“arte educação em dois tempos” barbosa e iavelberg

Transcrição

“arte educação em dois tempos” barbosa e iavelberg
Universidade de São Paulo
Centro Universitário Maria Antonia – USP
Célia Regina Ornellas Ricci
“ARTE EDUCAÇÃO EM DOIS TEMPOS”
BARBOSA E IAVELBERG SOB A ÓTICA DE UM ARTISTA
São Paulo
2008
Célia Regina Ornellas Ricci
“ARTE EDUCAÇÃO EM DOIS TEMPOS”
BARBOSA E IAVELBERG SOB A ÓTICA DE UM ARTISTA
Monografia apresentada ao Centro Universitário Maria Antonia
da Universidade de São Paulo para obtenção do título de
especialista em Linguagens da Arte.
Linha de investigação: Materiais, recursos e fontes de pesquisa
para o ensino da arte.
Orientador: Luciana Mourão Arslan
São Paulo
2008
“Precisamos libertar nossa mudez, bradar contra o absurdo da
sombra, rasgar a teia e descobrir o lugar no vértice de vínculo
único, dilacerado pela correnteza do tempo. Tanger os
rebanhos que adormeceram à margem da história. Acordar os
vizinhos para atravessar o vazio dos castiçais e levá-los
através das miragens de quem não sonha, para alcançar um
sonho ainda maior.”1
J. Camelo Ponte
Agradecimentos
Agradeço aos mestres Professora Doutora Rosa Iavelberg,
Professora Monika Jun Honma, Professora Luciana Mourão
Arslan, Professora Doutora Sandra Terezinha Amarante e
Professor e Escritor Jose Camelo Ponte pela dedicação,
colaboração e pelas valiosas contribuições para este trabalho.
À toda equipe de mestres do Centro Universitário Maria
Antonia USP , funcionários da administração e colegas que
no exercício da convivência e aprendizagem transformaram a
minha realidade. Agradeço, ainda, à Professora Doutora Ana
Mae Barbosa por toda atenção que sempre dispensa a mim e
ao meu aprendizado. Agradeço à minha família, por estar
comigo sempre, tratando-me como a rainha do lar. Agradeço
aos meus queridos que do céu velam por mim e cuidam para
eu nunca desanimar.
Dedicatória
Dedico este trabalho ao Mestre e Psicólogo Frei José Leonel
Viera, que preside a Comunidade Jardim Primavera , onde
cuida de mais de 500 crianças e da formação de jovens e
adultos em três unidades educacionais por ele criadas.
À ele a minha gratidão por acreditar em mim e me fazer
redescobrir o caminho que valida e completa a minha
existência : o meu ser docente!
1
Ponte, J. Camelo. Sobre Caminhantes...São Paulo: Linguagem-Editora, 2002.
4
“ARTE EDUCAÇÃO EM DOIS TEMPOS”
BARBOSA E IAVELBERG SOB A ÓTICA DE UM ARTISTA
Resumo
Direcionada aos arte educadores, pesquisadores e pensadores
contemporâneos, esta pesquisa pretende pontuar os elementos forjadores de
uma eficiente atuação do docente em suas praticas em arte-educação,
reconhecer as premissas principais apontadas por ambas para a formação
do professor.
Célia Regina Ornellas Ricci
Concluiu magistério, é bacharel em economia, pós-graduada em história da
arte, artista plástica, pesquisa a identidade brasileira e, como arte
educadora propõe workshops
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho, elaborado a fim de ilustrar o cumprimento de mais uma
etapa de nossas pesquisas no plano da arte educação, tem por finalidade precípua tratar
das concepções de arte educação de duas referências nacionais no assunto – Ana Mae
Barbosa e Rosa Iavelberg – utilizando como base a obra de cada uma delas que
julgamos melhor representar suas teorias, não tanto com o escopo de compará-las e
sim muito mais agregá-las.
Este exercício de convergência é nosso objetivo inicial mas, não é um fim em
si mesmo, e sim um meio, um instrumento para demonstrar a forma como os
ensinamentos ali contidos traduzem e verbalizam aquilo que nossa experiência – num
5
primeiro momento autodidata, empírica e desprovida de bases teóricas – intuiu ao
longo de nossa trajetória artística.1
Adotamos como ponto de partida Ana Mae Barbosa, principal figura em arte
educação no Brasil, e seu livro “A Imagem no Ensino da Arte” – Anos Oitenta e
Novos Tempos, publicação emblemática da arte educação que, desde a década de 90,
traz contribuições importantes ao ensino da arte para a decodificação e compreensão
da leitura das imagens.
Além da proposta de Barbosa, que carrega em sua trajetória vastas publicações
no campo da arte educação no Brasil, inclusive com informes de pensadores
internacionais, optamos por avaliar as contribuições de Rosa Iavelberg, a partir da
obra “Para Gostar de Aprender Arte” – Sala de aula e formação de professores,
outro riquíssimo estudo afeto ao campo do ensino da arte.
Tal obra foi elaborada nesta década, em que a formação de professores se
apresenta, pelos pressupostos dos Parâmetros Curriculares Nacionais, como condição
sine qua non para que o processo educativo apoiado na arte possa, cada vez mais,
resultar em um estado satisfatório para a educação como um todo, em contextos,
linguagens, referenciais e dinâmicas diversas.
Ato contínuo, após situar suas obras dentro dos contextos pessoais de cada uma
delas, e de convergir as conclusões de seus trabalhos a um ponto de contato, um
objetivo comum, que é o de diminuir a distância entre a teoria e a prática no ensino da
arte, transportamos a experiência que estas educadoras conseguiram verbalizar, para
nossa vivência, essencialmente empírica.
1
(ver Apêndice C)
6
2. SOBRE AS AUTORAS, SUAS CARACTERÍSTICAS E AÇÕES
2.1 ESCORÇO CURRICULAR
Ana Mae Tavares Bastos Barbosa, primeira doutora em arte educação em
artes visuais no Brasil. Doutora formada em Humanistic Education pela Boston
University, B.U., – U.S.A., fez mestrado em Arte Educação, na Southern Connecticut
State College, S.C.S.C., – USA, e pós-doutorado pela Columbia University, CUNYC,
USA é, sem dúvida, a articuladora de um processo que culminou com uma prática
segundo a qual a formação do professor em arte compreende a sistematização das
atividades, princípios, métodos para o melhor desempenho pedagógico, congregando,
assim, teoria e prática da arte.
Traz como característica certo espírito de busca pela justiça como equilíbrio
social, identificação corroborada inclusive por sua incursão pelo terreno do Direito,
uma de suas graduações.
Esta vertente, aliada às suas ações visando a politização dos arte educadores
brasileiros, coaduna-se com sua atuação sempre inovada, atualizada, disseminadora da
promoção social e comunitária e geradora de intercâmbios de notícias e encontros para
discussões no circuito acadêmico, com pensadores nacionais e internacionais.
Durante sua trajetória, buscou, assim como um artista, informar e, na qualidade
de mestra, formar. Sua linha de pesquisa partiu da história e das metodologias do
ensino da arte e da cultura visual sendo que, atualmente, sua atenção está voltada para
a relação entre política e arte e multiculturalismo por meio da arte.
Atualmente está aposentada como professora titutar da Universidade de São
Paulo, mas trabalha ainda como orientadora de pós-graduação na Escola de
7
Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo e ministra aulas na Universidade
Anhembi Morumbi. 2
Foi presidente da INSEA3 paralelamente à sua atuação como diretora do Museu
de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, onde criou a equipe de arte –
educadores, preparadores do fruir bem da arte através da prática do fazer, criticar e
contextualizar - pressupostos da junção entre a história e fruição (leitura) da obra de
arte; a Proposta Triangular.
Rosa Iavelberg é mestra em educação, especialista em arte educação I e II e
doutora em arte educação pela Universidade de São Paulo. Suas experiências abarcam a
área de artes, formação de professores, principalmente nos temas arte na educação,
desenho da criança e do jovem.
Atualmente, leciona no programa de graduação e pós-graduação da Faculdade
de Educação da Universidade de São Paulo, é diretora do Centro Universitário Maria
Antonia e coordenadora do curso de formação de professores, Especialização nas
Linguagens da Arte. Atuou também junto aos Parâmetros Curriculares Nacionais dos
quais participou como coordenadora e foi uma das elaboradoras, sendo referência no
país em tal seguimento.
Traz em sua linha de pesquisa a psicologia, além da educação e sua prática se
constitui de um resultado sabido – obtido através de sua ação como professora – mas
que não é somente empírico, vez emana não apenas do seu fazer docente, mas também
de seus princípios voltados ao estudo, à pesquisa e à fusão do fazer docente com a
prática pedagógica.
2
Publicou 19 livros sobre Arte e Arte Educação.Recebeu vários prêmios , com destaque para o
Internacional Herbert Read,1999 e a Ordem do Mérito Científico(Brasil, 2004). Pronunciou aulas em
OhioState e Yale University e palestras em Harvard, Columbia, MOMA e em cerca de 30 paíse das
Américas, Europa, Ásia e África.Consultora do CNPq, Canal Futura(2005-6),membro do Conselho da
Petrobrás Cultural , redatora do edital para Formação(2007). É curadora visual das Casas de Cultura
AES:Eletropaulo (informação verbal)
3
International Society for Education Through Art
8
Dotada de um espírito de “curadoria” pela excelência de sua formação em
arquitetura, ela guarda semelhança, em seu desenho educacional, com os princípios da
Gestalt4, selecionando formas, maneiras, métodos – os mais adequados possíveis – a
serem repassados aos docentes.
Sua atuação traduz o cuidado de apreender a unidade e o equilíbrio, o que faz
como mediadora e selecionadora, em seu rigor pedagógico próprio da didática de uma
mãe ao educar seu filho.
Em seus ensinamentos para a organização da aprendizagem, pela sua ação
interventora, edificadora, nos conduz ao melhor, à profissionalização.
Apresenta atualmente os inovadores projetos que levam a arte contemporânea
às escolas do ensino fundamental e médio, o Projeto Lá Vai Maria e o Projeto Arte
Passageira – com a intervenção em ônibus denominada CARNE, de Carmela Gross.
2.2
PRESSUPOSTOS TEÓRICOS DAS AUTORAS
Barbosa toma como base o DBAE-Disciplined Based Art Education5 (que
integra a produção, a crítica, a estética e a história da arte, abordagem racionalista
,originalmente concebida por Richard Hamilton e alguns professores6) e as pesquisas
das “Escuelas Al Aire Libre”, do México7.
4
Pallamin,Vera, Princípios da Gestalt na Organização da Forma-AbordagemBidimensional, São Paulo,
FAU,1989, p.24
5
6
Proposta do Getty Center of Education in the Arts-USA(BARBOSA, 1991)
Richard Smith, Joe Tilson e Eduardo Paolozzi –Newcastle University,Inglaterra(ibidem,p.36)
7
Proposta que, à partir das influências do artista mexicano Best Maugard, propunha o desenvolvimento
do fazer em consonância com a história da arte nacional, no sentido de levar o povo à conscientização
política e cultural.(ibidem p.36)
9
Apresenta ainda, em seu livro, as teorias de importantes pensadores, dentre os
quais podemos citar Robert Saunders8 ,E.B.Feldman9, Monique Brière do Canadá10 ,
Rosalind Ragans11 e propõe o entendimento da obra, da imagem que domina o plano
contemporâneo à partir do fazer artístico, da leitura da imagem e da história da arte.
Nesta abordagem contextual, impõe-se a aprendizagem da arte não somente como um
meio de expressão mas, como um objeto de aquisição cultural.
Tal proposta veio a tona, conforme discorre Evelyn Berg,12 na apresentação do
livro, quando a Fundação Iochpe pinçou-a como aporte significativo para integrar a
gama de projetos do Arte na Escola criados com o fim de acompanhar a evolução
sentida na civilização como um todo, desenvolvidos desde 1988, sob a orientação de
Barbosa.
Provinda do Arte na Escola, é proposta que pretende indicar o decodificador da
obra de arte quando forma o fruidor - conhecedor da obra de arte - e tem como
pressuposto a Metodologia Triangular, dentre outros elementos complementares, vídeo
e imagens, imagens móveis dentro da sala de aula.
A preocupação de Barbosa reflete a arte em suas generalizações e abstrações e
traz o sentido do discurso das imagens para o qual indica a utilização do tripé de
decodificação por ela proposto na atualidade, atentando-se quanto ao que está sendo
veiculado, o que está sendo dito e o que realmente deve ser absorvido pelo educando
8
Método de Multipropósito- Saunders,Robert “Teaching Through Art”, series A e B, New York,
American Books Company, 1971, pp. 1 e 3) apud (ibidem,pp.50-59)
9
Método Comparativo de Análise de Obras de Arte – Feldman, Edmund Burke “Becoming Human
Through Art: Aesthetic Experience in the School, New Jersey, Prentice Hall, 1970 apud (ibidem, pp. 4350)
10
DBAE com ênfase na produção- Briére, Monique, Art Image 5,New York, Art Image Publications
Inc., 1988, PP.101-104) apud (ibidem, 1991,(pp.63-69)
11
DBAE com ênfase na crítica- Ragans, Rosalind, Arttalk, Mission Hill, Califórnia, Glencoe Publishing
Company,1988(ibiden, pp.69-76)
12
Superintendente do Projeto Cultural Iochpe
10
em seu processo de leitura, pensamento e transposição dos discursos presentes nesta
civilização em que, segundo ela, 82% da aprendizagem se faz através das imagens,
sendo que 55% é absorvida inconscientemente.(BARBOSA,1991)13 .
Preocupando-se com a formação de sujeitos identificados com a arte
principalmente na adolescência, acrescenta em suas reflexões importante comentário
de Regina Machado contido em texto de Octavio Paz14, sobre as indagações surgidas
nesta fase da juventude em que o sujeito da aprendizagem se sente hesitante diante de
tantas descobertas.
Barbosa é figura de atuação constante em todas as instâncias através de uma
ação organizadora, força tendente a impulsionar, em nosso país, uma condição cultural
que abrigue o novo vocabulário e os novos contextos, e uma geração humana criativa,
dentro de ações sociais abrangentes e significativas da aprendizagem da arte, do ensino
da arte.
O ensino da arte, segundo ela, é fundamental nas escolas, nos museus, centros
culturais , nas escolas profissionalizantes, nas universidades, em todos os projetos com
múltiplas utilizações da técnica.
Arte-educação para Barbosa, é epistemologia e, portanto, o meio de investigação
dos modos como se aprende arte na escola de 1º e 2º grau, na universidade e nos
ateliês.15
Em 1987, iniciou um programa de arte-educação no Museu de Arte
Contemporânea de São Paulo, combinando trabalho prático com história da arte e
leitura de obras de arte.
13
(ver Apêndice A)
Paz, Octávio El Labirinto de la Soledad, México, Fondo de Cultura Económica, 1977 apud Machado,
Regina , “AHC ED ASAC : uma Reflexão sobre a Funçaõ da Arte no Magistério”, 1988, texto manuscrito
apud (ibidem, pp. 28-31)
15
(ibidem,1991).
14
11
A metodologia utilizada para a leitura de uma obra de arte pode ser estética,
semiológica, iconológica, princípios da Gestalt16 etc, de conformidade com a formação
do professor, proposta cuidadosa para não transformar a leitura de uma obra de arte num
simples questionário, de modo a não reduzir a análise ou apreciação artística a um jogo
de questões e respostas – um mero exercício escolar – que leva a leitura a um nível
irrelevante, simplificando o complexo de significados de uma obra de arte, limitando
desta feita a imaginação do fruidor. Na concepção de Barbosa, “a idéia de leitura da
imagem é construir uma metalinguagem da imagem. não é falar sobre uma pintura mas
falar a pintura num outro discurso, às vezes silencioso, algumas vezes gráfico, e verbal
somente na sua visibilidade primária.”(BARBOSA ,1991)17 Para esta significação
dentro das imagens, utiliza as sistematizações propostas por vários pensadores.18
Já Iavelberg, por seu turno, durante os anos 80 e 90, quando atuou na formação
de professores das escolas públicas e privadas de vários estados do País, constatou a
recorrência de diversas práticas irrefletidas e vem procurando selecionar teorias e
práticas pedagógicas para serem sugeridas – as mais avançadas concepções de arte e
ensino de arte – orientando-se pelo diálogo permanente entre as teorias que elegeu,
seus princípios e suas ações em sala de aula.
Ao preocupar-se com os métodos e procedimentos didáticos para uma
aprendizagem significativa, adota o referencial da aprendizagem de Antoni Zabala19
para o grupo de conteúdos a serem trabalhos numa educação em arte: os conceitos,
princípios, fatos, valores e atitudes em suas ocorrências no cotidiano pedagógico com
16
Pallamin,Vera, op.cit.
(ver Apêndice A – item I).
18
Louis Marin (Estudos Semiológicos: La Lectura de La Imagem, Madrid, Comunicación, 1978), JeanLouis Schefer (Scénographie d’um tableau, Paris, Seuil, 1969);Oscar Morrina e Maria Elena Jubrias,
Havana, Editorial Gente Nueva, Edmundo Burke Feldman, Harry Broudy, J.Bronowski, Rudolf Arnheim,
etc.)(BARBOSA,1991, p.19)
19
Zabala, A. A prática educativa: como ensinar. Porto Alegre:Artmed,1998apud (IAVELBER,2003,p.36)
17
12
os alunos, em consonância com o referencial para uma educação do século XXI, de
Jacques Delors20.
Realça, no resultado de suas pesquisas, as teorias de pensadores que surgiram
como propostas educativas já nos anos 80: Piaget e a Escola Construtivista e suas
contribuições da Epistemologia Genética, a Escola Sócio – histórica de Vigotsky, a
Metodologia Triangular de Barbosa, a Teoria da Aprendizagem Significativa, de
Ausubel21, as práticas de reflexão de Antonio Nóvoa22.(IAVELBERG,2003).
Transporta-nos, ainda, pelo território das leituras das imagens, apresentando em sua
publicação os níveis de desenvolvimento e compreensão estética de vários
pensadores23, os quais relaciona com a evolução das propostas do grafismo em
desenho, dentre as quais destacamos a do desenho cultivado por ela desenvolvida.24
Neste sentido, reforça a sua tese de que a criança evolui em suas construções artísticas
de maneira cultivada, isto é, guardando crédito ao contexto cultural.25
Iavelberg aponta que em nossa decisão de transmitir educação devemos sempre
definir os objetivos atrelados aos conteúdos dos três eixos: fazer, apreciar e refletir.
O educador deve entender que uma proposta curricular compreende uma gama
de escolhas e decisões orientadoras da área do conhecimento e da prática em sala de
aula e que o currículo é o centro das decisões e escolhas tanto para o conhecimento
quanto para a maneira prática empregada pelo docente para desenvolver suas aulas; e
portanto, devem estar em constante mutação. Neste sentido, o papel da escola e o
20
Saber saberes ( fatos, conceitos, princípios), saber fazeres (procedimentos), saber ser e saber ser no
convívio com o outro (valores e atitudes).Delors,J.(org)-Educação : um tesouro a descobrir. Brasília
:Mec/Unesco,1998 apud (Iavelberg,2003,p.28)
21
Ausubel, D.H. et al. Psicologia educacional.Rio de Janeiro: Interamericana, 1970 apud
(Iavelberg,2003)
22
Nóvoa, A (org.). Os professors e sua formação, Lisboa: Don Quixote, 1995, idem, Estrela, A. (org).
Avaliações em educação: novas perspectivas. Portugal: Porto Editora, 1993 apud (Iavelberg, 2003)
23
Edmund Feldman,Abigail Housen,Robert William Ott, Michael Parsons(ibidem,p.76
24
Luquet, Lowenfeld, Kellog e Iavelberg(ibidem,pp.87-88)
25
(ver Apêndice A – item IV)
13
sentido da educação devem estar em consonância com a evolução teórica e prática dos
assuntos ou temas.
O disseminador da educação deve preparar-se para definir os objetivos e realçar
a motivação que justifica a escolha de determinado conjunto de conteúdos para a ação
de educar.
Para cada objetivo deverão ser relacionados conteúdos de vários tipos a
diferentes ações de aprendizagem dos estudantes. O aluno pode aprender tipos de
conteúdos distintos dentro dos eixos fazer (expressão e construção), apreciar
(capacidade de leitura e fruição das imagens) e refletir (desenvolvimento de teorias
próprias a partir de fontes que refletem sobre arte ).
Para ela, a apresentação dos conteúdos deve ser passada aos educandos em
formatos diversos, tais como narrativas, imagens, meios elétricos e eletrônicos, textos.
Ao aluno cabe transformar estes ensinamentos em conhecimento através de sucessivas
interações.
Defende, também, que os fatos são assimilados por repetição das informações
neles contidas uma vez que a sua assimilação está ligada à memorização que deve ser
significativa, colocando os fatos em ligação com as redes de conteúdos, isto é, com seu
conhecimento prévio configurando-se em redes de significação. Realça, também, a
importância de planejamento das atividades, proposições em constante comunicação
com os alunos com o intuito de informá-los sobre a razão e o sentido da avaliação.
Reflete que o desenvolvimento do texto crítico é importante e se torna um
instrumento de avaliação por parte dos professores; sua leitura feita pelo educador será
muito favorável para a avaliação da aprendizagem. Para o desenvolvimento do texto
crítico, o ideal será promover leituras de vários textos afetos à arte, sendo que este
14
exercício facilitará ainda a interdisciplinaridade em função da articulação de vários
saberes interligados ainda com a realidade pessoal do aluno. 26
Iavelberg atua firmemente na formação do professor em arte, alertando sobre a
atenção quanto aos temas transversais a serem trabalhados 27, refletindo sobre as novas
tecnologias de comunicação e informação na atualidade, incluindo, ainda as premissas
para a ação participante e interventora do professor na instituição escolar, na
comunidade e em todas as instâncias de sua atuação.
3.
PANORAMA DAS OBRAS
O livro de Barbosa foi publicado posteriormente a um tempo em que o desenho
geométrico, as imagens de baixa qualidade e imagens prontas para colorir dominavam
os livros didáticos, a apreciação estética e a história da arte não encontravam espaço
nas salas de aula e o conceito do ensino da arte completava-se ainda com a livre
expressão da criatividade.
É uma obra que apresenta brilhante resposta à “civilização da imagem” que,
conforme discorre Roque Spencer Maciel de Barros28, se contrapõe à “civilização da
palavra”, mas carece de uma reflexão, de uma mediação:
As próprias assim chamadas ‘artes visuais’, para serem verdadeiramente artes, não se
esgotam nunca na imagem: a percepção estética pressupõe, implícita, a palavra que torna
possível a inteligibilidade da obra artística bem como eleva ao nível da consciência a
emoção que ela provoca. Assim sendo, a imagem, por si só, entregue a si mesma, e sem a
mediação da palavra, que é o suporte concreto do conceito, não pode suscitar o esforço
mental – antes o dispensa - o raciocínio e a crítica; ela se esvazia e cai no plano do nãosignificado.
26
(ver Apêndice A)
(ver Apêndice B)
28
Barros,Roque Maciel de,-As Duas Culturas, texto do Jornal da Tarde-número 8658-Ano 29, de
27
13janeiro1994,anverso da 1ªp, p.02
15
No livro (lançado três anos antes de Barros publicar tais comentários), Barbosa
reflete o sentido conceitual e político do ensino da arte no Brasil, em comparação com
o que acontecia de mais avançado em pesquisas em arte educação na Inglaterra,
Estados Unidos e México e apresenta ao público conceitos tendentes a impulsionar a
arte educação brasileira conforme já ocorria com a mundial, utilizando como
ferramenta a Metodologia Triangular.29
A obra de Iavelberg, por sua vez, é um convite à apreciação dos inúmeros
instrumentos, métodos, informações e condutas que, conforme sua visão, nutrida de
dinâmica competente, profissional e técnica e apontada em direção a um sentido
sistemático e edificante, são passíveis de serem empregados na didática do ensino da
arte.
Suas idéias enfatizam a tese de que a arte permite a utilização de todas as
premissas contidas no ato do fazer, apreciar e refletir da aprendizagem com aporte
significativo, para situar o receptor professor, educador - no contexto das situações a
serem por ele vivenciadas durante a disseminação de informações que irá realizar.
Tal metodologia busca tornar o professor, o educador (disseminador) apto a
transitar pela linha da existência humana, pelo crescimento da civilização, enfim, pelas
variáveis do tempo e no espaço, de modo a desenvolver o melhor método de
exteriorização do conteúdo a ser ministrado.
Propõe-se, portanto, para o professor, a constância no desenvolvimento de
pesquisas e aperfeiçoamentos de qualidade para os seus educandos, de modo que estes
últimos passem a incluir a arte em seu processo de aprendizagem como algo natural e
necessário, despertando-lhes a atitude filosófica na busca e desejo do saber.30
29
30
(ver Apêndices A e B )
(ver Apêndices A e B)
16
4.
CONVERGÊNCIA ENTRE AS OBRAS
Reconhecemos, a partir da trajetória dessas duas pensadoras, que ambas afluem
na busca do encontro e aproximação da teoria e prática no ensino da arte.
Sem dúvida, a existência de um propósito essencial comum a partir da
utilização de metodologias diferentes torna a tarefa de discorrer sobre suas teorias uma
forma de agregar seus ensinamentos. Assim, comparar suas ações é sem dúvida uma
oportunidade de nos aproximarmos de previsões relevantes e dos aspectos principais
quanto ao ensino da arte.
Barbosa, com sua incansável ação valorizadora e promotora das condições que
propiciam a evolução e os constantes aperfeiçoamentos neste plano, apresenta uma
diversidade de situações ligadas à tecedura que envolve o discurso e prática em arte
educação. Inclui, ademais, em sua publicação, a interessante evolução da pratica
educativa nos museus do mundo inteiro.
Iavelberg, por seu turno, não se contenta com os aspectos generalizantes que a
arte propõe mas, em seu rigor psicopedagógico, se empenha em especificar em suas
investigações as propostas que melhor se adaptem às exigências da prática em sala de
aula, levando-se em consideração a particularidade cognitiva de cada educando.
Adiciona, ainda, em sua publicação, a evolução histórica das tendências pedagógicas.
Ressalte-se que ambas possuem um caráter de aceitação de sugestões
sobretudo se estiverem firmemente estabelecidas e conduzidas pelos critérios da
verdade,
do
se
contemporaneidade.
fazer
docente,
principalmente
conforme
os
ditames
da
17
5.
PARALELO ENTRE NOSSA EXPERIÊNCIA EMPÍRICA
E AS REFLEXÕES DAS AUTORAS
Em nossa vivência empírica, constatamos que a arte é fundamental, exercita
nossa capacidade de julgar e de formular significados que fogem à nossa possibilidade
de verbalização, exatamente como discorre Barbosa. Para ela, que apresenta em sua
preocupação uma vigília constante a todas as instâncias em que a presença da arte se
faz necessária, “arte é cognição, profissão, interpretação da realidade, do imaginário e
é acima de tudo conteúdo.” (BARBOSA, 1991)
E neste ponto temos em nossa experiência vivida, sentida e, via de
conseqüência, de crescimento, exatamente o conhecimento de situações presentes no
processo cognitivo, as quais não se apresentam como ações comunicativas para serem
verbalizadas, mas sim refletidas nos objetos artísticos como inúmeras condições de
aprendizagens significativas. Tais objetos reconhecem e traduzem nosso processo de
organização do conhecimento.31
O objeto artístico se configura então num meio de organização do conhecimento,
numa imagem para o reconhecimento, o entendimento, a aprendizagem. E isto se
apresenta para nós como o conceito de arte na pós-modernidade indicado por Barbosa a
Berg:“ Na pós-modernidade o conceito de arte está ligado à cognição; o de fazer arte
está ligado à construção e o conceito de pensamento visual está ligado à construção do
pensamento a partir da imagem”.32
Podemos afirmar que, através de nosso desenvolvimento artístico, sentimo-nos
cidadãos ativos e atuantes, compromissados com a disseminação e o testemunho desta
oportunidade de experiência que cunhou de maneira efetiva a nossa identidade, o
31
32
(ver Apêndices B e C)
(Berg apud Barbosa, 1991,p.XIV,Apres.)
18
reconhecimento de nossas mais profundas identificações de origem e, portanto, o
alicerce para a equilibrada evolução de nosso caráter, do nosso ser.33
Iavelberg, a despeito dos parâmetros curriculares nacionais efetivamente
vigentes, informa que, em sua elaboração, a preocupação de todos os participantes,
Barbosa inclusive, envolvia a construção de um referencial em arte que trouxesse uma
evolução na educação, visando o desenvolvimento das classes menos favorecidas, com
propostas educativas mais humanistas.
Nossa vivência particular comprovou justamente que a busca dos elementos de
nossa identidade pessoal e social resultante de nossa aprendizagem contribuiu de
maneira significativa para a alteração de nosso comportamento, de nossas atitudes e
para a ampliação dos conhecimentos adquiridos.
Para Iavelberg, o “fazer parte do todo”, a integração à comunidade, esta formada
por cidadãos participantes e responsáveis e isto é resultado da experiência de
aprendizagem do estudante que se origina na escola. Contudo, é essencial que o
professor repasse em seus ensinamentos os processos de criação dos artistas,
proporcionando aos seus alunos o desenvolvimento da capacidade de elaboração de suas
próprias criações.
A construção artística por nós experimentada – nossa aprendizagem significativa
– atingiu nossas instâncias existenciais exatamente por traduzir, ou melhor, por
concretizar o desenvolvimento de nossa aptidão para o melhor desempenho em nossas
atividades.34
A referida educadora aponta que os anos 90 (a lei 9394/96) reflete os novos
paradigmas e uma política que propicia a consolidação dos parâmetros curriculares
nacionais. Aponta, ainda, que uma grande mobilização em torno da formação contínua
33
34
(ver Apêndices B e C)
(ver Apêndices B e C)
19
de professores se fez sentir, somada aos referenciais provindos dos anos 80 quando
desponta a escola construtivista que contempla a epistemologia genética de Piaget, a
visão sócio-histórica de Vigotsky, a teoria da aprendizagem significativa de Ausubel,35
as pesquisas sobre aquisição de conhecimento, como a psicogênese da língua escrita de
Emília Ferrero e Ana Teberosky36 e o novo olhar dos educadores no final da década de
80, denominados de neopiagetianos.(IAVELBERG, 2003).
À partir daí, segundo a autora, passou-se a dar ênfase à observação do “sujeito
psicológico”, aquele que percorre níveis conceituais na aprendizagem por estratégias
pessoais, seus saberes práticos, solucionando problemas, tomando decisões, pondo em
prática seus conhecimentos prévios, de conformidade com o seu sistema operatório e
relacionado com seus meios de aprendizagem.
Assim, a tradução do aprendizado em objeto ou em ato, em atitude artística – é
a forma do receptor da informação, do educando, de adaptar a informação recebida ao
seu contexto pessoal.
Aliás, neste sentido, não se pode deixar de mencionar que o objeto e o ato
artístico são, em muitos casos, as formas mais democráticas e acessíveis de
transmissão de conhecimento e de manifestação de aprendizado, pois podem surgir dos
mais variados materiais (ou mesmo daquilo que já se descartou como material para
outras finalidades), bem como da simples expressão facial, do gesto, da cor ou da
ausência destes elementos.
Em sua projeção para o futuro da arte educação no Brasil, Barbosa aponta como
objetivos a relevância do estudo da imagem no ensino da arte, principalmente na
educação como um todo; a consideração da proposta artística dos educandos baseada
em seu próprio meio, atentando para o aspecto de que a defasagem entre a cultura culta
35
36
Op cit
Ferrero,E e Teberosky,A, Psicogênese da Língua Escrita,Artes Médicas, 1985, Porto Alegre
20
e a popular inviabiliza o entendimento e dificulta a decodificação e interação das
culturas.
Reforça, assim, a idéia de que os movimentos de arte e comunidade na arteeducação formal evitam perigo de se negar a informação da “norma culta” para a classe
popular e inclui, ainda, a orientação da arte-educação à iniciação dos princípios do
design especialmente para escolas de 2º grau, argumentando que o fazer via artefato
trará mais qualidade à vida, se além das propriedades funcionais também se apelar para
a imaginação.
Estas tendências garantirão para a arte-educação o papel de transmissora de
valores estéticos e culturais para o avanço no contexto de um país do terceiro mundo.
6.
CONCLUSÕES
Na perspectiva das ações educativas, se levarmos em consideração a
subjetividade em que o “sujeito epistêmico” (universal) está compreendido, aliado ao
“sujeito psicológico”(individual), com as suas particularidades apontado por Iavelberg,
conectado com o “fazer artefatos” pontuado por Barbosa, e se a esta construção for
adicionada a preocupação com os liames de nossa identidade – especialmente (mas não
exclusivamente) no que tange ao negro e ao indígena, justamente os semblantes centrais
da exclusão que se busca afastar - definiríamos o fio condutor e propulsor de um
desenvolvimento sustentado em todas as instâncias necessárias para que o indivíduo se
apresente como cidadão participativo dentro de uma sociedade, dentro de um Estado de
feições igualitárias.37
37
(ver Apêndices A, B e C)
21
Reconhecemos, desta feita, que as autoras trazem em suas publicações um
arsenal importante para a prática do ensino da arte principalmente com relação aos
aspectos voltados à promoção social, política e econômica, levando-se em consideração
uma projeção a longo prazo,
num futuro que certamente contemplará um estado
cultural e educacional mais justo e satisfatório.
A arte nos permite, através do espaço reservado à criação, que nos aproximemos
do exercício da forma, da maneira, do jeito, do sentido vivido e empírico, em toda a
história da humanidade. É, portanto, um dos alicerces – verdadeiro arcabouço de
esperança em todo o mundo – para a prática, resolução e conformação de uma
sociedade mais equilibrada e realmente mais humana. Neste sentido, compreende-se na
ação destas mulheres, que são sujeitos que se apresentam na história como agentes de
amplitude social, verdadeiras pedagogas no sentido da prática da socialização e
construção individual no âmbito da arte educação, propagadoras e multiplicadoras de
ensinamentos que prestam obediência e rendem homenagem à didática da Criação!
6.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Arslan,Luciana Mourão, Iavelberg, Rosa, Ensino de Arte, São Paulo: Thompson
Learning, 2006
Barbosa , Ana Mae, A Imagem no Ensino da Arte : Anos oitenta e novos tempos.
São Paulo, Perspectiva, Porto Alegre, Fundação Ioschpe,1991
Barbosa, Ana Mae, Tópicos Utópicos, BeloHorizonte, Editora C/Arte, 1998
Iavelberg,Rosa, Para Gostar de Aprender Arte, Sala de Aula e Formação de
Professores, Porto Alegre, Artmed, 2003
22
Brasil. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais
:Arte, Brasília.MEC/SEF,1998
____Currículo do Sistema de Currículos Lattes (Ana Mae Tavares Bastos Barbosa)
disponível em http://lattes.cnpq.br/1650414096296319 Acesso em 27.Agosto.2008
_____Currículo do Sistema de Currículos Lattes
(Rosa Iavelberg) disponível em
http://lattes.cnpq.br/3612410780790990 Acesso em 27.Agosto.2008
23
APÊNDICES A, B e C
NOTA : Devido a reprodução deste trabalho neste Site, os apêndices acima
deverão ser consultados pelos interessados nos arquivos no Centro Universitário
Maria Antonia – USP , em função das imagens reproduzidas dos livros das
autoras, objeto de nossa pesquisa.