tribuna classista

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tribuna classista
TRIBUNA CLASSISTA
Uma publicação de simpatizantes da CRQI (Coordenação pela Refundação da IV Internacional) no Brasil
Nº 18 – 2ª QUINZENA DE MAIO DE 2014
ELEIÇÕES E COPA EM ESTADO DE
EXCEÇÃO
Os jornais dão conta de que estaria se formando uma
nova “força pública” para combater os movimentos de
luta, que seria legalizada por proposta parlamentar de
2012 do deputado do PT Vanderlei Siraque (quem?). Ou
seja, a coisa vem de longe, e não foi motivada pelos
protestos contra a Copa, nem pelas manifestações de
junho-julho de 2013. A Copa será realizada sob um
verdadeiro estado de exceção policial-militar, com a
colaboração dos EUA e do sionismo israelense, com
toda sua experiência de combate urbano contra a
população palestina. Serão mobilizados 180 mil agentes
de segurança, incluindo o pessoal da segurança privada
e das Forças Armadas. No Rio de Janeiro, a
mobilização da Polícia Militar que seria realizada
durante a Copa foi adiantada em quarenta dias, bem
antes da presença de qualquer turista ou time
estrangeiro, demonstrando seu exclusivo caráter
repressivo. E ainda assim, os jornais estrangeiros, que
influem na potencial afluência de turistas ao país
durante a Copa, falam em “crise de segurança no
Brasil”.
A maior parte do gasto de segurança foi destinada à
compra de armamento. Parte do pessoal de segurança
foi treinado por uma empresa paramilitar norteamericana acusada de massacrar civis no Iraque (a
Blackwater). Ainda não tinham se apagado as
repercussões da greve policial na Bahia quando se
sublevaram as favelas do Rio de Janeiro, já
militarizadas, em contra da brutal morte de um jovem e
de uma idosa, durante uma ação policial “de rotina”. A
população dos subúrbios brasileiros se manifesta contra
as unidades policiais “de pacificação”, acusadas de
violar direitos elementares, incendiando veículos,
montando barricadas e cortando ruas e avenidas. Em
Osasco, trinta ónibus formas incendiados: um jornal
qualificou como “endêmicas” as expressões de fúria
popular, apontando que em 2014 já foram incendiados
mais veículos do que em todo o ano de 2013.
A compra superfaturada da refinaria de Pasadena
(Texas) pela Petrobrás se transformou em novo fator de
crise política, com o STF determinando que uma
comissão do Senado se ocupe exclusivamente da
investigação do escândalo. O governo do PT apelou ao
Supremo Tribunal para ganhar tempo, enquanto
impulsiona inquéritos sobre as obras do porto de Suape
em Pernambuco (Eduardo Campos governador) e pela
roubalheira do metrô de São Paulo, que involucra o
PSDB de Aécio Neves. O golpista O Globo difundiu uma
auditoria da Petrobrás, na qual se estabelece
claramente que foram retirados da refinaria de
Pasadena 10 milhões de dólares através de uma
simples autorização verbal de um “chefão”. Os níveis de
corrupção e decomposição a céu aberto do regime
político brasileiro superam todos os registros
conhecidos na história moderna do país. Os casos de
corrupção revelados publicamente (André Vargas e
quejandos) se multiplicam toda semana. No ato da CUT
do 1º de Maio todos os políticos presentes foram
vaiados e repudiados. Para não falar das vaias e as
hostilidades que o Secretário Geral da Presidência da
República, Gilberto Carvalho, teve de enfrentar no
Sindicato dos Bancários, no Rio de Janeiro,
O governo continua subsidiando o grande capital com
uma taxa negativa de juros de 1% através do BNDES.
As taxas de juros do povo, endividado nos bancos ou no
cartão de crédito, é superior a 90%. Os trabalhadores
perdem de duas a três horas por dia num transporte
público degradado. O governo subsidia a gasolina para
os mais ricos e coloca em risco a Petrobrás. A
instabilidade da situação política é revelada pelas
especulações sobre o desempenho da seleção
canarinha na Copa do Mundo. A precariedade política
de um governo que amarrou sua sorte a um prognóstico
esportivo não poderia ser maior. Sem falar que é
ingênuo supor que a conquista da Copa do Mundo
apaziguará os ânimos caldeados dos explorados do
país, postos em movimento em 2013.
Os objetivos econômicos, a base forte da década
petista, fraquejam cada dia mais. O superávit primário
(para pagar a dívida pública) continua abaixo da
trajetória da meta fixada. O que significa risco de
default, de fuga de capitais e de degringolada
econômica completa. E 66% dos brasileiros se
manifestam “sem preferência partidária” (ou seja,
rejeitam o sistema político vigente) superando o recorde
de 60% que tinha sido atingido em 1990, durante o
Collorgate. Dilma caiu para 37% das intenções de voto
(contra folgados mais de 50% que possuía no primeiro
semestre de 2013). Sem beneficiar a oposição (Aécio +
Campos) que, juntos, só chegam a 30%. O
abstencionismo declarado e a indiferença eleitoral
atingiram também um recorde histórico: 30%. Lula foi
forçado a meter o bedelho na crise do PT e do governo,
e não faltam as vozes que lhe reclamam que volte a se
candidatar à presidência, recurso extremo. Nestas
condições, a esquerda classista do país será, está
sendo, submetida ao seu teste político decisivo.
ESTADOS UNIDOS, OTAN, UNIÃO EUROPEIA, NAZISTAS: FORA DA
UCRÂNIA! POR UMA UCRÂNIA UNIDA, INDEPENDENTE E SOCIALISTA!
A COPA JÁ ERA
Jorge Luiz Souto Maior (Professor e Juiz do Trabalho)
1. A perda do sentido humano
O debate entre os que defendem a causa “não vai ter copa” e os
que afirmam “vai ter copa” está superado. Afinal, haja o que
houver, o evento não vai acontecer, ao menos no sentido
originariamente imaginado, como instrumento apto a gerar lucros
e dividendos políticos “limpinhos”, como se costuma dizer, pois
não é mais possível apagar os efeitos deletérios que a Copa já
produziu para a classe trabalhadora brasileira. É certo, por
exemplo, que para José Afonso de Oliveira Rodrigues, Raimundo
Nonato Lima Costa, Fábio Luiz Pereira, Ronaldo Oliveira dos
Santos, Marcleudo de Melo Ferreira, José Antônio do Nascimento,
Antônio José Pitta Martins e Fabio Hamilton da Cruz, mortos nas
obras dos estádios, já não vai ter Copa.
Aliás, a Copa já não tem o menor valor para mais de 8.350
famílias que foram removidas de suas casas no Rio de Janeiro,
em procedimento que, como adverte o jornalista Juca Kfouri, no
documentário, A Caminho da Copa, de Carolina Caffé e Florence
Rodrigues, “lembram práticas nazistas de casas que são
marcadas num dia para serem demolidas no dia seguinte, gente
passando com tratores por cima das casas”. Essas práticas,
segundo relatos dos moradores, incluíram invasões nas
residências, para medir, pichar e tirar fotos, estabelecendo uma
lógica de pressão a fim de que moradores assinassem laudos que
atestavam que a casa estava em área de risco, sob o argumento
de que na ausência de assinatura nada receberiam de
indenização, o que foi completado com o uso da Polícia para
reprimir, com extrema violência, os atos de resistência legítima
organizados pelos moradores, colimando com demolições que se
realizaram, inclusive, com pessoas ainda dentro das casas. As
imagens do documentário mencionado são de fazer chorar e de
causar indignação, revolta e repúdio, como o são também as
imagens da violência utilizada para a desocupação de imóvel da
VIVO na zona norte do Rio de Janeiro, ocorrida no dia 11 de abril
de 2014, onde se encontravam 5.000 pessoas. Lembre-se que as
remoções para a Copa ocorreram também em Cuiabá, Curitiba,
Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Manaus, São Paulo e
Fortaleza, atingindo, segundo os Comitês Populares da Copa,
cerca de 170 mil famílias em todo o Brasil. A Copa já não tem
sentido para o Brasil, como nação, visto que embora sejam gastos
cerca de R$ 30 bilhões para o montante total das obras, sendo
85% vindos dos cofres públicos, a forma como se organizou – ou
não se organizou – a Copa acabou abalando a própria imagem do
Brasil. Ou seja, mesmo se pensarmos o evento do ponto de vista
econômico e ainda que, imediatamente, se possa chegar a algum
resultado financeiro positivo, considerando o que se gastou e o
dinheiro que venha a ser atraído para o mercado nacional, é fácil
projetar um balanço negativo em razão da quebra de
confiabilidade.
Se o Brasil queria se mostrar como de fato não é para mais de
dois bilhões de telespectadores, pode estar certo de que a
estratégia já não deu certo. A propósito, a própria FIFA, a quem
se concederam benefícios inéditos na história das Copas, tem
difundido pelo mundo uma imagem extremamente negativa do
Brasil, que até sequer corresponde à nossa realidade, pois faz
parecer que o Brasil é uma terra de gente preguiçosa e
descomprometida, quando se sabe que o Brasil, de fato, é um
país composto por uma classe trabalhadora extremamente sofrida
e dedicada e onde se produz uma inteligência extremamente
relevante em todos os campos do conhecimento, mas que, enfim,
serve para demonstrar que maquiar os nossos problemas sociais
e econômicos não terá sido uma boa estratégia.
2. Ausência de beneficio econômico
Mesmo que entre perdas e ganhos o saldo econômico seja
positivo, há de se indagar qual o preço pago pela população
brasileira, vez que restará a esta conviver por muitos anos com o
verdadeiro legado da Copa: alguns estádios fantasmas e obras
inacabadas, nos próprios estádios e em aeroportos e avenidas,
além da indignação de saber que os grandes estádios e as obras
em aeroportos custaram milhões aos cofres públicos, mas que, de
fato, pouca serventia terão para a maior parte da classe operária,
que raramente viaja de avião e que tem sido afastada das
partidas de futebol, em razão do processo notório de elitização
incrementado neste esporte.
Oportuno frisar que o dinheiro público utilizado origina-se da
riqueza produzida pela classe trabalhadora, vez que toda riqueza
provém do trabalho e ainda que se diga que não houve uma
transferência do dinheiro público para o implemento de uma
atividade privada, vez que tudo está na base de empréstimos, não
se pode deixar de reconhecer que foram empréstimos com prazos
e juros bastante generosos, baseados na previsibilidade de
ganhos paralelos com o evento, ganhos que, no entanto, já se
demonstram bastante questionáveis.
No caso do estádio Mané Garrincha, em Brasília, por exemplo,
com custo final estimado em R$1,9 bilhões, levando-se em
consideração o resultado operacional com jogos e eventos
obtidos em um ano após a conclusão da obra, R$1.137 milhões,
serão precisos 1.167 anos para recuperar o que se gastou, o que
é um absurdo do tamanho do estádio, ainda que o Ministro do
Esporte, Aldo Rebelo, e o secretário executivo da pasta, Luis
Fernandes, tenham considerado o resultado, respectivamente,
“um êxito” e “um exemplo contra o derrotismo”. O problema
aumenta, gerando indignação, quando se lembra que não se tem
visto historicamente no Brasil a mesma disposição de investir
dinheiro público em valores ligados aos direitos sociais, tais como
educação pública, saúde pública, moradias, creches e transporte.
O que se sabe com certeza é que a FIFA, que não precisa se
preocupar com nenhum efeito social e econômico correlato da
Copa, obterá um enorme lucro com o evento. Uma projeção feita
pela BDO, empresa de auditoria e consultoria especializada em
análises econômicas, financeiras e mercadológicas, aponta que a
Copa do Mundo de 2014 no Brasil vai render para a Fifa a maior
arrecadação de sua história: nada menos do que US$ 5 bilhões
entrarão nos cofres da entidade (cerca de R$ 10 bilhões).
3. O prejuízo para o governo
O governo brasileiro, que tenta administrar todos os prejuízos do
evento, vê-se obrigado, pelo compromisso assumido por ocasião
da candidatura, a conferir para a FIFA garantias, que ferem a
Constituição Federal e que, por consequência, estabelecem um
autêntico Estado de exceção, para que o lucro almejado pela
FIFA não corra risco de diminuição, entregando-lhe, além dos
estádios, que a FIFA utilizará gratuitamente:
a) a criação de um “local oficial de competição”, que abrange o
perímetro de 2 km em volta do estádio, no qual será reservada à
FIFA e seus parceiros, a comercialização exclusiva, com proibição
do livre comércio, inclusive de estabelecimentos já existentes no
tal, caso seu comércio se relacione de alguma forma ao evento;
b) a institucionalização do trabalho voluntário, para serviços
ligados a atividade econômica (estima-se que 33 mil pessoas
terão seu trabalho explorado gratuitamente, sem as condições
determinadas por lei, durante o período da Copa no Brasil);
c) o permissivo, conferido pela Recomendação n. 3/2013, do CNJ,
da exploração do trabalho infantil, em atividades ligadas aos
jogos, incluindo a de gandula, o que foi proibido, ainda que com
bastante atraso, em torneios organizados pela CBF desde 2004,
seguindo a previsão constitucional e o Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA);
d) a liberdade de atuar no mercado, sem qualquer intervenção do
Estado, podendo a FIFA fixar o preço dos ingressos como bem
lhe aprouver (art. 25, Lei Geral da Copa);
e) a eliminação do direito à meia-entrada, pois a Lei Geral da
Copa permitiu à FIFA escalonar preços em quatro categorias, que
serão diferenciadas, por certo, em razão do local no estádio,
sendo fixada a obrigatoriedade de que se tenha na categoria 4, a
mais barata (não necessariamente com preço 50% menor que a
mais cara), apenas 300 mil ingressos, sem quórum mínimo para
cada jogo, e apenas dentre estes é que se garantiu a meia
entrada para estudantes, pessoas com idade igual ou superior a
60 (sessenta) anos; e participantes de programa federal de
transferência de renda, que, assim, foram colocados em
concorrência pelos referidos ingressos;
2
f) o afastamento da aplicação do Código de Defesa do
Consumidor, deixando-se os critérios para cancelamento,
devolução e reembolso de ingressos, assim como para alocação,
realocação, marcação, remarcação e cancelamento de assentos
nos locais dos Eventos à definição exclusiva da FIFA, a qual
poderá inclusive dispor sobre a possibilidade: de modificar datas,
horários ou locais dos eventos, desde que seja concedido o direito
ao reembolso do valor do ingresso ou o direito de comparecer ao
evento remarcado; da venda de ingresso de forma avulsa, da
venda em conjunto com pacotes turísticos ou de hospitalidade; e
de estabelecimento de cláusula penal no caso de desistência da
aquisição do ingresso após a confirmação de que o pedido de
ingresso foi aceito ou após o pagamento do valor do ingresso,
independentemente da forma ou do local da submissão do pedido
ou da aquisição do Ingresso (art. 27).
4. O prejuízo para a cidadania
Para garantir mesmo que o lucro da FIFA não seja abalado, o
Estado já anunciou que o evento terá o maior efetivo de policiais
da história das Copas, com gasto estimado de 2 bilhões de reais,
mobilizando, inclusive, as Forças Armadas, tudo isso não
precisamente para proteger o cidadão contra atos de violência
urbana, mas para impedir que o cidadão, vítima da violência da
Copa, possa se insurgir, democraticamente, contra a sua
realização. A respeito das manifestações, vale frisar, é
completamente impróprio o argumento de que como nada se falou
antes, agora é tarde para os cidadãos se insurgirem. Primeiro,
porque quando o compromisso foi firmado ninguém foi consultado
quanto ao seu conteúdo. E, segundo, porque nenhum silêncio do
povo pode ser utilizado como fundamento para justificar o abalo
das instituições do Estado de Direito, vez que assim toda tirania,
baseada na força e no medo, estaria legitimada. O argumento,
portanto, é insustentável e muito grave, sobretudo no ano em que
a sociedade brasileira se vê diante do desafio de saber toda a
verdade sobre o golpe de 1964 e os 21 anos da ditatura civilmilitar.
Deve-se acrescentar, com bastante relevo, que o evento festivo,
composto por alguns jogos de futebol, está sendo organizado de
modo a abranger toda a sociedade brasileira, impondo-lhe os
mais variados sacrifícios, pois impõe uma intensa alteração da
própria rotina social, atingindo a pessoas que nenhuma relação
possuem com o evento ou mesmo que tenham aversão a ele.
O próprio calendário escolar foi alterado, para que não houvesse
mais aulas durante a Copa, buscando, de fato, melhorar
artificialmente o trânsito e facilitar o acesso aos locais dos jogos.
A educação, que é preceito fundamental, que se arranje, pois,
afinal, é ano da Copa! Algumas cidades, para melhor atingir esse
objetivo da facilitar a circulação, mascarando os problemas do
transporte, pensam, seriamente, em decretar feriados nos dias de
jogo da seleção brasileira, interferindo, também, na lógica
produtiva nacional. Nos serviços públicos já se anunciaram
alterações nos horários de funcionamento, de modo a não permitir
coincidência com os dias de jogos do Brasil, sendo que em alguns
Tribunais do Trabalho (Mato Grosso – em Cuiabá e nas cidades
do interior; Rio Grande do Sul e São Paulo, com diferenças de
intensidade e de datas); o funcionamento foi suspenso, gerando
adiamento das audiências… Ou seja, o trabalhador, que esperou
meses para ser atendido pela Justiça, verá sua audiência adiada
para daqui a alguns novos meses, pois, afinal, era dia de jogo da
Copa! Somados todos esses fatores, é fácil entender que a Copa
já perdeu todo o sentido para a nação brasileira. Não por outra
razão, aliás, é que a aprovação para a realização da Copa no
Brasil, em novembro de 2008, que era de 79% caiu, em abril de
2014, para 48%, e os que eram contrários subiram, no mesmo
período, de 10% para 41%, sendo que mais da metade dos
brasileiros considera que os prejuízos serão maiores que os
ganhos.
5. O prejuízo para a razão
Numa leitura otimista, o diretor-geral do Comitê Organizador Local
da Copa do Mundo Fifa 2014, que se chama, por coincidência
reveladora, Ricardo Trade (comércio, em inglês), prefere dar
destaque ao fato de que 48% são a favor e apenas 41% são
contra, avaliando, então, que o copo está meio cheio. Só não
consegue ver que o copo está esvaziando e que, de fato, nos
trens e ônibus, que transportam os trabalhadores, só se fala da
Copa para expressar indignação com relação às condições do
transporte, da saúde, das escolas, e da falta de creches.
Sintomático, aliás, o fato de que as periferias das grandes cidades
não estão pintadas para a “festa” do futebol, como estavam nas
Copas anteriores e isso porque, com a Copa sendo realizada
aqui, é possível ver as disparidades e perceber com maior
facilidade como a retórica do legado não atinge, concretamente, a
vida da classe trabalhadora.
Os tais empregos gerados são precários e inseridos, sobretudo
nas obras de estádios, aeroportos e vias públicas, na lógica
perversa da terceirização, sendo que muitos trabalhadores ainda
serão explorados sem qualquer remuneração no mal denominado
trabalho “voluntário”, referido com orgulho pelo “Senhor
Comércio”.
Fato é que não será mais possível assistir a um jogo da Copa, no
estádio, pela TV ou nos circos armados do “Fan Fest” e se
emocionar com uma jogada ou um gol, sem lembrar do preço
pago: assalto à soberania; Estado de exceção; gastos públicos;
abalo da confiabilidade em razão da desorganização; violências
dos despejos, dos acidentes de trabalho e da repressão policial…
Sobre o Fan Fest, ademais, é oportuno esclarecer que se trata de
um “evento oficial” da Copa da FIFA, que deve ser organizado e
custeado pelas cidades sedes de jogos, para que os excluídos
dos estádios possam assistir aos jogos por um telão, com o
acompanhamento de shows. Esse evento, organizado e pago
pelo Estado e realizado em espaço público, atende aos interesses
privados da FIFA e suas parceiras. No caso da cidade de São
Paulo, o Decreto n. 55.010, de 9 de abril de 2014, assinado pela
vice-prefeita em exercício, Nádia Campeão, que regulou o evento,
transforma a área pública do Fan Fest em uma área privada,
reservada aos fãs da Copa: “FAN FEST: área do Vale do
Anhangabaú indicada pela cidade-sede e reconhecida pela FIFA
como área de lazer exclusiva aos fãs da Copa do Mundo FIFA
2014” grifou-se.
O mesmo decreto fixa esse local, o do Fan Fest, como área de
“restrição comercial”. É importante saber que ao se impedir a
comercialização na área reservada a Prefeitura de São Paulo
acabou interrompendo um processo de negociação, iniciado em
maio de 2012, com os ambulantes que atuavam na cidade e, em
especial, na região central, onde se situa o Vale do Anhangabaú,
e cuja licença havia sido cassada no contexto de uma política de
endurecimento muito forte quanto à fiscalização de sua atuação,
que fora intensificada, exatamente, a partir de 2011, quando
houve a assinatura do termo de compromisso, anunciando São
Paulo como uma das cidades sedes da Copa. Em 2012,
acabaram sendo canceladas todas as 5.137 licenças dos
ambulantes e até hoje, mesmo após instaurado, desde 2012, um
grupo de trabalho tripartite – trabalhadores, sociedade civil e
prefeitura (Fórum dos Ambulantes), para a discussão do
problema, nada se resolveu e, em concreto, ao editar o
Chamamento Público acima citado, a Prefeitura acabou
dificultando sobremaneira a pretensão dos ambulantes de terem
alguma atuação comercial durante a Copa. É a Copa, na verdade,
fechando postos de trabalho!
6. De novo o dinheiro
Há de se considerar que todos esses efeitos já foram produzidos
e continuarão repercutindo na vida real para além da Copa, ainda
que o saldo econômico desta venha a ser positivo. E se o tema é
dinheiro, há de se indagar: dinheiro para quem, cara pálida? É
evidente que o benefício econômico não ficará para a classe
trabalhadora e sim para quem explora o trabalho ou se vale da
lógica de reprodução do capital. Para o trabalhador, o dinheiro
que se direciona é o fruto do trabalho realizado, que, de fato, na
lógica do modelo de sociedade capitalista, não representa, jamais,
o equivalente necessário para restituir à classe trabalhadora como
um todo o valor do trabalho empregado no serviço ou na obra. A
lógica econômica da Copa não é outra coisa senão a
intensificação do processo de acumulação de riqueza por meio da
exploração do trabalho alheio, sendo que se considerarmos a
utilização do denominado “trabalho voluntário”, que se realizará
sem qualquer custo remuneratório, a acumulação que se autoriza
é ainda maior.
O tal efeito benefício econômico, a que tanto se alude, portanto,
não será, obviamente, revertido à classe trabalhadora. Esta,
3
inclusive, será enormemente prejudicada, na medida em que o
dinheiro público utilizado para financiar a atividade lucrativa de
índole privada foi extraído da tributação realizada sobre a riqueza
produzida pelo trabalho e que, assim, deveria ser,
prioritariamente, revertida ao conjunto da classe trabalhadora para
a satisfação das necessidades essenciais garantidas por
preceitos constitucionais: escolas, hospitais, previdência e
assistência social, creches e transporte, por exemplo. É
completamente ilógico dizer, como disse o diretor-geral do Comitê
Organizador Local da Copa do Mundo Fifa 2014, no texto
mencionado, que se está usando o dinheiro público para
incentivar uma produção privada com o objetivo de, ao final,
tributar essa produção e devolver o dinheiro aos cofres públicos.
O argumento seria apenas ilógico não fosse, também, digamos
assim, carregado de alguns equívocos, o que o torna, portanto,
muito mais grave. Ora, como adverte Maurício Alvarez da Silva,
pelos termos da Lei Geral da Copa, Lei n. 12.350/10, “foi
concedida à Fifa e sua subsidiária no Brasil, em relação aos fatos
geradores decorrentes das atividades próprias e diretamente
vinculadas à organização ou realização dos Eventos, isenção de
praticamente todos os tributos federais” .
Além disso, em 17 de maio de 2013, o governo federal publicou
no Diário Oficial decreto que concede isenção de tributos federais
nas importações destinadas à Copa das Confederações neste
ano e à Copa do Mundo de 2014. Entre os produtos incluídos na
isenção estão alimentos, suprimentos médicos, combustível,
materiais de escritório, troféus. O benefício abrange Imposto
sobre Produtos Industrializados incidente na importação, Imposto
de Importação, PIS/Pasep-Importação, Cofins-Importação, Taxa
de utilização do Siscomex, Taxa de utilização do Mercante,
Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante e Cidecombustíveis”. Em concreto, continuarão sendo tributados apenas
as empresas nacionais, que não estejam integradas ao rol das
apaziguadas da FIFA, sofrendo, ainda, com a isenção concedida
às importadoras, os trabalhadores e os consumidores, sendo que
o valor circulado nesta seara é ínfimo se considerarmos aquele,
sem tributação, destinado à FIFA e suas parceiras e às
importadoras.
7. De novo os ataques aos trabalhadores
Quando os trabalhadores, saindo da invisibilidade, se apresentam
no cenário político e econômico e se expressam no sentido de
que planejam uma organização coletiva para tentarem diminuir o
prejuízo, buscando, por meio de reivindicações grevistas, atrair
para si uma parte maior do capital posto em circulação em função
da Copa, logo algum economista de plantão vem a público com a
ameaça de que tais ganhos podem resultar em demissões
futuras. Mas, essa possibilidade aventada pelos trabalhadores de
se fazerem ouvir na Copa, que pode, em concreto, minimizar o
prejuízo dos trabalhadores, no processo de acumulação, e do
país, na evasão de riquezas, acabou provocando uma reação
institucional imediata, afinal o compromisso assumido pelo Estado
brasileiro foi o de permitir que a FIFA obtivesse o seu maior lucro
da história. Então, a Justiça do Trabalho se adiantou e divulgou
que vai estabelecer um sistema de plantão para julgar, com a
máxima celeridade (de um dia para o outro), as greves que
ocorram durante a Copa, com o pressuposto já anunciado de que
“as greves têm custo para os trabalhadores, empregadores e
população”, sendo certo que a Copa não pode ser usada para
“expor o país a uma humilhação internacional, como no Carnaval,
quando houve greve de garis”.
Pouco importa o quanto a Justiça do Trabalho, historicamente,
demora para dar respostas aos direitos dos trabalhadores, no que
se refere às diversas formas de violência de que são vítimas em
razão das práticas de algumas empresas no que tange à falta de
registro, ao não pagamento de verbas rescisórias, ao não
pagamento de horas extras, ao não pagamento de indenizações
por acidentes do trabalho etc. Mesmo que já tendo melhorado
sobremaneira na defesa dos interesses dos trabalhadores,
transmite ainda a ideia central de que o que importa é ser célere
quando isso interessa ao modelo econômico, que se vale da
exploração do trabalho para reproduzir o capital. A iniciativa
repressiva da Justiça, ademais, foi aplaudida por editorial da
Folha de S. Paulo que, em declaração no mínimo infeliz, chamou
os trabalhadores de oportunistas: É uma iniciativa elogiável para
evitar o excesso de oportunismo sindical, que não hesita em
prejudicar o público e ameaçar o principal evento do ano no país.
Ou seja, todo mundo pode ganhar, menos os trabalhadores.
Parodiando a máxima penal, é como se lhes fosse dito: “tudo que
vocês ganharem pode ser utilizado contra vocês mesmos…”.
Como foram as condições de trabalho nas obras? Quantos
trabalhadores não receberam ainda os seus direitos por serviços
que prestaram para a realização da Copa? Segundo preconizado
pelo viés dessa preocupação, nada disso vem ao caso… Na visão
dos que só veem imperativo obrigacional de realizar a Copa,
como questão de honra, custe o que custar, o que importa é que o
“público” receba o proveito dos serviços dos trabalhadores e se
estes não ganham salário digno ou se trabalham em condições
indignas não há como trazer à tona, para não impedir a realização
do evento e para não abalar a imagem no Brasil lá fora.
Mas, concretamente, que situação pode constranger mais a figura
do Brasil no exterior? O Brasil que faz greves? Ou o Brasil em que
os trabalhadores são submetidos a condições subumanas de
trabalho e que não permite que esses mesmos trabalhadores, em
geral invisíveis aos olhos das instituições brasileiras, se insurjam
contra essa situação, tendo que aproveitar o momento de um
grande evento para, enfim, ganhar visibilidade, inclusive,
internacional? Na verdade, a humilhação internacional, a qual não
se quer submeter o Brasil, é a de que o mundo saiba como o
capitalismo aqui se desenvolve, ainda marcado pelos resquícios
culturais de quase 400 anos de escravidão e sem sequer os
limites concretos da eficácia dos Direitos Humanos e dos direitos
sociais, promovendo, em concreto, uma das sociedades mais
injustas da terra.
8. O perverso legado das condições de trabalho na Copa
Do ponto de vista da realidade, é preciso consignar que a pressa
na execução das obras ainda tem aumentado a espoliação da
classe trabalhadora com elevação das jornadas de trabalho, cuja
retribuição, ainda que paga, nunca é suficiente para atingir o nível
da equivalência, ainda mais quando são implementadas fórmulas
jurídicas fugidias do efetivo pagamento (banco de horas,
compensações etc.). O trabalho em jornadas extraordinárias,
ademais, gera um desgaste físico e mental do trabalhador que
não é computado e não se compensa por pagamento.
Além dos acidentes do trabalho citados inicialmente, portanto, é
importante adicionar ao legado da Copa para a classe
trabalhadora as más condições de trabalho, caracterizadas pela
elevação das jornadas de trabalho, pelo aumento do ritmo do
trabalho e da pressão pela celeridade.
O relato de alguns fatos, extraídos do noticiário jornalístico, auxilia
na visualização desse contexto de supressão de direitos dos
trabalhadores no período de preparação para a Copa. Em
setembro de 2013, 111 migrantes, vindos do Maranhão, Sergipe,
Bahia e Pernambuco foram encontrados em condições análogas
à de escravos na obra de ampliação do aeroporto de
Guarulhos/SP, o mais movimentado da América Latina, sob a
responsabilidade da empresa OAS, que além de ser uma das
maiores construtoras do Brasil, é também a terceira empresa que
mais faz doações a candidatos de cargos políticos, segundo
levantamento do jornal Folha de S. Paulo, sendo uma das quatro
empresas que formam o consórcio Invepar que, junto com a
Airports Company South Africa, detêm 51% da sociedade com a
Infraero para a administração do Aeroporto Internacional de
Guarulhos através da GRU Airport e que para as obras de
ampliação do aeroporto, onde foi flagrado trabalho escravo,
obteve do BNDES um empréstimo-ponte de R$1,2 bilhões.
E a OAS, evidentemente, declarou que “vem apurando e tomando
todas as providências necessárias para atender às solicitações”
do Ministério do Trabalho e Emprego, negando que as vítimas
fossem suas empregadas ou que tivesse tido qualquer
“participação no incidente relatado”...
Até abril de 2012, conforme reportagem de Vinícius Segalla, oito
dos doze estádios da Copa já haviam enfrentado greves,
atingindo 92 dias de paralisação, sendo o recorde do Maracanã,
no Rio de Janeiro, com 24 dias. As reivindicações foram variadas,
indo desde questões ligadas à remuneração até o desrespeito de
direitos como pagamento de horas extras e fornecimento de
planos de saúde. Segundo a reportagem, “Em uma das quatro
paralisações já ocorridas em Pernambuco, no início de novembro
4
do ano passado, o motivo foi a forma como a Odebrecht lidou com
as reivindicações dos trabalhadores. É que a empreiteira demitiu
dois funcionários da arena que eram membros da Cipa (Comissão
Interna de Prevenção de Acidentes) porque eles teriam incitado
os trabalhadores a fazer greve. A demissão dos operários, junto
com denúncias de assédio moral supostamente praticados pelo
responsável pela segurança do canteiro, levou os funcionários a
decretar greve.”
Também nos termos da reportagem, “a empresa explicou ao UOL
Esporte que ‘Os dois empregados membros da Cipa foram
demitidos por justa causa, por cometimento de flagrante ato de
indisciplina, quando, no último dia 31 de outubro, instigaram os
colegas a paralisarem a obra da Arena da Copa, sem nenhuma
razão plausível’.” Embora, depois, por meio de nota tenha dito que
as dispensas se deram sem justa causa. A situação foi também
bastante séria na greve do Maracanã, em setembro de 2011, cuja
motivação, segundo Nilson Duarte, presidente do Sindicato dos
Trabalhadores nas Indústrias da Construção Pesada (Sitraicp),
teria sido o fato de que “foram servidos aos cerca de 2.000
trabalhadores da obra macarrão e feijão estragados, salada com
bichos e leite fora da validade”, o que fora negado pelo Consórcio
Maracanã (Odebrecht, Delta e Andrade Gutierrez), por meio de
nota. O local já havia sido alvo de uma greve, um mês antes,
agosto de 2011, por causa de uma explosão no canteiro que feriu
um trabalhador.
Relata-se, ainda, que em Manaus (AM), na Arena Amazônia,
houve paralisação de um dia, em 22 de março de 2012, porque
conta do valor da cesta básica que estava sendo paga aos
operários, R$ 37, enquanto que “de acordo com pesquisa do
Dieese, o valor da cesta básica, composta por 12 produtos,
fechou o mês de março a um custo R$ 251,38 na capital
amazonense”, tendo a greve se encerrado com o aumento da
cesta para R$ 60, acompanhado da promessa da empresa de que
iria “voltar a pagar hora extra aos sábados, o que parara de fazer
três meses antes”.
Na arena de Pernambuco, no início de 2012, foi promovida a
dispensa coletiva de 560 empregados. 560 trabalhadores
acabaram recebendo o comunicado de demissão. A expectativa
da comissão organizadora da recente greve, que paralisou as
obras do estádio por oito dias, é de que outros mil funcionários
peçam a carta de dispensa. Por considerar “abusiva e ilegal”, o
Tribunal Regional do Trabalho (TRT-PE) exigiu, na quinta-feira, a
volta aos trabalhos dos grevistas, com penalidade de R$ 5 mil, por
dia, ao sindicato da categoria, o Sintepav, em caso de
descumprimento. Apesar da obrigatoriedade, a ideia dos
remanescentes nas obras da Arena Pernambuco é praticar –
como os próprios denominam – uma “operação tartaruga”.
Antes das demissões, as obras para a Arena da Copa contavam
com 2.437 trabalhadores. Entre as reivindicações, os
trabalhadores exigiam aumento de benefícios, como cesta básica
de R$ 80 para R$ 120, maior participação nos lucros e resultados
(PLR), Plano de Saúde para os profissionais e ajudantes, além de
abono dos dias parados e estabilidade de um ano para a
comissão dos trabalhadores. A questão pertinente às condições
de trabalho chegou a tal extremo que, na Arena do Grêmio (que
não está integrada aos jogos da Copa, mas se alimenta da
mesma lógica), em outubro de 2011, os próprios trabalhadores
pediram sua demissão, como “forma de protesto pelas condições
de trabalho impostas pela empreiteira. A maioria dos
trabalhadores é do Maranhão e retornará ainda hoje para seu
estado natal.” No estádio do Itaquerão, os operários disseram, em
janeiro de 2014, que estavam recebem salário “por fora” (que
impede a tributação e não se integra aos demais direitos dos
trabalhadores), “para trabalhar mais do que o previsto pelo acordo
e evitar que a inauguração do palco de abertura da Copa do
Mundo atrase ainda mais”. Segundo consta da reportagem, “Um
soldador que trabalha na obra contou à reportagem que espera
receber um salário quatro vezes maior do que o normal neste mês
devido às horas extras irregulares que está fazendo”.
O acordo, firmado com o aval do Ministério do Trabalho e
Emprego em dezembro de 2013, foi o de que estaria autorizado o
trabalho em até duas horas extras diariamente, sendo que,
anteriormente, dizem os trabalhadores, havia jornadas de até 16
horas. E, presentemente, as horas além das duas extras
permitidas, que já é, por si, grave afronta à Constituição, eram
trabalhadas sem marcação em cartão de ponto. “Eles [os chefes]
falam para a gente: ‘Não pode atrasar’. Ainda tem muita coisa pra
fazer e às vezes é melhor mesmo você trabalhar umas horinhas a
mais num dia para terminar uma tarefa e já começa num ponto
mais a frente no dia seguinte”, disse à reportagem um ajudante de
pedreiro, de 23 anos, que, assim como os outros trabalhadores
que conversaram com o UOL Esporte, pediu para não ser
identificado. Nos termos da reportagem, “Além do medo de perder
o salário adicional, os funcionários da construtora disseram que
foram orientados a não dar entrevistas. ‘Teve uma palestra no fim
do ano para falar pra gente tomar cuidado com a imprensa, pra
não ficar falando qualquer coisa porque isso só atrapalha a gente’,
declara o ajudante de pedreiro”. Como revela notícia publicada na
Folha de S. Paulo, foram flagrados trabalhadores executando
suas tarefas sem as mínimas condições de segurança e de uma
subsistência digna em obra do centro de treinamento da seleção
da Alemanha no sul da Bahia (Santa Cruz Cabrália).
9. O atentado histórico à classe trabalhadora
A maior parte dos problemas dos trabalhadores nas obras da
Copa está ligada à sua submissão ao processo de terceirização e
de precarização das condições de trabalho, que acabaram sendo
acatados, sem resistência institucional contundente, durante o
período de preparação para a Copa, interrompendo o curso
histórico que era, até então, de intensa luta pela melhoria das
condições de trabalho no setor da construção civil, que é o
recordista, vale destacar, em acidentes do trabalho. Essa luta,
implementada pelo Ministério Público do Trabalho, tendo como
ponto essencial o combate à terceirização, entendida como fator
principal da precariedade que gera acidentes, já havia sido
encampada pelo governo federal, em 2012, ao se integrar, em 27
de abril, ao Plano Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho.
O fato é que o evento Copa, diante da necessidade de se
acelerarem as obras, acabou por jogar por terra quase toda,
senão toda, a racionalidade que já havia sido produzida a respeito
do assunto pertinente ao combate à terceirização no setor da
construção civil, chegando-se mesmo ao cúmulo do próprio
Superintendente Regional do Trabalho e emprego de São Paulo,
vinculado ao Ministério do Trabalho e Emprego, Luiz Antônio
Medeiros, um ex sindicalista, declarar, sobre as condições de
trabalho no Itaquerão, que: “Se esse estádio não fosse da Copa,
os auditores teriam feito um auto de infração por trabalho precário
e paralisado a obra. Estamos fazendo de conta que não vemos
algumas irregularidades” (entrevista ao jornal Folha de S. Paulo,
em 03/04/14).
O período da preparação para a Copa, portanto, pode ser
apontado como um atentado histórico à classe trabalhadora, que
jamais será compensado pelo aludido “aumento de empregos”,
até porque tais empregos, no geral, se deram por formas
precárias. Nas obras o que se viu e se vê – embora não seja visto
pelo Ministério do Trabalho e Emprego – são processos de
terceirização e quarteirização, sem uma oposição institucional,
que, por consequência, produz o legado de grave retrocesso
sobre o tema, que tende a se estender, perigosamente, para o
período posterior à Copa. Não se pode esquecer que quase todos
os acidentes fatais acima mencionados, não por coincidência,
atingiram trabalhadores terceirizados, e o Estado de exceção,
acoplado ao silêncio institucional sobre as formas de exploração
do trabalho (exceção feita a algumas iniciativas individualizadas
de membros do Ministério Público do Trabalho) e acatado para
garantir a Copa, acabaram servindo como uma luva a certas
frações do setor econômico, que serão as únicas, repita-se, que
verdadeiramente, se beneficiarão do evento, para desferir novo
ataque aos trabalhadores, representado pela tentativa de fuga de
responsabilidade da empresa responsável pela obra, transferindoa à empresa contratada (terceirizada), que possui, como se sabe,
quase sempre, irrisório suporte financeiro para arcar com os
riscos econômicos envolvidos. Sobre a morte de José Afonso de
Oliveira Rodrigues, a construtora Andrade Gutierrez, responsável
pela construção da arena em Manaus, defendeu-se,
publicamente, dizendo que Martins trabalhava para a Martifer,
empresa contratada para fazer as estruturas metálicas da fachada
e da cobertura...
5
SENADO APROVA PERDÃO DE R$ 2 BILHÕES AOS PLANOS DE SAÚDE
O Senado aprovou a medida provisória nº 627/13, que
determina a anistia de R$ 2 bilhões aos planos de saúde. O
montante, estimado pelo Ministério da Saúde, refere-se a
multas aplicadas aos planos pela Agência Nacional de Saúde
(ANS). A MP prevê a drástica redução no valor das multas às
operadoras de planos de saúde que se neguem a realizar
procedimentos. Além da diminuição do valor, a medida reduz
também o número de procedimentos pelos quais elas podem
ser multadas. De um máximo de 50, para somente dois. Na
prática, a MP acaba com o poder de fiscalização da ANS.
Como o Senado não acrescentou ou retirou emendas do texto,
a matéria segue direto para o gabinete da presidente, que tem
até 15 dias, a contar da aprovação no Senado, para vetar ou
sancionar a MP. Segundo reportagem do Uol, originalmente, a
matéria tratava apenas da tributação dos lucros obtidos por
empresas brasileiras no exterior. No entanto, enquanto
tramitou na Câmara dos Deputados, o texto recebeu uma
série de emendas que versam sobre temas estranhos ao
assunto original. Na Câmara, o relator foi o deputado Eduardo
Cunha (PMDB-RJ). A presidente já sinalizou que pretende
vetar a emenda que trata do perdão aos planos de saúde, que
se referem ao não cumprimento dos contratos com os clientes
e variam de R$ 5 mil a R$ 1 milhão.
A MP 627/13 estabelece um teto para o pagamento das
infrações. O plano autuado de duas a 50 vezes com multas da
mesma natureza, para apenas duas; o que recebeu de 50 a
100 autuações, pagará quatro multas; acima de mil multas,
serão cobradas apenas 20 multas. Por exemplo: um plano que
recebeu cem multas de R$ 50 mil pagará R$ 200 mil, em vez
de R$ 5 milhões. De acordo com dados do Tribunal Superior
Eleitoral (TSE) divulgados pelo Uol, os planos de saúde
doaram R$ 12 milhões para campanhas de 157 candidatos,
filiados a 19 partidos diferentes, nas eleições de 2010. No
pleito de 2006, as doações alcançaram R$ 7,1 milhões.
Várias entidades já se manifestaram contrárias à MP, entre
elas a Associação dos Servidores e demais Trabalhadores da
Agência Nacional de Saúde Suplementar (Assetans) e o
Conselho Federal de Medicina (CFM). No último dia 11, o
CFM emitiu uma nota solicitando ao Senado a derrubada de
emenda à MP 627/13, referente ao perdão da dívida às
operadoras de planos de saúde. Segundo a entidade, a anistia
beneficia somente as empresas de saúde suplementar,
privilegiando o lucro das operadoras em detrimento à
assistência de mais de 50 milhões de brasileiros que tem
planos de saúde.
Para o CFM, a MP facilita ainda a ocorrência de abusos que
prejudicam pacientes, familiares e profissionais encarregados
do atendimento, visto que a medida limita o número de multas
a serem pagas pelas operadoras. “No caso de sua
manutenção pelos senadores, solicita-se o veto integral da
presidência da República ao item, o qual pode representar um
perdão às dívidas das operadoras de planos de saúde, num
montante estimado de R$ 2 bilhões”.
O QUE O GOVERNO ESTADUAL PAULISTA DEIXOU DE
REPASSAR A USP, UNESP E UNICAMP DE 2008 A 2013
Um escândalo de dimensões dantescas espreita o governo
tucano paulista. As universidades estaduais paulistas
deixaram de receber desse governo, só em 2013, R$ 540,41
milhões, devido a manobras contábeis. A tabela abaixo indica
os valores nominais deixados de receber entre 2008 e 2013.
Além dos descontos indevidos dos montantes destinados à
Habitação e ao programa Nota Fiscal Paulista (NFP), as
alíneas de execução orçamentária desconsideradas pelo
governo no cômputo dos 9,57% devidos à USP, Unesp e
Unicamp são as seguintes:
1.
2.
3.
50);
4.
Multas e juros de mora do ICMS (1911);
Multas e juros da dívida ativa do ICMS (1913);
Multas por infração do regulamento do ICMS (1919
Receita da dívida ativa do ICMS (1931 15);
Outras receitas, provenientes de acréscimo financeiro sobre
ICMS não inscrito, referentes aos programas de parcelamento
incentivado (PPI) e de parcelamento especial (PPE) (1990 99).
Valores não repassados às universidades estaduais paulistas - 2008-2013 (em R$ milhões)
2008
2009
2010
2011
2012
2013
Habitação
568,12
322,04
662,10
741,19
1.083,00
1.053,00
NFP
203,80
804,00
971,00
1.142,00
1.313,00
1.302,00
1911
555,24
425,40
534,26
667,32
545,00
2.846,70
1913
59,05
82,67
132,82
240,45
32,55
116,50
1919 50
39,61
83,40
128,83
186,66
7,85
68,20
1931 15
34,95
32,85
42,12
57,65
79,56
31,70
1990 99
Total
Valor não repassado
129,73
167,54
236,66
303,90
296,03
228,80
1.590,50
1.917,90
2.707,79
3.339,17
3.356,99
5.646,90
152,21
183,54
259,14
319,56
321,26
540,41
Fontes: Secretaria de Estado da Fazenda e planilhas Cruesp
Utilizando-se o Índice Geral de Preços - Disponibilidade
Interna (IGP-DI) da Fundação Getúlio Vargas é possível obter
uma melhor estimativa do total atualizado para 2013, em R$
milhões 1.999,33, ou seja, quase dois bilhões de reais! Esta
questão é central na nossa luta, tanto com o governo do
Estado, quanto com o Cruesp (Conselho de Reitores) que vem
se submetendo a esta prática política. Assim, será necessário
intervir com energia no debate da Lei de Diretrizes
Orçamentárias (LDO) de 2014, para reverter a sonegação de
recursos para a educação superior pública paulista. Será que
o análogo não estaria acontecendo com a Fapesp (Fundação
de Amparo à Pesquisa do Estado)? É bom lembrar que, fruto
da luta de docentes e pesquisadores, a Constituição Paulista
de 1989 destinou 1% da receita de impostos do Estado de
São Paulo a essa fundação pública. O governo está fazendo a
conta direito? Estaria utilizando o mesmo método com as
universidades estaduais?
Se a resposta for sim, a conclusão óbvia é a de que parte
importante da capacidade pública instalada de ensino,
pesquisa e extensão está sendo atacada; se a resposta for
não, é imperioso questionar porque só as universidades
estariam sendo vítimas desta política.
SÃO PAULO: A OCUPAÇÃO COPA DO POVO
Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST)
A poucos quilômetros do estádio em que começará
Copa do Mundo, milhares de famílias ocupam terreno e
reivindicm: dinheiro público precisa assegurar direitos
para todos. Na noite do dia 2 de maio centenas de
famílias organizadas pelo MTST ocuparam um terreno
que estava abandonado há anos em Itaquera.
Nos dois dias seguintes, a ocupação recebeu cerca de 2
mil famílias que estavam em condições precárias de
moradia na região. São trabalhadores do Jardim Helian,
Gleba do Pêssego e Jardim Cibele (comunidades de
Itaquera). Mas não só: famílias vieram também de São
Miguel, Ermelino Matarazzo e outros bairros da zona
leste. As histórias são quase as mesmas. Famílias que
não podem mais arcar com o valor abusivo dos
aluguéis, que cresceu violentamente, em especial em
Itaquera, por conta do estádio e das obras ligadas à
Copa. Segundo o Índice Fipe/Zap, o valor do metro
quadrado em Itaquera aumentou 165% nos últimos 6
anos. É claro que a especulação imobiliária não ocorreu
apenas por conta da Copa. Mas o evento agravou a
tendência que já existia, principalmente nas regiões das
obras. Isto não é um fato novo: Estudo da Relatoria de
Moradia da ONU já demonstrou que os megaeventos
estão sempre ligados à especulação imobiliária por
onde passam.
Por estas razões, a ocupação foi batizada como “Copa
do Povo”. Enquanto a Copa da FIFA ocorrerá com
investimentos de cerca de R$ 30 bilhões, sem atender o
povo, que sequer poderá pagar ingresso para assistir
aos jogos, o povo organiza sua resposta.
A menos de três quilômetros do palco de abertura,
milhares de famílias lutam debaixo de lona pelo direito
básico a uma moradia digna. A ocupação Copa do Povo
escancara essa contradição.
Esperamos que os governos – municipal, estadual e
federal – tenham a responsabilidade de não reprimir a
ocupação e de desapropriar o terreno para moradia das
famílias sem-teto.
Se teve dinheiro para a Copa da FIFA, tem que ter pra
Copa do Povo!
MAGISTÉRIO PARANAENSE INICIOU GREVE
Os professores e funcionários da educação pública do
Paraná iniciaram a 23de abril uma greve que busca a
resolução de cinquenta problemas por parte do governo
estadual, entre eles a abertura de concursos públicos, o
pagamento do piso salarial e 33% de hora-atividade
para os professores. A adesão à greve é grande,
chegando, segundo a Associação dos Professores do
Paraná (APP-Sindicato), a 80% de professores e
funcionários paralisados. A greve iniciou com atos em
diversas cidades do estado, e um grande ato na frente
do Palácio do Iguaçu, em Curitiba, que contou também
com a presença de estudantes. Os grevistas montaram
acampamento em frente à sede do poder executivo
estadual e lá ficarão até o final do movimento paredista.
Há uma programação política e cultural durante os dias
de acampamento aberta a toda comunidade. Na tarde
do primeiro dia de greve os professores foram
chamados pelo governador Beto Richa (PSDB) a
negociar suas pautas com o governo. Diretores do
sindicato foram recebidos pelo governador, que
prometeu responder até o final de quinta-feira (24) a
possibilidade de negociação sobre os 33% de horaatividade, o reajuste do piso salarial do Magistério, o
reajuste dos funcionários, a suspensão do corte do
auxílio-transporte, a alteração dos contratos PSS e o
pagamento das promoções e progressões em atraso.
Na reunião, os professores ainda questionaram o
governador sobre a nota publicada no site da Secretaria
de Estado da Educação (SEED) que alega que os
professores do Paraná recebem 70% a mais do que o
Piso Nacional. Na realidade, o governo estadual paga
abaixo do Piso. Além disso, a APP reafirmou a
continuidade da greve. Esta só poderá ser suspensa
após a realização de uma assembleia estadual, que
apenas será convocada quando o governo apresentar
uma proposta concreta de atendimento da pauta.
INCA DO RIO EM GREVE CONTRA A PRIVATIZAÇÃO
Servidores do Instituto Nacional do Câncer (Inca) no Rio
de Janeiro entraram em greve na segunda-feira 28 de
abril contra a possível privatização dos serviços
prestados pela instituição. Em assembleia, eles
definiram estratégias para retomar a paralisação iniciada em fevereiro e encerrada em março - por
melhores condições de trabalho no setor hospitalar. O
movimento volta, agora, com a agravante da possível
privatização do atendimento do Inca. Os trabalhadores
de outras instituições de saúde federais querem retomar
a greve e pressionar pelo atendimento de reivindicações
como jornada de 30 horas de trabalho semanal, respeito
ao duplo vínculo, concurso público, reajuste salarial,
condições dignas de atendimento à população e fim dos
processos de privatização na saúde. A proposta de
privatização representaria uma mudança para a saúde
federal,
ocasionando
diferença
nos
vínculos
empregatícios entre os funcionários do hospital. Existe
um processo em discussão, dentro do Inca, para
atuação de uma empresa pública de direito privado, o
que significa privatização. Isso abriria precedentes para
a atuação de subsidiárias de empresas públicas, não
necessariamente ligadas à saúde. As subsidiárias têm
ações de empresas privadas para financiá-las, o que
abre a possibilidade de o setor privado poder decidir
dentro de unidades públicas de saúde. Por serem
acionistas, teriam direito a voto de decisão. Na teoria
continuaria sendo empresa pública, mas passando a ter
ações de empresas privadas, que poderiam ter poder de
decisão no Instituto.
7
UFMS: REITORIA OCUPADA
Nota de Solidariedade aos estudantes pela Chapa 3
A Chapa 3 Autonomia Sindical se solidariza com os
nossos alunos, principalmente os beneficiados por
estudantes da UFMS que ocuparam o prédio da reitoria
quotas raciais e de renda, que garantam o direito de
cobrando uma política de assistência estudantil urgente.
estudar e a redução do desistência nos cursos da
Entendemos ser urgente e até mesmo uma questão de
UFMS. Este é um problema crônico na instituição e que
sobrevivência uma ação administrativa e política
alguns casos chegam até mais 80%, com cursos
capazes de agilizar o processo de liberação de bolsas
chegando formar um aluno por semestre. Neste sentido,
de assistência e de Programa com PETI, mecanismos
os integrantes da Chapa 3 – Autonomia Sindical, cobra
fundamentais para garantir a permanência de
da reitoria da UFMS, um resposta imediata do
estudantes com baixa renda, uma vez que adianta
problema, com calendário, metas e prazos e
democratizar o acesso aos cursos de instituições, sem
transparentes e capazes de tornar mais eficiente e
investimentos em programas que alavanque e motivo
eficaz o programa de assistência estudantil.
BANCÁRIOS RS: POR UMA CHAPA OPOSITORA CLASSISTA, VOTAR NA CHAPA 2
Guilherme Giordano
O processo eleitoral para o Sindicato de Bancários de
Porto Alegre e região teve a inscrição de duas chapas.
A chapa 1 da situação é composta pela DS, Articulação
Sindical e PC do B, com remanescentes da velha
burocracia sindical. A chapa 2, Um Novo Rumo Para
Todos, composta pela CUT Pode Mais (racha da DS),
PSTU e alguns setores do PSOL, no seu primeiro
manifesto público para a categoria nem sequer
menciona que é de oposição. Os membros da corrente
CUT Pode Mais, na sua maioria, faziam parte da gestão
que está se encerrando. Se uma determinada
composição se lança contra outra em um sindicato é
porque deve existir um mínimo de divergências políticas
para que isso aconteça. Além de não declarar-se
oposição, a chapa, quando apresenta suas
divergências, limita-se a questões meramente
administrativas, de gerenciamento do sindicato. Diante
de um escândalo que foi denunciado publicamente, em
que antigos diretores sindicais e ex-funcionários,
sabidamente ligados à atual diretoria, meteram a mão
nas ações judiciais dos bancários, roubando R$ 5
milhões, limitam-se à “defesa da integridade,
transparência
e
dedicação”.
Uma
Comissão
Independente da própria categoria eleita nos locais de
trabalho ou numa assembleia geral de base para abrir o
livro-caixa do sindicato nem foi cogitada. O objetivo do
Novo Rumo é “construir um verdadeiro sindicato do qual
tenhamos orgulho”. Os governos, nacional e estadual,
que ajudam os banqueiros a descarregar sua crise nas
costas da categoria bancária, são completamente
ignorados pela chapa que deveria ser de oposição. O
mundo dessa oposição não parece ser o mesmo de
uma categoria que foi dizimada ao longo das últimas
duas décadas, assolada por demissões em massa, pelo
enxugamento drástico do contingente de trabalhadores
e de agências bancárias, obrigando a categoria a
produzir mais, com um quadro de mão de obra
reduzidíssimo, pela aplicação das chamadas metas
estipuladas,
provocando
o
adoecimento
dos
trabalhadores, e até alguns suicídios, o que motivou a
publicação do livro Um requiem para os bancários
mortos nos locais de trabalho. Sem falar no arrocho
salarial e no assédio moral que a categoria vem
sofrendo ao longo dos anos. A chapa opositora tem que
tomar um rumo de oposição real, classista, de
mobilização da categoria baseado num plano de lutas
que contenha as necessidades prementes da categoria,
único caminho capaz de superar o atual impasse. Por
esse objetivo lutamos, e por isso chamamos a votar na
Chapa 2.
POLÍCIA INVADE UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO
GRANDE DO SUL
Mais uma universidade foi palco de ações repressivas da
Polícia Militar (PM). Depois da Universidade Federal de
Santa Catarina (UFSC) ser transformada em campo de
guerra no final de março, dessa vez a repressão policial
ocorreu na Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS), na madrugada de sexta 19 de abril, terminando
a ação com quatro estudantes detidos e vários feridos. De
acordo com uma nota divulgada pelos diretórios
acadêmicos de educação física, enfermagem e história da
UFRGS, a Escola de Educação Física (ESEF) da
universidade sediava o 98º Conselho Nacional de
Entidades de Enfermagem naquele dia. Perto das 1h30 do
sábado 20 de abril uma viatura da PM se aproximou do
portão e um policial avisou que haveria uma reclamação de
som alto por parte da vizinhança. Ainda que os estudantes
tenham encerrado a festa em razão da reclamação, a PM
não se deu por satisfeita e exigia que sua entrada no
campus fosse liberada. Os estudantes e os seguranças
patrimoniais terceirizados negaram, então, a entrada dos
policiais. Minutos depois, a PM voltou ao portão da ESEF,
dessa vez com três viaturas. Avisaram que haveria
reclamações por som alto, ainda que a festa já tivesse sido
encerrada. Tendo a entrada novamente negada, duas
viaturas se retiraram do local. Porém, os estudantes que
conversavam com a polícia foram surpreendidos por um
ataque, pelas costas, de doze policiais que agiram com
extrema violência e imediatamente algemaram um dos
estudantes. Em seguida os policiais passaram a dar
cacetadas, socos e empurrões, a ameaçar os estudantes
com armas apontadas, e a retirar celulares dos presentes.
Quatro estudantes foram detidos, dois de educação física,
um de história e uma de enfermagem - acusados de
desacato, desobediência e resistência à prisão. Eles foram
encaminhados à 8ª Delegacia de Polícia, e em seguida ao
Departamento Médico Legal, sendo três deles liberados às
6h, e outro às 8h30, devido à necessidade de atendimento
médico por causa das agressões policiais. Três diretórios
acadêmicos afirmam que a ação policial na UFRGS foi
mais uma tentativa de criminalizar os movimentos sociais
no período que sucede as grandes mobilizações de 2013 e
inicio de 2014 e antecede à realização da Copa do Mundo,
na qual Estado repressor brasileiro já aponta suas armas.
Carta enviada à Frente de Esquerda e aos trabalhadores da GM da Argentina
PELA UNIDADE INTERNACIONAL DOS
TRABALHADORES CONTRA OS
ATAQUES NO SETOR AUTOMOTIVO
Os trabalhadores do setor automotivo de todo o mundo
estão sendo alvo de uma campanha internacional de
ataques que envolvem demissões, afastamento
temporário, lay-off, day-off e férias coletivas. Para
resguardar seus lucros, as multinacionais, mais uma
vez, sacrificam os trabalhadores com a perda de
empregos, direitos, salários e um futuro incerto.
Somente nos últimos meses, mais de três mil
trabalhadores brasileiros foram demitidos da Scania,
Volkswagen, Fiat, Ford, GM, criando um efeito dominó
que afeta fortemente as fábricas de autopeças. Outros
milhares estão em casa, em afastamento temporário ou
férias coletivas.
Não queremos ver se repetir em nenhum país do mundo
a situação vivida por milhares de metalúrgicos dos
Estados Unidos, demitidos em função do fechamento de
diversas unidades da General Motors, em 2008.
Passados seis anos da crise que levou à reestruturação
da GM, a montadora aprofunda os ataques aos
trabalhadores, tentando fechar a planta de Bochum, na
Alemanha.
Na América Latina, as multinacionais usam o mercado
de pretexto para chantagear os trabalhadores de um
país contra o outro, ameaçando-os com demissões e
perda de direitos com a finalidade aumentarem seus
lucros e sua competitividade. Exemplo disso é a
campanha de calúnias feita pela GM, na tentativa de
provocar uma disputa entre os trabalhadores argentinos
e brasileiros em torno à produção do Fenix.
Com a ameaça de fechamento de postos de trabalho,
as montadoras forçam os operários a aceitarem a
flexibilização do trabalho, com menores salários e
direitos, garantindo assim o aumento dos lucros.
Não podemos nos calar diante dessa realidade. É
preciso mobilização e ampla unidade internacional dos
trabalhadores na defesa dos empregos e direitos.
Desde o Brasil, a CSP-Conlutas e o Sindicato dos
Metalúrgicos de São José dos Campos, nos somamos a
todos os esforços no sentido de construir essa unidade,
com a realização de encontros que organizem nossa
luta internacionalmente.
Desde 2012, para unificar as lutas contra as demissões
anunciadas pela GM, organizamos um encontro
internacional que reuniu representantes sindicais de
diversos países e resultou no Dia de Ação Global contra
os ataques da montadora, em janeiro de 2013, e em
mobilizações unificadas no 1º de maio. Ainda em 2013,
representantes de nossas entidades participaram do
Encontro Internacional do Sindicalismo Alternativo,
realizado em Paris, que resultou na construção de uma
rede sindical internacional de solidariedade e lutas.
Dando continuidade a essa resistência internacional,
representantes de nosso sindicato participam, nesta
semana, do encontro internacional de representantes do
setor automotivo, realizado na Alemanha.
Saudamos com entusiasmo a iniciativa dos(as)
companheiros(as) argentinos(as) que buscam organizar
a luta e a resistência contra os ataques e as demissões
em
Córdoba, em Rosário, etc. usando a tribuna
parlamentar para dar visibilidade a essa luta.
Seja no Brasil, na Argentina, ou em qualquer país, os
ataques realizados pelas montadoras são os mesmos.
Por isso, reforçamos nosso chamado à unidade na luta
dos trabalhadores de todo o mundo, em defesa dos
empregos, salários e direitos.
Queremos juntos com vocês, construir uma campanha
de denúncia internacional do papel da indústria
automobilística e das autopeças que para manter suas
taxas de lucro querem que paguemos com nossos
empregos e direitos. Bem como exigir dos governos de
nossos países, que financiam essas multinacionais com
dinheiro público a garantir que não ocorra mais
nenhuma demissão, nem fechamento de nenhuma
planta.
Chega de demissões, retirada de direitos e redução
salarial. Nenhuma demissão, estabilidade no emprego
já! Viva a unidade e a solidariedade internacional dos
trabalhadores!
São Paulo, 06 de Maio de 2014
Antonio Ferreira de Barros pelo Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e Região – SP – Brasil
Luis Carlos Prates (trabalhador da GM São José dos Campos)
Dirceu Travesso pela Executiva Nacional da CSP-CONLUTAS.
INCRÍVEL, MAS REAL...
267 deputados votaram pela aprovação de um projeto
de lei que permite que a jornada de trabalho dos
motoristas profissionais chegue a 12 horas diárias.
Apenas 71 votaram contra. O texto vai ao Senado.
Federações de trabalhadores e outras entidades
pressionaram contra a proposta, em defesa de direitos
historicamente conquistados, mas não adiantou. O
lobby das empresas de transporte, grandes
financiadoras de campanhas eleitorais, foi grande. A
autorização legal de uma jornada de trabalho excessiva
para motoristas não significa apenas a perda de direitos,
mas também o crescimento do risco de acidentes
trágicos. Como escreveu certa vez Mark Twain, temos o
melhor Congresso que o dinheiro pode comprar...
OS MAGGI E OS MAYCOM: UNS BILIONÁRIOS E
OUTROS CEGOS PELA POLÍCIA
Nestes anos de governo petista, principalmente entre 2002 e
2012, muito foi publicado referente à diminuição da pobreza
absoluta no Brasil e sobre a queda da desigualdade social.
Comentava-se que esses indicadores foram alcançados pelas
políticas de transferência de renda, ou seja, pela valorização
do salário mínimo acima da inflação e pela ampliação do
programa bolsa-família. Porém, os dados publicados, em
2013, na última Pesquisa Nacional de Análise de Domicílios
(Pnad) apontam que, depois de uma década de governo
petista, a média de renda salarial dos 10% mais pobres no
Brasil só chegava a R$ 215,00. Isso, enquanto a média do 1%
mais rico alcançava a cifra de R$ 18.889,00.
É bom ressaltar que a Pnad só capta o ganho salarial, não os
ganhos de capital, como lucros, juros, especulações, etc.
Dessa forma, é preciso mudar a questão a ser debatida sobre
desigualdade no Brasil. Pois a desigualdade de renda é
apenas a ponta do iceberg. A questão central precisa ser
posta no funcionamento do sistema político que reproduz uma
acentuada concentração de renda e é evidentemente
excludente em relação aos mais pobres. Nesta questão,
podemos visualizar que para além da significativa distância
salarial, o principal fator de reprodução das desigualdades
está nos benefícios do sistema político para os que detêm os
lucros do capital, seja na forma de latifúndios, grandes
indústrias ou de aplicações financeiras. É para a manutenção
da desigualdade entre os ganhos do Capital e do Trabalho
que o sistema político no Brasil está estruturado. Assim, podese lançar alguma luz sobre o funcionamento desse sistema
através de uma análise rápida das fortunas dos Maggi e dos
Maycom publicadas no mesmo dia pela imprensa.
Desse modo, o primeiro fato a ser destacado é o ingresso dos
quatro principais proprietários do grupo Andre Maggi, ligado
ao agronegócio e a produção de energia, na lista dos
bilionários em dólares da revista Forbes. O valor desse grupo
foi avaliado em US$ 6,2 bilhões. Os novos quatro integrantes,
todos da mesma família, nesta lista seleta cujos participantes
brasileiros não param de crescer são: Blairo Maggi, senador
do Mato Grosso pelo PR que já foi governador do estado,
aliado de primeira hora de Lula, atualmente, um dos principais
nomes de sustentação do governo no congresso e, talvez,
candidato do Planalto e palanque de Dilma no Mato Grosso;
Itamar Locks, cunhado de Blairo; Marli Maggi, irmã de Blairo;
Lúcia Maggi, mãe de Blairo.
O caminho para a família tornar-se bilionária passou pelo
plantio de soja em áreas do sul da Floresta Amazônica que
foram recentemente devastadas. A produção de soja de Blairo
Rodrigo Belinaso Guimarães
Maggi é em quase sua totalidade exportada em estado bruto
para virar ração para porcos, bois e outros animais confinados
em países da Europa e Ásia. Em 2005, o atual senador
recebeu do Greenpeace o prêmio Motosserra de Ouro, por
sua contribuição à destruição da floresta. Na época, Blairo
Maggi chegou a declarar que: “Esse negócio de floresta não
tem futuro”. A premiação foi concedida porque entre os anos
de 2003 e 2004, a Amazônia foi devastada em 26 mil
quilômetros quadrados, sendo metade desta área por obra de
Blairo Maggi. Após a premiação e do escândalo que se
seguiu, Maggi começou a adotar discursos ambientalistas e
buscar certificações ambientais para sua produção de soja
como forma de não prejudicar seus negócios com a Europa.
Deste modo, chegou à presidência da comissão de meio
ambiente do Senado.
É fácil adotar discursos de sustentação ambiental depois de já
ter ocupado uma fatia expressiva da Amazônia para a
produção agrícola. O fato é que depois de ter sido declarado o
pior inimigo ambiental do Brasil, Blairo Maggi só viu sua
fortuna aumentar. Em 2006, as riquezas de Blairo somavam
R$ 33,5 milhões, em 2010 os rendimentos de suas terras já
lhe davam a quantia em bens de R$ 152,4 milhões, agora, em
2014, os milhares de quilômetros ocupados da Amazônia lhe
garantem uma fortuna estimada pela Forbes em R$ 2,3
bilhões. A riqueza de Blairo se valorizou desde sua premiação
como Motosserra de Ouro em impressionantes 7.778%.
Ao contrário, encontramos na imprensa no mesmo dia em que
os Maggi se tornaram bilionários, a história da violenta
desocupação no Rio de Janeiro no terreno que era da antiga
companhia telefônica do Estado (Telerj) e que atualmente
pertence a Oi. É bom recordar que o governo do Rio de
Janeiro é fiel aliado do governo Dilma e que a empresa Oi foi
sistematicamente ajudada pelos governos petistas para se
tornar uma das maiores companhia de telecomunicações do
país. O local estava ocupado desde o final de março por cerca
de 5 mil moradores que improvisaram barracos, pois tinham
ficado sem moradia após a implantação de UPP's nas favelas
onde moravam. A especulação imobiliária tem acompanhado
a instalação de UPP's e muitas famílias não conseguem pagar
a alta dos aluguéis em suas antigas comunidades. A ação dos
1.650 policiais militares foi brutal, começou de madrugada,
quando todos dormiam, foram utilizados helicópteros que
lançaram bombas de gás lacrimogêneo e os policiais
dispararam balas de borracha. Moradores relataram o uso de
armas convencionais e que ninguém teve tempo de recolher
seus pertences, já que os barracos foram postos ao chão por
uma retro escavadeira tão logo começou a desocupação.
O terreno adquirido pela privatização da Telerj estava
abandonado há mais de uma década sem que se desse a ele
uma finalidade social. Antes da bárbara atuação da polícia,
não houve nenhuma tentativa de cadastrar os moradores e de
resolver o impasse politicamente. Simplesmente todas as
famílias foram jogadas na rua novamente. O entregador de
pizzas Maycon Gonçalves Melo ficou cego de um olho ao ser
atingido por uma bala de borracha durante a ação, seu
trabalho sustenta sua família e sua mãe deficiente física. Até
mesmo o repórter Bruno Amorim, do jornal O Globo, foi preso
com outros 27 moradores da “favela da Telerj”. O repórter
disse ao jornal O Estado de São Paulo sobre sua prisão que:
“Puxei o celular da empresa para tirar fotos. Foi quando outro
policial me deteve, alegando que eu estava tacando pedras.
Me deu uma chave de braço e me machucou. Jogou meu
celular no chão”. É natural que cenas de resistência ocorram
nessas condições, o que é aproveitado pela grande mídia para
qualificar de vândalos e arruaceiros uma população pobre e
explorada que estava lutando por seu direito a uma moradia,
mesmo que precária.
É interessante recordar que em 2012, a presidenta Dilma
esteve inaugurando casas do programa “Minha casa, minha
vida” no Rio de Janeiro e afirmou em discurso que: "Você
sabe que a coisa mais importante quando se trata de cidade é
você ter o terreno. Hoje, a prefeitura, através do Eduardo
Paes, obteve um terreno com a Oi, que vai permitir que
construamos mais 2240 residências. Essa é a melhor notícia
da minha viagem". Assim, o terreno da “Favela da Telerj” era a
princípio público, mas foi repassado a Oi em privatizações da
telefonia que só beneficiaram as grandes empresas, depois, a
Oi iria vender novamente o mesmo terreno para a Prefeitura
do Rio de Janeiro, porém o negócio ainda não se concretizou
por falta de acordo financeiro entre as partes. No fim, a
“melhor notícia” de Dilma seria a de que seus aliados políticos
apenas dois anos depois de seu anúncio barbarizariam a
população pobre que não tem alternativas de moradia.
Portanto, as desigualdades sociais no Brasil para além dos
indicadores são aquelas que distanciam os Maggi dos
Maycom. Os primeiros ocupam áreas gigantescas de floresta
e tornam-se bilionários depois de alguns anos com pleno aval
do sistema político. Enquanto os Maycom, expulsos de suas
comunidades por não terem como pagar o aluguel
inflacionado, entregam pizzas, ocupam poucos metros
quadrados de um terreno abandonado, perdem um olho pela
ação do mesmo sistema político e são qualificados de
vândalos pela grande mídia.
A CRISE ARGENTINA E O PARTIDO
OBRERO
Depois de desenvolver uma política fictícia de
desendividamento, os funcionários oficiais da Argentina
peregrinam no momento pelas capitais financeiras para
restabelecer o crédito internacional do país. Para chegar
até 2015 (eleições gerais). O governo de Cristina
Kirchner não vacilou, para esse fim, em proceder a um
incremento inédito da dívida externa passiva, como
ocorre com o pagamento da indenização a Repsol ou
aos “fundos urubus” que venceram pendências judiciais
no Ciadi e como pretende fazê-lo com o Clube de Paris
e com os “fundos urubus” que estão fora da operação.
Aceitou inclusive a sentença da Corte dos EUA que
ordena o pagamento de um ressarcimento financeiro à
British Gas, em que pese o fato da Corte da Argentina,
em 2005, ter respaldado a pesificação das dívidas. O
governo da Argentina está acatando uma sentença
estrangeira que redolariza as tarifas públicas. É uma
violação descomunal da soberania nacional.
A desvalorização recente do peso argentino integra
esse operativo de resgate internacional. O propósito
principal foi tornar “atraentes” (pela sua desvalorização)
os ativos nacionais para os fundos estrangeiros, aos
que se ofereceu uma taxa de juros em dólares no curto
prazo de 30% anual. Isto produziu outro aumento
abusivo da dívida: com as comercializadoras de cereais,
que adiantaram ingressos de divisas, e com os
importadores, que tomaram créditos externos. A
contratação de crédito novo (dívida ativa) continua em
nível zero. O FMI pôs como condição para novos
empréstimos um reajuste de tarifas, muito maior que o
recente aumento da gasolina ou da supressão parcial
ou gradual de subsídios. O empreendimento do governo
Jorge Altamira
se encontra em ruínas. O movimento operário, por outro
lado, já deixou claro que o ‘ajuste’ será enfrentado com
a luta até as últimas consequências.
Argentina não atravessa uma crise de crédito externo,
mas a derrubada de seu sistema financeiro e da sua
moeda. O Banco Central e a Anses [o INSS platino] que
bancaram o financiamento oficial, se encontram em
situação falimentar. 75% dos ativos do Banco Central
são créditos irrecuperáveis concedidos ao Estado; as
reservas do país rendem 0.25% anual, enquanto os
passivos do mesmo Estado pagam até 27/30% anuais.
Aproximadamente 60% do crédito do Banco Nación
financia um Estado deficitário. Os bancos locais, que
usaram os depósitos para apostar na desvalorização da
moeda local, lucram com as taxas usurárias que oferece
o próprio Estado, e se preparam para uma nova
desvalorização. Una dívida externa maior, nestas
condições (a chamada distressed debt), apressaria a
falência do sistema. Argentina já possui uma dívida
pública de US$ 240 bilhões, metade da qual se
encontra, provavelmente, dolarizada.
A nação argentina se encontra diante de uma alternativa
nítida: ou o FMI conduz a reestruturação do sistema
financeiro interno, o que é o destino da política oficial
atual, o que implicaria, só para começar, uma maxi
desvalorização que dilua as dívidas internas do Estado,
e obviamente um tarifaço; ou, pelo contrário, a carga do
ajusto é transferida para os grandes grupos econômicos
e financeiros, com a recuperação da poupança nacional
para uma política de melhoras sociais e de
industrialização intensa. Essa é a política do Partido
Obrero. (Publicado no jornal argentino “Clarin”).
11
MAIS DE 30 MIL OPERÁRIOS CHINESES EM GREVE
Os trabalhadores da fábrica taiwanesa Yue Yuen na cidade
de Dongguan, uma das maiores instalações de produção
de calçado do mundo, recusaram voltar ao trabalho a 14
de abril, em protesto contra as condições salariais,
descumprimentos contratuais e a ausência do pagamento
das devidas contribuições sociais. A administração da
empresa, que tinha prometido uma solução para o conflito
que se iniciou em 5 de abril, quando centenas de
trabalhadores bloquearam uma ponte local, anunciou na
segunda-feira que só ponderaria assinar novos contratos
com todos os seus funcionários a partir de 1º de maio e
recusou-se a pagar as contribuições para a segurança
social e os pagamentos do fundo de habitação em atraso.
O protesto está sendo vigiado por um forte dispositivo
policial,
munido
de
equipamento
antimotins
e
acompanhado de cães de patrulha, que se encontra
disposto em redor da fábrica. Durante uma marcha
pacífica, que teve lugar na segunda-feira, os trabalhadores
foram alvo de agressões por parte das forças policiais e
registaram-se algumas detenções. As reivindicações
apresentadas pelos trabalhadores de Yue Yuan refletem
problemas enfrentados pela maioria dos trabalhadores na
indústria manufatureira da China. A Yue Yuen Industrial
Holdings Ltd., com fábricas nos EUA, México, Vietnã,
China e Indonésia, trabalha para marcas como Nike,
Adidas, Puma, Timberland, Asics, Converse e New
Balance, tendo contabilizado, em 2003, receitas de 7,58
bilhões de dólares e um lucro de 434,8 milhões. O maior
proletariado do mundo começa a se pôr em pé...
UCRÂNIA: BOICOTAR AS
ELEIÇÕES DA OTAN
Rússia e os governos da OTAN puseram-se de acordo,
em Genebra, sobre a necessidade de desarmar as
milícias que surgiram no leste da Ucrânia e de
desocupar os prédios públicos que se encontram
tomados. Motivou-os o afã por conter uma crise
internacional maior, e principalmente o temor de que
poderia desenvolver-se uma situação revolucionária no
país. A Ucrânia é um vulcão social a ponto de explodir
por todo o seu território.
A “pacificação”, no entanto, não ocorreu. Os meios de
comunicação atribuem a responsabilidade do fracasso a
Putin, que estaria alimentando a ação armada dos
grupos pró-russos. O assunto não é tão simples. Na
realidade o governo usurpador de Kiev, instalado por
um golpe de Estado manipulado fundamentalmente por
Obama, sem eleições, com o voto da maioria
parlamentar que havia sustentado, anteriormente, o
governo derrubado; este governo lançou uma operação
militar contra o Leste do país, sob a direção dos
funcionários da CIA e da NSA. O governo usurpador
pretende legitimar o golpe pró-OTAN, no próximo dia 25
de maio, e anexar a Ucrânia à União Europeia
submetendo-a à Troika (da qual fazem parte a UE, o
FMI e o Banco Central Europeu). É uma anexação na
mesma linha estratégica que integrou a Alemanha
Oriental e a ex-Iugoslávia ao dispositivo econômico e
militar do imperialismo. Os Estados Unidos envia aviões
e tropas ao Báltico e inclusive tem instalado ali bases
militares “provisórias”. Os delegados participantes da
Conferência Europeia convocada pela CRQI, tomaram a
decisão de impulsionar o boicote a estas eleições. A
independência da Ucrânia do imperialismo e sua
unidade nacional somente poderão ser asseguradas por
uma Assembleia Constituinte, ou seja, uma deliberação
democrática do povo da Ucrânia, que seja convocada
pelas organizações dos trabalhadores.
Rússia propõe uma reforma da Constituição, que dê
uma forma federal ao Estado ucraniano, com o
propósito de manter uma influência decisiva no espaço
geográfico limítrofe. A OTAN entregou a Crimeia, porem
não quer ir mais além (ainda que seja o mesmo que o
Jorge Altamira
PSOE propõe para evitar uma secessão da Catalunha
do Estado espanhol). Os porta vozes da rebelião no
Leste convocaram um referendo para o dia 11 de maio,
com o propósito de impor a autonomia política de suas
regiões de forma unilateral.
O Estado, na Ucrânia, é uma ficção. O partido que
governou os últimos anos encontra-se pulverizado. As
forças tradicionais do oeste não reúnem intenções
suficientes de votos para ganhar as eleições no dia 25
próximo; um oligarca da indústria de chocolate
encabeça as pesquisas. Este desequilíbrio político
geral, interno assim como internacional, não pode
encontrar uma saída por meio de operações
diplomáticas.
A esse cenário acrescenta-se uma acentuação dos
conflitos entre os Estados Unidos e a China pelo
controle do espaço marítimo que a China disputa com o
Japão, Filipinas e outros países. Obama advertiu a
China contra a tentativa de ultrapassar certo teto de
tonelagem naval, o que tem lembrado a mesma ameaça
da Grã Bretanha à Alemanha, que desatou a Primeira
Guerra Mundial em 1914. Está se formando um
tabuleiro de três lados, se acrescentarmos a reticência
da Alemanha de alinhar-se de forma incondicional com
os EUA contra a Rússia. Entre esses dois países
desenvolve-se uma forte disputa pelo controle da zona
do euro e da UE (a França acaba de intervir para evitar
que sua empresa Alshtom seja adquirida pela General
Electric norte-americana). Um jogo de sanções
econômicas crescentes ameaça desestabilizar ainda
mais a economia mundial. A Rússia, de imediato, está
sofrendo uma forte desvalorização do rublo. Se as
sanções alcançarem a empresa Gazprom, o que até
agora não ocorreu, a desestabilização econômica se
acentuaria tanto na Rússia como na UE.
É necessária uma campanha contra a tomada e
ocupação da Ucrânia por parte da UE e da OTAN, por
um lado, e contra as pretensões de dominação do
governo oligárquico capitalista de Putin, por outro, ou
seja, lutarmos por fazer convergir as tendências
revolucionárias no Leste e no Oeste da Europa.
40 anos da Revolução dos Cravos em Portugal
GRÂNDOLA VILA MORENA
Pablo Rieznik
Há quarenta anos, depois da meia-noite, a transmissão
pela rádio portuguesa da canção que intitula este artigo
atuou como senha para o levantamento militar que então,
um 25 de abril, derrubou a mais duradoura ditadura
fascista do século XX, que debutara com um golpe militar
em 1926 e se identificou com liderança de Antônio de
Oliveira Salazar desde 1932. O tirano lusitano manteve seu
cargo durante três décadas. Foi substituído por Marcelo
Caetano em 1968, depois de um acidente que o deixou
incapacitado. Começava assim o final de um regime
anacrônico, no ano que vislumbrava uma crise de alcance
planetária quando, em janeiro, os heroicos vietnamitas
ocuparam a embaixada ianque, em Saigon. O ano da
greve geral francesa e da primavera de Praga; o dos
grandes movimentos civis nos EUA, das rebeliões juvenis
praticamente universais e o de uma crise generalizada dos
regimes políticos latino-americanos, desde o sul de Rio
Bravo ao Rio da Prata.
O anacronismo do regime português se transformou em
uma
decomposição
imparável
catalisada
pelo
desmoronamento de um império em decadência. A
juventude era levada para um serviço militar obrigatório de
quatro anos, dois dos quais eram em ultramar (em
Moçambique, Angola, Guiné Bissau). Combatida pelos
movimentos independentistas, financeiramente quebrada,
a ditadura portuguesa era um fruto podre. Caiu a 25 de
abril de 1974, sem ter como resistir ao golpe liderado por
jovens oficiais, reunidos no “Movimento das Forças
Armadas” (MFA) que entregaram o poder ao general
dissidente Antônio Spinola, empenhado em recompor a
ordem. Já era tarde: o transbordamento militar se
transformou em insurreição, com as massas lançadas às
ruas com os primeiros raios de sol desse mesmo dia, com
a confraternização com os soldados, com as flores na boca
dos fuzis, a alegria popular de uma explosão
revolucionária. A revolução debutava nas portas do velho
continente, em um período convulsivo de nossa história.
A etapa aberta na Europa em 1968 alcançava uma sorte
de “clímax” e Portugal estava entre seus protagonistas. O
25 de abril foi apenas o princípio. Semanas depois, no 1º
de maio operário, mais de 300 mil manifestantes
convertiam a jornada na maior mobilização da história
portuguesa. O processo de radicalização das massas
alcançou seu apogeu no ano seguinte com a ampliação
das organizações dos trabalhadores nos locais de trabalho,
a massiva ação direta em defesa de suas reivindicações,
os levantamentos contra os motins da direita, e sua
conexão com a mobilização no campo e com o mundo
colonial português, que conquistava sua independência.
Portugal transitava uma crise revolucionária. Desde o
início, o PC e o PS saíram da clandestinidade para formar
parte dos governos que foram se sucedendo, sacudidos
pela pressão das ruas e da população insurgente.
Contando com o respaldo da imensa maioria dos
trabalhadores e o povo, expressaram desde esse mesmo
princípio as diversas variantes políticas dirigidas a
dissolver a revolução nos limites do respeito à
“democracia”, quer dizer, à propriedade privada e ao
próprio capital. Algo que não se modificou nem sequer
quando a meados de 1975, o PS se retirou do governo,
que ficou em mãos do setor mais esquerdista do MFA e do
PC. O PC opôs o respaldo irrestrito ao governo da
hierarquia militar radicalizada à alternativa de um governo
das organizações operárias. A dimensão desta política era
internacional: os chefetes do Kremlin reclamavam então
que o elenco uniformizado se mantivesse dentro da OTAN
para não alterar a “coexistência pacífica” com o
imperialismo. Seus correligionários em Portugal acusavam
de “contrarrevolucionárias” as greves e as tentativas de
ação independente dos explorados. Não era, para eles, a
hora do socialismo nem do governo dos trabalhadores
(ditadura do proletariado).
A defesa do arbítrio dos militares (o bonapartismo) contra o
poder das massas insurretas não era em vão: “O arraigado
sentimento de subordinação à hierarquia, da necessidade
de um chefe que, por cima nós, nos orientasse no caminho
‘certo’, nos perseguiu até o final, com as funestas
consequências já conhecidas”, disse Otelo Saraiva de
Carvalho, líder da esquerda do MFA. A divisão de tarefas
entre o PC e o PS para desmoralizar a classe operária fez
seu trabalho. A partir de novembro de 75, a “hierarquia” do
exército destituiu seus elementos de esquerda e colocou o
PC à margem de seus postos de comando no governo;
algo que o stalinismo português aceitou sem dar um pio. O
pacto foi que todo mundo participaria das eleições gerais
no marco de uma Constituição que preservava um Portugal
capitalista e reconstituía as “instituições” do Estado
(burguês). Neste quadro, os planos que em segredo havia
discutido a OTAN para intervir pela força foram
descartados.
A impulsão da revolução caiu, como consequência da
democracia, quer dizer, do trabalho contrarrevolucionário
das direções das organizações operárias, consagradas à
defesa da “ordem” como alternativa a uma suposta
anarquia, que se brandia como um espantalho. Uma
alternativa política de força poderia, ao contrário, suscitar
uma explosão revolucionária. Havia, além disso, um
antecedente: no apogeu da greve geral de 1968 na França,
o presidente De Gaulle havia discutido também a
eventualidade de um golpe militar com a cúpula do
Exército. Temeroso de provocar um desastre, De Gaulle
concluiu reclamando a colaboração do PC e o do PS, para
acabar com o movimento de greve e pactuar uma
convocatória eleitoral geral. Acabada a greve, De Gaulle
preparou suas malas, a “República” ficou a salvo do
assalto de uma eventual comuna proletária.
A virada em Portugal, controlando o estouro revolucionário,
foi um elemento chave para reverter o convulsivo processo
que europeu ficou posto a partir desse mesmo ano de
1968. Em 1975, a crise mundial capitalista se expressava
na
monumental
derrota
dos
ianques,
fugindo
desesperadamente do sudeste asiático. E também na
bancarrota econômica: esse ano, pela primeira vez no pósguerra, a recessão se generalizou e se estendeu a todas
as grandes potencias do capital. Sintoma do final de uma
época, de um marasmo geral que o capital buscou superar
com os Reagan e as Thatchers, com um renovado saque
da periferia capitalista, preparando o assalto “ao outro lado
do muro”. No início dos anos 1990 parecia ter saído
garboso do desafio. Hoje sabemos que este último
gigantesco recurso não foi suficiente. A crise mundial que
se estende desde finais do século passado recoloca toda a
história de um capitalismo em decomposição. Há dois
anos, nas mobilizações de massas que sacudiram a
Espanha, um conjunto de hinos de protestos se
generalizou: nas ruas ouviu-se de novo “Grândola Vila
Morena”. Um manifestante respondeu assim a pergunta de
um repórter televisivo sobre o fenômeno: foi a canção –
disse que levantou a um povo contra uma ditadura e agora
a retomamos contra outra ditadura, a da “troika”. Saibamos
nesse detalhe redescobrir o fio de uma história que agora é
a nossa.
25 DE ABRIL, 40 ANOS DEPOIS – UM DEPOIMENTO
Naquela noite, em Coimbra, de 24 para 25 de abril de 1974,
nosso grupo – Artur, Natal, Jerônimo… – no meio das
discussões de sempre – ação, resistência, estratégia – sob a
luz pálida do aparelho em que nos reuníamos, começaram a
chegar pouco antes da meia-noite alguns sinais estranhos
vindos primeiro dos Emissores Associados de Lisboa, logo
seguidos da canção do Paulo de Carvalho, “E depois do
Adeus”, emitida pelo Luís Filipe Costa, senha utilizada pelos
capitães de abril para desencadear o movimento. À meia noite
e vinte foi transmitida a canção “Grândola Vila Morena”, de
José Afonso, pelo programa Limite, da Rádio Renascença,
que confirmava o movimento e marcava o início das
operações. A noite foi longa, mas o amanhecer já trazia em si
a esperança da derrubada do mais longo regime de ditadura
em nosso país. Nas primeiras horas da manhã Salgueiro Maia
ocupa o Terreiro do Paço. O povo toma as ruas. Os cravos
vermelhos são distribuídos por uma florista que os dava à
população que por seu turno os ia colocando nos canos das
espingardas e assim nasceu o nome da nossa revolução
popular: “A Revolução dos Cravos”.
A ditadura que acabávamos de derrubar durou 48 anos, veio
na sequência do golpe militar de 28 de maio de 1926, que a
instaurou em Portugal, sob a égide da Constituição de 1933,
que instituiu um regime autoritário de inspiração fascista se
autodenominando Estado Novo, Salazar controlava o país
através do partido único “União Nacional”. Durante a ditadura
nosso país se caracterizou por eleições fraudulentas e
perseguição sem tréguas a todos os opositores. Manteve sua
política colonialista e se tornou feroz e sanguinário contra os
movimentos de independência em África: Angola,
Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde, São Tomé e
Príncipe e Timor Leste. Economicamente, o regime manteve
uma política que protegia certos monopólios e certos grupos
industriais e financeiros, o país se manteve pobre e sem
perspectiva alguma para o povo do campo e da cidade, nada
mais lhes restando que a emigração. Qualquer tentativa de
mudança política era impedida pela polícia política PIDE. Nos
finais dos anos 60, o regime apodrecia na decrepitude,
obcecado pela defesa do Império, sendo visto como um
incômodo, em plena Guerra Fria, tanto pelos blocos
capitalistas quanto comunistas que começavam a apoiar e a
financiar os movimentos de independência africanos. Grande
parte do orçamento de Estado era gasto na defesa do
“Império”. A guerra colonial tornava-se um tema forte de
discussão. Portugal estava isolado do mundo. A maioria dos
estudantes e opositores viam-se forçados a abandonar o país
para fugir da guerra, da prisão e da tortura. É neste contexto
que o nasce o Movimento das Forças Armadas. Nele estão
envolvidos oficiais do exército, entre eles Otelo Saraiva de
Carvalho que vai ser um dos últimos oficiais a se render a
realidade que se impôs pós 25 de novembro de 1975, que
veio a significar o alinhamento a um processo social
democrata longe dos cânones da revolução popular sonhada
Marilinda Marques Fernandes
e ambicionada por todos nós que acreditamos na democracia
direta e na autogestão popular.
Com a Revolução dos Cravos, Angola, Moçambique, Cabo
Verde, Guiné Bissau, São Tomé e Príncipe e Timor Leste se
tornaram independentes. A ditadura franquista em Espanha se
tornou mais fraca, nossos companheiros de luta ibérica se
sentiram com mais estrutura para lutarem, e a ditadura
brasileira perdeu um forte aliado. Esse é sem dúvida um
legado que transcende o caráter nacional da nossa Revolução
e nos mostra a importância da luta como rastilho propulsor de
outras frentes de libertação. Em 25 de abril de 1975 as
eleições para a Assembleia Constituinte, mostraram
claramente a adesão massiva dos portugueses a um projeto
de mudança, garantindo um meticuloso enunciado de direitos,
liberdades, bem como os princípios de um Estado
democrático.
40 anos após o 25 de abril, a Constituição já sofreu
sucessivas revisões. Dezenas e dezenas de artigos foram
modificados, alterados substituídos ou suprimidos. 40 anos
passaram, sem império, sem projeto de expansão ou de
mobilização coletiva e, seguindo preso ao seu atraso
periférico, Portugal atirou-se nos braços dessa Europa
“eternamente solidária”. Durante anos o projeto europeu agiu
como estabilizador político, recuperador da autoestima do país
e fonte direta ou indireta de financiamento para quase tudo.
O papel assistencial da União Europeia para com Portugal
raramente teve uma atitude crítica por parte das autoridades
nacionais que também não envolveram a população no
projeto. Enquanto a ideia de Europa assentou apenas na livre
circulação de pessoas e bens a nossa relação foi cordial.
Contudo, com a crise da dívida soberana, nos demos conta
que a construção da união obedece sempre aos interesses
dos países mais fortes. Hoje, o fato é que comemoramos o 25
de abril sob a intervenção da troika (Banco Central Europeu,
União Europeia e FMI), situação por demais humilhante e
injusta. Assistimos à captura do Estado pelos interesses
privados e o regime levado a cabo pelo conservador Passos
Coelho (primeiro-ministro português) e sua camarilha nos
mantém como o mais pobre país europeu, como resultado de
um longo processo de reação das classes proprietárias e seus
aliados nas classes médias. Nesse contexto a memória do 25
de abril de 1974 é a fonte que nos alimenta a resistência nos
dias de hoje, é ela que nos resgata dessa sensação de nos
sentirmos um país à deriva, sem projeto de futuro, sem
grandeza que não seja a dos números da dívida. Em 25 de
abril de 1974, tudo era uma explosão só. Sentíamo-nos livres
e plenos de sonhos. Eram os dias da igualdade, do fim da
propriedade privada, da autogestão operária, da reforma
agrária. Tudo nos parecia possível, vivíamos a Revolução! É
essa memória de sonho, de luta, de liberdade, de exercício do
poder popular que nos leva hoje às ruas de todo o país, pois
dentro de Portugal jamais morrerá o sonho de que quem
mande seja o povo!
Andrey Bradhevskiy Radzihovskaya, militante assassinado pelo fascismo em Odessa
FORA O FASCISMO DA UCRÂNIA!
Bandos nazistas, com apoio da policia, tocaram fogo na Casa
dos Sindicatos de Odessa, assassinando 43 pessoas, a
maioria queimadas vivas. Depois de um enfrentamento
desigual na rua Gréchaskaya e na Praza Sobornaya, os
fascistas de Praviy Séktor (Setor Direita) organizados com
facas, barras de aço, bombas molotov e armas de fogo,
atacaram militantes desarmados, a maioria pertencentes a
organizações de esquerda, como a organização Contra a
Corrente e o Partido Comunista de Ucrânia, assim como aos
integrantes do sindicato Borotba, os que recuaram para o
“campo de Kulikovo” e depois se refugiaram no prédio da
Casa dos Sindicatos. Os nazistas lançaram bombas molotov,
dispararam contra as janelas e fecharam as saídas, do que
resultaram 43 personas mortas e mais de 170 outras, feridas.
Várias vítimas se precipitaram desde as janelas para fugir do
fogo, e foram arrematadas no chão pelos assassinos. Ao final
do incêndio entraram e arremataram aos sobreviventes. Os
bombeiros chegaram várias horas depois. Entre os mortos
está o filho da companheira Elena Radzihovskaya, Andrey
Bradhevskiy Radzihovskaya. Andrey integrava o sindicato
Borotba. Elena é militante de Contra a Corrente, organização
participante de la Segunda Conferência Euro-Mediterrânea de
Trabalhadores realizada em Atenas em finais de março, e
assinante do Chamado à Solidariedade Internacional por uma
Ucrânia Unida, Independente e Socialista, proposto e
divulgado pela Coordenação pela Refundação da Quarta
Internacional (CRQI), cujo texto reproduzimos na página a
seguir.
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ESTADOS UNIDOS, OTAN, UNIÃO EUROPEIA,
NAZISTAS: AFASTEM-SE DO POVO DA UCRÂNIA!
POR UMA UCRÂNIA UNIDA, INDEPENDENTE E
SOCIALISTA
Chamado à solidariedade internacional
O governo norte-americano de Obama e a OTAN, apoiados
pela UE, foram à guerra contra os centros proletários da
Ucrânia do Leste. Eles ordenaram aos seus agentes em Kiev
enviar tropas armadas, tanques, helicópteros e as tropas
fascistas de Svoboda e Paviy Sektor, para esmagar a rebelião
da classe trabalhadora e a resistência das massas locais
frente aos projetos do falso “governo interino” de oligarcas próimperialistas e nazistas. Nas vésperas do lançamento das
operações, o chefe da CIA, John Brennan, viajou a Kiev,
obviamente para supervisionar a campanha de repressão
militar sobre o povo, enquanto a Casa Branca, em conferência
de imprensa pública, “instou ao governo da Ucrânia a avançar
para estabelecer a lei e a ordem”. Necessitam urgentemente a
ordem desta bárbara “lei” do capitalismo selvagem para impor
as medidas de canibalismo social demandadas pelo FMI para
transformar a Ucrânia em uma colônia do capital dos EUA e
da UE.
O número de mortos e feridos no sudeste da Ucrânia é cada
vez maior. Não somente os heroicos trabalhadores e a
resistência popular estão enfrentando a agressão, como
também esta gerou atos fraternais entre as tropas ucranianas
e o povo, quando os soldados se recusaram a assassinar
mulheres e crianças, tomando partido pelo seu povo. A
agressão propiciada pela OTAN no sudeste ucraniano ameaça
não somente ao povo ucraniano, com uma generalizada e
sangrenta guerra civil, e aos povos da Ucrânia e Rússia com
uma guerra fratricida: como também a todos os povos da
região, da Europa oriental e ocidental, e a paz mundial.
Devemos detê-los mediante uma mobilização internacional
dos trabalhadores e movimentos populares e sociais!
Não se pode depositar confiança alguma na diplomacia
secreta entre os governos dos EUA, da UE, da Rússia e o
governo ucraniano. Nem o Kremlin, nem os oligarcas, mas sim
a classe operária internacional é a verdadeira aliada dos
trabalhadores
ucranianos.
Nossos
destinos
estão
interconectados e temos que tomar o assunto em nossas
mãos. Temos que combater juntos aos mesmos inimigos: o
imperialismo dos EUA e a OTAN e seus promotores de
guerra, o FMI, a UE e seus planos draconianos; os oligarcas
de todo o espaço pós-soviético, que incentivam o
nacionalismo ucraniano e grã-russo: o ódio étnico e religioso;
um novo auge do antissemitismo e o fascismo.
As assim chamadas eleições para o dia 25 de maio são uma
repugnante fraude na medida em que ocorrerão sob um
ilegítimo e ditatorial regime nascido de um golpe, sob um
governo de coalizão de oligarcas e nazis, sob a ameaça de
tanques. Chamamos a boicotar estas eleições.
A falsa Verkhovna Rada (Conselho Supremo – Parlamento
unicameral de Ucrânia) de máfias de oligarcas, que aplaudiu
as matanças em Mariupol, deve dissolver-se imediatamente.
Devem se formar Conselhos de Trabalhadores em todos os
lados e eleger delegados para um novo Conselho
Parlamentar, em uma Ucrânia unida, independente e socialista
regida pelos conselhos de seus trabalhadores e de seu povo,
não por gângsteres pagos por Washington, Berlim ou
Bruxelas.
Chamamos a todas as organizações dos trabalhadores,
partidos de esquerda, movimentos sociais, de resistência e
pela emancipação de todo o mundo a mobilizar-se
urgentemente por todos os meios (manifestações, piquetes,
reuniões, materiais, etc.) para deter a criminosa agressão
militar contra o povo do sudeste da Ucrânia.
Não podemos esquecer que, particularmente na Europa e
EUA, o inimigo principal está em casa: as mesmas classes
governantes da Europa e EUA, que querem transformar a
Ucrânia e todos os ex estados soviéticos em suas colônias, já
matam de fome a seus próprios povos mediante a permanente
austeridade e o desemprego em massa. Somos todos
ucranianos!
Façamos um dia internacional de solidariedade com o povo
ucraniano contra o regime ditatorial em Kiev e seus chefes do
oeste. Que todo o mundo escute nossa voz, a voz da classe
operária internacional: Não passarão! Paz para o povo! Poder
aos conselhos de trabalhadores!
18 de abril de 2014
Assinam: Aleksei Prigarin, AMO-Moscou; Tatyana Ivanovna Filimonova, AMO-Leningrado; Darja Mitina, Frente de Esquerda, OKP (Partido
Comunista Unificado da Rússia); Savas Michael-Matsas (EEK, Grécia); Sungur Savran (DIP, Turquia); Iosif Abramson, (RPK, Partido dos
Comunistas da Russia, Conselho da Frente de Esquerda da Rússia); Mikhail Konashev (pelo Conselho de Leningrado da AMO); Yuriy
Larionov (RPK Comitê Executivo); Vyacheslav Lesov. (Communist Leningrada Conselho Editorial); Matyas Benyik (Sociedade Karl Marx de
Budapest); Hillel Ticktin (Professor Emeritus da Glasgow University); Dimitris Mizaras (Marxist Workers League, Finlândia); Yury Shakhin
(Organização Contra a Corrente da Ucrânia); Jorge Altamira (Partido Obrero, Argentina); Néstor Pitrola e Pablo López (deputados nacionais
do Partido Obrero-Frente de Esquerda, Argentina); Marcelo Ramal, Claudio del Pla, Gabriela Cerrano, Julio Quintana, Martin Dalmau, Tito
Fresina, Andrea Rodriguez (legisladores provinciais do PO-Frente de Esquerda, Argentina); Osvaldo Coggiola (Professor da Universidade de
São Paulo); Jeremy Lester (Professor da Reading University da Inglaterra, editor de Counter-Hegemony); Calliope Rigopoulou (Professor
Universidade de Atenas); Giagkos Andreadis (Professor da Panteion University, Atenas); Bertell Ollman (Professor New York University, EUA);
Tamas Krausz (Professor Eotvos Lorand University de Budapest); Roberto Yépez (Opción Obrera, Venezuela); Said Gafourov (economista e
jornalista da Pravda de Moscou); Monika Karbowska (militante do Novo Partido Anticapitalista de França e da Esquerda Anticapitalista da
Polônia); Boris Ikhlov (Secretário da Comissão Executiva do Sindicato Trabalhador da Rússia); Alexandr Sidorov (dirigente executivo do
sindicato de trabalhadores de Perm, Rússia); Mitchel Cohen (Brooklyn Greens/Green Party de New York); Ana Bazac (Professora da
Universidade de Bucarest), e seguem as firmas...
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Conselho de Redação: Carlos Sanches – Rodrigo Belinaso Guimarães – Guilherme Giordano – Cristiana de Vasconcelos Lopes –
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