32-Bond-Buckup et al..
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32-Bond-Buckup et al..
ÁREA TEMÁTICA BIOLOGIA E ECOLOGIA UM MODELO EXPERIMENTAL DE ÁGUAS DOCES: O CRUSTÁCEO AEGLA PLATENSIS SCHMITT(CRUSTACEA, ANOMURA, AEGLIDAE) Georgina Bond-Buckup1,2, Alessandra A.P.Bueno1,2; Ludwig Buckup1,2 1. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Departamento de Zoologia, PPG Biologia Animal, Av.Bento Gonçalves, 9500, predio 43435, CEP 91501-970 Porto Alegre, RS. 2. IGRE-Associação Sócio-Ambientalista, Caixa postal 18550, CEP:90480-200 Porto Alegre, RS. [email protected] (GBB); [email protected] (AAPB); Os resultados já foram publicados: a) BUENO, A.A.P.; BOND-BUCKUP, G.; BUCKUP, L. 2000. Crescimento de Aegla platensis Schmitt em ambiente natural (Crustacea, Decapoda, Aeglidae). Revta bras.Zool.17(1):51-60. b) BUENO, A.A.P.; BOND-BUCKUP, G. 2000. Dinâmica populacional de Aegla platensis Schmitt (Crustacea, Decapoda, Aeglidae). Revta bras.Zool.17(1):43-49. c) BUENO, A.A.P.; BOND-BUCKUP, G. 2004. Natural diet of Aegla platensis Schmitt and Aegla ligulata Bond-Buckup & Buckup(Crustacea, Decapoda, Aeglidae) from Brazil. Acta Limnol. Bras., 16(2):115-127, 2004. Resumo: O crustáceo de água doce Aegla platensis Schmitt vem sendo utilizado como modelo experimental no Departamento de Zoologia da UFRGS desde a década de 90. Os trabalhos de investigação vem sendo desenvolvido sobre aspectos da biologia e da ecologia, especialmente, quanto à reprodução, o crescimento e o hábito alimentar da espécie. As coletas foram realizadas de julho/97 a setembro/00 em uma população que ocorre no Arroio do Mineiro, da Bacia do Gravataí, município de Taquara/ RS. Os resultados sugerem que A. platensis investe na reprodução o ano todo, com ciclo de vida de aproximadamente 3 anos e hábito alimentar caracterizado como omnívora, oportunista e generalista. Palavras-chaves: caranguejo, Aegla, ciclo de vida Introdução Os crustáceos anomuros do gênero Aegla estão presentes em arroios, rios de correnteza e lagos na América do Sul desde o município de Franca, São Paulo, até a ilha Madre de Dios, no Chile (BOND-BUCKUP & BUCKUP 1994). São elos importantes nas cadeias alimentares dos ambientes límnicos por fazerem parte da dieta de muitos animais como rãs, peixes e aves (ARENAS 1974). Poucas investigações de cunho bio-ecológico tem sido realizadas com os eglídeos. Um dos primeiros trabalhos versa sobre a biometria de Aegla sp., do Uruguai (VAZ-FERREIRA et al. (1945). Já com respeito ao crescimento e reprodução, um dos pioneiros foi o trabalho de BAHAMONDE & LOPES (1961) realizado no Chile. LOPEZ (1965) estudou a biologia de Aegla odebrechtti paulensis Schmitt, 1942 (hoje A. paulensis), em São Paulo. RODRIGUES & HEBLING (1978) caracterizaram aspectos biológicos e biométricos de Aegla perobae Hebling & Rodigues, 1977, em São Paulo. Com relação a dieta dos aeglídeos, poucos são os trabalhos que avaliaram o conteúdo estomacal dos eglídeos. No entanto, algumas pesquisas mostraram uma análise qualitativa da dieta de algumas espécies, como BAHAMONDE & LOPEZ (1961), BURNS (1972), RODRIGUES & HEBLING (1978) e MAGNI & PY-DANIEL (1989). No laboratório de Crustáceos do Departamento de Zoologia da UFRGS outros estudos vem sendo realizados com A. platensis, destacando-se o metabolismo intermediário, comportamento reprodutivo, morfologia das gônadas e relações filogenéticas. As pesquisas relatadas tiveram como objetivos contribuir para o conhecimento de aspectos da bio-ecologia de Aegla platensis, espécie que ocorre em vários cursos d´água da bacia do Guaíba. Metodologia Exemplares de Aegla platensis Schmitt, 1942 foram coletados de julho/97 a setembro/00, no Arroio do Mineiro, localidade de Fazenda Fialho, município de Taquara, RS. Os animais foram capturados com auxílio de puçás. Foram registrados o sexo, o comprimento e a largura do cefalotórax. O sexo dos exemplares foi determinado pela presença ou ausência de pleópodos, que estão presentes somente nas fêmeas. Foram identificados como juvenis os indivíduos menores de 9mm de comprimento de carapaça (CC), considerando-se que o comprimento da menor fêmea ovígera foi de 9,87mm de CC (BUENO & BOND-BUCKUP, 2000). O período reprodutivo foi verificado através da presença de fêmeas ovígeras ao longo do ano. Após a mensuração todos os crustáceos foram devolvidos ao curso d´água. Para análise dos estômagos foram amostrados 15 animais (cinco machos, cinco fêmeas e cinco juvenis) a cada seis horas, completando um ciclo de 24 horas. Os animais foram acondicionados em saco plástico devidamente etiquetados (data e hora) e mantidos em caixa de isopor com gelo para paralisar o processo de digestão. Em laboratório, os estômagos foram dissecados e o conteúdo estomacal identificado. Análise estatística: O crescimento em comprimento de machos e fêmeas foi estimado, separadamente, através do deslocamento das modas obtidas, em cada mês de amostragem, nas distribuições de freqüências absolutas por intervalo de classe de comprimento. Para a descrição do crescimento de machos e fêmeas utilizou-se o modelo de BERTALANFFY (1938): Ct = C∞ [ 1- e -k(t + to) ] sendo Ct: comprimento médio do cefalotórax dos indivíduos com idade t, em mm; C∞: comprimento médio máximo da carapaça, em mm; k: parâmetro relacionado com a taxa de crescimento, referente a dias; e: base dos logaritmos naturais; t: idade dos indivíduos, em dias; to: parâmetro relacionado com o comprimento do animal ao nascer. Os estômagos foram analisados utilizando-se os seguintes métodos: GR (grau de repleção), MP (método dos pontos), FO (freqüência de ocorrência) e o IA (Índice de importância alimentar). Resultados e Discussão As curvas de crescimento em comprimento do cefalotórax (CC) de machos e fêmeas são descritas pelas seguintes equações: Ct = 17,39 [ 1 – e –0,0041(t+ 39,13)] n= 1303 r= 0,96 (machos) –0,0033(t + 50,38) Ct = 19,12 [ 1 – e ] n= 1219 r= 0,87 (fêmeas) O comprimento médio máximo das fêmeas (19,12mm) foi maior que os dos machos (17,39mm). Isto ocorreu, não porque os machos são menores que as fêmeas, mas porque machos com comprimento superior a 17,39mm foram raros na população. Esporadicamente, foram capturados machos com até 21mm de comprimento CC. O período reprodutivo observado de A. platensis estende-se por todo ano, porém o maior número de fêmeas ovígeras ocorreu no mês de julho onde 20% das fêmeas coletadas estavam ovígeras. A razão sexual média obtida para espécie foi de 1,08 machos para cada fêmea. Além disso, não houve diferenças significativas na proporção de machos e fêmeas na população ao longo do ano Foram analisados 760 estômagos de A. platensis, destes, 110 (14,5%) estavam vazios e 650 (85,5%) apresentaram conteúdo. A variação sazonal do GR mostrou que durante todo o ano os estômagos apresentaram-se relativamente cheios, ficando entre as classes 4 e 5 (50 a 75 % de conteúdo), sendo o outono a estação com valor mais elevado. A análise da variação diária, no entanto, revelou que o valor de GR foi mais alto no horário das 24h, indicando uma tendência maior da atividade alimentar a noite. Através da análise do conteúdo estomacal dos exemplares foi possível identificar 20 itens que compõem a dieta de A. platensis (Tab I). Apenas nove itens foram comuns entre adultos e juvenis, no entanto, não houve diferenças significativas entre as frequências relativas de pontos das categorias alimentares. Verificou-se que Planariidae foi o item exclusivo nos estômagos dos juvenis. Conclusão Os resultados destas pesquisas constituem dados inéditos para os eglídeos, configurando a espécie Aegla platensis como um ótimo modelo experimental. A espécie investe na reprodução o ano todo, com ciclo de vida próximo de 3 anos e com hábito alimentar omnívoro, com estratégias oportunista e generalista. Bibliografia BAHAMONDE, N. & M. T. LOPEZ. 1961. Estudios biologicos en la populacion de Aegla laevis laevis (Latreille) de el Monte (Crustacea, Decapoda, Anomura). Investnes. zool. chil.. 7: 19-58. BERTALANFFY, L. 1938. A quantitative theory of organic growth (inquiries on growth laws II). Hum. Biol. 10 (1): 181-213. BOND-BUCKUP, G. & L. BUCKUP. 1994. A família Aeglidae (Crustacea, Decapoda, Anomura). Archos Zool. Est. S Paulo 2 (4): 159-346. LOPEZ, M. T. 1965. Estudios biologicos en Aegla odebrechtti paulensis, Schmitt (Crustacea, Decapoda, Anomura). Bol. Zool. Fac. Fil. Cien. Letras 25: 301-314. MAGNI, S.T. & V. PY-DANIEL. 1989. Aegla platensis Schmitt,1942 (Decapoda, Anomura) um predador de imaturos de Simullidae (Diptera, Culicomorpha). Revta Saúde Púb. 23 (3): 258-259. RODRIGUES, W. & N. J. HEBLING. 1978. Estudos biológicos em Aegla perobae Hebling & Rodrigues, 1977 (Decapoda, Anomura). Revta. bras. Biol. 38 (2): .383-390. VAZ-FERREIRA, R.; R. GARY & M. VAZ-FERREIRA. 1945. Notas biométricas sobre los crustáceos decapodos del gênero Aegla Leach, I. La variación de algunas magnitudes en Aegla uruguayana Schmitt. Commun. Zool. Mus. Historia nat. Montev. 1(24): 1-6. WEAR, R.G. & M. HADDON. 1987. Natural diet of the crab Ovalipes catharus (Crustacea, Portunidae) around Central and Northen New Zealand. Mar. Ecol. Prog. Ser. 35:39-49. WILLIAMS, M. J. 1981. Methods for analysis of natural diet in portunid crabs (Crustacea: Decapoda: Portunidae). J. Exp. Mar. Biol. Ecol. 52:103-113. Figura 1- Ciclo de vida hipotético de Aegla platensis. Tabela I- Itens presentes nos estômagos de juvenis e adultos de Aegla platensis. Itens Algas Detrito vegetal Porifera Platyhelminthes Metacercárias Planariidae Mollusca Gastropoda Insecta Coleoptera Diptera Ephemeroptera Hemiptera Lepidoptera Plecoptera Trichoptera Partes de Insetos Crustacea Hyalellidae Aeglidae Escamas de peixes Areia Material Calcário MND Juvenis(%) 4,71 56,03 0,00 Adultos (%) 1,87 49,83 0,07 0,25 0,25 0,64 0,00 0,00 0,45 0,00 4,08 0,68 0,00 0,00 0,00 0,00 3,91 0,20 1,13 1,71 0,27 0,72 0,18 0,09 6,09 0,00 0,00 1,02 2,53 0,00 26,54 0,02 1,97 0,05 1,02 0,68 33,00