35 anos da Escola da Vila

Transcrição

35 anos da Escola da Vila
#35anos
ESCOLA DA VILA
35 ANOS ESCREVENDO HISTÓRIAS
E DESPERTANDO MEMÓRIAS.
ESCOLA DA VILA
35 anos escrevendo histórias
e despertando memórias
A gente nasce todos os dias. Novos contatos, novas histórias. E, de
repente, temos 35 anos e nossa curiosidade se renova a ponto de querer
perguntar:
Quando você chegou aqui? Por que veio? Encontrou o que buscava?
Passou muito tempo ou foi um encontro breve? Foi importante para você?
O que o marcou? Fez amigos? Onde estão? Aprendeu, e para que serviu?
Lembra-se dos detalhes ou só dos acontecimentos marcantes? Uma frase
ou uma pessoa inesquecível, você guardou na memória? E... como veio
parar aqui? Alguém o trouxe? Alguém lhe falou sobre? E o que mais? Sofreu,
chorou, sorriu, gargalhou? O que você viveu na Vila? Quer compartilhar
conosco?
Em 2015 celebramos nossos 35 anos e decidimos comemorar nos vendo
através dos olhos, das percepções e lembranças dos pais, mães, alunos,
ex-alunos, professores, funcionários, participantes dos cursos, assessores,
amigos.
Recebemos muitas histórias que emocionaram, alegraram, provocaram
risadas e lembranças importantes e significativas. Enchemo-nos de
orgulho ao constatar a importância desta escola na vida de tantas
pessoas.
Esta revista traz as 35 histórias mais curtidas e comentadas em nossas
redes sociais.
Agradecemos a todos que compartilharam conosco momentos tão
especiais.
2
Índice
#naprimeiradecada.......................... 4
Júlia Abrão................................... 46
Sônia Barreira................................ 5
Marcos Mourão (Marcola)............. 47
Zélia Cavalcanti ............................. 8
Aline Gasparini Montanheiro........ 51
Roseles N. Turatto, Rô................... 11
Monica G. Fortunato Friaça .......... 53
Rosa Iavelberg ............................. 12
#naterceiradecada......................... 55
Áurea Trigo................................... 14
Gabriella Leão Ferraz Montiel
e Mariana Segueira Rocha........... 56
Maria Cristina Pereira
(Cris Preta)................................... 18
Emerson Marinheiro..................... 57
Ana Paula Yazbek......................... 20
Fermín Damirdjian....................... 60
Maria da Penha Brant .................. 22
Andrea Aly ................................... 65
Fernanda Flores........................... 25
Andrea Monteiro........................... 67
Marta Durante - Diretora
pedagógica da Escola Santi......... 27
João Colombero........................... 71
#nasegundadecada........................ 29
Susane Lancman Sarfatti............. 30
Wanilda Tieppo............................ 33
Tiê Parma Yamato........................ 36
Andréa Polo.................................. 37
Edison Leite de Magalhães........... 39
Sandra Durazzo............................ 40
Angela Kim................................... 43
Daniela Munerato......................... 44
Carina Contarini Dietrich.............. 73
Débora Delmaschio Crotti............ 78
Rogê Carnaval.............................. 80
Miruna Genoino............................ 84
Rui Piranda, marido de Adriana,
pai de André, Olívia e Pedro.......... 88
Fernanda de Lima
Passamai Perez............................ 90
Renata Marzola ........................... 92
Cida, Luzinete, Sílvia Irene
e Vera........................................... 95
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#naprimeiradecada
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#35anosescoladavila
Por Sônia Barreira
Não é só a Escola da Vila que faz 35 anos em 2015. Também faço eu, 35 anos de Vila!
É um tempo tão grande, que escrever sobre ele fica parecendo impossível. Adio,
evito, busco algo que já escrevi no passado, perco no computador, desvio da tarefa
o mais que posso. Como abordar? O que contar? De qual ponto de vista?
Decido evitar o pessoal, afinal, o texto
será publicado e talvez seja inadequado misturar os dois universos. Mas,
me lembro que uma vez ouvi alguém
dizendo que, no caso do educador,
quando ele separa demais o pessoal
do profissional ambos saem perdendo. Faz sentido! Viver dos 22 anos de
idade aos 57 anos trabalhando diariamente em uma escola te mostra que
essa mistura é inevitável!
Vida com os filhos que crescem amigos de alunos que se tornam quase
filhos. Vida com os colegas que compartilham conhecimento, emoções,
angústias, conflitos, e se tornam queridos amigos. Vida com famílias diversas que acompanhamos de perto e
que se misturam com a nossa. Alunos
que crescem e se vão, mas voltam e se
tornam profissionais e colegas. Pequenos que se tornam adultos tão incrivelmente rápido, e trazem seus filhos para
oferecer a eles os desafios de uma formação que receberam de pessoas em
quem confiam. Colegas que saíram e
voltam com seus netos, retomando laços e reavivando memórias. Vida com
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#35anosescoladavila
perdas dolorosas, trajetórias interrompidas que jamais serão esquecidas. Viver na
escola é viver a vida de muitas pessoas ao mesmo tempo, suas dores, seus medos,
suas conquistas. Mas, certamente, não é o melhor viés para falar dos 35 anos da Escola da Vila… seria impossível.
Então, talvez, a cronologia me salve. Começo
Quero apenas agradecer a abordando a espontaneidade e a criatividade da
todos que fizeram e fazem escola que definiu seu DNA em seus dez primeiros
desta escola um lugar
anos, depois abordo a capacidade de produzir e
especial, e um lugar em
inovar que nos fez crescer tanto nos dez anos seque vale a pena viver!
guintes, depois relato a formação de uma equipe
que influenciou tantos educadores e escolas de
todo o país em outros dez anos, e, depois, finalizo com as convicções solidificadas
dos últimos cinco anos acompanhada de novas e intensas inquietações!
Mostro a utopia presente todo o tempo, alimentando nossa equipe e não nos deixando acomodar, impulsionando nossas buscas e afastando sempre de nós a satisfação completa com o nosso trabalho, pois cada vez que nos aproximamos dela
verificamos que podemos mais e podemos melhor, deixando a marca da inquietude no nosso cotidiano. Bom, mas a memória não me ajudará, e essa trajetória será
contestada. Já imagino alguém me corrigindo: “Não foi nesse ano, isso foi antes
daquilo”, e assim por diante. Não, a sequência cronológica não me ajudará nesse
texto difícil!
Não posso, também, citar nomes, pois omitirei outros tantos; contar os casos pitorescos, nem pensar, esbarraria certamente na ética. Que tal as anedotas, as situações inusitadas, surpreendentes, engraçadas, melhor não, podem ofender os
gregos e alegrar apenas os troianos. Não posso lembrar os momentos difíceis, pois
já me esqueci deles e não posso destacar os momentos de construção do Projeto
Pedagógico, pois seria muito chato para os leitores não educadores! Não… não
posso, não posso, não posso. O texto começa a ficar impossível.
E se eu falasse apenas dos sentimentos, para variar um pouco?
Falar do meu profundo orgulho e emoção a cada formatura das turmas dos terceiros anos, pela convicção de que entregamos ao mundo, ao país, à nossa cidade,
pessoas verdadeiramente críticas e comprometidas com um mundo melhor?
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#35anosescoladavila
Falar da minha alegria de conviver com uma equipe séria, competente, cooperativa
e igualmente comprometida com a construção de um país mais justo, através da
educação de crianças e jovens, e da participação na vida cidadã?
Falar como me sinto privilegiada pelo fato de a Escola da Vila ter-me feito acreditar na escola como uma instituição fundamental para a preparação dos alunos
para a vida em sociedade? Para uma vida mais cooperativa e menos competitiva,
mais aberta a novas ideias e menos cheia de certezas, mais sensível ao diferente
e menos individualista!
Não haveria espaço para expressar tudo o que realmente sinto e vivo na Escola da
Vila, e não quero cansar ainda mais os leitores que chegaram até aqui. Quero apenas agradecer a todos que fizeram e fazem desta escola um lugar especial, e um
lugar em que vale a pena viver!
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#35anosescoladavila
Por Zélia Cavalcanti
Entre o passado e o futuro
Quando, em 1978, resolvi abandonar o doutorado em história contemporânea do
Brasil, na FFLCH, para trabalhar em uma escola de educação infantil, que minha
filha começara a frequentar no ano anterior, ainda não conhecia o livro de Hannah Arendt cujo título tomei emprestado para nomear esse post e, com o qual
tanto aprenderia anos depois.
O desencanto com a carreira universitária, que se mostrava, para mim, muito solitária, e o encantamento com a animada e ruidosa curiosidade das crianças por
tudo que as cerca provocaram essa mudança de rumo profissional. Deixei a monitoria de seminários para grupos de veteranos do departamento de História e
aceitei o convite para ser professora de uma classe de nove crianças de cinco
anos de idade do período vespertino na Escola Criarte.
Gostei. Tanto que, em 1980, aceitei o convite para participar do grupo fundador
da Escola da Vila, Pré-escola e Centro de Estudos. Professora, responsável pelo
8
#35anosescoladavila
atendimento
e depois
co-cooratendimentode
depais,
pais,de
denovo
novoprofessora
professora
e depois
ordenadora
educaçãoinfantil,
infantil,professora
professoraem
emcursos
cur- do
denadora dedeeducação
sos
dose
Centro
de Estudos,
coordenadora
assim
passaram
três décadas
e meia. do Centro de
Formação. E assim se passaram três décadas e meia.
As crianças me
ensinaram a
querer saber mais
sobre elas.
Durante esses anos, aprendi muito. Aprendi com as crianças, que me ensinaram a
querer saber mais sobre elas, tanto pelo convívio cotidiano como pelo que estudei
para melhor conhecê-las. Aprendi com os outros profissionais: os colegas desde o
início, os que chegaram e ainda estão, e os que passaram.
Hoje tenho absoluta certeza de que, por mais que me dedicasse a ler e a estudar,
sem as múltiplas interações que tive oportunidade de viver nesse período não
teria aprendido o que hoje sei sobre educar e ser educador.
O tempo passou e, com ele, o meu tempo na escola. No próximo ano deixarei as
atividades relacionadas ao Centro de Formação, que vinha realizando nos últimos quinze anos.
Saber que continuarei vinculada a essa maneira particular de pensar e fazer educação escolar, podendo, como já aconteceu anteriormente, compartilhar o conhecimento construído na Vila em outros projetos, é o que me dá plena certeza
de que fiz a coisa certa quando, em 1978, deixei de olhar para o passado (pesquisando e ensinando história) e passei a me dedicar ao futuro, colocando todo meu
interesse na educação das novas gerações.
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A primeira casa,
na Vila Madalena
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#35anosescoladavila
Por Roseles N. Turatto, Rô.
Quando cheguei aqui, a Vila já tinha 9 anos de existência. Entrei como datilógrafa e, lembro bem, ficávamos todas juntas numa única sala, ali no casarão,
eu e todos os setores administrativos… Éramos polivalentes, fazíamos de tudo um pouco, embora cada
um na sua função. Acompanhei o crescimento deste lugar sempre com muita admiração e orgulho, percebendo que aqui, de fato, havia profissionais capazes de levar
adiante um trabalho sério, com a mesma intensidade e amor de quem cria um filho.
Ah… Quantas histórias!
Construídas por todos
que me acompanharam
nessa trajetória.
Nos esbarrávamos o tempo todo
nessa dinâmica do saber e do
construir, construir um lugar
onde se pensava essencialmente
no aluno como um ser em construção, de autonomia e capacidade para exercer a cidadania na
essência da palavra.
Todos me conhecem como Rô…
Mas Rô de quê? E para quem não
sabe, é Rô de Roseles, esse é meu
nome, embora conhecida por
muitos como Rodriga, nome esse
inventado pela Sônia, quando,
numa abordagem de um aluno
chamado Rodrigo, lhe perguntou: “Se você é Rô de Rodrigo, a Rô é Rô de quê?” E ele, na
maior propriedade dos seus 3 anos de idade, virou-se e disse: “É Rô de Rodriga!!!”… rs…
E assim fiquei conhecida pelos antigos daqui!
Ah… Quantas histórias!!! Construídas por todos que me acompanharam nessa trajetória e pelos quais eu tenho gratidão, respeito e agradecimento profundos!
A todos que me ajudaram a chegar até aqui, solidificando o meu trabalho e a minha
vida, agradeço pelo muito que recebi!
Parabéns, minha querida Escola da Vila… Escola da minha vida!!!
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#35anosescoladavila
Por Rosa Iavelberg
Participei da Escola da Vila como sócia fundadora. Antes pertenci à sociedade da
Escola Criarte, que antecedeu a Vila.
Passar da Escola Renovada à Contemporânea, junto a diferentes equipes, foi uma
bela caminhada. Sempre se estudava, tendo como referência a prática em sala de
aula. A atualização também chegava às equipes pela interlocução com muitos profissionais brasileiros e estrangeiros, que trabalharam no Centro de Estudos ou na
própria Vila.
Cursei bacharelado em arquitetura da USP. Lá fiz mestrado e doutorado e também
duas especializações em arte-educação na Escola de Comunicações e Artes. Entretanto, minha formação substantiva em Educação e Arte-educação deu-se na Criarte e depois na Vila.
A referência dessa formação e do modo como se concebia a prática educativa nas
referidas escolas orientam minhas ações profissionais até hoje. Parei de trabalhar
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#35anosescoladavila
na Vila em 1995, mas prossegui como uma das participantes da diáspora vilaiana,
às vezes em equipes junto a outros ex-membros da Vila, que agora ocupam novos
territórios.
A referência dessa
formação orienta
minhas ações
profissionais até
hoje.
Penso que é bom valorizar e não esquecer nossa origem
profissional, afinal ela nos constituiu. Hoje, sou professora de Metodologia do Ensino da Arte na Faculdade de
Educação da USP e tenho dois netos que frequentam a
escola: Júlia, de 9 meses, está no Berçário da Vila e Sofia,
de 7 anos, no 2º ano do Ensino Fundamental. Esse prolongamento da existência da Escola em minha vida nem
poderia ser diferente, em razão do feitiço da Vila.
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#35anosescoladavila
Por Áurea Trigo
Memória é invasora, memória me acorda no meio da noite, me sacode no fim do dia,
soprando no ouvido: “Conta aquela: vão gostar, não duvido…”
Augusto Boal
Cheguei! Na Escola da Vila.
“Senti o frescor das árvores e o acolhimento do canto dos pássaros assim que cheguei
ao seu portão”. Entrei e adentrei.
Depois disso, fui ficando, ficando, e já conto com vinte anos de trabalhos prestados
no setor de telefonia da escola.
Entre tantas histórias vividas na Escola da Vila, vou escrever sobre um assunto que
mexe com todos os seres humanos. Algo que gosto de fazer, pois sei que, com esse
gesto, posso proporcionar momentos de alegria e prazer. Um belo prato com comi14
#35anosescoladavila
da fresquinha, saborosa e feita com muito carinho. Fiz um combinado com minhas
colegas do administrativo: nas férias de julho, em uma sexta-feira de muitas vividas
neste vinte anos, eu faria um almoço para todas elas. Compartilharia meus dotes
culinários e também seria uma forma de provar o meu bem querer por todas elas.
Nosso almoço teria um cardápio para agradar a todos os paladares. Eu seria a cozinheira. Tudo combinado e, já que o assunto é comida, fizemos uma “vaquinha”
para a compra de todos os ingredientes.
Caprichei no cardápio escolhido. Cação ao molho de camarão com arroz branco
soltinho, purê de mandioca com leite de coco.
Salada completa. As sobremesas, escolhidas por Hoje já não fazemos mais
todos: doce de abóbora, cocada mole de colher esses almoços de férias,
e queijo branco fresco, torta de limão. Essa parte mas ficaram gravados em
preparada toda em minha casa, para ganharmos meu caderno de receitas
todos os pratos que fiz.
tempo no preparo do almoço.
A cozinha ficava em ebulição total. Das panelas e das pessoas. Quando os aromas
dos temperos do alho e da cebola subiam ao ar, espalhavam-se pela escola, esticando-se até as salas onde elas estavam trabalhando. Logo a cozinha estava cheia de
“degustadores oficiais”. Entravam e diziam: “Se você não me deixar provar, vou ter
um treco! Vou passar mal! Tô com fome!” Voltavam para suas salas com uma “provinha da comida”.
Próximas à cozinha, ficavam as salas dos grupos com suas mesinhas e cadeirinhas,
e lá foi organizada a grande mesa para o nosso banquete. Chegou a hora de servir o
tão esperado almoço. Todos sentados rindo, dizendo que, finalmente, estavam passando até mal de tanta fome! Servimo-nos dos alimentos todos ali juntos. Naquele
dia, contamos muitas piadas, rimos tanto, tanto. Acredito até que só por estarmos
usando o espaço e as mesinhas dos alunos, viramos naquele momento, também
crianças, podíamos rir sem sermos tão severos adultos!
Passamos horas assim juntos. Ou foi só uma hora? Foi tão bom! Que deixamos agendado o próximo almoço. Passei o cardápio, Frango no Ninho. Todos concordaram,
já imaginando sentir o aroma delicioso que iria exalar da cozinha.
Cada um cuidou de lavar seu prato, seu talher, limpamos tudo, e a cozinha de repente voltou ao normal do dia a dia. Agora na cozinha invadia o aroma do café coado. Impossível evocar as lembranças queridas sem me emocionar. Trazer à minha
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#35anosescoladavila
memória o rosto de cada colega e seu riso feliz, dizendo: “Muito obrigado! Estava
uma delícia!”.
Hoje já não fazemos mais esses almoços de férias, mas ficaram gravados em meu
caderno de receitas todos os pratos que fiz. Os que agradaram mais o paladar de
cada colega. A Rô, com o creme de mandioquinha com salsão e bacon. A Vera, com
o macarrão à pizzaiolo e a macarronada à bolonhesa. A Cida, com a costelinha assada no vinho e as batatas sotê. A Luzinete, com o Yakisoba. A Dona Nenê, com o arroz e a couve. A Sílvia, com a feijoada, o peixe, o frango xadrez, a berinjela no forno e
um quiabo com polenta recheada. Acho que era a mais fiel fã da minha gastronomia.
Quem quiser ainda tenho as receitas.
Obrigada à minha querida diretora Ana Maria Cerqueira, que sempre participou
desses nossos almoços e durante eles rimos muito.
A propósito, ela adora um delicioso pastel e uma gostosa sopa de agrião.
Aproveito para aqui agradecer e parabenizar as diretoras da Escola da Vila por seus
trinta e cinco Anos de Vida com vidas.
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Conhecido nas
décadas de 80 e
90 como Centro de
Estudos, o Centro de
Formação da Escola
da Vila também
completou 35 anos.
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#35anosescoladavila
Por Maria Cristina Pereira (Cris Preta)
A Escola da Vila se mistura à historia da minha vida, dos meus ideais, dos meus sonhos e também dos meus desapegos.
Minha história com a Vila começou quando nós, um grupo de educadores idealistas, ou talvez sonhadores, criou uma escola que se chamava Criarte, em 1972. Sonhávamos mudar o mundo educando crianças com liberdade, já que vivíamos em
plena ditadura e éramos apaixonadas por pensadores que nos faziam aspirar a um
Brasil melhor.
Durante alguns anos, mantivemos essa escola para crianças pequenas, até que começamos a pensar nas crianças maiores. Juntamo-nos, então, a um grupo educacional mais experiente, que trabalhava com classes de 1a. série em diante. Mas
ficou claro, muito rapidamente, que não era esse o nosso caminho.
Sonhávamos mudar
o mundo educando
crianças com liberdade
Fomos corajosas, optamos pela separação, por começar de novo, deixando até nosso precioso piano
para elas.
Foi assim que nasceu a Escola da Vila.
O local não podia ser outro: Vila Madalena, bairro já habitado por artistas, intelectuais, além dos moradores originais, que ali viviam há muitos anos.
O nome inspirador foi dado pela Rosa, perfeito.
Éramos uma comunidade, revezávamos os cargos, ora éramos professoras, ora
orientadoras.
Foi esse revezamento que me fez sair por um tempo da Escola. Eu não queria voltar à sala de aula, pois tinha duas filhas quase bebês. Resolvi, então, comunicar ao
grupo minha decisão e foi esse o momento do desligamento. Quem não aceitasse a
regra tinha de deixar a sociedade. Optei por ficar com os filhos e sair da Escola. Foi
cruel, mas era assim que funcionávamos.
Nesse período de afastamento, formei-me em Psicodrama Pedagógico e tentei nova
vida profissional. Mas, no meio do caminho, apareceu o livro Psicogênese da língua
escrita, de Emília Ferreiro e Ana Teberosky. E lá estava eu, de novo, envolvida com o
mesmo grupo, estudando o que, para nós, foi uma revolução.
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#35anosescoladavila
Decidi voltar à Escola como professora de alfabetização, para experimentar tudo
que aprendíamos nos livros. Foi assim que a intenção de ficar um ano em uma classe se estendeu por quatro anos, depois por mais outros tantos como coordenadora
e professora do Centro de Estudos.
Até que o mundo me chamou de novo e acabei indo para o MEC fazer os PCNs.
Hoje, acompanho o crescimento da Escola e ainda sinto um grande orgulho de tudo.
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#35anosescoladavila
Por Ana Paula Yazbek
Minha história com a Escola da Vila
Minha história com a Escola da Vila começou
em 1990, quando eu estava na Faculdade de
Educação da USP, começando minha história
como educadora e comecei a ouvir falar de uma
escola diferente, que trabalhava com crianças
de um modo muito especial. Naquele ano, fiz
meu primeiro curso pelo Centro de Formação:
“A Psicogênese da Língua Escrita, segundo Emília Ferreiro”, e foi aí que me encantei completamente e comecei a sonhar em um dia trabalhar
nessa escola.
Passaram-se dois anos e, após mais alguns cursos, soube por uma professora que
estava saindo da Escola que haveria um processo seletivo e então encaminhei meu
currículo. Pouco tempo depois, fui chamada para uma entrevista. Lembro-me até
hoje de quando, na conversa com Vania Marincek, ela me perguntou sobre o que
eu achava da relação entre teoria e prática na educação. Não me lembro da minha
resposta, mas sim da sensação de que se fosse trabalhar ali teria sempre que refletir
muito sobre o trabalho, e isso me encantou.
Alguns dias depois participei de mais uma dinâmica e fui comunicada de que seria
contratada. Era junho de 1992 e, em agosto, começaria como auxiliar de uma turma de crianças de três anos, do G1. A professora, Maria da Penha Brant, era muito
competente, gerenciava o grupo de uma forma que eu nem imaginava ser possível.
Aprendi muito com ela!
Meus primeiros anos na Escola foram de imersão num ambiente de muita efervescência de ideias e produção de conhecimentos. As reuniões pedagógicas aconteciam numa única sala de aula, com toda a equipe (nesse primeiro ano, a Escola ia
até a quarta série e estava começando a formar a equipe que iria compor o fundamental II, que iniciaria no ano seguinte), líamos textos dos “espanhóis”; as professoras apresentavam situações de aprendizagem de suas salas de aula; participava de
grupos de estudo compostos por todas as auxiliares, coordenados por Vania, que
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#35anosescoladavila
sempre de modo muito acolhedor nos
colocava bons questionamentos. Também participava das orientações com Zélia Cavalcanti, que, além de nos colocar
para ler e estudar textos que eu não tinha
lido na faculdade, falava sobre arte, cultura, música, mostrando que trabalhar com educação é algo muito mais amplo e
interessante do que o universo da pedagogia.
Na conversa com Vania Marincek
tive a sensação de que se fosse
trabalhar ali teria sempre que
refletir muito sobre o trabalho.
Fui auxiliar durante um ano e meio, tive a oportunidade de auxiliar pessoas muito
diferentes e competentes e, em 1994, assumi minha primeira sala como professora
de G4 (correspondente ao atual primeiro ano). Não foi nada fácil assumir essa turma, estava substituindo a licença maternidade de uma ótima professora, Cláudia
Aratangy. Era um grupo de 27 alunos de cinco e seis anos, crianças muito competentes, a maior parte lia desde o início do ano, e todas acabaram o ano lendo e escrevendo. Foi difícil conseguir o controle do grupo, mas, em parceria com Susane
Lancman Sarfatti e com a leitura do livro As bruxas, de Roald Dahl, terminamos o
ano bem.
Nos anos seguintes, voltei a trabalhar com os pequenos e fiquei transitando entre
as classes da educação infantil.
Comecei a dar cursos pelo Centro de Formação e fui construindo em paralelo minha
carreira como formadora de educadores e, até hoje, mantenho meu vínculo com o
CFEV, ministrando cursos nas programações de férias, em seminários itinerantes e
também em parceria com algumas prefeituras.
Em 2001, propus à Escola uma parceria para abrir um berçário e, em 2002, em sociedade com Lena Yazbek (minha mãe) e Maria Amélia Nogueira (minha tia), inauguramos o Espaço da Vila, berçário que atende crianças entre zero e três anos. Desde
então, deixei de acompanhar o dia a dia da Escola como educadora, mas mantendo
sempre o contato pela parceria estabelecida, e principalmente como mãe de dois
alunos: Marina, que neste ano termina o Ensino Médio, e Pedro, que está no último
ano do fundamental II.
São 23 anos em que partilho minha vida profissional com a história da Escola da
Vila. Participei da comemoração dos quinze, vinte, trinta e, agora, dos trinta e cinco
anos, e posso dizer que sinto muito orgulho disso!
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#35anosescoladavila
Por Maria da Penha Brant
Estou de volta à Escola da Vila
pelas mãos de Andrea Aly, a
querida professora de artes das
crianças e da equipe, que cumpre sua licença maternidade.
Tive então a oportunidade de
estar de volta à sala de aula,
espaço fecundo, decididamente dinâmico e criativo. Disso eu
nunca consegui me desprender,
sempre senti saudades.
Minha história com a Escola da
Vila me leva ao final dos anos
1980, quando ainda morava em
Belo Horizonte e tinha o desejo,
como muitas pessoas têm, de ampliar a experiência de vida e morar em outro lugar. Nessa época, eu já sabia que, para mim, era fundamental trabalhar em consonância à criação, algo que eu já tinha identificado nos relatos de trabalho dos
profissionais da Vila. Vim morar em São Paulo com o desejo de trabalhar com essa
equipe. Deu certo! Comecei pela educação infantil e logo fui encorajada a ampliar
minha atuação profissional. Tornei-me professora de
artes. Fui fazer a FAAP. Mineiro nunca esquece Minas, A prática educacional
mas eu fiz laços em São Paulo atravessando a ponte se dá em um ambiente
da Cidade Universitária. Tive duas filhas, uma delas se que vai além da sala
formou aqui há dois anos, está na USP. A segunda está de aula.
cursando o fundamental.
Poderia continuar a narrar aqui toda a minha formação na Escola da Vila, e eu mencionaria pessoas que fazem parte da história da educação nesse país, que direcionaram sua prática profissional por uma escola mais reflexiva e transformadora (para
usar um termo que remete aos estudos e aos escritos sobre educação, quando eu
iniciava minha trajetória na área).
22
#35anosescoladavila
Mas vou pular essa parte para destacar o que, para mim, é um amplo aprendizado
dentro do cotidiano da Escola da Vila, que é a construção de uma prática educativa
em equipe – entendida por aquelas pessoas que saem de suas casas diariamente
para trabalhar nessa escola. Tenho aprendido aqui que a prática educacional se
dá em um ambiente que vai além da sala de aula, que é singular, mas composto
de camadas.
Vejo essa arqueologia em muitos momentos. Quando solicitamos que se diminua
a altura da mesa que fica na área externa ao ateliê, para que se possa usar com as
crianças pequenas e a pessoa encarregada me diz: “Vamos esperar o primeiro feriado, para não precisar isolar a área, e faremos isso!” Ou quando leio um bilhete
deixado pelo pessoal da limpeza ao encontrar uns papéis pintados e amassados no
canto do ateliê: “Esse papel é para jogar fora ou é trabalho [de arte]?” E, ainda, Penha, tenho aqui guardado uns papéis que eram da sua época, quando as crianças
faziam aquelas pinturas de girassóis, lembra?
Minhas memórias vêm do trabalho diário de toda equipe…
Parabéns pelos seus 35 anos, Escola da Vila!!!
Toque na
imagem
para ampliar
Trecho do diário de classe, 1994. Mais um exemplo da presença da equipe no cotidiano da escola, com a
contribuição de Cintia Fondora sendo mencionada na organização dos encaminhamentos para a classe e
Zélia Cavalcanti, na época coordenadora na Educação Infantil, comentando a prática pedagógica (no post it).
23
Foto relíquia: Turma da Educação
Infantil na Rua Mourato Coelho.
24
#35anosescoladavila
Por Fernanda Flores
Receava começar este texto e me perder em mim.
Mas alguns acontecimentos são especialmente únicos e disparam uma vontade de
escrever que, então, abracei… Sem medo de ser piegas, sem medo de… nada.
Seus 35 anos me permitem isso, pois deles compartilho 25, menos uns 4 nos quais
estive em outros caminhos da vida… Como filho que sai de casa e depois volta…
Mas hoje, o que de especial vivi, somente a vida na escola me pôde proporcionar… É disso que desejo falar:
uma escola proporciona tantas emoções simultaneamente que somente
aqueles que dela fazem (ou fizeram)
seu cotidiano têm a possibilidade de
imaginar do que estamos falando…
Uma manhã com agenda lotada
de desafios os mais diversos, que
abraçamos, pensamos juntas, reclamamos, ponderamos, revisamos,
e, sempre na parceria especial das
guerreiras da gestão, procuramos
melhores caminhos para seguir, fazendo ESSA escola pulsante, com as
caras de TODOS os nossos alunos e
alunas, e com a MARCA única de nossos professores e professoras.
À tarde, um bate-papo espontâneo
com um menino de 3 anos que chamava sua irmã de 5 para sair de sua sala e vir se
sentar com ele, numa beiradinha de banco no qual cabia somente mais um… E eu,
ao me sentar e puxar papo, entendo que ali não era o meu lugar e que precisava sair
muito, mas muito rápido, para dar lugar a uma irmã que teimava em vir, entretida
com as coisas de seu grupo, demorando a sair de sua sala aos olhos do ansioso irmão. Coisas de escola…
25
#35anosescoladavila
Pouco depois, encontro com parte de minha equipe maravilhosa para fazer um balanço do ano e as projeções que têm para 2016, entre pontos que precisamos manter como conquistas lindas de equipe e outros que devemos seguir aprofundando
nessa insana e maravilhosa missão de educar em uma escola nos dias de hoje.
Conversas francas e cheias de planos partilhados.
Obrigada por esse sem
fim de experiências e
por ser sempre tão
intensa, nossa Escola
da Vila.
E, à noite, (o que dizer das tantas noites que trabalhamos na escola, pela escola…) a emoção de apresentar aos pais de nossa própria comunidade o que
será da vida escolar de seus filhos ao alçar novo voo,
deixando aos poucos a segurança conhecida da Educação Infantil rumo ao Fundamental.
E, nesse contexto, contar com parceiras especiais e
poder, ainda, de cancha, apresentar uma professora querida com quem trabalho e
admiro há tantos anos, introduzindo-a ao desafiador mundo da orientação. Vê-la
experiente e segura, tocando lado a lado uma singela reunião que tanto significa
para nós.
Assim, da soma dos casos de todos os dias, você me fez, em seus 35 anos, nas parcerias incontáveis, nos desafios de ensinar e aprender, em cada um dos meus alunos e alunas, nas conversas nas salas dos professores, nas entrevistas com mães e
pais, nos inúmeros bons dias… Enfim, obrigada por esse sem fim de experiências e
por ser sempre tão intensa, nossa Escola da Vila.
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#35anosescoladavila
Por Marta Durante - Diretora pedagógica da Escola Santi
Quando você chegou aqui?
Cheguei ao final de
1990. Tinha acabado
a faculdade (PUC/SP)
em 89 e resolvido viver
uma grande aventura,
morar em Trancoso/
Bahia. Voltei para São
Paulo e precisava encontrar um trabalho.
Encontrei uma super
amiga da faculdade
que tinha feito um
curso de alfabetização com a Cris Preta
e tinha amado. Falou
encantanda do curso
e da escola. Contou
que estavam realizando um processo de seleção, mas que parecia estar encerrado.
Eu estava mudando para o Jardim Bonfiglioli e resolvi passar para deixar um currículo.
Na época, sabia muito pouco sobre o construtivismo e sobre a Escola da Vila. Tinha
algumas informações sobre essa escola, quando eu estava na faculdade, que era
tão diferente. Eu tinha mais amigas que trabalhavam em outras escolas e o que
queria mesmo era trabalhar nos movimentos sociais e na educação pública.
Quando fui levar o currículo, no prédio do Butantã, entrei e olhei para aquele espaço com a quadra com a asa delta branca cobrindo-a, árvores, bananeiras, salinhas
branquinhas no meio desse cenário. Senti algo muito profundo e tive a clareza, naquele momento, de que era ali que eu queria trabalhar. Lembro até hoje o meu encantamento e a minha sensação. Depois disso, tudo foi se constituindo. O processo
de seleção realmente já estava quase que ao final, mas eu fui escolhida para ser
professora da 1ª. série, como era chamado o 2º ano na época.
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#35anosescoladavila
Eu tinha 25 anos e foi na Vila que me tornei professora, que me profissionalizei e
descobri o que realmente pensava sobre educação e sobre tudo o que poderia fazer a partir dessa profissão. Não foram muitos anos na escola, mas foram vários
momentos de encontros profundos e de profunda formação.
Tive a oportunidade de realizar um projeto de alfabetização de adultos em parceria com o Centro de Estudos da Escola da Vila, a Método Engenharia, o Sesc Vila Mariana e a
Rede de Alfabetização Brasil. Esse trabalho gerou a minha
tese de mestrado e a produção de um livro sobre o mesmo
tema. Um trabalho importante para mim e para a educação de jovens e adultos do Brasil.
Foi na Vila que me
tornei professora e
descobri o que
realmente pensava
sobre educação
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#nasegundadecada
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#35anosescoladavila
Por Susane Lancman Sarfatti
Minha história com a Vila…
Cara Escola da Vila,
Imagino que você já deve estar pensando o quão retrógrada sou em escrever uma
carta a você, quando temos formas mais modernas de comunicação: Facebook,
Skype, Vídeo conferência, Hangout… Mas, sou das
Independentemente
antigas. E é justamente por isso que retomo a nossa
da idade dos alunos,
trajetória nesses quase 20 anos de convivência.
o desafio é fazer um
trabalho de qualidade: é Conheci você quando tinha 15 anos, uma menina
ser uma boa professora. em pleno processo de passagem para juventude,
e eu, com um pouco mais de uma década do que
você, aportando na Terra da Garoa, que mudou tanto que nem chove mais.
Sempre que penso na mudança da infância para a adolescência, me aparecem a
imagem e as palavras da Alice no País das Maravilhas: “Ai meu Deus! Como está
tudo esquisito hoje! E ontem estava tudo tão normal. Será que mudei durante a
noite? Deixe ver: eu era a mesma quando me levantei hoje de manhã? Estou quase
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#35anosescoladavila
jurando que me sentia um pouquinho diferente. Mas, se não sou a mesma, então
que é que sou? Ah, aí que está o problema!”
Você, Vila, tal como Alice, sempre se mostrou questionadora, tentando entender
seus princípios e valores, tentando agir de forma coerente e respondendo de forma
consistente a grande questão: “Quem sou eu?”
Confesso que me deslumbrei com tantas questões que você trazia, tudo exigia
uma explicação. As boas ações pedagógicas e educacionais não bastavam se não
tivessem respaldo teórico. Assim, as minhas certezas se converteram em dúvidas
ou em busca pelo conhecimento, desde o primeiro momento em que iniciei o
estágio.
Primeiro fui estagiária do 4º ano e me entusiasmava ver a forma que a professora
instigava os alunos a discutir, parecia um grande maestro de uma orquestra maravilhosa. Impactou-me ler com alunos tão pequenos Graciliano Ramos, trabalhar
algoritmos alternativos da divisão, relacionar a pontuação com tipologia textual…
Nossa, que sabidos (palavra do seu repertório que absorvi) eram esses alunos. Nessa
época, conheci a Delia Lerner, pesquisadora tão difundida no seu meio que passei
a me achar também íntima dela.
Depois fiz estágio no grupo 4, conheci a Grécia, os Polos Norte e Sul, as versões de
contos de fadas, os jogos matemáticos… Um mundo novo se abria. E, sem dúvida,
a pesquisadora Emilia Ferreiro foi o ícone das novas descobertas com a teoria psicogenética da alfabetização que lemos ainda em espanhol. Deslumbrei-me com a
forma que os alunos aprendiam sobre a língua com palavras e assuntos tão difíceis:
Hércules, Atenas, mitos, Hera, pinguins, Amyr Klink, morsa… Era a curiosidade pelo
mundo que abria as portas das letras.
No ano seguinte e por vários anos, fui professora da 3ª série. Costumo brincar dizendo que, como pulei quando pequena a 3ª série, passei muitos anos repetindo essa
série, como professora. Foram momentos maravilhosos com alunos muito bacanas
(mais uma palavra do seu repertório. E repertório também é palavra sua) e projetos
e sequências didáticas instigantes. Você me apresentou autores que ajudavam a
embasar o nosso trabalho: Beatriz Aizenberg, Bernard Schneuwly, Mario Carretero,
Ana Spinoza, Ana Maria Kaufmann, Patricia Sadovsky… Essa sua busca em relacionar a prática com a teoria e vice versa me encantou e ainda me encanta.
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#35anosescoladavila
Paralelamente ao trabalho em sala de aula, iniciei, no Centro de Estudos, dando
cursos de formação de professores. E a criação do PIF, Programa Interno de Formação, foi um momento muito especial. Ficou claro para mim que fazer um bom trabalho com os alunos é um grande desafio, mas falar sobre o trabalho para colegas
era um desafio ainda maior, pois exige um outro nível de reflexão sobre a prática.
No seu Centro de Estudos, pude refletir sobre a natureza do ser professor e os aspectos que permeiam a identidade docente, tornando o meu trabalho mais consistente e significativo para uma prática transformadora. Viajei dando cursos para
Fortaleza, Salvador, Porto Alegre, Curitiba, Brasília… Enfim, entrar no avião com o
curso em um pendrive, levar caixas com todo o material a ser distribuído e aportar
nas escolas para representar o seu saber foi um grande aprendizado. Para tanto
estudei muito Perrenoud, Cesar Coll, Monica Gardner, Zabala, Zabalza, Isabel Alarcão…
Passados alguns anos, veio um novo desafio: atuar no fundamental 2 como orientadora educacional. Um novo mundo de estudos se abria, o foco não eram mais as
didáticas das disciplinas e áreas, nem tampouco a formação de professores: era preciso entender melhor sobre a construção moral do sujeito, as características da adolescência e seus conflitos emocionais e sociais, as novas configurações familiares, a
atuação com as famílias… Novos autores: Puig, Savater, Yves … e o retorno ao meus
velhos amigos, Piaget e Freud, base na minha formação, antes de conhecer você.
A lista interminável de autores e pesquisadores da educação que listo nesta carta
me parecem tão íntimos que escrevo como se fossem velhos conhecidos, por isso
a falta do nome completo. Obrigada por tê-los me apresentado. Agradeço também
aos muitos colegas e amigos de trabalho que conheci através de você.
Agora, cá estou no Ensino Médio. Poderia dizer que é um novo desafio pela nova faixa
etária, contudo, hoje percebo que, independentemente da idade dos alunos, o desafio é fazer um trabalho de qualidade: é ser uma boa professora. E é isso que continuo
buscando, sabendo que conto com o seu apoio e incentivo nessa longa jornada.
Parabéns pelos seus 35 anos! Você continua com uma aparência jovial e ativa, mais
segura e estável, como qualquer mulher bem vivida com a sua idade.
Beijos,
Susane
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#35anosescoladavila
Por Wanilda Tieppo
Um pedaço de mim
Eu tentei chegar à Vila em 1984!
Recém-formada, em busca de especialização na Educação Infantil,
coloquei meu currículo bem pobre debaixo do braço e toquei a
companhia da Escola da Vila. Nesse mesmo portão azul, na rua Barroso Neto, 91, entreguei a minha
experiência! Não fui selecionada.
Anos depois, em 1996, eu já estava
numa escola, e quem chegou foi a
Escola da Vila.
Ela chegou com um baita currículo institucional debaixo do braço,
e achei que, mais uma vez, eu não
seria “selecionada”.
Era o mês de junho e, na ocasião,
eu coordenava a Educação Infantil do Colégio Fernando Pessoa.
Quem coordenava esse segmento na Escola da Vila era a Zélia Cavalcanti. Gente, eu
não tinha chance nenhuma! Disputar, mesmo que na unidade Morumbi, o cargo com
uma grande educadora, com expertise invejável, historiadora, escritora de livros,
meu pai! Nem no meu mais ambicioso e maluco sonho eu teria alguma chance.
Toquei o meu trabalho com a certeza de que, no final do ano, eu teria de procurar
outra escola.
Em dezembro, Sonia Barreira me chamou para uma conversa e eu saí da minha
sala com destino à sala dela imaginando que seria dispensada. E o que é surpreendente: “Eu teria compreendido, com toda a honestidade, a decisão dela”.
33
#35anosescoladavila
Pois é! Em vez de demissão, veio o convite para ser assistente de direção. Gente!
Confesso que o meu susto e a minha alegria foram enormes.
Em todos esses anos, minhas atribuições foram as mais variadas: cuidar da segurança e da rotina da escola; coordenar a equipe de atendimento, a de monitoria;
ser responsável pela comunicação interna e com os pais; atender os pais novos;
organizar os eventos, as formaturas, a chegada de trabalho de campo; e mais umas
coisinhas.
Minha experiência
profissional na Vila se
resume em uma única
palavra: aprendizagem.
Esse turbilhão de tarefas e de mudanças constantes
de responsabilidade “bate” com meu jeito agitado.
Gosto de mudanças, gosto de desafios, e gosto de
aprender.
Se me pedissem para resumir a minha experiência profissional na Escola da Vila em uma única palavra, eu usaria a seguinte:
APRENDIZAGEM.
Nossa! Como aprendi e como aprendo no meu dia a dia! E é isso que me fascina e
me tira da cama bem cedinho para trabalhar.
Sou uma funcionária orgulhosa da Escola em que trabalho, e estou feliz por estar
aqui neste ano de comemorações!
Parabéns, Vila, pelos 35 anos de contribuição para a educação!
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Comemoração dos
10 anos da Vila.
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#35anosescoladavila
Por Tiê Parma Yamato
É sempre bom ver que a gente ainda faz parte da história dessa escola… Isso faz
relembrar momentos inesquecíveis!!!
Esta foto, (eu e a Ana Marincek) me faz lembrar da escola, dos amigos que fiz por lá
e que serão para a vida toda!
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#35anosescoladavila
Por Andréa Polo
Das experiências e significados de aprender na ESCOLA DA VILA
Pensei muito no que escrever em homenagem à ESCOLA DA VILA. Retomei fatos
marcantes, pessoas incríveis, preciosos livros indicados e senti meu coração disparar novamente quando me lembrei da primeira reunião de pais, do meu primeiro
curso no Centro de Formação e dos alunos que vi crescendo até voltarem com seus
filhos para a Escola, já como pais e mães!
Quase vinte anos depois, lembrei detalhadamente um fato que marcou
meu percurso como educadora nessa instituição.
A Escola da Vila era uma mocinha de
quinze anos quando ingressei como
professora auxiliar numa das salas
de 3º ano. Lena, a professora titular,
me acolheu cheia de responsabilidades, garantindo que me aproximasse
rapidamente dos projetos da série e
especialmente do “Vilês” (assuntos e
termos específicos de quem trabalha
na Escola da Vila). Lembro-me claramente de suas explicações rebuscadas, cheias de detalhes sobre as tão
apaixonantes leituras realizadas em
voz alta com a classe toda.
Lena (professora da minha filha), Andréa e Lorena Polo.
Lançamento do Livro da Família
Diariamente, no mesmo horário, logo depois do parque, as crianças voltavam para a
sala e abriam seus livros para acompanhar as narrativas encantadoras, com os tons,
sabores e vozes que Lena era mestra em produzir. Tatiana Belinky e seu Transplante
de menina iluminavam minhas tardes como se eu fosse uma das alunas da professora! E era! Sem dar maiores explicações, eu parava tudo o que ela me pedia para
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#35anosescoladavila
Aprender com os mais
velhos continua
fazendo parte do que
fazer pelo prazer e pela paixão que eram reveladas a mim
a Vila tem de melhor!
por uma profunda conhecedora do “poder” dos livros.
Eu tinha certeza de que começava a ser formada por alguém que ensinava cotidianamente um dos princípios mais valorosos da Escola: a formação de uma comunidade
leitora. Das tantas vivências com os livros, em casa, nas escolas por onde passei – e
que fique bem claro: sempre amei ler! –, nunca tinha vivido uma experiência tão intensa e marcante, que tivesse me transpassado completamente a ponto de desejar
reler tudo o que já tinha feito de forma “solitária”, agora em comunidade!
Percebi logo a profundidade que Lena alcançava com suas intervenções e “gelei”,
depois de uma semana, quando ela precisou fazer um exame e me disse para encaminhar a retomada da lição de casa porque talvez se atrasasse. Parecia tão simples… A proposta era pesquisar sobre a vida do Pelé e do Villa Lobos. O 3º ano
estava estudando algumas biografias para fazer o Livro da Família e eu, naquele
dia, deveria retomar a lição de casa levantando semelhanças entre os textos dos
biografados. Comecei conversando com as crianças, expondo “tudo” o que pensava saber sobre “favorecer boas situações de aprendizagem”, até que Lena chegou:
“Andréa, você quer continuar, ou quer que eu assuma?”. Claro que respondi que
preferia que ela assumisse, pois ainda não conseguia “me ver” dando uma aula
para a professora Lena assistir! Ela, então, assumiu as orientações.
Absolutamente envergonhada, comparando seus encaminhamentos com o que eu
tinha feito em quinze minutos de sua ausência, percebi claramente o tanto que
“aquela” novata precisava aprender, o quanto “ela” achava que sabia sobre “provocar” os alunos! Que privilégio conviver com alguém que generosamente me ensinava a construir os mais fortes significados da docência com seus exemplos diários.
Eu tinha lido sobre Emilia Ferreiro, Piaget, Vygotsky, mas, ali, diante de uma educadora sem par, as coisas começaram a fazer todo o sentido. E o melhor disso tudo é
ver que esse movimento de aprender com os mais velhos continua fazendo parte
do que a Vila tem de melhor! Muito tempo já se passou e posso garantir que, em
cada canto da escola, há ciclos de admiração e consciência dos professores mais
jovens para com seus tutores, parceiros, duplas que desfrutam desse momento privilegiado de formação contínua. Penso que isso só acontece porque todos sabem
da responsabilidade que possuem quando esticam a mão para um colega e dizem:
“Vamos lá, porque você terá muito para aprender e ensinar, e eu, por mais tempo de
casa que possua, também!”.
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#35anosescoladavila
Por Edison Leite de Magalhães
Gostaria de homenagear a Escola e agradecer a todos com um poema sobre
pensamento positivo
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#35anosescoladavila
Por Sandra Durazzo
Escola da Vila e eu, uma história antiga e duradoura
Meu nome é Sandra Durazzo ou, como costumam se referir a mim aqui na Escola da
Vila, a Sandra de inglês. Mas a minha história não começou com inglês, ou melhor,
começou sim. Eu sou professora mais ou menos desde que nasci. Meus melhores
amigos sempre me disseram que, faça o que fizer, você “É” professora e sempre será.
Estavam certos. Foi por meio de aulas de inglês para executivos, num momento em
que a minha carreira de engenheira tinha ficado de lado devido à maternidade, que
eu conheci o Thomás, a Sônia e a Escola da Vila. Na época, procurava uma escola
para a minha filha mais nova e, ao conhecer o projeto da Vila, senti que aqui ela seria feliz. E foi. Ela, e logo depois meu filho mais novo, viveram momentos marcantes
desde o grupo 1 até a formatura no Ensino Médio. Hoje são jovens adultos daqueles
que, depois de conversar um tanto, pensamos: “Que gente bacana!”.
E como é que virei a Sandra de inglês? Bem, após alguns anos de festa junina, reunião
de pais, festa para as professoras dos filhos, enfim, de curtir o papel de mãe da escola,
a Sônia me deu um voto de confiança gigante ao me convidar para dar aulas de inglês
substituindo a professora Zínia, que tinha decidido seguir outros caminhos. Cheguei
sem nem entender algumas das perguntas e respostas
nas reuniões pedagógicas e, graças à generosidade e As portas que a Escola
à paciência da Ivone, aprendi muito, construí muito da Vila me abriu foram
e fiz inúmeras relações maravilhosas com alunos, pro- incontáveis.
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#35anosescoladavila
fessores, funcionários e pais (meu facebook é recheado de ex-alunos com seus filhos,
mestrados, carreiras e conquistas).
As portas que a Escola da Vila me abriu foram incontáveis. Pude participar da construção do projeto de inglês na escola. Contribuo até hoje com a consolidação desse projeto e a formação dos professores. A empresa que montei com a Vera, outra
professora da escola, multiplica o saber adquirido. Os cursos do Centro de Formação que ministro me proporcionam a chance de pensar a educação em uma perspectiva mais abrangente do ponto de vista geográfico. Os amigos que fiz aqui me
acompanham em comemorações e saudades. Enfim, minha vida se transformou,
consolidando o que meus amigos já sabiam: sou professora! Continuo estudando muito, afinal, essa é uma característica da Escola da Vila: uma instituição que
aprende, que se reinventa o tempo todo, que enfrenta seus obstáculos com estudo,
transformando-os em novas vitórias.
35 anos. Que sejam mais 35 e mais 35, formando “gente bacana” e abrindo portas
para outros sortudos como eu! Parabéns!!!
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Arte e Ciências.
Um evento que
deixou saudades!
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#35anosescoladavila
Por Angela Kim
“Por que você não leva seu currículo na Escola da Vila?
Dizem que é muito boa”, sugeriu minha irmã, que na época
cursava Psicologia na USP.
Foi assim, no final do meu 2° ano de Pedagogia, que ouvi
falar pela primeira vez do lugar onde eu trabalharia por muitos anos e que viria a ser uma escola para mim. Comecei a
trabalhar na Vila em 1998 e aqui estou, até hoje.
17 anos de escola – 8 como professora de 5° ano, 4 como professora de Língua Portuguesa e Literatura no Fundamental
II, 4 como professora de produção textual no Ensino Médio,
8 como capacitadora no Centro de Formação – fizeram-me
educadora. Nesses 17 anos, dezenas de turmas, centenas de
alunos, muitos cursos, umas tantas supervisões e palestras,
vários acampamentos, festas juninas e simpósios, milhares
de registros (primeiro em papel, depois no Public e em pendrives, em seguida no Ambiente Virtual de Aprendizagem e
atualmente na nuvem), inúmeras reuniões. Hoje tenho muito orgulho do meu trabalho e da equipe da qual faço parte.
Tenho muito
orgulho do meu
trabalho e da
equipe da qual
faço parte.
Não, nem tudo são flores. Há as crises, angústias, insatisfações, questionamentos, frustrações, medos. Mas datas festivas são propícias aos balanços, e o resultado deste é positivo, sem dúvida: um texto produzido por aluno que arrepia
e põe um sorriso na boca; uma amizade para toda a vida
nascida no ambiente de trabalho; uma palavra gentil enviada por e-mail; as delicadas flores na paisagem da escola;
as conversas divertidas na sala dos professores; a confiança
no seu trabalho expressa em convites para novos desafios;
a atenção de um funcionário; a empolgação com a realização de um novo projeto; adolescentes sussurrando poemas
para crianças pequenas; a gratidão em um abraço.
Escola da Vila: parabéns pelos seus 35 anos. E que venham
muitos mais!
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#35anosescoladavila
Por Daniela Munerato
Cheguei por aqui em fevereiro de 2002, na correria de um início de semestre na
Unidade Morumbi. Desde então, passei por diversas experiências das quais tenho memórias que gostaria de compartilhar, como um percurso repleto de vida
e movimento.
A Vila proporciona experiências importantes. Aqui vivenciei diversas funções, como
estagiária, professora da Educação Infantil, formadora de professores nos cursos
do Centro de Formação, professora da Pós-Graduação, orientadora da Educação
Infantil e dos primeiros anos, e aguardo o que ainda estiver por vir, sempre ávida
pelos desafios. Encontrei nesse tempo o que procurava: o diálogo entre a teoria e a
prática sob o olhar de autores que eu sempre estudei, e ainda de muitos outros que
tive a oportunidade de conhecer através de tantas ações formativas. Além disso, a
atenção para o aluno em cada fase de seu desenvolvimento, repleto de respeito,
escuta e propostas que o façam sempre avançar me encantam. Um lugar que certamente os prepara para a vida!
O movimento no nosso dia a dia é intenso. Em nossas prateleiras, sempre cabe mais
um livro, e os mesmos precisam ser lidos mais de uma vez. Literatura, música, arte
e cultura são temas presentes, bem como o respeito ao outro, a formação dos grupos e a importância da interação e da cooperação. As equipes estão sempre juntas.
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#35anosescoladavila
Tenho muitas lembranças
Os dias parecem ter muito mais que 24 horas e, ao envolvendo todos os
final deles, apesar dos momentos desafiadores que funcionários da escola.
os compõem, os de parceria sempre se sobressaem.
Se eu imaginar uma caixinha com tesouros guardados, como as crianças pequenas
costumam fazer, terei lembranças como os amigos secretos envolvendo todos os
funcionários da escola, as discussões nos primeiros Simpósios com dilemas do cotidiano, os acantonamentos do Grupo 3 e as Festas Juninas temáticas. A caixinha
seria repleta de nomes, com amizades para sempre, pessoas de referência e enorme admiração. Não poderia faltar a imagem da primeira criança que vi chorar de
emoção, junto a todos os bilhetes e desenhos que recebo até hoje e revelam laços
importantes. Entre todas essas memórias, uma carta muito especial de pais de um
aluno querido, endereçada a mim e à minha estagiária da época, da qual segue um
breve trecho:
“Dizem que no Japão, a ninguém é dado o direito de elevar sua cabeça à altura maior
do que a cabeça do Imperador. Uma única exceção confirma a regra: o imperador japonês desce de seu trono e declina de sua vaidade e poder, baixa sua cabeça só e exclusivamente diante do professor de ensino primário (hoje fundamental). A ninguém
mais. Sinal do respeito de uma cultura, sinal do valor de um professor. (…) enfim,
também sou dado a observações, e, naturalmente observei vocês o tempo todo. Eu
e Rosana o fizemos, às vezes comentando; às vezes no silêncio de cada um… O que
percebi foi uma enorme dedicação; uma sabedoria para o ofício; uma sensibilidade
para o gênero humano; quem faz relatórios daquele tipo, com tamanha riqueza de
detalhes, com tal carinho? Quem vai ao ponto daquele modo, sem dar bandeira, sem
fazer estardalhaço, sem chamar a atenção para si mesmo?
Vocês fizeram deste modo cada momento de nossa relação neste ano, e eu passei a
admirá-las, na calma, na doçura de vocês com cada criança. Cada relatório que nos
chegou e emocionou: alguém zelava e orientava meu filho; compreendia-o; despertava nele o sentido do ser humano que progride; do aprendizado, da transformação do
bebê que vai fazendo a si mesmo criança – e, infelizmente, daí para frente também.
(…) vocês carregam uma missão. O imperador do Japão saberia reconhecer isso.”
Neste contexto de parceria, termino meu breve relato agradecendo todas as equipes das quais faço e já fiz parte, cada aluno e cada família que tive e tenho o privilégio de acompanhar como professora ou orientadora. Parabéns, Escola da Vila! Que
venham as comemorações de 40, 45, 50… E a continuação da nossa história!
45
#35anosescoladavila
Obrigada, Vila,
por me fazer
questionar tudo
desde cedo.
Por Júlia Abrão
Me lembro até hoje do “teste” que fiz para entrar na 1ª série da Vila. Me lembro de
quando meu irmão mais velho chegou correndo na escola em que eu fazia o Pré
gritando: “Você passou na Vila!” Me lembro dos professores. Me lembro da primeira
vez em que colei numa prova. Me lembro de que fui pega (desculpa, Marília). Meu
primeiro “E”. Me lembro de quando a mesma Marília leu Drácula à luz de velas para
a turma. Me lembro dos lanches coletivos. E da Guerra das Bolas. Me lembro da
primeira vez que caí na dupla com o menino de quem eu gostava. Me lembro de
quando falaram de anticoncepcionais e de drogas. Me lembro dos pentaminós e
do Escher. Me lembro das peças de teatro. Das visitas à Bienal. Me lembro do bananal. Me lembro da rádio na hora do intervalo. Me lembro de que pediram nossa
opinião quando decidiram mudar o logo do coqueiro. Me lembro de que “nuvens
brancas passam por brancas nuvens”. Me lembro de que fomos a primeira 5ª, 6ª, 7ª
e 8ª séries da história da Vila. Me lembro de diálogos. Me lembro de aulas que caminhavam para fora do currículo regular das outras escolas simplesmente porque os
alunos pediam mais. Iam longe. Se interessavam, perguntavam, questionavam. Me
lembro de quando tive que deixar a Vila. Me lembro das Festas Juninas e de encontros que fizemos depois. Me lembro da primeira vez que achei algumas carinhas no
Facebook e de que sorri de saudades e carinho. Me lembro da Vila como me lembro
do cheiro do café da minha falecida vó Celeste. É tanto carinho e lembrança boa
que não me lembro das broncas, não me lembro das brigas… Obrigada, Vila. Obrigada por me fazer questionar tudo desde cedo. E por ter sido parte importantíssima
dos rumos que tomei até me tornar educadora.
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#35anosescoladavila
Por Marcos Mourão (Marcola)
A minha história de vida na Vila
Dedicada ao professor de Educação Física
Marcelo Barros da Silva, o Jabú
A primeira vez que ouvi falar da Escola da
Vila foi na minha graduação na USP. Fazia
o curso de licenciatura em Educação Física,
e o professor Oswaldo Ferraz, da disciplina
“Ed. Física na infância”, convidou dois colegas para uma conversa com a turma, um deles era o professor Marcelo Barros, conhecido como Jabú. Quando Jabú começou a
falar sobre a proposta de trabalho na Escola da Vila, imediatamente senti uma grande
empatia por suas ideias. Para conhecê-las
mais a fundo, resolvi que iria tentar fazer um
estágio de observação na unidade Butantã.
Lembro-me do dia em que vi, pela primeira vez, o portão azul de entrada na Barroso
Neto. Estava fechado, sem tranca, cadeado.
Esperei algum tempo, e, como não apareceu ninguém, resolvi entrar. Subi os degraus
de pedra e logo avistei uma moça, a Alessandra, na época, a secretária. Perguntei
pelo Jabú, e a Alê me pediu para esperá-lo
na quadra. Quadra? Qual quadra? Na época, só havia um pátio coberto por uma lona
laranja, conhecida como “Asa Delta”! Fiquei
aguardando um pouco e logo chegou a turma de crianças. Assim que a aula começou,
as ideias expostas na faculdade começaram
a se materializar. Uma aula que não se nor47
#35anosescoladavila
teava pela atividade repetitiva de exercícios? Estranho… Uma aula que respeitava
a atividade corporal da criança? Muito estranho… Uma aula que não precisava de
linhas esportivas na quadra e que não propunha o uso de material complicado,
caro e específico, mas utilizava sucatas e outros materiais simples, de fácil acesso?
Bem estranho… Uma aula na qual as crianças interagiam, se divertiam e não se
agrediam? Esquisitíssimo!
Decidi que era isso que queria fazer na minha vida profissional! Passei então a estudar alguns teóricos da pedagogia e da psicologia e voltar minha atenção ao desenvolvimento infantil e ao jogo, aguardando a oportunidade de um dia ser convidado
pela Escola da Vila. E essa oportunidade veio com a introdução da atividade de
extensão curricular de capoeira, no segundo semestre de 1993. Nessa época, a escola atendia aos alunos do fundamental 1, mas, no ano seguinte, abriria a primeira
turma de 6º ano E, com a perspectiva de trabalhar com uma faixa etária inédita, me
convidaram para assumir as aulas de educação física e introduzir o treinamento
esportivo! Obviamente fiquei muito feliz e preocupado… Será que daria conta?
Minha primeira entrevista foi com o Vinicius Signorelli, coordenador do ensino fundamental 2. Para aqueles que não conheceram o Vinicius na época, pensem na figura de um viking. Acrescentem a ela um pouco de Einstein e Beethoven. Era fácil se
intimidar à primeira vista…
Fui muito bem recebido
por toda a equipe da escola. Para se ter uma ideia,
as reuniões pedagógicas
de terça-feira aconteciam
numa sala do bloco B com
todo o corpo pedagógico!
Muitas reuniões podiam
ser chamadas de “terças
insanas”! Era uma concentração absurda de ideias e
conceitos pedagógicos por
m²! Imaginem um garoto
de 23 anos, recém-formado, com pouca experiência docente, nesse ambiente! De
qualquer modo, ficava escutando e admirando aquelas mentes brilhantes. Men48
#35anosescoladavila
tes? Mas eu não era do corpo? Pois é, uma das coisas que aprendia aos poucos era
que o professor de educação física que gostaria de me tornar precisaria de tantos
estudos, tanto embasamento teórico, tanto conhecimento, como todos os outros
mestres.
Bigode (matemática), Vinicius (ciência), Graça (Geografia), Conceição (História),
Sérgio (Teatro), Claudio Cretti (Artes), Noemi (Português), Zinia (Inglês), Clice (O.E)
são os primeiros professores do ensino fundamental 2 de 1994 que me marcaram
profundamente. Com eles aprendi que não sabia nada, mas tinha sempre um colega que sabia, pois não dava para construir uma equipe sozinho. Pelo menos isso
eu aprendi na elaboração do trabalho de implementação do ensino fundamental 2.
Gostaria de ter tido
uma escola como a Vila
na minha formação.
Falando em saberes, quero destacar um deles para
dar a dimensão do tempo que já passei nesta escola.
Era 1994, e uma reunião quase inteira foi ocupada
para a apresentação de algo revolucionário na busca
e na troca de saberes: a INTERNET.
Ficamos todos ao redor de uma mesa, aguardando a conexão por linha discada,
enquanto o ruído característico (os mais velhos lembram) acusava a tentativa. Após
uns vinte minutos discando, nada apareceu na tela. Tivemos que nos contentar com
os relatos do Vicente sobre o site da NASA, de como era fantástico, etc. Hoje conto
essa história aos meus filhos Pedro (14) e Marina (16), como se fôssemos homens
da caverna em busca do fogo!
Pois é, foi na Escola da Vila que, desde pequenos, eles sempre estudaram. Pedro
ainda teve o privilégio de frequentar o Espaço da Vila, Berçário de 0 a 3 anos. Confesso que tenho uma certa “inveja” deles… Como gostaria de ter uma escola assim
na minha formação. Uma escola que cumpre o seu papel de formar estudantes,
que olha com respeito a diversidade e a inclusão, que não restringe a sua atuação à
sala de aula, que se compromete com as questões sociais, que orienta e educa seus
alunos, suas famílias. E que, com uma significativa parcela de minha contribuição,
trata o corpo e o movimento numa perspectiva integrada, libertadora e autônoma.
Obrigado, Escola da Vila, e parabéns pelos seus 35 anos!!!!
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Olim Vila. Orgulho de
pertencer à Vila, usar
a camisa e defender
as cores!
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#35anosescoladavila
Por Aline Gasparini Montanheiro
Vilaline
Começamos pequenas
Grupo 1, 2, 3, 4. “Pré”, não!
Sala grande, porta azul abobadada
Cantos, cabaninha, roda…
Banquinhos azuis com furo no meio
Tanque de areia e brinquedão
Grupos, histórias, recontos
Leitura, biblioteca, apresentação
Era uma vez
A alfabetização construtivista
Que reescrevendo histórias
E informando de um polo a outro
Tomou forma e criou sentido
Tornando-se clássica
Quase como a Grécia Antiga
Aguça-se o gosto pela leitura
Mas de ir ao parque não vemos a hora
Inscrevemo-nos nessa tessitura
Tal como imigrantes
Tateando nossa própria memória
Dos mamíferos aos microorganismos
Da primeira prova à tabuada pensada
Do jornal à poesia
Dos anos 60 aos quilombos
E na arte encontramos moradia
Como a gente cresce…
Fica crítica, analítica, moderna e contemporânea
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#35anosescoladavila
Tipo um Outsider
Tenta se controlar
Mas não consegue
Bora pra Ubatuba, Paraty ou Petar Que tudo segue
Aquela do início
Não é mais a mesma
Muitos por ela passaram
Alguns ficaram
Outros ainda virão
Mas Ensino Médio é preciso
Sem alívio, mais pressão
Não pode olhar pra trás
Senão perde o ar
Ainda tem que pensar
No vestibular!
A tal da bolinha
Saiu da caixinha
Está diferente
Abriu mais a mente
É professora
Aluna de outrora
Pra escola voltou
Aqui estou!
- Você é filha da Vila?
Perguntou alguém.
A questão talvez seja:
- Essa história é de quem?
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#35anosescoladavila
Por Monica G. Fortunato Friaça
Desde 1999 fazemos parte da Escola
da Vila. Nosso filho Bernardo (Beba)
entrou na Vila aos três anos de idade.
Estávamos chegando de uma estadia em Cambridge, UK, de três anos,
e sabíamos que nosso filho iria estudar na Vila. Muitos de nossos sobrinhos tinham estudado na Vila, e outros, que estudam atualmente, e era
a Vila que tínhamos escolhido.
Depois de vários anos na Vila e adorando a escola, Bernardo resolveu
praticar um esporte… Resolveu, e pediu: “Quero jogar handebol com o professor Sidiney”. Pensei muitas vezes, pois nada dava certo para ele. Natação… odiava.
Futebol, dormia no gol nas manhãs que ia treinar no clube. Basquete, gostava, mas se
entediava. O que fazer, então, com um moleque que era devagar nos esportes?
Pensamos… ops… pensei: “Ele pediu handebol, vou tentar… Fiz a inscrição primeiro na Escola da Vila, e eu ia a todos os jogos. Nos treinos ele se animava, e queria mais e mais. Acampamento nas férias no Sul, Itajaí sozinho (aos nove anos de
idade) com alguns amigos, pela primeira vez tanto tempo fora, dez dias, foi. Voltou
louco por handebol.
Começou a treinar no Clube Pinheiros e na Escola da Vila.
Muitos campeonatos ganhos, inclusive brasileiros. Quero jogar handebol
Bolsa-atleta ganhou algumas, foi chamado pro com o professor Sidiney.
acampamento da Seleção Brasileira.
Muitos sucessos e insucessos, e fraturou a coluna em 2014. Voltou do acampamento
da Seleção com muita dor. Depois de alguns meses, operou no final do ano, e agora
está voltando a jogar, e eu quase morta! Para quem me conhece, sabe bem….
Hoje, aos 19 anos, ele cursa economia no Insper, faz parte da Atlética, e leva o
esporte no coração!
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#35anosescoladavila
Queria fazer um agradecimento especial ao professor
Sidiney, que mudou a vida
desse moleque. Sei da importância das “chatices” desse
grande formador de atletas e
de cidadãos. Hoje, até o Beba
elogia o Sidão…
As broncas tornaram esses
meninos cumpridores de horários, responsáveis pelos outros, e veem o mundo de outra forma.
Bernardo é elogiado na faculdade, não pelo seu primor nas exatas, mas, sim, pelo
questionador que a Vila o ensinou a ser. Um cidadão de voz ativa, e batalhador.
Obrigada à Vila e ao professor Sidiney!!
Atualmente tenho dois sobrinhos na Vila e gostaria de dar aos meus netos o que dei
ao meu filho.
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#naterceiradecada
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#35anosescoladavila
Por Gabriella Leão Ferraz Montiel e Mariana Segueira Rocha
As alunas do 4º ano emocionaram as secretárias da unidade Butantã quando
entregaram este lindo presente, acompanhado de um sincero “Parabéns para vocês!!!”
A obra de arte ganhou lugar especial na história da Vila. E na sala da Wanilda também!
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#35anosescoladavila
Por Emerson Marinheiro
Três gerações
A Vila faz 35 anos, mas, em minha família, a Vila já está presente há três gerações.
A matemática parece dizer que essa conta não bate, mas vou provar que isso é
possível.
Como morador de um
Butantã de 30 anos
atrás, tive uma infância
muito simples, gostosa, quase como no interior. Na minha casa,
não faltava comida,
mas também não houve mais nada de material que sobrasse. Meu
pai era alfaiate e minha
mãe, doméstica.
Como eu morava em
frente à Escola da Vila,
cresci vendo e vivendo
a movimentação da escola, carros que paravam, pais que esperavam seus filhos no
degrau em frente à minha porta. A Vila fazia parte da nossa rotina.
Um pouco mais tarde, as coisas apertaram financeiramente na minha casa e minha
mãe resolveu conseguir um segundo emprego, e este foi justamente como auxiliar
de limpeza na Escola da Vila, à noite.
Durante anos, minha mãe chegava do seu emprego diurno, vestia o uniforme e enfrentava outro turno na Vila, quando as crianças já tinham ido embora e a escola
precisava ser limpa e arrumada para o dia seguinte. Eu era novo, mesmo assim entendia que era uma rotina pesada para a minha mãe e tinha ideia do esforço que
ela fazia em nome do bem-estar da minha família.
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#35anosescoladavila
Os anos passaram eu fui trabalhar em uma Fundação da USP. Com isso, pude cursar uma faculdade. Fui a segunda pessoa da minha família a ter um diploma de 3º
grau. Meu primeiro diploma foi o de Publicitário, mas circunstâncias diversas fizeram com que eu nunca trabalhasse na área.
Desde a adolescência, a capoeira já ocupava uma parte enorme da minha vida e
posso dizer, com tranquilidade, que Mestre Alcides, meu mestre de capoeira, foi
mais do que uma inspiração: através do seu exemplo, não só como mestre, mas
como educador, eu e outros jovens capoeiristas do grupo construímos um futuro
de superação através da capoeira e, posteriormente, da Educação.
Conheci minha esposa com 27 anos e, pouco antes de me casar, decidi que era hora
de mudar a minha vida e finalmente ouvir a minha vocação. Voltei para a faculdade
e, dessa vez, para fazer o curso de Educação Física. Enquanto eu fazia minha 2ª faculdade e, em seguida, uma pós-graduação, me casei e tive meus dois filhos, e isso me
aproximou ainda mais do mundo das escolas e da educação. Ao escolher a escola
para o meu primeiro filho, descobri que a maioria das escolas era muito diferente
do que buscávamos. Queríamos que o nosso filho estivesse em um ambiente seguro e acolhedor para poder brincar e se desenvolver.
Quis o destino que a
O problema é que, aparentemente, brincar não estaVila estivesse presente
va nos planos de boa parte das escolas de educação
na história de três
infantil que visitamos.
gerações da minha
Após muita pesquisa, escolhemos uma escola confamília.
fiável e amorosa, cujo foco era de fato o aspecto humano da educação e onde nosso filho passou sua primeira infância cercado de
bons amigos e educadores queridos. Pouco tempo após meu filho ter entrado nessa escola, fui convidado a lá iniciar um trabalho com a capoeira e acabei me tornando professor de capoeira dessa escola e depois de tantas outras.
Alguns anos depois, era chegado o dia do nosso João fazer a transição para o ensino
fundamental, e novas dúvidas e inseguranças surgiram. Visitamos todas as escolas
da região, mas estávamos convictos de que o João deveria ir para uma determinada escola para onde todos seus amigos da educação infantil também seguiriam.
Foi quando minha esposa me perguntou porque não havíamos visitado a Vila.
Eu não soube responder. Às vezes, o que é mais óbvio parece nos passar desapercebido. Agendamos a vivência e ficamos surpresos ao nos darmos conta de que a Vila
tinha todas as características da escola que desejávamos para o nosso filho. E, para
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#35anosescoladavila
o João, isso também ficou claro desde o primeiro momento. Durante a vivência, ele
demonstrou traços de uma autonomia, de um desejo de viver coisas novas, com
novos amigos, que nem mesmo nós conhecíamos.
E, com algum nível de insegurança nessa possibilidade que não havia sido considerada até então, decidimos apostar, e foi na Vila que João deu início à sua incrível jornada de descoberta do mundo das letras e dos números, acompanhado por
uma professora experiente, firme e amorosa e em um espaço físico que para ele era
mágico, porque, além de ser muito maior que o da sua escola anterior, era exatamente em frente à casa da sua avó!
Já nesse início, eu, como pai, educador e capoeirista, me animei com a perspectiva
de acompanhar através das vivências do meu filho um novo método de aplicação
da Capoeira apresentado pelo Mestre Marcos Mourão, mais conhecido na Vila como
Marcola. Ele mesmo foi quem, com tanta generosidade, se dispôs a abrir as portas
da sua sala de Capoeira para me apresentar seu método e sua experiência junto
aos alunos do Fundamental I. E o resto vocês já sabem. Não apenas fui apresentado às salas de Capoeira da Vila como hoje trabalho nelas quase todas as tardes,
como professor de Capoeira dessa criançada incrível, que inclui também o meu
filho João, hoje no 3º ano do E.F.I
Quis o destino que a Vila estivesse presente na história de 3 gerações da minha família. E de diferentes formas e em diferentes papéis, nós 3 também fazemos parte
da história da Vila.
Feliz 35 anos, Vila!
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#35anosescoladavila
Por Fermín Damirdjian
O elevador
Era uma terça-feira qualquer de 2007. Eu esperava
o elevador, na garagem, com as mãos carregadas
de compras do supermercado. Tudo disposto daquela forma que não sabemos exatamente como
abriremos a porta quando ele chegar, mas na qual
está tudo tão bem encaixado que deixamos para
resolver esse pequeno problema somente quando
a caixa metálica, de fato, plantar-se diante de nós.
Assim estava eu, como um monumento à minha
vida ordinária, quando alguém faz o favor de me
ligar no celular. Aqueles de telinha verde. Tinha um
jogo da cobrinha que eu costumava usar no ônibus
quando me cansava de ler.
Pensei um pouco se valia a pena sair do meu pedestal de herói da garagem, pai de família que voltava
pra casa com as mãos fartas para alimentar minha
esposa e uma pirralha de pouco menos de um ano
de idade. Marina faria um ano na quinta-feira. Mas
o celular persistia, e, para encher o elevador com
sacos de supermercado, eu precisava trabalhar. Na
época, era tutor de alunos, uma iniciativa absolutamente individual. Recebia alunos do Lourenço
Castanho, da Viva, do Pentágono, do St. Pauls, da
Play Pen e de qualquer um que quisesse me enviar um jovem desajustado com o sistema escolar.
Também tinha uma orientadora e um orientador
de uma escola do Butantã que vinham me encaminhando alguns desses espécimes. De modo que
era melhor atender.
Largo as sacolas de uma das mãos, deposito a valiosa carga no chão e enfio a mão no bolso para
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#35anosescoladavila
arrancar aquele aparelho piolhento que não parava de escandalizar a garagem, na
esperança de que o telefonema realmente valesse a pena.
- Boa tarde, é o Fermín que fala?
- Sim, sou eu.
- Meu nome é Neninha (Quem?? Cada nome…). Você deixou um curriculum aqui
com a Verinha e o Chicão (Todo mundo ali parecia ter um nomão ou um nominho.),
e quero saber se você ainda tem interesse em vir até aqui conversar conosco.
Interesse? Eu tenho uma filha pra criar, minha senhora.
- Ah, acho que sim. Por que não? Se for em um horário viável… (Eu tinha montes de
horários viáveis!).
Uma das minhas primeiras
incumbências foi colecionar
uns papéis amarelos que
significavam algo muito
importante.
- Pode ser na quinta feira, às 14h?
Justo no aniversário da Marina. A gente iria
almoçar junto, os três…
- Claro que sim. Está ótimo. Está perfeito. Agendado.
Desliguei, o elevador chegou, como chegou também a quinta-feira. Ao contrário da
escola do Butantã, que eu tinha visitado para estreitar meus contatos profissionais
com uma orientadora baixinha e um orientador barbudo, agora eu tinha que ir à
outra Escola da Vila, que ficava no final da Eliseu de Almeida. Cheguei pontualíssimo, afinal, eu tinha aquele horário viável. Na verdade, a quinta-feira inteira estava
insuportavelmente viável naquela época. Tão viável que realoquei a singela comemoração do primeiro aniversário da Marina em qualquer outro momento do dia.
Fui, por fim, a uma sala conversar com uma mulher que falava muito sobre educação e pedagogia. Não era uma fala muito extensa ou prolixa. Parecia ater-se às informações necessárias de uma conversa. Nem muito mais, nem muito menos, sem
deixar de ser dinâmica.
- Trabalhar em escola é, sim, um tanto cansativo, por ter um grande volume de ações
ao mesmo tempo. Chegamos ao fim do ano bem esgotados. No entanto, esperamos sempre recomeçar no ano seguinte, e tudo o que fazemos nos motiva e instiga
novas ideias e coisas por experimentar.
61
#35anosescoladavila
E seguia. Enquanto a ouvia, eu olhava em volta tentando absorver referências. Meus
olhos sempre trabalham bastante. Com frequência, costumam ser bem mais ativos
do que minha audição e mais ainda que a minha parca concentração. Havia um
quadro na parede, em cima da cabeça da diretora. Outros, a meu lado esquerdo.
À minha direita, uma estante imensa, repleta de livros que, somado ao assoalho
de madeira, davam uma acústica aconchegante ao lugar. Era uma casa meio surrada pelo uso, como uma roupa antiga, já com algum cheiro próprio. Bem à altura
do meu antebraço direito, meus olhos pousaram sobre uma referência importante:
Tempos interessantes, a autobriografia do Hobsbawm. Em meio à pedagogia, que
eu vinha perseguindo com certa distância desde que eu me afastara da clínica com
adolescentes em instituições públicas e ONGs, a história era sempre uma parceira
que me acompanhava em minha leitura de cabeceira. Um porto seguro, um vínculo
leal que sobrevivia ao meu trânsito profissional da clínica com jovens em direção à
educação. E este senhor elegante, sábio, inglês, que sabia falar tanto de Marx como
de Maradona, Eric Hobsbawm era uma referência intelectual e afetiva sobre quem
eu me apoiava desde minha tenra juventude. Se na adolescência eu trocava as leituras escolares por Ernesto Sábato e García Márquez, na faculdade eu traía o bom e
velho Freud com extensas leituras deste historiador contemporâneo.
- Seria importante se você pudesse vir amanhã conversar com a Susane para ver
sua disponibilidade de horários.
Que gente prática. Amanhã? Horários? Não sei se já mencionei, mas eu tinha alguns
horários viáveis, naquela época.
Sendo assim, no dia seguinte, às 7h20, fui conversar com uma orientadora grandona que parecia levar o trabalho mais à sério que um sacerdote em retiro, embora
nem tão serena nem muito menos lenta como um monge. Montamos ali uma grade
horária um tanto assassina. Por mais que eu tivesse, sim, abundância de horários
viáveis, parecia que estavam me empurrando para compor uma seleção em meio
às quartas de final de uma Copa do Mundo, sem eu saber exatamente a quem eu
deveria passar a bola. Tinha horários viáveis, mas também não vamos exagerar. Eu
tinha vida lá fora.
Não importa. Entrei em campo. Uma das minhas primeiras incumbências foi colecionar uns papéis amarelos que significavam algo muito, mas muito importante.
Eu também tinha que xerocar TODAS as provas que tivessem uma nota abaixo
de “C”. Era agosto. Havia provinhas, provonas. Lições. Palavras estranhas, como,
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#35anosescoladavila
por exemplo, “SMA”. Parecia conversa de uma seita secreta que habitava galerias
subterrâneas. Um encontro muito importante, da escola toda, em algum sábado,
parecia se aproximar e deixar todos os professores muito, muito, muito tensos.
Tudo bem, eu já tinha trabalhado na ala pública de hospitais psiquiátricos. Podia
suportar muitas coisas.
Tinha que lidar com pirralhos de onze anos e também de quatorze. Irreverentes,
mas também afetivos e simpáticos. Aulas interessantes, situações engraçadas. Certa confiança foi-se tecendo, tanto com aquela massa de púberes como com as figuras que me rodeavam como parceiros de trabalho.
Quando eu já tinha me aclimatado e me sentia confortável, com uma boa ideia do
que eu deveria fazer, resolveram me catapultar para outro território escolar. Algo
como um além-mar dentro da própria escola. Mas que gente inquieta! Devem enlouquecer seus maridos mudando os móveis da sala todos os meses. Logo eu, que
gosto de rotina. Que me desorganizo sozinho, sem precisar da ajuda de ninguém.
Mas vamos lá. Outra equipe a conhecer, outro espaço, e outra massa de pirralhos,
já com outra cara, no Ensino Médio. Algo naquilo tudo me instigava. Muitas coisas
me intrigavam e motivavam. Foi-se construindo um sentimento que era um misto
de exaustão e vício. O mesmo fenômeno que suga é também o que alimenta. Essencialmente, trabalhar com jovens. Deparar-se diariamente com o próprio passado. Vibrar quando conseguimos oferecer algo que fez sentido aos alunos, repensar
a escola quando eles só fazem pela tarefa. Sentir que as necessidades dos alunos
são tão absurdas quanto legítimas. Que nós, adultos, precisamos a cada semana
repensar nossos vícios diante de situações que parecem burlar a experiência que se
acumula e se mostra útil. Mas que nunca é suficiente.
Passado algum tempo ali, e para a minha alegria, aquele orientador que me recebera com a orientadora no Butantã, anos atrás, agora caíra na cadeira ao meu
lado. Mais algum tempo e aquela com quem eu montara minha grade horária
semanal no Fundamental II foi alegremente catapultada para o nosso pedaço. E
como essa gente gosta tanto de mudanças, nunca mais frequentei aquela salinha
com a estante gigante. Agora os orientadores, coordenadores e diretora frequentamos outra, algo mais moderna, talvez mais fria. Há menos livros, bem menos.
Mas em sua essência, é a mesma. Inclusive porque ali ainda repousa, silencioso
e resoluto, o volume de Eric Hobsbawm, indicando que ainda não se esgotaram
esses tempos interessantes.
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Festival de Poesia.
A importância da
literatura e da cultura
na identidade da Vila.
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#35anosescoladavila
Por Andrea Aly
Lembro-me lembro do primeiro dia em que entrei na escola. Eu estava procurando
uma vaga para estagiar na educação infantil e fui recebida pela Vania e pela Dayse.
Lembro desse dia, do clima agradável que senti ao observar as crianças brincando
e passando pela sala com piso colorido onde eu esperava.
Na reunião, uma pergunta: mas o que a Escola poderia te oferecer? Afinal, eu já havia me formado, acabado de casar, estava voltando de um ano na França e pleiteava uma vaga de estágio na educação infantil. Respondi : preciso conhecer este universo, viver isso e entrar de cabeça nas questões que envolvem a infância e a arte.
Assim, comecei minha jornada que, neste ano, chega a 8 anos de Escola.
Uma equipe incrível,
uma comunidade
extremamente
competente e envolvida,
uma escola de primeira!
Passei de estagiária de sala para professora de arte,
comecei a dar cursos no Centro de Formação, tive
minhas duas filhas e estou nesta delícia a todo este
tempo!
Uma das coisas que mais me chama atenção na Escola ainda hoje é a qualidade crítica que os alunos
65
#35anosescoladavila
da Vila possuem. Quando fazemos visitas a museus ou nas aulas de apreciação que
pude presenciar, fico sempre muito emocionada com os comentários deles e a capacidade de observar, analisar, refletir e discutir sobre arte.
Outro ponto muito importante é a quantidade de gente especial que a Escola envolve. Uma equipe incrível, uma comunidade extremamente competente e envolvida, uma escola de primeira!
Continuo muito feliz em poder fazer parte de tudo isso e de estar perto das crianças
fazendo-os felizes durante esses momentos tão especiais que são as aulas de arte!
66
#35anosescoladavila
Por Andrea Monteiro
A Vila tem uma história interessante com a minha vida. Tenho uma irmã pedagoga
que hoje está com 45 anos. Quando éramos estudantes, ela chegava tarde da noite
algumas vezes em casa e, como dividíamos o mesmo quarto, muitas vezes ela comentava que tinha ido fazer um curso na Vila. E assim aconteceu por diversas vezes.
Na minha cabeça, a Vila era uma central de cursos para professores e estudantes de
magistério, nada além disso.
Passados 8 anos, eu me casei, e minha enteada estudava na Vila, Marina Monteiro,
e sua mãe era professora de História da Vila, a Conceição. Foi aí que entendi que a
Vila era uma escola, Escola da Vila.
Dois anos depois, nasceu minha primeira filha, Beatriz Monteiro, morávamos na
época em Moema, e ela acabou estudando a pré-escola num colégio do bairro.
Quando ela tinha 7 anos, mudamos para o Alto de Pinheiros e, de repente, eu estava matriculando minha filha naquela Escola da Vila que eu achava que era uma
Central de Cursos para pedagogos… Acabei colocando ela na Vila sem nenhuma
referência, o objetivo único era que as duas irmãs estudassem na mesma escola, já
que, na época, não moravam juntas e era uma forma de mantê-las mais próximas.
67
#35anosescoladavila
A Bia foi aluna da querida Andrea Polo, logo no primeiro ano do ensino fundamental. Que sorte foi a nossa de ter essa professora de cara. A Bia saía da sala toda hora
porque queria ir ver a irmã mais velha. Lembro-me da Andrea me dizendo que “tudo
bem, isso ia passar e etc…”, o que, de fato, passou.
Na 1ª reunião que fui à escola, eu não conhecia ninguém. Uma moça que depois eu
descobri que era a mãe da Julia Ferraz, colega da Bia, num determinado momento,
comentou numa rodinha de mães: “Nossa, a Vila é tudo pra mim, essa escola é maravilhosa”. Nem me lembro em que contexto aquilo foi falado, mas fiquei impressionada naquele dia com tantas manifestações positivas em relação à escola.
Passaram-se meses e eu fui me enturmando com as mães, crianças e a própria escola. E aí descobri o porquê do encanto com a escola. Entre tantas qualidades, a
Vila tem a maior e mais importante para uma criança no início de sua vida escolar
– ela é uma escola verdadeiramente acolhedora. Ela acolhe a criança como nenhuma outra faz. Ela aceita as diferenças e é uma escola de inclusão de verdade.
As pessoas que escolhem colocar seus filhos na Vila não podem ser arrogantes, afetadas, fúteis, simplesmente porque isso não combina com a escola. Essas pessoas
não permanecem na escola, não tem como. Os pais da Vila são pessoas inteligentes, simples, a maioria bem sucedida, inclusive, mas
isso não é relevante pra ninguém. Aqui o que importa A Bia foi aluna da
é a convivência desinteressada e harmônica entre as querida Andrea Polo,
pessoas, sejam pais, sejam filhos.
logo no primeiro ano
Em 2014, a Bia viajou com a escola em razão do inter- do ensino fundamental.
câmbio com a Argentina. Fui buscá-la na escola e um Que sorte foi a nossa de
pai que eu nem conhecia me falou, enquanto esperá- ter essa professora!
vamos a van chegar: “Como eu sou feliz de ter podido
proporcionar ao meu filho que estudasse nesta escola.” Sinceramente, fiquei tão
comovida na hora com tamanha demonstração de carinho pela escola que nem
perguntei quem era o filho dele.
Marina fez grandes amigos na Vila, está hoje com 19 anos e entrou na POLI em 2014.
Apesar de sempre ter gostado mais da área de exatas, adora literatura, lê muito, e
eu tenho certeza de que ela aprendeu isso na Vila da forma mais prazerosa possível.
Tem um carinho especial pela escola e, com certeza, vivenciou momentos inesquecíveis na Vila.
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#35anosescoladavila
Enquanto escrevo esse texto, obviamente me vêm tantas lembranças à cabeça,
como festas juninas, reuniões, peças de teatro, a palestra sobre “Luto” num ano difícil da sala da Bia (o que foi uma demonstração enorme de carinho e preocupação
naquele momento com os alunos), entre tantos outros.
Não posso deixar de escrever que a Bia pediu pra sair da escola no 1º ano do ensino médio – queria uma experiência diferente e nós, pais, respeitamos a decisão e
aceitamos sua saída. Passados 5 meses, a Bia começou a ficar triste. Um dia confessou que estava morrendo de saudades da escola e dos amigos. Lá fui eu pedir
clemência ao Fermín, outra pessoa doce e maravilhosa que um dia a Vila contratou.
Ele nem hesitou – “pode voltar”. E foi a melhor coisa que fizemos. Em uma semana,
ela era outra pessoa.
Este ano é o último ano dela na Vila. Não quero nem pensar na formatura. Já fico
emocionada só de escrever essa palavra.
Como ela foi feliz nessa escola, que saudades vou sentir da turma dela se reunindo
em casa: o Tatá, a Clarinha Orfão, Marina Perez, Bruno, Karen, Lara, Gui, entre tantos outros. Aliás, inesquecível o discurso do Gui no aniversário de 15 anos dela. Só
quem ouviu pode descrever. Tenho certeza que eles serão amigos pra vida toda,
ainda que cada um vá seguir seu caminho. Espero que esse seja um dos grandes
legados que a Vila vai deixar pra eles.
Por fim, diante de tantos bons momentos de que acabei me lembrando, escrevendo esse texto modesto, mas feito com muito carinho, só posso agradecer ao destino
por ele ter colocado a Vila no meu caminho, e dela ter sido minha parceira na educação formal e emocional de duas garotas que se tornaram meninas maravilhosas.
Um beijo enorme a todos vocês e parabéns pelos merecidos 35 anos de história.
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Festa Junina.
A valorização
da cultura popular
na escola.
70
#35anosescoladavila
Por João Colombero
Talvez quem devesse estar escrevendo este depoimento fosse um dos meus irmãos
mais velhos: André Colombero, formado na turma de 2004, ou Leonardo Colombero, formado na turma de 2011 (ambos estudaram na escola desde criancinhas até
o último ano do Ensino Médio, assim como eu). Porém, como irmão mais novo, em
um ano de encerramento da escola e de formatura, acredito que tenho muito o que
falar da Escola da Vila.
Me sinto uma pessoa muito privilegiada em poder percorrer a minha vida escolar
nesta instituição de ensino, que hoje é mais uma segunda casa, passando boa parte do dia nela, seja por revisões, estudos ou até mesmo treino esportivo, voltando
para casa para comer e dormir.
71
#35anosescoladavila
O que eu irei levar para Algumas das minhas amizades dentro da Escola da
Vila são de longa data, desde o Grupo 1, quando tinha
sempre dessa escola
3 anos de idade. Digo isso porque, sem dúvida, o que
serão as amizades.
eu irei levar para sempre dessa escola serão as amizades. Levarei também a simpatia que criei pelos professores, pelas meninas da cozinha, do almoxarifado, da secretaria, pela Madalena, a telefonista, os funcionários
da limpeza, da portaria, pelos estagiários e, até mesmo, pelos alunos novos.
Me recordo de várias mudanças que ocorreram dentro da escola. Uma delas, quando o pátio dos brinquedões deu lugar para a nova cantina, ou quando o extenso
prédio da biblioteca, com suas enormes portas de madeira (aquele em que Celinha
nos contava histórias no mar azul ao final de cada dia) deu lugar à construção de
um novo prédio. Confesso que uma mudança marcante (não sei porquê) foi a troca
do aparelho retroprojetor (aquele em que a professora de Língua Portuguesa usava
para nos ensinar gramática com uma folha transparente e uma caneta permanente) por um computador e um datashow em cada sala.
Não foi fácil para os meus pais pagarem a mensalidade dos meus dois irmãos, a minha e da minha irmã mais nova (ufa! acho que lembrei de todos!). Naquela época,
cogitávamos a ideia de mudar de escola. Mas não. Nenhuma escola seria capaz de
substituir a forma de ensinar, de educar, de respeitar, da maneira como o conhecimento é transmitido aos alunos, a paciência e a paixão dos professores em explicar
o conteúdo (mesmo que fosse necessário mais de uma vez). E, por falar em professores, acho que são eles as figuras que mais devo citar e agradecer pelo fato de terem me formado, não podendo esquecer também os coordenadores (viu, Susane?
Espera: Susane com S ou com Z? Até hoje me confundo!).
Agora a lista daqueles que me marcaram profundamente dentro da Escola da Vila:
Conceição, a cozinheira. Bel, a monitora. Celinha, a bibliotecária. Edson e Hernane,
os porteiros. Como não me esquecer da Madalena, a telefonista, com quem tenho
contato até hoje. Meus pais adotivos, Chacur e Chicão. E as três professoras da Educação Infantil: Teca, Tucha e Miruna, essas duas últimas ainda encontro pelos corredores da escola.
E aqui vão meus parabéns pelos 35 anos e um muitíssimo obrigado!
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#35anosescoladavila
Por Carina Contarini Dietrich
Era o ano de 1999. Eu, com 19
anos, casamento marcado e um
novo emprego para ser iniciado
em Macaé, Rio Janeiro. Foi nesse contexto que tive o meu primeiro contato com a Escola da
Vila. Era janeiro e fiz um curso
sobre “O que ensinar na Educação Infantil”. Inesquecível.
Depois desse, vieram mais de
20 cursos (acreditem, parei de
contar depois do vigésimo).
Morei em diferentes cidades,
mas, independentemente de
onde eu estivesse, não conseguia trabalhar sem refletir e
estudar com a equipe da Vila.
Era inevitável. Minha trajetória
profissional ia se modificando
e era na Vila onde sempre encontrava espaço para pensar,
repensar, errar e aprender. Nos
cursos que fiz, aprendi não somente sobre sequências didáticas ou projetos. Aprendi
a falar, aprendi a argumentar,
aprendi a elaborar minhas próprias propostas. Aprendi a ser
mais que professora, aprendi a ser uma educadora.
Foram horas intermináveis em ônibus, noites longas em estradas, dias sozinha
em hotéis e muitos momentos perdida em São Paulo, cidade onde fui morar em
2011 com minha família. Coincidência? Não, acho que não… Minha história com
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#35anosescoladavila
essa escola não havia nem começado ainda… O curioso é que eu não sabia disso,
até então.
Confesso que, quando me mudei para São Paulo, meu foco eram minhas filhas,
uma com 4 e a outra com 7 anos, na época. A mudança era grande para nós naquele momento e, honestamente, nem pensava em voltar a trabalhar tão cedo. Mas, a
vida tomou seu rumo rapidamente, a rotina se estabeleceu e superamos os desafios dos primeiros meses na nova cidade. Assim, poucos meses após a mudança e
ainda sem emprego, lá estava eu na Escola da Vila, estudando novamente.
Em meados de outubro de 2012, resolvi visitar várias escolas em São Paulo deixando meu currículo. Neste período, criei coragem e preenchi o formulário online da
Escola da Vila e enviei o meu currículo. Jamais cogitei a possibilidade de fazer uma
visita pessoalmente, como estava fazendo com as outras escolas. Nunca! A verdade? Não acreditava que estivesse à altura.
Era uma segunda-feira, eu estava em casa lendo um dos livros indicados no último
curso que fiz na Vila, quando o telefone tocou. Me disseram: “Carina, aqui é da Escola da Vila e você foi selecionada para uma entrevista amanhã, blá, blá, blá, blá, blá,
blá, blá”. Sim, eu só consegui entender o início da frase, porque fiquei paralisada
do outro lado do telefone. Precisei de muita força para me concentrar novamente e
voltar minha atenção para aquela voz feminina que continuava falando sem parar.
Enfim, perguntei: “Você poderia repetir o horário e o local, por favor?”. E, mesmo
com a repetição, depois que desliguei o telefone, não tinha certeza para qual unidade eu deveria ir. Foi tenso.
O processo seletivo foi longo, árduo e cansativo. Tenho
CN, CS, PL, SAD, SMA… certeza de que esse é o olhar de quem esteve dentro
Pensava comigo: “Que dele e, apesar de cada etapa ter durado em média 1
língua é essa que elas hora, a sensação é que havia durado 10 horas. Voltava
estão falando?!?
para casa exausta… Mas, não me deixava abater. Estudava, ou melhor “devorava” livros, textos e artigos
em dias, esperando ser convocada para a próxima etapa. Eu tinha que estar preparada. Era muita ansiedade, muita vontade de acertar, muita vontade de conseguir,
muita vontade de fazer parte da equipe Vila. O que aconteceu depois dos 10 dias de
processo seletivo? Minha primeira reunião com a equipe do 5º ano em dezembro
de 2012.
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#35anosescoladavila
Essa reunião foi bem engraçada… CN, CS, PL, SAD, SMA… Pensava comigo: “Que
língua é essa que elas estão falando?!? Não vou dar conta…”. Fico imaginando
hoje quais eram as expressões no meu rosto… Muita novidade… Assustava, certamente. No ano seguinte, estudo, dedicação, noites sem dormir e satisfação. Sim,
uma indescritível sensação de satisfação após cada etapa vencida. Fazia tudo valer a pena. Ao longo de 2013, minha exigência foi aumentando e mais desafios
surgiram. Mais noites de intenso estudo e de trabalho árduo. Depois de dois anos
na Vila, eu já começava a me sentir diferente. Aquela ansiedade do primeiro ano
havia passado, me sentia familiarizada com a equipe e com os inúmeros desafios
diários que enfrentamos enquanto professoras nesta escola. Mas a vida tinha outros planos para mim…
Dezembro de 2014. Eu me preparava para um novo desafio na unidade Granja Viana. Estava dando um passo grande na escola e aquele frio na barriga do 1º ano
voltava a fazer parte da minha vida novamente. Foi, então, que veio a notícia: estávamos de mudança para outro país. Era oficial.
O que veio depois da minha conversa com a escola não foi fácil. Me lembro com
clareza do meu último dia de trabalho na unidade Butantã. Estava sem chão, desorientada, não sabia se deveria me despedir das pessoas ou agir como se nada
estivesse acontecendo. Definitivamente, não estava nos meus planos deixar a Vila.
Foi assustador.
Ao longo daquela manhã, pensei que sim, que eu precisava dizer para todas aquelas
parceiras incríveis de trabalho o quanto elas foram importantes na minha trajetória
profissional, o quanto me ensinaram e o quanto elas significavam para mim. Mas
não deu muito certo… Bastava eu dizer as primeiras palavras para a minha garganta fechar e as lágrimas tomarem conta dos meus olhos. Desisti. Portanto, aproveito
esta oportunidade para dizer o que não consegui dizer na minha despedida.
Queridos amigos, amigas, parceiros e parceiras de trabalho,
Obrigada pelos anos inesquecíveis que vivi com vocês. Foram poucos, é verdade,
mas foram intensos. Passei a vida inteira tentando fazer parte de outros grupos,
mas foi na Escola da Vila que me senti realmente parte de um.
Nesta escola, conheci pessoas extremamente generosas, que me “estenderam a
mão” nas pequenas necessidades do cotidiano: desde uma ajuda com o liquidi75
#35anosescoladavila
Se pude me aprimorar
como educadora,
agradeço à equipe Vila.
ficador para o famoso “Milkshake da Carina”, até as
exceções para impressões e materiais de última hora.
Faz toda diferença poder contar com gente solidária.
As dificuldades ficam menores, os problemas se tornam motivos de boas risadas. Quanta saudade…
Conheci, também, uma equipe de professores e coordenadores “pensantes”, pesquisadores, leitores e escritores que transformaram a minha prática e a forma como
olhava para a educação como um todo. Se pude me aprimorar como educadora,
agradeço à equipe Vila, que desde 1999 faz parte da minha trajetória profissional.
Tenho muito orgulho de ter feito parte dessa equipe. Esperem… Não vou mentir,
ainda me sinto parte dela.
O que aprendi com a intensa programação de estudo para a produção de artigos,
textos para sites e blogs, novos projetos e sequências didáticas todos os anos, representam apenas parte do que levo comigo. As amizades que fiz são, sem dúvida,
a parte mais preciosa. Saudade de vocês, meninas… Do dia a dia, das reuniões, das
piadas, das brincadeiras, dos lanchinhos corridos no final do dia, dos presentes esquisitos de aniversário… Guardo cada um desses momentos no meu coração com
um carinho imenso.
Equipe linda essa… Me deram até um apelido, coisa que nunca tive em toda a minha
vida. Cá. Que especial foi para mim ser chamada de Cá. (Prometi a mim mesma que
não ia chorar ao escrever isso… Ainda bem que vocês não podem me ver agora… rs)
Bem, preciso encerrar… Escrevo demais… (Aposto que tem gente da equipe rindo
ao ler isso… É, continuo a mesma…rs) Sinto muito, ficaria aqui escrevendo sobre
minha experiência na Vila por dias se fosse preciso.
Hoje, há milhares de milhas que nos separam fisicamente, mas elas jamais serão
suficientes para enfraquecerem nossa amizade. Obrigada mais uma vez pelas ajudas, pelos incontáveis momentos de apoio e generosidade de todos. Qualquer dia
desses apareço por aí!
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Um pouquinho
de Brasil. O evento
mais colorido
da Vila!
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#35anosescoladavila
Por Débora Delmaschio Crotti
Todos os filhos são especiais… Têm sua marca registrada no jeito de olhar, na
singularidade dos gestos, nas manias, nos dengos, no sorriso…
Mano é especial por todos os quesitos mencionados acima e por mais um… Tem
Síndrome de Down…
Assim começa nossa história com a Vila.
Chegamos aqui pelo forte histórico da escola no trabalho de inclusão. Nós, pais
despreparados de primeira viagem, não sabíamos por onde iniciar…
Sabíamos apenas a nossa missão: apresentar o mundo à Manoela. Para isso, qual
a premissa básica? Encontrar uma escola que tivesse como princípio respeitar sua
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#35anosescoladavila
individualidade e não exaltar a sua diferença. Diferentes somos todos. Gostaríamos
de vê-la, além de incluída, respeitada.
E foi… Devemos confessar que no começo não foi nada fácil.
O nosso medo ora nos paralisava, ora nos indignava, ora nos fazia criar uma redoma em torno dela. Gunga, determinada, nos ajudou a reconhecer o potencial de
Mano. Nessa trajetória, tivemos muita sorte! Mano teve professoras incríveis, que
guardaremos para sempre em nossos corações… Dani, Anelise, Miruna, Clara. Queridas. Fortes. Capacitadas. Competentes demais.
Em 2012, foi o momento da filha caçula entrar na Vila… Marina… Agora eram duas
irmãs frequentando, democraticamente, o mesmo espaço!
De igual para igual! Isso consolidou a satisfação
Vê-las crescerem assim,
que até então relutávamos em reconhecer…
repletas de oportunidades
Passados 6 anos (entrando no sétimo), já conse- e possibilidades, nos dá a
guimos deixar Mano ir para o acampamento sem certeza de ter feito a
sofrer com um mês de antecedência. Ganhamos escolha certa.
confiança nela e na escola.
Prestes a completar 10 anos, concluímos: Mano é uma menina que brilha! Quem a
conhece pode, com certeza, confirmar: É linda! Cheia de vida, de atitude, de personalidade, de carisma, de luz… Vocês nos ajudaram muito na construção de sua autoestima. O mesmo acontece com Marina. O medo que sentíamos nos “primeiros
passos” cedeu espaço para uma motivação sem fronteiras.
Vê-las crescerem assim, repletas de oportunidades e possibilidades, nos dá a certeza de ter feito a escolha certa.
Manoela e Marina. Uma dupla tão diversa, mas que se respeita acima de tudo!
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#35anosescoladavila
Por Rogê Carnaval
Lembro a primeira vez que ouvi o nome Escola da Vila na minha vida. O ano era
1997, eu refazia o 1º colegial numa escola tradicional do bairro do Pacaembu, muito
perto de onde morava nessa época, Perdizes. Pelo meio do ano, meus pais se viram
obrigados a devolver o apartamento alugado em Perdizes, e questões financeiras
nos trouxeram de volta ao Butantã, onde temos um apartamento desde o início dos
anos 80, no qual nunca havíamos morado. Acostumar-mo-nos com o novo bairro
foi difícil, e talvez por isso meus pais nem sequer cogitaram nos trocar de escola.
Foram anos difíceis, cruzando a ponte cotidianamente, enfrentando a intransponível Rebouças, morando muito longe da escola pela primeira vez na vida. Por outro
lado, foi um tempo de novos aprendizados: usar o transporte público da cidade,
o primeiro assalto (perdi um par de tênis que amava), desvendar outras partes da
cidade distantes do bem comportado bairro de Perdizes.
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#35anosescoladavila
O problema continuava sendo o desempenho nas exatas: matemática e física eram
pedras no meu sapato! Um dia, uma amiga propôs que fizéssemos juntos aulas
particulares com uma moça que ela jurava explicar matemática como ninguém.
Conheci assim a Ligia. Ela estudava arquitetura e se sustentava com aulas particulares. Além de linda, eu a admirava pela inteligência e pelo posicionamento político.
Lígia talvez nem saiba, mas me despertou de forma irreversível o interesse pelas
questões sociais, algo que, lá na frente, seria decisivo na minha escolha profissional. Um dia, Ligia me perguntou: “Por que você continua estudando nessa escola
tradicional, longe da sua casa, sendo que você parece infeliz lá? Aqui bem perto da
sua casa tem a Escola da Vila, construtivista como a escola em que estudei, é a sua
cara! Ou então o Equipe, que é bem pertinho também! Vai, se arrisca, Rogê!”. Eu
pensei que não fazia sentido mudar de escola, já que, a essa altura, eu estava na
metade do 2º colegial. Mesmo instigado pelo que ouvia sobre a Vila e o construtivismo, meus parcos 16 anos não me permitiram tão ousada mudança.
Em 2006, já na FFLCH, vivi uma experiência de moradia coletiva numa linda casa do
Morro do Querosene. Naquele ano, um dos meus melhores amigos e que morava
comigo, o Fábio, havia sido contratado para trabalhar como professor de História na
Vila. Eu era professor de cursinho nessa época. O que se faz em termos pedagógicos
em um cursinho é essencialmente diferente do que se faz em uma escola, especialmente na Vila. Conversando sobre as práticas pedagógicas da Vila com o Fábio, eu
enfim começava a entender o que havia perdido por não seguir o conselho da Ligia.
Me encantava ouvir os projetos, as propostas, as produções dos alunos do Fábio. No
ano seguinte, comecei a trabalhar em uma escola da comunidade coreana no Bom
Retiro, mas mantive-me também no cursinho. Aos poucos, me enQue alunos! cantava mais o trabalho na escola, ainda que não desgostasse de
Que escola! forma alguma em trabalhar com os pré-vestibulandos. Em 2009,
o Fábio já havia saído da Vila para se dedicar integralmente à carQue astral!
reira acadêmica. Mas mantinha-se dando o curso de Revisão para
o vestibular, opcional aos alunos do 3º ano do Médio. Ocorreu que, por razões de
agenda, ele não poderia dar as aulas de revisão naquele ano, e me indicou ao então coordenador do EM, Armando Tambelli. Durante 6 semanas, revisei com aquele
3º ano temas como Revolução Francesa, Revolução Inglesa, neocolonialismo. Foi
então que entendi de vez a besteira que fiz ao não seguir o conselho da Ligia: que
alunos! Que escola! Que astral! Aquilo existia mesmo! Fiquei realmente feliz com o
trabalho que executei naquelas semanas.
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#35anosescoladavila
Em 2010, o professor Pedro Ravelli assumiu a coordenação da área de Humanas
no EM. Armando precisava de um professor de História que pegasse apenas uma
turma, algo como 6 aulas. Aceitei imediatamente! E assim cheguei oficial e regularmente à Escola da Vila.
Em 2011, a Sônia me convidou pra permanecer no EM e assumir também o 9º ano.
Hoje, à frente dos 8os e 9os anos, sinto que cheguei aonde queria, cheguei ao lugar
certo. Gosto do trabalho que realizo, do projeto da Escola, onde, além de ensinar,
aprendo muito, com alunos e colegas. Nesse lugar, fiz amigos pra vida, além de proporcionar às minhas filhas um ensino em que acredito e que eu mesmo acabei não
vivenciando como aluno. Hoje, é impossível não pensar: a Ligia tinha mesmo razão.
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Vila Literária.
Evento de
celebração
da literatura,
da poesia,
da metáfora
e da arte.
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#35anosescoladavila
Por Miruna Genoino
Nos pequenos detalhes
Texto dedicado à Andréa Polo, atual orientadora da Educação Infantil
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#35anosescoladavila
Como ex-aluna da Vila, irmã de aluno, e agora mãe de alunos da Vila, pude participar da maior parte (se não de todos) os aniversários da Vila, marcados de forma
especial a cada 5 anos. Já escrevi a partir de diferentes pontos de vista e sempre
apresentando um pedacinho do sentimento enorme que tenho por essa escola que
já me deu tanto, que já me mostrou tanto, que já me fez viver tantas coisas.
Neste aniversário de 35 anos, porém, não queria falar mais como professora que
é ex-aluna da escola, mas sim como professora em começo de carreira, de como
foi o começo de tudo, o que marcou a minha entrada neste mundo complexo da
profissão docente. Pois sim, foi na Vila. Eu tinha acabado de prestar vestibular para
a faculdade de Pedagogia e, ao encontrar antigas professoras na formatura de 8ª
série do meu irmão, recebi o convite para que, caso eu fosse aprovada, viesse fazer
estágio na Vila. Quis, fui, e de lá nunca mais me afastei… Na verdade, eu nunca tinha me afastado, mas, desde aquele momento, eu começava uma nova forma de
viver a Escola da Vila, agora pelo lado de dentro.
Depois de um estágio maravilhoso com a Angela Crescenzo, no ano seguinte fui
contratada como professora auxiliar e me disseram que eu ia ficar com a professora
Andréa Polo. “Ela é uma professora muito especial, com um olhar bem cuidadoso
para as relações e para o brincar, acho que vai ser ótimo para você”, foi o que me
disseram. O que eu não podia imaginar é que eu seria colocada ao lado de alguém
que iria mudar a minha vida para sempre.
Andréa me recebeu em sua sala de 1º ano com um
sorriso do tamanho do mundo e uma paciência Andréa foi me mostrando
sem fim para trilhar uma parceria com uma meni- o valor do pequeno,
na que 19 anos ainda tão inexperiente no mundo do simples, dos pequenos
da educação, mas com tantos sonhos, com tanta detalhes.
utopia. Pois bem, enquanto eu só queria pensar
no grande, a cada dia em que íamos construindo
nossa parceria, Andréa foi me mostrando o valor do pequeno, do simples, dos pequenos detalhes. O que eu não sabia era o quanto esses pequenos detalhes marcariam para sempre a minha carreira e a minha visão do que é uma educação não só
construtivista, como libertadora.
Com Andréa, aprendi o cuidado de perguntar ao aluno qual o nome e o sobrenome
que gostaria de que fosse colocado na lista de nomes, mesmo que isso significasse
explicar aos pais a diferença entre o que vinha de casa e o desejo que a criança ma85
#35anosescoladavila
nifestava. Com ela, presenciei o cuidado e o carinho que podem existir na simples
confecção de um cartaz com uma parlenda preferida, e nas palavras da rotina escritas demoradamente na lousa da classe. Ela me dava sinais delicados mostrando
que talvez fosse hora mais de ouvir do que de falar (que grande ensinamento, meu
Deus, para uma tagarela como eu!), e me ajudava a construir uma conversa carinhosa com os alunos ao abrir uma lancheira e compartilhar um pedacinho de casa
com a classe.
Tudo o que Andréa me mostrou naqueles dias em que estivemos juntas eu carrego comigo como um pequeno tesouro. E, nesse pequeno tesouro, existe um muito especial, que veio por meio de um conselho, uma “chamada de atenção”, uma
conversa franca que eu nunca, jamais esqueci, nem esquecerei. Eu, ativa e agitada
como sempre fui, estava sempre querendo ajudá-la, e ia me adiantando sempre que
possível aos tantos afazeres que faziam parte desse emaranhado da sala de aula…
Além disso, ela estava grávida, e isso aumentava o sentido de responsabilidade de
que eu tinha que ajudar no que fosse preciso. Um dia, Andréa me chamou e disse:
“Mi, você tem sido uma parceira maravilhosa e mostra sempre uma eficiência incrível em tudo o que faz.
Tudo o que Andréa
me mostrou naqueles Mas eu queria te dizer uma coisa… Você precisa ter o
dias em que estivemos cuidado de não se adiantar sempre e acabar fazendo
antes algo que as crianças mesmas podem fazer. Deijuntas eu carrego
xe que elas assumam a responsabilidade pela classe
comigo como um
também, você vai ver que dá certo.”
pequeno tesouro.
Foi incrível. Naquelas poucas palavras, Andréa me
presenteou com um dos maiores valores presentes naquele que seria um princípio
fundamental na minha relação com a educação, com a aprendizagem, com a sala
de aula: buscar a autonomia, sempre, e acreditar nessa autonomia do aluno, lembrando-me dela sempre que necessário também. E ela tinha razão, tudo sempre dá
certo quando a gente aposta por esse caminho…
Eu e ela vivemos muitas coisas juntas desde então. A mais forte delas foi o nascimento da Lorena, o bebê lindo que foi crescendo à medida que crescia nossa amizade
também. Mas outras tantas vivências, também muito emocionantes, se sucederam…
Lembro-me das lágrimas em seus olhos quando eu soube que ia assumir uma licença médica, sua emoção de me ver firme e segura em uma sala de aula, o carinho do
nosso reencontro, quando voltei para a Vila depois de alguns anos fora do Brasil.
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#35anosescoladavila
A Vila sempre vai representar muita coisa para mim, pois ela fez parte de praticamente todas as etapas da minha vida e da minha família. Mas, nestes 35 anos, quero homenagear a Vila por conseguir reunir tantas pessoas maravilhosas e competentes, que possibilitam que a gente descubra belezas profundas em momentos
grandiosos, como no final da produção de uma escrita coletiva, mas também nos
menores detalhes, como na confecção de uma lista de nomes. Os gestos de Andréa
que eu presenciei sempre ficarão marcados aqui dentro de mim, como uma recordação maravilhosa daquele tempo juntas, quando eu aprendia a cada gesto, a cada
fala, a cada olhar, o que era ser uma professora tão comprometida e tão símbolo do
que é a Escola da Vila.
Parabéns Vila, parabéns a todos os que fazem a Vila ser o que é!
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#35anosescoladavila
Por Rui Piranda, marido de
Adriana, pai de André, Olívia
e Pedro
Eu nunca vou esquecer
que o primeiro lugar que
me acolheu foi a Escola
da Vila.
Minha história diante dos 35
anos dessa escola é até recente. Tem apenas 13 anos. Havia
acabado de me mudar com a
família para São Paulo. As escolas da minha cidade (meus
filhos gêmeos estavam em diferentes escolas) tinham feito algumas indicações… Mas
ambas apontaram a Vila como
sua preferida. Fui ver todas as
opções. Por último, deixei a
‘preferida’ (queria formar minha própria opinião). Na (ótima) entrevista, encontrei como
interlocutora a Vania Marincek,
extremamente competente,
simpática e firme. Me disse que
havia vaga para apenas um
dos meus filhos. Emocionado
(mesmo) eu disse: ‘Vania, você
tem dois trabalhos.’. Ela riu e
disse: ‘Quais?’ Eu ainda, emocionado: ‘Encontrar vaga para
meu segundo filho e me ajudar a escolher um lugar para
morar.’. Ela riu e… Me ajudou
nas duas tarefas! Eu nunca vou
esquecer que o primeiro lugar
que me acolheu foi a Escola da
Vila. Vida longa para vocês.
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Cooperação,
conhecimento
e autonomia
continuam
sendo os
valores da Vila.
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#35anosescoladavila
Por Fernanda de Lima Passamai Perez
E lá se foram 3.830 dias. 10 anos e lá vai!… Parece que foi ontem que adentrei os
portões da rua Barroso Neto para realizar um grande desejo: fazer parte da Escola
da Vila. Desejo esse que me perseguia desde menina quando avistava, através da
murada, aquela escola que mais parecia um sítio, cercada de altas árvores e gente
muito feliz. Certa vez, tive a oportunidade de acompanhar uma amiga que viera
buscar sua irmã e então pude conhecer o espaço além dos portões. O sentimento
se tornou mais e mais intenso…tal qual aconteceu com a Raquel e sua Bolsa Amarela…ops, essa é outra história, deixa pra outra vez.
Bom, não pude ser aluna, capricho do Destino talvez. Muitos anos depois, com um percurso profissional constituído, ingressei como funcionária. A felicidade não coube em
mim quando ouvi a Vânia falar: “Por mim, você está aprovada!”.
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#35anosescoladavila
Desde então, percorri alguns setores, onde pude conhecer mais intimamente as
pessoas e o funcionamento da instituição, até me fixar aqui na unidade Butantã,
na Biblioteca Tatiana Belinky, há 8 anos. Agora percebo que Fortuna, diferente do
Destino, foi muito generosa: faço parte da Vila, sou mãe de aluna e sou colaboradora, desfruto do prazer de trabalhar com literatura e estou sempre rodeada de gente
muito sabida.
“O tempo passa e eles crescem!” me disse Wanilda, A felicidade não coube
a quem sou muito grata por não me deixar desistir em mim quando ouvi a
quando um problema de saúde quase me fez desistir. Vânia falar: “Por mim,
você está aprovada!”.
É, o tempo passa. Construí muitas amizades. Muita gente chegou. Muita gente partiu. Alguns saíram
como alunos e voltaram como colegas de trabalho. Outros, partiram para sempre.
E nada como um pouco de saudosismo encerrar. Deixo um pequeno registro de alguns momentos dentre tantos.
Meu agradecimento à comunidade da Escola da Vila pelo acolhimento e parceria.
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#35anosescoladavila
Por Renata Marzola
Meus 35 especialmente comemorados com os 35 anos da Escola da Vila!
Minha história com a Vila começou em 2002, quando, ainda no início de minha carreira, optei por buscar estabelecer uma parceria de trabalho com a escola, pois entendia que seria um importante lugar para a minha formação.
Conhecia muito pouco sobre o trabalho educativo, havia acabado de entrar na área,
mas tinha a certeza, por conta dos depoimentos de alguns importantes profissionais com os quais tive a sorte de “crescer”, de que seria um lugar interessante para
estar e, quem sabe, se tudo desse certo de acordo com as minhas expectativas,
também ser o lugar escolhido para ver minha pequena Luana crescer.
E assim começou a
busca por profissionais
que pudessem fazer a
ponte entre o meu desejo e a porta de entrada para torná-lo uma
realidade…
01 de fevereiro de 2003!
Entrei por essa porta
que se abriu, fui recebida com muito carinho
e com uma grande expectativa vinda da percepção acerca desse
meu desejo em fazer
parte do corpo pedagógico da Vila.
Comecei cheia de curiosidade, acompanhei grandes profissionais, educadores que,
com todo o cuidado, analisavam as características de seus grupos e as especificidades
da faixa etária, planejavam, executavam suas atividades de forma a despertar em seus
pequenos o desejo pela investigação. Avaliavam, replanejavam, estudavam o ensino e
a aprendizagem de forma científica, investigativa, afetiva e principalmente, reflexiva.
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#35anosescoladavila
Observava atentamente todo esse movimento. Estava sendo colocada para pensar, para construir uma compreensão acerca das diferentes possibilidades do fazer
educativo, das estratégias didáticas que eram amplaEsta é uma escola que mente exploradas em cada uma das áreas do conhecipossibilita importantes mento, dos inúmeros conteúdos atitudinais, conceitutransformações para
ais e procedimentais que estavam sendo construídos.
todos que se
Começava a entender com maior profundidade sobre
disponibilizam a
aprender, ensinar, planejar, executar, avaliar, ressignifiressignificar seus
car, partilhar, mediar, crescer, amadurecer, respeitar e
conhecimentos e
conquistar pouco a pouco a tão esperada autonomia!
avançar!
Fui aprendendo sobre a importância em zelar pelos
aprendizes, como se fossem cristais.
Fui compreendendo, então, que “…a importância de uma coisa há que ser medida
pelo encantamento que a coisa produza em nós”, como li uma vez em um poema
de Manoel de Barros. Estava cheia de encantamento!
Segui e sigo minha trajetória pessoal e profissional partindo desse encantamento,
sempre em busca de um conhecimento que se apresente em constante expansão
e, dessa expansão, possibilite a construção de uma sabedoria não estática, entendendo que esta deve ser colocada em prática a partir desses determinados conhecimentos, sendo sua luz.
Essa trajetória inicial em comunhão com a bagagem pessoal vinda de experiências
anteriores e posteriores, cujos valores e filosofia tanto em relação ao desenvolvimento humano do ponto de vista profissional, quanto do pessoal e principalmente materno decorrente do crescimento das minhas filhas, Luana e Nina, segue em
meu dia a dia até hoje.
Acredito que toda essa experiência, aplicada na vida adulta e para além das áreas
do conhecimento que compõe diretamente o currículo escolar, faz com que seja
possível buscar pelas transformações vindas através da sabedoria, da competência, da parceria, da autonomia, da resolução madura de conflitos e, principalmente, do desejo sobre essa transformação que nos faz avançar.
Acabo notando, nesse meu “balanço”, que o tempo do conhecimento e da sabedoria
vai da disponibilidade que cada um possui para ressignificar o processo pessoal do
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#35anosescoladavila
dia a dia, através da revisão constantemente e da busca pela expressão e pela elevação vibratória nas decisões e relações estabelecidas individual e socialmente, no
meio ao qual estamos inseridos.
Deixo os parabéns pelos nossos 35 anos e por esta importante parte de uma trajetória que segue lado a lado com tantas outras!
Parabéns também por esta ser uma escola que possibilita importantes transformações, não apenas para mim e minhas filhas, mas para todos que se disponibilizam
a ressignificar seus conhecimentos e avançar!
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#35anosescoladavila
Menção Honrosa
Por Cida, Luzinete, Sílvia Irene e Vera
Depoimentos emocionantes e emocionados!
95
Não existe
“uma” história
da Escola da Vila,
mas, sim, tantas
quantas foram
as experiências
vividas por aqui.
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#35anos

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