Untitled - Senac São Paulo

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Biomonitoramento da Qualidade do Ar na Ciclovia do Rio Pinheiros
em São Paulo
Biomonitoring of the Air Quality in the Bike Path of Pinheiros River in São Paulo
Felipe Arrelaro Campello, Silvia Fazzolari Corrêa
Centro Universitário Senac - Senac
Área de Meio Ambiente- Bacharelado em Engenharia Ambiental
{[email protected], [email protected]}
Resumo. O ar é um dos elementos mais importantes para a sobrevivência na vida
terrestre, sua formação se dá por inúmeros compostos presentes em diferentes
concentrações. Com as diversas mudanças feitas pelo homem, a concentração de
determinadas substâncias vem fazendo com que a qualidade do ar e eventualmente
de todo o meio acabe por se deteriorar. Este projeto tem a intenção de analisar a
qualidade do ar por meio de espécies vegetais que possuem grande sensibilidade a
elementos específicos, para assim verificar se a prática de exercícios físicos na ciclovia
do rio Pinheiros pode trazer prejuízos à saúde dos atletas. A colocação de tabaco
(Nicotiana tabacum) em três estações da Linha 9 Esmeralda da CPTM, paralela à
ciclovia do rio Pinheiros e à Av. nações Unidas (São Paulo) indicou forte presença de
ozônio (O3), enquanto não houve resultados conclusivos para a planta coração roxo
(Tradescantia pallida).
Palavras-chave: Ar, Monitoramento, Biomonitoramento, Qualidade, Concentração.
Abstract. Air is one of the most important elements for the survival of life in this
planet, it’s is made by numerous compounds present in different concentrations. With
the many changes made by man, the concentration of certain substances is leading
the air quality and all life to eventual deterioration. This project is intended to analyze
the air through plant specimens that have great sensitivity to specific elements
present in the air, so as to verify that the physical exercise in the Pinheiros river bike
path can bring harm to the health of athletes. The placement of tobacco (Nicotiana
tabacum) in three stations of Line 9 Esmeralda CPTM, having bike path parallel to the
Pinheiros River and the Nações Unidas Avenue (São Paulo), indicated a strong
presence of ozone (O3), while there was no conclusive results for the purple heart
plant (Tradescantia pallida).
Key words: Air Monitoring, Biomonitoring, Quality, Concentration.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística
Edição Temática em Sustentabilidade
Vol. 5 n°. 3 – Dezembro de 2015, São Paulo: Centro Universitário Senac
ISSN 2179-474X
Portal da revista: http://www1.sp.senac.br/hotsites/blogs/revistainiciacao/
E-mail: [email protected]
Esta obra está licenciada com uma Licença Creative Commons Atribuição-Não Comercial-SemDerivações 4.0
Internacional
1. Introdução
Biomonitoramento é um tipo de avaliação da qualidade ambiental de uma
determinada área em certo período de tempo. Sua abordagem depende da questão a
ser respondida, o que pode variar de poucos dias a vários anos. Os Bioindicadores
podem ser espécies, grupos de espécies ou comunidades biológicas que tem suas
funções vitais correlacionadas tão intensamente com determinados fatores ambientais,
que podem ser usados para indicar uma mudança e auxiliar na avaliação de uma dada
área, relacionando um determinado fator natural com um potencial poluente (PAULA,
2010). Existem dois grandes tipos de bioindicadores: Os bioindicadores sensíveis, que
reagem modificando seu comportamento em relação ao comportamento normal. E os
bioindicadores acumulativos, sendo aqueles que acumulam influências antrópicas, sem
mostrar danos a ponto de serem reconhecidos em um curto espaço de tempo
(OBERDAN et. al., 2008).
Classificação dos bioindicadores:
Espécies sentinelas – introduzidas para indicar;

Espécies detectoras – ocorrem naturalmente e respondem ao stress de
forma mensurável;

Espécies exploradoras – reagem positivamente ao distúrbio ou agente
estressor;

Espécies acumuladoras – acumulam agentes estressores permitindo
avaliar a bioacumulação;

Espécies para bioensaios – usados na experimentação.
Alguns organismos monitores são utilizados em metodologias que acompanham as
condições ambientais e que dão informações necessárias para o controle aplicado da
poluição, especialmente da poluição do ar. Como por exemplo a Gramíneae Lolium
Multiflorum que é utilizada para avaliar o acúmulo de poluentes como enxofre
(RODRIGUES, 2010); o tabaco e o choupo que são empregados na avaliação do efeito
do ozônio apresentando necrose foliar no caso de presença do poluente; liquens que
são usados na determinação de efeitos fito-tóxicos e acúmulo de poluentes e a couve
que é usada para indicar hidrocarbonetos aromáticos (OBERDAN et. al., 2008).
A atmosfera terrestre apresenta aproximadamente 500 km de altura e é constituída
basicamente de nitrogênio (78%), oxigênio (21%), argônio (0,07%) e dióxido de
carbono (0,03%). A população humana está cada vez mais concentrada nos centros
urbanos, pelas facilidades e comodidades que as cidades oferecem, mas com o grande
aumento de veículos e o número de indústrias cada vez maior, uma maior queima de
combustíveis fosseis é feita, contaminando o ar com diversos poluentes (PEDROSO,
2007). Poluente atmosférico é classificado como qualquer forma de matéria ou energia
com intensidade e em quantidade, concentração, tempo ou características em
desacordo com os níveis estabelecidos e que tornem ou possam tornar o ar impróprio,
nocivo ou ofensivo à saúde, inconveniente ao bem estar público, danoso aos
materiais, à fauna e à flora ou prejudicial à segurança, ao uso e gozo da propriedade e
às atividades normais da comunidade (CONAMA, 1990). Nos últimos anos é possível
se observar que a adesão pela prática de exercícios físicos tem sido cada vez maior,
na procura de um melhor condicionamento físico e uma melhor qualidade de vida. Os
locais de maior utilização para essas práticas são em geral praças, parques entre
outras áreas e que, na maioria das vezes, estão muito próximos a ruas e avenidas,
expondo os praticantes a diversos poluentes (SCALO, 2010). Uma pessoa adulta
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necessita em média de 8 litros de ar por minuto (GUARDANI, 2009); se nesse ar há a
presença de monóxido de carbono (CO) produzido pelos carros e que tem uma
afinidade 250 vezes maior que o oxigênio (O2) com a hemoglobina (Hb), a pessoa
acaba por se intoxicar (SCALO, 2010). Além do CO, existem outros tipos de poluentes
com efeitos variados como:
Material Particulado
É uma mistura de partículas tanto líquidas como sólidas suspensas no ar; a sua
composição e o seu tamanho variam dependendo das fontes de emissão. A parte de
menor tamanho deste material particulado pode ser inalada, apresentando uma
característica importante que é a de transportar gases adsorvidos em sua superfície
até as partes mais profundas das vias aéreas, onde acontecem as trocas de gases
no pulmão. Conforme elas vão se depositando no sistema respiratório, estas
partículas começam a ser removidas por alguns mecanismos de defesa. O primeiro
deles é o espirro, onde as grandes partículas acabam se depositando e são
expelidas. A tosse é um mecanismo semelhante que acontece quando há a invasão
do além da laringe por partículas. Quando as partículas se depositam na superfície
das células do trato respiratório, outro mecanismo de defesa entra em
funcionamento: o aparelho muco-ciliar. Este muco é posto para fora do trato
respiratório. As partículas que se depositam sobre o muco também são carregadas.
Aquelas partículas que atingem as porções mais profundas das vias aéreas são
fagocitadas pelos macrófagos alveolares, sendo então removidas via aparelho
mucociliar ou sistema linfático (BRAGA et. al., 2011).
Ozônio (O3)
Presente na troposfera é formado por uma série de reações catalisadas pela luz do
sol, envolvendo óxidos de nitrogênio e hidrocarbonetos, vindo de fontes de
combustão móveis, como os carros, de fontes estacionárias, como indústrias e até
mesmo fontes naturais como as árvores. O ozônio é um potente oxidante, citotóxico
(provoca lesão das células), que atinge as porções mais distantes das vias aéreas
(BRAGA et. al., 2011).
Dióxido de Enxofre (SO2)
Resultado da combustão de combustíveis fósseis, como carvão e petróleo, têm
como fontes principais os automóveis e termoelétricas. O SO2 é altamente solúvel
em água à 30°C; se inalado por uma pessoa em repouso é absorvido nas vias
aéreas superiores. Já se a pessoa estiver praticando uma atividade física isso leva a
um aumento da ventilação, com consequente aumento da absorção nas regiões
mais profundas do pulmão. Ele pode ser eliminado de dois modos: pela expiração
(através das narinas), e pela urina (BRAGA et. al., 2011).
Óxidos de Nitrogênio (NOX)
As principais fontes de óxido nítrico (NO) e dióxido de nitrogênio (NO2) são os
motores dos carros e as usinas termoelétricas; indústrias que utilizam combustíveis
fósseis contribuem também, mas em menor escala. O NO2 quando é inalado atinge
as porções mais profundas do pulmão por causa da sua baixa solubilidade e é
tóxico pelo fato de ser um agente oxidante (BRAGA et. al., 2011).
Hidrocarbonetos (HC)
Os hidrocarbonetos são encontrados em geral no petróleo, no gás natural e no
carvão. Pequenas quantidades destas substâncias, sobretudo líquidos, podem
entrar nos pulmões e afetá-los diretamente. Entre os líquidos mais espessos, os
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óleos usados em alguns produtos são muito perigosos porque são extremamente
irritantes e podem causar uma pneumonia grave por aspiração (MERCK, 2009).
A ciclovia situada na margem esquerda do Rio Pinheiros e bem ao lado da avenida
marginal (Av. das Nações Unidas) na cidade de São Paulo e está a menos de 3 metros
de distância de uma grande concentração de veículos e, assim sendo, constantemente
exposta aos diversos poluentes aqui citados; com isso vê se necessária a análise da
qualidade do ar da região para indicar se realmente é seguro a prática de exercícios
físicos no local.
Figura 1 – Localização das Estações de Trem Amostradas.
Fonte: GoogleMaps, 2013.
2. Objetivos
Objetivo Geral
Este projeto tem como objetivo geral utilizar a sensibilidade que alguns
espécimes de plantas possuem para verificar a existência de poluição atmosférica que
possa promover efeitos prejudiciais à saúde dos ciclistas ao longo da ciclovia do rio
Pinheiros.
Objetivos Específicos
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- Levantar bibliografia para determinar as melhores espécies indicadoras para a
situação da ciclovia;
- Determinar os melhores pontos de amostragem para a obtenção de resultados mais
abrangentes e precisos;
- Especificar a frequência na qual os espécimes devem ser averiguados;
- Monitorar o ar ao longo da ciclovia e discutir resultados;
- Aprofundar o conhecimento da técnica;
- Apresentar proposta inicial de melhoria para a saúde dos ciclistas, dependendo dos
resultados obtidos.
3. Metodologia
A região de estudo é a ciclovia do rio Pinheiros na zona Sul de São Paulo; sua
extensão é de 18,8 km, indo da estação Jurubatuba até a estação Cidade Universitária
(linha – 9 CPTM); nesta etapa, com a devida permissão do órgão responsável pelas
estações (CPTM), o monitoramento foi feito até a estação Granja Julieta, um pouco
mais de um terço de toda a ciclovia (7 Km). Este trecho foi dividido em 3 pontos de
amostragem com uma distância de cerca de 2 Km entre eles. A qualidade do ar é
classificada conforme o “índice de qualidade do ar”. Segundo a CETESB, esse índice
indica a quantidade de determinados poluentes e de acordo com essa quantidade o
local é classificado de qualidade boa, moderada, ruim, muito ruim ou péssima. Na
tabela 1 apresenta-se o índice de qualidade do ar:
Tabela 1- Índice de Qualidade do Ar
Qualidade Índice
Fonte: CESTESB, 2013.
Quando a qualidade do ar é classificada como boa, os riscos a saúde são praticamente
nulos, já moderada, as pessoas mais sensíveis como crianças e idosos podem
apresentar alguns sintomas de doenças respiratórias, no caso de ruim toda a
população pode apresentar sintomas como tosse seca, cansaço entre outros, sendo
muito ruim os sintomas anteriores se agravam em toda a população e quando
classificada como péssima, toda a população pode apresentar sérios riscos de
manifestações de doenças respiratórias e cardiovasculares e há o aumento de mortes
prematuras em pessoas de grupos sensíveis(CETESB – 2013).
Seguindo os dados fornecidos pela estação Santo Amaro da CETESB localizada na Rua
Padre José Maria, 355 (estação mais próxima do experimento), medindo os níveis de
partículas inaláveis (MP10), monóxido de carbono (CO) e ozônio (O3) os resultados são
apresentados na tabela 2 a seguir:
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Tabela – 2 Medições da estação Santo Amaro (2012)
Fonte: CETESB, 2012.
Com base nessas informações tem-se que os principais poluentes são o monóxido de
carbono (CO), o material particulado (MP) e o ozônio (O3). Seguindo esse dados, a
melhor espécie para a detecção do O3 na atmosfera é o Tabaco (Nicotiana Tabacum),
que se exposto ao mesmo apresenta sintomas de necrose foliar; para os outros
poluentes foi utilizado o coração roxo ou Tradescantia (Tradescantia sp.) pois é uma
espécie com alta sensibilidade aos poluentes antes citados (MONTEIRO – 2007). Forão
utilizados quatro indivíduos de cada espécie: um em cada ponto de amostragem e um
na câmara de ar como controle. A Nicotiana Tabacum, tabaco (Figura 2), é uma planta
herbácea robusta (família das solanáceas) que é originária da América tropical
(América do Sul, México e as Índias Ocidentais); hoje é cultivada em todo o mundo
como a principal fonte comercial de tabaco, que é fumado ou mastigado. Planta de
caule grosso que pode crescer de um a três metros de altura; Suas flores são
tubulares, que variam nas cores branco ou creme a rosa e vermelho carmim que
crescem em uma grande ramificação, com flores individuais de 3,5 a 5 cm de
comprimento. As flores podem ser atraentes e aromáticas. Muitas espécies
relacionadas a Nicotiana são cultivadas como plantas ornamentais, mas em cultivo
comercial para o fumo, a inflorescência é geralmente cortada antes de totalmente
desenvolvida para incentivar um maior crescimento das folhas (BAILEY et. al., 1976).
A Trandescantia pallida (Figura 3) comumente conhecida como coração-roxo é uma
planta herbácea, suculenta, que varia de 15 a 25 cm de altura, com folhas roxas; suas
flores são pequenas (também roxas), pouco vistosas. A planta é pouco tolerante à
baixas temperaturas do inverno, e exige poucos cuidados no dia-a-dia. Deve ser
cultivada a pleno sol a fim de que a cor das folhas fique acentuada, mas também pode
ser deixada em locais com bastante luz indireta. É muito utilizado como forração ou
em maciços (LORENZI, 2008).
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Figura 2 - Nicotiana Tabacum.
Fonte: Monteiro, 2007.
Figura 3 - Tradescantia pallida cultivada na estufa do Centro Universitário SENAC.
Durante os levantamentos para a escolha das plantas bioindicadoras, em 18 de
setembro de 2012 foi realizada uma entrevista com a Dra. Marisa Domingos,
Pesquisadora do Núcleo de Pesquisa em Ecologia do Instituto de Botânica – Secretaria
do Meio Ambiente de São Paulo e especialista em Bioindicação. Nesta ocasião, a
pesquisadora chamou a atenção para, entre outros pontos, a necessidade do correto
cultivo das plantas em ar limpo, sugerindo a construção de uma câmara de ar filtrado.
A partir disso, foi desenvolvido o projeto entre outubro e novembro do mesmo ano, de
acordo com o número e tamanho de mudas para cultivo, a ser construído em acrílico
(Figura 4). Após a comunicação pessoal com um especialista em qualidade do ar,
calculou-se a potência da bomba necessária para promover a circulação do ar pelo
filtro e câmara, utilizando os seguintes cálculos:
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(1)
(2)
(3)
(4)
(4)
Onde: V = Velocidade, a = Aceleração, t = tempo; Vaz. = Vazão, V = Velocidade, A = Área.
Esferas de vidro foram utilizadas como meio de suporte na câmara inferior, permitindo
maior fluxo e distribuição de ar no sistema. O sistema de filtragem contou com um
filtro adsorvente preenchido com carvão ativado. A câmara foi construída entre
fevereiro e início de junho, no Laboratório de Design do Centro Universitário Senac,
com os materiais necessários providos pelo Setor de Pesquisa.
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Figura 4 – Projeto de câmara de ar filtrado
Considerando a necessidade de análise das estruturas de reprodução das plantas,
conforme metodologia consagrada para este tipo de trabalho (LIRA et. al., 2008),
começou-se a realizar treinamento em cortes histológicos de plantas, sob a orientação
de um especialista em botânica.
Foi contatado o chefe do Departamento de Meio Ambiente da Companhia Paulista de
Trens Metropolitanos - CPTM, para explicar o projeto e obter as devidas autorizações
para a colocação das plantas nas estações de trem escolhidas. Com o
acompanhamento de um representante da CPTM, foram realizadas visitas às estações
Jurubatuba, Santo Amaro e Granja Julieta, quando o projeto foi apresentado para os
responsáveis pelas estações que auxiliaram na escolha dos locais mais adequados
para a colocação das plantas.
Para a análise da Tradescantia foi utilizada a metodologia descrita por Ma (1981).
Após cultivo em local ideal e depois exposta no local a ser analisado, a metodologia
mostra que apenas inflorescências jovens devem ser coletadas e imediatamente
fixadas em uma solução de ácido acético - álcool (1:3). Após 24 horas de fixação, são
transferidos para Etanol 70% e mantidas em ambiente refrigerado (± 6ºC) até o
momento da preparação.
Para preparar as lâminas, as inflorescências são dissecadas com o auxílio de um
bisturi sob um microscópio estéreo, a fim de isolar os botões florais. Uma vez que os
botões tenham sido isolados, eles são dispostos por ordem de tamanho e o botão de
tamanho médio é preferencialmente selecionado. Este é então transferido para uma
lâmina de vidro e dissecado também com o auxílio de bisturi sob um microscópio
estéreo, de modo a expor as anteras. Após descartar os fragmentos do botão, as
anteras são maceradas usando uma vareta de vidro, e as gotas de aceto carmim
(10 %) são adicionadas (Figura, 5). Após a maceração ter sido concluída, a lâmina é
aquecida rapidamente no bico de Bunsen. Uma lamela é então colocada e depois
pressionada para baixo, com auxílio do dedo e a lâmina é colocada sob um
microscópio para identificar se há um número suficiente de tétrades. Após a
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confirmação de que há um número suficiente, a lâmina é considerada apropriada para
análise e os outros botões de flores são descartados. Se não houver número suficiente
de tétrades, o procedimento é repetido com outro botão, e assim por diante.
O resultado esperado quando há poluição, é o aparecimento de micronúcleos fora das
células das tétrades. A maior dificuldade na metodologia para Tradescantia é que não
se tem garantia de florescimento nos momentos planejados para análise.
Figura 5 - Passo-a-passo do método de preparação utilizando aceto-carmim.
Fonte: Ma, 1981.
Para a análise da Nicotiana Tabacum foi utilizada a metodologia descrita por
Sant’Anna (2007): depois de expostas, foram retiradas cinco folhas de cada indivíduo
e fotografadas com a câmera a uma distância da 30 cm da folha. Utilizando-se o
software CompuEye foram analisadas a superfície de cada folha separada gerando
gráficos que mostram a área sadia e a área afetada de cada amostra. De acordo com a
metodologia, em um período menor que 20 dias, uma superfície afetada maior que
10% já representa ação do O3. Desta forma foi feita uma média da área afetada em
cada ponto de amostragem determinando qual ponto foi o mais afetado. No caso da
Nicotiana Tabacum, o que se espera observar é a clorose inicial na presença de
poluentes, que pode progredir para necrose foliar de acordo com o tempo de
exposição.
A frequência do experimento foi de apenas um período de amostragem, durante 17
dias em maio de 2014. Após cultivo em local ideal (Figura 6), foram expostos um
indivíduo de Tradescantia e um indivíduo de tabaco em cada ponto de amostragem
(Figuras 7, 8 e 9). Todos os pontos de amostragem estiveram a menos de 1 km da
marginal Pinheiros e da ciclovia em si.
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Figura 6 - Câmara de Ar Filtrado com espécimes de Tradescantia em seu interior
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Figura 7
Figura 8
(1)
Figura 8
Pontos de Amostragem com Espécies no Local – Estações Jurubatuba (1), Sto. Amaro (2) e
Granja Julieta (3)
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(2)
4. Resultados e Discussão
O efeito sobre a Trasdecantia foi analisado utilizando-se, primeiramente, algumas
flores coletadas do jardim do SENAC para aprendizado e fixação da metodologia; em
seguida, foram analisadas as plantas que estavam na câmara de ar, quando foram
tomadas algumas fotos de referência (Figura 10). Entretanto, quando as plantas foram
levadas aos locais de amostragem, não ocorreu o florescimento em todo o período e
que ficaram expostas, impedindo a análise dos possíveis efeitos sobre esses
indivíduos.
Figura 10 – Fotos retiradas das tétrades encontradas nos botões florais de
Trandescantia na câmara de ar filtrado no Senac (Aumento 100x)
Para a Nicotiana Tabacum, após a análise das plantas controle foi obtida uma média
de superfície afetada (área total com pontos de clorose) das 5 amostras de 7%; desta
forma ficou estabelecido, uma vez que o ar onde estes controles foram cultivados é
considerado limpo, que todas as amostras que ultrapassassem esse valor seriam
consideradas como “afetadas” e se chegassem a uma média menor ou igual a 7%
seriam consideradas como “não-afetadas”.
Para a análise da incidência de clorose e necrose, também se levou em consideração o
tempo mínimo de exposição de 15 dias.
Os resultados gerais para as análises das médias de áreas afetadas nas cinco folhas de
cada planta em cada ponto de análise mostram que:
 Estação Jurubatuba – Sua média chegou a 10,54%, indicando que a área possui
um pequeno indício da presença de ozônio;
 Estação Santo Amaro – Sua média chegou a 10,84%, indicando que a área
possui indícios da presença de ozônio um pouco acima dos resultados obtidos
na estação Jurubatuba;
 Estação Granja Julieta – A média da Granja Julieta foi de 15,95%, isso indica
que há forte indicio da presença de ozônio no ar da região, sendo a maior de
todas as estações, uma vez que para um período tão pequeno não deveria
haver nenhuma alteração nas folhas.
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A figura 11 sumariza estes resultados, comparando-os com as análises feitas nas
folhas do grupo controle.
Figura 11. Gráfico Comparativo das médias de áreas
afetadas entre os pontos de Amostragem
5. Conclusão
Não foi possível evidenciar a presença de poluentes como material particulado e
óxidos de enxofre, pois os indivíduos de Tradescantia não floriram quando ficaram
expostos nas estações da Linha 9 Esmeralda da CPTM que foram estudadas.
Porém, fica evidenciada a presença de ozônio (O3) nas estações de trem amostradas,
e é interessante notar que os efeitos desse poluente sobre as plantas se intensifica à
medida que os pontos de amostragem se aproximam da região mais central deste eixo
de tráfego: as taxas de O3 são crescentes das estações Jurubatuba (no extremo sul
desta linha) para Santo Amaro e finalmente Granja Julieta, mais próxima à região da
Chácara Flora e Brooklin.
No caso do uso específico da ciclovia, sobretudo por atletas em treinamento, essa
questão pode ser preocupante, já que ozônio é um potente oxidante e citotóxico
(provoca lesão das células), que atinge as porções mais distantes das vias aéreas. No
entanto, as análises foram realizadas em apenas um pequeno período amostral, com
poucos indivíduos de cada espécie e apenas três estações de trem. Recomenda-se que
o estudo seja continuado para assegurar maior confiabilidade de dados, não apenas
nas três estações iniciais, mas em outras ao lado das quais os índices de trânsito na
av. das Nações Unidas sejam mais críticos.
Outros fatores precisam também ser melhor averiguados, como as concentrações dos
poluentes nas diferentes épocas do ano, as plumas de dispersão de poluentes
atmosféricos ao longo do canal do rio Pinheiros e o tempo médio de exposição ao ar
poluído a que esportistas regulares se sujeitam quando praticam ciclismo naquele
local.
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6. Agradecimentos
Agradeço aos professores Indriunas, Saron e Licco, por ajudarem a dar uma base mais
sólida para os resultados e também agradeço a CPTM e a Dra. Marisa Domingos pelo
tempo e a disposição na realização deste projeto e também ao Leandro Dimitrov por
me auxiliar com o projeto.
7. Referências
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http://eol.org/pages/581050/details> Acessado em: 12/06/2013 – 17:00.
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Avaliação do Filtro Biolítico para Tratamento de Esgoto Sanitário
Paper template for Revista Iniciação: Evaluation of Efficiency of a Biolytic
Filter in Sewage Treatment
Bruna Oliveira Torrone, Cristiane de Azevedo Melo Brosso, Alexandre Saron
Centro Universitário Senac - Senac
Departamento de Exatas - Bacharelado em Engenharia Ambiental
{[email protected], [email protected],[email protected]}
Resumo. Este trabalho foi desenvolvido com o objetivo de avaliar a eficiência de um
filtro biolítico no tratamento de esgoto sanitário por ser uma técnica de baixo custo,
fácil manutenção, compacta e com alta eficiência, sendo considerada uma ótima
alternativa aos tratamentos de esgoto convencionais unitários. O filtro biolítico foi
construído com quatro anéis de concreto e seu leito constituído de terra mineral,
maravalha, britas recicladas e aproximadamente 5.500 minhocas. Foi instalado em
um templo religioso, em Itapecerica da Serra, o qual recebe 50 pessoas a cada 15
dias. A avaliação da eficiência foi monitorada nos meses de Setembro e Outubro de
2014. Os resultados do sistema foram de 80% de remoção de matéria orgânica
medidos por DBO e COT, 73% na remoção de fosfatos totais, 82% de nitrogênio
amoniacal, 42% de nitrito, 20% de coliformes fecais. O sistema é aeróbio e houve a
conversão do nitrogênio reduzido para nitrato o qual foi diagnosticado um aumento na
concentração em 124%. Com os resultados obtidos, recomenda-se a inclusão de um
sistema de wetland como pós tratamento para possível diminuição do teor de nitrato
resultante.
Palavras-chave: tratamento de esgoto, filtro biolítico, minhocas.
Abstract. The objective of this study was to evaluate the efficiency of a biolytic filter
in sewage treatment, easy and low cost maintenance technique that presents high
efficiency and is considered a great alternative to conventional wastewater
treatments. The biolytic filter was built with four concrete rings and its bed consists of
mineral soil, wood chips, recycled gravel and approximately 5.500 earthworms. It was
installed at a religious temple in the municipality of Itapecirica da Serra, which
receives 50 people every 15 days. The efficiency was monitored in the months of
September and October of 2014. The results of the system were 80% of removal of
organic matter measured by BOD and TOC, 73% in total phosphates degradation,
82% in ammonia nitrogen, 42% in nitrite, 20% in fecal coliforms. The system is
aerobic and there was the conversion of reduced nitrogen to nitrate, which was
diagnosed an increase in the concentration of 124%. With these results, it is
recommended the inclusion of a wetland system as a post treatment for possible
reduction of the resulting nitrate content.
Key words: sewage treatment, biolytic filter, earthworms.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística
Edição Temática em Sustentabilidade
Vol. 5 no 3 – Dezembro de 2015, São Paulo: Centro Universitário Senac
ISSN 2179-474X
Portal da revista: http://www1.sp.senac.br/hotsites/blogs/revistainiciacao/
E-mail: [email protected]
Esta obra está licenciada com uma Licença Creative Commons Atribuição-Não Comercial-SemDerivações 4.0
Internacional
1. Introdução
No Brasil, o índice de abastecimento de água é de 82,7%, sendo coletado apenas
48,3% do esgoto gerado e desses, 69,4% passa por algum tratamento antes de ser
lançado no corpo hídrico receptor (SNIS, 2014). Segundo Silveira (2014), há
diferenças substanciais no acesso ao esgoto tratado entre as áreas rurais e urbanas
do Brasil, devido a esse serviço ainda ser visto pelo paradigma empresarial, em que a
falta de capacidade de pagamento compromete o atendimento a pequenas cidades,
periferias urbanas e localidades rurais. Fora os problemas acarretados ao meio
ambiente pela falta de saneamento básico há também prejuízos à saúde da
população. Os estudos demonstram que para cada real gasto em saneamento há
economia entre R$ 1,5 e R$ 4 na saúde (NERI, 2009).
Muitas cidades do Estado de São Paulo estão sofrendo com a escassez de água e
aliado a isso, está a grande poluição dos corpos d’águas devido ao desenvolvimento
da infraestrutura sanitária não acompanhar o crescimento populacional, ocasionando
problemas de saneamento principalmente por lançamentos de esgotos irregulares
(CETESB, 2014) e sem tratamento, além da deposição de resíduos inadequada
(MANCUSO; SANTOS, 2003). O aumento do atendimento dos serviços de coleta e
tratamento de esgoto a população, é imprescindível para a melhora da qualidade das
águas e diante disso, a Secretaria de Saneamento e Recursos Hídricos se
comprometeu em universalizar tal sistema nos municípios do litoral paulista até 2018
e o restante do estado em 2020, atingindo 60% em 2013 (CETESB, 2014).
Itapecerica da Serra está inserida na Unidade de Gerenciamento de Recursos Hídricos
(UGRHI) do Alto Tietê, a qual possui uma população urbana de 20.386.396, com 88%
de coleta de esgoto sendo 54% tratado (CETESB, 2014). De acordo com o IBGE
(2014), a população estimada em 2014 em Itapecerica da Serra equivale a 165.327
habitantes, sendo aproximadamente 0,8% rural 99,2% urbana. Segundo o IBGE
(2010), nenhuma residência na área rural possuía um tratamento do esgoto
considerado adequado, 96% semi adequado e 4% inadequado. Já na área urbana,
49,3% das residências possuíam um tipo de tratamento adequado, 50,1% semiadequado e 0,7% inadequado.
Diante disso, a busca por técnicas de tratamento de esgoto, fáceis de serem
disseminadas em áreas rurais e periféricas é emergencial, sendo o filtro biolítico uma
alternativa de fácil disseminação para o tratamento de esgoto. É uma técnica
descentralizada, de baixo custo, compacta, simples manutenção e operação. O
sistema utiliza minhocas no processo de digestão dos detritos orgânicos, ocupa uma
área menor do que a de uma fossa, não utiliza energia elétrica e não utiliza químicos
(SARTORI, 2010).
O filtro biolítico foi construído em escala real em um templo religioso localizado em
Itapecerica da Serra – SP na Região Metropolitana de São Paulo (Figura 1) e está
situado em área rural. No local são realizados cultos a cada 15 dias, recebendo um
total de 50 pessoas que passam o dia inteiro no local (figura 2). A contribuição de
esgoto, máxima de 5m3 em dia de culto, é oriunda de três vasos sanitários, três
chuveiros, três pias mais a pia da cozinha.
Toda a área da cidade de Itapecerica da Serra está inserida em locais protegidos pelas
Leis Estaduais de Proteção aos Mananciais – Lei n. 898/75, 1.172/76 e 9.866/97 –
sendo que 78% de seu território total pertencem à bacia do Guarapiranga (VENTURI,
2001).
Devido à ausência do serviço de tratamento de esgoto pela concessionária, no
local de estudo havia uma fossa negra que recebia todo o esgoto gerado apresentando
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problemas nos dias de culto. Em função disso, foi decidido implantar um sistema
alternativo e descentralizado para melhorar tal situação. Dessa maneira, o objetivo foi
construir o filtro biolítico seguido de uma vala de infiltração com plantas e avaliar a
eficiência do mesmo.
Figura 1. Destaque da localização do templo religioso.
Fonte: Adaptado Google Earth.
Figura 2. Templo religioso em Itapecerica da Serra.
Fonte: Autoria própria.
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2. Revisão Bibliográfica
O filtro biolítico ou vermifiltro foi apresentado pela primeira vez pelo professor José
Toha na Universidade do Chile em 1992. Defendida como uma tecnologia sustentável
de baixo custo - comparada a sistemas convencionais - para tratamento de esgoto
doméstico e resíduos orgânicos ao mesmo tempo e com imenso potencial de aplicação
nas áreas rurais (XING; LI; YANG, 2010; FLOUTARD, 2006).
O sistema é considerado um tratamento biológico de esgoto e de resíduos orgânicos
que utiliza um leito filtrante chamado de vermicomposto, onde minhocas e outros
microrganismos degradam a matéria orgânica. O processo pode ser comparado com a
compostagem, a qual ocorre o tempo inteiro na natureza, compreendida como a
transformação de matéria orgânica em húmus, gás carbônico, calor e água, através
da ação dos microrganismos responsáveis pela ciclagem de nutrientes no solo
(TAYLOR, 2003).
O filtro é uma torre constituída basicamente por três camadas: de cima para baixo a
primeira é feita de material orgânico com elevado nível populacional de microorganismos e minhocas californianas (Eisenia phoetida), para absorção e degradação
da matéria orgânica presente nos esgotos domésticos; a segunda camada é apenas
de material orgânico, que pode ser serragem para que ocorra mais uma filtração e por
último a terceira camada formada por cascalho e brita, tendo por finalidade
proporcionar a aeração e a permeabilidade no sistema (LAWS, 2003).
Segundo Taylor; Claker; Greenfield (2003), não há nenhum estudo que relate outro
sistema capaz de tratar as águas residuais domésticas e resíduos sólidos juntos. O
filtro ainda é pouco utilizado no Brasil, entretanto a tecnologia já foi implantada em
algumas casas de baixa renda e é comercializado por uma empresa brasileira e uma
australiana com a garantia de tratar esgoto para reuso, porém não há estudos que
descrevam sua eficiência.
O filtro pode ser configurado de várias maneiras, possuir tamanhos diversos e
podendo superar largamente sistemas convencionais de lodos ativados (OSMAN,
2003). Pode ser atrelado a outro sistema de tratamento para melhorar sua eficiência
dependendo do uso ou destinação que será dado ao esgoto tratado. No Chile é muito
usado o filtro biolítico seguindo por uma câmera de radiação UV, a qual completa o
tratamento com a desinfecção. O esgoto nesse caso pode ser reutilizado na irrigação
agrícola e vem sendo aplicado a escolas, residências, comunidades rurais,
condomínios residenciais e aeroportos (LAWS, 2003).
A cidade de Combaillaux na França, era desprovida de estação de tratamento de
esgoto (ETE) e as casas possuíam fossa séptica, porém quando foi atingido o número
de 500 fossas, mesmo com esse tratamento primário, o solo não suportava mais a
descarga, causando mal cheiro e poluição aos corpos hídricos. A cidade decidiu então
ligar as fossas a um segundo tratamento, o filtro biolítico, configurado para atender
mais de 2.500 pessoas. O esgoto sanitário chega à estação, passa por um sistema de
filtração para retirar as partículas maiores e depois é borrifado igualmente por toda a
camada superior do filtro biolítico, onde há mais de 25.000 minhocas por metro
quadrado. O esgoto tratado é utilizado na irrigação e as partículas sólidas retiradas no
inicio do processo são encaminhas para um sistema de compostagem, também com
minhocas e o composto utilizado na agricultura (FLOUTARD, 2006).
As minhocas no filtro biolítico desempenham papel fundamental no tratamento.
Segundo Xing, Li e Yang (2010) a quantidade delas está diretamente relacionada com
a eficiência do tratamento, já que são responsáveis por melhorar a atividade dos
microrganismos e estabilização da matéria orgânica.
A vermicompostagem envolve a oxidação biológica e estabilização do material
orgânico pela ação conjunta de minhocas e microorganismos. Embora sejam os
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microorganismos que degradam bioquimicamente a matéria orgânica, as minhocas
são os motoristas cruciais do processo. Conforme estudos (FLOUTARD, 2006;
DOMINGUEZ; EDWARDS, 2011) as ações realizadas pelas minhocas dentro do biolítico
são as seguintes:
Constroem galerias: são responsáveis por construírem túneis por toda a torre do
filtro por onde os fluidos e o ar circulam e devido à atividade, o sistema não
colmata como ocorre em outros filtros;
Aeração: os túneis facilitam a aeração de todo o sistema o que permite com que a
atividade microbiana aumente drasticamente;
Mistura: as minhocas fazem o constante deslocamento dos substratos, uma vez que
nunca defecam onde comem, aumentando a superfície exposta à ação dos
microrganismos;
Ingestão: minhocas alimentam-se seletivamente em substratos orgânicos ricos em
moléculas assimiláveis que incluem os microorganismos mais poluentes e matéria
orgânica. Ingerem inclusive as substâncias pútridas na superfície da camada
ativa;
Digestão: durante este processo, a matéria orgânica, incluindo os microrganismos
mais assimiláveis, é triturada. As minhocas são capazes inclusive de digerir
substâncias como a celulose e a queratina encontrada nos cabelos. O processo
digestivo faz, no entanto, o esmagamento e a mistura deixando a matéria mais
assimilável para a fauna microbiana;
Eliminação de patógenos: as minhocas secretam uma substância chamada
hemolisina que possui propriedades que dificultam a proliferação de
microrganismos que causam apodrecimento, além disso, fungos e bactérias
promovidas pelas minhocas produzem antibióticos, como o fungo penicillium
(muito encontrado no intestino da minhoca), que colaboram com a eliminação de
patógenos;
Mineralização do nitrogênio: as minhocas o deixam disponível para as plantas.
Conforme estudos (XING; LI; YANG; 2010, TAYLOR; CLARKE; GREENFIELD,
2003; BATISTA et al., 2011; LAWS, 2003; SARTORI, 2010) a eficiência do tratamento
de esgoto dentro do vermifiltro pode ser afetada pelos seguintes fatores:
Quantidade de minhocas adultas: quanto maior a quantidade de vermes adultos
melhor, por serem mais ativos;
Tipo de substratos utilizados dentro da torre do filtro: o que irá variar o tempo de
retenção do líquido e a filtração;
Volume do efluente: estudam comprovam que se houver uma quantidade muito
maior ao estimado o sistema é prejudicado;
Temperatura: variação adequada entre 0 e 30ºC;
Tempo de retenção do efluente dentro do filtro: quanto maior o tempo melhor,
aumentando o período de contato com os microrganismos e minhocas;
Efluente tóxico: substâncias tóxicas podem matar algumas minhocas, o que pode
prejudicar o tratamento.
Como existem todos esses fatores que influenciam na eficiência do vermifiltro, todos
os dados encontrados se diferem bastante. Entre eles estão os valores informados
pelos estudos de Sartori (2010), que verifica a eficiências de três biolíticos
constituídos com meios filtrantes diferentes como lixo orgânico, outro de bagaço de
cana-de-açúcar e serragem de madeira. A média de eficiência para aplicações de 0,5;
1,0 e 1, 5 m³ m-²d-1 de efluente foi:
lixo orgânico
onão recomendável para retirar NO3o55% para NT
o73% para SST
o33% para ST
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o44% para DBO
o8% para Fósforo
bagaço de cana-de-açúcar
o40% a 68% para NO3o71% para NT
o85% para SST
o40% para ST
o66% para DBO
o64% para Fósforo
serragem de madeira
o40% a 68% para NO3o74% para NT
o86% para SST
o42% para ST
o74% para DBO
o68% para Fósforo
Segundo estudos (XING; LI; YANG, 2010; TAYLOR; CLARKE; GREENFIELD, 2003;
BATISTA et al., 2011; LAWS, 2003, FLOUTARD, 2006) as vantagens do filtro biolítico
são:
- Baixo custo de implantação (aproximadamente R$ 1.050,00) e manutenção;
- Fácil implantação e manutenção;
- Compacto;
- Inexistência de maus odores;
- Eficiente no tratamento de esgoto doméstico e resíduos orgânicos;
- Não produz lodo;
- Não há problemas com colmatação;
- Não há a utilização de produtos químicos;
Já as desvantagens (XING; LI; YANG, 2010; TAYLOR; CLARKE; GREENFIELD, 2003;
BATISTA et al., 2011; LAWS, 2003, FLOUTARD, 2006):
- Baixa remoção de patógenos;
- Necessário o controle do volume do efluente;
- Necessário o uso de minhocas especificas (Eisenia phoetida).
- Necessária à escavação de um buraco profundo para que o esgoto doméstico
chegue ao sistema por gravidade.
3. Metodologia
Para o dimensionamento do sistema, o padrão de geração de esgoto foi baseado na
Norma ABNT NBR 7229/93 como de alojamento, já que nos dias de culto o templo
tem essa função, estabelecendo-se que uma pessoa gera 80L/dia de esgoto no local.
Considerando esse dado e que em um dia de culto o número máximo de pessoas é de
50, podemos afirmar que:
80L/dia * 50 pessoas = 4000L de esgoto em um dia de culto.
Ou seja, era necessário construir um filtro biolítico que suportasse receber
aproximadamente 4m³ de esgoto em um só dia, sabendo-se que um número mínimo
de pessoas tomam banho no local esse volume de esgoto cai consideravelmente.
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De acordo com o estudo de Xing, Li e Yang (2010) que estuda a atividade das
minhocas em relação ao tratamento de esgoto dentro do filtro, o sistema deve
atender uma taxa de 6m³/m2.d. Sendo assim, a área de um anel de concreto com 1m
de diâmetro equivale a:
= 0,8m²
Com 0,8m² é possível despejar aproximadamente 5m³ de esgoto em um dia e
conforme o estudo citado, fazer o filtro utilizando anéis de concreto com 1m de
diâmetro é adequado para o caso.
Assim, o anel de concreto utilizado para a construção do filtro biolítico possuía 1m de
diâmetro e com área de 0,8m², possibilitando lançar aproximadamente 5m³ de esgoto
em um dia.
O estudo de Sinha, Bharambe e Chaudhari (2008) avalia a eficiência do sistema e
define o tempo de detenção hidráulica ideal (TDH) na faixa de 1 a 2h. No filtro
construído, foram utilizados os mesmos materiais filtrantes que o avaliado pelo
estudo, dessa forma foi utilizado o mesmo cálculo de tempo de detenção hidráulica
para verificar se a altura de 1m de materiais filtrantes seria ideal.
Considerou-se uma média de 0,4m³ de efluente/hora.
TDH = (p * Vs)/ Q(2)
Em que,
TDH = tempo de detenção hidráulica
p= porosidade média do meio filtrante
Vs= Volume do meio filtrante
Q= Vazão do efluente sanitário.
TDH = (0,82 * 0,8) / 0,4
TDH = 1,64 horas.
Através do cálculo confirmamos que o volume que foi colocado de meio filtrante está
adequado.
O filtro biolítico em questão (figura 3), foi construído com quatro anéis de concreto,
cada um com 1m de diâmetro por 0,5m de profundidade, constituído de terra mineral,
maravalha, britas recicladas e aproximadamente 5.500 minhocas (Figura 4).
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Figura 3. Filtro biolítico construído
Fonte: Autoria própria.
Figura 4. Croqui do filtro biolítico.
2m
1m
0,5m
1m
Fonte: Autoria própria.
Coleta e Monitoramento
Após a construção do filtro em Agosto de 2014, aguardaram-se 17 dias referentes à
fase de aclimatação do meio. As coletas das amostras foram realizadas uma vez por
semana durante 2 meses. A Amostra 1 corresponde ao esgoto bruto, Amostra 2 é o
esgoto parcialmente tratado já percolado pelas camadas do filtro biolítico, e a Amostra
3 é o efluente tratado coletado na caixa de passagem depois do filtro e antes da vala
de infiltração (Figura 5).
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Figura 5. Pontos de amostragem.
AMOSTRA 1
1
AMOSTRA 3
AMOSTRA 2
Fonte: Autoria própria.
Por meio de análises físico-químicas, químicas e biológicas foi realizado o
monitoramento analítico dos parâmetros pH, OD, DBO, COT, NO3-, NO2-, PO4–3 , NNH4+ e coliformes fecais, recomendados pelo Standard Methods for Examination of
Water and Wastewater 22th.
4. Resultados
Os dados das análises realizadas em triplicata foram compilados em médias das
determinações obtidas durante o período do estudo com o índice de confiabilidade
(IC) de 95%.
O Decreto Estadual 8468/76 art. 18 foi utilizado como referência ao atendimento dos
padrões de lançamento em um corpo hídrico.
Com os resultados médios obtidos no período de análise, foi possível identificar a
eficiência do filtro biolítico no tratamento do esgoto sanitário ilustrado na Figura 4.
Através do monitoramento nos três pontos informado anteriormente, foram calculadas
duas eficiências, sendo uma a do filtro biolítico e outra a do sistema total. A primeira
envolve os valores médios obtidos nas amostras 1 e nas amostras 2, ou seja, na
entrada do sistema e no fundo falso do filtro. Já a segunda é referente aos valores
médios obtidos nas amostras 1 e na amostra 3, ou seja, na entrada do sistema e na
caixa de passagem após o sistema.
Em relação à DBO, foi desconsiderado no cálculo da eficiência o dia em que o templo
recebeu um público muito maior do que foi desenvolvido no projeto do filtro. Dessa
maneira, a remoção de carbono apresentou resultados satisfatórios, atendendo o
Decreto Estadual 8468/76 Art. 18, pois foi obtido 85% para a eficiência do filtro e
80% a do sistema total tanto para a DBO5,20 como também para o Carbono Orgânico
Total.
No caso dos nutrientes, em geral os resultados foram satisfatórios. A remoção dos
fosfatos totais apresentou uma eficiência no filtro de 60% e no sistema de 73%. O
nitrogênio amoniacal possuiu uma eficiência no filtro de 65% e de 73% na eficiência
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do sistema. Na degradação do nitrito, a eficiência do filtro foi de 47% e no sistema foi
de 42%. Já o nitrato, possui uma produção de 34% no filtro e de 124% no sistema.
Isso devido ao processo de nitrificação ocorrida no período de análise, em que a
amônia é convertida em nitrito que se converte em nitrato.
Figura 4. Eficiência do tratamento a partir dos valores médios obtidos do período de
setembro à outubro de 2014.
Fonte: Autoria própria.
Em relação ao pH, os valores das amostras 2 e 3 reduziram em relação à amostra 1,
tendendo a neutralidade. Além disso, atende a exigência do Dec. Estadual 8468/76
Art. 18, com limite mínimo de 5 e máximo de 9.
5. Discussões
Segundo estudos (XING; LI; YANG; 2010; LAWS, 2003; SARTORI, 2010), a eficiência
do tratamento do filtro biolítico pode variar em função da quantidade das minhocas
adultas, tipos de substratos utilizados como meio filtrante, volume do efluente,
temperatura, tempo de detenção hidráulico e efluentes tóxicos. Segundo Sartori
(2010), a eficiência do filtro biolítico varia em função dos substratos utilizados como
meio filtrante. No caso do uso da serragem como substrato, o sistema em estudo
possui resultados próximos a da bibliografia, a qual encontrou 40% a 68% para
nitrato, 74% para amônia, 74% para DBO e 68% para fosfato.
Em relação à remoção da matéria orgânica no filtro biolítico em estudo, os principais
parâmetros de quantificação de matéria orgânica (COT e DBO5,20) apresentaram
resultados satisfatórios no período analisado, ocorrendo o atendimento ao Decreto
8468/76 Art. 18 em relação à DBO.
Já na remoção de E. Coli, foi diagnosticada a baixa eficiência do sistema. Entretanto,
de acordo com Floutard (2006) aumentando-se o número de minhocas da espécie
Eisenia phoetida, há a melhora na eficiência de remoção de coliformes fecais, uma vez
que esses fungos e bactérias promovidas pelas minhocas produzem antibióticos, como
o fungo penicillium (muito encontrado no intestino da minhoca). Além disso, de
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 - Dezembro de 2015
Edição Temática em Sustentabilidade
28
acordo com Laws (2003), para a redução de coliformes fecais é aconselhavel instalar
após o filtro biolítico, um sistema composto por uma câmera de radiação UV,
completando o tratamento com desinfecção.
Os resultados do pH atendem a exigência do Decreto Estadual 8468/76 Art. 18 e no
caso dos nutrientes, os resultados de remoção durante o período analisado foram
satisfatórios. Isso porque a fração nitrogenada foi alta e foi perceptiva a redução do
nitrogênio amoniacal e do nitrito, sendo que pelo processo de nitrificação a quantidade
de nitrato total que sai do sistema é maior do que a entrada no filtro. Após o filtro
biolítico, há uma vala de infiltração com plantas e que segundo Floutard (2006) o
nitrato gerado é benéfico, auxiliando no desenvolvimento das plantas.
6. Conclusão
Através do monitoramento do filtro biolítico, projetado e construido no estudo piloto
na cidade de Itapecerica da Serra, constatou-se a eficiência do sistema em remover
matéria orgânica em esgoto sanitário, representando uma alternativa potencial para
comunidades isoladas ou resídências unifamiliar. Assim, representa uma alternativa
sustentável para áreas sem coleta e tratamento pela concessionária, uma vez que o
esgoto tratado atende o Decreto Estadual 8468/76 sem desequilibrar o meio
ambiente, além de ser um sistema com baixo custo de implantação e manutenção
contribuindo consequentemente, para a qualidade de vida da população.
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Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 - Dezembro de 2015
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Recebido em 24/04/2015 e Aceito em 13/08/2015.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 - Dezembro de 2015
Edição Temática em Sustentabilidade
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Responsabilidade solidária por danos socioambientais oriundos das águas de lastro
Solidary liability for environmental damages arising from the waterballast
Carlos Eduardo de Moraes Gomes, Robson Ivan Stival
Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUCPR
Escola de Direito – Bacharelado em Direito
{[email protected], [email protected]}
Resumo. Este artigo situa-se no campo interdisciplinar e trata do instituto jurídico
da responsabilidade solidária, sob a perspectiva ambiental, a partir das políticas
públicas ambientais concernentes à preservação da fauna e flora marinhas. Tem
por objetivo identificar quais os entes passíveis de responsabilização por danos ambientais causados pelo deslastro inadequado. A pesquisa é teórica, descritiva e exploratória, com análise de dados bibliográficos pelo método dedutivo. São estabelecidas relações entre a responsabilidade solidária, os procedimentos internacionalmente adotados e a legislação nacional competente. Dentre os resultados obtidos,
apurou-se que foi criada uma legislação satisfatória para a proteção da biota, sem
desconsiderar, no entanto, a necessidade de crescimento econômico, denotando a
preocupação com o desenvolvimento sustentável.
Palavra-chave: direito ambiental, responsabilidade solidária, águas de lastro.
Abstract. This article is placed in the interdisciplinary field and it handles the legal
institute of solidary liability, in environmental matters, from the public policy concerning the environmental preservation of the marine fauna and flora. It aims to
identify which ones are accountable for environmental damage caused by improper
de-ballasting. The research is theoretical, descriptive and exploratory, with analysis
of bibliographic data using the deductive method. Relations between the solidary
liability, the procedures adopted internationally and the relevant national legislation
are established. Among the results obtained, it was found that a satisfactory
legislation was created to protect the environment, without ignoring, however, the
necessity of economic growth, showing concern for the sustainable development.
Keywords: environmental law, solidary liability, waterballast.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística
Edição Temática em Sustentabilidade
Vol. 5 n°. 3 – Dezembro de 2015, São Paulo: Centro Universitário Senac
ISSN 2179-474X
Portal da revista: http://www1.sp.senac.br/hotsites/blogs/revistainiciacao/
E-mail:[email protected]
Esta obra está licenciada com uma Licença Creative Commons Atribuição-Não Comercial-SemDerivações
4.0
Internacional
1.INTRODUÇÃO
O planeta Terra é coberto por cerca de 70% (setenta por cento) de mares e oceanos, os quais têm papel fundamental na economia mundial, principalmente no que
se refere ao transporte de cargas.
Correspondendo a aproximadamente 80% (oitenta por cento) do transporte de
mercadorias mundiais – no Brasil são, aproximadamente, 95% (noventa e cinco por
cento) -, o intenso tráfego de embarcações resultou, gradativamente, em um aumento excessivo da poluição causada pelo deslastro (descarte) inadequado das
águas utilizadas como lastro por essas embarcações.
Cabe ressaltar que a água de lastro é fundamental para as embarcações utilizadas
no transporte de cargas, pois lhes garante a estabilidade, tanto estática quanto
dinâmica. Ocorre que a captação dessa água, além de trazer para os porões dos
navios espécies marinhas vivas nativas de uma determinada região, muitas vezes é
realizada em áreas costeiras povoadas (ou no próprio porto), cujas águas não recebem tratamento adequado, tornando-se, portanto, contaminadas. Não havendo
controle, o deslastro pode ser realizado, também, em áreas povoadas, não apenas
correndo o risco de contaminar águas limpas como também de introduzir espécies
exóticas nessas áreas, causando profundos desequilíbrios nesses ecossistemas.
A presente pesquisa busca identificar quais seriam os entes passíveis de responsabilização jurídica pelos danos ambientais causados pelo deslastro inadequado, os
limites de suas responsabilidades, bem como a quem compete legislar e fiscalizar
os portos e as embarcações quanto aos procedimentos convencionados.
2. ORIGEM E EVOLUÇÃO DA QUESTÃO AMBIENTAL
O dilema da humanidade é que o homem pode perceber a problemática e, no entanto, apesar do seu considerável conhecimento e habilidades, ele não conhece as
origens, a significação e as correlações de seus vários componentes e, assim, é
incapaz de planejar soluções eficazes. Fracasso que ocorre, em grande parte, porque continuamos a examinar elementos isolados na problemática, sem compreender que o todo é maior que as partes; que a mudança em um dos elementos significa mudança nos demais (MEADOWS, 1978).
Este prólogo nos remete a 1968, quando um grupo de trinta pessoas de dez países,
de diversas áreas e profissões - pessoas estas de renome nacional e internacional -,
reuniram-se na Academia dei Lincei, em Roma, para discutir com maior amplitude
os dilemas atuais e futuros do homem, razão esta que originou o Clube de Roma,
que através dos seus estudos, promovia o entendimento do sistema global em que
vivemos.
Historicamente, esta deve ter sido uma das primeiras reuniões de um grupo independente, não governamental, preocupado com a evolução do homem no contexto
ambiental. Esse fato trouxe temores frente às expectativas negativas relacionadas
ao futuro da humanidade, devido à degradação ambiental pela expansão industrial
e à busca de novas fontes de energia para alavancar a demanda do crescimento
populacional, mas também mostrou que é possível evitar um colapso global dos
recursos naturais, uma vez que determinados freios e contrapesos podem ser adotados como medidas de prevenção baseadas no progresso global.
É notório que as inovações tecnológicas permitem uma melhoria na qualidade de
vida e em diferentes aspectos da nossa sociedade. O desenvolvimento industrial é
absolutamente um valor social e cultural contemporâneo e a tecnologia é o instru33
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 - Dezembro de 2015
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mento imprescindível para a realização deste objetivo em todo o planeta (ZANELLA,
2010).
O caminho do crescimento é coroado de tensões entre valores importantes, escolhas difíceis. Mesmo em meio a essas tensões relativas ao desenvolvimento versus
meio ambiente, é preciso encontrar o ponto de equilíbrio sem interferência nos
princípios humanos como, por exemplo, a liberdade. Afinal, todo gênero humano,
grupo social, comunidades afins, possuem um papel importante no desenvolvimento e preservação dos recursos naturais não renováveis.
Porém, nem sempre o homem se dedicou à análise desses problemas, visto que as
origens historicamente relatadas sobre o meio ambiente podem remontar a períodos anteriores à Revolução Industrial do século XVIII, que já estava provocando
seus primeiros efeitos sobre o meio ambiente, mesmo em proporções pequenas. Já
ocorria o acúmulo de subprodutos da transformação, o uso da madeira na queima
dos fornos para a produção de vapor, a própria fumaça produzida pela queima de
combustíveis fósseis nas máquinas. Tudo isso gerou desenvolvimento econômico e
social, aumento da perspectiva de vida com estabilidade, tendo esse caminho se
alongado, dando início à degradação do meio ambiente.
A partir deste período, o homem deu um salto na história da humanidade, em que
as transformações do meio ambiente começaram a evidenciar-se. O desenvolvimento industrial nessa época começou em uma linha ascendente, em oposição ao
meio ambiente que começou a declinar suas reservas. Viu-se que o desenvolvimento não foi acompanhado de políticas públicas ambientais.
Com a Revolução Industrial, as interações humanas com a natureza foram intensamente alteradas. Os solos e os subsolos foram explorados para atender às necessidades de uma população crescente; a indústria tornou-se a maior consumidora de
energia e de matérias-primas; as necessidades humanas aparecem aos economistas do período como infindas e o desenvolvimento industrial e tecnológico tornamse o único caminho capaz de satisfazê-las. Imensas áreas foram destinadas à agricultura ou extração de matérias-primas, para cobrir as necessidades dos países em
processo de industrialização (ZANELLA, 2010).
De acordo com dados levantados pela Agencia Internacional de La Energia, divulgados no sítio eletrônico da Repsol Corporation, empresa transnacional dedicada à
pesquisa e produção de combustíveis, no ano de 2013 cerca de 81% (oitenta e um
por cento) da produção de energia industrial da humanidade procediam de combustíveis fósseis (carvão, petróleo e gás natural). Quando são queimados esses combustíveis, é liberado na atmosfera, entre outras substâncias, o dióxido de carbono
(CO²). Correntemente, cerca de vinte bilhões de toneladas de dióxido de carbono
estão sendo liberados de combustíveis fósseis. Muitos estudiosos estão concluindo,
com base em evidências significativas e razoavelmente objetivas, que a duração da
vida da biosfera, como uma região habitável para os organismos, deve ser medida
em décadas, em vez de em centenas de milhões de anos. Essa diminuição na projeção da duração das formas de vida é atribuída à ação predatória praticada de
forma descontrolada pela espécie humana (MEADOWS, 1978).
E o que pode ser dito a respeito de todas estas coisas, se com uma visão mais acurada se identifica, como algoz da natureza, a necessidade crescente pela obtenção
de comodidades, elemento nutricional do crescimento desenfreado do consumo
que, por meio de sua voracidade, dilapida os recursos naturais para alimentar-se e
promover o tão sonhado desenvolvimento econômico (COSTA & INÁCIO, 2011).
Mais e mais a sociedade consumista vem respondendo de maneira positiva aos apelos midiáticos do mercado, às disponibilidades tecnológicas, promovendo mais consumo, que nada mais é do que uma forma de atender às necessidades humanas
34
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 - Dezembro de 2015
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primárias e secundárias, internas e externas ao adquirir e/ou utilizar produtos ou
serviços, sejam naturais ou artificiais (COSTA& IGNÁCIO, 2011).
A sociedade estabeleceu um paradigma em que o consumo é sinônimo de felicidade, prestígio e status. Com efeito, esqueceu-se do equilíbrio que deve haver entre
produção e extrativismo e passou a acumular bens independentemente da real necessidade, pois a indústria, na sua benesse sem limites, alimenta o ego da sociedade de forma paradoxal, investindo milhões de dólares em publicidade para atingir
seus objetivos econômicos.
Em meio a esta insuflação da Revolução Industrial do século XVIII, atrelado ao capitalismo sem limites do século XIX - eventos esses que contribuíram para a crescente poluição atmosférica transfronteiriça -, o aumento significativo no número de
tragédias ambientais a partir da década de 1960, conduziram o processo de mobilização no âmbito das Nações Unidas, no sentido de adotar medidas globais voltadas
à preservação do meio ambiente. Assim, foi realizada uma reunião em Estocolmo,
na Suécia, a qual foi denominada de Conferência de Estocolmo sobre o meio ambiente humano (ACCIOLY, 2012).
A conferência colocou pela primeira vez, em pauta mundial, as discussões sobre
questões ambientais, iniciando uma nova era nos estudos, análises e debates internacionais sobre os recursos naturais (ZANELLA, 2010). Nesta conferência foi criado
o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), primeira instituição
internacional com sede em um país africano que se voltou para a área de pesquisas
científicas voltadas ao meio ambiente e acordos internacionais (BARAGLIO, 2013).
A partir de então, verificou-se que a questão ambiental não é algo pontualmente
localizado, mas algo transnacional, de extensão global, e os esforços depositados
pelas nações envolvidas e preocupadas com o meio ambiente de forma global, foi
prejudicado pela questão da guerra fria (Estados Unidos e União Soviética), em que
os países estavam focados por um determinado tempo, numa possível evolução
militar de proporções mundiais, na ocorrência de uma eventual batalha com mísseis
nucleares.
Entretanto, devido à importância crescente da discussão acerca do meio ambiente,
a Organização das Nações Unidas criou, em 1983, a Comissão Mundial sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento, chefiada pela primeira ministra norueguesa Gro Harlen Brundtland, com o objetivo de produzir um estudo imparcial e amplo sobre os
efeitos da atuação do homem na biosfera. Os resultados desses estudos deram origem ao Relatório de Brundtland, de 1987, também conhecido como “Nosso Futuro
Comum”, em que apontava o homem como uma ameaça ao equilíbrio do meio ambiente, diferenciando o papel dos países ricos e pobres no impacto ambiental, e o
primeiro conceito de desenvolvimento sustentável (BARÁGLIO, 2013).
O período entre 1972 e 1992 foi marcado por inúmeros tratados internacionais voltados à proteção do meio ambiente, mas também foi marcado por inúmeras catástrofes, como a guerra do Vietnã, onde foi usado um produto químico pelo exército
americano chamado de agente laranja (desfoliante); em 1984, em Bhopal, Índia,
houve uma explosão na fábrica da Union Carbide, liberando gases tóxicos (aproximadamente vinte mil pessoas morreram); a explosão do reator nuclear na usina de
Chernobyl, Ucrânia, em 1986, até hoje não se sabendo o número exato de mortos,
pois a antiga União Soviética não divulgou os números.
Diante do cenário preocupante que se estabeleceu por conta dos resultados apresentados no Relatório de Brundtland, de 1987, foi convocada pela ONU a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada na cidade do Rio de Janeiro, conhecida como Rio 92 (ACCIOLY, 2012). Esta conferência
resultou nos seguintes documentos não vinculantes:
 Agenda 21 – norteador das políticas públicas;
35
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 - Dezembro de 2015
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


Declaração de Princípios sobre as Florestas – exploração econômica e
conservação das florestas;
Declaração de Princípios sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento –
políticas ambientais; luta contra a pobreza; responsabilidade dos países industrializados nas degradações já ocorridas;
Comissão para o Desenvolvimento Sustentável – acompanhar a implementação da Agenda 21.
Posteriormente à realização da Rio 92, foi realizada a Rio +10 ou Cúpula Mundial
sobre Desenvolvimento Sustentável, na cidade de Johanesburg, África do Sul, cujo
objetivo foi discutir os efeitos da implantação da Agenda 21 na Rio 92, a qual não
teria como responsáveis somente os entes governamentais, mas todos os cidadãos.
A continuidade deste evento mundial foi a Conferência das Nações Unidas sobre o
Desenvolvimento Sustentável, conhecida como Rio+20, ocorrida em junho de 2012
na cidade do Rio de Janeiro (Brasil), cujo objetivo foi a renovação do compromisso
político com o desenvolvimento sustentável. Os participantes e chefes de estados
de mais de cento e noventa países propuseram mudanças no modo como estão
sendo usados os recursos naturais do planeta e questões sociais como a falta de
moradias.
Ademais, pode-se perceber que a partir da segunda metade do século XX, até a
Rio+20, aconteceram vários encontros e acordos mundiais todos visando manter o
equilíbrio do planeta na questão meio ambiente versus desenvolvimento econômico, pois a crescente expansão da população mundial requer políticas sérias, envolvendo não só o primeiro setor, ou o segundo ou terceiro setor, mas todos os cidadãos que, comprometidos com a busca de uma sadia qualidade de vida para si e
para as gerações futuras, poderão repensar suas políticas consumistas, buscando
alternativas viáveis para suas necessidades.
3. O DIREITO AMBIENTAL NO BRASIL
Sabe-se que o objeto do Direito Ambiental é a tutela do meio ambiente, entretanto,
faz-se necessária a transcrição do conceito de meio ambiente estabelecido pela Lei
de Política Nacional do Meio Ambiente, qual seja, “o conjunto de condições, leis,
influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, obriga e
rege a vida em todas as suas formas”.
Uma análise mais apurada acerca desse conceito legal revela sua enorme abrangência, sendo, por essa razão, regido por vários princípios, como o do direito à sadia qualidade de vida; acesso equitativo aos recursos naturais; do usuário-pagador
e poluidor-pagador; da precaução; da prevenção; da informação; da participação e,
talvez os de maior relevância ante o escopo deste trabalho, o direito ao meio ambiente equilibrado que concerne à conservação das propriedades e das funções naturais desse meio, de forma a permitir a existência, a evolução e o desenvolvimento
dos seres vivos, bem como o princípio da reparação, que conforme prescreve a Lei
6.938/1981, a responsabilidade ambiental é objetiva, sendo constitucionalmente
imprescindível a obrigação de reparar os danos causados, independentemente de
ter agido com culpa.
Objetivando ampliar a tutela do meio ambiente entre os entes políticos, a Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, estabeleceu, em seu artigo 24, a
competência concorrente entre a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios para criarem normas relativas ao meio ambiente, obedecendo-se, sempre, aos
limites determinados em normas gerais criadas pela União. Na ausência de normas
gerais, os estados poderão exercer a competência legislativa plena. Outrossim, é
36
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 - Dezembro de 2015
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preciso ressaltar a previsão de cooperação entre os entes públicos, conforme estampado no artigo 23 da lei Maior, visando ao equilíbrio do desenvolvimento e do
bem-estar em âmbito nacional.
Sendo o meio ambiente um bem coletivo, de uso comum do povo, pode ele ser
desfrutado por todos, geral ou individualmente. Em contrapartida, diante da sua
característica de interesse difuso, cabe a todos, não somente ao poder público, protegê-lo e defendê-lo. Assim, todo indivíduo está legitimado a exercer o direito de
requerer informações e dados existentes nos órgãos e entidades do Sistema Nacional do Meio Ambiente, sem a necessidade de comprovar a ocorrência de dano social
ou ambiental, assim como os cidadãos estão legitimados a ajuizar ação popular
ambiental.
Essa proteção ambiental, cujo espectro revela-se cada vez mais amplo, tem sido
encarada, muitas vezes, como fator limitador da expansão do desenvolvimento
econômico, verdadeiro obstáculo a este. Não obstante essa visão antagônica, o
legislador constituinte buscou harmonizá-lo, ao menos em tese, com a proteção do
meio ambiente, uma vez que ambos são indispensáveis para a consecução dos objetivos da República, como a construção de uma sociedade livre, justa e solidária; a
garantia do desenvolvimento nacional; a erradicação da pobreza e a marginalização
e redução das desigualdades sociais e regionais e a promoção do bem de todos
(Constituição Federal, artigo 3º).
O dever de defender e preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado, incumbência do poder público e da coletividade, inclui a preservação e restauração
dos processos ecológicos essenciais, assim como o provimento do manejo ecológico
das espécies e dos ecossistemas. Numa interpretação doutrinária dessa norma
constitucional, o manejo ecológico seria
a utilização dos recursos naturais pelo homem, baseada em
princípios e métodos que preservam a integridade dos ecossistemas, com redução da interferência humana nos mecanismos de auto-regulação dos seres vivos e do meio físico
(MACHADO, 2010, p. 164).
Como qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas das águas
pode vir a causar danos ao meio ambiente, buscam-se meios de evitá-la. Uma das
formas de prevenção é através do gerenciamento das águas de lastro, sua fiscalização, as hipóteses de exceção de sua aplicação e as infrações previstas pelo descumprimento de procedimentos obrigatórios, principalmente estabelecidos na Norma da Autoridade Marítima NORMAM-20/DPC, de 2005, havendo ainda legislações
correlatas como a Lei 6.938/1981 (Lei de Política Nacional do Meio Ambiente); Lei
9.537/1997 (Lei de Segurança do Tráfego Aquaviário); Lei 9.605/1998 (Lei dos
Crimes Ambientais); Lei 9.966/2000 que dispõe sobre a prevenção, o controle e a
fiscalização da poluição causada por lançamento de óleo e outras substâncias nocivas ou perigosas em águas sob jurisdição nacional e a Resolução RDC nº 72 de 29
de dezembro de 2009, editada pela ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).
Vale observar que essa proteção se estende a todas as águas jurisdicionais brasileiras, compreendidas nessas as águas interiores, as dos portos, as das baías, as dos
rios e suas desembocaduras, as dos lagos, das lagoas e dos canais, as dos arquipélagos, as águas entre os baixios a descoberta e as costas e as águas marítimas sob
jurisdição nacional que não sejam interiores. Quando se trata de Direito Ambiental,
em que pese haver previsão de reparação do dano produzido, o que se espera é
que o dano efetivamente não ocorra, pois ainda que se tente repará-lo, leva-se
muito tempo para que o meio ambiente volte ao seu estado anterior e, por vezes,
os danos são irreparáveis.
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4. CARACTERÍSTICAS DA RESPONSABILIDADE CIVIL EM MATÉRIA AMBIENTAL
Segundo o artigo 14, parágrafo 1º da Lei 6.938/1981, o poluidor é obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados
ao meio ambiente e a terceiros afetados por sua atividade, cabendo ao Ministério
Público da União e dos estados a legitimidade para propor ação de responsabilidade
civil e criminal por danos causados ao meio ambiente. É a consagração da responsabilidade objetiva ambiental que, comprovando-se “o dano ao meio ambiente, dáse início ao processo de imputação civil objetiva ambiental para, só depois, se estabelecer o nexo de causalidade entre a ação ou omissão e o dano” (MACHADO,
2010). Não importa o motivo que deu ensejo à degradação, pois na seara ambiental está-se diante da obrigação jurídica de reparar o dano.
No caso, o que é apreciado não é a conduta subjetiva daquele que provocou o dano, mas o efetivo prejuízo causado ao homem e seu ambiente. Na concepção do
jurista e ministro aposentado do Tribunal Federal de Recursos José de Aguiar dias,
o que deve prevalecer é o interesse da coletividade, pois não é aceitável “que o
direito de um pode prejudicar o de outro, pode ultrapassar os raios da normalidade
e fazer seu titular um pequeno monarca absoluto” (MACHADO, 2010).
Em razão da evidente dificuldade de reparar o dano ambiental, ganha relevância a
responsabilidade de prevenir atos e omissões que possam vir a degradar o meio
ambiente. A prevenção ganha suporte nos princípios da precaução, do poluidorpagador e da responsabilidade comum mas diferenciada, através das avaliações
dos impactos ambientais e da cobrança do uso dos recursos naturais com fins
econômicos, entre outras hipóteses.
Uma questão interessante acerca do dano ambiental, é a que trata da responsabilidade do Estado, como Poder Público, já que é ele quem cria as normas relativas à
proteção, fiscalização e punição dos agentes poluidores. Ocorre que, por vezes, o
próprio Estado exerce atividades econômicas, as quais podem incorrer em risco
para o homem e o meio ambiente. Assim, os limites estabelecidos podem não ser
exatamente aqueles necessários à preservação sanitária e ambiental, ou seja, ainda
que esses limites sejam respeitados, os prejuízos são inevitáveis. São as normas
baseadas “em simples imperativo tecnológico, ou na melhor tecnologia disponível”
(MACHADO, 2010). Nessas situações, o Estado responde solidariamente com o particular.
Como já dito anteriormente, o estabelecimento do nexo de causalidade só ocorre
após a responsabilização objetiva ambiental. Fato é que, na seara ambiental, o nexo causal deve ser analisado de maneira mais tênue, ampla e agravada, tendo em
vista os reais interesses tutelados pela finalidade da lei (LEMOS, 2008). Essa atenuação tem por objetivo coibir a probabilidade de dano futuro. Assim, a configuração do nexo de causalidade demanda uma análise detalhada do caso concreto pelo
operador do direito. Não raro, em determinadas situações, pode existir mais de um
autor do dano ocorrido, tornando extremamente difícil saber ao certo qual deles
causou, efetivamente, o dano. Para que o infrator, ou infratores, não se beneficiem
dessa incerteza em estabelecer o montante do prejuízo atribuível a cada um, surge
a característica da indivisibilidade do dano, perante a responsabilidade solidária
entre eles. Dessa forma, a vítima pode escolher o poluidor que quer processar, inclusive optando pelo mais solvente, bem como pode processar todos, conjuntamente.
Já nas situações em que a causa da poluição seja atribuída ao caso fortuito e à força maior que, em tese, poderiam afastar a responsabilidade do poluidor, há uma
controvérsia doutrinária em relação aos efeitos gerados pelos fatos necessários que
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os caracterizam. Parte da doutrina entende que a carga de imprevisão e inevitabilidade presente nessas situações não bastam para sua caracterização, necessitando
uma análise de cada caso concreto. Ocorre que:
tratando-se de responsabilidade civil objetiva, é analisada a
ausência de previsão e de tomada de medidas para evitar os
efeitos do fato necessário, sem se levar em conta a diligência
dos atos do devedor, pois a ocorrência da responsabilidade
independe de sua culpa (MACHADO, 2010, p. 378).
Já afirmava Nelson Nery Júnior, em conferência proferida em Uruguaiana/RS, em
1984, ser irrelevante a demonstração do caso fortuito ou força maior como excludentes da responsabilidade, pois fazendo uma interpretação teleológica da Lei de
Política Nacional do Meio Ambiente, conclui-se que o legislador disse menos do que
queria dizer quando estabeleceu a responsabilidade objetiva. Assim, deve o poluidor assumir integralmente os riscos decorrentes de sua atividade.
5. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA
Conforme as regras do Direito Ambiental, aquele que lucra com a atividade que
gera riscos ao meio ambiente, seja direta ou indiretamente, deve responder por
eventual dano ambiental causado por essa atividade, independentemente do seu
grau de participação no evento danoso. Daí ser tão comum, em matéria ambiental,
o litisconsórcio passivo facultativo, cabendo àquele que indenizar, o direito de regresso contra os demais (STIVAL, 2012).
Quando a responsabilidade é imputada ao Estado, este responde pelos seus atos
comissivos que venham a causar poluição ou pelos atos omissivos que impliquem
na desobediência do dever constitucional de proteger o meio ambiente. Entretanto,
observa Herman Benjamin que “a execução da responsabilidade estatal solidária é
de natureza subsidiária” (REsp 1071741/SP Rel. Ministro HERMAN BENJAMIM, SEGUNDA TURMA, JULGADO EM 24/03/2009, DJe 16/12/2010), devendo o Estado
integrar o polo passivo da demanda somente quando exauridas todas as tentativas
de execução em face do degradador original. Isso se deve ao fato de que, se assim
não fosse, o Estado exerceria a função de garante dos poluidores, que transfeririam
a conta para a sociedade.
Observe-se que, conforme disposto no artigo 265 do Código Civil, “a solidariedade
não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes”, levando à conclusão de
que é necessário que haja lei que embase a responsabilidade solidária. Nessa esteira, a competência privativa para “legislar sobre... direito civil, comercial, penal,
processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho” é da
União, segundo prescreve o artigo 22, inciso I da Carta Magna.
De outro lado, os artigos 23, inciso VI e 24, incisos I e VIII da Constituição Federal
estabeleceram que “é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios... proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas”, e que “compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal
legislar concorrentemente sobre ... direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico”... e sobre responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao
consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico”.
O aparente conflito de competências é resolvido quando se conclui que a competência para legislar acerca da responsabilidade por dano ao meio ambiente é concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal; enquanto a competência para
legislar acerca da imposição da responsabilidade solidária é da União, a qual esta39
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belecerá normas gerais, restando aos Estados e ao Distrito Federal a competência
legislativa suplementar.
Outra questão relevante diz respeito às atividades sujeitas a licenciamento ambiental, o qual demanda estudos técnicos realizados por profissionais habilitados, os
quais “serão responsáveis pelas informações apresentadas, sujeitando-se às sanções administrativas, civis e penais” (artigo 11, parágrafo único, da Resolução CONAMA 237 de 1997). “A responsabilidade profissional tem sido considerada pela
jurisprudência como delitual, com fundamento no ato ilícito e não no contrato” (MILARÉ, 2013). Contudo, não se deve esquecer que, em matéria ambiental, a responsabilidade é objetiva na modalidade risco integral (GONÇALVES, 2012), devendo
responder pelo dano, preferencialmente, aquele que aufere lucro com a atividade
que gera riscos ao meio ambiente, ficando ressalvada a possibilidade de o empreendedor ajuizar ação regressiva em face do profissional que tenha agido culposamente ou se omitido no cumprimento de sua obrigação.
Tal é a abrangência da solidariedade quanto à responsabilidade por danos na seara
ambiental, que inclusive as instituições financeiras oficiais são solidariamente responsáveis pelos danos causados por seus mutuários. Como consequência, os bancos oficiais incorporaram critérios socioambientais ao processo de análise para concessão de financiamentos de projetos, sendo que essa variável ambiental influenciará, diretamente, na taxa de juros incidente sobre o valor financiado. Por enquanto,
em que pese a adesão de algumas instituições financeiras privadas ao referido protocolo, ainda não houve a equiparação destas às instituições oficiais.
Pode, ainda, a solidariedade ser estendida aos sócios das sociedades empresárias
responsáveis pelo evento danoso mediante a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, necessitando para tanto que esta se constitua em
“obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente”,
conforme previsto no artigo 4º, da lei 9.605/1998. Caracteriza-se essa teoria, acolhida também no Direito do Consumidor, pela desconsideração efetuada de forma
objetiva, não buscando evidências de dolo ou culpa de qualquer dos sócios ou administradores. Registre-se que tal instituto só se aplica em fase de execução, após
comprovada a impossibilidade de a pessoa jurídica arcar com a indenização a que
foi condenada.
6. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL ÀS ÁGUAS DE LASTRO
Devido à importância da água tanto no contexto econômico quanto social, o Poder
Público direciona especial atenção ao controle de sua qualidade, seja através da
edição de normas ou da efetiva fiscalização do seu uso. A Lei 9.433/1997, que instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos e criou o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, em seu artigo 1º, incisos I e II, aponta como seus
fundamentos ser a água um bem de domínio público e um recurso natural limitado
dotado de valor econômico.
Dispõe, ainda, o a Lei 9.433/1997:
Art. 2º São objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos:
I - assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água, em padrões de qualidade adequados
aos respectivos usos;
II - a utilização racional e integrada dos recursos hídricos, incluindo o transporte aquaviário, com vistas ao desenvolvimento sustentável;
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III - a prevenção e a defesa contra eventos hidrológicos críticos de origem natural ou decorrentes do uso inadequado dos
recursos naturais.
Sendo o deslastro inadequado considerado pela legislação uma forma de poluição
marinha, conforme já dito anteriormente, são várias as normas que tratam das
águas de lastro, ainda que apenas parcialmente. Busca-se o gerenciamento dessas
águas sob a perspectiva da prevenção da transferência de espécies marinhas nocivas ao meio ambiente aquático e da disseminação de doenças. O artigo 8º da Lei
8.617/1993 (Lei do Mar) dispõe que:
na zona econômica exclusiva, o Brasil, no exercício da sua
jurisdição, tem o direito exclusivo de regulamentar a investigação científica marinha, a proteção e preservação do meio
marítimo, bem como a construção, operação e uso de todos
os tipos de ilhas artificiais, instalações e estruturas.
A Lei 9.966/2000, também conhecida como Lei do Óleo, estabelece regras para
navios relacionadas às águas de lastro, cujo foco específico é a presença ou não de
substâncias oleosas nessas águas. O seu artigo 15 dispõe que:
é proibida a descarga, em águas sob jurisdição nacional, de
substâncias nocivas ou perigosas classificadas na categoria
“A”, definida no artigo 4º desta Lei, inclusive aquelas provisoriamente classificadas como tal, além da água de lastro, resíduos de lavagem de tanques ou outras misturas que
contenham tais substâncias.
Vale destacar que as substâncias elencadas na categoria “A”, conforme disposto,
são aquelas enquadradas como de alto risco tanto para a saúde humana como para
o ecossistema aquático. Ainda, o artigo 21, da mesma Lei, prescreve que:
as circunstâncias em que a descarga, em águas sob jurisdição nacional, de óleo e substâncias nocivas ou perigosas, ou
misturas que o contenham, de água de lastro e de outros resíduos poluentes for autorizada não desobrigam o responsável de reparar os danos causados ao meio ambiente e de indenizar as atividades econômicas e o patrimônio público e
privado pelos prejuízos decorrentes dessa descarga.
Em sentido mais amplo, a Resolução A 868, da IMO (Organização Marítima Internacional), estabelece diretrizes para o controle e gerenciamento da água de lastro
dos navios, com procedimento tanto para as embarcações quanto para os Estados
dos portos, assim como a Convenção Internacional para a Prevenção da Poluição
Causada por Navios (MARPOL - 1973/1978) garante ao Estado costeiro a possibilidade de inspeção dos navios visitantes conforme suas normas.
A NORMAM 20, Norma da Autoridade Marítima para o gerenciamento de água de
lastro de navios, é a principal norma regulamentadora do tema em nível nacional, tendo sido estabelecida com o objetivo de prevenir a poluição provocada por
embarcações nas águas jurisdicionais brasileiras, tomando por base os procedimentos de troca da água de lastro determinados na Resolução da Assembleia da IMO, A
868 e na Convenção Internacional de Controle e Gestão da Água de Lastro e
Sedimentos de Navios, adotados pelo Brasil em 25 de janeiro de 2005. Importante
lembrar que o sistema de gerenciamento da água de lastro estabelecido pela NORMAM 20, quando da sua efetivação, fica condicionado à segurança do navio, seus
equipamentos, sua tripulação e passageiros, ou seja, o procedimento não pode colocá-los em risco, sob pena da embarcação não estar obrigada a cumprir tais normas.
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A Resolução RDC 72/2009, da ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária),
aprovou o regulamento técnico para a vigilância sanitária em portos instalados no
território nacional, de embarcações que operam transporte de cargas e passageiros. Assim, quando da solicitação de livre prática, deverá ser entregue à autoridade
sanitária, pelo capitão do navio, o formulário de água de lastro devidamente preenchido.
A Lei de Segurança do Tráfego Aquaviário (LESTA), Lei Federal 9.537/1997, estabeleceu os requisitos necessários para a prevenção da poluição marinha.
Há também, na legislação, a previsão de situações excepcionais em que não é exigido o cumprimento dos procedimentos estabelecidos na NORMAM 20, tais como:
• Nos casos de força maior ou de emergência, em que seja necessário resguardar a vida humana e/ou o próprio navio;
• Quando for necessária a captação ou descarga da água de lastro e sedimentos nela contidos para garantir a segurança de um navio e das pessoas a bordo
em situações de emergência;
• Quando ocorrer descarga acidental da água de lastro e sedimentos nela
contidos resultante de dano ao navio ou aos seus equipamentos, desde que todas
as precauções razoáveis tenham sido tomadas;
• Quando a captação e descarga da água de lastro e sedimentos nela contidos for realizada com a finalidade de evitar ou minimizar incidentes de poluição
causados pelo navio e
• Quando a descarga da água de lastro e sedimentos nela contidos realizarse no mesmo local onde a totalidade daquela água de lastro e seus sedimentos se
originaram.
Há embarcações que estão isentas do cumprimento da NORMAM 20, como
os:
• Navios de guerra, navios auxiliares de Marinha ou qualquer outro navio
oficial ou operado por Estado utilizado, temporariamente, apenas em serviço governamental não comercial;
• Navios com tanques selados contendo água de lastro permanente
• Embarcações de apoio marítimo e portuário;
• Navios cujas características do projeto não permitam a troca de lastro e
• As embarcações de esporte e recreio usadas somente para recreação/competição.
7. AS ÁGUAS DE LASTRO E A POLUIÇÃO GERADA POR ELAS
Os danos causados ao meio ambiente, decorrentes do deslastro inadequado, podem
ser enormes. Apesar de considerados não intencionais, tais danos, causados mais
especificamente pela bioinvasão e pela transmissão de doenças, resultam da água
de lastro contaminada por bactérias, fungos, vírus e espécies exóticas oriundas de
habitats diversos daquele onde se realizou o deslastro.
Sabe-se que os portos que se encontram instalados em regiões povoadas, onde o
poder público não dá o devido tratamento ao esgoto doméstico e industrial, possivelmente estarão com suas águas contaminadas por vírus e bactérias. Dessa forma, as embarcações que realizam a captação dessas águas contaminadas para utilizá-las como lastro, caso realizem o deslastro em outras áreas povoadas, estarão
contribuindo para a disseminação desses agentes patogênicos.
Estudos demonstram que as bactérias mais comuns encontradas nas águas de lastro são o Vibrio cholerae e a Salmonella sp, que são responsáveis pela transmissão,
respectivamente, da cólera e da salmonelose. Essas bactérias podem estar presen42
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tes na água, plâncton ou bivalves, sendo que estes últimos podem servir de alimento à população (KESSELRING, 2007).
Durante o percurso entre o local de origem dos bioinvasores, em que foi realizada a
captação da água, e o local de destino, onde foi realizado o deslastro, apesar de os
porões dos navios serem ambientes hostis, sem iluminação, sem ventilação e com
pouco oxigênio, muitas espécies resistem às longas viagens marítimas em condições adversas.
Quanto às espécies exóticas que são transportadas de seu habitat natural para habitats diversos, tal transferência não seria prejudicial se a biota (fauna marinha)
fosse igual em todo o planeta, mas não é isso o que ocorre. A transferência dessas
espécies exóticas invasoras pode alterar as condições aquáticas da região invadida,
levando até mesmo à extinção de espécies nativas.
Ademais, os prejuízos não se restringem apenas à vida marinha, mas também podem atingir as populações litorâneas e ribeirinhas. Vale lembrar que os prejuízos
econômicos ocasionados pela bioinvasão também podem ser de grande vulto, como
é o caso da infestação dos bivalves asiáticos Limnosperna fortunei, popularmente
conhecido como mexilhão dourado, nas usinas hidrelétricas de Itaipu, Porto Primavera e Sérgio Motta. Esse molusco causa entupimento nas tubulações, nos filtros e
nas bombas de aspiração de água, obrigando, muitas vezes, ao desligamento das
turbinas para a realização de limpeza nesses equipamentos, conforme informações
contidas no endereço eletrônico da usina hidrelétrica Itaipu Binacional.
8. OS ENTES PASSÍVEIS DE RESPONSABILIZAÇÃO SOCIOAM
BIENTAL PELOS DANOS AMBIENTAIS DECORRENTES DAS
ÁGUAS DE LASTRO
Conforme foi possível identificar nas legislações concernentes ao gerenciamento
das águas de lastro, as medidas de prevenção ali estabelecidas abrangem procedimentos a serem seguidos tanto pelas embarcações quanto pelos portos organizados. Abrangem, ainda, o dever de fiscalização, pela Autoridade Marítima, do fiel
cumprimento desses procedimentos, fiscalização esta que se traduz num componente essencial no controle do gerenciamento das águas de lastro.
Os portos organizados poderão ser responsabilizados caso não disponham de instalações ou meios adequados para o recebimento e tratamento dos diversos tipos de
resíduos e para o combate da poluição (Lei 9.966/2000, art. 5º). Vale lembrar que
referidos portos podem ser concedidos ou explorados pela União.
Quanto aos procedimentos estabelecidos para as embarcações, caso não seja preenchido o formulário sobre a água de lastro e posteriormente remetido, pelo comandante, com antecedência mínima de 24 (vinte e quatro) horas para as Capitanias dos Portos, assim como na ausência do cumprimento da troca da água de lastro e descarga de sedimentos segundo os procedimentos exigidos pelo Estado do
porto, poderão ser responsabilizados pelo descumprimento dessa norma, conforme
dispõe o artigo 25, parágrafo 1º, da Lei 9.966/2000,
 O proprietário do navio, pessoa física ou jurídica, ou quem legalmente o represente;
 O armador ou operador do navio, caso este não esteja sendo armado
ou operado pelo proprietário;
 O concessionário ou a empresa autorizada a exercer atividades pertinentes à indústria do petróleo;
 O comandante ou tripulante do navio;
 A pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, que legalmente represente o porto organizado, a instalação portuária, a plata43
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
forma e suas instalações de apoio, o estaleiro, a marina, o clube aquático ou instalação similar;
O proprietário da carga.
Por fim, ante a responsabilidade objetiva do Estado, em qualquer de suas esferas,
federal, estadual ou municipal, a negligência ou omissão de seus agentes públicos
na fiscalização do cumprimento da Lei 9.966/2000 e da NORMAM 20, implicará crime de responsabilidade para estes, respondendo solidariamente o Poder Público. Os
órgãos incumbidos do cumprimento da Lei 9.966/2000, cada qual com suas respectivas atribuições, estão elencados em seu artigo 27, quais sejam
 O órgão federal de meio ambiente;
 O órgão estadual de meio ambiente;
 O órgão municipal de meio ambiente e
 O órgão regulador da indústria do petróleo.
9. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O indissociável elo que une o crescimento econômico e a preservação do meio ambiente traduz-se no crescimento sustentável, ou sustentabilidade. A crescente preocupação em fazer com que as consequências do consumismo excessivo agridam o
menos possível o meio ambiente resultou numa soma de esforços para a elaboração de leis ambientais extremamente protetivas e, trazendo para a realidade do
sistema jurídico pátrio, até mesmo na atenuação do nexo de causalidade em matéria ambiental.
Contudo, esse aparato legislativo só fará jus à sua razão de ser se devidamente
obedecido pelas autoridades, pelos fabricantes de produtos, pelos prestadores de
serviços e pelos consumidores. Essa observação amolda-se, perfeitamente, às situações que envolvam os transportes marítimo, fluvial e lacustre, quanto ao gerenciamento das águas de lastro, cujo objetivo nada mais é do que preservar o equilíbrio
da biota e dos ecossistemas em geral; prevenir a contaminação das águas costeiras
por substâncias oleosas ou organismos exóticos e impedir a disseminação de doenças através das águas de lastro contaminadas. Por melhor que sejam as leis, por
mais eficientes que sejam as políticas públicas ambientais, não havendo a conscientização e colaboração de cada um, o legado que se deixará para as gerações futuras certamente será motivo de preocupação.
Conclui-se, portanto, que a solidariedade alcança cada ente participante da cadeia
de transporte marítimo, fluvial ou lacustre, respondendo cada qual na medida de
suas responsabilidades, seja por descumprimento dos procedimentos legais - como
o proprietário do navio ou da carga; o comandante da embarcação ou a própria
tripulação; o armador; a concessionária ou empresa que exerce atividades petrolíferas e o representante do porto organizado – seja pela omissão ou negligência na
fiscalização – como os agentes públicos e o Poder público em todas as suas esferas.
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(Edição extra)
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Roupas Feitas de Roupas
Clothes made Clothes
Adriana Pinto, Cyntia Santos Malaguti de Sousa
Centro Universitário Senac
Departamento de Design - Bacharelado em Design de Moda- Habilitação em Modelagem
{[email protected], [email protected]}
Resumo: Este artigo apresenta as principais descobertas e reflexões feitas na etapa
de pesquisa, durante o desenvolvimento do trabalho de conclusão de curso da autora.
A partir de uma inquietação inicial em relação ao impacto da indústria do fast-fashion
sobre os hábitos de consumo e sobre o meio ambiente, buscou-se, inicialmente, um
olhar mais amplo sobre o contexto em que esta situação ocorre, procurando
compreender a relação das pessoas com os bens de consumo, assim como a da moda
em geral com a sustentabilidade. Em seguida investigou-se como se dá todo o
processo de descarte deste segmento da moda após o término de uma coleção. Foram
também pesquisadas diferentes formas de reaproveitamento de peças do vestuário e
suas técnicas, de modo a subsidiar a segunda etapa do trabalho, que envolveu o
desenvolvimento de uma proposta para contribuir com o prolongamento do ciclo de
vida das peças descartadas pelo fast fashion, reduzindo assim os impactos ambientais
provocados por seu modus operandi.
Palavras-chave: moda, sustentabilidade, ciclo de vida, fast fashion.
Abstract: This article presents the main findings and reflections on the research
stage, during development work of course completion the author. From an initial
concern about the impact of the fast fashion industry on consumer habits and on the
environment, he sought initially a broader look at the context in which this occurs,
trying to understand the relationship people with consumer goods, as well as fashion
in general to sustainability. Then it investigated how is the whole disposal process for
this fashion segment after the end of a collection. They were also researched different
ways of reusing clothing details and techniques in order to support the second phase
of work, which involved the development of a proposal to contribute to the
prolongation of the life cycle of parts discarded by fast fashion, thereby reducing the
environmental impacts of their modus operandi.
Key words: fashion, sustainability, circle of life, fast fashion
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística
Edição Temática em Sustentabilidade
Vol. 5 nº. 3 – Dezembro de 2015, São Paulo: Centro Universitário Senac
ISSN 2179-474X
Portal da revista: http://www1.sp.senac.br/hotsites/blogs/revistainiciacao/
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Internacional
1. Introdução
Até a Idade Média, a legitimidade social se firmava pela perpetuação do passado, pela
continuidade, pelo conservadorismo e tradição; as relações das pessoas com os bens
de consumo eram meramente funcionais e pautadas pela extrema necessidade.
Durante a mais longa parte da história da humanidade as sociedades
funcionaram sem conhecer os movimentados jogos das frivolidades.
(Lipovetsky, 2009, pág. 28).
Com o aparecimento do Estado e da divisão de classes é que os indivíduos vão se
distanciando das normas coletivas e criando uma maior individualidade; as pessoas
começam a ter o desejo de se assemelhar àqueles que são considerados superiores, os
que têm prestigio e posição social. E o consumo de bens surge então como uma das
formas de satisfazer tal desejo. Grant McCracken (1965 p.21) comenta que o
consumo e s t á c a r r e g a d o d e s i g n i f i c a d o c u l t u r a l . U s a m o s e s s e s
significados com propósito cultural e somos vistos pelos outros
s o b a mesma perspectiva, seja para construir uma imagem ou para
satisfazer u m d e s e j o .
Para McCracken (1965 p.21) o consumo começa na era elisabetana. No séc. XVIII os
bens de consumo eram usados para mostrar poder e manipular as pessoas; havia uma
guerra de status, incentivado pela rainha e copiado por sua corte. Como esta queria
ser aceita, tornava-se um alvo fácil a ser manipulado.
Com a expansão comercial, as pessoas passam a ter acesso mais fácil aos produtos,
as transformações no mundo vão acontecendo, as pessoas vão mudando. Primeiro era
a nobreza que ditava as regras da sociedade, o povo não tinha voz e as classes eram
nitidamente separadas pelos modos e costumes. Depois, com o declínio da nobreza e
a ascensão da burguesia, as classes populares passaram a ter mais voz, o dinheiro
passou a prevalecer e este agora não vinha de berço; uma burguesia não tão bem
nascida, mas que trabalhava, era quem detinha o dinheiro e que começou a ditar as
regras.
(...) apareceu o grande novo-rico, de padrão de vida faustoso, que se veste
como os nobres, que se cobre de joias e de tecidos preciosos, que rivaliza em
elegância com a nobreza de sangue. (Lipovetsky, 2009, pág. 44).
Os valores começam a mudar e o admirável passa a ser o trabalho e não ócio cultuado
ao longo do tempo; as pessoas tinham que mostrar suas habilidades, os indivíduos
passam a ter vontades próprias, direitos e deveres. No entanto, a forma como as
pessoas usam os bens de consumo não muda, ou melhor, aumentam as proporções,
pois mais pessoas têm acesso a eles e os usam mostrar todo o seu poder e sua
diferenciação na sociedade. Mas o mais notável de tudo, certamente, foi o fato de que
o consumo tornou-se uma atividade de massa.
Segundo McCracken (2003 p.51), por volta do séc. XIX a revolução do consumo havia
se instalado como um fato social permanente. Nesta época surgiram também novos
“estilos de vida de consumo” e novos padrões de interação entre pessoas e coisas,
onde o consumo era algo idealizado, um estilo de vida feliz e sedutor, com o qual o
marketing contribuía, transformando os objetos em fetiche.
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A sociedade de consumo e da obsolescência planejada
A aceleração do consumo na sociedade contemporânea vem ocorrendo há muito tempo, mas
hoje em dia tomou proporções gigantescas, gerando inúmeras consequências para o ambiente.
Os consumidores não são mais coadjuvantes dessa história e sim protagonistas, ao fazerem suas
escolhas.
A sociedade contemporânea marca o fim dos padrões, da estabilidade, da
segurança e das certezas e surge o tempo da indefinição, das inseguranças e do
medo. (BAUMAN, 2008, pág. 52).
É uma sociedade instável, vulnerável aos objetos e à sensação instantânea que eles
podem proporcionar. As pessoas se apegam aos bens de consumo como se fossem a
solução dos seus problemas.
Consumir objetos duráveis e de posse, transmitia respeito pessoal, confiança,
durabilidade em longo prazo. No entanto, com a emancipação dos indivíduos e a
liberdade de escolha, onde cada um escolhe a maneira como quer atender suas
necessidades naquele momento, os bens duráveis perdem o brilho e o que passa a
atrair na nova sociedade que se forma, o que começa a ser valorizado é a rapidez.
A força e insistência pela busca desta felicidade não é algo que podemos
chamar de natural ou instintivo, pois segundo o autor, essa felicidade a nós
apresentada hoje, deriva de fatores externos, d a e v o l u ç ã o d a s o c i e d a d e
moderna, a sociedade de consumo.
As lojas de departamentos mudam a forma como os consumidores, consumiam no
século XIX; lá foi o lugar onde o consumo começou a ser cultuado. Elas eram cheias
de estilos e significados, um lugar mágico;
Baseado em novas políticas de venda agressivas e sedutoras, o grande
magazine constitui a primeira revolução comercial moderna, inaugurando a era
da distribuição de massa. (Lipovetsky, 2007 pág. 30)
Associado às lojas de departamentos, o marketing e o boom das marcas após a II
Guerra Mundial incentivaram muito o consumo; o poder das marcas entra em ação, o
que antes era atribuído à qualidade do produto, agora é à marca; as marcas ditam as
regras, promovendo os seus produtos, alguns dos quais se tornaram símbolos da
sociedade contemporânea, como o automóvel, a televisão, os eletrodomésticos, os
computadores e os celulares.
O indivíduo passou a fazer uma ligação muito direta inconsciente, entre a felicidade e
a aquisição de bens de consumo de determinadas marcas.
O acúmulo de produtos torna-se uma evidência do sucesso: assim, nesse
contexto, ter coisas, muitas vezes inúteis, propicia uma satisfação ao seu
próprio ego. Transfere-se para os bens de consumo todo um significado do que
é idealizado e desejado; como uma esperança que fosse alcançada. E esses
bens ajudam as pessoas ou grupos a estabelecer maneiras, alternativas de
encarar a si mesmas. (McCracken, 2003, pág. 77).
No entanto, todo este consumo, o acúmulo de bens e a procura desenfreada por um
novo produto, que muitas vezes é descartado antes do final de sua vida útil, nos
fazem pensar no impacto gerado sobre o ambiente: onde fica a questão de
sustentabilidade nessa prática?
Um produto que ainda está sólido, em termos de qualidade ou desempenho,
torna-se ‘gasto’ em nossa mente porque um aprimoramento de estilo ou outra
modificação faz com que fique menos desejável. (PACKARD, 1960, p. 51)
O consumo é pautado pelo desejo, cada satisfação proporcionada pelo consumo é
imediatamente substituída pelo estímulo de outra marca conectada a outra sensação;
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o consumidor é permanentemente impulsionado para uma nova necessidade vinculada
pela mídia à “felicidade” ou a sensação dela.
É o tempo do consumo, da impaciência. Encolhido, precipitado, acelerado ainda
pelo marketing, que favorecendo a renovação incessante da oferta de objetos
inúteis, participa do aumento exponencial do volume dos resíduos, esse tempo
moderno bate de frente com o tempo da natureza em sua produção de
matérias-primas e em sua capacidade de absorção da enorme quantidade de
resíduos gerados. (Kazazian, 2009 p.40).
Mas da mesma forma que conquistamos o direito de escolher o que queremos e de
resolver nossas necessidades de imediato, podemos decidir que tipo de consumidor
ser, escolher de forma consciente nossos produtos e cobrar das empresas respostas
sobre como e onde se fabrica e se inova os produtos.
Para Lipovetsky (2004, p. 341) as principais características dessa sociedade são a
desqualificação do passado e a valorização do novo; a afirmação do individual sobre o
coletivo e a efemeridade como característica reinante.
O excesso de mercadorias aumenta a incerteza nas escolhas dos indivíduos e esta é a
função desses novos produtos: manter o indivíduo sempre em busca de satisfação e
de estar na moda, explorando o fascínio das novidades sobre ele e sua fragilidade
diante delas, prometendo ainda muitas emoções. As pessoas são bombardeadas a
cada dia com novidades muito sedutoras, porém inúteis, numa grande velocidade;
além disso, a velocidade com que se cria é a mesma com que a roupa sai de cena.
2. Fast Fashion
Com a globalização e a velocidade com que as pessoas têm a acesso as informações
no século XX surgiu um novo conceito de moda, o fast fashion, ou moda rápida. Este
conceito se refere à redução do tempo de produção, distribuição, que permite fabricar
produtos com ciclo de vida curto e no momento mais próximo possível de sua venda.
Para Lipovetsky (2007 p.186), a sociedade de consumo não poderia desabrochar
senão com base em uma ampla difusão do modelo tayloriano-fordista, que era a alta
produtividade, a exploração das economias de escala, o volume de vendas elevado e a
rotação rápida das mercadorias; esta base é nitidamente vista nos padrões
estabelecidos do fast fashion.
Pode-se dizer que o sistema fast fashion é, sem dúvida, o modelo produtivo de maior
sucesso nos últimos anos, e o ingrediente para obter bons resultados neste mercado,
é a habilidade de detectar novas tendências e produzir peças em tempo recorde,
vendendo-as a preço barato, o que só é possível mediante a exploração de mão de
obra barata e dos recursos naturais.
Segundo a autora Matilda Lee (2009 p.19) a fabricação de roupas entrou em declínio
na Europa e nos EUA graças à legislação progressista e à consciência social que
melhoraram a vida dos trabalhadores, deslocando o problema para outros países.
Nos últimos cinco a dez anos, o trabalho se concentrou na China, no
Paquistão, em Bangladesh, na Índia, no México, na Romênia, no
Camboja e na Turquia. (Lee, 2009 pág. 20).
Nesses países os trabalhadores são submetidos a um trabalho de condições
desumanas com baixos salários, onde os donos das fábricas se comprometem com
seus clientes para entregar um produto em um prazo curto no qual, muitas vezes, só
sua equipe não consegue atender a demanda. Com isso ele submete seus funcionários
há horas extras abusivas e a um sistema de trabalho muitas vezes escravo. Boa parte
da produção de roupas e tecidos hoje é concentrada na China, por ter uma mão de
obra qualificada e barata. Segundo Cietta, (2012 p.29) a China detém grande
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qualidade manufatureira, seus desempenhos econômicos são extraordinários e não
estão fadados a se esgotar ou a diminuir no decorrer do próximo decênio.
Toda essa procura por fornecedores rápidos e baratos acontece porque atualmente
uma tendência de moda não surge apenas a partir dos desfiles. Ela pode se configurar
em minutos, bastando uma celebridade aparecer com um sapato ou roupa, ser clicada
por várias revistas e comentada por pessoas influentes na mídia. A instantaneidade
dos meios de comunicação faz com que os varejistas partam enlouquecidos para os
fornecedores dispostos a transformar essa tendência em um produto a ser consumido
em semanas.
Uma das características principais do fast fashion é a rapidez. Coleções não são mais
periodicamente lançadas como primavera-verão, outono-inverno, mas coleções são
lançadas no mercado ao longo dos meses, chegando até a mais de 10 coleções anuais,
trazendo um volume excessivo de roupas, consideradas fora de moda, a cada troca de
coleção. Uma loja como a Zara, uma das principais varejistas mundiais, renova seus
modelos a cada duas semanas, produzindo cerca de mais de 10 mil designs de peças
diferenciadas por ano segundo, Lipovetsky, (2007 p. 88).
As empresas de moda rápida parecem conseguir fazer tudo em prazos menores
em relação às empresas tradicionais, a ponto de podermos nos perguntar
quanto estas últimas poderão resistir ao ciclone que está vindo de encontro a
ela. (Cietta, 2012 pág. 29).
Outra característica do fast fashion que o fez ganhar um grande espaço é que ele
viabiliza o acesso a uma estampa ou um modelo lançado por uma marca de luxo até
então “exclusiva”; em poucos dias se vê este modelo em marcas de fast fashion pelo
mundo, com preços acessíveis e, muitas vezes, com matéria prima similar ao modelo
copiado, de tal modo que, dependendo do contexto, poucos saberiam distinguir uma
da outra. Entretanto esses produtos geram custos ao serem transportados por via
aérea ou marítima, abastecendo países e mais países. Muitas vezes o volume que é
negociado é muito maior que a demanda, gera um enorme impacto poucas vezes
calculado pelas empresas e pelos consumidores que alimentam essa indústria.
Embora o efeito econômico desejado de tal velocidade seja promover o crescimento
do negócio, a consequência inevitável é aumento na demanda por recursos
materiais e mão de obra, ditado por uma produção de mercadorias cada vez maior.
O impacto dessa dinâmica sobre os ecossistemas e os trabalhadores está no cerne
do desafio da sustentabilidade para a moda. (Fletcher, 2011 pág.124).
Para atingir mercados que chegam a milhões de consumidores, as indústrias investem
na inovação e na produção de bens de forma acelerada, sendo poucas as que se
preocupam com os resíduos gerados pelos processos de fabricação, assim como com o
descarte pós-uso destes produtos e as condições a que são submetidos os
trabalhadores que as produzem.
Fast fashion no Brasil – o crescimento das marcas nacionais.
Fundada em 1975 por Amâncio Ortega, a rede de varejo espanhola Zara, após ser
considerada uma das precursoras do modelo de negócio fast fashion, no final dos anos
90, inaugurou sua primeira loja no Brasil na cidade de São Paulo no shopping
Ibirapuera. Desde então, o grupo expandiu seus negócios no país, conquistando
milhares de consumidores. A chegada da marca ao Brasil provocou a criação e
reestruturação de vários negócios no país, seguindo o novo modelo fast fashion,
grandes varejistas como a Renner, a C&A e a Riachuelo, se reposicionaram no
mercado, segundo informações disponíveis em seus sites.
As informações abaixo citadas foram retiradas dos sites das respectivas empresas.
A Riachuelo, com 269 lojas distribuídas por todo o País, dois parques industriais e
40.000 funcionários, o canal direto de distribuição dos produtos do Grupo Guararapes,
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um dos maiores grupos de confecção de roupas da América Latina. Iniciou suas
atividades em 1947, com pequenas lojas de rua, vendendo tecidos a preços
baixos. Em 1979, a rede de lojas de tecidos foi comprada pelo grupo Guararapes,
e passou a vender roupas prontas para serem usadas. A partir de 1983, o foco passou
a ser a moda. Esta estratégia envolveu a criação e o fortalecimento de marcas
próprias, cada uma com identidade visual e público-alvo específico. Atualmente a loja
conta com uma grande equipe de estilo, que visa oferecer aos clientes peças de roupa
com informação de moda adequada às suas diferentes submarcas de tal forma que,
dentro das lojas, é possível encontrar linhas de produto em sintonia com diferentes
faixas etárias e perfis de público.
As lojas Renner S.A, fundada em 1965, devido ao seu crescimento e evolução, dois
anos depois, em 1967, a Companhia transformou-se em uma empresa de capital
aberto.
Após décadas de bom desempenho, a empresa passou por uma profunda
reestruturação no início dos anos 90 e começou a operar no formato de loja de
departamentos especializada em moda. Nesta época a Renner expandiu para além do
Rio Grande do Sul, chegando aos estados de Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Rio
de Janeiro, Minas Gerais e para o Distrito Federal, consolidando sua posição nesses
mercados como uma loja de departamentos especializada em moda com mercadorias
de qualidade a preços competitivos. Segundo o site da empresa, são 102 lojas, das
quais 95 estão instaladas em Shopping Centers e sete em pontos centrais de cidades,
atingindo todas as regiões.
A rede Holandesa C&A chegou ao Brasil em 1976, com a inauguração de sua primeira
loja no shopping Ibirapuera da cidade de São Paulo. Desde então a marca conquistou
milhares de consumidores e aprimorou sua forma de desenvolver produtos, hoje a
empresa conta com equipes de estilo e compras em diversos países onde está
instalada. Este modelo de negócio viabilizou o desenvolvimento de produtos
regionalizados, permitindo que a marca se adequasse melhor ao clima e às
peculiaridades do consumidor local. Outra estratégia importante adotada pela empresa
foi à subdivisão de marcas dentro da rede C&A, auxiliando o cliente a entender qual a
proposta e estilo de cada uma delas.
3. A “sobra” do varejo como consequência da dinâmica
do fast fashion.
O mercado da moda dita quase que diariamente novas tendências, e produz novas
coleções que alimentam o consumo desenfreado. A cada dia está maior e desmedido o
consumo do fast fashion, sobrecarregando a demanda por recursos naturais como
matérias-primas, água e energia (para os processos produtivos e a logística de
distribuição) e aumentando o volume de lixo gerado.
Não sendo apenas o fast fashion responsável pelo excesso de peças, mas toda a
indústria têxtil tem sua responsabilidade desde da fabricação nas sobras de retalhos,
aparas de corte e costura, como no pós consumo, de acordo, com dados da Associação
Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (ABIT), o Brasil é o 5º maior produtor
têxtil do mundo, representando mais de 5% do Produto Interno Bruto (PIB) industrial
brasileiro. São mais de 32 mil empresas que, juntas, produzem em média 9,8 bilhões
de peças de roupa por ano. Apesar de serem números importantes para a economia
do país, esse é um setor que gera grande quantidade de resíduos. Aliás, os impactos
decorrentes de suas atividades e dos modelos de distribuição e consumo a ele
associados percorrem não apenas toda a cadeia produtiva têxtil como também o ciclo
de vida da peça de roupa: desde o plantio do algodão, a confecção da peça, seu uso,
manutenção e descarte.
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Na confecção, os retalhos causam um impacto altamente significativo, mas não
perceptível. No Brasil, a estimativa de resíduos têxteis é da ordem de 175 mil
toneladas/ano. Desse total, menos de 10% são reaproveitadas na produção de
barbantes, mantas, novas peças de roupas e fios. Segundo dados da Associação
Brasileira da Indústria Têxtil e Confecção (ABIT) no bairro do Bom Retiro, cidade de
São Paulo, diariamente são descartados inadequadamente 12 toneladas de resíduos
têxteis (retalhos) produzidos por mais de 1,2 mil confecções; e sua coleta é realizada
de forma desorganizada, sem preocupação com a destinação adequada.
Cada peça produzida inevitavelmente gera aparas e retalhos que atualmente são
descartados no lixo comum. Visando o gerenciamento dos artigos têxteis advindos do
descarte doméstico e dos resíduos gerados nos processos de fabricação, a reutilização
de retalhos como matéria-prima surge como uma resposta emergencial aos problemas
ambientais, como o descarte inadequado e o saturamento dos aterros sanitários.
De acordo com a classificação de resíduos sólidos (ABNT NBR 10004:2004), os
retalhos se enquadram em Resíduos Classe II A – Não inertes, que possuem
propriedades como biodegradabilidade, combustibilidade ou solubilidade em água. A
partir de agosto de 2010 entrou em vigor no Brasil a lei nº. 12.305 que instituiu a
Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), com a finalidade de regulamentar o
tratamento ou disposição de resíduos de maneira adequada para minimizar o impacto
ambiental. A lei exigiu a eliminação de lixões e a disposição final ambientalmente
adequada dos rejeitos até 2014, demandando das empresas que geram resíduos a
adoção de mudanças na sua cultura, relacionadas às práticas de destinação dos
resíduos.
Diante desse cenário, uma das possibilidades para evitar a destinação inadequada dos
retalhos é sua reciclagem, ou seja, sua reutilização e transformação em fios. Por meio
de processos industriais, os fios podem ser usados para a fabricação de novos tecidos,
estopas, colchões, mobiliários.
Por que existe a “sobra”? A vida útil das coleções, a segmentação de
mercados e o descarte.
De acordo com Kotler (1999 p.225) existem três ciclos de vida de um produto de
moda: Estilo, Moda e Modismo. Os produtos de ciclos longos denominados produtos
Estilo, permanecem durante gerações, estando dentro e fora de moda, com vários
períodos sucessivos de interesse, como por exemplo, o estilo básico.
Os produtos de Moda têm um ciclo de vida médio, possuindo uma curva de
crescimento gradual permanecendo aceita ou popularizada pelos consumidores
durante determinado período e descendo lentamente, normalmente o espaço de
tempo de uma estação. Já os produtos com ciclo de vida curto podem ser
caracterizados como produtos de Modismo.
É o produto que “entra rapidamente, é adotado com grande entusiasmo, atinge
seu auge em pouco tempo e declina também em pouco tempo” (Kotler, 1999,
pág.225).
Este último perfil de ciclo é o que alimenta o fast fashion, sendo o produto que entra
rapidamente, atinge seu auge em pouco tempo e declina também em pouco tempo.
Esta moda passageira, denominada “modinha”, tem duração de poucos meses, onde
se tem o maior número de vendas e também o maior risco se a ideia não for absorvida
pelo consumidor: esta incerteza da reação do mercado para novidades aumenta o
risco de sobras. Segundo Berlim (2012 p.155), o produto de “moda” passou a ser
compreendido como algo útil enquanto está “na moda”; depois o interesse por ele
desaparece. E o que fazer com o que sobra?
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Um dos problemas de sustentabilidade do fast fashion ainda pouco debatido é a sobra
no pós-venda. Semanalmente grandes quantidades de peças são inseridas no
mercado, o qual muitas vezes não absorve tanta demanda, e como o grande alimento
do fast fashion é a novidade constante, ele mesmo é contaminado pelo seu ciclo
vicioso. Outra causa das sobras do fast fashion é o grande volume de peças que se
negocia, para que o preço seja atrativo tanto para fornecedores como para
compradores; as peças vêm na maioria das vezes da China ou de países asiáticos, em
contêineres, em grandes quantidades para que se tenha melhor preço e o valor
compense as altas taxas de importação.
Ao se comprar uma peça de roupa barata com a etiqueta made in China,
raramente o consumidor tem em mente o que está por trás daquela etiqueta.
(...) mas em geral, a preocupação de quem compra é buscar um preço melhor uma roupa mais barata e, ao mesmo tempo, esteticamente bela. (BERLIM,
2012, pág. 29).
Segundo FLETCHER e GROSE (2011 p.124) a lógica da produção industrial é regida
pelos resultados financeiros: produzir muito para gerar muitos lucros. O problema é
que há impactos sociais e ambientais consequentes, muitas vezes não despercebidos
pelo consumidor.
De certa maneira o lado positivo do fast fashion é uma maior democratização da
moda, onde peças lançadas em passarelas internacionais em poucas semanas estão
disponíveis em lojas de comércio populares de rua e também em lojas de shoppings
centers, proporcionando informação de moda a todas as classes sociais.
Como o foco desta pesquisa é abordar, o ciclo de vida de um produto do fast fashion
por serem, curtos e movidos pelo elevado índice de compras por impulso, produtos
que são desenvolvidos para capturar preferências momentâneas e devem durar
poucas semanas nas prateleiras, tudo isso influenciado por fatores como o clima,
lançamento de novos produtos no mercado, novelas, filmes, celebridades, artistas e
acontecimentos e é ainda um dos modelos de negócio, mas rentáveis no mercado
brasileiro atualmente.
A solução dos outlets
Segundo o dicionário de língua portuguesa Aurélio a palavra outlet, se define como
um estabelecimento comercial ou conjunto de lojas cujas mercadorias são vendidas,
diretamente ao público a preços reduzidos.
Os outlets apareceram pela primeira vez no leste dos Estados Unidos na década de
1930. O conceito surgiu das lojas de fábrica que passaram a oferecer aos empregados
a preços baixos os produtos excedentes ou danificados. Em 1936 a Anderson-Little
(marca de roupas masculinas) abriu a primeira loja independente das fábricas. Este
conceito permaneceu até a década de 1970. Depois o público se expandiu para não
funcionários. Entre as décadas de 1980 e 1990 estes outlets transformaram-se em
shoppings crescendo fortemente. Em 2003 os Outlets geraram uma receita de US$ 15
bilhões em todos os Estados Unidos.
No Brasil, o primeiro Outlet foi aberto no estado de São Paulo em junho de 2009.
Batizado de Outlet Premium São Paulo, o empreendimento tem cerca de 90 lojas e
reúne grifes conhecidas. Recentemente foi inaugurado o segundo Outlet do país, com
o nome de Outlet Premium Brasília, localizado a 80 km da capital. Em 2013, foi
inaugurado o terceiro Outlet no país, o Outlet Premium Salvador, localizado região
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Metropolitana da cidade. Há ainda o Nova América Outlet Shopping, em Del Castilho,
no Rio de Janeiro, tradicional há mais de duas décadas.
Uma das soluções para a grande demanda das sobras do varejo são os outlet. Através
de contato com o sac. (Serviço de atendimento ao consumidor) das principais lojas de
fast fashion do Brasil perguntou-se o que era feito com as sobras das coleções
passadas. Todas responderam que liquidam suas peças até esgotarem os estoques em
suas próprias lojas ou em outlets próprios, ou até mesmo doam essas peças para
instituições de caridade locais, que por sua vez, organizam bazares populares e as
vendem.
Embora seja um negócio pouco explorado no país, sem se expandido muito. Até 2016
estima-se que a área de shopping centers do tipo outlets, saldos de lojas e grifes
nacionais e internacionais, vai mais do que dobrar, passando de 74 para 168 mil
metros quadrados, de acordo a Associação Brasileira de Shopping Centers. Esta
expansão poderá contribuir para que os outlets funcionem como uma opção para o
mercado, na aquisição de roupas de qualidade a preços baixos, além de tornar-se uma
válvula de escape para o excesso produzido pelo varejo, aumentando assim o ciclo de
vida de roupas. Seja do ponto de vista da indústria ou do comércio os outlets são uma
boa alternativa para dar vazão a seus estoques, tornados obsoletos pelo ciclo do fast
fashion.
Pesquisa de campo em outlets
Com a finalidade de conhecer o perfil e a quantidade de roupas oferecidas nos oulets,
foram feitas visitas a campo em diversos outlets, no período de maio e julho de 2014.
Em São Paulo, os grandes outlets estão afastados dos grandes centros comerciais da
cidade, muitas vezes este espaço é dividido por setores que atendem vários públicos e
produtos como: biquíni, sapatos, bolsas, roupas esportivas, moda feminina, masculina
e infantil de diversas marcas.
Segundo os funcionários desses locais, o conceito do espaço também é inspirado no
modelo americano, com roupas separadas por modelos e tamanhos. O público é variado,
encontrando-se tanto pessoas que buscam apenas preço, como donas de casa que tem a
missão de comprar peças para a família, e nos outlet encontram um preço melhor; como
outras querendo ter a oportunidade de levar peças de marca para casa sem se preocupar
com a moda. Funcionam com coleções passadas e atuais, mas a maioria não a troca de
peças, o que impede que alguém presenteie outro com um produto de ponta de
estoque; daí se resolve este problema colocando nos outlets algumas peças de coleção
atual.
Nos outlets, visitados foi observado um volume considerável de peças de “modinha”, ou
seja, de cores fluorescentes, estampas chamativas onde se tinha um grande volume e os
tamanhos de maior demanda eram os extremos como 34 e 46. As peças de maior volume
eram as básicas, porque são compradas em maiores quantidades, em todas as coleções,
por se tratar de peças de coleção permanente. As peças ficam expostas, até todas
venderem, os preços vão abaixando, sem alternativa de renovação, até que outra
coleção chegue e as coleções vão se misturando.
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4. O consumo consciente
Os impactos negativos gerados pelo hábito de consumo excessivo de produtos do
vestuário são muitos, tanto à natureza quanto ao ser humano. A consciência e o
conhecimento destes impactos levaram a reação de diversos grupos de consumidores,
muitos hoje se organizam em grupos e adotam critérios em suas decisões de compra,
uso e descarte que possam reduzir tais impactos e ainda explicitam suas posições na
própria roupa, utilizando-a como forma de expressão, como manifesto. Alguns
criaram, inclusive, slogans como a estilista Danielle Ferraz, com sua campanha
“chique é ser consciente”, ou a Lílian Pace, com o movimento pelas “ecobags”. Tais
manifestações possuem em comum, em geral, uma busca por um estilo de vida mais
sustentável.
Para Berlim (2012 p.29), o consumidor passa a ter mais autonomia e questiona-se o
porquê comprar, percebendo que ele é o responsável por essa resposta. Surge então
um novo perfil de consumidores que, conscientes de seu papel na sociedade e
atuantes nas novas mídias sociais, lançam movimentos contrários ao consumo
excessivo.
O conceito de sustentabilidade ambiental foi no inicialmente debatido na década de
70, na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, para mostrar que era
possível crescer economicamente sem destruir o meio ambiente, sendo uma tentativa
para harmonizar o desenvolvimento humano com os limites da natureza. Para Berlim
(2012 p.16), a sustentabilidade está presente na moda desde a década de 60, quando
surgiram no Brasil e no mundo as primeiras preocupações com o impacto ambiental
causado pela indústria têxtil.
Na mesma época, o consumidor europeu passou a ter consciência também sobre a
exploração de trabalhadores nos países em desenvolvimento, nascendo assim o
Fairtrade (mercado justo), cuja maior preocupação era diminuir as diferenças
comerciais, sociais e éticas entre os trabalhadores, pequenos agricultores e as grandes
corporações.
Conciliar o sistema de moda com a sustentabilidade, não é algo fácil,
uma vez que “os indivíduos atomizados, absorvidos consigo mesmos,
estão pouco dispostos a considerar o interesse geral, a renunciar aos
privilégios adquiridos; a construção do futuro tende a ser sacrificada às
satisfações das categorias e dos indivíduos do presente”. (Lipovetsky
1989, pág. 13).
Este novo consumidor, preocupados com o meio ambiente e com o futuro das novas
gerações, surge no cenário brasileiro, está usando seu poder de escolha para premiar
ou punir empresas por suas atitudes sociais e ambientais; busca informações sobre os
produtos que consome e encontra em alguns veículos da mídia, mas, sobretudo na
internet, que têm divulgado novos comportamentos e tendências de mercado.
Observam-se sinais, em alguns grupos de consumidores, de uma mudança gradativa
na cultura e no comportamento de consumo, mudança fundamental para a aceitação
de produtos sustentáveis. No entanto, representa ainda um grande desafio quebrar a
cultura consumista acomodada que ainda prevalece, e tentar orientar a mesma para
novos hábitos ecologicamente corretos.
O gráfico abaixo, divulgado pela Abit (Associação Brasileira da Indústria Têxtil),
mostra dados de uma pesquisa qualitativa onde foram levantados dados dentro de um
grupo de consumidores, moderados por uma pesquisadora, em 2010, do qual analisa
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o grau de importância que o consumidor atribui, na hora da compra, aos aspectos
ligados à sustentabilidade de um produto.
Figura 1. Visão do consumidor a respeito da sustentabilidade no produto de moda
Fonte:
ABIT
(Associação
Brasileira
de
Indústria
Têxtil).
Disponível
<http://abit.org.br/habitosdeconsumos/Banco_Dadosrpt.asp>Acesso em: 05/09/2014
em:
Refletindo sobre a importância de monitoramentos como este e sobre as mudanças
que estão ocorrendo no comportamento de consumo, Lee (2009 p.98) afirma que,
para as lojas e para seus fornecedores, em breve, ser “verde e ético” não será mais
uma opção: será um fator essencial, sem isso não haverá condições de se estabelecer
no mercado.
Moda sustentável e suas diferentes manifestações
Um dos aspectos que caracteriza o modo de produção do fast fashion e que provoca
graves consequências ao meio ambiente é seu ciclo de vida linear de produçãoconsumo-descarte. Assim, uma das propostas de mudar esta dinâmica é a adoção de
outros modelos, adotando um ciclo de vida em círculo fechado, aberto ou em loopespiral.
Logística reversa
A logística reversa é uma estratégia que integra qualquer um desses modelos e faz
parte das diretrizes da nova Política Nacional de Resíduos Sólidos, já mencionados.
Logística Reversa: em uma perspectiva de logística de negócios, o termo
refere-se ao papel da logística no retorno de produtos, redução na fonte,
reciclagem, substituição de materiais, reuso de materiais, disposição de
resíduos, reforma, reparação e remanufatura. (Stock 1998, pág. 20,
apud, Leite 2009, pág.16).
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A Logística reversa, nada mais é que o retorno dos produtos às empresas para dar
novo uso, e a reutilização de peças descartadas, facilitando o retorno do produto ao
ciclo produtivo ou remanufatura, reduzindo desta forma a poluição da natureza e o
desperdício de insumos.
A reutilização de peças do vestuário descartadas como matéria prima para
desenvolvimento de novos produtos contribui para a redução de impacto sócio
ambiental, uma prática pouco utilizada na indústria têxtil do Brasil. Após as
liquidações ao público em geral, não existe retorno desses produtos, restando apenas
como prática habitual à venda a mercados secundários, talvez por se achar que com a
LR, não se pode obter ganhos financeiros. Entretanto este pode ser um grande
engano, pois uma vez que se podem economizar em matéria prima, os gastos ao final
poderão ser menores na fabricação de novos produtos.
(...) Preços de matérias-primas secundárias menores que as matérias-primas
novas, em geral terão economias com o uso de energias industriais na
fabricação dos produtos, além de economias em outros insumos indústrias,
perfazendo, em geral, importantes diferenças de custos que permitem
significativas vantagens competitivas (...) por meio de reforço da imagem
corporativa e da ética social. (Leite, 2009 pág.34 e 35).
Um dos casos bem sucedidos de logística reversa na indústria da moda é o da
empresa Levi Strauss, uma das mais importantes indústrias de confecções dos Estados
Unidos.
O volume de mercadorias devolvidas representa cerca de 5 % das vendas da
empresa, ou 300 milhões de dólares. Toda a comunicação do retorno é realizada
on-line, utilizando 42 códigos de retorno informatizados e de classificação dos
artigos que facilitam o crédito aos clientes de forma rápida e permitem domínio
logístico das mercadorias retornadas. (Fonte: Adaptado de Kerry Merrit,
Frontline Solutions, Duluth, jul.2001, apud Leite, 2009 pág.192).
A seguir, são apresentadas diversas propostas difundidas como alternativas ao fast
fashion, algumas das quais se vinculam à logística reversa.
Do-it-yourself (Faça você mesmo)
Produzir o que se consome: essa é a ideia preconizada no “do-it-yourself”. Muitos sites
de moda e design dão dicas de como reinventar roupas e objetos reaproveitando
aquilo que você já tem. Ultimamente tem se ouvido muito falar na expressão DIY, do
It Yourself ou Faça Você Mesmo. Basicamente foi criada no início dos anos 1950, em
que bandas DIY eram aquelas que contavam com produção independente desde a
composição das músicas até a venda. O conceito DIY também foi associado a ideias
anticapitalistas, anticonsumistas, pregando que todos são capazes de produzir o que
consomem.
Ao praticar o “Faça você mesmo” o indivíduo tem baixo custo com um novo
produto e isso ainda desperta a sensação de autossuficiência, assim as
motivações podem ser desejo de provar capacidade a si mesmo, o prazer em
resolver problemas práticos, o lazer na execução de trabalhos manuais, a
satisfação de competência ao utilizar a ferramenta certa ou o domínio de uma
habilidade, e a satisfação de um trabalho feito (WATSON & SHOVE, 2008 apud
FUKUSHIMA, 2009, pág. 43).
O movimento tem um grande alcance na internet, principalmente em blogs e redes
sociais como um todo, ancorado na necessidade do indivíduo sentir-se exclusivo na
maneira de se vestir e se comportar. A proposta do “feito à mão” (de maneira geral)
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vem suprir a demanda por produtos com valor agregado, e que também se situa na
contracorrente do consumo massificado imposto pelo fast fashion.
O movimento está consolidado no exterior, no Brasil também está presente, mas com
muita cópia das criações internacionais e de forma mais lenta.
Customização
A customização ou personalização também tem sido uma técnica para prolongar o
tempo de uso de produtos do vestuário. A expressão customização foi criada para
traduzir um termo da moda americana “custom made”. A customização chegou com
força ao Brasil no fim dos anos 90; criou um novo conceito de moda que personaliza e
dá mais tempo de vida para as peças do vestuário. Ao se customizar uma roupa
consegue-se prolongar o ciclo de vida de uma peça que estava em desuso, aplicando
variadas técnicas, como bordados, apliques e aplicações e outros.
Upcycling
Um conceito que vem ganhando importância é o upcycling, que significa o
reaproveitamento de um material já utilizado ou o resíduo de um produto da
maneira com que foi encontrado, sem que seja realizada a reciclagem.
(McDonough e Braungart, 2002, p.53).
É o processo de transformar resíduos, peças, produtos inúteis e descartáveis em novos
materiais ou produtos de maior valor, uso ou qualidade. Ou seja, significa transformar
algo que já está no fim de sua vida útil em algo novamente útil sem que precise
passar por processos de reciclagem. Os pontos positivos upcycling são: a redução do
desperdício têxtil, a recolocação no mercado de materiais inutilizados, a agregação de
valor a produtos obsoletos e a redução no custo da produção.
Slow Fashion
O conceito de slow fashion foi emprestado do movimento slow food, fundado em 1986
por Carlo Petrini na Itália. O slow food conjuga o prazer da alimentação com
consciência e responsabilidade.
O slow fashion propõe que a moda tenha uma velocidade menor, com peças
contínuas, ou que, pelo menos, persistam mais de uma estação. É o movimento que
defende peças duráveis, de qualidade, para serem guardadas e não descartadas.
Segundo Kate Fletcher (2007 p.128), o movimento slow fashion está baseado em
conceber, produzir, consumir e viver melhor, principalmente no que diz respeito à
qualidade, pois requer uma combinação de mudanças criativas, de expressão de moda
e de valores. Assim, o slow fashion, valorizando a qualidade antes da quantidade, tira
a pressão do tempo sobre as coleções de moda, tanto no desenvolvimento quanto na
produção e comercialização. Isso permite maior planejamento na empresa em longo
prazo e dá há ela tempo para construir relações mutuamente benéficas.
O slow fashion permite uma interação entre o designer, o produtor e o usuário.
“Um forte laço de relacionamento é formado, que vai muito além da cadeia de
fabricação de vestuário” (FLETCHER, 2007 p.128).
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Desconstrução
Desconstruir uma roupa é criar, transformar, descobrir novas formas a partir de uma
peça já pronta, dando novas possibilidades e aumentando o seu ciclo de vida.
As origens da abordagem remontam ao ano de 1983, quando três jovens estilistas
japoneses abalaram a forma de se fazer moda. Yohji Yamamoto, Issey Miyake e Rei
Kawakubo inventaram um estilo completamente novo: a desconstrução de roupas, uma
nova linguagem para o mundo da moda.
No Brasil uma marca que vem se destacando por fazer um trabalho de reconstrução
de roupas é a IN USE que usa peças compradas das sobras de estoques de coleções
passadas de fábricas e marcas e cria novas peças com novas formas, dando novas
possibilidades. Na verdade ela associa a desconstrução à ideia do up-cycle. O
diferencial da marca é que ela propõe a técnica, dando palestras e workshops, onde
parte do princípio que qualquer um pode transformar suas peças.
5. A formulação de uma proposta
Depois de levantar diversas formas de reaproveitamento de roupas e, em especial, das
sobras do fast fashion, constatou-se ao final da pesquisa, que a única opção de
logística reversa adotada até o momento em São Paulo, no varejo de moda, depois
das grandes liquidações, é a venda das peças aos mercados secundários que são os
outlets.
Observou-se que os outlets são uma alternativa confortável para a maioria das
empresas, pois as permite atingir um público secundário sem novo investimento.
Algumas possuem seus próprios outlets e outros funcionam como negócios
independentes, aos quais as empresas vendem as peças das coleções passadas. Dessa
forma, externalizando este custo da parcela perdida de cada coleção, ficam livres para
se manter em sua dinâmica “fast”. Reiniciam então um novo ciclo onde voltam a
buscar novas matérias primas, junto a fornecedores dispostos apenas a lucrar, ao
invés de pensar em alternativas vinculadas ao incentivo de um consumo mais
consciente, para evitar que a matéria prima já comprometida, mas sem nenhum uso,
seja desperdiçada. E assim, o ritmo permanentemente acelerado de produção do fast
fashion associado à grande escala produtiva que o caracteriza, vai gerando um efeito
“bola-de-neve” no aumento das sobras do varejo.
Diante dessa situação foi proposto outro tipo de iniciativa de logística reversa para o
varejo do fast fashion. A partir de peças coletadas dos outlets, novos produtos e
coleções de moda seriam criados, utilizando os mesmos elementos de inspiração do
fast fashion, mas, ao mesmo tempo, os materiais seriam reaproveitados, sem
reprocessamento.
Dessa forma, aplicados em novas peças de roupa, eles retornariam ao mercado,
aumentado seu ciclo de vida: a lucratividade da empresa aumentaria pela economia
do gasto com a compra de matéria prima, ao mesmo tempo em que se faria uma
moda mais sustentável.
A partir das visitas feitas aos outlets, compramos algumas peças para serem
transformadas em outras peças. Escolhemos as peças que mais tinha excesso no local
e os tamanhos de maior demanda, de acordo com o modelo, que eram os tamanhos
extremos como 36 e 46. Conforme segue as figuras abaixo.
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Figura 2. Blusa de malha em maior quantidade em arara do outlet e blusa adquirida para
transformação
Fonte: da autora
Peças compradas nos outlets, para desconstrução.
Figura 3. Camisa em maior quantidade adquirida em outlet, para transformação.
Fonte: da autora.
Figura 4. Vestido em maior quantidade adquirida em outlet, para transformação.
Fonte: da autora.
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Figura 5. Vestido em maior quantidade adquirida em outlet, para transformação
Fonte: Richard Nicoll para TOPSHOP. Disponível, WWW. http://multticlique.com.br/blog/goodvibes/richard-nicoll-cria-vestidos-de-noiva-para-topshop/, acesso em: 20 de out. de 2014
Depois das peças compradas, todas foram desconstruídas, formando pedaços de
tecidos desde sintéticos, como poliéster a tecidos naturais como seda, de diversos
tamanhos e gramaturas e diversos aviamentos como; elásticos, botões, zíperes e
outros.
Figura 6 e 7. Tecidos e aviamentos das peças descosturadas
Fonte: da autora
Justificativa para escolha do look
O fast fashion nada mais é do que uma releitura da passarela, a preço baixo e em
grande escala, com a rapidez que a tendência chega ao consumidor e com o preço
muito mais reduzido do que uma marca de luxo, com isso as peças que se encontra
numa loja de fast fashion, são as tendências das principais marcas de luxo como
Chanel, Balmain, Louis Vuitton, Marc Jacobs, Isabel Maran e outros, que lançam suas
coleções nas principais passarelas internacionais, como a semana de moda de Paris,
Nova Iorque, Londres.
Com isso o look de referencia escolhido foi uma das principais tendências das coleções
2014 e 2015.
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Figura 8. Desfile Marc Jacobs Nova York Verão 2014
Fonte: FFW (Fashion Forward). Disponível em: htpp: //www.ffw.com.br/desfiles, 15 de maio de
2014
Para a construção das peças, foram necessários, alguns encaixes, utilização de
recortes para melhor aproveitamento dos pedaços de tecido, sendo muitas vezes
posicionado tanto no fio como no contra fio do tecido, como exemplifica, algumas
figuras abaixo.
Figura 9 e 10. Molde em posicionado no tecido
Fonte: da autora
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Figura 11 e 12. Molde em posicionado no tecido
Fonte: da autora
Depois do encaixe nos moldes as peças foram costuradas, aproveitando o máximo de
aviamentos existentes, formando um look com as peças desconstruídas.
Figura 13 e 14. Look pronto
Fonte da autora
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Figura 15 e 16. Look pronto em detalhes
Fonte da autora
6. Considerações finais
A princípio, esta pesquisa de forma despretensiosa, procurou fazer roupas feitas de
roupas, mas logo no inicio percebeu-se que a relação das pessoas com as roupas não
é construída prioritariamente pela satisfação de uma necessidade real, mas sim,
muitas vezes, pela conquista de um prazer instantâneo e descartável.
No entanto a preocupação com o meio ambiente está tornando as pessoas mais
atentas e preocupadas com outros aspectos relacionados a elas tais como de onde
vem e para onde vão as roupas que consomem, sendo as mídias sociais, grandes
estimuladoras desse novo consumidor.
Na pesquisa de campo junto aos outlets, deparou-se com a enorme quantidade de
peças efêmeras, típicas das lojas de fast fashion, uma moda fútil e estagnada, que não
demonstrava nenhuma preocupação por parte de seus idealizadores com os impactos
ocasionados pelo excesso dessa sobrecarga de demanda de recursos sobre o meio
ambiente, muito menos pelos efeitos dos resíduos nele despejados.
Depois das peças compradas, das quais 70 % eram made in china, um dos problemas
enfrentados foi sua desconstrução: foi muito trabalhoso e tomou muito tempo
descosturá-las, pois suas costuras eram fortes e resistentes, caindo por terra o
conceito que se tem de que peças made in china, em sua maioria é de péssima
qualidade.
Tendo em vista que tempo é dinheiro no mundo da moda, em busca de uma solução,
encontrou-se a Wear-2, empresa do Reino Unido, que vende uma tecnologia que
consiste em um fio que perde a resistência e logo se desfaz, quando exposto a
radiação de um forno micro-ondas, sem deixar traços têxteis quando removido. Com
esta tecnologia o tempo gasto no processo de desconstrução seria menor e
demandaria um número menor de pessoas, tornando menos onerosa à confecção de
um novo produto a partir da reutilização dos materiais.
Outra percepção ao longo do processo foi que, pelo fato das matérias-primas serem,
de fato, pedaços de tecidos e não peças inteiras foram necessários um grande estudo
de encaixe antes de cortar as peças. Muitas vezes foi preciso inserir recortes no
modelo proposto, tomando um tempo maior no processo de construção, tempo este
que, na indústria, poderia ser otimizado com a utilização de softwares específicos de
encaixe, como por exemplo, o Audaces Encaixe, muito conhecido na indústria têxtil
brasileira.
Outro aspecto que merece ser destacado é que, por se tratar de pedaços de tecido, a
mistura de tecidos e matérias era inevitável, criando um desafio ao design, pelas
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diversas reações que cada tecido apresentava, na proposição de soluções criativas,
pois o intuito era aproveitar o máximo possível dos tecidos e aviamentos já existentes.
Ao longo da pesquisa, na construção das peças foi-se percebendo que, apesar do
trabalho se abastecer do mercado fast fashion na escolha das peças a serem
transformadas, e dos novos modelos propostos seguirem as principais tendências
internacionais, as peças perderam seu caráter de fast, quando foram recriados a partir
de novos critérios, processos metodológicos e técnicos.
A abordagem seguiu uma dinâmica muito mais compatível com a lógica slow onde o
design para, pensa e cria peças elaboradas, forradas, pensando de forma mais
consciente, em soluções criativas para utilizar as matérias primas já existentes,
transformando-as em peças mais sustentáveis.
E finalmente percebeu-se que ser sustentável nos dias de hoje, onde tudo em sua
volta te convida a consumir, não é tarefa fácil. Para suprir uma demanda de novos
consumidores que estão preocupados em consumir de forma consciente, é preciso que
o designer saia da zona de conforto e proponha novas possibilidades para a indústria
da moda.
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Recebido em 30/07/2015 e Aceito em 17/11/2015.
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Sustentabilidade de embalagens celulósicas: estudo do processo
difusivo de revestimento à base de filmes de quitosana com adição
de corantes naturais.
Sustainability cellulosic packaging: Study of diffusion coating process chitosan films
based with the addition of natural dyes.
Roberta Cardoso Fonseca, Mara Lúcia Ramalho, Arlete Barbosa dos Reis
Instituto de Ciência e Tecnologia, DEAD-Diretoria de Educação a Distância
{[email protected], [email protected], [email protected]}
Resumo. A utilização de corantes na indústria de embalagens é prática comum, já
que a cor e a aparência têm um papel importante na aceitação dos produtos pelo
consumidor. Em contrapartida, visando a sustentabilidade das embalagens de modo
geral, existe o mercado de substituição de polímeros sintéticos por polímeros naturais,
dando ênfase aos que podem ser utilizados como veículo para adição de outros
produtos, como os corantes naturais. O presente trabalho teve como objetivo um
estudo preliminar do coeficiente de difusão de diferentes soluções à base filmes de
quitosana, com adição dos corantes: Urucum, Clorofila e Antocianina, avaliando a
possibilidade de utilização desses filmes como revestimentos a serem aplicados em
embalagens celulósicas; Para tanto, foram realizadas análises preliminares como:
Análise visual; Espessura; Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV); Permeabilidade
ao Vapor D’água (PVA) e Coeficiente de Difusão.
Palavras-chave: biopolímero quitosana, corantes, coeficiente de difusão.
Abstract. The use of dyes in the packaging industry it is common practice since the
color and appearance have an important role in consumer acceptance of the products.
In contrast, targeting the sustainability of general packaging, there is the replacement
market of synthetic polymers with natural polymers, emphasizing that can be used as
a vehicle for adding other products, such as natural dyes. This work aimed to a
preliminary study of the diffusion coefficient of different solutions based chitosan films
with added colors: Urucum, chlorophyll and anthocyanin, the feasibility of using these
films as coatings to be applied to cellulosic casings; Therefore, preliminary analyzes
were performed as Visual analysis; Scanning Electron Microscopy (SEM), Water
Permeability Vapor (WVP) and Diffusion Coefficient.
Key words: chitosan biopolymer, dyes, diffusion coefficient.
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Vol. 5 n°. 3 – Dezembro de 2015, São Paulo: Centro Universitário Senac
ISSN 2179-474X
Portal da revista: http://www1.sp.senac.br/hotsites/blogs/revistainiciacao/
E-mail: [email protected]
Esta obra está licenciada com uma Licença Creative Commons Atribuição-Não Comercial-SemDerivações 4.0
Internacional
1. Introdução
As estimativas do mercado de biopolímeros são, em razão das diferentes definições
adotadas, bastante discrepantes. Destaque-se em particular o potencial de
crescimento dos biopolímeros. No período 2003 a 2007 houve um aumento na
capacidade de produção e no potencial técnico de substituição de plásticos
petroquímicos por bioplásticos. Dentre os biopolímeros, alguns se destacam como
mais atrativos após as modificações químicas, com introdução de cadeias contendo
grupos básicos, para que exerça ações em remoção de cátions e corante. Nos últimos
anos, os biopolímeros que têm despertado maior interesse têm sido a celulose, que
provém de várias fontes, e a quitina, que é proveniente de crustáceos, moluscos,
insetos, cogumelos e outros organismos.
A quitina é o segundo polissacarídeo mais abundante na natureza depois da celulose,
sendo o principal componente do exoesqueleto de crustáceos e insetos; sua presença
ocorre também em nematoides e parede celular de fungos e leveduras. Outra
característica da quitina é sua capacidade de obtenção de outros produtos, a partir de
reações químicas como, por exemplo, a quitosana, obtida a partir da desacetilação da
quitina. Os principais fatores que afetam tais reações químicas são: o grau de
desacetilação e, consequentemente, as características da quitosana obtida, que
consequentemente são reflexo de alterações diversas tais como, temperatura e tempo
de reação, concentração da solução do álcali, razão quitina/álcali, tamanho das
partículas da quitina e presença de agentes que evitam a despolimerização.
Dentre os grupos funcionais da quitosana, podemos citar o grupo das hidroxilas (OH)
que estão presentes na estrutura geral desses biopolímeros, mas a principal diferença
entre eles é a presença de grupos amino (NH2) na estrutura da quitosana. Dentre as
vantagens do uso do biopolímero quitosana no setor de embalagens, está a utilização
da matriz polimérica como revestimentos que podem ser utilizados em diversas áreas,
tais como a obtenção de embalagens inteligentes, que atuam como indicador das
características internas do produto embalado. A exemplo, podemos incluir as
embalagens celulósicas revestidas com soluções poliméricas compostas por
biopolímero + corantes e, em se tratando de corantes, visando a garantia de
sustentabilidade das embalagens obtidas, nada mais indicado que substituir os
corantes comumente encontrados no mercado, como os corantes sintéticos, elos
corantes naturais.
Os corantes naturais têm origem preferencialmente nos sucos e extratos vegetais
conhecidos, podendo ser também de origem animal. São em geral de baixo custo. Ao
serem isolados, deve-se ter o cuidado de não levar junto resinas ou substâncias que
atuam como purgantes intestinais. Esses pigmentos às vezes não toleram altas
temperaturas sem perder as tonalidades que lhes são características. É necessário, em
cozimentos obrigatórios a altas temperaturas, utilizar os corantes inorgânicos. Os
pigmentos de diferentes cores podem misturar-se entre si para dar tonalidades medis.
(SALINAS, 2002).
Os corantes derivados das sementes de urucum (Bixa orellana, L.) são extensivamente
utilizados na indústria alimentícia. Suas características peculiares como a que
possibilita a obtenção de corantes hidrossolúveis ou lipossolúveis a partir de pequenas
alterações nos processos de produção, foi um dos fatores do sucesso deste pigmento.
Observa-se que só recentemente, pouco mais de cinco anos, têm sido dedicados
esforços no estudo das características físico-químicas das diferentes estruturas de
carotenoides que participam do chamado corante de urucum. As clorofilas são os
pigmentos naturais mais abundantes presentes nas plantas e ocorrem nos cloroplastos
das folhas e em outros tecidos vegetais. Estudos em uma grande variedade de plantas
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caracterizaram que os pigmentos clorofilianos são os mesmos. As diferenças aparentes
na cor do vegetal são devidas à presença e distribuição variável de outros pigmentos
associados, como os carotenóides, os quais sempre acompanham as clorofilas (VON
ELBE, 2000). As antocianinas são compostos da família dos flavonóides e constituem
grupo de pigmentos responsáveis por grande parte das cores em flores, frutas, folhas,
caules e raízes de plantas (MARKAKIS, 1982).
Devido a versatilidade do biopolímero quitosana, em particular sua capacidade de
atuar como veículo na incorporação de diferentes aditivos, tais como: agentes
antiumectantes, antioxidantes, etc. Os experimentos aqui apresentados foram feitos a
partir da adição de corantes à quitosana. No intuito de avaliar a adição dos diferentes
corantes na formação da matriz polimérica de quitosana, optou-se por trabalhar com
os seguintes corantes: antocianina, urucum e clorofila. Neste trabalho foram testados
diferentes tipos de corantes, a fim de estudar o comportamento e características que
deram aos filmes de quitosana, dando ênfase ao processo difusivo, visando futura
aplicação em embalagens celulósicas, com vistas a abranger a sustentabilidade das
mesmas.
1 Fundamentação Teórica
1.1.Quitina
A Figura 1, ilustra a estrutura da quitina, que é insolúvel na maioria dos solventes
testados, predominam unidades de 2-acetamido-2-deoxi-Dglicopiranose enquanto que
a quitosana, é predominantemente formada por unidades de 2- amino-2-deoxi-Dglicopiranose é solúvel em soluções aquosas diluídas de ácidos orgânicos e
inorgânicos. (AZEVEDO et. al., 2007).
Figura 1 - Estrutura molecular da quitina
A quitina é separada de outros componentes da carapaça por um processo químico
que envolve as etapas de desmineralização e desproteinização das carapaças com
soluções diluídas de HCl e NaOH, seguida de descoloração com KMnO4 e ácido oxálico,
por exemplo. A quitina obtida, o biopolímero contendo grupos acetil (NHCOCH3), é
desacetilada com solução concentrada de NaOH, produzindo a quitosana. A quitosana
é um produto natural obtido da quitina de carapaças de crustáceos. (AZEVEDO et al.,
2007)
1.2.Quitosana
Por meio da desacetilação da quitina com álcalis, é possível obter a quitosana (Figura
2), podendo também estar naturalmente presente em alguns fungos, como aqueles
pertencentes aos gêneros Mucor e Zygomicetes. Este biopolímero possui uma
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estrutura molecular quimicamente similar à da celulose, diferenciando-se somente nos
grupos funcionais. O desenvolvimento de novos materiais baseados na quitosana, a
serem empregados em aplicações tecnológicas e biomédicas, é um campo de pesquisa
muito atraente, o que tem sido corroborado pelo grande número de publicações
científicas e patentes. (LARANJEIRA; FÁVERE, 2009).
Figura 2 - Estrutura molecular da quitosana
1.3.Filmes de Quitosana
Foram desenvolvidos, na última década, inúmeros estudos que visavam à produção e
caracterização de filmes biodegradáveis à base de polímeros naturais, como
quitosana. Em condição seca, os filmes de quitosana apresentam baixa permeação a
gases, inferiores aos medidos para PET ou PVC e a demais filmes de base biológica
como glúten e celulose.
Além disso, adicionalmente, alguns estudos tem mostrado que a permeação de CO 2 é
superior à de O2 o que pode vir a ser de interesse na confecção de embalagens com
atmosferas controladas (CHEN et al.,1996). Estudos reportados na literatura
apresentam que as propriedades mecânicas dos filmes de quitosana são influenciadas
pela massa molar do polímero e do ácido utilizado para formação das soluções
filmogênicas (ARVANITOYANNIS et al., 1998).. Outra característica abordada é que a
tensão na ruptura aumenta com o aumento da massa molar da quitosana devido à
formação das ligações de hidrogênio entre os grupos amino e hidroxila na formação
dos filmes.
1.4.Formação de Filmes de Quitosana
A formação dos filmes é influenciada pelo pH, força iônica, tipo de solvente (ácido),
adição de plastificante, sendo variáveis controladas de acordo com as propriedades
mecânicas e porosidade da membrana desejada (ARVANYTOYANNIS et al., 1998). Os
filmes de quitosana são resistentes, elásticos, flexíveis, de difícil rompimento e
oferecem barreiras extremamente boas para o oxigênio, mas possuem baixa barreira
ao vapor d água (BUTLER et al., 1996). Os filmes de quitosana têm sido normalmente
obtidos de maneira bem simples e rudimentar: o polímero é dissolvido em meio
apropriado, normalmente, em solução aquosa à base de ácidos fracos, e vertido sobre
uma superfície plana.
71
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1.5.Corantes
A utilização de corantes naturais requer o conhecimento químico de suas moléculas
para adapta-las às condições de uso em processos, embalagens e distribuição.
Atualmente permite-se o uso de sete corantes artificiais, por razões técnicas:
estabilidade, pureza, disponibilidade e superioridade tecnológica com relação aos
corantes naturais. Sua utilização é limitada por imposições legais, publicidade adversa
e interesse do consumidor por produtos naturais (ARAÚJO, 2004).
Os corantes naturais são divididos em três grupos principais: compostos heterocíclicos
com estrutura tetra-pirrólica; compostos de estrutura isoprenóide; e compostos
heterocíclicos contendo oxigênio. Além destes, existem outros grupos de pigmentos
também encontrados unicamente em vegetais: as betalaínas, que são compostos
nitrogenados; os taninos, que agrupam uma série de compostos de estruturas
extremamente variáveis; as quinonas e as xantonas. (BOBBIO & BOBBIO, 2003).
2.5.1.Antocianina
O termo antocianina é de origem grega (anthos, uma flor, e kyanos, azul escuro).
Após a clorofila, as antocianinas são o mais importante grupo de pigmentos de origem
vegetal (HARBORNE & GRAYER, 1988). Compõem o maior grupo de pigmentos
solúveis em água do reino vegetal e são encontradas em maior quantidade nas
angiospermas. (BRIDLE & TIMBERLAKE, 1997)
As antocianinas compõem o maior grupo de pigmentos solúveis em água do reino
vegetal segundo BRIDLE & TIMBERLAKE (1997) e são estudadas em todo o mundo
como agentes da coloração natural, sendo elas as responsáveis pelos tons
compreendidos desde a coloração vermelha até a coloração azul em muitas frutas,
legumes e hortaliças. Em solução aquosa, as antocianinas se encontram comumente
na forma de uma mistura de diferentes estruturas químicas em equilíbrio.
Naturalmente a coloração das antocianinas é diretamente influenciada pela
substituição dos grupos hidroxila e metoxila na molécula. Incrementos no número de
grupos hidroxila tendem a tomar a coloração azulada. Na direção contrária,
incrementos no número de grupos metoxilas aumentam a intensidade do vermelho
(LÓPEZ et al., 2007).
A principal desvantagem das antocianinas frente aos corantes sintéticos deve-se à
mudança de coloração decorrente de reações químicas dos produtos alimentícios, pois
as antocianinas possuem grupos cromóforos que são bastante sensíveis às alterações
de pH do meio, segundo estudo de. Por outro lado, é possível o aproveitamento dessa
desvantagem para atuação em embalagens inteligentes, indicadoras da alteração de
pH, por exemplo.
72
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2.5.2.Clorofila
As clorofilas são os pigmentos naturais mais abundantes presentes nas plantas e
ocorrem nos cloroplastos das folhas e em outros tecidos vegetais. Estudos em uma
grande variedade de plantas caracterizaram que os pigmentos clorofilianos são os
mesmos. As diferenças aparentes na cor do vegetal são devidas à presença e
distribuição variável de outros pigmentos associados, como os carotenóides, os quais
sempre acompanham as clorofilas (VON ELBE, 2000).
As clorofilas tendem a ser foto-oxidadas sob alta irradiação e, devido aos carotenóides
poderem prevenir a foto-oxidação das clorofilas, a relação entre as clorofilas e
carotenóides pode ser usada como um indicador potencial de perdas foto-oxidativas
causadas por fortes irradiações. As clorofilas são pigmentos verdes muito comuns em
legumes e em várias frutas.
Devido a sua cor e as propriedades físico-químicas, são também usadas como aditivos
para produtos alimentícios. Estes pigmentos são quimicamente instáveis e podem ser
alterados ou destruídos facilmente, modificando a percepção e a qualidade dos
produtos. Em geral, as clorofilas são relativamente instáveis e sensíveis à luz,
aquecimento, oxigênio e a degradação química.
A decomposição das clorofilas é afetada pelo pH dos tecidos. O pH básico torna a
clorofila mais estável ao calor, quando comparada ao pH ácido (3,0). Os íons positivos
minimizam a permeabilidade da membrana, que entra em equilíbrio com as cargas
negativas diminuindo, dessa forma, a degradação das clorofilas (VON ELBE, 2000).
Essa instabilidade da molécula pode alterar a sua cor, o valor comercial e as
qualidades nutritivas, levando também a uma impressão negativa do produto.
A clorofila a é mais suscetível à degradação oxidativa na presença de ácidos graxos
saturados quando comparada com ácidos graxos insaturados durante o aquecimento.
A presença de ácidos graxos saturados pode facilitar a formação de isômeros I e II da
clorofila a enquanto a presença de ácidos graxos insaturados pode facilitar a formação
de clorofila a’. A clorofila a é mais suscetível à degradação oxidativa e isomerização
que o β-caroteno na presença de ésteres de ácidos graxos, especialmente metil
estearato, durante aquecimento (LUI & CHEN, 1998). Por outro lado, é possível o
aproveitamento dessa desvantagem para atuação em embalagens indicadoras da
alteração de temperatura, por exemplo.
2.5.3.Urucum
O principal pigmento do urucum é o carotenóide bixina, substância solúvel em
gordura, mas insolúvel em água e, representa mais de 80% dos carotenóides totais
presentes na semente. (TAKAHASHI, 1987). Extraído do pericarpo de um arbusto
nativo do Brasil de outras regiões tropicais do planeta, o corante de urucum vem
sendo largamente utilizado em partes do mundo em escala industrial, por conferir
coloração atraente a uma extensa gama de produtos manufaturados. O extrato de
urucum é um produto industrial obtido pela remoção dos pigmentos da semente de
urucum (Bixa orellana L.) diluídos em solução oleosa. O extrato lipossolúvel contém
vários pigmentos coloridos, sendo a bixina o principal
2.6.Processo Difusivo
A difusão é um processo que depende do tempo, isto é, a quantidade de um elemento
que é transportado no interior de outro elemento é uma função do tempo. Faz- se
73
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necessário saber o quão rápido ocorre a difusão, ou seja, a taxa de transferência de
massa. Essa taxa é, com frequência, expressa como um fluxo de difusão (J), definido
como sendo a massa que está em difusão através e perpendicularmente a uma área
unitária de seção reta do sólido por unidade de tempo. Essa definição pode ser
matematicamente representada pela seguinte fórmula:
Onde,
A = Área,
= Diferencial relacionada por massa e tempo de difusão ocorrido.
2.6.1.Lei de Fick
Pela Lei de Fick, a massa da substância que passa através de uma sessão pela
unidade de tempo é proporcional ao gradiente de concentração na mesma direção.
Esta lei descreve o fluxo de um soluto em condições de equilíbrio, e pode ser
matematicamente representada pela seguinte equação:
Onde,
Ds = Coeficiente de difusão;
= Gradiente de concentração pela direção que se envolve o processo.
A partir da fórmula apresentada, é possível estudar os diferentes tipos de difusão. Pela
variação ou não do gradiente de concentração é possível determinar o estado. Quando
não há variação temos a difusão em estado estacionário ou permanente.
O sinal de negativo no fluxo na equação acima indica que o fluxo ocorre na direção
contrária à do gradiente de concentração, isto é, no sentido das concentrações altas
para as concentrações baixas.
Se combinarmos a Lei de Fick com a equação de conservação de massa, encontramos
a segunda lei de Fick, que descreve a difusão em estado não estacionário:
74
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Quando são especificadas condições de contorno que possuem um sentido físico, é
possível obter-se soluções para segunda Lei de Fick. Essas soluções são funções C =
f(x,t) que representam as concentrações em termos tanto da posição quanto do
tempo.
Para calcular o coeficiente de difusão dos filmes de quitosana, foi utilizada a seguinte
equação:
Onde,
a = Valor da constante que obtemos pela equação da reta y= ax + b;
D = Coeficiente de difusão (m²/s);
= 3,14 é a constante de Arquimedes ou número de Ludolph;
= Valor médio da espessura do filme.
2.7. Permeabilidade ao Vapor D’Água
Em decorrência do impacto ambiental gerado pelo uso contínuo de material inerte
oriundo exclusivamente de derivados de petróleo, houve o aumento de pesquisas
visando o desenvolvimento de filmes a base de biopolímeros, pois estes se
reincorporam mais rapidamente ao meio ambiente.
Os filmes biodegradáveis comestíveis elaborados a base de biopolímeros podem ser
consumidos juntamente com os alimentos, pois desempenham funções de suporte de
nutrientes, conservação, melhoria das características nutricionais e sensoriais dos
alimentos, elevando com isso a qualidade e validade comercial do alimento. Neste
contexto, os polissacarídeos apresentam-se como alternativa, pois são capazes de
formar matrizes poliméricas contínuas. (FARIAS, 2012)
De acordo com a ASTM E96-95 permeabilidade é a taxa de transmissão de vapor de
água por unidade de área através do filme, de espessura conhecida, induzida por um
gradiente de pressão entre duas superfícies específicas, de umidade relativa e
temperatura especificada (ASTM, E-96-00)
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A determinação foi feita utilizando cinco amostras de cada ensaio. A permeabilidade
ao vapor d’água (PVA) foi determinada nos filmes através da equação:
Onde,
∆m = corresponde a massa ganha (g);
Espessura = Média da espessura de cada amostra (mm);
∆t = diferença de tempo de realização da análise (h);
Δp = diferença de pressão parcial através do filme (KPa).
3.
Sustentabilidade – Embalagens celulósicas
O desenvolvimento que não degrada a natureza para satisfazer às necessidades da
geração presente e, nesse sentido, não compromete as necessidades das gerações
futuras é também definido como sustentabilidade (WCED, 1987). Desse modo, podese concluir que um dos princípios básicos de sustentabilidade, é a visão de longo
prazo, uma vez que os interesses e a sobrevivência das futuras gerações dependem de
ações e iniciativas presentes.
O conceito de sustentabilidade, devido à sua amplitude não deve ser limitado à visão
tradicional, considerando também as dimensões no âmbito social, econômico, cultural
e ecológico. A sustentabilidade ecológica envolve medidas para reduzir o consumo de
recursos e a produção de resíduos, introduzindo o uso de tecnologias limpas e
poupadoras de recursos naturais, além de definição de regras que permitam uma
adequada proteção ambiental (SACHS, 1998).
Assim sendo, desde a conscientização e preocupação das as empresas com o meio
ambiente, foi dado início à adequação a essa responsabilidade conjunta, com base nos
comprovados e possíveis ganhos em competitividade, as indústrias atualmente vêm
incentivando projetos e processos com produtos voltados ao desenvolvimento
sustentável pelo ganho econômico, social e ambiental.
Seguindo esses preceitos, a fim de se adequar ao uso coerente de recursos
renováveis, as indústrias têm realizado o estudo do ciclo de vida de seus produtos por
intermédio de ferramentas como gerenciamento sustentável e avaliação do ciclo de
vida. Ter o conhecimento da origem das matérias-primas utilizadas, o destino dos
produtos fabricados, os subprodutos e os resíduos de processo, bem como os efeitos
das emissões geradas para o ambiente, nada mais é que, ter o conhecimento do ciclo
de vida dobem produzido e consumido (MOURAD et al., 2002).
No âmbito deste contexto a indústria de embalagem, injustamente penalizada pelas
questões ambientais no início da década de 90 (MADI et al., 1998), apresenta hoje,
diferenças significativas quanto às necessidades e as prioridades das questões
ambientais, como é o exemplo da reciclabilidade das embalagens metálicas,
embalagens flexíveis; o reaproveitamento e criação de novos produtos oriundos das
embalagens laminadas e o uso de energia renovável no processo produtivo das
embalagens celulósicas.
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3.1.O Ciclo do Papel
Para atender ao quesito Sustentabilidade, surgem materiais recicláveis de baixo custo
e baixo impacto, tanto na produção como no descarte. É possível obter resultados
impressionantes com materiais muito simples, obtidos diretamente da natureza, sem
ofendê-la. Infelizmente, materiais dela obtidos de forma sustentável ainda são pouco
utilizados, apesar do grande diferencial que com eles se pode criar.
O futuro para a indústria de papel reflete segurança pois sua matéria-prima é
renovável e seu produto é reciclável. Isto faz da indústria de papel candidata ideal
para um estudo demonstrativo de suas práticas como parte interessada em realizar
mudanças. Se de um lado, a indústria de papel é a principal consumidora de energia,
também difere das demais indústrias gerando suas próprias necessidades de energia,
queimando subprodutos (resíduos, etc.), gerando fonte de energia renovável e não
contribuindo com as emissões de dióxido de carbono.
3.2.O Ciclo do Quitosana
A quitosana é um polissacarídeo que exibe numerosas propriedades físico-químicas e
biológicas, encontrando aplicações em diferentes campos: agricultura, cosméticos,
alimentos, bioadesivos, filmes ou coberturas, hidrogéis, micropartículas e outros
(DODADE et al., 1999), devido à sua biodegradabilidade, biocompatibilidade e
bioatividade (PETER, 2002a).
A quitosana é produzida seguindo uma seqüência de processos tais como:
desproteinização, demineralização e desacetilação (Figura 5), sua massa molar
depende das condições do processo de desacetilação (Peter, 2002a).
Devido à sustentabilidade já conhecida do papel, e, com base no ciclo de vida do
biopolímero quitosana, é possível afirmar que a aplicação de revestimentos à base do
polímero natural quitosana apresenta-se como uma alternativa potencial à
substituição de polímeros sintéticos (Figura 3).
77
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Figura 3 – Ciclo de vida da quitosana
Fonte: Reis, A.B.(2010)
4.
Objetivo
Neste trabalho foram testados os corantes: antocianina, clorofila e urucum, a fim de
estudar o comportamento e características que deram aos filmes de quitosana, dando
ênfase ao processo difusivo, visando futura aplicação em embalagens celulósicas como
diferentes indicadores da qualidade dos produtos embalados, com vistas a abranger a
sustentabilidade das mesmas.
5.
Material e Método
5.1.Material
Para a preparação dos filmes, foram utilizados os seguintes materiais:


Quitosana da marca Polymar;
Ácido acético da marca Shynth;

Placas de acrílico com dimensões 13,5cm x 3,5 cm;

Corante natural de Clorofila C-10.000P-WS-AP da marca CHR HANSEN;

Corante de Urucum A-720-WS-AP da marca CHR HANSEN;

Corante de Antocianina AC 12r WSP da marca CHR HANSEN.
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5.2.Método
Para produção dos filmes utilizados no presente trabalho foram preparadas quatro
diferentes formulações, alternando- se os corantes, Urucum, Clorofila e Antocianina.
Os filmes tratados aqui como filme- padrão, ou seja, os filmes produzidos a partir da
solução de quitosana(4%), foi utilizada a sigla FQ. Para os filmes contendo os
diferentes corantes, foi acrescido à solução padrão, 0,8% em cada solução dos
corantes, Antocianina, Clorofila e Urucum . Os corantes foram diluídos em água e
acrescidos à solução filmogênica de quitosana, separadamente, originando as siglas
FQA, FQC e FQU, respectivamente (Tabela1).
Tabela 1 - Siglas e composição das amostras de filmes de quitosana.
Quitosana
Antocianina
Clorofila
Urucum
(%)
(%)
(%)
(%)
FQ
4
-
-
-
FQU
4
-
-
0,8
FQC
4
-
0,8
-
FQA
4
0,8
-
-
Siglas
5.2.1. Filmes de Quitosana
Depois de prontas, as soluções foram levadas para agitação durante 60 minutos, para
completa homogeneização das mesmas. Os procedimentos deram continuidade,
espalhando 25 ml em placas planas retangulares de acrílico de dimensões 13,5 x 3,5.
Estando uniformemente distribuídas, as amostras foram encaminhadas para uma
estufa com temperatura controlada em torno de 35°C. O tempo de secagem dos filmes
foi de aproximadamente 48 horas. Foi medida, com ajuda de um micrometro a
espessura em cinco pontos aleatórios e feito uma média desses valores para
determinar a espessura.
A umidade dos filmes foi retirada a partir da exposição dos mesmos em um
dessecador durante 120 horas com sílica gel. Antes da utilização para tal processo, a
sílica gel que foi submetido a temperaturas de 100° em uma estufa, durante cerca de
40 minutos para chegar às condições necessárias. Logo em seguida os filmes foram
colocados em outro dessecador com uma solução saturada de cloreto de sódio (NaCl),
o qual teve umidade controlada de aproximadamente 80%. As amostras foram
pesadas com intervalos de 2 horas, durante doze horas consecutivas. E depois foram
pesadas em intervalos de 24 horas até completarem 168 horas de observação, tempo
em que ocorreu a saturação das amostras.
5.2.2. Permeabilidade ao Vapor D’água
Para análise da Permeabilidade ao Vapor D’Água, as amostras foram colocadas como
forma de tampas, em recipientes contendo sílica gel, seca, e vedadas com veda rosca
para que não houvesse nenhum outro modo de entrada de umidade, a não ser pela
própria amostra. Feito isso, as amostras foram levadas a um dessecador com solução
aquosa de NaCl, para que obtivesse uma maior umidade do ambiente. Os recipientes
foram pesados, com intervalos de 24 horas, durante 168 horas, para que a partir da
relação de massa seja calculado o teor de umidade para cada amostra.
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6.
Resultados e Discussão
6.1. Análise Visual – Fotografia comum
No intuito de ilustrar as características das amostras de filmes de quitosana com e
sem adição de corantes, foram tiradas fotos em câmara digital comum de 14pixels das
amostras FQ, FQA, FQC e FQU Foi possível verificar as características básicas de cada
tipo de filme utilizado na execução do presente trabalho. Nas fotos das amostras FQ,
foi possível constatar aparência transparente, levemente amarelada e resistência
comum aos filmes de quitosana(Figura 4a). Nas fotos tiradas das amostras FQA, foi
possível verificar aparência quebradiça (Figura 4b). As figuras 4c e 4d, ilustram
características das fotos das amostras FQC e FQU, respectivamente, ambas
apresentaram características similares como homogeneidade da matriz filmogênica
formada, resistência e coloração característica a dos corantes utilizados durante sua
composição.
6.2. Microscópia Óptica
A análise de microscopia óptica foi realizada utilizando microscópio óptico da marca
Bioval, utilizando-se ampliação de 10X das amostras de filmes de quitosana com e
sem adição de corantes. Foi possível observar, além das diferentes colorações, os
diferentes rearranjos das estruturas das amostras FQ, FQA, FQC e FQU (Figuras 5a,
5b, 5c e 5d), respectivamente.
Figura 4 – Fotos tiradas com câmera comum
Figura 4a - FQ
Figura 4b - FQA
Figura 4c – FQC
Figura 4d - FQU
Fonte: autor
Figura 5 – Fotos tiradas em microscópio óptico – ampliação de 10X
Figura 5a - FQ
Figura 5b - FQA.
Figura 5c - FQC.
Figura 5d - FQU.
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6.3. MEV
A análise de MEV foi realizada num equipamento de bancada do modelo TM 3000
Tabletop Microscope da marca HITACHI e as micrografias foram feitas nas ampliações
de 200, 500 e 1000 vezes. De acordo com a Figura 6, foi possível verificar a
homogeneidade das soluções filmogênicas, de forma condizente com as diferentes
colorações dos corantes utilizados e homogeneidade das soluções obtidas. As Figuras
6a, 6b e 6c ilustram a conformidade na formação da matriz polimérica obtida nos
filmes produzidos à base de quitosana (FQ). De forma semelhante, foi apresentado o
comportamento das amostras de filmes de quitosana com adição do corante
antocianina, de modo que os riscos observados, foram originados do suporte plástico
utilizado para a deposição da solução filmogênica, antes de submetidas ao processo de
secagem, porém, na ampliação de 1000X, é possível confirmar a homogeneidade da
solução obtida nas Figuras 6d, 6e e 6f. As fotos de MEV das amostras obtidas a partir
dos filmes compostos por quitosana contendo o corante clorofila, mostraram pontos de
irregularidades ilustradas pelos diferentes tons de coloração obtidos durante o período
de secagem, o que evidenciou uma não homogeneidade da solução obtida conforme
ilustram as Figuras 6g, 6h e 6i. Já as amostras de filmes de quitosana com adição de
urucum ilustraram maior homogeneidade na formação da matriz polimérica, de acordo
com as Figuras 6j, 6k e 6l.
Figura 6 – MEV das amostras de filmes de quitosana
Figura 6a - FQ 200 X
Figura 6d - FQA 200 X
Figura 6g - FQC 200 X
Figura 6j - FQU 200 X
Figura 6b - FQ 500 X
Figura 6e - FQA 500 X
Figura 6h - FQC 500 X
Figura 6k - FQU 500 X
Figura 6c - FQ 1000 X
Figura 6f - FQA 1000
X
Figura 6i - FQC 1000
X
Figura 6l - FQU 1000 X
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6.2. Análise da Permeabilidade ao Vapor D’Água
Inicialmente apresentaram um determinado peso, que variou conforme o
desenvolvimento do processo, de secagem em sílica e de dessecação com controle de
umidade.
Os resultados foram avaliados a partir da média obtida da análise de PVA realizada
com dez repetições de cada amostra de filmes de quitosana com e sem adição de
corantes. A Tabela 3 ilustra que não houveram diferenças estatisticamente
significativas entre as amostras FQA e FQU. De modo que, as amostras dividiram-se
em três grupos diferenciados, considerando-se a permeabilidade em ordem crescente,
como: grupo I= amostras FQ; grupo II= FC; grupo III= FQA e FQU.
Tabela 3 – Permeabilidade ao vapor d’água de filmes de quitosana com e sem adição de
corantes (g água. m-2.dia-1)
Permeabilidade
Amostras
ao vapor d’água
(g água. m-2.dia-1)
FQ
0,31485
FQA
0,6067
FQC
0,42041
c
FQU
0,64263
b
a
b
Nota: letras diferentes na mesma coluna representam diferença significativa (p>0,05) entre as
médias obtidas pelo teste de Tukey
6.3. Análise do Coeficiente de Difusão
Os valores obtidos através da análise do coeficiente de difusão ilustram que houveram
diferenças estatisticamente significativas entre as amostras FQ e FQU, de acordo com
análise feita pelo teste de Tukey, realizado utilizando-se o programa Statística, versão
7.0. Assim, sendo, a capacidade de difusão segue a ordem crescente de acordo com a
disposição das amostras ilustradas na Tabela 4.
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Tabela 4 – Coeficiente de difusão de filmes de quitosana com e sem adição de corantes
Coeficiente de difusão
(m²/s)
Amostras
FQ
-4,07E-06
FQA
6,11E-04
b
FQC
6,87E-05
b
FQU
1,28E-04
c
a
Nota: letras diferentes na mesma coluna representam diferença significativa (p>0,05) entre as
médias obtidas pelo teste de Tukey
7.
Conclusões
A partir das análises, pode-se concluir que, as amostras de filmes de quitosana com
adição do corante Clorofila, apresentaram coeficiente de difusão e permeabilidade ao
vapor d’Água aproximado ao dos filmes obtidos a partir da solução-padrão (FQ). Assim
sendo, tais amostras, se mostraram eficientes quanto à retenção de vapor d’água,
podendo, após de serem submetidos a outras análises, mais aprofundadas, serem
utilizados como revestimento em embalagens celulósicas.
As amostras de filmes de quitosana adicionados do corante Antocianina, embora tenha
apresentado coeficiente de difusão e Permeabilidade ao Vapor D’Água, menores que os
filmes de quitosana adicionados do corante Urucum, visualmente demonstraram
propriedades mecânicas frágeis, num comportamento quebradiço.
Partindo do pressuposto de que o presente trabalho visou apenas o intuito de
relacionar os filmes de quitosana com os filmes de quitosana adicionado aos corantes
urucum, clorofila e antocianina.
Donde pode- se concluir que a aplicação dos filmes de quitosana com adição dos
corantes, Urucum, Clorofila e Antocianina, devem variar de acordo com a necessidade
da aplicação, exigindo, portanto, estudos mais aprofundados.
8.
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Recebido em 03/08/2015 e Aceito em 17/11/2015.
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Estudo de alternativas para melhoria do desempenho energético
de uma edificação comercial em São Paulo
Paper template for Revista Iniciação: Study of alternatives for the energy efficiency
improvement of a commercial building in São Paulo
Thiago dos Santos Ferreira, Anarrita Bueno Buoro
Universidade Cidade de São Paulo (UNICID) / Instituto Brasileiro de Pós-Graduação (INBEC)
MBA em Construções Sustentáveis, Pós-Graduação Lato Sensu
{[email protected], [email protected]}
Resumo. Diante da importância de se projetar e reabilitar edificações na busca da
redução do consumo de energia, este trabalho concentrou-se em avaliar diversas
estratégias que pudessem reduzir o dispêndio de energia de um determinado edifício
comercial situado em São Paulo, capital. Como objeto de estudo, foi escolhido um
edifício existente e representativo dentro do contexto imobiliário do município para
estudar as propostas de melhoria de desempenho energético. Tal análise foi efetuada
levando em conta técnicas comerciais utilizadas com frequência no mercado
imobiliário, com o auxílio de um software paramétrico de simulação. As informações
inseridas neste programa foram levantadas in loco e pesquisadas em normas. Em
consonância com os dados climáticos, um cenário base foi estabelecido para que,
posteriormente, novos cenários com estratégias de melhoria pudessem ser aplicados
ao estudo de caso. Com base nos cenários obtidos a partir das simulações das
estratégias, avaliaram-se os impactos no consumo de energia anual. Para cada
proposta, examinaram-se as qualidades e vulnerabilidades para que o produto final
tivesse a melhor relação custo-benefício. O somatório das melhores estratégias gerou
uma economia de 21,21% no consumo de energia da edificação.
Palavras-chave: Eficiência energética, simulação termo-energética, retrofit,
desempenho térmico, edificações comerciais.
Abstract. Bearing in mind the importance to design and refurbish buildings with low
impact and energy consumption, this work concentrated on evaluating various
strategies that could mitigate and reduce the energy expenditure of a certain building.
As for the case study, a commercial building that was representative within the real
estate market of the city was chosen. This analysis was performed taking into account
techniques used frequently in the retrofit market, with the aid of a parametric
simulation software. The input data used in the software was collected with the
facilities managers of the case study and researched in international regulations. In
line with the climatic data, a base scenario was established, so that the improvement
strategies were able to be simulated. Based on the scenarios obtained from the
simulations of the strategies proposed, the impacts on annual energy consumption as
well as on the lighting and air conditioning systems were evaluated. The techniques
were examined in order to elucidate the qualities and vulnerabilities of each of them.
The sum of the best strategies generated savings of 21.21% in the building energy
consumption.
Key words: Energy efficiency, parametric simulation, retrofit, thermal performance,
commercial buildings.
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Edição Temática em Sustentabilidade
Vol. 5 n°. 3 – Dezembro de 2015, São Paulo: Centro Universitário Senac
ISSN 2179-474X
Portal da revista: http://www1.sp.senac.br/hotsites/blogs/revistainiciacao/
E-mail: [email protected]
Esta obra está licenciada com uma Licença Creative Commons Atribuição-Não Comercial-SemDerivações 4.0
Internacional
1. Introdução
O desenvolvimento das sociedades, principalmente a partir da Revolução Industrial,
sempre esteve ligado ao alto consumo de recursos energéticos. A forma desmedida
com que esses insumos foram sendo consumidos, desde o crescimento técnico
cientifico da humanidade, tem gerado graves problemas ambientais, como o
aquecimento global. Segundo Melo (2007), dentre as consequências do aquecimento
global está o aumento do nível dos oceanos em razão do derretimento das geleiras, o
crescimento e o surgimento de desertos, assim como o aumento de ciclones. Muitos
pesquisadores afirmam que este evento decorre principalmente da emissão de gases
poluentes derivados da queima de combustíveis fósseis, os quais ainda são utilizados
como fonte de energia em diversos países desenvolvidos.
Para Serafin (2010), o crescente aumento no consumo de energia elétrica é reflexo do
crescimento econômico de um país e dos hábitos de vida contemporâneos. Esse
crescimento tende a aumentar, se considerarmos que a maior parte da população
mundial viverá nos grandes centros urbanos nas próximas décadas. Devido às
condições hidrológicas desfavoráveis do Brasil em 2013, houve uma redução na oferta
de energia hidráulica nesse período. Esse cenário, juntamente com o aumento do
consumo final de eletricidade do país, de 3,6%, com destaque para os setores
residencial e comercial, favoreceu a expansão da geração térmica, especialmente das
usinas movidas a carvão mineral (EPE 2014).
Ao redor do mundo, estima-se que 30% a 40% da energia primária seja utilizada em
edificações, fator que evidencia a construção civil como um setor chave para promover
um desenvolvimento sustentável e com baixo consumo energético (UNEP, 2007).
Sendo assim, a realidade energética e ambiental demonstra a necessidade de tanto a
produção quanto a operação dos edifícios serem adaptadas às novas regulamentações
energéticas e ambientais (SANTANA, 2006). A redução do consumo energético através
da renovação de edificações existentes é uma das opções mais atraentes e de baixo
custo para diminuir as emissões de dióxido de carbono (CE, 2012). O fomento para
esse tipo de atividade tem crescido de forma evidente nos países da União Europeia,
já que segundo o relatório da ENFORCE (European Network for the Energy
Performance Certification of Buildings, 2010), as edificações utilizam 40% da energia
final do bloco.
Segundo Guzenski (2011), do mesmo modo que a economia e a sociedade avançam,
as edificações deveriam ser melhoradas para suportar a possível demanda de energia
excedente causada pela má qualidade das envoltórias e das construções em si. O
desenho arquitetônico tem a responsabilidade de ser sempre a peça chave capaz de
minimizar a demanda energética para resfriamento e aquecimento das edificações.
Frente a este cenário, o arquiteto e outros profissionais ligados à área da construção
civil devem desempenhar a função de projetar edificações com elevada performance
energética, assegurando qualidade e conforto aos usuários. Uma análise
fundamentada das propriedades físicas dos materiais e do tipo de clima no qual a
edificação será inserida pode gerar grandes ganhos de eficiência (MELO 2007).
Com o crescente aumento de normas de eficiência energética no mundo, assim como
das certificações ambientais no Brasil, principalmente no setor de edifícios
corporativos e comerciais, tais como AQUA-HQE, LEED, PBE EDIFICA, entre outros,
abre-se um precedente para se buscar edificações mais eficientes. Em virtude da alta
competitividade do mercado, principalmente na região de São Paulo, os proprietários
de prédios existentes tendem a reavaliar as suas gestões e até mesmo investir em
uma renovação para manterem seus patrimônios atualizados e atrativos.
Em razão desta demanda, ferramentas computacionais para auxiliar os projetistas e
tomadores de decisão vêm sendo utilizadas com frequência. Os softwares de
simulação permitem estimar o consumo de energia de uma edificação existente de
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acordo com as suas características, bem como a partir da proposição de novas
soluções tecnológicas e arquitetônicas, visando a melhoria do seu desempenho
energético. Considerando este contexto histórico e mercadológico, esta pesquisa busca
estudar o potencial de conservação de energia de uma edificação comercial, localizada
em São Paulo, através da utilização de um software paramétrico de simulação termoenergética.
2. Objetivo
Criar e avaliar estratégias para diminuir o consumo energético de um edifício
comercial na cidade de São Paulo, considerando a viabilidade e tecnologia adequada
para a implantação de cada uma delas. Para isto, os dados do projeto e ocupação
foram analisados e embasaram as propostas de substituição de materiais e
tecnologias, buscando um entendimento plausível e factível de como elas poderiam
aprimorar a performance energética do estudo de caso a partir da simulação termoenergética destas variáveis.
3. Metodologia
Estabeleceu-se uma metodologia para se avaliar a edificação sob a ótica do consumo
energético através do levantamento das informações técnico-construtivas, de
entrevistas com os atuais administradores do edifício, projetistas responsáveis pelos
projetos complementares, e através de simulações termo-energéticas utilizando
softwares computacionais específicos para determinado fim. A primeira etapa da
pesquisa foi iniciada através de registros fotográficos da edificação, de seus espaços
interiores e instalações. Posteriormente, entrevistou-se a equipe responsável pela
operação do edifício a fim de entender o seu funcionamento, seguido pelos indivíduos
responsáveis pelo sistema de automação. Dados sobre o consumo de energia,
funcionamento dos equipamentos, modus operandi dos sistemas e projetos foram
coletados com estas equipes e alguns dos projetistas da edificação. Uma unidade,
localizada no quarto pavimento, também foi visitada de modo a realizar uma análise
real da iluminação natural do projeto. A Figura 1 elucida o procedimento aplicado
neste trabalho.
Figura 1. Fluxograma da metodologia aplicada a pesquisa.
Fonte: Elaboração própria.
Ferramentas de avaliação energética
O software Ecotect, da empresa Autodesk, é uma ferramenta de análise que permite
aos projetistas verificar os diferentes níveis de insolação sobre uma edificação, entre
outras funções. Optou-se pela utilização deste programa para simular o impacto das
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edificações localizadas no entorno imediato da torre, pois o mesmo combina funções
de análise complexas e uma interface interativa. Todos os edifícios lindeiros foram
modelados através deste programa computacional a fim de verificar o sombreamento
promovido por eles, e de que forma esse fator afeta no consumo de energia da
edificação em estudo. Por sua vez, O software Design Builder é um avançado
dispositivo gráfico que foi especialmente desenvolvido na Inglaterra para rodar
simulações termo-energéticas com base na plataforma Energy Plus. O software foi
escolhido devido a sua interface didática e extensa biblioteca de materiais. As
simulações de todos os cenários foram criadas a partir deste programa.
4. Avaliação do edifício construído
Aspectos gerais
O objeto de estudo é uma edificação comercial localizada próxima a região da Berrini,
Zona Sul de São Paulo, conforme Figura 2. A torre foi projetada em 2001 e teve sua
operação iniciada em 2003. Possui 16 andares comerciais, com 15 pavimentos tipo, os
quais possuem 865m² de área privativa cada e uma cobertura de e 1.080m² com
mezanino. Há um espaço disponível no térreo para um restaurante e uma loja, a qual
está desocupada neste momento. O teatro localiza-se no 1º subsolo e possui uma área
total de 780m². A loja localiza-se fora do corpo principal do edifício dispondo de uma
área de 450m². Por fim, a área reservada para o restaurante e eventos tem 441m²,
com pé-direito triplo e acesso independente. Há também cinco subsolos para
acomodar o estacionamento e os serviços de infraestrutura, tais como grupo gerador,
reservatórios, casas de máquinas, transformadores e depósitos.
Figura 2. Localização do objeto de estudo.
6
Figura 3. Planta baixa tipo.
2
1
5
4
3
Fonte: Elaboração própria sobre imagem do Google Earth.
Fonte: Elaboração própria.
O entorno imediato é composto por um complexo de edifícios comerciais, cujas alturas
são iguais ou maiores do que da torre estudada. Tendo em vista essa situação, os
edifícios lindeiros foram modelados a fim de verificar a incidência do sombreamento
promovido por eles sobre as edificações vizinhas, as quais afetam consideravelmente
a incidência solar sobre a edificação em estudo, já que a mesma se encontra
circundada por obstruções em todas as orientações.
O diagrama solar da Figura 4a, refere-se a fachada nordeste, azimute 18º, onde
encontra-se o acesso a torre. O sombreamento dos edifícios vizinhos afeta
principalmente os meses mais frios, no solstício de inverno, das 9h às 16h, onde a
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radiação pode ser necessária para o aquecimento dos ambientes, dependendo das
condições de ocupação e dos ganhos internos em cada conjunto.
A Figura 4b, enfatiza a baixa incidência de sol sobre a fachada de azimute 72º,
indicando que a altura e disposição das torres 1,2 e 6 impactam diretamente no nível
de iluminação dos pavimentos. É importante ressaltar que a torre 6 possui a fachada
espelhada, portanto durante alguns períodos da tarde, dependendo da posição e
orientação da janela, é possível receber radiação solar indireta.
A Figura 4c ilustra que há incidência solar direta apenas entre Setembro e Novembro
na fachada sul, azimute 162º, no intervalo de tempo entre 13h e 18h. Por fim, a
fachada de azimute 108º, Figura 4d, onde situam-se as janelas dos halls dos
elevadores, recebe um bom nível de radiação durante as primeiras horas da manhã.
Entretanto, a sua proporção é diminuta e não influencia de forma significativa no
consumo de energia do edifício.
Figura 4. Sombreamento das fachadas principais.
Fonte: Elaboração própria com software Ecotect.
Parâmetros da modelagem do edifício em software paramétrico de
simulação
Com base no levantamento dos dados atuais do edifício, o mesmo foi modelado no
software de simulação termo-energética. As variáveis consideradas encontram-se a
seguir.
Materiais e estrutura
Os materiais que compõem a edificação (Tabela 1) foram extraídos do levantamento
in loco e do manual do usuário fornecido pela empresa que opera a edificação. As
paredes externas são constituídas por um revestimento de granito na face externa,
uma camada de ar, concreto e reboco interno pintado. O sistema de entrepiso é
composto por forro de gesso, uma espessa camada de ar, laje de concreto e piso
elevado. A cobertura da última laje é formada por um forro de gesso, uma camada de
ar, laje de concreto e uma camada de regularização.
Tabela 1. Características térmicas dos materiais.
Elementos
Espessura
(cm)
Transmitância térmica U
(W/m².K)
Resistência térmica R
(m².K/W)
Parede externa
31
2.10
0.475
Parede interna
19
1.24
0.80
Piso intermediário
119
0.78
1.27
Cobertura
7
1.67
0.60
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Propriedades térmicas do vidro instalado
Os vidros das esquadrias externas são do tipo laminado refletivo na cor azul
acinzentada, espessura total de 9 mm (vidro metalizado de 4 mm + 1 PVB incolor de
0,38 mm + vidro cristal incolor de 5 mm). Através de uma entrevista com o
fabricante, constatou-se que esse tipo de vidro não é mais fabricado, portanto os
valores das propriedades térmicas foram estimados pelo próprio fornecedor, de acordo
com a Tabela 2.
Tabela 2. Características térmicas dos materiais.
Tipo de vidro
Laminado
controle solar
Espessura
(mm)
Transmitância
térmica U
(W/m².K)
Transmissão
luminosa
Fator solar
(SHGC)
9
5.70
29%
37%
Características dos sistemas de ar condicionado e iluminação
O sistema de ar condicionado que atende aos conjuntos comerciais é do tipo expansão
indireta, composto por três Chillers com condensação a ar, capacidade de 192,5 TR
cada, com coeficiente de performance (COP) de 2,92. A distribuição do ar nos
pavimentos tipo acontece através de dois fan-coils, que atendem aos dois conjuntos
comerciais, separadamente. Ambos são controlados pela automação predial e dotados
de variadores de frequência. O Projeto original de luminotécnica previu, para o
ambiente principal de cada unidade, a instalação de lâmpadas do tipo fluorescente
tubular T8. Para os ambientes de transição, assim como banheiros e copa, o projeto
pressupõe a colocação de lâmpadas fluorescentes compactas.
Cargas internas da edificação
Para a carga de iluminação adotou-se a taxa de 12 W/m², com fração radiante igual a
37 % e fração visível (eficiência da lâmpada) de 18 %, com base nas recomendações
da ASHRAE (2005). Para a carga de equipamentos adotou-se a taxa de 16 W/m² com
fração radiante de 30 %, de acordo com a ASHRAE (2005). O valor de densidade de
ocupação utilizado foi de 0,10 pessoas/m², o mesmo adotado pelo projetista de ar
condicionado para efetuar os cálculos da demanda de resfriamento dos ambientes
internos. A taxa de infiltração é um parâmetro difícil de ser medido ou adquirido. Com
isso utilizaram-se dados extraídos da norma ASHRAE (2005). O valor empregado foi
de 0,50 ACH (Air Changes per Hour).
Padrão de uso
O valor de padrão de uso adotado para o funcionamento da edificação foi de 10h. Este
padrão condiz com os horários de ocupação convencionais de uma edificação
comercial durante a semana, sendo o horário inicial das atividades às 8h e o final às
18h. Não foi considerada nenhuma ocupação para os finais de semana. A Tabela 3
resume os parâmetros utilizados na simulação.
Tabela 3. Parâmetros utilizados na simulação termo-energética da edificação em estudo.
Parâmetro
Valor adotado
Clima
São Paulo – SP
Padrão de ocupação
10 horas (8h às 18h)
Densidade de carga de equipamentos
16 W/m² (ASHRAE)
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Densidade de carga de iluminação
12 W/m² (ASHRAE)
Infiltração
0,5 ACH (Air changes per hour)
COP (Coeficiente de performance) do sistema de
ar condicionado
2,92
Análise dos resultados simulados: condição atual do consumo de
energia
Os consumos anuais obtidos através da
simulação
relacionados
à
iluminação,
equipamentos e ar condicionado foram de
360,87MWh, 481,16MWh e 371,87MWh,
respectivamente. O percentual de cada um
dos sistemas em relação ao consumo anual de
energia é de 30% para iluminação, 40% para
equipamentos e 31% para o ar condicionado
(Figura 6). Possivelmente, o consumo de
energia reduzido do ar condicionado com
relação ao total, se comparado a bibliografia
estudada, é devido ao sombreamento das
fachadas, que como apresentado na Figura 4,
reduz significativamente o ganho de calor pela
envoltória.
Figura 6. Consumo de energia por usos
finais do modelo simulado do estudo de
caso.
Na Figura 7 observa-se o gráfico de consumo
em kWh/m² no decorrer do ano. O edifício
Fonte: Elaboração própria.
apresenta um consumo anual real de energia,
referente as áreas ocupadas, de 1213,9 MWh
ano, ou 98,97 kWh/m²/ano. É perceptível a redução do consumo durante o período de
temperaturas mais amenas (junho, julho e agosto), apesar do sistema de ar
condicionado ser acionado com menor frequência e provavelmente com temperaturas
de setpoint mais elevadas, se comparadas com os meses mais quentes.
Figura 7. Consumo de energia do estudo de caso no ano de 2002.
Fonte: Elaboração própria com dados de saída do programa Design Builder.
Neste ínterim, analisou-se também o comportamento térmico dos fechamentos opacos
e translúcidos (Figura 8). O fluxo energético, demonstrado na Figura 8, analisado em
um ano típico, sugere que há mais perda de energia do que ganho através dos
materiais instalados. Percebe-se que os vidros contribuem de forma significativa,
tanto no sentido de perda de energia, de maio a julho, quanto no sentido de ganho
energético, durante os meses de janeiro e fevereiro.
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Figura 8. Balanço térmico do estudo de caso no ano de 2002.
Fonte: Elaboração própria com dados de saída do programa Design Builder.
Ao analisar os ganhos internos ao longo do ano (Figura 9), percebe-se que as cargas
internas, que não dependem das condições climáticas, contribuem de forma
expressiva para o consumo energético.
Figura 9. Ganhos internos do estudo de caso no ano de 2002.
Fonte: Elaboração própria com dados de saída do programa Design Builder.
5. Avaliação dos cenários para melhoria do desempenho energético
Substituição dos vidros
O tipo de vidro pode elevar ou diminuir o consumo de uma edificação radicalmente.
Sendo assim, analisaram-se diversas composições de vidro de modo a efetuar um
comparativo. Os dados dos vidros foram adquiridos através de diferentes fabricantes e
ilustram as diversas composições possíveis (Tabela 4).
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Tabela 4. Dados comparativos dos vidros analisados.
Tipo de vidro
Espessura
(mm)
Transmitância
térmica U
(W/m².K)
Transmissão
luminosa
Fator solar
(SHGC)
Laminado
controle solar
9
5.70
29%
37%
GA118 Insulado
25
1.76
37%
30%
GA119 Laminado
8
5.52
35%
36%
GA119 Insulado
24
1.71
38%
31%
GA120 Laminado
8
5.6
50%
33%
GA120 Insulado
24
1.5
49%
27%
De forma geral, a reposição do vidro atualmente instalado por outros de melhor
desempenho não apresentou uma significativa redução no consumo de energia,
confirmando as expectativas anteriores de que o ganho térmico através das fachadas
não representa a maior porção da carga térmica da edificação (Figura 10). Isso se
deve ao sombreamento excessivo das fachadas ao longo do ano somado ao fato de
que a carga térmica dominante é advinda dos equipamentos.
O vidro GA 118, por exemplo, aumentou o consumo da edificação em 2,10% ao ano.
Esse fato se deve a sua composição, que diminui as trocas térmicas e evita que o calor
gerado internamente seja perdido para o exterior, exigindo assim maior esforço do
sistema de ar condicionado para resfriar os ambientes.
Figura 10. Consumo de energia atrelado aos diferentes tipos de vidros.
Fonte: Elaboração própria com base nas informações dos fabricantes, utilizando o software
Design Builder.
Aplicação de película de controle solar sobre os vidros existentes
As películas de controle solar têm sido utilizadas no mercado para diminuir o consumo
de energia através da redução do calor excessivo recebido pela radiação solar,
principalmente em edificações existentes, já que em alguns casos a troca dos vidros
torna-se inviável, tanto por questões físicas quanto financeiras. Neste contexto,
testou-se a aplicação de três modelos de películas na edificação, cujas características
podem ser vistas na Tabela 5.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 – Dezembro de 2015
Edição Temática em Sustentabilidade
93
Tabela 5. Dados comparativos das películas analisadas.
Película
Transmissão
solar total
Transmitância
térmica U
(W/m².K)
Transmissão
solar direta
Transmissão
luminosa
Película 1
16%
4.20
10%
14%
Película 2
18%
4.73
12%
15%
Película 3
23%
5.60
11%
10%
As películas de controle solar 1 e 2 apresentaram uma redução significativa no
consumo de energia se comparadas ao vidro de melhor desempenho, com uma
diminuição no consumo de ar condicionado na ordem de 4,9%. O filme que
apresentou o melhor resultado foi o 3. O consumo do ar condicionado atrelado a
instalação desta película foi reduzido em 5,6% (Figura 11). Apesar das películas
apresentarem um bom resultado energético, é preciso avaliar a transmissão luminosa
dos produtos, pois este fator pode comprometer o nível de iluminação natural dos
ambientes.
Figura 11. Consumo de energia atrelado aos diferentes tipos de películas.
Fonte: Elaboração própria com base nas informações dos fabricantes, utilizando o software
Design Builder.
Instalação de persianas internas nos andares
A instalação de elementos de proteção solar internos pode ser uma boa solução, pois é
de fácil colocação e geralmente menos onerosa se comparada aos sistemas de
sombreamento complexos e vidros de alta performance.
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Edição Temática em Sustentabilidade
94
Figura 12. Consumo de energia atrelado a instalação de persianas internas.
Fonte: Elaboração própria utilizando o software Design Builder.
Para esta simulação utilizaram-se persianas de alumínio com lâminas de 25cm,
sempre fechadas, distantes 15cm das esquadrias. Os resultados obtidos com a
instalação dos elementos encontram-se na Figura 12. O caso simulado com a
colocação dos elementos de sombreamento internos representou uma diminuição no
consumo de ar condicionado na ordem de 2,12%, equivalente a um dispêndio total
anual de energia de 1.203.794,50 kWh contra 1.213.901,09 kWh do caso base.
Somando o vidro GA 120 a instalação das persianas, tem-se um consumo anual
equivalente a 1.199.309,01 kWh, gerando assim uma economia de 0,65% ao ano com
relação ao caso base.
Substituição do sistema de iluminação
Como alternativa de substituição às lâmpadas entregues com as unidades, propõe-se
a utilização de lâmpadas do tipo LED. Segundo o Departamento de Energia dos
Estados Unidos, as lâmpadas LED podem ser até sete vezes mais energeticamente
eficientes que as lâmpadas incandescentes e gerar uma economia de até 80% na
conta de energia.
De modo a manter as características das luminárias previstas no projeto, adotou-se
uma luminária similar, embutida com refletores de alumínio. A lâmpada escolhida para
a simulação foi o modelo LED840 da marca Philips, com entrega de pelo menos 450
lux contínuos sobre o plano de trabalho, cuja densidade de potência é de 7,19 W/m².
Os resultados do desempenho energético estão contidos na Figura 13.
Figura 13. Consumo de energia atrelado a instalação de lâmpadas LED.
Fonte: Elaboração própria com base nas informações dos fabricantes, utilizando o software
Design Builder.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 – Dezembro de 2015
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95
Analisando a implementação das lâmpadas LED, observa-se uma redução considerável
no consumo anual do ar condicionado e total, 11,9% e 16,04% respectivamente. O
consumo anual do sistema de iluminação diminuiu de 360.870,04 kWh para
210.507,72 kWh. A soma de intervenções com o vidro GA 120 possibilitou uma
redução de 17,1% no consumo total ao longo de um ano. Substituindo o vidro GA
120 por uma película, a redução pode chegar a 18%.
Controle de iluminação artificial para melhor aproveitamento da luz
natural
Segundo Laudares (2007), o projeto de iluminação deve buscar a integração entre luz
natural e artificial, com o objetivo de se alcançar edificações energeticamente
eficientes. O planejamento dessa integração deve avaliar o balanço da carga térmica
nos espaços, com o controle do ofuscamento e com a adequação às variações da
disponibilidade de luz natural nos diversos horários do dia e épocas do ano. Dessa
forma, buscou-se avaliar e analisar um sistema de controle de iluminação que
buscasse diminuir o consumo de energia através da integração de luz natural e
artificial.
Figura 14. Consumo de energia atrelado a instalação de sensores de iluminação natural.
Fonte: Elaboração própria utilizando o software Design Builder.
No modelo simulado, o setpoint do sensor foi regulado para manter o nível de
iluminação mínimo de 500 lux, ou seja, sempre que a luz natural contribuir com esse
grau de iluminância, as lâmpadas estarão operando com ínfima intensidade, diminuído
assim o consumo de energia. Cada sensor instalado pode operar até vinte luminárias,
consequentemente os dois equipamentos são responsáveis por aproximadamente 15%
da potência total instalada em cada unidade.
Com apenas a implementação dos sensores foi possível atingir uma economia de
4,12% no consumo do ar condicionado e 5,52% no consumo total de energia (Figura
14). Agregando-se soluções anteriores como o vidro de melhor performance e
lâmpadas LED, atinge-se uma economia de 20,11% ao ano, equivalente a 245.890,22
kWh. Quanto a contribuição da iluminação no consumo, esta cai drasticamente de
360.870,04 kWh/ano para 176.884,89 kWh/ano. Nos casos em que o vidro GA 120 foi
substituído por uma película de controle solar, a redução foi ainda maior.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 – Dezembro de 2015
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96
6. Análise dos resultados
O capítulo 5 apresentou os diversos cenários criados através de situações de mercado
recorrentes para a melhoria do desempenho energético do estudo de caso. Avaliou-se
o impacto de cada solução no que tange o consumo de energia como um todo visando
a redução do seu dispêndio. Do ponto de vista da escolha dos cenários, todos se
basearam em estratégias factíveis, podendo ser estudados para aplicação em um
espaço curto de tempo, sem grandes prejuízos monetários e físicos à operação da
edificação e dos locatários que hoje ocupam os conjuntos.
A partir destas definições, montou-se um cenário base com dados pesquisados em
normas que regulamentam a calibração de modelos paramétricos de edifícios,
manuais e memoriais descritivos fornecidos pelos projetistas, bem como informações
levantadas in loco. O consumo de energia das áreas úteis, ou seja, das áreas
ocupadas pelos locatários é de 1213,9 kWh/ano, ou 98,97 kWh/m²/ano. Esse
resultado está um pouco abaixo da média de consumo dos edifícios em São Paulo
verificada por Borgstein e Lamberts (2014) em uma recente pesquisa, a qual apontou
um valor de aproximadamente 170 kWh/m²/ano.
Conforme comentado nos capítulos sobre iluminação natural, o estudo de caso possui
um elevado nível de sombreamento, fator que corrobora com o baixo consumo do ar
condicionado, se comparado a outras edificações do mesmo porte.
O primeiro cenário contemplou a substituição dos vidros existentes por outros de
melhor desempenho. Com base nas informações dos fabricantes, simulou-se a
implementação de materiais com diferentes tecnologias embarcadas. Dos cinco tipos
analisados, o modelo GA120 Laminado se mostrou o mais eficiente na redução do
consumo de energia total (0,5%). Outro aspecto inerente a este material e que deve
ser avaliado quando da sua colocação é a transmissão luminosa, aspecto este que
impacta diretamente no conforto dos usuários. A Tabela 6 apresenta um resumo das
soluções adotadas e seus respectivos resultados.
Tabela 6. Resumo dos cenários para melhoria do desempenho energético do estudo de caso.
Cenários
Baseline
Consumo
Equip.
Ilum.
Redução
AC
Redução
Total
Redução
39,3
29,48
-
30,19
-
98,97
-
Vidros
GA118 In.
39,3
29,48
-
32,27
6,88%
101,05
2,10%
GA120 Lam.
39,3
29,48
-
29,68
-1,67%
98,47
-0,51%
GA120 In.
39,3
29,48
-
30,98
2,62%
99,76
0,80%
GA119 Lam.
39,3
29,48
-
30,09
-0,33%
98,87
-0,10%
GA119 In.
39,3
29,48
-
30,81
2,04%
99,59
0,62%
Películas
Película 1
39,3
29,48
-
28,72
-4,87%
97,23
-1,76%
Película 2
39,3
29,48
-
28,49
-5,63%
96,99
-2,00%
Película 3
39,3
29,48
-
28,71
-4,90%
97,22
-1,77%
-2,12%
98,33
-0,65%
Persianas
Persianas (P)
39,3
29,48
-
29,55
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P+GA120 Lam.
39,3
29,48
-
29,19
-3,31%
97,97
-1,01%
Substituição do sistema de iluminação
LED
39,3
17,20
-41,67%
26,60
-11,90%
83,10
-16,04%
LED+GA120+P
39,3
17,20
-41,67%
25,56
-15,35%
82,05
-17,09%
LED+Pelíc.3
39,3
17,20
-41,67%
24,83
-17,75%
81,17
-17,99%
Controle de iluminação
Sensores (S)
39,3
25,26
-14,30%
28,94
-4,13%
93,51
-5,52%
S+GA120
39,3
24,77
-15,97%
28,32
-6,18%
92,40
-6,64%
S+GA120+LED
39,3
14,45
-50,98%
25,32
-16,13%
79,07
-20,11%
S+Pelíc.3
39,3
25,82
-12,41%
27,46
-9,04%
92,58
-6,46%
S+Pelíc.3+LED
39,3
15,06
-48,91%
24,24
-19,72%
78,60
-20,58%
Por outro lado, as películas se mostraram mais eficientes do que os vidros na
atenuação do dispêndio de energia. O modelo 3 apresentou uma redução de 2% no
consumo total de energia. A utilização de persianas pouco contribuiu para a melhoria
do desempenho energético, porém é um elemento essencial para evitar o ofuscamento
próximo as janelas.
Analisando o comportamento da edificação no advento da substituição do sistema de
iluminação, nota-se que a influência das lâmpadas com tecnologia LED é vital na
performance do estudo de caso. Os resultados da simulação demonstraram que a
economia foi de 16,04% no consumo total anual.
Instalando apenas o sistema de controle de iluminação, composto por sensores de
iluminação natural, economizou-se 5,52%, entretanto combinando outras estratégias
concomitantes, é plausível chegar a um abatimento de 20,58% na despesa energética.
O resultado final desta análise reforça que o levantamento de dados da condição atual
do estudo de caso e a calibração do software de simulação termo-energética
representam uma etapa importante do trabalho. No entanto, para que os cenários
estudados e o aproveitamento das tecnologias existentes sejam incorporados ao
edifício existente, deve-se estudar criteriosamente cada estratégia para que o retrofit
proposto atenda o seu objetivo principal que é a redução do consumo energético com
a incorporação de soluções tecnológicas adequadas.
7. Considerações finais
A partir da análise do comportamento energético das áreas úteis da edificação, cujo
consumo foi de 99,11 kWh/m²/ano, avaliaram-se cenários alternativos para buscar a
redução do dispêndio de energia, levando em conta as particularidades e influências
de cada um deles. Algumas das alternativas empregadas se mostraram mais
eficientes, como a aplicação de películas de controle solar e principalmente as ligadas
ao sistema de iluminação como a instalação de lâmpadas LED e sensores de
iluminação natural. Ambas as tecnologias necessitam cuidados quanto às questões de
conforto visual, apesar de apresentarem grande potencial e já serem uma realidade no
mercado de edificações comerciais. No melhor cenário possível, considerando as
técnicas estudadas neste trabalho, o consumo de energia da torre poderia ser reduzido
em 21,21%, representando um consumo de 77,98 kWh/m²/ano. Este resultado é fruto
do somatório das estratégias supracitadas.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 – Dezembro de 2015
Edição Temática em Sustentabilidade
98
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MELO, Ana Paula. Avaliação computacional de estratégia para redução do
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SANTANA, Marina Vasconcelos. Influência de parâmetros construtivos no
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Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil), Universidade Federal de Santa
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SERAFIN, Raquel May. Avaliação da redução do consumo de Energia Elétrica
em Função do Retrofit no Edifício Sede da ELETROSUL. Dissertação (Mestrado
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2010.
UNEP. Buildings and Climate Change: Status, Challenges and
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U.S. Department of Energy (DOE). Advanced Energy Retrofit Guide:
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2011.
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Edição Temática em Sustentabilidade
99
Lista de abreviaturas e siglas
ASHRAE - American Society of Heating, Refrigerating, and Air-Conditioning
Engineers
COP – Coefficient of Performance
ENFORCE – European Network for the Energy Performance Certification of
Buildings
EPE – Empresa de Pesquisa Energética
LEED - Leadership in Energy and Environmental Design
PBE – Programa Brasileiro de Etiquetagem
Recebido em 31/07/2015 e Aceito em 07/12/2015.
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Edição Temática em Sustentabilidade
100
Reuso de containers marítimos na construção civil
Reuse of shipping containers in construction
Rita Guedes, Anarrita Bueno Buoro
SENAC- Santa Cecilia
Curso de Projeto Sustentável de Arquitetura e Design - pós-graduação latu-sensu
{[email protected]; [email protected]}
Resumo. A pesquisa tem como objetivo analisar o reuso de container na construção
civil, como método alternativo de construção sustentável, que promove a redução do
uso de matérias-primas naturais, quando comparado ao sistema construtivo
convencional. A pesquisa inclui estudos relacionados ao desenvolvimento sustentável
e ao crescimento populacional, que contribui diretamente no aumento da demanda na
construção, assim como, na manutenção do ambiente construído. Novas soluções
tecnológicas devem suprir esta necessidade para a redução do impacto ambiental.
Para atestar a viabilidade da qualidade ambiental do uso de containers, foi
desenvolvido estudo de desempenho térmico com base em um modelo
termodinâmico, desenvolvido a partir de uma unidade habitacional por meio de
simulação energética no software Domus Eletrobrás. O resultado deste estudo
confirmou a viabilidade do material aplicado em projetos residenciais para a zona
bioclimática 3, onde foi obtida etiqueta da envoltória com nível A para o Programa
Brasileiro de Etiquetagem (PBE Edifica).
Palavras-chave: reuso, container, impacto ambiental, construção civil,
sustentabilidade.
Abstract. The research analyzes shipping container reuse in construction, as an
alternative method of sustainable construction, which promotes reducing the use of
natural resources materials compared to conventional building system. The research
includes studies related to sustainable development and population growth that have
direct impact on increasing demand for construction, as well as maintenance of the
built environment. New technological solutions should attend this need to reduce the
environmental impact. To attest the viability of the environmental quality of the use of
containers, was done study of thermal performance based on a thermodynamic model
developed from a housing unit through energy simulation software in Domus
Eletrobras. The result of this study confirmed the viability of the material applied in
residential projects for bioclimatic zone 3 and the project obtained envelope label
level A to Brazilian Labeling Program (PBE Edifica).
Key words: reuse, container, environmental impact, construction, sustainability.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística
Edição Temática em Sustentabilidade
Vol. 5 no 3 – Agosto de 2015, São Paulo: Centro Universitário Senac
ISSN 2179-474X
Portal da revista: http://www1.sp.senac.br/hotsites/blogs/revistainiciacao/
E-mail: [email protected]
Esta obra está licenciada com uma Licença Creative Commons Atribuição-Não Comercial-SemDerivações 4.0
Internacional
1. Introdução
A partir da sociedade industrial houve grande desenvolvimento tecnológico e
científico, que promoveu o crescimento da qualidade e expectativa de vida do ser
humano, proporcionando o crescimento continuado da produção de bens de consumo,
o que provocou alterações significativas no equilíbrio do planeta ameaçando até
mesmo, a sobrevivência da espécie. A sobrevivência da humanidade depende de
alterações dos hábitos de consumo, no modo de produzir e fazer negócios (JOHN &
PRADO, 2010). Este estilo de vida exerce forte pressão sobre o meio ambiente,
atualmente a metade dos seres humanos habitam zonas urbanas e dependem de
edificações para seu resguardo e sua existência (EDWARDS, 2008). A construção civil,
é responsável pelo grande espaço construído em que vivemos e para que este
ambiente construído seja mantido e atualizado a indústria da construção consome
50% dos recursos mundiais, o que faz com que este setor exerça uma das atividades
menos sustentáveis do planeta (EDWARDS, 2008).
O tamanho do impacto ambiental causado pela construção civil está diretamente
relacionado com a extensa cadeia produtiva do setor, que se inicia pela extração de
matérias-primas, produção, transporte de materiais, projeto, execução, ocupação de
terras, geração/descarte de resíduos, uso, manutenção, destinação dos resíduos
gerados durante o uso da edificação e ao final da vida útil, sua demolição ou
desmontagem. Além disso, também é utilizada água e energia durante a construção,
uso e manutenção do edifício (AGOPYAN, et al., 2011).
Segundo Edwards (2008), estima-se que a população mundial chegará em 2050 a 10
bilhões de habitantes no planeta, o que afetará diretamente o meio ambiente
(recursos naturais e resíduos) e exigirá novas abordagens nos projetos de edifícios
como a utilização de resíduos. Com isto eles deverão ser vistos como potenciais fontes
de energia ou futuros materiais de construção com a intenção de reduzir as etapas da
cadeia da construção civil.
Entre os materiais residuais temos o container marítimo, que tem grande potencial
como matéria prima-estrutural para ser adaptado como novos edifícios. O container,
recipiente metálico normalizado pela International Organization for Standardization
(ISO), possibilita uma arquitetura flexível, componível que permite a ampliação ou
desmontagem do edifício de modo racional. Esta técnica alternativa de construção
atende as ações necessárias ao desenvolvimento sustentável, contribuindo com o meio
ambiente, pois preserva recursos naturais que seriam extraídos, promove a
reutilização
de
materiais
de
qualidade,
reduz
etapas
construtivas,
e
consequentemente proporciona a redução de resíduos durante a obra.
2. Objetivos
O objetivo da pesquisa é estudar, baseando-se na bibliográfica, a solução alternativa
construtiva a partir da reutilização de containers marítimos em desuso, bem como a
adaptação deste material para uso residencial, através de análise de sua viabilidade
técnica de aplicação para este fim em termos de desempenho térmico. Para isto, foi
desenvolvido projeto de uma unidade residencial, a qual foi realizada a simulação no
software Domus Eletrobrás, para atestar sua viabilidade em termos de conforto
ambiental e eficiência energética.
3. Metodologia
No sentido de alcançar o objetivo proposto, a pesquisa foi delimitada através das
seguintes etapas:
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Edição Temática em Sustentabilidade
102

Pesquisa sobre Sustentabilidade na Construção Civil, a relação com os recursos
naturais e seu impacto neste setor;

Levantamento através de revisão bibliográfica, referente ao transporte
marítimo, o histórico do uso de container e sua utilização mais recente na
construção como moradia;

Levantamento de estudos de caso com diferentes tipos de soluções de
habitações em containers, as quais demonstraram como esta técnica
construtiva pode ser eficiente;

Desenvolvimento de projeto de uma unidade habitacional, com a intenção de
atender as necessidades de um programa residencial proposto com qualidade
ambiental. Foram identificadas as exigências relativas ao conforto para
adaptação dos containers a norma de desempenho dos materiais da envoltória.
Para isto foram estudadas as exigências para a Zona Bioclimática 3 (cidade de
São Paulo) de acordo com a NBR 15575(2013) - Norma de Desempenho e as
exigências de conforto ambiental;

O desenvolvimento de um projeto, cujo modelo proposto foi simulado no
software Domus Eletrobrás para atestar a combinação dos materiais e aferir o
percentual de horas ocupadas em conforto de acordo com os valores definidos
para a envoltória e com padrão de uso definido como referência no projeto
residencial. Além disso, foi obtida a etiqueta de simulação do projeto de acordo
com os requisitos do PBE Edifica.
4. Revisão Bibliográfica
Sustentabilidade
A sustentabilidade está baseada em três pilares básicos que se dividem nos âmbitos:
econômico, social e ambiental que devem ser considerados de modo integrado para
atender o desenvolvimento sustentável (AGOPYAN, et al., 2011).
De acordo com o Ministério do Meio Ambiente (2015), na busca de minimizar os
impactos ambientais provocados pela construção, surge o paradigma da construção
sustentável.
Os desafios para o setor da construção são diversos, porém, em síntese,
consistem: na redução e otimização do consumo de materiais e energia, na
redução dos resíduos gerados, na preservação do ambiente natural e na
melhoria da qualidade do ambiente construído. Para tanto, recomenda-se:
mudança dos conceitos da arquitetura convencional na direção de projetos
flexíveis com possibilidade de readequação para futuras mudanças de uso e
atendimento de novas necessidades, reduzindo as demolições; busca de
soluções que potencializem o uso racional de energia ou de energias
renováveis; gestão ecológica da água; redução do uso de materiais com alto
impacto ambiental; redução dos resíduos da construção com modulação de
componentes para diminuir perdas e especificações que permitam a reutilização
de materiais (BRASIL,2015).
No ano 2000 a população urbana superou a população rural, atingindo 6,2 bilhões de
habitantes (EDWARDS, 2008). Este deslocamento da população para as zonas urbanas
exerce grande pressão no meio ambiente, quanto mais a população se urbaniza, mais
consome, desperdiça e polui. Estima-se que em 2050 este impacto seja quatro vezes
maior do que em 2000, considerando-se um crescimento econômico anual de 2% e
uma população mundial de 10 bilhões (EDWARDS, 2008). Segundo projeções da ONU
até 2030 serão necessárias 877 milhões de novas habitações, como também serão
necessárias novas cidades. Para atender a demanda por um maior ambiente
construído, serão necessárias inovações tecnológicas, pesquisas, uso equilibrado dos
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 - Dezembro de 2015
Edição Temática em Sustentabilidade
103
recursos disponíveis. (AGOPYAN et al, 2011).A reciclagem e a reutilização deverão
fazer parte desta demanda, pois recuperam materiais
descartados, reduzem a
produção de resíduos e preservam recursos naturais.
Os materiais utilizados na construção civil exercem grande impacto ambiental, desde a
extração até o seu descarte, considerando que a indústria da construção consome
50% dos recursos naturais, a escolha dos materiais é um dado muito importante para
que se atinjam as exigências da construção sustentável. Para especificar materiais
construtivos sustentáveis deve-se pensar no grau de energia incorporada de cada
elemento. Além da energia, outros critérios devem ser avaliados na escolha dos
materiais como: a poluição do ar e da água durante seu processo de fabricação, a
quantidade de resíduos que geram em seu ciclo de vida e também a possibilidade de
reuso ou reciclagem (EDWARDS, 2008).
Os resíduos gerados pela construção, também são um grande problema para o meio
ambiente, pois os materiais ao longo do seu ciclo de vida geram resíduos e ao final de
sua vida útil tornam-se lixo ou resíduo pós-uso. A massa residual destes materiais
torna-se de 2 a 5 vezes maior que a massa de produtos consumidos, portanto
reutilizar materiais construtivos ou especificar materiais que tenham conteúdo
reciclado é critério preferível quando comparado a utilização de novos produtos
(AGOPYAN, et al.,2011).
A escolha dos materiais no processo de construção sustentável tem um papel
fundamental, pois neste momento é que são tomadas decisões que impactam de
modo positivo ou não durante todo o ciclo de vida do edifício, quanto mais duráveis
melhor.
Containers
De acordo com Santos (1982) a definição de containers apresenta-se no Artigo 4º
paragrafo único do Decreto nº 80.145 de 15 de agosto de 1977:
O container deve preencher, entre outros os seguintes requisitos:
Ter caráter permanente e ser resistente para suportar o seu uso
repetido;
b) Ser projetado de forma a facilitar sua movimentação em uma
ou mais modalidades de transporte, sem necessidade de
descarregar a mercadoria em pontos intermediários;
c) Ser provido de dispositivos que assegurem facilidade de sua
movimentação, particularmente durante a transferência de um
veículo para outro, em uma ou mais modalidades de
transporte;
d) Ser projetado de modo a permitir seu fácil enchimento e
esvaziamento;
e) Ter seu interior facilmente acessível à inspeção aduaneira, sem
a existência de locais onde se possam ocultar mercadorias;
(SANTOS,1982, p.77).
Os modelos de containers mais utilizados no transporte marítimo são: os de 20’ e 40’.
O container de 20’, referido como Twenty-foot Equivalent Unit (TEU) tornou-se a
referência padrão da indústria como volume de carga e capacidade dos navios. O
container de 40’, refere-se a 2 TEUs, ou também conhecido como o Forty-foot
Equivalent Unit (FEU) (WORLD SHIPPING COUNCIL, 2015).
Os containers são normalizados em suas dimensões e características pela
International Organization for Standardization (ISO 668:2013) sua estrutura, perfis
verticais e horizontais são em aço corten, os fechamentos nas faces laterais e
posterior são em painéis em chapa corrugada. O fechamento superior também é feito
por painéis em chapa corrugada e deve ter resistência para suportar até 200 kg sem
danificar a estrutura. Todos os painéis verticais e horizontais são soldados à estrutura
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principal de modo a aumentar a resistência do container. Na face frontal do container
há duas portas com travas, o piso é composto por chapas de compensado de madeira
de 28 mm, fixadas por parafusos (SAWYERS, 2008).
A estrutura do container é extremamente estável, pois é preparada para resistir as
mais difíceis condições como: terremoto, furacão e incêndio (ISBU ASSOCIATION,
2010). O empilhamento destes recipientes pode atingir até 8 alturas sem a
necessidade de estrutura auxiliar, são estruturas reforçadas, leves e fabricadas para
um perfeito encaixe quando fixados uns aos outros (SAWYERS, 2008).
Histórico do uso de containers
Philip C. Clark, em 23 de novembro de 1987 registrou patente número 4854094 “Method for converting one or more steel shipping containers into a habitable building
at a building site and product thereof”. Esta patente teve como data de emissão 8 de
agosto de 1989 e descreve métodos básicos para transformar 2 ou mais containers
marítimos em habitações (SAWYERS, 2011).
O uso de containers para habitação começou como abrigos temporários em países que
sofreram desastres naturais ou em guerras, como na Guerra do Golfo em 1991, onde
também serviram como transporte de prisioneiros iraquianos (PORTAL METÁLICA,
2015).
Nos Estados Unidos, houve um acúmulo de containers em desuso na última década,
causado pelo desequilíbrio entre importações de mercadorias vindas da Ásia em
grande quantidade. Como as exportações deste país eram em menor número, muitos
containers tinham que ser enviados à sua origem vazios a um alto custo de frete,
portanto seria mais compensadora a compra de novos na Ásia do que enviá-los vazios
(GADAROWSKI, 2014).
Em 2005, havia cerca de 700.000 containers desativados nos portos dos Estados
Unidos, este fato se deu devido à explosão de crescimento das importações vindas da
China. Na busca de reduzir este estoque, os containers passaram a ser utilizados para
outros fins como: edifícios residenciais, hotéis, escolas, abrigos, pavilhões de
exposições etc. O excesso de containers não só nos Estados Unidos, como também em
outros países, fez com que o custo deste material fosse reduzido o que reforçou ainda
mais o interesse em nível mundial em construções de edifícios com menor custo. No
final de 2007, os estoques de containers nos portos norte-americanos baixaram cerca
de 25%. Apesar disto, de acordo com a ISBU1, o interesse pela construção em
container passou a ser pela versatilidade do material, não mais pelo excedente ou o
baixo custo (ISBU ASSOCIATION, 2010).
Países como Estados Unidos, Alemanha, Holanda e Inglaterra já utilizam esta técnica
para a construção de escritórios, hotéis, residências e alojamentos para estudantes.
Na Inglaterra temos o exemplo da Container City I e II (Figura 1) localizado em Trinity
Buoy Wharf, região portuária de Docklands, em Londres. A construção da fase I com
15 containers iniciou-se em 2000 e levou cinco meses para sua conclusão, em maio de
2001. Ligado ao Container City I por uma passarela está o Container City II,
construído dois anos depois com mais conjuntos habitacionais (PORTAL METÁLICA,
2015).
1
ISBU, significa Intermodal Steel Building Unit, esta denominação é dada ao ISO containers
quando este é transformado em moradia.
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105
Figura 1 - Container City II -Vista da entrada pela fachada leste.
Fonte: Slawik, et al., 2010.
No Brasil, a utilização de containers é recente, em 2010 foi construída a primeira loja
em container para a empresa Container Ecology Store. Já a primeira residência
construída em containers foi 2011, em São Paulo, pelo arquiteto Danilo Corbas que
propôs soluções eficientes, práticas, utilizando design e arquitetura de elevado nível
de complexidade de uso, diferentemente do que acontecia no início do uso deste
material como elemento construído. (PORTAL METÁLICA, 2015). Hoje é crescente este
tipo de construção no Brasil, já existem empresas especializadas como a Delta
Containers, em Curitiba, Paraná e a Ferraro Container Habitat em Florianópolis, Santa
Catarina. Conforme são divulgados os novos projetos em containers estes acabam
sendo difundidos o que aumenta a procura pelo seu apelo sustentável e também em
função de vantagens como: a redução do custo final da obra, velocidade no prazo de
execução e redução de resíduos.
Aplicação do container na construção civil
Os containers mais utilizados na construção civil são os high cube de 20’ e 40’ devido
ao pé-direto mais alto adequado para as construções, com 2,68 metros. Os projetos
em containers no início foram declarações e manifestos mostrando que um único
módulo seria suficiente para criação de espaço de moradia. Conforme este tipo de
construção foi evoluindo, passaram a ser construídas residências com volumes
extrudados das dimensões padrão do container com a intenção de possibilitar mais
eficiência no uso do espaço interno (KOTNIK,2013). A figura 2 ilustra esta solução
adotada pela Unidade LOT-EK residência móvel.
Figura 2 Unidade Lot-Ek
Fonte : Slawik, et al., 2010.
Outra etapa da evolução da arquitetura em containers foi o empilhamento de várias
unidades em formações maiores, removendo paredes intermediárias para a criação de
grandes espaços internos. A figura 3 ilustra edifício, cuja construção demonstra
possibilidades de arranjo dos containers e exibe um grande balanço de
aproximadamente 5 metros.
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Figura 3 – Orbino –Edifício construído como escultura e também como plataforma de
observação. Arq. Luc Deleu
Fonte : Slawik, et al., 2010.
Além do empilhamento, os containers passaram a ser combinado com outros materiais
de construção, o que resultou em projetos mais dinâmicos. Alguns exemplos estão
representados nas figuras 4 a 6 : 12 Containers House, Redondo Beach House e Chalet
du Chemin Brochu, respectivamente.
Figura 4 – 12 Container House. Arg Adam Kalkin . Local: Maine , EUA
Fonte : Slawik, et al., 2010.
Figura 5– Redondo Beach House – Arq. Peter De Maria. Local California, EUA
Fonte : Slawik, et al., 2010.
Figura 6- Chalet du Chemin Brochu – Arq. Pierre Morency . Local Québec, CA
Fonte : Slawik, et al., 2010.
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A tendência em revestir o container para esconder ou personalizar sua aparência
industrial fez com que este tipo de construção se tornasse mais aceitável atraindo um
público maior. Hoje projetos em containers já não estão limitados aos arquitetos
“inovadores”, mas estão se estabelecendo como um ramo comercialmente viável de
arquitetura modular (KOTNIK, 2013). A Figura 7 ilustra a evolução da arquitetura
projetada com o uso de containers.
Figura 7 – Fases da arquitetura em container. 1 . Uso Conceitual; 2. Expandindo o espaço
interno; 3.Combinações com mais módulos; 4. Combinações com outros materiais;
5. Incorporação de características de construção pré-fabricada
Fonte: Kotnik, 2013
O que torna possível este tipo de arquitetura é a produção em massa dos containers,
os quais podem ser adquiridos em qualquer lugar do mundo, além disso, o caráter
ecológico quando se faz reaproveitamento do material é outra questão que reforça a
decisão do uso do material para construção (KOTINIK, 2008).
Vantagens e desvantagens da construção em containers
No desenvolvimento da pesquisa foram verificadas características do container
adequadas para a construção de edifícios e suas vantagens são:

Modularidade - dimensões padronizadas pela ISO 668:2013, permitindo as
mais variadas composições;

Disponibilidade - podem ser adquiridos em qualquer parte do mundo;

Custo acessível;

Grande resistência- são feitos para resistirem as mais difíceis condições
climáticas como também a incêndio e terremotos (ISBU ASSOCIATION, 2010).;

Durabilidade – estrutura e fechamentos em aço;

São empilháveis, podem chegar até 8 níveis sem estrutura auxiliar e quando
fixados uns aos outros estes módulos adquirem maior estabilidade (SAYWER,
2008);

Recicláveis e reutilizáveis;

As construções podem ser facilmente ampliadas ou reduzidas, dependendo da
necessidade do usuário;

O uso de container para a estrutura do edifício gera economia na utilização de
recursos naturais como: areia, tijolo, água, ferro o que acarreta redução de
impactos ambientais na extração de recursos naturais e na geração de
resíduos, além de minimizar poluição do ar e sonora durante a construção
(ESSER, 2012);

Como são elementos modulares e leves, exigem muito menos mão-de-obra nos
trabalhos de fundação do que as construções tradicionais, também reduzem
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trabalhos de terraplenagem, o que garante menor interferência no solo,
preservando o lençol freático e a absorção de água de chuva (ESSER, 2012);

A intermodalidade proporciona flexibilidade ao edifício e permite que a
construção possa ser desmontada e transportada para outra localidade se
necessário. Esta característica contribui para que não haja desperdício do
material empregado na construção e ao final da vida útil da edificação, pode
ser adaptado a outro uso, que favorece a redução da pegada ecológica,
característica definida como: a quantidade de terra e água necessária para
sustentar as gerações atuais, tendo em conta todos os recursos materiais e
energéticos, gastos por uma determinada população (WIKIPEDIA, 2015);

A construção em container proporciona redução no custo final da obra em
aproximadamente 35% (ESSER, 2012) quando comparada à construção
tradicional, pois neste processo são eliminadas muitas etapas construtivas,
reduzindo o emprego de materiais, mão-de-obra e geração de resíduos;

Acelera a velocidade da construção, por ser um material pré-fabricado,
portanto sua montagem é rápida;

Os trabalhos de serralheria, transporte e montagem devem sempre ser feitos
por mão-de-obra especializada, o que favorece a redução do trabalho informal,
fator importante quando se pretende atingir o desenvolvimento sustentável.
Dentre as desvantagens da construção em containers podemos citar:

Custos com transporte, caso a localização do terreno seja muito distante de
zonas portuárias;

Pequena disponibilidade de mão-de-obra especializada, para recorte das
chapas, movimentação e montagem dos módulos, que exigem equipamentos
específicos;

A alta condutibilidade térmica das chapas dos containers requer estudo de
adequação para o uso de isolamento térmico nas vedações;

Possibilidade de contaminação com relação à carga transportada. Por isso, é
necessário que se faça laudo de vistoria ao se adquirir um container, para que
seja certificado que o material está livre de contaminações e de avarias em sua
estrutura.
A construção em container permite que sejam incorporadas soluções sustentáveis ao
projeto como:

Captação de água pluvial;

Ventilação cruzada, utilizando grandes aberturas;

Telhado verde que auxilia no isolamento térmico da cobertura;

Telhas térmicas tipo sanduíche de poliuretano para melhor desempenho
térmico da cobertura;

Paredes e forros - uso de sistema steel frame com fechamento em chapa de
OSB ou gesso acartonado com isolamento em EPS, lã de pet, lã de vidro ou lã
de rocha, para melhor desempenho térmico;

Uso de aquecimento solar associado a outro sistema complementar (como à
gás, por exemplo);

Pintura ecológica: tintas à base de água, sem cheiro, com baixa taxa de Compostos Orgânicos Voláteis (COV) (PORTAL METÁLICA,2015).
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Desenvolvimento de projeto com uso de containers
O projeto a seguir foi desenvolvido na pesquisa e como partido foram utilizados dois
containers High Cube de 40 pés. A área da residência proposta é de 93m². O Quadro 1
ilustra as dimensões do container utilizado.
Quadro 1– Quadro de dimensões, capacidade e peso do Container High Cube.
Fonte: Treasure, Container.
Para atestar a viabilidade da qualidade ambiental do uso de containers, foi
desenvolvido estudo de desempenho térmico com base em um modelo
termodinâmico, de uma residência de dois pavimentos, térreo e superior, cuja ligação
vertical foi concebida em alvenaria de bloco de concreto.
Programa proposto no projeto residencial
A proposta considerou o programa de uma residência com dois pavimentos
distribuídos da seguinte forma:

Pavimento Térreo – Sala estar/jantar, cozinha, lavabo, hall e área de serviço;

Pavimento Superior – Suíte, 2 dormitórios, sanitário e hall.
Foram utilizados dois containers high cube, que possuem maior altura, para facilitar a
passagem de infraestrutura de elétrica, hidráulica bem como a aplicação de materiais
isolantes. Estes containers têm altura interna de 2.695 metros, enquanto que os dry
containers tem altura interna de 2,38 metros.
Características construtivas: projeto e materiais
Devida à baixa resistência térmica das chapas dos containers e a fim de garantir o
conforto térmico e acústico da residência, foram especificados materiais isolantes nas
paredes e no teto do pavimento superior. Os materiais isolantes propostos foram:
placas de EPS e foam (espuma projetada em poliuretano) que é um ótimo isolante
térmico, anticondensante e impermeabilizante. O fechamento destes materiais deverá
ser feito por chapas de OSB, com acabamento em pintura na cor branca, para que
seja garantida adequada iluminação interna. Foram propostas aberturas em posições
opostas para proporcionar a ventilação cruzada. Na região da escada foi feita abertura
que serve como chaminé térmica superior, para possibilitar corrente de ar com
velocidade suficiente a trazer conforto aos usuários. Para garantir a estanqueidade da
residência e maximizar o conforto térmico interno, foi sobreposta cobertura leve sobre
o edifício.
Como estratégia para melhoria da temperatura interior, a residência foi proposta para
ser construída com 50 cm acima do solo e com britas colocadas abaixo do container.
Adicionou-se ao piso térreo uma abertura no piso regulada por um mecanismo
manual, para que o ar ao passar pelas britas sombreadas, seja resfriado e penetre no
ambiente interno incrementando a ventilação interior. Além disso, no projeto outras
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práticas sustentáveis podem ser agregadas à residência como: o uso de lâmpadas
LED, aquecimento solar (água) e tintas à base de água.
A simulação de conforto no software Domus Eletrobrás, considerou como local
hipotético para a implantação da residência a cidade de São Paulo, na região de
Interlagos, à Rua Alcindo Ferreira, conforme Figura 8.
Localização do terreno
Figura 8 : Localização do terreno
Fonte: Google Maps
Estratégias de projeto
As estratégias de projeto, foram levantadas no software Zoneamento Bioclimático do
Brasil (ZBBR), disponível no site do Laboratório de Eficiência Energética em
Edificações (LabEEE). O ZBBR identificou a zona bioclimática do terreno proposto para
o projeto e as respectivas recomendações de conforto, conforme ilustra a Figura 9.
Figura 9 – Classificação bioclimática para a cidade de São Paulo
Fonte: Software ZBBR
A cidade de São Paulo encontra-se na Zona bioclimática 3 e as recomendações
relativas à transmitância térmica são: U< 3,6 W/m²K para paredes e U<2,0 W/m²k
para cobertura.
Projeto
De acordo com os estudos anteriores, o projeto resultante na pesquisa, está
apresentado nas Figuras 10 e 11. A Figura 10 ilustra planta do pavimento térreo com
o seguinte programa: sala de jantar, estar, lavabo, cozinha e área de serviço.
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111
Figura 10 – Planta Baixa do Pavimento Térreo
Fonte: Guedes, Rita
O pavimento superior, ilustrado na Figura 11, apresenta o seguinte programa: dois
dormitórios, sendo um com terraço, um banheiro e suíte principal com terraço.
Figura 11 – Planta do pavimento superior
Fonte: Guedes, Rita
Nas Figuras 12,13,14,15 e 16 estão apresentadas as fachadas e descrições das
soluções do projeto e dos materiais propostos.
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Containers modelo
High Cube 40’
Caixa de escada em bloco de
concreto sem revestimento
externo e com reboco
e
pintura de cor clara na face
interna.
Figura 12 – Fachada Posterior – Sul
Fonte: Guedes, Rita
Terraços.
Containers elevados do solo
para permitir a ventilação
pelo piso térreo e também a
passagem da infraestrutura.
Figura 13 – Fachada Lateral Direita - Oeste
Fonte: Guedes, Rita
As
portas
do
container
delimitam
o terraço, cujo
piso
foi
concebido
em
estrutura metálica auxiliar
fixada ao container.
Porta de acesso à residência.
Figura 14 – Fachada Frontal – Norte
Fonte: Guedes, Rita
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Janelas altas próximas ao
vazio da caixa da escada,
que são utilizadas para o
aproveitamento da
ventilação pelo efeito
chaminé.
Figura 15– Fachada Lateral – Leste
Fonte: Guedes, Rita
Telhado leve sobreposto
ao container com área de
ventilação, para garantir
a estanqueidade e
aumentar o conforto
térmico interno.
Fechamento em tela
perfurada para promover
a circulação do ar sob o
telhado.
Figura 16– Fachada Posterior – Sul
Fonte: Guedes, Rita
Simulação termodinâmica – Software Domus Eletrobrás
O Domus Eletrobrás é um instrumento de auxílio ao desenvolvimento do programa
brasileiro de Regulamentação de Eficiência Energética em Edificações (PBE Edifica). É
um programa de simulação higrotermoenergética de edificações adaptado à realidade
brasileira em termos de climas e de topologias de construções locais. Trata-se de um
software voltado aos profissionais de engenharia e de arquitetura, permitindo análise
de diferentes parâmetros tais como: consumo e demanda de energia; conforto térmico
segundo diferentes índices; risco de crescimento de mofo e de condensação;
dimensionamento de sistemas de climatização; avaliação do nível de eficiência
energética para edificações comerciais, de serviços e públicas, em conformidade com o
RTQ-C (Regulamento Térmico de Qualidade: Edifícios Comerciais, Serviços e
Públicos);
influência
climática;
monitoramento
de
sistemas
centrais
de
condicionamento de ar. Este software foi validado pelo Método da ASHRAE best test
140, e trata-se do software validado pela Eletrobrás e PBE Edifica para a certificação
energética brasileira (DOMUS PROCEL EDIFICA,2013)
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114
Uso do Domus Eletrobrás para a unidade habitacional proposta
O software foi utilizado na simulação do projeto proposto, como ferramenta para a
verificação da eficiência energética da edificação, relativo ao parâmetro de conforto
térmico com relação aos materiais empregados, número e dimensões das aberturas da
edificação, com a intenção de se obter a classificação da envoltória pelo RTQ-C. O
Quadro 2, apresenta especificações das paredes que revestem a estrutura do
container e da alvenaria referente a circulação vertical.
Quadro 2: Composição parede do container.
Composição paredes
Container
Material
Bloco de circulação vertical em alvenaria
Espessura (cm)
Aço
0,2
Foam Insulation
3
OSB
1,25
EPS
2
Câmara de ar
3
Transmitância Térmica (U)
( W/m².K)
0,47
Material
Espessura (cm)
Bloco de concreto
14
Reboco (face interna)
2,5
Transmitância Térmica (U)
1,97
( W/m².K)
Fonte: Dados obtidos através do Software Domus Eletrobrás
A transmitância térmica da composição das paredes do container, segundo resultado
do programa, é de U= 0,47 W /m².K , já as paredes em bloco de concreto da
circulação vertical apresentam U= 1.97 W /m².K. Conforme recomendação da zona
bioclimática 3, a transmitância térmica deve ser <3,6, o que indica que a composição
especificada para as paredes está em conformidade com os parâmetros necessários
para zona 3. De modo a garantir a eficiência energética do edifício, foi especificado
telhado sobre a estrutura do container. O Quadro 3 apresenta a composição da
cobertura que também atende a norma, onde U<2,0 W/m²k (para a cobertura).
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115
Quadro 3 – Composição da cobertura sobre o container e composição da cobertura sobre bloco
da circulação vertical em alvenaria de bloco de concreto.
Composição Cobertura
Container
Material
Bloco de circulação vertical em alvenaria
Espessura (cm)
Telha de fibro-cimento
Aço
2
0,2
Foam Insulation
3
OSB
1,25
EPS
2
Câmara de ar
Espessura (cm)
Laje de concreto
12
Reboco (face interna)
2,5
Câmara de ar
10
Chapa de gesso
1,25
Transmitância Térmica (U)
0,62
10
Transmitância Térmica (U)
(W/m².K)
Material
0,21
(W/m².K)
Fonte: Dados obtidos através do Software Domus Eletrobrás
De acordo com as especificações dos materiais em projeto, a residência recebeu
classificação “A” em eficiência energética no que diz respeito à envoltória, conforme
ilustrado na Figura 17.
Figura 17 – Simulação RTQ-C
Fonte: Dados obtidos através do Software Domus Eletrobrás
Através do estudo realizado nesta pesquisa foi comprovado que o emprego do
container para o fim residencial é condição viável, de acordo com a combinação dos
materiais especificados para a envoltória, os quais atendem a necessidade de
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116
desempenho energético requisitada na NBR 15575 (2013), no que se refere à
transmitância térmica.
5. Conclusão
A pesquisa demonstrou que reuso de container na construção civil, agrega aspectos
positivos como: a redução de materiais empregados, a redução dos trabalhos de
fundações, terraplenagem, estrutura, mão-de-obra. Consequentemente agiliza a
execução, além de minimizar a quantidade de resíduos de obra. A modularidade é
outra qualidade dos containers, suas dimensões e características construtivas são
normalizadas pela ISO 668 (2013), o que facilita a implantação do edifício a diferentes
condições de terreno, sem necessidade de grandes movimentações no perfil natural,
proporcionando as mais diversas configurações de modo prático e racional. Além
disso, a intermodalidade do material permite o transporte por: caminhões, trens e
navios. Esta característica possibilita a mobilidade do edifício feito em container, que
pode ser desmontado e transportado à outra localidade. Esta qualidade enfatiza o
apelo sustentável deste tipo de construção e reduz a pegada ecológica.
Através do projeto desenvolvido com o uso de containers e sua simulação no software
Domus Eletrobrás foi constatado que a proposta de reaproveitamento do material é
condição viável na construção civil do ponto de vista de conforto e eficiência
energética. As dimensões do container proporcionam boa organização espacial dos
ambientes internos e sua modularidade permite infinitos arranjos de modo prático e
racional de acordo com o programa de necessidades de cada projeto. O container pode
ser revestido por vários materiais, pois se associa bem a madeira, vidro, gesso,
concreto e etc. Com a combinação adequada de materiais adicionados a sua
envoltória, alcança grande capacidade de isolamento térmico e acústico atingindo as
exigências de nível conforto para a habitação conforme a NBR 15575 (2013). A
construção em container apresenta grande potencial construtivo, qualidade do
material empregado, além de unir conceitos de sustentabilidade como: reuso de
materiais descartados, eficiência energética, construção com menos geração de
resíduos e velocidade no processo de construção.
Referências
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Edificios habitacionais de até cinco pavimentos- Desempenho. Parte 1:
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Recebido em 31/07/2015 e Aceito em 07/12/2015.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 - Dezembro de 2015
Edição Temática em Sustentabilidade
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Resíduos veiculares na ressignificação do espaço público
Public space ressignification from vehicular waste
Paulo Cesar Meira, Anna Maria Abraão Khoury Rahme
Universidade Anhembi Morumbi - Arquitetura e Urbanismo
{[email protected], [email protected]}
Resumo. O artigo relata uma investigação sobre intervenções no espaço público,
buscando novas plataformas de construção mencionando a estrutura de ônibus após
seu descarte, problema gerado pelo descaso em relação ao material inerte decorrente
das frotas de ônibus da antiga CMTC (Companhia Metropolitana da cidade de São
Paulo), que atualmente é propriedade da SP TRANS. A partir do levantamento de
trabalhos desenvolvidos por Coletivos - grupo de pessoas com interesse comum,
atuando em diversas disciplinas que designam intervenções no espaço público – nos
últimos anos, questões de dimensões sociais, econômicas, espaciais, culturais e
sustentáveis são abordadas como uma postura arquitetônica. Ações estas que, em
conjunto, constituem meios alternativos de realizar uma nova forma de urbanismo
gerado pelo usuário.
Palavras-chave: Ressignificar, ônibus, descarte, sustentabilidade, coletivo
Abstract. This paper reports an investigation about public interventions, in order to
search new building platforms regarding bus structure after its disposal, problem
caused by the neglect of inert material resulting from the bus fleets of the old CMTC
(Metropolitan Company of São Paulo). From the survey of works developed by
Collectives - groups of people with common interests, working in various disciplines
resulting in public space interventions -, in the current urban context, issues of social,
economic, spatial, cultural and sustainable dimensions are discussed as an
architectural emplacement. All these actions together could be seen as an alternative
ways to achieve a new form of user’s generated urbanism.
Key words: Reframing, Public buses, Sustainability, Waste, Collective.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística
Edição Temática em Sustentabilidade
Vol. 5 no 3 – Dezembro de 2015, São Paulo: Centro Universitário Senac
ISSN 2179-474X
Portal da revista: http://www1.sp.senac.br/hotsites/blogs/revistainiciacao/
E-mail: [email protected]
Esta obra está licenciada com uma Licença Creative Commons Atribuição-Não Comercial-SemDerivações 4.0
Internacional
1. Introdução
No atual contexto urbano e arquitetônico, entende-se o conceito de Sustentabilidade
como uma alternativa viável de enfretamento de problemáticas em dimensões
econômicas, sociais, ambientais e culturais. Este conceito é hoje o novo paradigma de
desenvolvimento equilibrado, democrático e integrador, dentro de uma ordem cujo
objetivo primordial é obter lucro econômico em detrimento da qualidade de vida do
ser humano, imposta desde a Revolução Industrial do século XVIII.
A partir desse período o aumento exponencial de pessoas fora deste
“desenvolvimento” implicou na população uma busca incessante de desenvolver
mecanismos que agreguem cada vez mais conforto (e aceitação) ao seu modo de vida
(MOURA, 2011). As consequências destas ações acabaram refletindo-se em uma
série de questões sociais, que podem ser exemplificadas com o atual cenário de
consumo e descarte desenfreado; problemas de gestão de resíduos; gigantescos
abismos e exclusões sociais; déficit habitacional; degradação do meio ambiente, entre
outros aspectos.
Neste sentido, seria razoável considerar que tais questões seguem simultâneas e
subsequentes e devem ser consideradas como indissociáveis? E, se assim seguem,
quais seriam as direções palpáveis para uma transformação em prol da
sustentabilidade em todas as suas dimensões1?
É sabido, que a demanda por produtos novos e mais modernos tem implicado em um
grande custo para os recursos naturais ainda disponíveis. Os gastos energéticos e a
excessiva utilização de matérias primas, como água e energia durante a produção,
uso e final de ciclo de vida dos bens produzidos, acabam por piorar o preocupante
estado em qual se encontra o meio ambiente. Além disso, o crescimento do mercado
automotivo criou um grave problema urbano de descarte devido aos volumes de
resíduos gerados, a grande diversidade de materiais envolvidos e sua toxidade
(ALQUINO, 2012). E, ainda, seria razoável considerar que “está ficando cada vez
mais evidente que não poderemos sustentar esta rápida obsolescência sem considerar
os impactos ambientais e econômicos que ela causa ao planeta” (ALQUINO, 2012).
Com essa constante busca em minimizar os gastos energéticos produzidos pelas
grandes indústrias e, como a cidade é gerida por essas incorporações, a
responsabilidade de novas posturas em estabelecer critérios de como lidar com essas
matérias, que são colocados em pauta. Para Cotti (2014), apesar da enormidade do
desafio diante da situação, o autor defende que a sociedade atual possui o senso de
sabedoria coletiva para confrontar e resolver os problemas criados por nossa
insensibilidade global em relação ao meio ambiente. O autor ainda afirma que é ainda
possível criar um futuro alternativo diferente deste cenário previsível.
Antes de tudo, precisamos começar a fazer um
esforço para reutilizar as construções existentes o
máximo possível. Está ao nosso alcance
economizar em até 40 % a energia que utilizamos
atualmente e limitar assim as emissões de
carbono, simplesmente renovando de maneira
eficiente o contexto atual. (COTTI, 2014.
p.114)
Dimensões sociais, ambientais e econômicas. Tríade da sustentabilidade, proposta por Ignacy Sachs
(1993).
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Além das premissas de Cotti em reutilizar ao máximo as construções existentes,
novas tecnologias irão permitir projetar e/ou construir de maneira a exigir menos
recursos naturais. Para mobilizar a arquitetura e o urbanismo em torno desta
perspectiva inteiramente ecológica, deve-se levar em consideração o reuso de
materiais, o grau de utilização das matérias-primas não renováveis e as emissões de
carbono em sua produção, além de contextualiza-la social e economicamente
(SOMMER, 2014, p.380).
Afim de complementar a questão e contextualiza-la dentro da pesquisa, pode-se
recorrer à afirmação de Medina (2003), sobre as sucatas abandonadas a céu aberto
não terem mais lugar no século XXI. Para o autor, é certo que o futuro do automóvel
e sua indústria passam, necessariamente, pela capacidade dos fabricantes de reduzir
e/ou compensarem seus efeitos danosos sobre o ambiente, desde a fabricação de
materiais até a reciclagem de autopeças, em fim, de vida.
Tais entendimentos revelam algumas das inquietações que precederam os
levantamentos de dados sobre resíduos veiculares, especificamente, nos espaços
destinados, pelo Município de São Paulo, às frotas de ônibus do transporte público,
responsáveis por abrigar mais de 400 unidades. Estes veículos, que antes faziam
parte da antiga frota pertencente à Prefeitura Municipal de São Paulo (PMSP),
deixaram de ter utilidade na troca de gestão efetivada em 1995 e criaram mudanças
no contexto capazes de gerar, na investigação, a pergunta sobre qual será o destino
dos veículos inservíveis retirados de circulação?
2. Arquitetura Reciclável
Os questionamentos surgidos, durante os estudos conceituais, direcionaram a
pesquisa para um levantamento de casos já executados no âmbito da arquitetura, do
design e do urbanismo, conduzindo aos chamados Coletivos 2. Alguns destes grupos
que surgiram na última década como Archigram, Archzoom, Constant , Coop
Himmeld(I)au, GIAP (Grupo internacional de Arquitetura Prospectiva) Haus-RuckerCo, Superstudio demostram tais preocupações e questionamento sobre o espaço
ocupado, tendo a oportunidade de construir ou ensaiar protótipos de equipamentos
urbanos para cidade.
É o caso do Coletivo LAB.PRO.FAB3, que realiza suas intervenções em contêineres
convertidos em outros materiais reciclados. Seus projetos trazem usos alternativos
para estes materiais e promovem, ao mesmo tempo, a inclusão de pessoas que
ficaram de fora do discurso formal da cidade. Cursos nos segmentos de hip hop,
comunicação popular e alternativa, artes cênicas e música compõem algumas das
diversas atividades que o Coletivo propõe. Tais ações, em conjunto, constituem outros
meios alternativos de realizar uma nova forma de urbanismo emergente (REVISTA
SUMA, 2012).
Coletivos: Grupo de pessoas com interesses comuns, atuam em diversas disciplinas designam
intervenções no espaço público
2
3
www.labprofab.com
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Fonte: LAB PRO. FAB – Cidades Eletronika - Infográfico utilizado pela equipe para o desenvolvimento de
bancos com o desenvolvimento de estudantes e profissionais das áreas de Design, Artes , Arquitetura e
Urbanismo, 2012.
Estes e outros projetos, no âmbito urbanístico – que passam a integrar o chamado
‘micro urbanismo instantâneo’ -, tem como principal premissa oferecer um espaço
público alternativo que facilita o intercâmbio, a expressão, a formação, a recreação e
a inclusão de jovens famílias (REVISTA SUMA, 2012).
Para a grande parte destes Coletivos, as ações promovidas junto à população por
meio de processos participativos, seja na concepção do projeto ou em sua execução,
são extremamente importantes por uma transformação de forma horizontal. Acreditase que este forte poder de empoderamento proposto mobiliza profundamente a
população afim de construir democracia.
Um processo de mobilização passa por dois
momentos. O primeiro é do despertar do desejo e
da consciência da necessidade de uma atitude de
mudança. O Segundo é da transformação desse
desejo e dessa consciência em disposição para
ação e na própria ação. (TOTO e WENECK,
2004. P.79)
Ainda, pela publicação da revista Suma (2012), deve-se lembrar que entre as
posturas emergentes em urbanismo e arquitetura, está a de “entender que a prática e
os comportamentos sociais existentes são os que criam os espaços públicos”, e que no
projeto, os verdadeiros protagonistas não são os que criam as formas e sim os que se
apropriam dela.
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3. Protótipos Urbanos
Os conceitos e definições, para compreensão de um protótipo urbano, precedem o
reconhecer os espaços físicos nas particularidades do tecido sócio espacial, dentro do
âmbito da complexidade urbana. Os experimentos, sob a ótica da compreensão
desses espaços, promovem a mudança da dinâmica sociocultural, avaliando o
desempenho de uma nova abordagem, função, rede e conexão para novas realidades
do contexto urbano. Por sua vez, o desenvolvimento estabelecido demonstra os
resultados como agregador de soluções as necessidades exigidas para o espaço físico
tornando um projeto piloto especificamente elaborado para as transformações locais.
Sendo, a proposta em questão, um resultado de medidas avaliadoras a serem
adaptadas e multiplicadas na dinâmica da cidade.
A partir desse entendimento o desenho da forma de um protótipo muitas vezes
define-se pelo material utilizado e o volume concebido, em muitos casos, é um
elemento secundário. Como protagonistas dessa vertente tecnologias disponíveis
ressaltam o enfrentamento para novos desafios em renovar a cidade, um
engajamento para novos modos de contribuir com a sociedade.
Precisamos de protótipos urbanos nas cidades de modo integrar
todo o fluxo de processos, estabelecer novas relações entre
esses processos, e transformar a estrutura inerente de uma
cidade. Protótipos urbanos são como singularidades que
conectam fluxos existentes com algo novo, uns processos
impostos de fora, de baixo para cima, um processo global,
virado ao avesso vindo do coração de uma comunidade.
(BUNSCHOTEN, 2014, p.616)
Nesse sentido, posturas engajadas no cunho social e sustentável trazem à tona modos
de elaboração de cidade e, assim, se constituem em incubadoras de propostas
voltadas para o micro urbanismo no sentido de resistir uma dinâmica (ZEIN, 2014).
Mas gostaria de pensar que talvez a cidade pudesse mudar.
Não com planos mirabolantes e planejamentos verbosos, nem
descartando tudo o que não teve, desde o início, um gênio bom
fundante; mas confiando que o bom exemplo do bom projeto
de arquitetura também possa ajudar a transformar e
contaminar outras vontades que a melhorem. Na cidade melhor
talvez faça mais falta, em vez dos arquitetos iluminados, os
profissionais, os profissionais atentos, capazes de aproveitar
mesmo as pequenas oportunidades como alavancas para
levantar o mundo. E, para que sejam bem sucedidos, sua base
instrumental só poderá ser aquela do saber fazer disciplinar da
arquitetura, concertado e temperado pelo conhecimento
projetual, temperado por uma visão histórica, teórica e crítica,
destilado da acumulação de outras boas experiências – que se
leem, questionam, comparam e redirecionam, na tentativa de
sempre e outra vez fazer melhor. E essa prática não tem fim:
tem apenas horizonte. (ZEIN, 2014. p. 155)
A arquitetura como ferramenta de transformação pode aportar um conhecimento
específico e, ao mesmo tempo, mediar a construção das condições que possibilitem
essa transformação. Sendo assim, no contexto atual os resíduos veiculares,
especificamente, os ônibus do transporte público em investigação, ao final de seus
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ciclos de vida útil, estão designados ao armazenados em três grandes terrenos da
grande São Paulo em locais situados na Região Sul, na Região Centro-Oeste e na
Região Leste (SPTV, 2009)4.
Garagem Gatusa Av. Guido Caloi, 1200, São Paulo, SP. Fonte: SPTRANS, 2012
Por motivos de falência das empresas que geriam o transporte público, com contrato
vinculado à Prefeitura, esta fica de posse de centenas de ônibus como garantia, até
que possam ser removidos em processo de liberação judicial e serem destinados ao
leilão para as empresas que utilizam sucatas.5
Outra questão, igualmente relevante, é de quanto tempo esses ônibus estão parados
nesses terrenos, a permanência dos veículos sob o terreno, resíduos como óleo do
motor, peças que contém substâncias prejudiciais implica na contaminação de solo
sem algum trabalho preventivo preservando o solo.
Precede a questão, o entrave estabelecido pela própria legislação, pois, não há lei de
abrangência nacional que incentive e regulamente a reciclagem de veículos, ou
mesmo de desembaraço e baixa do veículo nos órgãos de trânsito. E, mais ainda, o
processo de reciclagem se resume aos casos que se mostrem economicamente viáveis
(AEA, 2012). Por tudo isso, a discussão, em torno dos ensaios de projetos pilotos
para paisagem urbana, exige um reengajamento contextual fundamental para
entendimento das infraestruturas para sua efetivação no discurso da arquitetura
reciclável. (JACUBOVICH, 2012)
4
SPTV. Cemitérios de ônibus estão lotados na capital paulista. Disponível em:
http://g1.globo.com/Noticias/SaoPaulo/0,,MUL1158006-5605,00cemiterios+de+onibus+estap+lotados_na+capital+paulista.html. Acessado em 01/05/2014.
Entrevista com José Geraldo P. de Jesus, Gerente Administrativo das garagens de ônibus - SPTRANS,
cedida 15/10/2014
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4. Empoderamento e Ressignificação do espaço
Ocupar e ressignificar o espaço público, em sua primeira estância, contempla o fator
do empoderamento popular. Segundo Lerner (2011), criar uma relação de vida com
o próprio espaço físico é um exercício de fomentar multiplicadores desta ação, assim,
para o autor as necessidades locais são as diretrizes para gerir espaços obsoletos
geridas por diversas plataformas.
Se só existe a atividade econômica e falta gente, é essencial
incentivar a moradia. Se o que ocorre é a falta de atividade, o
importante é incentivar os serviços. Se um terreno vai ficando
vazio, é importante trazer alguma coisa para aquele local. Um
terreno, quando vazio, tem que ser preenchido imediatamente,
de preferência com alguma atividade de animação. (LERNER,
2011, p.37).
O autor defende a possibilidade de até se instalarem estruturas provisórias para
consolidar algumas atividades, até que surjam novos projetos.
É a acupuntura das novas estruturas através de instalações
portáteis, que possam ser colocados no local até para garantir
vida, revitalizar uma região, gerando a função urbana que
esteja faltando. A mistura de funções é importante. E a
continuidade do processo é fundamental. Continuidade é vida.
(LERNER, 2011. p.37).
Neste sentido, seria razoável considerar que o empoderamento gerado pelo usuário
em contraposição ao urbanismo tecnocrático resulta em pertencimento ao espaço
destinado a uma transformação, viabilizando novas estratégias de como pensar o
espaço físico. Rebar (2014) chama de urbanismo dos táticos aqueles que inventam
usos temporários nas brechas do tecido socioespacial e, defende estes processos, ao
afirmar que padrões circulares, híbridos e sobrepostos de consumo de recursos,
tendem a estimular uma ecologia social resiliente e diversa.
Os processos de desenvolvimento propiciam ferramentas aos
habitantes das cidades para que configurem seus espaços,
readaptem as infraestruturas urbanas estáticas existentes de
modo a responder à ecologia social dinâmica dos cidadãos
metropolitanos. (REBAR, 2014. p. 37).
Neste sentido, para ambos os autores Lerner (2011) e Rebar (2012), a capacidade
de viabilização de novas formas emergidas são resultados de uma necessidade. Sendo
assim, repensar a arquitetura e urbanismo em torno de sua concepção de espaço
físico pode ser apresentada em duas diretrizes afluentes: primeira, um desejo
exercido pela população para suprir uma necessidade local e, segundo, a arquitetura e
urbanismo serem a ferramenta técnica para tornarem viáveis os projetos.
A esse conjunto de práticas, as arquiteturas emergentes podem ser expressas em
formas geometricamente simples, porém simbolicamente “impuras” (DI PECO, 2012).
Como é o caso do uso de contêineres, que, apesar de geometricamente prismáticos,
possuem forma que evidenciam sua origem industrial antes de sua unicidade, ou
presença monumental. De acordo com Di Peco (2012), as superfícies rústicas, os
volumes desarticulados, os materiais locais e baratos, o pré-fabricado, o reutilizado, a
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mão de obra “entusiasta”, a pintura de cores fortes e o graffiti, são rasgos distintivos
destas outras áreas que se manifestam em modos democráticos de fazer arquitetura.
Por sua vez, Stasi (2012) ressalta outro aspecto importante das chamadas
arquiteturas emergentes, “o micro urbanismo urbano”, como o autor intitula, aponta a
necessidade de não definir a ocupação do espaço e sim permitir que a flexibilidade, no
acaso do uso, ‘caduque’ ou mude.
Para mim é importante não hipotecar o futuro do espaço, se
construo algo destinado a uma atividade e num futuro essa
necessidade se torna obsoleta, eu vejo claro que não há que
deixar o edifício no lugar, acredito que deveria ser desmontado
e transladado a um lugar onde possa funcionar novamente por
que é aí onde existe a necessidade. (STASI, 2012. p. 92).
5. Considerando o espaço público como laboratório
Para desenvolvimento equilibrado, democrático e integrador à cidade, os
denominadores comuns tradicionais impostos pela Carta de Atenas 6 são questionados
por diversos autores como já supracitado, entretanto, Branzi (2012). Acrescenta,
ainda mais, a questão considerando o espaço físico fértil para novas abordagens de
experimentação. Nesse sentido, a cidade torna-se laboratório para integrar a
multiplicidade nos espaços vazios possivelmente obsoletos na trama socioespacial
promovendo novas oportunidades/possibilidades de expor o espaço físico.
Os limites de um espaço podem ser entendidos como uma zona
dinâmica multifuncional que serve tanto o lado de dentro como
lado de fora: isso permite integrar e proteger o experimento,
oferecer-lhe uma interface pública, dar uma contribuição
especial e informativa par o espaço urbano e fornecer uma
identidade pública culturalmente reconhecível para acentuar o
significado e o valor atribuído ao experimento. (FELSON E
POLLAK 2014. p. 359)
Tais oportunidades como teatro, música, dança, circo, cultura digital, artes visuais,
artes manuais, literatura, cinema e vídeo, esportes, meio ambiente, alimentação,
saúde, ações para cidadania tornam-se possíveis modalidades do espaço físico gerado
pelo usuário, que podemos acompanhar o novo comportamento da população que
transita pelo local e consecutivamente trará um retorno consequente aos efeitos de
novas arquiteturas passivas. Se pensarmos, numa ressignificação do resíduo veicular,
ou seja, o uso da estrutura da carcaça de ônibus como um modulo construtivo,
podemos sintetizar as múltiplas possibilidades citadas na composição de um
infográfico onde a estrutura veicular constitui-se em protótipo urbano.
A Carta de Atenas é o manifesto urbanístico resultante do IV Congresso Internacional de Arquitetura
Moderna (CIAM), realizado em Atenas em 1933.
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Infográfico elaborado pelo autor, 2015.
Felson e Pollack (2014) destacam a efetiva participação dos escritórios e estúdios
de coletivos que utilizam a cidade como um receptor para cultivar novas vertentes do
campo de arquitetura e urbanismo, de como fazer projetos integrados com a
participação efetiva da sociedade, experimentos urbanos como um palco para
realizações de protótipos de diversas áreas.
Não apenas experimentos ecológicos em espaços públicos
podem ter componentes educativos e demonstrativos, mas
esses componentes acabam sendo parte integrante do
programa social e cultural de realizar experimentos em cidades.
É a conexão – dizer para as pessoas o que está sendo feito –
que permitirá que a existência do experimento no espaço
compartilhado de uma cidade faça sentido.
A ideia de espaços públicos como ambientes de pesquisa pode
ser compreendida como uma prática híbrida, que fornece
oportunidades para influenciar cidades de novas formas,
monitorar, evoluir e se adaptar às condições ecológicas urbanas
em transformação. (FELSON E POLLAK 2014. p. 359)
6. Considerações Finais
Constatada a escassez literária acadêmica sobre o tema em questão, a pesquisa foi
direcionada para os sites oficiais e as leis que regulamentam as atividades de uso e
descarte das frotas de ônibus do Serviço Público. Igualmente, buscou-se familiarizar
com o assunto assistindo às oficinas oferecidas pelos coletivos e artistas que atuam no
espaço público com suas intervenções artísticas e urbanas, trazendo uma contribuição
imprescindível à pesquisa quanto à compreensão do papel desempenhado pelas
referidas plataformas e suas propostas.
Sendo assim, estes estudos confrontam os levantamentos de dados da situação
permanente dos ônibus que integravam a CMTC com as informações levantadas junto
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à SPTRANS, atual órgão que administra a mobilidade na cidade de São Paulo,
questionando o uso desse material considerado “residual”.
Posteriormente, se
utilizam do material resultante da revisão bibliográfica elaborando camadas de
informações, que se aglutinam para um embasamento desafiador sobre a utilização
dessa matéria-prima regendo, como protagonista, novos formatos para a arquitetura
e o urbanismo.
A pesquisa aponta que os ensaios desenvolvidos com prototipos para cidade, bem
como o novo urbanismo gerado pelo úsuario, são eficazes e tendem a estimular uma
diversidade social resiliente. Além disso, contribuem com uma sabedoria coletiva para
confrontar essas problematicas, visando um mundo mais sustentável pelo
engajamento na preocupação do que vem sendo produzido hoje, buscando, em futuro
não tão distante, contribuir para um mundo mais palpável às condições humanas.
Pôde-se perceber que os conhecimentos da situação-problema proporcionaram,
diversas diretrizes que nortearam as disciplinas/técnicas abordadas no percurso de
como fazer Arquitetura e Urbanismo de modo participativo, para o entendimento de
uma postura arquitetônica para mediar em diversos conflitos e necessidades que a
cidade revela.
A ressignificação do uso da estrutura do ônibus coletivo é um retorno para a
apropriação do espaço público e sua idealização por equipes, que exaltam a
necessidade de reavaliar os critérios de ocupação do uso de solo pela sociedade,
criando uma iniciativa mais humana em paralelo ao crescimento da cidade. Para isso,
esses coletivos multidisciplinares agregam conhecimentos e postura arquitetônica até
então desconhecidos no Brasil, e são exaltados por inúmeros autores, graças à
preocupação para entender os desafios dessa nova prática de fazer uma arquitetura
para o desenvolvimento sociocultural, reavaliando paradigmas e imprimindo
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desperdício? Disponível em: http://www.saopauloantiga.com.br/cemiteriode-onibus-ou-monumento-ao-desperdicio/. Acessado em 01/05/2014.
SAOPAULOANTIGA. Cemitério de Ônibus estão lotados na capital
paulista. Disponível em:
http://g1.globo.com/Noticias/SaoPaulo/0,,MUL1158006-5605,00cemiterios_de+onibus+estao+lotados+na+capital+paulista.html. Acessado
em 01/05/2014.
Recebido em 30/07/2015 e Aceito em 13/10/2015.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 - Dezembro de 2015
Edição Temática em Sustentabilidade
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Contribuição para rede técnica de resíduos sólidos da construção
civil: levantamento do perfil socioeconômico dos trabalhadores
dos pontos de entrega voluntária - PEVS
Contribution to network technical of construction solid waste: lifting the socioeconomic profile of the
workers’ voluntary delivery points - VDPS
Loraine Lubachewiski Barquero, Emília Satoshi Miyamaru Seo
Centro Universitário Senac
Grupo de Pesquisa em Sustentabilidade
{[email protected], [email protected]}
Resumo. Este artigo é parte da identificação da rede técnica dos resíduos de
construção civil (RCC) do município de São José dos Campos/SP, que contribuirá na
proposição de ferramentas de gestão do município. Pretende-se dar ênfase aos
operadores da rede técnica de RCC, afim de realizar o levantamento do perfil
socioeconômico desses agentes sociais e diagnosticar a infraestrutura dos pontos de
entrega voluntária (PEVs). Para desenvolvimento deste trabalho foram levantados
dados primários por meio de um questionário aplicado aos trabalhadores dos PEVs e
os dados secundários sobre entendimento sobre rede técnica de resíduos sólidos e
resíduos sólidos da construção civil. Com base nos resultados, permitiu a confirmação
da relevância dos PEVS para o contexto ambiental e social do município de São José
dos Campos. Relacionadas às questões de higiene e segurança constatou-se que a boa
saúde ocupacional dentro dos PEVs é ferramenta indispensável para obtenção de
qualidade de vida e desempenho do trabalhador. Concluiu-se que os agentes sociais
operadores se sentem orgulhosos de seu importante papel para o meio ambiente e
para o cumprimento do Plano de gestão do município de José dos Campos, e podem
contribuir grandemente para o aprimoramento da gestão e gerenciamento das
atividades.
Palavras-chave: PEVs. Rede técnica de resíduos sólidos. Ferramentas de gestão.
Perfil socioeconômico.
Abstract. This article is part of the identification of the technical network of building
waste in São José dos Campos/SP, which will help in proposing the municipality
management tools. In this project, we intend to give emphasis to the technical
network operators RCC in order to survey the socioeconomic profile of these agents
and diagnose social infrastructure of Voluntary Delivery Points (VDPs). For
development of this work we were raised primary data through a questionnaire
administered to employees of PEVs and secondary data on understanding of technical
network of solid waste and solid waste construction. Based on the results, allowed the
confirmation of the relevance of VDPs for environmental and social context in São José
dos Campos. Related to issues of health and safety it was been found that good
occupational health within the VDPs is indispensable for achieving quality of life and
worker performance tool. It was concluded that operators social workers feel proud of
their important role for the environment and for the fulfillment of the management
Plan of the Municipality, and can contribute greatly to the improvement of
management and management of activities.
Key words: VDPs. Network technical of solid waste.
Management tools.
Socioeconomic profile.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística
Edição Temática: Sustentabilidade
Vol. 5 no 3 - Dezembro de 2015, São Paulo: Centro Universitário Senac
ISSN 2179474 X
Portal da revista: http://www1.sp.senac.br/hotsites/blogs/revistainiciacao/
E-mail: [email protected]
Esta obra está licenciada com uma Licença Creative Commons Atribuição-Não Comercial-SemDerivações 4.0
Internacional
1. Introdução
A produção dos resíduos sólidos é resultante das diversas atividades antropogênicas,
como aquelas ocorrentes na indústria da construção civil. Considerada uma das mais
importantes para o desenvolvimento econômico e social do Brasil, o setor se
caracteriza também como um dos grandes geradores de impactos ambientais, tanto
pelo consumo de recursos naturais, como pela modificação da paisagem e da geração
de resíduos (JOHN, 2000). Ao final dos anos 1990, o autor Pinto (1999) ao descrever a
situação dos resíduos de construção civil (RCC) no país afirma que, em muitos casos,
esses eram descartados em terrenos baldios impactando o solo, atraindo animais
transmissores de doenças e comprometendo a paisagem.
As diretrizes de gerenciamento para os RCC foram estabelecidas no país por meio do
Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) que promulgou em 2002 a Resolução
nº 307, determinando aos geradores de resíduos da construção civil a
responsabilidade pelos resíduos gerados resíduos das atividades de construção,
reforma, reparos e demolições de estruturas e estradas, bem como por aqueles
resultantes da remoção de vegetação e escavação de solos (BRASIL, 2002). A
resolução estabeleceu também as diretrizes, critérios e procedimentos para a gestão
municipal dos resíduos da construção civil, definindo entre as responsabilidades do
poder público, a necessidade de apoio às ações de destinação para os pequenos
geradores.
O presente trabalho é parte da identificação da rede técnica dos resíduos de
construção civil do município de São José dos Campos/SP que propiciará ao grupo de
pesquisa a proposição de ferramentas de gestão. O município de São José dos Campos
(SJC), situado na região do Vale do Paraíba, no estado de São Paulo, gera cerca de
1500 t/d de RCC (FIORE et al., 2008). O município dispõe de lei municipal que
contempla especificamente os resíduos de construção civil (Lei Municipal nº
7.146/2006) e elaborou em 2008, um Plano de Gestão para os resíduos que indicava a
necessidade de implantação de pontos de entrega voluntária (PEVs) para receber
resíduos da construção civil em pequenas quantidades (até um metro cúbico)
(PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS, 2006). Na atualidade, dez PEVs
estão em operação no município de SJC, distribuídos nas regiões sul, sudeste, norte e
central. Esses locais recebem gratuitamente os resíduos gerados no município como
restos de obras de construção (tábuas, tijolos, telhas, tubulações, pisos), móveis e
equipamentos domésticos (sofás, cadeiras, geladeiras), pilhas, baterias, lâmpadas
fluorescentes inteiras, restos de poda, tinta e óleo de cozinha.
A infraestrutura dos PEVs implantada foi verificada neste estudo, uma vez que nesses
fixos de beneficiamento ocorrem ações de recebimento, segregação e armazenamento
de parte dos resíduos de construção civil gerados no município. Os funcionários dos
PEVs, retratados neste artigo, figuram na rede técnica em estudo como os agentes
sociais operadores. Possuem um papel fundamental nas atividades de gerenciamento
dos RCC, pois são responsáveis pela geração de dados, conscientização e apoio aos
usuários, operacionalização das atividades de segregação e de armazenamento dos
resíduos sólidos e por isso o seu perfil socioeconômico foi levantado.
O objetivo deste trabalho é contribuir para a rede técnica de resíduos da construção
civil do município de São José dos Campos, por meio do levantamento do perfil
socioeconômico dos trabalhadores dos pontos de entrega voluntária e diagnóstico da
infraestrutura dessas unidades.
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2. Redes técnicas de resíduos sólidos
Desde a antiguidade, as redes possibilitam ver a trajetória de conexão entre pontos e
dão mobilidade aos fluxos. O surgimento da teorização e conceituação das redes
técnicas só ocorreu no século XII, porém o desenvolvimento de sistemas que remetem
ao sentido de redes é anterior a Era Cristã, exemplificado por meio da construção de
aquedutos, desenvolvimento de estratégias militares e sistemas viários e de irrigação
(FIORE, 2013).
Segundo Rutkowski, Pereira e Demantova (2010):
As redes técnicas são formadas por um sistema integrado de objetos técnicos (fixos no espaço) e de
fluxos (matéria, serviços e informação em circulação) que criam as conexões entre os objetos
técnicos no território. Essas conexões podem ser físicas e invisíveis. Sempre que existir
infraestrutura física e transporte de serviços, matérias e informação circulando nas estruturas, há
redes técnicas.
No caso das redes técnicas de resíduos sólidos, estas descrevem as atividades
humanas no território, e, por isso, devem levar em conta os agentes sociais que
demandam, operam e utilizam os sistemas, bem como os fixos envolvidos nas
atividades de manejo, a matéria, os valores e as informações que são colocadas em
circulação. Na rede técnica de resíduos sólidos, incluem-se os seguintes agentes
sociais: os geradores, nas atividades exercidas no decorrer do tempo; os gestores,
que determinam e fiscalizam as condições/diretrizes em que se desempenham as
atividades; e os operacionalizadores, que asseguram o efetivo manejo dos resíduos
sólidos (FIORE, 2013). Para esta autora, a rede técnica é formada por um sistema de
fixos que se integram para circular a matéria, serviços e informação. Desta forma, é
indispensável descrever tais fixos de forma a compreendê-la. Os elementos físicos que
garantem as atividades relacionadas a geração de resíduos, beneficiamento e
disposição são abordados como objetos técnicos fixos no espaço, ou seja, são os fixos
da rede técnica.
As atividades humanas geram resíduos sólidos com características específicas. Neste
sentido, em tais fixos, a rede técnica de resíduos sólidos se inicia quando o gerador de
restos determina quais são impróprios sob o seu ponto de vista. Nos locais de
exercício de atividades, a geração de resíduos pode ser apresentada como difusa,
principalmente nos que são utilizados para uso coletivo. Nos fixos de geração, podem
ocorrer as atividades relacionadas aos resíduos, como o beneficiamento e a disposição.
Considerando que os resíduos sólidos não são o objetivo das ações humanas, em
geral, estes são somente segregados, acondicionados e temporariamente
armazenados. O beneficiamento dos resíduos pode haver em boa parte dos fixos da
rede, porém como há unidades específicas para esse fim, foram categorizadas neste
trabalho como fixos beneficiadores (FIORE et al., 2008). Os resíduos são dispostos no
solo quando as possibilidades de reuso, minimização e reciclagem estão esgotadas. A
disposição pode ser temporária ou permanente, de forma legal ou clandestina. Sendo
assim, entre os fixos da rede técnica de resíduos sólidos, ocorre o fluxo dos resíduos
reversos e rejeitos. A figura 1 apresenta o diagrama de síntese da rede técnica de
resíduos sólidos.
Para o autor Santos (2008), as diretrizes da gestão de resíduos sólidos determinam os
fluxos da rede técnica, condicionados pelas dinâmicas do uso territorial que viabilizam,
demandam e dão suporte às ações. Essas ações de resposta aos serviços fornecidos
pela rede podem não especificar a totalidade dos conflitos existentes entre os agentes
sociais, contudo apresentam a qualidade dos fluxos. Sendo assim, compreender as
características da população propulsora e as forças de atuação da rede técnica é um
elemento central para ser considerado afim de se obter uma melhora continua.
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Figura 1 - Rede técnica de resíduos sólidos.
Fonte: FIORE, 2013.
Tipos de redes técnicas
As atividades humanas desempenhadas no território geram diversos tipos de resíduos
e atribuições de gerenciamento que, em função das características dos materiais,
configuram a rede técnica real. A rede técnica idealizada pretende vincular o vetor da
sustentabilidade em todas a suas dimensões, orientada por acordos sociais. A rede
técnica legal é construída com os fluxos e fixos apontados pelos instrumentos legais
pertinentes ao tema, sendo o foco deste trabalho.
No Brasil, a rede técnica legal pode ser compreendida como uma cartilha de fixos
ideais previstos para serem colocados em prática no país e servir de guia para a
escolha de soluções de destinação dos resíduos sólidos. Essa rede tende a ganhar
novas características quando associada ao âmbito municipal, pois será agregada a
legislação incidente na esfera estadual, bem como a legislação do próprio município.
Portanto, a rede técnica legal a ser utilizada pelos agentes sociais gestores terá
contornos locais adequados à realidade sociocultural e econômica de cada região,
como é o caso do município de São José dos Campos (FIORE, 2013). Na figura 2 é
apresentado um diagrama de síntese da rede técnica de resíduos da construção civil.
A construção civil é considerada uma das mais importantes atividades para o
desenvolvimento econômico e social de um país. Contudo, apresenta-se como grande
geradora de impactos ambientais, tanto pelo consumo de recursos naturais, como pela
modificação da paisagem e da geração de resíduos. Segundo John (2000), do
Departamento de Engenharia de Construção Civil da Universidade de São Paulo, a
indústria da construção civil consome entre 14 e 50% dos recursos naturais extraídos
do planeta. Sendo assim, essa quantia coloca este setor como o maior consumidor
individual de recursos naturais.
Esta atividade constitui um grave problema ambiental, principalmente no que diz
respeito à produção de resíduos. De modo geral, a massa de RCC gerados nas cidades
é igual ou maior que a massa de resíduos sólidos domiciliares (JOHN, 2000).
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Figura 2 - Rede técnica legal de resíduos da construção civil.
Legenda: (A, B, C, D) = Classes de resíduos sólidos.
Fonte: FIORE, 2013.
No caso das redes técnicas de resíduos sólidos, estas descrevem as atividades
humanas no território, e, por isso, devem levar em conta os agentes sociais que
demandam, operam e utilizam os sistemas, bem como os fixos envolvidos nas
atividades de manejo, a matéria, os valores e as informações que são colocadas em
circulação. Na rede técnica de resíduos sólidos, incluem-se os seguintes agentes
sociais: os geradores, nas atividades exercidas no decorrer do tempo; os gestores,
que determinam e fiscalizam as condições/diretrizes em que se desempenham as
atividades; e os operacionalizadores, que asseguram o efetivo manejo dos resíduos
sólidos (FIORE, 2013).
As diretrizes da gestão de resíduos sólidos determinam os fluxos da rede técnica,
condicionados pelas dinâmicas do uso territorial que viabilizam, demandam e dão
suporte às ações. Essas ações de resposta aos serviços fornecidos pela rede podem
não especificar a totalidade dos conflitos existentes entre os agentes sociais, contudo
apresentam a qualidade dos fluxos. Sendo assim, compreender as características da
população propulsora e as forças de atuação da rede técnica é um elemento central
para ser considerado afim de se obter uma melhora continua (SANTOS, 2008).
3. Metodologia
Para o desenvolvimento deste trabalho foi realizado uma pesquisa bibliográfica sobre
resíduos da construção civil e as redes técnicas de resíduos sólidos e uma pesquisa
documental referente aos resíduos da construção civil no município de São José dos
Campos.
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Em uma segunda etapa do desenvolvimento do trabalho foi desenvolvida uma
pesquisa mais aprofundada sobre a região em estudo, buscando identificar o perfil
socioeconômico dos operadores dos PEVs do município de São José dos Campos, assim
como sua consciência ambiental e aspectos relacionados à saúde, higiene e segurança
do trabalho. Para tal, foi aplicado questionário estruturado nos dez PEVs do município
em questão, dos onze PEVs existentes (Apêndice A). Em cada PEV foi entrevistado 01
trabalhador, totalizando uma amostra de 10 pessoas entrevistadas. Para diagnosticar
a infraestrutura dos PEVs foi elaborado um check-list (Anexo A), de acordo com o
previsto na NBR 11174/1990 e foi realizado um diagnóstico para identificar se todos
os PEVs seguem as normas técnicas para armazenagem de resíduos não perigosos
com o uso de máquina fotográfica. Tanto os dados sobre o perfil socioeconômico dos
trabalhadores do PEVs como informações sobre a armazenagem de resíduos não
perigosos contribuirão para o desenvolvimento de um sistema integrado das
informações das redes técnicas do município de São José dos Campos para apoio à
gestão dos dados das redes técnicas.
4. Resultados e Discussão
O presente trabalho aborda o município de São José dos Campos, situado na região do
Vale do Paraíba, no estado de São Paulo. De acordo com a Lei Municipal nº 7.146, de
31 de julho de 2006, foi instituído o Plano Integrado de Gerenciamento e o Sistema de
Gestão Sustentável de Resíduos da Construção Civil e Resíduos Volumosos para o
município, baseado na Resolução CONAMA nº 307. O objetivo deste plano é a correta
disposição, o disciplinamento dos fluxos e dos agentes envolvidos, e a destinação
adequada dos resíduos da construção civil gerados no município (Art. 4º - Lei nº
7.146) (PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS, 2006). A tabela 1
apresenta os principais resultados levantados para a geração de RCC, destacando o
município de São José dos Campos.
Tabela 1 - Quantidade estimada da geração de RCC nos municípios brasileiros
Fonte: JOHN, 2000.
Segundo Pinto (1999), a composição média dos materiais de RCC de obras brasileiras
é: 64% de argamassa; 30% de componentes de vedação (tijolos e blocos) e 6% de
outros materiais (concreto, pedra, areia, metálicos e plásticos). Tais dados indicam
que é possível reciclar mais de 90% do resíduo gerado nos canteiros de obra, com o
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objetivo de ser utilizado como agregado, na produção de componentes de construção
e argamassa.
Tendo em vista o percentual de resíduos gerados pela construção civil, no dia 3 de
julho de 2009, o Grupo Dutrafer inaugurou a RCC Ambiental, usina de reciclagem de
resíduos da construção civil e demolição. Instalada em São José dos Campos, a usina
ocupa uma área de 12.590 m2 com capacidade produtiva de 60m3/hora. Seu principal
objetivo é amenizar os impactos decorrentes da geração e disposição de entulho,
incorporando-o novamente no processo de produção, além de garantir a qualidade do
processo atendendo as normais ambientais previstas pela Resolução CONAMA 307.
Também com foco nos resíduos da construção civil, a Prefeitura de São José dos
Campos em parceria com uma cooperativa local instituiu uma iniciativa pioneira no
município, os pontos de entrega voluntária. Estes representam uma parte importante
do sistema de gestão de resíduos da construção, já que o principal objetivo é evitar o
despejo de entulho em áreas impróprias e direcionar este material para a reciclagem.
Localizados em áreas públicas, eles atendem a determinação da Resolução CONAMA
307/2002 e da Lei Municipal nº 7.146/2006 (PREFEITURA DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS,
2006).
Em São José dos Campos existem onze PEVs distribuídos pelo município, que atendem
aos bairros da região sul, sudeste, norte e central. Estes pontos (PEVs) são destinados
a receber restos de obras de construção (tábuas, tijolos, telhas, tubulações, pisos),
móveis, equipamentos domésticos (sofás, cadeiras, geladeiras), pilhas, baterias,
lâmpadas fluorescentes inteiras, restos de poda, tinta e óleo de cozinha. Apesar da
diversidade de resíduos, os PEVs aceitam apenas pequenas quantidades de materiais
(até um metro cúbico, que equivale ao volume de uma carroça pequena, um portamalas de carro de passeio ou uma caçamba de um utilitário pequeno) (PREFEITURA
MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS, 2012).
Foram registradas as infraestruturas dos PEVs visitados realizando o check list e
registrando por meio de uso de uma máquina fotográfica. Observou-se que os 10 PEVs
visitados possuem a administração própria (figura 3), áreas de triagem (figura 4),
armazenamento de resíduos (figura 5), acondicionamento dos resíduos armazenados
(figura 6), sistema de isolamento (figura 7), sinalização de segurança (figura 8),
identificação dos resíduos armazenados (figura 9), equipamento de proteção individual
(figura 10), cobertura para controle da poluição do ar (figura 11) e registro de
operação (figura 12).
Na visita aos 10 PEVs observou-se que estes seguem o mesmo padrão de instalação e
operação e, se diferenciam apenas em relação ao tamanho da área útil. Analisando o
serviço e as condições de trabalho, constatou-se que a infraestrutura dos PEVs de São
José dos Campos é boa, uma vez que estes fornecem aos funcionários equipamentos
de proteção e estão preocupados com a higiene e organização do ambiente de
trabalho.
Os resultados dos perfis socioeconômicos dos PEVs são apresentados no gráfico 1 (a,
b, c, d, e, f. g e h). No gráfico 1 constata-se que os funcionários dos PEVs são em sua
maioria do sexo feminino, com grau de instrução nível médio completo, possuem
filhos e 60% destes filhos frequentam escolas. O transporte mais utilizado pelos
trabalhadores é o ônibus (60%), e os restantes dos 30% não utilizam transporte e os
10% utilizam carro. O número de pessoas que residem em cada família dos
trabalhadores, em sua maioria é de 2 a 3 pessoas. Pode-se observar também no
gráfico 1 que a quantidade de pessoas que contribuem com a renda familiar são duas
pessoas por família e em sua maioria não possui outra renda, a não ser o salário
proveniente dos PEVs.
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Figura 3 - Área administrativa
Fonte: autoras e Caio da Silva Miranda
Figura 4 - Áreas de triagem - PEVs Residencial Gazo (a) e Altos de Santana (b)
(a)
(b)
Fonte: autoras e Caio da Silva Miranda
Figura 5 - Armazenamento de resíduos - PEV Satélite
Fonte: autoras e Caio da Silva Miranda
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Figura 6 - Acondicionamento dos resíduos armazenados - PEV Martins Pereira
Fonte: autoras e Caio da Silva Miranda
Figura 7 - Sistema de isolamento impedindo o acesso de veículos não autorizados - PEV 31
Março
Fonte: autoras e Caio da Silva Miranda
Figura 8 - Sinalização de segurança - PEV Dom Pedro II
Fonte: autoras e Caio da Silva Miranda
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Fonte: autoras e Caio da Silva Miranda
Figura 9 - Identificação dos resíduos armazenados - PEV Galo Branco
(a)
(b)
(c)
Fonte: autoras e Caio da Silva Miranda
Figura 10 - Equipamento de combate ao incêndio - PEV Interlagos (a), Sinalização de uso
obrigatório de equipamento de proteção individual – PEV Campo dos Alemães (b) e Estojo de
primeiros socorros (c)
Fonte: autoras e Caio da Silva Miranda
Figura 11 - Cobertura para controle da poluição do ar - PEV Residencial Gazzo
Figura 12 - Registro de operação - PEV Altos de Santana
Fonte: autoras e Caio da Silva Miranda
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Os resultados sobre saúde, higiene e segurança do trabalho evidenciaram que os PEVs
disponibilizam equipamentos de proteção individual (EPIs) e de proteção coletiva
(EPCs). Não há presença de ratos ou baratas, mas relataram que há presença de
cachorros, pombos e cobras. Raramente ficam doentes, sendo mais comum para
maioria dos trabalhadores, a gripe. Constatou-se que nenhum dos funcionários toma
banho no local e todos fazem as suas refeições dentro dos PEVs.
A pesquisa de campo mostrou que cerca de 90% dos entrevistados acredita que não
esteja faltando nenhum equipamento de segurança nos locais, exceto equipamento
para proteção dos braços.
Os resultados do gráfico 2 evidenciam que os funcionários não recebem assistência
governamental (80%) e os 20% restantes possuem bolsa família ou outros programas
sociais. Os resultados da pesquisa de campo revelaram que a maioria dos
trabalhadores está muito satisfeita com as condições de trabalho, sendo 60% dos
trabalhadores classificam como muito bom; 30% bom e 10% como regular. Dentre as
melhorias apontadas estão: a cobertura do local, uma vez que os mesmos ficam
expostos à chuva e ao sol intenso; segurança contra assaltos, vandalismo e a
implantação de câmeras de segurança; o aumento do volume de resíduos que o PEV
recebe.
Os trabalhadores reconhecem a importância do PEV (gráfico 3) para a destinação
adequada dos resíduos e, se preocupam com o meio ambiente reutilizando a água da
máquina de lavar, para lavar o quintal e separando e entregando o óleo de cozinha
nos próprios pontos em que eles trabalham. Conforme os resultados obtidos dos
questionários no que tange a conscientização quanto à questão ambiental, os 80% dos
funcionários separam os resíduos recicláveis e os destinam para a coleta seletiva
realizada pelo poder público ou os entrega diretamente em cooperativas.
Os trabalhadores dos PEVs, retratados neste trabalho, figuram na rede técnica em
estudo como os agentes sociais operadores. Possuem um papel fundamental nas
atividades de gerenciamento dos RCC, pois são responsáveis pela geração de dados,
conscientização e apoio aos usuários, operacionalização das atividades de segregação
e de armazenamento dos resíduos sólidos e por isso o seu perfil socioeconômico foi
levantado.
5. Conclusões
Com a realização deste trabalho permitiu a confirmação da relevância dos PEVS para o
contexto ambiental e social do município de São José dos Campos. O ambiental está
associado ao valor dos PEVs para o sistema de gestão de resíduos da construção civil,
uma vez que evitam o despejo de resíduos em áreas impróprias e direcionam estes
materiais para uma destinação adequada. Já o social está ligado à inserção da
população no mercado de trabalho, fornecendo condições adequadas de serviço e
renda.
Com base nas questões de higiene e segurança do trabalho abordadas no
questionário, constata-se que a boa saúde ocupacional dentro dos PEVs é ferramenta
indispensável para obtenção de qualidade de vida e desempenho do trabalhador. A
aplicação dos questionários permitiu a verificação de que esses trabalhadores dos
PEVs se sentem orgulhosos de seu importante papel para o meio ambiente e para o
cumprimento do Plano de gestão do município, e podem contribuir grandemente para
o aprimoramento da gestão e gerenciamento das atividades.
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(a)
(b)
(c)
(d)
(e)
(f)
(g)
(h)
Gráfico 1 - Sexo dos trabalhadores (a), Grau de escolaridade dos trabalhadores (b),
Trabalhadores que possuem filhos (c), Frequência dos filhos na escola (d), Transporte utilizado
pelos trabalhadores (e), Quantidade de pessoas que moram na residência do trabalhador (f),
Fonte de renda (g) e Outras fontes da renda familiar (h).
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Gráfico 2 - Assistência governamental.
Gráfico 3 - A importância do PEV para o trabalhador.
Além das informações sobre os trabalhadores dos PEVs é fundamental a aquisição de
informações sobre os pequenos e grandes geradores de RCC e dos gestores visando
identificação dos fixos de geração, beneficiamento e disposição final da rede técnica
de resíduos sólidos e bem como, para a construção do banco de dados do sistema
integrado de informações da rede técnica de resíduos sólidos da construção civil.
6. Agradecimentos
Agradecemos à profa. Fabiana Alves Fiore pelas orientações no entendimento sobre as
redes técnicas e na elaboração do questionário e, ao estudante do Curso de
Engenharia Ambiental do centro Universitário Senac, Caio da Silva Miranda, pelo
auxílio na pesquisa de campo.
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Referências
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Paulo: Edusp, 2008.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 - Dezembro de 2015
Edição Temática: Sustentabilidade
143
APÊNDICE A - QUESTIONÁRIO
PEV:______________________________________ Data :___/___/_____
Nome do entrevistado: ___________________________________________
Aspectos Socioeconômicos
1.Sexo:
( ) Masculino
( ) Feminino
2.Idade:____.
3.Escolaridade:
Superior
( ) completo ( ) incompleto
Ensino médio ( ) completo ( ) incompleto
Ensino fundamental (1ª a 8ª) ( ) completo ( ) incompleto
Nenhum grau de instrução ( )
4.Qual (is) o(s) meio(s) de transporte utilizado(s) para o trabalho na PEV?
( ) A pé
( ) Ônibus/coletivos
( ) Moto
( ) Trem
( ) Carro
( ) Outro. Qual? _______________________________________________.
5.Possui filhos: (caso não possua filhos, vá para a questão 8)
( ) Sim
( ) Não
6.Os filhos frequentam a escola:
( ) Sim
( ) Não
7.Há dificuldade de acesso à escola, falta de professores ou outros?
( ) Sim
( ) Não
8.Possui outra fonte de renda:
( ) Sim Qual?________________. ( ) Não
9.Qual é a sua renda média mensal?
( ) Menos de um salário mínimo
( ) De 1 salário mínimo a 2 salários mínimos
( ) De 2 salários mínimos a 3 salários mínimos
( ) De 3 salários mínimos a 4 salários mínimos
( ) De 4 salário mínimos ou mais.
10. Quantas pessoas moram em sua residência: _________________.
11. E quantas contribuem com a renda familiar:_________________.
12. Qual a renda média mensal da sua casa?
( ) Menos de um salário mínimo
( ) De 1 salário mínimo a 2 salários mínimos
( ) De 2 salários mínimos a 3 salários mínimos
( ) De 3 salários mínimos a 4 salários mínimos
( ) De 4 salário mínimos ou mais.
13. A família do cooperado recebe alguma forma de assistência governamental
( ) Bolsa-Família
( ) Benefício Assistencial de Prestação Continuada - BPC
( ) Outro programa social
( ) Não recebe assistência governamental.
Saúde, Higiene e Segurança do Trabalho
14. Qual a frequência que o você e sua família ficam doentes:
( ) 1 vez por mês
( ) 1 vez a cada 2 meses
( ) 1 vez a cada 6 meses
( ) 1 vez ao ano
( ) o cooperado raramente fica doente.
15. Das doenças abaixo qual(is) já foram verificada(s) :
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Edição Temática: Sustentabilidade
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16.
17.
18.
19.
20.
21.
22.
( ) Gripe ( ) Diarreia ( ) Doenças de pele ( ) Doenças respiratórias
( ) Leptospirose( ) Virose( ) Dores de cabeça ( ) Náuseas
( ) Outra (s). Qual (is)? _______________________________________.
Costuma verificar a presença de animais dentro da PEV como:
( ) Ratos ( ) Pombos ( ) Mosquitos ( ) Baratas ( ) Cachorros
O cooperado recebe orientações sobre práticas de higiene e saúde?
( ) Sim. Qual (is)? ____________________________. ( ) Não
Há alguma forma de treinamento para execução das tarefas?
( ) Sim
( ) Não
A cooperativa possui e fornece equipamentos de proteção individual (EPI’s)
( ) Sim. Qual (is)? ____________________________. ( ) Não
O cooperado utiliza equipamentos de proteção individual (EPI’s):
( ) Sim. Qual(is) ? ____________________________.
( ) Não. Por quê? ____________________________.
Qual (is) equipamento(s) de segurança, o cooperado acredita que falte em seu
ambiente de trabalho:
(1)_________________________________________________________.
(2)_________________________________________________________.
(3)_________________________________________________________.
O cooperado esta em dia com a vacina antitetânica?
( ) Sim
( ) Não
Conscientização quanto à questão ambiental
23. Quanto tempo o cooperado demora no banho:
( ) 5 minutos
( ) De 5 a 10 minutos
( ) De 15 a 20 minutos
( ) Mais de 20 minutos.
24. Como o cooperado lava o quintal/calçada de sua residência:
( ) Varre e depois lava com balde
( ) Apenas lava com balde
( ) Abre a mangueira apenas quando for utilizá-la
( ) Deixa a mangueira aberta o tempo todo.
25. Como é feito o descarte do lixo em sua residência?
( ) Não separa o lixo, Por quê ?_________________________________.
( ) Separa material reciclado e não reciclado
( ) Separa o material reciclado e óleo de cozinha
( ) Outro. Qual? ____________________________________________.
26. O resíduo gerado em sua residência é destinado:
( ) Ao caminhão de lixo da Prefeitura
( ) Ao caminhão da Coleta Seletiva
( ) À cooperativa
( ) Aos catadores de rua
( ) Não sabe.
27.Qual a opinião do trabalhador para a importância ambiental do serviço das PEV’s?
______________________________________________________.
Oportunidades de melhoria
28.O que o trabalhador acha do serviço na PEV? Qual a visão do trabalhador, com
relação ao trabalho na PEV:
- A função desta questão é identificar como está a auto estima do cooperado quanto a
valorização do trabalho na PEV.
_________________________________________________________________
______.
29. Todos os cooperados recebem o mesmo valor por hora trabalhada?
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( ) Sim
( ) Não
30. Quais os critérios que determinam o valor da hora trabalhada?
_________________________________________________________________
_____.
31.Cite ações de melhoria que deveriam ser apresentadas à cooperativa.
(1)_________________________________________________________.
(2)_________________________________________________________.
(3)_________________________________________________________.
ANEXO A - CHECK LIST DE ACORDO COM A NBR 11174
Local
O PEV deve possuir:
Área administrativa
Área de triagem
Armazenamento
Os resíduos das classes II e III não devem ser armazenados juntamente com resíduo
classe I. (Resolução CONAMA 357/2002)
I - Classe A - resíduos reutilizáveis ou recicláveis como agregados:
- Solos provenientes de terraplanagem;
Tijolos;
Blocos;
Telhas;
Placas de revestimento;
Argamassa;
Concreto;
Tubos;
Meio fios.
II - Classe B - resíduos recicláveis para outras destinações:
Plásticos;
Papel/Papelão;
Metais;
Vidros;
Madeiras.
III - Classe C - resíduos que não podem ser reciclados/recuperados:
Produtos oriundos do gesso.
Acondicionamento de resíduos
O armazenamento de resíduo: classe II e III em contêineres e/ou tambores, em
tanques e a granel. (Resolução CONAMA 307/2002)
II - Classe B - resíduos recicláveis para outras destinações:
Plásticos;
Papel/Papelão;
Metais;
Vidros;
Madeiras.
III - Classe C - resíduos que não podem ser reciclados/recuperados:
Produtos oriundos do gesso.
Isolamento e sinalização
O local de armazenamento deve possuir:
Sistema de isolamento tal que impeça o acesso de pessoas estranhas;
Sinalização de segurança e de identificação dos resíduos ali armazenados.
Controle da poluição do ar
Medidas que minimizem a ação dos ventos para evitar a poluição do ar por agentes
sólidos armazenados a granel.
Controle da poluição do solo e das águas
Para conter a poluição se faz necessário:
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Edição Temática: Sustentabilidade
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Prever um sistema de retenção de sólidos;
Prever um sistema de impermeabilização da base do local de armazenamento;
Prever medidas para contenção de vazamentos acidentais, no caso de
armazenamento em contêineres, tanques e/ou tambores.
Treinamento
Deve incluir:
Forma de operação da instalação;
Procedimentos para o preenchimento dos quadros de registro de movimentação e
armazenamento de resíduos.
Equipamentos de segurança
Equipamentos de combate ao incêndio.
Procedimentos para registro da operação
A instalação deve possuir:
Registro de sua operação.
Recebido em 13/08/2015 e Aceito em 07/12/2015.
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147
Diagnóstico do gerenciamento de resíduos da construção civil em
obras no município de Jaboticabal - SP
Diagnosis of waste management in construction works in Jaboticabal city- SP
Lilian Rosa Martins, Rener Luciano de Souza Ferraz, Fernanda Galindo Acre, José Luiz
Merelli Bariani, João Teixeira Neto, Daniel Fernando Ferreira.
Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial - SENAC
Curso Técnico em Meio Ambiente
{[email protected], [email protected], [email protected],
[email protected], [email protected], [email protected]}
Resumo. A construção civil está entre as atividades econômicas que mais degradam o
meio ambiente, gerando resíduos responsáveis por diversos impactos ambientais. A
destinação destes resíduos tem sido parcialmente para aterros sanitários. Devido à
legislação ambiental, as empresas estão adaptando-se quanto à necessidade de
conservação ambiental. Baseado nessa situação, por meio desse trabalho objetivou-se
realizar diagnóstico qualitativo da geração de resíduos em obras de construções e, em
seguida, propor medidas mitigadoras para promoção da qualidade ambiental. As obras
em estudo estão localizadas na cidade de Jaboticabal/SP. Para a execução da pesquisa
foi realizada uma pesquisa exploratória, para se aliar os elementos metodológicos e
teóricos, e também foi feito um levantamento de informações através de visitas e
aplicação de questionário ao responsável por cada obra. Constatou-se que a destinação
dos resíduos é feita de forma não planejada, sendo que não há coleta seletiva destes os
quais são colocados em caçambas para aguardarem coleta por empresa terceirizada.
Entre as propostas de melhorias foi sugerida a implantação de sistema de
Gerenciamento Integrado de Resíduos Sólidos, Ponto de Entrega Voluntária e educação
ambiental através de informativos sobre a separação e descarte correto destes
materiais.
Palavras-chave: entulhos, reciclagem, educação ambiental.
Abstract. The building is among the more economic activities that degrade the
environment, generating waste responsible for many environmental impacts. The
disposal of this waste has been mainly to landfills. Due to environmental legislation,
companies are adapting to the need for environmental conservation. Based on this
situation, through this work aimed to perform qualitative diagnosis of waste generation
in construction works and then propose mitigating measures for environmental quality
promotion. The works under consideration are located in Jaboticabal city, SP. For the
implementation of research exploratory research was carried out to combine the
methodological and theoretical elements, and was also made a survey of information
through visits and application of the questionnaire responsible for each work. It was
found that the disposal of waste is done in an unplanned way, and there is no separate
collection of these which are placed in buckets to await collection by a third party.
Among the proposals for improvements it was suggested the implementation of Solid
Waste Integrated Management System, Voluntary Delivery Point and environmental
education through informative about the separation and proper disposal of these
materials.
Key words: debris, recycling, environmental education.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística
Edição Temática em Sustentabilidade
Vol. 5 n°. 3 – Dezembro de 2015, São Paulo: Centro Universitário Senac
ISSN 2179-474X
Portal da revista: http://www1.sp.senac.br/hotsites/blogs/revistainiciacao/
E-mail: [email protected]
Esta obra está licenciada com uma Licença Creative Commons Atribuição-Não Comercial-SemDerivações 4.0
Internacional
1.
Introdução
O crescimento populacional e o acelerado processo de urbanização dos municípios têm
contribuído para a geração de grandes volumes de Resíduos da Construção Civil (RCC) e,
consequentemente, para o aumento da geração de Resíduos Sólidos Urbanos (RSU).
Salienta-se que os problemas decorrentes da exploração da construção civil residem,
sobretudo, no elevado consumo energético necessário para suprimento de matéria prima
para esta atividade. O setor consome demasiada quantidade de materiais com significativo
teor energético, como aço, cimento, alumínio, cerâmica, entre outros materiais. Dentre os
principais impactos causados por estes resíduos, podem ser citados: contaminação do solo
e elevação dos teores de metais tóxicos, perda da fertilidade por indisponibilidade de
nutrientes, alterações das propriedades físicas do solo. É importante mencionar que tais
impactos refletem-se, também, na qualidade da água, notadamente pelo fato de parte dos
resíduos estar sujeita a lixiviação e consequente contaminação do lençol freático (SOUZA
et al., 2015).
O descarte dos resíduos sólidos provenientes das atividades de construção civil impacta
na preservação do meio ambiente, por isso é importante seu gerenciamento (LEPRE et al.,
2015). A ação é característica das empresas que se preocupam com o desenvolvimento
sustentável, contribuindo para práticas participativas com os trabalhadores. Salienta-se
que o incentivo empresarial por meio da educação ambiental é considerado transformador
podendo impactar em mudanças de comportamentos do homem com a natureza (LUIZARE
e CAVALARI, 2003). Esta informação sustenta-se em no fato de tais ações serem
obrigatórias no Brasil (CONAMA, 2002).
O gerenciamento é fundamentado na execução de ações empresariais com utilização do
planejamento e controle das atividades de produção de qualquer organização, o que
implica também no gerenciamento dos resíduos gerados nessas atividades até o momento
do correto descarte (SILVA, 2008).
Notoriamente, a educação ambiental promovida pelas empresas de construção civil leva
ao desenvolvimento de ações educativas, focando a sustentabilidade nas obras ao
capacitar os trabalhadores e ao informar da necessidade do correto manuseio dos resíduos
sólidos no momento do seu descarte ou reaproveitamento.
Objetivou-se com esta pesquisa realizar um diagnóstico do gerenciamento de resíduos da
construção civil em obras no município de Jaboticabal no estado de São Paulo, com ênfase
em identificar os principais tipos de resíduo, estratégias de coleta, transporte e disposição
final, além de verificar se existe o Programa Municipal de Gerenciamento Integrado de
Resíduo Sólido.
2.
Material e Métodos
Este trabalho foi desenvolvido entre os meses de fevereiro a maio de 2015 na cidade de
Jaboticabal, SP. O município possui 75.436 habitantes, ocupando área territorial de
706,602 km² (IBGE, 2015). Quanto ao método de abordagem, a pesquisa combina
elementos exploratórios e descritivos (GIL, 2010), utilizando-se de revisão bibliográfica.
Foi utilizada também pesquisa documental (SÁ-SILVA et al., 2009). O estudo valeu-se
ainda de investigação pontual, na qual foi possível coletar dados da realidade do segmento
de construções, tendo em vista os pressupostos para o desenvolvimento sustentável, e os
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 - Dezembro de 2015
Edição Temática em Sustentabilidade
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possíveis impactos ambientais causados pelo processo produtivo na ausência das diretrizes
da gestão ambiental de resíduos sólidos.
A pesquisa quantitativa (MORESI, 2003) de igual forma foi adotada, e o instrumento de
pesquisa, um questionário de questões objetivas e discursivas, a saber: 1 – Nas
dependências da obra existe área destinada a coleta seletiva de resíduos? 2 – Quantas
caçambas de resíduos são geradas por dia? 3 – Qual a área da obra em m2? 4 – Existe
alguma forma de evitar desperdício na obra, qual? 5 – Os colaboradores possam por algum
treinamento para evitarem o desperdício?
A aplicação do questionário teve como público alvo profissionais da área em questão,
sendo realizada em três visitações pré-agendadas, tendo em vista que estes profissionais
são agentes determinantes nas tomadas de decisões dentro do processo produtivo e que
poderão direcionar a construtora para uma gestão ambiental adequada e eficiente. O
tempo para preenchimento do questionário limitou-se a 30 minutos, sem a presença da
equipe de pesquisa.
Para tanto, procedeu-se levantamento de dados junto a Empresa Reúsa Conservação
Ambiental (atual Empresa responsável pelo Aterro Sanitário), quanto à média de entrada
de RCC (Resíduo da Construção Civil) que serão apresentados em gráficos após serem
processados em planilhas, para verificação da quantidade de material que está sendo
descartada e poderia ser reutilizada.
3.
Resultados e Discussão
Por meio do trabalho de pesquisa, foi possível observar o grande desperdício de materiais
gerados pela construção civil, materiais que geralmente são descartados de forma
irregular: plásticos, canos de PVC, ferro, papelão, embalagens em geral e outros resíduos
(Figura 1).
Figura1. Descarte de resíduos da construção civil. (A) plásticos, (B) cerâmica, papel, madeira e
borracha, (C) argamassas, madeira, plásticos e diversos. Jaboticabal, SP, 2015.
Fonte: Lilian Rosa Martins.
Embora não possam ser descartados em aterros sanitários, hoje já é reconhecido que os
RCC (Resíduo de Construção Civil) são um dos responsáveis pelo esgotamento das áreas
dos aterros de RSU (Resíduo Sólido Urbano), uma vez que correspondem a mais de 50%
dos resíduos sólidos urbanos (ANGULO et al, 2003).
Após duas décadas de discussões, em 02 de agosto de 2010, foi sancionada a Lei Federal
Nº12.305, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS, 2010). A Lei dispõe
sobre os princípios, objetivos e instrumentos, bem como sobre as diretrizes relativas à
gestão integrada e ao gerenciamento de resíduos sólidos (incluídos os Resíduos da
Construção Civil), às responsabilidades dos geradores e do poder público e os
instrumentos econômicos aplicáveis (CONAMA, 2002).
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 - Dezembro de 2015
Edição Temática em Sustentabilidade
150
Na figura 2 pode ser observado um Ponto de Coleta Seletiva dentro de uma obra,
denotando uma ideia de como separar os resíduos dentro de uma construção.
Notadamente sob a ótica dos usuários do local onde os coletores são instalados, embora
a percepção e experiência de especialistas seja preponderante para compreender que em
linhas gerais esta separação em grande escala não seja uma tarefa simples.
Figura 2. Ponto de Coleta Seletiva em uma Obra.
Fonte: Premium (2010).
De fato, a ausência de um Plano Municipal de Gerenciamento Integrado de Resíduos
Sólidos (PMGIRS) no município, que nada mais é que um planejamento das reais condições
para desenvolver de forma correta e ambientalmente adequada o gerenciamento de
resíduos sólidos, revela-se como um fato preocupante, pois o descarte incorreto
continuará crescendo. Lima (2005) afirma que a maioria dos municípios brasileiros adotam
um modelo de Gerenciamento de RCC denominado “Gestão Corretiva”, que se caracteriza
por adotar ações emergenciais, por englobar atividades não preventivas e custosas as
quais não surtem resultados adequados, e são, por isso, profundamente ineficientes.
Com base no exposto, são apresentadas algumas medidas estruturantes dos municípios
para a reciclagem e reutilização dos RCC, conforme verifica-se na figura 3.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 - Dezembro de 2015
Edição Temática em Sustentabilidade
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Figura 3. Medidas estruturantes dos municípios para a reciclagem e reutilização dos Resíduos da
Construção Civil.
Fonte: Lilian Rosa Martins.
Pode-se observar nas figuras 4A e 4B uma ideia de como são os PEV’s, além de uma ATT
(Área de Transbordo e Triagem).
Figura 4. Pontos de Entrega Voluntária (A) e Área de Transbordo e Triagem (B).
Fonte: (A) Inova (2015).
(B) RSA (2015).
Com base nos resultados gerados a partir dos dados obtidos via questionário, verificou-se
que a reciclagem e reutilização das obras visitadas são pequenas em vista da quantidade
de resíduo gerada nas mesmas.
Através do questionário, notou-se que a coleta seletiva não é uma atividade exigida dentro
das obras da área A1 e A2 que não há uma área específica para a coleta dos resíduos,
sendo este tipo de coleta adotado na obra da área A3 conforme figura 5B. Na figura 5C,
vê-se a quantidade de caçambas geradas em cada área estudada, sendo esta quantidade
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considerada elevada, de modo que pode-se inferir que se houvesse uma coleta seletiva
este número poderia ser menor.
Na figura 5D observa-se que poderia haver uma forma de se evitar o desperdício,
sobretudo porque os entrevistados têm a consciência que poderiam reutilizar, separar e
reciclar os resíduos da obra. Na figura 5E, verifica-se que nas áreas A1 e A3 os
trabalhadores são submetidos a treinamento para entenderem o processo de separação
dos resíduos.
Figura5. Resultados do questionário aplicado em construções na cidade. Jaboticabal, SP, 2015
Fonte: Lilian Rosa Martins.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 - Dezembro de 2015
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Pode-se observar na figura 6 a quantidade de resíduo transportada pelos “caçambeiros”
no período de Fevereiro a Junho de 2015. Percebe-se que no período citado anteriormente,
em média, no mês de fevereiro ocorre grande acúmulo de resíduos, logicamente em
virtude da época do ano impulsionar o setor na região. No mês de março ocorre abrupta
redução no montante de resíduos transportados, enquanto que em abril o volume
aumenta, mantendo-se estável em maio, com tendência de redução em junho.
Esta variação sazonal na geração de resíduos pode ser explicada pelo processo de
desaceleração relatado por Bahia et al. (2015). Estes pesquisadores reportam que a
produção da indústria brasileira como um todo apresentou uma retração de 2,37% no
primeiro trimestre de 2015 (em relação ao mesmo período de 2014). Esse desempenho
mantém o comportamento de retração de 2014, se comparado com 2013, quando
apresentou no ano uma retração produtiva de 4,12%, de modo que os pesquisadores
alertam que é necessário visualizar setorialmente e ao longo de cada mês de 2015 como
o atual desempenho do setor da construção civil vem ocorrendo.
Figura 6. Descarte Mensal de Resíduo. Jaboticabal, SP, 2015.
Fonte: Lilian Rosa Martins.
Atualmente, a Empresa Reúsa Conservação Ambiental é responsável pela operação do
Aterro Sanitário da cidade de Jaboticabal, que recebe em média 200 toneladas por dia de
entulho da construção civil e das demolições. De acordo com o Engenheiro responsável
pelo Setor Operacional acerca dos resíduos de construção civil e de demolição que são
descarregados no Aterro, primeiramente é realizada uma triagem manual do material,
para a retirada de madeiras e resíduos recicláveis. Posteriormente, é realizado o
peneiramento com o auxílio da retroescavadeira que alimenta a peneira vibratória (Figura
7A e B). Em seguida a terra separada é utilizada no aterramento de resíduos domiciliares,
já a brita mais fina (Figuras 7C e D) e o restante do entulho são compactados e aterrados.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 - Dezembro de 2015
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Figura 7. Peneira vibratória. (A) Peneira, (B)
Retroescavadeira alimentando a peneira, (C) Pós
peneiração (D) Material britado. Jaboticabal, SP, 2015.
Fonte: Favero (2014).
Além dos benefícios ambientais obtidos pelo gerenciamento adequado dos RCD’s,
destacam-se também, os ganhos econômicos resultados das múltiplas aplicações práticas
dos produtos da sua reciclagem, a partir da utilização de tecnologias relativamente
simples.
O Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) através da Resolução nº307 de
05/07/02-DOU de 17/07/02, estabeleceu diretrizes, critérios e procedimentos para gestão
dos resíduos da construção civil, disciplinando as ações necessárias de forma a minimizar
os impactos ambientais, tendo para esse fim definido as especificações de resíduos da
construção civil. Essa resolução estabelece que os resíduos de classe A devem ser
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 - Dezembro de 2015
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encaminhados para aterros específicos, de modo a não permitir sua deposição em aterros
sanitários.
A geração de resíduo RCC durante a fase de construção é decorrente das perdas dos
processos construtivos. Parte das perdas estão associadas as dimensões finais neste caso
argamassas de revestimento, concretos etc. Com algumas mudanças, como
aperfeiçoamento de projetos, seleção adequada de materiais, treinamento de recursos
humanos, utilização de ferramentas adequadas, melhoria das condições de estoque e
transporte, além de melhor gestão dos processos, seria possível combater as perdas em
construções.
Pelas características da região, a reciclagem do entulho que pode gerar até oito tipos de
matérias-primas diferentes, dependendo do grau de processamento que este material
receber, quais sejam, a bica corrida, a areia grossa, a brita 1, 2, 3 e 4, o pedregulho e a
pedra rachão, o produto processado deverá ser direcionado para cascalhamento das
estradas rurais (LEPRE et al., 2015) do município e utilização como sub-base de vias
asfaltadas. Posteriormente, poderá se avançar para a utilização da areia grossa e das
frações da brita, para produção de pavimentos e blocos, para fins de recuperação dos
pavimentos das praças públicas e construção de casas populares. (REUSA, 2013)
De acordo com Gonçalves (2003), o sucesso de um programa de coleta seletiva, visando
a reciclagem, depende do envolvimento da população, através de um bom programa de
comunicação e educação ambiental; uma boa logística de coleta; e um bom sistema de
escoamento dos materiais. A coleta seletiva deve ser planejada considerando esses três
elos, sendo que o planejamento deve ser feito “de trás para a frente”, primeiro definido a
destinação a ser dada aos materiais, depois escolhendo a logística a ser adotada para a
coleta e, só então elaborado o programa de educação ambiental, que deve ser constante,
e não apenas uma campanha.
4.
Conclusões
Conclui-se que a destinação dos resíduos é feita de forma não planejada, sendo que não
há coleta seletiva destes os quais são colocados em caçambas para aguardarem coleta por
empresa terceirizada. Entre as propostas de melhorias foi sugerida a implantação de
sistema de Gerenciamento Integrado de Resíduos Sólidos, Ponto de Entrega Voluntária e
educação ambiental através de informativos sobre a separação e descarte correto destes
materiais.
Referências
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caracterização de resíduos de construção e demolição. In: VI Seminário de
Desenvolvimento Sustentável e Reciclagem na Construção civil. IBRACON CT-2006.
São Paulo, 2003.
CONAMA - CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE. Resolução nº 307, de 5
de julho de 2002. Estabelece diretrizes, critérios e procedimentos para a gestão
dos resíduos da construção civil. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Brasília,
DF,
nº
136,
de
17
jul.
2002,
p.
95-96.
Disponível
em:
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 - Dezembro de 2015
Edição Temática em Sustentabilidade
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GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 5. Ed. São Paulo: Atlas, 2010.
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Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 5 no 3 - Dezembro de 2015
Edição Temática em Sustentabilidade
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Alagamentos, Enchentes Enxurradas e Inundações: Digressões
sobre seus impactos sócio econômicos e governança.
Eduardo Antonio Licco, Silvia Ferreira Mac Dowell
Área de Pesquisa em Sustentabilidade
Centro Universitário Senac
Resumo. Este trabalho faz uma abordagem livre de aspectos técnicos, sócio
econômicos e de governança das enchentes, alagamentos e inundações que afligem
desde há muito a cidade de São Paulo. Trata-se de digressões sobre o tema dos
desastres naturais, cada vez mais presentes na vida das pessoas.
Palavras-chave: enchentes, alagamentos, inundações
Abstract. This work is a free approach to technical, economic and social
governance of overflows, waterlogging and floods afflicting since long been the city
of São Paulo. It is digressions on the subject of natural disasters, increasingly
present in people's lives.
Key words: overflows, waterlogging, floods
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística
Edição Temática em Sustentabilidade
Vol. 5 nº. 3 – Dezembro de 2015, São Paulo: Centro Universitário Senac
ISSN 2179-474X
Portal da revista: http://www1.sp.senac.br/hotsites/blogs/revistainiciacao/
E-mail: [email protected]
Esta obra está licenciada com uma Licença Creative Commons Atribuição-Não Comercial-SemDerivações
4.0
Internacional
1. Introdução
A cada dia que passa torna-se mais evidente o crescimento no número e na
intensidade dos impactos causados pelos assim chamados desastres naturais. Com
a globalização da informação são praticamente diárias as notícias de eventos com
perdas de vidas e materiais motivadas pela exposição de populações a elementos
da natureza. Furacões, terremotos, enchentes, deslizamentos de terra ocorrendo
em diferentes partes do globo matam, desabrigam e impõem perdas materiais de
elevada monta. Computados, identifica-se hoje mais desabrigados no mundo em
consequência de desastres naturais do que de conflitos. Estudos indicam que este
aumento pode estar diretamente vinculado as mudanças climáticas globais (LICCO,
2013).
No Brasil, em 2004, o Furacão Catarina devastou parte do Estado de Santa
Catarina, sendo reconhecido como o primeiro furacão do Atlântico Sul. Na
oportunidade deixou 14 municípios em estado de Calamidade Pública. Em 2015,
três cidades foram atingidas por dois tornados que passaram pelo oeste
catarinense: Ponte Serrada, Passos Maia e Xanxerê.
De acordo com levantamento patrocinado pelo Ministério da Integração Nacional, o
Brasil sofreu mais de 30 mil desastres naturais entre 1990 e 2012, o que dá uma
média de 1.363 eventos por ano (BRASIL, 2013). O Atlas Brasileiro de Desastres
Naturais (CEPED/UFSC, 2013) mostra que, entre 1991 e 2012 foram registradas
31.909 catástrofes no País, sendo que 73% ocorreram na última década. A
publicação indica que 2009 foi o ano em que mais ocorreram desastres naturais no
Brasil, com 10% dos registros — ou cerca de 3.000. O banco de dados do histórico
dos desastres brasileiros associados a fenômenos naturais indica que as estiagens e
secas e as inundações bruscas e alagamentos são as tipologias mais recorrentes do
país.
São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espirito Santo, que juntos registraram a
maior porcentagem de óbitos (75,27% do total nacional), foram assolados por
35,64% das ocorrências de desastres. A análise da região, com foco na proporção
de mortes, conduz à hipótese da relevância da variável densidade demográfica,
uma vez que o fato de um mesmo desastre atingir duas regiões de densidades
demográficas diferentes afeta mais intensamente aquela com mais habitantes
(CEPED/UFSC, 2013).
Mais do que pela influência das forças naturais, os desastres são definidos pela
vulnerabilidade dos sistemas humanos, ou seja, pela susceptibilidade das pessoas
ou de suas coisas expostas a um perigo. Assim, a maior ou menor intensidade de
um
desastre
dependerá
da
vulnerabilidade
da
população
exposta.
Desgraçadamente, as populações mais pobres são as mais expostas e vulneráveis.
As pressões da pobreza, o crescimento populacional nas grandes metrópoles, e o
direito desigual da terra forçam mais e mais pessoas a se instalarem em áreas de
perigo, como encostas íngremes e desprotegidas e em margens de rios. Na
ocorrência de um desastre, as consequências se acentuam, tomando proporções de
catástrofes exatamente sobre aqueles que menos têm acesso aos bens materiais
básicos e principalmente autonomia emancipatória. O 4º relatório do IPCC
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160
menciona que no Brasil os desastres de origem atmosférica tendem a aumentar,
com destaque para as tempestades e os eventos de precipitações intensas sobre as
regiões sul e sudeste do Brasil.
Este trabalho faz uma abordagem livre de aspectos técnicos, sócio econômicos e de
governança de um segmento da tipologia mais comum de eventos naturais
impactantes que são os hidrometeorológicos. Trata-se de digressões sobre o tema
dos desastres naturais, focadas nas enchentes, alagamentos, enxurradas e
inundações que afligem desde há muito a cidade de São Paulo, e que a cada dia se
tornam mais presentes na vida dos paulistanos.
Variações Climáticas e a falta de chuvas
Estiagem é um fenômeno climático diretamente relacionado à redução da
frequência e intensidade das chuvas, ao atraso do período chuvoso ou à ausência
de chuvas previstas para uma determinada temporada, em que a perda de
umidade do solo é superior à sua reposição. Segundo Castro (2003) a estiagem se
faz presente quando há um atraso superior a quinze dias do início da temporada
chuvosa e quando as médias de precipitação mensais dos meses chuvosos
permanecem inferiores a 60% das médias mensais de longo período da região.
Trata-se de um dos desastres de maior ocorrência e impacto no mundo, devido ao
longo período em que ocorre e à abrangência das áreas que afeta.
A seca, analisada do ponto de vista meteorológico é, na visão de Castro (2003),
uma estiagem prolongada, caracterizada por provocar uma redução sustentada das
reservas hídrica existentes. É a forma crônica da estiagem. No período de 1991 a
2012 ocorreram 116 registros oficiais de estiagens e secas no Estado de São Paulo.
A maior incidência dos eventos ocorreu no sudoeste do estado, nomeadamente na
região de Assis. As regiões de Campinas, Piracicaba, da Grande São Paulo e litoral
não apresentaram registros destes fenômenos no período (CEPED/UFSC, 2013)
2014 foi um ano que marcou a vida e todos os brasileiros e, em especial, a dos
paulistas e paulistanos. Verdades e mentiras técnicas e políticas, mexeram com
corações e mentes durante todo o ano de eleições, em meio a uma crise hídrica de
proporções inéditas, resultado de uma estiagem prolongada. Em cenas próximas a
de um dia qualquer no sertão nordestino, paulistanos esperaram a chegada de um
caminhão pipa para encher baldes e panelas com água para beber, cozinhar e até
mesmo para um “banho de caneca”. Com chuvas no verão 2013 - 2014 muito
abaixo da média, o nível da água no sistema Cantareira chegou a patamares
críticos. Investigada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, a crise
do abastecimento motivou a abertura de uma CPI na Câmara paulistana.
Em 2014 moradores de São Paulo sentiram o que já sofreram em anos anteriores
cidadãos castigados pela seca em Estados como Rio Grande do Sul, Minas Gerais e
Pernambuco. A mistura de falta de planejamento, administração ruim, eventos
climáticos extremos e consumo excessivo desregularam totalmente o fornecimento
de água em cidades paulistas (e mesmo brasileiras).
Na região metropolitana de São Paulo a crise deveu-se, em parte, a falta de água
nas cabeceiras de rios que abastecem o Sistema Cantareira aonde, desde 2013
vinham sendo registrados níveis de pluviosidade abaixo da média dos últimos 30
anos. Nos três primeiros meses de 2014, em vez dos esperados 600 milímetros de
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chuva, precipitaram menos de 300 milímetros (Marcelo Shneider citado em
CALIXTO e IMERCIO, 2014)
Segundo o Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos do Instituto Nacional
de Pesquisas Espaciais (Cptec/Inpe), a seca histórica que assolou o Sudeste em
2014 teria a ver com características do El Niño, resultando em déficit pluviométrico
no norte e precipitações acima dos valores normais no sul do país. Ainda de acordo
com os prognósticos do Cptec/Inpe, chuvas mais regulares ocorreriam a partir de
meados de novembro na grande área central do Brasil, que inclui Sudeste e CentroOeste, com ligeiro atraso em relação ao início climatológico da estação chuvosa
(outubro a março). Se tudo corresse bem a ameaça de um racionamento de 2 dias
com água e 5 sem água estaria afastada da vida dos moradores da Grande São
Paulo.
As chuvas de verão e a crise hídrica
Verão de 2015. As chuvas previstas chegam ao sudeste. Chove no sistema
Cantareira e os níveis da água começam a se elevar acima do ponto crítico. A
ameaça do racionamento sai de foco, embora ainda muito longe de significar uma
solução para um problema de raízes estruturais. Agora é vez dos alagamentos,
enxurradas e inundações em São Paulo.
Áreas de instabilidade associadas ao calor e a entrada de frentes frias - ocorrências
climáticas típicas na região - provocam chuvas intensas em forma de pancadas,
com raios e trovoadas, e com elas as situações de sempre: estado de atenção para
enchentes e alagamentos, ruas intransitáveis, operação do metrô interrompida,
trânsito caótico. Benéfica do ponto de vista de recarga dos mananciais de água
para abastecimento, as chuvas de verão também se fazem presentes para lembrar
velhas promessas políticas não cumpridas. Com elas, no sentimento dos
paulistanos, alteram-se momentos de alegria e tristeza por chover e por não
chover.
Entre novembro de 2014 e fevereiro de 2015 as tempestades de verão levaram,
mais uma vez, o caos à Região Metropolitana de São Paulo. O Centro de
Gerenciamento de Emergências da Prefeitura de São Paulo registrou a queda de
1.765 árvores no período. Em Higienópolis, um dos bairros nobres da cidade, um
homem morreu atingido por galhos; no centro da capital, uma árvore desabou
sobre a fiação elétrica que atingiu um carro e, ao sair do veículo o motorista
morreu eletrocutado. Toda a cidade de São Paulo entrou várias vezes em estado de
atenção. A Zona Leste e cidades do ABC foram as áreas mais atingidas. Rios e
córregos transbordaram; pedestres insistiram em enfrentar enxurradas e
alagamentos, em meio à água cheia de lixo. Em níveis elevados, as águas
atingiram linhas de trem e metrô e muitos passageiros tiveram que voltar para casa
a pé.
Alagamentos, Enchentes Enxurradas e Inundações
Há muito São Paulo é castigada pelas chuvas tropicais. De geografia montanhosa,
solo argiloso difícil de drenar, e cortada por diversos vales e cursos d’água, desde
sempre a cidade é propensa a alagamentos e inundações. A capital paulista tem
hoje, cerca de 400 km2 de área construída e impermeabilizada, e abriga 11 milhões
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de habitantes, que descartam nas ruas toneladas de detritos, de toda espécie,
todos os dias. Não é de estranhar, portanto, que o paulistano sofra tanto com as
chuvas intensas.
Fato comum nos períodos chuvosos, as notícias sobre inundações, enchentes e
alagamentos se fazem presentes na mídia escrita, falada e televisada. Embora de
uso comum, as expressões alagamento, cheia, enchente e inundação têm
significados diferentes. Conhecidas por seus efeitos, inundações, enchentes,
enxurradas e alagamentos são eventos nem sempre corretamente descritos,
havendo um grande desentendimento por parte da população em geral – e mesmo
dos órgãos públicos - a respeito do que significam. Mesmo nos meios científicos e
técnicos ainda não há uma posição final sobre os termos, existindo algumas
divergências de interpretação.
Definições
A Defesa Civil de São Bernardo do Campo – SP (2015) define Inundação,
como sendo o transbordamento das águas de um curso d’água, atingindo a planície
de inundação ou área de várzea. Enchentes ou cheias são definidas como a
elevação do nível d’água no canal de drenagem devido ao aumento da vazão,
atingindo a cota máxima do canal, porém, sem extravasar; alagamento seria o
acúmulo momentâneo de águas em determinados locais por deficiência no sistema
de drenagem e enxurrada, o escoamento superficial concentrado e com alta
energia de transporte, que pode ou não estar associado a áreas de domínio
dos processos fluviais.
VALENTE (2009) descreve esses fenômenos hidrológicos utilizando didaticamente
os perfis típicos de regiões montanhosas e de regiões planas, como mostrado na
figura 1.
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Figura 1. Perfis de terrenos abrigando cursos d’água
Fonte: Adaptado de Valente (2009)
Nas regiões montanhosas, o autor destaca a calha (canal) do curso d’água, por
onde circula a água na maior parte do tempo, e uma área adjacente, o leito maior,
que é bem delimitado e usado pelo rio para expansão em épocas de chuvas
intensas. Nas regiões planas, o leito maior é menos definido, predominando as
várzeas, que também são áreas naturais de expansão. Quando os aumentos de
vazões ficam restritos à calha, tem-se, no pensar do autor, as cheias. Quando
extravasam a calha, ocupando, em parte ou no todo, o leito maior ou a várzea,
tem-se as enchentes. Se há ocupação dos leitos maiores e das várzeas com
construções e plantações, as enchentes vêm e cobrem tudo com água, são
as inundações. Para Valente, alagamentos, são entendidos como acúmulos de água
formados pelas enxurradas, que são escoamentos superficiais provocados por
chuvas intensas em áreas totais ou parcialmente impermeabilizadas. O autor
classifica ainda as enchentes quanto a sua origem, como: i) Provenientes das
enxurradas formadas na própria área urbana; ii) Provenientes de enxurradas
ocorridas nas áreas rurais a montante; e iii) Provenientes da junção das duas
anteriores.
Para a Superintendência de Proteção e Defesa Civil do estado da Bahia (2015)
existem 2 tipos de Inundações: as repentinas, bruscas ou enxurradas, que ocorrem
em regiões de relevo acentuado, montanhoso, como na região Sul do País e as
Inundações lentas ou de planície. As primeiras acontecem pela presença de grande
quantidade de água num curto espaço de tempo, sendo frequentes em rios de
zonas montanhosas com bastante inclinação e vales profundos. Nas segundas, as
águas elevam-se de forma paulatina e previsível, mantêm-se em situação de cheia
durante algum tempo e, a seguir, escoam-se gradualmente. Normalmente, as
inundações são cíclicas e nitidamente sazonais. Segundo o órgão de defesa civil
baiano as inundações em cidades ou alagamentos são águas acumuladas no leito
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das ruas e nos
cidades
com
extravasamento
dificulta a vazão
perímetros urbanos, por fortes precipitações pluviométricas, em
sistemas
de
drenagem
deficientes. Nos
alagamentos,
o
das águas depende muito mais de uma drenagem deficiente, que
das águas acumuladas, do que das precipitações locais.
Em trabalho da UNESP publicado na rede mundial, enchente (ou cheia) seria a
elevação temporária do nível d'água normal da drenagem, devido a acréscimo de
descarga e inundação, um tipo particular de enchente, na qual a elevação do nível
d'água normal atinge tal magnitude que as águas não se limitam à calha principal
do rio, extravasando para áreas marginais, habitualmente não ocupadas pelas
águas.
Em publicação do Ministério das Cidades/IPT (Min. Cidades/IPT, 2007) as
inundações representam o transbordamento das águas de um curso d’água,
atingindo a planície de inundação ou área de várzea. As enchentes ou cheias são
definidas pela elevação do nível d’água no canal de drenagem devido ao aumento
da vazão, atingindo a cota máxima do canal, porém, sem extravasar. O alagamento
é um acúmulo momentâneo de águas em determinados locais por deficiência no
sistema de drenagem. A enxurrada é escoamento superficial concentrado e com
alta energia de transporte, que pode ou não estar associado a áreas de domínio dos
processos fluviais.
Como se pode concluir pela leitura dessas definições existem interpretações
diversas para enchentes, inundações, enxurradas e alagamentos. Aqui estaremos
adotando as definições do Ministério das Cidades/IPT, representadas na figura 2.
Impactos sócio ambientais das enchentes, alagamentos enxurradas e inundações
Embora o termo “inundação” usualmente represente uma conotação negativa, de
desastre e danos, as inundações possuem vários efeitos positivos, tanto de caráter
ecológico como econômico. Não obstante, são os impactos negativos que, com o
processo de urbanização e adensamento, tendem a ser relevantes nas áreas
urbanas. As características socioeconômicas da comunidade exposta, o padrão de
uso e ocupação do solo, a ocorrência do evento e as características da cheia
definem a magnitude dos danos da inundação nas áreas atingidas.
Figura 2. Perfil esquemático do processo de enchente e inundação
Fonte: Adaptado de Min. Cidades/IPT (2007)
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Segundo Cançado (2009) os danos causados por inundações podem ser
classificados como tangíveis e intangíveis, e diretos ou indiretos. Os tangíveis são
aqueles passíveis de mensuração em termos monetários, normalmente estimados
por meio dos preços de mercado; os intangíveis relacionam-se a bens de difícil
quantificação como o valor da vida humana, de bens de valor histórico e
arqueológico e/ou de objetos de valor sentimental; os danos diretos são aqueles
resultantes do contato físico de bens e pessoas com a água de inundação, enquanto
que os indiretos são os decorrentes dos danos diretos, como interrupções e
perturbações das atividades sociais e econômicas. Cançado resumiu os principais
danos decorrentes das inundações em áreas urbanas conforme exposto na tabela 1.
Um caso emblemático da cidade São Paulo, envolvendo inundações, populações
expostas, vulnerabilidades e danos é o do distrito de Jardim Helena, região de São
Miguel Paulista. A região, localizada no extremo leste do município faz divisa com
os municípios de Guarulhos ao norte, Itaquaquecetuba ao leste, e com o distrito de
Itaim Paulista ao sul. É vizinha ao rio Tietê e ao Córrego Três Pontes e, assim como
outras áreas da periferia da Zona Leste da cidade de São Paulo, está em área de
perigo de inundação.
Desde sempre a região esteve submetida a enchentes sazonais. Localizada ao lado
da várzea do rio Tietê, urbanizou-se de maneira informal, sem maiores
planejamentos, numa área considerada de perigo de inundação. A razão de suas
ruas frequentemente inundarem é o fato da região estar, em muitos pontos, abaixo
do nível da várzea do Rio. Em situação de chuvas mais intensa o nível da água na
várzea sobe, ficando acima do nível da galeria das águas pluviais. Esta condição
não somente impede o escoamento das águas de chuva como força as águas do rio
a ocupar a região (LICCO, 2013; MEDEIROS E GONÇALVEZ, 2013)
Medeiros e Gonzalez (2013) analisaram a vulnerabilidade social da população do
Jardim Romano, bairro do distrito de Jardim Helena em face das inundações que
impactavam a região, vis a vis, as políticas públicas de gerenciamento de riscos.
Para solucionar o problema e evitar os danos diretos e indiretos causados pelas
inundações no local, a prefeitura de São Paulo implantou medidas de contenção de
inundações no local com a construção de um pôlder, finalizado em 2012. Conforme
a pesquisa de Medeiros e Gonzalez o pôlder tem evitando novos alagamentos no
bairro Jardim Romano. Após a obra, as notícias sobre enchentes no distrito de
Jardim Helena continuam ocorrendo, mas afetando os bairros vizinhos.
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Tabela 1. Principais danos decorrentes de inundações em áreas urbanas
Danos Tangíveis
Diretos
Indiretos
Danos físicos aos domicílios: construção e
Custos de limpeza, alojamento e
conteúdo das residências.
medicamentos. Re-alocação do tempo e dos
gastos na reconstrução. Perda de renda.
Danos físicos ao comércio e serviços:
Lucros cessantes, perda de informações e base
construção e conteúdo (mobiliário,
de dados. Custos adicionais de criação de novas
estoques, mercadorias em exposição, etc.). rotinas operacionais pelas empresas. Efeitos
multiplicadores dos danos nos setores
econômicos interconectados.
Danos físicos aos equipamentos e plantas
Interrupção da produção, perda de produção,
industriais.
receita e, quando for o caso, de exportação.
Efeitos multiplicadores dos danos nos setores
econômicos interconectados.
Danos físicos à infra-estrutura
Perturbações, paralisações e
congestionamento nos serviços, custos
adicionais de transporte, efeitos
multiplicadores dos danos sobre outras áreas
Danos Intangíveis
Diretos
Indiretos
Ferimentos e perda de vida humana.
Estados psicológicos de stress e ansiedade.
Doenças pelo contato com a água, como
Danos de longo prazo à saúde
resfriados e infecções.
Perda de objetos de valor sentimental.
Falta de motivação para o trabalho.
Perda de patrimônio histórico ou cultural.
Inconvenientes de interrupção e perturbações
nas atividades econômicas, meios de
transporte e comunicação.
Perda de animais de estimação.
Perturbação no cotidiano dos moradores
Fonte: Adaptado de Cançado, 2009
As enxurradas são outro tipo de fenômeno que ameaça a população de São Paulo
durante as chuvas de verão. Ocorrem com frequência e em várias localidades da
cidade, constituindo perigo relevante para as pessoas e para o patrimônio. Nas
áreas pavimentadas com declividade, a exemplo de inúmeras ruas e avenidas da
capital, a água das enxurradas chega a velocidades que podem ultrapassar os 3
m/s. Pela elevada densidade da água elas são capazes de arrastar pesos enormes
que encontram pela frente.
A força de uma enxurrada pode ser estimada por equações da física e mais
especificamente da mecânica dos fluidos. Um corpo com área A exposto à
velocidade V das águas de uma enxurrada enfrenta uma força igual a
F=ρ*A*V2
onde ρ = densidade da água; A= área do corpo exposta à água; V = velocidade da
água.
Com as chuvas do começo de 2015, os jornais noticiaram o fato inusitado de uma
caçamba de entulho sendo arrastada pela enxurrada, indo parar na confluência de
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duas ruas no bairro de Campo Grande, zona sul da capital. De acordo com
testemunhas, a enxurrada estava forte e com cerca de 40 a 50 centímetros de
altura de água (ALVES, 2015). Nessa situação, a força exercida pela enxurrada no
equipamento pode ser estimada em 6.750N, suficientes para arrastar um peso de
690 Kgf 1
A força das enxurradas explica a frequência com que pessoas são derrubadas e
levadas pela água (Figura 3), por vezes com resultados fatais, como a morte de um
homem arrastado pelas águas do Córrego do Engenho, no Capão Redondo, Zona
Sul de São Paulo, em fevereiro de 2015.
Figura 3. Enxurrada arrasta mulher que tentava entrar no ônibus.
Fonte: JORNAL NACIONAL, 2014.
Finalmente, os alagamentos, o evento que completa a tríade de fenômenos
hidrometeorológicos que tanto judia dos paulistanos. Os alagamentos não poupam
os habitantes da zona norte, sul, leste ou oeste. Eles são praticamente
onipresentes, bastando chover forte por um determinado período de tempo. A
combinação de pancada de chuva e solo impermeabilizado forma o cenário que leva
ao alagamento de ruas, um dos maiores pesadelos dos motoristas. Acredita-se não
haver um único motorista em São Paulo que não tenha se deparado com uma rua
ou avenida alagada em sua vida de condutor (Figura 4).
Os mapas com os pontos frequentes de alagamento mostram a vulnerabilidade da
cidade a este fenômeno A figura 5 localiza os mais de 3.700 pontos identificados na
região metropolitana de São Paulo, com ênfase na capital. A contagem dos pontos
de alagamento é crescente com a urbanização da cidade, feita sem a implantação
da necessária infraestrutura de drenagem.
Os prejuízos contabilizados com os alagamentos são enormes, variando de perdas
parciais a totais de veículos, móveis e bens residenciais, produtos no comércio e na
indústria, interrupção das atividades normais da comunidade, atrasos e
paralizações nos transportes.
F= densidade da água, vezes a área exposta da caçamba vezes a velocidade da água ao quadrado =
(1000 kg/m3)*(0,75m2)*(3m/s)2 = 6750 N
1
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Figura 4. Ponto de alagamento na avenida 9 de Julho, próximo ao terminal
Bandeira
Fonte: LARA,2015
Cada ponto de alagamento formado na cidade de São Paulo após uma chuva forte
provoca um prejuízo diário de mais de R$ 1 milhão ao país. Com 749 pontos
críticos de alagamento identificados na cidade, as perdas anuais no âmbito do
município chegam a quase R$ 336 milhões. E, com o espraiamento dos efeitos
pelas longas cadeias de produção e renda, o prejuízo vai a mais de R$ 762 milhões
em escala nacional (HADDAD e TEIXEIRA, 2013).
Segundo os autores, os alagamentos contribuem para reduzir o crescimento da
cidade e o bem-estar da população, aumentando os custos das empresas instaladas
em São Paulo e prejudicando sua competitividade nos mercados doméstico e
internacional. O estudo aponta ainda que os efeitos não são apenas locais, mas se
espraiam por meio de longas cadeias de produção e renda, sendo que para avaliar
todos os efeitos, seria preciso considerar as interações internas e externas ao
sistema urbano. Haddad e Teixeira computaram apenas as perdas decorrentes das
interrupções da produção, do comércio e dos serviços. Não consideram os gastos
com danificação de edifícios, veículos e equipamentos; destruição de mercadorias,
bens particulares e instalações públicas e /ou atendimento à saúde das pessoas
afetadas.
Aspectos Institucionais das Enchentes, Alagamentos e Inundações
A Dimensão Institucional de um estudo ou de um projeto busca levantar e
compreender a complexidade de atores públicos e privados envolvidos, seus
interesses e, principalmente, quais as “regras do jogo” que disciplinam ou norteiam
as suas respectivas ações. Em geral, essas “regras” estão estabelecidas em
políticas, com explicitação de instrumentos e de agentes para a sua aplicação. O
mesmo vale para eventos envolvendo enxurradas, alagamentos e inundações.
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Figura 5. Pontos de alagamento identificados na região metropolitana de
São Paulo.
Fonte: GLOBO,2014
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No campo da Gestão Pública, ao analisar ou propor determinada política ou projeto
de intervenção, a dimensão institucional tem por objetivo identificar e analisar
diversos itens, tais como:
O quadro institucional existente: quais os órgãos e agências governamentais
envolvidas, suas competências e esferas de atuação;
As lacunas e/ou sobreposição de competências entre esferas governamentais (nível
nacional, subnacional e local) e possíveis conflitos intergovernamentais;
O papel de organismos multilaterais em termos de recomendações e adoção de
políticas, como Programas e Escritórios específicos da ONU, (caso da UNDRO United Nations Disaster Relief Organization) e do Fórum Econômico Mundial (que
lançou em janeiro de 2013 o Relatório Riscos Globais 2013, incluindo os Desastres
Naturais);
As diversas políticas públicas incidentes, legislação específica e instrumentos legais
que as regem, instrumentos de gestão;
As diretrizes programáticas e orçamentárias previstas;
Os recursos empregados: equipes, orçamentos, tecnologias, estruturas;
A formatação do Processo decisório, se é centralizado em algum órgão ou se
existem instâncias de deliberação participativas, com envolvimento da sociedade
civil.
Esses itens focam a base sobre a qual uma dada situação é ou será gerida /
conduzida. É esta base que constitui o que se entende por Governança, ou seja, a
capacidade administrativa e financeira existente em um Estado que lhe permite
administrar em situações complexas, procurando atingir os objetivos gerais de
ordem, liberdade, justiça social e bem-estar econômico. Segundo Dror (1998, p.),
ter Governança significa “ser capaz de tomar decisões cruciais sendo ético
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(identificando o que é certo), democrático (buscando o balanço de interesses) e
competente (agindo de forma eficiente e efetiva) ”.
A discussão sobre Governança ou “capacidade de Governo” tem sido cada vez mais
relevante na definição de projetos e intervenções estatais. Na área ambiental, no
que tange a problemática das inundações, enxurradas e alagamentos, ou mesmo o
setor de saneamento (nomeadamente no que diz respeito à drenagem de águas
pluviais e de águas servidas), a a Governança enfrenta um desafio extra: a
dificuldade dos órgãos do setor em garantir espaço de atuação frente a uma
agenda governamental que privilegia setores influentes como energia, transporte,
infraestrutura (Camargo et all, 2002). No caso do Gerenciamento de Desastres
Naturais, ainda é preciso estabelecer - na gestão pública - o papel da Prevenção e
Mitigação de danos, em termos de interfaces com outras Políticas Públicas. Neste
contexto, a dimensão institucional tem caráter estratégico na identificação dos
aspectos que facilitam ou dificultam a Governança nessa direção.
O gerenciamento de desastres, instituições e instrumentos envolvidos no
Brasil
Os Desastres Naturais, dentre eles as Enchentes, Alagamentos e Inundações
podem ser gerenciados. Isso não significa a sua eliminação, mas a compreensão de
que os Governos e a sociedade podem desenvolver mecanismos para evitar,
diminuir ou mitigar os riscos envolvidos. E isso envolve o desenvolvimento de
instituições e de instrumentos específicos, em termos de planejamento de ações,
definição de procedimentos e definição de responsabilidades.
Do ponto de vista institucional, Cardona, 1996, apud Tominaga et all, 2009define
uma sequência de etapas que se inter-relacionam antes, durante e após os
desastres e que compõem o seu gerenciamento. Segundo o autor, essas etapas
são:
Prevenção,
Mitigação,
Preparação,
Alerta,
Resposta,
Reabilitação,
Reconstrução / Desenvolvimento, assim entendidas:
Antes do desastre:
 Prevenção: objetiva evitar que ocorra o evento.
 Mitigação: pretende minimizar o impacto do mesmo, reconhecendo que
muitas vezes não é possível evitar sua ocorrência.
 Preparação: estrutura a resposta
 Alerta: corresponde à notificação formal de um perigo iminente.
Durante o desastre: Atividades de resposta ao desastre: são aquelas que se
desenvolvem no período de emergência ou imediatamente após de ocorrido
o evento. Podem envolver ações de evacuação, busca e resgate, de
Assistência e alívio à população afetada e ações que se realizam durante o
período em que a comunidade se encontra desorganizada e os serviços
básicos de infra-estrutura não funcionam.
Após o desastre
 Reabilitação: período de transição que se inicia ao final da emergência e no
qual se restabelecem os serviços vitais indispensáveis e os sistemas de
abastecimento da comunidade afetada.
 Reconstrução: caracteriza-se pelos esforços para reparar a infraestrutura
danificada e restaurar o sistema de produção, revitalizar a economia,
buscando alcançar ou superar o nível de desenvolvimento prévio ao
desastre.
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Para o gerenciamento de desastres, as Nações Unidas desenharam um sistema
conhecido como Modelo UNDRO (United Nations Disaster Relief Organization), com
o objetivo de identificação dos riscos envolvidos por meio da avaliação de dois
aspectos: i) na possibilidade de ocorrência do processo geológico, com base na
análise de seus condicionantes naturais e antrópicos; ii) nas conseqüências sociais
e econômicas potenciais, caso o processo ocorra. (UNDRO 1991):
O Modelo UNDRO de Gerenciamento de Desastres prevê as seguintes Etapas:
(1)
(2)
(3)
(4)
(5)
Identificação dos Riscos
Análise dos Riscos
Medidas de Prevenção
Planejamento para situações de emergência
Informações Públicas e Treinamento
O modelo de gerenciamento de desastres adotado pela Defesa Civil Nacional
(Brasília, 2007) compõem-se de: (a) Prevenção; (b) Preparação para Emergências
e Desastres; (c) Resposta e (d) Reconstrução. O modelo tem uma visão cíclica, em
que o último momento- Reconstrução também subsidia ações de revisão do
Momento 1- Prevenção.
Considerando os 4 momentos de forma integrada, a Reconstrução além de
restabelecer a normalidade, visa à prevenção a novos desastres, caracterizando
assim a sequência cíclica das etapas de gerenciamento de desastres.
Para o Município de SP, a visão institucional e a governança relativas ao
gerenciamento de desastres é tema particularmente sensível aos paulistanos,
devido a recorrência das Enchentes na agenda paulistana. E também é tema
também do atual processo de revisão do Plano Diretor e do Zoneamento da Cidade
de SP (abril-julho/2015), abordando os 4 momentos de gerenciamento, com
medidas desde a prevenção até a mitigação.
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