioso, a abertura às diferenças e o reconhecimento e respeito à
pluralidade religiosa, a partir do confronto com diferentes modelos de
pensamento, prática social e construção de sentidos (PLANO
CURRICULAR DE ENSINO RELIGIOSO PARA O BRASIL MARISTA,
2007, p.35).
Nessa perspectiva o Colégio Marista Nossa Senhora de Nazaré em
conformidade com o Plano Curricular de Ensino Religioso para o Brasil
Marista, apresenta sua matriz curricular, assumindo o Ensino Religioso
como área do conhecimento, cujo objeto de estudo é o Fenômeno
Religioso/Religiosidade. A disciplina é um componente curricular de todas
1
Especialista em Ciências da Religião pelo Instituto Esperança de Ensino Superior de
Santarém.
Graduado
em
Ciências
da
Religião
–
UEPA.
Email:[email protected].
FONAPER
as séries da Educação Básica, tendo uma hora/aula por semana na
primeira fase do Ensino Fundamental, duas horas/aulas por semana na
segunda fase do Ensino Fundamental e uma hora/aula por semana no
Ensino Médio.
O Ensino Religioso no Currículo da Rede Marista de Ensino
O objetivo do Ensino Religioso é promover a compreensão,
interpretação e (re)significação da Religiosidade e do Fenômeno Religioso
em suas diferentes manifestações, linguagens e paisagens religiosas
presentes nas culturas e nas sociedades.
O objeto de estudo é delimitação de um saber a ser desvendado,
descoberto, pesquisado, apreendido, desconstruído e construído no
universo das aprendizagens. Estabeleceu-se o objeto de Ensino Religioso
a partir de uma perspectiva contemporânea e das experiências de outras
áreas de conhecimento que historicamente se constituíram como ciência.
O Ensino Religioso é uma área de conhecimento incipiente no
conjunto que compõe o quadro das ciências humanas na educação básica.
Tal fato exige uma postura investigativa que não se encerra com a
produção de um plano curricular. As possibilidades de buscas continuam
abertas. Contudo não é possível que o ER se constitua como componente
curricular sem a definição de um objeto de estudo que direcione a seleção
de objetivos e conteúdos significativos que contemplem a especificidade
dessa área.
Dessa forma, dentre as tantas possibilidades de abordagens e
recortes no campo das ciências, constitui-se como objeto de estudo do ER:
o Fenômeno Religioso/Religiosidade. A opção por esse objeto quer
garantir o tratamento do fato religioso que advém das experiências
humanas com o ser Transcendente e da dimensão religiosa considerada
inerente ao ser humano.
O ser humano é essencialmente um ser religioso. Todas as culturas
humanas registram práticas religiosas, mesmo que estas não estejam
ligadas a uma instituição religiosa. Esta disposição primeira do ser humano
para se relacionar com o Transcendente é chamada de religiosidade. A
religiosidade é uma atitude dinâmica de abertura efetiva da pessoa em
relação ao mundo que ela integra e, nesse sentido, apresenta-se como a
292
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
dimensão mais profunda da vida, inter-relacionada com todas as
dimensões humanas.
A religiosidade muitas vezes é exteriorizada dentro de sistemas
formais: ritos, mitos, doutrinas, mistérios, celebrações, reuniões,
comunidades, tradições etc. Estes sistemas se inserem em um espaço
cultural próprio, que define as maneiras de se viver a religiosidade.
O fenômeno religioso é a manifestação cultural das opções religiosas
individuais e coletivas e, por isso, é antes de tudo um fenômeno humano.
Todo ser humano, considerado em sua totalidade ou tomado em cada uma
de suas dimensões, só se desenvolve quando se expressa e relaciona
com outros entes. Da mesma forma, a religiosidade torna-se efetiva e se
desenvolve pela expressividade, comunicabilidade e linguagem. O
dinamismo religioso ganha forma, ritmo e intensidade no fenômeno
religioso.
Compreender o Fenômeno Religioso/Religiosidade como objeto de
estudo pressupõe alguns elementos de disposição e abertura
epistemológica. Torna-se necessário estudar o sentido das experiências
religiosas no seu contexto específico e na sua estruturação e coerência, o
que exige também a investigação e compreensão da diversidade religiosa,
da significação do processo religioso, das atitudes, do campo simbólico e
dos textos sagrados, entre outros.
O fenômeno é gerado também nas diferentes maneiras pelas quais o
ser humano busca compreender as questões existenciais (de onde vim?
Para onde vou?); tem, portanto, uma origem pessoal e individual, que se
manifesta na vivência grupal. É no processo comunitário que as respostas
são sistematizadas e produzem formas de relações com o outro e com o
Transcendente, novas narrativas e manifestações religiosas. Esta
pluralidade constituída desafia o processo ensino-aprendizagem e, ao
mesmo tempo, traz grandes possibilidades de construção do conhecimento
a partir da ressignificação da dimensão religiosa na contemporaneidade.
Sendo o Ensino Religioso um componente curricular, fundamentar-se-á
nos seguintes princípios (Plano Curricular de Ensino Religioso para o
Brasil Marista, 2010):
a) Abordagem metodológica que favoreça
interpretação, significação e ressignificação;
a
compreensão,
293
FONAPER
b) Abertura a todas as situações de aprendizagem que favorecem a
produção do conhecimento religioso;
c) Leitura crítica e contextualizada da realidade na busca e na
construção do sentido da vida;
d) Respeito às diferenças culturais e religiosas;
e) Flexibilidade curricular frente à alteridade sociocultural;
f) Investigação e problematização do fato religioso para qualificar
conceitos, valores e atitudes; e
g) Prática pedagógica baseada na interdisciplinaridade.
A partir das definições contidas no Plano Curricular de Ensino
Religioso para o Brasil Marista quanto às competências e aprendizagens
fundamentais do Ensino Religioso e quanto às competências a partir dos
eixos estruturantes, demarcamos treze competências básicas para a
disciplina de Ensino Religioso no Colégio Marista Nossa Senhora de
Nazaré. Dessa forma, ao final da educação básica, no que diz respeito à
disciplina de Ensino Religioso, o aluno deverá ter adquirido a capacidade
de:
1) Reler e interpretar o fenômeno religioso;
2) Ler e interpretar textos e símbolos sagrados;
3) Compreender o conhecimento religioso para a busca de
respostas às questões existenciais do ser humano e para a
busca do sentido da vida;
4) Compreender-se como corresponsável pelo equilíbrio dinâmico
na relação consigo mesmo, com o outro, com o meio e com o
Transcendente;
5) Compreender as tradições e culturas religiosas como construção
sócio-histórica;
6) Reconhecer e valorizar o papel das comunidades humanas
como lugar de manifestações interculturais e de ampliação dos
pertencimentos;
7) Decodificar a linguagem religiosa e os elementos que a
constituem;
8) Ter domínio da linguagem religiosa para compreender os
fenômenos, as manifestações religiosas e os textos sagrados;
9) Compreender as linguagens religiosas como instância de poder;
10) Compreender e problematizar as situações sócio-religiosas
contemporâneas, abrindo-se ao diálogo inter-religioso;
294
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
11) Compreender as relações religiosas nos processos sociais,
políticos, éticos e culturais;
12) Estabelecer uma relação de alteridade nos grupos religiosos,
sociais e culturais;
13) Conviver com as diferenças, dialogando de maneira respeitosa
com as múltiplas expressões de espiritualidade.
A disciplina de Ensino Religioso se estrutura a partir dos seguintes
eixos: fundamentos, linguagem religiosa e relações religiosas. Estes eixos
estruturantes devem perpassar os conteúdos da disciplina garantindo a
unidade desse componente curricular ―que visa discutir a diversidade e a
complexidade do ser humano como pessoa aberta às diversas
perspectivas do sagrado presentes nos tempos e espaços históricoculturais‖ (OLIVEIRA et al, 2007, p. 33).
Os fundamentos referem-se aos elementos teórico-práticos que
compõem o Fenômeno Religioso/Religiosidade. Neste eixo são
contemplados as teologias, as culturas, as tradições religiosas e os textos
sagrados.
O eixo linguagem religiosa circunscreve-se no contexto da
interpretação, compreensão e decodificação do fato religioso não apenas
para decifrar as mensagens presentes na sociedade, mas também para
rever posicionamentos, posturas e condutas frente a esses fatos.
A compreensão da linguagem religiosa está intimamente ligada à
experiência do sagrado que a própria linguagem quer comunicar.
Compreender a linguagem religiosa a partir da experiência do sagrado é
condição para ir-se além do conceito e se aproximar da vida real, do
contexto histórico e cultural onde a experiência é vivida e partilhada.
O ser humano delineia as suas características históricas e culturais
nas relações sociais e interpessoais que estabelece e que geram novos
tipos de relação: compromisso social e transformação da realidade; apelo
à solidariedade; testemunho de vida religiosa, pessoal e social; apreensão
de uma ética a partir de valores religiosos, e, também, a alteridade e os
limites éticos que sustentam as relações.
A análise e observação dos procedimentos e das várias formas de
manifestação ajudarão a compreender e reconhecer processos que
incluem o cuidado e a solidariedade como jeito de ser-estar no mundo. O
acolhimento e a inclusão das diferenças enriquecem e evidenciam uma
postura ética e crítica, necessária frente às relações de poder presentes
295
FONAPER
também no campo religioso, visto que, essas relações de poder podem ser
geradoras de lutas infindáveis em nome de um ser transcendental.
A moral, os costumes e até mesmo os princípios éticos são
delineados a partir de uma caracterização social, histórica e cultural. Nesse
sentido as relações religiosas evidenciam a diversidade e as possibilidades
de respostas religiosas para os tempos atuais. Essa visão ampliada auxilia
na busca de novas significações para a própria existência, desenvolvendo
as mais variadas formas de relacionamento com a diferença religiosa, na
tentativa de superação dos preconceitos e a favor da alteridade, da
ampliação dos pertencimentos e da consciência planetária.
A metodologia e a didática do Ensino Religioso se direcionam a duas
vertentes que se inter-relacionam. A primeira diz respeito aos aspectos
filosóficos, culturais e sociais na abordagem do saber religioso. A segunda
refere-se aos aspectos de ordem didático-pedagógica que envolvem as
relações professor/ estudante.
É importante que se tenha presente que a metodologia que assegura
ao ER à validade de componente curricular, está ancorada nas ciências
humanas. É o ser humano o sujeito desse processo com todas as suas
circunstâncias e em todos os seus contextos. Para dar conta desse objeto
no ER pode-se lançar mão de uma metodologia interdisciplinar que permita
a interpretação, a compreensão e ressignificação do fenômeno religioso.
Desde a fenomenologia e a hermenêutica até a semiologia e a genealogia,
há uma gama enorme de possibilidades de olhares.
Esse tratamento plural do objeto é uma demanda que advém do
próprio objeto de estudo (Fenômeno Religioso/Religiosidade) e também
dos eixos estruturantes (Fundamentos, Linguagem Religiosa, Relações
Religiosas), pois abrem um leque de possibilidades metodológicas no
sentido da aproximação dos aspectos tangíveis do fenômeno e daqueles
que o precedem.
Em Ciências Humanas é fundamental que se tenha essa variedade
de olhares, de perspectivas, de óticas e de explicações para atender da
melhor forma possível a complexidade do objeto. Por isso, ao se propor
uma análise multirreferencial do Fenômeno Religioso, propõe-se
multiplicidade de leituras, sob diferentes ângulos e a partir de muitas
referências que ajudarão na produção de novos conceitos, dispositivos,
metodologias, terminologias, etc.
296
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Esse procedimento amplia o tratamento do fato religioso, da
manifestação religiosa, da experiência religiosa a partir de uma abordagem
sociológica e antropológica. Nesse sentido, pode-se levar em conta não só
as narrativas e as experiências coletivas e individuais, mas também outros
aprofundamentos como o da interioridade, da espiritualidade, da mística,
do mistério, do sagrado, de tudo que está à raiz dos questionamentos da
existência humana, da busca de sentido, assim como, atentar-se para a
dimensão dos significados, da interpretação e da compreensão da
linguagem, dos signos e símbolos religiosos.
Dessa forma o ER se ocupará não somente em estudar o fenômeno
religioso, mas a sua essência, buscando seus significados e sua
compreensão. Procura-se, então, não somente garantir o estudo do objeto,
assim como ele se apresenta à experiência humana, mas deixam-se
espaços para a descrição das experiências, compreendendo-as a partir
das inter-relações.
O descrever as próprias experiências, fazendo emergir as memórias,
acoplando essas memórias aos conhecimentos religiosos, facilitará a
produção de uma genealogia das experiências e vivências religiosas.
Além de tudo o que foi dito acima, há o aspecto didático-pedagógico
que exige igual atenção e aprofundamento.
A especificidade e a natureza pedagógica do ER requerem clareza e
objetividade na escolha dos instrumentos que favorecerão a relação entre
as variáveis da relação didática – professor, estudante e conhecimento.
Considera-se, para tanto, os princípios definidos e a natureza do objeto de
estudo. A prática pedagógica do Ensino Religioso deve estar imbuída pela
disposição metodológica de contribuir com o processo de busca pelo
sentido da vida. No mundo contemporâneo, encontram-se possibilidades
de diálogo, de socialização, de análise das diferentes relações entre
sujeitos que favorecem a construção do conhecimento religioso. Essa
construção solicita do sujeito aprendente, disposição para a interação
sociocultural para a interpretação, a compreensão num processo de
significação.
O processo de significação é aquele que visa à busca do sentido da
linguagem, e a relação entre significante e significado geradora de signos,
enunciados e discursos. O signo é composto de um significante
(corresponde ao conceito ou à noção plana da expressão) e de um
significado (corresponde à forma, é o plano do conteúdo). A significação
297
FONAPER
não é o objeto em si, mas a relação entre o objeto e sua representação
psíquica (conceito), por exemplo, a relação entre o som cruz e o objeto
cruz produz uma associação que é a significação. Neste contexto do ER,
entretanto, partir-se-á da semiologia para compreender os sistemas de
signos que dizem respeito ao campo religioso. A semiologia acrescenta
outro elemento na relação significado/significantes, que é o ‗dizível‘, isto é,
o significado será não a representação psíquica e nem a coisa real, mas o
que se pode dizer da coisa real, das imagens e dos gestos. Voltando ao
exemplo da cruz, o cristão ao ouvir o som cruz, imediatamente remete-se à
imagem de Jesus morto que é o ‗dizível‘ de sua experiência. A semiologia
ocupa-se da significação do objeto (seja gestos, imagens, símbolos, sons,
ritos, etc.) e os interroga sob a relação de sentido que detêm, pois seu
lugar está situado no sistema de sentido.
A semiologia pode se constituir em análise religiosa, no caso do ER,
dos diferentes sistemas de signos religiosos, colocando-os em relação, por
exemplo, os sistemas simbólicos das diversas tradições religiosas.
Pode-se dizer ainda que a significação é também caracterizada por
alguns conceitos-síntese: poeticidade, reflexividade, alteridade e
reciprocidade. A poeticidade diz respeito ao valor criativo da linguagem, às
formas de expressão da atividade subjetiva que forma um objeto no
pensamento; a reflexividade trata da capacidade específica da linguagem
de voltar-se sobre si mesma e para outros sistemas de signos não-verbais;
a alteridade, que está voltada para a presença do outro, e a reciprocidade,
que diz respeito ao diálogo. Nesse sentido, quando se fala em significação,
tenta-se responder à pergunta: por quais meios ou processos um
enunciado é produzido como possuidor de sentido?
No ER os processos de significação e ressignificação são permeados
de desconstrução e construção de novos sentidos. Nesse campo, a
compreensão e a interpretação, ajudam a extrair todas as possibilidades
de sentido do objeto, e a interpretação, principalmente, ajuda a projetar
para mais longe a significação.
Outro aspecto, que vale salientar, no que diz respeito aos elementos
didático-pedagógicos, é a relação dos princípios contextualização e
interdisciplinaridade e a relevância da problematização.
Nesse processo a problematização dá abertura para novas
narrativas, respeitando as diferenças individuais, permitindo um
distanciamento do problema e ajudando a questionar as várias maneiras
298
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
de agir e de reagir, assim como, o sentido das coisas, das vicissitudes, dos
objetivos em relação ao próprio problema. Só é capaz de problematizar
aquele que se dispõe a pensar. Dessa forma, o Ensino Religioso, além de
assumir o papel de problematizador, amplia as capacidades de diálogo,
debate, pesquisa, qualificando a síntese pessoal e coletiva.
Para o Ensino Religioso é fundamental que a contextualização
ultrapasse os exemplos encontrados nos livros ou narrados pelos
professores e alcance também a vivência extramuros, ampliando e
diversificando o currículo.
O ER é uma área de conhecimento interdisciplinar por natureza, por
isso é importante compreender bem a interdisciplinaridade como uma
metodologia, e não como uma forma de atividade.
Interdisciplinaridade vem do latim da junção de inter, que quer dizer
em relação, reciprocidade ou interação, e disciplina, que significa a forma
de organizar e de concentrar as pesquisas e as experiências dentro de
uma perspectiva. Cada disciplina oferece uma imagem particular da
realidade, pois delimita um aspecto da mesma. Desde o início do século
XIX, vê-se surgir o conceito de disciplina como a se entende hoje, isto é,
possuidora de objeto de estudo, marcos conceituais, métodos e
procedimentos específicos. Tais características acabaram produzindo uma
visão rígida na compreensão das diferentes disciplinas. A
interdisciplinaridade surge para quebrar esta rigidez, trazendo flexibilidade
aos estudos e pesquisas. A interdisciplinaridade, portanto, permite a
reciprocidade e a aproximação de diferentes áreas na busca de algo novo.
Para melhor compreender a interdisciplinaridade é preciso diferenciála de seus correlatos: multidisciplinaridade e transdisciplinaridade.
A multidisciplinaridade é o nível mais restrito de integração. Ela se dá
quando se busca ajuda em diversas disciplinas para solucionar algum tipo
de problema, sem que esta ação contribua para a transformação ou
enriquecimento das disciplinas envolvidas. Nesse nível não há tanta
cooperação, pelo fato de haver apenas justaposição de disciplinas. A
multidisciplinaridade é essencialmente aditiva, e não integrativa. Uma
característica marcante da multidisciplinaridade é que cada área de
conhecimento se preocupa em manter e proteger seus próprios modelos.
A transdisciplinaridade é o nível de interação em que a rede está
estabelecida de forma que não haja mais fronteiras entre as disciplinas.
299
FONAPER
Este é o nível ideal para o qual concorre toda ação interdisciplinar, ou seja,
quando realmente se trabalhará sem os limites impostos pelas disciplinas.
No nível da interdisciplinaridade, a interação enriquece, e o
intercâmbio é de verdadeira reciprocidade.
A interdisciplinaridade reúne estudos de diversas disciplinas num
contexto mais coletivo no tratamento dos fenômenos a serem estudados
ou das situações-problema em destaque. Tal procedimento exige um
compromisso maior ao elaborar, de modo mais geral, os projetos de
pesquisa que resultarão em intercomunicação e enriquecimento, e,
também, em transformação de metodologias de pesquisa, modificação de
conceitos e de terminologias.
A definição original de interdisciplinaridade é comunicar ideias para
integrar e organizar conceitos, metodologia, procedimentos, epistemologia,
terminologia, informações. Nesse sentido, a interdisciplinaridade surge
para corrigir o equívoco da compartimentação e da não comunicação entre
as disciplinas. Ela é ao mesmo tempo processo, uma filosofia de trabalho
que facilita ações para resolução de problemas. Embora não haja apenas
um processo, e nem mesmo um conjunto rígido de ações, existem alguns
passos que podem estar presentes na intervenção interdisciplinar, desde
que se respeite o princípio da flexibilidade: delimitar os problemas de
acordo com os questionamentos iniciais; determinar os conhecimentos
necessários; desenvolver um marco integrador e as questões a serem
pesquisadas, etc.
Nas ciências humanas é frequente a integração entre disciplinas
próximas, como história, sociologia, filosofia, Ensino Religioso, entre
outras. A pesquisa interdisciplinar nesse campo parte dessa integração
com o objetivo de organizar conceitos, metodologias, dispositivos,
epistemologias para se chegar a uma nova abordagem como
consequência da construção de seus próprios objetos de investigação,
conceitos fundantes, premissas e paradigmas.
A avaliação é um instrumento de aprendizagem, que envolve
pressupostos epistemológicos (construção do conhecimento), ontológicos
(o ser) e axiológicos (valores) que não são separados. A ação
transformadora implica pensar, planejar, replanejar, agir, avaliar o que se
conhece, o que se está conhecendo e o que se necessita conhecer. A
avaliação é um exercício de reflexão, única e exclusiva do ser humano, de
pensar os seus atos, de analisá-los, de interagir com o mundo e com os
300
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
seres, de influenciar na tomada de decisões e transformação da realidade.
Avaliar exige a definição de onde se quer chegar. Precisam-se estabelecer
critérios e escolher procedimentos adequados. Na avaliação está implícita
a concepção de homem que se quer formar, o modelo de sociedade que
se quer construir.
Essa avaliação não se refere apenas ao domínio de conteúdos
específicos, mas também, ao desenvolvimento das competências,
habilidades e atitudes. Significa avaliar o estudante como um todo, nas
diversas situações que envolvem a aprendizagem.
A avaliação processual promove o crescimento, a análise da
situação, a busca de alternativas e momento privilegiado de aprendizagem,
promovendo um conjunto de ações com o objetivo de aprofundar os
conhecimentos, esclarecer, opinar, discernir, participar e decidir. É ação de
acompanhamento, de conhecimento de onde se encontra o estudante e
das aprendizagens que se deseja construir.
Uma avaliação significativa no Ensino Religioso torna-se excelente
instrumento de aprendizagem, e exige que o educador saiba trabalhar com
objetivos; exige que saiba, ainda, identificar elementos que determinem o
aprimoramento do saber e da postura cidadã; e que saiba, também,
reconhecer o estudante em sua totalidade.
A avaliação no ER contempla o conhecimento, a participação, a
atitude de vida e as inter-relações, como também implica na abertura e na
criação de espaços para a análise das experiências religiosas.
A avaliação nestes termos decorre da postura do educador em
relação ao estudante e dos instrumentos utilizados durante o
desenvolvimento das aulas para obtenção da aprendizagem destes.
Portanto, a dimensão vivencial do Ensino Religioso não pode ser medida,
mas pode ser avaliada na perspectiva do crescimento pessoal, e pode ser
observada, para ser retomada e redimensionada pelos envolvidos no
processo. É um espaço para crescer no conhecimento, na consciência e
na religiosidade.
Torna-se necessário buscar critérios que correspondam a esta
proposta e às expectativas que daí são geradas, colocando a avaliação a
serviço da promoção e da melhoria da aprendizagem, buscando
estratégias que possam concretizar a qualidade educacional.
A avaliação é uma parte do processo ensino-aprendizagem. É por
meio dela que o professor consegue verificar aquilo que foi apreendido
301
FONAPER
pelos alunos. No ensino formal, geralmente ela é feita de forma escrita,
mas não deve ser a única forma de verificação de aprendizagem.
O acompanhamento dos alunos, através da observação e dos
registros do professor é importante para verificar a participação e a
produtividade dos alunos ao longo do ano.
Neste sentido, as provas escritas não devem ter um caráter apenas
classificatório dos educandos, mas questões que estejam de acordo com o
objetivo do conteúdo trabalhado e a faixa etária dos alunos. Devem ter
uma linguagem clara, que não induza a erros, nem contenham caráter de
dubiedade, e não devem ter um fim em si mesmo, mas orientar a tomada
de decisões por parte da equipe docente sobre aqueles conteúdos que
precisam ser revistos e /ou aprofundados.
A realização de atividades em grupos e a execução de exercícios
permitem a socialização dos educandos, a tomada de decisões e
favorecem também a capacidade de interpretação e análise do grupo, ao
ter que contrastar suas informações com as de outras pessoas que
compõem o coletivo.
As pesquisas que visam ampliar o conhecimento sobre determinado
tema, precisam ser conduzidas de forma a propor a solução de problemas
e a investigação do meio, permitindo uma visão crítica da realidade em
diferentes escalas: seja ela local, regional, nacional ou internacional.
Resultados
Através da pesquisa realizada pode-se perceber que a escola citada,
apesar de pertencer a um carisma e uma filosofia confessional católica, há
uma distinção organizada e sistematizada, acerca do Ensino Religioso
como disciplina da área do conhecimento das ciências humanas,
contrapondo os tipos de Ensino Religioso do passado, tendo os modelos
catequéticos e teológicos segundo (PASSOS, 2007). Os resultados dessa
sessão serão realizados através das análises documentais, tendo como
maior referência o Plano Trienal de Evangelização 2007-2009. Serão
observados os métodos, modelos, aspectos avaliativos neste estudo.
a) Quanto à concepção de Ensino Religioso
A Província Marista nos seus constantes estudos em busca de uma
educação de qualidade, não esqueceu o componente curricular Ensino
302
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Religioso. De uma disciplina pautada a partir de um currículo catequético,
a Província Marista acompanhou o percurso histórico-político por que
passou o Ensino Religioso.
As novas abordagens pedagógicas e consequentemente uma nova
concepção de educação, com vistas à construção de um ser humano
pensante e crítico, foi acompanhada pela elaboração de leis voltadas à
educação brasileira. Os Maristas deram um passo significativo, quando em
2007, atenderam as exigências da Lei de Diretrizes e Bases (LDB –
9394/96), sobretudo, a partir da Lei 9.475/97.
A Província, através do seu Plano Trienal de Evangelização, 20072009 (UMBEC. PNE.) organizou seu setor de evangelização, orientando
que, entre as mudanças, o Ensino Religioso passasse a ter sua Matriz
Curricular própria, seguindo as exigências da LDB.
Com as mudanças ocorridas não menos, em princípio, confusas e
resistentes por parte de alguns, a primeira ação foi separar o Ensino
Religioso da gerência do Serviço de Orientação Religiosa - SOR. Essa
gerência ficou a cargo do Núcleo de Apoio Pedagógico - NAP, das séries
de Maternal ao Ensino Médio. Essa mudança fez com que, o ER passasse
a ter um tratamento pedagógico semelhante aos das outras disciplinas,
como por exemplo, instrumentos avaliativos, plano de aula, livro didático,
material didático, entre outros. É verdade que muito já se avançou nesse
processo, contudo, nem toda a comunidade escolar, ainda absorveu o
novo paradigma do Ensino Religioso. Porém, à medida que novas dúvidas
e discussões vão surgindo, é preciso mergulhar em novos estudos,
reformulações e formulações de outras respostas a fim de amadurecer
cada vez mais a concepção da disciplina.
b) Quanto ao processo de avaliação da aprendizagem no Ensino
Religioso
Na pesquisa, até 2008, não foi encontrado nenhum registro de
documentos e textos relacionados à avaliações quantitativas (provas e
testes); de forma informal, foi perguntado a professores que trabalhavam
nesse período, e as respostas foram as mesmas, que até o ano
mencionado, as avaliações eram realizadas através da participação e
frequência dos alunos; ressaltaram que nesse período, a disciplina não
tinha obrigatoriedade na aplicação de testes avaliativos. A partir de 2009,
303
FONAPER
pode-se verificar a presença de alguns registros de provas, aplicadas pelos
educadores de ER.
Dentro da nova proposta do ER como área do conhecimento, esse
mecanismo passa a ser uma ferramenta indispensável na rotina
educacional da rede Marista, podendo se verificar que muito já evoluiu
nesse sentido, mas ainda existem muitos percalços nessa trajetória, um
deles é escassez de materiais didáticos específicos, baseados no modelo
das Ciências da Religião; outro a falta de banco de questões para os
conteúdos da disciplina.
c) Quanto à metodologia de ensino do Ensino Religioso
Segundo Passos (2007) percebeu-se que os planos de Curso de
Ensino Religioso de 2002 a 2005 utilizaram uma metodologia voltada para
o modelo teológico reforçando os aspectos ético-valorativos, tendo como
ferramentas as dinâmicas de grupos, assim como, a presença do aspecto
catequético através do momento reservado à oração. Com um modelo de
plano mais estruturado, em 2006, os métodos ainda acompanham os
modelos teológicos, trabalhando temas geradores como: a pessoa, a
família, o mundo e a religião, percebe-se que os aspectos da religiosidade
são trabalhados de maneira segmentada e com pouca proximidade do
modelo das Ciências da Religião.
No ano de 2008, com a reestruturação da Catequese e do Ensino
Religioso (UMBEC. PNE), em passos pequenos foi se construindo novos
métodos, se aproximando cada vez mais do modelo das Ciências da
Religião. Ainda em 2010, sem ter um referencial estruturado e
fundamentado no Fenômeno Religioso, percebeu-se que conteúdos
metodologias e avaliações acabavam-se repetindo em alguns momentos.
A equipe de professores de Ensino Religioso foi convidada, pela gestão da
escola, para suprir, principalmente, os desnivelamentos de conteúdos das
séries.
No início de 2011, foi construído um documento, do Maternal II ao 2º
ano do Ensino Médio, verticalizando os conteúdos da disciplina ER que
serviria de base para a construção do Plano de Curso do ano referido.
Sem imaginar que um ano depois a mantenedora, através de um grupo de
educadores da rede, iria construir uma Matriz Curricular do Ensino
Religioso fundamentada nas leis, PCNs de ER.
304
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
d) O Ensino Religioso na escola Marista de Belém em 2013
Quanto à organização nos níveis de ensino, existe uma peculiaridade
quanto à nomenclatura da disciplina, como a escola tem dentro de sua
grade curricular a partir da Educação Infantil – Maternal II – esse segmento
recebe um nome próprio Sentido Religioso, estabelecido pela rede. A
nomenclatura é Ensino Religioso, e a outra novidade, é a presença da
disciplina no Ensino Médio com o nome de Culturas Religiosas.
Hoje, no seu quadro de professores a escola conta com cinco
profissionais para ministrar as aulas de Ensino Religioso, distribuídos nos
segmentos de ensino sinalizados, todos com a habilitação legal para
exercer a função. É importante ressaltar que o critério seletivo para o cargo
é realizado da mesma forma que qualquer outra disciplina e com requisito
essencial, a graduação em Ciências da Religião ou Licenciatura em Ensino
Religioso.
A carga horária da disciplina, do 6º ao 3º Ano do Ensino Médio
obedece-se uma hora/aula por turma semanalmente, enquanto as turmas
da Educação Infantil ao 5º Ano/09 tem o acréscimo de mais uma hora/aula,
sendo 2 horas aulas semanais para cada turma.
Sabe-se da dificuldade e escassez de materiais didáticos
compatíveis a nova realidade do Ensino Religioso. A escola desde 2012
adotou livros didáticos de duas editoras diferentes, a primeira coleção da
Editora Vozes, Redescobrindo o Universo Religioso, para as turmas do 2º
Ano/09 até o 5º Ano/09; já a segunda da Editora Moderna, reservada para
o Ensino Fundamental II.
O livro didático, mais que uma ferramenta no auxílio do ensinoaprendizagem tem contribuído bastante para o desenvolvimento da
disciplina dentro da instituição, suprindo possíveis lacunas encontradas
nessa ferramenta pedagógica os educadores do ER, produzem seus
próprios materiais didáticos para poder complementar as necessidades
acadêmicas de cada série.
As avaliações são realizadas de acordo com a proposta pedagógica
da escola atual; a cada trimestre os alunos a partir do 3º ano /09 fazem as
seguintes aplicações avaliativas: 1. Avaliação Trimestral - AVT; 2.
Avaliação de Área - AVA.
Dentro da proposta Marista, a formação é continuada; é visto e
trabalhado como prioridade para todos os educadores da rede, e não é
diferente para os profissionais do ER, no ano de 2012. Foram realizadas
305
FONAPER
pelas mantenedoras dos cursos EAD, Fenômeno Religioso e O Ensino
Religioso e o Currículo com carga horária de 80h, além da Quarta de
formação, que são formações em conjuntos com os outros profissionais
da escola, reservados à discussão dos diversos assuntos guiados pela
proposta educacional Marista. O ano de 2013, no mês de maio, teve um
grande encontro do Ensino Religioso em Brasília, onde foi um momento
ímpar para os estudos do Fenômeno Religioso, troca de experiências entre
as unidades da rede Marista, assim como, fazer um levantamento de quais
avanços foram obtidos pelo ER enquanto rede Marista e quais são os
desafios e dificuldades encontradas pela disciplina nesse percurso.
A escola Marista de Belém foi bem representada por três
profissionais da área, como também, uma coordenadora pedagógica, uma
agente pastoral e a coordenadora de área das ciências humanas. No
retorno do grupo, no momento da socialização, foi detectado que pela nova
estrutura da matriz curricular, o livro didático utilizado na educação
fundamental I pouco atende os anseios da matriz atual e que
provavelmente não será adotado no ano de 2014, já o livro do ensino
Fundamental II, ainda está sendo feito uma analise pela equipe.
Considerações Finais
Ao longo da história do Ensino Religioso neste país, é notória a
influência cristã nas práxis desenvolvidas em sala o que dificulta o
processo de mudança a um novo e moderno conceito acerca da disciplina.
Ainda é muito comum o conflito entre ensino laico versus o confessional,
onde se visualiza um enfraquecimento do Ensino Religioso, principalmente
pelo descaso de alguns gestores e comodismo de muitos educadores.
Já não se vive mais no período colonial, onde os métodos
educacionais eram devocionais. Vive-se em um mundo onde o respeito e a
reverência devem ser buscados a todo o momento, individualmente ou em
grupos, e a escola não pode ficar de fora desse processo e o Ensino
religioso precisa e deve mostrar a sua ―cara‖ ou a ―nova cara‖ que é
representada pelo estudo do fenômeno religioso, dando ênfase na
diversidade e da pluralidade cultural religiosa, porque lhe cabe esta função.
Ao término da pesquisa, fica minha convicção de que a Escola
Marista de Belém mesmo pertencendo a uma confessionalidade religiosa,
vem alcançando diversos avanços na busca de um ensino-aprendizagem
306
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
coerente para disciplina estudada fundamentada na pluralidade cultural e
religiosa. Acredito também, que para aprimorar e crescer ainda mais é
necessário que a instituição invista em profissionais especializados da área
da Ciência das Religiões no intuito de gerenciar o Ensino Religioso da
Rede Marista.
Este trabalho não esgota a discussão, mas constitui-se em um
elemento que provoca a reflexão crítica e um olhar atualizado sobre nova
ótica da disciplina Ensino Religioso nas escolas públicas e privadas do
Brasil e tem a pretensão de mostrar, ao leitor, em especial, aos
acadêmicos das Ciências da Religião e aos professores de Ensino
Religiosos, que uma escola de carisma e filosofia confessional pode
trabalhar o Ensino Religioso de forma a obedecer à laicidade legalizada no
Brasil.
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308
O ENSINO RELIGIOSO NAS ESCOLAS PÚBLICAS
BRASILEIRAS: UMA ANÁLISE A PARTIR DAS LEGISLAÇÕES
EDUCACIONAIS
Claudia Berdague1
Resumo:
Este artigo trata da permanência do Ensino Religioso no currículo das escolas públicas
brasileiras. A disciplina foi inserida nas escolas no período colonial quando o Estado
assumia a Igreja Católica como sua religião oficial. No período republicano acontece a
separação entre Estado e Igreja, entretanto as Constituições e leis da educação
normatizam sobre o tema, mantendo a disciplina no currículo. O objetivo desta discussão é
analisar as legislações emanadas pelo Conselho Nacional de Educação, após a
promulgação da LDB 9394/1996, objetivando compreender como a disciplina vem se
mantendo nos currículos escolares.
Palavras-chave: Ensino Religioso. Legislação Educacional. Currículo Escolar.
Introdução
A religiosidade nas suas diversas formas de expressão é uma das
dimensões constitutivas do ser humano. Na escola, o estudo do tema tem
a função de embasar o entendimento do fenômeno religioso, através do
conhecimento das culturas e tradições religiosas presentes no convívio
social dos educandos, buscando educar para o diálogo e a reverência ao
transcendente.
Entretanto, os sistemas de ensino demonstram certa dificuldade em
trabalhar com este componente curricular, necessitando que os órgãos
regulamentadores da educação brasileira, os conselhos de educação,
deliberem sobre sua aplicabilidade nas escolas públicas. A lei torna a
disciplina facultativa para o aluno, mas obrigatória para a escola. E, no
entendimento de algumas redes de ensino, o ―facultativo‖ desobriga a
oferta da disciplina, visto que não há um entendimento da contribuição da
mesma para a formação dos sujeitos. Além disso, muitos não sabem como
se fará a formação de professores para a disciplina.
1
Pedagoga Especialista em Planejamento e Gestão Escolar. Mestranda do Curso de
Ciências das Religiões na Faculdade Unida de Vitória. Docente das Faculdades
Integradas do Extremo Sul da Bahia. E-mail: [email protected]
FONAPER
Desta forma, o estudo deste tema se justifica pela busca de um novo
paradigma para a disciplina Ensino Religioso, capaz de sustentar uma
prática pedagógica significativa para a formação das novas gerações
inseridas nas escolas públicas e, à luz das legislações emanadas pelo
Conselho Nacional de Educação (CNE), compreender os conflitos que
interferem no tratamento dado à disciplina nos dias atuais, visto que o
Ensino Religioso tem sido alvo de debate quanto à compreensão de sua
natureza e papel na escola.
O Ensino Religioso nas leis brasileiras: da colonização à década de 1980
O Ensino religioso, enquanto uma área de conhecimento, sempre
esteve presente nos currículos escolares. A disciplina insere-se na
trajetória da educação brasileira, desde o período da colonização (1500 a
1800), quando Estado e Igreja apresentavam-se integrados numa relação
de interdependência. Neste período, por delegação pontifícia e
reafirmando o poder exercido sobre o Estado, a Igreja Católica
desenvolveu um modelo de ensino voltado para a evangelização dos
gentios e catequese para os índios e negros.
Num segundo momento, de 1800 a 1964, a educação passa a ser
referendada pelo Estado, tendo como objetivo a escola pública, gratuita e
laica para todos. Nesse contexto, o Estado assume seu papel e a
burguesia toma o lugar da hierarquia religiosa na gestão das escolas. Este
período, de acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino
Religioso2 (FONAPER, 2009), compreende épocas distintas, a saber:
Monarquia Constitucional (1823 a 1889): O ensino Religioso é
submetido ao esquema de protecionismo da Metrópole. O fio
condutor é o texto da Carta Magna de 1824, que mantém a Religião
Católica Apostólica Romana, a Religião oficial do Império em seu
artigo 5º. A religião passa a ser um dos principais aparelhos
ideológicos do Estado. O que se faz na Escola é o Ensino da Religião
Católica,
Regime Republicano (1890 – 1930): Acontece a separação entre
Estado e Igreja pelo viés dos ideais positivistas. Na primeira
Constituição Republicana aparece a expressão ―Será leigo o ensino
ministrado nos estabelecimentos de ensino‖. Mesmo havendo a
laicidade o Ensino da Religião nesse período esteve presente pelo
2
Embora tenham sido publicados pelo FONAPER desde 1997, os Parâmetros
Curriculares Nacionais do Ensino Religioso ainda não foram aprovados pelo CNE.
310
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
zelo de fidelidade dos princípios estabelecidos sob a orientação da
Igreja Católica.
Período de transição (1930 – 1937): O Ensino Religioso é inicialmente
admitido em caráter facultativo, através do Decreto de 30 de abril de
1931. Assim diz a constituição de 1934 no artigo 153: ―O Ensino
Religioso será de matrícula facultativa ministrado de acordo com os
princípios da confissão religiosa do aluno (...) e constituirá matéria dos
horários das Escolas Públicas primárias, secundárias, profissionais e
normais‖.
Estado Novo (1937 – 1945): O Ensino Religioso perde o seu caráter
de obrigatoriedade.
Terceiro período republicano (1946 – 1964): O Ensino Religioso é
contemplado como dever do Estado para com a liberdade religiosa do
cidadão que frequenta a Escola.
Quarto período republicano (1964 – 1984): Os avanços democráticos
alcançados pela sociedade brasileira são interrompidos. Nesse
contexto o Ensino Religioso é obrigatório para a Escola, concedendo
ao aluno o direito de optar pela frequência ou não no ato da matricula.
No sentido de regulamentar o tratamento da disciplina no âmbito
escolar, no período republicano foram homologadas duas Leis de
Diretrizes e Bases da Educação (LDB). A primeira LDB, de Nº 4.024,
publicada em 1961, após amplo debate iniciado em 1948, estabelece,
através de seu Artigo 97, que:
Art. 97 O Ensino Religioso constitui disciplina dos horários normais
das escolas oficiais, é de matrícula facultativa e será ministrado sem
ônus para os cofres públicos, de acordo com a confissão religiosa do
aluno, manifestada por ele, se for capaz, ou pelo seu representante
legal ou responsável.
1º parágrafo – A formação de classe para o ensino religioso
independe de número mínimo de alunos.
2º parágrafo – O registro dos professores de ensino religioso será
realizado perante a autoridade religiosa respectiva.
A segunda LDB, de Nº 5.692, homologada em 1971, fundamentada
na necessidade de uma escola tecnicista e voltada para a preparação para
o trabalho, disciplinou o tratamento a ser dado ao tema, da seguinte forma:
Art. 7º Será obrigatória a inclusão de Educação Moral e Cívica,
Educação Física, Educação Artística e Programa de Saúde nos
currículos plenos dos estabelecimentos de 1º e 2º graus, observado
quanto à primeira o disposto no Decreto-lei no 869, de 12 de setembro
de 1969.
311
FONAPER
Parágrafo único. O ensino religioso, de matrícula facultativa constituirá
disciplina dos horários normais dos estabelecimentos oficiais de 1º e
2º graus.
Por influência da Igreja Católica e compreendendo a religião como
parte integrante da formação do sujeito, ambas as leis mantiveram em seu
texto a disciplina, embora não se apresentasse uma proposta coerente e
que atendesse à Constituição quanto à laicidade da escola. Na prática
cotidiana das escolas, predominava o ensino da religião, em detrimento da
discussão acerca da religiosidade.
Tal fato se deu, primeiro, em função do Estado não assumir o ônus
com os docentes, permitindo que outros agentes assumissem a função
dentro das escolas. Segundo, quando o Estado passa a assumir o ônus,
permite que a disciplina seja ministrada por docentes do quadro efetivo do
magistério que precisavam de complemento da carga horária, os quais
nem sempre estavam preparados para ministrá-la, passando doutrinas da
religião por eles escolhida.
Na década de 1980, foi promulgada a Constituição Federal (CF) de
1988, que em seu Artigo 210 estabelece que ―O Ensino Religioso de
matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das
escolas públicas de ensino fundamental‖ (Art. 210, parágrafo 1º do capítulo
II).
No contexto da CF, o Ensino Religioso garante seu espaço no
currículo básico do Ensino Fundamental, garantindo, posteriormente,
espaço real nas leis da educação. Desta forma, com a promulgação da
terceira LDB, Lei Nº 9394 de 1996, a disciplina é inserida no contexto
global da educação, preconizando o respeito à diversidade cultural
religiosa existente no Brasil.
O Ensino Religioso na LDB Nº 9.394/1996
Analisando o texto original da LDB Nº 9.394/1996, constatou-se que
esta cometia o mesmo equívoco da primeira (4.024/1961), pois defendia a
posição de que a disciplina não deveria ter ônus para o Estado. Tal fato
provocou protestos no setor educacional, e assim, em 1997, foi publicada a
Lei 9.475, que altera o artigo 33 da referida LDB, retirando de seu texto o
termo ―sendo oferecido sem ônus para os cofres públicos‖ e dando outros
dispositivos, conforme abaixo:
312
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Art. 33 O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante
da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários
normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o
respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer
formas de proselitismo.
§ 1º Os sistemas de ensino regulamentam os procedimentos para a
definição do conteúdo do ensino religioso e estabelecerão as normas
para a habilitação e admissão dos professores.
§ 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas
diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos
do ensino religioso.
Com esta lei, o Ensino Religioso passa a garantir o direito à
diversidade cultural e religiosa do Brasil, sem quaisquer formas de
proselitismo. Porém, a forma como a disciplina está posta na lei ainda não
atende às necessidades do setor educacional, visto que, sendo uma
disciplina facultativa para o aluno, não deve constar no cômputo das 800
horas anuais, devendo cada sistema de ensino deliberar sobre a melhor
forma de atender a esta prescrição da lei.
Para os sistemas de ensino esse tema ainda apresenta dúvidas
quanto à aplicação das leis educacionais. Percebe-se uma falta de clareza
nos textos legais, pois não definem como a disciplina deve ser tratada, se
como uma área de conhecimento, ou como um tema.
Entre os anos de 1997 a 1999 foram feitas várias consultas ao
Conselho Nacional de Educação no sentido de compreender os
dispositivos da LDB Nº 9.394/1996, quanto às diretrizes para inserir a
disciplina no Ensino Fundamental, sua carga horária e a formação de
professores.
No mês de março de 1997, o CNE publica o Parecer Nº 05/97,
aprovado pelo Conselho Pleno em 11/03/1997. Os relatores, Conselheiros
João Antonio Cabral de Monlevade e José Arthur Giannotti, apresentam
duas formas de entendimento para o Ensino Religioso: a primeira é o
ensino da matéria ―religião‖ o que, neste caso, permite que qualquer
profissional que tenha a formação acadêmica adequada, seja concursado
ou contratado para a docência pode ministrar a disciplina; a segunda,
defendida pelos conselheiros, compreende por Ensino Religioso ―o espaço
que a escola pública abre para que estudantes facultativamente, se iniciem
313
FONAPER
ou se aperfeiçoem numa determinada religião‖. Neste caso, somente os
representantes das igrejas poderiam ministrar a disciplina, preservando o
caráter leigo do Estado, uma vez que o Art. 19 da CF veda a subvenção a
cultos religiosos e as igrejas.
Neste contexto, a escola apenas deve garantir a matrícula facultativa
dos alunos e disponibilizar horário e espaço físico para os encontros/aulas
da disciplina Ensino Religioso, conforme a opção dos discentes e/ou
responsáveis pelos mesmos. Os conselheiros finalizam o parecer
afirmando que:
[...] para a oferta do ensino religioso nas escolas públicas de ensino
fundamental, da parte do Estado, e, portanto dos sistemas de ensino e
das escolas, cabe-lhes, antes do período letivo, oferecer horário
apropriado e acolher as propostas confessionais e interconfessionais
das diversas religiões para, respeitado o prazo do artigo 88 da lei
9394/96, ser incluída no Projeto Pedagógico da escola e transmitida
aos alunos e pais, de forma a assegurar a matricula facultativa no
ensino religioso e optativa segundo a consciência dos alunos ou
responsáveis, sem nenhuma forma de indução de obrigatoriedade ou
de preferência por uma ou outra religião.
Este parecer esclarece alguns pontos acerca do tratamento a ser
dado à disciplina. Porém, com a publicação da Lei 9.475, em julho de
1997, o artigo 33 é alterado, e na nova redação assegura o ―respeito à
diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de
proselitismo‖. Em seu artigo primeiro, delega aos sistemas de ensino a
tarefa de regulamentar os conteúdos, habilitação e admissão dos
professores. Entende-se que o Estado deve arcar com o pagamento desse
profissional, visto que, na nova redação, o termo ―sem ônus para os cofres
públicos‖ foi retirado do texto.
Outra questão posta por essa Lei, em seu artigo segundo, é que os
conteúdos devem ser definidos pelos sistemas de ensino, com a
participação da sociedade civil constituída pelas diferentes denominações
religiosas. Desta forma, não há compatibilidade de acolhimento às
propostas confessionais ou interconfessionais, conforme estabelecia o
texto original da LDB Nº 9.394/96.
Desta forma, com a alteração do Artigo 33 tornou-se necessário novo
pronunciamento do CNE. Assim, em janeiro de 1998, foi publicado o
Parecer Nº 04/98, que define diretrizes nacionais para o Ensino
Fundamental. Em sua introdução, a relatora, Conselheira Regina Alcântara
314
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
de Assis, afirma que: ―A magnitude da importância da Educação é assim
reconhecida por envolver todas as dimensões do ser humano: o singulus,
o civis, o socius, ou seja, a pessoa em suas relações individuais, civis e
sociais‖.
A conselheira não menciona o aspecto religioso como dimensão
constituinte do ser, apenas reafirma que a ―Educação Religiosa, nos
termos da lei, é uma disciplina obrigatória de matrícula facultativa no
sistema público‖.
Em junho de 1998, o CNE publica novo parecer sobre o Ensino
Religioso. Trata-se de resposta à consulta feita pela Secretaria de Estado
da Educação de Santa Catarina. O referido Parecer, de Nº 16/98, vem
esclarecer o prescrito na lei 9.475/97, e teve como relator o Conselheiro
Kuno Paulo Rhoden, que inicia seu texto enfatizando a função social do
Ensino religioso e sua oferta na escola, em seguida faz uma ―exegese‖ da
Lei 9.475/1997, explicitando que a disciplina deve fazer parte dos horários
normais do Ensino Fundamental, e que cabe a cada sistema de ensino a
elaboração da Proposta Pedagógica que irá determinar as normas e
procedimentos para o cumprimento das disposições legais e operacionais
das escolas.
Quanto à formação de professores para a disciplina Ensino
Religioso, ainda não se tem uma orientação concreta de como os sistemas
de ensino devem proceder para a contratação de docentes. Numa tentativa
de nortear os sistemas de ensino, em 06/04/1999 o CNE publica o Parecer
Nº CP 97/99, que trata da formação de professores para o Ensino
Religioso nas escolas públicas de Ensino Fundamental. Este parecer teve
como relatora a Conselheira Eunice R. Durham, que aborda as demais
legislações que tratam do tema e dá uma resposta às solicitações de
autorização de cursos de licenciatura em Ensino Religioso. De acordo com
a conselheira, em virtude da diversidade de manifestações religiosas
existentes no Brasil, não é possível que o Estado autorize um curso desta
natureza sem ferir a autonomia dos sistemas de ensino tão enfatizada nas
demais legislações. Assim, de acordo com a referida conselheira, não cabe
à União,
[...] determinar, direta ou indiretamente, conteúdos curriculares que
orientam a formação religiosa dos professores, o que interferira tanto
na liberdade de crença como nas decisões de Estados e municípios
referentes à organização dos cursos em seus sistemas de ensino, não
lhe compete autorizar, nem reconhecer, nem avaliar cursos de
315
FONAPER
licenciatura em ensino religioso, cujos diplomas tenham validade
nacional.
Ainda sobre a formação de professores, em 19/04/1999 é publicada
a Resolução do CNE Nº 02/1999, que estabelece diretrizes para a
formação de docentes para a Educação Básica. Apenas o Artigo 2º, Inciso
III, faz menção à questão, ao estabelecer que os sistemas de ensino
devam preparar professores capazes de:
III – desenvolver práticas educativas que contemplem o modo singular
de inserção dos alunos futuros professores e dos estudantes da
escola campo de estudo no mundo social, considerando abordagens
condizentes com as suas identidades e o exercício da cidadania
plena, ou seja, as especificidades do progresso de pensamento, da
3
realidade socioeconômica, da diversidade cultural, ética, de religião
e de gênero, nas situações de aprendizagem;
Desta forma, espera-se que cada sistema de ensino elabore sua
proposta pedagógica, determinada por um projeto de educação que atenda
aos anseios da comunidade para a qual se destina. Uma vez definida a
proposta, deve-se priorizar a formação de docentes capazes de dar vida
ao proposto, imprimindo em suas práticas pedagógicas ações capazes de
transformar a realidade, ora esvaziada de valores próprios à boa
convivência social.
Considerações Finais
O estudo aqui apresentado mostra que as normas regulamentadoras
do setor educacional definem que a disciplina Ensino Religioso deve fazer
parte do currículo normal do sistema escolar. O tema não deve ser
entendido como ensino de uma religião ou das religiões na escola, mas
sim uma disciplina centrada em pressupostos antropológicos, teológicos e
pedagógicos.
Alguns setores ainda a consideram como elemento eclesiástico e
não como disciplina regular integrante do currículo escolar. Assim, ainda
se faz presente nas salas de aula práticas confessionais, ou então, diante
da carência de docentes para a disciplina, a mesma é tratada de forma
superficial e às vezes como tema transversal, usando a metodologia da
pedagogia de projetos.
3
Grifo nosso.
316
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
As diversas legislações que tratam do tema demonstram as
incertezas quanto a sua oferta. Isto faz com que os sistemas de ensino não
a valorizem, não invistam na formação de professores ou elaborem uma
proposta pedagógica que responda aos anseios da sociedade para a
formação das novas gerações que vêm demonstrando comportamentos
caracterizados pela violência e intolerância.
No contexto atual, a disciplina Ensino Religioso deve se constituir
num espaço para a discussão e debate de questões como cultura,
tradições, valores, ética e fé. Faz-se urgente repensar a disciplina Ensino
Religioso nas escolas públicas, visto que a mesma é um dos caminhos
para combater os preconceitos e discriminações ligados à raça, ao gênero,
às diferenças, à religião e à cultura, proporcionando a construção de uma
nova ideologia para uma sociedade como a nossa, que é composta por
diversas etnias, caracterizada por marcas identitárias, que precisam ser
educadas para a justiça e a paz.
Referências
BRASIL. Constituição Federal de 1998. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 20 de mai 2011.
______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional Nº 4.024 de
1961. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L4024.htm>. Acesso em 20 de
mai. 2011.
______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nº 5.692 de 1971.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5692.htm>.
Acesso em: 20 de mai. 2011.
______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nº 9.394 de 1996.
Disponível em:
<http://bd.camara.gov.br/bd/bitstream/handle/bdcamara/2762/ldb_5ed.pdf?
sequence=1>. Acesso em: 20 de mai. 2011.
_____. Lei Nº 9475 de 1997. Disponível em:
<http://www.pedagogiaemfoco.pro.br/lindice.htm>. Acesso em: 20 de mai.
2011.
317
FONAPER
______. Conselho Pleno do Conselho Nacional de Educação. Parecer nº
05, de 11 de março de 1997. Interpretação do artigo 33 da Lei nº
9.394/96. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/PNCP0597.pdf>. Acesso em 25
jun. 2012.
______. Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação.
Parecer nº 04, de 29 de janeiro de 1998. Diretrizes Curriculares Nacionais
para o Ensino Fundamental. Disponível em
<http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/PCB04_1998.pdf>. Acesso em:
25 jun. 2012.
______. Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação.
Parecer nº 16, de 01 de junho de 1998. Consulta a carga horária do
ensino religioso no Ensino Fundamental. Disponível em
<http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/pceb 16_98.pdf>. Acesso em: 25
jun. 2012.
______. Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação.
Resolução Nº 02 de 1998. Disponível em:
<http://pt.scribd.com/doc/20483294/Resolucao-CEB-02-98-Institui-asDiretrizes-Curriculares-Nacionais-para-o-Ensino-Fundamental>. Acesso
em: 20 de mai. 2011.
______. Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação.
Resolução nº 02 de 19 de abril de 1999. Institui diretrizes curriculares
nacionais para a formação de docentes da educação infantil e dos anos
iniciais do ensino fundamental, em nível médio na modalidade normal.
Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/doc/rceb02_99.doc>.
Acesso em 02 mai.2006
______. Conselho Pleno do Conselho Nacional de Educação. Parecer nº
97, de 06 de abril de 1999. Formação de professores para o Ensino
Fundamental nas escolas públicas de ensino fundamental. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/PNCP0597.pdf>. Acesso em 25
jun. 2012.
FONAPER. Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso. Parâmetros
curriculares nacionais - Ensino Religioso. São Paulo: Mundo Mirim,
2009.
318
O ENSINO RELIGIOSO NO CURRÍCULO ESCOLAR1
Elisângela Madeira Coelho2
Resumo:
O artigo aborda a necessidade de discutir e socializar estudos relacionadas aos processos
de construção de conhecimentos nas culturas – tradições religiosas e não-religiosas e suas
interfaces com o Ensino Religioso enquanto área de conhecimento da educação básica. A
partir dessa perspectiva, destacamos que um dos grandes desafios para a educação é
promover o respeito pelo outro como legítimo outro, sem o intento de homogeneizar as
culturas. Outro aspecto relevante é levar em consideração o perfil docente que possa
atender a proposta do Ensino Religioso. Espera-se desse profissional, uma metodologia
dialógica e contextual e o grande desafio, porém, é efetivar um Ensino Religioso voltado
para a superação do preconceito religioso, alicerçado no conhecimento e respeito à
diversidade cultural e religiosa.
Palavras-chave: Ensino Religioso. Currículo. Formação de professores.
Introdução
A esfera da religiosidade é uma dimensão constitutiva da realidade
humana. Desde que o ser humano começou a ter consciência das coisas,
ele já percebeu a existência de algo superior a ele, que foge da sua
compreensão. Esta interpretação foi feita por vários povos e culturas
diferentes, do qual resultaram distintas crenças em seres ou espíritos
divinos, também chamados de transcendentes. Segundo o dicionário
Aurélio (2002), o sentido da palavra transcendente possui muitos
significados como: algo muito elevado, superior, sublime, excelso, que
transcende aos limites da experiência possível, que supõe a intervenção
de um princípio que lhe é superior.
De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino
Religioso (FONAPER, 2009), o transcendente é uma das manifestações do
fenômeno religioso, entendido como o processo de busca que o ser
humano realiza na procura pela transcendência, o que perpassa desde sua
experiência pessoal até a sua experiência religiosa em grupo, comunidade
ou tradições religiosa.
1
2
Este artigo é resultado parcial da dissertação do Mestrado em Ciências da Religião.
Elisângela Madeira Coelho, Pedagoga-Supervisora Escolar no Instituto Federal do
Espírito Santo – Campus Itapina, Mestranda em Ciências da Religião na Faculdade
Unida de Vitória - ES, e-mail: [email protected]
FONAPER
Como a sociedade brasileira é caracterizada pela diversidade
cultural, coexistem inúmeras expressões religiosas no contexto social, bem
como nas escolas e salas de aula, o que implica diretamente nas relações
estabelecidas entre os diversos personagens que constituem o ambiente
escolar. Pensar estas relações na escola supõe desafios e possibilidades.
Desafios enquanto as dificuldades de aceitar o diferente e as diferenças e
possibilidades enquanto espaço de contato com o diferente e as diferenças
para então (re)significá-las na perspectiva da alteridade.
Por isso, evidencia-se a importância de oportunizar acesso ao
conhecimento das diferentes tradições e movimentos religiosos que se
apresentam na atualidade, considerando que a intolerância religiosa
promove diversos tipos de discriminação, que em muitas ocasiões podem
levar a graves conflitos. Para viver democraticamente em uma sociedade
multicultural é preciso conhecer e respeitar as diferentes culturas que a
constituem. E o ambiente escolar é o espaço privilegiado para promover o
conhecimento e a valorização da trajetória dos diferentes grupos sociais,
pois só assim será possível superar atitudes de intolerância em relação às
diferenças culturais.
A fim de promovermos significativas mudanças na vida das pessoas,
com o intuito de elas repensarem a forma de agir e interagir em sociedade,
devemos utilizar meios para que sejam impulsionadas a desfazer posturas
avarentas e coercivas. Nesse contexto, evidenciamos a grande
contribuição do Ensino Religioso no processo formativo e educacional.
O grande desafio, porém, é efetivar um Ensino Religioso voltado para
a superação do preconceito religioso, alicerçado no conhecimento e
respeito à diversidade cultural e religiosa. Tal componente deve oferecer
subsídios para que os estudantes entendam como os grupos sociais se
constituem culturalmente e como se relacionam com o sagrado. Estudar o
fenômeno religioso requer, por sua própria natureza, uma metodologia
dialógica e contextual.
Neste trabalho, propomos trazer elementos teóricos que auxiliem na
reflexão e compreensão dessas implicações na disciplina do Ensino
Religioso, apontando para alguns aspectos práticos que propiciem a
construção de espaços democráticos onde as diversas culturas e religiões
possam estar representadas e principalmente a formação do profissional
de Ensino Religioso que necessita de uma leitura crítica das realidades
320
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
sociais para organização e direcionamento do seu trabalho em sala de
aula.
Por fim, reiteramos a importância do Ensino Religioso em abordar o
conhecimento das diferentes culturas e religiões presentes na sociedade,
uma vez que o ambiente escolar é o espaço privilegiado para promover o
reconhecimento e a valorização da trajetória dos diferentes grupos sociais.
Consideramos que os saberes abordados pela disciplina precisam ser
pesquisados e contextualizados histórica e socialmente. A partir dessa
perspectiva, destacamos que um dos grandes desafios para a educação é
promover o respeito pelo outro como legítimo outro, sem o intento de
homogeneizar as culturas.
Diversidade Religiosa e Ensino Religioso
A nova redação do art. 33 da Lei n° 9394, de 20 de dezembro de
1996, determina que o Ensino Religioso, de matrícula facultativa, seja
parte integrante da formação básica do cidadão, constituindo disciplina nos
horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado
o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer
formas de proselitismo.
Neste sentido, para Junqueira (1995, p.14) não é ―função do Ensino
Religioso escolar promover conversões, mas oportunizar ambiente
favorável para a experiência do Transcendente, em vista de uma educação
integral, atingindo as diversas dimensões da pessoa‖. Tornar essa
concepção possível no currículo escolar implica considerar professores e
alunos sujeitos produtores e disseminadores de conhecimento,
conscientes de sua cidadania, em formação permanente. Assim, o Ensino
Religioso nos permite andar pelos caminhos da cultura e da diversidade,
resgatando valores que podem influenciar na construção de uma
sociedade mais justa e humana.
Na escola, diante da diversidade cultural e das tradições religiosas
em que o educando se insere, o Ensino Religioso, por meio do estudo do
fenômeno religioso, desencadeia o respeito à tolerância para com o
diferente, implicando ao professor compreender os movimentos
específicos das diversas culturas, cujo substantivo religioso colabora com
a constituição de cidadãos multiculturalistas, e também valorizar a
diversidade daquilo que distingue os diferentes componentes culturais,
321
FONAPER
com a finalidade de adotar na sua prática, políticas educacionais e sociais
de valorização da diversidade.
A literatura sobre o Ensino Religioso disponível não tem nenhuma
dúvida sobre as possibilidades concretas deste apresentar alguma
contribuição para a formação do cidadão. Citamos trechos paradigmáticos
de duas autoras:
Esta disciplina, trabalhada de forma interdisciplinar, colabora para que
educandos e educadores estejam comprometidos com a qualidade de
vida, em que a justiça, a fraternidade, o diálogo e o respeito pelo
diferente, pela história, pelas tradições e culturas favoreçam a paz, a
unidade, a esperança e a solidariedade. Admitido como parte
integrante da formação global o educando, favorece a humanização e
a personalização de educandos e educadores, como sujeitos de seu
desenvolvimento e protagonistas na construção de um mundo novo,
humano e solidário (CARON, 1998, p. 286-287).
Muitas vezes é pelo vazio desta disciplina que no relacionamento
humano o direito se tornou a lei do mais forte e a vida social termina
no egoísmo que semeia as injustiças mais gritantes. Eis a finalidade
da religião na vida da pessoa: tentar orientá-la para o sobrenatural;
ligá-la novamente com o sobrenatural... No entanto, esta ligação deve
ser orientada numa dimensão libertadora e não alienante, pois já
vimos que a religião pode ser usada para libertar o homem e levá-lo a
uma ação transformadora, condizente com o projeto de Deus, ou pode
levá-lo a uma atitude totalmente contrária como é o caso da opressão,
da exploração, da dominação e da discriminação, tão presentes em
nosso continente Latino-americano (FERNANDES, 2000, p. 30-31).
Uma das funções sociocultural-histórico da educação básica é
desenvolver fundamentos para a formação do cidadão e que o currículo
deste ensino contribua para uma aprendizagem significativa de releitura e
interpretação da realidade, possibilitando assim a participação do cidadão
na sociedade de forma autônoma, livre e feliz.
O Ensino Religioso, área de conhecimento, tem um referencial
próprio de leitura e de interpretação da realidade e o objetivo de contribuir
com a formação integral do indivíduo, inserindo-o no processo de
participação cidadã na sociedade, de forma autônoma e solidária.
Enquanto campo de conhecimento, o Ensino Religioso se
fundamenta na matriz teórica das ciências das religiões e
metodologicamente trabalha com eixos estruturantes, que tem por objetivo
desenvolver a compreensão do fenômeno religioso e a compreensão das
experiências e expressões da religiosidade no ser humano. Os eixos que
sustentam o componente curricular se organizam em torno da leitura e
322
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
compreensão das Tradições e Culturas, Teologias, Textos Sagrados Orais
e Escritos, Ritos e Ethos (FONAPER, 2009).
É a ação pedagógica realizada a partir de conteúdos programáticos
que possibilita ao educando apropriar-se de uma metodologia de leitura e
compreensão da realidade, quando se desenvolvida numa ação de:
• Observação: ou seja, de olhar e perceber o fenômeno religioso em
suas múltiplas dimensões e de fazer a análise do contexto para
apropriar-se de conceitos básicos do componente curricular
Ensino Religioso.
• Informação: ou seja, da aproximação do conhecimento, na
perspectiva de que o educando amplie seus conhecimentos, para
construir instrumentos e referenciais de interpretação e análise,
possibilitando recolocar e ressignificar conceitos.
• Reflexão: ou seja, oportunizar o confronto pedagógico do
conhecimento teórico com a prática, exercitando e organizando
observações, e gerenciando informações necessárias à
construção do conhecimento.
• Ação: ou seja, mobilizar o educando para apropriar-se de
linguagens, compreender fenômenos, construir argumentações e
elaborar propostas para a convivência fraterna, respeitosa e de
dignidade.
Assim se constitui a área de conhecimento Ensino Religioso, na
compreensão do seu objeto de estudo e possibilidade de a abertura de um
campo de leitura e de relações multi e transdisciplinar, integrando diversos
saberes e dialogando com outras ciências com a finalidade de contribuir
para a construção de novas práticas, que auxilie para a formação integral
do educando e que tenha uma perspectiva sempre aberta para o novo.
Que se expande para novos e desconhecidos horizontes do saber.
A Formação do Professor de Ensino Religioso
Freire (1996) nos ensina que o diálogo não é mero bate-papo, não é
tática para fazer amigos, não é um vaivém de informações, não é um
método, não é uma técnica para obter resultados ―não existe num vácuo
político. Não é um espaço livre onde se possa fazer o que se quiser.‖ O
diálogo implica uma troca de saberes, mas não se esgota nela. É condição
para a construção de conhecimento, porque na situação dialógica a
323
FONAPER
comunicação entre os sujeitos que estão dialogando problematiza o objeto
de conhecimento, questionando, criticando, avaliando, trazendo novos
aportes de informação, enfim, ampliando as dimensões do que é possível
saber sobre o objeto a ser conhecido/reconhecido. Nas palavras de Paulo
Freire (1986, p.123),
O diálogo é uma espécie de postura necessária, na medida em que os
seres humanos se transformam cada vez mais em seres criticamente
comunicativos. O diálogo é o momento em que os seres humanos se
encontram para refletir sobre sua realidade tal como a fazem e a
refazem.
A relação é presença e construção. Portanto, a educação é
construída na base de uma compreensão pluridimensional da pessoa e vai
acontecer nos espaços de aprendizagem como exercício de reflexão e
ação críticas. A educação no Ensino Religioso deve apresentar-se como
uma pedagogia que promova a construção de uma participação, incentive
a compreensão dos dissensos e conflitos, leve a uma abertura para o
mundo como compromisso concreto com os contextos nos quais se dão os
processos educativos.
A investigação sobre o currículo e a formação do professor de Ensino
Religioso encontra-se intimamente atrelada ao processo histórico e social
da educação brasileira. A promulgação da LDB/96 se deu em meio a uma
época marcada por significativos avanços científicos tecnológicos,
reestruturações no mundo do trabalho, ampliação dos meios de acesso à
informação e instauração de políticas públicas voltadas às demandas das
classes menos favorecidas. Crescia, porém, a consciência da necessidade
de um fortalecimento de iniciativas em prol da valorização das diferentes
culturas, preservação ecológica, respeito à ética e à dignidade humana,
entre outros.
O Ensino Religioso na sua articulação prescinde de alguns aspectos
fundamentais para a sua concretização, como por exemplo: as
contribuições das áreas afins, a busca permanente pelo sentido da vida, a
superação da fragmentação das experiências e da realidade, o pluralismo
religioso, a compreensão do campo simbólico e a necessidade de evitar o
proselitismo. Através dos eixos temáticos e da concepção de que a
atuação do ser humano não se limita às relações com o meio ambiente e
às relações sociais, mas sim está sempre em busca de algo que
transcende essas realidades.
324
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Nesse sentido, como os professores de Ensino Religioso estariam
trabalhando /vivenciando sua prática no dia-a-dia escolar? Não se faz
Ensino Religioso sem pensar em organização da educação como um todo,
em projeto de escola e em concepções que se têm do conhecimento
religioso. As ideias de Morin (2003) em suas produções individuais ou
como relator da UNESCO, têm se mostrado significativas para a pesquisa
na área do Ensino Religioso. Suas contribuições estão centralizadas no
conceito de multidimensionalidade do ser humano e da sociedade. Entre
essas dimensões encontra-se a religiosa. Ao mesmo tempo em que Morin
(2003, p. 116) ressalta as partes, as diferentes dimensões, para mostrar
que elas existem, também destaca que há ―uma interretroação‖ entre elas
para que se gere o ―conhecimento pertinente‖.
O conhecimento religioso torna-se, a partir desse argumento, um
conhecimento pertinente porque faz parte da multidimensionalidade do ser
humano e da sociedade, ou seja, proporcionará o entendimento das ideias
em contribuir para o incremento do estudo das concepções
epistemológicas do Ensino Religioso, conhecer as concepções
epistemológicas que norteiam a intencionalidade e a prática dessa área de
conhecimento.
As religiões fazem parte da cultura humana, e, portanto, cada religião
é peculiar, por expressar diferentes linguagens, diferentes formas de
acreditar, de celebrar, de rezar, e de relacionarem-se com alteridade e de
simbolizar de formas diferentes esses fenômenos religiosos vivenciados
pelos membros de cada cultura.
A educação precisa ajudar a interpretar a nossa história, a refletir
sobre atitudes, a perceber como se constrói uma vida melhor. Os
professores de Ensino Religioso tem grande dificuldade em manter um
clima agradável em sala de aula, uma vez que os alunos e a comunidade
escolar de um modo geral ―ainda não estão conscientizados‖ da
importância da disciplina, causando tumulto no ambiente escolar. Desta
forma os professores de Ensino Religioso precisam de instrumentos que
os façam interessarem e com isso possam transmitir seu conteúdo de
forma dinâmica e prazerosa.
Lurdes Caron e equipe do GRERE, no livro O Ensino Religioso na
nova LDB, relatam que a escola, ao introduzir o Ensino Religioso na sua
matriz curricular, busca refletir e integrar o fenômeno religioso como um
325
FONAPER
saber fundamental para a formação integral do ser humano. Mas, a partir
disso, emerge uma questão: quem educará os educadores?
Morin (2005) remete-nos a uma resposta quase que imediata:
precisamos adequar a nossa formação para que ela possa atender a este
―Novo Mundo‖ no qual vivemos hoje, onde a cada dia, novas ferramentas
tecnológicas estão à nossa porta. É preciso pensar que muito mais do que
a própria ideologia neoliberal que aponta a exigência da formação para
que se tiverem títulos – necessitamos de uma formação e auto-formação
que possam avançar na ciência, no estudo do objeto e de suas relações.
Surge então a ideia de perfil docente que possa atender a proposta
de Ensino Religioso. Espera-se do professor um envolvimento que inicia e
culmina no projeto político-pedagógico da escola, referindo-se à
competência pedagógica de trabalhar com situações novas em que a
pessoa docente demonstre coerência entre preceitos teóricos e sua
prática. Freire (2005, p. 90) enfatiza que ―não é no silêncio que os homens
se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão‖.
A capacidade de interagir com pessoas de diferentes etnias,
gêneros, situação sociocultural, confissões religiosas supõe conhecimento
das características da identidade nacional, regional e local. Colocar-se em
diálogo com diferentes pensamentos e formas de ser requer humildade e
sabedoria ao mesmo tempo.
Para Freire (1980, p. 83), ―o diálogo não pode existir sem um
profundo amor pelo mundo e pelos homens. Designar o mundo, que é ato
de criação e de recriação, não é possível sem estar impregnado de amor.
O amor é ao mesmo tempo o fundamento do diálogo e o próprio diálogo‖.
Dada tal importância ao diálogo, é possível dizer que, no prisma
educacional, dialogar não é ―catequizar‖, mas socializar para uma reflexãoação. Dialogar vai além de intercambiar ideias, mas é uma conversa que
gera uma reflexão coletiva visando criar ou aprimorar ações
emancipadoras dos oprimidos.
Ao assumir o Ensino Religioso na perspectiva da formação, da busca
de um significado de vida, do desenvolvimento da personalidade com
critérios seguros, do compromisso com a plena realização, tem
implicações com os conteúdos e as metodologias veiculadas, isto é,
Junqueira (2004, p.35) relata que se exige a coerência e a consistência
entre teoria e prática, intenções e ações, o que perpassa pela
transformação de seu articulador, de seu interlocutor, de seu mediador que
326
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
é a pessoa do educador, o professor de Ensino Religioso como catalisador
pela sua sensibilidade, perspicácia e criatividade.
Ao docente se faz necessário que transite com segurança e equilíbrio
entre o saber religioso e a adesão religiosa do corpo discente e a sua
própria. O perfil docente se constrói de modo contextualizado. A figura
professoral se faz em consonância com o seu espaço de atuação, em
conjunto com outras pessoas docentes, em conjunto com seu corpo
discente e em sintonia com a sua formação.
Nesta perspectiva, percebemos que a identidade do Ensino
Religioso pretende contribuir para que os educandos tenham: esperança e
utopia, para buscar uma sociedade justa, humana e solidária; capacidade
de dialogar com os diferentes num contexto de uma sociedade ao mesmo
tempo plural e desigual; condições de buscar o Transcendente sem perder
de vista o compromisso ético com o ser humano; senso crítico e
discernimento tanto para fazerem a leitura do mundo à sua volta quanto
para fazer a distinção entre o certo e o errado com base em valores
religiosos e humanistas; engajamento e militância nas causas que
envolvem o enfrentamento de toda forma de opressão, exploração,
exclusão, dominação e discriminação.
Considerações Finais
Com este trabalho verificamos a necessidade dos profissionais de
Ensino Religioso terem formação para colocar em prática os objetivos da
disciplina, a qual tem suas especificidades e os professores precisam
buscar referenciais para a organização e o redirecionamento do seu
trabalho em sala de aula, ampliando-se as vivências no trato com o outro,
para aprender a ser e conviver. Morin (2003) salienta a necessidade da
formação do professor para ajudar a contextualizar, a ampliar o universo
alcançado pelos estudantes, a problematizar, a descobrir novos
significados no conjunto das informações trazidas, ou seja, de
conhecimentos prévios.
Para Pedro Demo (2002), a pesquisa deve ser compreendida como
atividade cotidiana onde o educando é desafiado e estimulado a buscar
ajuda na literatura e, com os professores, a acessar recursos tecnológicos,
a montar um mosaico das informações, a discuti-las e criticá-las, e com
isso, a construir seu próprio conhecimento.
327
FONAPER
Dessa forma há uma interação entre educando (sujeito), fenômeno
religioso (objeto) e conhecimento (objetivo); o fenômeno religioso se
estrutura na bipolarização: cultura e tradição religiosa, visto que toda
cultura tem em seu substrato a presença do religioso e que toda tradição
religiosa constitui-se no bojo de uma cultura, num processo simultâneo,
interativo.
As possibilidades de uso de novos recursos são imensas. O mais
importante, porém, seria abrir os olhos dos nossos adolescentes para
analisar tudo o que acontece à sua volta, tornando-os capazes de entender
a vida para ter liberdade de escolher, construir e modificar sua prática.
Referências
BRASIL. Lei n. 9.394 - Diretrizes e bases da educação nacional:
promulgada em 20/12/1996. Brasília, Editora do Brasil, 1996.
CARON, Lurdes. O Ensino Religioso na nova LDB. Petrópolis: Vozes,
1999.
DEMO, Pedro. Educar pela pesquisa. Campinas, SP: Autores
Associados, 2002.
FERNANDES, Maria Madalena S. Afinal, o que é o Ensino Religioso?
Sua identidade própria em contraste com a Catequese. São Paulo: Paulus,
2000.
FONAPER. Ensino religioso: referencial curricular para a proposta
pedagógica da escola. 2000.
________. Parâmetros curriculares nacionais: ensino religioso. São
Paulo: Ave Maria, 1997.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática
educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996, p. 152 a 159.
GADOTTI, Moacir. Paulo Freire: uma biobibliografia. São Paulo: Cortez:
Instituto Paulo Freire; Brasília, DF: UNESCO, 1996.
JUNQUEIRA. Sérgio Rogério Azevedo. O processo de escolarização do
ensino religioso no Brasil. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.
328
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
_______________________________. O ensino religioso no contexto
da educação. Curitiba: Champagnat, 2004, p. 35
MORIN, Edgard. A cabeça bem-feita. 8 ed. Rio de Janeiro: Bertrand
Brasil, 2003.
329
O LUGAR DO ENSINO RELIGIOSO NO CURRÍCULO DA
EDUCAÇÃO ADVENTISTA
Francisco Luiz Gomes de Carvalho (PPCIR/UFJF)1
Resumo:
Assim como caracterizar o modelo de Ensino Religioso (ER) ofertado no sistema
educacional adventista é fundamental para compreender a lógica inerente aplicada pela
denominação em sua missão veiculada na efetividade do projeto educacional, de igual
importância é entender a estruturação e operacionalização curricular no nível escolar para
observamos o lugar reservado ao ER. Os dados aqui apresentados advêm de análise
documental balizada por uma abordagem crítica que se afirma como crivo reflexivo. É
conveniente indicar que este texto apresenta uma fundamentação teórica devedora à área
de estudos curriculares e da sociologia da educação, especialmente das teorias analíticas
de Apple (2006), Bourdieu (1989), Foucault (1979), Goodson (2008) e Silva (2004).
Palavras-chave: Ensino Religioso; Currículo; Educação Adventista;
Introdução
A história da Igreja Adventista do Sétimo Dia (IASD) apresenta em
seus primórdios um desinteresse pela educação, porque a membresia
aguardava o segundo advento de Jesus em sua geração. Assim ―[...] para
muitos pais adventistas a iminência do advento tornava uma educação
comum e básica até mesmo relativamente sem importância‖ (SCHWARZ;
GREENLEAF, 2009, p. 116). Por isso, o sistema educacional adventista
foi o último empreendimento denominacional.
Nesta direção, Knight (1982, p. 1) afirma que:
A educação formal foi o último segmento institucional a ser
estabelecido dentro da denominação. Ela foi precedida pelo
estabelecimento da obra de publicações em 1849, da organização
eclesiástica centralizada em 1863 e da obra médica em 1866. Em
contraste, a Igreja Adventista estabeleceu sua primeira escola em
1872 e não chegou a possuir um amplo sistema de escolas
fundamentais até cerca de 1900.
1
Doutorando em Ciência da Religião (UFJF / Bolsista FAPEMIG). Mestre em Ciência da
Religião (PUC-SP/ Bolsista CNPq), graduado em Teologia (UNASP-SP) e graduando
em Pedagogia (UNIP). Participante do NEPROTES – Núcleo de Estudos em
Protestantismos e Teologias. E-mail: [email protected].
FONAPER
Desta forma, a primeira escola patrocinada pela denominação surgiu
em Battle Creek (EUA), em 1872. Dois anos após, a Sociedade
Educacional Adventista do Sétimo Dia torna-se entidade legal nos Estados
Unidos da América.
Por ocasião da inauguração da primeira escola oficial da
denominação, Uriah Smith apresenta o propósito que a educação
adventista deveria representar: ―[...] Como a semente de mostarda entre as
plantas, esperamos que esta escola ocupe um lugar importante entre as
instituições em funcionamento para o avanço da verdade‖ (SMITH, 1872,
p. 204).
É fato que o início da história da educação brasileira deu-se no berço
da confessionalidade, tendo ao longo de seu percurso recebido influências
significativas do catolicismo e protestantismo. Certamente que as missões
norte-americanas ligadas ao protestantismo prestaram importante
contribuição à educação brasileira ao ampliar a oferta educacional para a
população não contemplada pelo sistema de ensino vigorante, bem como
―[...] pela inovação do sistema pedagógico, que veio preencher as lacunas
existentes‖ (HACK, 2000, p.12).
Nesta direção, Silva (2002) aponta possíveis contribuições do
sistema educacional adventista para a educação brasileira, são elas: a) a
instalação de escolas em áreas rurais favoreceu a difusão da educação no
Brasil; b) a oferta de bolsas de estudos para estudantes oriundos das
camadas mais pobres contribuiu para que a educação proporcione a
mobilidade social ascendente.
Queremos, neste trabalho, apresentar o lugar que o Ensino Religioso
(ER) ocupa na educação adventista, analisando-o a partir da perspectiva
da sociologia da educação e dos estudos de currículo. Tal análise funda-se
numa apropriação tópica (CATANI; CATANI; PEREIRA, 2001) das teorias
analíticas de Apple (2006), Bourdieu (1989), Foucault (1979), Goodson
(2008) e Silva (2004).
É imprescindível neste texto apresentar que os delineamentos a
serem expostos acerca do ER na educação adventista tem a compreensão
maximizada à luz de dois documentos que são balizadores para tal
sistema educacional confessional, a saber: Pedagogia Adventista
(DSAIASD, 2009) e Declaração da Filosofia Educacional Adventista do
Sétimo Dia (RASI, 2001).
332
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
A educação adventista
A educação adventista é um empreendimento denominacional que
foi precedido pela organização denominacional da obra de publicações em
1849, e pelo vigoroso programa de saúde de 1866 (KNIGHT, 1982). Este
empreendimento encontrou nos escritos advindos de Ellen G. White2 as
diretrizes a serem seguidas na implantação e desenvolvimento de uma
educação cristã, centrada na preocupação com o currículo, tendo a Bíblia
como referencial para todos os níveis de educação (CADAWALLADER,
1949).
De algum modo, Ellen G. White apenas refletiu as mudanças que
estavam acontecendo na sociedade de sua época (GREENLEAF, 2010),
pois o ânimo e interesse denominacional pela educação deve ser
entendido numa dialética que considere o espírito de reforma que
reanimava a sociedade norte-americana pelo progresso da educação.
Nesta conjuntura maior entende-se que no meio adventista
[...] os princípios educacionais foram desenvolvidos, por um lado,
dentro do contexto das tentativas do século dezenove de reformar a
educação e, por outro lado, dentro do contexto denominacional de
comparativa indiferença para com a reforma educacional (DOUGLAS,
2001, p. 344).
Certamente que o desenvolvimento do sistema educacional
adventista caminhou concomitantemente às orientações da profetisa,
todavia, seus princípios, alvos e objetivos educacionais encontram-se
pulverizados em uma ampla e variada coleção de cartas, panfletos e
artigos publicados ao longo de sua vida, e posteriormente sistematizados
pela liderança eclesiástica.
É perceptível nos escritos denominacionais de White, que a
educação deve ser vista a partir da perspectiva da cosmovisão bíblicocristã, a fim de que a Bíblia tenha centralidade no processo educativo, para
que o aluno seja desenvolvido nas múltiplas dimensões, tornando-se uma
pessoa preparada para atuar como obreiro ou como alguém que, mesmo
não estando nas fileiras dos servidores denominacionais ao escolher sua
profissão apoie a missão da igreja. Para tanto, o ideário educacional que
2
Ellen G. White recebeu em janeiro de 1872 sua primeira visão sobre princípios
educacionais e escreveu 30 páginas sobre o que havia visto, por título a Devida
Educação.
333
FONAPER
permeia o sistema educacional adventista, bem como compõe o imaginário
denominacional refere-se a uma proposta educacional de ―restauração‖ do
indivíduo.
Segundo Suárez (2010), desde que se criou um consenso acerca da
missão educacional da IASD, a partir daí buscou-se a formulação de um
currículo educacional que fosse condizente com os ideais propostos. Em
sua obra, Hilde (1980) dentre as reflexões realizadas acerca da
presentividade da educação adventista, ressalta que a preocupação com o
currículo deve estar permeada pelos apontamentos da mensagem da
IASD.
A questão curricular na educação adventista tem sempre ocupado a
pauta das preocupações institucionais da IASD, pois é neste campo onde
se assentam as bases para a integração fé e ensino pretendida por este
sistema educacional. Com a prerrogativa de que um currículo equilibrado é
aquele que fomenta o desenvolvimento integral da vida espiritual,
intelectual, física, social, emocional e vocacional, na educação adventista o
currículo além de promover a excelência acadêmica, deve contar com ―[...]
cursos de formação espiritual que guiarão o viver cristão [...] A formação
do cidadão inclui apreço por sua herança cristã [...]‖ (RASI, 2001, p. 08). É
notória a preocupação com a implantação de um currículo ―plenamente
adventista‖, no qual a Bíblia constitua a base de todo o currículo e os
escritos de Ellen G. White sejam permanente fonte de leitura e orientação,
de modo que o ―modo de vida adventista‖ seja ensinado (AZEVEDO,
2003).
É imprescindível apresentar as bases para a oferta da disciplina de
ER na educação adventista de nível básico, fundamentado no pressuposto
de que o ser humano é marcadamente caracterizado pela necessidade
humana pelo transcendente, de modo que a religião e a religiosidade são
componentes fundamentais da identidade humana.
O lugar do Ensino Religioso na Educação Adventista
Como ponto de partida convém aqui explicitar que a concepção de
integração fé e ensino é o espectro que permeia a educação adventista
nos mais diversos níveis escolares. Em suma, entende-se que é
[...] um processo contínuo e sistemático mediante o qual se enfocam
todas as atividades educativas de uma perspectiva bíblico-cristã, a fim
334
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
de que os alunos, ao completarem seus estudos, tenham internalizado
voluntariamente uma visão de vida, do conhecimento e seu destino.
Essa visão se centraliza em Cristo, orienta-se para o serviço e projetase até o reino do Céu (STENCEL, 2005, p. 27).
Na declaração de missão3 da educação adventista diz que o alvo
primordial é prover ―[...] oportunidade para os estudantes aceitarem a
Cristo como seu Salvador pessoal, permitir ao Espírito Santo transformar
suas vidas e cumprir a missão de pregar o Evangelho ao mundo‖
(AZEVEDO, 1997, p. 61).
Por sua vez, a justificativa e objetivo das aulas de ER, a disposição
da disciplina no currículo, como também o propósito e a intencionalidade
última
de
tal
projeto
revelam-se
pautado
pelo
binômio
educação/evangelização. Neste sistema educacional confessional, o
professor é entendido como ―[...] astro de primeira grandeza no firmamento
educacional [...]‖ (DSAIASD, 2009, p. 63). Assim, o professor adquire a
função de catalisar o processo de integração fé e ensino na sua prática
pedagógica em seu ambiente privilegiado, a sala de aula. Isto se dá
porque quando o ―professor entra na sala e fecha a porta, ele é o currículo,
por que o aprendizado é grandemente comunicado através da sua visão
de mundo e da vida‖ (STENCEL, 2004, p. 31).
Como exposto até aqui, percebe-se que o professor é peça chave na
integração fé e ensino, pois é o docente que no ambiente escolar e na
relação com os estudantes operacionalizará na prática o que a teoria rege.
Orientado pela perspectiva educacional cristã, balizado pela filosofia
educacional adventista, o educador para alcançar os propósitos da
educação adventista deve manifestar e buscar continuamente algumas
posturas. Destacam-se, as seguintes: ―a) ser um imitador de Jesus; b) ter
senso da presença divina; c) conhecer e estar sintonizado com a filosofia e
a proposta da educação adventista [...]‖ (DSAIASD, 2009, p. 63-64).
Neste sentido, no magistério, o docente pode incrementar o cotidiano
da sala de aula com algumas atividades de cunho espiritual, tais como:
[...] realizar oração intercessória por alunos, familiares, professores e
funcionários; planejar e executar semanas especiais com temas
espirituais; compartilhar textos bíblicos com as famílias e pessoas da
comunidade que estejam necessitando de auxílio especial; dar
estudos bíblicos e distribuir folhetos com mensagens bíblicas de
3
Para maiores informações o texto está disponível em
<http://educacao.adventistas.org.pt/paginas/missao.php>. Acesso em: 11 ago. 2011.
335
FONAPER
saúde que promovam a qualidade de vida; promover campanhas de
cunho social e espiritual; fazer uma maratona de leitura da Bíblia com
a turma; estimular a criação de uma agenda pessoal e coletiva de
oração (DSAIASD, 2009, p. 74).
A disposição e sequência da disciplina de ER apontam para um
ordenamento prévio, no qual prevalece uma intencionalidade para a
construção do currículo, visto que na educação adventista o currículo tem
―[...] caráter contextual no qual se considera a inter-relação entre as
agencias educativas: família, igreja e escola, tendo como alvo o
cumprimento da missão e visão‖ (DSAIASD, 2009, p. 52).
Evidentemente que não nos propusemos inventariar a gênese dos
conteúdos programáticos, nem mesmo assinalar o seu progressivo
desenvolvimento, todavia, é indispensável mencionar que os mesmos
apresentam-se intrinsecamente relacionados e embasados com as
doutrinas da mantenedora. De maneira que:
Doutrinas, fatos bíblicos, descobertas arqueológicas, correlações do
pensamento bíblico com a filosofia grega, as implicações dos distintos
pontos de linguagem, e assim por diante, certamente fazem parte da
―substância‖ do ensino religioso (KNIGHT, 2010, p. 174).
Os conteúdos programáticos selecionados devem enfatizar os
objetivos específicos de cada área de conhecimento, mas sem perder de
vista os ―[...] valores e ideologias, [...] conceitos, procedimentos e atitudes
que se deseja ver no desenvolvimento integral do educando‖ (DSAIASD,
2009, p. 68). Assim, fica nítido o comprometimento da seleção dos
conteúdos com a cosmovisão pregada e defendida pela instituição
educacional.
A nomenclatura que abarca a disciplina confessional apresenta-se de
forma confusa nos documentos que balizam a educação adventista, de
modo que em alguns momentos é tida por ―aula de Bíblia‖, ―aula de
religião‖, ―ensino da Bíblia‖ ou mesmo ―ensino religioso‖. Todavia, o que se
espera mesmo é a integração de outros tópicos do currículo com a
cosmovisão cristã com contornos de marcas denominacionais pregadas e
defendidas pela mantenedora, de maneira que especialmente a disciplina
confessional possa ―[...] preparar o caminho para essa integração na
mente dos estudantes enfatizando a cosmovisão cristã e o que esta
perspectiva significa para o restante de sua educação‖ (KNIGHT, 2010, p.
176).
336
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Sendo que a Bíblia, a natureza e a racionalidade humana constituem
as principais fontes de conhecimento consideradas pela filosofia
educacional adventista é preciso compreender que alguns conhecimentos
são privilegiados na organização e seleção do programa de estudos da
educação adventista, o que implica em saber que também neste nível
educacional o ―[...] currículo escolar está relacionado diretamente às
questões do conhecimento, provocando desse modo a seleção,
organização, institucionalização e dinamização das atividades, valores,
competências [...]‖ (DSAIASD, 2009, p. 67).
É adequado indicar que neste sistema de ensino confessional, as
orientações referentes ao currículo das instituições educacionais buscam
incluir uma perspectiva teórica de abordagem e tratamento da realidade,
entretanto, é importante
[...] lembrar que no currículo integral-restaurador o estudo das
ciências, dos problemas contemporâneos e dos contextos culturais
globais e locais tem espaço e é tratado à luz da cosmovisão bíblica
(DSAIASD, 2009, p. 69).
Considerações Finais
As atividades proselitistas que atravessam o cotidiano das
instituições
educacionais
protestantes
podem
ser
percebidas
principalmente nas práticas educativas, pois é sempre difícil a delimitação
clara entre a prática educativa e a prática religiosa. Basta relembrar que
―[...] o programa educativo é uma das primeiras e mais importantes
expressões da obra missionária‖ (RAMALHO, 1976, p. 69).
De certa forma, o que subjaz nestas práticas catequéticas é uma
elaborada estratégia proselitista que, além compor o núcleo evangelizador
intenciona difundir por meio dos conteúdos a serem transmitidos os
elementos distintivos da identidade confessional da instituição. Assim, a
concepção de ER colocada em prática é baseada primordialmente nos
princípios eclesiásticos, mesmo que contenha princípios educacionais.
Desse modo, ―a intencionalidade proselitista, ainda que disfarçada sob os
princípios humanistas, é que de fato efetiva essas práticas [...]‖ (PASSOS,
2007, p. 57).
A compreensão das relações de poder no contexto educacional é
cada vez mais importante na composição dos sistemas interpretativos,
337
FONAPER
devido à enorme contribuição para a leitura da realidade, pois ao mesmo
tempo em que se apresentam de forma oculta demarcam e fornecem os
padrões de conduta dos educadores, os princípios seletivos dos
conteúdos, além de patentear as próprias matrizes paradigmáticas
educacionais. Estar atento à detecção das relações de poder na escola é
considerar
[...] o poder em suas extremidades, em suas últimas ramificações, lá
onde ele se torna capilar; captar o poder nas suas formas e
instituições mais regionais e locais, principalmente no ponto em que,
ultrapassando as regras do direito que o organizam e delimitam, ele se
prolonga, penetra em instituições, corporifica-se em técnicas e se
mune de instrumentos de intervenção material [...] (FOUCAULT, 1979,
p. 182).
Ficou evidenciado neste texto o fato de que o currículo não é
componente neutro e desinteressado no amplo processo educacional, pois
no processo de organização e seleção de conteúdos programáticos
recorre-se às fontes da filosofia institucional, a fim de que os valores,
crenças e ideologia sejam difundidos de forma consensuais. Sobre esta
realidade, Silva (2004, p. 46) afirma que ―a seleção que constitui o
currículo é resultado de um processo que reflete os interesses particulares
das classes e grupos‖.
As relações de poder não se apresentam como protagonistas no
enfrentamento da resistência e oposição advinda de algum movimento
discente, mas certamente elas se subterfugiam nos bastidores da
confecção curricular. Todavia, não podemos deixar de indicar que no
currículo estão envolvidas as questões de poder, pois:
Selecionar é uma operação de poder. Privilegiar um tipo de
conhecimento é uma operação de poder. Destacar, entre as múltiplas
possibilidades, uma identidade ou subjetividade como sendo a ideal é
uma operação de poder (SILVA, 2004, p. 16).
Os caracteres da operacionalização do ER na educação adventista
possibilita-nos entender que este modelo educacional confessional contém
uma propriedade simbólica, de maneira que suas instituições educacionais
de uma forma ou outra preservam e distribuem o seu próprio capital
cultural contribuindo assim para a criação e recriação de formas de
consciência que vinculadas aos princípios da filosofia educacional
338
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
adventista pretendem atuar de maneira subjacente na vida dos estudantes
(APPLE, 2006).
Compreendemos que, especialmente no sistema escolar
confessional, por meio da disciplina de ER, a ideologia e experiência
escolar são regularidades básicas de comprometimentos subjacentemente
assumidos no currículo explícito. Desta maneira, é seguro afirmar que
também ―a escola atua ideologicamente através de seu currículo, [...] de
uma forma mais direta, através das matérias mais suscetíveis ao
transporte de crenças explicitas [...]‖ (SILVA, 2004, p. 31).
Muitas pesquisas curriculares consideram o currículo como uma
construção social, e o fazem por meio do apontamento de padrões de
mudança, desvelamento dos processos de seleção de conteúdos, além de
indicar que muitos saberes são considerados legítimos em detrimento de
outros. Nesta esteira interpretativa, Goodson (2008) faz-nos entender que
a criação de um currículo possibilita visualizar as metas e estruturas
prévias como mapas ilustrativos que condicionam as práticas
educacionais, especialmente no contexto institucionalizado. Assim que,
para este autor, a confecção curricular acontece balizada pelo nível préativo, que por sua vez oferece elementos para a execução interativa
efetivada por meio das práticas escolares. Este entendimento nos
possibilita afirmar que os parâmetros que orientam as ações pedagógicas
em sala de aula e sua consequente negociação interativa são permeados
por valores e objetivos patenteados na escolarização (GOODSON, 2008).
Tendo entendido as conjunturas institucionais nas quais se efetiva o
ER confessional no currículo escolar, percebe-se cada vez mais
transparente a instauração de relações de domínio subjacente de poder
simbólico. O poder simbólico apresenta-se como pedra fundamental na
construção de uma dominação simbólica, pois transporta violência de
forma dissimulada e transfigurada (BOURDIEU, 1989).
Diante disso, é importante manifestar a preocupação sobre os
conhecimentos que compõem o ER na educação adventista, tendo em
vista o grande número de estudantes não-adventistas. Tal preocupação,
[...] não é com a validade epistemológica do conhecimento
corporificado no currículo. A questão não é saber qual conhecimento é
verdadeiro, mas qual conhecimento é considerado verdadeiro. A
preocupação é com as formas pelas quais certos conhecimentos são
considerados como legítimos, em detrimento de outros, visto como
ilegítimos (SILVA, 2004, p. 46).
339
FONAPER
Em um sistema de ensino confessional, cuja racionalidade se
apresenta como meio de efetivação das demandas identitárias da
mantenedora, o ER na educação básica adventista além de explicitar uma
hierarquização dos conhecimentos em um contexto de assimetria nas
relações pedagógicas, concede aos estudantes apenas a possibilidade de
uma contestação puramente simbólica, que por sua vez não debate os
princípios fundamentais, nem mesmo as relações de poder.
Foi somente por meio de uma abordagem crítica fundamentada nas
análises teóricas de Apple (2006), Goodson (2008) e Silva (2004) que, ao
analisarmos o lugar do ER no currículo da educação adventista, foi
possível indicar que a seleção dos conteúdos, a hierarquização dos
saberes e a uniformização do conhecimento contribuem para a
caracterização de um poder simbólico (BOURDIEU, 1989) dissimulado e
transfigurado em relações pedagógicas assimétricas.
Referências
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342
O ENSINO RELIGIOSO TRANSVERSALIZANDO OUTRAS ÁREAS
DE CONHECIMENTO
Iêda de Oliveira Caminha (SEDEC)1
Maria José Torres Holmes (SEDEC)2
Resumo:
Apresentamos neste artigo a relação do Ensino religioso com outras áreas de
conhecimento, no decorrer de um processo de formação continuada envolvendo os cinco
eixos organizadores dos conteúdos propostos pelos PCNER (FONAPER, 2009), no qual
construímos com os educadores uma dinâmica metodológica que focaliza o processo de
ensino e aprendizagem do fenômeno religioso.
Palavras chave: Currículo; Ensino Religioso; formação continuada;
Introdução
Pensar o Ensino Religioso (ER) no contexto escolar é um desafio
muito grande quando se pretende articulá-lo com outras disciplinas do
currículo escolar. Durante séculos, esse componente curricular foi visto
nas escolas como um elemento com características religiosas de propósito
proselitista. Entretanto graças às mudanças na legislação de ensino,
atualmente há um novo olhar sobre o ER que proporcionou grandes
discussões focalizando a parte pedagógica no processo de ensino e
aprendizagem dentro do contexto escolar.
Por isso, nesse momento, a grande preocupação do FONAPER3 é
sistematizar um currículo que venha oferecer ao educador(a) mais
segurança quanto à transmissão dos conteúdos no processo de ensino e
aprendizagem. Segundo (ANDRADE 2003, p. 11):
[...] o currículo escolar é o elo entre a teoria educacional e a prática
escolar (o que realmente ocorre nas salas de aula), o instrumento que
articula possibilidades, necessidades, interesses, pretensões e
1
2
3
Pedagoga (UFPB). Especialista em Gestão Educacional (FIP). Teológa (IBBB) e Mestre
em Ciências das Religiões (UFPB). Profª. Secretaria de Educação e Cultura de João
Pessoa-PB. E-mail [email protected]
Pedagoga. Especialização e Mestrado em Ciências das Religiões (UFPB). Secretaria de
Educação e Cultura de João Pessoa-PB. E-mail: [email protected].
Fórum Nacional Permanente de Ensino Religioso. Fundado em 26 de setembro de
1995, é um espaço de discussão e ponto aglutinador de ideias, propostas e ideais na
construção de propostas concretas para a operacionalização do Ensino Religioso na
escola.
FONAPER
perspectivas da escola, em um conjunto de escolhas, ações, ênfases
e omissões.
Para isso, vale salientar que a formação docente é uma necessidade
básica para o(a) docente de todas as áreas de conhecimento,
principalmente para os de Ensino Religioso, tendo em vista existir uma
rotatividade muito grande no quadro desses(as) professores(as). Essa é
uma questão a ser enfrentada por esse(a) profissional o que reforça a
necessidade da sistematização desse processo, principalmente diante da
demanda de qualificação para assumir as classes e ministrar essas aulas,
mesmo porque, muitos ainda não possuem habilitação nessa área de
conhecimento.
Para isso é preciso um estudo aberto e criativo, com muito diálogo
sobre o fenômeno religioso das diversas culturas religiosas e suas
manifestações na nossa sociedade, já que este é considerado o objeto de
estudo desse componente curricular. A proposta intenta promover um
espaço onde o diálogo, o respeito e a aceitação dos educandos, sejam
quais forem suas convicções, se deem no sentido de um amadurecimento
sobre o conhecimento religioso das tradições religiosas, os quais possam
minimizar ou até mesmo eliminar as diversas formas de preconceitos
existentes no espaço escolar e na sociedade. Com isto esta se educando
as novas gerações, apresentando-lhes alternativas e precavendo-os contra
fundamentalismos e manipulações ideológicas de discursos religiosos.
Tais considerações são importantes para os educadores do Ensino
Religioso, já que precisam se fundamentar a esse respeito para que
possam desenvolver na escola, de forma organizada em sua ―linguagem
específica‖, a releitura do fenômeno religioso, conforme preconiza a Lei
9475/97.
Neste sentido, de acordo com Holmes (2010, p. 53),
Todas as culturas religiosas têm o seu modo especial de expressar o
seu encontro com o sagrado. Por isso a religião para cada ser humano
se expressa com uma dimensão existencial de grande profundidade,
marcando assim os seus elementos culturais dentro de uma realidade
histórica, onde a religiosidade torna-se efetiva para o ser humano,
denominada em cada cultura como fenômeno religioso.
O currículo do ER articulado com as demais áreas de conhecimento
Compreendendo a importância da linguagem específica do Ensino
Religioso, enquanto componente curricular entre as demais áreas de
344
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
conhecimento, propusemos o uso simbólico da imagem da árvore em um
processo de formação continuada para professores deste componente
curricular. Atrelamos o saber que o símbolo transmite e desperta com os
saberes dos cinco eixos organizadores dos conteúdos proposto pelos
PCNER (FONAPER, 2009).
Ao nosso redor, no mundo que vivemos a televisão, o vídeo e outras
tecnologias constantemente nos envolvem com enxurradas de imagens
que permeiam o nosso pensamento. As imagens nos chamam atenção.
Ficamos perplexos com a fotografia de momentos especiais, além da
internet que nos proporciona o contato com inúmeras imagens. Entretanto,
qual é o papel das imagens para a educação? E, especificamente, como
usar a imagem a favor da aprendizagem? Tendo em vista o fato de ser tão
usada na construção de novos conhecimentos, pensamos em utilizar a
imagem como recurso para nossa proposta formativa:
A imagem torna-se, portanto, um objeto a ser analisado, investigado e
debatido, sobretudo quando se entende que ela é um texto portador
de valores, de atitudes, de comportamentos e de saberes que
produzem efeitos significativos sobre a formação da consciência e a
conduta dos indivíduos em suas diferentes fases da infância,
adolescência, juventude e adulta (SILVA, 2008, p. 8).
Portanto, a imagem possui seu papel no processo didático
pedagógico imprescindível nesse momento que buscamos novas técnicas
e metodologias para o momento de ensino aprendizagem. Todavia, a
imagem que apresentamos é a ‗imagem viva‘, imagem de um elemento
presente na humanidade desde seus primórdios. A árvore é um dos
símbolos que merece atenção por sua presença em todos os cantos da
terra, além de apresentar semelhança com o ser humano, pois nas
locuções metafóricas, a madeira muitas vezes representa o próprio homem
(GIRARD, 1988, p.436).
Desde os seus elementos constitutivos como a raiz, o tronco, galhos,
folhas, flores e frutos, bem como suas necessidades para manter-se firme,
em pé, a árvore simboliza vida:
As árvores se contextualizam. Espalhadas por todas as partes em
diversas culturas sabem como viver e crescer; independentemente do
mundo ao seu redor, elas cumprem seu papel. Assim percebemos que
apontam caminhos essenciais para a vida, e sua simbologia de mestre
nos ensina. Quem deseja aprender com elas pela sua ontologia pode
345
FONAPER
tirar lições, é só sentar a sombra de uma delas [...] (SILVA, 2010,
p.19).
A árvore é um símbolo cuja semântica abrange diversos sentidos. A
imagem da árvore nas narrativas míticas representa a ―árvore cósmica que
se encontra no meio do universo e que sustenta como um eixo os três
mundos‖ (ELIADE, 1991, p. 40). A árvore cósmica é um simbolismo do
centro e é também um dos mais propagados que existe. A árvore cósmica
é encontrada nas mitologias hindus, mesopotâmica e entre os maias e
astecas.
Para fazer uso dessa imagem viva é necessário exercer
sensibilidade. ―Que nos deem o jardim e o prado, a campina e a floresta, e
nós reviveremos nossas primeiras felicidades‖ (GIRARD, 1988, p.437). A
árvore é uma ‗imagem viva‘, um símbolo4, um arquétipo para a
humanidade, podendo ser utilizada para facilitar a aprendizagem em todas
as áreas do conhecimento.
A árvore é um símbolo de linguagem universal, ele quebra as barreiras
da incompreensão de um indivíduo ou de uma cultura, pois o homem
é simbólico em todo viver, criando e recriando sentidos. Os símbolos
podem passar anos, décadas, séculos ou milênios e eles estarão lá;
impregnados a cultura e para conhecê-las corramos atrás do seu
sentido, pois o símbolo é um código que revela e desvela uma cultura
[...] (SILVA; GOMES, 2010, p. 217).
No percurso da nossa caminhada de formação continuada, tivemos a
ideia de trabalhar com os eixos temáticos numa dinâmica de
transversalizar o ER fazendo pontes com a área de Ciências e Língua
Portuguesa, comparando as cinco partes de uma árvore com os cinco
organizadores dos conteúdos do ER e, por meio disso, produzir um texto
para melhor compreensão da proposta formativa.
Como recursos metodológicos, apresentamos um estudo sobre os
cinco eixos organizadores dos conteúdos através de slides com
discussões e debates. Em seguida elaboramos uma oficina com cinco
grupos, cada qual representado uma parte de uma árvore. Isto aconteceu
em dois turnos de trabalho, tendo em vista a formação estar dividida em
dois grandes grupos. Esta dinâmica proporcionou um estudo reflexivo
4
No dizer de Girard (1997, p.26), ―Símbolo‘ provém do termo grego symbolon, derivado
do verbo sym-ballein, que em seu sentido primeiro significa ‗lançar com, pôr junto com,
juntar‖.
346
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
envolvendo todos os educadores. Foi uma forma que encontramos para
aperfeiçoar a formação continuada e logicamente facilitar o processo de
ensino e aprendizagem do fenômeno religioso. De acordo com os PCNER
(FONAPER, 2009, p. 57),
O tratamento didático subsidia o conhecimento. Assim, o Ensino
Religioso, pelos eixos de conteúdos de Culturas e Tradições
Religiosas, Escrituras Sagradas, Teologias, Ritos e Ethos, vão
sensibilizando para o mistério, capacitando para a leitura da
linguagem mítico-simbólica e diagnosticando a passagem do
psicossocial para a metafísica/Transcendente.
Assim, relacionamos os cinco eixos organizadores dos conteúdos do
ER com as cinco partes de uma árvore, destacando cada uma através da
interpretação do texto proposto, onde cada grupo trabalhou com questões
específicas, conforme apresentado abaixo:
a) Raiz: parte responsável pela sustentação da planta ao solo,
alimentando-a e nutrindo-a com seus sais minerais. Compreendemos que
essa parte representa o eixo Culturas e Tradições Religiosas, o que
remete ―a árvore que é o eixo do mundo, a Axis mundi, um arquétipo do
Universo que recebe seu alimento do transcendente‖ (PONTES, 1998, p.
203). Também foi possível vincular o papel das tradições religiosas na
sustentabilidade do Planeta Terra: a) Como o grupo se vê diante do
preconceito religioso de uma cultura em relação à outra? b) Em suas
escolas isso acontece? De que maneira você enfrentaria essa situação?
Aqui temos um caminho para trabalhar a diversidade religiosa do
mundo e do povo brasileiro. ―Compreendemos que as raízes podem indicar
uma comunicação com outras árvores pela terra que a todas alimenta e de
onde as árvores tiram seu sustento. Isso repercute na necessidade do ser
humano relacionar-se com o outro‖ (SILVA, 2011, p.34). Ou seja: mesmo
que eu faça parte de um grupo religioso isso não significa que eu não
possa me relacionar com o outro diferente enquanto pertencente à outra
tradição religiosa.
b) Caule: parte que sustenta a planta transportando a seiva retirada
da raiz levando até seus galhos, folhas e frutos. Esta pode ser comparada
com os textos sagrados orais e escritos, pois estes são responsáveis
pela transmissão da comunicação através do tempo-história, as verdades
de fé de uma cultura religiosa, o mistério do transcendente.
347
FONAPER
Podemos observar que o tronco das árvores está no espaço humano,
aquele que é mais visível, que faz a ligação com o céu e embaixo da
terra. A humanidade na procura por sentido de vida e também por
querer respostas para as perguntas ante as faces do tempo e da
morte busca o transcendente. As árvores convivem, mesmo com sua
diversidade, com as raízes na terra, os troncos entre nós [...] (SILVA,
2011, p.61).
Entendemos que a busca pelo transcendente é uma ação da
humanidade dentro da diversidade religiosa que existe. Desta forma
podemos trabalhar as diferenças no que se refere às tradições escritas e
orais. Assim levantamos as seguintes perguntas: a) qual a importância dos
textos sagrados orais e escritos? b) Qual a diferença entre um texto
sagrado oral e um texto sagrado escrito?
c) Folhas: são as responsáveis pela fotossíntese, respiração e
transpiração, funções primordiais de um ser vivo do reino vegetal. Essa
parte da planta simboliza o eixo temático Teologias, que representa o
oxigênio das culturas religiosas que sistematiza as afirmações, os
conhecimentos das religiões sobre o sagrado, suas crenças e doutrinas
sobre o tempo, a vida e a morte. Com essa perspectiva perguntamos:
quais são as possíveis respostas para a vida além da morte nas tradições
religiosas?
d) Flores: quando uma flor desabrocha significa que está pronta para
reproduzir-se. Quando uma planta "dá flor", está em sua fase mais crítica,
pois direciona toda a energia a esta atividade. Compreendemos que as
flores são os saberes que ensinamos e mediamos aos alunos, utilizando
nossa criatividade e metodologia, através do diálogo.
Assim são os Ritos religiosos na vida das pessoas. Existe uma
infinidade de ritos, práticas celebrativas, símbolos e espiritualidades nas
culturas e tradições religiosas. São ações que fortalecem o mundo mítico
da tradição em que o rito é celebrado.
O rito, portanto, é uma vivência que tem fundamentalmente duas faces
correlacionadas: por um lado, é uma ação não instrumental com
caráter expressivo, e isso liga-se bem com o seu movimento para um
mundo ‗místico‘, tendendo a levar para uma compreensão ‗mística‘ de
toda a existência; por outro lado, é um fato concreto que vive na
opacidade como qualquer outro fato comunicativo social (TERRIN,
2004, p.30).
A vivência do rito leva a uma compreensão de uma existência
mística, ou seja, ―o rito parece um elemento de estruturação e organização
348
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
do mundo‖ (TERRIN, 2004, p.192). Logo, no rito vivido, podemos ver a
tradição religiosa ser estabelecida em que a busca pelo sagrado faz-nos
perceber a grandeza da transcendência da humanidade.
A busca pelo sagrado compreende o fenômeno religioso e na religião
procura-se tanto o encontro, como a capacidade para transcender nas
relações, o ser humano necessita aprender a conviver como humano,
observando no humano as singularidades, bem como as diferenças e
estabelecer diálogo (SILVA, 2011, p. 95).
As relações entre as tradições e as relações pessoais da
humanidade entre os seus iguais ou diferentes nos permitem perguntar: a)
Qual a importância dos ritos nas tradições religiosas? b) Como você vê
essa questão em relação ao preconceito religioso? É possível um diálogo?
e) Frutos: é o ovário fecundado que se incumbe de proteger a maior
riqueza de uma planta, a semente, guardando-a em seu interior para dar
origem a outro vegetal da mesma espécie. Tanto os frutos, como a árvore
em si são arquétipos da imagem feminina:
A árvore é um símbolo feminino por excelência, e representam os
instintos da maternidade, da gestação, da fecundidade, pois cria a
vida, alimenta e protege. Portanto, é um símbolo que conta com as
emoções mais profundas do ser humano. A associação da natureza
com a mulher é imediata, a copa da árvore, por exemplo, lembra a
cabeleira da mulher, e de dentro da árvore sai à seiva que tira o
alimento da terra, faz a ligação com o céu; mediando os dois reinos,
da terra e o celeste, além de servir de abrigo. De forma geral
encontramos nas religiões mais tradicionais ritos, mitos e cultos
consagrados à árvore, pois são tidas como sagradas (SILVA, 2011,
p.34).
Assim também o eixo Ethos representa o próprio sentido do ser, é
formado na percepção de valores de que nasce o dever como expressão
da consciência como resposta do próprio ―eu‖ pessoal. Ética e religião são
temas centrais no processo de humanização das pessoas. É do Ethos que
os educadores devem tirar os frutos do seu trabalho.
A religião é experiência do encontro com o sagrado. Quando estamos
ante um texto sagrado no sentido re-liga (re-ligare) o texto revela o
que está em nossas entranhas e movimenta nossas lembranças mais
ancestrais, memória humana (FERREIRA–SANTOS, 2010).
Portanto, o Ethos não pode ficar de fora do processo educacional,
pois é um valor essencial no exercício da cidadania, onde se situa o
349
FONAPER
princípio de alteridade. É por isso que o Ensino Religioso nas escolas se
torna um espaço importante. Nesse sentido, elaboramos a seguinte
questão: quais princípios integram a ética educacional do Ensino
Religioso?
A escola é o espaço aberto, amplo e muito rico para se trabalhar com
as culturas e tradições religiosas. Não só no aspecto de construção do
conhecimento, mas, pela riqueza de sua diversidade. Faz parte de uma de
suas tarefas o desenvolvimento do ser humano nos aspectos: sensorial,
intuitivo, afetivo, racional e religioso-antropológico, porém, não é função da
escola mostrar a vivência desses valores, enquanto conduta religiosa de
fé, mas possibilitar esse conhecimento através do componente curricular
do Ensino Religioso que não privilegia esta ou aquela religião. Esta é uma
questão de respeito às diferenças existentes no contexto escolar.
Com embasamento nestes cinco eixos é que os conteúdos do Ensino
Religioso, segundo o FONAPER, devem ser dialogados com os
educadores. Para que estes levem para sala de aula essa mesma relação
estabelecendo vínculos de uma aprendizagem prazerosa e humanizada
com afetividade. Estudar as culturas de outros povos com suas crenças e
valores deve ser aplicado e refletido no cotidiano escolar e isto tem muita
importância para estabelecer a construção do currículo do Ensino religioso.
Segundo SACRISTÁN (2008, p. 94),
Na escola, normalmente, não se pode aprender qualquer coisa em
qualquer momento, embora tenha relevância e interesse indubitável
para os alunos. Inclusive, a partir de determinados esquemas
pedagógicos e modelos ou formatos de aprendizagem, se define uma
alta estruturação de processos e conteúdos didáticos para
desenvolver o currículo. [...]
Em se tratando deste componente curricular, também precisamos
estabelecer seus conteúdos. Ensino Religioso não é qualquer coisa! Não é
trabalhar religião! Não é também imaginar que este professor é bonzinho.
Nem tão pouco, uma oportunidade do professor complementar a sua carga
horária. Então, ensinar o quê?
Foram-se os tempos em que o ER era visto como um ensino
confessional. Hoje a LDB já não permite mais que isto aconteça. Por outro
lado não é ensinar somente valores, como se passa no imaginário popular,
mesmo porque valores é um tema transversal inserido em qualquer
350
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
componente curricular. E nem tão pouco esta área de conhecimento serve
para complementação de carga horária, como se apresenta nas escolas.
Para Oliveira et al. (2007, p. 110)
A presença de diversas culturas, com suas diferentes expressões de
ordem linguística, artística, religiosa, etc., num sistema educacional
requer indubitavelmente uma tomada de consciência, uma reflexão
sobre os encaminhamentos e a elaboração de suas propostas
curriculares.
Esta é uma das grandes preocupações do FONAPER em construir
uma proposta curricular para o Ensino religioso, sistematizando seus
conteúdos para todo o território nacional, além da luta pelos cursos de
licenciatura nesta área de conhecimento.
Da Teoria à Práxis
Segundo Olenik e Daldegan (2003, p.14),
No processo de ensino-aprendizagem do Ensino Religioso o
encantamento será a mola motivadora que favorece o educador e
educando, a reconhecer, pelo prisma do conhecimento e do respeito,
o seu universo religioso e o do outro. Este aprendizado pode se tornar
o ponto-chave para construir uma cultura de paz em diferentes
ambientes e consequentemente entre povos. Assim, podemos dizer
que nesse processo ambos, professor e educando, podem ocupar o
lugar da borboleta, que em seu voo descobre a diversidade, no
entanto sem deixar de ser borboleta.
De acordo com essas autoras, percebemos que estes são
exemplos para os docentes de Ensino Religioso seguirem. É onde podem
alçar os voos das borboletas a quem elas se referem, onde se confundem
entre o ensinar e o aprender, isto é, uma troca de saberes, em que a partir
daí poderão alçar voos mais distantes sem perderem de vista que são
educadores compromissados cujos desafios, fazem parte do seu cotidiano,
não só na condição de ensinar, mas de aprender. Uma troca de saberes.
O processo de formação ora descrito possibilitou aos educadores um
estudo reflexivo a respeito dos eixos que conduzem aos conteúdos do
Ensino Religioso. Veremos a seguir os relatos do que os professores
vivenciaram com a metodologia das partes da árvore e a oficina da
produção do texto para trabalhar em sala de aula.
351
FONAPER
A oficina de produção de texto foi um momento significativo da
formação, pois não só despertou o interesse pelo trabalho, mas motivou
para outras experiências. Vejamos os resultados dos trabalhos das
equipes:
Equipes Raízes: Preconceito/Respeito; Imposição/Compreensão;
Diversidade
Religiosa/Diálogo
Inter-religioso;
Intermediar
com
naturalidade; Globalização/Pós Modernidade. Esses são temas para
serem debatidos em sala de aula. Segundo os relatos das duas equipes
que trabalharam Culturas Religiosas nos encontramos em meio a um
grande desafio,
[...] uma vez que o etnocentrismo religioso suplanta os valores
religiosos de outras culturas. É necessário um preparo sócio
antropológico por parte dos docentes para tratar em sala de aula
essas questões, de maneira que não ignore os valores e as
particularidades de cada tradição cultural, como também uma
consciência pautada pela ética religiosa capaz de nos levar a enxergar
cada cultura como igual.
O preconceito religioso existe dentro das escolas e se apresenta
fortemente nas aulas do ER visto ser um espaço de construção e
reflexão do conhecimento. É comum a imposição por parte dos
adeptos de várias tradições religiosas, todavia cada professor de ER
deve nesse momento, mediar o conhecimento da diversidade cultural
religiosa, levando o aluno a perceber a necessidade de compreensão
e diálogo interreligioso para convivência pacífica entre os alunos e
entre as pessoas.
Equipes Caules:
A tradição oral tem sua grande importância por ter o compromisso em
passar de geração em geração todo o seu conhecimento cultural
religioso. Portanto seus rituais são vivenciados e rememorados
constantemente. Na tradição escrita todos os conhecimentos
religiosos são registrados para contribuir para a reflexão e prática de
sua religiosidade. Embora que dependendo das tradições feitas,
podem correr o risco de interpretações do texto sagrado, assim como
a tradição oral depende da influência de outras tradições religiosas
podem trazer outros elementos agregadores para seus rituais. Ambas
as tradições possuem importância fundamental para a compreensão
da prática, conhecimento, experiência, visão de mundo, de fé e
religiosidade, de conhecimento cultural religioso e o fenômeno
religioso presente em diversas culturas religiosas.
352
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
A diferença de um texto sagrado oral e de um texto sagrado escrito
é pelo fato de que o texto oral passa o conhecimento cultural e
religioso envolvendo os mitos, lendas, rituais a história de pais para
filhos de geração em geração (ancestralidade). E o texto escrito é a
forma fundamentada da crença religiosa onde esses registros
sagrados tornam-se leis e estatutos para serem cumpridos. Todos os
textos sagrados (orais e escritos) são relevantes, cada um com sua
importância sagrada.
Ambos representam as cores do arco-íris, são lindos exuberantes,
participantes e fundamentais na natureza. Para o conhecimento
dessas tradições por outros segmentos religiosos ou estudiosos na
área a tradição escrita torna-se mais fácil o entendimento porque a
palavra escrita comprova, fundamentaliza e consegue ultrapassar o
tempo.
Equipes Folhas:
O mundo transcendente do ser humano, o que há além da morte,
tanto as tradições religiosas orais e escritas interpretam de várias
formas o mundo além morte. Na tradição cristã se ensina a ideia de
um céu como premiação por uma vida obediente a Deus. E uma ideia
de inferno como punição por desobediência e acreditam na
ressurreição.
Na tradição budista existe a ideia de vidas sucessivas assim como no
espiritismo (reencarnação) como forma de evolução espiritual.
Ancestralidade para outras culturas e o nada, porque existem aqueles
que acreditam que após a morte tudo se acaba. Na condição de
professor acreditamos que devemos transmitir informações sobre essa
temática de forma que contemple a visão das várias crenças, através
do debate, diálogo, vídeos, pesquisas entre outros.
Equipes Flores: A tradição e o conhecimento, a criatividade e a
interatividade para vencer preconceitos.
Os ritos são essenciais nas tradições religiosas. Tudo começa e
termina com um ritual no percurso das celebrações. É uma forma de
perpetuar o conhecimento, transmitir a comunicação entre as
tradições, responder perguntas, interagir e celebrar a história e a
memória.
A cultura religiosa por si só traz consigo preconceitos e obstáculos. E
cabe a nós educadores utilizar da criatividade na metodologia para
desmistificar essas barreiras do preconceito. É possível sim o diálogo!
Se as pessoas tomarem consciência da importância do respeito e do
diálogo religioso, essas barreiras do preconceito serão amenizadas.
353
FONAPER
Equipes Frutos: pensar uma ética educacional para trabalhar as culturas
religiosas é "praticar o não proselitismo em sala de aula, saber respeitar as
escolhas de cada um, demonstrando para os alunos o quanto é importante
respeitar as religiões dos colegas".
O respeito a tudo e a todos que fazem parte desse mundo é
fundamental. A diversidade cultural religiosa, diferença de raças,
gênero limitações e deficiências, nos fazem repensar que poderemos
trabalhar em nossas aulas através da conscientização, da informação,
do não preconceito junto às demais culturas diferentes das suas.
Os frutos é o que deixaremos para as gerações que virão, para que
delas possam se alimentar e se fortalecer para a vida.
Enquanto princípios para uma ética educacional para o Ensino
Religioso, os professores indicaram: o não proselitismo; o diálogo interreligioso; respeitar a tolerância e a laicidade do nosso País; entender o
direito que todas as culturas religiosas têm; respeitar as pessoas que
dizem não professar nenhuma crença religiosa; respeitar a individualidade
de cada um; cumprir o que preconiza o Artigo 33 da LDB; participar da
formação continuada; e do planejamento da escola; seguir os preceitos
das diretrizes que regem o Ensino Religioso; ter compromisso e
responsabilidade não só com as escolas, mas com os alunos e toda
comunidade escolar; não ser complemento de carga horária; elaborar um
currículo próprio para ser seguido. Com bases nesses princípios as
pessoas poderão vivenciar a humildade, caridade e demais virtudes; afeto,
amor, respeito e fé; prudência, tolerância e atitudes responsáveis.
Considerações Finais
Neste processo formativo tivemos a oportunidade de interagir com
dois grandes grupos e seus subgrupos e verificamos que foram momentos
de muita riqueza e dinamismo segundo depoimentos e avaliação dos(as)
educadores. Dessa forma percebermos que esta é uma grande
oportunidade de conhecermos a importância do trabalho interdisciplinar no
cotidiano escolar. Isto faz a grande diferença.
As árvores são como escolas que nos remetem a aprendizagem
através da ontologia própria da imagem que se uni a ontologia do humano.
354
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Dessa forma pensamos a escola que de forma bela trata o Rubem Alves
(2011)5:
Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas.
Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros desaprendam
a arte do voo. Pássaros engaiolados são pássaros sob controle.
Engaiolados, o seu dono pode levá-los para onde quiser. Pássaros
engaiolados sempre têm um dono. Deixaram de serem pássaros.
Porque a essência dos pássaros é o voo. Escolas que são asas não
amam pássaros engaiolados. O que elas amam são pássaros em voo.
Existem para dar aos pássaros coragem para voar. Ensinar o voo, isso
elas não podem fazer, porque o voo já nasce dentro dos pássaros. O
voo não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado.
Na contemplação do símbolo podemos aprender com ele, onde os
pássaros podem ir e vir; fazerem os ninhos, buscando proteção e
aconchego na natureza. Que façam suas escolhas de forma livre nossos
pássaros, nossos alunos. Que nas nossas escolas os professores
intermedeiem o conhecimento de forma que os alunos sejam como
pássaros livres para ir e vir, que façam seus ninhos com liberdade, onde
encontrem símbolos de proteção e aconchego, e através destes possam
construir conhecimentos e a sua história, através do diálogo e da
afetividade. E com isto, aos poucos vão eliminando formas prosélitas de
preconceitos e logicamente, transformar a convivência, não só no espaço
escolar, mas para fora dos muros da escola e serem mediadores de
conflitos, na construção de uma sociedade mais humana e mais justa, para
um mundo melhor, além de ser também um construtor de pontes, para
uma cultura de paz.
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DANÇAS CIRCULARES SAGRADAS: UM RELATO DE UMA
PROPOSTA METODOLÓGICA NO CURSO DE LICENCIATURA
NO ER- PARFOR/ BLUMENAU
Laudicéia Lene de Freitas Barbosa (PARFOR/FURB)1
Resumo:
Toda prática educativa necessita de um nível de reflexão, pois qualquer proposta de
atividades possui uma história que a precede e a justifica, sendo decorrente de escolhas.
Porém, os educadores escolhem sempre ideias, finalidades e alternativas concretas em que
seus atos de escolhas estão relacionados com a sua atitude valorativa geral. Decisões que
dependem da intencionalidade, e o objetivo aqui a ser destacado é a aprendizagem, a
interação cognitiva e a construção de conhecimentos. Neste intuito há que se reconhecer
na prática a Dança Circular Sagrada na importância dos indivíduos como parte de um todo,
objetivando desenvolver nos alunos a capacidade de convivência em sociedade de maneira
harmoniosa. O trabalho ora apresentado é parte da atividade realizada nas aulas de Ensino
Religioso com uma proposta de renovação nas práticas educativas. Uma vez que, é de
mãos dadas e em círculo, que os alunos colocam-se em contato com seu corpo em
movimento, seu ser em expressão com o outro, estabelecendo e transformando suas
relações. A educação na perspectiva libertadora tem como ponto de partida para a
formação, a construção das identidades e a percepção do ambiente escolar como forma de
interação e compartilhamento de experiências.
Palavras chave: Ensino Religioso; Danças Circulares Sagradas; Diversidade Cultura.
Introdução
Este trabalho foi desenvolvido dentro de um procedimento
metodológico inserido no currículo escolar e que proporcionou maior
conhecimento para a elaboração do planejamento de aulas para a
docência despertando cada vez mais o encantamento pelo Ensino
Religioso. Refere-se às descobertas ou redescobertas no processo da
própria espiritualidade, da diversidade religiosa, assim concebida:
O Ensino Religioso, como disciplina, trata do conhecimento dos
elementos essenciais que compõem o fenômeno religioso [...] [e o
professor] necessita ter presente na aprendizagem os conhecimentos
anteriores do educando e possibilitar uma continuidade progressiva no
entendimento do fenômeno religioso, sem comparações, confrontos
ou preconceitos de qualquer espécie (SED/SC, 2001, p. 21).
1
Possui Graduação em Matemática pela UFPE; Graduanda na Ciências da Religião pelo
PARFOR/FURB; Trabalha na EEB Santos Dumont/Blumenau-SC; Coordenadora do
Programa
COOPER
JOVEM/SISCCOP
na
escola
que
atua.
[email protected].
FONAPER
Acreditamos que, conhecemos e construímos cultura, também
resgatamos os valores, mas não apenas via educação formal, do que é
trabalhado nas escolas, mas em tantos momentos e processos
vivenciados informalmente. Podemos citar: família, amigos, ou seja, a
educação compreendida como um processo de vida podendo contribuir
para a reflexão das culturas de outros povos.
Neste sentido refletimos o que nos afirma Santos (1983, p. 19),
[...] é importante considerar a diversidade cultural interna à nossa
sociedade, isso é de fato essencial para compreendermos melhor o
país em que vivemos. Essa diversidade não é feita só de ideias, ela
está também relacionada com as maneiras de atuar na vida social, é
um elemento que faz parte das relações sociais do país. A diversidade
também se constitui de maneira diferente de viver, cujas razões
podem ser estudadas, contribuindo dessa forma para eliminar
preconceitos e perseguições de que são vítimas grupos e categorias
de pessoas (SANTOS,1983, p.19).
Pensamos dessa forma, a aprendizagem escolar como uma prática
pedagógica fundamentada no equilíbrio entre a teoria e a prática. Nesse
sentido, a disciplina de Estágio em Ensino Religioso busca proporcionar e
promover atividades pedagógicas integradas para a contribuição da
formação docente.
Conhecer o ambiente escolar, bem como o contexto em que a
escola e seus atores estão inseridos é fundamental para pensar e repensar
o fazer pedagógico. De modo especial, nesse estudo, destaca-se com
ênfase a prática docente do(a) professor(a) de Ensino Religioso. Em suma,
foi possível perceber, que o Estágio permitiu analisar e compreender o
ensino e a aprendizagem escolar como um processo múltiplo, onde cada
criança aprende com diversas estratégias e de acordo com a etapa do seu
desenvolvimento, sem desconsiderar o contexto e a trajetória de vida da
qual o educando está inserido.
É o contato com o ambiente escolar, que proporciona ainda mais ao
estagiário assimilar tudo que vem aprendendo e que ainda vai aprender
teoricamente na formação docente no estágio curricular. Ou seja, é no
momento da formação, que concretamente colocamos em prática a busca
de uma possível ponte que une o discurso e a prática docente,
proporcionando uma melhor compreensão das práticas institucionais e das
ações praticadas pelos profissionais, como maneira de prepará-los, uma
vez que a teoria, ao longo do curso, proporciona vários pontos de vista
358
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
para uma ação contextualizada, bem como, mecanismos para análise
histórica, social, cultural e organizacional de si mesmo e demais
profissionais da educação.
As Danças na metodologia escolar no ER
O professor é o grande responsável, em tantos momentos, para guiar
e mediar o processo na construção do conhecimento do aluno. Com
responsabilidade de sua ação e aproveitando suas expectativas em torno
de sua atuação, como docente deflagra o processo de questionamentos
com os alunos, a didática para o ensino-aprendizagem, ou seja, os
recursos didáticos precisam ir além do quadro e giz. Portanto, é preciso
usar dinâmicas que incentivem o aluno a aprender com prazer e não por
mera obrigação. Desta forma, fica estabelecido um canal aberto entre
docente e discente, tornando assim, uma ação motivada por atividades
participativas exigindo planejamento para as respectivas realizações.
Para isso, a construção teórica Piagetiana nos propõe uma escola
voltada para o pensamento, uma vez que o propósito da docência é o de
preparar o educando(a) para o desenvolvimento do seu completo
potencial. Como seres humanos dotados de racionalidade, isto é, como
indivíduos únicos que pensam e desejam continuar a pensar eternamente
devido a sua natureza.
Lê-se em Cellerier (1980, p. 43) que,
A pedagogia que se desprende da teoria de Piaget gera uma
aprendizagem libertadora, participante, vivenciada, com os olhos
escancarados para a realidade e para a vida prática: orientadas, as
crianças discutem entre si e com os professores, para assessorar-se
de valores que serão os seus futuramente. É preciso limpar a velha
escola das atividades que não contribuem para a saúde mental, social
e afetiva do educando. Importante é fortalecer o pensamento e a
criança poderá expressar-se inteligentemente por meio da linguagem.
Essa inteligência cresce concomitantemente com o desenvolvimento
da afetividade (CELLERIER, 1980, p. 43).
Desta forma, o discurso da prática com todos seus erros e acertos
são características peculiares da ação do homem, devendo ser
preocupação constante da ação pedagógica. E, agindo assim, estaremos
vivenciando a ação escolar e a interação entre os alunos para a
construção dos saberes, abrindo espaço para a vida na sala de aula.
359
FONAPER
Percebemos que a educação é mais que ensino, não se constituindo
em instrumento solucionador de problemas, mas altamente revelador de
valores implícitos na relação entre professor e aluno remetendo-nos às
reflexões e inferências no processo de construção do conhecimento. Essa
construção democrática envolve ensino e pesquisa em que os envolvidos
precisam ser mediadores e transformadores trabalhando com a concepção
de um currículo que estimule todos os envolvidos na aprendizagem, pois
ela se funda num processo que necessita da relação dialógica entre
professor e aluno, e como tal, na sua prática, tem início as derrubadas de
diversos paradigmas. Contudo, isto só será efetivamente compreendido
quando o docente ajudar os alunos no seu processo educativo via diálogo,
onde exista no processo de aprendizagem, espaço para a inteligência e
afetividade. Para isto, temos que romper com qualquer tipo de relação
imposta, sendo assim, se faz necessário romper paradigmas, que ao longo
do processo educacional os alunos possam construir conceitos sobre os
conteúdos do Ensino religioso, que em sua maior parte são, de fato,
criações culturais a diversidade.
Neste sentido, a Resolução a seguir é altamente elucidadora:
I - o ensino visando à aprendizagem do aluno; II - o acolhimento e o
trato da diversidade; III - o exercício de atividades de enriquecimento
cultural; IV - o aprimoramento em práticas investigativas; V - a
elaboração e a execução de projetos de desenvolvimento dos
conteúdos curriculares; VI - o uso de tecnologias da informação e da
comunicação e de metodologias, estratégias e materiais de apoio
inovadores; VII - o desenvolvimento de hábitos de colaboração e de
trabalho em equipe (Art. 2º da Resolução CNE/CP 01/2002).
Desta forma, a escolha do roteiro de aprendizagem elaborada foi as
―Danças Circulares Sagradas‖. Com a finalidade de trabalhar
conhecimentos de valores éticos, de cooperação, diversidade social diante
do cotidiano escolar, conduzindo a um processo de reflexão e
possibilidades do educando criar sua autonomia para eleger seus valores,
tomar suas decisões e ampliar seus conhecimentos epistêmicos. Segundo
Garaudy "a dança é um modo total de viver o mundo: é, a um só tempo,
conhecimento, arte e religião" (GARAUDY, 1998, p. 15).
O principal intuito foi reconhecer na ―Dança Circular Sagrada‖ a
importância dos indivíduos como parte de um todo, a fim de desenvolver
nos alunos a capacidade de convivência em sociedade, de maneira
harmoniosa e civilizada. É de mãos dadas e em círculo, que os alunos se
360
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
colocam em contato com seu corpo em movimento, seu ser em expressão
e com o outro, estabelecendo e transformando suas relações. ―A dança
possibilita o conhecimento para despertar e leva ao encantamento pelo
Ensino Religioso no que se refere à descoberta ou redescoberta da sua
espiritualidade, da sua dimensão religiosa.‖ (OLENIKI; DALDEGAN, 2003,
p. 41).
Oleniki e Daldegan (2003, p.42), afirmam sobre o futuro professor de
Ensino Religioso:
Deverá estar sempre atento à linguagem, pois o proselitismo é vetado.
[...] Para favorecer de linguagem adequada é significativo que o
professor de Ensino Religioso organize um quadro ou pesquisa das
tradições religiosas, em sua classe, para evitar a exclusão de algumas
delas e possibilitar aos educandos manifestarem-se (OLENIKI;
DALDEGAN, 2003, p.42).
E trazendo a nossa discussão para o campo da pesquisa, apoiamonos em Dyniewicz (2007), para destacá-la no aspecto quantitativo, que
prevê a mensuração de variáveis preestabelecidas para verificar e explicar
sua influência, mediante análise de frequência de incidência, correlações e
estatísticas. O método quantitativo é baseado na medida, geralmente
numérica, de um grande conjunto de dados, dando ênfase à comparação
de resultados e ao uso intensivo de técnicas estatísticas.
Todo este processo também requer dimensões acerca da efetivação
de uma metodologia participativa. Minayo (1992, p. 10) assim a conceitua,
A metodologia qualitativa é aquela que incorpora a questão do
significado e da intencionalidade como inerentes aos atos, às relações
e às estruturas sociais. O estudo qualitativo pretende aprender a
totalidade coletada visando, em última instância, atingir o
conhecimento de um do fenômeno histórico que é significativo em sua
singularidade (MINAYO, 1992, p. 10).
Considerando o exposto, percebemos que a necessidade de
trabalhar a dança circular na sua dimensão avaliativa do próprio ensino, na
forma quanti-qualitativa, por ser considerada a mais adequada para
dimensionamento e compreensão do aprendizado.
361
FONAPER
A Dança Circular Sagrada no Ensino Religioso
A prática das danças no meio educacional traz uma proposta
pedagógica a fim de que, o trabalho em conjunto possibilite ao educando a
sua adaptação, integração com ele e o outro. Ocorrendo desta forma o
equilíbrio e a libertação e oferecendo um plano com o intuito de possibilitar
o acesso à multiplicidade da educação. Tal formação harmônica, também
traz para a comunidade uma ação positiva. Ou seja, a dança oferece um
meio pedagógico que busca a idealidade para trabalhar às pré-condições
do jovem educando tornar-se potencialmente capaz de viver em harmonia
com a comunidade ou grupo a qual pertencem.
Baseado nos Parâmetros Curriculares do Ensino Religioso, em que o
ambiente escolar é responsável pela socialização de conhecimentos, à
medida que os conteúdos estão inseridos na disciplina do Ensino
Religioso. Isto possibilita melhor compreensão do fenômeno religioso, do
transcendente, da diversidade cultural. A dança, bem aplicada
pedagogicamente, desenvolve nos educandos um movimento de execução
de ritmo, ordem, da referência espacial, a aceitação do seu eu com o outro
e com a comunidade, a atenção e a concentração, favorecendo a
autoestima e exercitando o respeito às diversidades.
No ambiente escolar, a presença da criança é uma experiência social,
na qual o cuidar e o educar desenvolvem-se de forma programada,
planejada, pensada previamente dentro de um sistema que atende, na
coletividade, à individualidade e à diversidade de realidades dos
educandos (OLENIKI; DALDEGAN. 2003, p. 58).
Tornando assim, as pessoas criativas e participativas, com a
aceitação de errar, acertar e aprender ―a dança é uma oferta desta ordem.
Onde pessoas dançam umas com as outras, elas se educam e se formam
a si mesmas‖ (WOSIEN, 2000, p 66). Dançar em círculo significa delimitar
um centro; e este é a ―manifestação do divino que existe em cada um.
Representa a força maior, pela qual somos guiados‖ (BISCONSIN;
MIZUMOTO, 2008, p.9), algo que favorece o ser humano a entrar em
contato com a linguagem simbólica, metafórica e transcendental.
Neste contexto, as danças possibilitam a integração das diversas
áreas do conhecimento e em qualquer nível de aprendizagem da educação
362
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
seja infantil, juvenil e adulta, em que a dança proporciona os sete saberes,
que:
1-Cegueiras do conhecimento: considerar os vários pontos de vista e
que cada um traz em si múltiplas realidades. 2- Princípios do
conhecimento pertinente: dançando no círculo, símbolo da totalidade,
é possível experienciar ser Todo em Si e Parte de Algo Maior:
qualquer ação local reverbera no todo e o todo nas partes –
complexidade/interdependência. 3- ensinar a condição humana - As
danças nos conectam com a teia cósmica da Vida. Os gestos,
carregados de significados, abrem portais de acesso arquivo
energético da humanidade. Do infinitamente pequeno, ao infinitamente
grande, tudo dança. O universo está em permanente movimento. Nós,
seres humanos, somos dançantes. Renascemos e reinterpretamos
cotidianamente a dança cósmica da criação. 4- Ensinar a identidade
terrena; 5- Ensinar a compreensão – Dançar/ corpar outros povos é
espelhá-los, é aprender com o que há na memória da matéria
profunda e permite reconhecer, legitimar, respeitar, e harmonizar as
diferenças. 6 - Enfrentar as incertezas – experimentar a
construção/desconstrução de gestos. A cada dança, uma aventura ao
desconhecido mundo das culturas, das ideias, dos movimentos, das
crenças. Novas formas corporais surgem e trazem novos conceitos
sobre as possibilidades de si mesmo. 7- Certeza-risco-incertezas.
Ética do gênero humano – as danças, por todos os pontos descritos
até então, contribuem para a humanização da humanidade, alcançar a
unidade planetária na diversidade, desenvolver a ética da
solidariedade, da compreensão, da cooperação (RAMOS, 2008, p.12).
O que faz a diferença são as pessoas de mãos dadas e unidas a
colocarem-se em movimentos. Existindo o encontro de aceitação do eu
com o outro e a entrega de todos na roda, temos como resultado a
essência do transcendental no encontro com o sagrado. ―No momento
desse contato temos a união de espírito e matéria e a possibilidade da
criação. O ser humano se torna um ser íntegro quando se torna criativo. A
partir daí ele tem a trindade dentro de si‖ (RAMOS, 2008, p.3).
No entanto, dançar em círculo é um processo de transformação e um
princípio de mudança, símbolo universal da unidade e da totalidade. Ela é
sagrada não por ser religiosa, mas por expressar em si a espiritualidade.
A mão direita é, neste caso, a que recebe, com a palma da mão
voltada para cima, e a esquerda, a mão doada, com as costas
voltadas para cima. Ela dá a luz adiante, garantindo ao mesmo tempo
a retro-ligação [...]. Desta forma o presente e o passado estão
misteriosamente interligados. Só nós humanos separamos o hoje e o
amanhã. O eterno, sub spezia e aeternitatis, está além do tempo.
Acorrente circular, uma imagem sensorial da eternidade (WOSIEN,
2000, p.43).
363
FONAPER
Com a finalidade de promover uma organização de tempo e espaço
no ensino aprendizagem e a relação do ser humano.
Entretanto, faz-se interessante destacar a necessidade de conhecer
e valorizar cada grupo na sua aprendizagem, a fim de levar o diálogo para
o educando de forma que o mesmo possa vivenciar sua própria cultura e a
construção do seu convívio social respeitando as diversidades culturais.
Conhecendo as Danças Circulares Sagradas
As Danças Circulares Sagradas têm início na década de 60, com
Alemão bailarino e coreógrafo Bernhard Wosien. A descoberta dessas
danças teve como ponto de partida as danças folclóricas tradicionais e
com o principal objetivo o de analisar como evoluíam as formas, símbolos
e o que iria além dos passos desta dança. Muitas foram pesquisadas em
aldeias e campos daquela época, a fim de que, com tais danças, fosse
possível buscar em pessoas simples da comunidade, a alegria e a
comunhão entre o grupo cultural a qual cada grupo pertencia.
Em todas as culturas o conhecimento está subordinado à um contexto
natural, social e de valores. Indivíduos e povos criam, ao longo da
história, instrumentos teóricos de reflexão e observação. Associados a
estes, desenvolvem técnicas e habilidades para explicar, entender,
conhecer e aprender, visando saber e fazer. Assim, teorias e práticas
são respostas a questões e situações diversas geradas pela
necessidade
de
sobrevivência
e
transcendência.
A
transdisciplinariedade é uma postura transcultural de respeito pelas
diferenças, de solidariedade na satisfação das necessidades
fundamentais, e de busca de uma convivência harmoniosa com a
natureza (D‘AMBRÓSIO, 1997, p.10).
Em 1977, Wosien com todo o conhecimento que havia tido através
das diversas comunidades que passou conhecendo as danças,
transformou a ―Dança Circular‖ em diversas coreografias, levando-a
posteriormente para a comunidade escocesa, Findhorn. Lá ensinou a um
grupo de pessoas e se tornou, desde então, responsável pela divulgação
das ―Danças Circulares Sagradas‖ espalhadas por todo o mundo. No
Brasil, ela chegou por volta de 1980, no Estado de São Paulo, na cidade
de Nazaré Paulista.
Todo esse processo de efetiva pesquisa, no entanto, transformou-se
para o bailarino num encantamento e, com a necessidade de manter viva a
raiz desta dança, que não havia excluídos, porque todos participavam
364
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
percebendo nela a força da comunhão ali contida, em gestos simples,
muito mais que apenas uma coreografia ou danças em círculo, ―a ideia da
dança como caminhada para dentro do silêncio e de uma meditação em
movimento‖ (WOSIEN, apud BICONSIN; MIZUMATO, 2008, p. 6).
A ‗Dança Circular Sagrada‘ envolve o ritualístico em conexão com o
divino, proporcionando a interação humana. Porém, nem todas as danças
são realizadas em círculos podendo ser em labirintos ou espiral, mas sem
perder as ―metáforas perfeitas da circulação da vida na terra e da
totalidade do ser humano, inspirando nos dançarinos o desejo de
transformação e evolução‖ (RODRIGUES, 2008, p. 2).
O homem e a mulher antigos, na medida em que desvendavam as leis
e os princípios de organização da realidade circundante, registrava-os
no corpo através de movimentos rítmicos e significativos [...] A dança
é uma das raras atividades humanas em que o ser humano está
totalmente engajado: corpo, espírito e coração. Por isso, a arte de
imitar a natureza através de movimentos rítmicos e repetitivos é uma
virtude que torna o conhecimento definitivo, inesquecível
(RODRIGUES, 2008 p.3).
Sendo assim, a dança poderá levar a um conhecimento para
formação da linguagem e da manifestação cultural, de forma que, as
―Danças Circulares Sagradas‖ estão relacionadas às danças populares de
todas as regiões do mundo; assim, como os cantos tradicionais e junto
com eles, elas têm o poder dos costumes, que se transmitem de geração
para geração. Neste sentido, todos somos dançarinos. Considera-se que
o verbo dançar em grego orce-omai (orque-omai) é derivado de or-numi
(ornumi), cujo significado é fazer levantar, despertar, fazer nascer
(LORTHIOIS, 1998).
Considerações Finais
O trabalho desenvolvido para o presente artigo teve como objetivo o
envolvimento com a prática e o estudo das ―Danças Circulares Sagradas‖
e foi então que, entramos na roda para dançar! O desafio não foi dar aulas
de dança, mas criar um espaço no qual a dança se tornasse uma
experiência em círculo para um reencontro com o eu e o outro, ou seja,
não era apenas falar sobre ou se tornar uma mera apresentação, mas de
fato, falar de si mesmo e o que a dança poderia mobilizar. Que todos de
mão dadas, voltados para um centro comum em passos ritmados na
365
FONAPER
crescente harmonia, aceitando as diferenças, poderiam afirmar ao mesmo
tempo a individualidade.
Gerando através das ―Danças Circulares Sagradas‖ uma conexão
com o todo e a integração com os envolvidos, dentro do currículo da
disciplina de Ensino Religioso, as reflexões teóricas e próprias
experiências obtidas como uma forma metodológica um grande
aprendizado.
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Esta comunicação é um estudo bibliográfico que tem como objetivo demonstrar como
historicamente a disciplina de Ensino Religioso (ER) vem sendo trabalhada na Rede
Municipal de Ensino de Curitiba/PR. Os referenciais bibliográficos apoiam-se principalmente
nas considerações de Junqueira (2008), Oliveira e Koch (2008), Paraná (2008), Fonaper
(2001) e Assintec (2010). Incialmente faz-se um histórico sobre o Ensino Religioso no
mundo e especificamente no contexto brasileiro e paranaense. Em seguida, focaliza-se a
atenção em descrever como o ER é trabalhado no estado do Paraná e mais
especificamente na rede municipal de ensino de Curitiba. O processo histórico de ingresso
e consolidação dessa disciplina na Rede Municipal Ensino de Curitiba, resguardadas as
suas singularidades, acompanhou o processo nacional que é marcado por contradições,
avanços e retrocessos. Com este estudo objetiva-se oferecer elementos para uma reflexão
mais aprofundada sobre o ER no Brasil e o seu reconhecimento como disciplina integrante
do currículo da educação básica.
Palavras-chave: Ensino Religioso. Curitiba. História.
Introdução
A análise e, consequentemente, a busca pela compreensão do
fenômeno religioso em um diálogo inter-religioso constitui uma tarefa
importante na sociedade contemporânea. O conteúdo dos programas que
assistimos na televisão, ouvimos no rádio, acessamos na internet estão
repletos de conteúdo religioso, embora na maioria das vezes isso passe
despercebido.
Contudo, o voltar-se para o universo religioso e procurar analisá-lo e
compreendê-lo não pode ser considerado uma aventura que se faz sem
nenhum critério ou fundamentação histórica e epistemológica. A falta de
tais critérios conduz a posições extremistas de desprezo ou
fundamentalismo em relação ao fenômeno religioso. Nesta perspectiva o
1
2
Mestre e Doutorando em Educação pela Universidade Tuiuti do Paraná. Coordenador
do Curso de Especialização em Metodologia do Ensino Religioso do Centro
Universitário Internacional UNINTER.
Mestre em Geologia ambiental pela UFPR. Tutora do Curso de Especialização em
Metodologia do Ensino Religioso do Centro Universitário Internacional UNINTER.
FONAPER
trabalho com a disciplina de Ensino Religioso requer uma formação
coerente dos professores, com as implicações que dele decorrem.
A compreensão do Ensino Religioso e sua presença no currículo da
educação básica requer atenção ao processo histórico de sua constituição
e desenvolvimento no decorrer dos tempos. Assim o intuito desse trabalho
é analisar como a disciplina de Ensino Religioso (ER) vem sendo
trabalhada na Rede Municipal de Ensino de Curitiba/PR.
Conforme a legislação vigente no Brasil, o Ensino Religioso, ainda
que de matrícula facultativa, é considerado uma disciplina que integra os
saberes necessários para a formação do cidadão. Nesse sentido, é
fundamental aprofundar a pesquisa no que diz respeito ao seu
reconhecimento como um campo do conhecimento, o que implica
necessariamente uma fundamentação epistemológica e pedagógica.
Não se trata de impor mais um elemento para o currículo das
escolas, mas de fato reconhecer a importância de um elemento que é
essencial para proporcionar uma formação integral, com vistas à
superação de todo tipo de preconceito e formas de proselitismo.
O processo histórico do Ensino Religioso no Mundo e no Brasil
Abrolhadas na Alemanha por inspiração da Reforma, as escolas
tinham como escopo universalizar o ensino elementar com vistas à
divulgação religiosa. Lutero (1483-1546) reivindicava que o Estado
assumisse essa tarefa, já que por meio da alfabetização e o estudo de
outros elementos seria possível ler a Bíblia e interpretá-la. Assim, a
motivação religiosa implica uma organização no processo educacional.
Apesar da Guerra dos Trinta Anos (1618-1648) e todas as consequências
que ela acarretou, os alemães obtiveram melhores resultados no que diz
respeito à educação na Europa (JUNQUEIRA, 2009).
No século XVIII, temos o Movimento Iluminista representando o
poder da razão humana de interpretar e reorganizar o mundo. Assistimos,
também, ao desenvolvimento das ciências experimentais com Bacon,
Galileu e Newton, o empirismo com Locke e o racionalismo cartesiano.
Com a introdução da máquina a vapor em 1750 e o início da Revolução
Industrial o panorama socioeconômico altera-se definitivamente.
Conforme Junqueira (2008, p. 147), ―o marco histórico da origem do
Ensino Religioso no Ocidente é o estabelecimento do Império Austro370
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Húngaro no século XIX‖. Nesse sentido é importante destacar a atuação
da imperatriz Maria Teresa da Áustria que criou uma comissão da corte
para os Estados, a qual ressaltava que a instrução é e sempre foi em cada
época um fato político.
O abade Felbiger foi chamado pela rainha e, sob sua influência, a
educação na Áustria tomou um novo rumo. Esse pedagogo ensaiou,
com a melhor sorte, interessantes ideias educativas. (...). Todo esse
processo foi importante para que, na criação das escolas do império
austro-húngaro, fosse finalmente criada, pela primeira vez na história
da educação ocidental, a disciplina Ensino da Religião que originaria o
Ensino Religioso (JUNQUEIRA, 2009, p. 149-150).
Dessa maneira, para compreensão atual do Ensino Religioso é
importante retomar as influências pedagógicas, que também sofrem
interferências políticas na concepção e divulgação de propostas de ensino
aprendizagem (JUNQUEIRA, 2008). Em 1794, o imperador Frederico, o
Grande, mesmo sofrendo oposição do clero e do povo, publicou no império
austro-húngaro uma lei declarando que todas as instituições educativas,
públicas ou não, eram instituições do Estado e deviam estar sob seu
controle.
Percebe-se assim que progressivamente a compreensão de
educação e a forma de organizá-la vão se modificando. Com Kant a
pedagogia toma contornos de ciência teórico-prática que une arte e saber
para promover a moralidade e a felicidade dos sujeitos.
Racionalizar e laicizar constitui-se como estratégias da escola para
promover uma educação para a formação do cidadão honesto, paciente,
equilibrado e generoso, fiel a Deus e ao Imperador. Também a religião é
ensinada como forma de educar. O catecismo era o instrumento que ao
mesmo tempo era utilizado como meio para a instrução religiosa e cartilha
para alfabetizar.
Nesse contexto histórico, as aulas de religião, assim como a
alfabetização em língua materna, dava-se por meio do ensino do
catecismo e das histórias bíblicas, o que colaborou para a unidade
desse império. Tal experiência influenciou outros países nos quais a
relação entre Igreja e Estado era muito próxima, inclusive no Brasil,
como verificamos anteriormente. Este pressuposto é importante para
compreendermos o Ensino Religioso no contexto internacional e
verificarmos os caminhos construídos com a criatividade e
sensibilidade dos professores e pesquisadores brasileiros
(JUNQUEIRA, 2008, p. 147).
371
FONAPER
Como é possível notar, o Ensino Religioso é uma disciplina que tem
suas raízes em um contexto no qual o Estado se responsabiliza pela
educação no século XVI, quando se desencadeia o processo da Reforma
Protestante. Trata-se de um momento muito importante na história, pois:
Era a primeira vez que se falava de educação universal e ao mesmo
tempo, Lutero solicitava às autoridades oficiais que assumissem essa
tarefa, considerando que a educação para todos devia ser de
competência do Estado, pois, por meio da alfabetização e do estudo
de outros elementos, haveria a possibilidade de ler a Bíblia e sua
interpretação; portanto, a motivação religiosa demandaria uma
organização no processo de ensino-aprendizagem (BRAIDO, 1991
apud JUNQUEIRA, 2008, p. 148).
Convêm salientar que esta preocupação com a formação elementar
para todos está também relacionada com as necessidades da época, as
mudanças no processo produtivo. Além de dar instrução religiosa, tratavase preparar trabalhadores para o comércio e para a indústria. O Estado
progressivamente descobre o papel da escola como instrumento de
domínio político e social e cada vez mais toma medidas para organizar e
controlar a educação.
Entre outras consequências, isso provoca
desencontros com a Igreja, que percebe sua perda de domínio do sistema
educacional.
Conforme Junqueira (2008), assistimos progressivamente uma
pedagogização da sociedade, que com o nascimento do Estado moderno e
da sociedade burguesa, articula-se, de fato, a instituição escolar e um
projeto social em torno de uma preocupação com a cultura e com as
ciências. Ao longo desse processo, assistimos as resistências da Igreja
Católica, progressivamente excluída de seus tradicionais domínios
geográficos e ideais.
Tal caminho histórico interfere na discussão atual da questão
religiosa no continente europeu. Evidencia-se que todas as pessoas têm
direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião, o que
acarreta implicações fundamentais no horizonte educacional.
Como se pode notar o Ensino Religioso paulatinamente passou a
fazer parte do espaço da escola, articulando-se a partir da estrutura
escolarizada da sociedade.
O Ensino Religioso, criado no século XVIII, entra no contexto da
escola que passa a ser orientada pelo Estado. Inicialmente essa
disciplina possui um perfil relacionado à religião hegemônica do país.
372
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Mas ao longo dos séculos, e como as conquistas do povo e os novos
direitos alcançados, a questão religiosa nas escolas assumiu um
caráter polêmico. Nos países da comunidade europeia as fortes
tradições ainda se fazem presentes nas decisões que orientam essa
área. Na América Latina, a força da Igreja Católica ainda persiste na
influência de uma confessionalidade determinante, enquanto no
Canadá existe uma discussão que busca a leitura de uma cultura
religiosa como a proposta brasileira, mas ainda será um tema de
longas reflexões a presença dos temas religiosos no espaço escolar
(JUNQUEIRA, 2008, p. 170).
Com relação ao contexto latino-americano convém ressaltar o projeto
político-religioso implantado pelos colonizadores ibéricos, que fará da
confessionalidade a marca dominante do Ensino Religioso proporcionado.
Tal consideração é fundamental para a compreensão do processo histórico
do ER no contexto brasileiro, onde a disciplina de Ensino Religioso integra
os currículos escolares há muito tempo, assumindo diferentes
características pedagógicas e legais em cada período histórico.
Muito embora no contexto do Brasil Colônia não seja possível falar em
políticas públicas para a educação e também numa disciplina
denominada de Ensino Religioso, a primeira forma de inclusão dos
temas religiosos na educação brasileira, que se perpetuou até a
Constituição da República em 1891, pode ser identificada nas
atividades de evangelização promovidas pela Companhia de Jesus e
outras instituições religiosas de confissão católica (PARANÁ, 2008, p.
38).
No Brasil Império a religião oficial era a Católica Apostólica Romana
conforme determinava a Constituição de 1824. Uma nova concepção da
educação escolar de caráter laico foi manifestada com os princípios
estabelecidos pelos republicanos e explicitados desde o início do regime
com a criação, em 1889, do Ministério de Instrução, Correios e Telégrafos.
Porém, temos um contexto de disputas, em que estão presentes
demandas republicanas e confessionais, no qual a Igreja Católica tenta
recuperar seu domínio. Entre os pontos polêmicos no campo da educação
estava o Ensino Religioso.
Nesse sentido as pesquisas realizadas por Romanelli (2000, p.14)
levaram-na a certas constatações, tais como:
A primeira delas é a de que a forma como evolui a economia interfere
na evolução da organização do ensino, já que o sistema econômico
pode ou não criar a demanda de recursos humanos que devem ser
preparados pela escola. A segunda constatação relaciona-se com a
373
FONAPER
evolução da cultura, sobretudo da cultura letrada. [...] A terceira
constatação tem implicações com o sistema político a forma como se
organiza o poder também se relaciona diretamente com a organização
do ensino, em princípio porque o legislador é sempre o representante
dos interesses políticos da camada ou facção responsável por sua
eleição ou nomeação e atua, naquela organização, segundo esses
interesses ou segundo os valores da camada que ele representa.
Uma intensa campanha foi desenvolvida ao longo da Primeira
República com o objetivo de minorar os efeitos práticos da laicidade do
Estado exarado na constituição. Na década de 1930 colocam-se em
defesa da Igreja Augusto de Lima e depois Leonel Franca que, em Minas
Gerais, teve seu texto sobre o Ensino Religioso incorporado à Constituição
de 1934, sendo facultativo para o aluno e obrigatório para Escola. Tratavase de uma tentativa de colocar fim as disputas atendendo tanto às
demandas confessionais quanto republicanas. Em 1937, ele passa a ser
facultativo para ambos (PARANÁ, 2008).
As incoerências dessa introdução do Ensino Religioso na
Constituição de 1934 são questões que ainda demandam muitas
pesquisas para possibilitar uma compreensão adequada, o que não é o
foco desse artigo. Desde os anos de 1930 se tornaram constantes as
disputas sobre a manutenção ou retirada o Ensino Religioso do currículo
do ensino brasileiro.
Na constituinte da década de 1980 os argumentos contrários e a
favor do Ensino Religioso foram discutidos e a polêmica continuou mesmo
depois da aprovação da LDBEN 9.394.96, que no tocante ao Ensino
Religioso exigiu uma nova formulação aprovada no ano seguinte com Lei
nº 9.475/19973:
O art. 33 da Lei n° 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar
com a seguinte redação: Art. 33. O ensino religioso, de matrícula
facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e
constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de
ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural
religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. § 1º Os
3
Ao então deputado Pe. Roque Zimermann (PT-PR), como membro da Comissão de
Educação, Cultura e Desporto, coube assumir a relatoria do processo de revisão do art.
33 da LDBEN. A proposta apresentada pelo deputado foi na realidade, uma colaboração
do FONAPER, resultado de diversos estudos, em um retorno aos projetos anteriores,
sobretudo porque aproveitava o viés conceitual que dificultou a discussão anterior em
relação ao que seria, de fato, o inter-religioso, já que tal termo estava mal colocado.
Sem utilizar novas terminologias, o substitutivo respeitava o espírito de todas as
discussões, ou seja, o pluralismo religioso (JUNQUEIRA, 2008, p. 37).
374
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição
dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a
habilitação e admissão dos professores. § 2º Os sistemas de ensino
ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações
religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso‖.
O Art. 33 foi o primeiro da LDBEN 9.394/96 a ser alterado. Em 1998
com a Resolução nº 02/1998 o Conselho Nacional de Educação (CNE)
reconheceu o Ensino Religioso como área de conhecimento a ser
organizado não a partir de religiões, mas da escola (JUNQUEIRA, 2008).
O Ensino Religioso no Estado do Paraná
A altercação sobre o Ensino Religioso no Estado do Paraná não é
recente. Documentos apontam que uma das fases mais marcantes sobre o
mesmo ocorreu entre 1922 até 1930, em meio às ações e os discursos dos
intelectuais católicos em defesa do ensino religioso, privilegiando suas
intervenções na imprensa católica e no Congresso Legislativo Paranaense
(CAMPOS, 2011).
Nos pressupostos de Campos (2011) em 1922, foi apresentado pelo
deputado Padre Alcidino Pereira o Projeto n. 40, que visava estabelecer o
ensino religioso facultativo nas escolas públicas e nas instituições de
ensino privadas subvencionadas pelo poder estatal paranaense. A
proposição desse projeto provocou forte debate entre os parlamentares. O
mesmo autor pondera que em 1926, o grupo católico estabeleceu a revista
A Cruzada, com circulação até 1931. Neste mesmo ano (1931), através do
decreto n. 19.941 Francisco Campos, Ministro da Educação, instituiu o
ensino religioso como disciplina facultativa para compor o currículo das
escolas públicas brasileiras. A imprensa católica paranaense divulgou um
conjunto de artigos em tom comemorativo pelo alcance dessa matéria no
ordenamento jurídico brasileiro.
Conforme apresentado pela Secretaria de Educação do Estado do
Paraná com o objetivo de viabilizar a proposta de Ensino Religioso no
Estado, a Assintec4, formada por um grupo de caráter ecumênico, cuidou
da elaboração de material pedagógico e também, com cursos de formação
continuada. Como resultado desse trabalho foi elaborado em 1972 o
4
Associação Interconfessional de Curitiba
375
FONAPER
(Prontel)5, que propôs a instituição do Ensino Religioso radiofonizado nas
escolas municipais, com parecer favorável do Conselho Estadual de
Educação. Havendo o consentimento de abrigar o Prontel da SEED
juntamente com a Prefeitura Municipal de Curitiba.
Como relata a Secretaria de Educação do Estado do Paraná em
suas diretrizes curriculares:
O conteúdo veiculado pelo sistema radiofônico teve como foco
curricular as aulas de ensino moral-religioso nas escolas oficiais de
primeiro grau. Em 1973, foi firmado um convênio entre a SEED e a
Assintec, com a proposta de implementar um Ensino Religioso
interconfessional nas escolas públicas de Curitiba. No mesmo ano, a
SEED designou a entidade como intermediária entre a Secretaria e os
Núcleos Regionais de Educação, nos quais foi instituído o Serviço de
Ensino Religioso para orientar a proposta curricular da disciplina
(PARANÁ, 2008 p. 41).
Em 1976, pela Resolução n. 754/76, foram autorizados cursos de
atualização religiosa em quatorze municípios do Estado, com o apoio da
Associação das Escolas Católicas (AEC). Em 1981, nasceu um novo
programa de rádio dirigido aos professores, como meio para ampliar as
possibilidades de uma formação continuada, bem como favorecer a
preparação dos temas a serem tratados nas aulas de Ensino Religioso.
Além disso, realizou-se o Primeiro Simpósio de Educação Religiosa.
Seis anos depois (1987) teve inicio o curso de Especialização em
Pedagogia Religiosa, numa parceria da SEED, Assintec e PUC/PR,
voltado à formação de professores interessados em ministrar aulas de
Ensino Religioso. Nos pressupostos da Secretaria de Estado da Educação
do Paraná (2008) durante o transcorrer do curso, ficou demonstrada a
inquietação com a formação do professor para a pluralidade religiosa,
ainda que, por conta da concepção de Ensino Religioso que vigorava na
época, prevalecessem atividades marcadas por celebrações e vivências de
valores.
Durante o período da Constituinte as discussões iniciadas foram
intensificadas com a promulgação da Constituição Federal, em 1988, por
meio da organização de um movimento nacional, que buscou garantir o
Ensino Religioso como disciplina escolar.
Inicialmente, o entendimento das orientações oriundas dos textos
legais, do Congresso Nacional (art. 210, § 1º da Constituição Federal de
5
Programa Nacional de Tele-educação
376
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
1988 e art. 33 da LDBEN 9.394/96) e dos pareceres do Conselho Nacional
de Educação (CNE), foi fundamental para o posicionamento de cada um
dos Estados da Federação em relação ao Ensino Religioso (JUNQUEIRA,
2007).
Na mesma década (1980), com o processo de redemocratização do
país, as tradições religiosas asseguraram o direito à liberdade de culto e
de expressão religiosa. Nessa conjuntura, no ano de 1990, o Estado do
Paraná elaborou o Currículo Básico para a Escola Pública do Paraná. O
Ensino Religioso não foi apresentado como as demais disciplinas na
primeira edição do documento. Sob a responsabilidade da Assintec com a
SEED dois anos mais tarde, foi publicado um caderno para o Ensino
Religioso, conforme os moldes do Currículo Básico.
Houve um esvaziamento do papel do Estado em relação ao Ensino
Religioso, retomando-se na prática, a compreensão de que a definição do
currículo da disciplina é responsabilidade das tradições religiosas. Diante
do exposto evidenciou-se, ainda, o distanciamento do Ensino Religioso das
demais disciplinas escolares. Conforme explicitado pela SEED
No âmbito legal, o Ensino Religioso ofertado na Rede Pública
Estadual atendia às orientações da Resolução SEED n. 6.856/93, que,
além de reiterar o estabelecido anteriormente entre a SEED e a
Assintec, definia orientações para oferta do Ensino Religioso nas
escolas. No entanto, esse documento perdeu validade nas gestões
que se sucederam, especialmente a partir da promulgação da nova
LDBEN 9.394/96 (PARANÁ, 2008, p.43).
O Ensino Religioso passou a ser compreendido como disciplina
escolar, com a discussão da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional ― LDBEN 9.394/96, incentivadas pela sociedade civil
organizada. Em decorrência desse processo, sua instituição nas escolas
públicas do país foi regulamentada.
O enfraquecimento da disciplina de Ensino Religioso na Rede
Pública Estadual do Paraná ocorreu no período entre 1995 a 2002,
acentuando-se a partir de 1998, uma vez que nesse período não havia
sido regulamentado pelo Conselho Estadual de Educação, ficando restrito
somente às escolas onde havia professor efetivo na disciplina. Na
reorganização das matrizes curriculares do Ensino Fundamental, realizada
nesse período, o Ensino Religioso foi praticamente extinto, mesmo diante
da exigência legal de sua oferta pela LDBEN 9.394/96.
377
FONAPER
O Ensino Religioso não foi contemplado na elaboração dos
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) coordenado pelo Ministério da
Educação (MEC). Tornou-se então tema de debate pelo FONAPER. Nesse
contexto é que se elaborou uma proposta educacional com educadores de
diversas tradições religiosas. No ano de 1997 foi publicado o PCN de
Ensino Religioso.
O Conselho Estadual de Educação do Paraná, em 2002, aprovou a
Deliberação 03/02, que regulamentou o Ensino Religioso nas Escolas
Públicas do Sistema Estadual de Ensino do Paraná. Com a aprovação
dessa deliberação, a SEED elaborou a Instrução Conjunta n. 001/02
do DEF/SEED, que estabeleceu as normas para esta disciplina na
Rede Pública Estadual. No inicio da gestão 2003-2006, o Estado
retomou a responsabilidade sobre a oferta e organização curricular da
disciplina no que se refere à composição do corpo docente dos
conteúdos da metodologia, da avaliação e da formação continuada de
professores (PARANÁ, 2008, p. 41).
Dessa forma os professores que ministravam aulas de Ensino
Religioso foram abarcados em um processo de formação continuada que
tinha como objetivo a legitimação da Rede Pública Estadual. Tal processo
ocorreu entre os anos de 2004 a 2008 por meio de Simpósios, grupos de
Estudos, e resultou na fundamentação das Diretrizes Curriculares do
Ensino Religioso. Como explicita a SEED:
No final de 2005, a SEED encaminhou os questionamentos oriundos
desse processo de discussão com os Núcleos Regionais de Educação
e com os professores ao Conselho Estadual de Educação (CEE). Em
10 de fevereiro de 2006, o mesmo Conselho aprovou a Deliberação n.
01/06, que instituiu novas normas para o Ensino Religioso no Sistema
Estadual de Ensino do Paraná (PARANÁ, 2008, p.44).
Portanto, no ano de 2006, após um longo processo de discussão, a
SEED lançou a primeira versão para das Diretrizes Curriculares do Ensino
Religioso para a Educação Básica. Após inúmeras discussões entre os
diversos setores envolvidos o resultado final, mas não conclusivo, deste
processo surgiu a proposta de implementação de um Ensino Religioso
laico e de forte caráter escolar.
378
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
O Ensino Religioso na Rede Municipal de Curitiba
Como vimos, a discussão acerca da presença do Ensino Religioso
nos espaços escolares oficiais do Paraná remonta longa data. Conforme
Campos (2011), em 1922, o parlamentar Pe. Alcídio Pereira apresentou ao
Congresso Legislativo Paranaense, o Projeto nº 406 que objetivava instituir
o ensino religioso facultativo nas escolas públicas e subvencionadas pelo
estado do Paraná. Tal proposição provocou um forte debate entre os
parlamentares. ―A imprensa curitibana, particularmente aquela alinhada
aos anticlericais (Comércio do Paraná, Diário da Tarde, Gazeta do Povo),
endereçou muitas críticas à iniciativa do representante do clero‖
(CAMPOS, 2011, p. 66-67).
De acordo com Hernandes, Nizer e Correa (2012) a Secretaria
Municipal da Educação de Curitiba conta, atualmente, com 181 unidades
educacionais que ofertam Ensino Fundamental. Elas estão distribuídas em
nove Núcleos Regionais da Educação.
Em todas as escolas da Rede Municipal de Ensino de Curitiba o ER
é ofertado. Do total de 144 escolas, 141 contam com um professor
específico para esta disciplina. Nas outras escolas o professor regente
assume esse componente curricular. Nas escolas em que se ofertam os
anos finais do Ensino Fundamental a responsabilidade pelas aulas de ER
na maioria das vezes fica com os professores de História. Ao todo são
onze escolas que possuem essa oferta (HERNANDES; NIZER; CORREA,
2012).
No que diz respeito à formação continuada dos professores de
Ensino Religioso, eles participam anualmente, na área de vários encontros
e eventos.
São oferecidos também cursos7 de introdução e de
aprofundamento de conteúdos em parceria com a equipe pedagógica da
Associação Inter-religiosa de Educação (ASSINTEC).
6
7
No contexto dessa discussão convém mencionar o Decreto nº. 119a de 7 de janeiro de
1890, cuja vigência foi reestabelecida pelo Decreto nº 4.496 de 2002: É proibido à
autoridade federal, como a dos Estados federados, expedir leis, regulamentos ou atos
administrativos, estabelecendo alguma religião, ou vedando-a a criar diferenças entre os
habitantes do país ou nos serviços sustentados a custa do orçamento, por motivo de
crença
ou
opiniões
filosóficas
ou
religiosas.
Disponível
em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1851-1899/d119-a.htm>. Acesso em: 01
Ago. 2013.
Entre os já ofertados pode-se citar: Textos Sagrados (2010), Respostas norteadoras
para o sentido da vida além-morte (2011) e Espaços Sagrados (2012) (HERNANDES;
NIZER; CORREA, 2012).
379
FONAPER
Conforme argumenta Valdir Cândido de Deus (2010), a constituição
da ASSINTEC remonta ao Movimento Ecumênico de Curitiba. A origem
oficial da entidade ocorreu no ano de 1973, quando se realizou um
convênio com Secretaria Estadual de Educação, sob a condição de que
dentro de seis meses fosse criada uma associação responsável pelo
projeto de implementação do Ensino Religioso nas escolas públicas do
Paraná. Além da Secretaria Estadual de Educação, firmou-se um convênio
com a Secretaria Municipal de Curitiba.
Se considerarmos estas três últimas décadas, a Assintec passou por
diferentes fases. Primeiramente surgiu como entidade ecumênica, que
tinha como objetivo fomentar o Ensino Religioso que superasse a
catequese cristã na escola pública. Em seguida, a ênfase era o ensino de
valores humanos. Contudo, com a LDBEN 9.394/96, sob novos alicerces, a
Asssintec passou a trabalhar com o conhecimento religioso historicamente
acumulado e vivido no contexto das tradições religiosas, místicas e
filosóficas.
A presença do Ensino Religioso na escola tem gerado inúmeros
debates. Isso se deve, por um lado devido a crescentes resistências, e por
outro lado, aceitações, sendo levantadas diferentes concepções com
relação a sua metodologia, sua importância e também para que fins a sua
contribuição no ambiente escolar.
Nos pressupostos de Valdir Cândido de Deus (2010), alguns autores,
e até mesmo organismos, estão aventando e conjeturando sobre este
assunto, de modo que se desenvolva um currículo multicultural, que
propicie ao aluno o pleno exercício da cidadania. O mesmo esforço tem
partido do FONAPER8 para contemplar um currículo que seja também
multicultural. Sob essa perspectiva, o conhecimento religioso é:
Um patrimônio da humanidade e necessita estar à disposição da
escola, contribuindo para que os educandos se tornem capazes de
entender os movimentos no âmbito das diversas culturas, colaborando
para que o autêntico cidadão multiculturalista se aprofunde (DEUS,
2010, p. 49).
No município de Curitiba, com base na Lei 9.475/97, que dá uma
nova redação ao Art. 33 da Lei da LDB n. 9.394/96, redimensionando o
Ensino Religioso no contexto escolar, lançou-se um Caderno Pedagógico
8
Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso.
380
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
com o título ―Caderno Pedagógico: Ensino Religioso‖, onde estabelece e
determina como deverá ser o Ensino Religioso nas escolas públicas de
Curitiba. Neste, como área de conhecimento, o Ensino Religioso deve
trabalhar os seus conteúdos buscando fazer a articulação com as demais
áreas.
Uma parceria entre a Rede Municipal de Educação de Curitiba e a
ASSINTEC gerou a proposta de Ensino Religioso no município. Em 2005,
ambas as entidades citadas coordenaram um processo de revisão das
diretrizes curriculares municipais. Ocasionando também mesma data a
discussão da proposta com os profissionais da Educação de Ensino
Fundamental, onde se apontou possibilidades de trabalho efetivo com os
alunos.
A discussão da proposta foi pensada na atual legislação, a partir do
Art. 33 da LDBEN n. 9394/96, sendo alterado pela Lei n. 9.475/97,
contando com a Resolução n. 2/1998, da Câmara de Educação Básica do
CNE:
O Ensino Religioso, mediante isto, passa a ser considerado área do
conhecimento e parte integrante da Base Nacional Comum, sendo
trabalhado de modo sistemático, em articulação com as demais áreas,
em horário normal das escolas. A legislação determina o respeito à
diversidade cultural religiosa existente na realidade brasileira.
Considerando que o trabalho com o Ensino Religioso na escola não é
uma doutrinação, evangelização, catequese ou imposição de
quaisquer práticas religiosas, fica proibido o proselitismo (DEUS, 2010
p. 50).
A ASSINTEC, juntamente com a RME, desenvolve planos anuais de
formação continuada dos professores, visando conhecer e analisar as
diversas tradições religiosas, místicas e filosóficas, ao lado de condutas
que reforçam os valores em comum.
A realidade do estudante deve ser o ponto de partida e o ponto de
chegada no processo ensino-aprendizagem. Nessa concepção,
consideram-se as peculiaridades ou particularidades da comunidade
na qual se insere a escola, para que o estudante chegue ao
entendimento da diversidade das manifestações do sagrado e
construa um referencial de respeito às diferenças (RIBEIRO
HOLANDA, apud DAUDT DA COSTA; SCHLÖGEL, 2006, p. 24).
Com alusão ao desenvolvimento em seu trabalho pedagógico, de
caráter especial o Ensino Religioso, os professores precisam de modo
381
FONAPER
constante de instrumentos de apoio que lhes permitam uma
fundamentação segura. Com o objetivo de dar apoio para os professores
das escolas municipais, dois cadernos de Ensino Religioso foram
construídos nos anos 2003 e 2004. O primeiro Caderno teorizava sobre os
aspectos legais a que área estava ligado. Já o segundo Caderno tinha
como base uma complementação do anterior, trazendo exemplos de
planejamentos de aulas para os ciclos I e II.
Outros materiais foram produzidos três anos mais tarde (no ano de
2006) para os professores dos Ciclos I e II (do 1º ao 5º ano do Ensino
Fundamental), categorizados como Cadernos Pedagógicos.
Nos demais encontros que foram realizados, pedagogos, professores
e outros interessados realizaram avaliações sobre a importância do objeto
de estudo, aos conteúdos e à metodologia que o Ensino Religioso se
propôs.
Considerações Finais
Neste estudo procurou-se apresentar uma abordagem histórica sobre
a disciplina de Ensino Religioso no contexto nacional, estadual e
particularmente no contexto da rede municipal de ensino de Curitiba/PR.
Considerou-se como pressuposto que a realidade singular ― o Ensino
Religioso na Rede municipal de Curitiba ― é um elemento do universal ―
o Ensino Religioso no contexto histórico nacional e mesmo internacional.
No entanto, tal realidade particular não pode ser vista apenas como um
reflexo da realidade geral, pois, ela possui características próprias que lhe
conferem uma identidade particular.
Pela exposição do processo histórico de introdução e
desenvolvimento do Ensino Religioso na realidade mundial e brasileira
nota-se uma situação constante de disputas pelo controle do sistema
educacional como um dos meios para alcançar e garantir o controle
político, econômico e social.
Com relação aos esforços para a promoção de um Ensino Religioso,
enquanto área de conhecimento e a consequente valorização dos
professores que com ele trabalham, na realidade brasileira desde 1995, é
preciso destacar o trabalho do FONAPER, que em sua carta de princípios
estabelece, entre outros, ―A garantia que a Escola, seja qual for sua
natureza, ofereça Ensino Religioso ao educando, em todos os níveis de
382
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
escolaridade, respeitando as diversidades de pensamento e opção
religiosa e cultural do educando‖.9
Também no contexto paranaense esse cenário se reproduz à sua
maneira, bem como na capital do Estado. Uma das particularidades a
serem destacadas dessa realidade singular é o trabalho da Associação
Inter-religiosa de Educação (Assintec), que procura também atuar no
sentido de superar disputas e promover um Ensino Religioso que
realmente colabore para formação integral do ser humano.
Na capital paranaense como em todo território nacional está presente
o desafio de superar visões sectárias para a promoção de um Ensino
Religioso, enquanto área de conhecimento pautado no respeito à
diversidade religiosa com vistas à formação integral do ser humano frente
aos desafios da sociedade hodierna.
Referências
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União, Rio de Janeiro, 7 de janeiro de 1890. Disponível em:
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384
PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NO ENSINO RELIGIOSO:
EXPERIÊNCIAS, DESAFIOS E PERSPECTIVAS
Josiane Crusaro (ASPERSC)1
Lindamir Teresinha Bianchi Crusaro (UNIGRAN)2
Adecir Pozzer (GPEAD/FURB)3
Resumo:
O espaço escolar é lócus de acolhida, integração, mediações, socializações, aprendizagens
e reconhecimento do(s) outro(s) e, ao mesmo tempo, palco de exclusões, conflitos,
intolerância e desentendimentos gerados pela incapacidade de um diálogo autêntico e
vivencial, legitimado pela escuta ativa e pelo respeito às diferenças na convivência entre as
diversidades. Repensar o currículo de forma contextualizada perpassando as concepções,
planejamentos, metodologias e avaliações, atendendo aos anseios de uma educação
significativa para o educando, capaz de promover, além do conhecimento, uma formação
cidadã pautada em princípios éticos de convivência e práticas alteritárias é tarefa constante
que perpassa as diferentes áreas do conhecimento da Educação Básica. Por isso,
objetivamos socializar atividades de aprendizagem desenvolvidas no componente curricular
Ensino Religioso que, enquanto área do conhecimento da Educação Básica tem por meta
assegurar o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil.
Palavras-chave: Ensino Religioso; espaço escolar; diversidade cultural religiosa.
Palavras iniciais
A escola possui diversos significados e compreensões. Pode ser
entendida como espaço de acolhida, encontros, reencontros, amizades,
1
2
3
Graduação no Curso Ciências da Religião - licenciatura em Ensino Religioso pela
Unochapecó (2012) e História pela UNOESC - ;Xanxerê. Professora de Ensino
Religioso da Rede Pública Estadual de Santa Catarina e vice-secretária da Associação
dos Professores de Ensino Religioso do Estado de Santa Catarina - ASPERSC, Gestão
2011/2013. E-mail: [email protected]
Acadêmica do Curso de Pedagogia - UNIGRAN. Professora do Ensino
Fundamental/Séries Iniciais da Rede Municipal de Ensino de Faxinal dos Guedes/SC. Email: [email protected].
Mestrado em Educação pela UFSC; Graduação em Ciências da Religião - Licenciatura
em Ensino Religioso pela FURB (2010); Especialização em Formação de Professores
para o Ensino Religioso pela PUCPR (2006). Bacharel em Ciências Religiosas pela
PUCPR (2002). Membro dos grupos de Pesquisa Ethos, Alteridade e Desenvolvimento
(GPEAD/FURB) e Arte e Educação da linha Filosofia da Educação (GRAFIA/UFSC).
Coordenador do Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso (FONAPER 20122014). Professor de Ensino Religioso da Rede Pública do Estado Santa Catarina, da
Associação Franciscana Senhor Bom Jesus na região da Grande Florianópolis e da
FURB/PARFOR. Atua na área da Educação, com ênfase nos seguintes temas:
diversidade cultural religiosa, ensino religioso, formação de formadores e direitos
humanos. E-mail: [email protected]
FONAPER
diálogos, construção de saberes e aprendizados, que contribuirão na
formação da identidade, ou também como espaço de legitimação,
opressão, regras, imposições, exclusão e intolerância.
Estando incumbida, enquanto instituição social, de ser
espaço/local/ambiente de aprendizagens e, ao mesmo tempo, de
convivência entre as diversidades, sabe-se que o cuidado para com o
outro, não raras as vezes, tem estado em segundo plano porque ainda há
uma formação visando atender as demandas do sistema capitalista, ou
seja, para um mercado de trabalho centrada na geração de capital e no
incentivo ao consumismo exacerbado, cujo fundamento é uma
racionalidade reduzida à instrumentalização.
Avaliações servem como indicativos ou métodos para averiguar e
classificar os níveis de aprendizagens que, socializados em gráficos, não
passam de meros resultados para verificar se atenderam ou não às metas
estabelecidas. São importantes para quem detém o controle e que precisa
demonstrar os índices dos quais depende inclusive a sua sobrevivência.
Com o objetivo de refletir este contexto em que a escola está fortemente
envolvida, faz-se necessário recuperar o desejo e o sabor do aprender e
do ensinar, para além de uma capacitação técnica para o exercício de uma
profissão.
E, na construção do saber aliado ao sabor do aprender, do
compreender e do ensinar, o diálogo é base/fator preponderante, porque
estudantes e professores precisam discutir, refletir e trabalhar
conjuntamente
atuando
como
protagonistas
no
processo
ensino/aprendizagem, utilizando constantemente do encontro, para ouvir,
dialogar e interagir no espaço escolar.
Diante dessa perspectiva, Silva (2007, p. 250) afirma que:
um dos grandes desafios da escola hoje é contribuir para a construção
da alteridade e do conhecimento do eu e o outro, oportunizando
espaços de diálogo para o pleno desenvolvimento dos educandos, a
partir de processo de ressignificação da linguagem utilizada por eles.
Acrescenta a autora (2007, p. 251) que há uma ―[...] necessidade de
criar um ambiente de diálogo na sala de aula, de troca de experiências,
oportunizando assim a valorização de todos‖ implementando outras lógicas
onde todos/as se sintam integrados, acolhidos e ao mesmo tempo tenham
386
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
assegurado o reconhecimento da alteridade, agindo assim com
responsabilidade diante do outro.
Fontanive, Daneliczen e Kravice (2009) afirmam que uma educação
capaz de atender aos pressupostos da alteridade é tarefa desafiadora, pois
rompe com a postura tradicional a qual estamos habituados e nos provoca
a (re)flexão sobre a necessidade do respeito perante às diferenças que
estão presentes nos diversos espaços.
Para Pozzer, Cecchetti e Riske-Koch (2009, p. 271) ―a alteridade é
negada, esquecida [...]‖ forjando-se identidades, moldando, marcando e
etiquetando estudantes de acordo com os ideais de um sistema que
oprime o ser humano e nega a beleza e riqueza da diversidade,
principalmente, nos ambientes escolares.
Diante dessa perspectiva, concordamos que ―[...] na sociedade
excludente, o diferente é visto como alguém inferior e não digno do círculo
das nossas relações sociais‖ (WITT; PONICK, 2008, p. 09), possibilitando
o surgimento de tipificações, exclusões, (pré)conceitos, discriminações,
intolerâncias em relação ao outro, enquanto sujeito histórico singular,
diferente e único.
Daí a necessidade constante da escola refletir seu papel no contexto
atual, atuando como promotora de uma conscientização que parta do
outro, de caráter alteritário, humano e respeitoso para com os diferentes
indivíduos que constituem a sociedade, contribuindo com uma formação de
sujeitos de direitos, emancipados e críticos frente às injustiças e a negação
do direito de aprender e se desenvolver.
As flores e o jardineiro: aprendendo e convivendo com a diversidade
Vamos imaginar uma sala de aula? Um espaço da diversidade,
constituído por diferentes corpos, saberes, experiências, etnias, cores,
crenças religiosas ou não, gêneros, gostos, desejos, ideias,
entendimentos, significados e sentidos. A sala de aula comparada a um
jardim demonstra que cada qual na sua maneira de ser, ver, agir e viver, é
especial e requer atenção, compreensão, cuidado, acolhimento e
responsabilidade.
Recordamos com isso, que ―[...] o homem se constitui como ser
humano na relação com o outro, ou seja, por meio de sua inserção sócia
histórica‖ (MARTINS FILHO, 2011, p.60), por isso, é preciso a inter-relação
com o outro/diferente, o convívio e respeito ao que não existimos sozinhos.
387
FONAPER
O ―jardineiro‖ necessita cuidar, cultivar suas ―flores‖ para que
cresçam e juntas constituam o jardim. Da mesma forma, o professor tem
de cuidar, ensinar e educar os educandos para que reconheçam e
aprendam a conviver respeitosamente na diversidade, pois ―[...] conhecer o
que é do outro permite a construção do respeito mútuo [...]‖ (OLENIKI;
DALDEGAN, 2003, p. 21). Geralmente, os (pré)conceitos são originários
da falta de (re)conhecimento e entendimento.
De acordo com Rubem Alves (1994, p. 6) ―a alegria está no jardim
que se planta, na criança que ensina, no livrinho que se escreve‖. Por isso,
o professor assume uma tarefa primordial no processo de
ensino/aprendizagem, pois, tem de assegurar as possibilidades para que
aconteça aprendizagem e (con)vivência.
Para Giroux (1997), o professor precisa criar oportunidades para que
os estudantes tornem-se cidadãos e que a partir do conhecimento
adquirido e/ou produzido sejam críticos e autônomos, o que de fato, pode
corroborar na importância do educador ser mediador.
Nesta perspectiva, ―a docência é uma profissão que exige muito mais
do que a transmissão dos conteúdos teórico-práticos, aprendidos nos
cursos de formação inicial e continuada‖ (SOUZA, 2008, p.92), porque
exige comprometimento e qualificação constante do profissional,
sensibilidade e responsabilidade ética frente às interpelações expressas no
rosto do outro.
Reafirmando a relevância do professor enquanto educador, exige-se
que este,
[...] prepare o aluno para enfrentar as contradições sociais da
conjuntura atual, que, por meio de práticas inovadoras e atraentes,
ofereça e provoque no aluno o desejo de adquirir e construir o
conhecimento para responder aos desafios da sociedade (VEIGA;
VIANA, 2010, p. 32).
Para Delors (2001, p. 54) ―o respeito pela diversidade e pela
especificidade dos indivíduos constitui, de fato, um princípio fundamental
[...]‖, o que implica em ensinar aos sujeitos/estudantes desde cedo à
necessidade de respeitar o outro como ele é considerando suas escolhas e
diferenças, principalmente, no que se refere às questões religiosas que
são de foro individual ou familiar.
Por isso, é preciso que a escola como um todo esteja comprometida
com a oferta:
388
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
[...] de uma educação de qualidade, que, ao mesmo tempo, seja
universal na garantia de acesso e atenda também as necessidades
educativas de crianças, adolescentes e jovens [...] que nela estão
inseridos (KUENH, 2007, p.196).
É preciso demonstrar aos estudantes que enquanto pessoas, eles
são únicos, diferentes e especiais, porém, iguais em direitos, dignidade e
deveres. Ensinar e aprender esta perspectiva não são responsabilidade
somente do componente Ensino Religioso, mas dos demais componentes
e áreas do conhecimento que compõem o currículo escolar e possuem por
incumbência contribuir na formação cidadã de cada estudante.
Ensino Religioso: concepções e compreensões acerca do
componente em Santa Catarina
O componente Ensino Religioso no decorrer do processo histórico
brasileiro foi marcado por diversos entendimentos, ideias, compreensões e
análises. Aceito, ignorado, com avanços e retrocessos, foi trabalhado,
ensinado e/ou abordado em diferentes perspectivas.
Destacamos que a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional - LDB nº 4024/61 - abordava o termo Ensino Religioso, mas na
prática pedagógica o mesmo era concebido como ensino catequético e/ou
doutrinal de caráter confessional, através do qual eram ensinados os
princípios do cristianismo católico.
Para Santos (2011), a concepção exposta na Lei nº 5.692/71 é
marcada por um discurso pluriteológico e embasado nos aspectos morais
da tradição cristã, em que o componente recebeu caráter
interconfessional/ecumênico, continuando a privilegiar/priorizar uma
pequena parcela da população.
Para o FONAPER4 (2000, p. 7) ―o novo para o Ensino Religioso
começa a ser vislumbrado a partir dos anos 90 [...]‖ quando passou a ser
concebido como parte integrante da formação básica do cidadão, ao
assegurar o respeito à diversidade cultural religiosa, sendo vedadas
quaisquer formas de proselitismo, conforme art. 33 da LDB de 1996.
De acordo com FONAPER (2000, p. 16), ―o Ensino Religioso
pluralista deve apresentar uma visão positiva da diversidade religiosa,
situando-a como parte de um contexto democrático, no qual a liberdade de
pensamento e de credo pode se expressar‖. Por isso, a escola tem de
4
Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso.
389
FONAPER
promover o acolhimento de todos/as e tratar a diversidade religiosa
envolvendo e integrando as diferenças existentes, em uma perspectiva
inter-religiosa e intercultural.
Destacamos que o Ensino Religioso no contexto atual, concebido
como área do conhecimento e componente a integrar a educação básica
(Cf. Resolução CNE/CEB nº 4/2010 e Parecer CNE/CEB nº 7/2010), tem
por objeto estudar o fenômeno religioso, isto é, aquilo que se mostra,
revela ou manifesta na existência humana.
Desta forma, o Ensino Religioso contribui na vivência pessoal do
estudante. Daí a necessidade das unidades escolares se constituírem
enquanto espaços de construção, produção e socialização de
conhecimentos, pois, a escola tem ―a função de ajudar o educando a se
libertar de estruturas opressoras que o impedem de progredir e avançar‖
(FONAPER, 2009, p. 41).
No Estado de Santa Catarina, o Ensino Religioso:
[...] apresenta um histórico construído pela participação de inúmeros
homens, mulheres, jovens e crianças, que edificaram nesta disciplina
um dos espaços no currículo escolar a contribuir significativamente
com reflexões e encaminhamentos pedagógicos na construção de
cidadãos catarinenses comprometidos com um mundo melhor e
possível (CECCHETTI; THOMÉ, 2007, p. 150).
Dentre os avanços significativos, é preciso destacar que em muitos
Municípios, por meio de suas redes de ensino, o componente Ensino
Religioso faz parte da matriz curricular, sendo que alguns oportunizam
profissional específico nos nove anos do Ensino Fundamental o que vem
corroborar com o debate referente ao Ensino Religioso estar ou não
inserido nos currículos escolares, com professor específico.
Destacamos que as discussões do Ensino Religioso, enquanto área
do conhecimento, estão presentes em diferentes espaços, tanto nas
unidades escolares, como nas instituições formadoras. Verificamos
também que houve um número maior de universidades que
ofertaram/ofertam cursos de licenciatura na área, bem como o constante
apoio na organização de eventos, congressos, seminários e cursos de
formação continuada que buscam ter em pauta o tema Ensino Religioso na
perspectiva da diversidade cultural religiosa.
390
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Semeando esperança, despertando para a responsabilidade –
relato de práticas pedagógicas
A Escola de Educação Básica Romildo Czepanhik, da qual
relataremos a prática pedagógica, foi fundada no ano de 1985 e está
situada no Bairro Veneza, na cidade de Xanxerê/Santa Catarina. Conta
com aproximadamente 900 estudantes matriculados no Ensino
Fundamental e Médio.
A grande maioria dos estudantes reside naquele bairro, porém, há
um número expressivo oriundos de bairros vizinhos e também
provenientes do campo. Em comum, possuem o desejo de aprender. É
significativa a diversidade nos aspectos físicos, cognitivos, econômicos,
culturais, religiosos e sociais.
Referente ao componente Ensino Religioso identificamos que os
estudantes gostam muito da disciplina e apresentam um bom
relacionamento com a professora desta área. É de se destacar que em
anos anteriores, havia na unidade escolar um profissional habilitado, fato
que contribui com a concepção de Ensino Religioso que os estudantes
possuem.
Diante disso, Krieck e Pacheco (2007, p. 295) afirmam que:
não se aprende a participar teorizando sobre os processos
participativos, aprende-se a participar participando. Ensina-se a
participar abrindo espaços para que os educandos participem. Uma
prática social participativa ensina a cidadania e amplia os limites da
qualidade de vida e proporciona o exercício dos princípios definidos
para o ser humano no que se pretende formar.
E é nessa perspectiva que analisamos o desenvolvimento desta
unidade escolar no decorrer de sua história em relação ao Ensino
Religioso, pois é perceptível que os estudantes se sentem protagonistas
do processo de ensino-aprendizagem atuando como integrantes e
participantes nas aulas de Ensino Religioso.
De acordo com o FONAPER (2009, p. 34-35), a escola é local onde
se constroem conhecimentos, se socializam os saberes historicamente
produzidos e acumulados pela humanidade, sendo um deles o
conhecimento religioso que também precisa ser disponibilizado aos
estudantes. Daí decorre a necessidade do diálogo entre todos enquanto
promotores e mediadores de aprendizagens.
391
FONAPER
Neste sentido, ―precisamos compartilhar uma visão de escola como
ambiente que pode ser de felicidade, de satisfação, de diálogo, onde
possamos de fato desejar estar‖ (ROCHA; TRINDADE, 2006, p. 55), onde
saber e sabor, diálogo e silêncio, fala e escuta, ensino-aprendizagem e
convivência estejam integrados num processo contínuo.
Assim, no início do semestre letivo, procuramos desenvolver um
projeto voltado à convivência e respeito à diversidade cultural religiosa
para ser socializado em diferentes momentos que a escola
proporcionasse, como eventos ou feiras interdisciplinares. O objetivo foi
demonstrar à comunidade as atividades de aprendizagem desenvolvidas
pelos estudantes.
Primeiramente buscamos compreender/conhecer a composição das
famílias dos estudantes; para isso, todos foram convidados a fazer a
dobradura de uma casa, ilustrar as pessoas que compunham sua família e
registrar qual tradição ou denominação religiosa seus familiares
frequentavam, ou se não tinham nenhuma. Na sequência, propomos uma
socialização onde todos puderam expor a sua realidade familiar.
Posterior a isso, realizamos uma pesquisa na unidade escolar
envolvendo todas as pessoas - estudantes, professores, orientação
pedagógica, merendeiras e agentes de serviços gerais – com o objetivo de
conhecer a diversidade religiosa presente na escola. Os estudantes
estiveram na cozinha, nas salas de orientação pedagógica, nos corredores
para realizar as entrevistas.
Outra atividade proposta levou a reflexões em torno da vida
enquanto presente e/ou dádiva, pois ninguém pagou para nascer e ser o
que é. Simplesmente nascemos e o mundo nos acolheu, as pessoas nos
cuidaram. Fomos e estamos nos constituindo enquanto sujeitos históricos,
sempre nos transformando, melhorando ou não. Para chegar a esta
reflexão, cada estudante registrou numa tarja de papel o que para ele
significava viver; posteriormente confeccionamos um mural no qual
expomos as tarjas sobre um círculo representando o sol, que significa o
nascer do dia, uma nova oportunidade para viver.
Dialogando sobre o sentido da vida identificamos que há em nós um
desejo de ser eterno, por isso buscamos a todo o momento prolongar a
vida. Assim, pensamos em práticas que podem contribuir para uma vida
saudável (a alimentação, o exercício físico, etc.) evitando atitudes que
392
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
conduzem a morte – seja ela lenta ou rápida - (uso de bebidas alcoólicas,
drogas, dirigir embriagado, etc.).
Destacamos que em cada tarefa objetivamos dialogar e ao mesmo
tempo ouvir, pois precisamos aprender ―[...] a olhar o outro com um olhar
de compreensão, aceitação, respeito e interesse de aprender com este
outro [...]‖ (KRIECH; PACHECO 2007, p. 299). Para isso, os estudantes
foram convidados a contornar sua mão em uma folha de ofício e registrar
os sonhos, desejos e perspectivas para o futuro.
As atividades visaram propiciar aos estudantes o entendimento da
importância do eu e o outro, do sentido da vida, da necessidade da
convivência numa lógica de acolhimento, integração, responsabilidade e
ajuda para com as pessoas que habitam este mundo.
Neste sentido, não se pode esquecer que:
o grande líder da não-violência, Mahatma Gandhi, nos deixou grande
exemplo [...], pois não demorou em perceber que só nos construímos
no encontro com o diferente, e que todo ser torna-se humano na
medida em que se confronta e dialoga com aquilo que é desconhecido
(CECCHETTI; THOMÉ, 2007, p. 141).
Também no decorrer desse semestre letivo destacamos as inúmeras
atividades de integração, acolhimento, conhecimento e desenvolvimento
de aprendizagens envolvendo todos que fazem parte da comunidade
escolar, pois ―[...] sentimos que ressurge forte em nosso intimo e na
sociedade em geral um anseio de comunhão, de comunicação e de
relacionamento fraterno‖ (Idem, p. 297).
Percebemos assim, que diante da construção de aprendizados e
aproximação das pessoas, avanços significativos foram sendo alcançados
no decorrer do processo, pois, é impossível aprender e conviver sozinho;
sempre precisaremos do outro, do diferente, da coletividade para
podermos (sobre)viver e nos educar. Este é um dos grandes legados da
pedagogia freiriana: ―Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si
mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo‖
(FREIRE, 1987, p. 68).
Para concluir o trabalho desenvolvido, realizamos uma feira
multidisciplinar apresentando à comunidade a perspectiva que o
FONAPER propõe e defende em relação ao componente Ensino Religioso,
conforme prevê o art. 33 da LDB, pois, ao mesmo tempo em que assegura
o respeito à diversidade cultural religiosa no contexto escolar, (re) ensina a
393
FONAPER
convivência com as diferenças enquanto processo de formação em e para
a alteridade.
(In)concluindo
Quantos passos precisam ser dados em direção a uma educação
diferenciada, capaz de possibilitar diferentes olhares, concepções,
entendimentos e compreensões em torno de um ensino e uma
aprendizagem que humanize o homem para a convivência com os demais.
Adentrar na sala de aula, poder dialogar, interagir, ouvir e crescer em
sabedoria com as pessoas que constituem aquele ambiente; tantos
desejos que são possíveis quando desafiamos a nós mesmos e
acreditamos que a mudança se inicia nos pequenos gestos e ações.
Essas atitudes e práticas não são tarefa apenas do
professores/educadores do Ensino Religioso, porque a escola enquanto
espaço/ambiente/local de conhecimentos e aprendizagens deve
proporcionar e exigir que cada área ou componente curricular atente para
a prática da acolhida do outro, desenvolvendo processos centrados nos
direitos de aprendizagem e desenvolvimento dos estudantes.
Por isso, seguimos guerreiros, aprendizes, educadores porque a
cada dia que passa continuamos lutando pela possibilidade de dias e
mundos melhores para todos/as. Assim, juntos, diferentes, unidos...
continuamos
nessa
caminhada
entendendo
que
enquanto
professores/educadores/amigos do Ensino Religioso uma significativa
história estamos tecendo.
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396
GT3: CONCEPÇÕES METODOLÓGICAS DO ENSINO RELIGIOSO
Coordenação:
Me. Henri Luiz Fuchs (UNILASALLE)
Dr. Remí Klein (Faculdades EST)
Ementa: Toda concepção metodológica reflete um determinado entendimento de
Ensino Religioso. Ao longo da história desta área de conhecimento diferentes
encaminhamentos metodológicos reafirmaram suas respectivas concepções. Com
a promulgação da Lei nº 9.475/1997, o Ensino Religioso visa assegurar o respeito
à diversidade cultural religiosa presente no Brasil. Neste sentido, este GT acolherá
pesquisas e relatos de práticas pedagógicas relacionadas às concepções e
encaminhamentos metodológicos do Ensino Religioso; procedimentos e processos
de ensino e aprendizagem em Ensino Religioso e, seleção e uso de recursos
didáticos e paradidáticos para esta área do conhecimento na diversidade cultural
religiosa.
Palavras-chave: Ensino Religioso; Concepções Metodológicas; Diversidade
Cultural Religiosa.
O FENÔMENO RELIGIOSO NO ENSINO RELIGIOSO: DESAFIOS
EPISTEMOLÓGICOS PARA DOCENTES NO ENSINO
FUNDAMENTAL
Anderson Ferreira Costa 1
Edile Maria Fracaro Rodrigues2
Resumo:
Este artigo tem a proposta de mostrar as dificuldades epistemológicas que o ensino
religioso apresenta aos profissionais que se aventuram em uma área de conhecimento tão
esquecida pelo poder público e desvalorizada no campo educacional. Torna-se, portanto,
necessário verificarmos e analisarmos a causa de tantos problemas para podermos então
refletir em que estrada percorrer rumo a valorização de uma disciplina que integra a
formação humana, e não meramente capitalista e liberal no sentido do mercado.
Palavras-chave: educação, ensino religioso, cultura, fenômeno religioso.
Introdução
O objetivo deste artigo é refletir sobre o fenômeno religioso como
conhecimento a ser estudado na disciplina de ensino religioso. Este tema é
necessário para a formação do cidadão, levando em consideração que a
dimensão religiosa do ser humano é algo de extrema complexidade, que
causa impactos significativos na sociedade brasileira e especificamente no
cenário religioso paraense. Para este estudo, é necessário pensarmos os
aspectos que compõem o fenômeno religioso, neste caso aspectos que
causam dificuldades na implementação da disciplina na escola como por
exemplo os fundamentalismos, a falta de formação dos professores,
questões como doutrina, ritos, ethos e tradições religiosas que acabam
sendo vistas a partir de conceituações de fé e não culturais. É exatamente
essa falta de conceituação que transforma o ensino religioso em espaço de
1
2
Aluno do Curso de Especialização em Metodologia do Ensino Religioso — Artigo
apresentado como Trabalho de Conclusão de Curso — Faculdade Internacional de
Curitiba – FACINTER, 2011.
Professora orientadora TCC do Curso de Especialização em Metodologia do Ensino
Religioso da Facinter. Mestre em Educação pela Universidade Católica do Paraná
(PUCPR), Curitiba (PR), Brasil e-mail: [email protected].
FONAPER
proselitismo e a geografia que será observada o fenômeno, que no caso
será na região de Marapanim.
Como é visto o Ensino Religioso em uma Escola Municipal de
Marapanim
Marapanim fica a 200 quilômetros de distância da capital do estado
do Pará, Belém. Tem cerca de 30 mil habitantes e pouco mais de 50
escolas contando as da zona rural e zona urbana. Existe apenas um
professor formado em Ciências da Religião que ministra a disciplina, outros
professores que ministram a disciplina não são formados na área e estão
ministrando as aulas por questão de carência. Marapanim é conhecida por
ser a terra do carimbo, ritmo musical que canta o cotidiano do pescador
ribeirinho, da amazônica. Essa dança possui claras influências africanas e
mistura com cultura de tradição cristã. Em um primeiro momento imaginase que, por conta de uma cultura ribeirinha diversificada, os professores
residentes na região tenham um pensamento mais contemporâneo sobre o
ensino religioso, entretanto, através de entrevistas esta hipótese cai por
terra e vimos que a tradição cristã é preponderante à tradição religiosa
africana, e que raízes culturais são esquecidas. Esse esquecimento é
percebido através dos comentários acerca do ensino religioso. Sobre a
escola, a atual diretora não permitiu que fosse divulgado nenhum dado
sobre a instituição e sobre os professores, apenas que fosse exposto o
pensamento sobre o tema em questão.
Nessa pesquisa qualitativa serão apresentadas ideias e autores que
vão subsidiar as reflexões para a análise de dados levantados por meio de
entrevistas sobre quais os conteúdos que o ensino religioso deve conter.
Para começarmos, vamos ver algumas entrevistas feitas com alguns
professores sobre o ensino religioso. A entrevista foi feita com dois
diretores, cinco professores.
As perguntas foram:
1. Você acha o ensino religioso uma disciplina importante na escola?
2. Quais conteúdos devem ser abordados nas aulas?
3. Qual a qualificação mais adequada dos professores para esta
disciplina?
4. Voce acha correto a disciplina ser facultativa ao aluno?
5. Você já ministrou a disciplina durante a sua carreira?
400
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Vamos ver as respostas:
Diretora 1:
1. A disciplina é importante na escola para que os alunos possam se
sensibilizar com o que está acontecendo no mundo, violência, o
homem cada vez mais afastado de deus, marginalidade, drogas,
tudo isso é importante ser trabalhado, e o ensino religioso é peça
fundamental para se combater estes males.
2. Acredito que conteúdos referentes a deus, a todas as religiões, à
paz, amor ao próximo que está tão devassado hoje em dia, e
principalmente à família que está tão desestruturada.
3. Teologia ou filosofia
4. É complicado, por que o ensino religioso não é uma disciplina
difícil, e por isso, de repente o aluno não passa, mas passa em
matemática? Fica complicado, por isso acho melhor deixar o
ensino religioso como está, que mal nenhum ele está fazendo.
5. Sim, quando era professora, ensinava pra quinta à oitava,
passava conteúdos relacionados a valores, como paz, amor,
família, solidariedade, meio ambiente. Nunca usei a disciplina para
doutrinar meus alunos na minha crença.
A diretora 1 tem 45 anos, e 20 de docência, é formada em pedagogia
e a cinco anos atua como diretora. Mora na região metropolitana de Belém
e tem cinco filhos, sua religião é cristã de denominação protestante
(pentecostal da Assembleia de Deus)
Vamos analisar agora o entrevistado 2.
Diretor 2:
1. Acho sim, acredito que a violência, as drogas e a prostituição
possam ser combatidas nos momentos das aulas, já que as outras
disciplinas estão mais preocupadas com seus conteúdos
específicos.
2. Deve ensinar sobre deus, que na verdade é um valor universal, e
se fugirmos disso, estaremos fugindo da própria realidade do
aluno. Pode ser o mais bandido da escola, mas se você falar de
deus pra turma você percebe que ele se comporta. Por isso não
401
FONAPER
há assunto mais pertinente. Se não for isso é melhor mudar de
nome.
3. Teologia, né?
4. Acho que deus não deveria ser uma opção de conhecimento e sim
uma obrigação, desde quando falar sobre a verdade é uma
questão de escolha?
5. Sim, sim, eu levava a bíblia pra sala de aula e lá lia um trecho e
explicava historicamente o que aquilo significava, os alunos
adoravam e realmente prestavam atenção.
O diretor 2 é católico, tem 32 anos e sete anos de docência, há dois
anos atua como diretor, tem um filho e é divorciado, sua formação é em
matemática.
A próxima entrevistada é uma professora que atua com a disciplina
na escola.
Professora 1
1. A disciplina é importante, mas acho que ela deveria falar somente
de deus, por que é a verdade máxima, esse negócio de falar
sobre outras religiões não leva a nada, pois, não é a realidade do
aluno.
2. Principalmente valores, que hoje em dia estão sendo perdidos,
ética e moral. Se formos perceber, no cristianismo todos estes
valores estão presentes, por isso, ensinar sobre Cristo é ensinar
sobre tudo isso que é importante.
3. Eu estudei teologia, sempre foi teologia.
4. Mesmo que não fosse, a gente teria a obrigação de passar os
alunos de ano por que não é uma disciplina difícil de se entender.
5. Atuo até hoje, e adoro o que faço, os alunos gostam a meu ver e
nunca tive problema com a disciplina. Acredito que o que estou
fazendo é um serviço para mim e para eles também, que muitas
vezes não conseguem ouvir uma palavra de conforto.
A professora tem 26 anos e é formada em teologia em curso de nível
médio certificado pela Assembleia de Deus. É formada em nível médio
pelo magistério e atua há cinco anos na docência.
402
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Professor 2
1. Eu acho que ela deveria sair da grade curricular e entrar no lugar
a educação ambiental, porque a religião é algo que não pode
partir da escola mas sim das igrejas, educação ambiental é algo
importante, os geógrafos são muito bons em trabalhar esse
assunto, mas não podemos trabalha-lo com maior dedicação por
conta dos assuntos que são muitos.
2. Deveria ensinar algum assunto que fosse geral pra todos, não
apenas para uma religião, como por exemplo, educação
ambiental, educação para o trânsito, enfim, algo que servisse para
a pessoa valorizar sua cidade.
3. Qualquer pessoa pode ensinar religião porque todos nós temos
religião.
4. Tem que continuar, por que ninguém pode ser reprovado por não
acreditar em determinada religião.
5. Não!
O professor em questão tem 35 anos, atua a dez anos como
docente, é formado em geografia pela FINOM, Faculdade do Norte de
Minas Gerais, não tem filhos e nem esposa, possui uma crença
independente de religiões.
Professor 3
1. Acho que é importante sim; os alunos precisam ouvir mais sobre
determinados valores como amor, paz e solidariedade.
2. Valores universais, pode até usar o exemplo de Jesus, é religião
mesmo, como amor, paz, união, família, deve falar sobre o perigo
das drogas e sobre moral e ética.
3. Teologia.
4. Acho que tanto faz, o que importa é o aluno aprender, se ele não
aprender não vai mudar muita coisa na vida dele.
5. Não.
O professor tem 29 anos, é docente de língua portuguesa, formado
pela Universidade Vale do Acaraú, UVA, ministra aulas há 4 anos. Católico
e catequista da igreja local.
403
FONAPER
Professor 4
1. É sim, até mesmo porque a religião é algo do ser humano, não
existe a possibilidade de não haver religião no mundo e se ela
está no mundo faz parte da realidade do aluno e deve ser
ensinada, não apenas uma, mas todas.
2. Deve ensinar sobre a história das religiões e sobre os valores
universais como paz, amor, família, solidariedade.
3. É ciências da religião, né?
4. Não vejo problema nisso, por que o ensino religioso não é uma
matéria que o aluno tem dificuldade em aprender.
5. Não.
Professor de 31 anos, formado em história pela Universidade Federal
do Pará e que ministra aulas há 6 anos, possui uma crença independente
de religiões.
Professor 5
1. É importante sim, existem muitas coisas que a escola fecha os
olhos, e o ensino religioso deve abrir, como as drogas, a
prostituição, a violência. Acho importante a gente falar mais de
Jesus, não pra converter, mas por que ele é um símbolo de paz,
amor, os ensinamentos dele tem tudo a ver com o que a gente
precisa pra nossa vida.
2. A vida de Jesus interessa a todos, assim como a páscoa, o natal,
a bíblia que é o livro mais lido no mundo, isso não pode passar
despercebido na escola.
3. Teologia, pastores e padres.
4. Acho que deus não deveria ser opcional, deveria ser obrigatório
para todos.
5. Sim.
Professora de Inglês, 43 anos, casada, dois filhos, é da Assembleia
de Deus e leciona há 15 anos.
Todas estas entrevistas nos levam a crer o quão devassado está o
conceito de ensino religioso dentro da cabeça dos próprios diretores,
professores e da comunidade escolar em geral, ao menos na escola em
que atuo. Podemos perceber que a maior parte dos pensamentos é de que
o ensino religioso é uma espécie de disciplina transversal, que ela não
possui uma epistemologia própria e nem uma referencial nacional, e
404
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
sabemos que isso não condiz com a verdade. Os parâmetros curriculares
nacionais do Ensino Religioso foi formulado pelo FONAPER em 1998 após
uma reunião com o Conselho Nacional de Educação que deliberou a
responsabilidade do Fórum de legislar sobre o ensino religioso, e embora
não tenha uma dimensão legal sobre a disciplina, o Fórum Permanente de
Ensino Religioso tem sido até hoje o subsídio para milhares de professores
compromissados com um Ensino Religioso sem proselitismo na escola
pública e privada. Todas as respostas apresentaram desafios
epistemológicos à disciplina, incorporados à prática de sala de aula e ao
objeto próprio, mais importante em saber sobre o que pensam da
disciplina, é encontrar maneiras de superar os erros. Estes desafios
encontram-se na comunidade escolar e na formação do professor.
Religião como Cultura e os problemas para o Ensino Religioso
Segundo Frank Usarski (2002), religião constitui ―sistemas simbólicos
com plausibilidades próprias‖, podemos pensar religião como um
fenômeno universal, sem reducionismos teológicos, que é o que
caracteriza a teologia. Mas para estudarmos a religião e suas
―plausibilidades‖ precisamos entender o fenômeno religioso, que é o que
define a religião como uma produção simbólica universal e diversamente
manifesta no mundo. Para isso, a fenomenologia da religião é de
fundamental importância, pois, segundo Luiz Alves (2009, p. 49):
a fenomenologia das religiões...pretende construir um sistema de
análises das religiões que não perca de vista as complexidades
presentes nestas. Essa tarefa foi facilitada com a criação da ciência da
religião.
A ciência da religião procura estudar seu objeto de forma acadêmica,
científica e principalmente neutra, não a neutralidade que imaginamos que
possa existir, mas uma neutralidade exposta por Usarski (2002 p. 12):
Se um cientista for um ateu ou um indivíduo religioso será uma opção
particular, feita na sua vida privada. Mas quando exercer sua tarefa
profissional deve controlar e disciplinar as próprias preferências
ideológicas o tanto quanto possível. Nunca se consegue isso
totalmente. Mas isso não invalida a importância do ideal da
neutralidade, da objetividade.
405
FONAPER
A neutralidade também não é total em outras áreas de
conhecimento, pois, as ideias, sejam políticas e religiosas do pesquisador,
sempre podem influenciar, entretanto, isso não nega o fato da
responsabilidade de ser o máximo possível imparcial. Para estudar o
fenômeno religioso é necessário que se pense na gama de religiões que
fazem parte da nossa sociedade, nos impactos de influências que elas
causam nos diversos setores, políticos, de saúde pública e de sociedade
em geral.
Para esquematizar o estudo deste fenômeno é necessário que haja
observação de determinadas tradições religiosas e que seja construído um
discurso racional sobre elas para que possa ser transportado para a sala
de aula com a devida linguagem. O fenômeno religioso é assim a base
para uma nova epistemologia do ensino religioso, criando conceitos
universais e um pensamento mais abrangente sobre as diversas religiões
no mundo.
As religiões criam discursos, doutrinas, rituais e criam símbolos, tudo
isso faz parte do objeto da disciplina, mas para que essa nova
epistemologia no ensino fundamental possa acontecer, o ensino religioso
precisa passar por uma revolução, começando pela formação dos
professores. A formação dos professores é um grande problema
educacional brasileiro e que está longe de ser resolvido, principalmente
dentro do ensino religioso que não possui uma lei nacional específica que
legitime uma formação adequada para este profissional. Dentro desta nova
concepção a formação adequada está dentro das licenciaturas de Ciências
da Religião.
Para o estudo do fenômeno religioso é necessário estudar os
esquemas que compõe a religião como o mito, o rito doutrina, dogmas e a
história das tradições religiosas. À luz da fenomenologia de Hurssel,
pensador que ―proporcionou condições de realizar um estudo ordenado e
sistemático do fenômeno‖ (OLIVEIRA, et al. 2007) o conhecimento
religioso das tradições religiosas e das suas nuances faz que a religião
seja vista como um fator cultural como os autores Lilian Oliveira, Sérgio
Junqueira, Luiz Alves e Ernesto Keim em sua obra Ensino Religioso no
Ensino Fundamental afirmam:
Atualmente, considera-se como marco referencial a concepção de que
o fenômeno religioso se manifesta em uma cultura. É a cultura que
406
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
marca profundamente a maneira de ser e viver do ser humano. É ela o
leitmotiv de sua maneira de perceber-se, estar e agir no mundo.
Sobre cultura podemos citar o antropólogo Roger Keesing (1998) que
elaborou um conceito de cultura a partir de duas divisões. A primeira o
autor considerava a cultura como sistema adaptativo e a segunda divisão
chamada idealista que está subdividida em três aspectos, a cultura como
sistema cognitivo, como sistema estrutural e como sistema simbólico.
Dentre estas três abordagens o sistema estrutural tem em seu destaque o
antropólogo Claude Lévi-Strauss (2003), que acredita que a cultura seja
uma teia de interações e de relacionamentos, os teóricos da corrente
estruturalista defendem a idéia que a sociedade na verdade possui um
mesmo padrão cultural, apenas a manifestação é diferente.
Sobre religião e cultura podemos dizer que uma influencia a outra
como afirmam nossos autores já citados (Oliveira; Junqueira; Alves; Keim,
2007), ―a religião manifestou-se e manifesta-se em um universo cultural,
ora influenciando a cultura, ora sendo influenciada por ela. É impossível,
pois, querer entender a religião sem remeter-se à cultura em que ela está
inserida.‖.
Eis o eixo do estudo do fenômeno religioso a partir de uma formação
adequada, no caso as Ciências da Religião. O estudo da cultura nos faz
entender o quão importante é a interação social do ser humano na
construção de religiosidades e de doutrinas, ética e na construção do
sagrado.
Mas o que ensinar em ensino religioso? A criação de doutrinas,
crenças, dogmas rituais símbolos e o próprio ethos fazem parte do
fenômeno religioso, entretanto estudar esse objeto de estudo com
neutralidade é um desafio, a luz das várias áreas de conhecimento juntas
em uma só. O estudo no ensino fundamental deste objeto deve ser através
de uma linguagem acessível à realidade do educando.
A teologia, as ciências da religião, outras áreas de conhecimento das
ciências humanas estudam o fenômeno religioso. O estudo teológico deste
fenômeno é um estudo das características da religião a partir de uma outra
religião, isso quando não se estuda a idéia de deus, ou a própria divindade
pois, existem muitas teologias, e suas diferenças são tantas quantas o
numero de religiões espalhadas no mundo, por isso falar em teologia como
um subsídio para o estudo de fenômeno religioso seria mais adequado em
uma atividade doutrinal e não educacional.
407
FONAPER
Outras áreas de conhecimento como a filosofia ou a sociologia
podem estudar o fenômeno religioso, entretanto farão uma análise a partir
de suas bases, ou seja, será apenas um estudo filosófico ou sociológico.
Em ciências da religião, o pesquisador poderá estudar o fenômeno
religioso através de uma série de visões de conhecimento, que partem
deste a história até a psicologia da religião, e por isso terá uma análise
maior sobre o fenômeno porque terá o discurso de várias áreas de
conhecimento ao seu favor.
O fenômeno religioso analisa o discurso, tanto escrito quanto oral, e
reconhece a importância desses discursos como preponderantes para as
tradições religiosas. Estes discursos regulamentam a vida religiosa do fiel
e servem de apoio para as dificuldades da vida. Como exemplo, temos a
bíblia, alcorão, tanak, a tradição oral nas religiões afro-brasileiras e
religiosidade indígena dentre outras. A invenção da escrita proporcionou a
latência do fenômeno religioso na antiguidade criando-se os textos
sagrados. Essa latência pode ser comprovada através dos primeiros
escritos, que se referia à religiosidade dos grupos.
a primeira codificação foi a dos livros sagrados, que se constituem
num primeiro esforço de organização da experiência de fé, para que
as gerações futuras tivessem acesso a esse saber e, mais importante
de tudo, para que o conhecimento fosse preservado, não se perdesse
no tempo histórico e que o seu conteúdo não sofresse grandes
alterações. (ALVES, 2009, p.133)
Os textos sagrados vão definir as tradições religiosas como
instituição, ―o texto escrito passa a ser a base dos diversos saberes que
serão produzidos no interior da tradição religiosa, tais como: a doutrina, os
ritos, a moral, a simbologia etc. (ALVES, 2009)
Por isso, conhecer os textos sagrados das tradições religiosas é
importante para o estudo do fenômeno religioso levando em consideração
que muitos fenômenos desta natureza são justificados por conta da
literatura sagrada. O professor deve conhecer as diferentes literaturas para
basear o conhecimento de outros componentes do fenômeno como a
doutrina, a transcendência e o sagrado.
O que regulamenta a doutrina religiosa é o livro sagrado, mas como
analisar esse aspecto do fenômeno religioso no ensino fundamental?
Segundo ALVES (2009), doutrina é ―o conjunto de conhecimentos que
fundamentam a tradição religiosa‖. O desenvolvimento intelectual da
408
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
humanidade caminhou junto com o desenvolvimento institucional das
religiões e com a criação da escrita as interpretações destes textos gerou a
criação das doutrinas religiosas que vão regulamentar as normas e regras
do grupo religioso, dando nascimento a mais um fenômeno religioso, o da
normatização do sagrado. A vivência religiosa fica então condicionada à
doutrina religiosa.
Apesar dos textos sagrados, da doutrina religiosa existe outro
aspecto do fenômeno que dá vida à vivência religiosa, é o rito. ―O rito é
uma linguagem em gestos, por meio do qual o homem procura expressar a
sua total entrega a deus, como ser não só espiritual, mas também
corporal‖ (ALVES, 2009).
Os ritos são importantes para ver o invisível e entrar em contato com
a divindade de determinada tradição religiosa, um contato não apenas
teórico, e sim mais vívido, mais eficaz com o que a doutrina diz. Os ritos
podem ser divididos de acordo com a função. Ritos repetitivos são os
―estão ligados aos mitos primordiais‖ (ALVES, 2009), procuram explicar a
origem de alguma coisa, chamam-se assim por repetirem os gestos e
ações em ciclos durante o ano em datas determinadas. Os ritos de
passagem são os ritos que definem a situação do ser humano dentro da
sociedade e sua mudança dentro da mesma através de gestos e ações
simbólicas.
Ainda existem os ritos religiosos que possuem a função de ligar o ser
humano à divindade de determinado grupo religioso. Os ritos agrários
fazem uma ponte entre a fertilidade da terra e a fertilidade humana, as
tradições celtas possuem esses ritos com mais afinco, e finalmente os ritos
de coroação que são os gestos, cerimônias que legitimam o poder
temporal constituído a alguém.
O rito depende muito de seu significado simbólico e por isso, muitas
vezes há muita dramaticidade e outras vezes poucos gestos simbólicos.
Algumas vezes o rito está ligado ao mito, para manter a memória de
estórias passadas sempre viva no sentimento de fé dos fiéis.
Não existe rito sem símbolo, este último ―é uma apresentação ritual
da crença, posto que sintetiza no ritual religioso uma explicação da
realidade e as regras que irão normatizar o comportamento das pessoas
no grupo.‖(ALVES, 2009 pp 39)
De acordo com o autor, os símbolos podem ser classificados:
409
FONAPER
Emblema: É uma figura visual que representa uma ideia, um ser ou
elemento moral. Ex: bandeira para pátria.
Atributo: é uma imagem que representa o todo de alguma coisa,
essa imagem deve ser uma parte do que se quer representar. Ex: asa para
companhia aérea.
Alegoria: é o figurino, ou fantasia em forma humana ou animal ou
vegetal que representa heroísmo, qualidades e defeitos. Ex: a mulher
alada que representa a vitória.
Metáfora: é um elemento simbólico que compara dois seres ou duas
situações para medir intensidade. Ex: que doce de menina.
Analogia: é uma relação entre uma coisa e um fato, ou um ser e um
fato ou entre dois fenômenos, como por exemplo, a cólera de deus, faz
relação com a cólera do homem, uma doença devastadora, ou outro
exemplo o câncer cristão, relacionando o fenômeno cristão a uma doença
que mata a humanidade transformando essa tradição, portanto em uma
doença.
Síndrome: uma prévia do que pode ser mais perturbador ou
conflitante. Ex: o movimento pentecostal cresce agora, para dominar
depois.
Parábola: uma estória com fundo de lição moral. Ex: o sermão da
figueira de Buda.
Apólogo: é uma fábula com fundo de moral com a função a passar
determinado conhecimento por meio de situações imaginárias.
Estes recursos em que o símbolo se divide são usados pelas
religiões onde denotam diversas interpretações. Elas geram eficácia nos
ritos, que consequentemente geram a eficácia da religião e sua legitimação
junto ao fiél.
Diante de todo este contexto que cerca o fenômeno religioso, existe
a criação da ética, normas e condutas que orientam uma civilização.
Segundo Alves, a ética pode ser dividida em normativa, ―que indica os
princípios da conduta correta‖, e a metaética ―que norteia a fundamentação
e a aplicação de conceitos como certo e errado, bem e mal‖ (ALVES, 2009,
p. 67). A metaética está baseada nos pensamentos de Platão e Sócrates
que pesquisaram a natureza da bondade chegando ao resultado da virtude
para orientar uma boa vida. A maior parte das sociedades vêem a ética
como sendo um conjunto de regras que possuem o intuito de viverem em
harmonia. Dentro das comunidades religiosas a ética está atrelada ao
410
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
sentimento de sagrado e a transcendência e na maioria das vezes entra
em contradição de viver em harmonia com outros grupos sociais. ALVES,
(2009), comentando Usarski diz:
as instituições religiosas racionalizadas, devido à sua força e
influencia na sociedade, tendem a produzir um discurso ético que
favoreça o equilíbrio e a estabilidade de todos... A influencia delas
reside na sua força moral e política e no acúmulo das experiências de
que são portadoras. Esse é o aspecto positivo da tradição. O aspecto
negativo é o risco do conservadorismo que afeta a tradição, tornandoa resistente às mudanças históricas.
Dentro do fenômeno religioso existe uma infinidade de códigos de
conduta ética que devem ser seguidos pelos fiéis. Entre os judeus a ética
prega a unidade humana; no cristianismo a ética leva em consideração a
bondade e o cuidado com o mundo como criação de deus; entre os hindus
a ética varia de acordo com as castas e, por isso, não existe uma
igualdade natural entre os seres humanos, cada ser evolui a partir de seu
próprio estado encarnatório; na religião afro-brasileira a ética se preocupa
com a vivência em grupo e por isso o mais importante é a relação entre as
pessoas da comunidade e sendo assim o fiel deve pensar sempre no bem
da comunidade e a ele mesmo; a ética budista se baseia nas quatro
nobres verdades para a construção da paz e justiça, e por fim a ética
islâmica está associada ao alcorão sendo este livro a orientação ética dos
fiéis para o controle dos impulsos.
Dependendo das denominações religiosas entre as tradições, a ética
de uma pode ser também a ética de outra, e sendo assim este fenômeno
religioso acaba se tornando um trânsito entre as condutas éticas com
discrepâncias doutrinais que nem sempre ajudam a promover o diálogo
entre as crenças.
O fenômeno religioso aborda todas as características analisadas e
por isso é necessário que o professor tenha o conhecimento profundo
sobre estes fenômenos e tanto outros que permeiam a religião. A
complexidade deste fenômeno vai mais além da configuração religiosa,
passa por setores da sociedade afetados por doutrinas, ritos, símbolos,
mitos e éticas religiosas, como bem podemos observar na política e até
mesmo no futebol. Entretanto, a coisa se complica quando este fenômeno
atinge os limites do público e do privado. Pelo discurso forte, incentivador e
esperançoso a religião acaba expandindo-se para setores públicos com a
411
FONAPER
missão de crescer em numero de fiéis. Entretanto esse fenômeno é mais
observado nas religiões de salvação que possuem a ideia de expansão
como vitória transcendental, e o limiar para o fundamentalismo fica muito
tênue.
O fundamentalismo não deixa de ser um fenômeno também,
provocado por interpretações da literatura sagrada, por êxtase religioso
que acabam produzindo uma visão da realidade escatológica que
emergência uma solução divina de imediato. Pedro Lima Vasconcelos, em
sua obra Fundamentalismos (2008), faz uma análise do início deste
fenômeno que também pode ser religioso dentro dos Estados Unidos no
século XIX e início do século XX. Para o autor, o fundamentalismo
protestante é um claro exemplo do que ele chama de militância. Essa
relação de fundamentalismo com a militância se dá pela verdade absoluta
e também pela dimensão escatológica como diz Vasconcelos (2008, p.
138):
Esse quadro ilustra outro componente básico dos grupos
fundamentalistas em geral: a densidade escatológica que conferem a
seus atos e a percepção do caráter dramaticamente decisivo dos
eventos presentes e do que entendem serem desvios ou corrupções
da ordem estabelecida divinamente desde sempre.
O fundamentalismo se faz ouvir e ver e utiliza de diversas formas
para que isso aconteça travando luta política e religiosa para conseguir
impor doutrinas e a própria ética, prova disso, são as bancadas
evangélicas que travam batalha contra direitos de grupos considerados
oposição do sistema religioso protestante.
O fundamentalismo como um empecilho para tratar de questões
tabus dentro da religião é também um problema para o professor em sala
de aula, pois, o que fazer com alunos que não admitem conhecimentos
considerados tabus. Há que se pensar a relação entre conhecimento e
absorção deste conhecimento como verdade, liberdade de se questionar e
aceitar, mas o importante é que se deve ter o conhecimento para que se
possa criar um pensamento sobre. Negar o conhecimento a isso é negar a
diversidade religiosa, entretanto, o professor deve saber como passar
essas informações como não sendo verdades absolutas, mas possibilidade
de reflexão e aceitação das diferenças, esse é um desafio ao professor de
ensino religioso, não demonstrar doutrinação científica, mas incentivar o
pensamento racional no educando como habilidade de superar
412
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
questionamentos de diferença religiosa evitando juízos de valores e
discriminações.
Seja na política, seja na educação o fundamentalismo é um dos
grandes desafios para se ensinar sobre o fenômeno religioso. É necessário
que o professor entenda sobre este fenômeno para lidar com ele em sala
de aula, pois, educandos, pais e muitas vezes a própria direção da escola
podem agir tal como.
O problema do que ensinar sem doutrinar no ensino religioso está
ligado também ao currículo. É necessário pensar no que ensinar sem
causar proselitismo e abordar o fenômeno religioso em seus aspectos
históricos,
psicológicos,
filosóficos,
sociológicos,
antropológicos,
geográficos e fenomenológicos. Estes aspectos refletem um fenômeno
religioso com bases nas ciências humanas, transformando a disciplina em
uma área de conhecimento tão importante quanto qualquer outra.
Apesar de analisarmos o fenômeno religioso como sendo um campo
a ser estudado pelas ciências da religião, ele se difere do fenômeno
científico pelo fato de ele ser bem mais subjetivo do que os fatos
observáveis e mensuráveis. Assim como o fenômeno artístico, o fenômeno
religioso é algo que surge intimamente nos delírios e sonhos humanos e
externa-se na institucionalização religiosa, criando fatos que em essência
são religiosos. O estudo de fenômeno religioso requer uma identificação
própria, linguagem própria algo que o defina como diferente de outras
áreas. O docente de ensino religioso deve se ater de sua própria tradição
religiosa e abrir sua mente para outras tradições, aprender a observar os
fatos religiosos a partir de mensurações racionais e não amadoras e
confessionais, caso o contrário ele estará ensinando a sua própria doutrina
para os educandos. A produção de conceitos é muito importante para se
definir o fenômeno religioso como uma área própria, sobre isso Oliveira
(2009, p. 91) afirma:
em primeiro lugar, os conceitos fazem parte da nossa linguagem, a
qual está inserida em nossa vida concreta. Nesse sentido a linguagem
religiosa é contextualizada, de modo que não age com seriedade
quem emprega as palavras de outras ciências no ensino religioso sem
preparar os alunos e sem alertá-los para o feto de que existe uma
diferença entre a compreensão das outras ciências e a compreensão
do ensino religioso. É de fundamental importância compreender que
diverge o sentido do verbo acontecer quando empregado em uma aula
de química e em uma aula de ensino religioso. Não se trata de ir
contra a ciência, mas de admitir que há diferenças entre o
413
FONAPER
conhecimento empírico-científico e o conhecimento religioso, as quais
podem ser evidenciadas quando há referência a linguagem religiosa.
Esta pode utilizar as mesmas palavras e as mesmas estruturas
gramaticais que a linguagem científica, todavia, a compreensão e a
significação são completamente diferentes.
Utilizar o fenômeno para conceituar características do próprio
fenômeno é dar identidade e estrutura independente para o docente de
ensino religioso possa abordar com mais propriedade os temas
trabalhados em sala de aula. Não significa dizer que o método científico
não seja usado no estudo do fenômeno religioso, na verdade ele é base
para este estudo, mas difere na compreensão e significado dos resultados,
sobre isso podemos interpretar o que Mondin, citado por Oliveira, nos diz
(2008, p. 140):
a experiência religiosa se diferencia de todas as outras experiências
humanas, sobretudo pelo objeto ao qual se refere; e a diferença está
essencialmente no fato de que o objeto pertence a ordem
transcendente, ultraterrena.
Para pesquisar é necessário fazer a investigação como se
acreditasse que a experiência religiosa fosse verdadeira, é vestir a pele do
fato e observá-los com olhos fieis, é sentir para descrever e analisar com a
metodologia empírico-científica. Como apreciar uma canção sem deixar-se
levar? Como contemplar uma pintura sem antes fixar a mente em suas
cores e formas? Como esculpir sem algo a se sentir? Na religião acontece
a mesma coisa, como investigar a aparição de imagens de santos sem
procurar sentir a emoção de se acreditar na imagem? É necessário que o
cientista da religião saiba separar sua fé, de sua investigação, ou então, o
resultado de sua pesquisa não estará mais pautada no método científico,
mas sim no campo teologal. Podemos resumir com o que Oliveira (2008, p.
84) preconiza:
o primeiro passo para obter uma melhor compreensão do que a
religião pode ser, é deixar de pensar que a crença religiosa é
principalmente uma questão de sustentar que certas proposições das
tradições religiosas devam ser demonstráveis e, em vez disso
começar a encará-las como modo de vida.
Sendo assim o conhecimento científico serve como a arma, mas a
forma como se a usa é diferente quando se faz a investigação, não se
corta o fenômeno com essa arma, entra-se com ela no fenômeno, ela
414
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
passa então a servir como lanterna, iluminando o fenômeno por dentro e
destrinchando-se a vivência do fenômeno, sem o destruir.
Existem muitos desafios no campo da disciplina que precisam ser
superados, a formação dos professores, a criação de currículo baseados
nas ciências da religião, o proselitismo em sala de aula do professor, a
pesquisa do fenômeno religioso em um novo paradigma e a própria
construção do conhecimento sobre a religião como fenômeno. Todos estes
desafios podem ser superados através de uma política de valorização dos
profissionais de sua formação e da tomada do governo pela disciplina,
pois, e podemos dizer que isso também é um desafio, as igrejas cristãs
sentem-se responsáveis pela disciplina, promovendo encontros, criando
currículos e formando professores, o que é pior.
Considerações Finais
Não se pode culpar a disciplina, mas sim os responsáveis pela
educação pública que se ausentam da responsabilidade sobre a
justificativa de não intervir na formação religiosa de professores e
educandos na sociedade. Eis um dos maiores desafios dentro da
disciplina, deixar de ser vista como formação religiosa. O modelo das
ciências da religião propõe uma formação que adeque o pensamento do
cidadão para viver a diversidade religiosa e que mudanças de atitudes
discriminatórias aconteçam em todas as modalidades da sociedade, o
ensino religioso possui esta força de mudança, entretanto, diante de tantos
desafios, é necessário que haja vontade de transformação, e que todos
estes desafios sejam superados.
Os problemas do ensino religioso não se resolvem com sua
exclusão, mas sim com uma nova forma de pensar esta área de
conhecimento, a exclusão da disciplina do currículo brasileiro significa que
a educação brasileira não considera a diversidade religiosa significativa na
sociedade, quando sabemos que a religião é fator determinante na política,
nos temas tabus, em todas as esferas da sociedade, na exclusão de
pessoas, ou em alguns casos na liberdade de expressão e de culto, na
mudança de costumes de uma sociedade, na própria esperança de
cidadãos que vivem na linha da pobreza (fenômeno neopentecostal da
prosperidade) e que muitas vezes resultam em fundamentalismos e acaba
acontecendo o inverso de paz entre os seres humanos. O ensino religioso
415
FONAPER
é necessário na escola pública e laica, exatamente para aprendermos a
ser laicos em determinados lugares, nos momentos certos e em outras
circunstancias expressarmos nossa religiosidade sem interferir no
pensamento religioso de outras pessoas.
Referências
USARSKI, Frank. Constituintes da Ciência da Religião. São Paulo:
Paulinas, 2006.
ALVES, Luiz. OLIVEIRA, Lilian; JUNQUEIRA, Sérgio; ALVES, Luiz; KEIM,
Ernest. Ensino Religioso no Ensino Fundamental. Curitiba: IBPEX,
2009.
KEESING, Roger M. Teorias da Cultura, Revista Anual de Antropologia.
São Paulo: p. 45 - 56, 16 mar 1998 (Artigo).
STRAUSS. L. Claude. Antropologia Estrutural. Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 2003.
VASCONCELOS. L. Pedro. Fundamentalismos. São Paulo:Paulinas,
2008.
416
ENSINO DO FATO RELIGIOSO: CONHECIMENTO PARA A
ACEITAÇÃO DO DIFERENTE
José Antonio Lages1, UMESP
Resumo
Esta comunicação apresenta os resultados parciais de uma pesquisa de doutorado sobre o
Ensino Religioso na Escola Pública, com um estudo de caso do projeto do Paraná. Dentre
os diversos modelos de ensino religioso nas escolas públicas adotados no Brasil,
destacaremos aquele que se aproxima muito do que Régis Debray chamou de ―ensino do
fato religioso‖. Que papel pedagógico exerce este modelo, tornando esta área de
conhecimento epistemologicamente possível, necessária e até indispensável no currículo
escolar? Essa parece ser a questão que deve ser enfrentada. Nossa hipótese é de que este
modelo de ensino religioso assume um papel fundamental para o reconhecimento da
diversidade e da afirmação do respeito para com o outro, principalmente frente ao
crescimento dos mais diversos fundamentalismos, contribuindo para a aceitação do
diferente, no contexto de uma educação focada na solidariedade.
Palavras-chave: Ensino do fato religioso; alteridade; aceitação do diferente; solidariedade.
Introdução
Propomo-nos nesta comunicação apresentar os resultados parciais
de uma pesquisa de doutorado sobre o ensino religioso na escola pública,
com um estudo de caso do projeto do Paraná. Iniciaremos fazendo uma
rápida resenha das vertentes ou modelos de ensino religioso adotados nas
escolas públicas do Brasil. Esta diversidade se explica pela própria
legislação, no caso a LDBEN (Lei 9394/96), que liberou aos sistemas de
ensino decisões sobre questões cruciais como objetivos, conteúdos,
avaliação e formação de professores.
Focaremos mais aquele modelo que procura ser aconfessional e não
proselitista, como transposição didática da(s) Ciência(s) da Religião para
os currículos escolares, muito próximo do que Règis Debray sugeriu para a
França, o ―ensino do fato religioso‖ em vez do ensino religioso.
Entendendo ser esta uma possibilidade ainda bastante complexa e
1
José Antonio Lages é mestre em História pela Universidade Estadual Paulista (UNESP)
e doutorando em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo
(UMESP). É membro do grupo de pesquisa Memória religiosa e vida cotidiana:
interpretações historiográficas e teológico-literárias coordenado pelo Prof. Dr. Lauri
Emilio Wirth. E-mail para contato: [email protected]
FONAPER
incipiente, no entanto, mais condizente com uma visão de Estado laico e
mediador e com uma sociedade secularizada como a nossa.
Veremos que este modelo poderá assumir um papel fundamental
para o reconhecimento da diversidade e da afirmação do respeito para
com o outro, principalmente frente ao crescimento dos mais diversos
fundamentalismos. Além disso, pretendemos demonstrar que o estudo da
religião nos ambientes escolares é necessário, não só porque a religião
pode ser o mais despercebido instrumento de sustentação das mais
diversas formas de dominação do passado, mas, principalmente, porque
ela é uma referência para as resistências a diversas formas de dominação
do presente.
O que está em jogo é o lugar do ensino religioso no âmbito público.
Qual é a utilidade dos saberes religiosos para uma sociedade
secularizada? Essa parece ser a questão que deve ser enfrentada.
Buscaremos como referenciais teóricos nesta discussão autores como
Faustino Teixeira, Cristel Hasselmann, Danilo R. Streck, Jorg Rieger,
Edgar Morin e Jung Mo Sung.
A controvérsia do Estado laico e do ensino religioso na escola
pública
O ensino religioso na escola pública tem suscitado amplo debate em
toda a sociedade brasileira, desde a Constituição de 1988, que tornou a
oferta deste componente curricular obrigatória com sua matrícula
facultativa, e sua regulamentação pela Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (LDBEN, Lei 9394/96 modificada posteriormente pela
Lei n.º 9.475/97). Podemos sintetizar este debate que envolve organismos
do Estado, mas particularmente gestores e órgãos da área de educação,
confissões religiosas e setores acadêmicos, estabelecendo três grandes
modelos para este debate: 1º) os que não admitem, em hipótese alguma, o
ensino religioso na escola pública, escudados na defesa absoluta da
laicidade do Estado; 2º) os que admitem o ensino religioso na escola
pública como área de conhecimento, privilegiando a escolarização e não
os interesses das confissões religiosas, como uma transposição didática
da(s) Ciência(s) da Religião para os currículos escolares; 3º) os que
defendem o ensino religioso confessional, utilizando as contradições da
própria lei, quando a LDBEN prevê, por exemplo, o respeito à diversidade
cultural e religiosa da sociedade brasileira com o veto a quaisquer formas
418
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
de proselitismo, mas, ao mesmo tempo, prevê também um órgão colegiado
integrado pelas confissões religiosas que deverá estabelecer os conteúdos
a serem ministrados em cada sistema de ensino.
Percebe-se que não existe hoje no Brasil um consenso em torno da
questão do ensino religioso nas escolas públicas. É um tema de extrema
complexidade, que envolve uma série de variáveis. Mas também não há
como trabalhar esta questão sem levar em conta as conquistas
republicanas do Estado laico, sobretudo a liberdade religiosa, bem como o
reconhecimento de uma afirmação cada vez mais decisiva da pluralidade e
diversidade religiosas no país. Nestas últimas décadas, o Brasil vem
passando por importantes deslocamentos no campo religioso e isso
recondiciona a visão da laicidade e, por consequência, o próprio
tratamento da questão do ensino religioso entre nós.
O debate do ensino religioso na escola pública frente à laicidade do
Estado permanece no Brasil preso a um forte viés político-jurídico. Aqueles
que são contrários a qualquer forma de ensino religioso na escola pública
justificam a sua posição na defesa radical do caráter laico do Estado
previsto na Constituição (art. 19) e em vários de seus dispositivos
relacionados à dignidade da pessoa humana (art. 1º, 3º e 4º), à igualdade
de todos perante a lei (art. 5º) e ao dever da família, da sociedade e do
Estado em relação às crianças e adolescentes (art. 227). A preocupação é
com a liberdade de consciência, de crença e de culto. (FISCHMANN, 2008
& DINIZ, 2010).
Assim, a discussão permanece no âmbito da lei e da ordem jurídica,
envolvendo interesses do Estado e das confessionalidades, e não abrange
a contextualização do ensino religioso na escola pública no âmbito
propriamente educacional e pedagógico, dentro de um processo de
escolarização voltado para os estudos de cultura e de uma formação para
a cidadania.
Ressalte-se que a proposta do ensino religioso como transposição
didática da (s) Ciência (s) da Religião é apenas uma possibilidade
colocada, que precisa de uma ampla discussão que propomos aqui apenas
iniciar. Nossa hipótese é que é possível o ensino religioso na escola
pública, como área de conhecimento curricular comprometido com a
formação geral do educando, inclusive com a construção de valores para a
sua cidadania, sem caráter confessional e sem objetivos proselitistas, com
419
FONAPER
respeito à laicidade do Estado, à diversidade cultural e à pluralidade
religiosa da sociedade brasileira.
Admitimos que é possível o estudo das tradições religiosas, e mais
que isso, o estudo do que se baseiam todas elas – ou seja a dimensão
transcendental da vida humana - como um área de conhecimento
configurada em um componente curricular no contexto do Estado laico. Os
que se colocam contra esta alternativa partem de um conceito fechado de
laicidade, entendida apenas como separação entre Estado e Igreja, sem
levar em conta a construção social/histórica deste conceito refletindo as
realidades próprias de cada sociedade nacional. Percebe-se que quase
sempre se apegam a um conceito militante, geralmente inspirado no caso
francês, que Demétrio Velasco chamou de laicidade de exclusão por
substituição (In DA COSTA, 2006: 16), mas que passa atualmente por
ampla revisão na própria França.
Se a religião é uma das falas ausentes (ou silenciadas) no discurso
acadêmico, na escola também o é, sem nunca ter sido. Sabemos que
todos os envolvidos no processo docente transmitem, conscientemente ou
não, ideias, valores e princípios aos educandos em todas as disciplinas.
Embutidas neste imaginário encontram-se as idéias religiosas ou contra
quaisquer religiões. Afinal, se a ciência não é neutra, a educação também
não o é.
Este debate possui algumas nuances interessantes. As duas
vertentes acadêmicas que reconhecem a laicidade do Estado brasileiro e
não admitem o ensino religioso confessional na escola pública não
dialogam entre si e este é um dos fatores que tem aberto grande espaço
para a vertente do ensino religioso confessional, como no caso dos
estados do Rio de Janeiro e Bahia.
Em nível de encontros, seminários, simpósios ou congressos
acadêmicos, não se observam os representantes destas duas vertentes
participando de mesas ou debates em defesa de suas posições. Apenas
um dos lados se faz presente (o que talvez se justifique exatamente pelo
pressuposto do silêncio/fala ausente da religião no âmbito acadêmico).
Existe, na verdade, um diálogo de surdos. Uma vertente procede como se
a outra não existisse. Não somente as palavras, como já dizia Bourdieu
(2009), mas também o silêncio tem muito a dizer.
De um lado, uma das vertentes, muito forte em nível das Pontifícias
Universidades Católicas; de outro, acadêmicos de algumas universidades
420
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
públicas e representantes do campo jurídico. A segunda tenta justificar
veladamente a posição da primeira afirmando que esta está ligada a
instituições da Igreja Católica. Camuflada nesta crítica pode estar a idéia
de que ―o religioso não pode estudar a religião‖ pela exigência de uma
neutralidade científica. Percebe-se, nas entrelinhas, certa tentativa de
colocar no mesmo barco a posição dos acadêmicos das PUCs e dos
defensores do ensino confessional.
Em alguns momentos em que parecem fazer certa concessão ao
ensino religioso não confessional na escola pública, os contrários a ele
admitem o estudo da religião dentro do sistema cultural como uma história
das religiões, Mas indagamos, por que não a sociologia das religiões? A
antropologia das religiões? A psicologia das religiões? Talvez se
aproximando do projeto do estudo da religião na transversalidade dos
conteúdos escolares, como alguns sistemas escolares encaminharam. Ou,
ás vezes, imagina o ensino religioso na escola pública reduzido ao ensino
da ética e da cidadania, função que deve estar presente em todas as
disciplinas, sendo, portanto, desnecessária uma disciplina específica para
isso, com o nome de ensino religioso.
O convencimento sobre a conveniência do ensino religioso na escola
pública se dá, pois, no âmbito geral de duas grandes questões. A primeira
é a da laicidade do ensino que exclui os conteúdos religiosos como
ameaça aos princípios fundantes do Estado Moderno. A segunda é a
fundamentação epistemológica desse ensino como área de conhecimento.
O convencimento sobre a primeira questão, sem levar em conta a
segunda, acaba por abrir espaço para as confissões religiosas assumirem
a condução do ensino religioso, uma vez que são detentoras, segundo a
própria concepção dada pelo Estado, dos conhecimentos religiosos (e até
a LDBEN consagra esta concepção quando passa para representantes de
confissões religiosas reunidos em um conselho a responsabilidade de
definição de conteúdos).
Até agora todos os esforços realizados para se construir uma prática
coerente dessa disciplina girou em torno da questão da confessionalidade
religiosa e da laicidade do Estado. É possível hoje pensar um modelo que
supere este impasse em nome da autonomia dos estudos de religião e da
própria educação? O convencimento que deve ser feito é, assim,
fundamentalmente de ordem epistemológica, ou seja, a demonstração do
estudo da religião como área de conhecimento que pode gozar de
421
FONAPER
autonomia teórica e metodológica, com todo o respeito aos sistemas laicos
de ensino, sem nenhum prejuízo de suas laicidades, muito pelo contrário, a
favor delas.
Há de se destacar ainda a função teleológica dos saberes religiosas
no âmbito escolar. Ensino religioso na escola pública para quê? Que papel
ele teria no currículo escolar? Todas as disciplinas são ensinadas nas
escolas com finalidades pedagógicas e possuem, portanto, crenças
embutidas em seus programas. A educação não é neutra, pois tem uma
função axiológica com base em princípios e valores a serem assimilados
pelos educandos. A educação funda-se numa teleologia: num tipo de
pessoa e de sociedade que se deve e se quer construir. Este é um objetivo
de toda a educação. A composição curricular é o meio a ser percorrido
para tal finalidade.
É consenso que a escola deve ensinar o conhecimento acumulado
pela humanidade no que diz respeito a todas as áreas da natureza, da
técnica e das humanidades, incluindo as mais diversas expressões da
cultura, como as linguagens, as artes. Mas não pode colocar a religião
como objeto de estudo? Justamente a religião que é a matriz de todas as
culturas e civilizações? Mesmo com a sua previsão legal e reconhecendo a
religião como um fenômeno que, em vez de seu desaparecimento previsto
pelos defensores da ―morte de Deus‖, pelo contrário, ocupa um lugar
público cada vez mais reconhecido, principalmente na América Latina,
África e Ásia?
A questão da laicidade permanece como o pano de fundo de toda a
controvérsia. Por isso, aprofundar nesta questão é essencial. Acreditamos
que a discussão do Estado laico frente ao ensino religioso na escola
pública é a porta de entrada do problema. E ela vem sendo feita por alguns
círculos acadêmicos em torno de Sueli Carneiro e Anna Cândida da Cunha
Ferraz, da USP, Débora Diniz, da UNB, Roseli Fischmann, da UMESP,
Daniel Sarmento, da UERJ, Luiz Antonio Cunha, da UFF e de muitos
outros.
Mas quando ela avança nas críticas de certas experiências
desenvolvidas em alguns sistemas estaduais de ensino, sua crítica enfoca
particularmente o que há de notório e flagrante descumprimento da lei e de
grave ofensa aos direitos fundamentais, no caso os estados do Rio de
Janeiro e Bahia, com o seu projeto de ensino religioso confessional.
Aquelas críticas passam ao largo de outras experiências como a do
422
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
FONAPER, do Paraná, de Santa Catarina e, de certa forma, do Rio
Grande do Sul, com perspectivas bem diferentes. Ou se discute estas
experiências, elas acabam sendo mal compreendidas e/ou mal
explicitadas.
Não há como desconhecer o fenômeno religioso na sociedade, os
enormes deslocamentos internos deste campo, sua presença e
intervenção cada vez maior no espaço público, independente de qualquer
regulamentação legal. Isso interessa às ciências sociais e, de modo
especial, às ciências da religião. Há de interessar também ao aprendizado
escolar, inclusive das escolas públicas, não somente no sentido de
informar sobre aquele fenômeno, mas de ter consciência de seu papel na
sociedade, de ter opinião sobre ele, de se posicionar como cidadão crítico
e consciente. O Estado laico, portanto, tem algo a dizer sobre os saberes
religiosos na escola pública.
Uma função teleológica para o ensino do fato religioso: uma proposta
em construção
No início da segunda parte deste trabalho, podemos lembrar aqui
uma discussão muito comum nos meios acadêmicos em torno do estudo
das religiões. Trata-se da proposta de alguns estudiosos da necessidade
de certo ―ateísmo metodológico‖ para se garantir a neutralidade do estudo
da religião do ponto de vista científico, em paralelo com o argumento de
que a religião deve estar ausente da escola pública, pois, também pelas
mesmas razões, a religião não caberia num ambiente de estudo das
diversas ciências. Diante do ―horror do invisível‖, esse procedimento
metodológico acaba justificando não uma perspectiva de neutralidade
objetiva, mas de ―militância antirreligiosa‖.
Não é preciso lembrar que esta visão pode ser encontrada não
apenas nos meios acadêmicos, mas em vários outros segmentos da
sociedade. Em alguns partidos de esquerda ou em tendências deles, em
alguns movimentos sociais e sindicatos, podemos encontrar uma postura
flagrantemente impermeável a qualquer crença religiosa e principalmente à
sua presença no âmbito público, como nas escolas. Talvez seja um
resquício de uma tradição marxista ortodoxa escudada no entendimento
tradicional da religião como ―ópio do povo‖.
Mas o interessante que em vários âmbitos políticos e acadêmicos
reconhecidamente distantes da questão religiosa, seja pela sua postura
423
FONAPER
filosoficamente ateia e/ou agnóstica, seja pela sua clara origem ideológica
marxista, começa-se a esboçar outra visão sobre o ensino religioso na
escola pública. Régis Debray, por exemplo, nos traz uma posição bastante
surpreendente, vinda de quem vem. Interessante relatório seu, de 2002,
propôs o ensino ―do fato religioso‖ ou ―do religioso‖ (l‘enseignement du
religieux) em vez do ensino religioso na escola pública francesa, buscando
uma aproximação ―descritiva, factual e nocional‖ das religiões em sua
pluralidade, sem privilégios e exclusividades. A preocupação de Debray,
ao fazer esta proposta, era com a ―incultura religiosa‖ dos estudantes das
escolas públicas de seu país, decorrente principalmente da ruptura das
identidades religiosas herdadas o que dificulta, para ele, a formação geral
dos estudantes.2
Sua proposta se aproxima do projeto do sistema estadual de ensino
do estado de São Paulo que nunca foi plenamente executado. O seu
encaminhamento não se daria através de uma disciplina específica, mas
através da ampliação do âmbito das disciplinas já existentes como
Filosofia, História, Geografia e Línguas. Os professores receberiam uma
preparação específica para ampliar a sua competência no manejo dos
assuntos relacionados à religião. Não há nesta proposta nenhuma ruptura
com a laicidade do Estado, na visão de Faustino Teixeira:
A inserção do estudo ‗do religioso‘ não significaria romper com a
tradição da laicidade francesa, mas passar de ‗uma laicidade de
incompetência‘ (o religioso, por construção, não nos interessa) a uma
‗laicidade de inteligência‘ é nosso dever compreendê-lo. (In SENA,
2007: 72-73).
Faustino Teixeira defende a possibilidade do acesso à reflexão
apropriada sobre o religioso na escola pública, levando-se em conta a
importância do fator religião na sociedade brasileira e de sua relevância
para a compreensão da nossa própria cultura. Segundo ele, ―as ciências
da religião constituem um canal importante para possibilitar este exercício
2
Sempre existiram crises de transmissão que hoje assumem, no entanto, uma mudança
profunda de natureza. Hoje elas são lacunas que representam verdadeiras rupturas
culturais que atingem a identidade social, a relação com o mundo e a capacidade de
comunicação dos indivíduos. Observa-se um remanejamento global das referências
coletivas, rupturas da memória (as sociedades atuais são cada vez menos sociedades
de memória e cada vez mais sociedades do imediatez), reorganização de valores que
questionam os próprios fundamentos dos laços sociais. E a religião, por mais que não
seja percebida, está no centro de todo este processo que é social, religioso, mas,
sobretudo, existencial.
424
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
reflexivo: de aperfeiçoamento da compreensão do religioso como ‗objeto
de cultura‘, ou fenômeno de cultura‖. (In SENA, 2007: 73)
As tradições religiosas são portadoras de um ―rico patrimônio
espiritual‖ que para Teixeira justificam o seu estudo no âmbito escolar
como área de conhecimento, mas, além disso, também um exercício de
maior aproximação existencial, um contato mais estreito com elas. Teixeira
avança ainda mais na concepção do ensino ―do religioso‖ em relação a
Régis Debray, afirmando:
E para isso, faz-se necessário também o aperfeiçoamento do ‗tato
religioso‘, que favorece a superação de uma certa mentalidade que
resiste em adentrar-se em esferas particulares da experiência
humana, limitando-se a reduzir o engajamento vivido pelo outro a uma
mera ‗rapsódia de observações exteriores e frias‘. Não há como
compreender o contexto histórico das religiões, desconectando-o da
‗espiritualidade‘ que o anima. (In SENA, 2007: 75).
Para Cristel Hasselmann (2006), diferentemente da teologia, a
ciência da religião trabalha de maneira meta-confessional e independente.
Isso significa que ela não toma partido a favor de uma determinada
religião, e suas reivindicações de verdade e suas pretensões
soteriológicas, nem de um conjunto delas que tenha a mesma matriz,
numa visão ecumênica. Seu objetivo é o entendimento de uma religião
abordada, mas não o consentimento com ela, o que seria um objetivo
teológico. Também é insignificante a convicção pessoal de um cientista da
religião sobre a existência ou não de Deus ou dos deuses. Pode-se
compará-lo com um tradutor simultâneo ou um guia turístico, com a
diferença de que ele desempenha o papel de um mediador entre diferentes
religiões. Por tudo isso, o docente devidamente preparado para o ensino
religioso, na visão de Hasselmann (2006), deve ser o cientista da religião,
e não o teólogo.
Danilo R. Streck3 defende a escolarização do conhecimento do
fenômeno religioso como instrumento fundamental para o reconhecimento
da diversidade e de afirmação do respeito para com o outro. Este respeito
3
Danilo R. Streck é doutor em Fundamentos Filosóficos da Educação pela The State
University of New Jersey, Estados Unidos (1977) e professor titular da Universidade do
Vale do Rio dos Sinos, em São Leopoldo (RS), Brasil. Streck defende uma modalidade
de Ensino Religioso na escola pública que não é propriamente a que nós defendemos,
mas que tem uma larga tradição em alguns círculos ecumênicos, principalmente no Rio
Grande do Sul e que constitui hoje uma das referências principais nos encontros
acadêmicos sobre o tema.
425
FONAPER
seria mais que tolerância, seria, na verdade, a aceitação do diferente, o
conhecimento para a convivência, numa profunda relação de alteridade ―na
esperança de contribuir para uma educação que ajude as pessoas a
sentirem o mundo como sua casa (oikos) comum, em constante processo
de construção para que todos e todas nela tenham lugar.‖ (STRECK, 1998:
39).
Streck (1998) aponta a necessidade do ensino religioso na escola
pública na formação de crianças e adolescentes, em particular para fazer
frente ao crescimento dos mais diversos fundamentalismos4, inclusive
religiosos. Teixeira acrescenta ainda que ele é também necessário para o
―aperfeiçoamento do olhar e da escuta do mundo e da alteridade e o
respeito à sua dignidade, a percepção da riqueza e do valor de um mundo
plural e diversificado e a recuperação da força espiritual das religiões.‖ (In
SENA, 2007: 75-76).
Alguns pensadores que se incluem nos Subaltern Studies Groups
nos oferecem aportes interessantes nesta discussão. Jorg Rieger5 (2008),
por exemplo, afirma que o estudo da religião é fundamental, não só porque
ela foi a primeira sustentação das mais diversas formas de dominação
econômica, social, cultural e política do colonialismo moderno, mas
também porque ela é uma referência para as resistências locais a estas e
a outras formas de dominação contemporâneas relacionadas a questões
de raça, gênero, opções sexuais, religiosas, etc. Assim, não há como se
pensar em um projeto político-pedagógico sem considerar o imaginário
religioso de todos os envolvidos com o projeto pedagógico da escola
pública.
Sabemos que todos os impérios coloniais modernos foram
justificados religiosamente. Por este motivo o estudo crítico da religião é
crucial para investigações pós-coloniais. Rieger (2008) afirma que Walter
4
5
Existem fortes correlações existentes entre a ―volta do diabo‖ promovida por alguns
grupos fundamentalistas e as diversas modalidades de demonização do outro através
das quais se expressa em outras formas, não mais racionais, mas socialmente mais
perigosas, o sentimento de não se ter nenhuma responsabilidade pessoal no mundo
como ele é, nenhuma capacidade de agir sobre o seu futuro (a culpa é do diabo...).
Jorg Rieger é professor de Teologia na Perkins School of Theology (SMU). Ele aborda
geralmente em seu trabalho a relação entre política, a economia e a nossa atual crise
de uma perspectiva bíblica e teológica. Por mais de duas décadas Jorg Rieger se
esforça para reunir a teologia e as lutas por justiça e libertação que marcam nossa
época. Seu trabalho enfatiza a importância da teologia para a vida pública, utilizando
ferramentas de estudos culturais, teoria crítica, e estudos religiosos, e refletindo sobre o
abuso de poder em política e economia.
426
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Mignolo foi muito feliz quando apontou que o cristianismo se tornou o
primeiro desenho global do sistema mundial moderno/colonial, depois da
bem-sucedida expulsão dos judeus e árabes da Espanha e da conquista
das Américas. Para Rieger:
Como tal, o cristianismo tornou-se uma base ideológica importante
sobre a qual as estruturas coloniais de poder podiam ser construídas
Uma religião que identificou Deus que está ao lado dos poderes
coloniais, sejam eles os monarcas da Espanha e de Portugal, sejam
os corpos governantes mais amplamente constituídos, sejam as
tentativas dos Estados Unidos de ―civilizar‖ a América Latina póscolonial, deixou marcas para valer. Neste contexto, deixar de
considerar o elemento religioso seria fechar os olhos para um dos
motores do colonialismo. (RIEGER, 2008: 96).
Sabemos que desconsiderar o religioso leva a perder não somente a
oportunidade de retrabalhar uma parte importante da história colonial e
pós-colonial. E mais: nos leva a perder também um elemento importante
da resistência que continua em tempos pós-coloniais e chega até à
contemporaneidade. Em muitos casos, os saberes religiosos e a intimidade
com eles fornecem sementes de tal resistência.
Muitas pessoas nas margens de nosso atual império levantam
questões religiosas e são motivadas por elas – um fato que em algum grau
é reconhecido também nos Subaltern Studies Groups. Em muitos lugares
comunidades de fé têm se envolvido em resistir a estruturas coloniais,
conduzindo as suas vidas de modo alternativo. Rieger conclui que
―enquanto a história do colonialismo olha o cristianismo mais de perto, a
história da resistência exige um horizonte religioso muito mais amplo, que
inclui interesse por outras religiões e diálogo inter-religioso‖. (RIEGER,
2008: 101).
Assim, também numa perspectiva de formação para a tomada de
uma consciência e de uma atitude que Rieger chama de pós-colonial, o
ensino ―do fato religioso‖ na escola pública tem um papel a cumprir. Um
papel de preparar os alunos, a partir do estudo da(s) religião(ões), para
uma vida de resistência frente a toda onda de formas desumanizadoras da
vida, típicas da civilização pós-moderna em que vivemos.
Sabemos que aceitar o diferente não é apenas tolerá-lo. Mas
sabemos também que aceitar o diferente vai muito além de uma postura
neutra e indiferente. Ela exige uma profunda relação de alteridade que nos
leva a tomar a posição ativa de solidariedade. Resta saber, na linha de
427
FONAPER
raciocínio que adotamos até aqui, se estudar os saberes religiosos na
escola contribui para uma formação para a solidariedade? Acreditamos
que sim. Resistir às estruturas de dominação neocoloniais é uma postura
que exigirá um compromisso de solidariedade com os dominados ou
excluídos.
Já ouvimos falar muito que a escola deve preparar para a vida.
Entendemos que preparar para a vida signifique encontrar um sentido
último para ela. A educação escolar deve se pautar pela busca deste
sentido e isto supõe o discernimento entre os muitos mitos que povoam a
sociedade contemporânea, alguns que nos levam a uma postura de vida
humanizadora e solidária, outros, de vida desumanizadora e egoísta.
Este sentido último para a vida não pode prescindir da solidariedade
como um imperativo ético, como um valor, um movimento de ir ao encontro
do outro, reconhecendo-se no outro sua própria dignidade humana numa
profunda relação de alteridade. Solidariedade com o próximo e com os
excluídos e vítimas da lógica sacrificial da idolatria do mercado (GIRARD,
1990). A educação para a solidariedade seria o caminho para ―reencantar
a vida, ou seja, dar-lhe um sentido último, alcançar aquela situação em que
se conclui que a vida vale a pena de ser vivida‖ (SUNG, 2002),
independentemente de qualquer crença religiosa.
No contexto do projeto político-pedagógico da escola, todas as
disciplinas estão comprometidas com este objetivo. No entanto, os saberes
religiosos ocupam uma posição de excelência. A experiência religiosa faz
parte do acontecimento humano, com os fatos e os sinais que a
expressam e por isso tem grande importância para o conhecimento teórico
e para a tomada de uma posição diante da vida. Por isso, ela tem uma
grande contribuição a dar para uma educação para a solidariedade, na
busca de um sentido último para a vida.
Educar para a solidariedade é uma tarefa e um objetivo de todas as
disciplinas escolares, mas, uma tarefa tão especial como esta, precisa de
uma disciplina específica que sistematize as contribuições feitas por outras
e desenvolva temas e experiências que precisam de uma atenção
especial.
Morin, falando da necessidade de uma ciência antropossocial religada,
que concebesse a humanidade em sua unidade antropológica e em
suas dimensões individuais e culturais, reconhece que essa religação
ainda está fora do alcance das ciências e que por isso é importante
que o ensino de cada uma delas fosse orientada para a condição
428
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
humana. Isso inclui as ciências naturais, pois a condição humana é,
ao mesmo tempo, físico-químico-biológico-antropológico-socialsimbólica. (SUNG, 2006: 41-42).
Edgar Morin (2000) afirma que os saberes sobre os mitos e as
religiões seriam orientados para o destino mítico-religioso do ser humano.
De fato, as religiões, mitos e ideologias devem ser considerados em sua
ascendência sobre as mentes humanas, e não mais como
‗superestruturas‘. Morin (2000) chama essa disciplina ou ciência de
noologia e afirma que ela está ainda por ser construída. Mas, diríamos nós,
os trabalhos dessa área, que já existem, pelo menos no campo dos
saberes religiosos, precisam ser mais conhecidos e desenvolvidos. De
qualquer forma, uma nova ciência não submetida à totalitária racionalidade
ocidental.
O estudo escolar dos saberes religiosos pode desde já resgatar o
encanto por um sentido último da vida como quer Jung (2006). Para isso,
aquele discernimento dos mitos que povoam o nosso tempo há de passar
necessariamente pela dessacralização do mercado e pela crítica à idolatria
sacrificial do capitalismo. Esta será a porta de entrada para se posicionar a
favor de uma sociedade mais humana e solidária. Assim também será
possível reconhecer-se o papel do estudo das religiões no âmbito escolar
em uma sociedade marcada pela diversidade cultural, pluralidade religiosa
e receptiva à laicidade do Estado.
Considerações finais
Duas ações diretas de inconstitucionalidade (ADINs) sobre o ensino
religioso na escola pública estão para ser julgadas pelo Supremo Tribunal
Federal: a de nº 4439, focada na questão do Acordo Brasil-Vaticano, já
aprovado pelo Congresso (o que tem força constitucional) e a de nº 3268
sobre o ensino religioso confessional instituído nas escolas públicas do
estado do Rio de Janeiro. Vê-se, então, que se trata de uma questão
política relevante e que traz várias outras implicações para a sociedade
brasileira.
Mas a questão fundamental é: há necessidade de uma disciplina
tradicionalmente chamada de ensino religioso na escola pública? Este
trabalho pretendeu, na verdade, iniciar uma discussão que busque dar
uma resposta, ainda que parcial e provisória, a esta questão. Entendemos
429
FONAPER
que um projeto de ensino religioso que busque realizar a leitura
pedagógica da(s) Ciência(s) da Religião para a escola pública, como
pretende o Sistema Estadual de Ensino do Paraná, poderá ter grande
relevância para a educação. Ao finalizar este trabalho, podemos ressaltar
algumas preocupações e alguns questionamentos que permanecem e nos
obrigam a colocar esta modalidade de ensino religioso na escola pública
na agenda da sociedade.
O ensino religioso, como foi aqui colocado, contribui ou não para a
formação do ser humano por inteiro? Sabemos que a religiosidade faz
parte intrínseca da humanidade e que a educação parte do humano como
razão fundante, se insere permanentemente em suas estratégias e a ele
se destina em todos os seus objetivos. Por isso, há necessidade de tornar
mais clara a relação entre a educação e as religiões e indagar que papel
poderá exercer o ensino do religioso na formação dos educandos ao lado
das demais disciplinas da escola.
Esta disciplina na escola pública contribui ou não para a convivência
social? Sabemos que a escola prepara a pessoa para o convívio social e a
cidadania que a escola busca formar inclui informações teóricometodológicas, sensibilização artística, formação política e preparação
para a vida em sociedade. O ensino religioso poderá contribuir com a
formação da cidadania nesses diversos aspectos?
As tradições religiosas são portadoras de éticas que orientam e
disciplinam a vida de seus adeptos na convivência interna do grupo e na
vida social. Então, podemos também perguntar: o ensino religioso poderá
contribuir na explicitação de consensos éticos a partir das tradições
religiosas?
No dizer de Paulo Freire, a leitura de textos e a leitura da realidade
devem ser simultâneas para que, de fato, formem o cidadão crítico e
autônomo. Assim como se educam os olhares racionais, estéticos e éticos
nas diversas disciplinas, o olhar simbólico sobre a realidade pode receber
também receber um aporte do ensino religioso?
E por fim, o ensino religioso pode ter algum papel na integração do
conhecimento, já que os estudos atuais de epistemologia têm ressaltado a
fragmentação das ciências em suas diversas áreas, de forma a perder a
sua visão de conjunto? Os currículos escolares refletem também esta
fragmentação. A construção de currículos interdisciplinares é desejável,
mas ainda está longe de ser alcançada. O ensino religioso tem condições
430
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
de contribuir com a necessária integração dos conhecimentos pela sua
natureza e objetivos? Ele tem condições de contribuir para a superação
desta fragmentação do conhecimento, da desumanização da ciência e da
construção de uma ética para todos os campos de conhecimento?
Todos estes pontos sobre o ensino religioso são pautas da educação
geral do cidadão. A educação laica para a cidadania não pode ignorar as
religiões, pela sua forte presença e função social. É preciso decodificar
criticamente as representações e práticas religiosas em nome da
convivência sempre mais construtiva entre as pessoas e grupos, educar
para a convivência social das diversidades confessionais, assim como tirar
das tradições religiosas valores que contribuam com a vida humana na sua
subsistência e convivência.
Referências
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431
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TEIXEIRA, Faustino (org.). A(s) Ciência(s) da Religião no Brasil: afirmação
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repensando o religioso entre lo público y lo privado en el siglo XXI.
Montevidéo: CLAEH/PUERTAS, 2006.
432
POR UM ENSINO RELIGIOSO NÃO RELIGIOSO: DESAFIOS NO
CONTEXTO ESCOLAR
Daniela Crusaro (UNOESC)1
Josiane Crusaro (ASPERSC)2
Lindamir Teresinha Bianchi Crusaro (UNIGRAN)3
Resumo:
Ensino Religioso: área do conhecimento, que visa assegurar o respeito à diversidade
cultural religiosa brasileira pautando-se no estudo do Fenômeno Religioso e vedando-se
quaisquer formas de proselitismo (Cf. art. 33 LDB/1996). Diante dessa nova proposta
vislumbramos inúmeros avanços significativos que foram tecidos/elaborados para a
identidade do componente Ensino Religioso, mas, ao mesmo tempo, identificamos que
diante da insuficiência de profissionais habilitados para atuar no espaço escolar bem como
o imaginário de que Ensino Religioso é aula de religião e/ou valores humanos, muito se tem
a fazer no contexto atual para que as crianças brasileiras tenham a garantia de um Ensino
Religioso não religioso. Por isso, nos dispomos a relatar a prática pedagógica utilizada nos
Anos Iniciais do Ensino Fundamental em uma escola municipal de Faxinal dos
Guedes/Santa Catarina, em que as aulas de Ensino Religioso buscam propiciar a partir de
diálogos, interações e mediações, a compreensão sobre a pluralidade cultural religiosa
existente e importância das práticas alteritárias para a (con)vivência entre e na diversidade.
Palavras-chave: Ensino Religioso; prática pedagógica; diversidade religiosa.
Desafios para a garantia da aprendizagem
O professor enquanto educador e mediador do processo ensinoaprendizagem é sujeito que precisa constantemente estudar, ler,
escrever/registrar, aperfeiçoar-se, participar de encontros e eventos que
dialoguem sobre a práxis pedagógica e desafios atuais para a garantia de
1
2
3
Acadêmica do Curso de Direito da Universidade do Oeste de Santa Catarina –
UNOESC Xanxerê. E-mail: [email protected].
Graduação no Curso Ciências da Religião - licenciatura em Ensino Religioso pela
Unochapecó (2012) e História pela Unoesc - Xanxerê. Professora de Ensino Religioso
da Rede Pública Estadual de Santa Catarina e Vice-secretária da Associação dos
Professores de Ensino Religioso do Estado de Santa Catarina – ASPERSC, Gestão
2011/2013. E-mail: [email protected].
Acadêmica do Curso de Pedagogia - UNIGRAN. Professora do Ensino
Fundamental/Séries Iniciais da Rede Municipal de Ensino de Faxinal dos Guedes/SC. Email: [email protected].
FONAPER
uma educação com qualidade. Destacamos que é importante compreender
e entender que, nos dias atuais,
o trabalho do professor não consiste simplesmente em transmitir
informações ou conhecimentos, mas em apresentá-los sob a forma de
problemas a resolver, situando-os num contexto e colocando-os em
perspectiva de modo que o aluno possa estabelecer a ligação entre a
sua solução e outras interrogações mais abrangentes (DELORS:
2001, p.150).
Sabemos que vislumbrando os espaços escolares, identificaremos
inúmeras tendências e teorias pedagógicas, porém entendemos que
práticas permeadas pelo autoritarismo e submissão não propiciam/
favorecem o contato, o diálogo, as socializações entre os estudantes e
professores, por isso, a necessidade/urgência do professor educador,
utilizando da autonomia e das interações sociais no processo pedagógico.
Perrenoud (1999, p. 82), destaca que:
a maioria dos docentes foi formada por uma escola centrada nos
conhecimentos e sente-se a vontade nesse modelo. Sua cultura e sua
relação com o saber foram forjadas dessa maneira, e eles
aproveitaram tal sistema, pois seguiram uma longa escolaridade e
foram aprovados nos exames com sucesso.
Conforme a pedagoga e psicopedagoga Barbosa (2013, on-line) ―a
solução, com certeza, não é voltar à palmatória, ao uso dos grilhões, nem
mesmo das varas; precisamos pensar sobre esse aspecto da questão em
todas as instâncias da sociedade, e também na escola‖ de maneira que a
mesma venha ser espaço de aprendizagens, mas também de acolhida,
vivência e respeito para e com o outro.
Por isso, ressaltamos que o atual e futuro educador precisam de
competências e habilidades que desmistifiquem a prática do domínio e
submissão de corpos, favorecendo a integração de todos os estudantes,
não importando sua bagagem de aprendizados, mas entendendo que
somos seres em construção, sempre abertos para o novo/desconhecido.
Diante dessa perspectiva, em que o professor educador é
democrático e permite a comunicação, a escuta e o diálogo entre sujeitos como fonte de aprendizados - Weffort (1997) destaca que o ambiente
escolar, assim, se tornará favorável e propício à aprendizagem,
demonstrando e corroborando sua importância enquanto espaço social.
Defendendo essa ideia de educador mediador, Delors contribui ao afirmar:
434
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
a grande força dos professores reside no exemplo que dão,
manifestando sua curiosidade e sua abertura de espírito, e mostrandose prontos a sujeitar as suas hipóteses à prova dos fatos e até
reconhecer os próprios erros (2001, p. 150).
Por sua vez, o autor e educador Rubem Alves (1994, p. 12) nos faz
refletir sobre a vitalidade da educação e (re)lembra que, infelizmente, a
mesma ―[...] fascinada pelo conhecimento do mundo, esqueceu-se de que
sua vocação é despertar o potencial único que jaz adormecido em cada
estudante‖, estando o educador incumbido de resgatar e proporcionar o
prazer pelo aprender.
Alves segue ainda relatando que ―o prazer é uma experiência
qualitativa. Não pode ser medido. Não há receitas para suas repetições.
Cada vez é única, irrepetível‖, no processo ensino-aprendizagem; daí o
desafio constante de aproximar saber e sabor, aprendizagem e
encantamento, conhecimento e alegria (1999, p. 125).
E diante desse olhar, não podemos esquecer que embora cada
professor educador contribua na autonomia, aprendizagem e criticidade do
sujeito estudante, a escola precisa, urgentemente, ser ambiente/local:
[...] de felicidade, de satisfação, de diálogo, onde possamos de fato
desejar estar. Um lugar de conflitos, sim, mas tratados como
contradições, fluxos e refluxos. Lugar de movimento, aprendizagem,
trocas, de vida, de axé (energia vital) (ROCHA; TRINDADE: 2006, p.
55).
Para os gregos o termo escola foi concebido como local/espaço de
conhecimentos, de aventura, de liberdade para a construção de
aprendizagens e saberes. No contexto atual pensar nesse viés, requer
(re)pensar em estratégias e metodologias que propiciem e favoreçam a
inserção, e ao mesmo tempo, a permanência dos estudantes na escola,
para que ambos também atuem como protagonistas no processo ensinoaprendizagem.
Por isso, enfatizamos aqui a tendência pedagógica crítico-social
que ―entende a escola como mediação entre o individual e o social [...]‖
numa perspectiva de assimilação e mediação dos conteúdos, onde o ser
mais experiente auxilia o menos experiente e o educador utiliza do diálogo
na relação com o estudante (FERNANDES: 2012, p. 20). De acordo com
Silva (2009, p. 249),
435
FONAPER
há muitos espaços e lugares, para a construção da dignidade em
nossa sociedade, porém, muitos deles não são aproveitados, ou
simplesmente ignorados como espaços ou lugares que promovem e
veiculam dignidade ao ser humano.
E as unidades escolares enquanto instituições/locais/ambientes de
aprendizagens, saberes e (con)vivência, podem/devem favorecer esse
encontro, pois são consideradas um ―[...] um fértil espaço para criar
relações de abertura e convívio respeitoso‖ (WITT; PONICK: 2008, p. 9).
Para o autor e pedagogo Martins Filho, faz-se vital também:
[...] pensar em um currículo para a diversidade que dialogue com os
vários campos disciplinares do conhecimento [...] em um sentido, de
expressar e ser promotor dos direitos sociais humanos [...] (2011, p.
78-79).
Diante disso, podemos expressar o desejo da escola trabalhar na
perspectiva da inter/trans/multidisciplinaridade elaborando e construindo
conhecimentos, tornando a prática pedagógica significativa, favorecendo o
convívio e a aprendizagem entre estudantes e educadores, tornando-os
sujeitos protagonistas, autônomos e críticos do espaço que habitam. Para
as autoras Veiga e Viana (2010, p.32), a partir desse enfoque, o professor
educador precisa preparar seus estudantes para
enfrentar as contradições sociais da conjuntura atual, [...] por meio de
práticas inovadoras e atraentes, [...] que ofereça e provoque no aluno
o desejo de adquirir e construir o conhecimento para responder aos
desafios da sociedade.
É preciso querer/desejar estar na escola, daí a necessidade da
mesma estar promovendo uma dinâmica de aprendizados e saberes,
proporcionando a acolhida às diversidades e ―[...] o entrelaçamento das
relações afetivas entre os atores [...]‖ que compõe tal ambiente (SOUZA;
CARDOSO: 2008, p. 94).
Por fim, reafirmamos que ―[...] a educação tem como objetivo a
formação de um cidadão‖, sujeito pleno para o exercício da cidadania, mas
também para o convívio social, bem como sensibilidade e responsabilidade
para as práticas alteritárias, (re)inventando o espaço que habita, tornandoo ambiente de coexistência (REYES: 2009, p. 235).
436
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Ensino Religioso no cenário educacional: percursos para a garantia
da diversidade religiosa
Pensar o Ensino Religioso enquanto área do conhecimento da
educação básica (Cf. Resolução 04/2010 da CNE/CEB) desde o limiar da
história brasileira, propõe refletir as diferentes concepções e
entendimentos que o mesmo recebeu no processo e contexto educacional.
De acordo com Bortoleto e Meneghetti (2010, p. 66),
quando a temática do ER é abordada no conjunto de ações escolares
formais, há uma questão de fundo que está presente e que merece
atenção especial. Trata-se da distinção entre Ensino Religioso e
Catequese, isto é, trata-se de considerar as naturezas distintas de um
mesmo problema.
No Brasil, destacamos que o regime do Padroado (união entre Igreja
e Estado), que perdurou até 1889, definia a religião católica como oficial,
por isso desde a vinda dos padres jesuítas se educava de acordo com os
princípios cristãos, promovendo práticas de catequização e utilizando-se
do proselitismo. Assim, ressaltamos que
[...] o ensino religioso traz profundas marcas, por conta de um
imaginário formado durante quase cinco séculos e sustentado pelas
relações de poder e de saber das partes interessadas (CNBB: 2007, p.
26).
Na educação, a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDBEN nº 4024/61) enfatizava o termo Ensino Religioso, porém,
a prática pedagógica estava voltada ao caráter doutrinário, ao ensino da
tradição católica romana, ou seja, ao ensino da religião (FONAPER: 2000,
Caderno 1). A partir de 1970, com a nova LDBEN nº 5692/71, um novo
direcionamento foi concebido ao componente, substituindo-se o enfoque
catequético para o caráter ecumênico vivenciado as mudanças sociais e
políticas no período (CECCHETTI; THOMÉ: 2007).
Mas, avanços significativos - que proporcionassem novas lentes e
olhares para com o Ensino Religioso - ocorreriam somente a partir do final
do século XX através da LDBEN nº 9394/96 – com alteração do artigo 33
pela Lei nº 9475/97 que trouxe uma compreensão diferente acerca do
componente e seu objeto de estudo.
Os autores Bortoleto e Meneghetti (2010, p.71) destacam que ―[...] a
Lei nº 9475/97, em seu art. 33 da LDBEN nº 9394/96, corrigindo um
437
FONAPER
equívoco de compreensão dos termos confessional e interconfessional‖, foi
de suma importância, pois proporcionou assegurar o respeito à diversidade
cultural religiosa e vedar quaisquer formas de proselitismo.
Pozzer, Cecchetti e Riske-Koch vêm a confirmar que diante desse
novo enfoque, ―[...] criaram-se oportunidades de sistematizar o Ensino
Religioso como disciplina escolar que não seja doutrinação religiosa nem
se confunda com o ensino de uma ou mais religiões‖ (2009, p. 281).
E, nessa nova compreensão, Holanda confirma a relevância do
Ensino Religioso nas unidades escolares, pois:
respeitar a diversidade cultural religiosa, que transita no cotidiano
escolar, é permitir que todos os educandos tenham acesso ao
conjunto de conhecimentos religiosos, que integram o substrato das
culturas assumindo o compromisso de uma escola que proporcione o
respeito e a tolerância religiosa (2010, p. 60).
O FONAPER (2009, p. 35) enfatiza que ―todo o conhecimento
humano torna-se patrimônio da humanidade‖, assim o conhecimento
religioso também é, daí a necessidade deste estar disponível no espaço
escolar, proporcionando a partir das socializações o conhecimento e
respeito para com as escolhas, principalmente religiosas, de cada sujeito.
Diante das significativas mudanças que foram/estão sendo tecidas,
registramos que o Ensino Religioso, enquanto componente curricular,
propõe ―[...] desafiar educandos e educadores para diferenciados olhares e
leituras na perspectiva da construção de um outro mundo, melhor e
possível [...]‖ diante do exercício da acolhida, respeito e vivência perante a
diversidade predominante (DANELICZEN: 2007, p.239).
Assim, professores educadores, continuemos na luta incessante para
a garantia do componente Ensino Religioso - área do conhecimento - nos
espaços escolares, visto que, abordado nesse novo viés, permite a
reflexão sobre a prática da alteridade, da efetivação dos direitos humanos,
do respeito e (con)vivência para com os seres que habitam o planeta
Terra.
Ensino Religioso e atividades de aprendizagem:
relato de experiências pedagógicas
Com base nos Parâmetros Curriculares Nacionais de Ensino
Religioso - PCNER de 1997, o Ensino Religioso é caracterizado como
componente curricular, considerado parte integrante da formação básica
438
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
do cidadão e veiculado a um conjunto de conhecimentos que buscam o
entendimento do fenômeno religioso e a compreensão das diferentes
formas de exprimir o transcendente.
O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, precisa ser administrado
nos horários normais das escolas e enquanto componente possui a
―função de garantir que todos os educandos tenham a possibilidade de
estabelecer diálogo‖ no intuito de disponibilizar e oportunizar o acesso ao
conhecimento onde este se dá através das pesquisas, estudos,
socializações, relatos, comparações e interações (FONAPER: 2009, p. 45).
Conforme as educadoras Oleniki e Daldegan (2003, p.29),
ao assumir o Ensino Religioso pela via do conhecimento, os
conteúdos deverão proporcionar o diálogo e a participação dos
educandos, por meio de um procedimento que gera a atitude de
alteridade em relação ao conhecimento religioso pessoal e o
entendimento do outro, contribuindo para que o educando possa
desenvolver-se sem preconceito e torne-se um cidadão que promova
a paz.
Diante desse olhar exposto pelas autoras, relataremos a prática
pedagógica utilizada no segundo ano (2º ano) dos Anos Iniciais – Ensino
Fundamental na Escola Municipal Santa Terezinha na cidade de Faxinal
dos Guedes/Santa Catarina. Fundada no ano de 1995, a mesma está
situada na Rua Presidente Dutra, número 22, centro e integra a Rede
Municipal de Ensino contando com 480 estudantes provenientes do centro,
bairros e interior (SANTA TEREZINHA, 2013).
Todos os professores educadores que atuam na unidade escolar são
habilitados, 95% são efetivos e os demais ocupam caráter temporário
(ACT). A direção e coordenação pedagógica são elencados/nomeados
através de acordos partidários políticos, mas identificamos que o espaço
escolar é permeado pelo bom convívio entre o grupo que a compõe.
Entendemos que devido à carência de profissionais habilitados na
área Ensino Religioso, ausência de materiais adequados nos espaços
escolares e, também, o entendimento que o componente foi recebendo no
decorrer do processo histórico, não raras às vezes, a aula acaba sendo
ministrada numa lógica de valores humanos e religiosos calcados numa
única tradição religiosa.
Embora saibamos que não há número suficiente de profissionais
habilitados nessa área, destacamos a importância dos cursos de formação
439
FONAPER
continuada – presencial e a distância; compreendemos que os mesmos
não suprirão todas as defasagens e dificuldades encontradas para
ministrar o componente, mas entendemos que permitirá aos professores
educadores novos olhares para com esta área da educação básica.
Frisamos ainda que o Ensino Religioso, bem como as demais
disciplinas que constituem área do conhecimento e integram os currículos
escolares, devem favorecer abertura à pluralidade cultural, permitindo-se
uma ―[...] pedagogia da diversidade e do respeito às diferenças‖ que
constituem e integram os seres vivos (ROCHA; TRINDADE: 2006, p.62).
Assim, no principiar do ano letivo, nas aulas de Ensino Religioso,
propusemos aos estudantes o projeto Nosso planeta é um presente! que
teve/tem inúmeros objetivos, mas em especial, a compreensão sobre o
cuidado e respeito para com a vida humana bem como com a natureza e
demais seres que integram este habitat.
Primeiramente confeccionamos um círculo e convidamos os
estudantes para auxiliar na pintura, tornando-o multicores, representando a
beleza que faz parte do universo. Foi maravilhoso! Várias mãos, cores,
toques, olhares, sorrisos, concentrações, atenções e registros. Ao término,
expomos a representação em um mural para darmos sequência ao
trabalho proposto.
Mas, o planeta não é vazio... Ele é representando pela diversidade
de pessoas! Assim, realizamos a atividade Meu/minha amigo(a) secreto(a)
é, que consistiu em registrar o nome num papel para que depois pudessem
ser distribuídos entre os estudantes. Assim, após cada um(a) retirar um
papel, ambos tiveram a incumbência ilustrar seu/sua amigo(a) secreto(a)
para depois ser revelado a turma.
Conforme relembra Silva (2007, p. 251) ―ir em direção, ao encontro
do Outro, percebendo-o face a face [...]‖ é uma tarefa que nos fazer
(re)conhecer, aprender e conviver com este outro/diferente, que faz parte
da nossa vida, entendendo que é a partir dele que nos tornamos pessoas,
pois não conseguimos (sobre)viver sozinhos. Por isso, foi tão bonito o
momento em que os estudantes foram apresentando suas ilustrações e
dialogando sobre as representações. Sem preconceitos e indiferenças
fomos entendendo que cada um(a) é diferente, único, singular.
Também aproveitamos no desenvolver do projeto para dialogar sobre
as diferenças físicas, econômicas, sociais, culturais, bem como as etnias,
religiões, ideias, gostos, escolhas que fazem parte da vida das pessoas. E,
440
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
buscando conhecer o que é do outro, principalmente no que compete a
escolha religiosa, cada estudante foi convidado a registrar em uma tarja
algo de bom que sua tradição religiosa ensina.
Todos os estudantes da turma declararam-se cristãos, - católicos e
evangélicos - e assim, anotaram a palavra no papel em branco. Quanta
coisa bonita se aprendeu! Cada estudante apresentou seu trabalho final e
aos poucos foram concluindo que não importa qual é a denominação
religiosa, pois todas ensinam a prática do bem, da vivência, do amor, do
perdão, do diálogo e da amizade.
Mas então, porque tanto ódio, guerras, (pré)conceito e intolerância?
Os estudantes foram instigados a pensar sobre isso e registrar em seu
caderno o motivo de tantas desavenças na humanidade. Apontaram que
dentre os fatores estavam o ―achismo‖, a falta de respeito, a ignorância,
pois o homem se considera melhor que seu semelhante quando de fato
não é.
No limiar do bimestre, pensamos nos demais seres vivos que
integram o planeta. Assim, contamos a história O reino das borboletas
amar-elas que abordava o tema preconceito; dialogamos sobre o contexto
atual bem como os desafios para um planeta diferente e melhor, onde
cada qual deve fazer sua parte. Ao término, realizamos a dobradura da
borboleta e cada qual coloriu representando a diversidade.
Posteriormente, fomos expondo os trabalhos ao lado do planeta que
ia ficando cada vez mais belo e diferente. Abordamos o tema Meio
Ambiente, interligando também as demais disciplinas que compunham a
grade escolar, analisando que ―a missão do ser humano não é estar sobre
as coisas e outros seres vivos, dominando-as, mas ficar ao seu lado,
cuidando deles, pois ele é parte responsável da imensa comunidade
terrenal e cósmica (ALMEIDA; ALMEIDA: 2007, p. 258).
Entendendo que a natureza é sagrada e que precisamos/devemos
cuidá-la, pois nossa vida depende da mesma, os estudantes trouxeram
copinhos descartáveis de iogurte para a sala de aula. Após seleção de
diversas imagens das pessoas que compõe nosso planeta, os estudantes
foram colando-as nos copos e ao redor passando papel verde.
Juntos, confeccionamos uma grande árvore entendendo que somos
nós que temos o poder de escolher qual futuro deixaremos para as
próximas gerações. Foi um momento impar e significativo, pois cada
estudante foi dando toques especiais para o resultado final; proporcionou
441
FONAPER
também o (re)pensar e a (re)flexão sobre nossas práticas cotidianas. Por
isso, o mural permanece na nossa escola, inacabado, porque depende de
nós qual o percurso a ser construído.
Considerações finais
Poder sorrir, encantar-se, emocionar-se, sonhar, acreditar... Só quem
é feliz sabe o que é felicidade! Por isso, lembramos os bons momentos
que vivemos, aprendemos e construímos. Juntos, unidos, distantes, mas
interligados pela mente, pelo desejo de aprender.
Só quem vive essa sensação sabe explicar o quão importante é ter a
garantia de um Ensino Religioso não religioso no espaço escolar, que
provoque para o contato, convívio, diálogo, escuta e respeito entre as
diferentes culturas que constituem nosso planeta.
Um Ensino Religioso que nos propunha refletir também sobre o
cuidado com a natureza, espaço sagrado/vital para nossa vivência/
existência que apela para a urgência das práticas alteritárias, da atenção e
responsabilidade para com os seres vivos.
Poder vislumbrar horizontes, olhar a partir de diferentes perspectivas,
caminhar novos percursos... Desafios esses que nos tornam sujeitos
humanos/cidadãos e nos sensibilizam para a vivência na diversidade que é
imensa e embeleza o planeta Terra. Portanto lembremos: As sementes de
esperança e mudança já estão lançadas! Estejamos unidos para, em
breve, colhermos os bons resultados!!
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445
ALTERIDADE E DIVERSIDADE CULTURAL RELIGIOSA:
REFLEXÕES SOBRE O SER HUMANO
Marcely Carnieletto Gazoni1
Leonel Piovezana2
Resumo:
O trabalho tem por objetivo apresentar algumas reflexões e atividades sobre a alteridade e
diversidade cultural religiosa do ser humano. Ao trabalhar culturas, tradições religiosas,
reflexões de alteridade na disciplina de Ensino Religioso no Ensino Fundamental de uma
escola pública do município de Chapecó-SC, oportunizamos aos educandos o
reconhecimento e o respeito às diversidades individuais no ambiente escolar e na
sociedade. Ao direcionarmos nosso olhar para os sujeitos em formação observamos a
existência de vários estudos que apontam para a inclusão social e a valorização dos
indivíduos nas diversas disciplinas do currículo escolar. Ademais, procuramos estabelecer
pensamentos relevantes para a melhor compreensão da diversidade religiosa e cultural
existente no Brasil, destacando a inclusão social que está em evidencia nos dias atuais e
em todas as camadas da sociedade que abrange. Não haveria exagero em se afirmar que,
a religiosidade é plural e diversificada, e esta se apresenta nas matrizes religiosas
estudadas em sala de aula pelo professor de Ensino Religioso. Cabendo ao mesmo evitar o
proselitismo e possibilitar através dos estudos sobre a religiosidade brasileira que os
educandos possam se reconhecer como um ser único e diferente, para que o mesmo faça
tal reconhecimento em relação ao outro. Apresentamos assim, alguns elementos da cultura
e tradição religiosa pluralista brasileira. Através da atividade desenvolvida com os
educandos em sala de aula com o conceito essencial: Ser humano, Alteridade e
diversidade cultural religiosa, com o título: Eu sou eu! Que Legal!, obtêm-se uma
experiência única e satisfatória quando os educandos assimilam e compreendem a
alteridade, a coexistência, a inclusão e o (re)conhecimento da diversidade brasileira que
manifesta-se através da religiosidade das diferentes matrizes religiosas que trazem em seu
bojo os diferentes fenômenos religiosos que enriquecem a cultura brasileira.
Palavras-chave: Culturas, Tradições Religiosidade, Alteridade, Diversidade.
1
2
Graduada (Bacharel) em Teologia pela UNIASSELVI; Licenciada em Ciências da
Religião pela UNOCHAPECÓ; Acadêmica do 7º período de Licenciatura plena em
História pela UNOCHAPECÓ; Pós – Graduanda Especialização Lato Sensu em
Educação em Direitos Humanos e Diversidades: Uma abordagem Interdisciplinar.
Professora da Rede Pública de Santa Catarina, voluntária na rede colaborativa de
Ensino Religioso e de Cursos de formação continuada do Ensino Religioso para
professores da Educação Básica, pela UNOCHAPECÓ.
Professor Orientador. Doutor em Desenvolvimento Regional e coordenador do curso de
Ciências da Religião da Unochapecó.
FONAPER
Alteridade e Diversidade Cultural
Não haveria exagero em se afirmar que na disciplina do Ensino
Religioso temos a possibilidade de trabalhar com a coexistência e a
alteridade, direcionando um olhar para o outro como ser humano diferente
que traz em seu bojo toda uma cultura e tradição de vivência diferente da
nossa. Sendo assim, não somos todos iguais, pois temos modos diferentes
de ver e de viver a vida, nossas crenças, costumes, vestimentas, dialeto e
visões de mundo nos diferenciam e nos identificam como seres humanos
únicos, diante de uma sociedade pluralista em seus modos de vida em
relação ao outro. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais do
Ensino Religioso:
O ser humano constitui-se num ser em relação. Na busca de
sobreviver e dar significação para sua existência ao longo da história,
desenvolve as mais variadas formas de relacionamento com a
natureza, com a sociedade e com o Transcendente, na tentativa de
superação da sua provisoriedade, limitação, ou seja, sua finalidade.
Dilema que o desafia de forma marcante diante da complexidade da
técnica, da industrialização, da urbanização, do racionalismo, da
secularização: Quem sou? De onde vim? Para onde vou? Perante
essas indagações, o ser humano desenvolve conhecimentos que lhe
possibilitam interferir no meio e em si próprio. (PCNs, 2009, p. 31)
Assim o ser humano, tem em si uma busca constante de
identificação dentro da sociedade na qual o mesmo está inserido. A
identificação e afirmação de ser alguém que tem valor muitas vezes leva-o
a desvalorizar o outro como ser humano, colocando em primeiro lugar os
bens materiais, na afirmação de que o Eu tem mais valor pelo que possui
do que pela vida que possui, ocorrendo assim uma negação de valores
éticos, morais, espirituais, e religiosos, negando assim a própria cultura e
tradição, de si mesmo e do outro. Com olhares nos bens materiais
ocorrendo uma inversão de valores e de identidade enquanto ser humano.
Desse modo, a ação humana consiste em tornar a Transcendência
sua companheira de todas as etapas de aventura como origem de
projetos, enquanto desejo e utopia. A recusa à Transcendência é
trágica para o ser humano, pois o torna resignado em sua
mediocridade. (PCNs,2009, p. 32)
Trabalhar O Eu e o Outro é necessário para que novos valores sejam
integrados na vivência do educando em sala de aula e na sociedade no
448
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
qual o mesmo está inserido, desta forma quando olhamos o lado espiritual,
valorizamos também o lado ético/moral, que não está incluído nos bens
materiais. Ter um olhar de sensibilidade com relação ao outro é
literalmente arrancar do meu Eu interior o egoísmo de que o mundo não
gira somente em torno de nós mesmos. Mas existe um colorido de valores
e significados que podem mudar o mundo, quando notados e valorizados
com respeito e dignidade no qual foram concebidos pela humanidade
conforme suas culturas e tradições que abarcam também os fenômenos
religiosos.
O Ensino Religioso necessita cultivar a reverência, ressaltando pela
alteridade que todos são irmãos. Só então a sociedade irá se
conscientizando de que atingirá seus objetivos desarmando o espírito
e se empenhando, com determinação, pelo entendimento mútuo.
Nessa perspectiva, o Ensino Religioso é uma reflexão crítica sobre a
práxis que estabelece significados, já que a dimensão religiosa passa
a ser compreendida como compromisso histórico diante da vida e do
Transcendente. E contribui para o estabelecimento de novas relações
do ser humano com a natureza a partir do progresso da ciência e da
técnica. (PCN, 2009, p. 33)
A atividade objetiva assim reconhecer-se como pessoa única e
repleta de possibilidades, situada em um mundo que pode ser descoberto
e compreendido. Aprender a lidar com os sentimentos e compreender que
ser pessoa é amar, ser amada e ter o seu espaço numa sociedade plural,
que traz em seu bojo um mundo de novidades no qual podemos
desabrochar e resplandecer para a vida, bem como sentir que o perfume
da flor que exala em torno de nós também pode ser do outro, quando
temos a sensibilidade de notá-lo com sua bagagem de experiência, que
nos ajuda a desenvolver nossa capacidade de refletir sobre o Outro.
Ao observarmos as mudanças paradigmáticas no cenário da
educação vemos a necessidade do reconhecimento e o respeito às
diversidades individuais dentro do ambiente escolar. Ao direcionarmos
nosso olhar para os educandos como sujeitos em formação de
conhecimento científico e ―profissionalizante‖ preparação para a vida,
observamos a existência de vários estudos que apontam para a inclusão
social e a valorização dos mesmos nas diversas disciplinas do currículo
escolar.
No Brasil, essa mudança de postura pedagógica tem estado voltada
para uma educação inclusiva que atenda a todos sem distinção, deste
449
FONAPER
modo o Ensino Religioso tem por objetivo e finalidade a inclusão social e
cultural das diferentes crenças religiosas que estão presentes em todo o
âmbito nacional, de uma forma geral as culturas religiosas tem sua história
e seus adeptos que estão presentes em toda a sociedade brasileira.
Desde modo, o art. 33 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional nº 9.394/96, alterado pela Lei n. 9475/97 esclarece que o ―Ensino
Religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica
do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas
de Ensino Fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural
religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo‖.
Sendo assim, o espaço escolar, deve permitir as interações entre os
educandos e as suas diferentes culturas dentre as quais sua religião, como
forma de conhecimento e respeito praticando a alteridade.
Entende-se também que a Escola é o espaço de construção de
conhecimentos e principalmente de socialização dos conhecimentos
historicamente produzidos e acumulados. Como todo o conhecimento
humano é sempre patrimônio da humanidade, o conhecimento
religioso deve também estar disponível a todos os que a ele queiram
ter acesso. A Escola, por sua natureza histórica, tem uma dupla
função: trabalhar com os conhecimentos humanos sistematizados,
historicamente produzidos e acumulados, e criar novos
conhecimentos. (PCNs, 2009 p.34).
Nesse contexto, pensamos que o Ensino Religioso, como uma das
disciplinas do currículo escolar contribui para desmistificar o preconceito à
diversidade, através do respeito pelo diferente que são as diversas
religiões com seus costumes e rituais que nos trazem vivências e
experiências diversas para a sala de aula.
Assim, o Ensino Religioso tem por objetivo aguçar a capacidade de
respeitar o diferente que se apresenta nas diversas formas de cultuar um
transcendente com muitos nomes e significados diferentes para cada
cultura religiosa, que se fazem presentes tanto na escola, como na
comunidade e nas diferentes culturas étnicas do povo brasileiro.
O papel da escola tem sido árduo nos dias atuais, ao passo que o
mundo caminha cada vez mais para um desenvolvimento econômico e
tecnológico, o ser humano caminha cada vez mais para uma vida de
correria e desmotivação desenfreada.
A busca por uma vida melhor traz uma agitação cada vez maior, o
capitalismo encontra-se na sociedade atual, o anseio por uma vida melhor
450
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
e com mais conforto tem tomado o tempo e a atenção dos pais para com
seus filhos, que estão sendo educados por jogos eletrônicos de todas as
formas - o problema é que estes jogos eletrônicos, em sua maioria, vêm
instigando a violência, a criminalidade, o preconceito e uma vida
desregrada, com poucos objetivos e sensibilidade para com o Outro,
tornando nossas crianças e jovens em futuros adultos egoístas que não
buscam um relacionamento pessoal com o Outro, pois o sistema de
informação na qual vivemos hoje tem levado nossas crianças a um
relacionamento virtual e sem contato pessoal, logo é difícil que a criança
consiga envolver-se com o Outro de uma forma saudável, onde se possa
identificar o Outro como um ser que tem seus valores morais/éticos,
costumes e tradições religiosas diferentes da nossa, mas que tem sentido
de vida para o mesmo.
Assim, a concepção de mundo é a maneira como cada ser humano
compreende o mundo. A concepção de mundo assume o papel de
acolher ou rejeitar as respostas que se enquadram ou não na
compreensão que se tem do mundo. A tradição religiosa, a política, a
ideologia se apresentam como estruturantes da concepção de mundo.
Em algumas pessoas, a concepção de mundo se apresenta com muita
rigidez e inflexibilidade, noutras, mais aberta, e sem critérios de
julgamento. Em determinados momentos, a tradição religiosa aparece
como determinante da estrutura da concepção de mundo, noutros,
aparece a ideologia, a política ou a tradição e o contexto sociocultural.
(PCNs, 2009, p. 39)
Neste ínterim, em que se encontra a sociedade atual, a escola em
sua totalidade vem sofrendo mudanças e desfoco em seu papel de ensinar
aos educandos na apropriação dos conhecimentos científicos. Este papel
passou de ensinar para educar filhos de pais ausentes com seus
compromissos paternos. O Ensino Religioso busca em suas práticas
pedagógicas, construir uma educação voltada para a alteridade, buscando
entender e compreender o Ser Humano, como um ser único e diferente,
mas que demonstra seus sentimentos de relacionamentos com o Outro,
ainda que este seja diferente de seus costumes, valores sociais ou
familiares.
Portanto, a escola é um espaço onde os diferentes se encontram e,
ao mesmo tempo podem ser acolhidos, respeitados e dialogados para um
entendimento e conhecimento da diversidade cultural, na qual todos educandos, professores e sociedade - estão inseridos. Desta forma o
Ensino Religioso é essencial, pois este pode trabalhar as diversas
451
FONAPER
questões humanas na esfera histórica, antropológica e sócio-culturais.
Buscando um reconhecimento de identidades dentro do espaço escolar,
trabalhar o diferente situar o educando no mundo de hoje é importante
para que o mesmo possa desenvolver-se como um ser humano capaz de
inserir-se na sociedade com integridade e cidadania, na prática do respeito
e coexistência como experiências únicas que podem direcionar suas
ideologias políticas, éticas, morais e religiosas.
O Ensino Religioso é essencial interdisciplinar. Requer atividades
interativas que proporcionem não só pesquisa rigorosa, reelaboração
de dados, produção de formas literárias e artísticas do conhecimento
adquirido e reflexão, como também experiências significativas na
educação integral, pois nenhuma disciplina como o Ensino Religioso
lida com as questões humanas universais. Estas, por sua vez,
refletidas e dialogadas, podem iluminar questões particulares e
coletivas e se transformar em construção da sabedoria de vida, que
leva à cidadania e ao protagonismo na humanização e na
transformação da sociedade (CARNIATO, 2002 p.10).
Assim o trabalho realizado em uma das escolas estaduais de ensino
fundamental e médio da cidade de Chapecó teve uma observação prévia
onde se percebeu que os educandos são respeitosos com os colegas e
professora, mas agitados, ansiosos, elétricos e com muita disposição e
energia para aprender e relacionar-se com o Outro, porém, imaturos ainda
nesta percepção, pois a pré-disposição em valorizar mais o ter do que ser
acentua-se em determinados momentos, logo se buscou uma forma de
trabalho que pudéssemos amadurecer melhor as questões da reflexão do
ser humano através da alteridade e do mundo de diversidade no qual os
mesmos estão inseridos. Assim, a problemática Eu sou eu! Que legal!
Contribuirá para que reflitam sobre o Outro e o Eu, valorizar o ser e não
somente o ter, o trabalho com os educandos foi dividido em duas etapas e
o mesmo nos possibilitou uma experiência única diante de um mundo de
diversidade que a escola nos apresenta, a cada dia, a cada momento,
trabalhar a inocência e muni-la de instrumentos que promovam a paz, a
igualdade, a fraternidade, e o diálogo inter-religioso e cultural é uma
abertura para um mundo melhor e menos egoísta, levar os educandos a
um relacionamento pessoal na busca da observação do Outro como ele é
e de nos percebermos como somos, fará com que nossas crianças sejam
adultos sensíveis.
452
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Assim o trabalho desenvolveu-se na primeira etapa de uma forma
diferenciada, começando pela acolhida dos educandos com a música
―Segredo da felicidade‖, onde buscamos proporcionar aos mesmos um
momento para que eles ouvissem a música como forma de ―quebra gelo‖
entre educandos e professores para que pudéssemos juntos, estabelecer
um vínculo de relação em um momento de descontração e alegria
proporcionado pela música.
A temática trabalhada com os educandos ―EU SOU EU! QUE
LEGAL!‖, foi desenvolvida através da história ―O patinho feio‖, a leitura do
texto foi essencial para que os educandos fizessem um reconhecimento do
diferente, do excluído, do mais forte, do mais fraco, do belo, do feio, e da
forma como nós vemos o mundo e o outro, com seus costumes e tradições
religiosas, bem como vestimenta, culinária, dialeto, ideologia e posição
política. A dinâmica de reconstruir a história com as crianças fazendo sons
e movimentos da fazenda, da estrada, da lagoa. Por exemplo, imitar a
família de patos em que o pequeno cisne nasceu, imitar outros animais da
fazenda, assobiar e balançar o corpo ao som do vento, lutar contra a
tempestade, procurar proteger-se do frio, etc, levou-os a um momento de
alegria e diversão, marcante por assim dizendo, pois fez diferença na aula
marcando-os com a questão da inclusão social pelos olhos julgadores de
uma sociedade com padrões de beleza, de físico, de culturas e costumes
diferenciados dos padrões europeus estabelecidos desde a colonização do
Brasil.
As atividades foram sendo desenvolvidas conforme os educandos
assimilavam a temática, quando propomos que cada educando
desenhasse um patinho conforme seu gosto, de forma que possam ser
coloridos e diferentes um do outro e logo após compartilhassem com os
colegas, foi marcante, pois cada um liberou-se em momentos de risos e
alegrias por ver que cada um tem uma forma e um pensamento de cor e
modelo de pato, assim, começamos a trabalhar a inclusão e as diferentes
formas de tradições religiosas. Ao colar os patinhos no painel da
diversidade onde fora desenhado o lago da diversidade, cada educando
pode visualizar melhor as diferenças entre os próprios desenhos coloridos
que eles fizeram, logo ao verem o lago com todos os patinhos diferentes
eles mesmos começaram a falar dos diferentes tipos de patos, uns
grandes outros pequenos, cada um com sua cor, enfim o diálogo entre os
educandos foi notório, percebeu-se que os mesmos viram as diferenças
453
FONAPER
nos desenhos, porém salientamos que apesar das diferenças entre eles
todos eram patos.
Logo após o diálogo, foram coladas palavras de diferentes
significados, tais como: feio, bonito, preto, branco, bondade, maldade,
amor, ódio, paz, guerra, pequeno, grande, triste e alegre. E salientamos
que no mundo onde vivemos, essas diferenças existem e, o que, para um
é feio, para o outro, pode ser bonito e, assim com todas as demais
palavras. Logo que os educandos perceberam as palavras que estimulam
a guerra, o ódio e o preconceito perguntaram por que elas estavam no
lago, e com a explicação de que no mundo existem tais ações humanas,
os educandos tiveram a concepção de que as mesmas não deveriam fazer
parte do mundo na qual nós vivemos então as mesmas foram riscadas
como forma de protesto e indignação, pois a agressividade e o negativismo
não deveriam fazer parte do nosso mundo de inclusão e reflexão sobre a
alteridade e diversidade cultural.
Com os educandos entendendo sobre as questões da alteridade da
diversidade e da inclusão social trabalhamos com eles a dinâmica - A
dança das cadeiras: organizamos as cadeiras em círculos, três a menos do
que o número de crianças. Ao som de uma música, eles dançaram ao
redor do círculo, ao parar a música, todos disputaram uma cadeira. Os três
que ficaram de fora saíram da brincadeira e assim sucessivamente até que
restaram apenas três crianças.
Ao passo que as crianças iam saindo da brincadeira as mesmas
receberam um canetão para que eles escrevessem o nome em cartazes,
estes continham um desenho de carinhas de sentimentos, para que
pudessem expressar os sentimentos no ato da exclusão da brincadeira,
essas carinhas expressavam seus sentimentos em forma de desenho em
semblantes de alegre, triste, enraivecido, temeroso ou sereno. Após a
brincadeira concluída, abriu-se um momento de diálogo para que cada
criança explicasse o motivo do sentimento que a mesma escreveu seu
nome no semblante dos sentimentos. Todos puderam expressar seus
sentimentos, alguns com exaltação por terem sidos excluídos, outros
entristecidos e os que ficaram indiferentes puderam colocar suas
sugestões com relação à brincadeira, o momento foi tenso para algumas
crianças, pois a sensação de perda para alguns não foi agradável, o
sentimento de fracasso de derrota instigou o lado mais sombrio de
algumas crianças, estas expuseram vários motivos de sua perda, bem
454
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
como, dizer que o colega o empurrou derrubando-o da cadeira, de que o
colega não o respeitara e que não foi justo o resultado, este momento foi o
mais difícil com os educandos, pois a rivalidade acentuou-se em forma de
racismo, exclusão e brutalidade, bem como os que não se importaram com
os resultados dizendo que tudo não passava de uma brincadeira, e que
como o patinho feio os mesmos não deveriam estar brigando e sim
brincando.
Assim, a dinâmica das cadeiras foi refeita novamente como forma de
inclusão, os educandos que ficaram, colocaram três cadeiras na roda e
eles convidaram outros três colegas para que entrassem na brincadeira e,
estes três educandos convidados, foram convidando outros três e assim
por diante, até que todos estavam novamente na brincadeira. Com o final
da brincadeira refeita, o diálogo foi retomado, e foi impossível deixar de
perguntar o porquê, apesar de cada um ter uma cadeira para se assentar
os mesmos estavam ainda empurrando, correndo, tentando achar uma
cadeira. Os educandos não souberam responder a não ser que eles não
queriam ficar de fora da brincadeira, observou-se que mesmo que tivesse
cadeiras de sobra eles inconscientemente continuariam a brigar pelas
cadeiras, pois, a questão da disputa, da sensação de derrota, da exclusão
está bem presente na sociedade inclusive nas crianças de tenra idade.
Assim colocamos a musica ―Olhe eu Aqui‖ para que os mesmos ao
ouvirem pudessem sentir-se importantes, como eles são e lhes foi dito que
não havia motivos para agressividade e sentimentos de exclusão, pois,
todos, mesmo sendo diferentes, têm lugar e espaço no mundo para que
todos possam expressar sua cultura.
Assim, trabalhamos até um segundo momento, pois, ao trabalhar a
ideia de inclusão social, deixamos bem saliente as diferenças e as
diversidades existentes no mundo e no meio social em que vivemos,
trabalhamos a questão dos sentimentos dos educandos, relacionando com
a história do Patinho Feio e a dança das cadeiras. Além de trabalhar o
respeito mútuo, o respeito próprio e a questão de ser uma pessoa única no
mundo e de que não podemos ser substituídos.
Em um segundo momento, trabalhamos bem a questão cultural, ou
seja, as diferentes culturas religiosas existentes no mundo. Para
começarmos a segunda etapa, passamos para os educandos um texto
sobre o que é cultura. Com explicação e exemplos, os educandos
entenderam melhor o que significa cultura religiosa, passamos para eles
455
FONAPER
de forma clara e objetiva como cada cultura religiosa se comporta no
mundo e no meio social onde vivemos, salientamos ainda que em nossa
sociedade existem muitas culturas religiosas, porém nem sempre, temos
acesso a todas, logo não conhecemos todas, por isso, não podemos ter
preconceito de nenhuma. Com a leitura do texto e diálogo sobre as
diferentes culturas religiosas, os educandos fizeram um exercício sobre
cultura, e cultura religiosa. Então os educandos receberam um texto sobre
diversidade e uma atividade de caça-palavras para instiga-los à reflexão do
que é diversidade cultural e religiosa.
Foi passado para os alunos o slide da Tita: uma Coelha de uma
orelha só, no qual eles viram mais uma vez a diversidade que existe no
mundo, e como as pessoas podem se sentir por serem diferentes, tanto na
maneira de falar, vestir, comer e ter fé. Também foi passado para os
alunos um slide sobre povos africanos, onde ficou realmente bem saliente
a questão cultural, pois este povo diferente contrasta e muito com a
realidade de cada um, principalmente com a nossa cultura, o que fez com
que os educandos pudessem encantar-se com o diferente, a forma
diferente deste povo vestir-se, bem como a forma diferente dos mesmos
cuidarem da natureza como que fazendo parte dela, ou seja, a natureza
está intimamente ligada a cada ser que compunha tal tribo africana. Com o
diálogo sobre o que viram os educandos receberam uma atividade de
labirinto, para que os mesmos ajudassem o patinho encontrar o caminho
da diversidade.
Após esse momento, foi montado um painel das diversas religiões
que compõem o mundo, cada educando colocou em uma tarja de papel o
nome de sua denominação religiosa ou de uma denominação que os
mesmos ouviram falar ou visitaram com seus pais, a dinâmica foi
envolvente, pois, os educandos puderam relatar sobre algumas
experiências religiosas que tiveram com seus pais, tiveram a liberdade de
falar sobre sua denominação, o que os deixou alegres e entusiasmados
em poderem relatar o que faziam e como as crianças são tratadas em sua
denominação religiosa. Assim, desenhamos um globo e todos um a um
colaram suas tarjas com o nome de sua denominação, e foi acrescentado
ainda o nome de outras culturas e tradições religiosas que os mesmos não
conhecem ou nunca ouviram falar, bem como foi colada uma tarja em
branco sem nome o que chamou a atenção dos educandos que disseram
―como pode não ter religião ou não crer em Deus?‖, assim explicamos que
456
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
no mundo também tem lugar para os que não crêem em nada, e que cada
um tem direito de ter ou não uma religião.
Após apresentarmos para os alunos um slide, mostrando como
algumas religiões expressam-se em reverência ao seu Deus. O objetivo foi
mostrar que, cada povo e cultura religiosa, têm sua maneira e forma de
expressar-se ou de comunicar-se com seu Deus e assim, devemos
respeitar as diferentes formas de expressão ou comunicação com Deus.
Portanto, assim como o Patinho Feio era diferente dos demais animais da
fazenda, existem formas e religiões diferentes da nossa e; nem por isso,
essas se tornam feias ou más, mas devemos respeitar, por que dentro da
sociedade em que vivemos, temos semelhanças, mas temos diferenças na
forma de crer e adorar Deus ou Transcendente.
Como forma de avaliação e entendimento foi entregue para os
educandos uma atividade, onde cada criança deve ligar a figura
apresentada à religião correta. Fixando melhor o conhecimento adquirido
através do slide ―As diferentes formas de comunicação com Deus‖.
Foi dialogado com as crianças que, todos somos seres humanos
respiramos o mesmo ar, compartilhamos a mesma luz solar, chuva, os
benefícios alimentícios e outros que a terra produz, porém, somos
semelhantes e ao mesmo tempo diferentes em cor de cabelo, olhos, pele,
estatura, homem, mulher, pensamentos e da mesma forma vemos e
conhecemos ―Deus‖ que pode ser o mesmo mas que vemos de forma
diferente, logo podemos dizer. EU SOU EU, QUE LEGAL! Por que
ninguém é igual ao outro. Valorizando assim a si mesmo e o outro como
ser humano único e específico que não pode ser substituído por ninguém.
Ao finalizar o trabalho, tivemos a oportunidade de montar uma sexta
de balas de frutas, com cores diferentes e sabores diferentes, que foi
entregue a cada educando, mostrando que assim como as balas são do
mesmo tipo, ou seja, da mesma essência doce, as mesmas podem
apresentar formas, sabores e cores diferentes e que, apesar das
diferenças, a essência e o sabor são agradáveis. Portanto, o diferente só é
diferente e insípido quando a gente quer. No fim da atividade desenvolvida
com os educandos, foi tocando a canção ―Iguais‖ o que oportunizou que os
mesmos pudessem refletir mais uma vez sobre a alteridade e a
diversidade cultural religiosa bem como a reflexão sobre o ser humano.
Assim pudemos mais uma vez dialogar sobre a experiência de como
nos sentimos quando nos deixam de fora e não há lugar para nós? E
457
FONAPER
quando deixamos outras pessoas fora? Será que pensamos nos outros em
determinados momentos, ou pensamos somente em nós? Concluindo que
cada pessoa é única e existe para ser amada, para ser feliz, para amar e
fazer os outros felizes, e que é possível superar as diferenças sem ser
preconceituoso em uma vivencia de alteridade e coexistência, pois, no
mundo que é a fazenda, existe lugar para todos mesmo que este seja o
―Patinho Feio‖, pois em um determinado momento de nossa vida
encontramos nosso lugar, bem como o Outro, sem tirar o direito de
ninguém. Podemos dizer que todos nós temos muitas qualidades e somos
pessoas belas e importantes em sua forma diferente de ser e de viver a
vida que é colorida quando a mesma é respeitada, deste modo
aprendemos que as religiões ensinam que todas as pessoas merecem
amor e respeito por suas diferenças.
Avaliação dos Educandos
A avaliação é uma abordagem do conhecimento adquirido no período
de administração das aulas. O Ensino Religioso como área do
conhecimento visualiza articular, contextualizar, a permanente formação do
educando em uma sociedade onde as transformações são inevitáveis.
A avaliação tem como objetivo o registro de quais conceitos foram
apreendidos, como os educandos perceberam e se apropriaram dos
conteúdos e ideias e, observar o progresso de apropriação do
conhecimento elaborado para os educando, averiguando se os resultados
das ações e operações foram satisfatórios.
De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais, a avaliação é
um elemento integrador entre a aprendizagem do educando e a atuação
do educador na construção de conhecimento. A avaliação foi dirigida da
seguinte forma: a participação na brincadeira das cadeiras, a interação dos
educandos nos momentos do diálogo, a participação na construção dos
painéis, as atitudes que cada criança conseguiu viver durante as
atividades, como cada criança se sentiu no grupo expressando suas ideias
e sentimentos nos momentos das brincadeiras, como cada criança se
sentiu ao ser excluída, como cada criança se sentiu ao ser convidada para
fazer parte do grupo novamente, como cada um percebeu a importância de
conviver com o próximo e respeitar o diferente como um ser único, mas
458
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
que, está carregado de diferenças em sua vida bem como a fé, o Deus que
adora, o dialeto, a roupa, a culinária, e suas ideologias.
Formação Específica de Professores
Consideramos a partir desta experiência apresentada a necessidade
de mais projetos e consolidação da disciplina do Ensino Religioso nas
escolas de rede pública e privada em todas as séries. O desafio é grande,
pois, o mesmo aponta o caminho para o desenvolvimento de outros
projetos e produção de materiais didáticos específicos dos fenômenos
religiosos como um direito do aluno para sua formação básica, conforme
assegura a constituição de 1988:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o
anonimato;
VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo
assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na
forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;
VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa
ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximirse de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir
prestação alternativa, fixada em lei;
IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de
comunicação, independentemente de censura ou licença;
XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o
sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional.
(CONSTITUIÇÃO, 1988, p. Web)
A docência da atividade do Ensino Religioso em todas as séries
depende de investimento público e privado. Faltam recursos didáticos,
livros e outros materiais específicos para elaboração de atividades, bem
como para a prática da docência no dia a dia dos professores, a falta de
professores capacitados na área ocasiona um desleixo ainda maior, o não
conhecimento correto da disciplina tanto por parte de professores como de
educandos confunde o Ensino Religioso com a catequese, o proselitismo,
a discriminação religiosa, e a ocupação das aulas do Ensino Religioso para
459
FONAPER
a realização de qualquer outra atividade, desprovendo assim o educando
de seu direito de ter sua aula de Ensino Religioso.
A garantia do Ensino Religioso se fundamenta na legislação. Mas,
que se priorize, principalmente, a qualidade humana, a competência
profissional específica. Isto exige a seriedade de um plano de
formação permanente das pessoas envolvidas com o Ensino
Religioso. (FIGUEIREDO, 1995. P. 99)
Quase todos os materiais utilizados foram desenvolvidos pela
professora. Os livros utilizados são de propriedades da mesma, os vídeos
foram baixados da internet, os slides foram produzidos pela professora. A
restrição se dá em torno de conseguir material didático-pedagógico para
trabalhar com os educandos, que ao contrario das demais disciplinas o
Ensino Religioso é um desafio a cada dia e uma vitória a cada atividade
elaborada e realizada com sucesso pelos professores que são autores e
construtores da história do Ensino Religioso de caráter não proselitista,
que apresenta a alteridade e o respeito ao diferente em sua forma de
crença e cultura religiosa dentro do fenômeno religioso, que abarca as
diferentes matrizes religiosas.
Considerações Finais
O desenvolvimento da atividade com a turma ocorreu de acordo com
o projeto, consideramos que as atividades e linguagem foram adequadas.
Aprendemos que praticar a docência é um desafio e nos arremete à
importância de saber trabalhar com os educandos de forma que possamos
prender a atenção dos mesmos em um assunto que lhes chame a atenção,
aprendemos, portanto, como é importante ensinar sobre a diversidade
cultural e os fenômenos religiosos na alteridade através da coexistência
em um mundo de diversidade que abarca o fenômeno religioso, na
formação de cidadães que promovam a liberdade de consciência e de
crença, ensinar a convivência na perspectiva dos direitos humanos, foi um
desafio.
Sabemos que contamos com pouco material didático, e as
elaborações das atividades é um desafio e uma realização para cada
etapa, a colaboração dos educandos sempre é muito importante para que
se possa alcançar os objetivos propostos nas atividades, portanto,
poderíamos contar com, mais recursos audiovisuais, além de material
460
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
didático atrativo e de boa qualidade, o que ajudaria numa melhor resposta
a prática da docência em Ensino Religioso.
De forma geral fomos bem recebidos pelos educandos que agiram
normalmente com nossa presença em sala de aula, ocorrendo uma
cooperação melhor entre educandos e professor, o movimento diferente no
início da aula causou excitação por parte de alguns. As brincadeiras
realizadas envolveram os alunos de uma forma que puderam ser eles
mesmos, expressaram suas ideias e atitudes, bem como dialogaram com
relação ao diferente que até então existia, mas que, ainda não havia sido
apresentado aos mesmos, a didática diferente e a temática causou
estranheza e alguns momentos, o diálogo e a introdução foram momentos
de reflexão pelos educandos que se deixaram envolver de uma forma
natural.
A faixa etária na qual a atividade foi desenvolvida tem muitas
curiosidades, percebemos o quanto elas vivenciam suas convicções
religiosas e culturais. Sabem manifestar suas crenças, acreditam com
facilidade, possuem espiritualidade religiosa e gostam de manifestá-la.
Ouvem com atenção o conteúdo proposto discorrem com seus olhos
detalhadamente cada material disponibilizado a eles, inteirando-se de tudo
o mais rápido possível, aprendem e assimilam o assunto com rapidez. A
atividade nos possibilitou um contato amplo com a realidade escolar tanto
de professores como dos educandos, o desafio é conseguir conhecer o
mundo em que os mesmos vivem. O Ensino Religioso possibilita a
convivência com as diferentes religiões e culturas de um modo geral, não
só a religiosa, mas que se estende desde etnias, costumes, dialeto,
vestimentas e ideologias.
A atividade levou os educandos, e a todos os que a vivenciaram, a
uma reflexão sobre o ser humano em uma abordagem de alteridade e
coexistência. Os resultados foram satisfatórios, pois pudemos observar
que os mesmos chegaram a um entendimento e raciocínio sobre culturas e
tradições religiosas dentro do contexto social e escolar no qual os mesmos
estão inseridos, pois quando trabalhado com os mesmos sobre o Eu e o
Outro estes tiveram a oportunidade de visualizar o diferente, como um ser
com direitos iguais que devem ser respeitados dentro de sua cultura e fé
religiosa.
461
FONAPER
Referências
BRASIL: (1996). Lei de Diretrizes e Bases da Educação nacional nº
9.394/96 –Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
Brasília/DF/BRA: MEC.
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> acesso em 28/06/2012
CARNIATO, Maria Inês Nós protegemos a vida: 2º ano: professor/Maria
Inês Carniato- São Paulo: Paulinas, 2010. – (Coleção ensino religioso
fundamental). Editora Paulinas.
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<http://www.jornalcomunicacao.com/Secoes.asp?Pagina=5&Act=Proxima&
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Permanente do Ensino Religioso. São Paulo: Mundo Mirim, 2009.
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Santa Catarina. Secretaria de Estado da Educação e do Desporto.
Currículo: ensino religioso. - Florianópolis: SED, 2001.
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Sua Pesquisa. com Cultura
<http://www.suapesquisa.com/o_que_e/cultura.htm> acesso em
24/11/2011
462
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Diversidade Cultural <http://pt.wikipedia.org/wiki/Diversidade_cultural>
acesso em 25/11/2011.
463
A QUESTÃO ATUAL DO ENSINO RELIGIOSO COMO CAMPO
DISCIPLINAR: UMA PROPOSTA DE CONSCIENTIZAÇÃO PARA
A COMUNIDADE ESCOLAR
Terezinha de Souza Pacheco 1 - FCC
Neusa Maria de Souza Trindade2
Resumo:
A disciplina ensino religioso tem sido, por vezes, fator de resistência para seu efetivo
desempenho no meio escolar, ainda que sua premissa seja um conteúdo mais alinhado ao
conhecimento do fenômeno religioso e da sua historicidade. Grande parte dos atores que
constituem o contexto escolar não tem clareza sobre as mudanças que ocorreram com esta
disciplina e, por isso, muitos deles se mantêm em visões amparadas no proselitismo
religioso e, como tal, desconhecem os avanços na legislação (Lei n. 9.475/97), como
também a existência de um programa de ensino orientado para a compreensão do mundo
contemporâneo. Isto posto, o foco deste estudo é apresentar as influências que movem a
compreensão tendenciosa desse ensino pela comunidade escolar. Assim, a elaboração de
um projeto cultural religioso para expor os conteúdos da disciplina ensino religioso foi
realizada por meio de uma proposta pedagógica coordenada pelo professor de ensino
religioso envolvendo alunos, gestores e demais professores, incluindo a participação
indireta dos pais. Um dos objetivos foi refletir sobre este ensino nas perspectivas do
respeito à diversidade cultural, do conhecimento sobre as origens das diferentes religiões e
dos limites da legislação. Outra medida foi a aplicação de um dos instrumentos ―Associação
Livre de Palavras- ALP‖ em uma pesquisa realizada com 53 sujeitos do ensino fundamental
da educação pública. A base teórica contou com a análise de conteúdo (BARDIN, 1977)
que organiza categorias semânticas, as quais, com o suporte da teoria das representações
sociais idealizada por Serge Moscovici (1971), possibilitaram identificar alguns dos
estereótipos que esses sujeitos construíram a respeito dessa disciplina. Este estudo
pretende responder às perguntas: como desconstruir a compreensão proselitista dos atores
da Comunidade escolar? O nome da disciplina influencia a Comunidade escolar na
distinção do ―ensino religioso‖ do ensino da religião? A religião no contexto sociopolítico
representado nas Constituições Republicanas Brasileiras (CF1824; CF 1891; CF1934;
CF1937; CF1946; CF1967; CF1988) e o seu papel nas instituições escolares pode explicar,
de certa forma, a resistência sobre essa disciplina. As políticas de educação, além da
questão da formação docente, podem ser uma das dificuldades em adotar o novo conteúdo
do ensino religioso. Por fim, este trabalho oferece algumas sugestões de superação no
confronto das demandas que estão em jogo para que a disciplina ensino religioso seja,
eficazmente, compreendida e desenvolvida.
Palavras-chave: comunidade escolar, disciplina ensino religioso, representações sociais,
prática pedagógica.
1
2
Mestra em Educação pela UNISANTOS. Pesquisadora Associada da Fundação Carlos
Chagas, participando do CIERS-Ed (Centro Internacional em Representações Sociais e
Subjetividade – Educação). E-mail: [email protected].
Especialista em ―Propedêutica às Ciências Sociais‖ pela Fundação Educacional –
Coordenação de Extensão e Pós-Graduação CESSU. E-mail:
[email protected].
FONAPER
Introdução
A hipótese de que a Comunidade escolar necessita de uma
conscientização a respeito da área Ensino Religioso (ER) na escola
pública tem como justificativa os desafios que se têm enfrentado e, que em
última instância, dificulta a boa implementação deste ensino nas escolas
públicas brasileiras. Acredita-se que a aproximação de todos os atores
escolares no conhecimento da relevância do ER como possibilidade de
ganho intelectual ajudaria a gerar uma nova interação escolar no sentido
de envolver outras disciplinas e, também, de valorizar a diversidade
religiosa construindo, assim, uma cultura de alteridade. Os alunos ao
aprenderem sobre temas, fatos religiosos no contexto da história da
civilização em que se tratam as diferentes culturas religiosas e suas
características podem, dentro desta lógica, fazer um paralelo com o que
ocorre na sociedade, na sua família e consigo mesmo. Nesta
intercomunicação, eles podem compreender a disciplina ER como
ferramenta de diálogo ao observar as intertextualidades que o tema
religião propicia nas obras de arte, na música, na arquitetura, na própria
organização sociopolítica do Brasil.
Hoje, encontra-se no sistema educacional um quadro de
desigualdade no funcionamento desta disciplina com abrangência em nível
nacional, estadual e municipal, o que dificulta a construção de sua
identidade. Estudiosos desta área (JUNQUEIRA, 2002; OLIVEIRA, 2006)
têm apresentado pesquisas que mostram essas discrepâncias.
Uma tentativa de explicar tal situação é pautando-se primeiro na
legislação: a) Constituição Federal (CF) artigo 210, que aplica o caráter
laico e facultativo para a educação religiosa na escola pública; b) LDBEN
9394/96 artigo 33 sob a redação da Lei 9475/97 que coloca este ensino
como ―parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina
nos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental...‖; c)
Resolução CEB 02 de 2 de abril de 1998 que insere a disciplina ER não na
base diversificada que é voltada para temas transversais (saúde,
sexualidade, trabalho, meio ambiente, entre outros), mas a situa como
área de conhecimento onde compartilham as disciplinas convencionais Língua Portuguesa, Matemática, Ciências Biológicas, entre outras.
Percebe-se que a disciplina ER instalada como área de
conhecimento, mas atrelada ao caráter facultativo traz uma intrínseca
incoerência, pois ela é a única disciplina que não exige participação
466
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
obrigatória do aluno. Isto implica maior conscientização de todos os
envolvidos para reconhecer, então, seu lugar epistemológico. Como
incentivar políticas públicas que supere tal contradição? Qual a eficácia do
ensino religioso nas escolas diante do caráter facultativo dessa disciplina?
Ponto candente é a questão da formação docente cujas disposições
legais oferecem lacunas quanto à qualificação deste professor. Assim, as
aulas de ER são atribuídas àqueles profissionais da área de Ciências
Humanas – história, geografia, sociologia. Na ausência desses, os demais
podem assumir a disciplina. O ER requer uma compreensão interdisciplinar
que passa por um esforço consciente de sua importância pedagógica. Os
professores de ER têm ao seu alcance os Parâmetros Curriculares
Nacionais do Ensino Religioso - PCNER elaborados pelo Fórum Nacional
Permanente do Ensino Religioso – FONAPER. São conteúdos
disciplinares sob os eixos temáticos ―Culturas e Tradições Religiosas‖;
―Textos e Livros Sagrados: orais e escritos‖; ―Teologias‖; ―Ritos‖ e ―Ethos‖
os quais garantem para este ensino a perspectiva do fenômeno religioso.
Certo que se deve considerar que alguns Estados como Paraná,
Santa Catarina, alguns municípios isolados do território brasileiro já
trabalham com professores especializados para o ER. Os investimentos
neste sentido não são suficientes para dar uma unidade no sistema
educacional relativo a este ensino. Portanto, um dos passos é conhecer o
que pensam os professores que convive com a disciplina ER.
Aportes teóricos
Para identificar as representações que os professores possuem
sobre E R, a Teoria das Representações Sociais - TRS desenvolvida por
Serge Moscovici (1971) vem contribuir na medida em que ela desvela
concepções, sistemas de valores, significados construídos pelos sujeitos.
As representações sociais são conhecimentos do senso comum.
Nas sociedades modernas somos diariamente confrontados com uma
grande massa de informações. As novas questões ou eventos que
surgem no horizonte social frequentemente exigem, por nos afetarem
de alguma maneira, que busquemos compreendê-los, aproximando-os
daquilo que já conhecemos, usando palavras que fazem parte do
nosso repertório. Nas conversações diárias, em casa, no trabalho,
com os amigos, somos instados a nos manifestar sobre eles
procurando explicações, fazendo julgamentos e tomando posições.
Estas interações sociais vão criando universos consensuais, no
467
FONAPER
âmbito dos quais as novas representações vão sendo produzidas e
comunicadas, passando a fazer parte desse universo não mais como
simples opiniões, mas como verdadeiras teorias do senso comum,
construções esquemáticas que visam dar conta da complexidade do
objeto, facilitar a comunicação e orientar condutas. Essas teorias
ajudam a forjar a identidade grupal e o sentimento de pertencimento
do indivíduo no grupo (MAZZOTTI, 1994, p.61).
Portanto, uma das características da TRS pode ser entendida como ―um
processo cognitivo em que o sujeito se apropria da realidade em construção
para integrar ao seu sistema de valores‖ (JODELET, 1994). Esta teoria
permite interpretar os fatos porque ela tem o papel de orientar
comportamentos, atitudes e práticas sociais. Assim, este estudo, contou com
a participação de professores do EFII em uma pesquisa de Mestrado
(PACHECO, 2012) com o objetivo de conhecer as representações que esses
têm sobre ensino religioso. Uma análise do instrumento metodológico
Associação Livre de Palavras - ALP realizado com 53 sujeitos do EFII revelou
onde provavelmente estas compreensões estão ancoradas.
Uma dessas ancoragens pode estar presente no percurso histórico
do ER no Brasil. Sabe-se que a religião no contexto sociopolítico
representado nas Constituições Republicanas Brasileiras - CF1824; CF
1891; CF1934; CF1937; CF1946; CF1967; CF1988 – é um dos tópicos
debatido calorosamente desde a cisão entre a Igreja e o Estado. Esse
ensino no Brasil-colônia gozava da hegemonia cristã católica apostólica
romana e, portanto, a orientação era catequética e doutrinal. Porém, de
ensino da religião para ER laico, as mudanças se deram ao sabor dos
interesses políticos tal que em 30 de abril de 1931, pelo decreto nº 19.941,
o Governo de Getúlio Vargas, instituiu o Ensino Religioso nos cursos
básicos com exigência da justificação pelo aluno por sua opção facultativa.
As CF. 1934 e a CF. 1946 incluíram no artigo 153 e artigo 168,
respectivamente, um ensino que respeitasse a confissão religiosa do
aluno. No período ditatorial militar (1964-1985), também se manteve estas
prescrições para o ensino religioso relativizando, assim, a condição de
Estado laico. O que a História constata é que o enfoque para um Ensino
Religioso disciplinar definitivamente laico apoia-se na CF 1988 e nas Leis e
Diretrizes e Bases 4024/61, 5692/71 e a 9.394/96. Esta última, em seu
artigo 33 aprimorou-se com a redação de 22 de julho de 1997 sob a Lei
9.475/97:
468
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante
da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários
normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o
respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer
formas de proselitismo.
§ 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a
definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as
normas para a habilitação e admissão dos professores.
§ 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas
diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos
do ensino religioso.
Redação anterior - Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa,
constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de
ensino fundamental, sendo oferecido, sem ônus para os cofres
públicos, de acordo com as preferências manifestadas pelos alunos ou
por seus responsáveis, em caráter:
I - confessional, de acordo com a opção religiosa do aluno ou do seu
responsável, ministrado por professores ou orientadores religiosos
preparados e credenciados pelas respectivas igrejas ou entidades
religiosas; ou
II - interconfessional, resultante de acordo entre as diversas entidades
religiosas, que se responsabilizarão pela elaboração do respectivo
programa.
Este novo paradigma que se completa com o artigo 3º da Resolução
nº2/98 do Conselho Nacional de Educação e Câmara de Educação Básica
institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental as
quais determina que os alunos tenham acesso a uma base nacional
comum em nível nacional e a uma parte diversificada. Elas podem ser
mais bem entendidas na classificação abaixo a seguir:
a) a vida cidadã através da articulação entre vários dos seus
aspectos como:
1. a saúde
2. a sexualidade
3. a vida familiar e social
4. o meio ambiente
5. o trabalho
6. a ciência e a tecnologia
7. a cultura
8. as linguagens
b) as áreas de conhecimento:
1. Língua Portuguesa
2. Língua Materna, para populações indígenas e migrantes
3. Matemática
4. Ciências
5. Geografia
6. História
469
FONAPER
7. Língua Estrangeira
8. Educação Artística
9. Educação Física
10. Educação Religiosa, na forma do artigo 33 da Lei nº 9.394, de 20
de dezembro de 1996.
O que está claro é que a disciplina ER ocupa uma posição curricular
autônoma o que comporta uma atenção rigorosa em sua estruturação
educacional quanto às políticas adotadas nas diferentes esferas
institucionais.
Fundamentação da proposta pedagógica
Para fundamentar este estudo, foi feito um recorte na pesquisa de
Mestrado (PACHECO, 2012) para analisar o contexto atual da disciplina
Ensino Religioso no campo da docência pelos dados apontados pelo grupo
de 53 sujeitos que participaram na pesquisa. Todos são professores do
Ensino Fundamental II composto pelas diferentes disciplinas: Matemática
= 11; Língua Portuguesa = 8; Arte = 6; Ciências = 6; Geografia = 6; História
= 5; Inglês = 4; Ed. Física = 4; Informática = 3. Os cinco professores de
Ensino Religioso atuam nas disciplinas de História (2); Geografia (1); Artes
(1); Matemática (1). Estes professores estão vinculados à Rede Municipal
da cidade de Santos/SP cujas escolas, ao todo 16, possuem na grade
curricular a disciplina ER. Foi importante conhecer a denominação religiosa
a que eles pertencem porque pode influenciar a visão que esses sujeitos
têm sobre ER.
Gráfico 1: Perfil dos professores do ensino fundamental II – denominação religiosa
470
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Este gráfico em que aparecem seis religiões mostra o contexto
pluralista da cultura religiosa que caracteriza o espaço escolar e, por
conseguinte, a sociedade. Estes dados também indicaram que a religião
cristã é predominante na população investigada.
O instrumento metodológico Associação Livre de Palavras - ALP
possibilita conhecer a relação que os professores têm com o objeto ER.
Eles, como sujeitos pesquisados, são convidados a evocar as primeiras
quatro palavras que lhes vierem à mente ao ouvirem alguns termos. Esses
termos são chamados de termos indutores, pois eles trazem à mente
representações ligadas ao termo, que são então expressas por palavras.
Os termos indutores selecionados foram: ensino religioso; ensino
religioso e currículo; ensino religioso e diversidade; ensino religioso
e escola. A ideia é que essa tarefa facilita a expressão, de forma
espontânea, das imagens relacionadas aos termos indutores.
Assim, foi solicitado da seguinte maneira: ―Escrevam as primeiras
quatro palavras que lhes vêm à mente quando digo ‗ensino religioso‘‖.
Após o término da escrita das quatro palavras, o pesquisador coloca o
segundo termo ―ensino religioso e currículo‖ e espera o tempo necessário
para que todos os sujeitos terminem de escrever, e, passa para o terceiro
termo ―ensino religioso e diversidade‖ e, por último o quarto termo ―ensino
religioso e escola‖.
O caráter espontâneo – portanto menos controlado – e a dimensão
projetiva dessa produção deveriam, portanto permitir o acesso, muito
mais fácil e rapidamente do que uma entrevista, aos elementos que
constituem o universo semântico do termo ou do objeto estudado. A
associação livre permite a atualização de elementos implícitos ou
latentes que seriam perdidos ou mascarados nas produções
discursivas (ABRIC, 1994b, apud SÁ, 1988, p. 91).
Para analisar as palavras ao cruzar dados como a frequência e a
ordem de evocação, utilizou-se o software EVOC (2000) de análise textual
foi elaborado por Pierre Vergès (1992) e popularizado após um trabalho
acadêmico realizado no campo das representações sociais. Com ele é
possível identificar os possíveis elementos centrais e periféricos das
representações que os sujeitos pesquisados possuem e observar como
esses elementos estão articulados.
O conjunto de palavras emitidas foi tratado dentro de categorias
semânticas orientadas pela análise de conteúdo (BARDIN, 1977) para
471
FONAPER
classificar unidades de vocabulário em itens de sentido como pressupostos
de interpretação.
As palavras mais frequentes tornam-se importantes, pois a saliência de
uma ideia pode ser observada e explicada pela frequência de aparição dessa
ideia nos discursos dos componentes de um mesmo grupo. A frequência de
evocação e a ordem média de evocação possibilita o levantamento dos
elementos centrais e periféricos das representações (SÁ, 1996).
O software gera uma tabela com quatro possíveis agrupamentos, ou
quadrantes. Para o primeiro termo indutor, as palavras com alta frequência
e prontamente evocadas foram apenas uma “Deus” e ocupa o primeiro
quadrante. Elas indicam os elementos constituintes do núcleo central da
representação. Elas foram as mais salientes pela alta frequência e pronta
evocação. As palavras altamente frequentes, mas pronunciadas menos
prontamente foram “Amor, Respeito, Valores‖ são do segundo quadrante.
Elas correspondem aos elementos periféricos da representação. As palavras
encontradas no 3º quadrante ―Crença, Espiritualidade, Ética, Religião” e
são palavras com baixa frequência, mas pronunciadas prontamente. E as
palavras “Conhecimento, Paz” foram as de baixa frequência e pronunciadas
não prontamente (quarto quadrante).
A palavra ―Deus‖ está no primeiro quadrante e indica sua
centralidade na representação desse termo. É possível dizer que a
representação está associada ao conceito de transcendente. A palavra
amor, no segundo quadrante, indica que este sentimento humano se liga à
ideia de um Deus. Já as palavras respeito e valores expressam que esse
ensino promove uma consciência cidadã.
No terceiro quadrante encontramos três possíveis significados. A
palavra crença tem a ver com fé, enquanto que espiritualidade nos remeta
à ideia de transcendência. A palavra ética já manifesta um sentido de
princípio que rege as relações sociais. Embora no último quadrante, a
palavra conhecimento indique uma referência à atual perspectiva deste
ensino, é a palavra paz que sobressai e pode ser interpretada como
expressando um desejo, uma expectativa de se alcançar esse estado de
paz. Os professores do fundamental II lidam com as questões do ensino
religioso mais fortemente, pois as escolas em que trabalham têm em seus
planejamentos de curso a proposta de desenvolver essa disciplina. Mesmo
que nem todos os professores lidem diretamente com ele, é possível que
exista uma proximidade com o tema. A palavra ―conhecimento‖ no último
472
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
quadrante é significativa, pois esse ensino, tal como prevê a legislação
vigente, deve trabalhar com conhecimentos sobre religiões.
Interessante observar que os demais termos indutores: “ensino
religioso e currículo”; “ensino religioso e diversidade”; “ensino
religioso e escola”. tiveram no primeiro quadrante, ou seja, como núcleo
central das representações dos sujeitos pesquisados as palavras
“Respeito e Valores”. Possivelmente, elas ocupam este quadrante
porque os sujeitos entendem que os conteúdos para este ensino devem
tratar de temas formativos, ou seja, que respaldam questões de
comportamento e de relacionamento que permeiam as discussões entre
gestores e professores. Essas seriam ideias sobre esse ensino enraizadas
nas culturas, nas tradições. Para a teoria do núcleo central, são ideias que
possuem um caráter de rigidez, que dificilmente se transformam. Estão
ligadas à memória coletiva, são consensuais e estáveis. Mudar o núcleo
central seria mudar a própria representação (SÁ, 1996).
Outro ponto de ancoragem pode ser encontrado na história desse
ensino no Brasil. Ele foi visto, até pouco tempo, como um momento de
formação catequética. Somente com o Parecer CNE/CBE no 2/98 este
ensino adquiriu um caráter disciplinar e foi considerado como uma área de
conhecimento, articulada com as outras áreas como Língua Portuguesa,
Geografia, História, etc. Portanto, possivelmente, os professores ainda têm
uma concepção de um ensino religioso ligado à catequese e à Igreja
Católica. O perfil dos sujeitos nos mostra que eles são, em sua maioria,
católicos. Portanto, a ênfase na catequese pode ser explicada por esse
maior número de sujeitos ligados à religião católica, que tem sua história
no Brasil vinculada ao ensino de uma específica religião no contexto
escolar.
Esta amostragem pode também refletir uma compreensão
tendenciosa dos professores sobre o ensino religioso na escola pública de
modo que uma proposta de conscientização do paradigma atual desse
ensino vem ao encontro dos professores, gestores e dos demais
participantes da instituição escolar para que a implementação desta
disciplina alcance sua verdadeira identidade.
Como, então, organizar uma proposta de conscientização para a
Comunidade escolar, de forma democrática, visando a uma
desmistificação em torno do ER como disciplina curricular da Educação
Básica? Quem é essa Comunidade escolar?
473
FONAPER
Proposta pedagógica
A ideia de elaborar uma proposta, com tal objetivo, tornou-se
premente frente à realidade retratada nas alegações acima sobre os
percalços que têm acompanhado a implantação do ER nas escolas
públicas. Ela deve ser direcionada aos professores, gestores, funcionários,
alunos e pais, imbuídos do propósito de um envolvimento responsável em
relação ao tema em si.
Por meio da realização de vários encontros tendo em vista as
diferentes posições dos pares que compõem a unidade escolar, optou-se
pela seguinte logística de distribuição, a qual se constituiria em vários
momentos:
- 1º momento: um encontro entre os professores de ER onde irão
discutir os PCNER1995 e demais materiais concernentes que tratam dos
conteúdos dessa disciplina com vistas a um trabalho interdisciplinar
abrangendo áreas afins para favorecer a integração de conteúdos.
Esse encontro poderá se prolongar mais do que os outros, uma vez
que estes profissionais é que estarão diretamente ligados ao trabalho, com
o ensino propriamente dito.
Todavia, é muito importante que os gestores (administrativo/
pedagógico) participem de todas as etapas, pois serão os facilitadores da
desburocratização dando apoio para essa nova e dinâmica visão de prática
escolar. Sabe-se que muitas variáveis interferem na condução de trabalhos
de vanguarda na escola, exigindo, inclusive, mudança na estrutura física e
adaptação do layout tradicional de cadeira uma atrás da outra para outras
disposições mais ―dialógicas‖. Ainda por serem os coordenadores desta
proposta, os professores de ER terão que ter bem claros os conceitos
estruturantes dessa disciplina para poderem intercambiar com os das
outras áreas afins.
Em termos ideais, esse trabalho deveria ser desenvolvido com todas
as áreas do conhecimento, pois é para o aluno que está na ponta do
sistema educacional que são envidados todos os esforços pedagógicos,
administrativos e legais. Enfim, tudo isso só fará sentido se o acesso à
reelaboração e produção do conhecimento pelo aluno permitir uma
compreensão mais globalizada do mundo no lugar de um ensino de
disciplinas estanques e sem comunicação que produz fragmentação do
saber de tal forma que o ensino tem se tornado sem significado e
desinteressante.
474
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Nesta atividade é Importante destacar alguns conceitos que fazem
parte do arcabouço teórico-prático da disciplina ER, os quais poderão
servir de fio condutor para o desenvolvimento dos temas pertinentes a
essa área curricular: Religião/ Religiosidade/ Espiritualidade/ Moral/ Ética/
Diálogo x Discussão/ Verdade/ Incerteza/ Condição humana/ Identidade
Planetária/ Preconceito/ Alteridade/ Respeito. A clareza dos conceitos que
envolvem os conteúdos dessa disciplina, após pesquisas e discussões,
será imprescindível para o confronto e o diálogo diante da diversidade
religiosa e cultural dos alunos que não tem sido levada em conta
transformando o ER em aulas de catequese e atividades esotéricas.
- 2° momento: um encontro dos professores de ER com os
professores das Áreas afins para compartilhar ideias, opiniões e troca de
experiências conduzindo à interação entre as áreas do conhecimento.
Esse encontro, coordenado pelos professores de ER, deve ser
pautado no trabalho conjunto entre ER e aquelas disciplinas cujos
conceitos estruturantes possam dar uma dimensão mais totalizadora e, os
conteúdos ou temas trabalhados, possam permitir ao aluno se conhecer
melhor, seu espaço, localizar-se na sua comunidade e começar perceber a
correlação dos conhecimentos. Com isso, sentir-se mais autoconfiante e
capaz de atuar e contribuir na transformação do mundo. Cada área
levantaria os conceitos, os temas centrais de suas disciplinas, sem,
contudo, fazer apenas uma justaposição, e sim, um trabalho que amplie os
horizontes de percepção do aluno, e que fiquem claras as possíveis
interligações entre os conhecimentos das múltiplas disciplinas.
Um ponto fundamental para o exercício da interdisciplinaridade e da
conscientização das novas concepções do ER é o diálogo que deve existir
numa perspectiva de horizontalidade permitindo aos professores,
sobretudo, os de ER e os alunos, a oportunidade de vivenciar,
substancialmente, os próprios valores os quais permeiam e fundem-se aos
próprios conteúdos dessa disciplina.
O fato de ER não ter uma ciência de referência, seus elementos
estruturais e conceituais vão se erigir a partir do conhecimento da história
das religiões que ao longo de toda trajetória da humanidade assumiu
diferentes modos de relação com o invisível, com o mistério. No princípio,
buscando explicação nos mitos, até chegar a formas mais complexas e
institucionalizadas. Segundo, Karen Armstrong (2.006, p.16), ―um dos
motivos pelos quais a religião parece irrelevante, hoje em dia, é que muita
475
FONAPER
gente não tem mais a sensação de estar cercada pelo invisível. Nossa
cultura científica nos educa para que concentremos nossa atenção no
mundo físico e material que está diante de nós‖.
3° momento: um encontro dos professores de ER com os pais dos
alunos. A presença dos demais professores seria interessante porque
demonstraria uma escola comprometida com a formação do aluno.
Esse encontro, por tratar de uma linguagem não acadêmica, pode
iniciar o diálogo a partir de um ditado popular. É muito comum ouvir:
―Religião e Política não se discutem‖. Este seria um bom tema como
sugestão para debate com os pais na expectativa de apontar as ideias
estereotipadas existentes em torno dessa disciplina. Sob a coordenação
dos professores de ER, os pais seriam encorajados a colocar suas
impressões com relação ao ER na escola.
O intuito, nesse momento, é perceber os níveis de aceitação e/ou
resistência dentro da disciplina ER, e em seguida os professores exporiam
o que preconiza a legislação atual do ER.
Considerações finais
Essa proposta de conscientização é audaciosa no sentido de propor
mexer na infra (física) e super (mental) estrutura da escola, descentralizar
o poder escolar propiciando uma experiência efetiva de autonomia dos
próprios sujeitos. Essa ousadia envolve muito mais competência, expõe
os pontos nevrálgicos da escola, valoriza a cooperação, resgata a
dimensão mais totalizadora do conhecimento, protagoniza o diálogo
dinamizando a comunicação, e dá mais significado ao conteúdo escolar.
Os ―Encontros‖ como estratégias de trabalho são importantes na medida
em que se abre um espaço de interlocução entre os participantes para que
as visões e os estereótipos, sejam aos poucos desconstruídos.
O que deve estar subjacente em todas as discussões, nesses
encontros, é o como proceder às mudanças necessárias diante do quadro
atual com suas contradições já diagnosticadas. Com referência à situação
legal, hoje o ER tem o seu lugar na Escola como componente curricular,
porém com opção facultativa para os alunos, deve ser laico e respeitar a
diversidade religiosa dos alunos e ministrada uma aula, uma vez por
semana, na maioria das escolas. Em face disso, cada sistema de Ensino
irá deliberar e formular seus conteúdos disciplinares.
476
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Enfim, o trabalho deve propor uma nova visão do ER na escola e
uma proposta metodológica de conscientização com os pontos levantados
acima levando em conta o caráter laico do Estado brasileiro. Dentro dessa
fisionomia, por que não sugerir a mudança do nome dessa disciplina com o
compromisso de investigar até que ponto a própria nomenclatura Ensino
Religioso tem contribuído para essa visão distorcida da disciplina,
confundindo o conceito de Religião com o conceito de Ensino Religioso.
Vale ressaltar que quando se quer uma mudança mais radical em busca
de práticas mais substanciais buscando envolver todo o fenômeno, não
basta mudar apenas o conteúdo, a mudança da forma também se faz
necessária. Como sugestão, alguns nomes: ―Ciências Religiosas‖,
―Civilizações religiosas‖, ―Estudo das religiões‖.
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Tomo XLV, 405, 203-209, 1992.
478
O ATEÍSMO NAS AULAS DO ENSINO RELIGIOSO
Narjara Lins de Araújo1 /UFPB
Resumo:
Este artigo aborda a problemática da falta de materiais didáticos que apresentem conteúdos
referentes ao tema relacionado ao ateísmo durante as aulas de Ensino Religioso. Sabe-se
que assim como se deve respeitar a opção religiosa dos sujeitos, é preciso o respeito aos
sujeitos não-religiosos considerados ateus e ateias que frequentam as aulas desta
disciplina. Este trabalho teve como objetivo geral verificar se existem materiais didáticos
que abordem o conteúdo voltado para o ateísmo em escolas públicas nas quais os alunos
da graduação em Ciências das Religiões da Universidade Federal da Paraíba- UFPB
realizam estágio. E, como objetivo específico, levantar a existência de alunos ateus/ateias
nessas escolas. Este trabalho faz parte de outra pesquisa maior que é de campo,
quantitativa e qualitativa, cujo procedimento metodológico foi por meio de um questionário
semiestruturado e com uma questão do teste de Associação Livre de Palavras de Coutinho
(2003). Os resultados mostram que existem alunos ateus/ateias nas escolas envolvidas e
na grande maioria delas não existem materiais didáticos que abordem o tema ateísmo.
Palavras-chaves: Ensino Religioso; ateísmo; materiais didáticos.
Introdução
Atualmente se tem consciência da diversidade de alunos (as)
religiosos (as) e não-religiosos (as) que ocupam as escolas públicas do
Brasil. Existem vários projetos de Leis como é o caso da Lei de Diretrizes e
Bases da Educação (LDB) que declara o respeito e inclusão das
características da diversidade cultural do povo brasileiro.
O Ensino Religioso é a disciplina que trabalha diretamente com as
questões que giram em torno dos fenômenos religiosos e
consequentemente o ateísmo. Já existem Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCNER), criados pelo Fórum Nacional Permanente do Ensino
Religioso (FONAPER), que tenta abranger esta pluralidade religiosa dos
alunos (as). Devido à credibilidade do FONAPER esta proposta vem sendo
usada como base para os cursos superiores de formação de professores e
na construção do currículo escolar do ER. (BRANDENBURG, 2004, P.62)
Junqueira (2012) defende que o ER deve abordar a questão religiosa
a partir da Ciência da Religião, segundo ele, só assim será possível
1
Pedagoga e mestranda da pós-graduação em ciências das religiões na Universidade
Federal da Paraíba- UFPB. E- mail: [email protected]
FONAPER
compreender todas as dimensões presentes que a religião infere na
sociedade, inseridas no cotidiano, posturas e discursos.
Houve um aumento das Instituições Superiores para a formação de
professores para atuarem no ER com bases na Ciência da Religião, cujo
objetivo era tratar o fenômeno religioso como característica cultural dos
povos e patrimônio da humanidade, passível de ser estudado e
pesquisado. (JUNQUEIRA, 2012)
Mas, e quando o assunto é a falta da religião? Como gerar o respeito
e o entendimento deste termo em meio a tantas culturas religiosas? Os
professores recebem formação específica para estes casos? E os
estudantes que estão em processo de formação inicial em cursos
superiores?
Este trabalho teve como objetivo geral verificar se existem materiais
didáticos que abordem o conteúdo voltado para o ateísmo em escolas
públicas nas quais os alunos da graduação em Ciências das Religiões da
UFPB realizam estágio. E como objetivo específico, levantar a existência
de alunos ateus/ateias nessas escolas.
Este trabalho faz parte de outra pesquisa maior que é de campo,
quantitativa e qualitativa, cujo procedimento metodológico foi por meio de
um questionário semiestruturado e com uma questão do teste de
Associação Livre de Palavras de Coutinho (2003).
O Ateísmo na Antiguidade
Na Antiguidade os Gregos e Romanos também viviam num ambiente
em que havia templos por todo o lado, os deuses adoravam as suas
moedas, o calendário ia de festival em festival religioso e os ritos religiosos
seguiam todas as grandes transições da vida. Por esse motivo, o ateísmo
nunca se tornou uma ideologia popular. (BREMMER, 2010, p.19)
O foco de ateísmo que existia nesta época, eram indivíduos
excepcionais que se encorajavam a dar voz a sua descrença, ou filósofos
corajosos que propunham teorias intelectuais sobre a origem dos deuses
sem que, normalmente, pusessem as suas teorias em prática e sem que
rejeitassem completamente as práticas religiosas. O que existia era um
ateísmo ―frouxo‖ ou a imputação de ateísmo aos outros para desacreditar.
(BREMMER, 2010, p.19-20)
472
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
É importante compreender que os cépticos e descrentes sempre
existiram na humanidade, e estavam sujeitos às circunstancias históricas.
Alguns períodos toleraram mais as pessoas consideradas ateístas, mas no
geral o ateísmo era visto como teorias aceitáveis sobre os deuses e a
origem da religião. (BREMMER, 2010, p.20)
Por isso, temos de prestar mais atenção aos diferentes períodos em
que o ateísmo de certo modo dissipou do jeito que os Gregos e Romanos
posteriores interpretam os seus antecessores e as razões pelas quais as
pessoas de uma dada época colocam o ateísmo aos contemporâneos que
tem conceitos religiosos diferentes dos seus. (BREMMER, 2010, p.19-20)
No período clássico houve um grande interesse pelo ateísmo, este
termo classificava aqueles pensadores e pessoas que negavam a
existência dos deuses. Publicações desta época são reescritas em edições
mais modernas, e nos fazem perceber de forma diferente os antigos
indícios gregos escritos no século XX. (BREMMER, 2010, p.20-21)
O ateísmo surge visivelmente na Grécia durante esse período, de modo
especial em Atenas, por volta do século V a.C. Ainda assim, o primeiro ―ateu‖
não foi desta região, ele veio a surgir por volta de c. 490-420, e era conhecido
como Protágoras, este foi muitíssimo respeitado ao longo de sua vida por
vários intelectuais da época, como, por exemplo, Platão.
Assim como Protágoras, outros intelectuais como Xenófanes (c. 570495 a.C) e Heráclito (c.500 a.C) tentaram introduzir novas ideias sobre o
divino, em vez de abolir completamente a ideia de divino. Mais tarde, no
século III d. C, Diógenes Laércio, por exemplo, veio a complementar esta
ideia revolucionária afirmando que ―o Sol era uma massa de metal ao
rubro‖ quebrando com a representação do Sol como o deus Hélio,
retirando assim a sua natureza divina. (BREMMER, 2010, p.22)
Bremmer (2010) afirma que a conexão entre ateísmo e a
especulação sobre a natureza dos céus é uma característica dos filósofos
considerados ateus nesta época. Platão descreve bem este pensamento
na Apologia:
Há um homem sábio chamado Sócrates que tem teorias sobre os
céus e que investigou tudo sob a terra, e que pode fazer o mais fraco
argumento derrotar o mais forte. São estas pessoas, senhores do júri,
os que disseminam estes rumores, que são os meus perigosos
acusadores, porque quem os ouve supõe que quem investiga tais
questões tem de ser um ateu. (BREMMER, 2010, P.23)
473
FONAPER
Neste, Platão esclarece que o filosofo Sócrates era um grande
sábio, que era discriminado por investigar além das bases filosóficas dadas
pela religião, outras filosofias, não tendo a ideologia religiosa como pura
verdade, sendo por isso considerado um ateu.
O filosofo Pródico foi bem mais radical afirmando que os deuses da
crença popular não existem, e as pessoas não sabem disso, mas o homem
primitivo, os frutos da terra e praticamente tudo o que contribui para a sua
existência. Continuou seu pensamento dizendo, que os primeiros conceitos de
deuses começaram a surgir quando o homem primitivo passou a chamar de
―deuses‖ aos elementos da natureza dos quais mais dependiam como o Sol e
a Lua, os rios e os frutos. Ou seja, para Pródico, houve um tempo sem
deuses, apesar de o homem já existir. E a ideia de religião só veio surgir,
posteriormente, com o início da agricultura. (BREMMER, 2010, p.24)
Bremmer (2010) relata que o filosofo Sísifo (415 a. C), o grego mais
esperto da mitologia, afirma que a religião foi inventada para assegurar o
bom comportamento dos seres humanos. E Crítias (450-403 a. C) relata
este pensamento, com a seguinte passagem:
Houve um tempo em que a vida dos seres humanos era desordenada,
semelhante a dos animais e regida pela força, não havendo
recompensa para o virtuoso nem castigo para o perverso. Depois,
penso que os seres humanos decidiram estabelecer as leis como
castigo de modo a que a justiça pudesse governar mantendo o Crime
e a Violência como escravos. E só castigavam quem continuasse a
fazer o mal. Então, dado que as leis restringiam os actos de violência
aberta, os homens continuaram a cometê-los em segredo; então,
penso, um homem sábio e esperto inventou para os mortais o medo
dos deuses, de modo a dissuadir os perversos, quando agem ou
dizem ou pensam algo em segredo (...). (BREMMER, 2010, P.26)
Sócrates (469-399 a.C) foi acusado pelos Atenienses de ―não
reconhecer os deuses que a cidade reconhece e de introduzir poderes
novos‖, colocando em dúvida os deuses tradicionais. Mas só após a morte
de Sócrates, já em Platão (c. 429-347) é que a palavra grega atheos, cujo
significado original é ―sem deuses, abandonado pelos deuses‖, realmente
ganha força e desgasta cada vez mais as crenças tradicionais, tornando os
―verdadeiros‖ ateus um fenômeno raro no mundo grego. (BREMMER,
2010, P.29)
Outro fato importante para a história do ateísmo na Antiguidade,
além da abertura para a liberdade intelectual, foi que os Gregos, Romanos,
474
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
pagãos e cristãos utilizaram do termo ―ateu‖ como forma de rotular os seus
inimigos. (BREMMER, 2010, P.32)
O Ateísmo na Modernidade
Na modernidade, período que predomina o ―desejo de um domínio
omniabarcante da realidade por meios racionais e\ou científicos‖ o teísmo
(a crença em deus) vai se perdendo, dando lugar ao ateísmo que passa a
ser uma característica desse período, estimulando os novos filósofos a
defenderem a necessidade de deixar para o passado os ideais culturais
religiosos até agora firmados. (HYMAN, 2010, P.40)
O termo ―ateísmo‖ vai sendo definido com menos limitações, como a
―crença de que Deus não existe‖, porém o entendimento desse conceito
vai depender da concepção de teísmo que se tenha. O que significa que
existirão tantas variedades de ateísmo quantas as variedades de teísmo.
Isto é, o ateísmo será sempre uma negação de uma forma particular de
teísmo. (HYMAN, 2010, P.41)
Mais especificamente o termo ateísmo neste período, se
caracterizava mais como uma negação da intervenção da providencia
divina e não uma negação da existência de Deus, ou seja, se assemelhava
a heresia e não uma negação sem rodeios do teísmo. Porém, esse
significado rapidamente vai se moldando e ficando cada vez mais parecido
com a definição que nos é mais familiar. Devido ao crescimento do
ateísmo a todos os níveis sociais, este ganha importância, não apenas de
todo um corpo de literatura, como também de políticas, sentenças judiciais
e preocupações sociais contra os ateus, pois estes passaram a ocupar o
centro da polêmica. O termo ―ateísmo‖ que até então era usado como uma
forma de acusação, só vem a surgir como termo de autodefinição, uma
declaração da nossa própria crença (ou ausência dela) no século XVIII
entre os intelectuais parisienses. (HYMAN, 2010, P.42)
Entre estes intelectuais, está Denis Diderot, o primeiro dos ateus,
não apenas cronologicamente, como também o primeiro e principal
defensor e influência. Seu argumento se baseava na física matemática de
Descartes e a mecânica universal de Newton. A partir daí, apresentou ―a
formulação inicial, mas definitiva‖ do ateísmo: ―o princípio de tudo é a
natureza criadora, a matéria na sua autoactividade, produzindo
eternamente toda a mudança e todo o desígnio‖. (HYMAN, 2010, P.43). O
475
FONAPER
ponto importante a ser destacado é que Diderot chegou a suas conclusões
ateias por meio da intensificação das ideias de Descartes e Newton, dos
quais dependiam os cristãos para defenderem seus conceitos de fé.
Devido o termo ateísmo estar ligado com a política revolucionária de
extrema- esquerda e com as ideias de Karl Marx, muitos intelectuais, entre
eles Huxley e os seus companheiros, que criaram um novo termo, o
―agnosticismo‖, que não representava um novo credo, mas um
desconhecimento metafísico; esse passa a disputar com o ateísmo como
disposição intelectual alternativa. (HYMAN, 2010, P.43)
Apesar de todo este tumulto em torno do ateísmo, ainda existiam
pessoas que lutavam para que este fosse aceitável e respeitável. Um que
teve grande destaque foi Charles Bradlaugh, por volta do século XIX, ele
foi o primeiro ateu explícito e confesso do Parlamento britânico, que lutou
para que o ateísmo se tornasse aceitável na sociedade civil, e pelo direito
dos ateus testemunharem em tribunal. (HYMAN, 2010, P.44)
O ateísmo só vai ganhar mais impulso no final do século XIX, quando
Friedrich Nietzsche e John Newman tomaram consciência que um novo
espírito que se agitava e que teria grandes conseqüências, ou melhor, que
―a impotência religiosa, ou o desinteresse, não permaneceria um fenômeno
privado ou isolado, que isso caracterizaria cada vez mais o intelecto
instruído da Inglaterra, França e Alemanha e que a sua influência acabaria
por se fazer sentir em todos os aspectos rotineiros da civilização‖. Porém,
isso só veio acontecer sessenta anos depois, marcando o período como a
―era do ateísmo‖ e só veio a se enraizar nos últimos quarenta anos do
século XX. (HYMAN, 2010, P.45)
Esse novo ateísmo tinha características distintas dos conceitos
anteriores, ou seja, algo de distintivo na negação contemporânea de Deus,
tanto no que se refere ao seu alcance como a sua instituição cultural. A
ligação do ateísmo com a modernidade, é que nesta última, houve um
afastamento de um comprometimento religioso baseado na tradição, mas
esse fato não gerou o ateísmo generalizado, pois o ateísmo era uma
confissão minoritária, junto a outras alternativas de ―espiritualidades‖, que
surgiam no mundo ocidental moderno. (HYMAN, 2010, P.46)
A concepção de Deus a qual o ateísmo moderno se opôs é aquela
que o ver como pertencente à mesma ordem ou qualidade dos atributos
humanos, pois para eles Deus estava num grau maior. (HYMAN, 2010,
P.56)
476
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
Pode-se perceber a ligação da modernidade e do ateísmo, desta
forma com o ―fechamento‖ da primeira, o ateísmo e, consequentemente, o
teísmo mais moderno, sofrem transformações advindas do pósmodernismo, podendo ainda regredir para formas mais medievais.
Independente de qualquer um, o destino do ateísmo está ligado ao da
modernidade. (HYMAN, 2010, P.59-60)
Ateísmo e Religião
De acordo com o argumento de Martin (2010, p.283), o ateísmo em
si não é uma religião. Porém, existem três religiões mundiais, isto é, o
jainismo, budismo e confucionismo, que são ateístas, ou melhor, a
negação da existência de um Deus teísta. O ateísmo não se opõe às
religiões teístas, mas depende do contexto histórico do qual foi construído.
Independente da definição dada ao ateísmo, este não tem as
exigências necessárias para ser uma religião, pois o ateísmo negativo, ou
seja, não ter uma crença em Deus ou em deuses, não tem qualquer uma
das características constitutivas de um conceito de religião. Já o ateísmo
positivo, ou seja, a crença de que não há Deus, nem deuses, de acordo
com algumas definições de religião também não é considerado uma
religião. (MARTIN, 2010, P.288)
De acordo com Martin (2010, p. 291), o argumento que o jainismo é
uma religião ateísta, não é totalmente verdade, pois este é ateísta apenas
em sentido restrito, devido aos seus deuses terem pouco poder e não
desempenhar qualquer papel no objetivo jaina da salvação. Ou seja, os
deuses poderiam ser eliminados do jainismo sem que se perda o essencial
desta religião. Então, apesar de o jainismo não ser considerado de fato
uma religião ateia no sentido lato, poderia ser ateia nesse sentido.
(MARTIN, 2010, P.291)
Já no caso do budismo, se existir realmente a crença nos deuses
devas, então este não é uma religião ateia no sentido lato. E apesar
desses deuses não terem um papel na via budista para a salvação,
encontrada nas Quatro Nobres Verdades e na Nobre Via Óctupla, faziam
parte da mundividência budista. Assim, como o jainismo, o budismo é uma
religião ateia positiva com base em argumentos racionais. Como se sabe,
a tradição intelectual budista faz uso de razões para não acreditar em um
Deus teísta. (MARTIN, 2010, P.295)
477
FONAPER
Assim como o jainismo e o budismo, existe desacordo entre os
estudiosos sobre se o confucionismo é uma religião ateia. Os estudiosos
jesuítas nos séculos XVII e XVIII argumentaram que, visto o confucionismo
ser basicamente um sistema ético, os seus seguidores poderiam ser
convertidos ao cristianismo sem abandonar as suas próprias perspectivas.
Estudiosos protestantes missionários posteriores, como James Legge
(1815-1897), argumentaram que apesar de o próprio Confúcio ser céptico
quanto à religião, a perspectiva tradicional do Céu que as pessoas comuns
tinham era o verdadeiro Deus da religião cristã. (MARTIN, 2010, p.296)
Mas será que realmente existem religiões ateias? A resposta é a
seguinte, apesar de existir algumas religiões ateístas no sentido estrito, o
ateísmo não é contra necessariamente a religião. De acordo com Martin
(2010):
(...) apesar de o jainismo, budismo e confucionismo não serem ateias
no sentido lato, parece possível eliminar qualquer Deus ou deuses
destas religiões sem grande conseqüências, pois não parece que a via
da salvação espiritual e a forma de vida especifica por estas religiões
fossem significativamente afetadas ao eliminar todos os deuses.
(MARTIN, 2010, p.299)
Porém, saber-se que um ateísta é contrário às crenças teológicas da
religião é coerente com outros aspectos da religião. Um ateísta pode
apreciar os rituais de uma religião teísta por razões estéticas sem
necessariamente defender que o código ético de uma religião teísta está
correto, mesmo rejeitando a idéia de que Deus a criou. (MARTIN, 2010,
P.299).
Contextualizando o Ensino Religioso no âmbito escolar
Acredita-se que as escolas precisem ter uma orientação racional, de
conhecimento e análise da situação religiosa, quer dizer, durante as suas
tarefas educativas deve-se refletir sobre a realidade a partir das
referências oferecidas pelas ciências sobre os mais diversos elementos
que dão forma a sociedade. De acordo com contexto o estudioso Passos
afirma que:
O ER assume, necessariamente, em suas definições curriculares, a
crítica ao conhecimento tecnicista que instrumentaliza o conhecimento
no domínio de algum aspecto restrito da realidade, a crítica ao
478
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
positivismo que coloca a ciência como a versão da verdade e a crítica
a neutralidade das ciências como abordagem definitiva da realidade.
(PASSOS, 2007, p.37 – 46).
Isto porque na contemporaneidade a educação tem assumido uma
concepção integral do ser humano, buscando superar teorias e posturas
que privilegiam o racional, ignorando dimensões como a religiosa em
relação ao desenvolvimento do educando e no processo de construção do
conhecimento.
Segundo Sena (2005), o Ensino Religioso na atualidade esta inserido
na perspectiva de ―uma educação integral, que considera o ser humano na
totalidade do seu ser, a religiosidade e suas diferentes expressões se
apresentam hoje como uma dimensão humana relevante, manifestando os
níveis mais criativos e profundos do ser humano‖.
Devido ao importante papel da religião dentro das sociedades
humanas como expressão da religiosidade, a educação nos dia de hoje:
Não pode omitir a educação da religiosidade e o estudo do fenômeno
religioso, objeto da disciplina de Ensino Religioso‖. Diante de
situações-limite, do inexplicável, como o sofrimento e a morte, surgem
perguntas existenciais para as quais a ciência não tem respostas.
Essa a razão pela qual assistimos hoje o retorno da sensibilidade ao
sagrado, a busca do misticismo de várias formas, a valorização do
mistério, a busca de espiritualidade. O fenômeno religioso se impõe
como um aspecto indissociável da vida humana, cujo estudo não pode
ficar fora da escola. (SENA, 2005)
Sabe-se que a principal função da instituição escolar é ―fornecer
instrumentos de leitura da realidade, capacitando o educando para
compreender melhor a si mesmo e ao mundo, e criar condições para a
convivência entre pessoas‖. (SENA, 2005)
Por este motivo, a inserção do Ensino Religioso no currículo escolar,
como disciplina e área de conhecimento, visa desenvolver a espiritualidade
presente no contexto espiritual ―preenchendo o vazio deixado por uma
educação com predominância quase exclusiva no racional, no
desenvolvimento científico e tecnológico do educando, deixando de lado as
razões e as finalidades últimas da existência‖. (SENA, 2005)
Partindo deste princípio, o Ensino Religioso visa desenvolver a
religiosidade através do conhecimento dos elementos básicos que
compõem o fenômeno religioso, partindo das experiências religiosas de
cada aluno.
479
FONAPER
O ensino religioso como área de conhecimento deve em seu fazer
pedagógico partir de conhecimentos produzidos, acumulados e
sistematizados historicamente de forma a possibilitar aos educandos
conhecer o passado e o presente numa perspectiva de criar novos
conhecimentos. (OLENIKI, 2005)
Ou melhor, o fazer pedagógico no Ensino Religioso acontece por
meio do serviço ao educando, no diálogo inter-religioso com o propósito de
gerar a informação, a interpretação do conhecimento acumulado, a
ressignificação de conteúdos e conceitos durante o processo de ensinoaprendizagem, em relação às diferenças, diversidades e pluralidade, numa
ênfase histórica, que permite o entendimento de si e do outro, viabilizando
a formação do cidadão. (OLENIKI, 2005)
Qualquer área de conhecimento deve partir do ponto que ―ensinar
exige respeito aos saberes e experiências de vida dos educandos. Sendo
fundamental discutir com os alunos a razão de ser de alguns dos seus
saberes em relação com o ensino dos conteúdos‖; (FREIRE, 2011, P.31)
Logo, o Ensino Religioso que é reconhecido como área de
conhecimento constituirá um referencial estruturado de leitura e
interpretação da realidade a partir do seu foco de ação, do seu objeto de
estudo destacando os elementos essenciais pra garantir a participação dos
educandos como cidadãos na sociedade de forma autônoma. (OLENIKI,
2005)
Este referencial metodológico deve possibilitar a abertura para um
ato de ensinar que ―exija respeito à autonomia do ser do educando, e este
saber vai contra uma prática docente autoritária, que tira a liberdade do
aluno, para tanto é preciso desenvolver uma prática baseada no diálogo‖.
(FREIRE, 2003, p.59)
O ensino religioso como área de conhecimento será definido com
base no seguinte foco teórico: Tradições e Culturas Teologias, Textos
Orais e Escritos Sagrados, Ritos e Ethos; da adequação do teórico ao
contexto comunidade escolar e do exercício ou fazer pedagógico na
relação ensino aprendizagem junto aos educandos.
Segundo Oleniki (2005), este processo será efetivado pela releitura e
compreensão do religioso na sociedade de acordo com uma metodologia
que permite realizar a partir dos conteúdos programáticos: a observação
do fenômeno religioso em suas múltiplas dimensões, destacando-se desta
observação a análise da ação, falta ou parte dela em seu contexto, e em
480
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
suas relações para explorar e trabalhar os conceitos básicos do Ensino
Religioso; a informação enquanto aproximação de um aspecto do
conhecimento religioso a partir do qual se torna possível ao educando
ampliar seu conhecimento para construir instrumentos que possibilitem
referenciais de interpretação ou análise efetivando-se a ressignificação de
conceitos; reflexão como aspecto que oportuniza o confronto pedagógico
do conhecimento teórico com a prática.
É refletindo o fenômeno religioso dentro do contexto real do
educando que se efetua uma aprendizagem significativa, possibilitando a
construção de soluções para as dúvidas e problemas que surgirem
relacionados ao aspecto religioso. Ou seja, ―ensinar não é transferir
conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção, sua
construção‖ (FREIRE, 2005, p.24)
Pode- se descrever o procedimento metodológico do Ensino
Religioso como área de conhecimento a partir da caracterização do foco
teórico, do fazer pedagógico que se concentram em torno de objetivos e
conteúdos que remetem a metodologia de interação, entre os aspectos
historicamente construídos nas diferentes tradições religiosas e a sua
presença na cultura vigente. Sendo importante o tratamento metodológico
se concretizar na ação - reflexão - ação promovida pela observação informação - reflexão. (OLENIKI, 2005)
Isto é, no procedimento metodológico do Ensino Religioso assim
como de qualquer outra disciplina do currículo escolar é necessário:
Inserir o reconhecimento e a assunção da identidade cultural do
educando; só assim teremos o conhecimento dos seres inacabados
que somos. O próprio discurso teórico tão necessário para a reflexão
critica, tem de ser de tal modo concreto que quase se confunda com a
prática. (FREIRE, 2011, p.39 e 42)
É preciso compreender que a linguagem do ensino religioso está
dentro da formação básica do cidadão e ―alicerça nos princípios básicos da
cidadania que se concretizam na formação integral do educando‖.
(HOLANDA, 2005)
Para tanto, pode-se tomar como parâmetro os princípios defendido
pelas Diretrizes Curriculares para o Ensino Fundamental e os princípios e
fins da Educação Nacional da lei nº 9.394/96 cujo principal fim é orientar as
escolas na elaboração de suas ações pedagógicas.
481
FONAPER
De acordo com a professora Holanda (2005) no caso do ensino
religioso esses princípios apresentam uma relação próxima com o campo
de atuação deste ensino, podendo expressar muito bem a linguagem que é
utilizada no desenvolvimento dos conteúdos, refletindo algumas questões
básicas da educação.
Se for ensino, continua a professora, ensina o quê? Na linguagem
pedagógica do ensino religioso, podem ser observados os seguintes
critérios e atitudes para a mudança e para a construção de valores, tais
como: a valorização das experiências religiosas previamente construídas
pelos alunos e alunas, favorecendo a capacidade de vivenciar uma relação
emancipada com as diferentes culturas, considerando os princípios éticos
da autonomia, da responsabilidade e do respeito ao bem comum; o
exercício da criatividade e do respeito à ordem democrática em sala de
aula, a partir da articulação dos conhecimentos, das discussões, debate e
do desenvolvimento com base nos princípios políticos, caracterizados
pelos direitos e deveres da cidadania e do respeito ao diferente que se
manifesta nas culturas e tradições religiosas; a criação de condições para
que cada educando(a) construa sua identidade, para saber acolher,
conhecer, conviver e aprender a ser, valorizando e respeitando o outro,
superando preconceitos que desvalorizam qualquer experiência religiosa,
tendo como referência os princípios estéticos da sensibilidade e da
criatividade.
E acrescenta, que esta linguagem tem sentido de busca, de
entendimento que responda às questões existenciais: Quem sou? De onde
vim? Para onde vou? Diante dessas indagações o ser humano desenvolve
competências para relacionar-se consigo, com a natureza, a sociedade e o
transcendente, definindo seu projeto pessoal e coletivo de vida.
No desenrolar dos eixos temáticos do ensino religioso e nos blocos
de conteúdos apresentados nos Parâmetros Curriculares Nacionais, o
entendimento dessa linguagem destaca a interação entre quem aprende e
quem ensina para construção do conhecimento histórico cultural, devido à
importância de toda cultura. Sabe- se que essa linguagem estimula o
diálogo, a tolerância e a convivência pacífica com as manifestações
religiosas, respeitando a pluralidade cultural religiosa brasileira.
(HOLANDA, 2005)
De acordo com a nova redação do art. 33 da LDB, com a sanção da
Lei 9475/97, os sistemas de ensino terão maior responsabilidade na
482
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
definição de conteúdos para o ensino religioso, incluindo as características
como cultos, movimentos, grupos, filosofias de vida e outras que integram
uma sociedade pluralista, com as mais diversificadas tradições e
manifestações culturais presentes no Brasil. (FIGUEIREDO, 2005)
Os dois parágrafos contidos no art. 1º da Lei 9475/97 que destacam
a definição das responsabilidades, referentes aos conteúdos do ensino
religioso, são: ―§ 1º - Os sistemas de ensino regulamentarão os
procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e
estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores. §
2º - Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas
diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do
ensino religioso". (BRASIL, 1997).
O processo de construção dos conteúdos para a disciplina de ensino
religioso deve ser feito segundo a atual LDB, por meio da autonomia,
incluindo o incentivo a participação da sociedade, especialmente da
comunidade educativa, de forma ampla, em todo projeto políticopedagógico.
Segundo o professor Antonio Boeing (2005) para se concretizar o
Ensino Religioso destaca alguns aspectos fundamentais, tais como: as
contribuições das áreas afins, como a antropologia, psicologia, pedagogia,
sociologia, ciências da religião e teologias; a busca permanente do sentido
da vida; a superação da fragmentação das experiências e da realidade; o
pluralismo religioso; a compreensão do campo simbólico; e, a necessidade
de evitar o proselitismo.
Partindo desse contexto o Fórum Nacional Permanente do Ensino
Religioso (FONAPER) pensando na efetivação desta área do
conhecimento, definiu cinco eixos e os respectivos conteúdos: Culturas e
Tradições Religiosas - desenvolve os temas decorrentes da relação entre
cultura e tradição religiosa, tais como: a ideia Transcendente na visão
tradicional e atual; a evolução da estrutura religiosa nas organizações
humanas no decorrer dos tempos; a função política das ideologias
religiosas; e, as determinações da tradição religiosa na construção mental
do inconsciente pessoal e coletivo; Teologias - analisa as múltiplas
concepções do Transcendente, dentre os conteúdos destacam-se: a
descrição das representações do Transcendente nas tradições religiosas;
o conjunto de muitas crenças e doutrinas que orientam a vida do fiel nas
tradições religiosas; e, as possíveis respostas norteadoras do sentido da
483
FONAPER
vida: ressurreição, reencarnação, ancestralidade, nada; Textos Sagrados
e Tradições Orais - aprofunda o significado da palavra sagrada no tempo
e no espaço, com destaque para: a autoridade do discurso religioso
fundamentado na experiência mística do emissor que a transmite como
verdade do Transcendente para o povo; o conhecimento dos
acontecimentos religiosos que originaram os mitos e segredos sagrados e
a formação dos textos; a descrição do contexto sócio- político religioso
determinante para a redação final dos textos sagrados; e, a análise e a
hermenêutica atualizada dos textos sagrados; Ritos - busca o
entendimento das práticas celebrativas, por isso contempla: a descrição de
práticas religiosas significantes, elaboradas pelos diferentes grupos
religiosos; a identificação dos símbolos mais importantes de cada tradição
religiosa, comparando seu(s) significado(s); e, o estudo dos métodos
utilizados pelas diferentes tradições religiosas no relacionamento com o
Transcendente, consigo mesmo, com os outros e com o mundo; Ethos analisa a vivência crítica e utópica da ética humana a partir das tradições
religiosas, por isso considera: as orientações para o relacionamento com o
outro, permeado por valores; o conhecimento do conjunto de normas de
cada tradição religiosa, apresentado para os fiéis no contexto da respectiva
cultura; e, a fundamentação dos limites éticos propostos pelas várias
tradições religiosas. (Cf. FONAPER. Caderno Temático Ensino Religioso,
nº. 1, p. 31-32).
Tanto os eixos e como os conteúdos do Ensino Religioso foram
elaborados a partir da concepção de que a atuação do ser humano não se
limita às relações com o meio ambiente e as relações sociais, pois busca o
transcendente. Os eixos e conteúdos do Ensino Religioso contribuem para
que o ser humano inacabado, inquieto e aberto ao Transcendente. Já dizia
Freire:
É na inconclusão do ser, que se sabe como tal, que se funda a
educação como processo permanente. Mulheres e homens se
tornaram educáveis na medida em que se reconheceram inacabados.
Não foi a educação que fez mulheres e homens educáveis, mas a
consciência de sua inconclusão é que gerou sua educabilidade. É
também na inconclusão de que nos tornamos conscientes e que nos
inserta no movimento permanente de procura que se alicerça a
esperança. ―Não sou esperançoso‖, disse certa vez, por pura teimosia,
mas por exigência ontológica. (FREIRE, 2003, p.58).
484
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
O Ensino Religioso sempre foi desenvolvido dentro da doutrina
estabelecida pela religião católica romana deste os seus primórdios. Só na
legislação de 1997 foi que houve mudanças significativas no modo de
proceder com o Ensino Religioso.
O modelo aderido para o desenvolvimento do Ensino Religioso na
prática de sala de aula; a seleção e organização dos conteúdos; a
pedagogia utilizada e a formação dos professores que atuam nessa área
vão depender ―das condições legais, e, especialmente, da concepção que
se tenha desse componente curricular e da interpretação que se faz do
artigo 33 da LDB‖. (SENA, 2005)
Dependendo destas escolhas os modelos a serem seguidos podem
ser os seguintes: confessional- ofertado em coerência com a opção
religiosa do aluno ou do seu responsável e ministrado por professores
qualificados pelas respectivas entidades religiosas; o inter- confessionalo ensino religioso passa a ser ministrado mediante um acordo estabelecido
entre os diversos grupos religiosos de confissões cristãs. Tem como
objetivo destacar o que é comum às diferentes Igrejas ou confissões e
respeita as características especificidade de cada uma e o conteúdo que
servira de base é fundamentado na Bíblia; supra- confessionalministrado nas escolas públicas, não aceita qualquer tipo de proselitismo
religioso, preconceito ou manifestação em desarmonia com o direito
individual dos alunos e de suas famílias de seguir um credo religioso ou
mesmo o de não seguir nenhum, garantindo o respeito a Deus, à
diversidade cultural e religiosa, e tomando como base princípios de
cidadania, ética, tolerância e em valores universais existentes em todas as
religiões; Disciplina curricular- nesse modelo o Ensino Religioso é visto
como área de conhecimento, a ênfase não é nas crenças ou religiões, mas
no seu objeto de estudo, o fenômeno religioso. Tem como principal
objetivo desenvolver o humanismo e o respeito às liberdades individuais e
a questão da tolerância para com os que explanam crenças diferentes a
favor da pluralidade étnica e cultural da nação brasileira.
Considerações Finais
Os resultados para as perguntas da pesquisa referentes à temática
deste artigo mostraram que existem sim alunos ateus/ateias nas escolas
485
FONAPER
envolvidas e na maioria delas não existem materiais didáticos que
abordem o tema e as questões referentes ao ateísmo.
As respostas para a pergunta: Existe algum material didático voltado
para alunos ateus\ateias na escola onde trabalha ou faz estágio? Foram as
seguintes, entre os 30 sujeitos entrevistados, 28 falaram que NÃO e
apenas 02 sujeitos falaram que SIM, que existem alunos ateus\ateias nas
escolas onde atuam.
E entre os dois que falaram SIM, foi pedido que respondessem qual
era esse material didático, as respostas foram às seguintes:
Sujeito 1 – ―Sim. O professor aborda as questões nos conteúdos‖
Sujeito 2- ―Sim. Através do processo em sala de aula. A respeito do assunto
ateísmo‖
Porém, nenhum dos 02 sujeitos que responderam SIM,
especificaram o material usado, apenas que a temática era abordada de
forma mais geral nos conteúdos das aulas.
Já para a outra pergunta, ou seja: Na turma de Ensino Religioso que
você faz estágio ou trabalha existem alunos (as) ateus/ateias? Dos 30
sujeitos entrevistados, 11 falaram que SIM; 14 falaram que NÃO e 05
afirmaram que NÃO SABEM, se existem alunos ateus\ateias nas escolas
onde atuam.
Os resultados mostram que apesar de existirem alunos ateus\ateias
nas escolas públicas da cidade de João Pessoa-PB, pouco é trabalhado
dentro de matérias didáticos mais específicos no contexto da disciplina
Ensino Religioso. Acredito que desenvolver estes materiais ajudariam a
desenvolver o respeito a esta opção não-religiosa de vida, como também
abriria espaço para que alunos com estas opções de vida se sentissem
incluídos neste contexto e pudessem refletir a cerca da diversidade do
mundo religioso.
Referências
BRANDENBURG, Laude E. A Interação Pedagógica no Ensino
Religioso. São Leopoldo RS: Sinodal, 2004.
BREMMER, J. O ateísmo na antiguidade. In: MARTIN, M. Um Mundo
sem Deus. Ensaios sobre o Ateísmo. Ed. 70, Lisboa- Portugal, 2010.
486
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
FONAPER. Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino
Religioso (PCNER). São Paulo: Mundo Mirim, 2009.
FONAPER. Caderno Temático Ensino Religioso, nº. 1, s/a.
OLENIKI, M. L. R.; DALDEGAN, Viviane Mayer. Encantar. Uma prática
pedagógica no Ensino Religioso. 2ª. ed. Petrópolis: Editora Vozes, 2005.
HYMAN, G. O ateísmo na história moderna. In: MARTIN, M. Um Mundo
sem Deus. Ensaios sobre o Ateísmo. Ed. 70, Lisboa- Portugal, 2010.
JODELET, D. (Org.) As representações sociais. Rio de Janeiro, Ed.UERJ,
1989.
JUNQUEIRA, Sérgio. A presença da religião nos processos educacionais.
In: HUFF, J, ARNALDO, E. e RODRIGUES, E. Experiências e
Interpretações do Sagrado: interfaces entre saberes acadêmicos e
religiosos. São Paulo: Paulinas, 2012 (Coleção ABHR, v.9)
MARTIN, M. Ateísmo e Religião. In: MARTIN, M. Um Mundo sem Deus.
Ensaios sobre o Ateísmo. Ed. 70, Lisboa- Portugal, 2010.
487
POSSIBILIDADES METODOLÓGICAS PARA O ENSINO
RELIGIOSO NO ENSINO MÉDIO EM SANTA CATARINA
Eliston Terci Panzenhagen - UNOCHAPECÓ1
Resumo:
Trabalho realizado no âmbito do curso Ciências da Religião – Licenciatura em Ensino
Religioso - PARFOR/UNOCHAPECÓ. Objetiva estudar a possibilidade de uma proposta
metodológica para o Ensino Religioso (ER) no Ensino Médio (EM). De início, busca-se uma
compreensão introdutória do EM e seus indicadores no estado nos últimos anos, bem como
do ER enquanto área do conhecimento e componente integrante da base nacional comum.
Após, faz-se um levantamento sobre a presença do ER na matriz curricular do EM em
Santa Catarina. Posteriormente, realiza-se análise da legislação, tais como LDB 9.394/96,
CONAE-2010, PNE 2011-2020, Resolução CNE/CEB Nº 4/2010, Resolução CNE/CEB Nº
2/2012, que permitem visualizar perspectivas didático/metodológicas para o trabalho com o
ER nessa modalidade de ensino e apontam possibilidades.
Palavras-Chave: Ensino Religioso, Ensino Médio, possibilidades metodológicas.
Por uma discussão introdutória
Ao nos atermos a análise da realidade dos currículos escolares no
Brasil e de alguns de seus indicadores nas últimas décadas, ou mesmo no
último século, percebemos claramente que um grande debate faz-se
necessário, assim como, o ―chão de sala de aula‖ se apresenta como
problema de pesquisa cada vez mais intrigante e desafiador. Neste
sentido, conseguimos estabelecer uma conexão bastante intensa entre as
qualidades, os pontos críticos por assim dizer, e também as mudanças
necessárias na educação com uma questão muito simples (ou complexa)
que é o método (metodologia), ou seja, a forma pela qual conduzimos o(s)
processo(s) ensino aprendizagem, tendo ciência de que, métodos
(metodologias) derivam de uma concepção mais ampla que se desenvolve
acerca dos processos educativos e que influenciam sua prática, e também,
por sua vez, possibilitam o desenvolvimento de novas concepções.
Para Dmitruck (2012, p. 186)
1
Graduado em Filosofia – UNOESC/SC; Graduado em Ciências da Religião –
UNOCHAPECÓ/SC; Especialista em Filosofia – CELER FACULDADES/SC;
Especialista em Gestão Escolar – UFSC; Mestrando em Educação UNOCHAPECÓ/SC.
Email elistonp@unochapecó.edu.br
FONAPER
O método representa o ―caminho‖; define o ―o que fazer‖, as etapas a
serem vencidas para alcançar os objetivos propostos. As técnicas se
configuram como um conjunto de normas que orientam o ―como
fazer‖, da forma mais adequada e precisa possível. [...] Portanto,
pode-se afirmar que o método constitui um procedimento estratégico
geral que pode abranger inúmeras técnicas, isto é, procedimentos
específicos mesmo dentro das diversas etapas de um método.
(DMITRUCK, 2012, p. 186)
Compreendendo desta forma, que metodologia deriva de método,
esta nos remete a uma discussão ampla, ou seja, diante dos inúmeros
problemas pelos quais transita a educação brasileira, principalmente a
pública, percebemos que um descompasso entre políticas educacionais e
realidade educacional se desvenda, sendo que, em sua grande maioria
das discussões, a questão metodológica aparece como foco central. Digo
isto, partindo dos reclamos dos docentes, das notícias veiculadas na mídia
diariamente e da realidade cotidiana de sala de aula com que convivo e
com a qual convivem milhares de professores brasileiros bem como alunos
e famílias, uma vez que, são muitos os movimentos que envolvem novos
projetos, políticas, modelos, metodologias e porque não dizer, interesses e,
contraditoriamente, muitas vezes, raras preocupações que têm como
assunto principal a qualidade da educação brasileira; porém na realidade
concreta e prática, a maioria destes não passam de experiências isoladas,
modismos, movimentos circulares que nos dão a falsa impressão de
movimento, ou ainda, planos de governo ao invés de projetos de Estado.
Isto posto, não podemos querer insinuar e nem afirmar que a
educação pública brasileira seja um lamaçal do qual, portanto, também
fizemos parte. Muito pelo contrário, o interesse aqui é mostrar que existe e
se torna cada vez mais visível que a educação não necessita ou pelo
menos não sobrevive de falácias, de projetos e políticas que teoricamente
sejam exemplares, mas na operacionalização, na trama diária do processo
educacional que carece de investimento (de todas as ordens e esferas) de
apoio pedagógico e de uma compreensão mais qualitativa do que
quantitativa em relação à aprendizagem dos educandos, de forma que
possamos qualificar a organização metodológica do processo educativo e
da consequente construção do conhecimento e não conceber o educador
como uma espécie de marionete que esteja a serviço de ideologias
dominantes.
É sabido que a questão metodológica do trabalho pedagógico requer
fundamentação teórica, investimento em estrutura, formação e, além disto,
490
Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
do estabelecimento de diversas parcerias, tanto que, o educador não é o
único responsável pelo trabalho pedagógico que desenvolve assim como a
escola não é o único espaço educativo. O trabalho pedagógico que a
escola desenvolve, bem como a metodologia do trabalho docente,
dependem de uma esfera mais ampla, emanando de determinada
concepção que se tenha de educação, do qual deriva toda a estruturação e
organização da(s) rede(s) e sistema(s) de ensino, e que, posteriormente
vão veicular determinada compreensão de mundo.
Por este motivo precisamos ao mesmo tempo em que falamos de
metodologia ou possibilidades metodológicas, falar da formação docente e
da necessária consciência crítica do educador. Esta consciência, por sua
vez, significa desenvolver a capacidade de ir além do nível individual em
que nos encontramos enquanto educadores, de compreender o contexto
que nos envolve e transpor a subjetividade particular para estabelecer,
gradativamente, uma compreensão global, de forma a perceber as
necessidades humanas, as relações em seus diferentes níveis e também
as formas pelas quais podemos transformar a partir do processo
pedagógico, pois:
Apesar de uma melhoria quantitativa ocorrida ao longo das últimas
décadas, principalmente no século XX, o sistema educacional
apresenta ainda hoje resultados que correspondem a um fraquíssimo
desempenho e alto grau de seletividade, evidenciado no ensino
fundamental a partir das altas taxas de evasão e repetência. (SANTA
CATARINA, 2006, p. 71)
Antes de prosseguir, é importante conceituar o que se compreende
por processo ensino aprendizagem, que pode ser considerado como
cenário ou palco onde se constroem ou desenvolvem os índices que neste
momento pretendemos analisar. Neste sentido, a Proposta Curricular de
Santa Catarina – Estudos Temáticos (2005, p. 5-6) contribui para
esclarecer, dizendo que:
O advento das novas tecnologias da informação e da comunicação
proporciona o repensar do processo ensino-aprendizagem. O ensino
circunscrito à sala de aula, pressupondo o domínio pelo professor de
uma determinada disciplina ou área do conhecimento, avança na
direção de um processo aberto de aprendizagem em que todos os
atores têm oportunidades quase infinitas de acessar bases de
informações e experiências que fluem de todas as partes do mundo
pela rede informatizada de comunicações. [...] A transformação dos
meios de comunicação leva necessariamente à mudança do processo
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FONAPER
de ensino-aprendizagem. Não há como ser um bom professor, ditando
aos alunos trechos de uma apostila amarelada ou de um livro-texto
que não acompanha a dinâmica de renovação das informações que
fluem através das redes em permanente atualização. Essa mudança
atinge todos os níveis e modalidades de educação. Desde crianças,
as pessoas têm acesso a interações de alto conteúdo comunicativo.
Os jovens e as crianças de hoje são sujeitos de aprendizagem ativos e
rebeldes a uma prática pedagógica unidirecionada ao aluno. Cabe,
então, ao professor de sucesso, exercer o importante papel de líder e
facilitador do processo interativo de ensino-aprendizagem. As novas
tecnologias têm transformado todas as organizações contemporâneas,
inclusive a Escola. Por isso, torna-se necessário construir uma Escola
diferente, gerida de forma diferente e com um outro processo de
ensino-aprendizagem. O diferencial é sair do modelo autocrático,
pautado pela relação autoritária de comando e obediência, na qual um
manda e o outro obedece, um ensina e o outro aprende, para um
processo democrático de educação em que as pessoas interagem e
se comprometem de forma coletiva com os objetivos educacionais e
com a direção de futuro desejada. (SANTA CATARINA, 2005, p. 5-6)
Com base nesta compreensão de processo ensino-aprendizagem, e
ao observarmos índices que demonstram e avaliam a aprendizagem
escolar, percebemos que ainda é bastante difícil a uma escola conseguir
alcançar 50% do que é esperado pelos sistemas de ensino em termos de
avaliação, e desta forma, tem-se uma noção prévia do quanto ainda é
necessário avançar para uma reconfiguração dos processos educativos a
fim de que se alcance o sucesso do educando na escola.
Porém, também não cabe aqui culpar demasiadamente a escola por
todos os infortúnios dos quais é ou somos vítima. Sabe-se muito bem que
o rendimento escolar e a aprendizagem não são dadas ou construídas
unicamente na escola, ou como se, a escola fosse uma redoma de vidro,
dentro do qual resguardássemos nossos educandos de tudo que ele vive
ou viveria fora do contexto escolar. Neste sentido, cabe-nos compreender
como se dão as diferentes relações no contexto da escola, considerando
este como o lugar por excelência quando nos referimos a aprendizagem
sistematizada, ou seja, organizada dentro de um ritual pedagogicamente
organizado e estruturado, envolvido por diferentes espaços, tempos,
compreensões e conhecimentos, ou seja, o currículo escolar. Precisa-se
superar muito ainda e coletivamente crescer neste ambiente/espaço.
Por muito tempo, e por diversos motivos, o conhecimento científico,
por assim dizer, foi considerado como único conhecimento válido perante
os olhos dos currículos escolares e das academias. Ao mesmo tempo,
cabe lembrar que o conhecimento filosófico, o religioso, o mítico e o
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Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
conhecimento gerado pelo senso comum, foram e às vezes ainda são
considerados como inaceitáveis ou inválidos perante a ciência. Até aqui,
pouco se conseguiu tratar de assuntos filosóficos ou religiosos, por
exemplo, num viés fenomenológico nas escolas públicas brasileiras.
A ausência de disciplinas da área de ciências humanas nos
currículos escolares favorece uma prática de ensino aprendizagem que
não tenha como foco principal a contextualização, questionamento, ou
reflexão acerca da presença e da ação do ser humano enquanto produtor
e construtor do conhecimento e da sua própria realidade, com
responsabilidade. Ou seja, a construção de um ser pensante, seja em nível
de educador ou de educando, que se sinta integrante da realidade que o
compreende e responsável pela mesma, tem recebido grande contribuição
das disciplinas curriculares das ciências humanas.
Desta forma, podemos afirmar que a área de ciências humanas e
suas tecnologias, tem uma função de, na escola e na academia, propiciar
um conhecimento amplo e integrado sobre o ser humano. Com base no
que já dizia o próprio Sócrates ―Conhece-te a ti mesmo‖, vemos a escola
como um dos espaços de construção, inclusive de construção humana e
responsável do individual e do social. A análise e a reflexão de tudo que
nos cerca, é tarefa fundamental das disciplinas das áreas humanas e do
educador comprometido com sua prática. Igualmente, a presença destas
disciplinas, como já percebido em outras épocas da história brasileira,
podem caracterizar na escola uma ameaça às constantes práticas de
subordinação, opressão e desconstrução da identidade e da racionalidade
humana, seja por quaisquer dos aparelhos ideológicos que compõe a
realidade social brasileira e que buscam na escola espaço para
reprodução de verdades e ―in‖verdades cristalizadas no decorrer do tempo.
Partindo mais especificamente do Ensino Religioso, no Brasil este foi
motivo de diversos embates e discussões quanto a ser ou não componente
curricular do Ensino Fundamental e Médio. Diferentes grupos têm se
posicionado a partir de diferentes interesses e concepções de ER.
Atualmente essas concepções e interesses perduram e volta e meia vêm à
tona. Neste contexto, o FONAPER vem construindo uma concepção de ER
que, ao estudar o fenômeno religioso, aborda epistemológica e
pedagogicamente a diversidade cultural religiosa, sem proselitismo (Lei nº
9.475/97).
493
FONAPER
No entanto, muito mais do que garantir a presença do ensino
religioso na escola e o não proselitismo em sua prática de ensino, cabenos discutir algumas questões fundamentais que ainda impedem um
processo de ensino aprendizagem pleno e eficiente no campo do Ensino
Religioso, de forma que o educando possa compreendê-lo enquanto
fenômeno universal e inerente à vida humana, independente de participar
ou não de uma prática confessional em suas comunidades onde vive, e
também compreender-se enquanto ser que vive, se relaciona, faz escolhas
e é responsável pelas suas opções.
Cabe-nos aqui, uma vez que se busca uma discussão acerca de uma
possibilidade metodológica do ER no ensino médio, reforçar a ideia da
escola e de educação como um espaço adequado para a discussão, o
debate, o crescimento coletivo, a proposição de novos conhecimentos e o
refutamento de outros que já não se adéquam mais ao tempo e espaço em
que vivemos. A educação e a escola, desta forma, precisam oferecer ao
educando uma possibilidade de interação, onde o sujeito cria e recria,
pensa, sugere, questiona e se afirma no mundo em que vive, de forma que
este mundo (espaço) não lhe seja hostil, ou seja, que o ser humano possa
viver num mundo pensado e construído por ele mesmo, que se percebe
detentor de direitos, deveres, responsabilidades e desafios.
Uma vez que o educador tiver uma compreensão da educação e da
escola enquanto uma oportunidade de construção e autoafirmação, este
necessariamente tratatrá com atenção o seu fazer e suas escolhas
metodológicas.
Educar para e na contemporaneidade com responsabilidade, porém,
nos traz outras tantas reflexões sejam de cunho físico, estrutural,
pedagógico, entre outros. Com base em tudo isso, podemos procurar nos
ater ao que nos enseja este trabalho, ou seja, qual a(s) possibilidade(s)
metodológica(s) do ER enquanto componente curricular para toda a
educação básica, a saber, também no ensino médio, nível de ensino em
que, na atualidade, este componente não é trabalhado em grande parte
dos estados brasileiros.
O Ensino Médio e o Ensino Religioso – Uma possibilidade!?
O Ensino Médio recebe diferentes conceituações e definições nos
diversos contextos em que se apresenta. É etapa integrante (final) da
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Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso
educação básica. Segundo a Resolução Nº 4, de 13 de julho de 2010, do
Conselho Nacional de Educação, que define Diretrizes Curriculares
Nacionais Gerais para a Educação Básica:
Art. 21. São etapas correspondentes a diferentes momentos
constitutivos do desenvolvimento educacional: I - a Educação Infantil,
que compreende: a Creche, englobando as diferentes etapas do
desenvolvimento da criança até 3 (três) anos e 11 (onze) meses; e a
Pré-Escola, com duração de 2 (dois) anos; II - o Ensino Fundamental,
obrigatório e gratuito, com duração de 9 (nove) anos, é organizado e
tratado em duas fases: a dos 5 (cinco) anos iniciais e a dos 4 (quatro)
anos finais; III - o Ensino Médio, com d